O Ensino Da Gramática - John de Salisbury (Tradução de Rafael Falcón)
O Ensino Da Gramática - John de Salisbury (Tradução de Rafael Falcón)
O Ensino Da Gramática - John de Salisbury (Tradução de Rafael Falcón)
Salisbury
POR RAFAEL FALCN /FILOSOFIA, REVISTA / MAR 2014
Traduo
dos
captulos
23
24
do
possui
como
sua
matria-prima
os
textos
escritos.
leitura,
ensinamento
meditao
do
luz
at aos
menores
detalhes: requeira
que
se
caractersticas dos ps, que devem ser observadas nos poemas 10.
Destaque as expresses brbaras, as imprprias e outras que tenham
sido compostas contra a lei do discurso. Mas no o faa como se
reprovasse os poetas, aos quais muito se deve perdoar pela
obrigao do metro de modo que os defeitos, num poema, devem
ser estimados com o nome de virtudes. De fato, a mesquinhez das
obrigaes muitas vezes rouba o louvor da virtude, pois no se lhes
pode negar o assentimento sem alguma perda11.
Que
mostre
os
metaplasmos,
esquematismos
tropos
tcnicas
discursivas,
por
meio
de
frequentes
muitos
conhecimentos,
tanto
mais
plenamente
conseguir
ltimo
elemento
desta
declinao,
quer
dizer,
1.
3.
5.
6.
Vede que amor nos dedicou o Pai, que sejamos chamados filhos de
Deus, e que realmente o sejamos (Joo 1, 3, 1).
8.
Deus opera em ns o querer e o realizar segundo o seu
prazer(Filipenses, 2, 13). Contra os santarres ignorantes, que poderiam
negar ao conhecimento seu primado sobre a virtude, remetendo-a Graa,
John lembra que no apenas a virtude, mas o prprio conhecimento e at o
desejo de conhecer so intimamente dependentes do Esprito Santo. Em
seguida, porm, ele nos lembrar que os dons do Esprito no podem ser
desprezados; e esta precisamente a omisso dos nscios que, sob
pretexto de moralizar suas aes, recusam-se a aplicar-lhes a inteligncia
dom do Esprito.
9.
quele que no tem, mesmo o que tem lhe ser tirado (Mateus, 25,
29). Agora John no fala mais ao moralista ignorante, mas ao intelectual
especulativo; suas descobertas devem resultar em boas aes. Lembre-se
ele de que sua inteligncia lhe foi dada pela Graa, e pode ser-lhe tirada;
no abandone as boas obras, substituindo-as pelos estudos tericos, porque
ambos os pesos devem estar em equilbrio para agradar a Deus.
10.
Partes do discurso (partes orationis) so as classes das palavras,
como substantivo, adjetivo, etc. Antes de apont-las, o aluno deve soltar o
verso (versum solvere), isto , reorden-lo como se prosa fosse. Tambm
deve observar os ps, isto , as unidades mtricas do poema, que em latim
eram constitudas da alternncia entre slabas breves e slabas longas.
11.
12.
O termo grego no tem nada que ver com a traduo latina. John no
sabia grego, e est citando erroneamente algum termo de manual retrico.
15.
18.
20.
Isto , o Pai-Nosso.
21.
Os incios solenes, e que prometem grandes coisas, muitas vezes,
para que mais brilhem, so remendados com pano prpura (Horcio, Ars
Poetica, 14-16). Refere-se Horcio a poemas que comeam com trechos
grandiloquentes, que porm foram enxertados, isto , inseridos de modo
artificial, sem combinar com o conjunto. John de Salisbury trabalha sobre a
imagem, sugerindo que os alunos plagiavam autores clssicos (pano
alheio), e que o plgio era mais visvel por causa da inadequao com o
restante do texto. Considerando o restante do pargrafo, provavelmente
est implcito, aqui, que um plgio bem inserido no novo contexto no era
Mais uma vez, John ressalta a ateno que tinha Bernardo de Chartres
para com a memria, exigindo que todos os dias os alunos lhe mostrassem
algo que haviam memorizado. bom lembrar que no se tratava da
memorizao de informaes abstratas, mas depassagens literrias, de
poesia ou prosa.
26.
Isto , desejo de gabar-se por conhecer muitas coisas (mesmo que
insignificantes). Alguns de ns diriam pedantismo. Quanto inquietude,
ela bem conhecida de certos estudantes to bem-intencionados quanto
desorientados que, para no se sentirem estpidos, perseguem
conhecimentos fceis e inteis.
27.
28.
No pode um mesmo homem gostar de ouro e das Escrituras,
apreciar vinho e entender os Profetas e Apstolos (S. Jernimo, Epistulae,
III, 61, 3).
29.
Uma aluso ao vir bonus dicendi peritus, definio do orador,
originalmente enunciada por Cato: um homem nobre e habilidoso no
discurso. A frase ficou famosa por meio de Quintiliano, que se valeu dela
para condensar sua filosofia pedaggica segundo a qual s poderia ser
considerado um homem educado aquele que fosse, ao mesmo tempo,
formado no discurso e na moralidade (dicere et agere). Esse componente
duplo da pedagogia de Quintiliano adaptado por John de Salisbury com a
expresso vita et conversatio. Se e como possvel unir, no mesmo
processo pedaggico, o domnio tcnico da arte retrica ao
desenvolvimento da moralidade, uma questo que vem sendo discutida
h algum tempo, e que exigiria um artigo parte.
30.
Trata-se de uma metfora: prometem transfundir a filosofia como se
faz uma transfuso de sangue. A ideia absurda porque a filosofia no pode
ser transfundida de uma pessoa para a outra: tem de ser mediada pela
linguagem. Ora, se o discpulo no devidamente treinado nas artes
do trivium, ele no tem o nvel de conscincia e de domnio tcnico da
linguagem necessrio para proceder alta filosofia.
31.
No fica claro se Guilherme e Ricardo desistiram de ensinar, pela falta
de alunos, ou se cederam ao mesmo mtodo degenerado, e passaram a
ensinar as doutrinas filosficas sem passar pelas artes preparatrias
do trivium.
32.
litterator, Aquele que faz ser letrado, o letrador.
33.
Catulo, Liber, 14, 9.