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Quem é Quem na Museologia Portuguesa

2019, Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa

Sobre o arqueólogo, etnólogo e museologo Eduíno Borges Garcia

DICIONÁRIO Quem é Quem na Museologia Portuguesa COORDENAÇÃO Raquel Henriques da Silva (IHA-NOVA/FCSH) Joana d’Oliva Monteiro (IHA-NOVA/FCSH) Emília Ferreira (MNAC; IHA-NOVA/FCSH) Elisabete Pereira (IHC-NOVA/FCSH-UÉ) EDIÇÃ REVIST O AE AMPLI ADA Índice Editorial A ALARCÃO, Adília ALARCÃO, Jorge de ALLEN, Eduardo ALLEN, João ALMEIDA, António de Medeiros e ALMEIDA, Januário Correia de ALMEIDA, Luís Augusto Ferreira de ALVES, Francisco Manuel AMARAL, João ANDRADE, Carlos Freire de ANDRADE, Guilherme Rebelo de ANDRADE, Sérgio Augusto Albuquerque Guimarães de ARAGÃO, Augusto Carlos Teixeira de ARAÚJO, António Jacinto de AZEVEDO, Carlos Mascarenhas Martins de AZEVEDO, Frei José Batista da Costa AZUAGA, Marciano 4 7 11 14 17 20 24 27 31 35 39 42 45 48 52 55 58 60 B BALSEMÃO, Luís Pinto de BANDEIRA, José Ramos BAPTISTA, António José Vidal BÁRTHOLO, Maria de Lourdes Coelho BEAUMONT, Maria Alice Mourisca BELLINO, Albano Ribeiro BEM, D. Tomás Caetano do BENAVENTE, Luís BOCAGE, José Vicente Barbosa du BONVALOT, Carlos Augusto BORBA, João Botelho Moniz BOTO, Joaquim Maria Pereira BRANDÃO, D. Domingos de Pinho BUCHHOLZ, Karl 65 68 72 75 77 80 84 87 90 93 97 100 103 106 C CABRAL, António Moreira CABRAL, Madalena CÁCERES, Luís de Albuquerque de Melo Pereira e CALDEIRA, Francisco Xavier Cardoso CAMPOS, Alfredo Luís CARVALHO, Armindo Ayres CARVALHO, Domingos Pereira de CASTELBRANCO, Eduardo Ernesto de CASTRO, Fernando de CENÁCULO, Frei Manuel do CHAVES, Luís Rufino CHICÓ, Maria Alice Lami Tavares CHICÓ, Mário Tavares COIMBRA, Maria Helena CORDEIRO, Luciano CORREIA, António Mendes 110 114 118 121 123 125 128 132 136 140 143 146 149 153 157 161 2 CORREIA, Eugénio CORREIA, Raul Alexandre de Sá CORREIA, Vergílio CORTEZ, Fernando Russell COSTA, Alfredo Augusto Machado e COSTA, João Manuel da COSTA, José Miguel da COUTO, João Rodrigues da Silva CRUZ, André Monteiro da 165 168 172 175 178 181 184 187 191 D DANTAS, Júlio DAUPIAS, Pedro Eugénio DEVISME, Gerard DIAS, António Jorge 195 198 201 203 F FERNANDES, Joaquim Agostinho FERNANDES, Luís José Seixas FERNANDO II, Rei‑consorte de Portugal FERRÃO, Julieta FERREIRA, Alexandre Rodrigues FEYO, Salvador Barata FIGUEIREDO, José de FONSECA, António José Branquinho da FORMOSINHO, José dos Santos Pimenta FRANÇA, José‑Augusto FREIRE, Luciano Martins 207 211 215 219 222 225 228 232 235 238 241 G GALHANO, Fernando GARCIA, Eduíno Borges GEORGE, Frederico GIL, Fernando Bragança GLÓRIA, António José Nunes da GOMES, Jacinto Pedro GONÇALVES, António Anastácio GONÇALVES, António Augusto GONÇALVES, António Nogueira GRAÇA, António dos Santos GRAINHA, Manuel Borges GUARIENTI, Pietro Maria GUIMARÃES, Alfredo GUIMARÃES, António José Gonçalves 245 248 251 254 257 260 263 266 269 272 275 278 281 285 H HOLSTEIN, D. Francisco de Sousa 289 J JÚNIOR, Francisco Tavares Proença JÚNIOR, Manuel Domingues Heleno JORGE, Artur Ricardo JÚNIOR, António José da Silva Sarmento JÚNIOR, Frederico Augusto Lopes da Silva 293 297 300 303 306 K KAMENEZKY, Eliezer KEIL, Alfredo KEIL, Luís Cristiano Cinatti KUGEL, Jacques 309 313 316 319 L LACERDA, Abel de LARCHER, Tito LIMA, Manuel Coelho