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4. Tendncias Contemporneas e o
Design de Jias no Brasil


Nos ltimos anos, o binmio design e inovao tornou-se o
elemento dinmico e propulsor da indstria nacional de
joalheria.
cio Morais
182



Falar sobre o design de jias no Brasil, falar de
acontecimentos bem recentes do ponto de vista histrico.
Embora a joalheria tenha quase 5000 anos de histria,
nosso foco ser, objetivamente, a introduo do design no
processo de configurao de jias.
Conceitualmente, o design surge quando a fabricao
deixa de ser um processo realizado inteiramente pelo
arteso, dividindo-se em duas etapas: projetar e fabricar.
Para haver design importante haver projeto.
O historiador Rafael Cardoso ressalta quatro episdios
que, de forma decisiva, marcaram momentos de rupturas
que propiciaram o surgimento do design no Brasil:

[...] a chegada da chamada Misso Francesa, em 1816, que
deu origem mais rica e instigante experincia acadmica
dos trpicos; a vinda de Le Corbusier, em 1929, estopim da
vitoriosa campanha da arquitetura modernista sob a gide
da ditadura getulista; a visita do escultor Max Bill, em 1951,
por ocasio da 1 Bienal Internacional de So Paulo,
deflagrando o duradouro bipartidarismo concretista de anos
posteriores; e a mobilizao em torno do Museu de Arte
Moderna do Rio de Janeiro, MAM/RJ, em 1959, que
desaguou trs anos depois na fundao da Escola Superior
de Desenho Industrial, Esdi.
183


Nossa abordagem ser delineada, ento, pelas
transformaes que a produo de jias sofreu a partir do
final da dcada de 1940, com o surgimento de um novo
paradigma projetual e de um novo profissional focado
especialmente na criao de jias.
No Brasil, segundo Angela Andrade, diretora da
AJORIO, entre as dcadas de 50 e 70
184
, as jias eram
projetadas pelos ourives mais experientes ou por alguns
poucos desenhistas, provenientes de cursos como Belas
Artes e Arquitetura, cuja especializao se dava dentro das


182
MORAIS, E. O design no setor joalheiro. In:__ Infopaper do CSPD,
n.02, 2004.
183
CARDOSO, R. Tudo Moderno; nada Brasil: Design e a busca da
Identidade Nacional. In:__ Tudo Brasil, catlogo organizado por Lauro
Cavalcanti. 2004, p.81.
184
ANDRADE, ngela Carvalho de. O Desenvolvimento do Design de
Jias no Brasil Polticas, Instituies, Aes e Resultados. Indito, p.6.
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empresas onde trabalhavam
185
. Suas criaes, a maioria
utilizando gemas coradas, mantinham o seu foco principal
no consumidor externo ou turistas, pois a valorizao das
pedras brasileiras, tanto as lapidadas como os brutos, dava-
se muito mais entre o pblico estrangeiro. Por isso, o design
de jias no Brasil, durante algumas dcadas, esteve muito
mais preocupado em atender aos desejos desse
consumidor, realizando modelos cuja linguagem no
traduzia nossas referncias culturais.
At a dcada de 1970, ainda segundo Angela
Andrade, a criao de jias no Brasil apresentava o seguinte
antagonismo:

[...] de um lado, jias de autor, desenhadas e fabricadas em
regime de produo artesanal por poucos e iluminados
artistas. De outro, algumas empresas integradas produzindo
manualmente peas especiais e, em escala industrial, jias
de boa qualidade, mas de grau relativamente baixo de
diferenciao em design; alm de um grande nmero de
produtores ofertando peas de origem estrangeira ou cpias
delas, sem nenhum valor criativo agregado ao produto.
Toda e qualquer tentativa consciente de inovao e
melhoria podia ser creditada unicamente iniciativa
individual, ao talento artstico ou viso empresarial de
pessoas excepcionais, jamais existncia de um ambiente
institucional propcio difuso das melhores prticas de
criao, produo e comercializao de jias a todos os
participantes do setor.
186


Neste sentido, torna-se relevante o reconhecimento da
importncia de alguns empresrios e artistas que, graas s
suas iniciativas, transformaram-se em personagens
inseparveis da histria da joalheria no Brasil, como Hans
Stern, Jules Sauer, Burle Marx e Caio Mouro. Como
Angela Andrade assinala, esses empresrios e artistas
iniciaram por sua conta e risco o longo processo de
posicionamento do setor joalheiro em seu merecido lugar de
destaque na complexa atualidade brasileira.
187

O pioneirismo deste processo marcado por
trajetrias diversas, porm, em cada uma delas
identificvel um forte componente de ousadia, viso de
futuro e determinao. Estes so os ingredientes que, nas
ltimas dcadas, temperaram com muita inventividade o
surgimento de um grupo de artistas e empresrios geniais.
Grupo este que soube, com muita garra, estabelecer as
bases do setor joalheiro no Brasil, imprimindo um toque de
modernidade a uma arte milenar.
importante salientar que somente a partir da dcada
de 1990 o movimento do design de jias no Brasil comeou


185
Esta, inclusive, a vivncia da autora que, em 1972, interrompeu o
curso de Belas Artes (UFRJ) para se dedicar ao design de jias na
joalheria H. Stern.
186
ANDRADE, ngela Carvalho de. O Desenvolvimento do Design de
Jias no Brasil Polticas, Instituies, Aes e Resultados. Indito, p.6.
187
Ibid., p.4.
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de fato a se organizar e a ganhar fora. Segundo o
presidente do IBGM Hcliton Santini, o design de jias no
Brasil se fortaleceu a partir da metade da dcada de 90,
aps o Plano Real, quando o mercado voltou a crescer e a
concorrncia com a mercadoria importada ficou mais
acirrada
188
. Para Angela Andrade, o setor joalheiro tem
demonstrado um grande progresso na capacitao dos
designers, fruto da criao e do fortalecimento das escolas
de joalheria e design do Pas e da atuao coerente e
contnua das instituies interessadas
189
. Portanto,
surpreendente o salto tanto qualitativo quanto quantitativo
alcanado em to pouco tempo.


4.1 O IBGM e a consolidao do design de jias
no Brasil


Fundado em 1977 e com sede em Braslia, o IBGM
Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos uma
entidade nacional, de direito privado e sem fins lucrativos,
fruto da associao das 50 empresas de jias mais
representativas no pas, alm de diversas associaes de
classe estaduais, ligadas ao setor de pedras preciosas,
jias, bijuterias, metais preciosos e afins. Como observa
Angela Andrade, sua atuao tem sido fundamental para a
consolidao de uma viso estratgica sobre o crescimento
do setor joalheiro e para a integrao e o alinhamento dos
esforos das vrias partes interessadas nesse
crescimento.
190

Alm disso, o instituto zela pelo respeito tica nos
negcios e cuida do cumprimento da legislao que se
aplica ao setor.
Reconhecido e respeitado mundialmente, o IBGM o
representante do Brasil na CIBJO Confederao
Internacional da Bijuteria, Joalheria, Ourivesaria, Diamante,
Prolas e Pedras, com sede na Inglaterra.
Em 1991, o IBGM j havia assumido a posio de
coordenador do setor joalheiro. Entendendo a urgncia de
se traar um retrato fiel do estado da arte a fim de se buscar
solues estratgicas para os possveis gargalos da cadeia
produtiva, o IBGM apresentou ao Programa Brasileiro de
Qualidade e Produtividade um grande trabalho de pesquisa
intitulado Diagnstico do Setor de Gemas, Jias e Bijuterias
e suas Tendncias Nacionais e Internacionais. Esse
Diagnstico, segundo Hcliton Santini, pode ser considerado
um marco para a joalheria no Brasil, pois alm de fazer
uma radiografia do Setor, apresentou um balizamento


188
SANTINI, H. Entrevista concedida Cidda Siqueira por correio
eletrnico em Abril de 2006.
189
ANDRADE, ngela Carvalho de. O Desenvolvimento do Design de
Jias no Brasil Polticas, Instituies, Aes e Resultados. Indito, p.3.
190
Ibid., p.6.
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estratgico de mdio e longo prazo, para o aumento da
competitividade da indstria nacional
191
. Nele, trs reas
foram destacadas por sua importncia: qualidade,
produtividade e design. O design apareceu como o mais
importante diferencial a ser incorporado ao produto jia.
Outro dado interessante levantado pelo Diagnstico serve
como exemplo da importncia que o design alcanou a partir
da dcada de 1990.

guisa de exemplos, citem-se dois fatos relativos ao design
de jias: na primeira pesquisa, publicada em 1996, a
indstria joalheira colocou o design como o segundo fator,
em importncia, para o sucesso das empresas; na segunda,
em 1998, mais de 89% dos estabelecimentos de varejo
explicitaram demanda por melhor informao quanto ao
design dos produtos que vendiam.
192


