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Resolução Cirúrgica de Cólicas em Equinos

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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA

Faculdade de Medicina Veterinária

RESOLUÇÃO CIRÚRGICA DE CÓLICAS EM EQUINOS –


CRITÉRIOS, DESENVOLVIMENTO E PÓS-OPERATÓRIO

SARA CRISTINA FARRAJOTA MORA

CONSTITUIÇÃO DO JÚRI ORIENTADOR:


Doutor José Paulo Pacheco Sales Luís Doutor Eduardo Malschitzky
Doutora Graça Maria Leitão Ferreira Dias
Doutor Fernando António da Costa Ferreira CO-ORIENTADOR:
Doutor Eduardo Malschitzky Doutora Graça Maria Leitão Ferreira Dias

2009
LISBOA
UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA
Faculdade de Medicina Veterinária

RESOLUÇÃO CIRÚRGICA DE CÓLICAS EM EQUINOS –


CRITÉRIOS, DESENVOLVIMENTO E PÓS-OPERATÓRIO

SARA CRISTINA FARRAJOTA MORA

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM CLÍNICA E CIRURGIA DE EQUINOS

CONSTITUIÇÃO DO JÚRI ORIENTADOR:


Doutor José Paulo Pacheco Sales Luís Doutor Eduardo Malschitzky
Doutora Graça Maria Leitão Ferreira Dias
Doutor Fernando António da Costa Ferreira CO-ORIENTADOR:
Doutor Eduardo Malschitzky Doutora Graça Maria Leitão Ferreira Dias

2009
LISBOA
Aos meus pais, por todo o amor e apoio
Sem eles, o sonho de completar este curso não teria sido possível!

Obrigada
AGRADECIMENTOS

Ao Dr. Eduardo Malschitzky por me ter aceite como estagiária. Agradeço ainda ao Dr.
Jarbas Castro Júnior, à Dra. Valesca Peter dos Santos (Médicos Veterinários da Clínica
Hípica) e ao Américo Jesus Souza (auxiliar na mesma clínica), por todos os conhecimentos
transmitidos.

À Prof. Dra. Graça Maria Leitão Ferreira Dias, minha co-orientadora, pelo auxílio na procura
do local de estágio e pela prontidão com que aceitou ser minha co-orientadora.

A toda a minha família por toda a força e incentivo. A admiração que sinto que têm por mim,
deu-me forças para tentar nunca os desiludir.

Aos meus pais, por todas as oportunidades que me têm permitido ter ao longo da vida,
incluindo a oportunidade de tirar o curso dos meus sonhos e de fazer o meu estágio no
Brasil.

Ao meu namorado, Pedro, por todo o amor e compreensão. O apoio que senti da sua parte
foi muito importante para mim nos últimos dois anos de curso.

Às minhas colegas de turma, não só pelas infindáveis horas a fazer trabalhos, mas
principalmente pelas jantaradas, lanches e festas que sempre ajudavam a animar quando as
dificuldades apertavam.

Aos meus colegas de residência, pelo convívio e por me mostrarem o verdadeiro espírito
académico.

Por fim, a todos aqueles que directa ou indirectamente contribuíram para a execução deste
trabalho.

A todos, o meu obrigado

i
RESUMO
Resolução Cirúrgica de Cólicas em Equinos – Critérios,
Desenvolvimento e Pós-operatório
A cólica em equinos é um dos principais receios de quem lida com esta espécie. Apesar dos
avanços científicos e do aumento da taxa de sobrevivência em animais sujeitos a cólica
complicada ou mesmo a resolução cirúrgica da mesma, as cólicas são um problema que
continua actualmente a liderar as causas de morte em cavalos.
O trabalho que se apresenta tem como principais objectivos explicar de forma simples e
clara os principais critérios a ter em conta para o encaminhamento de um animal para
cirurgia. Descreve as técnicas cirúrgicas mais frequentemente utilizadas para resolução de
cólicas em equinos, bem como as principais particularidades anestésicas. São descritos
alguns protocolos medicamentosos pós-cirúrgicos e alguns cuidados a ter com os pacientes,
e as principais complicações pós-cirúrgicas e algumas das suas consequências.
Os critérios utilizados incluem a avaliação do exame geral do paciente, constituído pela
observação do mesmo e pelo exame físico. Para além do exame geral podem ser
necessários exames laboratoriais para análise do líquido peritoneal e de parâmetros
sanguíneos ou mesmo exames ecográfico, radiológico, endoscópico ou laparoscópico.
A aproximação cirúrgica a um cavalo com cólica é geralmente realizada através de
laparotomia pela linha média ventral e de acordo com o tipo de cólica presente, assim os
procedimentos cirúrgicos realizados em seguida.
Vários cuidados na preparação pré-cirúrgica do paciente e nos procedimentos cirúrgicos em
si, estão relacionados com possíveis complicações (aderências, laminite, ileo pós-cirurgico
ou problemas incisionais) e com a taxa de sobrevivência dos animais pós-cirurgicamente.
A medicação pós-operatória e a alimentação do animal são pontos fulcrais na recuperação
cirúrgica do paciente e vários protocolos estão descritos.
O presente estudo foi complementado com a descrição dos procedimentos utilizados na
Clínica Hípica (Porto Alegre, Brasil) perante pacientes com cólica cirúrgica e ainda com o
relato de 6 casos clínicos observados durante o estágio curricular realizado na mesma.
Em 37 laparotomias realizadas na Clínica Hípica de nove de Maio de 2008 a sete de Maio
de 2009, 73% foram realizadas com sucesso e todos os pacientes sobreviveram no curto
período pós-operatório avaliado. Não foi frequente a ocorrência de complicações pós-
cirurgicas, reflectindo uma boa técnica cirúrgica e anestésica, assim como um protocolo
medicamentoso, adequado.

Palavras-chave: cólica equina, laparotomia, enterotomia, enterectomia, anastomose, pós-


operatório.

ii
ABSTRACT
Surgical Resolution of Colic in Horses – Criteria, Development
and Post-surgical
Colic in horses is one of the main fears of those who deal with this species. Despite the
scientific advances and increased survival rate in animals subjected to complicated colic or
even to surgery resolution of colic, this is a problem that up to date is the leading cause of
death in horses.
The present work, intends to explain the main criteria used to refer a colickly horse for
surgery. It describes the most commonly used surgical techniques for resolution of colic in
horses as well as the main anesthetic procedures. This study presents some post-surgical
medication protocols and some cares needed with the patients. It also introduces the major
post-surgery complications and some of its consequences.
The used criteria include the evaluation of the general examination of the patient, consisting
in observation and in physical examination. In addition, laboratory tests as peritoneal fluid
and blood parameters analysis or ultrasound, radiological, endoscopic or laparoscopic
examination, may be needed.
The surgical approach to a horse with colic is usually performed through laparotomy in the
ventral midline and in accordance with the present type of colic, the other surgical
procedures needed, are then selected.
Several preliminary care in the preparation of surgical patients and the surgical procedures
themselves are related to possible complications (adhesions, laminitis, post-surgical ileum or
incisional problems) and to the survival rate of animals in the post-surgery.
The post-operative medication and feeding are key points in the recovery of surgical patients
and several protocols are described.
The present study was complemented with the description of the procedures used in Clínica
Hípica (Porto Alegre, Brazil) to patients with colic surgery and with the presentation of 6
cases observed during the internship performed in the same clinic.
In 37 laparotomies performed in the Clínica Hípica between nine of May of 2008 and seven
of May of 2008, 73% were successful and all those pacients have survived in the short
postoperative time. The occurrence of post-surgical complications was not very frequent,
reflecting a good surgical and anesthesic technique, and an appropriate medical protocol.

Key words: equine colic, laparotomy, enterotomy, enterectomy, anastomosis, post-surgical.

iii
ÍNDICE GERAL
Resumo ................................................................................................................................. ii
Abstract .................................................................................................................................iii
Prefácio ............................................................................................................................... viii
Capítulo I – Introdução........................................................................................................... 1
Capítulo II – Revisão bibliográfica.......................................................................................... 4
1 – Critérios para indicação cirúrgica ................................................................................. 4
1.1 – Observação do paciente ........................................................................................ 5
1.1.1 – Dor .................................................................................................................. 5
1.1.2 – Distensão abdominal ....................................................................................... 7
1.1.3 – Comportamento e Atitude................................................................................ 8
1.2 – Exame físico .......................................................................................................... 9
1.2.1 – Indicadores de hidratação e perfusão tissular................................................ 10
1.2.2 – Motilidade Intestinal....................................................................................... 12
1.2.3 – Temperatura corporal .................................................................................... 13
1.2.4 – Avaliação fecal .............................................................................................. 14
1.2.5 –Entubação nasogástrica ................................................................................. 15
1.2.6 – Palpação rectal.............................................................................................. 17
1.3 – Exames laboratoriais ........................................................................................... 18
1.3.1 – Abdominocentese e análise do líquido peritoneal.......................................... 18
1.3.2 – Hemograma................................................................................................... 21
1.3.3 – Proteína plasmática total (PT) ....................................................................... 21
1.3.4 – Equilíbrio hidroelectrolítico e ácido-base (gases sanguíneos) ....................... 22
1.3.5 – Outros parâmetros sanguíneos ..................................................................... 25
1.4 – Outros exames complementares ......................................................................... 26
1.4.1 – Exame ecográfico.......................................................................................... 26
1.4.2 – Exame radiológico ......................................................................................... 27
1.4.3 – Endoscopia ................................................................................................... 28
1.4.4 – Laparoscopia................................................................................................. 28
2 – Cirurgia ...................................................................................................................... 30
2.1 – Anestesia............................................................................................................. 32
2.2 – Cirurgia Propriamente Dita................................................................................... 35
2.2.1 – Laparotomia .................................................................................................. 36
2.2.2 – Enterotomia................................................................................................... 37
2.2.3 – Enterectomia e anastomose .......................................................................... 39
2.2.4 – Conclusão da cirurgia e recuperação anestésica .......................................... 40
3 – Pós-Operatório ........................................................................................................... 44
3.1 – Medicação e convalescença ................................................................................ 44
3.2 – Complicações pós cirúrgicas................................................................................ 45
3.2.1 – Complicações incisionais............................................................................... 45
3.2.2 – Ileo pós-cirúrgico ........................................................................................... 47
3.2.3 – Aderências e peritonite.................................................................................. 47
3.2.4 – Outras complicações pós-cirúrgicas .............................................................. 48
Capítulo III – Casos Clínicos................................................................................................ 51
1 – Critérios, resolução cirúrgica e pós-operatório na Clínica Hípica ................................ 51
1.1 – Critérios utilizados na Clínica Hípica .................................................................... 51
1.2 – Desenvolvimento cirúrgico na Clínica Hípica ....................................................... 52
1.3 – Pós-operatório na Clínica Hípica.......................................................................... 54
2 – Caso clínico nº1 ......................................................................................................... 56
3 – Caso clínico nº 2 ........................................................................................................ 60
4 – Caso clínico nº 3 ........................................................................................................ 61
5 – Caso clínico nº 4 ........................................................................................................ 63
6 – Caso clínico nº 5 ........................................................................................................ 64
7 – Caso clínico nº 6 ........................................................................................................ 66
Capítulo IV – Discussão e Conclusões ................................................................................ 67
Bibliografia........................................................................................................................... 69
iv
ÍNDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1: Casuística das intervenções clínicas observadas. ............................................... viii
Gráfico 2: Distribuição das cirurgias observadas. ................................................................. ix

ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1: Desidratação estimada......................................................................................... 12
Tabela 2: Estruturas normalmente palpáveis durante o exame rectal .................................. 17
Tabela 3: Valores normais de leucócitos presentes no líquido peritoneal ............................ 20
Tabela 4: Relação entre a concentração de fosfato e a necessidade cirúrgica .................... 20
Tabela 5: Exemplo de protocolo para indução anestésica em equinos ................................ 33
Tabela 6: Vantagens e desvantagens dos principais fios de sutura utilizados na laparorrafia
mediana............................................................................................................................... 42
Tabela 7: Laparotomias realizadas na Clínica Hípica........................................................... 67
Tabela 8: Complicações pós-cirurgicas ocorridas nos animais sujeitos a laparotomia. ........ 68

v
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
AINE Anti-inflamatório não esteróide
AST Aspartato aminotransferase
AV Átrio-ventricular
BE Excesso de base (base excess)
BID Bis in die (duas administrações diárias)
bpm Batimentos por minuto
CID Coagulação intravascular disseminada
CO2 Fórmula química de dióxido de carbono
CV Cardiovascular
DMSO Dimetilsulfóxido
EDTA Ácido etilenodiamino tetra-acético (ethylenediaminetetraacetic acid)
EV Endovenoso
FC Frequência cardíaca
FR Frequência respiratória
G Gauge
GGT Gama glutamil transferase
GI Gastro intestinal
h Horas
H2CO3 Fórmula química de ácido carbónico
HCO3 Fórmula química de bicarbonato
HT Hematócrito
ID Intestino delgado
IM Intra-muscular
IG Intestino grosso
kV Quilovolt
mA Miliampere
mEq/L Miliequivalente por litro
MHz Megahertz
min Minuto
mL/kg p.v./dia Mililitro por quilo de peso vivo por dia
mL/kg p.v./h Mililitro por quilo de peso vivo por hora
mmHg Milímetro de mercúrio
mmol Milimole
PaCO2 Pressão parcial de dióxido de carbono
PaO2 Pressão parcial de oxigénio
pH Símbolo de potencial de hidrogénio

vi
PO Per os (via oral)
PT Proteínas totais
QID Quater in die (quatro administrações diárias)
seg Segundo
SID Single in die (uma administração diária)
SN Sistema nervoso
SNC Sistema nervoso central
TRC Tempo de replecção capilar
UI Unidades Internacionais
Z.H.R. Zakharin-head-roge
α Alfa
β Beta
® Marca Registada

vii
PREFÁCIO
A presente dissertação foi realizada como corolário do estágio curricular de natureza
profissional, efectuado no âmbito do Mestrado Integrado em Medicina Veterinária. O estágio,
na área de Clínica e Cirurgia de Equinos, começou no dia 8 de Setembro de 2008 e
terminou no dia 15 de Dezembro de 2008, tendo sido realizado na Clínica Hípica, Porto
Alegre (Estado do Rio Grande do Sul, no Brasil). A orientação científica foi levada a cabo
pelo Dr. Eduardo Malschitzky, incluindo também o acompanhamento do Dr. Jarbas Castro
Júnior e da Dra. Valesca Santos.
A Clínica Hípica é uma clínica de referência no sul do Brasil, para onde são encaminhados
cavalos para realizar cirurgias, exames radiográficos e urgências. Está inserida na
Sociedade Hípica Porto Alegrense, um Centro Hípico com cerca de 150 equinos
permanentes, mas que chega a albergar mais de 500 animais durante alguns eventos,
nomeadamente o Campeonato Brasileiro de Saltos.
A minha rotina de trabalho começava com a abertura da clínica e organização do plano de
tratamentos diário, que era seguidamente confirmado por um dos Médicos Veterinários. Os
tratamentos, que incluíam medicações, mudança de pensos e assepsia de feridas, eram na
sua maioria realizados por mim. Durante as consultas, auxiliava o Médico Veterinário na
realização de alguns exames, na contenção do animal, na sua medicação ou na preparação
do cavalo e/ou material para as intervenções que fossem necessárias. No Gráfico 1 está
representada a casuística das intervenções clínicas observadas, tendo em conta o aparelho
ou sistema afectado.

Gráfico 1: Casuística das intervenções clínicas observadas.

A B

A: Distribuição das intervenções ao nível do aparelho músculo-esquelético e das intervenções em


outros aparelhos; B: Distribuição por aparelhos das intervenções clínicas presenciadas, exceptuando
as do aparelho músculo-esquelético.

viii
A alta incidência de afecções no aparelho músculo-esquelético é facilmente explicada pelo
facto de os animais observados na clínica, serem maioritariamente animais de desporto e
competição, não representando a distribuição de afecções na população geral.
Durante o período de estágio, foram observadas 28 cirurgias, nas quais actuei como
circulante e cuja distribuição está representada no Gráfico 2.

Gráfico 2: Distribuição das cirurgias observadas.


Artroscopia Laparotomia
Neurectomia Orquiectomia
Remoção de massa Outras cirurgias ortopédicas
Encerramento de hérnia umbilical Cesariana

As artroscopias, apesar de se tratarem de cirurgias ortopédicas, foram diferenciadas devido


à sua frequência. As 6 laparotomias executadas deveram-se na sua totalidade a episódios
de urgência, em animais com quadro agudo de cólica.
O Dr. Jarbas Castro Jr., um dos Médicos Veterinários que acompanhou o meu trabalho
durante estágio, é especialista em cólicas, transmitindo-me conhecimentos e o gosto por
estudar acerca desta doença, que é uma das principais causas de morte de cavalos em todo
o mundo.
Pensa-se que existem mais de 100 causas diferentes de cólicas, tratando-se de um tema
muito abrangente. Dentro das cólicas, apenas cerca de 1% a 2% são sérias o suficiente
para requerer resolução cirúrgica (Freeman, 2005). Nestes casos, se não houver uma
intervenção rápida e adequada, os pacientes acabam por sucumbir. Para diminuir a taxa de
mortalidade desta afecção, é portanto importante saber reconhecer precocemente os sinais
que indicam o seu agravamento, uma vez que nos estágios iniciais pode ser muito difícil
distinguir uma cólica simples de uma cólica potencialmente fatal.
Pela sua importância e actualidade, resolvi escolher este tema para a minha dissertação de
mestrado: “Resolução Cirúrgica de Cólicas em Equinos”, focando os critérios que indicam
necessidade cirúrgica, a técnica cirúrgica em si e o pós-cirúrgico com as suas possíveis
complicações e sequelas.

ix
CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO
Apesar de, por definição, cólica significar simplesmente dor abdominal, segundo o grupo de
pesquisa sobre cólicas da Universidade de Liverpool, para os médicos veterinários de
equinos, cólica é o termo utilizado para descrever os sinais comportamentais associados a
essa mesma dor. É por muitos considerada uma síndrome, ou seja, um “conjunto de
sintomas e sinais que coexistem em determinada doença e que a definem clinicamente”
(Costa, 2005), sendo ainda uma importante causa de doença e morte em cavalos (Cohen,
Gibbs & Woods, 1999).
As cólicas podem ser classificadas de diversas maneiras e essa classificação é muitas
vezes imprescindível para um bom diagnóstico e tratamento. A primeira classificação
geralmente utilizada é a mais simples e segundo ela, Cólicas Verdadeiras são as originadas
por situações patológicas do tracto gastrointestinal (GI) enquanto as Falsas Cólicas iniciam-
se por processos patológicos situados em órgãos que não especificamente os digestivos,
nomeadamente nefrites, metrites, tumores abdominais, urolitíase, torções e contracções
musculares uterinas, toxicose hepática, patologia renal primária, entre outros (Thomassian,
1996).
Outra classificação utilizada com alguma frequência baseia-se no segmento intestinal onde
a patologia teve início: intestino delgado (ID), cólon maior, cólon menor, cólon transverso ou
ceco. É frequente todo o tracto GI se encontrar afectado. No entanto, identificar onde se
iniciou o problema é geralmente possível, pelo menos através de uma laparotomia e pode
ser indispensável para a resolução cirúrgica de um episódio de dor abdominal aguda. Esta
síndrome pode ainda ser classificada com base na causa: dieta, predisposição anatómica,
alterações na motilidade, infecções, parasitismo, ulceração ou deslocamentos. Muitas outras
classificações podem ser encontradas na literatura, sendo umas mais específicas, outras
mais generalizadas, mas infelizmente, numa grande percentagem de casos de cólica
continua a não ser possível fazer qualquer classificação a não ser quanto à sua duração
(aguda, crónica ou recorrente) (Edwards & White, 1999).
Apesar dos sinais que caracterizam as cólicas nos equinos poderem variar desde uma
simples inquietação do animal até sinais de dor severa, devido à sua grande incidência, a
maioria dos tratadores está capacitado para identificar esta síndrome. A sintomatologia mais
frequente consiste em:
• Inquietação ou depressão; • Diarreia;
• Rolar no chão; • Pontapear o abdómen e escoicear;
• Raspar o chão contínua ou • Permanecer deitado por períodos
intermitentemente; excessivos de tempo;
• Deitar e levantar repetidamente; • Sudorese (regional ou difusa);
• Olhar o flanco; • Diminuição ou perda de apetite;