Baptista de LOPES, Adriano de Sousa LOPES, António Teixeira LOPES, Carlos Manuel de Penha e Costa da Silva LUÍS I, Rei de Portugal 323 326 330 333 336 339 342 M MACEDO, Diogo de MACEDO, Manuel de MACHADO, Bernardino MALTA, Eduardo MARDEL, Fernando MARQUES, António Paes da Silva MARQUES, Manuel Augusto Paixão MAYNE, Frei José MENDONÇA, Maria José de Almeida Furtado de MOITA, Irisalva MONTANHA, José António Furtado MONTÊS, António MONTÊS, Paulino António Pereira MOREIRA, Francisco de Almeida MOURA, Abel de MOURA, Manuel António de MOURINHO, António Maria 346 349 353 357 360 363 366 369 372 375 379 382 386 390 392 395 398 N NATIVIDADE, Manuel Vieira NORONHA, D. Pedro José de 402 405 O OLEIRO, João Manuel Bairrão OLIVEIRA, Bernardino Lopes de OLIVEIRA, Ernesto Luís Alves da Veiga de OLIVEIRA, Manuel Paulino de OLIVEIRA, Manuel Sousa d’ ORTIGÃO, José Duarte Ramalho OSÓRIO, Júlio 409 412 415 418 422 425 429 P PEIXOTO, Augusto da Rocha PEREIRA, Gabriel Victor do Monte PERDIGÃO, Maria Madalena Biscaia Azeredo PESSANHA, D. José Maria da Silva PINA, D. Manuel Correia de Bastos PINHEIRO, Columbano Bordalo PINTO, Maria Helena Mendes POPPER, Erich PORFÍRIO, António Ventura 433 436 439 443 446 449 452 455 458 R REIS, Carlos RELVAS, José de Mascarenhas 462 466 3 REY, Jorge RIBEIRO, João Baptista RIBEIRO, Luís da Silva ROCHA, António dos Santos RODRIGUES, Armando Porfírio RODRIGUES, Francisco de Assis RODRIGUES, José Filipe RODRIGUES, José Rafael ROSAS, Etheline Isaac Chamis 469 472 475 478 483 486 489 492 495 S SAA, Mário SALDANHA, Fernando António de Almeida e Silva SALGADO, José Bénard Guedes SAMPAIO, Alberto SANTOS, Joaquim José Júdice dos SANTOS, Luciano Afonso dos SANTOS, Luís Reis SARMENTO, Francisco Martins de Gouveia Morais SCHMITZ, Ernst Johann SERRÃO, Eduardo da Cunha SILVA, Abílio de Mattos e SILVA, Casimiro Gomes da SILVA, Cristiano Augusto da SILVA, Joaquim Possidónio Narciso da SILVA, Marciano Henriques da SILVA, Maria Madalena de Cagigal e SILVA, Mário Augusto da SIMÕES, Augusto Filipe SIMÕES, João Miguel dos Santos SOUSA, João Vidal da Costa e SOUSA, José Vasco Alvim de 500 503 506 509 512 515 517 520 523 526 529 532 535 539 542 545 548 552 555 558 560 T TAVARES, Joaquim do Couto TAVARES, José Augusto (Padre) TÁVORA, Bernardo Ferrão de Tavares e TAXINHA, Maria José TEIXEIRA, Raúl Manuel TIRINNANZI, Luiz TORRES, António da Silva e Sousa TRINDADE, Leonel de Freitas Sampaio 565 568 571 574 577 580 583 586 V VALENTE, António Vasco Rebelo VAN‑DECK, José Rollem VANDELLI, Domingos VASCONCELOS, Flórido Teles de Menezes e VASCONCELOS, Joaquim António da Fonseca de VASCONCELOS, José Leite de VEIGA, Estácio da VERMELHO, Joaquim José VIEIRA, Custódio José VILHENA, Ernesto Jardim de VITORINO, Pedro 591 594 596 599 602 606 609 612 615 618 621 Z ZAGALO, Manuel Carlos de Almeida Cayola 625 Índice de autores 628 Lista de abreviaturas 633 Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa Editorial O Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa, acessível no site do Instituto de História de Arte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (IHA-NOVA FCSH), é um projecto editorial inédito integrado no Grupo de investigação Museum Sudies (MuSt). Com coordenação científica de Raquel Henriques da Silva, Joana d’Oliva Monteiro, Emília Ferreira e Elisabete Pereira, foi especificamente