Uma Viagem Sentimental
De Sterne
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Uma Viagem Sentimental - Sterne
Sterne
UMA VIAGEM SENTIMENTAL
Através da França e Itália
1a edição
img1.jpgIsbn: 9786587921204
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Prefácio
Prezado Leitor
Sterne (1713 -1768) foi um escritor e clérigo anglicano irlandês, famoso principalmente pelo seus romances: A Vida e as Opiniões do Cavalheiro Tristram Shandy e Uma Viagem Sentimental Pela França e Itália.
Uma Viagem Sentimental, o romance mais curto de Steme, é uma pérola do humor. Combinando episódios autobiográficos, ficção incidental e pastiche de diários de viagem, o livro relata a jornada de Yorick e seu criado La Fleur pela França. A GrandTour, aquela educação nos modos e arte da Europa continental tão importante ao cavalheiro inglês, figura como alvo implícito de sátira.
Mais do que uma mera história, o prazer principal desse romance é sua manipulação divertida da intimidade do colóquio. O modo de contar ganha prioridade, enquanto o autor-narrador deixa diferentes incidentes suspensos entre interpretações sentimentais e um realismo mais prático. A obra Uma Viagem Sentimental faz parte da famosa coletânea: 1001 Livros Para Ler Antes de Morrer.
Uma excelente e divertida leitura
LeBooks Editora
Sumário
APRESENTAÇÃO
Sobre o autor
Sobre a obra
UMA VIAGEM SENTIMENTAL
Calais
O Monge
O Monge
O Monge
A Carruagem
Prefácio
Viajantes Comuns
Na Rua
A Porta da Cocheira
A Porta da Cocheira
A Caixa de Rapé
A Porta da Cocheira
Na Rua
A Cocheira
A Porta da Cocheira
A Cocheira
Na Rua
Montriul
Montriul
Montriul
Montriul
Um Fragmento
Montriul
O Cavalo
Nampont
Nampont
Amiens
A Carta
A Carta
A Peruca
O Pulso
O Marido
As Luvas
A Tradução
O Anão
A Rosa
A Fille de Chambre
O Passaporte
O Passaporte
O Cativo
O Estorninho
O Pedido
O Pasteleiro
A Espada
O Passaporte
O Passaporte
O Passaporte
O Caráter
A Tentação
A Conquista
O Mistério
O Caso de Consciência
O Enigma
Le Dimanche
O Fragmento
O Fragmento
O Fragmento e o Buquê
O Ato de Caridade
O Enigma Explicado
Paris
Maria
Maria
O Bourbonnois
A Ceia
A Graça
Um Caso Delicado
APRESENTAÇÃO
Sobre o autor
img2.pngO desejo de conhecimento, como a sede de riqueza, está sempre a aumentar com a nossa aquisição dele
Lawrence Sterne
Laurence Sterne (Clonmel, Irlanda, 24 de novembro de 1713 — Londres, 18 de março de 1768) foi um escritor e clérigo anglicano irlandês, famoso pelo seus romances: A Vida e as Opiniões do Cavalheiro Tristram Shandy e Uma Viagem Sentimental, entre outros.
Aos dez anos de idade, Sterne foi mandado para Halifax, na Inglaterra, para estudar. Anos mais tarde, estudou no Jesus College (Cambridge) e se tornou pastor da Igreja Anglicana em Yorkshire, eventualmente se tornando pastor remunerado da Catedral de Iorque em 1733. O bisavô de Sterne fora ordenado arcebispo de Iorque em 1664.
A Vida e as Opiniões do Cavalheiro Tristram Shandy
foi originalmente publicado em vários volumes, os dois primeiros aparecendo em 1759, e os demais no decorrer dos dez anos seguintes. Controverso, o livro teve reações dissonantes entre os escritores da época, mas o humor grosseiro foi bem aceito pela sociedade londrina. Hoje, o livro é tido como precursor do fluxo de consciência.
Mais tarde, Sterne publicou Jornada Sentimental pela França e Itália
(1768) baseado em suas viagens pela Europa devido à tuberculose, além de diversos sermões.
