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DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 EDUCAÇÃO MUSEAL ONLINE: a Educação Museal na/com a Cibercultura ONLINE MUSEUM EDUCATION: Museum Education in Cyberculture EDUCACIÓN MUSEAL ONLINE: Educación Museal en/con la Cibercultura Frieda Maria Marti1 Edméa Oliveira dos Santos2 RESUMO O presente artigo tem como objetivo narrar as principais transformações comunicacionais e educacionais geradas pelo rápido e intenso desenvolvimento das tecnologias digitais em rede (TDR) na contemporaneidade e discutir sua relação com a educação museal. O termo e noção ‘Educação Museal Online’ (EMO) é apresentado e sugerido como um novo modo de fazerpensar3 ações educativas museais na/com a cibercultura, a partir dos referenciais teórico-epistemológicos da multirreferencialidade (Ardoino, 1998) e das pesquisas dos/nos/com os cotidianos (Alves, 2008, 2010; Certeau, 2014), assim como das experiências de práticas educativas museais online levadas a cabo pela primeira autora com/na Seção de Assistência ao Ensino do Museu Nacional/UFRJ, como parte de sua participação como professora colaboradora do setor e de sua pesquisa de doutorado em desenvolvimento no Programa de Pós-Graduação (PROPED) da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). PALAVRAS-CHAVE: Educação Museal. Cibercultura. Educação Museal Online. SAE. ABSTRACT This article aims to describe the main communicational and educational changes generated by the rapid and intense development of digital network technologies (TDR) in contemporary times and discuss their relationship with museum education. The term and notion 'Online Museml Education' (OME) is presented and suggested as a Submetido em: 14/08/2019 Aceito em: 29/08/2019 Publicado em: 31/08/2019. 1 Graduada em Ciências Biológicas (Licenciatura/UERJ), Mestre Zoologia (Museu Nacional/UFRJ), Doutoranda da Faculdade de Educação (PROPED/UERJ). Integrante do Grupo de Pesquisa Docência e Cibercultura (GpDOc), coordenado pela Profa Dra Edmea Santos e do Grupo de Pesquisa Educação Museal: história, conceitos e políticas, do diretório do IBRAM no CNPq, coordenado pela Profa Dra Fernanda Castro. 2 Professora Titular-Livre da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro/Programa de Pós-Graduação em Educação e Programa de Pós-Graduação em Educação da UERJ. Endereço para acessar CV: http://lattes.cnpq.br/4023554724278836. Sites institucionais: http://cursos.ufrrj.br/posgraduacao/ppgeduc/, www.proped.pro.br. Ambiente Virtual: www.docenciaonline.pro.br. Email:edmeabaiana@gmail.com 3 Segundo OLIVEIRA e ALVES (2008, p. 11) a junção de termos e a sua inversão, em alguns casos, foi a forma das autoras mostrarem “os limites para as pesquisas nos/dos/com os cotidianos, do modo dicotomizado criado pela ciência moderna para analisar a sociedade”. © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 41 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 new way of thinking about museum education activities in/with cyberculture, based on the theoreticalepistemological grounds of multirreferentiality (Ardoino, 1998) and everyday life research (Alves, 2008, 2010; Certeau, 2014), as well as based on the experiences of online museum educational practices carried out by the first author with the Teaching Assistance Section of the National Museum/UFRJ, as part of her collaboration with the the sector and her PhD research project at the Post-Graduation Program (PROPED) of the Faculty of Education of the State University of Rio de Janeiro (UERJ). KEYWORDS: Museum Education. Cyberculture. Online Museum Education. SAE RESUMEN Este artículo tiene como objetivo narrar las principales transformaciones comunicativas y educativas generadas por el rápido e intenso desarrollo de las tecnologías de redes digitales (TDR) en los tiempos contemporáneos y discutir su relación con la educación museal. El término y la noción 'Online Museal Education' (EMO) se presenta y sugiere como una nueva forma de pensar sobre las acciones educativas musinales en / con la cibercultura, basada en las referencias teórico-epistemológicas de la multirreferencialidad (Ardoino, 1998) y la investigación de (Alves, 2008, 2010; Certeau, 2014), así como las experiencias de prácticas educativas en museos en línea llevadas a cabo por la primera autora con / en la Sección de Asistencia Docente del Museo Nacional / UFRJ, como parte de su Participación como profesora colaboradora del sector y su investigación de doctorado en desarrollo en el Programa de Posgrado (PROPED) de la Facultad de Educación de la Universidad Estatal de Río de Janeiro.. PALABRAS CLAVE: Educación museal. Cibercultura. Educación museal. SAE INTRODUÇÃO Este artigo tem como objetivo narrar as principais transformações comunicacionais e educacionais geradas pelo rápido e intenso desenvolvimento das tecnologias digitais em rede (TDR) na contemporaneidade e discutir sua relação com a Educação Museal. Para tal, dividimos nosso texto em seções que apresentam e discutem os principais temas relacionados ao objetivo em questão. Na primeira seção buscamos apresentar as características das TDR e narrar como essas, a partir de suas potencialidades e noções como, hipertexto, hipermídia, interatividade, mobilidade e ubiquidade vem condicionando a cultura contemporânea, a qual nomeamos de Cibercultura. Nessa mesma seção fazemos um breve relato sobre os desafios e possibilidades que o contexto contemporâneo apresenta aos museus, apresentando exemplos de diferentes usos que os mesmos vêm fazendo das TDR. Na segunda seção, apresentamos um panorama sobre o fazerpensar a educação na cibercultura a partir da noção de Educação Online, suas características e premissas, na relação com as TDR. © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 42 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 A Educação Museal é discutida na seção seguinte a partir de sua origem socio-histórica e política e de seu conceito apresentado Política Nacional de Educação Museal (PNEM). Por fim, o termo e noção ‘Educação Museal Online’ (EMO) é apresentado e sugerido como um modo outro de fazerpensar ações educativas museais na/com a cibercultura, a partir dos referenciais teórico-epistemológicos da multirreferencialidade (Ardoino, 1998) e das pesquisas dos/nos/com os cotidianos (Alves, 2008, 2010; Certeau, 2014), assim como das experiências de práticas educativas museais online levadas a cabo pela primeira autora com/na Seção de Assistência ao Ensino (SAE)4 do Museu Nacional/UFRJ, como parte de sua participação como professora colaboradora do setor e de sua pesquisa de doutorado5 em desenvolvimento no Programa de Pós-Graduação (PROPED) da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. A CIBERCULTURA O surgimento e o intenso desenvolvimento das TDR vêm transformando nossos modos de ser, estar e sentir o mundo. Os grandes avanços no campo das tecnologias da informação e da telecomunicação que ocorreram a partir da década de 1970, com a digitalização da informação e a internet, e posteriormente com a world wide web, podem ser considerados os primeiros catalisadores das intensas transformações sociotécnicas, culturais, políticas e econômicas contemporâneas. Essas tecnologias, segundo SANTOS (2014, p.53), vem possibilitando inúmeros mecanismos de processamento, armazenamento e circulação de informações e conhecimentos variados. E provocando mudanças radicais nos modos e meios de produção e de desenvolvimento em várias áreas da atividade humana, entre elas transformações dos clássicos processos de comunicação e, sociabilidade, bem como de educação e aprendizagem. O processo de digitalização dos mais diversos tipos de informação pode ser considerado 4 https://www.facebook.com/saemuseunacional/ ; https://www.instagram.com/saemuseunacional ; https://saemuseunacional.com “A Educação Museal Online: uma ciberpesquisa-formação na/com a Seção de Assistência ao Ensino (SAE) do Museu Nacional/UFRJ” – projeto de Doutorado. 