Os programas de ações afirmativas em prol da população transexual e travesti
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Os programas de ações afirmativas em prol da população transexual e travesti - Edgar Pierini Neto
CAPÍTULO 1 - SEXUALIDADES E IDENTIDADES DE GÊNERO
1.1 BREVE HISTÓRICO DA SEXUALIDADE
A sexualidade se revelou um importante mecanismo utilizado pelas mais diversas sociedades para traçar diferenças entre o comportamento dos seus membros. Com base nela, criaram-se padrões de moralidade, atribuindo-lhe uma complexa simbologia.
Dissertando sobre o assunto, Araujo (2000, p. 36) salienta que:
[...] falar da sexualidade humana é falar das origens da humanidade. Em todas as culturas, incluindo as mais primitivas, a sexualidade sempre esteve presente, permeando todos os setores da vida do indivíduo e do grupo no qual está inserido. O sentido da sexualidade sempre variou conforme a época, a cultura e os costumes morais vigentes.
Os aspectos mais ostensivos e comuns sobre a sexualidade entre os diferentes povos, culturas e épocas se relacionam por ela ter sido associada à reprodução e à continuidade da espécie. Aliado a isso, é incontroverso que esta nunca representou um mero ato físico, mas, sim, assumiu diversas formas, sempre tendo como base a organização da sociedade e a formação de valores morais e éticos.
Feitas essas considerações iniciais, é essencial entender que a sexualidade passou por transformações no decorrer da história e [...] esse transformar-se do pensar humano provocou uma dissociação entre as ideias de prazer e reprodução
(ARAUJO, 2000, p. 37).
Acerca desse assunto, Foucault (2018) foi capaz de traçar uma história da sexualidade, porquanto a compreendeu como um mecanismo social, ou seja, assimilou-a como constituída a partir de múltiplos discursos sobre o sexo, os quais regulamentam, normalizam, instauram saberes e produzem verdades
.
Inicialmente, vale destacar que, em sua obra História da Sexualidade
, Foucault (2018, p. 125) apontou duas grandes rupturas no contexto histórico desta: a primeira ocorreu no século XVII, no qual houve o nascimento das grandes proibições, imperativos de decência e esquiva obrigatória do corpo; e a segunda, no século XX, em que, apesar de ter sido um pouco menos intensa, representou o momento no qual os mecanismos de repressão teriam começado a afrouxar.
Para que se possam entender as aludidas rupturas, faz-se mister proceder a um breve retrospecto histórico desde a Idade Média até os dias atuais.
Durante a Idade Média, verificou-se que a Igreja conquistou poder e exerceu grande interferência na esfera política. Nesse período, a referida Instituição assumiu o papel de moralizadora e centralizadora das funções tipicamente inerentes dos Estados, diante de uma sociedade enfraquecida. Com isso, interferia na vida social e política da época, o que acarretou, como reflexo, modificações profundas na sexualidade humana.
Com a fusão das culturas judaica e greco-romana, o Cristianismo passou a ter uma ideologia universalista e moralista, de modo que, em seu processo de ocidentalização, incorporou o dualismo corpo e alma, admitindo apenas o prazer espiritual (ARAUJO, 2000, p. 40).
Nessa época, ao mesmo tempo que sacralizava a união heterossexual, a Igreja apoiava apenas a prática sexual voltada aos fins reprodutivos. Aliado a isso, com o avanço do Cristianismo, surgiram os ideais de virgindade e pureza, a condenação do adultério, a proibição do divórcio e, paulatinamente, o enquadramento da população nesses preceitos morais.
Passou-se a pregar que a máxima crescei e multiplicai-vos
deveria ser observada. Esse pensamento advinha do judaísmo, que considerava a procriação como única razão para o sexo (ARAUJO, 2000, p. 40).
Gradativamente, com o passar do tempo, os discursos sobre moral, ética e sexualidade foram se tornando mais dispersos e reproduzidos nas mais diversas áreas do saber. Para Foucault (2018, p. 37):
A Idade Média tinha organizado, sobre o tema da carne e da prática da confissão, um discurso estreitamente unitário. No decorrer dos séculos recentes, essa relativa unidade foi decomposta, dispersada, reduzida a uma explosão de discursividades distintas, que tomaram forma na demografia, na biologia, na medicina, na psiquiatria, na moral, na crítica política.
A religiosidade característica da Idade Média foi gradativamente abandonada e, aos poucos, cedeu lugar à Idade Moderna, a qual se caracterizou como um período de significativas mudanças no pensamento humano. Se aquela teve como característica primordial a razão de Deus, esta elegeu a razão do homem como elemento basilar da sociedade, de modo que o estudo da sexualidade, enquanto ciência, surgiu exatamente nessa época
(ARAUJO, 2000, p. 41).
Nesse período, então, manteve-se o ideal de que o prazer era algo relativo à perversão moral, porém, a partir daí, não mais relacionado exclusivamente a uma moral religiosa, englobando também outras instituições, como a família.