Tristram Shandy
faz uso de técnicas hostis ao leitor, como sequências de dezenas de asteriscos e páginas em branco. Unidos a esses elementos, com a falta de consistência do enredo e a ausência de uma conclusão satisfatória, Sterne consegue o efeito de paródia do (então recente) romance como forma literária. De especial interesse para leitores de língua portuguesa, A Vida e as Opiniões do Cavalheiro Tristram Shandy teve influência decisiva na obra de Machado de Assis, influência admitida livremente em Memórias Póstumas de Brás Cubas. Já a obra Viagem Sentimental mistura gêneros e estilos, influenciando Viagens na minha terra de Almeida Garrett
Sterne morreu em Londres em 1768.
Sobre a obra
Uma Viagem Sentimental (A Sentimental Journey Through France and Italy), o romance mais curto de Steme, é uma pérola do humor. Combinando episódios autobiográficos, ficção incidental e pastiche de diários de viagem, o livro relata a jornada de Yorick e seu criado La Fleur pela França. A GrandTour, aquela educação nos modos e arte da Europa continental tão importante ao cavalheiro inglês, figura como alvo implícito de sátira. Mas não há muito de grandioso nessa viagem. Pelo contrário, somos confrontados com uma investigação desdenhosa e microscópica da sensibilidade.
Mais do que uma mera história, o prazer principal desse romance é sua manipulação divertida da intimidade do colóquio. O modo de contar ganha prioridade, enquanto o autor-narrador deixa diferentes incidentes suspensos entre interpretações sentimentais e um realismo mais prático. Um exemplo notável é um homem lamentando seu asno morto, relatado como uma alegoria da natureza de como o sentimento por um animal pode fornecer um exemplo edificante do sentimento pelo semelhante humano.
O pranteador, porém, explorou e matou de fome o asno que pranteia. A subsequente chicotada cruel nos animais que asseguram o transporte do autor dota essa alegoria de duplo sentido. Tais abismos entre sentimento, condições materiais e ponto de vista narrativo estão sempre perto da superfície, embora se procure desviar a atenção de considerações financeiras, paixões mundanas e do erotismo implícito.
UMA VIAGEM SENTIMENTAL
— Fazem isso — disse eu — melhor em França...
— O senhor esteve em França? — perguntou o cavalheiro, voltando-se rapidamente para mim, de maneira muito gentil e triunfante.
É estranho! pensei, debatendo o assunto comigo mesmo. É estranho que o fato de navegar vinte e uma milhas — pois que não é, em absoluto, mais longa a distância entre Dover e Calais — outorgue ao homem esses direitos. Eu os verificarei. Em vista disso, pondo de lado a questão, dirigi-me diretamente aos meus aposentos, separei meia dúzia de camisas e um par de calções negros de seda (o casaco que estou envergando — disse eu, examinando-lhe as mangas, — servirá) e tomei passagem num navio. Tendo o paquete zarpado de Dover às nove horas da manhã seguinte, às três achava-me sentado diante do meu jantar, debruçado sobre uma galinha fricassê, tão incontestavelmente em França, que, tivesse eu morrido de indigestão nessa mesma noite, o mundo inteiro não teria conseguido invalidar os efeitos de Droits d’aubaine{1}. Minhas camisas, os calções pretos de seda, e mala e tudo o mais, teriam ido parar nas mãos do Rei de França, até mesmo o pequeno retrato que há tanto tempo trago comigo, e tantas vezes te disse, Eliza, que o carregaria até a sepultura; até mesmo ele me seria desatado do pescoço. Falta de generosidade! Apoderar-se assim dos despojos de um incauto passageiro, chamado ao país por seus próprios súditos. Céus! Sire, não é justo. E aborrece-me muito ter de discutir com o monarca de um povo tão civilizado e cortês, e tão famoso por seus nobres sentimentos.
Todavia, mal acabo de pôr os pés em seus domínios...
Calais
Tendo terminado o jantar, e bebido à saúde do Rei de França, para comprazer o meu espírito, e esclarecer que não nutria animosidade alguma por sua pessoa, muito pelo contrário, fazia grande honra ao sentido humanitário do seu caráter —, ergui-me, acreditando ter crescido uma polegada.