O incentivo ao design de jias e bijuterias tornou-se,
ento, um dos propsitos do IBGM, visando o aumento da
competitividade da joalheria brasileira no mercado externo.
A partir desse momento, o IBGM passou a desenvolver
aes importantes, particularmente no mbito do Programa
Brasileiro de Qualidade e Produtividade, como o apoio
participao de empresas brasileiras em feiras
internacionais, a busca de incentivos exportao, a
divulgao do design brasileiro no exterior, a implantao do
Prmio IBGM de Design, a criao de Ncleos Setoriais de
Design, a promoo de pesquisas relativas indstria e ao
comrcio varejista de jias, a criao dos Consrcios de
Exportao, o apoio a cursos e seminrios, o oferecimento
de consultorias especializadas e a publicao anual de um
Caderno de Tendncias dirigido s indstrias de jias,
designers, escolas e compradores.
Para Hcliton Santini, uma das aes fundamentais
dentro deste processo foi a promoo da integrao
crescente do designer com o setor industrial, cuja
dificuldade de relacionamento era considerada um dos
pontos nevrlgicos para a total adeso ao design pelas
indstrias. Segundo ele, o melhor entendimento das
caractersticas, formao, responsabilidades e objetivos de
ambas as partes proporcionou um trabalho conjunto de
parceria cujo resultado impactou todo o desenvolvimento
futuro do design nacional
193
. Como Hcliton Santini
comenta, atualmente, quase todas as empresas, mesmo as
micro e pequenas indstrias, possuem designers, internos
ou externos, para desenvolver colees prprias.




191
SANTINI, H. Entrevista concedida Cidda Siqueira por correio
eletrnico em Abril de 2006.
192
ANDRADE, ngela Carvalho de. O Desenvolvimento do Design de
Jias no Brasil Polticas, Instituies, Aes e Resultados. Indito, p.10.
193
SANTINI, H. Entrevista concedida Cidda Siqueira por correio
eletrnico em Abril de 2006.
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4.2 O design de jias brasileiro uma linguagem
que seduz o planeta


Exotique, rotique, classique et unique, mystique et ludique.
Un langage est n qui sduit la plante.
Didier Brodbeck
194



Falando sobre o atual posicionamento da joalheria
brasileira no mercado mundial, o Diretor do IBGM Edmundo
Calhau revelou que as exportaes de jias, nos ltimos trs
anos, tiveram um aumento de aproximadamente 30%. Em
seguida ele relaciona os pases/mercados onde a jia
brasileira tem efetiva participao: Estados Unidos, Canad,
Japo, Rssia, Alemanha, Sua, Inglaterra, Espanha,
Portugal, Frana, Mxico, Caribe e pases da Amrica do
Sul. Segundo ele, nesses mercados, a jia brasileira
reverenciada por apresentar design criativo, inovador e uma
extica mistura de materiais
195
.
A grande visibilidade alcanada pelo design de jias
brasileiro alterou de forma bastante expressiva a forma
como ele era visto pelo pblico estrangeiro. Como comenta
Angela Andrade, dessa avaliao externa o design brasileiro
saiu vitorioso. Em poucos anos, passamos de copiadores a
criadores e estamos sendo reconhecidos mundialmente,
pelo design diferenciado, legitimamente made in Brazil.
196

Em 2001, o Brasil recebeu o convite para participar do
concurso American Facet Award e, em seqncia, do
World Facet Award. Na primeira etapa, os designers
brasileiros estariam concorrendo com designers dos
Estados Unidos, Mxico, Chile, Colmbia, Costa Rica,
Canad e Argentina e na segunda, com designers do mundo
todo. O resultado desse concurso exemplifica bem o
patamar que o design de jias brasileiro conquistou em sua
breve histria. Dos seis prmios destinados aos designers
profissionais, cinco foram brasileiros, sendo trs primeiros
lugares e um segundo lugar na categoria brilliant (Figura
10), a primeira e a terceira colocao na categoria
exclusive e a segunda colocao na categoria student.
Acrescidos a esses, mais 16 designers foram classificados
para a etapa mundial, junto com finalistas da Europa e sia.
Nas trs categorias do World Facet Award, o Brasil
conquistou os trs segundos lugares.


194
BRODBECK, D. Extrado do artigo Joia avec un J comme joie.
In:__Suplement a World of Dreams, numero 28 / Juillet 2005, p.147
(Extica, ertica, clssica e nica, mstica e ldica. Nasce uma linguagem
que seduz o planeta).
195
CALHAU, Edmundo. Entrevista. Jia Brasileira, bela pela prpria
natureza. In:__Catlogo Oficial da 41 Feninjer. 2005, p.34.
196
ANDRADE, Angela Carvalho de. A Jia na Cultura Brasileira.
Monografia. 2002, p.46.
Figura 10 Broche
Mar de Luzes,
segundo lugar na
categoria Brilliant do
American Facet Award
2001 Lucia Abdenur.
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Muitos tm sido os prmios internacionais
conquistados pelos designers brasileiros e a relao
extensa. Como exemplos, o Antwerp Diamond High Council
Award 2003 (Figura 11) e o IF Design 2004 (Figura 12), 2006
(Figura 13) e 2007 (Figura 14).
Na edio de n 250, de fevereiro/maro de 2002, da
revista International Jeweler (Europa Star)
197
, a jornalista
Cynthia Unninayar, que escreve sobre tendncias na
joalheria, assinou uma matria de trs pginas, intitulada
The Worlds Best Kept Secret (o segredo mais bem
guardado do mundo), referindo-se s jias brasileiras.
Convidada pelo IBGM em 2002, junto com outros dois
jornalistas estrangeiros, a visitar o Brasil e conhecer o setor
joalheiro, Cynthia encantou-se com o que encontrou,
tornando-se a partir de ento, uma grande divulgadora de
nosso design no exterior. De 2002 para c, Cynthia tem
retornado ao Brasil todos os anos para cobrir a Feninjer
Feira Internacional de Jias e Relgios, a maior feira de
jias da Amrica do Sul, em So Paulo, onde acontecem os
grandes lanamentos de jias sempre em acordo com as
ltimas tendncias.
A revista espanhola ARTE VJOYA publica anualmente
o Dossier Euro Design & Design of the World, onde
apresenta as principais empresas e designers do mundo.
Em 2002, o Dossier
198
dedicou 52 pginas ao design
brasileiro, onde designers como Bialice Duarte, Cathrine
Clarke, Ceclia Rodrigues, Christina Cunali, Glucia Silveira,
Maria Alves de Lima, Miriam Mamber, Patricia Centurion,
Pepe Torras, Ruth Grieco e Yael Sonia tiveram seus
trabalhos apresentados de forma primorosa.
Em 2004, a revista de jias A World of Dreams
199
,
uma das mais conceituadas revista de jias da Frana,
dedicou sua edio n 21, de Maro, joalheria brasileira.
So 129 pginas onde o melhor do design de jias brasileiro
apresentado pelo jornalista Didier Brodbeck, com o ttulo
Une premire: un spcial Brsil. Empresas como F.R.
Heb, Manoel Bernardes, Vancox, Vianna, Brner, Danielle,
CR Brner, e designers como Bettina Terepins, Maria Jos
Cavalcanti, Willian Farias, Melissa Maia, Marco Marchese,
Mrcia Mr, Brenda Vidal e Carla Amorim puderam
apresentar suas jias ao mundo.
Em julho de 2005, a A World of Dreams
200
repetiu o
feito, editando um suplemento especial em sua edio n 28,
com o ttulo Jias do Brasil. Neste nmero, Didier
Brodbeck apresenta a joalheria brasileira com os seguintes
comentrios:



197
INTERNATIONAL JEWELER (Europa Star). N 250, 2002.
198
ARTE VIJOYA. Dossier Eurodesign & design of the world. p.152 a
205.
199
A WORLD OF DREAMS. N 21, 2004.
200
Ibid., N 28, 2005.
Figura 11 Bracelete
em ouro branco,
diamantes e plumas
2 lugar no Antwerp
Diamond Award 2003
Glucia Silveira FR
Heb.
Figura 12 Anel
Ciclo, em ouro
amarelo Prmio IF
Design 2004
Antonio Bernardo.
Figura 13 Colar
Tentculos em prata
e borracha Prmio
IF Design 2006
Ivete Cattani

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Les crateurs brsiliens ont tout pour plaire car ils rompent
avec la monotonie, la grisaille, la morosit. Ces inventeurs
sont des enchanteurs qui mettent du soleil dans leau froide
de notre quotidien. Ils mettent du rythme e de la musique
dans les formes et les couleurs des pierres.
Cette explosion, ce feu dartifice, qui blouit nos yeux et qui
a touch notre coeur, sexplique par la diversit de ce
territoire la taille dun continent. Les influences de
lEurope, des indiens, des races qui se ctoient, ont fait
bouillir une marmite qui dborde dimagination et de
vibrations. Exotique, rotique, classique et unique, mystique
et ludique. Un langage est n qui sduit la plante.
201