5 © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 43 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 como precursor e catalizador dessas transformações infocomunicacionais e sociotécnicas. Segundo Santaella (2007), os méritos da digitalização são: a universalização da linguagem, que possibilita tratar qualquer tipo de informação sob o mesmo princípio, a compressão de dados que permite o envio e armazenamento de dados em um menor espaço, e “a independência da informação digital em relação ao meio de transporte” (2007, p. 301). Além disso, a autora destaca que a digitalização se tornou o suporte ideal para a operacionalização do hipertexto e para o surgimento de uma nova linguagem, a hipermídia. Apesar de não ser um fenômeno exclusivo do digital, o hipertexto ganhou potência ao ser incorporado pelos computadores, pois passou a ser constituído de vínculos não lineares entre fragmentos textuais associativos, interligados por conexões conceituais (campos), indicativas (chaves), ou por metáforas visuais (ícones) que remetem, ao clicar de um botão, de um percurso de leitura a outro, em qualquer ponto da informação ou para diversas mensagens em cascatas simultâneas e interconectadas. (SANTAELLA, 2007, p.300) O acesso à informação não linear permite que o leitor, por meio de hiperlinks, defina o seu próprio caminho de leitura e acesso à informação, definindo ele mesmo o volume e os níveis de profundidade da informação. Ele não precisa mais se deslocar fisicamente em meio ao hipertexto (em uma biblioteca, por exemplo), pois esse encontra-se disponível à sua frente, em uma tela de ‘computador’, de forma plástica e móvel. Não existe início, meio e fim. “O fim no hipertexto é sempre um novo começo caleidoscópico, no qual podemos, simultaneamente, ler vários textos (janelas mixadas), cortar, colar e criar intertextos” (SILVA e SANTOS, 2009, p.7). Para SANTAELLA (2007, p. 312), em tempos de hipertexto, um mesmo texto, quando passa do suporte impresso para um suporte digital, já não é realmente o mesmo, pois novos dispositivos formais modificam suas condições de recepção e de compressão. Lévy (1999) argumenta que o hipertexto possibilita a autoria do leitor, uma vez que permite que esse leitor construa a sua ‘matriz de textos potenciais’, participando assim da estruturação desse texto que, por sua vez, faz mais sentido para ele do que para quem o criou. Os leitores podem não apenas modificar os links, mas também podem acrescentar ou modificar nós (textos, imagens, etc.), conectar um hiperdocumento a outro e dessa forma transformar em um único documento dois hipertextos que antes eram separados ou, de acordo com o ponto de vista, traçar links hipertextuais entre um grande número de documentos. (LÉVY, 1999, p. 59) Ao hipertexto também foram incorporadas outras linguagens. Santaella (2007) afirma que um © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 44 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 dos aspectos mais importantes da evolução digital foi o rápido desenvolvimento da multimídia, resultado da fusão dos vários campos midiáticos tradicionais (o documento escrito, o audiovisual, as telecomunicações, e a informática), processo a que se refere como ‘convergência das mídias’. Para a autora, a hibridização das tecnologias e a convergência das mídias foram os principais fatores propulsores do surgimento da hipermídia, considerada uma nova linguagem e que traz consigo novos modos de pensar, agir e sentir. Brotando da convergência fenomenológica de todas as linguagens, a hipermídia significa uma síntese inaudita das matrizes da linguagem e pensamento sonoro, visual e verbal, com todos os seus desdobramentos e misturas possíveis. (SANTAELLA, 2007, p. 320) Santaella (2007, p.119) nos revela que, “foi a emergência da cultura planetária, via redes de teleinformática, que instalou definitivamente a crise na hegemonia dos meios de massa”. A autora revela o surgimento de uma revolução digital, a partir de meados da década de 90, que permitiu a conversão de textos, imagens e/ou sons em uma mesma linguagem, ou seja, a ‘convergência das mídias’. Um dos aspectos mais significativos da evolução digital foi o rápido desenvolvimento da multimídia que produziu a convergência de vários campos midiáticos tradicionais. Foram assim fundidas, em um único setor do todo digital, as quatro formas principais da comunicação humana: o documento escrito (imprensa, magazine, livro); o áudio visual (televisão, vídeo, cinema); as telecomunicações (telefone, satélites, cabo) e a informática (computadores, programas informáticos)” (SANTAELLA, 2003, p. 84). Com o advento da internet e posteriormente o surgimento da web, esses “signos híbridos, digitalizados, fluidos e reconfiguráveis à vontade” (SANTAELLA, 2007, p. 321) passaram a circular e configurar um potente ambiente comunicacional de interação e conectividade online. A partir da digitalização da informação e dessa interconexão mundial de computadores surge o ciberespaço, que, segundo LEVY (1999, p. 92), se configura no espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores. Essa definição inclui o conjunto dos sistemas de comunicação eletrônicos (aí incluídos os conjuntos de redes hertzianas e telefônicas clássicas), na medida em que transmitem informações provenientes de fontes digitais ou destinadas à digitalização. Sendo assim, as redes humanas e não humanas (máquinas cerebrais) formadas a partir do advento da internet permitiram a configuração e a reconfiguração de novos espaçotempos de interação e de aprendizagemensino. Esse novo espaço conversacional, o ciberespaço, permite © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 45 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 a troca de informações e diversos modos de comunicação, simultânea ou não, entre todos os seus usuários (um-um, um-todos, todos-todos). A interatividade que emerge nesses novos espaçotempos desafia o modelo massivo unidirecional e linear de comunicação, característico das mídias de massa e das salas de aula ‘tradicionais´’. De acordo com Silva (2012), a interatividade é um fenômeno comunicacional da ‘sociedade da informação’ que se instalou devido às novas configurações informáticas e telecomunicacionais e que se manifesta nas esferas tecnológica, mercadológica e social. Segundo o autor, as transformações sociais são observadas pela não mais pregância da passividade da recepção diante da emissão do produto acabado, mas uma crescente autonomia de busca, onde cada indivíduo faz por si mesmo, num ambiente polifônico, polissêmico que vem à tona quando ocorre o enfraquecimento dos grandes referentes que determinavam significações ou verdades acabadas para o consumo passivo das massas (Igreja, política, família, ideologia, educação escolar, mídia de massa, etc.). Há uma recursividade em evidência. (SILVA, 2012, p.13) Santos (2011) relata que a interatividade é compreendida como um ato intencional de comunicação com o outro, onde há a cocriação da mensagem, por meio de intervenção física na mesma, com ou sem mediação digital. Entretanto, a autora enfatiza a potencialidade das interfaces digitais para fomentar a interatividade em casos onde os sujeitos estejam geograficamente dispersos, e chama a atenção de que “o digital em rede institui novas presencialidades para além do espaço físico e geográfico das