Broadman Volume 03 PDF
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Junta Editorial
EDITOR GERAL
1 Para um a visão geral dos problemas envolvidos n a datação de eventos Assim, am bos os “livros’’ de Samuel se acham escritos num só perga-
do Antigo Testamento, veja S. J. DeVries, “Chronology o f the Old m inho, no texto encontrado n a C averna 4 do M ar M orto (cf. o
Testam ent”, ID B (New York: Abingdon, 1962), v. 1, p. 580-599. com entário a seguir no texto).
li
desenvolvimento de unta monarquia sobre mente que devem-se levar em conta as
Israel e Judá. Devemo-nos lembrar, todavia, diferenças de detalhes históricos (2Sm 21.19
de que o registro bíblico, quando foi escrito, — cf. lCr 20.5; 2Sm 24.1 — cf. lCr 21.1;
tinha primordialmente em vista um povo 2Sm 24.9 — cf. lCr 21.5).
cujo interesse pelo passado foi motivado Os historiadores modernos parecem cada
por preocupações que diferem considera vez mais convencidos de que é impossível
velmente das preocupações do leitor escrever um relato absolutamente objetivo
moderno. Os antigos hebreus estudavam de qualquer evento passado. Todo registro
a história não só porque desejavam satis reflete os interesses pessoais do autor, quer
fazer sua curiosidade intelectual, mas na seleção que ele faz dos eventos signifi
também porque tinham em vista compre cativos, quer na descrição que fornece de
ender a natureza da relação entre Deus e tais fatos. A Bíblia é um bom exemplo disso,
seu povo. uma vez que seus autores empregavam a
Inúmeros aspectos de interesse para o compreensão que tinham acerca do passado
historiador moderno foram tratados super de Israel para tomarem conhecidas suas
ficialmente ou foram até mesmo totalmente opiniões teológicas.
ignorados. Assim é que quase nenhuma Por isso, em Samuel, o propósito do autor
informação ficou registrada acerca da estru não era escrever um registro abstrato de
tura governamental de Israel ao tempo dos fatos isolados na história de Israel. Ao invés
juizes, mas a reivindicação popular em favor disso, o que buscava era extrair de ocorrên
de um rei foi duramente condenada, sendo cias passadas os princípios sobre os quais
vista como um repúdio à liderança pessoal o Senhor baseara seu relacionamento com
de Deus (ISm 8.7,8; 10.19). Semelhante seu povo. Tanto o autor como seus leitores
mente, a perda da arca e a história que ela viam em Deus a autoridade derradeira por
teve entre os filisteus vem registrada com detrás de todo acontecimento humano. O
bastantes detalhes (ISm 4—6); porém a queda Senhor estava sempre agindo pelo bem
de Siló, aparentemente o centro adminis supremo de Israel, fosse como juiz, fosse
trativo de Israel naquele tempo, não é como redentor (ISm 12.6-13). Mesmo depois
mencionada nos livros de Samuel. Em que o povo exigiu a instalação da monar
relação ao reinado de Saul, encontra-se o quia, a nação haveria de prosperar, se
mesmo contraste. Nada se disse acerca das ambos, povo e rei, fossem sensíveis à lide
pressões políticas devastadoras que Saul rança de Deus. O juízo divino, entretanto,
deve ter sofrido, ao passo que seu fracasso recairia sobre os rebeldes (ISm 12.14,15;
como o primeiro rei de Israel é explicado 2Sm 23.1-7). Destarte, foi Saul rejeitado por
em bases puramente religiosas (ISm 13.1-14; desobediência (cf. comentário sobre ISm
15.1-23). Poder-se-iam apontar circuns 15.1-35) e substituído por Davi.
tâncias semelhantes na ascensão e reinado De acordo com tais princípios, Natã
de Davi. previu que seria bem-sucedida a empreitada
É preciso, no entanto, considerar seria de fazer Davi rei de Israel e que uma
mente as circunstâncias históricas que linhagem duradoura de seus descendentes
formam o contexto dos livros de Samuel. ocuparia o trono (2Sm 7). Nesses líderes
No todo, esse material parece ter sido guiados por Deus repousava a esperança
compilado por pessoas que conscientemente de Israel no futuro.
lidavam com ele (cf. posterior comentário
sobre a estrutura dos livros) e que, por
vezes, tinham acesso a registros (2Sm 1.18) III. Texto
ou arquivos (2Sm 8.1-14; cf. Hertzberg, Desde 1937 a maioria das traduções do
p. 289,290). Não obstante isso, os próprios Antigo Testamento vem usando textos
registros bíblicos demonstram muito clara hebraicos impressos que, em última
12
instância, baseiam-se num manuscrito tante na interpretação da mensagem de
concluído por membros da família Ben Samuel do que achávamos até agora.3
Asher, no ano 1008 da era cristã. Até o
momento, é esse o mais antigo manuscrito IV. Autoria
completo do Antigo Testamento a que se De acordo com a tradição judaica,
tem acesso. Várias gerações daquela notável Samuel foi o principal autor de Juizes e dos
família empenharam-se com afinco para livros que levam seu nome. Pensava-se que
concluir a obra de uma extensa linhagem as informações acerca do período que
de hebraístas, conhecidos como massoretas, seguiu-se à sua morte foram supridas pelos
que procuraram estabelecer um texto profetas Gade e Natã (cf. lCr 29.29,30).
oficial, seguindo a maneira como se pronun Os livros em si mesmos são anônimos, e
ciava o hebraico da época.
a forma de apresentação deles não indica
Infelizmente, o Texto Massorético dos nome algum como tendo colaborado para
livros de Samuel foi malconservado, sendo a sua redação.
hoje ilegível em diversas passagens. Na Estudos recentes, entretanto, sugerem
maioria dos casos, o texto pode ser resta que os livros de Samuel foram compilados
belecido com razoável margem de segu a partir de um corpo maior de tradições
rança, através do confronto com a Septua- bem antigas acerca de Samuel, Saul, Davi,
ginta e, onde existam, com passagens a arca etc. A existência desse material para
paralelas do livro de Crônicas. Visto que lelo às narrativas bíblicas é explicitamente
tais fontes aparentemente se baseavam em mencionada pelo menos duas vezes em
tradições textuais que diferiam freqüente Samuel. Os direitos e deveres do rei, por
e significativamente das fontes massoré- exemplo, foram escritos num livro que foi
ticas, deve-se aceitar um grande número de colocado “perante o Senhor” (ISm 10.25).
diferenças quanto aos pormenores das Fato semelhante se deu com uma cópia do
passagens controversas. lamento de Davi sobre a morte de Saul e
Em 1952, numa caverna próxima a de Jônatas, lamento que se dizia ter sido
Khirbet Qumran, na costa noroeste do Mar escrito no Livro dos Justos (2Sm 1.18).
Morto, foram descobertas porções de dois A presença, em Samuel, de diversas
rolos de Samuel, escritos em hebraico. narrativas duplas de incidentes paralelos
Enquanto a maior parte do material então também sugere que os atuais livros
encontrado fossem fragmentos quebradiços, basearam-se em tradições e material mais
os textos de Samuel tiveram melhor sorte antigos. Assim, Eli é duas vezes advertido
no ambiente inóspito da caverna. O mais acerca da desgraça que se avizinha de sua
antigo dos dois consiste de apenas algumas “casa” (ISm 2.27-36; 3.11-14). Um dos relatos
linhas dispersas, escritas em hebraico, mas sobre o pedido de Israel, reivindicando um
o outro é representado por, no mínimo, 47 rei para si, opõe-se fortemente à monarquia
das 57 colunas originais. Calcula-se que a (ISm 7.1—8.22), enquanto o outro apre
escrita pertença a um estilo corrente no senta essa instituição como um instrumento
século primeiro a.C., de modo que esse rolo de Deus para a libertação de seu povo (parte
aparenta ser pelo menos mil anos mais principal dos capítulos 9—11). Saul é acla
velho que qualquer outro texto de Samuel mado rei publicamente duas vezes (10.17-24;
anteriormente disponível. É bastante signi 11.15), e duas vezes rejeitado pelo Senhor
ficativo que o texto apresentado pelo (13.14; 15.23). Davi primeiramente se torna
manuscrito se ache mais próximo do músico e escudeiro pessoal de Saul (16.14-
hebraico que serviu de base para a Septua-
ginta, e dos livros de Crônicas, que do texto
massorético tradicional. Por isso, o teste 3 Cf. Frank M. Cross, Jr. The A n c ien t Library ofQ um ran a nd M o d em
Biblical Studies (Garden City, New York: Doubleday and Company,
munho dessas duas fontes é mais impor 1958), p. 30-33.
13
23) e, então, até matar Golias, era desco rativas paralelas, novamente sob a desig
nhecido do rei e seu general (17.1—18.2). nação de J e E como no Ftentateuco, haviam
Davi foi duas vezes traído pelos zifeus sido entretecidas para servir como núcleo
(23.19-28; 26.1-5), e duas vezes poupou a básico das informações acerca da transição
vida de Saul, que o perseguia (24.1-22; de Israel de um governo tribal para um
26.6-25). Até mesmo a maneira pela qual governo monárquico. De modo semelhante,
Saul encontra a morte vem duplamente rela identificaram ainda diversas recensões e
tada (ISm 31; 2Sm 1). adições subseqüentes que asseguraram ao
Alguns desses exemplos poderiam ser texto sua forma atual.
explicados como coincidência, conside Mais recentemente, especialistas em
rando que a experiência real é complexa exame de fontes reconheceram a dificuldade
e variada. A impressionante freqüência de demonstrar um número suficiente de
dessas repetições sugere, entretanto, um constantes (semelhanças de estilo, teologia,
esforço consciente de fundir ciclos de perspectiva histórica etc), dentro de cada
tradição independentes. ciclo de tradição, que permita estabelecer
Esses fatores, entre outros, levaram os uma continuidade com os documentos do
estudiosos de Samuel à conclusão de que Fentateuco. Apesar disso, pareceu-lhes que
o editor desses livros teve necessidade de as narrativas repetidas, particularmente em
compulsar material mais antigo, o qual usou Samuel, poderiam ser vinculadas, for
de maneira bastante consciente. Surpreen mando, em separado, duas narrações signi
dentemente, cada passagem reteve sua ficativas — pelo menos até o capítulo 8 do
própria identidade, livre de alterações desa segundo livro de Samuel.
jeitadas que teriam resultado numa história
mais simples, porém menos significativa. Outros observadores notaram que as
tradições acerca de determinados temas
tendem a chegar até nós em blocos ou
V. Composição complexos de material bem estruturado e
integrado. Isso os levou à conclusão de que
Embora já pareça justo admitir que através dos anos foram sendo recolhidas,
Samuel baseia-se em tradições antigas e gradualmente, versões acerca da história da
independentes, os estágios que o material arca (ISm 4—6; 2Sm 6), da instalação da
percorreu até alcançar a forma atual não monarquia (ISm 8—12), e da luta pela
são absolutamente inquestionáveis. Neste sucessão ao trono de Davi (2Sm 9—20; lRs
último século e meio debateu-se acirrada- 1—2). Concluíram que esses e outros
mente a questão de saber se tais variantes complexos narrativos foram finalmente
representam fontes interligadas ou frag reunidos por um editor que utilizou mate
mentos independentes.4 rial mais antigo para levar a cabo suas
Nas primeiras tentativas sérias de próprias intenções teológicas.
restaurar o material que serve de base para
Samuel, recorreu-se ao emprego de técnicas Uma vez, portanto, que não se chegou
crítico-literárias desenvolvidas no estudo do a consenso em matéria de explicações da
Fentateuco. Os comentaristas mais antigos composição de Samuel, devemos evitar
reconheciam nos livros históricos as soluções dogmáticas face ao problema.
mesmas fontes que haviam identificado nos Nos últimos anos particularmente, um
cinco primeiros livros do Antigo Testa número cada vez maior de indícios e provas
mento. Eles sustentavam que duas nar tem conferido uma importância maior ao
papel da tradição oral na formação dos
Para um estudo mais acurado do enfoque crítico à obra de Samuel, documentos bíblicos. Assim, uma divisão
veja E rnst Selim, introduction to the Old Testament, edição revista
e reescrita por G eorg Fohrer, traduzida para o inglês por David E.
absolutamente precisa das fontes, que
Green (Nashville: Abingdon, 1965), p. 215-217, 522,523. inclua até mesmo fragmentos de versículos
14
isolados, vai ficando mais e mais difícil de termina com o declínio de sua própria influ
se manter. ência.
Semelhantemente, não se deve esperar A inclusão de um sumário do ministério
um relato pormenorizado dos processos de cada um, inclusão feita antes da menção
pelos quais o presente texto foi composto. de seu declínio, em vez de por ocasião de
Análises tão minuciosas ainda devem sua morte, exemplifica ainda mais o cuidado
aguardar um aperfeiçoamento considerável do autor no arranjo dos ciclos narrativos.
de nossas habilidades nas áreas de literatura Assim é que a proclamação dos feitos de
e história. Apesar disso, é possível apre Samuel (ISm 7.12-17) antecede o anúncio
sentar algumas notas e sugestões cautelosas. de sua velhice e rejeição (8.1-9), e o reinado
de Saul é aclamado (14.47-52) antes que
1. A Coletânea Básica as razões de sua rejeição fossem relatadas
(15.1-35).6
Uma intrigante sugestão quanto à estru Todavia, podemos notar uma discre
tura subjacente à obra de Samuel é a
pância no fato de aparecer o sumário do
maneira incomum com que se faz a divisão
reinado de Davi (2Sm 8.15-18) isento de
entre os livros de Samuel e os de Reis. A
maior parte do relato acerca do reinado de quaisquer indícios de um final próximo
(2Sm 23.1; lRs 1.1; 2.1). As tentativas de
Davi aparece em Samuel, mas o livro de
Absalão e de Sebá se apossarem do trono
Reis é que trata de sua morte. Aqui os prin
(2Sm 13-20) podem significar que seu pres
cípios da separação divergem consideravel
tígio estivesse declinando, mas outros
mente dos utilizados nos livros mais antigos
incidentes, após o capítulo 9, retratam Davi
do Antigo Testamento.
A cada grande líder, instituição ou no apogeu de sua força. Tanto o brando
período histórico de Israel parece ter sido tratamento que dispensa a Mefibosete
(9.1-13) quanto o relato de sua guerra
dedicado, idealmente, um livro em separado:
contra os amonitas (10.1—11.1) retratam um
Êxodo cuida da partida de Israel do Egito;
homem confiante em sua autoridade.
Levítico trata do sacerdócio; Números se Mesmo seu pecado com Bate-Seba (11.2—
ocupa da jornada no deserto; Deuteronômio
15.23) apenas provoca problemas em sua
é dedicado a Moisés; Josué, à conquista;
e Juizes, à colônia em Canaã.5 casa, e não o fim de seu reinado.
Até agora não se apresentou qualquer Acompanhando, pois, o sumário do
remado de Davi (2Sm 8.15-18), a narrativa
explicação satisfatória para o fato de o
se desvia do padrão que vinha seguindo
ministério de Davi ter sido registrado em
anteriormente. O capítulo 9, entretanto, tem
Samuel, e sua morte, no livro de Reis. Hertz-
sido largamente reconhecido como início
berg simplesmente afirma que os fatos de
que trata IReis 1—2 são mais relevantes de outro complexo literário independente,
denominado Narrativa da Sucessão (cf. a
em relação a Salomão do que em relação
seção seguinte desta introdução).
a Davi. Além disso, as condições aqui são
Fode-se levantar uma objeção válida: a
por demais surpreendentes para serem resul
remoção do capítulo 9 e seguintes ainda
tado de um simples descuido, ou obra do
deixa o “plano” do autor sem a previsível
acaso. Se a divisão do livro no final de
Samuel foi deliberada, podemos adiantar descrição do ocaso do herói. Os dois
uma modesta hipótese de trabalho: nos primeiros capítulos de Reis se prestariam
facilmente ao papel, mas já se lhes adju-
livros de Samuel a história de cada herói
começa com o declínio do antecessor e
A rejeição de Saul por causa de seu sacrifício em Gilgal é apresen-
Aqui o emprego d a seqüência bíblica não implica necessariamente tada antes (ISm 13.8-15). Contudo, a passagem é difícil de interpretar
dizer que os livros surgiram nessa ordem. D e m odo semelhante, não à luz de outras práticas sacrificais d a época. É possível q u e o juízo
se tira aqui nenhum a conclusão q uanto à ordem em que tais livros teológico que recai sobre Saul seja um comentário acrescentado poste
foram postos em form a escrita. riormente (cf. com entário sobre o texto).
15
dicou uma parte da Narrativa da Sucessão. 1—2 fazem parte de uma unidade literária
Os estudiosos, entretanto, há muito já reco que trata da luta pelo trono de Davi. A esses
nheceram que IReis 2 passou por nume capítulos, denominados Narrativa da
rosas modificações. Por isso mesmo, sua Sucessão, faltam as repetições que caracte
complexidade pode ter resultado, em parte, rizaram ISamuel.7 Ao invés disso, exibem
da inclusão de elementos de um relato um estilo coordenado, coerentes descrições
autêntico (agora perdido) acerca da velhice de personagens e um tema básico. É possível
de Davi. Dai o fato de estar a estrutura dos que o autor tenha se servido de material
livros de Samuel, até 2Samuel 8, organizada já existente ao tratar da guerra amonita
em torno da “ascensão e reinado” dessas (2Sm 10.1—11.1; 12.26-31), da parábola de
três personagens principais. Natã (2Sm 12.1-15), e, num capítulo final,
Mesmo essa coletânea básica, no entan da morte de Davi e dos primeiros atos de
to, fez uso de tradições diversas, mais Salomão (lRs 2). Esse material, entretanto,
antigas, que já poderiam ter sido organi foi integrado à história e fornece sua própria
zadas como fontes. A reverência de nosso contribuição para o desenvolvimento da
autor em face do conteúdo dessas fontes narrativa.
e a freqüente recorrência de narrativas repe Por outro lado, os registros sobre a
tidas sugerem que pelo menos duas linhas disputa pelo trono de Israel são interrom
de tradição acerca desse período já estavam pidos por uma coletânea de textos sobre
em circulação. diversos assuntos (2Sm 21—24). Nada
Pbderíamos isolar também um certo nesses relatos parece exigir esse contexto
número de unidades literárias menores, mas específico. Certamente, nada contêm eles
estas, no essencial, já estão bem integradas que requeresse a interrupção de uma narra
na corrente da história. A estrutura do tiva contínua. Todavia, qualquer explicação
cântico de Ana (ISm 2.1-10), por exemplo, significativa da composição de Samuel
tem provavelmente origem no período precisa, justifica a inclusão desses relatos
monárquico (veja comentário sobre o texto), nesse ponto.
mas o hino, muito habilmente, expressa o Aqui, uma vez mais, a resposta mais
júbilo de sua justificação diante de Penina. simples ao problema parece ser a mais
Os relatos mais antigos sobre a arca (ISm razoável. A miscelânea de materiais foi
4—6) também mantêm um vínculo muito acrescentada ao final do livro de Samuel,
tênue com seu contexto, mas proporcionam depois que a divisão entre Samuel e Reis
uma espécie de pano de fundo para a estra e o acréscimo da Narrativa da Sucessão já
tégia religiosa de Davi (2Sm 6) e a promessa haviam ocorrido.
de Natã de uma dinastia duradoura (2Sm 7). Em suma, os responsáveis pela divisão
Qualquer data que se vincule à con reconheciam o plano da coletânea básica
cisão do “documento” de Samuel teria um de Samuel e incluíram o relato sobre a
caráter extremamente especulativo. Na velhice de Davi com o início da saga de
melhor das hipóteses, estaria situada no Salomão em Reis. Algum tempo depois da
período monárquico, e bem afastada dos separação entre Samuel e Reis, foi acrescen
incidentes em questão. A coletânea inteira tada a Narrativa da Sucessão, sendo esta
parece que já estava bem definida quando também dividida de acordo com o plano
foi acrescentada a Narrativa da Sucessão, anteriormente seguido.
uma vez que a estrutura básica de cada Posteriormente, a miscelânea de textos
complexo literário permaneceu intacta. de 2Samuel 21—24 foi incluída no final do
2. A Narrativa da Sucessão
A existência independente d a Narrativa d a Sucessão foi sugerida
A maioria dos estudiosos do Antigo Tes pela primeira vez por L. Rost em 1926 (Die Überlieferung von der
Thronnachfoige Davids). U m a súm ula de sua visão em to m o do
tamento concorda que 2Sm 9—20 e IReis problema pode ser encontrada em Bentzen, v. 2, p. 105.
16
livro, violando ainda mais a integridade lite deuteronômica se limitam a poucas notas
rária da Narrativa da Sucessão. Pode-se cronológicas (ISm 4.18; 13.1; 2Sm 1.10,11;
imaginar que o editor talvez tenha acres 5.4,5).
centado a Narrativa da Sucessão e os textos No entanto, não se pode arrancar de seu
suplementares à coletânea básica de Samuel contexto os livros de, Samuel, e é preciso
ao mesmo tempo em que foram separados reconhecer o caráter deuteronômico desse
os livros. Essa seqüência, entretanto, parece contexto. Uma solução do problema deve
improvável. estar na natureza do material em que se
baseiam os livros. Aparentemente, os dois
3. Editoração Deuteronômica complexos literários básicos (ISm 1—2Sm
Samuel permanece como um importante 8; 2Sm 9—20 e lRs 1—2) usados pelo editor
segmento da história de Israel no período já haviam sido aceitos numa forma relati
que se estende da entrada na Terra Prome vamente fixa muito antes que chegassem
tida até a queda do reino de Judá às suas mãos. Assim, os editores deutero-
(Deuteronômio-Reis). Nos demais livros nômicos, que livremente davam forma às
históricos, principalmente Juizes8 e Reis, tradições mais maleáveis subjacentes aos
a história é contada de acordo com um demais livros históricos, faziam as mínimas
padrão de fácil reconhecimento (cf. lRs alterações possíveis quando organizavam
15.1-8). O ponto de vista teológico do editor as estruturas literárias mais estáveis em
é bastante claro. A doutrina da retribuição Samuel.
divina é rigorosamente aplicada, e o sucesso
ou retrocesso de Israel aparece inevitavel
mente ligado à retidão ou ao pecado do 4. Conclusões
povo. Considerando que essa filosofia A luz da discussão precedente, diversas
permeia inteiramente a estruturação dos observações nos parecem corretas:
livros Deuteronômio-Reis, é amplamente 1) Os editores que separaram Samuel de
aceito que um único editor (ou grupo de Reis assim procederam numa fase inicial
editores), adepto dessa idéia, foi o do desenvolvimento dos atuais livros de
responsável pela compilação dessa versão Samuel. Supõe-se que foram representantes
completa da história de Israel. da “escola deuteronômica”, os quais deram
Nos livros de Samuel, entretanto, as forma à ampla história de Israel que vai
marcas da editoração deuteronômica são de Deuteronômio até Reis. O impacto desses
manifestamente esparsas, o que contrasta editores é muito menos perceptível em
com Josué, Juizes e Reis, onde o vigamento Samuel do que em Josué, Juizes e Reis.
deuteronômico é bastante pronunciado. 2) O livro de Samuel era originalmente
Mesmo os que reconhecem o dedo do editor constituído pelas principais partes de
em Samuel não estão de acordo sobre onde ISamuel 1 a 2Samuel 8, mais uma seção,
identificá-lo. A visão deuteronômica da agora perdida, que descrevia os anos de
história patenteia-se com mais clareza no declínio de Davi. Essa “coletânea básica”
discurso de despedida de Samuel (ISm 12), de Samuel demonstra a existência de um
que lembra a fala final de Moisés (cf. espe plano literário em que se apresenta a
cialmente Dt 2). Em outros aspectos, os ascensão e reinado dos primeiros líderes de
possíveis indícios e provas de uma influência Israel. O clímax de cada relato vem acom
panhado de um sumário das façanhas do
Sob os juizes, a história de Israel é descrita com o um a série de ciclos herói, inserido no momento em que ele
de pecado, juízo, arrependim ento e libertação (Jz 2.16*23). Q uando,
em tempos de paz, a nação resvalava para o pecado, D eus punia
atinge o ápice de sua carreira. Quando um
o povo, entregando-o nas m ãos de um opressor estrangeira Então, grande homem começa a declinar, con
sob o juízo de Deus, Israel se arrependia, e u m juiz era enviado
para libertar o povo de Deus. Ai vinha um período de vinte a quarenta
sidera-se que a história de seu sucessor já
anos de paz, antes que o ciclo inteiro se repetisse. começou.
17
3) Os editores que separaram os livros durante o governo de Tiglate-Pileser I
de Samuel dos livros dos Reis reconheciam (1116-1078 a.C.), mas seus sucessores foram
a estrutura literária subjacente à coletânea impotentes para consolidar suas conquistas.
básica de Samuel e fizeram a divisão de Após dominar o Vale da Mesopotâmia e
acordo com ela, i.e., a história de Salomão ocupar o norte da Síria, subjugando-a, a
começa com o declinio de Davi (IReis 1—2). Assíria entrou em decadência, permane
4) A Narrativa da Sucessão (2Sm 9—20 cendo nessa situação até o século 9 a.C.
e lRs 1—2) provavelmente foi acrescentada Embora livre da dominação estrangeira,
depois que os livros foram divididos, e a a Palestina ainda figurava como palco de
integridade estrutural da narrativa foi sacri uma acirrada luta pelo poder. Durante os
ficada para que se preservasse o plano séculos 12 e 11 a.C., o avanço tecnológico
literário da coletânea básica de Samuel. favoreceu o surgimento de diversos estados
5) Mais tarde, uma miscelânea de textos pequenos e fortes naquela região. Quando
foi introduzida no final de Samuel (cap. o velho monopólio hitita da fabricação de
21—24), dividindo, pois, ainda mais a ferro foi rompido, até as nações pequenas
outrora contínua Narrativa da Sucessão. puderam dar-se ao luxo de possuir um bom
armamento. A construção de reservatórios
caiados para estocagem de água propiciou
VI. Situação Histórica o aproveitamento de terras até então exces
Em meados do século 11 a.C., a situação sivamente áridas para sustentarem uma
política na região montanhosa da Palestina população sedentária. À mesma época, a
tinha chegado a tal ponto que a existência domesticação de camelos atraiu pessoas
de Israel estava seriamente ameaçada. Por para o deserto, uma vez que rotas comer
estranho que pareça, os problemas de Israel ciais em regiões áridas tornaram-se viáveis
não eram resultado de pressões feitas pelas e altamente lucrativas.
grandes potências da época, mas de pres Mesmo depois da conquista e coloni
sões exercidas pelas pequenas, porém fortes, zação da Canaã, Israel experimentou quase
nações locais. nenhum descanso no intervalo entre as
Os egípcios, que reivindicavam pelo freqüentes guerras com vizinhos hostis. A
menos um controle nominal da Palestina leste, Edom, Moabe e até mesmo Amom,
desde os tempos de Tutmés III (1490-1435 já no século 13 a.C., constituíam estados
a.C.), atravessavam momentos difíceis. florescentes. Invasores oriundos dessa
Gastos excessivos com programas de cons região vinham periodicamente afligir Israel
trução, dissensões internas, liderança na época dos juizes (Jz 3.12-30; 6.1 — 8.28;
incapaz, ataques vindos de fora (e.g., os 11.1-40), e Saul teve a primeira manifestação
Povos do Mar, por volta 1170 a.C.), tudo de apoio público à sua monarquia incipiente
isso limitava cada vez mais o poder do Egito quando defendeu Jabes-Gileade de um
fora de suas fronteiras. Quando a dinastia ataque amonita (ISm 1.1 e ss.). Mais ao
tanita assumiu o poder em 1065 a.C., a lei norte, Israel defrontou-se com Damasco e
e a ordem no país caíram por terra, è a espe os estados arameus, que em breve poriam
rança do Egito de restabelecer o controle à prova o espírito combativo de Davi (2Sm
de seu império asiático sucumbiu de vez. 8.3-12). Menos espetaculares, porém talvez
As potências da Mesopotâmia enfren mais ameaçadoras, eram as restantes forta
tavam limitações semelhantes, e nenhuma lezas cananitas como Jerusalém, Megido,
nação foi capaz de tirar proveito da fraqueza Taanaque e Aco.
dos egípcios, estendendo suas fronteiras, nas Os mais perigosos rivais de Israel nesse
direções oeste e sul, até o interior da Pales período, entretanto, foram os filisteus. Esse
tina. A Assíria experimentou, de fato, uma grupo, tendo fracassado em suas tentativas
breve recuperação da sua força e influência de invadir o Egito no tempo de Ramsés III
18
(1175-1144 a.C.), fixou-se na costa sudoeste uma cultura sedentária, seu compromisso
de Canaã. Trouxeram os filisteus de seu com o Senhor enfrentou o desafio das
antigo torrão natal, no Mar Egeu, uma pretensões contrárias de diversos deuses da
herança militar que fez deles e de povos fertilidade: e.g., Baal, Dagom e Astarote.
aparentados o flagelo do Mediterrâneo Destarte, no século XI, Israel foi sucessivas
oriental. No tempo dos juizes, empreen vezes humilhado por nações que profes
deram periódicas incursões contra Israel, savam lealdade a esses mesmos deuses.
experimentando diferentes graus de sucesso Assim, duas importantes questões teoló
(Jz 3.11; 13.1—15.20). gicas emergiram do conturbado cenário
Retomando sua política de agressão, os político israelita. Os avanços militares dos
filisteus, em meados do século 11 a.C., logo filisteus faziam crer a alguns que Deus era
caíram sobre os judeus. Em seguida à vitória impotente para proteger seu povo contra
em Afeque, quando aprisionaram a arca a força dos deuses vizinhos. A outros
do Senhor (ISm 4 e ss.), destruíram Siló, parecia que o antigo sistema tribal de
Bete-Zur, Tell Beit Mirsim, Gibeá e Bete- governo, da época dos juizes, havia durado
-Sã. Embora seu avanço tenha sido tem mais do que a sua própria utilidade, sendo
porariamente retardado, durante o minis agora necessário um rei para unir o povo.
tério de Samuel (ISm 7.7-14), parece que Essas questões são abordadas com vigor
não foram desalojados por completo da ao longo dos livros de Samuel. Do início
região montanhosa. Quando Saul subiu ao ao fim, as histórias de Samuel, Saul e Davi
trono, encontrou os filisteus ainda insta são narradas, revelando um fundo comum:
lados no centro do território israelita (ISm a certeza do senhorio de Iavé sobre a
13.3). história. Sente-se a mão de Deus na escolha
Submetido Israel a tais pressões, seu dos líderes de Israel (ISm 3.1-20; 9.15,16;
futuro tornou-se sombrio, e a costura que 16.1), na proteção que dele obtiveram (e.g.,
mantinha unidas as diversas partes que 25.26), e na rejeição deles quando se rebe
formavam a nação foi esticada até o ponto laram contra Deus (15.35—16.7). A idéia
de se romper. Os juizes raramente foram de que o Senhor fosse menos poderoso que
capazes de unir toda a nação; e, a menos os deuses dos filisteus é particularmente
que uma das tribos fosse diretamente amea rejeitada nos relatos acerca da arca (ISm
çada por um agressor, era improvável que 4—6). Embora tenha permitido que os filis
reunisse tropas em favor da defesa comum teus se apossassem da arca, Deus fez com
(Jz 4—5). Israel parecia fadado à destruição. que ela voltasse, humilhando Dagom e
enviando uma praga contra os filisteus. Os
reveses de Israel, portanto, eram vistos como
VII. Lições Religiosas resultado da violação da vontade de Deus
pelo povo, ao invés de um indício qualquer
1. Fé em Crise de fraqueza da parte dele.
Os problemas políticos de Israel foram Os livros de Samuel também repudiam
agravados por uma crise religiosa de a idéia de que fraquezas inerentes ao sistema
proporções assustadoras. No tempo dos político de Israel estivessem causando a
juizes, uma fé comum em Iavé tinha sido falência da nação. O fracasso das intenções
o principal fator de unificação das tribos agressivas dos filisteus, durante o ministério
de Israel, em que pese a desigualdade entre de Samuel, foi entendido como um indício
elas. O povo acalentava lembranças do de que o velho sistema tribal funcionaria
êxodo e da conquista, em que via as marcas quando o povo abandonasse seus maus
da mão protetora de Deus na vitória reite costumes (ISm 7.3-14). Deus podia operar
rada e decisiva. Todavia, como se voltassem através de um sistema monárquico de
os israelitas para atividades agrícolas de governo, e o faria com certeza, mas o
19
clamor popular por um rei mostrava a falta Os babilônios, por exemplo, sentiam-se à
de compreensão do povo em face de seu mercê de deuses caprichosos, que não hesi
verdadeiro problema. Israel carecia de tariam em destruir a humanidade se não
unidade, não porque o sistema tribal em tivessem necessidade de servos humanos.9
si mesmo fosse deficiente, mas em virtude Ignorando o que seja causa secundária ou
das falhas do próprio povo. Cada tribo se intermediária, os antigos viam por trás de
tornou excessivamente preocupada com cada força da natureza a presença de um
seus próprios interesses, fazendo vista grossa deus inescrutável.
para as necessidades da nação. Israel só seria Os israelitas também atribuíam à inicia
unido e forte quando o povo se submetesse tiva divina toda sorte de ações, mesmo as
à liderança do Senhor e trabalhasse pelo más (cf. Is 45.7). Daí haver procedido do
bem comum. Senhor o mau espírito de Saul (ISm 16.14),
e o fatídico recenseamento de Davi ter sido
2. Retribuição Divina entendido como resultado da instigação de
“O Deus de Israel é o Senhor da história Iavé (2Sm 24.1). De certo modo, entretanto,
e o pai da justiça, que recompensa os bons viam nesses atos o resultado da ira ou juízo
e castiga os maus!” Essa grande afirmação do Senhor contra os pecados de seu povo.
de fé, conhecida como retribuição divina, Alguns antigos israelitas, porém, aspi
é indispensável para a compreensão dos ravam a uma melhor compreensão das
livros de Samuel. Essa confiança na supre situações a que a doutrina da retribuição
macia do Senhor e em seu governo moral divina parecia não se aplicar. Notavam que,
do universo permeia completamente a embora os maus tendessem a sofrer, muita
mensagem de Samuel. gente corrupta parecia continuar desfru
A história de Davi se sobressai a quantos tando as “primícias da terra”. Outros, de
exemplos se possam citar. Embora de modo semelhantè, reconheciam que a
maneira alguma perfeito, Davi é retratado, bondade não constitui garantia alguma de
particularmente na mocidade, como um paz e prosperidade. Projetando-se contra
homem sensível às manifestações de lide o fundo doutrinário dos livros de Samuel,
rança divina. Enquanto se mostrou Oséias, Jó e o Servo Sofredor de que nos
convenientemente humilde na presença de fala Isaías (cf. sobretudo Is 52.13—53.12),
Deus, o Senhor o protegeu da insana perse tais situações oferecem percepções adicio
guição de Saul, conduziu-o com segurança nais quanto à natureza do justo padecer.
ao longo do exílio filisteu e, por fim, Pbrém, à luz da clara promessa neotes-
colocou-o no trono de Israel. Sob a direção tamentária de juízo eterno, a justiça de
de Davi, a nação se converteu numa Deus na supervisão da história humana
potência influente nos assuntos mundiais. pode ser vista numa perspectiva diferente
Apesar disso, quando, motivado por seu e mais completa. Assim, embora Jesus
envolvimento com Bate-Seba, Davi pla lembrasse que as bênçãos de Deus (Mt 5.45)
nejou a morte de Urias e fê-la executar, e as vicissitudes do homem (Lc 13.4,5) caem
rebeliões devastadoras irromperam no seu sobre todos igualmente, também ensinou
governo, flagelando os anos finais de seu que justos e injustos seriam separados entre
reinado. Desta maneira, a sorte de Israel, si para efeito de recompensa e punição no
fosse boa ou ruim, era sentida como uma juízo (Mt 13.47-50).
recompensa moral pelos atos de seu povo Embora, como é óbvio, a doutrina da
e de seus líderes. retribuição divina tenha sofrido modifi
Essa forma de apreensão da natureza cações com o passar do tempo, sua impor-
do prazer e do sofrimento representava um
C f. a Epopeia de Gilgamesh, placa XI, linhas 175-185. In: D. W inton
importante avanço em relação às con Thom as, ed., D ocum ents from O ld Testament Times (New York:
cepções sustentadas pelos vizinhos de Israel. Harper and Brothers, 1958), p. 23.
20
tante contribuição para o desenvolvimento guisse objetivos comuns, mas porque o
da fé de Israel não diminuiu de maneira Senhor estava operando no meio dele, a fim
alguma. Adequadamente compreendida, de cumprir seus propósitos na história. De
essa premissa fundamental dos livros de fato, do ponto de vista político, o reino de
Samuel vale ainda como lembrete de que Israel nunca esteve realmente unido.
vivemos num universo moral governado por Mesmo sob os governos de Saul e Davi,
um Deus tão misericordioso quanto justo. intensas rivalidades regionais, a par de
ressentimentos tribais, deixaram o país
seriamente dividido (cf. comentário sobre
VIII. Unidade na Diversidade ISm 4.12-18 e ISm 24.1-17). Contudo, o ideal
Em qualquer enfoque abrangente vol de um estado israelita unido marca tão
tado para o estudo de Samuel, somos extensamente o Antigo Testamento que, de
confrontados com uma ampla variedade tempos em tempos, “filhos de Abraão” têm
de posições teológicas e pontos de vista retornado de seu exílio no mundo, em
históricos que desafiam a fácil conciliação. esforços renovados por concretizar as possi
Davi, por exemplo, parece querer dizer que bilidades que o Senhor havia idealizado para
a perseguição movida por Saul contra ele o seu povo.
empurrava-o para dentro de um território Assim, a mensagem de Samuel está arrai
estrangeiro onde não seria alcançado pela gada numa linguagem que fala de luta e
providência do Senhor (ISm 26.19). dissensão — entre os juizes como sistema
Contudo, as histórias da arca (ISm 4—6) de governo e a monarquia, entre Samuel
descrevem claramente o Deus de Israel e Saul, entre Saul e Davi, ou entre este e
demonstrando autoridade sobre seu próprio os rebeldes. Via-se no Senhor a força de
povo (cf. comentário sobre ISm 6.19-21) e motivação a impulsionar cada aconteci
sobre os estrangeiros também (5.1—6.18). mento na história de Israel, mas ao mesmo
Fato semelhante se deu com a instalação tempo viam-no operar de maneira a
da monarquia em Israel, quando diferentes permitir que os homens fossem livres (cf.
opiniões se mobilizaram a respeito. De comentário sobre ISm 8.19-22 e 2Sm 15.26).
modo geral, ISamuel 8—12 retrata a reivin A rota traçada pela história implica,
dicação do povo por um rei como uma portanto, tortuosos envolvimentos, e é
forma de repúdio da direção divina (ISm supremamente frustradora (cf. comentário
8.7). Não obstante, escolheu o Senhor a Saul sobre 2Sm 3.16-21). Como homens livres
para reinar sobre Israel, a fim de que livrasse — bons e maus — lutassem uns com os
a nação das mãos dos filisteus. O que é mais outros, Deus se empenhava em estabelecer
significativo ainda, os livros de Samuel, na a monarquia israelita, a fim de prover seu
maior parte, concentram-se na escolha de povo com uma medida de segurança e fixar
um soberano que haveria de ser um homem as leis básicas da sucessão (2Sm 7).
segundo o coração de Deus (ISm 13.14). O autor de Samuel compreendia clara
Assim, através de muitos fatos e pessoas, mente, portanto, que a verdadeira unidade
o Senhor operou na história para fazer Davi do povo de Deus repousava em sua fé
rei, e então prometeu que ele teria uma comum num Deus vivo e soberano. Dentro
linhagem duradoura a ocupar o trono de de uma comunidade que, em última
Israel (2Sm 7). instância, é dirigida por Deus, existe amplo
Põr mais irreconciliáveis que pareçam espaço para desacordo no tocante a obje
tais posições, é precisamente nessa diver tivos, métodos, e até mesmo doutrina.
sidade que a profunda unidade de Israel Fazendo nosso o ponto de vista da teologia
e a maturidade de sua fé são reveladas. O encarnada nos livros de Samuel, pode
povo de Deus existiu e floresceu, não porque ríamos até dizer que Deus opera através
tivesse um só pensamento ou porque perse de tais conflitos para manter seu povo
21
dentro do curso de sua vontade. Seja como 2) Resumo do ministério de Samuel
for, seu poder e graça são suficientes para (7.12-17)
conduzir seus planos a um final bem-
sucedido. Ao homem, portanto, confia-se II. Ascensão e reinado de Saul (8.1—14.52)
a liberdade de consciência e ação para reagir 1. A influência de Samuel diminui
à sua própria compreensão da liderança gradualmente (8.1-22)
divina. Assim aos verdadeiramente humil 1) Os filhos de Samuel pervertem
des em vida promete-se a direção do Senhor, a justiça (8.1-3)
e os orgulhosos acabarão sendo vítimas de 2) Israel pede um rei (8.4-9)
sua própria altivez (ISm 12.14,15; 2Sm 3) Descrição do comportamento de
22.28). um rei (8.10-18)
4) Israel continua resoluto (8.19-22)
2. Deus escolhe o rei de Israel
Esboço (9.1—10.27)
I. Ascensão e “reinado” de Samuel 1) Saul habilita-se ao cargo (9.1,2)
(1.1—7.17) 2) Saul procura as jumentas extra
1. Nascimento e dedicação de Samuel viadas (9.3-14)
(1. 1— 2 . 11) 3) Saul encontra Samuel (9.15-27)
1) A família de Samuel visita Siló 4) Samuel unge Saul (10.1-16)
( 1. 1- 8 ) 5) Saul publicamente aclamado rei
2) Ana faz um voto (1.9-18) (10.17-27)
3) Ana dedica Samuel (1.19-28) 3. Saul apoiado pelo povo (11.1-15)
4) O Cântico de Ana (2.1-10) 1) Amonitas atacam Jabes-Gileade
2. A casa de Eli é rejeitada (2.11-36) (11.1-4)
1) Os filhos de Eli pecam no exer 2) Saul derrota os amonitas (11.5-11)
cício do cargo (2.11-17) 3) O povo proclama Saul rei
2) A família de Samuel prospera (11.12-15)
(2.18-21) 4. Samuel dá conselhos à monarquia
3) A repreensão de Eli fracassa (12.1-25)
(2.22-26) 1) Samuel defende seu passado de
4) Sentença sobre a casa de Eli serviços e conduta (12.1-5)
(2.27-36) 2) Crônica da rebelião de Israel
3. Samuel inicia seu ministério (12.6-18)
(3.1—4.1a) 3) Samuel promete orações
1) Samuel serve no templo (3.1-9) (12.19-25)
2) O Senhor julga a casa de Eli 5. Israel conquista independência
(3.10-14) (13.1—14.52)
3) Samuel divulga a mensagem de 1) Começa a guerra da libertação
Deus (3.15-18) (13.1-15a)
4) Samuel torna-se profeta 2) Descrição das condições da
(3.19—4.1a) guerra (13.15b-23)
4. A história da arca (4.1b—7.2) 3) Israel alcança vitória (14.1-23)
1) A arca é capturada (4.1b-22) 4) Vitória interrompida (14:24-46)
2) A arca causa transtorno aos filis 5) Sinopse do reinado de Saul
teus (5.1-12) (14.47-52)
3) A arca volta a Israel (6.1—7.2)
5. Samuel liberta o povo (7.3-17) III. Ascensão e reinado de Davi (ISm
1) Vitória alcançada em Mizpá 15.1—2Sm 8.18)
(7.3-11) 1. Saul rejeitado como rei (15.1-35)
22
1) Saul transgride a ordem de Deus 6) Israel derrotado em Gilboa (ISm
(15.1-9) 31.1—2Sm 1.27)
2) Saul rejeitado como rei (15.10-23) a. Saul comete suicídio (31.1-13)
3) Samuel abandona Saul (15.24-35) b. Um jovem reivindica a morte
2. Davi ungido futuro rei (16.1-13) de Saul (2Sm 1.1-16)
3. Davi reúne-se à corte de Saul « c. Davi pranteia a perda de Israel
■ (16.14—18.5) (1.17-27)
1) Davi torna-se escudeiro de Saul 7. Davi torna-se rei (2Sm 2.1—8.18)
(16.14-23) 1) Davi reina sobre Judá (2.1—4.12)
2) Davi combate o gigante 2) Davi soberano sobre todo o Israel
(17.1—18.5) (5.1—8.18)
4. Saul procura tirar a vida de Davi a. Os anciãos “elegem” Davi rei
(18.6—20.42) (5.1-5)
1) Tentativa de homicídio por parte b. Davi instala sua corte (5.6-16)
de Saul (18.6-16) c. Davi detém os filisteus
2) Saul usa os filisteus (18.17-30) (5.17-25)
3) Saul procura assassinos (19.1-7) d. A arca retorna a Jerusalém
4) Saul volta a praticar violência (6.1-23)
(19.8-17) e. Natã profetiza a dinastia
5) Samuel oferece refúgio (19.18-24) (7.1-17)
6) Davi e Jônatas se separam f. Davi rende graças (7.18-29)
(20.1-42) g. Panorama do reinado de Davi
5. Davi torna-se um fugitivo (8.1-18)
(21.1—26.25) IV. Narrativa da Sucessão (9.1—20.26)
1) Sacerdotes ajudam Davi em 1. Davi poupa o filho de um amigo
Nobe (21.1-9) (9.1-13)
2) Davi finge loucura (21.10-15) 2. Davi enfrenta sírios e amonitas
3) Davi reúne um exército (22.1-5) (10.1-19)
4) Saul perde apoio sacerdotal 3. Tragédia no rastro do pecado
(22.6-23) (11.1—12.31)
5) Davi liberta Queila (23.1-14) 1) Davi sucumbe à concupiscência
6) Amigos ampliam aliança (11.1-13)
(23.15-18) 2) Davi manda matar Urias
7) Zifeus traem Davi (23.19-29) (11.14-27)
8) Saul entregue a Davi (24.1-22) 3) Natã acusa Davi (12.1-15a)
9) Davi se casa com Abigail 4) Davi perde um filho (12.15b-25)
(25.1-44) 5) Davi derrota os amonitas
10) Novo ato de traição dos zifeus (12.26-31)
(26.1-25) 4. Amnon viola Tamar (13.1-22)
6. Davi se une aos filisteus (ISm 5. Absalão vinga sua irmã (13.23-39)
27.1—2Sm 1.27) 6. Absalão retorna à corte (14.1-33)
1) Davi torna-se vassalo (27.1-12) 1) Joabe testa Davi (14.1-20)
2) Saul consulta uma médium 2) Absalão retorna a Jerusalém
(28.1-14) (14.21-33)
3) Condenação da casa de Saul 7. Absalão usurpa o trono (15.1—18.33)
(28.15-25) 1) Absalão torna-se rei (15.1-12)
4) Davi excluído da guerra (29.1-11) 2) Davi foge de Jerusalém (15.13-37)
5) Amalequitas atacam Ziclague 3) A família de Saul opõe-se a Davi
(30.1-30) (16.1-14)
■ 23
4) Absalão entra em Jerusalém ble. London: Thomas Nelson and
(16.15-23) Sons, Ltd., 1962.
5) Husai ganha tempo (17.1-14) BRIGHT, JOHN. A History of Israel.
6) Davi foge para Maanaim Philadelphia: The Westminster Press,
(17.15-29) 1959.
7) Absalão morto em batalha BUTTRICK, GEORGE ARTHUR et alii,
(18.1-18) eds. The Interpreter’s Dictionary of
8) Relato da morte de Absalão the Bible. 4 v. New York: Abingdon
(18.19-33) Press, 1962.
8. Davi volta a ocupar o trono (19.1-40) CAIRD, GEORGE B. “The First and
1) Israel chama Davi de volta Second Books of Samuel: Introduction
(19.1-15) and Exegesis”. In.: The Interpreter’s
2) Davi volta a Jerusalém (19.16-40) Bible, v. 2, p. 855-1176. New \brk:
9. Sebá lidera a revolta israelita Abingdon Press, 1953.
(19.41—20.26) DRIVER, S. R. Notes on the Hebrew Text
1) A desconfiança provoca a guerra and the Topography of the Books of
(19.41—20.2) Samuel. Oxford: Oxford University
2) Os homens de Davi perseguem Press, 1913.
Sebá (20.3-22) HERTZBERG, HANS WILHELM. 1 e
3) Relação dos líderes de Davi 2Samuel. Traduzido para o inglês por
(20.23-26) J. S. Bowden (In: “The Old Testament
Library”). Philadelphia: The West
V. Anexos (21.1—24.25)
1. Gibeonitas executam os filhos de minster Press, 1964.
Saul (21.1-14) MCKANE, WILLIAM. I and II Samuel.
2. Os filisteus voltam a guerrear (In: “Torch- Bible Commentaries”).
London: SCM Press, Ltd., 1963.
(21.15-22)
3. Cântico de ação de graças de Davi RUST, ERIC C. Judges, Ruth and Samuel.
(In: “The Laymen’s Bible Commen
(22.1-51) tary”). Richmond: John Knox Press,
4. As últimas palavras de Davi (23.1-7)
5. Relação dos “valentes” de Davi 1961.
SMITH, HENRY PRESERVED. A
(23.8-39)
6. Davi ordena o censo (24.1-17) Criticai and Exegetical Commentary
7. Davi constrói um altar (24.18-25) on the Books of Samuel. (In: “The
International Critical Commentary”.)
Edinburgh: T. and T. Clark, 1899.
DE VAUX, ROLAND. Ancient Israel.
Bibliografia Selecionada Traduzido para o inglês por John
BALY, DENIS. The Geography of the Bible. McHugh. New York: McGraw-Hill
New York: Harper and Row, 1957. Book Co., 1961.
BENTZEN, AAGE. Introdução ao Antigo WRIGHT, GEORGE ERNEST e FLOYD
Testamento. 2. v. São Paiilo: ASTE, VIVIAM FILSON, eds. The West
1968. minster Historical Atlas to the Bible.
BLACK, MATTHEW e H. H. ROWLEY, Ed. revista. Philadelphia: The West
eds. Peake’s Commentary on the Bi- minster Press, 1956.
24
Comentário Sobre o Texto
I. Ascensão e “Reinado” de Samuel a Siló sugerem que ele era um um homem
(1.1—7.17) piedoso e com algumas posses. Como
marido de duas mulheres, procurava tratar
1. Nascimento e Dedicação de Samuel cada uma com justiça, mas acabou, inevi
(1.1— 2 .11) tavelmente, apanhado entre os ciúmes das
duas. Aria (equivalente ao nome moderno
1) A Família de Samuel Visita Siló (1.1-8) “Graça”) sentia-se uma pessoa falha pelo
'Houve um homem de Ramataim-Zofim, da fato de não poder ter filhos, e Penina
região montanhosa de Efraim, cujo nome era (“Pérola”) ressentia-se da consideração espe
Elcana, filho de Jeroão, filho de Eliú, filho de Toú, cial de Elcana por sua rival. Contudo,
filho de Zufe, efraimita. 2Tinha ele duas mulheres: soube ele reagir, em meio às tensões que
uma se chamava Ana, e a outra Penina. Penina
tinha filhos, porém Ana não os tinha. 3De ano em tornam a vida difícil, com graça e afeição.
ano este homem subia da sua cidade para adorar Ramataim-Zofim (conhecido alhures, em
e sacrificar ao Senhor dos exércitos em Siló. Assis Samuel, simplesmente como Ramá, “a
tiam ali os sacerdotes do Senhor, Hofni e Finéias,
os dois filhos de Eli. 4No dia em que Elcana sacri Elevação” — 1.19). Para distinguir essa
ficava, costumava dar quinhões a Penina, sua mulher, cidade de várias outras com o mesmo nome,
e a todos os seus filhos e filhas; sporém a Ana, foi preciso uma identificação mais com
embora a amasse, dava um só quinhão, porquanto pleta. O período é gramaticalmente difícil,
o Senhor lhe havia cerrado a madre. 6Ora, a sua
rival muito a provocava para irritá-la, porque o
e provavelmente dever-se-ia ler assim:
Senhor lhe havia cerrado a madre. 7E assim “Havia um certo homem de Ramataim ias
sucedia de ano em ano que, ao subirem à casa do Elevações Gêmeas), zufita da região monta
Senhor, Penina provocava a Ana; pelo que esta nhosa de Efraim.” Ramá, lar dos ancestrais
chorava e não comia. ‘Então Elcana, seu marido, de Samuel, tornou-se mais tarde o centro
lhe perguntou: Ana, por que choras? e por que não
comes? e por que está triste o teu coração? Não de sua administração judicial itinerante
te sou eu melhor do que dez filhos? (7.15-17).
A história da passagem de Israel de um Adorar e sacrificar. A peregrinação
sistema frouxo de confederação tribal para anual aqui descrita e a de que fala Juizes
um estado dinástico centralizado começa 21.19 parecem refletir condições anteriores
propriamente com um relato da ascensão à instituição das três grandes festas que se
e governo de Samuel. Ele desempenhou tomaram obrigatórias para o culto israelita.
papéis de vital importância como o último Essas festas, associadas ao plantio da prima
grande juiz de Israel, um de seus primeiros vera, à colheita de cereais no inverno, e à
profetas, e como orientador na escolha de colheita da safra de verão, ficaram mais
seus dois primeiros reis. Através de sua tarde conhecidas como festas dos Pães
influência, a fé e os ideais que deram Asmos; das Semanas e dos Tabernáculos
origem a Israel foram transmitidos com (lRs 9.25; Ex 23.14-17; Dt 16.16).
sucesso ao novo sistema de governo. No período pré-monárquico, havia dois
As circunstâncias em meio às quais tipos principais de sacrifícios: o mais gene
Samueí nasceu e se formou são contadas ralizado. de caráter comunal, em que o
de maneira singela, mas com a pungência povo comia uma porção do animal sacri
que costuma assinalar a obra de um mestre ficado, e o holocausto, em que o sacrifício
da narração. Os membros de sua família inteiro era consumido no altar. Em Siló, o
e as pressões sob as quais viviam emergem culto era do primeiro tipo. Era essa, com
com impressionante clareza. efeito, uma ocasião de júbilo, em que se
A inclinação e habilidade de Elcana em estabeleciam boas relações entre Deus e
levar sua família numa peregrinação anual seus adoradores.
25
Sua rival reflete uma expressão semítica Fenina, a Ana é que cabia, em larga me
de uso comum que quer dizer “esposa rival”, dida, abrir mão desses direitos.
“co-esposa”. Todo contato social mais intimo Impressionado com o fervor de Ana, por
envolve uma certa medida de tensão no ele confundido com embriaguez, Eli acres
relacionamento, mas a prática da poligamia centou sua própria bênção à prece em que
tornava a vida familiar, no antigo Israel, a mulher estéril pedia um filho. O alívio
extremamente complicada (cf. a disputa de de Ana face às frustrações que a atrapa
Sara com Hagar, Gn 16; o rompimento de lhavam na observância da festa religiosa
relações entre Raquel e Léia, Gn 30.1-8). foi alcançado não em virtude de seu pedido
ser acolhido, mas através da realização
2) Ana Faz um Voto (1.9-18) pessoal por ter orado do fundo do coração.
Agora, cheia de uma paz espiritual que
9Então Ana se levantou, depois que comeram antes lhe faltava, retornou jubilosamente
e beberam em Siló; e Eli, sacerdote, estava sentado
numa cadeira, junto a um pilar do templo do à festa. No tempo oportuno, veio-lhe o
Senhor. 10Ela, pois, com amargura de alma, orou primeiro filho (cf. 2.21).
ao Senhor, e chorou muito, ne fez um voto, Templo do Senhor. A palavra hebraica
dizendo: Ó Senhor dos exércitos! se deveras aten para “templo” é um termo semítico comum,
tares para a aflição da tua serva, e de mim te
lembrares, e da tua serva não te esqueceres, mas mas, antes do período de Davi e Salomão,
lhe deres um filho varão, ao Senhor o darei por só em 1.9 e 3.3 é empregado para designar
todos os dias da sua vida, e pela sua cabeça não um santuário israelita.
passará navalha. 12Continuando ela a orar perante Ignora-se a natureza exata dessa cons
o Senhor, Eli observou a sua boca; 13porquanto
Ana falava no seu coração; só se moviam os seus
trução. A referência ao templo como casa
lábios, e não se ouvia a sua voz; pelo que Eli a teve (1.24) contrasta fortemente com a reação
por embriagada, 14e lhe disse: Até quando estarás enérgica contra a construção de uma habi
tu embriagada? Aparta de ti o teu vinha 15Mas tação para o Senhor (7.6). A melhor
Ana respondeu: Não, senhor meu, eu sou uma explicação dessa diferença, tê-la-íamos,
mulher atribulada de espirito; não bebi vinho nem
bebida forte, porém derramei a minha alma perante talvez, na conclusão de que o texto de 7.6
o Senhor. l6Não tenhas, pois, a tua serva por filha procede de fonte diversa, que não estava
de Belial, porque da multidão dos meus cuidados familiarizada com a natureza do santuário
e do meu desgosto tenho falado até agora. 17Então de Siló. Seja como for, o santuário de Siló
lhe respondeu Eli: Vai-te em paz; e o Deus de Israel foi destruído pelos filisteus mais ou menos
te conceda a petição que lhe fizeste.18Ao que disse
ela: Ache a tua serva graça aos teus olhos. Assim, em 1050 a.C.11
a mulher se foi o seu caminho, e comeu, e já não
era triste o seu semblante. 3) Ana Dedica Samuel (1.19-28)
Desesperançada por não ver qualquer
final previsível para sua esterilidade, Ana, 19Depois, levantando-se de madrugada, ado
raram perante o Senhor e, voltando, foram a sua
por fim, apelou para o Senhor. Em retri casa em Ramá. Elcana conheceu a Ana, sua mulher,
buição a Deus pela dádiva de um filho, e o Senhor se lembrou dela. 20De modo que Ana
prometeu que consagrá-lo-ia ao serviço de concebeu e, no tempo devidoi, teve um filho, ao qual
nazireu (Nm 6.1-8) por toda a vida. Ela chamou Samuel; porque, dizia ela, o tenho pedido
estava propensa a abrir mão das obrigações ao Senhor. 21Subiu, pois, aquele homem, Elcana,
com toda a sua casa, para oferecer ao Senhor o
familiares normais que uma criança tem sacrifício anual e cumprir o seu vota “ Ana,
para com seus pais; estava, com efeito, porém, não subiu, pois disse a seu marido: .quando
renunciando a uma garantia de cuidados ò menino for desmamado, então o levarei, para que
quando chegasse à velhice.10Considerando apareça perante o Senhor, e lá fique para sempre.
que Elcana tinha outros filhos, todos com
11 A queda de Siló não ê registrada em Samuel nem em Reis, mas
a arca foi colocada em Quiriate-Jearim após voltar de ter sido captu
10 Veja John Van Seters, “The Problem of Childlessness in N ear Eastern rada pelos filisteus (2Sm 7.2; cf. J r 7.12,14; 26.6,9; SI 78.60). Veja
Law and the Patriarchs of Israel”, Journal o f Biblical Literature, Joseph Blenkinsopp, “Kiriath-Jearira and the Ark”, Journal o f Bibíical
LXXXVI1 {December, 1968), p. 403. Literature, LX XX VIU {1969}, p. 143-156.
26
23E Elcana, seu marido, lhe disse: Faze o que bem 4) O Cântico de Ana (2.1-10)
te parecer; fica até que o desmames; tão-somente
confirme o Senhor a sua palavra. Assim, ficou a 'Então Ana orou, dizendo:
mulher, e amamentou seu filho, até que o desmamou. O meu coração exulta no Senhor;
24Depois de o ter desmamado, ela o tomou o meu poder está exaltado no Senhor;
consigo, com um touro de três anos, uma efà de a minha boca dilata-se contra os meus inimigos,
farinha e um odre de vinha, e o levou à casa do porquanto me regozijo na tua salvação.
Senhor, em Siló; e era o menino ainda muito 2Ninguém há santo como o Senhor;
criança. “ Então degolaram o touro, e trouxeram não há outro fora de ti;
o menino a Eli; Me disse ela: Ah, meu senhor! tão não há rocha como o nosso Deus.
certamente como vive a tua alma, meu senhor, eu ’Não faleis mais palavras tão altivas,
sou aquela mulher que aqui esteve contigo, orando nem saia da vòssa boca a arrogância;
ao Senhor. 2TPor este menino orava eu, e o Senhor porque o Senhor é o Deus da sabedoria,
atendeu a petição que eu lhe fiz. MPor isso eu e por ele são pesadas as ações.
também o entreguei ao Senhor; por todos os dias 4Os arcos dos fortes estão quebrados,
que viver, ao Senhor está entregue. E adoraram e os fracos são cingidos de força.
ali ao Senhor. 5Os que eram fartos se alugam por pão,
e deixam de ter fome os que eram famintos;
Ana estava profundamente cônscia de até a estéril teve sete filhos,
e a que tinha muitos filhos enfraquece
seu débito para com o Senhor, o qual aten éO Senhor é o que tira a vida e a dá;
dera seu pedido e lhe dera um filho. faz descer ao Seol e faz subir dali.
Entretanto, a confissão dela — o tenho 70 Senhor empobrece e enriquece;
pedido ao Senhor — não se associa facil abate e também exalta.
8Levanta do pó o pobre,
mente com seu atual contexto. Assim como do monturo eleva o necessitado,
está, o que essa frase oferece é uma expli para o fazer sentar entre os príncipes,
cação melhor do nome Saul (sha’ul).12 O para os fazer herdar um trono de glória;
nome Samuel, em hebraico, tem origem na porque do Senhor são as colunas da terra;
expressão que significa “o nome de Deus”. sobre elas pôs ele o mundo.
’Ele guardará os pés dos seus santos,
Nada se disse anteriormente sobre um porém os ímpios ficarão mudos nas trevas,
voto de Elcana. Isso pode ser reflexo de um porque o homem não prevalecerá pela força.
compromisso anterior de participar de uma 10Os que contendem com o Senhor serão
peregrinação anual a Siló (cf. 1.3), ou um quebrantados;
indício de que ele compartilhou, volunta desde os céus trovejará contra eles.
O Senhor julgará as extremidades da terra;
riamente, da consagração do filho de Ana dará forças ao seu rei,
ao serviço divino (Hertzberg, p. 28). e exaltará o poder do seu ungida
Samuel, provavelmente, já passava dos A referência ao rei, no cântico de Ana
três anos quando foi levado para a casa do (v. 10), mostra com clareza que o salmo não
Senhor, em Siló. Era essa a idade em que,
foi originalmente escrito tendo em vista sua
no mundo antigo, habitualmente se dava
presente função. A instituição da monar
a desmama (2Macabeus 7.27).
quia ainda era coisa do futuro, algo que
Elcana voltou para casa, e o garoto chegaria bem mais tarde na vida de Samuel,
passou a ministrar ao Senhor na presença e sua implacável oposição ao estabeleci
de Eli (2.11). Nada se diz acerca de Ana, mento de uma monarquia em Israel
que pode ter permanecido temporariamente
(8.10-18) dificilmente estaria justificada, se
para cuidar de seu filho e executar outras
esse cântico fosse o endosso profético de
funções no templo. Por outro lado, como
Deus para aquela nova modalidade de
sugere a versão grega, não é improvável que
governo. Mais provavelmente, um salmo
ela tenha retornado para Ramá, em compa escrito mais tarde foi colocado nesse
nhia do marido. contexto para resumir a atitude de uma
mulher, atitude esta finalmente justificada.
12 O nom e Saul tem origem no verbo hebraico que se traduz por “pedir”.
Embora a tônica do salmo esteja no
Em 1.20,27,28 e 2.20 há um jogo de palavras apoiado nessa raiz. louvor de Deus por causa de sua soberania
27
sobre toda a criação, há uma acentuada a cozer a carne, vinha o servo do sacerdote, tendo
ênfase na convicção do salmista de que o na mão um garfo de três dentes, 14e o metia na
panela, ou no tacho, ou no caldeirão, ou na marmita;
Senhor se move na história, recompensando e tudo quanto o garfo tirava, o sacerdote tomava
o bem e punindo o mal. Essa crença na retri para si. Assim, faziam a todos os de Israel que
buição divina, bem difundida no Antigo chegavam ali em Siló. l5Tàmbém, antes de quei
Testamento, ainda que não o permeie por marem a gordura, vinha o servo do sacerdote e
completo, encontra sua expressão clássica dizia ao homem que sacrificava: Dá carne de assar
para o sacerdote; porque não receberá de ti carne
no versículo 9. cozida, mas crua. 16Se lhe respondia o homem:
Ana deve ter encontrado um conforto Sem dúvida, logo há de ser queimada a gordura
especial na idéia de que os papéis vividos e depois toma quanto desejar a tua alma; então
por humildes e exaltados hão de inverter-se ele lhe dizia: Não! hás de dá-la agora; se não, à
força a tomarei. 17Era, pois, muito grande o
com freqüência, quando o Senhor tomar pecado destes mancebos perante o Senhor, por
para si a defesa dos justos. É bem provável quanto os homens vieram a desprezar a oferta do
que o salmo tenha sido escolhido para uso Senhor.
aqui em virtude da combinação que nele
O despontar da influência de Samuel é
se nota entre o louvor do Senhor e as pala
vras que se encontram em 2.5b. acompanhado pelo trágico declínio da casa
de Eli. Samuel deve ter, mais tarde, refle
“A estéril teve sete filhos,
tido acerca da angústia causada a Eli por
e a que tinha muitos filhos enfraquece.” Hofni e Finéias quando ficou provado que
De acordo com o registro bíblico, entre
os seus próprios filhos eram corruptos
tanto, Ana teve só seis filhos, incluindo
(8.1-3).
Samuel (2.21).
A primeira série de acusações contra os
Tem-se interpretado o versículo 6 como filhos de Eli diz respeito à questão de divi
uma prova antiga de uma fé na ressurreição
são doStacrifícios. O sangue era derramado,
dos mortos. Embora certamente possível,
e ã gordura, queimada como sacrifício ao
essa interpretação, contudo, não é indispen
Senhor. O sacerdote deveria contentar-se
sável. No hebraico, as idéias contidas nos
com o que conseguisse apanhar, logo na
três primeiros verbos são apresentadas mais
ou menos independentemente — não que primeira vez, num caldeirão de carne sendo
cozida. O resto do sacrifício deveria ser
Deus necessariamente mate e depois consumido pelos adoradores.
restaure a vida, mas que Deus é responsável Aparentemente, o que os filhos de Eli
pela morte tanto quanto o é pelo nasci
desejavam era garantir para si melhores
mento, pela enfermidade (faz descer ao
nacos de carne e uma porção maior do
Seol) tanto quanto pela recuperação da
sacrifício. Seus atos talvez refletissem um
saúde. De qualquer maneira, essas passa descontentamento relativamente generali
gens, mais tarde, devem ter preparado o zado em face da maneira de se estabelecer
terreno para uma crescente tomada de cons- a participação dos sacerdotes no sacrifício.
ciência da vitalidade pessoal no
Seja como for, a parte que cabia ao sacer
além-túmulo.
dote era, em outras épocas, determinada
com clareza, tanto do ponto de vista do
2. A Casa de Eli é Rejeitada (2.11-36) tamanho quanto da qualidade (Dt 18.3;
Lv 7.31-34).
1) Os Filhos de Eli Pecam no Exercício do Hofni e Finéias resolveram, entretanto,
Cargo (2.11-17) apelar para a violência física. Não se
nEntão Elcana se retirou a Ramá, à sua casa. mostravam inclinados a confiar ao Senhor
O menino, porém, ficou servindo ao Senhor perante o sustento de suas necessidades.
o sacerdote Eli. 12Ora, os filhos de Eli eram homens
impios, não conhedam ao Senhon 13Porquanto o Homens ímpios. A RC (Revista e Corri
costume desses sacerdotes para com o povo era gida) traduz aqui “filhos de Belial”, em que
que, oferecendo alguém um sacrifidoi, e estando-se o hebraico b<4iyy’al foi simplesmente trans-
28
literado e então tratado como nome próprio. fama esta que ouça Fazeis transgredir o povo do
É verdade que, na literatura pós-bíblica, Senhor. “ Se um homem pecar contra outra, Deus
o julgará; mas se um homem pecar contra o Senhor,
Belial foi empregado como sinônimo de quem intercederá por ele? Todavia eles não ouviram
Satanás; mas nos livros históricos é melhor a voz de seu pai, porque o Senhor os queria destruir.
interpretar a palavra como um adjetivo com 26E o menino Samuel ia crescendo em estatura e
o sentido de imprestável ou desprezível. em graça diante, do Senhor, como também diante
dos homens.
2) A Família de Samuel Prospera (2.18-21) Novamente levantam-se sérias acusações
18Samuel, porém, ministrava perante o Senhor, contra os filhos de Eli, desta vez por terem
sendo ainda menino, vestido de um éfode de linho, mantido relações imorais com as mulheres
19E sua mãe lhe fazia de ano em ano uma túnica
pequena, e lha trazia quando com seu marido subia que serviam à porta da tenda da congre
para oferecer o sacrifício anual. “ Então Eli aben gação. Embora, possivelmente, tais atos
çoava a Elcana e a sua mulher, e dizia: O Senhor fossem aceitáveis para os cananeus, que
te dê desta mulher descendência, pelo empréstimo estavam acostumados com a presença de
que fez ao Senhor. E voltavam para o seu lugar.
21Visitou, pois, o Senhor a Ana, que concebeu, e “prostitutas sagradas”13 no culto de seus
teve três filhos e duas filhas. Entrementes, o menino templos, a promiscuidade representava uma
Samuel crescia diante do Senhor. grave violação da conduta moral judaica.
Principalmente nos períodos em que a luta
A inserção destes breves versículos, contra o baalismo era mais aguda, as trans
descrevendo as bênçãos de Deus sobre a gressões sexuais se igualavam com a ido
família de Samuel, demonstra a mestria do latria como forma gravíssima de violação
autor na arte de narrar. A passagem pouco da vontade de Deus. O próprio Eli adverte
acrescenta ao desenvolvimento da narra que, por terem pecado contra Deus, não
tiva, mas o relato do singelo ministério de haveria quem os defendesse na presença do
Samuel perante o Senhor e da boa sorte Senhor.
de Ana contrasta perfeitamente com as Embora Hofni e Finéias devessem arcar
desgraças que estão prestes a cair sobre a com a responsabilidade de seu pecado, pode-
casa de Eli. -se localizar em Deus a causa remota da
A natureza do éfode que o jovem Samuel rebelião de ambos: porque o Senhor os
envergava não é revelada de maneira sufi
queria destruir. Esse versículo e numerosas
cientemente clara. Neste contexto é
outras passagens do Antigo Testamento
obviamente visto como uma peça do para
enfatizam a soberania de Deus sobre a
mento sacerdotal (cf. 2.28), talvez confec história e a utilização por ele das ações
cionada pela própria mãe do menino (2.19). humanas para cumprir seus próprios desíg
Embora pudesse ser uma veste simples, feita
nios. Assim é que o Senhor endureceu o
de linho (cf. 22.18; 2Sm 6.14), poderia
coração de Faraó para que seu próprio
também ser uma peça trabalhada, feita com
poder fosse demonstrado (Ex 4.21). Até
material dispendioso. Por outro lado, um
mesmo a ira do homem resulta em louvor
éfode podia ficar sozinho num local de a Deus (SI 76.10).
adoração (ISm 21.9), ou até vir a ser ele
Todavia, em outros tempos, ou talvez
próprio um objeto de adoração (Jz 8.27;
em outros círculos, o homem era visto como
17.5; 18.14).
um livre agente que, na maioria das
circunstâncias, podia determinar seu
3) A repreensão de Eli fracassa (2.22-26)
22Eli era já muito velho; e ouvia tudo quanto O baalismo cananeu particularm ente encarnava um a forma de
seus filhos faziam a todo o Israel, e como se dei adoração em que a prostituição tan to m asculina com o feminina
tavam com as mulheres que ministravam à porta era praticada regularm ente entre os serviçais do templo. O Antigo
Testam ento está repleto de condenações contra tais práticas (cf. Dt
da tenda da revelação. 23E disse-lhes: Por que 23.17; 2Rs 23.4-7; J r 2.23,24; Ez 23.35-45). Veja B. A. Brooks, “Ferti
fazeis tais coisas? pois ouço de todo este povo os lity C ult Functionaries in the Old Testament”, Journal o f Biblical
vossos malefícios. “ Não, filhos meus, não é boa Literature, LX (1941), p. 227*253.
29
próprio destino. Era ainda uma criatura de no meu coração e na minha mente. Edificar-lhe-ei
Deus, mas uma criatura livre. Mesmo que uma casa duradoura, e ele andará sempre diante
tivesse de colher os frutos de sua rebelião, do meu ungida “ Também todo aquele que ficar
de resto da tua casa virá a inclinar-se diante dele
seria capaz de resistir com sucesso à von por uma moeda de prata e por um pedaço de pão,
tade de Deus (Gn 3.1-25), uma vez que o e dirá: Rogo-te que me admitas a algum cargo sacer
Senhor, por algum tempo, permitiria ações dotal, para que possa comer um bocado de p ãa
contrárias à sua vontade (SI 95.7-8). Infe Apenas os aspectos gerais das circuns
rior somente a Deus, o homem haveria de
tâncias históricas que transparecem nesses
subjugar e dirigir o mundo que o cerca importantes versículos podem ser identifi
(SI 8.5-9). cados com certo grau de exatidão. Aparen
Os autores bíblicos enfatizavam, por temente, uma grande insurreição no meio
tanto, antes de tudo a onipotência de Deus, da liderança religiosa de Israel ocorreu
e só depois a liberdade do homem. Cada simultaneamente à adoção da monarquia.
conceito é importante para uma adequada Na rejeição divina da casa sacerdotal de
compreensão do outro. Assim, embora que Eli, a natureza moral das relações de Deus
a ênfase seja o controle de Iavé sobre a com o homem tornou-se conhecida. As
história, a liberdade do homem encontra promessas e advertências não são de natu
reconhecimento no fato de que os filhos reza mecânica para serem aplicadas sem
de Eli deviam aceitar as conseqüências de levar-se em conta a reação do homem. Ao
seus atos.
invés disso, os atos de Deus salientam seu
caráter e a condição do homem. O resul
4) Sentença Sobre a Casa de Eli (2.27-36) tado é a justiça. Nesse caso em particular,
a família de Eli, por seus próprios atos,
27Veio um homem de Deus a Eli, e lhe disse:
Assim diz o Senhor: Não me revelei, na verdade,
provara ser indigna de continuar desempe
à casa de teu pai, estando eles ainda no Egito, nhando o ofício sacerdotal.
sujeitos à casa de Faraó? eu o escolhi dentre A relação entre esta passagem e seu
todas as tribos de Israel para ser o meu sacerdote, contexto sugere que havia uma esperança
para subir ao meu altar, para queimar o incenso, de que Samuel fosse o sacerdote fiel que
e para trazer o éfode perante mim; e dei à casa de
teu pai todas as ofertas queimadas dos filhos de se tornaria o progenitor de uma linhagem
Israel. 29Pòr que desprezais o meu sacrifício e a duradoura de sacerdotes. Entretanto, serviu
minha oferta, que ordenei se fizessem na minha ele como juiz e foi seguido por seus filhos,
morada, e por que honras a teus filhos mais do cuja corrupção os impediu de prover qual
que a mim, de modo a vos engordardes do prin quer liderança duradoura em Israel
cipal de todas as ofertas do meu povo Israel?
30Portanto, diz o Senhor Deus de Israel: Na (7.15-17).
verdade eu tinha dito que a tua casa e a casá de Pbde-se presumir que haja uma perspec
teu pai andariam diante de mim perpetuamente. tiva histórica mais abrangente, em que se
Mas agora o Senhor diz: Longe de mim tal coisa, veja a sentença contra a casa de Eli atin
porque honrarei aos que me honram, mas os que
me desprezam serão desprezados. 31Eis que vem gindo o clímax na expulsão de Abiatar do
dias em que cortarei o teu braço e o braço da casa sacerdócio de Jerusalém, a qual foi orde
de teu pai, para que não haja mais ancião algum nada por Salomão (lRs 2.27). Somente
em tua casa. 32E tu, na angústia, olharás com Abiatar sobrevivera à chacina dos sacer
inveja toda a prosperidade que hei de trazer sobre
Israel; e não haverá por todos os dias ancião algum
dotes de Nobe (22.11-23; cf. 2.33) — para
em tua casa. 330 homem da tua linhagem a quem apoiar o candidato errado à sucessão do
eu não desarraigar do meu altar será para consumir- trono de Davi. Quando mandado para o
•te os olhos e para entristecér-te a alma; e todos exílio em Anatote, seu lugar foi ocupado
os descendentes da tua casa morrerão pela espada por Zadoque, cujos descendentes atuaram
dos homens. ^E te será por sinal o que sobrevirá
a teus dois filhos, a Hofni e a Finéias; ambos como conselheiros reais em Jerusalém.
morrerão no mesmo dia. 3SE eu suscitarei para Durante o exílio, pôde Ezequiel prever
mim um sacerdote fiel, que fará segundo o que está que somente aos zadoquitas seria permitido
30
o exercício de um ministério sacerdotal no levantando-se, foi a Eli e disse: Eis-me aqui, porque
templo restaurado de Jerusalém. Os levitas tu me chamaste. Então entendeu Eli que o Senhor
chamava o menina ’Pelo que Eli disse a Samuel:
comuns seriam relegados a cargos inferiores Vai deitar-te, e há de ser que, se te chamar, dirás:
(Ez 44.9-16). Aparentemente, portanto, via- Fala, Senhor, porque o teu servo ouve. Foi, pois,
se em Zadoque o sacerdote fiel destinado Samuel e deitou-se no seu lugar.
a tornar-se o progenitor de um sacerdócio Contrastando vivamente com a debili
perpétuo para o Senhor (v. 35).
dade física de Eli e a depravação de seus
À idéia aqui expressa de que Deus enviou filhos, o retrato que temos de Samuel mostra
castigo sobre todo o sacerdócio levítico, por
um jovem moralmente robusto, que traba
causa dos pecados de dois de seus membros,
lhava como uma espécie de ajudante e que
suscita sérias questões na mente de
estava destinado a desempenhar um papel
inúmeros leitores modernos. Os antigos
fundamental como servo de Deus, num
hebreus, no entanto, haviam aprendido
momento crítico da história de Israel. A
acerca da influência recíproca que existe idade de Samuel, nessa época, é desconhe
entre o indivíduo e a sociedade de que faz cida. Chamam-no na’ar, palavra hebraica
parte. A comunidade, inevitavelmente, para
que indica desde um recém-nascido (4.21)
vantagem ou prejuízo dela, não só se deixa
até um jovem adulto (2Cr 13.7). O termo
afetar pelos atos de seus membros, como
pode simplesmente designar uma pessoa
também, de certa maneira, compartilha da
que ainda não atingiu a maturidade física
responsabilidade de seus atos. Em todo caso,
ou mental, ou um empregado ou um servo
cada indivíduo é, em última instância, o pessoal (ISm 9.3).
responsável por seu próprio destino (Dt
A vida nacional, sob o governo dos
24.16; Jr 31.29-34; Ez 18.1-32). A soberania
juizes, atingira uma situação tão adversa
de Deus não é arbitrária nem mecânica.
que muita gente deve ter-se perguntado por
Embora influenciado por seu ambiente, o
homem tem condições de romper as cadeias que a mão do Senhor já não se mostrava
tão vigorosa na defesa de Israel como havia
das circunstâncias e, em oposição a isto, sido na conquista. Pelo menos uma parte
suscitar uma nova influência sobre a socie do problema pode ser creditada ao fato de
dade.
que havia pouquissimos homens preparados
para receber a orientação de Deus.
3. Samuel Inicia seu Ministério (3.1—4.1a) Embora não houvesse ainda atingido o
1) Samuel Serve no Templo (3.1-9) ápice de seu potencial, Samuel era um porta-
'Entretanto, o menino Samuel servia ao Senhor
voz de Deus mais capaz do que um sacer
perante Eli. E a palavra do Senhor era muito ra dócio plenamente credenciado, porém deca
ra naqueles dias; as visões não eram freqüentes. dente.
zSucedeu naquele tempo que, estando Eli deitado O lugar de repouso de Samuel, no
no seu lugar (ora, os seus olhos começavam já a
escurecer, de modo que não podia ver), 3e ainda
templo, ao lado da arca, sugere algç mais
não se havendo apagado a lâmpada de Deus, e que um simples quarto de dormir. É mais
estando Samuel também deitado no templo do provável que o rapaz estivesse servindo
Senhor, onde estava a arca de Deus, 4o Senhor numa função sacerdotal, talvez cuidando
chamou: Samuel! Samuel! Ele respondeu: Eis-me das lâmpadas, que ardiam a noite inteira,
aqui. SE correndo a Eli, disse-lhe: Eis-me aqui,
porque tu me chamaste. Mas ele disse: Eu não te diante do lugar sagrado (Ex 27.20,21; Lv
chamei; torna a deitar-te. E ele foi e se deitou. 24.1-4). A origem do chamado de Samuel,
6Tornou o Senhor a chamar: Samuel! E Samuel antes da alvorada, passou despercebida ou
se levantou, foi a Eli e disse: Eis-me aqui, porque porque o garoto era inexperiente ou porque
tu me chamaste. Mas ele disse: eu não te chamei, as visitações divinas eram raras.
filho meu; torna a deitar-te. 7Ora, Samuel ainda
não conhecia ao Senhor, e a palavra do Senhor ainda Quando Eli finalmente reconheceu a
não lhe tinha sido revelada. sO Senhor, pois, presença de Deus, deu instruções a Samuel
tornos a chamar a Samuel pela terceira vez. E ele, sobre como responder corretamente ao
31
chamado de Deus. Ele devia mostrar-se 2.27-36). Dessa vez até o velho sacerdote
disposto a ouvir. Embora Samuel não esti aparece envolvido nos pecados de seus
vesse procurando ativamente uma mani filhos. Ele havia tomado conhecimento de
festação divina, o contexto mais amplo suas transgressões, mas nada fizera para
mostra uma pessoa preocupada com a lide detê-las.
rança do Senhor. Deus pode falar através A gravidade dos pecados deles excedia
do “sussurro suave” a um homem já em sua própria transgressão. Haviam deixado
busca de orientação, mas é improvável que de prover a liderança de que Israel tão deses
o Senhor revista de poder uma pessoa insen peradamente carecia. Presume-se que seu
sível à sua orientação. castigo consistiu na primeira sentença
As visões não eram freqüentes. O texto contra ele pronunciada: a rejeição perpétua
é aqui um pouco difícil, e o sentido, conjec de seus nomes como sacerdotes.
tural. Talvez devêssemos compreender que
a palavra do Senhor era de muita valia 3) Samuel Divulga a Mensagem de Deus
naqueles dias, conforme lemos na RC, visto (3.15-18)
que o movimento profético não havia eclo 15Samuel ficou deitado até pela manhã, e então
dido sobre o povo. Samuel é reconhecido abriu as portas da casa do Senhor; Samuel, porém,
nesse contexto como um profeta (3.20) e, temia relatar essa visão a Eli. 16Mas chamou Eli
posteriormente, associado a um grupo, em a Samuel, e disse: Samuel, meu filho! Ao que este
respondeu: Eis-me aqui. 17Eli perguntou-lhe: Que te
Ramá, dedicado a experiências extáticas falou o Senhor? peço-te que não mo encubras; assim
(19.18-24). Esse crescente movimento pode Deus te faça, e outro tanto, se me encobrires alguma
perfeitamente ter ajudado a preservar os coisa de tudo o que te falou. 18Samuel, pois,
elementos essenciais da fé mosaica relatou-lhe tudo, e nada lhe encobriu. Então disse
enquanto Israel entrava numa nova fase de Eli: Ele é o Senhor, foça o que bem parecer aos
seus olhos.
sua vida nacional.14
32
os sentimentos de Eli estavam vividamente 4. A História da Arca (4.1b—7.2)
claros a Samuel. 1) A Arca é Capturada (4.1b-22)
A calma aceitação por Eli da sorte a. A Arca Levada Para Afeque (4.1b-4)
pronunciada contra seu lar é característica
Ora, saiu Israel à batalha contra os filisteus,
do fatalismo demonstrado por muitos povos e acampou-se perto de Ebenézer; e os filisteus se
do Oriente Próximo. Todos os aspectos da acamparam junto a Afeque. 2E os filisteus se dispu
existência, mesmo o sofrimento e o mal, seram em ordem de batalha contra Israel; e, travada
são vistos como resultado do controle de a peleja, Israel foi ferido diante dos filisteus, que
mataram no campo cerca de quatro mil homens
Deus sobre o mundo (cf. Jó 9.13-24). Por do exército. ’Quando o povo voltou ao arraial,
sua reação, Eli estava simplesmente reco disseram os anciãos de Israel: Por que nos feriu
nhecendo que era uma criatura diante da o Senhor hoje diante dos filisteus? Tragamos para
irrestrita autonomia de Deus. nós de Siló a arca do pacto do Senhor, para que
ela venha para o meio de nós, e nos livre da mão
de nossos inimigos. 4Enviou, pois, o povo a Siló,
4) Samuel Torna-se Profeta (3.19—4.1a) e trouxeram de lá a arca do pacto do Senhor dos
exércitos, que se assenta sobre os querubins; e os
19SamueI crescia, e o Senhor era com ele e não dois filhos de Eli, Hofni e Finéias, estavam ali com
deixou nenhuma de todas as suas palavras cair em a arca do pacto de Deus.
terra. Z0E todo o Israel, desde Dã até Berseba,
conheceu que Samuel estava confirmado como Este capítulo introduz uma seção rela
profeta do Senhor. 21E voltou o Senhor a aparecer tando histórias sobre a arca do Senhor, nas
em Sil6; porquanto o Senhor se manifestava a quais Samuel é raramente mencionado (ISm
Samuel em Siló pela sua palavra. 'E chegava a 4—6; 2Sm 6). Presumivelmente, estes capí
palavra de Samuel a todo o Israel.
tulos outroia haviam circulado indepen
À medida que ia amadurecendo, a repu dentemente, e aqui são introduzidos como
tação de Samuel como porta-voz de Deus importante material de fundo histórico. A
ia se espalhando pela terra. Os únicos crité significação da arca nesse período é confir
rios pelos quais um profeta podia ser mada pelo fato de que quase um terço de
avaliado eram o cumprimento de suas todas as referências a ela no Antigo Testa
mensagens por parte de Deus. Muitos mento encontram-se nos livros de Samuel.
homens poderiam dizer: “Assim diz o Em tempos antigos, a arca estava asso
Senhor” mas somente aqueles cujas pala ciada com a jornada de Israel pelo deserto
vras eram respaldadas pelos acontecimentos (Nm 10.33) e com as guerras de conquista
preditos seriam considerados verdadeiros (Js 6). O termo “Senhor dos exércitos” reflete
profetas. O crisol da história fornece um lembranças de intervenções de Deus no
teste tanto para o Deus que fala (Is 41.26) passado em favor de Israel.
quanto para o homem que fala por ele Quando as forças israelitas foram postas
(Jr 14.13-16). a fugir pelos filisteus na batalha crucial em
Uma vez que o povo reconhecia que Afeque, a derrota foi atribuída não ao julga
Deus estava falando mediante a palavra de mento de Deus sobre os pecados do povo,
Samuel, Siló novamente tornou-se um mas à sua ausência física do campo de
importante santuário em Israel. A presença batalha (cf. também Nm 14.43,44).
de Deus no culto não seria garantida por Parece que quase nenhuma distinção se
uma cerimónia impressionante e pomposa, fez entre a arca e o próprio Senhor. Quando
por uma história prestigiosa, ou mesmo pela a arca saía do acampamento no deserto,
posse de objetos sagrados, tal como a arca. Moisés dizia: “Levanta-te, Senhor, e dissi
O verdadeiro culto dependia da disposição pados sejam os teus inimigos, e fujam diante
do homem em abrir sua vida ao controle de ti os que te odeiam” (Nm 10.35). Seme
divino. A responsividade de Samuel à lhantemente, quando retornava, ele dizia:
direção de Deus inaugurava uma nova era “Volta, ó Senhor, para os muitos milhares
profética para Israel. de Israel” (v. 36). No tempo de Samuel, a
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arca era provavelmente considerada o trono Os filisteus ficaram abatidos com as notí
do Senhor, mas estava ainda associada com cias procedentes do arraial inimigo.
sua santidade e poder. Reconheceram o incentivo que a arca daria
Os filisteus, nos livros de Samuel mencio às desencorajadas tropas de Israel, pois
nados pela primeira vez aqui, estabele- tinham ouvido falar das proezas do Senhor
ceram-se na costa sudoeste de Canaã após contra os egípcios. Não obstante, resolveram
um ataque sem êxito contra o Egito por revelar toda sua valentia a fim de não se
volta de 1175 a.G. A herança militar e o tornarem eles próprios escravos.
melhor armamento desses povos deram-lhes Numa segunda batalha, Israel foi nova
uma significativa vantagem sobre seus mal mente derrotado, mas dessa vez a um custo
organizados vizinhos. As batalhas de muito mais terrível. O exército foi deban
Sansão (Jz 13—15) e a migração danita dado, e, pior ainda, a própria arca caiu em
(Jz 18) atestam quanto à seriedade e mãos inimigas.
duração da ameaça filistéia à segurança de
Israel. c. Notícias do Desastre Matam Eli (4.12-18)
12Então um homem de Benjamim, correndo do
b. A Arca Perdida em Batalha (4.5-11) campo de batalha chegou no mesmo dia a Siló, com
5Quando a arca do pacto do Senhor chegou ao as vestes rasgadas e terra sobre a cabeça. 13Ao
arraial, prorrompeu todo o Israel em grandes gritos, chegar ele, estava Eli sentado numa cadeira ao pé
de modo que a terra vibrou. 6E os filisteus, do caminho vigiando, porquanto o seu coração
ouvindo o som da gritaria, disseram: Que quer dizer estava tremendo pela arca de Deus. E quando aquele
esta grande vozearia no arraial dos hebreus? homem chegou e anunciou isto na cidade, a cidade
Quando souberam que a arca do Senhor havia toda prorrompeu em lamentações. 14E Eli, ouvindo
chegado ao arraial, 7os filisteus se atemorizaram; a voz do lamento, perguntou: Que quer dizer este
e diziam: Os deuses vieram ao arraial. Diziam mais: alvoroço? Então o homem, apressando-se, chegou
Ai de nós! porque nunca antes sucedeu tal coisa. e o anunciou a Eli. 15Ora, Eli tinha noventa e oito
8Ai de nós! quem nos livrará da mão destes deuses anos; e os seus olhos haviam cegado, de modo que
possantes? Estes são os deuses que feriram aos egip- jâ não podia ver. 16E disse aquele homem a Eli:
cios com toda sorte de pragas no deserto. Estou vindo do campo de batalha, donde fugi hoje
9Esforçai-vos, e portai-vos varonilmente, ó filisteus, mesma Perguntou Eli: Que foi que sucedeu, meu
para que porventura não venhais a ser escravos dos filho? 17Então respondeu o que trazia as novas, e
hebreus, como eles o foram vossos, portai-vos varo disse: Israel fugiu de diante dos filisteus, e houve
nilmente e pelejai. ,0Então pelejaram os filisteus, grande matança entre o povo; além disto, também
e Israel foi derrotado, fugindo cada um para a sua teus dois filhos, Hofni e Finéias, são mortos, e a
tenda; e houve mui grande matança, pois caí arca de Deus é tomada. 18Quando ele fez menção
ram de Israel trinta mil homens de infataria. da arca de Deus, Eli caiu da cadeira para trás, junto
"Também foi tomada a arca de Deus, e os dois à porta, e quebrou-se-lhe o pescoço, e morreu, por
filhos de Eli, Hofni e Finéias, foram mortos. quanto era homem velho e pesada Ele tinha julga
do a Israel quarenta anos.
Quando Hofni e Finéias trouxeram a
arca para o arraial, o povo deu um brado Embora o texto do versículo 13 seja algo
forte, que causou medo aos filisteus. Esse confuso, a situação geral é clara. Eli, idoso
grito de guerra tem sido associado com a e cego, estava sentado ao lado de uma das
fórmula que era recitada quando a arca vias da cidade, ansiosamente aguardando
entrava no arraial ou dele saía (Nm notícias da frente de batalha.
10.35,36). Porém, uma tão breve fórmula Um mensageiro benjamita, trazendo
de palavras dificilmente explicaria o deses evidentes sinais de lamentação, percorreu
pero que dominou o inimigo, pois não era pressurosamente mais de cinqüenta quilô
uma fórmula muito longa nem causava sufi metros para trazer notícias da tragédia até
ciente empolgação. É mais provável que Siló. Um grito de desespero ia marcando
uma incontida explosão de regozijo frené a passagem do mensageiro, até que ele
tico tenha acompanhado a chegada do chegou ao idoso sacerdote.
objeto sagrado, despertando a esperança de Todo o universo de Eli estava ligado ao
uma vitória fácil. resultado da batalha. Seus dois filhos
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estavam no meio da luta, filhos por quem permitir uma reconstrução precisa de como
ele mantinha um amor paternal a despeito era o governo israelita naquela época (veja
de suas persistentes más ações. As espe John Bright, p. 152-160).
ranças do país quanto ao futuro giravam A maioria do povo comum provavel
em torno da sorte de milhares de jovens mente considerou a derrota de Israel em
que lá arriscavam suas vidas. A primeira Afeque e especialmente a captura da arca
preocupação de Eli, no entanto, era pela como uma derrota do Deus de Israel.
segurança da arca de Deus. Quando soube Muitos antigos criam que cada nação tinha
da sua captura pelos filisteus, sucumbiu o seu próprio deus, o qual dirigia os destinos
morto, tendo o pescoço quebrado. de seu povo (cf. Jz 11.24; lRs 11.33). Assim,
Para alguns líderes de Israel, a arca era alguns temiam que o Senhor não tivesse
sobretudo um objeto sagrado com poderes poder para defender seu povo ou mesmo
mágicos ou psicológicos a seres explorados. seu próprio trono pessoal entre os homens.
Para Eli, representava um modo de vida. Contudo, o autor desses versículos vê
Sua vida inteira tinha sido dedicada ao a derrota em Afeque como o resultado do
serviço do Senhor, cuja habitação terrena julgamento de Deus sobre a corrupção na
entre os homens era simbolizada pela linhagem sacerdotal de Eli. Acontecimentos
presença da arca. Sua perda para um povo subseqüentes (cap. 5-6) mostrarão que o
pagão era mais do que o homem idoso pôde Senhor não se tornara impotente, mas que
suportar. sua intervenção em favor de seu povo reque
A teologia popular daquele tempo rerá a submissão deles à sua liderança.
também reconhecia a perda da arca como
assunto sério. A arca bem poderia ter sido
d. O Nascimento de Icabô (4.19-22)
o ponto de convergência de toda a estru
tura política de Israel naquele tempo. WE estando sua nora, a mulher de Finéias,
grávida e próxima ao parto, e ouvindo estas novas,
Martin Noth foi o primeiro a reconhecer de que a arca de Deus era tomada, e de que seu
um paralelo entre o governo de Israel sob sogro e seu marido eram mortos, encurvou-se e
os juizes e as ligas anfictiônicas das civili deu à luz, porquanto as dores lhe sobrevieram. ME,
zações egéias de épocas bem posteriores. na hora em que ia morrendo, disseram as mulheres
As anfictionias eram sistemas mantidos que estavam com ela: Não temas, pois tiveste um
filha Ela, porém, não respondeu, nem deu atenção
unidos por um culto comum num santuário a ista 21E chamou ao menino Icabô, dizendo: De
central (no caso de Israel, a arca). Cada clã Israel foi-se a glória! Porque fora tomada a arca
ou tribo cuidava dos ritos do santuário de Deus, e por causa de seu sogro e de seu marida
durante um mês por ano, ou durante dois 22E disse: De Israel se foi a glória, pois é tomada
a arca de Deus.
meses numa liga de seis membros. À parte
desses deveres cultuais e da necessidade de A reação da nora de Eli ante as notícias
suprir tropas para defesa mútua, cada tribo sombrias vindas de Afeque deve ter sido
era completamente autônoma. Os juizes característica da reação de todo o Israel.
surgiam sobretudo durante dificuldades Ela lamentava o infortúnio que se abatera
políticas e tinham maior ou menor êxito sobre a linhagem sacerdotal de seu marido,
na tarefa de unificarem brevemente a Israel. mas sua preocupação era quanto ao desastre
Esse sistema logicamente atribuiria grande maior que recaíra sobre a nação: De Israel
importância à arca e ao sumo sacerdote que se foi a glória, pois é tomada a arca de Deus.
a servia. Num só dia Israel perdeu ambos. Mesmo a chegada de um herdeiro do sexo
Essa interpretação da estrutura tribal masculino, apressada pelo choque da
pré-monárquica tem muito a recomendá- derrota, foi insuficiente para aliviá-la da
la, mas não se pode forçar demais a angústia asfixiante. Ela, por isso, chamou
interpretação. Materiais disponíveis acerca ao filho de Finéias Icabô (“Onde está a
do período dos juizes são muito vagos para glória?” ou “Inglório”). Sua morte durante
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o parto não é atribuída especificamente ao por um terremoto, ou por comandos guer
juízo de Deus sobre seu povo, mas contribui rilheiros.
para aumentar a aura de desespero que Os filisteus a princípio atribuíram a pros
acompanhou o desastre em Afeque. tração de Dagom diante da arca a mero
acaso. Somente o acúmulo de tais “coinci
dências” convenceu-os de que o Deus de
2) A Arca Causa Transtorno aos Filisteus Israel poderia ser o responsável por seus
(5.1-12) infortúnios.
A natureza exata do costume pagão
a. Dagom Danificado em Asdode (5.1-5) envolvido no não pisar o limiar é incerta.
‘Os filisteus, pois, tomaram a arca de Deus, e A santidade do limiar entre os vizinhos de
a levaram de Ebenézer a Asdode. 2Então os filis Israel pode ter-se originado na inclusão dos
teus tomaram a arca de Deus e a introduziram na
casa de Dagom, e a puseram junto a Dagom. corpos das vítimas sacrificiais em fundações
3Levantando-se, porém, de madrugada no dia de edifícios importantes (lRs 16.34). Se tal
seguinte os de Asdode, eis que Dagom estava caído for o caso, a cabeça e mãos separadas de
com o rosto em terra diante da arca do Senhor; Dagom contêm uma ironia especialmente
e tomaram a Dagom, e tornaram a pô-lo no seu
lugar. 4E, levantando-se eles de madrugada no dia macabra. Não obstante, em clara contra
seguinte, eis que Dagom estava caído com o rosto dição à teologia filistéia, os israelitas suprem
em terra diante da arca do Senhor; e a cabeça de (cf. v. 5) sua própria resposta zombeteira
Dagom e ambas as suas mãos estavam cortadas sobre o porquê de os sacerdotes de Dagom
sobre o limiar; somente o tronco ficou a Dagom. evitarem contato com o limiar de seu
sPelo que nem os sacerdotes de Dagom, nem
nenhum de todos os que entram na casa de Dagom templo.
pisam o limiar de Dagom em Asdode, até o dia A prática de saltar sobre o limiar era
de hoje. claramente proibida entre os israelitas (Sf
Tendo-se declarado livre de qualquer 1.9). Não obstante, Ezequiel pode estar
dependência física de Israel (cf. comentário deixando implícito que israelitas de época
sobre 4.12-18), Deus rapidamente demons posterior, por motivos decididamente dife
trou que a derrota em Afeque não se deveu rentes, reverenciavam o limiar do templo
a uma falta de poder de sua parte. Em duas de Jerusalém. Uma oferta especial devia
cenas dramáticas, o Senhor demonstrou sua ali ser feita (46.2), e o rio sagrado fluindo
superioridade, primeiro sobre o deus filisteu do templo iria ter origem naquele ponto
e depois sobre o próprio povo belicoso. (47.1).15
A preocupação do leitor moderno com
as técnicas empregadas por Deus no exer b. Enfermidades Devastam a Filístia (5.6-12)
cício de seu domínio obscurece seriamente 6Entretanto a mão do Senhor se agravou sobre
o propósito principal da narrativa bíblica. os de Asdode, e os assolou, e os feriu com tumores,
a Asdode e aos seus termos. 70 que tendo visto
Os antigos israelitas careciam de nossa os homens de Asdode, disseram: Não fique conosco
compreensão da relação causa-efeito e atri a arca do Deus de Israel, pois a sua mão é dura
buíam todos os fenômenos naturais direta sobre nós, e sobre Dagom, nosso Deus. 8Pelo que
mente a Deus. Ele era autor tanto do bem enviaram mensageiros e congregaram a si todos
(SI 16.2) quanto do mal (ISm 16.14). Suas os chefes dos filisteus, e disseram: Que faremos
nós da arca do Deus de Israel? Responderam: Seja
obras portentosas poderiam ser ou muito levada para Gate. Assim levaram para lá a arca
espetaculares (Js 10.13) ou bastante comuns do Deus de Israel. 9E desde que a levaram para
(Is 8.18). O autor do presente contexto não lá, a mão do Senhor veio contra aquela cidade,
estava preocupado em como a imagem de causando grande pânico; pois feriu aos homens
daquela cidade, desde o pequeno até o grande, e
Dagom fora derrubada, mas com o signi
ficado do acontecimento em si. Deus estava
tornando seu poder conhecido a todos — 15 O term o bastante desusual para designar “lim iar” m iphtan, que
aparece em ISm 5.4,5, é encontrado alhures no A ntigo Testamento
fosse o ato cumprido por sua própria mão, somente em Ez 9.3; 10.4,18; 42.6; 47.1; Sf 1.9.
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nasceram-lhes tumores. 10Então enviaram a arca a disenteria como a praga são facilmente
de Deus a Ecrom. Sucedeu, porém, que, vindo a transmissíveis.
arca de Deus a Ecrom, os de Ecrom exclamaram,
dizendo: Transportaram para nós a arca do Deus Quando a praga atingiu Asdode e vizi
de Israel, para nos matar a nós e ao nosso povo. nhanças, os homens da cidade começaram
‘'Enviaram, pois, mensageiros, e congregaram a a buscar uma explicação para seu infor
todos os chefes dos filisteus, e disseram: Enviai daqui túnio. Estranhos acontecimentos cercavam
a arca do Deus de Israel, e volte ela para o, seu a presença da arca no templo de Dagom,
lugár, para que não nos mate a nós e ao nosso povo.
Porque havia pânico mortal em toda a cidade, e de modo que o povo, sem muita certeza,
a mão de Deus muito se agravara sobre ela. 12Pois conclui que o Deus de Israel poderia estar
os homens que não morriam eram feridos com buscando vingança sobre eles. Evidente
tumores; de modo que o clamor da cidade subia mente, eles ainda tinham esperança de que
até o céu.
a praga e seu valioso troféu de guerra não
Para muitos observadores, a captura da tivessem relação entre si. Doutro modo, difi
arca do Senhor pelos filisteus (4.12-18) cilmente estariam tão ansiosos por mandar
sugeria impotência da parte do Deus de a arca a outras importantes cidades filistéias.
Israel. O antigo escritor claramente Primeiro em Gate, e depois em Ecrom,
demonstra que a derrota em Afeque repre morte e sofrimento acompanharam sua
sentava o julgamento de Deus sobre a passagem.
corrupção nacional, não uma falta de poder
divino. Primeiro Deus provou sua superio 3) A Arca Volta a Israel (6.1—7.2)
ridade sobre o deus filisteu (5.1-5), e depois
demonstrou seu controle sobre aquele povo. a. Os Filisteus Pagam Reparações (6.1-9)
A natureza da doença que afligiu os filis *A arca do Senhor ficou na terra dos filisteus
teus é incerta. A palavra traduzida por sete meses. zEntão os filisteus chamaram os sacer
dotes e os adivinhadores para dizer-lhes: que
tumores (’»phalim) é, no singular, provavel faremos nós da arca do Senhor? Fazei-nos saber
mente o mesmo que o nome Ofel (’ophel), como havemos de enviá-la para o seu lugar.
que refere-se a uma colina fortificada ou 3Responderam eles: Se enviardes a arca do Deus
acrópole dentro de uma cidade (Ne 3.26; de Israel, não a envieis vazia, porém sem falta envia
reis a ele uma oferta pela culpa; então sereis curados,
cf. 2Rs 5.24; Is 32.14). Assim, qualquer e se vos fará saber por que a sua mão não se retira
inchaço ou tumor no organismo podia ser de vós. 4Então perguntaram: Qual é a oferta pela
indicado. A menção a ratos no capítulo culpa que lhe havemos de enviar? Eles responderam:
seguinte (6.4 e s.) sugere à mente moderna Segundo o número dos chefes dos filisteus, cinco
a peste bubônica. Essa praga mortal é acom tumores de ouro e cinco ratos de ouro, porque a
praga é uma e a mesma sobre todos vós e sobre
panhada por uma inchação das glândulas todos os vossos príncipes. sFazei, pois, imagens
linfáticas sem que estas mudem de cor, espe dos vossos tumores, e dos ratos que andam
cialmente na virilha e nas axilas. Contudo, destruindo a terra, e dai glória ao Deus de Israel;
no capítulo 5 não se faz qualquer referência porventura aliviará o peso da sua mão de sobre
vós, e de sobre vosso deus, e de sobre vossa terra.
a ratos. 6Por que, pois, endureceríeis os vossos corações,
Por outro lado, os massoretas, que preser como os egípcios e Faraó endureceram os seus
varam o texto hebraico, não pronuncia corações? Porventura depois de os haver Deus casti
vam a palavra ’»phalim. Eles ignoravam o gado, não deixariam ir o povo, e este não se foi?
termo escrito e liam tehorim em seu lugar. 7Agora, pois, fazei um carro novo, tomai duas
vacas que estejam criando, sobre as quais não tenha
Emprega-se esta palavra para designar vindo o jugo, atai-as ao carro e levai os seus bezerros
inchações no intestino reto resultantes de de após elas para casa. 8Tomai a arca do Senhor,
tipos virulentos de disenteria. Daí, “hemor e ponde-a sobre o carro; também metei num cofre,
róidas” haveria de ser tradução mais ao seu lado, as jóias de ouro que haveis de oferecer
ao Senhor como ofertas pela culpa; e assim a envia
adequada. De qualquer forma, sofrimento reis para que se vá. 9Reparai então: se ela subir
e morte podiam facilmente atingir pelo caminho do seu termo a Bete-Semes, foi ele
proporções epidêmicas, uma vez que tanto quem nos fez este grande mal; mas, se não, sabe-
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remos que não foi a sua mão que nos feriu, e que As ações dos filisteus provavelmente
isto nos sucedeu por acaso. refletiam uma crença no efeito mágico de
O texto do capítulo 6 é confuso e os deta “simpatias”. O povo esperava que de algum
lhes da história são difíceis de ser recons modo as imagens ajudassem a desviar a
truídos. A princípio, os sacerdotes filisteus peste para longe. O valor de sua oferta
pareciam convencidos de que uma oferta destinava-se a reduzir a responsabilidade
aplacaria o Deus de Israel: então sereis por sua culpa.
curados, e se vos fará saber por que a sua O perdão de Deus, contudo, não pode
mão não se retira de vós. Posteriormente, ser comprado com a moeda do ritual vazio.
contudo, eles se revelaram incertos: dai Sem uma vida transformada, o sacrifício
glória ao Deus de Israel; porventura aliviará atrai o juízo de Deus, não a sua graça (Is
o peso da sua mão de sobre vós, e de sobre 1.11-17).
vosso Deus, e de sobre vossa terra. O Sem concordar com essa distorcida pers
número de ratos de ouro também varia. O pectiva da religião, o antigo escritor emprega
versículo 4 indica que deveriam ser feitos aquela experiência para demonstrar mais
cinco deles, mas o 18 deixa implícito que uma vez a grandeza de Deus. O Senhor
seriam consideravelmente mais. Antigas humilhou o deus dos filisteus, debilitou seu
traduções gregas e aramaicas também povo e forçou-o a reconhecer publicamente
oferecem textos que diferem significativa sua subserviência a ele.
mente do Texto Massorético.
Embora circunstâncias que cercam o b. A Arca de Volta a Israel (6.10-18)
retorno da arca dos filisteus possam parecer 10Assim, pois, fizeram aqueles homens:
incertas, o impacto teológico do relato é tomaram duas vacas que criavam, ataram-nas ao
carro, e encerraram os bezerros em casa;
bastante claro. O Senhor que havia punido "também puseram a arca do Senhor sobre o carro,
Israel por permitir que a nação fosse derro bem como o cofre com os ratos de ouro e com as
tada em batalha, agora também havia imagens dos seus tumores. 12Então as vacas foram
humilhado os conquistadores filisteus. Ele caminhando pelo caminho de Bete-Semes, seguindo
a estrada, andando e berrando, sem se desviarem
promoveu o retorno de sua arca de um terri nem para a direita nem para a esquerda; e os chefes
tório inimigo e permaneceu pronto para dos filisteus foram seguindo-as até o termo de Bete-
defender sua privacidade contra israelitas -Semes. 13Ora, andavam os de Bete-Semes fazendo
abelhudos (6.19). a sega do trigo no vale; e, levantando os olhos, viram
a arca e, vendo-a, se alegraram. 14Tendo chegado
Após sete longos meses de devastação o carro ao campo de Josué, o bete-semita, parou
desanimadora, os filisteus estavam ansiosos ali, onde havia uma grande pedra. Fenderam a
por devolver a arca para o seu lugar, mas madeira do carro, e ofereceram as vacas do Senhor
em holocausto. 15Nisso os levitas desceram a arca
sentiram que deviam seguir um protocolo do Senhor, como também o cofre que estava junto
apropriado. Os sacerdotes e adivinhos filis a ela, em que se achavam as jóias de ouro, e puseram-
teus deram instruções para o preparo de -nos sobre aquela grande pedra; e no mesmo dia
imagens de ouro das pragas que os haviam os homens de Bete-Semes ofereceram holocaustos
e sacrifícios ao Senhor. 16E os cinco chefes dos
afligido. filisteus, tendo visto aquilo, voltaram para Ecrom
Os sacerdotes filisteus se expressaram no mesmo dia. 17Estes, pois, são os tumores de
ouro que os filisteus enviaram ao Senhor como
quase como iavistas praticantes, mas a refe oferta pela culpa: por Asdode um, por Gaza outro,
rência deles à experiência de Israel com o por Asquelom outros por Gate outro, por .Ecrom
Egito simplesmente declara: “Por que outra 18Como também os ratos de ouro, segundo
esperar até mais tarde? Vamos ver agora o número de todas as cidades dos filisteus, perten
mesmo se Deus trouxe isso sobre nós.” Dar centes aos cinco chefes, desde as cidades fortificadas
até as aldeias campestres. Disso é testemunha a
glória ao Deus de Israel era admitir que grande pedra sobre a qual puseram a arca do
ele era o responsável pelos infortúnios que Senhor, pedra que ainda está até o dia de hoje no
haviam sobrevindo à terra. campo de Josué, o bete-semita.
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Os adivinhos filisteus idealizaram uma 'Vieram, pois, os homens de Quiriate-Jearim,
última maneira para testar o envolvimento tomaram a arca do Senhor e a levaram à casa de
Abinadabe, no outeiro; e consagraram a Eleazar,
do Senhor nas calamidades que haviam filho dele, para que guardasse a arca do Senhor.
sobrevindo ao seu país. Duas vacas, sepa 2E desde o dia em que a arca ficou em Quiriate-
radas de seus bezerros, deveriam ser usadas -Jearim passou-se muito tempo, chegando até vinte
para puxar a arca numa carroça construída anos; então toda a casa de Israel suspirou pelo
Senhor.
especialmente para tal propósito. Se as vâcas
retornassem a seus bezerros ao serem soltas, A história da arca após ter retornado a
a peste que havia varrido a terra devia ser Israel representa o clímax do argumento
teológico que vem sendo desenvolvido ao
considerada um acontecimento casual. Se
longo dos capítulos 4—6. Como conse
as vacas seguissem na direção de Bete-
qüência da corrupção dos filhos de Eli, que
-Semes, a cidade israelita mais próxima,
assistiam à arca, o Senhor permitiu que a
então o povo concluiria que o Senhor os
tinha afligido. Assim, o envolvimento de arca caísse em mãos inimigas em Afeque.
Deus na história humana foi mais uma vez Ele então defendeu sua honra e poder,
operando a libertação da arca das mãos dos
confirmado quando as vacas foram soltas
filisteus. Agora, para ter certeza de que sua
e a arca foi conduzida no rumo de seu terri
lição inicial não foi esquecida, o Senhor
tório.
repreendeu seu povo por deixar de respeitar
Quando a arca foi devolvida a Israel, seu
primeiro ponto de parada foi Bete-Semes. a transcendência divina.
O carro e as vacas foram usados num sacri Os israelitas de Bete-Semes não sentiram
o perigo causado pela presença da arca entre
fício para comemorar o evento, e um grande
eles. Iavé, afinal de contas, era o seu Deus
altar de pedra ali serviu como testemunho
e acaba de exercer poder sobre seus
perpétuo da confirmação da honra do
inimigos. Presumiram que, por serem isra
Senhor. Nada se diz sobre a arca retornar
a Siló, onde havia estado antes da Batalha elitas, o Senhor deveria estar aos lado deles.
de Afeque. Igualmente, a Bíblia em parte Sua falta de temor em relação à arca logo
os encorajou a satisfazerem a curiosidade
alguma menciona a destruição desse
quanto à relíquia religiosa. Julgaram que,
santuário estratégico, conquanto saiba-se
como povo escolhido de Deus, estavam
que caiu por volta desse tempo. O autor
livres das regras de conduta que dirigem
aparentemente tinha um propósito mais
os homens comuns. Logo aprenderam que,
importante em mente. Ele estava mostrando
não importa qual seja sua origem nacional,
que, embora a arca tivesse sido anterior biológica ou religiosa, todos os homens
mente guardada em Siló, poderia legiti
devem sujeitar-se ao controle divino.
mamente ficar localizada em qualquer
Presumivelmente a praga que havia
outro lugar de Israel. Num sentido real,
portanto, a arca já havia retornado para devastado a Filístia dirigiu-se a Israel e
afligiu igualmente os israelitas. O sacrílego
casa.
tratamento dispensado à arca pelo povo de
Bete-Semes supriu uma pronta explicação
c. Mortandade em Bete-Semes (6.19—7.2) do juízo de Deus, e a arca foi transferida
19Ora, o Senhor feriu os homens de Bete- para Quiriate-Jearim.
-Semes; porquanto olharam para dentro da arca
do Senhor; feriu do povo cinqüenta mil e setenta
Nesse ponto a lição de teologia estava
homens; então o povo se entristeceu, porque o completa, a história chegara a um ponto
Senhor o ferira com tão grande morticínio. estacionário, e a arca passou vinte anos
20Disseram os homens de Bete-Semes: Quem em obscuridade. Permaneceu em Quiriate-
poderia subsistir perante o Senhor, este Deus santo? Jearim sob os cuidados de Abinadabe e seus
e para quem subirá de nós? 21Enviaram, pois,
mensageiros aos habitantes de Quiriate-Jearim, filhos até ser trazida, com honras, para Jeru
para lhes dizerem: Os filisteus remeteram a arca salém, ao tempo de Davi (2Sm 6; mas cf.
do Senhor; descei, e fazei-a subir para vós. ISm 14.18).
39
5. Samuel Liberta o Povo (7.3-17) em prosperidade nacional. Sob a influência
da carreira notável de Samuel, Israel foi se
1) Vitória Alcançada em Mizpá (7.3-11) desviando cada vez mais dos cultos de ferti
’Samuel, pois, falou a toda a casa de Israel, lidade cananeus e volveu a uma fé em
dizendo: Se de todo o vosso coração voltais para Deus, obtendo, assim, uma trégua tempo
o Senhor, lançai do meio de vós os deuses estra rária da agressão filistéia.
nhos e as astarotes, preparai o vosso coração para O culto a Baal e Astarote era bastante
com o Senhor, e servi a ele só; e ele vos livrará
da mão dos filisteus. 4Os filhos de Israel, pois, difundido entre os vizinhos cananeus de
lançaram do meio deles os baalins e as astarotes, Israel. Ambos os nomes são empregados
e serviram só ao Senhor. 5Disse mais Samuel: no plural aqui para referir-se às muitas
Congregai a todo o Israel em Mizpá, e orarei por variedades ou manifestações locais das prin
vós ao Senhor. 6Congregaram-se, pois, em Mizpá,
tiraram água e a derramaram perante o Senhor;
cipais divindades masculinas e femininas
jejuaram aquele dia, e ali disseram: Pecamos contra do panteão cananeu. O culto em seus
o Senhor. E Samuel julgava os filhos de Israel em santuários envolvia a prática ostensiva de
Mizpá. 7Quando os filisteus ouviram que os filhos ritos sexuais, tornando-os particularmente
de Israel estavam congregados em Mizpá, subiram repugnantes a iavistas zelosos. Esses dois
os chefes dos filisteus contra Israel. Ao saberem
disto os filhos de Israel, temeram por causa dos termos, baalins e astarotes, são usados
filisteus. 8Pelo que disseram a Samuel: Não cesses freqüentemente juntos para designar o culto
de clamar ao Senhor nosso Deus por nós, para de todos os deuses pagãos locais entre os
que nos livre da mão dos filisteus. 9Então tomou vizinhos de Israel (Jz 2X3; 10.6; ISm 12.10).
Samuel um cordeiro de mama, e o ofereceu inteiro
em holocausto ao Senhor; e Samuel clamou
As condições subjacentes à assembléia
ao Senhor por Israel, e o Senhor o atendeu. de Mizpá não são de modo algum claras.
,0Enquanto Samuel oferecia o holocausto, os filis A campanha inteira é relatada como um
teus chegaram para pelejar contra Israel; mas o único acontecimento, embora um conside
Senhor trovejou naquele dia com grande estrondo rável período de tempo pareça mais pro
sobre os filisteus, e os aterrou; de modo que foram
derrotados diante dos filhos de Israel. nOs vável (cf. v. 7).
homens de Israel, saindo de Mizpá, perseguiram Provavelmente devemos entender que
os filisteus e os feriram até abaixo de Bete-Car. Samuel era uma espécie de estrategista
militar, bem como profeta^ sacerdote e juiz.
Após a digressão um tanto quanto longa A ênfase do autor, contudo, não recai sobre
tratando do destino da arca, o autor bíblico esse homem notável, mas sobre Deus. O
reenceta a história da carreira de Samuel. planejamento, a obra e o sacrifício feitos
Em ambas as seções há importantes impli pelos homens foram todos esquecidos em
cações históricas, mas nenhum dos relatos face da voz de Deus (trovão), o qual,
está basicamente interessado na estrita sozinho, recebeu crédito pela vitória.
narração de detalhes. Sob a influência de
Eli e seus filhos corruptos, Israel se enfra 2) Resumo do Ministério de Samuel
quecera a ponto de ter sua existência (7.12-17)
nacional ameaçada pela expansão do poder l2Então Samuel tomou uma pedra, e a pôs
filisteu. Agora, sob a liderança de Samuel, entre Mizpá e Sem, e lhe chamou Ebenézer; e
as condições tendiam a melhorar um pouco. disse: Até aqui nos ajudou o Senhor. 13Assim os
O relato da reunião em Mizpá propicia filisteus foram subjugados, e não mais vieram aos
termos de Israel, porquanto a mão do Senhor foi
uma perspectiva concisa, quase estilizada, contra os filisteus todos os dias de Samuel. 14E as
do rumo que as questões nacionais toma cidades que os filisteus tinham tomado a Israel lhe
ram agora que uma nova era profética fora foram restituídas, desde Ecrom até Gate, cujos
instituída em Israel (3.19,20). O tema cen termos também Israel arrebatou da mão dos filis
teus. E havia paz entre Israel e os amorreus.
tral (v. 3) é um bom exemplo duma aplica lsSamuel julgou a Israel todos os dias da sua vida.
ção da doutrina da retribuição divina (cf. l6De ano em ano rodeava por Betei, Gilgal e
Introdução): a pureza religiosa resultará Mizpá, julgando a Israel em todos esses lugares.
40
7
l7Depois voltava a Ramá, onde estava a sua casa, tório de Israel (cap. 13). Contudo, nada
e ali julgava a Israel; e edificou ali um altar ao
Senhor.
existe que torne improvável um período de
relativa paz e prosperidade durante os
Estes versículos marcam o ponto alto primeiros anos de Samuel. Essa paz vem
da carreira de Samuel, pois 0 capítulo em cumprimento da promessa anterior de
seguinte começa com a observação de que Samuel de que, se o povo fosse leal ao
ele está velho e de que seus filhos estão Senhor, este haveria de livrá-lo dos filisteus
pervertendo a justiça.16Seu papel no esta (7.3).
belecimento da monarquia e na escolha dos Assim, nesse ponto Israel havia se arre
dois primeiros reis de Israel foi muito impor pendido de seus pecados e se livrado do
tante. Não obstante, na mente do autor, esse culto a deuses estrangeiros. O Senhor havia
papel pertencia a outra etapa da história. respondido fielmente, enviando um juiz
O período dos juizes terminou quando os muito capaz, Samuel, e livrando seu povo
anciãos do povo disseram: “constitui-nos dos opressores estrangeiros. Em visível tran
(...) um rei” (8.5). qüilidade, o período dos juizes termina com
Este sumário das condições à época da Samuel administrando justiça como um juiz
administração de Samuel como juiz repre itinerante que serve de guia espiritual para
senta, portanto, não só a avaliação do autor o povo.
sobre Samuel, mas também seu entendi
mento acerca do sistema político de Israel II. Ascensão e Reinado de Saul
sob os juizes. Primeiro ele registra o ergui- (8.1—14.52)
mento do memorial de pedra chamado
Após o resumo do ministério de Samuel
Ebenézer num local perto de Mizpá. em 7,12-17, subseqüentemente a atenção
Samuel explica que até aqui nos ajudou o
se concentra na ascensão de Saul ao poder
Senhor. A pedra em, si não desempenha (cf. Introdução, V, 1). Samuel ainda tem
qualquer parte no simbolismo. Samuel
um papel a desempenhar na narrativa, mas
simplesmente tomou um topónimo comum
não é mais o centro da atenção do leitor.
que significava “a pedra de ajuda” e, Antes que a história de Saul possa ser
mediante um jogo de palavras, criou um
narrada, contudo, algum relato deve ser
memoxiaLincorporando sua confissão de fé.
dado sobre a mudança na forma de governo
Neste contexto, Ebenézer. pode referir-
de Israel.
se à vitória anterior em Mizpá, mas sua
Esta seção de Samuel é claramente
inclusão neste ponto específico da história
marcada por atitudes ambivalentes para
sugere uma aplicação muito mais ampla. com o estabelecimento da monarquia. O
O autor está, na verdade, dizendo que o enfoque geral do editor é mais do que claro.
sistema sob a liderança dos juizes funciona O caráter essencialmente funcional da
quando o povo de Deus lhe permanece fiel.
estrutura tribal de Israel, administrada por
Em termos abrangentes o autor descreve,
um juiz político-religioso, foi firmemente
a seguir, uma retirada definitiva dos filis
defendida (cf. 7.13). Limitações do sistema
teus de território israelita e a devolução
não são totalmente ignoradas, mas atribu
das cidades capturadas. Essas expressões
ídas à falha do povo em ser fiel ao Senhor,
aparentemente descrevem condições exis o qual é, em última análise, o verdadeiro
tentes ao compará-las com outros tempos cabeça do governo de Israel (cf. especial
mais difíceis, pois, quando a guerra foi-
mente os cap. 8 e 12).
reiniciada sob Saul, os filisteus haviam
POr outro lado, uma opinião contrária,
penetrado até mais profundamente no terri com uma disposição muito mais favorável
à monarquia (a porção principal dos cap.
Este sum ário m arca o fim da “ascensão e governo” de Samuel (]Sm
1.1—7.17). A “ascensão e reinado” de Saul é o que se segue 9—11), também é encontrada nesta seção.
(8.1— 14.52). Veja Introdução, V, 1. De acordo com esta posição, o próprio
41
Senhor estava propic ando um rei para ele claramente reconheceu muitas das limi
livrar Israel da mão dos filisteus (9.15,16). tações da estrutura tribal de Israel sob os
Ele agiria de acordo com o novo sistema juizes. Um problema básico em qualquer
tal como havia feito mediante o velho sistema baseado em personalidades fortes
(12.14,15). gira em torno da dificuldade de propiciar
A seção como agora se apresenta está uma transição tranqüila de uma adminis
arranjada de tal modo que o elemento anti- tração para outra. Primeiro no tempo de
monárquico é mais pronunciado. Não Abimeleque (Jz 9.6), depois sob Eli, e agora
obstante, não se pode negar o sentimento com Samuel, tentou-se estabelecer um
a favor de um reino israelita. Muito possi sistema dinástico. Contudo, caráter e capa
velmente, ambas as posições foram man cidade de liderança não seguem obriga
tidas independentemente por um longo toriamente linhagens sangüíneas.
período de tempo antes de terem sido final Nações emergentes encontram hoje uma
mente combinadas em sua forma atual. O dificuldade semelhante para encontrar
estudo dos processos subjacentes à compo líderes honestos e de confiança. Desafortu
sição de textos bíblicos é um segmento nadamente, nem todas as pessoas que estão
legítimo da área técnica da pesquisa bíblica, se destacando na vida privada são capazes
o qual deveria ser reconhecido e encorajado. de suportar as pressões morais dos cargos
A principal tarefa que o leitor comum públicos. A corrupção nos altos escalões
enfrenta é, contudo, a da interpretação do finalmente solapará até o governo mais
registro bíblico em sua forma atual, de estável, e a perversão da justiça alienará
modo que possa ser visto como um guia uma população que doutro modo seria leal.
significativo para a vida moderna. De maneira que a experiência de Israel com
Longe de ser uma questão para preo os filhos de Samuel fornece munição para
cupação, a preservação de idéias contradi um sério ataque a todo o sistema tribal
tórias quanto a questões sociais é evidência administrado pelos juizes.
da vitalidade dos registros bíblicos. Sob a Por mais sérias que fossem tais questões,
liderança, seja de um juiz ou de um rei, o clamor por um rei poderia ter sido poster
havia valores políticos e religiosos a se gado indefinidamente caso não tivesse sido
ganhar ou a se perder. Deus parece ter precipitado por uma crise militar de
estado empregando homens que advo proporções sem precedentes. Além das
gavam ambos os sistemas de governo para desgastantes guerras com os filisteus, Israel
guiar seu povo através desse difícil período. agora enfrentava uma eclosão de hostilidade
As tensões resultantes ajudaram a preservar com seus vizinhos da região transjordânica
os valores de ambos os sistemas. (12.12). A própria sobrevivência de Israel
como nação parecia estar em jogo e
1. A Influência de Samuel Diminui Gradual nenhuma solução fácil se podia avistar.
mente (8.1-22)
2) Israel Pede um Rei (8.4-9)
1) Os Filhos de Samuel Pervertem a Justiça 4Então todos os anciãos de Israel se congre
(8.1-3) garam, e vieram ter com Samuel, a Ramá, 5e lhe
disseram: Eis que já estás veDra, e teus filhos não
'Ora, havendo Samuel envelhecido, constitui a andam nos teus caminhos. Constitui-nos, pois, agora
seus filhos por juizes sobre Israel. 20 seu filho um rei para nos julgar, como o têm todas as nações.
primogênito chamava-se Joel, e o segundo Abias; 6Mas pareceu mal aos olhos de Samuel, quando
e julgavam em Berseba. ’Seus filhos, porém, não disseram: Dá-nos um rei para nos julgar. Então
andaram nos caminhos dele, mas desviaram-se após Samuel orou ao Senhor. 7Disse o Senhor a
o lucro e, recebendo peitas, perverteram a justiça. Samuel: Ouve a voz do povo em tudo quanto te
dizem, pois não é a ti que têm rejeitado, porém a
Conquanto as convicções do autor mim, para que eu não reine sobre ele. 8Conforme
fossem fortemente contrárias à monarquia, todas as obras que fizeram desde o dia em que os
42
tirei do Egito até o dia de hoje, deixando-me a mim vez disso, buscaram impor uma solidarie
e servindo a outros deuses, assim também fazem
a ti. 9Agora, pois, ouve a sua voz, contudo lhes dade artificial baseada sobre a força e a
protestarás solenemente, e lhes declararás qual será autoridade externa. Sob tais circunstâncias,
o modo de agir do rei que houver de reinar sobre o estabelecimento de uma monarquia
eles. prometia conseqüências funestas.
Em vista das muitas limitações e pro
blemas dentro do sistema tribal, os anciãos 3) Descrição do Comportamento de um Rei
de cada tribo reuniram-se e pediram que (8.10-18)
Samuel dirigisse o estabelecimento duma 10Referiu, pois, Samuel todas as palavras do
monarquia em Israel. O desejo deles de Senhor ao povo, que lhe havia pedido um rei, ne
serem como (...) todas as nações provavel disse: Este será o modo de agir do rei que houver
de reinar sobre vós: tomará os vossos filhos, e os
mente deve ser interpretado como algo mais porá sobre os seus carros, e para serem seus cava
do que mera conformidade social. Um leiros, e para correrem adiante dos seus carros;
governo teocrático incorporando princípios 12e os porá por chefes de mil e chefes de cinqüenta,
democráticos nem sempre garante adminis para lavrarem os seus campos, fazerem as suas
colheitas e fabricarem as suas armas de guerra e
tração eficaz. Estavam dispostos a aceitar os petrechos de seus carros. 13Tomará as vossas
um regime totalitário a fim de passar a ter filhas para perfumistas e padeiras. 14Tomará o
uma autoridade suficientemente centrali melhor das vossas terras, das vossas vinhas e dos
zada para atender rápida e eficientemente vossos olivais, e os dará aos seus servos. 15Tomará
às exigências de uma sociedade em trans o dizimo das vossas sementes e das vossas vinhas,
para dar aos seus oficiais e aos seus servos.
formação. 1‘Também os vossos servos e as vossas servas, e
Por mais sério que fosse o problema, os os vossos melhores mancebos, e os vossos jumentos
israelitas tinham outras opções em aberto. tomará, e os empregará no seu trabalha 17Tomará
Poderiam ter continuado sob a liderança o dízimo do vosso rebanho; e vós lhe servireis de
escravos. 18Então naquele dia clamareis por causa
de Deus para procurar melhorias na orga do vosso rei, que vós mesmos houverdes escolhido;
nização que incorporassem seus ideais mas o Senhor não vos ouvirá.
pessoais e teológicos. Em lugar disso,
volveram-se a uma nova estrutura social Aos olhos de Samuel, o grande perigo
baseada em valores estranhos à fé de Israel. em estabelecer uma monarquia em Israel
Não devemos concluir, porém, que o jazia no fato de que o novo sistema político
Senhor estivesse imutavelmente oposto à encorajaria a nação a realmente tornar-se
monarquia e irrevogavelmente preso ao “como todas as nações”. Sua descrição do
antigo sistema. Uma corrente importante modo de agir do rei retrata uma completa
desta narrativa (cap. 9-11) deixa implícito contradição aos valores pessoais encarnados
o apoio divino para a monarquia israelita. na fé iavista. As pessoas perderiam sua liber
Também, uma vez estabelecida a monar dade individual, e a dignidade humana seria
quia, logo tomou-se norma aceita, mediante negligenciada. Moços seriam convocados
a qual Deus tratou com seu povo (cf. Jz para servir como trabalhadores, soldados
17.6; 18.1; 19.1; 21.25). ou artesãos; e moças, para servirem como
O pecado de Israel em solicitar um rei serviçais domésticas. Propriedades seriam
jaz no fato de que seus líderes externavam expropriadas. Israel poderia salvar-se, mas
fraquezas nacionais. Achavam que um novo o Israel do passado se perderia para
sistema de governo resolveria o seu sempre.17
problema, enquanto as maiores limitações
de Israel deviam-se a atitudes espirituais.
O povo poderia ter recuperado uma genuína As condições que Samuel descreve, como é sabido, existiram entre
os vizinhos de Israel no período compreendido dos séculos dezoito
unidade de propósito e ação pelo reexame a treze a.C. Veja I. M endelsohn, “Sam uel’s D enunciation o f King
das bases de sua existência como nação — ship in the Light o f the Akkadian D ocum ents from U garit”, Bulletin
o f the A m erican Schools o f Oriental Research, 143 (October, 1956),
isto é, seu compromisso com o Senhor. Em p. 17-22.
43
A despeito de todos j s sombrios prenún Esta expressão da habilidade do homem
cios de Samuel, o rei em Israel não parece em resistir a Deus dificilmente parecerá har
ter desfrutado o autoritarismo irrestrito que monizar-se com demonstrações anteriores
os monarcas tinham em outras nações do da autonomia divina nos negócios humanos
Oriente Médio. O iavismo, conquanto perio (cap. 4—6). Contudo, no pensamento do
dicamente acossado por cultos estrangeiros, Antigo Testamento, a onipotência de Deus
mantinha uma ênfase constante na digni e a liberdade do homem são mantidas como
dade do homem e no valor da personalidade um paradoxo sublime. O homem é capaz
humana. Vozes proféticas, encorajadas por de escolher seus próprios cursos de ação,
esta herança, ousavam criticar o rei e, assim, mas não é capaz de se declarar indepen
serviam como um controle sobre seu poder dente das conseqüências de suas ações.
(Mq 3.1-4; Is 3.14,15). Assim, Israel pode ter um rei ao insistir em
Um sumário da função real a partir desta sua exigência por um, mas então ficará sem
perspectiva reflete-se em Deuteronômio desculpas. Quando a monarquia finalmente
17.14-20. O rei deveria ser israelita nato, produzir os temíveis frutos preditos pelo
escolhido por orientação divina. Devia porta-voz do Senhor, Israel não deverá
evitar toda forma de ostentação na vida, esperar absolvição da culpa. Nesse entre-
isto é, não deveria acumular para si gado, tempo, todavia, Deus ajudará na escolha
bens ou esposas. Devia seguir as normas de um rei.
divinas “para que seu coração não se exalte
sobre os seus irmãos”. 2. Deus Escolhe o Rei de Israel (9.1—10.27)
Na prática, o caráter dos reis de Israel
variava enormemente. Nem todos se confor 1) Saul Habilita-se ao Cargo (9.1,2)
mariam ao terrível retrato de um rei que ‘Ora, havia um homem de Benjamim, cujo
fora pintado por Samuel, mas o potencial nome era Quis, filho de Abiel, filho de Zeror, filho
estaria sempre ali. A nova forma de governo de Becorate, filho de Afias, filho dum benjamita;
incorporava perigos contra os quais Israel era varão forte e valorosa 2Tinha este um filho,
chamado Saul, jovem e tão belo que entre os filhos
constantemente deveria pôr-se em guarda. de Israel não havia outro homem mais belo do que
ele; desde os ombros para cima sobressaia em
4) Israel Continua Resoluto (8.19-22) altura a todo o povo.
190 povo, porém, não quis ouvir a voz de As credenciais de Saul como futuro rei
Samuel; e disseram: Não, mas haverá sobre nós de Israel são apresentadas concisamente,
um rei, 20para que nós também sejamos como sem apologia e sem maior elaboração. As
todas as outras nações, e para que o nosso rei nos qualificações naturais de Saul eram impor
julgue, e saia adiante de nós, e peleje as nossas bata
lhas. 21Ouviu, pois, Samuel todas as palavras do tantes porque mesmo sua unção por Sa
povo, e as repetiu aos ouvidos do Senhor. 22Disse muel não era suficiente para torná-lo rei.
o Senhor a Samuel: Dá ouvidos à sua voz, e Antes que pudesse assumir o trono, preci
constitui-lhes rei. Então Samuel disse aos homens sava obter apoio público de uma popula
de Israel: Volte cada um para a sua cidade
ção seriamente dividida.
Mediante a voz de seu profeta Samuel, Um dos principais problemas enfren
o Senhor expressou relutância em conceder tados por Israel nesse tempo era a divisão
uma mudança na estrutura política de do país de acordo com fronteiras geográfi
Israel. O profeta demonstrou que a efici cas e tribais. Por mais de uma centena de
ência autoritária do rei, tão ansiosamente anos, as tribos do norte e as do sul haviam
buscada pelos anciãos, tenderia de fato a trilhado caminhos independentes. O Cân
solapar os princípios básicos da fé iavista. tico de Débora, em Juizes 5, por exemplo,
Não obstante, o povo estava livre para retrata Israel como uma entidade coletiva,
decidir, e permaneceram teimando que defrontando um inimigo comum, mas
Israel devia ter um rei. somente dez tribos são mencionadas. Seis
44
são elogiadas por responderem ao chamado formação social e espiritual que o condu
às armas, e quatro são repreendidas por ziu ao próprio limiar da grandeza.
sua indiferença, enquanto Judá e Simeão Provavelmente fosse também importante
são completamente ignoradas. Aparente para o êxito inicial de Saul a impressionan
mente não eram consideradas parte da liga te aparência física' que possuía. Num
tribal de Israel nesse tempo. Uma vez que ,o tempo em que a proeza física e magnetis
poema é geralmente considerado bastante mo pessoal eram considerados importantes,
antigo, sendo talvez até mesmo contem Saul parecia-se com um rei. Conquanto
porâneo dos eventos que descreve (c. 1150 seu físico avantajado não garantisse o
a.C.), a importância desse testemunho é êxito por si só, deu força a suas ameaças de
evidente. A busca por atender aos limitados violência quando foi necessária uma ação
interesses regionais deixou Israel tão seria decisiva numa campanha militar contra
mente dividido que realmente mais se Amom (11.7).
parecia como duas nações do que como
uma.18 2) Saul Procura as Jumentas Extraviadas
A própria origem tribal de Saul equipa (9.3-14)
va-o para um papel de mediador nessa dis
3Tinham-se perdido as jumentas de Quis, pai
puta entre as várias regiões. Benjamim de Saul; pelo que disse Quis a Saul, seu filho:
ocupava uma posição central entre o norte Toma agora contigo um dos moços, levanta-te e
e o sul, de modo que o novo rei não estaria vai procurar as jumentas. 4Passaram, pois, pela
demasiadamente identificado com qualquer região montanhosa de Efiraim, como também pela
dos dois lados. Sendo que a tribo era terra de Salisa, mas não as acharam; depois
passaram pela terra de Saalim, porém tampouco
pequena, outros grupos interessados teriam estavam ali; passando ainda pela terra de Ben
pouco a temer ou a invejar com a crescente jamim, não as acharam. 5Vindo eles, então, à terra
influência de Benjamim. de Zufe, Saul disse para o moço que ia com ele:
Por outro lado, os antigos israelitas Vem! Voltemos, para que não suceda que meu pai
deixe de inquietar-se pelas jumentas e se aflija por
consideravam uma origem destacada da causa de nós. 6M as ele lhe disse: Eis que há nesta
família como qualificação básica para a li cidade um homem de Deus, e ele é muito consi
derança. Uma linhagem nobre era prova derado; tudo quanto diz, sucede infalivelmente.
de gerações de habilidade comprovada e de Vamos, pois, até lá; porventura nos mostrará o
caminho que devemos seguir. 7Então Saul disse ao
uma longa herança de serviços e realiza seu moço: Porém, se lá formos, que levaremos ao
ções. A proeminência da família de Saul homem? Pois o pão de nossos alforjes se acabou,
é atestada por uma genealogia que remon e presente nenhum temos para levar ao homem de
ta seus ancestrais a até cinco gerações Deus; que temos? sO moço tornou a responder a
passadas. Seu pai também é chamado de Saul, e disse: Eis que ainda tenho em mão um
quarto dum siclo de prata, o qual darei ao homem
varão forte e valoroso (em hebr. gibbor de Deus, para que nos mostre o caminha ’(Anti
chayil), expressão que também pode ter o gamente em Israel, indo alguém consultar a Deus,
sentido de “homem de bens”. No mundo dizia assim: Vinde, vamos ao vidente; porque ao
antigo pessoas assim provavelmente cons profeta de hoje, outrora se chamava vidente.)
10Então disse Saul ao moço: Dizes bem; vem, pois,
tituíam uma nobreza proprietária de vamos! E foram-se à cidade onde estava o homem
terras.19 De sua família Saul recebeu a de Deus. uQuando eles iam subindo à cidade,
encontraram umas moças que saíam para tirar
As forças centrífugas que estavam solapando a unidade de Israel
água; e perguntaram-lhes: Está aqui o vidente?
a essa época eram bastante complexas, ftara um tratam ento mais 12Ao que elas lhes responderam: Sim, eis aí o tens
profundo veja Bright (p. í 54-160) ou M artin N oth, The H istory diante de ti; apressa-te, porque hoje veio à cidade,
o f Israel, traduzido para o inglês por P R. Ackroyd (New York: H arper porquanto o povo tem hoje sacrifício no alta
and Brothers Publishers, 1960), p. 154-163.
13Entrando vós na cidade, logo o achareis, antes
19 A referência de Saul a seu clã em 9.21 é um exemplo de modéstia que ele suba ao alto para comer; pois o povo não
exagerada, que realça à consciência do leitor o uso que Deus faz
de pessoas simples para realizar sua vontade Este tem a da “pessoa
comerá até que ele venha, porque ele é o que aben
hum ilde que se to m a im portante” é bem difundido na literatura çoa o sacrifício, e depois os convidados comem.
bíblica (p. ex., Jz 6.15). Subi agora, porque a esta hora o achareis.
45
14Subiram, pois, à cidade; e, ao entrarem, eis que te é alguém que vê ou aprende aquilo que
Samuel os encontrou, quando saía para subir ao outros deixam de perceber.
alta A palavra “profeta” (nabi’) é muito mais
freqüente no Antigo Testamento, ocorrendo
O relato que temos acerca da ascensão
cerca de trezentas vezes. É geralmente
de Saul ao poder está dividido em três epi
identificada com outras antigas raízes semí
sódios mais curtos: sua escolha por Samuel ticas que têm o sentido de “chamar” ou
(9.3—10.16), sua apresentação a Israel
“anunciar”, mas o exato sentido etimoló
(10.17-27) e sua conquista de apoio popular
gico do termo hebraico é incerto. Pode
(11.1-15).
significar “alguém que é chamado” ou
Saul atraiu a atenção de Samuel ao es
“alguém que anuncia”. Todavia, mesmo que
tar ele e um servo procurando jumentas de as raízes de todas as três palavras pu
seu pai que estavam extraviadas. O roteiro dessem ser analisadas com exatidão, seus
de sua jornada é obscuro, uma vez que as
significados ainda poderiam ter mudado ao
localidades de Salisa e Saalim são desco
longo de séculos de emprego variado.
nhecidas, mas provavelmente concluíram
sua busca a não mais de trinta quilômetros Muito mais importante para nossos
de casa. Após um longo e infrutífero esfor propósitos são as funções e atividades do
ço, o servo de Saul persuadiu-o a consultar profeta no Antigo Testamento. Samuel é
o homem de Deus na cidade próxima para retratado como um clarividente (9.1-27),
que não tivessem de retornar para casa de um estadista preocupado (8.10-18), um fa
mãos vazias. Assim, Samuel foi contatado zedor de reis (10.1; 16.1), e o líder de um
graças à sua reputação de clarividente. Saul grupo extático de profetas (19.20). Tais ati
e seu servo encontraram Samuel enquanto vidades refletem os complexos envolvimen
este ia supervisionar os sacrifícios no lugar tos dos profetas de Israel.
alto da cidade. O culto nesses santuários O êxito de Samuel em predizer o futuro
locais foi mais tarde condenado devido a está em harmonia com o legítimo papel
sua impureza (ex., 2Rs 23.18), mas ne desempenhado pelo elemento preditivo em
nhum estigma se prendia a cultos ali na profecia canônica. Presumia-se que Deus
época. respaldaria as palavras de seus porta-vozes,
Este episódio e passagens subseqüentes e o cumprimento da história era indicação
em Samuel (cap. 10 e 19) são muito impor de confirmação divina da mensagem do
tantes no estudo da profecia do Antigo profeta. A condição de Samuel como
Testamento. Conquanto o termo profeta profeta foi, portanto, demonstrada pelo fato
seja empregado já no período patriarcal de que o Senhor “não deixou nenhuma de
(Gn 20.7), pouco se conhece da natureza todas as suas palavras cair em terra” (3.19;
específica do papel de um profeta ou de cf. 9.6; observe também lRs 22.28).
suas atividades antes do tempo de Samuel. Predições exatas eram importantes ainda
Neste contexto, Samuel aparece inicial para os últimos profetas “escritores” (cf. Jr
mente como um vidente, mas o leitor é 28.9), mas cada vez mais se procurava, de
informado de que os videntes mais tarde outros modos, verificar a mensagem do
também foram chamados de profetas. profeta. Conquanto nenhum teste com
Infelizmente, um estudo etimológico das técnicas externas pudesse distinguir o
palavras hebraicas envolvidas apresenta profeta falso do verdadeiro, em qualquer
apenas idéias muito vagas quanto à função época o primeiro seria traído pelo caráter
dos primeiros profetas. Existem duas pala inferior de sua vida (Jr 29.23) e mensagem
vras traduzidas como “vidente” no Antigo (Jr 23.28). As mensagens morais e éticas
Testamento: ro’eh, que é empregada aqui, dos grandes profetas do oitavo ao sexto
e chozeh. Ambas derivam de raízes com séculos a.C. servem como padrão norma
o sentido de “ver”, de modo que um viden tivo de percepção profética no Antigo
46
Testamento. Devemos, contudo, lembrar instituição. O Senhor preparou Samuel para
que Samuel está situado no início do movi a chegada de Saul, anunciando antecipada
mento profético de Israel e deve, portanto, mente que o jovem de Benjamim seria o
ser avaliado em função de seu próprio futuro príncipe20 de Israel (v. 15,16). Pór
contexto, e não de um contexto posterior. sua ação Deus estava propiciando liderança
para seu povo, de modo que pudessem ser
3) Saul Encontra Samuel (9.15-27) libertos de seus senhores filisteus. Saul agiu
15Ora, o Senhor revelara isto aos ouvidos de com elogiável modéstia quando Samuel
Samuel, um dia antes de Saul chegar, dizendo: informou-o de sua (futura) posse de riqueza
16Amanhã a estas horas te enviarei um homem da de Israel (v. 20b). Até Samuel parece isento
terra de Benjamim, o qual ungirás por príncipe de hostilidade ao tornar Saul seu hóspede
sobre o meu povo de Israel; e ele livrará o meu de honra numa festa especial (v. 22-24) e
povo da mão dos filisteus; pois olhei para o meu
povo, porque o seu clamor chegou a mim. 17E ao oferecer-lhe o local mais agradável para
quando Samuel viu a Saul, o Senhor lhe disse: Eis dormir (v. 25,26).
aqui o homem de quem eu te falei. Este dominará
sobre o meu povo. 18Então Saul se chegou a 4) Samuel Unge Saul (10.1-16)
Samuel na porta, e disse: Mostra-me, peço-te, onde
é a casa do vidente. 19Respondeu Samuel a Saul: ‘Então Samuel tomou um vaso de azeite, e o
Eu sou o vidente; sobe diante de mim ao alto, derramou sobre a cabeça de Saul, e o beijou, e
porque comereis hoje comigo; pela manhã te disse: Porventura não te ungiu o Senhor para ser
despedirei, e tudo quanto está no teu coração to príncipe sobre a sua herança? 2Quando te apar
declararei. “ Também quanto às jumentas que há tares hoje de mim, encontrarás dois homens junto
três dias se te perderam, não te preocupes com elas, ao sepulcro de Raquel, no termo de Benjamim, em
porque já foram achadas. Mas para quem é tudo Zelza, os quais te dirão: Acharam-se as jumentas
o que é desejável em Israel? porventura não é para que foste buscar, e eis que já o teu pai deixou de
ti, e para toda a casa de teu pai? 21Então pensar nas jumentas, e anda aflito por causa de
respondeu Saul: Acaso não sou eu benjamita, da ti, dizendo: Que farei eu por meu filho? 3Então dali
menor das tribos de Israel? E não é a minha família passarás mais adiante, e chegarás ao carvalho de
a menor de todas as famílias da tribo de Benjamim? làbor; ali te encontrarão três homens, que vão
Por que, pois, me falas desta maneira? 22Samuel, subindo a Deus, a Betei, levando um três cabritos,
porém, tomando a Saul e ao seu moço, levou-os outro três formas de pão>, e o outro um odre de
à câmara, e deu-lhes o primeiro lugar entre os vinha 4Eles te saudarãoi, e te darão dois pães, que
convidados, que eram cerca de trinta homens. receberás das mãos deles. 5Depois chegarás ao
23Depois disse Samuel ao cozinheiro: Traze a outeiro de Deus, onde está a guarnição dos filis
porção que te dei, da qual te disse: Põe-na à parte teus; ao entrares ali na cidade, encontrarás um
contigo. “ Levantou, pois, o cozinheiro a espádua, grupo de profetas descendo do alto, precedido de
com o que havia nela, e pô-la diante de Saul. E saltérios, tambores, flautas e harpas, e eles profe-
disse Samuel: Eis que o que foi reservado está tizanda 6E o Espírito do Senhor se apoderará de
diante de ti. Come; porque te foi guardado para ti, e profetizarás com eles, e serás transformado
esta ocasião, para que o comesses com os convi em outro homem. 7Quando estes sinais te vierem,
dados. Assim, comeu Saul naquele dia com Samuel. faze o que achar a tua mão para fazer, pois Deus
25 Então desceram do alto para a cidade, e falou é contiga 8Tu, porém, descerás adiante de mim a
Samuel com Saul, no eirada “ E se levantaram de Gilgal, e eis que eu descerei a ter contigo, para
madrugada, quase ao subir da alva, pois Samuel oferecer holocaustos e sacrifícios de ofertas pací
chamou a Saul, que estava no eirado, dizendo: ficas. Esperarás sete dias, até que eu vá ter contigo
Levanta-te para eu te despedir. Levantou-se, pois, e te declare o que hás de fazer. 9Ao virar Saul as
Saul, e saíram ambos, ele e Samuel. 27Quando costas para se apartar de Samuel, Deus lhe mudou
desciam para a extremidade da cidade^ Samuel disse o coração em outro; e todos esses sinais aconte
a Saul: Dize ao moço que passe adiante de nós (e ceram naquele mesmo dia. 10Quando eles iam
ele passou); tu, porém, espera aqui, e te farei ouvir chegando ao outeiro, eis que um grupo de profetas
a palavra de Deus. lhes saiu ao encontro; e o Espírito de Deus se
apoderou de Saul, e ele profetizou no meio deles.
Ao contrário dos capítulos 8 e 12, este 20 O uso deste term o inagid) está limitado principalm ente a Samuel,
episódio descreve a monarquia de um ponto Reis e porções de Crônicas que se baseiam nesses dois primeiros
livros. É empregado sobretudo para designar o herdeiro divinam ente
de vista favorável, e todas as personagens indicado para um a posição de liderança. Seu emprego reforça a ênfase
surgem com uma atitude propícia à nova d o contexto q uanto ao papei do Senhor n a escolha de Saul.
47
"Todos os que o tinham conhecido antes, ao verem O contato de Saul com os profetas no
que ele profetizava com os profetas, diziam uns aos outeiro de Deus representa uma importante
outros: Que é que sucedeu ao filho de Quis? Está
também Saul entre os profetas? 12Então um
contribuição para a compreensão do profe-
homem dali respondeu, e disse: Pois quem é o pai tismo no Israel antigo. Embora fosse errado
dele? Pelo que se tornou em provérbio: Está também concluir que todos os profetas operassem
Saul entre os profetas? 13Tendo ele acabado de como um grupo, alguns grupos de consi
profetizar, foi ao alto. 14Depois o tio de Saul derável tamanho eram comuns (19.20; lRs
perguntou-lhe, a ele e ao seu moço: Aonde fostes?
Respondeu ele: Procurar as jumentas; e, não as 22.6; 2Rs 3.15), e transes involuntários não
tendo encontrado, fomos ter com Samuel. 15Disse eram considerados incomuns (19.18 e ss.).
mais o tio de Saul: Declara-me, peço-te, o que vos Tais ocorrências parecem notavelmente
disse Samuel. 16Ao que respondeu Saul a seu tio: semelhantes a práticas entre profetas cana-
Declarou-nos, seguramente, que as jumentas tinham
sido encontradas. Mas quanto ao assunto do reino, neus. No tempo de Elias, por exemplo,
de que Samuel falara, nada lhe declarou. adoradores de Baal chegaram a um ponto
de frenesi, dança, gritos, e mesmo laceração
Como sinal de escolha divina, Samuel de seus corpos (ÍRs 18.26-29). Conquanto
ungiu a cabeça de Saul com óleo. Por tal nos primeiros tempos profetas hebreus
ato, comum em Israel e entre seus vizinhos, possam ter compartilhado de algumas
tanto homens quanto objetos podiam ser manifestações psicológicas de seus vizinhos
postos de parte para funções religiosas espe pagãos, tais semelhanças eram exclusiva
ciais. Assim, a pedra em Betei (Gn 28.18), mente externas. Em contraste marcante
a arca (Ex 30.26), sacerdotes (Ex 28.41), com a grosseira imoralidade e licenciosidade
profetas (lRs 19.16), bem como reis, foram das religiões pagãs nas regiões vizinhas,
consagrados para o serviço divino. Samuel faz parte de uma longa lista de
A unção de Saul parece representar um profetas hebreus que se opunham firme
reconhecimento exterior de uma função mente a tais práticas.
divinamente designada, e não um ato sacra Quando Saul submeteu-se ao espírito do
mental que transmitia bênçãos especiais ao Senhor e começou a profetizar (cf. v. 6,16),
novo rei. Na verdade, Saul seria mais tarde seus vizinhos notaram seu comportamento
rejeitado por Deus e afligido por um espí e começaram a perguntar: Está também
rito mau (16.14), mas seria reconhecido Saul entre os profetas? Esta declaração foi
como o “ungido do Senhor” até a morte feita repetidamente e tornou-se um pro
(2Sm 1.16). O dom divino de um novo vérbio com um estigma social implícito. As
coração não implica necessariamente uma pessoas se admiravam de que Saul arriscasse
experiência espiritual do tipo encontrado trazer opróbrio ao nome de sua família e
no Novo Testamento. Antes, denota a força à sua chamada divina, participando do
da personalidade que era característica de excêntrico comportamento dos profetas
um homem de Deus. (cf. 19.24).
Para dar a Saul alguma confirmação Um morador local retrucou com outra
exterior do papel do Senhor em sua seleção, pergunta: Pois quem é o pai dele? Con
Samuel ofereceu um sinal triplo que logo quanto a interpretação desta expressão seja
poder-se-ia verificar. Primeiro, Saul encon incerta, é provavelmente melhor entendida
traria dois viajantes que relatariam a como uma avaliação positiva do papel profé
recuperação das jumentas perdidas e a preo tico. Está ele dizendo que Saul não é apenas
cupação de seu pai quanto a ele. Segundo, um dos profetas; é também ou o líder deles,
ele e seu servo receberiam alimento para ou o seu incentivador.21
sua viagem de volta aò lar (cf. 9.7) por A despeito do dramático cumprimento
homens que subiam a sacrificar em Betei. dos sinais preditos por Samuel, Saul
Terceiro, Saul seria dominado pelo espírito
do Senhor quando encontrasse um grupo 21 A palavra hebraica para “pai”, ’a b, è freqüentem ente utilizada como
de profetas em sua jornada para casa. um term o de respeito e honra (2Reis 2.12; 5.13; 6.21).
48
manteve segredo de sua unção real mesmo da monarquia. A solicitação de um rei pelo
para seus próprios familiares. povo foi novamente condenada como uma
rejeição da liderança do Senhor. A despeito
5) Saul Publicamente Aclamado Rei do cuidado de Deus durante o êxodo do
(10.17-27) Egito e a conquista de Canaã, Israel
17Então Samuel convocou o povo ao Senhor em recusava-se a confiar nele durante sua crise
Mizpá; 18e disse aos filhos de Israel: Âssim diz o atual. Não obstante, o Senhor continuou
Senhor Deus de Israel: Eu fiz subir a Israel do a agir em favor dos mais altos interesses
Egito, e vos livrei da mão dos egfpcios e da mão
de todos os reinos que vos oprimiam. 19Mas vós de seu povo quando dirigiu a escolha de
hoje rejeitastes a vosso Deus, àquele que vos livrou Saul, sobre quem se podia dizer que não
de todos os vossos males e angústias, e lhe dissestes: há entre o povo nenhum semelhante a ele.
Põe um rei sobre nós. Agora, pois, ponde-vos Admiração e respeito ante esta demons
perante o Senhor, segundo as vossas tribos e
segundo os vossos milhares, ^ en d o , pois, Samuel tração da vontade divina foi salientada pelo
feito chegar todas as tribos de Israel, foi tomada fato de que, primeiramente, Saul não foi
por sorte a tribo de Benjamim. 21E, quando fez encontrado entre o povo. Somente depois.
chegar a tribo de Benjamim segundo as suas famí de consultas adicionais ao Senhor, foi ele
lias, foi tomada a família de Matri, e dela foi tomada
Saul, filho de Quis, e o procuraram, mas não foi localizado entre a bagagem. O sorteio tinha
encontrada 22PeIo que tornaram a perguntar ao o objetivo de fornecer respostas afirmativas
Senhor: Não veio o homem ainda para cá? E ou negativas, e não declarações factuais
respondeu o Senhor: Eis que se escondeu por entre orais, tal como a que se encontra em 10.22
a bagagem. “ Correram, pois, e o trouxeram dali;
e estando ele no meio do povo, sobressaía em altura
(cf. 14.41,42). Não obstante, uma seqüência
a todo o povo desde os ombros para cima. MEntão de perguntas poderia facilmente ter sido
disse Samuel a todo o povo: Vedes já a quem o idealizada, as quais, em essência, teriam
Senhor escolheu? Não há entre o povo nenhum fornecido aquela resposta.
semelhante a ela Então todo o povo o aclamou,
dizendo: Viva o rei! 25Também declarou Samuel Samuel persistiu em seus esforços por
ao povo a lei do reino, e a escreveu num livro, e preservar algumas das liberdades da antiga
pô-lo perante o Senhor. Então Samuel despediu todo liga tribal ao codificar os direitos e deveres
o povo, cada um para sua casa. “ E foi também do reino e sacramentá-los perante o Senhor.
Saul para sua casa em Gibeá; e foram com ele Um conjunto de “salvaguardas constitucio
homens de valor, aqueles cujo coração Deus tocara.
27M as alguns homens ímpios disseram: Como nais” desse teor é refletido em Deute-
pode este homem nos livrar? E o desprezaram, e ronômio 17.14-20 (McKane, p. 79). Embora
não lhe trouxeram presentes; porém ele se fez como essas restrições fossem em grande parte
surda ineficazes após o reinado de Saul, alguns
Esta passagem reenceta a história da membros da sociedade israelita provavel
escolha do rei de Israel no ponto em que mente trabalharam para manter vivos os
foi deixada em 8.22. Saul é retratado como antigos ideais. Certamente dentro do Reino
um exemplo soberbo de masculinidade do Norte a força da monarquia foi conti
hebréia, mas seu papel como príncipe nuamente limitada pelas atividades políticas
(nagid) continua sem ser notado. Samuel dos profetas.
reuniu o povo em Mizpá e supervisionou Já desde o começo do reinado de Saul,
o sorteio como se Saul lhe fosse desconhe o povo de Israel esteve dividido em seu apoio
cido. Embora Samuel como vidente talvez ao governo. Conquanto todos bradassem
pudesse ter previsto a escolha de Saul no Viva o rei! e alguns homens cujo coração
sorteio, os “episódios de busca” (9.1—10.16) Deus tocara entusiasticamente seguissem
não se empenham em predizer sua escolha Saul por todo o caminho de volta para casa,
pública, e esta seção não dá atenção à outros indagavam como pode este homem
unção de Saul por Samuel. nos livrar? Revelavam desprezo pelo novo
Como no capítulo 8, o texto como um governante, negando-se a presenteá-lo,
todo indica oposição ao estabelecimento conforme era costume em tais ocasiões.
49
A designação homens ímpios, atribuída censura a todos os israelitas por sua inca
aos oponentes de Saul, reflete uma atitude pacidade de defender uma de suas cidades
favorável para com a monarquia, seme irmãs. A disposição de Naás em conceder
lhante à encontrada em 9.1—10.16, e uma trégua de sete dias demonstra ainda
divergindo da de 10.17-25. Claramente, o mais sua certeza de uma vitória derradeira.
autor final do livro de Samuel estava Estava convencido de que Israel era dema
lidando muito conscienciosamente com as siado fraco para proporcionar qualquer
fontes à sua disposição, quaisquer que solução eficaz para Jabes, mesmo que
fossem seus próprios sentimentos. tivesse tempo para fazê-lo.
50
imediatas para assegurar a unidade de Israel Mesmo com manifestações públicas
nessa crise. Ele sacrificou os touros com (10.17-27) e privadas (9.1—10.16) de direção
os quais estava arando, partiu os corpos em divina no estabelecimento da monarquia,
vários pedaços e remeteu uma porção a cada Saul defrontou-se com firme resistência
tribo de Israel. As violentas atitudes de Saul (10.27). De modo que preferiu agir devagar
reforçaram a sombria advertência dos e aguardar a oportunidade para demonstrar
mensageiros: Qualquer que não sair* após o apoio do Senhor à sua causa (10.7). O
Saul e após Samuel, assim se fará aos seus papel de Saul na vitória decisiva sobre Naás
bois (cf. Jz 19.29). No ajuntamento que se granjeou-lhe o apoio de uma grande parte
seguiu, a enumeração em separado dos da população Logo o povo estava clamando
homens de Israel e Judá revela a frágil natu pelo sangue daqueles que ainda se opunham
reza da unidade imposta pela força da ao novo governo.
personalidade de Saul. Não obstante, uma A estabilidade da personalidade de Saul
das maiores deficiências da velha liga tribal nos primeiros anos de seu governo é clara
havia sido remediada. As tribos foram mente retratada no seu tratamento
compelidas a honrar seu compromisso de compassivo daqueles que haviam feito
enviar tropas em tempo de crise militar. campanha contra ele. Saul reconhecia que
Relatos da batalha são quase um anti muitos dos seus adversários o combatiam
clímax. Saul reuniu um exército porque criam que a nação havia rejeitado
considerável22 em Bezeque, cerca de vinte a liderança do Senhor ao reivindicar um
quilômetros ao norte de Siquém, e mandou rei. A lealdade de súditos como esses não
avisar Jabes-Gileade de que socorro estaria poderia ser forçada, mas conquistada. Saul
chegando no dia seguinte. Após uma atingiu bem o cerne da questão quando,
marcha por toda a noite de cerca de vinte desvencilhando-se de qualquer crédito
e quatro quilômetros, Saul e suas tropas pessoal, declarou as simples palavras: Neste
chegaram ao amanhecer,23 e a matança dia o Senhor operou um livramento em
começou. Os amonitas que não sucum Israel.
biram foram implacavelmente dispersados Como atualmente se apresenta o registro,
e o flanco oriental de Israel ficou seguro. a injunção de Samuel para que o povo fosse
a Gilgal a fim de renovar o reino não é intei
3) O Povo Proclama Saul Rei (11.12-15) ramente clara. Se somente agora o plano
divino estava se concretizando plenamente,
12Então disse o povo a Samuel: Quais são os
que diziam: Reinará porventura Saul sobre nós? esperar-se-ia então que o reino fosse esta
Dai cá esses homens, para que os matemos. 13Saul, belecido, em vez de renovado. Por outro
porém, disse: Hoje não se há de matar ninguém, lado, a oposição à monarquia pode ter sido
porque neste dia o Senhor operou um livramento tão forte que as primeiras tentativas de Saul
em Israel. 14Depois disse Samuel ao povo: Vinde,
vamos a Gilgal, e renovemos ali o reina 15Foram,
em estabelecer um governo tinham sido
pois, para Gilgal, onde constituíram rei a Saul derrotadas. Sob tais circunstâncias o reino
perante o Senhor, e imolaram sacrifícios de ofertas precisaria ser renovado, mas os registros
pacíficas perante o Senhor; e ali Saul se alegrou existentes não fornecem provas de uma
muito com todos os homens de Israel. rejeição tão drástica da liderança de Saul.
a palavra hebraica p ara “milhares”, ’e leph, tem dois sentidos. Além
de seu significado estritam ente numérico, pode tam bém referir-se
4. Samuel Dá Conselhos à Monarquia
à subunidade de um a tribo, a partir da qual fazia-se a convocação (12.1-25)
(cf. Jz 6.15). A proporção de cerca de dez hom ens de Israel para
um de Ju d á está grosso modo de acordo com outros censos tribais.
Veja G. E. M endenhall, “T h e Census List o f Num ber 1 and 26”
1) Samuel Defende seu Pãssado de Serviços
Journal o f Biblical Literature, LX X V II (1958), p. 52-66. e Conduta (12.1-5)
23 Sendo que o dia hebreu começava ao pôr*do-sol, “vigilia da m anhã”
refere-se à noite em que a mensagem foi enviada. A noite era divi
‘Então disse Samuel a todo o Israel: Eis que
dida em três períodos: o principio das vigílias (Lm 2.19), a vigilia vos dei ouvidos em tudo quanto me dissestes, e cons
do meio (Jz 7.19) e a vigília da m anhã (Caird, p. 940). tituí sobre vós um rei. 2Agora, eis que o rei vai
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adiante de vós; quanto a mim, já sou velho e enca mais aberta a sério questionamento. O
necido, e meus filhos estão convosco: eu tenho discurso de Samuel resume, portanto, os
andado adiante de vós desde a minha mocidade até
o dia de hoje. 3Eis-me aqui! testificai contra mim
princípios teológicos sobre os quais Deus
perante o Senhor, e perante o seu ungida De quem tratará com seu povo sob o novo sistema
tomei o boi? ou de quem tomei o jumento? ou a de governo.
quem defraudei? ou a quem tenho oprimido? ou Samuel começou seu discurso com uma
da mão de quem tenho recebido peita para enco defesa de seu próprio ministério como juiz.
brir com ela os meus olhos? E eu vo-lo restituirei.
4Responderam eles: Em nada nos defraudaste, nem O povo concordou que, como um jurista,
nos oprimiste, nem tomaste coisa alguma da mão ele estava acima de crítica. Não havia
de ninguém. sEle lhes disse: O Senhor é teste roubado a ninguém, recebido suborno ou
munha contra vós, e o seu ungido é hoje testemunha pervertido a justiça. Até seus filhos, que
de que nada tendes achado na minha m ãa Ao que
respondeu o povo: Ele é testemunha.
anteriormente eram a fonte de considerável
embaraço para ele (8.1-5), são aqui citados
Este capítulo é geralmente considerado sem qualquer censura. Por sua defesa
como o discurso de despedida de Samuel Samuel procurou exonerar-se não só a si
para Israel, comparável em escopo ao de próprio mas também a todo o sistema
Moisés (especialmente Dt 28 e ss.) ou Josué teocrático sob os juizes.
(Js 24). Se tal for o caso, contudo, o discurso
parece fora de lugar neste contexto. Um 2) Crônica da Rebelião de Israel (12.6-18)
sumário do ministério de Samuel foi ante
6Então disse Samuel ao povo: O Senhor é o
riormente apresentado (7.12-17), quando que escolheu a Moisés e a Arão, e tirou a vossos
estava no auge do seu poder, antes de Saul pais da terra do Egito. 7Agora ponde-vos aqui,
ter começado a ascender ao poder (cf. Intro para que eu pleiteie convosco perante o Senhor,
dução, V, 1). Pòr outro lado, o ministério no tocante a todos os atos de justiça do Senhor,
ativo de Samuel ainda não está encerrado, que ele fez a vós e a vossos pais. 8Quando Jacó
entrou no Egito, e vossos pais clamaram ao Senhor,
pois ele deveria desempenhar um papel então o Senhor enviou Moisés e Arão, que tiraram
crucial na rejeição de Saul e unção de Davi, vossos pais do Egito, e os fizeram habitar neste
antes que sua morte seja registrada em lugar. 9Esqueceram-se, porém, do Senhor seu
ISamuel 25. Deus; e ele os entregou na mão de Sisera, chefe
do exército de Hazor, e na mão dos filisteus, e na
Parece provável, portanto, que o discurso mão do rei de Moabe, os quais pelejaram contra
de Samuel deva ser visto como uma impor eles. ‘“Clamaram, pois, ao Senhor, e disseram:
tante declaração de diretrizes, e não como Pecamos, porque deixamos ao Senhor, e servimos
seu discurso de despedida. Até este ponto, aos baalins e astarotes; agora, porém, livra-nos da
a ascensão de Saul ao poder como rei de mão de nossos inimigos, e te serviremos. "Então
o Senhor enviou Jerubaal, e Baraque, e Jefté, e
Israel tem sido complicada por um debate Samuel; e vos livrou da mão de vossos inimigos
sobre as implicações teológicas de um em redor, e habitastes em segurança. lzQuando
sistema monárquico dentro do estado isra vistes que Naâs, rei dos filhos de Amom, vinha
elita. Embora ambos os lados da questão contra vós, dissestes-me: Não, mas reinará sobre
nós um rei; entretanto, o Senhor vosso Deus era
sejam refletidos no registro bíblico, o ponto o vosso Rei. 13Agora, eis o rei que escolhestes e
de vista do autor nunca esteve em questão. que pedistes; eis que o Senhor tem posto sobre vós
Ele considerava o sistema teocrático sob um rei. 14Se temerdes ao Senhor, e o servirdes, e
a antiga liga tribal como a estrutura polí derdes ouvidos à sua voz, e não fordes rebeldes
tica legítima de Israel. A monarquia às suas ordens, e se tanto vós como o rei que reina
sobre vós seguirdes o Senhor vosso Deus, bem está;
representava, na melhor das hipóteses, uma lsmas se não derdes ouvidos à voz do Senhor, e
concessão de Deus ante a dureza do coração fordes rebeldes às suas ordens, a mão do Senhor
do povo. será contra vós, como foi' contra vossos pais.
No entanto, após a vitória de Saul sobre 16Portanto ficai agora aqui, e vede esta grande
coisa que o Senhor vai fazer diante dos vossos olhos.
os amonitas, a monarquia tomou-se um fato 17Não é hoje a sega do trigo? clamarei, pois, ao
estabelecido. Reis e dinastias podiam ser Senhor, para que ele envie trovões e chuvas; e sabe
mudados, mas a instituição em si não estava reis e vereis que é grande a vossa maldade, que
52
fizestes perante o Senhor, pedindo para vós um rei. 3) Samuel Promete Orações (12.19-25)
18Então invocou Samuel ao Senhor, e o Senhor
enviou naquele dia trovões e chuva; pelo que todo 19Disse todo o povo a Samuel: Roga pelos teus
o povo temeu sobremaneira ao Senhor e a Samuel. servos ao Senhor teu Deus, para que não morramos;
porque a todos os nossos pecados temos acrescen
Samuel havia-se defendido como um tado este mal, de pedirmos para nós um rei.
administrador do sistema legal de Israel, 20Então disse Samuel at> povo: Não temais; vós
mas não fez qualquer reivindicação como fizestes todo este mal; porém não vos desvieis de
lídqr militar à maneira de Gideão ou Sansão. seguir ao Senhor, mas servi-o de todo o vosso
coraçãa 21Não vos desvieis; porquanto seguiríeis
Issó levou Samuel ao que talvez fosse a mais coisas vãs, que nada aproveitam, e tampouco vos
séria crítica à antiga liga tribal: ela tinha livrarão, porque .são vãs. 22Pois o Senhor, por
sido incapaz de unir a nação e, como resul causa do seu grande nome, não desamparará o seu
tado, Israel fora deixado à mercê de seus povo; porque aprouve ao Senhor fazer de vós o seu
povo. 23E quanto a mim, longe de mim esteja o
inimigos. pecar contra o Senhor, deixando de orar por vós;
Tal acusação contra a direção de Deus eu vos ensinarei o caminho bom e direita 24T3o-
(cf. v. 12) foi, contudo, vista como uma -somente temei ao Senhor, e servi-o fielmente de
incompreensão dos princípios sobre os quais todo o vosso coração, pois vede quão grandiosas
o Senhor baseava seu envolvimento na coisas vos fez. 25Se, porém, perseverardes em fazer
o mal, perecereis, assim vós como o vosso rei.
história humana. Samuel recapitulou os
pontos altos da história israelita para O povo de Israel temia que sua indepen
demonstrar mais uma vez o plano de Deus dência, ao solicitar um rei, resultaria em
no trato com seu povo. Seguindo o mesmo sua rejeição final pelo Senhor. Samuel
esquema básico de raciocínio que se assegurou-lhes que somente a rebelião
encontra em Josué e Juizes, Samuel revelou contínua poderia separá-los do cuidado de
que Israel era entregue a um opressor Deus. Por causa do seu grande nome, isto
estrangeiro quando o povo pecava. Quando, é, simplesmente porque o Senhor é quem
porém, se arrependiam, o Senhor era fiel é, não despedirá seu povo arbitrariamente.
e logo enviava seus libertadores escolhidos: Deus livremente decidiu abrir-se para uma
Jerubaal, Baraque, Jefté e até o próprio comunhão especial com Israel. O povo
Samuel. Assim, a crise precipitada pelo podia interromper essa comunhão ao
ataque de Naás contra Jabes-Gileade buscar coisas vãs, que nada aproveitam, mas
deveria ter induzido Israel a arrepender-se o caminho estaria sempre aberto para eles
de seus pecados. Em vez disso o povo pediu retornarem ao Senhor.
um rei. Como prova adicional de que suas Também o povo temia que Samuel se
ações constituíam uma rebelião contra a retirasse, deixando de ser seu conselheiro
liderança divina, Samuel suplicou por uma espiritual, uma vez que haviam rejeitado
tempestade de trovões na época da colheita, seu conselho quanto ao reino. Ele, porém,
época em que esses fenômenos não eram prometeu continuar como intercessor em
comuns. O povo reconheceu sua culpa e favor deles em oração e como seu guia no
permaneceu reverente diante do Senhor e caminho bom e direito. Um homem menos
de Samuel. altruísta teria se revelado amargurado, acar
No entanto, por mais errado que Israel retando assim sua própria rejeição como
possa ter sido ao solicitar um rei, o Senhor instrumento da graça de Deus.
concedeu liberdade para estabelecerem a
monarquia. Por seu profeta Samuel, ele
comprometeu-se a operar mediante o novo 5. Israel Conquista a Independência
chefe de estado da mesma maneira como, (13.1—14.52)
no passado, havia feito mediante os juizes. 1) Começa a Guerra de Libertação
Se o povo aceitasse a direção do Senhor, (13.1-15a)
tudo iria bem. Caso contrário, então ele iria 'Saul tinha... anos de idade quando começou
punir tanto o povo quanto o rei. a reinar; e tendo reinado dois anos sobre Israel,
53
2escolheu para si três mil homens de Israel; dois sua estabilidade mental. Os detalhes dessas
mil estavam com Saul em Micmás e no monte de duas lutas não são conhecidos com maior
Betei, e mil estavam com Jônatas em Gibeá de exatidão, mas, sem dificuldade, pode-se
Benjamim. Quanto ao resto do povo, mandou-o cada
um para sua tenda. 3Ora, Jônatas feriu a guar perceber suas linhas gerais.
nição dos filisteus que estavam em Geba, o que os Saul tinha (...) anos de idade. Este tipo
filisteus ouviram; pelo que Saul tocou a trombeta de fórmula introdutória, comum nos livros
por toda a terra, dizendo: Ouçam os hebreus. dos Çeis, é aqui usada em reconhecimento
4Então todo o Israel ouviu dizer que Saul ferira
a guarnição dos filisteus, e que Israel se fizera do fato de que o reinado de Saul começa
abominável aos filisteus. E o povo foi convocado propriamente neste ponto. É incomum,
após Saul em Gilgal. SE os filisteus se ajuntaram contudo, que tanto a idade como a duração
para pelejar contra Israel, com trinta mil carros, de seu reinado estejam faltando no texto
seis mil cavaleiros, e o povo em multidão como a
4reia que está à beira do mar; subiram e se acam hebraico. O numeral dois diz respeito à
param em Micmás, ao oriente de Bete-Áven. duração de seu reinado, mas aparece numa
'’Vendo, pois, os homens de Israel que estavam em tal posição que sugere que um outro núme
aperto (porque o povo se achava angustiado), ro foi omitido (“Saul tinha (...) anos de ida
esçonderam-se nas cavernas, nos espinhais, nos
penhascos, nos esconderijos subterrâneos e nas
de quando começou a reinar, e reinou (...)
cisternas. 7Ora, alguns dos hebreus passaram o e dois anos sobre Israel. Saul escolheu três
Jordão para a terra de Gade e Gileade; mas Saul mil homens de Israel”; v. 1,2a). A referência
ficou ainda em Gilgal, e todo o povo o seguia em Atos 13.21 a um reinado de quarenta
tremenda 8Esperou, pois, sete dias, até o tempo anos de Saul reflete uma tradição bem
que Samuel determinara; não vindo, porém, Samuel
a Gilgal, o povo, deixando a Saul, se dispersava. antiga, mas que não se fundamenta sobre
’Então disse Saul: Trazei-me aqui um holocausto, qualquer texto do Antigo Testamento.
e ofertas pacificas. E ofereceu o holocausto. 10Mal Israel passava por terríveis dificuldades
tinha ele acabado de oferecer o holocausto, eis que
Samuel chegou; e Saul lhe saiu ao encontro, para
quando Saul assumiu o cargo. O povo
o saudar. "Então perguntou Samuel: Que fizeste? enfrentava uma prèssão tão forte por parte
Respondeu Saul: Porquanto via que o povo, dos filisteus no ocidente que os territórios
deixando-me, se dispersava, e que tu não vinhas transjordânicos podiam ser atacados por
no tempo determinado, e que os filisteus já se tinham amonitas nômades (11.1-11). Os filisteus
ajuntado em Micmás, 12eu disse: Agora descerão
os filisteus sobre mim a Gilgal, e ainda não apla controlavam a Palestina com guarnições
quei o Senhor. Assim me constrangi e ofereci o locais tal como a de Geba, a menos de onze
holocausto. 13Então disse Samuel a Saul: Proce quilômetros a norte-nordeste de Jerusalém,
deste nesciamente; não guardaste o mandamento mas tinham completa liberdade de movi
que o Senhor teu Deus te ordenou. O Senhor teria mento por todo o país. Os filisteus
confirmado o teu reino sobre Israel para sempre;
14agora, porém, não subsistirá o teu reino; já tem empregavam Micmás como sua própria
o Senhor buscado para si um homem segundo o base pouco depois de ter sido utilizada como
seu coração, e já o tem designado para ser príncipe um acampamento israelita. Ainda mais
sobre o seu povo, porquanto não guardaste o que importante era o total embargo de armas
o Senhor te ordenou. 15Então Samuel se levantou,
e subiu de Gilgal a Gibeá de Benjamim.
pelos filisteus no território ocupado por
Israel. Só recentemente armas de ferro
Muitos dos detalhes da guerra de inde haviam entrado em uso no antigo Oriente
pendência de Israel são vagos e incertos, Médio, e os filisteus mantinham controle
mas dois fatos claramente se destacam. Já dos segredos de sua forja (13.19 e s.) Assim,
desde o início do reinado de Saul propria as primerias batalhas de Saul foram sobre
mente dito sobre Israel, ele defrontou dois tudo ataques-relâmpagos, levados a cabo
conflitos principais: um contra seus domi por soldados civis mal equipados.
nadores filisteus, e o outro contra Samuel, A primeira vitória de Israel em sua
o homem de Deus. O primeiro iria, no final, guerra de independência foi conquistada
custar a vida de Saul, e o último contri não por Saul, mas por Jônatas, que somente
buiria para que, mais cedo ainda, perdesse mais tarde foi identificado como filho do
54
rei (13.16). Como comandante de mil trono era realmente seu. Muito possivel
homens, derrotou a pequena guarnição em mente ele temia que a combinação de
Geba e, com seu ato, enraiveceu os filisteus autoridade civil e religiosa finalmente
e despertou o coração de seus concidadãos levasse a uma situação em que a prática
para a liberdade. Quando um enorme exér religiosa seria considerada simplesmente
cito foi enviado para abafar a insurreição, como outro negócio de estado. Fossem quais
suas tropas se dispersaram para buscar fossem os fatores envolvidos, o autor deste
refúgio no território escarpado das proxi material estava firmemente convencido de
midades. que a quebra da comunhão entre o rei e
Nesse entretempo, Saul estava reunindo seu conselheiro religioso ocorrera bem cedo
uma força maior em Gilgal. Confrontado no reinado de Saul.
pelo exército filisteu muitas vezes maior, 2) Descrição das Condições da Guerra
sua própria posição era extremamente (13.15b-23)
precária. O moral dos soldados civis sob
15Saul contou o povo que se achava com ele, cerca
seu comando ia rapidamente se deterio de seiscentos homens. 16E Saul, seu filho Jônatas
rando à medida que chegavam notícias de e o povo que se achava com eles, ficaram em Gibeá
contramedidas dos filisteus. As deserções de Benjamim, mas os filisteus se tinham acampado
constantemente aumentavam, e, mesmo em Micmás. l7Nisso os saqueadores saíram do
aquelas tropas que permaneciam, não se arraial dos filisteus em três companhias: uma das
dispunham a engajar-se em batalha até que companhias tomou o caminho de Ofra para a terra
de Suai, 18outra tomou o caminho de Bete-
se realizassem os devidos rituais religiosos -Horom, e a outra tomou o caminho do termo que
(Dt 20.1-20; 23; cf. ISm 21.4,5). Após dá para o vaie de Zeboim, na direção do deserta
esperar por Samuel os sete dias prescritos 19Ora, em toda a terra de Israel não se achava um
(ISm 10.8), Saul decidiu resolver ele mesmo só ferreiro; porque os filisteus tinham dito: Não
façam os hebreus para si nem espada nem lança.
a questão, oferecendo os sacrifícios prepa 20PeIo que todos os israelitas tinham que descer
ratórios. Quando Samuel finalmente aos filisteus para afiar cada um a sua relha, a sua
chegou ao acampamento, indicou que Saul enxada, o seu machado e o seu sacha 21Tinham
seria rejeitado como rei por seu ato presun porém limas para os sachos, para as enxadas, para
as forquilhas e para os machados, e para consertar
çoso. as aguilhadas. 22Assim, no dia da peleja, não se
Sérios conflitos claramente existiam achou nem espada nem lança na mão de todo o
entre Saul e Samuel desde os primórdios povo que estava com Saul e com Jônatas; acharam-
da monarquia, sem estarem claros os reais -se, porém, com Saul e com Jônatas seu filha 23E
saiu a guarnição dos filisteus para o desfiladeiro
motivos de suas divergências. Samuel de Micmás.
simplesmente disse que Saul não havia guar
dado o mandamento que o Senhor lhe As terríveis condições que a combativa
ordenara. A transgressão de Saul tem sido monarquia israelita defrontava são breve
costumeiramente interpretada como uma mente sumariadas. Saul, com somente
violação da função sacerdotal de oferecer seiscentos de seus três mil soldados iniciais,
sacrifício (Lv 14.20). Por outro lado, sabe- mudou-se de Gilgal para Geba, uma forta
se de outros não levitas que ofereceram leza natural logo em frente do posto
sacrifício sem incorrer na ira divina (Jz avançado dos filisteus em Micmás. Com
6.25,26; ISm 13.9; lRs 18.30 e s.) suas forças superiores, os filisteus enviavam
Talvez Saul tivesse violado acordos feitos bandos de atacantes para devastar os terri
em seus primeiros contatos com Samuel. tórios de que os guerrilheiros israelitas
“Esperarás sete dias até que eu vá ter precisavam para obter suprimentos. Saul
contigo e te declare o que hás de fazer” só era capaz de impedir que os inimigos
(10.8). Talvez Samuel suspeitasse que o rei penetrassem o país até o sul, onde estava
abrigasse uma disposição indevida de sua maior força. Mesmo ali, contudo, seus
dispensar a orientação divina, agora que o seguidores estavam em nítida desvantagem
55
devido ao estrito controle dos filisteus na de Israel. 19E sucedeu que, estando Saul ainda
falando com o sacerdote, o alvoroço que havia no
manufatura de instrumentos e armas de arraial dos filisteus ia crescendo muito; pelo que
ferro. Os israelitas, entretanto, eram espe disse Saul ao sacerdote: Retira a tua m ãa 20Então
cialistas na arte de guerra de guerrilhas. Saul e todo o povo que estava com ele se reuniram
e foram à peleja; e eis que dentre os filisteus a espada
3) Israel Alcança Vitória (14.1-23) de um era contra o outro, e houve mui grande
derrota.21Os hebreus que estavam dantes com os
'Sucedeu, pois, um dia, que Jônatas, filho úe
filisteus, e tinham subido com eles ao arraial,
Saul, disse ao seu escudeiro: Vem, passemos à guar também se ajuntaram aos israelitas que estavam
nição dos filisteus, que está do outro lado. Mas com Saul e Jônatas. 22E todos os homens de Israel
não o fez saber a seu pai. 2Ora, Saul estava na que se haviam escondido na região montanhosa
extremidade de Gibeá, debaixo da romeira que havia de Efraim, ouvindo que os filisteus fugiam, também
em Migrom; e o povo que estava com ele era cerca os perseguiram de perto na peleja. 23Assim o
de seiscentos homens; Je Aíja, filho de Aütube,
Senhor livrou a Israel naquele dia, e a batalha
irmão de Icabô, filho de Finéias, filho de Eli, sacer passou além de Bete-Áven.
dote do Senhor em Siló, trazia o éfode. E o povo
não sabia que Jônatas tinha ida 4Ora, entre os Nos dias de hoje a guerra de guerrilhas
desfiladeiros pelos quais Jônatas procurava chegar difere da do antigo Oriente Médio num
à guarnição dos filisteus, havia um penhasco de
um e de outro lado; o nome de um era Bozez, e aspecto importante. Na ausência de explo
o nome do outro Sené. 5Um deles estava para o sivos e outros armamentos mais recentes,
norte defronte de Micmás, e o outro para o sul pequenas forças podiam, com êxito,
defronte de Gibeá. 6Disse, pois, Jônatas ao seu defender com relativa facilidade cidadelas
escudeiro: Vem, passemos à guarnição destes incir-
cuncisos; porventura operará o Senhor por nós,
localizadas em posições bem situadas.
porque para o Senhor nenhum impedimento há de Assim chegou-se a um impasse com a guar
livrar com muitos ou com poucos. 7Ao que o seu nição filistéia em Micmás, Jônatas com um
escudeiro lhe respondeu: Faze tudo o que te pequeno contingente em Geba, e Saul com
aprouver; segue, eis-me aqui contigo para o que cerca de seiscentos israelitas numa locali
quiseres. 8Disse Jônatas: Eis que passaremos
àqueles homens, e nos descobriremos a eles.9Se dade próxima de Migrom. Micmás e Geba
nos disserem: Parai até que cheguemos a vós; então estão separadas uma da outra cerca de três
ficaremos no nosso lugar, e não subiremos a eles. quilômetros, e localizadas em lados opostos
I0Se, porém, disserem: Subi a nós; então subi de uma íngreme ravina rochosa chamada
remos, pois o Senhor os entregou em nossas mãos;
isso nos será por sinal. “Então ambos se desco
Wadi Suweinit. Os filisteus, novamente a
briram à guarnição dos filisteus, e os filisteus força mais forte, foram capazes de estabe
disseram: Eis que já os hebreus estão saindo das lecer um posto avançado no próprio
cavernas em que se tinham escondida l2E os desfiladeiro (13.23).
homens da guarnição disseram a Jônatas e ao seu Jônatas viu nesse posto uma situação
escudeiro: Subi a nós, e vos ensinaremos uma coisa.
Disse, pois, Jônatas ao seu escudeiro: Sobe atrás que poderia transformar-se em vantagem
de mim, porque o Senhor os entregou na mão de para Israel. O terreno escarpado ao redor
Israel. 13Então trepou Jônatas de gatinhas, e o seu impedia sua captura por uma força de
escudeiro atrás dele; e os filisteus caíam diante de grandes proporções, mas a ausência de forti
Jônatas, e o seu escudeiro os matava atrás dele.
l4Esta primeira derrota, em que Jônatas e o seu
ficações abria a possibilidade de que pudesse
escudeiro mataram uns vinte homens, deu-se dentro ser tomada de surpresa. Respondendo a um
de meia jeira de terra. 15Pelo que houve tremor no sinal divino (v. 9,10), Jônatas foi convidado
arraial, no campo e em todo o povo; também a a avançar pelos filisteus, que foram enga
própria guarnição e os saqueadores tremeram; e nados por sua aproximação aberta e pela
até a terra estremeceu; de modo que houve grande
pânica I601haram, pois, as sentinelas de Saul em presença de somente dois homens. Após
Gibeá de Benjamim, e eis que a multidão se derretia, escalar com dificuldade a face da escarpa,
fugindo para cá e para lá. 17Disse então Saul ao Jônatas e seu escudeiro caíram sobre os
povo que estava com ele: Ora, contai e vede quem guardiões do posto tão subitamente que os
é que saiu dentre nós. E contaram, e eis que nem
Jônatas nem o seu escudeiro estavam ali. ISEntão
filisteus não tiveram oportunidade de valer-
Saul disse a Aíja: Traze aqui a arca de Deus. Pois se de sua superioridade numérica dentro
naquele dia estava a arca de Deus com os filhos dos limites de seu posto no alto da colina.
56
Logo estavam mortos vinte homens, e Israel suas forças. Rapidamente a batalha ganhou
havia ultrapassado outro marco em sua ímpeto, e, logo, até simpatizantes dos filis
viagem de volta rumo à liberdade. teus e antigos desertores israelitas foram
A esta altura, dois detalhes nesta história atraídos de volta para lutar ao lado de Saul.
são especialmente dignos de nota. Primeiro,
Jônatas, não Saul, obteve as duas primeiras 4) Vitória Interrompida (14.24-46)
vitórias dramáticas na guerra de libertação ^Ora, os homens de Israel estavam já exaustos
de Israel. Este conhecimento bem pode ter naquele dia, porquanto Saul conjurara o povo,
propiciado um argumento àqueles que, por dizendo: Maldito o homem que comer pão antes
outras razões, opunham-se ao reinado de da tarde, antes que eu me vingue de meus inimigos.
Saul. Em segundo lugar, de conformidade Pelo que todo o povo se absteve de comer. 25Mas
todo o povo chegou a um bosque, onde havia mel
com a teologia da antiga liga tribal, Jônatas à flor da terra. 26Chegando, pois, o povo ao
atribuiu totalmente ao Senhor o sucesso bosque, viu correr o mel; todavia ninguém chegou
de toda a sua ação militar. Como ele a mão à boca, porque o povo temia a conjuração.
ressaltou, para o Senhor nenhum impedi 27Jônatas, porém, não tinha ouvido quando seu pai
conjurara o povo; pelo que estendeu a ponta da
mento há de livrar com muitos ou com vara que tinha na mão, e a molhou no favo de mel;
poucos. A súbita agitação causada pelo e, ao chegar a mão à boca, aclararam-se os olhos.
ataque de Jônatas pôs em confusão toda 28Então disse um do povo: Teu pai solenemente
a força dos filisteus. O resultado do assalto conjurou o povo, dizendo: Maldito o homem que
comer pão hoje. E o povo ainda desfalecia. 29Pelo
surpreendeu até mesmo os atacantes, que que disse Jônatas: Meu pai tem turbado a terra;
ficaram igualmente chocados com a repen ora vede como se me aclararam os olhos por ter
tina mudança de sorte dos filisteus. provado um pouco deste mel. 30Quanto maior não
Certamente aquilo era uma reviravolta de teria sido a derrota dos filisteus se o povo hoje ti
“tremer o mundo”. vesse comido livremente do despojo, que achou de
seus inimigos? "Feriram, contudo, naquele dia aos
Enquanto o ataque inicial de Jônatas filisteus, desde Micmás até Aijalom. E o povo des
ainda estava em andamento, vigias no faleceu em extremo; 32então o povo se lançou ao
acampamento de Saul perceberam a despojo, e tomou ovelhas, bois e bezerros e,
confusão da batalha e levaram as notícias degolando-os no chão, comeu-os com sangue. 33E
para seu líder. Um rápido exame de suas o anunciaram a Saul, dizendo: Eis que o povo está
pecando contra o Senhor, comendo carne com o
tropas revelou que até ali somente Jônatas sangue. Respondeu Saul: Procedestes deslealmente.
e seu escudeiro estavam envolvidos na esca Trazei-me aqui já uma grande pedra. 34Disse mais
ramuça. Saul teria agora de decidir quanto Saul: Dispersai-vos entre o povo, e dizei-lhes: Tra
ao envolvimento de sua força principal zei-me aqui cada um o seu boi, e cada um a sua
ovelha, e degolai-os aqui, e comei; e não pequeis
nessa luta. A princípio ele buscou a orien contra o Senhor, comendo com sangue. Então todo
tação divina a respeito. O texto hebraico povo trouxe de noite, cada um o seu boi, e os dego
assinala a presença da arca de Deus laram ali. 35Então edificou Saul um altar ao
enquanto antigas traduções gregas referem- Senhor; este foi o primeiro altar que ele edificou
ao Senhor. ^Depois disse Saul: Desçamos de noite
-se ao éfode de Aíja. Qualquer dessas atrás dos filisteus, e despojemo-los, até o amanhe
possibilidades é viável uma vez que tanto cer, e não deixemos deles um só homem. E o povo
a arca (Jz 20.27; cf. lRs 2.26) quanto o éfode disse: Faze tudo o que parecer bem aos teus olhos.
(ISm 23.9-12; 30.7,8) estavam associados Disse, porém, o sacerdote: Cheguemo-nos aqui a
com o Urim e o Tumim, que eram empre Deus. 37Então consultou Saul a Deus, dizendo:
Descerei atrás dos filisteus? entregá-los-ás na mão
gados para determinar a vontade do Senhor de Israel? Deus, porém, não lhe respondeu naquele
(Ex 28.30). Seja como for, Saul interrompeu d ia .18Disse, pois, Saul: Chegai-vos para cá, todos
o sacerdote, cuja mão já estava estendida os chefes do povo; informai-vos, e vede em que se
para lançar sortes e assim descobrir a cometeu hoje este pecado; 39porque, como vive o
vontade de Deus. O intenso fragor da Senhor que salva a Israel, ainda que seja em meu
filho Jônatas, ele será m orta Mas de todo o povo,
batalha inspirou Saul a, de sua própria ninguém lhe respondeu. 40Disse mais a todo o
iniciativa, atacar os filisteus com todas as Israel: Vós estaris dum lado, e eu e meu filho
57
Jônatas estaremos do outra Então disse o povo ro, mas não houve resposta alguma. Agora,
a Saul: Faze o que bem parecer aos teus olhos. o ímpeto para lutar estava lamentavelmen
4IFalou, pois, Saul ao Senhor Deus de Israel: te perdido, e Saul exigiu com maior ênfase
Mostra o que é justa E Jônatas e Saul foram
tomados por sorte, e o povo saiu livre. 42Então saber quem fora culpado. Novamente os
disse Saul: Lançai a sorte entre mim e Jônatas, dados sagrados foram consultados e, por
meu filha E foi tomado Jônatas. 43Disse então fim, Jônatas foi sorteado. Ante a indaga
Saul a Jônatas: Declara-me o que fizeste: E Jôna ção do pai, Jônatas prontamente admitiu
tas lho declarou, dizendo: Provei, na verdade, um
pouco de mel com a ponta da vara que tinha na
que havia, sem o saber, transgredido a mal
mão; eis-me pronto a morrer.44Ao que disse Saul: dição de seu pai e declarou-se pronto a pa
Assim me faça Deus, e outro tanto, se tu, certa gar com a vida. A justiça inata do povo
mente, não morreres, Jônatas. 45Mas o povo disse prevaleceu, contudo, e nenhum mal foi
a Saul: Morrerá, porventura, Jônatas, que operou permitido sobre aquele cuja incursão vito
esta grande salvação em Israel? Tàl não suceda!
como vive o Senhor, não lhe há de cair no chão riosa tinha acarretado sucesso para Israel
um só cabelo da sua cabeça! pois com Deus fez naquele dia. O filho do rei foi resgatado,
isso hoje. Assim o povo livrou Jônatas, para que provavelmente com um sacrifício animal,
não morresse. 46Então Saul deixou de perseguir e o incidente foi encerrado com israelitas
os filisteus, e estes foram para o seu lugar.
e filisteus retornando a seus lugares.
Por grande que tenha sido a vitória de Não devemos, como leitores modernos,
Israel em Micmás, ela poderia ter sido ficar muito perturbados com indagações
ainda maior se não fosse o voto insensato teológicas após ler esta narrativa chocante.
de Saul. Em sua ânsia de perseguir os filis Na verdade, é precisamente em experiên
teus, Saul pronunciou uma maldição sobre cias como essas que identificamos os seve
qualquer que fizesse uma pausa antes do ros testes históricos em que a fé do Antigo
cair da noite, mesmo que fosse apenas para Testamento estava sendo refinada. Con
comer. Apesar de exaustos como se acha quanto os israelitas não fossem filósofos
vam devido à fúria da luta, o povo perma especuladores, eles encaravam honesta e
neceu fiel às instruções do rei, mesmo corajosamente os problemas de sua fé, e
quando encontraram mel silvestre nas este incidente proporciona um bom exem
matas por onde passavam. Somente Jônatas, plo de sua sensata perspectiva de vida.
que não estava ciente da maldição de seu Q antigo autor começou com um
pai, valeu-se do rico alimento que a natu conjunto de fatos aceitos: Israel iniciou a
reza concedia. guerra de independência com uma vitória
Quando a noite desceu, contudo, o povo espetacular, mas foi incapaz de manter o
caiu sobre o gado que havia tomado como ímpeto inicial. Ele então empregou uma
espólio e comeu sua carne sem esperar que percepção religiosa válida: Deus se envolve
o sangue fosse ritualmente drenado dela. na história e fortalece os braços daqueles
Assim consumiram o sangue, que era santo cuja causa é justa. Contudo, o escritor fica
ao Senhor e deveria ter sido derramado com um problema teológico. Fbr que Deus,
ao lado do altar por um sacerdote (Lv que havia concedido a primeira vitória,
17.10-15; 1.5). Quando Saul soube que não continuou arrasando com os filisteus?
haviam violado práticas religiosas da lei, A resposta-padrão e mais óbvia é qne
improvisou um altar para impedir viola alguém dentro das tropas de Israel havia
ções maiores da parte do povo. pecado e incorrido na ira divina (cf. Js 7).
Quando o povo se fartou, Saul estava O relato bíblico torna bastante claro que,
pronto para reencetar a perseguição aos fi nesse caso em particular, nenhuma das
listeus, até que um sacerdote sugeriu que personagens é completamente inocente.
o Senhor devia ser consultado primeiro. Saul havia entrado na batalha de Micmás
No que foi, sem dúvida, um longo proce sem terminar sua consulta em busca de-
dimento, o Senhor foi buscado o dia intei conselho divino (14.19). Também, no trans-
58
curso do combate, ele impulsivamente eram estes: o da mais velha Merabe, e o da mais
invocou uma maldição que privava seus nova Mical. 50O nome da mulher de Saul era
Ainoã, filha de Aünaaz; e o nome do chefe de seu
homens das energias necessárias para a exército, Abner, filho de Ner, tio de Saul. 51Quis,
perseguição dos inimigos. Igualmente, o filho de Saul, e Ner, pai de Abner, eram filhos de
povo como um todo havia incorrido em Abiel. 52E houve forte guerra contra os filisteus,
culpa ritual por ingerir indevidamente o por todos os dias de Saul; e sempre que Saul via
sangue de animais que matou para comer. algum homem poderoso e valente;, o agregava a si.
Por fim e sem tanta importância, havia
Jônatas que inadvertidamente quebrara o Este sumário do reinado de Saul é em
juramento de seu pai por comer um pouco pregado pelo autor bíblico para mostrar
de mel. que sua história sobre o primeiro rei de
Israel alcançava agora o clímax. Está para
Agora o antigo teólogo está pronto para
se transferir a atenção para Davi, a próxi
apresentar seu problema mais espinhoso.
O que se deve fazer quando o sorteio divi ma personagem principal no drama nacio
nal (Introdução, V, 1). Ainda haverá rela
no aponta alguém cuja ofensa parece ser
tos acerca de Saul; mas a partir deste ponto
a mais inócua, aliás, alguém que até esse
ponto tem sido o herói de Deus para a seu sucesso entra em declínio, enquanto o
de seu sucessor ganha brilho cada vez
ocasião? A despeito do amor paternal pelo maior.
filho, Saul estava preparado para executar
Jônatas devido a uma consciência de obri Até aqui, os principais esforços de Saul
foram gastos na tentativa de assegurar uma
gação diante de Deus. O povo, contudo,
sentiu que essa solução não refletiria transição suave de um sistema tribal para
adequadamente a justiça inerente à natu um sistema monárquico de governo em
meio a profundas alterações econômicas,
reza de Deus. Inconscientemente, eles se políticas e religiosas. Somente o inicio de
firmaram mais em sua percepção espiritual
inata do que em qualquer meio exterior de seu próprio reinado é apresentado com
maiores detalhes, mas o estabelecimento
compreensão da vontade divina. Recu-
saram-se a permitir que qualquer mal da monarquia e a sobrevivência da nação
viesse a seu herói, Jônatas, e decidiram que seguem de mãos dadas.
De fato, todo o reinado de Saul é avalia
ele devia ser resgatado. Esta prática de
substituir a vida de um homem pela de um do com base em suas realizações militares.
animal é conhecida em outros trechos, do Enumeram-se campanhas bem-sucedidas
contra Amom, Moabe e Edom, a oriente
Antigo Testamento, principalmente no
do Jordão, e contra os amalequitas, no
tocante ao resgate do primogênito (Ex
13.13; 34.20; cf. 21.18,30). A medida foi extremo sul. Pelo menos alguns contatos
com povos arameus são indicados por suas
aparentemente tomada para que não se
desafiasse abertamente a revelação feita batalhas contra os reis de Zobá. Os filis
teus, contudo, continuaram a perturbar
pelo sorteio divino, e ao mesmo tempo se
Israel por todos os dias de Saul e estavam
atendesse à causa da justiça.
novamente no controle da maior parte da
terra quando ele foi morto na batalha do
5) Sinopse do Reinado de Saul (14.47-52) monte Gilboa.
47Tendo Saul tomado o reino sobre Israel,
Saul também se destacou por suas
pelejou contra todos os seus inimigos em redor: inovações na organização militar de Israel.
contra Moabe, contra os filhos de Amom, contra A antiga liga tribal não mantinha um exér
Edom, contra os reis de Zobá e contra os filisteus; cito regular, mas em vez disso utilizavam
e, para onde quer que se voltava, saía vitoriosa uma milícia convocada dentre as tribos que
‘‘‘Houve-se valorosamente, derrotando os amale-
q uitas, e libertando Israel da mão dos que o a constituiam. Saul continuava a depender
saqueavam. 49Ora, os filhos de Saul era Jônatas, grandemente de um exército convocado na
Isvi e Malquisua; os nomes de suas duas filhas hora de necessidade, mas foi o pioneiro no
59
desenvolvimento de uma liderança profis Segundo o arranjo global do material
sional treinada. Assim, quando quer que nos livros de Samuel, este capítulo, que tra
visse um homem com destacada habilidade ta da rejeição de Saul como rei, é realmente
natural, o agregava a si. parte da história da ascensão de Davi ao
Mesmo nesses breves relatos do reinado poder (Introdução, V, 1). Como se pela
de Saul, somos capazes de ver nele uma primeira vez (cf. 13.1-15), as razões para a
das grandes figuras trágicas do Antigo Tes rejeição de Saul são rememoradas. Neste
tamento. Suas realizações foram consi capítulo Saul é condenado por seu fracasso
deráveis, contudo outros homens continua em seguir a instrução divina.
mente faziam-lhe sombra nas afeições do Novamente o palco para o incidente é
povo (18.7). Ele era um homem religioso uma guerra envolvendo Israel. Desta vez,
por natureza (10.10; 14.44), contudo foi contudo, o conflito é precipitado não por
finalmente rejeitado pelo Senhor, que o pressões exteriores sobre o estado hebreu,
havia escolhido para ser rei. Foi uma im mas por uma guerra de retaliação. O Se
portante figura militar, mas Davi foi nhor pedira o total aniquilamento dos
maior. Todavia, quaisquer que possam ter amalequitas por sua oposição a Israel
sido suas deficiências, ele ajudou a prepa durante a conquista (Ex 17.8-16; Nm 14.45;
rar a nação para enfrentar os anos à frente. Dt 25.17-19). Essas pessoas pertenciam a
um pouco coeso grupo de nômades do
III. Ascensão e Reinado de Davi deserto meridional, que continuamente
(ISm 15.1—2Sm 8.18) realizava ataques à fronteira judaica.
1. Saul Rejeitado Como Rei (15.1-35) Esse aniquilamento era “guerra santa”
do tipo apropriadamente associado com a
1) Saul Transgride a Ordem de Deus (15.1-9) antiga liga tribal e posta em prática sobre
tudo durante a conquista de Canaã. Num
'Disse Samuel a Saul: Enviou-me o Senhor a
ungir-te rei sobre o seu povo, sobre Israel; ouve, tal tipo de guerra, o inimigo e todos os seus
pois, agora as palavras do Senhor. 2Assim diz o bens eram postos sob interdição (cherem),
Senhor dos exércitos: Castigarei a Amaleque por isto é, nenhum despojo se deveria tomar
aquilo que fez a Israel quando se lhe opôs no do inimigo derrotado. Todas as pessoas e
caminho, ao subir ele do Egito. 3Vai, pois, agora
e fere a Amaleque, e o destrói totalmente com tudo
animais deviam ser mortos, e todos os bens
o que tiver; não o poupes, porém matarás homens de valor deviam ser queimados em consa
e mulheres, meninos e crianças de peito, bois e gração ao Senhor (Js 6.17,21).
ovelhas, camelos e jumentos. 4Então Saul
convocou o povo, e os contou em Telaim, duzentos A destruição total do inimigo e seus
mil homens de infantaria, e mais dez mil dos de bens teoricamente removia todos os moti
Judá. 5Chegando, pois, Saul à cidade de vos de ganho pessoal, e os que participa
Amaleque, pôs uma emboscada no vale. f'E disse vam na batalha lutavam somente para a
Saul aos queneus: Ide, retirai-vos, saí do meio dos
amalequitas, para que eu não vos destrua junta
glória de Deus. Na realidade, porém, po
mente com eles; porque vós usastes de misericórdia dem continuar existindo muitas conside
com todos os filhos de Israel, quando subiram do rações de ordem prática. Na batalha de
Egito. Retiraram-se, pois, os queneus do meio dos Saul contra os amalequitas, por exemplo,
amalequitas. 7Depois Saul feriu os amalequitas o conceito de “guerra santa”, que estava
desde Havilá até chegar a Sur, que está defronte
do Egito. 8E tomou vivo a Agague, rei dos amale associado com a antiga tribal, poderia ter
quitas, porém a todo o povo destruiu ao fio da ajudado a obter apoio para Saul entre os
espada. 9Mas Saul e o povo pouparam a Agague, que ainda favoreciam aquele sistema polí
como também ao melhor das ovelhas, dos bois, e tico. Igualmente, o povo de Judá foi atraí
dos animais engordados, e aos cordeiros, e a tudo
o que era bom, e não os quiseram destituir total do para mais perto de Israel com a ajuda
mente; porém a tudo o que era vil e desprezível de Saul em subjugar seus problemáticos
destruíram totalmente. vizinhos ao sul.
60
O ataque de Saul contra a cidade de respondeu Saul a Samuel: Pelo contrário^ dei
Amaleque provavelmente não deve ser ouvidos à voz do Senhor, e caminhei no caminho
considerado um cerco a uma cidade em pelo qual o Senhor me enviou, e trouxe a Agague,
rei de Amaleque, e aos amalequitas destruí total
particular. Uma vez que esse povo era mente; 21mas o povo tomou do despojo ovelhas e
nômade, não dispondo de cidades muradas bois, o melhor do anátema, para o sacrificar ao
tais como as que eram comuns em outras Senhor teu Deus em Gilgal. 22Samuel, porém,
partes da Palestina, parece mais provável disse: Tem, porventura, o Senhor tanto prazer em
holocaustos e sacrifícios, como em que se obedeça
que os israelitas mandaram dizer aos à voz do Senhor? Eis que o obedecer é melhor do
queneus que se retirassem de território que o sacrificar, e o atender, do que a gordura de
amalequita (v. 6) antes de começarem uma carneiros. “ Porque a rebelião é como o pecado de
série de ataques e emboscadas contra os adivinhação, e a obstinação é como a iniqüidade
campos inimigos (v. 5). Obviamente» nem de idolatria. Porquanto rejeitaste a palavra do
Senhor, ele também te rejeitou a ti, para que não
todos os amalequitas foram aniquilados, sejas rei.
uma vez que Davi continuou a combatê-
los durante sua fuga de diante de Saul Parece que Saul estava tentando obter
(30.1). algum benefício pessoal duma expedição
que fora empreendida como uma “guerra
O relato bíblico está menos preocupado santa”. Conquanto o Senhor merecesse
com os detalhes da campanha do que com louvor por vencer as batalhas de Israel
sua conclusão: Saul fracassou em pautar-
se segundo a interdição Ele poupou o rei (14.6), Saul erigiu um monumento para si
e o melhor do gado, e, quando sua seleti próprio no Carmelo (logo ao sul de
vidade foi mencionada, suas motivações Hebrom). Ele aparentemente também
tencionava divertir-se à custa de Agague,
imediatamente se tornaram suspeitas.
o rei amalequita, ou talvez empregá-lo para
demonstrar sua própria grandeza. Mesmo
2) Saul Rejeitado Como Rei (15.10-23)
o desejo de Saul por sacrificar em Gilgal
10Então veio a palavra do Senhor a Samuel, os animais seletos pode ter um motivo
dizendo: uArrependo-me de haver posto a Saul oculto. O povo podia participar de um sacri
como rei; porquanto deixou de me seguir, e não fício regular (veja comentário sobre 1.1-8),
cumpriu as minhas palavras. Então Samuel se
contristou, e clamou ao Senhor a noite toda. 1ZE mas não de animais separados sob o cherem.
