Fiodor Dostoiévski - O Grande Inquisidor
Fiodor Dostoiévski - O Grande Inquisidor
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O GRANDE INQUISIDOR
Fiodor Dostoivski
por fim, que cessem os tormentos, todos os anos, desde Sexta-Feira Santa
ao Pentecostes, e os condenados, do fundo do Inferno, agradecem a Deus
e gritam: Senhor, a Tua sentena justa!. Pois bem: o meu poemazito
teria sido deste gnero, se o tivesse escrito nessa poca. Deus aparece; no
diz nada; s passa. Rodaram quinze sculos, depois que prometeu voltar
ao Seu reino, depois que o Seu profeta escreveu: Cedo voltarei; quanto
ao dia e hora, o Filho mesmo no os conhece; s o sabe meu Pai que est
nos Cus, segundo as prprias palavras que pronunciou na Terra. E a
humanidade espera-0 com a mesma f que outrora, f mais ardente
ainda, porque j quinze sculos passaram depois que o Cu deixou de dar
penhores aos homens: Cr no que te diz o corao; os Cus no do
penhores.
verdade que se produziam ento numerosos milagres: os santos
realizavam curas maravilhosas, a Rainha dos Cus visitava certos justos, a
acreditar no que narram as biografias. Mas o Diabo no dorme; a
humanidade comea a duvidar da autenticidade destes prodgios. Neste
momento, nasceu na Alemanha uma heresia terrvel que negava os
milagres. Uma grande estrela, ardendo como um facho (a Igreja,
evidentemente!), caiu sobre as fontes das guas, que se tornaram
amargas. A f dos fiis redobrou. As lgrimas da humanidade elevam-se
para Ele como outrora, e aguardam-n e amam-n e tm esperana
n'Ele como outrora... J h tantos sculos que a humanidade roga com
ardor: Senhor, digna-Te aparecer-nos, j h tantos sculos que para Ele
vo seus gritos, que, na Sua misericrdia infinita, quis descer junto dos
fiis. J antes tinha visitado, pelo que nos dizem os bigrafos, alguns
justos, mrtires e santos anacoretas. Entre ns, Pintchev(3), que
acreditava profundamente na verdade das Suas palavras, proclamou que
curvado ao peso da Sua cruz e com humilde aparncia, o Rei dos Cus te
percorreu, terra natal, a abenoar-te toda.
Mas eis que se quis mostrar, por um instante ao menos, ao povo sofredor
e miservel, ao povo mergulhado nos pecados, mas que O ama
ingenuamente. A aco passa-se em Espanha, em Sevilha, na
poca mais
terrvel da Inquisio, quando todos os dias, para glria de Deus, se
acendiam as fogueiras e os medonhos hereges ardiam em soberbos
autos- de-f. Oh! no foi assim que prometeu voltar, no fim dos tempos,
em toda a Sua glria, subitamente, como um relmpago que brilha de
Oriente a Ocidente. No; quis visitar Seus filhos, precisamente no lugar
em que crepitavam as fogueiras dos hereges. Na Sua infinita misericrdia,
volta para entre os homens com a forma que tinha durante os trs anos de
vida pblica. Desce pelas ruas ardentes da cidade meridional em que,
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Sem ns, estaro sempre com fome. Nenhuma cincia lhes dar o po
enquanto estiverem livres; e ho-de dep- la a nossos ps, a essa
liberdade, e diro: Fazei de ns escravos, mas alimentai-nos.
Compreendero, enfim, que a liberdade inconcilivel com o po da
Terra discrio, porque nunca ho-de saber reparti-lo entre si!
Tambm se ho-de convencer da sua impotncia para se tornarem
livres,
porque so fracos e depravados, revoltados e nulos. Prometias-lhes o po
do Cu; e, vamos l uma vez mais, acaso se pode ele comparar com o da
Terra aos olhos da fraca raa humana, eternamente ingrata e depravada?
Milhares e dezenas de milhares de almas Te ho-de seguir por causa deste
po, mas que h-de ser dos milhes e dos bilies que no tiverem coragem
de preferir o po do Cu ao po da Terra? No serias Tu amigo seno dos
grandes e dos fortes, para quem os outros, a multido inumervel, que
fraca, mas que Te ama, servira apenas de matria explorvel? Mas ns
somos tambm amigos dos seres fracos. Embora depravados e revoltados,
ho-de tornar-se finalmente dceis. Ho-de admirar-nos e ho-de
julgar-nos deuses por termos consentido, pondo-nos frente deles, em
assegurar a liberdade que temiam e em domin-los; tal ser, por fim, o
seu medo de serem livres. Mas dir-lhes-emos que somos Teus discpulos,
que reinamos em Teu nome. Engan-los-emos de novo, porque nessa
altura no deixaremos que Te aproximes de ns. E esta impostura que
constituir o nosso sofrimento, porque seremos obrigados a mentir. este
o sentido da primeira pergunta que Te fizeram no deserto e foi isto o que
Tu repeliste em nome da liberdade que punhas acima de tudo. Continha,
no entanto, o segredo do mundo. Se tivesses consentido no milagre dos
pes, terias acalmado a eterna inquietao da humanidade - indivduos e
colectividade - : diante de quem se inclinar? Porque no h para o
homem que ficou livre cuidado mais constante e mais doloroso do que o
de procurar um ser diante do qual se incline. Mas no quer inclinar-se
seno diante de uma fora incontestada, que todos os seres humanos
respeitam por um consentimento universal. Estas pobres criaturas
atormentam-se na busca de um culto que reuna no somente alguns fiis,
mas no qual comunguem todos juntos, unidos pela mesma f. Esta
necessidade do comum na adorao o principal tormento de cada
indivduo e da humanidade inteira, desde o comeo dos sculos. para
realizar este sonho que tem havido os extermnios a gldio. Os povos
forjaram deuses e desafiaram-se uns aos outros: Abandona os vossos
deuses, adorai os nossos; seno, ai de vs e dos vossos deuses! E ser
assim at o fim do mundo, mesmo quando j os deuses tiverem
desaparecido; prostrar-se-o diante dos dolos. No ignoravas, no podias
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