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Libras & Autismo - um diálogo possível?
Libras & Autismo - um diálogo possível?
Libras & Autismo - um diálogo possível?
E-book239 páginas5 horas

Libras & Autismo - um diálogo possível?

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Sobre este e-book

Este livro traz inquietações presentes no cotidiano escolar, no qual é possível perceber que os professores se deparam com dificuldades relacionadas ao processo de comunicação com alunos com TEA (Transtorno do Espectro do Autismo). Têm se tornado lugar comum nas EMEBS - Escolas Municipais de Educação Bilíngue para Surdos e em escolas regulares polos de atendimento inclusivos e bilíngues para Surdos a presença de alunos com TEA-Surdos. Essa condição é caracterizada pelos déficits relacionados ao transtorno e à ausência da audição e frequentemente ocasiona dificuldades em desenvolver a comunicação. Embora esse quadro possa gerar comprometimentos, esses alunos podem se beneficiar de algumas estratégias no ambiente escolar quando adequadas às suas necessidades comunicativas. Tal fato incita à discussão sobre as dificuldades encontradas pelos professores e corrobora os questionamentos sobre instrumentos de comunicação utilizados em sala de aula. Frente a esse quadro, na opinião dos professores, é possível propor a Libras – Língua Brasileira de Sinais como instrumento de comunicação para esses alunos? O leitor encontrará aqui aspectos relacionados aos Sistemas de C.A.A. - Comunicação Alternativa e Ampliada e a importância da Libras nesse contexto. O livro tem a finalidade de alcançar diversos públicos: estudantes, professores, ouvintes, Surdos e profissionais da surdez.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento29 de jun. de 2021
ISBN9786559567782
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    Libras & Autismo - um diálogo possível? - Raquel Aparecida Lopes

    1. INTRODUÇÃO

    Transtornos do Espectro do Autismo incluem condições diversas que apresentam em comum déficits persistentes nas interações sociais e comunicação social; existência de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades, que podem se apresentar de forma extremamente variável no que se refere aos graus de prejuízos presentes em cada um destes domínios (AMATO e FERNANDES, 2010; KHOURY et at., 2014; CANABARRO, 2018; SCHMIDT, 2014; ZANOLLA et al., 2015). Parte dos prejuízos se faz presente desde a infância e o diagnóstico precoce auxilia na reabilitação, é destacada a importância nas Diretrizes de Atenção à Reabilitação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, documento publicado em 2014 pelo Ministério da Saúde.

    Em muitas pessoas com TEA a linguagem é marcadamente prejudicada, alguns não adquirem linguagem verbal e, os que adquirem, podem apresentar sérios desvios. Aproximadamente 37% começam a falar as primeiras palavras cedo, mas deixam de fazê-lo entre o vigésimo quarto e o trigésimo mês (SCHWARTZMAN, 2011; 2015). Um outro dado que merece atenção relaciona-se ao fato de que 50% apresentam algum indicador de deficiência intelectual (KHOURY et al., 2014; ZANOLLA et al., 2015).

    A linguagem deve ser entendida como fator de interação da criança com os outros e o mundo que a cerca, sendo fundamental para o desenvolvimento de qualquer indivíduo, pois, através dela é possível compreender-se e transformar-se, atuando como sujeito ativo, histórico e social (GOLDFIELD, 2002; MOURA, 2013). Neste sentido, ocupa um papel inegável sendo que sua ausência ocasiona em diversos danos psicológicos e comportamentais que certamente implicarão em desvantagens para a interação do indivíduo no meio social, sobretudo, no escolar. Assim, a escola se estabelece como um mecanismo importante a favor da educação, pois, a possibilidade de vivenciar diferentes situações de comunicação certamente contribui no processo de aquisição da linguagem.