Samuel madrugou para encontrar-se com Saul pela Para muitos leitores modernos a punição
manhã; e foi dito a Samuel: Já chegou Saul ao de Saul por violar o cherem (interdito) na
Carmelo, e eis que levantou para si uma coluna e, batalha contra Amaleque parece arbitrária
voltando, passou e desceu a Gilgal. BVeio, pois,
Samuel ter com Saul, e Saul lhe disse: Bendito sejas e irrefletida. Contudo, o belo salmo de
do Senhor; já cumpri a palavra do Senhor. 14Então Samuel ressalta a questão fundamental —
perguntou Samuel: Que quer dizer, pois, este balido obediência. Já se demonstrou que a alte
de ovelhas que chega aos meus ouvidos, e o mugido ração das regras do cherem por Saul
de bois que ouço? 15Ao que respondeu Saul: De envolvia julgamentos questionáveis. O que
Amaleque os trouxeram, porque o povo guardou
o melhor das ovelhas e dos bois, para os oferecer está aqui envolvido é muito mais do que
ao Senhor teu Deus; o resto, porém destruímo-lo uma cega conformidade a regulamentos
totalmente. 16Então disse Samuel a Saul: Espera, cultuais. As regras para o cherem não eram
e te declararei o que o Senhor me disse esta noite. mais invioláveis do que as para sacrifício
Respondeu-lhe Saul: Fala. 17Prosseguiu, pois,
Samuel: Embora pequeno aos teus próprios olhos, Saul foi condenado porque seus julga
porventura não foste feito o cabeça das tribos de mentos conflitavam com a vontade de Deus.
Israel? O Senhor te ungiu rei sobre Israel; I8e bem Na vida real, as decisões são inevitáveis,
assim te enviou o Senhor a este caminho, e disse: mas o homem tem responsabilidade derra
Vai, e destrói totalmente a estes pecadores, os amale deira por perceber a revelação divina. Saul
quitas, e peleja contra eles, até que sejam
aniquilados. I9Por que, pois, não deste ouvidos à teve negada uma dinastia duradoura por
voz do Senhor, antes te lançaste ao despojo, e fizeste causa de sua rebelião contra a direção de
o que era mau aos olhos do Senhor? 20Então Deus.
61
O anúncio do Senhor de sua rejeição de -me aqui a Agague, rei dos amalequitas. E Agague
Saul produziu reações incomuns em veio a ele animosamente; e disse: Certamente já
Samuel. Primeiro, ele ficou irado, e depois passou a amargura da morte. 33Disse, porém,
Samuel: Assim como a tua espada desfilhou a
clamou ao Senhor a noite toda. Os motivos mulheres, assim ficará desfilhada tua mãe entre
para essa reação de Samuel não são indi as mulheres. E Samuel despedaçou a Agague
cados, mas presumivelmente estava irado perante o Senhor em Gilgal. 34Então Samuel se
porque a obra em que havia investido tanto foi a Ramá; e Saul subiu a sua casa, a Gibeá de
Saul. 35Ora, Samuel nunca mais viu a Saul até o
de sua vida agora parecia repudiada. Sua dia da sua morte, mas Samuel teve dó de Saul. E
ira também pode ocultar temor causado o Senhor se arrependeu de haver posto a Saul rei
pela evidente contradição entre esses novos sobre Israel.
acontecimentos e o que ele havia entendido
Os problemas de personalidade de Saul,
como a vontade do Senhor até aquele que mais tarde se tornariam evidentes a
tempo. Seja qual for a explicação para sua todos, já estavam se manifestando na
ira, Samuel emergiu de uma noite angus- batalha contra Amaleque. À medida que
\ tiosa de oração pronto para defrontar Saul diminuía seu senso de segurança interior,
com o juízo do Senhor. Saul ia se tornando excessivamente preo
O lado trágico da personalidade de Saul
cupado com a opinião pública. Mesmo
vem novamente à tona pelo fato de ele
como rei, ele não estava disposto a resistir
parecer genuinamente não ter consciência aos desejos do povo. Estava também ansioso
de qualquer erro de sua parte no episódio por manter uma aparência de entrosamento
amalequita. Ele não hesitou em alegrar-se com Samuel após sua rejeição pelo Senhor
com a companhia de Samuel na jornada ter-se tornado definitiva. Conquanto essas
para Gilgal. Reivindicou o cumprimento
tensões interiores sejam compreensíveis à
da ordem do Senhor mesmo após ter ouvido
luz de sua luta inicial para estabelecer a
a condenação da parte de Samuel. Pode
monarquia, elas, não obstante, prejudi
também ter-se sentido livre de responsabi caram severamente sua capacidade de atuar
lidade quanto às ações do povo. Foi, como rei de Israel.
contudo, precisamente essa falta de julga
Como sinal exterior da rejeição, pelo
mento ético que mais severamente Senhor, de Saul como rei, Samuel realizou
questionou seu direito de governar. dois atos simbólicos. O primeiro tem a ver
com o rasgar a capa como sinal de que Deus
3) Samuel Abandona Saul (15.24-35) havia retirado o reino do controle de Saul.
Nossa tradução introduz um tom dramá
Z4Então disse Saul a Samuel: Pequei, por
quanto transgredi a ordem do Senhor e as tuas tico no versículo 27: E, virando-se Samuel
palavras; porque temi ao povo, e dei ouvidos à sua para se ir, Saul pegou-lhe pela orla da capa,
voz.25Agora, pois, perdoa o meu pecado, e volta a qual se rasgou. O texto hebraico, contudo,
comigo, para que eu adore ao Senhor. “ Samuel não contém o nome de Saul, e é Samuel
porém disse a Saul: Não voltarei contigo; por quem realiza o ato de simbolismo profético.
quanto rejeitaste a palavra do Senhor, e o Senhor
te rejeitou a ti, para que não sejas rei sobre Israel. O fato de Samuel se afastar de Saul, ocor
Z7E, virando-se Samuel para se ir, Saul pegou-lhe rido contra suas próprias inclinações
pela orla da capa, a qual se rasgou. Z8Então pessoais, também simboliza a retirada do
Samuel lhe disse: O Senhor rasgou de ti hoje o apoio do Senhor. Assim como o ardente
reino de Israel, e o deu a um teu próximo, que é
melhor do que tu. “ Tkmbéin aquele que é a Força apelo de Saul conseguiu um adiamento
de Israel não mente nem se arrepende, porquanto temporário da partida de Samuel, da mésma
não é homem para que se arrependa. 30Ao que forma Deus permitiu que Saul continuasse
disse Saul: Pequei; honra-me, porém, agora diante a reinar até sua morte; seus herdeiros é que
dos anciãos do meu povo, e diante de Israel, e volta
comigo, para que eu adore ao Senhor teu Deus.
sofreram o golpe de sua rejeição.
31Entãoi, voltando Samuel, seguiu a Saul, e Saul Na expressão a Força de Israel vemos
adorou ao Senhor. 3ZEntão disse Samuel: Trazei- o uso de uma descrição ou de um atributo
62
de Deus como substituto para o nome e vem; enviar-te-ei a Jessé o belemita, porque den
divino. Esta prática era especialmente tre os seus filhos me tenho provido de um rei.
2Disse, porém, Samuel: como irei eu? pois Saul o
comum no período final do Antigo Testa ouvirá e me matará. Então disse o Senhor: Leva
mento, quando os israelitas tomaram contigo uma bezerra, e dize: Vim, para oferecer
precauções especiais para não violarem o sacrifício ao Senhor. 3E convidarás a Jessé para
terceiro mandamento. o sacrifício, e eu te farei saber o que hás de fazer;
Na forma atual dos textos, há uma e ungir-me-ás a quem eu te designar. 4Fez, pois,
Samuel o que dissera o Senhor, e veio a Belém;
contradição patente entre o versículo 29 então os anciãos da cidade lhe saíram ao encontro,
e os versículos 11 e 35b. O problema parece tremendo, e perguntaram: Ë de paz a tua vinda?
ser precipitado pelo uso que o autor faz de sRespondeu ele: Ë de paz; vim oferecer sacrifício
termos denotando atividade humana ao Senhor. Santificai-vos, e vinde comigo ao sacri-
fício. E santificou ele a Jessé e a seus filhos, e os
mental ou emocional para referir-se a Deus. convidou para o sacrifício. 6E sucedeu que,
Surge a pergunta: Pode Deus mudar de entrando eles, viu a Eliabe, e disse: Certamente
“idéia”? É bem possível que um antigo está perante o Senhor o seu ungido. 7M as o
copista tenha incluído no corpo do texto Senhor disse a Samuel: Não atentes para a sua
comentários marginais contendo tais senti aparência, nem para a grandeza da sua estatura,
porque eu o rejeitei; porque o Senhor não vê como
mentos (cf. Nm 23.19). Por outro lado, um vê o homem, pois o homem olha para o que está
único autor pode ter reconhecido nessas diante dos olhos, porém o Senhor olha para o
declarações conflitantes um paradoxo da coração. 8Depois chamou Jessé a Abinadabe, e o
natureza divina. Qualquer declaração vis fez passar diante de Samuel, o qual disse: Nem
a este escolheu o Senhor. 9Então Jessé fez passar
ta isoladamente pode levar a uma com a Samá; Samuel, porém, disse: Ikmpouco a este
preensão errônea do caráter de Deus. escolheu o Senhor.10Assim fez passar Jessé a sete
Juntas representam uma idéia semelhante de seus filhos diante de Samuel; porém Samuel
àquela encontrada em Salmo 103.8,9: a disse a Jessé: O Senhor não escolheu a nenhum
paciência de Deus não é sem limites. Ele destes. “ Disse mais Samuel e Jessé: São estes
todos os teus filhos? Respondeu Jessé: Ainda falta
não se faz de surdo aos apelos do homem, o menor, que está apascentando as ovelhas. Disse,
mas é sempre fiel a seu próprio caráter. É pois, Samuel a Jessé: Manda trazê-lo^ porquanto
certo que, no final, haverá julgamento. não nos sentaremos até que ele venha aqui. 12Jessé
Em linguagem contemporânea não mandou buscá-lo e o fez entrar. Ora, ele era ruivo,
de belos olhos e de gentil aspecta Então disse o
diríamos abertamente que Saul atingira um Senhor: Levanta-te, e unge-o, porque é este mesma
ponto em que Deus não mais o perdoaria. 13Então Samuel tomou o vaso de azeite, e o ungiu
Contudo, sua rebelião tinha-se desenvolvido no meio de seus irmãos; e daquele dia em diante
tão completamente que sua vida teria de o Espírito do Senhor se apoderou de Davi. Depois
suportar os frutos das sementes que havia Samuel se levantou, e foi para Ramá.
plantado. A despeito da penitência de Saul, A atitude ambivalente de Samuel para
Samuel nada mais faria do que postergar com Saul é claramente demonstrada nesta
seu rompimento final com o rei. passagem. Até então a relutância de Sa
Samuel nunca mais viu a Saul até o dia muel em ungir Saul como rei havia sido
da sua morte. Isto provavelmente significa enfatizada e só ocasionalmente indícios
que Samuel retirou-se da vida oficial na haviam sido deixados sobre uma amizade
corte de Saul, uma vez que Saul aparente entre os dois homens (10.1,24; 15.10).
mente o visitou em Naiote (19.24). Contudo,
Neste contexto Samuel é levado a agir
o povo de Israel sabia, pelo afastamento de
tanto por afeição quanto por temor diante
Samuel, que o rei não mais desfrutava da de Saul.
confiança ou apoio do profeta. O Senhor interrompeu as reflexões de
2. Davi Ungido Futuro Rei (16.1-13) Samuel sobre a sorte do rei e ordenou que
'Então disse o Senhor a Samuel: Até quando
o profeta fosse a Belém para ungir o gover
terás dó de Saul, havendo-o eu rejeitado, para que nante que sucederia a Saul. O temor de
não reine sobre Israel? Enche o teu vaso de azeite, Samuel em incorrer na ira real indica quais
63
seriam as realidades políticas da época. A Jessé, Davi, foi trazido do trabalho de cui
influência do profeta repousava em seus dar das ovelhas de seu pai, Samuel recebeu
poderes de persuasão, e a influência do rei instrução para agir, pois aquele estava
repousava em seu contingente de soldados. destinado a ser o ungido do Senhor.
Para proteger tanto o profeta quanto o Com a unção por Samuel, daquele dia
recém-designado príncipe (nagid) de Israel, em diante o Espírito do Senhor se apode
Samuel foi instruído a associar sua busca rou de Davi. As manifestações exteriores
por um rei com uma peregrinação rotineira que acompanham essa ocorrência variam
a Belém. consideravelmente Diferentemente de San-
Até este ponto, nada na história expli são (Jz 14.19) e Saul (ISm 10.10,11; 19.23,
caria a atitude temerosa dos anciãos da 24), Davi não revelou formas violentas de
cidade perante Samuel. Possivelmente eles atividade como prova visível dessa expe
simplesmente ficaram tomados de respeito riência. Aparentemente a presença do
diante da visita de uma pessoa de proemi Espírito do Senhor na vida de Davi sim
nência nacional em sua aldeia. A veemência plesmente indicava que ele, daí em diante,
da reação deles sugere, contudo, que estava divinamente equipado para desem
questões mais poderosas estariam em jogo. penhar seu papel como rei de Israel.
Talvez, como imagina Hertzberg (p. 137),
os anciãos da cidade temiam verem-se envol 3. Davi Reúne-se à Corte de Saul
vidos na animosidade entre Samuel e Saul. (16.14—18.5)
Mais tarde a sorte dos habitantes de Nobe 1) Davi Torna-se Escudeiro de Saul
(22.11-19) indica que tal preocupação não (16.14-23)
teria sido sem motivo.
14Ora, o Espirito do Senhor retirou-se de Saul,
Samuel assegurou aos anciãos que suas e o atormentava um espírito maligno da parte do
intenções eram pacíficas e convidou-os a Senhor. 15Então os criados de Saul lhe disseram:
assistirem ao sacrifício juntamente com Eis que um espirito maligno da parte de Deus te
Jessé e seus filhos. O texto fala da consa atormenta; 16dize, pois, senhor nosso, a teus servos
gração dos participantes na cerimônia, que estão na tua presença, que busquem um homem
que saiba tocar harpa; e quando o espírito maligno
provavelmente por uma cerimônia de da parte do Senhor vier sobre ti, ele tocará com
lavagem, mas nada mais se diz sobre o a sua mão, e te sentirás melhor. 17Então disse Saul
próprio sacrifício. Claramente, a questão aos seus servos: Buscai-me, pois, um homem que
de maior interesse é a designação da esco toque bem, e trazei-mo. '“Respondeu um dos
lha do Senhor entre os filhos de Jessé. mancebos: Eis que tenho visto um filho de Jessé,
o belemita, que sabe tocar bem, e é forte e deste
A escolha de Davi entre seus irmãos faz mido, homem de guerra, sisudo em palavras, e de
lembrar da escolha de Saul, por sorteio, gentil aspecto; e o Senhor é com ele. '’Pelo que
dentre todas as tribos de Israel (10.17-24). Saul enviou mensageiros a Jessé, dizendo: Envia-
Eliabe, o filho mais velho de Jessé, causou -me Davi, teu filho, o que está com as ovelhas.
“ Jessé, pois, tomou um jumento carregado de pão,
impressão favorável em Samuel, mas não e um odre de vinho, e um cabrito, e os enviou a
foi escolhido pelo Senhor. As instruções de Saul pela mão de Davi, seu filha 21Assim Davi
Samuel para não considerar a estatura dos veio e se apresentou a Saul, que se agradou muito
candidatos em potencial parece indicar um dele e o fez seu escudeira 22Então Saul mandou
dizer a Jessé: Deixa ficar Davi ao meu serviço,
repúdio às qualificações pelas quais Saul pois achou graça aos meus olhos. 23E quando o
foi escolhido (10.23). A preocupação de espirito maligno da parte de Deus vinha sobre
Deus agora se concentrava nas qualidades Saul, Davi tomava a harpa, e a tocava com a sua
invisíveis de caráter, liderança e obediência. mão; então Saul sentia alívio^ e se achava melhor,
A dramaticidade do momento foi nova e o espírito maligno se retirava dele.
mente realçada pela ausência do escolhido A história da unção de Davi é seguida
do Senhor quando do acontecimento (cf. por dois relatos de sua admissão na corte
10.22). Quando o filho mais jovem de de Saul. O primeiro está ligado à habilida-
64
de de Davi como músico, e o outro, à sua 2) Davi Combate o Gigante (17.1—18.5)
vitória sobre Golias.
Após a rejeição de Saul como rei, o Es a. Golias Lança um Desafio (17.1-11)
pírito do Senhor o deixou e um espírito
'Ora, os filisteus ajuntaram as suas forças para
maligno da parte do Senhor veio sobre ele. a guerra e congregaram-se em Socó, que pertence
Conquanto Deus houvesse abençoado os a Judá, e acamparam éntre Socó e Azeca, em Efes-
esforços de Saul nos primeiros anos de seu -Damim. 2Saul, porém, e os homens de Israel se
reinado, o rei agora achava-se cada vez ajuntaram e acamparam no vale de Elá, e orde
naram a batalha contra os filisteus. 3Os filisteus
mais incapaz de agir com eficácia. Ele estavam num monte de um lado, e os israelitas
tornou-se sujeito a ataques em que sua estavam num monte do outro lado; e entre eles o
personalidade normal era “posta de lado”, vale. 4Então saiu do arraial dos filisteus um
e ele parecia motivado por um “espírito campeão, cujo nome era Golias, de Gate, que tinha
mau”. Esse espírito maligno estava asso de altura seis côvados e um palmo. SrD-azia na
cabeça um capacete de bronze, e vestia uma
ciado ao Senhor porque o antigo escritor couraça escameada, cujo peso era de cinco mil
não conseguia imaginar qualquer evento siclos de bronze. 6Tàmbém trazia grevas de bronze
importante ocorrendo à parte do controle nas pernas, e um dardo de bronze entre os ombros.
de Deus (cf. Is 45.7). Somente no pensa 7A haste da sua lança era como o órgão de um
tear, e a ponta da sua lança pesava seiscentos siclos
mento posterior do Antigo Testamento é de ferro; adiante dele ia o seu escudeira *Ele, pois,
que as possessões demoníacas foram intro de pé, clamava às fileiras de Israel e dizia-lhes: Por
duzidas como explicação para a origem do que saistes a ordenar a batalha? Não sou eu filisteu,
mal (lCr 21.1; cf. 2Sm 24.1). Num racio e vós servos de Saul? Escolhei dentre vós um
cínio análogo, os cristãos são advertidos a homem que desça a mim. 9Se ele puder pelejar
comigo e matar-me, seremos vossos servos; porém,
não atribuir as tentações do homem a se eu prevalecer contra ele e o matar, então
Deus (Tg 1.13-15). Hoje diríamos que Saul sereis nossos servos, e nos servireis. 10Disse mais
sofria de uma doença mental ou emo o filisteu: Desafio hoje as fileiras de Israel; dai-me
cional. um homem para que nós dois pelejemos. "Ouvin
do, então, Saul e todo o Israel estas palavras do
Saul foi convencido por membros de sua filisteu, desalentaram-se, e temeram muita
corte a procurar um músico cuja habilida
de em tocar harpa pudesse diminuir o Um segundo relato da apresentação de
impacto das explosões de gênio do rei. Davi a Saul encontra-se na história da
Davi foi recomendado por um dos servos vitória de Davi sobre Golias. Neste relato,
mais jovens de Saul como bom músico e Davi era um jovem que vivia em seu lar,
como um homem de guerra. Ele era sisudo cuidando das ovelhas do pai. Ele estava ali
em palavras, e de gentil aspecto, isto é, era no campo de batalha não por ser escudeiro
maduro e sereno, e o Senhor era com ele. de Saul, mas por estar levando de casa
Quando Davi veio para a corte, trouxe a provisões aos irmãos. Era forte o suficiente
Saul um presente simbólico de alimentos, para matar ursos ou leões com mão desar
representando sua capacidade de sustentar- mada (17.34-37), mas faltava-lhe totalmente
se a si próprio. Ele veio a convite do rei, experiência militar (17.38,39). Até a hora
não por necessidade econômica. de sua vitória, ele parecia ser desconhecido
Sob a influência do talento musical de de Saul (17.58); mas, graças ao destaque
Davi, Saul encontrou um alívio pelo me que acabara de ganhar, tornou-se amigo
nos temporário do espírito maligno que o íntimo de Jônatas, que imediatamente
afligia, e logo tornou o jovem seu escudei assegurou-lhe um lugar na corte de Saul
ro. Nessa função, Davi servia como guarda- (18.2).
costas pessoal de Saul, posição reservada O manuscrito Vaticano da Septuaginta
somente para quem desfrutava completa preserva uma versão consideravelmente
confiança da parte do rei. Assim Davi mais curta da batalha de Elá, que elimina
tornou-se membro regular da corte de Saul. muitos dos conflitos entre os capítulos 16
65
e 17 (17.12-31 e 17.55—18.5 são omitidos). e oitenta centímetros de altura. Como se
A questão que permanece é: qual é o texto dera em outras ocasiões, na história de
original — o mais curto ou o mais largo? Israel, a vontade do povo em resistir estava
Geralmente é mais fácil entender como sendo erodida por um homem de propor
uma passagem seria encurtada a fim de ções épicas (Nm 13.32,33; Dt 2.11,20; 3.11).
resolver problemas de harmonização. Seria Alguma confusão é criada pelo uso do
mais difícil explicar por que a história seria nome Golias em 2Samuel 21.19, onde um
expandida a ponto de fazer perder sua gigante chamado Golias, que carregava
coesão interna. A maioria dos estudiosos uma lança com haste “como órgão de
do texto concorda, portanto, que se deve tecelão”, foi morto por um belemita cha
aceitar a versão hebraica. Uma vez que os mado El-Hanã. A semelhança entre esse
dois relatos, na forma em que agora se gigante e a vítima de Davi tem levado
apresentam, não podem ser harmonizados alguns a concluir que o mesmo episódio
com êxito, temos presumivelmente versões serve de base para ambos os relatos. Tem-se
independentes da maneira como Saul e aventado a hipótese de que Davi recebeu
Davi vieram a se encontrar pela primeira crédito pelas façanhas de um de seus
vez. soldados (21.22; cf. também 1.15—4.10).
Os filisteus ajuntaram as suas forças (...) Outros têm sugerido que El-Hanã era o
em Socó. A posição estratégica de Saul na nome de nascimento de Davi, sendo Davi
batalha de Socó melhorou consideravel o nome que ele assumiu ao ascender ao
mente em relação à de seu encontro ante trono. Conquanto esses argumentos sejam
rior com os filisteus. Em vez de lutar em demasiadamente complexos para serem
Micmás, no coração de seu próprio terri adequadamente considerados no limitado
tório (13.5), ele estava defendendo o vale espaço aqui disponível, podemos notar que
de Elá, uma das principais gargantas que noutras partes a tradição bíblica associa
conduziam desde a planície filistéia até o intimamente Davi à impressionante vitória
planalto de Judá. sobre o gigante filisteu na batalha pelo vale
Numa manobra clássica para exércitos de Elá (21.9; 22.10). É possível que, poste
antigos que dispunham de aproximada riormente, um nome conhecido tenha sido
mente a mesma força, ambos se haviam acrescentado ao relato da vitória de Davi
retirado para posições defensivas, domi sobre o filisteu, como ele é normalmente
nando escarpas opostas do mesmo vale. chamado (exceto em 17.4,23), mas não há
Nenhum dos comandantes se dispunha a razões que nos forcem a dissociar Davi
deixar a vantagem do terreno mais elevado dessa vitória espetacular.
para conduzir a batalha até o inimigo. No
impasse assim estabelecido, os filisteus b. Davi Visita seus Irmãos (17.12-23)
estavam ganhando uma vantagem psicoló uOra, Davi era filho de um homem efrateu, de
gica por meio de seu gigantesco guerreiro, Belém de Judá, cujo nome era Jessé, que tinha oito
que diariamente desafiava os israelitas ao filhos; e nos dias de Saul este homem era já velho
e avançado em idade entre os homens. 13Os três
combate individual. filhos mais velhos de Jessé tinham seguido Saul
Golias, de Gate, que tinha de altura seis à guerra; eram os nomes de seus três filhos que
côvados e um palma No antigo Israel um foram à guerra: Eliabe, o primogênito, o segundo
Abinadabe, e o terceiro Samá. l4Davi era o menor;
côvado era a distância do cotovelo à ponta os três maiores seguiram a Saul, 15mas Davi ia e
do dedo médio, o que dava aproximada voltava de Saul, para apascentar as ovelhas de seu
mente de 42 a 45 centímetros. Um palmo pai em Belém. 16Chegava-se, pois, o filisteu pela
era a distância entre os dedos polegar e manhã e à tarde; e apresentou-se por quarenta dias.
17Disse então Jessé a Davi, seu filho: Toma agora
mínimo, estando a mão totalmente aberta, para teus irmãos uma efa deste grão tostado e estes
isto é, cerca de vinte centímetros. Portanto, dez pães, e corre a levá-los ao arraial, a teus
Golias tinha aproximadamente dois metros irmãos. 18Leva, também, estes dez queijos ao seu
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comandante de mil; e verás como passam teus com tempo suficiente apenas para saudar
irmãos, e trarás notícias deles. 19Ora, estavam
Saul, e eles, e todos os homens de Israel no vale seus irmãos antes que o filisteu aparecesse.
de Elá pelejando contra os filisteus. 20Davi então c. Davi Aceita o Desafio (17.24-40)
se levantou de madrugada e, deixando as ovelhas
com um guarda, carregou-se e partiu, como Jessé 24E todos os homens de Israel, vendo aquele
lhe ordenara; e chegou ao arraial quando o exér homem, fugiam de .diante dele, tomados de pavor.
cito estava saindo em ordem de batalha e dava 25Diziam os homens de Israel: Vistes aquele
gritos de guerra. 21Os israelitas e os filisteus se homem que subiu? pois subiu para desafiar a Israel.
punham em ordem de batalha, fileira contra fileira. Ao homem, pois, que o matar, o rei cumulará de
22E Davi, deixando na mão do guarda da bagagem grandes riquezas, e lhe dará a sua filha, e fará livre
a carga que trouxera, correu às fileiras; e, che a casa de seu pai em Israel. “ Então falou Davi aos
gando, perguntou a seus irmãos que estavam bem. homens que se achavam perto dele, dizendo: Que
23Enquanto ainda falava com eles, eis que veio se fará ao homem que matar a esse filisteu, e tirar
subindo do exército dos filisteus o campeão, cujo a afronta de sobre Israel? pois quem é esse incir-
nome era Golias, o filisteu de Gate, e falou con cunciso filisteu para afrontar os exércitos do Deus
forme aquelas palavras; e Davi as ouviu. vivo? 27E o povo lhe repetiu aquela palavra,
dizendo: Assim se fará ao homem que o matar.
O autor bíblico agora apresentava Davi “ Eliabe, seu irmão mais velho, ouviu-o quando fa
como se o leitor estivesse lendo a seu lava àqueles homens; pelo que se acendeu a sua ira
contra Davi, e disse: Por que desceste aqui, e a
respeito pela primeira vez. Ele é novamente quem deixaste aquelas poucas ovelhas no deserto?
retratado como o mais jovem dos oito filhos Eu conheço a tua presunção, e a maldade do teu
de Jessé, o belemita. Os três filhos mais coração; pois desceste p ara ver a peleja.
velhos estavam servindo no exército de Saul 29Respondeu Davi: Que fiz eu agora? porventura
não há razão para isso? 30E virou-se dele para
em Elá, enquanto Davi ia e voltava de Saul, outro, e repetiu as suas perguntas; e o povo lhe
para apascentar as ovelhas de seu pai em respondeu como da primeira vez. 31Então, ouvidas
Belém. Este versículo pode ajudar a recon as palavras que Davi falara, foram elas referidas
ciliar a diferença entre os capítulos 16 e 17, a Saul, que mandou chamá-la 32E Davi disse a
ao mostrar por que Davi não estava ser Saul: Não desfaleça o coração de ninguém por causa
dele; teu servo irá, e pelejará contra este filisteu.
vindo como escudeiro de Saul. Mesmo 33Saul, porém, disse a Davi: Não poderás ir contra
assim, a razão por que Saul parece não esse filisteu para pelejar com ele, pois tu ainda és
conhecer Davi em 17.58 permanece inex- moço, e ele homem de guerra desde a sua moci
plicada. Considerados independentemente, dade. 34Então disse Davi a Saul: Teu servo
porém, os detalhes da disputa de Davi com apascentava as ovelhas de seu pai, e sempre que
vinha um leão, ou um urso, e tomava um cordeiro
Golias e de sua apresentação a Saul não do rebanho, 3Seu saía após ele, e o matava, e lho
apresentam qualquer dificuldade para arrancava da boca; levantando-se ele contra mim,
compreensão. segurava-o pela queixada, e o feria e matava.
Jessé enviou Davi ao acampamento de teu servo matava tanto ao leão como ao urso; e este
incircunciso filisteu será como um deles, porquanto
guerra israelita para levar a seus filhos afrontou os exércitos do Deus viva 37Disse mais
mais velhos provisões suplementares. Um Davi: O Senhor, que me livrou das garras do leão,
“presente” extra para o oficial comandante e das garras do urso, me livrará da mão deste
foi incluído como garantia adicional de que filisteu. Então disse Saul a Davi: Vai, e o Senhor
as provisões receberiam permissão para seja contiga 38E vestiu a Davi da sua própria
armadura, pôs-lhe sobre a cabeça um capacete de
chegar a seu destino. bronze, e o vestiu de uma couraça. 39Davi cingiu
Como um jovem aproximando-se da fase a espada sobre a armadura e procurou em vão andar,
adulta, Davi estava ansioso por alcançar pois não estava acostumado àquila Então disse Davi
o campo de batalha. Ele saiu bem cedo de a Saul: Não posso andar com isto, pois não estou
acostumada E Davi tirou aquilo de sobre si.
casa, caminhou mais de 25 quilômetros, '"‘Então tomou na mão o seu cajado, escolheu do
e ainda chegou bem quando os israelitas ribeiro cinco seixos lisos e pô-los no alforje de
estavam se movimentando para suas pastor que trazia, no surrão, e, tomando na mão
posições de combate. Deixando seus a sua funda, foi-se chegando ao filisteu.
presentes com os que guardavam o acam Por mais de um mês nenhum confronto
pamento, Davi apressou-se até as fileiras importante tinha-se dado. Agora as ações
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do gigante e as ameaças que ele represen normal de batalha, escolheu sua munição
tava para o moral das tropas de Israel eram do leito de um regato: cinco pedras, cada
conhecidas de todos. Entre os soldados, se uma de cerca do tamanho do punho de um
comentava sobre a recompensa oferecida homem. Ataques maciços com essa arma
como incentivo a quem derrotasse Golias. formidável faziam parte destacada de táticas
Vez após vez, Davi entrou nessas conversas, militares antigas (cf. Jz 20.16), mas Davi
não tanto para ouvir a repetição das recom teve a imaginação, o sangue-frio, e a técnica
pensas, mas para lançar uma idéia: Quem para aplicá-la com êxito também no com
é esse incircunciso filisteu, para afrontar bate individual.
os exércitos do Deus vivo?
A intenção de Davi em colocar-se no d. Davi Derrota Golias (17:41-54)
próprio centro da ação foi claramente 4lO filisteu também vinha se aproximando de
notada por seu irmão mais velho, Eliabe. Davi, tendo à sua frente o seu escudeira 42Quando
Ele considerou Davi presunçoso ao tentar o filisteu olhou e viu a Davi, desprezou-o, por
subir acima do lugar que lhe cabia na vida. quanto era mancebo, ruivo, e de gentil aspecta
43Disse o filisteu a Davi: Sou eu algum cão, para
Davi alegou inocência, perguntando, por tu vires a mim com paus? E o filisteu, pelos seus
sua parte, que mal havia em falar. deuses, amaldiçoou a Davi. “ Disse mais o filisteu
Logo os planos de Davi foram percebidos a Davi: Vem a mim, e eu darei a tua carne às aves
quando suas palavras foram transmitidas do céu e às bestas do campa 45Davi, porém, lhe
a Saul, e ele foi chamado perante o rei.24 respondeu: Tb vens a mim com espada, com lança
e com escudo; mas eu venho a ti em nome do Senhor
A atitude confiante de Davi aparentemente dos exércitos, o Deus dos exércitos de Israel, a quem
baseava-se em três fatores. Primeiramente, tens afrontada “ Hoje mesmo o Senhor te entre
ele estava convencido de sua capacidade gará na minha mão; ferir-te-ei, e tirar-te-ei a cabeça;
física para enfrentar o filisteu. Como prova os cadáveres do arraial dos filisteus darei hoje
mesmo às aves do céu-e às feras da terra; para que
disso, Davi citou vezes em que, desarmado, toda a terra saiba que há Deus em Israel; 47e para
venceu animais selvagens que encontrou que toda esta assembléia saiba que o Senhor salva,
em seu trabalho. Talvez faltasse-lhe expe não com espada, nem com lança; pois do Senhor
riência no manejo de armamentos, mas ele é a batalha, e ele vos entregará em nossas mãos.
estava longe de ser um garoto despreparado, ‘"Quando o filisteu se levantou e veio chegando
para se defrontar com Davi, este se apressou e
imaginado por muitos leitores modernos. correu ao combate;, a encontrar-se com o filisteu.
Um segundo e ainda mais importante 49E Davi, metendo a mão no alforje, tirou dali uma
fator motivador da confiança de Davi pode pedra e com a funda lha atirou, ferindo o filisteu
ser visto na sua fé no Deus vivo. Ele apre na testa; a pedra se lhe cravou na testa, e ele caiu
com o rosto em terra. 50Assim Davi prevaleceu
sentou uma longa lista de experiências contra o filisteu com uma funda e com uma pedra;
pessoais para justificar a certeza que tinha feriu-o e o matou; e não havia espada na mão de
de que o Senhor o ajudaria a enfrentar os Davi. 51Correu, pois, Davi, pôs-se em pé sobre o
desafios do futuro. Conquanto Davi às filisteu e, tomando a espada dele e tirando-a da
vezes ficasse aquém dos mais elevados bainha, o matou, decepando-lhe com ela a cabeça.
Vendo então os filisteus que o seu campeão estava
níveis de conduta ética, essa marca de reli morto, fugiram. 52Então os homens de Israel e de
giosidade pessoal genuína parece tê-lo Judá se levantaram gritando, e perseguiram os filis
acompanhado a vida inteira. teus até a entrada de Gai e até as portas de Ecrom;
A terceira razão para Davi confiar na e caíram os feridos dos filisteus pelo caminho de
Saraim até Gate e até Ecrom. 53Depois voltaram
vitória sobre o filisteu jazia no fato de que os filhos de Israel de perseguirem os filisteus, e
ele contava com uma arma secreta — a despojaram os seus arraiais. 54Davi tomou a
funda. Após pôr de lado a indumentária cabeça do filisteu e a trouxe a Jerusalém; porém
pôs as armas dele na sua tenda.
O m anuscrito Vaticano da LX X om ite a história inteira acerca dos
irmãos de Davi e das viagens deste a Belém (v. 12-31). Davi estava
presente no campo de batalha, portanto, com o escudeiro de Saul
Davi apareceu perante Golias como um
(veja com entário sobre 17.1-11). jovem simples, vestido e armado como um
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pastor. Cada um de seus movimentos foi e. Jônatas Busca Amizade de Davi (17.
calculado para alimentar a complacência 55—18.5)
do gigante e, ao mesmo tempo, realçar o 55Quando Saul viu Davi sair e encontrar-se
impacto teológico de sua vitória iminente. com o filisteu, perguntou a Abner, o chefe do exér
A ação começou com a troca de ataques cito: De quem é filho essç jovem, Abner? Respondeu
verbais. Golias fez pouco caso da aparência Abner: Vive a tua alma, ó rei, que não sei. 56Disse
então o rei: Pergunta, pois, de quem ele é filha
de menino que Davi tinha e amaldiçoou-o 57Voltando, pois, Davi de ferir o filisteu, Abner o
em nome dos deuses filisteus. Aceitando tomou consigo, e o trouxe à presença de Saul,
o desafio do gigante, Davi sumariou como trazendo Davi na mão a cabeça do filisteu. 58E
Israel via aquela guerra. A batalha estava perguntou-lhe Saul: De quem és filho, jovem?
Respondeu Davi: filho de teu servo Jessé, belemita.
nas mãos do Senhor, e ele determinaria o 'Ora, acabando Davi de falar com Saul, a alma
resultado não com base no poder militar, de Jônatas ligou-se com a alma de Davi; e Jônatas
mas segundo sua própria vontade. o amou como à sua própria alma. 2E desde aquele
dia Saul o reteve, não lhe permitindo voltar para
Terminados os embates preliminares, o a casa de seu pai. 3Então Jônatas fez um pacto
confronto rumou rapidamente até o seu com Davi, porque o amava como à sua própria alma.
clímax. Antes que os combatentes chegas 4 E Jônatas se despojou da capa que vestia, e deu
sem à distância das armas convencionais, a Davi, como também a sua armadura, e até mesmo
a sua espada, o seu arco e o seu cinta 5E saia Davi
Davi empregou sua funda e derrubou o aonde quer que Saul o enviasse, e era sempre bem
gigante ali mesmo. Utilizando a própria sucedido; e Saul o pôs sobre a gente de guerra,
espada de Golias, Davi degolou seu inimigo, e isso pareceu bem aos olhos de todo o povo, e até
confirmando assim a convicção israelita de aos olhos dos servos de Saul.
que o Senhor, e não as armas, determinam
o resultado da batalha (cf. 14.6). As indagações de Saul sobre a formação
de Davi são surpreendentes somente se o
Desmoralizados com a inesperada jovem guerreiro já tivesse servido como
derrota de seu campeão, os soldados filis escudeiro real (cf. 16.14-23). Se, como parece
teus fugiram de suas defesas no alto das provável, o relato da vitória de Davi sobre
montanhas e assim se tornaram presas Golias é uma narrativa independente da
fáceis para as hostes de Israel. Após perse apresentação de Davi a Saul, esta pergunta
guir o inimigo por aproximadamente quinze seria esperada. Desde que em seu encontro
a vinte e cinco quilômetros, os soldados de anterior só se preocupara basicamente com
Saul retornaram para desfrutar os espólios os preparativos para a batalha, Saul só
do acampamento filisteu. agora estava tomando conhecimento das
Davi tomou a cabeça do filisteu e a origens de seu futuro genro (cf. 17.25).
trouxe a Jerusalém. Por esse tempo Jeru Como resultado de sua vitória sobre
salém era ainda controlada pelos jebuseus, Golias, Davi recebeu imediatamente um
que não teriam razão alguma para celebrar lugar permanente na corte de Saul. Desde
uma vitória israelita sobre os filisteus. o começo, Davi teve uma receptividade
Talvez, como sugere Hertzberg (p. 153), esta surpreendentemente favorável por membros
referência reflita a existência de uma da corte real, especialmente em vista do
famosa relíquia dessa batalha na cidade de fato de que se destacara tão subitamente.
Jerusalém, muito tempo depois de ela ter Jônatas, por exemplo, tomou a iniciativa
sido capturada e transformada na capital no que se tomaria sua amizade imorredoura
de Israel. Porém pôs as armas dele na sua com Davi. A aliança em que os dois jovens
tenda. Antes não havia sido mencionado entraram numa fraternidade voluntária foi
nem sugerido tal abrigo. A espada de Golias estabelecida sob a direção de Jônatas. O
foi obviamente preservada, uma vez que espírito de todo o acordo da aliança é suma
mais tarde ela aparece em posse dos sacer riado na dádiva de roupas e armas de
dotes de Nobe (ISm 21.9). Jônatas para Davi. Por tal ato todos ficaram
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sabendo que Jônatas amava a Davi como o Senhor era com ele.15Vendo, então, Saul que ele
à sua própria alma. Apenas pouco tempo era tão bem sucedido, tinha receio dele. 16Mas
todo o Israel e Judá amavam a Davi, porquanto
depois Jônatas estava mesmo disposto a saía e entrava diante deles.
reconhecer que Davi, e não ele, seria o
próximo rei de Israel. Quando a popularidade de Davi atingiu
Em seu relacionamento com Davi, o auge, a frágil autoconfiança de Saul não
Jônatas se revela como um dos melhores pôde mais admitir aquilo. Sofrendo da frus
personagens do Antigo Testamento. Ele tração de anos de luta com Samuel, com
nada tinha a ganhar, mas altruisticamente “homens ímpios” que se opunham a seu
deu de si mesmo em favor de um amigo. reinado (10.27) e com os filisteus, agora
A contribuição de Davi à amizade não é Saul concentrou suas hostilidades em cima
tão bem conhecida, mas algo de sua de Davi, o favorito do povo, o ungido do
consideração para com Jônatas pode-se Senhor.
perceber em seu lamento pala morte de No fundo, Saul estava enciumado com
Saul e de seu filho (2Sm 1.19-27). a atenção dispensada a Davi. O sentimento
O autor conclui esta seção, sumariando de insegurança de Saul não podia tolerar
a vida de Davi na corte de Saul. Ele teve competição pela afeição popular. Por outro
êxito em toda iniciativa que tomou; obteve lado, Saul estava começando a suspeitar que
uma importante promoção no exército; e Davi abrigasse ambições políticas. Con
conquistou a amizade da população em quanto provavelmente ainda não estivesse
geral, bem como dos burocratas de Saul. Tal cônscio de que Davi já havia sido ungido
constatação haveria de provar-se dema por Samuel, Saul pôde ver que a popula
siadamente perfeita para o próprio bem de ridade daquele jovem poderia, por fim,
Davi. levá-lo a querer o trono. Finalmente, pertur
bando todos os processos de raciocínio de
4. Saul Procura Tirar a Vida de Davi Saul, havia o espírito maligno que o ator
(18.6—20.42) mentava (cf. comentário sobre 16.14-23).
As ações de Saul são cada vez mais retra
1) Tentativa de Homicídio por Parte de Saul tadas como as de uma personalidade
(18.6-16) demente. Seu confuso estado emocional
6Sucedeu porém que, retornando eles, quando
reflete-se em sua rápida mudança de
Davi voltava de ferir o filisteu, as mulheres de todas atitudes para com Davi. Ele foi sucessiva
as cidades de Israel saíram ao encontro do rei Saul, mente motivado pelo amor (16.21), ira
cantando e dançando alegremente, com tamboris, (18.8), temor (18.12) e respeito (18.15).
e com instrumentos de música. 7E as mulheres, O rei finalmente decidiu que Davi devia
dançando, cantavam umas para as outras, dizendo:
Saul feriu os seus milhares, porém Davi os seus ser morto, fosse por assassínio direto (v. 10
dez milhares. ’‘Então Saul se indignou muito, pois e s.), ou mediante batalha contra os filisteus
aquela palavra pareceu mal aos seus olhos, e disse: (v. 20 e s.), ou mediante o empregos de assas
Dez milhares atribuíram a Davi, e a mim somente sinos contratados (19.1 e s.).
milhares; que lhe falta, senão só o reino? ’Daquele As próprias tentativas de Saul em matar
dia em diante, Saul trazia Davi sob suspeita. 10No
dia seguinte o espírito maligno da parte do Senhor Davi estão associadas com o mau espírito
se apoderou de Saul, que começou a profetizar no que periodicamente o levava a agir como
meio da casa; e Davi tocava a harpa, como nos um louco.25 Davi estava servindo nova
outros dias. Saul tinha na mão uma lança. UE Saul mente como escudeiro de Saul e músico,
arremessou a lança, dizendo consigo: Encravarei
a Davi na parede. Davi, porém,.desviou-se dele por
duas vezes. 12Saul, pois, temia a Davi, porque o A palavra hebraica para “irar-se” iyitnabbe) no versículo 10 tem
Senhor era com Davi e se tinha retirado dele. relação com a palavra para “profeta” {n a b i\ O verbo é geralmente
traduzido por “profetizar”, mas seu violento conteúdo está clara
13Pelo que Saul o afastou de si, e o fez comandante m ente assinalado n o presente contexto. Esta passagem oferece
de mil; e ele saia e entrava diante do povo. 14E Davi testem unho adicional do com portam ento extático dos primeiros
era bem sucedido em todos os seus caminhos; e profetas.
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quando o rei repetidamente tentou matá-lo rei, temendo a reação pública, hesitou em
com uma lança (v. 10,11; 19.9,10). Quando ordenar que Davi se expusesse a tal perigo.
essas tentativas falharam, Saul colocou Assim, ele tentou atrair Davi à aceitação
Davi num comando militar. No entanto, voluntária de tal atribuição.
em lugar de ocultá-lo da atenção pública, Saul estava publicamente comprometido
essa medida granjeou-lhe ainda maior popu em oferecer uma filha em casamento ao
laridade. homem que derrotou Golias; contudo, o
costume era que o noivo oferecesse à famí
2) Saul Usa os Filisteus (18.17-30) lia da noiva um presente digno como seu
17Pelo que Saul disse a Davi: Eis que Merabe, dote. Saul primeiro ofereceu a Davi a mão
minha filha mais velha, te darei por mulher, contanto de sua filha mais velha, Merabe. Aparen
que me sejas filho valoroso, e guerreies as guerras temente Davi não entendeu o pedido de
do Senhor. Pois Saul dizia consigo: Não seja contra Saul para que ele guerreasse as guerras do
ele a minha mão, mas sim a dos filisteus. 18Mas
Davi disse a Saul: Quem sou eu, e qual é a minha Senhor como a sugestão para um presente
vida e a família de meu pai em Israel, para eu vir matrimonial. De qualquer forma, ele
a ser genro do rei? 19Sucedeu, porém, que ao escusou-se do casamento, baseado na humil
tempo em que Merabe, filha de Saul, devia ser dada dade de suas origens, isto é, sua família era
a Davi, foi dada por mulher a Adriel, meolatita. demasiado pobre para pagar um dote digno
20Mas Mical, a outra filha de Saul, amava a Davi;
sendo isto anunciado a Saul, pareceu bem aos seus de uma princesa.
olhos. 21E Saul disse: Eu lha darei para que ela lhe Uma segunda oportunidade de levar
sirva de laço, e para que a mão dos filisteus venha avante o “plano filisteu” de Saul ocorreu
a ser contra ele. Pelo que Saul disse a Davi: Com quando sua filha Mical anunciou que
a outra serás hoje meu genro. 22Saul, pois, deu
ordem aos servos: Falai em segredo a Davi, amava Davi. Desta vez Saul não se arris
dizendo: Eis que o rei se agrada de ti, e todos os caria a ser mal compreendido. Enviou
seus servos te querem bem; agora, pois, consente mensageiros que asseguraram a Davi que
em ser genro do rei. 23Assim os servos de Saul o rei consideraria o preço pelo casamento
falaram todas estas palavras aos ouvidos de Davi.
Então disse Davi: Parece-vos pouca coisa ser genro
bem pago se seu candidato a genro lhe trou
do rei, sendo eu homem pobre e de condição xesse provas de ter matado cem filisteus
humilde? ME os servos de Saul lhe anunciaram incircuncisos. Novamente o plano de Saul
isto, dizendo: Assim e assim falou Davi. 25Então fracassou quando Davi foi capaz de
disse Saul: Assim direis a Davi: O rei não deseja desincumbir-se de sua obrigação com segu
dote, senão cem prepúcios de filisteus, para que
seja vingado dos seus inimigos. Porquanto Saul rança, tendo, dentro do espaço de tempo
tentava fazer Davi cair pela mão dos filisteus. estabelecido pelo rei,26 matado o dobro de
“ Tendo os servos de Saul anunciado estas palavras filisteus. Davi tomou-se genro do rei por
a Davi, pareceu bem aos seus olhos tornar-se genro seu casamento com Mical, mas Saul tornou-
do rei. Ora, ainda os dias não se haviam cumprido,
27quando Davi se levantou, partiu com os seus se mais desconfiado dele do que nunca.
homens, e matou dentre os filisteus duzentos
homens; e Davi trouxe os prepúcios deles, bem 3) Saul Procura Assassinos (19.1-7)
contados, ao rei, para que fosse seu gem a Então
Saul lhe deu por mulher sua filha Mical. “ Mas 'Falou, pois, Saul a Jônatas, seu filho, e a todos
quando Saul viu e compreendeu que o Senhor era os seus servos, para que matassem a Davi. Porém
com Davi e que todo o Israel o amava, 29temeu Jônatas, filho de Saul, estava muito afeiçoado a
muito mais a Davi; e Saul se tornava cada vez mais Davi. 2Pelo que Jônatas o anunciou a Davi,
seu inimiga ^Então saíram os chefes dos filisteus dizendo: Saul, meu pai, procura matar-te; portanto,
à campanha; e sempre que eles saiam, Davi era guarda-te amanhã pela manhã, fica num lugar oculto
mais bem sucedido do que todos os servos de Saul, e esconde-te; 3eu sairei e me porei ao lado de meu
pelo que o seu nome era muito estimada
6 N enhum período de tem po é registrado no texto em lide. A frase
A artimanha seguinte de Saul para traduzida por “com a outra” no versículo 21 (“com esta segunda”,
provocar a morte de Davi envolvia RA) realmente reza “por dois” (bishtayim ), o que não se ajusta bem
aqui. Acrescentando-se um a consoante, seria possível um a tradução
combates arriscados contra os filisteus. O mais significativa: “dentro de dois anos” (bishnatayim).
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pai no campo em que estiveres; falarei acerca de Saul procurou encravar a Davi na parede, porém
ti a meu pai, verei o que há, e to anunciarei. 4Então ele se desviou de diante de Saul, que fincou a lança
Jônatas falou bem de Davi a Saul, seu pai, e disse- na parede Então Davi fpgiu, e escapou naquela
-lhe: Não peque o rei contra seu servo Davi, porque mesma noite. uM as Saul mandou mensageiros
ele não pecou contra ti, e porque os seus feitos para à casa de Davi, para que o vigiassem, e o matassem
contigo têm sido muito bons. 5Porque expôs a sua pela manhã; porém Mical, mulher de Davi, o avisou,
vida e matou o filisteu, e o Senhor fez um grande dizendo: Se não salvares a tua vida esta noite,
livramento para todo o Israel. Tu mesmo o viste, amanhã te matarão. 12Então Mical desceu Davi
e te alegraste; por que, pois, pecarias contra o por uma janela, e ele se foi e, fugindo, escapou.
sangue inocente, matando sem causa a Davi? 6E 13Mical tomou uma estátua, deitou-a na cama, pôs-
Saul deu ouvidos à voz de Jônatas, e jurou: Como -lhe à cabeceira uma pele de cabra, e a cobriu com
vive o Senhor, Davi não m orrerá.7Jônatas, pois, uma capa. 14Quando Saul enviou mensageiros
chamou a Davi, contou-lhe todas estas palavras, para prenderem a Davi, ela disse: Está doente.
e o levou a Saul; e Davi o assistia como dantes. ,stornou Saul a enviá-los, para que vissem a Davi,
dizendo-lhes: Trazei-mo na cama, para que eu o
Frustrado em seus dois planos anteriores mate. 16Vindoi, pois, os mensageiros, eis que estava
de livrar-se de Davi, Saul agora buscava a estátua na cama, e a pele de cabra à sua cabe
converter seus servos e seu próprio filho ceira. 17Então perguntou Saul a Mical: Por que
em assassinos. Com esta ação Jônatas foi assim me enganaste, e deixaste o meu inimigo ir
a escapar? Respondeu Mical a Saul: Porque ele
submetido a um difícil teste de lealdade. me disse: Deixa-me ir! por que hei de matar-te?
Tivesse ele mantido em segredo as intenções
de Saul, seu pai teria sido culpado de Infelizmente o breve, mas bem acolhido
derramar sangue inocente Tampouco podia período de paz, que havia sido conseguido
Jônatas permanecer indiferente enquanto mediante a influência de Jônatas, não
a morte de seu amigo estava sendo insti perdurou. Outra escaramuça na guerra
gada. Num esforço por ser leal tanto a Davi com os filisteus levou Davi ao campo de
quanto ao pai, Jônatas tentou agir como batalha, e novamente voltou para casa
um pacificador. cercado de glórias. Como em ocasiões ante
Os detalhes do encontro de Jônatas com riores, um espírito maligno inspirou Saul
seu pai no campo já não são mais conhe a praticar um novo atentado contra a vida
cidos, mas o esboço geral de seu plano é de Davi. Desviando-se de uma lança, Davi
claro. Ele já havia informado Davi do ardil fugiu para sua própria casa, mas mensa
de seu pai e recomendou-lhe que se manti geiros foram enviados para impedi-lo de sair
vesse escondido até que suas negociações da cidade. Desta vez foi a filha de Saul que
com o rei se completassem. Depois, numa ajudou Davi a escapar.
conversa particular com o pai, Jônatas Não se deve dar demasiado valor ao
defendeu a inocência de Davi. apoio de Mical a seu marido. No antigo
Não peque o rei contra seu servo Davi. Israel, casamentos em famílias importantes
Pecado, no Antigo Testamento, não é exclu eram freqüentemente arranjados com
sivamente um termo teológico. Pode ser propósitos políticos, e a intriga era comum.
utilizado, como é o caso aqui, para designar O casamento de Davi com Mical não foi
erros cometidos contra outra pessoa. Ao exceção. Saul havia encorajado a união num
final do discúrso de Jônatas, Saul jurou dar esforço de fazer com que Davi fosse morto
por encerrada sua conspiração contra Davi; pelos filisteus. Ele mais tarde desfez o
e uma paz temporária foi restaurada. contrato matrimonial e deu Mical a outro
homem, provavelmente num esforço para
4) Saul Volta a Praticar Violência (19.8-17) impedir que Davi reivindicasse um laço legí
'Depois tornou a haver guerra; e saindo Davi, timo com a casa governante de Israel (25.44;
pelejou contra os filisteus, e os feriu com grande 2Sm 3.15). Entretanto, a devoção de Mical
matança, e eles fugiram diante dele. ’Então o espi
rito maligno da parte do Senhor veio sobre Saul, por seu marido revela sua honradez e
estando ele sentado em sua casa, e tendo na mão acentua a condenação contra os injustos
a sua lança; e Davi estava tocando a harpa. i°E ataques de Saul contra Davi.
72
O ardil que Mical empregou para ajudar tempo que desfrutava de seu primeiro con
Davi a escapar foi provavelmente mais tato com Samuel desde sua unção (16.13).
complexo do que as traduções vernáculas Quando Saul foi notificado de que Davi
dão a entender. A imagem empregada foi estava com Samuel em Ramá, despachou
um teraphim, termo hebraico vertido de tropas com ordens de trazerem Davi de
diversas maneiras no Antigo Testamento: volta. Os planos de Saul, porém, foram frus
ídolos ou deuses caseiros (Gn 31.19 e s.), trados quando os soldados caíram sob a
terafins ou ídolos do lar (Jz 17.5 e s.; 2Rs influência do Espírito de Deus e começaram
23.24; Os 3.4), idolatria (ISm 15.23), ou a “profetizar” entre os do grupo de Samuel.
estátua. Tivessem o uso que fosse, os tera Saul decidiu capturar Davi pessoalmente
fins foram finalmente rejeitados como parte após seus servos repetidamente fracassarem,
das práticas religiosas de Israel (ISm 15.23; mas ele também viu-se incapacitado por
2Rs 23.24). Com toda probabilidade, a utili um “ataque profético”. Aparentemente se
zação dessas imagens por Mical continha fazia quase nenhuma distinção entre os
conotações teológicas hoje perdidas de vista transes extáticos que acompanhavam a
pelos leitores modernos. atividade profética e a experiência religiosa
que os inspirava. Este contexto, de qualquer
5) Samuel Oferece Refugio (19.18-24) forma, destaca o aspecto comportamental,
18Assim Davi fugiu e escapou; e indo ter com e não tanto as conseqüências religiosas, da
Samuel, em Ramá, contou-lhe tudo quanto Saul influência do profeta. Assim, Saul, após
lhe fizera; foram, pois, ele e Samuel, e ficaram em chegar a Naiote, despiu-se e permaneceu
Naiote. E foi dito a Saul: Eis que Davi está em nu perante Samuel um dia inteiro.
Naiote, em Ramá. “ Então enviou Saul mensa
geiros para prenderem a Davi; quando eles viram
À luz dessa experiência, o povo come
a congregação de profetas profetizando, e Samuel çou a perguntar: Está também Saul en
a presidi-los, o espirito de Deus veio sobre os mensa tre os profetas? Em seu contexto anterior
geiros de Saul, e também eles profetizaram. (10.10-12), a pergunta deixava implícito que
21Avisado disso, Saul enviou outros mensageiros, Saul trouxera opróbrio sobre si mesmo e
e também estes profetizaram. Ainda terceira vez
enviou Saul mensageiros, os quais também profe sua família por associar-se com os mal
tizaram . 22Então foi ele mesmo a Ramá e, conceituados profetas extáticos. Contudo,
chegando ao poço grande que estava em Sécu, no contexto atual, o provérbio parece
perguntou: O nde estão Samuel e Davi? questionar as qualificações de Saul para
Responderam-lhe: Eis que estão em Naiote, em
Ramá. “ Foi, pois, para Naiote, em Ramá; e o Espí ser membro da corporação de profetas
rito de Deus veio também sobre ele, e ele ia (McKane, p. 122). Os profetas e as atividades
caminhando e profetizando, até chegar a Naiote, deles estão intimamente associadas com
em Ramá. ME despindo as suas vestes, ele também Saul na tradição de tal modo que não se
profetizou diante de Samuel; e esteve nu por terra pode questionar a respeito. Por outro lado,
todo aquele dia e toda aquela noite. Pelo que se
diz: Está também Saul entre os profetas? Saul apropriou-se das manifestações ex
teriores da atividade espiritual, sem sub
meter-se às demandas éticas encontra
Após fugir da corte real, Davi não se das numa genuína comunhão com o Deus
dirigiu a Belém, como Saul esperaria, mas vivo. Em qualquer época esta é uma prá
rumou ao norte em direção a Ramá. Samuel
tica devastadora.
estava ali instalado como o ancião que
presidia um grupo de profetas. Fora deste
contexto não há confirmação de que Naiote 6) Davi e Jônatas se Separam (20.1-42)
fosse um topónimo, e talvez indique o nome a. Amigos Renovam a Aliança (20.1-23)
próprio dado à habitação dos profetas em, ‘Então fugiu Davi de Naiote, em Ramá, veio
ou perto de Ramá (veja Drivei; p. 158,159, ter com Jônatas e lhe disse: Que fiz eu? qual é a
para uma lista das possibilidades). Davi minha iniqüidade? e qual é o meu pecado diante
buscou proteção entre esse grupo ao mesmo de teu pai, para que procure tirar-me a vida? 2E
73
ele lhe disse: Longe disso! n.'o hás de morrer. Meu assim: Olha que as flechas estão para lá de ti; vai-te
pai não faz coisa alguma, neir< grande nem pequena, embora, porque o Senhor te manda ir. 23E quanto
sem que primeiro ma participe; por que^ pois, meu ao negócio de que eu e tu falamos, o Senhor é teste
pai me encobriria este negócio? Não é verdade. munha entre mim e ti para sempre.
3Respondeu-lhe Davi, com juramento: Teu pai bem
sabe que achei graça a teus olhos; pelo que disse:
Não saiba isto Jônatas, para que não se magoe.
À luz dos muitos atentados que haviam
Mas, na verdade, como vive o Senhor, e como vive sido praticados contra a vida de Davi,
a tua alma, há apenas um passo entre mim e a morte: é de admirar que haja quaisquer dúvidas
4Disse Jônatas a Davi: O que desejas tu que eu te quanto às intenções de Saul. Jônatas, entre
faça? 5Respondeu Davi a Jônatas: Eis que amanhã tanto, tinha ainda recentemente conseguido
é a lua nova, e eu deveria sentar-me com o rei para
comer; porém deixa-me ir, e esconder-me-ei no uma trégua entre seu pai e seu amigo
campo até a tarde do terceiro dia. ‘Se teu pai notar (19.1-7), e tais foram as ações subseqüentes
a minha ausência, dirás: Davi me pediu muito que de Saul que estavam sujeitas a diferentes
o deixasse ir correndo a Belém, sua cidade, por interpretações. Seu último ataque contra
quanto se faz lá o sacrifício anual para toda a
parentela. 7Se ele disser: Está bem; então teu servo
Davi, com uma lança, estava associado a
tem paz; porém se ele muito se indignar, fica sabendo um espírito maligno que o afligia só perio
que ele já está resolvido a praticar o mal. 8Usa, dicamente e que, até certo ponto, justificava
pois, de misericórdia para com o teu servo, porque seu comportamento (19.8-10). Conquanto
o fizeste entrar contigo em aliança do Senhor; se, Davi estivesse convencido quanto às
porém, há culpa em mim, mata-me tu mesmo; por
que me levarias a teu pai? 9Ao que respondeu intenções de Saul nos incidentes em sua
Jônatas: Longe de ti tal coisa! se eu soubesse que casa em Ramá, não sofrera ataques em
meu pai estava resolvido a trazer o mal sobre ti, público. Entende-se, portanto, por que
não to descobriria eu? 10Perguntou, pois, Davi a Jônatas buscou confirmação adicional dos
Jônatas: Quem me fará saber, se por acaso teu pai
te responder asperamente? ‘‘Então disse Jônatas
desígnios assassinos de seu pai.27
a Davi: Vem. e saiamos ao campa E saíram ambos Davi propôs um teste envolvendo os
ao campa I2E disse Jônatas a Davi: O Senhor, rituais associados com a chegada da lua
Deus de Israel, seja testemunha! Sondando eu a nova. As disposições bíblicas prescreviam
meu pai amanhã a estas horas, ou depois de amanhã, o soar da trombeta e sacrifícios especiais
se houver coisa favorável para Davi, eu não enviarei
a ti e não to farei saber? 130 Senhor faça assim para a observância da lua nova (Nm 10.10;
a Jônatas, e outro tanto, se, querendo meu pai 28.11). Presumivelmente, aquelas eram cele
fazer-te mal, eu não te fizer saber, e não te deixar brações mensais uma vez que se utilizava
partir, para ires em paz; e o Senhor seja contigo, um calendário lunar. O sacrifício fictício
assim como foi com meu pai. 14E não somente
usarás para comigo, enquanto viver, da benevolência
que Davi empregou como álibi para sua
do Senhor, para que não morra, 15como também ausência devia ter sido um acontecimento
não cortarás nunca da minha casa a tua benevo familiar sem qualquer conexão necessária
lência, nem ainda quando o Senhor tiver com outras festas de lua nova.
desarraigado da terra a cada um dos inimigos de A refeição envolvida no teste era uma
D avi.16Assim fez Jônatas aliança com a casa de
Davi, dizendo: O Senhor se vingue dos inimigos refeição íntima, dela participando somente
de Davi. 17Então Jônatas fez Davi jurar de novo, quatro personagens principais. A ausência
porquanto o amava; porque o amava com todo o de Davi não poderia ser passada por alto,
amor da sua alma. 18Disse-lhe ainda Jônatas: mas somente a irada rejeição por Saul do
Amanhã é a lua nova, e notar-se-â tua ausência,
pois o teu lugar estará vazia 19Ao terceiro dia
álibi de Davi seria interpretada como indício
descerás apressadamente, e irás àquele lugar onde de que o rei tencionava matá-lo.
te escondeste no dia do negócio, e te sentarás junto
à pedra de Ezel. 20E eu atirarei três flechas para
Outros com entaristas interpretam os capituios 19 e 20 com o relatos
aquela banda como se atirasse ao alva 21Então paralelos, mas divergentes, da fuga de Davi da corte de Saul (McKane,
mandarei o moço, dizendo: Anda, busca as flechas. p. 110). É possível que em certa época os dois capítulos tenham
Se eu expressamente disser ao moço: Olha que as experim entado circulação independente, m as têm estado m ais efeti
flechas estão para cá de ti, apanha-as; então vem, vamente unidos do que m uitos com entaristas estão dispostos a
admitir. Em sua form a presente, os acontecim entos do capítulo 20
porque, como vive o Senhor, há paz para ti, e não estão mais destinados a revelar as intenções de Saul para com Jônatas
há nada a temer. 22M as se eu disser ao moço do que para com Davi (cf. especialmente 20.1-4).
74
Tanto Davi quanto Jônatas estavam morrer. 12Ao que respondeu Jônatas a Saul, seu
cientes de que o teste que haviam elaborado pai, e lhe disse: Por que há de morrer? que fez ele?
33Então Saul levantou a lança para o ferir; assim
poderia precipitar uma crise que iria pôr entendeu Jônatas que seu pai tinha determinado
seriamente em perigo sua amizade. Sen matar a Davi. “ Peio que Jônatas, todo encoleri
tiram necessidade de reafirmar sua aliança zado, se levantou da mesa, e no segundo dia do
anterior (18.3,4). Ademais, Davi buscou mês não comeu; pois se magoava por causa de Davi,
garantia de que Jônatas o advertiria se Saul porque seu pai o tinha ultrajada ^Jônatas, pois,
saiu ao campo, pela manhã, ao tempo que tinha
conspirasse contra ele. Ele sabia que não ajustado com Davi, levando consigo um rapazinha
podia continuar a evadir-se dos ataques de “ Então disse ao moço: corre a buscar as flechas
Saul sem a ajuda de Jônatas. que eu atirar. Corrèu, pois, o moço; e Jônatas atirou
Jônatas, por outro lado, estava ciente de uma flecha, que fez passar além dela 37Quando o
moço chegou ao lugar onde estava a flecha que
que, se estourasse um conflito aberto entre Jônatas atirara, gritou-lhe este, dizendo: Não está
Saul e Davi, ele poderia facilmente perder porventura a flecha para lá de ti? ^E tornou a
qualquer reivindicação quanto ao trono. gritar ao moço: Apressa-te, anda, não te demores!
Em tal caso, desejou felicidades a Davi: O E o servo de Jônatas apanhou as flechas, e as trouxe
a seu senhor. 390 moço, porém, nada percebeu; só
Senhor seja contigo assim como foi com Jônatas e Davi sabiam do negócio. 40Então
meu pai. Jônatas pediu que, caso sobrevi Jônatas deu as suas armas ao moço, e lhe disse:
vesse a uma tal batalha pelo trono, os termos Vai, leva-as à cidade. 41Logo que o moço se foi,
de sua aliança fossem honrados, embora levantou-se Davi da banda do sul, e lançou-se sobre
tivessem lutado em posições opostas. Ele o seu rosto em terra, e inclinou-se três vezes; e
beijaram-se um ao outro, e choraram ambos, mas
especialmente estava buscando anistia para Davi chorou muito mais. 42E disse Jônatas a Davi:
sua família. Vai-te em paz, porquanto nós temos jurado ambos
Os dois amigos renovaram o compro em nome do Senhor, dizendo: O Senhor seja entre
misso de lealdade de um para com o outro, mim e ti, e entre a minha descendência e a tua
descendência perpetuamente. 43Então Davi se
combinaram um código secreto para levantou e partiu; e Jônatas entrou na cidade.
advertir Davi, e se separaram.
Não está limpa Inúmeros incidentes
b. Davi Foge da Corte de Saul (20.24-43) poderiam tornar um homem cerimonial-
^Escondeu-se, pois, Davi no campo; e, sendo mente imundo de modo que seria impróprio
a lua nova, sentou-se o rei para comer. 25E, para ele tomar parte numa celebração ritual
sentando-se o rei, como de costume, no seu assento (Lv 7.21; 11.24 e s.; 15.16). Saul supôs que
junto à parede, Jônatas sentou-se defronte dele, e Davi estava ausente do primeiro dia da festa
Abner sentou-se ao lado de Saul; e o lugar de Davi
ficou vazia 26Entretanto Saul não disse nada
por uma dessas razões.
naquele dia, pois dizia consigo: Aconteceu-lhe Então se acendeu a ira de Saul contra
alguma coisa pela qual não está limpo; certamente Jônatas. Saul rejeitou violentamente a
não está limpa 27Sucedeu também no dia seguinte, desculpa combinada para a ausência de
o segundo da lua nova, que o lugar de Davi ficou Davi no segundo dia e dirigiu sua ira contra
vazia Perguntou, pois, Saul a Jônatas, seu filho:
Por que o filho de Jessé não veio comer nem ontem Jônatas. Saul, ou já havia descoberto a
nem hoje? 28Respondeu Jônatas a Saul: Davi profunda lealdade de seu filho para com
pediu-me encarecidamente licença para ir a Belém, Davi, ou então tinha suspeitas disso, e
29dizendo: Peço-te que me deixes ir, porquanto a julgou que ele estivesse colocando aquela
nossa parentela tem um sacrifício na cidade, e meu
irmão ordenou que eu fosse; se, pois, agora tenho
amizade acima da lealdade que devia à sua
achado graça aos teus olhos, peço-te que me deixes própria família. A explosão de injúrias sobre
ir, para ver a meus irmãos. Por isso não veio à mesa Jônatas somente era dirigida de modo indi
do rei. “ Então se acendeu a ira de Saul contra reto a sua mãe. Saul gritou, dizendo que
Jônatas, e ele lhe disse: Filho da perversa e rebelde! a preferência de Jônatas por Davi procedia
Não sei eu que tens escolhido o filho de Jessé para
vergonha tua, e para vergonha de tua mãe? 31Pois do fato de que ele havia sido um filho que
por todo o tempo em que o filho de Jessé viver sobre se comportava mal desde o próprio nasci
a terra, nem tu estarás seguro, nem o teu reino; mento: tens escolhido o filho de Jessé para
pelo que envia agora e traze-mo, porque ele há de vergonha tua, e para vergonha de tua mãe.
75
Embora Saul tivesse mais uma vez come conflitantes, refletiram sobre a aliança que
tido o sério erro de interpretar erronea os unira. O Senhor devia permanecer como
mente a lealdade básica de Jônatas (veja mediador entre suas duas famílias para
comentário sobre 19.1-7; 20.1-23), ele sempre.
pensava estar fazendo um favor ao filho.
Podia ver que, enquanto Davi vivesse, 5. Davi Torna-se um Fugitivo (21.1—26.25)
Jônatas jamais se tornaria rei. Assim, pro
curava justificar sua própria responsabili 1) Sacerdotes Ajudam Davi em Nobe
dade pessoal pelos impulsos que motivavam (21.1-9)
seu ódio por Davi. 'E ntão veio Davi a Nobe, ao sacerdote
Jônatas aparentemente não desejava Aümeleque, o qual saiu, tremendo, ao seu encontro,
tornar-se mesmo rei; certamente não dese e lhe perguntou: Por que vens só, e ninguém
java se isso implicasse em ir contra Davi. contigo? 2Respondeu Davi ao sacerdote
Aimeleque: O rei me encomendou um negócioi, e
Mesmo após ser advertido da ameaça que me disse: Ninguém saiba deste negócio pelo qual
Davi representaria a seu próprio governo, eu te enviei, e o qual te ordenei. Quanto aos
Jônatas respondeu serenamente: Por que mancebos, apontei-lhes tal e tal lugar. 3Agora, pois,
há de morrer? que fez ele? Talvez sentisse que tens à mão? Dá-me cinco pães, ou o que se
que Deus já tinha escolhido a Davi como achar. 4Ao que, respondendo o sacerdote a Davi,
disse: Não tenho pão comum à mão; há, porém,
o próximo rei de Israel, e estava preparado pão sagrado, se ao menos os mancebos se têm
para aceitar esse julgamento. Ele era dotado abstido das mulheres. 5E respondeu Davi ao sacer
duma qualidade que faltava totalmente a dote, e lhe disse: Sim, em boa fé, as mulheres se
seu pai. Era capaz de apreciar a grandeza nos vedaram há três dias; quando eu saí, os vasos
dos mancebos também eram santos, embora fosse
em outros sem sentir-se inferior. para uma viagem comum; quanto mais ainda hoje
Assim entendeu Jônatas que seu pai não serão santos os seus vasos? 6Então o sacer
tinha determinado matar a Davi. No dia dote lhe deu o pão sagrado; porquanto não havia
seguinte, Jônatas procedeu com o sinal pré- ali outro pão senão os pães da proposição, que se
combinado, pelo qual Davi seria informado haviam tirado de diante do Senhor no dia em que
se tiravam para se pôr ali pão quente. 7Ora,
da reação de Saul ante sua ausência. Para achava-se ali naquele dia um dos servos de Saul,
assegurar-se de que não haveria mal- detido perante o Senhor; e era seu nome Doegue,
-entendidos, Jônatas acrescentou instruções edomeu, chefe dos pastores de Saul. 8E disse Davi
orais tencionadas a Davi, mas dirigidas a a Aimeleque: Não tens aqui à mão uma lança ou
uma espada? porque eu não trouxe comigo nem
seu ajudante, que de nada suspeitava: a minha espada nem as minhas armas, pois o
Apressa-te, anda, não te demores. negócio do rei era urgente. ’Respondeu o sacer
Com a mensagem enviada, o leitor dote: A espada de Golias, o filisteu, a quem tu
espera que Jônatas retome à corte de seu feriste no vale de Elá, está aqui envolta num pano,
pai, enquanto Davi inicia o seu exílio. Neste detrás do éfode; se queres tomar, toma-a, porque
não há outra aqui senão ela. E disse Davi: Não
ponto, porém, Jônatas manda seu jovem há outra igual a essa; dá-ma.
ajudante de volta à cidade com suas armas,
e Davi sai do esconderijo para uma emocio Após fugir da corte de Saul, Davi parou
nante despedida. Os dois amigos haviam em Nobe para obter provisões, armas e
combinado aquela detalhada mensagem em orientação divina (22.10). Presumivelmente,
código presumivelmente porque conside Nobe foi fundada pelos sacerdotes que
raram muito perigoso serem vistos juntos. fugiram da destruição de Siló pelos filisteus
Contudo, quando se tornou evidente que em meados do século onze a.C. No tempo
agora estavam percorrendo caminhos de Davi, abrigava um santuário de razoá
opostos, não poderiam separar-se sem se veis proporções, no qual trabalhava uma
despedirem, equipe de cerca de 85 sacerdotes (22.18).
Ao se prepararem os dois amigos para Localizado à vista de Jerusalém, a cidade
seguir seus destinos separados, até mesmo ficava no caminho que Davi estava
76
tomando rumo ao sul (Is 10.27-32; Ne Quanto mais ainda hoje não serão santos
11.31,32). Encontrando-se com Davi, seus vasos? Este é um eufemismo para
Aimeleque, Kder do grupo em Nobe, tremeu indicar a continência sexual de um soldado
de apreensão, reação semelhante com que enquanto numa expedição militar. A parti
os anciãos de Belém haviam saudado a cipação em guerra requeria pureza ritual
Samuel (veja comentário sobre 16.1-13).» no antigo Israel, de modo que as relações
Este episódio apresenta uma outra etapa sexuais tinham de ser evitadas enquanto
da história da ascensão de Davi ao poder. numa campanha (Lv 15.17). Esses jovens,
Aqui o tema ou propósito subjacente é porém, não existiam; eram parte da mentira
muito semelhante ao das narrativas prece de Davi.
dentes sobre sua vida na corte. O autor A habilidade do autor em narrar histó
continuará a demonstrar mediante o relato rias é ilustrada por sua referência a Doegue,
da vida de Davi, que foi alguém que saiu o edomeu. Embora não desempenhe qual
do nada, que o Senhor estava atuando na quer papel neste contexto, é introduzido
história para trazê-lo ao trono de Israel. numa única sentença que interrompe o
fluxo da história. O leitor pode assim prever
A lamentável condição de Davi perante um papel mais importante para ele poste
Aimeleque é um quadro perfeito de um riormente.
começo humilde. Ele estava totalmente só,
tendo fugido sem comida, armadura ou 2) Davi Finge Loucura (21.10-15)
acompanhantes. Quando Aimeleque pediu
10Levantou-se, pois, Davi e fugiu naquele dia de
explicações quanto às condições que pare diante de Saul, e foi ter com Áquis, rei de Gate.
ciam estranhas para um oficial tão desta "M as os servos de Áquis lhe perguntaram: Este
cado do rei, Davi mentiu, mencionando não é Davi, o rei da terra? não foi deste que can
realizar uma missão secreta para Saul. tavam nas danças, dizendo: Saul matou os seus
Fazendo vaga referência a um encontro milhares, porém Davi os seus dez milhares? 12E
Davi considerou estas palavras no seu coração, e
com um pequeno contingente de tropas teve muito medo de Áquis, rei de Gate. 13Pelo que
próximas, Davi conseguiu obter alimento se contrafez diante dos olhos deles, e fingiu-se doido
suficiente para sustentá-lo ao longo de uma nas mãos deles, garatujando-se nas portas, e
jornada considerável. deixando correr a saliva pela barba. 14Então disse
Áquis aos seus servos: Bem vedes que este homem
Certamente Aimeleque deve ter tido está louco; por que mo trouxeste a mim? lsFaltam-
ainda maiores suspeitas pelo fato de Davi -me a mim doidos, para que trouxésseis a este para
não ter armas consigo, mas por solicitação fazer doidices diante de mim? há de entrar este na
minha casa?
de Davi ele lhe ofereceu a espada de Golias.
Assim ele entregou a Davi uma espada e Muitos comentaristas consideram este
também um bom “prenúncio”. Que deleite relato da visita de Davi ao rei de Gate como
para um narrador de histórias! Davi não uma narrativa variante de sua experiência
dispunha sequer de uma espada quando como vassalo de Áquis (27.1-12). Eles assi
fugiu de Saul; e, quando retomasse, teria nalam, por exemplo, a falta de sabedoria
um exército inteiro. em tentar alistar-se como um soldado filis
Nada se diz neste contexto sobre Davi teu, enquanto armado com a espada de
buscar orientação divina por meio de Golias (Caird, p. 999; Rust, pi 112,113).
Aimeleque, mas isso é destacadamente É realmente estranho que Davi tivesse
mencionado no capítulo seguinte (22.10, planejado participar da corte de Áquis sem
13,15). Talvez este aspecto da visita de Davi ter previsto algumas das dificuldades para
tenha sido omitido para salientar à cons fazê-lo. Contudo, há no relato alguns
ciência do leitor a inocência de Aimeleque elementos que podem indicar ser ele um
de qualquer cumplicidade com os planos hóspede involuntário dos filisteus. Assim,
de Davi. especulam quanto à sua identidade. Davi
77
estava em suas mãos, e levaram-no perante em sua tentativa de escapar para Gate sem
o rei, e escapou para Adulão (22.1). Esta ser notado ali, mudou-se para Adulão, na
interpretação da situação de Davi está de fronteira entre Israel e a Filístia. Adulão
acordo com o título do Salmo 56: “Mictam é identificado com as ruínas de ’aid-el-ma,
de Davi, quando os filisteus o prenderam a cerca de vinte quilômetros a sudoeste de
em Gate”. Belém e a menos de cinco quilômetros de
Podemos, pois, especular que Davi distância do vale de Elá, onde Davi havia
percebeu o perigo que corria como um fugi combatido Golias. Ali, numa região de
tivo solitário em qualquer parte de Israel. ravinas pronunciadas e numerosas caver
Tinha esperado viver anonimamente entre nas, Davi começou a formar um exército.
os filisteus em Gate, mas soldados descon Com o tempo, Davi reuniu ao seu redor
fiados o detiveram e o levaram perante cerca de quatrocentos homens de sua
Áquis. Quando parecia que sua identidade própria família e vários descontentes de
havia sido descoberta, mas antes de haver todo o IsraeL A despeito da origem póuco
provas a respeito, Davi fingiu demência e recomendável, esse grupo mais tarde
evitou ser identificada Novamente foi salvo formaria a espinha dorsal do exército
pelo cuidado do Senhor e por sua própria regular de Davi, uma inovação aprendida
esperteza. O ardil de Davi — fingiu-se doido com os filisteus. Mas primeiramente ele
— foi bem escolhido porque os loucos eram tinha de treiná-los, educá-los na hierarquia
considerados possuídos por espíritos (16.14). militar e sustentá-los, ao mesmo tempo em
Qualquer que seja a interpretação deste que se evadia de Saul.
texto, a experiência de Davi perante Áquis Enquanto membros da família de Davi
serve neste contexto como prova concreta podiam proteger-se de Saul, unindo-se aos
de seu total desamparo. Uma questão teoló fora-da-lei de Davi, seus idosos pais não
gica domina a mente de cada leitor: Como podiam acompanhar esse ritmo. Davi, pois,
o Senhor fará do seu ungido um rei? Os conseguiu arranjar refúgio para eles com
israelitas mais taide lembrariam de quando o rei de Moabe (cf. Rt 1.4; 4.18-22). A
ele teve que agir como um bobo para salvar tradição rabínica afirma que o rei de Moabe
a vida! traiu a confiança de Davi e matou seus pais.
Isso explicaria o tratamento perverso que
3) Davi Reúne um Exército (22.1-5) dedicou aos moabitas quando assumiu o
'Depois Davi, retirando-se desse lugar, escapou poder (2Sm 8.2). A Bíblia, contudo, não
para a caverna de Adulão. Quando os seus irmãos oferece qualquer outra referência explícita
e toda a casa de seu pai souberam dissoi, desceram a seus pais.
ali para ter com ele. 2Ajuntaram-se a ele todos os Não fiques no lugar forte. Comentaristas
que se achavam em aperto^ todos os endividados,
e todos os amargurados de espírito; e ele se fez têm tido dificuldade em concordar se o
chefe deles; havia com ele cerca de quatrocentos lugar forte refere-se a Mizpe de Moabe ou
homens. 3 Dali passou Davi para M izpe de a Adulão. Uma vez que referências subs-
Moabe; e disse ao íei de Moabe: Deixa, peço-te, qüentes (2Sm 23.13; lCr 11.15) colocam o
que meu pai e minha mãe fiquem convosco, até que
eu saiba o que Deus há de fazer de mim. 4E os lugar forte num contexto semelhante a
deixou com o rei de Moabe; e ficaram com ele por Adulão, Moabe parece descartado. No
todo o tempo que Davi esteve no lugar forte. 5Disse entanto, no Antigo Testamento os termos
o profeta Gade a Davi: Não fiques no lugar forte; caverna e lugar forte não são empregados
sai, e entra na terra de Judá. Então Davi saiu, e como sinônimos. Assim, é melhor consi-
foi para o bosque de Herete.
dérar o lugar forte, ou fórtaleza, um nome
Davi sabia que não conseguiria escapar próprio neste contexto, referindo-se a toda
de Saul se permanecesse no território isra a vizinhança ao redor de Adulão, onde os
elita, e que nem conseguiria resistir às fora-da-lei de Davi encontraram refúgio
forças reais por si só. Depois de fracassar (cf. também 2Sm 5.17).
78
Nos livros de Samuel o profeta Gade é a casa de teu pai. 17E disse o rei aos da sua guarda
mencionado somente aqui e em 2Samuel que estavam com ele: Virai-vos, e matai os sacer
dotes do Senhor, porque também a mão deles está
24, mas ele é noutro lugar conhecido como com Davi, e porque sabiam que ele fugia e não mo
um dos cronistas do reinado de Davi (lCr fizeram saber. M as os servos do rd não quiseram
29.29). Seu conselho para que Davi retor estender as suas mãos para arremeter contra os
nasse a Judá parece estranho, uma vez que sacerdotes do Senhor. 18Então disse o rei a
Adulão foi por um tempo considerado parte Doegue: Vira-te e arremete contra os sacerdotes.
Virou-se, então^ Doegue, o edomeu, e arremeteu
daquela tribo (Js 15.35). Por outro lado, contra os sacerdotes, e matou naquele dia oitenta
havia sido anteriormente uma cidade cana- e cinco homens que vestiam éfode de linho.
néia (Js 12.15), e, como vimos, à época de 19Também a Nobe, cidade desses sacerdotes,
Davi, Adulão provavelmente ficava na fron passou a fio de espada; homens e mulheres, meninos
teira entre Judá e Filístia. Gade desejava e criancinhas de peito, e até os bois, jumentos e
ovelhas passou a fio de espada. “ Todavia um dos
que Davi estivesse mais intimamente unido filhos de Aímeleque, filho de Aitube, que se chama
com o seu próprio povo durante aquele va Abiatar, escapou e fugiu para Davi. 21E Abiatar
período. anuneiou a Davi que Saul tinha matado os sacer
dotes do Senhor. 22Então Davi disse a Abiatar:
Bem sabia eu naquele dia que, estando ali Doegue,
4) Saul Perde Apoio Sacerdotal (22.6-23) o edomeu, não deixaria de o denunciar a Saul. Eu
‘Ora, ouviu Saul que já havia noticias de Davi sou a causa da morte de todos os da casa de teu
e dos homens que estavam com ela Estava Saul pai. 23Fica comigo, não temas; porque quem
em Gibeá, sentado, debaixo datamargueira, sobre procura a minha morte também procura a tua;
o alto, e tinha na mão a sua lança, e todos os seus comigo estarás em segurança.
servos que estavam com ele. 7Então disse Saul a Quando Saul foi informado de que Davi
seus servos que estavam com ele: Ouvi, agora,
benjamitas! Acaso ofilho de Jessé ms dará a todos estava reunindo tropas e retomando ao terri
vós terras e vinhas, e fàr-vos-á a todos chefes de tório de Israel, seus piores temores pareciam
milhares e chefes de centenas, 8para que todos vós confirmados. Davi parecia estar se prepa
tenhais conspirado contra mim, e não haja ninguém rando para um ataque maciço contra o
que me avise de ter meu filho feito aliança com o
filho de Jessé, e não haja ninguém dentre vós que trono de Saul. Uma vez que dificilmente
se doa de mim,e me participeo ter meu filho suble se conseguiriam localizar os rebeldes de
vado meu servo contra mim, para me armar ciladas, Davi no deserto de Judá, Saul decidiu
como se vê neste dia? ’Então respondeu Doegue, deixar um exemplo para quantos ajudassem
o edomeu, que também estava com os servos de a causa de Davi. Uma oportunidade para
Saul, e disse: Vi o filho de Jessé chegar a Nobe,
a Aímeleque, filho de Aitube; 10o qual consultou isso surgiu quando um de seus servos,
por ele ao Senhor, e lhe deu mantimento, e lhe deu Doegue, o edomeu, relatou que Aímeleque,
também a espada de Golias, o filisteu. uEntão o um sacerdote de Nobe, tinha dado orien
rei mandou chamar a Aímeleque, o sacerdote, filho tação, provisões e armas a Davi (cf.
de Aitube, e a toda a casa de seu pai, isto é, aos
sacerdotes que estavam em Nobe; e todos eles comentário sobre 21.1-9).
vieram ao rei. 1ZE disse Saul: Ouve, filho de Saul convocou todos os sacerdotes de
Aitube! E ele disse: Eis-me aqui, senhor meu. Nobe para se apresentarem perante ele em
13Então lhe perguntou Saul: Por que conspirastes Gibeá e acusou-os de terem papel impor
contra mim, tu e o filho de Jessé, pois deste-lhe
pão e espada, e consultaste por ele a Deus, para
tante na conspiração de Davi para derrubar
que se levantasse contra mim a armar-me ciladas, o reino. 28Aímeleque admitiu ter dado
como se vê neste dia? 14Ao que respondeu ajuda a Davi, mas declarou-se inocente de
Aímeleque ao rei, dizendo: Quem há, entre todos quaisquer motivos subversivos. Ele não
os teus servos, tão fiel como Davi, o genro do rei, sabia da defecção de Davi da corte de Saul
chefe da tua guarda, e honrado na tua casa?
lsForventura é de hoje que comecei a consultar por e acreditava que apenas estava dando assis-
ele a Deus? Longe de mim tal coisa! Não impute
o rei coisa nenhuma a mim seu servo, nem a toda
H á um reconhecim ento de que profetas e sacerdotes tiveram parti-
a casa de meu pai, pois o teu servo não soube nada cipação ativa em tais m anobras políticas (2Sm 15.12); 16.23; lR s
de tudo isso, nem muito nem pouco. 160 rei, 1.7). Alguns até iniciaram m udanças dinásticas (lR s 11.26-40;
porém, disse: Hás de morrer, Aímeleque, tu e toda 19.15-17).
79
tência a alguém que era um servo leal do Conquanto ele não pudesse desfazer um
rei. erro anterior, Davi tentou pôr as coisas em
Saul, contudo, não se deixou dominar seus devidos lugares, oferecendo proteção
pela razão ou pela justiça, mas sim por um a Abiatar. Essa amizade durou enquanto
neurótico senso de perseguição. Incapaz de Davi viveu.
fazer com que qualquer israelita nativo
tomasse medidas contra os sacerdotes do 5) Davi Liberta Queila (23.1-14)
Senhor, Saul persuadiu Doegue, o edomeu, ‘Ora, foi anunciado a Davi: Eis que os filisteus
a executar sua sentença de morte contra pelejam contra Queila, e saqueiam as eiras. zPelo
eles. Insatisfeito com a morte de 85 homens, que consultou Davi ao Senhor, dizendo: Irei eu,
Saul colocou Nobe sob interdito e massa e ferirei a esses filisteus? Respondeu o Senhor a
Davi: Vai, fere aos filisteus e salva a Queila. 3Mas
crou cada habitante da cidade. Esse deveria os homens de Davi lhe disseram: Eis que tememos
ser o fim de quantos ajudassem Davi e seus aqui em Judá, quanto mais se formos a Queila
rebeldes. contra o exército de filisteus! 4Davi, pois, tornou
Todavia, o plano de Saul de deixar um a consultar ao Senhor, e o Senhor lhe respondeu:
Levanta-te, desce a Queila, porque eu hei de entregar
exemplo pavoroso para o povo, saiu-lhe pela os filisteus na tua mão. 5Então Davi partiu com
culatra, pois calculou erroneamente a os seus homens para Queila, pelejou contra os filis
reação popular ante o assassinato dos sacer teus, levou-lhes o gado, e fez grande matança entre
dotes. Pbr suas ações o rei havia provocado eles; assim Davi salvou os moradores de Queila.
a hostilidade da comunidade religiosa e ‘Ora, quando Abiatar, filho de Aimeleque, fugiu
para Davi, a Queila, desceu com um éfode na mão.
levado Abiatar, o único membro sobrevi 7Então foi anunciado a Saul que Davi tinha ido a
vente da linhagem sacerdotal de Eli, para Queila; e disse Saul: Deus o entregou nas minhas
o lado de Davi. Assim, Davi ganhou a mãos, pois está encerrado, porque entrou numa
amizade daqueles que continuavam a cidade que tem portas e ferrolhos. 8E convocou
todo o povo à peleja, para descerem a Queila, e
manter instituições religiosas associadas cercar a Davi e os seus homens. ’Sabendo, pois,
com o período dos juizes. Agora Davi podia Davi que Saul maquinava este mal contra ele, disse
reivindicar endosso tanto profético (16.13; a Abiatar, sacerdote: Itaze aqui o éfode. 10E disse
22.5) quanto sacerdotal. Saul, por seu turno, Davi: Ó Senhor, Deus de Israel, teu servo acaba
havia afastado de si todo o apoio religioso. de ouvir que Saul procura vir a Queila, para destruir
a cidade por causa de mim. nEntregar-me-ão os
A frase tinha na mão a sua lança pode cidadãos de Queila na mão dele? descerá Saul, como
significar que a lança era um cetro, ou um o teu servo tem ouvido? Ah, Senhor Deus de Israel!
símbolo da autoridade de Saul. Por outro faze-o saber ao teu servo: Respondeu o Senhor:
lado, a freqüência com que ela é mencio Descerá. 12Disse mais Davi: Entregar-me-ão os
cidadãos de Queila, a mim e aos meus homens,
nada talvez reflita a crescente desconfiança nas mãos de Saul? E respondeu o Senhor: Entre
de Saul para com aqueles que estavam ao garão. 13Levantou-se, então, Davi com os seus
seu redor (18.10; 19.9; 20.33; 26.7). Ele homens, cerca de seiscentos, e saíram de Queila,
sentia que tinha de cuidar de sua própria e foram-se aonde pnderam. Saul, quando lhe foi
proteção, o que fazia com que criasse anunciado que Davi escapara de Queila, deixou de
sair contra ele. 14E Davi ficou no deserto, em luga
hábitos como o de sentar-se com as costas res forte, permanecendo na região montanhosa no
para a parede (20.25). deserto de Zife. Saul o buscava todos os dias, porém
Ouvi, agora benjamitas. Saul lembrou Deus não o entregou na sua m ãa
a seus companheiros de tribo que o trabalho
deles na corte dependia de seu governo Em função do conselho implícito nas
continuar existindo. Se Davi chegasse ao instruções do profeta Gade (22.5), Davi
poder, ele tenderia a favorecer os da tribo esperava obter apoio, apresentando-se como
de Judá como seus conselheiros e oficiais. um amigo do povo de Judá. Uma oportu
Eu sou a causa da morte. Davi reco nidade surgiu com um ataque filisteu contra
nheceu que seu logro para Aimeleque tinha Queila, uma cidade murada na fronteira
sido responsável pela destruição de Nobe. de Judá, a cerca de cinco quilômetros
80
abaixo de Adulãa O ataque filisteu visava para ter os planos frustrados pela sensibi
pilhagem, não propriamente conquista lidade de Davi à orientação divina.
permanente, mas a perda de uma safra de A exata natureza do éfode já não é mais
grãos de toda uma estação representaria conhecida. É geralmente descrito como um
considerável prejuízo aos camponeses item dos paramentos .vestidos pelos sacer
locais. dotes (Ex 28.28,29; ISm 2.18; 22.18; 2Sm
Após buscar a direção divina por duas 6.14), mas às vezes parece ser uma imagem
vezes e ignorando as objeções de seus associada com um lugar específico de
homens, Davi avançou para romper o cerco adoração (Jz 8.27; ISm 21.9). Neste
filisteu a Queila. Conquanto pouco se diga contexto, porém, o éfode está claramente
sobre a batalha em si, os israelitas prova associado com a busca de Davi por orien
velmente começaram com um ataque tação divina (23.6-12). Aparentemente, o
contra o comboio de suprimento dos filis éfode sacerdotal servia como receptáculo
teus (cf. Hertzberg, p. 191). Ali os homens do lançamento dos dados sagrados ou o
de Davi capturaram os animais de carga Urim e Tumim. Perguntas eram cuidado
do inimigo e desviaram a atenção, de modo samente formuladas pelo sacerdote, e o
que a força principal de Davi irrompeu Senhor respondeu ao controlar o resultado
contra as forças filistéias e as pôs em deban das sortes lançadas, dando respostas afir
dada. O cerco foi levantado, e os homens mativas ou negativas. A presença de
de Davi instalaram-se temporariamente na Abiatar com o éfode ao lado de Davi servia
cidade. como lembrete visível de que Deus dirigia
Ao ter notícias da ação em Queila, Saul a causa de Davi.
percebeu uma oportunidade de apanhar
Davi num erro estratégico. Se as tropas de 6) Amigos Ampliam Aliança (23.15-18)
Davi permanecessem comprometidas com 15Vendo, pois, Davi que Saul saíra à busca de
a defesa mesmo de um único local fortifi sua vida, esteve no deserto de Zife, em Hores.
cado:, não representariam adversário à altura l6Então se levantou Jônatas, filho de Saul, e foi ter
para as experientes tropas do rei. Davi, com Davi em Hores, e o confortou em Deus; 17e
disse-lhe: Não temas; porque não te achará a mão
contudo, reconhecia sua desvantagem tática de Saul, meu pai; porém tu reinarás sobre Israel,
e o perigo que sua permanência trazia ao e eu serei contigo o segundo; o que também Saul,
povo da cidade. Abandonando o local, meu pai, bem sabe. 18E ambos fizeram aliança
dispersou seus homens no território ao perante o Senhor; Davi ficou em Hores, e Jônatas
voltou para sua casa.
redor. Davi, portanto, recorreu a suas táticas
iniciais de guerrilha e evitou confrontos Em seguida a sua retirada de Queila,
diretos com as forças superiores de Saul. Davi dirigiu seus homens vinte e cinco a
Davi é novamente retratado de modo trinta quilômetros mais ao sudeste, para o
atraente nesta seção. Ele é um líder expe deserto de Judá, a leste de Zife e Maom.
riente e ousado, contudo modestamente não Essas cidades, localizadas respectivamente
aceita qualquer crédito pessoal e reconhece a cinco quilômetros e meio e a treze quilô
a necessidade de buscar a orientação divina. metros e meio ao sul de Hebrom, jazem
Em contraste com o ataque criminoso de ao longo das partes mais elevadas da árida
Saul contra os habitantes de Nobe, Davi encosta ocidental que desce para o Mar
é compreensivo e cheio de consideração Morto. Esse território propiciou a Davi e
para com as pessoas de Queila, que teriam- seus homens alguma pastagem e conside
no entregue a Saul se tivessem sido rável proteção, embora a persistente
convocadas a fazê-lo. O impacto do mas perseguição por Saul (23.14) tornasse difícil
sacre dos sacerdotes de Nobe por Saul ocultar-se.
começa a ser vista Saul dirige suas campa Bem quando as crescentes pressões da
nhas com considerável visão tática somente vida clandestina de Davi estavam para
81
minar sua fé e sua vontade de resistir, reinado de Davi, não devia haver qualquer
Jônatas apareceu, novamente querendo paz idéia de, à força, remover Saul do trono.
com seu amigo. A aliança que foi firmada Eles tinham de esperar pacientemente e
aqui no deserto de Zife marca um decidido aguardar que o Senhor tratasse com Saul
progresso além de quaisquer outras alianças segundo a sua vontade e seu próprio tempo.
anteriormente feitas entre os dois homens. Ikmbéin Saul, meu pai, bem sabe (veja
Estritamente falando, essa era uma proposta comentário sobre 24.16-22).
para formar um governo de coalizão, com
Davi como chefe e Jônatas como a segunda 7) Zifeus Traem Davi (23.19-29)
pessoa em importância. 19Então subiram os zifeus a Saul, a Gibeá,
A narrativa biblica não apresenta qual dizendo: Não se escondeu Davi entre nós, nos
quer informação sobre os acontecimentos lugares fortes em Hores, no outeiro de Haquila,
que conduziram ao encontro de Davi e que está à mão direita de Jesimom?20Agora, pois,
6 rei, desce apressadamente, conforme todo o desejo
Jônatas, e nenhuma interpretação de seu da tua alma; a nós nos cumpre entregá-lo nas mãos
significado para Israel se faz notar. Con do re i.21Então disse Saul: Benditos sejais vós do
tudo, podemos especular que a aliança de Senhor, porque vos compadecestes de mim. 22Ide,
Zife foi o resultado de planejamento cuida pois, informai-vos ainda melhor; sabei e notai o lugar
doso da parte dos dois jovens. Ambos que ele freqüenta, e quem o tenha visto ali; porque
me foi dito que é muito astuta 23Pelo que atentai
entenderam que o profundo abismo que se bem, e informai-vos acerca de todos os esconde
desenvolvia dentro de Israel era o resultado rijos em que ele se oculta; e então voltai para mim
da insegurança e temor irracionais de Saul, com noticias exatas, e eu irei convosco. E há de
que forçaram Davi a sair da corte do rei. ser que, se estiver naquela terra, eu o buscarei entre
todos os milhares de Judá. MEles, pois, se levan
Igualmente podiam prever que a preo taram e foram a Zife adiante de Saul; Davi, porém,
cupação de Saul com a perseguição a Davi e os seus homens estavam no deserto de Maom,
estava reabrindo caminho para um ressur na campina ao sul de Jesimom.25E Saul e os seus
gimento do poder filisteu (cf. 23.1-14,27; homens foram em busca dele. Sendo isso anunciado
28.1—31.13). Do jeito como tudo se achava, a Davi, desceu ele à penha que está no deserto de
Maom. Ouvindo-o Saul, foi ao deserto de Maom,
nem Davi nem Jônatas conseguiriam a perseguir Davi. “ Saul ia de uma banda do
formar um governo viável sem a colabo monte, e Davi e os seus homens da outra banda.
ração do outro, porque cada um deles era E Davi se apressava para escapar, por medo de Saul,
respaldado por grupos que representavam porquanto Saul e os seus homens iam cercando
interesses por demais poderosos para serem a Davi e aos seus homens, para os prender. 27Nisso
veio um mensageiro a Saul, dizendo: Apressa-te,
ignorados. e vem, porque os filisteus acabam de invadir a terra.
Uma coalizão, entretanto, ainda era “ Pelo que Saul voltou de perseguir a Davi, e se
possível. Conquanto a paciência e fé de foi ao encontro dos filisteus. Por esta razão aquele
Davi tivessem diminuído bastante, ele não lugar se chamou Selá-Hamalecote. 29Depois disto,
Davi subiu e ficou nos lugares fortes de En-Gedi.
havia empregado suas forças contra Israel.
Jônatas, de sua parte, estava em posição Este é o primeiro de dois relatos de uma
de garantir que Saul não conseguiria tentativa pelo povo de Zife de entregar Davi
capturar seu amigo Davi. Juntos seriam nas mãos de Saul (cf. 26.1-25). Em ambos
capazes de restabelecer um governo pací os contextos, a tradição dos zifeus precede
fico para Israel. Primeiro, porém, era pre imediatamente uma experiência em que
ciso levar Saul em conta. Davi demonstra seu respeito por Saul como
Desde o princípio da doença de Saul, o ungido do Senhor, após o rei ter milagro
nem Jônatas nem Davi têm sido descritos samente ficado ao alcance de Davi.
em ações que fossem contrárias aos mais Numerosos outros paralelos também
elevados interesses do rei. Conquanto esti existem (cf. 23.19 e 26.1; 24.2 e 26.2; 24.16
vessem convencidos de que o Senhor estava e 25.17; 24.30 e 26.25; 24.22 e 26.25). Os
em processo de demonstrar seu apoio ao dois relatos respaldam mutuamente a auten-
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ticidade histórica em geral da experiência, 5Sucedeu, porém, que depois doeu o coração de
mas é difícil ter certeza acerca das Davi, por ter cortado a orla do manto de Saul. 6E
circunstâncias que cercam o incidente disse aos seus homens: O Senhor me guarde de
que eu faça tal coisa ao meu senhor, ao ungido do
básico. Senhor, que eu estenda a minha mão contra ele,
O acordo entre Davi e Jônatas para pois é o ungido do Senhpr. 7Com essas palavras
formar um governo de coalizão para Israel Davi conteve os seus homens, e não lhes permitiu
(cf. 23.15-18) ainda se deparava com um que se levantassem contra Saul. E Saul se levantou
da caverna, e prosseguiu o seu caminha “Depois
problema básico: Saul permanecia no trono também Davi se levantou e, saindo da caverna, gritou
e continuava perseguindo Davi. Os zifeus, por detrás de Saul, dizendo: Ó rei, meu senhor!
bem cientes do poderio e espírito de Quando Saul olhoii para trás, Davi se inclinou com
vingança de Saul, estavam preparados para o rosto em terra, e lhe fez reverência. ’Então disse
entregar Davi da mesma forma como o Davi a Saul: Por que dás ouvidos às palavras dos
homens que dizem: Davi procura fazer-te mal?
povo de Queila estivera antes deles (23.1-14). 10Eis que os teus olhos acabam de ver que o
Sabendo que os fora-da-lei de Davi tinham Senhor hoje te pôs em minhas mãos nesta caverna;
sido vistos no deserto ao redor de Maom, e alguns disseram que eu te matasse, porém a minha
Saul e suas forças estavam inspecionando mão te poupou; pois eu disse: Não estenderei a
minha mão contra o meu Senhor, porque é o ungido
aquela área quando notícias de um ataque do Senhor. nOlha, meu pai, vê aqui a orla do teu
filisteu contra Israel chegaram ao rei. Saul manto na minha mão, pois cortando-te eu a orla
interrompeu a busca e retirou-se para do manto, não te matei. Considera e vê que não
combater os filisteus sem saber que Davi há na minha mão nem mal nem transgressão
estava logo ali depois da próxima escarpa. alguma, e que não pequei contra ti, ainda que tu
andes à caça da minha vida para ma tirares.
Indubitavelmente, gerações posteriores assi lzJulgue o Senhor entre mim e ti, e vingue-me o
nalaram uma montanha específica onde Senhor de ti; a minha mão, porém, não será contra
Davi tinha por tão pouco escapado de ser ti. 13Como diz o provérbio dos antigos: Dos ímpios
capturado por Saul: Por esta razão aquele procede a impiedade. A minha mão, porém, não
será contra ti. 14Após quem saiu o rei de Israel?
lugar se chamou Selá-Hamalecote, sendo a quem persegues tu? A um cão morto, a uma pulga!
Selá-Hamalecote termo hebraico que signi 15Seja, pois, o Senhor juiz, e julgue entre mim e
fica “a penha de escape”. ti; e veja, e advogue a minha causa, e me livre da
A providência divina novamente se tua m ãa
revelou no espetacular livramento de Davi,
Após escapar por pouco de ser pego por
cuja captura pelo rei era quase certa. O Saul no deserto de Zife, Davi dirigiu-se uns
chocante contraste entre as personalidades 25 quilômetros para o leste, entrando no
de Saul e Davi é visto na comparação deste deserto de Judá até chegar a uma área que
incidente com o que se segue. margeava o Mar Morto. A vida nessa área
é basicamente sustentada por uma fonte
8) Saul Entregue a Davi (24.1-22) de águas quentes chamada En-Gedi, que
a. Davi Poupa Saul (24.1-15) emerge das rochas quase 120 metros acima
‘Ora, quando Saul voltou de perseguir os filis do Mar Morto. O território circunvizinho,
teus, foi-lhe dito: Eis que Davi está no deserto de exceto o oásis adjacente à fonte, é árido e
En-Gedi. 2Então tomou Saul três mil homens esco acidentado, sendo assim ideal para fugitivos
lhidos dentre todo o Israel, e foi em busca de Davi em busca de esconderijo.
e dos seus homens, até sobre as penhas das cabras
monteses. 3E chegou no caminho a uns currais de
A narrativa bíblica não registra o resul
ovelhas, onde havia uma caverna; e Saul entrou nela tado da expedição de Saul contra os filis
para aliviar o ventre. O ra Davi e os seus homens teus. Pode ter-se tratado de um rápido
estavam sentados na parte interior da caverna. ataque de fustigação ou mesmo um alarme
4Então os homens de Davi lhe disseram: Eis aqui falso, pois não se registra qualquer batalha.
o dia do qual o Senhor te disse: Eis que entrego
o teu inimigo nas tuas mãos; far-lhe-ás como parecer Não obstante, mais uma vez o rei não
bem aos teus olhos. Então Davi se levantou, e de deixaria de procurar Davi. Com três mil
mansinho cortou a orla do manto de Saul. homens de elite, Saul seguiu a Davi até En-
83
-Gedi. Uma vez mais, porém, o Senhor 19Pois, quem há que, encontrando o seu inimigo,
interveio. Desta vez para entregar Saul nas o deixará ir o seu caminho? O Senhor, pois, te pague
com bem, pelo que hoje me fizeste.20Agora, pois,
mãos de Davi. sei que certamente hás de reinar, e que o reino de
Davi estava agora em condições de, Israel há de se firmar na tua mão. 21Portanto jura-
numa oportunidade aparentemente dada -me peio Senhor que não desarraigarás a minha
por Deus, remover o último obstáculo que descendência depois de mim, nem extinguirás o
bloqueava o plano seu e de Jônatas para meu nome da casa de meu pai. 2ZEntão jurou Davi
a Saul. E foi Saul para sua casa, mas Davi e os
restaurar a estabilidade do governo de Israel seus homens subiram ao lugar forte.
(23.15-18). O rei poderia ser morto, ou
mesmo capturado, e a dissipação das ener Davi provou que era inocente de
gias de Israel, acarretada por sua intenções traiçoeiras, recusando-se a matar
perseguição a um súdito leal, teria fim. Com Saul na caverna de En-Gedi. O rei, portanto,
Saul fora do caminho, um governo de foi forçado a admitir que suas suspeitas
coalizão poderia ser estabelecido, devol quanto a Davi tinham sido injustas o tempo
vendo assim a razão e a ordem à estrutura todo e que ele tinha estado tratando injus
política de Israel. tamente seu súdito. Davi provara a si mesmo
Davi, contudo, não estava ansioso por que era um homem superior ao manter sua
tomar controle pessoal de questões sob juris compostura diante da séria provocação e
dição divina. Diferentemente de Saul, ele por recusar a violar sua integridade, retri
estava disposto a aguardar o tempo divi buindo o mal com o mal. Ao reconhecer
namente apontado (cf. 13.1-15) para levar tal fato, Saul estava admitindo que não
a efeito a ordem do Senhor (cf. 15.1-23). tinha mais condições para governar. A
Davi, portanto, controlou seus homens,
administração de justiça era uma respon
que recomendavam a pronta execução de sabilidade básica do rei, e seu julgamento
Saul, e, em vez disso, apenas cortou a barra tinha-se provado seriamente deficiente.
do seu manto.29 Se Saul devia ser deposto À luz de sua confissão de que era injusto,
como rei de Israel, Deus teria de prover seus Saul reconheceu que Davi reinaria em
próprios meios para depô-lo. Davi não Israel; e pediu um tratamento magnânimo
ergueria a mão contra o ungido do Senhor. para sua família quando Davi chegasse ao
Não obstante, a oportunidade devia ser poder. Esta passagem é geralmente consi
totalmente aproveitada. Mostrando a barra derada tão-somente uma declaração
do manto de Saul para provar que o rei havia antecipada do papel que Davi iria futura
realmente estado à mercê dele, Davi repre mente desempenhar em Israel (Hertzberg,
endeu Saul por sua insistente disposição p. 197; McKane, p. 147). Como tal, porém,
em considerá-lo desleal. está apenas remotamente ligado à situação
difícil de Davi em En-Gedi. O reconheci
b. Saul Admite a Injustiça (24.16-22) mento por Saul aparentemente significou
16Acabando Davi de folar a Saul todas estas
muito pouco para Davi em termos de enco
palavras, perguntou Saul: É esta a tua voz, meu rajamento, e nada significou para Saul se
filho Davi? Então Saul levantou a voz e chorou. julgarmos por suas atitudes.
17E disse a Davi: Di és mais justo do que eu, pois Por outro lado, as declarações de Saul
me recompensaste com bem, e eu te recompensei fora da caverna em En-Gedi são notavel
com mal. 18E tu mostraste hoje que procedeste
bem para comigo, por isso que, havendo-me o mente semelhantes às de Jônatas quando
Senhor entregado na tua mão, não me mataste. se. encontrou com Davi no deserto de Zife
(23.15-18). Ali ambos fizeram aliança para
29 M cKane (p. 148,149) sugere que n o cortar o m anto do rei, Davi
estabelecer um governo de coalizão com
uniu*se a Samuel era rejeitar Saul como o ungido do Senhor (cf. Davi à frente e Jônatas como o segundo
15.27). Isto explicaria sua contrição diante de seu a to (v. 5-7)quando
veio a perceber a natureza duradoura da bênção de Deus. Observe-
em importância. Parece mesmo que as
-se a sem elhança deste ato com o de Aias (lR s 11.26*40). negociações de Jônatas foram feitas com
84
pleno conhecimento de seu pai e sua apro de Davi ao poder experimenta uma pausa,
vação: “E [Jônatas] disse-lhe: Não temas; e interessantes facetas de sua existência
porque não te achará a mão de Saul, meu clandestina são apresentadas: Samuel morre
pai; porém tu reinarás sobre Israel, e eu serei (25.1); Davi arranja duas esposas (25.2-43)
contigo o segundo; o que também Saul, meu e perde uma outra (25.44). Somente com
pai, bem sabe” (23.17). uma segunda versão da traição dos zifeus
É verdade que as ações de Saul subse e da miraculosa entrega de Saul às mãos
qüentes à visita de Jônatas não refletem de Davi (26.1-25) é que o relato retoma seu
qualquer disposição de sua parte em renun ritmo. Então, grandemente descoroçoado,
ciar a seu reinado. Não obstante, Saul pode Davi torna-se vassalo de Áquis, rei de Gate,
ter encorajado essa aliança e a amizade de enquanto aguarda maiores mudanças em
Jônatas para com Davi para dar a seu Israel. Talvez, mais profundamente do que
inimigo uma falsa sensação de segurança. temos percebido, a nova direção que a narra
Caso soubesse das intenções do pai, Jônatas tiva bíblica toma tenha sido influenciada
jamais teria empreendido tal missão, mas pela morte de Samuel (25.1; cf. lCr 29.29).
Saul parecia capaz de enganar seu próprio É esta a tua voz? Estas palavras melhor
filho a fim de alcançar seus propósitos (cf. se encaixam em 26.17, onde a escuridão
20.3). impede que Saul reconheça facilmente a
Se Saul de fato tentou ludibriar Davi com Davi. Neste contexto Saul parece estar
uma aliança falsa, seu conluio com os zifeus expressando surpresa diante da bondade de
foi ainda mais condenável. Igualmente, o Davi: “Você está realmente falando sério,
ato pelo qual Deus frustrou seus planos na Davi?”
Psnha de Escape (23.28) foi ainda mais Sei. Esta palavra em hebraico (yada‘ti)
apropriado, porque a traição de Saul fora pode transmitir uma ampla variedade de
inútil e o Senhor o havia entregue às mãos sentidos, além deste mais comum que
de Davi em En-Gedi. A poderosa demons aparece em nossa tradução. A tradução
tração divina de apoio a Davi forçou Saul “confesso” ou “reconheço” estaria bem mais
a estabelecer um acordo ainda menos vanta de acordo com a interpretação do parágrafo
joso do que aquele que Jônatas fizera com acima (cf. Jr 3.13; 14.20; SI 51.3).
Davi em Zife. Desta vez Jônatas não foi
mencionado, mas Davi reafirmou seu 9) Davi se Casa com Abigail (25.1-44)
compromisso anterior de agir generosa Este relato do casamento de Davi com
mente para com a família de Saul (Jônatas) Abigail coloca-se entre as obras-primas lite
(20.42). rárias do Antigo Testamento. O autor
É possível que Saul nunca tenha dese combinou nítidas descrições das persona
jado cumprir sua parte neste novo acordo, gens, romance, intriga, sabedoria e humor
e Davi certamente teve todos os motivos num dos mais belos exemplos de redação
para ser cauteloso. Ainda mais desconfiado de breves histórias da literatura antiga. Não
da integridade de Saul do que antes, Davi se trata, porém, duma simples história. O
retornou à fortaleza quando Saul foi para que a princípio parece ser apenas um relato
Gibeá, talvez para preparar uma transfe bem feito de um dos casamentos mais inte
rência de poder. ressantes de Davi, na realidade fala de uma
Desafortunadamente, nada mais se diz sutil, mas séria crise moral na vida de Davi.
quanto ao resultado do reconhecimento por Em En-Gedi Davi havia recusado fazer
Saul do direito de Davi governar (cf. comen justiça divina com suas próprias mãos. Ele
tário sobre 24.16-22). É interessante, conseqüentemente havia tratado Saul com
contudo, observar que a natureza da narra extrema generosidade a despeito das repe
tiva bíblica muda um pouco ao final do tidas tentativas do rei em tirar sua vida. Ao
capítulo 24.0 rápido progresso da ascensão tratar Nabal, contudo, Davi esteve pronto
85
para liquidar todos os membros do sexo todos os dias que andamos com eles apascentando
masculino de toda uma família por causa as ovelhas. 17Considera, pois, agora e vê o que hás
de fazer, porque o mal já está de todo determinado
de um insulto e de alimento de que neces contra o nosso amo e contra toda a sua casa; e
sitava. Somente a oportuna intervenção de ele é tal filho de Belial, que não há quem lhe possa
Deus na pessoa da bela esposa de Nabal falar.
reteve a mão de Davi. O Senhor novamente
demonstrou seu providencial cuidado por Numa sociedade moderna, bem organi
seu príncipe ungida zada, a maneira de Davi sustentar sua tropa
pareceria uma forma de extorsão ilegal. Bar
a. Davi Vende Proteção (25.1-17) controlar seu bando heterogêneo (22.2) e
'O ra, faleceu Samuel; e todo o Israel se
impedir ataques por parte de beduínos que
ajuntou e o pranteou; e o sepultaram na sua casa, passavam por ali (cf. 30.1 e s .), Davi espe
em Ramá. E Davi se levantou e desceu ao deserto rava receber tributo da população local,
de Parã. 2Havia um homem em Maom que tinha estando preparado para fazê-lo.
as suas possessões no Carmela Este homem era Conquanto alguns proprietários de terra
muito rico, pois tinha três mil ovelhas e mil cabras:
e estava tosquiando as suas ovelhas no Carmela obviamente objetassem às exigências de
3Chamava-se o homem Nabal, e sua mulher Davi, o tributo que ele esperava receber não
chamava-se Abigail; era a mulher sensata e formosa; parece ter sido considerado excessivo para
o homem, porém, era duro, e maligno nas suas os padrões da época. Aparentemente os
ações; e era da casa de Calebe. 4Ouviu Davi no próprios servos de Nabal e mesmo sua
deserto que Nabal tosquiava as suas ovelhas, se
enviou-lhe dez mancebos, dizendo-lhes: Subi ao esposa julgaram que Davi merecia alguma
Carmela, ide a Nabal e perguntai-lhe, em meu nome, compensação pela proteção que havia dado
como está. 6Assim lhe direis: Paz seja contigo, e aos pastores de Nabal no deserto. Ademais,
com a tua casa, e com tudo o que tens. 7Agora, os homens de Davi apareceram para receber
pois, tenho ouvido que tens tosquiadores. Ora, os
pastores que tens acabam de estar conosco; agravo pagamento ao final da época da tosquia,
nenhum lhes fizemos, nem lhes desapareceu coisa quando se podia esperar que o proprietário
alguma por todo o tempo que estiveram no Carmela normalmente oferecesse uma festa e
8Pergunta-o aos teus mancebos, e eles to dirãa compartilhasse seus ganhos com os vizi
Que achem, portanto, os teus servos graça aos teus
olhos, porque viemos em boa ocasiãa Dá, pois,
nhos (cf. 2Sm 13.23).
a teus servos e a Davi, teu filho, o que achares à Conquanto não esteja explícito em parte
mão. ’Chegando, pois, os mancebos de Davi, alguma, nosso autor parece dar a entender
falaram a Nabal todas aquelas palavras em nome que a recusa de Nabal tinha motivação polí
de Davi, e se calaram.10Ao que Nabal respondeu tica. Davi é comparado a um servo que
aos servos de Davi, e disse: Quem é Davi, e quem
o filho de Jessé? Muitos servos há que hoje fogem fugiu de seu mestre, a um rebelde a quem
ao seu senhor. uTomaria eu, pois, o meu pão, e a Nabal não estava disposto a sustentar. Davi
minha água, e a carne das minhas reses que degolei aparentemente encontrara um considerável
para os meus tosquiadores, e os daria a homens número de pessoas que, como Nabal, os
que não sei donde vêm? 12Então os mancebos de
Davi se puseram a caminho e, voltando, vieram zifeus e o povo de Queila, permaneciam
anunciar-lhe todas estas palavras. uPelo que disse leais a Saul. Abigail, por outro lado, levou
Davi aos seus homens: Cada um cinja a sua espada. provisões a Davi não apenas porque ele era
E cada um cingiu a sua espada, e Davi também um poderoso combatente, mas porque o
cingiu a sua, e subiram após Davi cerca de quatro Senhor o havia designado como príncipe
centos homens, e duzentos ficaram com a bagagem.
14Um dentre os mancebos, porém, o anunciou a (nagid) sobre Israel (25.30). A disputa pelo
Abigail, mulher de Nabal, dizendo: Eis que Davi trono de Israel tinha se tornado qúestão
enviou mensageiros desde o deserto a saudar o de acirrada controvérsia e que até mesmo
nosso amo; e ele os destratou. I5Todavia, aqueles trouxera dissensão a muitos lares entre o
homens têm-nos sido muito bons, e nada nos desa
pareceu por todo o tempo em que convivemos com povo de Deus.
eles quando estávamos no campa 16De muro em Faleceu Samuel (veja comentário sobre
redor nos serviram, assim de dia como de noite, 24.16-22).
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Davi então desceu ao deserto de Parã. de meu senhor, que enviaste.26Agora, pois, meu
O manuscrito Vaticano da Septuaginta reza senhor, vive o Senhor, e vive a tua alma, porquanto
o Senhor te impediu de derramares sangue, e de
aqui Maom, e o restante do contexto indica te vingares com a tua própria* mão, sejam agora
essa localidade. Carmelo (palavra hebraica como Nabal os teus inimigos e os que procuram
que significa terra-jardim) designa uma fazer o mal contra o meu senhor.27Aceita agora
aldeia cerca de onze quilômetros a sul- este presente que a tua serva trouxe a meu senhor;
seja ele dado aos mancebos que seguem ao meu
-sudeste de Hebrom e não ao promontório senhor. P erd o a, pois, a transgressão da tua serva;
ao sul de Aco (Js 15.55; ISm 15.12). O porque certamente fará o Senhor casa firme a meu
deserto de Parã associado à época de Moisés senhor, pois meu senhor guerreia as guerras do
(Nm 13.26; cf. Dt 1.1-22) estava localizado Senhor; e não se achará mal em ti por todos os
perto de Cades-Baméia e, portanto, muito teus dias. 29Se alguém se levantar para te perseguir,
e para buscar a tua vida, então a vida de meu senhor
mais ao sul para ser o território aqui mencio será atada no feixe dos que vivem com o Senhor
nado. teu Deus; porém a vida de teus inimigos ele arro
Nabal era da casa de Calebe. O autor jará ao longe, como do côncavo de uma funda.
demonstra ter uma apreciação bem ^Quando o Senhor tiver feito para com o meu
senhor conforme todo o bem que já tem dito de
pequena pelos descendentes de Calebe, que ti, e te houver estabelecido por príncipe sobre Israel,
formavam um clã dentro da tribo de Judá. 31então, meu senhor, não terás no coração esta tris
Note-se como o autor associa o clã de Nabal teza nem este remorso de teres derramado sangue
com o seu caráter (duro, isto é, grosseiro, sem causa, ou de haver-se vingado o meu senhor
e maligno nas suas ações) em vez de com a si mesma E quando o Senhor fizer bem a meu
senhor, lembra-te então da tua serva.
sua cidade natal.
De muro em redor nos serviram.
O papel de Davi como o protetor não
Compare-se esta figura de linguagem com
oficial, e às vezes não bem acolhido, da vida
a experiência de Israel no Mar Vermelho
no deserto de Judá parece ter sido consi
(Ex 14.22).
derado razoavelmente legítimo (cf.
comentário sobre 25.1-16). Não obstante,
b. Abigail Intercede (25.18-31) não devemos concluir que os planos de Davi
para uma violenta represália ao insulto de
18Então Abigail se apressou, e tomou duzentos
pães, dois odres de vinho, cinco ovelhas assadas, Nabal mereçam complacência. Tais atitudes
cinco medidas de trigo tostado, cem cachos de seriam de se esperar de um bandoleiro
passas, e duzentas pastas de figos secos, e os pôs ocioso, mas não eram dignas do líder esco
sobre jumentos. 19E disse aos seus mancebos: Ide lhido por Deus para seu povo. Davi havia
adiante de mim; eis que vos seguirei de perta Porém
não o declarou a Nabal, seu marido. “ E quando
decidido na caverna de En-Gedi que não
ela, montada num jumento, ia descendo pelo enco elevaria a mão contra o legítimo rei de
berto do monte, eis que Davi e os seus homens lhe Israel. Agora, em Carmelo, ele é levado a
vinham ao encontro; e ela se encontrou com eles. ver que não deve igualmente empregar seu
21Ora, Davi tinha dito: Na verdade que em vão poder para prevalecer-se sobre seus
tenho guardado tudo quanto este tem no deserto,
de sorte que nada lhe faltou de tudo quanto lhe oponentes entre o povo em geral (25.26,33).
pertencia; e ele me pagou mal por bem .22Assim Quando Abigail soube que seu marido
faça Deus a Davi, e outro tanto, se eu deixar até recusara insultuosamente atender o pedido
o amanhecer, de tudo o que pertence a Nabal, um de Davi, imediatamente preparou uma
só varão. 23Vendo, pois, Abigail a Davi, apressou-
-se, desceu do jumento e prostrou-se sobre o seu
dádiva de provisões e secretamente partiu
rosto diante de Davi, inclinando-se à terra, Me, para aplacar a ira de Davi. Assumindo plena
prostrada a seus pés, lhe disse: Ah, senhor meu, responsabilidade pela afronta ao orgulho
minha seja a iniqüidade! Deixa a tua serva falar de Davi, ela suplicou-lhe que não fizesse
aos teus ouvidos, e ouve as palavras da tua serva. vingança com as próprias mãos, mas que
2SRogo-te, meu senhor, que não faças caso deste
homem de Belial, a saber, Nabal; porque tal é ele esperasse a justiça divina, que seguramente
qual é o seu nome. Nabal é o seu nome, e a loucura adviria no tempo certo. A reaçao dela foi
está com ele; mas eu, tua serva, não vi os mancebos sábia, indicando ter consciência tanto dos
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acontecimentos políticos que estavam divi de rei; e o coração de Nabal estava alegre, pois
dindo Israel como também de sua ele estava muito embriagado; pelo que ela não lhe
deu a entender nada daquilo^ nem pouco nem muito,
significação teológica. até a luz da manhã. 37Sucedeu, pois, que, pela
Ide adiante. Abigail remeteu sua dádiva manhã, estando Nabal já livre do vinho, sua mulher
à frente dela a fim de que Davi tivesse uma lhe contou essas coisas; de modo que o seu coração
atitude favorável para encontrá-la quando desfaleceu, e ele ficou como uma pedra. 38Passados
uns dez dias, o Senhor feriu a Nabal, e ele morreu.
ela chegasse (cf. Gn 32.13-21). O tamanho 39Quando Davi ouviu que Nabal morrera, disse:
do presente parece bem modesto se compa Bendito seja o Senhor, que me vingou da afronta
rado com o número de homens sob Davi. que recebi de Nabal, e deteve do mal a seu servo,
Abigail proferiu um jogo de palavras fazendo cair a maldade de Nabal sobre a sua cabeça.
com o nome de Nabal: porque tal é ele qual Depois mandou Davi falar a Abigail, para tomá-la
por mulher. 40Vindo, pois, os servos de Davi, a
é o seu nome. O nome Nabal vem de uma Abigail, no Carmelo, lhe falaram, dizendo: Davi
raiz hebraica que significa “insensato” ou nos mandou a ti, para te tomarmos por sua mulher.
“tolo”. A palavra é especialmente usada para 41Ao que ela levantou, e se inclinou com o rosto
designar alguém que carece de percepção em terra, e disse: Eis que a tua serva servirá de
criada para lavar os pés dos servos de meu senhor.
de valores éticos ou morais, pelo que o troca 42Então Abigail se apressou e, levantando-se,
dilho de Abigail é bem apropriado. montou num jumento, e levando as cinco moças
Agora, pois, meu senhor, vive o Senhor. que lhe assistiam, seguiu os mensageiros de Davi,
Meu senhor designa Davi, e o Senhor indica que a recebeu por mulher. 43Davi tomou também
Deus. Esta confusão não ocorre no texto a Aínoã de Jizreel; e ambas foram suas mulheres.
"Pois Saul tinha dado sua filha Milca, mulher de
hebraico, onde as consoantes para o nome Davi, a Palti, filho de Laís, o qual era de Galim.
próprio de Deus (YHWH) aparecem toda
vez que nossa tradução traz o Senhor. Ao evitar que Davi consumasse seu
Atada no feixe dos que vivem é uma ataque retaliatório, Abigail impediu-o de
figura de linguagem que parece ter origem derramar sangue inocente, o que teria
no fato de que o chefe de família fazia um causado censura ao seu governo antes que
feixe de seus bens mais preciosos de modo este começasse. Não obstante, o autor deixa
que os pudesse proteger e dedicar-lhes sua claro que, em última instância, Deus é o
atenção pessoal (Smith, p. 227). Os antigos ator principal desse drama. Abigail tinha
julgavam que especialmente os que vivem servido como porta-voz do Senhor quando
estavam sob a supervisão direta de Deus. ele novamente protegeu e dirigiu a vida de
Desse modo, essa declaração revela a seu príncipe ungido.
convicção de Abigail de que Davi viveria Conquanto o clímax da história tivesse
uma existência longa, cheia de vida, sob sido alcançado, o desfecho não era menos
o cuidado pessoal de Deus. interessante para o leitor da antigüidade.
O antigo senso de justiça e a antiga teologia
c. Davi Renuncia à Vingança (25.32-44) concordavam em requerer que todos os
erros fossem reparados antes que a ação
32Ao que Davi disse a Abigail: Bendito seja o chegasse a um fim. Renunciando à reta
Senhor Deus de Israel, que hoje te enviou ao meu
encontro! 33E bendito seja o teu conselho, e bendita liação contra Nabal, Davi permitiu que a
sejas tu, que hoje me impediste de derramar sangue, responsabilidade pela vingança ficasse a
e de vingar-me pela minha própria mão! ^Pois, na cargo do Senhor, como apropriadamente
verdade, vive o Senhor Deus de Israel que me devia ser.
impediu de te fazer mal, que se tu não te apressaras
e não me vieras ao encontra, não teria ficado a Nabal A morte precoce de Nabal e o casamento
até a luz da manhã nem mesmo um menina subseqüente de sua viúva foram entendidos
35Então Davi aceitou da mão dela o que lhe tinha como demonstração divina da inocência
trazidoi, e lhe disse: Sobe em paz à tua casa; vê de Davi e de seu comportamento correto
que dei ouvidos à tua voz, e aceitei a tua foce;
“ Ora, quando Abigail voltou para Nabal, eis que
em todo o episódio. A honra de Davi fora
ele fàzia em sua casa um banquete, como banquete defendida pelo próprio Senhor!
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Quando Abigail contou a Nabal o que se deitavam Saul e Abner, filho de Ner, chefe do
havia ocorrido, o seu coração desfaleceu. seu exércita E Saul estava deitado dentro do acam
pamento, e o povo estava acampado ao redor dela
O papel do coração na circulação sangüínea 6Então Davi, dirigindo-se a Aümeleque, o heteu, e
era desconhecido aos povos antigos. Na a A bisai, filho de Zeruia, irmão de Joabe, pergun
psicologia hebréia, o coração representava tou: Quem descerá comigo a Saul, ao arraial?
o centro do ser íntimo do homem, donde Respondeu Abisai: Eu descerei contiga 7Foram,
partiam sua vontade, ação e razão. Nabal, pois, Davi e Abisai de noite ao povo; e eis que Saul
estava deitado, dormindo dentro do acampamento,
portanto, ficou mudo e paralisado pelo e a sua lança estava pregada na terra à sua cabe
choque. Após permanecer em coma por dez ceira; e Abner e o povo estavam deitados ao redor
dias, sofreu outro ataque e morreu. dela “Então disse Abisai a Davi: Deus te entregou
Mandou Davi falar a Abigail. Davi hoje nas mãos o teu inimigo; deixa-me, pois, agora
encravá-lo na terra, com a lança, de um só golpe;
aparentemente tinha grande respeito pela não o ferirei segunda vez. 9Mas Davi respondeu
sabedoria de Abigail bem como apreciação a Abisai: Não o mates; pois quem pode estender
por sua beleza. Por sua parte, Abigail estava a mão contra o ungido do Senhor, e ficar inocente?
disposta a servir a Davi como um de seus I0Disse mais Davi: Como vive o Senhor, ou o
Senhor o ferirá, ou chegará o seu dia e morrerá,
mais humildes servos. Nada se diz do ou descerá para a batalha e perecerá; uo Senhor,
respaldo material ou moral que esse casa porém, me guarde de que eu estenda a mão contra
mento propiciou a Davi, mas deve ter sido o ungido do Senhor. Agora, pois, toma a lança que
considerável (Hertzberg, p.205). O mesmo está à tua cabeceira, e a bilha d’âgua, e vamo-nos.
se poderia dizer de seu casamento com I2Tomou, pois, Davi a lança e a bilha d’âgua da
cabeceira de Saul, e eles se foram. Ninguém houve
Ainoã de Jizreel, em Judá. que o visse, nem que o soubesse, nem que acordasse;
Saul tinha dado (...) Mical (...) a Pálti. porque todos estavam dormindoi, pois da parte do
Saul talvez tenha justificado sua atitude, Senhor havia caído sobre eles um profundo sona
alegando que Davi havia rejeitado a Mical As semelhanças entre o conteúdo do
e lhe trazido má reputação quando a aban capítulo em pauta e os acontecimentos
donou em sua fuga da corte (cf. Dt 22.13-21; narrados em 23.19—24.22 são tão impres
24.1-4). Por outro lado, pode ser que Saul sionantes que não podem ser ignoradas. A
tenha sido movido por motivos políticos. maioria dos comentaristas têm concluído
Talvez estivesse tentando negar a Davi qual que as duas passagens são versões diferentes
quer direito a um laço legítimo com a do mesmo incidente e que o autor incluiu
família real de Israel. Certamente esse casa ambas para atingir seu objetivo particular.
mento teve um significado incomum para Por outro lado, muitos ainda insistem em
Davi (2Sm 3.14-16). que Davi foi traído duas vezes pelos zifeus,
que Saul empregou 3 mil soldados nas duas
10) Novo Ato de Traição dos Zifeus expedições, que Deus milagrosamente
(26.1-25) entregou Saul nas mãos de Davi em ambas
as ocasiões, e que nas duas vezes Saul disse:
a. Davi Penetra no Acampamento de Saul “Não é esta tua voz, meu filho Davi?”, e
(26.1-12) que, por fim, Saul confessou suas injustiças
'O ra, vieram os zifeus a Saul, a Gibeá, para com Davi.
dizendo: Não está Davi se escondendo no outeiro A questão real, entretanto, não é se essas
de Haquila, defronte de Jesimom? 2Então Saul se
levantou, e desceu ao deserto de Zife, levando
passagens refletem acontecimentos distintos
consigo três mil homens escolhidos de Israel, para ou um único. Muito mais importante é
buscar a Davi no deserto de Zife. 3E acampou-se descobrir por que o autor bíblico preferiu
Saul no outeiro de Haquila, defronte de Jesimom, incluir dois incidentes semelhantes dentre
junto ao caminho; porém Davi ficou no deserto, todos os inúmeros acontecimentos em que
e percebendo que Saul vinha após ele ao deserto,
4enviou espias, e certificou-se de que Saul tinha tanto Saul como Davi estiveram envolvidos.
chegada 5Então Davi levantou-se e foi ao lugar Logicamente nunca podemos dizer em defi
onde Saul se tinha acampado; viu Davi o lugar onde nitivo o que ia na mente de pessoas que
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viveram milhares de anos atrás. Não do Senhor (cf. comentário sobre 24.1-15,
obstante, podemos notar as diferenças 16-22). O máximo que ele pôde fazer foi
marcantes entre os dois episódios e tirar tomar a lança e o cantil de Saul como prova
certas conclusões a partir de nossas desco de que conseguira penetrar no acampa
bertas. mento do rei.
A forma dos relatos apresenta diferenças Contudo, tal como no relatório anterior,
quanto aos detalhes, que são por demais é evidente que Davi não estava agindo
numerosas para serem aqui enumeradas, sozinho. O Senhor tornara toda a aventura
mas, no geral, as mesmas questões básicas possível, fazendo com que um sono
ou interesses teológicos se refletem em profundo e incomum caísse sobre o rei e
ambas as passagens. O presente contexto, todos os seus homens.
contudo, varia significativamente do
primeiro relato da traição dos zifeus e dos b. Davi Confronta Saul (26.13-25)
acontecimentos subseqüentes em quatro
aspectos principais: retrata Davi num papel 13Então Davi, passando à outra banda,pôs-se
no cume do monte, ao longe, de maneira que havia
mais ousado (v. 4 e s.); menciona a repre grande distância entre eles. 14E Davi bradou ao
ensão de Abner por Davi (v. 15 e s.); reflete povo, e a Abner, filho de Ner, dizendo: Não respon
o temor de Davi em deixar Israel (v. 19 e derás, Abner? Então Abner respondeu e disse:
s.); e oferece uma idéia bem mais ampla da Quem és tu, que bradas ao rei? ISAo que disse
bênção de Saul a Davi (v. 25). Essas dife Davi a Abner: Não és tu um homem? e quem há
em Israel como tu? Por que, então, não guardaste
renças serão discutidas em maiores detalhes o rei, teu senhor? porque um do povo veio para
numa análise de versículos específicos. destruir o rei, teu senhor. 16Não é isso bom que
Defronte de Jesimom é a área entre a fizeste. Vive o Senhor, que sois dignos de morte,
porque não guardastes a vosso senhor, o ungido
região montanhosa de Judá e o Mar Morto. do Senhor. Vede, pois, agora onde está a lança do
É mais freqüentemente chamada deserto rei, e a bilha dágua que estava à sua cabeceira.
de Judá. Sendo que se desconhece qual era 17Saul reconheceu a voz de Davi, e disse: Não é
a área de Jesimom, pode-se dizer que ficava esta a tua voz, meu filho Davi? Respondeu Davi:
tanto a leste como ao sul (23.19). Os locais É a minha voz, ó rei, meu senhor. 18Disse mais:
Por que o meu senhor persegue tanto o seu servo?
exatos são desconhecidos, mas a área em que fiz eu? e que maldade se acha na minha mão?
questão situava-se num triângulo entre 19Ouve, pois, agora, ó rei, meu senhor, as palavras
Hebrom, Zife e En-Gedi. de teu servo: Se é o Senhor quem te incita contra
Quem descerá comigo a Saul, ao arraial? mim, receba ele uma oferta; se^ porém, são os filhos
dos homens, malditos sejam perante o Senhor, pois
Os relatos anteriores do livramento de Davi eles me expulsaram hoje para que eu não tenha
da mão de Saul na Pbnha do Escape (23.38) parte na herança do Senhor, dizendo: Vai, serve
e na caverna de En-Gedi (24.1 e s.) ressal a outros deuses. 20Agora, pois, não caia o meu
taram a instrumentalidade divina. Ali Davi sangue em terra fora da presença do Senhor; pois
era retratado quase como que um recipiente saiu o rei de Israel em busca duma pulga, como
quem persegue uma perdiz nos montes. 21Então
passivo da graça e poder do Senhor. Neste disse Saul: Pequei; volta, meu filho Davi, pois não
contexto, contudo, Davi é retratado como tornarei a fazer-te mal, porque a minha vida foi
um guerreiro ousado, cujas façanhas e hoje preciosa aos teus olhos. Eis que procedi como
conquistas são ansiosamente relatadas. um louco, e errei grandissimamente. 22Davi então
respondeu, e disse: Eis aqui a lança, ó rei! Venha
Após atrair Saul para o deserto, Davi pesso cá um dos mancebos, e leve-a. 230 Senhor, porém,
almente penetra no acampamento de Saul pague a cada um a sua justiça e a sua lealdade;
e localiza-o dormindo no meio de todo seu , pois o Senhor te entregou hoje na minha mão, mas
exército. não quis estender a mão contra o ungido do Senhor.
Novamente, como na caverna de En- 24E assim como foi a tua vida hoje preciosa aos
meus olhos, seja a minha vida preciosa aos olhos
-Gedi, Davi recusa-se a permitir que qual do Senhor, e livre-me ele de toda a tribulação.
quer mal sobrevenha ao ungido do Senhor, 25Então Saul disse a Davi: Bendito sejas tu, meu
preferindo deixar o destino de Saul nas mãos filho Davi, pois grandes coisas farás e também certa-
90
mente prevalecerás. Então Davi se foi o seu caminho outra escolha. O autor selecionou e orga
e Saul voltou para o seu lugar.
nizou seu material com extrema habilidade,
O autor realça a consciência que temos de modo a transmitir o significado dramá
do perigo que Davi corria em sua aventura, tico dos eventos momentosos que estavam
assinalando como ele estabelece uma ocorrendo. Ao ter Davi de enfrentar no capí
distância segura entre ele e o exército de tulo seguinte sua peregrinação entre os
Saul ãntes de ousar despertar o rei. Então, filisteus, este ousado ataque no deserto
como que para prolongar o drama, ele se oferece ao autor uma oportunidade para
dirige a Abner. O sarcasmo mordaz de Davi explorar a relutância de Davi em dar os
ao repreender Abner não é tanto dirigido passos decisivos que estão à sua frente.
ao próprio homem quanto à futilidade de Vai, serve a outros deuses. Em algumas
sua tarefa. A lealdade de Abner a Saul é etapas do pensamento do Antigo Testa
inquestionável. Fora ele quem apresentara mento, o povo cria que o Senhor podia ser
Davi a Saul (17.55-58) e quem se sentava adorado somente entre seu próprio povo
em posição de honra ao lado do rei ao serem e no território ocupado por eles. Assim, a
tratadas as questões de estado (20.25). Após decisão de Rute de ficar com Noêmi
a morte de Saul em Gilboa, foi Abner quem envolvia a aceitação do Deus de Noêmi (Rt
tentou pôr o filho de Saul no trono de Israel 1.16; 2.12). Também, quando Naamã
(2Sm 2.8). Davi até mesmo parece ter um desejou adorar a Deus em sua terra natal,
profundo respeito por seu adversário de ele levou consigo um pouco de terra isra
longa data (2Sm 3.31-35). A reprimenda elita sobre o qual erigiria um altar (2Rs
sarcástica de Davi para com alguém com 5.17). Davi relutava em deixar Israel porque
credenciais tão impecáveis assinalava a futi sentia que isto iria de algum modo separá-
lidade de quando mesmo o melhor homem lo de sua muito íntima comunhão com
empreende um trabalho em que Deus não Deus (cf. 22.5). Outras passagens do Antigo
está presente. Abner havia falhado, não Testamento retratam o domínio universal
porque fosse um mau soldado, mas porque de Deus (Jz 5.19-23; ISm 6.1-9; Jr 2.5-11),
o Senhor estava operando contra ele. e talvez Davi mesmo tenha conhecido este
Ao continuar a conversa entre Davi e aspecto da natureza divina. Não obstante,
Abner, Saul reconheceu a voz familiar, as emoções de Davi levam-no a temer
ouvida no meio da escuridão da noite, e separar-se de sua terra, de seu povo, de seu
supôs que fosse Davi. Este imediatamente Deus.
atacou o ponto crucial da questão e per Davi empregou uma interessante
guntou a Saul por que estava a persegui-lo. descrição da perseguição de Saul: como
Se Deus estava usando Saul como um quem persegue uma perdiz nos montes.
instrumento de sua ira, Davi suplicava que, Essa ave não voaria do perigo a menos que
sem demora, lhe fosse concedido perdão. fosse abruptamente assustada, mas correria
Contudo, se a perseguição de Saul era de pelo chão. Os caçadores mantinham a ave
origem humana, Davi pedia que uma em movimento até ficar exausta, e então
maldição recaísse sobre os responsáveis. podia ser capturada com facilidade. Esta
Davi reconheceu que estava sendo expulso era exatamente a estratégia de Saul em sua
de Israel. Numa súplica dirigida tanto a perseguição de Davi.
Deus quanto a Saul, Davi rogou que lhe Grandes coisas farás e também certa
fosse dada uma oportunidade, de modo que mente prevalecerás. As declarações de Saul
não tivesse de deixar seu próprio povo. acerca do futuro de Davi são aqui muito
Estava ciente de todos os perigos do exílio: mais reservadas do que aquelas que fez
pessoais, políticos e religiosos. Ansiava por quando do encontro de ambos em En-Gedi
outro caminho, mas estava sendo caçado (24.20). Neste contexto, o pronunciamento
como um animal e parecia-lhe não haver de Saul está na forma de um oráculo enig-
91
mático, que tanto pode refletir esperança 6Então lhe deu Aquis naquele dia a cidade de
quanto ameaça, dependendo de sua inter Ziclague; pelo que Ziclague pertence aos reis de
Judá, até o dia de hoje 7E o número dos dias que
pretação. Saul apenas disse: “você fará Davi habitou na terra dos filisteus foi de um ano
muitas coisas e terá êxito nelas”. Vistas de e quatro meses. 8Ora, Davi e os seus homens
uma perspectiva positiva, essas palavras subiam e davam sobre os gesuritas, e os girzitas,
reconhecem a habilidade de Davi e prevêem e os amalequitas; pois, desde tempos remotos, eram
um futuro brilhante para ele. Para o ingênuo estes os moradores da terra que se estende na
direção de Sur até a terra do Egita 9E Davi feria
e crédulo soaria como se o rei estivesse nova aquela terra, não deixando com vida nem homem
mente admitindo a vitória dos rebeldes, nem mulher; e, tomando ovelhas, bois, jumentos,
num reconhecimento de que Davi final camelos e vestuários, voltava, e vinha a Aquis. 10E
mente triunfaria. quando Áquis perguntava: Sobre que parte fizeste
incursão hoje? Davi respondia: Sobre o Negebe
Davi, que conhecia Saul melhor, deve de Judá; ou: Sobre o Negebe dos jerameelitas; ou:
ter notado as coisas que Saul deixou de Sobre o Negebe dos queneus. "E Davi não
dizer. Saul, por exemplo, não deu qualquer deixava com vida nem homem nem mulher para
indicação de que sentisse a perda da direção trazê-los a Gate, pois dizia: Para que porventura
divina ou de que reconhecesse o poder de não nos denunciem, dizendo: Assim fez Davi. E
este era o seu costume por todos os dias que habitou
Deus operando através dos atos de Davi. na terra dos filisteus. 12Áquis, pois, confiava em
Ainda mais evidentemente, deixou de fazer Davi, dizendo: Fez-se ele por certo aborrecível para
qualquer associação entre Davi e o trono com o seu povo em Israel; pelo que me será por
de Israel. servo para sempre
Em resumo, Davi foi informado de que Davi saiu do deserto de Zife com uma
estava livre para continuar vivendo em compreensão mais clara de seu futuro
Israel somente se desistisse de qualquer idéia pouco promissor em Israel. Mesmo que
de Davi se tomar rei. Quaisquer esperanças, pudesse confiar que Saul pouparia sua vida
que, após a experiência em En-Gedi, ainda (26.21), o preço da paz seria elevado. Davi
existissem de uma solução pacífica para as teria de deixar de lado seu senso de missão
disputas dinásticas de Israel, estavam agora divina para garantir sua segurança pessoal.
perdidas. Plenamente resolutos, Davi e Saul Sendo que não era capaz de confiar em
seguiram caminhos diferentes. Saul, nem estava disposto a ignorar sua
unção como futuro rei de Israel, a con
6. Davi se Une aos Filisteus (ISm tínua perseguição por Saul deixou Davi
27.1—2Sm 1.27) sem qualquer outra alternativa a não ser
sair do território israelita.
1) Davi Torna-se Vassalo (27.1-12) No entanto, a vida de Davi entre os filis
‘Disse, porém, Davi no seu coração: Ora, pere teus estava também eivada de perigos. Por
cerei ainda algum dia pela mão de Saul; não há um lado, sempre havia a possibilidade de
coisa melhor para mim do que escapar para a terra que Áquis descobrisse os verdadeiros obje
dos filisteus, para que Saul perca a esperança de
mim, e cesse de me buscar por todos os termos tivos de Davi e tomasse medidas contra ele.
de Israel; assim escaparei da sua mão. 2Então Davi O exército pessoal de Davi, uma força de
se levantou e passou, com os seiscentos homens razoáveis proporções, poderia ter propiciado
que com ele estavam, para Aquis, filho de Maoque, uma certa proteção para ele, mas não teria
rei de Gate. 3E Davi ficou com Aquis em Gate, ele esperança alguma de suportar um ataque
e os seus homens, cada um com a sua família, e
Davi com a suas duas mulheres, Ainoã, a jizre- maciço pelos filisteus.
elita, e Abigail, que fora mulher de Nabal, o Põr outro lado, Davi poderia experi
carmelita. 4Ora, sendo Saul avisado de que Davi mentar o rompimento com o seu próprio
tinha fugido para Gate, não cuidou mais de buscá- povo ao associar-se com os inimigos filis
-la 5Disse Davi a Aquis: Se eu tenho achado graça
aos teus olhos, que se me dê lugar numa das cidades teus. As ações de Davi devem ter parecido
do pais, para que eu ali habite; pois, por que haveria traiçoeiras na ocasião, e somente mais tarde
o teu servo de habitar contigo na cidade real? seus verdadeiros motivos se tornaram
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conhecidos. Não obstante, por meio de uma Áquis desejasse que o período parecesse
série de argumentos ardilosos, Davi conse maior (29.3).
guiu convencer Áquis de sua lealdade, sem Gesuiitas, e os girzitas, e os amalequitas.
ser obrigado a lutar contra seu próprio povo. Os amalequitas eram remanescentes da
A narrativa bíblica apresenta com evidente matança de Saul entre os inimigos de Israel
admiração a habilidade de Davi em mani no deserto ao sul de Judá (cf. comentário
pular os filisteus, mas em toda a sua ex sobre 15.4-9). Os gesuritas eram um
tensão há um sentimento não declarado de pequeno grupo nômade que vagueava no
que o Senhor está manifestando seu cuida norte do Sinai a leste do Egito (Js 13.2).
do contínuo pelo futuro rei de Israel. Os girzitas são desconhecidos.
Davi ficou com Áquis em Gate, ele e os Davi feria aquela terra, não deixava com
seus homens. Davi havia anteriormente vida nem homem nem mulher. As ações de
aparecido sozinho perante Áquis (21.10-15). Davi não tinham absolutamente nada a ver
As circunstâncias são, contudo, tão dife com as determinações de natureza religiosa
rentes, que somente as personagens de uma “guerra santa” (cf. comentário sobre
principais são as mesmas. Os filisteus agora 15.1-3). Com toda liberdade Davi pilhava,
tinham tido tempo para saber que Davi era mas matava todas as pessoas para impedir
um fugitivo da corte de Saul. Como líder que notícias de sua dissimulação chegassem
de 600 homens desprezados pela sociedade até os filisteus. O registro bíblico não
israelita, Davi representava um poderoso censura Davi por suas ações brutais. Dessa
instrumento político que Áquis esperava maneira, na mente do escritor bíblico ele
utilizar contra seus inimigos. Esses homens é aparentemente justificado, seja com base
com suas famílias provavelmente represen no fato de que aqueles povos eram inimigos
tavam um contingente com um total de de Israel ou de que, como estrangeiros, não
2.000 pessoas. O problema de alimentar esse mereciam a consideração dada a Nabal (cf.
grupo teria ajudado a persuadir Áquis a 25.26).
que empregasse proveitosamente os homens Davi alegava falsamente estar atacando
de Davi. o Negebe (região árida) dos clãs israelitas
ao sul. Os jerameelitas foram mais tarde
Então lhe deu (...) Ziclague. Ziclague era considerados uma parte de Judá (lCr 2.9),
uma cidade a cerca de 26 quilômetros ao e os queneus eram tradicionalmente amigos
sul-sudeste de Gate. Quase à mesma dos hebreus (ISm 15.6; 30.29). Ambos eram
distância a sudoeste de Hebrom, a cidade grupos nômades, cujos territórios são atual
ficava na fronteira filistéia-israelita e, assim, mente de localização incerta.
num ponto ideal para ataques contra Judá.
Não temos informações sobre como Áquis
2) Saul Consulta uma Médium (28.1-14)
veio a possuir a cidade, mas, em outras
passagens, ela é associada com as cidades 'Naqueles dias ajuntaram os filisteus os seus
ocupadas por Judá (Js 15.31) ou Simeão (Js exércitos para a guerra, para pelejarem contra
Israel. Disse Áquis a Davi: Sabe de certo que
19.5). A referência aos reis de Judá, nos sairás comigo ao arraial, tu e os teus homens.
livros de Samuel, encontrada apenas nesta 2Respondeu Davi a Áquis: Assim saberás o que teu
passagem, reflete um ponto de vista edito servo há de fazer. E disse Áquis a Davi: Por isso
rial após a divisão da monarquia. te farei para sempre guarda da minha pessoa.
3Ora, Samuel já havia morrido, e todo o Israel o
Um ano e quatro meses refere-se ao tinha chorado, e o tinha sepultado em Ramá, que
tempo total que Davi passou entre os filis era a sua cidade E Saul tinha desterrado os necro-
teus, não somente em sua estada em Gate. mantes e os adivinhos. 4Ajuntando-se, pois, os
filisteus, vieram acampar-se em Suném; Saul ajun
Porém, este é um período tão curto que não tou também todo o Israel, e se acamparam em
é de surpreender que os outros líderes filis Gilboa. 5Vendo Saul o arraial dos filisteus, temeu
teus se recusassem a confiar nele ou que e estremeceu muito o seu coração. 6Pelo que
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consultou Saul ao Senhor, porém o Senhor não divina. Profundamente alarmado com as
lhe respondeu, nem por sonhos, nem por Urim, notícias da mobilização filistéia, Saul bus
nem por profetas. 7Então disse Saul aos seus
servos: Buscai-me uma necromante, para que eu cou por todos os meios a instrução do
vá a ela e a consulte. Disseram-lhe os seus servos: Senhor, mas foi-lhe negada orientação
Eis que em En-Dor há uma mulher que é necro mediante os recursos normais de revelação
mante. 8Então Saul se disfarçou, vestindo outros divina. Completamente desesperado, fez
trajes; e foi ele com dois homens, e chegaram de
noite à casa da mulher. Disse-lhe Saul: Peço-te que com que localizassem uma médium espí
me adivinhes pela necromancia, e me faças subir rita, de modo que pudesse consultar o es
aquele que eu te disser.9A mulher lhe respondeu: pírito de Samuel, que, em certa época,
lii bem sabes o que Saul fez, como exterminou da havia sido o seu mentor espiritual.
terra os necromantes e os adivinhos; por que, en
tão, me armas um laço à minha vida, para me fa Os detalhes do triste abismo em que
zeres morrer? 10Saul, porém, lhe jurou pelo Se Saul caíra são todos bem evidentes no re
nhor, dizendo: Como vive o Senhor, nenhum cas lato. Afastado do legítimo aconselhamen
tigo te sobrevirá por issa "A mulher então lhe to profético (15.35) e sacerdotal (22.11-23),
perguntou: Quem te farei subir? Respondeu ele:
Faze-me subir Samuel. 12Vendo, pois, a mulher a Saul voltou-se para os necromantes e fei
Samuel, gritou em alta voz, e falou a Saul, di ticeiros, que eram proibidos por lei (Lv
zendo: Por que me enganaste? pois tu mesmo és 19.31; 20.6), e que ele próprio havia elimi
Saul. 13Ao que o rei lhe disse: Não temas; que é nado de Israel no início de seu reinado.
que vês? Então a mulher respondeu a Saul: Vejo Parece que o relato bíblico não considerou
um deus que vem subindo de dentro da terra.
14Perguntou-lhe ele: Como é a sua figura? E disse a consulta aos mortos uma impossibilida
ela: Vem subindo um ancião, e está envolto numa de ou mesmo como um embuste perpe
capa. Entendendo Saul que era Samuel, inclinou- trado pela “feiticeira” de En-Dor. Em vez
-se com o rosto em terra, e lhe fez reverência. disso, tais práticas eram consideradas co
Pbr cerca de dezesseis meses Davi ti mo influências contaminadoras, cuja ori
nha conseguido evitar quaisquer atos hos gem eram as práticas religiosas dos vizi
tis contra seu próprio povo enquanto vivia nhos de Israel (Dt 18.9-14). O patético
entre os filisteus. Durante esse tempo, ele quadro de um rei rejeitado é completado
tinha enganado Áquis, fazendo-o pensar quando Saul deixou de lado suas vestes
que lhe era totalmente leal, ao fingir que reais para vestir um disfarce humilde e
realizava ataques contra Judá, quando, na buscou, numa desesperada tentativa final,
verdade, estava atacando os inimigos nô receber uma palavra favorável da parte do
mades de Israel no extremo sul. A oportu Senhor.
nidade para continuar tal engano, porém, Ajuntando-se (...) os filisteus, vieram
parecia ter chegado ao fim quando Áquis acampar-se em Suném. Ao organizar seu
informou Davi de que esperava que ele e material, o autor aparentemente colocou
seus homens lutassem ao lado dos filisteus outros valores acima da ordem cronoló
na ofensiva iminente contra Israel, Nessas gica. Os acontecimentos aqui descritos
circunstâncias, Davi não poderia evitar que tiveram lugar na véspera da batalha em
suas ações fossem diretamente observadas Monte Gilboa (28.19) e se encaixariam
pelos chefes filisteus, em vista de que Áquis muito bem entre os capítulos 30 e 31. O
o designara seu próprio guarda--CQStas prin contexto mais amplo descreve o avanço
cipal. Como recurso para aumentar o sus- dos filisteus a partir de Afeque, cerca de
pense da história, o autor permite ao lei dezesseis quilômetros a nordeste de Jope
tor contemplar o destino de Davi (resu (29.1), pelo vale de Jizreel (29.11; cf. 31.7),
mido em 29.1 — 30.31), enquanto apresenta até Suném, cerca de dez quilômetros a
um interessante relato da rejeição final de nordeste da fonte do Monte Gilboa (28.4;
Saul pelo Senhor (28.3-25). cf. 29.1). A jornada de Saul a En-Dor,
Saul é retratado como uma figura trá cerca de treze quilômetros a norte de seu
gica, cuja vida trazia as marcas da rejeição acampamento em Gilboa, era, portanto,
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uma aventura ousada através das linhas para que tenhas forças quando te puseres a cami
inimigas. nha 23Ele, porém, recusou, dizendo: Não come
rei. Mas os seus servos e a mulher o constrange
Vendo (...) a mulher a Samuel, gritou ram, e ele deu ouvidos à sua voz; e levantando-se
em alta voz. Nenhuma explicação é dada do chão, sentou-se na cama. 24Ora, a mulher ti
para a razão pela qual a mulher reconhe nha em casa um bezerro c,evado; apressou-se, pois,
ceu Saul somente quando viu Samuel. Al e o degolou; tambénr tomou farinha, e a amassou,
guns manuscritos gregos trazem Saul, em e a cozeu em bolos ázimos. 25Então pôs tudo
diante de Saul e de seus servos; e eles comeram.
vez de Samuel. Assim, quando ela viu (e Depois levantaram-se e partiram naquela mesma
reconheceu) Saul, gritou. Aparentemente noite.
só a mulher viu a figura fantasmagórica
Levado à beira da histeria pela crescen
de Samuel. Saul, contudo, parece ter ou
vido a voz de Samuel e ter conversado te ameaça da máquina de guerra dos filis
com ele (28.15). teus, Saul buscou instruções do espírito
Vejo um deus que vem subindo de den mal-humorado de seu falecido conselhei
ro profético. Saul se apresentou como um
tro da terra. A palavra deus (’elohim) é um
substantivo comum. Empregada no Anti homem que havia se esforçado por tentar
go Testamento, tem uma variedade de conhecer a vontade do Senhor através dos
.sentidos, que incluem o Deus de Israel, meios regulares de revelação, mas a quem
ídolos, e seres espirituais de vários tipos. havia sido negado conselho divino. Sa
Samuel é retratado como um espírito, des muel, porém, havia-o confrontado com o
pertado de seu sono no Seol, onde a exis juízo do Senhor, mas Saul recursou-se a
tência era vista como um estado de fra admitir, que havia sido rejeitado em favor de
queza e esquecimento (SI 88.4,12). Davi como íei de Israel.
Saul havia, a princípio, tentado alterar
pela força os planos do Senhor, buscando
3) Condenação da Casa de Saul (28.15-25) matar Davi. Tendo falhado neste intento,
,5Samuel disse a Saul: Por que me inquietaste, estava freneticamente procurando receber
fazendo-me subir? Então disse Saul: Estou muito um oráculo favorável que lhe desse alguma
angustiado^ porque os filisteus guerreiam contra esperança de vitória em sua luta iminente
mim, e Deus se tem desviado de mim, e já não me
responde, nem por intermédio dos profetas nem contra os filisteus. Infelizmente, conquanto
por sonhos; por isso te chamei, para que me fa o juízo de Deus pudesse ser retardado (de
ças saber o que hei de fazer. 16Então disse Sa 15.26 em diante), não poderia ser evitado.
muel: Por que, pois, me perguntas a mim, visto Samuel anunciou antes mesmo de come
que o Senhor se tem desviado de ti, e se tem feito
teu inimigo? nO Senhor te fez como por meu in çar a batalha que era certo que se cum
termédio te disse; pois o Senhor rasgou o reino priria a sentença de Deus sobre Saul. Este
da tua mão, e o deu ao teu próximo, a Davi. foi informado de que, em combate no dia
,8Porquanto não deste ouvidos à voz do Senhor, seguinte, os exércitos de Israel seriam der
e não executaste o furor da sua ira contra Ama- rotados e que ele e seus filhos unir-se-iam
leque, por isso o Senhor te fez hoje isto. 19E o
Senhor entregará também a Israel contigo na a Samuel no Seol. Abalado pelo impacto
mão dos filisteus. Amanhã tu e teus filhos esta emocional das predições sombrias de Sa
reis comigo, e o Senhor entregará o arraial de muel e enfraquecido pelo jejum de um dia
Israel na mão dos filisteus. “ Imediatamente Saul inteiro, Saul caiu desmaiado no chão.
caiu estendido por terra, tomado de grande medo
por causa das palavras de Samuel; e não houve
A descrição das atenções da mulher
força nele, porque nada havia comido todo aquele pelo seu rei ali prostrado é marcada por
dia e toda aquela noite. 2lEntão a mulher se apro uma ternura e piedade que caracterizam
ximou de Saul e, vendo que estava tão perturbado, a atitude oculta que o autor tem para com
disse-lhe: Eis que a tua serva deu ouvidos à tua Saul. Conquanto Saul teimosamente recu
voz; pus a minha vida na minha mão, dando ou
vidos às palavras que disseste.22Agora, pois, ouve sasse reconhecer a escolha pelo Senhor de
também tu as palavras da tua serva, e permite que seu sucessor, havia feito uma contribuição
eu ponha um bocado de pão diante de ti; come;, inigualável à história do seu povo. Como
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primeiro rei de Israel, havia ganho um chama a atenção para o contraste existen
respeito e amor que mesmo suas falhas te entre os papéis de Saul e de Davi nos
posteriores não apagariam. Recuperando planos do Senhor para Israel. Com o re
as forças com a refeição preparada pela sultado da batalha em Gilboa já conheci
mulher de En-Dor, Saul partiu, como um do, o fim da vida trágica de Saul está à
homem condenado, para enfrentar o seu vista. Davi, por outro lado, estava sendo
destino no dia seguinte. firmemente conduzido ao destino que es
tivera implícito em sua unção pelas mãos
4) Davi é Excluído da Guerra (29.1-11) de Samuel (16.1-13).
'Os filisteus ajuntaram todos os seus exércitos
Uma vez mais o Senhor estava operan
em Afeque; e acamparam-se os israelitas junto à do mediante processos históricos para fa
fonte que está em Jizreel. 2Então os chefes dos zer com que sua vontade se cumprisse.
filisteus se adiantaram com centenas e com milha Um governo estava sendo deixado de lado,
res; e Davi e os seus homens iam com Áquis na e o caminho estava sendo preparado para
retaguarda. 3Perguntaram os chefes dos fiÜsteus:
Que fazem aqui estes hebreus? Respondeu Áquis um outro governo chegar ao poder. Agora,
aos chefes dos filisteus: Não é este Davi, o servo ao final de um perigoso exílio na Filístia,
de Saul, rei de Israel, que tem estado comigo al Davi estava na iminência de livrar-se da
guns dias ou anos? e nenhuma culpa tenho acha necessidade de ir à batalha contra seu
do nele desde o d!a em que se revoltou, até o dia próprio povo, o que o impediria de reivin
de hoje. 4Mas os chefes dos filisteus muito se in
dignaram contra ele, e disseram a Áquis: Faze dicar o trono de Israel de modo pacífico.
voltar este homem para que torne ao lugar em No momento em que as tropas filistéias
que o puseste; não desça ele conosco à batalha, estavam sendo passadas em revista em
a fim de que não se torne nosso adversário no Afeque, antes de começar sua marcha pa
combate; pois, como se tornaria este agradável a
seu senhor? porventura não seria com as cabeças
ra Jizreel (veja comentário sobre 28.4),
destes homens? 5Este não é aquele Davi, a respei seus líderes perceberam alarmados a pre
to de quem cantavam nas danças: Saul feriu os sença de hebreus no fim da coluna. Áquis
seus milhares, mas Davi os seus dez milhares? defendeu sua decisão de trazer Davi e seus
‘Então Áquis chamou a Davi e disse-lhe: Como
vive o Senhor, tu és reto, e a tua entrada e saída
homens, baseado no fato de que não ti
comigo no arraial é boa aos meus olhos, pois nham lhe dado qualquer razão para sus
nenhum mal tenho achado em ti, desde o dia em peitar da lealdade deles, uma vez que Da
que vieste ter comigoi, até o dia de hoje; porém vi havia desertado para o seu lado um
aos chefes não agradas. 7Volta, pois, agora, e vai bom tempo antes. Os líderes filisteus, con
em paz, para não desagradares os chefes dos filis
teus. sÁo que Davi disse a Áquis: Por quê? que tudo, lembrando-se da deserção de mer
fiz eu? ou, que achaste no teu servo, desde o dia cenários hebreus na batalha de Gibeá
em que vim ter contigo, até o dia de hoje, para (14.21), insistiram em mandar Davi de
que eu não vá pelejar contra os inimigos do rei volta a Ziclague.
meu senhor? ’Respondeu, porém, Áquis e disse a
Davi: Bem o sei; e, na verdade, aos meus olhos és Áquis transmitiu as ordens dos coman
bom como um anjo de Deus; contudo os chefes dantes filisteus a Davi e, nos termos mais
dos filisteus disseram: Este não há de subir co fortes possíveis, professou confiança na leal
nosco à batalha. 10Levanta-te, pois, amanhã de dade de seu vassalo. Conquanto Davi
madrugada, tu e os servos de teu senhor que vie
ram contigo; e, tendo vos levantado de madruga provavelmente estivesse muito relutante em
da, parti logo que haja luz. “Madrugaram, pois, ir à guerra contra seu próprio povo, o papel
Davi e os seus homens, a fim de partirem, pela que estava desempenhando requeria que
manhã, e voltaram à terra dos filisteus; e os filis protestasse contra a decisão de mandá-lo
teus subiram a Jizreel.
para a retaguarda. Não obstante, Davi e seus
homens estavam preparados para partir
Sem expressar abertamente juízo de para casa no alvorecer do dia seguinte.
valor, mais uma vez o autor dispõe o ma A Sm de que não se torne nosso adver
terial de sua narrativa de um modo que sário no combate. O termo para adversário
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é o mesmo que está por detrás do nome por causa de seus filhos e de suas filhas. M as Davi
Satanás. É empregado aqui como substan se fortaleceu no Senhor seu Deus. 7Disse Davi a
Abiatar, o sacerdote, filho de Aimeleque: Traze-me
tivo comum num contexto que lança aqui o éfode. E Abiatar trouxe o éfode a Davi.
importante luz sobre outras ocorrências 8Então consultou Davi ao Senhor, dizendo: Perse
desse nome no Antigo Testamento (cf. Jó guirei eu a esta tropa? alcançá-la-ei? Respondeu-lhe
1 e 2; Zc 3.1,2). Os filisteus temiam que o Senhor: Persegue-a; porque de certo a alcançarás
e tudo recobrarás. 9Ao que partiu Davi, ele e os
Davi empregasse essa ocasião para recon seiscentos homens que com ele se achavam e
quistar o favor de Saul, voltando-se contra chegaram ao ribeiro de Besor, onde pararam os
eles (cf. 18.25-27). que tinham ficado para trás. 10Mas Davi ainda os
Volta, pois, agora, e vai em paz. Áquis perseguia, com quatrocentos homens, enquanto que
esperava que Davi ficasse desapontado ao duzentos ficaram atrás, por não poderem, de
cansados que estavam, passar o ribeiro de Besor.
ser-lhe negada permissão de participar da uOra, acharam no campo um egipcioi, e o trou
batalha contra Israel, e provavelmente xeram a Davi: deram-lhe pão a comer, e água a
muitos de seus homens assim ficaram. Os beber; 12deram-lhe também um pedaço de massa
soldados lucravam ao tomar despojos em de figos secos e dois cachos de passas. Tendo ele
comido, voltou-lhe o ânimo; pois havia três dias e
batalha, e agora, após uma longa marcha, três noites que não tinha comido pão nem bebido
os homens de Davi retornavam para casa água. 13Então Davi lhe perguntou: De quem és tu,
de mãos vazias. Em pelo menos uma outra e donde vens? Respondeu ele: Sou um moço egípcio,
ocasião, tem-se notícia de que, em servo dum amalequita; e o meu senhor me aban
donou, porque adoeci há três dias. 14Nós fizemos
circunstâncias semelhantes, mercenários uma incursão sobre o Negebe dos queretitas, sobre
atacaram cidades de seus até então empre o de Judá e sobre o de Calebe, e pusemos fogo
gadores (2Cr 25.9-13). Áquis está enco a Ziclague. lsPerguntou-lhe Davi: Poderias descer
rajando Davi a evitar tais incidentes in e guiar-me a essa tropa? Respondeu ele: Jura-me
convenientes em sua viagem para casa. tu por Deus que não me matarás, nem me entre
garás na mão de meu senhor, e eu descerei e te
No capítulo seguinte, a ênfase na questão guiarei a essa tropa.
de despojos de guerra confirma que o saque
era algo importante para os homens de Após completar uma jornada de uns cem
Davi. quilômetros através do coração do território
filisteu, Davi e seus homens retornaram a
5) Amalequitas Atacam Ziclague (30.1-30) Ziclague para encontrá-la abandonada e em
ruínas. Deparando-se com a perda de
a. Atacantes Nômades Saqueiam Ziclague esposas, filhos e bens, os homens de Davi
(30.1-15) se extenuaram de tanto chorar e então
'Sucedeu, pois, que, chegando Davi e os seus voltaram sua ira contra seu líder. Davi, na
homens ao terceiro dia a Ziclague, os amalequitas verdade, havia cometido um sério erro tático
tinham feito uma incursão sobre o Negebe, e sobre que, além do perigo imediato para sua
Ziclague, e tinham ferido a Ziclague e a tinham própria vida, poderia também pôr em risco
queimado a fogo; 2e tinham levado cativas as
mulheres, e todos os que estavam nela, tanto seu papel como futuro rei de Israel. Ao
pequenos como grandes; a ninguém, porém, conduzir todo o seu grupo de soldados para
mataram, tão-somente os levaram consigo, e foram Afeque, ele havia deixado sua base sem
o seu caminha 3Quando Davi e os seus homens defesa contra o bando de amalequitas pilha-
chegaram à cidade, eis que estava queimada a fogo,
e suas mulheres, seus filhos e suas filhas tinham dores.
sido levados cativos. 4Então Davi e o povo que se O erro militar de Davi não era, contudo,
achava com ele alçaram a sua voz, e choraram, até irreparável, pois o Senhor ainda estava
que não houve neles mais forças para chorar. agindo em seu favor. Após receber um
5Também as duas mulheres de Davi foram levadas
cativas: Ainoã, a jizreelita, e Abigail, que fora
oráculo divino favorável, de que o resgate
mulher de Nabal, o carmelita. 6Tkmbém Davi se ainda era possível, Davi e seus homens
angustiou; pois o povo falava em apedrejá-lo^ por partiram em marcha forçada no encalço dos
quanto a alma de todo o povo estava amargurada atacantes do deserto. Numa época em que
97
a velocidade era essencial, os homens de b. Davi Avança Sobre os Amalequitas
Davi encontraram um egípcio faminto, que, (30.16-31)
como ex-escravo amalequita, estava pronto l6Desceu, pois, e o guiou; e eis que eles estavam
a conduzir os hebreus ao acampamento dos espalhados sobre a face de toda a terra, comenda,
atacantes. bebendo e dançando, por causa de todo aquele
A ninguém mataram (...) tão-somente os grande despojo que haviam tomado da terra dos
filisteus e da terra de Judá. 17Então Davi os feriu,
levaram. Os amalequitas haviam raptado desde o crepúsculo até a tarde do dia seguinte, e
as pessoas para vendê-las como escravas. nenhum deles escapou, senão só quatrocentos
O fato de que ninguém foi morto no ataque mancebos que, montados sobre camelos, fugiram.
sugere que Davi deixara a cidade comple 18Assim recobrou Davi tudo quanto os amalequitas
haviam tomado; também libertou as suas duas
tamente indefesa. Se ele tivesse planejado mulheres. 19De modo que não lhes faltou coisa
conseguir que seus homens fossem dispen alguma, nem pequena nem grande, nem filhos, nem
sados antes da batalha contra Israel, é difícil filhas, nem qualquer coisa de tudo quanto os amale
compreender por que conduziu toda sua quitas lhes haviam tomado; tudo Davi tornou a
trazer. 20Davi lhes tomou também todos os seus
guarnição, dessa forma deixando Ziclague rebanhos e manadas; e o povo os levava adiante
seriamente exposta. Talvez, como McKane de outro gado, e dizia: Este é o despojo de Davi.
(p. 166) sugere, ele tivesse originalmente 21Quando Davi chegou aos duzentos homens que,
planejado empregar suas tropas para atra de cansados que estavam, não tinham podido segui
palhar o ataque filisteu. Em tal caso, dos, e que foram obrigados a ficar ao pé do ribeiro
de Besor, estes saíram ao encontro de Davi e do
precisaria de todos os homens disponíveis povo que com ele vinha; e Davi, aproximando-se
para resistir a uma retaliação dos filisteus. deles, os saudou em paz. 22Então todos os
Mas Davi se fortaleceu no Senhor seu malvados e perversos, dentre os homens que tinham
ido com Davi, disseram: Visto que não foram
Deus. Ao longo dos livros de Samuel, Davi conosco, nada lhes daremos do despojo que reco
é retratado como um homem de genuína bramos, senão a cada um sua mulher e seus filhos,
religiosidade pessoal. Aqui, em meio a sua para que os levem e se retirem. 23Mas Davi disse:
própria dor e desespero, sua comunhão com Não fareis assim, irmãos meus, com o que nos deu
o Senhor, que nos guardou e entregou nas nossas
Deus propiciara o vigor e a estabilidade de mãos a tropa que vinha contra nós. 24E quem vos
que ele carecia para perceber que era neces daria ouvidos nisso? pois qual é a parte dos que
sário haver ação, caso quisesse salvar o seu desceram à batalha, tal será também a parte dos
povo. Somente na força do Senhor ele foi que ficaram com a bagagem; receberão partes
capaz de resistir às pressões impostas por iguais. assim foi daquele dia em diante, ficando
estabelecido por estatuto e direito em Israel até
seus soldados, cuja dor os levou à beira de o dia de hoje. g u a n d o Davi chegou a Ziclague,
um motim. enviou do despojo presente aos anciãos de Judá,
seus amigos, dizendo: Eis aí para vós um presente
Duzentos ficaram atrás. Com a totali do despojo dos inimigos do Senhor; 27aos de Betei,
dade de seu exército fatigado pela marcha aos de Ramote do Sul, e aos de Jatir; “ aos de
extenuante, Davi deixou os mais esgotados Aroer, aos de Sifmote, e aos de Estemoa; 2,aos de
protegendo equipamento e suprimentos que Racal, aos das cidades dos jerameelitas, e aos das
havia em excesso. Fica-se a imaginar se tal cidades dos queneus; 30aos de Horma, aos de
Corasã, e aos de Atace; aos de Hebrom, e aos
providência não foi inspirada pela lição de todos os lugares que Davi e os seus homens costu
aprendida com o desastre de Ziclague. mavam freqüentar.
Descerei e te guiarei a essa tropa. A
descoberta do ex-escravo amalequita deve Guiados pelo escravo amalequita que
ter sido percebida como uma prova da fora deixado para morrer no deserto, Davi
direção divina, pois sem ele a expedição de e seus homens chegaram até o grupo que
Davi teria pouquíssima esperança de êxito. assaltara Ziclague, enquanto esse grupo
Mesmo o mais leve sinal teria dado aos comemorava o saque. Após observar a
amalequitas oportunidade de empregar seus situação atentamente, os israelitas atacaram
reféns para tirar o máximo proveito. logo após o crepúsculo e continuaram perse-
98
guindo os restantes do inimigo por todo o (nesheph) pode referir-se ao lusco-fusco do
dia seguinte. O vingativo resgate que Davi entardecer ou alvorecer (Is 5.11; Jr 13.16;
fez de seu povo foi completo, exceto quanto cf. 2Reis 7.5-12; Jó 7.4). Uma vez que a
aos cavaleiros amalequitas, que conse escuridão teria permitido aos amalequitas
guiram escapar para o deserto em seus fugir, um único dia dé batalha parece o mais
camelos. provável. A frase do dia seguinte ocorre no
Os despojos tomados por Davi foram Antigo Testamento somente aqui, e parece
maiores do que suas perdas, pois, além de estranha no hebraico. Emendas sugeridas
seus pertences pessoais, os amalequitas para essa frase, que associaram a matança
estavam levando presas tomadas de comu de Davi entre os amalequitas com o
nidades do deserto tanto filistéias quanto conceito de cherem (cf. comentário sobre
israelitas. Os homens de Davi, que prova 15.1-3), são, contudo, muito improváveis.
velmente ainda estavam aborrecidos pela A versão aqui utilizada captou a interpre
ida a Afeque, a qual não tinha propiciado tação mais provável.
proveito algum, começaram a discutir a A referência no versículo 17 a quatro
respeito da distribuição de sua riqueza centos mancebos designa a elite das forças
recém-encontrada. Os soldados mais amalequitas. Exceto no que toca à influ
robustos, que tinham chegado a participar ência do Senhor apoiando seu ungido, esses
do combate, desejavam excluir os que homens sozinhos teriam sido suficiente
haviam ficado para trás, incumbidos de mente fortes para infligir pesadas baixas às
cuidar dos suprimentos. Davi, porém, forças de Davi.
lembrando-se de sua própria culpa e
fracasso em Ziclague, reconheceu que a 6) Israel Derrotado em Gilboa (ISm
providência divina, e não a força das armas 31.1—2Sm 1.27)
israelitas, dera-lhes a vitória sobre os amale
quitas. Ele, portanto, insistiu em que os a. Saul Comete Suicídio (31.1-13)
despojes fossem distribuídos igualmente por 'Ora, os filisteus pelejaram contra Israel; e os
todos os soldados, não importa onde homens de Israel fugiram de diante dos filisteus,
houvessem atuado. e caíram mortos no monte Gilboa. 2E os filisteus
apertaram com Saul e seus filhos, e mataram a
Ao retornar a Ziclague, Davi também Jônatas, a Abinadabe e a Malquisua, filhos de Saul.
enviou parte de seus despojos para os 3A peleja se agravou contra Saul, e os flecheiros
anciãos de Judá, para distribuição nas áreas o alcançaram, e o feriram gravemente. 4Pelo que
onde ele e seus homens haviam perambu disse Saul ao seu escudeiro: Arranca a tua espada,
lado enquanto fugiam de Saul. Além de e atravessa-me com ela, para que porventura não
venham esses inciraindosos, e me atravessem e
servir como compensação parcial por quais escarneçam de mim. M as o seu escudeiro não quis,
quer inconvenientes que o povo pudesse ter porque temia muita Então Saul tomou a espada
sofrido nas mãos dos homens de Davi, esses e se lançou sobre ela. 5Vendo, pois, o seu escudeiro
despojos também serviam como importante que Saul já era morto, também ele se lançou sobre
a sua espada e morreu com ele. 6Assim morreram
lembrete de que ele não tivera parte na juntamente naquele dia Saul, seus três filhos, o seu
batalha de Gilboa. Queria que ninguém se escudeiro, e todos os seus homens. 7Quando os
esquecesse de que, quando os filisteus israelitas que estavam no outro lado do vale, e os
atacaram as forças israelitas ao norte, em que estavam além do Jordão, viram que os homens
Jizreel, ele havia estado combatendo os de Israel tinham fugido, e que Saul e seus filhos
estavam mortos, abandonaram as suas cidades e
inimigos do Senhor no Negebe. Ademais, fugiram; e vieram os filisteus e habitaram nelas.
estava desejoso por compartilhar os frutos 8No dia seguinte quando os filisteus vieram para
de sua vitória para prová-lo. despojar os mortos, acharam Saul e seus três filhos
estirados no monte Gilboa. ’Então cortaram a
Desde o crepúsculo até a tarde do dia cabeça a Saul e o despojaram das suas armas; e
seguinte. O linguajar aqui é incomum, mas enviaram pela terra dos filisteus, em redor, a anunciá-
não impossível. A palavra para crepúsculo -lo ho templo dos seus ídolos e entre o povo.
\
99
‘“Puseram as armas de Saul no templo de Asta- em exibição no templo de uma deusa filis-
rote; e penduraram o seu corpo no muro de Bete-Sã.
"Quando os moradores de Jabes-Gileade ouviram
téia, e seu corpo decapitado foi exposto
isso a respeito de Saul, isto é, o que os filisteus lhe juntamente com os cadáveres de seus fi
tinham feito, 12todos os homens valorosos se levan lhos nos muros de Bete-Sã. Uma demons
taram e, caminhando a noite toda, tiraram o corpo tração do respeito que alguns israelitas
de Saul e os corpos de seus filhos do muro de Bete- conservavam pelo seu falecido rei é vista
-Sã; e voltando a Jabes, ali os queimaram.
,3Depois tomaram os seus ossos, e os sepultaram no ousado resgate desses corpos pelos ho
debaixo da tamargueira, em Jabes, e jejuaram sete mens de Jabes-Gileade. Lembrando-se do
dias. resgate de sua cidade, por Saul, no início
Com o relato da morte de Saul e da de seu reinado, eles arriscaram a vida pa
derrota de Israel em Gilboa, chegamos ao ra oferecer aos corpos da casa real um se-
ponto a que as narrativas bíblicas estive pultamento decente.
ram se encaminhando desde a rejeição de Não venham esses incircuncisos, e me
Saul no capítulo 15. Após o trágico en atravessem sugere que Saul parece não ter
contro de Saul com o espírito de Samuel temido a morte tanto quanto a vida entre
ou as aventuras de Davi em Afeque e Zi- os filisteus. O relato paralelo em lCrônicas
clague, esse relato parece quase um anti 10.1-12, que omite e me atravessem deste
clímax. Não obstante, é narrado de modo versículo, preserva melhor o sentido origi
simples e com considerável grau de empa- nal (v. 4).
tia e respeito pelo rejeitado rei de Israel. Saul tomou a espada, e se lançou sobre
A história começa no final do dia em ela. O suicídio era tão raro quanto despre
que as linhas de combate israelitas come zível no pensamento do Antigo Testamen
çam a desmoronar e em que uma retirada to. Somente três outros exemplos são en
se transforma em pandemônio. Saul, com contrados em toda a Bíblia: 2Samuel
a lembrança da experiência devastadora 17.23; IReis 16.18; e Mateus 27.5 (Caird,
em En-Dor na noite anterior ainda viva p. 1.039).
em sua mente (28.3-25), assistiu a três de Desampararam as suas cidades e fugi
seus filhos tombarem em combate antes ram. É duvidoso que os filisteus tenham
de ele próprio ser gravemente ferido. Não penetrado em território a leste do Jordão.
temendo a morte em si, mas, sim, a tortu Jabes-Gileade, a menos de trinta quilôme
ra e humilhação tal como Sansão havia tros de distância, era obviamente ainda
experimentado (Jz 16.21-25), Saul buscou israelita; e Isbosete baseou seu reino isra
a morte pelas mãos de seu escudeiro. elita no território transjordaniano (2Sm
Quando o jovem, tal como Davi antes de 2.9). O texto de lCrônicas 10.7 está me
le, recusou golpear o ungido do Senhor, lhor, omitindo além do Jordão.
Saul lançou-se sobre a própria espada. No dia seguinte. Caso os filisteus não
Assim terminou a primeira fase da expe estivessem próximos demais para identifi
riência de Israel com a monarquia. car e roubar os corpos do rei e de seus fi
A morte de Saul e de seus filhos, con lhos, os israelitas teriam tido condição de,
jugada com a dizimação de suas tropas em até o dia seguinte, cuidar dos cadáveres
Gilboa, teve um efeito desastroso sobre da família real.
Israel. Os filisteus estavam uma vez mais As palavras os queimaram, talvez fosse
controlando amplos vales produtivos ao melhor omiti-las em face da passagem pa
norte, e os hebreus ficaram limitados ao ralela de lCrônicas 10.12. A queima de
interior montanhoso. corpos humanos era nofmalmente um ato
Notícias da derrota de Israel espalha de punição ou reprovação no Antigo Tes
ram-se rapidamente, com os filisteus can tamento (Am 2.1; Js 7.25; Lv 20.14). Es
tando a vitória e tomando o máximo pro tudos recentes, contudo, indicam que a
veito disso. A armadura de Saul foi posta raiz hebraica normalmente traduzida por
100
“queimar” (saraph) também pode signifi assemelha ao primeiro em muitos aspec
car “ungir”, como se dá com relação a tos, diferindo, contudo, em outros pontos
ungiientos para sepultamento (veja Hertz- cruciais. A principal diferença entre os
berg, p. 233, nota de rodapé). dois encontra-se no papel do mensageiro
Deve-se notar que 2Samuel é, na ver amalequita que trouxe a Davi a notícia da
dade, uma continuação de ISamuel — morte de Saul. Ele falou de um encontro
daí a continuidade de esboço (veja a In casual com o ferido rei de Israel, que lhe
trodução a ambos os livros). pediu para ser morto depressa a fim de
evitar uma morte lenta. Depois de ter
b. Um Jovem Reivindica a Morte de Saul atendido à solicitação de Saul, o jovem
(1. 1-16) disse que apanhou a coroa e o bracelete
'Depois da morte de Saui, tendo Davi voltado do rei, os quais apresentou a Davi como
da derrota dos amalequitas e estando há dois dias confirmação de sua história.
em Ziclague, 2ao terceiro dia veio um homem do
arraial de Saul, com as vestes rasgadas e a cabe Conquanto em parte nenhuma expres
ça coberta de terra; e, chegando ele a Davi, pros samente se declare que o amalequita esti
trou-se em terra e lhe fez reverência. 3Pergun- vesse mentindo, o cotejo dos dois relatos
tou-lhe Davi: Donde vens? Ele lhe respondeu: Es sugere que o mensageiro observou os acon
capei do arraial de Israel. 4Davi ainda lhe inda
gou: Como foi isso? Dize-mo. Ao que ele lhe tecimentos em Gilboa mais ou menos co
respondeu: O povo fugiu da batalha, e muitos do mo são descritos no capítulo precedente.
povo caíram, e morreram; também Saul e Jôna Após pilhar o cadáver de Saul, ele se
tas, seu filho, foram mortos. 5Perguntou Davi ao apressou a Ziclague com a história de sua
mancebo que lhe trazia as novas: Como sabes participação pessoal na morte do rei a fim
que Saul e Jônatas, seu filho, são mortos? 6Então
disse o mancebo que lhe dava a notícia: Achava-me de cair na graça de Davi. Entretanto, se
por acaso no monte Gilboa, e eis que Saul se en esse foi o plano do amalequita, ele estava
costava sobre a sua lança; os carros e os cava fatalmente equivocado.
leiros apertavam com ele. 7Nisso, olhando ele pa Davi, como um verdadeiro israelita,
ra trás, viu-me e me chamou; e eu disse: Eis-me
aqui. 8Ao que ele me perguntou: Quem és tu? E tinha persistentemente recusado erguer a
eu lhe respondi: Sou amalequita. ’Então ele me mão contra o ungido do Senhor. Somente
disse: Chega-te a mim, e mata-me, porque uma um estrangeiro, tal como Doegue, o edo-
vertigem se apoderou de mim, e toda a minha vi meu (ISm 22.18), ou agora esse anônimo
da está ainda em mim. l0Cheguei-me, pois, a ele,
e o matei, porque bem sabia eu que ele não vive amalequita, ousaria com tanta arrogância
ria depois de ter caído; e tomei a coroa que ele admitir um fato desses. Embora há muito
tinha na cabeça, e o bracelete que trazia no bra houvesse sido rejeitado como rei, Saul era
ço, e os trouxe aqui a meu senhor. “ Então pegou a pessoa escolhida por Deus e somente
Davi nas suas vestes e as rasgou; e assim fize
ram também todos os homens que estavam com
Deus deve julgar. O Senhor poderia feri-lo
ele; 12e prantearam, e choraram, e jejuaram até a diretamente, provocar sua morte em com
tarde por Saul e por Jônatas, seu filho, e pelo bate, ou deixá-lo morrer naturalmente,
povo do Senhor, e pela casa de Israel, porque ti mas nenhum homem devia tirar a vida do
nham caído à espada. l3Perguntou então Davi ao rei escolhido por Deus (ISm 26.10). Davi,
mancebo que lhe trouxera a nova: Donde és tu?
Respondeu ele: Sou filho de um peregrino amale portanto, chamou seus soldados para exe
quita. 14Davi ainda lhe perguntou: Como não cutarem o amalequita devido à culpa que
temeste estender a mão para matares o ungido do ele havia espontaneamente admitido com
Senhor? 15Então Davi, chamando um dos mance seus próprios lábios.
bos, disse-lhe: Chega-te, e lança-te sobre ele. E o
mancebo o feriu, de sorte que morreu. 16Pois Seja o que for que tenha acontecido na
Davi lhe dissera: O teu sangue seja sobre a tua encosta do Monte Gilboa, o autor bíblico
cabeça, porque a tua própria boca testificou con usa este capítulo para tornar um fato bas
tra ti, dizendo: Eu matei o ungido do Senhor. tante claro: Davi nada tinha a ver com a
A passagem em lide contém um segun morte de Saul. Ele estava ocupado bem
do relato sobre a morte de Saul, que se longe, no sul, quando o rei encontrou a
101
morte na batalha, e se dispunha a matar nunca recuou o arco de Jônatas,
qualquer um que se atrevesse a reivindicar nem voltou vazia a espada de Saul.
ter levantado o braço contra o rei. 23Saul e Jônatas, tão queridos e amados na
sua vida,
Estando [Davi] há dois dias em Zicla- também na sua morte não se separaram;
gue. Gilboa ficava a 135 quilômetros em eram mais ligeiros do que as águias,
linha reta, e a uma distância bem maior mais fortes do que os leões.
pelo caminho que uma pessoa teria de 24Vós, filhas de Israel, chorai por Saul,
tomar. Uma tal jornada consumiria quase que vos vestia deliciosamente de escarlata,
que três dias, especialmente para alguém que vos punha sobre os vestidos adornos de
oura
já exausto pela batalha. Presumivelmente,
“ Como caíram os valorosos
Davi estava retornando de sua batalha no meio da peleja!
com os amalequitas quando Saul defron Jônatas nos teus altos foi morto!
tou a morte. 26Angustiado ^estou por ti, meu irmão J ô
Prantearam, e choraram, e jejuaram até natas;
a tarde. A primeira emoção de Davi, ao muito querido me eras!
Maravilhoso me era o teu amor,
tomar conhecimento da morte de Saul, foi ultrapassando o amor de mulheres.
de pesar. Embora possa ter-se sentido 27Como caíram os valorosos,
aliviado por ficar livre da perseguição de e pereceram as armas de guerra!
Saul, e conquanto o caminho agora esti
vesse livre para seguir seu destino como
rei de Israel, sua dor parece genuína. Seus A tragédia inteira da rejeição e declínio
laços com Jônatas eram fortes, e seu rela de Saul é captada na elegia de Davi, na
cionamento inicial com Saul tinha sido qual lembrava a morte do rei e de seu fi
bem afetuoso. lho Jônatas. A despeito de sua liderança
A demora ocasionada pelo período de inconstante contra os filisteus e de sua
pranto formal, que durou até o entardecer, perseguição injusta contra Davi, Saul ain
indica que a execução do amalequita por da desfrutava bastante afeição por parte
Davi não foi um ato passional. Provou-se de seus súditos. Conquanto o povo tivesse
uma reação bem pensada à violência feita percebido que o Espírito do Senhor o ha
ao ungido do Senhor. via deixado (ISm 16.4), não se deleitava
em observar seu progressivo declínio. Se
c. Davi Lamenta a Perda de Israel (1.17- melhantemente, Davi muito havia sofrido
27) nas mãos de Saul, embora seu sentimento
de perda com a morte de velhos amigos
l7Lamentou Davi a Saul e a Jônatas, seu filha, não fosse menos real.
com esta lamentação, 18mandando que fosse ensi Compreende-se provavelmente melhor
nada aos filhos de Judá; eis que está escrita no
livro de Jasar: a elegia de Davi, contrastando-a com os
19Hia glória, ó Israel, foi morta sobre os teus complexos costumes funerários do antigo
altos! Oriente Médio, em que o pranto público
Como caíram os valorosos! se apresentava tão destacadamente (Jr
20Não o noticieis em Gate,
nem o publiqueis nas ruas de Asquelom;
16.4; 22.18; ISm 25.1). Carpideiras, sobre
para que não exultem as filhas dos incircun- tudo mulheres, eram amplamente empre
cisos. gados (2Cr 35.25; Jr 9.17; Am 5.16; cf.
21Vós, montes de Gilboa, 2Sm 1.24). Assim, num sentido real, este
nem orvalhoi, nem chuva caia sobre vós, ó lamento poético reflete a dor tanto pessoal
campos de morte; quanto nacional de Isráel.
pois ali desprezivelmente foi arrojado o escu
do dos valorosos,
No Antigo Testamento, os cantos fune
o escudo de Saul, ungido com ólea rários empregavam um ritmo especial em
22Do sangue dos feridos, que a segunda parte do verso é mais breve
da gordura dos valorosos, do que a primeira. Tal padrão contrasta
102
fortemente com as formas normais de condições de aplicar óleo (cf. Is 21.5). Por
poesia hebraica, que dependem grande- outro lado, a passagem pode sugerir que
mênte de construções simétricas ou para Saul não estava ritualmente preparado pa
lelas. O desequilíbrio resultante cria uma ra a batalha (cf. comentário sobre ISm
espécie de eco, com um efeito assustador 28.1-14).
que é especialmente apropriado para trans Na sua vida (:..) na sua morte não se
mitir sentimentos de tristeza e desespero separaram. Novamente chama-se atenção
(cf. especialmente v. 25-27). para o fato de que, a despeito da íntima
A beleza e vigor da maneira como Davi amizade de Jônatas com Davi, ele jamais
expressa seu lamento confirmam sua capa foi desleal com o pai (cf. comentário sobre
cidade como poeta de reconhecido valor. ISm 19.1-7; 20.24-42).
Sem dúvida alguma, esta obra é com toda
razão reconhecida como a maior elegia da 7. Davi Torna-se Rei (2.1—8.18)
língua hebraica.
O âmago do poema como um todo é 1) Davi Reina Sobre Judá (2.1—4.12)
captado no lamento propriamente dito:
Como caíram os valorosos (v. 19,25,27): a a. Formados Reinos Rivais (2.1-11)
nação perdera os mais primorosos exem 'Sucedeu depois disto que Davi consultou ao
plos de masculinidade israelita. A angús Senhor, dizendo: Subirei a alguma das cidades de
tia do poeta é tão intensa que ele não Judá? Respondeu-lhe o Senhor: Sobe. Ainda per
consegue suportar o pensamento de que guntou Davi: Para onde subirei? Respondeu o
Senhor: Para Hebrom. 2Subiu, pois, Davi para lá,
os filisteus estavam se gabando da impor e também as suas duas mulheres. Ainoã, a jizreeli-
tância de sua vitória. Ele até pediu que ta, e Abigail, que fora mulher de Nabal, o carme
uma maldição perpétua caísse sobre os lita. 3Davi fez subir também os homens que
campos da batalha onde Saul e Jônatas estavam com ele, cada um com sua família; e habi
taram nas cidades de Hebrom. 4Então vieram os
perderam a vida. homens de Judá, e ali ungiram Davi rei sobre a
Após expressar a terrível sensação de casa de Judá. Depois informaram a Davi, dizendo:
perda experimentada por Israel, Davi pas Foram os homens de Jabes-Gileade que sepulta
sou a elogiar os falecidos. Unidos na mor ram a Saul. 5Pelo que Davi enviou mensageiros
te como na vida, Saul e Jônatas tinham aos homens de Jabes-Gileade, a dizer-lhes: Ben
ditos do Senhor sejais vós, que fizestes tal bene
sido guerreiros capazes, pessoas atraentes volência, sepultando a Saul, vosso senhor! ‘Agora,
e fortes. Saul foi destacado pela prosperi pois, o Senhor use convosco de benevolência e fide
dade que trouxera à nação; mas, para Jô lidade; e eu também vos retribuirei esse bem que
natas, Davi não conseguiu pensar em ne fizestes. 7Esforcem-se, pois, agora as vossas mãos,
nhum elogio mais elevado do que chamá- e sede homens valorosos; porque Saul, vosso
senhor, é morto, e a casa de Judá me ungiu por
lo de irmão. seu rei. 8Ora, Abner, filho de Ner, chefe do exér
O livro de Jasar tem um significado cito de Saul, tomou a Isbosete, filho de Saul, e o
especial. Jasar significa justo. Esta é uma fez passar a Maanaim, 9e o constituiu rei sobre
Gileade, sobre os asuritas, sobre Jizreel, sobre
das duas referências canônicas ao que pa Efraim, sobre Benjamim e sobre todo o Israel.
rece ter sido uma antiga antologia de po 10Quarenta anos tinha Isbosete, filho de Saul,
emas sobre temas de interesse nacional quando começou a reinar sobre Israel, e reinou
(cf. Js 10.13). dois anos. A casa de Judá, porém, seguia a Davi.
UE foi o tempo que Davi reinou em Hebrom,
O escudo de Saul, ungido com óleo. sobre a casa Judá, sete anos e seis meses.
Melhor tradução é “e o escudo de Saul
não ungido com óleo”, embora seja difí Com a morte de Saul e a monstruosa
cil de se entender tal frase. Pôde lamentar derrota de Israel em Gilboa, Davi defron
o fato de que após Gilboa, o escudo de tou-se em Israel com uma situação politica
Saul fora abandonado e negligenciado, is radicalmente diferente. Conquanto os he
to é, o couro não fora mais mantido em breus ainda controlassem muitas cidades
103
fortificadas, que não podiam ser capturadas após Gilboa. Conquanto muitos israelitas
sem prolongados sítios, os filisteus eram o possam ter seguido Isbosete por motivos
poder militar dominante a oeste do Jordão. sentimentais, ele carecia de legitimidade
Uma vez que após sua vitória no vale de teológica, e as leis de primogenitura não
Jizreel não deram seguimento a outras tinham ainda sido estabelecidas em Israel.
campanhas no sul, suspeita-se que deci Não obstante, Davi novamente teve que
diram tentar enfraquecer ou controlar decidir sobre o tipo de tática que empre
Israel através de Davi, o “vassalo” de Áquis garia em sua ascensão ao poder como rei
(ISam 27). Iriam descobrir no devido tem de todo o Israel.
po que a verdadeira lealdade de Davi sem Não está bem definido o tempo que foi
pre permaneceu com o seu próprio povo. necessário para Davi ganhar autoridade
Nesse meio tempo, sem dúvida alguma sobre as tribos do norte. É dito que Isbo-
Davi empregou o período de paz que se sete reinou por dois anos (2.10), mas Davi
seguiu à guerra para solidificar sua posição é mencionado como tendo reinado em
em Israel. Hebrom, sobre a casa de Judá sete anos
Entre seu próprio povo, Davi nova e meio (2.11). Comumente se explica isso
mente encontrou uma nação seriamente subentendendo-se que Davi mudou sua
dividida em facções políticas. De acordo capital para Jerusalém sete anos e meio
com uma resposta favorável do Senhor, após chegar ao poder em Hebrom. Sendo
Davi deslocou-se com seu exército parti que Davi provavelmente se tornou rei em
cular de Ziclague para o aglomerado de todo Israel logo após o assassinato de Isbo-
pequenas cidades ao redor de Hebrom. sete. Aproximadamente nos últimos cinco
Agindo independentemente das tribos do anos de sua residência em Hebrom, ele foi
norte, os homens de Judá estabeleceram mais do que simples rei sobre a casa de
um reino independente ao sul e ungiram Judá.30
Davi como seu líder. O restante de Israel A argúcia e reserva com que Davi lidou
era nominalmente controlado por um com seus opositores israelitas são refletidas
governo no exílio, estabelecido em na maneira como tratou o povo de Jabes-
Maanaim, a leste do Jordão. O governante -Gileade, os mais firmes e leais aliados de
titular das tribos do norte era o filho de Saul, Saul. Ao saber de sua ousada expedição a
Isbosete, mas o poder real por trás do Bete-Sã (ISm 31.8-13), Davi imediatamente
trono repousava em Abner, o parente de enviou uma mensagem elogiando-os por
Saul que era comandante dos exércitos de sua coragem e expressando sua própria
Israel. afeição por Saul. Ao conluir, porém, Davi
Era bem pronunciado o contraste entre lembrou-lhes de que Saul estava morto e
os dois reinos disputando a lealdade de de que ele era o rei de Judá devidamente
Israel. Davi chegou ao poder recém-saído eleito. Sem criticar o filho de Saul ou
da vassalagem aos filisteus e apoiado por deixar implícita qualquer ameaça de coer
um tipo não-israelita de estrutura militar, ção, Davi claramente pediu o apoio deles.
seu exército particular. Não obstante, Conquanto não saibamos o resultado de
havia sido ungido por Samuel e estava seu apelo, tais atitudes ilustram ampla
sendo apoiado por Abiatar, que remontava mente seu esforços conciliatórios.
sua linhagem a Eli. Davi foi eleito rei por
b. Irrompe a Guerra Civil (2.12-32)
representantes do povo e consagrado em
l2Depois Abner, filho de Ner, com os servos
seu ofício em Hebrom. de Isbosete, filho de Saul, saiu de Maanaim para
Isbosete, por outro lado, tinha quase Gibeão. 13Saíram também Joabe, filho de Zeruia,
nada a recomendá-lo, além do fato de ser e os servos de Davi, e se encontraram com eles
filho de Saul e de ter o apoio de Abner,
M artin N oth, The H istory o f Israel, traduzido para o inglês por
que comandava o que restara do exército P R. Ackroyd (New York: H arper and Brothers, i960), p. 191.
104
perto do tanque de Gibeão; e pararam uns de um A despeito dos contínuos esforços de
lado do tanque, e os outros do outro lada 14Então Davi para manter relações pacíficas com
disse Ábner a Joabe: Levantem-se os mancebos,
e se batam diante de nós. Respondeu Joabe:
Israel, as hostilidades logo vieram à tona.
Levantem-se. 15Levantaram-se, pois, e passaram, Apanhado numa guerra civil que nenhum
em número de doze, por Benjamim e por Isbosete, dos lados desejava npm podia vencer, os
filho de Saul, e doze dos servos de Davi. 16E cada dois reinos em luta fizeram um esforço
um lançou mão da cabeça de seu contendor, e para conciliar suas diferenças.
meteu-lhe a espada pela ilharga; assim cairam
juntos; pelo que se chamou aquele lugar, que está Delegações sob a liderança dos coman
junto a Gibeão, Helcate-Hazurim. 17Seguiu-se dantes militares dos dois reinos se encon
naquele dia uma crua peleja; e Abner e os homens traram em Gibeào, dez quilômetros a noro
de Israel foram derrotados de diante dos servos
de Davi. 18O ra, estavam ali os três filhos de
este de Jerusalém, na fronteira entre Israel
Zeruia: Joabe, Abisai e Asael; e Asael era ligeiro e Judá. Embora não se diga claramente
de pés, como as gazelas do campa I9Perseguiu, quais foram as circunstâncias que envol
pois, Asael a Abner, seguindo-o sem se desviar viam essa reunião, o nível de importância
nem para a direita nem para a esquerda. “ Nisso dos participantes sugere que sérias nego
Abner, olhando para trás, perguntou: És tu Asael?
Respondeu ele: Sou e u .21Ao que lhe disse Abner: ciações diplomáticas estavam em anda
Desvia-te para a direita, ou para a esquerda, e mento. Os dois grupos sentaram-se defron
lança mão de um dos mancebos, e toma os seus te um do outro, em lados opostos do tan
despojos. Asael, porém, não quis desviar-se de que de Gibeão, provavelmente a não mais
segui-la zzEntão Abner tornou a dizer a Asael:
Desvia-te de detrás de mim; por que hei de ferir-te
do que 15 a 22 metros de distância en
e dar contigo em terra? e como levantaria eu o meu tre si.
rosto diante de Joabe, teu irmão? “ Todavia ele Como introdução à reunião de negó
recusou desviar-se; pelo que Abner o feriu com o cios, Abner, o comandante israelita, su
conto da lança pelo ventre, de modo que a lança
lhe saiu por detrás; e ele caiu ali, e morreu na
geriu que os jovens de ambos os lados en-
quele mesmo lugar. E sucedeu que, todos os que tretivessem o grupo com uma brincadeira
chegavam ao lugar onde Asael caira morto, pa- de guerra. As regras do “jogo” não são
ravam. Z4M as Joabe e Abisai perseguiram a mais conhecidas, mas parece que doze
Abner; e pôs-se o sol ao chegarem eles ao outeiro jovens de cada lado se engajaram num
de Amá, que está diante de Giá, junto ao caminho
do deserto de Gibeãa 25E os filhos de Benjamim combate simulado. Traição ou excesso de
se ajuntaram atrás de Abner e, formando-se entusiasmo levou a brincadeira a um
num batalhão, puseram-se no cume dum outeira conflito fatal. Pbr fim, todos os 24 comba
“ Então Abner gritou a Joabe, e disse: Devorará tentes iniciais estavam mortos, e as forças
a espada para sempre? Não sabes que por fim
haverá amargura? até quando te demorarás em
de Israel sofreram pesadas baixas nos
ordenar ao povo que deixe de perseguir a seus combates que se seguiram.
irmãos? 27Respondeu Joabe: Vive Deus, que, se No transcorrer da batalha subseqüente
não tivesse falado, só amanhã cedo teria o povo tomamos conhecimento da origem da
cessado, cada um, de perseguir a seu irm ãa
^Então Joabe tocou a buzina, e todo o povo desavença assassina que se desenvolveu
parou; e não perseguiram mais a Israel, e tam entre as famílias dos comandantes dos
pouco pelejaram mais. Z9E caminharam Abner e exércitos adyersários. Ao serem os israeli
os seus homens toda aquela noite pela Arabá; e, tas postos em fuga, Abner estava sendo
passando o Jordão, caminharam por todo o Bitrom,
e vieram a Maanaim. “ Voltou, pois, Joabe de
perseguido por Asael, irmão mais novo de
seguir a Abner; e quando ajuntou o povo, faltavam Joabe, que era um guerreiro inexperiente,
dos servos de Davi dezenove homens, e Asael. mas um corredor veloz. Abner reconheceu
31Mas os servos de Davi tinham ferido dentre os seu perseguidor e em vão insistiu para que
de Benjamim, e dentre os homens de Abner, a se afastasse para encontrar um oponente
trezentos e sessenta homens, de tal maneira que
morreram. 3ZE levantaram a Asael, e os sepul cujas habilidades estivessem mais pró
taram no sepulcro de seu pai, que estava em ximas da sua limitada experiência militar.
Belém. E Joabe e seus homens caminharam toda Reconhecendo que não poderia ganhar
aquela noite, e amanheceu-lhe o dia em Hebrom. distância ou escapar de Asael, Abner
105
atacou pelas costas com sua lança e matou a jizreelita; 3o segundo Quileabe, de Abigail, que
seu jovem oponente n*>local. fora mulher de Nabal, o carmelita; o terceiro
Os judeus continuaram a perseguir isra Absalão, filho de Maacá, filha de Talmai, rei de
Gesur; 4o quarto Adonias, filho de Hagite; o
elitas até que Abner reuniu seus homens quinto Sefatias, filho de Abital; 5e o sexto Itreão,
numa elevação, obtendo assim uma van de Eglá, também mulher de Davi; estes nasceram
tagem tática. Na troca de palavras que se a Davi em Hebrom.
seguiu, feita aos gritos, consegue-se ter
uma idéia melhor sobre o propósito inicial Na longa guerra que se seguiu ao inci
do encontro. Abner deixou implícito que dente de Gibeão, Davi prosperou enquan
a guerra civil já vinha se desenvolvendo to os descendentes de Saul continuaram
por algum tempo e perguntou: Devorará em decadência. A crescente força política
a espada para sempre? (...) até quando te de Davi encontra paralelo em sua crescen
demorarás em ordenar ao povo que deixe te família. Juntas, ambas serviam como
de perseguir a seus irmãos? Ele podia lembrete do contínuo respaldo do Senhor
prever que uma continuação do derrama à sua causa.
mento de sangue seria tão devastadora Seis filhos, de tanta importância nas
quanto inútil. Joabe respondeu que a sociedades antigas, nasceram-lhe em sete
guerra teria acabado já naquela manhã, anos e meio, e esta lista parece estar incom
não fora o funesto pedido de Abner por pleta. Não se menciona nenhuma menina,
entretenimento. e somente uma criança é mencionada para
A frase amanhã cedo (mehabboker) é cada esposa. Presumivelmente esses me
costumeiramente interpretada como re- ninos são mencionados aqui como exem
ferindo-se à manhã seguinte. Isto é grama plos da generosidade de Deus para com seu
ticalmente possível. Mas uma tradução servo Davi.
mais literal, “desde a manhã”, parece mais A lista também tem, contudo, seu lado
provável neste contexto. Os judeus inter trágico. Três dos meninos, Amnom, Absa
romperam sua perseguição não devido ao lão e Adonias, desempenharam papéis
pedido de Abner, mas porque os israelitas proeminentes, mas infelizes, na história de
haviam obtido uma posição estratégica Davi como rei. Os outros três presumivel
superior. O discurso malfadado a que mente morreram na infância, uma vez que
Joabe se referia ocorrera na manhã daque não são mencionados novamente.
le mesmo dia. Não houvesse o pedido de Filha de lalmai, rei de Gesur, mãe de
Abner precipitado tal carnificina, uma Absalão, era uma princesa de Gesur,
trégua já poderia estar em vigor. (Mas, cf. pequeno estado sírio a nordeste do Mar da
McKane, p. 186, que sustenta que o com Galiléia. Davi pode ter arranjado esse
bate persistiria por toda a noite se Abner casamento como meio de assegurar um
não tivesse pedido que a batalha chegasse aliado que estivesse situado à retaguarda
a um fim). Uma vez interrompida a luta, de Isbosete, em Maanaim (Bright, p. 176).
os sobreviventes de ambos os exércitos Eglá, também mulher de Davi. O signi
começaram marchas forçadas para casa, ficado da expresão qualificativa é incerto,
presumivelmente para informar seus go uma vez que presumivelmente todas essas
vernantes acerca da ruptura de suas nego mulheres eram esposas de Davi. Talvez o
ciações. nome de Davi tenha substituído o de um
antigo marido, numa expressão semelhan
c. Cresce a Família de Davi (3.1-5) te àquela relativa a Abigail no v. 3.