1
• Frequente posicionamento como • Ausência de defecação durante
que para urinar ou defecar; mais de 24 h.
No entanto pode ser observado apenas um destes sinais, ou vários simultaneamente e
manifestam-se em função do grau de dor e desconforto de que o animal é vítima.
É muito simples detectar um animal com cólica, mas para uma correcta aproximação e
tratamento é essencial tentar identificar qual o tipo de cólica presente. Para tal, é
imprescindível executar um exame físico completo e sistemático, assim como alguns
exames laboratoriais e outros exames complementares, os quais serão referidos mais
adiante neste trabalho.
São muitos os factores de risco que podem levar ao aparecimento desta síndrome e muitos
estudos têm sido feitos neste campo. Conhecê-los, assim como o seu envolvimento no
aparecimento de cólicas em equinos permite-nos adaptar o maneio e a dieta destes animais
de modo a tentar diminuir a incidência desta grave patologia. No entanto, esta matéria fica
além dos objectivos principais deste trabalho, pelo que irei apenas enumerar os principais
factores de risco geralmente estudados e explica-los sucintamente (White II, 2006b):
• Idade (inferior a 2 anos e superior a 10 anos);
• Raça (predisposição em algumas raças, como por exemplo no cavalo Árabe, apesar
de animais de qualquer raça poderem ser afectados);
• Sexo (garanhões com predisposição para hérnias inguinais, éguas na fase final da
gestação têm com mais frequência deslocamentos ou vólvulos no cólon maior e
machos têm maior risco de encarceramento do ID no forâmen epiplóico);
• Dieta (alterações bruscas na alimentação assim como aumento da quantidade de
concentrado na alimentação, são factores de risco);
• Maneio (animais que não se encontram em trabalho, ou com modificações não
graduais na quantidade de trabalho estão mais predispostos a cólicas, assim como
aqueles que não têm água ad libitum);
• Parasitismo (ocorrem tanto obstruções provocadas pelos próprios parasitas vivos,
como logo após a desparasitação, quando grande quantidade de parasitas mortos
obstrui o lúmen intestinal);
• Dentes (mudas, pontas dentárias, rasamento, má oclusão ou cáries, alteram a
mastigação e ingestão dos alimentos predispondo a cólicas);
• Transporte (aumenta o risco de cólica por impactação, mas o seu mecanismo ainda
não é conhecido);
• Febre (cavalos com reacções inflamatórias sistémicas podem ter alterações a nível
do tracto GI, estando predispostos a esta afecção);
• Clima (leva a variações na quantidade de água ingerida pelo animal, podendo
predispor a impactações quando essa ingestão se encontra diminuída,
nomeadamente num clima mais frio e húmido).
2
Existem também diversas particularidades anatómicas que predispõem os equídeos às
cólicas. São elas:
• Estômago muito pequeno (capacidade de 8 L a 16 L) em relação a uma grande
capacidade digestiva total;
• Cárdia, piloro e válvulas ileocecal e cecocólica com fisiologia para permitir situações
estanques para que a digestão se processe (impedindo por exemplo o vómito);
• ID muito longo (cerca de 22 m de comprimento), constituído por uma parte fixa
(duodeno) e por uma parte mesentérica (jejuno e íleo), que é comprida e está presa
a um mesentério muito longo e livre, o qual permite o seu envolvimento em vólvulos
e encarceramentos do ID;
• Ceco de grande capacidade (cerca de 30 L) em fundo de saco;
• Cólon maior contendo flexuras (esternal, pélvica e diafragmática) que são regiões de
possível obstáculo à passagem de alimentos de baixa qualidade ou mal digeridos;
• Partes direita e esquerda do cólon maior sem fixações transversais e sem inserção
na parede abdominal, sendo os deslocamentos consideráveis;
• Inserção do cólon dorsal direito (diâmetro de 20 cm a 25 cm) no estreito cólon menor
(5 cm a 7,5 cm de diâmetro), através do cólon transverso (infundibiliforme e fixo)
(Sisson & Grossman, 1986; Thomassian, 1996).
A acrescentar aos factores de risco e aos factores anatómicos predisponentes, são ainda de
salientar alguns factores fisiológicos como o peristaltismo extremamente elevado desta
espécie (comprovado pelo rápido fluxo da água desde o estômago até ao ceco em apenas
20 min a 40 min), o movimento retrógrado da ingesta e ainda o baixo limiar à dor que esta
espécie possui (pequenos estímulos produzem grandes sensações dolorosas,
principalmente ao nível do aparelho digestivo).
O presente trabalho tem como objectivo explicar de forma simples e clara os principais
critérios a ter em conta para o encaminhamento de um animal para cirurgia, de modo a
reduzir o tempo de decisão e consequentemente a deterioração do estado do animal. Uma
doença como a cólica equina, tem uma evolução muito rápida, e por vezes uma ou duas
horas podem fazer a diferença entre a sobrevivência e a morte do animal. Seguidamente
serão descritas as técnicas cirúrgicas mais frequentemente utilizadas, assim como as
particularidades da anestesia, uma vez que se trata de cavalos debilitados e com um risco
cirúrgico acrescido. Posteriormente será feita uma abordagem sobre os tratamentos e as
possíveis complicações pós-cirúrgicas. A seguir, serão descritos os critérios, a técnica
cirúrgica e protocolos medicamentosos utilizados na Clínica Hípica e ainda os casos clínicos
presenciados durante o estágio. Para finalizar, será realizado um pequeno levantamento
acerca das laparotomias a cavalos com cólica realizados na Clínica Hípica entre o dia nove
de Maio de 2008 e o dia sete de Março de 2009, com as respectivas taxas de sobrevivência,
tanto intra-cirurgicamente, como a curto prazo, até o animal ter alta.
3
CAPÍTULO II – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
1 – CRITÉRIOS PARA INDICAÇÃO CIRÚRGICA
A maior parte das decisões sobre tratamento e prognóstico em cavalos com cólica, é
baseada nos resultados de um minucioso exame físico. Os clínicos devem desenvolver uma
aproximação aos cavalos com cólica, que seja consistente e sistemática (Moore, 2006) para
evitar que certos detalhes sejam esquecidos e outros demasiado observados. O
encaminhamento de um animal para cirurgia deve ser decidido o mais rapidamente possível
e o exame clínico deve incluir:
• Anamnese: as questões mais relevantes são, para além das características do
animal e do seu habitat que podem constituir factores de risco, saber há quanto
tempo começou o episódio de cólica, qual a sua evolução, se o cavalo já tinha sido
vítima de outros episódios semelhantes ou de cirurgia a cólica, se o animal defeca ou
quando foi a última vez que o fez, se tem apetite ou bebe água e ainda quais os
tratamentos já realizados assim como o seu efeito.
• Exame físico: um episódio de cólica deve ser sempre visto como uma emergência e
uma doença de rápida evolução, pelo que o exame físico deve ser completo e
sistemático como para qualquer outra patologia, mas sem que para isso se
prolongue no tempo. Caso seja realizado antes de qualquer administração
medicamentosa, sinais como a frequência cardíaca (FC) e a frequência respiratória
(FR) poderão indicar com alguma fiabilidade o prognóstico (White II, 2006d) e após a
medicação, poderão ser úteis para a monitorização da resposta do animal à mesma
(Gaughan, 2006).
• Exames laboratoriais: geralmente não são efectuados em condições de campo
devido à falta de condições para tal e pela impossibilidade de rápidos resultados. Os
exames laboratoriais podem, caso haja necessidade, ser realizados mais tarde, após
a chegada do equídeo ao centro de referência.
• Outros exames complementares: o exame imagiológico dos pacientes que
apresentam dor abdominal aguda é actualmente realizado de forma rotineira em
hospitais veterinários em todo o mundo e é constituído principalmente por exame
ecográfico, radiográfico, endoscópico e por vezes laparoscópico.
Infelizmente, aquando da chegada do cavalo ao centro de referência, nem sempre é
possível apurar a sua história nem os dados do exame físico inicial ou ter conhecimento de
qualquer fármaco administrado, porque muitas vezes nem o proprietário do animal nem o
médico veterinário que o assistiu previamente, o acompanham até ao centro de referência.
Apesar de muitos estudos realizados recentemente nesse sentido, não foi possível ainda
definir uma fórmula ou parâmetro com sensibilidade suficiente, que permita diferenciar as
cólicas que exigem tratamento cirúrgico, das que se resolvem apenas com tratamento
4
médico. Não há definição concreta ou listas de parâmetros que permitam indicar a
necessidade de cirurgia e há vários graus de severidade e um conjunto extenso de sinais
clínicos para os diferentes tipos de cólicas, podendo todos os cavalos responder de maneira
diferente. Assim, a (por vezes complicada) decisão do encaminhamento de um animal para
cirurgia continua a ser tomada única e exclusivamente com base na experiência e
conhecimento do médico veterinário. Em caso de dúvida, a indicação cirúrgica é
recomendada como meio de diagnóstico específico, servindo para garantir que uma lesão
de estrangulamento ou obstrução não se encontra presente (White II, 2005a). É no entanto
de salientar que uma laparotomia é uma cirurgia bastante dispendiosa, pelo que os riscos e
benefícios da cirurgia, assim como o prognóstico, têm de ser discutidos com o proprietário
antes que qualquer decisão seja tomada.

1.1 – Observação do paciente


No acto de entrada na clínica, uma rápida avaliação do animal deve ser feita através da sua
observação. Esta avaliação não deve demorar mais do que o tempo necessário para a
entrada do cavalo no centro de referência, sua colocação no tronco e contenção, de modo a
não atrasar o início do exame físico propriamente dito.
A dor, a aparência externa, a distensão abdominal, o comportamento e a atitude são os
dados mais relevantes a reter na fase inicial da avaliação de um cavalo com cólica.
Os detalhes da aparência externa com maior importância nestes animais são a evidência de
sudorese e trauma os quais estão relacionados com o grau de dor vivido pelo animal, sendo
por isso incluídos na apresentação desta. O comportamento e a atitude, estando bastante
correlacionados, serão também abordados em conjunto.

1.1.1 – Dor
Em função da causa da cólica, a dor pode ser iniciada por uma ou várias das diferentes
maneiras (Grupo de pesquisa sobre cólica da Universidade de Liverpool, 2008):
• Espasmos ou motilidade incoordenada do intestino;
• Distensão do intestino (por gás, fluido ou ingesta);
• Dor isquémica por oclusão da circulação sanguínea do tracto GI;
• Estiramento do mesentério devido a deslocamento, impactação ou estrangulamento
intestinal.
Neurologicamente, as vísceras são enervadas por dois complexos sistemas nervosos (SN)
autónomos (Thomassian, 1996):
• SN parassimpático, representado pela enervação eferente e pré-ganglionar (nervos
vago e pélvico);

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• SN simpático, representado pela rede de fibras pré-ganglionares dos segmentos
torácico e lombar da espinha vertebral e por neurónios pós-ganglionares
noradrenérgicos originários dos gânglios pré-vertebrais (gânglio celíaco e gânglios
mesentéricos cranial e caudal).
Em situações de normalidade neurofisiológica, os intestinos promovem os movimentos
segmentares e propulsivos, sem que o animal tenha consciência ou sinta tal trabalho motor.
Além da participação dos SN autónomos acima referidos, o tracto GI conta também com
plexos nervosos intramurais e áreas neurológicas específicas, com actividade de marca-
passo que regulam o fluxo da ingesta ao longo do intestino. A isquémia com elevação do
dióxido de carbono (CO2) e catabólitos celulares, constituem os fenómenos mais
importantes no desencadeamento da sensação de dor.
A dor visceral pode ser traduzida clinicamente em áreas de aumento de sensibilidade
cutânea ou áreas de “Zakharin-head-roge” (“Z.H.R”) evidenciadas por movimentos de flexão
da cabeça, tentativas de morder, tremor da pele e sinais de inquietação geral (Thomassian,
1996).
A dor pode, pela avaliação do comportamento e da atitude do animal, ser classificada como
severa, moderada ou leve e ainda como intermitente ou contínua. A variação individual do
comportamento em caso de dor é frequente e em animais que foram medicados, muitas
vezes o verdadeiro nível de dor apresenta-se mascarado. A observação física do animal e a
presença de sudorese e escoriações recentes na cabeça (parte superior dos olhos) e nas
tuberosidades coxal e isquiática, podem indicar trauma devido a dor severa (Thomassian,
1996; White II, 2006d).
Em função do comportamento do animal, a dor pode ser classificada como:
• Dor leve: caracteriza-se por raspar o chão com os membros anteriores, inquietação,
olhar o flanco e enrolar o lábio. Normalmente a dor leve não é acompanhada de
alterações cardiovasculares significativas. Apresenta-se de forma contínua,
principalmente nos quadros leves e iniciais de impactação do cólon maior e de forma
intermitente em obstruções parciais sem estrangulamento de grandes troncos
vasculares.
• Dor moderada: acompanhada por deitar e levantar com frequência, rolar no chão
ocasionalmente e permanecer longos períodos em decúbito lateral ou esternal, olhar
o flanco, raspar o chão ou atingir o abdómen com os membros posteriores,
pontapeando-o. O cavalo assume a posição de cão sentado ou mesmo posição de
micção, sem que no entanto urine. Este facto leva a que muitos tratadores e
proprietários pensem que o cavalo não consegue urinar e administrem diuréticos,
levando a desidratação e deterioração mais acelerada do estado hígido do animal.
Na dor moderada, já há alterações cardiovasculares (CV) e respiratórias, podendo
alterar substancialmente o padrão da circulação periférica. Dor moderada contínua é
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observada nos quadros de distensão intestinal moderada (por líquido e/ou gás)
principalmente no ID, isquémia regional e na obstrução de troncos mesentéricos ou
do ramo íleo-ceco-cólico. Já a dor moderada intermitente pode estar relacionada
com espasmos intestinais e ocasionalmente com quadros de obstrução intraluminal
simples.
• Dor severa: pode exprimir-se sob a forma de qualquer sintoma acima referido, mas
mais intensa e violentamente e ainda: sudorese (localizada ou difusa), hiperpneia, o
cavalo atira-se ao chão e rola violentamente, intensa e continua raspagem do chão
ou movimentação impaciente. Dor severa intermitente é pouco frequente, podendo
no entanto ocorrer em casos de fortes espasmos intestinais de características
cíclicas. De forma contínua, este grau de dor manifesta-se nos quadros iniciais de
comprometimento vascular, grandes distensões intestinais (líquidas e/ou gasosas),
tensões e tracções do mesentério (Thomassian, 1996).
A dor pode ainda manifestar-se sob a forma de depressão (Freeman, 2003b). Em dor
moderada a severa, em que subitamente e sem motivo aparente, o animal apresenta
melhoras ou deixa de apresentar dor, com concomitante deterioração dos demais sinais
clínicos (sinais de choque), deve considerar-se a possibilidade de ruptura gástrica ou
intestinal. Quanto mais intensa a manifestação de dor, maiores as possibilidades de estar
perante uma afecção grave (Thomassian, 1996).
Em poldros restritos a espaços pequenos, que podem não mostrar a verdadeira natureza da
sua dor, é importante a observação de longe pois pode sugerir outro tipo de problemas.
Nesta idade a severidade dos sinais de dor tem pouca correlação com a severidade das
lesões, porque os poldros têm maior intolerância à dor abdominal, quando comparados com
cavalos adultos (Bohanon, 2005).
A não ser que algum outro critério contra-indique a cirurgia, dor incontrolável ou severa ou
dor que não responde à medicação com anti-inflamatórios não esteróides (AINE’s) (como a
flunixina meglumina), agonistas α-2 adrenérgicos (xilazina ou detomidina) ou opióides
(butorfanol) é geralmente indicação cirúrgica (Zimmel, 2003).

1.1.2 – Distensão abdominal


A distensão intestinal é uma causa frequente de dor abdominal e de acordo com a porção
de intestino afectada, esta pode manifestar-se externamente sob a forma de diferentes
graus de distensão abdominal.
Distensão apenas do ID, raramente é visível externamente (Thomassian, 1996) ou pode
manifestar-se sob a forma de distensão moderada na fossa paralombar (Moore, 2006). No
entanto, abdómen abaulado corresponde maioritariamente a casos de comprometimento
primário do intestino grosso (IG) ou a comprometimento secundário a hipotonia ou ileo
paralítico (alteração funcional da motilidade intestinal). Distensão abdominal pode ser
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classificada como baixa, média ou alta, de acordo com o terço horizontal afectado e pode
ser unilateral ou bilateral. Alguns exemplos de correspondências internas de diferentes
localizações de distensão abdominal são (Thomassian, 1996):
• Distensão unilateral direita da fossa paralombar, corresponde geralmente a
timpanismo do ceco;
• Abaulamento baixo unilateral, o cólon maior do lado correspondente encontra-se
dilatado, na maioria das vezes;
• Distensão abdominal baixa e bilateral, ocorre quando há compromisso do cólon
direito e esquerdo, ventral e dorsal, por sobrecarga ou impactação difusa;
• Todo o perímetro abdominal distendido, pressupõe envolvimento de todo o IG de
forma difusa, podendo haver ainda envolvimento do ID, como ocorre no timpanismo
difuso por hiperfermentação de alimentos ricos em hidratos de carbono ou nos
quadros de obstrução do cólon menor;
• Distensão abdominal baixa e bilateral em potros com idade até 72 horas de vida,
está frequentemente relacionado com ruptura de bexiga que leva a uroperitoneu,
urémia e morte (Thomassian, 1996);
• Em poldros, distensão abdominal severa pode ser causada por dilatação do ID ou do
cólon maior (Freeman, 2003b).
Devido à grande variabilidade de conformação e condição corporal com que os animais se
podem apresentar, por vezes pode ser complicado determinar o grau de distensão
abdominal em alguns cavalos (Moore, 2006).

1.1.3 – Comportamento e Atitude


São três as atitudes anormais geralmente visíveis em animais com cólica (Thomassian,
1996):
• Ansiedade é a atitude de menor gravidade e caracteriza-se principalmente por fáscia
contraída, movimentos vigorosos das orelhas e olhar atento. Ocorre por vezes nas
fases que precedem a ruptura gástrica ou imediatamente após esta. Pode ser
seguida de depressão e agravamento dos sinais sistémicos;
• Hiperexcitabilidade acompanha casos de dor severa devido a isquémia e distensão
intestinal (líquida ou gasosa) e quando há tensão do mesentério. É visível nas fases
iniciais de acidose, acompanhada por graves alterações respiratórias e circulatórias.
É a atitude mais perigosa para o cavalo e para quem lida com ele: os animais ficam
incontroláveis e executam movimentos incoordenados, traumatizando-se e pondo em
risco a integridade da equipa de atendimento. Nestes casos é imprescindível a
sedação e passagem de uma sonda nasogástrica para permitir a continuação do
exame clínico;

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• Depressão: a sua ocorrência coincide com a altura imediatamente antes e
imediatamente após grandes manifestações de desconforto abdominal agudo. Pode
ser consequente da aplicação de sedativos ou drogas analgésicas, de quadros de
alcalose metabólica, toxémia, enterite, peritonite ou depressão do SN central (SNC)
devido a esgotamento físico, exaustão ou choque. Em casos de ruptura do estômago
ou de alças intestinais, a depressão pode decorrer da ansiedade e da
hiperexcitabilidade e está associada a repercussões sistémicas das lesões do tracto
GI (Gaughan, 2006).
O comportamento do animal relaciona-se principalmente com a dor por si vivida e com a
localização da sua origem. Olhar o flanco dá indícios de problemas a nível do ceco ou cólon
maior e ocorre também quando há distensão abdominal. Extensão do corpo e
posicionamento como que para urinar, com abertura da base de apoio dos membros
posteriores, pode ocorrer em casos de distensão difusa, sobrecarga ou impactação do cólon
maior. Bruxismo e sialorreia em potros na fase de desmama relaciona-se frequentemente
com a presença de úlceras gástricas ou gastroduodenais. Posição de cão sentado pode ser
adoptada por cavalos com afecção gástrica, no entanto é imprescindível a diferenciação da
paralisia dos membros posteriores por lesões medulares caudais à região tóraco-lombar,
que leva ao mesmo comportamento. Em equinos portadores de indigestão por sobrecarga
ou com impactação de ingesta no cólon maior, o acto de “brincar com a água” é frequente
(Thomassian, 1996).

1.2 – Exame físico


Após a rápida observação do paciente, avançamos para o exame físico propriamente dito.
Este é constituído por vários componentes:
• Indicadores de hidratação e perfusão tissular: são vários os parâmetros a medir e
observar para ter noção do estado de hidratação, circulação sanguínea, possíveis
alterações cardiovasculares ou mesmo a presença de toxémia;
• Motilidade intestinal: permite avaliar o conteúdo intestinal, assim como possíveis
alterações na motilidade intestinal, que dão indícios da gravidade do episódio de
cólica presente;
• Temperatura corporal: a sua alteração permite confirmar a presença de infecções,
sendo um sinal útil na diferenciação entre obstrução intestinal e enterite proximal;
• Avaliação fecal: fornece dados importantes sobre o trânsito intestinal e a digestão
dos alimentos.

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Para além de um exame mais geral do animal, procedimentos mais invasivos devem ser
levados a cabo, nomeadamente:
• Entubação nasogástrica: permite avaliar o refluxo enterogástrico, o qual dá fortes
indícios de necessidade de cirurgia, quando presente em quantidade considerável;
• Palpação rectal: possibilita a detecção de anormalidades topográficas ou
dimensionais ao nível dos órgãos GI.

1.2.1 – Indicadores de hidratação e perfusão tissular


São vários os dados que podemos recolher durante o exame físico de um animal com
cólica, que nos permitem avaliar o seu estado de hidratação assim como a perfusão tissular.
Estes sinais, mesmo apontando para uma situação grave, não estão relacionados com a
necessidade de cirurgia, mas mais frequentemente permitem prever o prognóstico e chance
de sobrevivência (White II, 2006d).
A coloração das conjuntivas e mucosas (a oral é a mais comummente observada)
constituem um excelente indicador do estado circulatório e principalmente da toxémia do
animal em crise abdominal (Thomassian, 1996). As mucosas devem ser rosadas e húmidas
(Moore, 2006) e o tratamento do animal com AINE pode melhorar a sua aparência quando
alteradas, pelo que a prévia medicação deve ser levada em consideração (Freeman,
2003b). Acredita-se que a gravidade das alterações de coloração observadas nas
conjuntivas e mucosas, são directamente proporcionais à gravidade do processo, alteração
do estado circulatório do animal e à toxémia do paciente (Thomassian, 1996).
A coloração das mucosas e conjuntivas pode ser ictérica (amarelada), observada em
cavalos com dor abdominal podendo indicar doença obstrutiva biliar ou estar associada a
um período prolongado (aproximadamente 48 horas) sem ingestão, ou com ingestão de
alimentos diminuída (Moore, 2006). A icterícia pode ainda estar relacionada com animais
portadores de babesiose clínica, que sentem dor abdominal devido à deposição de
bilirrubina ao nível da serosa do aparelho digestivo, a qual estimula as terminações
nervosas periféricas, o que produz a sensação de desconforto. Estes animais apresentam
frequentemente icterícia subclínica (Thomassian, 1996). A coloração cianótica (arroxeada),
é indicadora de má perfusão, geralmente faz-se acompanhar por um aumento do tempo de
repleção capilar (TRC) (superior a 4 seg) e indica pobre perfusão periférica. Membranas
mucosas entre vermelho e púrpura ocorrem em cavalos com endotoxémia, comum em
animais com enterite proximal, enterocolite, obstrução por estrangulação prolongada, enfarte
sem estrangulamento ou peritonite (Moore, 2006). Podem ainda apresentar-se anémicas
(pálidas), o que pode indicar perda de sangue ou dever-se a má perfusão.
Para além da coloração, deve também avaliar-se a humidade ao nível das membranas
mucosas. A mucosa oral deve apresentar-se sempre húmida e se se encontrar seca no acto

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do exame clínico, é indicação de desidratação moderada a severa e frequentemente faz-se
acompanhar por retracção do globo ocular (Moore, 2006).
Um outro sinal a explorar ainda nas membranas mucosas, é o TRC, que corresponde à taxa
de retorno do sangue capilar para a membrana mucosa, após aplicação de uma pressão
suave e reflecte a perfusão tissular. É medido através de uma pressão digital sobre as
mucosas comprimido os pequenos capilares, o que bloqueia o fluxo sanguíneo para a área.
Quando a pressão é interrompida, os capilares reenchem rapidamente com sangue e a cor
volta, desde que o coração seja capaz de gerar pressão sanguínea arterial suficiente. É
considerado normal um TRC inferior a 2 seg. TRC entre 2 seg e 4 seg pode ser um reflexo
do comprometimento da circulação periférica e da instalação de desidratação moderada a
severa. Entre 4 seg e 6 seg, indica uma severa hipoperfusão e entrada em choque. Com
TRC acima de 6 segundos, estamos perante um quadro circulatório gravíssimo, o qual se
pode reflectir em alterações metabólicas e celulares irreversíveis e morte do animal
(Thomassian, 1996).
Outra apreciação que deve ser realizada para a correcta avaliação da hidratação e perfusão
tissular periférica é a medida do pulso, assim como as suas características. O pulso
depende de vários factores, nomeadamente: o rendimento cardíaco, o volume sanguíneo e
a pressão sanguínea arterial (Thomassian, 1996) e pode ser palpado ao nível da artéria
facial transversa (Moore, 2006). É considerada normal num adulto em repouso, uma FC de
30 batimentos por minuto (bpm) a 40 bpm e preenchimento do pulso forte e cheio. No
entanto estas características podem ser profundamente alteradas na presença de dor,
hipovolémia e toxémia, que podem estar presentes num episódio de cólica. Em situações de
dor, é normal o pulso arterial apresentar-se aumentado e o seu aumento está relacionado
com a gravidade do episódio, principalmente quando acompanha a progressão do estado
geral do paciente (insuficiência circulatória periférica). Quadros de taquisfigmia (pulso fino e
fraco), são de extrema gravidade (Thomassian, 1996). Deve também aceder-se ao pulso
digital e à temperatura dos cascos, o qual permite ainda a diferenciação entre cólica e
laminite, uma vez que não é rara a presença de sinais em comum e os animais com
problemas no tracto GI estão predispostos a ter laminites (Moore, 2006).
A FC, que pode ser medida através do pulso ou por auscultação cardíaca, é consequência
da resposta do SN simpático à dor, hemoconcentração e insuficiência circulatória. Esta deve
ser monitorizada para avaliar a evolução da doença assim como a resposta do paciente
(Thomassian, 1996; Gaughan, 2006). FC normal, indica pouca gravidade da afecção ou fase
inicial da mesma; entre 40 bpm e 60 bpm, corresponde usualmente a picos de dor e FC
constante acima de 60 bpm indica cólica grave, principalmente quando acompanhada por
desidratação e perfusão capilar diminuída. Também há aumento da FC em peritonites
secundárias a alterações da permeabilidade da parede intestinal, colapso vascular por
sequestro de grandes volumes de fluidos e em endotoxémia severa (Thomassian, 1996).

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A FR também aumenta com frequência como resposta à dor, choque, compensação do
equilíbrio ácido-base, acidose metabólica ou distensão das alças intestinais ou gástricas; FR
diminuída é observável em casos de extrema depressão do SNC devido a toxémia,
administração de tranquilizantes, em situações de alcalose iatrogénica e devido a perda de
cloretos nos refluxos enterogástricos ou em lavagens do estômago (Thomassian, 1996).
Para a sua avaliação, assim como para a avaliação do tipo de respiração presente, procede-
se à auscultação torácica. Também a FR é alterável com a medicação e é usada mais para
a avaliação do estado hígido do animal do que para diferenciar cólicas médicas de cólicas
cirúrgicas.
Finalmente o grau de elasticidade da pele, permite estimar clinicamente o grau de
desidratação presente, quando avaliada conjuntamente com os sinais previamente
apresentados. A desidratação pode ser classificada como leve (cerca de 5%), moderada
(cerca de 8%) ou como severa (à volta de 10%) (Thomassian, 1996), de acordo com os
sinais apresentados na tabela 1. Para avaliar o grau de elasticidade da pele, faz-se uma
prega de pele na tábua do pescoço, a qual se deve desfazer imediatamente após a sua
libertação. Prolongamento no tempo de anulação da prega de pele, é indicador de
desidratação.

Tabela 1: Desidratação estimada


Características Grau de desidratação
Leve Moderada Severa
Elasticidade da pele Ligeiramente diminuída Muito diminuída Ausente
TRC 2 a 4 seg 4 a 6 seg Superior a 6 seg
Sede Normal (presente) Normal (presente) Intensa
Extremidades Temperatura normal Frias Frias
Mucosas Húmidas Secas Secas
Atitude Normal Normal Depressão
Adaptado de "Enfermidades dos cavalos" Thomassian, 1996.