concebido como um work in progress e assume como objectivos fundamentais facultar uma visão abrangente, um conhecimento preciso e uma valorização actualizada das personalidades associadas à Museologia Portuguesa, que exerceram a sua actividade entre o século XVIII e os anos 1960, e actuantes em diferentes tipologias científicas (Arte, Ciência, Antropologia, Arqueologia, História, Etnologia); visando, ainda, contribuir para uma mais ampla compreensão da História dos Museus e da Museologia. A delimitação temporal elegida foi meramente operativa e conjuntural: entendeu-se que é necessária maior distância cronológica para se estudar o impacto das acções e das contribuições teóricas e profissionais dos biografados que estão ainda em actividade ou deixaram de estar em tempos muito recentes. Inscrito na tipologia de iha-seed-projects (micro-projectos), uma das linhas estruturais estratégicas do IHA-NOVA FCSH que o financiou conjuntamente com a Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), que se associou o projecto, aposta nas virtualidades da publicação online, dando continuidade ao investimento deste Instituto numa política de acesso aberto. Obra desenvolvida numa instituição académica, norteou-se pela boa prática colaborativa e inclusiva através da abertura de uma chamada pública, amplamente divulgada e dirigida a toda a comunidade científica e profissional fora da academia. Importa sublinhar a resposta obtida à chamada de trabalhos, manifestada, desde logo, pelo significativo número de propostas submetidas (cerca de duas centenas). Após a apresentação pública do Dicionário Quem é Quem… a 28 de Março de 2019 no Palácio Nacional da Ajuda, com 93 entradas biográficas online, o projecto conheceu um impulso muito significativo e um manifesto reconhecimento nos planos nacional e internacional, atestado quer pelo número exponencial de acessos no site do IHA-NOVA FCSH, quer pela efectiva divulgação nos diversos media da especialidade – destaque, a título exemplificativo, para a Associação Portuguesa de Museologia (APOM); Ibermuseos; ICOM Portugal; Ministerio de Educación Cultura y Deporte e o interesse despertado por Universidades estrangeiras (ex. Universidade de Belo Horizonte-Brasil), a que se deve, igualmente, o esforço empreendido pela Coordenação Científica na sua persistente divulgação e apresentação do Projecto em iniciativas variadas de cunho académico-científico e respectiva publicação de artigos. A edição que agora se publica, revista e ampliada, conta com 96 novas entradas biográficas, tendo sido a selecção dos autores arbitrada por uma Comissão Científica criada para o efeito, comprovando, uma vez mais, a relevância desta abordagem centrada no género biográfico, ao dar destaque ao papel empreendido por um naipe de individualidades regionais e 4 Editorial Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa locais, algumas delas desconhecidas ou desvalorizadas e áreas que, em geral, permanecem insuficientemente estudadas, convertendo-se o Dicionário Quem é Quem… numa obra de referência nacional e internacional nesta área de estudos, revelando-se, de igual forma, este mapeamento sem precedentes, um contributo determinante para a construção de uma historiografia que permite compreender os museus criados em Portugal de forma a enquadrá-los no contexto