cidades” (SANTOS, 2011, p. 88). Como novo e potente meio de comunicação que reúne, integra e redimensiona uma infinidade de mídias, esse espaço informacional se constitui e é constituído pelas tecnologias digitais em rede, que é para nosso tempo um dos mais importantes artefatos técnico-culturais, pois ampliam e potencializam a nossa capacidade de memória, armazenamento, processamento de informações e conhecimentos, e, sobretudo, de comunicação. A comunicação caracterizada pela liberação do polo da emissão, pela reconfiguração das mídias e pela conectividade generalizada. (SANTOS, 2011, p.77) Portanto, a emergência de formas outras de sociabilidade juntamente com a convergência entre a informática e as telecomunicações iniciadas a partir da década de 1970 vêm gerando relações e transformações comunicacionais, sociotécnicas, econômicas e culturais peculiares, a que Levy (1999) e Lemos (2003) nomearam de Sociedade da Informação e Castells (2010) designou como sociedade em rede. © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 46 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 De acordo com o último autor, um novo sistema de comunicação que fala cada vez mais uma língua universal digital tanto está promovendo a integração global da produção e distribuição de palavras, sons e imagens de nossa cultura como personalizando-os ao gosto das identidades e humores dos indivíduos. As redes interativas de computadores estão crescendo exponencialmente, criando novas formas e canais de comunicação, moldando a vida e, ao mesmo tempo, sendo moldadas por ela. (CASTELLS, 2010, p. 40) Essas novas formas de comunicação emergentes no ciberespaço, portanto, vêm transformando as relações entre a técnica e a vida social e produzindo novas linguagens e signos, e desenvolvendo uma nova cultura contemporânea, a cibercultura. Estruturada pelas TDR nas esferas do ciberespaço e das cidades, a cibercultura se caracterizou inicialmente pela emergência da web 2.0, seus softwares e redes sociais online. Segundo Lemos (2003), essas novas maneiras de nos relacionarmos com o mundo e com o outro se originaram a partir das características comunicacionais próprias da cibercultura, a que o autor nomeia de “princípios fundamentais da cibercultura” (Lemos, 2010, p. 158). A saber: a) a reconfiguração das instituições e da indústria cultural de massa - deve-se evitar a “lógica da substituição ou do aniquilamento” (LEMOS, 2003, p.8); ou seja, constitui a reconfiguração de práticas, mídias e espaços sem que seus antecedentes sejam substituídos; b) liberação do pólo de emissão - vozes e discursos anteriormente reprimidos e calados pelas mídias de massa agora libertam-se e ganham espaço. “A liberação do pólo da emissão está presente nas novas formas de relacionamento social, de disponibilização da informação e na opinião e movimentação social da rede” (LEMOS, 2003, p. 9); c) conexão generalizada - “A conectividade generalizada põe em contato direto homens e homens, homens e máquinas, mas também máquinas e máquinas, que passam a trocar informação de forma autônoma e independente” (LEMOS, 2003, p. 9). Podemos estar sós, mas sem estarmos isolados. Mais recentemente, com o desenvolvimento das tecnologias e dispositivos móveis, a cibercultura vem se caracterizando pela emergência da mobilidade ubíqua em conectividade com o ciberespaço e as cidades (SANTOS e SANTOS, 2012). Apesar de não ser uma nova realidade, a mobilidade possui um papel determinante no contexto cibercultural de nosso tempo, pois dado à interconectividade com o ciberespaço e a cidade, a mobilidade, associada ao hipertexto, permite a expansão da interatividade e, por sua © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 47 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 vez, da autoria dos praticantes culturais6, potencializando as práticas culturais contemporâneas e aprendizagens em espaçotempos plurais e diversos, como por exemplo o museu. O Museu e o Digital em Rede – novos desafios e perspectivas Além de provocar mudanças nos paradigmas educacionais, o novo cenário sociotécnico e cibercultural vem apresentando aos museus e seus praticantes novos desafios em relação às suas práticas comunicacionais e educacionais e em relação ao patrimônio e a cultura. “A cultura material e imaterial encontra uma nova linguagem para comunicar a sua historicidade e seu valor de bem patrimonial”, afirma MELLO (2013, p. 9). As intensas mudanças sociais do final da década de 1960, a crescente diversificação de públicos, e o aumento de suas coleções e demandas internas, além do rápido e progressivo desenvolvimento da computação direcionou a atenção dos museus para essa tecnologia emergente (Parry, 2007). De acordo com o autor, a história do uso de computadores em museus pode ser marcada a partir de 1963, quando o diretor do Museu Nacional de História Natural da Smithsonian Institution determina a criação de um grupo de estudos para pesquisar as possibilidades de desenvolvimento de um sistema de processamento de dados para gerenciamento de suas coleções. Em 1969 o sistema estava pronto e em funcionamento. Cientes de seu papel frente às comunidades e do papel do museu no que tange à disponibilização de informações acerca de suas coleções, (ELLIN, apud Parry, 2007) declara, durante reunião do ICOM em 1968, À medida que os públicos de museus continuam a crescer, estamos começando a reconhecer que os dados descritivos, textuais e visuais, de nossas coleções públicas de arte e de material científico e histórico devem se tornar mais acessíveis e empregados de maneiras muito mais imaginativas do que nos possibilitam os meios convencionais atuais. Os museus estão se aproximando rapidamente do ponto de estagnação no que tange a atender suas próprias necessidades de informação, para não mencionar as demandas intensificadas feitas pela comunidade acadêmica e pelo público. (1968, p. 5)7 Bautista (2014) afirma que os usos de computadores por museus nos anos iniciais de sua implementação estavam voltados ao atendimento de necessidades internas das instituições, Segundo Certeau (2014), os praticantes culturais são os ‘homens comuns’, os usuários e participantes que vivem e se envolvem dialogicamente com as práticas cotidianas, não apenas consumindo os produtos culturais hegemônicos, mas usando-os de formas inesperadas. 6 7 Tradução nossa. © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 48 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 como por exemplo, manutenção de registros, comunicação e disponibilização e facilitação do acesso a informações para estudantes e pesquisadores. Acompanhando as rápidas mudanças sociotécnicas das décadas seguintes, muitos museus passaram a disponibilizar CD-ROMs a seus públicos para facilitar o acesso a seus acervos, até que em 1991, diante da emergente popularização da internet, é realizada a primeira conferência sobre o uso da hipermídia e da interatividade nos museus. Mais conhecida pela sigla ICHIM - International Conference on Hypermedia and Interactivity in Museums - esta conferência tem-se realizado bianualmente nos Estados Unidos e em alguns países da Europa para discutir as questões sobre o uso das TDR nos museus (Oliveira, 2009; Silva, 2018). Em 1992 o ICOM reuniu o seu comitê de documentação, o CIDOC, para discutir os usos e implementação das tecnologias digitais nos museus e, em 1995, em nova reunião, foi gerado um documento8 contendo diretrizes e esclarecendo importantes questões sobre os uso das mídias e da internet no que diz respeito às políticas de gestão de coleções e documentos museais (gestão do patrimônio), dentre outras. Diante do surgimento da internet e compreendendo as suas