A partir do século XVII, constata-se a valorização exclusiva da sexualidade adulta e matrimonial, imperativos de decência, esquiva obrigatória do corpo, contenção e pudores imperativos da linguagem
(FOUCAULT, 2018, p. 125).
A família, enquanto instituição, torna-se fundamental para a manutenção dos bons costumes vigentes naquela sociedade. O casal une-se para reproduzir filhos, os quais terão como incumbência a manutenção e o aumento dos bens adquiridos (ARAUJO, 2000, p. 42).
A ideologia burguesa vigente à época trazia a família como cerne básico da sociedade em geral, independentemente do tempo ou de classe social. Há de se notar, no entanto, que esse modelo visava, unicamente, à reprodução e à manutenção de um sistema voltado ao sistema capitalista, que garantia, por intermédio das massas, um mercado com mão de obra farta e barata:
O que a ideologia burguesa, ao generalizar as famílias deixa de mostrar é que, no modelo atual, a família proletária tem por função exclusiva reproduzir a força-de-trabalho, ou seja, a ela é destinado o papel de procriar filhos. E daí surgem outras respostas: o aborto, por exemplo, é considerado proibido menos por razões religiosas e morais e, muito mais, por preocupação com a manutenção de um mercado de mão-de-obra farta e barata (CELESTINO, 2017, n.p).
Até a metade do século XVIII, havia uma higienização da sexualidade, já que era um dos meios pelos quais a burguesia se diferenciava das demais classes. Entretanto, no final daquele século, houve mudanças significativas nessa estrutura, de modo que o discurso da sexualidade passou a atingir também as camadas populares da sociedade, mormente em virtude dos problemas de natalidade.
Com o surgimento da população como problema econômico e político, o estudo da sexualidade foi incluído no centro das discussões, porquanto se fazia necessário analisar a taxa de natalidade, a idade do casamento, a precocidade e a frequência das relações sexuais, o efeito do celibato, bem como a incidência das práticas contraceptivas (FOUCAULT, 2018, pp. 28-29).
Na sociedade burguesa, foi a primeira vez, ao menos de maneira constante, que se preocupou com a maneira como cada pessoa utilizava seu sexo, o que se revelou importante à estrutura e à economia daquela população.
Vale ressaltar, ainda, que no século XVIII, o sexo se torna questão de ‘polícia’, mas não no sentido pleno e forte que se atribuía então a essa palavra – não como repressão da desordem e sim da majoração ordenada das forças coletivas e individuais
(FOUCAULT, 2018, p. 28).
Ou seja, ao mencionar o sexo como questão de polícia
, o autor visou destacar a necessidade da sociedade da época em regulá-lo por meio de discursos úteis e públicos, e não pelo rigor de uma proibição.
O estudo da sexualidade no século XVIII, portanto, serviu aos interesses da burguesia, tanto em relação ao controle da economia e mercado de trabalho, quanto à administração da taxa de natalidade.
Com o avanço da sociedade industrial, no século XIX, houve a dispersão das sexualidades e um reforço de suas formas consideradas absurdas, ou seja, houve uma implantação múltipla de perversões
, em seu sentido de degeneração moral e orgânica. Eram assim classificadas sempre que a prática sexual fugisse do direito canônico, da pastoral cristã e da lei civil. Dentre essas sexualidades periféricas, incluía-se a figura do homossexual, sobre o qual Foucault (2018, p. 48) destacou:
O homossexual do século XIX torna-se uma personagem: um passado, uma história, uma infância, um caráter, uma forma de vida; também é morfologia, com uma anatomia indiscreta e, talvez, uma fisiologia misteriosa. Nada daquilo que ele é, no fim das contas, escapa à sexualidade. Ela está presente nele todo: subjacente a todas as suas condutas, já que ela é o princípio insidioso e infinitamente ativo das mesmas; inscrita sem pudor na sua face e no seu corpo, uma vez que é um segredo que se trai sempre.
Fundamental destacar que o controle das perversões
sexuais, incluída a homossexualidade, era exercido por diversas instituições, dentre as quais se destacavam a escola, a medicina, o judiciário e a família.
Para Foucault (2018, p. 52):
As instituições escolares ou psiquiátricas com sua numerosa população, sua hierarquia, suas organizações espaciais e seu sistema de fiscalização constituem, ao lado da família, uma outra maneira de distribuir o jogo dos poderes e prazeres [...].
Desde o seu princípio, a instituição escolar empreendeu distinções. Ela se incumbiu de desagregar os sujeitos, dividindo, internamente, os que lá estavam, por meio de diversos aparatos de ordenamento, classificação e hierarquização. Dentre eles, é preciso salientar o controle que a escola exerceu acerca da sexualidade.
É indispensável reconhecer que a escola não apenas reproduziu ou refletiu tais concepções que circulavam na sociedade, mas também que ela as produziu (LOURO, 2014, p. 84).