No que toca ao design de jias no Brasil, talvez sua
relativa juventude proteja-o do peso histrico das
tradies, como acontece com a Europa. O segredo parece
estar exatamente nessa falta de comprometimento com uma
imagem definida priori, o que nos permite ousar mais,
tanto na linguagem e na mistura das cores como no
emprego dos materiais. Para o IBGM,

As jias brasileiras caminham, sem censura, por trilhas at
ento pouco exploradas na joalheria. Materiais inusitados
so vistos a todo momento nas colees brasileiras, assim
como formas surpreendentes. Tudo isso com uma
linguagem contempornea, atualizada, que encontra forte
identificao com o desejo do consumidor moderno, seja ele
brasileiro, americano, europeu ou asitico.
202


Contudo, na avaliao do sucesso que o design de
jias brasileiro faz no exterior, mais do que
compreendermos a dinmica responsvel por nossas razes,
podemos tambm reconhecer que ele agrada porque bom!
Seu especial falar uma linguagem que, embora
compreendida internacionalmente, no perde o seu sotaque.
Falando sobre o designer brasileiro de um modo geral,
Rafael Cardoso tece o comentrio abaixo, que se aplica
perfeitamente s condies atuais dos novos talentos do
design de jias no Brasil:

A lio que se depreende das trajetrias dos designers
brasileiros que mais se destacaram nos ltimos anos que


201
BRODBECK, D. Extrado do artigo Joia avec un J comme joie.
In:__Suplement a World of Dreams, numero 28 / Juillet 2005. p.147 (Os
designers brasileiros so inspirados e sentem prazer em romper com a
monotonia, o cinzento, a tristeza. Esses criadores so os encantadores que
colocam o sol na fria gua de nosso cotidiano. Eles pem ritmo e msica
nas formas e nas cores das pedras. Esta exploso, este fogo de artifcio
que deslumbra nossos olhos e que toca nosso corao, explica-se pela
diversidade de seu territrio, que tem o tamanho de um continente. As
influncias da Europa, dos indgenas, das raas que se tocam, fazem
ferver um caldeiro que transborda de imaginao e vibrao. Extica,
ertica, clssica e nica, mstica e ldica. Nasce uma linguagem que
seduz o planeta.).
202
IBGM. Design: jias com cara de Brasil. In:__ Catlogo Oficial da 37
Feninjer. So Paulo: Prieto & Associados, 2003. p.59
Figura 14 Brinco
Impulso, em ouro
Prmio IF Design
2007 Antonio
Bernardo.
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no existe uma nica frmula vlida para todos: cada
designer tem que encontrar o seu caminho e construir a sua
prpria identidade profissional.
203


De posse de sua maioridade, o design de jias
brasileiro, construdo artesanalmente como um grande
patchwork cultural, uma demonstrao de nossa
capacidade criativa proveniente da identificao com a
diversidade de nossas razes.


4.3 Novos paradigmas para o design de jias


Os produtos de luxo no so mais destinados apenas
clientela de elite, mas parte elitista que existe em cada
um de ns.
Gilles Lipovetsky e Eliett Roux
204



J h alguns anos a joalheria vem se deparando com
uma nova realidade e, quem sabe mesmo, uma
revalorizao de seu estatuto enquanto objeto simblico.
Depois de viver um longo perodo como objeto-investimento,
a jia redescobriu e resgatou seus outros papis, abrindo-se
para performances cada vez mais diversificadas. Objeto de
design, objeto de arte ou objeto de consumo, a jia passou a
trajar, como a moda, um vesturio repleto de variveis,
capazes de assegurar o seu aspecto como objeto nico e
precioso e manter o seu carter de legtima representante
do seu tempo.
O mundo contemporneo, povoado por uma infinidade
de bens de consumo similares e comandado por um alto
grau de competitividade, favorece a busca pela
diferenciao e personalizao dos produtos. nessa
instncia que as estratgias de marketing focalizam sua
ateno para construir o encantamento necessrio
seduo do consumidor. Segundo definio de Jean
Baudrillard, o consumo seria uma atividade de manipulao
sistemtica de signos
205
.
Da antiguidade aos nossos dias, o valor simblico das
jias ampliou seus significados. Os signos a elas
incorporados tanto podem ser de poder, riqueza, prestgio,
fidelidade, amor e honra, quanto de distino, magia, humor,
juventude ou seduo, entre outros. Todos esses
significados no so escolhidos aleatoriamente; sempre
estaro em sintonia com seu tempo e atendendo s
expectativas do pblico consumidor.
Foi a partir da dcada de 1990 que se inaugurou uma
nova dinmica no consumo de jias que, como observa


203
CARDOSO, R. 2004. p.221.
204
Citado por Dario Caldas In:__ A Jia, o Jovem e o Luxo Emocional.
2006, p.8.
205
BAUDRILLARD, J. 1968, p.206.
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Costanza Pascolato, revolucionou o comrcio e tirou da
letargia o design, inovando-o.
206
O evento responsvel por
essa transformao tem as mulheres como protagonistas,
quando elas passam a comprar suas prprias jias, no
mais dependendo da prtica at ento usual de receb-las
de presente, principalmente do pblico masculino (pais,
namorados, maridos, amantes.). Cada vez mais atuantes e
independentes, as mulheres influenciaram a mudana no
design das jias que, embora usando o mesmo luxo dos
materiais, ficaram mais atuais, despojados, prticos e
esportivos.
Outro movimento importante, tem sido a aproximao
da jia com a moda e as tenses decorrentes do antigo
antagonismo que ligava a primeira eternidade e a segunda
efemeridade. Uma pesquisa realizada em 2004, pelo
Observatrio de Sinais
207
a pedido do IBGM, tambm
localiza esse incio de dilogo atravs de duas principais
tendncias denominadas: a lgica do eterno, em que a
joalheria corresponde aos modelos mais tradicionais e
luxuosos, e a lgica da moda, ligada ao ritmo acelerado
das mudanas, das tendncias e da inovao. Neste
segundo grupo, a pesquisa situa a joalheria mais leve e
acessvel, as jias com materiais no-convencionais e as
jias com design diferenciado. O problema identificado ,
justamente, o impasse criado pelas grandes joalherias e
indstrias de jias, na busca de uma intermediao entre as
duas correntes, sem afetar o ncleo de sua identidade, o
tradicional universo do luxo. Segundo as pesquisas,

a aproximao da joalheria com o universo da moda traz um
ganho evidente ao setor, ao abrir todo um leque de produtos
renovveis com a estao (as colees), que oscilam ao
sabor das tendncias, combinando com as inspiraes,
temas, formas e cores que os criadores de roupas e
acessrios pem em evidncia.
208


Sobre o assunto, Carlos Ferreirinha
209
tece o seguinte
comentrio:

Quando percebo as pessoas preocupadas com a
associao jia e moda, percebo o quanto elas ainda no
entenderam a moda enquanto fenmeno de comportamento
e no moda vesturio, fashion e descartvel. O sculo XX
reconhecido como o sculo da moda. A indstria
automobilstica e as empresas de aparelhos de celular,


206
PASCOLATO, C. do artigo Como viver sem elas? In:__Vogue Brasil
H.Stern, 2006, p.12.
207
O Observatrio de Sinais uma agncia de consultoria, especializada
em pesquisa de tendncias.
208
IBGM. Diagnstico. A Jia, o Jovem e o Luxo Emocional. 2006, p.33.
209
Carlos Ferreirinha considerado uma das maiores autoridades no
mercado do luxo no Brasil e consultor do Programa Joalheria no Universo
do Luxo e da Moda, Lanado pelo IBGM (Instituto Brasileiro de Gemas e
Metais Preciosos) em parceria com a Ajesp (Associao de Joalheiros do
Estado de So Paulo).
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entre outras, j perceberam isso e esto fazendo um
excelente e notvel trabalho. Porque o setor de jias no
pode tambm se apropriar deste exerccio?
210


As barreiras j foram quebradas e, atualmente, as
empresas joalheiras j reconhecem que atualizar as jias
pelos movimentos da moda no um desprestgio nem
tampouco uma desvalorizao. Como j comentamos no
primeiro captulo, as colees de jias esto, hoje, em
sintonia com a esttica de outras reas do design, sejam
elas roupas, acessrios, automveis, eletrodomsticos ou
mobilirios. A cada ano, as tendncias de moda e de design
apresentam os temas e a cartela de cores e formas que
estar em evidncia. Cada uma dessas reas do design
aplica essas tendncias s especificidades de seus
produtos, e a joalheria j faz parte deste grupo. Na joalheria,
a cartela de cores amplamente trabalhada, no s atravs
da diversidade cromtica das pedras, como tambm pelas
novas tonalidades do ouro, obtidas pelo emprego de ligas
211

e rodinados
212
.
Se h 20 anos atrs a criao de jias estava
diretamente ligada valorizao de seus materiais gemas
e metais hoje, o foco de ateno direciona-se tambm
para as mensagens que elas trazem em si, prontas para
despertar emoes e encantamentos em quem as usa.
Todas as pocas e culturas possuem suas jias
caractersticas, tanto pelos materiais utilizados como pelo
design. Como observa Barbara Cartlidge, nosso sculo no
exceo: Il est fascinant de dcouvrir comment les bijoux
refltent la personnalit de ceux qui les portent de mme
que les grand choix et les vnements qui jalonnent leur
vie.
213