potencialidades no que tange a ampliação de oportunidades comunicacionais e educacionais, muitos museus começam a se presentificar no ciberespaço, por meio da criação de sites institucionais e fazendo uso dos recursos online disponíveis na época, a fim de ampliar a divulgação e a disponibilização de informações/conteúdos sobre seus acervos e atividades culturais realizadas em seus espaços físicos, e oferecer novos meios de comunicação para/com seus usuários/visitantes (Piacente, 1996; Teather, 1998; Marty, 1999; Rayward e Twidale, 1999; Teather e Wilhelm, 1999; Schweibenz, 2004; Han, 2015). Oliveira afirma que o uso inicial que os museus fizeram da internet foi o de oferecer acesso a informações antes inacessíveis por razões de distância física/geográfica. De acordo com o autor, em primeira instância, o museu divulgou a sua imagem em mídias como CD ROMs, para, em seguida, descobrir no ciberespaço caminhos para a divulgação dos seus serviços e projetos e a incorporação de interfaces digitais que possibilitassem a exposição, a ludicidade, a simples informação institucional e a (tímida) disponibilização do acervo. (2004, p.6) As diversas formas de uso e de presentificação dos museus na internet leva Schweibenz 8 Os relatórios da conferências do CIDOC podem ser acessados em: http://network.icom.museum/cidoc/archive/past-conferences/ © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 49 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 (2004) a estabelecer quatro categorias de museus ‘virtuais’9 com base no tipo de disponibilização de informações e interação com os usuários: • O museu folheto/brochura: site que contém informações básicas sobre o museu, tais como tipos de coleções, contatos, etc. Seu objetivo é oferecer informações a visitantes em potencial. • O museu de conteúdo: é um site que apresenta as coleções do museu e convida o visitante virtual a explorá-las online. O conteúdo é apresentado de forma orientada ao objeto e é basicamente idêntico ao banco de dados da coleção. É mais útil a especialistas do que aos leigos, porque o conteúdo não é apresentado de forma didática. O objetivo deste tipo de museu é fornecer um retrato detalhado de suas coleções físicas. • O museu de aprendizagem: é um website que fornece diferentes pontos de acesso aos seus visitantes virtuais, de acordo com a idade, ‘background’ e conhecimento. A informação é apresentada de forma contextual ao invés de centrada no objeto. Além disso, o site é apresentado de forma didática e possui links para informações adicionais que motivam o visitante virtual a aprender mais sobre um assunto de seu interesse e a revisitar o site. O objetivo do museu de aprendizagem é fazer com que o visitante virtual retorne e estabeleça um relacionamento pessoal com a coleção online. Idealmente, o visitante virtual visitará o museu ver os objetos reais. • O museu virtual: a etapa seguinte ao museu de aprendizagem é não só oferecer informações sobre as coleções da instituição, mas também disponibilizar links para outras coleções digitais. Dessa forma, são criadas coleções digitais que não possuem similares no mundo real. Esta é a implementação da visão de André Malraux sobre o "museu sem paredes" (SCHWEIBENZ, 2004, p. 3)10. Diante desse novo contexto sociotécnico e dos crescentes desafios e oportunidades que as TDR vinham apresentando ao campo, Manuel Castells, em palestra ministrada durante a conferência geral do ICOM em 2001, levanta o questionamento acerca da capacidade dos museus em intervir na significativa contradição cultural que emerge na/com a Era da Informação. Tal contradição, explica o autor, consiste, por um lado, na emergência de uma sociedade em rede, uma sociedade da hipercomunicação, que possibilita a comunicação global da cultura, e, por outro lado, na fragmentação de sociedades, na perda de códigos compartilhados e na ruptura da comunicação entre identidades específicas (Castells, 2001). Segundo o autor, os museus, como instituições culturais que armazenam, processam e transmitem mensagens culturais para/em determinado contexto social, podem se tornar protocolos de comunicação entre diferentes identidades, por meio da comunicação da arte, da ciência e da experiência humana; e podem se tornar conectores de diferentes temporalidades, traduzindo-as em uma sincronia comum, enquanto mantém uma perspectiva histórica. E, por último, podem conectar as dimensões globais e locais de identidade, espaço e sociedade. (CASTELLS, 2001, p. 9 O autor usa o termo ‘virtual’ para se referir a museus que se presentificam na internet. 10 Tradução nossa. © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 50 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 7)11 Entretanto, Castells (2001) chama a atenção de que para cumprirem esse papel, os museus precisam criar novos formatos tecnológicos de protocolos de comunicação, e precisam estar abertos à sociedade como instituições interativas e educacionais, que não apenas se constituem como repositórios de objetos/arquivos, situados em um determinado contexto identitário histórico, mas também que estejam abertos à multiplicidade de culturas do presente e do futuro a fim de se tornarem espaços de inovação cultural e centros de experimentação. Como visto, o advento da internet e o surgimento de uma ‘sociedade em rede’ e/ou uma ‘era da informação’ trouxe para os museus novos desafios e perspectivas diante do seu papel/função que já vinha sendo discutido e modificado. A Nova Museologia já havia gerado transformações de ordem física e discursiva, e os museus, que tradicionalmente voltavam seu foco para os objetos, estavam vivenciando um período de transição em que contextos sóciopolíticos de épocas anteriores engendraram reflexões acerca de sua função social e educacional. Até o presente, a definição de museu apresentada pelo ICOM é a seguinte: O museu é uma instituição permanente sem fins lucrativos, ao serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público, que adquire, conserva, investiga, comunica e expõe o patrimônio material e imaterial da humanidade e do seu meio envolvente com fins de educação, estudo e deleite (ICOM, 2015) 12. Portanto, para lidar com esses novos desafios emergentes e lançar mão das potencialidades comunicacionais da internet a fim de atender e responder às suas novas funções perante a sociedade, os museus, em um primeiro momento, e como já narrado anteriormente, se presentificaram no ciberespaço por meio da criação de sites institucionais e intencionalidades interativas de vários tipos. Entretanto, um novo desafio estava por vir: a web 2.0. O termo web 2.0 se torna popular nos primeiros anos década de 2000 e faz referência a uma série de novas interfaces na internet que, ao contrário das disponíveis anteriormente, permitem ao usuário a criação e o compartilhamento de conteúdo autoral por meio de texto, imagem e áudio. Nessa nova web, o usuário não apenas navega a internet para buscar 11 Tradução nossa. 