1.2.2 – Motilidade Intestinal


É possível aceder aos sons intestinais através da auscultação cuidada da cavidade
abdominal. Para tal, divide-se o abdómen em 4 quadrantes (Thomassian, 1996):
• Quadrante esquerdo dorsal: caudalmente, no terço médio da parede, permite avaliar
os ruídos do ID;
• Quadrante esquerdo ventral: onde se ausculta o cólon esquerdo dorsal e ventral,
assim como a flexura pélvica;
• Quadrante direito dorsal: onde são audíveis os sons da base do ceco e ainda os
sons produzidos pelas válvulas íleo-cecal e ceco-cólica;
• Quadrante direito ventral: permite ouvir os ruídos do corpo e do ápice do ceco, assim
como o cólon dorsal e o cólon ventral direitos, junto às 3 últimas costelas.
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Cada quadrante deve ser auscultado 30 seg a 60 seg, o que permite uma boa avaliação da
frequência e qualidade dos sons. Sons de mistura e propulsão são audíveis ao nível da
fossa paralombar, tanto dorsal como ventralmente. Além dos 4 quadrantes acima referidos,
deve ainda auscultar-se a zona ventral do abdómen, na linha média, pois permite detectar a
presença de areia no cólon maior (Moore, 2006) (causa frequente de impactação), devido ao
seu som característico (Freeman, 2003b).
A auscultação de sons intestinais normais, reflecte motilidade intestinal normal, e está
relacionada com cólicas simples e de fácil resolução. O aumento da motilidade intestinal,
que se traduz num aumento da intensidade e da frequência dos sons intestinais, pode
associar-se à presença de cólica espasmódica ou a inflamação da parede intestinal, devido
a mudanças alimentares, a alimentos inadequados, a diarreias ou a lesões parasitárias.
Através da auscultação abdominal é possível também diferenciar o conteúdo intestinal,
através dos diferentes sons produzidos pelo ar, líquido ou gás (Thomassian, 1996).
Outro modo de avaliar o conteúdo intestinal é através da percussão nos quadrantes dorsais,
estando a presença de “pings” associada ao cólon maior (lado esquerdo) ou ao ceco (lado
direito) (Gaughan, 2006).
A hipotonia ou atonia regional, relaciona-se com a lesão de determinados segmentos
intestinais; já a sua distribuição de forma difusa é indicativa de ileo paralítico, o qual ocorre
em afecções graves e por vezes está relacionado com o comprometimento irreversível das
alças intestinais. O ileo paralítico pode ser causado por peritonite e por desequilíbrios
electrolíticos. Em animais que não se alimentam há mais de 12 horas, a redução da
motilidade intestinal é considerada fisiológica. Vários sedativos frequentemente utilizados
em episódios de cólica, como a xilazina, detomidina ou butorfanol, reduzem potencialmente
os movimentos e consequentemente os sons intestinais, o que pode levar à distensão do
intestino e agravamento do quadro clínico (Thomassian, 1996).
Animais com atonia ou hipotonia intestinal estão mais associados a cólicas cirúrgicas, do
que animais com motilidade intestinal normal. No entanto, pode haver diminuição do sons
intestinais em cólicas simples, e sons do IG podem ser audíveis perante obstrução do ID
(White II, 2006d) o que mostra que a indicação cirúrgica não deve ser decidida apenas com
base num único sinal clínico, mas pela avaliação de todos eles em conjunto.
Em poldros, para além da auscultação abdominal, pode ser útil a palpação externa do
abdómen, principalmente na zona dos anéis inguinais (só nos machos), umbigo ou cicatriz
umbilical (Chaffin, 1999).

1.2.3 – Temperatura corporal


A temperatura corporal do cavalo é medida através da introdução de um termómetro
lubrificado, através do ânus e inclinando-o para que a extremidade fique encostada à parede
do recto e não entre as fezes. A temperatura corporal normal num cavalo adulto, situa-se
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entre 37 ºC e os 38 ºC (Tilley & Scholten, 2001). É um dado que não tem muito valor quando
analisado isoladamente, no entanto, valores situados abaixo do intervalo normal sugerem
que o animal se encontra em choque, hipovolémia ou colapso cardiovascular e o quadro é
frequentemente terminal. Por outro lado, hipertermia (principalmente quando a temperatura
se encontra acima dos 39ºC) relaciona-se com quadro inflamatório ou infeccioso (peritonite,
salmonelose ou enterite proximal ou enterocolite) (Thomassian, 1996; Moore, 2006), sendo
contra-indicada a resolução cirúrgica. É de salientar que em neonatos, 39ºC de temperatura
rectal, pode ser considerada normal (Hardy, 2008).
Em animais com estrangulamento agudo ou obstrução, a temperatura está usualmente
normal. A administração de AINE leva a uma tendência para a normalização da temperatura
corporal, mesmo em animais com quadro inflamatório que apresentavam hipertermia
anteriormente e com persistência do problema (White, 2006).
É importante que a temperatura seja medida antes do exame rectal, pois a presença de
pneumorrecto pode levar a uma diminuição irreal da temperatura rectal, que não
corresponde a uma diminuição da temperatura corporal (Gaughan, 2006; Moore, 2006).

1.2.4 – Avaliação fecal


As fezes para avaliação fecal podem ser obtidas durante o exame por palpação rectal ou
através da recolha de fezes frescas imediatamente após defecação (Moore, 2006). As
porções arredondadas que constituem as fezes são chamadas de síbalas e são várias as
características macroscópicas que podem ser avaliadas, nomeadamente: forma, humidade,
coloração, película de cobertura, odor e tamanho das partículas (presença de sementes
inteiras e tamanho dos fragmentos de forragem) (Thomassian, 1996).
A presença de areia é frequentemente causa de impactação, e pode ser confirmada pela
introdução de algumas síbalas numa luva, homogeneização com água morna e observação
após alguns minutos, para confirmar a presença de um depósito de areia nos dedos da luva
(Thomassian, 1996; Moore, 2006).
A pesquisa de sangue nas fezes também poderá ser útil. Sangue misturado com as fezes
ocorre em animais com impactação do cólon menor. Sangue fresco com coágulos pode
indicar a presença de lacerações no recto ou cólon menor. (Moore, 2006).
Presença de parasitas GI pode ser de considerar quando há forte indicação de processo
parasitário, como causa da cólica (Thomassian, 1996). As fezes podem também ser
submetidas a testes, como pesquisa de sangue oculto, parasitas, Clostridium difficile ou
Salmonella sp (Moore, 2006).
A ausência de fezes pode indicar a presença de um processo obstrutivo ou o
desenvolvimento de ileo paralítico (Thomassian, 1996). A avaliação das fezes pode ainda
ser utilizada para “medir” a velocidade do trânsito intestinal. Em condições fisiológicas, óleo
mineral administrado oralmente aparece nas fezes cerca de 12 h depois. Retardamento para
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além das 12 h pode indicar a presença de obstrução, pois o óleo consegue passar
lentamente, mesmo com várias formas de obstrução intraluminal (Moore, 2006).

1.2.5 –Entubação nasogástrica


A aplicação de uma sonda nasogátrica tem valor, tanto de diagnóstico como terapêutico e
deve ser realizada em todos os animais com cólica. Em animais que apresentam dor severa
e particularmente nos cavalos que se encontram suados (particularmente à volta da cabeça)
e com a FC e a FR aumentadas, a introdução da sonda nasogástrica deve ser executada
imediatamente, para aliviar a dilatação gástrica e evitar a sua ruptura (Moore, 2006; Fehr,
2007c).
Em termos de diagnóstico:
• Gás em grande quantidade ocorre em processos secundários a obstrução ou íleo
paralítico;
• Gás com odor fétido e de fermentação está presente em sobrecarga gástrica ou
ingestão de alimentos mofados;
• Fluido em quantidade insignificante não descarta a possibilidade de processo
obstrutivo proximal no ID, mas deve-se reavaliar, principalmente quando
concomitantemente há dor abdominal persistente;
• Pode não ocorrer acumulação considerável de fluido na impactação gástrica por
sobrecarga;
• Mais de 2 L de fluido retirados através da sonda, dão indício da presença de
processo obstrutivo do ID, enterite proximal (com odor fétido), atonia regional ou
mesmo íleo adinâmico;
• pH acima de 5, sugere origem entérica do refluxo, enquanto pH abaixo de 5 sugere
origem gástrica;
• Líquido castanho, com sangue digerido (aparência de borras de café), sugere úlcera
gástrica ou duodenal (mais frequente em poldros) ou ocorrência de rinorragia, com
deglutição de sangue durante a colocação da sonda nasogástrica (Thomassian,
1996).
• Deslocamento do cólon maior pode levar à obtenção de refluxo em quantidade
moderada, devido a obstrução extraluminal do duodeno, secundária à tensão
exercida sobre o ligamento duodenocólico (Moore, 2006).
A finalidade terapêutica da colocação da sonda nasogástrica, inicia-se com a evacuação de
gás e líquido, aliviando o animal e evitando a ruptura gástrica (Thomassian, 1996; Moore,
2006). Permite a execução de lavagem gástrica, indicada em casos de sobrecarga e
fermentação: infusão de 3 L de água morna (o facto de a água não estar fria, evita
vasoconstrição e espasmo gástrico e estimula o peristaltismo ao nível do ID) e posterior

15
sifonagem após cada infusão. Até que o diagnóstico seja definido ou até à resolução da
cólica, a sonda nasogástrica deve ser mantida, especialmente em casos de refluxo
abundante, permitindo a monitorização do paciente e descompressão gástrica.
(Thomassian, 1996; Moore, 2006). É importante que o tubo fique seguro, principalmente se
o paciente permanecer algum tempo sem observação permanente (por exemplo numa
boxe).
Para proceder à entubação de um cavalo, deve-se escolher uma sonda de diâmetro
adequado (para evitar lesões desnecessárias tanto nas vias nasais como na faringe ou
esófago) e lubrifica-la com óleo mineral, facilitando o seu deslizamento (Thomassian, 1996).
Em recém-nascidos pode utilizar-se uma algália e confirma-se a presença de refluxo com
uma seringa de 60 ml, pois nesta idade é difícil por vezes obter refluxo, mesmo quando está
presente distensão abdominal (Chaffin, 1999).
No entanto o tubo não pode ser demasiado estreito para permitir a saída do conteúdo
gástrico e é recomendada a presença de abertura em ambas as extremidades, assim como
perfurações laterais para evitar a probabilidade de ocorrência de bloqueamento da sonda
por ingesta (Moore, 2006).
O animal tem de estar bem contido, de preferência num tronco e se necessário coloca-se
um aziar. Para facilitar a passagem da sonda nasogástrica, fecha-se o ângulo cabeça-
pescoço, favorecendo o momento da deglutição e a posição anatómica da via digestiva em
relação à respiratória. Para evitar lesões ao nível da faringe, é recomendado aguardar pelo
momento da deglutição. A correcta introdução da sonda e a sua passagem no esófago é
confirmada por uma leve dificuldade no seu deslizamento e pela sua visualização à
esquerda, no esófago cervical, sob a forma de uma “onda” (Thomassian, 1996). Para
auxiliar a passagem pelo esófago, é recomendado soprar pela extremidade externa da
sonda, até à sua passagem pelo cárdia. Se mesmo assim a passagem da sonda através do
cárdia não for possível devido à forte pressão por distensão gástrica, procede-se à
administração de 60 ml de lidocaína ou mepivacaína pelo tubo, a qual vai levar ao
relaxamento do esfincter, facilitando a entrada no estômago (Moore, 2006).
Após a introdução da sonda no estômago ou durante a lavagem gástrica, o abaixamento da
cabeça do animal permite a saída, por gravidade, do líquido presente. É importante medir a
quantidade de refluxo, não só para efeitos de diagnóstico mas também para calcular a
quantidade de fluidos a repor (Moore, 2006).
Embora a presença de refluxo nasogástrico esteja frequentemente relacionada com a
necessidade cirúrgica, esta afirmação deixa de ser verdadeira em casos de refluxo muito
abundante, que sugerem enterite proximal. O refluxo nasogástrico (presença ou ausência,
quantidade, pH e cor) deve ser avaliado juntamente com outros sinais clínicos e nunca
isoladamente (White II, 2006d).

16
1.2.6 – Palpação rectal
A palpação rectal é considerada como um dos testes de diagnóstico mais útil quando
utilizada individualmente (Moore, 2006). Os achados do exame rectal são muitas vezes
decisivos para a elaboração do diagnóstico etiológico da cólica ou para determinar a
necessidade de tratamento cirúrgico e ainda para determinar o prognóstico (Thomassian,
1996; Moore 2006).
Como na entubação nasogástrica, é importante a adequada contenção do cavalo, para a
qual se pode utilizar um tronco, aziar ou sedativos podendo inclusive utilizar-se os três caso
haja necessidade, tendo em vista a garantia da segurança do cavalo, do tratador e do clínico
(Moore, 2006).
Para proceder à palpação rectal, utiliza-se uma luva própria (que protege todo o braço) e
lubrifica-se a mesma com carboximetilcelulose, vaselina ou óleo mineral, antes da sua
introdução no recto. Em animais stressados, que nunca foram palpados ou com um recto de
diâmetro pequeno, este procedimento deve ser realizado ainda com mais cuidado e
delicadeza (Thomassian, 1996).
Palpação dolorosa associada a um aumento do desconforto do animal, é indicativa de
afecção grave e pode impossibilitar o exame completo de todas as estruturas acessíveis
pela via transrectal (Thomassian, 1996). Uma instilação rectal com 60 ml de lidocaína ou
mepivacaína, está indicada nestas situações ou quando há muita tensão (Moore, 2006).
O exame por palpação rectal deve ser executado de forma sistemática e consistente, para
evitar a não detecção de lesões presentes e palpáveis. As estruturas normalmente palpáveis
através do exame rectal, incluem o terço caudal da cavidade abdominal (cerca de 30% a
40% do abdómen) (Moore, 2006; Fehr, 2007b) e estão indicadas na tabela 2.

Tabela 2: Estruturas normalmente palpáveis durante o exame rectal


Dorsal ao recto Ventral ao recto Lado direito Lado esquerdo Lado esquerdo
Eixo sagital Eixo sagital dorsal Ventral ao recto
Aorta abdominal Corpo do útero Região fixa do Rim esquerdo Baço (parte
terminal (fêmeas) íleo (parte caudal) caudal)

Artérias ilíacas Cólon menor Cólon transverso Ovário esquerdo Flexura pélvica

Artéria Ansas do ID Ceco (base, Ligamento Cólon dorsal


mesentérica corpo e ténias nefro-esplénico esquerdo
caudal Bexiga ventral e medial)
Anel inguinal
Ovário direito interno esquerdo

Anel inguinal Superfície


interno direito peritoneal
Adaptado de “Enfermidades dos cavalos”, Thomassian, 1996
Ao palpar, deve avaliar-se o tamanho, a sensibilidade à palpação e a localização dos
diferentes órgãos e estruturas (Moore, 2006). O duodeno e o estômago, por serem
17
estruturas com localização mais cranial, não são palpáveis nem fisiologicamente nem em
casos de dilatação, deslocamento ou outras alterações (Thomassian, 1996).
É de salientar que o exame pode ser normal numa fase precoce, devendo ser repetido de
forma seriada, para determinar a progressão da doença (com distensão ou alterações
topográficas) e a resposta ao tratamento (Moore, 2006). A palpação de corpos estranhos,
deslocamentos, dilatações ou outras alterações permite o diagnóstico etiológico da cólica e
consequentemente a avaliação da necessidade de intervenção cirúrgica. Em animais novos,
devido à reduzida dimensão do recto, o exame por palpação rectal está contra-indicado
(Freeman, 2003b).
Descrição mais detalhada sobre algumas alterações palpáveis através do exame rectal, será
encontrada na apresentação de casos clínicos.

1.3 – Exames laboratoriais


São vários os exames laboratoriais úteis em animais que apresentam cólica, nomeadamente
a análise do líquido peritoneal e o exame hematológico. No entanto, devido ao tempo
necessário para a obtenção de resultados, muitas vezes os mesmos não são utilizados de
forma rotineira, até porque não são geralmente úteis na decisão de necessidade de cirurgia
(White II , 2006), mas sim no estabelecimento do prognóstico.
Por outro lado, a realização de hemograma, concentração de fibrinogénio, análise dos gases
sanguíneos e análises bioquímicas poderá justificar-se em certos casos de cólicas, pois
disponibilizam informação sobre focos inflamatórios ou infecciosos, desidratação ou
hipovolémia, toxémia, desequilíbrios electrolíticos, ácido-base ou metabólicos, ajudando a
chegar a um diagnóstico correcto e ao estabelecimento do tratamento e prognóstico (Moore
2006).

1.3.1 – Abdominocentese e análise do líquido peritoneal


Sendo um dos testes laboratoriais com maior valor de diagnóstico e prognóstico
(Thomassian, 1996), a abdominocentese é a forma primária para aceder à viabilidade
intestinal (Fehr, 2007a) e permite um exame mais completo do interior do abdómen
(Gaughan, 2006). A análise e citologia do fluido abdominal, são utilizadas em alguns cavalos
com cólica para classificar o tipo de lesão, a viabilidade intestinal, determinar a severidade
da doença ou confirmar a presença de perfuração gastrointestinal, ajudando a estabelecer
tanto o diagnóstico como o prognóstico (Moore, 2006). Fisiologicamente, o líquido peritoneal
tem como principal função lubrificar e envolver as vísceras e tanto a sua produção como a
sua reabsorção estão submetidas a vários factores: pressão hidrostática e oncótica do
sangue e do espaço intersticial, permeabilidade capilar e fluxo sanguíneo (Thomassian,
1996). O volume normal é de apenas 300 mL no cavalo adulto, o que corresponde a um

18
volume muito pequeno em função do tamanho do animal. No entanto, com doença ou
inflamação intestinal este volume aumenta pela efusão de fluido e como parte da cascata
inflamatória (Gaughan, 2006). O líquido peritoneal reflecte a condição em que se encontra a
superfície mesotelial da cavidade abdominal. Alterações do líquido peritoneal ocorrem
rapidamente em resposta às alterações desencadeadas pelo processo inflamatório
envolvendo o peritoneu ou os tecidos da parede intestinal (Thomassian, 1996).
Na obstrução ou redução do fluxo sanguíneo ou linfático e no aumento da permeabilidade
capilar nas lesões do endotélio, ocorre transudação de fluido para o interior da cavidade
abdominal. A natureza e composição desse fluido dependem da intensidade do
comprometimento vascular e da severidade do processo inflamatório (Thomassian, 1996).
Para proceder à análise do líquido peritoneal, é imprescindível que este seja colhido através
de parancentese, que se realiza com o animal em estação. Após tricotomia e assepsia
cirúrgica da região abdominal entre o apêndice xifóide e a cicatriz umbilical (no ponto mais
baixo da linha abdominal), introduz-se através da linha branca a agulha. Alternativamente
pode utilizar-se uma cânula mamária (com a extremidade cega), mas neste caso a sua
introdução é feita após a incisão da pele (anestesiada localmente) e linha branca com um
bisturi, ao longo de cerca de 1 cm de comprimento (Thomassian, 1996).
Em poldros há maior risco de laceração intestinal ou mesentérica, devido à tendência destes
animais para não pararem quietos. Por isso, em poldros é recomendada a utilização de uma
cânula com extremidade cega. A probabilidade de enterocentese durante a
abdominocentese em poldros, aumenta significativamente com a presença de distensão
intestinal. Por isso é preferível realizar uma ultrassonografia prévia, para localizar as zonas
de acumulação de fluido peritoneal e facilitar a selecção adequada do local de punção. Se
necessário, a abdominocentese pode ser realizada com o animal em decúbito lateral
(Chaffin, 1999).
A amostra é colhida para um tubo de ensaio contendo ácido etilenodiamino tetra-acético
(EDTA) e as suas características macroscópicas podem ser imediatamente observadas: cor
(deve ser amarelo claro), turgidez (o líquido peritoneal deve ser transparente), odor e
presença ou ausência de fibrina ou material fecal. Com a utilização de uma “fita de
urianálise” pode-se ainda estimar a glicose, as proteínas (normal abaixo de 2,5 g/dl) e o pH
da amostra. Laboratorialmente pode realizar-se a contagem de eritrócitos (até 4000
hemácias/mm3 a 6000 hemácias/mm3 é normal), as contagens total e diferencial de
leucócitos (intervalos normais representados na tabela 3), as proteínas totais (PT) (inferior a
2,5 g/dl), o fibrinogénio (abaixo de 10 mg/dL pela técnica de precipitação pelo calor), o
lactato (deve ser de 3 mg/dL a 9 mg/dL e é útil quando equiparado aos níveis de lactato
sanguíneo), coloração Gram e cultura do líquido, desde que tenha sido colhido num tubo ou
seringa esterilizados (Thomassian, 1996).

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Tabela 3: Valores normais de leucócitos presentes no líquido peritoneal
Leucócitos totais Células mononucleadas Neutrófilos Linfócitos Eosinófilos
3
< 5000/mm 7% a 45% 45% a 70% 4% a 20% 0% a 2%
Adaptado de “Enfermidades dos cavalos” Thomassian, 1996.

Os níveis de lactato peritoneal auxiliam o estabelecimento do prognóstico (Basoglu, 2005).


Vários estudos mostraram que a identificação de fosfato alcalino, lactato e hemoglobina
elevados no fluido peritoneal, são métodos sensíveis para a identificação de lesões por
estrangulamento intestinal, numa fase precoce da doença. No entanto, estes parâmetros
não são usualmente medidos no fluido peritoneal (Fehr, 2007c). A tabela 4 representa a
relação entre a concentração de fosfato no líquido peritoneal e a necessidade cirúrgica.

Tabela 4: Relação entre a concentração de fosfato e a necessidade cirúrgica


Cavalo Cólica Cólica cirúrgica Cólica cirúrgica
normal médica (sem enterectomia) (com enterectomia)
Concentração de 0,94
0,9 mmol/l 0,96 mmol/l 1,48 mmol/l
fosfato no fluido mmol/l
(± 0,07) (± 0,09) (± 0,11)
peritoneal (± 0,09)
Concentração de
0,88 mmol/l 0,9 mmol/l 0,9 mmol/l 1,24 mmol/l
fosfato no soro
(± 0,07) (± 0,07) (± 0,07) (± 0,1)
sanguíneo
Adaptado de "The equine hospital manual",Corley & Stephen, 2008.

Animais com obstrução por estrangulamento apresentam com frequência o volume do


líquido peritoneal aumentado, serosanguinolento e turvo com as PT elevadas, eritrócitos e
células nucleadas (com mais de 90 % neutrófilos não-degenerados). Por outro lado, cavalos
com enterite proximal, apresentam-se com PT aumentadas mas com a concentração de
células nucleadas normal ou apenas ligeiramente aumentada. Fluido de cavalos com
obstrução sem estrangulamento tem marcado aumento na concentração das células
nucleadas (superior a 100.000 células/L, com mais de 95% de neutrófilos), com elevação
variável das PT e dos eritrócitos. A presença de bactérias observadas no exame citológico
indica permeabilidade da parede do intestino comprometido, perfuração intestinal, peritonite
primária ou enterocentese (Moore, 2006; White II, 2006d).
A paracentese abdominal pode ser repetida a cada duas horas, se necessário, para
monitorizar a evolução do processo abdominal. Deve sempre confrontar-se os dados obtidos
na análise do fluido peritoneal com os sinais clínicos e a evolução do caso (Thomassian,
1996). Quando o resultado à análise do fluido peritoneal é normal e os sinais físicos
sugerem a necessidade de cirurgia, podem ainda não ter ocorrido alterações intestinais ou
pode ser muito cedo no processo patológico para as alterações do fluido abdominal serem
detectáveis (White II, 2006d).

20
A análise ao fluido peritoneal nunca deve ser utilizado isoladamente para decidir a
necessidade cirúrgica, pois a espera pelas alterações pode atrasar a cirurgia e diminuir a
taxa de sobrevivência (White II, 2006d).
Apesar de ser de bastante utilidade, esta técnica torna-se desnecessária quando os demais
sinais clínicos demonstram a necessidade cirúrgica, devendo o reencaminhamento do
animal para cirurgia, ser feito quanto antes (Freeman, 2005b).