Dos revivals
214
s experimentaes, a joalheria
constri novos paradigmas, renovando-se e mantendo-se
atualizada com seu tempo. Se ainda existem dvidas sobre


210
IBGM. A importncia da marca no setor joalheiro. In:__ Catlogo
Oficial da 39 Feninjer. 2004, p.39.
211
As ligas so utilizadas para dar maior dureza ao ouro, considerado, em
seu estado puro, muito flexvel para a joalheria. Para cada tonalidade de
ouro, utilizada uma composio de metais, cujo total deve obedecer aos
padres mundiais. No ouro 18 quilates, necessria uma proporo de
75% de ouro e 25% de liga. Atravs das ligas, podemos obter vrias
tonalidades, como o ouro amarelo e o branco at o vermelho, o verde e o
rosa.
212
O rdio um metal considerado nobre, cuja cor mais suave que o
branco da platina. As jias de ouro branco e platina levam um banho de
rdio para tornar sua cor mais atraente. Seguindo as ltimas tendncias da
moda, as empresas especializadas vm desenvolvendo novas tonalidades,
como o rdio negro e o marrom.
213
CARTLIDGE, B. Op.cit., p.7 ( fascinante descobrir como as jias
refletem a personalidade daquele que as usa, da mesma maneira que as
grandes escolhas e os acontecimentos que marcam sua vida.).
214
Termo utilizado na moda para se referir busca de inspirao no
passado, em temas histricos, estilos de arte, literatura, arquitetura e
comportamentos de outras pocas.
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a importncia do papel das pesquisas de tendncias no
design de jias elas, hoje, j no representam a opinio da
maioria.

4.3.1 O impacto da industrializao e a jia
industrial


Se antes, era o homem que impunha seu ritmo aos objetos,
hoje so os objetos que impem seus ritmos descontnuos
aos homens, sua maneira descontnua e sbita de se
apresentarem, de se alterarem ou de substiturem-se uns
aos outros sem envelhecer.
Jean Baudrillard
215



Em seu livro A Terceira Onda, Alvin Toffler nos fala que
cada civilizao tem um cdigo oculto, uma srie de regras,
tal qual um desenho repetido, que permeia todas as suas
atividades. Na civilizao industrial, a padronizao aparece
como um de seus mais significativos princpios, representada
atravs de milhares de produtos idnticos e medidas
uniformes que se espalharam por grande parte do mundo.
Segundo Jean Baudrillard
216
, a oposio modelo/srie
que define o estatuto do objeto moderno. Embora esta
oposio tenha estado presente em muitos momentos da
histria das sociedades, somente com a era industrial que
modelo e srie ganham a conotao que hoje
conhecemos.
Ao longo do sculo XIX, a sociedade sofreu o impacto
de uma avalanche de espetaculares avanos tecnolgicos,
decorrentes da Revoluo Industrial. Esses avanos
permitiram que as fbricas almejassem maiores nveis de
eficincia em seu desempenho e muitos artigos,
anteriormente fabricados mo, perderam suas
caractersticas rudimentares e artesanais para entrarem
numa linha de montagem cada vez mais veloz, com custo
reduzido. Na joalheria, Clare Phillips comenta que:

Crucial to the development of mass-produced jewelry was the
application of steam power to stamping machines that
punched out both the basic shape and the surface detailing of
a piece in one rapid action.
217


Essas mudanas causaram um especial impacto na
joalheria entre ourives e artesos que, tradicionalmente,
criavam e executavam suas jias. Na Antigidade, o ourives


215
BAUDRILLARD, J. 2000, p.169.
216
Ibid., pp.145 147.
217
PHILLIPS, C. 1997, p.152 (Crucial para o desenvolvimento da
produo de jias em massa foi a aplicao da fora do vapor nas
mquinas de estamparia que moldam a forma bsica e o detalhamento da
superfcie de uma pea rapidamente.).
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era considerado um ser especial, dotado de poderes que o
levavam a manipular metais preciosos com maestria e
tcnicas sofisticadas, concebendo objetos impregnados de
smbolos msticos e sagrados. Tanto o domnio dessas
tcnicas quanto a posse desses objetos estavam reservados
a poucos privilegiados, pertencentes a uma camada especial
e superior das sociedades. A era industrial vai quebrar esse
domnio, rompendo a sociedade em milhares de partes
encadeadas e separando o arteso do criador.
A industrializao, com todas as novidades que
atingiram e transformaram vrios campos da sociedade,
acabaram por provocar, segundo Franois Baudot
218
, um
duelo e um antagonismo entre o homem e a mquina, entre a
vontade de criar e a necessidade de produzir. Essa
oposio transparece atravs de um mundo dividido, cujas
partes se espelham no conjunto das atividades humanas,
atingindo o arteso/artista/criador em sua essncia. Como
bem observa Baudot, o advento da industrializao
estabelece uma ciso entre a criao e a produo, pois
onde o criador se quer singular, o industrial pensa no
plural
219
.
A jia, cuja nobreza a distinguia enquanto modelo
absoluto e transcendente, encontra na industrializao a
possibilidade de seu desdobramento em sries, extrapolando
o seu carter de objeto de casta, nico e singular. atravs
da difuso serial que a joalheria alarga seu potencial de
abrangncia, tornando-se acessvel a todos, por direito. Essa
popularizao, que percorre todas as cores do prisma social,
acompanha os mesmos movimentos adotados pela moda,
entre a alta costura e o prt--porter.
Porm, se a produo em massa tornou os bens
acessveis a um mercado mais amplo, seus operrios e ex-
artesos acabaram alienados e distantes de todo o processo
de fabricao, passando a atuar em apenas uma etapa
reduzida, annima e repetitiva da cadeia produtiva. Na
civilizao das mquinas, o arteso no tem mais a posse de
suas ferramentas, de seus meios de produo, passando a
ser apenas mais um operrio dentro de uma indstria.
E embora no sculo XIX a fabricao de alguns
produtos tenha atingido uma produo bastante expressiva
em termos de repetio de unidades, no sculo XX que o
conceito de produo em massa ganha fora como
inovao. A produo em srie tambm gera a necessidade
da confeco de modelos que necessita para isso de mo
de obra especializada. Segundo Rafael Cardoso,

Um dos aspectos mais interessantes da transio da
fabricao oficinal para a industrial est no uso crescente de
projetos ou modelos como base para a produo em
srie.
220



218
BAUDOT, Franois. 2000, p.11.
219
Ibidem.
220
CARDOSO, R. 2004. p.25.
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Na joalheria, a fabricao do modelo considerada, hoje,
uma das etapas mais importantes no processo de produo
em srie, possuindo caractersticas muito especficas para
ajust-lo ao processo de reproduo. Segundo o consultor e
mestre de ourivesaria Rudolf Ruthner
221
, 90% das falhas de
fundio encontradas nas empresas de jias visitadas por
ele eram derivadas de problemas no modelo. Segundo ele,
o modelo uma ferramenta e no uma jia, e como tal
deve ser tratado
222
.
Na dcada de 50, surgiu nos EUA a polmica
estratgia da obsolescncia planejada onde, atravs de
pequenas mudanas estilsticas, as empresas lanavam
novos produtos no mercado. O filsofo Gilles Lipovetsky
comenta que a cultura industrial, instalando-se em p de
igualdade com o perecvel, levou os produtos a uma busca
imediata de sucesso, cujos critrios passaram a ser a curva
de vendas e a audincia. Embora obras imortais possam
ser realizadas, a tendncia global, fruto dessa nova cultura,
caminha para uma obsolescncia integrada ao cotidiano,
onde presenciamos o encolhimento do presente, incentivado
pelos projetos de curta durao. Nesse ambiente, os objetos
tm sua morte programada com antecedncia e, muitas
vezes, so consumidos antes mesmo de sua posse.
As indstrias, mais preocupadas com a quantidade do
que com a qualidade de seus produtos, passaram a buscar
solues que agilizassem os processos de fabricao,
reduzindo seus custos. Como comenta Rafael Cardoso,

[...] bastava um bom designer para gerar o projeto, um bom
gerente para supervisionar a produo e um grande nmero
de operrios sem qualificao nenhuma para executar as
etapas, de preferncia como meros operadores de
mquinas.
223


Para Jean Baudrillard, existe uma oposio
fundamental entre a tcnica e o lucro. Enquanto a tcnica se
verticaliza, buscando uma contnua superao atravs da
inveno, o lucro leva horizontalidade, atravs do
fechamento de um sistema de objetos e de formas
recorrentes
224
.
A tcnica, fruto do desenvolvimento de artistas que, ao
longo dos tempos, aperfeioaram e sofisticaram seus
resultados, d lugar ao tecnicismo; o estilo, que tanto
qualificou quanto historicizou cada perodo da formao das
sociedades, cede ao estilismo; e a virtude, enquanto
potncia eficaz, sucumbe ao virtuosismo. Como argumenta
Alfredo Bosi,