'Ora, houve uma longa guerra entre a casa de d. Abner Negocia com Davi (3.6-21)
Saul e a casa de Davi; porém Davi se fortalecia
cada vez mais, enquanto a casa de Saul cada vez 6Enquanto havia guerra entre a casa de Saul
mais se enfraquecia. 2Nasceram filhos a Davi em e a casa de Davi, Abner ia se tornando poderoso
Hebrom. Seu primogênito foi Amnom, de Ainoã, na casa de Saul. 7Ora, Saul tivera uma concubi-
106
na, cujo nome era Rizpa, filha de Aias. Perguntou, unir o reino sob Davi por meios pacíficos
pois, Isbosete a Abner: Por que entraste à con (cf. comentário sobre ISm 23.15-18; 2Sm
cubina de meu pai? ‘Então Abner, irando-se muito
pelas palavras de Isbosete, disse: Sou eu cabeça
2.12-32).
de cão, que pertence a Judá? Ainda hoje uso de Esta tentativa de tentar a conciliação
benevolência para com a casa de Saul, teu pai, e entre os reinos de Israel e Judá tem origem
para com seus irmãos e seus amigos, e não te em um incidente pessoal entre Isbosete e
entreguei nas mãos de Davi; contudo tu hoje queres Abner. Conquanto Abner sempre tivesse
culpar-me no tocante a essa mulher. ’Assim faça
Deus a Abner, e outro tanto, se, como o Senhor sido a verdadeira fonte de poder por trás
jurou a Davi, assim eu não lhe fizer, “ transferin- do trono de Israel, parece que ele se es
do o reino da casa de Saul, e estabelecendo o forçou sinceramente por manter o governo
trono de Davi sobre Israel, e sobre Judá, desde de Saul intacto com o próprio filho de Saul
Dã até Berseba. nE Isbosete não pôde responder
a Abner mais uma palavra, porque o temia.
como rei. Não obstante, à medida que
12Então enviou Abner da sua parte mensageiros crescia a força de Davi, e se desvanecia a
a Davi, dizendo: De quem é a terra? Comigo faze influência de Israel, tornou-se mais e mais
a tua aliança, e eis que a minha mão será contigo, evidente que o governo em Maanaim
para fazer tornar a ti todo o Israel. 13Respondeu estava nas mãos de um só homem. Final
Davi: Está bem; farei aliança contigo; mas uma
coisa te exijo; não verás a minha face, se primeiro mente, Isbosete confrontou Abner, ex
não me trouxeres Mical, filha de Saul, quando pressando suspeitas de que ele estava
vieres ver a minha face. 14Também enviou Davi tentando tornar-se rei tanto de direito
mensageiros a Isbosete, filho de Saul, dizendo: como de fato.
Entrega-me minha mulher Mical, que eu desposei
por cem prepúcios de filisteus. 15Enviou, pois,
A pergunta a Isbosete no versículo 7 é
Isbosete, e a tirou a seu marido, a Paltiel, filho de bem objetiva:
Laís, 16que o seguia, chorando atrás dela até Por que entraste à concubina de meu
Baurim. Então lhe disse Abner: Vai-te; volta! E ele pai? Isso era mais do que uma acusação
voltou. 17Falou Abner com os anciãos de Israel, de escandalosa imoralidade. As concubi
dizendo: De há muito procurais fazer com que
Davi reine sobre vós; 18fàzei-o, pois, agora, porque nas do rei eram consideradas sua proprie
o Senhor falou de Davi, dizendo: Péla mão do meu dade particular, e como tal, tornavam-se
servo Davi livrarei o meu povo da mão dos filisteus possessão de seu sucessor. Reivindicar
e da mão de todos os seus inimigos. 19Do mesmo uma concubina do rei era, portanto, o
modo falou Abner a Benjamim, e foi também dizer
a Davi, em Hebrom, tudo o que Israel e toda a
mesmo que reclamar o trono (cf. 2Sm
casa de Benjamim tinham resolvida 20Abner foi 16.22; IReis 2.22,23). É incerto se Abner
ter com Davi, em Hebrom, com vinte homens; e era culpado da acusação que Isbosete
Davi fez um banquete a Abner e aos homens que assacou-lhe. Alguns comentaristas, com
com ele estavam. 21Então disse Abner a Davi: base em apoio textual de recensões de
Eu me levantarei, e irei ajuntar ao rei meu senhor
todo o Israel, para que faça aliança contigo; e tu uma versão grega, afirmam que as pala
reinarás sobre tudo o que desejar a tua alma. vras “e Abner a tomou” deveriam ser
Assim despediu Davi a Abner, e ele se foi em paz. acrescentadas ao versículo 7 (Hertzberg,
p. 257). Essas palavras, porém, não são
A história da ascensão de Davi ao poder encontradas nos melhores textos, e não se
é ao mesmo tempo simples e complexa. harmonizam bem com o restante da his
De uma perspectiva teológica, o resultado tória.
final da história nunca esteve em dúvida: Abner, ao que parece, nunca negou ter
Davi estava destinado por Deus a tornar-se grande poder em suas mãos; mas ficou
rei de todo Israel (ISm 16.1). Historica indignado com o fato que sua constante
mente, contudo, o caminho percorrido por generosidade para com a família e amigos
Davi até chegar a essa posição de destaque de Saul não tivesse deixado claro que ele
foi extremamente sinuoso e imensuravel- não alimentava desejo de ser rei. Desani
mente frustrante. O capítulo em lide conta mado com a influência cada vez menor de
acerca de outra tentativa abordada de seu governo em Israel e desapontado por
107
que suas motivações tinham sido mal mente a Davi que se tornasse o seu rei
interpretadas, Abner decidiu pôr sua in (cf. 5.3).
fluência a favor daqueles que estavam se
empenhando por reunir Israel sob a lide e. Joabe Mata Abner (3.22-39)
rança de Davi. 22Eis que os servos de Davi e Joabe voltaram
de uma sortida, e traziam consigo grande despojo;
Uma vez que havia feito de Isbosete rei, mas Abner já não estava com Davi em Hebrom,
esta uma função que naquela época não porque este o tinha despedido, e ele se fora em paz.
representava um poder de verdade, Abner “ Quando, pois, chegaram Joabe e todo o exército
não precisava ocultar suas intenções. Con que vinha com ele, disseram-lhe: Abner, filho de
sultou abertamente os anciãos de Israel, Ner, veio ter com o rei; e o rei o despediu, e ele
se foi em paz. 24Então Joabe foi ao rei, e disse:
alguns dos quais tinham estado apoiando Que fizeste? Eis que Abner veio ter contigo; por
Davi por todo o tempo, e obteve o apoio que, pois, o despediste, de maneira que se fosse
deles para seus planos. Mesmo a tribo de assim livremente? “ Bem conheces a Abner, filho
Benjamim, que estivera mais intimamente de Ner; ele te veio enganar, e saber a tua saída e
a tua entrada, e conhecer tudo quanto fazes. “ E
envolvida na administração de Saul, reco Joabe, retirando-se de Davi, enviou mensageiros
nhecia que a esperança de Israel para o atrás de Abner, que o fizeram voltar do poço de
futuro jazia na reunificação sob a lide Sira, sem que Davi o soubesse. 27Quando Abner
rança de Davi. voltou a Hebrom, Joabe o tomou à parte, à en
trada da porta, para lhe falar em segredo; e ali,
Abner imediatamente iniciou nego por causa do sangue de Asael, seu irmão, o feriu
ciações, enviando emissários a Hebrom, os no ventre, de modo que ele morreu. 28Depois
quais proclamaram sua autoridade sobre Davi, quando o soube, disse: Inocente para sempre
sou eu, e o meu reino, para com o Senhor, no
o reino do norte e anunciaram sua dispo tocante ao sangue de Abner, filho de Ner. 29Caia
sição de negociar com Davi. Entretanto, ele sobre a cabeça de Joabe e sobre toda a casa
Davi exigiu que sua esposa Mical, filha de de seu pai, e nunca falte na casa de Joabe quem
Saul, fosse-lhe devolvida antes de se chegar tenha fluxo, ou quem seja leproso, ou quem se
atenha a bordão, ou quem caia à espada, ou quem
a qualquer acordo final (cf. ISm 18.20-27). necessite de pão. 30Joabe, pois, e Abisai, seu
Suas razões foram provavelmente mais de irmão, mataram Abner, por ter ele morto a Asael,
ordem prática do que romântica, uma vez irmão deles, na peleja em Gibeãa 11Disse Davi a
que seu casamento com Mical propiciava- Joabe e a todo o povo que com ele estava: Rasgai
lhe um laço legítimo com a primeira casa as vossas vestes, cingi-vos de sacos e ide prante
ando diante de Abner. E o rei Davi ia seguindo o
governante de Israel. Num esforço para se féretro. 32Sepultaram Abner em Hebrom; e o rei,
assegurar de que suas condições eram levantando a sua voz, chorou junto da sepultura
compreendidas e de que o rei de Israel de Abner; chorou também todo o pova ’’Pranteou
participava das negociações, Davi enviou o rei a Abner, dizendo:
Devia Abner, porventura, morrer como morre
mensageiros a Isbosete com suas exigên o vilão?
cias. Sem o poder nas mãos, Isbosete não 34As tuas mãos não estavam atadas,
tinha escolha senão atender. Acompanha nem os teus pés carregados de grilhões;
da pela lamentação do marido, a quem Mas caíste como quem cai diante dos filhos da
tinha sido dada por seu pai, Mical partiu iniqüidade.
Então todo o povo tornou a chorar por ele.
para estar com Davi. 35Depois todo o povo veio fazer com que Davi
Após esses arranjos preliminares terem comesse pãoi, sendo ainda dia; porém Davi jurou,
dizendo: Assim Deus me faça, e outro tanto, se^
sido completados, o próprio Abner fez antes que o sol se ponha, eu provar pão ou qual
uma viagem a Hebrom para tratar dos quer outra coisa. 36Todo o povo notou isso, e
detalhes para a reunificação do reino. pareceu-lhe bem; assim como tudo quanto o rei fez
Após ter sido cordialmente recebido, e pareceu bem a todo o pova 37Assim todo o povo
cercado de honrarias por seus anfitriões e todo o Israel entenderam naquele mesmo dia que
não fora a vontade do rei que matassem a Abner,
judeus, Abner partiu para reunir os an filho de Ner. 38Então disse o rei aos seus servos:
ciãos de Israel que iriam solicitar formal Não sabeis que hoje caiu em Israel um príncipe,
108
um grande homem? 39E quanto a mim, hoje estou da família de Joabe. A seguir, Davi pre
fraco, embora ungido rei; estes homens, filhos de
Zeruia, são duros demais para mim. Retribua o
parou para Abner um funeral com honras
Senhor ao malfeitor conforme a sua maldade. de chefe de estado e exigiu que Joabe e
seus amigos assistissem a ele como lamen-
Bem quando a reunificação pacífica de tadores vestidos de pano de saco. O próprio
Israel e Judá parecia ter êxito garantido, Davi participou do evento, expressando
as delicadas negociações de Davi com o tanto um lamento pela morte de Abner
reino do norte foram complicadas pela como um tributo por sua grandeza em vida.
intervenção insubordinada de seu general Devia Abner (...) morrer como morre um
e sobrinho, Joabe. Por determinação de vilão? é uma frase que não tem o mesmo
Davi ou por circunstâncias fortuitas, Joa sentido afetivo da lamentação de Davi por
be estava longe de Hebrom quando Abner Saul e Jônatas (1.19-27). Davi deplora a
chegou para discutir os arranjos do trata morte de Abner como obra de homens
do. Abner mal tinha deixado a cidade, após perversos, mas sugere que se deveu em
completar sua missão, todavia, quando parte à própria negligência de Abner.
Joabe, retomando duma expedição mili Sendo que ele não era um prisioneiro,
tar bem-sucedida, soube de sua visita a deveria estar atento contra seu inimigo.
Hebrom. Note-se que a morte de Abner é, no versí
Motivado pelo desejo de vingar a morte culo 30, atribuída tanto a Joabe quanto a
do irmão (2.18-28) e por uma desconfiança Abisai.
das intenções de Abner, Joabe repreendeu O autor corajosamente se esforça por
Davi por ter deixado de deter Abner, mas demonstrar que Davi não era cúmplice
sem resultado. Joabe, portanto, agiu inde desse episódio. Ele chamou a atenção duas
pendentemente e enviou mensageiros para vezes ao fato de que a morte de Abner foi
trazerem Abner de volta a Hebrom. Agin motivada por questões pessoais, não polí
do como se em missão oficial, Joabe en ticas, e fez notar que até mesmo o povo de
controu seu adversário junto ao portão da Israel estava convencido da inocência de
cidade e subitamente, sem qualquer aviso, Davi.
o feriu. Não obstante, a falta de habilidade de
O portão de uma cidade fortificada era Davi em manter controle sobre Joabe e o
composto por uma série de câmaras me fato de deixar de tomar medidas punitivas
nores, que podiam ser fechadas com pesa contra Joabe parecem incomuns, para
das portas de madeira e defendidas suces dizer o mínimo. Davi tinha pouco a ga
sivamente. Exceto em tempo de guerra, nhar e muito a perder com a morte inopor
essas áreas eram utilizadas para fins judi tuna de Abner, uma vez que Abner já
ciários e em outras funções da adminis estava se movimentando para unir o reino
tração pública (15.2). Presumivelmente o sob o governo de Davi. Portanto, pareceria
assassinato teve lugar numa dessas cortes que outros feitores, além de envolvimento
interiores, à entrada da porta, literalmente, pessoal, impediram que Davi tomasse
“no interior da porta”. medidas contra Joabe. As decisões de Davi
Reconhecendo a seriedade da ofensa de podem ter sido influenciadas pelo fato de
Joabe e o modo em que isso seria recebido que Joabe era filho de sua irmã Zeruia,
em Israel, Davi agiu com rapidez para mas a situação política foi provavelmente
dissociar-se do assassinato de Abner. A o fator decisivo por trás de sua indulgên
maldição que Davi pronunciou sobre a cia. Sem dúvida, havia muitos em Judá
casa de Joabe era particularmente ade que se lembravam do incidente em Gibeão
quada, uma vez que Abner fora morto (2.12-32) e eram, portanto, céticos quanto
como resultado de uma querela assassina, às intenções pacíficas de Abner. De qual
morte cujo propósito era reafirmar a honra quer modo, Davi lamentou sua inabilidade
109
em tomar as medidas corretas e colocou pedaçar-se quando primeiramente Abner
a questão toda perante o Senhor para que e depois os anciãos de Israel decidiram
julgasse a questão de um modo definitivo obter um tratado pelo qual Davi se
e com isenção. faria rei de todo Israel. Nesse período o exér
f. Isbosete Assassinado (4.1-12) cito, há muito a verdadeira fonte de
autoridade no reino do norte, era controlado
‘Quando Isbosete, filho de Saul, soube que pela personalidade dominante de Abner.
Abner morrera em Hebrom, esvaíram-se-lhe as
forças, e todo o Israel ficou perturbado. 2Tinha
Agora que ele estava morto, a posição do
Isbosete, filho de Saul, dois homens chefes de guer rei ficou mais precária do que nunca
rilheiros; um deles se chamava Baaná, e o outro quando vários grupos começaram a fazer
Recabe, filhos de Rimom, e beerotita, dos filhos manobras para tirar vantagem do vazio de
de Benjamim (porque também Beerote era contado poder que se desenvolvera no reino do norte.
de Benjamim, Hendo os beerotitas fugido para
Gitaim, onde têm peregrinado atê o dia de hoje). Reconhecendo que o futuro da nação
4Ora, Jônatas, filho de Saul, tinha um filho alei inteira jazia agora nas mãos de Davi, dois
jado dos pés. Este era da idade de cinco anos quando ambiciosos oficiais do exército tentaram
chegaram de Jizreel as novas a respeito de Saul conquistar seu favor, eliminando o seu rival.
e Jônatas; pelo que sua ama o tomou, e fugiu; e
sucedeu que, apressando-se ela a fugir, ele caiu, Os homens, dois irmãos oriundos de
e ficou coxo. O seu nome era Mefibosete. 5Foram Beerote, em Benjamim, entraram furtiva
os filhos de Rimom, o beerotita, Recabe e Baaná, mente na casa de Isbosete durante a sesta
no maior calor do dia, e entraram em casa de Isbo- do início da tarde e mataram o rei em seu
sete, estando ele deitado a dormir a sesta. leito. Após decapitarem a vítima,
6Entraram ali até o meio da casa, como que vindo
apanhar trigo, e o feriram no ventre; e Recabe e marcharam a noite inteira pelo Vale do
Baaná, seu irmão, escaparam. 7Porque entraram Jordão para levar a Davi, em Hebrom, a
na sua casa, estando ele deitado na cama, no seu prova de seu ato.
quarto de dormir, e o feriram e mataram, e cortando-
-lhe a cabeça, tomaram-na e andaram a noite toda Os dois conspiradores apresentaram seu
pelo caminho de Arabá.8Assim trouxeram a cabe tétrico troféu a Davi e reivindicaram que
ça de Isbosete aDavi em Hebrom, e disseram ao Fei: fora por suas mãos que o Senhor tinha
Eis aqui a cabeça de Isbosete, filho de Saul, teu ini operado vingança sobre a casa de Saul.
migo, que procurava a tua morte; assim o Senhor Davi, contudo, persistiu em sua crença de
vingou hoje ao rei meu senhor, de Saul e da sua des
cendência. 9M as Davi, respondendo a Recabe e a que o Senhor era capaz de levar a cabo sua
Baaná, seu irmão, filhos de Rimom, o beerotida, dis vontade sem pôr o seu povo uns contra os
se-lhes: Vive o Senhor, que remiu a minha alma de to outros (ISm 26.10,11). Após relatar a sorte
da a angústia! 10Se àquele que me trouxe novas, do amalequita que alegou ter matado Saul,
dizendo: Éis que Saul è morto, cuidando que trazia
boas novas, eu logo lancei mão dele, e o matei em Davi fez com que os assassinos fossem
Ziclague, sendo essa a recompensa que lhe dei pelas executados, e seus corpos, mutilados e
novas, "quanto mais quando homens cruéis expostos. Enquanto os cadáveres dos benja-
mataram um homem justo em sua casa, sobre a mitas serviam como um lembrete público
sua cama, não requererei eu o seu sangue de vossas de que Davi recusava obter o trono de Israel
mãos, e não vos exterminarei da terra? 1ZE Davi
deu ordem aos seus mancebos; e eles os mataram pela força, a cabeça de Isbosete foi sepul
e, cortando-lhe as mãos e os pés, os penduraram tada no sepulcro de Abner, em Hebrom.
junto ao tanque em Hebrom. Tomaram, porém, a A nota parentética nos versículos 2, 3,
cabeça de Isbosete, e a sepultaram na sepultura
de Abner, em Hebrom.
Beerote (...) até o dia de hoje, tem suscitado
muita especulação quanto ao seu sentido.
Quando as notícias do assassinato de Ao tempo da conquista, Beerote era uma
Abner alcançaram Maanaim, a capital de das quatro cidades numa liga comandada
Israel, a confusão deu origem ao caos. por Gibeão (Js 9.17). Sua localização, bem
Jamais tendo sido por si mesmo um líder como a de Gitaim, é desconhecida. Alguns
forte, Isbosete tinha anteriormente teste comentaristas sugerem que o povo de
munhado seu mundo de realeza des Beerote fugiu devido à severa perseguição
110
por Saul, que suspeitava que eles (»labo outros candidatos capazes para o ofício que
ravam com os filisteus (Bright, p. 168; ele buscava.
McKane, p. 197). Se tal fosse o caso, porém, O relato da ascensão de Davi ao trono
a presença de Baaná e Recabe como oficiais é impressionantemente simples. Os anciãos
no exército de Isbosete seria difícil de de Israel, como reprçsentantes de todas as
explicar. Nenhuma resposta inteiramente tribos, juraram a Davi sua lealdade numa
satisfatória pode ser dada com base nas cerimônia de aliança e ungiram-no rei. Base
informações disponíveis. aram sua ação na comprovada habilidade
O versículo 4, que interrompe a história de Davi como líder militar sobre Saul e na
do assassinato de Isbosete, serve para intro crescente convicção que tinham de que ele
duzir Mefibosete como personagem de era o governante escolhido pelo Senhor para
certa importância numa narrativa futura o seu povo.
(9.1-13). Num exemplo clássico de anteci É dito que Davi reinou quarenta anos.
pação literária, o leitor é levado a antecipar Uma vez que quarenta anos era freqüen
sua aparição posterior e, então, à luz dessa temente empregado como um número
experiência, a reinterpretar a primeira. A redondo próprio para indicar um longo
casa de Saul estava chegando a uma período de duração indeterminada, o
situação triste quando somente um neto número pode ou não ser exato. Com base
aleijado sobreviveria para herdar seus bens. em sincronismo com outros acontecimentos
conhecidos mencionados nas obras de
2) Davi Soberano Sobre Todo o Israel Josefo, a data da ascensão de Salomão é
(5.1—8.18) calculada com relativa precisão como tendo
ocorrido em 961 a.C.31 O reinado de Davi,
a. Os Anciãos “Elegem” Davi Rei (5.1-5) portanto, teria se estendido de cerca de 1000
'Então todas as tribos de Israel vieram a Davi
a 961 a.C.
em Hebrom e disseram: Eis-nos aqui, teus ossos Em Hebrom reinou. A captura de Jeru
e tua carne! 2Além disso, outrora, quando Saul salém por Davi está aqui associada com o
ainda reinava sobre nós, eras tu o que saias e início de seu governo sobre Israel, sete anos
entravas com Israel; e também o Senhor te disse: e meio após ter-se tornado rei sobre Judá,
Tu apascentarás o meu povo de Israel, e tu serás
chefe sobre Israel. 3Assim, pois, todos os anciãos
em Hebrom. Esta afirmação, contudo, não
de Israel vieram ter com o rei em Hebrom; e o rei leva em consideração o reinado de Isbosete
Davi fez aliança com eles em Hebrom, perante o de somente dois anos sobre o reino do norte
Senhor; e ungiram a Davi rei sobre Israel. 4Trinta (2.10). Sendo que não há qualquer indicação
anos tinha Davi quando começou a reinar, e reinou de Israel ter esperado cinco anos e meio
quarenta anos. 5Em Hebrom reinou sete anos e
seis meses sobre Judá, e em Jerusalém reinou trinta após a morte de Isbosete antes de ungir a
e três anos sobre todo o Israel e Judá. Davi rei, é melhor entender que Davi
capturou Jerusalém cinco anos após os
A corrente que por tanto tempo havia
reinos se unirem sob o seu governo. Daí,
carregado Davi rumo ao trono de Israel era
numa seqüência cronológica exata, 5.6-10
agora forte demais para ser detida pelas
viria após 5.17-25.
mortes de Abner e Isbosete. Em vista da
resolução anterior de Israel de “ir com Davi”
b. Davi Instala sua Corte (5.6-16)
(3.17-19), sua ascensão como rei de modo
algum dependia do assassinato dos princi 6Depois partiu o rei com os seus homens para
pais líderes do reino do norte. Uma forte Jerusalém, contra os jebuseus, que habitavam
naquela terra, os quais disseram a Davi: Não
reação pública poderia ter temporariamente entrarás aqui; os cegos e os coxos te repelirão;
postergado o inevitável, mas aparentemente
Davi foi capaz de convencer a nação como David Noel F reedm an, “T he Chronology o f Israel and the A ncient
um todo de sua inocência nesses assassi N ear East: Section A. Old Testament Chronology”, The Bible and
the A n c ien t N ea r East, editado por G. E rnest W right (Garden City,
natos. Contudo, na verdade não havia New York: Doubleday, 1961), p. 209.
ill
querendo dizer: Davi de maneira alguma entrará A passagem paralela de lCrônicas 11.4-9,
aqui. 7Todavia Davi tomou a fortaleza de Sião; esta
é a cidade de Davi. 8Ora, Davi disse naquele dia: que, em outros aspectos, segue o conteúdo
Todo o que ferir os jebuseus, suba ao canal, e fira de Samuel quase palavra por palavra, omite
a esses coxos e cegos, a quem a alma de Davi abor a referência toda aos coxos e cegos. A última
rece. Por isso se diz: Nem cego nem coxo entrará metade de 2Samuel 5.6 é omitida e o versí
na casa. 9Assim habitou Davi na fortaleza, e culo 8 é alterado para rezar: “Davi disse:
chamou-a cidade de Davi; e foi levantando edifícios
em redor, desde Milo para dentro. 10Davi ia-se Qualquer que primeiro ferir os jebuseus será
engrandecendo cada vez mais, porque o Senhor chefe e capitão. E Joabe, filho de Zeruia,
Deus dos exércitos era com ele. "Hirão, rei de subiu primeiro, pelo que foi feito chefe” (lCr
Tiro, enviou mensageiros a Davi, e madeira de cedro, 11.6).
e carpinteiros e pedreiros, que edificaram para Davi
uma casa. 12Entendeu, pois, Davi que o Senhor o
A Septuaginta, contudo, reflete um texto
confirmara rei sobre Israel, e que exaltara o reino bastante semelhante ao adotado neste
dele por amor de seu povo Israel. 13Davi tomou comentário, com exceção duma pequena
ainda para si concubinas e mulheres de Jerusalém, alteração no versículo 8. Onde lemos a
depois que viera de Hebrom; e nasceram a Davi quem a alma de Davi aborrece, a versão
mais filhos e filhas. 14São estes os nomes dos que
lhe nasceram em Jerusalém: Samua, Sobabe, Natã, grega pode ser traduzida por “e aqueles que
Salomão, 15Ibar, Elisua, Nefegue, Jafia, 16Elisama, odeiam a alma de Davi”. Isto requereria só
Eliadá e Elifelete. uma pequena alteração do texto hebraico,
mas doutro modo permanece a dificuldade.
As dificuldades textuais desses versículos
são por demais complicadas para serem aqui c. Davi Detém os Filisteus (5.17-25)
enumeradas, mas os resultados gerais das 17Quando os filisteus ouviram que Davi fora
ações de Davi podem ser prontamente ungido rei sobre Israel, subiram todos em busca
percebidas. Cerca de cinco anos após ele dele. Ouvindo isto, Davi desceu à fortaleza. 18Os
filisteus vieram, e se estenderam pelo vale de Refaim.
ter-se tornado rei sobre todo Israel (cf. nota 19Pelo que Davi consultou ao Senhor, dizendo:
sobre v. 5), Davi mudou sua capital para Subirei contra os filisteus? entregar-mos-ás nas
Jerusalém, que capturou graças à habilidade mãos? Respondeu o Senhor a Davi: Sobe, pois eu
e coragem de suas tropas pessoais. Essa entregarei os filisteus nas tuas mãos. “ Então foi
cidade proporcionou-lhe uma base facil Davi a Baal-Perazim, e ali os derrotou; e disse: O
Senhor rompeu os meus inimigos diante de mim,
mente fortificada, que fazia divisa tanto como as águas rompem barreiras. Por isso chamou
com Israel quanto com Judá, mas que, o nome daquele lugar Baal-Perazim. 21Os filisteus
sendo propriedade particular, não devia leal deixaram lá os seus ídolos e Davi e os seus homens
dade a qualquer dos dois. os levaram. 22Tbrnaram ainda os filisteus a subir,
e se espalharam pelo vale de Refaim. 23E Davi
A prosperidade de Davi e o bem-estar consultou ao Senhor, que respondeu: Não subirás;
geral de seu reino durante os primeiros anos mas rodeia-os por detrás, e virás sobre eles por
de seu reinado confirmam-se em sua defronte dos balsameiros. 24E há de ser que,
conquista duma nova capital, em seu ouvindo tu o ruído de marcha pelas copas dos balsa
programa de edificações bastante ambicioso meiros, então te apressarás, porque é o Senhor que
sai diante de ti, a ferir o arraial dos filisteus. “ Fez,
e em sua crescente família. pois, Davi como o Senhor lhe havia ordenado; e
Esses coxos e cegos, a quem a alma de feriu os filisteus desde Geba, até chegar a Gezer.
Davi aborrece parece uma expressão cruel
e preconceituosa para um homem do calibre Os filisteus tinham desejado, tinham até
de Davi. Comentaristas recentes têm ofere mesmo ansiado, que Davi se tornasse rei
cido várias interpretações, nenhuma das de Judá, uma vez que qualquer aconteci
quais oferece uma solução plenamente satis- mento que dividisse Israel apenas operaria
fatória para o problema. Contudo, para o seu benefício. Provavelmente
aparentemente os leitores modernos não também esperavam que Davi, um ex-vassalo
são os primeiros a terem dificuldade com de Áquis, rei de Gate, se inclinaria a favo
o texto. recer seus antigos senhores (cf. comentário
112
sobre 2.1-11). Sem dúvida, notaram com lo típico de guerrilha, os homens de Davi
satisfação os efeitos debilitadores da guerra reuniram os despojos, inclusive os deuses
civil de Israel e os esforços repetidamente de batalha dos filisteus, e desapareceram
frustrados de promover a reconciliação no campo.
entre o norte e o sul. Os filisteus reagruparam suas forças e
Quando Davi emergiu como o líder de retornaram ao mesmo campo, e provavel
um único estado, a política dos filisteus mente à mesma estratégia. Novamente
mudou, pois agora enfrentaria a oposição Davi consultou o Senhor, mas desta vez foi
de um povo unido, dirigido por um expe aconselhado a evitar um ataque frontal em
riente líder militar de comprovada favor de um assalto pela retaguarda.
habilidade. Imediatamente começaram a Utilizando-se de balsameiros como cober
mobilizar seus exércitos para uma expedição tura, Davi e seus homens puseram-se em
contra o novo rei. posição ao redor do acampamento filisteu
Sem tempo para organizar e treinar o e esperaram por um som nas copas daque
potencial humano vindo de todo Israel, las árvores como sinal divino para avançar.
Davi teve de apoiar-se principalmente em Novamente os israelitas foram vitoriosos,
suas tropas pessoais e na milícia de Judá. e os filisteus, desalojados das montanhas
Com limitados recursos, não ousou designar da região centro-sul da Pelestina.
seus homens para a defesa de locais forti A referência no versículo 17 a desceu
ficados, onde poderiam ser isolados e à fortaleza não é bem clara. Pela atual
subjugados pelos filisteus a seu bel-prazer seqüência do texto, a fortaleza parece
(cf. sua decisão em Queila: ISm 23.1-14). referir-se à cidadela em Jerusalém. Se, no
Davi, portanto, retirou suas forças para a entanto, a captura de Jerusalém ocorreu
fortaleza no deserto, nos arredores de bastante depois da unificação do reino
Adulão. A partir de bases volantes nessa (cf. comentário sobre 5.5), Davi não havia
área, estava livre para promover o tipo de ainda tomado Jerusalém quando derrotou
guerra de guerrilha que conhecia melhor. os filisteus em Refaim. A fortaleza men
Uma vez que Davi não oferecia aos cionada aqui então se refere ao deserto ao
filisteus um alvo estacionário, eles prova redor de Adulão, onde Davi encontrou
velmente decidiram-se por uma tática proteção quando primeiro começou a
designada para atraí-lo para fora do terri organizar um exército de guerrilha (cf. co
tório que lhe era familiar e onde tivera mentário sobre ISm 22.5).
início sua experiência militar. Estabele
cendo uma base no vale de Refraim, a d. A Arca Retorna a Jerusalém (6.1-23)
sudoeste de Jerusalém, os filisteus podiam 'Ibrnou Davi a ajuntar todos os escolhidos de
enviar comandos de ataque para o norte Israel, em número de trinta mil. 2Depois levan-
ou para o sul, para devastar território isra tou-se Davi, e partiu para BaaRJudá com todo o
elita até que Davi viesse em socorro. povo que tinha consigo, para trazerem dali para
cima a arca de Deus, a qual é chamada pelo nome,
Sentindo o perigo representado pela o nome do Senhor dos exércitos, que se assenta
posição dos filisteus, Davi buscou o con sobre os querubins. 3Puseram a arca de Deus em
selho do Senhor quanto a se devia se man um carro novoi, e a levaram da casa de Abinadabe,
que estava sobre o outeiro; e Uzá e Alô, filho de
ter em sua base no sul ou subir a Refaim. Abinadabe, guiavam o carro nova 4Foram, pois,
Assegurado da vitória por indicação divi levando-o da casa de Abinadabe, que estava sobre
na, Davi conduziu secretamente suas for o outeiro, com a arca de Deus; e Aiô ia adiante
ças desde o deserto a fim de passar a ter da arca. 5E Davi, e toda a casa de Israel, tocavam
a iniciativa. Avançando sobre as hostes dos perante o Senhor, com toda sorte de instrumentos
de pau de faia, como também com harpas, salté
filisteus tal qual uma enchente que arre rios, tamboris, pandeiros e címbalos. 6Quando
benta um açude de terra, os israelitas chegaram à eira de Nacom, Uzá estendeu a mão
puseram seus inimigos em fuga. Num esti à arca de Deus, e pegou nela, porque os bois trope-
113
çaram. 7Então a ira do Senhor se acendeu contra das e tenham circulado como parte de um
Uzá, e Deus o feriu ali; e Uzá morreu junto à arca grupo de narrativas que tratam da história
de Deus. 8E Davi se contristou, porque o Senhor
abrira rotura em Uzá; e passou-se a chamar àque da arca (ISm 4—6). Não obstante, em seu
le lugar, Pérez-Uzá, até o dia de hoje. ’Davi, pois, atual contexto este incidente é mais do que
teve medo do Senhor naquele dia, e disse: Como um simples episódio interessante sobre a
virá a mim a arca do Senhor? 10E não quis levar arca. Na verdade, a história carrega vis
a arca do Senhor para a cidade de Davi; mas fâ-la lumbres tanto políticos como religiosos
entrar na casa de Obede-Edom, o gitita. nE ficou
a arca do Senhor três meses na casa de Obede- dos primeiros tempos do reinado de Davi.
-Edom, o gitita, e o Senhor o abençoou e a toda No pensamento israelita, a arca sim
a sua casa. l2Então informaram a Davi, dizendo: bolizava a presença do Senhor entre seu
O Senhor abençoou a casa de Obede-Edom, e
tudo quanto é dele, por causa da arca de Deus. povo, tanto em marcha pelo deserto (Nm
Foi, pois, Davi, e com alegria fez subir a arca de 10.33-36) quanto em batalha (Js 6). A
Deus, da casa de Obede-Edom para a cidade de partir da arca, Deus dispensava sabedoria
Davi. >3Quando os que levavam a arca do Senhor e poder a seu povo. Á época dos juizes, a
tinham dado seis passos, ele sacrificou um boi e arca servia de ponto de convergência da
um animal cevada 14E Davi dançava com todas as
suas forças diante do Senhor; e estava Davi cin religião de Israel e, provavelmente, tam
gido dum éfode de linha 15Assim Davi e toda a bém de seu governo tribal (cf. comentário
casa de Israel subiam, trazendo a arca do Senhor sobre ISm 4.12-18). No entanto, a arca foi
com júbilo e ao som de trombetas. 16Quando virtualmente ignorada a partir de seu re
entrava a arca do Senhor na cidade de Davi,
Mical, filha de Saul, estava olhando pela janela;
torno da captura pelos filisteus (ISm 7.1,2),
e, vendo ao rei Davi saltando e dançando diante e Saul aparentemente não empreendeu
do Senhor, o desprezou no seu coraçãa ^Intro qualquer esforço sério para restaurá-la a
duziram, pois, a arca do Senhor, e a puseram no uma posição central na vida de Israel.
seu lugar, no meio da tenda que Davi lhe armara;
e Davi ofereceu holocaustos e ofertas pacíficas Saul chegou ao poder com a aprovação
perante o Senhor. 18Quando Davi acabou de relutante dos líderes principais desse sis
oferecer os holocaustos e ofertas pacificas, aben tema mais antigo (ISm 8—11), mas suas
çoou o povo em nome do Senhor dos exércitos. ações logo levaram à alienação tanto de
19Depois repartiu a todo o povo, a toda a multi
dão de Israel, tanto a homens como a mulheres, profetas (ISm 13—15) quanto de sacerdotes
a cada um, um bolo de pãoi, um bom pedaço de (ISm 22.11-19). Durante os últimos anos de
carne e um bolo de passas. Em seguida todo o povo Saul e por todo o reinado de Isbosete, os
se retirou, cada um para sua casa. 20Então Davi anciãos tribais tinham pouquíssimas influ
voltou para abençoar a sua casa; e Mical, filha de
Saul, saiu a encontrar-se com Davi, e disse:
ências à medida que a autoridade centra
Quão honrado foi o rei de Israel, descobrindo-se lizava-se cada vez mais no rei e em sua corte.
hoje aos olhos das servas de seus servos, como sem Indubitavelmente, essas tensões envene
pejo se descobre um individuo qualquer.21Disse, navam as mentes de muitos para com a
porém, Davi a Mical: Perante o Senhor, que me própria monarquia.
escolheu a mim de preferência a teu pai e a toda
a sua casa, estabelecendo-me por chefe sobre o Davi, contudo, era sensível a esses senti
povo do Senhor, sobre Israel, sim, foi perante o mentos e, sempre que possível, agia de
Senhor que dancei; e perante ele ainda hei de acordo com a estrutura organizada por
dançar. 22Também ainda mais do que isso me
envilecerei, e me humilharei aos meus olhos; mas
uma geração anterior. Repetidas vezes
das servas, de quem falaste, serei honrado. evitou o emprego da força bruta entre seu
23E Mical, filha de Saul, não teve filhos, até o dia próprio povo, mesmo para cumprir o que
da sua morte. cria ser a vontade de Deus (cf. comentário
sobre ISm 24.6; 25.26). Aparentemente,
Este capítulo prossegue o sumário de Davi também tinha considerável respeito
acontecimentos significativos associados pelos anciãos tribais, uma vez que somente
com a conquista de Jerusalém por Davi a pedido deles assumiu o trono tanto em
(5.1-16). É possível que as próprias tradi Judá (2Sm 2.4) quanto em Israel (5.1-3).
ções tenham sido originalmente preserva Agora ficamos sabendo que Davi decidiu,
114
com a aprovação dos anciãos (lCr 13.2-4), -se de Quiriate-Jearim (lCr 13.5,6), onde
trazer a arca à sua nova capital, Jerusalém. a arca fora posta sob os cuidados de Abina-
Após fazer detalhados preparativos, dabe, após retornar dos filisteus (ISm 7.1)
Davi partiu com um séquito apropriado Talvez o antigo nome de Quiriate-Jearim,
para transferir a arca para seu novo lar. Baalá, tenha sido usado, explicando-se
A morte súbita de Uzá, um ajudante que assim a confusão no texto. Se, ao tempo
tocóu na arca, foi considerada um pressá de Davi, a arca estava ainda situada em
gio da ira do Senhor; e a procissão foi Quiriate-Jearim, a jornada não seria longa,
imediatamente interrompida. Davi aparen pois ficava somente a onze quilômetros a
temente tomou precauções para que parte noroeste de Jerusalém.
da fúria do Senhor não fosse atribuída à O hebraico dos versículo 6 e 7 é proble
sua família ou à sua nova capital. Por mático, e os detalhes deste incidente não
três meses a arca foi deixada com Obede- são claros. A morte súbita sob tais cir
-Edom, um forasteiro de Gate; e, quando cunstâncias seria bem compreensível,
se tomou evidente que ele estava sendo contudo, mesmo ocorrendo devido a meios
abençoado, e não amaldiçoado, a jornada naturais, isto é, por causa de temor, esgo
foi reencetada. tamento etc.
A arca foi trazida pelo restante do e. Natã Profetiza a Dinastia (7.1-17)
caminho até a cidade com toda pompa e
cerimônia possível. Quando ela avançou 'Ora, estando o rei Davi em sua casa e tendo-
seis passos, foi oferecido um sacrifício, -Ihe dado o Senhor descanso de todos os seus
inimigos em redor, 2disse ele ao profeta Natã: Eis
celebrando um auspicioso início da jor que en moro numa casa de cedro, enquanto que
nada. Vestido numa estola sacerdotal de a arca de Deus dentro de uma tenda. 3Respondeu
linho, o próprio Davi dançava perante a N atã ao rei: Vai e faze tudo quanto está no teu cora
arca e dirigia-a rumo à tenda que fora ção^ porque o Senhor ê contigo. 4M as naquela mes
erguida para abrigá-la. Outros sacrifícios ma noite a palavra do Senhor wio a Natã, dizendo:
5Vai, e dize a meu servo Davi: Assim diz o Se
foram feitos, dádivas generosas de alimen nhor: Edificar-me-ás tu uma casa para eu nela
tos foram distribuídas entre o povo, e Israel habitar? ‘Porque em casa nenhuma habitei,
teve um dia que por muito tempo recor desde o dia em que fiz subir do Egito os filhos de
daria. Israel até o dia de hoje, mas tenho andado em
tenda e em tabernáculo. 7E em todo lugar em que
Nem todos, porém, se alegraram com tenho andado com todos os filhos de Israel, falei
a ocasião. Para Mical, filha de Saul e porventura alguma palavra a qualquer das suas
esposa de Davi, o expor-se em público e tribos a quem mandei apascentar o meu povo de
Israel, dizendo: For que não me edificais uma casa
os gestos frenéticos de um êxtase religioso de cedro? 8Agora, pois, assim dirás ao meu servo
pareceram indignos de um rei (cf. comen Davi: Assim diz o Senhor dos Exércitos: Eu te tomei
tário sobre ISm 10.1-6). Foi de um modo da malhada, de detrás das ovelhas, para que fosses
bem trágico, ainda que tão característico, principe sobre o meu povo, sobre Israel; e fui' con
que ela deixou de compreender as obri tigo, por onde quer que foste, e destruí a todos os
teus inimigos diante de ti; e te farei um grande nome,
gações que aquela posição de destaque como o nome dos grandes que há na terra.
impunham. Contudo, Davi entendeu mais 1“Também designarei lugar para o meu povo, para
claramente que suas responsabilidades eram Israel, e o plantarei ali, para que ele habite no seu
primeiro para com Deus e depois para com lugar, e não mais seja perturbadoi, e nunca mais
o seu povo. os filhos da iniqüidade o aflijam, como dantes, ne
como desde o dia em que ordenei que houvesse
Observe-se que Baal-Judá, no versículo juizes sobre o meu povo Israel. A ti, porém, darei
2, não é um topónimo, mas uma expressão descanso de todos os teus inimigos. Tunbém o
que significa “dirigentes de Judá”. É assim Senhor te declara que ele te fará casa. 12Quando
teus dias forem completados, e vieres a dormir
que está traduzida na Septuaginta. Toda com teus pais, então farei levantar depois de ti um
via, aparentemente perdeu-se do texto um dentre a tua descendência, que sair das tuas entra
nome geográfico. Provavelmente tratava- nhas, e estabelecerei o seu reina °Este edificará
115
uma casa ao meu nome, e eu estabelecerei para alcançada quando Deus fizesse com que
sempre o trono do seu reina MEu lhe serei pai, e se cumprissem as três principais predições
ele me será filha E, se vier a transgredir, castigá-
-lo-ei com vara de homens, e com açoites de filhos da profecia de Natã. Primeiro, Israel gozaria
de homens; 15mas não retirarei dele a minha paz para habitar com segurança sobre a
benignidade como a retirei de Saul, a quem tirei terra, livre de qualquer opressão estrangeira.
de diante de ti. 16A tua casa, porém, e o teu reino Segundo, quando Davi morresse, seria suce
serão firmados para sempre diante de ti; teu trono dido no trono por uma linhagem duradoura
será estabelecido para sempre. 17Conforme todas
estas palavras, e conforme toda esta visão, assim de seus próprios descendentes, os quais
falou Natã a Davi. teriam o domínio para sempre. Terceiro,
Deus prometeu dirigir esses futuros reis,
Neste capítulo chegamos ao ponto enviando adversidades quando se
teológico crucial dos livros de Samuel. desviassem. A dinastia de Davi, contudo,
De fato, a história toda do reino do sul não seria rejeitada, como Saul tinha sido
e a expectativa que ia surgindo de um por suas transgressões.
messias davídico se devem aos vislumbres Compreensivelmente, esta visão da
teológicos e políticos aqui expressos. dinastia davídica tinha profundas impli
A profecia de Natã é, na verdade, for cações para a história e a religião de Israel,
mada por dois oráculos que são unidos especialmente após o reino do sul tornar-se
mediante um jogo de palavras com o termo um estado independente. A confiança de
casa. O primeiro oráculo era um desenvol Judá derivava do fato de que seus gover
vimento do plano de Davi em edificar uma nantes pertenciam à casa de Davi (cf. SI
casa (templo) para o Senhor. Como parte 78) e, em tempos de adversidade, as
de seus esforços para centralizar a vida reli promessas de Deus na profecia de Natã figu
giosa e política de Israel em Jerusalém, raram destacadamente nas liturgias do
Davi propôs a construção de um templo templo (SI 89).
rico em detalhes para substituir a tenda Entretanto, os reis posteriores de Judá
que abrigava a arca.32 revelaram ter uma influência tão corrupta
Na qualidade de poderoso conselheiro sobre a nação que as esperanças de um
profético de Davi, Natã concordou inicial governante justo do calibre de Davi foram
mente (cf. v. 3) com o novo plano do rei. cada vez mais lançadas para o futuro.
Contudo numa noite de reflexão passada Quando a monarquia fracassou completa
em oração, Natã foi levado a ver que o mente após a destruição de Jerusalém pelos
maior serviço de Davi para Deus não era babilônios, essas esperanças então se trans
a construção de um templo, mas resolver formaram na expectativa da vinda de um
com êxito os problemas de sucessão em messias celestial (Is 55; Ez 34).
Israel, daí o segundo oráculo e o jogo de Conquanto outros textos bíblicos obvia
palavras envolvendo o termo casa. Davi mente se inspirem nos conceitos subjacentes
não construiria uma casa ao Senhor (tem à profecia de Natã, permanece em aberto
plo), mas o Senhor construiria uma casa uma questão acerca das condições que
(dinastia) para Davi. deram origem ao surgimento da expectativa
A ênfase maior da profecia de Natã de uma linhagem perpétua de Davi.
A profecia de Natã influenciou práticas
encontra-se no segundo oráculo (v. 8-16).
dinásticas judaicas, ou esta passagem é uma
Esse oráculo fala da contínua atividade de
profecia depois do fato acontecido? Infeliz
Deus em favor de Davi, que estava desti
mente, as opiniões variam amplamente.
nado a ser alistado entrè os homens mais
Alguns, tais como H. P. Smith (p. 297) e
ilustres do mundo. A grandeza de Davi seria
R. H. Pfeiffer,33 consideram a profecia de
32 Para um a análise dos fatores motivadores subjacentes ao plano de
Davi, veja R. E. Clements, G o d a n d Temple (Philadelphia: R>rtress 33 Robert H . Pfeiffer, Introduction to th e O ld Testament (New York:
Press, 1965), p. 40-62. H arper and Brothers, 1941), p. 371.
116
Natã como uma criação de teólogos pós- Davi e os remanescentes da casa de Saul.
-exílicos, colocada nos lábios de uma Somente após repetidos fracassos nas nego
personagem que vivera anteriormente. ciações de paz, numerosos assassinatos, e
Outros, incluindo Martin Noth34 e H. W. finalmente a morte do rei de Israel foi o
Hertzberg (p. 283), consideram os conceitos reino novamente reunificado sob a liderança
básicos subjacentes ao material como de Davi.
produtos do mesmo contexto histórico que Em contraste com tudo isto, tornou-se
o capítulo descreve. Contra tal diversidade novamente claro que o futuro do povo de
de opiniões, pareceria apropriado tentar Deus estaria seriamente comprometido a
fazer uma análise do papel que o pronun menos que os israelitas encontrassem uma
ciamento de Natã (especialmente o v. 16) solução pacífica para seus problemas de
desempenharia na empolgante história polí sucessãa Assim, a profecia de Natã era mais
tica do reino unido de Davi. do que uma simples declaração das
À época da antiga liga tribal de Israel condições que automaticamente ocorreria
quase inexistia uma efetiva centralização em Israel. Na verdade, o profeta realmente
de autoridade. Em tempos de guerra, o povo expressara o juízo do Senhor numa solução
era forçado a unir-se sob a liderança dos que estava sendo proposta para as dificul
juizes militares, mas a eficácia de tal dades dinásticas de Israel. Daí em diante,
unidade variava em função da seriedade o rei legítimo sairia dentre os descendentes
da ameaça externa existente e da capaci de Davi. Não havia ainda qualquer acordo
dade de persuasão pessoal de cada juiz sobre qual de seus filhos ocuparia o trono
individual. Contudo, com o ressurgimento (este problema é tratado na Narrativa da
de uma política agressiva por parte dos filis Sucessão — 2Sm 9-20; IReis 1,2; cf. Intro
teus, a falta em Israel de um sistema que dução, V, 2); mas pelo menos um passo foi
proporcionasse uma liderança contínua e dado para o restabelecimento da lei e da
efetiva a nível nacional revelou ser uma defi ordem.
ciência de proporções quase fatais. Num Costumeiramente tem-se interpretado os
esforço por corrigir essa deficiência, Samuel, versículos 5-7 como uma polêmica contra
como o destacado expoente da velha lide os perigos da religião institucionalizada.
rança tribal, orientou no estabelecimento Natã é visto como alguém proibindo a cons
de um governo mais centralizado sob o trução do templo, com a fundamentação
controle de um rei. teológica de que o Senhor não habitara
O reinado de Saul, contudo, revelou-se permanentemente em uma casa: Em casa
um fiasco. Após um começo auspicioso nenhuma habitei. Antes, ele havia acam
tanto internamente quanto no campo de pado com seu povo em tendas desde que
batalha, Saul fortaleceu as forças seriamente o dirigiu para fora do Egito. O culto ao
desagregadoras já existentes em Israel Senhor não devia, portanto, confinar-se a
devido à sua insana perseguição de Davi. um edifício em particular. Indubitavel
A nação estava uma vez mais mutilada por mente, esses versículos propiciaram uma
condições semelhantes àquelas que haviam importante fonte de inspiração para os
trazido a monarquia à existência. Após a profetas que mais tarde se manifestaram
morte de Saul, a difícil situação do país quanto aos abusos do ritualismo vazio do
tornou-se ainda mais crítica. Com o reino culto no templo (Is 1.11-17; Jr 7; Ez 8; 9).
dividido, Israel logo se viu envolvido numa Contudo, comentaristas que têm
cruel guerra civil entre os que apoiavam adotado essa interpretação têm-se revelado
embaraçados com o versículo 13, que fala
4 The Laws in the fentateuch: Their Assum ptions an d M eaning, tradu- do filho de Davi que edificaria uma casa
zido para o inglês por D. R. Ap-Thomas (Philadelphia: Fortress Press,
1966), p. 16. Esse artigo foi originalm ente publicado em alemão
para o nome do Senhor. Geralmente têm
em 1940. sustentado que esse versículo, que parece
117
contrariar frontalmente a teologia dos versí que falaste acerca do teu servo e acerca da sua casa,
culos 5-7 é uma adição posterior feita por e faze como tens falado, 20para que seja engran
decido o teu nome para sempre, e se diga: O Senhor
um escriba mais recente que sabia da exis dos exércitos é Deus sobre Israel; e a casa do teu
tência do templo de Salomão. servo será estabelecida diante de ti. 27Pois tu,
Por outro lado, é possível interpretar mais Senhor dos exércitos, Deus de Israel, fizeste uma
naturalmente a passagem inteira não como revelação ao teu servo, dizendo: Edificar-te-ei uma
uma proibição, mas como um adiantamento casa. Por isso o teu servo se animou a fazer-te esta
oraçãa 28Agora, pois, Senhor Jeová, tu és Deus,
da construção de um templo.35 O Senhor e as tuas palavras são verdade, e tens prometido
sempre se contentara em viver como tinha a teu servo este bem. 29Sê, pois, agora servido de
vivido seu povo. Tendas eram perfeitamente abençoar a casa do teu servo, para que subsista
adequadas enquanto Israel estivera em pere para sempre diante de ti; pois tu, ó Senhor Jeová,
o disseste; e com a tua bênção a casa do teu servo
grinação, e Deus não havia requerido será abençoada para sempre.
qualquer habitação permanente. Depois o
Senhor havia escolhido Davi como príncipe Davi reagiu às promessas divinas ditas
sobre Israel e havia fortalecido suas mãos por Natã com uma oração formal de ação
contra os inimigos de seu povo. Quando de graças e consagração. A oração parece-
o povo de Israel estivesse firmemente esta se com um hino de louvor porque, embora
belecido em seu próprio lugar e quando trate de questões relacionadas com o
experimentasse a paz, o Senhor criaria uma homem e suas necessidades, seu alvo final
linhagem duradoura para a casa de Davi é a glorificação do Senhor. Davi começou
sobre o trono de Israel. Quando seu povo sua oração, louvando a Deus por seus
estivesse assim instalado, então seria apro inúmeros atos graciosos na própria vida de
priado que o Senhor estivesse associado Davi. Não foi devido a qualquer bondade
com uma “casa” fixa. inerente de Davi, mas por causa da graça
do próprio coração de Deus, que ele tomou
f. Davi Rende Graças (7.18-29) um insignificante pastor e fê-lo rei.
l8Então entrou o rei Davi, e sentou-se perante Igualmente, a própria existência do povo
o Senhor, e disse: Quem sou eu, Senhor Jeová, e de Israel reflete glória sobre o Deus de Israel.
que é a minha casa, para me teres trazido até aqui? O Senhor inverteu a seqüência usual, em
19E isso ainda foi pouco aos teus olhos, Senhor
Jeová, senão que também falaste da casa do teu que as nações do mundo escolhem o deus
servo para tempos distantes; e me tens mostrado a quem servem. Em vez disso, o Senhor
gerações futuras, ó Senhor Jeová? 20Que mais te chamou Israel à existência e repetidamente
poderá fazer Davi? pois tu conheces bem o teu servo, operou ativamente na história em benefício
ó Senhor Jeová. 21Fk>r causa da tua palavra, e
segundo o teu coração, fizeste toda esta grandeza,
de seu povo.
revelando-a ao teu serva “ Portanto és grandioso, Davi concluiu sua oração com um
ó Senhor Jeová, porque ninguém há semelhante ardente apelo para que o Senhor concluísse
a ti, e não há Deus senão tu só, segundo tudo o o que havia iniciado entre seu povo. Davi
que temos ouvido com os nossos ouvidos. “ Que prometeu que enquanto Israel existisse e
outra nação na terra é semelhante a teu povo Israel,
a quem tu, ó Deus, foste resgatar para te ser povo, enquanto um membro de sua linhagem se
para te fazeres um nome, e para fazeres a seu favor assentasse sobre o trono, o nome do Senhor
estas grandes e terríveis coisas para a tua terra, não deixaria de receber louvor.
diante do teu povoi, que tu resgataste para ti do Egito,
desterrando nações e seus deuses? 24Assim esta g. Panorama do Reinado de Davi (8.1-18)
beleceste o teu povo Israel por teu povo para sempre,
e tu, Senhor, te fizeste o seu D eus.25Agora, pois, 'Sucedeu depois disso que Davi derrotou os
ó Senhor Jeová, confirma para sempre a palavra filisteus, e os sujeitou; e Davi tomou a Metegue-
■Ama das mãos dos filisteus. 2Também derrotou
os moabitas, e os mediu com cordel, fazendo-os
35 Esta passagem, contudo, não associa este adiam ento com qualquer
culpa relacionada ao papel de Davi com o um grande com batente
deitar por terra; e mediu dois cordéis para os matar,
UCr 22.8; 28.3). Em Samuel o próprio Senhor recebe o reconhe e um cordel inteiro para os deixar com vida. Ficaram
cim ento peia derrota dos inimigos de Davi. assim os moabitas por servos de Davi, pagando-
118
-lhe tributos. 3Davi também derrotou a Hadadézer, lhidos para inclusão no registro bíblico
filho de Reobe, rei de Zobá, quando este ia esta (5.17-25; 21.15-22; 23.9-17; e as passagens
belecer o seu domínio sobre o rio Eufrates. 4E
tomou-lhe Davi mil e setecentos cavaleiros e vinte
paralelas em lCr). Essas passagens não
mil homens de infantaria; e Davi jarretou a todos parecem estar dispostas em ordem crono
os cavalos dos carros, reservando apenas cavalos lógica, e a referência aqui feita ao domínio
para cem carros. 5Os sírios de Damasco vieram de Davi sobre os filisteus simplesmente
socorrer a Hadadézer, rei de Zobá, mas Davi matou declara o resultado final da disputa. Os filis
deles vinte e dois mil homens. 6Então Davi pôs
guarnições em Síria de Damasco, e os sírios ficaram teus nunca mais representaram uma séria
por servos de Davi, pagando-lhe tributos. E o ameaça a Israel, e Davi logo estava empre
Senhor lhe dava a vitória por onde quer que ia. gando mercenários filisteus, tal como antes
7E Davi tomou os escudos de ouro que os servos havia trabalhado para Áquis, rei de Gate.
de Hadadézer usavam, e os trouxe para Jerusalém.
sDe Betá e de Berotai, cidades de Hadadézer, o Desconhece-se a localização de Metegue-
rei Davi tomou grande quantidade de bronze. -Ama.
’Quando Toí, rei de Hamate, ouviu que Davi ferira Nenhuma explicação é dada para o
todo o exército de Hadadézer, 10mandou-lhe seu tratamento extremamente severo que Davi
filho Jorão para saudá-loi, e para felicitá-lo por haver dispensou aos moabitas cativos. Outrora
pelejado contra Hadadézer e o haver derrotado;
pois Hadadézer de contínuo fazia guerra a Toí. E ele havia confiado o cuidado de seus pais
Jorão trouxe consigo vasos de prata, de ouro e de a eles (cf. comentário sobre ISm 22.1-5).
bronze, uos quais o rei Davi consagrou ao Senhor, Aparentemente, táticas assim perversas
como já havia consagrado a prata e o ouro de todas não eram consideradas tão excepcionais
as nações que sujeitara; 12da Síria, de Moabe, dos
amonitas, dos filisteus, de Amaleque e dos despojos no mundo antigp, uma vez que o autor
de Hadadézer, filho de Reobe, rei de Zobá. não se sentiu na obrigação de justificar
13Assim Davi ganhou nome para si. E quando as atitudes de Davi. A omissão dos terrí
voltou, matou no Vale do Sal a dezoito mil edomitas. veis atos subseqüentes a essa vitória em
WE pôs guarnições em Edom; pô-las em todo o lCr 18.2 sugere, contudo, que gerações
Edom, e todos os edomitas tornaram-se servos de
Davi. E o Senhor lhe dava a vitória por onde quer posteriores consideravam isto uma mácula
que ia. 15Reinou, pois, Davi sobre todo o Israel, no registro do reinado de Davi. Tal trata
e administrava a justiça e a eqüidade a todo o seu mento dos moabitas de modo algum cor
pova 16Joabe, filho de Zeruia, estava sobre o exér responde ao conceito de guerra santa do
cito; Jeosafá, filho de Aiílude, era cronista;
17Zadoque, filho de Aitube, e Aüneleque, filho de
cherem, em que a população toda e todos
Abiatar, eram sacerdotes; Seraías era escrivão; os seus deuses deviam ser destruídos
18Benaías, filho de Jeoiada, tinha o cargo dos (cf. comentário sobre ISm 15.1-9).
quereteus e peleteus; e os filhos de Davi eram minis Davi encontrou oportunidade para
tros de estada estender sua influência na direção do
norte, explorando as tensões que já exis
O autor bíblico emprega este sumário
tiam entre os reis de Zobá, Hamate e
do império israelita em expansão e da cres Damasco. Enquanto Hadadézer, rei de
cente corte em Jerusalém para indicar que Zobá, estava ocupado, abafando uma rebe
sua narrativa da ascensão e reinado de Davi lião de seus súditos perto do Eufrates,
(ISm 15.1—2Sm 8.18) atingiu agora o Davi lançou uma expedição rumo às
clímax (cf. Introduçãoi, V, 1). A obra de Davi
nascentes do rio Jordão, entre o Monte
ainda não terminou, mas daí em diante seu
Líbano e o Monte Hermom, para atacá-lo
papel será retratado de uma perspectiva pela retaguarda.36 Uma vez que Hada
ligeiramente diferente. As fraquezas de Davi dézer não podia lutar em duas frentes
(11.1-27; 13.21,22) são mais prontamente
simultaneamente, Davi teve condições de
reconhecidas na seção subseqüente, e a
atacar quase a seu gosto. Os despojos da
atenção se dirige para a escolha de seu
região incluíam ouro, bronze, e cavalos de
sucessor.
Somente episódios representativos das 36 Este roteiro parece provável, um a vez que doutro m odo Davi teria
guerras de Davi com os filisteus foram esco defrontado os sírios hostis de Damasco.
119
guerra em quantidade suficiente para casos mais importantes ou difíceis. A auto
propósitos de vanglória. Aparentemente ridade militar estava dividida entre Joabe,
Davi julgou que carros seriam de pouco comandante da milícia, e Benaías, líder do
uso para combates em região montanhosa, pequeno exército regular de soldados pro
aos quais estava acostumado, uma vez que fissionais. Não se conhece com precisão as
na sua maioria esses animais foram sim diferenças entre o papel do escrivão e o do
plesmente aleijados e abandonados. cronista, mas ambos serviam como im
Tensões políticas existentes na área se portantes conselheiros e oficiais do rei
refletem no fato de que, enquanto o rei de (cf. 2Reis 18.18; Jr 36.12 e s.). São abun
Hamate enviava a Davi um rico presente dantes os problemas técnicos relacionados
de congratulações por derrotar Hadadézer, com a identificação dos sacerdotes oficiais
o povo de Damasco enviava um exército da corte de Davi e na explicação de como
para atacar os israelitas. Contudo, essas os filhos de Davi (não levitas) também
tropas foram igualmente incapazes de atuaram como sacerdotes. Não obstante,
deter os desordeiros homens de Davi. podemos ver que Davi não deixou de ter
Após uma campanha muito bem-sucedida, o apoio religioso, que narrativas anteriores
Davi retirou-se, deixando algumas poucas demonstraram ser tão essencial para qual
guarnições em torno de Damasco para quer rei israelita.
simbolizar seus interesses no que ainda Assim, Davi é retratado no auge do seu
era essencialmente território inimigo poder como um rei eminentemente bem-
(cf. 10.6-19).37 sucedido. Ele havia sido capaz de trans
Após uma vitória sobre os edomitas formar sua nação de um povo dividido,
numa campanha só vagamente lembrada sujeito à autoridade filistéia, numa impor
(cf. lCr 18.12; SI 60), Davi tornou-se o tante potência mundial. Tem-se visto a
principal poder entre a Mesopotâmia e o mão de Deus por detrás dessa intricada
Egito. Ele controlava firmemente o ter seqüência de episódios históricos que le
ritório desde o deserto, no leste, até o varam Davi ao pináculo do êxito, e o autor
Mediterrâneo, no oeste; desde o Mar da duas vezes insere neste sumário a obser
Galiléia, no norte, até a extremidade infe vação do papel do Senhor nas vitórias de
rior do Mar Morto, no sul. Suas guarni Davi (cf. v. 6,14). Deste ponto em diante,
ções avançadas mantinham um mínimo de o Senhor continuará operando na história
controle sobre tributários hostis, amplian de Israel, mas Davi, como um monarca em
do assim sua influência desde Cades, no declínio, desempenhará papel cada vez
rio Orontes, até o Golfo de Ácaba. Verda menor nessa história.
deiramente, o Senhor lhe dava a vitória
por onde quer que ia. IV. Narrativa da Sucessão (9.1—
Conquanto Davi fosse lembrado como 20.26)
rei principalmente por suas façanhas mili 1. Davi Poupa o Filho de um Amigo (9.1-13)
tares, ele também introduziu inúmeras
mudanças na administração do reino. 'Disse Davi: Resta ainda alguém da casa de
Saul, para que eu use de benevolência para com
Mesmo durante a monarquia, o papel do ele por amor de Jónatas? 2E havia um servo da
juiz era de suprema importância; assim casa de Saul, cujo nome era Ziba; e o chamaram
Davi supervisionava a aplicação da justiça à presença de Davi. Perguntou-lhe o rei: Tu és
e indubitavelmente ele próprio ouvia os Ziba? Respondeu ele: Teu servo! 3Prosseguiu o
rei: Não há ainda alguém da casa de Saul para
que eu possa usar com ele da benevolência de
37 A palavra hebraica traduzida por “guarnição" (neís/v) parece ter Deus? Então disse Ziba ao rei: Ainda há um filho
um a conotação semelhante às palavras “posto/poste” em português. de Jônatas, aleijado dos pés. ‘Perguntou-lhe o rei:
Fbde tanto referir-se a um estabelecimento militar (cf. v. 14) como
a um a coluna ou pilar (Gn 19.26). Davi pode, portanto, ter erigido
Onde está? Respondeu Ziba ao rei: Está em casa
m onum entos ou pilares comemorativos em lugar de guarnições ao de Maquir, filho de Amiel, em Lo-Debar. sEntão
redor de Damasco. mandou o rei Davi, e o tomou da casa de Maquir,
120
filho de Amiel, em Lo-Debar. 6E Mefibosete, filho Sete já haviam sido entregues aos habitan
de Jônatas, filho de Saul, veio a Davi, e, pros-
trando-se com o rosto em terra, lhe fez reverência.
tes de Gibeão para compensarem a culpa
E disse Davi: Mefibosete! Respondeu ele: Eis aqui de sangue incorrida por seu pai, Saul
teu servo. 7Então lhe disse Davi: Não temas, (veja comentário sobre 21.1-9). Ao tempo
porque de certo usarei contigo de benevolência por deste episódio, os descendentes de Saul
amor de Jônatas, teu pai, e te restituirei todas as tinham quase desaparecido completamente.
terras de Saul, teu pai; e tu sempre comerás à
minha mesa. 8Então Mefibosete lhe fez reverência, Pelo menos alguns em Israel suspeitavam
e disse: Que é o teu servo, para teres olhado para que Davi estava preparando a oportuna
um cão morto tal como eu? ’Então chamou Davi eliminação de seus adversários (16.7,8).
a Ziba, servo de Saul, e disse-lhe: Tudo o que
pertencia a Saul, e a toda a sua casa, tenho dado
O autor bíblico, portanto, situou a
ao filho de teu senhor. 10Cultivar-lhe-ás, pois, a história do relacionamento de Davi com
terra, tu e teus filhos, e teus servos; e recolherás Mefibosete em posição destacada para
os frutos, para que o filho de teu senhor tenha pão demonstrar que Davi, como um homem
para comer; mas Mefibosete, filho de teu senhor, de caráter, permanecia fiel à sua aliança
comerá sempre à minha mesa. Ora, tinha Ziba
quinze filhos e vinte servos. "Respondeu Ziba ao com Jônatas (ISm 29.42; cf. 24.21 e s.).
rei: Conforme tudo quanto meu senhor, o rei, Após considerável investigação, Mefibose
manda a seu servo, assim o fará ele. Disse o rei: te foi localizado em Lo-Debar, uma cidade
Quanto a Mefibosete, ele comerá à minha mesa desconhecida em algum lugar perto de
como um dos filhos do rei. 12E tinha Mefibosete
um filho pequena, cujo nome era Mica. E todos Maanaim. O jovem ficou compreensivel-
quantos moravam em casa de Ziba eram servos mente aterrorizado pela súbita convocação
de Mefibosete. I3M orava, pois, Mefibosete em para comparecer perante o rei. Usando
Jerusalém, porquanto sempre comia à mesa do uma figura de linguagem que o próprio
rei. E era coxo de ambos os pés. Davi havia criado, Mefibosete negou
Até este ponto os relatos sobre Davi quaisquer ambições políticas ao dizer:
ressaltaram sua miraculosa ascensão ao Quem é o teu servo, para teres olhado para
poder e seu espetacular êxito em formar um cão morto tal como eu? (cf. ISm 24.14).
um império israelita. Contudo, com a Devemos provavelmente entender melhor
visão panorâmica do reino e da corte, no que ele era realmente inocente de quais
capitulo 8, o autor indicou que a vida de quer ambições quanto ao trono. Não
Davi alcançou um ponto decisivo. Dai em obstante, enquanto ele ou seu filho vi
diante a atenção se concentrará na inda vessem, Davi estava correndo o risco de
gação levantada pela profecia de Natã em que algum dia Israel se voltasse à casa de
7.1-17: Quem sucederá a Davi no trono de Saul em busca de liderança (cf. 16.3;
Israel? Este é o tema da Narrativa da 19.24-30).
Sucessão (2Sm 9-20; IReis 1; 2). Portanto, conquanto Davi fosse genero
A introdução do filho de Jônatas, Mefi so com Mefibosete, também foi cauteloso.
bosete, bem no princípio desta secção, Concedeu a Mefibosete posição de prín
destaca o fato de que os descendentes de cipe e lhe deu as propriedades da família
Saul representavam uma ameaça substan de Saul, assegurando-lhe assim uma renda
cial ao cumprimento da profecia de Natã. vitalícia adequada. Davi, contudo, reque
Em circunstâncias semelhantes, era costu reu sua presença à mesa real, onde podia
meiro que o governante de uma nova observar cada uma de suas atitudes. Ele
dinastia exterminasse toda a casa de seu até encarregou Ziba de administrar as
predecessor (2Reis 10.8; 11.1) ou mesmo terras de Saul, de modo que os negócios
membros de sua própria família, se fossem não dessem a Mefibosete motivos para
possíveis pretendentes ao seu trono (Jz 9.5; ausentar-se da corte.
2Sm 13.30). Assim, novamente Davi empregou
A verdade é que os filhos de Saul não discrição e generosidade ao dar vazão a
estavam se saindo muito bem em Israel. seu senso de vocação divina.
121
2. Davi Enfrenta Sírios e Amonitas centos carros, e quarenta mil homens de cavalaria;
(10.1-19) e feriu a Sobaque, general do exército, de sorte
que ele morreu ali. “ Vendo, pois, todos os reis,
servos de Hadadézer, que estavam derrotados
'Depois disto morreu o rei dos amonitas, e seu
diante de Israel, fizeram paz com Israel, e o
filho Hanum reinou em seu lugar. 2Então disse
serviram. E os sírios não ousaram mais socorrer
Davi: Usarei de benevolência para com Hanum,
aos amonitas.
filho de Naás, como seu pai usou de benevolência
para comigo. Davi, pois, enviou os seus servos
para o consolar acerca de seu pai; e foram os
servos de Davi à terra dos amonitas. 3Então Conquanto a maior parte dos relatos
disseram os príncipes dos amonitas a seu senhor, das guerras estrangeiras de Davi foram
Hanum: Pensas, porventura, que foi para honrar relatadas antes do sumário de seu reinado
teu pai que Davi te enviou consoladores? Não te
enviou antes os seus servos para reconhecerem ou como parte dele (8.1-18), estas narra
esta cidade e para a espiarem, a fim de transtorná- tivas sobre a guerra amonita são aqui
-la? 4PeIo que Hanum tomou os servos de Davi, incluídas para prover um pano de fundo
rapou-lhes metade da barba, cortou-lhes metade para a história de Bate-Seba. Embora os
dos vestidos, até as nádegas, e os despediu.
5Quando isso foi dito a Davi, enviou ele mensa relatos de guerra contenham bem poucas
geiros a encontrá-los, porque aqueles homens referências cronológicas, esta narrativa
estavam sobremaneira envergonhados; e mandou parece suprir uma explicação para a eclo
dizer-lhes: Deixai-vos estar em Jericó, até que vos são de hostilidades tanto com os amonitas
torne a crescer a barba, e então voltai. 6Vendo, como com os sírios. De fato, Bright (p. 181,
pois, os amonitas que se haviam feito abomináveis
para com Davi, enviaram e alugaram dos sírios de 182) considera que a guerra de Davi com
Bete-Reobe e dos sírios de Zobá vinte mil homens Amom foi a primeira que ele travou na
de infantaria e do rei Maacá mil homens, e dos formação do império de Israel. A ação
homens de Tbbe doze mil. 70 que ouvindo Davi, contra Moabe (8.2,13 e s.), Edom (8.13,14;
enviou contra eles a Joabe com todo o exército
dos valentes. *E saíram os amonitas, e ordenaram lRs 1.15-18) e Síria (8.3-12) viriam então
a batalha à entrada da porta; mas os sírios de em seguida.
Zobá e de Reobe, e os homens de Tobe e de Maacá
estavam à parte no campa ’Vendo, pois, Joabe Se a seqüência precedente estiver cor
que a batalha estava preparada contra ele pela reta, deve-se compreender o crescimento
frente e pela retaguarda, escolheu alguns homens do império não como o produto da ambi
dentre a flor do exército de Israel, e formou-os em ção de Davi, mas como o resultado da
linha contra os sírios; 10e entregou o resto do proteção divina em face da provocação
povo a seu irmão Abisai, para que o formasse em
linha contra os amonitas. UE disse-lhe: Se os internacional. Certamente, na campanha
sírios forem mais fortes do que eu, tu me virás em amonita, foi Hanum, e não Davi, quem
socorro; e se os amonitas forem mais fortes do que desejou a guerra.
tu, eu irei em teu socorra 12Tem bom ânimo, e
sejamos corajosos pelo nosso povo, e pelas cidades Embora Israel e Amom tivessem sido
de nosso Deus; e faça o Senhor o que bem lhe inimigos durante os primeiros anos do
parecer. 13Então Joabe e o povo que estava com reinado de Saul (ISm 11.1-11), Davi fora
ele travaram a peleja contra os sírios; e estes capaz de restabelecer — e aparentemente
fugiram diante dele. 14E, vendo os amonitas que
os sírios fugiam, também eles fugiram de diante tencionava manter — relações amistosas
de Abisai, e entraram na cidade. Então Joabe com seus vizinhos do leste. Com a morte
voltou dos amonitas e veio para Jerusalém. do rei de Amom, Davi enviou represen
>5Os sirios, vendo que tinham sido derrotados tantes diplomáticos para transmitir suas
diante de Israel, trataram de refazer-se. 16E Hada-
dézer mandou que viessem os sírios que estavam condolências e reafirmar suas intenções
da outra banda do rio; e eles vieram a Helã, tendo pacíficas. Não obstante, tomando medidas
à sua frente Sobaque, chefe do exército de Hada- cujo propósito era humilhar os enviados
dézer. l7Davi, informado disto, ajuntou todo o oficiais de Davi e lançar seu governo no
Israel e, passando o Jordão, foi a Helã; e os sirios
se puseram em ordem contra Davi, e pelejaram
ridículo, Hanum, o novo rei de Amom,
contra ele. 18Os sirios, porém, fugiram de diante mandou a delegação de Israel de volta em
de Israel; e Davi matou deles os homens de sete- condição humilhante. Dificilmente Hanum
122
lhes teria causado tal humilhação se não 3. A Tragédia no Rastro do Pecado
estivesse razoavelmente bem assegurado de (11.1—12.31)
respaldo militar no caso de uma retaliação
por Israel. 1) Davi Sucumbe à Concupiscência (11.1-13)
De qualquer maneira, Hanum tinha um 'Tendo decorrido uii) ano, no tempo em que os
reis saem à guerra, Davi enviou Joabe, e com ele
bom exército quando Davi inevitavelmente os seus servos e todo o Israel; e eles destruíram
buscou resgatar a dignidade de seus homens os amonitas, e sitiaram a Rabá. Porém Davi ficou
(cf. a reação de Davi ante a recusa sarcás em Jerusalém. 2Ora, aconteceu que, numa tarde,
tica de Nabal, ISm 25.21,22). Quando Davi se levantou do seu leito e se pôs a passear
no terraço da casa real; e do terraço viu uma mulher
Joabe se aproximou com a nata dos que se estava lavando; e era esta mulher mui formosa
soldados do exército de Israel, os amonitas à vista. 3Tendo Davi enviado a indagar a respeito
se reuniram fora dos portões da cidade, daquela mulher, disseram-lhe: Porventura não é
convidando ao ataque, enquanto mercená Bate-Seba, filha de Eliã, mulher de Urias, o heteu?
rios dos estados sírios próximos esperavam 4Então Davi mandou mensageiros para trazê-la;
e ela veio a ele, e ele se deitou com ela (pois já estava
para atacar os israelitas pela retaguarda. purificada da sua imundicia); depois ela voltou para
Percebendo as conhecidas táticas de cilada, sua casa. 5A mulher concebeu; e mandou dizer a
Joabe empregou parte de suas tropas para Davi: Estou grávida. 6Então Davi mandou dizer
combater os sírios, enquanto o restante, sob a Joabe: Envia-me Urias, o heteu. E Joabe o enviou
a Davi. 7Vindo, pois, Urias a Davi, este lhe per
o comando de Abisai, enfrentava os guntou como passava Joabe, e como estava o povo,
amonitas. Quando os sírios sucumbiram e como ia a guerra. 8Depois disse Davi a Urias:
diante de Joabe e seus homens, os amonitas Desce a tua casa, e lava os teus pés. E, saindo Urias
se retiraram para dentro da cidade, de modo da casa real, logo foi mandado apôs ele um presente
que o embate terminou com a vitória de do rei. 9Mas Urias dormiu à porta da casa real,
com todos os servos do seu senhor, e não desceu
Israel, mas com Hanum em, segurança. a sua casa. 10E o contaram a Davi, dizendo: Urias
não desceu a sua casa. Então perguntou Davi a
Os aliados sírios de Amom, sem dúvida Urias: Não vens tu duma jornada? por que não
alarmados com notícias da vitória de Joabe, desceste a tua casa? “ Respondeu Urias a Davi: A
reagruparam suas tropas e começaram a arca, e Israel, e Judá estão em tendas; e Joabe,
meu senhor, e os servos de meu senhor estão acam
trazer reforços dos mais distantes recantos pados ao relento; e entrarei eu na minha casa, para
de seus domínios. Sabendo dessa imensa comer e beber, e para me deitar com minha mulher?
mobilização de forças inimigas, Davi tomou Como vives tu, e como vive a tua alma, não farei
a iniciativa, cruzando o Jordão e atacando tal coisa. 12Então disse Davi a Urias: Fica ainda
com todo o exército israelita. Os sírios hoje aqui, e amanhã te despedirei. Urias, pois, ficou
em Jerusalém aquele dia e o seguinte. 13E Davi o
fugiram novamente, após sofrerem pesadas convidou a comer e a beber na sua presença, e o
perdas tanto de vidas como de bens. Daí embebedou; e à tarde saiu Urias a deitar-se na sua
em diante, os sírios cessaram de se intro cama com os servos de seu senhor, porém não
meter nos assuntos da Transjordânia. desceu a sua casa.
Rapou-lhes metade da barba (v. 4). No Esta história do pecado de Davi com
antigo Oriente Médio considerava-se uma Bate-Seba serve como uma introdução
barba inteira como marca de masculinidade teológica ao corpo da Narrativa da
e maturidade. Normalmente a barba era Sucessão. Nosso estudo até este ponto tem
rapada só como sinal de lamentação ou revelado uma convicção por parte do autor
desgraça iminente. (Is 15.2; Jr 41.5). Davi de que Deus se envolvia nos negócios dos
fez com que seus diplomatas ficassem em homens, recompensando o bem e punindo
Jericó até que suas barbas crescessem para o mal. Em particular, o progresso de Israel
que a presença deles em Jerusalém não era influenciado pela condição espiritual
servisse como uma acusação de que eram do povo e especialmente pela estatura moral
pequenos o poder e o prestígio de Davi. de seus líderes.
123
Assim, a nação prosperou sob a orien Esses problemas não foram ignorados,
tação correta de Samuel (ISm 7.13), mas mas o autor concentrou a atenção no cerne
seus filhos corruptos contribuíram bastante da questão. As falhas de Davi como líder
para o fracasso da antiga liga tribal sob os de seu povo eram resultado não da magni
juizes (ISm 8.1-9). Semelhantemente, os tude dos problemas que ele defrontava, mas
exércitos de Israel experimentaram consi das deficiências pessoais de natureza moral
derável êxito durante os primeiros anos do e espiritual. O poder tendia e ainda tende
reinado de Saul, mas os filisteus recupe a corromper os poderosos. O que Davi havia
raram a vantagem quando ele foi rejeitado aprendido como um fugitivo (ISm
por resistir à direção de Deus (cf. comen 25.32-35), tinha esquecido como rei de
tário sobre ISm 13.1-15; 15.10-23). Israel. Seu pecado com Bate-Seba era
Por outro lado, Davi, sendo um homem apenas a expressão exterior de sua resis
segundo o coração de Deus (ISm 13.14), tência interior à direção divina.
havia desfrutado extraordinário êxito. Ele O restante da Narrativa da Sucessão se
não era retratado como um homem perfeito ocupará, portanto, da repercussão teológica
(ISm 20.5,6; 21.1-5), mas o Senhor repetidas dessa experiência, dando especial destaque
vezes interveio para protegê-lo e ajudá-lo à disputa pelo trono israelita. As mais terrí
a evitar uma séria transgressão moral (ISm veis tragédias a se abaterem sobre Davi e
25.32,33). Sob a liderança de Davi, Israel a nação serão vistas como a devida retri
foi transformado de dois reinos em conflito, buição para os erros que ele cometeu contra
sujeitos ao domínio filisteu, numa impor Urias (12.10-12).
tante potência do mundo mediterrâneo Os exércitos partiram para o campo no
oriental. tempo em que os reis saem à guerra —
Contudo, quando Israel começou a normalmente entre abril e junho, após as
enfrentar sérias dificuldades internas, o chuvas de primavera terem cessado e após
povo buscou uma explicação teológica para os camponeses das milícias terem terminado
a mudança da sorte do país. Uma resposta o trabalho em suas terras, no cultivo de
imediata foi dada pelas flagrantes transgres cereais fundamentais à economia do país.
sões morais de Davi no caso Bate-Seba. Após suspenderem o ataque no outono
Conquanto este sórdido episódio sem precedente, Davi reiniciou o cerco de Rabá,
dúvida acentuasse os muitos problemas atual Amã, enviando uma força expressiva
nacionais e precipitasse outros, a cobiça da sob o comando de Joabe para pilhar a terra
esposa de Urias por Davi não foi a única e acampar-se ao redor da cidade.
causa das dificuldades de Israel. As rivali O passeio de Davi no terraço da casa
dades regionais que Saul enfrentara (cf. real era algo bastante natural. As coberturas
comentário sobre ISm 9.1,2) tinham sido planas das casas antigas eram freqüente
simplesmente ignoradas quando Davi mente empregadas como excelente lugar
tornou-se rei de todo Israel. Elas, portanto, para dormir e para estar (cf. ISm 9.25).
estavam aguardando somente uma provo Bate-Seba era filha de Eliã, um membro
cação mínima para irromperem novamente das tropas de elite de Davi (23.34), e neta
(20.1; lRs 12.1-5). Além disso, sob a lide de Aitofel, um de seus conselheiros. Aitofel
rança de Davi o país havia embarcado numa posteriormente apoiou a rebelião de
política de atuação internacional, e o Absalão (15.12,31), talvez como conse
trabalho de construção da nova capital em qüência do relacionamento ilícito de Davi
Jerusalém se fazia de acordo com um plano com Bate-Seba.
fenício (5.11). Desenvolviam-se até mesmo Davi mandou mensageiros para trazê-
planos para tirar a arca do Senhor de sua -la. Não se poderia manter em segredo um
tenda e colocá-la num templo comparável arranjo desses numa cidade tão pequena
ao palácio do rei (7.1-7,13). quanto Jerusalém era na época. O autor
124
bíblico não menciona qualquer cumplici chegado, referiu a Davi tudo o que Joabe lhe orde
dade de Bate-Seba, mas sob a lei judaica nara. 23Disse o mensageiro a Davi: Os homens
ganharam uma vantagem sobre nós, e saíram contra
ela era igualmente culpada por ter deixado nós ao campo; porém nós os repelimos até a entrada
de gritar (Dt 22.22-24). Ambos estavam da porta. 24Então os flecheiros atiraram contra os
sujeitos à pena de morte. teus servos desde o alto do muro, e morreram alguns
Pois já estava purificada da sua imun servos do rei; e também morreu o teu servo Urias,
dícia. Veja Levítico 15.19-24. Esse era o heteu. “ Disse Davi ao mensageiro: Assim dirás
a Joabe: Não te preocupes com isso, pois a espada
considerado o período mais fértil de uma tanto devora este como aquele; aperta a tua peleja
mulher. contra a cidade, e a derrota. Encoraja-o tu assim.
Quando se tornou evidente que a natu “ Ouvindo, pois, a .mulher de Urias que seu marido
reza havia apanhado Davi e Bate-Seba na era morto, o chorou. 27E, passado o tempo do nojo,
mandou Davi recolhê-la a sua casa; e ela lhe foi
armadilha do pecado, Davi tentou esconder por mulher, e lhe deu um filha Mas isto que Davi
sua culpa. Urias foi chamado da frente de fez desagradou ao Senhor.
batalha e encorajado, num gesto de
aparente benevolência por parte do rei, a Davi tinha sido bastante desajeitado em
cumprir novamente seu papel de marido. seus esforços por encobrir seu adultério com
Lava os teus pés é provavelmente um eufe Bate-Seba. Primeiro, envolvera alguns
mismo para designar relação sexual; pelo servos em sua insensatez e, depois, revelara
menos assim o entendeu Urias. Seja porque uma atitude abertamente solícita para com
suspeitava dos verdadeiros motivos do rei, um marido desconfiado. Seu plano de
seja porque não estava disposto a desfrutar desfazer-se de Urias não era menos trans
um privilégio que seus companheiros de parente. Com profunda crueldade, Davi
armas não podiam ter, Urias recusou voltar determinou a Joabe que ordenasse a suas
para casa e, em vez disso, se alojou com tropas que deixassem Urias sozinho no meio
a guarda real. Quando fracassou o plano da batalha para que ali encontrasse a morte.
de Davi de, com bebida forte, fazer Urias
Reconhecendo os efeitos perniciosos que
mudar de idéia, não conseguiu enxergar uma traição aberta dessa natureza teria
nenhuma saída de seu dilema a não ser fazer sobre o moral de suas tropas, Joabe revelou
com que Urias fosse morto. um desrespeito ainda maior pela vida
humana ao manter os planos do rei em
2) Davi Manda Matar Urias (11.14-27) segredo e ao determinar que seus soldados
14Pela manhã Davi escreveu uma carta a Joabe, marchassem para a batalha. Empregando
e mandou-lha por mão de Urias. lsEscreveu na táticas que, com certeza, resultariam em
carta: Ponde Urias na frente onde for mais renhida elevadas baixas, Joabe enviou um contin
a peleja, e retirai-vos dele, para que seja ferido e
morra. 16Enquanto Joabe sitiava a cidade, pôs gente de seus melhores soldados para um
Urias no lugar onde sabia que havia homens assalto infrutífero perto do muro da cidade
valentes. 17Quando os homens da cidade saíram (o suprimento dágua do inimigo? cf. 12.27).
e pelejaram contra Joabe, caíram alguns do povo, A capital amonita não foi tomada na
isto é, dos servos de Davi; morreu também Urias,
o heteu. 18Então Joabe mandou dizer a Davi tudo ocasião, mas Urias, juntamente com um
o que sucedera na peleja; 19e deu ordem ao mensa bom número de seus companheiros, foi
geiro, dizendo: Quando tiverdes acabado de contar morto. Quase como se estivesse atraindo
ao rei tudo o que sucedeu nesta peleja, 20caso o a ira do rei, Joabe instruiu seu mensageiro
rei se encolerize, e te diga: Por que vos chegastes a só dar notícia da morte de Urias no fim
tão perto da cidade a pelejar? Não sabieis vòs que
haviam de atirar do muro? 21Quem matou a de seu relatório. De qualquer forma, o
Abimeleque, filho de Jerubesete? Não foi uma acesso de ira que Davi teve por causa da
mulher que lançou sobre ele, do alto do muro, a violação por Joabe dos mais elementares
pedra superior dum moinho, de modo que morreu princípios táticos de cerco foi subitamente
em Tebez? Por que chegastes tão perto do muro?
Então dirás: Também morreu teu servo Urias, o interrompido quando soube que o marido
heteu. 22Partiu, pois, o mensageiro e, tendo de Bate-Seba estava morto (veja o comen
125
tário sobre o v. 23, abaixo). O leitor fica a cordeira do pobre e a preparou para o seu
a imaginar quantas outras vezes Joabe foi hóspede. 5Então a ira de Davi se acendeu em
grande maneira contra aquele homem; e disse a
tentado a empregar seu conhecimento desse Natã: Vive o Senhor, que digno de morte é o
sórdido acontecimento como um instru homem que fez issa 6Pela cordeira restituirá o
mento para manipular seu comandante- quádruplo, porque fez tal coisa, e não teve com
em-chefe. paixão. 7Então disse N atã a Davi: Esse homem és
tu! Assim diz o Senhor Deus de Israel: Eu te ungi
Após um breve período de luto por seu rei sobre Israel, livrei-te da mão de Saul, *e te dei
marido, Bate-Seba mudou-se para o palá a casa de teu senhor, e as mulheres de teu senhor
cio e deu à luz um filho de Davi. Assim, em teu seio; também te dei a casa de Israel e de
parecia que Davia tinha com êxito evitado Judá. E se isso fosse pouco, te acrescentaria outro
tanta ’Por que desprezaste a palavra do Senhor,
pagar as conseqüências de seu pecado. A fazendo o mal diante de seus olhos? A Urias, o
questão, porém, não estava encerrada, pois heteu, mataste à espada, e a sua mulher tomaste
embora Urias estivesse morto, a questão para ser tua mulher; sim, a ele mataste com a
não estava. A medida do desprazer do espada dos amonitas. 10Agora, pois, a espada
jamais se apartará da tua casa, porquanto me
Senhor ainda se faria mostrar. desprezaste, e tomaste a mulher de Urias, o heteu,
Na Septuaginta, o versículo 22 indica para ser tua mulher. "Assim diz o Senhor:
que Davi reagiu tal como Joabe previra. Eis que suscitarei da tua própria casa o mal sobre
Deve-se provavelmente dar preferência a ti, e tomarei tuas mulheres perante os teus olhos,
essa versão, uma vez que no hebraico o e as darei a teu próximo, o qual se deitará com
tuas mulheres à luz deste sol. 12Pois tu o fizeste
relatório do mensageiro a Davi, no versí em oculto; mas eu farei este negócio perante todo
culo 23, começa com uma palavra (Ki) que o Israel e à luz do sol. 13Então disse Davi a Natã:
freqüentemente introduz a resposta a uma Pequei contra o Senhor. Tornou Natã a Davi:
pergunta anterior. Assim Davi perguntara: Também o Senhor perdoou o teu pecado; não
morrerás. 14Todavia, porquanto com este feito
Por que vos chegastes tão perto do muro? deste lugar a que os inimigos do Senhor blas
O mensageiro respondeu, dizendo que os femem, o filho que te nasceu certamente morrerá.
homens ganharam uma vantagem sobre 15Então Natã foi para sua casa.
nós. (Cf. McKane, p. 231).
Passando o tempo do nojo. O período Como um hábil porta-voz de Deus,
costumeiro de luto estrito era de sete dias Natã reconhecia que uma repreensão é
(Gn 50.10; ISm 31.13). O novo casamento inútil a menos que seja atendida, e que os
de uma viúva logo após a morte do marido assuntos mais difíceis com freqüência
era provavelmente bastante comum no podem ser abordados indiretamente. Natã
antigo Oriente Médio. A menos que tal apelou às mais elevadas qualidades do
mulher retornasse para a casa de seu pai caráter de Davi ao fazer um teste com o
ou tivesse filhos para sustentá-la, ela não rei, apresentando um pleito perante o mais
tinha qualquer proteção nem direito aos alto magistrado da nação. A história é
bens (Gn 38.11; Nm 27.8-11). simples e soberbamente narrada. Com sua
inteira atenção fisgada por aquela situa
3) Natã Acusa Davi (12.1-15a) ção, e enfurecido com ela, Davi irada
'O Senhor, pois, enviou N atã a Davi. E, mente pronunciou sua sentença antes de
entrando ele a ter com Davi, disse-lhe: Havia numa saber quem era o réu. Muito cedo, contu
cidade dois homens, um rico e outro pobre. do, ouviu as palavras diretas de Natã:
20 rico tinha rebanhos e manadas em grande
número; 3mas o pobre não tinha coisa alguma, Esse homem és tu.
senão uma pequena cordeira que comprara e Tanto o rei quanto o profeta basearam
criara; ela crescera em companhia dele e de seus seus julgamentos na lei da retribuição
filhos; do seu bocado comia, do seu copo bebia, (Ex 21.24; Lv 24.20; Dt 19.21), em que a
e dormia em seu regaço; e ele a tinha como filha.
4Chegou um viajante à casa do rico; e este, não punição era determinada de modo a equi-
querendo tomar das suas ovelhas e do seu gado parar-se precisamente ao crime. Conquan
para guisar para o viajante que viera a ele, tomou to as emoções de Davi lhe indicassem que
126
o homem rico merecia morrer, ele restrin como tais tornavam-se posse de seu suces
giu a punição à compensação quádrupla sor (cf. comentário sobre 2.7).
prescrita na lei (Ex 22.1). Este é um exem O filho que te nasceu morrerá. A idéia
plo excelente das intenções humanas da de que Deus pune uma criança pelos
filosofia do “olho por olho” na lei do pecados de seus pais é modificada em
Antigo Testamento. Restrições faziam-se outras passagens do Antigo Testamento.
necessárias para proibir sentenças excessi Os antigos hebreus reconheciam que as
vamente severas, pronunciadas por juizes conseqüências do pecado do homem são
dominados pela emoção. Os pecados de freqüentemente transferidas a seu descen
Davi talvez merecessem a pena capital, dente (Ex 20.5,6). Contudo, também sa
mas o roubo pelo homem rico de um biam que cada indivíduo é punido por seu
simples cordeiro, por mais valioso que próprio pecado (Ez 18.1-4,20).
fosse, certamente não mereceria tal cas
tigo. 4) Davi Perde um Filho (12.15b-25)
O julgamento de Natã sobre Davi l5Depois o Senhor feriu a criança que a
esteve igualmente à altura de sua trans mulher de Urias dera a Davi, de sorte que adoeceu
gressão. Tal como Davi havia empregado gravemente. 16Davi, pois, buscou a Deus pela
a espada dos amonitas para alcançar os criança, e observou rigoroso jejum e, recolhendo-
-se, passava a noite toda prostrado sobre a terra.
seus propósitos contra Urias, assim sua 17Então os anciãos da sua casa se puseram ao
própria casa (dinastia) seria continuamen lado dele para o fazerem levantar-se da terra;
te atingida pela violência (cap. 13-18). porém ele não quis, nem comeu com eles. 18Ao
Como Davi havia secretamente tomado a sétimo dia a criança morreu; e temiam os servos
mulher de outro homem, suas próprias de Davi dizer-lhe que a criança tinha morrido; pois
diziam: Eis que, sendo a criança ainda viva, lhe
esposas seriam desonradas publicamente falávamos, porém ele não dava ouvidos à nossa
(16.20-23). A declaração seguinte de Natã voz; como, pois, lhe diremos que a criança mor
parece, contudo, unir tanto a lógica quanto reu? Poderá cometer um desatina 19Davi, porém,
a justiça. Seria de esperar-se que o juizo percebeu que seus servos cochichavam entre si, e
entendeu que a criança havia morrido; pelo que
seguisse as diretrizes anteriores. Uma vez perguntou a seus servos: Morreu a criança? E eles
que Davi havia tirado a vida de Urias, responderam: Morreu. “ Então Davi se levantou
esperava-se que ele pagasse com a sua da terra, lavou-se, ungiu-se, e mudou de vestes;
própria vida. Não obstante, o filho de e, entrando na casa do Senhor, adorou. Depois
Bate-Seba sofreu essa parte da sentença. veio a sua casa, e pediu o que comer; e lho deram,
e ele comeu. 21Então os seus servos lhe disseram:
Davi viveria, mas a criança nascida em Que é isso que fizeste? Pela criança viva jejuaste
conseqüência desse caso ilícito teria de e choraste; porém depois que a criança morreu te
morrer. levantaste e comeste. 22Respondeu ele: Quando a
criança ainda vivia, jejuei e chorei, pois dizia:
A frase digno de morte capta o sen Quem sabe se o Senhor não se compadecerá de
tido da expressão idiomática hebraica mim, de modo que viva a criança? 23Todavia,
(o homem que fez isto é “um filho da agora que é morta, por que ainda jejuaria eu?
morte”). Contudo, não se deve interpretar Poderei eu fazê-la voltar? Eu irei para ela, porém
tal frase como uma sentença de morte ela não voltará para mim. 24Então consolou Davi
a Bate-Seba, sua mulher, e entrou, e se deitou
pronunciada pelo rei, uma vez que, em com ela. E teve ela um filho, e Davi lhe deu o nome
outras vezes que o Antigo Testamento de Salomãa E o Senhor o amou; 25e mandou, por
emprega a expressão, não há provas de sua intermédio do profeta Natã, dar-lhe o nome de
execução (cf. especialmente ISm 26.16 e Jedidias, por amor do Senhor.
uma frase parecida em lRs 2.26). Pela segunda vez pelo menos, Davi
Assim diz o Senhor: (...) dei-te (...) as reconheceu que havia sido responsável
mulheres de teu senhor em teu seio. As pelo infortúnio que caiu sobre outras
mulheres do harém do rei eram conside pessoas (cf. ISm 22.22). Conquanto
radas como propriedade pessoal dele, e buscasse em cada caso minorar o sofri-
127
mento que havia causado, foi incapaz de da vida do homem assim como o nasci
evitar as conseqüências de seus atos. mento é o seu início. Vista pela perspecti
Quando seu filho com Bate-Seba ficou va de Deus, a morte em si não é necessa
doente, Davi expressou seu pesar e con riamente má ou desagradável. Davi viu
trição, jejuando e dormindo diretamente que a punição aplicada caiu sobre ele
no chão. Ele implorou fervorosamente que mediante a perda de seu filho.
a vida do menino fosse poupada, até que Eu irei para ela, porém ela não voltará
se esgotaram todas as esperanças de um para mim. Esta declaração não implica
adiamento da sentença de Natã. Quando, necessariamente que já estava desenvol
contudo, seus servos anunciaram que a vida entre os antigos hebreus a crença de
criança morrera, ele lavou-se, adorou e vida após a morte. Davi está simplesmente
retomou as atividades normais do dia-a- dizendo que, em harmonia com sua natu
-dia. Ao inverter de modo surpreendente reza mortal, ele finalmente se unirá ao
a seqüência normal das práticas de luto, filho no Seol, a habitação dos mortos
Davi demonstrou que suas ações eram (cf. comentário sobre ISm 28.1-14).
sinceras, não o resultado de uma mera
formalidade religiosa. Seu declarado prag 5) Davi Derrota os Amonitas (12.26-31)
matismo teria sido amplamente satisfató 26Ora, pelejou Joabe contra Rabá, dos amoni
rio para os antigos hebreus, que com tas, e tomou a cidade real. 27Então mandou Joabe
freqüência enfrentavam a morte, reconhe mensageiros a Davi, e disse: Pelejei contra Rabá,
cendo que, sempre que possível, a vida e já tomei a cidade das águas. “ Ajunta, pois,
agora o resto do povo, acampa contra a cidade e
tem de continuar. toma-a, para que eu não a tome e seja o meu
A morte do filho de Bate-Seba, entre nome aclamado sobre ela. 29Então Davi ajuntou
tanto, chamou a atenção para realidades todo o povo, e marchou para Rabá; pelejou contra
políticas, bem como religiosas. O pecado ela, e a tomou. 30Também tirou a coroa da cabeça
do seu rei; e o peso dela era de um talento de ouro
de Davi contra Urias foi grave o bastante e havia nela uma pedra preciosa; e foi posta sobre
para solapar a estabilidade da monarquia a cabeça de Davi, que levou da cidade mui grande
de Israel. A promessa de Natã de que o despoja 31E, trazendo os seus habitantes, os pôs
Senhor não destituiria a casa governante a trabalhar com serras, trilhos de ferro, machados
de Davi (7.14-16) estava sendo posta à de ferro, e em fornos de tijolos; e assim fez a
todas as cidades dos amonitas. Depois voltou
prova. Davi e todo o povo para Jerusalém.
É com esse pano de fundo que o nasci
mento de um segundo filho de Davi e Após o autor bíblico concluir a história
Bate-Seba teve importância notável. Em de Davi e Bate-Seba, ele então falou do
bora o Senhor, como sinal de seu desagra final vitorioso da guerra contra os amoni
do, tivesse negado descendência a Mical, tas. Uma vez que o pecado de Davi,
deu a Bate-Seba um filho para mostrar diferentemente da transgressão de Acã
que ainda estava agindo para edificar para (Js 7.1-26), foi abertamente confessado e
Davi uma casa duradoura a ocupar o trono plenamente expiado, não afetou adversa
de Israel. Assim, Davi chamou seu fi mente o resultado do cerco de Rabá por
lho Salomão (relacionado com a palavra Israel.
hebraica para paz) em reconhecimento de Após Joabe ter ganho o controle do
sua comunhão renovada com o Senhor, suprimento dágua de Rabá, tornando sua
e Natã chamou o menino de Jedidias rendição inevitável, convidou Davi a co
(Amado do Senhor) como um meio de mandar o exército por ocasião da queda
prenunciar o papel da criança no futuro final da cidade. Davi reuniu a milícia de
de Israel. Israel e chegou em tempo para que suas
Quem sabe se o Senhor não se compa tropas participassem do combate final e
decerá de mim. A morte é o fim natural do saque da cidade. O próprio Davi re-
128
cebeu o crédito pela vitória, e a coroa de parecia impossível a Amnom fazer coisa alguma
Amom foi acrescentada à de Israel e Judá, com ela. 3Tinha, porém, Amnom um amigo, cujo
que ele já possuía (5.1-5). nome era Jonadabe, filho de Simêia, irmão de Davi;
e era Jonadabe homem mui sagaz. 4Este lhe
A expressão tomou a cidade real suge perguntou: Por que tu de dia para dia tanto
riria normalmente toda a capital, mas no emagreces, ó filho do,rei? não mo dirás a mim?
versículo 27 Joabe reivindicou a posse Então lhe respondeu Amnom: Amo a Ikmar, irmã
somente da cidade das águas. Alguns de Absalão, meu irmão. 5Tornou-lhe Jonadabe:
Deita-te na tua cama, e finge-te doente; e quando
têm sugerido que o versículo 26 seja teu pai te vier visitar, dize-lhe: Peço que minha irmã
emendado para rezar cidade das águas, Tkmar venha dar-me de comer, preparando a comida
como no versículo 27, mas as duas expres diante dos meus olhos, para que eu veja e coma
sões talvez designem posições defensivas da sua mão. 6Deitou-se, pois, Amnom, e fingiu-se
dentro da cidade, as quais sucessivamente doente: Vindo o rei visitá-lo, disse-lhe Amnom: Peço-
-te que minha irmã Ikmar venha, e prepare dois
caíram diante da pressão israelita. Se é bolos diante dos meus olhos, para que eu coma
esse o caso, então essa foi uma batalha da sua mão. 7Mandou, então, Davi a casa, a dizer
especialmente penosa e demorada. Note- a làmar: Vai a casa de Amnom, teu irmão, e faze-
se, por exemplo, o relato de Josefo quanto •lhe alguma comida. 8Foi, pois, Ikmar a casa de
Amnom, seu irmão; e ele estava deitada Ela tomou
à luta final pela torre Antônia durante a massa e, amassando-a, fez bolos e os cozeu diante
batalha de Jerusalém em 70 d.C. (Guerra dos seus olhos. 9E tomou a panela, e os tirou
Judaica, cap. 20). diante dele; porém ele recusou comer. E disse
A coroa (...) o peso dela era de um Amnom: Fazei retirar a todos da minha presença.
talento de ouro. Conquanto seja impos E todos se retiraram dele. 10Então disse Amnom
a Ikmar: H-aze a comida à câmara, para que eu
sível calcular com exatidão os equivalen coma da tua mão. E Ikmar, tomando os bolos que
tes entre sistemas antigos e modernos de fizera, levou-os à câmara, ao seu irmão Amnom.
medida, um talento parece ter pesado nQuando lhos chegou, para que ele comesse,
aproximadamente 165 quilos. O imenso Amnom pegou dela, e disse-lhe: Vem, deita-te
comigo, minha irmã. 12Ela, porém, lhe respondeu:
tamanho da coroa amonita sugere que Nãoi, meu irmão, não me forces, porque não se faz
adornava um ídolo e que Davi usou ape assim em Israel; não faças tal loucura. 13Quanto
nas uma gema dela para sua própria a mim, para onde levaria o meu opróbrio? E tu
coroa. Nesse caso, deve-se ler a frase do passarias por um dos insensatos em Israel. Rogo-
seu rei (malkam) como uma referência à -te, pois, que fales ao rei, porque ele não me negará
a ti. >4Todavia ele não quis dar ouvidos à sua voz;
divindade amonita Milcom (cf. IReis 11.5). antes, sendo mais forte do que ela, forçou-a e se
O tratamento que Davi dispensou deitou com ela. 15Depois sentiu Amnom grande
aos amonitas capturados não está claro. aversão por ela, pois maior era a aversão que sentiu
A IBB, fazendo alterações mínimas num por ela do que o amor que lhe tivera. E disse-lhe
texto que de outro modo seria ininteligí Amnom: Levanta-te, e vai-te. 16Então ela lhe
respondeu: Não há razão de me despedires assim;
vel, retrata Davi empregando o povo em maior seria este mal do que o outro que já me tens
várias atividades como trabalhadores es feita Porém ele não lhe quis dar ouvidos, 17mas,
cravos. Outras traduções (RC e RA), con chamando o moço que o servia, disse-lhe: Deita
tudo, indicam que ele os torturou com fora a esta mulher, e fecha a porta após ela. 18Ora,
trazia ela uma túnica talar; porque assim se vestiam
implementos agrícolas. Conquanto Davi as filhas virgens dos reis. Então o criado dele a
tenha-se demonstrado capaz de tais atos deitou fora, e fechou a porta após ela. 19Pelo que
desumanos (8.2), a IBB provavelmente Ikmar, lançando cinza sobre a cabeça, e rasgando
captou melhor o sentido. a túnica talar que trazia, pôs as mãos sobre a cabeça,
e se foi andando e clamando. “ Mas Absalão, seu
4. Amnom Viola Tamar (13.1-22) irmão, lhe perguntou: Esteve Amnom, teu irmão,
contigo? Ora pois, minha irmã, caia-te; é teu irm ãa
‘Ora, Absalão, filho de Davi, tinha uma irmã Não se angustie o teu coração por ista Assim ficou
formosa, cujo nome era Ikmar; e sucedeu depois Ikmar, desolada, em casa de Absalão, seu irm ãa
de algum tempo que Amnom, filho de Davi, 21Quando o rei Davi ouviu todas estas coisas,
enamorou-se dela. 2E angustiou-se Amnom, até muito se lhe acendeu a ira .22Absalão, porém, não
adoecer, por Ikmar, sua irmã; pois era virgem, e falou com Amnom, nem mal nem bem, porque
129
odiava a Amnom por ter ele forçado a Tamar, sua uma vez que não conseguia controlar
irmã. adequadamente a si mesmo.
O protesto de Tamar de que não se faz
Agora que o autor da Narrativa da assim em Israel aparentemente presumia
Sucessão apresentou um relato das causas que as intenções de Amnom eram elevadas,
históricas para a agitação que se avizinhava isto é, que pretendia casar-se com ela. Ela
dentro da família de Davi (cf. comentário comentou que casamentos em que o noivo
sobre 11.1-13), ele retoma à questão básica arrebatava sua noiva (cf. Jz 21.16-24) eram
subjacente a seu trabalho: Quem sucederá próprios somente de pessoas loucas ou
a Davi no trono? Tudo quanto se segue deve rudes. Um compromisso de casamento refle
ser lido levando em conta a situação de tiria a boa formação tanto do homem
intriga política em que cada um dos perso quanto da mulher. Amnom poderia conse
nagens principais deve ser visto como um guir devidamente o casamento, pedindo a
rei de Israel em potencial. Dos dezessete seu pai (Davi) permissão, a qual ela tinha
filhos de Davi já mencionados (3.2-5; certeza de que ele concederia: porque ele
5.14,15), somente quatro irão figurar com não me negará a ti. Somente mais tarde
destaque nas narrativas seguintes: Amnom, Tamar percebeu que Amnom não tinha
Absalão, Adonias e Salomão. Cada um em qualquer intenção de se casar com ela.
sua vez será examinado e rejeitado até que Aparentemente, os casamentos entre
fique o escolhido pelo próprio Deus. meio-irmãos não eram condenados em
Num relato tragicamente semelhante ao Israel nesse tempo (cf. Abraão e Sara; Gn
caso de Davi com Bate-Seba, o autor 20.12), porém mais tarde foram expressa
descreve Amnom, o príncipe herdeiro de mente proibidos (Dt 27.22; Lv 18.9,11). Tais
Israel, como um homem de caráter vil, sem casamentos consangüíneos eram provavel
quaisquer qualidades superiores ou mente comuns entre os vizinhos de Israel
circunstâncias atenuantes que compen e eram a regra, antes que a exceção, dentro
sassem seu caráter. A fria piemeditação com da família real egípcia.
que planejou sua investida em cima de Maior seria este mal do que o outro que
Tamar foi repugnante mesmo numa socie já me tens feito. O pecado mais grave de
dade há muito familiarizada com abusos Amnom foi ter deixado de aceitar a respon
sexuais de todo tipo (Gn 19; Jz 19.22-26; sabilidade moral da violação de Tamar. A
21.16-24). Embora fosse a poligamia ainda lei israelita determinava que o homem que
praticada, e a fraqueza humana tolerada houvesse forçado e violado uma virgem
(Gn 38; Jz 16; 2Sm 11; IReis 11), o reino descompromissada casasse com ela (Dt
de Israel não devia ser confiado a alguém 22.28,29). Quando um homem chegava a
que utilizasse a força bruta para atingir seus ter o contato mais íntimo de todos os
objetivos sem levar em conta os direitos de contatos humanos com uma mulher, ele
outros. Esta, logicamente, era precisamente se tornava moralmente obrigado a cuidar
a questão com que Davi tinha tantas vezes do bem-estar pessoal dela.
se debatido ao empregar a força (ISm 25; Minha irmã, cala-te; é teu irmão.
2Sm 11). Davi, contudo, fora rápido em Absalão viu como seria fútil tornar pública
admitir a culpa e corrigir o erro quando a situação lamentável de Tamar. Uma vez
confrontado a respeito. Amnom, por outro que a ofensa não havia transposto os
lado, arrogantemente expulsou Tamar após círculos familiares, uma inimizade de morte
violentá-la e teimosamente recusou aceitar não seria aplicável; mas, sendo uma briga
as determinações que a lei prescrevia para em família, a aplicação da justiça era da
tais casos (Dt 22.28,29). Mesmo que responsabilidade de Davi. Infelizmente, sua
houvesse vivido, Amnom obviamente indignação não resultou em qualquer ação
estaria desqualificado para governar Israel construtiva, e a semente da discórdia aqui
130
plantada pôde crescer e frutificar na vida Na segunda metade do capítulo, Absalão
de seus dois filhos. Amnom sem dúvida e Davi emergem como personagens prin
continuou egoisticamente abusando dos cipais — Absalão pelo que fez e Davi pelo
outros, e Absalão ficou por dois anos silen que não fez. Quando, após dois anos
ciosamente maquinando sua vingança. completos, Davi não havia tomado medidas
para punir Amnom por seu ataque contra
5. Absalão Vinga sua Irmã (13.23-39) Tamar, Absalão tomou providências para
tratar ele mesmo do problema. Assim, ao
^Decorridos dois anos inteiros, tendo Absalão
tosquiadores em Baal-Hazor, que está junto a buscar aplicar a justiça dentro da família,
Efraim, convidou todos os filhos do rei. MFoi, pois, Absalão já está usurpando deveres que, por
Absalão ter com o rei, e disse: Eis que agora o direito, pertenciam a seu pai. Embora o
teu servo faz a tosquia. Peço que o rei e os seus autor não haja atribuído qualquer moti
servos venham com o teu serva “ O rei, porém, vação política ao assassinato premeditado
respondeu a Absalão: Não, meu filho, não vamos
todos, para não te sermos pesados. Absalão instou de seu irmão mais velho, pode-se ver aqui
com ele; todavia ele não quis ir, mas deu-lhe a sua as mesmas atitudes que mais tarde emergem
bênçãa “ Disse-lhe Absalão: Ao menos, deixa ir nas tentativas de Absalão de apossar-se do
conosco Amnom, meu irm ãa O rei, porém, lhe trono (2Sm 15—19).
perguntou: Para que iria ele contigo? 27Mas como
Absalão instasse com o rei, este deixou ir com ele O autor, contudo, retrata o papel de
Amnom, e os demais filhos do rei. “ Ora, Absalão Absalão em todo esse complexo narrativo
deu ordem aos seus servos, dizendo: Tomai sentido; (cap. 13—19) com uma grande parcela de
quando o coração de Amnom estiver alegre do
vinho, e eu vos dissen Feri a Amnom; então matai- compaixão e calor humano. Ele de modo
-a Não tenhais medo; não sou eu quem vo-lo algum pode fazer vista grossa à recusa de
ordenou? Esforçai-vos, e sede valentes. 29E os Absalão em deixar a vingança de Tamar
servos de Absalão fizeram a Amnom como Absalão nas mãos do Senhor (cf. ISm 25.33), mas
lhes havia ordenada Então todos os filhos do rei está ciente de que o fracasso de Davi em
se levantaram e, montando cada um no seu mulo,
fugiram. 30Enquanto eles ainda estavam em exercer o papel de pai e rei havia criado um
caminho, chegou a Davi um rumor, segundo o qual vazio de autoridade que clamava por ser
se dizia: Absalão matou todos os filhos do rei; preenchido. A história é narrada sem reto
nenhum deles ficou. 31Então o rei se levantou e, ques editoriais visíveis, mas o leitor pode
rasgando as suas vestes, lançou-se por terra; da
mesma maneira todos os seus servos que lhe assis
facilmente perceber a ambivalência do autor
tiam rasgaram as suas vestes. 32Mas Jonadabe, na maneira de tratar os dois personagens
filho de Siméia, irmão de Davi, disse-lhe: Não principais.
presuma o meu senhor que mataram todos os
mancebos filhos do rei, porque só morreu Amnom; Absalão criou uma oportunidade de se
porque assim o tinha resolvido fazer Absalãoi, desde vingar de Amnom, organizando uma
o dia em que ele forçou a Tàmar, sua irmã. 33Não grande festa para a qual convidou toda a
se lhe meta, pois, agora no coração ao rei meu corte de Davi. A festa seria realizada no
senhor o pensar que morreram todos os filhos do auge da estação de tosquia das ovelhas na
rei; porque só morreu Amnom. 34Absalão, porém,
fugiu. E o mancebo que estava de guarda, levan fazenda de Absalão, em Baal-Hazor, a cerca
tando os olhos, olhou, e eis que vinha muito povo de 24 quilômetros ao norte de Jerusalém
pelo caminho por detrás dele, ao lado do monte. (cf. ISm 25.1-17). Como Absalão sem
35Então disse Jonadabe ao rei: Eis ai vêm os filhos dúvida havia previsto, Davi declinou o
do rei; conforme a palavra de teu servo, assim
sucedeu. 36Acabando ele de falar, chegaram os
convite para participar, mas concordou em
filhos do rei e, levantando a sua voz, choraram; e dar sua bênção à ocasião. Absalão, contudo,
também o rei e todos os seus servos choraram amar provavelmente fingindo interesse em
gamente. 37Absalão, porém, fugiu, e foi ter com preparar uma lista de convidados de pres
Talmai, filho de Amiur, rei de Gesur. E Davi pran tígio, insistiu até que Davi finalmente
teava a seu filho todos os dias. ^ e n d o Absalão
fugido para Gesur, esteve ali três anos. 39Então o concordou em enviar um representante em
rei Davi sentiu saudades de Absalão, pois já se tinha seu lugar. (O hebraico indica que Davi
consolado acerca da morte de Amnom. enviou [wayyishlach] Amnom com
131
Absalão.) O príncipe herdeiro Amnom iria tidos de luto, não te unjas com óleo, e faze-te
assistir à festa à frente de todo o grupo dos como uma mulher que há muitos dias chora al
filhos do rei. Ante um sinal preestabelecido, gum morto; 3vai ter com o rei, e fala-lhe desta
maneira. Então Joabe lhe pôs as palavras na bo
os servos de Absalão assassinaram Amnom, ca. 4A mulher tecoíta, pois, indo ter com o rei e
e os demais filhos do rei fugiram. prostrando-se com o rosto em terra, fez-lhe uma
A primeira notícia da traição de Absalão reverência e disse: Salva-me, ó rei. 5Ao que lhe
indicava que todos os filhos de Davi haviam perguntou o rei: Que tens? Respondeu ela: Na
verdade eu sou viúva; morreu meu marido. '’Ti
sido mortos. Absalão matou todos os filhos nha a tua serva dois filhos, os quais tiveram uma
do rei. A dor do rei com a perda de seus briga no campo e, não havendo quem os apar
filhos acrescentou-se o temor de que as tasse, um feriu ao outro, e o matou. 7E eis que
ações de Absalão assinalassem uma inves toda a parentela se levantou contra a tua serva,
tida ao trono. Israel logo poderia estar dizendo: Dá-nos aquele que matou a seu irmão,
para que o matemos pela vida de seu irmão, a
envolvido numa guerra civil. Mas o fato quem ele matou, de modo que exterminemos tam
de que Absalão não matou todos os filhos bém o herdeira Assim apagarão a brasa que me
do rei indica que motivos políticos não eram ficou, de sorte a não deixarem a meu marido
a preocupação principal nesse assassinato nem nome, nem remanescente sobre a terra. 8En-
tão disse o rei à mulher: Vai para a tua casa, e
de Amnom. eu darei ordem a teu respeita ’Respondeu a mu
O sofrimento de Davi foi diminuído lher tecotta ao rei: A iniqüidade, ó rei meu se
somente em parte quando a verdade sobre nhor, venha sobre mim e sobre a casa de meu pai;
os fatos se tornou conhecida, pois ainda e fique inculpável o rei e o seu trona 10Tornou o
assim ele tinha perdido dois filhos. Amnom rei: Quem folar contra ti, traze-mo a mim, e nunca
mais te tocará. uDisse ela: Ora, lembre-se o rei
tinha sido assassinado e Absalão partira do Senhor seu Deus, para que o vingador do san
para um exílio do qual não haveria retorno gue não prossiga na destruição, e não extermine
fácil. As próprias emoções de Davi também a meu filha Então disse ele: Vive o Senhor, que
ficaram confusas quando percebeu que os não há de cair no chão nem um cabelo de teu fi
lh a 12Então disse a mulher: Permite que a tua
dois candidatos mais prováveis a futuro rei serva fale uma palavra ao rei meu senhor. Res
de Israel não mais estavam disponíveis. pondeu ele: Fala. 13Ao que disse a mulher: Por
Quaisquer outras dificuldades que tivesse que, pois, pensas tu tal coisa contra o povo de
de enfrentar, Davi sempre estaria preo Deus? Pois, falando o rei esta palavra, fica como
cupado com uma sucessão pacífica ao trono culpado, visto que o rei não torna a trazer o seu
desterrada 14Porque certamente morreremos, e
de Israel. seremos como águas derramadas na terra, que
Absalão, porém, fugiu, e foi [a] (...) Gesur. não se podem ajuntar mais; Deus, todavia, não ti
Absalão exilou-se em Gesur, país de onde ra a vida, mas cogita meios para que não fique
viera sua mãe, um pequeno reino a nordeste banido dele o seu desterrada l5E se eu agora
do Mar da Galiléia. Davi logo sentiu-se vim falar esta palavra ao rei meu senhor, é porque
o povo me atemorizou; pelo que dizia a tua serva:
inclinado a convidar Absalão a retornar, Falarei, pois, ao rei; porventura fará o rei segun
mas aparentemente não se sentia à vontade do a palavra da sua serva. 16Porque o rei ouvirá,
para fazê-lo. O texto parece confuso, uma para Hvrar a sua serva da mão do homem que in
vez que a fuga de Absalão está registrada tenta exterminar da herança de Deus tanto a mim
como a meu filha 17Dizia mais a tua serva: Que
três vezes, e os versículos 37 e 38 se a palavra do rei meu Senhor me dê um descanso;
sobrepõem seriamente. porque como o anjo de Deus é o rei meu senhor,
para discernir o bem e o mal; e o Senhor teu Deus
seja contiga 18Então respondeu o rei à mulher:
6. Absalão Retorna à Corte (14.1-33) Peço-te que não me encubras o que eu te pergu
ntar. Tornou a mulher: Fale agora o rei meu se
1) Joabe Testa Davi (14.1-20) nhor. 19Perguntou, pois, o rei: Não é verdade que
a mão de Joabe está contigo em tudo isso!? Res
‘Percebendo Joabe, filho de Zernia, que o pondeu a mulher: Vive a tua alma, ó rei meu se
coração do rei estava inclinado para Absalão, nhor, que ninguém se poderá desviar, nem para a
2mandou a Tecoa trazer de lá uma mulher sagaz, direita nem para a esquerda, de tudo quanto diz
e disse-lhe: Ora, finge que estás de nojo; põe ves o rei meu senhor; porque Joabe, teu servo, é quem
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me deu ordem, e foi ele que pôs na boca da tua para seu retorno do exílio. Enquanto se
serva todas estas palavras; 29para mudar a feição opusesse ao retorno de Absalão, Davi era
do negócio é que Joabe, teu servo, fez isso. Sábio, levado a crer que tinha um libelo contra
porém, é meu senhor, conforme a sabedoria do
anjo de Deus, para entender tudo o que há na o povo de Deus. Aparentemente, Joabe e
terra. muitos do povo sentiam que o futuro de
Israel corria perigo, a menos que Absalão
Davi suportava um infortúnio comum retornasse como príncipe herdeiro. Final
em que era capaz de tratar com os filhos mente, convencido pela eloqüência da mu
de outros homens mais eqüitativamente lher e pela consciência de que até Joabe
do que com seus próprios filhos. Joabe, estava contra ele, Davi permitiu que Ab
portanto, sentindo a ambivalência de Davi salão retornasse de Gesur para casa.
para com Absalão, fez com que a mulher A iniqüidade, ó rei meu senhor, venha
viesse de Tecoa para trazer um caso pen sobre mim. Esta provavelmente é uma
sado perante o rei. sentença declarativa. Quando Davi prome
Conquanto esse episódio não tenha a teu dar uma ordem protegendo o filho da
objetividade da parábola de Natã (12.1-6), viúva, ela alegou estar temerosa, uma vez
é, não obstante, em si mesmo artistica que o povo a culparia, e não ao rei. Davi
mente elaborado. A mulher de lècoa dei prometeu-lhe proteção real, mas a mulher
xou de lado o porte e a condição implíci insistiu até que ele declarou sua sentença
tos em seu título de mulher sagaz (chaa- num juramento diante de Deus. A “atriz”
kamah), isto é, sábia, e se apresentou com de Tecoa estava conduzindo Davi até que
a rudeza humilde que se esperaria de uma ele não teve como escapar.
mulher duma pequena cidade no deserto
judaico. Usando um linguajar redundante, 2) Absalão Retorna a Jerusalém (14.21-33)
efusivo e repetitivo, ela desempenhou seu 2lEntão o rei disse a Joabe: Eis que faço o que
papel de modo tão convincente que Davi pedes; vai, pois, e faze voltar o mancebo Absalão.
foi apanhado em sua armadilha. 22Então Joabe se prostrou com o rosto em terra
A história de Joabe não fazia o parale e, fazendo uma reverência, abençoou o rei; e disse
lo exato com as dificuldades de Davi com Joabe: Hoje conhece o teu servo que achei graça
aos teus olhos, ó rei meu senhor, porque o rei fez
Absalão, mas envolvia alguns dos mesmos segundo a palavra do teu serva 23Levantou-se,
princípios básicos. Em cada caso, uma so pois, Joabe, foi a Gesur e trouxe Absalão para
lução justa requeria que as determinações Jerusalém. 24E disse o rei: Torne ele para süa ca
da lei de vingança do sangue (cf. Gn 9.6) sa, mas não venha à minha presença. Tornou,
pois, Absalão para sua casa, e não foi à presença
fossem modificadas à luz de circunstâncias do rei. 25Não havia em todo o Israel homem tão
especialmente atenuantes. No relato apre admirável pela sua beleza como Absalão; desde a
sentado por Joabe, Davi reconheceu que planta do pé até o alto da cabeça não havia nele
não se fazia justiça executando-se o último defeito algum. ME, quando ele cortava o cabelo,
sobrevivente masculino numa família que, o que costumava fazer no fim de cada ano, por
quanto lhe pesava muito, o peso do cabelo era de
doutro modo, estava ameaçada de extin duzentos siclos, segundo o peso real. 27Nasceram
ção. Ele, portanto, ordenou ao clã que a Absalão três filhos, e uma filha cujo nome era
cancelasse a vendeta. Tamar; e esta era mulher formosa à vista.28Assim
Assim, Davi foi forçado a reconhecer a ficou Absalão dois anos inteiros em Jerusalém,
sem ver a face do rei. 29Então Absalão mandou
complexidade do caso de Absalão. Ele era chamar Joabe, para o enviar ao rei; porém Joabe
legalmente culpado de assassinato, mas não quis vir a ele. Mandou chamá-lo segunda vez,
parecia que a própria negligência de Davi mas ele não quis vir. MPelo que disse aos seus
era pelo menos um fator que contribuía servos: Vede ali o campo de Joabe pegado ao
meu, onde ele tem cevada; ide, e ponde-lhe foga
para o acontecido. Em última análise, E os servos de Absalão puseram fogo ao campa
contudo, a necessidade que Israel tinha de 31Então Joabe se levantou, e veio ter com Absa
Absalão foi o argumento mais eloqüente lão, em casa, e lhe perguntou: Por que os teus
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servos puseram fogo ao meu campo? 32Respondeu Os comentários nos versículos 25-27
Absalão a Joabe: Eis que enviei a ti, dizendo: Vem quanto à beleza de Absalão e a sua família
cá, para que te envie ao rei, a dizer-lhe: Para que
vim de Gesur? Melhor me fora estar ainda lá.
são introduzidos aqui para antecipar os
Agora, pois, veja eu a face do rei; e, se há ent mim eventos seguintes. Absalão é retratado co
alguma culpa, que me mate. 33Foi, pois, Joabe à mo um homem maduro, com considerável
presença do rei, e lho disse Então o rei chamou atração e influência sobre o público. Ele,
Absalão, e ele entrou à presença do rei, e se pros de fato, é o homem que representará o
trou com o rosto em terra diante do rei; e o rei
beijou Absalão. maior desafio para Davi; um homem que
terá êxito em se apossar do trono para, em
O autor não se demora nas razões de seguida, perder a vida numa batalha.
Joabe para desejar o retorno de Absalão
do exílio, mas o tom da narrativa prece 7. Absalão Usurpa o Trono (15.1—18.33)
dente sugere que sentia ser isto para o bem
do país. Presumivelmente, temia que algo 1) Absalão Torna-se Rei (15.1-12)
pudesse acontecer a Davi antes que um
herdeiro em condições tivesse sido desig Aconteceu depois disso que Absalão adquiriu
para si um carro e cavalos, e cinqüenta homens
nado para o trono. Em tal caso, a luta que corressem adiante dele. 2E levantando-se
interna pelo poder deixaria Israel como Absalão cedo, parava ao lado do caminho da
presa fácil para seus inimigos. Joabe apa porta; e quando algum homem tinha uma deman
rentemente esperava que, com o retorno da para vir ao rei a juízo, Absalão o chamava a
si e lhe dizia: De que cidade és tu? E, dizendo
de Absalão, Davi apoiasse a causa daque ele: De tal tribo de Israel é teu servo, 3Absalão
le que parecia tanto o futuro rei de Israel lhe dizia: Olha, a tua causa é boa e reta, porém
e tanto se comportava como tal. não há da parte do rei quem te ouça. 4Dizia mais
Porém, as esperanças de Joabe não se Absalão: Ah, quem me dera ser constituído juiz
concretizaram. Absalão teve permissão de na terra! para que viesse ter comigo todo homem
que tivesse demanda ou questão, e eu lhe faria
voltar a Jerusalém, mas Davi recusou vê- justiça. 5Sucedia também que, quando alguém se
lo. Por dois anos Absalão permaneceu chegava a ele para lhe fazer reverência, ele esten
como um virtual prisioneiro dentro da dia a mão e, pegando nele o beijava. 6Assim fazia
própria casa (cf. Hertzberg, p. 334), e a Absalão a todo o Israel que vinha ao rei para
juízo; desse modo Absalão furtava o coração dos
questão em torno da linha de sucessão ao homens de Israel. 7Aconteceu, ao cabo de quatro
trono de Israel permanecia sem resolução. anos, que Absalão disse ao rei: Deixa-me ir pagar
Quando Absalão não mais conseguiu em Hebrom o voto que flz ao Senhor. ‘Porque,
suportar seu crescente isolamento, provo morando eu em Gesur, na Síria, fez o teu servo
cou um incêndio para chamar a atenção um voto, dizendo: Se o Senhor, na verdade, me fi
zer tornar a Jerusalém, servirei ao Senhor. ’En
de Joabe e exigir uma audiência com o tão lhe disse o rei: Vai em paz. Levantou-se, pois,
rei. Tem-se um vislumbre do caráter de e foi para Hebrom. “ Absalão, porém, enviou
Absalão no fato de que ele era capaz de emissários por todas as tribos de Israel, dizendo:
enfrentar o exílio ou a morte, mas não Quando ouvirdes o som da trombeta, direis: Ab
salão reina em Hebrom. UE de Jerusalém foram
conseguia tolerar ser ignorado. Seu deses com Absalão duzentos homens que tinham sido
perado estratagema funcionou, porém, e convidados; mas iam na sua simplicidade, pois na
ele reconquistou o favor do rei. da sabiam daquele desígnio. 12Íàmbém Absalão,
Torne ele para sua casa, mas não venha enquanto oferecia os seus sacrifícios, mandou vir
à minha presença. Poucas diferenças pes da cidade de Silo, Aitofel, o gilonita, conselheiro
de Davi. E a conspiração tornava-se poderosa,
soais são resolvidas quando os envolvidos crescendo cada vez mais o número do povo que
se isolam um do outro. A comunicação é estava com Absalão.
essencial para que haja reconciliação. Pa
receria que Davi devia ter punido Absa Após Absalão ter retornado à sua po
lão severamente ou tê-lo perdoado com sição normal na corte do rei, tornou-se o
pletamente. De qualquer forma, o meio- ponto de convergência de um movimento
termo era totalmente ineficaz. planejado para solapar a autoridade de
134
Davi entre seu povo. Conquanto até este duma peregrinação como pagamento de um
ponto o leitor tenha estado livre para es voto que fizera enquanto no exílio. Sem
pecular quanto às ambições políticas de dúvida, ele esperava obter apoio daqueles
Absalão, o autor deixa claro que agora que se lembravam que havia nascido ali (3.3)
Absalão está determinado a tornar-se rei e daqueles que ficaram ofendidos com a
de Israel. Ele e seus conspiradores experi transferência da.capital por Davi para Jeru
mentam um êxito considerável, em grande salém (Hertzberg, p. 337). De qualquer
parte devido a que podiam-se fazer quei forma, Hebrom era o lugar de um venerável
xas procedentes contra o governo de Davi. santuário, no qual o próprio Davi havia
As pessoas viajavam grandes distâncias anteriormente se tomado rei (cf. comentário
para levar suas demandas legais perante o de 2.1-4). Acertos foram feitos para que
rei em Jerusalém somente para descobri Absalão fosse aclamado rei mediante
rem que ninguém tinha sido designado demonstrações populares por todo o país.
para ouvir seus casos. Conquanto dificul Essas demonstrações foram marcadas para
dades com o exercício da justiça pudessem ocorrer simultaneamente com sua ascensão
ser identificadas já nos dias de Moisés (Ex ao trono em Hebrom.
18.13), as exigências de um governo em Tudo correu bem e a conspiração de
expansão inevitavelmente isolavam Davi Absalão rapidamente ganhou impulso.
do homem comum. Alguns inocentemente seguiram a Absalão
Absalão, contudo, explorava o distan sem compreender plenamente seus verda
ciamento do rei, fazendo um esforço para deiros objetivos ou as questões envolvidas.
aparecer em público como o amigo do po Outros, como Aïtofel, o avô de Bate-Seba,
vo. Ele se solidarizava com aqueles que deram pronto apoio por causa de antigas
tinham de ficar esperando uma audiência mágoas contra Davi. Fossem quais fossem
na corte do rei, e protestava publicamente seus motivos, tantas pessoas por todo Israel
que não lhe tinha sido dada uma oportu se opunham a Davi que seu governo corria
nidade para servir ao povo. Ah! quem me sério perigo.
dera ser constituído juiz na terra! (lit.,
“Ah! se ele me designasse juiz”) sugere que 2) Davi Foge de Jerusalém (15.13-37)
Absalão sofria pelo fato de que Davi recu
13Então veio um mensageiro a Davi, dizendo:
sara dar-lhe uma função importante no O coração de todo o Israel vai após Absalão.
governo. Ele dedicava tempo para conhe 14Disse, pois, Davi a todos os seus servos que
cer os reclamantes e suas causas, e tratava estavam com ele em Jerusalém: Levantai-vos, e
todos os forasteiros não como súditos, mas fujamos, porque doutra forma não poderemos
como amigos. O autor da Narrativa da escapar diante de Absalão. Apressai-vos a sair; não
seja caso que ele nos apanhe de súbito, e lance sobre
Sucessão assinala, contudo, a superficiali nós a ruina, e fira a cidade ao fio da espada.
dade do método popularesco de Absalão, 15Então os servos do rei lhe disseram: Eis aqui os
fazendo notar que ele também se envolvia teus servos para tudo quanto determinar o rei, nosso
nas questões militares da realeza. Seu car senhor. 16Assim saiu o rei, com todos os de sua
casa, deixando, porém, dez concubinas para guar
ro e seus cinqüenta guarda-costas certa darem a casa. 17Tendo, pois, saído o rei com todo
mente teriam sido desnecessários, exceto o povo, pararam na última casa. 18E todos os seus
como um indício de seu desejo de se tor servos iam ao seu lado; mas todos os quereteus,
nar rei. Como um comentário final quan e todos os peleteus, e todos os giteus, seiscentos
homens que o seguiram de Gate, caminhavam
to a seus métodos demagógicos, o autor adiante do rei. 19Disse o rei a Itai, o giteu: Por que
declara que Absalão furtava (não conquis irias tu também conosco? Volta e fica-te com o rei,
tava) o coração dos homens de Israel. porque és estrangeiro e exilado; torna a teu lugar.
20Ontem vieste, e te levaria eu hoje conosco a
Após quatro anos em tais atividades, a vaguear? Pois eu vou para onde puder ir; volta, e
conspiração veio à tona. Absalão primeiro leva contigo teus irmãos; a misericórdia e a fide
fez arranjos para ir a Hebrom sob o pretexto lidade sejam contigo.21Respondeu, porém, Itai ao
135
rei, e disse: Vive o Senhor, e vive o rei meu senhor, tivesse permanecido em Jerusalém, não
que no lugar em que estiver o rei meu senhor, seja importa quão fortes fossem suas defesas,
para morte, seja para vida, ai estará também o teu
serva 22Então disse Davi a Itai: Vai, pois, e passa a influência de Davi em Israel teria sido
adiante. Assim passou Itai, o giteu, e todos os seus neutralizada, e a fome iria provocar, no fim,
homens, e todos os pequeninos que havia com ele; a sua rendição. Contudo, com uma força
23Toda a terra chorava em alta voz, enquanto todo de soldados profissionais de grande mobi
o povo passava; e o rei atravessou o ribeiro de lidade, Davi era ainda um fator ponderável,
Cedrom, e todo o povo caminhava na direção do
deserta 24E chegou Abiatar; e veio também até mesmo decisivo, na política israelita.
Zadoque, e com ele todos os levitas que levavam O autor descreve uma cena tensa e
a arca do pacto de Deus; e puseram ali a arca de tocante com Davi decidindo às pressas quais
Deus, até que todo o povo acabou de sair da cidade.
“ Então disse o rei a Zadoque: Torna a levar a arca de seus seguidores permaneceriam em Jeru
de Deus à cidade; pois, se eu achar graça aos olhos salém e quais o acompanhariam em sua
do Senhor, ele me fará voltar para lá, e me deixará fuga pelo deserto. Seus servos (civis) o acom
ver a arca e a sua habitaçãa 26Se ele, porém, panhariam para manterem intacto o seu
disser: Não tenho prazer em ti; eis-me aqui, faça governo; e seu exército regular, inclusive
a mim o que bem lhe parecer. 27Disse mais o rei
a Zadoque, o sacerdote: Não és tu porventura todos os mercenários filisteus, seria abso
vidente? volta, pois, para a cidade em paz, e contigo lutamente indispensável.
também teus dds filhos, Aímaaz, teu filha, e Jônatas, Outros, contudo, ficaram. Davi ali
filho de Abiatar. “ Vede eu me demorarei nos vaus
do deserto até que tenha notícias da vossa parta deixou dez concubinas para enfrentarem
29Zadoque, pois, e Abiatar tornaram a levar para uma sorte desconhecida (16.20-23), como
Jerusalém a arca de Deus, e ficaram ali. “ Mas símbolos de sua permanente reivindicação
Davi, subindo pela encosta do monte das Oliveiras, do palácio real. Abiatar e Zadoque, guar
ia chorando; tinha a cabeça coberta, e caminhava
com os pés descalços, làmbém todo o povo que diães da arca, estavam dispostos a segui-lo,
ia com ele tinha a cabeça coberta, e subia chorando mas Davi decidiu deixá-los em Jerusalém
sem cessar. 31Então disseram a Davi: Aitofel está como espiões. A posição deles como sacer
entre os que conspiraram com Absalãa Pelo que dotes na adoração institucionalizada em
disse Davi: Ó Senhor, torna o conselho de Aiitofel Jerusalém dava-lhes uma desculpa para
em loucura! 32Ora, aconteceu que, chegando Davi
ao cume, onde se costumava adorar a Deus, Husai, ficarem, e também propiciava-lhes uma
o arquita, veio encontrar-se com ele, com a roupa certa medida de proteção. Finalmente, Davi
rasgada e a cabeça coberta de terra. 33Disse-lhe deixou Husai, um conselheiro amigo e de
Davi: Se fores comigoi, ser-me-ás pesado; Mporém confiança, para que se infiltrasse no corpo
se voltares para a cidade, e disseres a Absalão: Eu
serei, ó rei, teu servo; como fui dantes servo de teu
de assessores de Absalão. Ali, se fosse capaz
pai, assim agora serei teu servo; dissipar-me-ás então de conquistar a confiança de Absalão, ele
o conselho de Aitofel. 35E não estão ali contigo poderia solapar a influência de Aitofel, o
Zadoque e Abiatar, sacerdotes? Portanto, tudo o mais astuto dos estrategistas de Absalão.
que ouvires da casa do rei lhes dirás. “ Eis que Finalmente, feitos os acertos, Davi fugiu
estão também ali com eles seus dois filhos, Aümaaz,
filho de Zadoque, e Jônatas, filho de Abiatar; por pouco antes de Absalão entrar na cidade.
eles me avisareis de tudo o que ouvirdes. 37Husai, Tendo, pois, saído o rei com todo o povo.
pois, amigo de Davi, voltou para a cidade. E Absalão Davi deveria estabelecer um acampamento
entrou em Jerusalém.
de base em Maanaim (17.24-29), onde as
Ao saber do sucesso da ousada ação de famílias de suas tropas poderiam perma
Absalão em Hebrom, Davi ordenou que necer em relativa segurança. Até que
seu governo e suas tropas saíssem de Jeru atravessassem o Jordão e estabelecessem
salém. Em vista da ampla base popular que seu acampamento, o bando de Davi estaria
apoiava Absalão, Davi podia ver que estava longe de constituir a força móvel de que
novamente se deparando com uma força carecia. Durante essa marcha crucial Davi
tática superior. Uma vez mais teria de esteve praticamente desamparado porque
recorrer a táticas de guerrilhas (cf. comen sua partida precipitada impediu-o de fazer
tário sobre ISm 23.1-4; 2Sm 5.17-25). Caso preparativos adequados e organizar melhor
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o cuidado às famílias daqueles que o acom inclinando-se, disse: Que eu ache graça aos teus
panhavam (15.16,22). olhos, ó rei meu Senhor. 5Tendo o rei Davi
chegado a Baurim, veio saindo dali um homem da
Faça a mim o que bem lhe parecer. A linhagem da casa de Saul, cujo nome era Simei,
filosofia religiosa de Davi estava bem filho de Géra; e, adiantando-se, proferia maldições.
distante da concepção fatalista tão comum 6làmbém atirava pedras contra Davi e todos os
no Oriente Média Enquanto um fatalista seus servos, ainda.que todo o povo e todos os valo
rosos iam à direita e à esquerda do rei. 7E,
se resigna passivamente a qualquer que seja amaldiçoando-o Simei, assim dizia: Sai, sai, homem
a sorte que lhe determine o seu deus, Davi sanguinário, homem de Belial! “O Senhor te deu
estava ativamente empenhado em fazer agora a paga de todo o sangue da casa de Saul,
tudo ao seu alcance para determinar seu em cujo lugar tens reinado; já entregou o Senhor
o reino na mão de Absalão^ teu filho; e eis-te agora
próprio futuro. Não obstante, estava na desgraça, pois és um homem sanguinária
convencido de que o Senhor basicamente ’Então Abisai, filho de Zeruia, disse ao rei: Por
tinha o controle da vida, e sua vontade por que esse cão morto amaldiçoaria ao rei meu senhor?
fim se cumpriria na história humana. Deixa-me passar e tirar-lhe a cabeça. '"Disse,
Davi saiu de Jerusalém chorando. O porém, o rei: Que tenho eu convosco, filhos de
Zeruia? Por ele amaldiçoar e por lhe ter dito o
autor retrata vividamente a relutância de Senhor: Amaldiçoa a Davi; quem dirá: Por que
Davi em partir, ao descrever suas paradas assim fizeste? "Disse mais Davi a Abisai, e a todos
na última casa da cidade (v. 17 e s.), ao lado os seus servos: Eis que meu filho, que saiu das
do Cedrom (v. 23 e s.), e sobre o monte das minhas entranhas, procura tirar-me a vida; quanto
Oliveiras (v. 30 e s.). Sem dúvida, Davi mais ainda esse benjamita? Deixai-o; deixai que
amaldiçoe, porque o Senhor lho ordenou. >2Forven-
chorava porque aquela era considerada a tura o Senhor olhará para a minha aflição, e me
sua cidade, mas sobretudo porque se pagará com bem a maldição deste dia. MProsse-
lembrava de que era seu filho que buscava guiam, pois, o seu caminho, Davi e os seus homens,
tirar-lhe a vida (16.11; 17.3,4). enquanto Simei ia pela encosta do monte, defronte
dele, caminhando e amaldiçoando, e atirava pedras
Dissipar-me-ás então o conselho de contra ele, e levantava poeira. 14E o rei e todo o
Aitofel. O conselho de Altofel era conside povo que ia com ele chegaram cansados ao Jordão,
rado quase em pé de igualdade com um e ali descansaram.
oráculo divino (16.23). Davi conhecia-o
bem, e Absalão tinha-o em alta estima. Davi A atenção dedicada aos detalhes da fuga
reconheceu que sua maior ameaça estava de Davi de Jerusalém confirma a seriedade
na sabedoria de Aítofel. Por tal razão, o da rebelião de Absalão. Não só a posse do
papel de Husai como espião era importan trono por Davi estava sendo desafiada, mas
tíssimo. também rivalidades tribais e regionais outra
vez ameaçavam destruir a unidade de Israel.
Embora o golpe de estado dado por Absalão
3) A Família de Saul Opõe-se a Davi não constituísse uma mudança dinástica
(16.1-14) nem um movimento de secessão, tal evento
proporcionou aos seguidores de Saul uma
'Tendo Davi passado um pouco além do cume,
eis que Ziba, o moço de Mefibosete, veio encontrar-
oportunidade para restabelecerem um reino
-se com ele, com um par de jumentos albardados, independente sobre as tribos do norte. A
e sobre eles duzentos pães, cem cachos de passas, nação não estava desta vez dividida em
e cem de frutas de verão e um odre de vinha função das fronteiras regionais, mas os dois
zPerguntou, pois, o rei a Ziba: Que pretendes com incidentes seguintes revelam que poderosas
isso? Respondeu Ziba: Os jumentos são para a casa
do rei, para se montarem neles; e o pão e as frutas pressões desagregadoras estavam ocultas,
de verão para os moços comerem; e o vinho para movendo-se logo abaixo da superfície da
os cansados no deserto beberem. ^Perguntou ainda política israelita.
o rei: E onde está o filho de teu senhor? Respondeu Mal havia Davi perdido Jerusalém de
Ziba ao rei: Eis que permanece em Jerusalém, pois
disse: Hoje a casa de Israel me restituirá o reino
vista quando encontrou-se com Ziba, o
de meu pai. ‘‘Então disse o rei a Ziba: Eis que tudo mordomo sobre as propriedades de Saul,
quanto pertencia a Mefibosete é teu. Ao que Ziba, oferecendo apoio simbólico à causa de Davi
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e notícias de ambições de Mefibosete. Absalão, disse-lhe: Viva o rei, viva o rei! 17Absa
Conquanto os presente i de Ziba fossem de lão, porém, perguntou a Husai: É esta a tua bene
volência para com o teu amigo? Por que não foste
proporções modestas, eram, não obstante, com o teu amigo? 18Respondeu-lhe Husai: Não;
importantes. Forças guerrilheiras, que não pois daquele a quem o Senhor, e este povo, e to
dispõem de adequado apoio logístico, não dos os homens de Israel têm escolhido, dele serei
podem sobreviver sem essas muitas provas e com ele ficarei. 19E, demais disto, a quem servi
de apoio popular (17.27-29). ria eu? Porventura não seria a seu filho? Como
servi a teu pai, assim servirei a ti. “ Então disse
Mefibosete mal podia esperar pela vinda Absalão a Altofel: Dai o vosso conselho sobre o
de Absalão para Jerusalém a fim de que devemos fazer. 21Respondeu Altofel a Absa
convidá-lo a ser rei de todo Israel. É muito lão: Entra às concubinas de teu pai, que ele dei
provável, porém, que ele estivesse esperando xou para guardarem a casa; e assim todo o Israel
ouvirá que te fizeste aborrecivel para com teu pai,
se aproveitar da confusão para estabelecer e se fortalecerão as mãos de todos os que estão
um reino como o de Isbosete sobre as tribos contigo. 22Estenderam, pois, para Absalão uma
do norte (a casa de Israel). Por outro lado, tenda no terraço; e entrou Absalão às concubinas
Ziba pode ter caluniado o seu senhor para de seu pai, à vista de todo o Israel. 23E o conse
lho que Aítofel dava naqueles dias era como se o
tirar vantagem pessoal. Quando Davi mais oráculo de Deus se consultara; tal era todo o
tarde retornou a Jerusalém, não sabia se conselho de Altofel, tanto para com Davi como
acreditava em Ziba ou em Mefibosete; por para Absalão.
isso, dividiu os bens de Saul.
Em Baurim, a pequena distância a leste Quando Absalão chegou a Jerusalém,
de Jerusalém, Davi encontrou Simei, um soube que por pouco não conseguira rea
lizar seu plano de sitiar Davi na cidade.
parente distante de Saul, que expressou os
sentimentos hostis de muitos de seus conci O fato de Davi ter escapado por um triz
dadãos de tribo (cf. 20.1). Lançando pedras para o deserto com o núcleo de um exér
e amaldiçoando, Simei acusou Davi de cito respeitável apresentava às forças de
cumplicidade nas mortes violentas que Absalão uma nova situação tática, reque
haviam dizimado a casa de Saul (cf. 1.10; rendo uma estratégia completamente dife
3.27; 4.8; 21.1-14). Abisai, irmão do feroz rente. Era claro que a vitória final podia
e sanguinário Joabe, ofereceu-se para deca ser ganha ou perdida em função das deci
pitar Simei por sua impertinência. Davi, sões tomadas nas primeiras horas cruciais
porém, reconheceu que tinha mais a ganhar após a chegada de Absalão a Jerusalém.
com a tolerância do que com uma enérgica Das pessoas que permaneceram na ci
exibição de força. Assim, suportou silencio dade, provavelmente a maioria parecia
samente as imprecações desse benjamita, pronta a ajudar o novo regime. Absalão
prosseguindo em sua jornada rumo ao sabia que muitas dessas pessoas não mere
Jordão. Quando Davi voltou ao poder, deve ciam confiança, mas as demais poderiam
ter apreciado o humilhante pedido de oferecer valiosos bens e serviços à sua
desculpas de Simei (19.16-23), pois nunca causa. Husai, conselheiro de Davi, era um
perdoara verdadeiramente aquela ofensa. bom exemplo do dilema representado por
Ao final de sua vida, quando algumas das tais pessoas. Se ele estivesse sendo sincero
tensões regionais haviam esfriado um em sua transferência de lealdade, ninguém
pouco, Davi instruiu Salomão a procurar poderia dar a Absalão uma melhor expli
uma oportunidade de vingar-se do insulto cação quanto aos planos e táticas de Davi.
em Baurim (lRs 2.8,9). É claro que ele teria de ser vigiado, mas
o potencial de sua utilidade era grande
demais para que seu ofçrecimento de aju
4) Absalão Entra em Jerusalém (16.15-23) da fosse rejeitado de pronto.
,5Absalão e todo o povo, os homens de Israel, Embora Davi tivesse escapado por pou
vieram a Jerusalém; e Altofel estara com ele 16E co de ficar cercado em Jerusalém, a cap
chegando Husai, o arquita, amigo de Davi, a tura da capital de Israel por Absalão ain
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da representava uma tremenda vitória psi desmaiará; porque todo o Israel sabe que teu pai
cológica para os que o apoiavam. Enquan é valoroso, e que são valentes os que estão com
ela "Eu, porém, aconselho que com toda a pressa
to todos os olhares ainda estavam voltados se ajunte a ti todo o Israel, desde Dã até Berseba,
para os acontecimentos relacionados com em multidão como a areia do mar; e que tu em
a queda da cidade, Absalão procurou um pessoa vás à peleja. 12Então iremos a ele, em
meio de tirar o maior proveito propagan- qualquer lugar em que se achar, e desceremos so
bre ele, como o orvalho cai sobre a terra; e não
dístico com sua vitória. Por sugestão de ficará dele e de todos os homens que estão com
Aítofel, outro dos antigos conselheiros de ele nem sequer um só. MSe ele, porém, se retirar
Davi, Absalão decidiu-se proclamar-se rei, para alguma cidade, todo o Israel trará cordas
mediante o ato de tomar publicamente àquela cidade, e. arrastá-la-emos até o ribeiro, até
posse das concubinas de seu pai (cf. co que não se ache ali nem uma só pedrinha. 14Então
Absalão e todos os homens de Israel disseram:
mentário sobre 3.7). Além do significado Melhor é o conselho de Husai, o arquita, do que
político, tal ato foi planejado para produ o conselho de Aitofel. Porque assim o Senhor b
zir um abismo pessoal entre pai e filho ordenara, para aniquilar o bom conselho de Aíto-
(Dt 22.30). Aparentemente, alguns dos fel, a fim de trazer o mal sobre Absalãa
seguidores de Absalão desejavam uma ga
rantia de que seu líder não iria arranjar
uma trégua de último momento com Da A decisão básica perante Absalão e seus
vi, deixando seus companheiros de cons conselheiros dizia respeito às táticas a se
piração em situação bastante difícil (Mc rem empregadas contra Davi, que ainda
Kane, p. 257). Talvez Aítofel também estava a apenas poucas horas de distância
pensasse que as ações de Absalão servi de Jerusalém. Aítofel era favorável a um
riam como retribuição adequada para o ataque imediato, a ser lançado naquela
tratamento dispensado por Davi a Urias mesma noite de modo que Davi pudesse
e Bate-Seba (cf. comentário sobre 11.3). ser apanhado antes de poder atravessar o
Rio Jordão. Aítofel compreendeu que,
5) Husai Ganha Tempo (17.1-14) uma vez que Davi conseguisse se infiltrar
no deserto além do Jordão, seria capaz de
'Disse mais Aítofel a Absalão: Deixa-me esco
lher doze mil homens, e me levantarei, e perse
prolongar a luta e combater de acordo
guirei a Davi esta noite. 2Irei sobre ele, enquanto com o tipo de guerra que suas tropas me
está cansado e fraco de mãos, e o espantarei: en lhor conheciam. Se, contudo, pudessem
tão fugirá todo o povo que está com ele. Ferirei ser apanhadas junto com suas famílias e
tão-somente o rei; 3e farei tornar a ti todo o po bagagens antes de cruzarem o Jordão
vo, como uma noiva à casa do seu esposo; pois é
a vida dum só homem que tu buscas; assim todo (15.16,22), as forças de Absalão levariam
o povo estará em paz. 4E este conselho agradou uma vantagem decisiva. Ademais, havia
a Absalão e a todos os anciãos de Israel. 5Disse, uma clara possibilidade de que o próprio
porém, Absalão: Chamai agora a Husai, o arqui- Davi fosse morto, em cuja hipótese toda
ta, e ouçamos também o que ele diz. 6Quando a resistência ruiria por terra.
Husai chegou a Absalão, este lhe disse: Desta
maneira falou Aítofel; faremos conforme a sua Contudo uma expedição dessas não
palavra? Se não, fala tu. 7Então disse Husai a deveria ser feita de qualquer modo, os
Absalão: O conselho que Aitofel deu desta vez homens de Davi eram soldados profissio
não é bom. 8Acrescentou Husai: Tii bem sabes nais; e, uma vez que haviam abandonado
que teu pai e os seus homens são valentes, e que
estão com o espírito amargurado, como a ursa no Jerusalém voluntariamente, as condições
campo, roubada dos seus cachorros; além disso de batalha poderiam ser de sua própria
teu pai é homem de guerra, e não passará a noite escolha. Uma marcha forçada durante a
com o povo. ’Eis que agora está ele escondido noite seria particularmente arriscada,
nalguma cova, ou em qualquer outro lugar; e será
que, caindo alguns no primeiro ataque, todo o que
pois tal manobra quase atrairia uma em
o ouvir dirá: Houve morticínio entre o povo que boscada.
segue a Absalão. “ Então até o homem valente, Absalão, portanto, chamou a Husai pa
cujo coração é como coração de leão, sem dúvida ra uma proposta alternativa. Reconhecen-
139
do que Davi não tini ia previsto que as 6) Davi Foge Para Maanaim (17.15-29)
forças de Absalão poderiam lançar sua
l5Também disse Husai a Zadoque e a Abiatar,
perseguição imediatamente além de Jeru sacerdotes: Assim e assim aconselhou Aitofel a
salém (15.28; cf. 17.16), Husai tentou de Absalão e aos anciãos de Israel; porém eu acon
ter o ataque. Comparando os soldados de selhei assim e assim.16Agora, pois, mandai apres
Davi e suas famílias a ursas que tiveram sadamente avisar a Davi, dizendo: Não passes
seus filhotes roubados, Husai recordou a esta noite nos vaus do deserto; mas passa sem
falta à outra banda, para que não seja devorado
Absalão a força de seu oponente. Ele en o rei, e todo o povo que com ele estiL 17Ora, Jô-
tão descartou a idéia de que a guerra pu natas e Aimaaz estavam esperando junto a En-
desse ser vencida com um único ataque, -Rogel; e foi uma criada, e lhes avisou, para que
uma vez que Davi, um ardiloso comba eles fossem e dissessem ao rd Davi; pois não de
viam ser vistos entrando na cidade. 18Viu-os to
tente do deserto, dificilmente seria tão davia um moço, e avisou a Absalãa Ambos, po
ingênuo para dormir no descampado com rém, partiram apressadamente, e entraram em
o grosso de suas tropas. Finalmente, Husai casa de um homem, em Baurim, o qual tinha no
fez notar que nessa primeira batalha até pátio de sua casa um poço, para o qual eles des
ceram. 19E a mulher, tomando a tampa, colocou-a
mesmo baixas modestas nas tropas de sobre a boca do poço, e espalhou grão triturado
Absalão poderiam ter efeitos desastrosos sobre ela; assim nada se soube. ^Chegando, pois,
sobre seus seguidores em qualquer confli os servos de Absalão àquela casa, perguntaram à
to prolongado. Em resumo, desaprovava o mulher: Onde estão Ai'maaz e Jônatas? Respon
plano de Aitofel. deu-lhes a mulher: Já passaram a corrente das
águas. E, havendo-os procurado sem os encon
Em lugar disso, Husai recomendou um trarem, voltaram para Jerusalém. 21Depois que
jogo de força que parecia bom, mas que eles partiram, Aimaaz e Jônatas, saindo do poço,
na realidade representava as próprias tá foram e avisaram a Davi; e disseram-lhe: Levantai-
-vos, e passai depressa as águas, porque assim e
ticas que Davi esperava que seus perse assim aconselhou contra vós Aitofel. “ Então se
guidores tivessem. Em contraste com a levantou Davi e todo o povo que com ele estava,
força móvel de homens bem treinados, e passaram o Jordão; e ao raiar da manhã não
Husai recomendou um exército bem nu faltava nem um só que não o tivesse passada
“ Venda, pois, Aitofel que não se havia seguido o
meroso de recrutas trazidos de todo o Is seu conselho^ albardou o jumento e, partindo, foi
rael. Em lugar de aceitar o oferecimento para casa, para a sua cidade; e, tendo posto em
da liderança madura de Aitofel, o próprio ordem a sua casa, se enforcou e morreu; e foi se
Absalão iria comandar a expedição. Para pultado na sepultura de seu pai. 24Então Davi veio
afastar os líderes de Israel para ainda mais a Maanaim; e Absalão passou o Jordão, ele e to
dos os homens de Israel com ela “ E Absalão
longe das verdadeiras táticas de Davi, colocou Amasa em lugar de Joabe sobre o exér
Husai deixou subentendido que, em vista cito. Ora, Amasa era filho de um homem que se
de tão esmagadora força, Davi provavel chamava Itra, o jizreelita, o qual entrara a Abi-
mente buscaria refúgio numa cidade on gail, filha de Naás e irmã de Zeruia, mãe de Joa-
b a "Israel e Absalão se acamparam na terra de
de pudesse ser facilmente capturado. Hu Gileada 27Tendo Davi chegado a Maanaim, Sobi,
sai havia desempenhado muito bem seu filho de Naás, de Rabá dos filhos de Amom, e
papel de espião! Maquir, filho de Amiel, de Lo-Debar, e Barzilai,
A despeito do fato de que o conselho o gileadita, de Rogelim, “ tomaram camas, bacias
e vasilhas de barro; trigoi, cevada, farinha, grão
de Husai ignorava a vida pregressa de Da tostado, favas, lentilhas e torradas; 2’mel, mantei
vi como um líder guerrilheiro, os dirigen ga, ovelhas e queijos de vaca, e os trouxeram a
tes de Israel aceitaram o seu plano. Esse Davi e ao pow que com ele estava, para come
abandono da sabedoria e da lógica moti rem; pois diziam: O povo está faminto, cansado
e sedento, no deserta
varam um raro comentário editorial do
antigo autor. Tal decisão era compreensí Ao final de sua conversa com Absalão,
vel somente se o Senhor o ordenara para Husai ainda estava incerto quanto aos
aniquilar o bom conselho de Aitofel, a fim planos finais de batalha do rei rebelde. Os
de trazer o mal sobre Absalão. anciãos de Israel pareciam impressionados
140
com as propostas de Husai, mas podiam segredo com que se desenvolvera a cons
estar tentando enganá-lo, a fim de arma piração de Absalão e o caráter repentino
rem uma cilada para Davi. Por uma ques de seu ataque contra Jerusalém haviam
tão de segurança, Husai fez arranjos para deixado pouquíssimo tempo para os prepa
informar Davi de toda a discussão sobre rativos para uma longa jornada através do
a estratégia e advertiu-o a buscar ime deserto. Felizmente, os vassalos de Davi
diatamente refúgio no deserto da Trans- além do Jordão decidiram permanecer-lhe
jordânia. fiéis. É possível que estivessem buscando
A linha de comunicação d,e Davi com vantagens na hipótese de que, como espe
seus espiões em Jerusalém envolvia os sa ravam, ele surgisse como vitorioso nessa
cerdotes Zadoque e Abiatar, e os filhos luta. Por outro lado, podem ter tido a espe
deles, Aímaaz e Jônatas. Estes dois ti rança de incentivar outra devastadora
nham-se escondido fora de Jerusalém, pro guerra civil israelita, que os deixaria livres
vavelmente por preverem que todos os para seguirem seu próprio destino. Fossem
antigos membros da corte de Davi seriam quais fossem os seus motivos, forneceram
proibidos de deixar a cidade. Zadoque e os suprimentos que eram essenciais para
Abiatar confiaram a mensagem de Husai que a causa de Davi se mantivesse em pé.
a uma criada que regularmente trazia Nesse entretempo, Absalão não ficara
água de En-Rogel, uma fonte localizada ocioso. Enquanto Davi apressadamente
uns quatrocentos metros ao sul dos muros reunia provisões (e talvez mais soldados?)
da cidade. O perigo que rodeava os aliados dentre seus aliados, Absalão ajuntava um
de Davi em Jerusalém é sugerido pelo fato exército de todo o Israel, pondo-o sob o
de que os filhos dos sacerdotes foram reco comando de Amasa, primo de Joabe e outro
nhecidos na fonte e conseguiram escapar dos sobrinhos de Davi. Acompanhado por
da perseguição somente por se esconderem esse imenso exército, Absalão cruzou o
no poço de amigos em Baurim. As opor Jordão e acampou em Gileade em busca
tunidades em que Davi e seu povo esca de Davi e seus homens.
param por pouco do perigo servem para
tornar o leitor ainda mais cônscio da par Então Davi veio a Maanaim. Conquanto
ticipação de Deus nessas ocorrências. a localização de Maanaim seja hoje desco
Deus estava operando para livrar Davi e nhecida, parece ter sido uma cidade
derrotar Absalão. Assim, Davi pôde con bastante fortificada no planalto de Gileade.
duzir seu rebanho até o lugar seguro do Tinha logicamente sido a capital do reino
outro lado do Jordão. do norte sob o reinado de Isbosete (2.8).
Quando Aitofel soube que Absalão se Parece bem possível que, de conformidade
decidira pela estratégia de Husai, conven- com as táticas guerrilheiras de Davi, muitos
dos seus estavam acampados no deserto que
ceu-se de que sua própria sorte estava
rodeava a cidade (17.29).
selada. Pôde antever que os rebeldes não
teriam esperanças de uma vitória militar Sobi, filho de Naás. Davi havia nomeado
sobre Davi enquanto interpretassem tão Sobi para governar Amom após a queda
erroneamente as táticas do inimiga Não de Rabá (10.1—12.31). Maquir, de Lo-Debar,
tendo meios de prever a surpreendente em Gileade oriental, havia outrora prote
consideração de Davi para com os que, gido Mefibosete e dele cuidado. Talvez
sem êxito, se rebelaram contra ele (19.13), apoiasse Davi por seu tratamento bondoso
Aitofel pôs seus negócios em ordem e para com o herdeiro de Jônatas (9.4-13).
matou-se. Barzilai, homem rico e idoso, obteve a
Quando Davi e seus homens chegaram eterna gratidão de Davi pelo apoio que lhe
a Maanaim, estavam totalmente sem propiciou naquela hora sombria (cf.
condições, quer de viver, quer de lutar. O 19.31-39; lRs 2.7).
141
memória do meu nome. E deu o seu próprio nome
7) Àbsalão Morto em Batalha (18.1-18) àquela coluna, a qual até o dia de hoje se chama
'Então Davi contou o povo que tinha consigo, o Pilar de Absalãa
e pôs sobre ele os chefes de mil e chefes de cem.
2E Davi enviou o exército, um terço sob o mando Davi não havia abandonado Jerusalém
de Joabe, outro terço sob o mando de Abisai, filho para ser apanhado dentro da cidade murada
de Zeruia, irmão de Joabe, e outro terço sob o
mando de Itai, o giteu. E disse o rei ao povo: Eu
de Maanaim! Ele havia escolhido lutar no
também sairei convosca -’Mas o povo respondeu: bosque de Efraim (na realidade, um local
Não sairás; porque se fugirmos, eles não se impor a leste do Jordão, na altura de Gileade),
tarão conosco; nem se importarão conosco ainda onde a densa vegetação no meio do bosque
que morra metade de nós; porque tu vales por dez dispersaria a milícia inexperiente de
mil tais como nós. Melhor será que da cidade nos
mandes socorra 4Respondeu-lhes o rei: Farei o Absalão, concedendo a seus próprios
que vos parecer bem. E o rei se pôs ao lado da soldados profissionais enorme vantagem.
porta, e todo o povo saiu em centenas e em milhares. Sabendo que manobras em larga escala
5E o rei deu ordem a Joabe, a Abisai e a Itai, seriam impossíveis em tal terreno, Davi
dizendo: Tratai brandamente, por amor de mim,
o mancebo Absalãa E todo o povo ouviu quando
dividiu suas tropas em três grupos, sob o
o rei deu ordem a todos os chefes acerca de Absalãa comando de Joabe, Abisai e Itai, o giteu,
6Assim saiu o povo a campo contra Israel; e deu- todos eles leais veteranos. Ficando na reta
-se a batalha no bosque de Efraim.7Ali o povo de guarda, Davi enviou seus homens com as
Israel foi derrotado pelos servos de Davi; e naquele instruções finais de que tratassem branda
dia houve ali grande morticínio, de vinte mil homens.
8Pois a batalha se estendeu sobre a face de toda mente o jovem Absalão.
aquela terra, e o bosque consumiu mais gente A batalha propriamente dita ocorreu
naquele dia do que a espada. 9Por acaso Absalão como Davi havia esperado. Ambos os exér
se encontrou com os servos de Davi; e Absalão ia citos se espalharam, e seus próprios soldados
montado num mulo e, entrando o mulo debaixo profissionais infligiram pesadas baixas às
dos espessos ramos de um grande carvalho, pegou-
-se a cabeça de Absalão no carvalho, e ele ficou tropas de Absalão em combates corpo-a-
pendurado entre o céu e a terra; e o mulo que estava -corpo. Maior foi o número de recrutas
debaixo dele passou adiante. “ Um homem, vendo israelitas despreparados que desertaram
issoi, contou-o a Joabe, dizendo: Eis que vi Absalão para as matas do que os que foram feridos
pendurado dum carvalha "Então disse Joabe ao
homem que lho contara: Pois que o viste, por que em batalha (cf. a engraçada figura de
não o derrubaste logo por terra? E eu te haveria linguagem do v. 8).
dado dez siclos de prata e um cinta 12Respondeu, Finalmente, o acontecimento que Aitofel
porém, o homem a Joabe: Ainda que eu pudesse havia imaginado (17.2) realmente veio a se
pesar nas minhas mãos mil siclos de prata, não passar: porém Absalão, e não Davi, foi a
estenderia a mão contra o filho do rei; pois bem
ouvimos que o rei deu ordem a ti, e a Abisai, e vítima. Num momento de distração,
a Itai, dizendo: Guardai-vos, cada um, de tocar no Absalão se deixou embaraçar numa árvore,
mancebo Absalãa 13E se eu tivesse procedido ficando assim sem defesa diante dos homens
falsamente contra a sua vida, coisa nenhuma se de Davi. Não obstante, os soldados comuns
esconderia ao rei, e tu mesmo te oporias a mim.
14Então disse Joabe: Não posso demorar-me assim recordaram-se das palavras de Davi e não
contigo aqui. E tomou na mão três dardos, e tras se dispunham nem mesmo a serem subor
passou com eles o coração de Absalão, estando nados para golpear o pobre rei rebelde.
ele ainda vivo no meio do carvalha 15E o cercaram Somente quando seu destemido e brutal
dez mancebos, que levavam as armas de Joabe; e comandante, Joabe, desferiu o primeiro
feriram a Absalão, e o mataram. 16Então tocou
Joabe a buzina, e o povo voltou de perseguir a Israel; golpe, alguns dos homens de Davi levan
porque Joabe deteve o povo. 17E tomaram a taram a mão contra Absalão. Então todos
Absalão e, lançando-o numa grande cova no bosque, os guarda-costas de Joabe feriram Absalão
levantaram sobre ele mui grande montão de pedras. a fim de que nenhum homem recebesse
E todo o Israel fugiu, cada um para a sua tenda.
18Ora, Absalão, quando ainda vivia, tinha feito sozinho a descarga da ira de Davi. O corpo
levantar para si a coluna que está no vale do rei; foi então sepultado sob uma pilha de rochas
pois dizia: Nenhum filho tenho para conservar a no bosque, e a batalha teve fim.
142
Vales por dez mil tais como nós. Davi teu Deus, que entregou os homens que levantaram
era insubstituível, uma vez que sem ele a a mão contra o rei meu senhor. 29Então perguntou
o rei: Vai bem o mancebo Absalão? Respondeu
resistência a Absalão se desmoronaria. Aimaaz: Quando Joabe me mandou a mim, o servo
Tratai brandamente. As instruções de do rei, vi um grande alvoroço; porém não sei o que
Davi podem ter por base mais do que era. “ Disse-lhe o rei: Põe-te aqui ao lado. E ele
simples preocupação paternal. Por toda sua se pôs ao lado, e esperou> de pé. 31Nisso chegou
carreira ele foi impressionantemente tole o cuchita, e disse: Novas para o rei meu senhor.
Pois que hoje o Senhor te vingou da mão de todos
rante com os israelitas de nascimento que os que se levantaram contra ti. 32Então perguntou
a ele se opunham politicamente (cf. comen o rei ao cuchita: Vai bem o mancebo Absalão?
tário sobre 2.1-32; 19.22). Enfrentou uma Respondeu o cuchita: Sejam como aquele mancebo
luta constante para manter unidos o norte os inimigos do rei ineu senhor, e todos os que se
levantam contra ti para te fazerem mal. 33Pelo que
e o sul. Joabe, por exemplo, era muito mais o rei ficou muito comovido e, subindo à sala que
brutal do que Davi desejava (3.39). estava por cima da porta, pôs-se a chorar; e andando,
Traspassou (...) o coração de Absalão. dizia assim: Meu filho Absalão, meu filho, meu filho
Somente um homem de grande poderio era Absalão! quem me dera que eu morrera por ti
capaz de desafiar dessa forma uma ordem Absalão^ meu filho, meu filho!
do rei. Joabe comandava tropas que sem Após chegar ao clímax da batalha no
dúvida eram leais à sua pessoa. Se Abner bosque de Efraim, o autor passa a relatar
foi a força por trás do trono de Isbosete o modo por que Davi soube da morte do
(2.8,9), então Joabe deve ter sido uma filho. A história é narrada artisticamente
importante força por detrás de Davi. com plena consciência do caráter marcante
e comovente daquele episódio. O rei, que
8) Relato da Morte de Absalão (18.19-33) já está ficando idoso, é descrito como
alguém que está ainda esperando ansiosa
19Então disse Aímaaz, filho de Zadoque:
Deixa-me correr, e anunciarei ao rei que o Senhor mente bem junto ao portão da cidade, do
o vingou da mão de seus inimigos. “ Mas Joabe lado de dentro, por qualquer notícia da
lhe disse: Di não serâs hoje o portador das novas; frente de batalha. Finalmente um corredor
outro dia as levarás, mas hoje não darás a nova, apareceu à distância e, logo em seguida,
porque é morto o filho do rei. 21Disse, porém, outro! O primeiro relatou somente que
Joabe ao cuchita: Vai tu, e dize ao rei o que viste.
O cuchita se inclinou diante de Joabe, e saiu Absalão havia sido derrotado na batalha,
correndo. 22Então prosseguiu Aimaaz, filho de mas o segundo trouxe notícias de sua morte.
Zadoque, e disse a Joabe: Seja o que for, deixa-me A torturante ambivalência dos homens de
também correr após o cuchita. Respondeu Joabe: Davi fica evidente com os relatos desses
Para que agora correrias tu, meu filho, pois não
receberias recompensa pelas novas? 23Seja o que dois, quando a comemoração de vitória foi
for, disse Aimaaz, correrei. Disse-lhe, pois, Joabe: silenciada pelo culposo conhecimento que
Corre. Então Aimaaz correu pelo caminho da tinham da morte de Absalão.
planície, e passou adiante do cuchita. 24Ora, Davi É fato digno de encómios que Davi ainda
estava sentado entre as duas portas; e a sentinela se preocupasse com o bem-estar de um filho
subiu ao terraço da porta junto ao muro e, levan
tando os olhos, viu um homem que corria só. que buscava tirar-lhe a vida (16.11). A dor
25Gritou, pois, a sentinela, e o disse ao rei. de Davi, porém, levou-o a perder o ânimo
Respondeu o rei: Se vem só, é portador de novas. de viver e a ignorar as necessidades de
Vinha, pois, o mensageiro aproximando-se cada homens que tinham sido filhos mais verda
vez mais. “ Então a sentinela viu outro homem que
corria, e gritou ao porteiro, e disse: Eis que lá vem deiros do que jamais Absalão havia sido.
outro homem correndo só. Então disse 0 rei: Desde o assassinato de Amnon, a falta de
Também esse traz novas. 27Disse mais a sentinela: comunicação significativa entre pai e filho
O correr do primeiro parece ser o correr de Aimaaz, provavelmente complicara o ajuste à morte
filho de Zadoque: Então disse o rei: Este é homem do filho. Deve Davi ter tido consciência de
de bem, e virá com boas novas. “ Gritou, pois,
Aimaaz, e disse ao rei: Paz! E indinou-se ao rei que seus fracassos como pai haviam contri
com o rosto em terra, e disse: Bendito seja o Senhor buído para o ignóbil fim do filho. Com
143
muita freqüência, a dor excessiva procede filho! 5Então entrou Joabe na casa onde estava o
de um senso de culpa reprimido. rei, e disse: Hoje envergonhaste todos os teus servos,
Tu não serás hoje o portador das novas. que livraram neste dia a tua vida, a vida de teus
filhos e filhas, e a vida de tuas mulheres e concu
A palavra novas regularmente se aplica a binas, 6amando aos que te odeiam, e odiando aos
boas novas (contudo cf. ISm 4.17, que é que te amam. Forque hoje dás a entender que nada
uma exceção). Esta cláusula não é uma valem para ti nem chefes nem servos; pois agora
ordem direta; é uma simples declaração de entendo que se Absalão vivesse, e todos nós hoje
fato: hoje você não será um homem de boas fôssemos mortos, ficarias bem contente. 7Levanta-
-te, pois, agora; sai e fala ao coração de teus servos.
novas. Não podia haver boas novas naquele Porque pelo Senhor te juro que, se não saires, nem
dia porque o filho do rei estava morto. um só homem ficará contigo esta noite; e isso te
Vai tu, e dize ao rei o que viste. Comen será pior do que todo o mal que tem vindo sobre
taristas têm especulado que Joabe enviou ti desde a tua mocidade até agora. “Pelo que o rei
se levantou, e se sentou à porta; e avisaram a todo
o cuchita, um etíope, para evitar que em o povo, dizendo: Eis que o rei está sentado à porta.
sua mente Davi associasse Aimaaz com as Então todo o povo veio apresentar-se diante do rei.
más notícias da morte de Absalão (1.15,16; Ora, Israel havia fugido, cada um para a sua tenda.
3.10; cf. McKane, p. 266). Esta suposição* ’Entrementes todo o povo, em todas as tribos de
Israel, andava altercando entre si, dizendo: O rei
contudo, deixaria sem resposta a questão nos tirou das mãos de nossos inimigos, e nos livrou
de por que Joabe finalmente acedeu ante das mãos dos filisteus; e agora fugiu da terra por
os insistentes apelos de Aimaaz. Parece mais causa de Absalãa 10Tkmbém Absalão, a quem
provável que Aimaaz sabia dos resultados ungimos sobre nós, morreu na peleja. Agora, pois,
gerais da batalha (v. 6-8), mas só naquele por que vos calais, e não fazeis voltar o rei?
nEntão o rei Davi mandou dizer a Zadoque e a
momento estava sendo informado da morte Abiatar, sacerdotes: Falai aos anciãos de Judá,
de Absalão. O etíope fora enviado para levar dizendo: Por que seríeis vós os últimos em tornar
a notícia por que não conhecia os detalhes a trazer o rei para sua casa? Porque a palavra de
sobre o fim de Absalão. todo o Israel tem chegado ao rei, até a sua casa.
12Vós sois meus irmãos; meus ossos e minha carne
Não sei o que era. Aimaaz, contudo, sois vós; por que, pois, serieis os últimos em tornar
havia tido alguma informação da morte de a trazer o rei? 13Dizei a Amasa: Porventura não
Absalão. Essa declaração ou é uma mentira és tu meu osso e minha carne? Assim me faça Deus,
intencional, ou era costume que um mensa e outro tanto, se não fores chefe do exército diante
geiro devia relatar somente sua própria de mim para sempre, em lugar de Joabe. 14Assim
moveu ele o coração de todos os homens de Judá,
experiência. Ao mencionar a atividade que como se fosse o de um só homem; e enviaram ao
havia contemplada, Aimaaz preparou Davi rei, dizendo: Volta, com todos os teus servos.
para as más notícias que se seguiriam, mas 15Então o rei voltou, e chegou até o Jordão; e Judá
descartou qualquer conhecimento direto do veio a Gilgal, para encontrar-se com o rei, a fim
de fazê-lo passar o Jordãa
assunto. Assim, Aimaaz apareceu perante
o rei como sendo inocente de cumplicidade
r_a morte de Absalão. Contrariamente às expectativas de
Joabe, o assassinato de Absalão provocou
uma rápida queda no moral das tropas de
8. Davi Volta a Ocupar o TVono (19.1-40) Davi. Naquele exato momento em que
medidas rápidas e decisivas eram necessá
1) Israel Chama Davi de Volta (19.1-15) rias para tirar vantagem da falta de liderança
'Disseram a Joabe: Eis que o rei estâ chorando em Israel, Davi estava imobilizado por seu
e se lamentando por Absalãa 2Então a vitória se próprio remorso, repleto de culpas, por
tornou naquele dia em tristeza para todo o povo, causa da morte do filho. Homens que
porque nesse dia o povo ouviu dizer: O rei estâ haviam arriscado a vida em batalha estavam
muito triste por causa de seu filha 3E nesse dia compreensivelmente desapontados ao
o povo entrou furtivamente na cidade, como o faz
quando, envergonhado, foge da peleja. 4Estava, saberem que seu líder pensava exclusiva
pois, o rei com o rosto coberto^ e clamava em alta mente na morte de um a quem haviam sido
voz: Meu filho Absalão, Absalão meu filho, meu levados a considerar como o inimigo. Prova-
144
velmente muitos outros temiam que Davi As motivações de Davi para fazer essa
pudesse estar planejando punir os que eram mudança têm sido acaloradamente deba
suspeitos de violar sua ordem de poüpar tidas e exaustivamente criticadas (McKane,
Absalão. Assim, quanto mais Davi demo p. 271,272). Deve-se notar, contudo, que
rasse para aparecer em público, mais incerto Joabe manteve o. posto de menor prestígio,
se tomava o futuro de sua causa. mas de maior poder imediato, de coman
Em seu confronto com Joabe, Davi foi dante do exército regular de Davi de
forçado a reconhecer os fatos sombrios na mercenários estrangeiros (20.7). Esse era
realidade política. Suas políticas estavam o exército que acabara de derrotar a milícia
sendo desafiadas, e ele enfrentava deserção de Israel no bosque de Efraim. Em prin
por atacado. Para muitos, parecia que sua cípio, Amasa podia estar numa posição de
atitude conciliatória para com o inimigo exercer grande influência no governo de
(16.11; 19.22) e sua dor diante da morte do Davi, mas até ser enviado para convocar
filho rebelde derivavam de uma falta de inte e treinar um exército de soldados alistados,
resse pelos que o apoiavam. Davi, portanto, seu papel era em grande parte honorífico.
deixou de parte todos os outros interesses No final das contas, não viveu muito tempo
(20 . 10).
e reuniu-se a seu povo nas ruas.
Davi pode ter decidido ignorar a respon
Em vista da dificuldade que Davi estava sabilidade de Joabe pela morte de Absalão
tendo com seu próprio partido, é surpreen para evitar dissensão naquele momento. O
dente que fosse capaz de reconquistar o segredo de Joabe dificilmente poderia ser-
trono de um Israel unido. Entretanto, após lhe ocultado (18.13), mas o autor bíblico
a morte de Absalão, o suicídio de AJtofel, não expressa qualquer interesse da parte
e a desastrosa derrota de Amasa, nem Israel de Davi em conhecer os detalhes da morte
nem Judá possuíam um líder que pudesse de Absalão. Conquanto Davi não repreen
ganhar apoio suficiente para dirigir a nação. desse Joabe publicamente pela sua
Finalmente, as pessoas do povo do reino desobediência, tornaram-se evidentes os
do norte prevaleceram sobre seus anciãos claros indícios de tensão entre o rei e seu
e pediram a Davi que retornasse ao trono. general (19.13). Sem dúvida, Davi teve a
Num esforço para reunir seu antigo intenção de repreender Joabe como, por
reino, Davi fez um apelo especial aos exemplo, quando Abisai foi feito coman
anciãos de Judá para que seguissem o dante supremo da expedição contra Sebá
exemplo de seus vizinhos do norte. Conti (20.6). Não obstante, durante toda a
nuando com sua antiga política para com campanha, Joabe permaneceu a persona
seus concidadãos israelitas, Davi tratou com lidade dominante. Embora a morte de
muita generosidade aqueles que estiveram Absalão não seja especificamente mencio
profundamente implicados na revolta nada como uma causa, Davi finalmente
contra ele (v. 16-30). Até concordou em apelou a Salomão para vingar o sangue
aceitar Amasa, o general de Absalão, em inocente derramado por Joabe (IReis 2.5,6).
seu próprio governo como comandante da 2) Davi Volta a Jerusalém (19.16-40)
milícia, desde que pudesse reunir um exér
cito desses (20.4,5). Aparentemente, Davi “ Ora, apressou-se Simei, filho de Gêra, benja-
mita, que era de Baurim, e desceu com os homens
era motivado principalmente por fatores de Judá a encontrar-se com o rei Davi; 17e com
políticos, uma vez que Amasa não era ele mil homens de Benjamim, como também Ziba,
parente mais próximo de Davi do que o era servo da casa de Saul, e seus quinze filhos, e seus
Joabe (cf. 8.16; 17.25). Davi empregou vinte servos com ele; desceram apressadamente ao
Jordão adiante do rei, 18atravessando o vau para
termos semelhantes ao reivindicar paren trazer a casa do rei e para fazer o que aprouvesse
tesco com Amasa e com todo o povo de a ele. Quando o rei ia passar o Jordão, Simei, filho
Judá (v. 12,13). de Gêra, se prostrou diante dele, 19e lhe disse: Não
145
me impute meu senhor a minha culpa, e não te 39Havendo, pois, todo o povo passado o Jordão,
lembres do que tão perversamente fez teu servo, e tendo passado também o rei, beijou o rei a Barzilai,
no dia em que o rei meu senhor saiu de Jerusalém; e o abençoou; e este voltou para o seu lugar. 40Da*
não conserve o rei isso no coração. 20Porque eu, li passou o rei a Gilgal, e Quimã com ele; e todo
teu servo, deveras confesso que pequei; por isso o povo de Judã, juntamente com a metade do po
eis que eu sou o primeira, de toda a casa de José, vo de Israel, conduziu o rei.
a descer ao encontro do rei meu senhor.
21Respondeu Abisai, filho de Zeruia, dizendo: Não
há de ser morto Sitnei por haver amaldiçoado ao Embora Davi tivesse recebido um
ungido do Senhor? 22Mas Davi disse: Que tenho convite das tribos tanto do norte quanto
eu convosco, filhos de Zeruia, para que hoje me
sejais adversários? Será morto alguém hoje em do sul para retornar como rei de Israel, o
Israel? pois não sei eu que hoje sou rei sobre Israel? resultado da rebelião de Absalão tinha
23Então disse o rei a Simei: Não morrerás. E o rei demonstrado quão extremamente débil real
lho jurou. 24Também Mefibosete, filho de Saul, mente era seu domínio sobre o trono
desceu a encontrar-se com o rei, e não cuidara dos hebreu. Absalão havia desfrutado amplo,
pés, nem fizera a barba, nem lavara as suas vestes
desde o dia em que o rei saíra até o dia em que embora não universal, apoio popular, e Judá
voltou em paz. BE sucedeu que, vindo ele a Jeru havia estado particularmente relutante em
salém a encontrar-se com o rei, este lhe per fazer Davi retomar o poder. Davi, portanto,
guntou: Por que não foste comigo, Mefibosete? utilizou toda ocasião possível para demons
“ Respondeu ele: Ó rei meu senhor, o meu servo trar sua disposição de perdoar erros
me enganou. Porque o teu servo dizia: Albardarei
um jumento, para nele montar e ir com o rei; pois
passados a fim de que obtivesse apoio para
o teu servo é coxa 27E ele acusou falsamente o teu seu esforço de conservar unido o povo de
servo diante do rei meu senhor; porém o rei meu Deus.
senhor é como um anjo de Deus; faze, pois, o que Ao retornar Davi para Jerusalém, foram
bem te parecer. 28Pois toda a casa de meu pai não ao seu encontro junto ao Jordão represen
era senão de homens dignos de morte diante do
rei meu senhor; contudo, puseste teu servo entre tantes de Israel e Judá, os quais deveriam
os que comem à tua mesa. E que direito mais tenho escoltá-lo de volta à cidade. Algumas
eu de clamar ainda ao rei? 29Ao que lhe respondeu daquelas pessoas que haviam tido parti
o rei: Pbr que falas ainda de teus negócios? Já decidi: cipação destacada em sua fuga da capital
Tu e Ziba reparti as terras. “ Então disse Mefibo
sete ao rei: Deixe que ele tome tudoi, uma vez que
estavam presentes para fazer as pazes com
o rei meu senhor já voltou em paz à sua casa. o rei que retornava.
31Também Barzilai, o gileadita, desceu de Simei, que havia amaldiçoado Davi com
Rogelim, e passou com o rei o Jordão, para tanta desenvoltura enquanto o rei passava
acompanhá-lo até a outra banda do r ia 32E era por Baurim, estava à frente dos benjamitas
Barzilai mui velho, da idade de oitenta anos; e ele para pedir perdão ao rei pela imprudência
tinha provido o rei de viveres enquanto este se demo
rara em Maanaim, pois era homem muito rica que cometera. Tendo a mesma visão vinga
33Disse, pois, o rei a Barzilai: Passa tu comigo e tiva e cruel de seu irmão Joabe, Abisai
eu te sustentarei em Jerusalém, em minha compa sugeriu que Simei fosse executado por sua
nhia. “ Barzilai, porém, respondeu ao rei: Quantos ofensa contra o rei ungido do Senhor. Davi,
anos viverei ainda, para que suba com o rei a Jeru
salém? 35Oitenta anos tenho hoje; poderei eu contudo, repreendeu os filhos de Zeruia e
discernir entre o bom e o mau? poderá o teu servo proclamou uma anistia para comemorar seu
perceber sabor no que comer e beber? poderei eu retorno ao trono. Na verdade, Davi não era
mais ouvir a voz dos cantores e das cantoras? e mais perdoador que Abisai ou Joabe (cf.
por que será o teu servo ainda pesado ao rei meu lRs 2.8,9), mas acreditava que a necessi
senhor? %0 teu servo passará com o rei até um
pouco além do Jordãa Por que me daria o rei tal dade política requeria uma atitude
recompensa? 37Deixa voltar o teu servo, para que conciliadora, pelo menos até que a monar
eu morra na minha cidade^ junto à sepultura de quia conquistasse aceitação mais ampla.
meu pai e de minha mãe. Mas eis ai o teu servo As tensões que freqüentemente eclodiam
Quimã; passe ele com o rei meu senhor, e faze-lhe
o que for do teu agrada 38Ao que disse o rei:
entre Davi e Joabe deviam, em última
Quimã passará comigo, e eu lhe farei o que te análise, remontar a esta controvérsia básica
parecer bem, e tudo quanto me pedires te farei. sobre o tratamento a ser dado aos oponentes
146
do regime de Davi (cf. 3.28,39; 16.10; 19.13; ele algum presente? 43Ao que os homens de Israel
20.6; lRs 2.5,6). responderam aos homens de Judá: Dez partes te
Também entre aqueles que vieram mos no rei; mais temos nós em Davi do que vós.
Por que, pois, fizestes pouca conta de nós? Não
encontrar-se com Davi estava Mefibosete, foi a nossa palavra a primeira, para tornar a tra
filho de Jônatas, que anteriormente havia zer o nosso rei? Porèm a palavra dos homens de
sido acusado de tentar promover suas Judá foi mais forte do que a palavra dos homens
próprias ambições políticas durante a fuga de Israel.
’Ora, sucedeu achar-se ali um homem de Be-
de Davi diante de Absalão (16.1-4). Uma lial, cujo nome era Sebá, filho de Bicri, homem
vez que Davi não tinha meios para discernir de Benjamim, o qual tocou a buzina, e disse: Não
quem estava certo — se Ziba com sua temos parte em Davi, nem herança no filho de
acusação, se Mefibosete com sua contra- Jessé; cada um à sua tenda, ó Israel! 2Então to
dos os homens de Israel se separaram de Davi, e
acusação (v. 26) —, ele decidiu dividir a seguiram a Sebá, filho de Bicri; porém os homens
propriedade de Saul entre ambos. Embora de Judá seguiram ao seu rei desde o Jordão até
possa ter mantido sérias desconfianças Jerusalém.
quanto à correção das ações de Mefibosete
A frágil natureza do reino unido, nessa
durante sua ausência, continuaria fiel a sua
aliança de amizade com Jônatas (ISm altura da história de Israel, revela-se nas
20.42; cf. 2Sm 21.7). queixas triviais que eram suficientes para
precipitar um novo surto de resistência
Ao aproximar-se do Jordão, em sua volta
ao reinado de Davi. Nas festividades que
a Jerusalém, Davi estava chegando ao final acompanharam o retorno de Davi a Jeru
de um dos períodos mais sombrios de sua
salém, os homens de Israel sentiam que a
existência. Havia sido deposto por um filho
tribo de Judá tinha recebido injustamente
rebelde que obtivera apoio de uma porção
considerável do povo de Israel. Mal conse o papel mais destacado. Os laços de pa
guira escapar de Jerusalém para chegar, sem rentesco com Judá estavam tendo o mes
mo peso que o tamanho maior de Israel
provisões, com suas tropas mercenárias ao
planalto além do Jordão. Compreensivel- e a primazia deste em pedir ao rei que
mente, Davi sentia-se profundamente voltasse, e o parentesco venceu o embate.
endividado com seus súditos leais, cujo Essa disputa insignificante sobre ques
apoio material dera-lhe condições de recon tões de protocolo teria acabado sem maio
quistar o trono. O idoso Barzilai simbolizava res problemas, não fora pela presença de
um inflamado benjamita que provavel
aqueles a quem Davi jamais poderia recom
pensar adequadamente e por quem sentia mente esperava alimentar suas próprias
uma obrigação eterna. Os descendentes de ambições monárquicas a expensas de Da
Barzilai iriam, portanto, sempre encontrar vi. Aproveitando-se da proclamação de
pronta aceitação na corte de Israel (lRs 2.7). anistia por Davi, Sebá, filho de Bicri, re
jeitou a liderança de Davi e persuadiu o
contingente israelita a retirar-se da procis
9. Sebá Lidera a Revolta Israelita (19.41 são para Jerusalém. Os da tribo de Judá,
—20.26) contudo, provavelmente acompanhados
por alguns indivíduos das tribos do norte
1) A Desconfiança Provoca a Guerra (cf. Simei, o benjamita, lRs 2.8), conti
(19.41—20.2) nuaram a escoltar Davi rumo à capital.
41Então todos os homens de Israel vieram ter Dez partes temos no rei. As dez tribos
com o rei, e lhe disseram: Por que te furtaram do norte teoricamente experimentavam a
nossos irmãos, os homens de Judá, e fizeram oposição de Judá e Simeão no sul (cf.
passar o Jordão o rei e a sua casa, e todos os comentário sobre ISm 9.1,2). Na realida
seus homens com ele? 42Responderam todos os
homens de Judá aos homens de Israel: Porquanto de, contudo, Simeão não mais existia, e
o rei é nosso parente. Por que vos irais por isso? Judá havia crescido tanto a ponto de in
Acaso temos comido à custa do rei, ou nos deu cluir todo o território ao sul de Benja
147
mim. O sistema ideal de doze tribos esta pois, e cercaram a Sebá em Abel de Bete-Maacá;
va tão firmemente implantando nas men e levantaram contra a cidade um montão, que se
elevou defronte do muro; e todo o povo que estava
tes do povo que conservou-se o número com Joabe batia o muro para derrubá-la 16Então
maior mesmo quando o desaparecimento uma mulher sábia gritou de dentro da cidade: Ou
de uma tribo foi claramente reconhecido vi! ouvi! Dizei a Joabe: Chega-te cá, para que eu
(lRs 11.29-32). Deve-se notar que isso te fale. 17Ele, pois, se chegou perto dela; e a mu
ocorreu muito depois da divisão da tribo lher perguntou: 1b és Joabé? Respondeu ele: Sou.
Ela lhe disse: Ouve as palavras de tua serva. Dis
de José para compensar o desaparecimen se ele: Estou ouvinda '“Então falou ela, dizendo:
to de Levi como uma tribo secular (Gn Antigamente costumava-se dizer: Que se peça
48.1-22; Nm 1.47-54; cf. Dt 33.1-29). conselho em Abel; e era assim que se punha ter
mo às questões. 19Eu sou uma das pacíficas e das
fiéis em Israel; e tu procuras destruir uma cidade
2) Os Homens de Davi Perseguem Sebá que é mãe em Israel; por que, pois, devorarias a
(20.3-22) herança do Senhor? 20Então respondeu Joabe, e
3Quando Davi chegou à sua casa em Jeru disse: Longe, longe de mim que eu tal faça, que
salém, tomou as dez concubinas que deixara para eu devore ou arruine! 21A coisa não é assim; po
guardarem a casa, e as pôs numa casa, sob guar rém um só homem da região montanhosa de
da, e as sustentava; porém não entrou a elas. As Efraim, cujo nome é Sebá, filho de Bicri, levantou
sim estiveram encerradas até o dia da sua morte, a mão contra o rei, contra Davi; entregai-me só
vivendo como viúvas. 4Disse então o rei a Amasa: este, e retirar-me-ei da cidade. E disse a mulher
Convoca-me dentro de três dias os homens de a Joabe: Eis que te será lançada a sua cabeça pelo
Judá, e apresenta-te aqui. sFoi, pois, Amasa para m ura 22A mulher, na sua sabedoria, foi ter com
convocar a Judá, porém demorou-se além do tem todo o povo; e cortaram a cabeça de Sebá, filho
po que o rei lhe designara. 5Então disse Davi a de Bicri, e a lançaram a Joabe. Este, pois, tocou
Abisai: Mais mal agora nos fará Sebá, filho de a buzina, e eles se retiraram da cidade, cada um
Bicri, do que Absalão; toma, pois, tu os servos para sua tenda. E Joabe voltou a Jerusalém, ao
de teu senhor, e persegue-o, para que ele porven rei.
tura não ache para si cidades fortificadas, e nos
escape à nossa vista. 7Então saíram atrás dele os Ao chegar a Jerusalém, Davi agiu ime
homens de Joabe, e os quereteus, e os peleteus, diatamente para esclarecer a situação de
e todos os valentes; saíram de Jerusalém para suas concubinas que haviam sido publica
perseguirem a Sebá, filho de Bicri. 8Quando che mente possuídas por Absalão (16.20-22).
garam à pedra grande que está junto a Gibeão,
Amasa lhes veio ao encontra Estava Joabe cin Davi tomou providências para seu susten
gido do seu traje de guerra que vestira, e sobre to material uma vez que ainda lhe perten
ele um cinto com a espada presa ao seus lombos, ciam, mas isolou-as sob guarda, devido ao
na sua bainha; e, adiantando-se ele, a espada caiu tratamento dado por Absalão. A atitude
da bainha. 9E disse Joabe a Amasa: Vais bem, de Davi não deixa implícito que tivesse
meu irmão? E Joabe, com a mão direita, pegou
a barba de Amasa, para o beijar. 10Amasa, po havido um comportamento impróprio por
rém, não reparou na espada que estava na mão de parte das mulheres, mas, caso o rei tivesse
Joabe; de sorte que este o feriu com ela no ventre, reiniciado as relações conjugais com elas,
derramando-lhe por terra as entranhas, sem feri-lo isso poderia ter sido interpretado politica
segunda vez; e ele morreu. Então Joabe e Abisai,
seu irmão, perseguiram a Sebá, filho de Bicri.
mente (cf. comentário sobre 16.20-22).
"M as um homem dentre os servos de Joabe fi Uma vez que Davi negou qualquer legiti
cou junto a Amasa, e dizia: Quem favorece a Joa midade ao breve reinado de Absalão, cum
be, e quem é por Davi, siga a Joabe. 12E Amasa priu suas responsabilidades para com suas
se revolvia no seu sangue no meio do caminha E concubinas, mas evitou maiores contatos
aquele homem, vendo que todo o povo parava,
removeu Amasa do caminho para o campo, e lan com elas.
çou sobre ele um manto, porque viu que todo Conquanto a fuga de Sebá com cerca
aquele que chegava ao pé dele parava. l3Mas re de mil correligionários (19.17 e s.) não re
movido Amasa do caminho, todos os homens se presentasse uma ameaça militar imediata,
guiram a Joabe, para perseguirem a Sebá, filho
de Bicri. 14Então Sebá passou por todas as tribos Davi sabia muito bem que, com o tempo,
de Israel até Abel e Bete-Maacá; e todos os beri- um rebelde podia obter apoio suficiente
tas, ajuntando-se, também o seguiram. I5Vieram, para ser bastante problemático. Ele, por-
148
tanto, concedeu a Amasa, seu antigo ini no que Joabe encontrou retribuição para
migo, somente três dias para retornar com sua excessiva crueldade e brutalidade
a milícia judaica. Quando Amasa deixou (lRs 2.31,32).
de retornar dentro do tempo determinado, As forças de Davi, unidas agora sob o
Davi sentiu que não podia esperar mais. comando de Joabe, avançaram rumo ao
Desfazendo-se de todas as forças de reser norte, mantendo Sebá em movimento até
va e de proteção pessoal, Davi despachou que procurou refugiar-se em Abel de Bete-
suas fiéis tropas mercenárias e soldados -Maacá, cerca de oito quilômetros a oeste
profissionais para irem atrás de Sebá antes de Dã. É possível que uma desanimadora
que ele ganhasse apoio decisivo. reação à sua convocação para a guerra
Enquanto as tropas de Davi partiam em tenha forçado Sebá a percorrer todo o ca
busca de Sebá, a posição do rei ficara mui minho em retirada até a fronteira de Israel,
to precária. Não só estava ele se deparando ou talvez tenha tido a esperança de obter
com uma insurreição dentro das tribos do apoio dos estados arameus vizinhos, que
norte, mas também só conseguia exercer anteriormente haviam se oposto a Davi
um controle parcial sobre suas próprias (10.6-8; 13.37-39). Seja como for, cometeu
forças. Após o fracasso da rebelião de um sério erro tático que lhe custou a vida
Absalão, Davi havia reorganizado sua es (cf. comentário sobre ISm 23.1-14 e 2Sm
trutura militar. Como resultado da insu 15.13-23). Em vez de ocultar-se no campo
bordinação de Joabe no bosque de Efraim aberto ou de deixar o território israelita até
(18.9-15), Davi havia procurado restringir ter força suficiente para retornar, Sebá
seu poder e influência. Amasa fora posto buscou a segurança numa cidade fortifi
à frente da milícia (cf. comentário sobre cada. Joabe, então, cercou a cidade e co
19.13); e agora, na campanha contra Sebá, meçou a preparar-se para destruir seus
Abisai, irmão de Joabe, recebera o coman muros.
do dos soldados profissionais de Davi (v. Quando a sorte inevitável de Abel tor-
6,7). Joabe, embora continuamente leal a nou-se evidente, uma mulher local, conhe
Davi, tinha o temperamento forte demais cida por sua sabedoria, negociou uma
para aceitar essas mudanças sem resis anistia par a cidade em troca da vida de
tência. Sebá. Quando a cabeça de Sebá foi, sem
A campanha contra Sebá mal estava qualquer cerimônia, atirada por sobre o
em andamento quando Joabe agiu rápida muro, chegou ao fim a última séria amea
e traiçoeiramente para tomar o controle ça ao trono de Davi.
da expedição. Quando Amasa chegou a Joabe permaneceu um fator importante
Gibeão, trazendo um tanto tardiamente a a ser levado em conta, mas aparentemente
milícia de Judá, foi ardilosamente assassi não tinha ambições pessoais de empunhar
nado. Como nas ocasiões anteriores, nos a coroa. Conquanto Davi tivesse muitas
casos de Abner e Absalão, Joabe agiu razões para desaprovar as táticas de seu
sozinho e com profunda brutalidade para general, nunca teve motivos para duvidar
eliminar seu oponente. A despreparada de sua lealdade. Ao retornar a Jerusalém
milícia judaica, tendo pouquíssimo ou ne com o controle de todas as forças militares
nhum sentimento de lealdade pessoal por de Israel, Joabe era o governante de facto
seu líder, mal teve tempo para uma pausa sobre a nação. Não obstante, permaneceu
antes de unir forças com o assassino de fiel a Davi, que aguardava na capital sem
Amasa (v. 11-13). Joabe emergiu como um mesmo ter a proteção de suas tropas mer
comandante militar de tal força que Davi cenárias. Sem dúvida, Joabe teria enfren
foi incapaz de tomar quaisquer outras tado considerável resistência dentro do
medidas contra ele. Não foi senão algum exército caso se lançasse contra Davi, mas
tempo após a ascensão de Salomão ao tro por certo ninguém jamais tivera melhor
149
oportunidade de assumir o controle do no final do reinado de Davi. Joabe havia
governo de Israel. reconquistado seu papel como líder militar
Davi havia sobrevivido a muitas crises de Israel a despeito de seu rebaixamento
graves, e o caminho ainda estava aberto logo após ter assassinado Absalão e de
para um cumprimento da profecia de Natã suas repetidas divergências com Davi.
(7.12-16), mas a questão básica permanecia Benaías era ainda o comandante do sempre
sem resposta. Até o momento, Davi não importante exército profissional, que cons
fizera qualquer movimento para designar tituía o principal esteio do poder de Davi.
seu sucessor, e postergaria essa decisão até A única mudança de maior conse
bem o fim de sua vida (IReis 1; 2). qüência está na inclusão de Adorão como
Para que ele porventura não ache para supervisor de um batalhão de trabalhos
si cidades fortificadas, e nos escape. Ou forçados. O emprego de trabalho escravo
Davi julgava que Sebá tinha mais apoio do em projetos da coroa pode ter tido início
que era realmente o caso, ou estava empre numa tentativa de explorar os serviços
gando um estratagema para levar seu ini de estrangeiros capturados em batalha
migo a um erro tático. Davi sabia que uma (12.31). Não obstante, com o tempo Ado
pequena força deve evitar a tentação de rão (Adonirão em lRs 5.13,14) comanda
esconder-se por detrás dos muros de uma ria 30.000 israelitas natos que foram con
cidade (cf. comentário sobre 15.13-23), vocados para servir nos projetos de cons
mas aparentemente Sebá não o sabia. trução de Salomão. Adorão tornou-se tão
E todos os beritas, ajuntando-se, tam identificado com esse aspecto detestado da
bém o seguiram. Tal como está, o texto monarquia de Israel que foi apedrejado até
hebraico deste versículo está repleto de a morte quando o reino se dividiu sob
problemas. Há muitas leituras possíveis, e Roboãó (lRs 12.18). O sistema de traba
esta, preferivelmente à IBB, encaixa-se lhos forçados não havia crescido a tais
bem no contexto; “Então Sebá passou por proporções sob Davi, mas ele introduziu
todas as tribos de Israel até Abel de Bete- esse significativo desvio dos processos
-Maacá; e todos os bicritas ajuntaram-se democráticos existentes sob a velha estru
e o seguiram.” Em lugar de desfrutar o tura tribal de Israel.
apoio de todo Israel, Sebá havia atraí
do somente seus próprios parentes para V. Anexos (21.1—24.25)
segui-lo.
Antigamente costumava-se dizer. A 1. Gibeonitas Executam os Filhos de Saul
partir do texto hebraico é impossível res (21.1-14)
gatar a natureza do antigo provérbio sobre
‘Nos dias de Davi houve uma fome de três
Abel. anos consecutivos; pelo que Davi consultou ao
Senhor; e o Senhor lhe disse: É por causa de Saul
3) Relação dos Líderes de Davi (20.23-26) e da sua casa sanguinária, porque matou os gibe-
onitas. 2Então o rei chamou os gibeonitas e falou
23Ora, Joabe estava sobre todo o exército de com eles (ora, os gibeonitas não eram do filhos de
Israel; e Benaías, filho de Jeoiada, sobre os quere- Israel, mas do restante dos amorreus; e os filhos
teus e os peleteus; 24e Adorão sobre a gente de de Israel tinham feito pacto com eles; porém Saul,
trabalhos forçados; Jeosafá, filho dé Ailude, era no seu zelo pelos filhos de Israel e de Judá, pro
cronista; 25Seva era escrivão; Zadoque e Abiatar, curou feri-los); 3perguntou, pois, Davi aos gibeo
sacerdotes; 26e Ira, o jairita, era o oficial-mor de nitas: Que quereis que eu vos faça? e como hei de
Davi. fazer expiaçãoi, para que abençoeis a herança do
Senhor? 4Então os gibeonitas lhe disseram: Não
Esta lista de oficiais na corte de Davi é por prata nem ouro que temos questão com Saul
e com a sua casa; nem tampouco cabe a nós matar
é bastante semelhante à encontrada em pessoa alguma em Israel. Disse-lhes Davi: Que
8.15-18. A atual relação serve como um quereis que vos faça? 5Responderam ao rei:
comentário sobre a natureza da monarquia Quanto ao homem que nos consumia, e procurava
150
destruir-nos, de modo que não pudéssemos subsis do Davi por ataques aos descendentes de
tir em termo algum de Israel, 6de seus filhos se Saul (16.5-14), ele é aqui retratado sob uma
nos dêem sete homens, para que os enforquemos
ao Senhor em Gibeá de Saul, o eleito do Senhor. ótica bastante favorável. Caso seu envolvi
E o rei disse: Eu os darei. 70 rei, porém, poupou mento no episódio tivesse sido motivado
a Mefibosete, filho de Jônatas, filho de Saul, por politicamente, dificilmente teria ignorado
causa do juramento do Senhor que entre eles o filho de Jônatas para atacar o filho de
houvera, isto é, entre Davi e Jônatas, filho de
Saul. 8Mas o rei tomou os dois filhos de Rizpa,
uma concubina ou os filhos das filhas de
filha de Aias, que ela tivera de Saul, a saber, a Saul.
Armoni e a Mefibosete, como também os cinco A queixa dos gibeonitas derivava do
filhos de Merabe, filha de Saul, que ela tivera de ataque de Saul contra eles, uma violação
Adriel, filho de Barzilai, meolatita, 9e os entre
gou na mão dos gibeonitas, os quais os enforcaram da aliança de seus ancestrais com Israel
no monte, perante o senhor; e os sete caíram todos durante a conquista (v. 2,5; cf. Js 9.15,19).
juntos. Foi nos primeiros dias da sega que foram Ele provavelmente havia suspeitado de eles
mortos, no principio da sega da cevada. 10Então e outras populações estrangeiras dentro de
Rizpa, filha de Aias, tomando um pano de cilicio,
estendeu-o para si sobre uma pedra e, desde o Israel colaborarem com os filisteus. Como
principio da sega até que a água caiu do céu sobre membros de uma minoria estrangeira
os corpos, não deixou que se aproximassem deles dentro de Israel, os gibeonitas não tinham
as aves do céu de dia, nem os animais do campo direitos e não estavam em posição de
de noite. uQuando foi anunciado a Davi o que iniciar uma inimizade de morte para pro-
fizera Rizpa, filha de Aias, concubina de Saul,
l2ele foi e tomou os ossos de Saul e os de Jônatas tegerem-se. Saul, contudo, havia quebrado
seu filho, aos homens de Jabes-Gileade, que os uma aliança solene firmada sob a égide do
haviam furtado da praça de Bete-Sã, onde os filis Senhor. Em tais casos, entendia-se que
teus os tinham pendurado quando mataram a Saul havia um envolvimento da honra de Deus
em Gilboa; 13e trouxe dali os ossos de Saul e os
de Jônatas seu filho; e ajuntaram a eles também em trazer a parte culpada a juízo. De
os ossos dos enforcados. 14Enterraram os ossos acordo com a compreensão que os hebreus
de Saul e de Jônatas seu filho, na terra de Ben tinham da responsabilidade coletiva, a
jamim, em Zela, na sepultura de Quis, seu pai; e família inteira de Saul, aliás, todo o Israel,
fizeram tudo o que o rei ordenara. Depois disto tinha uma parcela de responsabilidade na
Deus se aplacou para com a terra.
culpa de Saul (Js 7; cf. comentário sobre
ISm 2.27-36).