1.3.2 – Hemograma
O hemograma é constituído por uma série de testes laboratoriais, nomeadamente:
• Contagem de eritrócitos: em casos de cólica tem pouco valor de diagnóstico e de
prognóstico (Thomassian, 1996);
• Hematócrito (HT): útil para calcular a taxa de desidratação, o seu valor é muito
variável em função da raça e tipo de trabalho do animal, sendo valores entre 30% e
44%, considerados normais. Preferencialmente, o HT é utilizado e interpretado
conjuntamente com as PT (Thomassian, 1996);
• Leucograma: é comum apresentar-se normal na fase inicial do processo, ou com
ligeiras alterações com leucopénia ou leucocitose. A utilidade do leucograma prende-
se à avaliação do grau de endotoxémia, comprometimento da parede intestinal ou
peritonite. Leucopénia com neutropénia e linfopénia reflecte uma situação
endotoxémica (Thomassian, 1996), causada mais frequentemente por colite ou
peritonite do que por obstrução ou estrangulamento, pelo menos nas fases inicias do
processo (White II, 2006d); leucopénia ocorre também devido à migração de
neutrófilos para um foco inflamatório extenso, como em casos de enterite proximal,
torções, deslocamentos e peritonite aguda. Em alguns casos de necrose gradual da
parede intestinal, como nas impactações do cólon com desenvolvimento de
peritonite, está presente neutrofilia (Thomassian, 1996). A execução do leucograma
pode ainda ser útil como indicador prognóstico (Basoglu, 2005).

1.3.3 – Proteína plasmática total (PT)


Utilizada principalmente para a avaliação do grau de desidratação, é avaliada em conjunto
com os valores de hematócrito. 5,5 g/dL a 7,5 g/dL de PT é considerado normal e pode
ocorrer nas fases iniciais do desconforto abdominal agudo, cuja etiologia e gravidade não
conduzam a grandes alterações na volémia ou perda de proteínas para a cavidade
abdominal (Thomassian, 1996).
HT aumentado associado a PT normais, reflecte contracção esplénica devido a stress.
Elevação do HT e das PT simultaneamente é indicador de desidratação. Já HT elevado com
PT diminuídas ocorre quando há perda de proteínas no lúmen intestinal (inflamação severa
21
ou doença isquémica da mucosa intestinal) ou para a cavidade peritoneal (peritonite)
(Thomassian, 1996; Freeman, 2003b).
Aumento das PT pode também ser encontrado em processos inflamatórios crónicos, que
estimulam a produção de globulinas, elevando as PT (Thomassian, 1996).
Para a avaliação laboratorial prática do grau de desidratação consideram-se os seguintes
valores (Thomassian, 1996):
• HT 50%, PT 8 g/dl – 6% desidratação (leve)
• HT 55%, PT 9 g/dl – 8% desidratação (moderada)
• HT 60%, PT 10 g/dl – 10% desidratação (severa)

1.3.4 – Equilíbrio hidroelectrolítico e ácido-base (gases sanguíneos)


A avaliação do equilíbrio ácido-base e hidroelectrolítico e dos gases sanguíneos é
imprescindível ao adequado maneio do paciente com desconforto abdominal. Praticamente
todas as doenças com sede no tracto GI levam a um desequilíbrio no pH, no bicarbonato, no
sódio, no cloro e no potássio, que quando não são corrigidos adequadamente podem ser
fatais. Para compensar estes desequilíbrios o organismo activa sistemas de compensação
(sistemas tampão) cuja finalidade é compensar e corrigir as alterações detectadas pelo
próprio organismo (Thomassian, 1996).
A dinâmica dos fluidos corpóreos é regida pelas leis da isosmolaridade e da
electroneutralidade e as deslocações da água e dos electrólitos é feita de forma a manter a
osmolaridade constante. Fluidos hipertónicos ocasionam movimento positivo de água,
levando ao deslocamento da água neste sentido, quando há conteúdo hipertónico no lúmen
intestinal (como ocorre numa obstrução) ou nas dilatações gástricas (pois o conteúdo
gástrico também é hipertónico) (Thomassian, 1996).
Fisiologicamente, o íleo recebe cerca de 40 L de fluidos que são eficientemente absorvidos
num processo dinâmico pelo IG, sendo esta secreção e absorção líquida, de importância
primordial na manutenção do volume do líquido extracelular. O IG contem 75% do volume
de água total do tracto GI e cerca de 95% deste volume é regularmente absorvido. Em 24 h,
o IG recebe um volume de líquido aproximadamente igual ao volume total do líquido
extracelular. Por isso, as alterações que desencadeiam falhas na absorção deste fluido
levam a perdas significativas no líquido circulante, podendo desencadear hipovolémia e
precipitando em alguns casos o choque hipovolémico (Thomassian, 1996).
Apesar das grandes quantidades de fluido perdidas para o lúmen intestinal nas obstruções
intestinais baixas, geralmente a concentração dos electrólitos encontra-se normal (com a
obstrução do fluxo líquido o intestino torna-se progressivamente distendido, a pressão
intraluminal aumenta e causa redução do fluxo de água e sódio para o sangue;
simultaneamente ocorre aumento do aporte sanguíneo para a mucosa, que com o retorno
venoso prejudicado devido ao aumento da pressão intraluminal resulta em edema da parede
22
que leva a uma inversão da função das células da mucosa intestinal). Nas obstruções por
estrangulamento há perda significativamente rápida de fluido contendo electrólitos e
proteínas, que juntamente com a lesão vascular, pode levar a choque hipovolémico e a
acidose metabólica (Thomassian, 1996).
Os principais iões plasmáticos avaliados num paciente com cólica são:
• Sódio: é o principal catião do líquido extracelular e regula a osmolaridade e o volume
do líquido extracelular; a sua concentração normal encontra-se entre 132 mEq/L e
155 mEq/L; os seus níveis sanguíneos resultam do equilíbrio entre ingestão,
secreção e absorção no tracto GI, aliados à excreção renal e sudorese;
hipernatrémia é visível em dilatações gástricas por ingestão excessiva de alimento
hiperosmótico ou em impactação do cólon maior; a concentração de sódio
intraluminal é semelhante à do plasma, pelo que a concentração sódica plasmática é
utilizada para a determinação da natureza da desidratação (hipo, iso ou hipertónica).
• Potássio: é o principal catião do fluido intracelular; a manutenção dos níveis
sanguíneos de potássio é realizada através da ingestão, absorção intestinal e perdas
na urina, suor e fezes; o potássio está directamente relacionado com o potencial da
membrana plasmática, sendo um dos principais iões responsáveis pela condução do
impulso neuromuscular (grandes alterações na sua concentração plasmática,
atingem directamente a função do miocárdio); os valores normais de potássio variam
entre 2,4 mEq/L e 6,7 mEq/L; em enterites, a “inflamação” da mucosa intestinal leva
a secreção activa de electrólitos e água para o lúmen intestinal, ocorrendo grandes
perdas de potássio; já as obstruções intestinais simples sem comprometimento
vascular, levam a perdas de potássio pelo comprometimento na absorção; nas
obstruções intestinais com comprometimento vascular as perdas ocorrem não só
pelo comprometimento da absorção, mas ainda pela secreção intraluminal.
• Cloro: é o anião extracelular mais abundante; valores de concentração normal
oscilam entre 95 mEq/L e 111 mEq/L; geralmente, desequilíbrios primários de cloro
são acompanhados por mudanças compensatórias de bicarbonato (quando se inicia
uma hipoclorémia o bicarbonato plasmático aumenta na mesma proporção);
hipoclorémia pode ocorrer quando há grande volume de refluxo gástrico (espasmo
pilórico ou lavagem gástrica abundante e contínua); processos que causem
comprometimento na absorção do cloro (patologias na porção final do ID) podem
resultar em hipoclorémia (Thomassian, 1996).
No que diz respeito ao pH, o seu valor sanguíneo, fisiologicamente, é mantido dentro de
limites paramétricos estreitos (7,35 a 7,45). Alterações primárias no pH são observadas
praticamente em todas as patologias do tracto gastroentérico e estão directamente
relacionadas com as perdas iónicas de hidrogénio ou bicarbonato para o lúmen intestinal
(Thomassian, 1996).
23
Nas obstruções gástricas primárias o fluido gástrico tem pH de 4 a 5, portanto há depleção
de iões de hidrogénio e cloreto, havendo tendência para o estabelecimento de alcalose e
hipoclorémia. A elevação ou redução dos níveis de bicarbonato possui relação directa com o
pH sanguíneo e os seus níveis séricos variam entre 22 mEq/L e 26 mEq/L. Valores
superiores ou inferiores a estes traduzem estados de alcalose ou acidose, respectivamente
(Thomassian, 1996).
Grande quantidade de solução tampão é secretada pelo pâncreas e ducto biliar, para
neutralizar o pH ácido do conteúdo gástrico, havendo depleção de iões bicarbonato nas
obstruções de ID, o que geralmente resulta em acidose metabólica. A dor intestinal por si só,
pode induzir maiores perdas de bicarbonato pela estimulação vagal do pâncreas, que
aumenta a sua secreção até 5 vezes. Nos processos obstrutivos do IG, a absorção de iões
bicarbonato secretados no ID fica comprometida, originando um défice de bicarbonato
sérico, o que desencadeia acidose metabólica. Quando há comprometimento vascular em
patologias obstrutivas, ocorre interrupção da função de absorção, pelo que o aumento da
pressão intraluminal promove a secreção de fluidos e electrólitos da circulação para a luz
intestinal, ocorrendo sequestro de fluido rico em bicarbonato, o que gera também acidose
metabólica (Thomassian, 1996).
A avaliação do equilíbrio ácido-base deve ser realizada concomitantemente com a análise
dos gases sanguíneos (hemogasometria) e quando analisadas em conjunto e com a
concentração de bicarbonato circulante, permitem estabelecer o equilíbrio ácido-base, as
condições metabólicas e a participação dos sistemas tampão do organismo animal. O
sangue para hemogasometria deve ser arterial, sendo recomendada a sua colheita ao nível
da Artéria carótida externa direita, com uma seringa heparinizada e vedada com uma rolha
de borracha de modo a impedir o contacto do sangue com o ar ambiente. Este sangue pode
permanecer até duas horas em condições de refrigeração (4 ºC a 5 ºC), sem que ocorram
alterações dos seus valores. É útil a determinação laboratorial da pressão parcial de
oxigénio (PaO2), da pressão parcial de dióxido de carbono (PaCO2), do pH, do excesso de
base (BE), e do bicarbonato. As alterações ácido-base ocorrem por aumento ou diminuição
do ácido carbónico e do bicarbonato, principalmente (Thomassian, 1996).
Acidose metabólica é o desequilíbrio mais frequentemente observado em cavalos com
cólica, devido à redução do bicarbonato sanguíneo. A acidose será tão severa quanto mais
esgotado estiver o organismo, principalmente nos processos obstrutivos e em decorrência
de colapso circulatório consequente ao choque (Thomassian, 1996). No entanto, alcalose
metabólica pode ser encontrada por perda de ácido gástrico, devido a refluxo intenso (White
II, 2006d).

24
1.3.5 – Outros parâmetros sanguíneos
Para além dos parâmetros sanguíneos acima expostos, há outros parâmetros que se
mostram relevantes aquando da avaliação de um paciente com cólica, nomeadamente o
fibrinogénio plasmático, o lactato sanguíneo e as enzimas séricas para avaliação das
funções renal e hepática.
A concentração de fibrinogênio plasmático é um indicador não específico de diagnóstico e
prognóstico de processos inflamatórios em equinos (Montello, 2004). Valores abaixo de 400
mg/dL são considerados normais, enquanto os valores medidos acima de 400 mg/dL
sugerem presença de foco inflamatório (Thomassian, 1996) e é um bom indicador
prognóstico em cavalos com cólica (Basoglu, 2005).
Com bastante valor prognóstico (Thomassian, 1996; Basoglu, 2005) e para a decisão de
necessidade cirúrgica, o lactato sanguíneo é um dado importante a avaliar num paciente de
cólica. Em animais em repouso, são considerados normais valores abaixo de 10 mg/dL.
Quantidades de lactato entre 10 mg/dL e 75 mg/dL, são indicativas de acidose láctica
resultante de metabolismo anaeróbico. Valores de lactato sanguíneo que se encontram
entre 76 mg/dL e 100 mg/dL são fortes indicativos de alteração intestinal grave. Apenas
cerca de 30% dos animais nesta situação sobrevivem ao tratamento cirúrgico. Quando o
lactato sanguíneo está situado acima de 100 mg/dL, a acidose láctica é resultante de
choque severo com endotoxémia severa e com alterações irreversíveis. O prognóstico nesta
situação é extremamente reservado (Thomassian, 1996).
As enzimas séricas avaliadas num cavalo com cólica, servem para avaliar a função renal e a
função hepática. A avaliação da função renal é importante, pois permite diferenciar se a
etiologia do desconforto é de origem renal e permite também estabelecer o grau de
comprometimento renal, devido à desidratação que pode ser prolongada e severa. Para tal,
são doseadas a ureia (normal até 47 mg/dL) e a creatinina (fisiologicamente estão presentes
valores de 1,0 mg/dL a 1,9 mg/dL). Se estes valores se encontram aumentados e assim
permanecem mesmo após reposição hídrica adequada, pode considerar-se que há
comprometimento renal, sendo recomendada a realização de urianálise para
complementação do exame (Thomassian, 1996).
Uma vez que a cólica pode ter como origem processos localizados no fígado, a análise dos
níveis sanguíneos de aspartato-aminotransferase (AST), de sorbitol-desidrogenase e de
gama glutamil transferase (GGT) permitem avaliar o grau de envolvimento hepático.
Elevação dos valores normais de sorbitol-desidrogenase (normal de 3 UI/L a 14 UI/L) está
presente em doença hepática aguda com lesão de hepatócitos acompanhada de icterícia. A
GGT (fisiologicamente com valores entre 11 UI/L e 44 UI/L) encontra-se elevada na
presença de colelitíase com obstrução biliar, lesões na rede biliar e pancreatite. Para a AST,
os valores normais são de 153 UI/L a 411 UI/L. Para auxiliar a avaliação da função hepática
pode-se ainda dosear a bilirrubina, que permite diagnosticar icterícia subclínica. Os valores
25
de normalidade de bilirrubina situam-se entre 0,1 mg/dL e 2,5 mg/dL; a bilirrubina indirecta
normal é em torno de 0,22 mg/dL e a directa entre 0,1 mg/dL e 0,3 mg/dL (Thomassian,
1996).

1.4 – Outros exames complementares


Para além dos exames laboratoriais, outros exames, nomeadamente imagiológicos, podem
e devem ser realizados num animal com cólica e na sua maioria, permitem diminuir a lista
de diagnósticos diferenciais ou mesmo por vezes estabelecer o diagnóstico definitivo, sendo
bastante úteis na realização da avaliação da necessidade cirúrgica. No entanto, caso os
sinais clínicos e outros exames realizados indiquem a presença de uma cólica cirúrgica, o
animal deve ser imediatamente encaminhado para a cirurgia, evitando gastar tempo e
recursos com mais exames. Os exames complementares referenciados em seguida, são o
ecográfico, radiográfico, endoscópico e laparoscópico.

1.4.1 – Exame ecográfico


A ecografia abdominal é uma técnica imagiológica que providencia várias informações,
assim como a visualização não invasiva dos órgãos abdominais e vísceras GI, que noutras
condições seriam difíceis de examinar (Reef, 2003). Tal como a abdominocentese, o exame
ecográfico permite a avaliação de partes do abdómen cujo exame não foi possível através
da palpação rectal. Pode ser realizada uma ultrassonografia transrectal ou uma
ultrassonografia percutânea. A distensão do ID, espessura da parede intestinal, mobilidade
intestinal e fluido abdominal excessivo podem ser avaliados através da ecografia abdominal.
Imagens satisfatórias por avaliação transabdominal podem ser obtidas com sondas de
frequência 3,5 e 5 MHz e são preferíveis sondas de matriz linear microconvexa (Gaughan,
2006; Moore, 2006).
Através da ecografia abdominal é possível diagnosticar estrangulações intestinais,
peritonites, intussuscepções (jejuno-jejunal, ileocecal, cecocólica e ceco-cecal),
deslocamentos e ainda encarceramento nefro-esplénico do cólon maior, efusão peritoneal,
hérnia diafragmática, inguinal e escrotal, colelitíase, ruptura da bexiga, impactação por
ascarídeos e neoplasia abdominal. Para o diagnóstico de enterolitíase a utilização de um
ecógrafo não é muito esclarecedora, porque os enterólitos são facilmente confundidos com
sombras gasosas (Freeman, 2003b).
O exame ecográfico pode ser muito útil em poldros. (Freeman, 2003b). Tendo em conta as
pequenas dimensões do abdómen de um poldro, a sua visualização ecográfica é possível
mesmo com o uso de matrizes lineares comummente disponíveis nos aparelhos portáteis
utilizados na prática equina, com transdutores de 7,5 MHz ou de 5,0 MHz (Reef, 2003;
Bohanon, 2005; Hardy, 2008).

26
Uma vez que o acesso ecográfico de todo o abdómen de um equino, gastaria tempo
precioso num animal em estado grave e com urgente necessidade cirúrgica, a
ultrassonografia abdominal localizada rápida de cavalos (FLASH – fast localized abdominal
sonography of horses) mostrou resultados que a caracterizam como uma técnica simples e
rápida para avaliação de patologias cirúrgicas em animais com cólica. A FLASH é
constituída pela observação de sete pontos específicos, sem prévia tricotomia da zona:
1. Abdómen ventral (do cranial ao caudal);
2. Janela gástrica (aproximadamente o 10º espaço intercostal, no terço médio do
abdómen);
3. Janela nefro-esplénica (aproximadamente no 17º espaço intercostal esquerdo, entre
os terços dorsal e médio do abdómen);
4. Terço médio do abdómen esquerdo;
5. Janela duodenal (aproximadamente 14º e 15º espaços intercostais, na parte dorsal
do terço médio do abdómen);
6. Abdómen médio direito;
7. Janela torácica (tórax direito ventral cranial).
Nestes sete pontos é possível a verificação de: presença de líquido livre, avaliação do rim
esquerdo, observação das ansas do ID dilatadas e túrgidas (obstrução do ID) ou ansas do
ID cheias de fluido não túrgido, avaliação da motilidade intestinal e avaliação da qualidade
do conteúdo do IG. Os resultados desta técnica ecográfica foram bons (medidos através da
comparação entre os achados ecográficos e os achados durante a cirurgia ou necropsia) e o
tempo dispendido na mesma variou de 7 min a 17 min, com uma média de 10,7 min (Busoni
et al, 2007).
Uma vez que se trata de uma técnica segura, não invasiva, rápida e confiável, exigindo
equipamento geralmente já existente em hospitais veterinários e centros de referência, o
seu uso é já frequente na avaliação de cavalos com cólicas em todo o mundo e a tendência
é o aumento da sua utilização, pois a informação obtida pode levar a uma decisão imediata
entre tratamento médico ou cirúrgico, o que contribui para a melhoria dos resultados
(Desrochers, 2005).

1.4.2 – Exame radiológico


O exame radiológico é de bastante utilidade na avaliação de poldros com desconforto
abdominal, uma vez que estes animais são de avaliação mais complicada, por não ser
possível a realização de palpação rectal (Freeman, 2003b). E apesar de mesmo nos poldros
a realização de ecografias praticamente ter substituído as radiografias na avaliação de
patologias do ID, o exame radiográfico continua a ser utilizado para o diagnóstico de
doenças obstrutivas do cólon maior (Hardy, 2008).

27
Devido à grande dimensão do abdómen equino raramente se realizam radiografias
abdominais em adultos, no entanto, estas podem ser de bastante utilidade quando há
suspeita da presença de enterólito ou impactação por areia (Moore, 2006).
Para minimizar o efeito de movimento, recomenda-se a utilização de grade, ecrã
fluorescente e potência de 5 mA a 28 mA e 75 kV a 95 kV (Chaffin, 1999). Devido à
alteração da posição do gás e fluido em função da posição, é recomendado obter
radiografias do animal em estação e em decúbito direito e esquerdo sempre que possível,
para melhor e mais fácil interpretação. Tal como outros exames, o raio X deve ser
interpretado juntamente com os demais sinais clínicos (Chaffin, 1999).
As enterites, peritonites e obstruções do ID, são vistas sob a forma de múltiplas interfaces
intraluminais gás/fluido, devido à presença de gás que provoca distensão do ID. Por sua
vez, o IG dilatado e por vezes deslocado pode ser visível em casos de impactações por
mecónio e vólvulos ou deslocamentos do IG (Bohanon, 2005).
Para além de radiografias simples, a execução de radiografias de contraste poderá ser útil
em alguns casos, pois permite a localização de obstruções. Podem ser utilizados enemas de
bário ou radiografias seriadas para avaliar o tracto GI superior, após administração de uma
suspensão de bário, através da sonda nasogástrica (citado por Chaffin, 1999).

1.4.3 – Endoscopia
O exame endoscópico em animais adultos, é facilmente realizado com um vídeo-endoscópio
flexível com 3 m de comprimento e permite a visualização do esófago, estômago, piloro e
duodeno proximal. A endoscopia permite o diagnóstico definitivo de impactação gástrica,
ulceração, carcinoma das células escamosas, e ingestão de corpos estranhos que tenham
permanecido no estômago. É útil também para a avaliação da resposta dos animais a
tratamento anti-úlceras, através da realização de endoscopias seriadas (Freeman, 2003b).
Em animais com sinais de cólica crónica ou recorrente, muitas vezes podem estar presentes
úlceras gástricas. No entanto, há que ter em atenção o facto de por vezes as úlceras
gástricas serem secundárias, podendo estar presente concomitantemente outra patologia
GI, que pode ser o problema primário (Freeman, 2003b).

1.4.4 – Laparoscopia
A laparoscopia deve ser realizada após se esgotarem os demais exames complementares,
para a elaboração do diagnóstico diferencial da cólica de origem GI (Thomassian, 1996) e
permite explorar áreas de difícil visualização até durante a laparotomia (Rijkenhuizen, 2002).
É um procedimento relativamente rápido e pouco invasivo, pelo que as complicações pós-
cirúrgicas (como infecções) são reduzidas.

28
A laparoscopia transparietal é realizada com o animal em estação e sob anestesia local da
fossa paralombar esquerda e permite visualizar o ligamento nefroesplénico, o baço, a
gordura peri-renal, a face dorsal do estômago, o diafragma e o fígado quando direccionado
cranialmente. Posicionando o laparoscópio caudalmente é visível o cólon menor, o cólon
dorsal esquerdo, o ID, a flexura pélvica, o anel inguinal esquerdo, o ovário, o corno uterino
esquerdo, a bexiga e a face esquerda da parede do recto (Thomassian, 1996).
A laparoscopia transparietal à direita permite a visualização da base do ceco, da raiz do
mesentério, do duodeno descendente, do lobo direito do fígado, do tecido adiposo peri-renal
direito e do diafragma quando o laparoscópio está posicionado em direcção cranial.
Direccionando-se o laparoscópio caudalmente, é possível a observação do ID, do cólon
maior direito, do cólon menor, do recto, do anel inguinal direito, do ovário e do corno uterino
direitos e da bexiga urinária (Thomassian, 1996).
As grandes limitações desta técnica prendem-se ao facto de a sua realização estar restrita
aos grandes hospitais veterinários (e em Portugal mesmo nesses poderá não ser possível a
sua realização) devido ao alto custo dos utensílios necessários para a sua execução
(Thomassian, 1996) e por não ser possível visualizar todo o abdómen apenas com um
acesso, sendo necessário realizar vários acessos em várias zonas para conseguir explorar
as diferentes partes da cavidade abdominal do cavalo (Rijkenhuizen, 2002).
Infelizmente, na grande maioria dos casos, a laparoscopia acaba por preceder a laparotomia
exploratória (Thomassian, 1996).