221
RUTHNER, R. Entrevista. In:__Rio Jia Informativo. 2002, p.3.
222
RUTHNER, R. Materiais e Processos de Fabricao I (continuao).
Apostila. Especiaizao em Design de Jias PUC-Rio. 2007.
223
CARDOSO, R. 2004, p.26.
224
BAUDRILLARD, J. 2000, p.134.
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[...] quase todos os grandes estilos conhecidos engendraram,
no seu perodo final, uma corrente de repetidores, os
chamados epgonos, que nada mais so que o uso
obsessivo ou compulsivo de frmulas j testadas e
consagradas.
225


Ainda de acordo com Bosi, a capacidade imitativa
uma das mais fortes tendncias dos seres vivos que, atravs
da repetio daquilo que deu certo, influenciou
significativamente a histria das civilizaes.
O desenvolvimento tecnolgico trouxe para a joalheria
ferramentas e mquinas de alta preciso, aprimorando cada
vez mais a qualidade de seus produtos, enquanto antigos
processos artesanais de fabricao comearam a ser
substitudos por tcnicas industrializadas. Hoje, com
tecnologias extremamente sofisticadas como a prototipagem
rpida, onde a mquina substitui a participao direta do
ourives na construo do modelo, a solda e o corte a laser, a
joalheria demonstra que est em sintonia com seu tempo,
acompanhando o homem em sua trajetria.
Entretanto, quando percorremos a histria da joalheria
num sentido inverso, percebemos que sua aura de
eternidade no se d somente na representao da jia
enquanto objeto raro, mas na prpria manuteno de
tcnicas que, desenvolvidas h milhares de anos, ainda
surpreendem e fascinam o homem contemporneo.
Este um dos panos de fundo sobre o qual as
pesquisas de tendncias mantm seu olhar vigilante, pois a
jia industrial est definitivamente ligada histria da
joalheria e, evidentemente, ao design. Alm disso, a cada
nova tecnologia que surge, o design de jias responde com
novas idias, conceitos e atitudes. As mudanas que da
ocorrem so vrias e imprevisveis. Porm, podemos
ressaltar algumas delas ligadas ao consumo e ao valor
simblico das jias. E sobre isso que falaremos a seguir.

4.3.2 Jia, objeto de consumo


uma histria: Era uma vez um homem que vivia na
Raridade. Depois de muitas aventuras, e de uma longa
viagem atravs da cincia econmica, ele encontrou a
Sociedade da Abundncia. Eles se casaram e tiveram
muitas necessidades.
Jean Baudrillard
226



Dentre as teorias da moda, existe uma viso, muito
particular, que a define como uma linguagem que,
expressando idias e sentimentos, os traduz em termos
artsticos. Essa expresso artstica, que tanto pode ser de


225
BOSI, A. 2002, p.23.
226
ALLRS, D. 2000, p.33.
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uma linguagem social ou psicolgica, o aspecto menos
explorado da moda e por isso, segundo Gilda de Mello e
Souza, talvez seja uma de suas faces mais apaixonantes
227
.
A anlise da joalheria e seus desdobramentos nos
movimentos da moda devem considerar esse mesmo
aspecto por onde transita a criao artstica. Por ter a aura
da permanncia inserida em seu discurso formal e, ao
mesmo tempo, estar afinada aos valores de seu tempo, a jia
encontra-se entre os objetos que tm possibilidades de
consumo e fruio.
Avaliar o objeto/jia enquanto objeto de consumo
requer, inicialmente, um entendimento de como trataremos o
consumo neste trabalho. O socilogo francs Jean
Baudrillard descarta a definio de consumo como uma mera
satisfao de necessidades e alerta para o fato de ter ele
uma relao ativa com os objetos, com a coletividade e com
o mundo.

No so os objetos e os produtos materiais que so objetos
de consumo: estes so apenas objetos da necessidade e da
satisfao. Em todos os tempos comprou-se, possuiu-se,
usufruiu-se, gastou-se e, contudo, no se consumiu.
228


O consumo, segundo ele, se d quando se estabelece
uma relao entre o indivduo e o significado do objeto, ou
seja, o signo do qual o objeto se reveste que o torna
consumvel. Na medida em que os objetos, revestidos de
valores e signos, so oferecidos ao homem contemporneo
como capazes de suprir suas carncias internas, tornam-se
objetos de desejo. No entanto, como a idealidade do objeto
no pode preencher esse vazio, permanece ele frustrado em
sua necessidade de complementao, gerando uma
irreprimvel compulso para o preenchimento dessa realidade
ausente. O objeto de consumo surge e se multiplica ao
infinito tendo como foco essa ausncia interna do homem e,
por isso, porque jamais se realiza, ele no tem limites. Ainda
para Baudrillard,

Les object ne constituem ni une flore ni une faune. Pourtant
ils donnent bien limpression dune vgtation prolifrante et
dune jungle, o le nouvel homme sauvage des temps
modernes a du mal retrouver les rflexes de la civilisation.
Cette faune et cette flore, que lhomme a produites et qui
reviennent lencercler et linvestir comme dans les mauvais
romans de science-fiction, il faut tenter de les dcrire
rapidement, telles que nous les voyons et les vivons en
noubliant jamais, dans leur faste et leur profusion, quelles
sont le produit dune activit humaine, et quelles sont
domines, non par de lois cologiques naturelles, mais par la
loi de la valeur dchange.
229



227
SOUZA, Gilda de Mello e. 1987, p.29.
228
BAUDRILLARD, J. 2000, p.206.
229
BAUDRILLARD, J. 1970, p.18 (Os objetos no se constituem nem em
uma flora nem em uma fauna. No entanto, do efetivamente a impresso
de uma vegetao prolfera e de uma selva, onde o novo homem selvagem
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Segundo Zygmunt Bauman, uma das caractersticas da
sociedade do sculo XXI sua capacidade de fluidez e de
mobilidade, que ele denomina de modernidade lquida.
Fazer parte desta sociedade significa ser incapaz de parar e
ainda menos capaz de ficar parado.
230
Para ele, este
excesso de mobilidade leva tambm impossibilidade de se
atingir a satisfao:

o horizonte da satisfao, a linha de chegada do esforo e o
momento da auto-congratulao tranqila movem-se rpido
demais. A consumao est sempre no futuro, e os objetivos
perdem sua atrao e potencial de satisfao no momento
de sua realizao, se no antes.
231


Poderamos ento entender o consumo como a busca
da satisfao de desejos atravs da idealidade dos objetos,
desejos esses que no se realizam em virtude da fluidez,
tanto dos valores intrnsecos ao objeto como da forma como
tudo se move no mundo contemporneo. O consumo no se
compraz com apenas uma compra. Ele se renova a cada
instante, na busca do novo, do diferente, do nico, do
especial.
Neste sentido, entendemos que as jias so
consumidas, em parte, por sua idia, pelos signos a elas
incorporados que tanto podem ser de poder, riqueza,
fidelidade, amor e honra, quanto de distino, magia e
seduo. Todos esses significados no so escolhidos
aleatoriamente; sempre estaro em sintonia com seu tempo
e atendendo s expectativas e desejos do pblico
consumidor.
Jean Baudrillard diz que todo objeto tem duas funes:
uma que a de ser utilizado, a outra a de ser possudo
232
.
Segundo ele, a posse do objeto vai alm de seu uso, pois o
utenslio devolve o usurio ao mundo. A posse sempre a
de um objeto abstrado de sua funo e relacionado ao
indivduo
233
. Ao considerarmos o aspecto simblico e
subjetivo das jias, podemos tambm inclu-las nesta
categoria. Dessa forma, as jias traro em si uma
singularidade absoluta, fruto de um empreendimento
individual e apaixonado de posse. Essa nova relao com
os objetos que, deixando de ser utilitria, passa a ser ldica,
instaura uma outra ordem na concepo dos mesmos.


dos tempos modernos tem dificuldade de reencontrar os reflexos da
civilizao. Esta fauna e esta flora, que o homem produziu e que torna a
cerc-lo e assalt-lo, como nas ms novelas de fico cientfica,
necessrio tentar descrev-las rapidamente, como as vemos e vivemos -
no esquecendo nunca que elas so, em seu fausto e em sua profuso, o
produto de uma atividade humana, e que so dominadas, no por leis
ecolgicas naturais, mas pela lei do valor de troca.).
230
BAUMAN, Z. 2001, p.37.
231
Ibidem.
232
BAUDILLARD, J. 1968, p.94.
233
Ibidem.
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E o que seria essa nova ordem? Para as pesquisas de
tendncias, o que se percebe hoje que os objetos esto
cada vez mais incorporando ao seu design valores
intangveis. As jias, hoje, tm nome, famlia e histria.
Esto deixando de ser apenas objetos para se
transformarem em sujeitos, os mais novos parceiros dos
consumidores na construo de uma relao mais
emocional.
Posicionada entre o clssico e o contemporneo, entre
a obsolescncia e a eternidade, a jia estabelece e impe
sua presena enquanto objeto precioso, mantendo, ao longo
de toda a trajetria da histria do homem, seu poder de
seduo.