internacional, passo decisivo para avançar para um Dicionário exclusivamente dedicado a Museus. Tal não seria possível sem os contributos de investigações recentes, muitas delas desenvolvidas em ambiente académico, no âmbito da realização de dissertações de mestrado e / ou teses de doutoramento. Pensada como um corpus em permanente construção e actualização de conteúdos, goza da vantagem de serem preenchidas lacunas que venham a ser detectadas e cada um dos autores poderá actualizar os seus verbetes, na sequência de desejáveis sugestões e críticas ou pelo desenvolvimento da investigação, em favor do imperioso aprofundamento das actuais e muito positivas dinâmicas da museologia em Portugal, especialmente no que se relaciona com a valorização da sua história, que encaramos como campo em expansão, pluridisciplinar e participativo. Resta agradecermos a todos os autores e aos membros da Comissão Científica que procederam à revisão dos artigos a generosidade do seu trabalho, desenvolvido gratuitamente. 5 GARCIA, Eduíno Borges Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa Na sua atividade como investigador destaca-se, nos anos de 1968-69, o trabalho de campo sobre a olaria açoriana nas ilhas Terceira, Santa Maria e, em particular, na de S. Miguel (Fig. 1). A coleção de cerâmica decorrente destes trabalhos constitui um núcleo representativo da olaria açoriana que integra o acervo do Museu de Olaria de Barcelos, tendo sido por esta instituição editado um catálogo (Fernandes, 1993). Os profícuos estudos históricos e arqueológicos, nomeadamente da Igreja Visigótica de S. Gião em parceria com Fernando de Almeida, das Anforetas, das Torres e Fachos da Lagoa da Pederneira, dos Pelourinhos dos coutos de Alcobaça, entre tantos outros, desenvolvidos ao longo das décadas de 1960 e 1970, começam a ser preteridos pela atenção conferida às comunidades rurais. Esta reorientação quase exclusiva do programa de investigação para o domínio da etnotecnologia e da cultura popular verifica-se em função das profundas transformações que abalavam o universo rural, o seu tecido social, as dinâmicas de trabalho e produção. É por esta consciencialização de um mundo em erosão que considera premente salvar para memória futura os trabalhos e os dias das populações camponesas tradicionais. GARCIA, Eduíno Borges Ribeira Grande (S. Miguel, Açores) 1922 – Lisboa, 1979 Borges Garcia teve uma vida demasiado curta para tantos projetos e interesses de uma geografia tão dispersa como a literatura, a história, a arqueologia, a etnografia e a museologia. Num percurso de vida intensamente ligado à cultura, privilegiou a popular que considerava ameaçada pelas profundas transformações socioeconómicas e políticas em curso. Formado em Farmácia pela Universidade do Porto, exerceu funções diretivas no Instituto Pasteur de Lisboa, mas a dimensão técnica e de gestão que desenvolveu profissionalmente não podia conter uma personalidade e um caráter tão inquisitivo e sensível sobre a realidade social. A defesa da cultura implica, na sua conceção de vida, um fator de militância ativa e consciente e é este exercício pleno de cidadania que melhor o descreve. A matriz do seu pensamento forjado na ação desenha-se, desde cedo, nas publicações que desenvolve no periódico micaelense A Ilha. Como salienta Urbano Bettencourt, no prólogo à obra póstuma