    Atualmente, é comum nas EMEBS² - Escolas Municipais de Educação Bilíngue para surdos e em escolas regulares polos³ de atendimento inclusivos e bilíngues para surdos, a matrícula de alunos com TEA que apresentam surdez associada. As EMEBS oferecem a educação bilíngue, o qual propõe o ensino da Libras como primeira língua (L1) para o surdo e o português como segunda língua (L2), na modalidade escrita. Para esses alunos a situação por vezes se agrava, pois a ausência da linguagem e da audição contribui para que se encontrem mais isolados, o que ressalta a importância de os professores escolherem estratégias específicas que proporcionem o avanço de suas habilidades comunicativas, sociais e emocionais.

    Têm aumentado o interesse por investigações científicas sobre a língua de sinais e pessoas com TEA surdas em outros países, principalmente nos Estados Unidos, contudo, observa-se no Brasil a escassez de estudos neste campo do conhecimento⁴. É importante salientar aqui que o TEA é um distúrbio do desenvolvimento neurológico cognitivo e que, as línguas de sinais, são línguas naturais de uma população sem déficits cognitivos: O Surdo⁵. Apesar das alterações de linguagem nessa população serem apresentadas frequentemente na literatura como déficits em comparação à linguagem de crianças com o desenvolvimento típico, as características linguísticas presentes podem perfeitamente serem analisadas sob outro viés, levando em consideração não o que lhes falta, mas sim, o que conseguem apreender do mundo e das interações, apesar de suas particularidades linguísticas.

    No que se refere às habilidades de uma primeira língua, sabe-se que podem ser alcançadas tanto por meio da aquisição de uma língua de modalidade oral-auditiva como a língua portuguesa por exemplo, quanto por meio da aquisição de uma língua de modalidade gesto-visual, como a Libras. Desde que nasce a criança ouvinte está exposta à linguagem oral, sendo adquirida naturalmente como língua materna, o que lhe possibilita realizar trocas comunicativas com o meio e experiências sociais. No caso de crianças surdas, é importante oferecer condições para que adquiram naturalmente uma língua-gesto-visual, a fim de que processos cognitivos e comunicativos se desenvolvam de forma adequada. Essas habilidades são pré-requisitos para que desenvolvam competências comunicativas e, posteriormente, adquiram a linguagem escrita.

    Se para o aprendizado da Libras é necessário utilizar diversos mecanismos como gramática, fonologia, semântica, morfologia e sintaxe, buscamos dar respostas a seguinte pergunta: É possível propô-la como instrumento de comunicação considerando as características que o TEA apresenta? Para chegar em algumas respostas, mergulhamos em estudos detalhados acerca da temática e preparamos este material visando oferecer maior subsídio à construção da prática pedagógica aos profissionais que atuam na educação de pessoas com TEA surdas no Brasil.


    2 O Decreto nº 52.785/11 cria as EMEBS - Escolas Municipais de Educação Bilíngue para Surdos, que contam com serviço bilíngue. A Portaria nº 5.707, de 12 de dezembro de 2011. Regulamenta o Decreto 52.785 de 10/10/11 que criou as escolas de educação bilíngue para surdos – EMEBS e dá outras providências. Diário Oficial da Cidade de São Paulo, São Paulo, 13 dez. 2011b.

    3 Com o Decreto nº 52.785/11, a educação especial transformou as escolas especiais em bilíngues e além disso definiu a escolha de algumas escolas regulares da Secretaria Municipal de Educação como polos de atendimento inclusivos e bilíngues para surdos (LACERDA, ALBRES e DRAGO, 2013).

    4 Alguns estudos serão apresentados no Capítulo 5.

    5 A palavra surdo é utilizada neste caso com S maiúsculo por concordar com MOURA (2000), em que utiliza a terminologia Surdos para elucidar a condição do sujeito, não a deficiência.

    2. TRANSTORNOS DO ESPECTRO DO AUTISMO: ASPECTOS HISTÓRICOS

    Estudos relacionados ao desenvolvimento infantil enfatizam a importância de como as concepções sobre a criança surgiram, criando formas e campos de visões educacionais que influem o modo de atuar dos profissionais nos dias de hoje, sobretudo, com crianças com TEA. Em termos históricos⁶, compreende-se que no final do século XVIII, a criança começa a ser vista com outros olhos por parte dos pesquisadores que, por sua vez, passaram a revelar que os desvios dos adultos são confundidos com os desvios das crianças, marcando assim um novo rumo às particularidades entre estes dois organismos. Sob este ponto, Rosenberg (2011) relata que no final do século XVIII a criança não era mais considerada um adulto em miniatura, um ser incompleto em tamanho que precisa ser treinado para ser um adulto mais tarde, e, no século XX, os psiquiatras notaram com espanto as particularidades das demências precoces e precocíssimas.

