Caderno Virtual Nº 21, v. 1 – Jan-Jun/2010
A Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações Laborais
Bruno Furtado Silveira
Introdução
Um dos mais controversos debates acadêmicos, no âmbito jurídico, diz respeito
à eficácia dos direitos fundamentais, notadamente acerca da aplicação direta desses
direitos nas relações entre os indivíduos.
O tema da aplicação horizontal dos direitos fundamentais nas relações laborais é
extremamente atual e instigante. Os Tribunais brasileiros têm utilizado cada vez mais
dessa tese em suas decisões. Também têm aumentado o número de trabalhos acadêmicos
que realizam um aprofundamento teórico acerca das diversas soluções para a
aplicabilidade horizontal dos direitos fundamentais.
A eficácia horizontal dos direitos fundamentais repercute em questões de
elevada relevância para o Direito do Trabalho e cujo debate se encontra na ordem do dia.
A teoria da eficácia horizontal nas relações de trabalho pode ser útil na análise
da legalidade do monitoramento do local de trabalho e da revista dos pertences dos
empregados, como também no exame da possibilidade de controle da correspondência
eletrônica por parte do empregador.
As mencionadas questões são meramente exemplificativas da extensa gama de
vertentes que envolvem, de forma direta e imediata, a eficácia horizontal dos direitos
fundamentais nas relações laborais.
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Teorias da Eficácia dos Direitos Fundamentais nas Relações Privadas
Atualmente, muito se tem debatido sobre as influências do Direito
Constitucional no Direito Privado, que resultam no fenômeno da constitucionalização
desse último. Dentro dessa nova área de estudos, um dos mais instigantes temas é a
eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas.
Para diferenciar as formas de vinculação exercidas pelos direitos fundamentais,
criou-se os termos eficácia vertical e horizontal dos direitos fundamentais. Em linhas
gerais, a eficácia de natureza vertical diz respeito à vinculação do estado (Executivo,
Legislativo e Judiciário) às normas concernentes a direitos e garantias fundamentais. Essa
dimensão dos direitos fundamentais não é objeto de controvérsia, uma vez que é ampla a
aceitação de que o estado deve respeitar e assegurar, de forma eficaz, esses direitos. A
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chamada eficácia horizontal, por sua vez, refere-se à aplicabilidade das normas
garantidoras de direitos fundamentais nas relações jurídicas privadas.
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No presente artigo, examinar-se-á a mencionada eficácia em seu sentido
material, ou seja, será objeto de estudo se os direitos fundamentais vinculam as relações
entre particulares e de que modo ocorre essa vinculação.
Apesar de constar no texto da Constituição Federal de 1988 que os direitos
fundamentais têm aplicação imediata (art. 5º, § 1º), é objeto de debate doutrinário e
jurisprudencial a amplitude desse comando constitucional. Tendo isto em vista,
questionamos: a eficácia dos direitos fundamentais representam garantias apenas do
cidadão frente ao estado ou é possível aplicar esses direitos nas relações eminentemente
privadas?
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Para responder a essa indagação encontramos diferentes teorias que tratam da
vinculação dos particulares aos direitos fundamentais.
É possível dividir as posições a respeito da eficácia dos direitos fundamentais
individuais nas relações privadas, de modo geral, em quatro correntes.
Para a doutrina da state action, adotada no sistema jurídico norte-americano, os
direitos fundamentais somente impõem restrições aos Poderes Públicos, ou seja, não se
aplicam às relações entre particulares. Essa teoria somente é amenizada pela chamada
public funtion theory, que admite a incidência dos direitos fundamentais nas relações que
envolvem particulares que agem no exercício de atividades próprias do estado.
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A teoria da eficácia indireta ou mediata dos direitos fundamentais nas relações
privadas propõe que a Constituição possui valores próprios, que influenciam os princípios
e regras de Direito Privado, o que configura a incidência daqueles somente de forma
reflexa. Nessa perspectiva, os princípios constitucionais auxiliam na interpretação das
cláusulas gerais e dos conceitos indeterminados, uma vez observados os princípios
próprios de direito privado. A Corte Constitucional da Alemanha e grande parte da
doutrina desse país adotam essa tese.
