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O Preconceito Racial No Brasil
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O Preconceito Racial No Brasil
E-book241 páginas4 horas

O Preconceito Racial No Brasil

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Sobre este e-book

O Preconceito Racial no Brasil: o racismo e a negação do direito negro a educação, faz uma retrospectiva histórica desde o período pós abolição, onde a libertação dos escravizados pela Princesa Izabel em 1888, não passou de um “sonho de liberdade”. Como ser livre se não se tem acesso à terra, a moradia, ao emprego, se é discriminado pela cor de sua pele e principalmente quando lhe é negada a ascensão social pela educação? Quais foram as formas que as elites forjaram para manter os afrodescendentes a margem da escola e da própria sociedade? Por que o mito da democracia racial perdurou por anos no Brasil? Quais as leis, decretos e ações afirmativas que os governos tentam “reparar”, devido aos longos anos de discriminação, preconceito e sofrimento do povo negro ao largo da história do Brasil? Por que as escolas brasileiras tratam a questão da negritude apenas em novembro, por ocasião do mês da consciência negra? Por onde andam os heróis negros e heroínas negras neste país? Por que personalidades negras que alçaram sucesso no esporte, na música, nas artes e na política, são exceções? Por que apelidos étnico-raciais e “piadas” dirigidos aos negros não são simples brincadeiras entre colegas? Por que as escolas que possuem seus alunos majoritariamente negros, não são reconhecidas e preparadas para atendê-los? Existe ambiente para o protagonismo e visibilidade negra no espaço escolar? Quais são as tendências de valorização da estética e do orgulho negro, nos tempos atuais? Esta obra tem a intenção de responder essas questões ou na impossibilidade de encontrar respostas, que pelo menos desperte no leitor uma visão crítica dos anos de sofrimento e invisibilidade do povo negro, que tanto contribuiu na formação da sociedade e da cultura brasileira.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento22 de jul. de 2021
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    Pré-visualização do livro

    O Preconceito Racial No Brasil - Ronildo Neumann Pastoriza

    INTRODUÇÃO

    Sob a ótica dos estudos culturais e de autores ligados ao campo da educação, esta obra abordou O preconceito racial no Brasil: o racismo e a negação do direito negro a educação. Desde a abolição da escravatura no Brasil, os afrodescendentes não tiveram acesso à educação, a terra, a propriedade e a cultura. O sonho da abolição, inicialmente pensado para um processo de igualdade racial no Brasil, tornou-se na verdade um grande pesadelo, pois os negros desprovidos de recursos materiais e financeiros, engrossaram, cada vez mais, a camada social mais baixa.

    Ao longo dos anos a sociedade brasileira escondeu e rejeitou o protagonismo negro em todas as áreas: sociais, políticas e educacionais. Chegou-se até mesmo ao ponto de importar cidadãos europeus, para que num processo de miscigenação com os negros, fosse possível branquear a população brasileira. O Movimento Negro, instituição formada por intelectuais e adeptos da causa da negritude, transformou-se no grande bastião de combate a desigualdade racial e social no Brasil.

    Na área da educação, nesse contexto de questionamentos das hierarquizações culturais e dos conhecimentos totalizantes, a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, foi alterada pela Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática da história e cultura afro-brasileira. A partir dessa lei, tornou-se obrigatório no currículo escolar da educação básica o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição dos povos negros nas áreas sociais, culturais, econômicas e políticas pertinentes à História do Brasil.

    No entanto, como destacam Gomes e Silva (2011), apesar da importância da diversidade étnico-cultural na sociedade brasileira, o trato não segregador da diferença étnico-racial ainda é uma prática ausente na maior parte das instituições de ensino. Nesse sentido, o estudo e a discussão da diversidade étnico-racial brasileira, representam um importante desafio à educação do país, em especial, à formação de professores, cuja atuação é de fundamental importância para o combate ao racismo e a discriminação nos espaços de educação formal.