Este capítulo introduz uma série de Quando Davi buscou uma explicação
materiais não diretamente relacionados divina para uma fome particularmente
com o tema da seção precedente (cap. severa que havia afligido a terra, a violação
9—20), que dizia respeito à sucessão ao por Saul da aliança de Israel com os gibe
trono de Davi. Os incidentes que se se onitas foi trazida à lembrança (cf. comen
guem estão em ordem aleatória, e deve-se tário sobre ISm 5.6-12 e 2Sm 14.24-46).
determinar individualmente o contexto Embora a expiação da culpa com paga
específico de cada um. Alguns dos mate mento de dinheiro de resgate fosse possível
riais obviamente remontam aos dias de sob certas circunstâncias (Ex 21.20), neste
Davi como fugitivo (cf. 23.13 e s.). A caso os gibeonitas recusaram-se a aceitar
conclusão da Narrativa da Sucessão está isso. Em consonância com a lei da retalia
associada com o início do reinado de Sa ção (Ex 21.14; Lv 24.20), exigiram pena
lomão (lRs 1; 2), de acordo com os prin capital para membros que representassem
cípios discutidos na Introdução (V, 2). a família de Saul. Os gibeonitas provavel
Este relato do conflito entre os gibeo mente expuseram os cadáveres dos des
nitas e a casa de Saul está só indiretamente cendentes de Saul como uma lembrança
relacionado com as histórias das dificul de que qualquer que violasse o tratado de
dades dinásticas de Davi. Conquanto Israel com Gibeom sofreria sorte seme
pareça que algumas pessoas tenham culpa lhante nas mãos do Senhor.
151
Quando as execuções tiveram lugar no obviamente reunidos por serem descrições
início da colheita de cevada (por volta de que revelam um interesse comum em vi
meados de abril), Rizpa, concubina de tórias israelitas sobre os gigantes filis
Saul e mãe de dois dos jovens, iniciou uma teus. Somente um relato chega a dedicar
vigília para proteger os corpos de serem alguma atenção, mesmo que pequena, às
atacados por animais de rapina. Sua circunstâncias em torno da ação, de modo
heróica vigília, que pode ter durado até o que é impossível falar com certeza da
princípio do outono, sem dúvida despertou natureza das guerras. Muitos comentaris
a imaginação e a simpatia de todo o Israel. tas associam essas disputas com as guerras
Com a atenção do povo voltada para o filistéias que se seguiram à reunificação de
acontecimento, Davi reconheceu naquilo Israel e Judá por Davi sob uma só coroa
uma oportunidade para dissociar-se de (5.17) e s.). Inerentemente, não há nada
qualquer responsabilidade por aquelas improvável num reinicio do conflito filis
mortes. Ele, portanto, trouxe os ossos de teu mais tarde no reinado de Davi. Na
Saul e Jônatas de Jabe-Gileade para tornar realidade, a desintegração da autoridade
a sepultá-los no túmulo da família de Saul. central após as rebeliões de Absalão e Sebá
Quando as chuvas de outono chegaram a quase certamente atraíram ataques agres
seu tempo, simbolizando um retorno do sivos pelos vizinhos de Israel. Os interesses
favor do Senhor, Davi reuniu os restos dos e o escopo restritos das narrativas bíblicas
jovens, dando-lhes um sepultamento hon não nos permitem, contudo, reconstruir os
roso entre seu próprio povo em Benjamim. detalhes deste período do reinado de Davi.
A localização de Zela é desconhecida. O primeiro gigante foi morto por
Abisai, que veio em socorro de Davi quan
2. Os Filisteus Voltam a Guerrear do este se fatigava numa batalha contra os
(21.15-22) filisteus. Os homens de Davi, que se preo
15De novo tiveram os filisteus uma guerra
cupavam por sua segurança, e pelo futuro
contra Israel. E desceu Davi, e com ele os seus de Israel, requereram que ele deixasse
servos; e tanto pelejaram contra os filisteus, que de acompanhar suas tropas às batalhas
Davi se cansou. 16E Isbi-Benobe, que era dos (cf. 18.3). É interessante que o autor de
filhos do gigante, cuja lança tinha o peso de Crônicas omitiu essa admissão de fragili
trezentos siclos de bronze, e que cingia uma
espada nova, intentou matar Davi. 17Porém, dade humana da parte de Davi, ao passo
Abisai, filho de Zeruia, o socorreu; e, ferindo ao que incluiu as três histórias seguintes
filisteu, o matou. Então os homens de Davi lhe de vitórias sobre os gigantes filisteus
juraram, dizendo: Nunca mais sairás conosco à (lCr 20.4-8).
batalha, para que não apagues a lâmpada de
Israel. 18Aconteceu depois disto que houve em O autor de Crônicas, todavia, aparente
Gobe ainda outra peleja contra os filisteus; então mente sentia haver um problema no relato
Sibecai, o husatita, matou Safe, que era dos filhos da morte de Golias, o giteu, nas mãos de
do gigante. 19Houve mais outra peleja contra os El-Hanã, o belemita (cf. comentário sobre
filisteus em Gobe; e El-Hanã, filho de Jaaré-
Oregim, o belemita, matou Golias, o giteu, de cuja ISm 17.1-11). De qualquer modo, a pas
lança a haste era como órgão de tecelão. 20Houve sagem em Crônicas não dá lugar a con
ainda também outra peleja em Gate, onde estava fusão com as façanhas anteriores de Davi
um homem de alta estatura, que tinha seis dedos uma vez que o texto difere considera-
em cada mão, e seis em cada pé, vinte e quatro por
todos; também este era descendente do gigante.
valmente do que consta em Samuel:
21Tendo ele desafiado a Israel, Jônatas, filho de “El-Hanã, filho de Jair, feriu Lami, irmão
Simei, irmão de Davi, o matou. 22Estes quatro de Golias, o giteu, cuja lança tinha a haste
nasceram ao gigante em Gate; e caíram pela mão como órgão de tecelão” (lCr 20.5).
de Davi e pela mão de seus servos.
Em Gobe ainda outra peleja contra os
Esses breves comentários de um rei filisteus. Gobe não é citada em qualquer
nicio de guerra com os filisteus foram outra passagem do Antigo Testamento, e
152
sua localização não é mais conhecida. O raios, e os desbaratou.
relato de Crônicas paralelo a este situa a 16Então apareceram as profundezas do mar;
ação como tendo ocorrido em Gezer os fundamentos do mundo se descobriram,
(lCr 20.4). pela repreensão do Senhor,
pelo assopro do vento das suas narinas.
Então Sibecai, o husatita, matou Safe. I7Estendeu do alto a sua mão e tomou-me;
Sibecai foi um dos homens poderosos de tirou-me das muitas' águas.
Davi (lCr 11.29; mas cf. 2Sm 23.27). Ele 18Livrou-me do meu possante inimigo,
e daqueles que me odiavam;
comandava um contingente de 24.000 porque eram fortes demais para mim.
homens na divisão da milícia que ser 19Encontraram-me no dia da minha calamidade;,
via durante o oitavo mês de cada ano porém o Senhor se fez o meu esteia
(lCr 27.11). Os husatitas parecem ter sido 20Conduziu-me para um lugar espaçoso;
livrou-me, porque tinha prazer em mim.
originários de Judá, de um lugar próximo 21Recompensou-me o Senhor conforme a minha
de Belém (lCr 4.4). justiça;
conforme a pureza de minhas mãos me
retribuiu.
3. Cântico de Ação de Graças de Davi 22Porque guardei os caminhos do Senhor,
(22.1-51) e não me apartei impiamente do meu
Deus.
23Pois todos os seus preceitos estavam diante de
‘Davi dirigiu ao Senhor as palavras deste cântico, mim,
no dia em que o Senhor o livrou das mãos de todos e dos seus estatutos não me desviei.
os seus inimigos e das mãos de Saul, dizendo: “ Fui perfeito para com ele,
20 Senhor é o meu rochedo, a minha fortaleza e guardei-me da minha iniqüidade.
e o meu libertador. 25Por isso me retribuiu o Senhor conforme a
3É meu Deus, a minha rocha, nele confiarei; minha justiça, conforme a minha pureza
é o meu escudo, e a força da minha diante dos seus olhos.
salvação, “ Para com o benigno te mostras benigno;
o meu alto retiro, e o meu refugia para com o perfeito te mostras perfeito,
Ó meu Salvador! da violência tu me livras. 27Para com o puro te mostras puro,
4Ao Senhor invocarei, pois é digno de louvor; mas para com o perverso te mostras
assim serei salvo dos meus inimigos. avessa
5As ondas da morte me cercaram, “ Livrarás o povo que se humilha,
as torrentes de Belial me atemorizaram. mas teus olhos são contra os altivos, e tu
‘Cordas do Seol me cingiram, os abaterás.
laços de morte me envolveram. 29Porque tu, Senhor, és a minha candeia;
7N a minha angústia invoquei ao Senhor; e o Senhor alumiará as minhas trevas.
sim, a meu Deus clamei; “ Pois contigo passarei pelo meio dum esqua
do seu templo ouviu ele a minha voz, drão;
e o meu damor chegou aos seus ouvidos. com o meu Deus transporei um mura
8Então se abalou e tremeu a terra, 31Quanto a Deus, o seu caminho é perfeito,
os fundamentos dos céus se moveram; e a palavra do Senhor é fiel;
abalaram-se porque ele se irou. é ele o escudo de todos os que nele se
’Das suas narinas saiu fumaça, refugiam.
e da sua boca um fogo devorador, 32Pois quem é Deus, senão o Senhor?
que pôs carvões em chamas. e quem é rocha, senão o nosso Deus?
10Ele abaixou os céus, e desceu; 33Deus é a minha grande fortaleza;
e havia escuridão debaixo de seus pés. e ele torna perfeito o meu caminha
nMontou num querubim, e voou; MFaz ele os meus pés como os das gazelas,
apareceu sobre as asas do venta e me põe sobre as minhas alturas.
12E por tendas pôs trevas ao redor de si, 35Ele instrui as minhas mãos para a peleja,
ajuntamento de nuvens, espessas nuvens do de modo que os meus braços podem
céu. entesar um arco de bronze.
13Pelo resplendor da sua presença acenderam-se “ Também me deste o escudo da tua salvação,
brasas de foga e tua brandura me engrandece.
14Do céu trovejou o Senhor, 37Alargaste os meus passos debaixo de mim,
o Altíssimo fez soar a sua voz. e não vacilaram os meus artelhos.
15Disparou flechas, e os dissipou; ^Persegui os meus inimigos e os destruí,
153
e nunca voltei atrás sem que os consu experiências de toda sua vida parecem ter
misse. sido empregadas para o desenvolvimento
39Eu os consumi, e os atravessei, de modo que
nunca mais se levantaram;
de formas literárias que serviram para
sim, caíram debaixo dos meus pês. expressar todos os sentimentos de gratidão
‘"’Pois tu me cingiste de força para a peleja; e louvor dos homens. Uma análise deta
prostraste debaixo de mim os que se levan lhada do contexto e da estrutura do poema
taram contra mim. será considerada no volume que trata do
41Fizeste que me voltassem as costas os meus
inimigos, Saltério, mas umas poucas palavas sobre
aqueles que me odiavam, para que eu os seu papel nas atuais narrativas estão em
destruísse. ordem a esta altura.
"Olharam ao redor, mas não houve quem os
salvasse; O cântico destina-se explicitamente a
clamaram ao Senhor, mas ele não lhes celebrar o livramento de Davi de sob Saul
respondeu. e outros inimigos não identificados. De fato,
"Então os moi como o pó da terra; as comparações do Senhor com uma rocha
como a lama das ruas os trilhei e dissipei. (v. 2,3,32,47), uma fortaleza (v. 2), um
““Também me livraste das contendas do meu
povo; escudo (v. 3) e uma grande fortaleza, isto
guardaste-me para ser o cabeça das é, um refúgio (v. 33), sugerem as experiên
nações; cias de Davi como fugitivo do ciúme
um povo que eu não conhecia me serviu. irracional de Saul. De igual maneira, a preo
45Estrangeiros, com adulação, se submeteram a
mim; cupação pessimista de Davi quanto ao seu
ao ouvirem de mim, me obedeceram. futuro logo antes de seu exílio entre os filis
‘‘‘Os estrangeiros desfaleceram teus (ISm 27.1) se harmonizaria bem com
e, tremendo, saíram dos seus esconderijos. as condições extremas do salmista, descritas
470 Senhor vive; bendita seja a minha rocha,
e exaltado seja Deus, a rocha da minha
no versículos 5 e 6.
salvação, Por outro lado, o salmo também parece
‘“o Deus que me deu vingança, tratar de condições que surgiram num
e sujeitou povos debaixo de mim, período bem posterior da vida de Davi. O
49e me tirou dentre os meus inimigos;
porque tu me exaltaste sobre os meus êxito dele na formação de um império a
adversários; expensas de seus vizinhos pode estar refle
tu me livraste do homem violenta tido na subserviência obsequiosa que os
50Por isso, ó Senhor, louvar-te-ei entre as estrangeiros lhe devotavam (v. 44-46). Seme
nações, lhantemente, as vitórias de Davi nas várias
e entoarei louvores ao teu nome.
5>Ele dá grande livramento a seu rei, guerras civis dirigidas contra ele parecem
e usa de benignidade para com o seu estar aqui sugeridas. Desse modo, ele foi
ungido, livrado de conflitos com seu próprio povo.
para com Davi e a sua descendência para Seus inimigos apelaram ao Senhor, mas ele
sempre.
rejeitou seus apelos (v. 42). A referência à
fuga de Davi de diante de inimigos que lhe
Uma versão ligeiramente modificada eram demasiado fortes (v. 18) é sugestiva
deste poema é também encontrada no livro de sua posição precária durante a rebelião
de Salmos (cap. 18). Um título em ambos de Absalão, mas as circunstâncias são vagas
os casos associa o cântico com Davi, e demais para estabelecer uma relação entre
parece não haver argumentos internos rele
ambos os eventos.
vantes contra tal relação.38 Não obstante,
o escopo de salmo é amplo demais para Alguns versículos dentro do poema,
permitir uma identificação com qualquer contudo, não parecem ajustar-se às conhe
período específico da vida de Davi. De fato, cidas condições da vida de Davi. O salmista,
por exemplo, parece considerar as bênçãos
38 Mitchell D ahood, Psalms / ( “The A nchor Bible”. (Garden City, New
e livramentos do Senhor como o resultado
York: Doubleday, 1965]), p. 104. de sua própria bondade (v. 21-31). Ele alega
154
ter mãos limpas (v. 21) e uma consciência tanto, enquanto reconhecia-se que a proeza
limpa de transgressões contra a lei de Deus e habilidade física com armas desempe
(v. 23). Tais declarações dificilmente nhavam um importante papel no resultado
parecem apropriadas para alguém que se da batalha, o Senhor era visto como a fonte
sentiu forçado a cometer assassinato a fim mesma dessas artes seculares (v. 34-43).
de acobertar sua infidelidade marital (cap. Assim, Deus estava operando na história
11). para cumprir sua promessa de uma
À primeira vista esses versículos não se linhagem duradoura para Davi sobre o
aplicariam verdadeiramente a qualquer trono de Israel (v. 51; cf. 7.1-29).
homem, certamente não a Davi. São,
porém, o desenvolvimento de uma teologia 4. As Últimas Palavras de Davi (23.1-7)
que sustentava que o Deus justo de Israel ‘São estas as últimas palavras de Davi:
sempre recompensava o bem e punia o mal Diz Davi, filho de Jessê,
neste m undo. Os repetidos livramentos de diz o homem que foi exaltado,
Davi foram, portanto, tidos como prova o ungido do Deus de Jacó,
aparente de que havia agradado a Deus. o suave salmista de Israel:
20 Espirito do Senhor fala por mim,
Mesmo assim, a alegação do salmista é e a sua palavra está na minha língua.
exagerada; mas este pode ser o resultado 3Falou o Deus de Israel,
da freqüente indulgência no Oriente Antigo a Rocha de Israel me disse:
quanto ao uso de hipérbole. Na realidade, Quando um justo governa sobre os homens,
quando governa no temor de Deus,
o próprio salmista parece estar ciente dos 4será como a luz da manhã ao sair do sol,
perigos de pensar o homem mais elevada da manhã sem nuvens,
mente de si mesmo do que deveria (v. 28). quando, depois da chuva, pelo resplendor do
O Senhor, portanto, era visto como o liber sol, a erva brota da terra.
tador do humilde que se submetesse à sua 5Pois não ê assim a minha casa para com
Deus?
direção, mas como um juiz severo para com Porque estabeleceu comigo um pacto
o exaltado que resistisse a suas ordens. eterno,
Vistos sob esta luz, tais versículos podem e tudo bem ordenado e seguro;
ainda ser tomados como um desdobra pois não fará ele prosperar toda a minha
salvação e todo o meu desejo?
mento da experiência de Davi, pois estava 6Porém os ímpios todos serão como os espi
nptavelmente disposto a confessar a sua nhos, que se lançam fora,
culpa quando fora levado a reconhecê-la porque não se pode tocar neles;
(ISm 25.32; 2Sm 12.13). 7mas qualquer que os tocar
se armará de ferro e da haste de uma
O tema de todo o salmo é sumariado lança;
nos dois versículos finais, em que o Senhor e a fogo serão totalmente queimados no
é louvado como o poder efetivo por detrás mesmo lugar.
de todos os êxitos de Davi. Quer explícita,
quer implícita, uma consciência da provi Este breve salmo é de capital importância
dência divina é subjacente a toda a no estudo do papel ideal do rei no pensa
narrativa, desde a unção de Davi às mãos mento do Israel antigo. As idéias aqui
de Samuel até sua vitória sobre Sebá e seus expressas têm relação com as encontradas
seguidores. O salmista fala da intervenção no discurso de despedida de Samuel (cf.
do Senhor em seu favor em termos de uma especialmente ISm 12.14,15), e na profecia
teofania divina em que Deus aparece caval de Natã (2Sm 7.1-17), mas vão além. A loca
gando sobre uma tempestade para dispersar lização do cântico no final da carreira de
seus inimigos (v. 8-16). Tal linguagem figu Davi parece modelar-se segundo os
rada era comum no mundo antigo (cf. Is discursos de “bênçãos” ou despedida dos
19.1 e SI 104.3 e ss.), mas não excluía uma grandes líderes anteriores de Israel (Jacó,
visão mais mundana do êxito militar. Entre Gn 49; Moisés, Dt 33; Samuel, ISm 12;
155
cf. também a obra posterior O Testemunho Joabe, filho de Zeruia, era chefe dos trinta; e este
dos Doze Patriarcas). 39 alçou a sua lança contra trezentos, e os matou, e
Nestes versículos, o papel sacro do rei tinha nome entre os três. 19Porventura não era este
o mais nobre dentre os trinta? portanto se tornou
emerge bem claramente. Ele fora exaltado o chefe deles; porém aos primeiros três não chegou.
e separado pelo Senhor, e seus pronuncia 20Iambém Benaías, filho de Jeoiada, filho dum
mentos tinham a chancela divina. Quando homem de Cabzeel, valoroso e de grandes feitos,
o rei governava conforme a liderança de matou os dois filhos de Ariel de Moabe; depois
desceu, e matou um leão dentro duma cova, no
Deus, conduzia toda a nação a um relacio tempo da neve. 21M atou também um egípcio,
namento correto com o Senhor. Trazia homem de temível aspecto; tinha este uma lança
prosperidade ao seu povo da mesma forma na mão, mas Benaías desceu a ele com um cajado,
como o sol e a chuva trazem fertilidade ao arrancou-lhe da mão a lança, e com ela o matou.
22Estas coisas fez Benaías, filho de Jeoiada, pelo
solo. Sendo a própria escolha de Deus para que teve nome entre os três valentes. “ Dentre os
o trono, Davi recebeu a promessa de uma trinta ele era o mais afamado, porém aos três
linhagem duradoura (cf. 7.11-14), ao passo primeiros não chegou. Mas Davi o pôs sobre os
que era certa a destruição final do usur seus guardas. MAsael, irmão de Joabe, era uni dos
pador, muito embora este fosse trinta; El-Hanã, filho de Dodó, de Belém; 25Samá,
o harodita; Elica, o harodita; “ Helez, o paltita;
potencialmente perigoso (cf. ISm 12.15). Ira, filho de Iques, o tecoíta; 27Abiezer, o anatotita;
Mebunai, o husatita; “ Zalmom, o aoíta; Maarai,
5. Relação dos “Valentes” de Davi (23.8-39) o netofatita; 29Helebe, filho de Baaná, o netofatita;
Itai, filho de Ribai, de Gibeá dos filhos de Benjamim;
8São estes os nomes dos valentes de Davi: “ Benaías, o piratonita; Hidai, das torrentes de
Josebe-Bassebete, o taquemonita; era este principal Gaás; 31Abi-Albom, o arbatita; Azmavete, o baru-
dos três; foi ele que, com a lança, matou oitocentos mita; 32Eliabá, o saalbonita; Bene-Jásen; e
de uma vez. 9Depois dele Eleazar, filho de Dodó, Jônatas; "Samá, o hararita; Aião, filho de Sarar,
filho de Aoí, um dos três valentes que estavam com o hararita; 34Elifelete, filho de Acasbai, filho do
Davi, quando desafiaram os filisteus que se haviam maacatita; Eliã, filho de Aitofel, o gilonita;
reunido para a peleja, enquanto os homens de Israel 3SHezrai, o carmelita;Paarai, o arbita; %Igal, filho
se retiravam. 10Este se levantou, e feriu os filisteus, de Natã, de Zobá; Bani, o gadita; "Zeleque, o
até lhe cansar a mão e ficar pegada à espada; e amonita; Naarai, o beerotita, o que trazia as armas
naquele dia o Senhor operou um grande livramento; de Joabe, filho de Zeruia; wIra, o itrita; Garebe,
e o povo voltou para junto de Eleazar, somente para o itrita; 39Urias, o heteu; trinta e sete ao toda
tomar o despoja "Depois dele era Samá, filho de
Agé, o hararita. Os filisteus se haviam ajuntado
em Lei, onde havia um terreno cheio de lentilhas;
e o povo fugiu de diante dos filisteus. 12Samá, A inclusão das façanhas e dos nomes
porém, pondo-se no meio daquele terrenoi, defendeu- dos soldados mercenários mais importantes
-o e matou os filisteus, e o Senhor efetuou um grande de Davi está em consonância com a
livramento. ,3Também três dos trinta cabeças importância do papel que o grupo desem
desceram, no tempo da sega e foram ter com Davi,
à caverna de Adulão; e a tropa dos filisteus acam penhou no reinado de Davi. Nos dias dos
para no vale de Rafaim. 1JDavi estava então no juizes e mesmo sob o governo de Saul, o
lugar forte, e a guarnição dos filisteus estava em poder israelita tinha se baseado sobretudo
Belém. 15E Davi, com saudade, exclamou: Quem na milícia, que era reunida somente em
me dera beber da água da cisterna que está junto
à porta de Belém! 16Então aqueles três valentes
casos de emergência. O exército freqüente
romperam pelo arraial dos filisteus, tiraram água mente experimentava uma deficiência de
da cisterna que está junto à porta de Belém, e a contingente, uma vez que o governo central
trouxeram a Davi; porém ele não quis bebê-la, mas carecia de um meio para impor uma
derramou-a perante o Senhor; 17e disse: Longe de convocação às armas. Saul havia começado
mim, ó Senhor, que eu tal faça! Beberia eu o sangue
dos homens que foram com risco das suas vidas? a reunir os mais promissores guerreiros de
De maneira que não a quis- beber. Isto fizeram Israel em torno de si como um núcleo de
aqueles três valentes. 18Ora, Abisai, irmão de líderes militares profissionais (ISm 14.52),
mas foi somente com Davi que ocorreu um
39 Aubrey R. Johnson, Sacral K ingship in A n c ien t Israel, segunda
afastamento maior dessa antiga prática
edição (Cardiff: University of Wales Press, 1967), p. 16-19. tribal.
156
O primeiro grupo de soldados profissio durante o ataque dos filisteus a Davi após
nais de Davi não era do mais alto gabarito ele ter-se tornado rei sobre todo o Israel
(ISm 22.2), mas proporcionou-lhe um meio (5.17-25). O grupo principal dos filisteus
de proteção contra os intentos assassinos estava acampado no vale de Refaim, perto
de Saul. Após Saul e Jônatas serem mortos de Jerusalém, e uma guarnição menor
em batalha no Monte Gilboa, o exército ocupava Belém. Três Soldados não identi
pessoal de Davi provavelmente teve bastante ficados do exército de Davi, que estava perto
influência na decisão de Judá em elegê-lo de Adulão, infiltraram-se corajosamente
rei (2.1-4). Daí, seguindo-se à sua ascensão pelas linhas filistéias e levaram a seu coman
ao trono sobre todo o Israel, Davi empregou dante a bebida que ele havia desejado num
seus homens para capturar Jerusalém, sua momento de extravagância. Sentindo que
nova capital (5.6-10). A mais clara demons os homens haviam santificado a água ao
tração da importância das inovações arriscarem tão seriamente a vida, Davi
militares de Davi veio, contudo, durante as derramou-a como uma oferta ao Senhor
revoluções destinadas a destroná-lo do (Lv 17.11-13). Este episódio ilustra ampla
poder. Não fosse pela lealdade inabalável mente a intensa lealdade que prevalecia
de suas tropas de mercenários estrangeiros entre Davi e seus valentes.
(15.13-23), Davi dificilmente teria sobrevi Os membros do grupo dos trinta parecem
vido à rebelião de Absalão, seguida ter mudado de tempos em tempos conforme
imediatamente pela revolta de Sebá. se tornassem necessárias as substituições.
Obtendo uma base de poder comprometida Assim, Crônicas alista dezesseis homens
pessoal e totalmente com ele, Davi fez com que não são encontrados aqui (lCr
que a profecia de Natã (ISm 7.1-17) estivesse 11.41-47). A lista presente começa com
mais perto de seu cumprimento. Asael, irmão de Joabe, que fora anterior
Feitos de destaque ou dignos de mérito mente morto por Abner (2.18-23), e o último
entre as tropas mercenárias de Davi homem incluído era Urias, o heteu, ao qual
parecem ter sido recompensados com a Davi havia assassinado. Conquanto Joabe
inclusão do combatente em uma das duas não seja mencionado como membro do
ordens militares especiais honoríficas. A grupo, presumivelmente deve ser incluído.
menor, um grupo mais de elite, denominado Ele é mais destacado do que seus dois
simplesmente os três, compunha-se dos irmãos, Abisai e Asael, e certamente mais
homens que se haviam distinguido por faça ainda do que seu escudeiro, que também
nhas espetaculares contra o inimigo durante compunha a lista (v. 37). A omissão de
as campanhas de Israel contra os filisteus Joabe provavelmente se explica com a obser
(v. 8-12). Membros desse grupo não estão vação final de que havia trinta e sete ao
enumerados com o grupo maior dos trinta, todo (v. 39), quando somente 36 nomes são
mas Josebe-Bassebete (Jasobeão, cf. lCr dados no capítulo (para uma boa análise
11.11; 27.2) noutra parte aparece como o panorâmica dos nomes, cf. Driver, p.
comandante de um contingente da milícia 362,363). Uma comparação com a
de Davi. Outros homens alcançaram fama passagem paralela em lCrônicas 11.10-4la
semelhante (v. 22) ou ascenderam para revela, contudo, considerável variação na
posição mais elevada (20.23), mas nenhum enumeração, e deve-se evitar qualquer
outro conquistou o mesmo grau de destaque dogmatismo a respeito.
que estes haviam conquistado.
6. Davi Ordena o Censo (24.1-17)
Os três homens que haviam arriscado
a vida para buscar água para Davi no poço 'A ira do Senhor tornou a acender-se contra
Israel, e o Senhor incitou a Davi contra eles,
de Belém eram membros dos trinta e, dizendo: Vai, numera a Israel e a Judá. 2Disse,
portanto, distinguidos dos homens anterior pois, o rei a Joabe, chefe do exército, que estava
mente mencionados. O incidente ocorreu com ele: Percorre todas as tribos de Israel, desde
157
Dã até Berseba, e numera o povo, para que eu saiba onde o Templo deveria ser construído (v.
o seu número. 3Então disse Joabe ao rei: Ora, 18-25).
multiplique o Senhor teu Deus a este povo cem vezes
tanto quanto agora é, e os olhos do rei meu senhor O episódio todo parece basear-se em
o vejam. Mas, por que tem prazer nisto o rei meu mudanças que Davi estava implantando na
Senhor? 4Todavia a palavra do rei prevaleceu estrutura militar de Israel. Antes do esta
contra Joabe, e contra os chefes do exército; Joabe, belecimento da monarquia, Israel havia
pois, saiu com os chefes do exército da presença desfrutado um governo bastante descentra
do rei para numerar o povo de Israel. 5Tendo eles
passado o Jordão, acamparam-se em Aroer, à direita lizado, em que cada tribo era virtualmente
da cidade que está no meio do vale de Gade e na independente em todas as questões, exceto
direção de Jazer; 6em seguida foram a Gileade, e nas relacionadas com religião e guerra.
à terra de Tatim-Hódsi; dali foram a D âJaã, e ao Durante o período dos juizes, Israel se
redor até Sidom; 7depois foram à fortaleza de Tiro,
e a todas as cidades dos heveus e dos cananeus; reunia basicamente para prestar seu culto
e saíram para a banda do sul de Judá, em Berseba. em conjunto e pela necessidade de prover
*Assim, tendo percorrido todo o país, voltaram a tropas para defesa mútua (cf. comentário
Jerusalém, ao cabo de nove meses e vinte dias. sobre ISm 4.12-18). Mesmo em épocas de
’Joabe, pois, deu ao rei o resultado da numeração
do povo. E havia em Israel oitocentos mil homens
emergência nacional, cada tribo era
valorosos, que arrancavam da espada; e os homens responsável por reunir suas próprias tropas,
de Judá eram quinhentos mil. 10Mas o coração de e freqüentemente uma tribo podia recusar-
Davi o acusou depois de haver ele numerado o povo; se a dedicar sua própria milícia para servir
e disse Davi ao Senhor: Muito pequei no que fiz; numa região distante do país (cf. Jz 5). Em
porém agora, ó Senhor, rogo-te que perdoes a iniqüi
dade do teu servo, porque tenho procedido mui face de crescentes pressões externas, líderes
nesciamente. "Quando, pois, Davi se levantou pela dentro de Israel sentiram-se obrigados a
manhã, veio a palavra do Senhor ao profeta Gade, buscar uma nova forma de governo que
vidente de Davi, dizendo: 12Vai, e dize a Davi: seria bem mais capaz de propiciar uma força
Assim diz o Senhor: D-ês coisas te ofereço; escolhe dissuasiva permanente para a agressão
qual delas queres que eu te faça. 13Yfeio, pois, Gade
a Davi, e fez-lho saber dizendo-lhe: Queres que te estrangeira (cf. ISm 8.20; 12.12).
venham sete anos de fome na tua terra; ou que por Uma vez que Saul havia enfrentado pres
três meses fujas diante de teus inimigos, enquanto sões de quase todos os lados, opondo-se à
estes te perseguirem; ou que por três dias haja peste própria idéia de uma nonarquia israelita,
na tua terra? Delibera agora, e vê que resposta hei
de dar àquele que me enviou. 14Respondeu Davi seu governo reteve os principais aspectos
a Gade: Estou em grande angústia; porém caiamos da antiga federação tribal (cf. Bright, p. 169).
nas mãos do Senhor, porque muitas são as suas Davi, por outro lado, havia introduzido
misericórdias; mas nas mãos dos homens não caia reformas profundas e inovadoras, parti
eu. 15Então enviou o Senhor a peste sobre Israel,
desde a manhã até o tempo determinado; e
cularmente em relação à estrutura militar
morreram do povoi, desde Dã até Berseba, setenta da nação. Desde o começo de seu reinado,
mil homens. 16Ora, quando o anjo estendeu a mão Davi havia dependido grandemente de seu
sobre Jerusalém, para a destruir, o Senhor se arre exército profissional regular (cf. comentário
pendeu daquele mal; e disse ao anjo que fazia a sobre 23.8-39); e agora aparentemente está
destruição entre o povo: Basta; retira agora a tua
mão. E o anjo do Senhor estava junto à eira de propondo também uma reorganização da
Araúna, o jebuseu. 17E, vendo Davi ao anjo que milícia tribal.
feria o povo, falou ao Senhor, dizendo: Eis que eu Conquanto recenseamentos para outros
pequei, e procedi iniquamente; porém estas ovelhas, propósitos fossem permissíveis (Ex 30.11 e
que fizeram? Seja, pois, a tua mão contra mim,
e contra a casa de meu pai.
ss.; Nm 1.2 e ss.; 26.1 e ss.), os interesses
militares inerentes na enumeração de Davi
(v. 9) sugerem que ele estava planejando
estabelecer uma quota de convocação de
A última narrativa sobre Davi no vigor soldados para cada uma das tribos.40
de sua vida envolve três acontecimentos
principais: um recenseamento (v. 1-9); uma 4U George E. M endenhall, “T h e C ensus Lists o f Num bers 1 and 26”,
praga (v. 10-17); e a aquisição de uma área Journal o f Biblical Literature, LX X V II (1958), p. 56.
158
Mesmo Joabe pôde ver que as pessoas iriam 21.1-14. Contudo, nenhuma menção à ira
resistir violentamente a um tal alistamento do Senhor é encontrada no contexto ante
militar e inutilmente instou Davi a aban rior.
donar o plano (v. 3). Havia em Israel oitocentos mil homens
Infelizmente, Davi não havia previsto valorosos, que arrancavam da espada; e os
a forte reação religiosa a esse censo militar. homens de Judá erâm quinhentos mil. Os
Em vista da íntima relação anterior entre números são incertos uma vez que a
o culto de Israel e a guerra, as pessoas consi passagem paralela em Crônicas indica
deravam sua decisão como um ataque aos 1.100.000 homens em Israel e 470.000 em
princípios teológicos sobre os quais a nação Judá, sem nenhum de Levi ou Benjamim
fora estabelecida. Quando uma grave praga (lCr 21.5,6).
atingiu Israel logo após o censo ter-se O Senhor se arrependeu daquele mal.
completadoi, foi tida como sinal do desprazer A seqüência parece confusa aqui. O versí
do Senhor. Presumivelmente, o Senhor, que culo 16 deixa implícito que Deus já havia
estava irado com Israel por alguma razão interrompido a praga pouco antes de
não declarada, tinha incitado Davi a levan alcançar Jerusalém, e contudo o restante
tar o censo a fim de que pudesse ter oca do capítulo não toma conhecimento desse
sião de descarregar a ira sobre o seu povo. fato (cf. especialmente v. 17,21,25). Talvez
Conquanto tal opinião sem dúvida este versículo tenha sido transposto de outro
local.
tivesse o objetivo de exaltar a Deus como
dirigente de toda a vida e história humana
(cf. Is 45.7), não deixa de apresentar difi 7. Davi Constrói um Altar (24.18-25)
culdades teológicas. É verdade que o
universo inteiro é, em última análise, 18Naquele mesmo dia veio Gade a Davi, e lhe
disse: Sobe, levanta ao Senhor um altar na eira de
operado sob a autoridade e controle de Araúna, o jebuseu. '“'Subiu, pois, Davi, conforme
Deus, mas o pensamento bíblico posterior a palavra de Gade, como o Senhor havia ordenada
torna claro que o Senhor busca dirigir o 20E olhando Araúna, viu que vinham ter com ele
homem para o bem, e não para o que lhe o rei e os seus servos; saiu, pois, e inclinou-se diante
é prejudicial. O autor dos livros de Crônicas do rei com o rosto em terra. 21Perguntou Araúna:
Por que vem o rei meu senhor ao seu servo?
parece ter aprendido este fato, pois sua Respondeu Davi: Para comprar de ti a eira, a fim
versão desta passagem indica que Satanás de edificar nela um altar ao Senhor, para que a
incitou Davi a fazer o recenseamento do praga cesse de sobre o povo. 22Então disse Araúna
povo (lCr 21.1; cf. também Rm 8.28; Tg a Davi: Tome e ofereça o rei meu senhor o que bem
lhe parecer; eis aí os bois para o holocausto, e os
1.13). trilhos e os aparelhos dos bois para lenha. 23Tudo
Confrontado com a reação pública a isto, ó rei, Araúna te oferece. Disse mais Araúna
seu recenseamento, Davi estava pronto para ao rei: O Senhor teu Deus tome prazer em ti.
confessar seu erro e culpa, mesmo antes 24M as o rei disse a Araúna: Não! antes to
de qualquer demonstração de desprazer comprarei pelo seu valor, porque não oferecerei ao
Senhor meu Deus holocaustos que não me custem
divino tornar-se evidente (v. 10 e s.). Ele nada. Comprou, pois, Davi a eira e os bois por
aceitou prontamente plena responsabilidade cinqüenta siclos de prata. 25E edificou ali um altar
por seus atos e buscou proteger o povo de ao Senhor, e ofereceu holocaustos e ofertas paci
sofrimento (v. 17). Em face do juízo ficas. Assim o Senhor se tornou propicio para com
a terra, e cessou aquela praga de sobre Israel.
iminente, contudo, Davi preferiu lançar-se
a si e a seu povo sob a misericórdia divina
em vez de cair nas mãos de um inimigo A narrativa sobre o censo de Davi leva
humano. naturalmente à história da aquisição que
A ira do Senhor tornou a acender. faz da eira de Araúna, para ser um local
Aparentemente a palavra tornou refere-se sagrado. Uma vez que o relato carece de
aos três anos de fome mencionada em detalhes específicos que requeiram um
159
período posterior no reinado de Davi, presu Quando Araúna soube que Davi preci
mivelmente foi introduzido neste ponto para sava de sua propriedade, ele se dispôs a dar
prover um elo de transição para o reinado ao rei não só sua terra, mas também seus
de Salomão. Os materiais nos capítulos animais para sacrifício e seus equipamentos
20—24 não abordam a questão central do para servir de combustível. Davi, contudo,
contexto imediato de tais capítulos, isto é, declinou da generosa oferta do jebuseu
o problema de encontrar o sucessor porque havia aprendido a natureza do
adequado para o trono de Davi (cf. Intro verdadeiro sacrifício. As ofertas ao Senhor
dução). O relato em lide, que culmina com são importantes não por causa do que fazem
a compra do local do Templo, é, pois, empre ao Senhor, mas pelo que fazem pelo
gado para direcionar a atenção do leitor homem. Mediante um verdadeiro sacrifício,
para aquele que seria responsável pela edifi a pessoa reconhece novamente que a tota
cação do local central do culto israelita. Daí lidade de sua vida e riqueza pertencem em
que o relato paralelo em lCrônicas 21.1-27 última análise a Deus. No ato de dar, o
prossegue dizendo do ajuntamento de mate adorador dedica não só seus bens, como
riais por Davi para utilização no programa também sua personalidade ao Senhor da
de construção de Salomão (22.1 e s.). vida.
160
l-2Reis
M. PIERCE MATHENEY JR. E ROY L. HONEYCUTT JR.
Introdução
161
especial concernente a passagens paralelas a libertação de Joaquim, na Babilônia
de Reis e porções dos livros de Crônicas, (2Reis 23.26—25.30). Talvez, como alguns
Isaías e Jeremias terá de ser levada em estudiosos vêem tal escrito, esse editor no
consideração no comentário sobre essas exílio revisou certas porções de Reis para
seções em particular. Não se faz necessária preparar seus leitores para o que viria
qualquer análise adicional quanto a esse adiante (p. ex., IReis 9.6-9). Contudo, sendo
assunto, uma vez que os dois mais recentes que esse editor deuteronômico de Reis tinha
comentários técnicos sobre Reis trazem total simpatia pelo trabalho do historiador
amplas e excelentes discussões do texto principal, essa atualização do relato de
(Montgomery-Gehman, p. 3-24; Gray, p. modo algum se desvia dele, antes serve para
43-55). completá-lo.
O historiador fala basicamente do julga
III. O(s) Autor(es) mento de Deus visto nos eventos da história
O autor ou autores dos livros de Reis de Israel. Seu ponto de vista teológico é o
não são conhecidos. O Talmude Judaico do livro de Deuteronômio (p.ex., Dt 28).
afirma que Jeremias os escreveu, mas essa Deus escolheu um povo para si. Ele entrou
é uma tradição posterior sem qualquer em aliança com esse povo, prometendo
prova que a respalde. Não há dificuldade bênçãos sobre aqueles que obedecessem os
em crer na autoridade e inspiração de qual seus mandamentos. Mas advertiu contra
quer livro bíblico pelo simples fato de que a desobediência, que resultaria em exílio
seu autor humano é desconhecido. e destruição. Durante a reforma de Josias,
Há, porém, um contexto mais amplo dos a história da decadência dos reinos hebreus
livros de Reis que permite que se façam é relatada para encorajar a obediência.
algumas declarações sobre o autor, que O mau exemplo do reino de Israel, ao
preferimos denominar de “o historiador”. norte, e a destruição que já se precipitara
Foi um membro das escolas proféticas em sobre aquele reino são uma advertência
Jerusalém, as quais apoiavam integralmente especial para Judá. O editor exílico acres
a reforma de Josias. Uma vez que uma centa a queda de Judá ao relato a fim de
porção do atual livro de Deuteronômio foi que a história toda sirva às gerações exíli-
provavelmente o livro da lei que se tornou cas e pós-exílicas como uma advertência
a base daquela reforma, os eruditos têm tido de que Deus executará sua palavra profé
o costume de referirem-se a ele(s) como tica entre as nações humanas. O historia
sendo o(s) historiador(es) deuteronômico(s). dor está especialmente interessado nos
Na verdade, todo o conjunto de livros profetas e suas admoestações a vários reis,
chamados Profetas Anteriores — a saber, confirmadas no desenrolar dos aconteci
Josué, Juizes, Samuel e Reis — é conhe mentos.
cido como a história deuteronômica.
O principal narrador em quem temos inte IV. As Fontes
resse é aquele historiador que situou os atos A partir desse ponto de vista particular
de Salomão e os anais do reino dividido à mente teológico, o historiador fez uso de
luz da controvérsia de Deus com o seu certas fontes escritas. Ele cita três delas:
povo. Estudos técnicos do Antigo Testa (1) o livro dos atos de Salomão (IReis
mento têm sugerido que ele viveu e escreveu 11.41); (2) o Livro das Crônicas dos reis de
durante a época da reforma de Josias, por Israel (IReis 14.49); e (3) O Livro das
volta de 621-609 a.C. Crônicas dos reis de Judá (IReis 14.29).
Então, por volta de 550 a.C., após a Os dois últimos não devem ser confundidos
destruição de Jerusalém, um editor no exílio com nossos livros bíblicos de Crônicas.
babilónico redigiu a conclusão de 2Reis, Eram, na verdade, os anais oficiais da corte
iniciando pela morte de Josias e indo até dos reinos divididos, ou sumários proféti
162
cos deles. Além disso, o historiador tam está preservado em 2Reis 2-10 e 13, sendo
bém utilizou outras fontes escritas ou orais que nem todos os relatos apresentam Eliseu
que podem ser identificadas por estarem como a personagem central, mas todos
subjacentes à presente forma dos livros. pertencem ao período de sua liderança
A primeira dessas é a História da Corte profética.
(um documento citado por alguns comen Finalmente, uma última fonte adicional
taristas pelo nome de “Narrativa da Su diz respeito ao profeta canônico Isaías e
cessão”) acerca da sucessão de Davi ao o papel significativo que desempenhou na
trono. Geralmente afirma-se que os limites crise assíria durante o reinado de Ezequias
desse importante documento escrito por de Judá. Essa história é contada em 2Reis
testemunhas oculares são 2Samuel 9—20 e 18—20 e numa forma ligeiramente diferente
IReis 1,2. Uma vez que esses dois últimos em Isaías 36—39. Esse não é um ma
capítulos propiciaram a introdução para a terial escrito por Isaías, mas acerca dele,
história de Salomão, foram empregados em talvez redigido por um de seus discípulos, e é
Reis, separados dos restantes dessa fonte semelhante a outros materiais biográficos de
pelo apêndice aos livros de Samuel, seu livro, importantes para uma recons
2Samuel 21—24.0 autor dessa história da trução de seu papel como conselheiro dos
sucessão pode ter sido Natã, o profeta (cf. reis de Judá durante as crises de seus
lCr 29.29), ou um dos outros participantes reinados. Provavelmente não seja possível
ativos dos acontecimentos descritos. nem necessário dizer qual é o relato mais
Uma segunda fonte adicional usada pelo antigo desses acontecimentos concernentes
historiador de Reis dedicava-se a uma a Ezequias, ou se tais relatos se basearam
avaliação mais positiva do reinado de Acabe, em material comum a ambos, quer escrito
o “Salomão do Norte”, do que com aquela ou oral. A maioria dos eruditos parece
que se encontra nos relatos sobre Elias. Essa favorecer a opinião de que o material
fonte é encontrada em IReis 20 e 22, atual comum aos dois livros foi acrescentado ao
mente separada pelo famoso incidente de livro de Isaías a partir de 2Reis.
Nabote, mas que na versão de Reis na Há uma questão semelhante sobre
Septuaginta não está dividida. porções de 2Reis 25 encontradas em Jere
Uma terceira fonte adicional, e muito mias 52, com a diferença de que o autor
mais significativa, empregada para dar aos desse relato acerca da queda de Jerusalém
livros de Reis alguns de seus ensinos reli foi provavelmente testemunha ocular que
giosos de maior peso, é o ciclo de relatos participou dos acontecimentos registrados.
proféticos do Reino do Norte, Israel, que Ele é quem completou o relato do histo
tem como personagens centrais Elias e seu riador principal de Reis após a morte de
discípulo-sucessor, Eliseu. Elias, o tisbita, Josias, escrevendo durante o exílio babi
é o profeta mais importante entre Samuel lónico pelo menos até a ascensão de Evil-
e Amós. O cerne do que deve ter sido -Merodaque, filho e sucessor de Nabuco-
outrora uma biografia mais ampla encon donozor, cujo tratamento bondoso dispen
tra-se em IReis 17—19, 21, e 2Reis 1,2. sado a Joaquim é o incidente final da
Entremeado com IReis 19 e 2Reis 2 está história toda. Pode ter havido outras
o início da história de Eliseu, um pouco fontes especiais subjacentes aos livros de
diferente mas bastante extensa. Conquan Reis, tal como os encontramos agora, tais
to possamos supor que o próprio Eliseu como registros especiais do templo ou dos
preservou a história de seu mestre, Elias, sacerdotes, mas as que foram mencionadas
talvez Geazi ou outro dentre os filhos dos acima são as principais fontes utilizadas
profetas tenha registrado os maravilhosos pelo historiador. Conquanto, sem dúvida
feitos de Eliseu, o líder daquelas escolas de alguma, ele as haja moldado para seus
profetas (cf. 2Reis 8.1-6). O relato desses atos propósitos teológicos, o historiador oferece
163
um relato fiel com base em materiais de Abião e Asa começaram seus reinados em
que ele dispunha acerca da história do Judá. Mas o reinado excepcionalmente
reino, desde Salomão até sua queda. longo de Asa exigiu a inclusão da referên
cia pelo historiador à guerra com Baasa,
V. O Esboço antes de o historiador poder contar como
É o modo todo particular como o histo o filho de Jeroboão, Nadabe, foi assassinadÇ
riador utiliza as três fontes escritas, as quais e como seu poder foi usurpado por Baasa.
menciona nominalmente, que dá à sua Pode-se notar a referência adicional à
guerra civil, acrescentada à fórmula de
narrativa da monarquia um sabor diferente.
O fato de cobrir uns quatrocentos anos de conclusão do reinado de Nadabe, para ver
acontecimentos forçou o historiador a como o historiador remediou esse desajuste
adotar um princípio de seletividade no uso (cf. IReis 15.16,31,32). Prosseguiu então
para alcançar a história de Israel e apresenta
dessas fontes. Ele simplesmente indica aos
os relatos de todos os seus reis cujos rei
leitores documentos conhecidos e presu
nados começaram durante o longo reinado
mivelmente disponíveis para os detalhes
adicionais que não podiam ser empregados de Asa em Judá (cf. IReis 15.25 e ss., 33
para ilustrar as lições do relato que está e ss.; 16.8 e ss., 15 e ss., 23 e ss, 29 e ss.).
fazendo. O lugar óbvio para reportar-se a Conseqüentemente, seis capítulos da his
esses detalhes, tão tentadores e ao mesmo tória do Reino do Norte são introduzidos
tempo inatingíveis para o intérprete entre Asa e Jeosafá.
moderno, era a fórmula material no início Ele está tão condicionado ao uso dessas
e no fim de cada narrativa real. A junção fórmulas de introdução e conclusão para
da morte de Davi ao início da consolidação os reinados de cada rei que até as utiliza
do poder de Salomão ocorre numa frase para Zinri, que reinou somente sete dias!
ologia típica em IReis 2.10-12, com a última (cf. IReis 16.15,20). As fórmulas para
frase sendo repetida ao final do capítulo Judá são mais longas do que as referentes
para indicar o fim do material oriundo a Israel.
da História da Corte, o qual tratava da No material introdutório, o historiador
sucessão ao trono de Davi. Ele menciona prestou as seguintes informações com
sua principal fonte sobre o reinado de respeito a cada rei: (1) a data de sua ascen
Salomão na conclusão do uso que faz desse são em termos do ano do reinado de seu
material — veja IReis 11.41-43. rei vizinho; (2) a duração de seu reinado
Essa linguagem padronizada indica o em anos; (3) o julgamento do historiador
início e o fim dos relatos de cada reinado quanto à qualidade de seu reinado em
da monarquia dividida numa monótona função de sua fidelidade às expectativas
regularidade. O historiador resolveu seu divinas. Ademais, no que concerne aos reis
problema básico de tratar monarcas con de Judá, o escritor acrescentou entre os
temporâneos de Israel (ao norte) e Judá de itens (1) e (2) a idade do rei em particular
um modo lógico, sem fragmentar a história e quando começou seu reinado, e entre os
de cada um. Ele seguiu o modelo de rela itens (2) e (3) o nome da mãe do rei junta
tar a história completa de cada rei cuja mente com a do pai dela. Compreende-se
ascensão ao trono ocorreu dentro do a inclusão deste último item, visto que, na
período de reinado de seu rei vizinho, alter corte polígama de Judá, a identidade da
nando então para atualizar os relatos rainha-mãe era considerada uma infor
históricos daquele reino vizinho. mação vital. Com efeito, era freqüente
No primeiro exemplo dessa prática mente significativa sua influência sobre a
podemos ver como isso provocaria certas religião do novo monarca.
desigualdades. Durante os 22 anos do Para as fórmulas de conclusão, o histo
reinado de Jeroboão em Israel, Roboão, riador (1) citava sua fonte escrita, (2) às
164
vezes acrescentava uma concisa frase rar ou descartar um ou outro. Ademais,
como sumário, caracterizando os aconte ambos os sistemas pareciam apresentar
cimentos do reinado desse rei, e (3) falava períodos extensos demais em relação a
de sua morte e da ascensão de seu filho ao dados recém-descobertos sobre o Egito e
poder, ocasionalmente acrescentando a Mesopotâmia. Contudo, estudos mais
informações que tinham sido omitidas na recentes feitos' por essa ciência da crono
fórmula introdutória. logia antiga destacaram, em vez disso, a
Incorporados a essa estrutura minu aceitabilidade de qúase todos os dados
ciosa e monótona, cujo linguajar revela bíblicos a partir de indicações cuidadosa
tão claramente as tendências teológicas do mente coletadas, parte das quais diziam
historiador, encontravam-se aqueles outros respeito a como esses reinos circunvizi
itens concernentes à religião, aos empreen nhos contavam o tempo de seus reinados.
dimentos de construção, ou às guerras de De maneira especial, a obra monumental
cada rei, que pudessem servir a seu propó de Edwin R. Thiele2 propiciou uma meto
sito narrativo. Tais informações provinham dologia acertada, que presume que os
de uma das fontes escritas ou orais exis dados bíblicos são precisos e explicáveis
tentes à sua disposição e que cobriam o àqueles que têm paciência para procurar
período que transcorre até o século sétimo, tais indicações.
quando relatou a impressionante história Vista dessa maneira, a cronologia de
do bom rei Josias e de suas reformas, Reis revela-se impressionantemente exata
acontecimentos de que o historiador pro para os dias, conquanto a maioria das
vavelmente foi ao mesmo tempo partici datas sejam ainda aproximações dentro de
pante e contemporâneo. O editor que uma variação de uns poucos anos. Afortu
completou a obra do historiador no exílio nadamente, mediante a comparação dessa
teve o cuidado de dispor os acontecimen cronologia bíblica relativa com a crono
tos restantes numa estrutura semelhante. logia assíria já estabelecida, pode-se tam
bém tentar uma datação absoluta para os
VI. A Cronologia eventos bíblicos. A lista epônima assíria,
A questão mais técnica para qualquer uma relação do tipo “homem do ano” ou
análise detalhada dos livros de Reis ou da “acontecimento do ano”, tem fornecido
história da monarquia dividida é a crono datas exatas com base em um eclipse solar
que os astrônomos calculam ter ocorrido
logia. Nos primórdios da história de Israel,
as dificuldades com cronologia envolvem em maio/junho de 763 a.C., em Nínive.
uma escassez de datas bem como uma A batalha de Carcar, em que tanto Acabe
de Samária e Bene-Hadade de Damasco
certa falta de exatidão. Mas para os três
séculos e meio dos dois reinos, há uma lutaram contra Salmanasar III da Assíria
surpreendente abundância de dados, com pode, dessa forma, ser datada de 853 a.C.
O rei Jeú de Israel é retratado no famoso
a pretensão de serem bastante precisos,
Obelisco Negro como pagando tributo ao
todos presumivelmente baseados em regis
mesmo Salmanasar em 841 a.C. Outros
tros oficiais disponíveis ao historiador de
Reis. reis, de Menaém a Manassés, estão tam
Até as últimas décadas, aqueles que bém registrados como pagando tributos, e
tinham prestado maior atenção a essas as datas desses pagamentos são impor
tantes para a solução de problemas crono
questões imaginavam que o sistema utili
lógicos de um período muito difícil duran
zado para determinar a duração e a sin
cronização dos reinados dentro de cada te a sujeição e queda de Israel e a sujeição
reino em relação com os reis contem de Judá ao poderio militar da Assíria.
porâneos no outro reino eram mutuamen 2 The M ysterious N um bers o f the H ebrew Kings (ed. rev., G rand Rapids,
te contraditórios, e que se deveria alte M ich: W m. B. Eerdmans Publishing Co., 1965).
165
Outra importante ajuda para atribuição o enfermo rei Davi sendo forçado pelos
de uma data exata para a queda da Assíria acontecimentos a escolher seu filho Sa
e os últimos dias de Judá é a recentemente lomão como seu co-regente e sucessor.
descoberta crônica babilónica. Às vezes Semelhantemente, acontecimentos também
agora é possível datar a estação do ano, até impuseram esse padrão ao final da história
mesmo o mês e o dia, dos acontecimentos de Judá, quando Joaquim foi levado para
durante os anos 616 e 587 a.C., os quais o exílio na Babilônia. Conquanto ele
marcam a ascensão do império neobabilô- houvesse reinado apenas três meses, dados
nico à custa tanto da Assíria quanto de tanto judaicos quanto babilónicos indicam
Judá.3 que continuou a ser considerado o rei legí
A mais importante das sugestões de timo, enquanto seu tio Zedequias reinava
Thiele para harmonizar os dados bíblicos em Jerusalém como uma espécie de co-
com as cronologias dessas nações circun regente. Os registros bíblicos também
vizinhas é a teoria de várias co-regências. contam como a lepra de Azarias (Uzias)
Alguns desses reinados paralelos são levou-o a tornar Jotão, seu filho, num
mencionados nas fontes, particularmente co-regente durante uma década, isso já no
em relação a Judá, onde a prática era final de seu longo reinado. Thiele encontra
muito mais freqüente na dinastia davídica provas de quatro outras co-regências em
consolidada. O livro de IReis começa com Judá, indicadas mediante parênteses no
o relato que estabelece esse padrão, com gráfico cronológico abaixo.
VII. A Cronologia do Reino Dividido4
Judá Israel
Roboão 931-913 Jeroboão 931-910
Abião 913-911
Asa 911-870 Nadabe 910-909
Baasa 909-886
Elá 886-885
Zinri 885
Onri 885 ( 881 ) 874
Jeosafá 873 ( 8 70)848 Acabe 874-853
Jeorão 853 ( 848)-841 Acazias 853-852
Acazias 841 Jorão 852-841
Atalia 841-835 Jeú 841-814
Joás 835-796 Jeoacaz 814-798
Amazias 796-767 Jeoás 798-782
Azarias 792 (7 6 7 )7 4 0 Jeroboão II 793 ( 782)753
Zacarias 753-752
Salum 752
Menaém 752-742
Fecaías 742-740
Jotão 750 (7 4 0 )7 3 2 R xa 752 (74 0 )7 3 2
Acaz 735 (732)715 Oséias 732-722
Queda de Samária 721
Ezequias 715-687
Manassés 69 7 (687 ) 642
Amom 642-640
Josias 640-609
Jeoacaz 609
Jeoiaquim 609-598
Joaquim 598-597
Zedequias 597-587
Queda de Jerusalém 587
3 Jack Finegan, H andbook of Biblical Chronology (Princeton U niversity Press, 1964), p. 308-328.
4 Thiele* op. cit., p. 205, com algum as pequenas variações baseadas em m inha própria pesquisa e na de Gray, p. 55-74.
166
Em contraste, houve apenas uma co- da confederação tribal que, embora
-regência em Israel, mas a incerteza maior houvesse o santuário central da arca em
provocada pelas sucessões dinásticas deu Siló para a festa anual da renovação da
oportunidade a duas ocasiões de reinados aliança, enquanto os lugares altos (outrora
rivais. Tibni foi rival de Onri por quatro nichos cúlticos dos cananeus) fossem usados
anos, e parece que Peca governou em no culto a Iavé, a lealdade de Israel estaria
Gileade enquanto Menaém e Pecaías dividida.
ocupavam o reino principal em Samária. Isso explica a grande ênfase na edificação
Outros dados que ajudam a fundamentar por Salomão do templo de Jerusalém, sobre
o sistema de Thiele são as diferentes ma o qual o historiador pensa como sendo o
neiras de computar o ano novo em dife único lugar onde o Senhor fará habitar o
rentes períodos históricos nos dois reinos, seu nome (cf. Dt 12.1-14). Esse também é
e diferentes modos de considerar o ano de um cumprimento da promessa feita a Davi,
ascensão de um novo rei. o qual tencionava, por sua própria lide
rança, edificar o templo (2Sm 7). A história
VIII. A Teologia da dedicação do templo deixa claro que,
Certos temas ocorrem repetidas vezes acima de tudo, ele é um lugar para a nação
orar e se arrepender de seus pecados num
devido à maneira como o historiador estru
tura seu relato da história dos reis. O tema tempo de angústia (lRs 8). Embora histo
central e subjacente é o inevitável cumpri ricamente o templo tenha começado sua
mento da palavra de juízo profético do existência como pouco mais que uma capela
Senhor. Isso tem a ver com a teologia básica real, situada ao lado do palácio, havia se
da aliança da fé mosaica, segundo a qual tornado um santuário nacional no tempo
de Josias. Em virtude da reforma que
a obediência aos mandamentos do Senhor
acarreta bênçãos, e a desobediência traz empreendeu, é o único verdadeiro lugar de
maldição e castigo (cf. Dt 28). Além desta culto.
ênfase na lei da aliança, encontramos a idéia Vista dessa perspectiva, a criação por
de lealdade ao ideal de um reino associado Jeroboão de um sistema religioso rival em
com o nome de Davi e com o oráculo dinás Betei e Dã, empregando o perigoso símbolo
tico que Natã falou a Davi (2Sm 7). Esses de um bezerro de ouro na adoração, é pura
dois temas podem ser vistos no conselho heresia. Não obstante Deus o haja inspi
do moribundo Davi a seu filho e sucessor, rado pela palavra do profeta Aias a
Salomão, em IReis 2.2-4. revoltar-se contra as opressivas medidas da
A promessa de Davi, de que jamais monarquia de Salomão, ainda assim os
deixaria de haver um descendente seu no “pecados de Jeroboão” tornaram-se a
trono em Jerusalém, certamente não maldição que recaiu sobre todos os reis de
isentou Salomão ou quaisquer de seus Israel e resultou finalmente na derrocada
sucessores da urgente necessidade de de Samária. Essa é uma lição tão impor
obedecer ao Senhor em suas condutas e tante para a própria época do historiador
com dedicação integral. Essa bênção condi que ele prega um longo sermão quando
cional é comunicada a Salomão numa chega ao tema da queda de Israel (cf. 2Rs
segunda visão como a de Gibeão, segundo 17.7-18).
consta de IReis 9.2-9. A divisão do reino O outro vilão da história, além de Jero
surgiu porque Salomão falhou em obedecer boão, foi Manassés, aquele rei de Judá que
a essa admoestação (cf. lRs 11). inverteu todas as boas reformas de
Essa divisão do reino põe em destaque Ezequias, chegando até mesmo a trazer
outro tema muito importante do historiador objetos religiosos pagãos para a própria área
— a total necessidade de pureza e centra- do templo. Foram os pecados de Manassés
lidade de culto. Ficou claro pela história que o rei Josias teve de desfazer. E, após
167
ter inicialmente narrado a história desse rei crescimento da literatura sacra de Israel.
dentro da seqüência cronológica normal, As fontes épicas acerca do trato de Deus
o editor exílico dá seu veredito de que esses com seu povo desde a época dos patriarcas
pecados de Manasses constituíam a causa até a conquista, prefaciadas pelas histórias
derradeira da destruição e exílio (cf. 2Rs da criação e do início da humanidade, prova
21.2-16; 24.3,4). Esse juízo sobre Manasses velmente foram primeiro coletadas e
mostra que, com a queda de Israel, o tema registradas na era de Salomão.
da unidade religiosa cede lugar ao da pureza O Reino do Norte tinha sua própria
religiosa. Finalmente, o historiador apre versão dessa epopéia nacional, bem como
senta sua lamuriosa descrição do declínio sua própria codificação da lei divina, ambas
e queda do reino hebreu para confirmar o escritas e preservadas durante esses séculos.
elevado ideal de um culto puro e unificado A literatura de adoração no templo de Israel
ao Senhor, conduzido por um rei ideal começa a ser coligida com Davi e Salomão
comparável a um “novo Davi”, o bom rei e cresce ao longo do período dos reinos. O
Josias. movimento de sabedoria formal tem início
O veredicto final do editor exílico parece com Salomão e prossegue através de todo
ser o de que há esperança de restauração, o período, conforme se percebe pelo cres
bastando que os exilados aprendam as lições cimento da literatura de sabedoria. Mas,
da história e se arrependam (cf. lRs mais importante de tudo, a profecia hebraica
8.46-53). Ele vê alguns lampejos de espe como instituição adquire maior importância
rança na recente soltura de Joaquim, no do que o sistema monárquico, e o flores
qual se reconhece a linhagem legítima de cimento dos grandes profetas escritores tem
Davi (2Rs 25.27-30; cf. Ez 1.2; Jr 22.24-30; relação direta com a decadência e queda
Ag 2.20-23; lCr 3.17,19). Somente num dos reinos hebreus.
sentido lato essa esperança poderia ser
chamada de “messiânica”.5 Contudo, a Um dos axiomas do estudo moderno do
mesma teologia profética, mediante a qual Antigo Testamento é que o desenvolvi
o Senhor entrou em controvérsia com os mento dessas tradições veterotestamentárias
reis da época, culminando na rejeição deles, foi vitalmente influenciado e moldado pela
é o elemento que fez com que as esperanças experiência e adoração das pessoas que as
de Israel se voltassem para um futuro rei preservaram. Assim, não se pode escrever
ideal da linhagem restaurada de Davi. um comentário sobre os livros de Reis sem
também falar de outras leis, narrativas,
salmos, provérbios e oráculos proféticos que
IX. O Contexto propiciam esse contexto histórico e literário
mais amplo. Especialmente, o papel político
A reconstituição dos acontecimentos do de um Isaías ou Jeremias é refletido nas
Antigo Testamento narrados nos livros de histórias acerca desses profetas, bem como
Reis foi obra do historiador deuteronômico, em seus próprios oráculos, e sugere um
mas o contexto literário e teológico é mais papel semelhante desempenhado anterior
abrangente do que isso. Na discussão das mente por Elias. Assim, também a teologia
fontes, já foi assinalado que porções de Reis profética da história refletida nas narrativas
têm relação especial com porções dos livros de Reis encontra confirmação nos oráculos
de Crônicas, Isaías e Jeremias. O período dos escritos dos profetas, que proclamaram
histórico coberto pelos livros de Reis é justa- a controvérsia de Deus com seu povó, resul
mente o tempo mais crucial para o tando em julgamento e destruição. Deve-se
constantemente recordar que a interpre
tação de qualquer porção particular do
5 G erhard von Rad, O ld Testament Theology, Vol. I, trad, para o inglês
por D.M.G. Stalker (New York: H arper & Brothers Publishers, 1962),
Antigo Testamento depende primeiramente
p. 344. de vê-la em relação ao todo.
168
X . A Relevância
podem, em última instância, impedir o
governo de Deus entre seu povo. Essa
Os livros de Reis continuam a ter mensagem do Rei dos reis é uma mensagem
importância e sentido para nossa vida hoje. viva na atualidade.
Quando foram inicialmente escritos, a
história estava sendo recontada durante a Esboço de IReis
reforma de Josias ou no exílio babilónico,
para mostrar ao povo de Deus o que ele I. O reino salomônico (lRs 1.1—11.43)
havia feito, estava fazendo e pretendia fazer 1. A sucessão ao trono davídico
mediante os acontecimentos interpretados (1.1—2.46)
como revelatórios. O grande otimismo de 1) A escolha de Salomão (1.1-53)
que a reforma de Josias restauraria o reino 2) A consolidação do poder (2.1-46)
de Davi e introduziria o reino de Deus 2. A sabedoria de Salomão (3.1—4.34)
provou-se infundado, ou pelo menos prema 1) Sonho em Gibeão (3.1-15)
turo. Mas mesmo a derrota do exílio, o fim 2) O julgamento das prostitutas
do reino no sentido costumeiro, resultou (3.16-28)
no final para Israel em um aprofundamento 3) Os oficiais de Salomão (4.1-19)
e renovação da fé de que o Deus Iavé era 4) A prosperidade e extensão do
e é o verdadeiro Rei. Essa fé reluz ao longo reino (4.20-28)
da narração e recapitulação da história de 5) A reputação pela literatura de
Israel. sabedoria (4.29-34)
Pbr exemplo, mesmo quando o Reino 3 .0 templo de Salomão (5.1—7.51)
do Norte havia caído ao seu nível mais peri 1) O tratado com Hirão, rei de Tiro
goso de contemporização com o culto (5.1-18)
cananeu a Baal, Elias realizou a maior parte 2) O tempo da edificação do templo
do árduo trabalho de levar o povo a ver e (6.1-38)
reafirmar que não é Baal, mas Iavé que é 3) O palácio e outras edificações
Deus. O mesmo profeta, que é tão firme (7.1-12)
no enfrentamento público dos profetas 4) Os trabalhos em metais para o
rivais, viu-se dominado por temor e auto- templo (7.13-51)
comiseração quando foi ameaçado pela 4 .A festa de dedicação do templo
resoluta patrocinadora deles. Verdadeira (8.1—9.9)
mente, como Tiago diz de modo tão 1) A procissão da arca (8.1-11)
apropriado, “Elias era homem sujeito às 2) A bênção da assembléia (8.12-21)
mesmas paixões que nós” (5.17a). O mesmo 3) A oração de dedicação (8.22-53)
Senhor que respondeu com fogo sobre o 4) A bênção (8.54-61)
Monte Carmelo não estava no vento- 5) Os sacrifícios de consagração
-terremoto-fogo da tempestade no Monte (8.62-66)
Horebe. O mesmo Senhor cujo anjo 6) A promessa e a advertência
confortou Elias em sua jornada censurou- divinas (9.1-9)
-o, cobrando-lhe tarefas inconclusas e 5. Os empreendimentos comerciais de
responsabilidades assumidas. A “voz mansa Salomão (9.10—10.29)
e delicada” da revelação abafou o chora 1) A venda de vinte cidades (9.10-14)
mingar de autocomiseração. O 2) Trabalhos forçados para projetos
remanescente de Deus sobreviverá à revolta de construção (9.15-22)
profética contra o Baal de Jezabel (lRs 3) A frota do Mar Vermelho
19.18). Nem as matanças de Senaqueribe (9.23-28)
(2Rs 19.30,31) nem a aparente destruição 4) A visita da rainha de Sabá
da monarquia (2Rs 24.12 e ss.; 25.27 e ss.) (10.1-13)
169
5) A riqueza de ' lalomão (10.14-22) 8. O fim da dinastia de Baasa (16.1-7)
6) Salomão em sua glória (10.23-25) 9. A revolta de Zinri (16.8-20)
7) Os negócios com carros e cavalos 10. A nova dinastia de Onri (16.21-28)
(10.26-29) 11.0 inicio do reinado de Acabe 16.
6. A apostasia e punição de Salomão 29-34)
(11.1-43) III. A revolta profética (lRs 17.1—22.53)
1) Voltando-se a deuses de esposas 1. Os profetas e Acabe (17.1—22.40)
estrangeiras (11.1-8) 1) Elias e a seca (17.1-24)
2) A resultante divisão do reino 2) O confronto no Monte Carme-
(11.9-13) lo (18.1-46Í)
3) O primeiro adversário: Hadade 3) A revelação no Monte Horebe
de Edom (11.14-22) (19.1-21)
4) O segundo adversário: Rezom 4) As guerras com Bene-Hadade
de Damasco (11.23-25) da Síria (20.1-43)
5) O terceiro adversário: Jeroboão 5) A vinha de Nabote em Jizreel
de Efraim (11.26-40) (21.1-29)
6) A morte de Salomão (11.41-43) 6) A última batalha de Acabe
O começo do reino dividido (22.1-40)
(12.1—16.34) 2 . 0 reinado de Jeosafá em Judá
1. A revolta de Jeroboão (12.1-33) (22.41-50)
1) A assembléia em Siquém (12.1-5) 3 .0 começo do reinado de Acazias
2) A política insensata de Roboão em Israel (22.51-53)
(12.6-15)
3) A rebelião bem-sucedida (12.16- Esboço de 2Reis6
24)
4) Os pecados de Jeroboão (12.25 Primeira Parte: A revolução profética (2Rs
-33) 1.1—13.25; cf lRs 17.1—
2 .0 julgamento profético sobre Jero 2Rs 13.25)
boão (13.1—14.20) I. Os últimos dias de Elias (1.1—2.25)
1) A palavra do Senhor contra 1 .0 juízo profético sobre a infideli
Betei (13.1-34) dade de Acazias (1.1-18)
2) A palavra de Aias em Siló (14.1 2. Eliseu, sucessor de Elias: a trasla-
-20)
dação de Elias (2.1-25)
3 .0 reinado de Roboão em Judá II. O estabelecimento de Eliseu no ce
(14.21-31) nário político nacional: seu conselho
1) Os pecados de Roboão (14.21-24) profético na guerra contra os moabi-
2) A invasão de Sisaque do Egito tas (3.1-27)
(14.25-28) 1. A avaliação deuteronômica de
3) A morte de Roboão (14.29-31) Jorão (3.1-3)
4 . 0 reinado de Abião (15.1-8) 2 .A guerra moabita e o conselho
5 .0 remado de Asa (15.9-24) de Eliseu (3.4-27)
1) A reforma parcial de Asa (15.9-15) III. A preocupação profética com a neces
2) A guerra civil com Baasa (15.16 sidade humana: milagres por Eliseu
-22)
(4.1—6.7)
3) A morte de Asa (15.23,24) 1. A provisão para a viúva do profe
6 . 0 reinado de Nadabe em Israel ta e sua família (4.1-7)
(15.25,26) 2. A bênção da maternidade para a
7. A revolta de Baasa em Israel mulher sunamita (4.8-37)
(15.27-34) 6 Preparado por Roy L. H oneycutt Jr.
3 .“Morte na panela”: o cozido es 3. Um sumário do reinado de Amazias
tragado (4.38-41) (14.15-22)
4. A multiplicação dos pães (4.42-44) II. Uma sucessão de reis israelitas e
5. A cura de Naamã, o sírio (5.1-27) judeus (14.23—17.6)
6 .0 machado que flutuou (6.1-7) 1. Jeroboão II de Israel (14.23-29)
IV. Eliseu e as guerras contra os sírios 2 .Azarias (Uzias) de Judá (15.1-7)
(6.8—8.15) 3 .A anarquia em Israel (15.8-31)
1. Eliseu captura uma tropa síria 4 . Dois reis judeus (15.32—16.20)
atacante (6.8-23) 5 .Oséias, último rei de Israel (17.1-6)
2.Sam ária é libertada do cerco III. A queda e subseqüente repovoamen
(6.24—7.20) to de Israel: uma avaliação poste
3. A consideração adicional para com rior (17.7-41)
a mulher sunamita (8.1-6) 1. Uma avaliação deuteronômica da
4 .0 papel de Eliseu no golpe contra desintegração do Reino do Norte
o rei sírio (8.7-15) (17.7-23)
V. A rebelião de Jeú e o expurgo do 2. Uma perspectiva sacerdotal do repo
baalismo (8.16—10.36) voamento de Israel (17.24-41)
1 .0 envolvimento de Judá no expurgo
de Jeú: uma avaliação deuteronô- Terceira Parte: Décadas de renovação e
mica do reinado judaico (8.16-29) destruição final: Somente
2. Eliseu instiga a rebelião de Jeú o Reino de Judá
(9.1-13) (18.1—25.30)
3. Os assassínios que expurgaram o I. O reavivamento profético: Ezequias
baalismo de Israel (9.14—10.27) e a crise assíria (18.1—20.21)
4. Uma avaliação do reinado de Jeú 1. A reforma e independência de
(10.28-36) Ezequias (18.1-12)
VI. A reforma em Judá sob Joás 2. A tradição de Isaías (18.13—20.19)
( 11. 1— 12. 21) 3. A avaliação deuteronômica de
1. A usurpação de Atalia e a coroação Ezequias (20.20,21)
de Joás (11.1-21) II. Décadas de infidelidade e apostasia
2 .0 reparo no templo: uma tradição (21.1-26)
independente (12.1-16) 1 .Manassés (21.1-18)
3 .0 fim de Joá (12.17-21) 2.Amom (21.19-26)
VII. As provações de Israel e a morte de III. Josias e a reforma religiosa
Eliseu (13.1-25) (22 1—23 30)
1. Os avanços dos sírios sob Hazael 1. Josias (22.1,2; cf. 23.28-30)
(13.1-13) 2 .0 início da reforma (22.3-20)
2 .A ação profética de Eliseu e a 3 .A implementação da reforma
derrota de Hazael (13.14-25) (23.1-25)
4 .0 fracasso da reforma e o último
ato de Josias (23.26-30)
Segunda Parte: Décadas de amargura e IV. A destruição de Jerusalém e a queda
derrota em Israel e Judá de Judá (23.31—25.30)
1. Jeoacaz (23.31-35)
I. A guerra localizada entre Judá e Israel 2.Jeoiaquim (23.36—24.7)
(14.1-22) 3 .Joaquim (24.8-17)
1. A ocasião da guerra (14.1-10) 4. Zedequias (24.18—25.21)
2 .A derrota de Judá por Israel 5 .0 resultado da queda de Jerusalém:
(14.11-14) dois apêndices (25.22-30)
171
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172
1. A Sucessão ao Trono Davídico aqui o sentido está modificado pelo propó
(1.1—2.46) sito básico da solução que era sugerida, o
Na Introdução já se fez referência à suprimento de calor corpórpo vital por meio
História da Corte, da qual foram tirados do contato físico.
os dois primeiros capítulos de IReis para Abisague era de Suném (moderna
prover uma introdução ao reinado de Solém), na encosta ocidental da colina de
Salomão. Essa narrativa bem expressiva, Moré, a noroeste de Jizreel, no território
feita por uma testemunha ocular, acerca de Issacar (Js 19.18).
das tragédias que recaíram sobre os últimos Porém o rei não a conheceu, isto é,
anos de Davi, tem como tema os problemas carnalmente. Essa nota pungente é incluída
em torno da sucessão ao trono de Davi. para preparar o palco para o pedido de
Adonias, uma vez que ele não ousaria pedir
1) A Escolha de Salomão (1.1-53) uma mulher que tivesse realmente se
tornado concubina de Davi. Pode também
O clímax desses problemas ocorre refletir a noção de nações circunvizinhas
quando Davi está velho e doente, talvez não de que o bem-estar de um povo dependia
mais viril, e portanto possivelmente em seu da potência do seu rei e de que um homem
leito de morte. Dos muitos casamentos de não podia permanecer como rei se se
Davi, o mais velho filho sobrevivente, após tornasse impotente (Snaith, p. 19,20).
o assassinato de Amnom e a revolta de
Absalão, era Adonias. Mas Salomão era o b. As Ambições de Adonias (1.5-10)
filho de sua esposa favorita, Bate-Seba.
5Então Adonias, filho de Hagite, se exaltou e
disse: Eu reinarei. E preparou para si carros e cava
a. A Velhice de Davi (1.1-4) leiros, e cinqüenta homens que corressem adiante
'O ra, o rei Davi era já velho, de idade mui dele. 6Ora, nunca seu pai o tinha contrariado,
avançada; e por mais que o cobrissem de roupas dizendo: Por que fizeste assim? Além disso, era
não se aquecia, disseram-lhe, pois, os seus servos: ele muito formoso de parecer; e era mais moço do
Busque-se para o rei meu Senhor uma jovem que Absalão. 7E teve entendimento com Joabe,
donzela, que esteja perante o rei, e tenha cuidado filho de Zeruia, e com o sacerdote Abiatar, os quais
dele; e durma no seu seio, para que o rei meu senhor aderiram a ele e o ajudavam. 8Mas Zadoque, o
se aqueça. 3Assim buscaram por todos os termos sacerdote, e Benaías, filho de Jeoiada, e Natã, o
de Israel uma jovem formosa; e acharam Abisague, profeta, e Simei, e Rei, e os valentes que Davi tinha,
a sunamita, e a trouxeram ao rei. 4Era a jovem não eram por Adonias. ’Adonias matou ovelhas,
sobremaneira formosa; e cuidava do rei, e o servia; bois e animais cevados, junto à pedra de Zoelete,
porém o rei não a conheceu. que está perto de En-Rogel; e convidou a todos os
seus irmãos, os filhos do rei, e a todos os homens
Os primeiros quatro versículos do capí de Judá, servos do rei; 10porém a Natã, o profeta,
tulo preparam o cenário para o golpe e a Benaías, e aos valentes, e a Salomão, seu irmão,
não os convidou.
fracassado de Adonias. Davi tinha cerca
de 70 anos (2.11; 2Sm 5.4,5), uma idade Adonias, o quarto filho de Davi, era o
avançada nos tempos bíblicos (SI 90.10). Por seguinte na linha de sucessão após Amnom
mais que o cobrissem de roupas, não se e Absalão (2Sm 3.2-4). Seguindo o mau
aquecia. Sendo que isso não melhorava a exemplo de seu irmão Absalão (2Sm 15.1),
condição do rei, seus cortesãos sugeriram Adonias tentou usurpar o trono de seu pai.
que uma virgem em idade de casar fosse Os seguidores de primeira hora estavam
trazida como concubina para o harém de tanto pensando em um futuro seguro para
Davi. Ela cuidava do rei e o assistia, o que si quanto desejando aparecer, e evidente
indicava que ela cumpriria o ofício de uma mente constituíam um grupo especial
ajudante ou prestaria serviços ou propiciaria dentro das forças reais desde o tempo de
companhia. Durma no seu seio freqüente Saul (ISm 22.17; De Vaux, p. 221,222).
mente se referia à intimidade sexual, mas Davi não desafiou as pretensões do filho,
173
assim como anteriormente havia permitido servindo como rei-sacerdote na Jerusalém
que Absalão prosseguisse com esse tipo de jebuséia de tempos pré-davídicos.7
comportamento e até atitudes piores por Benaías, o filho de Jeoiada, foi general
quatro anos (2Sm 15.7). O historiador, num do corpo de guarda-costas de Davi,
de seus raros comentários éticos, toma claro composto de mercenários estrangeiros, os
o relacionamento sentimentalmente indul quereteus e os peleteus (2Sm 8.18), e
gente e desastroso que Davi mantinha com também um de seus renomados valorosos,
os filhos. A literatura de sabedoria é espe tendo pertencido a seu grupo inicial de
cialmente cônscia do dever paternal de foras-da-lei (2Sm 23.20-23). Mas o cérebro
repreender e disciplinar os filhos (Pv 13.24; do partido salomônico era o profeta Natã,
19.18; 22.6; 23.13 e s.). que, juntamente com Bate-Seba, teve êxito
Além da senilidade e permissividade de em convencer o rei Davi a tomar uma
Davi, o historiador destaca ainda a bela atitude decisiva.
aparência de Adonias (cf. ISm 16.12; 2Sm Simei e Rei são desconhecidos, não rece
14.25), e também sua condição de o mais bendo título nem linhagem. Simei
velho dentre os filhos sobreviventes, como certamente não é aquele filho de Gera que
aspectos que fortalecem sua pretensão ao havia amaldiçoado Davi no dia da humi
trono. Para sua intriga palaciana, ele havia lhante fuga de diante de Absalão (2Sm 16.5
conquistado o apoio de dois elementos e ss.). Talvez fosse o outro Simei, mencio
muito capazes, que haviam sido guerri nado mais tarde como o superintendente
lheiros de Davi durante seu período de de Salomão sobre Benjamim (lRs 4.18). Rei
liderança no deserto e em Hebrom. Joabe provavelmente deve ser considerado um
era o líder da milícia tribal, um general título (de Vaux, p. 123).
severo mas capaz, leal aos interesses de Davi Tal como Absalão havia feito em
e aos seus próprios. O sacerdote Abiatar, Hebrom (2Sm 15.12), Adonias utiliza uma
último sobrevivente da casa de Eli, havia festa de clã como ocasião para ser aclamado
sido consultor de Davi durante o período rei (cf. 1.25). O local da festa é identificado
inicial. como o moderno “Poço de Jó, ao sul da
O escritor então alista o partido de junção dos vales de Hinom e Cedrom”
oposição, cujos membros por fim atrapa (Wright, p. 126). Inclui-se a lista de convi
lharam os planos de Adonias. Eram líderes dados de Adonias para demonstrar que
estava cônscio da existência do partido de
que haviam se tornado importantes no
Salomão na corte. O historiador faz notar
período de reinado de Davi em Jerusalém.
Zadoque não pertencia à mesma linhagem que o próprio Salomão foi o único dos
sacerdotal de Abiatar (de Vaux, p. 373). meios-irmãos de Adonias não convidado
Crônicas dá a Zadoque uma genealogia para a festa.
aarônica mediante Eleazar (lCr 24.3),
c. O Sábio Conselho de Natã (1.11-14)
também atribuindo-lhe um ministério no
tabernáculo de Gibeão (lCr 16.39). Por “ Então falou N atã a Bate-Seba, mãe de
Zadoque estar ligado com a arca quando Salomão, dizendo: Não ouviste que Adonias, filho
ele aparece pela primeira vez em atividade de Hagite, reina? e que nosso senhor Davi não o
sabe? 12Vem, pois, agora e deixa-me dar-te um
como sacerdote de Davi (2Sm Í5.24-29), conselhoi, para que salves a tua vida, e a de teu Dlho
alguns têm suposto que fosse irmão de Uzá Salomão. 13Vai à presença do rei Davi, e dize-lhe:
e que havia servido perante a arca em Não juraste, ó rei meu senhor, à tua serva, dizendo:
Quiriate-Jearim (ISm 7.2; 2Sm 6.3,4, Certamente teu filho Salomão reinará depois de
traduzindo-se Alô como “seu irmão”). Entre
estudiosos modernos, a teoria mais popular 7 Essa hipótese, claramente elaborada por H.H. Rowley em “Zadok
acerca da importância capital de Zadoque a n d N ehushtan” JB L , LVIII (1939), p. 113-141, tem sido usada para
explicar a predom inância da influência cananita no simbolismo e ar
para a religião de Israel é a de que estava q uitetura do templo salom ônico e seu c u lta
174
mim, e se assentará no meu trono? Por que, pois, por Salomão, bem como uma referência
reina Adonias? 14Eis que, estando tu ainda a falar incidental à escolha por Davi de Salomão
com o rei, eu também entrarei depois de ti, e confir
marei as tuas palavras. como sucessor, podem ser vistos no nome
especial, Jedidias (Amado de Iavé), que
Natã, por palavra do Senhor, atribuiu a
Os parágrafos seguintes do capítulo
Salomão quandó de seu nascimento (2Sm
revelam o que há de melhor no estilo lite
12.24,25).
rário do autor da História da Corte.
Empregando o recurso da repetição verbal,
d. A Petição de Bate-Seba (1.15-21)
bem conhecido devido às narrativas épicas
orais, ele apresenta uma série de cenas e lsFoi, pois, Bate-Seba à presença do rei na sua
diálogos numa rápida seqüência, de modo câmara. Ele era mui velho; e Abisague, a sunamita,
o servia. 16Bate-Seba inclinou a cabeça, e se pros
a descrever num estilo marcante os eventos trou perante o rei. Então o rei lhe perguntou: Que
que rapidamente se sucederam, às vezes queres? 17Respondeu-lhe ela: Senhor meu, tu
simultaneamente, naquele dia fatídico juraste à tua serva pelo Senhor teu Deus, dizendo:
(Gray, p. 85). As notícias do golpe tentado Salomão^ teu filho, reinará depois de mim, e se assen
por Adonias alcançam Natã, que rapida tará no meu tro n a 18E agora eis que Adonias
reina; e tu, ó rei meu senhor, não o sabes. 19Ele
mente se movimenta para capitalizar a matou bois, animais cevados e ovelhas em
influência da esposa favorita de Davi. abundância, e convidou a todos os filhos do rei,
O papel de Natã em dar conselho, no e a Abiatar, o sacerdote, e a Joabe, general do exér
que é freqüentemente descrito como uma cito; mas a teu servo Salomão não o convidou.
“ Mas, 6 rei meu senhor, os olhos de todo o Israel
simples intriga palaciana, tem surpreendido estão sobre ti, para que lhes declares quem há de
alguns que consideram a reprimenda que assentar-se no teu trono depois de ti. 21Doutro
passou em Davi por ocasião do caso de modo sucederá que, quando o rei meu senhor dormir
Bate-Seba como uma postura mais apro com seus pais, eu e Salomão meu filho seremos
priada para um profeta. Mas, no período tidos por ofensores.
inicial, tanto o sacerdote Abiatar quanto Seguindo o sábio conselho de Natã, a
o vidente Gade haviam servido como conse rainha-mãe apressou-se à recâmara real sem
lheiros de Davi (ISm 22.5; 23.6,9; 2Sm ser chamada por Davi. Essa maneira
24.11,18). Aqui Natã está estabelecendo presunçosa de entrar violava os costumes
aquele papel político da profecia na tradição das cortes no antigo Oriente Próximo,
de Jerusalém, papel que Isaías tão bem enquanto em outro instante desse mesmo
exemplifica dois séculos depois. Sua preo acontecimento o costume é escrupulosa
cupação com a sucessão dinástica ao trono mente seguido. Bate-Seba aprimora o
de Davi está bem em harmonia com o método sugerido por Natã (1.13), transfor
oráculo apresentado a Davi por ocasião da mando a pergunta em uma declaração de
recusa pelo Senhor de aceitar o ofereci fato, e acrescentando que o juramento foi
mento de edificar o templo (2Sm 7.11 e ss.). de caráter sagrado. Adonias reina trata-se
Não juraste. O conteúdo de tal jura de uma declaração e não de uma pergunta,
mento não foi anteriormente mencionado o que se comprova pelas ações descritas a
na história, e presumivelmente era do seguir, e que mostram que o rei disso não
conhecimento apenas de Natã, Bate-Seba tinha conhecimento.
e bem poucos outros. A negligência de Davi A expressão todo o Israel significa toda
em não ter tomado pública sua escolha mais a comunidade da aliança, incluindo as
cedo é compreensível, não só em termos tribos de Israel e Judá (2Sm 2.4; 5.1-5).
de sua própria personalidade e relaciona Conquanto a nação religiosa fosse um só
mento com os filhos, mas também devido povo, as divisões políticas entre os dois
à ameaça de que tal designação talvez dimi grupamentos tribais de Israel (ao norte) e
nuísse sua própria autoridade em seus anos Judá (ao sul), que se originaram nos primór
de declínio. Um interesse anterior de Natã dios de sua história, persistiram a despeito
175
da extraordinária capacidade pessoal que -convidados é apresentada (cf. 1.8,10,19),
Davi teve de conseguir a unificação, e final e Natã deixa subentendido que, a julgar
mente resultou na divisão dos reinos pelos acontecimentos públicos, Davi deve
quando da morte de Salomão (Heaton, p. ter designado Adonias sem o conhecimento
1, 2 , 6). de Natã e Bate-Seba.
Bate-Seba declara que a responsabilidade
do rei era designar seu sucessor, não renun f. A Promessa de Davi (1.28-31)
ciar a seu poder real. Essa designação de
28Respondeu o rei Davi: Chamai-me a Bate-
um co-regente estabelece um padrão para -Seba. E ela entrou à presença do rei, e ficou
a sucessão na dinastia davídica em Judá, de pé diante dela 29Então o rei jurou, dizendo:
o que evidentemente torna inócuo o prin Vive o Senhor, o qual remiu a minha alma de toda
cípio de primogenitura (Dt 21.15-17, cf. de a angústia, 30que, assim como te jurei pelo Se
Vaux, p. 101). nhor Deus de Israel, dizendo: Teu filho Salomão
há de reinar depois de mim, e ele se assentará
Tidos por ofensores, literalmente, no meu trono, em meu lugar; assim mesmo o
“tornar-se pecadores”, num sentido mais cumprirei hoje. 31Então Bate-Seba, inclinando-se
político do que religioso. Sem dúvida com o rosto em terra perante o rei, fez-lhe reve
Adonias teria considerado tanto Bate-Seba rência e disse: Viva para sempre o rei Davi meu
senhor!
quanto Salomão como rivais potencial
mente perigosos até que se encontrasse A reação de Davi revela agilidade
algum pretexto para eliminá-los. Todos mental, se não pleno vigor físico, ao ser
quantos acompanhavam Natã em sua estimulado à ação pelo duplo relatório.
iniciativa de deter o golpe seriam semelhan Tendo convocado Bate-Seba, o rei con
temente considerados culpados de se firma o seu juramento original, em que
acharem no lado errado. havia feito uma designação em particu
lar, com um segundo juramento solene de
e. A Palavra Confirmatória de Natã ação pública e imediata. É o juramento
(1.22-27) favorito de Davi (2Sm 4.9), em que suas
palavras mencionam a vida de Iavé e seu
22Enquanto ela ainda falava com o rei, eis que livramento do rei em relação a toda
chegou o profeta Natã. 23E o fizeram saber ao rei,
dizendo: Eis aí está o profeta Natã. Entrou Natã angústia. O poder da palavra falada e a
à presença do rei, inclinou-se perante ele com o teologia de um Deus vivo e salvador são
rosto em terra, 24e disse: Ó rei meu senhor, acaso realçados por tais juramentos. Bate-Seba
disseste: Adonias reinará depois de mim, e se assen responde em linguagem própria da corte
tará no meu trono? “ Pois ele hoje desceu, e matou com um voto apropriado para um rei recém-
bois, animais cevados e ovelhas em abundância, e
convidou a todos os filhos do rei, e aos chefes do -aclamado, ou para um velho rei. Para
exército, e ao sacerdote Abiatar; e eis que comem sempre aqui se refere, como freqüente
e jebem perante ele, e dizem: Viva o rei Adonias! mente se dá no Antigo Testamento, à vida
“ Porém a mim, teu servo, e ao sacerdote Zadoque, terrena.
e a Benaías, filho de Jeoiada, e ao teu servo
Salomão, não convidou. 27Foi feito isso da parte
do rei meu senhor? e não fizeste saber a teu servo
quem havia de assentar-se no teu trono depois de ti? g. A Unção de Salomão (1.32-40)
A interrupção de Bate-Seba ressalta o 32Depois disse o rei Davi: Chamai-me a
Zadoque, o sacerdote, e a Natã, o profeta, e a
impacto do momento (cf. os mensageiros Banaías, filho de Jeoiada. E estes entraram à
dos infortúnios de Jó, Jó 1.16-18). Partici presença do rei. 33E o rei lhes disse: Tomai
pando da festa de aclamação, os sectários convosco os servos do vosso senhor, fazei montar
de Adonias estavam fazendo uma aliança meu filho Salomão na minha mula, e levai-o a
no ato de tomarem refeição com ele, bem Giom. ME Zadoque, o sacerdote, com Natã, o
profeta, ali o ungirão rei sobre Israel. E tocareis
como oferecendo a familiar declaração de a trombeta, e direis: Viva o rei Salomão! 35Então
aclamação. A lista completa dos não- subireis após ele, e ele virá e se assentará no
176
meu trono; pois reinará em meu lugar, porquan conveniada com o povo, mediante repre
to o tenho designado para ser príncipe sobre sentantes tribais (ISm 10.24; 11.15), que
Israel e sobre Judá. “ Ao que Benaías, filho de
Jeoiada, respondeu ao rei, dizendo: Amém; freqüentemente tinham uma parte na
assim o diga também o Senhor Deus do rei meu cerimônia de unção (2Sm 2.4; 5.3). Mas
senhor. 37Como o Senhor foi com o rei meu com o estabelecimento da dinastia, a
senhor, assim seja ele com Salomão, e faça que unção de Salomão adquiriu um significa
o seu trono seja maior do que o trono do rei do diferente, a saber, o de sucessão a um
Davi meu senhor, “ Pelo que desceram Zadoque,
o sacerdote, e Natã, o profeta, e Benaías, filho poder já reconhecido. Nesse desvio das
de Jeoiada, e os quereteus, e os peleteus, e fi velhas práticas jazem as sementes da
zeram montar Salomão na mula que era do rei divisão, quando a designação profética
Davi, e o levaram a Giom. 39Então Zadoque, o divergia dos princípios dinásticos (11.30,
sacerdote, tomou do tabernáculo o vaso do azeite
e ungiu a Salomão. Então tocaram a trombeta, e 31; 12.15-20).
todo o povo disse: Viva o rei Salomão! ““E todo O próximo ato de coroação foi o soar
o povo subiu após ele, tocando flauta e alegran da trombeta. Depois veio a aclamação,
do-se sobremaneira, de modo que a terra retiniu seguida pela entronização de fato. Se
com o seu clamor. assentará no meu trono significa começar
a reinar como co-regente do soberano.
Fiel a seu juramento, Davi convoca Príncipe designava o líder da confede
seus três conselheiros de confiança, men ração tribal, cujos líderes especificamen
cionados acima como partidários de Sa
te recusavam o título cananeu de “rei”,
lomão, e ordena a unção de Salomão. Esse
que apropriadamente pertencia somente
relato é uma das duas descrições deta
a Iavé (Jz 8.22,23; ISm 8.4-9). Assim
lhadas em Reis (cf. 2Reis 11.12-20) do
Davi pretendeu transferir a Salomão os
ritual de coroação em Judá (de Vaux, privilégios de uma função que, anterior
p. 102-107). Davi ordena uma procissão mente, era conferida somente pelos líde
para a fonte de Giom na encosta oriental res de Israel e Judá. Benaías expressou a
de Ofel, a velha cidade jebuséia, fonte
leal resposta ao decreto do rei, e um de
que é o principal manancial de água da
dicado voto pela prosperidade do reinado
cidade desde tempos antigos.
de Salomão.
Pessoas comuns ainda cavalgavam Quereteus e peleteus (cretenses e filis
sobre jumentos (2.40). O cavalo ainda teus) constituíam a guarda de mercená
não havia sido introduzido como um
rios, da qual Benaías era o comandante.
animal de cavalgadura em Israel. Mas
A presença deles foi o elemento de força
desde que Davi se tornara rei, a mula se
decisivo no resultado do episódio (Bright,
tornara importante como o animal de p. 189-190). Ikbernáculo refere-se à tenda
montaria da realeza (cf. 2Sm 13.29; 18.19). que Davi havia armado para a arca, ao
A ação de Salomão em cavalgar a pró norte da cidade velha (2Sm 6.17), o qual
pria mula de Davi era para o povo sinal se tomou local de asilo para Adonias e
de que ele, e não Adonias, era o sucessor
Joabe (1.50; 2.28). O último versículo
designado pelo rei. Zadoque ungiu Salo
enfatiza o alegre ruído que alertou os
mão (cf. v. 39), conquanto a autoridade partidários de Adonias, que estavam a
de designação profética fosse conferida certa distância, mais para baixo no vale
por Natã. de Cedrom.
Os profetas desde Samuel (ISm 10.1;
16.13) até Eliseu (2Reis 9.1-6) tiveram um h. Más Notícias para Adonias (1.41-48)
papel destacado na designação e rejeição
de reis. A unção era um sinal não só da 41Adonias e todos os convidados que estavam
com ele o ouviram, ao acabarem de comer.
designação do próximo rei, mas também E ouvindo Joabe o soar das trombetas, disse:
da presença íntima do Espírito do Senhor. Que quer dizer este alvoroço na cidade? 42Ele
A monarquia surgira por uma aliança ainda estava falando, quando chegou Jónatas,
177
filho de Abiatar, o sacerdote; e disse Adonias: sem implica uma sucessão pacífica bem
Entra, porque és homem de bem, e trazes boas como a satisfação pessoal de Davi, que se
novas. 43Respondeu Jônatas a Adonias: Deveras!
O rei Davi, nosso senhor, constituiu rei a Sa lembra das frustrações do rei Saul quan
lomão. 44E o rei enviou com ele Zadoque, o sa to a essa questão, bem como a história
cerdote, e Natã, o profeta, e Benaías, filho de sangrenta de sua própria família.
Jeoiada, os quereteus e os peleteus; e eles o
fizeram montar na mula do rei. Zadoque, o
sacerdote, e Natã, o profeta, ungiram-no rei em i. A Humilhação de Adonias (1.49-53)
Giom; e dali subiram cheios de alegria, e a
49Então, tomados de pavor, levantaram-se
cidade está alvoroçada. Este é o clamor que
ouvistes. “ E Salomão já está assentado no trono todos os convidados que estavam com Adonias,
e cada qual se foi seu caminha 50Adonias, po
do reina 47Além disso os servos do rei vieram
rém, temeu a Salomão e, levantando-se, foi ape-
abençoar o nosso senhor, o rei Davi, dizendo:
gar-se às pontas do altar. S1E foi dito a Salomão:
Faça o teu Deus o nome de Salomão mais céle
Eis que Adonias teme ao rei Salomão; pois que
bre do que o teu nome, e faça o seu trono maior
do que o teu trona E o rei se inclinou no leita se apegou às pontas do altar, dizendo: Jure-me
48Também assim falou o rei: Bendito o Senhor hoje o rei Salomão que não matará o seu servo
à espada. 52Ao que disse Salomão: Se ele se
Deus de Israel, que hoje tem dado quem se
houver como homem de bem, nem um só de
assente no meu trono, e que os meus olhos o
seus cabelos cairá em terra; se, porém, se houver
vissem.
dolosamente, morrerá. 53Então o rei Salomão
deu ordem, e tiraram Adonias do altar. E vindo
O ruído da festa de Adonias foi dimi ele, inclinou-se perante o rei Salomão, o qual
lhe disse: Vai para tua casa.
nuindo à medida que o da aclamação
de Salomão se fazia mais e mais forte. Os partidários de Adonias sabiam que
O ouvido treinado do velho guerreiro sua cumplicidade na rebelião fora desco
Joabe ouviu o toque longínquo da trom berta, deixando-os atemorizados diante da
beta. Isso foi acompanhado de alvoroço ira do novo rei. Adonias teme ao rei Sa
ou tumulto e comoção (a palavra hebrai lomão. A causa desse temor era que ele
ca pode ter o sentido do som de uma sem dúvida havia planejado fazer algo a
colméia ou de uma multidão; cf. Ex 32. Salomão, pois era costume que os usurpa
17,18). dores eliminassem seus rivais (15.28,29;
Jônatas, filho de Abiatar havia bem 2Rs 9-10). Adonias fugiu para o território
servido a Davi durante a revolta de Absa- sagrado em busca de asilo e apegou-se à
lão como espião e mensageiro (2Sm 15.27 parte mais sagrada do altar, suas pontas.
e ss.; 17.17 e ss.). Adonias o chama de A prática de asilo temporário era conhe
homem de bem e supõe que ele traz boas cida em outros países do antigo Oriente
novas (a mesma palavra que descreve a Próximo. Era prevista na lei israelita so
proclamação profética em Is 40.9; 52.7; mente em caso de homicídio (Ex 21.
61.1, cuja tradução grega do termo, euan- 12-14). Isso tem a ver com a proteção
gelizo, significa dar boas novas). Mas as mais permanente das cidades de refúgio
novas eram más para Adonias, que ainda (Nm 35.9-34; Dt 19.1-13). Salomão soube
estava sob o controle de seu pai, o rei da atitude de Adonias e de sua temerosa
Davi, cujo trono buscava usurpar. insistência num juramento de clemência.
O acréscimo de detalhes adicionais O juramento verbal era algo sagrado e
completa o relato do ritual da coroação, irretratável, uma vez que fosse solene
destacando-se especialmente o respeito mente proferido. Nem um só de seus ca
demonstrando pelos oficiais de Davi e belos cairá em terra é um juramento de
pelos principais cidadãos de Jerusalém. perdão, dito em linguagem expressiva, e
Davi agradece a Deus por sua fidelida que era utilizado tanto pelo povo quanto
de à profecia de uma aliança com o rei pelo rei (ISm 14.45; 2Sm 14.11). Salomão
(2Sm 7.12), e a grande dádiva de um fi deu um perdão condicional, o qual de
lho como sucessor. Os meus olhos o vis pendia de que Adonias fosse digno de
178
confiança, proibindo que agisse dolosa e a Amasa, filho de Jeter, os quais ele matou, e
mente, isto é, que promovesse intriga em tempo de paz derramou o sangue de guerra,
manchando com ele o cinto que tinha nos lom
política. Vai para tua casa revela um bos, e os sapatos que trazia nòs pés. 6Faze, pois,
bom comportamento na questão de abju segundo a tua sabedoria, e não permitas que
rar a toda ambição e atividade políticas. suas cãs desçam à sepultura em paz. 7M as para
Adonias dificilmente estaria sob prisão com os filhos de Barzilai, o gileadita, usa de
domiciliar (2.13 e ss.). benevolência, e estejam eles entre os que comem
à tua mesa; porque assim se houveram comigo,
Isso marca o fim da breve rebelião de quando eu fugia por causa de teu irmão Absalão.
Adonias, com a história de sua morte re 8E eis que também contigo está Simei, filho de
latada no capítulo seguinte. É inútil espe Gêra, benjamita, de Baurim, que me lançou
cular se ele teria sido melhor rei do que atroz maldição, no dia em que eu ia a Maanaim;
porém ele saiu a encontrar-se comigo junto ao
Salomão (Dentan, p. 21). Ele era mimado Jordão, e eu lhe jurei pelo Senhor, dizendo:
e impetuoso como seus meios-irmãos, Não te matarei à espada. ’Agora, porém, não o
Amnom e Absalão, enquanto Salomão tenhas por inocente; pois és homem sábioi, e bem
parece cuidadoso e circunspecto em sua saberás o que lhe hás de fazer; farás com que as
sabedoria administrativa. suas cãs desçam à sepultura com sangue.
179
Mas ambos eram rivais em potencial. Davi reinou sobre Israel quarenta anos: sete anos
reinou em Hebrom, e em Jerusalém reinou trinta
Assim, Joabe estava visando os seus pró e três anos. 12Salomão, pois, assentou-se no trono
prios interesses, que ele interpretou como de Davi, seu pai; e o seu reino se fortificou sobre
sendo os de Davi. maneira.
Mas essa determinação de Davi a Sa
lomão não é uma expressão de vingança Dormiu com os seus pais é a lingua
pessoal; é, antes de mais nada, a compen gem comum em Reis para designar a
sação de uma idéia primitiva do perigo morte do rei governante, incluindo o se-
que representava para a dinastia o sangue pultamento no túmulo da família. Acredi
inocente não vingado (cf. 2Sm 21.6-9). ta-se que foi descoberto o túmulo de Davi
Alguns estudiosos têm insistido em que mediante recentes escavações (de Vaux, p.
isso contrasta tão grandemente com a ge 58). O seu reino se fortificou sobrema
nerosidade de Davi que esses versículos neira se encaixa melhor no versículo 46,
devem ter sido acrescentados por um edi onde serve de nota editorial do final da
tor para justificar o tratamento dispensa história da corte.
do por Salomão a Joabe.8 Verifica-se que
tal explicação é desnecessária pela inclu c. O Insensato Pedido de Adonias (2.13-18)
são de Simei, que não partilhava das pre
tensões de Adonias. 13Então Adonias, filho de Hagite, veio a Bate-
-Seba, mãe de Salomão; e perguntou ela: De
Faze, pois, segundo a tua sabedoria (cf. paz é a tua vinda? Respondeu ele: É de paz. 14E
também o v. 9) significa sagacidade políti acrescentou: Uma palavra tenho que dizer-te. Res
ca. A maneira como alguém morria pare pondeu ela: Fala. 15Disse, pois, ele: Bem sabes
cia afetar sua existência no Seol, de modo que o reino era meu, e que todo o Israel tinha
que uma morte violenta seria indesejável, posto a vista em mim para que eu viesse a rei
nar; contudo o reino se transferiu e veio a ser de
conquanto apropriada no caso de Joabe. meu irmão, porque foi feito seu pelo Senhor.
Para com os filhos de Barzilai, o gilea- 16Agora uma só coisa te peço; não ma recuses. Ela
dita, usa de benevolência. Uma recorda lhe disse: Fala. 17E ele disse: Peço-te que fales ao
ção mais aceitável para nossas sensibili rei Salomão (porque ele não to recusará), que me
dê por mulher a Abisague, a sunamita. ^Respon
dades é a recordação que Davi tem, em deu Bate-Seba: Pois bem; eu falarei por ti ao rei.
“amor leal”, de seu líder na Transjordânia
(2Sm 17.27-29; 19.31-40). É bem irônico que Adonias julgasse
O poder da maldição de Simei ainda poder usar Bate-Seba, a qual havia aju
estava ativo contra a dinastia, segundo a dado Natã a realizar a unção de Salomão.
antiga crença na eficácia de palavra sole A morte de Davi criou ocasião oportuna
nemente proferida. Conquanto Davi hou para Adonias realizar sua próxima jogada
vesse perdoado Simei (2Sm 19.19-23), evi política, caso tencionasse fazê-lo. Segundo
dentemente sentia que os termos técnicos a regra da primogenitura, Adonias não
de seu juramento seriam anulados por sua deveria ser descartado em favor de um fi
morte. Pbr detrás dessas temíveis recomen lho mais jovem (Dt 21.15-17; cf. de Vaux,
dações de Davi jazia sua preocupação de p. 53, 100-101). Mas ele expressa o que o
que seu sucessor herdasse um trono de historiador e seu povo criam: que Iavé é
sembaraçado de quaisquer antigos impe o Senhor da história e a fonte de todos
dimentos. os acontecimentos.
Que me dê por mulher a Abisague era
b. A Morte de Davi (2.10-12) um pedido tolo, mesmo no caso de que a
10Depois Davi dormiu com seus pais, e foi linda enfermeira não tivesse se tornado
sepultado na cidade de Davi. UE foi o tempo que concubina de Davi, uma vez que estava
8 T heodore H . Robinson, A H istory of Israel (Oxford: C larendon Press,
incluída em seu harém. Talvez o historia
1932), p. 244-245. dor esteja atribuindo a Adonias a mes
180
ma cobiça que resultou na derrocada de e. O Banimento de Abiatar (2.26,27)
Amnom e que tão pungentemente espe “ Também a Abiatar, o sacerdote, disse o rei:
lhava os pecados de seu pai Davi. Vai para Anatote, para os teus campos, porque és
homem digno de morte; porém hoje não te mata
rei, porquanto levaste a arca do Senhor Deus
d. A Eliminação de Adonias (2.19-25) diante de Davi, meu pai, e porquanto participaste
de todas as aflições de meu pai. 27Salomão, pois,
19Foi, pois, Bate-Seba ter com o rei Salomão, expulsou Abiatar, para que não fosse sacerdote
para falar-lhe por Adonias. E o rei se levantou a do Senhor, assim cumprindo a palavra que o Se
encontrar-se com ela, e se inclinou diante dela; nhor tinha dito acerca da casa de Eli em Siló.
então, assentando-se no seu trono, mandou que
pusessem um trono para a rainha-mãe; e ela se Anatote era um vilarejo ao norte de
assentou à sua direita. “ Então disse ela: Só uma Jerusalém, perto de Nobe, o último reduto
pequena coisa te peço; não ma recuses. Respon-
deu-lhe o rei: Pede, minha mãe, porque não ta
da casa de Eli. A matança de toda essa
recusarei. 21E ela disse: Dê-se Abisague, a suna- família sacerdotal pelo rei Saul, por aju
mita, por mulher a teu irmão Adonias. 22Então darem o fugitivo Davi, levou Abiatar a
respondeu o rei Salomão, e disse a sua mãe: E unir-se a Davi como seu sacerdote duran
por que pedes Abisague, a sunamita, para Ado te seus dias de fora-da-lei (ISm 21-22).
nias? Pede também para ele o reino (porque é
meu irmão mais velho); sim, para ele, e também Hoje constitui uma ameaça implícita, que
para Abiatar, o sacerdote, e para Joabe, filho de força Abiatar a um bom comportamento
Zeruia. 23E jurou o rei Salomão pelo Senhor, durante seu banimento. Alguns eruditos
dizendo: Assim Deus me faça, e outro tanto, se propõem uma emenda textual de arca pa
não falou Adonias esta palavra contra a sua vida.
24Agora, pois, vive o Senhor, que me confirmou e ra “éfode” (cf. ISm 14.18; Montgomery, p.
me fez assentar no trono de Davi, meu pai, e que 100). Mas isso é desnecessário porque
me estabeleceu casa, como tinha dito, que hoje Abiatar realmente tinha levado a arca
será morto Adonias. “ E o rei Salomão deu or desde seu estabelecimento na tenda-san-
dem a Benaías, filho de Jeoiada, o qual feriu tuário de Davi em Jerusalém (2Sm 15.24-
Adonias, de modo que morreu.
29). Expulsou, pois, Salomão a Abiatar
Conquanto Bate-Seba considerasse o do santuário de Jerusalém. Dificilmente o
pedido como apenas um pequeno favor, rei poderia impedir que Abiatar atuasse
Salomão interpretou-o como uma espécie como sacerdote no lugar alto em Anatote,
de “iniqüidade” política, que ele havia onde havia ainda sacerdotes ao tempo de
expressamente proibido quando dispensou Jeremias (Jr 1.1). O relato deuteronômico
Adonias para sua casa (1.52,53). O direito se forma a partir de uma cadeia de predi-
ao harém do pai era um significativo di ções-cumprimentos. O historiador refere-
reito do sucessor (2Sm 3.7; 12.8; 16.21,22; se à predição feita a Eli por um homem
cf. de Vaux, p. 116). Salomão não tinha anônimo da parte de Deus (ISm 2.27-36).
alternativa política senão aplicar essa in A confirmação, por acontecimento subse
terpretação. A referência a Abiatar e a qüente, foi uma das marcas distintivas da
Joabe revela a relativa insegurança da verdadeira profecia (Dt 18.21,22).
posição do novo rei, e também serve co
mo uma lista que prevê a eliminação de f. A Vingança do Sangue Derramado por
toda oposição. Assim Deus me faça, e ou Joabe (2.28-35)
tro tanto ou é uma maldição enfática não
28Ora, veio esta noticia a Joabe (pois Joabe se
mencionada, ou é um gesto simbólico, cu desviara após Adonias, ainda que não se tinha
jo propósito é confirmar a verdade do ju desviado após Absalão); pelo que Joabe fugiu pa
ramento do qual Deus é o guardião (IDB, ra o tabernáculo do Senhor, e apegou-se às pon
vol. III, p. 575-577). Benaías (...) feriu a tas do altar. 29E disseram ao rei Salomão: Joabe
fugiu para o tabernáculo do Senhor; e eis que es
Adonias — a primeira de uma trilogia tá junto ao altar. Então Salomão enviou Benaías,
sangrenta de execuções pelo homem forte filho de Jeoiada, dizendo: Vai, mata-a ^Foi, pois,
e leal dentre os partidários de Salomão. Benaías ao tabernáculo do Senhor, e disse a
181
Joabe: Assim diz o rei: Sai daí. Respondeu Joa- é que a mesma truculência com que ele
be: Não! porém aqui morrerei. E Benaías tornou eliminou todos os seus rivais é o instru
com a resposta ao rei dizendo: Assim falou Joabe,
e assim me respondeu. 31Ao que lhe disse o rei: mento pelo qual seu sucessor o elimina. O
Faze como ele disse; mata-o, e sepulta-o, para que julgamento de Deus sobre a violência bru
tires de sobre mim e de sobre a casa de meu pai tal é bem expresso nas palavras de Jesus
o sangue que Joabe sem causa derramou. 32Assim no Getsêmani: “Todos os que lançam mão
o Senhor fará recair o sangue dele sobre a sua da espada, à espada morrerão” (Mt 26.52).
cabeça, porque deu sobre dois homens mais justos
e melhores do que ele, e os matou à espada, sem
que meu pai Davi o soubesse, a saber: a Abner, g. A Retribuição de Simei (2.36-46)
filho de Ner, chefe do exército de Israel, e a
Amasa, filho de Jeter, chefe do exército de Judá. “ Depois o rei mandou chamar a Simei e lhe
33Assim recairá o sangue destes sobre a cabeça disse: Edifica para ti uma casa em Jerusalém,
de Joabe e sobre a cabeça da sua descendência habita aí, e daí não saias, nem para uma nem
para sempre; mas a Davi, e à sua descendência, para outra parte. 37E fica sabendo que, no dia em
e á sua casa, e ao seu trono, o Senhor dará paz que saíres e passares o ribeiro de Cedrom, decer
para sempre. 34Então Benaías, filho de Jeoiada, to hás de morrer. O teu sangue será sobre a tua
subiu e, arremetendo contra Joabe, o matou. E cabeça. 38Respondeu Simei ao rei: Boa é essa
foi sepultado em sua casa, no deserta 35Em lugar palavra; como tem dito o rei meu senhor, assim
dele o rei pôs a Benaías, filho de Jeoiada, sobre fará o teu serva E Simei habitou em Jerusalém
o exército; e a Zadoque, o sacerdote, pôs em lu muitos dias. 39Sucedeu porém que, ao cabo de
gar de Abiatar. três anos, dois servos de Simei fugiram para
Áquis, filho de Maacá, rei de Gate. E deram par
te a Simei dizendo: Eis que teus servos estão em
Gate. 40Então Simei se levantou, albardou o seu
Joabe sabia que era o próximo da lista jumento e foi a Gate ter com Áquis, em busca
de Salomão. Ainda que não tinha se des dos seus servos; assim foi Simei, e os trouxe de
viado após Absalão indica que o historia Gate. 41Disseram a Salomão que Simei fora de
dor se recorda da lealdade de Joabe para Jerusalém a Gate, e já havia voltada 42Então o
com Davi durante a tão difícil e crucial rei mandou chamar a Simei e lhe disse: Não te
conjurei pelo Senhor e não te protestei, dizendo:
revolta de seu filho favorito. O apoio de No dia em que saíres para qualquer parte, sabe
Joabe a Adonias não representava qual de certo que hás de morrer? E tu me disseste:
quer deslealdade a Davi, cujo sucessor le Boa é essa palavra que ouvi. 43Por que, então, não
gítimo presumivelmente seria o mais velho guardaste o juramento do Senhor, e a ordem que
te dei? 44Disse-lhe mais: Bem sabes tu, e o teu
dentre os filhos sobreviventes. A reivindi coração reconhece toda a maldade que fizeste a
cação de asilo, de que se valera Adonias Davi, meu pai; pelo que o Senhor fará recair a
(1.50 e ss.), não seria aceita para Joabe. O tua maldade sobre a tua cabeça. 45M as o rei
temor de violar o altar e suas poderosas Salomão será abençoadoi, e o trono de Davi será
confirmado perante o Senhor para sempre. 46E o
pontas por uma execução dessas revela-se rei deu ordem a Benaías, filho de Jeoiada, o qual
na relutância de Benaías e na necessidade saiu, e feriu a Simei, de modo que morreu. Assim
de uma segunda ordem. A preferência de foi confirmado o reino na mão de Salomãa
Joabe por morrer junto ao altar é respei
tada por Salomão, e essa segunda senten Simei era um benjamita de Baurim, su
ça de execução provê uma palavra de jus ficientemente rico para liderar mil homens
tificativa por realizar os últimos desejos para se encontrarem com Davi, quando
de seu pai com relação ao sanguinário suplicou anistia pela terrível maldição
Joabe (cf. v. 5,6). As palavras sem causa (2Sm 19.16 e s.). O único sobrevivente da
(...) dois homens mais justos e melhores família de Saul deve permanecer em Jeru
do que ele não constavam da determina salém. O ribeiro de Cedrom fica no vale,
ção de Davi. Isso não obscurece o benefí logo ao oriente de Jerusalém, e tinha de
cio político para Salomão em livrar-se de ser atravessado para ir para o território
um perigoso velho guerrilheiro. benjamita. Simei prontamente aceitou as
A ironia final do longo serviço de Joa condições de anistia. A extradição de es
be como principal homem forte de Davi cravos fugitivos era prevista na legislação
182
babilónica e era conhecida por todo Ori Isso serve ao propósito de iniciar a história
ente Próximo no segundo milênio a.C. de Salomão onde esta termina, com a
(Montgomery, p.97). Negociações pessoais história de sua apostasia para as religões
eram muitas vezes necessárias em tais ca de suas esposas estrangeiras.
sos — o que talvez explique a ida de Si-
mei para Gate atrás deles. Como a repre a. A Aliança Imperial com o Faraó (3.1,2)
ensão do rei indica, a quebra de juramen
‘Ora, Salomão aparentou-se com Faraó, rei do
to constituía sério crime. O rei Salomão Egito, pois tomou por mulher a filha dele; e a trouxe
será abençoado em livrar-se da velha mal à cidade de Davi, até que acabasse de edificar a
dição, e de quaisquer efeitos prejudiciais sua casa, e a casa do Senhor, e a muralha de Jeru
dela. Por desincumbir-se dos últimos dese salém em redor. 2Entretanto o povo oferecia
sacrificios sobre os altos, porque até aqueles dias
jos de seu pai, Salomão reivindica nova ainda não se havia edificado casa ao nome do
mente a promessa dinástica. Simei bem Senhor.
poderia ter-se dado ao luxo de deixar li
vres os dois escravos caso tivesse percebi Fazia parte da política externa de
do quão escrupulosamente Salomão man Salomão, pela qual ele mantinha a paz e
teria o juramento. estabelecia relações comerciais com muitas
Assim foi confirmado o reino. Neste nações, tomar esposas estrangeiras em
ponto a Septuaginta acrescenta uma cole alianças matrimoniais. Como a primeira
tânea ou miscelânea de matérias sobre dessas esposas, a filha de Faraó tornou-se
Salomão. Com essa nota o historiador a rainha de Salomão, com seu próprio
conclui a utilização da maravilhosa fonte palácio particular. Este foi um arranjo
documental sobre a sucessão do trono da- singular, uma vez que Faraós anteriores
vídico. haviam-se recusado em dar as filhas em
casamento a reis estrangeiros. A esta infor
2. A Sabedoria de Salomão (3.1—4.34) mação pertencem as palavras adicionais
sobre a filha de Faraó (9.16,24), onde se diz
Os próximos nove capítulos de IReis que Salomão recebeu a destruída cidade de
podem ser vistos como uma unidade em Gezer como dote.
que o historiador faz uso do “livro dos
atos de Salomão” (cf. 11.41 e s.). O estilo b. Oração de Salomão (3.3-9)
é episódico e contém uma variedade de 3E Salomão amava ao Senhor, andando nos
materiais. A sabedoria de Salomão é de estatutos de Davi, seu pai; exceto que nos altos
dois tipos. Primeiramente, ocorre a sabe oferecia sacrificios e queimava incensa 4Foi, pois,
doria administrativa para governar o povo o rei a Gibeão para oferecer sacrificios ali, porque
de Deus, pela qual ele ora a Deus em seu aquele era o principal dentre os altos; mil holo-
caustos sacrificou Salomão naquele altar. 5Em
sonho de Gibeão. A seguir há uma sabe Gibeão apareceu o Senhor a Salomão de noite em
doria proverbial associada com a autoria sonhos, e disse-lhe: Pede o que queres que eu te
da literatura de sabedoria por Salomão. dê. ‘Respondeu Salomão: De grande benevolência
usaste para com teu servo Davi, meu pai, porquan
to ele andou diante de ti em verdade, em justiça,
1) O Sonho em Gibeão (3.1-15) e em retidão de coração para contigo; e guardaste-
-lhe esta grande benevolência, e lhe deste um filho
que se assentasse no seu trono, como se vê neste
O historiador confirma a escolha de dia. 7Agora, pois, ó Senhor meu Deus, tu fizeste
Salomão para suceder a Davi, narrando a reinar teu servo em lugar de Davi, meu pai. E eu
história da oração de Salomão em que pede sou apenas um menino pequeno; não sei como sair,
sabedoria, e a graciosa resposta do Senhor, nem como entrar. 8Teu servo está no meio do teu
povo que elegeste, povo grande, que nem se pode
concedendo seu desejo. Mas primeiro o contar, nem numerar, pela sua multidãa ’Dá, pois,
historiador inclui uma nota sobre o casa a teu servo um coração entendido para julgar o
mento de Salomão com a filha de Faraó. teu povo, para que prudentemente discirna entre
183.
o bem e o mal; porque, quem poderia julgar a este fracassou em viver à altura de seus ideais
teu tão grande povo? (cf. 11.4,6).
O historiador introduz a oração ao fazer c. A Resposta do Senhor (3.10-15)
uma avaliação religiosa de Salomão. 10E pareceu bem aos olhos do Senhor o ter
Salomão amava ao Senhor, mas tem de se Salomão pedido tal coisa. nPelo que Deus lhe
acrescentar uma restrição: exceto que nos disse: Porquanto pediste isso, e não pediste para
altos oferecia sacrifícios, especialmente o ti muitos dias, nem riquezas, nem a vida de teus
inimigos, mas pediste entendimento para discer
grande alto em Gibeão. Gibeão (a moderna nires o que ê justo, 12eis que faço segundo as tuas
El-Jib), cerca de dez quilômetros a noroeste palavras. Eis que te dou um coração tão sábio e
de Jerusalém, recentemente tem sido esca entendido, que antes de ti teu igual não houve, e
vada por J. B. Pritchard (cf. IDB, vol. II, depois de ti teu igual não se levantará. 13Também
p. 391-393). Há informação de que o taber te dou o que não pediste, assim riquezas como glória;
de modo que não haverá teu igual entre os reis,
náculo com seu altar de sacrifícios de por todos os teus dias. 14E ainda, se andares nos
bronze estava ali (lCr 16.39). meus caminhos, guardando os meus estatutos e os
Talvez Salomão tivesse ido a Gibeão não meus mandamentos, como andou Davi, teu pai,
só para fazer sacrifícios de holocaustos, mas prolongarei os teus dias. 15Então Salomão
acordou, e eis que era sonha E, voltando ele a Jeru
para inquirir o Senhor. Acreditava-se que salém, pôs-se diante da arca do pacto do Senhor,
um método bem comum de comunicação sacrificou holocaustos e preparou sacrifícios pací
divina era um sonho com significado (cf. ficos, e deu um banquete a todos os seus servos.
ISm 28.6). Tal sonho freqüentemente A concessão, por Deus, do pedido que
ocorria num local sagrado (cf. Jacó, Gn Salomão fez de sabedoria faz lembrar as
28.11-16, e Samuel, ISm 3.3-9). Esse relato palavras de Tiago (1.5). Deus congratulou-
tem sido comparado a revelações, por se com o jovem rei por seus juízos de valor
sonhos, a vários Faraós do Egito. Na lite
e pelo altruísmo de sua oração. Ele poderia
ratura religiosa cananéia, proveniente de ter apresentado pedidos egoístas ou mesmo
Ras Shamra, tanto o rei Querete como o
vingativos, mas pensou primeiro em suas
antigo dignitário Daniel (cf. Ez 14.14,20; responsabilidades para com o povo de Deus.
28.3) têm visões por sonhos (Gray, p. 120).
Caso alguém tivesse de avaliar o reinado
Pede o que queres que eu te dê. Aqui de Salomão por uma perspectiva puramente
o sonho é um meio de revelação direta de humana, sua riqueza poderia ser atribuída
uma palavra de Deus, e não de símbolos a sua grande habilidade comercial. Mas a
carecendo de interpretação. Essa misteriosa interpretação particular das Escrituras é de
ordem de Deus vem a ser um teste das prio que sua sabedoria foi um dom especial de
ridades do jovem monarca. Salomão reage
Deus, de modo que tudo quanto foi conquis
com o linguajar da corte, revelando humilde
tado por sua sabedoria, tanto administrativa
subserviência a Deus. Ele expressa sua inca quanto prática, é também um dom de Deus.
pacidade com respeito às cargas de sua nova A aliança davídica era condicional para
função e da administração cotidiana das cada geração sucessiva da dinastia, sendo
questões de estado. A população havia cres que a duração do reinado terreno de um
cido notavelmente durante o reino unido rei dependia de sua obediência a Deus. Esse
(Albright, p. 55,56). Coração entendido para cenário serve para confirmar a liderança
julgar, literalmente “um coração que ouve de Salomão sobre o povo de Deus, sendo
para julgar”, refere-se àquela sabedoria que a revelação por sonho tomava o lugar
prática, requerida do rei como instância de
da liderança carismática de épocas ante
apelação para casos difíceis, tal como o que riores.
segue. Discirna entre o bem e o mal parece,
pois, aqui referir-se a decisão legal. Essa 2) O Julgamento das Prostitutas (3.16-28)
oração bem piedosa deve ser posta em 16Então vieram duas mulheres prostitutas ter
contraste com o relato realista de como ele com o rei, e se puseram diante dele. 17E disse-lhe
184
uma das mulheres: Ah, meu senhor! eu e esta mulher O jovem rei revela uma sabedoria divina
moramos na mesma casa; e tive um Olho, estando que não é própria de sua idade, um discer
com ela naquela casa. 18E sucedeu que, no terceiro
dia depois do meu parto, também esta mulher teve nimento e sagacidade muito admirados em
um filha Estávamos juntas; nenhuma pessoa Israel. Seu estratagema para chegar à
estranha estava conosco na casa; somente nós duas verdade é uma proposta decidida e chocante
estávamos ali. 19Ora, durante a noite morreu o de matar a criança remanescente. O amor
filho desta mulher, porquanto se deitara sobre ele. da mãe verdadeira é tão sensível que oferece
20E ela se levantou no decorrer da noite, tirou do
meu lado o meu filho, enquanto a tua serva dormia, uma certeza, na qual o rei percebe que pode
e o deitou no seu seio, e a seu filho morto deitou-o se basear. A sentença do julgamento nada
no meu seia 21Quando me levantei pela manhã, fala sobre a punição da outra mulher, que
para dar de mamar a meu Olho, eis que estava morto; havia sido culpada de tal crueldade. A lição
mas, atentando eu para ele à luz do dia, eis que
não era o filho que me nascera. 22Então disse a básica da história não é o caso em si, mas
outra mulher: Não, mas o vivo é meu filho, e teu a sabedoria com que foi resolvido, a sabe
filho o m orta Replicou a primeira: Não; o morto doria de Deus.
é teu filho, e meu filho o viva Assim falaram perante
o rei. 23Então disse o rei: Esta diz: Este que vive 3) Os Oficiais de Salomão (4.1-19)
é meu filho, e teu filho o morto; e esta outra diz:
Não; o morto é teu filho, e meu filho o viva MDisse Estes registros são incluídos a partir dos
mais o rei: TVazei-me uma espada. E trouxeram anais para ilustrar o gênio administrativo
uma espada diante dele. 25E disse o rei: Dividi em
duas partes o menino vivoi, dai a metade a uma, de Salomão; seguem uma tendência
e metade a outra. “ Mas a mulher cujo filho era iniciada sob Davi (cf. 2Sm 8.15-18;
o vivo falou ao rei (porque as suas entranhas se 20.23-26).
lhe enterneceram por seu filho), e disse: Ah, meu
senhor! dai-lhe o menino vivo, e de modo nenhum
o mateis. A outra, porém, disse: Não será meu, a. Os Oficiais da Corte (4.1-6)
nem teu; dividi-a 27Respondeu, então, o rei: Dai 'Assim foi Salomão rei sobre todo o Israel. 2E
à primeira o menino vivo, e de modo nenhum o estes eram os príncipes que tinha: Azarias, filho
mateis; ela é sua mãe. ME todo o Israel ouviu a de Zadoque, era sacerdote; 3Eliorefe e Aias, filhos
sentença que o rei proferira, e temeu o rei; porque de Sisa, secretários; Jeosafá, filho de Ailude,
viu que havia nele sabedoria de Deus para fazer cronista; 4Benaías, filho de Jeoiada, estava sobre
justiça. o exército; Zadoque e Abiatar eram sacerdotes;
sAzarias, filho de Natã, estava sobre os inten
O Targum revela-se embaraçado com o dentes; Zabude, filho de Natã, era o oficial-mor,
termo prostitutas e registra “estalajadeiras”. amigo do rei; 6Aisar, o mordomo; e Adonirão, filho
de Abda, estava sobre a gente de trabalhos forçados.
A prostituição era tolerada na sociedade
israelita como sendo um mal necessário, Os príncipes formavam o gabinete de
embora a fornicação com prostitutas fosse Salomão, sendo seus ministros. (1) Azarias,
considerada falta de sabedoria (Pv filho de Zadoque, era o sacerdote e sucessor
23.26-28). É logicamente algo condenado do pai. Isso indica que a lista refere-se a
à luz do ensino bíblico no seu todo. No caso um período posterior na administração de
em tela, a prostituta é vista como alguém Salomão (modificando o v. 4b). (2) Eliorefe
desamparado diante da lei, sem ninguém e Aias, filhos de Sisa, eram os secretários,
para defender-lhe a causa. Portanto, um guardiães de documentos oficiais. (3)
apelo especial é dirigido ao rei. A reclamante Jeosafá, filho de Ailude, era o cronista, que
no caso narra de modo expressivo a história chamava a atenção do rei para determi
de um crime desapiedado, para o qual, nados assuntos (havia também sido cronista
devido à natureza da situação, não teria de Davi). (4) Benaías, filho de Jeoiada, era
havido testemunhas. Seu principal argu o comandante do forte exército regular de
mento é de que uma mãe reconhecerá seu Salomão. (5) Azarias, filho de Natã, era o
próprio filho mesmo na mais tenra infância. arrecadador-chefe de impostos sobre os
A acusada simplesmente contesta a vera oficiais de distrito mencionados em 4.7-19.
cidade da história. (6) Zabude, filho de Natã, era “amigo do
185
rei”, um conselheiro real como o pai. (7) para equilibrar os recursos econômicos dos
Aísar, encarregado do palácio, era o distritos.9
mordomo real. Os três cargos — secretário, A seqüência geográfica dos distritos
cronista, e mordomo — seguiam o modelo começa com a região montanhosa de
da organização da corte egípcia (de Vaux, Efraim. Os três distritos seguintes ficam no
p. 129-132). (8) Adonirão, incumbido dos oeste, um ao norte, dois a leste, três na Gali-
trabalhos forçados, tem sido identificado léia, e dois ao sul. Como se pode verificar,
como o Adorão mencionado no fim do Judá não aparece nessa lista. Há doze
reinado de Davi, e novamente após a morte distritos sem Judá, e alguns têm suposto
de Salomão (2Sm 20.24; lRs 12.18). que Salomão isentou Judá do encargo dos
impostos. É provável que Judá tivesse já
sido organizado num sistema à parte por
b. Os Oficiais de Província (4.7-19) Davi (de Vaux, p. 133-135).
7Salomão tinha doze intendentes sobre todo o 4) A Prosperidade e Extensão do Reino
Israel, que proviam de mantimentos ao rei e à sua
casa; e cada um tinha que prover mantimentos para (4.20-28)
um mês no ano. 8São estes os seus nomes: Bene- 20Eram, pois, os de Judá e Israel numerosos,
-Hur, na região m ontanhosa de Efraim. como a areia que está à beira do mar; e, comendo
9Bene-Dequer, em Macaz, Saalabim, Bete-Semes e bebendo, se alegravam. 21E dominava Salomão
e Elom-Bete-Hanã; “ Bene-Hesede, em Arubote; sobre todos os reinos, desde o rio até a terra dos
também este tinha Socó e toda a terra de Hefer; filisteus e até o termo do Egito; eles pagavam
"Bene-Abinadabe, em toda a região alta de Dor; tributo, e serviram a Salomão todos os dias da sua
tinha este a Tafate, filha de Salomão, por mulher; vida. 220 provimento diário de Salomão era de
12Baaná, filho de Ailude, em Taanaque e Megido, trinta coros de flor de farinha, e sessenta coros de
e em toda a Bete-Seã, que está junto a Zaretã, farinha; “ dez bois cevados, vinte bois de pasto e
abaixo de Jizreel, desde Bete-Seã até Abel-Medá, cem ovelhas, afora os veados, gazelas, cabras
para além de Jocmeão; 13o filho de Geber, em montesas e aves cevadas. 24Pois dominava ele
Ramote-Gileade; tinha este as aldeias de Jair, filho sobre toda a região e sobre todos os reis daquém
de Manassés, as quais estão em Gileade; também do rio, desde Tifca até Gaza; e tinha paz por
tinha a região de Argobe, o qual está em Basã, todos os lados em redor. 25Judá e Israel habi
sessenta grandes cidades com muros e ferrolhos tavam seguros, desde Dã até Berseba, cada um
de bronze; '‘‘Aínadabe, filho de Ida, em Maanaim; debaixo da sua videira, e debaixo da sua figueira,
lsAimaaz, em Naftali; também este tomou a Base- por todos os dias de Salomão. S alo m ão tinha
mate, filha de Salomão, por mulher; 16Baaná, filho também quarenta mil manjedouras para os cavalos
de Hasai, em Aser e em Alote;17Jeosafá, filho de dos seus carros, e doze mil cavaleiros.27Aqueles
Paruá, em Issacar; 18Simei, filho de Elá, em intendentes, pois, cada um no seu mês, proviam
Benjamim; 19Geber, filho de Úri, na terra de de mantimentos o rei Salomão e todos quantos se
Gileade, a terra de Siom, rei dos amorreus, e de chegavam à sua mesa; coisa nenhuma deixavam
Ogue, rei de Basã; havia um só intendente naquela faltar. 2,1Também traziam, cada um segundo seu
terra. cargo, a cevada e a palha para os cavalos e os
ginetes, para o lugar em que estivessem.
Esta lista também foi elaborada num Essa miscelânea inclui declarações
período posterior ao reinado de Salomão, sobre a prosperidade do reino (v. 20,25), a
uma vez que dois dos governadores de extensão do império (v. 21,24), as provisões
distrito eram genros de Salomão (4.11,15). para a corte (v. 22,23,27), e os animais para
Os doze intendentes não são um reflexo da as carruagens (v. 26,28). O crescimento
confederação de doze tribos, mas uma populacional, indicado por numerosos,
medida prática para abastecer com como a areia que está à beira do mar, era
provisões a vasta e intrincada estrutura da um sinal de prosperidade (cf. Gn 22.17).
corte em Jerusalém. Segundo as descrições Uma apresentação idealística da paz e
dos limites desses distritos, Salomão mudou prosperidade material do fazendeiro israe
deliberadamente as antigas fronteiras tribais 9 G. E m est W right, ‘T h e Provinces o f Soiomon* Eretz-Israel, VoL 8
para ter um controle mais firme e, também, (1967), p. 58-68.
186
lita, cada qual habitando contente debaixo 5) A Reputação da Literatura de Sabedo
da sua videira, e debaixo da sua figueira, ria (4.29-34)
torna-se uma descrição típica da felicidade 29O ra, Deus deu a Salomão sabedoria, e
hebraica do dia-a-dia (2Rs 18.31; Mq 4.4; muitíssimo entendimento, e conhecimentos múlti
Zc 3.10). plos, como a areia, que está na praia do mar.
3(1A sabedoria de Salomão era maior do que a de
A extensão ideal do império de Sa todos os do Oriente e do que toda a sabedoria dos
lomão é apresentada duas vezes: primeiro egípcios.31Era ele ainda'mais sábio do que todos
em termos gerais no versículo 21 e depois os homens, mais sábio do que Etã, o ezraita, e do
em termos mais precisos no versículo 24 que Hemã, Calcol e Darda, filhos de Maol; e a
sua fama correu por todas as nações em redor.
— desde Tifca até Gaza. As conquistas 32Proferiu ele três mil provérbios, e foram os seus
militares de Davi haviam sido consolida cânticos mil e cinca 33Dissertou a respeito das
das por Salomão mediante acordos comer árvores, desde o cedro que está no Líbano até o
ciais. Um tal império sírio-palestino era hissopo que brota da parede; também dissertou
possível somente quando os impérios sobre os animais, as aves, os répteis e os peixes.
34De todos os povos vinha gente para ouvir a
maiores do Egito e Mesopotâmia esti sabedoria de Salomão, e da parte de todos os reis
vessem fracos. Tifsa era um local de tra da terra que tinham ouvido da sua sabedoria.
vessia na grande curva ocidental do rio
Eufrates, a fronteira noroeste do reino O segundo sentido da palavra sabedoria
arameu de Hamate (2Sm 8.3-12). O limite nas tradições a respeito de Salomão é de
uma sabedoria internacional, cultural que
meridional era Gaza, a mais meridional de
se tornou a base da sua reputação como
três cidades costeiras filistéias que manti
autor e compilador de literatura de sabe
nham certo grau de independência. A
doria. Essa sabedoria está ligada a suas
oriente, Edom, Moabe e Amom estavam
sob controle direto de Salomão. A Fenícia relações diplomáticas internacionais, par
retinha sua independência devida a seus ticularmente como o rei de Tiro, a rainha
acordos comerciais com Salomão (Bright, de Sabá, e o Faraó seu sogro (Thomas,
p. 172-186).
p. 192,193, Lâmina V).
Essa lista de homens, sobre os quais
A provisão diária para a intrincada Salomão era mais sábio, começa com
estrutura da corte de Salomão ilustra o que todos os do Oriente, o que poderia indi
os oficiais distritais tinham como encargo car povos árabes, babilónicos e arameus.
prover cada dia de seu mês em particular. Todos os homens deve ser emendado para
Se um “coro” equivale a 228 litros, cada “todos os edomitas” uma vez que os
distrito seria taxado em cerca de 205.200 nomes citados têm sido associados por
litros de flor de farinha, 410.400 litros de alguns eruditos aos filhos de Esaú (Gn 36),
farinha, 900 bois e 3.000 ovelhas, além aos homens sábios de Edom indicados em
de corços e aves. Presumindo que a popu Obadias 8, e aos amigos de Jó. Segundo
lação do distrito fosse inferior a 100.000 uma outra interpretação desses nomes,
pessoas, esse era realmente um “pesado eles eram sábios cananeus das corporações
jugo” de impostos (12.4; cf. Albright, musicais, as quais conta-se que Davi teria
p. 56). organizado.10 A poesia dos cananeus,
Parte da glória de Salomão prendia-se recuperada em Ras Shamra, antiga Ugari-
a sua extensa força de cavalos e carros. te, tornou provável uma ligação entre a
Quarenta mil deve ser corrigido para sabedoria cananéia e a hebraica.
“quatro mil” (cf. um MS da LXX; 2Cr Essa tentativa de catalogar a produção
9.25). Doze mil cavaleiros refere-se não a de literatura sapiencial de Salomão faz
cavalaria mas a condutores de carros ou parte da mesma tendência que atribui todo
seus cavalos. Os oficiais distritais também
tinham de providenciar a cevada e a palha
10 W.F. A lbright, A rdiaeology and the K elgion o f Israel (Baltimore:
para os cavalos. T h e Jo h n H opkins Press, 1956, p. 126-129, cf. lC r 6.33,34; SI 88,89.
187
o texto de Provérbios (1.1; mas cf. 30.1; em lugar de seu pai; porquanto Hirão fora sempre
31.1), Eclesiastes e Cântico dos Cânticos muito amigo de Davi. 2Salomão, pois, mamdou
dizer a Hirão: 3Bem sabes tu que Davi, meu pai,
a Salomão. Ele se tornou uma autoridade não pôde edificar uma casa ao nome do Senhor
na compilação das tradições de sabedoria, seu Deus, por causa das guerras com que o
de forma semelhante como ocorreu com cercaram, até que o Senhor lhe pôs os inimigos
Moisés em relação à lei e com Davi em debaixo dos seus pés. 4Agora, porém, o Senhor
relação aos Salmos. Uma recente desco meu Deus me tem dado descanso de todos os
lados; adversário não há, nem calamidade alguma.
berta da Caverna de Qumran, o comprido 5Pretendo, pois, edificar uma casa ao nome do
rolo dos Salmos, contém uma relação Senhor meu Deus, como falou o Senhor a Davi,
semelhante das produções literárias de meu pai, dizendo: Teu filho, que porei em teu lugar
Davi. São-lhe creditados 3.600 salmos, e no teu trono, ele edificará uma casa ao meu nome
‘Portanto, dá ordem agora que do Libano me
seus cânticos para ocasiões religiosas espe cortem cedros; os meus servos estarão com os teus
cíficas eram 450.11 servos; eu te pagarei o salário dos teus servos,
Os assuntos da literatura de sabedoria conforme tudo o que disseres; porque tu sabes que
de Salomão incluíam comparações com entre nós ninguém há que saiba cortar madeira
toda a flora e fauna do mundo natural como os sidônios.
(cf. Pv 30.15 e ss.). Listas abrangentes da Hirão enviou mensageiros a Salomão
ordem criada (cf. SI 104; Jó 38) são co não muito depois deste ter sucedido a Davi
nhecidas na literatura egípcia e meso- como rei. Este é o mesmo Hirão que havia
potâmica. Salomão implantou hábitos na construído o palácio de Davi em Jerusa
vida da corte de Jerusalém, de conformi lém. Por cansa das guerras, Davi tinha
dade com a requintada atmosfera cultural estado por demais empenhado em suas
dos impérios com que tinha relações co batalhas para poder edificar um templo.
merciais e diplomáticas. Mas toda essa Duas outras razões são dadas para Davi
glória não deixou de ter seu preço sobre não ter edificado um templo. O oráculo de
o caráter distintivo da aliança de fé de Natã indicara que o Senhor preferia um
Israel. santuário-tenda, em vez de um tipo ca-
naneu de santuário (2Sm 7.4-7). Crônicas
3. O Templo de Salomão (5.1—7.51) interpreta que era inadequado para um
Salomão tinha reputação não só de ser homem de muitas batalhas sangrentas
um homem sábio, mas também de um edificar um santuário ao Senhor (lCr
construtor, particularmente o construtor 22.8,9; 28.3). Antes, um homem de paz
do templo de Jerusalém. O interesse re (o significado do nome Salomão) seria o
ligioso de historiador revela-se pela quan construtor apropriado do templo de Deus.
tidade de material que retira dos arquivos Salomão tirou vantagem das saudações
do templo para aqui incluí-los. A prepa de Hirão para fazer negócio com ele.
ração para a construção, a ornamentação Salomão elogiou as habilidades dos fení
do edifício com decoração, móveis e traba cios bem como seus materiais de cons
lhos em metal compõem esta ação da trução. Após Davi ter dominado os filis
história. teus, cujo poder marítimo havia monopo
lizado por dois séculos a costa da Pales
1) O Tratado com Hirão, Rèi de Tiro tina, os fenícios conquistaram a supre
(5.1-18) macia no mar. Hirão dependia de Salomão
a. O Propósito de Salomão em Construir porque Salomão controlava as rotas co
(5.1-6) merciais terrestres com a Arábia.
‘Hirão, rei de Tiro, enviou os seus servos a b. Hirão Provê Madeiras de Lei (5.7-12)
Salomão, quando ouviu que o haviam ungido rei
7Quando Hirão ouviu as palavras de Salomão,
11 J.A. Sanders, The Psalm s Scroll of Q um ran Cave 11 (Oxford: At muito se alegrou, e disse: Bendito seja hoje o Senhor,
the Clarendon Press, 1965), p. 91-93. que deu a Davi um filho sábio sobre este tão
188
grande pova 8E Hirão mandou dizer a Salomão: e a leva se compunha de trinta mil homens.
Ouvi o que me mandaste dizer. Eu feirei tudo 14E os enviava ao Lfbano por turnos, cada mês
quanto desejas acerca das madeiras de cedro e de dez mil; um mês estavam no Libano, e dois meses
cipreste 9Os meus servos as levarão do Líbano cada um em sua casa; e Adonirão estava sobre a
até o mar, e farei conduzi-las em jangadas pelo leva. 15Tinha também Salomão setenta mil que
mar até o lugar que me designares; ali as de levavam as cargas, e oitenta mil que talhavam
samarrarei, e tu as receberás; também farás pedras nas montanhas, 16afora os mestres de obra
o meu desejo, dando sustento à minha casa. que estavam sobre aquele serviço, três mil e
10Assim dava Hirão a Salomão madeira de cedro trezentos, os quais davam'as ordens aos trabalha
e madeira de cipreste, conforme todo o seu deseja dores. 17Por ordem do rei eles cortaram grandes
HE Salomão dava a Hirão vinte mil coros de pedras, de grande preço, para fundarem a casa em
trigoi, para sustento da sua casa, e vinte coros de pedras lavradas. 18Lavraram-nas, pois, os edifica
azeite batido; isso fazia anualmente. 12Deu, pois, dores de Salomão, e os de Hirão, e os gebalitas,
o Senhor a Salomão sabedoria, como lhe tinha e prepararam as madeiras e as pedras para edi
prometida E houve paz entre Hirão e Salomão; ficar a casa.
e fizeram aliança entre si.
Esse relato de trabalhos forçados deter
Hirão concordou não só em fornecer os minados por Salomão parece estar em
materiais, mas também em supervisionar contradição com as declarações idealísti-
seu transporte por jangada desde Tiro cas do historiador, feitas em outra seção,
descendo o litoral (até Jope, 2Cr 2.16). de que Salomão não escravizou nenhum
Em retorno, Salomão tinha de fornecer israelita em sua equipe de trabalhos for
alimentos para a corte de Hirão, vinte mil çados (9.22). Os 150.000 mencionados no
coros de trigo, cerca de 4.560.000 litros versículo 15 podem representar um grupo
(cf. 4.22). Azeite batido era o óleo de recrutado em antigas cidades-estados
oliva mais fino, espremido manualmente. cananéias que Davi havia conquistado
A enorme quantidade talvez indique que (Noth, p. 211). Para tais, o número de 3.300
parte desses materiais destinava-se ao supervisores seria apropriado, correspon
comércio (Gray, p. 146). Isso representava dendo a um supervisor para cerca de
uma imensa sangria para a economia do cinqüenta trabalhadores. Os 30.000 eram
reino de Salomão. Fizeram aliança é, uma equipe de emergência para cortar
literalmente, “cortaram uma aliança”. madeira no Líbano, e atuavam em turnos
Essa expressão hebraica refere-se à ceri de 10.000 por mês.
mônia religiosa de compartilhar uma Inegavelmente, isso constituía uma
refeição sacrifical juntos. Esse tratado clara imposição sobre os agricultores isra
continuou a ser vantajoso para Salomão, elitas livres, que já estavam sobrecarrega
pois obteve de Tiro seus artesãos em metal, dos com um pesado sistema de impostos
e também o auxílio de Hirão para cons e de manutenção da corte. Isso também
truir uma frota (9.26-28; 10.11,22). Por era um “pesado jugo” (12.4), pelo que Jero-
outro lado, havia um perigo religioso em boão e as tribos setentrionais exigiram
tais alianças (Ex 23.32; 34.12,15; Dt 7.1; uma amarga compensação. Mas Salomão
Jz 2.2). Salomão selou essa aliança com havia iniciado um grande empreendimen
um acréscimo a seu harém, pois mulheres to, e essa tarefa de construção exigia o que
sidônias estão enumeradas entre aquelas havia de melhor em materiais e habilidade
mulheres estrangeiras de que se diz que ele artesanal.
amou, e declara-se que seu coração se des
viou após Astarote, a deusa dos sidônios 2) O Tempo da Edificação do Templo
(11.1,4,5). (6.1-38)
c. Trabalhos Forçados Para o Líbano Esse relato literário, juntamente com as
(5.13-18) descrições ligeiramente diferentes em
‘’Também o rei Salomão fez, dentre todo o Crônicas e Ezequiel (2Cr 3-4; Ez 40-43),
Israel, uma leva de gente para trabalho forçado; é tudo quanto resta do templo de Salomão.
189
Evidentemente o relato baseou-se em seus genérico para um templo que era simples
detalhes num arquivo do templo. O histo mente concebido como uma casa para a
riador estava mais interessado no templo divindade. O templo salomônico não
do que em todos os outros edifícios do recebeu um nome próprio como foi o caso
complexo real, e de modo algum era o mais de muitos templos do antigo Oriente
amplo. Próximo. A casa consistia de as duas salas
interiores do santuário, com um terceiro
a. Planos Gerais Para a Estrutura (6.1-10) cômodo, o vestíbulo ou pórtico, na frente.
'Sucedeu, pois, que no ano quatrocentos e Segundo o côvado padrão de aproximada
oitenta depois de saírem os filhos de Israel da terra
do Egito, no quarto ano do reinado de Salomão mente 45 centímetros (a medida desde o
sobre Israel, no mês de zive, que é o segundo mês, cotovelo de um homem até a ponta do
começou-se a edificar a casa do Senhor. 2Ora, a dedo médio da mão), as dimensões gerais
casa que o rei Salomão edificou ao Senhor era de da casa eram de 27 metros de comprimento,
sessenta côvados de comprimento, vinte côvados
de largura, e trinta côvados de altura. 3E o pór nove metros de largura e 13,5 metros de
tico diante do templo da casa era de vinte côvados altura. O pórtico era da mesma altura e
de comprimento, segundo a largura da casa, e de largura do santuário, mas tendo somente
dez côvados de largura. 4E fez para a casa janelas 4,5 metros de comprimento.
de gelósias fixas. 5Edificou andares em torno da As janelas eram aberturas bastante
casa, contra a parede, tanto do templo como do
oráculo, fazendo assim câmaras laterais ao seu estreitas na parte superior da estrutura
redor. 6A câmara de baixo era de cinco côvados, principal, acima das câmaras laterais
a do meio de seis côvados, e a terceira de sete mencionadas nessa seção. Essas câmaras
côvados de largura. E do lado de fora, ao redor laterais circundavam três lados da casa
da casa, fez pilastras de reforço, para que as vigas
não se apoiassem nas paredes da casa. 7E edi propriamente dita e consistiam de três
ficava-se a casa com pedras lavradas na pedreira; pavimentos de depósitos ou tesourarias.
de maneira que nem martelo, nem machado, nem O templo da casa, ou lugar santo, como
qualquer outro instrumento de ferro se ouviu na é mais tarde chamado, era o cômodo prin
casa enquanto estava sendo edificada. 8A porta cipal, e foi designado pela palavra hebraica
para as câmaras laterais do meio estava à banda
direita da casa; e por escadas espirais subia-se ao que tanto poderia significar templo como
andar do meio, e deste ao terceira 9Assim, pois, palácio, destacando a teologia real do
edificou a casa, e a acabou, cobrindo-a com traves reinado de Iavé. O oráculo, ou santíssimo
e pranchas de cedro. 10Também edificou os lugar, ficava na parte posterior do templo,
andares, contra toda a casa, de cinco côvados de
altura, e os ligou à casa com madeira de cedra o lugar da própria habitação de Deus (lit.,
o santíssimo), um cubo perfeito com
O escritor destacou a data para o início dimensões de 2,7 metros de cada lado.
da construção do templo para mostrar O versículo 7 interrompe a descrição das
quão rapidamente Salomão começou sua câmaras para uma nota editorial reverente
mais importante obra. O ano quatrocentos a respeito do silêncio ritual da construção
e oitenta, como se vê em outro lugar, é uma do templo.
data sacerdotal geral para doze gerações de b. A Aliança da Presença Divina (6.11-13)
quarenta anos cada (BBC, Vol. 1, p. 323).
O plano básico e as dimensões gerais do "Então veio a palavra do Senhor a Salomão,
templo são claras. As descobertas arque dizendo: 12Quanto a esta casa que tu estás edifi
cando, se andares nos meus estatutos, e executares
ológicas deste século têm fornecido notá os meus preceitos, e guardares todos os meus
veis dados artísticos e arquitetônicos para mandamentos, andando neles, confirmarei para
a reconstituição dos detalhes do templo de contigo a minha palavra, que falei a Davi, teu pai;
Salomão.12 A casa é um termo semítico 13e habitarei no meio dos filhos de Israel, e não
desampararei o meu povo de Israel.
12 Paul Leslie Garber, “A Reconstruction o f Solomon’s Tfemple" Ar-
chaeological Discoveries in the H oly Land. (New York; Thom as Y.
Esta seção interfere no relato dos deta
Crowell Company, 1967), p. 100-111. cf. Wrigt, p. 136-145. lhes sobre a construção em si para tratar
190
de uma questão do mais profundo signifi “ Uma asa de um querubim era de cinco côvados,
cado teológico. É introduzida pelo que é e a outra de cinco côvados; dez côvados havia desde
a extremidade de uma das suas asas até a extre
normalmente uma fórmula de linguagem midade da outra. 25Assim erá também o outro
profética, indicando tratar-se de um querubim; ambos os querubins eram da mesma
lembrete deuteronômico acerca da palavra medida e do mesmo talhe. “ Um querubim tinha
de aliança dinástica dita por Natã a Davi dez côvados de altura, e assim também o outra
(2Sm 7). Essa aliança condicionar-se-ia à 27E pôs os querubins na parte mais interior da
casa. As asas dos querubins se estendiam de
obediência de cada rei sucessivo no trono maneira que a asa de um tocava numa parede, e
davídico (cf. 2.4; 3.14). Também, a promessa a do outro na outra parede, e as suas asas no meio
da presença de Deus entre seu povo estaria da casa tocavam uma na outra. MTambém cobriu
condicionada a sua obediência. de ouro os querubins.
191
abertas; e as cobriu de ouro acomodado ao lavor. templo. A passagem aqui é bem curta em
^Também edificou o átrio interior de três ordens relação com a descrição do templo no capí
de pedras lavradas e de uma ordem de vigas de
cedra 37No quarto ano se pôs o fundamento da tulo 6 e em comparação com a descrição
casa do Senhor, no mês de zive. “ E no undécimo das obras em bronze para o templo, no
anoi, no mês de bul, que é o oitavo mês, se acabou restante do capítulo.
esta casa com todas as suas dependências, e com
tudo o que lhe convinha. Assim levou sete anos para
edificá-la.
a. O Complexo Administrativo (7.1-8)
'Salomão edificou também a sua casa, levando
O tema do querubim guardando treze anos para acabá-la. 2Edificou ainda a casa
palmeiras, provavelmente imaginada como do bosque do Líbano, de cem côvados de compri
a “árvore da vida”, é bem conhecido na arte mento, cinqüenta de largura e trinta de altura, sobre
do Oriente Próximo (cf. Gn 3.24). A quinta quatro ordens de colunas de cedros, e vigas de cedro
sobre as colunas. 3E por cima estava coberta de
parte da parede, na ARA (Almeida Revista cedro sobre as câmaras, que estavam sobre quarenta
e Atualizada) “porta pentagonal”, tem e cinco colunas, quinze em cada ordem. 4E havia
sido interpretada como uma solução três ordens de janelas, e uma janela estava defronte
que permitia que as portas do santo da outra janela, em três fileiras. sTodas as portas
e esquadrias eram quadradas; e uma janela estava
dos santos se abrissem mais amplamente defronte da outra, em três fileiras. ‘Depois fez um
do que normalmente seria o caso com um pórtico de colunas, de cinqüenta côvados de compri
batente retangular (cf. v. 33). O átrio inte mento e trinta de largura; e defronte dele outro
rior era construído com três ordens de pórtico, com suas respectivas colunas e degraus.
7làmbém fez o pórtico para o trono onde julgava,
pedras lavradas, e de uma ordem de vigas isto é, o pórtico do juizo, o qual era coberto de
de cedro. A arqueologia tem ilustrado farta cedro desde o soalho até o teta % em sua casa,
mente o estilo particular de construção de em que morava, havia outrô átrio por dentro do
paredes que é aqui descrito. Parece ter sido pórtico, de obra semelhante à deste; também para
a filha de Faraó, que ele tomara por mulher, fez
seguido nas edificações salomônicas de uma casa semelhante àquele pórtica
Megido, como o foi no templo de Tell Tainat,
muito semelhante ao templo de Salomão. A palavra casa aqui refere-se a todo o
Ciro ordenou que o templo pós-exílico fosse complexo de cinco edifícios, de modo que
edificado do mesmo modo (Ed 6.4; de Vaux, não é de admirar que foram necessários
p. 316). Assim Salomão completou seu treze anos para Salomão concluir seu
santuário real belíssima e ricamente deco grande programa de construção para Jeru
rado, ainda que comparativamente salém (cf. 9.10). Primeiro havia a casa do
pequeno, que lhe exigiu apenas cerca da bosque do Líbano. O edifício mais impo
metade do tempo que gastou para edificar nente de toda a área era esse grande arsenal
seu próprio palácio ali ao lado. Esse templo (cf. 10.17; Is 22.8), com o nome poético
servia basicamente para uso da corte real baseado no uso de bastante cedro na parte
em Jerusalém. Contudo, seu principal interna de sua construção. O escritor
propósito era abrigar a arca, o que lhe fornece suficientes detalhes para indicar
conferia uma contínua importância algo de sua imponência.
nacional. A seguir, seguindo em direção norte
3) O Palácio e Outras Edificações (7.1-12) dentro do complexo, vem o pórtico de
colunas. Devido a seu comprimento de
Ao norte da antiga cidade de Davi cinqüenta côvados, o mesmo da largura do
estendia-se a grande corte, contendo o edifício precedente, às vezes esse edifício
complexo administrativo dos palácios e, no tem sido visto como um pórtico ligado ao
lado mais setentrional, a seção do templo. arsenal. Outros interpretam seu significado
O próprio palácio particular de Salomão, como o de uma entrada para o edifício, no
junto com o de sua rainha, formava uma lado setentrional, o pórtico para o trono
seção intermediária logo ao sul da área do (...) pórtico do julgamento. Esse era o lugar
192
de acesso público ao rei e era considerado é idêntica à daquele descrito em Ezequiel,
como a corte suprema de apelação para ou seja, a de uma torre-tempfo babilónica
todas as pessoas. Foi nesse edifício que o de três níveis (Ez 43.13-17; cf. Wright, p.
grande trono de marfim depois descrito 139, fig. 93); mas o mais provável é que o
(10.18-20) foi colocado para o rei. Mais ao altar de Ezequiel seguiu o formato do novo
norte ficava o próprio palácio de Salomão altar feito pelo rei Acaz, construído segundo
numa seção separada, ao qual se ligava o o modelo de um altar mesopotâmico que
palácio da rainha. ele havia visto em Damasco, e com o qual
substituiu o altar salomônico (2Reis
b. A Alvenaria da Corte (7.9-12) 16.10-16).
9Todas estas casas eram de pedras de grande
preço, cortadas sob medida, tendo as suas foces a. Hirão, o Artesão em Metal de Tiro
por dentro e por fora serradas à serra; e isto desde (7.13,14)
o fundamento até as beiras do teto, e por fora até
o grande átrio. 10Os fundamentos eram de pedras 130 rei Salomão mandou trazer de Tiro a
de grande preçoi, pedras grandes, de dez e de oito Hirão. 14Era ele filho de uma viúva, da tribo de
côvados, "e por cima delas havia pedras de grande Naftali, e fora seu pai um homem de Tiro, que traba
preço, lavradas sob medida, e madeira de cedro. lhava em bronze; ele era cheio de sabedoria, de
lzO átrio grande tinha em redor três ordens de entendimento e de ciência para fazer toda sorte de
pedras lavradas, com uma ordem de vigas de cedro; obras de bronze. Este veio ter com o rei Salomão,
assim era também o átrio interior da casa do Senhor e executou todas as suas obras.
e o pórtico da casa.
Este Hirão não deve ser confundido com
A descrição do trabalho de alvenaria e o rei Hirão de Tiro, que enviou esse hábil
dos alicerces desse extenso projeto de cons artesão para realizar trabalhos especiais na
trução realça a precisão do trabalho dos construção 4o templo de Salomão (2Cr 2.13
pedreiros e o alto custo da obra. Foi prova e s.). Em Crônicas ele é mencionado como
velmente durante essa última parte do filho de uma mulher danita. Aqui sua mãe
programa de construção de Salomão em é chamada uma viúva, da tribo de Naftali.
Jerusalém que ele estendeu seu muro, De qualquer modo, seu pai era um homem
edificou Milo (“enchimento”, talvez uma de Tiro e um artífice em bronze, que ensinou
plataforma elevada para seu palácio) e sua profissão ao filho.
fechou a brecha de Davi (9.15; 11.27). Sabedoria (...) entendimento (...) ciência
eram aspectos de habilidade dos artesãos
4) O Artesanato em Metal Para o Templo e eram considerados um dom especial de
(7.13-51) Deus, como no relato sacerdotal sobre Beza-
A maior parte desta seção tem a ver com leel (Ex 31.2-5). Essas palavras, portanto,
o trabalho em bronze executado no vale devem ser entendidas em seu sentido
do Jordão por um artesão especial vindo prático, que é provavelmente o sentido
da Fenícia. A finalidade desse artesanato original da palavra sabedoria na língua
em metal era o uso no edifício do templo, hebraica. Alguns têm imaginado que Hirão,
onde as pessoas se reuniam para adoração. o artífice, era também um tipo de arquiteto
Uma importante peça do mobiliário do fenício, especialista em construção de
templo que falta nesse relatório é o grande templos cananeus. Contudo, segundo esse
altar de bronze para ofertas queimadas. Está relato, ele era basicamente um artesão em
incluído no livro de Crônicas entre a fabri metal.
cação das grandes colunas de bronze e a
fabricação do mar de fundição (2Cr 4.1 e b. As Colunas de Bronze (7.15-22)
ss.). Fica mais tarde subentendido no relato lsFormou as duas colunas de bronze; a altura
de Reis (8.22,54,64; 9.25). Alguns intér de cada coluna era de dezoito côvados; e um fio
pretes têm suposto que a forma desse altar de doze côvados era a medida da circunferência
193
de cada uma das colunas; l6também (ez dois capi O melhor indício para o significado das
téis de bronze fundido para pôr sobre o alto das colunas de bronze são seus nomes, Jaquim
colunas; de cinco côvados era a altura dum capitel,
e de cinco côvados também a altura do outra (“Ele estabelecerá”) e Boaz (“na força de”).
I7Havia redes de malha, e grinaldas entrelaçadas, Tem-se suposto que essas são as pala
para os capitéis que estavam sobre o alto das vras iniciais de inscrições relativas ao papel
colunas; sete para um capitel e sete para o outra do templo como testemunha visível da esta
18Assim fez as colunas; e havia duas fileiras de
romãs em redor sobre uma rede, para cobrir os bilidade da dinastia davídica. Assim,
capitéis que estavam sobre o alto das colunas; assim Jaquim pode ter tido o sentido de “Ele esta
fez com um e outro capitel. 19Os capitéis que belecerá o trono de Davi para sempre”; e
estavam sobre o alto das colunas, no pórtico, figu Boaz, de “na força de Iavé o rei se regozi
ravam lírios, e eram de quatro côvados. 20Os jará” (IDB, II, 780,781). Conquanto se tem
capitéis, pois, sobre as duas colunas estavam
também justamente em cima do bojo que estava sugerido outro simbolismo que tenha a ver
junto à rede; e havia duzentas romãs, em fileiras com fenômenos cósmicos, é muito mais
em redor, sobre um e outro capitel. 21Depois apropriado procurar algum significado
levantou as colunas no pórtico do templo; levantando histórico.
a coluna direita, pôs-lhe o nome de Jaquim; e levan
tando a coluna esquerda, pôs-lhe o nome de Boaz.
22Sobre o alto das colunas estava a obra de lírios. c. O Mar de Fundição (7.23-26)
E assim se acabou a obra das colunas.
23Fez também o mar de fundição; era redondo
As obras de Hirão que de modo mais e media dez côvados duma borda à outra, cinco
impressionante prestam tributo a seu côvados de altura e trinta de circunferência. 24Por
talento foram essas duas magníficas colunas baixo da sua borda em redor havia botões que o
de bronze. Cada coluna media 8,1 metros cingiam, dez em cada côvado, cercando aquele mar
em redor; duas eram as fileiras destes botões,
de altura e quase 1,8 metro de diâmetro. fundidas juntamente com o mar. 25E firmava-se
Eram ocas, com uma espessura, em metal, sobre doze bois, três dos quais olhavam para o norte;
de cerca de oito centímetros. Sobre o alto três para o ocidente, três para o sul e três para
de cada coluna havia um capitel com o o oriente; e o mar descansava sobre eles, e as partes
posteriores deles estavam para a banda de dentra
formato de uma cuia com 2,2 metros de 26A sua grossura era de três polegadas, e a borda
altura, dos quais 1,8 metro era coberto com era como a de um copo, como flor de lírio; ele levava
obra de lírios decorados com fileiras de dois mil batos.
romãs ornamentais. Tratavam-se de colunas
que se erguiam independentemente diante Não menos impressionante do que as
do templo (2Cr 3.17). colunas de bronze era o mar de fundição.
Muitas funções simbólicas e religiosas Sua bacia redonda tinha o diâmetro de 4,5
têm sido sugeridas para essas colunas de metros e a altura de 2,2 metros. Era também
bronze, além de seu óbvio valor decorativo. feito em bronze espesso, ricamente deco
Albright pensa que seriam gigantescos rado. A bacia repousava sobre quatro apoios
incensários, com fogo perpetuamente quei de três bois cada, voltados para os quatro
mando em seus capitéis em forma de pontos cardeais. Muito se tem especulado
cuia.13 Talvez tenham recebido algum sobre o simbolismo cósmico dessa imensa
significado histórico como representações bacia, com base em seu nome hebraico, yam
da coluna de fogo à noite e da coluna de (mar; Wright, p. 140). Na literatura religiosa
nuvem de dia, o que significava a direção cananéia Yam é um inimigo importante de
de Iavé no deserto (cf. Is 4.5). Outros as Baal na luta pela supremacia (Thomas, p.
têm considerado como masseboth estili 129). Crônicas observa que o mar servia
zados, como as colunas de pedra que a uma função prática, para as abluções dos
flanqueavam as entradas dos templos cana- sacerdotes (2Cr 4.6). Contudo, sua altura
neus (de Vaux, p. 314). parece proibitiva para tal função. Certa
mente seu principal valor prático era o de
13 O p. cit., p. 144-148 uma bacia de armazenamento dágua, a qual
194
chegaria por algum sistema de encana com suas pias: a lavagem dos utensílios para
mento até as pias dos dez suportes. os holocaustos (2Cr 4.6).
195
fez para a casa do Senhor. Então trouxe Salomão lugar de descanso no lugar santíssimo, inclui
as coisas que seu pai Davi tinha consagrado, a saber, um longo discurso e oração de Salomão,
a prata, o ouro e os vasos; e os depositou nos
tesouros da casa do Senhor.
e conclui com um relato da festa. Acrescida
à história da dedicação propriamente dita
A última seção do capítulo não está rela há uma resposta do Senhor à prece de
cionada intimamente com a que Salomão.
imediatamente a precede. A descrição de
todos os móveis de bronze do pavilhão do
1) A Procissão da Arca (8.1-11)
templo parecia requerer alguma ênfase
sobre os móveis do interior da casa. O altar 'Então congregou Salomão diante de si em
de ouro é provavelmente o altar de incenso Jerusalém os anciãos de Israel, e todos os cabeças
já mencionado numa referência ao lugar das tribos, os chefes das casas paternas, dentre os
filhos de Israel, para fazerem subir da cidade de
santo (6.20,22). A mesa de ouro, sobre a Davi, que é Sião, a arca do pacto do Senhor. 2De
qual estavam os pães da proposição era maneira que todos os homens de Israel se congre
semelhante á mesa do tabernáculo (Ex garam ao rei Salomão, na ocasião da festa, no mês
25.23-30; BBC, Vol. 1, p. 433,434). O ritual de etanim, que é o sétimo mês. 3E tendo chegado
todos os anciãos de Israel, os sacerdotes alçaram
de prover pão para o santuário do Senhor a arca; 4e trouxeram para cima a arca do Senhor,
certamente havia sido expurgado de quais e a tenda da revelação, juntamente com todos os
quer noções pagãs de alimentar o deus, e utensílios sagrados que havia na tenda; foram os
o pão era, antes, um reconhecimento da sacerdotes e os levitas que os trouxeram para cima.
5E o rei Salomão, e toda a congregação de Israel,
liberalidade do Senhor em prover alimento que se ajuntara diante dele, estavam diante da arca,
para seu povo. imolando ovelhas e bois, os quais não se podiam
Os dez castiçais, cinco de cada lado do contar nem numerar, pela sua multidão. 6E os
lugar santo, são certamente diferentes do sacerdotes introduziram a arca do pacto do Senhor
castiçal de sete braços do tabernáculo e do no seu lugar, d o oráculo da casa, no lugar santís
simo, debaixo das asas dos querubins. 7Pois os
templo de Herodes (Ex 25.31-40; BBC, Vol. querubins estendiam ambas as asas sobre o lugar
1, p. 434). A maioria dos pequenos uten da arca, e cobriam por cima a arca e os seus varais.
sílios alistados têm sido esclarecidos por 8Os varais sobressaíam tanto que as suas pontas
escavações arqueológicas (Wright, p. se viam desde o santuário diante do oráculo, porém
141,142)). As coisas que seu pai Davi tinha de fora não se viam; e ali estão até o dia de hoje.
9Nada havia na arca, senão as duas tábuas de
consagrado provavelmente é uma referência pedra, que Moisés ali pusera, junto a Horebe,
aos despojos e presentes conseguidos por quando o Senhor fez um pacto com os filhos de
Davi em suas batalhas na fase final de suas Israel, ao saírem eles da terra do Egito. 10E
campanhas na Transjordânia e na Síria sucedeu que, saindo os sacerdotes do santuário,
uma nuvem encheu a casa do Senhor; ude modo
(2Sm 8.9-12). Essa é a única nota em Reis que os sacerdotes não podiam ter-se em pé para
de um tema que era caro ao cronista: os ministrarem, por causa da nuvem; porque a glória
planos e preparativos de Davi para esse do Senhor enchera a casa do Senhor.
templo. Contudo, o templo é a grande reali O significado do templo centralizava-se
zação de Salomão para a vida religiosa de na presença da arca. Esse antigo relicário
seu povo. da aliança havia sido usado em migrações
tribais e em guerras como sinal da presença
4. A Festa de Dedicação do Templo
de Deus com seu povo. Quando foi recupe
(8.1—9.9)
rada por Davi, fora trazida até a cidade de
O significado religioso do templo de Davi com uma procissão solene (2Sm 6).
Salomão no culto de Israel deve ter aumen A composição dessa assembléia da
tado e mudado através dos séculos. Assim, aliança contraria a opinião de que o templo
vários níveis de desenvolvimento aparecem de Salomão era meramente uma capela real
nesse relato de sua dedicação. A história com pouquíssima significação nacional.
começa com uma procissão da arca até seu Sião era originalmente a colina que Davi
196
tomou dos jebuseus (2Sm 5.7), mas poste da promessa da aliança a Davi concernente
riormente o nome foi aplicado à área que ao templo.
ia do templo rumo ao norte. A festa, no O Senhor disse que habitaria na escu
(...) sétimo mês tratava-se da festa dos taber ridão, ou melhor, como está na Septuaginta,
náculos, uma antiga festa agrícola de ano “o Senhor pôs o sol nos céus, mas disse que
novo. Essa era talvez ocasião para uma cele habitaria na escuridão”. A primeira frase
bração anual da soberania de Iavé (cf. SI significa que o Senhor é o soberano da
132; 24.7-10). criação (cf. SI 19.1-6). Mas sobre a terra o
Duas tábuas de pedra são mencionadas Senhor habitará (“tabemaculará”) em trevas
de acordo com a visão deuteronômica como espessas. A escuridão do lugar santíssimo,
receptáculos do Decálogo (cf. 8.21; Dt sem janelas, é identificada com a nuvem
10.15). Isso explica o seu nome: a arca da escura da tempestade sobre o Sinai (Ex
aliança. Como havia tomado posse do taber 20.18; cf. SI 18.10,11). O mistério do Deus
náculo, assim Iavé agora manifesta sua de Israel, o qual é a um só tempo o trans
presença no templo. Nuvem (...) glória cendente soberano da criação e o imanente
estavam originalmente associadas à Senhor da adoração, é aqui belamente
aparição do Senhor na tempestade. expresso. Habitação (assento) é uma palavra
diferente daquela do versículo anterior. Aqui
2) A Bênção da Assembléia (8.12-21) declara-se ousadamente que Iavé realmente
,2Então falou Salomão: O Senhor disse que
vive no templo; enquanto, segundo a
habitaria na escuridão. l3Certamente te edifiquei teologia refletida na oração seguinte, Iavé
uma casa para morada, assento para a tua eterna habita nos céus, e somente seu nome está
habitação. 14Então o rei virou o rosto, e abençoou entronizado no santuário terrestre (8.27-30;
toda a congregação de Israel; e toda a congregação cf. Wright, p. 144,145). Esse desenvolvi
ficou em pé. 15E disse Salomão: Bendito seja o
Senhor, Deus de Israel, que falou pela sua boca
mento na teologia do templo poderá ser
a Davi, meu pai, e pela sua mão cumpriu a palavra compreendido se o santuário terrestre mais
que disse: 16Desde o dia em que eu tirei do Egito tarde for visto como um microcosmo da
o meu povo Israel, não escolhi cidade alguma de verdadeira habitação celestial de Deus (cf.
todas as tribos de Israel para se edificar ali uma Is 6.1-8).
casa em que estivesse o meu nome; porém escolhi
a Davi, para que presidisse sobre o meu povo Israel. A bênção se constitui em louvor pela
17Ora, Davi, meu pai, propusera em seu coração fidelidade do Senhor a suas promessas a
edificar uma casa ao nome do Senhor, Deus de Davi. Eu tirei do Egito o meu povo (cf. v.
Israel. 18M as o Senhor disse a Davi, meu pai: 21) estabeleceu aqui uma forte ligação entre
Quanto ao teres proposto no teu coração o edificar
casa ao meu nome, bem fizeste em o propor no
a aliança no Sinai e a aliança davídica na
teu coração. 19Todavia, tu não edificarás a casa; história da salvação. Esse sumário do
porém teu filho, que sair de teus lombos, esse edifi oráculo de Natã (2Sm 7) ignora a existência
cará a casa ao meu nome. 20E o Senhor cumpriu prévia de um templo de Iavé em Siló (ISm
a palavra que falou; porque me levantei em lugar 1.9; Jr 7.14). Salomão regozija-se por ser
de Davi, meu pai, e me assentei no trono de Israel,
como falou o Senhor, e edifiquei uma casa, ao nome o filho da promessa, o legítimo herdeiro que
do Senhor, Deus de Israel. 21E ali constituí lugar recebeu o poder do trono e selou sua perma
para a arca em que está o pacto do Senhor, que nência com a edificação de um templo
ele fez com nossos pais quando os tirou da terra dinástico.
do Egito.
3) A Oração de Dedicação (8.22-53)
O discurso de Salomão começa com um
antigo fragmento poético do Livro de Jasar Salomão age como mediador da aliança
(a LXX traz Livro dos Cânticos, mas cf. nessa cerimônia de dedicação. A oração
Js 10.13; 2Sm 1.18; Gray, p. 195,196). Então intercessória é geralmente a função do
Salomão se volta e abençoa a congregação profeta como mediador da aliança (cf. Ex
com louvor ao Senhor por seu cumprimento 32; ISm 7.5). Perante o altar das ofertas
197
queimadas, o rei permaneceu como supli que o teu servo hoje faz diante de ti; 29para que
cante com as mãos erguidas, uma atitude os teus olhos estejam abertos noite e dia sobre esta
típica de oração (cf. Is 1.15). Depois ele se casa, sobre este lugar, do qual disseste: O meu nome
estará ali; para ouvires a oração que o teu servo
ajoelhou (8.54; cf. 2Cr 6.13), publicamente fizer, voltado para este lugar. 30Ouve, pois, a
se humilhando perante o Senhor como o súplica do teu servo, e do teu povo Israel, quando
representante do povo. O conteúdo da orarem voltados para este lugar. Sim, ouve tu do
oração reivindica as promessas da aliança, lugar da tua habitação no céu; ouve, e perdoa.
pede que as intercessões do templo tenham Desde o princípio havia um forte ceti
acolhida, então acrescenta uma lista de cala cismo de que um templo pudesse chegar
midades e situações de emergência no país, a ser uma casa para abrigar o Deus do céu.
para as quais a oração e arrependimento Isso é semelhante às reações proféticas
podem ser dirigidos ao Deus dos céus, que contra a supersticiosa confiança do povo
é o Senhor do templo. no templo e na religião, toda vez que esses
se tornavam dissociados de uma vida de
a. A Promessa a Davi (8.22-26) obediência (Is 1.10-17; Jr 7.4 e ss.). Essa
22Depois Salomão se pôs diante do altar do reserva profética quanto ao valor de templos
Senhor, em frente de toda a congregação de Israel físicos foi novamente declarada de forma
e, estendendo as mãos para os céus, 23disse: O mais vigorosa ao tempo em que Zorobabel
Senhor, Deus de Israel, não há Deus como tu, em
cima no céu nem em baixo na terra, que guardas
reconstruiu o templo após o exílio (Is 57.15;
o pacto e a benevolência para com os teus servos 66.1,2; cf. At 7.47-50). Aqui o vocabulário
que andam diante de ti com inteireza de coração; de oração é rico, sendo que a primeira
24que cumpriste com teu servo Davi, meu pai, o palavra significa oração em geral, mas às
que lhe prometeste; porque com a tua boca o vezes é aplicada especificamente à inter
disseste, e com a tua mão o cumpriste, como neste
dia se vê. 25Agora, pois, ó Senhor, Deus de Israel, cessão (cf. 19.4; Jr 11.14). Súplica significa
faze a teu servo Davi, meu pai, o que lhe prome implorar um favor com base na graça de
teste ao dizeres: Não te faltará diante de mim Deus. Clamor geralmente significa uma
sucessor, que se assente no trono de Israel; contanto forte exclamação de louvor a Iavé, mas aqui
que teus filhos guardem o seu caminho, para significa um rogo. O santuário é uma casa
andarem diante de mim como tu andaste.26Agora
também, ó Deus de Israel, cumpra-se a tua palavra, de oração (cf. Is 56.7), para onde as orações
que disseste a teu servo Davi, meu pai. do povo devem ser simbolicamente diri
gidas, na confiança de que o Senhor, de sua
A base de toda oração verdadeira é o
habitação celestial, ouve as orações de seus
caráter de Deus: Não há Deus como tu. O adoradores.
monoteísmo prático da aliança mosaica está
caminhando na direção de um monoteísmo
explícito (cf. 8.60; Dt 4.35). A relação da c. O Juramento no Templo (8.31,32)
aliança é o gracioso ato redentor de um 3lSe alguém pecar contra o seu próximo e lhe
Deus amorável, mantendo sua promessa for exigido que jure, e ele vier jurar diante do teu
a Davi. A promessa na aliança davídica é altar nesta casa, 32ouve então do céu, age, e julga
os teus servos; condena ao culpado, fazendo recair
incondicional para a dinastia, mas para cada sobre a sua cabeça o seu proceder, e justifica ao
ocupante do trono está condicionada à reto, retribuindo-lhe segundo a sua retidãa
obediência.
O primeiro dos sete casos específicos em
b. A Acolhida Divina às Orações do Templo que há necessidade de petição voltada para
(8.27-30) o santuário é o sagrado juramento de
isenção de culpa. O pecado contra o
27Mas, na verdade, habitaria Deus na terra? Eis próximo é aquele em que alguém desconhe
que o céu, e até o céu dos céus, não te podem conter;
quanto menos esta casa que edifiquei! “ Contudo cido causou-lhe dano ou ferimento. Nesse
atende à oração de teu serva, e à sua súplica, ó caso não se pode determinar a culpa do
Senhor meu Deus, para ouvires o clamor e a oração suspeito por alguma testemunha. Mediante
198
julgamento ou ordálio, desde tempos A chuva era um dom da vida numa terra
antigos Deus havia diretamente efetuado relativamente seca, e era considerada bem
julgamento em tais casos (Ex 22.7,8; Nm literalmente como algo que ia descendo
5.11-22). O poder de tal juramento é uma através das janelas do céu, desde os reser
autocondenação prejudicial ao culpado, vatórios de Deus — as águas acima do
sem maus efeitos sobre o inocente. Os deute- firmamento. Deus podia também suster a
ronomistas imaginavam que punição e chuva como sinal de desprazer (cf. Is 5.6).
recompensa expressavam-se de um modo Isso significava literalmente fome numa
concreto nesta vida. Tal ideal de justiça terra onde o alimento nunca foi muito abun
freqüentemente ocorre no Antigo Testa dante. Tanto a punição pelo pecado como
mento bem como na experiência humana o perdão do pecador têm o propósito divino
em geral. de ensinar a seu povo o bom caminho em
que devem andar.
d. Derrota Militar (8.33,34)
’’Quando o teu povo Israel for derrotado
f. Vários Tipos de Pragas (8.37-40)
diante do inimigo, por ter pecado contra ti; se eles 37Se houver na terra fome ou peste, se houver
voltarem a ti, e confessarem o teu nome, e orarem crestamento ou ferrugem, gafanhotos ou lagarta;
e fizerem súplicas a ti nesta casa, ^ouve então do se o seu inimigo os cercar na terra das suas cidades;
céu, e perdoa o pecado do teu povo Israel, e torna seja qual for a praga ou doença que houver; ’“toda
a levá-lo à terra que deste a seus pais. oração, toda súplica que qualquer homem ou todo
o teu povo Israel fizer, conhecendo cada um a chaga
Essa petição traz à lembrança o ciclo do seu coração, e estendendo as suas mãos para
encontrado no livro de Juizes: apostasia, esta casa, 39ouve então do céu, lugar da tua habi
derrota, arrependimento, libertação. Por ter tação, perdoa, e age, retribuindo a cada um
pecado contra ti. A filosofia deuteronômica conforme todos os seus caminhos, segundo vires
da história declarava que a calamidade é o seu coração (pois tu, só tu conheces o coração
de todos os filhos dos homens); 40para que te
prova de pecado que necessita de punição. temam todos os dias que viverem na terra que deste
Contudo, o pecado é somente uma das a nossos pais.
possíveis razões para o sofrimento. A expe
riência humana daquela época (p.ex., Jó), A fome está mais relacionada com o caso
e também a de agora, nem sempre se en precedente da seca, mas também poderia
quadra nesse esquema mecânico e bem ser causada por pestilência, ataque de
delineado dos deuteronomistas. A palavra insetos ou cerco pelo inimigo. Joël é um
normal para o arrependimento do homem magnífico exemplo de oração litúrgica,
é simplesmente voltar a Deus. Torna a levá- lamento e arrependimento no caso de uma
-lo à terra normalmente pressuporia exílio grande praga de gafanhotos. Toda oração.
(cf. 8.46-53; 9.6-9) e pode pertencer a um Essa designação passou a cobrir toda a
período posterior. Contudo, haveria prisio espécie de necessidades nacionais e indivi
neiros e escravos como resultado de duais. Deus conhece as necessidades
qualquer derrota em batalha, de modo que daqueles que a ele oram e nele confiam para
a referência pode ser bastante antiga. obtenção duma resposta (cf. Mt 6.8; Rm
8.26,27). A verdadeira religião no Antigo
Testamento é freqüentemente definida
e. Seca (8.35,36) como o “temor do Senhor”, ou seja, um
35Quando o céu se fechar e não houver chuva, respeito reverente, não um temor subser
por terem pecado contra ti, e orarem, voltados para viente.
este lugar, e confessarem o teu nome, e se conver
terem dos seus pecados, quando tu os afligires, g. Oração do Estrangeiro (8.41-43)
16ouve então do céu, e perdoa o pecado dos teus
servos e do teu povo Israel, ensinando-lhes o bom 41lkmbém quando o estrangeiro, que não é do
caminho em que devem andar; e envia chuva sobre teu povo Israel, vier de terras remotas por amor
a tua terra que deste ao teu povo em herança. do teu nome, 42(porque ouvirão do teu grande
199
nome, e da tua forte mão, e do teu braço estendido), e procedemos perversamente, cometemos iniqüi
quando vier orar voltado para esta casa, 43ouve do dade; '“ se voltarem a ti de todo o seu coração e
céu, lugar da tua habitação, e fáze conforme tudo de toda a sua alma, na terra de seus inimigos que
o que o estrangeiro a ti clamar, a fim de que todos os tenham levado em cativeiro, e orarem a ti, voltados
os povos da terra conheçam o teu nome, e te temam para a sua terra, que deste a seus pais, para a cidade
como o teu povo Israel, e saibam que pelo teu nome que escolheste, e para a casa que edifiquei ao teu
é chamada esta casa que edifiquei. nome, 49ouve então do céu, lugar da tua habitação,
a sua oração e a sua súplica, e defende a sua causa;
O estrangeiro não residente em Israel “ perdoa ao teu povo que houver pecado contra ti,
estava, nos códigos de lei, numa situação perdoa todas as transgressões que houverem come
diferente em relação ao estrangeiro resi tido contra ti, e dá-lhes alcançar misericórdia da
dente, ao peregrino, que era melhor parte dos que os levarem cativos, para que se compa
deçam deles; 51porque são o teu povo e a tua
protegido. O código deuteronômico permitia herança, que tiraste da terra do Egito, do meio da
uma certa exploração dos estrangeiros (Dt fornalha de ferra S2Estejam abertos os teus olhos
14.21; 15.3; 23.32). Salomão foi generoso à súplica do teu servo e à súplica do teu povo Israel,
com respeito à adoração pelos estrangeiros, a fim de os ouvires sempre que clamarem a ti.
53Pois tu, ó Senhor Jeová, os separaste dentre
conquanto isso tivesse se tornado um todos os povos da terra, para serem a tua herança
problema por ter criado condições para a como falaste por intermédio de Moisés, teu servo,
adoração por parte de suas esposas estran quando tiraste do Egito nossos pais.
geiras (11.1-8). No Antigo Testamento há
um sincero elemento de hospitalidade para Essa seção pode ter sido acrescida à
com estrangeiros e prosélitos (Rute; Is 2.2-4; oração de Salomão pelo editor exílico de
56.6-8; Zc 8.20-23). Reis, conquanto o versículo 48 sugira que
o templo de Salomão ainda está de pé. A
h. Oração à Distância, em Tempos de dispersão do Reino do Norte, segundo a
Guerra (8.44,45) política de deportação em massa da Assíria,
44Quando o teu povo sair à guerra contra os mais tarde implantada contra Judá por
seus inimigos, seja qual for o caminho por que os Senaqueribe, propiciou a ocasião para uma
enviares, e orarem ao Senhor, voltados para a cidade oração dessas. Não há homem que não
que escolheste, e para a casa que edifiquei ao teu peque. Essa verdade é freqüentemente dita
nome, 45ouve então do céu a sua oração e a sua
súplica, e defende a sua causa.
na Bíblia. O pecado é a experiência e a
condição universais da raça humana. Nessa
Na verdade, esse caso prepara para o que oração de arrependimento o grande número
se segue. Seja qual for o caminho por que de vocábulos para designar pecado merece
os enviares significa que o Senhor era atenção. Pecarem significa “desviar-se do
consultado antes da batalha por intermédio caminho, errar, falhar em alcançar o alvo
do profeta ou sacerdote. O avanço da influ ou perder o rumo”. Perversamente é a
ência da adoração de Iavé em território palavra da qual deriva “maldade”, e signi
estrangeiro é uma tendência interessante fica “torcer, distorcer”. Iniqüidade deriva
de um monoteísmo agressivo. A oração em de uma palavra que significa “estar solto,
um local distante, feita na direção do tem disjuntado, mal regulado, anormal”. Trans
plo, foi enfatizada mais fortemente após o gressões é melhor traduzido como “revoltas,
exílio e dispersão (cf. Dn 6.10). rebeliões”. Essas palavras são realçadas nos
salmos penitenciais (32,51,130), a que esta
i. Oração de um Povo Exilado (8.46-53) oração pode ser comparada.
46Quando pecarem contra ti (pois não há O arrependimento deve ser total, incon
homem que não peque), e tu te indignares contra dicional, um retomo integral a Deus. Em
eles, e os entregares ao inimigo, de modo que os contraste com o versículo 34, parece haver
levem em cativeiro para a terra inimiga, longínqua
ou próxima; 47se na terra aonde forem levados em bem pouca esperança entre esses exilados
cativeiro caírem em si, e se converterem, e na terra de um breve retorno à sua própria terra.
do seu cativeiro te suplicarem, dizendo: Pecamos Esse detalhe deve estar apontando para o
200
cativeiro assírio ou babilónico. Fornalha tosos atos redentores de Iavé. Salomão
de ferro é uma metáfora bem vivida da invoca a mais preciosa promessa da Escri
história da salvação conforme vista pelos tura, Deus seja conosco. Nossos pais
deuteronomistas (Dt 4.20; cf. Jr 11.4). Esses refere-se aos patriarcas e a Moisés e Josué
versículos finais, que de um modo bem enér (Gn 21.22; 26.3; 31.3; Ex 3.12; Js 1.5).
gico se referem à doutrina da eleição, Incline a si os nossos corações reconhece
fornecem uma espécie de tema de encerra a dependência humana da graça divina. É
mento para a oração como um todo, fútil falar sobre o homem voltar-se a Deus
apelando ao amor de Deus em favor do povo em arrependimento sem esse ministério de
que ele tem escolhido. Deus no coração de um homem, fazendo-o
voltar ao caminho da obediência. Estejam
4) A Bênção (8.54-61) perto é a mesma expressão utilizada pelo
54Sucedeu pois que, acabando Salomão de
adorador e pelo sacerdote na apresentação
fazer ao Senhor esta oração e esta súplica, estando de um sacrifício. Salomão capta de um
de joelhos e com as mãos estendidas para o céu, modo muito bonito o sentido espiritual do
se levantou de diante do altar do Senhor, S5pôs-se sacrifício com a ênfase que dá às suas
em pê, e abençoou em alta voz a toda a congre próprias orações e às de seu povo, as quais
gação de Israel, dizendo: “ Bendito seja o Senhor,
que deu repouso ao seu povo Israel, segundo tudo acompanharam seus sacrifícios. Para que
o que disse; não talhou nem sequer uma de todas todos os povos da terra saibam significa que
as boas palavras que falou por intermédio de Israel nunca foi protegido e guardado exclu-
Moisés, seu serva 570 Senhor nosso Deus seja sivamente por sua própria causa: o
conosco, como foi com nossos pais; não nos deixe,
nem nos abandone; 5Smas incline a si os nossos propósito dos fatos da história da salvação
corações, a fim de andarmos em todos os seus cami era de que as nações reconhecessem que
nhos, e guardarmos os seus mandamentos, e os o Senhor é Deus. Seja (...) perfeito não
seus estatutos, e os seus preceitos, que ordenou parece se encaixar no restante da bênção,
a nossos pais. 5,E que estas minhas palavras, com que é dirigida a Deus. Essa exortação de
que supliquei perante o Senhor, estejam perto, diante
do Senhor nosso Deus, de dia e de noite, para que conclusão pode ser um indício da reutili
defenda ele a causa do seu servo e a causa do seu zação dessa oração numa festa anual de
povo Israel, como cada dia o exigir, ‘"para que renovação da aliança. Hoje pode referir-se
todos os povos da terra saibam que o Senhor é Deus, a cada ocasião sucessiva em que o povo
e que não há ou tra 61E seja o vosso coração
perfeito para com o Senhor nosso Deus, para
renovasse a aliança, reafirmando sua fé nas
andardes nos seus estatutos, e guardardes os seus promessas de Deus.
mandamentos, como hoje o fazeis.
5) Os Sacrifícios de Consagração (8.62-66)
Essa bênção conclui a oração da mesma
forma como a bênção anterior de Salomão 62Então o rei e todo o Israel com ele ofere
(8.12-21) a havia iniciado, isto é, com ceram sacrifícios perante o Senhor. 63Ora,
Salomão deu, para o sacrifício pacífico que ofereceu
linguagem de aliança. Conquanto as ao Senhor, vinte e dois mil bois e cento e vinte mil
promessas da aliança ali mencionadas ovelhas. Assim o rei e todos os filhos de Israel consa
fossem davídicas, estas são mosaicas. graram a casa do Senhor. MNo mesmo dia o rei
Repouso geralmente refere-se à dádiva da santificou o meio do átrio que estava diante da casa
terra, cuja conquista só se completou com do Senhor; porquanto ali ofereceu o holocausto,
a oferta de cereais e a gordura das ofertas pacíficas,
as guerras de Davi, para as quais a paz salo- porque o altar de bronze que estava diante do Senhor
mônica e a construção do templo era muito pequeno para nele caberem o holocausto,
propiciaram um clímax apropriado (cf. Dt a oferta de cereais, e a gordura das ofertas pací
12.10). Não folhou nem sequer uma de todas ficas. 65No mesmo tempo celebrou Salomão a
festa, e todo o Israel com ele, uma grande congre
as boas palavras. O cumprimento das gação, vinda desde a entrada de Hamate e desde
promessas divinas é um forte tema agluti- o rio do Egito, perante a face do Senhor nosso Deus,
nador dentro da história deuteronômica e por sete dias, e mais sete dias (catorze dias ao todo).
um forte incentivo para recontar os porten “ E no oitavo dia despediu o povo, e todos bendis
201
seram ao rei; então se forai 1 às suas tendas, alegres mas fordes, e servirdes a outros deuses, curvando-
e de coração contente, por causa de todo o bem -vos perante eles, 7então exterminarei a Israel da
que o Senhor fizera a Davi seu servo, e a Israel terra que lhe dei; e a esta casa, que santifiquei a
seu povo. meu nome, lançarei longe da minha presença, e
Essa seção retoma a descrição de eventos Israel será por provérbio e motejo entre todos os
povos. 8E desta casa, que é tão exaltada, todo
que se seguem ao versículo 11 e, assim, aquele que por ela passar pasmará e assobiará,
fornece o contexto narrativo para o grande e dirá: Por que fez o Senhor assim a esta terra e
discurso e oração de Salomão. Cento e vinte a esta casa? 9E lhe responderão: É porque
mil ovelhas parece um número excessiva deixaram ao Senhor seu Deus, que tirou da terra
do Egito a seus pais, e se apegaram a deuses alheios,
mente elevado, mesmo para alimentar uma e perante eles se encurvaram, e os serviram; por
grande assembléia como essa, e é omitido isso o Senhor trouxe sobre eles todo este mal.
pela Septuaginta. Se o holocausto e a oferta
de cereais referem-se às ofertas diárias regu A dedicação do templo não está
lares, então Salomão estava consagrando completa sem a resposta do Senhor à oração
a rotina normal de adoração, de confor de Salomão. Essa segunda aparição do
midade com a prática diária do culto no Senhor a Salomão propicia tanto uma
templo dali por diante (Snaith, p. 88,89). promessa quanto uma advertência. A
Somente as ofertas pacíficas, que eram os promessa é de que o Senhor ouvirá a oração
animais partilhados pelos adoradores, de Salomão e aceitará esse templo real como
teriam sido tão numerosos que nem todas seu próprio templo. Isso se liga à promessa
as porções de gordura poderiam ser acomo a Davi sobre sua dinastia. Mas, como o
dadas no altar regular. A festa é a festa dos historiador já tem deixado claro, essa
tabernáculos, aqui celebrada segundo o promessa condiciona-se à obediência de
modelo deuteronômico de uma festa de sete Salomão. A ameaça, nos versículos 6-9, da
dias seguida por uma despedida ao oitavo destruição do templo pode ter procedido
dia (Dt 16.13,15). O povo havia se reunido do editor pós-exílico.
desde as mais distantes localidades da terra O versículo 1 oferece um sumário dos
(veja comentário sobre 4.21). Agora podiam empreendimentos de construção de
retornar alegremente a seus lares, tendo Salomão (veja 9.10,19). Não é necessário
testemunhado uma das grandes ocasiões supor que, após a edificação e dedicação
de aliança em sua vida como um povo de do templo, Salomão tivesse de esperar treze
Deus. anos para a resposta a sua oração. Esse
segundo aparecimento é semelhante àquele
6) A Promessa e Advèrtência Divinas (9.1-9) em Gibeão, uma resposta à oração, e talvez
'Sucedera pois que, tendo Salomão acabado de uma visão noturna (cf. 2Cr 7.12). Santifi
edificar a casa do Senhor, e a casa do rei, e tudo quei assinala um ato divino. Salomão podia
quanto lhe aprouve fazer, 2apareceu-lhe o Senhor consagrar o átrio do templo (8.64), mas
segunda vez, como lhe tinha aparecido em Gibeãa
3E o Senhor lhe disse: Ouvi a tua oração e a tua somente o Senhor podia verdadeiramente
súplica, que fizeste perante mim; santifiquei esta santificar a adoração pelo homem. Andares
casa que edificaste* a fim de pôr ali o meu nome perante mim (...) com integridade de coração
para sempre; e os meus olhos e o meu coração e com eqüidade é linguagem de aliança (cf.
estarão ali todos os dias. 4Ora, se tu andares
perante mim como andou Davi, teu pai', com intei Gn 17.1). Os padrões éticos do reinado daví-
reza de coração e com eqüidade, fazendo conforme dico eram tão elevados que nenhum dos
tudo o que te ordenei, e guardando os meus esta sucessores terrenos de Davi pôde viver à
tutos e as minhas ordenanças, 5então confirmarei altura deles. A promessa da aliança no versí
o trono de teu reino sobre Israel para sempre, como culo 5 conduz na direção das promessas
prometi a teu pai Davi, dizendo: Não te faltará varão
sobre o trono de Israel. ‘Se, porém, vós e vossos messiânicas de Isaías. Sem tal promessa,
filhos de qualquer maneira vos desviardes e não vista pelo intérprete cristão como cumprida
me seguirdes, nem guardardes os meus manda no Novo Testamento, a história de Reis seria
mentos e os meus estatutos, que vos tenho proposto, uma história de trágico fracasso humano.
202
A mudança de pronomes no versículo Em adição à aliança que Salomão fir
6 (vós plural) deve referir-se ou à dinastia, mara com Hirão, rei de Tiro (5.10-12), Sa
vós e vossos filhos, ou deve ser considerada lomão tinha de arranjar um grande mon
uma advertência ao povo feita por um tante de ouro para financiar seus empre
editor. Servirdes a outros deuses é o pecado endimentos de construção e comércio.
crucial contra a aliança mosaica, apostasia Havia algumas cidades fronteiriças na
associada à idolatria. Exterminarei a Israel Galiléia ocidental, próximas de Aco, na
traz à lembrança a grande lição da queda tribo de Aser, que ele estava desejoso de
de Samária (2Reis 17.7-18). Provérbio e trocar com o rei fenício. O desprazer de
motejo aqui significam uma zombaria, uma Hirão com essas cidades é preservado na
“palavra profundamente desmoralizadora”. etimologia popular do nome Cabul (como
Desta casa, que é tão exaltada pode também nada), terra sem valor (cf. Js 19.27). A
ser traduzido por “esta casa se tomará um quantidade de ouro parece excessiva. Tem-
montão de ruínas”, o que faz lembrar a se calculado que seu valor alcance cerca
predição profética de Miquéias (3.12; cf. Jr de um milhão e meio de dólares (Snaith,
26.18). Mesmo que essa seção tenha uma p. 93). É a mesma quantidade trazida a
forma pós-exílica, contém um genuína Salomão pela rainha de Sabá (10.10), mas
ameaça pré-exílica. Os passantes indagarão é pequena comparada com outras quanti
por que Iavé faria isso à sua própria terra dades mencionadas (9.28; 10.14).
e à sua própria casa. A resposta é que seu
povo abandonou o Senhor de sua aliança. 2) Trabalhos Forçados Para Projetos de
Essa terrível ameaça estava para confirmar- Construção (9.15-22)
se ou já havia se tornado real. 1SA razão da leva de gente para trabalho for
çado que o rei Salomão fez é esta: edificar a ca
5. Os Empreendimentos Comerciais de sa do Senhor, e a sua própria casa, e Milo, e o
muro de Jerusalém, como também Hazor, e Me-
Salomão (9.10—10.29) gido, e Gezer. 16Pois Faraó, rei do Egito, tendo
Salomão é descrito nessa seção de no subido, tomara a Gezer e a queimara a fogo, e
matando os cananeus que moravam na cidade, de
tas miscelâneas como sendo um perfeito ra-a em dote a sua filha, mulher de Salomãa
e rico príncipe mercador. Seus empreendi 17Salomão edificou Gezer, Bete-Horom a baixa,
mentos comerciais incluíam seu comércio 18Baalate, Tamar no deserto daquela terra, 19como
com Ofir via Mar Vermelho, seu comércio também todas as cidades-armazéns que Salomão
por caravanas com o sul da Arábia, e seu tinha, as cidades dos carros, as cidades dos cava
leiros, e tudo o que Salomão quis edificar em
comércio de carros e cavalos. As riquezas Jerusalém, no Líbano, e em toda a terra do seu
de Salomão e também sua reputação inter dominia 20Quanto a todo o povo que restou dos
nacional são para o historiador demons amorreus, dos heteus, dos perizeus, dos heveus e
trações da sabedoria de Salomão. dos jebuseus, que não eram dos filhos de Israel,
21a seus filhos, que restaram depois deles na terra,
os quais os filhos de Israel não puderam destruir
1) A Venda de Vinte Cidades (9.10-14) totalmente, Salomão lhe impôs tributo de trabalho
forçadoi, até hoje. 22Mas dos filhos de Israel não
10Ao fim dos vinte anos em que Salomão edifi fez Salomão escravo algum; porém eram homens
cara as duas casas, a casa do Senhor e a casa do de guerra, e seus servos, e seus príncipes, e seus
rei, ucomo Hirão, rei de Tin», trouxera a Salo capitães, e chefes dos seus carros e dos seus ca
mão madeira de cedro e de cipreste, e ouro se valeiros.
gundo todo o seu desejo, deu o rei Salomão a
Hirão vinte cidades na terra da Galilêia. 12Hirão, Os projetos de construção do rei em
pois, saiu de Tiro para ver as cidades que Salo cidades-chaves ao redor do país, bem como
mão lhe dera; porém não lhe agradaram. 13Pelo
que disse: Que cidades são estas que me deste, em Jerusalém, requeriam trabalho forçado.
irmão meu? De sorte que são chamadas até hoje Há confirmação arqueológica de portões
terra de Cabul. 14Hirão enviara ao rei cento e e muros salomônicos em Hazor, Megido e
vinte talentos de oura Gezer (Gray, p. 227,228). Essas três forta-
203
lezas davam proteção i grande via princi de rituais que deu início à utilização do
pal que ligava a Mesopotâmia ao Egito templo e arredores. Assim, o propósito do
diagonalmente através do território da versículo 25 é exaltar o papel do rei no
Palestina. Megido tinha importância ainda culto em Jerusalém (Gray, p. 235,236).
maior por ser uma cidade-armazém, sede O principal assunto dessa seção é a ex
de distrito e cidade de carros (Wright, p. ploração pelo rei Salomão de um comércio
130-132). Talvez cada uma das capitais marítimo muito rendoso ao longo da costa
provinciais fosse uma dessas cidades-ar- do Mar Vermelho. Sendo que os fenícios
mazéns. haviam começado a desenvolver um co
Os remanescentes das cidades-estados mércio marítimo cada vez mais florescen
cananéias foram forçados à escravidão es te na direção ocidental, Salomão voltou-se
tatal; mas a afirmação de que Salomão a Hirão e seus marujos fenícios para cons
não empregou israelitas em trabalho com truir e operar sua frota no Mar Vermelho.
pulsório parece ser contraditada por outras Na extremidade do Golfo de Ácaba, Salo
afirmações (5.13-18; 11.27,28). Esse abuso mão edificou seu novo porto marítimo de
de trabalho escravo era considerado um Eziom-Geber. A escavação dessa antiga
“pesado jugo” pelo povo (12.4), para quem cidade tem ilustrado amplamente o uso
parecia uma violação de suas liberdades de por Salomão desse porto como um centro
aliança, experimentadas na antiga confe de armazenamento para sua indústria me
deração tribal (Bruce, p. 37). A advertência talúrgica.14 Os metais refinados, oriundos
de Samuel acerca do comportamento de de minas em Arabá, eram armazenados,
um rei que algum dia reinaria sobre Is e talvez refinados ainda mais, para serem
rael tinha-se cumprido em Salomão (ISm enviados a partir da cidade portuária.
8.10-18). Várias localidades têm sido propostas
para Ofir, o mais distante e mais rico por
3) A Frota do M ar Vermelho (9.23-28) to de abastecimento das viagens comer
23Estes eram os chefes dos oficiais que estavam ciais da frota, tais como índia, África e
sobre a obra de Salomão, quinhentos e cinqüenta, Arábia. A abundância de ouro fino pare
que davam ordens ao povo que trabalhava na obra. ce indicar o sudeste da Arábia. Almugue,
•^Subiu, porém, a filha de Faraó da cidade de Davi
à sua casa, que Salomão lhe edificara; então ele
uma variedade de sândalo, parece favore
edificou M ila 25E Salomão oferecia três vezes por cer a costa ocidental da índia (10.11,12).
ano holocaustos e ofertas pacíficas sobre o altar O marfim e duas espécies de macaco pa
que edificara ao Senhor, queimando com eles recem indicar a África oriental (10.22). A
incenso sobre o altar que estava perante o Senhor, sugestão mais provável é de que Salomão
depois que acabou de edificar a casa. “ Também
o rei Salomão fez uma frota e Eziom-Geber, que comercializava ao longo do litoral do Mar
está junto a Elote, na praia do M ar Vermelho, na Vermelho, no sudoeste da Arábia e nor
terra de Edom. 27Hirão mandou com aquela frota, deste da África. Por intermédio dos ataca
em companhia dos servos de Salomão, os seus distas de Sabá, ele pode ter assim conse
próprios servos, marinheiros que conheciam o guido todos os produtos mencionados des
mar; “ os quais foram a Ofir, e tomaram de lá
quatrocentos e vinte talentos de ouro, que trouxe ses vários lugares.
ram ao rei Salomão,
4) A Visita da Rainha de Sabá (10.1-13)
As três notas com que a seção começa
estão bem fora de seu contexto. O versí 'Tendo a rainha de Sabá ouvido da fama de
culo 25 suplementa o relato dos sacrifí Salomão, no que concerne ao nóme do Senhor,
veio prová-lo por enigmas. 2E chegou a Jerusalém
cios da festa do rei (8.62-64; cf. 3.3,4,15). com uma grande comitiva, com camelos carrega
Três vezes por ano assinala as três fes dos de especiarias, e muitíssimo ouro, e pedras
tas de peregrinação: pães asmos, semanas
e tabernáculos (2Cr 8.12-16). Depois que 14 Nelson Glueck, “Ezion-Geber” Biblical Archaeologist, Vol. X X V Ill,
acabou de edificar parece referir-se ao ciclo N.° 3 (setembro, 1965), p. 70-87; cf. W right, p. 132-136.