4.3.3 A jia e o consumo do simblico


Somente quando um produto for capaz de prender a
ateno do usurio durante um certo tempo, torna-se
possvel a posse psquica deste produto, sobrepujando o
seu uso prtico.
Bernd Lbach
234



Ao analisarmos a construo de uma marca, podemos
observar que um conjunto de ferramentas utilizado para
projetar e fortalecer sua imagem. Philip Kotler diz que
marcas fortes exibem uma palavra ou idia principal, um
slogan, uma cor, um logotipo ou uma srie de histrias que
so associadas uma determinada entidade
235
, ou seja,
personalidade que essa marca quer representar. Segundo
ele,

Uma marca implica um relacionamento entre um produto e
um cliente. Ela subentende um conjunto de qualidades e
servios que o cliente pode esperar. A fidelidade marca se
desenvolve pelo atendimento s expectativas do cliente ou,
melhor ainda, pela sua superao, ao deixar o cliente
encantado.
236


Na concepo e criao de um produto, o mesmo
processo pode ser utilizado, onde a conceituao e a
proposta de novas idias podem ajudar a manter o frescor e
a rejuvenescer sua imagem.
Estabelecer conceitos para um produto tem sido uma
ferramenta usada pelo design, com o objetivo de produzir
princpios que sejam suficientemente fortes para atender s
exigncias do consumidor e estabelecer diferenas entre um
produto e os demais. A conceituao de um produto fator
preponderante, pois ser atravs da escolha do conceito


234
LBACH, B. 2001, p.174.
235
KOTLER, P. 1999, p.89.
236
Ibid., p.93.
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ideal que os benefcios bsicos de um produto estaro
evidenciados. Porm, o que temos visto atualmente, que a
conceituao de um produto j no se refere apenas aos
seus aspectos fsicos e de uso, mas aborda muito
fortemente os aspectos subjetivos e intangveis que o
compem.
Para Borja de Mozota
237
, o designer de produto, hoje,
precisa ajustar seus processos de criao s novas
tendncias de design, que do nfase abstrao,
imaterialidade e complexidade. Segundo ela, ao invs de se
fixar apenas na preocupao com as necessidades do
consumidor, o designer precisa ir alm e ser capaz de
identificar com quem ele vai fazer contato e se comunicar.

The physical shape of these new, intelligent objects is not
the issue. The issue is the design of our relationship with the
shape and how this relashionship makes an impression on
our brains.
238


A fase de elaborao e escolha de conceitos permite
ao designer a experimentao de novas propostas e oferece
o ambiente propcio para as invenes. Conceitos originais
exigem mentes abertas e pensamentos no convencionais.
Dentro do design de produto, a gerao de conceitos uma
etapa extremamente importante para que se alcance a
definio do projeto, desde sua funo, forma, valor e
esttica at o seu carter simblico. Desse modo, podemos
entender que, hoje, para os objetos serem bem sucedidos
no mercado, necessrio um conceito adequado, coerente
e inovador.
Ao se referir aos nossos objetos cotidianos, o
socilogo francs Jean Baudrillard sugere que eles sejam,
com efeito,

[...] os objetos de uma paixo, a da propriedade privada,
cujo investimento afetivo no fica atrs em nada quele das
paixes humanas, paixo cotidiana que freqentemente
prevalece sobre todas as outras, que por vezes reina
sozinha na ausncia das outras.
239


Atravs desse entendimento, podemos considerar que
os objetos, num dado momento, podem estabelecer um
relacionamento profundo com o indivduo. Para Baudrillard,
nesse relacionamento o objeto deixa de ser unicamente um
corpo material que resiste para tornar-se uma cerca
mental, onde o indivduo reina, algo de que ele o sentido,
uma propriedade, uma paixo. Kevin Roberts assim define
essa nova relao: as coisas com as quais escolhemos
viver no so objetos inertes. Ns as embalamos com nossa


237
BORJA DE MOZOTA, B. 2003, p.31.
238
Ibidem. (A forma fsica desses novos objetos inteligentes no a
questo. A questo o design do nosso relacionamento com a forma e
como esse relacionamento causa uma impresso em nosso crebro).
239
BAUDRILLARD, J. 2000, p.93.
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imaginao. Ns nos expressamos por meio delas. Ns as
transformamos no que importante para ns.
240

Dessa forma, podemos traar uma relao entre o objeto
revestido de funo prtica e o objeto que adquire um
estatuto mais subjetivo. Assim, ao deixar de ser
especificado por sua funo prtica, o objeto passa a ser
qualificado pelo indivduo, ou seja, o objeto no tem mais
funo e sim uma virtude: um signo.
241


4.3.4 As colees que contam histrias a
necessidade da fico


Trsors arbors ou abrits dans leurs coffrets, botes,
crins, les bijoux redonnent corps des fantasmes;
regards, touchs, imagins, ils activent une mmoire qui
est surtout de lordre de linconscient et produit une parole
qui oscille en permanence entre la prsence e labsense, le
secret et le dvoilemente, loubli et le souvenir.
Patrizia Ciambelli
242



Jean Baudrillard analisa a coleo como uma
organizao mais ou menos complexa de objetos que se
relacionam entre si. Cada um desses objetos uma
abstrao que o indivduo recupera atravs de sua prpria
abstrao vivida no sentimento de posse. Na coleo, diz
ele, o funcional desfaz-se continuamente no subjetivo, a
posse mistura-se ao uso, [...] a prosa cotidiana dos objetos
se torna poesia, discurso inconsciente e triunfal
243
.
Baudrillard tambm observa que, hoje, poucos objetos so
ofertados sozinhos, sem estarem inseridos num contexto
que comunica. Et la relation du consommateur lobjet en
est change: il ne se rfre tel objet dans son utilit
spcifique, mais un ensemble dobjets dans se signification
totale.
244

A moda vai se apropriar desse princpio, adaptando o
conceito de coleo, a fim de propiciar ao consumidor uma
relao emocional com seus objetos. Foi Christian Dior
245



240
ROBERTS, K. 2005, p.50.
241
BAUDRILLARD, J. 2000, p.90.
242
CIAMBELLI, P. 2002, p.7 (Tesouros arvorados ou protegidos nos seus
estojos, caixas, porta-jias, as jias voltam a dar corpo aos fantasmas;
olhadas, tocadas, imaginadas, elas ativam uma memria que , sobretudo,
da ordem do inconsciente e produzem uma palavra que oscila
permanentemente entre a presena e a ausncia, o segredo e a revelao, o
esquecimento e a lembrana.).
243
BAUDRILLARD, J. 2000, p.95.
244
BAUDIRLLARD, J. 1970, p.20. (E a relao do consumidor com o
objeto alterada: no se refere determinado objeto na sua utilidade
especfica, mas a um conjunto de objetos em seu significado total).
245
SENAC.DN. MOUTINHO, M. R.; VALENA, M. T. (org). 2000,
p.144.
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quem primeiro lanou o princpio dos temas para suas
colees, ao lanar em 1947 a coleo que ganhou o
apelido definitivo de New Look, inspirada na corola das
flores, apresentando coerncia e harmonia entre os
modelos. Como Dior comenta, ils ont cependant tous entre
eux un petit air de famille
246
. Segundo Gilles Lipovetsky, na
moda, a partir desse momento, s importam o esprito das
colees, a potica da griffe, o campo livre da criatividade
de artista
247
.
Tendncia forte na concepo de jias, hoje, a coleo
codifica, classifica e d coerncia s peas, instaurando um
repertrio de formas e cores, tal qual uma linguagem que
conta a histria que as alicera, sensibilizando e
mobilizando as conotaes afetivas.
A forte competitividade da nossa economia no
permite que muitos produtos mantenham uma superioridade
tcnica por longo tempo. Individualiz-los e dot-los de
associaes e imagens, revestindo-os de significaes,
uma forma de torn-los sedutores e capacit-los enquanto
objetos de desejo. Como observa Umberto Eco, na moda,
...uma forma pode tornar-se fetiche e ser fruda no pelo
que ou possa ser, mas pelo que representa no plano do
prestgio ou da publicidade.
248

Na joalheria, o desenvolvimento de uma coleo
249

um processo que passa por vrias etapas. Inicialmente o
designer precisa observar o esprito da poca, realizando
suas pesquisas para a compreenso do contexto no qual
est inserido. Em seguida, avaliam-se as tendncias
observadas, adequando-as realidade da empresa e do
mercado visado. O prximo passo a montagem de um
mood board
250
com o material recolhido e previamente
selecionado. Mike Baxter
251
recomenda a criao de trs
quadros visuais, partindo de objetivos mais amplos e
afinando para formas mais especficas: um painel de estilo
de vida, um painel de expresso do produto e um painel do
tema visual. Este material importante para a definio do
tema e do conceito a ser trabalhado na coleo. Aps a
definio do tema, vem a etapa da pesquisa deste tema e
montagem de uma ambincia especfica, formada por uma
ou mais imagens. As etapas seguintes incluem uma anlise
das tecnologias disponveis, a escolha de materiais e a
definio dos cdigos visuais que sero usados na coleo.