Não, disse eu, os Bourbons não são, de forma alguma, uma raça cruel: podem ser mal conduzidos, mas há doçura em seu sangue. Ao tomar conhecimento disso, senti uma efusão mais delicada em minhas bochechas, mais cálida e amigável do que poderia ter produzido um Borgonha (pelo menos de duas libras a garrafa, tal era o preço daquele que eu bebera).
Justos Céus! exclamei, empurrando de lado, com o pé, minha mala. Que poderá existir nos bens terrenos para exasperar nossos espíritos, e fazer decair tantos dos nossos bondosos irmãos, como acontece?
Quando o homem está em paz com o seu semelhante, quão mais leve que uma pluma é, em sua mão, o mais pesado dos metais! Abre a bolsa, e, segurando-a de maneira airosa e sem comprimi-la, olha em tomo de si à procura de alguém com quem possa partilhá-la. A essa reflexão, senti dilatar-se cada vaso do meu corpo, senti as artérias baterem alegremente uníssonas, e toda a força que sustém a vida funcionar com fricção tão suave que teria confundido qualquer preciosa de França, mesmo a mais instruída; com todo o seu materialismo teria sido impossível tomar-me apenas por um autômato.
Estou confiante, disse comigo mesmo, de que poderia inverter até o credo alheio.
A exaltação dessa ideia transportou a natureza, nesse momento, à atitude máxima: achava-me antes em paz com o mundo, completava agora um retrato de paz com a minha própria pessoa. Fosse eu Rei de França, exclamei, que excelente ocasião
para um órfão pedir-me qualquer coisa, ainda que fosse a minha mala!
O Monge
Calais
Mal acabara de pronunciar essas palavras, quando um pobre monge da ordem de São Francisco entrou no aposento a fim de pedir algo para o seu convento. Homem algum importa-se em ter as virtudes dominadas pelas contingências; ou uma criatura pode ser generosa, da mesma forma que uma outra é poderosa — sed non quo ad hanc — seja como for, não há explicação razoável para a maré alta e baixa dos humores. Podem depender das mesmas causas, pelo que sei, os motivos que influenciam a maré, e não seria para nós descrédito algum supor-se assim. Pelo menos quanto a mim próprio, sentir-me-ia certamente mais satisfeito, que num caso onde não houvesse pecado nem desonra, de mim se dissesse me terem dirigido as influências da lua, do que atribuir-se a ação ao meu livre arbítrio.
Seja, porém, como for, quando pus os olhos no monge, estava predeterminado a não lhe dar um ceitil e agindo de acordo com essa decisão, guardei minha bolsa, retesei o corpo, e avancei gravemente em sua direção. Havia algo creio eu, de proibitivo em meu olhar. Tenho, neste momento, sua figura à minha frente, e penso que ela merecia coisa melhor!
O monge, segundo julguei ao observar-lhe a tonsura e os poucos e esparsos fios de cabelos brancos que lhe restavam nas têmporas, poderia ter uns setenta anos de idade, mas considerando seus olhos, e a espécie de brilho que irradiavam (que parecia mais temperado pela cortesia que pelo decorrer do tempo), não poderia ter mais de sessenta anos. Sendo possível, entretanto, achar-se a verdade no meio, teria ele sem dúvida sessenta e cinco. Sua aparência geral, não obstante a impressão de que rugas lhe tivessem sido plantadas na face muito antes do tempo, concordava com o meu cálculo.
Era uma dessas cabeças que Guido muitas vezes pintou; suave, pálida, penetrante, liberta de qualquer ideia vulgar, ou de ignorância satisfeita na contemplação da Terra. Olhava em frente, mas como se vislumbrasse algo além deste mundo. Como lhe foi tal coisa acontecer, os céus, que a deixaram cair sobre seus ombros, melhor o sabem; ter-se-ia adaptado perfeitamente a um Brâmane, e, o tivesse eu encontrado nas planícies do Industão, como o teria então reverenciado!
O resto do esboço pode ser feito em poucas pinceladas; poderia mesmo ser entregue a quaisquer mãos para que o desenhassem, porque não era nem elegante, nem nada que a isso se assemelhasse. O seu todo, porém, e a sua expressão apresentavam-no como uma figura esbelta, delgada, algo acima do tamanho normal, inclinada para a frente em atitude de súplica.
E como se mostra ante a minha imaginação.
Após ter dado três passos pela sala adentro,