    Por outro lado, alguns autores ligados aos estudos culturais em educação, têm tecido críticas à forma como a diferença étnico-racial tem sido tratada e tematizada na educação a partir da abordagem multiculturalista. Silva (2010), em seu estudo sobre a produção da identidade e da diferença, critica a abordagem multiculturalista, centrada na tolerância e no respeito à diversidade. Para esse autor, parece difícil que uma perspectiva que se limita a proclamar a existência da diversidade possa servir de base para uma pedagogia que coloque no seu centro a crítica política da identidade e da diferença. De acordo com esse autor, na perspectiva multiculturalista apoiada no vago e benevolente apelo à tolerância e ao respeito (Silva, 2010, p.73), a identidade e a diferença são naturalizadas e essencializadas, sem se problematizar as relações de poder implicadas nos processos de produção de construção da identidade e diferença.

    Este estudo abordou ainda as variadas formas de manifestação do racismo e do preconceito racial, capilarizados pelas escolas brasileiras. Investigou também o longo contexto histórico de lutas do Movimento Negro, que culminou com o desmascaramento do propalado mito da democracia racial, que propunham os governantes daquela época.

    A metodologia utilizada em cima dos dados apurados na pesquisa bibliográfica e das visitas presenciais as escolas carentes da periferia de Porto Alegre, seguiram uma linha qualitativa. A elaboração deste estudo, foi baseado em três eixos pedagógicos investigativos, cada um deles contendo questionamentos pertencentes a esse tema.

    No primeiro eixo, foi abordado a legislação antirracista e o contexto pertinente à cultura afro-brasileira e em especial a Lei 10.639/03. No segundo eixo, foi abordado o estudo do contexto histórico da exclusão do direito negro à educação, mesmo após o período abolicionista. No terceiro eixo, foi investigado o preconceito racial no Brasil: o racismo e a negação do direito negro a educação.

    CAPÍTULO I

    Justificativa do Estudo

    __________________________________________________

    A relevância e a originalidade acadêmica deste estudo estão relacionadas com a intenção de discutir e problematizar as questões étnico-raciais nas escolas e no Brasil e teve substancial embasamento teórico dos estudos culturais em educação. Sobre isso, nos estudos de Hall (1997), é percebido que profundas mudanças socioculturais das últimas décadas, como o desmoronamento das certezas, o afloramento das diferenças culturais, a velocidade na circulação das informações, os cruzamentos entre o local e o global, levaram ao questionamento das verdades universais e à busca de uma sociedade fragmentada e plural.

    Costa (2007), coloca que a utilização de teóricos dos estudos culturais, no eixo investigativo, tanto no Brasil quanto em outros países, tem conduzido as discussões sobre cultura, relações étnico-raciais, conhecimento e currículo a novos caminhos e horizontes, especialmente por retirar o significado destes conceitos da caixa fechada e abrir caminhos para novos enfoques e interpretações.

    Muitos programas governamentais a nível federal, estadual e municipal tem abordado a questão étnico-racial em suas plataformas didático-pedagógicas. Na necessidade de um aprofundamento maior, este estudo aborda as leis antirracistas que esses governos implementaram para tentar reparar os anos de sofrimento e discriminação ao qual os povos negros foram submetidos, mesmo após o período da abolição da escravatura no Brasil, em treze de maio de 1888.

    Este estudo aprofunda a história e a cultura africana, desde o seu tráfico transatlântico do continente africano até sua chegada em terras do Novo Mundo. O conhecimento científico extraído desta obra, procura abordar as duas visões que predominavam nesta época: a visão do explorador, branco, ocidental, do Velho Mundo e a visão dos escravizados negros, segregados de seu país, de sua família, de sua cultura e submetidos a um regime cruel de escravidão, sofrimento, dor e morte. Esse estudo também aborda a forma de como o racismo foi se capilarizando na escola brasileira, seja através dos livros didáticos, seja em relação as formas preconceituosas relativa ao seu tipo físico, a sua cor de pele, ou a as expressões pejorativas que eram submetidos os afrodescendentes, muitas de forma muito sutil, outras de forma explícita, sob a forma de inocentes brincadeiras. Mesmo sendo maioria, os afrodescendentes sempre foram discriminados racialmente e considerados inferior aos brancos, que sempre tentaram negar a sua presença na sociedade e em particular na educação. Sobre isto, a história mostra que, sem o protagonismo negro, a elite brasileira e os intelectuais tinham plena convicção de que a educação escolar levaria o Brasil rumo ao desenvolvimento econômico para se equiparar às nações europeias, como a França e a Inglaterra.