29
2 – CIRURGIA
Embora a cirurgia a animais com cólica fosse considerada desesperante há 60 anos atrás,
actualmente é uma cirurgia que pode salvar cavalos de doenças devastadoras e
proporcionar-lhes excelentes prognósticos para uma longa vida livre de recorrências e
complicações. Apesar disso, as cólicas continuam a ser consideradas pelas companhias de
seguros, proprietários e médicos veterinários, como a principal preocupação na saúde
equina e continuam a liderar as causas de morte em cavalos (Freeman, 2005a).
A laparotomia pode ser realizada ao nível da linha média ventral ou ao nível das fossas
paralombares, mas pelas limitações e baixa frequência de utilização da laparotomia pela
fossa paralombar (direita ou esquerda), apenas a laparotomia pela linha média ventral será
descrita.
Uma cirurgia a um cavalo com cólica pressupõe, tal como noutros tipos de cirurgia, que o
animal se encontre sob anestesia geral e isso acarreta riscos associados. Um cavalo em
boas circunstâncias, quando sujeito a anestesia geral, corre um risco de mortalidade que
varia de 0,6% a 1,8%. Num cavalo com cólica, esse risco de morte anestésica sobe para 5%
devido ao comprometimento funcional presente (Mosley, 2005).
A estatística associa o aumento significativo da mortalidade ao aumento da idade, longa
duração da anestesia, anestesia urgente e anestesia realizada fora das horas normais de
trabalho. A taxa de mortalidade também aumenta significativamente em animais com HT
superior a 45% antes da anestesia. A desidratação e o aumentado do HT estão também
relacionados com o aumento do risco de desenvolvimento de ileo pós-cirúrgico. Estes
achados indicam que uma falha na manutenção fisiológica normal antes e durante a
anestesia podem influenciar os resultados. As principais alterações com importância no
aumento do risco anestésico em cavalos com cólica são (Trim, 2005):
• Hipovolémia: o aumento do HT antes da anestesia pode dever-se em parte à
contracção esplénica que ocorre devido à libertação de catecolaminas, mas também
se deve à diminuição do volume sanguíneo. Hipotensão e FC diminuída são
prováveis ocorrências durante a anestesia, como resultado do impacto adverso dos
agentes anestésicos administrados para a indução, na função CV. A redução do
débito cardíaco e da pressão sanguínea arterial podem ser atenuados pela
administração de solução de lactato ou acetato de Ringer, na dose de 20 mL/kg p.v.,
ou de solução hipertónica salina a 7,5%, na dose de 4 mL/kg p.v., antes da indução
anestésica (Trim, 2005).
• Desequilíbrios electrolíticos: a hipocalcémia pode ser identificada antes da cirurgia
através de testes laboratoriais. Pode resultar em depressão do SNC e aumenta o
risco de hipotensão e de bloqueio cardíaco durante a anestesia. O tratamento inicial
pode incluir a administração de gluconato de cálcio a 23%, 0,5 mL/kg p.v., antes da

30
indução anestésica. A hipocalcémia leva com frequência a fraqueza muscular que
interfere com a capacidade de o animal se levantar após a recuperação da anestesia
geral. Em animais com hipocalcémia, a susceptibilidade a arritmias cardíacas
encontra-se aumentada e o risco de ileo pós-cirúrgico potencializado (Trim, 2005).
• Endotoxémia: baixos níveis de endotoxinas podem inicialmente resultar em choque
hiperdinâmico devido ao aumento de catecolaminas em circulação. O exame físico
destes cavalos revela aparência de função circulatória adequada, uma vez que as
membranas mucosas estão rosa brilhante devido à diminuição da resistência
vascular sistémica, o pulso arterial periférico está forte e o TRC é inferior a 1 seg. Os
requerimentos anestésicos podem ser relativamente normais nesta fase, mas a
função CV pode deteriorar-se rapidamente após a indução anestésica. Fases mais
avançadas de endotoxémia ou altas concentrações de endotoxinas são
acompanhadas por redução da contractilidade e débito cardíacos, pressão
sanguínea arterial e perfusão periférica (Trim, 2005). Sinais clínicos incluem FC
superior a 60 bpm, membranas mucosas congestionadas, TRC aumentado
(Blikslager, 2005c) e pulso arterial fraco. O aumento do volume sanguíneo e a
diminuição das doses de agentes anestésicos para pré-medicação e indução da
anestesia são muito importantes nestes animais. As consequências da endotoxémia
incluem a diminuição progressiva da pressão sanguínea arterial e da oxigenação
arterial (diminuição da PaO2) e acidose metabólica (Trim, 2005).
• Pressão abdominal aumentada: a distensão abdominal reduz o débito cardíaco em
animais anestesiados. O compromisso ventilatório criado pela distensão intestinal é
exacerbado pelo posicionamento do animal em decúbito dorsal (posição em que é
executada a cirurgia). Após a ligação do animal à máquina de anestesia volátil, é
recomendada a ventilação controlada para permitir a manutenção de uma PaO2 mais
elevada, do que aconteceria com a ventilação espontânea (Trim, 2005).
Antes da anestesia do animal, é por isso imprescindível a estabilização dos parâmetros
vitais do mesmo, providenciando suporte CV, ao assegurar um volume sanguíneo circulante
adequado, pela administração de fluidos (Trim, 2005).
O animal deve ser encaminhado para cirurgia quando está presente:
• Obstrução intraluminal do ID sem comprometimento vascular;
• Obstrução do ID com comprometimento vascular (vólvulos, torções, intussuscepção,
encarceramento no forâmen mesentérico e hérnia inguino-escrotal);
• Impactação do ceco;
• Obstrução sem comprometimento vascular do cólon maior (impactação, retro e
destroflexão e enterolitíase);
• Obstrução com comprometimento vascular do cólon maior (torções, encarceramento
no ligamento nefro-esplénico e deslocamentos graves);
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• Obstrução do cólon transverso e do cólon menor (enterolitíase e impactações);
• Compressão extra-luminal (por massas neoplásicas);
• Obstrução intra-luminal inespecífica.
Está também indicado tratamento cirúrgico sempre que não haja diagnóstico clínico
definitivo mas trata-se de uma cólica súbita sem suspeita clínica, está presente dor que não
responda à medicação, há rápida deterioração do estado geral do animal, estado circulatório
e dor intermitentes, FC elevada e pulso fraco (que não respondem ao tratamento médico),
mucosas e conjuntivas congestionadas com aumento do TRC, hipotonia ou ausência de
sons abdominais, refluxo nasogástrico superior a 2 L ou anormalidades no líquido peritoneal
que indiquem terapêutica cirúrgica (Thomassian, 1996).
Valores de FC superiores a 100 bpm, FR acima de 60 movimentos por minuto, TRC maior
que 8 seg, HT acima dos 60%, pH sanguíneo inferior a 6,8 ou superior a 7,8, PaO2 inferior a
30 mmHg e PaCO2 superior a 95 mmHg e lactato superior a 100 mg/dL, levam a alterações
irreversíveis, baixa probabilidade de recuperação e mau prognóstico (Thomassian, 1996).
O prognóstico para um paciente com cólica cirúrgica, depende sempre de diversos factores,
mas os de maior importância são a condição geral do paciente quando é encaminhado para
a cirurgia, assim como o tipo e localização das lesões (Martens, 2004).

2.1 – Anestesia
Em cavalos com cólica, é comum estar presente dor, distensão abdominal, desidratação,
disfunção CV e respiratória, desequilíbrios ácido-base, electrolíticos e dos gases sanguíneos
e tais parâmetros devem ser medidos e de preferência estabilizados antes de se dar inicio à
anestesia (Mosley, 2005).
A estabilização do animal e normalização dos parâmetros acima referidos pode ser
conseguida através da entubação nasogástrica, da trocaterização percutânea, da
fluidoterapia, da administração de AINE’s, α-2 agonistas ou opióides (para controlo da dor) e
da administração de factores anti-coagulantes, AINE’s e soros anti-toxémicos (para
combater a coagulação intravascular disseminada (CID) e a endotoxémia) (Thomassian,
1996; Mosley, 2005).
Para indução anestésica, é frequente a utilização de combinações anestésicas envolvendo:
• Acepromazina (tranquilizante fenotiazínico);
• α-2 agonistas (xilazina, detomidina; depressores do SNC com acção sedativa,
analgésica e miorrelaxante);
• Diazepam (tranquilizante benzodiazepínico, relaxante muscular, sedativo e anti-
convulsivo);
• Butorfanol (analgésico opióide);
• Tiopental (anestésico barbitúrico de acção ultra-curta);

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• Guaifenesin (relaxante muscular de acção central com propriedades sedativas e
analgésicas);
• Quetamina (anestésico dissociativo, não barbitúrico) (Mosley, 2005).
Nenhum dos anestésicos quando utilizado individualmente, demonstrou vantagens
comparativamente com as associações e a associação de diferentes anestésicos permite
capitalizar os efeitos aditivos de cada agente, reduzindo simultaneamente os efeitos
adversos particulares, associados a cada fármaco. No entanto é recomendado que cada
anestesista utilize a técnica anestésica com a qual se encontra mais familiarizado (Mosley,
2005). Um exemplo de protocolo de indução anestésica está representado na tabela 5.

Tabela 5: Exemplo de protocolo para indução anestésica em equinos


Nome do medicamento Dose Observações
Xilazina 1,1 mg/kg EV Pré-anestesia
Butorfanol 0,02 mg/kg EV Pré-anestesia
Diazepam 0,05 mg/kg EV lenta Indução
Quetamina 2,2 mg/kg EV Indução
Adaptado de "Anesthesia for the colic patient" Trim, 2005.

O efeito vasodilatador da acepromazina não é desejado num animal que se encontra


hipovolémico, pelo que este fármaco é geralmente evitado em cavalos com cólica (Mosley,
2005). A inclusão do butorfanol na pré-anestesia permite a redução da dose de xilazina e
proporciona relaxamento muscular durante a indução (Trim, 2005). Administração de
diazepam simultaneamente com a quetamina permite diminuir a incidência de um estado de
convulsão provocado pela quetamina (Riebold et al, 1995).
A manutenção da anestesia é realizada geralmente com a utilização de anestésico volátil
com fornecimento de oxigénio suplementar através de um tubo endotraqueal com “cuff”. A
colocação do tubo endotraqueal e a insuflação do cuff são realizadas imediatamente após a
indução anestésica e o derrube do cavalo numa boxe de indução (boxe com o chão e
paredes almofadadas). O isoflurano e o sevoflurano são os anestésicos voláteis
preferenciais, pois causam menor depressão do débito cardíaco do que doses equivalentes
de halotano. No entanto tanto o isoflurano como o sevoflurano causam maior depressão na
FR do que o halotano e este factor deve ser tido em conta quando não se tem disponível um
ventilador adequado (Mosley, 2005).
O butorfanol é frequentemente utilizado como analgésico intra-cirúrgico e é administrado
conforme necessário, na dose de 0,02 mg/kg p.v. a 0,04 mg/kg p.v.. Infusão de lidocaína
intra-cirurgicamente pode melhorar as condições anestésicas assim como a recuperação
pós-cirúrgica (Mosley, 2005).
Suporte respiratório e CV adequado, são extremamente importantes para a obtenção de
bons resultados anestésicos. Em cavalos com cólica, a disfunção respiratória resultante de
decúbito dorsal prolongado, pode adicionalmente exacerbar a distensão abdominal.

33
Idealmente, a PaO2 deverá manter-se nos 100 mmHg e valores superiores não aumentam
significativamente a quantidade de oxigénio transportada pelo sangue (Mosley, 2005).
Fluidoterapia intra-cirúrgica padrão é constituída por fluidos cristalóides, na dose de 5 mL/kg
p.v./h a 10 mL/kg p.v./h e fluidos colóides são administrados a um terço da velocidade (1,7
mL/kg p.v./h a 3,3 mL/kg p.v./h). Evidências da necessidade da continuação de fluidoterapia
agressiva podem ser o aumento do HT e PT, taquicardia, hipotensão, membranas mucosas
secas e pálidas e aumento do TRC (Mosley, 2005).
Durante a anestesia, valores de FC de 26 bpm a 48 bpm são aceitáveis, assim como uma
pressão sanguínea arterial média igual ou superior a 70 mmHg. Para aumentar a FC e a
pressão sanguínea arterial média, pode recorrer-se à administração de catecolaminas
(dobutamina, dopamina ou efedrina) (Trim, 2005).
A dobutamina é uma catecolamina sintética que estimula os receptores β1 a aumentar a
contractilidade e o débito cardíacos (Trim, 2005). Para facilitar a sua administração, dilui-se
a dobutamina em dextrose a 5% ou em soro fisiológico na dose de 0,5 mg/mL a 1,0 mg/mL.
Em doses altas, este fármaco causa taquicardia e arritmias, mas são por vezes observáveis
em alguns animais os mesmos efeitos adversos, em doses extremamente baixas (Mosley,
2005).
A dopamina é um precursor natural da norepinefrina e parte dos efeitos cardiovasculares por
ela exercidos, são mediados através da norepinefrina e parte pela estimulação dos
receptores DA1, α-1, β-1 e β-2 da dopamina. Os efeitos da dopamina são dependentes da
dose e do tempo:
• Em doses baixas (3 µg/kg p.v./min), aumenta o fluxo sanguíneo renal e mesentérico,
pode aumentar a pressão sanguínea arterial e produz um leve aumento no débito
cardíaco;
• Em doses moderadas (3 µg/kg p.v./min a 6 µg/kg p.v./min), aumentam a
contractilidade e o débito cardíaco; é produzida vasodilatação a qual vai diminuir a
taxa de aumento da pressão sanguínea arterial nos primeiros 5 min a 7 min; após 15
min a 30 min, a concentração de norepinefrina plasmática aumenta, assim como a
contractilidade cardíaca e a pressão sanguínea que também continuam a aumentar;
• Altas doses de dopamina (superiores a 10 µg/kg p.v./min), causam vasoconstrição e
estão indicadas para o tratamento de hipotensão profunda com risco de vida e
bloqueio cardíaco átrio-ventricular (AV) avançado (Trim, 2005).
A efedrina é um alcalóide de uma planta que aumenta a contractilidade cardíaca através da
libertação de norepinefrina dos neurónios e do leve efeito agonista directo nos receptores α,
β-1 e β-2. O débito cardíaco aumenta, assim como a pressão sanguínea e a FC; há indução
de vasoconstrição e um volume sanguíneo considerável é mobilizado das vísceras,
especialmente do baço. Consequentemente a efedrina é especificamente utilizada quando
se pretende induzir a contracção esplénica, de modo a facilitar a manipulação cirúrgica
34
(Trim, 2005). Vantagens desta droga residem na administração sob a forma de bolus e no
efeito prolongado (30 min a 60 min). Uma vez que alguns efeitos da efedrina estão
relacionados com a libertação endógena de catecolaminas, este fármaco poderá exercer
menos efeito num animal em que já há depleção das mesmas (Mosley, 2005).
Uma vez que na maioria dos pacientes com cólica, está presente acidose metabólica
causada pelo metabolismo anaeróbico e pela produção de ácido láctico secundária à
hipovolémia e à perfusão tissular, a administração de bicarbonato de sódio deve ser
considerada, principalmente quando o pH sanguíneo se encontra próximo de 7,1.
Idealmente o pH sanguíneo deve manter-se acima de 7,2 uma vez que ajuda a minimizar a
depressão a nível do miocárdio e os efeitos arritmogénicos relacionados com um pH
sanguíneo baixo (Mosley, 2005).
Deve também ser dada especial atenção às alterações do nível de cálcio iónico, uma vez
que a alteração do fluxo de cálcio nas células do miocárdio, pode ser responsável pelos
efeitos cárdio-depressores dos anestésicos voláteis. A infusão de gluconato de cálcio
durante a cirurgia é recomendada para melhorar o desempenho CV (Mosley, 2005).
No caso de poldros, a estabilização pré-cirúrgica do animal é ainda mais importante, no
entanto deve encontrar-se o equilíbrio entre a estabilização do animal e o tempo gasto com
a mesma, de modo a não atrasar demasiado a cirurgia, devido aos riscos envolvidos
(Bohanon, 2005).
É comum o começo da antibioterapia antes da cirurgia, utilizando um antibiótico de largo
espectro, como: sulfato de amicacina (25 mg/kg p.v. a 30 mg/kg p.v.) ou sulfato de
gentamicina (8,8 mg/kg p.v.), combinado com penicilina potássica (20.000 UI/kg p.v. a
50.000 UI/kg p.v., QID) ou ampicilina sódica (50 mg/kg p.v. a 100 mg/kg p.v., QID). A
administração de flunixina meglumina também deve ser feita pré-cirurgicamente, assim
como a colocação de uma sonda nasogástrica (Bohanon, 2005).
Em neonatos a anestesia pode ser induzida através de uma máscara com libertação de
isoflurano ou com a associação de diazepam e quetamina injectáveis (Bohanon, 2005).

2.2 – Cirurgia Propriamente Dita


Uma vez decidido o encaminhamento do cavalo para cirurgia, é colocado um catéter
endovenoso na veia jugular (caso ainda não tenha sido colocado para fazer a fluidoterapia)
(Grupo de pesquisa sobre cólicas da Universidade de Liverpool, 2008). Realiza-se a
tricotomia desde a área do púbis nas fêmeas ou desde o prepúcio no caso dos machos até
ao processo xifóide e com uma extensão de cerca de 30 cm para cada lado da linha média
ventral (Turner et al, 1989). Lava-se a cavidade bucal e o cavalo é encaminhado para a
boxe de indução onde se dá início à anestesia. Após o derrube, o cavalo é encaminhado
para a mesa cirúrgica onde se posiciona em decúbito dorsal de modo a permitir o acesso

35
abdominal por parte do cirurgião (Grupo de pesquisa sobre cólicas da Universidade de
Liverpool, 2008).
A abordagem ao abdómen equino para o tratamento cirúrgico de cólicas é realizada através
de uma laparotomia pela linha média ventral. Uma vez que o abdómen ventral se encontre
rapado e desinfectado, procede-se à celiotomia na linha média (Ragle, 2006). O objectivo do
tratamento cirúrgico de cólicas varia de acordo com o tipo de cólica presente em cada caso.
Após a identificação da patologia envolvida, o resto da cirurgia é planeada (Ragle, 2006;
Fehr, 2007b) e alguns dos seguintes procedimentos poderão ser necessários:
• Descompressão de intestino distendido com gás ou fluido;
• Correcção de deslocamentos ou vólvulos intestinais;
• Evacuação de conteúdo intestinal;
• Libertação de ansas intestinais retidas (por exemplo no forâmen epiplóico ou nos
anéis inguinais);
• Redução de vólvulos intestinais;
• Remoção de intestino isquémico (enterectomia) e anastomose entre as duas
terminações saudáveis;
• Caracterização e possível remoção de massas abdominais;
• Recolha de amostras para biopsia, de modo a realizar um diagnóstico definitivo
(Grupo de pesquisa sobre cólicas da Universidade de Liverpool, 2008).
Os princípios de assepsia devem ser respeitados, a cirurgia deve ser rápida e o
manuseamento dos tecidos deve ser tão atraumático quanto possível (Martens, 2004). É
importante a manutenção da humidade das vísceras durante toda a cirurgia, pois tal
procedimento minimiza a ocorrência de aderências (Pagliosa & Alves, 2004).

2.2.1 – Laparotomia
Desde os primeiros anos do séc. XX que a laparotomia equina apareceu descrita em livros.
No entanto os primeiros artigos sobre o tema não foram publicados até à década de 70
(White II, 2006a).
O acesso através da linha média ventral, permite a melhor exposição da cavidade peritoneal
do cavalo, com apenas uma incisão e com um procedimento relativamente rápido (Turner et
al, 1989). Devido à natureza fibrosa e escassez vascular da linha alba, há menor hemorragia
durante a incisão e maior resistência às forças de tensão da sutura e peso das vísceras
abdominais durante a cicatrização, o que justifica a sua escolha como local de incisão
(Pagliosa & Alves, 2004).
A incisão começa sobre a cicatriz umbilical e estende-se cranialmente. O comprimento da
sutura depende da patologia inerente, mas geralmente faz-se uma incisão com cerca de 30
cm a 40 cm de comprimento (Turner et al, 1989). O tamanho da incisão deve ser adequado,

36
evitando-se excessos (especialmente no sentido cranial, onde a linha alba é mais delgada e
menos resistente à tensão da sutura), mas permitindo o manuseamento das vísceras sem
provocar lesões nestas ou nos bordos da incisão (Pagliosa & Alves, 2004).
Primeiramente procede-se à incisão do tecido subcutâneo, que é fino na maioria dos
animais. Após o controlo da hemorragia dos pequenos vasos seccionados, procede-se à
incisão da linha alba, pois trata-se de uma zona menos musculada e irrigada. Em seguida
surge o tecido adiposo retroperitoneal, que quando afastado revela o peritoneu e a cavidade
abdominal (Turner et al, 1989).
Esta abordagem permite a inspecção visual de cerca de 75% do tracto GI, assim como a
palpação do restante. O abdómen equino deve ser explorado sistematicamente e mesmo
após a identificação da causa da cólica já ter sido identificada, a exploração de toda a
cavidade abdominal deve ser completada de modo a verificar a possível presença de uma
segunda alteração (Martens, 2004).
Idealmente, o ceco deve ser o primeiro órgão a ser identificado, pois é utilizado como ponto
de referência para a exploração sistemática, tanto do ID como do IG (Turner et al, 1989).
Para além de explorar todo o intestino, é recomendada a palpação de vários locais
específicos, como os anéis inguinais (para confirmar se o intestino não se encontrava lá
retido, anteriormente à sua exteriorização), o forâmen epiplóico e mesmo o estômago e o
baço (Turner et al, 1989). Após a identificação e exame de todas as porções, tanto do ID
como do IG, o problema primário pode ser avaliado (Greet, 2008).
A descompressão de segmentos intestinais é muitas vezes necessária logo na fase inicial
da inspecção visceral, de modo a permitir a visualização e manuseamento do restante tracto
GI (Greet, 2008). Esta é conseguida através da punção na parede intestinal com uma
agulha de 14 Gauge (G), ligada a um descompressor que opera através de sucção
(Freeman, 2003a).

2.2.2 – Enterotomia
A enterotomia está indicada para resolução de impactações, remoção de enterólitos ou
remoção de corpos estranhos. No entanto, alguns cirurgiões executam enterotomias ao
nível da flexura pélvica de forma rotineira em cirurgias a cavalos com cólica, com o objectivo
de aumentar a motilidade intestinal e melhorar o conforto pós-cirúrgico do animal (Ellis et al,
2007).
A enterotomia é um procedimento sujo e que necessita de vigilância constante para prevenir
a contaminação que poderia provocar infecção incisional ou peritonite (Freeman, 2003a).
Antes de proceder à enterotomia, é benéfica a lavagem da zona da incisão com 1 L de
solução fisiológica, contendo 20.000UI de heparina. Este procedimento vai reduzir a
aderência de material fecal à serosa do cólon (Ellis et al, 2007). Alternativamente, pode
também colocar-se carboximetilcelulose sódica na zona da incisão. (Freeman, 2003a). A
37
incisão é realizada com cerca de 12 cm a 15 cm de comprimento, atingindo toda a
espessura da parede intestinal (Freeman, 2003a).
Os locais mais frequentes de impactação são: a flexura pélvica, o cólon dorsal direito, o ileo
e o ceco. Impactação no estômago, duodeno ou jejuno, pode ocorrer mas é rara (Freeman,
2003c). A enterotomia deve realizar-se proximal à impactação e a colocação de uma
mangueira (de preferência com água morna) no lúmen intestinal, permite desfazer a massa
(Freeman, 2003c; Gerard, 2007). Posteriormente move-se a mangueira mais profundamente
no lúmen intestinal e simultaneamente massaja-se o intestino que se encontra mais
profundamente no abdómen, em direcção à região da enterotomia (Freeman, 2003c). É
importante remover também as fezes situadas a jusante da massa impactada, para diminuir
a quantidade de fezes que chega à zona do intestino intervencionada, logo após a cirurgia
(Gerard, 2007).
Para resolução de impactação no cólon menor, a incisão é realizada através da banda
longitudinal antimesentérica, que quando comparada com a incisão realizada através das
saculações, é de execução mais rápida e fácil, causa menos hemorragia e inflamação,
mantêm o diâmetro do lúmen intestinal mais largo e é mais forte às 96h pós-cirúrgicas
(Freeman, 2003c; Montello, 2004).
A remoção de enterólitos é outra das principais indicações cirúrgicas para a realização de
enterotomia. As técnicas cirúrgicas que poderão facilitar a remoção do enterólito e reduzir
potenciais complicações pós-cirúrgicas incluem:
• Incisão da linha média ventral mais cranialmente;
• Completa evacuação de ingesta e fluido intestinal adjacente ao local da enterotomia,
de modo a minimizar o derrame de conteúdo intestinal durante a exploração do
tracto GI, posteriormente ao seu encerramento;
• Encerramento cuidado do local da incisão da enterotomia para minimizar a redução
do diâmetro do lúmen intestinal. (Hassel et al, 1997).
Para encerramento da zona da enterotomia, várias técnicas estão descritas e a técnica
utilizada dependerá da preferência do cirurgião. Enterorrafia com uma sutura de Lembert
seguida de uma sutura de Cushing, utilizando fio 2-0 de polidioxanona é o método mais
utilizado. Este método expõe menos material de sutura à cavidade abdominal, reduzindo o
risco de adesões (Freeman, 2003a). A segunda sutura pode alternativamente ser executada
com fio 3-0. Alguns cirurgiões por sua vez preferem começar pelo encerramento apenas da
mucosa isolada. A sutura de Lembert é realizada com os pontos penetrando acerca de 1
mm a 2 mm do bordo da incisão, com cerca de 8 mm de largura e 10 mm de distância. Há
que ter atenção com a sutura de Cushing, para que fique próxima da sutura de Lembert
levando a inversão do tecido e estenose intestinal mínimas. O local da enterotomia é lavado
com solução fisiológica estéril, antes, durante e após o seu fechamento (Freeman, 2003c).