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Outra vertente doutrinária defende que a obrigação de se respeitar os direitos
fundamentais nas relações entre indivíduos emana diretamente da Constituição. Assim, as
normas de direito fundamentais presentes na Constituição impõem condutas tanto em
relação aos poderes públicos, quanto aos particulares, sem a necessidade da
intermediação do legislador ordinário. A maior parte da doutrina brasileira, como
também de países como Espanha e Portugal adotam esse posicionamento.
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A teoria dos deveres de proteção, surgida na Alemanha, sustenta que, apesar dos
direitos fundamentais se aplicarem diretamente somente em relação ao Estado, esse, ao
editar normas e realizar a prestação jurisdicional deve não somente adotar uma postura
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negativa, no sentido de não violar esses direitos, como também de protegê-los de
ameaças decorrentes dos particulares.
A doutrina brasileira, como já exposto, é majoritariamente favorável à
aplicabilidade direta e imediata dos direitos fundamentais nas relações privadas, tendo
como expoentes Barroso (2001), Sarmento (2006) e Sarlet (2007), dentre outros.
Os mencionados autores destacam a necessidade de se efetivar a aplicação
imediata dos direitos fundamentais nas relações entre particulares, por meio da
ponderação entre essa espécie de direitos e a autonomia privada.
Para Barroso (2001), a ponderação entre os direitos fundamentais e a autonomia
privada deve levar em conta a desigualdade material entre as partes, a razoabilidade, o
prestígio dos valores existenciais e a dignidade da pessoa humana.
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De acordo com Sarmento (2006), os princípios fundamentais incidem, inclusive,
na hipótese de relações jurídicas em que não se observa a desigualdade entre as partes,
tendo em vista a aplicabilidade universal do princípio da dignidade da pessoa humana.
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A eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre particulares resulta, em
última análise, em uma colisão de direitos, uma vez que todas as partes dessa relação
jurídica são destinatárias das garantias constitucionais. Para solucionar o conflito é
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necessária a utilização de critérios como a ponderação de direitos, a possível violação da
dignidade da pessoa humana e a renúncia dos direitos fundamentais.
Aplicabilidade da Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais nas
Relações Laborais
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As relações privadas, notadamente as que envolvem o trabalho humano, podem
ensejar diversas situações em que há possibilidade de violação aos direitos fundamentais.
Como exemplo de aplicação da teoria da eficácia horizontal dos direitos
fundamentais nas relações laborais podemos citar as cláusulas contratuais que proíbam a
filiação sindical do trabalhador ou mesmo que vede a gravidez da empregada durante o
contrato.
É inerente ao contrato de emprego a subordinação jurídica do empregado.
Muitas vezes o empregador abusa do seu direito de direção da prestação dos serviços e
impõe condições de trabalho que representam uma ofensa aos direitos fundamentais do
trabalhador.
Segundo Barroso , a necessidade de aplicação horizontal dos direitos
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fundamentais é diretamente proporcional à desigualdade das partes envolvidas no
conflito. Quanto maior a disparidade entre os sujeitos, maior deve ser a intervenção
estatal em favor da parte considerada hipossuficiente.
Em um contrato de trabalho é notória a desigualdade das partes: o trabalhador
necessita vender sua força de trabalho ao empregador, que dirige a prestação pessoal dos
serviços, impondo as condições em que o labor será desenvolvido.
As necessidades financeiras do trabalhador acabam por comprometer a sua
autonomia de negociação das cláusulas contratuais. O que a experiência histórica
demonstrou é que há uma sujeição da parte mais fraca, no caso, o trabalhador. Desse
modo, o Direito do Trabalho tem por princípio tratar os desiguais de forma desigual,
impondo benefícios em favor do empregado, como forma de equilibrar a relação jurídica.
O contrato de trabalho se consubstancia em uma relação jurídica privada em que
é ainda mais necessária a aplicação direta e imediata dos direitos fundamentais, ante a
desigualdade de fato entre o empregado e o empregador.
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Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 estabelece garantias em favor do
empregado. Dentre elas podemos destacar os princípios da dignidade da pessoa humana
(art. 1º, III), valorização do trabalho humano (art. 1º, IV e 170, caput), como também o
rol de direitos previstos no art. 7º, caput e incisos.
Toda a legislação trabalhista infraconstitucional também prevê discriminações
positivas aos trabalhadores. Como exemplos temos a vedação de alterações contratuais
lesivas ao empregado (art. 468 da CLT) e a intangibilidade salarial (art. 462 da CLT).