Ilhéus, Portugas & Outros, que reúne a esparsa produção literária de cariz neorrealista desenvolvida por Borges Garcia entre 1953 e 1971, desde os primeiros escritos da juventude a preocupação intelectual sobre a paisagem humanizada, o património histórico e arqueológico, as artes e ofícios e trabalho do povo afirmavam-se como um indicador em construção (Bettencourt, 1995: 5-6). O interesse que lhe desperta a literatura e os seus renomados autores leva a acolher na sua casa de Caxias o escritor John dos Passos, segundo testemunho da sua mulher Elisabete Rodrigues Garcia. FIG. 1 Eduíno Borges Garcia. Fotografia em que o investigador exibe uma peça cerâmica de Vila Franca do Campo (S. Miguel), n.º 112 (24 de janeiro de 1971). 248 G GARCIA, Eduíno Borges Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa Os levantamentos arqueológicos e etnográficos levados a cabo por Borges Garcia surgem sempre como contributos para uma museologia regional. Em plena campanha de S. Gião, o investigador é aliciado a doar o espólio descoberto nas escavações ao futuro Museu Regional da Nazaré, proposta que inicialmente declina dado acreditar estar para breve a criação do Museu Arqueológico de Alcobaça que tinha como fundamento a coleção arqueológica de Manuel Vieira Natividade (Garcia, 1976: 13). Borges Garcia colabora no projeto de planeamento do modelo museológico da Nazaré que abrange secções dedicadas à arte, à arqueologia e à etnografia. O investigador, que assume a presidência da direção dos Amigos do Museu entre 1969-71, considerava que o futuro museu deveria contemplar de forma soberana a vertente etnográfica, a que mais podia realçar os usos e costumes desta comunidade marítima. No ano de 1975, constitui em Alcobaça, com um grupo de jovens, uma equipa de estudos de etnografia com o propósito de promover a recolha de materiais para o futuro Museu dos Coutos de Alcobaça (Fig. 2). A primeira reunião aconteceu na casa de Leocádia Natividade, futura Casa-Museu Vieira Natividade, dada a intimidade do investigador com a família, nomeadamente com o Professor Joaquim Vieira Natividade. Esta atividade de campo mensal e por vezes quinzenal decorreu até à sua morte, tendo incidido sobre as práticas do calendário agrícola, as artes e ofícios tradicionais, as estruturas culturais e mentais do mundo rural. Os estudos etnográficos que desenvolve de forma mais sistemática e duradoura nesta peregrinação pelos campos centram-se sobre as oficinas de canastreiros de Évora de Alcobaça, de cutelaria em Turquel e Santa Catarina, de esteiraria na Castanheira e Póvoa de Cós. De realçar ainda os trabalhos sobre a tipologia das eiras e sua relação com a propriedade e cultivares, as construções de armazenamento e conservação das águas na beira Serra dos Candeeiros e, FIG. 2 Desenho de um arado recolhido na povoação de Carvalhal de Turquel (1976) pelo escultor Luís Carlos Cruz que, na altura, integrava o grupo de trabalho de etnografia © geograficamente exógena ao território dos coutos, a incursão às olarias de Flor da Rosa no Alto Alentejo. Mas a razão da pesquisa também envolvia os próprios atores, como acontece no Casal do Rei, em que a comunidade assiste a filmes que retratam a sua própria vida de trabalho, provocando comentários e debate vivo, intervenção virtuosa a que não é estranho o espírito de abril. A