38
2.2.3 – Enterectomia e anastomose
A enterectomia é uma intervenção que aumenta significativamente o risco de complicações
cirúrgicas e reduz a taxa de sobrevivência, pelo que se trata de uma decisão que deve
sempre ser exaustivamente discutida entre o médico veterinário e o proprietário (Martens,
2004).
Quando a vascularização intestinal se encontra comprometida, a enterectomia é
frequentemente necessária. Apesar dos inúmeros métodos que foram desenvolvidos para
determinar a viabilidade intestinal, a maioria dos cirurgiões ainda fundamenta a sua decisão
sobre a avaliação clínica do intestino, com base na cor intestinal, motilidade, espessura da
parede e cor da mucosa (Martens, 2004; Freeman, 2003a).
Esta avaliação tem mostrado não ser menos efectiva do que a utilização de outras técnicas
como a fluoresceína intravenosa, oximetria de superfície ou técnicas de doppler, que são
mais complexas e dispendiosas. De um modo geral, na prática, é melhor eliminar qualquer
parte do intestino cuja viabilidade pareça duvidosa, desde que seja prático e possível fazê-lo
(Greet, 2008).
O intestino estrangulado é removido com aproximadamente 30 cm ou mais de intestino
contíguo saudável em cada extremidade. Uma linha de incisão em forma de S, cortado com
uma tesoura Mayo curva, elimina ângulos acentuados e aumenta o comprimento da
superfície de contacto entre as duas extremidades intestinais, permitindo a produção de um
amplo estoma. Uma artéria, tão próximo quanto possível da sua origem a partir do vaso
mesentérico principal, é deixada para o abastecimento das terminações anastomosadas.
Pelo menos 5 cm a 10 cm do mesentério são deixados além dos últimos vasos e
bifurcações principais para impedir a oclusão vascular inadvertida ou punção de vasos
durante a fase final do encerramento mesentérico. Drenos de Penrose são colocados de 30
cm a 45 cm de cada lado do local de anastomose. Essa técnica evita traumas na área crítica
da anastomose e é menos traumática do que a utilização de pinças Doyen (Freeman,
2003a).
Várias técnicas para a realização de anastomoses no ID estão descritas, incluindo
anastomose terminal-terminal, lateral-lateral ou terminal-lateral e podem ser suturadas
manualmente ou com a aplicação de agrafos, dependendo da localização e da extensão do
intestino afectado (Loesch et al, 2001).
As anastomoses do ID são frequentemente associados a formação de aderências, que
podem colocar a vida do animal em risco, em alguns casos. Esforços para reduzir a
formação de aderências no local da anastomose incluem o uso de uma sutura invertida no
encerramento seromuscular. No entanto, esta técnica pode predispor à obstrução ou
estenose no local da anastomose devido ao reduzido diâmetro do lúmen intestinal. A
utilização de uma sutura contínua simples hemicircunferencial das camadas serosa e
muscular não parece resultar em complicações pós-cirúrgicas significativas a curto prazo,
39
secundárias à obstrução anastomótica, estenose, ou formação de aderências (Loesch et al,
2001).
A sutura manual de pequenas anastomoses terminal-terminal, é geralmente realizada com
sutura invertida com uma ou duas camadas. Pode ser realizada a sutura utilizando fio 2-0 ou
3-0 trançado ou monofilamentoso absorvível, numa sutura simples contínua
hemicircunferencial de 2 camadas, da mucosa e da seromuscular (Loesch et al, 2001).
As suturas são colocadas através dos bordos mesentérico e antimesentérico de ambos os
segmentos proximal e distal, para os alinhar e manter o seu diâmetro semelhante em todo o
encerramento. Com todos os padrões manuais de anastomoses, as suturas devem penetrar
suficientemente profundas para incorporar o duro tecido submucoso. Independentemente do
tipo de anastomose utilizada, a excessiva inversão e constrição do estoma deve ser evitada
e ambas são geralmente causados por tentativas exageradas de obter uma oclusão
hermética. Após a anastomose ser concluída, o restante defeito mesentérico é fechado num
padrão contínuo simples, tendo o cuidado de evitar a oclusão dos vasos mesentéricos ou
redução do mesentério na anastomose (Freeman, 2003a).
Para lesões de estrangulamento envolvendo o cólon ascendente, a enterectomia também é
possível, mas na maioria desses casos, uma grande porção do cólon está envolvido o que
faz com que a enterectomia se torne muito extensa (Martens, 2004).
Após a lesão ter sido corrigida, o intestino é organizado na sua orientação correcta sobre o
lado esquerdo da incisão abdominal e a extensão da enterectomia é definida e permanece
apenas um pequeno defeito da raiz do mesentério às extremidades intestinais (Freeman,
2003a).
Para as lesões pequenas, o prognóstico para a sobrevivência não é só determinado pelo
comprimento de intestino a ser removido, mas também pela duração do estrangulamento (e
portanto, pelo grau de peritonite) e pela localização da lesão (sempre pior quando há
envolvência do ileo). Cerca de 60% a 70% do ID pode ser eliminado, mas foi demonstrado
que uma parte estrangulada do ID apresenta um aumento de 30% em comparação com o
tamanho original (Martens, 2004). Para evitar má absorção após a cirurgia, devem ser
preservados pelo menos 4,5 m de comprimento de intestino delgado, num cavalo adulto
(Freeman, 2003a).

2.2.4 – Conclusão da cirurgia e recuperação anestésica


Após o encerramento de qualquer defeito mesentérico, descompressão do ID distendido e
remoção de gás a partir do IG, a cavidade peritoneal é lavada com uma solução
antibacteriana e a parede abdominal é fechada (Greet, 2008).
O tipo de sutura utilizado e o método de encerramento são ditados pela preferência do
cirurgião (Turner et al, 1989; Freeman, 2003a), mas a sutura da linha média ventral é
realizada geralmente em três ou quatro camadas (Turner et al, 1989).
40
O peritoneu não precisa ser suturado uma vez que é muito fino e rasga facilmente. No
entanto, vantagens da sua sutura são a exclusão de intestino do campo, durante o
encerramento da linha alba (reduzindo o risco de perfuração acidental) e redução da
drenagem e inchaço incisionais (Turner et al, 1989; Freeman, 2003a). Para a sutura do
peritoneu utiliza-se um padrão simples contínuo com fio de poligalactina 910 nº 2 (Vicryl)
(Turner et al, 1989).
Para a sutura da linha alba devem ser utilizadas agulhas atraumáticas, pois apesar de
facultarem maior dificuldade de penetração, são preferíveis para a laparorrafia mediana pela
menor possibilidade de ruptura dos tecidos aquando do ajuste da sutura e da deiscência da
ferida, que poderá ocorrer também se a sutura for incorrectamente apertada, gerando
isquémia (Pagliosa & Alves, 2004).
Muitos padrões de sutura foram utilizados para fechar a linha alba, incluindo a sutura
simples contínua, simples interrompida, cruzada ou cruzada invertida. Um padrão de sutura
contínua padrão, permite que as forças biomecânicas sejam mais uniformemente
distribuídas ao longo de toda a linha de incisão, é mais rápida de executar do que os
padrões interrompidos e é significativamente mais forte do que o padrão cruzado invertido.
O padrão contínuo também coloca menos material de sutura nos tecidos, levando a menos
reacção tipo corpo estranho e reduzindo o risco de infecção, em comparação com os
padrões interrompidos. (Freeman, 2003a). Se o comprimento total da incisão é inferior a 20
cm, uma sutura com material duplo é geralmente suficiente. Se a incisão tem um
comprimento superior a 20 cm, duas suturas separadas com início além da comissura da
incisão da linha alba devem ser realizadas e direccionadas para o centro da mesma (Turner
et al, 1989), reunindo-se centralmente onde são atadas juntas as extremidades longas de
ambas as suturas (Freeman, 2003a).
A entrada da agulha para celiorrafia deve obedecer a um afastamento de 10 mm a 15 mm
do bordo da incisão, o que garante uma distância segura da área de colagenólise (Pagliosa
& Alves, 2004). Os bordos da incisão devem ser puxados para uma confortável aposição
dos tecidos, mas não devem ser apertados demasiado firmes, porque estrangularia os
bordos incisionais e provocaria focos de necrose incisional. Os nós são os pontos mais
fracos da linha de sutura. Para melhorar a segurança do nó, deve utilizar-se um nó e meio
de cirurgião, seguido de um nó de cirurgião e ainda nós quadrados múltiplos (Freeman,
2003a).
O músculo recto do abdómen não deve ser incluído na sutura para evitar o risco de necrose
do mesmo (Pagliosa & Alves, 2004).
A drenagem peritoneal não é utilizada de forma rotineira após a cirurgia abdominal e a
colocação de drenos de Penrose tende a ser desencorajada devido ao risco de infecção
retrógrada. Se há suspeita de contaminação ou foi realizada uma anastomose intestinal, o

41
abdómen deve ser irrigado e um dreno plastificado heparinizado é útil nas primeiras 24 h,
após as quais é removido (Turner et al, 1989).
O tecido subcutâneo pode ser fechado num padrão simples contínuo com material sintético
absorvível 2-0. Há quem defenda o não encerramento do tecido subcutâneo, na convicção
de que suturas subcutâneas vão adicionar material estranho à ferida, servir como foco de
infecção e manter a infecção na parede abdominal e nas suturas mais profundas. Sem a
sutura subcutânea, a drenagem de uma incisão infectada é facilmente estabelecida e a cura
não parece ser prejudicada. A pele pode ser fechada com uma grande variedade de
padrões com agrafos de material sintético absorvível ou não-absorvível. Ácido poliglicólico
2-0 ou 3-0, num padrão contínuo simples é indicado e o material da sutura é normalmente
absorvido em 3 a 5 semanas, sem quaisquer efeitos adversos sobre a cicatrização da ferida
(Freeman, 2003a).
As características dos principais fios de sutura e as respectivas vantagens e desvantagens
estão apresentadas na tabela 6.

Tabela 6: Vantagens e desvantagens dos principais fios de sutura utilizados na laparorrafia


mediana

Fio Vantagem Desvantagem

Poliamida (não absorvível,


Inerte Menor segurança do nó
mono ou multifilamentoso)

Poliéster (não absorvível,


Alta resistência Potencial para fístula
multifilamentoso)

Ácido poliglicólico (absorvível, Efeito bactericida dos Perda de 80% da tensão


multifilamentoso) produtos da degradação em 14 dias

Poliglactina 910 (absorvível, Perda de 80% da tensão


Fácil manuseamento
multifilamentoso) em 14 dias

Polidioxanona (absorvível, Absorção completa em 182 Perda de 50% da tensão


monofilamentoso) dias em 14 dias

Polipropileno (não absorvível,


Inerte Difícil manuseamento
monofilamentoso)
Adaptado de Pagliosa & Alves, 2004

De um modo geral, os fios multifilamentosos são mais resistentes à tensão e permitem nós
mais estáveis do que os fios monofilamentosos. Contudo, podem facilitar a capilaridade, o
que representa um factor adicional ao risco de infecção e podem promover o corte do tecido
por ocasião da sutura ou edema pós-cirúrgico devido ao efeito serra exercido sob o tecido
suturado (Pagliosa & Alves, 2004). Por sua vez, a segurança dos nós é inversamente
proporcional à conservação e ao diâmetro do material de sutura utilizado (Freeman, 2003a).

42
Um plástico protector auto-adesivo, temporário e impermeável à água, colocado no final da
cirurgia na zona da intervenção, pode reduzir contaminações incisionais com sujidade
durante o encerramento da sutura. Complicações incisionais também podem ser reduzidas,
mantendo a boxe de convalescença limpa e seca quanto possível, tendo em vista a redução
da contaminação. As ligaduras podem ou não ser utilizadas rotineiramente, sendo no
entanto dispendiosas e exigindo mudanças frequentes, embora possam reduzir o inchaço e
protejam uma incisão infectada. A colocação de uma ligadura abdominal pode ser
especialmente útil para proteger a incisão em éguas paridas recentemente, da
contaminação pelo poldro e para proteger a incisão em cavalos que tenham desenvolvido
laminite e tenham tendência a deitar-se (Freeman, 2003a).
A ligadura abdominal, apesar de promover suporte e protecção da ferida cirúrgica e prevenir
edema nas regiões adjacentes à incisão, pode ocasionar dispneia quando muito apertada e
acumulação de exsudado na ferida cirúrgica abdominal, devendo ser evitada em dias muito
quentes e húmidos (Pagliosa & Alves, 2004).
A recuperação anestésica deve ocorrer sob supervisão cuidadosa. O cavalo é colocado
novamente na boxe onde foi induzida a anestesia, que funciona agora como boxe de
recuperação anestésica e gradualmente é desligado o fornecimento de fármacos
anestésicas e oxigénio. Idealmente o cavalo vai permanecer calmamente em decúbito
lateral até se sentir mais desperto e, em seguida, senta-se cerca de 10 min a 15 min, até
que finalmente se levanta quando já se consegue manter em estação de forma coordenada.
Às vezes os cavalos precipitam-se e tentam apressar este processo e levantar-se, o que
pode resultar em quedas perigosas (Grupo de pesquisa sobre cólicas da Universidade de
Liverpool, 2008).
Um protocolo anestésico correcto com manutenção da pressão arterial acima de 60 mmHg,
fluidoterapia suficiente e mesa cirúrgica com colchão adequado, minimizam transtornos de
excitação do cavalo durante a recuperação anestésica, que resultam em neuromiopatias,
traumatismos e pressões bruscas na sutura, com risco de deiscência (Pagliosa & Alves,
2004).

43
3 – PÓS-OPERATÓRIO
Os objectivos da maioria dos procedimentos pós-cirúrgicos são facilitar o retorno antecipado
do funcionamento normal do tracto GI e prevenir complicações (Freeman, 2003a). Estes
procedimentos consistem principalmente em antibioterapia, analgesia, desinfecção e
limpeza da sutura, gradual retoma da alimentação normal do paciente e finalmente gradual
recuperação do trabalho.
De um modo geral, os cavalos podem retomar plena actividade desportiva após uma cirurgia
a cólica (Launois et al, 2006).

3.1 – Medicação e convalescença


Tudo o que perturba a incisão abdominal, tal como o exame rectal, deve ser evitado após a
cirurgia (Freeman, 2003a). No entanto, o exercício controlado a passo é fundamental
durante o primeiro mês após a intervenção, pois a movimentação do paciente durante o pós-
cirúrgico imediato contribui para minimizar o edema e o stress (Pagliosa & Alves, 2004).
Fluidos EV por infusão contínua são administrados rotineiramente nos primeiros dias pós-
cirúrgicos. A taxa de manutenção em equinos adultos é normalmente estimada em 2 mL/kg
p.v./h a 3 mL/kg p.v./h ou 40 mL/kg p.v./dia a 60 mL/kg p.v./dia. A quantidade de fluidos
administrada deve ser aumentada quando está presente diarreia, refluxo ou outra causa de
perda de fluidos (Marr, 2008) e ajustada com base nos resultados do HT e PT (Freeman,
2003a). É indicada a utilização de solução de Hartmann para reposição de fluido e pode
combinar-se com lidocaína, benéfica pelo seu efeito analgésico e pró-cinético intestinal
(Greet, 2008).
A entubagem nasogástrica não permanece colocada por rotina, mas deve ser colocada
conforme necessário, para descomprimir o estômago (Freeman, 2003a; Greet, 2008),
dependendo da presença de refluxo e do conforto do animal (Greet, 2008).
É recomendada a antibioterapia (com penicilina e gentamicina), combinada com flunixina
meglumina (AINE) durante três dias após a cirurgia ou conforme necessário (Freeman,
2003ª; Freeman, 2003c; Greet, 2008). Uma dose baixa de fenilbutazona pode também ser
administrada rotineiramente e o uso de metaclopramida parece estimular a actividade
intestinal (Greet, 2008).
A dor pós-cirúrgica deve ser gerida para cada caso individual, mas quando esteve presente
doença intestinal e que é refractária aos analgésicos e à descompressão gástrica, pode
justificar-se o encaminhamento para uma segunda laparotomia (Freeman, 2003a; Greet,
2008).
Medidas profiláticas específicas para evitar aderências, drogas pró-cinéticas, assim como
anti-endotoxinas podem ser tomadas de forma rotineira ou apenas quando necessárias
(Freeman, 2003a).
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O recomeço rápido da alimentação age tanto como um estimulante intestinal como é um
meio de avaliação do progresso pós-cirúrgico (Greet, 2008). No entanto, não é possível
iniciar a alimentação se estiver presente ileo pós-cirúrgico. Em casos de deslocamento do
cólon e outros procedimentos que não envolvam enterotomia, pode administrar-se água e
em seguida uma pequena porção de erva fresca e feno dentro de 24 h a 36 h após a
cirurgia. Quando foi realizada enterotomia, administra-se água e em seguida uma pequena
quantidade de erva e feno das 48 h às 72 h pós-operatórias (Marr, 2008).
A remoção da sutura ou agrafos é realizada após 12 dias a 14 dias (Turner et al, 1989) e o
retorno ao exercício deve ser gradativo, variando de seis semanas a três meses,
dependendo do tamanho da incisão (Pagliosa & Alves, 2004). Um dos protocolos descrito
consiste em, após o primeiro mês de repouso, libertação do paciente durante 30 dias num
pequeno paddock antes do recomeço lento e gradual do trabalho, desde que a cura
incisional tenha sido simples (Freeman, 2003a).

3.2 – Complicações pós cirúrgicas


A cirurgia a cólicas tem-se vindo a tornar mais bem sucedida ao longo dos anos e a
sobrevivência até à saída do animal do hospital, ronda actualmente cerca de 80% dos
pacientes cirúrgicos. Por outro lado, com o aumento da taxa de sobrevivência, aumentou
também a incidência de complicações pós-cirúrgicas (Proudman, 2008).
São várias as possíveis complicações após uma cirurgia de cólica, nomeadamente:
complicações na zona de incisão cirúrgica, ileo pós-cirúrgico, desenvolvimento de
aderências ou peritonite, complicações anastomóticas, entre outras. Considerações sobre
os cuidados pré-cirúrgicos, tamanho da incisão, roupa do cirurgião, escolha do fio cirúrgico e
as condições clínicas e comportamentais do equino são salientadas entre os factores
predisponentes. A técnica cirúrgica deve ser praticada sob condições adequadas de
assepsia, hemostasia e trauma mínimo dos bordos da incisão (Pagliosa & Alves, 2004).

3.2.1 – Complicações incisionais


Complicações incisionais podem desenvolver-se em 40% dos cavalos que tenham sido
sujeitos a cirurgia intestinal. No entanto, as melhorias na técnica cirúrgica e materiais de
encerramento da sutura abdominal têm tornado este procedimento muito mais seguro do
que em anos anteriores (Freeman, 2005b). Os procedimentos cirúrgicos com mais de 2 h de
duração acarretam duas vezes mais chance de complicações incisionais (Pagliosa & Alves,
2004).
Um inalterável, factor crítico que tem sido associado a complicações incisionais é o tamanho
do cavalo. Factores cirúrgicos podem incluir o tipo de incisão, o tipo de material de sutura, o
método de encerramento, o grau de trauma cirúrgico, a duração da cirurgia, o número de

45
vezes que a mesma incisão é aberta e fechada (como para uma repetição exploratória) e a
dificuldade da recuperação anestésica (Freeman, 2005b).
Apesar de mais de 20% das bactérias cutâneas serem resistentes a qualquer desinfecção, a
principal fonte de contaminação da incisão cirúrgica é endógena. As principais complicações
pós-cirúrgicas que ocorrem ao nível da zona de incisão, características e consequências das
mesmas são (Pagliosa & Alves, 2004):
• Edema: tem origem em inflamação ou infecção da zona da incisão, caracteriza-se
por um aumento de volume adjacente à sutura da parede abdominal e tem como
consequências a cicatrização retardada e a deiscência da sutura.
• Drenagem incisional: tem origem na sutura mal coadaptada ou inflamada,
caracteriza-se pela libertação de um exsudado seroso ou serosanguinolento e as
suas possíveis consequências são o retardamento da cicatrização, infecção e hérnia.
• Hematoma e seroma: originam-se em suturas imperfeitas, caracterizam-se pelo
aumento de volume da zona e as suas consequências podem ser necrose ou
deiscência da sutura.
• Infecção: tem origem em bactérias da pele e microbiota intestinal, caracteriza-se pela
libertação de exsudado pela ferida e as consequências são o retardamento
cicatricial, peritonite e formação de aderências.
• Deiscência: tem origem em sutura indevida, edema, evisceração do omento e dor
abdominal, caracteriza-se por drenagem, hérnia e eventração na zona incisionada.
As suas consequências são evisceração e morte.
• Hérnia: deve-se a sutura indevida, hipoproteinémia ou infecção, caracteriza-se pelo
aumento do volume e formação de um anel hernial e tem como consequências o
encarceramento e estrangulamento intestinal.
• Eventração: tem origem na deiscência da sutura, caracteriza-se por aumento de
volume e tem como consequência o encarceramento intestinal.
• Evisceração: tem origem na deiscência da ferida e eventração, caracteriza-se pela
exposição das vísceras e provoca choque ou a morte do animal (Pagliosa & Alves,
2004).
Complicações da colotomia são muito raras, mas a mais comum é a hemorragia dos bordos
da incisão, o que pode ser suficientemente grave para causar melena e choque
hemorrágico. Há alguns indícios de que uma enterotomia, mas não uma enterectomia e
anastomose do ID, pode aumentar o risco de infecção incisional pós-cirúrgica e outros
problemas ao nível do local da incisão (Freeman, 2005b).

46
3.2.2 – Ileo pós-cirúrgico
O ileo pós-cirúrgico, ocorre em 10% a 55,6% dos cavalos após a cirurgia ao ID, com uma
taxa de mortalidade de 13% a 86% e representa 9% a 43% do total de mortes nesses
cavalos. Esta complicação é muito rara após cirurgia ao IG. Estudos mais recentes
documentam um declínio no número de casos desta complicação e um estudo demonstrou
que o ileo pós-cirúrgico relaciona-se mais com o tipo de anastomose do que com qualquer
outro factor (Freeman, 2005b).
É uma patologia complicada pela excessiva distensão intestinal, presença de endotoxinas e
desequilíbrios electrolíticos. Os sinais clínicos presentes são principalmente: cólica,
taquicardia e depressão. O diagnóstico é feito pela presença de refluxo nasogástrico e ID
distendido detectado durante os exames rectal ou ecográfico (Marr, 2008). Embora a
distinção entre obstrução mecânica e ileo pós-cirúrgico possa ser difícil, a obstrução
mecânica geralmente provoca maior dor e um aumento progressivo da FC (Freeman,
2005b). É importante que seja descartada a hipótese de obstrução física do ID e há risco de
ruptura gástrica, caso esta patologia não seja reconhecida atempadamente (Marr, 2008).
O tratamento é feito com base em analgesia, descompressão através da sondagem
nasogástrica ou laparotomia. O tratamento anti-endotóxico, a correcção dos desequilíbrios
electrolíticos e a administração de drogas pró-cinéticas podem ser importantes nestes casos
(Marr, 2008).
A realização de enterotomia ao nível da flexura pélvica, parece reduzir o risco de ileo pós-
cirúrgico, possivelmente pela redução da resistência ao esvaziamento ileal e pela diminuição
da compressão do intestino com hipomotilidade, pelo conteúdo de um cólon cheio
(Freeman, 2005b).