    A história oficial do Autismo infantil começa em 1943, quando a revista The Nervous Child publica o artigo de autoria do Dr. Leo Kanner, em que apresenta onze crianças, sinalizando inabilidade de se relacionar com pessoas e situações desde o início da vida, uma solidão autista extrema em relação aos estímulos externos, uma falha em assumir uma postura antecipatória ao ser carregado, ... uma dificuldade em assumir fala comunicativa e excelente memória em bloco (ROSENBERG, 2011, p. 23). A forma detalhada como Dr. Kanner descreveu os pacientes chamou a atenção de pessoas interessadas no assunto. Diante de tal fato, compreende-se por que tantos autores se referem ao assunto como síndrome de Kanner. No entanto, algumas terminologias têm acompanhado o histórico desta categoria como: Autismo Infantil Precoce, Autismo Infantil, Autismo, Criança Atípica e Psicose Infantil Precoce.

    Na mesma época, em 1944, Hans Asperger, descreveu em sua tese um conjunto de crianças com sinais e sintomas semelhantes àquelas descritas por Kanner e denominou o quadro de Psicopatia Autista (conhecido como Síndrome de Asperger). As características eram semelhantes, como a manifestação a partir dos três anos, marcha tardia, dificuldades no contato visual e graves problemas de interação social (PERISSINOTO, 2003). Há evidências de que Kanner e Asperger descreveram os quadros citados de forma independente.

    Em 1960 surge evidências de que o autismo era um transtorno cerebral presente desde a infância e que poderia ser independente de classes socioeconômicas. Neste mesmo ano surgiu a definição do termo Transtornos Invasivos do Desenvolvimento (TID), advindos especialmente dos trabalhos de M. Rutter, I. Kolvin e D. Cohen (MERCADANTE, SCHWARTZMAN e VAN DER GAAG, 2006). Contudo, no final dos anos 1970 houve a mudança do título do Journal of Autism and Childhood Schizophrenia para Journal of Autism and Development Disorders, conforme a publicação do DSM-III.

    O primeiro estudo epidemiológico foi realizado em 1966, no qual Lotter baseando-se nos sintomas descritos por Kanner, aplicou uma avaliação no Condado de Middlesex, na Grã-Bretanha, em uma população de 21\4 milhões de habitantes, onde desenvolveu um questionário entre os alunos em idade escolar, no qual obteve como resultado o número de 4,5 autistas por 10.000 habitantes de oito a dez anos (ROSENBERG, 2011). Posteriormente em 1978, Michael Rutter elaborou uma definição tendo como base o reconhecimento do autismo no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-III pela primeira vez em 1980, portanto, foi inserido na seção de Transtornos Invasivos do Desenvolvimento. Atualmente, o conceito que envolve os Transtornos Globais do Desenvolvimento é muito discutido entre os pesquisadores, para o diagnóstico é utilizado como base o DSM-V.

    2.1.1. AUTISMO: CONCEITO E DEFINIÇÃO

    Ao olhar para o contexto histórico de Kanner e a transição para a contemporaneidade, constata-se que o conceito de autismo se transformou. Visto como um distúrbio do desenvolvimento neurológico com fortes componentes genéticos que devem estar presentes desde a infância, o autismo se caracteriza por prejuízos nas dimensões sociocomunicativa e comportamental (APA, 2014; CANABARRO, 2018; SCHMIDT, 2014). As dificuldades na interação social podem ser manifestadas pelo isolamento em comportamento social impróprio, pobre contato visual, dificuldades em participar de atividades em grupo, indiferença afetiva ou demonstrações inapropriadas de afeto e falta de empatia social ou emocional. Dificuldades na comunicação, que ocorrem em variados graus, podem estar na habilidade verbal quanto na não-verbal de compartilhar informações com o outro. Os padrões repetitivos e estereotipados característicos do autismo constam de resistência às mudanças em determinadas rotinas, apego em excesso a objetos, e também estereotipias motoras (APA, 2014; KHOURY et al., 2014; SCHWARTZMAN, 2011; ZANOLLA et al., 2015).