escola técnica de Alcobaça também é chamada à liça com o projeto de medicina popular, pois era necessário cativar o corpo docente e discente para o estudo e divulgação da cultura local, tendo sido elaboradas fichas de trabalho de campo que foram aplicadas pelos alunos tutorados pelos docentes. Borges Garcia, num breve artigo designado “A Medicina Popular, o Museu e a Escola”, apresenta as linhas programáticas deste projeto, defende uma cooperação íntima entre as duas instituições e pensa nisto como um desígnio nacional. Para o autor, a ligação não pode ser unívoca, defendendo que “o Museu deve integrar-se com a Escola num Programa Educativo comum” (Garcia, 1978a: 18). O investigador pensava a cultura de forma integrada partindo da ideia de que só se preserva o património quando as populações o reconhecem como um valor identitário, quando estes bens constituem uma referência cultural assumida coletivamente. É nesta linha que defende a 249 G GARCIA, Eduíno Borges Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa BIBLIOGRAFIA BETTENCOURT, Urbano. 1995. “Eduíno Borges Garcia “Traços de um Percurso”. GARCIA, Eduíno, Ilhéus, Portugas & os Outros. Lisboa: Edições Salamandra: 5-12. FERNANDES, Isabel. 1993. Cerâmica Açoriana. Catálogo. Barcelos: C.M.B./Museu de Olaria. LAMEIRAS-CAMPAGNOLO, M.; Mestre, Vítor. 2008. “O Museu dos coutos de Alcobaça: prioridades, singularidades”. Comunicação apresentada ao Seminário do Património do Oeste (outubro de 2008). GARCIA, Eduíno. 1975. “O Futuro Museu dos Coutos de Alcobaça. Uma experiência Museológica”. Actas do Colóquio APOM 75. Museus Para Quê? (1-3 de novembro de 1975). Figueira da Foz: Associação Portuguesa de Museologia. 123-134. GARCIA, Eduíno. 1976. O Museu da Nazaré. Antecedentes Históricos do Museu etnográfico e Arqueológico do Dr. Joaquim Manso. Lisboa: Livraria Portugal. GARCIA, Eduíno. 1978a. “A Medicina Popular. O Museu e a Escola”. Boletim da ADEPA (abril-setembro de 1978), 14-18. GARCIA, Eduíno. 1978b. “Proposta dum esquema de organização para o futuro museu de Alcobaça”. Actas do Congresso Internacional de Defesa do Património. Alcobaça: 299-311. FIG. 3 Casa do Monge Lagareiro, um dos núcleos patrimoniais cistercienses a integrar o Museu dos Coutos de Alcobaça. Fotografia de António Valério Maduro © aposta na ecomuseologia, tema de conversa com Per-Uno Agren na visita que conduz ao território dos antigos coutos. Borges Garcia considerava que o Museu da Região de Alcobaça deveria ser dotado de uma estrutura polinuclear realçando as marcas patrimoniais do território (Fig. 3). Este princípio basilar vai, aliás, animar a nova proposta estruturante de modelo de Museu dos Coutos de Alcobaça sustentada por Maria Olímpia Lameiras-Campagnolo e Vítor Mestre, entre outros investigadores (Lameiras-Campanolo, 2008). Reconhecendo que a sinalização pelo estudo constitui um primeiro passo para alavancar a ideia de museu, pelo qual a comunidade alcobacense tanto anseia, propõe a organização de grupos de trabalho nos eixos que reputa de fundamentais: História Natural, Arqueologia, História de Arte e Etnografia. Para o investigador, a missão do museu implica uma perspetiva de compreensão do território como um todo, daí apostar numa articulação funcional e dinâmica entre os diversos núcleos, rejeitando um museu passivo virado para si próprio. Pelo