O tempo e o sonho: textos existenciais
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Sobre este e-book
Escritos em locais e datas diversos – mantidos como referência, os textos abrangem uma temática ampla e diferenciada. Esta vai do cotidiano familiar – partindo da vida a dois para se multiplicar em filhos e netos, incluindo o processo do envelhecer e a dialética saúde/doença – às experiências de viagens e a fatos políticos e sociais que marcaram o período. Agrega ainda retratos de pessoas amigas, que marcaram a trajetória da autora.
Escrito em um estilo leve e solto, que mescla características de crônica e de artigo, este livro revela percepções de uma mulher nascida no século passado, e abre-se aos novos desafios do milênio
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O tempo e o sonho - Lucia Ribeiro
Agradecimentos
Agradeço a todos e todas que, de múltiplas formas, fizeram possível o livro, especialmente à Letícia Cotrim e à Regina Pereira, pelas sugestões enriquecedoras, a Iza Labelle, Ney Paiva Chaves e Maria José Santos, pela interlocução permanente, a Ângela Dias e Flávio Ribeiro, pela revisão cuidadosa, ao Antônio Carlos Fester e ao Newton Queiroz pela leitura atenta. a Silvia Ribeiro por iluminar o livro com suas lindas mandalas. E ao Luiz Alberto Gómez de Souza, pela cumplicidade, sempre.
Nota da autora
Embora conscientes do sexismo implícito no uso convencional do plural masculino, ao referir-se ao masculino e ao feminino, adotamos esta forma por razões práticas.
Prefácio
Lucia, minha cara companheira de lutas desde os anos 50, insiste em me pedir uma apresentação para seu NOVO livro. Recebo os originais. Com surpresa vejo que alguma coisa mudou.
Acompanhei ao longo do tempo sua trajetória de socióloga e escritora que, durante toda uma vida, tem percorrido temas como religiosidade, migrações, aborto, feminismo, envelhecimento, sexualidade, reprodução, entre outros. Agora, são textos literários. Aqueles que escrevemos, às vezes, para a gaveta… Trata-se de tudo o que foi sendo produzido e ficou guardado em espera, talvez como algo menor. Por isso, aceito o desafio.
Apesar de ser o mesmo sujeito que escreve sobre a mesma realidade que nos cerca, admiro ainda mais o que ficou esperando guardado.
Cá entre nós, suponho que não haja nenhum ser que escreve a palavra que não possua uma gaveta secreta com seus alvoroços, seus avessos, seus devaneios provocados por uma cor, uma figura esquisita que passa, um dia em que tudo deu errado, ou uma data preciosa... O que eu não daria para visitar as gavetas de Marx, de Hannah Arendt, ou sei lá mais quem... É possível que as gavetas me facilitassem chegar mais perto.
Portanto, é possível que não exista propriamente um abismo entre os dois tipos de produção. Por um lado a ciência e a pesquisa, e, por outro lado, a literatura ciência/pesquisa e literatura.
É o olhar que muda. Quando as exigências metodológicas se fazem presentes, abordar a realidade resulta em um tipo de escrito. Quando o ímpeto de escrever que atinge esse mesmo sujeito não se submete às exigências que são justas, mas de algum modo o prendem, ele se liberta. Fica à vontade, permite certa incursão pelo sentimento, como se fosse um instante de intimidade, um intervalo que vai colecionando à parte. Com a passagem do tempo, as sobras
, esses instantes livres de compromisso, mostram outro tipo de compromisso. A meu ver, tão sério quanto o primeiro. Com sabor diferente, é verdade, mas compromisso com a verdade da mesma maneira.
Lembrei então de aulas antigas e de um tempo em que li coisas de Lucien Goldmann sobre a importância da literatura e naturalmente, inclusive a ficção, para de fato entender a história... Afinal, como diria o próprio Goldmann: a história depende do comportamento dos homens, de uma série de imponderáveis: estamos mais do que nunca diante de uma aposta
(LÖWY; NAIR, 2009).
Li atentamente o conjunto dos Textos Existenciais e aposto neles. Não importa se foram escritos à margem do trabalho. O que me dizem é sempre sobre o duradouro, o construído aos poucos, sem exageros, docemente, silenciosamente, simplesmente. A felicidade aqui é paciente. Não é a obrigação de ser feliz que vemos por aí nesse mundo contemporâneo onde não cabe nenhuma dor. É o terreno do contraditório que me encanta, presente o tempo todo na edificação das relações, com os outros. Com um único outro companheiro. Com aquele Outro que é o sagrado. Com as coisas vividas junto a um sem número de passantes, os outros casuais ou os que fazem parte das diferenciadas famílias de nossos pertencimentos.
Vejo nos Textos Existenciais, uma elaboração sobre a felicidade possível de uma mulher que nasceu quase como uma princesa, e conseguiu em pleno século XX na virada para o XXI – séculos de dor, medo, surpreendentes mudanças tecnológicas e de costumes – ser feliz para sempre
lutando como profissional, como escritora, como mulher, como mãe, como companheira, como militante, para edificar as cumplicidades pessoais e sociais, o que não se dá impunemente. Na literatura, essa arte de dizer as coisas que nos tocam, não há como escapar da precisão nem de todos os compromissos do eu quando contamos nossas histórias. Esse é o mistério que de alguma maneira contextualiza a história dos homens.
Letícia Cotrim
Referência
LÖWY, Michael; NAIR, Sami; Lucien Goldmann ou a Dialética da Totalidade. São Paulo: Boitempo, 2009. 192p.
Siglas e abreviaturas
Sumário
Introdução 17
A festa dos micos-leões 19
A cor-agem de Leonardo 22
Oscar 25
Salgueiro 27
Discovering the maple trees… 30
A dialética da cumplicidade 32
Carolina de Assis 36
D. Carmencita 39
Opções que se renovam 41
Abuelazgo
43
Nosso corpo (não) nos pertence 46
Bonjour, limites!
49
Bodas de Ouro: construção e dom 54
Velhice, uma realidade incômoda? 57
Tempo do cuidado 61
Reflexões ao longo de uma viagem ao Sul 65
Percalços de uma pesquisa transnacional 67
Turquia: uma experiência fascinante 70
Autonomia: um desafio 73
Dançando a liberdade 76
A vivência do envelhecer 79
Vovó Dindinha 83
O outro lado do rio 86
Fragmentos de viagem 89
Em busca da beleza, ainda que fugaz… 91
To be or not to be?
93
A eleição do Papa: um olhar feminino 96
O amor companheiro
99
O menino, a dama e o professor 103
Palavras que impactam 105
O testemunho de Rose Marie 108
Três pessoas iluminadas: 111
Celebrando as diferenças 113
Assumindo contradições: o réveillon de 2015 115
O sentido da vida nos tempos de cólera
117
Trilhando a (pen)última etapa 119
Marcelo, uma brisa leve 121
Vida religiosa em um mundo globalizado 123
O voo duplo 127
A orla perigosa 130
Passeio a cavalo 132
Dilma 134
A garota e a máquina 136
Mais velhos, mais sábios
138
Introdução
O tempo vai baralhando imagens diversas, ao configurar nossa trajetória: processo em permanente transformação. Condicionada por esse processo, nossa maneira de expressá-la também vai, pouco a pouco, sofrendo uma metamorfose.
Assim, meu estilo espontâneo de escrever, na adolescência, foi assumindo, nos tempos da universidade, um tom mais preciso e rigoroso. Com o início da vida profissional, no IBGE, foi forçado a tornar-se técnico, enquadrado pelos resultados