Vale destacar que a medicina também exerceu papel fundamental no controle da sexualidade, porquanto em nome de uma urgência biológica e histórica, justificavam-se os racismos oficiais, então iminentes. E os fundamentavam como ‘verdade’
(FOUCAULT, 2018, p. 60).
Ao produzirem verdades
e controlarem as patologias
sexuais, as referidas instituições estavam, na realidade, exercendo técnicas de poder, o qual não é uma instituição nem uma estrutura, não é uma certa potência de que alguns sejam dotados: é o nome dado a uma situação estratégica complexa numa sociedade determinada
(FOUCAULT, 2018, p. 101).
Ainda sobre o assunto:
Parece-me que se deve compreender o poder, primeiro, como a multiplicidade de correlações de forças imanentes ao domínio onde se exercem e constitutivas de sua organização; o jogo que, através de lutas e afrontamentos incessantes, as transforma, reforça, inverte; os apoios que tais correlações e forças encontram umas nas outras, formando cadeias ou sistemas, ou ao contrário, as defasagens e contradições que as isolam entre si; enfim, as estratégias em que se originam e cujo esboço geral ou cristalização institucional toma corpo nos aparelhos estatais, na formulação da lei, nas hegemonias sociais (FOUCAULT, 2018, pp. 100-101).
Dentre as referidas estratégias de poder sobre a sexualidade humana nos séculos mais recentes, Foucault (2018, pp. 113-114) elencou, de diversas possibilidades, quatro como sendo as principais:
Histerização do corpo da mulher: a sociedade exerce a desqualificação do corpo da mulher como integralmente saturado de sexualidade. Passa-se a regular sobre a fecundidade, o espaço familiar e a relação com a vida das crianças. A imagem da mulher nervosa
constituiu a forma mais visível dessa histerização.
Pedagogização do sexo da criança: dupla afirmação de que quase todas as crianças são suscetíveis a se dedicarem a uma atividade sexual, a qual ao mesmo tempo que é natural, é também indevida e traz consigo perigos físicos e morais, coletivos e individuais.
Socialização das condutas de procriação: socialização econômica por intermédio de incitações à fecundidade dos casais.
Psiquiatrização do prazer perverso: atribuiu-se um papel de normalização e patologização de toda a conduta relativa à sexualidade, bem como se procurou uma tecnologia corretiva para tais anomalias.
Além das principais estratégias de poder já utilizadas, Foucault (2018, pp. 91-92) também se dedicou ao estudo dos traços determinantes nas relações entre o poder e o sexo, dentre os quais se destacam cinco:
A relação negativa: no tocante ao sexo, o poder estabelece relações de rejeição, exclusão, recusa e até de ocultação. Seus efeitos tomam a forma geral do limite e da lacuna.
A instância da regra: o poder seria, essencialmente, aquilo o que a lei diz sobre o sexo. Definiria o que é sexo permitido e proibido, bem como lhe prescreveria uma ordem.
O ciclo da interdição: o poder oprimiria o sexo por meio de uma interdição que joga com a alternativa entre duas inexistências.
A lógica da censura: essa regra tomaria três formas – afirmar que não é permitido, impedir que se diga e negar que exista. Assim, a lógica do poder sobre o sexo seria aquela paradoxal de uma lei que poderia ser enunciada como injunção de inexistência, de não manifestação e de mutismo.
A unidade do dispositivo: o poder sobre o sexo exercer-se-ia do mesmo modo em todos os níveis e funcionaria de acordo com as engrenagens simples e infinitamente reproduzidas da lei, da interdição e da censura.
Se por um lado a sociedade se encarregava de exercer o controle da sexualidade por meio de suas estratégias, de modo a monitorar, curar
e marginalizar o que se entendia por perversão, houve também reação daqueles que não se enquadravam naqueles critérios até então desejados:
Ora, o aparecimento, no século XIX, na psiquiatria, na jurisprudência e na própria literatura, de toda uma série de discursos sobre as espécies e subespécies de homossexualidade, inversão, pederastia e hermafroditismo psíquico
permitiu, certamente, um avanço bem marcado dos controles sociais nessa região de perversidade
; mas também possibilitou a constituição de um discurso de reação
: a homossexualidade pôs-se a falar por si mesma, a reivindicar sua legitimidade ou sua naturalidade
, e muitas vezes dentro do vocabulário e com as categorias pelas quais era desqualificada do ponto de vista médico (FOUCAULT, 2018, p. 111).
Na concepção do filósofo, o exercício do poder sempre se dá entre sujeitos que são capazes de resistir, pois, caso contrário, haveria uma relação de violência. Assim, a resistência, ou melhor, a multiplicidade de pontos de resistência seria inerente ao poder.
O avanço e a estruturação dos pontos de resistência dão início ao afrouxamento, no século XX, dos métodos de repressão e proibição. Aliado a isso, diversos autores atribuem a Freud o grande mérito de revolucionar o conceito de sexualidade num contexto altamente moralista e de abrir caminho para novos estudos sobre a questão da orientação da libido, na busca do prazer, na realização