204
preciosas; e, tendo-se apresentado a Salomão, o havia abençoado materialmente. Enig
conversou com ele acerca de tudo o que tinha no mas, ou charadas, é uma referência ao ti
coração. 3E Salomão lhe deu resposta a todas as
suas perguntas; não houve nada que o rei não lhe
po de literatura de sabedoria atribuída a
soubesse explicar. 4Vendo, pois, a rainha de Sabá Salomão (4.29-34). Mas a sabedoria de
toda a sabedoria de Salomão, a casa que edifica Salomão reflete-se também em suas edifi
ra, sas iguarias da sua mesa, o assentar dos seus cações, sua intricada estrutura da corte e
oficiais, as funções e os trajes dos seus servos, e até mesmo sua adoração. Ficou estupefata
os seus copeiros, e os holocaustos que ele oferecia
na casa do Senhor, ficou estupefata, 6e disse ao significa que ela estava literalmente arre
rei: Era verdade o que ouvi na minha terra, acerca batada por tão extraordinária riqueza.
dos teus feitos e da tua sabedoria. 7Contudo eu A admiração do escritor do Israel poste
não o acreditava, até que vim e os meus olhos o rior por Salomão resplandece na fala reve
viram. Eis que não me disseram metade; sobrepu
jaste em sabedoria e bens a fama que ouvi. 8Bem-
rente da rainha de Sabá. Israel apreciava
-aventurados os teus homens! Bem-aventurados es rememorar tais histórias de louvor a Israel
tes teus servos, que estão sempre diante de ti, que e seu Deus quando pronunciadas por es
ouvem a tua sabedoria! ’Bendito seja o Senhor trangeiros. Deu ela ao rei dinheiro de im
teu Deus, que se agradou de ti e te colocou no postos, tal como o que era coletado de ou
trono de Israel! Porquanto o Senhor amou Israel
para sempre, por isso te estabeleceu rei, para exe tros reis e mercadores, cujas rotas comer
cutares juízo e justiça. 10E deu ela ao rei cento e ciais necessariamente passavam pelo terri
vinte talentos de ouro, especiarias em grande tório de Salomão (10.15,24,25). Abundân
quantidade e pedras preciosas; nunca mais apare cia de especiarias — os artigos mais pre
ceu tamanha abundância de especiarias como a
que a rainha de Sabá deu ao rei Salomão. uTam-
ciosos das caravanas de Sabá, e que aqui
bém a frota de Hirão, que de Ofir trazia ouro, entram em cena pela primeira vez na his
trouxe dali madeira de almugue em quantidade, tória, eram o incenso e a mirra, imortali
e pedras preciosas. 12Desta madeira de almugue zados na narrativa do nascimento de Jesus
fez o rei balaústres para a casa do Senhor, e para (Mt 2.11; cf. IDB, IV, p. 144-146).
a casa do rei, como também harpas e alaúdes pa
ra os cantores; não se trouxe nem se viu mais tal
madeira de almugue, até o dia de hoje. 13E o rei 5) A Riqueza de Salomão (10.14-22)
Salomão deu à rainha de Sabá tudo o que ela 14Ora, o peso do ouro que se trazia a Salo
desejou, tudo quanto pediu, além do que lhe dera mão cada ano era de seiscentos e sessenta e seis
espontaneamente, da sua munificência real. Então talentos de ouro, 15além do que vinha dos vende
voltou e foi para a sua terra, ela e os seus servos. dores ambulantes, e do tráfico dos negociantes, e
de todos os reis da Arábia, e dos governadores do
Essa história se tornou famosa devido país. “ Também o rei Salomão fez duzentos pave
ses de ouro batido; de seiscentos siclos de ouro
à referência de Jesus ao respeito que a mandou fazer cada pavês; 17do mesmo modo fez
“rainha do sul” teve para com a sabedoria também trezentos escudos de ouro batido; de três
de Salomão (Mt 12.42). Sua impressionan minas de ouro mandou fazer cada escuda Então
te viagem foi de 2.400 quilômetros desde o rei os pôs na casa do bosque do Líbano. 18Fez
o sudoeste da Arábia, feita em caravana de mais o rei um grande trono de marfim, e o reves
tiu de ouro puríssima 19Tinha o trono seis de
camelos, e talvez seu principal propósito graus, e o alto do trono era redondo pelo espal
tenha sido a negociação de um acordo co dar; de ambos os lados tinha braços junto aos
mercial para o controle das rotas de espe assento, e dois leões em pé junto aos braços. 20E
ciarias e outros produtos exóticos. Não é sobre os seis degraus havia doze leões de ambos
os lados; outro tal não se fizera em reino algum.
claramente afirmado que o comércio marí 21lkmbém todos os vasos de beber do rei Salo
timo de Salomão com a mesma área, mão eram de oura, e todos os vasos da casa do
mencionado por um parêntese inserido bosque do Líbano eram de ouro puro; não havia
nesse relato (10.11,12), teria forçado a rai nenhum de prata, porque nos dias de Salomão a
nha de Sabá e os reis da Arábia (10.15) a prata não tinha estimação alguma. 22Porque o rei
tinha no mar uma frota de Társis, com a de Hi
fazer tal acordo com Salomão. A fama de rão: de três em três anos a frota de Társis vol
Salomão era também, em certo sentido, o tava, trazendo ouro e prata, marfim, bugios e
nome ou reputação do Senhor, que tanto pavões.
205
O historiador deseja ilustrar, a partir de contra a ansiedade quanto a coisas mate
assuntos variados nos anais do reino de riais, declarando que “nem mesmo Salomão
Salomão, sua enorme riqueza. Seiscentos em toda a sua glória se vestiu como” os lírios
e sessenta e seis talentos de ouro, mais de do campo (Mt 6.29). Deus havia cumprido
dezesseis milhões de dólares (Snaith, p. abundantemente sua promessa de dar a
99), parece um exagero, não chegando a Salomão não somente a sabedoria que este
incluir nem os impostos de seu comércio solicitou, como também riquezas e honra
com caravanas. Os grandes escudos oblon que ele não pedira.
go, do tipo que protegia todo o corpo de
um homem, eram quatro vezes mais valio 7) Os Negócios com Carros e Cavalos
sos do que os escudos menores, redondos. (10.26-29)
No relato que conta como Sisaque, rei do 26Tàmbém ajuntou Salomão carros e cavaleiros,
Egito, saqueou esses tesouros, é-nos dito de sorte que tinha mil e quatrocentos carros e doze
que seu propósito era o de serem empre mil cavalheiros, e os distribuiu pelas cidades dos
gados em procissões cerimoniais até a casa carros, e junto ao rei em Jerusalém. 27E o rei
do Senhor (14.25-28). O magnífico trono tornou a prata tão comum em Jerusalém como as
pedras, e os cedros tantos em abundância como
de marfim, decorado com incrustações de os sicômoros que há pelas campinas. “ Os cavalos
marfim e folhas de ouro, era provavelmen que Salomão tinha eram trazidos do Egito e de
te de artesanato fenício. Seus sete degraus Coa; os mercadores do rei os recebiam de Coa por
e as decorações de leão e bezerro (a frase preço determinada 29E subia e saía um carro do
Egito por seiscentos siclos de prata, e um cavalo
o alto do trono era redondo pelo espaldar por cento e cinqüenta; e assim, por intermédio
pode também ser lida “no alto do trono desses mercadores, eram exportados para todos
havia a cabeça de um bezerro”) simboli os reis dos heteus e para os reis da Síria.
zavam a perfeição, poder e soberania exer
Os distritos administrativos de Salomão
cidos pelo rei assentado em julgamento. proviam os suprimentos para os seus cavalos
A referência a vasos de beber de ouro (4.26-28), as capitais de distritos e as cidades-
é explicada por uma outra descrição do
-armazéns. Salomão também providenciou
rico comércio marítimo. Társis tanto pode
cidades para seus carros e cavaleiros (9.19).
ser Tartessus, na Espanha, como Nora, na
Mediante seu grande exército efetivo, esta
Sardenha, ambas sendo colônias fenícias
cionado estrategicamente pelo país,
no Mediterrâneo ocidental. Esses navios Salomão mantinha paz em suas possessões
eram grandes naus para o alto-mar, que
herdadas de Davi, seu pai. A declaração
serviam para transportar lingotes de cobre sobre sua prosperidade material (cf. 2Cr
das atividades mineradoras dos fenícios.
1.15; 9.27) pode ser inserida nesse ponto
Pavões (conforme traduzido) baseia-se nu
para indicar que Salomão obteve ganhos
ma analogia com uma palavra sânscrita,
com seu comércio de carros e cavalos.
mas uma analogia melhor procede de um Egito e Coa. Atualmente Coa tem sido
termo egípcio que significa babuínos.
identificada com a cidade de Cilicia, no
sudeste da Ásia Menor, uma região famosa
6) Salomão em sua Glória (10.23-25) pela criação de cavalos. Alguns eruditos
crêem que a palavra para Egito, mitsraim,
23Assim o rei Salomão excedeu a todos os reis
da terra, tanto em riquezas como em sabedoria. deve ser lida mutsri, uma região da Capa
24E toda a terra buscava a presença de Salomão dócia, um pouco ao norte da Cilicia (Gray,
para ouvir a sabedoria que Deus lhe tinha posto p. 250). Mas o tratado de Salomão com o
no coraçãa 25Cada um trqzia um presente, vasos Egito provavelmente indica que a palavra
de prata, vasos de ouro, vestidos, armaduras, espe Egito é a palavra certa. Assim o rei Salomão
ciarias, cavalos e mulas; isso faziam cada ana
servia como uma espécie de intermediário
Jesus situou todo esse esplendor numa para fornecer aos sírios e siro-hititas esses
nova perspectiva em seu ensinamento dispendiosos bens. No desenvolvimento do
206
código deuteronômico, o texto sobre a lei Salomão o que era mau aos olhos do Senhor, e
do rei contém um indício sombrio de que não perseverou em o seguir, como fizera Davi, seu
pai. 7Nesse tempo edificou Salomão um alto a
Salomão talvez tenha vendido alguns isra Quetnós, abominação dos moabitas, sobre o monte
elitas para serem escravos no Egito a fim que está diante de Jerusalém, e a Moloque, abomi
de obter seus carros e cavalos (Dt 17.16,17). nação dos amonitas. 8E assim fez para todas as
Com esse auge de materialismo, chegou- suas mulheres estrangeiras, as quais queimavam
se a um novo status quo, com uma incenso e ofereciam saprificios a seus deuses.
perceptível ausência de conselho profético.
Nenhum profeta é mencionado no relato O fabulosamente grande harém de
desde a participação de Natã na unção Salomão era tanto um sinal de sua abun
de Salomão. Mas uma palavra profética dante riqueza quanto de sua astúcia em
contra a apostasia de Salomão em favor dos política externa. O rei preocupava-se sufi
deuses de suas esposas estrangeiras e uma cientemente com as esposas estrangeiras
rebelião profeticamente inspirada por um ao ponto de propiciar-lhes oportunidade
de seus líderes dos trabalhos forçados para adorarem segundo suas religiões. Mas
estavam para abalar o status quo e arrebatar o julgamento do historiador é de que essa
uma parte do reino de seu filho. tolerância irrestrita acarretou conseqüên
cias desastrosas sobre a lealdade do rei para
6. A Apostasia e Punição de Salomão com Iavé. O perigo da idolatria e apostasia
(11.1-43) era a razão para as determinações deutero-
Até esse capítulo, o historiador preferiu nômicas contra alianças que envolviam
realçar os aspectos positivos do reinado de casamentos mistos (Dt 7.3,4; 17.17; Js 23.7
Salomão. Houve apenas insinuações de e ss).
taxação opressiva e trabalhos forçados. Setecentas mulheres parece exagero para
Outros indícios de sua abertura do reino a maioria dos comentaristas (mas cf. Snaith,
podem ser vistas na influência estrangeira p. 102). Uma comparação com os números
resultante de relações diplomáticas e comer de outros haréns reais parece indicar um
ciais que eram seladas com casamentos número de esposas próximo de setenta,
mistos. O resultado é que a monarquia sendo o número de esposas geralmente
evoluiu da simples liderança militar da menor do que o número de concubinas (de
confederação tribal sob Saul para um despo Vaux, p. 115,116; cf. 2Cr 11.21; Ct 6.8). Essa
tismo oriental sob Salomão. passagem tem sem dúvida servido de base
para atribuir a autoria de Cantares de
1) Voltando-se Para Deuses e Esposas Salomão ao próprio Salomão (cf. IDB, IV,
Estrangeiras (11.1-8) 420-426).
De acordo com o historiador, esses casa
‘Ora, o rei Salomão amou muitas mulheres mentos mistos politicamente convenientes
estrangeiras, além da filha de Faraó: moabitas, começaram a exercer uma influência dele
amonitas, edomitas, sidônias e hetéias, 2das nações
de que o Senhor dissera aos filhos de Israel: Não téria sobre o iavismo puro, quando o rei
ireis para elas, nem elas virão para vós; doutra edificou santuários pagãos sobre o Monte
maneira perverterão o vosso coração para seguirdes das Oliveiras, que permaneceram em pé até
os seus deuses. A estas se apegou Salomão, levado os dias de Josias (2Reis 23.13). Astarote,
pelo amor. 3Tinha ele setecentas mulheres, prin
cesas, e trezentas concubinas; e suas mulheres lhe ou Astarte, deusa da fertilidade e consorte
perverteram o coração. 4Pois sucedeu que, no de Baal, desde a conquista havia sido uma
tempo da «elhice de Salomão, suas mulheres lhe pedra de tropeço para os israelitas (Jz 2.13),
perverteram o coração para seguir outros deuses; mas não deve ser confundida com a deusa-
e o seu coração jâ não era perfeito para com o
Senhor seu Deus, como fora o de Davi, seu pai;
-mãe cananéia Asera, também associada
sSalomão seguiu a Astarote, deusa dos sidônios, a Baal, e também uma pedra de tropeço
e a Milcom, abominação dos amonitas.6Assim fez para os israelitas (Jz 3.7; lRs 15.13; 18.19).
207
Milcom ou Moloque era o sanguinário deus 3) O Primeiro Adversário: Hadade e Edom
da guerra dos amonitas, em cujo culto se (11.14-22)
praticava o sacrifício de crianças (2Rs
140 Senhor levantou contra Salomão um adver
23.10), e talvez deva ser identificado com sário, Hadade, o edomeu; o qual era da estirpe real
Quemós, um deus guerreiro da vizinha de Edom. ,5Porque sucedeu que, quando Davi
Moabe (2Rs 3.27; Jz 11.24). esteve em guerra contra Edom, tendo Joabe, o chefe
do exército, subido a enterrar os mortos, e ferido
a todo varão em Edom 16(porque Joabe ficou ali
seis meses com todo o Israel, até que destruiu a
2) A Resultante Divisão do Reino (11.9-13) todo varão em Edom), 17Hadade, que era ainda
menino, fugiu para o Egito com alguns edomeus,
9Pelo que o Senhor se indignou contra servos de seu pai. 18Levantando-se, pois, de Midiã,
Salomão, porquanto o seu coração se desviara do foram a Parã; e tomando consigo homens de Parã,
Senhor Deus de Israel, o qual duas vezes lhe apare
foram ao Egito ter com Faraó, rei do Egito, o qual
cera, 10e lhe ordenara expressamente que não
deu casa a Hadade, proveu-lhe a subsistência, e lhe
seguisse a outros deuses. Ele, porém, não guardou
deu terras. 19E Hadade caiu tanto em graça a
o que o Senhor lhe ordenara. “ Disse, pois, o Faraó, que este lhe deu por mulher a irmã de sua
Senhor a Salomão: Porquanto houve isto em ti, mulher, a irmã da rainha lafnes. 20Ora, desta irmã
que não guardaste o meu pacto e os meus estatutos de lafnes nasceu a Hadade seu filho Genubate, o
que te ordenei, certamente rasgarei de ti este reino,
qual lafnes criou na casa de Faraó, onde Genubate
e o darei a teu serva 12Contudo não o farei nos
esteve entre os filhos do rei. 21Ouvindo, pois,
teus dias, por amor de Davi, teu pai; da mão de Hadade no Egito que Davi adormecera com seus
teu filho o rasgarei. 13Todavia não rasgarei o reino
pais, e que Joabe, chefe do exército, era morto, disse
todo; mas uma tribo darei a teu filho, por amor
a Faraó: Deixa-me ir, para que eu volte à minha
de meu servo Davi, e por amor de Jerusalém, que
terra. 22Perguntou-lhe Faraó: Que te falta em
escolhi.
minha companhia, que procuras partir para a tua
Em lugar algum se declara de modo mais terra? Respondeu ele: Nada; todavia, peço que me
deixes ir.
explícito a teologia profética do historiador
deuteronômico dos reis do que nesse julga Salomão certa vez havia descrito para
mento adverso contra Salomão. O Senhor Hirão a paz de seu reinado nos seguintes
se indignou ilustra como o Antigo Testa termos: “Adversário não há, nem calami
mento atribui emoções humanas a Deus; dade alguma” (5.4). Não se pode dizer com
mas essas emoções enfatizam o relaciona base nesta história quão cedo essa situação
mento pessoal do Senhor com seu povo. mudou. Duas perdas de territórios conquis
As revelações a Salomão — duas vezes tados por Davi são aqui registradas como
lhe aparecera — tomam sua apostasia ainda punições divinas.
mais tétrica. Somente a segunda das duas Hadade havia sobrevivido à campanha
aparições menciona a advertência expressa de Davi em Edom (2Sm 8.13,14) e a um
no versículo 10 (9.6-9). vasto expurgo por Joabe, e havia fugido por
Certamente rasgarei de ti este reino. etapas para o Egito. Parece que, enquanto
Talvez essa palavra de julgamento tenha ele ainda era um rapazinhoi, ficou escon
vindo de Aias, o silonita (11.29), uma vez dido no deserto perto de Edom até que se
que o uso tríplice do verbo rasgar nessa levantou um Faraó que não nutria simpa
passagem traz à memória a ação simbólica tias por Salomão. De acordo com o versículo
do profeta, executada diante de Jeroboão 21, as mortes de Davi e Joabe estimularam
(11.30,31). A palavra de julgamento é mistu o retorno de Hadade para Edom. Mas, se
rada com graça, com a calamidade adiada ele conquistou algum poder já tão cedo no
até os dias do filho de Salomão, e com a reinado de Salomão, foi somente para criar
tribo de Judá permanecendo fiel à dinastia problemas (11.25), insuficiente para inter
davídica. Não obstante, o mau exemplo de romper o funcionamento da ampla
Salomão e sua apostasia após os deuses das indústria metalúrgica, da navegação e do
esposas estrangeiras seria recordado cinco comércio por caravanas mediante Edom,
séculos mais tarde (Ne 13.26). os quais Salomão administrava.
208
4) O Segundo Adversário: Rezom de rei: Salomão tinha edificado a Milo, e cerrado a
Damasco (11.23-25) brecha da cidade de Davi, seu pai. 28Ora, Jero
boão era um homem forte e valente; e vendo
23Deus levantou contra Salomão ainda outro Salomão que este mancebo era laborioso, colocou-
adversário, Rezom, filho de Eliadá, que tinha fugido -o sobre toda a carga imposta à casa de José.
de seu senhor Hadadézer, rei de Zobá. 24Pois ele
ajuntara a si homens, e se fizera capitão de uma Evidentemente o pai de Jeroboão,
tropa, quando Davi matou os de Zobá; e, indo-se Nebate, morreu cedo. A mãe de Jeroboão,
para Damasco, habitaram ali; e fizeram-no rei em Zeruá, é chamada de viúva. Zeredá era um
Damasco. 25E foi adversário de Israel por todos local na região montanhosa de Efraim,
os dias de Salomão, e isto além do mal que Hadade entre Ramá e Siló, que, segundo a versão
fazia; detestava a Israel, e reinava sobre a Síria.
grega, Jeroboão teria fortificado. Isso pode
Muito mais significativo para os dois fornecer o contexto para ter levantado a
séculos seguintes da história de Israel foi mão contra o rei. Tem-se uma pista do
a perda territorial representada pela motivo da rebelião na ligação do serviço
defecção de Rezom. Antigo aliado de Hada prestado por Jeroboão a Salomão com o
dézer de Zobá, que era chefe da coalizão trabalho forçado dos efraimitas, o “pesado
síria derrotada por Davi (2Sm 8.3-8; 10.6-8, jugo” que seus concidadãos de tribo estavam
15.18), Rezom havia se tornado líder de um suportando devido ao ambicioso programa
bando de foras-da-lei de uma maneira bem de construção do rei (cc. 12.2). O curso dos
semelhante à do próprio Davi. Davi havia acontecimentos seguintes serve apenas para
estacionado soldados em Damasco, demonstrar o juízo do rei quanto à habili
transformando-a em um importante posto dade de Jeroboão, mesmo que o resultado
avançado de seu império. Bem cedo no tenha sido desastroso para seu reino e o seu
reinado de Salomão, Rezom e seus asseclas filho.
capturaram Damasco. Conquanto seja
improvável que tenha tido força suficiente b. Atos e Palavras do Profeta Aias
para desafiar o controle por Salomão do (11.29-39)
comércio de caravanas nessa região, sua
defecção enfraqueceu o império de 29E sucedeu naquele tempo que, saindo Jero
boão de Jerusalém, o profeta Aias, o silonita, o
Salomão. encontrou no caminho; este se tinha vestido duma
capa nova; e os dois estavam sós no campa
5) O Terceiro Adversário: Jeroboão de “ Então Aias pegou na capa nova que tinha sobre
Efraim (11.26-40) si, e a rasgou em doze pedaços. 31E disse a Jero
boão: 7bma estes dez pedaços para ti, porque
assim diz o Senhor Deus de Israel: Eis que
A rebelião tentada por Jeroboão ocorreu rasgarei o reino da mão de Salomão, e a ti darei
nos anos finais do reinado de Salomão. A dez tribos. 32Ele, porém, terá uma tribo, por
construção de Milo estava ligada ao fim amor de Davi, meu servo, e por amor de Jeru
de seu período de vinte anos de construção salém, a cidade que escolhi dentre todas as tribos
de Israel. MPorque me deixaram, e se encurva
em Jerusalém (cf. Gray, p. 224). A dinastia ram a Astarote, deusa dos sidônios, a Quemós,
havia mudado no Egito, para «ide Jeroboão deus dos moabitas, e a Milcom, deus dos amo-
fugiu, com a ascensão de Sisaque (cerca nitas; e não andaram pelos meus caminhos, para
de 940 a.C.). A Septuaginta apresenta uma fazerem o que parece reto aos meus olhos, e
para guardarem os meus estatutos e os meus
versão diferente da revolta de Jeroboão preceitos, como o fez Davi, seu pai. MTodavia não
(Montgomery, p. 251-254). tomarei da sua mão o reino todo; mas deixá-lo-ei
governar por todos os dias da sua vida, por amor
a. Um Líder Trabalhista Capaz (11.26-28) de Davi, meu servo, a quem escolhi, o qual guar
dou os meus mandamentos e os meus estatutos.
“ Também Jeroboão, filho de Nebate, efrateu 35M as da mão de seu filho tomarei o reino e
de Zeredá, servo de Salomão, cuja mãe era viúva, to darei a ti, isto é, as dez tribos. ’’’Todavia a seu
por nome Zeruá, levantou a mão contra o rei. 27E filho darei uma tribo, para que Davi, meu servo,
esta foi a causa por que levantou a mão contra o sempre tenha uma lâmpada diante de mim em
209
Jerusalém, a ddade que escolhi para ali pôr o contada com Judá à época da divisão
meu nome. 37Então te tomarei, e reinarás sobre (cf. 12.23).
tudo o que desejar a tua alma, e serás rei sobre
Israel. há de ser que, se ouvires tudo o que A vida de Davi e de seu sucessor ao
eu te ordenar, e andares pelos meus caminhos, e trono davídico era a lâmpada de Israel
fizeres o que é reto aos meus olhos, guardando (2Sm 21.17; SI 132.17). A palavra comum
os meus estatutos e os meus mandamentos, como para lâmpada (ner) é aqui grafada nyr
o fez Davi, meu servo, eu serei contigo, e te edifi (como também em IReis 15.4; 2Reís 8.19),
carei uma casa firme, como o fiz para Davi, e te
darei Israel. 39E por isso afligirei a descendência que pode ser traduzida como “domínio”.15
de Davi, todavia não para sempre. Se ouvires. Aias manteve os ideais da
aliança da antiga confederação tribal, tal
A sucessão de homens proféticos é
como Samuel fizera com Saul, condicio
contínua desde o tempo de Samuel. Agora
nando a continuidade da dinastia de
outra figura entra em cena no papel de Jeroboão a sua obediência a Iavé. Assim,
fazedor de reis, tal como Samuel e Natã: o Reino do Norte desenvolveu-se diferen
Aias, o silonita. O papel politico do profeta temente do de Judá, e a profecia desempe
estava diretamente ligado à relação de nhou um papel político mais importante.
concerto com Iavé. Se o rei no poder ti
vesse violado essa aliança, o profeta não
c. A Fuga de Jeroboão Para o Egito
hesitaria em suscitar uma rebelião contra
(11.40)
ele. Que Aias fosse do antigo santuário
central da confederação tribal em Siló 40Pelo que Salomão procurou matar Jero
pode ser significativo para seu papel profé boão; porém este se levantou, e fugiu para o
Egito, a ter com Sisaque, rei do Egito, onde
tico. esteve até a morte de Salomãa
Parte da singularidade dessa narrativa
é o ato simbólico de Aias. Esse é o mais O oráculo de Aias para Jeroboão des
antigo exemplo completo de um aspecto de pertou-o para algum ato de rebelião, ao
proclamação e implementação proféticas que Salomão reagiu tal como tinha feito
da palavra do Senhor, aspecto que se torna diante da ameaça do partido de Adonias
cada vez mais importante, alcançando seu (2.13 e ss.). Péla primeira vez no Antigo
clímax com Jeremias e Ezequiel. A capa Testamento, é dito o nome do Faraó,
do profeta estava freqüentemente envol Sisaque, o primeiro Faraó da nova dinas
vida na história (ISm 15.27,28; cf. IReis tia líbia. Seu apoio a Jeroboão foi mo
19.19; 2Reis 2.8 e ss.). A palavra hebraica tivado pelo ressurgimento da política
para capa nova indica um manto exterior, egípcia de intervenção militar na Pales
e é diferente da palavra usada para o tina (14.25-28). O momento oportuno para
manto de Samuel ou o de Elias, que se toma a rebelião era sempre a morte do monarca
o manto profético típico (cf. Zc 13.4). poderoso, por isso Jeroboão permaneceu
Os doze pedaços representam as doze no Egito até a morte de Salomão.
tribos de Israel como uma confederação
religiosa, conquanto as realidades políticas 6) A Morte de Salomão (11.41-43)
e geográficas tenham mudado desde o 41Quanto ao restante dos atos de Salomão, e
período anterior (cf. 4.7-19). Dez tribos a tudo o que ele fez, e à sua sabedoria, porven
(...) uma tribo (As versões LXX e Velha tura não está escrito no livro dos atos de Salo
Latina indicam duas tribos para Davi nos mão? 420 tempo que Salomão reinou em Jeru
salém sobre todo o Israel foi quarenta anos.
v. 32,36). O número de tribos do sul é 43E Salomão dormiu com seus pais, e foi sepul
confuso, uma vez que a posição de Ben tado na cidade de Davi, seu pai; e Roboão, seu
jamim como uma tribo fronteiriça é filhoi, reinou em seu lugar.
ambígua e contestada. Betei, agora em
Efraim, constitui o limite meridional das 15 R m l D. H anson, “T he Song o f H eshbon a n d David’s N ir” H arvard
dez tribos, de modo que Benjamim é Theological Review, Vol. 61, N ? 3 (juiho, 1968), p. 297-320.
210
Essa breve avaliação dos atos adminis tarmente fracos e não estavam religiosa
trativos de Salomão destacam sua sabe mente à altura. O interesse religioso do
doria. A despeito das falhas do rei, ele historiador agora se transfere dos reis aos
ainda fez uma contribuição positiva para profetas.
o reino de Deus. Suas grandes realizações
foram a construção do templo de Jerusa 1. A Revolta de Jeroboão (12.1-33)
lém e a autoria e compilação da literatura
de sabedoria. Na verdade, o reinado de Jeroboão surgiria como um dos adver
Salomão propiciou opulência e tempo sários de Salomão (11.26-40). Roboão
livre para um florescimento da atividade havia sucedido a Salomão em Jerusalém
literária (cf. Noth, p. 218-224). e Judá, mas não fora ainda confirmado
como rei de todo Israel. Esta seção trata
não só da divisão em si, mas de outras
II. O Começo do Reino Dividido medidas tomadas por Jeroboão para tor
(12.1—16.34) nar permanente a divisão.
O reinado de Davi era constituído por
1) A Assembléia em Siquém (12.1-5)
duas monarquias, governadas a partir de
uma capital tribalmente neutra, Jerusa 'Foi então Roboão para Siquém, porque todo
lém, que era propriedade pessoal de Davi o Israel se congregara ali para fazê-lo rei. 2E
Jeroboão, fllbo de Nebate, que estava ainda no
e seus sucessores. Davi fez dessa dupla Egito, para onde fugira da presença do rei Salo
monarquia uma base para seu império mão, ouvindo isto, voltou do Egita 3E mandaram
siro-palestino, que foi comercialmente chamá-lo; Jeroboão e toda a congregação de
explorado por Salomão. O reinado de Israel vieram, e falaram a Roboão, dizendo:
Davi sobre as tribos de Israel, anteriormente 4Teu pai agravou o nosso jugo; agora, pois, alivia
a dura servidão e o pesado jugo que teu pai nos
leais a Saul, deu-se por aliança com os impôs, e nós te serviremos. 5Ele lhes respondeu:
anciãos tribais (2Sm 5.3). Mas a ascensão Ide-vos até o terceiro dia, e então voltai a mim.
de Salomão ao trono de Davi deu-se mais E o povo se foi.
por intriga palaciana do que por aliança
tribal, e Salomão passou a violar as liber Evidentemente Salomão havia negli
dades da antiga confederação tribal ao genciado por muito tempo a reparação de
impor pesados tributos e trabalhos força legítimos agravos tribais. Mesmo sem a
dos. A assembléia em Siquém expressou a liderança de Jeroboão, teria havido pro
determinação das dez tribos do norte em blemas para um jovem rei inexperiente que
mudar esse despotismo salomônico ou tentasse ocupar o lugar de Salomão. Tem
rebelar-se contra ele. A insensatez de havido divergências quanto a até que
Roboão precipitou a revolta de Jeroboão, ponto Jeroboão tomou parte nas nego
com suas conseqüências desastrosas. Poli ciações da assembléia com Roboão. O
ticamente, o império estava perdido, e texto hebraico no versículo 2 (cf. 12.20) e
uma ressentida guerra civil explodiu. Reli a versão Septuaginta sobre a revolta indi
giosamente, Jeroboão entregou o Norte a cam que Jeroboão permaneceu no Egito.
uma religião rival, o que provocou a Mas 12.3,12 (cf. 2Cr 10.2) já o coloca em
indignação do Senhor contra ele e todos cena, assumindo a liderança para a qual
os seus sucessores. As duas primeiras ele é mais tarde formalmente eleito.
dinastias falharam na tentativa de obter Siquém era um antigo local de ajunta
poder ou de controlar a sucessão. A di mento para as tribos, cenário de uma
nastia de Onri terminou a guerra civil cerimônia periódica de renovação da
com Judá, mas precipitou uma revolta aliança (Dt 11.29,30; 27.11 e ss.; 31.10
profética contra Acabe e seus filhos. Em e ss; Js 8.30-35; 24.1-28,32). Nós te servi
Judá, Roboão e seus sucessores eram mili- remos era um compromisso assumido.
211
Não há razão para duvidar da boa fé das a prosperidade material baseada em des
tribos que realmente haviam suportado potismo cruel. Castigarei, essa era uma
um pesado jugo de impostos e trabalhos palavra importante nas escolas de sabe
forçados sob Salomão. doria, empregada para definir o tipo de
disciplina de que careciam aqueles jovens
2) A Política Insensata de Roboão (Pv 19.18; 29.17). Mudança é uma palavra
(12.6-15) peculiar para mudança de sorte, mas sem
6Teve o rei Roboão conselho com os anciãos um sentido fatalista. Pára cumprir a pa
que tinham assistido diante de Salomão^ seu pai, lavra profética que dissera por Aias, o
quando este ainda vivia, e perguntou-lhes: Como Senhor realmente faria as coisas mudarem
aconselhais vós que eu responda a este povo? (cf. 2.15; ISm 2.7).
7Eles lhe disseram: Se hoje te tom ares servo
deste povo, e o servires, e, respondendo-lhe, lhe
falares boas palavras, eles serão para sempre teus 3) A Rebelião Bem-Sucedida (12.16-24)
servos. 8Ele, porém, deixou o conselho que os
anciãos lhe deram, e teve conselho com os mancebos “ Vendo, pois, todo o Israel que o rei não lhe
que haviam crescido com ele, e que assistiam dava ouvidos, respondeu-lhe, dizendo: Que parte
diante dele, 9perguntando-lhes: Que aconselhais temos nós com Davi? Não temos herança no filho
vós que respondamos a este povo, que me disse: de Jessé. As tuas tendas, ó Israel! Agora olha por
Alivia o jugo que teu pai nos impôs? 10E os tua casa, ó Davi! Então Israel se foi para as suas
mancebos que haviam crescido com ele respon tendas. 17(Mas quanto aos filhos de Israel que
deram-lhe: A este povo que te falou, dizendo: habitavam nas cidades de Judá, sobre eles reinou
Teu pai fez pesado o nosso jugo, mas tu o alivia Roboãa) 18Então o rei Roboão enviou-lhes Adorão,
de sobre nós; assim lhe falarás: Meu dedo mínimo que estava sobre a leva de tributários servis; e todo
é mais grosso do que os lombos de meu pai. o Israel o apedrejou, e ele morreu. Pelo que o rei
"Assim que, se meu pai vos carregou dum jugo Roboão se apressou a subir ao seu carro e fugiu
pesado, eu ainda aumentarei o vosso jugo; meu para Jerusalém .19Assim Israel se rebelou contra
pai vos castigou com açoites; eu, porém, vos a casa de Davi até o dia de hoje. S u cedeu então
castigarei com escorpiões. 12Veio, pois, Jeroboão que, ouvindo todo o Israel que Jeroboão tinha
com todo o povo a Roboão ao terceiro dia, como voltado, mandaram chamá-lo para a congregação,
o rei havia ordenado, dizendo: Voltai a mim ao e o fizeram rei sobre todo o Israel; e não houve
terceiro dia. 13E o rei respondeu ao povo aspera ninguém que seguisse a casa de Davi, senão somente
mente e, deixando o conselho que os anciãos lhe a tribo de Judá. 21Tendo Roboão chegado a Jeru
haviam dado, 14falou-lhe conforme o conselho dos salém, convocou toda a casa de Judá e a tribo de
mancebos, dizendo: Meu pai agravou o vosso Benjamim, cento e oitenta mil homens escolhidos,
jugo, porém eu ainda o aumentarei; meu pai vos destros para a guerra, para pelejarem contra a casa
castigou com açoites, porém eu vos castigarei de Israel a fim de restituírem o reino a Roboão,
com escorpiões. 150 rei, pois, não deu ouvidos ao filho de Salomãa 22Veio, porém, a palavra de Deus
povo; porque esta mudança vinha do Senhor, para a Semaías, homem de Deus, dizendo: 23Fala a
confirmar a palavra que o Senhor dissera por Roboão, filho de Salomãoi, rei de Judá, e a toda
intermédio de Aias, o silonita, a Jeroboão, filho a casa de Judá e de Benjamim, e ao resto do povoi,
de Nebate. dizendo:24Assim diz o Senhor: Não subireis, nem
pelejareis contra vossos irmãos, os filhos de Israel;
À semelhança de Salomão, Roboão volte cada um para a sua casa, porque de mim
havia nascido “em berço de ouro” em proveio isto. E ouviram a palavra do Senhor, e
voltaram segundo o seu mandada
Jerusalém. Davi estragou seus filhos
Amnon, Absalão e Adonias, que rejei Israel levantou o clamor da rebelião de
taram conselho sábio, preferindo a tola Sebá contra Davi (2Sm 20.1), lembrando
vaidade. Evidentemente Salomão não agiu os representantes tribais de problemas ante
de uma forma melhor com Roboão. Os riores entre os dois grupos. O comentário
anciãos eram oficiais de Salomão (4.1-6), prosaico se foi para as suas tendas suben
que deram um conselho astucioso ainda tende que aqueles ali reunidos estavam
praticado por políticos em época de elei acampados tal qual um exército no campo
ção. Os mancebos também haviam cres perto de Siquém (Gray, p. 283). Os filhos
cido na suntuosa corte de Salomão e de Israel sobre os quais Roboão continuou
supunham nesciamente que não teria fim a reinar podem se referir a Benjamim, que
212
previamente se identificara com as tribos o rei, tendo tomado conselho, fez dois bezerros de
do norte, ou talvez aos israelitas piedosos ouro; e disse ao povo: Basta de subires a Jerusalém;
que debandaram para Judá (2Cr 11.16). eis aqui teus deuses, ó Israel, que te fizeram subir
da terra do Egita 29E pôs um em Betei, e o outro
Adorão, segundo várias versões, deve ser em Dã. 50Ora, isto se tornou em pecado; pois que
entendido como Adonirão, com quem esse o povo ia até Dã para adorar o ídolo. 31lkmbém
superintendente deve ser identificado (lRs fez casas nos altos, e constituiu sacerdotes dentre
4.6). Se ele e o chefe de trabalhos forçados o povo, que não eram dos filhos de Levi. 32E Jero
boão ordenou uma festa no oitavo mês, no dia
de Davi são a mesma pessoa, estaria décimo quinto do mês, como a festa que se cele
servindo por meio século (2Sm 20.24). brava em Judá, e sacrificou no altar. Seme
Roboão demonstrou grande estupidez ao lhantemente fez em Betei, sacrificando aos
enviar um oficial que seria uma lembrança bezerros que tinha feito; também em Betei esta
tão incisiva da razão daquela rebelião. A beleceu os sacerdotes dos altos que fizera.
33Sacrificou, pois, no altar que fizera em Betei, no
reação da assembléia foi um ato real de rebe dia décimo quinto do oitavo mês, mês que ele tinha
lião, o que levou Roboão a fugir para salvar escolhido a seu bei prazer; assim ordenou uma festa
a vida. para os filhos de Israel, e sacrificou no altar, quei
mando incenso.
Essa divisão do reino foi um dia cala
mitoso, assim lembrado dois séculos depois Jeroboão imediatamente pôs-se a campo
(cf. Is 7.17). A Septuaginta acrescenta para consolidar seu reino. Ele fortificou o
Benjamim à frase somente a tribo de Judá, antigo centro tribal de Siquém como sua
para concordar com os versículos 21-24. primeira capital, um fato confirmado pela
Semaías é chamado de homem de Deus, arqueologia (Wright, p. 147). Mais tarde ele
que é um sinônimo para profeta pertencente fortificou Penuel, do outro lado do Jordão,
às corporações proféticas (cf. 13.1). Esse é talvez à época da invasão de Sisaque. Tal
o único relato que temos a seu respeito em como Davi e Salomão haviam buscado
Reis, embora a versão Septuaginta sobre tornar Jerusalém um centro religioso, Jero
Jeroboão atribua a Semaías, em vez de a boão também sentiu por motivos políticos
Aias, o ato simbólico de rasgar a capa (11.29 a necessidade de estabelecer centros reli
e ss.). Crônicas menciona seu oráculo a giosos no norte. O historiador judaico do
Roboão durante a invasão de Sisaque (2Cr tempo de Josias nunca foi capaz de perdoar
12.5 e s.), e alguns intérpretes têm suposto Jeroboão e seus sucessores por essa religião
que a ameaça daquela intervenção egípcia paralela, conquanto dificilmente se poderia
é o motivo político para o Senhor proibir esperar que um reino politicamente divi
a batalha aqui. Assim diz o Senhor era a dido permanecesse unido religiosamente.
fórmula familiar de discurso profético, Aos dois bezerros de ouro é dirigida uma
também empregada por Aias (11.31). De declaração de aliança, o que imediatamente
mim proveio isto deve ser entendido como liga esse novo simbolismo à antiga história
uma declaração de que Deus é o Senhor de Arão e do bezerro de ouro (Ex 32.4,8),
da história, e que até mesmo faz com que quando uma fórmula virtualmente idêntica
rebeliões desastrosas sejam meios de atingir foi usada. O substantivo deuses poderia
seu propósito. muito bem ser traduzido como “Deus”,
exceto que aqui há um verbo no plural, e
4) Os Pecados de Jeroboão (12.25-33) em Êxodo há um pronome plural. Não se
25Jeroboão edificou Siqném, na região monta
deve interpretar isso como a idolatria gros
nhosa de Efraim, e habitou ali; depois, saindo dali, seira em que posteriormente teve a
edificou Penuel. “ Disse Jeroboão no seu coração: tendência de se tornar, mas como um novo
Agora tornará o reino para a casa de Davi. 27Se simbolismo semelhante aos querubins e à
este povo subir para fazer sacrifícios na casa do arca do templo de Salomão. Mas os touros
Senhor, em Jerusalém, o seu coração se tornará
para o seu senhor, Roboão, rei de Judá; e, matando- de Betei e Dã, diferentemente dos símbolos
me, voltarão para Roboão, rei de Judá. “ Pelo que de Jerusalém, parecem ter estado em expo
213
sição pública, e a inevitável associação com tivas sobre Aias, Elias e Eliseu, existem
o culto da fertilidade dos cananeus justifica histórias de profetas anônimos (18.4;
o julgamento do historiador de que isto se 13,22,35-43; 22.6; cf. Jz 6.8; ISm 2.27;
tornou em pecado. Ao tempo de Oséias, o 10.5). Esses são os “filhos dos profetas”, ou
culto desses bezerros é virtualmente um membros de corporações proféticas, mais
culto a Baal, desdenhado e condenado tarde localizadas em centros tais como Betei
como idolatria (Os 8.5,6; 10.5,6; 13.2). e Jericó (2Rs 2.3 e ss.; cf. Gibeá e Ramá
Betei era o “santuário real” nos dias de em ISm 10.10; 19.18 e ss.) e sujeitas a um
Amós (Am 7.13) e certamente era, por isso, mestre tal como Eliseu (2Rs 2.7,15; 4.1,38;
mais importante do que Dã. Foi um lugar 9.1). Uma lição muito importante de disci-
sagrado dos patriarcas, especialmente Jacó pulado nessas escolas proféticas foi a
(Gn 28.10-22; 35.1-15). O santuário em Dã absoluta obediência à palavra do Senhor
reivindicava um sacerdócio que descendia e à missão do discipulado (2Rs 4.29; cf. Lc
de Moisés e era local de peregrinação no 10.4). Os oráculos dos grandes profetas ca
limite setentrional do reino (Jz 18.30). nônicos e as narrativas a seu respeito foram
Ofensas subseqüentes de Jeroboão foram provavelmente preservados por tais escolas
que ele manteve os lugares altos locais, de discípulos (Is 8.16; 50.4,5; Jr 36.2,32).
designou sacerdotes não levíticos, transferiu
a festa da colheita para o oitavo mês, e a. Um Homem de Deus de Judá (13.1-10)
oficiou em Betei para iniciar a adoração ali. 'Eis que, por ordem do Senhor, veio de Judá
Tudo isso é condenado do ponto de vista a Betei um homem de Deus; e Jeroboão estava junto
do historiador deuteronômico e do sacer ao altar, para queimar incensa 2E o homem
clamou contra o altar, por ordem do Senhor,
dócio de Jerusalém. Foi o começo de uma dizendo: Altar, altar! assim diz o Senhor: Eis que
trajetória que culminou em declarada idola um filho nascerá à casa de Davi, cujo nome será
tria e atraiu os justos juízos de Deus. Josias; o qual sacrificará sobre ti os sacerdotes
dos altos que sobre ti queimam incenso, e ossos
2 .0 Julgamento Profético Sobre Jeroboão de homens se queimarão sobre ti. 3E deu naquele
(13.1—14.20) mesmo dia um sinal, dizendo: Este é o sinal de que
o Senhor falou: Eis que o altar se fenderá, e a cinza
A importância do movimento profético que está sobre ele se derramará. ‘‘Sucedeu pois
em Israel é realçada pelo fato de que o que, ouvindo o rei Jeroboão a palavra que o homem
de Deus clamara contra o altar de Betei, estendeu
mesmo profeta que designou um homem a mão de sobre o altar, dizendo: Pegai-o! E logo,
como rei podia também pronunciar o julga a mão que estendera contra ele secou-se, de modo
mento de Deus contra aquele rei e todos que não podia tornar a trazê-la a si. 5E o altar se
os seus sucessores em potencial. Em relação fendeu, e a cinza se derramou do altar, conforme
a Jeroboão, Aias, o silonita, desempenha o sinal que o homem de Deus, por ordem do Senhor,
havia dada 6Então respondeu o rei, e disse ao
essa função profética de fazedor e derri- homem de Deus: Suplica ao Senhor teu Deus, e
bador de reis. A impiedade do culto de roga por mim, para que se me restitua a minha
Jeroboão em Betei, segundo a perspectiva mãa Pelo que o homem de Deus suplicou ao Senhor,
do templo de Jerusalém, também é conde e a mão do rei se lhe restituiu, e ficou como dantes.
7Disse então o rei ao homem de Deus: Vem
nada por uma personagem anônima de comigo a minha casa, e conforta-te, e dar-te-ei uma
Deus vinda de Judá, cuja missão contra recompensa. 8Mas o homem de Deus respondeu
Betei trouxe à lembrança algumas das ao rei: Ainda que me desses metade da tua casa,
tarefas semelhantes de Amós (7.10-15; cf. não iria contigo, nem comeria pão, nem beberia
3.14; 5.5; 9.1). água neste lugar. ’Porque assim me ordenou o
Senhor pela sua palavra, dizendo: Não comas pão,
nem bebas água, nem voltes pelo caminho por onde
1) A Palavra do Senhor Contra Betei viest& 10Ele, pois, se foi por outro caminho, e não
(13.1-34) voltou pelo caminho por onde viera a Betei.
Surgindo dos mesmos círculos de Há duas indicações de que a história do
tradição profética que preservaram as narra- cumprimento, ao tempo do historiador,
214
dessa admirável predição influenciou a dependia o bom discípulo profético (cf. 2Rs
forma da narrativa. Uma é a observação 9.3), de modo que é imediatamente relatado
de que Josias é o nome do rei davídico que que o homem de Deus obedeceu.
profanaria o altar de Betei, o que a grande
maioria dos estudiosos toma como um b. O Teste da Obediência Profética
acréscimo por escribas. A outra é o emprego (13.11-19)
do termo “cidades de Samária” (13.32), signi "O ra, morava em Betei um velho profeta.
ficando a província de Samária. Samária Seus filhos vieram contar-lhe tudo o que o homem
não foi edificada nem foi assim chamada de Deus fizera aquele dia em Betei; e as palavras
até o início do reinado de Onri (16.24), e que ele dissera ao rei, contaram-nas também a seu
não se tornou província senão quando da pai. 12Perguntou-lhes seu pai: Por que caminho se
foi? Pois seus filhos tinham visto o caminho por
invasão assíria (cerca de 734 a.C.). Esse onde fora o homem de Deus que viera de Judá.
emprego do termo Samária é evidenciado 13Então disse a seus filhos: Albardai-me o jumenta
no relato da reforma de Josias, onde se E albardaram-lhe o jumento, no qual ele montou.
declara erroneamente que o velho profeta 14E tendo ido após o homem de Deus, achou-o
de Betei era de Samária (2Rs 23.17-19). sentado debaixo de um carvalhoi, e perguntou-lhe:
És tu o homem de Deus que vieste de Judá?
A ligação da história com o fim do capí Respondeu ele: Sou. 15Então lhe disse: Vem
tulo anterior parece indicar que a ocasião comigo a casa, e come p ãa “ Mas ele tornou: Não
era a festa de dedicação do altar de Betei posso voltar contigo, nem entrar em tua casa; nem
tampouco comerei pão, nem beberei água contigo
(cf. 8.2,22,62-66). Sinal é uma advertência neste lugar; 17porque me foi mandado pela palavra
ou predição agourenta, um sinal do profeta do Senhor: Ali não comas pão, nem bebas água,
em que confirmava a genuinidade de sua nem voltes pelo cam inho por onde vieste.
palavra profética por um acontecimento ali 18Respondeu-lhe o outro: Eu também sou profeta
como tu, e um anjo me falou por ordem do Senhor,
na hora. O rei, que gesticula contra o dizendo: Faze-o voltar contigo a tua casa, para que
homem de Deus, ordenando sua prisão, é coma pão e beba água. Mas mentia-lhe. 19Assim
sobrenaturalmente atingido, e solicita o homem voltou com ele, comeu pão em sua casa,
oração intercessória por parte daquele que e bebeu água.
tão obviamente é um homem de Deus.
Suplica significa, literalmente, “acaricia a Um dos problemas difíceis da história
face”, uma expressão convencional, embora da profecia é o fenômeno dos “falsos”
chocante, que tem o sentido de amainar profetas. O incidente da disputa de Micaías
o semblante irado do Senhor mediante a com os quatrocentos profetas de Acabe é
oração. um exemplo mais claro do problema do que
O convite de Jeroboão provavelmente a história em tela (22.5-28). Contudo, o
não é para que se cultue permanentemente velho profeta de Betei é em certo sentido
em Siquém ou Betei, mas para uma festa o rival do homem de Deus vindo de Judá.
no salão de banquete (cf. ISm 9.22). Assim Não há qualquer indício de uma ordem
como Balaão, o adivinhador babilónico, é divina a motivar seu engano; antes, o relato
retratado como um verdadeiro profeta que parece ser novamente contado como uma
recusa pagamento ou recompensa (Nm advertência do que poderia ocorrer com o
22.18; 24.13), também o homem de Deus discípulo profético desprevenido que não
responde: Ainda que me desses metade da obedece fielmente a ordem de marchar. O
tua casa, não iria contigo. A ordem de não relato considera um anjo me falou como um
comer ou beber com pessoa alguma em meio de revelação inferior ao da ordem
Betei implica recusar relações de aliança direta pela palavra do Senhor já citada. Mas
com aqueles que estavam associados com mentia-lhe é talvez uma dedução a que
o altar condenado (cf. ICo 10.8). Retornar chega o escritor a partir do resultado dos
por um caminho diferente parece ser uma acontecimentos. Segundo a teologia primi
daquelas ordens de cuja obediência tiva de Israel sobre o teste, tal engano podia
215
ser atribuído à inspiração divina (cf. o espí o chorar e o sepultar. ~
WE colocou o cadáver no seu
rito mentiroso da boca dos profetas de próprio sepulcro; e prantearam-no, dizendo: Ah,
irmão meu! 31Depois de o haver sepultado, disse
Acabe, 22.22,23). Mais tarde tal tipo de a seus filhos: Quando eu morrer, sepultai-me no
tentação seria atribuída a Satanás (cf. 2Sm sepulcro em que o homem de Deus está sepultado;
24.1; lCr 21.1). ponde os meus ossos junto aos ossos dele.
32Porque certamente se cumprirá o que, pela
c. A Punição da Desobediência (13.20-25). palavra do Senhor, clamou contra o altar que está
em Betei, como também contra todas as casas dos
20Estando eles à mesa, a palavra do Senhor altos que estão nas cidades de Samária.
veio ao profeta que o tinha feito voltar; 21e ele
clamou ao homem de Deus que viera de Judá,
dizendo: Assim diz o Senhor: Porquanto foste O cumprimento da palavra de juízo
rebelde à ordem do Senhor, e não guardaste o contra o homem de Deus parece convencer
mandamento que o Senhor teu Deus te mandara, o velho profeta de Betei acerca da genui
Z2mas voltaste, e comeste pão e bebeste água no
lugar de que te dissera: Não comas pão, nem bebas nidade da missão e mensagem do jovem.
água; o teu cadáver não entrará no sepulcro de teus Ele então trata o corpo com grande respeito,
pais. 23E, havendo eles comido e bebido, albardou sepultando-o em sua própria tumba, onde
o jumento para o profeta que fizera voltar. 24Este, planeja ser sepultado. Essa sepultura, assi
pois, se foi, e um leão o encontrou no caminho, nalada por um monumento, criou ocasião
e o matou; o seu cadáver ficou estendido no caminho,
e o jumento estava parado junto a ele, e também para a preservação e rememoração dessa
o leão estava junto ao cadáver. 25E, passando por estranha história, repetida a Josias quando
ali alguns homens, viram o cadáver estendido no se cumpriu o juízo do Senhor contra Betei
caminho, e o leão ao lado dele. Foram, pois, e o trezentos anos depois (2Rs 23.15-20). É
disseram na cidade onde o velho profeta habitava.
exagero chamar essa história de midrash,
Agora que seu ardil deu certo, o velho ou história folclórica, e considerá-la total
profeta de Betei recebe um genuíno oráculo mente sem base histórica (cf. Montgomery,
de julgamento acerca da morte iminente p. 260, Dentan, p. 51,52). O cerne da histo
do homem de Deus. Nesse tipo de narra ricidade na condenação de Betei é a antiga
tiva o leão é freqüentemente associado à tradição oral, com base na qual esta edifi
punição divina (20.36; 2Rs 17.25,26). O cante história do teste de obediência
rugido do leão tornou-se um símbolo bem profética foi transmitida pela corporação
significativo de juízo para Amós (1.2; dos discípulos.
3.4,8,12; 5.19). O comportamento peculiar
do leão e do jumento eram considerados e. A Contínua Impiedade de Jeroboão
um sinal de que estavam sob o controle do (13.33,34)
Senhor (cf. Nm 22.21-30). 33Nem depois destas coisas deixou Jeroboão
o seu mau caminho, porém tornou a fazer dentre
d. A Moral de uma Estranha História todo o povo sacerdotes dos lugares altos; e a qual
quer que o queria consagrava sacerdote dos lugares
(13.26-32) altos. ^E isso foi causa de pecado à casa de Jero
boão, para destrui-la e extingui-la da face da terra.
26Quando o profeta que o fizera voltar do
caminho ouviu isto, disse: E o homem de Deus, que
foi rebelde à palavra do Senhor; por isso o Senhor Com a repetição verbal do que já havia
o entregou ao leão, que o despedaçou e matou, sido dito na seção sobre os pecados de Jero
segundo a palavra que o Senhor lhe dissera. 27E
disse a seus filhos: Albardai-me o jumenta Eles boão, o historiador indica que a palavra
lho albardaram. “ Então foi e achou o cadáver profética não levou o rei ao arrependimento
estendido no caminho, e o jumento e o leão, que de seu mau caminho (12.30-32). Era o sacer
estavam parados junto ao cadáver; o leão não o dócio ilegítimo do culto de Jeroboão em
havia devorado, nem havia despedaçado o jumenta Betei que particularmente ofendia o histo
29Entâo o profeta levantou o cadáver do homem de
Deus e, pondo-o em cima do jumento, levou-o riador de Jerusalém, e não tanto os bezerros
consigo; assim veio o velho profeta à cidade para de ouro. Para Jeroboão, a permanência em
216
pecado a despeito das advertências profé Jacó porque este se disfarçou perante o cego
ticas significou a destruição de sua casa, Isaque (Gn 27.35,36). Mas o profeta
isto é, a possibilidade de ter uma dinastia. recebeu uma palavra de advertência do
Senhor, e já sabe quem ela é e porque está
2) Palavra de Aias em Siló (14.1-20) ali (cf. ISm 9.16-20).
O profeta que designou Jeroboão
(11.29-39) está agora velho e cego, mas ainda b. O Destino da Dinastia de Jeroboão
atuava como conselheiro (cf. ISm 9.5-9). (14.5b-16)
O rei demonstra ter um temor do partido Assim e assim lhe falarás; porque há de ser que,
profético, um medo quanto ao tipo de entrando ela, fingirá ser outra. 6Sucedeu que,
ouvindo Aias o ruído de seus pés, ao entrar ela
oráculo desfavorável, o qual ele de fato pela porta, disse: Entra, mulher de Jeroboão; por
recebe ao enviar a esposa em trajes disfar que te disfarças assim? Pois eu sou enviado a ti
çados. Pelo menos ele não consultou uma com duras novas. 7Vai, dize a Jeroboão: Assim diz
divindade estrangeira, como o fez Acazias o Senhor Deus de Israel: Porquanto te exaltei do
numa situação semelhante de enfermidade meio do povo, e te constituí príncipe sobre o meu
povo de Israel, 8e rasguei o reino da casa de Davi,
(2Rs 1.2-4). e o dei a ti; todavia não tens sido como o meu servo
Davi, que guardou os meus mandamentos e que
a. A Consulta Acerca de um Príncipe me seguiu de todo o coração para fazer somente
Enfermo (14.1-5a) o que era reto aos meus olhos; 9mas tens praticado
o mal, pior do que todos os que foram antes de
‘Naquele tempo adoeceu Abias, filho de Jero- ti, e foste, e fizeste para ti outros deuses e imagens
boaoL 2E disse Jeroboão a sua mulher: Levanta-te, de fundição, para provocar-me à ira, e me lançaste
e disfarça-te, para que não conheçam que és mulher para trás das tuas costas; ‘“portanto, eis que trarei
de Jeroboão, e vai a Siló. Eis que lá está o profeta o mal sobre a casa de Jeroboão, e exterminarei
Aias, o qual falou acerca de mim que eu seria rei de Jeroboão todo homem, escravo ou livre, em
sobre este povo. 3Leva contigo dez pães, alguns Israel, e lançarei fora os remanescentes da casa
bolos e uma botija de mel, e vai ter com ele; ele de Jeroboão, como se lança fora o esterco, até que
te declarará o que há de suceder a este menina de todo se acabe. nQuem morrer a Jeroboão na
4Assim, pois, fez a mulher de Jeroboão; e, cidade, comê-lo-ão os cães; e o que lhe morrer no
levantando-se, foi a Siló, e entrou na casa de Aias. campo, comê-lo-ão as aves do cèu; porque o Senhor
Este já não podia ver, pois seus olhos haviam cegado o disse. 12Levanta-te, pois, e vai-te para tua casa;
por causa da velhice. sO Senhor, porém, dissera ao entrarem os teus pés na cidade, o menino
a Aias: Eis que a mulher de Jeroboão vem consultar- morrerá. 13E todo o Israel o pranteará, e o sepul
-te sobre seu filho, que está doente; tará; porque de Jeroboão, só este entrará em
sepultura, porquanto, dos da casa de Jeroboão, só
nele se achou alguma coisa boa para com o Senhor
Aias aparece no princípio e fim da Deus de Israel. 140 Senhor, porém, levantará para
história de Jeroboão, conquanto não haja si um rei sobre Israel, que destruirá a casa de Jero
registro de relações constantes entre ambos boão nesse dia. — E agora, que será? l5Ferirá o
nesse entretempo. Presume-se, com base Senhor a Israel, como se agita a cana nas águas;
nesse oráculo de condenação, que ele e arrancará a Israel desta boa terra que tinha dado
a seus pais, e o espalhará para além do rio, por
compartilhava da reação do historiador às quanto fizeram os seus aserins, provocando o
inovações de Jeroboão. O relato informa Senhor à ira. 16E entregará Israel por causa dos
que ele vive em Siló, embora não se possa pecados de Jeroboão, o qual pecou e fez pecar a
determinar se existia ali uma corporação Israel.
profética. Era costume levar um presente
ao conselheiro profético (cf. ISm 9.7,8; 2Rs O profeta saúda a mulher com um reco
5.15; 8.8); neste caso a simplicidade do nhecimento imediato, com uma repreensão
presente foi ditada por a rainha se disfarçar por seu engano, e com duras novas. A
de uma mulher comum. Era proibido pela resposta à consulta é adiada para os versí
lei hebraica enganar uma pessoa cega ou culos 12,13, pois a principal palavra do
fazê-la desviar-se de seu caminho (Lv 19.14; profeta é dirigida a Jeroboão acerca do
Dt 27.18). Esaú queixou-se do engano de destino de sua dinastia. Grande parte do
217
linguajar do oráculo de Aias torna-se com a invasão de Sisaque. Há duas notas
normativa para a censura pública de di sobre a guerra intermitente entre Roboão
nastias israelitas pelos profetas (16.1-7; e Jeroboão (14.30; 15.6), e há também um
21.19-24). Rasguei refere-se ao ato simbó comentário sobre uma guerra entre Jero
lico de Aias e a sua interpretação (11.30,31). boão e o próximo rei de Judá, Abião (15.7;
O historiador considera a promessa às dinas cf. 2Cr 13). Conquanto Jeroboão esteja
tias do norte como estando condicionadas morto, o historiador continuará a assinalar
à obediência, a qual tem como paradigma a influência malévola de seus “pecados”
o ideal davídico (cf. 11.38). Outros deuses durante os dois séculos seguintes.
e imagens de fundição é a interpretação do
historiador acerca dos bezerros de ouro à 3. O Reinado de Roboão em Judá
luz do que chegaram a representar (14.21-31)
(12.28-30). Se Jeroboão foi um mau rei aos olhos
No antigo Oriente Médio os cães eram
do historiador, Roboão não foi muito
animais carniceiros, não de estimação. Aves melhor. Já se relatou como sua tola políti
referem-se a corvos e urubus. O significado
ca em Siquém contribuiu para dividir o
da declaração é que o descendente de Jero- reino. Agora acrescenta-se que ele promo
boão não será sepultado no túmulo da veu as religiões cananéias nos lugares
família, o que era uma punição bastante elevados, e que teve de pagar um elevado
severa. Além do rio, isto é, além do Eufrates,
tributo a Sisaque com os tesouros do
é um desenvolvimento do oráculo de Aias
templo.
pela pregação profética posterior, no oitavo
século a.C., quando o perigo assírio tornou-
1) Os Pecados de Roboão (14.21-24)
se uma real ameaça de julgamento.
21Reinou em Judá Roboão, filho de Salomão.
Tinha quarenta e um anos quando começou a
c. A Morte de Jeroboão (14.17-20) reinar, e reinou dezessete anos em Jerusalém, a
cidade que o Senhor escolhera dentre todas as
I7Então a mulher de Jeroboão se levantou e tribos de Israel para pôr ali o seu nome. E era o
partiu, e veio para Tirza; chegando ela ao limiar nome de sua mãe Naama, a amonita. 22E fez
da casa, o menino morreu. 1SE todo o Israel o Judá o que era mau aos olhos do Senhor; e, com
sepultou e o pranteou, conforme a palavra do os seus pecados que cometeram, provocaram-no
Senhor, que ele falara por intermédio de seu servo a zelos, mais do que o fizeram os seus pais.
Aias, o profeta. 19Quanto ao restante dos atos de “ Porque também eles edificaram altos, e colunas,
Jeroboão, como guerreou, e como reinou, eis que e aserins sobre todo o alto outeiro e debaixo de
está escrito no livro das crônicas dos reis de Israel. toda árvore frondosa; 24e havia também sodo
20E o tempo que Jeroboão reinou foi vinte e dois mitas na terra; fizeram conforme todas as abomi
anos. E dormiu com seus pais; e Nadabe, seu filho, nações dos povos que o Senhor tinha expulsado
reinou em seu lugar. de diante dos filhos de Israel.
218
(veja a Introdução). A única coisa boa que Roboão e Jerusalém, a maioria das cidades
o historiador pode dizer sobre Roboão é que que Sisaque alista estão no norte (cf. sua
reinou em Jerusalém, onde o santuário esteia de vitória em Megido,,Wright, p. 148).
central correto estava localizado. Mas ele Jeroboão aprendeu, apanhando, os perigos
seguiu a política bastante tolerante de de confiar no Egito. Não está claro se Jeru
Salomão, especialmente quanto aos lugares salém foi tomada, mas as informações em
altos no estilo cananeu. Colunas eram Crônicas (2Cr 12.1-12) são de que a cidade
símbolos da divindade masculina Baal. foi poupada mediante o pagamento de um
Aserins eram postes de madeira ou árvores grande tributo tirado dos tesouros do
estilizadas que simbolizavam a deusa-mãe templo. Os escudos de ouro do arsenal de
Asera (cf. 15.13), a consorte de Baal. Salomão (10.16,17) foram substituídos por
Como agora se sabe por causa dos textos escudos de bronze. Após a invasão de
de Ras Shamra, esses símbolos não eram Sisaque, Roboão fortificou um grupo de
somente divindades locais, mas os grandes cidades nos acessos sul e oeste que levam
deuses e deusas do panteão cananeu. O a Judá como uma linha de defesa contra
culto cananeu da fertilidade agrícola empre quaisquer invasões subseqüentes (2Cr
gava mágica imitativa para induzir a 11.5-12,23).
fertilidade da lavoura, dos rebanhos e das
famílias humanas. Incluíam-se aí ritos 3) A Morte de Roboão (14.29-31)
sexuais, empregando-se prostitutas e pros
titutos cultuais (sodomitas), que eram
homens dedicados a uma religião que 29Quanto ao restante dos atos de Roboão, e a
demonstrou ser uma grande pedra de tudo quanto fez, porventura não estão escritos no
livro das crônicas dos reis de Judá? 30Houve
tropeço para Israel. De fato, a história da guerra continuamente entre Roboão e Jeroboão.
fé israelita se concentra amplamente nessa 31E Roboão dormiu com seus pais, e foi sepultado
luta de iavismo mosaico contra a cultura com eles na cidade de Davi. Era o nome de sua
e religião cananéias. mãe Naama, a amonita. E Abião, seu filho, reinou
em seu lugar.
2) A Invasão de Sisaque do Egito
(14.25-28) A linguagem-padrão da fórmula que
indicava a morte de um rei na monarquia
25O ra, sucedeu que, no quinto ano do rei dividida inclui aqui a observação sobre a
Roboão, Sisaque, rei do Egita, subiu contra Jeru guerra civil. Abião é chamado de Abias em
salém, 26e tomou os tesouros da casa do Senhor
e os tesouros da casa do rei; levou tuda Também Crônicas, onde há um relato pessoal e mais
tomou todos os escudos de ouro que Salomão tinha detalhado acerca da família de Roboão (2Cr
feita 27Em lugar deles, fez o rei Roboão escudos 11.18-23).
de bronze, e os entregou nas mãos dos capitães
da guarda, que guardavam a porta da casa do rei. 4. O Reinado de Abião (15.1-8)
2*E todas as vezes que o rei entrava na casa do
Senhor os da guarda levavam os escudos, e depois ‘No décimo oitavo ano do rei Jeroboão, filho
tornavam a pô-los na câmara da guarda. de Nebate, começou Abião a reinar sobre Judá.
2Reinou três anos em Jerusalém. Era o nome de
Após a morte de Salomão, Sisaque sua mãe Maacá, filha de Absalãa 'Ele andou em
começou a preparar-se para invadir a Pales todos os pecados que seu pai tinha cometido antes
dele; o seu coração não foi perfeito para com o
tina, o que fez no quinto ano (cerca de 926 Senhor seu Deus como o coração de Davi, seu pai.
a.C.). Primeiramente ele tinha de obter reco 4M as por amor de Davi o Senhor lhe deu uma
nhecimento pelos sacerdotes de Tebas, em lâmpada em Jerusalém, levantando a seu filho
cujo templo de Amum em Carnaque mais depois dele, e confirmando a Jerusalém; sporque
Davi fez o que era reto aos olhos do Senhor, e não
tarde registrou a lista de cidades palestinas se desviou de tudo o que lhe ordenou em todos os
que pilhara. Conquanto o presente relato dias da sua vida, a não ser no caso de Urias, o
se preocupe somente com o que ele fez a heteu. 6Ora, houve guerra entre Roboão e Jero-
219
boão todos os dias da vida de Roboãa ’Quanto ção síria contra o Reino do Norte, isto é,
ao restante dos atos de Abião, e a tudo quanto fez, Israel (cf. 2Cr 16.7-10).
porventura não estão escritos no livro das crônicas
dos reis de Judá? Também houve guerra entre
Abião e Jeroboãa 8Abião dormiu com seus pais, 1) A Reforma Parcial de Asa (15.9-15)
e o sepultaram na cidade de Davi. E Asa, seu filho, 9No vigésimo ano de Jeroboão, rei de Israel,
reinou em seu lugar. começou Asa a reinar em Judá, I0e reinou qua
renta e um anos em Jerusalém. Era o nome de sua
O nome de Abião (“Meu pai é Iam”, um mãe Maacá, filha de Absalãa 11Asa fez o que era
reto aos olhos do Senhor, como Davi, seu pai.
deus marinho dos cananeus) pode ser uma 12Porque tirou da terra os sodomitas, e removeu
pista para sua religião. Ele não era o filho todos os idolos que seus pais tinham feita 13E até
mais velho de Roboão, mas o de sua esposa a Maacá, sua mãe, removeu para que não fosse
favorita, Maacá, filha de Absalão, por rainha, porquanto tinha feito um abominável idolo
causa de quem Abião foi designado prín para servir de Asera; e Asa desfez esse ídolo, e o
queimou junto ao ribeiro de Cedrom. 14Os altos,
cipe herdeiro (2Cr 11.18-22). A apostasia porém, não foram tirados; todavia o coração de
religiosa só piorou sob Abião, e foi apenas Asa foi reto para com o Senhor todos os seus
a graça de Deus para com a dinastia daví- dias. 15E trouxe para a casa do Senhor as coisas
dica que lhe permitiu reinar. que seu pai havia consagrado;, e as coisas que ele
mesmo consagrara: prata, ouro e vasos.
Guerra entre Abião e Jeroboão. Crôni
cas baseia-se em suas próprias fontes judai
cas para descrição de uma vitória de Abião Em Crônicas, uma festa de aliança e
contra Jeroboão nessa guerra de fronteira, uma reforma, inspiradas na profecia de
em que Betei e áreas do sul de Efraim Azarias, e ocorridas em seu décimo quinto
caíram temporariamente nas mãos de ano, resultaram na deposição da rainha-
Judá (“comentário do profeta Ido”, 2Cr mãe (2Cr 14.1-4; 15.1-19). Vigésimo ano,
13.22). Isso pode estar relacionado com a em comparação com o reinado de Abião
coalizão de Abião com Damasco, se é que de três anos, começando com o décimo
ele explorou a ameaça síria ao Reino do oitavo ano de Jeroboão (15.1,2), revela que
Norte do mesmo modo que seu filho Asa nesse tempo usava-se a contagem inclusiva
(15.19, cf. Bright, p. 215). de Judá, pela qual o reinado de Abião de
três anos teria sido de um ano completo
5. O Reinado de Asa (15.9-24) e mais partes de outros dois. Esse mesmo
sistema de antedatação era empregado em
Afortunadamente para Judá, seu pró Israel por esse tempo, segundo indica a
ximo rei davídico trouxe uma assinalada contagem dos dois anos de Nadabe (15.
melhora mediante reforma religiosa. Asa 25,33). Asa fez o que era reto, ou seja, no
governou por longo tempo, e o relato de julgamento do historiador ele restaurou a
seu reinado em Crônicas é grandemente pureza religiosa, conquanto ainda não
ampliado por narrativas proféticas. O lograsse a unidade religiosa. Ele removeu
reinado de Asa começou com dez anos os vestígios da apostasia sob Roboão e
de paz, durante os quais ele fortificou Abião, inclusive ídolos e uma preeminen
algumas cidades e formou um exército. te adoradora de ídolos, sua avó Maacá.
Depois teve de repelir um ataque de uma Como rainha-mãe, durante o início de seu
força egípcia comandada por Zerá, o etío reinado, ela deve ter tido uma grande in
pe, em Maressa, fazendo-os recuar até fluência (cf. 2Reis 9.31 e ss.; 11.1 e ss.).
Gerar (2Cr 14). Após as reformas religiosas Era uma devota da deusa-mãe cananéia
de Asa, ele teve problemas externos mais Asera (cf. 14.15,23). Asa derrubou o abo
sérios com Baasa, qué nesse ínterim havia minável ídolo de madeira de Maacá e o
usurpado o trono de Israel. Infelizmente, queimou no vale de Cedrom, entre Jeru
Asa seguiu uma política que não revelava salém e o Monte das Oliveiras. As coisas
qualquer visão, a de confiar na interven que ele mesmo consagrara é um breve
220
comentário em favor de Abião; talvez do pelo seu filho, Bene-Hadade III (19.15;
fossem despojos de guerra (cf. 8.51; 2Sm 2Rs 8.7-15; 13.3,24,25). O século nono
8 . 11, 12). a.C. é dominado pelas relações entre o
reino dividido e a Síria. Hadade era o
2) A Guerra Civil com Baasa (15.16-22) nome que davam ao deus da tempestade,
16Ora, houve guerra entre Asa e Baasa, rei de
Baal, cuja manifestação como Rimom
Israel, todos os seus dias. 17Pois Baasa, rei de (“Trovador”) era particularmente reveren
Israel, subiu contra Judá, e edificou Ramá, para ciada (2Rs 5.18).
que a ninguém fosse permitido sair, nem entrar a Essa aliança era um tratado, seme
ter com Asa, rei de Judá. 18Então Asa tomou lhante ao estabelecido por Salomão com
toda a prata e ouro que ficaram nos tesouros da
casa do Senhor, e os tesouros da casa do rei, e os Tiro (5.12), com a diferença de que este é
entregou nas mãos de seus servos. E o rei Asa os mais militar do que comercial (cf. 20.34).
enviou a Bene-Hadade, filho de làbrimom, filho Meu pai e teu pai. Abião tinha-se fiado
de Heziom, rei da Siria, que habitava em Damasco, em Tabrimom ao tempo de sua guerra com
dizendo: 19Haja aliança entre mim e ti, como Jeroboão. Anula a tua aliança com Baasa
houve entre meu pai e teu pai. Eis que aqui te
mando «m presente de prata e de ouro; vai, e anula revela quão oportunistas eram os sírios ao
a tua aliança com Baasa, rei de Israel, para que jogarem um rei contra o outro. Bene-Ha-
ele se retire de mim. “ Bene-Hadade, pois, deu dade atacou Baasa pelo norte, conquistan
ouvidos ao rei Asa, e enviou os capitães dos seus do algumas cidades de Naftali e Dã nas
exércitos contra as cidades de Israel; e feriu a
Ijom, a Dã, a Abel-Bete-Maacá, e a todo o dis regiões da Galiléia e Monte Hermom.
trito de Quinerote, com toda a terra de Naftali. Baasa teve de retornar a Tirza, e Asa
21E sucedeu que, ouvindo-o Baasa, deixou de empregou os materiais da construção de
edificar Ramá, e ficou em Tirza. “ Então o rei Ramá para fortificar Mizpá e Geba, que
Asa fez apregoar por toda a Judá que todos, sem
exceção, trouxessem as pedras de Ramá, e a
ficavam mais ao norte, na estrada monta
madeira com que Baasa a edificava; e com elas o nhosa para Betei. Caso se deva identificar
rei Asa edificou Geba de Benjamim e Mizpá. Mizpá com a moderna Tell-en-Nasbeh, as
escavações arqueológicas ali fornecem
Inevitavelmente o historiador está avan provas impressionantes dos muros de Asa
çado em relação à história de Israel ao e do período de incessante guerra civil no
tentar cobrir todo o longo reinado de Asa território benjaminita (Wright, p. 150).
em Judá. O Reino do Norte estava ficando
mais forte, conforme se verifica na tenta 3) A Morte de Asa (15.23,24)
tiva de Baasa de fortificar Ramá, somente
oito quilômetros ao norte de Jerusalém. 23Quanto ao restante de todos os atos de Asa,
e todo o seu poder, e tudo quanto fez, e as cidades
Isso significa que as conquistas de Abião que edificou, porventura não estão escritos no
foram apenas temporárias, embora na livro das crônicas dos reis de Judá? Porém, na
guerra de fronteira em Benjamim e no sul velhice, ficou enfermo dos pés. 24E Asa dormiu
de Efraim possa ter ocorrido de o controle com seus pais, e foi sepultado com eles na cidade
de Davi, seu pai; e Jeosafá, seu filho, reinou em
de algumas áreas ter mudado várias vezes seu lugar.
de mão (2Cr 13.19; 15.8).
Bene-Hadade (...) rei da Síria. A gene
alogia dessa casa real de Damasco foi Oito reis e usurpadores do Reino do
confirmada pela descoberta de um mo Norte, desde Jeroboão até Acabe, surgiram
numento com inscrições em aramaico, e desapareceram durante os 41 anos de
dedicado por esse Bene-Hadade ao deus Asa (cerca de 911-870 a.C.), de modo que
Melcarte (Thomas, p. 239,240). Provavel o historiador agora deve afastar a atenção
mente ele é pai de Bene-Hadade a quem de Judá para Israel até que possa retomar
Acabe combateu (20.1,34). Hazael usur a história de Judá com Jeosafá (22.41 e ss.).
pou o trono de Bene-Hadade II por insti Perto do fim de seu reinado, Asa adquiriu
gação profética, e foi por seu turno sucedi algum tipo de doença nos pés, talvez
221
necessitando de uma co-regência com seu comandante-em-chefe. Não está claro se
filho Jeosafá (2Cr 16.12). ele conspirou junto com o partido profé
tico, mas a matança que realizou contra
6. O Reinado de Nadabe em Israel os herdeiros de Jeroboão é interpretada
(15.25,26) como cumprimento da palavra de juízo de
“ Nadabe, filho de Jeroboão, começou a rei
Aias (14.14). Essa pode ser a razão da
nar sobre Israel no segundo ano de Asa, rei de omissão das referências ao sepultamento
Judá, e reinou sobre Israel dois anos. “ E fez o de Nadabe e seus irmãos (cf. 14.10,11).
que era mau aos olhos do Senhor, andando nos Tirza certamente era a capital de Baasa,
caminhos de seu pai, e no seu pecado com que quer tenha sido ele ou um de seus anteces
tinha feito Israel pecar.
sores e construtor da cidadela da casa do
rei, a qual a tornou uma fortaleza tão inex
Durante o diminuto tempo de dois anos pugnável (cf. 14.17; 16.18). A iniqüidade
Nadabe seguiu o caminho de Jeroboão e de Baasa é descrita na forma tradicional
colheu os frutos dos pecados de seu pai. — sua própria dinastia não demonstrou
A brevidade de qualquer tentativa de esta ser melhor do que aquela que havia subs
belecimento de uma dinastia em Israel tituído (cf. 16.7).
revela a comparativa instabilidade do
Reino do Norte. 8. O Fim da Dinastia de Baasa (16.1-7)
'Então veio a palavra do Senhor a Jeú, filho
7. A Revolta de Baasa (15.27-34) de Hanâni, contra Baasa, dizendo: 2Porquanto te
exaltei do pó, e te constitui chefe sobre o meu povo
27Conspirou contra ele Baasa, filho de Aias, Israel, e tu tens andado no caminho de Jeroboão,
da casa de Issacar, e o feriu em Gibetom, que e tens feito o meu povo Israel pecar, provocando-
pertencia aos filisteus; pois Nadabe e todo o Israel -me à ira com os seus pecados, 3eis que
sitiavam a Gibetom. 28Matou-o, pois, Baasa no exterminarei os descendentes de Baasa, e os des
terceiro ano de Asa, rei de Judá, e reinou em seu cendentes da casa dele; sim, tornarei a tua casa
lugar. 29E logo que começou a reinar, feriu toda como a casa de Jeroboão, filho de Nebate.
a casa de Jeroboão; a ninguém de Jeroboão que 4Quem morrer a Baasa na cidade, comê-lo-ão os
tivesse fôlego deixou de destruir totalmente, cães; e o que lhe morrer no campo, comê-lo-ão as
conforme a palavra do Senhor que ele falara por aves do céu. 5Quanto ao restante dos atos de
intermédio de seu servo Aias, o silonita, 30por Baasa, e ao que fez, e ao seu poder, porventura
causa dos pecados que Jeroboão cometera, e com não estão escritos no livro das crônicas dos reis
que fizera Israel pecar, e por causa da provocação de Israel? 6E Baasa dormiu com seus pais, e foi
com que provocara à ira o Senhor Deus de Israel. sepultado em Tirza. Então Elá, seu filho, reinou
31Quanto ao restante dos atos de Nadabe, e a tudo em seu lugar. 7Assim veio também a palavra do
quanto fez, porventura não estão escritos no livro Senhor, por intermédio do profeta Jeú, filho de
das crônicas dos reis de Israel? 32Houve guerra Hanâni, contra Baasa e contra a casa dele, não
entre Asa e Baasa, rei de Israel, todos os seus somente por causa de todo o mal que fizera aos
dias. 33No terceiro ano de Asa, rei de Judá, olhos do Senhor, de modo a provocá-lo à ira com
Baasa, filho de Aias, começou a reinar sobre todo a obra de suas mãos, tornando-se como a casa de
o Israel em Tirza, e reinou vinte e quatro anos. Jeroboão, mas também porque exterminara a casa
34E fez o que era mau aos olhos do Senhor, de Jeroboãa
andando no caminho de Jeroboão e no seu pecado
com que tinha feito Israel pecar.
A palavra de juízo do Senhor é pronun
O exército de Nadabe estava mantendo ciada contra Baasa e sua dinastia pelo
o cerco de Gibetom, uma importante forta profeta Jeú, filho de Hanâni, qüe pertence
leza dos filisteus na fronteira efraimita, a a um período posterior em Judá de acordo
oeste de Gezer, onde Israel ainda estava com Crônicas (2Cr 19.2; 20.34). Se a
acampado quando Onri se tornou rei analogia da relação de Aias com a casa de
(16.15-17). Presumivelmente Baasa de Jeroboão puder aplicar-se aqui, Jeú prova
Issacar era no exército de Nadabe o co velmente teve participação na ascensão de
mandante das tropas de sua tribo, ou o Baasa a essa liderança. O poder de Baasa
222
teve de ser forte para ele conseguir sobre seus chefes militares em Tirza. Zinri, o
viver 24 anos em face do terrível prece assassino, não teve êxito em sua revolta
dente de assassinato que havia estabele palaciana porque o general do exército,
cido, e que logo alcançaria o próprio filho. Onri, foi feito rei e logo se livrou de Zinri.
Também porque exterminara. Será que Já não há mais qualquer reivindicação de
Baasa é condenado por ter feito o expurgo designação profética ou reinado mediante
da dinastia de Jeroboão? Embora o texto aliança.
hebraico seja muito obscuro, o contexto do Zinri é um soldado profissional; talvez
versículo seguramente indica que Baasa nem fosse israelita, uma vez que nem pai
foi destruído porque havia se tornado ou tribo são indicados. Enquanto seu exér
semelhante aos próprios reis que havia cito estava em Gibetom, Elá estava be
substituído, provocando a ira de Iavé com bendo e embriagando-se (cf. 20.16) na casa
a idolatria (cf. 16.13). do seu mordomo real, Arza, que talvez
tenha tramado o assassinato junto com
9. A Revolta de Zinri (16.8-20) Zinri. Nem de seus parentes, nem de seus
8No ano vinte e seis de Asa, rei de Judá, Elá, amigos significa qualquer um que pudesse
filho de Baasa, começou a reinar em Tirza sobre
Israel, e reinou dois anos. ’E Zinri, seu serva,
vingar sua morte, indo além da palavra
chefe de metade dos carros, conspirou contra ele. profética de julgamento sobre a elimi
Ora, Elá achava-se em Tirza bebendo e em- nação de herdeiros masculinos. Zinri tinha
briagando-se em casa de Arza, que era o seu boas razões para temer represálias em face
mordomo em Tirza. l0Entrou, pois, Zinri e o de seus atos covardes, pelos quais seu
feriu, e o matou, no ano vigésimo sétimo de Asa,
rei de Judá, e reinou em seu lugar. nQuando ele nome tornou-se um dito proverbial (2Rs
começou a reinar, logo que se assentou no seu 9.31). Não temos detalhes acerca das apos-
trono, feriu toda a casa de Baasa; não lhe deixou tasias religiosas da casa de Baasa, e de
homem algum, nem de seus parentes, nem de seus vemos imaginar que eram semelhantes aos
amigos. 12Assim destruiu Zinri toda a casa de
Baasa, conforme a palavra do Senhor, que ele
“pecados de Jeroboão”.
falara contra Baasa por intermédio do profeta O reinado de sete dias do usurpador foi
Jeú, 13por causa de todos os pecados de Baasa, particularmente significativo por executar
e dos pecados de Elá, seu filho, com que pecaram, o massacre da dinastia de Baasa. Eviden
e com que fizeram Israel pecar, provocando à ira, temente ele teve pouquíssimo apoio entre
com as suas vaidades, o Senhor Deus de Israel.
14Quanto ao restante dos atos de Elá, e a tudo o povo, mesmo em Tirza. Notícias da cons
quanto fez, porventura não estão escritos no livro piração logo chegaram ao exército em
das crônicas dos reis de Israel? 15No ano vigé Gibetom, onde os pelotões tribais estavam
simo sétimo de Asa, rei de Judá, reinou Zinri sete novamente cercando a fortaleza filistéia
dias em Tirza. Estava o povo acampado contra
Gibetom, que pertencia aos filisteus. 16E o povo
(cf. 15.27). O povo imediatamente tornou
que estava acampado ouviu dizer: Zinri conspirou, o general rei e seguiu-o em marcha acele
e matou o rei; pelo que no mesmo dia, no arraial, rada até Tirza. Quando Zinri viu que sua
todo o Israel constituiu rei sobre Israel a Onri, causa estava perdida, tirou a própria vida
chefe do exército. 17Então Onri subiu de Gibetom pondo fogo à fortaleza do palácio, tornan
com todo o Israel, e cercaram Tirza. 18Vendo
Zinri que a cidade era tomada, entrou no castelo do-se assim um dos raros casos de suicídio
da casa do rei, e queimou-a sobre si; e morreu, no Antigo Testamento (cf. Aítofel, 2Sm
19por causa dos pecados que cometera, fazendo o 17.23).
que era mau aos olhos do Senhor, andando no
caminho de Jeroboão, e no pecado que este come 10. A Nova Dinastia de Onri (16.21-28)
tera, fazendo Israel pecar. 20Quanto ao restante 21Então o povo de Israel se dividiu em dois
dos atos de Zinri, e à conspiração que fez, porven partidos: metade do povo seguia a Tibni, filho de
tura não estão escritos no livro das crônicas dos Ginate, para fazê-lo rei, e a outra metade seguia
reis de Israel? a Onri. 22Mas o povo que seguia a Onri preva
leceu contra o que seguia a Tibni, filho de Ginate;
O forte Baasa foi sucedido por um filho de sorte que Tibni morreu, e Onri reinou. 23No
fraco, Elá, que foi assassinado por um de trigésimo primeiro ano de Asa, rei de Judá, Onri
223
começou a reinar sobre Israel, e reinou doze anos. A escolha estratégica de sua nova
Reinou seis anos em Tirza. 24E de Semer com
prou o outeiro de Samária por dois talentos de capital em Samária e o fato de ser o pro
prata, e edificou nele; e chamou a cidade que prietário da colina bem fortificada e loca
edificou Samária, do nome de Semer, dono do lizada numa posição bem central deram a
outeiro. 25E fez Onri o que era mau aos olhos do Onri o título de “O Davi do Norte”. Na
Senhor; pior mesmo do que todos os que o ante
cederam. “ Pois ele andou em todos os caminhos edificação das fortificações e do palácio
de Jeroboão, filho de Nebate, como também nos real ele empregou mão-de-obra fenícia,
pecados com que este fizera Israel pecar, provo obtida por um tratado comercial com Tiro.
cando à ira, com as suas vaidades, o Senhor Deus As funestas conseqüências religiosas dessa
de Israel. 27Quanto ao restante dos atos que Onri
fez, e ao poder que manifestou, porventura não
aliança foram o resultado do casamento
estão escritos no livro das crônicas dos reis de misto entre o filho de Onri, Acabe, e
Israel 2SOnri dormiu com seus pais, e foi sepulta Jezabel, filha de Etbaal, o rei sidônio de
do em Samária. E Acabe, seu filho, reinou em seu Tiro (16.31). Mas os aspectos comerciais
lugar. igualaram à crescente influência de Da
Onri ficou sem obter apoio de todo o masco, cujo rei, Bene-Hadade I, foi sufi
povo por mais quatro anos (16.15,23), cientemente forte para tomar algumas
porque libni, filho de Ginate, também cidades de Onri e obter algumas conces
aspirava ao trono. Contudo, em seu breve sões comerciais na nova cidade de Samária
reinado de doze anos, dos quais somente (20.34).
os oito últimos podem ser atribuídos a A principal reação profética ao sincre-
Onri como único governante, ele fundou tismo religioso de Onri e Acabe ocorre
a mais forte dinastia que chegou a gover durante o reinado de Acabe (16.31-33).
nar o Reino do Norte, Israel. É uma Aqui o único indício disso é a declaração
demonstração de preconceito religioso do de que Onri foi pior mesmo do que todos
historiador o fato de ter dedicado um os que o antecederam.
espaço tão curto a um rei tão talentoso. Ao poder que manifestou. Sabe-se, por
Dependemos sobretudo de fontes extrabí- causa da inscrição de Mesa, que Onri
blicas para uma avaliação mais justa de reconquistou Moabe para Israel (Thomas,
suas atividades políticas, militares e econô p. 195-198). Nas mentes de reis assírios,
micas. que começaram seu avanço na direção do
Dos dois pretendentes ao trono, men ocidente durante o reinado de Onri, o reino
ciona-se a genealogia de libni, mas não a de Israel foi a “casa de Onri” durante
de Onri. Às vezes tem-se suposto que Onri o século e meio seguinte (Wright, p. 151,
teria sido um mercenário cananeu a ser 156). Mais importante de tudo, foram Onri
viço de Baasa e de seu filho (Gray, p. 330). e seu filho Acabe que restabeleceram
libni morreu. O fato de que ele resistiu relações pacíficas com Judá após um
quatro anos diante de um soldado capaz século e meio de guerras fronteiriças.
como Onri demonstra que Tibni tinha Contudo, conforme as narrativas profé
considerável apoio. Reinou seis anos em ticas de Elias e Eliseu deixam claro, a
Tirza. Supondo-se que ele tivesse controle contaminação da religião de Israel pelo
da fortaleza que arrebatara ao infeliz Zinri, culto a Baal, trazido de Tiro por Jezabel,
isso significa que reinou por um período foi uma calamidade que anulou todos os
equivalente a seis anos em Samária. pontos fortes de Onri e Acahe.
Arqueólogos escavaram tanto Tell-el-Farah
(a antiga Tirza) quanto Samária, com desco 11. O Início do Reinado de Acabe
bertas que confirmam impressionantemente (16.29-34)
o relato bíblico.16 29No trigésimo oitavo ano de Asa, rei de
16 Kathleen M. Kenyon, Archaeology in the H oly Land. (New York Judá, começou Acabe, filho de Onri, a reinar
Frederick A.Praeger, Publisher, 1960), p. 260-269. sobre Israel; e reinou sobre Israel em Samária
224
vinte e dois anos.30E fez Acabe, filho de Onri, o maldição. Se assim foi, propiciou um
que era maus aos olhos do Senhor, mais do que exemplo bem claro dos resultados das
todos os que o antecederam. 3IE, como se fosse apostasias de Acabe.
pouco andar nos pecados de Jeroboão, filho de
Nebate, ainda tomou por mulher a Jezabel, filha
de Etbaal, rei dos sidônios, e foi e serviu a Baal, III. A Revolta Profética (IRs 17.1—
e o adorou; 32e levantou um altar a Baal na casa 2Rs 13.25)
de Baal que ele edificara em Samária; 33também
fez uma asera. De maneira que Acabe fez muito Deve-se observar que o relato do histo
mais para provocar à ira o Senhor Deus de Israel riador quanto à revolta profética na verda
do que todos os reis de Israel que o antecederam. de continua até 2Reis 13.25.
^Em seus dias Hiel, o betelita, edificou Jericó.
Quando lançou os seus alicerces, morreu-lhe O programa da revolta profética contra
Abirão, seu primogênito; e quando colocou as suas a dinastia de Onri está contido na tríplice
portas, morreu-lhe Segube, seu filho mais moço; ordem a Elias para ungir Hazael como rei
conforme a palavra do Senhor, que ele falara por de Damasco, Jeú como rei de Israel, e Eli-
intermédio de Josué, filho de Num. seu como seu sucessor profético (19.15,16).
A última dessas tarefas Elias cumpre
Se Onri pode ser chamado de “o Davi imediatamente, mas é Eliseu quem desper
do Norte”, então Acabe é “o Salomão do ta Hazael e envia um de seus discípulos
Norte”. Especialmente significativo ao his proféticos para ungir Jeú (19.19-21; 2Rs
toriador é o fato de Acabe construir para 8.7-15; 9.1-3). A sangrenta eliminação dos
Jezabel um santuário com altar, coluna e filhos de Acabe, feita por Jeú, encontra
asera para o deus de sua mulher, Baal paralelo em Judá na revolta contra a filha
Melcarte. Essa foi a política de Salomão de Acabe, Atalia.
para com suas princesas estrangeiras, mas
Salomão nunca teve uma esposa com o 1. Os Profetas e Acabe (17.1—22.40)
zelo missionário de Jezabel. Ela não só
queria prestar seu próprio culto em Samá Dois tipos de literatura se combinam
nessa seção. O choque entre Iavé e o deus
ria, mas também tentou converter Israel
a Baal Melcarte. de Tiro, Baal, é relatado em histórias que
exaltam o papel do profeta Elias (cap.
Esse parágrafo (v. 29-34) fornece a intro
dução normal do historiador para o reina 17—19,21). Os primeiros três capítulos
do de Acabe. A conclusão é adiada por formam uma unidade que trata da grande
uma impressionante série de narrativas seca, o confronto no Monte Carmelo, e a
proféticas e cronísticas (22.39,40). Como fuga de Elias para Horebe. A ousadia ética
um fantasma vindo do passado, o último de Elias revela-se no incidente da vinha de
versículo dessa seção relembra a conse Nabote (cap. 21). Elias não aparece nas
qüência naquela época de uma antiga outras histórias, em que Acabe é a princi
maldição (Js 6.26). Talvez por ordem de pal personagem e aparece sob uma ótica
mais favorável (cap. 20,22).
Acabe, uma vez que ele pode ter tido
razões para temer uma revolta moabita,
Jericó foi nesse tempo fortificada. Talvez 1) Elias e a Seca (17.1-24)
mortes ocasionais tenham ocorrido, as Desde Moisés e Samuel o líder mais
quais foram interpretadas como o cumpri importante da verdadeira adoração de Iavé
mento da antiga declaração (Montgomery, foi Elias, o tisbita. Ele foi uma figura soli
p. 288). Contudo, sacrifícios de crianças tária, tendo aparecido subitamente para
eram realizados pelos adoradores de Baal anunciar a seca. O primeiro grupo de his
Melcarte, de modo que podem ter sido tórias trata da vida pessoal do profeta e de
sacrifícios por ocasião do lançamento dos sua assistência a uma viúva de Sarepta,
alicerces, oferecidos para a proteção da que fez amizade com ele durante sua fuga
nova construção contra os efeitos da de diante de Acabe. A preeminência do
225
elemento miraculoso nos relatos de Elias “habitantes da estepe”. No início seu uso
e Eliseu tem levado certos especialistas a era coletivo; o plural indica um uso poste
classificá-los nas categorias literárias de rior. O elemento miraculoso em todas essas
saga e lenda. Contudo, observa-se que os narrativas proféticas tem um sentido de
milagres do Antigo Testamento se agrupam testemunho da fé de Israel no controle de
em torno de grandes crises históricas, Iavé sobre sua ordem criada (cf. 19.5-8).
sendo que neste ponto as guerras sírias Aquele que alimenta os filhotes de corvos
somaram-se à ameaça interna de uma (Jó 38.41) pode empregar essas aves de
agressiva religião de fora. rapina vorazes e imundas (Lv 11.15; Pv
30.17) para guardar seu profeta para a crise
a. Provisões em Gileade (17.1-7) vindoura. Pão e carne trazem à lembrança
o maná e as codornizes (Ex 16.8). Em
'E ntão Elias, o tisbita, que habitava em muitas maneiras Elias é descrito como um
Gileade, disse a Acabe: Vive o Senhor, Deus de
Israel, em cuja presença estou, que nestes anos
novo Moisés.
não haverá orvalho nem chuva, senão segundo a
minha palavra. 2Depois veio a Elias a palavra do
Senhor, dizendo: 3Retira-te daqui, vai para a b. A Viúva de Sarepta (17.8-16)
banda do oriente, e esconde-te junto ao ribeiro de 8Veio-lhe então a palavra do Senhor dizendo:
Querite, que está ao oriente do Jordão. 4Beberás 9Levanta-te, vai para Sarepta, que pertence a Si-
do ribeiro; e eu tenho ordenado aos corvos que ali dom, e habita ali; eis que eu ordenei a uma mulher
te sustentem. sPartiu, pois, e fez conforme a viúva ali que te sustente. “ Levantou-se, pois, e foi
palavra do Senhor; foi habitar junto ao ribeiro de para Sarepta. Chegando ele à porta da cidade, eis
Querite, que está ao oriente do Jo rd ãa 6E os que estava ali uma mulher viúva apanhando lenha;
corvos lhe traziam pão e carne pela manhã, como ele a chamou e lhe disse: Traze-me, peço-te, num
também pão e carne à tarde; e ele bebia do ri vaso um pouco d’âgua, para eu beber. nQuando
beira 7Mas, decorridos alguns dias, o ribeiro ela ia buscá-la, ele a chamou e lhe disse: Traze-me
secou, porque não tinha havido chuva na terra. também um bocado de pão contigo. l2Ela, porém,
respondeu: Vive o Senhor teu Deus, que não tenho
nem um bolo, senão somente um punhado de fa
O território da Palestina depende total rinha na vasilha, e um pouco de azeite na botija;
mente das chuvas (cf. Dt 11.10,11). A e eis que estou apanhando uns dois gravetos, para
predição de seca por Elias é um desafio ir prepará-lo para mim e para meu filho, a fim de
direto ao deus cananeu da tempestade, que o comamos, e morramos.13Ao que lhe disse
Elias: Não temas; vai, faze como disseste; porém,
Baal, por Iavé, Deus de Israel, verdadeiro faze disso primeiro para mim um bolo pequeno,
Senhor da Criação. Contam-se as duas e traze-mo aqui; depois o farás para ti e para teu
primeiras histórias para indicar quão se filha ,4Pois assim diz o Senhor Deus de Israel: A
vera a seca havia se tornado na Fenícia farinha da vasilha não se acabará, e o azeite da
bem como em Israel. Como nas narrativas botija não faltará, até o dia em que o Senhor dê
chuva sobre a terra. >5Ela foi e fez conforme a
do deserto, onde Deus provera alimento e palavra de Elias; e assim comeram, ele, e ela e a
bebida para seu povo, também aqui em sua casa, durante muitos dias. ,6Da vasilha a
forma maravilhosa ele cuidou de seu farinha não se acabou, e da botija o azeite não
profeta. A casa de Elias ficava em Gileade faltou, conforme a palavra do Senhor, que ele fa
lara por intermédio de Elias.
junto ao ribeiro de Querite, a leste de
Jabes-Gileade. A fome foi severa também na Fenícia,
Em cuja presença estou. Aqui e em pois Josefo (Antiq., VIII, 13,2) menciona
18.15 Elias define seu ofício profético uma tal fome durante o reinado de Etbaal.
como um assistente ministrando na pre Sarepta fica ao sul de Sidom, na costa da
sença do Senhor, sempre pronto para servir Fenícia. Jesus comentou em seu sermão
como seu mensageiro. Corvos. Não há de início de ministério quão irônico foi
necessidade de tentar racionalizar a história que o profeta tenha tido de fugir de seu
miraculosa mediante a alteração de vogais próprio país para as pecaminosas cida
na palavra hebraica, interpretando-a como des cananéias (Lc 4.25,26; cf. 10.13,14).
226
As viúvas eram uma das classes desam tos em Israel até bem mais tarde no pe
paradas na sociedade, pelas quais o Se ríodo do Antigo Testamento (Dn 12.2),
nhor revelou grande preocupação (veja Ex histórias como essa propiciam algum in
22.22; Is 1.17). A generosidade dessa viúva dício do poder divino sobre a morte, reve
em compartilhar sua última refeição com lado em sua plenitude somente na ressur
o profeta foi maravilhosamente recom reição de Jesus Cristo.
pensada.
2) O Confronto no Monte Carmelo (18.1-
c. A Ressurreição do Filho da Viúva 46)
(17.17-24) Trazer a chuva após a severa seca pode
17Depois destas coisas aconteceu adoecer o ser considerado como a chave correta para
filho desta mulher, dona de casa; e a sua doença a interpretação do ordálio sacrifical entre
se agravou tanto, que nele não ficou mais fôlego. os profetas de Baal e Elias. O cenário do
18Então disse ela a Elias: Que tenho eu contigo,
ó homem de Deus? Vieste tu a mim para trazeres impressionante confronto é a crista de um
à memória a minha iniqüidade, e matares meu fi promontório na costa da Palestina que
lho? 19Respondeu-lhe ele: Dá-me o teu filha E ele avança no Mar Mediterrâneo. É o primei
o tomou do seu regaço, e o levou para cima, ao ro lugar a receber as chuvas outonais que
quarto onde ele mesmo habitava, e o deitou em
sua cama. Z0E, clamando ao Senhor disse: O Se se precipitam sobre a região, vindas do
nhor meu Deus, até sobre esta viúva, que me hos este e sudoeste.
peda, trouxeste o mal, matando-lhe o filho?
zlEntão se estendeu sobre o menino três vezes, e a. A Severidade da Fome (18.1-6)
clamou ao Senhor, dizendo: Ó Senhor meu Deus,
faze que a alma deste menino torne a entrar nele. 'Depois de muitos dias veio a Elias a palavra
zzO Senhor ouviu a voz de Elias, e a alma do me do Senhor, no terceiro ano, dizendo: Vai, apre
nino tornou a entrar nele, e ele reviveu. Z3E Elias senta-te a Acabe; e eu mandarei chuva sobre a
tomou o menino, trouxe-o do quarto à casa, e o terra. zEntão Elias foi apresentar-se a Acabe. E a
entregou a sua mãe; e disse Elias: Vês aí, teu fi fome era extrema em Sam ária.3Acabe chamou a
lho vive. 24Então a mulher disse a Elias: Agora sei Obadias, o mordomo (ora, Obadias temia muito
que tu és homem de Deus, e que a palavra do ao Senhor; 4pois sucedeu que, destruindo Jezabel
Senhor na tua boca é verdade. os profetas do Senhor, Obadias tomou cem pro
fetas e os escondeu, cinqüenta numa cova e cin
Aparentemente sem relação com a pro qüenta noutra, e os sustentou com pão e água); 5e
disse Acabe a Obadias: Vai pela terra a todas as
visão de alimento durante a fome, essa fontes de água, e a todos os rios; pode ser que
história foi narrada para ilustrar que Elias achemos erva para salvar a vida dos cavalos e
era de fato um homem de Deus e um pro mulas, de maneira que não percamos todos os
feta da verdadeira palavra divina (v.24). animais. 6E repartiram entre si a terra, para a
Conquanto não seja realmente dito que percorrerem; e foram a sós, Acabe por um cami
nho, e Obadias por outra
o garoto tenha morrido (o texto bíblico
diz nele não ficou mais fôlego), isso se A busca de Acabe e Obadias, seu prin
presume peto protesto da mulher a Elias cipal auxiliar, por água e pastagens para
e o indignado clamor deste ao Senhor. os animais reais é uma prova convincente
Os movimentos vigorosos do profeta ti dos efeitos da estiagem prolongada. Uma
nham o propósito de, por contato, trans tradição posterior ampliou o terceiro ano
ferir o calor de sua carne e a vitalidade para três anos e meio (Lc 4.25; Tg 5.17),
de sua respiração ao corpo inerte (2Rs mas esse era o terceiro outono desde que
4.34,35; cf. At 20.10). Alma melhor se “as últimas chuvas”, em abundância, ha
traduz por vida. Reviveu é a palavra que viam ocorrido. Quando Jezabel perseguia
tem a mesma raiz de vive, no versículo os profetas de lavé (cf. v. 13,22; com o
seguinte, referindo-se à ressurreição da vi auxílio do povo, 19.10,14), Obadias os sal
da física. Conquanto não existisse uma vara. Evidentemente Acabe mantinha uma
doutrina explícita de ressurreição dos mor lealdade nominal a lavé, a despeito das
227
inovações da esposa (cf. os nomes de seus Elias: Não sou eu que tenho perturbado a Israel,
mas és tu e a casa de teu pai, por terdes deixado
filhos). A preocupação de Acabe para com os mandamentos do Senhor, e por teres seguido
os animais sugere a importância que ti os baalins. 19Agora pois manda reunir-se a mim
nham na guerra (cf. 4.26.28). todo o Israel no monte Carmelo, como também
os quatrocentos e cinqüenta profetas de Baal, e
b. Obadias, o Mordomo (18.7-16) os quatrocentos profetas de Asera, que comem
da mesa de Jezabel.
7Quando, pois, Obadias já estava em caminho,
eis que Elias se encontrou com ele; e Obadias, O rei faz uma acusação bastante séria
reconhecendo-o, prostrou-se com o rosto em terra contra o profeta quando o denomina per
e disse: És tu, meu senhor Elias? 8Respondeu-lhe turbador de Israel. Mas o profeta ousada
ele: Sou eu. Vai, dize a teu senhor: Eis que Elias mente volta a acusação contra o rei. Aca
está aqui. ’Ele, porém, disse: Em que pequei, para
que entregues teu servo na mão de Acabe, para ele be e Onri tinham abandonado o Senhor
me matar? I0Vive o Senhor teu Deus, que não há e seguido após os baalins, manifestações
nação nem reino aonde o meu senhor não tenha locais do deus cananeu da tempestade e
mandado em busca de ti; e dizendo eles: Aqui não fertilidade. Elias ordena a realização de
está; então fazia-os jurar que não te haviam acha uma assembléia de aliança no monte Car
d a “Agora tu dizes: Vai, dize a teu senhor: Eis
que Elias está aqui. 12E será que, apartando-me melo, inclusive os profetas importados por
eu de ti, o Espírito do Senhor te levará não sei Jezabel. Os quatrocentos profetas de Ase
para onde; e, vindo eu dar as novas a Acabe, e ra não são mencionados de novo, de mo
não te achando ele, matar-me-á. Todavia eu, teu do que talvez não tenham aceito o desa
servo, temo ao Senhor desde a minha mocidade
13Porventura não disseram a meu senhor o que fio junto com os profetas de Baal.
fiz, quando Jezabel matava os profetas do Senhor,
como escondi cem dos profetas do Senhor, cin
qüenta numa cova e cinqüenta noutra, e os sus d. O Desafio ao Povo (18.20-24)
tentei com pão e água? 14E agora tu dizes: Vai, 20Então Acabe convocou todos os filhos de
dize a teu senhor: Eis que Elias está aqui! Ele me Israel, e reuniu os profetas no monte Carmela
matará. 1SE disse Elias: Vive o Senhor dos exér 2IE Elias se chegou a todo o povo, e disse: Até
citos, em cuja presença estou, que deveras hoje hei quando coxeareis entre dois pensamentos? Se o
de apresentar-me a ele. I6Então foi Obadias en- Senhor é Deus, segui-o; mas se Baal, segui-a O
contrar-se com Acabe, e lho anunciou; e Acabe foi povo, porém, não lhe respondeu nada. 22Então
encontrar-se com Elias. disse Elias ao povo: Só eu fiquei dos profetas do
Senhor; mas os profetas de Baal são quatrocentos
Obadias reconheceu Elias talvez por e cinqüenta homens. 23Dêem-se-nos, pois, dois
sua vestimenta de pêlos (2Rs 1.8). Acabe novilhos; e eles escolham para si um dos novilhos,
havia realizado uma intensa busca pelo e o dividam em pedaços, e o ponham sobre a le
profeta esquivo, de modo que Obadias es nha, porém não lhe metam fogo; e eu prepararei
tava temeroso de despertar no rei quais o outro novilho, e o porei sobre a lenha, e não
lhe meterei foga 24Então invocai o nome do vosso
quer falsas esperanças de que Elias real deus, e eu invocarei o nome do Senhor; e há de
mente iria aparecer. O fato de que o ca ser que o deus que responder por meio de fogo,
mareiro de Acabe temesse por sua própria esse será Deus. E todo o povo respondeu, dizen
vida demonstra que a monarquia de Israel do: É boa esta palavra.
não tinha muito respeito por antigos di Como fez Josué em outra famosa as
reitos de aliança de seus cidadãos. Con sembléia de aliança, Elias apela ao povo
quanto Obadias considerasse os movimen a escolher naquele dia a quem serviriam
tos do profeta como bastante imprevisí (Js 24.15). Coxeareis. A palavra hebraica
veis (cf. Ez 3.12,14), Elias jurou-lhe que é a mesma que descreve a dança ritual
iria encontrar-se com Acabe. peculiar dos profetas de Baal (18.26). Pen
samentos — literalmente, saltando de uma
c. O Desafio a Acabe (18.17-19) perna para outra (Snaith, p. 154) — é
17E sucedeu que, vendo Acabe a Elias, disse- uma metáfora para a indecisão apática ou
-lhe: És tu, perturbador de Israel? 18Respondeu pensamento dúbio (SI 119.113). O profeta
228
desafia a neutralidade espiritual impossí vez tivesse o propósito de induzir ao êx
vel. O povo recusou a tomar uma posi tase (Montgomery, p. 301,302). A dança
ção, preferindo esperar pelo resultado do tinha um lugar no culto-israelita e tam
confronto. bém nos primórdios da profecia (Êx 15.20;
Elias não conta como profetas aqueles ISm 10.5,10; 2Sm 6.5,16).
a quem Obadias escondeu ao tempo da Com sarcástica ironia, ao meio-dia Elias
perseguição (18.4,13), pois ele é o único zombou da mitologia de Baal, que veio a
que atua como profeta, aceitando a difícil ser conhecida pelos textos de Ras Shamra,
incumbência de, em nome de Iavé, desafiar mitologia que fala de um deus moribundo
os profetas de Baal. Responder por meio que ressuscita. Durante o estio, ou estação
de fogo provavelmente significa relâmpago seca do longo verão palestino, criam que
(Jó 1.16; Ex 9.23,24; SI 18.12-14; 29.7; o deus Mote (morte) havia matado Baal.
148.8), conquanto o aspecto de fogo seja Então procediam a ritos de lamentação
bem comum na linguagem de teofania, para trazê-lo de volta à vida por rituais de
especialmente ligada ao Sinai (Ex 3.2. magia simpática. Eram cerimônias cujo
19.16,18; 20.18; cf. lRs 19.12). O aspecto propósito era provocar as vitais chuvas de
de fogo tornou-se intimamente associado outono, das quais a fertilidade das planta
ao próprio Elias (2Rs 1.10 e ss.). ções de cada ano dependia inteiramente
(Thomas, p. 130-133).
e. O Fracasso dos Profetas de Baal Elias não estava meramente se diver
(18.25-29) tindo com um pouco de sarcasmo, mas
“ Disse, pois, Elias aos profetas de Baal: Esco
sobretudo combatendo uma religião falsa
lhei para vós um dos novilhos, e preparai-o pri com todas as armas à sua disposição. Que
meiro, porque sois muitos, e invocai o nome do o deus pudesse estar dormindo era uma
vosso deus, mais não metais fogo ao sacrifício. idéia conhecida da religião de Iavé, mas
“ E, tomando o novilho que se lhes dera, prepara pelo menos uma vez essa noção foi clara
ram-no, e invocaram o nome de Baal, desde a
manhã até o meio-dia, dizendo: Ah Baal, respon- mente rejeitada (SI 44.23,24; 121.3,4).
de-nos! Porém não houve voz; ninguém respondeu. Acordem era empregado como uma metá
E saltavam em volta do altar que tinham feita fora antropomórfica para a atividade re
27Sucedeu que, ao meio-dia, Elias zombava deles, dentora de Iavé (SI 35.23; 59.4,5; 78.65).
dizendo: Clamai em altas vozes, porque ele é um
deus; pode ser que esteja falando, ou que tenha Após o zombeteiro discurso de Elias, os
alguma coisa que fazer, ou que intente alguma profetas de Baal tornaram-se mais frené
viagem; talvez esteja dormindo, e necessite de que ticos. Sua autolaceração com facas e com
o acordem. 28E eles clamavam em altas vozes e,
conforme o seu costume, se retalhavam com facas
lancetas, o auge do seu êxtase, foi um
e com lancetas, até correr o sangue sobre eles. ato de magia imitativa para trazer a chu
29Também sucedeu que, passado o meio-dia, pro va ou atrair a simpatia de Baal (Gray, p.
fetizaram eles até a hora de se oferecer o sacrifí 350,351). A autoflagelação talvez fosse
cio da tarde. Porém não houve voz; ninguém res conhecida também entre os profetas extá
pondeu, nem atendeu.
ticos hebreus (cf. 20.35,37,41; Os 7.14-16;
Os profetas de Baal realizam seu ritual Zc 13.6). No hebraico, profetizaram é uma
primeiro, e isso lhes toma o dia inteiro. forma intensiva do verbo profetizar: na
Invocar o nome do deus de alguém pode profecia de Baal essa forma intensiva ti
trazer a idéia de magia ou de oração. A nha o sentido de agir como um louco,
contínua repetição do nome pode também uma idéia que às vezes ocorria na profecia
servir para a produção de um estado de de Iavé (cf. 2Rs 9.11; Jr 29.26). Essa des
êxtase. Voz pode significar trovão no con crição clássica do profetismo extático ca-
texto da teofania de tempestade, seja de naneu fornece dessa forma alguns pontos
Baal ou Iavé (SI 29; cf. Thomas, p. 125, de comparação com a profecia hebraica
128). A dança ritual no culto a Baal tal em seus primórdios, mas também um im-
229
pressionante contraste com a expressão trovão, relâmpagos, grandes inundações
profética hebraica mais exaltada de perío repentinas (Js 10.11; Jz 5.20,21; Hc 3.3-15).
do posterior. O profeta Elias talvez esteja assegurando
ao povo e a seus oponentes que não há
f. O Preparo do Sacrifício ao Senhor
(18.30-35) truques, tornando o milagre ainda mais
extraordinário. Mas a seqüência dos acon
30Então Elias disse a todo o povo: Chegai-vos tecimentos parece indicar uma oração
a mim. E todo o povo se chegou a ele. E Elias dramatizada por chuva, relacionada com
reparou o altar do Senhor, que havia sido derru
bada 3,Tomou doze pedras, conforme o número
os outros atos simbólicos dos profetas, que
das tribos dos filhos de Jacó, ao qual viera a pa eram vistos como poderosos iniciadores
lavra do Senhor, dizendo: Israel será o teu nome; daquilo que simbolizavam (cf. 11.30; 22.11;
32e com as pedras edificou o altar em nome do 2Rs 13.14-19).
Senhor; depois fez em redor do altar um rego,
em que podiam caber duas medidas de semente.
33Então armou a lenha, e dividiu o novilho em g. A Resposta Pelo Fogo (18.36-40)
pedaços, e o pôs sobre a lenha, e disse: Enchei de 36Sucedeu pois que, sendo já hora de se ofere
água quatro cântaros, e derramai-a sobre o holo cer o sacrifício da tarde, o profeta Elias se che
causto e sobre a lenha. 1‘'Disse ainda: Fazei-o gou, e disse: Ó Senhor, Deus de Abraão, de Isa-
segunda vez; e o fizeram segunda vez. De novo que, e de Israel, seja manifestado hoje que tu és
disse: Fazei-o terceira vez; e o fizeram terceira Deus em Israel, e que eu sou teu servo, e que
vez. 3SDe maneira que a água corria ao redor do conforme a tua palavra tenho feito todas estas
altar; e ele encheu de água também o rega coisas. 37Responde-me, ó Senhor, responde-me
O próprio comportamento tranqüilo de para que este povo conheça que tu, ó Senhor, és
Elias é um impressionante contraste com Deus, e que tu fizeste voltar o seu coraçãa “ En
tão caiu fogo do Senhor, e consumiu o holocaus
os fúteis desvarios das manifestações extá to, a lenha, as pedras, e o pó, e ainda lambeu a
ticas de Baal. Aqui o profeta está atuando água que estava no rega 39Quando o povo viu
como mediador de aliança, um “profeta isto, prostraram-se todos com o rosto em terra e
semelhante a Moisés” (Ex 32.15-35; BBC, disseram: O Senhor é Deus! O Senhor é Deus!
40Disse-lhe Elias: Agarrai os profetas de Baal!
vol. 1, p. 453). O altar do Senhor que que nenhum deles escape. Agarraram-nos; e Elias
Elias restaurou assinalava o local de um os fez descer ao ribeiro de Quisom, onde os
antigo santuário. Doze pedras despertam matou.
reminiscências históricas do Sinai (Ex
24.4) e de Gilgal (Js 4.4. e ss.). Sem dú A oração do profeta é um apelo simples
vida esse é um exemplo do altar ritual e respeitoso a Iavé, Deus dos pais, com
mente correto feito de pedras não lavra uma invocação tríplice do nome divino
das (Ex 20.25; Dt 27.5,6). Quatro cânta (cf. Nm 6.24-26). Servo é um título parti
ros (...) terceira vez, doze ao todo, talvez cularmente apropriado para a função do
tenham o mesmo simbolismo das doze profeta como mediador de aliança em
pedras. oração intercessória. Fizeste voltar o seu
Qual é a interpretação correta de tal coração. O ensino profético posterior atri
ritual? A mais próxima analogia de uma bui a Elias um ministério semelhante de
cerimônia de mediação de aliança, presi precursor profético do dia do Senhor (Ml
dida por Samuel ao tempo da crise filis- 4.5,6). Caiu fogo do Senhor. O verbo he
téia, parece interpretar o ato de despejar braico distingue este fogo divino daquele
água como um símbolo de arrependimento que ás vezes se dizia que brotava miracu
(ISm 7.13,14). Quando Samuel ofereceu losamente do santuário ou do próprio al
uma oferta queimada e clamou a Iavé, a tar e consumia o sacrifício (Lv 9.24; Jz
resposta que decidiu a batalha a favor de 6.21; cf. “fogo do céu” em lCr 21.26;
Israel foi um fortíssimo trovão. Numa 2Cr 7.1).
guerra santa Iavé lutava por seu povo A interpretação de que esta teofania de
com suas armas da tempestade: saraiva, fogo é um relâmpago não anula de modo
230
algum o elemento miraculoso (note-se que vem, mas ele está simplesmente prostrado
o fogo consumiu tudo ao derredor!), uma em oração. Sete vezes é um número signi
vez que, pela seqüência dos acontecimen ficativo para ações simbólicas. Nuvem sig
tos, deve ter caído de um céu sem nuvens nifica nuvem escura, nuvem maciça, nu
(18.41-45). Esse milagre se inclui na cate vem de chuva, e inicialmente afirma-se
goria dos poderosos atos de Deus na his que é pequena devido à distância. A ur
tória da salvação. A decisão e confissão gente advertência de Elias a Acabe para
imediatas do povo são testemunho do ma que cruze o vale antes que se tornasse
ravilhoso evento. A vingança contra os impossível atravessar o Quisom foi rapida
profetas de Baal se compara ao conceito mente confirmada por uma chuva violen
israelita da “guerra santa” (ISm 15.32,33; ta e pesada. Mão do Senhor é uma ex
cf. 2Rs 10.19 e ss.), conquanto esse ato pressão de inspiração profética para ativi
deva ser julgado pelo intérprete cristão a dade extática (cf. 2Rs 3.15; Ez 1.3; 3.14,
plena luz do ensino e espírito de Cristo 22; 37.1; 40.1), aqui uma corrida de 27
(Dentan, p. 62). quilômetros diante da carruagem de Acabe.
231
temor de Elias quando Acazias tentou quei, e buscam a minha vida para ma tirarem.
prendê-lo (2Rs 1.15). De fato, “Elias era 11Ao que Deus lhe disse: Vem cá fora; e põe-te no
homem sujeito às mesmas paixões que monte perante o Senhor. E eis que o Senhor pas
sou; e um grande e forte vento fendia os montes
nós” (Tiago 5.17). Berseba ficava na fron e despedaçava as penhas diânte do Senhor, porém
teira setentrional de Judá, tendo mais tar o Senhor não estava no vento; e depois do vento
de se tornado um santuário de peregri um terremoto, porém o Senhor não estava no ter
nações para Israel (Am 5.5; 8.14). O seu remoto; 12e depois do terremoto um fogo, porém
moço era um jovem assistente pessoal, a o Senhor não estava no fogo; e ainda depois do
fogo uma voz mansa e delicada.
mesma pessoa que o assistiu na vigília
pela nuvem de chuva (18.43). Essa palavra
indica a mesma atividade que Geazi de A pergunta de Deus tem algo de uma
sempenhou para Eliseu (2Rs 4.12,25). reprovação pessoal ao profeta, o qual res
ponde levado por autocomiseração, quei-
b. A Fuga de Elias Para Horebe (19.4-8) xando-se de que todos são faltos de fé,
menos ele. Zeloso aponta a mesma carac
4Ele, porém, entrou pelo deserto caminho de
um dia, e foi sentar-se debaixo de um zimbro; e
terística em Jeú que resultou na fanática
pediu para si a morte, dizendo: Já basta, ó Se matança dos adoradores de Baal (19.17; cf.
nhor; toma agora a minha vida, pois não sou me 2Rs 10.16,17). A descrição da apostasia e
lhor do que meus pais. 5E deitando-se debaixo perseguição tem levado alguns estudiosos
do zimbro, dormiu; e eis que um anjo o tocou, e a julgarem que a experiência de Horebe
lhe disse: Levanta-te e come. 6Ele olhou, e eis que
à sua cabeceira estava um pão cozido sobre as precede logicamente à do monte Carmelo,
brasas, e uma botija de água. Tendo comido e mas isso implica uma reorganização por
bebido, tornou a deitar-se. 7Õ anjo do Senhor veio demais arbitrária do texto. O Senhor pas
segunda vez, tocou-o, e lhe disse: Levanta-te e sou perante o profeta acompanhado de
come, porque demasiado longa te será a viagem.
8Levantou-se, pois, e comeu e bebeu; e com a for sua teofania de tempestade, vento forte,
ça desse alimento caminhou quarenta dias e qua um terremoto, fogo. Mas o Senhor não
renta noites até Horebe, o monte de Deus. estava nos fenômenos da tempestade. A
essência de sua revelação ao homem de
O profeta ficou faminto, muito sedento,
sua escolha está numa voz mansa e deli
e cansado de sua jornada pelo deserto, cada, um cochicho, o som da quietude
mas foi sustentado pela provisão divina. após a tempestade (SI 107.29).
Zimbro não era o junípero do Líbano,
uma árvore de grandes dimensões, mas d. A Tarefa Profética (19.13-18)
sim um pequeno arbusto que crescia no
leito de regatos no deserto. Nesse ponto 13E ao ouvi-la, Elias cobriu o rosto com a ca
ele ficou tão descorçoado que desejou pa e, saindo, pôs-se à entrada da caverna. E eis
que lhe veio uma voz, que dizia: Que fazes aqui,
morrer. Após haver dormido, o anjo do Elias? ,4Respondeu ele: Tenho sido muito zeloso
Senhor serviu comida e bebida a seu can pelo Senhor Deus dos exércitos; porque os filhos
sado profeta (cf. 17.3 e ss.). Com a força de Israel deixaram o teu pacto, derrubaram os
transmitida por esse surpreendente ali teus altares, e mataram os teus profetas à espada;
mento, ele apressou seu passo em sua lon e eu, somente eu, fiquei, e buscam a minha vida
para ma tirarem. 15Então o Senhor lhe disse: Vai,
ga jornada rumo ao sul. volta pelo teu caminho para o deserto de Damas
co; quando lá chegares, ungirás a Hazael para ser
c. A Voz do Senhor (19.9-12) rei sobre a Siria. ,6E a Jeú, filho de Ninsi, ungi
rás para ser rei sobre Israel; bem como a Eliseu,
9Ali entrou numa caverna, onde passou a noi filho de Safate de Abel-Meolá, ungirás para ser
te. E eis que lhe veio a palavra do Senhor, dizen profeta em teu lugar. 17E há de ser que o que
do: Que fazes aqui, Elias? “ Respondeu ele: Te escapar da espada de Hazael, matá-lo-á Jeú; e o
nho sido muito zeloso pelo Senhor Deus dos que escapar da espada de Jeú, matá-lo-á Eliseu.
exércitos; porque os filhos de Israel deixaram o 18Todavia deixarei em Israel sete mil: todos os
teu pacto, derrubaram os teus altares, e mataram joelhos que não se dobraram a Baal, e toda boca
os teus profetas à espada; e eu, somente eu, fi que não o beijou.
232
Temendo encarar a Deus, o profeta os pais e amigos antes de assumir sua res
esconde o rosto em seu manto de pêlos e ponsabilidade junto a seu mestre profético
ouve uma vez mais a insistente pergunta. (cf. Lc 9.61,62).
Dessa vez a resposta a sua queixa é uma
nova tarefa. Não há tempo para autoco-
4) As Guerras com Bene-Hadade da Síria
miseração quando há trabalho a ser feito!
A ordem para ungir Eliseu é um tanto (20.1-43)
estranha, uma vez que somente reis e sa Os profetas que são conselheiros de
cerdotes eram ungidos (mas cf. Is 61.1). Acabe na condução de suas atividades mili
Seja como for, Elias designou seu sucessor tares estão preocupados principalmente
por uma investidura simbólica, antes que com a convocação de uma guerra santa,
por unção. Abel-Meolá era uma cidade pela qual Iavé possa dar a vitória a Israel.
em Gileade, perto de Tisbe, a cidade na Ambas as batalhas são defensivas, a
tal de Elias. A natureza esquemática da primeira em resposta a um cerco de Samá-
passagem está indicada no fato de que ria. A disposição de Acabe em livrar-se de
Eliseu não mata ninguém na reforma pro Bene-Hadade em termos de uma aliança
fética. Deixarei, ou deixei, tem a forma vantajosa para Israel é condenada mediante
do verbo em hebraico que indica certeza um emprego profético de parábola de modo
de que Deus poupará esses no expurgo. a levar o rei a julgar sua própria ação.
Sete mil propicia um testemunho anti Contudo, essa aliança deve ser julgada a
go da doutrina de um remanescente, a partir da perspectiva histórica mais ampla
qual se tornou uma parte significativa da da coalizão dos reis siro-fenícios que se
pregação profética posterior (cf. Is. 6.13; juntaram a Bene-Hadade e Acabe para deter
10.20-23). Salmanasar III da Assíria na Batalha de
Carcar.
e. O Chamado de Eliseu (19.19-21) a. O Cerco de Samária (20.1-6)
19Partiu, pois, M as dali e achou Eliseu, filho 'Ora, Bene-Hadade, rei da Síria, ajuntou todo
de Safate, qua andava lavrando com doze juntas o seu exército; e havia com ele trinta e dois reis,
de bois adiante dele, estando ele com a duodécima; e cavalos e carros. Então subiu, cercou a Samária,
chegando-se Elias a Eliseu, lançou a sua capa so e pelejou contra ela. 2E enviou à cidade mensa
bre ele. “ Então, deixando este os bois, correu geiros a Acabe, rei de Israel, a dizer-lhe: Assim
após Elias, e disse: Deixa-me beijar a meu pai e diz Bene-Hadade: 3A tua prata e o teu ouro são
a minha mãe, e então te seguirei. Respondeu-lhe meus; e também, das tuas mulheres e dos teus filhos,
Elias: Vai, volta; pois, que te fiz eu? “ Voltou, os melhores são meus. 4Ao que respondeu o rei
pois, de o seguir, tomou a junta de bois, e os de Israel, dizendo: Conforme a tua palavra, ó rei
matou, e com os aparelhos dos bois cozeu a car meu Senhor, sou teu, com tudo quanto tenha
ne, e a deu ao povo, e comeram. Então se levan 5Tornaram a vir os mensageiros e disseram: Assim
tou e seguiu a Elias, e o servia. fala Bene-Hadade, dizendo: Enviei-te, na verdade,
mensageiros que dissessem: Tu me hás de entregar
Elias cumpriu imediatamente somente a tua prata, e o teu ouro, as tuas mulheres e os
uma das tarefas ordenadas. Eliseu é cha teus filhos; 6todavia amanhã a estas horas te
mado de seu sucessor, mas não tem mais enviarei os meus servos, os quais esquadrinharão
participação na história até a cena da a tua casa, e as casas dos teus servos; e há de ser
morte de Elias (2Rs 2). O pai de Eliseu que tudo o que de precioso tiveres, eles tomarão
consigo e o levarão.
era um fazendeiro próspero, possuidor de
doze juntas de bois. Elias realizou um A fortaleza que Onri tinha edificado e
ato simbólico com seu famoso manto (cf. Acabe completado era uma posição defen
2Rs 1.8; 2.8,13,14), retratando, nesse cha siva tão forte que as torres de cerco dos
mado ao discipulado, a continuidade do assírios levaram três anos para capturá-la
ofício profético. Eliseu recebe permissão (2Rs 17.5). Trinta e dois reis eram vassalos
para realizar uma festa de despedida com do reino sírio de Damasco, que em breve
233
seriam substituídos por comandantes mili Samária a tantos punhados de pó, Acabe
tares como resultado c 5ssa batalha (20.24). replicou com um provérbio bastante obje
Assim fala Bene-hadade. Esta é a tivo do tipo “quem ri por último, ri melhor”.
linguagem-padrão comum para mensa
geiros reais, cujo uso secular ajuda o c. O Plano de Batalha Profético (20.13-15)
intérprete a definir o papel dos profetas 13E eis que um profeta, chegando-se a Acabe,
como mensageiros do conselho real do rei de Israel, lhe disse: Assim diz o Senhor: Viste
Senhor. A segunda exigência é mais humi toda esta grande multidão? eis que hoje te entre
garei nas mãos, e saberás que eu sou o Senhor.
lhante do que a primeira, pois seria abuso 14Perguntou Acabe: Por quem? Respondeu ele:
uma busca e apreensão irrestritas nos palá Assim diz o Senhor: Pelos moços dos chefes das
cios de Samária. Alguns estudiosos províncias. Ainda perguntou Acabe: Quem come
interpretam a disposição de Acabe em çará a peleja? Respondeu ele: Tu. 15Então contou
os moços dos chefes das províncias, e eram duzentos
submeter-se à primeira exigência como e trinta e dois; e depois deles contou todo o povo,
prova de que Israel já era um vassalo de a saber, todos os filhos de Israel, e eram sete mil.
Damasco (cf. 20.34).
Não somente os anciãos, mas também
b. O Desafio à Batalha (20.7-12) profetas anônimos traziam conselhos para
o rei numa época de guerra santa. Iavé dese
7Então o rei de Israel chamou todos os anciãos java entregar as hordas sírias nas mãos do
da terra, e disse: Notai agora, e vede como esse
homem procura o mal; pois mandou pedir-me as rei, como prova de lealdade de lavé a seu
minhas mulheres, os meus filhos, a minha prata povo da aliança (cf. Ex 6.7; Ez 6.7). Acabe
e o meu ouro, e não lhos neguei. 8Responderam- aceita a promessa e indaga quanto aos
-lhe todos os anciãos e todo o povo: Não lhe dês planos de batalha do Senhor. Moços dos
ouvidos, nem consintas. 9Pelo que disse aos mensa chefes eram jovens soldados profissionais
geiros de Bene-Hadade: Dizei ao rei, meu senhor:
Tudo o que a principio mandaste pedir a teu servo, a serviço de comandantes de distrito. Esse
farei; porém isto não posso fazer. Voltaram os versículo propicia um raro lampejo de como
mensageiros, e lhe levaram a resposta. '"Tornou funcionava o sistema administrativo de
Bene-Hadade a enviar-lhe mensageiros, e disse: Israel do Norte, sistema talvez organizado
Assim me façam os deuses, e outro tanto, se o pó
de Samária bastar para encher as mãos de todo por Onri (de Vaux, p. 137). Começará a
o povo que me segue. "O rei de Israel, porém, peleja pode significar prosseguir o ataque,
respondeu: Dizei-lhe: Não se gabe quem se cinge que fora começado pelos jovens guerri
das armas como aquele que as depõe. 12E sucedeu lheiros, de modo que Acabe irá rapidamente
que, ouvindo ele esta palavra, estando a beber com com os 7.000, em vez de ir à frente com
os reis nas tendas, disse aos seus servos: Ponde-vos
em ordem. E eles se puseram em ordem contra a os 232 (Gray, p. 377).
cidade.
d. A Primeira Vitória (20.16-22)
Acabe se aconselhou com os anciãos
tribais dos distritos (20.14), que evidente l6Saíram, pois, ao meio-dia. Bene-Hadade,
porém, estava bebendo e se embriagando nas tendas,
mente tinham buscado se proteger dos com os reis, os trinta e dois reis que o ajudavam.
exércitos sírios na fortaleza da capital. 17E os moços dos chefes das províncias saíram
Acabe havia tentado manter a paz mediante primeiro; e Bene-Hadade enviou espias, que lhe
um acordo com Bene-Hadade e um ofere deram aviso, dizendo: Saíram de Samária uns
homens. 18Ao que ele disse: Quer venham eles
cimento de lhe pagar tributo, mas até tratar de paz, quer venham à peleja, tomai-os vivos.
mesmo os anciãos concordaram que as 19Saíram, pois, da cidade os moços dos chefes das
exigências eram absurdas. Os pagãos Bene- províncias, e o exército que os seguia. 20E eles
-Hadade e Jezabel utilizaram, para jurar mataram cada um o seu adversária Então os sírios
por seus deuses, a mesma fórmula de jura fugiram, e Israel os perseguiu; mas Bene-Hadade,
rei da Síria, escapou a cavalo, com alguns cavaleiros.
mento que os israelitas utilizavam para 21E saindo o rei de Israel, destruiu os cavalos e os
jurarem por seu Deus (19.2; cf. 2.23). Ante carros, e infligiu aos sírios grande derrota. 22Então
a ameaça de Bene-Hadade de reduzir o profeta chegou-se ao rei de Israel e lhe disse: Vai,
234
fortalece-te; atenta bem para o que hás de fazer; 27Também os filhos de Israel foram arregimen
porque decorrido um ano, o rei da Síria subirá tados e, providos de viveres, marcharam contra eles.
contra ti. E os filhos de Israel acamparam-se defronte deles,
como dois pequenos rebanhos de cabras; mas os
Bene-Hadade estava tão autoconfiante sírios enchiam a terra. “ Nisso chegou o homem
que farreava nas barracas do exército. de Deus, e disse ao rei de Israel: Assim diz o Senhor:
Quando a pequena tropa surgiu vinda da Porquanto os sírios disseram: O Senhor é Deus
cidade, ele ficou inseguro quanto à sua dos montes, e não Deus dos vales, entregarei nas
tuas mãos toda esta grande multidão, e saberás que
intenção até que se iniciou o combate corpo- eu sou o Senhor. 29Assim, pois, estiveram acam
-a-corpo. Aparentemente, a essas alturas os pados sete dias, uns defronte dos outros. Ao sétimo
reis vassalos entraram em pânico. Con dia a peleja começou, e num só dia os filhos de
quanto Israel perseguisse rapidamente os Israel mataram dos sírios cem mil homens da infan
fugitivos sírios, Bene-Hadade escapou para taria. 30E os restantes fugiram para Afeque, e
entraram na cidade; e caiu o muro sobre vinte e
lutar noutra ocasião. Talvez o mesmo sete mil homens que restavam.
profeta que havia determinado os planos
de batalha agora advertia Acabe de que,
conquanto ele houvesse vencido uma Confirmando a advertência do profeta,
batalha, a guerra seria reiniciada. na primavera, época em que os reis promo
viam suas campanhas militares (cf. 2Sm
e. Os Novos Planos da Síria (20.23-25) 11.1; 2Cr 36.10), Bene-Hadade novamente
23Os servos do rei da Síria lhe disseram: Seus estava de volta, dessa vez com tantos
deuses são deuses dos montes, por isso eles foram soldados que enchiam a terra. Deve-se iden
mais fortes do que nós; mas pelejemos contra eles tificar Afeque não como a antiga área
na planície, e por certo prevaleceremos contra eles. pantanosa na planície de Sarom (ISm 4.1;
24Faze, pois, isto: tira os reis, cada um do seu
lugar, e substitui-os por capitães; “ arregimenta
29.1), mas como uma localidade na princi
outro exército, igual ao que perdeste, cavalo por pal entrada a leste do Mar da Galiléia, en
cavalo, e carro por carro; pelejemos com eles na tre Israel e Damasco (Gray, p.380). Isso pres
planície, e por certo prevaleceremos contra eles. supõe que Israel uma vez mais controlava
Ele deu ouvidos ao que disseram, e assim fez. seus territórios da Transjordânia, que tantas
A interpretação que os conselheiros de vezes tinham sido campo de batalha entre
Bene-Hadade fazem dessa derrota revela esses exércitos adversários. Não está espe
uma interessante teologia do politeísmo. cificado se o homem de Deus é o mesmo
Aos olhos dos sírios, os deuses de Israel são profeta anônimo que aconselhou Acabe
deuses da montanha especializados em antes ou é o mesmo membro das corpo
combates de montanhas. Planície refere-se rações de profetas que o confrontou após
à grande planície da Transjordânia. Parece a batalha. Iavé dará a vitória a Israel a fim
que a idéia aqui é de que os cavalos e carros de rebater a difamação contra sua soberania
dos sírios seriam mais eficazes, e o número em toda a terra. Conquanto o número de
superior de tropas, mais esmagador em baixas sírias talvez seja exagerado (somente
terreno plano (cf. Js 11.4; 17.16; Jz 1.19; 20.000 soldados a pé lutaram pela Síria
4.3). Capitães pode significar governadores, contra os assírios em Carcar), foi uma
indicando uma reorganização da instável grande vitória, incluindo o arrasamento de
confederação dos reis sírios num império Afeque, para onde Bene-Hadade fugiu.
arameu, tendo Damasco por capital.17
g. A Aliança de Acabe com Bene-Hadade
f. A Segunda Vitória em Afeque (20.26-30a) (20.30b-34)
“ Passado um ano, Bene-Hadade arregimentou Bene-Hadade, porém, fugiu, e veio à cidade, onde
os sírios, e subiu a Afeque, para pelejar contra Israel. se meteu numa câmara interior. 31Disseram-lhe os
seus servos: Eis que temos ouvido dizer que os reis
17 Benjamin Mazar, “T he Aram ean Em pire and Its Relations with
Israel”, Biblical Archaeologist, Vol. XXV, N.° 4 (dezembro, 1962),
da casa de Israel são reis clementes; ponhamos,
p. 98-120. pois, sacos aos lombos, e cordas aos pescoços, e
235
saiamos ao rei de Israel; pi >de ser que ele te poupe Semelhantemente à lucrativa aliança de
a vida. 32Então cingiran. sacos aos lombos e
cordas aos pescoços e, indo ter com o rei de Israel,
casamentos mistos com a Fenícia, esse
disseram-lhe: Diz o teu servo Bene-Hadade: Deixa- tratado com a Síria foi condenado pelos
me viver, rogo-te. Ao que disse Acabe: Pois ainda profetas.
vive? É meu irmãa 33Aqueles homens, tomando
isto por bom presságio, apressaram-se em apanhar h. A Parábola Profética Contra Acabe
a sua palavra, e disseram: Bene-Hadade é teu irmão! (20.35-43)
Respondeu-lhes ele: Ide, trazei-mo. Veio, pois, Bene-
-Hadade à presença de Acabe; e este o fez subir 35O ra, certo homem dentre os filhos dos
ao carra 34Então lhe disse Bene-Hadade: Eu te profetas disse ao seu companheiro, pela palavra
restituirei as cidades que meu pai tomou a teu pai; do Senhor: Fere-me, peço-te. Mas o homem recusou
e farás para ti praças em Damasco, como meu pai feri-la 36Pelo que ele disse: Porquanto não obede
as fez em Samária. E eu, respondeu Acabe, com ceste à voz do Senhor, eis que, em te apartando
esta aliança te deixarei ir. E fez com ele aliança de mim, um leão te matará. E logo que se apartou
e o deixou ir. dele um leão o encontrou e o matou. 37Depois o
profeta encontrou outro homem, e disse-lhe: Fere-
-me, peço-te. E aquele homem deu nele e o feriu.
O que era politicamente conveniente e 38Então foi o profeta, pôs-se a esperar o rei no
militarmente vantajoso aos reis de Israel caminho, e disfarçou-se, cobrindo os olhos com o
seu turbante. 39E passando o rei, clamou ele ao rei,
nem sempre era religiosamente agradável dizendo: Teu servo estava no meio da peleja; e eis
a seus profetas. Clementes é a conhecida que um homem, voltando-se, me trouxe um outro,
palavra chesed, que significa lealdade de e disse: Guarda-me este homem; se ele de qualquer
aliança. Essa reputação talvez houvesse sido maneira vier a faltar, a tua vida responderá pela
adquirida por Onri em relacionamentos vida dele, ou então pagarás um talento de prata.
■
“ E estando o teu servo ocupado de uma e de outra
anteriores entre as duas nações. Sacos parte, eis que o homem desapareceu. Ao que lhe
simbolizavam humilhação ritual como no respondeu o rei de Israel: Esta é a tua sentença;
pranto de luto. Meu irmão é uma expressão tu mesmo a pronunciaste. 41Então ele se apressou,
de aliança que indica o desejo de Acabe e tirou o turbante de sobre os seus olhos; e o rei
de Israel o reconheceu, que era um dos profetas.
de terminar o relacionamento como vassalo 42E disse ele ao rei: Assim diz o Senhor: Porquan
e estabelecer com Bene-Hadade um tratado to deixaste esco a r da mão do homem que eu havia
em condições de igualdade. Tomando isto posto para destruição, a tua vida responderá pela
por bom presságio significa “observando sua vida, e o teu povo pelo seu povo. 43E o rei de
os sinais, praticando adivinhação”, de modo Israel seguiu para sua casa, desgostoso e indignado,
e veio a Samária.
que tomaram a primeira palavra favorável
de Acabe como um sinal de que iria poupar A primeira das três condenações pro
a Bene-Hadade. féticas de Acabe (Elias, 21.21; Micaías,
Acabe recebeu Bene-Hadade compassi 22.17) procede um membro anônimo dos
vamente em seu carro particular, talyez o filhos dos profetas, a corporação profética.
mesmo em que morreu (22.35). Meu pai Traz isso à lembrança a estranha história
tomou a teu pai. A menos que a palavra do discipulado profético durante a dinas
pai seja interpretada livremente como prede tia de Jeroboão (especialmente a parte re
cessor, em cujo caso a referência podia ser ferente ao leão, 13.24 e ss.). Não é expli
a Bene-Hadade I e a Baasa, a frase deve cado por que esse profeta deseja que al
referir-se a conquistas anteriores sobre Onri. guém o esmurre e fira, a menos que isso
Praças é literalmente ruas ou bairros espe sirva como parte de seu disfarce diante de
cialmente dedicados ao comércio. Onri Acabe no campo de batalha. Cobrindo os
havia sido forçado a um tratado de vassa olhos com o seu turbante evidentemente
lagem, em que as vantagens comerciais em significa que ao redor dos oli.os havia al
Samária, sua capital, passaram a pertencer gum sinal que distinguia um membro da
a Damasco. Agora a vantagem comercial corporação profética (cf. Montgomery, p.
se transfere para Acabe, que deixa Bene- 325, Zc 13.6), que Acabe facilmente re
Hadade ir-se em troca dessas concessões. conheceu.
236
Tal como Natã havia induzido Davi a palácio de Acabe, rei de Samária, 2falou este a
julgar seu próprio caso com o emprego de Nabote, dizendo: Dá-me a tua vinha, para que me
sirva de horta, porque está vizinha, ao pé da mi
uma parábola ou de uma disputa legal nha casa; e te darei por ela outra vinha melhor;
fictícia, igualmente age esse profeta, que ou, se desejares, dar-te-ei o seu valor em dinheiro.
finge ser um soldado ou espectador da 3Respondeu, porém, Nabote a Acabe: Guarde-me
batalha que recebera a incumbência de o Senhor de que eu te dê a herança de meus pais.
vigiar um prisioneiro. O alto valor atri 4Então Acabe veio para sua casa, desgostoso e
indignado, por causa da palavra que Nabote, o
buído à vida do cativo representaria mais jizreelita, lhe falara; pois este lhe dissera: Não te
do que o preço de um escravo, e pode in darei a herança de meus pais. Tendo-se deitado na
dicar uma intenção de mantê-lo com vistas sua cama, virou o rosto, e não quis comer.
a um resgate. Ironicamente, Acabe respon Jizreel era o local do palácio de inverno
de esta é a tua sentença; tu mesmo a pro do rei. O palácio principal ficava em Sa
nunciaste sem reconhecer que era seu mária, a capital da dinastia de Onri. A
próprio caso que estava em questão. Bene- oferta de Acabe a Nabote para adquirir
-Hadade não era apenas um cativo de sua vinha parece um negócio perfeitamen
Acabe, um valioso trunfo de guerra, mas te legítimo. Mas Nabote não devia ven
o homem banido por Iavé (isto é, desti der a propriedade, pois a herança de um
nado à destruição), e como tal pertencia homem pertencia a seu pai e a seu filho
ao Senhor. A condenação se fundamenta tanto quanto a ele, e era inalienável pela
na desobediência do rei à determinação lei israelita (Nm 27.8-11). Acabe reconhe
profética de guerra santa (cf. ISm 15). A ceu a justeza da recusa de Nabote, con
tua vida responderá pela sua vida é uma quanto permanecesse quieto e mal-humo
frase tirada da parábola (v. 39). Que Acabe rado no palácio de Samária.
iria perder sua própria vida numa batalha
contra o mesmo homem que havia liber b. A Trama de Jezabel (21.5-10)
tado (23.31) é um ideal de justiça. Acabe
se afastou desgostoso e indignado. Essa 5Mas, vindo a ele Jezabel, sua mulher, lhe
declaração é uma transição ao relato se disse: Por que está o teu espírito tão desgostoso
que não queres comer? 6Ele lhe respondeu: Por
guinte (21.4), mas, em questões militares que falei a Nabote, o jizreelita, e lhe disse: Dá-me
internacionais, a verdadeira seqüência dos a tua vinha por dinheiro; ou, se te apraz, te darei
acontecimentos está no capítulo 22. outra vinha em seu lugar. Ele, porém, disse: Não
te darei a minha vinha. 7Ao que Jezabel, sua
mulher, lhe disse: Governas tu agora no reino de
5) A Vinha de Nabote em Jizreel (21.1-29) Israel? Levanta-te, come, e alegre-se o teu coração;
Se o encontro do monte Carmelo de eu te darei a vinha de Nabote, o jizreelita. 8Então
escreveu cartas em nome de Acabe e, selando-as
monstra que a religião profética de Elias com o sinete dele, mandou-as aos anciãos e aos
era o monoteísmo, o incidente da vinha de nobres que habitavam com Nabote na sua cidade.
Nabote prova que era o monoteísmo ético. 9Assim escreveu nas cartas: Apregoai um jejum,
Em parte alguma há um contraste mais e ponde Nabote diante do povo. 10E ponde de
fronte dele dois homens, filhos de Belial, que tes
claro entre o reinado tal como Israel o temunhem contra ele, dizendo: Blasfemaste contra
entendia e o reinado tal como se tornara Deus e contra o rei. Depois conduzi-o para fora,
sob a influência cananéia. O sangue ino e apedrejai-o até que morra.
cente de Nabote clama por um vingador.
Elias é o homem de Iavé para o momen A rainha, devido a sua formação auto
to, confrontando o rei ali na propriedade crática, repreende o rei por aceitar as li
confiscada. mitações israelitas do reino de aliança.
Jezabel passa a mostrar a Acabe como seu
a. A Rejeição do Pedido de Acabe (21.1-4) pai, Etbaal, talvez tivesse lidado com o
'Sucedeu depois destas coisas que, tendo Na caso em Tiro. É difícil crer que ela pudesse
bote, o jizreelita, uma vinha em Jizreel, junto ao ter usado o nome e o selo de Acabe sem
237
que ele concordasse com a questão. Os bote já não vive, mas ê morta ,6Quando Acabe
nobres eram os cidadãos, proprietários vi ouviu que Nabote já era morto, levantou-se para
descer à vinha de Nabote, o jizreelita, a fim de
talícios de terras, os quais constituíam tomar posse dela.
junto com os anciãos o conselho da cida
de. Aqui o jejum é indicação de alguma Ou a propriedade de criminosos exe
culpa coletiva que traria calamidade, a cutados passava à posse da coroa, ou esse
menos que fosse eliminada da comunida é um confisco legal de propriedade pelo rei.
de. Diante significa em posição de honra. Jeú observou, no cumprimento do terrível
Eles o prepararam para a falsa acusação oráculo de Elias, que os filhos de Nabote
ao honrá-lo. Dois homens, filhos de Belial, foram mortos com ele (2Rs 9.26). Essa era
isto é, homens indignos (cf. Pv 19.28a). a lei da responsabilidade coletiva, os peca
Isso tecnicamente cumpre os requisitos dos dos pais recaindo sobre os filhos, (cf.
legais de duas (ou três) testemunhas para Ex 20.5; Js 7.24). Para Acabe e Jezabel,
que se determinasse a pena de morte (Dt esse antigo costume serviu para livrar a
17.6; cf. Mt 26.60). No código da antiga propriedade de quaisquer reivindicações
aliança, caluniar o líder tribal (príncipe, legais posteriores.
dirigente) era equivalente a amaldiçoar a
Deus (Ex 22.28; cf. BBC, Vol. 1, p. 426). e. O Confronto Profético (21.17-19)
O apedrejamento era o método de execu 17Então veio a palavra do Senhor a Elias, o
ção, o que melhor expressava o envolvi tisbita, dizendo: 18Levanta-te, desce para encon-
mento da comunidade no processo legal trar-te com Acabe, rei de Israel, que está em Sa-
mária. Eis que está na vinha de Nabote, aonde
(Lv 24.10-23). desceu a fim de tomar posse dela. 19E falar-lhe-ás,
dizendo: Assim diz o Senhor: Porventura não
c. A Execução de Nabote (21.11-14) mataste e tomaste a herança? Falar-lhe-ás mais,
dizendo: Assim diz o Senhor: No lugar em que
"Pelo que os homens da cidade dele, isto é, os os cães lamberam o sangue de Nabote, lamberão
anciãos e os nobres que habitavam na sua cidade, também o teu próprio sangue.
fizeram como Jezabel lhes ordenara, conforme
estava escrito nas cartas que ela lhes mandara. Nesse segundo encontro clássico entre
IZApregoaram um jejum, e puseram Nabote dian Elias e Acabe (cf. 18.17-19), o profeta re
te do pova 131àmbém vieram dois homens, filhos cebe ordem de apanhar o rei com a mão
de Belial, e sentaram-se defronte dele; e estes
filhos de Belial testemunharam contra Nabote na massa. É um relato muito instrutivo
perante o povo, dizendo: Nabote blasfemou contra para a ênfase posterior dos profetas ao es
Deus e contra o rei. Então o conduziram para creverem sobre justiça social. Em sua re
fora da cidade e o apedrejaram, de sorte que preensão do rei, Elias coloca-se na tradi
morreu. 14Depois mandaram dizer a Jezabel:
Nabote foi apedrejado e morreu.
ção profética de Samuel, Natã e Aias. Co
mo de costume, o profeta aparece com
A malévola ordem de Jezabel foi cum impressionante rapidez. Mataste — o ver
prida à risca, o que demonstra o poder da bo hebraico do sexto mandamento tem
coroa e sua disposição de subverter os aqui o sentido mais sério, o de um assas
direitos de seus cidadãos. Fora da cidade sinato premeditado (Ex 20.13; cf. BBC,
evitava contaminação (cf. At 7.58). As Vol. 1, p. 415). Cães eram proeminentes
testemunhas cujo depoimento condena em oráculos proféticos de condenação
vam o indivíduo lançavam simbolicamen (21.23), quer aqui quer no dito conven
te as primeiras pedras (cf. João 8.7). cional que também mencioná aves de ra
pina (21.24; cf. 14.11; 16.4).
d. Os Espólios da Injustiça (21.15,16)
f. O Oráculo de Condenação por Elias
15Ora, ouvindo Jezabel que Nabote fora ape (21.20-24)
drejado e morrera, disse a Acabe: Levanta-te e
toma posse da vinha de Nabote, o jizreelita, a 20Ao que disse Acabe a Elias: Já me achaste,
qual ele recusou dar-te por dinheiro; porque Na ó inimigo meu? Respondeu ele: Achei-te; porque
238
te vendeste para fazeres o que é mau aos olhos 21.1; cf. Jó 2.3). O historiador vê Jezabel
do Senhor. 2lEis que trarei o mal sobre ti; lança como a principal tentação de Acabe, mas
rei fora a tua posteridade, e arrancarei de Acabe
todo homem, escravo ou livre, em Israel; 22e farei com isso não justifica sua' submissão dian
a tua casa como a casa de Jeroboão, filho de te dela. A ameaça implícita no terrível
Nebate, e como a casa de Baasa, filho de Aias, exemplo dos amorreus é de que Israel
por causa da provocação com que me provocaste também deve ser lançado fora por sua
à ira, fazendo Israel pecar. “ Também acerca de
Jezabel falou o Senhor, dizendo: Os cães come
idolatria.
rão Jezabel junto ao antemuro de Jizreel. 24Quem
morrer a Acabe na cidade, os cães o comerão; e h. A Humilhação e o Fim Adiado (21.27-29)
o que lhe morrer no campo, as aves do céu o co
merão. 27Sucedeu, pois, que Acabe, ouvindo estas pala
vras, rasgou as suas vestes, cobriu de saco a sua
A acusação de Acabe a Elias evoluiu carne, e jejuou; e jazia em saco, e andava humil
de “perturbador de Israel” (18.17) para a demente. 28Então veio a palavra do Senhor a
acusação mais pessoal de inimigo meu. Elias, o tisbita, dizendo: 29Não viste que Acabe se
Elias achou Acabe em dois sentidos: en humilha perante mim? Por isso, porquanto se
humilha perante mim, não trarei o mal enquanto
contrando-o em certo local e também des ele viver, mas nos dias de seu filho trarei o mal
cobrindo ou identificando seu crime. Te sobre a sua casa.
vendeste é uma metáfora da escravidão do
pecado (21.25; 2Rs 17.17). A linguagem Não há razão por que se deva conside
desses versos é a mesma dos oráculos de rar a humilhação ritual de Acabe, simbó
juízos condenatórios contra as dinastias de lica de seu arrependimento, como insince
Jeroboão 14.10,11) e Baasa (16.3,4), a qual ra (cf. 2Rs 20.1-5). Não foi sua própria
substituiu a predição mais específica da morte, mas a de sua dinastia, que com is
morte de Acabe, na ordem anterior de so se evitou temporariamente. Aqueles
Iavé. Também acerca de Jezabel na reali oráculos que prediziam o destino pessoal
dade faz parte da condenação pessoal do rei e da rainha (21.19,23) tiveram am
de Acabe (21.19). Jeú apresenta sua pró bos cumprimento (22.38; 2Rs 9.35-37).
pria tradição oral desses oráculos (2Rs Humildemente, literalmente quer dizer
9.26,36,37) junto com seu cumprimento. suavemente, gentilmente, não no sentimen
to de inconformação irada descrito ante
riormente (20.43; 21.45). Dias de seu fi
g. As Iniqüidades de Acabe (21.25,26) lho. Dois filhos de Acabe reinaram sobre
25(Não houve, porém, ninguém como Acabe,
Israel, Acazias e Jorão, mas foi nos dias
que se vendeu para fazer o que era mau aos olhos deste último deles que Jeú executou o ex
do Senhor, sendo instigado por Jezabel, sua mu purgo profético (2Rs 9.1—10.28). Uma vez
lher. 26E fez grandes abominações, seguindo os mais, o castigo do Senhor é suavizado por
ídolos, conforme tudo o que fizeram os amor- sua misericórdia (cf. 18.41-46). A história
reus, os quais o Senhor lançou fora da sua pos
sessão, de diante dos filhos de Israel.)
de Elias é concluída em 2Reis (1.2—2.18).
O historiador vale-se da oportunidade
6) A Última Batalha de Acabe (22.1-40)
para emitir um comentário editorial sobre
o ímpio reinado de Acabe (cf. 16.30-33), Após suas vitórias decisivas sobre Be-
um julgamento que perceptivelmente falta ne-Hadade II, Acabe uniu-se à coalizão de
na fórmula usada para registrar a morte reis contra a Assíria na batalha de Carcar,
(22.37-40). Instigado — fascinado, induzi estando em pé de igualdade com Bene-
do, seduzido, atraído — é o verbo usado -Hadade. Evidentemente, Bene-Hadade
para indicar a ação de provar ou tentar, a não havia cumprido sua parte no acordo
qual Israel em tempos primitivos atribuíra de devolver todas as cidades (20.34), e Ra-
a Deus (2Sm 24.1), enquanto a teologia mote-Gileade estava ainda em mãos sírias.
posterior culpava Satanás por isso (lCr O principal interesse da história reside no
239
contraste entre o oráculo da vitória dos nhor. 6Então o rei de Israel ajuntou os profetas,
profetas institucionais e a predição da cerca de quatrocentos homens, e perguntou-lhes:
Irei à peleja contra Ramote-Gileade, ou deixarei
morte de Acabe por Micaías, filho de Inlá, de ir? Responderam eles: Sobe, porque o Senhor
mencionado unicamente nesse incidente. a entregará nas mãos do rei. 7Disse, porém, Jeo
Esse é o primeiro encontro formal entre safá: Não há aqui ainda algum profeta do Senhor,
os profetas verdadeiros e falsos. O nome ao qual possamos consultar? 8Então disse o rei de
correto para esses profetas da vitória é Israel a Jeosafá: Ainda há um homem por quem
podemos consultar ao Senhor — Micaías, filho de
profetas mentirosos (22.22; cf. 13.18; Jr Inlá; porém eu o odeio, porque nunca profetiza o
23.25,26). Micaías insiste em falar a ver bem a meu respeito, mas somente o mal. Ao que
dadeira palavra de Iavé, muito embora ex disse Jeosafá: Não fale o rei assim. 9Então o rei
presse um destino sombrio para o rei. de Israel chamou um eunuco, e disse: TYaze-me
depressa Micaías, filho de Inlá. 10Ora, o rei de
Conquanto Acabe ordene que Micaías se Israel e Jeosafá, rei de Judá, vestidos de seus
ja mantido preso e tente evitar esse des trajes reais, estavam assentados cada um no seu
tino, mais tarde é ferido mortalmente por trono, na praça à entrada da porta de Samária;
um de seus arqueiros. e todos os profetas profetizavam diante deles. "E
Zedequias, filho de Quenaaná, fez para si uns
chifres de ferro, e disse: Assim diz o Senhor: Com
a. A Aliança com Jeosafá (22.1-4) estes ferirás os sírios, até que sejam consumidos.
'Passaram-se três anos sem haver guerra entre 12Do mesmo modo também profetizavam todos os
a Síria e Israel. zNo terceiro ano, porém, desceu profetas, dizendo: Sobe a Ramote-Gileade, e serás
Jeosafá, rei de Judá, a ter com o rei de Israel. 3E bem sucedido; porque o Senhor a entregará nas
o rei de Israel disse aos seus servos: Não sabeis mãos do rei.
vós que Ramote-Gileade é nossa, e nós estamos
quietos, sem a tomar da mão do rei da Síria? Fiel aos ideais da guerra santa, Jeosafá
4Então perguntou a Jeosafá: Irás tu comigo à deseja consultar a Iavé antes da batalha
peleja, a Ramote-Gileade? Respondeu Jeosafá ao (cf. 20.13,14,22,28). É um tanto surpreen
rei de Israel: Como tu és sou eu, o meu povo
como o teu povo, e os meus cavalos como os teus dente encontrar quatrocentos profetas de
cavalos. Iavé na corte de Acabe à luz das perse
guições anteriores feitas por Jezabel (18.4;
Jeosafá é descrito nessa narrativa como 19.10). Nessa fonte literária diversa, Elias
aliado ou vassalo de Acabe (mais tarde de
não aparece, mas Micaías cumpre uma
Jorão, 2Rs 3; mas cf. lRs 22.49). Essa função semelhante, como a do profeta soli
aliança foi selada com o casamento da fi tário da destruição. Esses profetas da corte
lha de Acabe, Atalia, com o filho de Jeo anunciavam aquilo que o rei desejava ou
safá, Jeorão (2Rs 8.18,25,27). Isso trouxe vir, no entanto confirmaram-se os oráculos
mais tarde sérias conseqüências para Judá a Acabe acerca de sua vitória anterior nas
(2Rs 11). Ramote-Gileade era uma impor
guerras que travou contra os sírios (20.13
tante fortificação, a capital distrital de Sa- e ss.). De qualquer modo, Jeosafá não se
lcmâo para Basã (4.13), na Transjordânia, impressiona e exige uma consulta mais
exatamente a leste de Jizreel. Ião logo Is aprofundada. Seria interessante conhe
rael e Síria detiveram Salmanasar III da
cer os encontros anteriores de Micaías
Assíria, reiniciaram sua guerra de frontei pelos quais ganhou fama de profeta da
ra. Meu povo (...) meus cavalos. A res
destruição.
posta de Jeosafá a Acabe pode indicar O relato apresenta uma cena impres
que ele quase não tem escolha nessa ques sionante diante dos portões de Samária,
tão (cf. 20.4). com os reis em seus tronos, trajando ves
tes reais, na praça, um grande espaço pla
b. A Predição de Vitória Feita Pelos Pro no e aberto, adequado a esse tipo de ma
fetas Favoráveis à Guerra (22.5-12) nifestação profética (cf. 18.29). Zedequias,
5Disse mais Jeosafá ao rei de Israel: Rogo-te, o líder dos profetas da corte, tem o nome
porém, que primeiro consultes a palavra do Se Iavé na raiz do seu próprio nome. Ação
240
simbólica podia ser utilizada pelos profetas mas sua explicação posterior leva-nos a
falsos tanto quanto pelos verdadeiros (cf. ver que Micaías deseja que Acabe cami
Jr 28); mas sem a genuína ordem de Iavé nhe para seu destino final. Acabe, todavia,
adquire distintamente contornos de magia. percebe a fina ironia do atípico oráculo de
Os chifres são um símbolo de poder, não vitória nos lábios de Micaías e insta-o a,
necessariamente de Baal, e são apropria em nome de Iavé, narrar a verdadeira vi
damente relacionados ao oráculo sobre são. O oráculo das ovelhas dispersas e sua
José na Bênção de Moisés (Dt 33. 17). interpretação acham-se em forma poética
Ferirás significa escornearás, e descreve a no texto original hebraico. A imagem do
ação simbólica do profeta com os chifres pastor como símbolo do rei era uma metá
(cf. 2Rs 13.14-19). Acreditava-se que tanto fora comum na literatura bíblica e na do
a ação quanto a palavra transmitiam po antigo Oriente Médio (cf. Ez 34).
der real para alcançar a vitória que estava
sendo prevista. d. O Plano do Conselho Divino (22.19-23)
’’Micaías prosseguiu: Ouve, pois, a palavra do
c. O Terrível Oráculo de Micaías (22.13- Senhor! Vi o Senhor assentado no seu trono, e
todo o exército celestial em pé junto a ele, à sua
18) direita e à sua esquerda. 20E o Senhor perguntou:
130 mensageiro que fora chamar Micaías fa Quem induzirá Acabe a subir, para que caia em
iou-lhe, dizendo: Eis que as palavras dos profetas, Ramote-Gileade? E um respondia de um modo, e
a uma voz, são favoráveis ao rei; seja, pois, a tua outro de ou tra 21Então saiu um espírito, apre-
palavra como a de um deles, e fala o que é bom. sentou-se diante do Senhor, e disse: Eu o induzi
14Micaías, porém, disse: Vive o Senhor, que o que rei. E o Senhor lhe perguntou: De que modo?
o Senhor me disser, isso falarei. lsQuando ele 22Respondeu ele: Eu sairei, e serei um espírito
chegou à presença do rei, este lhe disse: Micaías, mentiroso na boca de todos os seus profetas. Ao
iremos a Ramote-Gileade à peleja, ou deixaremos que disse o Senhor: Tu o induzirás, e prevalece
de ir? Respondeu-lhe ele: Sobe, e serás bem suce rás; sai, e faze assim. 23Agora, pois, eis que o
dido, porque o Senhor a entregará nas mãos do Senhor pôs um espírito mentiroso na boca de to
rei. I6E o rei lhe disse: Quantas vezes hei de con dos estes teus profetas; o Senhor é quem falou o
jurar-te que não me fales senão a verdade em mal a respeito de ti.
nome do Senhor? 17Então disse ele: Vi todo o
Israel disperso pelos montes, como ovelhas que Micaías se apressa a acrescentar outra
não têm pastor; e disse o Senhor: Estes não têm visão para contradizer o comentário do rei
senhor; torne cada um em paz para sua casa. Acabe (“Não te disse eu?”) a Jeosafá. Essa
18Disse o rei de Israel a Jeosafá: Não te disse eu cena de Iavé como Rei e sua hoste celes
que ele não profetizaria o bem a meu respeito, tial de espíritos mensageiros e conselheiros
mas somente o mal?
angélicos é o conselho divino, o protótipo
O mensageiro do rei tem alguns conse de experiências de chamado profético (Is
lhos politicamente convenientes para Mi 6.1-8; 40.1-11), que autentica suas predi
caías, de que ele deve concordar com a ções (Am 3.7), e as distingue dos profetas
opinião da maioria e acatar os desejos do mentirosos (Jr 23.18,22). O chamado a
rei. Micaías objeta com um juramento a voluntários faz lembrar da experiência do
qualquer possibilidade de controle huma chamado de Isaías (Is 6.8), mas nesse caso
no sobre seu oráculo. O próprio Iavé é a a missão é a de induzir Acabe para sua
única autoridade da palavra do profeta. morte (cf. Jr 20.7; Dt 13.1-5; Ez 14.9).
Uma vez que o profeta conheça essa pala Essa é uma antiga teologia, em que
vra do Senhor, nenhuma autoridade hu não há causas secundárias. Espírito menti
mana poderá impedi-lo de apresentar a roso deve ser comparado com o “espírito
mensagem. A primeira resposta de Mi maligno da parte do Senhor” que ator
caías está em chocante harmonia com o mentava o rei Saul após o Espírito de Iavé
oráculo de vitória dos profetas da corte. ter-se afastado dele (ISm 16.14).
Poderíamos supor que ele tenha se do Para o Israel pré-exílico tanto as coisas
brado ante a pressão e ao conformismo, boas quanto as más eram atribuídas em
241
dadas ocasiões a Deus. Esta visão monista reunidos para testemunhar essa cena? Es
simples de atribuir todas as coisas à sobe sas são as mesmas palavras com que o
rania divina tornou-se cada vez mais pro profeta canônico Miquéias começa sua
blemática à fé dos judeus após a destrui prédica (1.2), de modo que talvez haja
ção de Jerusalém. Mesmo com o desen uma interpolação aqui, especialmente ten
volvimento da doutrina de Satanás, con do em vista que a Septuaginta omite a
tudo ele é ainda retratado como um servo frase (Gray, p. 397). Mas um tipo tal de
de Deus no conselho divino (Jó 1.2; Zc 3). apelo para que assistentes eventuais teste
Tiago declara abertamente que Deus não munhassem uma predição que mais tar
tenta a ninguém, mas é o autor de todas de se cumprirá não é em si mesmo im
as coisas boas (1.13-17). As limitações hu provável.
manas da crença de Micaias de que Deus
inspirou homens a mentir (cf. 13.18) são f. O Ferimento em Acabe, sob Disfarce
uma prova da revelação progressiva. A vi (22.29-36)
são neotestamentária do problema do mal 29Assim o rei de Israel e Jeosafá, rei de Judá,
(Lc 13.1-5; João 9.1-3) certamente deve ser subiram a Ramote-Gileade. “ E disse o rei de Is
proferida para se chegar ao entendimento rael a Jeosafá: Eu me disfarçarei, e entrarei na
e à fé. peleja; tu, porém, veste os teus trajes reais. Dis-
farçou-se, pois, o rei de Israel, e entrou na peleja.
31Ora, o rei da Síria tinha ordenado aos capitães
e. A Profecia Falsa e a Verdadeira (22.24- dos carros, que eram trinta e dois, dizendo: Não
28) pelejeis contra pequeno nem contra grande, senão
só contra o rei de Israel. 32E sucedeu que, vendo
24Então Zedequias, filho de Quenaaná, che- os capitães dos carros a Jeosafá, disseram: Certa
gando-se, feriu a Micaias na face e disse: Por mente este é o rei de Israel. Viraram-se, pois, para
onde passou de mim o Espírito do Senhor para pelejar com ele, e Jeosafá gritou. 33Vendo os ca
falar a ti? 25Respondeu Micaias: Eis que tu o ve pitães dos carros que não era o rei de Israel, dei
rás naquele dia, quando entrares numa câmara xaram de segui-la MEntão um homem entesou o
interior, para te esconderes. 26Então disse o rei de seu arco e, atirando a esmo, feriu o rei de Israel
Israel: Tomai Micaias, e tornai a levá-lo a Amom, por entre a couraça e a armadura abdominal. Pelo
o governador da cidade, e a Joás, filho do rei. que ele disse ao seu carreteiro: Dá volta, e tira-me
27dizendo-lhes: Assim diz o rei: Metei este homem do exército, porque estou gravemente ferida 35E
no cárcere, e sustentai-o a pão e água, até que eu a peleja tornou-se renhida naquele dia; contudo o
volte em paz. “ Replicou Micaias: Se tu voltares rei foi sustentado no carro contra os sírios; porém
em paz, o Senhor não tem falado por mim. Disse à tarde ele morreu; e o sangue da ferida corria
mais: Ouvi, povos todos! para o fundo do carra 56Ao pôr do sol passou
A bofetada de Zedequias é um insulto pelo exército a palavra: Cada um para a sua cida
de, e cada um para a sua terra!
deliberado (Jó 16.10; Lm 3.30; SI 3.7; Mq
5.1; Is 50.6). Diante de dois partidos em A história da última batalha de Acabe
confrontação, somente um poderia estar não fornece o motivo de o rei disfarçar-se
possuído do Espírito do Senhor (cf. ISm para a batalha. Talvez já tivesse informa
16). Micaias oferece a Zedequias um orá ção dos planos de Bene-Hadade de concen
culo pessoal confirmatório, na forma de trar a batalha contra a pessoa do rei (v.
uma maldição (v. 25; cf. Am 7.16,17; Jr 31). Certamente estava tentando evitar o
28.15-17). O tratamento dispensado por resultado predito por Micaias, bem como
Acabe a Micaias revela que Jezabel não a destruição prevista por Elias (21.19) e
era a única fonte de perseguição. A amea pelo profeta anônimo (20.42). O fato de
ça de prisão perpétua ou talvez morte Jeosafá trajar suas vestes reais (ou as ves
está contida na declaração de Acabe até tes de Acabe, segundo a LXX), enquanto
que eu volte em paz. Mas Micaias aceita Acabe seguia disfarçado como soldado co
o teste de toda profecia verdadeira, a sa mum, deve indicar sua relutante parti
ber, de que se cumprirá (Dt 18.20-22; Jr cipação como vassalo do rei de Israel (cf.
28.9). Ouvi, povos todos! Havia ali povos 2Rs 3.11 e ss.). Quando os capitães dos
242
carros dos sírios se concentraram em Jeo- 2.6; 3.15; 6.4; Mq 6.16). Dormiu (...) com
safá, somente o seu grito de pavor o sal seus pais em outras partes significa mor
vou do destino de Acabe. Mediante inter reu pacificamente, mas aqui refere-se ape
venção divina a fraude de Acabe fracassa, nas a sepultamento no túmulo da família.
e ele é mortalmente ferido por uma flecha.
Heroicamente Acabe permaneceu com 2. O Reinado de Jeosafá em Judá (22.41-
suas tropas por todo o dia, enquanto seu -50)
sangue se esvaía ali na carruagem. Ao 41Ora, Jeosafá, filho de Asa, começou a reinar
pôr-do-sol, aproximadamente na hora em sobre Judá no quarto ano de Acabe, rei de Israel.
que ele morreu, espalhou-se por todo o 42Era Jeosafá da idade de trinta e cinco anos
exército a ordem de suspender o ataque quando começou a reinar, e reinou vinte e cin
(cf. 22.17). co anos em Jerusalém. Era o nome de sua mãe
Azuba, filha de Sili. 43E andou em todos os cami
nhos de seu pai Asa; não se desviou deles, mas
g. A Morte de Acabe (22.37-40) fez o que era reto aos olhos do Senhor. Todavia
os altos não foram tirados e o povo ainda sacrifi
37Morreu, pois o rei, e o levaram para Samá- cava e queimava incenso nos altos. 44E Jeosafá te
ria, e ali o sepultaram. 3SE lavaram o seu carro ve paz com o rei de Israel. 45Quanto ao restante
junto ao tanque de Samária, e os cães lamberam- dos atos de Jeosafá, e ao poder que mostrou, e
-lhe o sangue, conforme a palavra que o Senhor como guerreou, porventura não estão escritos no
tinha dito; ora, as prostitutas se banhavam ali. livro das crônicas dos reis de Judá? "“Também
39Quanto ao restante dos atos de Acabe, e a tudo expulsou da terra o restante dos sodomitas, que
quanto fez, e à casa de marfim que construiu, e ficaram nos dias de seu pai Asa. 47Nesse tempo
a todas as cidades que edificou, porventura não não havia rei em Edom; um vice-rei governava. ^E
estão escritos no livro das crônicas dos reis de Jeosafá construiu navios de Társis para irem a
Israel? 40Assim dormiu Acabe com seus pais. E Ofir em busca de ouro; porém não foram, porque
Acazias, seu filho, reinou em seu lugar. os navios se quebraram em Eziom-Geber. 49Então
Acazias, filho de Acabe, disse a Jeosafá: Vão os
Jizreel estaria mais próxima do que meus servos com os teus servos nos navios. Jeo
Samária, mas o rei provavelmente foi leva safá, porém, não quis. 50Depois Jeosafá dormiu
com seus pais, e foi sepultado junto a eles na ci
do ao local de sepultamento de Onri em dade de Davi, seu pai. E em seu lugar reinou seu
Samária. O sumário do historiador consi filho Jeorãa
dera os acontecimentos junto ao açude de
Samária como um cumprimento aproxi Ao tempo da monarquia dividida, o
mado da predição de Elias (21.19), embora historiador de Reis parece mais interessado
já teria havido justiça caso esse aconteci nos reis e profetas de Israel, enquanto
mento tivesse ocorrido em Jizreel, onde, Crônicas se concentra em Judá (por exem
mais tarde, seu filho Jorão morreu (2Rs plo, veja o relato do reino de Jeosafá, 2Cr
9.26). A referência a que prostitutas se 17-20).
banhavam ali não fora mencionada na Continuando a estabilidade de governo
predição de Elias. Isso implica uma profa conseguida pelo longo reinado de Asa, seu
nação do sangue do rei. O tanque de Sa pai, Jeosafá reinou por 25 anos. Também,
mária pode ser arqueologicamente identi à semelhança de seu pai antes dele, conse
ficável, juntamente com a casa de marfim, guiu uma reforma religiosa limitada (cf. v.
um magnífico palácio, cheio de móveis 46), e a aprovação básica do historiador.
com incrustações de marfim e de outras Sua aliança com Acabe não é condenada
peças decorativas fenícias (Wright, p. 153, aqui (mas cf. 2Cr 19.1-3), contudo certa
154; Heaton, p. 79,88). No século seguinte mente causou transtornos mais tarde por
tanto a arquitetura de Samária estabeleceu causa do comportamento de Atalia, nos
um padrão para abastados israelitas do moldes do de Jezabel.
norte, quanto o fizeram os atos de injus Jeosafá foi militarmente um rei forte.
tiça social como aquele perpetrado contra Ele lutou em aliança não só com Acabe,
Nabote, pelo qual adquiriu-se riqueza (Am mas também com Jorão contra nações vi-
243
zinhas (2Rs 3). Tinha evidentemente resta Baal, e o adorou, provocando à ira do Senhor
belecido controle sobre Edom, uma vez Deus de Israel, conforme tudo quanto seu pai
fizera.
que tentou restabelecer o comércio marí
timo de Salomão a partir de Eziom-Geber. A fórmula de linguagem com que o
Contudo, não teve êxito devido a um desa historiador introduz o breve reinado do
fortunado acidente com os navios no porto primeiro filho de Acabe está separada da
(cf. 9.26 e ss.). Ele recusou uma oferta de fórmula de conclusão (2Rs 1.17,18) por um
Acazias de Israel para uma segunda tenta incidente no ministério de Elias. É um
tiva, agora em parceria. padrão semelhante ao tratamento dado a
Acabe (16.29-34), e o julgamento religioso
3. O Começo do Remado de Acazias em contra ele é o mesmo.
Israel (22.51-53) Como se observou na Introdução, as
51Ora, Acazias, filho de Acabe, começou a Bíblias grega e vernácula fazem uma divi
reinar em Samária no ano dezessete de Jeosafá, são arbitrária neste ponto entre 1 e 2Reis.
rei de Judá, e reinou dois anos sobre Israel. 52E Contudo, a revolta profética contra o
fez o que era mau aos olhos do Senhor; porque
andou no caminho de seu pai, como também no baalismo fenício tinha já tido um início
caminho de sua mãe, e no caminho de Jeroboão, significativo com Elias, Micaías e seus
filho de Nebate, que fez Israel pecar. 53Serviu a anônimos profetas contemporâneos.
244
uma infinidade de falsas opções à revelação A Ocasião e o Anúncio da Palavra de
bíblica. Julgamento de Elias (v. 2-4). As casas eram
freqüentemente construídas com um ante
1) Nota Histórica Ilustrando o Tema do paro ao redor da cobertura, sendo o con
Juízo (1.1) junto todo conhecido como quarto alto.
'Depois da morte de Acabe, Moabe se rebelou Aparentemente a grade, isto é, o anteparo,
contra Israel. era aberta de modo a permitir a livre circu
lação de brisa, mas era construída de tal
forma a impedir que se visse seu interior.
O versículo 1 introduz 2Reis de um modo Há menção no Antigo Testamento desse
tão abrupto que não se harmoniza com a tipo de construção no alto das casas
condição de ser um livro à parte no cânon (Ne 3.31; Jr 22.14), e mesmo em cima dos
vernáculo. Isso talvez se explique em parte portões de uma cidade (2Sm 18.33).
pela sugestão de que 1 e 2Reis são na reali
Em vez de consultar a vontade de Iavé,
dade um só livro.
mediante meios normativos, Acazias enviou
A observação de que Moabe se rebelou
mensageiros (malek, a mesma palavra para
contra Israel após a morte de Acabe anjo como em o anjo do Senhor) para
relaciona-se sem dúvida com o relato mais
inquirir Baal-Zebube quanto à possibilidade
completo da rebelião de Moabe, sob a lide
rança de Messa, relato que aparece em 3.4 de sua recuperação. Perguntar é um verbo
(darash, buscar, recorrer a) empregado
e ss. e que também se encaixa muito bem
exclusivamente para designar a ação de ir
no contexto de IReis 22.1 e ss. A despeito
a um lugar com objetivo religioso (Am 5.5;
da tênue relação que o versículo mantém
Dt 12.5), consultar a Iavé (Gn 25.22; Ex
com este texto, o redator deliberadamente
18.15; ISm 9.9), ou consultar um deus ou
deixou ou inseriu o versículo neste ponto
necromante pagão (Ez 14.10; ISm 28.7).
como um comentário adequado sobre a infi
delidade de Acazias. Pode também ser utilizado para buscar a
Deus mediante oração e culto (Dt 4.29; Os
10.12). A palavra tornou-se um termo
2) Uma Narrativa de Juízo Sobre a Infi técnico para indicar a busca da revelação
delidade de Acazias ao Buscar Revelação divina.
em Baal (1.2-16) Baal-Zebube significa Senhor das mos
Procurando saber se iria se restabelecer cas, mas é altamente questionável que
do grave ferimento, Acazias procurou o se deva traduzir o texto como mosca ou que
Zebube seja uma palavra do texto original.
conselho de Baal-Zebube. Elias condena isso
Contudo, o texto grego de Reis aceitou a
e anuncia o destino de Acazias por ter-se
desviado da religião normativa de Israel palavra hebraica zebub, e intérpretes têm
num tal tempo de crise. Quando as forças sugerido que Baal-Zebube era um deus que
armadas do rei tentam prender Elias, são protegia contra pragas provocadas por
consumidas. moscas; daí a expressão Senhor das moscas
(muian theon na LXX).
2Ora, Acazias caiu pela grade do seu quarto A semelhança entre zebul e Baal se vê
alto em Samária, e adoeceu; e enviou mensageiros,
dizendo-lhes: Ide, e perguntai a Baal-Zebube, deus
na literatura de Ras Shamra na forma de
de Ecrom, se sararei desta doença. 30 anjo do Zbl-b’l, Príncipe Baal. Contudo, Baal-
Senhor, porém, disse a Elias, o tisbita: Levanta-te, Zebube era uma deidade mais cósmica do
sobe para te encontrares com os mensageiros do que local. Ele era o principal “concorrente”
rei de Samária, e dize-lhes: Porventura não há Deus de Iavé nos tempos de Elias e Eliseu
em Israel, para irdes consultar a Baal-Zebube, deus
de Ecrom? 4Agora, pois, assim diz o Senhor: Da (cf. IReis 18.20 e ss.).
cama a que subiste não descerás, mas certamente Melhores textos do Novo Testamento,
morrerás. E Elias se foi. inclusive os papiros Chester Beatty, refe
245
rem-se a Beelzebul em vez de a Beelzebu- tura não há Deus em Israel, para que mandes
be (cf. texto grego de Mt 10.25; 12.24; consultar a Baal-Zebube, deus de Ecrom? Portanto,
Mc 3.22; Lc 11.15 e ss.; cf. RC Beelzebu). da cama a que subiste não descerás, mas certa
mente morrerás. 7Pelo que ele lhes indagou:
Admitindo-se que o texto originalmente Qual era a aparência do homem que subiu
rezasse Baalzebul, a alteração para Baal- ao vosso encontro e vos falou estas palavras?
-Zebube foi aparentemente um trocadilho 8Responderam-lhe eles: Era um homem vestido
intencional e significativo que ridiculari de pêlos, e com os lombos cingidos dum cinto de
couro. Então disse ele: É Elias, o tisbita.
zava o Príncipe Baal como o Senhor das
Moscas.
É impossível ser mais específico quanto A recepção à palavra de julgamento de
à natureza do anjo do Senhor do que Elias (v. 5-8). Tisbita é um adjetivo que pres
supõe uma região ou uma vila denominada
sugerir que Elias ficou tão impressionado
Tisbi. Conquanto tenham-se feito tentativas
com o caráter dinâmico e pessoal da pa
de identificar Tisbi com Listibe, na Trans-
lavra que veio a ele da parte do Senhor
que falou dela em termos individuais. jordânia, não há indícios de uma ocupação
Pbuquíssimas pessoas hoje em dia insisti daquele local antes de épocas bizantinas,
riam no conceito literal de seres físicos que e não se tem conseguido descobrir qualquer
local com o nome de Tisbi. Cohen associa
viajam do céu para a terra e para lá re
tisbita com toshab, uma palavra usada para
tornam. Nem auxilia muito sugerir que o
designar forasteiros que obtiveram direitos
anjo do Senhor talvez tenha sido uma
pessoa profética, uma extensão da re de residência permanente. Ele argumenta
velação do Senhor em forma humana. ainda que Elias pode muito bem ter sido
O mais provável é que o conceito de anjo de origem recabita, uma pressuposição que
se harmoniza com o apego dos recabitas
do Senhor foi um meio muito significativo,
às tradições do deserto (uma das quais segu
mas não literal, de falar da presença de
ramente deve ter sido a extrema fidelidade
Deus — uma presença que as pessoas na
antigüidade provavelmente concebiam de a Iavé, Deus do Sinai). Uma herança reca
uma forma literal, física, como algumas bita se ajustaria bem a aspectos da vida e
pessoas ainda o fazem, mas uma compre caráter de Elias, e, considerando-se tudo
isso, a tese de Cohen é mais promissora do
ensão que não é obrigatória para o leitor
que situar uma Tisbi a leste do Jordão (cf.
contemporâneo nem um requisito para IDB).
uma apropriada apreensão da realidade
da presença de Deus para Elias. O texto hebraico somente sugere que
Elias era um bafai se‘ar; um possuidor,
A verdade da experiência é a mesma,
a despeito da explicação que se dê acerca proprietário, (ba‘al, senhor) de cabelo. Ca
do anjo do Senhor. Elias veio a apreender belo (se‘ar) pode referir-se ao de animais
como matéria-prima (Gn 25.25; Zc 13.4),
de modo inequívoco, pessoal e dinâmico
mas freqüentemente é usado para designar
a vontade de Deus a respeito da ida de
Acazias após Baal-Zebube. Com base numa cabelo humano (Jz 16.22; 2Sm 14.26), e
convicção legítima e divina, o profeta emitiu especialmente o cabelo longo de uma
sua palavra de julgamento. Como conse mulher (Ez 16.7; Ct 4.1; 6.5). Zacarias falou
de profetas que “se vestirão de manto de
qüência de uma infidelidade que está
implícita, conquanto não declarada, no pêlos” (Zc 13.4), e a veste de João Batista
era provavelmente uma imitação da de Elias
texto do julgamento, Acazias irá morrer.
(Mt 3.4). Conquanto a IBB provavelmente
esteja certa em sua versão “vestido de pêlos”,
sOs mensageiros voltaram para Acazias, que pode-se apresentar um argumento igual
lhes perguntou: Que há, que voltastes? ‘Res
ponderam-lhe eles: Um homem subiu! ao nosso mente forte defendendo a idéia de que Elias
encontro, e nos disse: Ide, voltai para o rei que vos tinha cabelos longos, muito semelhante ao
mandou, e dizei-lhe: Assim diz o Senhor: Porven dos nazireus, embora não se saiba que ele
246
tivesse assumido votos de nazireu (um dos narrativas de Eliseu. Essa narrativa e
quais proibia cortar o cabelo). aquelas associadas a Eliseu provavelmente
nos vieram pelas mãos dos filhos dos
9Então o rei lhe enviou um chefe de cinqüenta, profetas, os quais conservavam cuidadosa
com os seus cinqüenta. Este subiu a ter com Elias,
que estava sentado no cume do monte, e disse-lhe:
mente lembranças dos atos de Elias e Eliseu.
Ó homem de Deus, o rei diz: Desce. 10Mas Elias No processo de transmissão oral parece
respondeu ao chefe de cinqüenta, dizendo-lhe: provável que profetas sucessivos transfor
Se eu, pois, sou homem de Deus, desça fogo do maram o núcleo histórico original de vários
céu, e te consuma a ti e aos teus cinqüenta. Então relatos mediante o acréscimo de materiais
desceu fogo do céu, e consumiu a ele e aos seus
cinqüenta. nTornou o rei a enviar-lhe outro chefe um tanto quanto parecidos, em seu caráter,
de cinqüenta com os seus cinqüenta. Este lhe falou com relatos associados aos santos de certos
dizendo: O homem de Deus, assim diz o rei: Desce períodos da história cristã.
depressa. l2Também a este respondeu Elias: Se eu Um elemento de progressão que delibe
sou homem de Deus, desça fogo do céu, e te
consuma a ti e aos teus cinqüenta. Então o fogo radamente acentua a tensão do relato
de Deus desceu do céu, e consumiu a ele e aos seus emerge em vários aspectos da narrativa
cinqüenta. 13Ainda tornou o rei a enviar terceira como um todo. Por exemplo, a ordem do
vez um chefe de cinqüenta com os seus cinqüenta. primeiro capitão, Ó homem de Deus, o
E o terceiro chefe de cinqüenta, subindo, veio e
pôs-se de joelhos diante de Elias, e suplicou-lhe, rei diz: Desce, dá lugar à mais severa
dizendo: O homem de Deus, peço-te que seja ordem, Ó homem de Deus, assim diz o
preciosa aos teus olhos a minha vida, e a vida rei: (ko’amar, uma expressão retirada da
destes cinqüenta teus servos. l4Eis que desceu terminologia profética, e, de fato, usada
fogo do céu, e consumiu aqueles dois primeiros
chefes de cinqüenta, com os seus cinqüenta; agora,
anteriormente por Elias) Desce depressa.
porém, seja preciosa aos teus olhos a minha vida. Novamente, na primeira ocasião um fogo
15Então o anjo do Senhor disse a Elias: Desce vindo do céu destruiu o capitão e seu grupo,
com este; não tenhas medo dele. Levantou-se, pois, mas na segunda ocasião foi fogo de Deus
e desceu com de ao rei. 16E disse-lhe: Assim diz o que desceu do céu. O propósito dessa
Senhor: Por que enviaste mensageiros a consultar
a Baal-Zebube, deus de Ecrom? Porventura é elevação intencional de tensão dentro da
porque não há Deus em Israel, para consultares narrativa é servir de arcabouço em que a
a sua palavra? Portanto, desta cama a que subiste palavra do terceiro capitão toma a forma
não descerás, mas certamente morrerás. de súplica.
A narrativa ilustra a divina proteção do
A Reação à Palavra de Julgamento de profeta e o fato de que só voluntariamente
Elias (v. 9-16). A intenção do rei não é sua vida pode ser entregue ao rei. Tal relato
declarada: pode-se apenas subentender indubitavelmente foi empregado para
que a vida de Elias corria perigo, e bem exaltar a magnitude de Elias entre os discí
pode ser que o rei buscasse somente ouvir pulos dos profetas e outros crentes. Nem
a palavra de julgamento diretamente da mesmo um rei e seu exército poderiam ditar
boca do profeta. Ou, o destino daqueles ordens ao profeta Elias.
que buscavam prejudicar o profeta talvez Bem poucas pessoas defenderiam a vali
tenha tido um efeito salutar sobre o rei. dade ética de clamar por fogo do céu sobre
É claro, todavia, que, uma vez que Elias grupos de cinqüenta como ocorre na narra
se dirigiu ao rei, sua vida não corria perigo, tiva considerada. O Novo Testamento
e o profeta meramente repetiu a palavra de certamente repudia uma proposta compa
julgamento anteriormente dada. rável da parte de Tiago e João — a qual
A narrativa tem grande afinidade com reflete o tema da passagem de 2Reis
o espírito das narrativas de Eliseu, e é talvez (Lc 9.54 e ss.; Lv 10.2; Ap 11.5).
por esta razão que, quando Reis foi divi A palavra de julgamento (1.3 e ss., 6 e
dido em dois livros (uma divisão artificial), ss., 16 e ss.) sem dúvida tornou-se um ideal
essa narrativa foi colocada junto com as para inúmeros membros das escolas profé
247
ticas bem como para profetas posteriores. rei. E assim desceram a Betei. 3Então os filhos
Elias tornou-se o padrão de excelência dos profetas que estavam em Betei saíram ao
entre os profetas, da mesma forma Moisés encontro de Eliseu, e lhe disseram: Sabes que o
Senhor hoje tomará o teu senhor por sobre a tua
o foi em relação à lei, Davi em relação aos cabeça? E ele disse: Sim, eu o sei; calai-vos.
salmos e Salomão em relação à literatura 4E Elias lhe disse: Eliseu, fica-te aqui, porque o
de sabedoria. Ele enfrentou o rei em seu Senhor me envia a Jericó. Ele, porém, disse: Vive
próprio terreno, declarou a palavra de o Senhor, e vive a tua alma, que não te deixarei.
E assim vieram a Jericó. 5Então os filhos dos
Deus e descansou confiadamente numa profetas que estavam em Jericó se chegaram a
proteção que surgiu não de si mesmo. Eliseu, e lhe disseram: Sabes que o Senhor hoje
tomará o teu senhor por sobre a tua cabeça? E ele
disse: Sim, eu o sei; calai-vos. 6E Elias lhe disse:
3) A Avaliação Deuteronômica de Acazias Fica-te aqui, porque o Senhor me envia ao Jordão.
(1.17,18) Mas ele disse: Vive o Senhor, e vive a tua alma,
que não te deixarei. E assim ambos foram juntos.
17Assim, pois, morreu conforme a palavra do 7E foram cinqüenta homens dentre os filhos dos
Senhor que Elias falara. E Jorão começou a reinar profetas, e pararam defronte deles, de longe; e eles
em seu lugar no ano segundo de Jeorão, filho de dois pararam junto ao Jordão. 8Então Elias
Jeosafá, rei de Judá; porquanto Acazias não tinha tomou a sua capa e, dobrando-a, feriu as águas,
filha 18Ora, o restante dos feitos de Acazias, as quais se dividiram de uma à outra banda; e
porventura não está escrito no livro das crônicas passaram ambos a pé enxuta
dos reis de Israel?
Geograficamente os versículos 1.8
O sumário de conclusão do reinado de voltam sua atenção para os três centros
Acazias confirma a morte do rei como associados com as escolas dos profetas:
conseqüência da palavra do Senhor que Gilgal (conquanto essa seja a Gilgal a
Elias falara. Nenhum outro comentário norte de Betei, não no vale do Jordão),
moral ou religioso é necessário, uma vez Betei e Jericó.
que já se abordou suficientemente essa Nas três cenas sucessivas Elias procura
questão anteriormente neste capítulo. dissuadir Eliseu de segui-lo, sugerindo que
Acima de tudo, porém, é desnecessária ele está indo somente até Betei, Jericó ou
uma análise mais aprofundada uma vez o Jordão. Em cada caso, porém, Eliseu
que uma avaliação deuteronômica com declara sua determinação de acompanhar
pleta de Acazias aparece na conclusão de o profeta Elias, utilizando uma frase que
IReis. provavelmente era uma expressão comum
na cultura da época, Vive o Senhor e vive
2. Eliseu, Sucessor de Elias: a Translada a tua alma, que não te deixarei. Essa repe
ção de Elias (2.1-25) tição tríplice sugere um esforço deliberado
O problema da sucessão de um profeta da parte do editor em sugerir a fidelidade
tão preeminente como Elias na era ante de Eliseu a Elias, caracterizando-o no de
rior à profecia clássica (séculos oitavo e senrolar dos acontecimentos como um
sétimo) preocupava não só o profeta envol seguidor fiel, adequado para ser sucessor
vido, mas igualmente as escolas dos profe do profeta Elias. Suceder alguém depende
tas (cf. 2.3,5,7). da fidelidade às responsabilidades recebi
das no ministério.
1) A Escolha e Teste do Sucessor de Elias O redemoinho é freqüentemente asso
( 2 . 1-8 )
ciado à vinda de Iavé (cf. Is 29.6; Ez 1.4;
13.11,13; Zc 9.14; SI 107.25; 148.8; Jó 38.1;
'Quando o Senhor estava para tomar Elias ao 40.6). A palavra aparece como sujeito em
céu num redemoinhoi, Elias partiu de Gilgal com Isaías 40.24; 41.16; Jeremias 23.19; 30-23;
Eliseu. 2Disse Elias a Eliseu: Fica-te aqui, porque
o Senhor me envia a Betei. Eliseu, porém, disse: e como objeto em Salmo 107.29. Snaith
Vive o Senhor, e vive a tua alma, que não te deixa observa que somente no Salmo 107.25
248
Searah é empregada para designar uma fará; porém, se não, não se fará. UE, indo eles
tempestade comum. caminhando e conversando, eis que um carro de
fogo, com cavalos de fogo, os separou um do outro;
A frase filhos dos profetas refere-se aos e Elias subiu ao céu num redemoinha ,20 que
homens associados numa corporação ou vendo Eliseu, clamou: Meu pai, meu pai! o carro
irmandade. Viviam uma vida comunitá de Israel, e seus cavaleiros! E não o viu mais.
ria, conquanto não fossem celibatários.
Em sua estrutura aparentemente tinham Esse capítulo demonstra desconheci
um líder comum que levava o título de pai. mento da escolha prévia de Eliseu como
Eles eram dados a êxtases e eram suscetí sucessor de Elias (cf. lRs 19.19 e ss.), e
veis a atos frenéticos, que freqüentemente pode-se corretamente concluir que as duas
levavam alguns a encará-los com descon tradições existiam independentemente
fiança devido à sua conduta (cf. ISm 10.9 uma da outra durante o curso de seu
e ss.; conquanto esses elementos extáticos desenvolvimento antes da incorporação
não fossem chamados especificamente de nos atuais livros de Reis. O pedido que
filhos dos profetas, eles com toda probabi Eliseu fez, de uma dobrada porção do teu
lidade eram seus progenitores espirituais). espírito, não reflete a ambição de um discí
Embora Eliseu esteja intimamente asso pulo que deseja superar seu mestre. Ele se
ciado com eles, Elias aparece como um baseia na lei deuteronômica que concedia
solitário que não está cercado por tais ao filho mais velho uma porção dobrada
pessoas.
dos bens de seu pai (cf. Dt 21.17). Eliseu
Enquanto cinqüenta homens dos filhos pede que seja reconhecido como herdeiro
dos profetas permaneciam à distância de Elias, herdado o papel tradicionalmente
observando, Elias dividiu as águas do associado com o primogênito.
Jordão golpeando-as com seu manto. Um exame do emprego pelo Antigo
Os paralelos são tão claros que é virtual Testamento da palavra espírito (ruach)
mente impossível ler essa passagem sem
revela que uma conotação bem comum é
lembrar tanto a travessia do Mar Verme a de energia vital. O espírito equipava
lho quanto a do Jordão. Há, de fato, sucessivas gerações com poder, sabedoria,
muitos paralelos entre Moisés e Elias, e coragem, força e talento. Assim, Eliseu
R. P Carroll não somente propôs que buscou o poder energizante que caracte
Moisés foi o protótipo do ofício profético rizou o ministério de Elias, e um propósito
(como Deuteronômio sugere, Dt 18.15-18), das inúmeras histórias miraculosas asso
mas sugeriu a grande possibilidade da exis ciadas a Eliseu é a confirmação daquela
tência de uma linha de sucessão que transferência de poder.
inclui Elias.1 Segundo Carroll, Elias se A promessa de sucessão profética
compara a Moisés especialmente como um repousa nesse potencial de discernir os
exemplo do “profeta mosaico proclamando poderes ocultos de Deus em operação no
a palavra de Iavé ao povo e servindo de mundo, a necessária visão interior para
medidor da aliança entre Iavé e seu povo”. perceber a presença de Deus, que muitos,
conquanto tendo olhos, nunca vêem. Se
2) A Promessa de Sucessão (2.9-12a) me vires quando for tomado de ti, assim
’Havendo eles passado, Elias disse a Eliseu: se te fará.
Pede-me o que queres que eu te faça, antes que seja Mais tarde, ao Elias subir num rede
tomado de ti. E disse Eliseu: Peço-te que haja moinho, Eliseu chamou: Meu pai, meu
sobre mim dobrada porção de teu espírito.
I0Respondeu Elias: Coisa difícil pediste. Todavia, pai, o carro de Israel, e seus cavaleiros!
se me vires quando for tomado de ti, assim se te Essa frase provavelmente teve origem no
ciclo de Eliseu e é empregada em 6.17 e
1R. P CarroU, “T he Elijah-Elisha Sagas: Some Rem arks o n Prophetic
Succession in A n c ia it Israel”, Vetus Ifestamentum, X IX , n.° 4, p.
13.14. Teofanias de fogo eram freqüente
409 e ss. mente associadas ao aparecimento de Iavé,
249
e o fenômeno de tempestade provavelmente apresentar uma reivindicação legítima à
é o pano de fundo para a expressão “carros sucessão. Quando não há poder, igualmen
de fogo” (6.17). Pbr seu turno, a frase em te não há função profética.
pauta, carro de Israel, e seus cavaleiros, O rasgar as vestes era expressão comum
provavelmente tornou-se uma forma de de pesar: Pegou então nas suas vestes e as
descrever o aparecimento de Iavé (cf. 6.17; rasgou em duas partes. Pode muito bem
13.14; Is 66.15). ser, contudo, que o ato de Eliseu tenha sido
O texto não diz que Elias foi levado para de ação simbólica bem semelhante àquela
o céu no carro, apesar das interpretações de Aias no rasgar a capa de Jeroboão para
populares em contrário. Ele foi levado num significar a divisão do reino (lRs 11.29 e
redemoinho, uma maneira de dizer que ss.), ou a ação de Saul que rasgou a capa
Deus veio buscá-lo. de Samuel, embora acidentalmente, e que
As passagens (2.10 e ss.; 6.15 e ss.) falam Samuel interpretou então como sinal de
da presença constante de poderes espiri transferência do reino de Saul para seu
tuais invisíveis, mas que são passados por sucessor (cf. ISm 15.27 e ss.). Não havendo
alto, não observados e não notados. O fato outras expressões de pesar, e em vista da
de que não é dado a todo homem perceber ação simbólica anteriormente estabelecida
o carro de Israel e seus cavaleiros deve no rasgar de uma vestimenta, provavel
encorajar todos a uma maior sensibilidade mente a ação de Eliseu em rasgar a veste
para com a sua presença e a uma crescente em duas partes simboliza que ele próprio
diligência em perceber as realidades dispo sucedeu à função de Elias.
níveis àqueles que têm olhos para ver. A pergunta onde está o Senhor, o Deus
A verdadeira percepção espiritual da reali de Elias? destina-se a testar se o poder do
dade tal qual existe é um dom raro, que Senhor foi de fato transmitido para Eliseu.
deve ser cultivado e entesourado. A divisão das águas, imitativa de um ato
anterior de Elias, confirma o fato de que
3) Eliseu Confirmado Como Sucessor de o poder do Senhor é, verdadeiramente,
Elias <2.12b-25) mediado agora por Eliseu, que ele é o ver
dadeiro sucessor de Elias.
Três áreas específicas de atividade con
firmaram a sucessão de Eliseu para o 15Vendo-o, pois, os filhos dos profetas que
papel de Elias: (1) ferir a água pelo poder estavam defronte dele em Jericô, disseram: O espí
herdado de Elias (v. 12b-14), (2) a impossi rito de Elias repousa sobre Eliseu. E vindo ao seu
bilidade de encontrar Elias ou seu corpo, encontro, inclinaram-se em terra diante dele.
16E disseram-lhe: Eis que entre os teus servos há
confirmando portanto sua trasladação cinqüenta homens valentes. Deixa-os ir, pedimos-
(v. 15-18), e (3) a purificação das águas de -te, em busca do teu senhor; pode ser que o Espíri
Jericó (v. 19-22). to do Senhor o tenha arrebatado e lançado nalgum
monte, ou nalgum vale. Ele, porém, disse: Não os
Pegou então nas suas vestes e as rasgou em envieis. 17Mas insistiram com ele, até que se en
duas partes; 13tomou a capa de Elias, que dele vergonhou; e disse-lhes: Enviai. E enviaram
caíra, voltou e parou à beira do Jordão. 14Então, cinqüenta homens, que o buscaram três dias,
pegando da capa de Elias, que dele caíra, feriu as porém não o acharam. 18Então voltaram para
águas e disse: Onde está o Senhor, o Deus de Eliseu, que ficara em Jericó; e ele lhes disse:
Elias? Quando feriu as águas, estas se dividiram Não vos disse eu que não fôsseis?
de uma à outra banda, e Eliseu passou.
A Busca por Elias e a Confirmação de
O Poder de Iavé é Mediado por Eliseu sua Trasladação (v. 15-18). A crença de que
(v. 12b-14). A característica que continua Elias havia sofrido um acidente ou sido
mente confirma alguém no ofício profético transportado de outra maneira é normal.
é o poder de Iavé mediado por esse ofício. O redemoinho bem pode ter sido um
Profetas sem poder dificilmente podem “pé-de-vento, que poderia acompanhar o
250
siroco (uma tempestade de vento quente meninos que zombavam do profeta são
do deserto) a leste do Jordão. O fogo as primeiras de numerosas maravilhas que
sugere o siroco, e o visível avanço de uma caracterizam de modo único a vida de
tempestade de poeira que acompanhava o Eliseu. A vida de nenhuma outra pessoa
siroco poderia ser comparada a cavalos e no Antigo Testamento é acompanhada de
carros” (John Gray, p. 425). Especifica tal variedade de atos singulares. Não há
mente, os cinqüenta sugerem que o Espíri dúvida de que por detrás desses atos haja
to do Senhor pode tê-lo arrebatado e feitos históricos realizados pelos profetas.
lançado nalgum monte, ou nalgum dos Mas também é certo que tais feitos sofre
vales. Isto é, Elias pode ter sido possuído ram expansão literária pelos filhos dos
pelo Espírito e em tal estado de êxtase, ou profetas. Com as narrativas sobre Eliseu
transe, pode ter caído de algum despenha entra-se num mundo à parte da grande
deiro. maioria dos textos do Antigo Testamento
Como A Bíblia de Jerusalém sugere, e totalmente distinto dos grandes profetas
“A busca infrutífera certifica apenas que da era clássica tais como Amós, Oséias,
Elias não é mais deste mundo; seu destino Isaías ou Miquéias. Contudo, os relatos
é um mistério que Eliseu não quis des ainda apresentam um testemunho positi
vendar. O texto não diz que Elias não vo, pois testificam não só acerca do reco
morreu, mas facilmente se pôde chegar a nhecimento, dentro das escolas dos profe
essa conclusão”. Com base nessa tradição, tas, da sucessão de Elias, mas também
porém, Elias foi, juntamente com Enoque, testificam da estima e consideração com
tido como havendo sido trasladado para que Eliseu foi tido por gerações posterio
estar com Deus. Dali esperava-se que ele res. Assim, o valor das narrativas repousa
voltasse (cf. Ml 3.23; 4.5), e o Novo Testa não tanto na historicidade de aconteci
mento coloca Moisés e Elias juntos na mentos isolados, mas no testemunho que
transfiguração (Mt 17.3 e ss.), uma relação dão quanto ao julgamento que gerações
que não deve surpreender, caso se faça um posteriores fizeram da vida de Eliseu.
exame dos muitos paralelos entre as duas
personagens dentro do Antigo Testamento. A purificação das águas de Jericó faz
lembrar a ação de Moisés em purificar as
’’Os homens da cidade disseram a Eliseu: águas de Mara (cf. Ex 15.12 e ss.). Mas
Eis que a situação desta cidade é agradável, como Gray sugere que o uso de sal e um uten
vê o meu senhor; porém as águas são péssimas,
e a terra é estéril. 20E ele disse: Trazei-me um sílio novo indicam um rito de separação.
jarro novo, e ponde nele sal. E lho trouxeram. Jericó havia estado sob interdito desde sua
21Então saiu ele ao manancial das águas e, destruição durante a conquista, e o ato de
deitando sal nele, disse: Assim diz o Senhor: Sarei Eliseu, segundo Gray, é um reflexo de ritos
estas águas; não mais sairá delas morte nem este anteriores pelos quais Jericó e sua fonte,
rilidade. 22E aquelas águas ficaram sãs, até o dia
de hoje, conforme a palavra que Eliseu disse. vital à cidade, deixaram a condição de in
23Então subiu dali a Betei; e, subindo ele pelo terditadas para serem normalmente ocupa
caminho, uns meninos saíram da cidade, e zom das, o “que havia sido proibido sob a san
bavam dele, dizendo: Sobe, calvo; sobe calvo! ção da maldição (Js 6.17,26)” (p. 428).
24E, virando-se ele para trás, os viu, e os amaldi
çoou em nome do Senhor. Então duas ursas Assim, a narrativa da purificação da
saíram do bosque, e despedaçaram quarenta e dois fonte por Eliseu provavelmente baseia-se
daqueles meninos. 25E dali foi para o monte num ritual mais antigo de separação, pelo
Carmelo, de onde voltou para Samária. qual Jericó ficou acessível à ocupação. A
história foi colocada num novo contexto,
Dois Acontecimentos Extraordinários recebendo um novo significado pelo reda
que Confirmam Ainda Mais Eliseu Como tor. Tomou-se um meio de confirmar Eli
Sucessor (v. 19-25). A miraculosa purifi seu como sucessor de Elias. Sua capacida
cação das águas de Jericó e a morte de 42 de de operar atos maravilhosos de purifi-
251
cação identifica-o como um homem santo, 1. A Avaliação Deuteronômica de Jorão
um homem com o poder singular de Deus (3.1-3)
operando mediante ele. Por tal ação os fi
lhos dos profetas deram provas do poder ‘Ora, Jorão, filho de Acabe, começou a reinar
que Eliseu manifestava em seu meio. sobre Israel, em Samária, no décimo oitavo ano
A morte dos 42 meninos (especifica de Jeosafá, rei de Judá, e reinou doze anos. 2Fez
mente identificados como pequenos) está o que era mau aos olhos do Senhor, porém não
como seu pai, nem como sua mãe; pois tirou a
incluida neste ponto como meio de instilar coluna de Baal que seu pai fizera. 3Contudo ade
respeito pelo sucessor de Elias. Bem pou riu aos pecados de Jeroboão, filho de Nebate,
cos intérpretes defenderiam a moralidade com que este fizera Israel pecar, e deles não se
de tal narrativa, e nenhum intérprete de apartou.
fenderia esse acontecimento como um mo
delo de ação moral ou como um reflexo do Sucessivos reis de Israel são julgados
juízo divino; é mais bem conhecida como pelo padrão deuteronômico do santuário
uma história popular que foi empregada único (cf. Dt 12.1 e ss.), e, a despeito da
para instilar respeito pelo ofício profético. medida exterior de êxito que experimen
Relatos tais como a morte dos 42 me tasse um rei israelita, nenhum rei do Nor
ninos devem, todavia, ser compreendidos te é jamais elogiado. Cada rei é condena
à luz do propósito teológico do redator, is do pelos pecados de Jeroboão, filho de
so para nada dizer das condições culturais Nebate, isto é, a chocante ofensa represen
e sociais da época. Tem de se admitir que tada pelos santuários de Dã e Betei, e es
a morte dos meninos é pré-moral, mesmo pecialmente pelos bezerros de ouro, que
segundo o padrão ético do Antigo Testa eram o correspondente nortista da arca da
mento, para nada dizer do Novo Testa aliança sulista (julgava-se que Deus havia
mento. Mas o propósito teológico do re sido entronizado sobre cada um desses
dator é de importância fundamental. Utili objetos).
zando um relato popular que sem dúvida Jorão, filho de Acabe e irmão de Aca-
circulava no nono século a.C., ele demons zias, sucedeu a Acazias no trono (Acazias
trou vividamente o respeito e admiração não tinha filho para sucedê-lo). Conquan
associados com o profeta Eliseu. A des to não inteiramente elogiado, sua conde
peito de julgamentos modernos da morali nação pelo redator deuteronômico é me
dade da história, o redator é admiravel nos severa do que a de outros reis, sendo
mente bem-sucedido em utilizar uma nar atenuada pelo fato de que sua maldade
rativa popular para ilustrar um fato real — não foi como seu pai, nem como sua mãe
a veneração do ofício profético, para nada (isto é, Acabe e Jezabel). Ademais, ele tirou
dizer de veneração do próprio Eliseu. a coluna de Baal, um objeto de culto usa
do na adoração de Baal.
II. O Estabelecimento de Eliseu no 2. A Guerra Moabita e o Conselho de
Cenário Político Nacional: Seu Con Eliseu (3.4-27)
selho Profético na Guerra Contra os
Moabitas (3.1-27) A conquista de Moabe por Onri e a
subseqüente rebelião contra os onritas,
Tendo demonstrado como Eliseu se esta que foi comandada por Messa, rei de Mo
beleceu como o legítimo sucessor de Elias abe, é plenamente documentada num dos
dentro dos círculos proféticos, o redator de melhores paralelos literários palestinos ao
2Reis agora emprega o conselho de Eliseu Antigo Testamento. Segue-se um breve
na guerra moabita como forma de ilustrar excerto: “Quanto a Onri, rei de Israel, ele
o surgimento do profeta no cenário polí humilhou a Moabe por muitos anos (lit.,
tico nacional. dias), pois Quemós estava irado em sua
252
terra. Seu filho o seguiu e assim falou. 3) O Conselho Profético e sua Confirma
Mas eu triunfei sobre ele e sobre sua casa, ção (3.13-20)
enquanto Israel pereceu para sempre!” 13Eliseu disse ao rei de Israel: Que tenho eu
(“The Moabite Stone”, A N E T , II, 5 e ss.). contigo? Vai ter com os profetas de teu pai, e com
os profetas de tua mãe. O rei de Israel, porém,
lhe disse: Não; porque o Senhor chamou estes
1) A Coalizão Entre Israel e Judá (3.4-8) três reis para entregá-los nas mãos dos moabitas.