Embora muitas vezes seja patente a necessidade de proteção do trabalhador,
outras vezes os limites dessa proteção não são tão claros.
Até que ponto é permitido ao empregador adotar medidas que visam a proteção
do seu patrimônio? Seria possível se impor um sistema de revistas pessoais ou íntimas
aos trabalhadores para evitar o furto de mercadorias?
O empregador pode, por liberalidade, pagar certa verba a alguns funcionários,
excluindo os demais, sem estabelecer um critério objetivo que justifique a discriminação,
ou mesmo pagar esse benefício apenas aos trabalhadores de determinada nacionalidade?
Essas são apenas algumas questões que foram objeto de análise pelos Tribunais
brasileiros e que dizem respeito à eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas
relações de trabalho.
Jurisprudência Brasileira Acerca da Eficácia Horizontal dos Direitos
Fundamentais nas Relações Laborais
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Uma das primeiras decisões do Supremo Tribunal Federal admitindo a eficácia
direta dos direitos fundamentais nas relações laborais ocorreu no julgamento do Recurso
Extraordinário 161243-6/DF. O caso envolvia a recusa de aplicação do regulamento de
uma empresa aérea aos empregados brasileiros, unicamente em razão da nacionalidade
desses. A Segunda Turma do STF entendeu que o princípio constitucional da igualdade é
aplicável às relações entre particulares, motivo pelo qual é vedada a discriminação
lastreada na nacionalidade do funcionário.
A decisão do STF tem a seguinte ementa:
“CONSTITUCIONAL.
TRABALHO.
PRINCÍPIO
DA
IGUALDADE.
TRABALHADOR
BRASILEIRO
EMPREGADO DE EMPRESA ESTRANGEIRA: ESTATUTOS
DO
PESSOAL
DESTA:
APLICABILIDADE:
AO
TRABALHADOR ESTRANGEIRO E AO TRABALHADOR
BRASILEIRO. C.F., 1967, art. 153, § 1º, C.F., 1988, art. 5º,
caput.
I. – Ao recorrente, por não ser francês, não obstante trabalhar para
a empresa francesa, no Brasil, não foi aplicado o Estatuto do
Pessoal da Empresa, que concede vantagens aos empregados, cuja
aplicabilidade seria restrita ao empregado de nacionalidade
francesa. Ofensa ao princípio da igualdade: C.F., 1967, art. 153, §
1º; C.F., 1988, art. 5º, caput).
II. – A discriminação que se baseia em atributo, qualidade, nota
intrínseca ou extrínseca do indivíduo, como o sexo, a raça, a
nacionalidade, o credo religioso, etc., é inconstitucional.
Precedente do STF: Ag 110.846 (AgRg) – PR, Célio Borja, RTJ
119/465.
III. – Fatores que autorizariam a desigualdade não ocorrentes no
caso.
IV. – R.E. conhecido e provido.” (STF, RE-161243-6/DF, 2ª
Turma, Rel. Ministro Carlos Veloso, DJ 19.12.1997)
No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, a teoria da eficácia horizontal dos
direitos fundamentais foi expressamente utilizada na decisão do processo TST-RR-
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2195/1999-009-05-00.6, que envolvia o debate acerca da invasão da privacidade de uma
empregada. No caso, a Primeira Turma do TST deu provimento ao Recurso de Revista
para condenar a empresa ao pagamento de indenização por dano moral.
Na fundamentação dessa decisão, o Relator utilizou, de forma expressa, a tese da
aplicabilidade direta dos direitos fundamentais nas relações privadas, conforme exposto
no seguinte trecho:
Não obstante hodiernamente, por conta de uma cultura hedonista,
o corpo humano seja exposto e explorado diuturnamente,
atendendo aos interesses mais vis e abjetos, o desrespeito à sua
dignidade intrínseca não pode
alcançar as relações de trabalho, sob pena de aviltar ainda mais a
já aflitiva situação do trabalhador contemporâneo.
Entendo, nesse passo, que traduz grave afronta à dignidade do
corpo humano a obrigação imposta à Empregada por conta de
liame trabalhista de desnudar-se (porque para trocar de roupa é
necessário, por óbvio, que assim o faça) diante de representante
do empregador. Convém lembrar, a propósito, o episódio bíblico
da perdição de Davi, a quem bastou um olhar lançado à Bathseba,
mulher de Uriah, para urdir a morte deste último.