    O racismo tornou-se uma ideologia bem elaborada, sendo fruto da ciência europeia a serviço da dominação sobre a América, Ásia e África. E esta ideologia ganha força a partir da escravidão negra, adquirindo estatuto de teoria após a revolução industrial europeia. Nesse contexto de transformações sociais, econômicas e políticas, acreditava-se que o projeto de nacionalidade brasileira, para viabilizar o progresso da nação, só poderia ser feito pelo homem branco europeu.

    Não foram preciso muitos anos, para perceber-se que as ações das elites e a data-símbolo da chamada abolição, não passavam de um sonho de liberdade ao negar o acesso à educação e ao não propiciar condições de vida digna para a população negra no Brasil.

    Este estudo mostra muitas facetas de como a população negra se tomou um entrave para a consolidação de um projeto republicano de modernização nos moldes iluministas e as formas perversas de como esta perseguição ao povo negro ocorre até os dias de hoje e particularmente continua atuando no âmbito escolar, sob a forma de apelidos étnico-raciais e outras formas pejorativas que geram preconceito, discriminação e racismo, dificultando a visibilidade e a identidade dos alunos negros.

    O racismo é uma prática diária e difundida. A perspectiva deste estudo a nível pedagógico e educativo está relacionada com a centralidade das discussões sobre as ações afirmativas na educação e, particularmente, à urgência do ensino da cultura e da história africana e afro-brasileira na educação nacional contemporânea, de acordo com a Lei 10.639/03¹, promulgada pelo Poder Executivo Federal em 09 de janeiro de 2003 e também de acordo com as demais legislações e ações afirmativas vigentes no Brasil, que visam reparar os anos de sofrimento do povo negro no país. Fruto da longa luta do Movimento Negro, depois de muitas discussões e votações em plenário, surge, enfim a Lei 10.639/2003:

    Art.26-A- Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.

    § 1° - O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política, pertinentes à História do Brasil.

    § 2° - Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo currículo escolar em especial, nas áreas de Educação Artística e de Literatura e Histórias Brasileiras.

    Art.79-B – O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra

    Esta lei foi um avanço no processo de redemocratização do ensino no Brasil e consequentemente um importante passo na luta antirracista. Em nível distrital, na Capital Federal, assim como em alguns municípios, como se pode verificar acima, esta lei que estabelece a obrigatoriedade do ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira, também aborda questões como a revisão dos currículos, a qualificação docente e sua implementação pelo poder executivo. A crítica ressalta, porém, o aspecto muito genérico da lei, onde não há a adequada implementação do ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira, sem estabelecimento de metas e sem especificar adequadamente a forma didática de implantá-la nos currículos escolares.

    Esse estudo também teve a intenção de discorrer sobre a saga do povo negro na luta pela sua libertação, pela sua integração na sociedade, pelo seu direito a educação e em muitas situações pela criação de alternativas à sociedade existente. Através de uma análise qualitativa crítica, buscou-se entender a forma como autores abordam a questão étnico-racial, como por exemplo, nos livros de História. Muitos deles tendem a esconder ou minimizar a luta dos negros contra a escravidão, que negou o acesso a sua educação, apagando as páginas da repressão e da exclusão que se abateu sobre os negros e sua cultura em nosso país. Sobre isso Silva (2011) coloca que, ao analisar os livros didáticos trabalhados na sala de aula, que tratam da história do Brasil, percebem-se textos e figuras racistas ou preconceituosas, visto que ao reproduzir os valores socialmente dominantes, negligenciam ou sub representam a parte negra da população brasileira. O livro didático ainda é, atualmente, uma das ferramentas pedagógicas mais utilizados pelos docentes, principalmente nas escolas públicas, sempre carentes de melhores recursos áudio visuais e de outros materiais auxiliares. Algumas famílias não têm acesso aos meios de comunicação mais elementares como jornais e revistas e por isso o livro didático é muitas vezes, o único recurso informativo de acesso a essas famílias. Por isso que muitos autores o criticam, pois tendem a marcar a presença negra de forma estereotipada e caricata, reforçando a representação negativa da população negra e reforçando a representação positiva dos brancos.