‘'Ora, Messa, rei dos moabitas, era criador de 14Respondeu Eliseu: Vivç o Senhor dos exércitos,
ovelhas, e pagava de tributo ao rei de Israel cem em cuja presença estou, que se eu não respeitasse
mil cordeiros, e cem mil carneiros com a sua lã. a presença de Jeosafá, rei de Judá, não te contem
sSucedeu, porém, que, morrendo Acabe, o rei dos plaria, nem te veria. 15Agora, contudo, trazei-me
moabitas se rebelou contra o rei de Israel. 6Por um harpista. E sucedeu que, enquanto o harpista
isso, nesse mesmo tempo Jorão saiu de Samária tocava, veio a mão do Senhor sobre Eliseu. 16E ele
e fez revista de todo o Israel. 7E, pondo-se em disse: Assim diz o Senhor: Fazei neste vale muitos
marcha, mandou dizer a Jeosafá, rei de Judá: O poços. I7Porque assim diz o Senhor: Não vereis
rei dos moabitas rebelou-se contra mim; irás tu vento, nem vereis chuva; contudo este vale se en
comigo à guerra contra os moabitas? Respondeu cherá de água, e bebereis vós, os vossos servos e
ele: Irei; como tu és sou eu, o meu povo como o os vossos animais. 18E ainda isso é pouco aos
teu povo, e os meus cavalos como os teus cavalos. olhos do Senhor; também entregará ele os moa
8E perguntou: Por que caminho subiremos? Res- bitas nas vossas mãos, we ferireis todas as cida
pondeu-lhe Jorão: Pelo caminho do deserto de des fortes e todas as cidades escolhidas, cortareis
Edom. todas as boas árvores, tapareis todas as fontes
d’água, e cobrireis de pedras todos os bons cam
Por ter Messa fortificado os acessos a pos. 20E sucedeu que, pela manhã, à hora de se
Moabe pelo norte, Jorão necessitou da oferecer o sacrifício, eis que vinham as águas pelo
caminho de Edom, e a terra se encheu d’âgua.
cooperação de Judá e Edom a fim de ata
car pelo sul. A rebelião bem pode ter co Uma vez que Acabe e Jezabel haviam-
meçado durante o reinado de Acazias (cf. se cercado de profetas de Baal, Eliseu su
1.1) e prosseguido no reinado de Jorão, gere que naquele momento de necessidade
pois Acazias reinou por somente dois anos. o rei devia se voltar para aqueles profetas
(v. 13). A declaração é bem semelhante à
2) O Desespero dos Aliados (3.9-12) sarcástica reprimenda por Jeremias: “Mas
onde estão os teus deuses que fizeste para
’Partiram, pois, o rei de Israel, o rei de Judá ti? Que se levantem eles, se te podem li
e o rei de Edom; e andaram rodeando durante sete
dias; e não havia água para o exército nem para
vrar no tempo da tua tribulação” (Jr 2.28
o gado que o seguia. 10Disse então o rei de Israel: e ss.). A reação de Jorão deixa claro que
Ah! o Senhor chamou estes três reis para entregá- é necessário um profeta de Iavé, conquan
-los nas mãos dos moabitas. uPerguntou, porém, to Eliseu houvesse sugerido os profetas de
Jeosafá: Não há aqui algum profeta do Senhor Baal. Jorão respondeu: “Não; porque o
por quem consultemos ao Senhor? Então respon
deu um dos servos do rei de Israel, e disse: Aqui Senhor chamou estes três reis.” A narrati
está Eliseu, filho de Safate, que deitava água sobre va é deliberada e assinaladamente sarcás
as mãos de Elias. lzDisse Jeosafá: A palavra do tica em seu ataque à associação da dinas
Senhor está com ela Então o rei de Israel, e Jeo tia de Acabe com os profetas de Baal.
safá, e o rei de Edom desceram a ter com ele.
A necessidade de um harpista antes
que Eliseu desse o oráculo (v. 15) sugere
Atravessando Edom (cf. v. 8b-9), a ex que o oráculo profético, nesse estágio do
pedição fez uma marcha ao redor. No pro desenvolvimento da profecia, talvez tenha
cesso eles aparentemente gastaram seu su sido dado durante um transe extático. Esse
primento d’água (v. 9). A referência a Eli estado de êxtase podia ser despertado ou
seu como aquele que deitava água sobre induzido pelo uso de instrumentos musi
as mãos de Elias é uma maneira de suge cais, e tal despertamento certamente esta
rir que Eliseu fora servo de Elias. Ele der va presente entre os pioneiros dentre os
ramava água quando Elias lavava as mãos. filhos dos profetas (cf. ISm 10.5 e ss.).
253
A causa dessa abundância de água em O sacrifício de crianças era mais co
Moabe (v. 20) foi uma pesada chuva em mum em Moabe do que em Israel, con
Edom, que produziu uma repentina inun quanto haja no Antigo Testamento ilus
dação bem mais acima no ribeiro. Assim, trações dessa prática (cf. Jz 11.30,31; lRs
a profecia teve cumprimento bastante pre 16.34; Mq 6.7). É provável que a cena do
ciso. Houve água em abundância sem que rei sacrificando seu filho mais velho, o fi
se visse vento ou chuva. lho que estava destinado a sucedê-lo no
trono, tocou e emocionou de tal modo os
4) O Desespero Moabita e a Retirada de
moabitas que eles caíram sobre a coalizão
Israel (3.21-27) e a derrotaram por seu ataque frenético.
21 Ouvindo, pois, todos os moabitas que os reis
tinham subido para pelejarem contra eles, convo
caram-se todos os que estavam em idade de pegar III. A Preocupação Profética com a
armas, e dai para cima, e puseram-se às frontei Necessidade Humana: Milagres por
ras. 22Levantaram-se os moabitas de madrugada
e, resplandecendo o sol sobre as águas, viram Eliseu (4.1—6.7)
diante de si as águas vermelhas como sangue; 23e
disseram: Isto é sangue; certamente os reis pele Coligidos dentro dessa seção mais am
jaram entre si e se mataram um ao outro! Agora, pla, existem pelo menos seis relatos de fa
pois, à presa, moabitas! “ Quando, porém, chega
ram ao arraial de Israel, os israelitas se levanta
tos miraculosos associados com Eliseu. No
ram, e bateram os moabitas, os quais fugiram mundo antigo essas histórias de milagres
diante deles; e ainda entraram na terra, ferindo ali eram meios não questionados de destacar
também os moabitas. 25E arrasaram as cidades; e o valor de um líder religioso. Os milagres
cada um deles lançou pedras em todos os bons associados a Eliseu podem ser convenien
campos, entulhando-os; taparam todas as fontes
d’água, e cortaram todas as boas árvores; somente temente classificados em três categorias.
a Quir-Haresete deixaram ficar as pedras; contu Primeiro, algumas das narrativas caem na
do os fundeiros a cercaram e a feriram. 26Vendo categoria de história popular ou tipo bio
o rei dos moabitas que a peleja prevalecia contra gráfico representados nas narrativas como
ele, tomou consigo setecentos homens e arranca
vam da espada, para romperem contra o rei de
as que se acham em 2.1-18,19,20,23,24;
Edom; porém não puderam. 27Então tomou a seu 4.1-7,38-41, 42-44; 6.1-7; 13.20 e ss. Tais
filho primogênito, que havia de reinar em seu lu tradições se caracterizam por uma ênfase
gar, e o ofereceu em holocausto sobre o muro, destacada quanto ao miraculoso ou extra
pelo que houve grande indignação em Israel; por ordinário, bastante comparáveis, em ou
isso retiraram-se dele, e voltaram para a sua terra.
tras culturas, a atos de magia.
A água que descia pelas colinas de Em segundo lugar, outro ciclo de mila
arenito vermelho de Edom rebrilhava ao gres se mantém em relação muito mais di
sol como sangue, e os moabitas imagina reta com a narrativa histórica, na verdade
ram que tivesse havido uma grande bata desenvolvendo-se na fronteira entre a nar
lha em que os reis adversários se haviam rativa histórica e a saga. Um núcleo histó
matado um ao outro. A palavra Edom, rico jaz no cerne de cada relato, e este se
’edom, tem bastante relação com o termo desenvolveu a partir de dentro da comuni
hebraico para vermelho (’adom, “ter cor dade profética de gerações posteriores.
vermelha ou avermelhada”). Há também Quase se aproximando da lenda e da saga,
um interessante trocadilho com a palavra esses relatos surgiram devido à veneração
sangue, dam. A declaração dos moabitas, do homem de Deus dentro dò círculo de
Isto é sangue, é um exemplo da maneira discípulos dos profetas. Dustram-no 4.8-37;
como o Antigo Testamento pode facilmen 8.1-6; 5.1 e seguintes.
te ser mal-entendido mediante uma inde Em terceiro lugar, histórias tais como
vida interpretação literal; como, por exem as de 3.4-27; 6.8-23; 6.24—7.20; 8.1-15; 9.1
plo, a sugestão de que a água literalmente e seguintes; e 13.14-19 combinam saga e
se transformou em sangue. história. Como sugere Artur Weiser, “As
254
raízes das tradições que jazem nos limites livrada da fome pela ação de Elias (lRs
entre a saga e a história remontam às tra 17.8 e ss.). O fato de que os dois filhos
dições históricas e parecem ter surgido estivessem a ponto de ser,vendidos para
somente quando narrativas históricas mais pagar dívidas da família está em plena
antigas foram combinadas com tradições concordância com práticas do Antigo Tes
dos profetas” (Weiser, p. 177). tamento (cf. Ex 21.7; Lv 25.39; Ne 5.5).
Embora a coleção de tais histórias em Assim, no contexto dos costumes sociais
torno de uma figura central tal como Eli- da época o credor estava agindo de uma
seu corresse o risco de desenvolver um maneira perfeitamente aceitável.
culto à personalidade, Walther Eichrodt A reação de Eliseu sugere que a solução
sugere que, tomadas como um todo, as da situação crítica da viúva se limitava
narrativas milagrosas preocupam-se com somente ao grau de sua fé. A quantidade
as necessidades humanas e “os relatos de de óleo recebida limitou-se somente ao nú
milagres [apresentam] o homem de Deus mero de recipientes que ela reuniu. Ade
como aquele que ajuda o povo, não como mais, o enchimento dos vasos deu-se fora
alguém que opera milagres para causar da presença de Eliseu: ela se apartou dele.
boa impressão ou como demonstração de Depois, fechada a porta sobre si e sobre
poder... Por trás do nabi’ realizador de mi seus filhos... A ação é de Deus, não de
lagres, os homens podem discernir a mão Eliseu.
do seu Deus, a qual orienta e socorre (cf. A disposição de dedicar a vida à sa
lRs 17.16 e ss., 24; 2Rs 2.13 e ss.; 7.1; 4.1 tisfação das necessidades humanas é um
e ss.)”.2 constante pré-requisito para participar da
fraternidade profética, e a medida da preo
1. A Provisão Para a Viúva do Profeta e cupação de alguém pelos outros perma
sua Família (4.1-7) nece sendo a medida do grau em que
cumpre seu chamado profético.
‘Ora, uma dentre as mulheres dos filhos dos
profetas clamou a Eliseu, dizendo: Meu marido,
teu servo, morreu; e tu sabes que o teu servo temia 2. A Bênção da Maternidade Para a Mu
ao Senhor. Agora acaba de chegar o credor para lher Sunamita (4.8-37)
levar-me os meus dois filhos para serem escravos.
2Perguntou-lhe Eliseu: Que te hei de fazer? Dize- O nascimento e revivificação do filho
-me o que tens em casa. E ela disse: Tua serva não da mulher sunamita é um duplo aconteci
tem nada em casa, senão uma botija de azeite. mento extraordinário atribuído a Eliseu.
3Disse-lhe ele: Vai, pede emprestadas vasilhas a
todos os teus vizinhos, vasilhas vazias, não poucas.
4Depois entra, e fecha a porta sobre ti e sobre 1) O Nascimento de um Filho Para a
teus filhos; deita azeite em todas essas vasilhas, e Mulher Sunamita (4.8-17)
pôe à parte a que estiver cheia. 5Então ela se
apartou dele. Depois, fechada a porta sobre si e 8Sucedeu também certo dia que Eliseu foi a
sobre seus filhos, estes lhe chegavam as vasilhas, Suném, onde havia uma mulher rica que o reteve
e ela as enchia. 6Cheias que foram as vasilhas, para comer; e todas as vezes que ele passava por
disse a seu filho: Chega-me ainda uma vasilha. ali, lá se dirigia para comer. 9E ela disse a seu
Mas ele respondeu: Não há mais vasilha nenhu marido: Tenho observado que este que passa sem
ma. Então o azeite parou. 7Veio ela, pois, e o fez pre por nós é um santo homem de Deus. 10Faça-
saber ao homem de Deus. Disse-lhe ele: Vai, vende mos-lhe, pois, um pequeno quarto sobre o muro;
o azeite, e paga a tua dívida; e tu e teus filhos vi e ponhamos-lhe ali uma cama, uma mesa, uma ca
vei do resta deira e um candeeiro; e há de ser que quando ele
vier a nós, se recolherá ali. nSucedeu que um dia
A multiplicação do azeite para a viúva ele chegou ali, recolheu-se àquele quarto e se dei
necessitada faz lembrar de um relato ante tou. 12Então disse ao seu moço Geazi: Chama es
rior, acerca da viúva de Sarepta, que foi ta sunamita. Ele a chamou, e ela se apresentou
perante ele. l3Pois Eliseu havia dito a Geazi: Di
2 W. Eichrodt, Theology of the Old Testament, I, trad. para o inglês ze-lhe: Eis que tu nos tens tratado com todo o
por J. A. Baker (Philadelphia: The W estminster Press, 1961), p. 326. desvelo; que há de fazer por ti? Haverá alguma
255
coisa de que se fale por ti ao rei, ou ao chefe do 22Então chamou a seu marido, e disse: Manda-me,
exército? Ao que ela respondera: Eu habito no peço-te, um dos moços e uma das jumentas, para
meio do meu povo. 14Então dissera ele: Que se hâ que eu corra ao homem de Deus e volte. 21Disse
de fazer, pois, por ela? E Geazi dissera: O ra, ela ele: Por que queres ir ter com ele hoje? Não é lua
não tem filho, e seu marido è velha 15Pelo que nova nem sábada E ela disse: Tudo vai bem.
disse ele: Chama-a. E ele a chamou, e ela se pôs 24Então ela fez albardar a jumenta, e disse ao seu
à porta. I6E Eliseu disse: Por este tempo, no ano moço: Guia e anda, e não me detenhas no cami
próximo, abraçarás um filha Respondeu ela: Não, nhar, senão quando eu to disser. 25Partiu, pois, e
meu senhor, homem de Deus, não mintas à tua foi ter com o homem de Deus, ao monte Carmela
serva. ,7Mas a mulher concebeu, e deu à luz um
filho, no tempo determinado, no ano seguinte, co O Apelo a Eliseu (v. 18.25a). Sendo que
mo Eliseu lhe dissera.
o mal que acometeu o menino se deu no
A distinção entre o santo e o profano campo durante o tempo da colheita e afe
provavelmente levou à crença de que se tou a cabeça da criança (v. 18 e ss.), é
devia dar a um homem santo um quarto plausível a idéia de que ele haja sofrido
separado dos demais. É em torno desse te uma grave insolação. É claramente dito
ma da generosidade para com o profeta que a criança morreu, mas parece que a
que gira a narrativa. Conquanto o relato mãe manteve a morte da criança em se
não tivesse o fito de explorar a generosi gredo. Não há registro algum de que ela
dade manifestada pelas pessoas, sem dú haja contado a quem quer que seja, tendo
vida era um paradigma acerca da conduta apenas solicitado um servo e um jumento
apropriada a se ter com pessoas com dons para o transporte. De igual forma, seu
proféticos. marido imaginou que ela fosse visitar o
Numerosos filhos eram sinal de bênção profeta pelo mesmo motivo que as pessoas
divina no Antigo Testamento, enquanto a normalmente consultavam tais homens em
falta deles era interpretada como uma dias santos. Observe-se, por exemplo, seu
maldição, ou, na melhor das hipóteses, lembrete: Por que queres ir ter com ele
uma repreensão do Senhor. O nascimento hoje? Não é lua nova nem sábado.
de uma criança para pais estéreis ou ido A mulher age confiando que Eliseu,
sos é um tema comum usado para descre que tornou possível o nascimento da cri
ver a ação singular de Deus dentro da vi ança, possa operar sua recuperação. A ur
da de fé. A narrativa de nascimentos mira gência e ansiedade da mulher são óbvias
culosos ocorre em relação a Abraão e Sara em seu apelo (v. 24).
nas histórias dos patriarcas (Gn 18.1-15),
a Manoá e sua esposa, pais de Sansão (Jz E sucedeu que, vendo-a de longe o homem de
13.2 e ss.), e a Elcana e Ana, pais de Sa Deus, disse a Geazi, seu moço: Eis aí a sunamita;
26corre-lhe ao encontro e pergunta-lhe: Vais bem?
muel (ISm 1.3 e ss.). No Novo Testamento Vai bem teu marido? Vai bem teu filho? Ela res
Isabel concebeu João Batista em idade pondeu: Vai bem. 27Chegando ela ao monte, á
avançada (Lc 1.39 e ss.), mas o exemplo presença do homem de Deus, apegou-se-lhe aos
culminante de narrativas de nascimentos pés. Chegou-se Geazi para a retirar, porém, o
miraculosos é o de Maria (Lc 1.26 e ss.). homem de Deus lhe disse: Deixa-a, porque a sua
alma está em amargura, e o Senhor mo encobriu,
e não mo manifestou. “ Então disse ela: Pedi eu
2) A Revivificação de uma Criança (4.18- a meu senhor algum filho? Não disse eu: Não me
37) enganes? 29Ao que ele disse a Geazi: Cinge os teus
lombos, toma o meu bordão na mão, e vai. Se en
18Tendo o menino crescido, saiu um dia a ter contrares alguém, não o saúdes; e se alguém te
com seu pai, que estava com os segadores. 19Disse saudar, não lhe respondas; e põe o meu bordão
a seu pai: Minha cabeça! minha cabeça! Então ele sobre o rosto do menina 30A mãe do menino,
disse a um moço: Leva-o a sua mãe. 20Este o porém, disse: Vive o Senhor, e vive a tua alma,
tomou, e o levou a sua mãe; e o menino esteve so que não te hei de deixar. Então ele se levantou, e
bre os joelhos dela até o meio-dia, e então mor a seguiu. 3lGeazi foi adiante deles, e pôs o bordão
reu. 21Ela subiu, deitou-o sobre a cama do homem sobre o rosto do menino; porém não havia nele
de Deus e, fechando sobre ele a porta, saiu. voz nem sentidos. Pelo que voltou a encontrar-se
256
com Eliseu, e o informou, dizendo: o menino não de Eliseu, a vida da criança é restaurada.
despertou. Tem-se sugerido que a criança apenas pa
A Missão do servo Geazi (v. 25b-31). recia estar morta, e que, dentro da comu
Ao perceber a morte da criança (a morte nidade dos profetas, mais tarde interpre-
nunca é diretamente mencionada), Eliseu tou-se como morte essa grave enfermidade.
adverte Geazi a manter absoluto silêncio Esse ponto de vista não faz justiça ao tex
enquanto se dirige apressadamente à casa to. Tentativas de explicar a ação de Eliseu
da mulher com o bordão a fim de restabe ou a de Elias em IReis 17 como uma for
lecer a criança. A ordem de ficar em si ma de respiração artificial têm sido em
lêncio surge da crença de que era necessá vão. Deve-se ouvir as histórias segundo
rio Geazi ficar em silêncio para que reti . seu propósito original, tal como uma pes
vesse o poder comunicado através dele por soa vivendo dois e meio milênios atrás,
Eliseu. Norman H. Snaith sugere que antes da era científica moderna. Quer se
“muitos exemplos dessa necessidade de interpretem os relatos literalmente, quer
silêncio são encontrados em livros sobre como histórias de feitos miraculosos na
religiões e costumes primitivos... Há tam categoria de saga ou lenda, a narrativa
bém numerosas alusões ao poder mágico sugere que Eliseu de fato restaurou a vida
do silêncio” (Snaith, p. 207). da criança. É bastante provável que se
O bordão era um meio de transmitir trate de uma história de feitos extraor
poder nas narrativas das pragas, e o uso dinários da categoria de saga e lenda; as
da vara de Moisés por Arão encontra para sim mesmo, permitir que a história seja
lelo no uso por Geazi do bordão de Eliseu. enfraquecida por explicações racionalistas
A tensão da narrativa é realçada pelo fra é perder de vista o propósito básico do
casso do bordão em restabelecer a criança. redator.
Esse restabelecimento deve esperar pela A natureza das narrativas não deve
oração e poder pessoais do profeta Eliseu. eliminar para o leitor moderno o signifi
Uma tal ênfase é estranhamente análoga cado que elas têm para a comunidade de
à incapacidade dos discípulos de Jesus em fé. Foram meios legítimos de revelação
curar a criança, e o modo em que somen que declaravam que Eliseu, o homem san
te ele pôde realizar a maravilha de cura to profético, foi singularmente dotado de
(cf. Mt 17.14 e ss.), uma narrativa que poder vindo de Deus; que tal poder foi
tem certos elementos da tradição de Elias empregado em esforços humanitários; e
(cf. Mt 17.1 e ss.). que a comunidade de fé entesourou os
relatos de suas façanhas e exaltou sua vi
32Quando Eliseu chegou à casa, eis que o me da para gerações posteriores.
nino jazia morto sobre a sua cama. 33Então ele
entrou, fechou a porta sobre eles ambos, e orou
ao Senhor. MEm seguida subiu na cama e deitou- 3. “ Morte na Panela” : O Cozido Estra
-se sobre o menino, pondo a boca sobre a boca do gado (4.38-41)
menino, os olhos sobre os seus olhos, e as mãos
sobre as suas mãos, e ficou encurvado sobre ele ^Eliseu voltou a Gilgal. E havia fome na ter
até que a carne do menino aqueceu. 35Depois ra; e os filhos dos profetas estavam sentados na
desceu, andou pela casa duma parte para outra, sua presença. E disse ao seu moço: Põe a panela
tornou a subir, e se encurvou sobre ele; então o grande ao lume, e faze um caldo de ervas para os
menino espirrou sete vezes, e abriu os olhos. filhos dos profetas. 39Então um deles saiu ao cam
36Eliseu chamou a Geazi, e disse: Chama essa po a fim de apanhar ervas, e achando uma parra
sunamita. E ele a chamou. Quando ela se lhe brava, colheu dela a sua capa cheia de colocínti-
apresentou, disse ele: Toma o teu filha das e, voltando, cortou-as na panela do caldo, não
37Então ela entrou, e prostrou-se a seus pês, sabendo o que e ra .40Assim tiraram de comer pa
inclinando-se à terra; e tomando seu filho, saiu. ra os homens. E havendo eles provado o caldo,
clamaram, dizendo: Ó homem de Deus, há morte
Eliseu Restaura a Vida da Criança (v. na panela! E não puderam comer. 41Ele, porém,
32-37). Mediante o atendimento pessoal disse: Razei farinha. E deitou-a na panela, e dis
257
se: Tirai para os homens, a fim de que comam. E tal). Seus recursos são mais do que sufi
já não havia mal algum na panela. cientes para as necessidades do homem, e
A palavra colotíntidas (paqqu’oth) ocor uma função central do ofício profético é
re somente na passagem em lide, e não há provocar o devido contato entre o poder
como fazer comparações para se tentar divino e a necessidade humana.
determinar o seu sentido. Brown, Driver
e Briggs sugerem, contudo, que se trata 5. A Cura de Naamã, o Sírio (5.1-27)
va de um pepino silvestre (citrullus colo-
cynthis) com propriedades purgativas. Conquanto Naamã e sua cura seja o
Se a farinha tinha propriedades que principal motivo de atração desta narra
neutralizavam os efeitos da paqqu’oth, ou tiva, há na verdade dois temas distintos
se a ação de Eliseu era uma espécie de ato dentro do capítulo: a lepra de Naamã e
simbólico pelo qual o poder do profeta se sua cura (v. 1-19a) e a avareza de Geazi
transferiu para a panela de modo a causar (v. 19b-27).
uma anulação do poder venenoso ou pur
1) A Exaltação da Profecia de Israel
gativo dos pepinos, é questão debatível.
Novamente, contudo, uma ênfase exage (5.1-19)
rada quanto a tais detalhes pode fazer 'Ora, Naamã, chefe do exército do rei da Sí
com que se perca de vista o propósito do ria, era um grande homem diante do seu senhor,
redator. Mediante esse ato, ele ilustrou e de muito respeito, porque por ele o Senhor dera
livramento aos sírios; era homem valente, porém
uma vez mais o poder profético de Eliseu. leprosa 2Os sírios, numa das suas investidas, ha
viam levado presa, da terra de Israel, uma menina
4. A Multiplicação dos Pães (4.42-44) que ficou ao serviço da mulher de Naamã. 3Disse
ela a sua senhora: Oxalá que o meu senhor esti
42Um homem veio de Baal-Salisa, trazendo ao vesse diante do profeta que está em Samária! Pois
homem de Deus pães das primícias, vinte pães de este o curaria da sua lepra. 4Então Naamã foi no
cevada, e espigas verdes no seu alforje. Eliseu dis tificar a seu senhor, dizendo: Assim e assim falou
se: Dá ao povo, para que coma. 41Disse, porém, a menina que é da terra de Israel. 5Respondeu o
seu servo: Como hei de pôr isto diante de cem rei da Síria: Vai, anda, e enviarei uma carta ao rei
homens? Ao que tornou Eliseu: Dá-o ao povo, pa de Israel. Foi, pois, e levou consigo dez mil talen
ra que coma; porque assim diz o Senhor: Come tos de prata, e seis mil siclos de ouro e dez mudas
rão e sobejará. 44Então lhos pôs diante; e come de roupa. 6Tkmbém levou ao rei de Israel a carta,
ram, e ainda sobrou, conforme a palavra do Se que dizia: Logo, em chegando a ti esta carta, sa
nhor. berás que eu te enviei Naamã, meu servo, para
que o cures da sua lepra. 7Tendo o rei de Israel
A multiplicação dos pães tem paralelo lido a carta, rasgou as suas vestes, e disse: Sou eu
no Novo Testamento no episódio da ali Deus, que possa matar e vivificar, para que este
mentação da multidão (cf. Mt 14.13-21; envie a mim um homem a fim de que eu o cure da
15.32-39; Mc 6.30-34; 8.1-10; Lc 9.10-17), sua lepra? Notai, peço-vos, e vede como ele anda
um paralelo que sugere que uma intensa buscando ocasião contra mim.
investigação provavelmente revelaria uma Esperança que Surge da União de Dois
continuidade surpreendente, mas confir- Acontecimentos Culminantes (v. 1-7). Naa
matória, entre as intenções centrais de mã, conquanto houvesse acumulado todas
Moisés, Elias e Jesus. as honrarias possíveis que muitos homens
Eliseu percebe as primícias como um buscam, era um leproso — uma condição
homem santo, tal como o sacerdote o fa que muito obscurecia todos os seus feitos.
zia no santuário. O tema central da pas Contudo, essa situação crítica foi inter
sagem é claro: Iavé supre as necessidades rompida por um momento, a presença de
dos seus, e a refeição sacramental compar uma garota escrava israelita na casa de
tilhada devido a seu poder é algo que sa Naamã, uma garota que havia sido levada
tisfaz (cf. Gray, p. 450, para a opinião de cativa por uma força incursora síria. A
que se tratava de uma refeição sacramen partir dessa intersecção de situações críti
258
cas surge a sugestão de que Naamã visite conforme a palavra do homem de Deus; e a sua
o profeta de Samária, Eliseu. carne tornou-se como a carne dum menino, e fi
cou purificada
A palavra hebraica para lepra (tsara’ath)
é genérica e cobre toda uma gama de do A Cura de Naamã (v. 8-14). A hostili
enças de pele, e até é empregada para mo dade de Naamã em resposta às ações de
fo nas casas (cf. Lv 14.34 e ss.). A palavra Eliseu deriva de pelo menos três conside
grega lepra significava o aparecimento de rações. Primeiro, Eliseu não veio ao en
manchas escamosas e ásperas, correspon contro de Naamã, fato de que Naamã
dentes à psoríase, uma doença de pele que se ressentiu, uma vez que socialmente o
assume várias formas diferentes (cf. “Le profeta estaria em posição inferior à de
prosy”, IDB). Outro termo médico grego, Naamã. Em segundo lugar, Eliseu deixou
elephantiasis, descreve uma doença bem de executar os atos rituais e pronunciar as
mais séria, mais comparável com a lepra palavras que Naamã julgava serem ritual
moderna. O grego do Antigo Testamento mente apropriadas. Naamã, com efeito,
empregou lepra “para incluir psoríase, desejava prescrever sua própria cura. Em
leucodermia, tinha e males semelhantes, terceiro lugar, Naamã ressentiu-se da or
como também a verdadeira lepra” (Ibid.) dem de mergulhar no Jordão. Certamente
For isso é impossível só com base na ter o Jordão era menos atraente do que os
minologia determinar a natureza específi rios de Damasco. Geoige Adam Smith,
ca da enfermidade mencionada. por exemplo, tem uma descrição bem ilus
A lepra não era grandemente temida trativa: “Na maior parte silencioso e ne
apenas por causa do sofrimento físico en gro a despeito de sua velocidade, mas aqui
volvido, mas também devido à rejeição e acolá irrompendo em louvor e embran
social. Os leprosos eram ritualmente impu quecendo-se de espuma, o Jordão corre
ros e, assim, eram isolados de coisas santas em frente, barrento, entre bancos de lama,
(uma idéia comum do AT no caso de con despreocupado com a beleza, despreocu
dições físicas que não eram compreendi pado com a vida” (Snaith, p. 211).
das médica ou cientificamente, como, por 15Então voltou ao homem de Deus, ele e toda
exemplo, menstruação e nascimento de a sua comitiva; chegando, pôs-se diante dele, e
crianças). disse: Eis que agora sei que em toda a terra não
há Deus senão em Israel; agora, pois, peço-te que
8Quando Eliseu, o homem de Deus, ouviu que do teu servo recebas um presente. 16Ele, porém,
o rei de Israel rasgara as suas vestes, mandou di respondeu: Vive o Senhor, em cuja presença estou,
zer ao rei: Por que rasgaste as tuas vestes? Dei que não o receberei. Naamã instou com ele para
xa-o vir ter comigo, e saberá que há profeta em que o tomasse; mas ele recusou. 17Ao que disse
Israel. 9Veio, pois, Naamã com os seus cavalos, e Naamã: Seja assim; contudo dê-se a este teu servo
com o seu carro, e parou à porta da casa de Eli terra que baste para carregar duas mulas; porque
seu. 10Então este lhe mandou um mensageiro, a nunca mais oferecerá este teu servo holocausto
dizer-lhe: Vai, lava-te sete vezes no Jordão, e a nem sacrifício a outros deuses, senão ao Senhor.
tua carne tornará a ti, e ficarás purificada uNa- 18Nisto perdoe o Senhor ao teu servo: Quando
amã, porém, indignado, retirou-se, dizendo: Eis meu amo entrar na casa de Rimom para ali ado
que pensava eu: Certamente ele sairá a ter comigo, rar, e ele se apoiar na minha mão, e eu também
pôr-se-á em pé, invocará o nome do Senhor seu me tenha de encurvar na casa de Rimom; quando
Deus, passará a sua mão sobre o lugar, e curará assim me encurvar na casa de Rimom, nisto per
o leprosa 12Não são, porventura, Abana e Far doe o Senhor ao teu serva 19Eliseu lhe disse: Vai
par, rios de Damasco, melhores do que todas as em paz.
águas de Israel? não poderia eu lavar-me neles, e
ficar purificado? Assim se voltou e se retirou com A Dedicação de Naamã a Iavé (v. 15-
indignaçãa 13Os seus servos, porém, chegaram-se 19a). Em resposta a sua cura, Naamã ad
a ele e lhe falaram, dizendo: Meu pai, se o profeta mite que em toda a terra não há Deus se
te houvesse indicado alguma coisa dificil, porven
tura não a terias cumprido? Quanto mais, dizen- não em Israel, uma concepção teológica
do-te ele: Lava-te, e ficarás purificada 14Desceu avançada para aquele tempo, concepção
ele, pois, e mergulhou-se no Jordão sete vezes, que mal havia começado a emergir com
259
clareza em Israel. O oferecimento de Na- de Geazi. 24Tendo eles chegado ao outeiro, to-
amã de um presente com toda probabili mou-os das mão deles e os depositou na casa; e
despediu aqueles homens, e eles se foram. 25Mas
dade reflete uma sinceridade de intenção, ele entrou e pôs-se diante de seu am a Então lhe
mas serve também ao propósito literário perguntou Eliseu: Donde vens, Geazi? Respondeu
de ressaltar a conduta magnânima de Eli- ele: Teu servo não foi a parte alguma. 26Eliseu,
seu ao mesmo tempo em que provê um porém, lhe disse: Porventura não foi contigo o
meu coraçãoi, quando aquele homem voltou do seu
pano de fundo apropriado com o qual se carro ao teu encontro? Era isto ocasião para rece
contrasta a avareza demonstrada poste beres prata e roupa, olivais e vinhas, ovelhas
riormente por Geazi. e bois, servos e servas? 27Portanto a lepra de
Naamã deixa Eliseu com dois pedidos. Naamã se pegará a ti e à tua descendência para
Seu desejo de terra israelita está intima sempre. Então Geazi saiu da presença dele le
proso, branco como a neve.
mente ligado à crença comum de que os
deuses estavam identificados com a pró O relato da exploração de Naamã às
pria terra — uma atitude que persistiu mãos de Geazi tem a intenção de servir
mesmo em Israel por um período de tem tanto de explicação para o nome de Geazi
po constrangedoramente longo. Há uma (“avarento”), quanto de uma advertência
forte tradição de que a sinagoga em Ne- constante contra a tentação, para aqueles
harda, Irã, foi construída com pedras e associados com o ofício profético, de ex
terra trazidas de Jerusalém, e conta-se que plorar esse ministério. O engano de Geazi
a imperatriz Helena trouxe terra sagrada é duplo. Em primeiro lugar, mentiu a
de Jerusalém para Roma (cf. James A. Naamã quando pediu que Naamã desse
Montgomery e Henry S. Gehman, p. 377). prata e vestimentas para dois filhos dos
O segundo pedido de Naamã dizia res profetas que teriam há pouco vindo da
peito à necessidade de acompanhar seu região montanhosa. Para vergonha de to
mestre (aparentemente o rei da Síria) dos, uns poucos continuam a explorar
quando este cultuava Rimom, ou melhor, pessoas desprevenidas sob o pretexto de
Ramam, o deus da tempestade e chuva, conceder ajuda a causas religiosas neces
mais conhecido como Hadade. Eliseu apa sitadas. Charlatães religiosos do século
rentemente atende a ambos os pedidos, vinte são bem pouco diferentes de Geazi.
pois o texto registra que Eliseu despediu Em segundo lugar, Geazi mentiu para Eli
Naamã com a bênção tradicional, Vai em seu quando o profeta perguntou, Donde
paz. vens, Geazi?
O juízo pronunciado contra Geazi é
2) A Avareza de Geazi (5.20-27) estranhamente semelhante à advertência
20Quando Naamã já ia a uma pequena distân neotestamentária de que se pode conseguir
cia, Geazi, moço de Eliseu, o homem de Deus, o que é exterior e perder os verdadeiros
disse: Eis que meu senhor poupou a este sírio valores da vida (Mt 16.26). A tradução na
Naamã, não recebendo da mão dele coisa alguma
do que trazia; vive o Senhor, que hei de correr Bíblia de Jerusalém é vívida e capta muito
atrás dele, e receber dele alguma coisa. 21Foi, bem o espirito do texto: “Agora que rece
pois, Geazi em alcance de Naamã. Este, vendo beste o dinheiro, podes comprar com ele
que alguém corria atrás dele, saltou do carro a vestes, olivais e vinhas, ovelhas, bois, ser
encontrá-lo, e perguntou: Vai tudo bem? 22Res-
pondeu ele: Tudo vai bem. Meu senhor me enviou
vos e servas. Mas a lepra de Naamã se
a dizer-te: Eis que agora mesmo vieram a mim apegará a ti e à tua posteridade para sem
dois mancebos dos filhos dos profetas da região pre” (v. 26 e ss.). Essa é uma advertência
montanhosa de Efraim; dá-lhes, pois, um talento constante e assustadora àqueles que exal
de prata e duas mudas de roupa. “ Disse Naamã: tam as coisas exteriores da vida a expen
Sê servido de tomar dois talentos. E instou com
ele, e amarrou dois talentos de prata em dois sa sas das realidades espirituais, e muito es
cos, com duas mudas de roupa, e pô-los sobre pecialmente isso soa como uma advertên
dois dos seus moços, os quais os levaram adiante cia àqueles que, dentro do ofício proféti
260
co, abusam desse ofício seja por ambição Contudo, uma fraqueza básica de inter
ou outras formas de exploração. pretações racionalistas de narrativas de
milagres do Antigo Testamento é que dei
6. O Machado que Flutuou (6.1-7) xam de tratar diretamente da teologia e
‘Os filhos dos profetas disseram a Eliseu: Eis
propósito do redator final. Indubitavel
que o lugar em que habitamos diante da tua face mente, é possível que os eventos factuais
é estreito demais para nós. 2Vamos, pois, até o originais tenham-se desenvolvido como
Jordão, tomemos de lá, cada um de nós, uma viga, Gray sugere. Mas isso não muda o fato de
e ali edifiquemos para nós um lugar em que habi que os propósitos teológicos do redator se
temos. Respondeu ele: Ide. 3Disse-lhe um deles:
Digna-te de ir com os teus servos. E ele respon manifestam somente na forma que a nar
deu: Eu irei. 4Assim foi com eles; e, chegando rativa possui agora. Assim, quer se inter
eles ao Jordão, cortavam madeira. sMas sucedeu pretem literalmente os relatos de milagres,
que, ao derrubar um deles uma viga, o ferro do quer se interpretem como exemplos de
machado caiu na água; e ele clamou, dizendo: Ai, combinação de saga e lenda empregadas
meu senhor! ele era emprestada 6Perguntou o
homem de Deus: Onde caiu? E ele lhe mostrou para glorificar o profeta e expressar a alta
o lugar. Então Eliseu cortou um pau, e o lançou consideração em que era tido no círculo
ali, e fez flutuar o ferra 7E disse: Tira-a E ele profético, as histórias miraculosas devem
estendeu a mão e o tomou. ser interpretadas pelo que são na forma
A necessidade de ampliar o local onde atual, não pelo que eram originalmente.
habitavam sugere o progressivo crescimen Interpretada tal como agora se apre
to dos profetas sob a liderança de Eliseu. senta, a narrativa miraculosa ilustra o an
É impossível identificar o local que estava tigo princípio de magia imitativa ou ma
sendo desocupado, mas bem pode ter sido gia de contato. Mediante a magia imitati
a escola próxima a Jericó. De um modo va, a madeira atirada sobre a água flutua,
especial isso é verdade, já que foram até o e a cabeça do machado, imitando a ma
Jordão para se suprirem de vigas necessá deira, também flutua. A magia de conta
rias para suas novas edificações. Muitas to fazia com que objetos, assim que en
vezes fazia-se referência ao Vale do Jordão trassem em contato, voltassem a se juntar.
como sendo uma selva luxuriante (cf. Jr Seja qual for a atitude que se tenha para
12.5; 49.19; 50.44; Zc 11.3). com os antecedentes históricos da narra
Gray sugere que o evento histórico ou tiva, o centro da atenção é o mesmo: Eli
base factual subjacente ao milagre da ca seu possuía tão estupendo poder que fez
beça do machado que flutua “pode ser que com que a cabeça perdida de um macha
Eliseu, com um pau ou vara compridos, do flutuasse.
sondou o local indicado (um ponto impor
tante do texto) até que conseguiu encaixar IV. Eliseu e as Guerras Contra os Sí
a vara na cavidade da cabeça do macha rios (6.8—8.15)
do, ou, tendo localizado o objeto duro no
fundo lamacento, moveu-o até que o ho Os relatos das guerras sírias refletem o
mem foi capaz de apanhá-lo” (Gray, p. contínuo papel de Eliseu como um profeta
460). de proeminência nacional. O propósito do
Essa reconstrução proposta é útil não editor é indicar a maneira como a renova
apenas para compreender esse evento mas ção profética, que começou com Elias,
também como um exemplo do modo em continuou com Eliseu, ao mesmo tempo
que acontecimentos históricos foram ela em que exalta a grandeza individual de
borados ao longo de sucessivas gerações Eliseu. As populares histórias de milagres
até que a narrativa se torna uma combi de capítulos anteriores não estão presentes
nação de saga e lenda, intimamente en nessa seção, e as narrativas sob considera
tremeadas. ção são melhor classificadas como uma
261
combinação de saga e lenda. A veneração riu de cegueira, conforme o pedido de Eliseu.
do homem de Deus dentro do círculo de 19Então Eliseu lhes disse: Não é este o caminho,
nem é esta a cidade; segui-me, e guiar-vos-ei ao
seus discípulos é a preocupação básica. homem que buscais. E os guiou a Samária. 20E
sucedeu que, chegando eles a Samária, disse Eli
1. Eliseu Captura uma Tropa Síria Ata seu: Ó Senhor, abre a estes os olhos para que ve
cante (6.8-23) jam. O Senhor lhes abriu os olhos, e viram; e eis
que estavam no meio de Samária. 21Quando o rei
de Israel os viu, disse a Eliseu: Feri-los-ei, feri-los-
1) A Frustração dos Planos do Rei (6.8-14) -ei, meu pai? “ Respondeu ele: Não os ferirás;
8Ora, o rei da Síria fazia guerra a Israel; e feririas tu os que tomasses prisioneiros com a tua
teve conselho com os seus servos, dizendo: Em tal espada e com o teu arco? Põe-lhes diante pão e
e tal lugar estará o meu acampamento. 9E o ho água, para que comam e bebam, e se vão para
mem de Deus mandou dizer ao rei de Israel: seu senhor. 23Preparou-Ihes, pois, um grande ban
Guarda-te de passares por tal lugar, porque os sí quete; e eles comeram e beberam; então ele os
rios estão descendo ali. l0PeIo que o rei de Israel despediu, e foram para seu senhor. E as tropas
enviou àquele lugar, de que o homem de Deus lhe dos sírios desistiram de invadir a terra de Israel.
falara, e de que o tinha avisado, e assim se salvou. O aparecimento de cavalos e carros em
Isso aconteceu não uma só vez, nem duas. "Tur-
bou-se por causa disto o coração do rei da Síria, Dotã, que ficava a somente dezenove qui
que chamou os seus servos, e lhes disse: Não me lômetros de Samária, a capital, sugere que
fareis saber quem dos nossos é pelo rei de Israel? com toda probabilidade esse era um grupo
12Respondeu um dos seus servos: Não é assim, ó atacante avançado e não um exército com
rei meu senhor, mas o profeta Eliseu, que está em
Israel, faz saber ao rei de Israel as palavras que todo seu contingente (cf. contudo “um
falas na tua câmara de dormir. 13E ele disse: Ide grande exército”, v. 14). Em resposta ao
e vede onde ele está, para que eu envie, e mande temor de seu servo, Eliseu lhe assegurou
trazê-la E foi-lhe dito: Eis que está em Dotã. que os que estão conosco são mais do que
MEntão enviou para lá cavalos, e carros, e um os que estão com eles. Evidentemente
grande exército, os quais vieram de noite e cerca
ram a cidade. Eliseu faz referência à realidade de forças
espirituais invisíveis mas reais, disponíveis
A longa jornada de Eliseu através de não somente à comunidade profética, mas
toda a terra, para nada dizer de seus con igualmente a todo homem de fé.
tatos com muitas pessoas (algumas das Os cavalos e carros de fogo em redor
quais, tal como a serva israelita da narra de Eliseu simbolizavam a realidade do Se
tiva de Naamã, podem ter estado em Da nhor dos exércitos, o qual freqüentemente
masco até mesmo servindo na corte síria), é associado ao fogo como um símbolo de
provavelmente é o núcleo histórico acerca sua presença. O tema se compara ao de
da habilidade de Eliseu em falar ao rei de 2.10 e seguintes, e os carros e cavaleiros
Israel sobre os ataques sírios. comparam-se aos que Eliseu viu ao tempo
da trasladação de Elias. Ambos os con
2) A Cegueira e Captura dos Soldados textos falam da realidade de poderes espi
Sírios (6.15-23) rituais invisíveis, disponíveis aos homens
lsTendo o moço do homem de Deus se levan de percepção e sensibilidade.
tado muito cedo, saiu, e eis que um exército tinha A libertação veio para Eliseu e seu ser
cercado a cidade com cavalos e carros. Então o vo quando o Senhor, em resposta à oração
moço disse ao homem de Deus: Ai, meu senhor! de Eliseu, deixou os sírios cegos. A pala
que faremos? 16Respondeu ele: Não temas; porque
os que estão conosco são mais do que os que es vra cegueira é um plural intensivo, e, com
tão com eles. 17E Eliseu orou, e disse: Ó Senhor, exceção desse versiculo, ocorre somente
peço-te que lhe abras os olhos, para que veja. E em Gênesis 19.11. O tema de cegueira mi
o Senhor abriu os olhos do moço, e ele viu; e eis raculosa é idêntico em ambas as sagas
que o monte estava cheio de cavalos e carros de (6.18, Gn 19.11).
fogo em redor de Eliseu. l8Quando os sírios des
ceram a ele, Eliseu orou ao Senhor, e disse: Fere O profeta é chamado de pai pelo rei,
de cegueira esta gente, peço-te. E o Senhor os fe que indaga sobre se devia ou não executar
262
os guerreiros capturados. Há indícios tex muito acima do normal e que seu sabor
tuais para inserir um “não” na frase ferirás provavelmente era insuportável.
tu os que [não] tomasses prisioneiros com A referência a canibalismo é chocante,
a tua espada e o teu arco?, uma emenda mas não desconhecida durante épocas de
elogiável. Sendo que era costume em Is situações extremas no Antigo Testamento
rael matar o inimigo (cf. ISm 15.33; lRs (cf. Dt 28.56 e ss.; Ez 5.10; Lm 2.20;4.10).
20.42), o apelo de Eliseu pelas vidas dos Pbde-se detectar na controvérsia entre as
sírios baseava-se na idéia de que eles não duas mulheres um paralelo provável, em
foram capturados em batalha. bora grotesco, com a sentença que Salo
mão pronunciou entre as duas prostitutas
2. Samária é Libertada do Cerco (6.24— que reivindicaram a mesma criança (cf
7.20) lRs 3.16 e ss.).
1) Fome na Cidade (6.24-31) O desprazer do rei com Eliseu não tem
fundamento em fatos evidentes e talvez
24Sucedeu, depois disto, que Bene-Hadade, rei seja o reflexo de sua própria ansiedade e
da Síria, ajuntando todo o seu exército, subiu e frustração. Tem-se sugerido que a fome re
cercou Samária. 25E houve grande fome em Sa
mária, porque mantiveram o cerco até que se ven lacionava-se com a predição de Eliseu em
deu uma cabeça de jumento por oitenta siclos de 8.1 e seguinte, mas esse não parece ser o
prata, e a quarta parte dum cabo de esterco de caso. A fome aparentemente limitava-se a
pombas por cinco siclos de prata. 26E sucedeu Samária, e isso devido ao cerco. O exército
que, passando o rei de Israel pelo muro, uma mu sírio se sustentava com os produtos da
lher lhe gritou, dizendo: Acode-me, ó rei meu Se
nhor. 27Mas ele lhe disse: Se o Senhor não te terra, e, suspenso o cerco, não houve falta
acode, donde te acudirei eu? da eira ou do lagar? de suprimentos no campo.
“ Contudo o rei lhe perguntou: Que tens? E disse
ela: Esta mulher me disse: Dá cá o teu filho, para
que hoje o comamos, e amanhã comeremos o meu 2) Eliseu Prediz Alívio (6.31—7.2)
filha “ Cozemos, pois, o meu filho e o comemos;
32 Estava então Eliseu sentado em sua casa, e
e ao outro dia lhe disse eu: Dá cá o teu filho para também os anciãos estavam sentados com ele,
que o comamos; e ela escondeu o seu filha '“Ou quando o rei enviou um homem adiante de si;
vindo o rei as palavras desta mulher, rasgou as mas, antes que o mensageiro chegasse a Eliseu,
suas vestes (ora, ele ia passando pelo muro); e o
disse este aos anciãos: Vedes como esse filho de
povo olhou e viu que o rei trazia saco por dentro, homicida mandou tirar-me a cabeça? Olhai quan
sobre a sua carne. 31Então disse ele: Assim me fa do vier o mensageiro, fechai a porta, e empurrai-o
ça Deus, e outro tanto, se a cabeça de Eliseu, fi para fora com a porta. Porventura não vem após
lho de Safate, lhe ficar hoje sobre os ombros. ele o ruído dos pés de seu senhor? 33Quando Eli
As desesperadoras circunstâncias se re seu ainda estava falando com eles, eis que o men
sageiro desceu a ele; e disse: Eis que este mal
fletem não só nos preços exorbitantes, mas vem do Senhor; por que, pois, esperaria eu mais
no consumo de alimento normalmente pelo Senhor?
considerado imundo e na prática de cani 'Então disse Eliseu: Ouvi a palavra do Senhor;
balismo. O jumento era considerado imun assim diz o Senhor: Amanhã, por estas horas,
do. Tem-se feito vários esforços para expli haverá uma medida de farinha por um siclo, e
duas medidas de cevada por um siclo, à porta de
car a menção a esterco de pombas. Al Samária. 2Porém o capitão em cujo braço o rei se
guns alegam que a extrema penúria levou apoiava respondeu ao homem de Deus e disse:
os homens a de fato comerem excremento Ainda que o Senhor fizesse janelas no céu, pode
(Snaith). Outros, contudo, sugerem que a ria isso suceder? Disse Eliseu: Eis que o verás
com os teus olhos, porém não comerás.
expressão é um nome popular para algum
alimento, tal como grão-de-bico assado Dentro de um dia, predisse Eliseu, o
(Gray). A Bíblia de Jerusalém corrige o cerco seria levantado e, contrastando forte
texto para “cebola selvagem”. A única mente com os preços inflacionados e a
conclusão a que se pode chegar com cer comida intragável do cerco, a melhor co
teza é que o preço da alimentação estava mida seria comprada pelos preços mais
263
razoáveis possíveis. A certeza de tão incrí vos direi o que é que os sírios nos fizeram. Bem
vel declaração baseava-se no fato de que sabem eles que estamos esfaimados; pelo que saí
a predição era a palavra do Senhor. ram do arraial para se esconderem no campo, di
zendo: Quando saírem da cidade, então os toma
remos vivos, e entraremos na cidade. I3Então um
3) O Abandono do Acampamento Sírio dos seus servos respondeu, dizendo: Tomem-se,
(7.3-8) pois, cinco dos cavalos do resto que ficou aqui
dentro (eis que eles estão como toda a multidão
3Ora, quatro homens leprosos estavam à en dos israelitas que ficaram aqui de resto, e que se
trada da porta; e disseram uns aos outros: Pa vêm extenuando), e enviemo-los, e vejamos. I4To-
ra que ficamos nós sentados aqui até morrermos? maram, pois, dois carros com cavalos; e o rei os
4Se dissermos: Entremos na cidade; há fome na enviou com mensageiros após o exército dos sí
cidade, e morreremos ai; e se ficarmos sentados rios, dizendo: Ide, e vede. 15E foram após ele até
aqui, também morreremos. Vamo-nos, pois, agora o Jordão; e eis que todo o caminho estava cheio
e passemos para o arraial dos sírios; se eles nos de roupas e de objetos que os sírios, na sua preci
deixarem viver, viveremos; e se nos matarem, tão- pitação, tinham lançado fora; e voltaram os men
-somente morreremos. 5Levantaram-se, pois, ao sageiros, e o anunciaram ao rei.
crepúsculo, para irem ao arraial dos sírios; e,
chegando eles à entrada do arraial, eis que não A repentina observação dos quatro le
havia ali ninguém. ‘Porque o Senhor fizera ouvir prosos tem-se tomado uma palavra de ad
no arraial dos sírios um ruído de carros e de ca vertência a muitos para que não ignorem
valos, como de um grande exército; de maneira
que disseram uns aos outros: Eis que o rei de Is egoisticamente a outros: Não fazemos
rael alugou contra nós os reis dos heteus e os reis bem; este dia é dia de boas novas. O tema
dos egípcios, para virem sobre nós. 7Pelo que se da libertação da cidade por Deus em meio
levantaram e fugiram, ao crepúsculo; deixaram as à crise é um tema que aparece em outras
suas tendas, os seus cavalos e os seus jumentos, partes do Antigo Testamento (cf. 18.13
isto é, o arraial tal como estava, e fugiram para
salvarem as suas vidas. “Chegando, pois, estes e ss.).
leprosos à entrada do arraial, entraram numa
tenda, comeram e beberam; e tomando dali prata,
ouro e vestidos, foram e os esconderam; depois
voltaram, entraram em outra tenda, e dali tam
5) Um Dia de Cumprimento (7.16-20)
bém tomaram alguma coisa e a esconderam. “Então saiu o povo, e saqueou o arraial dos
sírios. Assim houve uma medida de farinha por
A fuga desordenada dos sírios foi pro um siclo, e duas medidas de cevada por um siclo,
vavelmente precipitada pelo barulho de conforme a palavra do Senhor. 170 rei pusera à
um exército de origem desconhecida se porta o capitão em cujo braço ele se apoiava; e o
aproximando. A desordem que caracteri povo o atropelou na porta, de sorte que morreu,
zou sua fuga sugere a crença de que era como falara o homem de Deus quando o rei des
cera a ter com ele. 18Porque, quando o homem de
iminente uma catástrofe, e o fato de que Deus falara ao rei, dizendo: Amanhã, por estas
fugiram em debandada na direção do Jor horas, haverá duas medidas de cevada por um si-
dão sugere adicionalmente que o inimigo clo, e uma medida de farinha por um siclo, à por
estava a oeste do Jordão. ta de Samária, ’’aquele capitão respondera ao
homem de Deus: Ainda que o Senhor fizesse ja
nelas no céu, poderia isso suceder? e ele dissera:
4) Um Dia de Boas Novas (7.9-15) Eis que o verás com os teus olhos, porém não
9Então disseram uns aos outros: Não fazemos comerás. 20E assim foi; pois o povo o atropelou à
bem; este dia é dia de boas novas, e nós nos ca porta, e ele morreu.
lamos. Se esperarmos até a luz da manhã algum Vendeu-se boa comida e a preço razoá
castigo nos sobrevirá; vamos, pois, agora e o
anunciemos à casa do rei. “ Vieram, pois, brada vel na cidade, e o capitão qüe tinha ridi
ram aos porteiros da cidade, e lhes anunciaram, cularizado a idéia de tão extraordinário
dizendo: Fomos ao arraial dos sírios e eis que lá feito, mesmo que o próprio Senhor agisse
não havia ninguém, nem voz de homem, porém e abrisse as janelas do céu (cf. 7.2), viveu
só os cavalos e os jumentos atados, e as tendas
como estavam.11Assim chamaram os porteiros, e para ver o cumprimento daquela promes
estes o anunciaram dentro da casa do rei. ,2E o sa, mas morreu sem partilhar de seus be
rei se levantou de noite, e disse a seus servos: Eu nefícios.
264
3. A Consideração Adicional Para com a do; e o homem de Deus chorou. 12Então disse
Mulher Sunamita (8.1-6) Hazael: Por que meu senhor está chorando? E ele
disse: Porque sei o mal que hás de fazer aos filhos
'Ora, Eliseu havia falado àquela mulher cujo de Israel: Porás fogo às suas fortalezas, matarás
filho ele ressuscitara, dizendo: Levanta-te e vai, tu à espada os seus mancebos, despedaçarás os seus
e a tua família, e peregrina onde puderes peregri pequeninos e fenderás as suas mulheres grávidas.
nar; porque o Senhor chamou a fome, e ela virá 13Ao que disse Hazael: Que é o teu serm, que não
sobre a terra por sete anos. 2A mulher, pois, le é mais do que um cão, para fazer tão grande coi
vantou-se e fez conforme a palavra do homem de sa? Respondeu Eliseu: O Senhor mostrou-me que
Deus; foi com a sua família, e peregrinou na terra tu hás de ser rei da Síria. 14Então apartou-se de
dos filisteus sete anos. 3Mas ao cabo dos sete Eliseu, e voltou ao seu senhor, o qual lhe per
anos, a mulher voltou da terra dos filisteus, e saiu guntou: Que te disse Eliseu? Respondeu ele: Dis-
a clamar ao rei pela sua casa e pelas suas terras. se-me que certamente sararás. 15Ao outro dia
4Ora, o rei falava a Geazi, o moço do homem de Hazael tomou um cobertor, molhou-o na água e
Deus, dizendo: Conta-me, peço-te, todas as gran o estendeu sobre o rosto do rei, de modo que este
des obras que Eliseu tem feita 5E sucedeu que, morreu. E Hazael reinou em seu lugar.
contando ele ao rei como Eliseu ressuscitara aque
le que estava morto, eis que a mulher cujo filho O relato da participação de Eliseu na
ressuscitara veio clamar ao rei pela sua casa e pe elevação de Hazael a rei da Síria é não só
las suas terras. Então disse Geazi: Ó rei meu se uma ilustração do papel crescente do pro
nhor, esta é a mulher, e este o seu filho a quem feta dentro do cenário político, mas tam
Eliseu ressuscitou. 60 rei interrogou a mulher, e
ela lhe contou o casa Então o rei lhe designou bém um meio de cumprir a tarefa original
um oficial, ao qual disse: Faze restituir-lhe tudo dada a Elias de que ele ungisse a Hazael
quanto era seu, e todas as rendas das terras desde rei da Síria, Jeú rei de Israel, e Eliseu
o dia em que deixou o país até agora. “profeta em teu lugar” (lRs 19.15 e ss.).
Durante a ausência da viúva, seu mari Com o golpe sírio cada uma dessas ordens,
do aparentemente havia morrido (cf. sua exceto a unção de Jeú, teve cumprimento,
idade avançada por ocasião do primeiro embora duas tenham se cumprido atra
contato de Eliseu com a família, 4.14), e vés de Eliseu, e não de Elias (lRs 19 é
é possível que sua terra tenha passado pa mais provavelmente uma tradição inde
ra as mãos do rei, ou que a terra tenha pendente).
passado para um parente próximo, como Referência a Bene-Hadade como o filho
era possível nos tempos do Antigo Testa de Eliseu (v. 9) é um termo de respeito re
mento (cf. Rt 4.1 e ss.; também, a remis velador, análogo ao que existia nas escolas
são de propriedades após sete anos, Ex dos profetas (onde Eliseu era conhecido
21.1; Dt 15.1 e ss.). como pai, e os profetas como filhos).
A declaração de Eliseu, Hás de sarar,
4. O Papel de Eliseu no Golpe Contra o refere-se à recuperação de Bene-Hadade de
Rei Sírio (8.7-15) sua doença. A observação de que o Se
nhor me mostrou que ele morrerá tem a
7Depois veio Eliseu a Damasca E estando
Bene-Hadade, rei da Síria, doente, lho anuncia
ver com o assassinato de Bene-Hadade.
ram, dizendo: O homem de Deus chegou aqui. A menção de que Eliseu ficou fitando
8Então o rei disse a Hazael: Toma um presente nele os olhos sugere as rígidas expressões
na tua mão, vai encontrar-te com o homem de faciais características de um transe, que
Deus e por meio dele consulta ao Senhor, dizen estava associado à outorga de um oráculo
do: Sararei eu desta doença? 9Foi, pois, Hazael
encontrar-se com ele, e levou consigo um presente, profético. Ao tempo do transe, Eliseu co
a saber, quarenta camelos carregados de tudo o meçou a chorar, aparentemente porque
que havia de bom em Damasca Ao chegar, apre previu o que Hazael faria a Israel (cf. Am
sentou-se a ele e disse: Teu filho Bene-Hadade, 1.3 e ss.).
rei da Síria, enviou-me a ti para perguntar: Sara Os anais assírios dessa era corroboram
rei eu desta doença? 10Respondeu-lhe Eliseu: Vai
e dize-lhe: Hás de sarar. Contudo o Senhor me a ascensão de Hazael ao trono: “Hazael,
mostrou que ele morrerá. "E olhou para Hazael, filho de um ninguém, arrebatou o trono”
fitando nele os olhos até que este ficou confundi- (Montgomery e Gehman, citando a inscri
265
ção de Berlim). “Filhi de um ninguém” Jeorão, filho de Jeosafá, não deve ser
sugere que Hazael foi am usurpador, sem confundido com Jorão, filho de Acabe,
relação de parentesco sangüíneo com a Jorão (yoram) e Jeorão (jchoram) têm gra
linha dinástica de Bene-Hadade. fias diversas.
Jeorão casou-se com Atalia, da dinastia
V. A Rebelião de Jeú e o Expurgo do de Onri. Ela é identificada como filha de
Acabe no versículo 18. A referência a Ata
Baalismo (8.16—10.36) lia como filha de Onri em 8.26, em outras
Mantendo-se fiel ao tema básico e mais versões, pode indicar o uso da palavra filha
amplo da revolução profética, que se es no sentido geral de neta ou descendente.
tende de IReis 17 até 2Reis 13, o redator Pode-se imaginar que, mediante esse ma
final de Reis está preocupado em ilustrar trimônio, a influência do baalismo per
meou a corte de Jerusalém e que é por es
o expurgo do baalismo em Israel. A rebe
sa razão que tanto Jeorão e Acazias são
lião de Jeú, conquanto de menor impor
tância do que o conflito de Elias com os condenados pelo editor. Além do mais, o
profetas de Baal no Carmelo (cf. lRs 18), cronista sugere que, quando Jeorão subiu
é de importância crucial. ao trono, “matou todos os seus irmãos à
espada, como também alguns príncipes de
Israel” (2Cr 21.4).
1. O Envolvimento de Judá no Expurgo As revoltas de Edom e Libna são ofere
de Jeú: Uma Avaliação Deuteronômica cidas como evidência concreta dos efeitos
do Reinado Judaico (8.16-29) sentenciais de tal infidelidade no que tan
Tematicamente, o redator inclui as ava gia à associação com Jeorão (v. 18). A
liações de Jeorão e Acazias nesse ponto de única razão de Judá não ter sido absoluta
2Reis por causa de sua solidariedade reli mente destruído, segundo o editor deute-
giosa com a apostasia no norte. ronômico, foi a fidelidade de Iavé à alian
ça davídica: por causa de Davi, seu servo,
1) O Reinado de Jeorão (8.16-24) porquanto lhe havia prometido que daria
uma lâmpada a ele, e a seus filhos para
16Ora, no ano quinto de Jorão, filho de Acabe, sempre (cf. 2Sm 7.8-17). A aliança davídi
rei de Israel, Jeorãoi, filho de Jeosafá, rei de Ju
dá, começou a reinar. ,7Tinha trinta e dois anos
ca permanece junto com a aliança mosai
quando começou a reinar, e reinou oito anos em ca em sua importância teológica para Ju
Jerusalém. I8E andou no caminho dos reis de dá, e foi o meio pelo qual os teólogos isra
Israel, como também fizeram os da casa de Acabe, elitas traduziram as promessas existentes
porque tinha por mulher a filha de Acabe; e fez na aliança patriarcal de uma terra e povo
o que era mau aos olhos do Senhor. 19Todavia o
Senhor não quis destruir a Judá, por causa de em termos mais especificamente adequa
Davi, seu servo, porquanto lhe havia prometido dos às condições monárquicas.
que lhe daria uma lâmpada, a ele e a seus filhos,
para sempre “ Nos seus dias os edomitas se rebe 2) O Reinado de Acazias (8.25-29)
laram contra o domínio de Judá, e constituíram
um rei para si. 21Pelo que Jeorão passou a Zair, “ No ano doze de Jorãoi, filho de Acabe, rei de
com todos os seus carros; e ele se levantou de Israel, começou a reinar Acazias, filho de Jeorão,
noite, com os chefes dos carros, e feriu os edomi rei de Judá. “ Acazias tinha vinte e dois anos
tas que o haviam cercado; mas o povo fugiu para quando começou a reinar, e reinou um ano em
as suas tendas.22Assim os edomitas ficaram rebe Jerusalém. O nome de sua mãe era Atalia; era
lados contra o domínio de Judá até o dia de hoje. neta de Onri, rei de Israel. 27Ele andou no cami
Também Libna se rebelou nesse mesmo tempo. nho da casa de Acabe, e fez o que era mau aos
230 restante dos atos de Jeorão, e tudo quanto olhos do Senhor, como a casa de Acabe, porque
fez, porventura não estão escritos nos livros das era genro de Acabe. 28Ora, ele foi com Jorão, fi
crônicas de Judá? “ Jeorão dormiu com seus pais, lho de Acabe, a Ramote-Gileade, a pelejar contra
e foi sepultado junto a eles na cidade de Davi. E Hazael, rei da Síria; e os sírios feriram a Jorão.
Acazias, seu filho, reinou em seu lugar. 29Então voltou o rei Jorão para se curar em Jiz-
266
reel das feridas que os sírios lhe fizeram em Ra- a implementação da vontade de Deus do
má, quando pelejou contra Hazael, rei da Síria; que em manter o status quo.
e desceu Acazias, filho de Jeorão, rei de Judá,
para ver Jorão, filho de Acabe, em Jizreel, por Não se deve confundir o pai de Jeú,
quanto estava doente. Jeosafá, filho de Ninsi, com Jeosafá, rei de
Judá, que era filho de Asa (cf. lRs 22.41).
Acazias é condenado pelo editor deute-
ronômico de Reis por seguir os passos de
Acabe, presumivelmente em seu compro 2) O Ato Profético de Ungir Jeú (9.4-10)
misso religioso. Devido à sua associação 4Foi, pois, o jovem profeta, a Ramote-Gileade.
com Jorão de Israel ele foi finalmente 5E quando chegou, eis que os chefes dos exércitos
morto (9.27 e ss.). estavam sentados ali; e ele disse: Chefe, tenho uma
palavra para te dizer. E Jeú perguntou: A qual de
todos nós? Respondeu ele: A ti, chefe! 6Então Jeú
2. Eliseu Instiga a Rebelião de Jeú (9.1-13) se levantou, e entrou na casa; e o mancebo
Os envolvimentos políticos de Eliseu são derramou-lhe o azeite sobre a cabeça, e lhe disse:
Assim diz o Senhor Deus de Israel: Ungi-te rei sobre
novamente elucidados na narrativa sobre o povo do Senhor, sobre Israel. 7Ferirás a casa de
a rebelião de Jeú, que culminou com a Acabe, teu senhor, para que eu vingue da mão de
morte de Jorão de Israel, Acazias de Judá, Jezabel o sangue de meus servos, os profetas, e
e Jezabel (9.21-37); além de príncipes de o sangue de todos os servos do Senhor. 8Pois toda
a casa de Acabe perecerá; e destruirei de Acabe
Israel e Judá, os homens de Samária, e ou todo filho varão, tanto o escravo como o livre em
tros adoradores deBaal (10.1-27). Conquan Israel. 9Porque hei de fazer a casa de Acabe como
to a rebelião fosse fomentada por Eliseu, a casa de Jeroboão, filho de Nebate, e como a casa
sua ação foi apenas a fagulha que incen de Baasa, filho de Aias. I0Os cães comerão a
diou as emoções e frustrações reprimidas Jezabel no campo de Jizreel; não haverá quem a
enterre. Então o mancebo abriu a porta e fugiu.
de caráter tanto religioso quanto sócio-
-econômico, as quais já se haviam
acumulado durante a dinastia onrita (John Ramote-Gileade (i.e., provavelmente
Bright, p. 231 e ss.). Ramá de Gileade) era aparentemente o local
em que o exército se reuniu, enquanto Jorão
1) Eliseu Comissiona um Profeta Para se recuperava dos ferimentos recebidos na
Ungir Jeú Rei (9.1-3) batalha contra Hazael, rei da Síria (cf. 8.28
e ss.). Jeú provavelmente era um dos ge
‘Depois o profeta Eliseu chamou um dos filhos
dos profetas, e lhe disse: Cinge os teus lombos, toma nerais, talvez até mesmo o comandante-
na mão este vaso de azeite e vai a Ramote-Gileade; em-chefe do exército. Ele era pessoa ama
2quando lá chegares, procura a Jeú, filho de durecida e suficientemente importante pa
Jeosafá, filho de Ninsi; entra, faze que ele se levante ra ter anteriormente cavalgado ao lado
do meio de seus irmãos, e leva-o para uma câmara
interior. 3Toma, então, o vaso de azeite, derrama- do rei Acabe (cf. 9.25).
-o sobre a sua cabeça, e dize: Assim diz o Senhor: Jezabel é objeto específico de preocu
Unjgi-te rei sobre Israel. Então abre a porta, foge pação para a(s) escolas(s) proféticas(s):
e não te detenhas. Os cães comerão a Jezabel (cf. v. 10; lRs
A unção era o ato tradicional pelo qual 21.23).
pessoas ou objetos eram dedicados ao
Senhor. Lugares sagrados podiam ser
ungidos, mas de modo especial a unção era 3) A Proclamação do Reinado de Jeú
o meio de separar pessoas para um trabalho (9.11-13)
consagrado no serviço de Deus. Eliseu "Saiu então Jeú aos servos de seu senhor; e
previa repercussões imediatas e sérias ao um lhe perguntou: Vai tudo bem? Por que veio a
ti esse louco? E ele lhes respondeu: Bem conheceis
ato de unção de Jeú (v. 3). Contudo, isso o homem e o seu falar. 12Mas eles replicaram. É
não o impediu de cumprir seu papel profé mentira; dize-no-lo, pedimos-te. Ao que disse Jeú:
tico. Ele estava bem mais preocupado com Assim e assim ele me falou, dizendo: Assim diz
267
o Senhor: Ungi-te rei sobre Israel. 13Então se sócio-econômicos, interesses militares, e
apressaram, e cada um tomou a sua capa e a pôs um descontentamento geral que estiveram
debaixo dele, no mais alto degrau; e tocaram a
buzina, e disseram: Jeú reina! igualmente envolvidos na precipitação da
revolta.
Chamar o profeta de louco não é algo
depreciativo como se poderia concluir hoje 1) O Assassinato de Jorão (9.14-26)
em dia. Homens santos de muitas culturas l4Assim Jeú, filho de Jeosafá, filho de Ninsi,
têm sido considerados loucos, e a loucura conspirou contra Jo rã a (Ora, tinha Jorão cerca
às vezes talvez não tenha sido um sinal de do a Ramote-Gileade, ele e todo o Israel, por causa
possessão. A palavra (shaga’) ocorre sete de Hazael, rei da Síria; 15porém o rei Jorão tinha
vezes no Antigo Testamento e é especifica voltado para se curar em Jizveel das feridas que
os sírios lhe fizeram, quando pelejou contra
mente utilizada para os profetas, como em Hazael, rei da Siria.) E disse Jeú: Se isto é o vosso
“todo homem obsesso que profetiza” (Jr parecer, ninguém escape nem saia da cidade para
29.26) e “o profeta é um insensato, o ir dar a nova em Jizreel. 16Então Jeú subiu a um
homem possesso de espírito é um louco” carro, e foi a Jizreel; porque Jorão estava acama
do ali; e também Acazias, rei de Judá, descera
(Os 9.7). para ver Jo rã a l70 atalaia que estava na torre de
Que o profeta que ungiu Jeú aparente Jizreel viu a tropa de Jeú, que vinha, e disse:
mente era bem conhecido em Israel é algo Vejo uma tropa. Disse Jorão: Toma um cavaleiro,
sugerido na resposta de Jeú a seus compa e envia-o ao seu encontro a perguntar: H á paz?
nheiros de comando: Bem conheceis o ,8E o cavaleiro lhe foi ao encontra, e disse: Assim
diz o rei: H á paz? Respondeu Jeú: Que tens tu
homem e o seu falar (shiach). Shiach é que fazer com a paz? Passa para trás de mim.
freqüentemente empregado para queixa E o atalaia deu aviso, dizendo: Chegou a eles o
(Jó 7.13; Pv 23.29), o pensar em voz alta mensageiro, porém não vòlta. I9Então Jorão
(lRs 18.27; SI 104.34), ou ansiedade ou enviou outro cavaleiro; e, chegando este a eles,
disse: Assim diz o rei: H á paz? Respondeu Jeú:
angústia (ISm 1.16), mas somente em 2Reis Que tens tu que fazer com a paz? Passa para trás
9.11 se usa para falar. de mim. 20E o atalaia deu aviso, dizendo: Também
O toque da trombeta provavelmente era este chegou a eles, porém não volta; e o andar se
um ato religioso em que o rei era empos parece com o andar de Jeú, filho de Ninsi, porque
sado no que constituía um ofício não só anda furiosamente. 21Disse Jorão: Aparelha-me o
carro! E lho aparelharam. Saiu Jorão, rei de
político mas também sagrado. A trombeta Israel, com Acazias, rei de Judá, cada um em seu
(shophar) era empregada no culto, como carro, para irem ao encontro de Jeú, e o en
sugerem passagens tais como Salmos 47.5; contraram no campo de Nabote, o jizreelita.
81.3; 98.6; 150.3; e 2Crônicas 15.14. Foi, 22E sucedeu que, vendo Jorão a Jeú, perguntou:
Há paz, Jeú? Respondeu ele: Que paz, enquanto
obviamente, usada sobretudo em guerra as prostituições da tua mãe Jezabel e as suas feiti
(cf. Jz 7.8,16; ISm 13.3; Am 3.6). A consu çarias são tantas? 23Então Jorão deu volta, e
mação da unção ocorre com o grito de fugiu, dizendo a Acazias: H á traição, Acazias!
coroação: malak yehu’. Jeú reina! 24M as Jeú, entesando o seu arco com toda a
força, feriu Jorão entre as espáduas, e a flecha
lhe saiu pelo coração; e ele caiu no seu carro.
3. Os Assassínios que Expurgaram o 2SDisse então Jeú a Bidcar, seu ajudante: Levan
Baalismo de Israel (9.14—10.27) ta-o, e lança-o no campo da herança de Nabote,
o jizreelita; pois lembra-te de que, indo eu e tu
Conquanto o sangrento expurgo por juntos a cavalo após seu pai Acabe, o Senhor pôs
Jeú se originasse de uma genuína preocu sobre ele esta sentença, dizendo: “ Certamente vi
pação profética pelos interesses do iavis- ontem o sangue de Nabote e o sangue de seus
mo, tanto a motivação para a rebelião filhos, diz o Senhor; e neste mesmo campo te
retribuirei, diz o Senhor. Agora, pois, levanta-o,
quanto a atitude final para com ela são e lança-o neste campo, conforme a palavra do
bem mais complexas do que parece à Senhor.
primeira vista. Pbis, a despeito do desejo
sincero de expurgar a terra de uma religião Recomendando absoluto sigilo, Jeú
apóstata, houve sem dúvida fortes fatores apressou-se até Jizreel onde Jorão esta
268
va convalescendo de ferimentos recebi Jeú matou o rei de Israel. Antes, Acazias
dos na batalha com Hazael em Ramo- foi morto porque era parente consagüíneo
te-Gileade. A cidade de Jizreel não deve da família de Acabe (sendo ele filho de
ser confundida com o Vale de Jizreel. Atalia, filha de Acabe). O expurgo de
Ramá (8.29) aparentemente é sinônimo Acabe destina-se a erradicar todo vestígio
de Ramote-Gileade. Furiosamente é pala da linhagem de Acabe, “pois toda a casa
vra com a mesma raiz para louco (cf. 9.11). de Acabe perecerá” (9.8). Esta vendeta
Shigga’on, loucamente, é empregado como estendeu-se não só àqueles que viviam em
uma hipérbole no versículo 20 (furiosa Israel, como especificamente declarado em
mente); “cavalga loucamente”, i.e., cavalga 9.8, mas também aos de Judá, como o
como um louco. revela a morte de Acazias e dos 42 prín
O baalismo era essencialmente um cipes de Judá.
culto à fertilidade, que incluía prostituição 3) O Assassinato de Jezabel (9.30-37)
cultual. Começando com Oséias, a infide
lidade de Israel em cultuar Baal foi carac 30Depois Jeú veio a Jizreel; o que ouvindo
terizada como prostituição (cf. Os 2). Das Jezabel, pintou-se em volta dos olhos, e enfeitou
a sua cabeça, e olhou pela janela. 3,Quando Jeú
38 ocorrências em que os termos prosti entrava pela porta, disse ela: Teve paz Zinri, que
tuição e prostituições aparecem na con matou a seu senhor?32Ao que ele levantou o rosto
cordância bíblica da versão inglesa da para a janela e disse: Quem é comigo? quem? E
RSV, oitenta por cento, ou um total de dois ou três eunucos olharam para ele. 33Então
disse ele: Lançai-a daí abaixo. E lançaram-na
trinta vezes, ocorrem em Oséias e Eze- abaixo; e foram salpicados com o sangue dela a
quiel, com Oséias como o criador da parede e os cavalos; e ele a atropelou. 34E tendo
analogia (cf. também Ap 17.1,15,16; 19.2). ele entrado, comeu e bebeu; depois disse: Olhai
De acordo com o oráculo de juízo por aquela maldita, e sepultai-a, porque é filha de
passado sobre Acabe por ter-se apropriado rei. 35Foram, pois, para a sepultar; porém não
acharam dela senão a caveira, os pés e as pal
da vinha de Nabote (lRs 21.1 e ss.), o corpo mas das mãos. 36Então voltaram, e lho disseram.
de Jorão foi lançado no mesmo pedaço de Pelo que ele disse: Esta é a palavra do Senhor, que
chão. Assim se cumpriu a palavra de julga ele falou por intermédio de Elias, o tisbita, seu
mento sobre Acabe: neste mesmo campo servo, dizendo: No campo de Jizreel os cães
te retribuirei (cf. lRs 21.17 e ss.). Por trás comerão a carne de Jezabel, 37e o seu cadáver
será como esterco sobre o campo, na herdade de
de tal ação jaz a convicção deuteronômica Jizreel; de modo que não se poderá dizer: Esta é
de que os atos dos pais são visitados nos Jezabel.
filhos, e de que dentro da história o pecado
encontra seu próprio julgamento; e a
justiça, sua própria recompensa. Antes da narrativa do assassinato de
Jezabel aparece uma nota cronológica
2) O Assassinato de Acazias (9.27-29) sobre o reinado de Acazias, a qual foi
27Quando Acazias, rei de Judá, viu isto, fugiu obviamente mal colocada ou inserida num
pelo caminho da casa do jardim. E Jeú o perse local inconveniente (9.29). Esse é um dos
guiu, dizendo: A este também! Matai-o! Então o esforços mais antigos de retificar a crono
feriram no carro, à subida de Gur, que está junto logia do livro, pois em 8.25 o décimo
a Ibleão; mas ele fugiu para Megido, e ali morreu. segundo ano de Jorão (841 a.C.) é dado
28E seus servos o levaram num carro a Jerusa
lém, e o sepultaram na sua sepultura junto a seus como a data de ascensão de Acazias.
pais, na cidade de Davi. 29Ora, Acazias começara O presente texto corrige aquele cálculo.
a reinar sobre Judá no ano undécimo de Jorão, Pode-se muito bem consultar a Introdução
filho de Acabe. para ter-se uma breve visão dos problemas
de cronologia nos livros dos Reis.
Deve-se entender a morte de Acazias O texto hebraico sugere que Jezabel
como mais do que um simples acidente “aplicou antimônio aos olhos” (puk, anti-
resultante de visitar Jorão à época em que mônio; lat. stibium), um pó mineral negro
269
(há sugestões de que na antigüidade teria 7Sucedeu pois, que, chegada a eles a carta, to
cores diferentes) usado para aumentar o maram os setenta filhos do rei, e os mataram;
brilho dos olhos mediante o escurecimen puseram as cabeças deles nuns cestos, e lhas
mandaram a Jizreel. 8Veio um mensageiro e lhe
to das beiras das pálpebras (cf. Jr 4.30; anunciou, dizendo: Trouxeram as cabeças dos
Ez 23.40). A atenção dada por Jezabel a filhos do rei. E ele disse: Ponde-as em dois mon
sua aparência física era mais do que uma tões à entrada da porta, até pela manhã. 9Ao sair
demonstração de vaidade, pois acreditava- ele pela manhã, parou, e disse a todo o povo:
Vós sois justos; eis que eu conspirei contra o meu
se que a condição do corpo no momento senhor, e o matei; mas quem feriu a todos estes?
da morte determinava a natureza da exis 10Sabei, pois, agora que, da palavra do Senhor,
tência após a morte. que o Senhor falou contra a casa de Acabe, nada
Conquanto Jeú mais tarde revele con cairá em terra; porque o Senhor tem feito o que
sideração por Jezabel com base nò fato de falou por intermédio de seu servo Elias. "E Jeú
feriu todos os restantes da casa de Acabe em
que ela tinha sangue real, ele não o fez até Jizreel, como também a todos os seus grandes, os
que os cães já tivessem devorado seu corpo. seus amigos íntimos, e os seus sacerdotes, até não
As ações de Jeú parecem deliberadamen lhe deixar ficar nenhum de resta
te cruéis — parando de comer e beber
antes de enviar servos para cuidarem de O assassinato dos setenta filhos, um
seu sepultamento. Alguns sugerem, con número arredondado que sugere todos os
tudo, que era mais do que uma questão de descendentes de sexo masculino (cf. 70
crueldade: a refeição era uma cerimônia filhos de Gideão, Jz 8.30; 70 que foram ao
comunitária que ligava a liderança da Egito, Gn 46.27), gira em torno de duas
cidade a Jeú e seu expurgo. cartas. Na primeira Jeú sugere que os
Novamente, o editor lembra o leitor que tutores dos filhos de Acabe equipem-nos
o assassinato e total desmembramento e preparem-nos para lutar. A reação deles
foram um cumprimento parcial da conde é natural. Se dois reis, possuindo um poder
nação anterior, fruto da experiência de único devido a seu ofício político e sagra
Nabote (cf. lRs 21.23). do, não conseguiam prevalecer contra Jeú,
4) O Assassinato dos Descendentes de mas foram mortos num único dia, como
Acabe e seus Aliados (10.1-11) iriam resistir? Assim, concordaram em
fazer o que parecer bem aos teus olhos.
'Ora, Acabe tinha setenta filhos em Samária. A segunda carta ordena que os aios deca
E Jeú escreveu cartas, e as enviou a Samária, aos pitem os filhos de Acabe e coloquem as
chefes de Jizreel, aos anciãos, e aos aios dos filhos
de Acabe, dizendo: 2Logo que vos chegar esta cabeças em duas pilhas à entrada da ci
carta, visto que estão convosco os filhos de vosso dade, o tradicional local de julgamento.
senhor, como também carros, e cavalos, e uma Jeú absolve a comunidade de qualquer
cidade fortificada, e armas, 3escolhei o melhor e culpa ritual devida às mortes de Jorão e
mais reto dos filhos de vosso senhor, ponde-o sobre outros, ocorridas na cidade ou perto dela
o trono de seu pai, e pelejai pela casa de vosso
senhor. 4Eles, porém, temeram muitíssimo, e (cf. Dt 21.1 e ss., quanto à lei sobre res
disseram: Eis que dois reis não lhe puderam re ponsabilidade comunitária por um cadáver
sistir; como, pois, poderemos nós resistir-lhe? na vizinhança de cidades e povoados). Ele
5Então o que tinha cargo da casa, o que tinha assume plena responsabilidade pela morte
cargo da cidade, os anciãos e os aios mandaram
dizer a Jeú: Nós somos teus servos, e tudo quanto
de Jorão, mas conclui suscitando a per
nos ordenares faremos; a homem algum constitui gunta: mas quem feriu a todos estes?
remos rei. Faze o que parecer bem aos teus olhos. A interpretação mais comum é que Jeú
6Depois lhes escreveu outra carta, dizendo: Se responde à sua própria pergunta como a
sois comigo, e se quereis ouvir a minha voz, tomai sugestão de que tudo isso sucedera para
as cabeças dos homens, filhos de vosso senhor, e
amanhã a estas horas vinde ter comigo a Jizreel. cumprir a palavra de Elias.
Ora, os filhos do rei, que eram setenta, esta Uma outra opção é mais provável,
vam com os grandes da cidade, que os criavam. conquanto menos lisonjeira a Jeú (mas
270
mesmo o editor mais tarde destaca a astú saudou e lhe perguntou:’ O teu coração é sincero
cia de Jeú, 10.19). Jeú teria manipulado para comigo como o meu o é para contigo?
Respondeu Jonadabe: É. Então, se é, disse Jeú,
os aliados de Acabe, que eram pessoas dá-me a tua m ãa E ele lhe deu a mão; e Jeú fê-lo
política e militarmente poderosas, levan subir consigo ao carro, 16e disse: Vem comigo, e
do-as a matarem os descendentes de Aca vê o meu zelo para com o Senhor. E fê-lo sentar
be. Ele assume a responsabilidade pela consigo no carro. I7Quando Jeú chegou a
Samária, feriu a todos os que restavam de Acabe
morte de Jorão (v. 9a), mas sua pergunta, em Samária, até os destruir, conforme a palavra
quem feriu a todos estes? visa colocar a que o Senhor dissera a Elias.
culpa da morte dos filhos de Acabe nos aios.
Assim os versículos 10 e 11 devem ser Jonadabe era evidentemente visto como
lidos consecutivamente. Por causa da o fundador dos recabitas (cf. Jr 35.19), e
palavra de julgamento de Elias, Jeú feriu Recabe provavelmente foi um antepassado
todos os restantes da casa de Acabe em mais distante de Jonadabe. Todas as infor
Jizreel, como também a todos os seus mações diretas sobre esse estranho grupo
grandes, os seus amigos íntimos, e os seus vem de Jeremias (cf. 35.1 e ss.). Aparente
sacerdotes, até não lhe deixar ficar nenhum mente tiveram origem no deserto, de
de resto. Jeú ganha tudo e perde muito parentesco queneu (cf. lCr 2.55), e
pouco: (1) ele induz os aios a matarem os buscavam viver segundo costumes primi
descendentes de Acabe, agradando assim tivos. Eles rejeitavam completamente a vida
um grande número dentre o povo; (2) ele fixa em algum lugar, viviam em tendas;
põe a responsabilidade desse crime sobre recusavam-se a construir casas, semear ou
os ombros dos aios; (3) ele executa os aios, cuidar de vinhas. Aparentemente fiéis em
assim agradando tanto os amigos de Acabe extremo às tradições do deserto, tal grupo
que se opuseram à traição dos aios contra teria sido totalmente favorável ao sangrento
os filhos quanto aqueles que há muito se expurgo de Jeú.
opunham à dinastia de Onri. O apoio recabita teria fortalecido a
5) O Assassinato dos Príncipes de Judá posição de Jeú, e a viagem que Jonadabe
(10.12-14) fez de carro tem o propósito de influenciar
os israelitas de orientação mais conserva
,2Então Jeú se levantou e partiu para ir a
Samária. E, estando no caminho, em Bete-Equede
dora a terem uma posição favorável para
dos pastores, 13encontrou-se com os irmãos de com Jeú. Esse é mais do que um encontro
Acazias, rei de Judá, e perguntou: Quem sois vós? casual. O compromisso e o aperto de mão
Responderam eles: Somos os irmãos de Acazias; simbolizavam uma coalizão formal entre
e descemos a saudar os filhos do rei e os filhos Jeú e os recabitas.
da rainha. 14Então disse ele: Apanhai-os vivos.
E eles os apanharam vivos, quarenta e dois
homens, e os mataram junto ao poço de Bete- 7) O Assassinato dos Devotos de Baal
-Equede, e a nenhum deles deixou de resta (10.18-27)
18Depois ajuntou Jeú todo o povo, e disse-lhe:
O acréscimo de dois ao número redon Acabe serviu pouco a Baal; Jeú, porém, muito o
do 40 pode ter o propósito de dar uma servirá. 19Pelo que chamai agora à minha presença
todos os profetas de Baal, todos os seus servos e
idéia de precisão dentro da narrativa. todos os seus sacerdotes; não falte nenhum, porque
Assim, o próprio número 42 pode ser na tenho um grande sacrifício a fazer a Baal; aquele
verdade um número redondo. que faltar não viverá. Jeú, porém, fazia isto com
astúcia, para destruir os adoradores de Baal.
20Disse mais Jeú: Consagrai a Baal uma assem
6) O Assassinato dos Descendentes de bléia solene. E eles a apregoaram. 21Tkmbém Jeú
Acabe em Samária (10.15-17) enviou mensageiros por todo o Israel; e vieram todos
os adoradores de Baal, de modo que não ficou deles
15E, partindo dali, encontrou-se com Jonadabe, homem algum que não viesse. E entraram na casa
filho de Recabe, que lhe vinha ao encontro, ao qual de Baal, e encheu-se a casa de Baal, de um lado
271
a outra 22Então disse ao que tinha a seu cargo as deixar escapar algum dos homens que eu vos
vestimentas: Tira vestimentas para todos os adora entregar nas mãos, pagará com a própria vida a
dores de Baal. E eles lhes tirou para fora as vida dele. “ Sucedeu, pois, que, acabando de fazer
vestimentas. 23E entrou Jeú com Jonadabe, filho o holocausto, disse Jeú aos da sua guarda, e aos
de Recabe, na casa de Baal, e disse aos adoradores oficiais: Entrai e matai-os! não escape nenhum!
de Baal: Examinai, e vede bem, que porventura não Então os feriram ao fio da espada; e os da guarda
haja entre vós algum servo do Senhor, mas somente e os oficiais os lançaram fora e, entrando no
os adoradores de Baal. 24Assim entraram para santuário da casa de Baal, 26tiraram as colunas
oferecer sacrifícios e holocaustos. que nela estavam, e as queimaram. 27Também
quebraram a coluna de Baal, e derrubaram a casa
O Engano de Jeú (v. 18-24a). Nesse de Baal, fazendo dela uma latrina, como é até o
dia de hoje.
ponto o editor não só admite a esperteza
de Jeú, mas a exalta. Conquanto tal engano
possa parecer inaceitável para o leitor A Destruição dos Adoradores (v. 24b-
moderno, deve-se reconhecer que a civili -27). O fato de oitenta homens constituírem
zação antiga gloriava-se em relatos de uma guarda suficiente para o massacre
ancestrais heróicos que eram capazes de ser confirma a sugestão prévia de que o número
mais astutos do que seus oponentes. As de adoradores foi menor do que todos
ordens finais de Jeú para darem busca no aqueles em Israel ou sugere que residiam
edifício a fim de assegurar que nenhum dos em Jizreel.
servos de Iavé estivesse presente são sinto Se uma porção de uma área tão grande
máticas da calamidade que estava para vir. de templo veio de fato a se transformar em
Jonadabe, muito significativamente, é coni latrina (machara’ah ocorre somente no
vente do massacre. plural, e somente no v. 27; BDB sugere
A declaração de que Jeú fazia isto com fossa) é algo aberto à discussão. Mas não
astúcia sugere engano (’aqbah). Esse versí há razão para questionar que pelo menos
culo é o único em que se usa a palavra; parte do terreno tenha tido esse uso. Tal
traição parece ser o sentido (BDB). O adje ação não era somente um esforço para
tivo ’aqob significa insidioso ou enganoso degradar o baalismo com insulto, mas
(Jr 17.9, onde descreve o coração do também deixava o local ritualmente
homem). imundo. Ou pelo menos há indícios a favor
A referência a todos os adoradores de dessa suposição com base em uma atitude
Baal é melhor compreendida num sentido do Antigo Testamento com relação aos
relativo. A afirmação pode ser uma hipér excrementos humanos (cf. Dt 23.12-14).
bole posterior, ou aqueles convidados para
uma convocação tão solene talvez tenham 4. Uma Avaliação do Reinado de Jeú
sido um número limitado dos adoradores (10.28-36)
de Baal mais proeminentes e influentes. A
extensão a todo o Israel pode ser uma 1) A Avaliação Deuteronômica de Jeú
expansão posterior, e originalmente talvez (10.28-31)
todas as vítimas residissem de Jizreel. Seja 28Assim Jeú exterminou de Israel a Baal.
como for, contudo, é melhor tratar a decla 29Todavia Jeú não se apartou dos pecados de Jero-
ração como hipérbole. É a maneira de o boão, filho de Nebate, com que fez Israel pecar,
escritor insistir que o baalismo foi total a saber, dos bezerros de ouro, que estavam em Betei
mente expurgado da terra. Que isso na e em Dã. 30Ora, disse o Senhor a Jeú: Porquanto
executaste bem o que é reto aos meus olhos, e fizeste
realidade não aconteceu é refletido vivida- à casa de Acabe conforme tudo quanto eu tinha
mente na impressionante força do no meu coração, teus filhos até a quarta geração
movimento durante o século seguinte (cf. se assentarão no trono de Israel. 31Mas Jeú não
Os 1 e ss.). teve o cuidado de andar de todo o seu coração na
lei do Senhor Deus de Israel, nem se apartou dos
Ora, Jeú tinha posto de prontidão do lado de pecados de Jeroboão, com os quais este fez Israel
fora oitenta homens, e lhes tinha dito: Aquele que pecar.
272
Em vista do zelo de Jeú por Iavé, é que está junto ao ribeiro de Arnom, por toda a
surpreendente que o editor deuteronômico Gileade e Basã. 34Ora, o restante dos atos de Jeú,
e tudo quanto fez, e todo o seu poder, porventura
limite seu sumário do reinado de Jeú a sete não estão escritos no livro das1crônicas dos reis
palavras (v. 28). Isso está em harmonia, de Israel? 35Jeú dormiu com seus pais, e o sepul
contudo, com a prática coerente desse taram em Samária. Em seu lugar reinou seu filho
editor, pois ele nunca dá aprovação incon Jeoacaz. ^O s dias que Jeú reinou sobre Israel em
dicional a qualquer governante do Reino Samária foram vinte e oito anos.
do Norte. A avaliação estereotipada dos reis
Durante esse período, a Síria dominou
israelitas é aplicada a Jeú; ele continuou
Israel, e a totalidade do território da Trans-
as práticas religiosas de Jeroboão I.
jordânia foi perdida. Não foi recuperado
Uma nota elogiosa adicional aparece no
até as conquistas de Jeroboão II em meados
versículo 30, que fala bem de Jeú e o recom do século oitavo. O ataque de Hazael contra
pensa. Contudo, o editor não permite que
Israel foi provavelmente precipitado pela
isso perdure por muito tempo sem um lem
recusa por Israel de unir-se à coalizão com
brete de que Jeú não repudiou as ações de
a Síria contra os assírios.
Jeroboão I. A verdade da questão, porém, Foi também durante o reinado de Jeú
é que, a despeito da atitude de editores lite
que Israel foi sujeitado à dominação assíria,
rários e teólogos de Judá, o sistema de culto
e uma das descobertas arqueológicas mais
inaugurado por Jeroboão não tinha o fito
bem conhecidas dessa era, o obelisco negro
de ser inteiramente apóstata, por mais que
de Salmanasar III, em que Jeú é retratado
tivesse violado certas regras normativas.
Israel continuou a adorar Iavé, não algum ajoelhando-se perante o rei assírio, oferece
a única representação pictórica descoberta
outro deus. Suas tradições literárias e leis de um rei hebreu. O texto reza: “O tributo
tinham paralelo com as do Sul, e os bezerros
de Jeú (Ia-u-a), filho de Onri (Hu-um-ri);
de ouro como objetos de culto eram os
símbolos visíveis acima dos quais Iavé recebi dele prata, ouro, um vaso dourado
estava entronizado. Eles tinham paralelo de saplu, um vaso dourado com fundo em
ponta, taças de ouro, vasilhames de ouro,
com os símbolos da arca no templo de Jeru
salém. A despeito de sua origem metal, um bordão real (e) um puruhtu
[sentido ignorado] de madeira” (ANET, p.
questionável e possivelmente da indevida
281).
veneração popular, não eram ídolos no
sentido mais estrito.
Não devemos, contudo, deixar de ter VI. A Reforma em Judá sob Joás
uma visão plena das implicações genuina (11.1- 12.21)
mente teológicas das práticas de adoração
iniciadas por Jeroboão. Eles tenderam à
deturpação do culto, deram origem a O tema básico da revolução profética
conceitos que conduziram o povo mais e (lRs 17 a 2Rs 13) é o triunfo do iavismo
mais rumo à idolatria, provocaram o sobre o baalismo. Assim, a reforma em Judá
desprazer do Senhor, e, por fim, tiveram sob Jeoiada-Joás é um tema adequado para
como conseqüência a sentença do juízo de ser incluído dentro da revolução profética,
Deus. a despeito da triste sorte de Joás.
1. A Usurpação de Atalia e a Coroação de
2) Um Trecho das Crônicas dos Reis de Joás (11.1-21)
Israel (10.32-36)
1) Atalia se Ápossa do Trono (11.1-3)
3ZNaqueles dias começou o Senhor a diminuir
os termos de Israel. Hazael feriu a Israel em todas ‘Vendo pois Atalia, mãe de Acazias, que seu
as suas fronteiras, 33desde o Jordão para o filho era morto, levantou-se, e destruiu toda a descen
nascente do sol, a toda a terra de Gileade, aos dência real. 2Mas Jeoseba, filha do rei Jorão, irmã
gaditas, aos rubenitas e aos manassitas, desde Aroer, de Acazias, tomou a Joás, filho de Acazias, furtando-
273
-o dentre os filhos do rei, aos quais matavam na o filho do rei, pôs-lhe a coroa, e lhe deu o teste
recâmara, e o escondeu de Atalia, a ele e à sua munho; e o fizeram rei e o ungiram e, batendo
ama, de sorte que não o mataram. 3E esteve com palmas, clamaram: Viva o rei!
ela escondido na casa do Senhor seis anos; e Atalia
reinava sobre o país.
Jeoiada é a figura central na narrativa
de Joás. Essa importância é reconhecida
O nome Atalia talvez signifique “Iavé pelo cronista, que apresenta seu elogio de
é exaltado”, sugerindo uma certa lealdade Joás com a observação de que “Joás fez o
da parte de seu pai, Acabe, a despeito de que era reto aos olhos do Senhor por todos
sua mãe, Jezabel, ter promovido o baalismo. os dias do sacerdote Jeoiada” (cf. 2Cr 24.2),
Única mulher a reinar no trono seja de como se com a morte de Jeoiada a vida de
Israel ou de Judá, Atalia apossou-se do Joás tivesse mudado (cf. 2Cr 24.17 e ss. para
trono após a morte de seu filho Acazias. confirmação dessa pressuposição).
Sua ação de matar a família real é seme O uso da palavra pacto no contexto do
lhante ao assassinato por Jeorão de seus acordo é uma boa ilustração do emprego
irmãos (cf. 2Cr 21.4) e sugere que fazia não teológico do termo aliança no Antigo
muito tempo que vinha havendo oposição Testamento (cf. também 2Sm 5.3; Jr 34.8
dentro de Judá tanto às influências políticas e ss.; ISm 18.3; Ml 2.14). Tal emprego ajuda
quanto às práticas religiosas pagãs que a ilustrar o sentido da aliança teologica
haviam sido importadas do norte. O fato mente orientada.
de que o editor deuteronômico não faz qual Jeoiada aparentemente escolheu a hora
quer avaliação de seu reinado, como da mudança da guarda para a vigília do
coerentemente faz com cada um dos reis, sábado como o momento da coroação. Ele
sugere que considerava Atalia uma usur reteve o grupo previamente em serviço, e
padora ao trono que nunca alcançou status com esse grupo os outros dois que viriam
de monarca. atuar no sábado. Assim, conseguiu com que
2) A Coroação de Joás (11.4-12) todos os três grupos estivessem presentes
sem causar qualquer alarme.
4No sétimo ano, porém, Jeoiada mandou Os símbolos da coroação eram a coroa
chamar os centuriões dos caritas e os oficiais da
guarda, e fê-los entrar consigo na casa do Senhor; (nezer) e o testemunho (’eduth). Outro
e fez com eles um pacto e, ajuramentando-os na elemento significativo foi a expressão
casa do Senhor, mostrou-lhes o filho do rei. sEntão pública de aclamação, que se pode identi
lhes ordenou, dizendo: Eis aqui o que haveis de ficar em sucessivas narrativas de coroação
fazer: Uma terça parte de vós, os que entrais no (cf. ISm 10.24; 2Sm 15.10; lRs 1.39; 2Rs
sábado, fará a guarda da casa do rei; 6outra terça
parte estará à porta Sur; e a outra terça parte à 9.13. Note-se que o toque de trombeta
porta detrás dos da guarda. Assim fareis a guarda freqüentemente precede o grito de acla
desta casa, afastando a todos. 7As duas compa mação). A nezer está intimamente re
nhias, a saber, todos os que saem no sábado, farão lacionada ao vocabulário dos nazireus e
a guarda da casa do Senhor junto ao rei; 8e rode
areis o rei, cada um com as suas armas na mão, representa um símbolo de dedicação (o
e aquele que entrar dentro das fileiras, seja morto; mesmo sentido de nazireu). Nezer é uma
e estai vós com o rei quando sair e quando entrar. palavra reservada para a coroa real e sacer
9Fizeram, pois, os centuriões conforme tudo dotal (cf. 2Sm 1.10; Zc 9.16; Ex 29.6),
quanto ordenara o sacerdote Jeoiada; e tomando
cada um os seus homens, tanto os que entravam
enquanto <aatarah era a palavra de sentido
no sábado como os que saíam no sábado, vieram geral e poético (cf. 2Sm 12.30; Jó 19.9). John
ter com o sacerdote Jeoiada. 10O sacerdote Gray fala do testemunho como um detalhe
entregou aos centuriões as lanças e os escudos que do ritual de coroação, dizendo que esteve
haviam sido do rei Davi, e que estavam na casa do “especificamente associado com a aliança
Senhor. "E os da guarda, cada um com as armas
na mão, se puseram em volta do rei, desde o lado
de Iavé com o rei davídico... parece óbvio
direito da casa até o lado esquerdo, ao longo do que ’edut ou ’edot significava especifica
altar e da casa. 12Então Jeoiada lhes apresentou mente as obrigações do rei na aliança”.
274
A necessidade de tropas que apoiassem que mataram Atalia à espada junto à casa do rei.
a ação de Jeoiada é um sinal da forte divisão 21Joás tinha sete anos quando começou a reinar.
que deve ter caracterizado o Reino do Sul A cerimônia de renovação da aliança era
nessa época. Parece, contudo, pela reação um importante aspecto de compromisso reli
do povo, que, qualquer que fosse a oposição gioso no Antigo Testamento. A aliança não
que Jeoiada esperasse devido à coroação, era meramente um acordo feito em anos
provavelmente estava associada com os passados com os ancestrais, mas uma expe
elementos da guarda fiéis a Atalia. Contudo, riência em que a pessoa continuamente
mesmo assim, na hora de sua execução não reentrava ao participar dos rituais de
houve qualquer demonstração de forças em adoração da comunidade devota.
contrário. Em contraste com o pano de fundo de
entusiasmo religioso, novas liberdades po
3) A Execução de Atalia (11.13-16) líticas e sociais, e o fermento geral carac
terístico de movimentos reformadores,
13Quando Atalia ouviu o vozerio da guarda e
do povo, foi ter com o povo na casa do Senhor;
o povo destruiu todo vestígio de baalismo:
14e olhou, e eis que o rei estava junto à coluna, santuário, altar e imagens, chegando a
conforme o costume, e os capitães e os tromheteiros matar o sumo sacerdote.
junto ao rei; e todo o povo da terra se alegrava e A esse relato da elevação de Joás como
tocava trombetas. Então Atalia rasgou os seus rei sobre Judá foi acrescentada uma nota
vestidos, e clamou: Traição! Traição! 15Então
Jeoiada, o sacerdote, deu ordem aos centuriões que cronológica destacando a idade de Joás
comandavam as tropas, dizendo-lhes: Tirai-a para ao tempo de sua ascensão ao trono (v. 21).
fora por entre as fileiras, e a quem a seguir matai-o Isso deve ser compreendido no contexto de
à espada. Pois o sacerdote dissera: Não seja ela 12.1.
morta na casa do Senhor. ,6E lançaram-lhe as
mãos e ela foi pelo caminho da entrada dos cavalos
à casa do rei, e ali a mataram. 2. O Reparo no Templo: Uma Tradição
Independente (12.1-16)
A entrada dos cavalos era um portão fora O capítulo 12 é composto de várias
da área do templo, que conduzia ao fontes: um registro especial sobre o templo,
Cedrom. Ficava a sudeste da área do templo, tirado dos registros do estado, e que dizia
nas cercanias do palácio (cf. IDB). Além respeito ao edifício, mobiliário e conteúdo
de não ficar junto ao templo, ela não tem dessa estrutura (v. 4-16); o livro das crônicas
significado especial para essa narrativa (cf. do reis de Judá (v. 19-21); uma fonte espe
lRs 14.27 e ss.; Jr 31.38; Ne 3.28). cial extraída de registros do estado (v. 17-18);
e a avaliação deuteronômica característica
(v. 1-3).
4) A Renovação da Aliança (11.17-21)
17Ora, Jeoiada firmou um pacto entre o Senhor
e o rei e o povo, pelo qual este seria o povo do 1) Uma Avaliação de Joás (12.1-3)
Senhor; como também firmou pacto entre o rei e
’Foi no ano sétimo de Jeú que Joás começou
o povo. I8Então todo o povo da terra entrou na
a reinar, e reinou quarenta anos em Jerusalém. O
casa de Baal, e a derrubaram; como também os
nome de sua mãe era Zíbia, de Berseba. 2E Joás
seus altares e as suas imagens, totalmente
fez o que era reto aos olhos do Senhor todos os
quebraram; e a M atã, sacerdote de Baal, mataram
dias em que o sacerdote Jeoiada o instruiu.
diante dos altares. lambém o sacerdote pôs vigias 3Contudo os altos não foram tirados; o povo ainda
sobre a casa do Senhor. 19E tomou os centuriões,
sacrificava e queimava incenso neles.
os caritas, a guarda, e todo o povo da terra; e condu
ziram da casa do Senhor o rei, e foram, pelo
caminho da porta da guarda, à casa do rei; e ele
se assentou no trono dos reis. 20E todo o povo da O editor de Deuteronômio, tal como o
terra se alegrou, e a cidade ficou em paz, depois fez o cronista, relacionou diretamente o bom
275
registro de Joás com a influência de Jeoiada, dinheiro das ofertas pela culpa, e o dinheiro das
o sacerdote (cf. 2Cr 24.2,17 e ss.). A hesi ofertas pelo pecado, não se trazia à casa do Senhor;
era para os sacerdotes.
tação do escritor em fazer um elogio total
de Joás reflete-se no julgamento dos altos,
santuários locais que violavam o princípio Coisas consagradas sugere toda a gama
deuteronômico do santuário único. Não é de dinheiro ou bens em espécie trazidos ao
de modo algum certo que isso se refira ao templo, inclusive a taxa de recenseamento
baalismo, como alguns sugerem, embora (cf. Ex 30.12-30), multas (cf. Amós 2.8),
seja bastante óbvio que o baalismo persis votos que foram feitos e cumpridos (Lv
tisse por um século ou mais após a morte 27.2-8), ofertas voluntárias. Tudo isso devia
de Atalia. ser destinado ao templo.
A palavra conhecidos é de difícil enten
2) O Reparo no Templo (12.4-16) dimento. Significaria que o dinheiro deve
4Disse Joás aos sacerdotes: Todo o dinheiro vir de pessoas conhecidas de cada sacerdote?
das coisas consagradas que se trouxer à casa do Ou significa que o dinheiro deve vir
Senhor, o dinheiro daquele que passa o arrolamento,
o dinheiro de cada uma das pessoas, segundo a
daqueles a quem o sacerdote ministra (e
sua avaliação, e todo o dinheiro que cada um trouxer assim é um conhecido)? Falando-se de modo
voluntariamente para a casa do Senhor, 5recebam- geral, o makar (conhecido) era uma pessoa
-no os sacerdotes, cada um dos seus conhecidos, com quem o sacerdote entrava em contato
e reparem os estragos da casa, todo estrago que durante o andamento de seus deveres profis
se achar nela. 6Sucedeu porém que, no vigésimo
terceiro ano do rei Joás, os sacerdotes ainda não sionais, e de quem recebia dinheiro por
tinham reparado os estragos da casa. 7Então o rei serviços prestados ou obrigações devidas.
Joás chamou o sacerdote Jeoiada e os demais sacer No versículo 4 os sacerdotes são instru
dotes, e lhes disse: Por que não reparais os estragos ídos a dar para o templo todo dinheiro
da casa? Agora, pois, não tomeis mais dinheiro de
vossos conhecidos, mas entregai-o para o reparo
consagrado, reservando o que recebessem
dos estragos da casa. 8E consentiram os sacer numa base mais pessoal (v. 5) para sua
dotes em não tomarem mais dinheiro do poro, e própria subsistência. Devido a que se
em não mais serem os encarregados de reparar passaram mais de duas décadas sem reparos
os estragos da casa. 9Mas o sacerdote Jeoiada no templo, Joás então proíbe o sacerdote
tomou uma arca, fez um buraco na tampa, e a pôs
ao pé do altar, à mão direita de quem entrava na de guardar até mesmo dinheiro pessoal, e
casa do Senhor. E os sacerdotes que guardavam exige que também seja empregado no reparo
a entrada metiam ali todo o dinheiro que se trazia do templo.
à casa do Senhor. 10Sucedeu pois que, vendo eles O problema a respeito da negligência dos
que já havia muito dinheiro na arca, o escrivão do
rei e o sumo sacerdote vinham, e ensacavam e
sacerdotes não foi resolvido até que Joás
contavam o dinheiro que se achava na casa do tomou duas medidas específicas. Primeiro,
Senhor. nE entregavam o dinheiro, depois de recusou permitir que os sacerdotes lidassem
pesado, nas mãos dos que faziam a obra e que com o dinheiro. Não se deve confundir
tinham a seu cargo a casa do Senhor; e eles o distri dinheiro com moedas. Moedas não foram
buíam aos carpinteiros, e aos edificadores que
reparavam a casa do Senhor; 12como também aos introduzidas senão no período pós-exílico,
pedreiros e aos cabouqueiros; e para se comprar embora haja registros de, já no nono século,
madeira e pedras de cantaria a fim de repararem existirem pesos regulares de metal que
os estragos da casa do Senhor, e para tudo quanto tinham o nome de um negociante gravado
exigia a despesa para se reparar a casa. 13Todavia, (Gray). A essa altura o dinheiro teria sido
do dinheiro que se trazia à casa do Senhor, não
se faziam nem taças de prata, nem espevitadeiras, metais preciosos.
nem bacias, nem trombetas, nem vaso algum de Segundo, o trabalho foi colocado nas
ouro ou de prata para a casa do Senhor; I4porque mãos de artesãos competentes em vez de
o davam aos que faziam a obra, os quais reparavam nas dos sacerdotes, uma reprimenda aos
com ele a casa do Senhor. 15E não se tomavam
contas aos homens em cujas mãos entregavam sacerdotes e suas negligências. A narrativa
aquele dinheiro para o dar aos que faziam a obra, toda tem insinuações acerca do rompimento
porque eles se haviam com fidelidade. 16Mas o entre Joás e os métodos de Jeoiada.
276
3. O Fim de Joás (12.17-21) tomar suas próprias decisões, criar sua
própria integridade e cumprir seu próprio
A nobreza e as elogiáveis virtudes de
destino.
Joás parecem ter durado apenas um breve
tempo, se é que duraram (cf. 2Cr 24.17 e VII. As Provações de Israel e a Morte
ss.), após a morte de Jeoiada. O fim do de EHseu (13.1-25)
rei é refletido em duas narrativas, extraí
das de fontes separadas.
1. Os Avanços dos Sírios sob Hazael
1) O Conflito Entre Hazael e Joás (12.17, (13.1-13)
18)
Um fator na habilidade dos sírios em
17Então subiu Hazael, rei da Síria, e pelejou prevalecerem contra nações tão poderosas
contra Gate, e a tomou. Depois Hazael virou o rosto quanto a Assíria era sua sagacidade em
para marchar contra Jerusalém. 18Pelo que Joás,
rei de Judá, tomou todas as coisas consagradas criar alianças entre numerosos grupos
que Jeosafá, Jeorão e Acazias, seus pais, reis de menores. A pressão constante para unir-se
Judá, tinham consagrado, e tudo o que ele mesmo a tais coalizões era uma causa de atritos
tinha oferecido, como também todo o ouro que se entre Israel e a Síria. Israel estava envol
achou nos tesouros da casa do Senhor e na casa vido nessa coalizão, e foi provavelmente a
do rei, e o mandou a Hazael, rei da Síria, o qual
se desviou de Jerusalém. partir dessa experiência que Acabe e Jeosafá
partiram para tomar Ramote-Gileade (lRs
O escritor busca nas linhas finais 22.29).
destacar a falha de Joás. É como se o editor Hazael estava constantemente envolvido
estivesse preocupado em sugerir que, após com sucessivos reis tanto de Israel quanto
a morte de Jeoiada, Joás seguiu um rumo de Judá — ferindo seriamente Jorão de
que o levou cada vez mais para baixo, até Israel (8.28 e s.), arrebatando territórios de
que finalmente foi destruído. Israel ao tempo de Jeú (10.32 e s.) e cons
tantemente incomodando Joás em Judá
2) O Assassinato de Joás (12.19-21) (12.17 e s.; 2Cr 24.23), bem como Jeoacaz
l9Ora, o restante dos atos de Joás, e tudo de Israel (13.1 e ss.; cf. R. A. Bowman,
quanto fez, porventura não estão escritos no livro “Hazael”, IDB). Éno contextodos avanços
das crônicas dos reis de Judá? 20Levantaram-se os desses reis que, com toda probabilidade,
servos de Joás e, conspirando contra ele, o feriram fazem-se as narrativas de 2Reis 6.8 e ss.,
na casa de Milo, junto ao caminho que desce para
S ila.21Foram Jozacar, filho de Simeate, e Jeoza- bem como as narrativas sobre Jeoacaz.
bade, filho de Somer, seus servos que o feriram,
e ele morreu. Sepultaram-no com seus pais na cidade 1) Jeoacaz de Israel (13.1-9)
de Davi. E Amazias, seu filho, reinou em seu lugar.
'N o vigésimo terceiro ano de Joás, filho de
Joás, cuja vida pública começou em Acazias, rei de Judá, começou a reinar Jeoacaz,
filho de Jeú, sobre Israel, em Samária, e reinou
méio às aflições de uma insurreição em que dezessete anos. 2E fez o que era mau aos olhos do
a rainha-mãe foi executada, morreu ele Senhor, porque seguiu os pecados de Jeroboão,
próprio vítima de assassinos. Talvez a filho de Nebate, com os quais ele fizera Israel pecar;
avaliação seja por demais severa, mas não se apartou deles. 3Pelo que a ira do Senhor
se acendeu contra Israel; e o entregou continua-
alguém sugeriu que, quando Joás chegou damente na mão de Hazael, rei da Síria, e na mão
ao fim da vida, não era melhor do que de Bene-Hadade, filho de Hazael. 4Jeoacaz,
Atalia (cf. 2Cr 24.17 e ss.). Conquanto posto porém, suplicou diante da foce do Senhor; e o
nas mãos de líderes religiosos que buscaram Senhor o ouviu, porque viu a opressão com que
moldar sua vida desde a infância, Joás o rei da Síria oprimia a Israel, 5(pelo que o Senhor
deu um libertador a Israel, de modo que saiu de
nunca se tornou de fato o que Jeoiada e sob a mão dos sírios; e os filhos de Israel habitaram
outros haviam previsto. Em última análise, nas suas tendas, como dantes. ‘Contudo não se
o indivíduo, sob a direção de Deus, deve apartaram dos pecados da casa de Jeroboão^ com
277
os quais ele fizera Israel pecar, porém andaram Hazael estão em marcante contraste com
neles; e também a Ásera ficou em pé em Samária.) o equipamento disponível a Acabe quase
7porque, de todo o povo, não deixara a Jeoacaz
mais que cinqüenta cavaleiros, dez carros e dez mil
meio século antes. Da contribuição militar
homens de infantaria; porquanto o rei da Síria os de Acabe para a coalizão que lutou contra
tinha destruído e os tinha feito como o pó da eira. Salmanasar em Carcar, em 853 a.C., um
8Ora, o restante dos atos de Jeoacaz, e tudo registro assírio cita o seguinte: “...2.000
quanto fez, e o seu poder, porventura não estão carros, 10.000 soldados a pé de Acabe, o
escritos no livro das crônicas dos reis de Israel?
9E Jeoacaz dormiu com seus pais; e o sepultaram israelita” (de acordo com a Inscrição do
em Samária. E Jeoás, seu filho, reinou em seu lugar. Touro, encontrada nas estátuas de touro
existentes em Calah; cf. ANET).
Jeoacaz (Iavé tem segurado) é introdu 2) Jeoás de Israel (13.10-13)
zido pela fórmula constumeira utilizada
para depreciar os reis de Israel. Os avanços 10No ano trinta e sete de Joás, rei de Judá,
começou a reinar Jeoás, filho de Jeoacaz, sobre
de Hazael estão diretamente relacionados Israel, em Samária, e reinou dezesseis anos. "E
com a ação de Iavé em resposta à infide fez o que era mau aos olhos do Senhor; não se
lidade dele. Essa opressão por Hazael pode apartou de nenhum dos pecados de Jeroboão, filho
ser o pano de fundo do oráculo de Amós de Nebate, com os quais ele fizera Israel pecar,
(cf. Amós 1.3 e ss.). porém andou neles. 12Ora, o restante dos atos de
Jeoás, e tudo quanto fez, e o seu poder, com que
A referência a um libertador é bastante pelejou contra Amazias, rei de Judá, porventura
semelhante ao tema do livro dos Juizes, e não estão escritos no livro das crônicas dos reis
a sua estrutura de pecado, juízo, arrepen de Israel? 13Jeoás dormiu com seus pais, e Jero
dimento e libertação (mediante um boão se assentou no seu trona Jeoás foi sepultado
libertador ou salvador). O libertador prova em Samária, junto aos reis' de Israel.
velmente foi um rei assírio cuja Jeoás de Israel não deve ser confundido
aproximação atraiu a atenção de Hazael com Joás de Judá (837-800 a.C.).
para longe de Israel — possivelmente Ada-
da Ninari III (810) 793 a.C.). 2. A Ação Profética de Eliseu e a Derro
Asera é freqüentemente mencionada no ta de Hazael (13.14-25)
Antigo Testamento, e especialmente asso
A última narrativa sobre a vida de Eli
ciada com o baalismo. A Asera pode indicar
seu a aparecer no livro dos Reis mencio
uma deusa (que é mencionada na literatura
de Ras Shamra e em passagens do Antigo na novamente o emprego de atos simbó
licos pelo profeta (v. 14-19), e o relato de
Testamento tais como IReis 15.13; 18.19;
sua morte, que inclui uma narrativa po
2Reis 21.7; 23.4 e ss.), ou um objeto de culto,
como no versículo em lide (cf. também Dt pular sobre o miraculoso poder dos ossos
de Eliseu (v. 20-24).
16.21; Jz 6.25; IRs 16.33), conquanto a
palavra apareça mais freqüentemente no
plural (asherim e asherot, bosque na RC). 1) O Ato Profético de Eliseu (13.14-19)
A forma do objeto de culto não é discutida ,4Estando Eliseu doente da enfermidade de que
no Antigo Testamento. Conseqüentemente, morreu, Jeoás, rei de Israel, desceu a ele e, cho
estudiosos identificam variadamente esse rando sobre ele exclamou: Meu pai, meu pai!
carro de Israel, e seus cavaleiros! 15E Eliseu lhe
objeto como “um poste simples, um poste disse: Toma um arco e flechas. E ele tomou um
talhado, um bordão, um triângulo na ponta arco e flechas. 16Então Eliseu disse ao rei de Is
de um bordão, uma cruz, um machado rael: Põe a mão sobre o arca E ele o fez. Eliseu
duplo, uma árvore, um toco de árvore, uma pôs as suas mãos sobre as do rei, 17e disse: Abre
tiara sacerdotal, e uma imagem de madeira” a janela para o oriente. E ele a abriu. Então disse
Eliseu: Atira. E ele atirou. Prosseguiu Eliseu: A
(cf. W. L. Reed, “Ashera” IDB). flecha do livramento do Senhor é a flecha do livra
Os limitados recursos militares que mento contra os sírios; porque ferirás os sírios em
sobraram a Israel após as incursões de Afeque, até os consumir. 18Disse mais: Toma as
278
flechas. E ele as tomou. Então disse ao rei de Is rarem um homem, viram uma dessas tropas, e
rael: Fere a terra. E ele a feriu três vezes, e ces lançaram o homem na sepultura de Eliseu. Logo
sou. 19Ao que o homem de Deus se indignou mui que ele tocou os ossos de Eliseu, reviveu e se le
to contra ele, e disse: Cinco ou seis vezes a deve vantou sobre os seus pés.
rias ter ferido; então feririas os sírios até os con
sumir; porém agora só três vezes ferirás os sírios.
O relato do retorno à vida do homem
cujo corpo foi lançado sobre os ossos de
Os profetas freqüentemente agiam de Eliseu quando o grupo que o sepultava se
modos estranhos na proclamação de sua apavorou ante a aproximação de atacantes
mensagem (cf. ISm 15.27 e s.; Is 20.2; Jr moabitas, ilustra a veneração e respeito
13.1 e ss.; Ez 4.1 e ss.; 5.1 e ss.; 37.15 e com que Eliseu era tido dentro das esco
ss.). Contudo, esse procedimento refletia las dos profetas, e em outros lugares, em
bem mais do que uma simples ilustração anos posteriores.
objetiva como meio de ensino. A ação O propósito mais imediato da inclusão
simbólica profética está intimamente liga desse relato popular neste contexto é a
da à concepção mágica de que ações es demonstração de poder associado a Eliseu.
pecíficas podem ser precipitadas dentro da Isso é uma prova confirmatória da ação
história em resposta a ações miméticas de simbólica dos versículos precedentes, asse
homens santos. gurando que, mediante tal poder profético
A ação simbólica profética hebraica é que caracterizava Eliseu, a ação se passa
a chave para a compreensão das estranhas ria, como de fato se deu (cf. 13.22 e ss.).
instruções de Eliseu ao rei de Israel para
que atirasse para o leste uma flecha desde
a sua janela, e também para que ferisse o 3) O Cumprimento do Ato Profético Sim
chão com outras das setas restantes. Ima bólico (13.22-25)
ginava-se que tal procedimento de fato
punha em ação as forças que provocariam 22Hazael, rei da Síria, oprimiu a Israel todos
a derrota do rei da Síria. os dias de Jeoacaz. 230 Senhor, porém teve mise
Meu pai, meu pai reflete a veneração ricórdia deles, e se compadeceu deles, e se tornou
para eles, por amor do seu pacto com Abraão^
do rei para com Eliseu, e provavelmente Isaque e Jacó; e não os quis destruir, nem lançá-
refere-se também aos poderes que se pre -los da sua presença.24Ao morrer Hazael, rei da
via estarem disponíveis para livrar Israel, Síria, Bene-Hadade, seu filho, reinou em seu lugar.
e pelos quais o rei está na verdade implo 25E Jeoás, filho de Jeoacaz, retomou das mãos de
rando a Eliseu. Bene-Hadade, filho de Hazael, as cidades que este
havia tomado das mãos de Jeoacaz, seu pai, na
Atirar a flecha na direção do oriente guerra; três vezes Jeoás o feriu, e recuperou as
dirige as forças de Iavé contra os sírios (cf. cidades de Israel.
a lança de Josué estendida na direção de
Ai, Js 8.18). O rei atira as flechas contra
a terra somente três vezes, o que irritou Dentro do contexto mais amplo de
Eliseu, que sugere que somente a limitada 2Reis 13.44 e ss., o redator empregou in
fé do rei impedia uma vitória mais signifi formações históricas tiradas dos arquivos
cativa. nacionais para confirmar o ato simbólico
de Eliseu, e para mostrar que as palavras
proféticas se cumprem. Assim, o interesse
2) A Morte e a Veneração de Eliseu (13.20 nos acontecimentos históricos entre Israel
- 21) e a Síria é entremeado pela constante
preocupação profética, por parte do reda
20Depois morreu Eliseu, e o sepultaram. Ora,
tor deuteronômico, em realçar a contri
as tropas dos moabitas invadiam a terra à entrada buição significativa de Eliseu e o ofício
do ano. 21E sucedeu que, estando alguns a enter profético.
279
Segunda Parte
Essa seção maior começa com a amar nem os filhos por causa dos pais; mas cada um
gura expressa no conflito entre Judá e Is será morto pelo seu próprio pecada 7Tàmbém
matou dez mil edomitas no Vale do Sul, e tomou
rael por instigação de Amazias (14.8 e ss.) em batalha a Sela; e chamou o seu nome Jocteel,
e conclui com a derrota do Reino do Norte nome que conserva até hoje. “Então Amazias en
(17.1 e ss.). Teologicamente, a passagem viou mensageiros a Jeoás, filho de Jeoacaz, filho
reflete a convicção de que a apostasia e a de Jeú, rei de Israel, dizendo: Vem, vejamo-nos
infidelidade nacionais só podem conduzir face a face. 9Mandou, porém, Jeoás, rei de Israel,
dizer a Amazias, rei de Judá: O cardo que estava
à fragmentação e derrota nacionais. Os reis no Líbano mandou dizer ao cedro que estava no
dessa era, tanto do Norte quanto do Sul, Líbano: Dá tua filha por mulher a meu filha Mas
são avaliados negativamente pelo(s) edi uma fera que estava no Líbano passou e pisou o
tores) de Reis. carda l0Na verdade feriste Edom, e o teu coração
se ensoberbeceu; gloria-te disso, e fica em tua ca
sa; pois, por que te entremeterias no mal, para
I. A Guerra Localizada Entre Judá e caíres tu, e Judá contigo?
Israel (14.1-22) A mão firme de Amazias (800-783 a.C.)
Durante todo o período dos reinos divi reflete-se nos 29 anos de duração de seu
didos a guerra localizada só foi interrom reinado, no modo como vingou a morte do
pida por períodos de ascendência israelita pai, e na sua vitória sobre os edomitas (cf.
sobre Judá. Para entender melhor essa 2Cr 25.5 e ss., que sugere que inicialmente
hostilidade, podem-se considerar os dados um contingente israelita deve ter partici
históricos que sugerem que ambos nunca pado-da campanha edomita).
experimentaram verdadeira unidade e que O escritor destaca que, conquanto Ama
seu período de união foi não somente bre zias tenha determinado a morte daqueles
ve, mas forjado basicamente devido ao po que assassinaram seu pai, os filhos dos as
derio singular de Davi. sassinos de Joás não foram mortos (v. 6)
— um aspecto que reflete o conceito deu-
1. A Ocasião da Guerra (14.1-10) teronômico de individualismo (Dt 24.16).
A vingança de crimes de sangue era um
‘No segundo ano de Jeoás, filho de Jeoacaz, costume israelita aceito, e concepções mais
rei de Israel, começou a reinar Amazias, filho de
Joás, rei de Judá. zTinha vinte e cinco anos quan antigas de solidariedade coletiva levavam
do começou a reinar, e reinou vinte e nove anos à punição de uma geração devido aos pe
em Jerusalém. O nome de sua mãe era Jeoadim, cados de outra (cf. Ex 20.5 e ss.; Js 7.22
de Jerusalém. 3E fez o que era reto aos olhos do e ss.). Uma compreensão maior da vonta
Senhor, ainda que não como seu pai Davi; fez,
porém, conforme tudo o que fizera Joás, seu pai. de de Deus levou Israel a entender que
4Contudo os altos não foram tirados; o povo ainda cada homem é responsável por sua própria
sacrificava e queimava incenso neles. Sucedeu que, vida, não pela de seus predecessores (cf. Jr
logo que o reino foi confirmado na sua mão, ma 31.29 e s.; Ez 18.1 e ss.). O Antigo Tes
tou aqueles seus servos que haviam matado o rei, tamento finalmente assim repudia a culpa
seu pai; 6porém os filhos dos assassinos não ma
tou, segundo o que está escrito no livro da lei de herdada.
Moisés, conforme o Senhor deu ordem, dizendo: Incentivado por sua demonstração de
Não serão mortos os pais por causa dos filhos, força sobre os edomitas, ou talvez refletin
280
do uma disputa de fronteira com Israel, sepultado em Jerusalém, junto a seus pais, na ci
Amazias desafiou Jeoás, rei de Israel. A dade de Davi. 21E todo o povo de Judá tomou a
fábula com que Jeoás responde a Amazias Azarias, que tinha dezesseis anos, e fê-lo rei em
lugar de Amazias, seu pai. 22Ete edificou a Elate,
é apenas uma das várias empregadas no e a restituiu a Judá, depois que o rei dormiu com
Antigo Testamento, freqüentemente com seus pais.
o propósito comum de demonstrar a ridí
cula fraqueza de um desafiante ou preten A avaliação deuteronômica de Amazias
dente ao poder (cf. Jz 9.7 e ss.; Ez 17.3 e ou é favorável (14.2 e ss.) ou é neutra (v.
ss.). Os versículos 8-10 são provavelmente 15 e ss.). A interpretação favorável de seu
de uma fonte do Norte. reino é consideravelmente aumentada caso
a frase “ainda que não como seu pai Davi”
2. A Derrota de Judá por Israel (14.11-14) (14.3) seja tratada como uma interpolação
posterior; essa é uma opinião sugerida por
"Amazias, porém, não o quis ouvir. De modo
que Jeoás, rei de Israel, subiu; e ele e Amazias,
Montgomery e Gehman (p. 439), e que
rei de Judá viram-se face a face, em Bete-Semes, provavelmente se deve aceitar.
que está em Judá. l2Então Judá foi derrotado A causa da conspiração suscitada con
diante de Israel, e fugiu cada um para a sua tenda. tra Amazias é indeterminada: pode ser a
13E Jeoás, rei de Israel, aprisionou Amazias, rei velha hostilidade dentro do círculo daque
de Judá, filho de Joás, filho de Acazias, em Bete-
-Semes e, vindo a Jerusalém, rompeu o seu muro les que assassinaram seu pai (12.20 e s.) ou
desde a porta de Efraim até a porta da esquina, daqueles que simpatizavam com os ho
quatrocentos côvados. I4E tomou todo o ouro e a mens a quem Amazias anteriormente con
prata, e todos os vasos que se achavam na casa denara à morte (14.5), ou o antagonismo
do Senhor e nos tesouros da casa do rei, como
também reféns, e voltou para Samária.
dos sacerdotes e seus aliados devido à apro
priação dos bens do templo por Amazias
Reflexão teológica posterior levou à (quer pela força de Jeoás quando ele veio
convicção de que a derrota de Judá refletia a Jerusalém, 14.13, quer por um ato pelo
o julgamento do Senhor por ter cultuado qual Amazias empregou os recursos do
deuses edomitas (cf. 2Cr 25.2 e ss.). A templo para comprar Jeoás), ou o desen
derrota de Amazias e a conseqüente des canto geral daqueles desapontados por sua
truição dos muros de Jerusalém, mais o derrocada ante Israel.
saque do templo, podem bem ter levado ao
posterior questionamento de seu reinado
(14.3) bem como à conspiração contra ele II. Uma Sucessão de Reis ímpios
(14.19 e s.). (14.23—17.6)
1. Jeroboão II de Israel (14.23-29)
3. Um Sumário do Reinado de Amazias
(14.15-22) 23No décimo quinto ano de Amazias, filho de
Joás, rei de Judá, começou a reinar em Samária,
15Ora, o restante dos atos de Jeoás, o que fez, Jeroboão, filho de Jeoás, rei de Israel, e reinou
e o seu poder, e como pelejou contra Amazias, rei quarenta e um anos. 24E fez o que era mau aos
de Judá, porventura não estão escritos no livro das olhos do Senhor; não se apartou de nenhum dos
crônicas dos reis de Israel? 16E dormiu Jeoás pecados de Jeroboãoi, filho de Nebate, com os
com seus pais, e foi sepultado em Samária, junto quais ele fizera Israel pecar. 2SFoi ele que restabe
aos reis de Israel. Jeroboão, seu filho, reinou em leceu os termos de Israel, desde a entrada de
seu lugar. Hamate até o mar de Arabá, conforme a palavra
17Amazias, filho de Joás, rei de Judá, viveu que o Senhor, Deus de Israel, falara por intermé
quinze anos depois da morte de Jeoás, filho de dio de seu servo Jonas, filho do profeta Amitai,
Jeoacaz, rei de Israel. I8Ora, o restante dos atos de Gete-Hefer. “ Porque viu o Senhor que a afli
de Amazias, porventura não está escrito no livro ção de Israel era muito amarga, e que não restava
das crônicas dos reis de Judá? ’’Conspiraram nem escravo, nem livre, nem quem socorresse a
contra ele em Jerusalém, e ele fugiu para Laquis; Israel. 27E ainda não falara o Senhor em apagar
porém enviaram após ele até Laquis, e ali o mata o nome de Israel de debaixo do céu; porém o li
ram. 20Então o trouxeram sobre cavalos; e ele foi vrou por meio de Jeroboão, filho de Jeoás. “ Ora,
281
o restante dos atos de Jeroboão, e tudo quanto fez, público (cf. a casa separada) e a co-regên-
e seu poder, como pelejou e como reconquistou cia de seu filho Jotão. Os nomes Azarias
para Israel Damasco e Hamate, que tinham sido
de Judá, porventura não estão escritos no livro e Uzias são sinônimos. Azarias (“Iavé tem
das crônicas de Israel? 29E Jeroboão dormiu com ajudado”) é comum em Reis; e Uzias, em
seus pais, os reis de Israel. E Zacarias, seu filho, Isaías e Crônicas (cf. Is 6.1; 2Cr 26.1 e ss.).
reinou em seu lugar. Casa separada tem tido variadas inter
Desde a era de Salomão, Israel não ti pretações, como habitação, como uma con
nha conhecido a prosperidade e grandeza dição, “não molestado” (Moffatt), ou “livre
associadas a Jeroboão II. Rivalizado so de obrigação” (tradução de John Gray em
mente pela dinastia de Onri na importân seu comentário). A questão gira em torno
cia que deu a Israel, Jeroboão é muito es de a expressão livre (chaphshi, livre; de
tranhamente e quase totalmente ignorado chaphash, ser livre; cf. Lv 19.20) ser uma
pelo editor deuteronômico. A estabilidade descrição do tipo de habitação em que o
política de seu reinado de 41 anos, con rei habitava ou das responsabilidades do
tudo, permanece em contraste marcante rei. 2Crônicas 26.21 e dez manuscritos de
com a agitação que se seguiu (cf. 15.8 2Reis 15.5 rezam chaphshith, que é o par-
e ss.). ticípio de separar; daí o adjetivo separada.
Em consonância com a posição teo O emprego de chaphshi em ISamuel 17.25
lógica do editor, o êxito de Jeroboão foi no sentido de livro de impostos, obrigações
atribuído ao Senhor, que não falara(...) em etc, sugere que aqui no versículo 5 o escri
apagar o nome de Israel de debaixo do tor talvez tenha em mente os deveres de
céu. Contudo, as obras proféticas de Amós Uzias. Ele estava desobrigado de certas
e Oséias são comentários apropriados so responsabilidades monárquicas que foram
bre a real e angustiante situação moral e assumidas por seu filho Jotão.
religiosa de Israel nesse tempo, e a prospe A natureza da lepra poderia ajudar a
ridade e grandeza nacional que acompa determinar se Uzias (1) residia num prédio
nharam a liderança de Jeroboão foram mal- separado, (2) tinha acomodações separadas
direcionadas, para dizer o mínimo. no palácio, ou (3) renunciou a certos deve
res monárquicos. Mas, como foi sugerido
2. Azarias (Uzias) de Judá (15.1-7) anteriormente, é impossível determinar a
partir da palavra lepra (metsora’) a exata
'No anjo vinte e sete de Jeroboão, rei de Is natureza da enfermidade, quer uma doen
rael, começou a reinar Azarias, filho de Amazias,
rei de Judá. 2Tinha dezesseis anos quando come ça superficial da pele ou a forma mais
çou a reinar, e reinou cinqüenta e dois anos, em séria de lepra. Da declaração do cronista
Jerusalém. O nome de sua mãe era Jecolia, de sobre a morte de Uzias pode-se inferir que
Jerusalém. ’E fez o que era reto aos olhos do ele foi sepultado longe dos outros (cf.
Senhor, conforme tudo o que fizera Amazias, seu
pai. 4Contudo os altos não foram tirados; o povo 2Cr 26-23).
ainda sacrificava e queimava incenso neles. 5E o
Senhor feriu o rei, de modo que ficou leproso até 3. A Anarquia Política em Israel (15.8-31)
o dia da sua morte; e habitou numa casa separada;
e Jotão, filho do rei, tinha o cargo da casa, jul O período de agitação política em Is
gando o povo da terra. 6Ora, o restante dos atos rael estava diretamente relacionado a um
de Azarias, e tudo quanto fez, porventura não problema duplo: o da sucessão ao trono
estão escritos no livro das crônicas dos reis de
Judá? 7E Azarias dormiu com seus pais, e com israelita e o ressurgimento assírio sob a li
eles o sepultaram na cidade de Davi. E Jorão, seu derança de Tiglate-Pileser III. Em primei
filho, reinou em seu lugar. ro lugar, um possível desencanto com a
dinastia de Jeú, o que se refletiu no assas
O longo reinado de 52 anos de Azarias sinato de seu sucessor, Zacarias (v. 8 e ss.),
foi maculado por sua lepra que aparente levou a um período de revolta sob Salum
mente provocou sua remoção do serviço (v. 10 e ss.), seguido por um período mais
282
longo de estabilidade sob Menaém (v. 17 Zacarias (“Iavé lembrou-se”), filho de
e ss.). Seu sucessor, Pecaías (v. 23 e ss.), Jeroboão II, reinou apenas dois meses.
contudo, foi logo assassinado por Peca (v. Além da avaliação estereotipada do reina
26), cujo reinado relativamente curto de do, feita pelo redator deuteronômico, pou
aproximadamente cinco anos (v. 27 e ss.) quíssimo se conhece sobre seu mandato.
terminou com seu assassinato pelas mãos Foi vítima de uma conspiração, aparente
de Oséias (17.1 e ss.). mente sob a liderança de Salum, que o
Segundo, a sorte de Israel nas duas úl assassinou em Jeblaám (cf. BJ, v. 10).
timas décadas de sua existência foi em
grande parte determinada pela dominação 2) Salum (15.13-16)
assíria do Oriente Próximo. Finalmente, l3SaIum, filho de Jabes, começou a reinar no
até mesmo Judá veio a estar sob a in ano trinta e nove de Uzias, rei de Judá, e reinou
fluência determinante da Assíria. Tiglate- um mês em Samária. I4E Menaém, filho de Gadi,
subindo de Tirza, veio a Samária; feriu a Salum,
-Pileser III, que tomou para si o nome Pul filho de Jabes, em Samária, matou-o e reinou em
como um nome do trono babilónico ao seu lugar. '5Ora, o restante dos atos de Salum, e
ascender àquele trono em 729 a.C., foi a conspiração que fez, estão escritos no livro das
um elemento fundamental no destino de crônicas dos reis de Israel. 16Então Menaém feriu
Israel nessa época. Conquanto seus regis a Tifsa, e a todos os que nela havia, como também
a seus termos desde Tirza; porque não lha tinham
tros históricos (745-727 a.C.) sejam incom aberto, por isso a feriu; e fendeu a todas as mulhe
pletos, pode-se reconstruir a estrutura bá res grávidas que nela estavam.
sica de acontecimentos que afetaram Is
rael. Em 743 ele começou uma série de O assassinato de Zacarias por Salum
campanhas, durante as quais recebeu tri reflete a contínua tensão no que respeita
buto de Rezim de Damasco e governantes à sucessão dinástica, com alguns preferin
vizinhos. Durante uma campanha poste do escolher outro rei em lugar do descen
rior, que terminou em vitória em 739, ele dente de Jeú. Oséias provavelmente esteve
recebeu tributo de Menaém de Israel. Em ativo durante essa época, e talvez te
734 Tiglate-Pileser III desceu o litoral nha tratado dessa instabilidade dinástica
através da Fenícia e Filistia, provavelmen (cf. Os 13.10 e ss.).
te em resposta a um apelo de Acaz de O severo tratamento dispensado por
Judá, que, segundo registros tanto bíbli Menaém à cidade de Tifsa reflete a leal
cos quanto assírios, pagou-lhe tributo. Pbr dade de seus cidadãos para com Salum. Tal
volta de 732 Damasco havia sido derrota ação com uma cidade israelita não tem
da, e o território no norte de Israel havia precedente na guerra localizada entre Judá
sido anexado. (Cf. D.J. Wiseman, em D. e Israel: fendeu a todas as mulheres grá
Winton Thomas, p. 53). vidas que nela estavam. A atrocidade de
passar mulheres grávidas (“com criança”)
1) Zacarias (15.8-12) ao fio da espada tem paralelo somente na
extrema crueldade de exércitos invaso
8No ano trinta e oito de Azarias, rei de Judá, res, tais como os sírios (8.12), ou grupos
reinou Zacarias, filho de Jeroboão, sobre Israel,
em Samária, seis meses. 9E fez o que era mau aos
atacantes, tais como o de amonitas (Am
olhos do Senhor, como tinham feito seus pais; 1.13).
nunca se apartou dos pecados de Jeroboão, filho
de Nebate, com os quais ele fizera Israel pecar. 3) Menaém (15.17-22)
10SaIum, filho de Jabes, conspirou contra ele;
feriu-o diante do povo, matou-o e reinou em seu 17No ano trinta e nove de Azarias, rei de
lugar. "Ora, o restante dos atos de Zacarias está Judá, Menaém, filho de Gadi, começou a reinar
escrito no livro das crônicas dos reis de Israel. sobre Israel, e reinou dez anos em Samária.
l2Esta foi a palavra do Senhor, que ele falara a 18E fez o que era mau aos olhos do Senhor; em
Jeú, dizendo: Tèus filhos, até a quarta geração, se todos os seus dias nunca se apartou dos pecados
assentarão sobre o trono de Israel. E assim foi. de Jeroboão, filho de Nebate, com os quais ele
283
fizera Israel pecar. l9Então veio Pul, rei da Assí a morte de seu pai (cf. 15.23 e 15.17). Esse
ria, contra a terra; e Menaém deu a Pul mil talen intervalo talvez reflita o tempo necessário
tos de prata, para que este o ajudasse a firmar o
reino na sua mão. “ Menaém exigiu este dinheiro para a Assíria aprovar a elevação de Pe
de todos os poderosos e ricos em Israel, para o caías ao trono. O assassinato de Bscaías
dar ao rei da Assíria, de cada homem cinqüenta pode ter sido estimulado pelo tributo que
siclos de prata; assim voltou o rei da Assíria, e não seu pai, Menaém, pagou aos assírios.
se demorou ali na terra. 21Ora, o restante dos
atos de Menaém, e tudo quanto fez, porventura 5) Peca (15.27-31)
não estão escritos no livro das crônicas dos reis
de Israel? 22Menaém dormiu com seus pais. 27 No ano cinqüenta e dois de Azarias, rei de
E Pecaías, seu filho, reinou em seu lugar. Judá, Peca, filho de Remalias, começou a reinar
sobre Israel, em Samária, e reinou vinte anos.
Menaém (“confortador”) chegou ao 28E fez o que era mau aos olhos do Senhor;
trono após o período de graves distúrbios nunca se apartou dos pecados de Jeroboão, filho
civis (cf. 15.14), e talvez tenham sido neces de Nebate, com os quais ele fizera Israel pecar.
2,Nos dias de Peca, rei de Israel, veio Tiglate-
sários alguns meses para ascender ao -Pileser, rei da A ssíria, e tomou Ijom,
trono. Quando posto em contraste com os Abel-Bete-Maacá, Janoa, Quedes, Hazor, Gi-
breves reinados de Zacarias e Salum, a leade e Galiléia, toda a terra de Naftali; e levou
duração de seu governo provê um inter cativos os habitantes para a Assíria. 30E Oséias,
regno de estabilidade. Isso não deve filho de Elá, conspirou contra Peca, filho de Rema
lias, o feriu e matou, e reinou em seu lugar, no
obscurecer, contudo, sua avaliação negati vigésimo ano de Jotão, filho de Uzias. 31Ora, o
va pelo escritor, nem sua óbvia sujeição à restante dos atos de Peca, e tudo quanto fez, estão
Assíria. O tributo que Menaém recolhia dos escritos no livro das crônicas dos reis de Israel.
homens abastados de Israel é indiretamente Quando o oficial de- Pecaías, filho de
mencionado nos anais das campanhas de Remalias, usurpou o trono, bem pode ter
Tiglate-Pileser III contra a Síria e a Pales dado a si mesmo o nome de trono de Peca
tina, no que fazem referência a Menaém: (Bright, p. 254). A atribuição de vinte anos
(...) Quanto a Menaém eu o suplantei ao reinado de Peca é o primeiro de vários
como uma tempestade de neve e ele(...) problemas cronológicos notáveis associa
fugiu como um pássaro e encurvou-se a dos ao oitavo século, e alguns estudiosos
meus pés? Eu o fiz retornar a seu lugar e substituem por cinco anos, enquanto
impus-lhe tributos, quais sejam: ouro, outros sugerem dois anos para o reinado de
prata, vestes de linho com ornamentos Pfeca.3
multicores(...) grande(...) recebi dele Antes da invasão de Tiglate-Pileser,
(Rawlinson, em ANET, p. 281 e s.). Peca e Rezim de Damasco buscaram for
4) Pecaías (15.23-26) mar com Judá uma coalizão antiassíria,
e quando isso falhou, atacaram Judá
23No ano cinqüenta de Azarias, rei de Judá,
Pecaías, filho de Menaém, começou a reinar sobre (cf. 15.37). Essa crise constitui o pano de
Israel em Samária, e reinou dois anos. 24E fez o fundo da passagem de Isaías 7.1 e ss. sobre
que era mau aos olhos do Senhor; nunca se apar “Emanuel”.
tou dos pecados de Jeroboão, filho de Nebate, com O fato de que os assírios, segundo os
os quais ele fizera Israel pecar. 25E Peca, chefe anais de Tiglate-Pileser III, “colocaram
das suas tropas, filho de Remalias, conspirou
contra ele, e o feriu em Samária, no castelo da casa Oséias como rei sobre eles” sugere que a
do rei, juntamente com Argobe e Arié; e com Peca conspiração contra Pfeca foi provavelmen
estavam cinqüenta homens dos filhos dos gileadi- te parte de uma revolta pró-assíria por
tas; e o matou, e reinou em seu lugar. 2<íOra, o Oséias.
restante dos atos de Pecaías, e tudo quanto fez,
estão escritos no livro das crônicas dos reis de
Israel. 3 N ão se pode en trar aqui nu m a análise completa desse problema, e
aqueles que se preocupam com a conciliação de problemas cronoló
Pecaías (“Iavé abriu”), segundo a crono gicos relacionados com esse e outros textos poderão consultar Edwin
R. Thiele, The M ysterious N um bers of the H ebrew Kings (Chicago:
logia bíblica, subiu ao trono dois anos após University o f Chicago Press, 1951).
284
4. Dois Reis Judeus (15.32—16.20) nos altos e nos outeiros, como também debaixo
de toda árvore frondosa.4
Em marcante contraste com a intriga
e revolução que caracterizaram Israel A Avaliação de Acaz (v. 1-4). Andou no
durante meados e o fim do oitavo século, caminho dos reis de Israel é uma referên
destaca-se a estabilidade de Judá. cia às religiões da natureza em Canaã,
especialmente aquelas associadas com os
1) Jotão (15.32-38) baalins (cf. 2Cr 28.2 e ss.). O crime mais
hediondo de Acaz foi, contudo, a reintro-
32No segundo ano de Peca, filho de Remalias,
rei de Israel, começou a reinar Jotão, filho de dução da antiga prática de sacrifício de
Uzias, rei de Judá. MTinha vinte e cinco anos crianças (cf. 2Cr 28.3). Provavelmente o
quando começou a reinar, e reinou dezesseis anos desespero de sua situação, análoga à de
em Jerusalém. O nome de sua mãe era Jerusa, Messa de Moabe (3.27), precipitou essa
filha de Zadoque. ^E fez o que era reto aos olhos
do Senhor; fez conforme tudo quanto fizera seu
atitude.
pai Uzias. 3SContudo os altos não foram tirados; sEntão subiu Rezim, rei da Síria, com Peca,
o povo ainda sacrificava e queimava incenso neles. filho de Remalias, rei de Israel, contra Jerusalém,
Foi ele que edificou a porta alta da casa do Senhor. para lhe fazer guerra; e cercaram a Acaz, porém
36Ora, o restante dos atos de Jotão, e tudo quanto não puderam vencê-lo. 6Nesse mesmo tempo
fez, porventura não estão escritos no livro das Rezim, rei da Síria, restituiu Elate à Síria, lan
crônicas dos reis de Judá? 37Naqueles dias çando fora dela os judeus; e os sírios vieram a
começou o Senhor a enviar contra Judá Rezim, Elate, e ficaram habitando ali até o dia de hoje.
rei da Síria, e Peca, filho de Remalias. :WE Jotão 7Então Acaz enviou mensageiros a Tiglate-Pi
dormiu com seus pais, e com eles foi sepultado na leser, rei da Assíria, dizendo; Eu sou teu servo e
cidade de Davi, seu pai. E Acaz, seu filho, reinou teu filho; sobe, e livra-me das mãos do rei da Síria,
em seu lugar. e das mãos do rei de Israel, os quais se levantaram
contra mim. 8E tomou Acaz a prata e o ouro que
A sugestão de que Jotão (“Iavé é se achou na casa do Senhor e nos tesouros da casa
completo”, isto é, “perfeito”) reinou 16 anos do rei, e mandou um presente ao rei da Assíria.
deve ser contrabalançada pelo reconheci 9E o rei da Assíria lhe deu ouvidos e, subindo
contra Damasco, tomou-a, levou cativo o povo
mento de que foi co-regente com seu pai para Quir, e matou Rezim.
Azarias, ou Uzias (15.5), pelo período
aproximado de 750-742 a.C. Exceto quan
to a referências a atividades de construção Capitulação à Assíria (v. 5-9). Prevendo
(cf. Jr 20.2; Ez 8.3; 9.2), quase nada da o avanço iminente da Assíria, Peca e
biografia de Jotão está registrada em Reis. Rezim buscaram uma coalizão antiassíria
com Judá (embora isso não seja explicita
mente afirmado, está claramente implí
2) Acaz (16.1-20) cito). A recusa de Judá conduziu à guerra
A preocupação pelo reinado de Acaz siro-efraimita de 734-733 a.C. (cf. 2Cr
gira principalmente em torno de seu envol 28.8-15; Is 7.1 e ss.) e à tentação de apelar
vimento com Tiglate-Pileser III, de copiar à Assíria, pedindo ajuda. Conquanto
objetos de culto assírios, e da pilhagem dos Isaías aconselhasse insistentemente a
arredores do templo. dependência do Senhor (cf. Is 7.3 e ss.),
Acaz buscou a ajuda de Tiglate-Pileser III
'No ano dezessete de Peca, filho de Remalias, e saqueou o templo a fim de financiar essa
começou a reinar Acaz, filho de Jotão, rei de Judá. abertura (v. 8 e ss.).
2Tinha Acaz vinte anos quando começou a reinar,
e reinou dezesseis anos em Jerusalém; e não fez ,0Então o rei Acaz foi a Damasco para se
o que era reto aos olhos do Senhor seu Deus, como encontrar com Tiglate-Pileser, rei da Assíria; e,
tinha feito Davi, seu pai, 3mas andou no caminho vendo o altar que estava em Damasco, enviou ao
dos reis de Israel, e até fez passar pelo fogo o seu sacerdote Urias a figura do altar, e o modelo exato
filho, segundo as abominações dos gentios que o
Senhor lançara fora de diante dos filhos de Israel.
4làmbém oferecia sacrifícios e queimava incenso 4 Cf. “N im rud Prism” Display Inscription Annals, p. 23-57.
285
de toda a sua obra. UE Unas, o sacerdote, edi O passadiço coberto é uma frase difícil.
ficou o altar; conforme tudo o que o rei Acaz lhe É traduzida por “estrado do trono” (Bíblia
tinha enviado de Damasco, assim o fez o sacerdote
Urias, antes que o rei Acaz viesse de Damasca
de Jerusalém) e caminho coberto para uso
,2Tendo o rei vindo de Damasco, viu o altar; e, no sábado (IBB, RA). A chave para a
acercando-se do altar, ofereceu sacrifício sobre tradução é o hebraico myysak, uma pa
ele; 13queimou o seu holocausto e a sua oferta de lavra desconhecida. Assim, alguns seguem
cereais, derramou a sua libação, e espargiu o a Septuaginta (themelion tês kathedras) e
sangue dos seus sacrifícios pacíficos sobre o
altar. 14E o altar de bronze^ que estava perante o lêem “base do assento”.
Senhor, ele o tirou da parte fronteira da casa, de Parece preferível seguir essa tradução
entre o seu altar e a casa do Senhor, e o colocou da Septuaginta. A base do assento pode ter
ao lado setentrional do seu altar. 1SE o rei Acaz sido feita de metal valioso, o qual foi reti
ordenou a Urias, o sacerdote, dizendo: No grande
altar queima o holocausto da manhã, como
rado como tributo para o rei da Assíria
também a oferta de cereais da noite, o holocausto (o que parece coerente em vista da preocu
do rei e a sua oferta de cereais, o holocausto de pação dos versículos precedentes com a
todo o povo da terra, a sua oferta de cereais e as questão de tributo). Muito provavelmente,
suas libações; e todo o sangue dos holocaustos, e porém, há a possibilidade de que a base
todo o sangue dos sacrifícios espargirás nele;
porém o altar de bronze ficará ao meu dispor para representasse uma posição especial de
nele inquirir. 16Assim fez Urias, o sacerdote, importância e honra para o rei judaico, o
conforme tudo quanto o rei Acaz lhe ordenara. que representaria uma ofensa ao rei assírio
(cf. “estrado do trono”, na Bíblia de Jeru
salém). A conclusão é apoiada no fato de
Retirada do Altar (v. 10-16). A substi
que o rei permanecia em pé num local
tuição do tradicional altar de bronze que designado quando era coroado (cf. 11.14)
jazia diante do templo por um altar assírio ou quando fazia decretos oficiais (cf. Josias
que Acaz havia visto em Damasco era um em 23.3).
símbolo de lealdade à Assíria, não mera
mente a expressão de uma fantasia arqui 5. Oséias, Último Rei de Israel (17.1-6)
tetônica de Acaz.
‘No ano duodécimo de Acaz, rei de Judá,
17Tàmbém o rei Acaz cortou as almofadas das começou a reinar Oséias, filho de Elá, e reinou sobre
bases, e de cima delas removeu a pia; tirou o mar Israel, em Samária, nove anos. 2E fez o que era
de sobre os bois de bronze, que estavam debaixo mau aos olhos do Senhor, contudo não como os
dele, e o colocou sobre um pavimento de pedra. reis de Israel que foram antes dele. 3Contra ele
l8Também o passadiço coberto para uso no subiu Salmanasar, rei da Assíria; e Oséias ficou
sábado, que tinham construído na casa, e a sendo servo dele e lhe pagava tributos. 40 rei da
entrada real externa, retirou da casa do Senhor, Assíria, porém, achou em Oséias conspiração;
por causa do rei da Assíria. l9Ora, o restante dos porque ele enviara mensageiros a Sô, rei do Egito,
atos de Acaz, e o que fez, porventura não estão e não pagava, como dantes, os tributos anuais ao
escritos no livro das crônicas dos reis de Judá? rei da Assíria; então este o fencerrou e o pôs em
20E dormiu Acaz com seus pais, e com eles foi grilhões numa prisão. 5E o rei da Assíria subiu por
sepultado na cidade de Davi. E Ezequias, seu filho, toda a terra, e chegando a Samária sitiou-a por
reinou em seu lugar. três anos. 6No ano nono de Oséias, o rei da
Assíria tomou Samária, e levou Israel cativo para
Pilhagem do Templo (v. 17-20). Almo a Assíria; e fê-los habitar em Haia, e junto a Habor,
o rio de Gozã, e nas cidades dos medos.
fadas das bases referem-se aos suportes
como rodas (cf. lRs 7.27 e ss.) que eram Oséias (“Iavé salva”) chegou ao trono
ornamentalmente talhados e provavel mediante o homicídio que praticou contra
mente de grande valor, tal como eram as Peca (15.30). Os registros assírios, porém,
bacias dentro delas, e os bois de bron declaram especificamente que Tiglate-
ze, sobre os quais repousava o lavatório -Pileser III colocou-o no trono: “Peca, seu
(lRs 7.25). Tudo isso foi retirado da área rei, eles o depuseram, e a Oséias pus [como
do templo, possivelmente como tributo rei] sobre eles” (Tablate de Ninrode, em
para a aliança assíria. Thomas, p. 55). Isso sugere que a revolta
286
de Oséias estava relacionada com um III. A Queda e Subseqüente Repovo
partido pró-Assíria, que teria apoiado a amento de Israel: Uma Avaliação
dinastia de Menaém e ao mesmo tempo Posterior (17.7-41)
teria se oposto à usurpação de Pecaías por
Pfeca (cf. 15.25 e ss.), A tese de que os livros dos Reis chegaram
à sua forma atual essencialmente pelas
Shalmanasar é Salmanasar V (727-722 mãos de dois editores deuteronômicos, um
a.C.), filho de Tiglate-Pileser III. Ele cercou vivendo durante o século sétimo e o outro
Samária como conseqüência da abertura em meados do século sexto (cf. Weiser, p.
israelita para o Egito. O cerco pode ter 170 e ss., mas especialmente p. 179; Georg
durado três anos, mas Salmanasar V muito Fohrer, p. 227 e ss.) claramente reflete-se
provavelmente morreu durante seu desen na estrutura e caráter dos versículos 7-41.
rolar. Ele foi sucedido por seu irmão Sargão
II (722-705 a.C.) Da Lista Epônima Assíria, 1. Uma Avaliação Deuteronômica da Desin
os três anos em que ele cercou Samária por tegração do Reino do Norte (17.7-23)
deixar de pagar tributo à Assíria seriam A partir da perspectiva da teologia deute
725-723 a.C. (cf. Wiseman, p. 58).
ronômica com sua insistência quanto ao
Pode-se entender que a referência ao rei controle divino da história, mas especial
da Assíria esteja atribuindo a queda de mente quanto ao princípio de pecado e
Samária a Salmanasar V. No entanto, retribuição dentro do contexto de aconte
Sargão II (722-705 a.C.) reivindica ter cimentos históricos, a queda de Samária
conquistado Samária em seu ano de foi interpretada como resultado de juízo
ascensão. Seus anais oferecem uma expres divino sobre Israel por causa de uma série
siva descrição do evento. de pecados tão antigos quanto o Êxodo-
No princípio [de meu reinado(...) a cidade -Conquista e tão recentes quanto a ação
dos sa]maritanos eu [a cerquei e de Sargão II.
conquistei(...)] o que me permitiu obter
vitória(...) trazer prisioneiros [27.290 das 1) Uma Interpretação Teológica da História
pessoas que nela habitavam; dentre elas eu da Salvação de Israel (17.7-18)
equipei cinqüenta carros para minhas
unidades do exército real(...) a cidade de 7Assim sucedeu, porque os filhos de Israel
tinham pecado contra o Senhor seu Deus, que os
Samária] eu a restaurei e a tornei mais habi fizera subir da terra do Egito, de debaixo da mão
tável do que antes. [Trouxe a ela] pessoas de Faraó, rei do Egito, e porque haviam temido a
dos países conquistados por minhas outros deuses, 8e andado segundo os costumes das
próprias mãos. [Meu oficial estabeleci sobre nações que o Senhor lançara fora de diante dos
filhos de Israel, e segundo os que os reis de Israel
eles como governador distrital e] impus-lhe introduziram.9Também os filhos de Israel fizeram
tributo como sobre uma (cidade) assíria(.„) secretamente contra o Senhor seu Deus coisas que
Fiz com que se misturassem; o preço de não eram retas. Edificaram para si altos em todas
mercado(...) (cf. Anais, 10-18; em Thomas, as suas cidades, desde a torre das atalaias até a
p. 59. Lacunas, assinaladas por colchetes, cidade fortificada; 10levantaram para si colunas e
aserins em todos os altos outeiros, e debaixo de
podem ser preenchidas a partir de outras todas as árvores frondosas; "queimaram incenso
fontes, tais como a “Inscrição de Exibição” em todos os altos, como as nações que o Senhor
ou o “Prisma de Ninrode” IV, 25.41). expulsara de diante deles; cometeram ações iníquas,
provocando à ira o Senhor, 12e serviram os ídolos,
A vitória de Sargão pode ter envolvido dos quais o Senhor lhes dissera: Não fareis isso.
uma participação conjunta na captura da I3Todavia o Senhor advertiu a Israel e a Judá, pelo
cidade ou, como Gray pressupõe, pode signi ministério de todos os profetas e de todos os
videntes, dizendo: Voltai de vossos maus caminhos,
ficar que Sargão, irmão de Salmanasar, e guardai os meus mandamentos e os meus esta
capturou Samária antes de ascender ao tutos, conforme toda a lei que ordenei a vossos pais
trono como sucessor do irmão. e que vos enviei pelo ministério de meus servos,
287
os profetas. 14Eles, porém, não deram ouvidos; é uma frase que faz lembrar a teimosia de
antes endureceram a sua cerviz, como fizeram seus Israel no deserto.
pais, que não creram no Senhor seu Deus; ^rejei
taram os seus estatutos, e o seu pacto, que fizera
com os pais deles, como também as advertências 2) A Subseqüente Desintegração de Judá
que lhes fizera; seguiram a vaidade e tornaram-se (17.19,20)
vãos, como também seguiram as nações que estavam
ao redor deles, a respeito das quais o Senhor lhes 19Nem mesmo Judá havia guardado os manda
tinha ordenado que não as imitassem. 16E, mentos do Senhor seu Deus; antes andou nos
deixando todos os mandamentos do Senhor seu costumes que Israel introduzira. 20Pelo que o
Deus, fizeram para si dois bezerros de fundição, Senhor rejeitou toda a linhagem de Israel, e os
e ainda uma Asera; adoraram todo o exército do oprimiu, entregando-os nas mãos dos despojadores,
céu, e serviram a Baal. I7Fizeram passar pelo fogo até que os expulsou da sua presença.
seus filhos, suas filhas, e deram-se a adivinhações
e encantamentos; e venderam-se para fazer o que Um editor que viveu após a queda de
era mau aos olhos do Senhor, provocando-o à ira. Jerusalém, provavelmente da escola deute-
18Pelo que o Senhor muito se indignou contra ronômica, avaliou a experiência de Judá
Israel, e os tirou de diante da sua face; não ficou
senão somente a tribo de Judá. à luz da derrocada de Israel. O breve comen
tário que inseriu ressalta a contínua
Numa descrição da ação de Iavé que é validade da teologia deuteronômica: o
muito semelhante em espírito às declarações pecado nacional traz inevitavelmente a retri
de fé (Dt 26.5 e ss.), ao apelo introdutório buição nacional.
nos mandamentos (Ex 20.1), ou às narra 3) A Contínua Rejeição de Jeroboão I
tivas recapitulatórias sobre a liderança de (17.21-23)
Israel por Iavé (Js 24.1 e ss.; Ne 9.1 e ss.),
o escritor apela à história da salvação de 21Pois rasgara Israel da casa de Davi; e eles
fizeram rei a Jeroboão, filho de Nebate, o qual
Israel (v. 7) e ilustra a atitude irresponsável apartou Israel de seguir o Senhor, e os fez cometer
de Israel para com a experiência redentora. um grande pecada 22Assim andaram os filhos de
O temor do Senhor é, no Antigo Testa Israel em todos os pecados que Jeroboão tinha
mento, o sinônimo mais aproximado de cometido; nunca se apartaram deles; “ até que o
religião; contudo, aqui temor é para com Senhor tirou Israel da sua presença, como falara
por intermédio de todos os seus servos os profetas.
outros deuses (uma violação do primeiro Assim foi Israel transportado da sua terra para
mandamento). O conceito de religião como a Assíria, onde está até o dia de hoje.
temor brota do sentimento de medo,
respeito profundo, ou, por outro lado, do Com palavras que repetem a condenação
fascínio que surge na presença do santo. estereotipada de sucessivos reis israelitas,
Costumes (chuq) é a mesma palavra que “não se apartou dos pecados de Jeroboão,
é traduzida por estatutos (v. 15). É empre filho de Nebate” (15.18, et al.), o editor
gada com vários sentidos no restante do deuteronômico retorna à queda de Samária.
Antigo Testamento como uma ordenação, Isso ocorreu, ele insiste, porque o povo não
decreto ou determinação seja de Deus ou repudiou os caminhos de Jeroboão: uma
do homem (cf. Ex 12.24; 15.25; Is 24.5), conclusão adequada ao tratamento que o
ou como leis civis prescritas por Deus (Ex editor dispensa à queda de Samária.
18.16). O contraste entre os estatutos de Iavé
e os costumes das pessoas é a medida da 2. Uma Perspectiva Sacerdotal do Repovo
apostasia de Israel (mais tarde chuq refere- amento de Israel (17.24-41)
-se aos costumes de Israel, após os quais Conquanto a forma final dessa passagem
Israel andou, cf. 17.19). tenha vindo da escola deuteronômica após
Contudo a despeito de tal conduta pelo o exílio, a(s) narrativa(s) apresenta(m) todos
povo, o Senhor foi fiel à aliança e enviou os indícios de serem de autoria sacerdotal.
profetas que buscaram chamar homens para Por exemplo, isso se vê no papel do sacer
a vida de aliança. Mas não deram ouvidos dote nos versículos 24-28, a contínua
288
preocupação com o culto, os altares, e 2) A Necessidade de Pureza na Adoração
aqueles que servem como sacerdotes (v. (17.29-34a)
29-34a, conquanto os deuteronomistas esti 2,Todavia as nações faziairí cada uma o seu
vessem igualmente interessados com o local próprio deus, e os punham nas casas dos altos que
do culto). Refletido por toda a narrativa está os samaritanos tinham feito, cada nação nas cidades
o problema pós-exílico dos samaritanos, os que habitava. 30Os de Babilônia fizeram Sucote-
descendentes daqueles que foram reassen- -Benote; os de Cuta fizeram Nergal; os de Hamate
fizeram Asima; 31os aveus fizeram Nibaz e
tados em Israel (cf. 17.6). Tartaque; e os sefarvitas queimavam seus filhos no
fogo a Adrameleque, e a Anameleque, deuses de
1) A Contribuição da Liderança Sacerdotal: Sefarvaim. ,2Temiam também ao Senhor, dentre o
Ensinando a Lei de Deus (17.24-28) povo fizeram para si sacerdotes dos lugares altos,
os quais exerciam o ministério nas casas dos lugares
24Depois o rei da Assíria trouxe gente de Babi altos. 33Assim temiam ao Senhor, mas também
lônia, de Cuta, de Ava, de Hamate e de Sefarvaim, serviam a seus próprios deuses, segundo o costume
e a fez habitar nas ddades de Samária em lugar das nações do meio das quais tinham sido trans
dos filhos de Israel; e eles tomaram Samária em portados. 34Até o dia de hoje fazem segundo os
herança, e habitaram nas suas cidades. 25E antigos costumes.
sucedeu que, no princípio da sua habitação ali, não
temeram ao Senhor; e o Senhor mandou entre eles Samaritanos não implica necessaria
leões, que mataram alguns deles. 26Pelo que foi mente que essa passagem seja de origem
dito ao rei da Assíria: A gente que transportaste, pós-exílica, conquanto provavelmente o
e fizeste habitar nas cidades de Samária, não seja, pois registros assírios consistentemente
conhece a lei do deus da terra; por isso ele tem
enviado entre ela leões que a matam, porquanto
falam de Samária durante esse período.4
não conhece a lei do deus da terra. 27Então o rei O editor continua a ressaltar a natureza
da Assíria mandou dizer: Levai ali um dos sacer corrompida da religião entre os samaritanos
dotes que transportastes de lá para que vá e habite por ressaltar que temiam a Iavé ao mesmo
ali, e lhes ensine a lei do deus da terra. “ Veio, pois, tempo em que serviam a seus próprios
um dos sacerdotes que eles tinham transportado
de Samária, e habitou em Betei, e lhes ensinou como deuses (v. 32,33). Conclui-se a menção a
deviam temer ao Senhor. outras violações da lei com a observação
de que até o dia de hoje fazem segundo os
antigos costumes. Embora seja impossível
A crise material que se abateu sobre os
determinar a data da narrativa com base
que repovoaram Israel foi interpretada
segundo a antiga crença de que cada terra no versículo 34, o teor geral sugere um
tinha seu próprio deus. Conseqüentemente, período de tempo consideravelmente afas
para que os reassentados vivessem pacifi tado dos acontecimentos; e provavelmente
está certo propor uma data quando o
camente na terra, deviam ter conhecimento
de Iavé. Com esse objetivo, um sacerdote problema samaritano da era pós-exílica
tivesse emergido (conquanto o v. 24 bem
de Israel é enviado a Samária a fim de que
lhes ensine a lei do deus da terra. Con possa representar uma inserção editorial
quanto essa narrativa reflita a opinião posterior).
primitiva que associa diretamente Iavé com
3) O Fracasso em Obedecer à Instrução
a terra e atribui toda ação ao Senhor (cf.
do Senhor (17.34b-40)
Am 4.6 e ss.; Ex 21.12-14), ela destaca posi
tivamente a convicção israelita de que Não temem ao Senhor; nem fazem segundo os
deve-se temer (adorar) Iavé de Israel acima seus estatutos, nem segundo as suas ordenanças;
de todos os outros (Ex 20.3). Também da nem tampouco segundo a lei, nem segundo o manda
mento que o Senhor ordenou aos filhos de Jacó,
preocupação básica é a função positiva do a quem deu o nome de Israel, 35com os quais o
sacerdote que ensina. Essa preocupação Senhor tinha feito um pacto, e lhes ordenara,
pelo sacerdote caracteriza em .última dizendo: Não temereis outros deuses, nem vos incli-
instância essa passagem como sendo de
origem sacerdotal. 4 “Taylor Prism ”, M useu Britânico, n:' 91.032.
289
nareis diante deles, nem os servireis, nem lhes um avanço essencial em relação ao pensa
oferecereis sacrifícios; 36mas sim ao Senhor, que mento da passagem anterior, e são sem
vos fez subir da terra do Egito com grande poder
e com braço estendido, a ele temereis, a ele vos incli dúvida um relato paralelo que se desen
nareis, e a ele oferecereis sacrifícios. 37Quanto aos volveu independentemente dos versículos
estatutos, às ordenanças, à lei, e ao mandamento, 7-18. A passagem é apropriadamente
que para vós escreveu, a esses tereis cuidado de incluída dentro de um diferente contexto
observar todos os dias; e não temereis outros deuses; literário, tendo vindo do segundo editor
'se do pacto que fiz convosco não vos esquecereis.
Não temereis outros deuses, 39mas ao Senhor deuteronômico, que escreveu em meados
vosso Deus temereis, e ele vos livrará das mãos do século sexto.
de todos os vossos inimigos. 40Contudo eles não
ouviram; antes fizeram segundo o seu antigo 4) O Sincretismo Samaritano de Iavé e
costume.
Outros Deuses (17.41)
Nesse ponto o escritor volta a falar sobre 41Assim estas nações temiam ao Senhor, mas
o modo como Israel repudiou a revelação serviam também as suas imagens esculpidas;
divina, e o conteúdo dos versículos 34b-40 também seus filhos, e os filhos de seus filhos fazem
até o dia de hoje como fizeram seus pais.
dificilmente se aplicaria aos samaritanos
reassentados. O Senhor não fez qualquer Acostumados com a adoração de muitos
aliança com aqueles novos habitantes, nem deuses, os novos habitantes buscaram
são eles descendentes de Jacó; o Senhor não adaptar o culto de Iavé ao seu próprio
escreveu a lei e mandamentos para eles, nem panteão. A frase fazem até o dia de hoje
os tirou do Egito. A passagem deve ser clara como fizeram seus pais indica uma data
mente lida em relação com os versículos posterior de composição para essa obser
7-18. Os versículos 34b-40 não representam vação editorial.
Terceira Parte
290
é moldada por uma preocupação editorial no de Oséias, rei de Israel, Samária foi tomada.
com as personagens proféticas e por inte uDepois o rei da Assíria levou Israel cativo para
a Assíria, e os colocou em Haia, e junto ao Ha-
resses que caracterizavam a escola deutero- bor, rio de Gozã, e nas ddadefe dos medos; ^por
nômica. quanto não obedeceram à voz do Senhor seu
Isaías esteve tão relacionado com a crise Deus, mas violaram o seu pacto, nada ouvindo
assíria que 18.13—19.37 (com uma exceção nem fazendo de tudo quanto Moisés, servo do
sem importância) reaparece na conclusão Senhor, tinha ordenada
do proto-Isaías (cf. Is 37). Como no caso Situar a ascensãò de Ezequias no ter
das narrativas de Elias-Eliseu, é propósito ceiro ano de Oséias reflete um problema
do escritor identificar a influência profética bastante difícil associado com a datação
nas questões nacionais. Além disso, o edi sincrônica empregada em Reis. A coloca
tor também está interessado na ênfase profé ção por Thiele de uma faceta do proble
tica sobre a inviolabilidade de Sião, a crença ma é bastante indicativa acerca da com
de que Jerusalém não cairia em face de plexidade e confusão características da
ataque inimigo (lRs 19.6 e s.), uma crença questão toda da cronologia sincrônica em
destinada a tornar-se doutrina, e uma Reis. Acaz chegou ao trono com vinte
bênção destinada a ser pervertida num falso anos de idade (16.2; 2Cr 28.1), no décimo
entendimento acerca da graça de Deus sétimo ano de Pfeca (16.1). Assim, Acaz
(cf. Jr 7.1 e ss.). O editor também se preo tinha 20 anos de idade no décimo sétimo
cupa em apresentar a teologia deuteronô- ano de Peca. Psca esteve no trono por 20
mica da história conforme se vê refletida anos (15.27), o que deixaria Acaz com 23
nos negócios de estado judaicos. Seu maior anos ao fim do reinado de Peca. Peca foi
interesse é ilustrar a contínua relação teo morto e sucedido por Oséias (15.30). Se
lógica entre a apostasia e a adversidade, a gundo a passagem em questão, Ezequias
fidelidade e a prosperidade. começou a reinar no terceiro ano de Oséi
1. A Reforma e Independência de Ezequias as (18.1). Por esse tempo Acaz estaria com
(18.1-12) 26 anos. Ezequias tinha 25 quando come
çou a reinar (18.2; 2Cr 29.1). Como Thie
'O ra, sucedeu que, no terceiro ano de Oséias,
filho de Elá, rei de Israel, começou a reinar Eze
le conclui, no que é uma afirmação in
quias, filho de Acaz, rei de Judá. 2Tinha vinte e completa, “certamente aqui existe algo se
cinco anos quando começou a reinar, e reinou riamente errado, pois uma criança de um
vinte e nove anos em Jerusalém. O nome de sua ano sem dúvida não poderia ser pai” (Thi
mãe era Abi, filha de Zacarias. 3Ele fez o que era ele, p. 104). Ele resolve o problema, ante
reto aos olhos do Senhor, conforme tudo o que
fizera Davi, seu pai. ‘‘Tirou os altos, quebrou as cipando os reinados de Peca e Oséias em
colunas, e deitou abaixo a Asera; e despedaçou relação ao que se declara no versículo 1
a serpente de bronze que Moisés fizera (por quanto ao reinado de Ezequias — um
quanto até aquele dia os filhos de Israel lhe quei problema que não podemos examinar aqui
mavam incenso), e chamou-lhe Neiistã. sConfiou
no Senhor Deus de Israel, de modo que depois (cf. Thiele, p. 105 e ss.; 136 e ss.).
dele não houve seu semelhante entre todos os O nome Neiistã lembra a palavra ser
reis de Judá, nem entre os que foram antes dele. pente (nachash) mas está mais diretamente
6Porque se apegou ao Senhor; não se apartou de relacionada com nechushah, bronze. A se
o seguir, e guardou os mandamentos que o Se melhança é indubitavelmente um jogo de
nhor ordenara a Moisés. 1Assim o Senhor era
com ele; para onde quer que saísse prosperava. liberado de palavras. O fato de a imagem
Rebelou-se contra o rei da Assíria, e recusou ser representar uma violação do segundo
vi-la 8Feriu os filisteus até Gaza e os seus ter mandamento é um motivo tão óbvio quan
mos, desde a torre dos atalaias até a cidade forti to adequado para eliminá-lo da vida re
ficada. 9No quarto ano do rei Ezequias, que era
o sétimo ano de Oséias, filho de Elá, rei de Is
ligiosa.
rael, Salmanasar, rei da Assíria, subiu contra Sa- Confiou é a palavra comum (batach)
mária, e a cercou '°e, ao fim de três anos, tomou- que designa ter fé em Deus (cf. 19.10; SI
-a. No ano sexto de Ezequias, que era o ano no 9.10; 21.7; 22.5,6; Is 26.3,4), mas também
291
é empregada para relacionamentos huma peito a se houve uma única invasão por
nos (Jz 9.26; SI 41.9; Jr 17.5; Mq 7.5), e Senaqueribe, ou duas.
confiança em coisas, o que freqüentemen Conquanto uma maioria de eruditos
te é condenado (cf. Am 6.1; Os 10.13; Ez opte por uma dupla invasão, um erudito
16.15). tão competente e minucioso com H. H.
A afirmação de que Ezequias se ape Rowley defende vigorosamente uma única
gou (dabaq) ao Senhor significava para ele invasão. Numa publicação mais recente
agarrar-se ao, ou manter-se perto (dabaq) do que a de Rowley, E. W. Heaton conclui
do, Senhor em lealdade; ele também guar que, com base no conhecimento atual, é
dou os mandamentos do Senhor fielmente. difícil decidir, mas que as discrepâncias
A declaração de que Ezequias rebelou- entre a teoria da invasão dupla, de um la
-se descreve com exatidão tanto a situação do, e os anais assírios e os registros autên
política quanto a reforma religiosa. A in ticos de Isaías, de outro, favorecem bas
tranqüilidade ocasionada pela morte de tante a opinião de que 18.13-16 é um su
Sargão II e os primeiros anos de Senaque- mário breve e factual da invasão, e que
ribe levaram a uma rebelião geral, e a 18.17—19.8 deve ser situado antes do pa
reforma religiosa esteve diretamente rela gamento do tributo. A invasão única é
cionada com isso. As lealdades religiosas aceita como hipótese de trabalho para es
e políticas estavam intimamente entreme te estudo.
adas, e exigia-se que nações conquistadas
fizessem concessões, quando não que ado a. A Capitulação de Ezequias Diante de
tassem a religião do poder conquistador. Senaqueribe (18.13-18)
A referência à derrota dos filisteus (v. L,No ano décimo quarto do rei Ezequias, su
8) é confirmada na declaração de Sena- biu Senaqueribe, rei da Assiria, contra todas as
queribe, “Fiz com que Padi, seu rei [isto cidades fortificadas de Judá, e as tomou. 14Pelo
que Ezequias, rei de Judá, enviou ao rei da As
é, de Ecrom], fosse libertado de Jerusalém síria, a Laquis, dizendo: Pequei; retira-te de mim;
e se assentasse no trono”.5 tudo o que me impuseres suportarei. Então o rei
da Assíria impôs a Ezequias, rei de Judá, trezen
2. A Tradição de Isaías (18.13—20.19) tos talentos de prata e trinta talentos de oura
15Assim deu Ezequias toda a prata que se achou
Muito semelhante aos episódios de na casa do Senhor e nos tesouros da casa do rei.
Elias-Eliseu nas narrativas concernentes à 16Foi nesse tempo que Ezequias, rei de Judá, cor
dinastia de Onri, as narrativas em questão tou das portas do templo do Senhor, e dos um
concentram-se na atividade profética de brais, o ouro de que ele mesmo os cobrira, e o
uma pessoa singular e criativa, o profeta deu ao rei da Assíria. l7Contudo este enviou de
Laquis Tartã, Rabe-Sáris e Rabsaqué, com um
Isaías. Exceto quanto ao sumário histórico grande exército, ao rei Ezequias, a Jerusalém; e
dos versículos 14-16, a coleção maior é ba subiram, e vieram a Jerusalém. E, tendo chega
sicamente composta daquelas tradições do, pararam ao pé do aqueduto da piscina supe
proféticas que trataram da crise assíria e rior, que está junto ao caminho do campo do
lavandeira 18Havendo eles chamado o rei, saíram-
do papel que Isaías nela desempenhou. -lhes ao encontro Eliaquim, filho de Hilquias, o
mordomo, e Sebna, o escrivão, e Joá, filho de
1) A Crise com Senaqueribe (18.13—19.37) Asafe, o cronista.
Um dos problemas mais perturbadores
do segundo livro dos Reis, aliás, de toda Os versículos 14b-16 — que se rela
a história veterotestamentária surge com cionam estritamente a essa cápitulação —
a crise de Senaqueribe e com o relaciona são extraídos de uma crônica que descreve
mento entre as várias narrativas assim en a capitulação de Ezequias e seus esforços
trelaçadas em 18.13—19.37 (cf. Is 36—37; subseqüentes para apaziguar Senaqueribe
2Cr 32). A questão fundamental diz res mediante o pagamento de tributo. Essa
narrativa é geralmente aceita como a ver
5 “Taylor Prism”, M useu Britânico, n? 91.032. são resumida da crise de 701 a.C.
292
A presença de Senaqueribe em Laquis a guerra. Em quem, pois, agora confias, que con
tra mim te revoltas? 21Estás confiando nesse bor
é confirmada pictoricamente por um bai- dão de cana quebrada, que é o Egito; o qual, se
xo-relevo numa parede de seu palácio real alguém nele se apoiar, entrar-lhe-á pela mão e a
de Nínive, em que ele é retratado como traspassará; assim é Faraó, rei do Egito, para com
sentado no trono em seu acampamento todos os que nele confiam. 22Se, porém, me dis
junto a Laquis. Acima do baixo-relevo do serdes: No Senhor nosso Deus confiamos; porven
tura não é esse aquele cujos altos e altares Eze
rei encontra-se a inscrição, “Senaqueribe, quias tirou, dizendo a Judá e a Jerusalém: Pe
rei de todos, rei da Assíria, sentado em rante este altar adorareis em Jerusalém? 23Ora,
seu trono-nimedu enquanto o espólio da pois, faze uma aposta com o meu senhor, o rei
cidade de Laquis passava diante dele” (Wi- da Assíria: dar-te-ei dois mil cavalos, se tu pude
res dar cavaleiros para eles. 24Como, então, pode
seman, in Thomas, referindo-se ao relevo rias repelir um só príncipe dos menores servos
n.° 124.911 do Museu Britânico). de meu senhor, quando estás confiando no Egito
Tàrtã (tarten) é um empréstimo que sig para obteres carros e cavaleiros? 25Porventura
nifica marechal de campo ou comandante- teria eu subido sem o Senhor contra este lugar
em-chefe (cf. Is 20.1), e é utilizado para o para o destruir? Foi o Senhor que me disse: So
be contra esta terra, e a destrói. “ Então disseram
general assírio no comando. Rabe-Sáris Eliaquim, filho de Hilquias, e Sebna, e Joá, a
(rab-saris, isto é, eunuco principal, pode Rabsaqué: Rogamos-te que fales aos teus servos
significar “aquele que permanece junto [ao em aramaicoi, porque bem o entendemos; e não
rei]”). Rabsaqué (rab-shaqeh) designava o nos fales na língua judaica, aos ouvidos do povo
que está em cima do m ura 27Rabsaqué, porém,
copeiro-chefe, que era um oficial da corte lhes disse: Porventura mandou-me meu senhor pa
de alta posição (cf. Neemias), e freqüente ra falar estas palavras a teu senhor e a ti, e não
mente era encarregado de questões admi aos homens que estão sentados em cima do mu
nistrativas (cf. IDB). ro, que juntamente convosco hão de comer o seu
excremento e beber a sua urina? “ Então, pondo-
-se em pé, Rabsaqué clamou em alta voz, na lín
b. Uma Confiança Singular em Face da gua judaica, dizendo: Ouvi a palavra do grande
Adversidade (18.19—19.37) rei, do rei da A ssíria.29Assim diz o rei: Não vos
engane Ezequias; porque não vos poderá livrar da
Há amplo consenso de que 2Reis 18.17 minha mão; 30nem tampouco vos faça Ezequias
—19.37 contém dois relatos paralelos do confiar no Senhor, dizendo: Certamente nos li
mesmo evento, a crise de Senaqueribe vrará o Senhor, e esta cidade não será entregue
(quer tenha havido uma crise, ou uma cri na mão do rei da Assíria. 3,Não deis ouvidos a
Ezequias; pois assim diz o rei da Assíria: Fazei
se dupla, em 701 a.C.) e uma outra inva paz comigo, e saí a mim; e coma cada um da sua
são quinze ou vinte anos mais tarde. A vide e da sua figueira, e beba cada um a água da
relação íntima entre as duas narrativas é sua cisterna; 32até que eu venha, e vos leve para
graficamente descrita mediante o seguinte uma terra semelhante à vossa, terra de trigo e de
esboço extraído de Fohrer: mosto, terra de pão e de vinhas, terra de azeite de
oliveiras e de mel; para que vivais e não morrais.
Senaqueribe exige a capitulacão 18.13, Não deis ouvidos a Ezequias, quando vos enga
17-37 ........................................ 19.9b-13 na, dizendo: O Senhor nos livrará. 33Porventura
A reação de Ezequias 19.1-5...19.14-19 os deuses das nações puderam livrar, cada um a
A promessa de Isaías 19.6,7...19.20-34 sua terra, das mãos do rei da Assíria? 34Que é
A retirada dos assírios 19.8,9a,36, feito dos deuses de Hamate e de Arpade? Que é
feito dos deuses de Sefarvaim, de Hena e de Iva?
37.................................................... 19.34 porventura livraram Samária da minha mão?
Esse esboço do texto, mais do que a se 35Dentre todos os deuses das terras, quais são os
qüência da IBB, deve-se tê-lo em mente que livraram a sua terra da minha mão, para que
como uma base melhor para compreensão o Senhor livre Jerusalém da minha mão? 360 po
vo, porém, ficou calado, e não lhe respondeu uma
das complicações de toda essa seção. só palavra, porque o rei ordenara, dizendo: Não
lhe respondais. 37Então Eliaquim, filho de Hil
,9E Rabsaqué lhes disse: Dizei a Ezequias: quias, o mordomo, e Sebna, o escrivão, e Joá, fi
Assim diz o grande rei, o rei da Assíria: Que lho de Asafe, o cronista, vieram a Ezequias com
confiança é essa em que te estribas? 20Dizes (são, as vestes rasgadas, e lhe fizeram saber as pala
porém, palavras vãs): Há conselho e poder para vras de Rabsaqué.
293
Exigência de Capitulação (18.19-37). A que o silêncio que se seguiu àquelas
futilidade da resistência (v. 19-25) é decla propostas foi, na verdade, um evidente
rada pelo representante de Senaqueribe: (1) repúdio.
o Egito é incapaz de livrar e se revelará g u a n d o o rei Ezequias ouviu isto rasgou as
como uma cana partida, sugerindo a sorte suas vestes, cobriu-se de saco, e entrou na casa do
inevitável daqueles que confiam em tal Senhor. 2Então enviou Eliaquim, o mordomo, e
aliança. (2) A remoção dos lugares altos Sebna, o escrivão, e os anciãos dos sacerdotes,
afastou o povo da disponibilidade do poder cobertos de sacos, ao profeta Isaias, filho de Amoz.
3Eles lhe disseram: Assim diz Ezequias: Este dia
divino. (3) A fraqueza inerente de Judá, é dia de angústia, de vituperação e de blasfêmia;
ressaltada em sua incapacidade de obter porque os filhos chegaram ao parto, e não há força
carros (ou até cavaleiros), requerendo que para os dar à luz. 4Bem pode ser que o Senhor
a Assíria até mesmo lhe fornecesse cava teu Deus tenha ouvido todas as palavras de
Kabsaqué, a quem o seu senhor, o rei da Assíria,
los, significava que Judá não conseguiria enviou para afrontar o Deus vivo, e repreenda as
repelir um único contingente de cavalaria palavras que o Senhor teu Deus ouviu. Faze, pois,
ou de carruagens da Assíria. A alegação oração pelo resto que ainda fica. 5Foram, pois, os
do rei assírio de que Iavé também lhe fa servos do rei Ezequias ter com Isaías.
lara era fruto da prática de consultar os A Reação de Ezequias (19.1-5). Todavia,
deuses de novas terras assim que se en tendo-se apresentado ao Senhor, o rei
trasse na terra daquele deus. imediatamente enviou uma delegação a
A conveniência política (v. 26,27) era a Isaías; aparentemente em busca de um
base de um outro apelo por capitulação, oráculo profético. A mensagem de Ezequias
um esforço para quebrar o moral do povo. dizia respeito (1) à natureza do dia: um dia
A declaração de Senaqueribe é esclare de angústia, reprovação, desgraça e
cida pela seguinte inscrição: “Mas quanto fraqueza, (2) uma sugestão, que é na verdade
a Ezequias, o judeu, que não se curvou em um pedido, de que o Senhor ouça e repre
submissão(...) Ele próprio eu o trancafiei enda as palavras de escárnio a ele dirigidas,
como um pássaro engaiolado dentro de e (3) o apelo para que Isaías ore pelo rema
Jerusalém, sua cidade real. Coloquei postos nescente.
de sentinela ao redor de toda ela e fiz expe 6E Isaías lhes disse: Assim direis a vosso
rimentar sua perdição todo aquele que senhor: Assim diz o Senhor: Não temas as pala
saísse do portão da sua cidade.” 6Para to vras que ouviste, com as quais os servos do rei da
dos os propósitos Jerusalém estava sob cer Assíria me blasfemaram. 7Eis que meterei nele um
espírito, e ele ouvirá uma nova, e voltará para a
co. Os assírios (v. 28-35) advertiram — na sua terra; e à espada o farei cair na sua terra.
verdade persuadiram mediante ameaças —
contra a crença de que Ezequias pudesse A Promessa de Isaías (19.6,7). Em razão
livrá-los ou de que o Senhor pudesse ajudá- de as palavras estarem dirigidas contra o
los, contra ignorarem o poder dos assírios Senhor (palavras(.„) Com as quais os servos
de ajudá-los, e contra a crença de que o do rei da Assíria me blasfemaram), o Senhor
Senhor os livraria. Cidades tão recente já pôs em operação o julgamento do rei.
mente capturadas por Senaqueribe Isso toma a forma de dois acontecimentos
descobriram que seus deuses eram inca históricos: (1) uma nova, ou rumor, que
pazes de livrá-las. A dependência em Deus provocará o retorno de Senaqueribe à sua
é o ponto crucial de todo esse apelo em favor própria terra, e (2) ele será morto num ato
da capitulação. Pode o homem confiar em de violência em seu próprio país. O emprego
Deus? da palavra espírito é uma ilustração da
Conquanto não haja menção a qualquer maneira como se acreditava que os propó
resposta oral à proposta assíria, foi claro sitos de Iavé se cumpriam por um outro
o propósito do editor de sugerir (v. 36,37) espírito que não fosse o Espírito de Deus
(cf. a frase “espírito maligno da parte do
6 “Taylor Prism”, M useu Britânico, n.° 91.032. Senhor”, empregada para expressar o
294
estranho comportamento de Saul, ISm l8e lançado os seus deuses no fogo; porquanto não
eram deuses, mas obra de mãos de homens, madeira,
16.14). Ações inexplicáveis eram freqüen e pedra; por isso os destruíram. 19Agora, pois,
temente atribuídas à possessão por um Senhor nosso Deus, livra-nos da sua mão, para que
espírito, fosse bom ou mau. todos os reinos da terra saibam que só tu, Senhor,
és Deus.
sVoltou, pois, Rabsaqué e achou o rei da 20Então Isaías, filho de Amoz, mandou dizer
Assíria pelejando contra Libna, porque soubera a Ezequias: Assim diz o Senhor Deus de Israel:
que o rei havia partido de Laquis. 9E o rei, ouvindo Ouvi o que me pediste no tocante a Senaqueribe,
dizer acerca de Tiraca, rei da Etiópia: Eis que saiu rei da Assíria. 21Esta é a palavra que o Senhor
para te fazer guerra, falou a respeito dele: A virgem, a filha de Sião, te
despreza e te escarnece; a filha de Jerusalém meneia
A Retirada dos Assírios (19.8,9a). A a cabeça por detrás de ti. 22A quem afrontaste e
opinião aqui expressa é de que os versículos blasfemaste? E contra quem alçaste a voz, e ergueste
36,37 devem ser devidamente analisados os olhos ao alto? Contra o Santo de Israel! “ Por
como uma seqüência dos versículos 8,9a. meio de teus mensageiros afrontaste o Senhor, e
A retirada dos assírios, segundo esse disseste: Com a multidão de meus carros subi ao
alto dos montes, aos lados do Líbano; cortei os
sumário (cf. v. 8,37), ocorreu apenas por seus altos cedros, e as suas mais formosas faias,
causa de um rumor (que era provavelmente e entrei na sua mais distante pousada, no bosque
verdadeiro) de uma insurreição na própria do seu campo fértil. 24Eu cavei, e bebi águas
Assíria, provavelmente uma revolta pala estrangeiras;
ciana. Essa insurreição terminou levando e com as plantas de meus pés sequei todos os
rios do E gita 25Porventura não ouviste que já há
Senaqueribe à morte (v. 36), um fato confir muito tempo determinei isto, e já desde os dias
mado pela Crônica Babilónica: antigos o planejei?
“Senaqueribe, rei da Assíria, partiu, e saiu, Agora, porém, o executei, para que fosses tu
e retornou, e habitou em Nínive. E deu-se que reduzisses as cidades fortificadas a montões
desertos. “ Por isso os moradores delas tiveram
que, estando ele adorando na casa de pouca força, ficaram pasmados e confundidos;
Nisroque, seu deus, Adrameleque e Sarezer, tornaram-se como a erva do campo, como a relva
seus filhos, golpearam-no com a espada, e verde, e como o feno dos telhados, que se queimam
fugiram para a terra de Ararate. E seu filho antes de amadurecec 27Eu, porém, conheço o teu
Esar-Hadom reinou em seu lugar” assentar, o teu sair e o teu entrar, bem como o teu
furor contra mim.
(Wiseman, p. 70). “ Por causa do teu furor contra mim, e porque
tornou a enviar mensageiros a Ezequias, di a tua arrogância subiu aos meus ouvidos, porei o
zendo: 10Assim falareis a Ezequias, rei de Judá: meu anzol no teu nariz, e o meu freio na tua boca,
Não te engane o teu Deus, em quem confias, e te farei voltar pelo caminho por onde vieste.
dizendo: Jerusalém não será entregue na mão do 29E isto te será por sinal: Este ano comereis o
rei da Assíria. nEis que já tens ouvido o que os que nascer por si mesmo, e no ano seguinte o que
reis da Assíria fizeram a todas as terras, destruindo- daí proceder; e no terceiro ano semeai e colhei,
-as totalmente; e tu serias poupado? 12Porventura e plantai vinhas, e comei os seus frutos. 30Pois o
os deuses das nações a quem meus pais destruíram, que escapou da casa de Judá, e ficou de resto,
puderam livrá-las, a saber, Gozã, Harã, Rezefe, e tornará a lançar raízes para baixo, e dará fruto
os filhos de Éden que estavam em Telassar? ' ’Que para cima. 31Porque de Jerusalém sairá o restante,
é feito do rei de Hamate, do rei de Arpade, do rei e do monte Sião os que escaparem; o zelo do Senhor
da cidade de Sefarvaim, de Hena e de Iva? fará ista 32Portanto, assim diz o Senhor acerca do
I4Ezequias, pois, tendo recebido a carta das mãos rei da Assíria: Não entrará nesta cidade, nem
dos mensageiros, e tendo-a lido, subiu à casa do lançará nela flecha alguma; tampouco virá perante
Senhor, e a estendeu perante o Senhor. 15E ele com escudo, nem contra ele levantará tranqueira.
Ezequias orou perante o Senhor, dizendo: O Senhor 33Pelo caminho por onde veio, por esse mesmo
Deus de Israel, que estás assentado sobre os queru voltará, e nesta cidade não entrará, diz o Senhor.
bins, tu mesmo, só tu és Deus de todos os reinos 34Porque eu defenderei esta cidade para livrá-la,
da terra; tu fizeste o céu e a terra. 16Inclina, ó por amor de mim e por amor do meu servo Davi.
Senhor, o teu ouvido, e ouve; abre, ó Senhor, os 35Sucedeu, pois, que naquela mesma noite saiu
teus olhos, e vê; e ouve as palavras de Senaqueribe, o anjo do Senhor, e feriu no arraial dos assírios
com as quais enviou seu mensageiro para afrontar a cento e oitenta e cinco mil deles; e, levantando-se
o Deus viva 17Verdade é, ó Senhor, que os reis da os assírios pela manhã cedo, eis que aqueles eram
Assíria têm assolado as nações e as suas terras, todos cadáveres. 36Então Senaqueribe, rei da
295
Assíria, se retirou, e, voltando, habitou em Nínive. Esse cântico provocativo sobre Senaque
37E quando ele estava adorando na casa de ribe ou o destino da Assíria (v. 21-28) parece
Nisroque, seu deus, Adrameleque e Sarezer, seus
filhos, o mataram à espada e fugiram para a terra
relacionar-se claramente com o lamento de
de Arará. E Esar-Hadom, seu filho, reinou em seu Isaías sobre a Assíria (Is 10.5-29), e prova
lugar. velmente originou-se dentro do círculo de
discípulos de Isaías. Mesmo um exame
Ainda Outras Reflexões Posteriores superficial revela os paralelos entre (1) a
Sobre a Crise de Senaqueribe (19.9b-37). missão confiada à Assíria e seus êxitos
O sumário em pauta é cronologicamente passados (Is 10.5-11) e o orgulho autocon-
posterior à fixação da tradição sobre a crise fiante por causa de êxitos internacionais
de 701 a.C., que aparece em (2Rs 19.21-24); e (2) o destino da Assíria
18.13,17—19.9a. É discutível que essa quando Iavé se volta contra ela (Is 10.12-19)
avaliação posterior tenha surgido em e a ação vingativa de Iavé, planejada com
círculos sacerdotais, como sugere Gray; mas tanta antecedência (2Rs 19.25-28). A forma
é amplamente aceito que esse é um para poética dos versículos 21-28 apresenta-se
lelo do relato imediatamente precedente. em forte contraste com a prosa de 2Reis
Como a narrativa agora se apresenta, e sugere que esse lamento é uma intrusão,
a exigência de capitulação (v. 9b-13) é uma quer preparada para a ocasião ou utilizada
continuação da narrativa anterior. A argu a partir de outra fonte. Para a continuação
mentação do rei em favor da capitulação da palavra profética de Isaías pode-se bem
num ponto difere significativamente da de saltar do versículo 21a diretamente para os
seu mensageiro: as pessoas não devem versículos 29 e ss.
deixar que Deus as engane, crendo que Jeru A menção à madeira do Líbano (v. 23)
salém escapará. Deus é um enganador, ou está em consonância com o valor que os
assim Senaqueribe sugeriu. Judá não pode assírios atribuíam a esses recursos. Não
esperar sair-se melhor do que outras nações tendo territórios com florestas, um precioso
sob seus deuses. espólio de guerra era a madeira do Líbano.
A reação de Ezequias nesse caso (v. Esar-Hadom, sucessor de Senaqueribe,
14-19), em contraste com a descrição em registra o seguinte, com respeito aos espó
19.1-5, é muito mais orientada teologica lios de suas próprias vitórias: “Enviei todos
mente. Aqui não há apelo algum a Isaías; esses para arrastar com dor e dificuldade
a oração ao Senhor é o único objeto da para Nínive, a cidade de meu domínio, como
reação do rei. suprimentos necessários para meu palácio,
O apelo de Ezequias é teologicamente grandes vigas, altos postes e tábuas apare
significativo, envolvendo a concepção de lhadas de cedro e de cipreste, produtos das
Deus como: rei divino, assentado (entroni montanhas de Sirara e do Líbano, onde por
zado), único Deus de todos os reinos, e muito tempo cresceram em altura e espes-
criador do céu e da terra. Ezequias implora sura(...)” (cf. carta assíria encontrada em
a Deus para que abra tanto os seus olhos Nínive; Museu Britânico, Tablete K. 1295;
quanto os seus ouvidos para que veja e ouça Wiseman, em Thomas).
as palavras de Senaqueribe, sugerindo a Iavé agora dará fim ao furor contra mim
natureza concreta de palavra. Dabar signi (v. 27,28). A ênfase no modo como a história
fica tanto palavra como coisa, e revela os propósitos ocultos de Deus é carac
freqüentemente se descreve a palavra como terística do pensamento de Isaías acerca do
sendo tão concreta que pode-se vê-la. Exílio (cf. 41.21 e ss., 25 e ss.). O uso de
A resposta de Isaías nessa seção (v. Senaqueribe por Iavé é ilustrado pela refe
20-34) se distingue da promessa anterior rência de Isaías à Assíria como uma vara
(19.6,7) tanto na extensão (catorze versí ou bordão na mão de Deus (Is 10.5 e ss.).
culos aqui; dois versículos lá) quanto no A mesma idéia está ainda mais revelada na
conteúdo. referência a Ciro da Pérsia como ungido do
296
Senhor (Is 45.1), mais a indicação adicional que a conduta ética não deixava de ter
de que Iavé suscitou a ascensão de Ciro (cf. relação com a inviolabilidade de Sião (cf.
Is 41.2 e ss.; 45.1 e ss.; 44.28). Há uma Jr 7.1 e ss.). Como se dá com a maior parte
ênfase coerente dentro da escola isaíaca de das heresias, que tão freqüentemente se
pensamento no uso iavístico da história, originam na indevida ênfase em uma faceta
uma interpretação teológica claramente da verdade, a inviolabilidade de Sião
paralela à visão deuteronômica da história, começou como uma doutrina de graça e
e vividamente harmonizada na teologia conforto, mas acabou como uma pressu
combinada isaíaco-deuteronômica de 2Reis posição pervertida e aviltada da graça de
19. Deus — uma graça barata.
Os versículos 29-31 declaram a base de A retirada dos assírios (v. 35-37) encerra
Isaías para uma esperança renovada. Sua o relato da crise de Senaqueribe.
resposta específica à ansiedade de Ezequias A morte súbita que feriu os assírios foi
é a garantia concernente às colheitas nos provavelmente uma praga de proporções
versículos 29-31. Contudo, isso é mais do enormes. Sugerir uma praga como o fator
que uma simples declaração acerca do supri causal no versículo 35 serve apenas para
mento de alimentos. É uma promessa realçar que Deus opera mediante a história
concernente tanto ao término da invasão e a ordem natural, e não à parte dela.
por Senaqueribe quanto às possibilidades
futuras do povo de Deus. O término da Sumário da Relação Entre as Passagens
invasão é vividamente sugerido na decla de 18.14b-16; 18.13,17—19.9a; 19.36,37; e
ração de que embora (1) o povo deva comer 19.9b-35. A relação entre as três passagens
o que nascer por si mesmo no primeiro ano, sob análise é complexa, mas a reconstrução
sem que haja qualquer colheita durante a seguinte parece razoável. (1) A crônica que
invasão, e embora (2) eles devam comer o registra a crise de Senaqueribe situa-se por
mesmo tipo de comida no segundo ano, pois trás de 18.4b-16, e é aqui que estamos mais
nada se poderia plantar durante a última próximos de uma reconstrução histórica dos
parte do ano da invasão, (3) a aragem e acontecimentos do que em qualquer outro
semeadura normais poderiam ocorrer ponto. A historicidade básica dessa
durante o verão, após a crise, com o resul passagem é clara. (2) Numa ocasião subse
tado de que o alimento colhido de atividades qüente ao contexto histórico da crise de
agrícolas poderia ser comido no terceiro Senaqueribe, os anais históricos foram
ano. expandidos durante o curso de sua trans
A doutrina da inviolabilidade de Jeru missão. Nesse processo, desenvolveram-se
salém (v. 32-34) também faz parte do no estilo da saga histórica associada com
encorajamento por Isaías. A inviolabilidade Elias e Eliseu. (3) Reflexão ainda posterior
de Jerusalém é singularmente associada ao acerca da crise de Senaqueribe, da perspec
ministério profético de Isaías. Sendo que tiva de outro círculo de devotos em Judá,
Jerusalém era a cidade de Iavé, era incon precipitou a narrativa que agora se encontra
cebível que ele permitisse sua destruição. em 19.9b-35. Essa narrativa desenvolveu-
A concepção isaíaca começou ainda nas se no estilo de saga-lenda associado às
conversações de Isaías com Acaz, durante narrativas de Eliseu que aparecem no
a crise siro-efraimita de aproximadamente contexto das crises sírias.
734 a.C., e emerge novamente na crise de A ênfase teológica distinta que assinala
Senaqueribe, em 701. a reflexão final sobre a crise distingue-a da
No tempo de Jeremias, contudo, a consideração anterior sobre o mesmo
concepção havia se pervertido na crença evento.
presunçosa e superficial de que Deus prote Primeiro, a exigência assíria de capitu
geria Jerusalém, não importa o que lação (18.13 e ss.) sublinha a falsa confiança
acontecesse. Jeremias destacou claramente de Judá no Egito, embora tanto a impo
297
tência dos deuses para se oporem à Assíria se o relato da enfermidade de Ezequias e
quanto as vitórias assírias anteriores sua recuperação (v. 1-7). De modo especial
também façam parte da argumentação o ato miraculoso dos versículos 8-11 tem
oferecida. A reflexão posterior (19.9b e ss.) um paralelo muito próximo com os de
é muito mais voltada para Deus, e os mensa Eliseu. A tradição da cura de Ezequias é
geiros assírios acusam o próprio Deus de distinta da tradição sobre a sombra.
enganar o povo (anteriormente Ezequiel é 'Por aquele tempo Ezequias ficou doente, à
acusado disso). morte. O profeta Isaías, filho de Amoz, veio ter
Em segundo lugar, a narrativa anterior com ele, e lhe disse: Assim diz o Senhor: Põe em
sugere que Ezequias entra na casa do ordem a tua casa, porque morrerás, e não viverás.
Senhor, mas imediatamente envia uma dele 2Então o rei virou o rosto para a parede, e orou
ao Senhor, dizendo: 3Lembra-te agora, ó Senhor,
gação para chamar Isaías. A reflexão te peço, de como tenho andado diante de ti com
posterior sobre a crise não faz menção de fidelidade e integridade de coração, e tenho feito
chamar Isaías, e toda a ação de Ezequias o que era reto aos teus olhos. E Ezequias chorou
é sumariada numa oração relativamente muitíssima 4E sucedeu que, não havendo Isaías
ainda saído do meio do pátio, veio a ele a palavra
longa e teologicamente significativa. do Senhor, dizendo: 5Volta, e dize a Ezequias, prín
Em terceiro lugar, a promessa de Isaías cipe do meu povo: Assim diz o Senhor Deus de
é bastante breve na primeira fonte, consis teu pai Davi: Ouvi a tua oração, e vi as tuas lágrimas.
tindo de somente dois versículos que Eis que eu te sararei; ao terceiro dia subirás à casa
prometem que Senaqueribe ouvirá o rumor do Senhor. 6Acrescentarei aos teus dias quinze
anos; e das mãos do rei da Assíria te livrarei, a
de insurreição e retornará a seu país, onde ti e a esta cidade; e defenderei esta cidade por amor
será morto. A preocupação teológica do de mim, e por amor do meu servo Davi. 7Disse
segundo relato revela-se no bem longo e mais Isaías: Tomai uma pasta de figos e ponde-a
provocativo cântico sobre Senaqueribe (v. sobre a úlcera; e ele sarará.
21-28) e o papel do remanescente (v. 29-31).
A libertação é prometida mediante inter Cura e Vida Prolongada (v.1-7). Con
venção direta de Iavé. quanto a expressão por aquele tempo não se
Em quarto lugar, a retirada dos assirios ja suficientemente específica para datar essa
relaciona-se com a atividade de Tiraca e narrativa, a garantia posterior de livramento
o rumor de insurreição, um rumor que leva pressupõe a crise assíria (cf. v. 6). Após o
à retirada de Senaqueribe (v. 35 e s.) e seu oráculo de Isaías sobre a morte, o rei busca
assassinato no final. Mas a reflexão poste ajuda divina numa oração baseada em
rior encontrada em 19.9b e ss. coloca muito quatro características de Ezequias. Ele
mais ênfase no miraculoso. A libertação, havia andado na presença de Deus (lit.,
segundo essa narrativa, tem lugar não “perante tua face”), uma frase freqüente
mediante insurreição, mas através da vinda mente empregada para designar a vida santa
do anjo do Senhor; uma ação que prova e justa de homens tais como Enoque (Gn
velmente teve o propósito de ser bem literal, 5.21), Noé (Gn 6.9), Abraão e Isaque (Gn
e que assim foi interpretada na época 48.15), e Davi (lRs 3.6). Fidelidade (’emeth)
bíblica. pode também ser traduzida como verdade,
A primeira reflexão (18.13,17 e ss.) tem e significa confiabilidade, estabilidade (Is
as características de saga típicas da escola 39.8) ou a condição de poder confiar em
de Elias, enquanto a segunda reflexão alguém (cf. Ne 7.2). Esclarece a maneira
(19.9b) é muito mais similar às histórias de como Ezequias andou perante Deus. A
Eliseu. conduta do rei perante Deus havia também
sido a de integridade de coração (leb
2) A Enfermidade e Restabelecimento de shalem). A personalidade de Ezequias era
Ezequias (20.1-11) íntegra ou completa, não possuindo dupli
Intimamente relacionado às histórias de cidade. Além disso, Ezequias sugere que ele
cura associadas com Elias e Eliseu encontra- havia feito o que era reto perante Deus.