contrário, advoga veementemente que o museu deve estar ao serviço da comunidade, sair de portas, organizar sessões culturais nas localidades, convidar as pessoas a visitarem as suas exposições e eventos tornando-o apelativo e próximo (Garcia, 1975: 123). [A.V.M.] ANTÓNIO VALÉRIO MADURO Doutorado em História Contemporânea pela Universidade de Coimbra. Leciona na secundária Francisco Rodrigues Lobo e no Instituto Universitário da Maia/ISMAI. Investigador do Centro de Estudos Transdisciplinares para o Desenvolvimento (CETRAD/UTAD), colaborador do Centro de História da Sociedade e da Cultura (CHSC/FLUC) e do CEDTUR/ISMAI. Sócio da Rural/Report, da SPER e da APAI. Integra a Comissão Instaladora do Museu do Vinho de Alcobaça. Secretário e editor da revista PASOS – Journal of Tourism and Cultural Heritage, da Universidade de La Laguna (presente na Web of Science). Autor de diversos estudos centrados na história rural, etnotecnologia, património cultural e industrial. 250 G DICIONÁRIO Quem é Quem na Museologia Portuguesa FICHA TÉCNICA Título Dicionário Quem é Quem na Museologia Portuguesa – edição revista e ampliada Coordenação Científica e Editorial Raquel Henriques da Silva (IHA-NOVA/FCSH) Joana d’Oliva Monteiro (IHA-NOVA/FCSH) Emília Ferreira (MNAC; IHA-NOVA/FCSH) Elisabete Pereira (IHC-NOVA/FCSH-UÉ) Comissão Científica Adelaide Duarte (IHA-NOVA/FCSH) Alexandre Nobre Pais (MNAz) Ana Carvalho (CIDEHUS-UÉ) Ana Cristina Martins (IHC-NOVA/FCSH-UÉ) Clara Frayão Camacho (DGPC; IHA-NOVA/FCSH) Duarte Manuel Freitas (CHSC) Elisabete Pereira (IHC-NOVA/FCSH-UÉ) Emília Ferreira (MNAC; IHA-NOVA/FCSH) Graça Filipe (IHC-NOVA/FCSH) Helena Barranha (IST-UL; IHA-NOVA/FCSH) Hugo Xavier (Palácio da Pena/Parques de Sintra-Monte da Lua, S.A; IHA-NOVA/FCSH) Joana Baião (IHA-NOVA/FCSH) Joana d’Oliva Monteiro (IHA-NOVA/FCSH) João Carlos Brigola (CIDEHUS-UÉ) Lúcia Almeida Matos (FBAUP; IHA-NOVA/FCSH) Maria de Aires Silveira (MNAC-MC) Marta C. Lourenço (MUHNAC) Paulo Oliveira Ramos (Uab; IHA-NOVA/FCSH) Raquel Henriques da Silva (IHA-NOVA/FCSH) Sandra Leandro (UÉ; IHA-NOVA/FCSH) Revisão de conteúdos Ana Caeiro Design José Domingues (Undo) Edição Instituto de História da Arte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/NOVA ISBN: 978-989-54405-5-9 2019/2022 Projeto editorial desenvolvido no IHA/NOVA FCSH, financiado por Fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia no âmbito do Projecto Estratégico do IHA [UIDB/00417/2020]. Apoio da Direção-Geral do Património Cultural. © Autores e Instituto de História da Arte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas/NOVA. Todos os conteúdos publicados (textos e imagens) são da exclusiva responsabilidades dos Autores. A opção de utilização do Acordo Ortográfico (1990) é responsabilidade dos autores. Agradecimentos Acácio de Sousa, Adília Alarcão, Ana Carvalho, Ana Margarida Martinho, Ana Paula Louro, Duarte Freitas, Joaquim Pais de Brito, José Alberto M. G. Allen, José Luís Porfírio, Maria de Aires Silveira, Maria Isabel Roque, Maria João Vilhena de Carvalho, Mariana Pinto dos Santos, Marta Lourenço, Quintino Lopes e Virgínia Gomes. Instituto de História da Arte – NOVA FCSH Campus de Campolide, Colégio Almada Negreiros 1099‑032 Lisboa, Portugal www.institutodehistoriadaarte.com Quem é Qu na Museolo Portuguesa Quem é Qu na Museolo Portuguesa