Em semelhante prática, a Empregada foi objeto de
constrangimento ilegal, com violação ao direito constitucional à
intimidade, porquanto submetida a situação vexatória e
humilhante, de indisfarçável constrangimento moral, pois
acompanhada por pessoa estranha ao despir-se em ambiente
devassado.
Manifesto que comportamento desse jaez atenta contra a
dignidade do ser
humano e merece repulsa e condenação.
Ofende, portanto, o direito à intimidade de Empregada prática de
Empresa que, exorbitando os limites do poder diretivo e
fiscalizador, impõe a presença de supervisor, ainda que do mesmo
sexo, para acompanhar a troca de roupa dos empregados no
vestiário.
A esse respeito, ALICE MONTEIRO DE BARROS observa que
o empregador, bem como seus prepostos, deve respeitar o direito
subjetivo
do
empregado
à
própria
intimidade,
“independentemente de encontrar-se o titular desses direitos
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Caderno Virtual Nº 21, v. 1 – Jan-Jun/2010
dentro do estabelecimento empresarial. É que a inserção do
obreiro no processo produtivo não lhe retira os direitos da
personalidade, cujo exercício pressupõe liberdades civis”. E
prossegue: “Não é o fato de um empregado encontrar-se
subordinado ao empregador ou de deter este último o poder
diretivo que irá justificar a ineficácia da tutela à intimidade no
local de trabalho, do contrário, haveria degeneração da
subordinação jurídica em um estado de sujeição do empregado.”
(BARROS, Alice Monteiro de. Proteção à intimidade do
empregado, São Paulo: LTr, 1997)
Desse modo, seja para desencorajar o furto, seja para impedir que
substâncias psicotrópicas alcancem a sociedade, a supervisão, nos
termos em que exercida pela Empresa, não encontra amparo legal.
Penso que nem em nome da defesa do patrimônio, tampouco por
interesse supostamente público, pode-se desrespeitar a dignidade
humana.
Aliás, a tese aqui esposada encontra apoio na teoria da Eficácia
Horizontal dos Direitos Fundamentais ou Drittwirkung der
Grundrechte, concebida pelo alemão Hans Carl Nipperdey, juiz e
prestigioso especialista em direito civil e do trabalho, já na década
de 50 do século passado. MÁRCIA NOVAES GUEDES assim
descreve as implicações da Drittwirkung na seara trabalhista, em
sua monografia sobre a matéria:
[...]
A doutrina encontra plena aplicabilidade na espécie. Com efeito,
a garantia fundamental inscrita no inciso X do art. 5º da
Constituição Federal há de pautar as relações de emprego,
máxime no tocante à imposição de limites ao poder de
fiscalização e controle conferido ao Empregador.
Em conclusão, embora não se cuide, aqui, a rigor, de revista
pessoal, o comportamento da Empregadora traduz nítido
desrespeito à intimidade da Empregada, de onde deflui,
inquestionavelmente, o direito à indenização por dano moral.
Direito que se assenta nos princípios consagrados no Texto
Constitucional, sobretudo os da dignidade da pessoa, erigida
como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito
(art. 1º, inciso III), da proibição de tratamento desumano e
degradante (art. 5º, inciso III) e da inviolabilidade da intimidade e
da honra (art. 5º, inciso X).
Restaria à Empresa, nesse contexto, valer-se de meios de controle
não agressivos à intimidade de seus empregados, tais como o
controle numérico dos medicamentos, o monitoramento por meio
de câmeras de vídeo nos ambientes em que há manipulação dos
produtos e a verificação contábil mais detalhada do estoque.
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(TST-RR- 2195/1999-009-05-00.6, 1ª Turma, Relator Ministro
João Oreste Dalazen, DJ 09.07.2004)
Outra decisão do Tribunal Superior do Trabalho, no processo TST-RR119037/2003-900-02-00.0, cujo relator foi o Ministro Carlos Alberto Reis de Paula,
também utilizou, ainda que de forma não explícita, a teoria da eficácia direta dos direitos
fundamentais nas relações laborais. Nesse processo, o trabalhador, com base na aplicação
do princípio constitucional da isonomia, pleiteia o pagamento da verba denominada
“gratificação por dispensa”, que foi paga somente a alguns funcionários.da empresa, sem
que houvesse nenhuma justificativa para a discriminação.