12 http://icom.museum/the-vision/museum-definition/ http://icom-portugal.org/2015/03/19/definicao-museu/ © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 51 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 informações, mas ele também pode ser o produtor de informações. Um novo paradigma comunicacional emerge da/na/com a web 2.0. A liberação do polo de emissão reestrutura a lógica comunicacional de um modelo unilateral (um-todos) para um modelo plural e polifônico (todos-todos). Para os museus, a web 2.0 trouxe desafios e oportunidades. Acostumados a ter o controle das informações que disponibilizavam na internet, os museus se veem diante do novo desafio de adaptação aos novos comportamentos de usuários gerados pela web 2.0. De acordo com Thompson (2010), as interfaces da web 2.0 oferecem boas oportunidades para o museu agir como mediador entre o objeto e o público, possibilitando a aprendizagem e o engajamento dos usuários por meio de perguntas e comentários, e outros tipos de participação não possíveis anteriormente. Adicionalmente, os usos dessas interfaces sociais, ainda vinculadas ao modelo unidirecional de informação da web 1.0, ofereceria ao museu oportunidades de assumir papéis variados (i.e. autoridade, parceria e aprendiz) no que tange a produção, distribuição e interpretação de conhecimentos. Segundo Schweibenz (2011), os museus precisariam se adaptar a esse novo contexto comunicacional na internet, uma vez que: (a) a comunicação com públicos heterogêneos e geograficamente distantes se tornaria cada vez mais importante e presente, (b) a população infantil e jovem já estaria familiarizada/imersa com/na lógica comunicacional da ‘web social’, (c) seria necessário não apenas estar presente na internet, que já era utilizada como a principal fonte de pesquisa de informações, mas também se adaptar aos novos ‘padrões de usos’ gerados pela web 2.0. O autor discute quatro temas que considera importante diante dos novos dilemas impostos, i.e. autoridade, comunicação, participação e confiança, e conclui Para ser e permanecer uma parte relevante da sociedade da informação, os museus devem estar prontos a ceder autoridade e controle de conteúdo, permitindo que seu público possa contribuir com suas visões e opiniões sobre o conteúdo do museu e usá-lo de acordo com seus interesses e necessidades. Isso inclui o uso de mídias sociais na Internet, o que não significa necessariamente que cada instituição precise de mídia social imediatamente e use toda a variedade de interfaces de uma só vez. É aconselhável começar por experimentar várias interfaces da web 2.0 para então decidir por uma ou duas que e estejam de acordo com a missão da instituição e atendam às necessidades de seu público. Neste processo, o equilíbrio entre autoridade e controle, por um lado, e a participação e confiança, por outro lado, podem ser testados e refinados na/com a prática diária. (SCHWEIBENZ, 2011, p.12)13 13 tradução nossa © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 52 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 Parry (2007) também aborda os temas ‘autoridade e autoria’ quando discute as mudanças no/do museu na relação com as comunidades locais e a sociedade como um todo. Essas mudanças se refletem em oportunidades de participação ativa dos públicos no/com o museu, por meio de uma série de atividades museais, como por exemplo, exposições de artistas locais, participação em sociedades de amigos do museu, workshops comunitários, avaliações dos visitantes etc. No que tange à web 2.0 o autor afirma que Para os profissionais e instituições que buscavam diversificar as vozes ouvidas dentro de um museu mais responsivo e relevante, as novas mídias (e a web em particular) ofereciam uma poderosa ferramenta pela qual os não visitantes podiam ser alcançados, várias narrativas podiam ser reunidas e onde a interpretação (para nos lembrar do léxico de Manovich) era tão variável quanto o próprio meio. (PARRY, 2007, p. 109)14 Para o autor, as características na nova web, ou seja, a abertura, o alcance e a liberação de autorias estariam em sintonia com as práticas, projetos e filosofias emergentes de/em alguns museus, onde autoridade e autoria poderiam ser compartilhadas, e não seriam apenas de propriedade do curador. A fluidez das mídias digitais estariam em consonância com os discursos e aspirações de um novo museu centrado nas pessoas. Discutindo a comunicação no/do/com o museu, Drotner e Schrøder (2013) chamam atenção de que as mídias sociais (i.e. as interfaces da web 2.0) instigam uma reflexão, por parte dos museus, acerca da necessidade de mudança de seu modelo comunicacional transmissivo unidirecional (i.e. o que a instituição deseja transmitir) para um modelo comunicacional centrado no usuário (i.e. o que os públicos poderiam desejar). Segundo xs autorxs, as mídias sociais podem estimular e ampliar o envolvimento de comunidades locais, o engajamento público e a aprendizagem, o que potencialmente poderia gerar impactos nas cinco dimensões listadas na definição de museu do ICOM, ou seja, na aquisição, conservação, pesquisa, exibição e comunicação. As mídias sociais oferecem um grande potencial para os museus no que tange à promoção do envolvimento dos visitantes, no fomento ao engajamento de visitantes em potencial e da sociedade em geral. Essas interfaces oferecem a seus usuários novos modos de interação, participação e criação de redes, com determinados museus, quando e onde desejarem. Essas potencialidades dizem respeito, principalmente, ao modos de comunicação oferecidos pelas mídias sociais em termos de presença, pois as pessoas já fazem uso desse modelo comunicacional; em termos de fácil feedback e diálogo com uma diversidade de grupos/fóruns sociais; e em termos de opções de colaboração e cocriação de conteúdo. Por meio dessas opções, os museus podem demonstrar a relevância de seu papel em colaborar para a 14 tradução nossa © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 53 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 reflexão de seus visitantes acerca de si no/com o mundo, fortalecendo assim suas conexões públicas e sua relevância social. (DROTNER e SCHRØDER, 2013, p. 20). A todas essas potencialidades das interfaces digitais em rede da web 2.0 somam-se o surgimento e o rápido desenvolvimento das tecnologias e dispositivos móveis que gerou grande impacto no que diz respeito à comunicação e, por conseguinte, à aprendizagem. A mobilidade, cuja dimensão primária se apresentou e caracterizou pela circulação física de corpos e objetos e em seguida pela circulação de pensamento, encontra-se atualmente representada pela dimensão informacional-virtual, a dimensão do fluxo de informação em rede (Lemos, 2009). Essas dimensões não excludentes de mobilidade e suas possíveis recombinações, associadas a habilidade de comunicação a qualquer hora e em qualquer lugar (ubiquidade) mediada pelo uso dispositivos móveis em rede, possibilitam a imersão na cultura contemporânea e promovem uma nova forma de ser e estar em sociedade. Considerando as potencialidades comunicacionais da mobilidade e da ubiquidade, muitos museus passaram a fazer uso das mesmas visando ampliar a experiência comunicacional e educacional de seus visitantes, por meio de participação ativa e de uma variedade de meios de compartilhamento de informações, tornando sua experiência mais significativa e contextualizada. São várias as experiências museais que lançaram mão da mobilidade e ubiquidade em ações expositivas e/ou educativas. Barbosa (2014) narra alguns projetos levados a cabo por três museus de arte da cidade de São Paulo, como por exemplo, o uso do Google Arts, do Instagram e o desenvolvimento de diferentes tipos de aplicativos para dispositivos móveis que tinham como objetivos: divulgar o acervo, auxiliar visitantes por meio de visitas guiadas em libras, ampliar o conhecimento do público sobre as coleções do museu por meio de um jogo interativo e possibilitar que o público tenha acesso a partes da coleção que não estão expostas por meio da realidade aumentada. Muitos outros museus internacionais também vêm lançando mão das potencialidades da mobilidade e da ubiquidade em diversos campos das TDR, como por exemplo, o desenvolvimento de aplicativos para celulares contendo inúmeros recursos informacionais, como por exemplo, áudio guias, a criação de situações de realidade