298
Ouvir (shama’) tem no Antigo Testa Palavras declaratórias eram vistas como
mento mais do que a idéia de audição e entidades quase físicas, semi-independentes,
sugere ação. Pbr exemplo, há ocasiões em que não podiam ser chamadas de volta (cf.
que shama’ é traduzida como obedecer ou as bênçãos e as maldições, Dt 28). Elas
obediente, quando empregada para o levavam consigo o poder de seu próprio
homem (cf. Is 1.19). Quando empregada cumprimento. Isso é sugerido pela incapa
com relação a Iavé, geralmente sugere ouvir cidade de Isaque retirar a bênção que dera
com disposição favorável. ao filho errado (cf. Gn 27.7 e ss.), bem como
A referência de quinze anos pode ser um a ilustração mais positiva da palavra de Iavé,
número genérico que sugere que a vida de que não retorna sem cumprir o propósito
Ezequias terá a duração normal. Se ele com o qual foi enviada (Is 55.10,11). No
tivesse cerca de 35 anos ao tempo da enfer caso em lide, Isaías havia acabado de
midade (pressupondo-se que sua doença proferir uma palavra da parte de Iavé (cf.
tivesse coincidido com a coroação de seu 20.1 e ss.), uma palavra que não podia ser
filho Manassés com a idade de 12), isso chamada de volta. Pbr isso, a revogação
representaria para Ezequias uma vida com sugerida por Isaías (cf. 20.4,6) explica o
a duração de cerca de 50 anos. pedido de um sinal por parte de Ezequias.
A pasta de figos era um cataplasma O pedido refletia a perplexidade de Ezequias
usado para drenar úlceras, segundo Plínio sobre como a enfermidade podia ser desfeita
(Hist. Nat. XXII, 7), e dois textos veteri uma vez que a palavra havia sido proferida.
nários de Ras Shamra, datados do segundo O recuo da sombra no relógio é uma vigo
milênio a.C., prescrevem uvas passas e rosa declaração de que com Deus tal
farinha de feijão (cf. Gray). A medicação retratação de palavra é possível. Assim
dada por Isaías provavelmente era comum como a sombra recuou, assim também o
na época. A prescrição, deve-se notar, obscu oráculo negativo e a certeza de morte
rece a continuidade entre os versículos 6 e 8. podem ser recuados.
8Perguntou, pois, Ezequias a Isaías: Qual é o
Algum fenômeno histórico, tal como um
sinal de que o Senhor me sarará, e de que ao terceiro eclipse solar que ocorreu em 11 de janeiro
dia subirei à casa do Senhor? ’Respondeu Isaías: de 689 a.C. (cf. Gray), bem pode ter sido
Isto te será sinal, da parte do Senhor, de que o o núcleo histórico em torno do qual se
Senhor cumprirá a palavra que disse: Adiantar- desenvolveu a presente narrativa popular.
-se-á a sombra dez graus, ou voltará dez graus atrás?
I0Então disse Ezequias: É fácil que a sombra Deve-se notar, contudo, que esse não foi
decline dez graus; não seja assim, antes volte a um eclipse total, pois F. R. Stephenson, do
sombra dez graus atrás. uEntão o profeta Isaías Departamento de Geofísica da Universi
clamou ao Senhor, que fez voltar a sombra dez graus dade de Newcastle upon Tyne, sugere que
atrás, pelos graus que já tinha declinado no relógio
de sol de Acaz.
“entre 1130 a.C. e 310 a.C. somente dois
eclipses solares poderiam ter feito o sol se
Um Sinal de Confirmação (v. 8-11). Sinais ‘tomar em tievas’em Judá. As datas desses
freqüentemente acompanhavam mensa episódios são 29 de fevereiro de 357 a.C.
gens proféticas bem como outros meios de e 4 de julho de 336 a.C.”7
revelação dentro do Antigo Testamento. O O perigo inerente em explicações racio
sinal (’oth) era um acontecimento físico com nais dessa e de outras histórias de
um significado que apontava para além de acontecimentos extraordinários ou milagres
si mesmo, na maior parte das vezes um é deixar de perceber que a teologia expressa
acontecimento ordinário com um sentido pelo redator emprega a história tal como
extraordinário implícito (cf. Js 2.17; Ex era entendida dentro de seu contexto
12.13; SI 86.17). O recuo da sombra do sol cultural. O escritor vivia num ambiente em
era um sinal da presença de Deus na decla
ração profética concernente à cura de 7 F. R. Stephenson, “T he D ating o f the Book o f Joel”, Vetus Testa-
Ezequias. tnentum, X IX , abril de 1969, p. 224 e ss., 229.
299
que as pessoas acreditivam que Deus de melhores ungiientos, a sua casa de armas e tudo
fato agia dessa maneira \ recisa, literal, como quanto havia nos seus tesouros; coisa nenhuma
houve que lhes não mostrasse, nem em sua casa,
está implícito no recuo (cf. shub) da sombra nem em todo o seu domínia 14Então o profeta
no relógio. M a maneira como a história Isaías veio ao rei Ezequias, e lhe perguntou: Que
está agora formulada é impossível chegar disseram aqueles homens, e donde vieram a ti?
a outra conclusão, senão de que o propó Respondeu Ezequias: Vieram de um pais mui
sito do escritor foi relacionar o evento remoto, de Babilônia. 1SE disse ele: Que viram em
tua casa? E disse Ezequias: Viram tudo quanto há
diretamente à ação de Iavé. Quaisquer que em minha casa; não há coisa nenhuma nos meus
tenham sido os meios secundários, Iavé fez tesouros que eu não lhes mostrasse.
com que a sombra recuasse. Explicações A Ingenuidade de Ezequias (v. 12-15).
racionais deixam de fazer justiça ao propó O contexto histórico da visita dos babi
sito último do autor e a seu intento lônios é o período de rebelião por Mero-
teológico. daque-Baladã (deve-se dar preferência a
O relógio não deve ser visto como um esta grafia; cf. Is 39.1), que governou Babi
relógio de sol tradicional, e deve-se ter em lônia entre 721 e 710 a.C. Ele foi derru
mente a idéia mais literal de graus (ma’alah, bado por Sargão em 710 e refugiou-se nos
degrau, escada; cf. Ed 7.9; lCr 17.17; Ez pântanos salgados, donde emergiu para
40.6). Podia-se calcular a hora do dia pela fomentar rebelião contra os assírios ao
posição da sombra nos degraus. tempo da morte de Sargão, em 704 a.C.
Seja qual for o núcleo histórico do relato, (cf. IDB, Gray, Snaith).
ele tem grande afinidade com as histórias Casa de seu tesouro (beyth nekothoh é
populares associadas a Eliseu. Seu propó provavelmente uma palavra assíria tomada
sito é garantir que, assim como o sol recuou, por empréstimo, e pode-se apenas especu
de igual modo o oráculo de morte recuaria. lar quanto ao edifício que se ajusta a essa
Assim, conquanto originando-se possivel descrição. Talvez a Casa do Bosque do
mente num círculo de tradição diferente de Líbano (cf. lRs 7.2-5) fosse um arsenal
20.1 e ss., os versículos 8 e ss. estão inte (uma pressuposição comum); pode ter
gralmente ligados em seu propósito básico guardado não somente parte do arsenal de
à narrativa da enfermidade e restabeleci Judá, mas também ter servido como uma
mento de Ezequias. tesouraria (cf. o conteúdo mencionado no
3) A Abertura Babilónica com Judá v. 13).
(20.12-19) 16Então disse Isaías a Ezequias: Ouve a pa
Cronologicamente essa narrativa lavra do Senhor: 17Eis que vêm dias em que será
pertence ao ciclo de acontecimentos que levado para Babilônia tudo quanto houver em tua
casa, bem como o que os teus pais entesouraram
ocorrem por volta de 710 a.C. Tematica- até o dia de hoje; não ficará coisa alguma, diz o
mente tem a ver com a intriga babilónica Senhor. 18E até mesmo alguns de teus filhos, que
dirigida contra a Assíria, e ao esforço para procederem de ti, e que tu gerares, levarão; e eles
atrair o apoio de Judá. Mais especifica serão eunucos no paço do rei de Babilônia.
I9Então disse Ezequias a Isaías: Boa é a palavra
mente, tem a ver com a acolhida calorosa do Senhor que disseste. Disse mais: Pois não é
dada à missão diplomática de Babilônia e assim, se em meus dias vai haver paz e segurança?
com a crítica de Israel à ingenuidade de Um Julgamento Profético Sobre a
Ezequias ao mostrar a condição material Ingenuidade em Negócios de Estado (v.
de Judá aos babilônios no que tange aos 16-19). Sempre oposto a alianças com es
tesouros e armamentos. trangeiros, que podem tão freqüentemente
I2Naquele tempo Berodaque-Baladã, filho de substituir a direção e apoio divinos pela
Baladã, rei de Babilônia, enviou cartas e um astúcia e força humanas, Isaías repreende
presente a Ezequias, porque ouvira que Ezequias
tinha estado doente. °E Ezequias deu audiência Ezequias com severidade. A sabedoria
aos mensageiros, e lhes mostrou toda a casa de devia ter-lhe ditado um curso de ação
seu tesouro, a prata e o ouro, as especiarias, e os mais responsável e cauteloso.
300
A sugestão de que a palavra de Isaías tanque de Siloé (cf. 2Cr 32.30; Snaith).
é boa (v. 19) não significa que Ezequias Ainda hoje o túnel pode ser examinado em
julgasse que o cativeiro fosse algo bom. Jerusalém, e sua construção foi um feito
Antes, é indicação daquele espírito indó de engenharia de consideráveis proporções
mito que vê a ação do Senhor como boa para aquele tempo. Começando em extre
em última instância: semelhante em gran midades opostas, operários escavaram um
de parte ao espírito de Jó, que pôde perder túnel medindo mais de quinhentos metros
tudo e ainda dizer: “Bendito seja o nome em meio a rocha durâ e se encontraram no
do Senhor” (Jó 1.21). centro. A Inscrição de Siloé está talhada
A frase final de Ezequias é difícil dentro do túnel e registra alguns detalhes
(v. 19b). Como está agora na IBB, sugere da construção, que estão aqui enumera
um interesse próprio quase irresponsável, dos:
dando a entender que, enquanto houver /(...)quando/ (o túnel) foi escavado.
paz e segurança nos dias de Ezequias, por E esta é a maneira em que foi escavado:
que não trocar o presente pelo futuro? — Enquanto /(...)/ (estavam) ainda (...)
A comparação do paralelo isaíaco reve machado(s), cada homem na direção de
la diferenças significativas (cf. Is 39.8). seu semelhante, e enquanto havia ainda
Pois Is 39.8 bem poderia ser traduzido: três cúbitos para serem escavados, fouviu-
“E ele falou (desse modo) porque havia -sd a voz de um homem chamando seu
paz e segurança em seus dias.” companheiro, pois havia uma sobrepo
Assim, longe de interesse próprio a sição (de camadas de rocha) na rocha à
expensas do futuro, o versículo sugere que direita (e à esquerda). E, quando o túnel
Ezequias pôde interpretar a mensagem foi completamente escavado, os pedreiros
profética (mesmo de destruição) como boa desbastaram (a rocha), cada homem na
por se tratar da mensagem do Senhor direção de seu companheiro, machado
(cf. Jó 1.21) — do Senhor que havia poster contra machado; e a água fluiu da fonte
gado a calamidade por causa de méritos em direção ao reservatório por 1.200
(cf. 22.18 e ss.) e havia abençoado a ge cúbitos, e a altura da rocha acimas da(s)
ração de Ezequias com paz e segurança. cabeça(s) dos pedreiros era de 100 cúbitos
(Wright, p. 170).
3. A Avaliação Deuteronômica de Eze
quias (20.20,21) II. Décadas de Infidelidade e
20Ora, o restante dos atos de Ezequias, e todo
Apostasia (21.1-26)
o seu poder, e como fez a piscina e o aqueduto, A era de maior infidelidade e apostasia
e como fez vir a água para a cidade, porventura na história de Judá surgiu no reinado de
não estão escritos no livro das crônicas dos reis
de Judá? 21E Ezequias dormiu com seus pais. E Manassés e continuou nos dias de seu
Manasses, seu filho, reinou em seu lugar. filho Amom. Conquanto não sem relação
com a dominação assíria, a apostasia de
A avaliação do reinado de Ezequias Manassés não tem uma explicação especí
deve na verdade ser lida em seguida a fica. Seu acentuado afastamento da re
18.1-12. As tradições isaíacas relacionadas forma coloca sua apostasia entre as ações
com a crise assíria foram inseridas nos inexplicáveis daquelas gerações que repu
anais históricos de um modo que inter diaram os caminhos de seus pais.
rompeu a continuidade do que prova 1. Manassés (21.1-18)
velmente foi um único texto: 18.1-12;
20 . 20 , 21 . Os cinqüenta e cinco anos do reinado
Mediante a construção de um aqueduto de Manassés devem ser reduzidos em dez
através da montanha, Ezequias trouxe anos, ou deve-se subentender que, como
água através do monte do templo para o faz Gray, Manassés tenha sido co-regente
301
com Ezequias. Desse versículo Gray de rosas da reforma de Ezequias (essa possi
clara: “A referência é à designação de bilidade aumenta grandemente caso Ma
Manassés como co-regente ou herdeiro nassés realmente tenha assumido o trono
legal com a idade de 12 anos(...)” aos 12 anos de idade, pois ele com toda
probabilidade teria sido controlado, ou
1) A Apostasia de Manassés (21.1-9) fortemente influenciado por um adulto, ou
adultos); (3) a apostasia e infidelidade
'Manassés tinha doze anos quando começou
a reinar, e reinou cinqüenta e cinco anos em Jeru
pessoais de Manassés.
salém. O nome de sua mãe era Hefzibá. 2E fez o
que era mau aos olhos do Senhor, conforme as 2) Os Efeitos da Apostasia de Manassés
abominações das nações que o Senhor desterrara (21.10-15)
de diante dos filhos de Israel. 3Porque tornou a
edificar os altos que Ezequias, seu pai, tinha 10Então o Senhor falou por intermédio de seus
destruído, e levantou altares a Baal, e fez uma servos os profetas, dizendo: “ Porquanto M a
Asera como a que fizera Acabe, rei de Israel, e nassés, rei de Judá, cometeu estas abominações,
adorou a todo o exército do céu, e os serviu. fazendo pior do que tudo quanto fizeram os amor-
4E edificou altares na casa do Senhor, da qual o reus, que foram antes dele, e com os seus ídolos
Senhor tinha dito: Em Jerusalém porei o meu fez Judá também pecar; 12por isso assim diz o
nome.5Também edificou altares a todo o exército Senhor Deus de Israel: Eis que trago tais males
do céu em ambos os átrios da casa do Senhor. sobre Jerusalém e Judá, que a qualquer que deles
6até fez passar seu filho pelo fogo, e usou de ouvir lhe ficarão retinindo ambos os ouvidos.
augúrios e de encantamentos, e instituiu adivinhos “ Estenderei sobre Jerusalém o cordel de Samá-
e feiticeiros; fez muito mal aos olhos do Senhor, ria e o prumo da casa de Acabe; e limparei Jeru
provocando-o à ira. 7Também pôs a imagem salém como quem limpa a escudela, limpando-a
esculpida de Asera, que tinha feito, na casa de que e virando-a sobre a sua face. l4Desampararei os
o Senhor dissera a Davi e a Salomão, seu filho: restantes da minha herança, e os entregarei na
Nesta casa e em Jerusalém, que escolhi dentre mão de seus inimigos; tornar-se-ão presa e despojo
todas as tribos de Israel, porei o meu nome para para todos os seus inimigos; 15porquanto fizeram
sempre; 8e não mais farei andar errante o pé de o que era mau aos meus olhos, e me provocaram
Israel desta terra que tenho dado a seus pais, à ira, desde o dia em que seus pais saíram do Egito
contanto que somente tenham cuidado de fazer até hoje.
conforme tudo o que lhes tenho ordenado, e
conforme toda a lei que Moisés, meu servo, lhes O editor deuteronômico atribui a Ma
ordenou. 9Eles, porém, não ouviram; porque nassés total responsabilidade pela queda
Manassés de tal modo os fez errar, que fizeram
pior do que as nações que o Senhor tinha des de Jerusalém. Mesmo assim, o editor
truído de diante dos filhos de Israel. admite que tal apostasia tinha suas raízes
nas rebeliões do deserto e remonta os ante
As múltiplas apostasias de Manassés cedentes do atual período de apostasia e
são de uma diversidade tão grande e con inevitável destruição ao dia em que seus
trastam tão fortemente com a reforma de pais saíram do Egito.
Ezequias que sugerem um repúdio delibe
rado à reforma do pai. A inclusão de
3) As Perseguições de Manassés (21.16)
alguns aspectos de práticas religiosas não-
-israelitas foi necessária pelo papel total 16Além disso, Manassés derramou muitíssimo
mente subserviente de Judá diante da sangue inocente, até que encheu Jerusalém de um
Assíria. Contudo, isso não explica a in a outro extremo, afora o seu pecado com que fez
Judá pecar fazendo o que era mau aos olhos do
clusão de temas religiosos não-assírios. Senhor.
Suspeita-se, portanto, que dentro de Judá
havia um repúdio deliberado ao movimen A tradição que associa Manassés à per
to de reforma de Ezequias, e a apostasia seguição aos profetas, e especialmente a
de Manassés teve pelo menos três bases: Isaías, originou-se em escritos não-canô-
(l)um indício de subserviência nacional nicos e culminou com a referência geral
imposta ante a Assíria; (2) a atividade de às perseguições aos profetas em Hebreus
grupo(s) em Judá oposto(s) às ações rigo 11.32 e ss. O livro pseudepígrafo O Mar-
302
tírio de Isaías sugere que um falso profeta 2. Amom (21.19-26)
chamado Belquira de Belém acusou Isaías
’’Amom tinha vinte e dois anos quando co
perante o rei Manassés: meçou a reinar, e reinou dois anos em Jerusalém.
E ele [Belquira] trouxe muitas acusa O nome de sua mãe era Mesulemete, filha de
ções contra Isaías e os profetas perante Haruz, de Jotba. 20EIe ft z o que era mau aos
Manassés. Mas Beliar [anjo da iniqüidade olhos do Senhor, como fizera Manassés, seu pai;
21e andou em todo o caminho em que seu pai
e governante deste mundo] habitava no andara, e serviu os ídolos que ele tinha servido,
coração de Manassés(...) e ordenou e apri e os adorou. 22Assim deixou o Senhor, Deus de
sionou Isaías. E o serrou em pedaços com seus pais, e não andou no caminho do Senhor.
uma serra de madeira(...) Mas Isaías estava 23E os servos de Amom conspiraram contra ele,
(absorvido) numa visão do Senhor, e, e o mataram em sua casa. mO povo da terra,
porém, matou a todos os que conspiraram contra
conquanto seus olhos estivessem abertos, o rei Amom, e constituiu Josias, seu filho, rei
ele (não) os viu.8 em seu lugar. 24Quanto ao restante dos atos de
Amom, porventura não está escrito no livro das
4) Um Sumário Deuteronômico (21.17,18) crônicas dos reis de Judá? 26E o puseram na sua
sepultura, no jardim de Uzá. E Josias, seu filho,
I7Quanto ao restante dos atos de Manassés, reinou em seu lugar.
e a tudo quanto fez, e ao pecado que cometeu,
porventura não estão escritos no livro das crôni Amom continuou as apostasias de seu
cas dos reis de Judá? 18E Manassés dormiu com pai, Manassés, mas morreu numa revolta
seus pais, e foi sepultado no jardim da sua casa, palaciana dois anos após ascender ao
rio jardim de Uzá. E Amom, seu filho, reinou em trono. Não se oferece qualquer razão para
seu lugar.
seu assassinato, mas pelo menos dois par
A localização do lugar de sepultamento tidos parecem ter-se envolvido nos distúr
de Manassés (no jardim da sua casa, no bios (cf. v. 23 e ss.). Os compromissos
jardim de Uzá) é algo aberto a várias inter pró-assírios de Manassés (e, presumivel
pretações. Primeiro, pode-se concluir que mente, de Amom) dão força à tese de que
sua apostasia impediu seu sepultamento Amom foi assassinado por um partido
junto aos reis de Judá (cf. “dormiu Acaz pró-Egito. Opondo-se àqueles que mata
com seus pais, e com eles foi sepultado na ram Amom, o povo da terra (um grupo
cidade de Davi”, 16.20, um lugar comum independente, sem relação com a estrutura
para os reis). Mas, em face das fortes monárquica) matou aqueles que conspi
opiniões de seu filho e a forte influência raram contra Amom e então estabelece
da Assíria, bem como a de sua própria ram Josias no trono.
dinastia, isso é questionável. Segundo, foi
dito que Ezequias foi sepultado “no mais III. Josias e a Reforma Religiosa
alto dos sepulcros dos filhos de Davi” (22.1-23.30)
(2Cr 32.33), o que provavelmente significa
que o local do sepultamento empregado A reforma de Josias foi apenas o lado
para os reis estava lotado. Terceiro, John visível de um movimento teológico muito
Gray sugere que o lugar reservado de Uzá mais básico e de muito maior alcance, o
era uma área reservada ao culto daquela qual é um dos mais importantes marcos da
divindade, e que tal área estava localizada jornada religiosa israelita. Aspectos fun
no jardim do rei.9 Essa proposta é atraen damentais da fermentação teológica res
te e viável. Somente Manassés e Amom ponsável pela reforma de Josias foram a
são citados como tendo sido sepultados no natureza teocêntrica da história, a centra-
“jardim de Uzá” (cf. 21.18,26). lidade de Jerusalém como o centro de
adoração, o princípio de retribuição moral
8 The M artyrdom o f Is ä a h 3.10-5.14, em The fteu d ep ig räp h a, R .H . a nível tanto individual quanto coletivo, e
Charles, editor, cf. 4.105.8.
9 O p. d t ., p. 646; cf. “T he D esert G od’ A ttar in the Literature and
as ênfases positivas na interpretação profé
Religion o f C anaan”. JNES. V III. 1949, p. 80. tica da vida. Essas características assina-
303
Iam esse movimento teológico como uma foi encontrado no curso de um programa
influência singular e determinativa para a de renovação provavelmente relacionado
religião e teologia de Israel. com a reforma.
Os efeitos dessa teologia deviam ser
medidos não somente na reforma especí 1) O Reparo no Templo (22.3-7)
fica de Josias e na implementação de prin
3No ano décimo oitavo do rei Josias, o rei
cípios deuteronômicos na vida nacional, mandou o escrivão Safã, filho de Azalias, filho de
mas também na atividade religiosa con Mesulão, à casa do Senhor, dizendo-lhe: 4Sobe a
temporânea, tal como a que caracterizou Hilquias, o sumo sacerdote, para que faça a soma
a época de Jeremias. Além disso, a teologia do dinheiro que se tem trazido para a casa do
da escola deuteronômica deixou sua marca Senhor, o qual os guardas da entrada têm recebido
do povo; 5e que o entreguem na mão dos mestres
em livros como Josué, Juizes, 1 e 2Samuel, de obra que estão encarregados da casa do Se
e 1 e 2Reis, cada um dos quais foi compi nhor; e que estes o dêem aos que fazem a obra,
lado a partir da influência decisiva da aos que estão na casa do Senhor para repararem
perspectiva da escola deuteronômica. os estragos da casa, 6aos carpinteiros, aos edifi
cadores, e aos pedreiros; e que comprem madeira
e pedras lavradas, a fim de repararem a casa.
1. Josias (22.1,2) 7Contudo não se tomava conta a eles do dinheiro
que se lhes entregava nas mãos, porquanto se
'Josias tinha oito anos quando começou a
haviam com fidelidade.
reinar, e reinou trinta e um anos em Jerusalém.
O nome de sua mãe era Jedida, filha de Adaías, Tanto os reparos no templo quanto a
de Bozcate. 2Ele fez o que era reto aos olhos do
Senhor; e andou em todo o caminho de Davi, seu
reforma subseqüente tinham relação com
pai, não se apartando dele nem para a direita nem o declínio do poderio da Assíria, cuja
para a esquerda. capital caiu diante de uma coalizão de
babilônios, medos e citas em 612 a.C.
A pouca idade de Josias ao tempo de A reforma foi não somente um movimento
sua ascensão ao trono encontra paralelo
autêntico de renovação espiritual, mas
na experiência de Joás (cf. 11.21), e sugere
a possibilidade de que o partido que pro também uma genuína afirmação de inde
pendência nacional.
moveu sua ascensão tenha sido bastante
A família de Safã (pêlo de pedra) foi
influente durante os primeiros anos de uma forte sustentadora da reforma, e tanto
Josias (cf. o papel de Jeoiada no princípio o próprio Safã quanto seus filhos Aicão e
do reinado de Joás). Elasa foram de considerável ajuda para
Jeremias (cf. 22.12; Jr 26.24; 29.3).
2. O Início da Reforma (22.3-20)
2) A Descoberta e Leitura do Livro
Os interesses religiosos e teológicos (22 . 8 -10)
do editor deuteronômico tornam-se clara
8Então disse o sumo sacerdote Hilquias ao
mente visíveis através de sua preocupação escrivão Safã: Achei o livro da lei na casa do
ínfima com os acontecimentos históricos Senhor. E Hilquias entregou o livro a Safã, e ele
não relacionados com o movimento de o leu. ’Depois o escrivão Safã veio ter com o rei
reforma. Com exceção de 23.1,2 e 23. e, dando ao rei o relatório, disse: Teus servos des
28-30, a totalidade do tratamento dispen pejaram o dinheiro que se achou na casa, e o entre
garam na mão dos mestres de obra que estão
sado a Josias concentra-se na reforma. encarregados da casa do Senhor. 10Safã, o es
Contudo, a descoberta do livro da lei não crivão, falou ainda ao rei, dizendo: O sacerdote
foi a única mola propulsora da reforma de Hilquias me entregou um Uvra E Safã o leu diante
Josias, o que se confirma tanto pela decla do rei.
ração do cronista de què a reforma tinha Já desde o tempo de Jerônimo, o livro
estado em andamento _por pelo menos seis da lei descoberto durante os reparos no
anos antes da descoberta da lei (cf. 2Cr templo em 622 a.C. tem sido identificado
23.3 e ss.) e quanto pelo fato de que o livro como o livro de Deuteronômio. Com
304
freqüência tem-se alegado que não se o que falei contra este lugar, e contra os seus habi
tratava de todo o livro de Deuteronômio, tantes, isto é, que se haviam de tornar em assola
ção e em maldição, e rasgaste as tuas vestes, e
sobretudo com base no fato de que foi lido choraste perante mim, também eu te ouvi, diz o
inteiramente duas vezesjnum único dia (cf. Senhor. 20Pelo que eu te recolherei a teus pais, e
v. 10; 23.2). Além disso, a reforma imple tu serás recolhido em paz à tua sepultura, e os teus
mentada por Josias pôs em prática somen olhos não verão todo o mal que hei de trazer sobre
te poucas estipulações do livro de Deute este lugar. Então voltaram, levando a resposta
ao rei.
ronômio.
Profetisa aparece apenas seis vezes no
3) A Reação ao Livro (22.11-13) Antigo Testamento: Miriã, Débora, Hulda
UE sucedeu que, tendo o rei ouvido as pala e Noadias foram as únicas mulheres a
vras do livro da lei, rasgou as suas vestes. uEntão atuarem como profetisas (cf. Ex 15.20;
o rei deu ordem a Hilquias, o sacerdote, a Aicão,
filho de Safã, a Acbor, filho de Micaías, a Safã,
Jz 4.4; 2Rs 22.14; 2Cr 32.22; Ne 6.14).
o escrivão, e Asaías, servo do rei dizendo: 13Ide, O termo foi uma vez aplicado à esposa de
consultai ao Senhor por mim, e pelo povo, e por Isaías, mas dificilmente com a idéia de
todo o Judá, acerca das palavras deste livro que atividade profética (cf. Is 8.3).
se achou; porque grande é o furor do Senhor, que O oráculo de Hulda revela que (1) a
se acendeu contra nós, porquanto nossos pais não
deram ouvidos às palavras deste livro, para faze nação deve sofrer uma ira que não se
rem conforme tudo quanto acerca de nós está apagará, uma referência à queda de Jeru
escrita salém; mas (2) o rei, devido a sua humil
A reação mais significativa de Josias à dade e reação para com Iavé não viverá
leitura do livro da lei foi a delegação de para ver a destruição que Hulda prevê para
mensageiros para buscarem um oráculo a nação. Essa dupla ênfase provavelmente
profético concernente ao bem-estar de si reflete a atividade editorial de um editor
mesmo, do povo e de todo Judá. Assim, pós-exílico, que incorporou as lembranças
desde o seu início a reforma está direta da queda de Jerusalém ao oráculo de
mente relacionada a bases proféticas. Essa Hulda. Durante o curso do oráculo Hulda
ênfase profética está plenamente de acordo utiliza o tradicional Assim diz o Senhor
com a contínua exaltação do ofício profé (ko amar Yahweh) para introduzir três
tico ao longo dos livros dos Reis. ordens ou revelações oficiais.
É bastante discutível se Josias foi levado
4) O ímpeto Profético Pela Reforma a sua sepultura em paz, pois morreu vio
(22.14-20) lentamente nas mãos do Faraó-Neco em
14Então o sacerdote Hilquias, e Aicão, e Megido (cf. 23.29). A profecia original de
Acbor, e Safã, e Asaías foram ter com a profetisa Hulda pode ter sido escrita antes de Me
Hulda, mulher de Salum, filho de Ticvá, filho de gido, e, assim, não ter tido conhecimento
Harás, o guarda das vestiduras (ela habitava então do destino do rei. É preferível, contudo,
em Jerusalém, na segunda parte), e lhe falaram.
15E ela lhes respondeu: Assim diz o Senhor, o interpretar em paz como uma referência de
Deus de Israel: Dizei ao homem que vos enviou que o país ainda se encontrava intacto.
a mim: I6Assim diz o Senhor: Eis que trarei O oráculo de Hulda é freqüentemente
males sobre este lugar, e sobre os seus habitantes, interpretado como uma fusão de dois
conforme todas as palavras do livro que o rei de oráculos (v. 15 e ss. e v. 18 e ss.), posterior
Judá leu. 17Porquanto me deixaram, e queimaram
incenso a outros deuses, para me provocarem à ira mente editado por alguém familiarizado
por todas as obras das suas mãos, o meu furor se com a destruição de Jerusalém. Isso se
acendeu contra este lugar, e não se apagará. harmoniza com a atividade editorial den
18Todavia ao rei de Judá, que vos enviou para tro do Antigo Testamento, conquanto não
consultar ao Senhor, assim lhe direis: Assim diz
o Senhor, o Deus de Israel: Quanto às palavras que haja nada inerentemente impossível na
ouviste, 19porquanto o teu coração se enterneceu, pressuposição de que Hulda previu, com
e te humilhaste perante o Senhor, quando ouviste a sagacidade com que foi dotada, a inevi-
305
tável destruição de Judá, um evento que respalda a interpretação de 16.18 como um
teve lugar menos de quarenta anos depois. alicerce real que se tirou do templo como
3. A Implementação da Reforma (23.1-25) sinal da subserviência de Acaz ante o rei
assírio.
A reforma provavelmente atravessou
uma série de fases distinguíveis: (1) restau 2) A Implementação Política das Estipu
ração do Templo, (2) expurgo religioso de lações da Aliança (23.4-14)
influências não-israelitas, e (3) o esforço de 4lambém o rei mandou ao sumo sacerdote
incluir pessoas do antigo Reino do Norte. Hilquias e aos sacerdotes da segunda ordem, e aos
O resultado do movimento de reforma foi guardas da entrada, que tirassem do templo do
Senhor todos os vasos que tinham sido feitos para
implementar as estipulações do livro da lei Baal, e para a Asera, e para todo o exército do
e dar-lhes autoridade política. Como tal a céu; e os queimou fora de Jerusalém, nos campos
reforma foi tanto religiosa quanto política. de Cedrom, e levou as cinzas deles para Betei.
5Destituiu os sacerdotes idólatras que os reis de
1) A Leitura Pública do Livro (23.1-3) Judá haviam constituído para queimarem incenso
sobre os altos nas cidades de Judá, e ao redor de
'Então o rei deu ordem, e todos os anciãos de Jerusalém, como também os que queimavam
Judá e de Jerusalém se ajuntaram a ele. zSubiu incenso a Baal, ao sol, à lua, aos planetas, e a todo
o rei à casa do Senhor, e com ele todos os homens o exército do céu. 6Tirou da casa do Senhor a
de Judá, todos os habitantes de Jerusalém, os Asera e, levando-a para fora de Jerusalém até o
sacerdotes, os profetas, e todo o povo, desde o ribeiro de Cedrom, ali a queimou e a reduziu a
menor até o maior; e leu aos ouvidos deles todas pó, e lançou o pó sobre as sepulturas dos filhos
as palavras do livro do pacto, que fora encontrado do pova ’Derrubou as casas dos sodomitas que
na casa do Senhor. 3Então o rei, pondo-se em pé estavam na casa do Senhor, em que as mulheres
junto à coluna, fez um pacto perante o Senhor, de teciam cortinas para a Asera. 8Tirou das cidades
andar com o Senhor, e guardar os seus manda de Judá todos os sacerdotes, e profanou os altos
mentos, os seus testemunhos e os seus estatutos, em que os sacerdotes queimavam incenso desde
de todo o coração e de toda a alma, confirmando Geba até Berseba; e derrubou os altos que estavam
as palavras deste pacto, que estavam escritas às portas, junto à entrada da porta de Josué, o
naquele livro; e todo o povo esteve por este pacta chefe da cidade, à esquerda daquele que entrava
pela porta da cidade. ’Todavia os sacerdotes dos
A proclamação pública das estipula altos não sacrificavam sobre o altar do Senhor em
Jerusalém, porém comiam pães ázimos no meio
ções da aliança dentro do Antigo Testa de seus irmãos. 10Profanou a Tofete, que está no
mento remonta ao Sinai (cf. Ex 20.2 e ss.; vale dos filhos de Hinom, para que ninguém
Dt 5.4 e ss.) e chega até à leitura pública fizesse passar seu filhoi, ou sua filha, pelo fogo a
da lei por Esdras após o exílio (cf. Ne 8.1). Moloque. "Tirou os cavalos que os reis de Judá
Parece que a leitura pública das estipula tinham consagrado ao sol, à entrada da casa do
Senhor, perto da câmara do camareiro Natã-
ções da aliança estava relacionada com -Meleque, a qual estava no recinto; e os carros do
uma cerimônia de renovação da aliança, sol queimou a fogo. l2Também o rei derrubou os
muito provavelmente celebrada em con altares que estavam sobre o terraço do cenáculo
junto com a festa dos tabernáculos na de Acaz, os quais os reis de Judá tinham feito,
como também os altares que Manassés fizera nos
época do outono. No contexto em refe dois átrios da casa do Senhor; e, tendo-os esmi
rência, o propósito da leitura pública foi galhado, os tirou dali e lançou o pó deles no ribeiro
dar sanção política oficial às estipulações de Cedrom. 130 rei profanou também os altos
da aliança, especialmente aquelas relacio que estavam ao oriente de Jerusalém, à direita do
nadas com a purificação do culto. Monte de Corrupção, os quais Salomão, rei de
Israel, edificara a Astarote, abominação dos sidô-
A referência do rei em pé junto à coluna nios, a Quemós, abominação dos moabitas, e
sugere um local oficial onde o rei agia. a Milcom, abominação dos filhos de Amom.
Por ocasião de sua coroação Joás “estava 14Semelhantemente quebrou as colunas, e cortou
junto à coluna, conforme o costume” os aserins, e encheu os seus lugares de ossos de
homens.
(11.14), e do mesmo evento o cronista diz
que o rei estava “junto à sua coluna” A purificação da vida religiosa rela-
(2Cr 23.13; cf. Ne 8.4). Tal interpretação cionava-se a uma afirmação de autonomia
306
nacional por Josias (tal como o reverso foi com o baalismo, ritos que afirmavam que
verdadeiro sob Acaz e Manassés). A limi a união sexual ritual precipitava a união
tação da reforma à vida religiosa é uma das da força procriativa cósmica com a mãe
razões para se supor que o livro da lei não terra, com isso aumentando a produtivi
constituía a totalidade do livro de Deute- dade da família, rebanhos e campos; (5) a
ronômio, mas apenas uma porção que retirada de centros loc?is de adoração dedi
tratava da pureza da vida religiosa (isto é, cados a Iavé, destacando assim o papel
especialmente Dt 12—26). O sumário de central de Jerusalém; (6) a profanação do
E. W. Nicholson sobre passagens paralelas local perto de Jerusalém onde se prati
entre Deuteronômio e Reis é de muito cavam os sacrifícios de crianças; (7) a reti
auxílio: rada de cavalos relacionados com o culto
2Reis 23 Deuteronômio ao sol, uma referência rara mas aparente
A bolição dos aserins, v. 7.5; 12.3; 15.21 mente válida ao papel do cavalo como um
4, 6, 7, 14 símbolo religioso; (8) a retirada de altares,
O exército do céu, v. 4, 5 17.3 provavelmente relacionados com o culto
D estruição das colunas, 7.5; 12.3.3; etc aos astros, e que haviam sido erigidos por
v. 14 Acaz e Manassés, sem dúvida numa imi
Lugares altos pagãos, v. 13 7.5; 12.2 e s.; etc tação de práticas assírias; (9) a contami
C ulto ao sol e à lua, v. 17.3 nação daqueles locais de culto idólatra,
5,11 associado com as inovações precipitadas
Prostituição cultual, v. 7 23.18 pelos compromissos matrimoniais de
Culto a Moloque, v. 10 12.31; 18.10 Salomão.
Deuses estrangeiros etc, v. 12; 13
13 3) A Ampliação do Expurgo Para o Norte
Necromancia, v. 24 18.11 (23.15-20)
Páscoa celebrada em Je- 16.1-811
15Igualmente o altar que estava em Betei, e o
ru salém , isto é, c e n tra alto feito por Jeroboão, filho de Nebate, que fizera
lizada em Jerusalém , v. Israel pecar, esse altar e o alto ele os derrubou;
21.23 queimando o alto, reduziu-o a pó, e queimou a
Asera. 16E, virando-se Josias, viu as sepulturas
Segundo a seqüência do capítulo em que estavam ali no monte, e mandou tirar os ossos
pauta (provavelmente extraída dos anais de das sepulturas, e os queimou sobre aquele altar,
Judá), a reforma consistiu nas seguintes e assim o profanou, conforme a palavra do Senhor
proclamada pelo homem de Deus que predissera
ações: (1) a queima de todos os vasos rela estas coisas. 17Então perguntou: Que monumento
cionados com Baal, Asera e o exército é este que vejo? Responderam-lhe os homens da
celeste, e a remoção das cinzas para Betei, cidade: É a sepultura do homem de Deus que veio
assim expurgando de Judá o último ves de Judá e predisse estas coisas que acabas de fa
zer contra este altar de Betei. 18Ao que disse
tígio de sua influência, ao mesmo tempo Josias: Deixai-o estar; ninguém mexa nos seus
lançando repreensão contra um local de ossos. Deixaram estar, pois, os seus ossos junta
culto no Reino do Norte; (2) a retirada de mente com os do profeta que viera de Samária.
todos os sacerdotes idólatras; (3) a retirada '’Josias tirou também todas as casas dos altos
de um ídolo em particular, relacionado que havia nas cidades de Samária, e que os reis
de Israel tinham feito para provocarem o Senhor
com Asera, e sua destruição completa à ira, e lhes fez conforme tudo o que havia feito
mediante queima; (4) a retirada de prosti em Betei. 20E a todos os sacerdotes dos altos que
tutas cultuais, mulheres dedicadas aos encontrou ali, ele os matou sobre os respectivos
ritos cananeus de fertilidade associados altares, onde também queimou ossos de homens;
depois voltou a Jerusalém.
10 E. W. Nicholson, Deuteronomy and Tradition, (Philadelphia: Fortress
Press. 1967) p. 3. N icholson cita L. B. Paton para um a lista mais
completa: “T h e Case for the Post-exilic Dating o f Deuteronom y”,
Conquanto muitas vezes surjam dúvi
JBL 47 (1928), p. 325 e a . das quanto a se Josias de fato pretendia
307
ou não incluir o Reino do Norte no movi do capítulo como um meio de confirmar
mento de reforma, tal tentativa harmoni Jerusalém como o lugar de culto. A afir
za-se com a crença do cronista (cf. 2Cr mação de que não se celebrara tal páscoa
34.6,7) e com a desintegração do controle desde os dias dos juizes provavelmente se
assírio sobre a Palestina nessa época espe refere à celebração de Josué 5.10 e ss. (cf.
cífica. A reivindicação sobre o Reino do Joshua, BBC, Vol. 2) e a comemorações
Norte aparentemente caracterizou a refor posteriores ocorridas no centro religioso,
ma de Josias e pode ter sido um aspecto Gilgal. A ação de Josias elevou a páscoa
de sua dificuldade final com o Egito e à condição de uma festa de peregrinação
de sua morte em seguida em Megido (cf. de importância nacional, com implicações
23.29,30). tanto polítícas quanto religiosas.
Dentro do formato mais amplo da nar
rativa há uma ênfase dupla sobre (1) ex 5) Um Sumário da Reforma (23.24,25)
purgar Betei do altar associado com o epi 24Além disso, os adivinhos, os feiticeiros, os
sódio do bezerro de ouro durante o tempo terafins, os ídolos e todas as abominações que se
de Jeroboão I (um pecado que o deutero- viam na terra de Judá e em Jerusalém, Josias os
nomista jamais esqueceu, e pelo qual afir extirpou, para confirmar as palavras da lei, que
mou que cada rei seguinte de Israel era estavam escritas no livro que o sacerdote Hilquias
achara na casa do Senhor. 25Ora, antes dele não
responsável); e (2) veneração do profe houve rei que lhe fosse semelhante, que se conver
ta que advertiu Jeroboão I (cf. lRs 13.1 tesse ao Senhor de todo o seu coração, e de toda
e ss.). a sua alma, e de todas as suas forças, conforme
A profanação mediante queima de os toda a lei de Moisés; e depois dele nunca se le
sos sobre o altar reflete a atitude comum vantou outro semelhante.
para com o limpo e imundo. A natureza Adivinhos (’oboth) sugere necromancia,
imunda de um cadáver era um claro meio a arte de suposta comunicação com os
de profanar o altar (cf. Lv 21.10 e ss.; mortos. Isso era, a julgar pelas passagens
22.4). A contaminação de Betei e o poste condenatórias, um problema comum em
rior expurgo de santuários israelitas estão Israel (cf. Lv 19.31; 20.27; Dt 18.11). Saul
diretamente relacionados com a advertên consultou uma mulher supostamente ca
cia levítica: “Destruirei os vossos altos, paz de contactar os mortos (cf ISm 28.7),
derrubarei as vossas imagens do sol, e lan e a prática esteve especialmente relacio
çarei os vossos cadáveres sobre os destro nada com os males do reinado de Manas
ços dos vossos ídolos; e a minha alma vos ses (21.6). A palavra feiticeiros (yidd^oni,
abominará” (Lv 26.30). “espírito familiar”, proveniente de yada’,
conhecer) estritamente significa conhecer
4) A Celebração Pública da Páscoa ou ter sabedoria no sentido de familiari
(23.21-23) dade com o mundo invisível (cf. Dt 18.11;
21Então o rei deu ordem a todo o poro, dizen ISm 28.3,9; Is 8.19; 19.3). Segundo Isaías
do: Celebrai a páscoa ao Senhor vosso Deus, co 2.6, a arte foi introduzida desde a Filístia.
mo está escrito neste livro do pacta 22Pois não se Terafins eram deuses ou ídolos domésticos
celebrara tal páscoa desde os dias dos juizes que (cf. Gn 31.19; Jz 17.5; ISm 19.13).
julgaram a Israel, nem em todos os dias dos reis
de Israel, nem tampouco nos dias dos reis de 4. O Fracasso da Reforma e o Último Ato
Judá. 23Foi no décimo oitavo ano do rei Josias
que esta páscoa foi celebrada ao Senhor em Je de Josias (23.26-30)
rusalém. “ Todavia o Senhor não se demoveu do ardor
O relato da celebração pública e centra da sua grande ira, com que ardia contra Judá por
causa de todas as provocações com que Manassés
lizada da páscoa em Jerusalém por Josias, o provocara. 27E disse o Senhor: Também a Judá
em oposição à natureza doméstica da fes hei de remover de diante da minha foce, como re
ta, é empregado pelo editor nesse ponto movi a Israel, e rejeitarei esta cidade de Jerusa
308
lém que elegi, como também a casa da qual eu velmente se dirige. É propósito do editor
disse: Estará ali o meu nome. MOra, o restante ilustrar a partir de fatos históricos o prin
dos atos de Josias, e tudo quanto fez, porventura
não estão escritos no livro das crônicas dos reis cípio de que a infidelidade religiosa (que
de Judá? 29Nos seus dias subiu Faraó-Necoi, rei no Antigo Testamento se diferencia da ir
do Egito, contra o rei da Assíria, ao rio Eufrates. responsabilidade moral) provocou o fim da
E o rei Josias lhe foi ao encontro; e Faraó-Neco nação. Essa tese básica claramente se re
o matou em Megido, logo que o viu. “ De Megi- vela na atenção relativamente pequena
do os seus servos o levaram morto num carro, e
o trouxeram a Jerusalém, onde o sepultaram no que se dá a eventos históricos concernen
seu sepulcro. E o povo da terra tomou a Jeoacaz, tes às preocupações tradicionais de gover
filho de Josias, ungiram-no, e o fizeram rei em no em comparação com a grande atenção
lugar de seu pai. dada às características religiosas de suces
Tendo vivido durante a queda de Jeru sivos reis. A ênfase do escritor é clara, e
salém, o segundo editor deuteronômico in os reinados dos reis depois de Josias de
sere uma nota advertindo quanto à natu monstram o princípio deuteronômico de
reza irrevogável da ira de Iavé. Nem mes retribuição dentro do arcabouço da his
mo uma pessoa tão nobre e fiel como Jo tória.
sias poderia evitar a calamidade. A inevi
tabilidade da destruição estava relacionada 1. Jeoacaz (23.31-35)
à severidade da apostasia de Manasses (cf. 31Jeoacaz tinha vinte e três anos quando co
21.10 e ss.). O editor corretamente observa meçou a reinar, e reinou três meses em Jerusalém.
que há um ponto que, uma vez ultrapas O nome de sua mãe era Hamutal, filha de Jere
mias, de Libna. 32Ele fez o que era mau aos olhos
sado, não pode impedir a desintegração do Senhor, conforme tudo o que seus pais haviam
nacional, pois forças retributivas de natu feita 33Ora, Faraó-Neco mandou prendê-lo em
reza religiosa, política e moral já haviam Ribla, na terra de Hamate, para que não reinasse
sido postas em ação pelo caráter religioso- em Jerusalém; e à terra impôs o tributo de cem
talentos de prata e um talento de oura 14Tambcm
-político da nação. Faraó-Neco constituiu rei a Eliaquim, filho de
A atenção menor dada à morte trágica Josias, em lugar de Josias, seu pai, e lhe mudou
e catastrófica de Josias em Megido subli o nome em Jeoiaquim; porém levou consigo a
nha o interesse básico do editor com a re Jeoacaz, que conduzido ao Egito, ali morreu. 3SE
novação religiosa e teológica em oposição Jeoiaquim deu a Faraó a prata e o ouro; porém
impôs à terra uma taxa, para fornecer esse di
a uma história de Judá. nheiro conforme o mandado de Faraó. Exigiu do
Em que base Josias foi encontrar-se povo da terra, de cada um segundo a sua avalia
com Neco, seja para opor-se-lhe (como é ção, prata e ouro, para o dar a Faraó-Neco.
provável), seja em resposta a uma exigên Jeoacaz (Iavé tem segurado) governou
cia de Neco, seja ainda voluntariamente somente três meses antes de ser deposto e
para parlamentar com ele, não nos é dito. levado para o Egito pelo Faraó-Neco. Sua
A morte de Josias em Megido, por volta
deposição pode ter estado relacionada com
de 609 a.C., provocou, para todos os pro
circunstâncias que cercaram sua escolha
pósitos práticos, o fim da reforma. Sua
como rei. Conquanto mais jovem do que
morte foi em si mesma uma refutação da Jeoiaquim (cf. 23.36), ele foi escolhido pe
tese deuteronômica de que a fidelidade era lo povo da terra (23.30) e ungido rei. Em
sempre recompensada na história. bora tanto Jeoiaquim e Jeoacaz fossem fi
lhos de Josias, tinham mães diferentes (v.
IV. A Destruição de Jerusalém e a 31,36), sugerindo a possibilidade de Jeoa-
Queda de Judá (23.31—25.30) caz/Zedequias e Jeoiaquim/Joaquim terem
tido formação e atitude diferentes. Faraó-
A destruição de Jerusalém e especial Neco aparentemente jamais reconheceu
mente do templo constitui o clímax em a sucessão de Jeoacaz, conforme se vê na
direção do qual o livro de 2Reis inexora declaração de que, quando Neco tornou
309
Jeoiaquim (Eliaquim) rei, ele o fez reinar em 605 a.C. introduziu aquele império ra
não em lugar de Jeoacaz, mas em lugar pidamente numa era de poderio interna
de Josias, seu pai. Pode-se suspeitar que cional que durou os 43 anos de seu rei
o povo da terra fosse antiegípcio, enquan nado (605-562 a.C.).
to Jeoiaquim (Eliaquim) fosse mais conci Nabucodonozor (cf. 25.1; 2Cr 36.6;
liatório. Dn 1.1) aparece em outra parte no Antigo
Testamento como Nebuchadrezzar (que é
2. Jeoiaquim (23.36—24.7) empregado somente por Jeremias e Eze-
36Jeoiaquim tinha vinte e cinco anos quando quiel; cf. a Tradução Brazileira de Jr 21.2;
começou a reinar, e reinou onze anos em Jerusa 32.1 e ss.; Ez 26.7; 30.10). Nebuchadrez
lém. O nome de sua mãe era Zebida, filha de Pe- zar, ou Nebucadrezar, está mais próximo
daías, de Ruma. 37Ele fez o que era mau aos da grafia acadiana Nabu-kudurri-usur,
olhos do Senhor, conforme tudo o que seus pais mas Nabucodonozor é a forma mais po
haviam feita
'Nos seus dias, subiu Nabucodonozor, rei de pular no Antigo Testamento (58 contra 33
Babilônia, e Jeoiaquim ficou sendo seu servo por ocorrências). Um contemporâneo imedia
três anos; mas depois se rebelou contra ele. 2En- to como Jeremias prefere Nebucadrezar
tão o Senhor enviou contra Jeoiaquim tropas dos (33 Nebucadrezar contra 8 Nabucodono
caldeus, tropas dos sírios, tropas dos moabitas e zor), e essa grafia é geralmente preferível.
tropas dos filhos de Amom; e as enviou contra
Judá, para o destruírem, conforme a palavra que De 58 referências a Nabucodonozor, 32 se
o Senhor falara por intermédio de seus servos os dão no livro de Daniel. Note-se a prefe
profetas. 3Foi, na verdade, por ordem do Senhor rência de um contemporâneo, Jeremias,
que isto veio sobre Judá para removê-lo de diante por Nebucadrezar, e a preferência de fon
da sua face, por causa de todos os pecados come
tidos por Manassés, 4bem como por causa do tes posteriores, como Daniel, por Nabu
sangue inocente que ele derramou; pois encheu codonozor. Neste comentário seguimos a
Jerusalém de sangue inocente; e por isso o Se grafia constante do texto bíblico.
nhor não quis perdoar. sOra, o restante dos atos Não há dados em 2Reis para estabele
de Jeoiaquim, e tudo quanto fez, porventura não
estão escritos no livro das crônicas dos reis de cer a data da ocasião em que Jeoiaquim,
Judá? ‘Jeoiaquim dormiu com seus pais. E Joa após um período de três anos de fideli
quim, seu filho, reinou em seu lugar. 70 rei do dade, se rebelou contra Nabucodonozor.
Egito nunca mais saiu da sua terra, porque o rei Uma breve reconstituição das atividades
de Babilônia tinha tomado tudo quanto era do rei
do Egito desde o rio do Egito até o rio Eufrates. de Nabucodonozor pode ajudar a situar
no tempo a ação de Jeoiaquim.
Jeoiaquim (Iavé suscita) foi um nome A Crônica Babilónica revela que Nabu
que o Faraó deu a Eliaquim (Deus suscita) codonozor, então príncipe herdeiro, estava
tanto para apaziguar Judá (de acordo com no comando das forças babilónicas que
H. B. MacLean, IDB) quanto para desta derrotaram o Egito em Carquêmis em 605
car o poder de Neco. Jeoiaquim era um ir a.C. e a seguir avançaram pela Síria e re
mão mais velho do rei Jeoacaz, e era quem giões da Palestina. Com a morte de seu
o Faraó colocou no trono deste (23.34 e pai, Nabopolassar (em 16 de agosto de 605
ss.). Jeremias é especialmente sarcástico ao a.C.), Nabucodonozor retornou para seu
condenar os reis de Judá que reinaram país a fim de assumir o trono. Mas ele es
durante esse período, e suas observações tava na fronteira do Egito em 604 a.C., e
concernentes a Jeoiaquim ressaltam clara capturou Asquelom no mês de quisleu
mente a insensibilidade moral e social do (novembro-dezembro). Sobre essa expedi
rei (cf. Jr 22.13 e ss.). ção a Crônica Babilónica declara especi
Com a queda de Nínive diante dos ba ficamente que “Todos os reis da terra de
bilônios, citas e medos em 612 a.C., o im Hatti vieram perante ele, e ele recebeu
pério assírio chegou ao fim. A elevação pesado tributo deles” (British Museum
de Nabucodonozor ao trono de Babilônia Tablet n.° 21.946; cf. Wiseman). Entre es
310
ses poderia estar Jeoiaquim (conquanto sul grande parte do mesmo papel que Jero-
Gray julgue que Jeoiaquim foi deixado boão I desempenhou no norte (v. 3).
em paz nessa ocasião, e que não lhe foi A morte de Jeoiaquim ppde ser datada
imposto tributo até a expedição de 601 com bastante precisão com base na Crônica
a.C.). Babilónica como. tendo ocorrido em 7 de
dezembro de 598 a.C., “três meses e dez
Após a sujeição da Palestina e da Síria, dias antes da captura de Jerusalém”
Nabucodonozor realizou marchas anuais (Wiseman, p. 81; cf. tâmbém 2Cr 36.9 em
para coletar tributos. Mas em 601 a.C. ele contraste com 2Reis 24.6).
partiu para o ataque a Neco II do Egito,
que o derrotou tão severamente que por
um ano e meio os babilônios permanece 3. Joaquim (24.8-17)
ram em Babilônia reequipando suas forças 8Tinha Joaquim dezoito anos quando começou
(Wiseman, p. 80). Em 599/98 a.C. Nabu a reinar, e reinou três meses em Jerusalém. O nome
codonozor derrotou as tribos árabes pre de sua mãe era Neústa, filha de Elnatã, de Jeru
parando-se para um avanço sobre Judá salém. ’Ele fez o que era mau aos olhos do Senhor,
(cf. Jr 49.28-33). conforme tudo o que seu pai tinha feita "’Naquele
tempo os servos de Nabucodonozor, rei de Babi
O exército babilónico reuniu-se para o lônia, subiram contra Jerusalém, e a cidade foi
ataque contra Jerusalém em 29 de novem sitiada. nE Nabucodonozor, rei de Babilônia,
chegou diante da cidade quando já os seus servos
bro de 598, e a cidade caiu em 16 de mar estavam sitianda 12Então saiu Joaquim, rei de
ço de 597 (Wiseman, p. 80,81). A Crônica Judá, ao rei de Babilônia, ele, e sua mãe, e seus
Babilónica contém esta inscrição: “(...) e, servos, e seus príncipes, e seus oficiais; e, no ano
tendo marchado para a terra de Hatti, oitavo do seu reinado, o rei de Babilônia o levou
presa 13E tirou dali todos os tesouros da casa do
cercou a cidade de Judá, e no segundo dia Senhor, e os tesouros da casa do rei; e despedaçou
do mês de Adar tomou a cidade e captu todos os vasos de ouro que Salomão, rei de Israel,
rou o rei. Ele ali designou um rei de sua fizera no templo do Senhor, como o Senhor havia
própria escolha, recebeu seus pesados tri d ita 14E transportou toda a Jerusalém, como
butos e enviou(-os) para Babilônia” (British também todos os príncipes e todos os homens
valentes, dez mil cativos, e todos os artífices e
Museum Tablet n? 21.946 rev 11-13, lâ ferreiros; ninguém ficou senão o povo pobre da terra.
mina 5, citado em Wiseman). 15Assim transportou Joaquim para Babilônia;
como também a mãe do rei, as mulheres do rei,
Esse contexto histórico e a narrativa de os seus oficiais, e os poderosos da terra, ele os levou
2Reis sugerem que Jeoiaquim começou a cativos de Jerusalém para Babilônia. 16Todos os
pagar tributo a Nabucodonozor (v. 1) em homens valentes, em número de sete mil, e artífices
604 a.C. e continuou até 601 a.C., quando, e ferreiros, em número de mil, todos eles robustos
e destros na guerra, a estes o rei de Babilônia levou
por causa da derrota babilónica por Neco cativos para Babilônia. I7E o rei de Babilônia cons
II, deixou de pagar tributo (Jeremias tituiu rei em lugar de Joaquim a Matanias, seu
condenou severamente a dependência tio paterno, e lhe mudou o nome em Zedequias.
diante do Egito, cf. Jr 37.1 e ss.). Ademais,
os ataques por tribos isoladas descritos no Joaquim (Iavé estabelece), também
versículo 2 provavelmente ocorreram apro conhecido como Jeconias (lCr 3.16,17; Jr
ximadamente no intervalo entre 599 e 598 24.1) e pela forma abreviada Conias (Jr
a.C., e foram empregados por Nabucodo 22.24,28; 37.1), sucedeu ao pai no trono
nozor para atrair a atenção de Judá até que para um breve reinado de três meses. A
ele pudesse conduzir o exército babilónico declaração de que ele fez o que era mau
uma vez mais até a Palestina. Esses ataques pode sugerir envolvimento político com o
por nações fronteiriças foram interpretados Egito em vez de infidelidade moral ou espi
pelo editor como uma expressão do juízo ritual. Essa é a maneira de o editor explicar
de Iavé sobre Judá por causa dos pecados a queda de Jerusalém e as tragédias subse
de Manassés, que veio a desempenhar no qüentes.
311
Embora os tesouros do templo tenham (23.26). Contrastar características ideoló
sido saqueados, e pessoas de destaque gicas dentro dos círculos familiares de
deportadas, Jerusalém não ficou deserta Jeoacaz-Matanias e Jeoiaquim-Zedequias
nessa ocasião, nem o templo foi destruído. pode ajudar a explicar (1) por que Neco
Joaquim e sua família foram levados cativos volveu-se para Eliaquim (Jeoiaquim)
para Babilônia, onde aparentemente quando tão recentemente havia deposto seu
tiveram bom tratamento (cf. 25.27 e ss.), irmão Jeoacaz, e (2) por que Nabucodo-
provavelmente vivendo sob prisão domici nozor deve ter-se voltado para Matanias,
liar e recebendo suprimentos da intendência tio de Joaquim, quando tão recentemente
do rei (cf. 25.30, e também confirmação havia deposto a Joaquim.
nos registros babilónicos conhecidos como
Os Tabletes de Joaquim). 2) A Rebelião e o Destino de Zedequias
A variação entre as datas da queda de (25.1-7)
Jerusalém em 24.12 (o oitavo ano de Nabu- 'E sucedeu que, ao nono ano do seu reinado,
no décimo dia do décimo mês, Nabucodonozor, rei
codonozor) e em Jeremias 52.28 (o sétimo de Babilônia, veio contra Jerusalém com todo o
ano) reflete sistemas diferentes de registros seu exército, e se acampou contra ela; levantaram
de datas. Em Judá o ano de ascensão não contra ela tranqueiras em redor. 2E a cidade ficou
era computado como o primeiro ano; daí, sitiada até o décimo primeiro ano do rei Zedequias.
Jeremias está um ano aquém do total dado 3Aos nove do quarto mês, a cidade se via tão aper
tada pela fome que não havia mais pão para o povo
em Reis. O número de deportados (10.000, da terra. 4Então a cidade foi arrombada, e todos
v. 14) deve ser comparado com o número os homens de guerra fugiram de noite pelo caminho
de 3.023 (cf. Jr 52.28). Reis talvez esteja da porta entre os dois muros, a qual estava junto
usando um número redondo, e também ao jardim do rei (porque os caldeus estavam contra
pode estar incluindo os membros das famí a cidade em redor), e o rei se foi pelo caminho de
Arabá. 5Mas o exército dos caldeus perseguiu o
lias, enquanto Jeremias talvez se refira rei, e o alcançou nas campinas de Jericó; e todo
somente aos homens. A referência a toda o seu exército se dispersou. 6Então prenderam o
a Jerusalémé genérica e os versículos 13,14 rei, e o fizeram subir a Ribla, ao rei de Babilônia,
são provavelmente anacrônicos. Sugerem o qual pronunciou sentença contra ele. d e g o
laram os filhos de Zedequias à vista dele,
a atividade de um editor pós-exílico que vazaram-lhe os olhos, ataram-no com cadeias de
condensou num único relato as catástrofes bronze e o levaram para Babilônia.
de 597 e 586 a.C.
O editor está basicamente preocupado
4. Zedequias (24.18—25.21) com a triste sorte de seu próprio povo e não
oferece qualquer sugestão com respeito à
1) Uma Avaliação de Zedequias (24.18-20)
crise internacional que pode ter precipitado
18Zedequias tinha vinte e um anos quando a rebelião sob Zedequias. Tal rebelião estava
começou a reinar, e reinou onze anos em Jerusalém. muito provavelmente relacionada, contudo,
O nome de sua mãe era Hamutal, filha de Jere
mias, de Libna. 19Ele fez o que era mau aos olhos a um ressurgimento do Egito em 588 a.C.
do Senhor, conforme tudo quanto fizera Jeoiaquim. Jeremias especificamente se refere à ativi
Z0Por causa da ira do Senhor, assim sucedeu em dade egípcia durante esse período de tempo
Jerusalém, e em Judá, até que ele as lançou da (cf. Jeremias para relatos paralelos acerca
sua presença. E Zedequias se rebelou contra o rei da queda de Jerusalém, 34.1 e ss.; 39.1 e
de Babilônia.
ss.; 40.7—41; 52).
Matanias (Dádiva de Iavé) era tio de O décimo mês do nono ano do seu
Joaquim (24.17) e irmão de Jeoacaz por reinado teria começado em dezembro/
parte de pai e mãe, sendo esta Hamutal, janeiro (o mês de Tebete) de 588 a.C. O cerco
filha de Jeremias de Libna (cf. 23.31; 24.18). de dezenove meses reflete não tanto o
Jeoiaquim também era filho de Josias, mas poderio de Judá e Jerusalém quanto a ação
meio-irmão de Jeoacaz e Matanias, sendo diversionária egípcia mencionada por Jere
sua mãe Zebida, filha de Pedaías de Ruma mias (Jr. 37.5).
312
O primeiro sinal de derrota foi a fuga nias, segundo sacerdote, e os três guardas da
do rei e dos homens de guerra no nono dia entrada. 19Da cidade tomou um oficial, que tinha
do quarto mês, ou em 9 de junho/julho de cargo da gente de guerra, e cinco homens dos que
viam a face do rei e que se achavam na cidade, como
586 a.C. Na literatura do Antigo Testa também o escrivão-mor do exército, que registrava
mento, Arabá pode significar (1) o vale do o povo da terra, e sessenta homens do povo da terra,
Jordão, (2) a região do Mar Morto, e (3) o que se achavam na cidade. 20Tomando-os Nebuza
território que vai do Mar Morto até o Golfo radão, capitão da guarda, levou-os ao rei de
Babilônia, a Ribla. 21Então o rei de Babilônia os
de Acaba. Neste caso refere-se provavel feriu e matou em Ribla, na terra de Hamate. Assim
mente ao vale do Jordão. Aparentemente Judá foi levado cativo para fora da sua terra.
Zedequias estava tentando cruzar o regato
perto de Jericó, pois ele foi apanhado nas Destruição da Cidade (v. 8—12). Após
campinas de Jericó. o abandono de Jerusalém por Zedequias,
Ribla, a julgar por freqüentes referências a cidade caiu no mês seguinte: no quinto
a localidades assírias, egípcias e babilónicas mês, no sétimo dia do mês, ou 5 de
ali instaladas, era uma destacada fortaleza julhoàgostode 586 a.C. Jeremias 52.29 data
militar. Situava-se no cruzamento das rotas a queda de Jerusalém no décimo oitavo ano
militares para o Egito e Mesopotâmia, perto de Nabucodonozor, enquanto Reis data o
de Cades. O quartel-general militar babiló evento no décimo nono ano. Nabucodo
nico aparentemente ficava ali, e foi ali onde nozor subiu ao trono de Babilônia em 605
Zedequias foi sentenciado. a.C. Em Judá o ano de ascensão não era
computado com os anos de reinado de um
3) A Queda de Jerusalém (25.8-21) soberano. O escritor aparentemente
entendeu que 605 a.C. foi o ano de ascensão
8Ora, no quinto mês, no sétimo dia do mês, no de Nabucodonozor, e 604 a.C. como o ano
ano décimo nono de Nabucodonozor, rei de Babi
lônia, veio a Jerusalém Nebuzaradão, capitão da de início de contagem de seu reinado. Por
guarda, servo do rei de Babilônia; 9e queimou a conseguinte ele datou a queda de Jerusalém
casa do Senhor e a casa do rei, como também todas no décimo oitavo ano (isto é, 604 menos
as casas de Jerusalém ; todas as casas de 18, ou 586 a.C., como em Reis).
importância, ele as queimou. 10E todo o exército A queima do templo e de outros edifí
dos caldeus, que estava com o capitão da guarda,
derrubou os muros em redor de Jerusalém. cios destruiu o madeiramento, mas somente
nEntão o resto do povo que havia ficado na cidade, em caso de calor extremo as pedras ficariam
e os que já se haviam rendido ao rei de Babilônia, danificadas. A maneira insultuosa como
e o resto da multidão, Nebuzaradão, capitão da os samaritanos mais tarde ridicularizaram
guarda, levou cativos. 12Mas dos mais pobres da
terra deixou o capitão da guarda ficar alguns para
a tentativa de edificar o muro sob a direção
vinheiros e para lavradores.13Ademais os caldeus de Neemias sugere, contudo, que as pedras
despedaçaram as colunas de bronze que estavam dos muros da cidade ficaram imprestáveis
na casa do Senhor, como também as bases e o mar para uso em construção (cf. Ne 4.2).
de bronze que estavam na casa do Senhor, e levaram Saque do Templo (v. 13-17). Um relato
esse bronze para Babilônia. l4Também tomaram
as caldeiras, as pás, as espevitadeiras, as colheres, mais específico do saque do templo ocorre
e todos os utensílios de bronze, com que se minis em Jeremias 52.17-23. Em ambos os casos,
trava, 15como também os braseiros e as bacias; porém, os escritores se interessam pelos
tudo o que era de ouro, o capitão da guarda levou metais valiosos, especialmente bronze, mas
em ouro, e tudo o que era de prata, em prata.16As
duas colunas, o mar, e as bases, que Salomão fizera
também ouro e prata, que foram tirados do
para a casa do Senhor, o bronze de todos esses templo (cf. lRs 7.13.51 para uma descrição
utensílios era de peso imensurável. 17A altura do mobiliário do templo).
duma coluna era de dezoito côvados, e sobre ela Execução de Líderes Judaicos (v.
havia um capitel de bronze, cuja altura era de três 18—21). No que provavelmente teve o
côvados; em redor do capitel havia uma rede e
romãs, tudo de bronze; e semelhante a esta era a propósito de servir de exemplo para os
outra coluna com a rede. lsO capitão da guarda cativos, o capitão da guarda tomou pessoas
tomou também Seraías, primeiro sacerdote, Sofo- da liderança dentre os sacerdotes e servi-
313
dores do templo, um oficial militar, cinco não só um provável motivo para Nabuco
membros do gabinete real, e um oficial donozor escolher Gedalias como
incumbido da convocação de tropas, mais governador, mas também em parte ajuda
sessenta homens ao acaso que provavel a explicar a atitude conciliatória de Geda
mente eram líderes de destaque, e lias (cf. v. 24 e ss.). Um relato bem mais
executou-os no quartel-general de Babilônia detalhado do governo de Gedalias em
em Ribla. A sentença final, Assim Judá Mizpá, e uma fonte mais diretamente rela
foi levado cativo para fora da sua terra, é cionada com eventos históricos, encontra-se
o fecho do trabalho do redator, e constitui em Jeremias 40.7 e ss.
a verdadeira conclusão de Reis. Os versí Nabucodonozor adotou uma atitude
culos que se seguem são apêndices sobre conciliatória para com os que deixara na
os acontecimentos de Mizpá e uma refe terra, como se vê em sua designação de um
rência final ao bom tratamento recebido membro de família tão proeminente como
por Joaquim e sua libertação pelos babilô a de Gedalias para o ofício de governador.
nios. Os homens que foram a Gedalias em
Mizpá constituíam porções daquelas forças
5. O Resultado da Queda de Jerusalém: militares que foram espalhadas durante e
Dois Apêndices (25.22-30) imediatamente após o cerco de Jerusalém.
Gedalias recomendou em grande parte o
1) O Governo de Gedalias em Mizpá mesmo curso de ação que Jeremias propôs
(25.22-26) aos exilados (Jr 29.11): ser pacientes, aceitar
“ Quanto ao povo que tinha ficado na terra de a vida babilónica, esperar pelo tempo da
Judá, Nabucodonozor, rei de Babilônia, que o libertação. Que esse consèlho foi repudiado
deixara ficar, pôs por governador sobre ele Geda está claramente refletido no assassinato de
lias, filho de Aicãoi, filho de Safã. “ Ouvindo, pois, Gedalias às mãos de Ismael.
os chefes das forças, eles e os seus homens, que
o rei de Babilônia pusera Gedalias por gover Judeus é uma expressão designativa dos
nador, vieram ter com Gedalias, a Mizpá, a saber: israelitas que viveram no exílio e depois.
Ismael, filho de Netanias, Joanã, filho de Careá, Teoricamente a palavra (y'hudi) é um adje
Seraias, filho de Iknumete netofatita, e Jaaza-
nias, filho do maacatita, eles e os seus homens.
tivo freqüentemente empregado como
24E Gedalias lhes jurou, a eles e aos seus homens, substantivo para descrever tais israelitas.
e lhes disse: Não temais ser servos dos caldeus; A palavra Judá (y*hudah) está intimamen
ficai na terra, e servi ao rei de Babilônia, e bem te ligada a judeu (y^hudi). Tecnicamente,
vos irá. 25Mas no sétimo mês Ismael, filho de o termo hebreu deve ser limitado ao pe
Netanias, filho de Elisama, da descendência real,
veio com dez homens, e feriram e mataram Geda ríodo anterior à conquista, israelita à era
lias, como também os judeus e os caldeus que da conquista e da monarquia, e judeus ao
estavam com ele em Mizpá. “ Então todo o povo, período pós-exílico.
tanto pequenos como grandes, e os chefes das Caldeus (kasdim) é empregado no An
forças, levantando-se, foram para o Egito, porque
temiam os caldeus.
tigo Testamento para designar tanto um
povo quanto uma terra. O termo deriva
Gedalias (Iavé é grande) foi neto de Safã, do antigo babilônio kaldu, antes da época
chefe de uma destacada família de Judá e em que o s substituiu o 1 (cf. BDB). A re
elemento ativo na reforma de Josias gião estava localizada na área meridional
(22.3,7). Aicão, filho de Safã e pai de Geda dos rios Tigre e Eufrates. Historicamente
lias, também participou ativamente na os caldeus levavam uma vida tribal pouco
reforma de Josias (22.12) e apoiou Jeremias estruturada em oposição à vida urbana
quando a vida do profeta correu perigo (cf. que culminou com Babilônia. Eles se opu
Jr 26.24). O próprio Jeremias foi escoltado nham tanto aos avanços assírios quanto à
para casa por Gedalias após a queda da tendência de Babilônia (a cidade) de de
cidade (Jr 39.14). Tal histórico familiar foi senvolver-se num poder cultural e politi-
314
camente dominante. Como resultado disso Talvez devido ao desejo de concluir o
(cf. Berodaque-Baladã), os caldeus se tor livro com uma nota auspiciosa antes que
naram governantes sem rivais no Império com um relato sombrio da destruição de
Babilónico, e o termo caldeu passou a ser Jerusalém, os detalhes do tratamento dis
aplicado à última dinastia de Babilônia pensado a Joaquim e sua liberdade final
(626-539 a.C.; cf. IDB). Um exame do em formam o apêndice concludente de 2Reis.
prego no Antigo Testamento sugere a pre Evil-Merodaque (cf. o acadiano Amel-
ferência pelo termo caldeu (81) em oposi -marduk, homem de Marduque), rei de
ção a babilônio (12), sendo o emprego pre Babilônia de 562 a 560 a.C., começou seu
dominante em Jeremias (43). Babilônia reinado com um gesto conciliatório estra
(276) é mais popular no Antigo Testamen nhamente semelhante ao de Ciro, que
to do que Caldéia (9), mas o emprego pre posteriormente concedeu liberdade a to
ponderante permanece em Jeremias. Cal dos os exilados. Amel-Marduque libertou
deu e babilónico são sinônimos em 25.25. Joaquim, provavelmente, como Gray suge
O Egito era um local de abrigo freqüen re, devido à antiga crença de que o reina
temente procurado em tempos de crise in do de alguém seria um reflexo de suas
ternacional. Já desde os tempos de Abraão ações iniciais. Daí, as ações benévolas ao
até aos tempos de Jesus, o Egito ofereceu tempo da ascensão tinham o propósito de
proteção a semitas fugitivos. Exilados ha desencadear um reinado próspero.
viam fugido para o Egito durante crises A referência à subsistência de Joaquim
associadas com o Reino do Norte, e aque tem sido confirmada arqueologicamente
les, além de judeus que chegaram poste por descobertas relacionadas com o pa
riormente, constituíam o núcleo israelita lácio de Nabucodonozor. Há agora tex
de um centro judaico no Egito que foi ex tos disponíveis que datam do período de
tremamente significativo não somente pa 595-570 a.C. e se referem às rações men
ra o judaísmo, mas especialmente para o sais para Joaquim (cf. W. J. Martin em
cristianismo. Thomas, p. 84 e ss.). Os Tabletes de Joa
quim esclarecem essa passgem de Reis:
2) A Consideração Para com Joaquim e “Para Ya’ukinu (da terra de Yaudu). 1/2
sua Liberdade (25.27-30) (PI) [um PI equivalia a aproximadamente
27Depois disso sucedeu que, no ano trinta e
25 litros] para Wukinu, rei da terra de
sete do cativeiro de Joaquim, rei de Judá, no dia Ya (hu-du) 2 1/2 silas [uma sila era ligeira
vinte e sete do décimo segundo mês, Evil-Mero- mente menos do que 0,7 litro] para os
daque, rei de Babilônia, no ano em que começou cinco filhos do rei da terra de Yahudu 4
a reinar, levantou a cabeça de Joaquim, rei de silas para oito homens, judeus (cada) 1/2
Judá, tirando-o da casa da prisão; 2Se lhe falou
benignamente, e pôs o seu trono acima do tro (sila).” Os tabletes continuam a alistar su
no dos reis que estavam com ele em Babilônia. primentos para Joaquim, seus filhos e ou
29Também lhe fez mudar as vestes de prisão; e ele tros judeus, e parecem ser ou recibos ou
comeu da mesa real todos os dias da sua vida. inventários empregados por alguém encar
30E, quanto à sua subsistência, esta lhe foi dada regado de fornecer suprimentos no palácio
de contínuo pelo rei, a porção de cada dia no seu
dia, todos os dias da sua vida. de Nabucodonozor.
315
1-2 Crônicas
CLYDE T. FRANCISCO
Introdução
317
a verdadeira igreja; com o coração voltado músico exímio, mas não há como saber com
para o ensino e para fazer valer a negligen certeza. Claramente se demonstra que ele
ciada lei de Moisés (...) Não há uma peça foi um apto anunciador da palavra de
em todo o guarda-roupa de Esdras que não Deus para o seu tempo.
se assente perfeitamente no cronista.”. Parece que ele se identifica mais com
Torrey afirma que a impressionante os levitas do que com os sacerdotes (2Cr
semelhança deve-se ao fato de que o 29.34). Sua obra combina conceitos sacer
cronista, com toda liberdade, inventou um dotais com aqueles da escola deuteronô-
Esdras imaginário à sua própria seme mica, que produziu 1e 2Samuel e 1e 2Reis.
lhança a fim de demonstrar a primazia dos Ele é o único historiador a combiná-los cria
exilados que haviam retomado. A partir tivamente. Tentar entender a história de
dos mesmos dados, entretanto, W. F. Israel sem comparar Crônicas com Samuel
Albright (XL, 104-124) não vê razão para e Reis seria comparável a estudar a vida
que não se possa aceitar a tradição talmú- de Cristo lendo somente um dos Evange
dica de que o próprio Esdras é na verdade lhos.
0 autor dos relatos. Não obstante, há dife Ele não revela qualquer animosidade ou
renças notáveis entre o perfil do cronista inveja para com os sacerdotes. Se ele foi um
e o de Esdras. Em primeiro lugar, o cro pregador levita, mais um pregador leigo do
nista foi mais flexível em sua atitude para que um religioso, isso explicaria suas
com a estrita observância da lei. Ele cria opiniões um tanto limitadas acerca do curso
que os levitas deviam executar funções da história. Seria de se esperar uma falta
sacerdotais além das tarefas servis que de elaboração em tal obra.
a lei de Moisés prescrevia (lCr 23.32;
2Cr 5.11; 30.16 e s.). Ele aprovou o relaxa O cronista, no entanto, não é uma pessoa
mento por Ezequias das leis cerimoniais religiosa de mente estreita. Ele é um
por ocasião da Páscoa (2Cr 30.18-20). pregador leigo capaz, que fielmente utiliza
Também os discursos remanescentes instrumentos que estavam ao seu alcance,
revelam o cronista falando em linguagem declarando ao povo de seus dias aquilo de
mais vívida do que o estilo mais burocrá que precisavam para permanecerem fiéis
tico de Esdras. Em nenhuma das memórias aos propósitos que tinham. Em vez de esta
de Esdras encontramos fraseologia tão belecer uma “religião de Davi”, ele estava
notável quanto a que caracteriza o cronista. tentando demonstrar que o culto era mais
importante em Israel do que o estado polí
Certamente o cronista teve alguma relação
tico, mesmo na mente de Davi. Sua preo
com Esdras, pois foi grandemente influen
cupação com o culto em Jerusalém não
ciado por ele. Essa é provavelmente a origem
da tradição que atribui sua obra a Esdras. refletia uma falta de interesse pelas pessoas
Fleming James1crê que o autor foi um em outros lugares. Em 2Crônicas 16.9 ele
levita e um cantor do templo, pois nenhuma faz uma das mais vigorosas declarações de
outra parte das Escrituras demonstra tanto todo o Antigo Testamento a respeito do inte
resse universal de Deus. Somente o cronista
interesse pela música sacra como se dá com
as Crônicas. Isso, porém, não significa ne apresenta um rei estrangeiro pronunciando
uma palavra profética válida (2Cr 35.22).
cessariamente que ele fosse um músico
profissional. Ele foi mais do que um músico, Absorvido em suas tarefas na comunidade
pois claramente desempenhou um papel religiosa de Jerusalém, ele não tinha tempo
profético na interpretação da história de para outras preocupações pelas quais deve
Israel. Estava ciente da importância da ter nutrido muitas simpatias. Ninguém que
citou Jeremias, “o profeta rebelde”, tal como
música na adoração e talvez tenha sido um
o cronista fez, podia ser um religioso de
1 Personalities o f the Old Testament (New York: C harles Scribner’s Sons, mente estreita (cf. 2Cr 36.21,22 e 15.2-4
1946), p.483-499. com Jr 29.10-14).
318
A data do cronista é difícil determinar. quanto algum material tenha sido acres
O fato de que Crônicas termina com o centado depois.3
decreto de Ciro, e Esdras começa com esse
mesmo decreto, indica o ponto exato onde
a obra original foi dividida. Certamente o IV. Conteúdo
autor de Crônicas viveu logo no inicio do Crônicas começa com listas genealógicas
tempo de Esdras, no final do quinto ou que tratam do período de Adão até Saul
início do quarto século. Ele não pode ser (lCr 1.1—9.44). Então a monarquia unifi
posterior a 180 a.C., porque Eclesiastes cada é tratada em grande detalhe, dando-se
47.8-10, que reflete lCrônicas 23-29, foi uma ênfase especial a Davi (lCr 10.1-
escrito nessa época. A genealogia de 2Cr 9.31). O cronista interessa-se sobre
lCrônicas 3.19-24 é aparentemente regis tudo por revelar que as funções levítica e
trada até a sexta geração após Zorobabel, sacerdotal de seu tempo eram confirmadas
que viveu entre 537 e 516 a.C., o que naquela época. O tratamento que dispensa
situaria o autor não antes de 350. A lista a Salomão tem como preocupação básica
de sacerdotes em Neemias 12.10-23 se a edificação e a dedicação do templo por
estende até Jadua, que de acordo com Salomão.
Josefo (Antiq., XI. 7.8) foi sumo sacerdote Após a divisão do reino, o cronista tratou
ao tempo de Alexandre, o Grande. Tàis gene apenas dos reis de Judá. Nessa longa seção
alogias, logicamente, podem ter sido (2Cr 10.1-36.21) ele dá um destaque espe
acrescentadas por editores que trabalharam cial aos reis que favoreceram o verdadeiro
depois do autor original.2 Até anos culto a Deus tal como o cronista via a
recentes a tendência tinha sido colocar os questão: Asa, Jeosafá, Ezequias e Josias.
livros de Crônicas durante o período grego 2Crônicas conclui com o decreto de Ciro
(após 333 a.C.). Contudo, tem surgido uma para reedificar Jerusalém. Nem tudo estava
crescente convicção de que W. F. Albright peniido (2Cr 36.22,23).
(p. 104-124) estava correto em sua análise
feita em 1921, conquanto haja pouca incli
nação em concordar que ele tenha provado V. Fontes Empregadas pelo Cronista
que Esdras foi o autor. Certamente seus 1. Canônicas
dados apontam para uma data anterior a
333 a.C., pois: 1) Os Papiros Elefantinos Cerca da metade de Crônicas constitui
demonstram conclusivamente que o citações de outros relatos canônicos ou
aramaico de Esdras é o do período persa. então claras referências a eles. Esses para
2) O estilo do cronista também demonstra lelos são alistados em detalhe por Curtis
que o hebraico continuava sendo uma e Madsen (XI, 17-19).
língua viva, ainda não substituída pelo É bem evidente, ao se observar o uso
aramaico. 3) Também, há muitas palavras que o cronista faz dessas fontes canônicas,
persas, especialmente em Esdras, que que ele é fiel ao lidar com elas, copiando-as
deixaram de ser comuns após os gregos em seu texto com pouquíssima alteração.
terem chegado ao poder. 4) O último rei De fato, em lugares onde anteriormente se
persa a ser mencionado é Dario II (423- cria que ele executara mudanças arbitraria
402 a.C.). Todas essas provas apontam para mente, temos agora razão para concluir que
uma data mais próxima de 400 do que de estava seguindo um texto mais antigo do
300 a.C. Isso indica que o autor principal que o Texto Massorético, e semelhante aos
viveu logo após a época de Esdras, con fragmentos descobertos em Qumran
(Myers, I, lxxxlx-xc).
2 Otto Eissfeldt, The Old Testament (New York: H arper a n d Row, 1965),
p.540. 3 Cf. Eissfeldt, loc. cit.
319
2. Não-Canônicas uma ênfase na história como resultado da
intervenção divina em resposta à oração
Quanto ao outro material empregado
e cântico, e um notável interesse em ativi
pelo cronista, ele declara que está baseando
muitas de suas afirmações em fontes origi dades religiosas, particularmente as dos
nais de informação. Essas são de dois tipos levitas. Nesse aspecto, ele não chega tanto
básicos: anais dos reis de Judá e Israel e a contradizer os livros de Reis, mas os
trechos de obras proféticas. Embora essas suplementa. Ocorreram realmente aqueles
passagens sejam mencionadas sob vários acontecimentos? A adoração desenvolvida
já era uma parte do Israel pré-exílico?
títulos, é provável que a maior parte desse
material de origem não-canônica tenha sido R. H. Pfeiffer declara que “considerar
tirado de uma obra que o cronista assinala Crônicas como história genuína, tal como
sob vários títulos descritivos, uma compo os cristãos e judeus ortodoxos têm feito, é
sição que é comumente designada como entender mal as obras (...) [O cronista
o “comentário do livro dos reis” (2Cr 24.27). nunca] permite que os fatos cheguem a esta
belecer limites, por menores que sejam, à
Talvez essa obra tenha até mesmo contido
a maior parte do material profético mencio esfera da fé”.5
nado pelo cronista, embora alguma parte Há dois tipos de passagens que suscitam
possa ter sido constituída por fontes inde a questão de credibilidade literal. Um tipo
pendentes. Alguns estudiosos duvidam da são as afirmações exageradas acerca de
existência das fontes mencionadas pelo quantidade de dinheiro (lCr 22.14) ou
cronista. Alegam que tais referências são tamanho de.exératos. Acerca de Davi é dito
imitações puramente literárias da metodo que economizou 100 mil talentos de ouro
logia dos livros canônicos de Reis (Noth, e 1 milhão de talentos de prata, o que certa
Torrey). Eissfeldt acredita que o cronista mente totalizaria bilhões de dólares em
utilizou essa fonte com fidelidade.4 Seu moeda de nossos dias. A Jeosafá se atribui
cuidado em usar as passagens canônicas um exército de mais de um milhão de
indica que ele não tratou descuidadamente homens. Contudo, mais tarde é mencio
essas fontes. nado que era inapelavelmente superado
pelos povos ao seu redor.
É possível que essas fontes usadas pelo
Na verdade, não sabemos o valor de um
cronista contivessem os aspectos proble
talento de prata ou ouro, mas a quantidade
máticos discutidos na seção seguinte. Esse
atribuída a Davi parece ser por demais
material tradicional tinha sido ampliado
elevada. O cronista pode estar empregando
desde os acontecimentos originais. Ele
“mil” num sentido figurado. Quanto ao
simplesmente empregou o que tinha rece
tamanho do exército de Jeosafá, obvia
bido (cf. von Rad, p. 350, especialmente
mente não foi um milhão. A palavra tradu
nota de rodapé n.° 7). zida por “mil” pode significar companhia,
sendo que é indeterminado o número de
VI. O Problema da Historicidade soldados nas companhias. Havia tantas
Esta é uma preocupação importante. “companhias” no exército de Jeosafá, em
Uma vez que não possuímos materiais em vez de milhares (cf. G. E. Mendenhall, p.
quaisquer outras formas que não as preser 52-66). É bastante improvável que o cro
vadas pelo cronista, é muitíssimo difícil nista afirmasse no capítulo 17 que Jeosafá
saber quando ele está citando e quando possuía um milhão de soldados em seu
está fazendo suas próprias observações. exército e, depois, no capítulo 20 o retra
Contudo, seu estilo básico é óbvio quando tasse como tendo soldados inimigos em
comparado com o dos livros de Reis. número muito superior. Ou o cronista era
É caracterizado por uma dupla ênfase: ingênuo, o que não pode ser o caso, pois
4 Cf. Eissfeldt, op. cit., p.532-534. 5 “Chronicles” IDB (Nashville: Abingdon, 1962), I, 577.
320
escreveu um livro tão notável, ou temos de portanto, abordar esses livros com a mes
reexaminar os dados numéricos do capítulo ma expectativa que se teria diante de um
17 e passagens semelhantes. Certamente estudo histórico moderno. Cada forma de
deve-se entendê-los como apontando para literatura deve ser compreendida à luz de
o número menor do que as traduções cos seus próprios princípios de interpretação.
tumeiras indicam. Não ousamos pedir a um historiador dos
Outra razão para duvidar de afirmações dias atuais que escreva sobre tudo quanto
históricas é a tendência do cronista em aconteceu, mas “um registro do que teve
realçar a intervenção direta por Deus na importância” (Elmslie). Não devemos exigir
história, independentemente da ação mili mais do cronista. Quais eram as questões
tar dos homens e de outros aspectos da do quarto século a.C. que eram de interesse
situação humana. É bem possível que o do escritor desse livro?
cronista tenha enfeitado o relato com deta
lhes de seu próprio padrão de culto, pois l.União com Israel do Norte
de que outra maneira ele iria se expressar
Após a queda de Samária em 721 a.C.,
em sua época? Isso não tem a ver com o
os assírios proibiram o culto a Iavé no Is
fato de acontecimento propriamente dito, rael do Norte, exceto num único santuário
mas com o fato de um narrador habilidoso em Betei. Mesmo ali, práticas idólatras se
enfeitar o acontecimento. Contudo, mesmo
insinuaram. Os verdadeiros adoradores de
aqui, nós próprios não sabemos o suficien
te sobre as práticas existentes à época. Se Iavé inclinavam-se a mudar para Judá ou
a ocasionalmente participar da adoração
ria presunção emitir um veredicto final
no templo em Jerusalém. Muitos levitas do
sobre o que ele diz acerca de questões tais norte haviam deixado de atuar como sa
como as atividades levíticas nos dias de cerdotes. Quando Jerusalém caiu em 587
Davi. Com o atual progresso no estudo dos
a.C., a maioria do povo foi deixada na ter
Salmos, em que mais e mais se reconhecem
ra, mas o templo foi destruído e os sacer
antigas características pré-exílicas nos
dotes zadoquistas (por direito descendentes
Salmos, somos forçados a perceber uma
de Arão) foram levados em cativeiro. Os
prática de adoração muito mais desenvol levitas de classes mais baixas, do norte e
vida no Israel pré-exílico do que anterior do sul, foram deixados para oficiar nas ruí
mente se admitia.
nas do santuário.
Recentemente, a crítica negativa ao
A partir dessa situação, a crise samari-
cronista tem sido atenuada por um realis
tana começou a desenvolver-se. Os exila
mo mais sóbrio. Jacob M. Myers (I, lxiii)
dos que voltavam (basicamente de Judá)
assinala: “Ademais, dentro dos limites de tinham rejeitado como estando em situa
seu propósito^ a história do cronista é exata ção irregular a maioria do povo que estava
onde quer que se possa conferi-la con na Palestina quando retornaram. Estes
quanto o método de apresentação seja ho- gradualmente se uniram num partido sa-
milético.”
maritano, reivindicando a autoridade ape
nas do Fentateuco e rejeitando os Profetas
VII. Propósitos e os Escritos.
O cronista estava claramente tentando
O propósito claro do cronista é fazer demonstrar que, embora Judá fosse verda
uma interpretação sacerdotal (ou levítica) deiramente a nação escolhida de Deus,
da história de Israel a fim de atender às todos aqueles israelitas do norte que dese
necessidades do povo hebreu do século jassem identificar-se com eles numa fé e
quarto a.C. Ele é antes de mais nada um prática genuínas deveriam ser recebidos
teólogo, não um historiador (cf. Dentan, com braços abertos. Isso havia ocorrido
VII, 12). Seria certamente muito injusto, durante os dias de Roboão (2Cr 11.13 e ss.)
321
e nos reinados de Ezequias (2Cr 30.1 e ss.) havia-se tomado uma congregação. Nas
e Josias (2Cr 35.18). Obviamente o cronista observâncias pós-exílicas por parte da
ansiava que isso ocorresse novamente; para congregação israelita de adoradores, os
tanto estava preparando o terreno em seus pontos essenciais do interesse de Davi
escritos. Ele estava especialmente interes estavam se concretizando. Esse cumpri
sado na aceitação dos levitas, não mento substancial das promessas foi a
importando de qual região procedessem. garantia divina de que, por fim, chegar-se-
-ia à vitória final do reino de Deus (lCr
2. A Nação Tornando-se Congregação 29.11,12). À medida que Israel aceita o
“O escritor está acima de tudo mais preo desafio de seu chamamento à adoração e
cupado com que a vida de Israel gire em ao serviço, expressa fidelidade para com
tomo da adoração no templo em Jerusalém” Deus. Nem tudo estará perdido caso o culto
(Curtis e Madsen, p. 7). Ele analisa exten permaneça. De fato, os aspectos mais essen
samente a retirada da arca por Davi, e está ciais do reino de Deus estão preservados
preocupado sobretudo com os preparativos — um povo santo agindo sob a direção de
feitos por Davi para a construção do templo Deus. Como num espelho, o cronista viu
e a execução desses planos por Salomão. obscuramente o claro esboço do que ainda
Quando descreve os reinados posteriores, deve ser por causa daquilo que restou. Reco
introduz referências freqüentes às atividades nhecidamente ele enfatiza a adoração
levíticas e sacerdotais, sobre as quais outras restrita a um único local sagrado. No
fontes nada falam. Isso faz com que alguns entanto, sua ênfase era o que se fazia neces
expositores achem que o cronista está sário numa época em que uma mentalidade
descrevendo as condições de seu próprio aberta resultaria na perda de todo o caráter
tempo, ou as que desejava que existissem, singular de Israel (Curtis e Madsen, p.
nas narrativas que faz de períodos ante 16,17).
riores. Não podemos, contudo, determinar
se se tratam de anacronismos ou se foram 3. Um Chamado ao Arrependimento
copiadas das fontes do cronista. Davi é visto Conquanto o cronista esteja interessado
como o mais importante organizador das basicamente nas práticas de adoração e no
ordens e ministérios corais levíticos; todos pessoal diretamente envolvido com isso, ele,
os desenvolvimentos posteriores realmente não obstante* está vitalmente interessado
se originaram com ele. A partir de seus na palavra profética. As palavras de Jeosafá
primeiros programas, formas posteriores expressam sua própria convicção: “Crede
tiveram seu desenvolvimento natural. no Senhor vosso Deus, e estareis seguros;
Crendo que Davi começou esse movimento crede nos profetas, e sereis bem sucedidos”
de adoração, o cronista naturalmente o vê (2Cr 20.20). Em cada crise na história de
como o responsável por todas as comple Judá aparece um profeta. De fato, o cronista
xidades de tal movimento. apresenta profetas onde, em outros relatos,
Davi é de um significado imensurável eles não aparecem. Isso leva alguns a conjec
para o cronista (2Cr 21.7). Conquanto Judá turarem que ele cria o profeta para a ocasião
tenha deixado de existir como um poder (Elmslie, Torrey); a ocasião clama por um
político e o reinado davídico pareça mais profeta. Algo mais provável é que ele havia
distante do que nunca, o escritor vê na encontrado esses profetas em suas fontes
correta observância da adoração em Jeru porquanto ele os estava procuranda
salém os pontos essenciais do reinado E propósito do cronista, portanto,
davídico (cf. von Rad, p. 347-354). Em sua demonstrar que, quando o povo de Israel
mente o templo era o principal interesse dava ouvidos à palavra profética, prospe
de Davi; o templo e sua adoração davídica, rava; quando a negligenciava, enfrentava
eles ainda os possuíam. A entidade política o desastre (lCr 10.13; 2Cr 14.5,6). Ainda
322
que tenham pecado, se se arrependerem conheciam bem os outros fatos, ele sentiu-
acharão perdão por parte de um Deus mise -se livre para demorar-se naqueles eventos
ricordioso (2Cr 7.14; 33.11 e 33.). O povo que eram essenciais a seu propósito. Mesmo
reconciliado expressará sua fé em Deus do com essa seleção do material, a obra inteira
modo por ele prescrito, em formas de do cronista (Crônicas-Neemias) ocupa um
adoração apropriadas. Contudo, a sinceri décimo de todo o Antigo Tfestamento.
dade é mais importante do que a
regularidade religiosa. Em emergências, os 5. Reinterpretação da História
levitas podem assumir funções sacerdotais O escritor buscou também explicar
(2Cr 29.34), e o leigo que não se purificou certas dificuldades que os relatos anteriores
devidamente do ponto de vista cerimonial haviam suscitado nas mentes das pessoas
poderá comemorar a Páscoa (2Cr 30.18 e de seu tempo. 2Samuel 21.19 havia dito que
ss.). O cronista respeita a lei de Deus mas El-Hanã matara Golias. Isso levantou
não é um legalista. dúvidas de que Davi o tivesse feito. O
cronista assevera que El-Hanã matou
4. Aprendendo com a História “Lami, irmão de Golias” (lCr 20.5). A mais
O cronista aceita a filosofia deuteronô- bem conhecida emenda do cronista acha-
mica da história de que há uma relação -se em lCrônicas 21.1, que deve ser cotejada
automática entre o mal e a calamidade, o com 2Samuel 24.1. A passagem em Samuel
bem e a prosperidade; e parece que ele declara que Deus instou Davi a realizar um
possui a visão mecanicista dessa doutrina, censo e depois irou-se com ele quando o
a qual é negada pelo livro de Jó. Contudo, fez. O cronista, diante de tal dilema, diz que
essa não é uma exposição precisa de seus foi Satanás, e não Deus, quem tentou a
pontos de vista. Ele não entende que neces Davi. Assim ele afirma que se deve fazer
sária e automaticamente cada ato leve a distinção entre o que Deus permite e o que
recompensa ou punição imediatas. Antes, ele diretamente ocasiona. Ele está envol
a partir da história de Israel ele escolheu vido em todas as coisas, mas não da mesma
somente aqueles eventos que ilustram isso. maneira. Só lCrônicas 21.1 já justifica a
Ele está bem familiarizado com o pecado obra do cronista. O texto revela que cada
de Davi com Bate-Seba, pois começa geração tem a necessidade de dar uma nova
copiando exatamente aquele capítulo de olhada na história à luz da nova revelação
2Samuel que contém a história. Sabe que que Deus sempre está fazendo de si mesmo.
seus leitores também estão familiarizados
com essa história. Contudo, está interessado 6. Os Meios de Realizar o Propósito de
somente nas virtudes. Igualmente, nada diz Israel
sobre os pecados de Salomão, pois precisa Essencial à perspectiva do cronista é sua
demonstrar como é recompensada a cons crença de que a paz é melhor do que a
trução do templo por Salomão. Ele e seus guerra, de que a presença de Deus é mais
leitores estão conscientes do outro aspecto, importante do que exércitos. Davi é proi
mas não deseja destacá-lo agora. bido de edificar o templo porque é um
Uma vez mais, o cronista discerniu em homem de guerra (lCr 22.8). Deus concede
Roboão virtudes que nenhum outro escritor paz quando uma nação é fiel a ele, de modo
percebeu. Essas foram recompensadas. Esse que seu povo não necessite lutar (2Cr 14.6).
escritor não é cego à realidade, mas está Se atacado, Deus o protege (2Cr 20.1 e ss.).
simplesmente reproduzindo material para Embora as fontes do escritor contenham
provar sua posição. Somente desse modo muitos relatos sangrentos, que às vezes ele
seus leitores serão advertidos. Se os leitores repete sem comentário (cf. 2Cr 13.13 e 33),
tivessem sido deixados na ignorância, teria nem uma única vez em seus escritos Deus
sido uma falha do autor. Uma vez que envia Israel para participar de uma típica
323
guerra santa. A maioria das batalhas de 1) O primeiro esforço abortado
Judá assume caráter defensivo. A clara (13.1-14)
convicção do cronista é que o ideal para 2) Atendendo à advertência
um povo é a paz. Guerras são males neces profética (14.1-17)
sários quando os homens não põem seus 3) Os levitas trazem a arca (15.1
corações em Deus. Quando as nações se —16.3)
voltarem para Deus, então a era de paz terá 4) Deveres dos levitas (16.4-43)
chegado. Portanto, quando o povo de Deus 4. Estabelecimento da linhagem
dirige suas orações e louvores ao Senhor, davídica (17.1—20.8)
está mais próximo do reino de Deus do que 1) A aliança divina (17.1-27)
quando os combatentes contam as mortes 2) As vitórias de Davi (18.1—
que causaram. Quando os israelitas do norte 20 .8)
e os judeus adoram no santuário comum 5. Os preparativos para o templo
em Jerusalém, estão se apercebendo de seu (21.1—29.25)
verdadeiro destino mais do que quando seus 1) Escolha de um local para
exércitos estão tentando dominar ou usar construção (21.1—22.1)
um ao outra 2) Instruções para Salomão
(22.2-19)
Esboço 3) Os líderes na adoração (23.1
—25.31)
I. A árvore genealógica (lCr 1.1—
9.44) 4.) Funcionários subalternos
(26.1-32)
1. O período patriarcal (1.1-54) 5) O exército ativo (27.1-15)
2. A tribo de Judá (2.1-55)
6) Dirigentes tribais (27.16-24)
3. A linhagem de Davi (3.1-24)
4. Listas das tribos do sul (4.1-43) 7) Os oficiais do rei (27.25-34)
5. As tribos da Transjordânia (5.1 8) Instruções finais a Salomão
-26) e a Israel (28.1—29.25)
6. A família de Levi (6.1-81) 6. Sumário do reinado (29.26-30)
7. Genealogias de norte-israelitas
(7.1-40) III. Salomão e o templo (2Cr 1.1—
8. Listas da tribo de Benjamim 9.31)
(8.1-40) 1. A prosperidade de Salomão (1.1
9. Jerusalém metropolitana (9.1- -17)
44) 2. A edificação do templo (2.1—
7.22)
II. As contribuições de Davi à ado 1) Arranjos finais (2.1-18)
ração (10.1—29.30) 2) Equipamento do templo (3.1
1. A tragédia de Saul (10.1-14) —4.22)
2. A ascensão de Davi ao poder 3) Dedicação do santuário (5.1
(11.1—12.40) —7.22)
1) Deus dirige sua carreira (11.1 3. O final do reinado de Salomão
-9) (8.1—9.31)
2) Os heróis de Davi (11.10-47) 1) Notável política interna (8.1
3) Seus primeiros seguidores -18)
( 12. 1-22) 2) Fama internacional (9.1-12)
4) Constituído rei de todo o Is 3) Prosperidade econômica (9.13
rael (12.23-40) -28)
3. A mudança da arca (13.1— 4) Sumário do reinado de Salo
16.43) mão (9.29-31)
324
IV. Judá pronto para a batalha (10.1 1. Vacilações de Amazias (25.1-28)
—20.37) 1) Um ato de misericórdia sem
1. O reinado de Roboão (10.1— precedentes (25.1-4)
12.46) 2) Mercenários norte-israelitas
1) Judá deixado só (10.1-19) (25.5-13)
2) Conflitos com Israel (11.1-12) 3) Deuses edomitas adorados
3) Os norte-israelitas leais (11.13 (25.14-16)
-17) 4) Israel desafiado (25.17-14)
4) A apostasia de Roboão (11.18 5) Sumário do reinado de Ama
— 12. 1) zias (25.25-28)
5) Sisaque do Egito (12.2-12) 2. A prosperidade e orgulho de
6) Sumário do remado (12.13-16) Uzias (26.1-23)
2. Abias e Jeroboão (13.1-22) 1) Interesses internos (26.1-15)
1) Sermão num monte (13.1-12) 2) Conflitos com sacerdotes (26.
2) A batalha com Jeroboão 16-23)
(13.13-22) 3. Rai piedoso, filho ímpio (27.1—
3. O governo de Asa (14.1—16.14) 28.27)
1) Lealdade a Deus (14.1-5) 1) Jotão, leal a Deus (27.1-9)
2) Sua recompensa (14.6-15) 2) Acaz, o idólatra (28.1-27)
3) Fervor religioso renovado 4. Reavivamento com Ezequias
(15.1-19) (29.1—32.33)
4) A apostasia de Asa (16.1-10) 1) A reforma de Ezequias (29.1
5) Sumário do governo de Asa -36)
(16.11-14) 2) Páscoa para todo o Israel
4. A era de Jeosafá (17.1—20.37) (30.1-27)
1) Sua fidelidade (17.1-19) 3) Lugares altos destruídos (31.1)
2) A aliança com Acabe (18.1 4) Provisões para o clero (31.2-
—19.3) 21)
3) Reforma religiosa (19.4-11) 5) A invasão de Senaqueribe
4) Ataque moabita-amonita (32.1-23)
(20.1-30) 6) Sumário de seu reinado
5) Significado do reinado de (32.24-33)
Jeosafá (20.31-37)
VII. Os anos finais (33.1—36.21)
V. A luta com o baalismo (21.1— 1. A ruína de Manassés (33.1-25)
24.27) 1) Sua má influência (33.1-9)
1. A casa de Acabe (21.1—22.9) 2) Seu arrependimento (33.10-
1) Jeorão e Atalia (21.1-20) 17)
2) A loucura de Acazias (22.1-9) 3) Conseqüências de seu reina
2. Atalia assume o trono (22.10- do (33.18-25)
12) 2. A reforma de Josias (34.1—
3. Jeoiada e Joás (23.1-21) 35.27)
1) Joás proclamado rei (23.1-11) 1) Destruição da idolatria (34.1
2) A morte de Atalia (23.12-21) -7)
4. A restauração do templo (24.1 2) Restauração do templo (34.8-
-14) 13)
5. A apostasia de Joás (24.15-27) 3) Descoberta da lei (34.14-33)
4) A grande páscoa (35.1-19)
VI. O transcorrer dos anos (25.1— 5) A rebelião fatal de Josias
32.33) (35.20-27)
325
3. As horas finais (36.1-21) MENDENHALL, G. E. “The Census
1) Reis incapazes (36.1-14) Lists of Numbers 1 and 26”, Journal
2) A ira de Deus (36.15-21) o f B iblical L iterature, LXXVII
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Pós-escrito: Começa uma nova era MYERS, JACOB M. I l l C hronicles
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326
tória de Israel deve ser vista à luz da his 1. O Período Patriarcal (1.1-54)
tória do homem.
A preocupação com genealogias, por Estas listas são extraídas inteiramente
tanto, não assinala falta de imaginação da do livro de Gênesis. O editor pressupõe
parte de um meticuloso estatístico, antes que os leitores estão familiarizados com o
é evidência de uma preocupação ecumê material ali encontrado e emprega somen
nica. A história nacional de Israel foi a te o que contribuirá para os seus propósi
culminação da história da raça, tornando- tos, embora a maior parte das genealogias
se a edificação do Templo onde Deus de Gênesis esteja incluída. Digna de nota
habitaria o ponto central dos eventos é a ausência da vida de Caim, que o cro
mundiais. Cada geração é herdeira do que nista considera conduzir a um beco sem
se passou antes, as marés de cada era flu saída.
indo desde a antiguidade. A compreensão
do homem quanto à sua própria existência 1) Os Patriarcas Antediluvianos (1.1-3)
como parte da aventura total da humani 'Adão, Sete, Enos, 2Quenã, Maalalel, Jarede,
dade é essencial para sua perspectiva do ’Enoque, Matusalém, Lameque.
significado da vida.
É importante observar que o cronista Aqui aparece a lista nua dos nove ho
extraiu seu material anterior do livro de mens que trouxeram a raça humana até o
Gênesis, o qual começa com uma genea dilúvio. Não há tentativa de adornar os
logia do céu e da terra (Gn 2.4). Igual relatos, mesmo com material extraído de
mente, o Novo Testamento começa com Gênesis. Ninguém é mencionado além
uma lista que remonta a Jesus e vai até daqueles que estão na linha direta dos he
Abraão (Mt 1.1-17), situando a vida e obra breus. Por que o cronista remonta a Adão,
de Jesus no contexto de tudo quanto se em vez de começar com Abraão? Num
passou antes e vendo o seu advento como tempo de exclusividade se esperaria que os
clímax da História até aquele ponto. judeus tão-somente estivessem interessa
É claro que houve empregos práticos dos em seu próprio segmento da humani
dessas listas. Elas não só serviram de ins dade. Contudo, mesmo em tal tempo eles
trumentos úteis como listas de referências, nunca poderiam esquecer que eram parte
indicando quando um rei ou sumo sacer integral de uma comunidade mundial e
dote operou, mas também eram importan que todos os homens pertencem essencial
tes para manter a comunidade israelita ge mente a uma mesma família.
nuína após o exílio. Ali, as famílias leví-
ticas encontravam autenticação para sua 2) A Família de Noé (1.4-27)
função no culto israelita, e outros clãs
provavam o seu direito de contarem-se 4Noé, Sem, Cão e Jafé. sOs filhos de Jafé:
Gomer, Magogue, Madai, Javã, Tubal, Meseque
como filhos de Abraão e herdeiros da pro e Tiras. 6Os filhos de Gomer: /vsquenaz, Rifate e
messa. Não há como negar que isto tam Togarma. 7Os filhos de Javã: Elisá, Társis, Quitim
bém produziu orgulho extremo em alguns, e Dodanim. "Os filhos de Cão: Cuche, Mizraim,
que consideravam seu pedigree como assi Pute e Canaã. 9Os filhos de Cuche: Seba, Havilá,
nalando-os superiores a seus vizinhos. Por Sabtá, Raamá e Sabtecá; e os filhos de Raamá:
Sebá e Dedâ. l0Cuche foi pai de Ninrode, o qual
outro lado, salvaguardava uma solidarie foi o primeiro a ser poderoso na terra. "D e M iz
dade nacional que o individualismo não raim descenderam os ludeus, os anameus, os
poderia ter preservado. Durante os dias leabeus, os naftueus, 12os patrusins, os casluins
de alienação nacional, a herança genealó (dos quais procederam os filisteus) e os caftoreus.
"Canaã foi pai de Sidom, seu primogênito, e de
gica de Israel foi o elo de ligação que o H ete,14 e dos jebuseus, dos amorreus, dos girga-
manteve junto. Mesmo hoje* a base da seus, 15dos heveus, dos arqueus, dos sineus, 16dos
unidade israelita é mais sua origem gene arvadeus, dos zemareus e dos hamateus. l7Os
alógica comum do que sua fé comum. filhos de Sem: Elão, Assur, Arfaxade, Lude, Arã,
327
Uz, Hul, Geter e Meseque. 18Arfaxade foi pai de 4) Os Edomitas (1.34-37)
Selá; e Selá foi pai de Eber. 19A Eber nasceram
dois filhos: o nome dum foi Pelegue, pois nos seus 34Abraão foi pai de Isaque. Os filhos de Isa
dias se repartiu a terra; e o nome de seu irmão que: Esaú e Israel. 35Os filhos de Esaú: Elifaz,
foi Joctã. 20Joctã foi pai de Almodá, Selefe, Ha- Reuel, Jeús, Jalão e Corá. “ Os filhos de Elifaz:
zarmavé, Jerá, 2IHadorão, Uzal, Diclá, 22EbaI, Temã, Omar, Zefi, Gatã, Quenaz, Timna e Ama-
Abimael, Sebá, 2'Ofir, Havilá e Jobabe; todos leque. 37Os filhos de Reuel: Naate, Zerá, Samá e
esses foram filhos de Joctã. “ Sem, Arfaxade, Se Mizá.
lá; 25Eber, Pelegue, Reú; “ Serugue, Naor, Tera;
27Abrão, que é Abraãa
O cronista copiou todo o material dis
ponível de Gênesis, aplicando-os aos
Como no livro de Gênesis, estas listas edomitas. Com base na analogia de sua
descrevem uma linhagem geográfica e cul omissão, por completo, da linhagem de
tural, em vez de biológica. Os jafitas es Caim e seu tratamento superficial de Is
tavam localizados principalmente na Ásia mael, é bastante significativo que ele trate
Menor e Europa, os canitas sobretudo na tão extensamente de Edom nesta passa
África e Arábia e os semitas na Meso- gem e pelo restante do capítulo. Aparente
potâmia e Palestina. mente, os edomitas eram ainda um grupo
A lista jafita é bem resumida, provavel significativo ao tempo da redação deste
mente porque eles não estavam tão inti texto. Pelo quarto século a.C. (por volta
mamente envolvidos nos assuntos israeli da época do cronista), os edomitas tinham
tas. Catorze nomes aparecem em sua lista. sido expulsos de seu território ancestral
Para Cão, há 30 (com omissão de Ninro- ao redor de Fetra e haviam sido substitu
de), e para Sem, 26, perfazendo um total ídos ali pelos nabateus (cf. Obadias). Al
de 70. Estes representam as 70 nações da guns deles permaneceram sujeitos ao novo
terra que desempenharam parte destacada conquistador, enquanto outros migraram
no pensamento judaico posterior. Note-se para Judá, ao sul, e tornaram-se habitan
também a ocorrência de 70 em Números tes da Iduméia. Esse influxo deve ter tido
11.16 e Lucas 10.1 e ss. Os tradutores da considerável influência sobre o interesse
Septuaginta foram 70, tendo tal título neste povo pelo cronista.
exatamente esse significado. De fato, embora houvesse considerável
hostilidade entre Edom e Judá, há alguma
3) Os Descendentes de Abraão (1:28-33) evidência de moderação de suas atitudes
nesse período. O autor do livro de Jó (c.
2!<Os filhos de Abraão: Isaque e Ismael. 29Es-
tas são as suas gerações: o primogênito de Is de 550-450 a.C.) faz seu herói, que vivia
mael, Nebaiote; depois Quedar, Adbeel, Mibsão, em Edom, ser aconselhado por um edomi-
“ Misma, Dumá, Massá, Hadade, Tema, 31Jetur, ta (Elifaz), que expressa teologia hebraica
Nafis e Quedemá; esses foram os filhos de Is tradicional. Herodes era idumeu. Na rea
mael. 32Quanto aos filhos de Quetura, concubina lidade, durante a luta final contra Roma
de Abraão, esta deu à luz Zinrã, Jocsã, Medã,
Midiã, Isbaque e Suá. Os filhos de Jocsã foram (66-73 d.C.), esses descendentes de Esaú
Sebá e Dedã. ’'O s filhos de Midiã: Efá, Efer, eram os mais fanáticos defensores de Judá
Hanoque, Abidá e Eldá; todos esses foram filhos e Jerusalém, isso certamente justificando
de Quetura. a inclusão pelo cronista de seu ancestral
em sua lista.
Isaque é mencionado antes de Ismael,
conquanto fosse mais jovem. Isto é uma 5) Os Filhos de Seir (1.38-42)
alteração da ordem em relação a Gênesis,
para destacar Isaque como o herdeiro. Os “ Os filhos de Sein Lotã, Sobal, Zibeão, Anãs,
Disom, Eser e Disã. 39Os filhos de Lotã: Hori e
filhos de Ismael precedem aos de Quetura, Homã; e a irmã de Lotã foi Timna. 40Os filhos de
o que é também uma reversão do arranjo Sobal: Aliã, Maanate, Ebal, Sefi e Onã. Os filhos
de Gênesis. de Zibeão: Aias e A nás.41Anás foi pai de Disom.
328
Os filhos de Disom: Hanrão, Esbã, Itrã e Querã. Israel e à que prevalecia durante a cons
42Os filhos de Eser: Bilã, Zaavã e Jaacã. Os fi tante troca de dinastias no Israel do Nor
lhos de Disã: Uz e Arã.
te. A frase antes que houvesse rei sobre
os filhos de Israel significa, literalmente,
Esta é uma lista dos habitantes mais “antes que um rei de Israel reinasse sobre
antigos da área antes que ali se instalas Edom”, isto é, antes da conquista de Edom
sem os edomitas . Gênesis 36.20 os chama por Davi (2Sm 8.14).
de horeus (habitantes de cavernas). Eles Belá, filho de Beor, podia, possivelmen
são os filhos da terra de Seir, e não de te, ser o mesmo que Balaão, filho de Beor,
Esaú. Esta lista está, aparentemente, in em Números 22-24. Assim, esse antigo
cluída para explicar a origem de certos profeta do verdadeiro Deus que se tornou
nomes de pessoas e lugares edomitas. Uz, traidor pode ter sido um chefe edomita,
nome geográfico do livro de Jó, é também bem como um oráculo. Motivos políticos
mencionada. podem tê-lo influenciado, bem como os
A palavra Seir significa “cabeludo” ou subornos de Balaque.
“coberto com arbustos rasteiros”. A área é
constituída, sobretudo, de terras altas e 2. A Iiibo de Judá (2.1-55)
planas, com algumas elevações atingindo
cerca de 1.800 metros de altitude. O com Aqui tem início uma lista de personali
pleto desmatamento dessas colinas foi dades tribais que prossegue por todo o
consumado durante a Primeira Guerra capítulo. Todos os descendentes de Israel
Mundial. (Jacó) que eram do interesse do cronista
estão incluídos. O historiador nunca cha
6) Os Governantes de Edom (1.43-54) ma o patriarca pelo nome de Jacó. Ele é
sempre Israel, o herdeiro das promessas
43Estes foram os reis que reinaram na terra de da aliança.
Edom, antes que houvesse rei sobre os filhos de
Israel: Belá, filho de Beor; e era o nome da sua
A impressão mais significativa deste
cidade Dinabá. "M orreu Belá, e reinou em seu capítulo é a variedade de pessoas assimi
lugar Jobabe, filho de Zerá, de Bozra. 45Morreu ladas por Judá. Embora o próprio Judá
Jobabe, e reinou em seu lugar Husão, da terra possa ser visto como um descendente di
dos temanitas. 46Morreu Husão, e reinou em seu reto de Israel, muitos membros posteriores
lugar Hadade, filho de Bedade, que derrotou os
midianitas no campo de Moabe; e era o nome da de sua tribo eram de origem diferente.
sua cidade Avite. 47Morreu Hadade, e reinou em Contudo, consideravam também Judá co
seu lugar Sâmela, de Masreca. 48Morreu Sâmela, mo seu pai, uma vez que eram agora
e reinou em seu lugar Saul, de Reobote junto ao membros dessa tribo.
ria 49Morreu Saul, e reinou em seu lugar Baal-
-Hanã, filho de Acbor. 50M orreu Baal-Hanã, e
Hadade reinou em seu lugar; e era o nome da sua 1) Os Filhos de Judá (2:1-4)
cidade Pai. O nome de sua mulher era Meetabel, 'Foram estes os filhos de Israel: Rúben, Si-
filha de Matrede, filha de Me-Zaabe.51E morreu meão, Levi, Judá, Issacar, Zebulom, 2Dã, José,
H adade Os príncipes de Edom foram: o príncipe Benjamim, Naftaii, Gade e Aser. 3Os filhos de
Timna, o príncipe Aliá, o príncipe Jetete, 52o prín Judá: Er, Onã e Selá; estes três lhe nasceram da
cipe Aolíbama, o príncipe Elá, o príncipe Pi-
filha de Sua, a cananéia. E Er, o primogênito de
nom, 53o príncipe Quenaz, o príncipe Temã, o Judá, foi mau aos olhos do Senhor, que o matou.
príncipe Mibzar, 54o príncipe Magdiel, o príncipe
4Tamar, nora de Judá, lhe deu à luz Pérez e Zerá.
Irã. Estes foram os príncipes de Edom. Ao todo os filhos de Judá foram cinco.
Uma vez que nenhum rei nesta lista é O verso 1 alista todos os filhos de Is
filho de seus predecessores e cada um resi rael, situando Judá em sua apropriada re
de num local diferente, parece que existia lação com os demais. Embora seja men
uma situação semelhante à que prevalecia cionado em quarto lugar, ele é imediata
na fase dos juizes dos primeiros tempos de mente assinalado no versículo 2 como o
329
centro de interesse do crc nista. O aspecto Aqui descobrimos que Jessé tinha sete
mais incomum da lista é b menção de Dã, filhos, inclusive Davi. ISamuel 16.6-11
o filho da serva de Raquel, antes das tri declara que eram oito. Os rabinos sugeriam
bos oriundas de Raquel. Em listas de ou que talvez um deles tivesse morrido sem
tros livros ele sempre se segue a Benja filhos, não tendo, assim, sido mencionado
mim. O rol tribal em Apocalipse 7 omite pelo cronista. A versão siríaca acrescenta
Dã completamente. As tribos, contudo, ra Eliú, que é mencionado como irmão de
ramente são enumeradas de forma uni Davi (lCr 27.18). Todavia, pode tratar-se
forme. de uma variante de Eliabe. O nome Eliabe
significa “Deus é pai”, sendo o mais antigo
2) Os Descendentes de lamar (2.5-8) atestado desse conceito no Antigo Testa
mento. Deve-se observar que a pessoa
5Os filhos de Pérez: Hezrom e Hamnl. 6Os
filhos de Zerá: Zinri, Etã, Hemã, Caicol e Dara; indicada como sendo a de quem proce
cinco ao toda 7Os filhos de Carmi: Acar, o per deram os famosos “filhos de Zeruia” é uma
turbador de Israel, que pecou no anátema. 8De mulher, e não um homem. A outra irmã,
Etã foi filho Azarias. Abigail, casou-se com um ismaelita, mes
clando ainda mais a linhagem de Judá.
Os filhos de Pérez estão mencionados
em primeiro lugar, mas o cronista rapida 4) Os Ancestrais de Bezaleel (2.18-24)
mente prossegue, apresentando a linhagem
de Zerá. Então ele se sente livre para re 18A Calebe, filho de Hezrom, nasceram filhos
tornar a Pérez com maiores detalhes. Acar de Azuba, sua mulher, e de Jeriote; e os filhos dela
foram estes: Jeser, Sobabe e Ardom. 19Morreu
é o mesmo Acã de Josué 7. Ali aprende Azuba; e Calebe tomou para si a Efrata, da qual
mos (v. 1) que Carmi era um neto de Pé lhe nasceu Hur. 20H ur foi pai de Úri, e Úri de
rez, sendo Zabdi alistado como o seu pai Bezaleel. 2>Então Hezrom, tendo já sessenta
(que é uma variação de Zinri no v. 6). O anos, tomou por mulher a filha de Maquir, pai de
Gileade; e conheceu-a, e ela lhe deu à luz Segube.
cronista faz um jogo de palavras sobre o 22Segube foi pai de Jair, o qual veio a ter vinte e
nome Acar. O particípio perturbador tem três cidades na terra de Gileade. “ Mas Gesur e
as mesmas consoantes de seu nome. O “r” Arã tomaram deles HavoteJair, e Quenate e suas
final do nome, em lugar de “n”, é o resul aldeias, sessenta cidades. Todos estes foram filhos
tado de uma associação com o lugar do pe de Maquir, pai de Gileade 24Depois da morte de
Hezrom, em Calebe de Efrata, Abia, mulher de
cado (Vale de Acor) ou um eno de cópia. Hezrom, lhe deu Azur, pai de Tecoa.
330
5) Os Primos Rurais de Davi (2.25-41) concubina de Calebe, deu à luz Seber e Tiraná.
49Deu à luz também Saafe, pai de Madmana, e
25Os filhos de Jerameel, primogênito de Hez- Seva, pai de Macbena e de Gibeá; e a filha de
rom, foram: Rão, o primogênito, Buna, Orem, Calebe foi Acasa. 50Estes foram os filhos de
Ozem e Aias. 26Jerameel teve outra mulher, Calebe.
cujo nome era Atara, a qual foi mãe de Onã.
27Os filhos de Rão, primogênito de Jerameel,
foram: Maaz, Jamim e Equer. “ Os filhos de Onã 7) Origens dos Queneus (2.50b-55)
foram: Samai e Jada; e os filhos de Samai:
Nadabe e Abisur. 29A mulher de Abisur era Filho de Hur, o primogênito, de Efrata: Sobal,
Abiail, que lhe deu à luz Abã e Molide. 10Os pai de QuiriateJearim , 51Salma, pai de Belém, e
filhos de Nadabe: Selede e Apaim; e Selede morreu Harefe, pai de Bete-Gader. 52Os filhos de Sobal,
sem filhos. 310 filho de Apaim: Isi; o filho de Isi: pai de QuiriateJearim, foram: Haroé e metade dos
Sesã; o filho de Sesã: Alai. 32Os filhos de Jada, menuotes. S3As famílias de QuiriateJearim: os
irmão de Samai: Jeter e Jônatas; e Jeter morreu itreus, os puteus, os sumateus e os misraeus; destes
sem filhos. 33Os filhos de Jônatas: Pelete e Zaza. saíram os zorateus e os estaoleus. 54Os filhos de
Esses foram os filhos de Jerameel. ^Sesã não Salma: Belém, os netofatitas, Atarote-Bete Joabe,
teve filhos, mas filhas. E tinha Sesã um servo metade dos manaatitas e os zoritas. S5As famílias
egípcio, cujo nome era Jarã. 3SDeu, pois, Sesã dos escribas que habitavam em Jabes: os tiratitas,
sua filha por mulher a Jará, seu servo; e ela lhe os simeatitas e os sucatitas; estes são os queneus
deu à luz A tai 36Atai foi pai de Natã, Natã de que descenderam de Hamate, pai da casa de Recabe.
Zabade. 37Zabade de Eflal, Eflal de Obede,
38Obede de Jeú, Jeú de Azarias. 39Azarias de A palavra queneu significa “ferreiro” e
Helez, Helez de Eleasá, 40Eleasá de Sismai, descreve os artesãos de metal itinerantes,
Sismai de Salum, 41Salum de Jecamias, e Jeca- que tiveram uma parte significativa na
mias de Elisama.
história dos primórdios de Israel. Jetro
Esta lista pré-exílica é a única genea (Hobabe), sogro de Moisés, tem essa origem
logia dos jerameelitas encontrada no Anti (Jz 4.11), e os recabitas do tempo de Jere
go Testamento. Em ISamuel 27.10 e lSa- mias continuaram com alguns de seus
muel 30.29, eles são mencionados como velhos princípios (Jr 35).
vivendo nas seções rurais de Judá. Além O verso 55 apresenta muitas dificul
disso, nada é sabido a respeito deles. Pa dades. A maioria das versões considera as
recem ser originalmente famílias não isra pessoas mencionadas como habitantes de
elitas, que mais tarde foram absorvidas cidades desconhecidas: tiratitas, simeatitas
por Judá. e sucatitas. Jerônimo descobriu aqui três
A passagem concernente a Sesã (v. diferentes tipos de funcionários religiosos.
34-41) não se acha na fonte de Samuel. Wellhausen também cria que eram algo
Alai pode ter sido uma filha. A História desse teor. É possível que houvesse três cate
atesta mais casamentos mistos entre ju gorias de escribas, seja no período mais
deus e egípcios, e neste caso um servo antigo ou no tempo do cronista ou em
egípcio do sexo masculino (v. 34). O Natã ambos. A raiz do termo tiratita tem a ver
desta lista (v. 36) pode muito bem ser o com “boca”; do simeatita, com “audição”,
mesmo profeta do tempo de Davi. e do sucatita, com “cerca”. Esses termos
podem muito bem descrever as três classes
6) A Família de Calebe (2.42-50a) de escribas: os que liam em voz alta para
os que redigiam ou para os que ouviam e
42Os filhos de Calebe, irmão de Jerameel:
Messa, seu primogênito, que foi o pai de Zife^ e
copiavam e os que conferiam as cópias finais
os filhos de Maressa, pai de Hebrom. 43Os filhos (“cercavam-nas”, protegiam-nas e as preser
de Hebrom: Corá, Tapua, Requem e Sema. vavam).
44Sema foi pai de Raãoj, pai de Jorqueão, e Re
quem foi pai de Samai. 450 filho de Samai foi
Maom; e Maom foi o pai de Bete-Zur. “ Efá, a 3. A Linhagem de Davi (3.1-24)
concubina de Calebe, teve Harã, Moza e Gazez;
e H arã foi pai de Gazez. ‘"O s filhos de Jadai: Põder-se-ia esperar que este material
Regem, Jotão, Gesã, Pelete, Efá e Saafe. ‘“Maaca, viesse imediatamente após a genealogia
331
davídíca em 2.9-17. Contudo, de maneira [Eliam]. Estas variações realçam tanto a difi
característica, o cronn ca tratou do restante culdade de copiar nomes com exatidão
da família de Hezrom antes de discutir Davi quanto a independência de transmissão do
em maior extensão. Neste capítulo a material empregado pelo cronista.
linhagem real é traçada até pelo menos 400
a.C., e talvez até 350, dependendo do 2) Os Descendentes de Salomão (3.10-24)
método de alguém computar o total de anos
10Filho de Salomão foi Roboão, de quem foi
de uma geração. A Septuaginta alista a filho Abias, de quem foi filho Asa, de quem foi filho
linhagem real até cerca de 250. Não se pode Jeosafá, "de quem foi filho Acazias, de quem foi
ter certeza se o próprio cronista completou filho Joás, 12de quem foi filho Amazias, de quem
os registros deste capítulo. Eles podem ter foi filho Jotão, 13de quem foi filho Acaz, de quem
sido atualizados por compiladores poste foi filho Ezeqtnas, de quem foi filho Manassés,
14de quem foi filho Amom, e de quem foi filho
riores. Assim, a passagem não oferece Josias. t5O s filhos de Josias: o primogênito,
indício claro quanto à data do cronista, a Joanã; o segundo Jeoiaquim; o terceiro Zedequias;
menos que se presuma que ele é o editor O quarto Salum. 16Os filhos de Jeoiaquim: Jeco-
final, uma hipótese que a evidência não nias, seu filho, e Zedequias, seu filha 17Os filhos
estabelece. de Jeconias, o deportado: Sealtiel, seu filho,
18Malquirão, Pedalas, Senazar, Jecamias, Hosama
e Nedabias. 19Os filhos de Pedaías: Zorobabel e
Simei; e os filhos de Zorobabel: Mesulão e Hana-
1) Os Filhos de Davi (3.1-9) nias, e Selomite, irmã destes; 20e Hasubá, Oel,
'Estes foram os filhos de Davi que lhe Berequias, Hasadias e Jusabe-Hesede, cinca
nasceram em Hebrom: o primogênito, Amnom, de 21Hananias for pai de Pelatias; Pelatias de Jesaias;
Aünoã, a jizreelita; o segundo Daniel, de Abigail, Jesaías de Refaías; Refaías de Arnã; Arnã de
a carmelita; 2o terceiro Absalão, filho de Maacá, Obadias; e Obadias de Secanias. 22Os filhos de
filha de làlmai, rei de Gesur; o quarto Adonias, Secanias: Semaías e os filhos deste: Hatus, Igal,
filho de Hagite; ’o quinto Sefatias, de Abital; o Bariá, N earias e Safate, seis. 23Os filhos de
sexto Itreão, de Eglá, sua mulher. 4Seis lhe Nearias: Elioenai, Ezequias e Azricão, três. 24E
nasceram em Hebrom, onde reinou sete anos e seis os filhos de Elioenai: Hodavias, EHasibe, Pelaías,
meses; e reinou trinta e três anos em Jerusalém. Acube, Joanã, Delaías e Anani, sete.
5Estes lhe nasceram em Jerusalém: Siméia, Este material corresponde aos livros
Sobabe, Natã e Salomão; estes quatro lhe nasceram
de Bate-Sua, filha de Amifl. 6Nasceram-lhe mais: dos Reis até Josias (v. 15). Joanã é mencio
Ibar, Elisama, Elifelete, Nogá, Nefegue, Jafia, nado como o seu primogênito, um nome
8Elisama, Eliadá e Elifelete, nove. ’Todos estes que não é encontrado em nenhuma outra
foram filhos de Davi, afora os filhos das concubinas; parte. Por analogia com 2Reis 23.30, este
e Tamar foi irmã deles.
deveria ser Jeoacaz, a quem Jeremias
Aqui é encontrada a lista mais completa chama de Salum (Jr 22.11). Contudo,
da descendência de Davi na Bíblia. Há Salum é alistado pelo cronista como o
algumas diferenças entre estas listas e os quarto filho de Josias (v. 15). Aparente
nomes em 2Samuel 3.2-5; 5.14-16 e mente, Joanã morreu com pouca idade, e
lCrônicas. 14.3-7.0 segundo filho de Davi Salum foi posto no trono pelo povo, que
é Daniel aqui no versículo 1, ao passo que o preferiu a Jeoiaquim, que era mais velho.
ele é chamado Quiliabe em 2Samuel 3.3. Outro problema é que Zorobabel é
Elifelete ocorre duas vezes na lista em pauta mencionado como filho de Pedaías, en
(v. 6 e 8), como Elpelete e Elifelete em quanto em Esdras 3.2 e alhures ele é citado
lCrônicas 14.5,7, mas aparece somente como “filho de Sealtiel”. A explicação costu
uma vez em 2Samuel 5.14-16. Outros nomes meira é que Zorobabel foi o verdadeiro
são grafados de modo diverso em diferentes filho de Pedaías, mas que Sealtiel não teve
lugares. Bate-Sua é uma variante de Bate- filhos e morreu cedo, tonwido o seu lugar
-Seba (v. 5). Seu pai é dito ser Eliã em Pedaías como o cabeça da família. Zoro
2Samuel 11.3. Amiel (v. 5) é composto babel era considerado, pela lei judaica,
revertendo-se as duas sílabas básicas de Eliã como o filho de Sealtiel.
332
É também de considerável interesse que de Zanoa; e estes foram os filhos de Bitia, filha
a lista após Zorobabel não corresponde à de Faraó, que M erede tomou. 19Os filhos da
mulher de Hodias, irmã de Naã, foram os pais de
genealogia de Jesus em Mateus 1 ou Lucas Queila, o garmita, e Estemoa, o maacatita.
3. Elas parecem ser bem independentes do 20Os filhos de Simão: Amnom, Rina, Bene-Hanã
cronista. Há oito gerações enumeradas e Tilom; e'os filhos de Isi: Zoete e Bene-Zoete.
entre Jeoiaquim e Anani (o último nome). 21Os filhos de Selá, filho de Judá: Er, pai de Leca,
Lada, pai de Maressa, e as famílias da casa dos
que fabricavam linho; em Bete-Asbéia; 22como
4. Listas das Tribos do Sul (4.1-43) também Joquim, e os homens de Cozeba, e Joás
Reunidas neste capítulo há informações e Sarafe, os quais dominavam sobre Moabe, e
Jasúbi-Leém .(Estes registros são antigos). 23Estes
adicionais sobre Judá e um sumário das foram os oleiros, os habitantes de Netaim e de
genealogias de Simeão. Muito do material Gedara; e moravam ali com o rei para o seu
é pré-exílico e reforça a reivindicação do serviço.
cronista quanto à historicidade. Ele afirma
que algumas das listas são bem antigas Esta lista contém nomes que não foram
(v. 22). “Até o dia de hoje” (v. 41 e 43) incluídos em materiais anteriores, embora
não se refere ao tempo do cronista, mas ao alguns dos nomes sejam os mesmos. De
da fonte original. O cronista copiou o importância capital é o episódio de Jabes
material palavra por palavra. (v. 9 e 10). Devido à sua dor (joseb) ao dar
à luz, sua mãe deu-lhe o nome de Jabes
1) A Tribo de Judá (4.1-23) (revertendo as duas últimas consoantes).
Num tempo em que a maldição de um
'O s filhos de Judá: Pérez, Hezrom, Carmi, nome podia, na opinião popular, somente
H ur e Sobal. 2Reaías, filho de Sobal, foi pai de
Jaate, e Jaate de Aiimai e Laade; estas são as famí ser contida pela aplicação mágica de outro
lias dos zoratitas. 3Estes foram os filhos de Etã: nome (cf. Gn 35.18), o cronista revela que
Jizreel, Ismá e Idbás; e o nome da irmã deles era a oração sincera podia ser até de efeito
Hazelelponi; 4e mais Penuel, pai de Gedor, e maior. Indubitavelmente, a oração foi
Ézer, pai de Husá; estes foram os filhos de Hur,
o primogênito de Efrata, pai de Belém. 5Asur, pai imatura, pois Jabes rogou ser poupado de
de Tècoa, tinha duas mulheres: Helá e Naará. dor a expensas do sofrimento de pessoas
6N aará deu-lhe à luz Aiizão, Hefer, Temêni e às quais iria substituir.
Haastári; estes foram os filhos de Naará. 7E os Ênfase adicional deste novo material é
filhos de Helá: Zerere, Izar e Etnã. 8Coz foi pai o fato de que as famílias de Judá eram
de Anube e Zobeba, e das famílias de Acarei, filho
de Harum. ’Jabes foi mais ilustre do que seus de bem dotados artesãos (v. 14), tecelões
irmãos (sua mãe lhe pusera o nome de Jabes, (v. 21) e oleiros (v. 23). Os últimos eram tão
dizendo: Porquanto com dores o dei à luz). hábeis que foram adotados pelo rei. Esta
10Jabes invocou o Deus de Israel, dizendo: Oxalá lista poderia ter sido usada para certificar
me abençoes, e estendas os meus termos; que a
tua mão seja comigo e faças que do mal eu não os membros da corporação de tempos
sejà afligido! E Deus lhe concedeu o que lhe posteriores.
pedira. “Quelube, irmão de Suá, foi pai de Meir;
este foi pai de Estom. 12Estom foi pai de Bete- 2) A TVibo de Simeão (4.24-43)
Rafa, Paséia e Teína, que foi pai de Ir-Náas; estes
foram os homens de Reca. 13Os filhos de Quenás: 24Os filhos de Simeão: Nemuel, Jamim,
Otniel e Seraías; e Otniel foi pai de Hatate 14e Jaribe, Zerá e Saul, “ de quem foi filho Salum, de
Meonotai, que foi pai de Ofra; Seraías foi pai de quem foi filho Mibsão, de quem foi filho Misma.
Joabe, fundador de Ge-Harasim, cujos habitantes “ Os filhos de Misma: Hamuel, seu filho, de quem
foram artífices. 15Os filhos de Calebe, filho de foi filho Zacur, de quem foi filho Simei. 27Simei
Jefoné: Iru, Elá e Naã; e Elá foi pai de Quenaz. teve dezesseis filhos e seis filhas; porém seus
16Os filhos de Jealelel: Zife, Zifá, Uria e Asareel. irmãos não tiveram muitos filhos, nem se multi
17Os filhos de Ezra: Jeter, Merede, Efer e Jalom; plicou toda a sua família tanto como as dos filhos
e ela deu à luz Miriã, Samai, e Isbá, pai de de Judá. “ Eles habitaram em Berseba, Molada,
Estemoa, ,8cuja mulher judia deu à luz Jerede, Hazar-Sual, 29Bila, em Ezem, Tolade, “ Betuel,
pai de Gedor, Heber, pai de Socó, e Jecutiel, pai Horma, Ziclague, 31Bete-Marcabote, Hazarsusim,
333
Bete-Biri e Saraim; essas foram as suas cidades e 15.26-32,42. O relato do cronista parece
até o reinado de Davi. 32As suas aldeias foram: ser o mais bem preservado dos três, tendo
Etã, Aim, Rimom, Toquem e Asã, cinco cidades,
33com todas as suas aldeias, que estavam em os nomes copiados com mais exatidão.6
redor destas cidades, até Baal. Estas foram as suas Contudo, as outras duas fontes são mais
habitações e as suas genealogias. MOra, Meso- antigas. Isto ilustra, adicionalmente, o
babe, Jamleque, Josa, filho de Amasias, 35Joel, meticuloso cuidado do cronista na trans
Jeú, filho de Josibias, filho de Seraías, filho de missão de seu material. Como declarou,
Asiel, “ Elioenai, Jaacobá, Jesoías, Asaias, Adiei,
Jesimiel, Benaías, 37e Ziza, filho de Sifi, filho de ele empregava um registro oficial (v. 33).
Alom, filho de Jedaías, filho de Sínri, filho de Deve-se notar que um homem idoso
Semaías — “ estes registrados por nome, foram que tinha o nome de uma tribo guerreira
príncipes nas suas famílias; e as famílias de seus foi o primeiro a ver que o prometido
pais se multiplicaram grandemente. 39Chegaram
até a entrada de Gedor, ao lado oriental do vale, Messias seria o Servo Sofredor, e não um
em busca de pasto para os seus rebanhos; 40e valente guerreiro (ver Lucas 2.25-35).
acharam pasto abundante e bom, e a terra era Simeão havia chegado ao cumprimento de
espaçosa, quieta e pacífica; pois os que antes habi seu destino!
tavam ali eram descendentes de Cão. 41Estes, que
estão inscritos por nome, vieram nos dias de
Ezequias, rei de Judá, e destruíram as tendas e 5. As Tribos da Transjordânia (5.1-26)
os meunins que se acharam ali, e os exterminaram
totalmente até o dia de hoje, e habitaram em lugar
Conquanto o cronista tenha primeira
deles; porque ali havia pasto para os seus re mente lidado com Judá e seu componente,
banhos. 42Também deles, isto é, dos filhos de Simeão, ele, não obstante, preocupava-se
Simeão, quinhentos homens foram ao monte Seir, com todas as doze tribos, mesmo aquelas
tendo por capitães Pelatias, Nearias, Refàías e que não mais eram elementos significa
Uziel, filhos de Isi, 43e, matando o restante dos
amalequitas, que havia escapado, ficaram habi tivos da vida de Israel. Aqui trata de
tando ali até o dia de hoje. Rúben, Gade e parte de Manasses, que
perdeu a identidade tribal durante a época
A genealogia de Simeão é encontrada assíria. Põr que ele se interessava por elas?
em três outros lugares no Antigo Testa Certamente, alguns membros dessas tribos
mento: Gênesis 46.10; Êxodo 6.15; Núme eram ainda conhecidos dele, caso contrá
ros 26.12,13. Ao serem comparados, ocor rio, as genealogias seriam de pouco valor.
rem as costumeiras diferenças em grafia e É possível, contudo, que ele tenha preser
omissão de nomes. No principal, porém, vado esses velhos documentos simples
há afinidade bem próxima. Simeão insta mente no interesse da compreensão e
lou-se dentro do território atribuído a Judá perpetuação da herança hebraica.
(Js 19.1-9) e, como o cronista observa, a
dele era bem menos numerosa do que essa 1) O Clã de Rúben (5.1-10)
tribo (v. 27). Simeão começou a perder sua 'Quanto aos filhos de Rúben, o primogênito
identidade cedo na história de Israel. Está de Israel (pois ele era o primogênito; mas, por
ausente da Bênção de Moisés (Dt 33) e não quanto profanara a cama de seu pai, deu-se a sua
está na lista de lugares para onde Davi primogenitura aos filhos de José, filho de Israel,
remeteu presas de Guerra (ISm 30.27-31). de sorte que na genealogia não é contada segundo
o direito da primogenitura; 2pois Judá prevaleceu
Contudo, o cronista estava interessado em sobre os seus irmãos, e dele proveio o príncipe;
Israel corao um todo. Provavelmente, porém a primogenitura foi de José); 3os filhos de
havia ainda judeus em seu tempo que Rúben, o primogênito de Israel: Hanoque, Palu,
estavam cônscios de sua linhagem indivi Hezrom e Carmi. 4Os filhos de Joel: Semaías, de
dual derivada de Simeão, conquanto a quem foi filho Gogue, de quem foi filho Simei, sde
quem foi filho Mica, de quem foi filho Reaías, de
tribo não mais tivesse um papel destacado
a desempenhar (cf. Ez. 48.24).
A lista de cidades ocupadas por Simeão
deve ser comparada com as de Josué 19.2-7 6 Cf. Y ohanan A haroni, I sa e l Exploration Journal, V III. 26-28,1958.
334
quem foi filho Baal, 6de quem foi filho Beera, a o segundo, Janai e Safate em Basã. 13Seus irmãos,
quem Tiglate-Pilneser levou cativo; ele foi príncipe segundo as suas casas paternas: Micael, Mesulão,
dos rubenitas. 7E seus irmãos, pelas suas famílias, Sebá, Jorai, Jacã, Ziá e Eber, sete; 14Estes foram
quando se fez a genealogia das suas gerações, os filhos de Abiail, filho de Huri, filho de Jaroá,
foram: o chefe Jeiel, Zacarias, 8Belá, fllho de filho de Gileade, filho de Micael, filho de Jesisai,
Azaz, fllho de Sema, filho de Joel, que habitou filho de Jado, filho de B u z ;15Aí, filho de Abdiel,
em Aorer até Nebo e Baal-Meom; 9ao oriente filho de Guni, chefe das casas paternas. I6E habi
habitou até a entrada do deserto, desde o rio taram em Gileade, em Basã e nas suas aldeias, como
Eufrates; porque seu gado se tinha multiplicado também em todos os arrabaldes de Sarom, até os
na terra de Gileade. 10E nos dias de Saul fizeram seus termos. ,7Todos estes foram registrados,
guerra aos hagarenos, que caíram pela sua mão; segundo as suas genealogias, nos dias de Jotão,
e habitaram nas suas tendas em toda a região rei de Judá, e nos dias de Jeroboão, rei de Israel.
oriental de Gileade:
Esta lista foi extraída de material que
É necessário, para o cronista, explicar nos é desconhecido. Não há relação entre
por que o direito de primogenitura não ela e a de Gênesis 46.16 ou Números
permaneceu com Rúben, o primogênito de 26.15-18. Sarom não é a planície perto do
Israel; de fato, ele começa sua explicação Carmelo, mas uma área a este da Trans-
no meio de sua declaração e tem de repetir jordânia. A menção de Jotão e Jeroboão
o seu início (v. 1,3). O pecado de Rúben é II data a fonte usada pelo cronista (cerca
descrito em Gênesis 35.22; 49.4b. Embora de 750-745 a.C.).
tome o partido de Judá, o cronista admite,
devidamente, que José recebeu o direito da 3) Guerra com os Hagarenos (5.18-22)
primogenitura. Por causa desse direito,
18Os rubenitas, os gaditas e a meia tribo de
José recebeu porção dupla, isto é, dois Manassés tinham homens valentes, que traziam
quinhões tribais: Efraim e Manassés. escudo e espada e entesavam o arco, e que eram
Conquanto José tenha recebido o. destros na guerra, quarenta e quatro mil setecentos
direito da primogenitura, Judá tomou-se e sessenta, que saíam à peleja. I9Fizeram guerra
tribo mais poderosa, mediante o seu prín aos hagarenos, bem como a Jetur, a Nafis e a
Nodabe, 20e foram ajudados contra eles, de sorte
cipe (nagid, “líder” ). Esta mesma palavra que os hagarenos e todos quantos estavam com eles
é empregada em 2Samuel 7.8 e ss. É Davi foram entregues em sua mão; porque clamaram
quem é referido no versículo 2 (cf. SI a Deus na peleja, e ele lhes deu ouvidos, porquanto
78.67,68). confiaram nele. 21E levaram o gado deles:
cinqüenta mil camelos, duzentos e cinqüenta mil
O nome Baal é sinal de data anterior ovelhas e dois mil jumentos, e também cem mil
para esta fonte, pois foi suprimido após o homens, 22pois muitos caíram mortos, porque de
reino unificado. Nomes compostos com Deus era a peleja; e ficaram habitando no lugar
“baal” foram mudados pelos escribas para deles até o cativeiro.
bosheth, que significa vergonha (cf. Es- Esta não parece uma “guerra santa”
baal, lCr 8.33, com Isbosete, 2Sm 2.8). típica no sentido de as tribos orientais serem
Alguns elementos desta lista devem enviadas à batalha numa missão divina.
preceder 850 a.C. Baal-Meom, Aroer e Parece que foram à batalha primeiro e
Nebo caíram nas mãos moabitas após esse depois, em meio a ela, clamaram a Deus
tempo. Os hagarenos eram tribos árabes que por ajuda, achando tal ajuda disponível.
viviam nessa área. Alguns derivam o nome Foi após findar a luta que viram que Deus
de Hagar, mas essa derivação não é certa. estava, afinal de contas, por detrás dela. O
Os hagarenos são também mencionados cativeiro referido é o da Assíria.
pelos geógrafos gregos Estrabo e Ptolo- De Deus era a peleja. Como devemos
meu, e por Plínio, o romano. entender esta declaração? Obviamente, ela
expressa como os israelitas do Norte e o
2) Os Filhos de Gade (5.11-17) cronista a percebiam. Estavam convencidos
uOs filhos de Gade habitaram defronte deles de que Deus estava por detrás tanto da
na terra de Basã, até Salca: 12o chefe Joel, Safã batalha quanto da vitória. Valiosa
335
percepção deste problema de exame de alma rei da Assíria, isto é, o espírito de Tilgate-
é fornecida por G. E. Wright: “Guerras Pilneser”. Este tipo de paralelismo é
existem por causa do pecado humano; comumente expresso pelo waw (e) no
contudo, mesmo na guerra o homem pode hebraico (cf. Myers, I, 34).
esperar salvação, porque Deus está ativa A teologia do cronista é evidente nos
e justamente em operação nela.”7 versículos 25-26. É o Deus de Israel que
O número citado de homens de com excita o rei da Assíria. O Deus de Israel é
bate na Transjoidânia é excessivo, con supremo sobre o mundo. Ele impele um rei
quanto não tão elevado quanto o censo de pagão a realizar a sua vontade. A cam
Números 1 e 26. É possível que haja um panha de Tilgate-Pilneser foi uma expres
exagero no relato dos despojos levados. são da ira de Deus contra as tribos da
Transjordânia. Elas haviam, nesciamente,
4) A Meia THbo de Manassés (5.23-26) adorado os deuses do povo que haviam
23Os filhos da meia tribo de Manassés habi
desalojado. Iavé tinha provado sua supre
taram naquela terra; e multiplicaram-se desde macia sobre esses deuses quando os he
Basã até Baal-Hermom, Senir, e o monte Her- breus primeiramente possuíram a terra.
mom. 24E estes foram os cabeças de suas casas Agora ele exibia o seu poder empregando
paternas, a saber: Efer, Isi, Eliel, Azriel, Jeremias, povos pagãos para julgar Israel.
Hodavias e J adiei, homens valentes, homens de
nome, e chefes das suas casas paternas. ^Come
teram, porém, transgressões contra o Deus de 6. A Família de Levi (6.1-81)
seus pais, e se prostituíram, seguindo os deuses
dos povos da terra, os quais Deus destruirá de Há uma quantidade de listas neste capí
diante deles. “ Pelo que o Deus de Israel excitou tulo, todas tratando dos sacerdotes e dos
o espirito de Pui, rei da Assíria, e o espirito de levitas. É feita uma clara distinção entre
Tilgate-Pilneser, rei da Assíria, que os levaram as funções dos levitas (v. 48), que minis
cativos, a saber: os rubenitas, os gaditas, e a meia travam no tabernáculo, e os filhos de Arão,
tribo de Manassés; e os transportaram para Haia,
Habor, e Hara, e para o rio de Gozã, onde estão que executavam os sacrifícios (v. 49 e ss.).
até o dia de hoje. O cronista dá a entender que isso tem sido
verdade desde os dias de Arão. Desde
Manassés será abordado adicionalmen
Wellhausen, alguns estudiosos têm desa
te, em 7.14-19. Aqui os elementos tribais
orientais são mencionados porque compar fiado a perspectiva sacerdotal comum no
Antigo Testamento, insistindo que antes
tilhavam da sorte comum de Rúben e de 587 a.C., tais limitações não eram feitas.
Gade, tendo sido evacuados por Tilgate- Presentemente, o debate prossegue.8
Pilneser em 734 a.C. A passagem foi
derivada de 2Reis 15.19,29; 17.6; 18.11,
1) Os Sacerdotes Principais (6.1-15)
para seu material histórico.
Pelo que o Deus de Israel excitou o espí ‘Os filhos de Levi: Gérson, Coate e Merári.
rito de Pul, rei da Assíria, e o espírito de 2Os filhos de Coate: Anrãoi, Izar Hebrom e Uziel.
3Os filhos de Anrão: Arão, Moisés, e Miriã, e os
Tilgate-Pilneser, rei da Assíria. Este verso filhos de Arão: Nadabe, Abiú, Eleazar e Itamar.
traduzido com a inserção de “e” após “rei 4Eleazar foi pai de Finéias, Finéias de Abisua,
da Assíria” pressupõe que o cronista 5Abisua de Buqui, Buqui de Uzi, 6Uzi de Zeraías,
confundiu Pul e Tilgate-Pilneser, julgando Zeraías de Meraiote, 7Meraiote de Amarias,
que dois reis diferentes fossem mencio Amarias de Aiitube, “Aitube de Zadoque, Zadoque
de de Aimaaz, 9Aimaaz de Azarias, Azarias de
nados em 2Reis 15.19,29 (cf. Curtis e Joanã, 10Joanã de Azarias, que exerceu o sacer
Madsen). Todavia, é melhor entender os dócio na casa que Salomão edificou em Jeru
termos como sinônimos: “o espírito de Pul,
8 Q uanto a duas opiniões diferentes com respeito a esta dificílima ques
tão, ver Elmslie (p. 364, 365), negando distinções anteriores, e R.
7 “Deuteronom y”, IB (New York and Nashville: Abingdon, 1953), II, Abba (“Priests and Levites” , IDB, III, p. 876-889), questionando a
391. posição de Wellhausen.
336
salém; "Azarias foi pai de Amarias, Amarias de Este relato segue bem de perto o de
Aitiibe, 12Aitube de Zadoque, Zadoque de Salum, Números 3.17 e seguintes. O aspecto mais
13Salum de Hilquias, Hilquias de Azarias,
14Azarias de Seraias, Seraias de Jeozadaque; notável é a inclusão de Samuel na linha
lsJeozadaque foi levado cativo quando o Senhor gem levítica. Lemos, em ISamuel 1.1, que
levou em cativeiro Judá e Jerusalém por inter Elcana, o pai de Samuel, era um efraimita.
médio de Nabucodonozor. Logicamente, ele podia ter sido um levita
Os versos 1-3 apresentam os filhos de que vivia em Efraim, porém não há indi
Arão. Os versos 4-15 indicam os descen cação disso nos livros de Samuel. Apa
dentes de Eleazar até o exílio babilónico, rentemente, uma pessoa que não fosse
omitindo a família de Itamar. A conti levita por nascimento podia ser adotada na
nuação de uma lista pós-exílica é encon tribo.
trada em Neemias 12.10. Em outra parte,
no Antigo Testamento, a linhagem de 3) Os Coros Levíticos (6.31-48)
Arão é seguida somente através de Finéias, 31Estes são os que Davi constituiu sobre o
seu neto. Omitidos da genealogia estão serviço de canto da casa do Senhor, depois que a
arca teve repouso. 32Ministravam com cântico
dois destacados sacerdotes chefes, Jeoiada diante do tabernáculo da tenda da revelação, até
(2Rs 11-12) e Urias (2Rs 16.10 e ss.), de que Salomão edificou a casa do Senhor em Jeru
modo que o relatório não é exaustivo. salém; e exerciam o seu ministério segundo a sua
É simplesmente uma tentativa de revelar ordem. 33São estes, pois, os que ali estavam com
seus filhos: dos filhos dos coatitas, Hemã, o
a linha geral de descendência. cantor, filho de Joel, filho de Samuel, Afilho de
Quando o Senhor levou em cativeiro Elcana, filho de Jeroão, filho de Eliel, filho de
Judá e Jerusalém por intermédio de Nabu Toá, 35filho de Zufe, filho de Elcana, filho de
codonozor. Este é um claro exemplo da Maate, filho de Amasai, Afilho de Elcana, filho de
perspectiva do cronista sobre a História. Joel, filho de Azarias, filho de Sofonias, "filho de
Taate, filho de Assir, filho de Ebiasafe, filho de
O Deus de Israel, do modo como empre Corá, Afilho de Izar, filho de Coate, filho de Levi,
gara os reis assírios, empregou Babilônia filho de Israel. 39E seu irmão Asafe estava à sua
para os seus propósitos de julgamento. direita; e era Asafe filho de Berequias, filho de
Siméia, Afilho de Micael, filho de Baaséias, filho
de Malquias, 41filho de Etni, filho de Zerá, filho
2) Os Levitas (6.16-30) de Adaias, 42filho de Etã, filho de Zima, filho de
16Os filhos de Levi: Gérson, Coate e Merári. Simei, 43filho de Jaate, filho de Gérson, filho de
17Estes são os nomes dos filhos de Gérson: Levi. 44E à esquerda estavam seus irmãos, os
Líbni e Simei. 18Os filhos de Coate: Anrão, Izar, filhos de Merári: Etá, filho de Quísi, filho de Abdi,
Hebrom e Uziel. 19Os filhos de Merári: Mali e filho de Maluque, Afilho de Hasabias, filho de
Musi. Estas são as fàmilias dos levitas, segundo Amazias, filho de Hilquias, 46filho de Anzi, filho
as casas de seus pais. 20De Gérson: Líbni, de de Bani, filho de Semer, 47filho de MaU, filho de
quem foi filho Jaate, de quem foi filho Z im a,21de Musi, filho de M erári, filho de Levi. ‘“E seus
quem foi filho Joá, de quem foi filho Ido, de quem irmãos, os levitas, foram designados para todo o
foi filho Zerá, de quem foi filho Jeaterai. 22Os serviço do tabernáculo da casa de Deus.
filhos de Coate: Aminadabe, de quem foi filho
Corá, de quem foi filho Assir, 23de quem foi filho Cada uma das três famílias principais
Elcana, de quem foi filho Ebiasafe, de quem foi da ordem levítica fornecia representantes
filho Assir, Mde quem foi filho Taate, de quem foi que dirigiam o culto na música: Hemã, o
filho Uriel, de quem foi filho Uzias, de quem foi descendente de Coate; Asafe, da linhagem
filho Saul. 25O s filhos de Elcana: Amasai e
Aímote, “ de quem foi filho Elcana, de quem foi de Gérson; e Etã, da família de Merári. É
filho Zofài, de quem foi filho Naate, 27de quem foi alegado pelo cronista que Davi foi o orga
filho Eliabe, de quem foi filho Jeroão, de quem foi nizador dessas corporações musicais e
filho Elcana. “ E os filhos de Samuel: Joel, seu quem primeiro designou os três líderes
primogênito, e Abias o segunda 29Os filhos de
Merári: Mali, de quem foi filho Líbni, de quem acima enumerados. O historiador não só
foi filho Simei, de quem foi filho Uzá, “ de quem assegura isto aqui, mas também em muitas
foi filho Siméia, de quem foi filho Hagias, de quem outras passagens (15.16,27;25.1 e ss.;
foi filho Asaías. 2Cr 29.26Í e ss.; Ne 12.46 e ss.). Tradições
337
sobre Davi apresentam-no como um músi facções dos jebuseus e israelitas.10 Outros
co consumado (ISm 16.14 e ss.; 2Sm 1.17 conjecturam que ele estava encarregado
e ss.), e a associação de seu nome com os da arca enquanto ela ainda estava em
Salmos certamente tem alguma base em Quiriate-Jearim, e Davi o conservou a seu
fatos, embora nem todos os salmos a ele serviço." Von Rad (p. 248,249) é cético
atribuídos tenham sido compostos por ele. quanto a uma conclusão satisfatória do
Tais corporações musicais mais antigas, problema. A própria geração de Zadoque
influenciadas pela cultura cananéia, exis o considerava um legítimo sacerdote e, se
tiram com muita probabilidade.9 foi necessário ser adotado na família
arônica para que gerações posteriores acei
4) Os Sacerdotes Zadoqueus (6.49-53) tassem isso, o processo é compreensível.
4,Mas Arão e seus filhos ofereciam os sacrifí 5) As Atribuições de Terras Levíticas
cios sobre o altar do holocausto e o incenso sobre
o altar do incenso, para todo o serviço do lugar (6.54-81)
santíssimo, e para fazer expiação a favor de Israel, Estas estatísticas são semelhantes às de
conforme tudo quanto Moisés, servo de Deus,
tinha ordenada 50Estes foram os filhos de Arão: Josué 21. A lista, aqui, combina cidades
Eleazar, de quem foi filho Finéias, de quem foi de refúgio com cidades em que os levitas
filho A bisua,51de quem foi filho Buqui, de quem estavam vivendo. Isto não significa que os
foi filho Uzi, de quem foi filho Zeraías, 52de quem levitas apenas estavam vivendo nas cida
foi filho Meraiote, de quem foi filho Amarias, de
quem foi filho Aitube, 53de quem foi filho Zado des particulares alistadas, e, sim, que
que, de quem foi filho Aimaaz. tinham uma porção ali. Há toda indicação
de que a lista básica procede do tempo de
O propósito desta seção parece ser Davi. Cidades cananéias tais como Gezer
prover um elo de ligação entre Arão e (v. 67) e Bileã (v. 70) não se tornaram partes
Zadoque e sublinhar o papel distintivo dos do território israelita até então. Gezer foi
sacerdotes zadoqueus. Eram os que foram destruída por Sisaque do Egito (c. de 900
designados para administrarem as ofertas a.C.) e Golã (v. 71), provavelmente, passou
de sacrifício e de incenso, entrar no lugar ao controle sírio após o tempo de Bene-
santo e efetuar a expiação por Israel. -Hadade (lRs 15.20). A distribuição das
Zadoque é uma pessoa quase tão mis cidades levíticas por tribos, em vez de por
teriosa quanto o seu predecessor Melqui- distritos administrativos, revela um tempo
sedeque (Gn 14), cujo nome é composto anterior a Salomão.
do seu. Ele aparece de repente durante o
reinado de Davi. Conquanto tenha um pai a. As Cidades dos Sacerdotes (6.54-65)
(Aitube, 2Sm 8.17) e filhos (Aimaaz,
2Sm 15.36; 18.19; Azarias, lRs 4.2), nada ^Ora, estas foram as suas habitações, segundo
os seus acampamentos nos seus termos, a saber:
mais é sabido sobre os seus antepassados aos filhos de Arãoi, das famílias dos coatitas
a partir de fontes contemporâneas ou qual (porque lhes caiu a primeira sorte), 55deram-lhes
quer outra até a obra do cronista. Há Hebrom, na terra de Judá, e os campos que a
alguns que insistem que ele estava na rodeiam; “ porém os campos da cidade e as suas
sucessão de sacerdotes jebuseus relacio aldeias, deram-nos a Calebe, filho de Jefoné.
57E aos filhos de A rão deram as cidades de
nados com Melquisedeque e qúe estariá refúgio: Hebrom, Libna e seus campos, Jatir e
servindo nesta posição quando Davi Estemoa e seus campos, ^Hilem e seus campos,
capturou Jerusalém. Sua designação como Debir e seus campos, 59Asã e seus campos, Bete-
sacerdote ao lado de Abiatar, da tradição -Semes e seus campos; “ e da tribo de Benjamim:
Geba e seus campos, Alemete e seus campos,
arônica, foi uma tentativa de reunir as
338
Anatote e seus campos; todas as suas cidades, pelas e seus campos; 70e da meia tribo de Manassés,
suas famílias, foram treze. 61M as os filhos de Aner e seus campos, e Bileã e seus campos,
Coate, aos restantes da família da tribo, por sorte deram-nos aos restantes da família dos filhos de
caíram dez cidades da meia tribo, da metade de Coate.
Manassés; “ aos filhos de Gérson, segundo as
suas famílias, caíram treze cidades das tribos de Correspondendo à designação de ci
Issacar, Aser, Naftali e Manassés, em Basã; 63e
aos filhos de Merári, segundo as suas famílias, por dades em Judá aos sacerdotes arônicos,
sorte caíram doze cidades das tribos de Rúben, outros descendentes de Coate, o avô de
Gade e Zebulom. 64Assim os filhos de Israel Arão, tiveram designações em Efraim e
deram aos levitas estas cidades e seus campos. Manassés ocidental, perto de Jerusalém.
“ Deram-lhes por sorte, da tribo dos filhos de
Judá, da tribo dos filhos de Simeãa, e da tribo dos
Estes receberam habitações bem mais
filhos de Benjamim, estas cidades que são mencio afastadas de Jerusalém. Isto pode ter
nadas nominalmente. sido tanto por escolha quanto por desíg
nio governamental.
Os sacerdotes arônicos receberam
cidades em Judá e Benjamim, perto de seu c. Território Gersonita e Merarita (6.
local de serviço em Jerusalém. Um ajuste 71-81)
tinha de ser feito com respeito à família de
Calebe, que havia conquistado o território 71Aos filhos de Gérson deram, da família da
meia tribo de Manassés, Golã, em Basã, e seus
de Hebrom e o possuía por direito de campos, e Astarote e seus campos; 7Ze da tribo
conquista. Para evitar conflito, um com de Issacar: Quedes e seus campos, Daberate e
promisso foi estipulado. Os sacerdotes seus campos, 73Ramote e seus campos, e Aném
receberiam a cidade de Hebrom e suas e seus campos; 74e da tribo de Aser: M asal e
seus campos, Abdom e seus campos, 7SHucoque
pastagens próximas, mas os calebitas e seus campos, e Reobe e seus campos; 76e da
manteriam a posse das aldeias e áreas agrí tribo de Naftali: Quedes, em Galiléia, e seus
colas da região. Os descendentes de Calebe campos, Hamom e seus campos, e Quiriataim e
eram, provavelmente, mais rurais do que seus campos.77Aos restantes dos filhos de Merári
urbanos, e os sacerdotes de Jerusalém, o deram, da tribo de Zebulom, Rimono e seus
campos, Tabor e seus campos; 78e dalém do
oposto. Jordão, na altura de Jericó, ao oriente do Jordão,
Esse arranjo será abordado mais ampla deram, da tribo de Rúben, Bezer, no deserto, e
mente na discussão de 6.66-81, quando o seus campos, Jaza e seus campos, 79Quedemote
território dos sacerdotes não sacrificantes e seus campos, e Mefaate e seus campos; “ e da
tribo de Gade, Ramote, em Gileade, e seus campos,
for mencionado. Os coatitas receberam M aanaim e seus campos, 81Hesbom e seus
cidades no território ocidental de Ma campos, e Jazer e seus campos.
nassés; os meratitas, cidades em Rúben,
Gade e Zebulom. Os israelitas, voluntaria A família de Coate (arônica) tendo sido
mente, consignaram essas áreas de moradia agora atendida, o cronista primeiro alista
dentro de seus territórios. Tais provisões a designação de Gérson, o primogênito de
significariam, inevitavelmente, que os Levi, e Merári, o caçula. A Gérson foram
serviços de culto locais seriam desenvol designadas cidades em Manassés oriental,
vidos. Aser, Issacar e Naftali, primariamente na
Galiléia. O grupo de Merári foi assentado
em Rúben, Zebulom e Gade — a área da
b. Cidades Levíticas em Efraim e Ma Transjordânia e um bolsão (Zebulom) na
nassés Ocidental (6.66-70) região central-norte de Israel. As colinas
66Algumas das famílias dos filhos de Coate de Golã acima do Mar da Galiléia con
receberam da tribo de Efraim cidades de seus trolam a área inteira. É por isso que Bene-
termos. 67Deram-lhes as cidades de refúgio: -Hadade agiu tão depressa ao se apossar
Siquém e seus campos, na região montanhosa de
Efraim, como também Gezer e seus campos. dessa área. Quando os levitas a possuíam
68Jocmeão e seus campos, Bete-Horom e seus no antigo Israel, tinham sob seu controle
campos, 69Aijalom e seus campos, e Gate-Rimom a melhor terra da região.
339
7. Genealogias dos Israelitas do Norte sempre é preenchida (cf. C. F. Mendenhall,
(7.1-40) p. 52-66; também a discussão na Introdu
Com este capítulo o cronista inicia ção).
uma nova ênfase, ressaltando o número de
guerreiros entre as tribos do Norte. Sendo 2) Os Filhos de Zebulom e Dã (7.6-12)
que ele não tinha qualquer preocupação
particular com proeza militar, mas antes 6Os filhos de Benjamim: Belá, Bequer e
Jediael, três. 7Os filhos de Belá: Esbom, Uzi,
com o culto sacerdotal e ritual, isto é Uziel, Jeremote e tri, cinco, chefes de casas
bastante estranho, pois prossegue com o paternas, homens valentes, os quais foram conta
tema ao longo do capítulo 8. Esta não fora dos pelas suas genealogias vinte e dois mil e trinta
sua ênfase antes, com exceção do relato de e quatra 8Os filhos de Bequer: Zemira, Joás,
Eliézer, Elioenai, Onri, Jerimote, Abias, Anatote
outra situação israelita do Norte (5.18-22). e Alemete; todos estes foram filhos de Bequer.
Estaria ensinando que a força de Judá se 9E foram contados pelas suas genealogias,
encontrava em outra área que não a mi segundo as suas gerações, chefes das suas casas
litar, e que a proeza militar não garantia paternas, homens valentes, vinte mil e duzentos.
0 futuro de um povo? Contudo, este relato 10O filho de Jediael: Bilã, e mais os filhos de Bilã:
Jeús, Benjamim, Eúde, Quenaaná, Zetã. Társis e
pode simplesmente ilustrar o peso das AIsaar. “Todos estes filhos de Jediael, segundo os
fontes que ele estava usando. Tratavam-se chefes das casas paternas, homens valentes, foram
de listas de recenseamento militares, en dezessete mil e duzentos, que podiam sair no exér
quanto ele tinha acesso no sul a outros cito à peleja. 12E também Supim, e Hupim, os
filhos de Ir, com Husim, o filho de Aer.
tipos de relatórios de família.
340
O verso 12, provavelmente, faz referên 4) Os Filhos de Efraim (7.20-29)
cia a Dã, conquanto o nome da tribo tenha
20Os filhos de Efraim: Sutela, de quem foi
sido eliminado na transmissão. Em Gê filho Berede, de quem foi filho Taate, de quem foi
nesis 46.23, Dã tem somente um filho, filho Eleadá, de quem foi filho làate, 21de quem
Husim, como indicado aqui. “Husim, filho foi filho Zabade, de quem foi filho Sutela; e Ezer
de Aer” deveria ser lido: “Husim, único e Eleade, aos quais os homens de Gate, naturais
filho.” da terra, mataram, por terem descido para tomar
o seu gado. 22E Efraim, seu pai, os pranteou por
muitos dias, pelo que seus irmãos vieram para o
consolar. Z3Depois juntou-se com sua mulher, e
3) Os Filhos de Naftali e Manassés (7. concebendo ela, teve um filho, ao qual ele deu o
13-19) nome de Berias, porque as coisas iam mal na sua
casa. “ Sua filha foi Seerá, que edificou a Bete-
13Os filhos de Naftali: Jaziel, Guni, Jezer e -Horom, a baixa e a alta, como também a Uzem-
Salum, filhos de Bila. l4Os filhos de Manassés: -Seerá. “ Foi seu filho Refà, como também Resefe,
Asriel, que teve da sua mulher; a sua concubina, de quem foi filho Tela, de quem foi filho Taã, Mde
a síria, teve a Maquir, pai de Gileade; l5e Maquir quem foi filho Ladã, de quem foi filho Amiúde, de
tomou mulheres para Hupim e Supim; a irmã dele quem foi filho Elisama, 27de quem foi filho Num,
se chamava Maaca. Foi o nome do segundo Zelo- de quem foi filho Josué. “ Ora, as possessões e as
feade; Zelofeade teve filhas. 16Maacá, mulher de suas habitações foram Betei e suas aldeias, e ao
Maquir, teve um filho, e chamou o seu nome Peres, oriente Naarã, e ao ocidente Gezer e suas aldeias,
e o nome de seu irmão foi Seres; e foram seus e Siquém e suas aldeias, até Gaza e suas aldeias;
filhos: Ulão e Raquém. l7De Ulão foi filho Bedã. 29e da banda dos filhos de Manassés, Bete-Seã
Esses foram os filhos de Gileade, filho de Maquir, e suas aldeias, Taanaque e suas aldeias, Megido
filho de Manassés. 18Sua irmã Hamolequete teve e suas aldeias, e Dor e suas aldeias. Nesses
Isode, Abiezer e Maclá. I9E foram os filhos de lugares habitaram os filhos de José, filho de Israel.
Semida: Aia, Siquém, Líqui e Aniãa
A pessoa mais ilustre neste relato é
Josué, filho de Num (v. 27). A referência
A lista de Naftali é derivada de Gênesis à matança dos filhos de Efraim pelos
46.24 e é-lhe idêntica. Evidentemente, esse
homens de Gate aponta para uma data
relato e Números 26.48 eram os únicos
anterior a este relato, pois revela o tipo de
registros disponíveis ao cronista. Isso não
situação que deve ter prevalecido quando
era verdade quanto à maioria das outras
as tribos primeiro viviam na Palestina.
listas tribais. Pode ter-se dado o caso de
que essa tribo sofreu mais destruiçção nas Elas haviam surripiado uma quantidade
de gado, tal como nas incursões de pilha
conquistas assírias, havendo-se perdido os
gem fora da lei no Oeste nos primeiros
registros tribais.
tempos dos Estados Unidos.
O relato de Manassés trata tanto da
A filha de Efraim, Seerá, é referida
Transjordânia quanto de Manassés oci
como tendo edificado duas cidades. Curtis
dental. Como de costume, o nome Maquir
e Madsen (p. 154) duvidam da autenti
(v. 14) é o mais proeminente. Também as
cidade da declaração, “uma vez que em
filhas de Zelofeade aparecem (cf. Nm todas as outras partes do AT os constru
26.33). O cronista concede mais espaço às
tores de cidades são homens”. Este é exata
mulheres em suas genealogias do que é
mente o ponto focal do relato. Aqui se
comum no Antigo Testamenta A menção
trata de uma mulher fazendo algo que
da concubina síria de Manassés oriental e
somente homens haviam feito antes.
Síria atesta o íntimo relacionamento exis
tente entre ambas as terras. Isso por fim
conduziu à dominação síria de Manassés, 5) Os Filhos de Aser (7.30-40)
as mulheres hebréias tornando-se concu
binas dos sírios. Assim as desigualdades ^O s filhos de Aser: Imná, Isvi, Berias e Sera,
irmã deles. 31Os filhos de Berias: H eber e
sociais tendem a formar um círculo Malquiel; este foi o pai de Birzavite. 32Heber foi
completo. pai de J afiete, Somer, Hotão e Suá, irmã deles.
341
’’Os filhos de Jafie te: Pasaque, Bimal e Asvate, e Sema (estes foram chefes de casas paternas dos
esses foram os filhos de Jaflete. MOs filhos de habitantes de Aijalom, os quais afugentaram os habi
Semer: Aí, Jeubá e Arã. 35Os filhos de seu irmão tantes de Gate), 14Aio, Sasaque, Jeremote.
Helem: Zofa, Imna, Seles e Amai. “ Os filhos de 15Zebadias, Arade, Eder, 16Micael, Ispá e Joá
Zofa: Suá, Harnefer, Suai, Beri, Inra, 37Bezer, foram filhos de Berias; 17Zebadias, Mesulão,
Hode, Samá, Silsa, Itrã e Beera. ^O s filhos de Hizqui, Heber, '“lsmerai, Izlias e Jobabe foram
Jeter: Jefoné, Pispa e Ara. 39Os filhos de Ula: filhos de Elpaal; 19Jaquim, Zicri, Zabdi, 20Elienai,
Ará, Haniel e Rízia. 40Todos esses foram filhos de Ziletai, Eliel, 21Adaías, Beraías e Sinrate foram
Aser, chefes das casas paternas, homens esco filhos de Simei; 22Ispã, Êber, Eliel, “ Abdom, Zicri,
lhidos e valentes, chefes dos príncipes; e o número H anã, 24Hananias, Elão, Antotias, “ Ifdéias e
deles, contados segundo as suas genealogias para Penuel foram filhos de Sasaque; 26Sanserai,
o serviço de guerra, foi vinte e seis mil homens. Searias, Atalias, 27Jaaresias, Elias e Zicri foram
filhos de Jeroãa “ Estes foram chefes de casas
Um terço dos nomes nesta lista é encon paternas, segundo as suas gerações, homens prin
trado aqui e aparentam serem bastante cipais; e habitaram em Jerusalém.
antigos (cf. Curtis e Madsen). A plenitude Quando isto é comparado com os relatos
deste relato é bem incomum à luz do fato de Gênesis 46.21 e Números 26.38-40, apre
de Aser ser uma das menores tribos de Zilpa senta afinidades e diferenças com cada qual.
(serva de Léia). Um antigo registro deve ter O cronista deve ter suplementado ambas
sido usado pelo cronista. O número total essas fontes com material independente.
de guerreiros para a tribo é indicado como Esta passagem apresenta inúmeras dificul
sendo de 26 mil. É consideravelmente dades intrincadas. Não ocorre nenhuma
menor do que os 41.500 e 53.400 de seção nessas genealogias em que haja
Números 1 e 26. Alguns sustentam que problemas mais insuperáveis. A maioria
aquele número constitui o total de uma das deles resulta de aparente corrupção textual.
famílias, mas esta não é a reivindicação do Talvez após copiar todos os dados estatís
cronista. Com sua tendência a exagerar ticos precedentes em Crônicas, os escribas
números, por que ele não o faz aqui? Este estivessem extremamente esgotados!
dado estatístico constitui evidência sólida Nada é sabido sobre o exílio a Manaate
de que ele copiou seus algarismos assim (v. 6). No versículo 7, isto é, Heglam reza
como os encontrou. Seus números exorbi literalmente em hebraico “ele os exilou”.
tantes em outros lugares devem ter sido Não sabemos quem exilou quem nesta
extraídos de fontes posteriores. Onde suas declaração. Acaso Eúde exilou Naamã, Aias
fontes são realistas, ele também o é. e Gêra e partiu para exílio voluntário? Ou
Gêra teria sido o que realizou o exílio? *
8. Listas da Tribo de Benjamim (8.1-40) Nada soubemos de outra parte quanto a
Saaraim (v. 8). Divorciou-se ele de duas de
1) As Famílias Benjamitas (8.1-28) suas esposas, mesmo da que lhe gerara filhos
'Benjamim foi pai de Belà, seu primogênita, de (v. 11)? Este seria o único exemplo de um
Asbel o segundo, e de Aará o terceiro, 2de Noá o tal divórcio duplo no Antigo Testamento.
quarto, e de Rafa o quinta 3Belá teve estes filhos: Isto poderia ter acontecido, logicamente,
Adar, Gêra, Abiúde, 4Abisua, Naamã, Aoá, sGêra, mas o nome Husim, o da suposta primeira
Sefufã e H urãa 6Estes foram os filhos de Eúde,
que foram os chefes das casas paternas dos habi esposa, em outros lugares é sempre nome
tantes de Geba, e que foram levados cativos para de homem. Contudo, é comum mulheres
Manaate: 7Namaã, Aias e Gêra; este os trans receberem nomes masculinos e vice-versa.
portou; foi ele pai de Uzá e Aiúde. 8Aaraim teve Soluções satisfatórias destes problemas
filhos na terra de Moabe, depois que despedira e outros semelhantes aguardam descobertas
Husim e Baara, suas mulheres. 9E de Hodes, sua
mulher, teve Jobabe, Zíbia, Messa, Malcã, 10Jeuz, posteriores. Há muitas restaurações conje-
Saquias e Mirma; esses foram seus filhos, chefes
de casas paternas. 11De Husim teve Abitube e
Elpaal. 12Os filhos de Elpaal: Eber, Misã, Semede * Tal problema não ocorre n a versão Alm eida Revisada, adotada na
(este edificou Ono e Lode e suas aldeias). 13Berias presente tradução do co m en tário — N. T.
342
turais do texto, mas tais hipóteses são A presença de Baal entre os nomes nesta
precárias. passagem (v. 30, 33 e 34), que ocorre em
muitos dos relatos do cronista, revela nova
2) Á Família de Saul (8.29-40) mente sua fidelidade aos seus registros.
29E em Gibeão habitaram o pai de Gibeão, cuja Gerações posteriores suprimiram tais
mulher se chamava Maacá, ^e seu filho primogê nomes, freqüentemente substituindo Baal
nito Abdom, depois Zur, Quis, Baal, Nadabè, por bosheth (vergonha). Em lCrônicas
31Gedor, Aiô, Zequer e Miclote. 32Miclote foi pai (8.33) Es-Baal torna-se Isbosete (2Sm 2.8),
de Siméia; também estes habitaram em Jerusalém e Meribe-Baal (8.34) torna-se Mefibosete
defronte de seus irmãos. 33Ner foi pai de Quis, e
Quis de Saul; Saul foi pai de Jônatas, Malquisua, (2Sm 9.6). Por que essa substituição é feita
Abinadabe e Es-Baal. 34Filho de Jônatas foi em Samuel, o relato anterior, e não em
Meribe-Baal; e Meribe-Baal foi pai de Mica. 35Os Crônicas? As passagens em Samuel eram
filhos de Mica foram: Pitom, Meloque, Tareá e lidas em voz alta regularmente na sinagoga
Acaz. wAcaz foi pai de Jeoada; Jeoada foi pai de
Alemete, Azmavete e Zinri; Zinri foi pai de Moza;
dos tempos posteriores e Crônicas não.
37Moza foi pai de Bineá, de quem foi filho Rafa,
de quem foi filho Eleasá, de quem foi filho Azei. 9. Jerusalém Metropolitana (9.1-44)
38Azei teve seis filhos, cujos nomes foram: Azricãa,
Bocru, Ismael, Searias, Obadias e Hanã; todos estes Observa-se um íntimo relacionamento
foram filhos de Azei. 39Os filhos de Ezeque, seu entre este capítulo e Neemias 11.
irmão: Ulão, seu primogênito, Jeús o segundo, e Correspondem-se muito proximamente
Elifelete o terceira 40Os filhos de Ulão foram quanto aos nomes levíticos e sacerdotais.
homens heróis, valentes, e flecheiros destros; e
tiveram muitos filhos, e filhas de filhos, cento e Contudo, o texto hebraico de Neemias 11
cinqüenta. Todos estes foram dos filhos de contém cerca de 81 nomes para 71 de
Benjamim. lCrônicas, e, não obstante, somente cerca
de 35 são bem parecidos entre si. Há
É óbvio que o propósito desta passagem também muitas diferenças nas listas. Possi
é apresentar os ancestrais e parentes de Saul. velmente, o que se deu é que uma lista
Contudoi, isso não é feito em linha não inter pré-exílica anterior foi atualizada pelo
rompida. Após apresentar Jeiel (cujo nome cronista com o auxílio dos dados estatísticos
não está realmente presente nesta lista, mas de Neemias. O contexto básico para o capí
é sugerido de 9.35) e seus filhos, a gene tulo é semelhante à situação após o retorno
alogia dirige-se aos descendentes mais do exílio babilónico descrito em Neemias.
próximos de Saul. Contudo, estes não têm
ligação com Jeiel. De fato, Quis é tido como
o filho de Ner. Em outra parte, Abner, 1) Os Primeiros Retornados (9.1-9)
comandante dos exércitos de Saul, é refe 'Todo o Israel, pois, foi arrolado por genealo
rido como filho de Ner e primo de Saul (ISm gias, que estão inscritas no livro dos reis de Israel;
14.50). O avô de Abner foi Abiel (ISm e Judá foi transportado para Babilônia, por causa
da sua infidelidade. 2Ora, os primeiros a se resta
14.51). Párece, assim, que Abiel foi também belecerem nas suas possessões e nas suas cidades
avô de Quis. ISamuel 9.1 diz que Quis foi foram de Israel, os sacerdotes, os levitas, e os neti-
filho de Abiel, mas isso também significa nins. 3E alguns dos filhos de Judá, de Benjamim,
neto. Novamente um equívoco do escriba e de Efraim e Manasses habitaram em Jerusalém:
4Utai, filho de Amiúde, filho de Onri, filho de Inri,
foi possivelmente cometido. O verso 33 filho de Bani, dos filhos de Pérez, filho de Judá;
poderia rezar: “Ner era o pai de Abner, Quis, 5dos silonitas: Asaías, o primogênito, e seus filhos;
de Saul.” Na cópia, o nome de Abner foi 6dos filhos de Zerá: Jeuel e seus irmãos, seiscentos
omitido e o de Quis escrito duas vezes; e noventa; 7dos filhos de Benjamim: Saiu, filho de
contudo, é também possível que Ner fosse Mesulão, filho de Hodavias, filho de Hassenuá;
8Ibnéias, filho de Jeroão; Elá, filho de Uzi, filho
o pai de Quis, bem como de Abner, e que de Micri; Mesulão, filho de Sefotrias, filho de Reuel,
Abner fosse tio de Saul, e não seu primo. filho de Ibnijas; 9e seus irmãos, segundo as suas
Isto autenticaria o texto em pauta. gerações, novecentos e cinqüenta e seis. Todos estes
343
homens foram chefes de casas paternas, segundo 3) Os Levitas (9.14-34)
as casas de seus pais.
Todo o Israel, pois, foi arrolado remonta a. Os Cantores Sacros (9.14-16)
aos capítulos 1-8. “Todo o Israel” inclui 14E dos levitas: Semaías, filho de Hassube, filho
todas as doze tribos. O livro dos reis de de Azricão, filho de Hasabias, dos filhos de Merári;
Israel não pertence aos livros canônicos, 15Baquebacar, Heres, Galai e Matanias, filho de
e, sim, é uma das fontes primárias usadas Mica, filho de Zicri, filho de Asafe; l6Obadias,
filho de Semaías, filho de Galai, filho de Jedútun;
pelo cronista. e Berequias, filho de Asa, filho de Elcana, morador
Os netinins (“os dedicados”). Original das aldeias dos netofatitas.
mente, parece terem sido escravos As pessoas alistadas simplesmente como
estrangeiros designados para trabalhar na
levitas parecem ser cantores. Os netofatitas
casa de Deus, tais como os gibeonitas (Js (habitantes de Netofá, perto de Jerusalém)
9.23). O cronista os inclui entre os levitas são citados como músicos em Neemias
(9.26-32). Parece que por fim foram 12.28. Asafe e Jedútun (v. 15 e 16) eram
adotados nas famílias levíticas. O cronista líderes de corporações musicais (6.39;
contribui para isso, pois é o primeiro a alistá- 16.41). Elcana representa Hemã, o cantor
los entre os levitas. Neemias menciona um
(6.33-34). Para o cronista os cantores eram
nível abaixo dos netinins, “os filhos dos os levitas mais importantes; assim, ele os
servos de Salomão”, (11.3). Aparentemente, alista em primeiro lugar. Eles são, na
o cronista achou muito difícil, mesmo com verdade, levitas.
o seu espírito generoso, atribuir-lhes status
levítico. b. Os Porteiros (9.17-27)
17Foram porteiros: Salum, Acube, Talmom e
2) As Famílias Sacerdotais (9.10-13) Aimã, e seus irmãos, sendo Salum o chefe; 18e até
aquele tempo estavam de guarda à porta do rei,
10E dos sacerdotes: Jedaías, Jeoiaribe, Jaquim; que ficava ao oriente. Estes foram os porteiros para
"Azarias, filho de Hilquias, filho de Mesulão, filho os arraiais dos filhos de Levi. 19Salum, filho de
de Zadoque, filho de Meraiote, filho de Aitube, Corém, filho de Ebiasafe, filho de Corá, e seus
regente da casa de Deus; 12Adaías, filho de Jeroão, irmãos da casa de seu pai, os corai tas, estavam
filho de Pasur, filho de Malquias; Maasai, filho encarregados do serviço como guardas das entradas
de Adiei, filho de Jazera, filho de Mesulão, filho do tabemáculoi, como seus pais também tinham sido
de Mesilemite, filho de Imer; ' ’Como também seus encarregados do arraial do Senhor, sendo guardas
irmãos, chefes de suas casas paternas, mil setecentos da entrada. “ Finéias, filho de Eleazar, dantes era
e sessenta, homens capacitados para o serviço da guia entre eles; e o Senhor era com ele;21Zacarias,
casa de Deus. filho de Meselemias, guardava a porta da tenda
da revelaçãa “ Todos estes, escolhidos para serem
guardas das entradas, foram duzentos e doze; e
Jeoiaribe foi o antepassado dos famosos foram contados por suas genealogias, nas suas
macabeus. aldeias. Davi e Samuel, o vidente, os constituíram
nos seus respectivos cargos, tin h a m , pois, eles
Homens capacitados (gibbor, homens e seus filhos o cargo das portas da casa do Senhor,
fortes de poder). Este é geralmente um a saber, da casa da tenda, como guardas. 24Os
termo aplicado a grandes guerreiros (cf. porteiros estavam aos quatro lados, ao oriente, ao
Gideão, por antecipação, Jz 6.12). É empre ocidente, ao norte e ao sul. “ Seus irmãos, que
gado neste sentido pelo cronista em 7.5 moravam nas suas aldeias, deviam de tempo em
tempo vir por sete dias para servirem com eles;
(“varões valentes”). Aqui o termo é aplicado 26pois os quatro porteiros principais, que eram
aos sacerdotes ao servirem no Templo. Isto levitas, estavam encarregados das câmaras e os
ilustra vividamente a convicção do cronista tesouros da casa de Deus. 27E se alojavam à roda
de que a luta espiritual do sacerdote é tão da casa de Deus, porque a sua guarda lhes estava
entregue, e tinham o encargo de abri-la cada manhã.
significativa quanto a proeza do soldado.
A força aparece de muitas formas, não Há somente dois nomes dados em
sendo a menor delas no homem de Deus. Neemias 11.19; aqui há quatro, um para
344
cada portão. O principal porteiro foi Salum, Os serviços de rotina da casa de Deus
que guardava o último portão, pois era o eram levados a efeito pelos levitas, exceto
que o rei geralmente atravessava e dava quanto a uma função: a fabricação de óleo
vistas para o santuário. O cronista remonta perfumado para a unção (cf. Ex 30.23). Isto
o trabalho dos porteiros a Finéias (v. 20) deveria ser feito pelos sacerdotes.
e atribui suas responsabilidades no Templo
às designações de Davi e Samuel, o vidente d. Os Deveres dos Cantores (9.33-34)
(v. 22). A menção de Samuel neste papel
33Estes são os cantores, chefes de casas
é bastante estranha. O título vidente, que paternas dos levitas, que moravam nas câmaras e
foi seu originalmente (ISm 9.9), pode signi estavam isentos de outros serviços, porque de dia
ficar que ele começou a reorganização logo e de noite se ocupavam naquele serviço. 34Estes
após a morte de Eli. Conquanto poucos foram chefes de casas paternas dos levitas, em suas
insistiriam em que Samuel e Davi organi gerações; e estes habitaram em Jerusalém.
zaram os levitas tão completamente como
o cronista dá a entender, não há que negar Os cantores, bem como os porteiros,
que o culto ao tempo de Samuel e Davi era estavam a serviço dia e noite (cf. SI 134;
organizado. Da estrutura rudimentar do Is 30.29). Eles começavam e terminavam
tempo deles desenvolveu-se o sistema poste o dia de atividades cultuais e por isso
rior. tinham que viver na área do Templo. Devido
Os porteiros principais, que eram levitas, às suas responsabilidades musicais, eles
como o eram seus auxiliares (23.24), tinham estavam livres de quaisquer outros deveres.
a responsabilidade de guardar os tesouros Estes são os cantores. Uma lista de
do Templo. As portas eram abertas de cantores precederia ou se seguiria a esta
manhã cedo (boker, v. 27). Assim, eles declaração. Ou a lista havia sido perdida
tomavam tanto disponiveis como protegiam ou 9.17-32, referente aos porteiros e obreiros
as coisas sagradas do santuário. Isto está de rotina, havia sido inserido entre a lista
no contexto de Mateus 16.19: “Dar-te-ei as de cantores em 9.14-16 e este sumário. A
chaves do reino dos céus.” Não apenas última hipótese é possível. Fontes simpá
Simão Pedro, mas a própria Igreja deve ticas aos porteiros podem ter inserido suas
guardar e tornar disponível o reino dos céus próprias listas no capítulo.
para aqueles que o buscam. A ênfase do
cronista é de que somente os que estavam
qualificados para esta tarefa a cumpriam. 4) A Família de Saul (9.35-44)
Guardiães autodesignados de ortodoxia 3SEm Gibeão habitou Jeiel, pai de Gibeão (e
certamente não estão em sua tradição. era o nome de sua mulher Maacá); “ seu filho
primogênito foi Abdom; depois Zur, Quis, Baal,
Ner e Nadabe, 37Gedor, Aüô, Zacarias e Miclote.
18Miclote foi pai de Simeão; também estes habita
c. Serviços de Rotina (9.28-32) ram em Jerusalém defronte de seus irmãos. 39Ner
foi pai de Quis; Quis de Saul; e Saul de Jônatas,
“ Alguns deles estavam encarregados dos uten M alquisua, Abinadabe e Es-Baal. 4,lFilho de
sílios do serviço, pois estes por conta eram trazidos Jônatas foi Meribe-Baal; Meribe-Baal foi pai de
e por conta eram tirados. 29Outros estavam encar Mica. 41Os filhos de Mica: Pitom, Meleque, Tareá
regados dos móveis e de todos os utensílios do e Acaz. 42Acaz foi pai de Jará; Jará foi pai de
santuário, como também da flor de farinha, do vinho, Alemete, Azmavete e Zinri; Zinri foi pai de Moza;
do azeite, do incenso e das especiarias. 30Os que J1Moza foi pai de Bineá, de quem foi filho Refaías,
confeccionavam as especiarias eram dos filhos dos de quem foi filho Eleasá, de quem foi filho Azei.
sacerdotes. 31Matitias, um dos levitas, o primogê 44Azei teve seis filhos, cujos nomes são: Azricão,
nito de Salum, o coraíta, estava encarregado de Bocru, Ismael, Searias, Obadias e Hanã; estes
tudo o que se cozia em sertãs. 32E de seus irmãos, foram os filhos de Azei.
dentre os filhos dos coatitas, alguns tinham o cargo
dos pães da proposição, para os prepararem de Este relato é essencialmente o mesmo
sábado em sábado. que em 8.29-38. Contudo, há diferenças que
345
dificilmente se explicariam como erros de 1. A Tragédia de Saul (10.1-14)
copista. Ner é encontrado entre os filhos 'Ora, os filisteus pelejaram contra Israel; e os
de Jeiel (v. 36), e vários nomes são grafados homens de Israel, fugindo de diante dos filisteus,
diferentemente. Se a lista no capítulo 8 é caíram mortos no monte Gilboa. 2Os filisteus
perseguiram a Saul e seus filhos, e mataram Jônatas,
uma cópia disto, o escriba também, inten Abinadabe e Malquisua, filhos de Saul. 3A peleja
cionalmente, fez algumas mudanças, com se agravou contra Saul, os flecheiros o alcançaram,
base em suas próprias informações. Se esta e ele foi ferido pelos flecheiros. 4Então disse Saul
lista for a introdução do cronista à história ao seu escudeiro: Arranca a tua espada, e atra
vessa-me com ela, para que não venham estes in-
de Saul, por que não encerra com os filhos circuncisos e escarneçam de mim. Mas o seu escu
dele (v. 39)? Em vez disso, ela continua por deiro não quis, porque temia muito; então tomou
muito mais gerações, possivelmente, até o Saul a sua espada, e se lançou sobre ela. 5Vendo,
exílio babilónico. Devemos ter em mente pois, o seu escudeiro que Saul já era morto, lançou-
que o cronista não está escrevendo para o -se também sobre sua espada, e morreu. 6Assim
morreram Saul e seus três filhos; morreu toda a
nosso século. Na genealogia de Saul, ele sua casa juntamente. 7Quando todos os homens
inclui tudo quanto sabe sobre sua família. de Israel que estavam no vale viram que Israel havia
Seus descendentes precisavam destes fatos fugido, e que Saul e seus filhos eram mortos, aban
para os seus próprios registros. Ele não vai donaram as suas cidades e fugiram; e vindo os
filisteus, habitaram nelas. 8No dia seguinte, quando
simplesmente para Saul, como o faríamos. os filisteus vieram para despojar os mortos, acharam
Sendo que não retornará a ele após chegar Saul e seus filhos estirados no monte Gilboa.
até Davi, põe-no em perspectiva histórica. 9Então o despojaram, tomaram a sua cabeça e as
suas armas, e enviaram mensageiros pela terra dos
filisteus em redor, para levarem a boa-nova a seus
II. Contribuições de Davi Para a ídolos e ao povo. '"Puseram as armas dele na casa
de seus deuses, e pregaram-lhe a cabeça na casa
Adoração (10.1—29.30) de Dagom. "Quando, pois, toda a Jabes-Gileade
ouviu tudo quanto os filisteus haviam feito a Saul,
É significativo que o cronista comece 12todos os homens valentes se levantaram e,
sua verdadeira história com a morte de Saul, tomando o corpo de Saul e os corpos de seus filhos,
pois isto revela que não estava preocupado trouxeram-nos a Jabes; e sepultaram os seus ossos
debaixo do terebinto em Jabes, e jejuaram sete dias.
com reinterpretar a história de Israel antes 13Assim morreu Saul por causa da sua infidelidade
do tempo de Davi. Isso, provavelmente, para com o Senhor, porque não havia guardado
deveu-se ao fato de que o ponto de vista a palavra do Senhor; e também porque buscou a
dos líderes cultuais exílicos e pós-exílicos adivinhadora para a consultar, 14e não buscou ao
Senhor; pelo que ele o matou, e transferiu o reino
já fora expresso nas tradições sacerdotais a Davi, filho de Jessé.
do Pbntateuco, Josué e Juizes. Havia ainda
necessidade de uma interpretação seme Este início não é abrupto, a menos que
lhante do reino hebraico. A fonte sacerdotal seja visto à parte das genealogias que
havia tratado das contribuições cultuais de tiveram lugar antes. Se a obra do cronista
Moisés. O cronista suplementaria essa obra original é encontrada somente em
com um tratamento da influência de Davi lCrônicas 10.1—2Crônicas 36 (cf. Elmslie,
sobre o culto israelita. Isso forneceria uma IB; Freedman, p. 436-442), este início apre
perspectiva extremamente necessária, que senta um sério problema. Pbde ser que um
não fora propiciada pelos historiadores princípio originai tenha sido substituído
deuteronômicos. A preocupação principal pelas atuais genealogias. Contudo, não
deles era com os reis e profetas. Conquanto contamos com tal evidência. É mais lógico
tivesse o cronista outros interesses, o prin tomar a posição de que o cronista prefixou
cipal deles girava em torno do papel dos genealogias à sua história como introdução
sacerdotes e outros líderes religiosos nesse a ela, embora posteriormente acréscimos
mesmo período. Não era seu propósito subs possam ter sido feitos em algumas listas de
tituir os livros de Samuel e Reis, mas tempos em tempos. O cronista não estava
complementá-los. interessado em retratar a vida de Saul. Ele
346
é apresentado somente como um pano de carne. zJá dantes, quando Saul ainda era rei, eras
fundo para a chegada de Davi. Para o tu o que fazias Israel sair e entrar; também o Senhor
cronista, é a sombra de Davi que cobre toda teu Deus te disse: Tu apascentarás o meu povo Israel;
tu serás príncipe sobre o meu povo Israel. 3Assim
a história posterior de Israel. Sua grandiosa vieram todos os anciãos de Israel ao rei; a Hebrom;
obra foi contrastada com o deplorável e Davi fez com eles um pacto em Hebrom, perante
fracasso de Saul. o Senhor; e ungiram a Davi rei sobre Israel,
Morreu toda a sua casa juntamente. conforme a palavra do Senhor por intermédio de
Samuel. 4Então Davi, com todo o Israel, partiu
ISamuel 31.6 declara que “morreram junta para Jerusalém, que é Jebus; e estavam ali os jebu-
mente naquele dialSaul, seus três filhos, o seus, habitantes da terra. 5Disseram os habitantes
seu escudeiro, e todos os seus homens”. O de Jebus a Davi: Ui não entrarás aqui. Não obstante
relato do cronista parece sugerir que todos issoi, Davi tomou a fortaleza de Sião, que é a cidade
os descendentes de Saul pereceram. Mais de Davi. 6Davi disse: Qualquer que primeiro ferir
adiante ele não menciona quaisquer outros os jebuseus será chefe e capitão. E Joabe, filho de
Zeruia, subiu primeiro, pelo que foi feito chefe.
filhos de Saul conforme encontrados no 7Então Davi habitou na fortaleza, e por isso foi
livro de Samuel. Estará tentando dar a chamada cidade de Davi. 8E edificou a cidade ao
impressão de que Davi não teve dificuldades redor, desde Milo em diante; e Joabe reparou o
em assumir o trono? Isso poderia ser resto da cidade. 9Davi tornava-se cada vez mais
forte; porque o Senhor dos exércitos era com ele.
alegado somente se as genealogias não
forem do cronista. Outros descendentes de
Saul são enumerados aqui (9.39,40). Toda Ambos os parágrafos desta seção
a sua casa significa todos os seus parentes terminam com a indicação de que a glória
que estavam na batalha com ele e seu escu de Davi devia-se ao favor de Deus para com
deiro pessoal. Alguns de seus guarda-costas ele. Tornou-se rei segundo a palavra do
eram-lhe, possivelmente, aparentados. Senhor por Samuel e partiu então para
Porque não havia guardado a palavra do outras vitórias, porque a presença de Deus
Senhor. Contudo, é dito que Saul buscou estava com ele.
tal direção (ISm 28.6). Está o cronista sendo Os versos 1-3 fazem paralelo com
injusto para com ele? Provavelmente, está 2Samuel 5.1-3; e os 4-9 com 2Samuel 5.6-10.
dizendo que Saul devia ter continuado a Conquanto a maior parte do material tenha
buscar uma palavra de Deus, em vez de exata correspondência, as diferenças são
recorrer a uma adivinhadora. Deus poderia significativas. Onde 2Samuel 5.1 diz “todas
estar testando-o. Maiores buscas poderiam as tribos de Israel”, lCrônicas usa todo o
ter produzido melhores resultados. Israel. A fonte anterior está fazendo refe
Pelo que ele (o Senhor) o matou. Lite rência às tribos setentrionais que vieram
ralmente, “o Senhor causou que morresse”. a Hebrom para unir sua aliança à de Judá,
Deus não o golpeou mortalmente, antes onde Davi já estivera reinando. O cronista
empregou as circunstâncias da batalha nunca menciona o reinado anterior de Davi
como meio de exercer sua ira. Foi o próprio em Hebrom, a menos que o esteja suben
Saul que se matou. Se Deus o tivesse tendendo ao declarar que Davi já era rei
matado, então sua morte não teria sido quando todo o Israel ali compareceu (v. 3).
suicídio. Saul foi o responsável pelo que fez. Ele retrata todas as doze tribos reunindo-se
Seu último ato foi a decisão derradeira de em Hebrom, o que, provavelmente, fizeram,
uma vida em conflito com o seu Autor. mas não fala de divisão alguma entre Judá
e Israel do Norte. Ansioso por realçar a
2. A Ascensão de Davi ao Poder unidade da nação de Israel, ele não viu
(11.1—12.40) necessidade em apontar suas divisões.
Na história da conquista de Jerusalém,
1) Deus Dirige Sua Carreira (11.1-9) a fonte de Samuel diz que “o rei com os
‘Então todo o Israel se ajuntou a Davi em seus homens” foram contra ela. O cronista
Hebrom, dizendo: Eis que somos teus ossos e tua afirma “Davi com todo o Israel”. Ele desejou
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tornar claro que Jerusalém não era pos -Damim, quando os filisteus ali se ajuntaram à
se privada de Davi, mas propriedade da peleja, onde havia um pedaço de campo cheio de
nação inteira. Era chamada “a cidade de cevada; e o povo fugia de diante dos filisteus.
uMas eles se puseram no meio daquele campo, e
Davi” não porque fosse dele, mas por tê-la o defenderam, e mataram os filisteus; e o Senhor
tornado sua capital. os salvou com uma grande vitória.
Somente o cronista menciona o modo
como Joabe tomou-se comandante de Davi.
2Samuel 2.13 declara que ele já era um líder, Somente dois dos três homens são
mas talvez sem título oficial. Somente o mencionados aqui, provavelmente como
cronista menciona o lugar que Joabe resultado de corrupção textual. De 2Sa-
ocupou na reconstrução de Jerusalém. Na muel 23.11 aprendemos que o terceiro
verdade, nunca menciona nada negativo nome é Samá.
sobre Joabe, nem mesmo a última maldição
de Davi sobre ele (lRs 2.5 e ss.). Em
Crônicas é sempre o fiel servo de Davi. Esta b. Água do Poço (11.15-19)
não é uma avaliação inexata, contudo. l5Três dos trinta chefes desceram à penha; a
Embora Joabe haja enfurecido Davi, o que ter com Davi, na caverna de Adulão; e o exército
ele fez partiu de sua fidelidade a ele, e não dos filisteus estava acampado no vale de Refaim.
“ Davi estava então no lugar forte, e a guarnição
de ambição pessoal somente. dos filisteus estava em Belém. 17E Davi, ofegante,
2) Os Heróis de Davi (11.10-47) exclamou: Quem me dera beber da água do poço
de Belém, que está junto à porta! 18Então aqueles
Não só obteve Davi o favor de Deus; ele três romperam pelo arraial dos filisteus, tiraram
era amado e respeitado por um fiel grupo água do poço de Belém que estava junto à porta,
e a trouxeram a Davi; porém Davi não a quis
de correligionários. Estes relatos são seme beber, mas a derram ou perante o Senhor,
lhantes aos encontrados em Samuel, com 19dizendo: Não permita meu Deus que eu faça
uma omissão ocasional e algumas adições. isso! Beberia eu o sangue da vida destes homens?
A principal diferença, contudo, é que Pois com perigo das suas vidas a trouxeram.
aparecem em Samuel num apêndice pelo Assim, não a quis beber. Isso fizeram aqueles três
valentes.
fim da vida de Davi (2Sm 23), enquanto
aqui são dados no início de seu reinado.
Obviamente, alguns dos nomes podem
pertencer aos anos bem-sucedidos de seu Esta história dá a razão por que Davi
reinado. Não há, porém, modo de resolver era tão querido por seus homens. Não só
essa questão. O cronista com isso assegura era ele uma pessoa extraordinária, dotada
que a lealdade dos homens de Davi foi fator de carisma, mas interessava-se sincera
significativo em sua ascensão à fama. O mente por seus seguidores. Quando os
historiador não tinha meios de dizer que relatos deste evento em Samuel e Crônicas
seguidores foram os primeiros e quais são comparados, são mais proximamente
vieram depois. Assim, insere a lista onde idênticos do que qualquer outro que haja
ela dará testemunho de seu propósito. sido examinado até aqui em Crônicas.
A única variação significativa é a excla
a. Os Três Homens Poderosos (11.10-14) mação de Davi, não permita Deus, en
quanto Samuel relata que ele se dirigiu a
I0São estes os chefes dos valentes de Davi, que
o apoiaram fortemente no seu reino, com todo o Deus como “ó Senhor” (2Sm 23.17). Esta
Israel, para o fazerem rei, conforme a palavra do é uma indicação do cronista da relação de
Senhor, no tocante a Israel. uEsta é a relação dos Davi com seu Deus (cf.11.2). Os relatos são
valentes de Davi: Jesobeão, filho dum hacmonita, idênticos porque o evento original foi inde
o chefe dos trinta, o qual, brandindo a sua lança
contra trezentos, duma só vez os matou. 12Depois
levelmente registrado na memória de Israel.
dele, Eleazar, filho de Dodó, o aoíta; ele estava entre Quase todos podiam contar esta história
os três valentes. °Este esteve com Davi em Pas- palavra por palavra.
348
c. Os Homens Poderosos de Davi (11. História. Ele deve ter utilizado uma lista
20-47) preparada na área da Transjordânia.
20Abisai, irmão de Joabe, era o chefe dos três; O nome mais destacado que está
o qual, brandindo a sua lança contra trezentos, os faltando na lista do cronista é o de Eliã,
matou, e teve nome entre os três. 21Ele foi mais filho de Aítofel (2Sm 23.34), pai de Bate-
ilustre do que os outros dois, pelo que foi feito -Seba. Uma vez que ele decidiu não men
chefe deles; todavia, não igualou aos primeiros cionar o pecado de Davi com Bate-Seba,
três. 22Havia também Benaías, filho de Jeoiada,
filho de um homem valente de Cabzeel, autor de pode ser que não desejasse Eliã e Urias,
grandes feitos; este matou dois filhos de Ariel de o heteu, em companhia próxima. Con
Moabe; depois desceu e matou um leão dentro tudo, a omissão pode dever-se simples
duma cova, no tempo da neve. “ Matou também mente a um problema textual.
um egípcio, homem de grande altura, de cinco
côvados. O egípcio tinha na mão uma lança como Matou dois filhos de Ariel, de Moabe.
o órgão de tecelão; mas Benaías desceu contra ele Um ariel é uma fornalha de altar. Talvez
com um cajado, arrancou-lhe da mão a lança e Benaías tenha destruído os altares sagra
com ela o matou. 24Estas coisas fez Benaías, filho dos dos moabitas. Contudo, o verbo “ferir”
de Jeoiada, pelo que teve nome entre os três
valentes. 25Dos trinta foi ele o mais ilustre,
no inglês (“matar” em nossa versão) se
contudo, não igualou os primeiros três; e Davi o aplica a seres animados. Portanto, muitos
pôs sobre os da sua guarda. 26Os valentes dos estudiosos traduzem a expressão hebraica
exércitos: Asael, irmão de Joabe; El-Hanã, filho como “dois heróis” (homens semelhantes
de Dodó, de Belém; 27Samote, o harorita; Helez, ao leão), visto que no hebraico a palavra
o pelonita; “ Ira, filho de Iques, o tecoíta; Abiezar,
o anatotita; 29Sibecai, o husatita; Ilai, o aoíta; para leão (v. 22b) é semelhante a Ariel.