    O cientificismo crítico deste estudo, aponta o modo e as diversas artimanhas que às elites brancas e os próprios governantes propunham, com a intenção de negar o direito negro a educação ou mesmo de dificultar o acesso e permanência dos afrodescendentes na escola. Chegou-se à crueldade de utilização de teorias eugenistas no Brasil, como por exemplo, a teoria do branqueamento, que tinham como iniciativa a redução das populações indesejáveis, utilizando para isso estratégias biológicas, materiais e simbólicas, que construíram um discurso de eliminação da negritude em aspectos culturais da população brasileira e do espaço escolar. A teoria do branqueamento, o discurso da miscigenação e a instituição da democracia racial compõem uma rede discursiva que propõem a eliminação do elemento africano na constituição do povo brasileiro.

    Portanto, essa imagem de igualdade racial, criada ideologicamente, foi passada das mais diversas maneiras e tornou-se como verdade para a população brasileira. Era conveniente para o poder e para o estado autoritário divulgar para o Brasil e para o mundo uma visão romântica das relações raciais aqui existentes, camuflando o racismo e a profunda desigualdade histórica vivida por negros, índios e brancos em nossa sociedade.

    Porém, com a constante luta do Movimento Negro, criou-se a construção de um debate político sobre a situação do povo negro no Brasil, bem como a realização de estudos acadêmicos e demais pesquisas, que têm comprovado a existência do racismo e, consequentemente, a desigualdade racial entre os negros e os brancos, assim como tem ajudado a superar o mito da democracia racial no país.

    A educação como direito social foi negada aos negros até o limiar do século XIX e início do século XX. Esses anos de discriminação e preconceito ajudaram a compreender a necessidade urgente de ações afirmativas e de políticas sociais e educacionais que objetivem reparar as injustiças cometidas ao povo negro no Brasil. Sobre isto, Peres (2013) informa que o primeiro registro do que poderíamos chamar de ação afirmativa no Brasil data de 1968, quando técnicos do Ministério do Trabalho e do Tribunal Superior do Trabalho manifestaram-se favoráveis à criação de uma lei que obrigasse as empresas privadas a manter uma porcentagem de empregados negros. No entanto, uma lei nesse sentido não chegou a ser elaborada no período.

    Atualmente as ações afirmativas previstas pelos governos, têm como objetivo a reparação, a correção e o combate as desigualdades raciais que permaneceram no Brasil, mesmo após anos da abolição da escravatura no país.

    Nesta obra, é investigada a forma de como o racismo² se dissemina pelo interior das escolas, camuflado algumas vezes e por outras atuando explicitamente no afloramento do preconceito racial³ atuante no âmbito escolar. Estas formas de atuação são muitas vezes explícitas, mas na maioria das vezes atuam de forma sutil, silenciosa, quase despercebida, mas carregada de forte preconceito racial contra a população afrodescendente⁴. Aliás, sobre isso, Nadai (1992) afirma que, no final de 1970, passou-se a questionar conceitos elaborados para a sociedade brasileira, como o conceito de democracia racial e o de cidadania. Com isso, enveredou-se pelo caminho do debate político sobre o significado do ensino de história no contexto de uma sociedade que estava lutando para se redemocratizar. Neste período, houve um forte processo de rejeição ao ensino de história, recomendado pelos governantes brasileiros para forjar o espírito de nacionalidade.

    Discriminação racial, racismo, segregação, exclusão do outro pela cor de sua pele ou pertencimento étnico-racial são temas complexos, cheios de discursos e antidiscursos, os quais remetem a realidades humanas concretas, que requisitam ser contadas e sair do silenciamento.

    O problema racial há muito deixou de ser um problema individual do negro ou da comunidade negra. Na contemporaneidade, tornou-se uma questão maior, uma questão nacional e global. Nesse cenário, o Brasil vive um dilema secular. Dilema abominável e autofágico. As injúrias, as assimetrias sociais e os assédios morais no trabalho, enquanto fenômenos de rivalidade e luta entre indivíduos, a serviço da discriminação étnico-racial, implicam não apenas a servidão de uma raça por outra, mas a decadência de uma sociedade inteira, sobretudo quando multirracial e multicultural como a do Brasil. A construção de um país democrático e igualitário passa pela discussão da discriminação de seus habitantes afrodescendentes, não como compaixão, mas como obrigação.

    As comunidades negras conhecem bem essa realidade, a partir de sua história e de seus antepassados, nos processos de sofrimento e luta, implicados na superação do racismo. Em especial no Brasil, a realidade é alarmante e a sociedade

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