aumentada e a utilização de códigos QR nos espaços expositivos (citar aqui os textos sobre mobilidade). A EDUCAÇÃO ONLINE Como discutido acima, a reconfiguração e a convergência das mídias digitais em rede, a conexão generalizada e a liberação do polo de emissão possibilitaram a qualquer usuário das © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 54 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 redes digitais (praticantes culturais) a produção, o armazenamento, e a circulação de informação em vários formatos. O cenário comunicacional contemporâneo é composto por fluxos multidirecionais de informações. O ciberespaço se constitui, portanto, em um espaço de múltiplas redes contínuas, abertas, plásticas e atemporais de aprendizagemensino em que múltiplos saberes são produzidos com o outro e/ou coletivamente. Portanto, esses artefatos culturais (as TDR móveis e ubíquas) constituem importantes meios, no que tange às suas potencialidades comunicacionais e pedagógicas, para fomentar a produção e cocriação de conhecimentos em rede, modificando as formas como os praticantes culturais se percebem e apreendem com/no mundo (Santos, Ribeiro e Carvalho, 2019). O ciberespaço está agora mais presente do que nunca, tão presente a um simples toque de dedos em levíssimos dispositivos sempre na palma de nossas mãos, que nem sequer nos damos conta de estarmos ao mesmo tempo no ciberespaço e fora dele, pisando o chão e simultaneamente ubíquos, viajando, pousando, entrando e saindo de espaços de informação e de comunicação à mesma velocidade com que nossos olhos piscam. (SANTAELLA, 2010, p. 89) Diante dessas novas dinâmicas e contextos comunicacionais e de produção de conhecimento, fez-se necessário fazerpensar outras modalidades de aprendizagemensino que levem em conta a relação do praticante cultural com esses múltiplos espaços de colaboração em rede (e.g. redes sociais digitais) na esfera cidade-ciberespaço em tempos de mobilidade e ubiquidade. Esse novo cenário sociotécnico e comunicacional engendra novos espaçotempos de aprendizagemensino e conhecimentossignificações, conforme apontado por Santos. A noção de espaço de aprendizagem vai além dos limites do conceito de espaço/lugar. Com a emergência da “sociedade em rede”, novos espaços digitais e virtuais de aprendizagem vêm se estabelecendo a partir do acesso e do uso criativo das novas tecnologias da comunicação e da informação. Novas relações com o saber vão-se instituindo num processo híbrido entre o homem e a máquina, tecendo teias complexas de relacionamentos com o mundo. (SANTOS, 2011, p. 28, grifo da autora) Esse cenário sociotécnico é a cibercultura, que é a cultura contemporânea mediada e estruturada pelas TDR nas esferas da cidade e do ciberespaço, e que atualmente se caracteriza como cibercultura móvel e ubíqua. Essas formas de acesso à internet, a mobilidade e a ubiquidade, não só mudaram a nossa relação com o ciberespaço, mas também vem modificando a nossa relação com os espaços urbanos e, esses com o ciberespaço (Santos, 2014). De acordo com a autora, a mobilidade ubíqua “caracteriza-se, sobretudo, pela conexão © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 55 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 constante com os espaços urbanos e interações sociais diversas com e nesses espaços” (SANTOS, 2014, p.33), e nesses espaços urbanos estão incluídos os diversos equipamentos culturais da cidade e dentre eles, os museus. Emergindo como um fenômeno da cibercultura, a Educação Online (EOL) é caracterizada por SANTOS (2014, p. 63) como “um conjunto de ações de ensino-aprendizagem, ou atos de currículo mediados por interfaces digitais que potencializam práticas comunicacionais interativas, hipertextuais e em mobilidade” e que não se constitui como uma evolução da Educação à Distância (EAD). A educação online não é simplesmente sinônimo de educação à distância. A educação online é uma modalidade de educação que pode ser vivenciada e exercitada tanto para potencializar situações de aprendizagem mediadas por encontros presenciais; a distância, caso os sujeitos do processo não possam ou não queiram se encontrar face a face; ou híbridos, quando os encontros presenciais podem ser combinados com encontros mediados por tecnologias telemáticas. (SANTOS, 2014, p. 55, grifos da autora) Segundo a autora, a EOL se fundamenta no uso de interfaces digitais em rede, lançando mão da hipertextualidade, da interatividade e da aprendizagem colaborativa, a partir da mediação docente de percursos de aprendizagem, para que os participantes aprendam na dialógica com os demais participantes envolvidos por meio de processos síncronos e assíncronos de comunicação, tanto em encontros presenciais, à distância ou em situações híbridas. Santos (2014) chama a atenção de que, no contexto da EOL, o conhecimento não pode ser transmitido, ele é produzido na relação dialógica entre os participantes, e no que tange a centralidade das interfaces digitais em rede a autora esclarece Não é o ambiente online que define a educação online. O ambiente/interface o condiciona, mas não determina. Tudo dependerá do movimento comunicacional e pedagógico dos sujeitos envolvidos para a garantia da interatividade e da cocriação. Acreditamos que aprendemos mais e melhor quando temos a provocação do “outro” com a sua inteligência, sua experiência; sabemos que temos interfaces que garantirão nossa comunicação com nossa fala livre e plural. É desse lugar que conceituamos a educação online para além da EAD tradicional. (SANTOS, 2014, p. 70, grifos da autora) Diante da compreensão de que nessa modalidade educacional a lógica comunicacional deixa de ser unidirecional e vertical (um-todos) para se constituir primordialmente em uma comunicação ‘todos-todos’ que, a partir da interatividade e hipertextualidade, fomenta situações e processos horizontais de cooperação e colaboração coletivos na produção de conhecimentos, e de que as interfaces digitais em rede são importantes artefatos culturais para promover a EOL, nos questionamos como esses modos de fazerpensar praticas educativas © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 56 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 na/com a cibercultura poderiam ser aplicados no contexto da educação museal. A EDUCAÇÃO MUSEAL Considerados lugares de memória (e de esquecimento), de patrimônio, de cultura, de ciência e de educação, os museus são espaços de interações sociais, de exposição, conservação e catalogação de artefatos culturais, constituindo, desse modo, importantes espaços de democratização e de popularização do patrimônio cultural e natural material e imaterial, de formação do cidadão e de desenvolvimento da comunidade na qual se encontram inseridos. O Estatuto de Museus conceitua-os como instituições sem fins lucrativos que conservam, investigam, comunicam, interpretam e expõem, para fins de preservação, estudo, pesquisa, educação, contemplação e turismo, conjuntos e coleções de valor histórico, artístico, científico, técnico ou de qualquer outra natureza cultural, abertas ao público, a serviço da sociedade e de seu desenvolvimento (BRASIL, 2009). A relação entre museu e educação se faz presente desde a origem dessa instituição. Marandino e Martins (2017) chamam a atenção de que, apesar da relação histórica entre museus e educação, a compreensão sobre o museu como espaço de educação não foi algo dado, sendo essa uma construção em progressão. Com vistas a uma compreensão histórica da relação entre museus e educação, Pereira (2010), apresenta e discute sobre a ‘dimensão educativa’ e a ‘função educativa’ dos museus. Não se propondo inicialmente a conceituar ‘dimensão