Cultura japonesa 6: A diáspora de Okinawa
De Masaomi Ise, Akira Miyagi, Chusei Takara e
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Sobre este e-book
Por que as pessoas daquele país deixaram de assaltar supermercados quando ocorreu aquele grande terremoto seguido de tsunami em 11 de março de 2011? Por que permaneceram ordeiramente em filas em meio à tragédia?
Por que, na Copa do Mundo de 2014, os torcedores daquele país recolheram o lixo na arquibancada do estádio após o término do jogo?
O que sentiu Einstein quando esteve no Japão, em sua viagem de conferências?
Que pensamentos tiveram os vultos da história japonesa do período da restauração de Meiji como Ryoma Sakamoto, no momento dramático da inclusão do país no sistema mundial após 260 anos de isolação?
Por que foram surgindo do Japão arrasado pela Segunda Grande Guerra, uma após outra, empresas de porte internacional?
Nas entrelinhas desta coleção se esconde a história do Japão e as bases do pensamento japonês, que não se resumem apenas a sushi, sashimi, animação e "cosplay".
Nesta série você encontrará a essência da cultura japonesa.
Uma publicação do Jornal Nikkey Shimbun.
Nesta edição:
Guerra e migração – A diáspora de Okinawa
Reflexões sobre a Batalha de Okinawa
A Batalha de Okinawa
Os dois guardiões da ilha
Assim lutou o povo de Okinawa
A guerra na minha infância
A Batalha de Okinawa e os imigrantes okinawanos
A identidade uchinanchu entre as novas gerações
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Cultura japonesa 6 - Masaomi Ise
Sumário
Introdução – Guerra e migração – A diáspora de Okinawa
Introdução – Reflexões sobre a Batalha de Okinawa
Capítulo 1 – A Batalha de Okinawa
Capítulo 2 – Os dois guardiões da ilha
Capítulo 3 – Assim lutou o povo de Okinawa
Capítulo 4 – A guerra na minha infância
Capítulo 5 – A Batalha de Okinawa e os imigrantes okinawanos
Capítulo 6 – A identidade uchinanchu entre as novas gerações
Capítulo 7 – Festival mundial uchinanchu
Créditos
INTRODUÇÃO
Guerra e migração
A diáspora de Okinawa
Masayuki Fukasawa
A Redação
Okinawa e as Ilhas Açores
Okinawa se parece com as Ilhas Açores, de Portugal.
As Ilhas Açores ocupam um ponto estratégico no Oceano Atlântico a aproximadamente 1500 km a oeste de Lisboa e a 3900 km da costa oriental da América do Norte.
Okinawa inclui no círculo de 2000 km ao seu derredor Tóquio, Pequim e Vladivostok. E se o círculo for estendido a 2500 km, incluirá também Wakkanai, Chengdu, Xunquim, Hanoi, Guam, e até Palau. Okinawa ocupa assim posição central do Oceano Pacífico no oriente asiático. Razão porque, no período final do xogunato em junho de 1853, o almirante Perry, comandante da esquadra norte-americana das Índias Orientais, optou por desembarcar inicialmente em Naha para se abastecer, à força, para dirigir-se logo depois em julho a Urawa, onde entregou ao xogum o ultimato do governo americano para a abertura do Japão ao mundo. O tratado de abertura assinado no ano seguinte serviu de estopim para a brusca reviravolta da nação rumo à Restauração de Meiji. Mas tudo começou em Okinawa.
Angra do Heroísmo localizada na costa sul da ilha Terceira, uma das ilhas dos Açores, classificada como Património Mundial pela UNESCO
Seja como for, tanto Açores como Okinawa não passavam, em suma, de pequenas ilhas pobres, isoladas no meio do oceano, e por isso mesmo, contribuíram à emigração ao Brasil desde cedo. Os açorianos emigraram em 1619 para o Estado do Maranhão inicialmente, para onde foram 300 casais. O fluxo continuou em direção ao litoral do norte, nordeste e sul do país. As cidades de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, Florianópolis, em Santa Catarina, e Itajaí foram fundadas por eles.
Okinawa, por sua vez, cuja população representava pouco mais de 1% da população japonesa, chegou a contribuir com até 10% do total da colônia japonesa no exterior. Objeto de discriminação racial da era Meiji antes da guerra, palco de uma das batalhas mais violentas durante a guerra, e submetido à ocupação americana após a guerra, Okinawa abriga ainda hoje a maior base militar americana em todo o Japão.
As distorções da história moderna japonesa que afetaram a ilha levaram o povo de Okinawa desde cedo a concretizar sua emigração à América do Sul.
Da esquerda para a direita, Tom Hanks, Katy Perry e presidente Mujica do Uruguai (wikimedia commons)
Da esquerda para a direita, os presidentes originários de Okinawa, Yokio Oshiro, da Aliança Cultural Brasil-Japão, Akeo Yogui, da Beneficência Nipo-Brasileira de São Paulo e Harumi Goya, da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social
As Ilhas Açores também possuem relacionamento com o exército americano. Na fase final da guerra, a força aérea americana teve permissão de uso da base aérea portuguesa de Lajes, na Ilha Terceira. Desde então, essa base passou a ter, para o exército americano, valor estratégico significativo, de entreposto para o acesso à Europa, o Mediterrâneo e o Oriente Médio.
São numerosos os artistas oriundos de Okinawa. O mesmo se dá entre os açorianos. Tom Hanks, astro famoso de Hollywood, era neto de açorianos. Katy Perry, famosa cantora-compositora americana, pertence à 5ª geração de açorianos. Entre os políticos, o presidente Mujica do Uruguai é também descendente de açorianos.