O Tribunal Regional havia negado provimento ao Recurso Ordinário da
Reclamante, sob o fundamento de que o princípio da igualdade teria eficácia meramente
programática, sendo inviável a extensão de um benefício criado pelo empregador a outros
trabalhadores.
Por sua vez, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho firmou o
entendimento de que o princípio da igualdade tem natureza material e incide, inclusive,
nas relações laborais. Nesses termos, o pagamento da verba “gratificação de dispensa”
apenas a alguns funcionários, sem a estipulação de nenhum critério objetivo, ofende o
mencionado princípio. Essa decisão tem a seguinte ementa:
RECURSO DE REVISTA. GRATIFICAÇÃO POR DISPENSA.
ISONOMIA. Esta Corte entende que o princípio constitucional da
isonomia tem natureza material e não formal, motivo pelo qual,
em princípio, devem ser estendidos ao empregado que se encontra
na mesma situação fática os benefícios concedidos apenas a
alguns trabalhadores. O pagamento da gratificação por dispensa
somente a alguns funcionários, sem a estipulação de nenhuma
critério objetivo, caracteriza violação do princípio da isonomia,
consubstanciado nos artigos 5º, caput, e 7º, XXXII, da
Constituição Federal. Recurso de Revista conhecido e provido.
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Caderno Virtual Nº 21, v. 1 – Jan-Jun/2010
(TST-RR-119037/2003-900-02-00.0, 3ª Turma, Rel. Ministro
Carlos Alberto Reis de Paula, DJ 31.08.2007)
Considerações Finais
A teoria da aplicabilidade horizontal dos direitos fundamentais é de suma
importância para os diversos ramos do direito, notadamente para o Direito do Trabalho,
que envolve direitos sociais de segunda geração.
O contrato de trabalho, por sua própria natureza, envolve o conflito entre a
autonomia privada, representada pelo direito de propriedade do empregador, e o direito
fundamental dos trabalhadores à imagem, dignidade, igualdade, dentre outros. Os direitos
de ambas as partes devem ser ponderados, de forma que se encontre uma solução para o
caso concreto sob análise. Por esse motivo, a aplicação dos direitos fundamentais nas
relações laborais apresenta um desafio ao interprete e ao julgador.
As decisões judiciais citadas neste trabalho evidenciam que tem havido uma
maior utilização da teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações
laborais. Dentre os fatores responsáveis por essa tendência podemos desatacar os diversos
estudos doutrinários acerca do tema. Esse é mais um exemplo de profícua interação entre
os estudos acadêmicos e a jurisprudência.
Bibliografia
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008.
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Caderno Virtual Nº 21, v. 1 – Jan-Jun/2010
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Acesso em: 18 ago. 2009.
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VALE, André Rufino do. Eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas.
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______. 50 anos do caso Lüth. Revista Jurídica Consulex. Brasília, v. 12, n. 274, p.5455, jun. 2008.
1 VALE, André Rufino do. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris Editor, 2004, p.19-20.
2 Ibidem, p.20.
3 PIMENTA, José Roberto Freire; BARROS, Juliana Augusta Medeiros. A eficácia imediata dos direitos
fundamentais individuais nas relações privadas e a ponderação de interesses. Disponível em:
http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/bh/jose_roberto_freire_pimenta.pdf
4 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2006. p.197-198.
5 SARLET, Ingo Wolfgang. Eficácia dos direitos fundamentais. 9ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2007, p.395-396.
6 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito. Revista de Direito
Administrativo. Rio de Janeiro, v. 240, p.1-42, 2005.
7 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2006, p.238.
8 VALE, André Rufino do. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas. Porto Alegre:
Sergio Antonio Fabris Editor, 2004, p.178.
9 BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito. Revista de Direito
Administrativo. Rio de Janeiro, v. 240, p. 1-42, 2005.
10 PIMENTA, José Roberto Freire; BARROS, Juliana Augusta Medeiros. A eficácia imediata dos direitos
fundamentais individuais nas relações privadas e a ponderação de interesses. Disponível em:
http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/bh/jose_roberto_freire_pimenta.pdf
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