educativa’ e ‘função educativa’, a autora compreende que “a função educativa dos museus se configura na trilha deixada pela construção social das dimensões educativas que sempre estiveram presentes no universo histórico dos museus” (PEREIRA, 2010, p. 15). Portanto, os museus são considerados espaços em que experiências de aprendizagemensino são vivenciadas e praticadas de formas diversas, e essas práticas sofreram influência dos contextos políticos e sociais vividos pelos museus e seus praticantes desde os primórdios de seu estabelecimento. Ao longo do tempo, os museus foram assumindo cada vez mais seu papel educativo. A criação do ICOM, em 1946, e três importantes seminários internacionais sobre o papel dos museus na educação organizados pela UNESCO (i.e. Nova Iorque, 1952; Atenas, 1954; Rio © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 57 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 de Janeiro, 1958), assim como a criação do CECA (Committee for Education and Cultural Action) são considerados marcos para a Educação Museal (IBRAM, 2018). No Brasil, a função educativa do museu foi institucionalizada a partir de 1927 com a criação do primeiro setor educativo brasileiro, atualmente conhecido como Seção de Assistência ao Ensino do Museu Nacional. No que tange à relação museu x educação e, conforme o cenário das políticas públicas voltadas aos museus, foi oficializada, por meio da Portaria 42215 de 30 de novembro de 2017, a criação da Política Nacional de Educação Museal (PNEM), que define o conceito de Educação Museal e dispõe sobre seus objetivos e práticas, princípios e diretrizes, e sobre os compromissos do IBRAM relacionados à sua promoção, desenvolvimento e implementação, dentre outros. A Educação Museal é conceituada como... uma série de aspectos singulares que incluem: os conteúdos e as metodologias próprios; a aprendizagem; a experimentação; a promoção de estímulos e da motivação intrínseca a partir do contato direto com o patrimônio musealizado, o reconhecimento e o acolhimento dos diferentes sentidos produzidos pelos variados públicos visitantes e das maneiras de ser e estar no museu; a produção, a difusão e o compartilhamento de conhecimentos específicos relacionados aos diferentes acervos e processos museais; a educação pelos objetos musealizados; o estímulo à apropriação da cultura produzida historicamente, ao sentimento de pertencimento e ao senso de preservação e criação da memória individual e coletiva. É, portanto, uma ação consciente dos educadores, voltada para diferentes públicos. A Educação Museal coloca em perspectiva a ciência, a memória e o patrimônio cultural enquanto produtos da humanidade, ao mesmo tempo em que contribui para que os sujeitos, em relação, produzam novos conhecimentos e práticas mediatizados pelos objetos, saberes e fazeres. Possui também estrutura e organização próprias, que podem relacionar-se com outras realidades que não a específica dos museus, de acordo com os objetivos traçados no seu planejamento. São ações fundamentalmente baseadas no diálogo. Isso inclui o reconhecimento do patrimônio musealizado, sua apropriação e a reflexão sobre sua história, sua composição e sua legitimidade diante dos diversos grupos culturais que compõem a sociedade. Neste contexto, a Educação Museal é uma peça no complexo funcionamento da educação geral dos indivíduos na sociedade. Seu foco não está em objetos ou acervos, mas na formação dos sujeitos em interação com os bens musealizados, com os profissionais dos museus e a experiência da visita. Mais do que para o “desenvolvimento de visitantes” ou para a “formação de público”, a Educação Museal atua para uma formação crítica e integral dos indivíduos, sua emancipação e 15 Diário Oficial da União - Portaria 422 de 30 de setembro de 2017: http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=13/12/2017&jornal=515&pagina=5&totalArquiv os=192 © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 58 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 atuação consciente na sociedade com o fim de transformá-la. (COSTA, CASTRO, CHIOVATTO, SOARES, 2018, p. 73-74) Silva (2018) se refere à PNEM como uma importante conquista para o campo da educação museal. Porém a autora pontua que a diretriz 6 sob o eixo Museu e Sociedade “é a única referência ao uso das TICs dentre as diretrizes da política educacional que acaba de ser estabelecida para o setor” (SILVA, 2018, p. 120) e prossegue Sobre esse aspecto, algumas deduções e inquietações. Vivemos em um mundo hiperconectado, no qual aprender, aperfeiçoar-se e inovar passaram a ser atribuições exigidas de quem quer que esteja inserido nesse contexto hipermidiático. Em contraposição, causa algum estranhamento a leniência dos chamados órgãos competentes no que se refere à atenção recomendada nas referidas Diretrizes, especificamente em relação aos aportes digitais requeridos por uma Educação Museal que incorpore os recursos tecnológicos disponíveis no “mercado” e supostamente indispensáveis nos cenários presente e futuro. (SILVA, 2018, p. 120, grifo da autora) Em face de seu objetivo de pesquisa, a autora sugere que um melhor aproveitamento dos museus na sua função educativa pode passar pelo uso mais intensivo dos instrumentos de comunicação, como as redes sociais e os sites, desde que se leve em consideração os anseios dos diversos atores sociais e das instituições que podem contribuir para alargar as teias de cidadania e aprendizagem. Essa ampliação pode se dar em termos de diversas configurações que a web tem potencial de proporcionar, ou ainda associada a outras instituições educacionais, como vem ocorrendo em museus europeus que trabalham em parceria com universidades. Para isso, é fundamental que esse debate esteja posto e congregue todos que direta ou indiretamente tenham interesse de contribuir. (SILVA, 2018, p. 120) Vimos que a relação museus e tecnologias digitais e museus e educação não é recente e que as mesmas se instituem e se modificam com base nos diferentes contextos socio-históricos e políticos de cada época. Vimos que a educação museal tem um compromisso com a formação crítica, integral e emancipatória dos sujeitos, visando sua atuação consciente na sociedade. Mas como pensarfazer a educação museal na cibercultura levando-se em conta as especificidades do campo e os novos modos de ser, estar e sentir o mundo forjados a partir das nossas relações com o digital em rede? A EDUCAÇÃO MUSEAL ONLINE Inspiradas em Alves (2008, 2010) compreendemos que a formação humana se dá em múltiplos espaçotempos e contextos, e essa formação é continuada e ultrapassa os muros © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 59 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 imaginários das escolas e contextos de exercício profissional. Portanto, “conhecimentos e significações são encarnados em nós nas ações que desenvolvemos nos contextos cotidianos” (ALVES, 2010, p. 1197). Deste modo, aprendemos dentro e fora das escolas, ou seja, em redes educativas, e em múltiplos espaçostempos, e estamos sempre em formação. E por se dar em múltiplos contextos, “não é nem simples, nem de fácil transformação” (Alves, 2010, p.197). Complementarmente a essa noção, Santos (2014) nos ensina que redes educativas são espaços plurais de aprendizagem e de modos de pensamento, “uma vez que a construção do conhecimento é tecida em rede, a partir de aprendizagens construídas pela apropriação dos diversos artefatos culturais, tecnologias, interações sociais, entre outros” (SANTOS, 2014, p.31). Alves e Garcia (1999) nos ensinam que a produção de conhecimentos não se dá linearmente e nem de forma hierarquizante em árvore, conforme