3.2.3 – Aderências e peritonite


As aderências correspondem à formação de cicatrizes fibrosas entre alças intestinais ou entre
intestino e a superfície peritoneal. É uma importante causa de cólica pós-cirúrgica crónica,
recorrente e potencialmente fatal (Marr, 2008; Pagliosa & Alves, 2004).
Os cavalos não são uma espécie particularmente propensa à formação de aderências no ID,
mas são muito susceptíveis a obstrução do mesmo, ainda que a aderência seja muito
inócua em tamanho e aparência. As aderências costumam causar problemas nos primeiros
2 meses após a cirurgia. Os poldros de 15 dias a 6 meses parecem mais predispostos ao
desenvolvimento de aderências e requerem múltiplas cirurgias para resolve-las, quando
comparados com poldros mais velhos (Freeman, 2005b).
Os principais factores que predispõem a aderências são: ileo pós-cirúrgico, isquémia,
presença de corpos estranhos, abrasão das serosas por toalhas, excesso de manuseio das

47
alças intestinais, utilização de muito material de sutura (Freeman, 2005b), cirurgia ao ID,
enterotomia, enterectomia e repetição da laparotomia (Marr, 2008).
Uma vez que o ileo pós-cirúrgico pode aumentar o risco de formação de aderências por
favorecimento de contacto prolongado entre diferentes porções intestinais, este risco pode
ser reduzido, em teoria, por estimulação da motilidade precoce, induzida pós-cirurgicamente
pela alimentação (Freeman, 2005b). A distensão intestinal, quando suficientemente severa,
leva a inflamação da parede do intestino e a redução da motilidade intestinal o que
eventualmente também favorece a formação de adesões (White II, 2006d).
Métodos para a profilaxia de aderências são: manuseio e contaminação mínimos do tecido
durante a cirurgia, lavagem abdominal intra-cirúrgica, instilação ou aplicação de polímeros
hidrofílicos de alto peso molecular, antibióticos e AINE’s durante o período pós-cirúrgico,
dimetilsulfóxido (DSMO) na dose de 20 mg/kg p.v., diluído até uma concentração inferior a
10% EV, BID ou heparina (Marr, 2008).
As aderências são muito raras após cirurgia ao cólon maior, mas o cólon menor parece ser
tão susceptível como o ID (Freeman, 2005b), não sendo raro o desenvolvimento de
aderências no cólon menor após massagem no local de impactação, punção, injecção de
soro fisiológico para desfazer a impactação ou enterotomia (Freeman, 2003a).
Os principais factores de risco para a formação de peritonite são: enterotomia, enterectomia,
cirurgia prolongada e endotoxémia. É uma patologia reconhecida pela presença de febre,
depressão, cólica e supuração através da incisão laparotómica (Pagliosa & Alves, 2004;
Marr, 2008) e caracteriza-se por tensão abdominal e debilidade orgânica (Pagliosa & Alves,
2004). O tratamento consiste na administração de antibióticos de largo espectro (como a
penicilina com gentamicina, metronidazole, enrofloxacina, trimetoprim ou sulfonamida com
rifampicina) associada a lavagem peritoneal (Marr, 2008). As consequências do
desenvolvimento de peritonite podem ser morbilidade grave e morte do paciente (Pagliosa &
Alves, 2004).

3.2.4 – Outras complicações pós-cirúrgicas


A recidiva da lesão inicial, deterioração continuada do intestino isquémico, endotoxémia,
enterocolite e peritonite são mais comuns após a cirurgia ao IG do que após a cirurgia ao ID
(Freeman, 2005b).
Ao nível da anastomose, pode ocorrer obstrução devido a inversão, intussuscepção
anastomótica, enfarte, hematoma, encurtamento do mesentério, defeitos mesentéricos,
hemorragia mesentérica e desalinhamento intestinal ou deiscência anastomótica com
peritonite, que felizmente são complicações raras e geralmente são causadas por isquémia
pós-cirúrgica e erro técnico. A obstrução anastomótica prolongada pode levar à formação de
aderências. Estomas de tamanho reduzido estão propensos a obstrução, o que exacerba o
ileo pós-cirúrgico (Freeman, 2005b).
48
Uma hemorragia fatal pode ser causada pela eliminação involuntária da veia porta durante a
extracção de intestino estrangulado do forâmen epiplóico ou por falta de eficácia na ligação
dos vasos mesentéricos.
Uma complicação rara da jejunocecostomia é a obstrução do orifício cecocólico por uma
intussuscepção ileal no ceco que avançou para o cólon ventral direito. Um método para
evitar este problema é deixar a parte ileal restante, tão curta quanto possível (Freeman,
2005b).
O desenvolvimento de CID é outra complicação possível e está associada a sepsis,
neoplasia sistémica, enterite e colite. Os sinais clínicos em grandes animais, manifestam-se
por trombose, hemorragias petequiais e sangramento nos locais de venopunctura, locais
incisionais e na sequência de entubação nasogástrica. O tratamento prende-se à
administração de plasma e heparina, assim como suporte circulatório. O prognóstico é pobre
se estão presentes manifestações clínicas (Marr, 2008).
A maioria das tromboses da veia jugular, está associada a cateterização ou injecção EV. O
tratamento desta patologia consiste na administração de antibióticos de largo espectro,
AINE’s sistémicos ou tópicos (DMSO), elevação da cabeça e termoterapia local a quente
(Marr, 2008).
O síndrome do intestino curto é rara, devido ao conceito original de que a ressecção de uma
porção superior a 50% do ID pode levar a má absorção. Em póneis, a ressecção de 70% do
ID é bem tolerada, embora o limite tolerado de extensão para a enterectomia possa sofrer
variações individuais nos cavalos. O congestionamento da parede intestinal pode aumentar
o comprimento do segmento afectado do intestino delgado até 36%, de forma que alguma
correcção para o aumento no comprimento que se segue ao estrangulamento é necessária,
para evitar uma estimativa excessivamente pessimista do risco de síndrome do intestino
curto. Um comprimento mínimo de 4,5 m de ID deixado intáctil, pode ser útil num cavalo
adulto. Outras possíveis complicações da ressecção extensa do ID são o desenvolvimento
de doença hepática e de anorexia (Freeman, 2005b).
As laminites são uma possível complicação após cólicas severas em geral, e não têm
relação directa com o procedimento cirúrgico, estando associadas com a presença de
endotoxémia e choque séptico. Os sinais de laminite são: pulso digital aumentado, cascos
quentes, caminhar doloroso, claudicação bilateral dos membros anteriores e deslocamento
frequente de peso entre os membros esquerdo e direito (Southwood, 2005b). Para impedir o
desenvolvimento de laminites, a administração de heparina de baixo peso molecular parece
útil pós-cirurgicamente em cavalos sujeitos a laparotomia, certamente devido às suas
propriedades anti-inflamatórias (Rebiere et al, 2008).
A repetição da laparotomia é um procedimento vital para o tratamento de complicações e
está indicada mais frequentemente após cirurgias ao ID do que após procedimentos no IG.

49
Duas importantes desvantagens de uma segunda exploração abdominal são os riscos de
complicações incisionais e os custos (Freeman, 2005b).

50
CAPÍTULO III – CASOS CLÍNICOS
1 – CRITÉRIOS, RESOLUÇÃO CIRÚRGICA E PÓS-OPERATÓRIO
NA CLÍNICA HÍPICA
Durante o período de estágio houve possibilidade de observação de 6 laparotomias pela
linha média ventral. Observaram-se várias enterotomias, não havendo no entanto nenhum
caso cuja resolução cirúrgica tivesse incluído enterectomia e anastomose intestinal.
Em seguida serão referidos os principais critérios, a técnica cirúrgica (incluindo o protocolo
anestésico e medicação intra-cirúrgica) e o protocolo pós-operatório utilizados na Clínica
Hípica.

1.1 – Critérios utilizados na Clínica Hípica


Por regra, na Clínica Hípica, o exame de estado geral para decisão cirúrgica é realizado de
forma rápida e concisa, evitando o desaproveitamento do tempo com dados que se
encontram alterados pela medicação (como a FC, FR, motilidade intestinal ou mesmo
temperatura) ou outros que não sejam imprescindíveis para a decisão sobre o
encaminhamento do animal para cirurgia, como a maioria dos exames laboratoriais.
Assim que se tem conhecimento da chegada de um paciente com cólica complicada, a sala
de cirurgia é prontamente preparada para que o encaminhamento do animal para cirurgia
seja o mais breve possível, em caso de necessidade.
Após a observação do paciente no acto da sua entrada na clínica, a análise visual da
mucosa oral (cor, humidade e TRC) e da elasticidade da pele do animal, permitem-nos
avaliar o grau de desidratação e de endotoxémia, assim como a necessidade de
estabilização urgente do estado do paciente.
Um dos primeiros procedimentos a efectuar é a sondagem nasogástrica. A presença de
conteúdo gástrico, quantidade de fluido e a sua origem (explorada através da medição do
pH quando há suspeita de origem entérica do refluxo) são dados a que se tem acesso
rapidamente através deste exame que permite ainda a lavagem e o esvaziamento do
estômago (um procedimento importante para evitar a sua ruptura quando está presente
conteúdo volumoso, assim como algum impedimento físico ou mecânico à progressão desse
conteúdo).
Em seguida, no caso de se tratar de um macho inteiro, observa-se o escroto para pesquisar
a presença de hérnia inguinal. Continuando até à zona mais caudal do paciente, procede-se
ao exame por palpação rectal.
É frequente conseguir-se tomar a decisão sobre a necessidade cirúrgica apenas com os
procedimentos descritos e nestas situações o cavalo é imediatamente encaminhado para a
cirurgia. Em situações menos esclarecedoras, a abordagem seguinte realiza-se através de
51
paracentese abdominal. Na clínica hípica não é frequente recorrer à realização de ecografia
abdominal, radiografia ou endoscopia em pacientes com cólica.
Entretanto, ambas as veias jugulares do cavalo são cateterizadas, sendo muitas vezes
recolhida uma amostra de sangue para calcular mais rigorosamente o grau de desidratação
do cavalo (através da medição do HT e das PT) e é iniciada a fluidoterapia. A tricotomia de
toda a zona abdominal ventral (desde a zona do púbis ou do prepúcio até ao processo
xifóide) também é realizada durante esta fase desde que o animal o permita sem prejudicar
a realização da avaliação do paciente. Em cavalos mais irrequietos ou assustados, a
tricotomia apenas é realizada após o derrube do animal, quando este já se encontra na
mesa cirúrgica.

1.2 – Desenvolvimento cirúrgico na Clínica Hípica


Uma vez que o animal seja encaminhado para cirurgia, a fluidoterapia é interrompida,
tapam-se os cateteres com tampas próprias e procede-se à pré-anestesia com a
administração de xilazina (1,1 mg/kg p.v. EV). Enquanto se espera pelos sinais de sedação
(cavalo fica calmo, com o pescoço estendido e a cabeça baixa), encaminha-se o paciente
para a boxe de indução. Passados cerca de 10 min, é efectuada a indução anestésica. O
protocolo anestésico utilizado na clínica hípica inclui a administração de diazepam (0,03
mg/kg p.v. a 0,5 mg/kg p.v. EV lento) seguida de ketamina (1,5 mg/kg p.v. a 2 mg/kg p.v.
EV).
Assim que o animal é derrubado, coloca-se um tubo endotraqueal, enche-se o cuff e o
cavalo é transportado até à mesa cirúrgica. É posicionado em decúbito dorsal, ligado ao
aparelho de anestesia volátil, recomeça-se a fluidoterapia (com soro fisiológico alternado
com lactato de Ringer) e dá-se início à preparação do campo cirúrgico. A sonda
nasogástrica permanece colocada durante toda a cirurgia e é importante o seu
esvaziamento após o derrube do animal. Com o cavalo deitado, a cabeça fica numa posição
mais baixa e por força da gravidade há saída de conteúdo gástrico, agravado pelo facto de
muitas vezes não ter havido jejum antes da sujeição à anestesia geral.
A manutenção anestésica é feita com isoflurano (começando em 2,5% e ajustando de forma
a manter o paciente no plano anestésico adequado) e fluxo de O2 de 4,5% a 6%.
Simultaneamente a tricotomia é aperfeiçoada e começa-se a assepsia da zona através da
lavagem com iodopovidona, utilizando uma escova Biotrat® (escova/esponja contendo
solução de iodopovidona espuma a 10%). Remove-se a espuma com uma solução de álcool
iodado (solução de iodopovidona com álcool), coloca-se iodopovidona líquida e deixa-se
actuar até ao início da cirurgia.
Nos animais do sexo masculino realiza-se uma sutura contínua ao nível do prepúcio com a
finalidade de prevenir a contaminação do campo operatório com urina.

52
Na Clínica Hípica, todo o material de tecido ou plástico utilizado é descartável,
nomeadamente batas, luvas, toucas, máscaras, campos de mesa e campos cirúrgicos. Após
a preparação do cirurgião com assepsia das mãos e antebraços e colocação de uma bata
esterilizada, segue-se a colocação dos campos cirúrgicos (não só no campo operatório mas
também a proteger todos os membros do animal para que o cirurgião se possa mover
livremente sem se contaminar no corpo do paciente e para reduzir o risco de contaminação
das porções intestinais que são exteriorizadas) e preparação da mesa cirúrgica com todo o
material necessário para a execução da cirurgia.
A incisão cirúrgica é realizada mais cranial ou caudalmente conforme a zona do abdómen
onde se suspeita estar localizada a alteração patológica. A incisão da pele é executada com
a utilização de um bisturi até exposição da linha alba, com o auxílio de uma sonda canelada.
Para a incisão da parede abdominal propriamente dita utiliza-se uma tesoura de Lister.
Durante este procedimento começa a ser administrada dopamina (2 a 10 µg/kg p.v./min EV)
em infusão contínua, quando necessário, para aumentar a pressão sanguínea.
Uma vez aberta a cavidade abdominal, procede-se à identificação das diferentes estruturas
nela contidas, descompressão das porções intestinais que se encontram distendidas devido
ao seu conteúdo (principalmente gasoso), identificam-se as alterações presentes e
programa-se o resto da cirurgia tendo em vista a sua resolução. Para descompressão
intestinal, punciona-se o intestino com uma agulha, após assepsia da parede intestinal com
iodopovidona líquida. À agulha acopla-se uma das extremidades de um sistema de
fluidoterapia ao qual foram retiradas as extremidades (restando apenas o tubo). A outra
extremidade é ligada a um descompressor que funciona por meio de sucção. Após a
retirada da agulha volta a passar-se uma compressa com iodopovidona líquida.
Durante todo o período de anestesia é importante a monitorização da FR, FC, pressão
sanguínea arterial e reflexo corneal, assim como o estado das mucosas e TRC. É ainda
administrado por infusão EV um suplemento à base de cálcio, fósforo e magnésio. A
hipocalcémia é frequente em animais sujeitos a estase intestinal ou cólica prolongada, em
que não houve ingestão de alimento durante algumas horas, ou esta esteve severamente
diminuída. Também a administração de 2 L a 3 L de solução de glicose a 5% vai auxiliar a
reposição energética que se encontra em balanço negativo.
Para combater a acidose metabólica frequente nestes pacientes, administra-se bicarbonato
de sódio, também em infusão contínua. A antibioterapia é iniciada através da administração
de gentamicina (4,4 mg/kg p.v. a 6,6 mg/kg p.v. EV) e de benzilpenicilina potássica (10.000
UI/kg p.v. a 50.000 UI/kg p.v. EV) durante a cirurgia.
É importante que as vísceras exteriorizadas sejam sempre mantidas húmidas, para evitar a
sua lesão. Antes de proceder à sutura da cavidade abdominal são colocados intra-
abdominalmente 2 L de solução de DMSO a 10%. Este procedimento tem efeito anti-

53
inflamatório local e previne a ocorrência de aderências. Após a resolução cirúrgica do
problema, segue-se a laparorrafia que na clínica Hípica é executada em 3 planos:
• Sutura do peritoneu e fáscia muscular, recorrendo a um padrão de sutura em X e
com a utilização de fio de poliglactina (Vicryl®) nº 2;
• Redução do espaço morto e aproximação dos bordos da ferida incluindo o tecido
subcutâneo, com uma sutura contínua simples e fio de poliglactina nº 2;
• Sintese da pele com sutura contínua encadeada e fio de poliglactina nº 1; em
incisões mais compridas, recorre-se à execução de duas suturas contínuas
encadeadas, no lugar de uma.
Imediatamente após o fim da cirurgia (antes de o animal acordar), administra-se ainda
flunixina meglumina (AINE) e uma associação de penicilina e estreptomicina (3.000.000 UI
de benzilpenicilina benzatina; 1.5000.000 UI de benzilpenicilina procaínica; 1.500.000 UI
benzilpenicilina potássica; 1.250 mg de dihidroestreptomicina base; 1.250 mg de
estreptomicina base – Pentabiótico Veterinário Reforçado, Fort Dodge Saúde Animal®).
A administração de anestésico volátil é cessada, são retirados os panos de campo e
transporta-se o animal de volta para a boxe onde foi realizada a indução anestésica e o
derrube do paciente. Aí é levada a cabo a sua recuperação, após a remoção do tubo
endotraqueal. É colocado um cabeção que fica preso a uma corda que atravessa um dos
cantos superiores da boxe. A cauda fica presa a outra corda que passa pelo canto superior
oposto (na oblíqua). Quando o animal começa com esforços para se levantar, ambas as
cordas são traccionadas com o objectivo de auxiliar a manutenção do equilíbrio.
Após estabilizar o suficiente para permitir a sua condução, o cavalo é encaminhado para
uma boxe normal.

1.3 – Pós-operatório na Clínica Hípica


O protocolo de medicação pós-cirúrgica adoptado pela Clínica Hípica em animais sujeitos a
laparotomia, consiste na associação de antibioterapia com analgesia e terapia anti-
inflamatória
A antibioterapia associada é composta por:
• Gentamicina (4,4 mg/kg p.v. a 6,6 mg/kg p.v. EV, SID): aminoglicosídeo efectivo
contra stafilococci e bactérias gram-negativas; a sua acção é dependente da
concentração;
• Pentabiótico veterinário reforçado, Fort Dodge Saúde Animal® (associação de
penicilina e estreptomicina; administração de um frasco que contém as doses
referidas anteriormente, IM, SID): tal como a gentamicina, também as
estreptomicinas são aminoglicosídeos, e como tal têm efeitos semelhantes; as
penicilinas actuam principalmente contra bactérias aeróbicas e anaeróbicas;

54
• Metronidazole (10 mg a 25 mg PO, BID): é um antibiótico com efeito contra
protozoários e contra muitas bactérias anaeróbicas.
Para a analgesia e para a terapia anti-inflamatória, recorre-se à administração de flunixina
meglumina (1,1 mg/kg p.v. EV, SID). Esta terapêutica tem geralmente 10 dias de duração,
podendo no entanto ser regulada de acordo com a situação. Topicamente procede-se à
limpeza diária da zona suturada com iodopovidona líquida seguida da aplicação de um
spray à base de sulfadiazina prata e cipermetrina com efeito larvicida, cicatrizante,
repelente, antisséptico e hemostático. Este procedimento permite também a observação da
ferida e detecção precoce de qualquer alteração ao nível da sutura. Durante o internamento
do animal, são ainda realizados passeios diários para o animal comer e pastar durante 30
min a 60 min, estimulando não só a motilidade do tracto GI, mas também o sistema
músculo-esquelético e diminuindo o stress.
Por regra, no primeiro dia pós-cirúrgico são administrados 30 L de fluidos (cerca de 20 L de
lactato de Ringer e 10 L de solução fisiológica) e no 2º dia pós-cirúrgico são administrados
mais 15 L de fluidos, na mesma proporção. De acordo com o caso, pode considerar-se
conveniente a recolha de sangue para HT e PT. Nessas situações a quantidade de fluidos
administrada é ajustada de acordo com o grau de desidratação apresentado.
Entre as 12h e as 18h após o fim da cirurgia é fornecido pasto verde ao animal, permitindo
avaliar se o animal procede à sua ingestão. A ingestão precoce de alimentos vai não só
estimular o peristaltismo intestinal, como fornecer nutrientes. Após um episódio de cólica
seguido de uma cirurgia abdominal, é normal que os pacientes se encontrem debilitados e
sub-nutridos.
Ao 10º dia pós-operatório, são retirados os pontos, descontinua-se a medicação e caso não
haja complicações, o animal tem alta.

55
2 – CASO CLÍNICO Nº1
Raça: Crioulo
Idade: 9 anos
Sexo: Masculino (inteiro)
História pregressa: Cólica com cerca de 48h de duração. Segundo o proprietário o animal
estava solto numa paddock e deu alguns “pinotes” após o que ficou com uma atitude
diferente, mais apática. Já tinha sido medicado várias vezes (desconhece-se qual o fármaco
administrado), com reaparecimento dos sintomas após algumas horas.
Após a chegada à Clínica Hípica, procedeu-se ao exame de estado geral, para o qual houve
necessidade de sedar o animal recorrendo à administração de xilazina EV, de modo a
cessar as suas tentativas para se deitar.
Exame físico: O animal apresentava várias escoriações ao nível da cabeça, principalmente
sobre os olhos e nas orelhas, dando indícios de ter vivido uma dor bastante severa. Durante
a entubação nasogástrica não se detectou refluxo abundante e procedeu-se a lavagem
gástrica. Retenção da prega de pele por alguns segundos, sugerindo a presença de
desidratação moderada a grave. Começou-se a fluidoterapia imediatamente. O exame rectal
revelou distensão do cólon maior, com alteração da topografia normal do mesmo.
O animal foi encaminhado para cirurgia com um importante pedido de retenção de custos
por parte do proprietário.
Cirurgia: Após incisão da cavidade abdominal procedeu-se a descompressão intestinal.
Detectou-se um deslocamento do cólon que foi prontamente corrigido, apesar de haver
alteração significativa na coloração das ansas intestinais. A viabilidade intestinal era
bastante suspeita, no entanto finalizou-se a cirurgia, suturou-se e o animal acordou bem,
sendo encaminhado para a boxe.
1º dia pós-cirúrgico: Fez-se a fluidoterapia e medicação de acordo com o protocolo
apresentado, adicionando 2 ml de lidocaína a 2% (administrada devido à sua acção pró-
cinética e diluída durante a fluidoterapia em infusão contínua EV). O animal não comeu e
apresentava diarreia líquida, passando a maior parte do tempo deitado.
2º dia pós-cirúrgico: Fez-se a medicação antibacteriana e anti-inflamatória, passeou-se a
passo apesar de o animal não ligar muito ao pasto e fez-se assepsia do local da incisão.
Devido à continuação da diarreia administrou-se novamente 30 L de fluidos (para repor a
perda aumentada). O cavalo continuou sem comer e passou novamente muito tempo
deitado.
3º dia pós-cirúrgico: Procedeu-se à medicação sistémica e ao tratamento local. A diarreia
continuou presente e o animal manteve-se deitado todo o dia sem comer. Apresentava-se
um pouco mais magro. Devido à presença de diarreia profusa, que não melhorou algum
tempo após a cirurgia e pela fraqueza geral do animal que passava o dia deitado, optou-se

56
pela administração de dipropionato de imidocarb (1 ml/50 kg p.v. IM, SID), para diagnóstico
terapêutico de babesiose.
4º dia pós-cirúrgico: Não houve alteração do estado do animal. Recolheu-se sangue e os
resultados foram HT: 53% e PT: 5,7 g/dL, correspondendo a uma desidratação leve,
justificada pela continuação da diarreia. Administrou-se 30 L de fluidos, dipropionato de
imidocarb (1ml/50 kg p.v. IM, SID), continuou-se a terapêutica anti-inflamatória e
antibacteriana e administrou-se ainda um probiótico, para tentar recompor a flora intestinal
benéfica através de exclusão competitiva, tendo em vista o controlo da diarreia. O animal
continuou deitado durante o dia todo e sem comer.
5º dia pós-cirúrgico: Foi a última administração de dipropionato de imidocarb, na mesma
dose que nos dias anteriores. Deu-se continuação à medicação com antibióticos e anti-
inflamatório. Apesar do mau estado do animal a zona da sutura apresentou-se sempre limpa
e com boa cicatrização. Continuou-se a fazer a sua limpeza e assepsia diárias.
6º dia pós-cirúrgico: O tratamento com dipropionato de imidocarb, não exerceu qualquer
efeito. A diarreia continuou, o paciente continuou praticamente sem comer, passando o dia
todo deitado e mostrando alguma relutância em mexer-se. Continuou-se com os antibióticos
e com o AINE.
7º dia pós-cirúrgico: De manhã a temperatura corporal estava nos 39,5ºC. Voltou a recolher-
se sangue para avaliar o nível de desidratação: HT: 55%, PT: 5,5 g/dL (desidratação leve).
Administraram-se 25 L de fluidos (15 L de lactato de Ringer e 10 L de soro fisiológico) e
ainda uma embalagem de complexo vitamínico-mineral, re-hidratante energético e
desintoxicante (Amino vit, Fort Dodge®) para combater o estado de sub-nutrição em que o
animal se encontrava. Continuou-se com a antibioterapia e com a administração de flunixina
meglumina. Devido à frequente administração EV, formaram-se hematomas em ambas as
veias jugulares, que foram tratados pela aplicação local de DMSO em gel e pela realização
de termoterapia a quente durante 15 minutos em cada veia. Ao fim da tarde a temperatura
corporal tinha normalizado (37,8ºC).
8º dia pós-cirúrgico: Continuou-se a medicação assim como o tratamento das veias
jugulares. O cavalo apresentava temperatura corporal de 38,8ºC antes da medicação.
Continuou a passar todo o dia deitado, mas começou a comer algum pasto, quando este era
colocado ao seu alcance.
9º dia pós-cirúrgico: Tentou-se uma nova abordagem para o tratamento da diarreia, com a
administração de Enterex® e novamente probiótico. Enterex® (associação de carvão
activado, zeolita, caolim e pectina) é altamente adsorvente e está indicado em caso de
diarreia inespecífica como agente de limpeza de todo o tracto GI, exercendo uma acção
protectora sobre a mucosa intestinal. No entanto, é imprescindível ter o cuidado de proceder
à sua administração com pelo menos 2 h de intervalo de qualquer outra medicação PO
(neste caso, com 2 h de intervalo de ambas as administrações de metronidazole e da