E na sociedade nikkei do Brasil, das cinco associações representativas da sociedade, três possuem atualmente presidentes originários de Okinawa. São eles: Harumi Goya, da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social, Akeo Yogui, da Beneficência Nipo-Brasileira de São Paulo e Yokio Oshiro, da Aliança Cultural Brasil-Japão.
A comunidade okinawana representa apenas dez por cento da sociedade nikkei de 1900 mil integrantes, mas sua presença se faz notar ano a ano em proporções maiores que a participação populacional. Na realidade, a comunidade okinawana já se constitui coluna mestra que sustenta toda a sociedade nikkei. Pode-se até dizer que quase toda a família nikkei possui em seu seio alguém de Okinawa. A presença deles é tal que passam a representar a sociedade nikkei inteira. Assim, chegou o momento de dedicarmos todos, inclusive, os não descendentes dessa província, maior atenção à história e à identidade do povo de Okinawa. Este livro foi planejado com esse intuito, de promover a compreensão recíproca.
Povo escorraçado pela guerra da Coreia do Sul
Estamos em maio de 2017, quando o problema provocado pelos mísseis atômicos da Coreia do Norte eleva a tensão não apenas na península coreana como em todo arquipélago japonês a partir de Okinawa, onde se acha a base militar norte-americana, em vista da possibilidade de se tornar alvo dos mísseis. Mas os anos 1950 quando muitos emigrantes de Okinawa deixaram a pátria, constituíram também um período de elevada tensão devido à ocorrência da guerra da Coreia (1950 ~ 53).
Tomamos aqui por tema a guerra e a emigração de Okinawa
, mas o assunto não se restringe apenas a Okinawa. Muitos outros emigrantes japoneses nasceram em Manchúria ou na península coreana e lá cresceram, vivenciaram a guerra durante a infância ou juventude. Na verdade, existe uma relação íntima entre a guerra e a emigração que independe de raça ou nacionalidade. Assim é que todas às vezes em que ocorrem conflitos na Europa, Oriente Médio ou Ásia, o Brasil é invadido ainda hoje por levas de emigrantes e retirantes.
Por outro lado, o Brasil é um país pacífico, que há quase 150 anos, desde a Guerra da Tríplice Aliança (1864 ~ 1870), não tem conflitos com países vizinhos. E por isso, tem sido muito procurado por aqueles que fogem da guerra em busca da paz.
Em Okinawa, nos anos recentes, o problema da transferência da base militar americana é assunto de acalorada discussão, dando lugar a vultosas manifestações populares. Para os descendentes de Okinawa nascidos no Brasil tudo isso deve parecer problema distante. Mas na verdade, são muitos os emigrantes que vieram chorando para o Brasil enxotados das terras de seus ancestrais pela construção dessas bases americanas.
Porém, mesmo entre a comunidade de Okinawa, a experiência da guerra já começa a ser esquecida.– Por que o papai deixou um país desenvolvido e rico como Japão só para vir sofrer no Brasil?" – é a pergunta que muitos filhos de emigrantes fazem ao pai. Na geração dos filhos, a vida já estava consolidada e eles tiveram boa educação. Isso porque a primeira geração realizou um trabalho suado, e cortou até a comida do dia para poupar dinheiro para educar os filhos.
A grande maioria dos isseis deixou de relatar aos descendentes os motivos históricos que acontecera em Okinawa e que os levaram à decisão de deixar a pátria. Mesmo porque tudo isso se associava a tristes recordações de fome e sofrimentos incontáveis.
Instalações militares americanas concentradas em Okinawa - www.pref.okinawa.jp
Durante a guerra, Okinawa registrava uma vítima entre quatro habitantes. Ernie Pyle, jornalista e correspondente de guerra americano detentor do Prêmio Pulitzer, que participou das batalhas travadas no front europeu, inclusive das operações de invasão da Normandia, relata em A Batalha de Okinawa
, na Wikipedia, o vulto das tropas empregadas na invasão de Okinawa: O nosso exército é o maior e o mais poderoso de toda a história da navegação no Pacífico
e Corresponde em escala a tudo que a América introduziu na Europa em termos de força naval, tropas e força de combate
.
Navio de guerra americano abrindo fogo contra a ilha principal de Okinawa
O exército japonês opôs resistência obstinada em Okinawa, pois pretendia impor ao exército americano um golpe severo que o levasse a desistir da invasão das quatro Ilhas principais do Japão (Honshuu, Hokkaido, Shikoku, Kyuushuu, conhecido como Hondo) mesmo à custa do sacrifício de Okinawa, para poder depois negociar a rendição em termos mais favoráveis. Entretanto, toda essa obstinação, para o povo de Okinawa (okinawano), só fazia aumentar a destruição da ilha, e acabou por deixar a impressão de que eles serviram apenas de peças de sacrifício. Essa impressão persiste até hoje e provoca divergências que estão no fundo do problema da transferência da base americana em Okinawa.
Acrescentamos no final deste capítulo o texto de Akira Miyagi, sobre Considerações sobre a Batalha de Okinawa a partir da leitura do discurso do sr. Masaomi Ise
. Muitos japoneses de Hondo ainda adotam o ponto de vista expresso nos capítulos 1 a 3 pelo autor em suas conversas. Entretanto, a maior parte dos okinawanos possue ponto de vista diverso, conforme se mostra nos capítulos 4 e 5. É necessário ver as coisas sob esse ponto de vista também, pois do contrário, não poderemos entender por que motivo tantos emigrantes saíram de Okinawa, e tampouco por que, como resultado, se formou no Brasil a maior comunidade mundial de descendentes de Okinawa. A raiz do problema da base americana em Okinawa está na divergência desses pontos de vista.
Soldado da 96ª Divisão de Infantaria do exército americano,
observando a situação