pensado e instituído na modernidade. Segundo as autoras, a criação do conhecimento segue caminhos variados, diferentes, não lineares e não obrigatórios, ao que Morin acrescenta que os conhecimentos são gerados pela complexidade social e que, dialética e dialogicamente, geram complexidade social. Estudar como o conhecimento é tecido exigem que se admitam as diferenças culturais sem hierarquias, o que abre múltiplas possibilidades ao ato humano de conhecer. (ALVES e GARCIA, 1999, p.12-13, grifo das autoras) Concebemos, portanto, a formação e a produção de conhecimentos como um processo dialógico e dialético de trocas de saberes e partilhas de sentidos entre os praticantes culturais nas diversas redes que habitam, incluindo os museus. Consequentemente, para nós, o museu pode ser considerado como uma (ou múltiplas) rede(s) educativa(s), e espaços multirreferenciais de aprendizagem (SANTOS, E., MARTI e SANTOS, R., 2019), atravessados por múltiplas linguagens, saberes, produções e experiencias de vida, em que múltiplos conhecimentossignificações são também tecidos dentrofora de seus muros pelos diversos praticantes culturais que habitam e transitam em seus vários espacostempos. Contrário à ideia de consumo passivo de produtos culturais hegemônicos, mas favorável a noção de uso dos mesmos, Certeau (2014, p. 40, grifo do autor) acredita que “os usuários ‘façam uma bricolagem’ com e na economia cultural dominante, usando inúmeras e infinitesimais metamorfoses da lei, segundo seus interesses próprios e suas próprias regras”. Segundo o autor, o ‘homem ordinário’, apesar de estar submetido a mecanismos disciplinares e de ordenação sociopolítica e cultural, lança mão de práticas operatórias diversas (maneiras de fazer) para se reapropriar do espaço organizado pelas técnicas da produção sociocultural. © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 60 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 Sendo assim, A presença e a circulação de uma representação (ensinada como o código da promoção socioeconômica por pregadores, por educadores ou por vulgarizadores) não indicam de modo algum o que ela é para seus usuários. É ainda necessário analisar a sua manipulação pelos praticantes que não a fabricam. Só então é que se pode apreciar a diferença ou a semelhança entre a produção da imagem e a produção secundária que se esconde nos processos de sua utilização (CERTEAU, 2014, p. 39). A partir das premissas teórico-epistemológicas narradas, compreendemos que o fazerpensar a educação museal online, ou seja, a educação museal na/com a cibercultura, seja ela presencial e/ou a distância, pressupõe a compreensão de que habitamos múltiplas redes de conhecimentossignificações que são tecidas a partir de nossos encontros com o outro em múltiplos espaçostempos, e que no contexto contemporâneo essas tessituras e aprendizagensensinos ocorrem a partir do compartilhamento de narrativas, sentidos e dilemas mediados pelos artefatos culturais de nosso tempo, i.e. as TDR. Fazerpensar a educação museal online é também compreender, conforme Certeau (2014) nos ensina, que o praticante cultural (i.e., o visitante do museu) não é um consumidor passivo de conteúdos expositivos e mediações museais. O visitante (online e/ou presencial) tece seus próprios conhecimentossignificações a partir das experiências vivenciadas no/com o museu, fazendo usos diversos daquilo que lhe pretende ser imposto, como veremos no exemplo a seguir. Portanto, é fundamental pesquisar e compreender esses usos no/com o museu para pensarfazer ações educativas museais online. Ações Educativas Museais Online na/com a Seção de Assistência ao Ensino do Museu Nacional (SAE)/UFRJ Apresentamos a seguir um exemplo de ação educativa museal online presencial levada a cabo junto à Seção de Assistência ao Ensino do Museu Nacional/UFRJ e seus praticantes culturais. O exemplo se refere à ação educativa museal online de criação de memes, realizada durante um dos encontros do Projeto Clube de Jovens Cientistas da SAE, Museu Nacional. O projeto tem como objetivo estreitar laços com a comunidade de estudantes de escolas públicas locais e visa promover a cultura científica, a educação em ciências e a popularização do conhecimento científico junto a jovens estudantes, além de aproximar o museu e as escolas envolvidas, estabelecendo uma comunicação dialógica entre as instituições, tendo os alunos como sujeitos ativos e participantes deste processo (MARTI; COSTA e MIRANDA, 2019, p. 98). © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 61 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 A criação de memes por parte dos alunos ocorreu após uma visita mediada à exposição do museu e teve como objetivo promover a interação dos estudantes com as exposições do Museu de uma maneira diferenciada, por meio do uso de um gênero textual digital muito conhecido pelos adolescentes. A intenção era a de partir do que era mais familiar para os estudantes, para aprofundar os conteúdos abordados no Museu. Cabe aqui destacar que o processo de criação dos memes não se deu a partir da reutilização de imagens já disponíveis nas redes, mas sim demandou uma produção imagética e verbal autoral dos alunos, com base nas características linguísticas e semióticas de um meme digital. (MARTI; COSTA e MIRANDA, 2019, p. 99-100) A atividade revelou, por meio da produção mêmica dos alunos (Figura 1), que a relação dos mesmos com os objetos museais em questão não se estabeleceu com base na ‘acuidade’ da informação científica a que tinham acesso, mas sim na intencionalidade de relacionar tais objetos ao imaginário simbólico inscrito em seus contextos culturais. (MARTI; COSTA e MIRANDA, 2019, p. 102) Figura 1. Memes produzidos pelos alunos do Projeto Jovens Cientistas da SAE, Museu Nacional Fonte: Marti; Costa e Miranda (2019) A atividade museal online mostrou como os múltiplos conhecimentossignificações são tecidos no/com o museu e seus objetos a partir de diferentes realidades e experiências cotidianas vivenciadas pelos praticantes culturais, nesse caso, os alunos, possibilitando aos educadores conhecer um pouco mais sobre os sentidos e significações que os jovens atribuíam aos objetos musealizados, o que veio a favorecer e embasar o pensarfazer de outras ações educativas museais com o grupo, focando no protagonismo e diálogo como os conhecimentossignificações dos educandos. © Redoc Rio de Janeiro v. 3 n.2 p. 62 Maio/Agosto 2019 ISSN 2594-9004 DOI: https://doi.org/10.12957/redoc.2019.44589 CONCLUSÃO O presente texto buscou apresentar o contexto contemporâneo por nós nomeado de cibercultura e discutir como as TDR engendram outras e novas possibilidades de fazerpensar a Educação Museal na contemporaneidade. Consideramos, portanto, Educação Museal Online toda concepção e prática educativa museal que lança mão das potencialidades do digital em rede (i.e. da hipermídia, da hipertextualidade, da interatividade e da conexão generalizada) em situações presenciais e/ou a distância para pensarfazer ações educativas dialógicas, colaborativas, multirreferenciais e centradas numa perspectiva de produção coletiva do conhecimento em uma lógica comunicacional polifônica e multidirecional. REFERÊNCIAS ALVES, Nilda. Tecer conhecimento em rede. Em: ALVES, Nilda e GARCIA, Regina Leite (Orgs.). O sentido da escola. Rio de Janeiro: DP&A, 2002, p.26-38. ALVES, Nilda. Decifrando o pergaminho: o cotidiano das escolas nas lógicas das redes cotidianas. Em: OLIVEIRA, Inês Barbosa de; ALVES, Nilda. (orgs.). Pesquisa nos/dos/com os cotidianos das escolas: sobre redes de saberes. Rio de Janeiro: DP&A, 2008. ALVES, Nilda. 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