57
administração de probiótico). Continuou-se o tratamento das veias jugulares assim como a
antibioterapia e a administração de AINE’s. A temperatura corporal apresentava-se nos
38,5ºC antes das administrações medicamentosas.
10º dia pós-cirúrgico: Ultimo dia da antibioterapia (excepto metronidazole), retirou-se os
pontos e procedeu-se à limpeza do tecido cicatrizado. Foi também o último dia de
administração de flunixina meglumina. O cavalo apresentava 38,8ºC de temperatura rectal.
As fezes deixaram de ser líquidas e passaram a pastosas, mas continuou-se com a
administração de Enterex® e probiótico. Recolheu-se sangue novamente: HT: 52%; PT:
6,2% (desidratação leve). Continuou-se o tratamento das veias jugulares com aplicação
local de DMSO seguida de 15 min de termoterapia a quente em cada veia. O animal
mostrava cada vez mais relutância em levantar-se e mesmo em movimentar-se.
11º dia pós-cirúrgico: As fezes já apresentavam consistência normal e o apetite estava mais
normalizado. No entanto o animal continuava muito magro e a passar muito tempo deitado.
Parou-se toda a medicação excepto o metronidazole PO.
12º e 13º dias pós-cirúrgicos: Administrou-se metronidazole PO. As fezes mantiveram-se
normais e o animal estava a comer melhor, mas continuava deitado e realizava sons
associados a dor quando era obrigado a mover-se ou a levantar-se.
14º dia pós-cirúrgico: O animal foi obrigado a levantar-se e a andar um pouco. Aparentava
ter dores intensas em todo o corpo e mostrava uma grande relutância em mover-se. Os
cascos apresentavam-se quentes e houve suspeita de laminite devido a excesso de toxinas
em circulação durante o episódio de cólica. Foi colocada uma bota a tapar o casco em
ambos os membros anteriores, com uma porção de algodão enrolada na zona das ranilhas.
Administrou-se metronidazole PO assim como fenilbutazona, um AINE com efeito
analgésico sobre o sistema músculo-esquelético. Optou-se por fenilbutazona PO para
possibilitar a sua fácil administração pelo tratador quando o paciente tiver alta e como forma
de suspender as administrações nas veias jugulares. Devido ao tempo que o animal
permanecia deitado, estavam presentes feridas de decúbito espalhadas por todo o corpo,
mas principalmente ao nível da ponta das ancas e cabeça, tendo sido colocado topicamente
um unguento à base de permetrina e óxido de zinco, com acção larvicida, repelente e
cicatrizante.
15º e 16º dias pós-cirúrgicos: Administrou-se oralmente metronidazole e fenilbutazona. O
cavalo continuava a passar grande parte do dia deitado mas já comia normalmente e as
fezes continuavam normais.
17º dia pós-cirúrgico: Continuou-se com as administrações orais de metronidazole e de
fenilbutazona, assim como com a aplicação tópica de unguento. Trocaram-se as botas dos
membros anteriores, colocando desta vez uma palmilha plástica protectora na zona dos
talões e ranilha (“lilly pad”), em vez do algodão.

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18º e 19º dias pós-cirúrgicos: Manteve-se a mesma medicação. O cavalo continuava com
alguma relutância em mover-se mas já o fazia com um pouco mais facilidade. A ingestão de
alimentos manteve-se normal.
20º dia pós-cirúrgico: O paciente teve alta. Fim da medicação com metronidazole. Levou
indicações para continuar as tomas diárias de fenilbutazona PO durante mais 7 dias,
continuar a colocar o unguento nas feridas de decúbito e ainda foi receitado omeprazol, um
inibidor da bomba de protões, com acção citoprotectora GI, importante pelo risco acrescido
de ocorrência de úlceras gástricas pela administração prolongada de AINE’s.
Um mês e meio após a cirurgia: O proprietário telefonou e relatou que o animal já passava
menos tempo deitado e estava a recuperar bem.

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3 – CASO CLÍNICO Nº 2
Raça: Crioulo
Idade: Desconhecida (cavalo adulto)
Sexo: Masculino (inteiro)
História pregressa: Praticamente desconhecida. O animal apresentou dor severa, não se
sabe qual a duração do episódio de cólica e foi medicado (foi utilizado alternativamente
xilazina e flunixina meglumina, com um total de 3 administrações, incluindo uma durante o
transporte). A resposta à medicação foi de curta duração, pelo que foram recomendados a
encaminhar o animal até ao centro de referência.
Exame físico: O animal chegou suado dando indicação de ter vivido dor severa, apesar de
se encontrar sedado e encontrava-se com o abdómen dilatado. A entubação nasogástrica
revelou refluxo abundante de origem entérica (pH 6). O exame rectal revelou a presença de
ID distendido, ocupando praticamente toda a cavidade abdominal, assim como a ausência
de fezes. Devido à presença de dilatação abdominal, fez-se uma enterocentese. Mediram-se
alguns parâmetros com uma “fita de urianálise”. As PT eram aproximadamente 6g/dl. Fez-se
fluidoterapia em infusão contínua rápida com o auxílio de bombas que provocam pressão
positiva dentro da garrafa de fluido, acelerando a taxa de administração. Após a
administração de 10 L de fluidos o cavalo foi encaminhado para cirurgia com suspeita de
obstrução intestinal.
Cirurgia: Imediatamente após incisão da cavidade abdominal, uma grande porção de ID
muito distendido ficou exposta fora da cavidade abdominal. Procedeu-se à sua
descompressão, de modo a permitir a inspecção do restante tracto GI. A parede intestinal
encontrava-se alterada. Iniciando-se a inspecção visceral, detectou-se uma torção do ID
com cerca de 20 cm de extensão. Tendo em conta a extensão da torção a as alterações
encontradas ao nível da parede intestinal provocadas pela distensão e isquémia presentes,
optou-se por eutanasiar o paciente.

60
4 – CASO CLÍNICO Nº 3
Raça: Crioulo
Idade: 13 anos
Sexo: Masculino (inteiro)
História pregressa: O animal começou com sintomatologia de cólica umas horas antes da
chegada à Clínica Hípica. Foi medicado e uma vez que os sintomas de dor abdominal
voltaram rapidamente, o proprietário tomou a iniciativa de transportar o cavalo até ao centro
de referência. Não comeu nem defecou desde o início da sintomatologia.
Exame físico: À sua chegada à clínica, o animal encontrava-se suado e estava bastante
agitado, tendo de ser sedado para permitir a entubação nasogástrica (recorreu-se
simultaneamente à utilização do aziar). Estava presente refluxo abundante. Observou-se a
zona do escroto que se encontrava normal. O exame por palpação rectal revelou ausência
de fezes e presença de uma massa dura no interior do IG. Suspeita de impactação,
fecaloma ou enterolitíase. Colheu-se sangue: HT: 42, PT: 7,6 g/dL(desidratação leve).
Uma vez que simultaneamente estava presente outro cavalo com cólica cirúrgica e já estava
pronto para a cirurgia, cateterizou-se o animal e fez-se fluidoterapia durante a espera, para
estabilizar o paciente e possivelmente desfazer a massa presente, pela sua hiper-
hidratação. Após 3h de fluidoterapia (reposição de cerca de 20 L de fluidos) a sala de
cirurgia voltou a ficar disponível. O animal não defecou durante este período e repetiu-se o
exame rectal. Não houve alterações. O animal foi encaminhado para cirurgia.
Cirurgia: Após incisão da cavidade abdominal, foi detectada uma impactação no cólon
maior. Procedeu-se a enterotomia ao nível da flexura pélvica. Para a realização de uma
enterotomia tem de se proceder à exteriorização da zona intestinal onde se pretende realizar
a incisão, para fora da cavidade abdominal. Aplicam-se vários panos de campo (na clínica
hípica utilizam-se 3 campos plásticos descartáveis) a separar o local da enterotomia do
resto do campo cirúrgico. Este procedimento é imprescindível para evitar a contaminação da
cavidade peritoneal ou do restante campo cirúrgico com conteúdo intestinal. Recorre-se
também à utilização de uma nova mesa cirúrgica e não há mistura do material utilizado na
zona limpa com o material utilizado na zona suja. Do mesmo modo, cada um dos dois
cirurgiões manuseia apenas uma das zonas do campo operatório, ou a zona limpa, ou a
zona suja.
A incisão é orientada longitudinalmente para reduzir a tensão pós-cirúrgica na zona da
sutura e realiza-se sobre a ténia anti-mesentérica, atingindo todos os planos da parede
intestinal.
Fez-se lavagem intestinal, com o auxílio de uma mangueira, massajando em seguida o
conteúdo intestinal na direcção da abertura. A completa evacuação de alimento e fluido
adjacente ao local de incisão (tanto no sentido oral como aboral), minimiza o derrame de
conteúdo durante a exploração intestinal posteriormente à enterorrafia. Durante a lavagem
61
intestinal, foi detectada a presença de um enterólito. Tentou-se a sua movimentação até ao
local da incisão, após a remoção de todo o conteúdo intestinal presente, mas a deslocação
do enterólito sem levar a lesões ao nível da parede intestinal não foi possível. Optou-se por
fechar o local da enterotomia e fazer uma outra mais próxima do entorólito. Procedeu-se à
sua remoção e novamente a lavagem intestinal.
Para a enterorrafia utiliza-se fio de poliglactina nº 2-0 em duas camadas de pontos contínuos
invaginantes. Após a sutura de ambas as zonas de enterotomia (e zonas intestinais
adjacentes ao local), as mesmas foram irrigadas sem pressão com uma solução de
iodopovidona diluída em 1 L de soro fisiológico, até uma concentração final de 10%. A
assepsia da zona suja recorrendo à utilização de iodopovidona reduz o risco do
desenvolvimento de peritonites, um dos riscos relacionados com a realização de
laparotomia, principalmente quando associada a enterotomia.
Após a finalização da enterotomia, lavagem intestinal, remoção do enterólito, enterorrafia e
assepsia da zona, removem-se os campos da zona suja e o cirurgião tem de voltar a
esterilizar-se antes de dar continuação à cirurgia. Verificou-se o resto do tracto GI que não
apresentava mais alterações e procedeu-se à celiorrafia.
No fim da cirurgia, antes de o animal acordar da anestesia, foi administrado, para além da
medicação padrão utilizada na Clínica Hípica, xilazina EV (1,1 mg/kg p.v.) para evitar uma
grande excitação durante a recuperação uma vez que se tratava de um animal com
comportamento bastante agitado. O paciente foi em seguida transportado para a boxe de
recuperação onde acordou bem e foi depois encaminhado para a boxe.
1º dia pós-cirúrgico: Fluidoterapia (10 L de soro fisiológico e 20 L de lactato de Ringer).
Procedeu-se à medicação, no entanto, tal como o proprietário havia alertado, não foi
possível a administração da medicação oral (metronidazole), nem directamente, nem
misturada com a alimentação. O animal comeu bem e defecou normalmente. Não havia
disponível na clínica metronidazole em solução injectável pelo que se arriscou deixar o
paciente sem esta medicação, apesar de ter sido sujeito a duas enterotomias.
2º ao 9º dias pós-cirúrgicos: O animal apresentava-se bem, comia normalmente, as fezes
eram normais e fez os passeios diários e a medicação (gentamicina, penicilinas com
estreptomicinas e flunixina meglumina). A sutura foi limpa e desinfectada diariamente e
apresentava-se seca e sem qualquer alteração.
10º dia pós-cirúrgico: Último dia de medicação. Apesar de não ter sido administrado
metronidazole, o animal recuperou normalmente, sem complicações aparentes. Foram
retirados os pontos e a cicatriz encontrava-se em boas condições.
11º dia pós-cirúrgico: O paciente teve alta.

62
5 – CASO CLÍNICO Nº 4
Raça: Indefinida
Idade: Desconhecida (cavalo adulto)
Sexo: Masculino (inteiro)
História pregressa: História de laparotomia prévia (presença de uma cicatriz na linha média
ventral). Antes do encaminhamento do animal para a Clínica Hípica, tinha havido uma
tentativa falhada de entubação nasogástrica, mas devido à grande resistência presente não
foi possível transpor o cárdia.
Exame físico: O animal entrou na clínica muito deprimido, suado, com a mucosa oral
cianosada, TRC muito prolongado e pulso fraco (sinais de choque). Procedeu-se
imediatamente à entubação nasogástrica. Apesar de estar presente bastante resistência
física à passagem da sonda, conseguiu-se atravessar o cárdia. Tal resistência era devido à
abundância de conteúdo gástrico presente (impactação gástrica). Procedeu-se a lavagem
gástrica. O conteúdo gástrico estava muito seco e sólido, pelo que houve necessidade de
repetir o procedimento várias vezes até que praticamente todo o conteúdo do estômago
tivesse sido removido. Após a lavagem gástrica as mucosas do paciente voltaram a ficar
rosadas e o TRC normalizou (inferior a 2 seg). O animal foi encaminhado para cirurgia.
Cirurgia: Após incisão ao nível da linha média abdominal ventral, detectou-se a presença de
abundante fluido abdominal com pequenas partículas de palha. O diagnóstico foi feito de
imediato: ruptura GI. Procedeu-se imediatamente a eutanásia, sem se explorar qual a zona
do tracto GI onde se deu a ruptura.

63
6 – CASO CLÍNICO Nº 5
Raça: Crioula
Idade: Desconhecida (cavalo adulto)
Sexo: Feminino
História pregressa: Desconhecida
Exame físico: Entrada na clínica calma, apesar apresentar algum grau de sudorese.
Procedeu-se à entubação nasogástrica, que não demonstrou presença de refluxo
abundante. Seguiu-se o exame por via transrectal, no qual se detectou uma massa de
consistência dura no interior do cólon maior, assim como ausência de fezes. Houve suspeita
de enterolitíase e a égua foi encaminhada para cirurgia.
Cirurgia: Após incisão da parede abdominal e durante a inspecção do tracto GI, detectou-se
uma massa dentro do cólon maior, aparentemente um enterólito. Procedeu-se à enterotomia
ao nível da flexura pélvica, através da qual a massa foi facilmente removida. Apesar de ser
de consistência bastante dura, não se tratava de um enterólito mas sim de um fecaloma.
Fez-se lavagem intestinal. O tracto GI apresentava-se sem outras alterações. Após a sua
total inspeção e administração intra-abdominal de 2 L de DMSO a 10%, executou-se a
sutura da cavidade abdominal. A recuperação da anestesia geral decorreu com normalidade
e a égua foi encaminhada para a boxe.
1º dia pós-cirúrgico: Fez-se a medicação padrão (antibiótico e anti-inflamatório), limpeza e
desinfecção da zona suturada e fluidoterapia (10 L de soro fisiológico e 15 L de lactato de
Ringer).
2º dia pós-cirúrgico: A égua já comia normalmente mas ainda não tinha defecado após a
cirurgia. Repetiu-se a fluidoterapia, com administração de 15 L de fluidos. Continuou-se com
a medicação e com os passeios para pastar.
3º dia pós-cirúrgico: Estavam presentes fezes de consistência normal. Foi medicada e o
apetite encontra-se normal.
4º dia pós-cirúrgico: Fezes e apetite normais. Fez-se a medicação. Começaram a surgir
alguns nódulos em todo o corpo do animal, mas mais abundantes na zona da cabeça.
5º dia pós-cirúrgico: Os nódulos estavam presentes em toda a superfície corporal.
Administrou-se, para além da medicação padrão, acetato de isoflupredona (20 mg IM, em
dose única). Devido à presença de uma grande infestação por pulgas, suspeitou-se que
estivesse presente uma reacção alérgica à picada das mesmas.
6º dia pós cirúrgico: Os nódulos regrediram na sua maioria. Continuou-se a medicação
(antibiótico e anti-inflamatório) e de uma forma geral a égua estava em bom estado de
saúde.
7º e 8º dias pós-cirúrgicos: Comeu e defecou normalmente, administrou-se a medicação e
fez-se a limpeza e desinfecção da zona da sutura. Continuou-se com os passeios diários
para pastar.
64
9º dia pós-cirúrgico: Último dia de medicação. Retiraram-se os pontos e como a cicatriz
ainda não se encontrava totalmente fechada, colocou-se topicamente uma pomada à base
de policresuleno, com efeito anti-séptico, hemostático e cicatrizante. A égua teve alta.

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7 – CASO CLÍNICO Nº 6
Raça: Manga larga
Idade: Desconhecida (cavalo jovem)
Sexo: Feminino
História: Desconhecida
Exame físico: Praticamente desconhecido. Estava presente alguma dilatação na zona dorsal
esquerda do abdómen. Ao exame por palpação rectal foi possível a palpação de cólon à
esquerda, no sentido ventro-dorsal e caudo-cranial. Suspeita de deslocamento dorsal
esquerdo do cólon esquerdo, com possível encarceramento nefro-esplénico. A égua foi
encaminhada para cirurgia.
Cirurgia: Após incisão da cavidade abdominal e durante a inspecção das vísceras, foi
confirmado deslocamento dorsal esquerdo do cólon esquerdo com torção e encarceramento
no espaço nefro-esplénico. Procedeu-se a descompressão intestinal e em seguida à
resolução do deslocamento. Suturou-se o espaço nefro-esplénico para evitar recidivas.
Colocaram-se 2 L de DMSO a 10% na cavidade abdominal e procedeu-se à laparorrafia. A
recuperação anestésica decorreu com normalidade.
1º dia pós-cirúrgico: Fez-se a medicação com gentamicina, penicilina e estreptomicina,
metronidazole e flunixina meglumina. Colheu-se sangue para avaliar o grau de desidratação.
Estava presente desidratação leve (HT: 45%; PT: 7,4 g/dL). Foram administrados 30 L de
fluidos EV em infusão contínua. Aplicou-se topicamente DMSO seguido de termoterapia a
quente em ambas as veias jugulares, devido à formação de hematomas após a remoção
dos cateteres no final da cirurgia.
2º ao 8º dias pós-cirúrgicos: Continuou-se com a medicação, foram realizados os passeios
diários para pastar e a limpeza e desinfecção da zona de sutura. As fezes estavam normais
assim como o apetite.
9º dia pós-cirúrgico: Foi o último dia de medicação. Retiraram-se os pontos e aplicou-se
policresuleno uma vez que a zona da sutura ainda não estava totalmente cicatrizada e seca.
A égua comeu normalmente e as fezes continuaram normais.
10º e 11º dias pós-cirúrgicos: Continuou-se a aplicação tópica de policresuleno na zona da
incisão abdominal, assim como os passeios para pastar.
12º dia pós-cirúrgico: A égua teve alta.

66
CAPÍTULO IV – DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
A prevalência de cólica na população normal de equinos está actualmente em cerca de 10%
a 36% por ano, com 1% a 2% dessas cólicas a serem suficientemente graves para exigir
resolução cirúrgica.
Uma vez que os casos clínicos observados foram em número insuficiente para averiguar o
sucesso da técnica cirúrgica utilizada na Clínica Hípica, foi realizado um levantamento das
laparotomias realizadas na mesma durante um período de cerca de 10 meses (desde o dia
nove de Maio de 2008 até ao dia sete de Março de 2009). No período referido foram
realizadas 37 laparotomias a cavalos com cólica, que estão representadas na tabela 7.

Tabela 7: Laparotomias realizadas na Clínica Hípica.


Número de animais Percentagem
Laparotomias bem sucedidas 27 73%
Eutanásia 7 19%
Morte do paciente 3 8%
Total de laparotomias 37 100%
Das 37 laparotomias realizadas, 73% (27:37) dos animais recuperaram da anestesia. Todos
os pacientes que acabaram a laparotomia sobreviveram durante pelo menos 10 dias após a
mesma, e tiveram alta.
Do total de pacientes, 19% (7:37) foram eutanasiados durante a cirurgia. As eutanásias
durante a cirurgia deveram-se maioritariamente (57%) a rupturas ao nível do tracto GI (4:7),
tendo um paciente sido eutanasiado devido à presença de uma torção no ID com lesões
aparentemente irreversíveis (caso clínico nº 2). Infelizmente não há registo da causa de
eutanásia nos outros dois cavalos sujeitos à mesma.
A percentagem de animais eutanasiados durante a cirurgia e a alta incidência de ruptura GI
como causa, apontam para a possibilidade de melhorar ainda o exame físico do paciente,
pois a inclusão da paracentese abdominal de forma mais rotineira, poderia permitir o
diagnóstico precoce de alguns destes casos. Quando é diagnosticada ruptura GI, há
indicação para eutanásia imediata, dispensando a anestesia geral do paciente, assim como
o início da cirurgia e todos os gastos envolvidos.
Para além dos sete animais eutanasiados, ocorreu também a morte de mais três animais
(8%), tendo sido um deles devido a ruptura do cólon maior direito, um com presença de
torção do ID e aderências localizadas no íleo e por fim um dos animais faleceu durante a
recuperação anestésica, após ter sido removido um enterólito do cólon maior.
Dos pacientes que terminaram a cirurgia com sucesso, apenas um animal (4%) (teve
necessidade de repetição da laparotomia. A ocorrência de diarreia e laminite pós-
cirurgicamente foram as complicações mais frequentes e afectaram respectivamente 22%
(6:27) e 7% (2:27) dos animais. Todos os pacientes recuperaram totalmente das respectivas
complicações associadas à laparotomia, antes de saírem da clínica hípica. As complicações
67
pós-cirurgicas ocorridas na Clínica Hípica durante o período estudado, estão representadas
na tabela 8.

Tabela 8: Complicações pós-cirurgicas ocorridas nos animais sujeitos a laparotomia.


Complicações pós-cirúrgicas Número de animais Percentagem
Diarreia 6 22%
Laminite 2 7%
Repetição da laparotomia 1 4%
Total de complicações 9 33%
A técnica e procedimentos cirúrgicos utilizados na Clínica Hípica parecem ser adequados,
uma vez que há baixa incidência de complicações pós-cirurgicas. O protocolo
medicamentoso utilizado também se revelou com bons resultados pela ausência de
infecções pós-cirúrgicas e pela sobrevivência no curto prazo de todos os pacientes que
recuperaram da anestesia cirúrgica.
Actualmente, há conhecimento de grandes melhorias nas técnicas de diagnóstico, cirurgia e
anestesia e é possível uma aproximação mais agressiva de cada caso, do que no passado.
A cirurgia é aplicada numa fase anterior do processo de doença do que era há décadas
atrás. Esta é uma tendência que tem de continuar, pois só assim é possível que os animais
sejam encaminhados para cirurgia antes de desenvolver lesões irreversíveis na parede
intestinal e efeitos de endotoxémia, prevenindo complicações cirúrgicas e pós-cirúrgicas.
A sensibilização dos tratadores e proprietários para a problemática das cólicas e mesmo a
sensibilização dos Médicos Veterinários de equinos, são imprescindíveis para o rápido
encaminhamento do paciente com cólica, para um centro de referência.
E apesar de um maior número de animais com cólica ser salvo actualmente, a prevalência
de animais com cólica tem vindo a aumentar e a artificialização cada vez maior da dieta dos
cavalos, principalmente em animais de desporto, é um importante factor de risco.
Só um olhar atento sobre os principais factores de risco e a sua eliminação sempre que
possível, poderão diminuir a incidência de cólicas. E só com a continuação de melhorias ao
nível das técnicas de diagnóstico, anestesia e cirurgia, poderemos paulatinamente deixar de
temer esta grave patologia.

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