    Sua etiologia ainda é desconhecida, porém, atualmente o TEA é considerado como uma síndrome de origem multicausal que envolvem fatores neurológicos, genéticos e sociais da criança e estima-se que atualmente a prevalência mundial esteja em volta de 70 casos para cada 10.000 habitantes, sendo que os meninos são acometidos quatro vezes mais (VOLKMAR e MCPARTLAND, 2014). O manual de Classificação e Estatísticas Internacional de Doenças e de problemas relacionados à saúde (CID 10) e o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, o DSM-V, são indicados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como guias de classificações diagnósticas do TEA. Os critérios específicos atuais para o diagnóstico do TEA possuem base nas diretrizes da 5ª edição DSM-V, publicado em maio de 2013 nos Estados Unidos. O diagnóstico deverá ser pautado em análise clínica realizada por anamnese, avaliação direta e exames complementares (estudos de cromossomos incluindo DNA para X-frágil e estudos de neuroimagem ou neurofisiologia, quando apropriados), bem como avaliação em que são utilizados instrumentos: Avaliação neuropsicológica e questionários (ASQ, ABC, CARS, ADOS, CHAT, Vineland, Varredura visual, entre outros).

    No Brasil, constata-se um índice de acometimento de 27,2 casos para cada 10.000 habitantes (LEVENSON, 2015). Isso sugere a importância de ações para diagnóstico e tratamento precoce dessa população na Saúde Pública, o que também implica na necessidade de identificação urgente de modelos de intervenção mais eficazes, assim como dos fatores que podem interferir nesses processos (AMATO, 2011).

    2.1.2. LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO NO AUTISMO

    Existe um consenso de que os principais problemas de linguagem no TEA se relacionam com a construção de narrativas e a compreensão sobre como esses indivíduos a utilizam para se expressar, ou seja, há limitações e dificuldades em fazer uso da linguagem de forma funcional. Alguns autistas não possuem habilidade de comunicação e, os que falam, podem apresentar linguagem imatura, ecolalia, alteração na prosódia e articulação, assim como dificuldade de compreender e contextualizar uma conversação (APA, 2014; MACPARTLAND, LAW e DAWSON, 2016; SCHWARTZMAN, 2011, 2015).

    A ecolalia consiste na repetição de produções vocais de outras pessoas e pode ocorrer de maneira imediata ou com um atraso (ecolalia tardia). Essa característica linguística é relatada desde 1943, quando Kanner descreveu o caso de Donald, um menino para quem as palavras tinham um significado exclusivamente literal, quando o pai lhe perguntava: Você quer que o pai o carregue nos ombros?, concordava repetindo literalmente a pergunta, configurando-se a ecolalia. A presença da ecolalia tardia ou imediata é marcante em 85% dos casos e é considerada uma repetição descontextualizada e sem significado, sendo comparada com tiradas de papagaios pelo fato de aparecerem quando menos se espera, recebendo também o nome de idiomatismo fonológico (PRIZANT e DUCHAN, 1981; MERGL e AZONI, 2015). Em dados momentos ela se apresenta como uma fala não comunicativa e estereotipada, no entanto, estudos demonstram que a criança que apresenta a fala ecolálica pode utilizá-la com intenção comunicativa. Normalmente apresentam uma linguagem inexpressiva e desprovida de emoção, além de alterações na altura do som, qualidade da voz, volume e entonação.

    Outro aspecto bem documentado é a dificuldade em usar corretamente pronomes, por vezes, referindo-se a si mesmos como você ao invés de eu. Além disso, geralmente apresentam a prosódia, que na literatura também é denominada melodia do discurso e se refere às variações de tom, intensidade

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