246
DIOR, C. Op.cit., 2003, p.27 (Eles tm contudo, entre si, um pequeno
ar de famlia.).
247
LIPOVETSKY, G. 1989, p.126.
248
ECO, U. 2001, p.99.
249
A metodologia foi formatada pela autora para o curso de
Desenvolvimento de Coleo na Joalheria ministrado por ela em
associaes e universidades do pas.
250
O mood board uma ferramenta muito utilizada na moda, no design e
nas pesquisas de tendncias, para criar um quadro com imagens que
traduzam os estmulos, emoes, valores, estilos de vida e informaes
captados nas pesquisas realizadas.
251
BAXTER, M. 2000, pp.190 e 191.
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A partir dessas informaes, uma argumentao slida pode
ser construda, dando ao produto a sustentao necessria
diante do mercado consumidor. A coleo, assim,
estabelece parceria com toda a cadeia produtiva, pois cada
etapa deve ser analisada para que a fabricao alcance o
mximo em seus resultados: beleza, qualidade e
competitividade.
Uma coleo de jias planejada de forma eficiente
pode apresentar o produto certo (corretamente direcionado
para o pblico-alvo), na hora certa (em sintonia com as
tendncias do momento) e com o preo certo, resultando
num bom relacionamento entre esse produto e o cliente.
Esse planejamento subentende um conjunto de qualidades
que vo agregar valor coleo, ajudando a desenvolver
uma sinergia entre a jia e o consumidor. A correta
interpretao das necessidades, sonhos, desejos, valores e
expectativas desse consumidor torna-se uma poderosa
ferramenta de venda, se comunicados adequadamente.
As colees de jias so projetadas para alm de uma
soluo de produo racional voltada apenas para os
princpios econmicos ou de uso. Em seu projeto,
observamos tambm a preocupao com a elaborao de
uma mensagem ou narrativa, cuja inteno tocar o
emocional do consumidor.
Ao aplicar esse conceito jia, o designer estabelece
um elo de atrao/seduo entre o produto e o consumidor.
Nosso mundo contemporneo povoado por uma infinidade
de bens de consumo similares e comandado por um alto
grau de competitividade. Nesse ambiente, a diferenciao e
a personalizao tornam-se fatores fundamentais na criao
de produtos de sucesso.
Cada item de uma coleo, como anel, brinco, pulseira
ou colar, torna-se ao mesmo tempo elemento importante
enquanto objeto nico e argumento de sustentao para os
demais. Visto isoladamente, mantm toda a beleza e
dignidade esttica na qual foi concebido; em conjunto,
oferece a possibilidade de um mergulho no imaginrio ou de
uma viagem no tempo/espao.
Em seguida, veremos alguns exemplos de colees de
jias desenvolvidas e produzidas por importantes indstrias
de jias no Brasil.
No exemplo da Figura 15, podemos analisar dois anis
que fazem parte da linha Dreams, desenvolvida pela
designer Glucia Silveira para a empresa FR Heb.
Inspirada nos sonhos e seus misteriosos caminhos, a
linguagem visual utilizada nesta coleo transmite, atravs
da sinuosidade das formas, a idia de leveza e movimento.
As tonalidades de rosa, em pedras translcidas ou leitosas,
convidam a um estado de doce encantamento, evidenciando
as sensaes e impresses onricas. Segundo a designer
252
,


252
Informao verbal dada pela designer autora, pessoalmente, em
2005.
Figura 15 - Linha
Dreams - Glucia
Silveira/ FR Heb

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o delicado tilintar das pequenas pedras articuladas emite,
como nos sonhos, sons indecifrveis de pura magia.
Na Figura 16 a seguir, podemos observar a coleo
desenvolvida pela designer Cludia Lamassa para a
empresa Brner, com o ttulo Jardim Secreto de Burle Max.
Segundo a designer
253
, a coleo presta uma homenagem
ao arquiteto e paisagista Roberto Burle Max, prestigiando a
arte brasileira e dando um enfoque cultural coleo.




















As formas orgnicas destacam tambm a feminilidade
e a sensualidade da mulher, envolvendo-a em cascatas
fludas de folhas, flores e pedras preciosas. Os cdigos,
bem definidos e sem excessos, esto presentes em cada
elemento da coleo - brincos, gargantilha e anel -,
transmitindo o conceito com clareza e elegncia. Os pontos
de atrao ficam evidentes na extica harmonia do contraste
cromtico, no cintilar das pedras dispostas em pav e no
movimento das peas articuladas.
A linha Flores Tropicais (Figura 17) faz parte da
coleo da Seven Metais de 2006/2007, que teve como
tema central a Preservao Ambiental. O release
apresentou o seguinte argumento:

O desmatamento irresponsvel tem devastado regies e
matas, extinguindo uma belssima e extica variedade de
plantas e empobrecendo o acervo natural da Terra.
Atravs da Linha FLORES TROPICAIS, a SEVEN manifesta
sua preocupao com a extino de algumas espcies,
engajando-se no movimento de preservao da Natureza.
254




253
Informao verbal dada pela designer autora, pessoalmente, em
2005.
254
O release da coleo foi realizado pela autora, Cidda Siqueira, como
parte das aes de consultoria empresa em 2006.
Figura 16 - Linha "Jardim Secreto de Burle
Max" - Cludia Lamassa

Figura 17 Linha
Flores Tropicais Ana
Carla Torraca/Seven
Metais
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A linha Spiders (Figura 18) foi desenvolvida pelo
designer Csar Aleandri para a empresa Gnesis e lanada
em 2005. O release da coleo
255
fala sobre a dimenso
simblica da aranha, como smbolo lunar e feminino, ligado
s tramas do destino humano. Conhecida como a grande
tecel, a aranha tambm tem sua teia ligada ao smbolo da
iluso, da fragilidade do mundo e das aparncias, segundo
os indianos. Segundo o designer
256
, a linha Spiders busca
representar toda a magia e encantamento da rainha das
tecels, atravs de uma jia ousada e sofisticada. o
mistrio do feminino e sua poderosa fora simblica
traduzidos com muito luxo.
O ecletismo em que a moda mergulhou, deu asas
liberdade criadora, permitindo um maior jogo entre os
diferentes estilos. As colees, hoje, j no se prendem
uma unidade esttica, como no tempo do New Look. O
mundo contemporneo abriu a moda para inmeras
vertentes, embaralhando suas referncias, e o indivduo j
capaz de fazer leituras dessa nova linguagem
heterognea.
As atuais tendncias de design apontam para a
valorizao da potica dos objetos, construindo narrativas
que toquem a ateno emocional do consumidor. As
colees contam histrias cujo fim no se exaure em si
mesmo, mas abre as portas para novos temas e novas
histrias. Como nas Mil e Uma Noites, as colees
assumem o papel de Sherazades modernas, oferecendo ao
consumidor uma infinidade de imagens e abordando os mais
diversos assuntos. Enquanto esprito e potica, as jias vo
tecendo caminhos de pura magia, unindo passado, presente
e futuro e permitindo que a criao tenha liberdade para
escolher sua prpria direo.

4.3.5 Jia de Autor Jia de Arte


...no sou fbrica, sou artista. Sou persistente e gosto de
ser livre, recuso a massificao."
Ulla Johnsen
257



Esta uma declarao definitiva e serve como um
divisor de guas entre o que se pode entender como
joalheria industrial e joalheria de arte. Ponto polmico e
aberto a muitas interpretaes, a discusso j foi motivo de


255
O release da coleo foi realizado pela autora, Cidda Siqueira, como
parte das aes de consultoria empresa em 2005.
256
Informao verbal dada pelo designer Csar Aleandri autora, em
2005.
257
JOHNSEN, U. Entrevista. Disponvel em:
http://www.joiabr.com.br/designer/ulla.html. Acessado em dezembro de
2005.
Figura 18 - Coleo
Spiders - Csar
Aleandri/Gnesis

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inmeros encontros entre designers, joalheiros, artistas e
autores. A busca de um senso comum algumas vezes
gerou muito mais antagonismos que concordncias. Dessa
forma, esta pesquisa no pretende resolver o impasse, mas
somente abordar os vrios e diferentes ttulos com que a
joalheria e seus criadores foram experimentando ao longo do
tempo.
Em geral, entende-se por jia de autor a jia que
confeccionada por quem a cria. Muitas vezes, no existe um
projeto prvio e durante o manuseio do metal que o artista
desenvolve sua obra. Em entrevista concedida Ricardo
Passos, em 2003, e divulgada no site Jias do Brasil, a
joalheira de arte Reny Golcman assim definiu jia de autor:

[...] uma pea nica ou de tiragem limitada, produto de um
desenho e realizada com tcnica de joalheria artesanal na
bancada. A jia de autor uma criao pura, no
importando ao autor entrar em oposio a tudo que existe,
uma antijia no sentido tradicional, o passo a frente do
convencional, uma escultura portvel.
258


A joalheira de arte Cathrine Clarke, conhecida por
expressar em suas criaes o respeito pelas pedras
preciosas, dando forma s suas jias a partir da
originalidade das gemas (Figura 19 e Figura 20), tece o
seguinte comentrio:

A joalheria contempornea provm da arte e do ofcio
tradicional, das formas simblicas do design abstrato e/ou
geomtrico e das variantes conceituais avant-garde, que
testam os prprios limites da joalheria. Dessa forma, jias
de arte so peas inventivas, compostas a partir de idias
especficas, enaltecendo caractersticas nicas. Hoje, para
criar a jia-arte, so necessrios smbolos engenhosos com
os quais se possa ter um envolvimento mais efetivo.
Joalheria artstica, assim como escultura e pintura, revela
com clareza o estilo de quem a concebe e a usa.
259


Para a joalheira e escultora Gloria Corbetta (Figura 21),
jia de arte ou jia assinada aquela criada por um artista
ou designer segundo sua prpria viso de harmonia e
beleza
260
. Na criao, Glria desenvolve seus prottipos
como esculturas, moldando materiais como papel, barro,
arame ou lato. Para ela, cada jia uma verdadeira obra
de arte, que representa a fuso entre a sensibilidade, a alma,
o interior de quem a idealizou
261
.


258
GOLCMAN, R. Entrevista a Ricardo Passos (Portugal) e publicada no
site Jias do Brasil em 24 de Julho de 2003. Disponvel em:
http://joiasdobrasil.com/entrevista/reny.asp - acessado em Dezembro de
2005.
259
CLARKE, C. Artigo: A Joalheria de Arte Ps-moderna. Disponvel
em: http://www.katesjewelry.com.br/artigo1.htm - acessado em
Dezembro de 2005.
260
CORBETTA, G. 2007, p.85.
261
Ibid., p.89.
Figura 19 Anel em
ouro com esmeralda
bruta - Cathrine
Clarke

Figura 20 Anel em
ao e ametista bicolor
Cathrine
Clarke/2007

Figura 21 Anel
em ouro Glria
Corbetta.
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Em 1961, o Goldsmiths Hall de Londres realizou a
primeira grande mostra de jias contemporneas que,
segundo Cathrine Clarke, alm de fortes qualidades formais,
dava ao artista-criador o reconhecimento de sua autoria.
Neste mesmo ano, foi inaugurado o primeiro museu de
joalheria de arte em Pforzheim, Alemanha o renomado
Schmuckmuseum.
Na dcada de 1970, a falta de ouro e outros materiais
preciosos na Alemanha Oriental, fizeram com que seus
artistas recorressem aos sintticos e reciclados para compor
suas peas, enquanto a arte japonesa ousava levar para o
ouro a textura de papel amassado. Termos pouco
convencionais ao setor joalheiro como tenso mecnica,
tenso visual, dimenses macroscpicas, experimental,
substncias poveras, cinestesia, minimalismo, high-
tech, questes tridimensionais, arte grafite, croch,
tric, tear, marcas pessoais, impresses digitais,
texturas, papier-mch, conceito e linguagem
passaram, a partir de ento, a fazer parte do discurso dos
artistas-joalheiros.
Clare Phillips
262
comenta que, entre as dcadas de
1960 e 1970, surgiu uma nova gerao de artistas que
puseram em questo a natureza da joalheria e sua funo na
sociedade. Esse questionamento encurtou os espaos entre
as fronteiras das jias e da escultura, ou at mesmo de
outras artes mais performticas. Dessa forma, as jias
passaram a oscilar entre a arte e o adorno.
Para Cathrine Clarke
263
, se a arte moderna se ateve s
convenes, a arte contempornea transbordou seus limites.
Assim, as idias revolucionrias das artes visuais tiveram um
forte impacto sobre a tradicional arte da joalheria,
incentivando a introduo de uma linguagem de vanguarda
na criao de jias.
atravs das experimentaes na joalheria de arte
que, constantemente, as tcnicas tradicionais de ourivesaria
so reinventadas. Com isso, a jia contempornea ganha um
novo flego. Como ressalta Cathrine Clarke,

Quaisquer que sejam os caminhos do futuro, a obra
conceitual ser sempre uma fonte de prazer, porque a arte
se relaciona com os estados psicolgicos do homem: seus
sentimentos, seu gosto, sua sensibilidade. Na arte, o poder
de fascinar e inspirar tem que inventar o por fazer e como
fazer de forma original, isto , sem apelar para as
releituras.
264


Em Novembro de 2004, na II Mostra Darcy Penteado
de Arte, realizada na Aliana Francesa em So Paulo, foram


262
PHILLIPS, C. 1996, p.195.
263
CLARKE, C. Artigo. A Arte na Joalheria Contempornea. Disponvel
em: http://www.katesjewelry.com.br/artigo1.htm - acessado em 2005.
264
CLARKE, C. A Arte na Joalheria Contempornea. Disponvel em:
http://www.katesjewelry.com.br/artigo1.htm - acessado em 2005.
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apresentadas, paralelamente, duas exposies de jias
265
,
onde ficou clara a preocupao em se estabelecer uma
diferena entre Arte e Design, pelo menos no que se refere
joalheria.
No espao denominado Jias de Autor, assinalamos a
presena de nomes como Caio Mouro, Giovanni Prozzi,
Juliana Pelllegrini, Lcia Abdenur, Marcia Ganem, Bia Saad,
Maria Lcia Barbosa, Marivaldo Pimentel, Monica Reda, Nani
Toledo, Paula Mouro, Renata Chagas, Valria Franolin,
Virgnia Griffel, Reny Golcman, Salvador Francisco, Yael
Sonia e Ruth Grieco.
No Salo de Design de Jias, uma exposio de
desenhos de designers brasileiros que atuam mais
diretamente em indstrias de jias, como Melissa Maia,
Elinia Rosetti, Lena Garrido, Dbora Camisasca, Gracia
Costa, Rodrigo Robson, Alain Monteiro e J Rodrigues.
Em maio de 2005, a Tecnogold Feira Internacional
de Mquinas e Tecnologia voltada para o setor joalheiro,
que acontece em So Paulo, prestou uma homenagem aos
artistas joalheiros pioneiros do mercado nacional, com a
Mostra Os Nossos Pioneiros. O evento foi uma
homenagem aos artistas desbravadores da joalheria no
Brasil, que se dedicaram, nos ltimos 45 anos, a repassar
conhecimento e conceitos para novas geraes de autores
de jias. Entre os nomes homenageados, esto: Clementina
Duarte, Kjeld Boesen, Marcos Augusto, Nelson Alvim,
Renato Wagner, Rene Sasson, Reny Golcman, Ricardo
Mattar, Salvador Francisco Neto, Ulla Johnsen, a Escola
Nova (representada por Marco Dualibi e Denise Mattar) e,
in memorian, os artistas Bobby Stepanenko, Caio Mouro,
Domenico S. Calabrone, Livio E. Levi e Mrcio Mattar. O
curador da mostra, Michael Striemer, fez a seguinte
declarao:

Para mim, esta exposio significa um muito obrigado, um
grande beijo em cada um deles por terem carpido os
primeiros trechos de uma grande e maravilhosa estrada que
a arte da criao e design de jias, agora do Brasil para o
mundo.
266


A joalheria de arte , hoje, uma das fortes tendncias
do setor, embora seus artistas afirmem no segui-las. A
verdade que isso no importa. O mais importante
reconhecer que os experimentos, as ousadias e as
loucuras realizadas pelos artistas-joalheiros tm
contribudo de maneira efetiva para o desenvolvimento do
design de jias no Brasil. Artesanal ou industrial, tradicional
ou vanguarda, a jia vem rompendo paradigmas e


265
Disponvel em: http://www.joiabr.com.br/noticias/n131104a.html -
acessado em Dezembro de 2005.
266
STRIEMER, M. Entrevista. Tecnogold 2005: Califrnia 120
homenageia artistas joalheiros com a exposio Os nossos pioneiros.
Disponvel em: www.california120.com.br/8atecnogoldimprensa2.htm.
Acessado em Dezembro de 2005.
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conquistando outras posies. Das tcnicas ancestrais s
tecnologias de ponta, todas as ferramentas so
possibilidades para se dar forma uma idia. Artistas ou
designers, as classificaes estaro sempre aqum da
capacidade criativa e inovadora daqueles que se lanam a
tirar das pedras e dos metais o que eles tm de mais
precioso.
















































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