DOI: https://doi.org/10.18309/ranpoll.v52i3.1666
Augusto de Campos: 90 anos
Augusto de Campos: Ninety Years
Andréia Guerini
Universidade Federal de Santa Catarina/CNPq, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil
Diana Junkes
Universidade Federal de São Carlos/CNPq, São Carlos, São Paulo, Brasil
Frederico Augusto Garcia Fernandes
Universidade Estadual de Londrina/CNPq, Londrina, Paraná, Brasil
Este número da Revista da Anpoll é o segundo destinado à série de escritores/escritoras
de língua portuguesa, e homenageia Augusto de Campos, que completou 90 anos em 14
de fevereiro de 2021 e se dedica à poesia há mais de 70 anos. Ao lado de Haroldo de
Campos e Décio Pignatari, Augusto de Campos foi um dos fundadores do Movimento da
Poesia Concreta (1956), que alterou radicalmente os rumos da poesia, o trabalho criativo
e desdobrou-se em diálogos com outras linguagens, como as artes visuais e o cinema,
além de um importante projeto tradutório que buscava, no paideuma concretista, as bases
para uma poesia verbivocovisual e, para além dela, a tradução tal qual proposta pelos
concretistas também influenciou a maneira pela qual uma concepção de tradução como
crítica se estabeleceu. Este volume apresenta dez artigos, duas entrevistas e um
depoimento. Abre o número o artigo de Kenneth David Jackson, “O non serviam de
Augusto”, que trata do universo poético da recusa em Augusto de Campos, já que “a
poesia da recusa abrange, de acordo com o autor, um programa estético e também social,
que justifica o ‘anti’, a ‘anti-poesia’ e a escrita ‘à margem da margem’, encontrado no
cerne da consciência poética e social das vanguardas poéticas”. Na sequência,
em “Genesi, analisi e sviluppi di CIDADE CITY CITÉ: una poesia Augusto de Campos”,
Enzo Minarelli parte da interpretação do poema fonético de 1963, publicado pela primeira
vez na Itália, e passa a desenvolver a função da voz na poesia concreta e na poesia dita
sonora pesquisada na sua expansão em direção à imagem em movimento (videopoesia) e
à performance, para relacionar com as experiências da segunda metade do século XX,
Guerini et al.
conhecidas como intermedia e polipoesia. Em “Autoironia e crise em “Bestiário para
fagote e esôfago”, poema de Augusto de Campos”, Adilson Antônio Barbosa Júnior
reflete sobre o tópico da crise como elemento constitutivo da poesia moderna. Em “A
verbivocovisualidade criptografada de Augusto de Campos”, Luciane de Paula e Rafaela
dos Santos Batista refletem sobre a poética de Augusto de Campos, centrando na
concepção estética da verbivocovisualidade e relacionando-a com a filosofia da
linguagem bakhtiniana no que tange a noção de linguagem, entendida como
tridimensional. Dirce Waltrick do Amarante e Sergio Medeiros, em “A interação entre
Josef Albers e Augusto de Campos”, colocam em diálogo um poema visual de Augusto
de Campos que é uma tradução de Maiakóvski com a série Homenagem ao quadrado, do
artista plástico Josef Albers. Odile Cisneros, em “Julio Plaza e Héctor Olea: O Brasil
concreto de dentro e de fora”, explora o papel e o “olhar” de Julio Plaza e Héctor Olea,
dois “viajantes estrangeiros”, a partir do contato que estabeleceram com os irmãos
Campos e com o mundo artístico e literário do Brasil nas décadas de 1970 e 1980. Em
“Passeio pelas lembranças com Augusto de Campos”, Aurora Bernardini destaca
momentos marcantes das traduções poéticas de Augusto de Campos, analisando as
estratégias tradutórias, realizadas a partir de obras de escritores de diferentes línguas:
franceses, russos, ingleses, americanos, italianos. Em “Uma análise do poema ‘if
recollecting were forgetting’, de Emily Dickinson sob a visão de Augusto de Campos”,
Benedita Teixeira Gama analisa a tradução do poema de Emily Dickinson, realizada por
Augusto de Campos, buscando refletir os caminhos percorridos pelo mesmo em seu
projeto tradutório. Em “Augusto de Campos, intersemiose de uma imanência”, Luciano
Barbosa Justino discorre sobre três estratos da poética do escritor, que constituem a
intersemiose de uma imanência. Em “Antiliteratura de Augusto de Campos: Passagens
entre Linguagens e Mídias”, Adam Joseph Shellhorse examina a recepção, trajetória,
filosofia e as dimensões estéticas da poética de Augusto de Campos dos anos 1950 até o
presente, mostrando como sua poesia é melhor enquadrada por seu compromisso com a
radicalização permanente da linguagem. Na seção “Entrevista”, Rosario Lázaro Igoa
entrevista Gonzalo Aguilar, professor e crítico argentino, que se ocupou de poesia
concreta brasileira e de Augusto de Campos por diferentes vertentes e Marina Ribeiro
Mattar entrevista Augusto de Campos. Nessa entrevista, Augusto de Campos ilumina
alguns pontos da origem do movimento da poesia concreta e a produção de seus livros
Revista da Anpoll, Florianópolis, v. 52, n. 3, p. 8-10, set.-dez., 2021 | 9
Apresentação
em edições de autor, junto a parceiros e amigos, discutindo as convergências entre o
movimento da poesia concreta e a produção de livros de artista. Na seção “Depoimento”,
temos o relato de Charles A Perrone, professor emérito da Universidade da Flórida,
intitulado “Celebrando os noventa anos de Augusto de Campos”. Ao homenagear a obra
de Augusto de Campos com este número, realiza-se o justo reconhecimento de um
proeminente ensaísta, poeta e performer brasileiro, que também se dedicou à tradução, à
crítica literária e musical, cuja presença na cena da poesia brasileira e internacional não
perdeu seu vigor. Vale lembrar do prêmio recebido na Hungria, "Grande Prêmio de Poesia
Janus Pannonius", no dia 23 de setembro de 2017, a entrega do título de Doutor Honoris
Causa a Augusto de Campos, pela Universidade Federal Fluminense, que vai acontecer
em 25 de janeiro de 2022, e das celebrações de aniversário às quais a Revista da Anpoll,
neste número especial, se junta. É importante mencionar ainda a forte atuação política do
poeta, por meio da produção de poemas que desde o golpe de 2016 vêm denunciando as
ameaças de um estado de exceção que pairam sobre o Brasil. Fazendo valer a máxima
benjaminiana, “quem não é capaz de tomar partido deve calar”, Augusto não se exime da
responsabilidade do artística perante a sociedade, pela via da linguagem, articulando uma
poesia política à política da poesia, como disse belamente Haroldo em “Ode explícita à
poesia no dia de São Lukácks”:
ou como
há pouco
augusto
o augusto:
que a flor flore
o colibri colibrisa
e a poesia poesia
Andréia Guerini
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ORCiD: https://orcid.org/0000-0002-3187-6246
Frederico Augusto Garcia Fernandes
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ORCiD: https://orcid.org/0000-0001-7852-9519
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ORCiD: https://orcid.org/0000-0002-5465-8030
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