30Maarai, o netofatita; Helede, filho de Baaná, Davi o pôs sobre os da sua guarda.
o netofatita; 31Itai, filho de Ribai, de Gibeá, A palavra “guarda” é literalmente “obedi
dos filhos de Benjamim; Benaías, o piratonita; ência”. Estes eram os seus obedientes,
32Hurai, dos ribeiros de Gaás; Abiel, o arbatita; aqueles que levariam a cabo qualquer
33Azmavete, o baarumita; Eliabá, o saalbonita;
14dos filhos de Hasém, o gizonita: Jônatas, filho ordem que ele desse. Não só o protegeriam,
de Sage, o hararita; 35Alão, filho de Sacar, o mas também o serviriam. É tal obediência
hararita; Elifal, filho de Ur; “ Hefer, o mequera- que Deus requer daqueles que são seus
tita; Aias, o pelonita; 37Hezro, o carmelita; íntimos. A maioria dos homens está mais
Naarai, filho de Ezbai; 38Joel, irmão de Natã;
M ibar, filho de Hagri; 39ZeIeque, o amonita; ansiosa em defender o seu Deus do que em
Narai, o berotita, escudeiro de Joabe, filho de cumprir a sua vontade.
Zeruia; ““Ira, o itrita; Garebe, o itrita; 41Urias, o
heteu; Zabade, filho de Alai; 42 Adina, filho de 3) Seus Primeiros Seguidores (12.1-22)
Siza, o rubenita, chefe dos rubenitas, e com ele
trinta; 43Hanã, filho de Maacá; Jeosafá, o mit- Não há paralelo para esta seção no
nita; ^Uzias, o asteratita; Sama e Jeiel, filhos de Antigo Testamento. O cronista teve acesso
Hotão, o aroerita; 45Jediael, filho de Sínri, e Joá, a velhos registros, que foram o pano de
seu irmão, o tizita; 46Eliel, o maavita, Jeribai e
Josavias, filhos de Elnaão; Itma, o moabita; fundo da passagem. Contudo, em sua
47Eliel, Obede e Jaasiel, o mezobaíta. presente forma este material e o restante
do capítulo apresentam sérios problemas.
Esta lista é essencialmente a mesma É dito que Benjamim enviou uma dele
que a de 2Samuel 23, que termina com gação considerável a Davi, em Ziclague.
Urias, o heteu. Em Crônicas os nomes que Contudo, 2Samuel 2.9,15,25 indicam que
se seguem ao de Urias (v. 41-47) são as Benjamim seguia constantemente Saul e
adições do cronista à companhia. Quase Isbosete, seu filho. Os proscritos seguidores
todos esses nomes estão ligados à Trans- de Davi durante suas andanças pelo de
jordânia. Talvez pertencessem à parte final serto são citados como sendo tão nume
do reinado de Davi, quando ele fugiu para rosos como “o exército de Deus” (v. 22),
aquela área. O cronista, na verdade, é o comparados com os 400 ou 600 de lSa-
único escritor bíblico a registrá-los na muel 22.2, 27.2. A reunião em Hebrom é
349
de quase 400 mil israelitas, enquanto Saul! Esses homens poderosos de Ben
2Samuel 5.3 simplesmente declara que jamim são mencionados como destros em
“todos os anciãos de Israel vieram”. Tais fundas e flechas, tanto com a mão direita
declarações levam Curtis e Madsen (p. quanto com a esquerda. Em tempos ante
194) a dizer: “Nosso capítulo, pois, não riores (Jz 20.16), foram destacados por sua
tem nenhum valor histórico real.” Seguin extraordinária precisão como atiradores
do a mesma acepção, Elmslie (p. 389) canhotos. Evidentemente, os anos suces
acentua: “Sobrepõe o incrível ao não histó sivos tinham-lhes concedido amplo espaço
rico.” de tempo para desenvolverem o uso da
Contudo, essas observações devem ser mão direita também. É digno de nota que
lidas com reservas. Embora a tribo de no processo de se tornarem mais conven
Benjamim realmente apoiasse Saul, alguns cionais nessas aptidões, eles não perderam
de seus membros estavam, certamente, sua eficiência anterior.
desapontados com ele. O cronista enumera Valente entre os trinta. Ismaías não é
somente um pequeno grupo deles (v. 23). mencionado na lista de trinta em 2Samuel
Mesmo que a expressão grande exército, 23 ou em lCrônicas 11. Esses “trinta”
como o exército de Deus seja hiperbólica, podem ser um grupo de famosos benjami
não torna o restante da passagem não- tas ou talvez Saul tivesse os seus “trinta”.
-histórica. Os termos cem (meah) e mil Alguns consideram isto como figurativo:
(’elep), no versículo 14, parecem aplicar-se Ismaías é comparado com os trinta heróis
a unidades militares, que podiam não ter de Davi, mesmo sendo-lhes superior, con
sempre seu quadro completo de homens, quanto nunca integrando a lista oficial.
como Mendenhall (p. 52-66) tem demons Não há quase nenhuma dúvida de que isso
trado. Mesmo que os números elevados fosse verdade quanto a muitos dos guer
fossem realmente intencionados pelo reiros do tempo de Davi. O valor genuíno
cronista, há pouca razão para se duvidar nem sempre é publicamente reconhecido.
de outros indicados no capítulo. O mate Alguns dos maiores sermões jamais serão
rial básico (v. 2,8,15,17-19) mostra evidên publicados entre os melhores do ano.
cia de autêntica tradição popular. O poema
b. Os Extraordinários Gaditas (12.8-15)
no versículo 18 traz o sabor da poesia isra
elita mais antiga. 8Dos gaditas se passaram para Davi, ao lugar
forte no deserto, homens valentes adestrados para
a. Homens de Benjamim (12.1-7) a guerra, que sabiam manejar escudo e lança; seus
rostos eram como rostos de leões, e eles eram tão
‘O ra, estes são os que vieram a Davi a ligeiros como corças sobre os montes. 9Ezer era
Ziclague, estando ele ainda tolhido nos seus movi o chefe, Obadias o segundo, Eliabe o terceiro,
mentos por causa de Saul, filho de Quis; e eram 10Mismana o quarto, Jeremias o quinto, uAtai o
dos valentes que o ajudaram na guerra. 2Eram sexto, Eliel o sétimo, 12Joanã o oitavo, Elzabade
archeiros, e usavam tanto da mão direita como da o nono, 13Jeremias o décimo, Macbanai o undé
esquerda em atirar pedras com fundas e em dis cima 14Estes, dos filhos de Gade, foram os chefes
parar flechas com o arco; eram dos irmãos de do exército; o menor valia por cem, e o maior
Saul, benjamitas. ’Aíezer, o chefe, e Joás, filhos por mil. 15Estes são os que passaram o Jordão no
de Samaâ, o gibeatita; Jeziel e Pelete, filhos de mês primeiro, quando ele transbordava por todas
Azmavete; Beraca, e Jeú, o anatotita; 4Ismaías, o as suas ribanceiras, e puseram em fuga todos os
gibeonita, valente entre os trinta, e chefe deles'; dos vales ao oriente e ao ocidente.
Jeremias, Jaaziel, Joanã e Jozabade, o gedera-
tita; 5Eluzai, Jerimote, Bealias, Semanas e Sefà-
tias, o harufita; 6Elcana, Issis, Azarei, Joezer e Os gaditas devem ter ido a Davi quando
Jasobeão, os coraítas; 7e Joela, Zebadias, filhos ele se encontrava nas colinas ao redor de
de Jeroão de Gedor. En-Gedi (ISm 24.1). Eram especialistas em
Os homens de Benjamim estão alista combate corpo a corpo (escudo e lança),
dos primeiro, devido à honraria especial ferozes como leões e rápidos como a corça.
que trouxeram a Davi por derrotarem Adicionalmente, eram extraordinários
350
nadadores, cruzando o Jordão durante d. O Contingente de Manassés (12.19-22)
cheias na primavera, quando as neves
19Tàmbém de Manassés alguns se passaram
distantes estavam se derretendo. Quando para Davi; foi quando ele veio com os filisteus para
os seguidores de Saul tentaram deter sua a batalha contra Saul; todavia, não os ajudou, pois
defecção, eles derrotaram os realistas em os chefes filisteus, tendo feito conselho, o despe
ambas as margens do Jordão! A cena é diram, dizendo: Com perigo de nossas cabeças ele
se passará para Saul, seu senhor. “ Voltando ele,
bem vívida. Eles forçaram seu caminho pois, a Ziclague, passaram-se para ele, de Manas
para o Jordão, atravessaram a nado suas sés: Adná, Jozabade, Jediael, Miacael, Jozabade,
águas agitadas e chegaram até Davi à base Eliú e Ziletai, chefes de milhares dos de Manas
de luta. sés. 21E estes ajudaram a Davi contra a tropa de
saqueadores, pois todos eles eram heróis valentes,
e foram chefes no exército. 22De dia em dia con
c. O Profeta Guerreiro (12.16-18) corriam a Davi para o ajudar, até que se fez um
grande exército, como o exército de Deus.
16Igualmente alguns dos filhos de Benjamim e
de Judá vieram a Davi, ao lugar forte. 17Davi
saiu-lhes ao encontro e lhes disse: Se viestes a mim De dia em dia concorriam a Davi para
pacificamente para me ajudar, o meu coração se o ajudar. Isto explica mais realisticamen
unirá convosco; porém se é para me entregar aos
meus inimigos, sem que haja mal nas minhas
te do que qualquer coisa nas fontes de
mãos, o Deus de nossos pais o veja e o repreen Samuel por que Saul perdeu a batalha
da. 18Então veio o Espirito sobre Amasai, chefe contra os filisteus. Muitos de seus melho
dos trinta, que disse: Nós somos teus, ó Davi, e res soldados tinham aderido a Davi. As
contigo estamos, ó filho de Jessé! Paz, paz con forças do filho de Jessé continham mais
tigo, e paz com quem te ajuda! pois que teu Deus
te ajuda. E Davi os recebeu, e os fez chefes de do que um conjunto de renegados.
tropas. Um grande exército, como o exército de
Deus. A palavra exército é literalmente
“um acampamento”. É a palavra usada em
Esta passagem contém um poema Gênesis 32.2 quando Jacó viu os anjos de
rítmico que dá evidência de pertencer à Deus. Ele chamou o lugar de Maanaim,
antiguidade. Mesmo mais impressionante “dois acampamentos”. Quais são os dois?
é a declaração de que veio o Espírito sobre Seus próprios e de Deus? Este parece ser
Amasai (lit., “revestiu-se com Amasai”, o melhor significado da palavra. O que isso
assim como um homem se veste com uma tem a ver com o tamanho do exército?
roupa). Esta expressão é também empre O grupo de Jacó não era excessivamente
gada em Juizes 6.34 e 2Crônicas 24.20. grande. Um “grande exército” muito natu
Em Juizes é descrito como o Espírito capa ralmente seria uma multidão, mas o termo
citou Gideão para lutar vitoriosamente. poderia estar descrevendo um exército
Em 2Crônicas fala da capacitação de poderoso. A expressão poderia estar signi
Zacarias, o sacerdote, para falar profetica ficando um exército invencível, e não,
mente. Aqui, um evento mais impressio necessariamente, uma força composta de
nante do que nunca é mencionado. O enormes contingentes. De fato, o número
homem de guerra profere uma palavra de homens mencionados pelo cronista em
profética, sendo dominado pelo Espírito 12.1-21 não indica uma tremenda multi
divino, que usa a sua boca para declarar dão. Pode-se bem entender o exército de
o favor de Deus para com Davi. Este Davi como grande em seu potencial de
conceito vívido “pode ser uma antecipa batalha, e não em tamanho.
ção da idéia da encarnação” (Myers, p. 97).
Quem é o Amassai mencionado aqui? 4) Constituído Rei de Todo o Israel (12.
Alguns dizem que é Abisai, chefe dos 23-40)
trinta (11.20). Outros o têm por Amasa 23Ora, estes são os números dos chefes arma
(2Sm 17.25; 19.13; 20.10). dos para a peleja, que vieram a Davi em Hebrom,
351
para transferir a eie o reino de Saul, conforme a reiros, especialmente Zadoque, com os
palavra do Senhor: 24dos filhos de Judá, que seus 22 comandantes que representavam
traziam escudo e lança, seis mil e oitocentos,
armados para a peleja; 25dos filhos de Simeão,
os sacerdotes (cf. 24.7 e ss.). A proeza
homens valentes para pelejar, sete mil e cem; deles, provavelmente, não era militar, mas
26dos filhos de Levi quatro mil e seiscentos. religiosa (cf. 9.13). São mencionados de
27Jeoiada, que era o chefe da casa de Arão, e com acordo com o propósito do cronista, pois
ele três mil e setecentos; 28e Zadoque, ainda ele considerava o papel deles tão impor
jovem, homem valente, com vinte e dois príncipes
da casa de seu pai; 29dos filhos de Benjamim, tante quanto o militar no estabelecimento
irmãos de Saul, três mil, porque até então a maior do reino.
parte deles se tinha conservado fiel à casa de Com inteireza de coração. Literalmen
Saul; Mdos filhos de Efraim vinte mil e oitocentos te, “sem coração e coração”, sem duas
homens valentes, homens de nome nas casas de
seus pais; 31da meia tribo de Manassés dezoito vontades; ou seja, não com uma dispo
mil, que foram designados por nome para virem sição para servir ao seu rei e outra para
fazer Davi rei; 32dos filhos de Issacar, duzentos servirem-se a si próprios, mas com ânimo
de seus chefes, entendidos na ciência dos tempos não dividido para servir.
para saberem o que Israel devia fazer, e todos os
seus irmãos sob suas ordens; 33de Zebulom, dos 2. A Transladação da Arca (13.1—16.43)
que podiam sair no exército, cinqüenta mil, orde
nados para a peleja com todas as armas de guerra, 1) O Primeiro Esforço Malogrado (13.
como também destros para ordenarem a batalha, 1-14)
e não eram de coração dobre; 34de Naftali, mil
chefes, e com eles trinta e sete mil com escudo e ‘Ora, Davi consultou os chefes dos milhares,
lança; 35dos danitas, vinte e oito mil e seiscentos, e das centenas, a saber, todos os oficiais. 2E disse
destros para ordenarem a batalha; “ de Aser, dos Davi a toda a congregação de Israel: Se bem vos
que podiam sair no exército e ordenar a batalha, parece, e se isto vem do Senhor nosso Deus,
quarenta mil; 37da outra banda do Jordão, dos enviemos mensageiros por toda parte aos nossos
rubenitas e gaditas, e da meia tribo de Manassés, outros irmãos que estão em toda a terra de Israel,
com toda sorte de instrumentos de guerra para e com eles aos sacerdotes e levitas nas cidades e
pelejar, cento e vinte mil. 38Todos estes homens de nos seus campos, para que se reúnam conosco, 3e
guerra, que sabiam ordenar a batalha, vieram a tornemos a trazer para nós a arca do nosso Deus;
Hebrom com inteireza de coração, para constituir porque não a buscamos nos dias de Saul. 4E toda
Davi rei sobre todo o Israel; e também todo o resto a congregação concordou em que assim se fizesse;
de Israel estava de um só coração para constituir porque isso pareceu reto aos olhos de todo o pova
Davi rei. 39E estiveram ali com Davi três dias, 5Convocou, pois, Davi todo o Israel desde Sior, o
comendo e bebendo, pois seus irmãos lhes tinham ribeiro do Egito, até a entrada de Hamate,
preparado as provisões. ““Também da vizinhança, para trazer de Quiriate-Jearim a arca de Deus.
e mesmo desde Issacar, Zebulom e Naftali, trou 6E Davi, com todo o Israel, subiu a Baalá, isto é,
xeram sobre jumentos, e camelos, e mulas e bois, a Quiriate-Jearim, que está em Judá, para fazer
pão, provisões de farinha, pastas de figos e cachos subir dali a arca de Deus, a qual se chama pelo
de passas, vinho e azeite, bois e gado miúdo em pome do Senhor, que habita entre os querubins.
abundância; porque havia alegria em Israel. 7Levaram a arca de Deus sobre um carro novo,
tirando-a da casa de Abinadabe; e Uzá e Ai'ô
guiavam o carro. 8Davi e Israel alegravam-se
Uma das facetas mais interessantes perante Deus com todas as suas forças, cantando
e tocando harpas, alaúdes, tamboris, cimbalos e
deste relato é o pequeno número de homens trombetas. 9Quando chegaram á eira de Quidom,
de Judá comparado com os de Israel do Uzá estendeu a mão para segurar a arca, porque
Norte. Isto pode ser a maneira de o cro os bois tropeçavam. 10Então se acendeu a ira do
nista declarar que as tribos do Norte Senhor contra Uzá, e o Senhor o feriu por ter
estendido a mão à arca; e ele morreu ali perante
estavam mais identificadas com Davi do Deus. UE Davi se encheu de desgosto porque o
que geralmente se pensava. Por outro lado, Senhor havia irrompido contra Uzá; pelo que
guerreiros de Judá podem já ter estado chamou aquele lugar Pérez-Uzá, como se chama
com Davi em Hebrom antes das novas até o dia de hoje. 12Temeu Davi a Deus naquele
adesões mencionadas pelo cronista. dia, e disse: Como trarei a mim a arca de Deus?
13Pelo que não trouxe a arca a si para a cidade de
Também digna de nota é a inclusão Davi, porém a fez retirar para a casa de Obede-
dos sacerdotes juntamente com os guer -Edom, o giteu.14Assim ficou a arca de Deus com
352
a família de Obede-Edom, três meses em sua casa; para edificarem uma casa. 2Então percebeu Davi
e o Senhor abençoou a casa de Obede-Edom, e que o Senhor o tinha confirmado rei sobre Israel;
tudo o que lhe pertencia. porque o seu reino tinha sido muito exaltado por
amor do seu povo Israel. 5Davi tomou, em Jeru
A passagem de Samuel (2Sm 5.11-25) salém, ainda outras mulheres, e teve ainda filhos
relata como Davi primeiro edificou sua e filhas. 4Estes são, pois, os nomes dos filhos que
própria casa e então combateu os filisteus, lhe nasceram em Jerusalém: Samua, Sababe,
antes que seu trono estivesse seguro/ O Natã, Salomão, 5Ibar, Elisua, Elpelete, 6Nogá,
cronista posterga esta parte da história, Nefegue, Jafia, 7Elisama, Beeliada e Elifelete.
sQuando os filisteus ouviram que Davi havia sido
porque está ansioso para exaltar a glória ungido rei sobre todo o Israel, subiram todos em
de Davi e falar de seu plano de transportar busca dele; o que ouvindo Davi, logo saiu contra
a arca para Jerusalém. O tema religioso é eles 9Ora, os filisteus tinham vindo e feito uma
sua principal preocupação. arremetida pelo vale de Refaim. 10Então Davi
consultou a Deus, dizendo: Subirei contra os filis
Os versos 1-4 têm paralelo em Samuel. teus, e nas minhas mãos os entregarás? E o
Aqui tomamos conhecimento de que Davi Senhor lhe disse: Sobe, porque os entregarei nas
tomou conselho com a grande assembléia tuas mãos. nE subiram os filisteus a Baal-Pe-
que haveria de coroá-lo em Hebrom antes razim, onde Davi os derrotou; e disse Davi:
de partirem de volta aos seus lares. Mesmo Por minha mão Deus fez uma brecha nos meus
inimigos, como uma brecha feita pelas águas.
durante a semana de sua coroação, ele Pelo que chamaram aquele lugar Baal-Perazim.
estava preocupado com a arca. 12E deixaram ali os seus deuses, que por ordem
Se bem vos parece, e se isto vem do (...) de Davi, foram queimados a fogo. 13Mas os filis
nosso Deus. O que quer que Davi dese teus tornaram a fazer uma arremetida pelo vale.
14Tornou Davi a consultar a Deus, que lhe res
jasse era o que o povo desejava (cf. 2Sm pondeu: Não subirás atrás deles; mas rodeia-os
3.36). Davi não teve dificuldade em conse por detrás e vem sobre eles por defronte dos balsa-
guir que o povo concordasse com os seus meiros; lse será que, ouvindo tu um ruído de
desejos. Ele estava ainda em sua lua-de- marcha pelas copas dos balsameiros, sairás à
peleja; porque Deus terá saído diante de ti para
mel política. Contudo, discernir a vontade ferir o exército dos filisteus. 16E fez Davi como
de Deus era questão bem diferente. Davi Deus lhe ordenara e desbarataram o exército dos
parece entender que se deseja esta ação e filisteus desde Gibeão até Gezer. 17Assim a fama
o povo concordar, a aprovação de Deus de Davi se espalhou por todas aquelas terras, e o
certamente o confirmará. Não há indi Senhor pôs o temor dele sobre todas aquelas gentes.
cação na passagem de que ele realmente
buscou a vontade de Deus. Este capítulo está intimamente relacio
Convocou, pois, Davi todo o Israel. nado com 2Samuel 5.11-25, mas na pas
A fonte de Samuel declara que Davi tor sagem anterior tais eventos são mencio
nou “a ajuntar todos os escolhidos de nados antes da primeira tentativa de
Israel, em número de trinta mil” (2Sm 6.1). transportar a arca. Aqui são colocados
Conquanto os totais do cronista sejam entre o primeiro e o segundo esforços.
mais altos, as declarações são semelhantes. De fato, poderia bem ter acontecido nessa
Foi um movimento de que participou uma seqüência, pois a frustração que causou
vasta multidão de pessoas de toda a terra. Davi empregar a expressão “Pérez-Uzá”
Tal procissão que seguia o novo rei era um (irromper contra Uzá, 13.11) foi suavizada
tributo significativo à sua liderança. quando Deus irrompeu sobre os inimigos
Quão desconcertante não foi a morte de Davi e os deuses deles (14.11,12), talvez
inesperada de Uzá! A grande procissão se encorajando-o a tentar novamente trans
deteve. ferir o símbolo da presença de Deus.
É claro o propósito do cronista, neste
2) Atendendo à Advertência Profética capítulo, de mostrar que Davi era o oposto
(14.1-17) de Saul. Ele regularmente inquiria Iavé e
'Hirão, rei de Tiro, mandou mensageiros a prestava atenção a quaisquer respostas que
Davi, e madeira de cedro, pedreiros e carpinteiros dele viessem. Os oráculos de Deus eram
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imprevisíveis e freqüentemente de signifi cional que divergia do empregado nas
cação contrastante. Davi iria à batalha ou fontes de Samuel.
a evitaria, conforme fossem as instruções
divinas. A recompensa para tal conscien 3) Os Levitas Trazem a Arca (15.1—16.3)
tização era êxito retumbante e crescente
fama. lCrônicas 14.17 é o sumário do a. Designações Levíticas (15.1-24)
cronista: Davi era reconhecido e respei 'Davi fez para si casas na cidade de Davi;
tado por todas as nações circundantes. também preparou um lugar para a arca de Deus,
e armou-lhes uma tenda. 2Então disse Davi:
Davi tomou (...) ainda outras mulheres. Ninguém deve levar a arca de Deus, senão os
Esta é uma das poucas vezes em que o levitas; porque o Senhor os elegeu para levarem
cronista menciona algo que poderia ter a arca de Deus, e para o servirem para sempre
reflexos sobre o caráter de Davi. Deve-se ’Convocou, pois, Davi todo o Israel a Jerusalém,
para fazer subir a arca do Senhor ao seu lugar,
notar que ele não suaviza o caráter desa que lhe tinha preparada 4E reuniu os filhos de
gradável desta questão omitindo a refe Ârão e os levitas: 5dos filhos de Coate, Uriel, o
rência às concubinas que 2Samuel 5.13 chefe, e de seus irmãos cento e vinte; 6dos filhos
inclui. Uma vez que o cronista não se de M erári, Asaías, o chefe, e de seus irmãos
duzentos e vinte; 7dos filhos de Gérson, Joel, o
refere ao pecado de Davi com Bate-Seba, chefe, e de seus irmãos cento e trinta; 8dos filhos
a inclusão deste material pode ser sua de Elisafã, Semaias, o chefe, e de seus irmãos
maneira de aludir ao tema de modo menos duzentos; 9dos filhos de Hebrom, Eliel, o chefe, e
ofensivo, em vista de que Salomão, o filho de seus irmãos oitenta; 10dos filhos de Uziel,
de ambos, está alistado. A advertência de Aminadabe, o chefe, e de seus irmãos cento e
doze. uEntão chamou Davi os sacerdotes Zado-
Deuteronômio 17.17 de que as práticas que e Abiatar, e os levitas Uriel, Asaías, Joel,
polígamas conduziriam a um desvio de Semaias, Eliel e Aminadabe, 12e disse-lhes:
Deus paira pesadamente sobre esta Vós sois os chefes das casas paternas entre os
passagem. levitas; santificai-vos, vós e vossos irmãos, para
que façais subir a arca do Senhor Deus de Israel
Por minha mão Deus fez uma brecha ao lugar que lhe preparei. 13Porquanto da primei
nos meus inimigos. 2Samuel 5.20 declara ra vez vós não a levastes, o Senhor fez uma brecha
que “o Senhor rompeu os meus inimigos em nós, porque não o buscamos segundo a orde
diante de mim”. À primeira vista parecerá nança. l4Santificaram-se, pois, os sacerdotes e os
levitas para fazerem subir a arca do Senhor Deus
que o historiador posterior declarou, arbi de Israel. 15E os levitas trouxeram a arca de Deus
trariamente, que Davi estava mais dire sobre os seus ombros, pelos varais que nela havia,
tamente envolvido na vitória, substituindo como Moisés tinha ordenado, conforme a palavra
por minha mão por “diante de mim”. do Senhor. 16E Davi ordenou aos chefes dos
levitas que designassem alguns dos seus irmãos
Contudo, é inclinação dele realçar a ativi como cantores, para tocarem com instrumentos
dade de Deus mais do que a do homem, musicais, com alaúdes, harpas e címbalos, e levan
mesmo quando falando de Davi. O intri tarem a voz com alegria. 17Designaram, pois, os
gante aparecimento de “Deus” (Elohim) levitas a Hemã, filho de Joel; e dos irmãos, a
em Crônicas, em vez de “Senhor” (Yah- Asafe, filho de Berequias; e dos filhos de Merári,
seus irmãos, a Etã, filho de Cusaías; 18e com eles
weh), como na passagem de Samuel, pode a seus irmãos da segunda ordem: Zacarias, Bene,
sugerir que fontes diferentes estão sendo Jaaziel, Semiramote, Jeiel, Uni, Eliabe, Benaías,
utilizadas pelos dois escritores da história. Maaséias, Matitias, Elifeleu e Micnéias, e Obede-
Este fenômeno continua na passagem -Edom e Jeiel, os porteiros. 19Assim os cantores
Hemã, Asafe e Etã se faziam ouvir com címbalos
seguinte. A presença de fontes diferentes de bronze; 20e Zacarias, Aziel, Semiramote, Jeiel,
é mesmo mais plausível, ao se notar que, Uni, Eliabe, Maaséias, e Benaías, com alaúdes
quando o cronista está narrando a história, adaptados ao soprano; 21e M atitias, Elifeleu,
ele emprega o título Elohim para Deus, Micnéias, Obede-Edom, Jeiel e Azazias, com
harpas adaptadas ao baixo, para dirigirem; 22e
mas quando faz sua própria observação Quenanias, chefe dos levitas, estava encarregado
emprega o termo Yahweh (v. 17). Ele está dos cânticos e os dirigia, porque era entendido;
claramente copiando de material tradi 23e Berequias e Elcana eram porteiros da arca;
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Sebanias, Josafá, Netanel, Amasai, Zacarias, de adoração agradável a Deus se origina
Benaías e Eliézer, os sacerdotes, tocavam as trom no amor e se expressa com sentimento.
betas perante a arca de Deus; e Obede-Edom e
Jeías eram porteiros da arca. Alaúdes, harpas e círtibalos. Esta é a
combinação costumeira no antigo culto
Esta seção é inteiramente contribuição hebraico, um contraste de instrumentos de
do cronista. Enquanto o livro de Samuel percussão e de cordas. Harpas e liras eram
atribui a renovada determinação de Davi semelhantes, mas a,s primeiras tendiam a
transportar a arca a notícias de que Deus ter mais cordas. A lira era o instrumento
havia abençoado a casa de Obede-Edom mais comum para a execução em solo e era
(2Sm 6.12), é-nos dito aqui que o rei conclui o instrumento tocado por Davi. Havia,
que o problema deveu-se ao fato de que ela normalmente, mais liras numa orquestra
não foi apropriadamente manuseada do que harpas.
segundo a lei mosaica (v. 2). Em vez de
utilizar um carro, os levitas deviam tê-la Adaptados ao soprano (Alamoth) (...)
transportado mediante varas sobre os adaptadas ao baixo (Sheminith). Alamoth
ombros (v. 13-15). A opinião dada aqui repre é o plural da palavra hebraica almah
senta, provavelmente, não só a atitude do (virgem; cf. Is 7.14). Visto que as mulheres
cronista para com a causa do problema, mas não cantavam nos corais levíticos, este é
era também o diagnóstico da dificuldade um termo difícil de se entender. Pode estar-
comum para o partido sacerdotal. se referindo às notas de soprano ou a um
tom elevado. Assim também Sheminith
A organização dos levitas descrita aqui significa “sob a oitava”, talvez uma oitava
pode estar sendo abordada em maior escala abaixo. Em outras palavras, as harpas
do que os simples arranjos da era davídica, podem ter destacado as notas mais agudas
mas há toda razão para se aceitar a tra e as liras as mais graves.
dição de que Davi instituiu tais corpo
Chefe dos levitas (...) encarregado dos
rações (cf. Myers, 1 ,111,112). A questão de
cânticos (na versão inglesa, “músico”). A
serem os músicos dos primeiros tempos
palavra traduzida por “músico” significa,
também levitas é outro problema que não
literalmente, encargo. Quando uma pessoa
pode ser definido de modo absoluto e final.
eleva sua voz, gritando ou cantando, está
Preparou um lugar para a arca de Deus. fazendo uso positivo de seu encargo.
Não só tinha Davi uma tenda pronta para Ainda hoje é comum dizer-se “sustentar
a arca, mas certo tipo de local abrigado um tom”. Segundo a percepção do hebreu,
definitivo. É significativo que quando um encargo podia ser simplesmente uma
Jesus disse que iria “preparar um lugar” pesada carga a ser levada ou uma oportu
para seus discípulos, empregou esta mes nidade de alguém expressar o seu louvor
ma expressão (cf. Jo 14.2, com a LXX a Deus. A ligação com cantores (15.27)
aqui). Assim como Davi preparou um favorece a tradução “músico” neste con
lugar para a habitação de Deus, Jesus texto. Aqueles que não reconhecem isto
prepara um lugar para os seus seguidores. consideram a expressão “os cantores”
(v. 27) uma glosa do escriba, devido a um
Com instrumentos musicais (...) levan mal-entendido posterior do texto.
tarem a voz com alegria. Uma igreja em É também digno de nota que Obede-
Cornwall, Inglaterra, tem inscrito sobre Edom e Jeías eram tanto músicos quan
sua plataforma do coro a observação: to porteiros (cf. o v. 21 com o v. 24). Al
“Amor, non clamor, ascendit in aures Dei” guns entendem isto como uma confusão
(“Amor, não barulho, ascende aos ouvidos de duas tradições ou a tentativa do cronis
de Deus”). Contudo, ambas as coisas não ta de atribuir posição levítica a Obede-
estão, necessariamente, em conflito. O tipo Edom, que havia abrigado a arca. Contu-
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do, nos primeiros dias do reinado era mui duas fontes, que não apresenta pontos de
to provável que os homens realizassem vista opostos, mas suplementares. Con
funções duplas. Conquanto não se exigisse quanto em Samuel Mical expresse os pen
dos cantores realizarem qualquer outra samentos que lhe perturbam a mente cons
tarefa (9.33), tinham a liberdade de apre- ciente, sua inconsciente irreverência para
sentar-se como voluntários. Sendo que com a arca também afetou sua atitude pa
tanto cantores quanto porteiros viviam no ra com a extática devoção de Davi a ela.
santuário, essa atividade dupla era bem Embora o cronista concorde com Sa
possível. muel, em que o sofar (chifre de carneiro)
b. A Procissão a Jerusalém (15.25—16.3) fora usado na procissão (cf. 15.28 com
2Sm 6.15), ele acrescenta a trombeta, um
2SSucedeu, pois, que Davi, os anciãos de Israel, instrumento reto de metal, geralmente de
e os capitães dos milhares foram, com alegria, pa cerca de 70 centímetros de comprimento,
ra fazer subir a arca do pacto do Senhor, da casa que era o favorito nas orquestras levíticas.
de Obede-Edom. 26E sucedeu que, havendo Deus
ajudado os levitas que levavam a arca do pacto do O sofar é mencionado com muito maior
Senhor, sacrificaram sete novilhos e sete carneiros. freqüência do que qualquer outro instru
27Davi ia vestido de um manto de linho fino, como mento na Bíblia. Contudo, é mencionado
também todos os levitas que levavam a arca, e os somente duas vezes em 2Crônicas 15.14.
cantores, e juntamente com eles Quenanias, di Isto poderia dever-se ao fato de que, em
retor do canto; Davi levava também sobre si um
éfode de linha 28Assim todo o Israel fez subir bora fosse empregado para sinalização de
a arca do pacto do Senhor com vozes de júbi qualquer sorte, sua função principal rela-
lo, ao som de buzinas, trombetas e cimbalos, cionava-se com a guerra (cf. Am 3.6). A
juntamente com alaúdes e harpas. 29E sucedeu relutância do cronista em empregá-lo em
que, chegando a arca do pacto do Senhor à cidade
de Davi, Mical, a filha de Saul, olhou duma janela
seu relato é, provavelmente, devida à sua
e, vendo Davi dançar e saltar, desprezou-o no seu atitude ambivalente para com os militares.
coraçãa Após a destruição do Templo, em 70 d.C.,
'Trouxeram, pois, a arca de Deus e a colo o sofar, que perdeu o seu papel militar, foi
caram no meio da tenda que Davi lhe tinha arma preservado no ritual das sinagogas.
do; e ofereceram holocaustos e sacrifícios pacífi
cos perante Deus. 2Tendo Davi acabado de ofere Tendo Davi acabado de oferecer os ho
cer os holocaustos e sacrifícios pacíficos, abençoou locaustos e sacrifícios pacíficos. O cronista
o povo em nome do Senhor. 3Então repartiu a agora cita pela primeira vez o fato de que
todos em Israel, tanto a homens como a mulheres, Davi tinha os sacrifícios a seu cargo. Con
a cada um, um pão, um pedaço de carne e um bo
lo de passas.
tudo, ele agora torna claro que os sacrifí
cios eram apresentados por toda a comuni
dade, com os sacerdotes levitas realizando
No relato de 2Samuel 6.12-19, Davi é suas funções apropriadas. Davi é visto ago
retratado como trajando somente um éfode ra não como um sacerdote, mas como o rei,
de linho, que era um saiote tal como um que supervisiona as apropriadas atividades
sacerdote trajaria sob sua veste. O cronista do culto. Foi, todavia, ele quem abençoou
o descreve vestido apropriadamente com o povo, não os sacerdotes.
um manto, bem como com um éfode, ten
do as vestes talvez livremente agitadas em
sua dança extática. Tal como o cronista re 4) Deveres dos levitas (16.4-43)
trata a cena, o desprazer de Mical para a. A Obra Coral (16.4-36)
com o comportamento de Davi ocorre de 4Também designou alguns dos levitas por mi
vido à sua devoção à arca, uma lealdade nistros perante a arca do Senhor, para celebrarem,
que faltava a Saul. Em Samuel, o enfoque e para agradecerem e louvarem ao Senhor Deus
de Israel, a saber: 5Asafe, o chefe, e Zacarias, o
em questão é o fato de expor-se em sua segundo e depois dele; Jeiel, Semiramote, Jeiel,
dança frenética (2Sm 6.20). Novamente, Matitias, Eliabe, Benaías, Obede-Edom e Jeiel,
há uma diferença de perspectiva entre as com alaúdes e com harpas; e Asafe se fazia ouvir
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com címbalos; 6e Benaias e Jaaziel, os sacerdotes, seguidores. As designações feitas em 15.16
tocavam trombetas continuamente perante a arca e seguintes eram somente para transportar
do pacto de Deus. 7Foi nesse mesmo dia que Da
vi, pela primeira vez, ordenou que pelo ministério a arca para Jerusalém. Agora Davi faz as
de Asafe e de seus irmãos se dessem ações de gra designações permanentes, que envolvem
ças ao Senhor, nestes termos: 8Louvai ao Senhor, menos pessoas. Parece haver somente dois
invocai o seu nome; fazei conhecidos entre os po deveres a serem cumpridos perante a arca:
vos os seus feitos. 9Cantai-lhe, salmodiai-lhe, falai música e proteção. A primeira seção trata
de todas as suas obras maravilhosas. ,0Gloriai-vos
no seu santo nome; alegre-se o coração dos que da música, para o que Asafe foi posto no
buscam ao Senhor. nBuscai ao Senhor e a sua comando.
força; buscai a sua face continuamente 12Lembrai- A palavra traduzida por celebrar apre
-vos das obras maravilhosas que ele tem feito, dos senta uma dificuldade entre os sentidos
seus prodígios, e dos juízos da sua boca, 13vós,
descendência de Israel, seus servos, vós, filhos de possíveis de “chamar à mente” (“invocar”,
Jacó, seus eleitos. 14Ele é o Senhor nosso Deus; como na KJV) ou “comemorar”. O pro
em toda a terra estão os seus juízos. l5Lembrai- blema está em qual dos dois sentidos se
-vos perpetuamente do seu pacto, da palavra que aplicaria aqui. A versão RSV no inglês
prescreveu para mil gerações; 16do pacto que fez
com Abraão, do seu juramento a Isaque; l7o qual
prefere o primeiro sentido. A Bíblia de Je
também a Jacó confirmou por estatuto, e a Israel rusalém dá preferência à última. Os títulos
por pacto eterno, 18dizendo: a ti te darei a terra para Salmos 38 e 70 contêm a mesma
de Canaã, quinhão da vossa herança. ’’Quando palavra, que a RSV verte como “oferta
eram poucos em número, sim, mui poucos, e es memorial”. É mais provável que estes sal
trangeiros na terra, ^andando de nação em nação,
dum reino para outro povo, 21a ninguém permitiu
mos fossem empregados para invocar a
que os oprimisse, e por amor deles repreendeu reis, atenção de Deus para o sofredor do que
"dizendo: Não toqueis os meus ungidos, e não para acompanhar uma oferta memorial,
façais mal aos meus profetas. “ Cantai ao Senhor uma vez que ambos retratam um homem
em toda a terra; proclamai de dia em dia a sua em situação desesperadora, precisando de
salvaçãa ^Publicai entre as nações a sua glória,
entre todos os povos as suas maravilhas. 25Porque atenção imediata.
grande é o Senhor, e mui digno de louvor; também Parece, então, que as três ênfases dos
é mais temível do que todos os deuses. “ Pois to cantores eram sobre (1) chamar a atenção
dos os deuses dos povos são ídolos, porém o Se
nhor fez os céus. 27Diante dele há honra e majes de Deus para as necessidades do adorador,
tade, há força e alegria no seu lugar. “ Tributai ao (2) agradecer-lhe pelo que havia feito ante
Senhor ó famílias dos povos, tributai ao Senhor riormente e (3) louvá-lo pelo que ele era.
glória e força. MTributai ao Senhor a glória devida O salmo encontrado em 16.8-36 con
ao seu nome; trazei presentes, vinde perante ele;
adorai ao Senhor vestidos de trajes santos. “ Tre
tém elementos de outros salmos no Sal
ma diante dele toda a terra; o mundo se acha tério. Os versos 8-22 correspondem a Sal
firmado, de modo que se não pode abalar. 31Ale- mos 105.1-5. Os versos 23-33 também são
gre-se o céu, e regozije-se a terra; e diga-se entre encontrados em Salmos 96.1-113. O verso
as nações: O Senhor reina. 32Brama o mar e a sua 34 e Salmos 106.1 são o mesmo, como são
plenitude; exulte o campo e tudo o que nele há;
33então jubilarão as árvores dos bosques perante os versículos 35, 36 e Salmos 106.47,48.
o Senhor, porquanto vem julgar a terra. 34Dai As diferenças são pequenas e de pouco
graças ao Senhor, porque ele é bom; porque a sua significado. Concorda-se em geral que Crô
benignidade dura para sempre. 35E dizei: Salva nicas está tomando dos Salmos, e não o
dos, ó Deus da nossa salvação, e ajunta-nos, e
livra-nos das nações, para que demos graças ao
contrário (cf. Myers. I, p. 121). A música
teu nome, e exultemos no teu louvor. “ Bendito se do segundo templo é usada para ilustrar
ja o Senhor Deus de Israel, de eternidade a eter como Asafe deve ter cantado. Certamente
nidade. Então todo o povo disse: Amém! e louvou a música posterior estava fundamentada
ao Senhor. nele, conquanto se haja tornado mais refi
lCrônicas 16.4-42 não tem paralelo em nada.
2Samuel. Portanto, encontramos aqui uma O verso 36 é realmente a doxologia que
contribuição distinta do cronista e seus encerra o quarto livro do Saltério, que não
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alcançou sua forma final até após o tempo a procissão a Jerusalém. De modo algum
do cronista. Obviamente, este verso, e pos esta ocasião especial deveria ser considera
sivelmente o salmo inteiro, é mais antigo da uma ameaça aos sacerdotes oficiantes
do que o cronista. lCrônicas 16.37 segue- que permaneceram com o tabernáculo do
se facilmente após os versos 6 ou 7, suge Senhor em Gibeão (cf. lRs 3.4 e ss.).
rindo a possibilidade de que o salmo foi A contribuição mais significativa do
inserido após o tempo do cronista. cronista nesta passagem é sua ênfase sobre
Quando o salmo é lido em sua forma a importância do culto sem sacrifício (cf.
presente, é óbvio que os judeus do período Myers, I, p. 121,122). Em Jerusalém a
pós-exílico viam no retomo da arca a Jeru companhia de Asafe adorava perante a ar
salém uma razão para crer que Deus um ca sem o auxílio de sacrifício. Isto cria ele
dia também traria o seu povo disperso de ser uma contribuição única de Davi. O
volta ao lar, de sua peregrinação. As ênfa nome de Moisés ocorre somente 31 vezes
ses do salmo tratam do governo de Deus em Crônicas-Neemias, enquanto Davi é
sobre a terra inteira, de seu cuidado para mencionado mais do que 250 vezes. Foi
com o seu povo quando estava em terras Moisés quem planejou os serviços do ta
estranhas e do final reconhecimento da bernáculo, mas Davi deu origem à liturgia
soberania de Iavé por todo o povo. O verso perante a arca. Israel agora tinha dois san
culminante é ajunta-nos, e livra-nos das tuários. O cronista não estava realmente
nações. Verdadeiramente, a esperança do dizendo que a música fosse melhor do que
fiel em ser reunido à cidade de Deus, tão o sacrifício, mas declarando que poderia
eloqüentemente expressa aqui, é conti haver culto significativo sem sacrifício, e
nuada na Nova Jerusalém do livro de esta era uma ousada posição, realmente,
Apocalipse. para o seu tempo. Ele deu precedente a
outras cerimônias, à parte de sacrifícios,
b. A Arca e o Santuário (16.37-43) e que refletiam tendências de sua época
37Davi, pois, deixou ali, diante da arca do pac ou, na verdade, encorajavam outras, no
to do Senhor, Asafe e seus irmãos, para ministra vas, tanto no Templo quanto na sinagoga.
rem continuamente perante a arca, segundo a
exigência de cada dia. “ também deixou a Obede-
Instrumentos para os cânticos de Deus
-Edom, com seus irmãos, sessenta e oito; Obede- (lit., “cântico do Senhor”, cf. Salmos 137.4
Edom, filho de Jedútun, e Hosa, para serem e 2Cr 29.27, onde a expressão “canto do
porteiros, 39e deixou Zadoque, o sacerdote, e seus Senhor” serve de paralelo). Observe-se co
irmãos os sacerdotes, diante do tabernáculo do mo o cronista, à semelhança da fonte sa
Senhor, no alto que havia em Gibeão, ‘“para ofe
recerem holocaustos ao Senhor continuamente, pe cerdotal no ftntateuco, muitas vezes prefe
la manhã e à tarde, sobre o altar dos holocaustos; re Elohim (Deus) a Yahweh (o Senhor).
e isto segundo tudo o que está escrito na lei que Esta expressão pode ser traduzida por
o Senhor ordenara a Israel; 41e com eles Hemã, “cântico de Deus”, o que ele ordenou, ou
e Jedútun, e os demais escolhidos, que tinham sido “canto sagrado”, o que lhe foi dedicado.
nominalmente designados, para darem graças ao
Senhor, porque a sua benignidade dura para sem lCrônicas 16.43 (cf. 2Sm 6.19-20) leva
pre. 42Éstavam Hemã e Jedútun encarregados das novamente o leitor à constatação de que
trombetas e dos címbalos para os que haviam de a passagem inteira de 16.4-42 foi inserida
tocar, e dos instrumentos para os cânticos dé
Deus, e os filhos de Jedútun estavam à porta. na história tradicional da remoção da arca.
43Então todo o povo se retirou, cada um para a Elmslie crê que a maior parté dos versos
sua casa; e Davi voltou para abençoar a sua casa. 37-42 foi adicionada à obra do cronista
como uma tentativa, mal dirigida, de ex
Nesta passagem o cronista torna claro plicar como Salomão pôde sacrificar no
o que quis dizer antes. Os serviços perante lugar alto de Gibeão após Davi ter estabe
a arca eram somente musicais. Nenhum lecido um santuário em Jerusalém. Con
sacrifício foi realizado ali, após terminar tudo, parece melhor entender, com Myers,
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que a inserção foi do próprio cronista. De 15Conforme todas estas palavras, e conforme toda
ve ser considerada como sua, a menos que esta visão, assim falou Natã a Davi.
possa ser provado o contrário. Esta passagem depende de 2Samuel 7,
mas o cronista considera o seu ponto focal
4. O Estabelecimento da Linhagem Daví- de sua própria perspectiva. 2Samuel 7.1
dica (17.1—20.8) registra que, quando Davi teve sua audi
Esta seção é caracterizada pela adesão ência com Natã, Deus lhe tinha “dado (...)
íntima do cronista a materiais tradicionais. descanso de todos os seus inimigos em
Ele realiza seu propósito por omitir todo redor”. Contudo, no próximo capítulo há
material irrelevante para o seu esquema e uma lista de conquistas subseqüentes em
por apresentar uma reinterpretação ocasio preendidas por Davi. Também esta expres
nal dos acontecimentos a serem descritos. são implica que considerável tempo trans
correu entre o transporte, por Davi, da
1) O Pacto Divino (17.1-27) arca para Jerusalém e sua expressão do
desejo de prover um templo apropriado
a. Os Oráculos de Natã (17.1-15) para abrigá-la. O cronista resolve ambas
'Tendo Davi começado a morar em sua casa, estas tensões por omitir a declaração.
disse ao profeta Natã: Eis que eu moro numa casa Uma das variações mais significativas
de cedro, mas a arca do pacto do Senhor está é a substituição de para ires a teus pais
debaixo de cortinas. 2Então Natã disse a Davi: pelo tradicional “com teus pais” (em nossa
Tudo quanto tens no teu coração faze, porque
Deus é contigo. 3Mas sucedeu, na mesma noite, versão, “vires a dormir com teus pais”) de
que a palavra de Deus veio a Natã, dizendo: 4Vai 2Samuel 7.12. Esta é uma expressão
e dize a Davi, meu servo: Assim diz o Senhor: tu incomum e pode implicar uma convicção
não me edificarás casa para eu habitar: 5porque de que a vida após a morte pode envolver
em casa nenhuma morei, desde o dia em que fiz mais do que o mero sono. 2Samuel 7.14
subir Israel até o dia de hoje, mas fui de tenda em
tenda, e de tabernáculo em tabernáculo. 6Por to menciona a possibilidade de iniqüidade da
das as partes por onde tenho andado com todo o parte do filho de Davi, mas o cronista não
Israel, porventura falei eu jamais uma palavra a o faz. Novamente, conquanto Samuel
algum dos juizes de Israel, a quem ordenei que mencione o rejeitado Saul pelo nome, a
apascentasse o meu povo, dizendo: Por que não
tendes edificado uma casa de cedro? 7Agora, pois,
passagem posterior fala dele somente em
assim, dirás a meu servo Davi: Assim diz o Se termos gerais. Mui digno de nota, real
nhor dos exércitos: Eu te tirei do curral de detrás mente, é a mudança de “a tua casa (...) e
das ovelhas, para que fosses chefe do meu povo Is o teu reino” (2Sm 7.16) para “na minha
rael; 8e estive contigo por onde quer que andavas, casa e no meu reino” (v. 14). O reino hebreu
e de diante de ti exterminei todos os teus inimigos;
também te farei um nome como o nome dos gran é visto aqui como uma teocracia (cf. lCr
des que estão na terra. ’Designarei um lugar para 28.5; 29.11; 29.23). Casa, neste contexto,
o meu povo Israel, e o plantarei, para que ele ha é paralelo a reino e refere-se ao povo de
bite no seu lugar, e nunca mais seja perturbado; Israel, não ao Templo. Eles são a casa de
e nunca mais o debilitarão os filhos da perversi
dade, como dantes, 10e como desde os dias em que Deus, em quem ele realmente habita.
ordenei juizes sobre o meu povo Israel; e subju b. A Oração de Davi (17.16-27)
garei todos os teus inimigos, làmbém te declaro
que o Senhor te edificará uma casa. "Quando ‘‘Então entrou o rei Davi, sentou-se perante o
forem cumpridos os teus dias, para ires aos teus Senhor, e disse: Quem sou eu, ó Senhor Deus, e
pais, levantarei a tua descendência depois de ti, um que é a minha casa, para que me tenhas trazido
dos teus filhos, e estabelecerei o seu reina ,2Esse até aqui? >7E isto foi pouco aos teus olhos,
me edificará casa, e eu firmarei o seu trono para ó Deus; também falaste da casa do teu servo para
sempre. l3Eu lhe serei por pai, e ele me será por tempos distantes, e me consideras como a um
filho; e a minha misericórdia não retirarei dele, homem ilustre, ó Senhor Deus! 18Que mais te dirá
como a retirei daquele que foi antes de ti; l4mas Davi, acerca da honra feita a teu servo? Pois tu
o confirmarei na minha casa e no meu reino para bem conheces o teu serva 19Ó Senhor, por amor
sempre, e para sempre o seu trono será firme. do teu servo, e segundo o teu coração, fizeste todas
359
estas grandezas, tornando conhecidas todas estas tes textuais, uma vez que todas tendem a
grandes coisas. 20Ó Senhor, ninguém há seme elucidar os temas básicos do livro. Uma
lhante a ti, e não há Deus fora de ti, segundo outra declaração, contudo, é bastante
tudo quanto ouvimos com os nossos ouvidos.
21Iambém quem há como o teu povo Israel, única debatível. Em 2Samuel 7.23, o hebraico
gente na terra a quem Deus foi remir para ser seu literal é bastante ambíguo, ao afirmar
povo, fazendo-te nome por meio de feitos grandes “a quem os deuses foram redimir” (onde
e terríveis, expulsando as nações de diante do teu ocorre o plural elohlm sem o artigo e rege
povo, que remiste do Egito? 22Pois fizeste o teu
povo teu para sempre; e tu, Senhor, te fizeste seu um verbo no plural). O texto do cronista
Deus. 23Agora, pois, ó Senhor, seja confirmada não apresenta problemas, pois o artigo
para sempre a palavra que falaste acerca do teu aparece com elohim, que agora rege um
servo, e acerca da sua casa, e faze como falaste. verbo no singular, que é a maneira costu
24E seja o teu nome estabelecido e glorificado meira de falar do Deus de Israel: “a quem
para sempre, e diga-se: O Senhor dos exércitos é
o Deus de Israel, sim, é Deus para Israel; perma Deus foi remir” (v. 21).
neça firme diante de ti a casa de Davi, teu serva
“ Porque tu, Deus meu, revelaste ao teu servo que 2) As Vitórias de Davi (18.1—20.8)
lhe edificarias casa; pelo que o teu servo achou
confiança para orar em tua presença. 26Agora, Esta seção corresponde bem de perto ao
pois, ó Senhor, tu és Deus, e falaste este bem material em 2Samuel (cf. lCr 18.1-17 e
acerca do teu serva 27E agora foste servido aben
çoar a casa do teu servo, para que permaneça para
2Sm 21.18-22). O cronista organizou o seu
sempre diante de ti; porque tu, Senhor, a abenço material na mesma ordem como as fontes
aste, ficará abençoada para sempre. anteriores, omitindo as passagens que
tratam de questões domésticas. A razão
Esta é a única menção, no Antigo Testa que ele dá para negar a Davi o privilégio
mento, de alguém sentar-se para orar, sendo de edificar o Templo é a de ser ele um
esta menção repetida tanto em Samuel guerreiro (22.8; 28.3). Portanto, imediata
como em Crônicas. Davi não está pros mente após Natã informar a Davi que ele
trado perante Deus, e, sim, sentado, de não teria permissão de fazê-lo, o cronista
cabeça inclinada. Não importando o arranja uma coleção de referências às
sentido da declaração comum, uma nova guerras de Davi. Sua inclusão dessas
dignidade é dada tanto a Davi quanto a incursões militares, portanto, não implica,
Israel na versão do cronista. 2Samuel necessariamente, seu endosso delas. Pbr
declara que o pacto foi feito por causa da outro lado, não seria exato afirmar que ele
promessa ou palavra de Deus (7.21), considerava as atividades militares peca
enquanto a versão de Crônicas assegura minosas. Contudo, sugere que tais cam
que foi por causa de seu servo Davi (v. 19). panhas interferiam nas atividades mais
Deus reina sobre Israel em 2Samuel 7.26, íntimas da adoração cultual. Se a conta
mas em Crônicas ele é o Deus de Israel e minação seria meramente ritualística é
age como Deus para com eles, num rela difícil determinar.12 O fato importante é
cionamento de pessoa para pessoa. Em que o cronista é o primeiro escritor bíblico
2Samuel Deus é citado como tu, Deus a focalizar o problema. Isto é particular
meu. mente notável à luz de sua relutância em
Deve-se ser muito cuidadoso, contudo, dizer algo que pudesse apresentar Davi sob
quanto a declarar que o cronista tenha uma luz desfavorável.
alterado arbitrariamente suas fontes. Em Em pelo menos dois lugares o texto do
alguns casos ele simplesmente reinterpre- cronista é superior ao de Samuel (lCr
tou o espírito delas. Em outros, ele pode 18.1,12). A misteriosa “Metegue-Ama” de
estar usando uma fonte que continha as
variações que emprega em seus relatos.
Nas passagens acima, parece que as va
12 G oettsberger, J., Die B ücher d er Chronik oder Paralipomenon
riações são reinterpretações, e não varian (Bonn: Rster Hanstein, 1939), p. 163.
360
2Samuel 8.1 em lCr 18.1 se torna “Gate arameus de Zobá, e não parece ver mal
e suas aldeias”. Certamente, os “edomeus” suficiente nisso para justificar a omissão
(18.12) é o termo correto, e não “sírios” desse fato. Esta era uma prática lógica
(texto hebraico) (em nossa versão, neste quando um exército vitorioso não podia
caso, consta, corretamente, “edomeus”) de fazer uso de tais animais. Salomão, con
2Samuel 8.13. Isto, provavelmente, indica tudo, foi mais sábio e menos desperdiça
que o cronista estava empregando um dor. Ele fazia um negócio lucrativo em
texto diferente do dos massoretas. O texto vender tais cavalos (lRs 10.28,29) a outras
hebraico do Antigo Testamento não foi nações!
padronizado até vários séculos após o Mil carros, sete mil cavaleiros e vinte
cronista ter realizado o seu trabalho. mil homens de infantaria. 2Samuel 8.4
a. Guerras de Conquista (18.1-13) menciona “mil e setecentos cavaleiros” e
20 mil homens de infantaria. O número de
'Depois disto Davi derrotou os filisteus, e os carros não é enumerado ali. Conquanto os
subjugou e tomou das mãos deles Gate e suas
aldeias. 2Tàmbém derrotou os moabitas, e estes
números do cronista sejam muitas vezes
lhe ficaram sujeitos, pagando-lhe tributa 3Davi maiores do que as fontes mais antigas, aqui
derrotou também Hadadézer, rei de Zobá, junto temos um aumento num item e o mesmo
a Hamate, quando foi estabelecer o seu domínio algarismo noutro. Pode tratar-se aqui de
junto ao rio Eufrates. 4E Davi lhe tomou mil um problema textual, uma vez que o
carros, sete mil cavaleiros e vinte mil homens de
infantaria; e jarretou todos os cavalos dos carros; primeiro “milhar” de Samuel pode ter sido
porém reservou deles para cem carros. 5E quan tomado para aplicar-se a carros, o mesmo
do os sírios de Damasco vieram para ajudar Hada número sendo substituído por “centenas”
dézer, rei de Zobá, Davi matou deles vinte e dois com referência a cavaleiros. Obviamente,
mil homens. 6Então Davi pôs guarnições entre os
sírios de Damasco, e os sírios lhe ficaram sujeitos, 700 cavaleiros não seria um contingente
pagando-lhe tributos; e o Senhor dava vitórias a adequado para um exército de mil carros.
Davi, por onde quer que ia. 7Davi tomou os Davi matou (...) vinte e dois mil homens.
escudos de ouro que tinham sido dos servos de Este número é exatamente o mesmo de
Hadadézer, e os trouxe a Jerusalém. “Também de
Tibate, e de Cum, cidades de Hadadézer, Davi 2Samuel 8.5. Novamente o cronista é fiel
tomou muitíssimo bronze, de que Salomão fez o à sua fonte e não aumenta arbitrariamente
mar de bronze, as colunas, e os utensílios de o número.
bronze. 9Ora, quando Toú, rei de Hamate, ouviu
que Davi destruíra todo o exército de Hadadézer, Bronze, de que Salomão fez o mar de
rei de Zobá, 10mandou seu filho Hadorão ao rei bronze. O verso 8 é uma adição ao relato
Davi, para o saudar, e para o felicitar por haver de Samuel. Conquanto o cronista sentisse
pelejado contra Hadadézer e por tê-lo destruído a mácula associada à guerra que negou a
(porque Hadadézer fazia guerra a Toú). Enviou- Davi a construção do Templo, ele não
-Ihe também toda sorte de utensílios de ouro, de
prata e de bronze. UA estes também o rei Davi revela consciência do problema moral
consagrou ao Senhor, juntamente com a prata e envolvido em empregar presas de guerra
ouro que trouxera de todas as nações: dos edomeus, para confeccionarem vasos sagrados.
dos moabitas, dos amonitas, dos filisteus e dos Abisai (...) matou dezoito mil edomeus.
amalequitas.12Além disso, Abisai, filho de Zeruia,
matou dezoito mil edomeus no Vale do Sal. 13E pôs 2Samuel 8.13 atribui este feito a Davi e
guarnições em Edom, e todos os edomeus ficaram declara que os inimigos eram sírios (nossa
sujeitos a Davi; e o Senhor dava vitórias a Davi, versão registra “edomitas”). O cronista está
por onde quer que ia. empregando um texto mais confiável, pois
não seria provável que os sírios estivessem
E significativo que o cronista omita o lutando no Vale do Sal. Com a tendência
cruel tratamento de Davi aos moabitas. É do cronista de exaltar Davi, é significativo
óbvio que ele considera isto um reflexo que o relato de Samuel dê a Davi o crédito
sobre a imagem de seu herói. Contudo, como comandante, enquanto o escritor
menciona seu ato de jarretar os cavalos dos posterior não o fez. Se o texto que ele
361
estava empregando atribute a vitória a Davi, mente, o título foi confinado a um ofício,
é difícil ver como o cronista deixou de o de sacerdote ministrante. No tempo de
perpetuar essa alegação. Aparentemente, Davi pode ter descrito “um capelão domés
sua fonte não continha esse tributo. tico” (cf. IDB, III, p. 882). O fato de que
b. O Gabinete de Davi (18.1417) Zadoque e Abiatar, os sacerdotes ofician
tes, eram também componentes do gabi
14Davi, pois, reinou sobre todo o Israel; e nete de Davi (2Sm 20.25) indicaria que o
julgava e fazia justiça a todo o seu povo. ISJoabe, ofício de seus filhos era diferente do deles,
filho de Zeruia, tinha o cargo do exército; Jeosafâ,
filho de Ailude, era cronista; 16Zadoque, filho de mas a natureza exata da função não é
Aitube, e Abimeleque, filho de Abiatar, eram conhecida. Eles podem ter servido como
sacerdotes; Savsa era escrivão; 17Benaías, filho de uma ligação entre o culto oficial e a coroa
Jeoiada, tinha o cargo dos quereteus e peleteus; nesse tempo de transição, quando as ten
e os filhos de Davi eram os primeiros junto ao rei.
sões, provavelmente, eram sérias.
A organização administrativa do rei c. A Campanha Amonita-Síria (19.1-19)
nado de Davi era, aparentemente, modelada
‘Aconteceu, depois disto, que Naás, rei dos
segundo o Egito. De fontes ali aprendemos amonitas, morreu; e seu filho reinou em seu lugar.
bem mais sobre os vários deveres. Os de 2Então disse Davi: Usarei de benevolência para
veres de Joabe são óbvios. As responsabi com Hanum, filho de Naás, porque o seu pai usou
lidades do cronista (mazkir) eram muito de benevolência para comigo. Pelo que Davi enviou
mensageiros para o consolarem acerca de seu pai.
complicadas, pois fazia todos os arranjos Mas quando os servos de Davi chegaram à terra
oficiais para o rei; ele era o chefe do proto dos amonitas, a Hanum, para o consolarem,
colo. O secretário não só conservava os 3disseram os príncipes dos amonitas a Hanum:
papéis do Estado, mas também protegia o Pensas que Davi quer honrar a teu pai, porque te
rei. O dever de Benaías era comandar a mandou consoladores? Não vieram ter contigo os
seus servos a esquadrinhar, a transtornar e a
guarda profissional real. A natureza da espiar a terra? 4Pelo que Hanum tomou os servos
tarefa dos filhos de Davi é a mais contro de Davi, rapou-lhes a barba, e lhes cortou as
vertida. 2Samuel declara que eles man vestes pelo meio até o alto das coxas, e os des
tinham o ofício de sacerdote (cohen). pediu. sEntão foram alguns e avisaram a Davi
acerca desses homens; pelo que ele mandou
O cronista, contudo, declara que eram os mensageiros ao seu encontro, pois estavam sobre
primeiros junto ao rei. Uma vez que cohen maneira envergonhados. Disse o rei: Ficai em
geralmente se aplica ao ofício de sacerdote Jericó até que vos torne a crescer a barba, e então
oficiante, muitos intérpretes julgam que o voltai. 6Vendo os amonitas que se tinham feito
cronista havia redefinido o ofício por odiosos para com Davi, Hanum e os amonitas
enviaram mil talentos de prata, para alugarem
causa de sua visão artificial de que nin para si carros e cavaleiros de Mesopotâmia, de
guém, a não ser um descendente de Arão, Arã-Maacá e de Zobá. 7E alugaram para si trinta
podia atuar como sacerdote. Contudo, é e dois mil carros e o rei de Maacá com a sua gente,
possível que cohen pudesse ter tido um os quais vieram e se acamparam diante de
Medeba; também os amonitas se ajuntaram das
sentido menos restrito no tempo de Davi, suas cidades e vieram para a guerra. 8Davi,
fato de que o cronista estava ciente. Há quando soube disto, enviou Joabe e todo o exército
duas outras passagens que apresentam dos valentes. 5Os amonitas sairam e ordenaram a
problema semelhante. Em 2Samuel 20.26 batalha à porta da cidade, porém os reis que
é dito que Ira, o jairita, era oficial-mor de tinham vindo se puseram à parte no campa
10Ora, quando Joabe viu que a batalha estava
Davi, e em lRs 4.5 Zabude, filho de Natã, ordenada contra ele pela frente e pela retaguarda,
era oficial-mor e amigo do rei. escolheu os melhores dentre os homens de Israel,
Em cultos religiosos anteriores este e os pôs em ordem contra os sírios; ne o resto do
termo aplicava-se a váriàs atividades no povo entregou na mão de Abisai, seu irmão; e eles
santuário, particularmente à da adivi se puseram em ordem de batalha contra os
amonitas. 12E disse Joabe: Se os sírios forem
nhação. Entre os hebreus poderia ter tido mais fortes do que eu, tu virás socorrer-me; e se
este emprego mais generalizado. Posterior os amonitas forem mais fortes do que tu, eu te
362
32 mil carros somente e declara que
socorrerei a ti. 13Esforça-te, e pelejemos varonil
mente pelo nosso povo e pelas cidades de nossoHanum os contratou por 1 mil talentos de
Deus; e faça o Senhor o que bem lhe parecer.
prata, que pesariam cerca de 37 1/2 tone
14Então se chegou Joabe, e o povo que estava com
ladas. 2Crônicas 25.6 diz que Amazias
ele, diante dos sírios, para a batalha; e estes
contratou 100 mil homens de Israel por
fugiram de diante dela lsVendo, pois, os amonitas
que os sírios tinham fugido, fugiram eles também
apenas 100 talentos de prata. Obviamente,
de diante de Abisai, irmão de Joabe, e entraram1 mil talentos é um montante muito
na cidade. Então Joabe voltou para Jerusalém.
16Ora, vendo-se os sírios derrotados diante deelevado. É bem possível que tenhamos
aqui um exemplo de alguém registrando a
Israel, enviaram mensageiros, e fizeram sair os
sirios que habitavam além do rio; e tinham porhistória de memória, confundindo a lista
comandante Sofaque, chefe do exército de Hada-de homens com os números concernentes
dézer.17Avisado disto, Davi ajuntou todo o Israel,
passou o Jordão e, indo ao encontro deles, ora dinheiro e carros. Os 1 mil atribuídos
originalmente aos homens de Maacá (2Sm
denou contra eles a batalha. Tendo Davi ordenado
10.6) agora são aplicados aos itens mone
a batalha contra os sírios, pelejaram estes contra
ele. 18Mas os sírios fugiram de diante de Israel;
tários. Isso deixou 32 mil homens que
e Davi matou deles os homens de sete mil carros,
estão alistados na fonte do cronista como
e quarenta mil homens da infantaria; matou
32 mil carros.
também Sofaque, chefe do exército. 19Vendo, pois,
os servos de Hadadézer que tinham sido derro No versículo 18 há um aumento de 700
carros em Samuel para 7 mil em Crônicas.
tados diante de Israel, fizeram paz com Davi, e
os serviram; e os sírios nunca mais quiseram Novamente, isto talvez seja o resultado das
socorrer os amonitas. tendências do tnidrash que o cronista está
empregando. Contudo, ao mesmo tempo
O cronista omite de seu relatório a
história do cuidado de Davi por Mefibo- os 40 mil cavaleiros das passagens de
sete (2Sm 9) que deve ter sido tentado a Samuel tornam-se 40 mil homens de infan
incluir, pois retrata Davi sob luz favorável. taria, uma contagem bem mais conser
vadora. Se o cronista está inclinado a
Contudo, devido à sua relutância em
mencionar qualquer coisa relacionada exagerar, por que aumentou um algarismo
e diminuiu o número de outro? Normal
com a casa de Saul, ele a omite. A história
de Naás conforme contada pelo escritor mente, ele, na verdade, teria expandido
posterior difere muito pouco do relato de todo o seu material. Seus algarismos con
flitantes certamente refletem as variadas
Samuel. Uma variação digna de nota é o
esforço óbvio do cronista de evitar uma fontes que estava empregando.
palavra objetável na descrição da expo d. O Cerco de Rabá (20.1-3)
sição vergonhosa dos enviados de Davi 'Aconteceu pois que, na primavera, no tempo
causada por Hanum. O relato de Samuel em que os reis costumam sair para a guerra, Joabe
diz que suas vestes foram cortadas no levou a flor do exército, e devastou a terra dos
meio, até as nádegas (heb., assentos). O amonitas, e foi, e pôs cerco a Rabá; porém Davi
cronista, aparentemente de mente mais ficou em Jerusalém. E Joabe bateu Rabá, e a
destruiu. 2Tirando Davi a coroa da cabeça do rei
delicada, empregou um eufemismo (“nos deles, achou nela o peso de um talento de ouro,
seus quadris”) literalmente, “ao passo”, e havia nela pedras preciosas; e foi posta sobre a
“ao lugar onde o corpo se divide na direção cabeça de Davi. E ele levou da cidade mui grande
dos pés”. Em sua tradução, Myers emprega despoja 3lkmbém fez sair o povo que estava nela,
e o fez trabalhar com serras, com trilhos de ferro
um eufemismo dele próprio: “exatamente e com machados; e assim fez Davi a todas as
ao ponto que tencionavam cobrir”! cidades dos amonitas. Então voltou Davi, com
Nesta passagem encontramos exemplos todo o povo, para Jerusalém.
de estimativas tanto exageradas quanto
conservadoras. 2Samuel 10.6 alista 20 mil, Aqui está um exemplo óbvio das práti
1 mil e 12 mil homens lutando contra Davi cas editoriais do cronista. Ele começa seu
ou um total de 33 mil. Crônicas contém relato como o de 2Samuel 11.1; mas se
363
gue-o por somente uma", poucas frases, e seis em cada pé, e que também era filho do
deixando fora a história Liteira do pecado gigante. 7Tendo ele insultado a Israel, Jôna-
de Davi com Bate-Seba, que continua em tas, filho de Siméia, irmão de Davi, o matou.
8Esses nasceram ao gigante em Gate; e caíram
2Samuel 12. Que ele tinha a passagem pela mão de Davi e pela mão dos seus servos.
inteira diante de si é evidente, pois 20.2
afirma que Davi havia chegado ao cenário O interesse nesta passagem centraliza-
da batalha sem contar como chegou até se em seu relacionamento com a morte de
ali, o que 2Samuel tem o cuidado de fazer. Golias por Davi. 2Samuel 21.19 afirma
Então o relato segue bem de perto o de que El-Hanã matou Golias. Este é um
Samuel novamente. A coroa de ouro deve conflito aparente com o relato familiar em
ter estado sobre a cabeça de Milcom, o ISamuel 17. Dar-se-ia o caso que Davi não
deus deles (malcam, rei). Era muito pesada matou Golias, afinal de contas, e que um
para ser usada por um homem (pesava de seus homens realizou o ato? Era comum
cerca de 30 quilogramas). A pedra preciosa que um rei obtivesse crédito para todos os
nela contida foi colocada sobre a cabeça atos vitoriosos de seus soldados. Na
de Davi, isto é, em sua própria coroa ou passagem em pauta, o cronista menciona
numa feita especialmente para a jóia. vários atos poderosos realizados pelos
A sorte do povo conquistado não está homens de Davi. Contudo, dá também
absolutamente clara. 2Samuel 12.31 diz crédito a Davi.
que foram postos a trabalhar com serras, O cronista resolve o problema suge
isto é, forçados a trabalho escravo. Con rindo que El-Hanã matou Lami, irmão de
tudo, a passagem de Crônicas, no original Golias, e não o próprio Golias. Contudo,
hebraico, aparentemente, afirma que Davi a frase descritiva cuja lança tinha a haste
cortou as pessoas com serras, conquanto como órgão de tecelão é a mesma usada
o significado do verbo seja discutível. para descrever a arma de Golias em
G. C. 0 ’Ceallaigh, observando corrupção ISamuel 17.17. Novamente Lami pode
textual óbvia, argumenta que o texto res simplesmente ser um nome derivado
taurado deveria rezar assim: “Ele os do fragmento lehem (de Bethlehem) de
fez profanar (ou demolir) os moloques.” 2Samuel 21.19. Slotki crê que El-Hanã era
13 Uma vez que o cronista omitiu o trata um título para Davi, tal como faraó ou
mento dos moabitas como inadequado sultão. É possível que El-Hanã fosse seu
para menção, por que incluiria esta decla nòme de infância e Davi um nome de
ração, se retrata Davi como ainda mais trono, adquirido quando ele se tomou rei.
cruel? Deve-se notar que o hebraico de Contudo, aqui não temos qualquer evi
Crônicas neste ponto diz que Davi trouxe dência.
o povo e “cortou com serras e picaretas de Outra possível solução é que o nome
ferro e machados”. Não é alegado que haja pessoal Golias não aparece no relato do
cortado as pessoas com os instrumentos. ato heróico de Davi em ISamuel 17, mas
e. Conflitos com os Filisteus (20.4-8) foi inserido posteriormente por alguém
mais familiar com o texto em Crônicas do
4Depois disso levantou-se guerra em Gezer que em 2Samuel. Certamente, não devemos
com os filisteus; então Sibecai, o husatita, feriu
Sipai, dos filhos do gigante; e eles ficaram subju facilmente descartar a história que signi
gados. 5Tornou a haver guerra com os filisteus; e ficou tanto para gerações de crentes.
El-Hanã, filho de Jair, matou Lami, irmão de
Golias, o giteu, cuja lança tinha a haste como 5. Os Preparativos Para o Templo
órgão de tecelãa 6Houve ainda outra guerra em (21.1—29.25)
Gate, onde havia um homem de grande estatura,
que tinha vinte e quatro dedos, seis em cada mão Exceto em 21.1—22.1, que reconta e in
terpreta a história registrada em 2Samuel
13 Vetus Tèstamentum, 12 (1962), p. 179-189. 24.1 e ss. e lCrônicas 22.2-19, que sumaria
364
os preparativos de Davi para o Templo, esta Se a diminuição de Davi significasse o cres
seção é inteiramente obra do cronista, e cimento do Templo, então o cronista não
não tem paralelos no Antigo Testamento. hesitaria em prosseguir narrando a his
Neste sentido, é a mais longa passagem tória.
deste tipo nos livros de Crônicas. Con a. O Censo (21.1-6)
quanto alguns argumentem que o material
lança pouca luz sobre o período davídico, ‘Então Satanás se levantou contra Israel, e
incitou Davi a numerar' Israel. 2E disse Davi a
e em vez disso reflete as condições dos Joabe e aos príncipes do povo: Ide, contai a Israel
tempos do cronista, é mais realista ver-se desde Berseba até Dã; e trazei-me a conta, para
esta obra como uma compilação e reedição que eu saiba o número deles. 3Então disse Joabe:
de materiais recebidos de várias fontes, O Senhor acrescente ao seu povo cem vezes tanto
algumas bem antigas e outras de origem como ele é! Porventura, ó rei meu Senhor, não são
todos servos de meu senhor? Por que requer isto
mais recentes. Cada um deve ser exami o meu senhor? Por que traria ele culpa sobre
nado à luz de suas próprias tendências. Israel? 4Todavia a palavra do rei prevaleceu
O cronista estava limitado tanto por suas contra Joabe. Pelo que saiu Joabe, e passou por
fontes quanto por seu conhecimento in todo o Israel; depois voltou para Jerusalém.
5E Joabe deu a Davi o resultado da numeração
completo do período anterior. A despeito do povo. E era todo o Israel um milhão e cem mil
disso, ele nos propiciou informação tanto homens que arrancavam da espada; e em Judá
sobre a organização cultual anterior quan quatrocentos e setenta mil homens que arranca
to sobre sua própria. Sem suas contri vam da espada. ‘M as entre eles Joabe não
buições, nosso conhecimento da vida contou os de Levi e Benjamim, porque a palavra
do rei lhe foi abominável.
sacerdotal e levítica de Davi a Esdras seria
enormemente deficiente.
Aqui está uma das reinterpretações
mais significativas que o cronista fez.
1) Escolha de um Local Para Construção Enquanto a história anterior havia atri
(21.1— 22.1)
buído o ato pecaminoso de Davi à influên
Esta passagem assemelha-se a 2Samuel cia de Deus, e então retratando Deus como
24.1-25 e parece ser uma expansão da ficando irado quando Davi pecou, o histo
passagem ou de um texto semelhante. riador posterior viu o problema moral
Com esta seção o cronista completou o seu envolvido em tal comportamento. Certa
tratamento do material dos livros de mente, Davi não poderia ser culpado
Samuel. O último capítulo de 2Samuel justamente por algo que Deus o levou a
parece ser parte de um apêndice (caps. fazer. A fonte mais antiga, vendo correta
22-24) a esse livro, contendo um salmo mente o envolvimento de Deus em todos
atribuído a Davi (cap. 22) e suas últimas os eventos, não teve problema com este
palavras (23.1-7). Em Samuel é um frag aparente conflito. Deus fez o que desejou
mento flutuante e não está ligado a qual e ninguém questionou seus atos de sobe
quer tempo particular do reinado de Davi. rania. O cronista, contudo, foi mais pers
O cronista encontra um ponto de partida picaz. Ele cria no total envolvimento de
para ele, vendo nesta história a base de de Deus, nem sempre determinando ativa
autoridade para transferir o santuário de mente o comportamento dos homens, mas
Gibeão para Jerusalém. Embora o relato permitindo o que ele não causou. Portanto,
retrate Davi sob luz um tanto dúbia, o atribuiu a influência sobre Davi a Satanás,
cronista estava disposto a utilizar a tra em vez de a Deus. Em outra parte do Antigo
dição devido à sua importância em estabe Testamento, Satanás (o adversário) sempre
lecer o Templo de Jerusalém. Aqui é aparece como um servo de Deus, um anjo
evidente que, conquanto o cronista fosse que age somente segundo Deus lhe estipula
um dedicado admirador de Davi, seu ou permite (Jó 1.6; 2.1; Zc 3.1,2). Somente
primeiro amor era pelo próprio Templo. nesta passagem a palavra aparece sem o
365
artigo, indicando, pois, que se tornou te pequei em fazer tal coisa; agora, porém, peço-te,
agora um nome pessoal. Sua função é tira a iniqüidade de teu servo, porque procedi mui
loucamente. ’Falou o Senhor a Gade, o vidente de
também diferente. Pela primeira vez ele faz Davi, dizendo: 10Vai, e dize a Davi: Assim diz o
mais do que acusar os homens perante Senhor: U ês coisas te proponho; escolhe uiaa de
Deus ou executar as ordens divinas. Aqui las, para que eu ta faça. nE Gade veio a Davi, e
é retratado como tentando Davi a pecar. lhe disse: Assim diz o Senhor: Escolhe o que
Contudo, mesmo aqui está agindo somente quiseres: 12Ou três anos de fome; ou seres por
três anos consumido diante de teus adversários,
conforme Deus permite. Deus não perdeu enquanto a espada de teus inimigos te alcance; ou
0 controle da situação. que por três dias a espada do Senhor, isto é, a
Por que traria eíe culpa sobre Israel? peste na terra, e o anjo do Senhor façam destrui
Aqui ocorre uma estranha situação. O rijo ção por todos os termos de Israel. Vê, pois, agora
que resposta hei de levar a quem me enviou. 13En-
guerreiro Joabe é mais sensível do que tão disse Davi a Gade: Estou em grande angústia;
Davi para com a implicação deste ato. caia eu, pois, nas mãos do Senhor, porque mui
De fato, a pergunta de Joabe, porventura, grandes são as suas misericórdias; mas que eu
ó rei meu Senhor, não são todos servos de não caia nas mãos dos homens.
meu senhor? implica que o recenseamento
foi feito a fim de regular mais completa Omitindo as particularidades relativas
mente as responsabilidades do povo para à realização do censo, o cronista observa
com a coroa. Joabe temia que a população imediatamente que, como Joabe previra,
reconhecesse isso e fosse induzida à rebe Davi havia incorrido em séria culpa. Ele
lião aberta, tal como ocorreu quando da parece dar a entender que o conhecimento
morte de Salomão. de Davi quanto ao sofrimento de seu po
O número total de homens contados no. vo despertou-lhe a consciência. 2Samuel
censo foi registrado como sendo de 1 mi 24.10-14, contudo, afirma, com clareza,
lhão e 300 mil em 2Samuel, mas somente que Davi tinha a consciência ferida antes
1 milhão e 100 mil em Crônicas. O núme que a calamidade desabasse. Aqui temos
ro em Judá foi de 30 mil menos do que o a circunstância incomum de Davi sendo
número atribuído em Judá em Samuel. O retratado sob melhor luz na fonte anterior
cronista, entretanto, afirma que Levi e do que na posterior. Sob escrutínio cuida
Benjamim não foram incluídos nessa lista. doso, parece que o cronista quer indicar a
Talvez o relato de Samuel os incluísse, ex mesma coisa que Samuel. Se a pestilência
plicando-se, assims a discrepância. Seja já havia ocorrido, por que Davi teve essa
qual for a razão, o cronista está aqui ape- escolha? Aparentemente, o verso 7 anteci
gando-se bem de perto às suas fontes, e pa a escolha de Davi, estando o cronista
não há tentativa de exagero de sua parte. ansioso em revelar o desprazer de Deus
Levi não foi incluído porque os levitas quanto à questão. Agindo assim, todavia,
estavam isentos do serviço militar (cf. Nm ele inadvertidamente apresenta Davi sob
1.49). Por que Benjamim não foi incluído luz menos favorável do que o faz Samuel.
não está claro. Há três possibilidades: (1) A espada do Senhor, isto é, a peste na
Joabe não conclui o censo. \2) Benjamim terra. O povo de Davi, por ele orgulhosa
havia-se tornado tão pequeno que seus mente computado, seria dizimado pela
membros foram poupados do serviço mili pestilência, referida como “a espada do
tar. (3) O santuário de Gibeão ficava em Senhor”.
território benjamita, e isto tornava a tribo Caia eu, pois, nas mãos do Senhor.
inteira isenta. 2Samuel declara: “Caiamos.” Aqui Davi
não pede que a ira do Senhor caia sobre
o povo por causa de seu pecado; ele so
b. O Arrependimento de Davi (21.7-13) mente se refere a si próprio. Davi estava
7E este negócio desagradou a Deus, pelo que ciente de que Deus mais provavelmente lhe
feriu Israel. 8Então disse Davi a Deus: Gravemen dedicaria misericórdia do que o fariam os
366
seus inimigos. Na verdade, este é um dos dele com o rosto em terra. “ Então disse Davi a
ensinos mais significativos da Bíblia. Deus Ornã: Dá-me o lugar da eira pelo seu valor, para
está mais inclinado a ser benevolente do eu edificar nele um altar ao Senhor, para que ces
se esta praga de sobre o povo. ^Respondeu Ornã
que os homens. a Davi: Ibma-o para ti, e faça o rei meu senhor o
que lhe parecer bem. Eis que dou os bois para ho-
c. A Mudança de Opinião de Davi- locaustos, os trilhos para lenha, e o trigo para
(21.14-17) oferta de cereais; tudo dou. 24Mas o rei Davi dis
se a Ornã: Não, antes quero comprá-lo pelo seu
^Mandou, pois, o Senhor a peste a Israel; e valor; pois não tomarei para o Senhor o que é teu,
caíram de Israel setenta mil homens. 15E Deus nem oferecerei holocausto que não me custe nada.
mandou o anjo a Jerusalém para a destruir; e, 25E Davi deu a Ornã por aquele lugar o peso de
estando ele prestes a destruí-la, o Senhor olhou seiscentos siclos de oura “ Então Davi edificou ali
e se arrependeu daquele mal, e disse ao anjo des um altar ao Senhor, e ofereceu holocaustos e ofer
truidor: Basta; agora retira a tua mão. E o anjo tas pacificas; e invocou o Senhor, o qual lhe res
do Senhor estava junto à eira de Ornã, o jebuseu. pondeu do céu com fogo sobre o altar do holo-
16E Davi, levantando os olhos, viu o anjo do Se causta 27E o Senhor deu ordem ao anjo, que tor
nhor, que estava entre a terra e o céu, tendo na nou a meter a sua espada na bainha. “ Nesse
sua mão uma espada desembainhada estendida mesmo tempo, vendo Davi que o Senhor lhe res
sobre Jerusalém. Então Davi e os anciãos, cober pondera na eira de Ornã, o jebuseu, ofereceu ali
tos de sacos, se prostraram sobre os seus rostos. os seus sacrifidos. 29Pbis o tabernáculo do Senhor,
17E disse Davi a Deus: Não sou eu quem mandou que Moisés fizera no deserto, e o altar do holo
que se contasse o povo? E eu mesmo sou o que causto, estavam naquele tempo no alto de Gibeão,
pequei, e procedi muito mal; mas estas ovelhas, “ mas Davi não podia ir perante ele para consul
que fizeram? Seja a tua mão, Senhor meu Deus, tar a Deus, porque estava atemorizado por causa
contra mim e contra a casa de meu pai, porém não da espada do anjo do Senhor.
contra o teu povo para castigá-lo com peste. ’Então disse Davi: Esta é a casa do Senhor
Deus, e este é o altar do holocausto para Israel.
O cronista dá o mesmo número de isra
elitas mortos do que faz o relato de Sa Nesta passagem o cronista revela a ra
muel. Sua descrição de como foi poupada zão por que incluiu este relato em sua
Jerusalém é bem mais vívida, contudo, e história. 2Samuel 24.18 e seguintes não
pode estar mais próxima do original em definiu que significado o relato teve na
alguns de seus detalhes do que 2Samuel. história de Israel, mas a deixa como uma
A menção do anjo ali é abrupta e pressu figura de outra significativa faceta do ca
põe uma menção prévia dele na fonte. De ráter de Davi. O cronista vê nesse evento
fato, 2Samuel 24 por si mesmo não é uma a autenticação de um novo local para o
das fontes mais antigas em Samuel. Claras santuário.
adições do cronista, contudo, podem ser E, virando-se Ornã, viu o anjo. 2Samuel
vistas na expressão olhou o Senhor e na não menciona o fato de que Ornã (Araúna)
impressionante figura do anjo em pé entre viu o anjo, mas antes que viu o rei. A
a terra e o céu, o que é indício de teologia palavra hebraica para anjo é mala’k, e para
posterior. No Israel mais antigo, os anjos rei é melek, e é óbvio que os dois termos
sempre apareciam como homens, e não se podiam ser confundidos. O cronista so
distinguiam deles em aparência. mente menciona os filhos de Ornã. Isto
não é, necessariamente, uma adição feita
d. Um Local Para o Templo (21.18—22.1) por ele, pois pode ter sido apresentada em
18Então o anjo do Senhor ordenou a Gade que
sua fonte.
dissesse a Davi para subir e levantar um altar ao Em Crônicas o montante de dinheiro
Senhor na eira de Ornã, o jebuseu. 19Subiu, pois, que Davi pagou pela propriedade é 12 ve
Davi, conforme a palavra que Gade falara em no zes o mencionado em 2Samuel. Há várias
me do Senhor. 20E, virando-se Ornã, viu o anjo; explicações dadas: (1) alguns tomariam is
e seus quatro filhos, que estavam com ele, se es
conderam. Ora, Ornã estava debulhando triga to como outro exemplo de exagero do cro
21Quando Davi se vinha chegando a Ornã, este nista. Tudo para o Templo devia ser em
olhou e o viu e, saindo da eira, prostrou-se diante ouro, em vez de prata; devia ser mais do
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que Abraão pagou pelo campo de Macpe- preparativos. Assim fez Davi grandes preparativos
la (Gn 23.15). (2) Uma antiga explicação antes da sua morte.
judaica é de que 2Samuel menciona ape
nas o montante designado para cada tribo Conquanto o relato em Reis mencione
conforme a sua avaliação na aquisição da que Salomão empregou trabalho forçado
propriedade do Templo. Crônicas oferece tanto israelita quanto estrangeiro (lRs 5.13;
o número total, que seria de 600 siclos de 9.15; 11.28), não diz quem organizou as
prata, doze vezes a quantia de 50 siclos de equipes de trabalho. É bem possível que
prata. (3) É mais provável que a quantia Davi não tenha estendido os requisitos
maior deve-se ao fato de que 2Samuel se também aos israelitas, medida que se tor
refere apenas ao custo da eira e dos ani nou necessária sob Salomão, com suas
mais para sacrifício, ao passo que Crôni operações mais extensas. Se Davi de fato
cas menciona o custo total de todo o ter empregou trabalho forçado israelita, o cro
reno do Templo (cf. o v. 22). nista, provavelmente, silenciou sobre o as
O qual lhe respondeu do céu, com fogo. sunto, tal como o fez com referência a Sa
Isto não está em 2Samuel. Aqui Deus é lomão, pois isso não contribuiria favoravel
retratado como autenticando o local (cf. mente para sua descrição de Davi.
Lv 9.24). De modo semelhante, Deus apro Os estrangeiros que estavam na terra de
vou a aceitação de gentios na igreja pelo Israel. A palavra hebraica é gerim (sing.„
envio do Espírito Santo (At 10.44). ger). Esta palavra é às vezes traduzida co
Pois o tabernáculo do Senhor. Os versos mo “forasteiros”. Descrevia os estrangeiros
29 e 30 são uma explicação parentética da que residiam em Israel. Eram pessoalmente
razão por que Davi teve permissão para livres, mas sem direitos políticos. Portanto,
sacrificar ali, em vez de no centro oficial podiam ser facilmente explorados, e os
em Gibeão. O verso 28 deve ser lido como hebreus eram freqüentemente advertidos
o início de uma cláusula completada em para não os oprimirem (Ex 22.21; 23.9; Lv
22.1: “Nesse mesmo tempo, vendo Davi(...) 19.33, Dt 24.14; Jr 7.6; Zc 7.10). Aqui
Então disse Davi: Esta é a casa do Senhor Davi é retratado como reunindo-os para
Deus.” cumprirem suas responsabilidades para
Em 2Crônicas 3.1 nos é dito que esse com a coroa, e não como forçando-os à
lugar era o mesmo monte Moriá, onde escravidão. O cronista não identifica a ori
Abraão havia levado Isaque para o sacri gem nacional desses estrangeiros. Os que
fício, e nesse local foi edificado o Templo serviam a Salomão são descritos como
de Salomão. Agora é ocupado pelo Domo remanescentes dos cananeus (lRs 9.15 e
da Mesquita da Rocha. ss.). 2Crônicas 30.25 refere-se aos gerim
como prosélitos, que era a posição deles na
2) Instruções a Salomão (22.2-19) comunidade pós-exílica (cf. Ex 12.49; Lv
24.22; Nm 9.14; 15.15). É possível que o
a. Provisões Para a Edificação (22.2-5) cronista os considere como exercendo tra
2Então Davi deu ordem que se ajuntassem os balho prosélito voluntário nesta passagem.
estrangeiros que estavam na terra de Israel, e en É significativo que o livro de Isaías ante
carregou pedreiros de lavrarem pedras de cantaria cipe que os estrangeiros participarão na
para edificar a casa de Deus. ’'làmbém aparelhou
ferro em abundância, para os pregos das portas
edificação do segundo Templo (Is 60.10),
das entradas e para as junturas; como também tal como fizeram com relação ao primeiro.
bronze em abundância, sem pesá-lo, 4e madeira de Deve ser magnifica em excelência, de
cedro sem conta; porque os sidônios e tirios tra renome e glória. Isto é, literalmente, “deve
ziam a Davi cedro em abundância. 5Porque dizia ser mais do que grande, para renome e pa
Davi: Salomão^ meu filho, ainda é moço e tenro,
e a casa que se há de edificar para o Senhor deve ra um ornamento”. Uma vez que a casa de
ser magnifica em excelência, de renome e glória Deus seria a evidência exterior de sua
em todas as terras; eu, pois, agora lhe farei os magnificência e grandeza, devia estar além
368
de qualquer coisa conhecida antes que sua é o primeiro escritor a perceber que há algo
fama pudesse ser conhecida em todo o inerentemente errado com a guerra, mesmo
mundo. Embora Davi estivesse consciente sendo justa. A maior parte das lutas empre
da impossibilidade da tarefa, ele conhecia endidas por Davi foi-lhe forçada, primeiro
a natureza do desafio. em defesa própria e posteriormente para
segurança nacional. Contudo, ele estava
b. A Palavra a Salomão (22.6-16) desqualificado de fazer o que ansiava mais
6Então chamou a Salomão, seu filho, e lhe do que tudo: edificar a casa de Deus. Davi
ordenou que edificasse uma casa ao Senhor Deus não é condenado por suas atividades mili
de Israel. 7Disse Davi a Salomão: Filho meu,
quanto a mim, tive em meu coração o propósito tares, uma vez que alguém teria de realizar
de edificar uma casa ao nome do Senhor meu esta sanguinolenta obra. Mas um homem
Deus. 8A palavra do Senhor, porém, veio a mim, de paz devia edificar o Templo, pois era o
dizendo: Tii tens derramado muito sangue, e tens propósito de Deus eliminar a guerra um
feito grandes guerras; não edificarás casa ao meu
nome, porquanto muito sangue tens derramado na dia; para isso sua casa foi edificada (cf.
terra, perante mim. 9Eis que te nascerá um filho, Is. 2.2-4).
que será homem de repouso de todos os seus ini Portanto Salomão será o seu nome. A
migos em redor; portanto Salomão será o seu no
me, e eu darei paz e descanso a Israel nos seus
raiz do nome é shalom, paz. Em 2Samuel
dias. 10Ele edificará uma casa ao meu nome. Ele 12.24 e seguinte ele é chamado de Jedidias,
me será por filhoi, e eu lhe serei por pai, e confir “amado do Senhor”. O nome Salomão po
marei o trono do seu reino sobre Israel para sem dia ser um nome de trono, que lhe foi atri
pre. “Agora, meu filho, o Senhor seja contigo; buído quando assumiu o reinado. Retrata
prospera, e edifica a casa do Senhor teu Deus,
como ele falou a respeito de ti. 12lSo-somente te va o propósito a que se aplicaria, em con
dê o Senhor prudência e entendimento para gover traste com a carreira de seu pai. A atri
nares sobre Israel, e para guardares a lei do Se buição de um novo nome favorece a possi
nhor teu Deus. 13Então prosperarás, se tiveres bilidade de que o nome “Davi” ou “ama
cuidado de guardar os estatutos e os juízos que
o Senhor ordenou a Moisés acerca de Israel. do” fosse também um nome de trono, sen
Esforça-te e tem bom ânimo; não temas, nem te do seu nome original El-Hanã (2Sm 21.19).
espantes. uCom trabalhos penosos preparei para Eu darei paz e descanso a Israel nos
a casa do Senhor cem mil talentos de ouro, e um seus dias. Davi fez bem em instar com
milhão de talentos de prata, e bronze e ferro que
por sua abundância, não se pesou; também madei Salomão para ser fiel à lei de Deus, pois
ra e pedras preparei; e tu os aumentarás ainda. quando Salomão desviou-se dela as guer
15Além disso tens trabalhadores em grande núme ras eclodiram em seu remado (cf. IReis
ro, canteiros, pedreiros e carpinteiros, e toda sor 11.14,23,26).
te de peritos em toda espécie de obra. 16Do ouro,
da prata, do bronze e do ferro não há conta. Le Agora, meu filho, o Senhor seja contigo.
vanta-te, pois; mãos à obra! E o Senhor seja con A passagem que se segue (v. 11-16) baseia-
tigo! se amplamente em IReis 2.1-9. Como nes
ta passagem, Davi fala com Salomão com
Disse Davi a Salomão. IReis 8.17,18 as mesmas palavras que Moisés dirigiu a
menciona o relatório de Salomão sobre es Josué. Davi é visto como uma espécie de
ta tarefa. Alguns expositores acham que segundo Moisés, mesmo no relato deute-
o cronista possuía somente o relato em ronômico em Reis; diante disto o cronista
Reis e colocou a fala de Salomão de volta tem precedente histórico para sua opinião
na boca de Davi. Contudo, é também pos sobre Davi. Assim como Josué seguiu
sível que o escritor posterior estivesse em Moisés para cumprir o sonho negado ao
pregando uma fonte mais antiga. grande legislador, também Salomão com
Tu tens derramado muito sangue. É so pletaria o alvo de Davi.
mente nesta passagem e em 28.3 que tal Contudo, é significativo que, enquanto
razão é dada para a recusa de Deus em no livro dos Reis as últimas palavras de
deixar Davi construir o Templo. O cronista Davi tenham a ver com vingança sobre
369
seus inimigos, aqui ele fala de seus pen jam trazidos para a casa que se há de edificar ao
samentos sobre o Templo e seu sonho de nome do Senhor.
paz. O livro dos Reis nada diz sobre o Aqui Davi exorta os lideres a permane
Templo nas últimas palavras de Davi a cerem ao lado de Salomão, em suas ope
Salomão. Aqui a casa de Deus é o assunto rações de edificação. Ele faz-lhes o apelo
principal em sua mente nessas horas derra para buscarem, conforme diz, o Senhor
deiras, e ele nada diz sobre seus inimigos. vosso Deus, levantando-se e edificando-lhe
Com penosos trabalhos preparei (...) e uma casa. Fazendo isto, eles o estarão con
tu os aumentarás ainda. A palavra penoso vidando a vir e estabelecer habitação apro
significa aflição. Davi acumulou essa ri priada com eles. Para o cronista, a verda
queza em meio a suas guerras e problemas deira religião não era simplesmente uma
pessoais. Salomão, num reinado pacífico, piedosa reflexão sobre a divindade, mas
deveria fazer muito mais. envolvia participação ativa na vida institu
Cem mil talentos de ouro, e um milhão cional que celebrava sua presença viva en
de talentos de prata, e bronze e ferro que, tre o seu povo.
por sua abundância, não se pesou (...) tra Para que a arca (...) e os vasos (...) se
balhadores em grande número. Cem mil jam trazidos para a casa. O povo estabele
talentos de ouro corresponderiam a 3.775 cido precisava de uma casa permanente
toneladas. Um milhão de talentos de prata para Deus. A sua habitação não deveria
seriam 37.750 toneladas. O equivalente ser inferior à deles. Este princípio ainda
em dólares seria um montante atingindo tem validade.
a casa dos bilhões (cf. Myers, I, p. 152).
Tais montantes estão fora do possível, pois 3) Os Líderes na Adoração (23.1—25.31)
é dito que Salomão mais tarde arrecada
va anualmente 666 talentos de ouro (lRs a. Os Levitas (23.1-32)
10.14). O cronista, obviamente, está empre
gando a hipérbole. Ele, especificamente, diz ‘Ora, sendo Davi já velho e cheio de dias, fez
Salomão, seu filho, rei sobre Israel. 2E reuniu
que o bronze e o ferro estavam além do todos os chefes de Israel, como também os sacer
cálculo e os trabalhadores, em grande nú dotes e levitas. 3Foram contados os levitas de trin
mero, sem especificação, e certamente ten ta anos para cima; e foi o número deles, segundo
cionava dizer que o montante em ouro e o sen registra, trinta e oito mil homens. 4Deste
número vinte e quatro mil promoverão a obra da
prata estava acima de possibilidade de casa do Senhor; seis mil servirão como oficiais e
cálculo. juizes; 5quatro mil como porteiros; e quatro mil
Elmslie (p. 420) está correto quando diz: para louvarem ao Senhor com os instrumentos,
“Nem o cronista judaico nem seus leitores que eu fiz para o louvar, disse Davi. 6Davi os
judaicos podiam ter imaginado que pudes repartiu por turmas segundo os filhos de Levi:
Gérson, Coate e Merári. 7Dos gersonitas: Ladã
se haver alguém tão prosaico, para admitir e Simei. 8Os filhos de Ladã: Jeiel o chefe, Zetão
literalmente as palavras douradas.” e Joel, três. 9Os filhos de Simei: Selomite, Haziel
e Arã, três; estes foram os chefes das casas pater
c. O Encargo dos Líderes (22.17-19) nas de Ladã. 10Os filhos de Simei: Jaate, Ziza,
Jeús e Berias: estes foram os filhos de Simei, qua
’’Também Davi deu ordem a todos os chefes tro. "Jaate era o chefe, e Ziza o segunda Mas
de Israel que ajudassem a Salomão, seu Olho, Jeús e Berias não tiveram muitos filhos; pelo que
dizendo: 18Porventura não está convosco o Senhor estes, contados juntos, se tornaram uma só casa
vosso Deus, e não vos deu repouso por todos os paterna. l2Os filhos de Coate: Anrão, Izar, He-
lados? Pois entregou na minha mão os habitantes brom e Uziel, quatro. 13O s filhos de Anrão: Arão
da terra; e a terra foi subjugada diante do Senhor e Moisés. Arão foi separado para consagrar as
e diante do seu pova '’Disponde, pois, agora o coisas santíssimas, ele e seus filhos, eternamente
vosso coração e a vossa alma para buscardes ao para queimarem incenso diante do Senhor, e o
Senhor vosso Deus; e levantai-vos, e edificai o servirem, e pronunciarem bênçãos em nome de
santuário do Senhor Deus, para que a arca do Deus para sempre l4Mas quanto a Moisés, ho
pacto do Senhor e os vasos sagrados de Deus se mem de Deus, seus filhos foram contados entre os
370
da tribo de Levi. 15Os filhos de Moisés: Gérson Essa medida, pela perspectiva do cronista,
e Eliézer. 16De Gérson: Sebuel o chefe 17De Elié- desfruta o beneplácito de Deus.
zer: Reabias o chefe; e Eliézer não teve outros fi
lhos; porém os filhos de Keabias foram muito nu A contagem dizia respeito aos levitas
merosos. 18De Izar: Selomide o chefe. 19Os filhos que tinham 30 anos de idade ou mais.
de Hebrom: Jerias o chefe, Amarias o segundo, Contudo, os que tinham 20 anos ou mais
Jaaziel o terceiro, e Jecameão o quarta 20Os fi
lhos de Uziel: Mica o chefe, e Issias o segunda deviam levar avante a obra permanente do
21Os filhos de Merári: Mali e Musi. Os filhos de novo Templo de acordo com as últimas
Mali: Eleazar e Quis. 22Eleazar morreu, não ten instruções de Davi (23.27). Esta discrepân
do filhos, mas tão-somente filhas; e os filhos de cia é difícil de se explicar. O verso 3 pode
Quis, seus irmãos, tomaram-nas por mulheres. ter, originalmente, rezado “vinte”, em lugar
MOs filhos de Musi: Mali, Eder e Jerimote, três.
24Esses são os filhos de Levi, segundo as suas de “trinta”. Por outro lado, alguns intér
casas paternas, isto ê, segundo os chefes das casas pretes julgam que o verso 27 é contribui
paternas, conforme o número dos que foram regis ção de uma revisão posterior de Crônicas,
trados pelos seus nomes, individualmente, da ida quando os levitas eram menos numerosos,
de de vinte anos para cima, os quais trabalhavam
no serviço da casa dos Senhor. “ Pois Davi disse: e, portanto, o limite de idade precisou ser
O Senhor Deus de Israel deu repouso ao seu po baixado. Outros insistem em que o verso
vo; e ele habita em Jerusalém para sempre “ Tam 27 reflete as condições prevalecentes quan
bém os levitas não terão mais de levar o taberná do os sacerdotes zadoquitas tiveram êxito
culo e todos os objetos pertencentes ao serviço do
mesma 27Eis por que, segundo as últimas pala
em estabelecer-se como autoridade, levan
vras de Davi, foram contados os levitas da idade do muitos levitas a deixar o serviço do
de vinte anos para cima. “ Porque o seu cargo Templo e assim dizimando suas fileiras. É
seria o de assistirem os filhos de Arão no serviço mais provável que o cronista esteja sim
da casa do Senhor, nos átrios, e nas câmaras, na plesmente dizendo que o censo foi tomado
purificação de todas as coisas sagradas, e em qual
quer trabalho para o serviço da casa de Deus, tal como Moisés o prescreveu em Núme
’-’cuidando dos pães da proposição, e da flor de ros 4.3 e seguintes, que dizia respeito so
farinha para a oferta de cereais, quer seja de bo mente aos de 30 anos de idade e acima.
los ázimos, quer seja do que se assa na panela, Ele estava convicto de que o limite de 20
quer seja do que é misturado com azeite, e de to anos foi estabelecido pelo próprio Davi e
da sorte de medida e pesos; “ e de estarem cada
manhã em pé para render graças e louvor ao Se havia continuado desde então (cf. 2Cr
nhor, e semelhantemente à tarde; 31e oferecerem 31.17; Ed 3.8). Davi mesmo fez o ajuste
continuamente perante o Senhor todos os holo- para as cerimônias permanentes do novo
caustos, nos sábados, nas luas novas e nas festas santuário. A edificação do Templo reque
fixas, segundo o número ordenada 32Também
teriam a seu cargo a tenda da revelação, o lugar ria os serviços dos levitas mais amadure
santo, e os filhos de Arão, seus irmãos, no serviço cidos. As cerimônias regulares requeriam
da casa do Senhor. o treinamento sistemático dos mais jovens
também.
Este capítulo trata primeiro dos recen A descrição da obra dos levitas (v. 24-32)
seadores das famílias levitas (v. 1-23), que não deixa dúvidas de que sua posição era
não haviam sido incluídas na problemática subserviente à dos sacerdotes. Eles deviam
aventura registrada em 21.1—22.1. Esta ser servos dos sacerdotes, bem como músi
passagem devia ser considerada em con cos do Templo, com a última função me
fronto com a anterior, como uma seqüên lhorando um pouco o seu status. Toda
cia e um contraste. Este censo não evoca via, o versículo 23 nos lembra novamente
a ira de Deus como o outro, pois não foi que, como músicos, eles estavam ainda
de caráter militar, que objetivava contribuir subordinados aos sacerdotes e não consti
para as ambições pessoais de Davi. Antes, tuíam um grupo independente da autori
o propósito, neste caso, foi a organização dade arônica. Esta seção, conquanto cor
do exército litúrgico de Deus, para execu respondendo aos regulamentos de Núme
tar os serviços da congregação celebrante. ros 3, circunscreve de tal modo o papel do
371
levita, enquanto o cronista tende a exaltá- dentre os filhos de Eleazar do que dentre os filhos
lo, que alguns julgam ser ela uma adição de Itamar; e assim foram distribuidos: dos filhos
de Eleazar, chefes das casas paternas, dezesseis;
posterior à sua obra, ali colocada num e dos filhos de Itamar, segundo suas casas pater
tempo em que as distinções eram mais nas, oito. 5Assim foram distribuidos por sortes,
rígidas. Contudo, essa parece ser a posição tanto uns como os outros; porque havia príncipes
do cronista ao longo de todo o seu traba do santuário e príncipes de Deus, tanto dentre os
lho. Embora ele exalte os levitas, recusa-se filhos de Eleazar, como dentre os filhos de Ita
mar. 6E os registrou Semaias, filho de Natanel, o
a fazê-lo às expensas da importância dos escrivão dentre os levitas, diante do rei, dos prín
sacerdotes. Quando quer que trate um cipes, de Zadoque, o sacerdote, de Aimeleque, fi
grupo em relação a outro, os sacerdotes lho de Abiatar, e dos chefes das casas paternas en
sempre ocupam posição superior (cf. 6.48; tre os sacerdotes e entre os levitas, tomando-se
uma casa paterna para Eleazar, e outra para Ita
16.39,40). mar. 7Assim a primeira sorte saiu a Jeoiaribe, a
O número de levitas registrado no censo segunda a Jedaías, 8a terceira a Harim, a quarta
tem ocasionado considerável debate. Trinta a Seorim, 9a quinta a Malquias, a sexta a Mia-
e oito mil homens acima de 30 anos foram mim, 10a sétima a Hacoz, a oitava a Abias, "a
contados. Isto é comparável aos 8.580 da nona a Jesuã, a décima a Secanias, 12a undécima
a Eliasibe, a duodécima a Jaquim, 13a décima
época de Moisés (Nm 4.36 e ss.). Alguns terceira a Hupá, a décima quarta a Jesebeade, 14a
intérpretes tomam isto como outro exem décima quinta a Bilga, a décima sexta a Imer, l5a
plo da tendência do cronista para exagerar, décima sétima a Hezir, a décima oitava a Hapi-
pois o número parece muito alto para o zes, 1<sa décima nona a Petaías, a vigésima a Jeez-
quel, 17a vigésima primeira a Jaquim, a vigésima
tempo de Davi. Contudo, se havia 8 mil segunda a Gamul, 18a vigésima terceira a Delaias,
no período mosaico, cinco vezes mais esse a vigésima quarta a Maazias. 19Esta foi a distri
montante não devia ser muito para o tem buição deles no seu serviço, para entrarem na casa
po de Davi. A questão essencial é o senti do Senhor, segundo lhes fora ordenado por Arão,
do da palavra “mil” (heb., ’elep). Sendo seu pai, como o Senhor Deus de Israel lhe tinha
mandada 20Do restante dos filhos de Levi: dos
tomada para representar uma unidade de filhos de Anrão, Subael; dos filhos de Subael,
número indeterminado (cf. Myers, I, p. Jedeías. 21Quanto a Reabias: dos filhos de Rea-
159), então a descrição é mais realística. bias, Issijá o chefe; 22dos izaritas, Selomote; dos
O recenseamento revelou que havia 38 filhos de Selomote, Jaate; 23dos filhos de Hebrom:
Jerias o chefe, Amarias o segundo, Jaaziel o ter
unidades no reinado de Davi contra oito ceira, Jecameão o quarto; Mdos filhos de Uziel,
unidades durante o tempo de Moisés. Ha Mica; dos filhos de Mica, Samir; 2So irmão de
via 580 levitas no período anterior, sendo Mica, Issijá; dos filhos de Issijá, Zacarias. “ Os
o número exato não incluído no posterior. filhos de Merári: Mali e Musi; dos filhos de Jaa-
Numa tal análise, o número que se segue zias, Beno; 27os filhos de M erári: de Jaazias:
Beno, Soão, Zacur e Ibri; “ de Mali: Eleazar; e
a ’elep (mil) seria a contagem real. Outra este não teve filhos. 29quanto a Quis: dos filhos de
explicação pode ser a de que a fonte do Quis, Jerameel; os filhos de Musi: Mali, Eder
cronista, o midrash levítico, teria feito e Jerimote: esses foram os filhos dos levitas, se
uma estimativa de qual poderia ter sido o gundo as suas casas paternas. 31Estes também,
como seus irmãos, os filhos de Arão, lançaram
número ao tempo de Davi. O cronista está sortes diante do rei Davi, de Zadoque, de Aïmele-
seguindo sua fonte nesta questão. que e dos chefes das casas paternas entre os sa
cerdotes e entre os levitas; assim fizeram, tanto
b. Sacerdotes e Levitas (24.1-31) para o chefe de casa paterna, como para o seu
irmão menor.
'Às turmas dos filhos de Arão foram estas: os
filhos de Arão: Nadabe, Ábiú, Eleazar e Itamar. Nesta passagem o cronista primeira
2Mas Nadabe e Àbiú morreram antes de seu pai, mente trata das principais famílias sacer
e não tiveram filhos; por isso Eleazar e Itamar dotais e depois apresenta outra lista leví-
exerciam o sacerdócio. 3E Davi, juntamente com
Zadoque, dos filhos de Eleazar, e com Aimeleque, tica (v. 20-31), que levanta os problemas
dos filhos de Itamar, os distribuiu segundo os mais sérios do capítulo. Não está absoluta
deveres do seu serviça 4E acharam-se mais chefes mente claro por que ela foi acrescentada
372
\\
como suplemento do relato em 23.7-23. como havia feito desde os dias de Salomão
Dez nomes ocorrem na lista que não estão (cf. lRs 4.2; 2Cr 31.10; lCr 6.4 e ss.). O
no capítulo 23, a maioria representando cronista menciona um dos filhos de Itamar,
uma geração adicional, além dessa lista. A que voltou com Esdras, e pode ser suben
família de Gérson não é mencionada, pro tendido que serviria como sacerdote (Ed
vavelmente, porque não havia novas famí 8.2), mas certamente não seria elegível para
lias envolvidas neste caso. Ou o cronista o sumo sacerdócio. Estranhamente, não
empregou uma lista mais antiga no capí mencionou especificamente a posição de
tulo 23 e nesta passagem a atualiza, ou o linhagem de Itamar, mas referiu-se apenas
capítulo anterior refere-se a famílias do aos levitas e zadoquitas. Talvez não soubesse
tempo do cronista e a passagem em lide de quaisquer sobreviventes no exílio (Ez
foi acrescentada após o seu tempo. Alguns 44.15 e ss.).
expositores julgam que esta lista, com seus
nomes adicionais, é uma tentativa de ele
c. Os Cantores (25.1-31)
var o número de famílias levíticas para 24,
o mesmo que para sacerdotes (v. 18) e os 'Também Davi, juntamente com os capitães do
cantores (25.31). Todas as tentativas para exército, separou para o serviço alguns dos filhos
de Asafe, e de Hemã e de Jedútun, para profeti
identificar os 24, contudo, têm requerido zarem com harpas, com alaúdes, e com címbalos.
revisão drástica do texto, sem adequada Este foi o número dos homens que fizeram a obra
evidência objetiva. segundo o seu serviço: 2dos filhos de Asafe: Zacur,
A menção de Aimeleque como servindo José, Netanias e Asarela, filhos de Asafe, a cargo
de Asafe, que profetizava sob as ordens do rei. 3De
juntamente com Zadoque é uma declaração Jedútun, os filhos de Jedútun: Gedalias, Zeri,
desconcertante. Em outra parte consta Jesaías, Hasabias e Matitias, seis, a cargo de seu
Abiatar (2Sm 15.35; 17.15; lCr 15.11; lRs pai, Jedútun, que profetizava com a harpa, louvando
4.4), exceto em 2Samuel 8.17. Aimeleque ao Senhor e dando-lhe graças. 4De Hemã, os filhos
de Hemã: Buquias, Matanias, Uziel, Sebuel, Jeri-
é o nome tanto do pai de Abiatar quanto mote, H ananias, H an ân i, E liatá, Gidálti,
de seu filho (ISm 22.20; 2Sm 8.17). Aparen Rom ânti-Ézer, Josbecasa, M alóti, H otir e
temente, ocorreu aí uma corrupção textual Maaziote. 5Todos estes foram filhos de Hemã, o
ou a referência representa uma confusão vidente do rei, segundo a promessa de Deus de
de tradições nas fontes do cronista, sendo exaltá-la Deus dera a Hemã catorze filhos e três
filhas. 6Todos estes estavam sob a direção de seus
mais provável a última hipótese. A trans pais para a música na casa do Senhor, com címbalos,
posição revertida dos nomes de Aimeleque alaúdes e harpas para o serviço da casa de Deus.
e Abiatar ocorreu em Marcos 2.26, onde E Asafe, Jedútun e Hemã estavam sob as ordens
Abiatar é mencionado como o sacerdote do rei. 7Era o número deles, juntamente com seus
irmãos instruídos em cantar ao Senhor, todos eles
quando Davi comeu o pão santo, enquanto mestres, duzentos e oitenta e oito. 8E determi
o relato em Samuel claramente diz ter sido naram seus cargos por sortes, todos igualmente,
Aimeleque (ISm 21.1). tanto o pequeno como o grande, assim o mestre
como o discípula 9A primeira sorte, que era de
As tensões existentes entre as duas casas Asafe, saiu a José; a segunda a Gedalias, que com
rivais de Itamar e Eleazar, finalmente resol seus irmãos e filhos eram doze; 10a terceira a
vidas em favor de Eleazar (os sacerdotes Zacur, seus filhos e irmãos, eram doze; ua quarta
zadoquitas), são suavizadas no relato do a Izri, seus filhos e irmãos, doze; 12a quinta a
cronista por um consenso a que todos os Netanias, seus filhos e irmãos, doze; I3a sexta a
Buquias, seus filhos e irmãos, doze; 14a sétima a
partidos se submetem. Haveria igualdade Jesarela, seus filhos e irmãos, doze; >5a oitava a
de posto, porém mais turnos foram conce Jesaías, seus filhos e irmãos, doze; 16a nona a
didos aos descendentes de Itamar, uma vez Matanias, seus filhos e irmãos, doze; l7a décima
que eram mais numerosos. Pelo peso de a Simei, seus filhos e irmãos, doze; 18a undécima
a Azarei, seus filhos e irmãos, doze; 19a duodécima
maior número, o ramo de Zadoque teria a Hasabias, seus filhos e irmãos, doze; 20a décima
mais influência quanto aos ofícios do terceira a Subael, seus filhos e irmãos, doze; 21a
Templo e controlaria o sumo sacerdócio, décima quarta a Matitias, seus filhos e irmãos, doze;
373
22a décima quinta a Jerimote, seus filhos e irmãos, acompanhamento, como o Davi tradicional.
doze; 23a décima sexta a Hananias, seus filhos e Os profetas do Antigo Testamento tinham
irmãos, doze; décima sétima a Josbecasa, seus um contato mais íntimo com o culto do
filhos e irmãos, doze; 25a décima oitava a Hanâni,
seus filhos e irmãos, doze; Z6a décima nona a que se reconhecia anteriormente. Contudo,
Malóti, seus filhos e irmãos, doze; 27a vigésima a durante o período clássico (oitavo ou sétimo
Eliatá, seus filhos e e irmãos, doze; “ a vigésima século a.C.) sua parte parecia um papel de
primeira a Hotir, seus filhos e irmãos, doze; 2,a orador, e não de cantor. Certamente, poucos
vigésima segunda a Gidálti, seus filhos e irmãos,
doze; Ma vigésima terceira a Maaziote, seus filhos dentre eles eram levitas. Ao tempo do
e irmãos, doze; 31a vigésima quarta a Românti cronista, eles haviam sido absorvidos no
Ézer, seus filhos e irmãos, doze. sistema levítico (cf. 2Cr 20.13-17). Conquan
to essa fusão de profecia e culto tendesse
Este capítulo constitui uma tentativa de a usurpar a individualidade e destacasse
exaltar o ofício dos cantores levitas. A orga mais ações de graças e louvores do que
nização deles é traçada até Davi, e eram censura pelo pecado, sublinhava a possibi
responsáveis por 24 turnos, tal como os lidade de música como uma forma
sacerdotes. Não há razão para se duvidar apropriada de comunicar a palavra divina.
que a persistente tradição do interesse de Nos coros levíticos era provável que mais
Davi por música tivesse base histórica (cf. dentre o povo de Deus pudessem ser
ISm 16.23; 18.10; 19;9 2Sm 1.17 e ss.; profetas, cumprindo o desejo de Moisés
6.5,14). A música estava altamente desen (Nm 11.29), do que no tempo das grandes
volvida entre os cananeus e havia evoluído personalidades proféticas, quando indiví
suficientemente ao tempo de Ezequias para duos isolados pregavam a palavra. Contudo,
que Senaqueribe aceitasse dele cantores era mais fácil que a profecia nesse meio se
tanto do sexo masculino quanto do femi tornasse institucionalizada. Existe a possi
nino. Obviamente, as mulheres não eram bilidade de que o próprio cronista fosse um
oficiantes litúrgicas (cf. ISm 18.6 e ss.). desses cantores proféticos (cf. o seu interesse
Chefes do serviço (em nossa versão, nessa área, lCr 15.16-22; 16.4-42; 2Cr
“capitães do exército”). Literalmente, “os 5.12,13; 29.27-30; Ed 3.10; Ne 12.27), sendo
capitães (príncipes) das hostes”. Esta que tal vocação profética o estivesse prepa
expressão refere-se, alhures, a comandantes rando para seu papel como historiador. Na
militares (cf. 2Sm 2.8; lCr 19.16; 27.3,34). tradição hebraica os livros de Josué e 2Reis
Não havia razão por que comandantes mili eram chamados de os Profetas Anteriores.
tares tivessem que designar cantores levitas. Certamente, o cronista, então, nesse sentido,
Aqui está outro exemplo da aplicação, pelo é um dos posteriores.
cronista, de terminologia militar para
oficiais de culto. Eles eram a verdadeira Sob as ordens do rei. Os cantores não
defesa de Israel. Os editores deuteronômicos eram diretamente responsáveis para com
conservaram, anteriormente, um senti o sumo sacerdote, mas para com o próprio
mento semelhante em relação a Elias (2Reis rei, que era um líder não só político, mas
2.12). O que a tradição dizia com respeito sagrado. Hemã (...) Maaziote. Esta lista de
a Elias o cronista aplicou aos líderes do culto nomes podia, originalmente, ter sido uma
público. prece. Como a redação pôde ter tido lugar,
Para profetizarem com harpas. Aqui a ninguém sabe. (Pára uma possível recons
função dos cantores levitas é ligada à trução, cf. Myers, 1, p. 172 e s.)
profecia. A ligação entre música e profecia Segundo a promessa de Deus de exaltá-
era antiga (cf. ISm 10.5). No período ante -lo. Literalmente, “segundo a palavra de
rior, a profecia parece referir-se a uma Deus para levantar sua buzina”. A expressão
experiência extática, provavelmente influen idiomática “levantar a buzina” em outra
ciada por música (cf. 2Rs 3.15). Aqui o parte significa exaltar o poder de alguém
cantor, aparentemente, tocava o seu próprio (cf. ISm 2.10; SI 89.17, 92.10; 148.14, Lm
374
2.17). Aqui, provavelmente, se refere à exal depósitos. 16A Supim e Hosa a do ocidente;, perto
tação feita a Hemã por causa de seus muitos da porta de Salequete, junto ao caminho da subida,
uma guarda defronte de outra guarda.17Ao oriente
filhos. estavam seis levitas, ao norte quatro por dia, ao
Determinaram seus cargos por sortes. sul quatro por dia, porém para a casa dos depó
Asafe teve designação do primeiro cargo, sitos de dois em dois. 18Para Parbar, ao ocidente:
e assim sua família se alternou primeiro com quatro junto ao caminho, e dois junto a Parbar.
19Essas foram as turmas dos porteiros dentre os
Jedútun e a seguir com Hemã. A família filhos dos coraítas, e dentre os filhos de Merári.
deste último ocupou as posições dos turnos
15-24, uma vez que era tão numerosa. É Este é um exemplo notável da inclinação
interessante notar que professores e alunos do cronista para elevar as fileiras dos servos
compartilhavam no mesmo nível dos do Templo. Seu status levítico não está claro
deveres práticos. A palavra traduzida por emEsdras 2.42,70; 10.24; Ne 10.28; 11.19.
“professor” literalmente significa “alguém Aqui é evidente.
que induz a discernir”. O método deles, A do sul. O templo de Salomão não tinha
portanto, certamente não era o de memo portão ao sul, pois ali estava o palácio.
rização e imitação barata. Nem constituía Alguns expositores, portanto, vêem isto
pura teoria, pois o próprio professor recebia como um anacronismo, o cronista arbitra
incumbências práticas. riamente fazendo atribuições segundo o
arranjo no segundo Templo (cf. Ez
4) Funcionários Subalternos (26.1-32) 40.24,28). Contudo, este verso poderia ser
tomado como significando que a família de
a. Os Porteiros (26.1-19) Obede-Edom recebeu a casa de depósitos, e
não o portão sul. Adicionalmente, conquan
'Quanto às turmas dos porteiros: dos coraítas: to o palácio estivesse situado no sul, uma
Meselemias, filho de Coré, dos filhos de Asafe. 2E
foram os filhos de Meselemias: Zacarias o primo
entrada privativa também ali estava e preci
génito, Jediael o segundo, Zebiadas o terceiro, sava ser guardada, para que alguma pessoa
Jatniel o quarto, 3Elão o quinto, Jeoanã o sexto, não autorizada não adentrasse o palácio
Elioenai o sétim a 4Os filhos de Obede-Edom pela área do Templo. Em alguns casos,
foram: Semafas o primogênito, Jeozabade o pessoas desqualificadas poderiam tentar
segundo, Joã o terceiro, Sacar o quarto, Natanael
o quinta, 5Amiel o sexto, Issacar o sétimo, Peuletai entrar no conjunto do Templo pelo palácio,
o oitavo; porque Deus o tinha abençoado. tais como guerreiros, por um golpe pala
6Também a seu filho Semaías nasceram filhos, que ciano, ou alguém cerimonialmente impuro.
dominaram sobre a casa de seu pai; porque foram Porta de Salequete. Ela não é mencio
homens valentes. 7Os filhos de Semaías: Ótni,
Refael, Obede e Elzabade, com seus irmãos, homens
nada alhures na Bíblia, mas a referência à
valentes, Eliú e Semaquias. 8Todos estes foram dos “entrada que sobe” assinala sua posição
filhos de Obede-Edom; eles e seus filhos e irmãos, oposta ao Vale de Tiropeiom, no principal
homens capazes e de força para o serviço, eram acesso, a partir da cidade baixa e a colina
sessenta e dois, de Obede-Edom. 9Os filhos e os ocidental.
irmãos de Meselemias, homens valentes, foram
dezoito. I0De Hosa, dos filhos de M erári, foram Guarda defronte de outra guarda. Ou
filhos: Sinri o chefe (ainda que não era o primo eles cumpriam os seus deveres alternada
gênito, contudo seu pai o constituiu chefe), mente ou tinham postos defronte um do
"Hilquias o segundo, Tebalias o terceiro, Zacarias outro.
o quarto; todos os filhos e irmãos de Hosa foram
treze. 12Destes se fizeram as turmas dos porteiros,
A Parbar. Esta misteriosa palavra
isto é, dos homens principais, tendo cargos como hebraica relaciona-se com parwarim
seus irmãos, para ministrarem na casa do Senhor. (recintos) de 2Reis 23.11. Parece derivar de
13E lançaram sortes, assim os pequenos como os uma raiz persa, significando “possuindo
grandes, segundo as suas casas paternas, para cada luz”. A opinião de eruditos mais antigos
porta. 14E caiu a sorte do oriente a Selemias.
Depois se lançou a sorte por seu filho Zacarias, de que havia algum tipo de pavilhão aberto
conselheiro entendido, e saiu-lhe a do norte. 15A adjacente ao Templo foi confirmada por
Obede-Edom a do sul; e a seus filhos a casa de uma inscrição lídia vinda de Sardes.
375
b. Os Tesoureiros (26.20-28) dois mil e setecentos homens valentes, chefes das
casas paternas, o rei Davi constituiu sobre os ru-
20E dos levitas, Áías tinha cargo dos tesouros benitas e os gaditas, e a meia tribo dos manassi-
da casa de Deus e dos tesouros das ofertas dedi tas, para todos os serviços de Deus, e para todos
cadas. 21Quanto aos filhos de Ladã, os filhos dos os negócios do rei.
gersonitas que pertencem a Ladã, chefes das casas Para os negócios de fora, como oficiais
paternas de Ladã: Jeiéli. 22Os filhos de Jeiéli:
Zetão e Joel, seu irmão; estes tinham cargo dos e juizes. Esses levitas tinham responsabili
tesouros da casa do Senhor. 23Dos anramitas, dos dades fora do próprio Templo, entre a po
izaritas, dos hebronitas, dos uzielitas; 24Sebuel, pulação em geral. Não há evidência de que
filho de Gérson, o filho de Moisés, que era chefe Davi tivesse qualquer sistema de impostos,
dos tesouros. 2^Seus irmãos: de Eliézer foi filho
Reabias, de quem foi filho Jesaías, de quem foi filho de modo que seus deveres, aparentemente,
Jorão, de quem foi filho Zicri, de quem foi filho diziam respeito a coletar materiais para a
Selomote. 26Este Selomote e seus irmãos tinham construção do Templo. Em casos de de
a seu cargo todos os tesouros das ofertas dedicadas, manda, eles também deviam ser juizes. De
que o rei Davi e os chefes das casas paternas, chefes
de milhares, e de centenas, e chefes do exércitos
acordo com 2Crônicas 19.4-11, os levitas
tinham dedicada 27Dos despojos das guerras dedi eram designados para postos judiciais no
caram ofertas para consertarei^ a casa do Senhor. reinado de Jeosafá. Josefo confirma esta
“ Também tudo quanto fora dedicado por Samuel, prática antiga (Antiq. IV, 8,14). Quaisquer
o vidente, Saul, filho de Quis, Abner, filho de Ner, que fossem os seus verdadeiros deveres,
e Joabe, filho de Zeruia, isto é, tudo quanto qual
quer havia dedicado estava sob a guarda de aqui está um exemplo de recebimento de
Selomote e seus irmãos. autoridade pelos levitas sobre os civis fora
Tesouros da casa de Deus (...) tesouros do culto regular.
das ofertas dedicadas. Os primeiros resul Em todos os negócios do Senhor e no
tavam das contribuições pelo povo; os serviço do rei. Literalmente, “para toda
últimos eram as dádivas especiais de presas questão (palavra) de Deus e toda questão
de guerra. (palavra) do rei”. Isto parece ser uma atri
Tudo quanto fora dedicado por buição bastante ambígua. Como as ques
SamueK...) Saul(...) Abner(...) Joabe. O tões seculares deviam ser distinguidas das
cronista, que reluta em mencionar Saul, fá- sagradas? É improvável que os antigos he
-lo aqui. Aparentemente, era um ritual breus fizessem qualquer distinção. Como
regular que um chefe militar ou rei doasse podia uma ordem de Deus ser vista como
parte de sua pilhagem ao seu Deus como distinta da do rei? Para muitos israelitas
sinal de gratidão pela vitória. Abraão pagou também aqui não havia qualquer diferen
seu dízimo dos espólios de guerra a Melqui- ça. Não admira que precisassem de juizes
sedeque (Gn 14.20). Antes que uma falta nesta área, mas os levitas devem ter tido
de percepção espiritual (Elmslie, p. 430), era dificuldade em serem objetivos. O proble
um sinal de devoção sincera à divindade ma ainda está conosco. Jesus certamente
naquele tempo. via cada área da existência como sendo
vivida sob a autoridade de Deus; não pode
c. Autoridades Civis (26.29-32) haver separação entre o secular e o sagra
do (Lc 16.10-13). Contudo, ele não suavi
29Dos izaritas, Quenanias e seus filhos foram zou a tensão entre a lealdade de César (o
postos sobre Israel para os negócios de fora, como Estado) e os deveres básicos de alguém
oficiais e juizes. ^Dos hebronitas foram Hasabias
e seus irmãos, homens valentes, mil e setecentos,
para com Deus (Mt 22.17 e ss.).
que tinham a seu cargo Israel, ao ocidente do
Jordão, em todos os negócios do Senhor e no ser 5) Exército de Infantaria (27.1-15)
viço do rei. 31Jerias era o chefe dos hebronitas,
segundo as suas gerações, conforme as casas pa ‘Ora, os filhos de Israel segundo o seu núme
ternas. No ano quarenta do reino de Davi foram ro, os chefes das casas paternas, e os chefes dos
procurados e acharam-se entre eles varões valen milhares e das centenas, com os seus oficiais, que
tes em Jazer de Gileade. 32Á ele e a seus irmãos, serviam ao rei em todos os negócios das turmas
37 6
que entravam e saíam de mês em mês, em todos tendo média mais próxima de 100 do que
os meses do ano, eram em cada turma vinte e qua de 1 mil, então o arranjo bem que foi
tro mil. 2Sobre a primeira turma, no primeiro
mês, estava Jasobeão, filho de Zabdiel; em sua
possível. Neste caso, cerca de 3 mil ho
turma havia vinte e quatro mil. 3Era ele descen mens estariam de plantão em cada turma
dente de Pérez, e chefe de todos os comandantes de serviço.
do exército para o primeiro mês. 4Sobre a turma Chefes dos milhares e das centenas.
do segundo mês estava Dodai, o aoíta, com a sua Este parecem ser termos definidos para
turma, cujo chefe era Miclote; e em sua turma
havia vinte e quatro mil. sO terceiro comandante unidades militares, e não para números
do exército para o terceiro mês, era o chefe Be precisos. A unidade maior chamava-se um
naías, filho do sacerdote Jeoiada; e em sua turma ’elep (mil) e a menor um me’ah (cem). Os
havia vinte e quatro mil. 6Este é aquele Benaías nomes não indicam o número exato na
que era o varão valente entre os trinta e comandava
os trinta; e da sua turma era seu filho Amizabade. unidade, mas apenas os limites superiores.
O quarto, do quarto mês, era Asael, irmão de O ’elep nunca alcança mais do que 1 mil,
Joabe, e depois dele Zebadias, seu filho; e em sua mas pode ser bem menos. Assim também
turma havia vinte e quatro mil. 80 quinto, do o me’ah nunca totalizava mais do que 100,
quinto mês, Samute, o izraíta; e em sua turma ha màs era, geralmente, menos. Qualquer uni
via vinte e quatro mil. 90 sexto, do sexto mês,
Uira, filho de Iques, o tecoíta; e em sua turma dade com mais de 100 era um ’elep. Quan
havia vinte e quatro mil. 10O sétimo, do sétimo do números exatos eram indicados, se
mês, Helez, o pelonita, descendente de Efraim; e guiam o nome da unidade. Os “mil e sete
em sua turma havia vinte e quatro mil. nO oitavo, centos” (26.30) que tinham a supervisão
do oitavo mês, Sebecai, o husatita, dos zeraítas;
e em sua turma havia vinte e quatro mil. 120 nono, sobre Israel ao ocidente do Jordão eram
do nono mês, Abiezer, o anatotita, dos benjamitas; “uma unidade com sete centenas de ho
e em sua turma havia vinte e quatro mil. 130 dé mens”. Semelhantemente, os “dois mil e se
cimo, do décimo mês, Maarai, o netofatita, dos tecentos” (26.32) que supervisionavam o
zeraítas; e em sua turma havia vinte e quatro mil. oriente do Jordão eram “duas unidades to
I40 undécimo, do undécimo mês, Benaías, o pira-
tonita, dos filhos de Efraim; e em sua turma havia talizando setecentos homens”.
vinte e quatro mil. lsO duodécimo, do duodécimo
mês, Heldai, o netofatita, de Otniel; e em sua 6) Dirigentes Tribais (27.16-24)
turma havia vinte e quatro mil.
"•Sobre as tribos de Israel estavam estes: so
Esta passagem assemelha-se bastante bre os rubenitas era chefe Eliézer, filho de Zicri;
sobre os simeonitas, Sefatias, filho de Maacá;
com a lista dos heróis de Davi registrada 17sobre os levitas, Hasabias, filho de Quemuel:
em 2Samuel 23.8-39 e lCrônicas 11.11-47, sobre os aronitas, Zadoque; 18sobre Judá, Eliú,
mas não deriva simplesmente delas. Repre dos irmãos de Davi; sobre Issacar, Onri, filho de
senta uma fonte independente, que, em sua Micael; '“’sobre Zebulom, Ismaías, filho de Oba-
dias; sobre Naftali, Jerimote, filho de Azriel;
forma original, foi, provavelmente, um tan 20sobre os filhos de Efraim, Oséias, filho de Aza-
to posterior às outras duas, pois, em lugar zias; sobre a meia tribo de Manassés, Joel, filho
de Benaías e Asael, seus filhos têm o en de Pedaías;2'sobre a outra meia tribo de Manas
cargo de suas divisões. O arranjo em tur sés em Gileade, Ido, filho de Zacarias; sobre
ma de deveres regulares em rodízio pode Benjamim, Jaasiel, filho de Aner; 22sobre Dã,
Azarei, filho de Jeroãa Estes eram os chefes das
ser uma invenção, seja do midrash levítico, tribos de Israel. 23Não tomou, porém, Davi o nú
empregado pelo cronista, ou do próprio mero dos de vinte anos para baixo, porquanto o
cronista. Pode mesmo ter-se originado com Senhor tinha dito que havia de multiplicar Israel
Davi, mas, seguramente, não em qualquer como as estrelas do céu. MJoabe, filho de Zeruia,
tinha começado a numerá-los, porém não acabou,
ampla escala. Se cada divisão fosse com porquanto viera por isso ira sobre Israel; pelo que
posta de 24 mil homens, isto seria muito o número não foi posto no livro das crônicas do
mais do que o requerido pela corte simples rei Davi.
de Davi. Se o termo ’elep (mil) é tomado
como uma unidade cujo exato comple Somente cinco pessoas de 25 nesta lista
mento de homens não é sempre o mesmo, são mencionadas em outra parte do Anti
377
go Testamento, embora a maior parte dos ele havia adquirido considerável proprie
nomes seja comum. Não há referência aos dade pessoal, de que derivava a renda que
líderes das tribos de Gad; e Aser. Visto sustentava a vida de sua corte. Isto incluía
que as listas tribais sempre contêm doze tudo, desde a agricultura até as caravanas
tribos, e como nesta lista já houve doze de camelos. Se as propriedades da coroa se
antes que o cronista chegasse até Gade e tornaram tão extensas durante este reina
Aser, essas tribos tiveram que ser omiti do, pode-se imaginar como os reis poste
das. Note-se que em lCrônicas 2.2 são as riores aumentaram suas posses com a pas
últimas na ordem. sagem do tempo. Esta é uma razão por
Joabe (...) tinha começado a numerá-los, que Ezequiel recomendou que o príncipe
porém não acabou. Isto se refere a lÇrô- recebesse uma porção determinada, que
nicas fe.6, onde é dito que ele não alistou não poderia ampliar (Ez 46.16-18).
Levfeljen iamim. O gabinete de Davi (v. 32-34) difere dos
O número não foi posto no livro das outros em registros semelhantes (cf. 2Sm
crônicas do rei Davi. Contudo, temos os 8.15-18; 20.23-26; lCr 18.15-17). Jônatas,
algarismos do recenseamento em lCrônicas o dod (tio, amigo da família) de Davi, não
21.5. Esta declaração pode significar queT é mencionado em nenhuma outra parte.
[Davi não permitiria que os resultados do_ Davi tinha um sobrinho com este nome
Icenso estivessem no registro público. O (lCr 20.7), porém ele dificilmente teria
•cronista e o escritor de Samuel podem ter aceito conselho de seu sobrinho. A pala
obtido seus dados numéricos de estatísticas vra dod também significa amado (Is 5.1
não oficiais. Esta pode ser a razão por que e em todo o Cântico dos Cânticos). Curtis
diferiam (cf. os comentários sobre lCr e Madsen estavam convencidos de que a
21. 1- 6). referência é a Jônatas, filho de Saul, ami
go íntimo de Davi durante suas primeiras
7) Os Oficiais do Rei (27.25-34) peregrinações.
“ Sobre os tesouros do rei estava Azmavete,
filho de Adiei; sobre os tesouros dos campos, das
cidades, das aldeias e das torres, Jônatas, filho de
8) Instruções Finais a Salomão e a Israel
Uzias; “ sobre os que faziam a obra do campa, na (28.1—29.25)
lavoura da terra, Ezri, filho de Quelube; 27sobre Uma grande assembléia foi convocada
as vinhas Simei, o ramatita; sobre o produto das
vides nas adegas, Zabdi, o sifmita; 28sobre os por Davi para todo o Israel, a fim de de
olivais e sicômoros que havia nas campinas, Baal- dicar o povo à edificação do Templo e pa
-Hanã, o gederita; sobre os armazéns do azeite, ra ungir Salomão como o novo rei. É es
Joás; 29sobre o gado que pastava em Sarom, tranho que na lista dos convidados para a
Sitrai, o saronita; sobre o gado dos vales, Safate,
filho de Adiai; “ sobre os camelos, Obiel, o isma-
reunião os sacerdotes e levitas não sejam
elita; sobre as jumentas, Jedeáis, o meronotita; 31e mencionados. Que ali estiveram é óbvio
sobre o gado miúdo, Jaziz, o hagarita. Todos es (cf. 28.21; 29.21), mas o cronista deve ter
tes eram os intendentes dos bens do rei Davi. empregado verdadeira restrição em não
32Jônatas, tio de Davi, era conselheiro, homem
entendido, e escriba; ele e Jeiel, filho de Hacmôni,
mencionar o papel específico que estavam
assistiam os filhos do rei; 33Aítofel era conselheiro desempenhando. Talvez os sacerdotes e
do rei; Husai, o arquita, era amigo do rei; Mdc- levitas não foram referidos porque já es
pois de Aítofel, Jeoiada, filho de Benaías, e Abia- tavam trabalhando ou já haviam chegado
tar foram conselheiros; e Joabe era chefe do exér para sua organização (23.2—26.32).
cito do rei.
378
chefes de cem, e os intendentes de todos os bens cada taça; como também para as taças de prata,
e possessões do rei e de seus filhos, como também o peso para cada taça, ue para o altar do incenso,
os oficiais e os homens mais valorosos e valentes. o peso de ouro refinado; como também o ouro
2Então o rei Davi se pôs em pé, e disse: Ouvi-me, para o modelo do carro dos querubins que, de
irmãos meus e povo meu. Em meu coração havia asas estendidas, cobririam a arca do pacto do
eu proposto edificar uma casa de repouso para a Senhor. 19Dido isso se me fez entender, disse Da
arca do pacto do Senhor, e para o escabelo dos vi, por escrito da mão do Senhor, a saber, todas
pês do nosso Deus, e tinha feito os preparativos as obras deste modela “ Disse, pois, Davi a seu
para a edificar. 3Mas Deus me disse: Tu não edifi filho Salomão: Esforça-te e tem bom ânimo, e faze
carás casa ao meu nome, porque és homem de a obra; não tonas, nem te desalentes, pois o Se
guerra, e tens derramado muito sangue. 4Tbdavia, nhor Deus, meu Deus, é contigo; não te deixará,
o Senhor Deus de Israel escolheu-me de toda a nem te desamparará, até que seja acabada toda a
casa de meu pai, para ser rei sobre Israel para obra para o serviço da casa do Senhor. 21Eis aí as
sempre; porque a Judá escolheu por príncipe, e turmas dos sacerdotes e dos levitas para todo ser
na casa de Judá a casa de meu pai, e entre os fi viço da casa de Deus; e estará contigo para toda
lhos de meu pai se agradou de mim para me fa obra todo homem bem disposto e perito em qual
zer rei sobre todo o Israel. 5E, de todos os meus quer espécie de serviço; também os chefes e todo
filhos (porque muitos filhos me deu o Senhor), o povo estarão inteiramente às tuas ordens.
escolheu ele o meu filho Salomão para se assen
tar no trono do reino do Senhor sobre Israel, 6e
me disse: Teu filho Salomão edificará a minha ca Davi já havia, privativamente, encarre
sa e os meus átrios, porque o escolhi para me ser gado Salomão da tarefa de edificar san
por filhoi, e eu lhe serei por pai. 7Estabelecerei o tuário (22.6 e ss.). Agora ele o faz publica
seu reino para sempre, se ele perseverar em cum
prir os meus mandamentos e os meus juízos, co
mente.
mo o faz no dia de hoje. 'Agora, pois, à vista de Irmãos meus e povo meu. Davi, astuta
todo o Israel, a congregação do Senhor, e em mente, descreveu sua relação para com eles.
presença de nosso Deus, que me ouve, observai e
buscai todos os mandamentos do Senhor vosso Eles tanto eram de sua própria família
Deus, para que possuais esta boa terra e a deixeis como seus súditos.
por herança a vossos filhos depois de vós, para És homem de guerra, e tens derramado
sempre. 9TÍi, meu filho Salomão, conhece o Deus
de teu pai, e serve-o de coração perfeito e espírito muito sangue. Isto pode ser melhor com
voluntário; porque o Senhor esquadrinha todos os preendido à luz de 22.8
corações, e penetra todos os desígnios e pensa Porque o escolhi para me ser por filho,
mentos. Se o buscares, será achado de ti; porém,
se o deixares, rejeitar-te-á para sempre. 1 Agora e eu lhe serei por pai. O Salmo 2.7 era,
tOma cuidado, porque o Senhor te escolheu para provavelmente, empregado quando da
edificares uma casa para o santuário; esforça-te coroação de cada novo rei, sendo que esta
e faze a obra. uEntão Davi deu a Salomão, seu adoção por Deus era operada liturgica-
filho, o modelo do alpendre com as suas casas, as mente. Pode também ter sido uma ceri
suas tesourarias, os seus cenáculos e as suas re-
câmaras interiores, como também da casa do pro
mônia anual, quando isto era repetido.
piciatório; 12e também o modelo de tudo que ti A vista de todo o Israel(.~) e em pre
nha em mente para os átrios da casa do Senhor, sença de nosso Deus, que nos ouve. Israel
para todas as câmaras em redor, para os tesouros
da casa de Deus e para os tesouros das coisas
é a testemunha da incumbência de Salo
sagradas; l3também para as turmas dos sacerdo mão, e Deus é o juiz perante o qual ela é
tes e dos levitas, para toda obra do serviço da casa dada. Esta situação de corte divina é,
do Senhor e para todos os vasos do serviço da provavelmente, a razão por que Davi le-
casa do Senhor, 14especificando o peso do ouro vantou-se para falar (v. 2), em lugar de
para os vasos de ouroi, para todos os vasos de
cada espécie de serviço; 15o peso para os castiçais dirigir-se à assembléia de seu trono, como
de ouro e suas lâmpadas, o peso de ouro para sua idade e posição poderiam sugerir.
cada castiçal e as suas lâmpadas, e o peso da Observai e buscai todos os manda
prata para os castiçais de prata, l6o peso do ouro
para as mesas dos pães da proposição, para cada mentos do Senhon Não só devia Salomão
mesa; como também da prata para as mesas de seguir os mandamentos com que estava
prata; 17e o ouro puro para os garfos, as bacias familiarizado, mas constantemente pes
e os jarros; para as taças de ouro, o peso para quisar para certificar-se de que sabia tudo
379
quanto Deus requeria. A maioria dos dou para a casa do meu Deus, afora tudo quanto
homens está satisfeita com o tentar viver tenho preparado para a casa do santuário: ‘‘três
segundo o pouco que conhece da Palavra mil talentos de ouro, do ouro de Ofir, e sete mil
talentos de prata refinada, para cobrir as paredes
de Deus. Por que saber mais de seus requi das casas; 5ouro para as obras de ouro, e prata
sitos, quando se falha quanto ao que já se para as de prata, para toda a obra a ser feita por
conhece? mão de artífices. Quem, pois, está disposto a fazer
oferta voluntária, consagrando-se hoje ao Senhor?
Conhece o Deus de teu pai. Isto signi 6Então os chefes das casas paternas, os chefes
fica: experimenta em tua própria vida o das tribos de Israel, e os chefes de mil e de cem,
Deus a quem teu pai conhece. Aqui ocorre juntamente com os intendentes da obra do rei,
uma magnífica sugestão de como o abismo fizeram ofertas voluntárias; 7e deram para o
serviço da casa de Deus cinco mil talentos e dez
entre as gerações deveria ser superado: mil dracmas de ouro, e dez mil talentos de prata,
Que as tradições religiosas que chegaram dezoito mil talentos de bronze, e cem mil talentos
até ti te conduzam a uma nova experiência de ferra 8E os que tinham pedras preciosas de-
de ti próprio. ram-nas para o tesouro da casa do Senhor, que
estava ao cargo de Jeiel, o gersonita. 9E o povo
Então deu Davi a Salomão, seu filho, o se alegrou das ofertas voluntárias que estes fi
modelo. Especificações escritas foram zeram, pois de um coração perfeito as haviam
passadas às mãos de Salomão na cerimô oferecido ao Senhor; e também o rei Davi teve
grande alegria.
nia pública. O cronista diz que assim como
Moisés, instruído por Deus, entregou os
planos para o tabernáculo (Ex 25.9), Davi convocou a assembléia para fazer
também Davi, semelhantemente inspirado oferendas livremente paia a construção do
(v. 19), apresentou seus planos a Salomão. Templo. Esta passagem inspira-se grande
mente no desafio de Moisés dirigido a Israel
O ouro para o modelo do carro dos quando o tabernáculo foi primeiro erigido
querubins. Não está claro se havia um (Ex 35.4 e ss.). A diferença básica foi que
carro real retratado aqui, como na visão Moisés tinha pouco com que contribuir em
de Ezequiel (cap 1), ou se os próprios riqueza material, enquanto Davi liderou o
querubins eram o carro (cf. SI 18.10). povo com dádivas de sua fortuna pessoal,
Esforça-te e tem bom ânimo (...) Deus que alcançavam o correspondente a 60
é contigo. As palavras de Moisés a Josué milhões de dólares em moeda atual. Este
são repetidas aqui, (Dt 31.8); Davi, o novo montante é muito maior do que se pensaria
Moisés, fala a Salomão, o novo Josué, que haver disponível naqueles primeiros tempos
deve agora iealizar o sonho negado ao seu de seu reinado. Ou o montante foi exage
pai. rado na tradição levítica, ou o cronista
estava sinceramente alistando o que julgava
b. O Desafio à Assembléia (29.1-9) ser o montante apropriado para a ocasião.
Certamente, ele não estava fabricando a
história propositadamente. Sua concepção
'Disse mais o rei Davi a toda a congregação:
Salomão, meu filho, o único a quem Deus esco
de Deus revelada em lCrônicas 28-29 não
lheu, é ainda moço e tenro, e a obra é grande; lhe permitira ensinar o que ele sabia não
porque o paládo não é para homem, mas para .o ser verdadeiro. O seu Deus, assim como o
Senhor Deus. 2Eu, pois, com todas as minhas de Davi, “esquadrinha todos os corações,
forças tenho preparado para a casa de meu Deus e penetra todos os desígnios e pensamen
o ouro para as obras de ouro, a prata para as de
prata, o bronze para as de bronze, o ferro para tos” (28.9); ele tem “prazer na justiça”.
as de ferro e a madeira para-as de madeira; pedras O palácio não é para homem, mas para
de berilo, pedras de engaste, pedras de ornato, o Senhor Deus. A palavra palácio é de
pedras de várias cores, toda sorte de pedras
preciosas, e mármore em abundância. 3Além origem persa, tratando-se de um termo que
disso, porque pus o meu afeto na casa de meu descreve a habitação de um rei. Somente
Deus, o ouro e prata particular que tenho, eu o o cronista a aplica para o santuário em si.
380
Consagrando-se hoje ao Senhor — 17E bem sei, Deus meu, que tu sondas o coração,
literalmente, “enchendo sua mão hoje”, e que te agradas da retidãa Na sinceridade do meu
aceitando suas responsabilidades. Esta coração voluntariamente ofereci todas estas coisas;
mesma expressão é empregada quando os e agora vi com alegria que o teu povoi, que se acha
aqui, ofereceu voluntariamente. 18Ó Senhor, Deus
filhos de Levi vieram para o lado de Moisés de nossos pais Abraão, Isaque e Israel, conserva
na ocasião em que Israel fez o bezerro de para sempre no coi*ação do teu povo estas dispo
ouro (Ex 32.29). É empregada quanto sições e estes pensamentos, e encaminha o seu
à ordenação de sacerdotes em outras coração para ti. 19E a Salomão, meu filho, dá um
coração perfeito, para guardar os teus manda
ocasiões. Aqui leigos são solicitados a se mentos, os teus testemunhos e os teus estatutos,
consagrarem, assim como o fez a família e para fazer todas estas coisas, e para edificar o
sacerdotal. “Aqueles que contribuem de palácio para o qual tenho providenciada
todo o coração para a ereção do Tèmplo
são comparáveis aos sacerdotes que minis Esta é uma das preces mais belas da
tram nele” (Slotki, p. 154). Para o generoso Bíblia. Fala por si mesma. Aqui temos o
cronista, os porteiros se tornam levitas e cronista em seu melhor. Nenhum homem
os leigos agem como sacerdotes. que pudesse escrever oração tão magnífica
Dez mil dracmas de oura Tratava-se poderia ser um propagandista estreito. Ele
de moedas persas com valor total corres se revela como um teólogo amadurecido
pondente a 56 mil dólares atuais. Por que e um crente consagrado. Assim como Davi
esta pequena quantia foi alistada entre os fala, o cronista está exteriorizando a
outros milhões? Talvez aqui os montantes oração. “A composição toda é ilustração
reais estejam preservados em termos dos excelente do elevado conceito que o cro
valores de câmbio do tempo do cronista, nista tem de Deus, e da apropriada relação
enquanto os outros algarismos baseavam- do homem com ele, e isto revela uma apre
se sobre sistemas que o próprio historia ciação sensível da arte da oração pública”
dor não compreendia. Então há sempre a (Dentan, VII, p. 139,140). A liturgia ma
possibilidade de que não saibamos o que tinal do culto judaico inclui os versículos
o cronista quer dizer com os termos que 10-13. Os responsos cristãos freqüente
emprega. mente apresentam o versículo 14.
Davi bendisse ao Senhor. De que
maneira pode o homem bendizer ao
c. A Oração de Davi (29.10-19) Senhor? Este parece ser o outro lado da
10Pelo que Davi bendisse ao Senhor na pre questão. A expressão original indica que
sença de toda a congregação, dizendo: Bendito és ele “dobrou os joelhos”. Davi, provavel
tu, ó Senhor, Deus de nosso pai Israel, de eterni
dade em eternidade. uDia é, ó Senhor, a grandeza,
mente, não mais está de pé, e expressa sua
e o poder, e a glória, e a vitória, e a majestade, adoração a Deus não somente pela genu-
porque teu é tudo quanto há no céu e na terra; teu flexão, mas por meio das gloriosas palavras
é, ó Senhor, o reino, e tu te exaltaste por chefe sobre que se seguem. Bendizer ao Senhor,
todos. 12Tanto riquezas como honra vêm de ti, tu portanto, significa dedicar-lhe apropriada
dominas sobre tudo, e na tua mão há força e poder;
na tua mão está o engrandecer e o dar força a tudu. adoração por palavra e ato.
"Agora, pois, ó nosso Deus, graças te damos, e Não há permanência. Literalmente,
louvamos o teu glorioso nome. 14Mas quem sou “não há esperança”, ou seja, não há espe
eu, e quem é o meu povo, para que pudéssemos
fazer ofertas voluntariamente? Porque tudo vem rança na vida vivida sem Deus.
de ti, e do que é teu to damos. lsPorque somos
estrangeiros diante de ti e peregrinos, como o d. A Reação do Povo (29.20-25)
foram todos os nossos pais; como a sombra são
os nossos dias sobre a terra, e não há permanên 20Então disse Davi a toda a congregação:
cia. ,6Ó Senhor, Deus nosso, toda esta abundân Bendizei ao Senhor vosso Deus! E toda a congre
cia, que preparamos para te edificar uma casa ao gação bendisse ao Senhor Deus de seus pais, e
teu santo nome, vem da tua mão, e é toda tua. inclinaram-se e prostraram-se perante o Senhor e
381
perante o rei. Z1E no dia seguinte imolaram sacri Israel. Alguns julgam que estes versos
fícios ao Senhor e lhe ofereceram em holocausto foram acrescentados à obra do cronista.
mil novilhos, mil carneiros, mil cordeiros, com as
suas libações, e sacrifícios em abundância a favor As referências do cronista a Samuel, Natã
de todo o Israel. 22E comeram e beberam naquele e Gade são interpretadas de diversos
dia perante o Senhor, com grande goza E pela modos. Sendo que o cronista, quando
segunda vez proclamaram rei a Salomão, filho de menciona estes três, somente emprega
Davi, e o ungiram ao Senhor para ser príncipe, e
a Zadoque para ser sacerdote. 23Assim Salomão
materiais nos livros de Samuel, muitos
se assentou no trono do Senhor, como rei cm lugar eruditos insistem em que estas referências
de seu pai Davi, e prosperou; e todo o Israel lhe não implicam a existência de fontes inde
prestou obediência. 24E todos os chefes, e os pendentes. Essas fontes, contudo, pode
homens poderosos, e também todos os filhos do
rei Davi se submeteram ao rei Salomãa 25E o
riam não ter dado ao cronista qualquer
Senhor engrandeceu muito a Salomão à vista de informação pessoal sobre os homens além
todo o Israel, e deu-lhe tal majestade real qual antes das que já possuímos. Contudo, tais livros
dele não teve nenhum rei em Israel. poderiam ter fornecido ao cronista muito
de seu material. Livros trazendo estes
A congregação adorou a Deus, honrou nomes, sendo o resultado de longos anos
o seu rei, ofereceu os seus sacrifícios e de tradição hebraica, poderiam ter perten
acomodou-se para uma gloriosa festa. cido a uma data posterior à dos próprios
Gozo e alegria prevaleciam. O ato mais homens. É certo que o cronista utilizou
momentoso do dia foi a coroação de muitas tradições, tanto remotas quanto
Salomão como Davi havia desejado. posteriores, do contrário sua lista paralela
de nomes não apresentaria tantas va
E pela segunda vez. Isto pode referir-se riações. Uma obra fabricada se revelaria
a 23.1, mas é difícil que assim seja. Prova
velmente, refere-se a IReis 1.6 e 2.12. mais clara. As diferenças revelam a inde
pendência das tradições. Recentes des
O cronista não mencionou a primeira ins cobertas arqueológicas autenticam isto.
talação, mas estava ciente dela (cf. Myers.
I, p. 197,198). Os acontecimentos que sobrevieram a
ele. Literalmente, “que vieram sobre ele”
Se assentou no trono do Senhor. O rei tal como ondas correm para a praia. Aqui
ocupou o trono de Deus, não o seu próprio.
O ofício real não pertencia ao ocupante do há uma valiosa pista para a perspectiva
histórica do cronista. Consiste de grandes
posto, mas a Deus, que o pôs ali e o poderia ondas sobre as quais se terá pouco con
remover.
trole, mas que se deve enfrentar heroica
mente, e em que o indivíduo deve aprender
6. Sumário do Reinado (29.26-30) a navegar. Os tempos clamavam por um
26Assim Davi, filho de Jessé, reinou sobre tòdo novo Templo, mas as guerras continuavam
o Israel. 270 tempo que reinou sobre Israel foi a sobrevir a Davi. “Com trabalhos pe
quarenta anos; em Hebrom reinou sete anos, e em nosos” (22.14) ele mantinha a cabeça
Jerusalém trinta e três. 28E morreu numa boa acima das águas e definia a rota do futuro.
velhice, cheio de dias, riquezas e honra; e Salomão,
seu filho, reinou em seu lugar. 29Ora, os atos do Salomão teria que construir enquanto o
rei Davi, desde os primeiros até os últimos, estão mar estivesse calmo.
escritos nas crônicas de Samuel, o vidente, nas
crônicas do profeta Natã, e nas crônicas de Gade,
o vidente, “ com todo o seu remado e o seu poder Hl. Salomão e o Templo (2Cr 1.1—9.31)
e os acontecimentos que sobrevieram a ele, a
Israel, e a todos os reinos daquelas terras. O livro de 2Crônicas era, originalmente,
uma continuação da história agora regis
Esta é a única vez que o cronista trada em lCrônicas 1—29, não constituindo
menciona o reinado de Davi de sete anos um segundo livro. Foi dividido por motivos
em Hebrom, mas mesmo então foi sobre práticos. Alguns estudiosos julgam que foi
382
realizado um trabalho editorial adicional 1. A Prosperidade de Salomão (1.1-17)
quando de sua divisão. Elmslie (p. 442)
'Ora, Salomão, filho de Pavi, fortaleceu-se no
está convencido de que 2Crônicas 1.1-13 seu reino, e o Senhor seu Deus era com ele, e muito
foi acrescentado depois, especialmente o engrandeceu. 2E falou Salomão a todo o Israel,
1.1-6. Em sua opinião, lCrônicas 29.26, aos chefes de mil e de cem, e aos juizes, e a todos
23-25 formava a introdução original para os príncipes em todo- o Israel, chefes das casas
paternas. 3E foi Salomão, e toda a congregação
0 atual trecho de 2Crônicas 1.14 e seguin com ele, ao alto que estava em Gibeãoi, porque ali
tes, seguindo-se a lCrônicas 29.28-30. Tais estava a tenda da revelação de Deus, que Moisés,
opiniões são difíceis de se provar e é mais servo do Senhor, tinha feito no deserta 4M as
realístico aceitar o material como vindo do Davi tinha feito subir a arca de Deus de Quiriate-
cronista, a menos que a evidência seja -Jearim ao lugar que lhe preparara; pois lhe havia
armado uma tenda em Jerusalém. 5Também o
conclusiva contra a sua autoria. Contudo, altar de bronze feito por Bezaleel, filho de Úri,
é possível que algum trabalho editorial filho de Hur, estava ali diante do tabernáculo do
tenha acompanhado a divisão do material Senhor; e Salomão e a congregação o buscavam.
original em dois livros. 6E Salomão ofereceu ali sacrifícios perante o
Em 2Crônicas, o escritor não acrescen Senhor, sobre o altar de bronze que estava junto
à tenda da revelação; ofereceu sobre ele mil holo
ta tanto de seu próprio material como o caustes. 7Naquela mesma noite Deus apareceu a
fez em lCrônicas. Sua contribuição parti Salomão, e lhe disse: Pede o que queres que eu te
cular resulta, basicamente, de sua pers dê. 8E Salomão disse a Deus: Ui usaste de grande
pectiva sobre a história de Israel. Ele é benevolência para com meu pai Davi, e a mim me
fizeste rei em seu lugar. ’Agora, pois, ó Senhor
capaz de apresentar um ponto de vista que Deus, confirme-se atua promessa, dada a meu pai
não se acha em nenhuma outra parte do Davi; porque tu me fizeste rei sobre um povo
Antigo Testamento. Outros escritos histó numeroso como o pó da terra. 10Dá-me, pois,
ricos contêm a orientação sacerdotal lado agora sabedoria e conhecimento, para que eu possa
a lado com a deuteronômica, tal como em sair e entrar perante este pow; pois quem poderá
julgar este teu povo, que é tão grande? uEntão
Josué-Samuel. Nesse momento posterior Deus disse a Salomão: Porquanto houve isto no
na História, o cronista havia absorvido a teu coração, e não pediste riquezas, bens ou honra,
visão deuteronômica, incorporando-a em nem a morte dos que te odeiam, nem tampouco
sua perspectiva sacerdotal. Uma foi assi pediste muitos dias de vida, mas pediste para ti
milada na outra, duas facetas contrastan sabedoria e conhecimento para poderes julgar o
meu povo, sobre o qual te fiz reinar, 12sabedoria
tes da vida de Israel sendo combinadas. e conhecimento te são dados; também te darei
Em lugar algum isto é mais evidente do riquezas, bens e honra, quais não teve nenhum rei
que em seu tratamento de materiais deute- antes de ti, nem haverá depois de ti rei que tenha
ronômicos concernentes ao Templo de coisas semelhantes. 13Assim Salomão veio a
Jerusalém, do alto que estava em Gibeão, de diante
Salomão. da tenda da revelação; e reinou sobre Israel.
Não é intenção do cronista substituir os 14Salomão ajuntou carros e cavaleiros; teve mil e
relatos deuteronômicos encontrados em quatrocentos carros e doze mil cavaleiros, que
1 e 2Reis, mas interpretá-los. Ele aceitou colocou nas cidades dos carros e junto de si em
essas tradições, mas sentiu uma necessidade Jerusalém. 15E o rd tornou o ouro e a prata tão
comuns em Jerusalém como as pedras, e os cedros
de reavaliá-las. Em sua opinião, não se tantos em abundância como os sicômoros que há
dera atenção bastante às atividades dos na baixada. 16Os cavalos que Salomão tinha eram
levitas e dos sacerdotes na história sacra trazidos do Egito e de Coa; e os mercadores do
de Israel. Para ele, esta era a área em que rei os recebiam de Coa por preço determinada
o destino de Israel se unia, o campo em que 17E faziam subir e sair do Egito cada carro por
seiscentos siclos de prata, e cada cavalo por cento
inquestionavelmente se destacava, que era e cinqüenta; e assim por meio deles eram expor
a adoração de seu Deus. O colapso do tados para todos os reis dos heteus, e para os reis
Estado e as tentativas de conquista militar da Síria.
haviam tornado flagrante ao cronista que
o futuro de Israel se configuraria pela Ora, Salomão (...) fortaleceu-se no seu
singularidade de sua religião. reina Embora o cronista não trate especi-
383
ficamente das lutas internas pelo trono Salomão juntou carros e cavaleiros.
registradas em IReis, parece referir-se a A passagem encontrada nos versículos
elas aqui em síntese. Todo o trecho dos 14-17 vem ao final do relato do reinado de
versículos 1-6 é claramente um acréscimo Salomão em IReis (10.26-29). O cronista
ao material registrado em Reis. Onde Reis o colocou no início para mostrar que Deus
se refere ao “alto maior” em Gibeão, o manteve o seu tiato para com Salomão.
cronista o reduziu simplesmente a alto, um Salomão não poderia estar mais disposto
termo que ele relutava em empregar de a ser fiel a Deus do que o Senhor a ele.
modo absoluto. Ele julgou necessário E o rei tornou o ouro e a prata tão
explicar novamente por que o lugar alto comuns em Jerusalém como as pedras. O
foi empregado, afinal de contas, por relato de IReis diz que fez com que hou
Salomão. O tabernáculo mosaico lá estava. vesse “prata como pedias”. O acréscimo
Somente o cronista declara que o altar de “ouro” é exemplo típico da pregação
de bronze feito por Bezaleel ainda existia popular levítica, que favorecia o emprego
(cf. Ex 31.1 e ss.; 38.1 e ss.), dando legiti de hipérbole É impossível discernir se o
midade ao santuário de Gibeão. cronista tomou emprestado de um midrash
E Salomão e a congregação o busca oral ou escrito ou se agiu por conta pró
vam. Este é o seu significado literal, o povo pria. Contudo, a tendência seria seguir a
“buscava a ele”. Pode significar que direção de suas fontes.
buscavam o altar (devido ao seu antigo
significado), mas é provável que se refira 2. A Edificação do Templo (2.1-7.22)
ao Senhor, da frase precedente, taber
náculo do Senhor, uma vez que este verbo 1) Arranjos Finais (2.1-18)
(darash) é freqüentemente utilizado para
inquirir Deus (cf. Gn 25.22; 2Rs 22.13). 'Ora, resolveu Salomão edificar uma casa ao
nome do Senhor, como também uma casa real
Naquela mesma noite Deus apareceu a para si. zDesignou, pois, Salomão setenta mil
Salomão. Em Reis esta aparição ocorre na homens para servirem de carregadores, e oitenta
forma de sonho. Aqui não há menção de mil para cortarem pedras na montanha, e três mil
sonho; é uma visão. O relato do cronista e seiscentos inspetores sobre eles. 3E Salomão
mandou dizer a Hurão, rei de Tiro: Como fizeste
é mais resumido, o que é bastante in- com Davi, meu pai, mandando-lhe cedros para
comum, uma vez que ele se inclinava a edificar uma casa em que morasse, assim também
oferecer mais pormenores. faze comigo. 4Eis que vou edificar uma casa ao
nome do Senhor moi Deus e lha consagrar para
Sabedoria e conhecimento, para que eu queimar perante ele incenso aromático, para apre
possa sair e entrar perante este povo. Esta sentar continuamente o pão da proposição, e para
é uma expressão empregada quanto a um oferecer os holocaustos da manhã e da tarde,
guerreiro (cf. ISm 18.13,16; ÍCÍ 11.2). nos sábados, nas luas novas e nas festas fixas do
Em IReis 3.7, Salomão confessa que não Senhor nosso Deus, o que é obrigação perpétua
de Israel. 5A casa que vou edificar há de ser
tem idade suficiente para ser um rei guer grande, porque o nosso Deus é maior do que todos
reiro e marchar à frente de seus exércitos. os deuses. 6Mas quem é capaz de lhe edificar
Para compensar isto, ele roga sabedoria. uma casa, visto que o céu e até o céu dos céus o
Aqui o cronista revela sua singular visão não podem conter? E quem sou eu, para lhe edificar
das coisas. Sabedoria e conhecimento não uma casa, a não ser para queimar incenso perante
ele? 7Agora pus, envia-me um homem hábil para
são vistos como uma adição a qualidades trabalhar em ouro, em prata, em bronze, em ferra,
guerreiras; são as virtudes pelas quais um em púrpura, em carmesim, e em azul, é que saiba
rei verdadeiramente governa o seu povo, lavrar ao buril, para estar com os peritos que estão
antes que pela qualidade de guerreiro. comigo em Judá e em Jerusalém, os quais Davi,
meu pai, escolheu. 8Manda-me também madeiras
Salomão desejava saber sair e entrar pe de cedro, de cipreste, e de algumins do Líbano;
rante este poro (lutar as guerras de Deus) porque bem sei eu que os teus servos sabem cortar
com as armas da justiça e da sabedoria. madeira no Líbano; e eis que os meus servos estarão
384
com os teus servos, 9a fim de me prepararem Reis o nome é Hirão (IReis 5.1), sendo que
madeiras em abundância, porque a casa que vou
edificar há de ser grande e maravilhosa. 10E aos
aqui se trata do mesmo nome, com uma
teus servos, os trabalhadores que cortarem a alternação na pronúncia. Obviamente, o
madeira, darei vinte mil coros de trigo malhado, texto usado pelo cronista continha esta
vinte mil coros de cevada, vinte mil batos de vinho pronúncia. O cronista afirma que Salomão
e vinte mil batos de azeite. uHurão, rei de Tiro, mandou dizer a Hurão, dando a entender
mandou por escrito resposta a Salomão, dizendo:
Porquanto o Senhor ama o seu povo, te constituiu que ele tomou a iniciativa dos procedi
rei sobre ele. 12Disse mais Hurão: Bendito seja o mentos. IReis declara que primeiramente
Senhor Deus de Israel, que fez o céu e a terra, que Hirão enviou embaixadores de boa vontade
deu ao rei Davi um filho sábio, de grande prudência a Salomão. Que foi depois disso que
e entendimento para edificar uma casa ao Senhor,
e uma casa real para si. 13Agora, pois, envio um
Salomão apresentou sua solicitação.
homem perito, de entendimento, a saber, Hurão- O nosso Deus é maior do que todos os
-Abi, 14filho duma mulher das filhas de Dã, e cujo deuses. Esta é uma ocorrência rara, um rei
pai foi homem de Tiro; este sabe trabalhar em ouro, hebreu dar o seu testemunho a um rei pagão
em prata, em bronze, em ferro, em pedras e em
madeira, em púrpura, em azul, em linho fino, e em
no que concerne à grandeza de seu Deus
carmesim, e é hábil para toda obra de buril, e para em correspondência estatal formal. De fato,
toda espécie de engenhosas invenções; para que o cronista deixa a impressão de que Hurão
lhe seja designado um lugar juntamente com os era de auxílio porque ele próprio cria em
teus peritos, e com os peritos de teu pai Davi, meu Iavé. O rei de Tiro emprega o nome Iavé
senhor.15Agora mande meu senhor para os seus
servos o trigo, a cevada, o azeite, e o vinho, de que e reconhece nele a criação do céu e a terra
falou; 16e nós cortaremos tanta madeira do (não os deuses de Tiro). Ciro faz uma
Líbano quanta precisares, e a levaremos em declaração semelhante em passagem poste
jangadas pelo mar até Jope, e tu mandarás rior (2Cr 36.22 e ss.). Talvez Hurão esti
transportá-la para Jerusalém. 17Salomão contou
todos os estrangeiros que havia na terra de Israel, vesse sendo diplomático, como Ciro certa
segundo o recenseamento que seu pai Davi fizera; mente o foi. Ele até chama Salomão de seu
e acharam-se cento e cinqüenta e três mil e seis senhor. A passagem em Reis diz que Hirão
centos. 18E deles separou setenta mil para ser estava interessado em virtude de seu afeto
virem de carregadores, e oitenta mil para cortarem por Davi e nada diz sobre as atitudes reli
madeira na montanha, como também três mil e
seiscentos inspetores para fazerem trabalhar o giosas deste (lRs 5.1). Alguns intérpretes
povo. julgam que o cronista está pondo sua
própria crença no poder universal de Iavé
Casa real para si. Literalmente, “para na boca de Hurãa Quem poderia afirmá-
o seu reino”. Não era simplesmente sua resi lo mais apropriadamente do que o rei de
dência real, mas o centro de todas as Tiro?
atividades do Estado. Vinte mil coros de cevada (...) vinho. O
Designou, pois, Salomão setenta mil cronista acrescenta tais itens à lista de supri
homens (...) oitenta mil (...) três mil e seis mentos de Reis. O azeite é multiplicado
centos. O cronista omite, de seu relato, a cem vezes!
convocação de trabalho escravo israelita Um homem perito (...) Hurão-Abi. Lite
(30 mil) encontrada no paralelo de IReis ralmente, “umhomem hábil(...) Hurão, meu
5.13-18. De outro modo, as passagens são pai”. IReis 7.13 e seguintes diz que seu nome
idênticas, exceto que Reis contém 3 mil e era Hirão e que era filho de uma viúva de
300 e o cronista 3 mil e 600 capatazes. A Naftali e de um homem de Tiro. Esta
diferença não se deve a exagero, tratando- passagem diz que sua mãe era da tribo de
se, provavelmente, de um número mais Dã. A diferença nas duas tradições tribais
exato do que em Reis (cf. Curtis e Madsen, deve-se, provavelmente, à associação de
p. 323). A quantia de 600 deve ser o número Bezaleel (que executava uma função seme
total de cada ’elep. lhante para o tabernáculo mosaico) com
Salomão mandou dizer a Hurão. Em um obreiro da tribo de Dã (cf. Ex 31.6).
385
Em Crônicas, as responsabilidades de era de cinqüenta sidos de o ura Também revestiu
Hurão são grandemente expandidas. Em de ouro os cenáculos. 10Também fez na câmara
santíssima dois querubins de madeira, e os cobriu
Reis, ele é apenas hábil em trabalhos com de oura 11As asas dos querubins tinham vinte
metal. Aqui, ele é também artesão em côvados de comprimento: uma asa de um deles,
madeira e tecido. Novamente a influência tendo cinco côvados, tocava na parede da casa, e
das tradições de Bezaleel pode ser notada a outra asa, tendo também cinco côvados, tocava
nesta descrição, pois ele também era dotado na asa do outro querubim; 12também a asa deste
querubim, tendo cinco côvados, tocava na parede
de todas estas habilidades. da casa, e a outra asa, tendo igualmente cinco
Pelo mar até Jope. O relato de Reis côvados, estava unida à asa do primeiro querubim.
13Assim as asas destes querubins se estendiam por
não menciona o nome do porto. Este era vinte côvados; eles estavam postos em pé, com os
o principal porto de Israel até a moderna rostos virados para a câmara. 14Thmbém fez o véu
Tel-Aviv ser fundada. Jonas partiu dessa de azul, púrpura, carmesim e linho fino; e fez bordar
cidade, para sua planejada visita a Tãrsis. nele querubins. l5Diante da casa fez duas colunas
de trinta e cinco corados de altura; e o capitel que
Contou todos os estrangeiros. IReis estava sobre cada uma era de dnco côvados.
5.13 e seguintes declara que Salomão esta 16Tàmbém fez cadeias no oráculo, e as pôs sobre
beleceu uma leva de 30 mil israelitas para o alto das colunas; fez também cem romãs, as quais
trabalhos forçados. Também alista mais pôs nas cadeias. 17E levantou as colunas diante do
templo, uma à direita, e outra à esquerda; e
153 mil outros obreiros, porém não os chamou o nome da que estava à direita Jaquim e
identifica. O cronista mantém um silêncio o nome da que estava à esquerda Boaz.
digno de nota acerca dos 30 mil israelitas,
mas alega que os 153 mil compunham-se Em Jerusalém, no monte Moriá. Esta
de estrangeiros. É possível, pois o trabalho é a única vez no Antigo Testamento que
deles era mais pesado. a montanha do Templo é chamada por este
nome. Assoda o local com o sítio do sacri
2) Equipamento do Templo (3.1—4.22) fício de Isaque por Abraão (Gn 22.2).
O comprimento em côvados, segundo a
a. Especificações da Edificação (3.1-17) medida primitiva. A antiga medida era de
cerca de 8 centímetros mais longa do que
a nova (cerca de 53 centímetros em compa
‘Então Salomão começou a edificar a casa do
Senhor em Jerusalém, no monte Moriá, onde o ração com 45). A modificação deve ter-se
Senhor aparecera a Davi, seu pai, no lugar que dado devido aos mercadores, que ao longo
Davi tinha preparado na eira de Ornã, o jebuseu. dos anos inclinavam-se a dar um compri
2Começou a edificar no segundo dia do segundo mento menor pela quantia estipulada em
mês, no ano quarto do seu reinada 3Estes foram dinheiro. Pela antiga medida, o santuário,
os fundamentos que Salomão pôs para edificar a
casa de Deus. O comprimento em côvados, segúndo portanto, era de cerca de 32 x 10m, medidas
a primitiva medida, era de sessenta côvados, e a bem pequenas para os nossos padrões.
largura de vinte côvados. 40 pórtico que estava na Mas, como o cronista irá demonstrar, o
frente tinha vinte côvados de comprimento, corres que faltava em tamanho era compensado
pondendo à largura da casa, e a altura era de cento
e vinte; e por dentro o revestiu de ouro pura pela qualidade.
5A câmara maior forrou com madeira de cipreste A altura era de cento e vinte. Isto faria
e a cobriu de ouro fino, no qual gravou palmas é com que a altura do pórtico fosse de mais
cadeias.6Para ornamento guarneceu a câmara de
pedras preciosas; e o ouro era ouro de Parvaim. de 60 metros. IReis 6.2 diz que a altura do
7Tàmbém revestiu de ouro as traves e os umbrais, principal santuário foi de somente 30
bem como as paredes e portas da câmara, e lavrou côvados (c. de 16 metros). Há alguma
querubins nas paredes. 8Fez também a câmara evidência textual de que 20 côvados eram
santíssima, cujo comprimento era de vinte côvados,
correspondendo à largura da casa, e a sua largura
a altura do pórtico. O átrio do Templo de
era de vinte côvados; e a revestiu de ouro fino, do Herodes era de 100 côvados de altura, e o
peso de seiscentos talentos. 90 peso dos pregos conhecimento disso pode ter levado um
386
escriba posterior a inserir os 100 côvados. certeza quanto à sua utilização e locali
Por outro lado, o átrio de Salomão pode zação. Slokti sugere que consistiam em
ter sido dessa altura. IReis não oferece quartos de depósitos situados entre as
sugestão a respeito. A Septuaginta de paredes, mas tais quartos, possivelmente,
Crônicas também traz 120 côvados (cf. o não haveriam de ser recobertos de ouro.
comentário sobre lCr 7.21). Estavam postos em pé, com os rostos
Guarneceu a câmara. As declarações virados para a câmara. Guardavam os
concernentes ao uso de pedras preciosas e querubins, assim, o lugar santíssimo (nave)
ouro de Parvaim somente ocorrem aqui. contra quem quer que dele se aproximasse,
Parvaim ficava, provavelmente, no Iêmen. vindo do lugar santo.
A revestiu de ouro fino, do peso de seis lambém fez o véu. IReis não menciona
centos talentos. Pode-se dizer: mais de um véu no Templo de Salomão. Havia um
22 toneladas e meia. Este registro não no tabernáculo mosaico (Ex 26.31 e ss.)
destoa da reivindicação de lCrônicas 29.4, Duas colunas de trinta e cinco côvados.
mas aquela passagem parece uma hipérbole. Literalmente, “trinta e cinco côvados de
O cronista está extático quanto à glória do extensão”. IReis 7.15 diz que cada uma era
Templo. Conquanto IReis pormenorize a de 18 côvados de altura. A discrepância se
quantia de ouro empregada, o cronista fala explica pela possibilidade de que original
entusiasticamente do ouro empregado no mente houvesse uma extensão de bronze,
santuário. Nos versículos 3-10 menciona- que foi cortada em dois pilares iguais de
se o revestimento de ouro como sendo de 17 côvados e meio. Depois capitéis de meio
nove vezes. Ele silencia quanto a muitos côvado foram adicionados a cada uma.
detalhes referidos em IReis, especialmente Contudo, é também possível que houvesse
no capítulo 6.4-8 (as janelas, as câmaras alguma confusão nas tradições emprega
laterais e as escadas). Eles não foram reco das pelos dois relatos bíblicos.
bertos de ouro! De fato, no que concerne Também fez cadeias. Literalmente,
a detalhes reais de edificação, “parece haver “fez cadeias no santuário interior” (debir).
maior preocupação pela liturgia do que pelo Ele dificilmente teria feito cadeias no
próprio edifício” (Myers, II, 16). Não era santuário para depois pô-las sobre o alto
um museu, e, sim, um lugar para adorar das colunas. A palavra debir é muitas
a Deus!
vezes empregada para santo dos santos.
O peso dos pregos era de cinqüenta Significa ou o lugar oculto ou o lugar do
siclos de ouro. Por certos padrões de oráculo, dependendo de como se trace a
medida, isto faria cada prego pesar perto história da palavra. Por uma leve mudança
de 1 quilograma! Outros sugerem que o peso no termo hebraico, a versão RSV, no inglês,
de cinqüenta siclos para cada prego era de lhe dá o sentido de “colar”, o que é muito
600 gramas (cf. Myers). Se o peso total de provável aqui.
todos os pregos for considerado como 50
siclos, então menos de 1 quilograma de
pregos de ouro, supostamente; sustentaria b. O Mobiliário do Templo (4.1-22)
52 toneladas de cobertura de ouro. A versão ‘Além disso fez um altar de bronze de vinte
RSV, no inglês, sugere que o texto deve ser côvados de comprimento, vinte de largura e dez
ligeiramente emendado para indicar que de altura. 2Fez também o mar de fundição; era
redondo e media dez côvados duma borda à outra,
um siclo de peso do prego devia ser usado cinco de altura e trinta de circunferência. 3Por
para cada cinqüenta siclos de cobertura de baixo da borda figuras de bois que cingiam o mar
ouro (cf. a margem). ao redor, dez em cada côvado, contornando-o todo;
Também revestiu de ouro os cenáculos. os bois estavam em duas fileiras e foram fundidos
juntamente com o mar. 40 mar estava assentado
Somente o cronista faz referência a esses sobre doze bois, três dos quais olhavam para o norte,
cenáculos (cf. lCr 28.11). Ninguém tem três para o ocidentç três para o sul, e três para
387
o oriente; o mar estava posto sobre os bois, cujas mente, o altar de bronze do cronista não
ancas estavam todas para a banda de dentro. era o mesmo, pois era muito mais amplo.
sTinha quatro dedos de grossura, e a sua borda
foi feita como a borda dum copo, como a flor
Em Êxodo 27.1 é-nos dito que o velho altar
dum lírio; e cabiam nele mais de três mil batos. era de 5 côvados por 5 côvados, com 3
6Fez também dez pias; e pôs cinco à direita e côvados de altura. Aqui, ele é de 20 por
cinco à esquerda, para lavarem nelas; isto é, lavavam 20 côvados, e 10 de altura. É comparável
nelas o que pertencia ao holocausta Porém o mar ao altar de Ezequiel (Ez 43.13 e s.). Talvez
era para os sacerdotes se lavarem nele. 7E fez dez
castiçais de ouro, segundo o que fora ordenado, o cronista cresse que Hurão ampliou o altar
a respeito deles, e pô-los no templo, cinco à direita de Bezaleel devido ao aumento dos sacri
e cinco à esquerda. ®Ikinbém fez dez mesas, e pô- fícios no culto em Jerusalém.
-las no templo, cinco à direita e cinco à esquerda;
e fez ainda cem bacias de oura 9Fez mais o átrio
Fez também o mar de fundição. O
dos sacerdotes; e o átrio grande, e as suas portas, cronista diz que esse imenso tanque, com
as quais revestiu de bronze 10E pôs o mar ao lado cerca de 5 metros em diâmetro e com capa
direito da casa, a sudeste: uHurão fez ainda as cidade para 38 mil litros de água, era usado
caldeiras, as pás e as bacias. Assim completou para abluções sacerdotais. Os rabinos
Hurão a obra que fazia para o rei Salomão na casa
de Deus: 12as duas colunas, os globos, e os dois criam que os sacerdotes imergiam comple
capitéis no alto das colunas; as duas redes para tamente nele (Slotki). É bem possível que
cobrir os dois globos dos capitéis que estavam no mar de fundição simbolizasse, original
alto das colunas; 13e as quatrocentas romãs para mente, o triunfo de Iavé sobre o caos
as duas redes, duas fileiras de romãs para cada
rede, para cobrirem os dois globos dos capitéis que
primordial.
estavam em cima das colunas. 14Tàmbém fez as Figuras de bois (na versão inglesa, colo-
bases, e as pias sobre as bases; lso mar, e os doze cíntidas; heb., “semelhança de bois”).
bois debaixo dele. ‘‘Semelhantemente as caldeiras, A versão RSV em inglês fez a ligação do
as pás, os garfos e todos os vasos, os fez Hurão-
-Abi de bronze luzente para o rei Salomão, para texto com a expressão encontrada em
a casa do Senhor. 17Na campina do Jordão, os IReis 7.24. Contudo, a passagem do
fundiu o rei, na terra argilosa entre Sucote e Zeredá. cronista está, provavelmente, mais próxima
18Salomão fez todos estes vasos em grande do original. O problema era a menção dos
abundância, de sorte que o peso do bronze não se
podia averiguar. 19Assim fez Salomão todos os
bois e sua associação com os touros
vasos que eram para a casa de Deus, o altar de adorados por Israel no deserto e no Israel
ouro, as mesas para os pães da proposição, do Norte. Colocíntidas podem ter sido subs
20os castiçais com as suas lâmpadas, de ouro tituídas por bois no relato de Reis e a
puro, para arderem perante o oráculo, a orde expressão suavizada aqui para “algo seme
nança; 21as flores, as lâmpadas e as tenazes, de
ouro puríssimo; 22como também as espevitadeiras, lhante” a bois.
as bacias, as colheres e os braseiros, de ouro pura Trinta côvados. No hebraico, ou “dez
Quanto à entrada da casa, tanto as portas internas, côvados” ou, literalmente, “dez num
do lugar santíssimo, como as portas da casa, isto
côvado”, dez ornamentos para cada dez
é, do santuário, eram de oura
côvados, totalizando 300. Pbr este número
parecer exorbitante, a versão RSV fez a
Além disso fez um altar de bronze. correção para trinta, significando a circun
Este altar não é descrito na lista dos objetos ferência do tanque. O cronista diz que
feitos de modo especial como em IReis 7. cabiam nele mais de 3 mil batos. Um bato
Contudo, um altar é mencionado em 2Reis era de, aproximadamente; 23 litros, mas ao
16.14, quando Acaz mudou sua localização. tempo do cronista pode ter contido menos
Este silêncio pode significar que o editor (cf. a redução do côvado).
de Reis presumiu que o altar construído Dez castiçais de ouro (...) dez mesas.
por Bezaleel para Moisés havia sido trans Somente o cronista apresenta esse tanto.
ferido para Jerusalém, vindo de Gibeão. Geralmente, os autores do Antigo Testa
Teria sido realmente estranho se esse antigo mento falam somente de um castiçal e uma
altar tivesse sido deixado em Gibeão. Obvia mesa de pães da proposição (cf. Ex 25.23).
388
Reis menciona os dez castiçais, mas a mesas no versículo 8. Nem todas as mesas
passagem pode ser de origem posterior continham pães da proposição; provavel
(IReis 7.49). Os dez castiçais de ouro, prova mente somente uma. Sustinham castiçais
velmente, foram dispostos sobre as dez pertinentes à área dos pães da proposição,
mesas. sendo conhecidas assim por esse nome.
O átrio dos sacerdotes, e o átrio grande. Ouro puro. Isto pode ser ouro vermelho
A segunda palavra para o átrio é diferente (cf. Myers, n, 21).
da primeira. É empregada somente em As portas (...) eram de ouro. IReis
Crônicas e Ezequiel. O templo de Salomão declara que eram recobertas de ouro (6.32).
tinha um átrio público interior, mas a área Pode ser isto o que o cronista quer dizer.
externa continha o terreno para edifica
ções públicas e o palácio. Em IReis 7.12, 3) A Dedicação do Santuário (5.1—7.22)
a mesma palavra é empregada para os dois
átrios, uma descrevendo o grande átrio a. Mudando Pára o Templo (5.1-14)
salomônico e a outra o átrio do Templo. 'Assim se completou toda a obra que Salomão
Ao tempo do cronista, o átrio interior só fez para a casa do Senhor. Então trouxe Salomão
podia ser adentrado pelos sacerdotes, as coisas que seu pai Davi tinha consagrada, a saber,
a prata, o ouro e todos os vasos, e os pôs nos
devido à influência de Ezequiel, e o átrio tesouros da casa de Deus. zEntão Salomão
exterior era para uso do povo. Isto se congregou em Jerusalém os anciãos de Israel, e
chamava o azarah, termo empregado pelo todos os cabeças das tribos, os chefes das casas
cronista. Ele está empregando um termo paternas dos filhos de Israel, para fazerem subir
que lhe era familiar para descrever a área da cidade de Davi, que é Sião, a arca do pacto do
Senhor. 3E todos os homens de Israel se congre
exterior, conquanto a palavra, provavel garam ao rei na festa, no sétimo mês. 4E, tendo
mente, não fosse empregada na época chegado todos os anciãos de Israel, os levitas levan
salomônica. taram a arca; 5e fizeram subir a arca, a tenda da
revelação e todos os utensílios sagrados que
Bacias de oura Pára espargir o sangue estavam na tenda; os sacerdotes levitas os levaram.
contra o altar. As caldeiras eram emprega 6Então o rei Salomão e toda a congregação de
das para cozer a carne dos sacrifícios, e as Israel, que se havia reunido a ele diante da arca,
pás, para dispor as cinzas. Os garfos eram sacrificavam carneiros e bois, que não se podiam
contar nem numerar por causa da sua multidão.
empregados para o manuseio da carne. 7Assim trouxeram os sacerdotes a arca do pacto
Os fundiu o rei. Ele ordenou que isso do Senhor para o seu lugar, no oráculo da casa,
fosse feito, não executou por si mesmo a no lugar santissimoi, debaixo das asas dos queru
bins. 8Porque os querubins estendiam as asas
obra. Este sentido pode, igualmente, sobre o lugar da arca, cobrindo a arca e os seus
aplicar-se ao rei fazendo um sacrifício; varais. 9Os varais eram tão compridos que as
estava sob sua supervisão (cf. lCr 16.2). suas pontas se viam perante o oráculo, mas não
se viam de fora; e ali tem estado a arca até o dia
Na terra argilosa, entre Sucote e Ze- de hoje. 10Na arca não havia coisa alguma senão
redá. Nelson Glueck14 argumenta que as duas tábuas que M oisés ali tinha posto
essas eram fundições de terra. IReis loca em Horebe, quando o Senhor fez um pacto com
liza esta atividade perto de Zarêtã e é, pro os filhos de Israel, ao sairem eles do Egito.
nQuando os sacerdotes saíram do lugar santo
vavelmente, o texto mais preciso. (pois todos os sacerdotes que se achavam presen
O altar de ouro, as mesas. O altar era tes se tinham santificado, sem observarem a ordem
para a queima de incenso (cf. Ex. 30.1). de suas turmas; 12também os levitas que eram
Somente o cronista apresenta as mesas no cantores, todos eles, a saber, Asafe, Hemã,
Jedútun e seus filhos, e seus irmãos, vestidos de
plural para os pães da proposição. Isto linho fino, com címbalos, com alaúdes e com harpas,
corresponde a lCrônicas 28.16, mas é, pro estavam em pé ao lado oriental do altar, e junta
vavelmente, para ser identificado com as mente com eles cento e vinte sacerdotes, que tocavam
as trombetas), 13quando os trombeteiros e os
cantores estavam acordes em fazerem ouvir uma
14BASOR 90 (abril de 1943), p. 13 e ss. só voz, louvando ao Senhor e dando-lhe graças,
389
e quando levantavam a voz com trombetas, e cronista em copiar sua fonte. Obviamente,
cimbalos, e outros instrumentos de música, e isto não se aplicava ao seu tempo, pois o
louvavam ao Senhor, dizendoc Porque ele é bom,
porque a sua benignidade dura para sempre; então Templo de Salomão havia sido destruído
se encheu duma nuvem a casa, a saber, a casa do e a arca se perdera. A fonte, porém, afirmou
Senhor, 14de modo que os sacerdotes não podiam isso e ele copiou o texto tal como rezava.
ter-se em pé, para ministrar, por causa da nuvem; A fonte anterior podia estar fazendo refe
porque a glória do Senhor encheu a casa de Deus.
rência à marca dos varais sobre o véu, que
podia ser observada de fora do santo dos
Primeiro, todos os tesouros armaze santos, e não os próprios varais.
nados por Davi foram transferidos para o Os versos 11-13 parecem uma adição
novo Templo. Depois, a arca e o taberná feita pelo cronista, descrevendo as ativi
culo foram trazidos até ali. A última dades dos coros levíticos nas cerimônias.
ação requereu uma grande procissão ceri É possível que esta fosse a situação real
monial. preservada nas tradições dos levitas, mas
No Sétimo mês. IReis 8.2 identifica não do interesse dos editores de Reis.
este mês como etanim, uma palavra cana- O relato de Reis diz que a nuvem de glória
néia. O cronista omite este lembrete dos apareceu quando os sacerdotes estavam
tempos antigos. O nome hebraico para o saindo do lugar santo, após ali depositarem
mês era tisri (correspondendo a meados de a arca. O cronista, de forma característica,
setembro—meados de outubro). IReis 6.38 relaciona isso ao cântico de louvor dos
declara que o Templo não foi completado levitas. A música inspirada trouxe a
até o oitavo mês. Foi a cerimônia realizada sensação da presença divina. Mesmo que
antes de ele ser concluído? Isto faria para o cronista não estivesse sendo historica
lelo a muitas situações modernas, em que mente preciso quanto ao que ocorrera
a inauguração não mais aguarda o término naquela ocasião, ele bem sabia quão
do trabalho. Alguns têm sugerido que a freqüentemente tais eventos haviam ocor
dedicação não foi observada até o ano rido e buscou destacar sua contínua
seguinte. importância.
Os levitas levantaram a arca. IReis 8.3
declara que foram os sacerdotes que o b. As Palavras de Salomão (6.1-42)
fizeram. Estudiosos de outra geração assi
a) A Bênção Salomônica (6.1-11)
nalavam que isso é uma ilustração do fato
de que uma distinção definida entre as 'Então disse Salomão: O Senhor disse que
funções dos levitas e as dos sacerdotes não habitaria nas trevas. 2E eu te construí uma casa
para morada, lugar para a tua eterna habitação.
foi feita até após o exílio babilónico. No 3Então o rei virou o rosto e abençoou toda a
Israel mais antigo, um levita podia desem congregação de Israel; e toda a congregação estava
penhar funções sacerdotais. O cronista em pé. 4E ele disse: Bendito seja o Senhor Deus
observa cuidadosamente a diferença nos de Israel, que pelas suas mãos cumpriu o que falou
pela sua boca a Davi, meu pai, dizendo: 5Desde
deveres. Contudo, 2Crônicas 5.5 não faz o dia em que tirei o meu povo da terra do Egito
uma nítida distinção, pois menciona os não escolhi cidade alguma de todas as tribos de
levitas sacerdotes. No hebraico não existe Israel, para edificar nela uma casa em que estivesse
a conjunção “(e)” entre os dois termos. o meu nome, nem escolhi homem algum para ser
Aqui também os levitas são considerados chefe do meu povo Israel; ‘mas escolhi Jerusalém
para que ali estivesse o meu nome; e escolhi Davi
como sacerdotes, mas não como sacerdotes para que estivesse sobre o meu povo Israel. ’Davi,
oficiantes. Somente os últimos podiam meu pai, teve no seu coração o propósito de edificar
carregar a arca ao seu lugar de perma uma casa ao nome do Senhor, Deus de Israel.
nência no santo dos santos. 8Mas o Senhor disse a Davi, meu pai: Porquanto
tiveste no teu coração o propósito de edificar uma
Ali tem estado (...) até o dia de hoje. casa ao meu nome, fizeste bem em ter isto no teu
Aqui está um exemplo da fidelidade do coração. ’Contudo, tu não edificarás a casa, mas
390
teu filho, que há de proceder de teus lombos, esse Deus, para ouvires o clamor e a oração que o teu
edificará a casa ao meu nome. 10Ássim cumpriu servo faz diante de ti; “ que dia e noite estejam os
o Senhor a palavra que falou; pois eu me levantei teus olhos abertos para esta casa, sim, para o lugar
em lugar de Davi, meu pai, e me assentei sobre de que disseste que ali poriafe o teu nome; para
o trono de Israel, como prometeu o Senhor, e edifi ouvires a oração que o teu servo fizer neste lugar.
quei a casa ao nome do Senhor, Deus de Israel. 21Ouve as súplicas do teu servo, e do teu povo
“ Nela pus a arca, em que está o pacto que o Israel, que fizerem neste lugar; sim, ouve do lugar
Senhor fez com os filhos de Israel. da tua habitação, do céu; e, ouvindo, perdoa.
391
caminho em que devem andar; envia chuva sobre interesses dos estrangeiros identificados
a tua terra, que deste ao teu povo em herança.
28Se houver na terra fome ou peste, se houver com Israel. A universalidade do pecado é
crestamento ou ferrugem, gafanhotos ou lagarta; outra declaração significativa (v. 36).
se os seus inimigos os cercarem nas suas cidades;
seja qual for a praga ou doença que houver; d) Conclusão Para a Oração (6.40-42)
29toda oração e toda súplica que qualquer homem
ou todo o teu povo Israel fizer, conhecendo cada 40Agora, ó meu Deus, estejam os teus olhos
um a sua praga e a sua dor, e estendendo as suas abertos, e os teus ouvidos atentos à oração que se
mãos para esta casa, “ ouve então do céu, lugar fizer neste lugar.41Levanta-te pois agora, Senhor
da tua habitação, e perdoa, e dá a cada um Deus, e vem para o lugar do teu repouso, tu e a
conforme todos os seus caminhos, segundo vires arca da tua fortaleza; sejam os teus sacerdotes, ó
o seu coração (pois tu, só tu conheces o coração Senhor Deus, vestidos de salvação, e os teus santos
dos filhos dos homens), 31para que te temam e se regozijem no bem. 42Ó Senhor Deus, não faças
andem nos teus caminhos todos os dias que virar o rosto do teu ungido; lembra-te das miseri
viverem na terra que deste a nossos p ais.32Assim córdias para com teu servo Davi!
também ao estrangeiro, que não é do teu povo
Israel, quando vier de um país remoto por amor Aqui o cronista substitui a prosaica
do teu grande nome, da tua mão poderosa e do
teu braço estendido, vindo elee orando nesta casa,
conclusão da oração salomônica em IReis
33ouve então do céu, lugar da tua habitação, e (8.50b-53) com uma mais impressionante.
faze conforme tudo que o estrangeiro te suplicar, Ele combinou Salmos 132.8 com Isaías
a fim de que todos os povos da terra conheçam o 55.3 de forma notável. Salmos 132 está
teu nome, e te temam como o teu povo Israel, e intimamente associado com as cerimônias
saibam que pelo teu nome é chamada esta casa que
edifiquei. 34Se o teu povo sair à guerra contra os de entronização real (cf. Myers, II, 37).
seus inimigos, seja qual for o caminho por que os Pode bem representar (especialmente
enviares, e orarem a ti, voltados para esta cidade 6.41-42a) as mesmas palavras proferidas
que escolheste e para a casa que edifiquei ao teu quando a arca foi depositada nos dias de
nome, 35ouve então do céu a sua oração e a sua
súplica, e defende a sua causa. 36Se pecarem
Salomão e repetidas no ritual anual de reno
contra ti (pois não há homem que não peque), e vação do concerto de gerações sucessivas.
tu te indignares contra eles, e os entregares ao Por outro lado, cerimônias posteriores
inimigo, de modo que os levem em cativeiro para podem ter influenciado a descrição da
alguma terra, longíngua ou próxima; 37se na terra situação aqui. Seja como for, o verdadeiro
para onde forem levados em cativeiro caírem em
si, e se converterem, e na terra do seu cativeiro te espírito da ocasião foi preservado. O cro
suplicarem, dizendo: Pecamos, e cometemos iniqüi nista está associando, como fez Israel, a
dade, procedemos perversamente; se eles se presença da arca com a segurança do
arrependerem de todo o seu coração e de toda a trono. É digno de nota que a arca e o
sua alma, ^na terra do seu cativeiro, a que os
tenham levado cativos, e orarem voltados para a reinado davídico foram perdidos simulta
sua terra, que deste a seus pais, para a cidade que neamente com a queda de Jerusalém.
escolheste, e para a casa que edifiquei ao teu nome,
39ouve então do céu, lugar da tua habitação, a sua
à oração e as suas súplicas, defende a sua causa c. Cerimônias de Dedicação (7.1-10)
e perdoa ao teu povo que houver pecado contra ti.
‘Tendo Salomão acabado de orar, desceu fogo
do céu e consumiu o holocausto e os sacrifícios;
e a glória do Senhor encheu a casa. 2E os sacer
Esta seção corresponde bem de perto a dotes não podiam entrar na casa do Senhor, por
Reis. De fato, não há diferenças significa que a glória do senhor tinha enchido a sua casa.
3E todos os filhos de Israel, vendo descer o fogo,
tivas. Como esta correspondência incomum e a glória do Senhor sobre a casa, prostraram-se
pode ser explicada? É bastante provável com o rosto em terra sobre o pavimento, adora
que estas orações eram realmente empre ram ao Senhor, e lhe deram graças, dizendo: Por
gadas nos serviços do Templo e foram que ele é bom; porque a sua benignidade dura pa
preservadas na liturgia. Nestas petições há ra sempre: 4Então o rei e todo o povo ofereceram
sacrifícios perante o Senhot SE o rei Salomão
um impressionante equilíbrio entre preocu ofereceu em sacrifido vinte e dois mil bois e cento
pações pela guerra com seus inimigos e os e vinte mil ovelhas. Assim o rei e todo o povo con-
392
sagraram a casa de Deus. 6Os sacerdotes estavam da o sentido mais provável. Ao oitavo dia,
em pé nos seus postos, como também os levitas isto é, da segunda semana, foram despedi
com os instrumentos musicais do Senhor, que o
rei Davi tinha feito para dar graças ao Senhor dos no encerramento do dia. Ficaram ali
(porque a sua benignidade dura para sempre) duas semanas, dois períodos de sete dias,
quando Davi o louvava pelo ministério deles; e os mas, na verdade, 15 dias, se contarmos o
sacerdotes tocavam trombetas diante deles; e todo dia em que saíram, o que o texto hebraico
o Israel estava em pé. 7Salomão consagrou tam de Reis faz.
bém o meio do átrio que estava diante da casa do
Senhor; porquanto ali ele ofereceu os holocaustos O cronista esclarece este texto difícil.
e a gordura das ofertas pacificas; pois no altar de Eles tiveram a Festa da Dedicação por se
bronze que Salomão tinha feito não cabiam o ho te dias, começando no oitavo dia do séti
locausto e a oferta de cereais e a gordura.8Assim mo mês. No décimo quarto começaram o
naquele tempo celebrou Salomão a festa por sete
dias, e todo o Israel com ele, uma grande congre
festival sagrado (Tabernáculos), o oitavo
gação, vinda desde a entrada de Hamate e desde dia desse festival sendo o clímax (o 22.°).
o rio do Egito. % no oitavo dia celebraram uma No vigésimo terceiro dia foram para casa.
assembléia solene, pois haviam celebrado por sete Segundo relato de Reis, no entanto, foram
dias a dedicação do altar, e por sete dias a festa. despedidos no oitavo dia da festa (o 22.°).
10E, no vigésimo terceiro dia do sétimo mês, ele
despediu o povo para a suas tendas, alegre e de Aqui parece haver uma pequena diferença
bom ânimo pelo bem que o Senhor tinha feito a na tradição. Eles partiram no oitavo dia
Davi e a Salomão, e a seu povo Israel. ou após ele? A própria independência das
tradições, neste ponto, dá validade ao
Agora algo é mencionado que não foi evento básico.
registrado em Reis. É dito que o fogo des Um problema mais significativo é o fato
ceu do céu e consumiu as ofertas. Isso ha de que o Dia da Expiação ocorria no déci
via ocorrido também quando Davi apre mo dia do mês, enquanto a Festa da Dedi
sentou ofertas na eira de Omã (lCr 21.26) cação se desenrolava, e nenhuma menção
e quando Arão foi consagrado (Lv 9.24). é feita de sua observância (cf. Nm 29.7).
Ambas as ocasiões apresentaram a auten Alguns eruditos insistem em que isto de
ticação de Deus para com a oferta de sa monstra que o cronista ignorava tal dia e
crifício. Aqui foi em resposta à oração. É que foi inaugurado após o seu tempo. Ou
o modo de o cronista dizer que a oração tros dizem que pode ter sido observado e
de Salomão foi uma oferta mais aceitável não é mencionado. Outra explicação é
a Deus do que os sacrifícios de animais, que a ocasião comum permitiu o desvio
que são um anticlímax de seu relato. Ele (Slotki).
não exagera o número de animais ofere
cidos, seguindo fielmente o relato em Reis. d. A Resposta Divina (7.11-22)
Davi tinha feito para dar graças ao Se 11Assim Salomão acabou a casa do Senhor e
nhor. Esta é uma declaração impressio a casa do rei; tudo quanto Salomão intentara fazer
nante. Significa: porque proveu-os com es na casa do Senhor e na sua própria casa, ele o
realizou com êxito. 1ZE o Senhor apareceu de noi
ses instrumentos e a oportunidade para te a Salomão e lhe disse: Eu ouvi a tua oração e
ministrar, o ministério deles sendo o seu escolhi para mim este lugar para casa de sacrifi-
próprio. Assim, o monarca servia median cio. 13Se eu cerrar o céu de modo que não haja
te os ministros aos quais assistia. chuva, ou se ordenar aos gafanhotos que consu
mam a terra, ou se enviar a peste entre o meu po
E no oitavo dia celebraram. Surgem vo; 14e se o meu povo, que se chama pelo meu
muitos problemas ao cotejar-se o relato de nome, se humilhar e orar, e buscar a minha foce,
Reis com este. Em IReis 8.65,66 é decla e se desviar dos seus maus caminhos, então eu
rado que esta foi uma festa de sete dias, e ouvirei do céu, e perdoarei os seus pecados, e sa
no oitavo dia as pessoas foram enviadas rarei a sua te rra .15Agora estarão abertos os meus
olhos e atentos os meus ouvidos à oração que se
para casa. Contudo, o hebraico traz: “sete fizer neste lugar. 1(Pois escolhi e consagrei esta
dias e sete dias, catorze dias”. Este é ain casa, para que nela esteja o meu nome para sem-
393
pre; e nela estarão fixos os n eus olhos e o meu Se desviar dos seus maus caminhos.
coração perpetuamente. 17E, q <anto a ti, se anda Deus não ouvirá orações desacompanha
res diante de mim como andou Davi, teu pai, fa
zendo conforme tudo que te ordenei, guardando das de verdadeiro arrependimento.
os meus estatutos e as minhas ordenanças, 18en- Ouvirei (...) perdoarei (...) sararei. Quan
tão confirmará o trono do teu reino, conforme o do uma vez o ouvido do Senhor é alcan
pacto que fiz com Davi, teu pai, dizendo: Não te
faltará varão que governe em Israel. ’’M as se vos çado, ele não só removerá a culpa, mas
desviardes, e deixardes os meus estatutos e os também restaurará a saúde e a utilidade.
meus mandamentos que vos tenho propostoi, e Que é tão exaltada ou “que foi elevada”.
fordes, e servirdes a outros deuses, e os adorar
des, 20então vos arrancarei da minha terra que
O texto em Reis foi, aparentemente, cor
vos dei; e esta casa que consagrei ao meu nome, rompido. Esta declaração favorece a inter
lançá-la-ei da minha presença, farei com que ela pretação literal de 2Crônicas 3.4, que diz
seja por provérbio e motejo entre todos os povos. que a altura do pórtico do templo era de
21É desta casa, que é tão exaltada, se espantará 60 metros (cf. o comentário sobre 2Crôni-
qualquer que por d a passar, e dirá: Por que fez
o Senhor assim a esta terra e a esta casa? 22E lhe cas 3.4). Se nenhuma parte do Templo
responderão: Porquanto deixaram ao Senhor tivesse mais de 30 côvados (cerca de 15
Deus de seus pais, que os tirou da terra do Egito, metros), dificilmente se poderia dizer que
e se apegaram a outros deuses, e os adoraram e era alto. A versão Almeida Revista e Atu
os serviram; por isso trouxe sobre eles todo este
mal.
alizada, tal como a inglesa RSV, toma a
declaração como figurada, o que é bem
Esta passagem faz paralelo a IReis 9.1- provável.
9, com o acréscimo nos versículos 12b-14.
Por um lado, refere-se ao Templo como ca 3 .0 Final do Reinado de Salomão (8.10—
sa de sacrifício, em lugar da designação 9.31)
mais avançada, ‘tasa de oração”. Tal ex
pressão revela mais um conceito sacerdotal
tradicional do que a perspectiva espiritua 1) Notável Política Interna (8.1-18)
lizada do próprio cronista (cf. o comentá ‘Ao fim de vinte anos, nos quais Salomão tinha
rio sobre lCr 7.1 e ss.). edificado a casa do Senhor e a sua própria casa,
Imediatamente, contudo, ele foi trans Salomão edificou as cidades que Hurão lhe tinha
dadoi, e fez habitar nelas os filhos de Israel, d e
portado da linguagem institucionalizada pois foi Salomão a Hamate-Zobá, e apoderou-se
para uma de suas declarações mais inspi dela. 4E edificou a Tadmor no deserto, e todas as
radas, uma declaração que tem apelado a cidades-armazéns, que edificou em Hamate. E d i
mais pessoas do que qualquer outra pas ficou também Bete-Horom, tanto a alta com a
baixa, cidades fortes, com muros, portas e ferro
sagem em Crônicas. lhos; 6como também Baalate, e todas as cidades-
Se o meu povo, que se chama pelo meu armazéns que Salomão tinha, e todas as cidades
nome. Ou, literalmente: “Se o meu povo se para os seus carros e as cidades para os seus ca
humilhar, aquele sobre o qual meu nome valeiros, e tudo quanto Salomão desejava edificar
tem sido invocado.” Dois conceitos são em Jerusalém, no Libano e em toda a terra do
seu domínio. Quanto a todo o povo que tinha
básicos aqui: 1) Israel pertencia a Deus; o ficado dos heteus, dos amorreus, dos perizeus, dos
seu nome havia sido invocado então; 2) heveus e dos jebuseus, os quais não eram de Is
eles devem reconhecer isto e submeter-se à rael; *a seus filhos, que ficaram depois deles na
sua autoridade. terra, os quais os filhos de Israel não destruíram,
Salomão lhes impôs tributo de trabalho forçado,
Tiago 2.7 baseia-se nesse conceito. O até o dia de hoje. 9Mas dos filhos de Israel Salo
nome de Cristo tem sido invocado sobre mão não fez escravo algum para a sua obra; porém
o crente no batismo. eram homens de guerra, chefes dos seus capitães,
Orar, e me buscar. Não só deviam orar e chefes dos seus carros e dos seus cavaleiros.
10Estes eram os chefes dos oficiais que o rei Sa
a Deus, como não conformar-se com me lomão tinha, duzentos e cinqüenta, qiie presidiam
nos do que serem admitidos em sua pre sobre o povo. UE Salomão levou a filha de Faraó
sença. Eles precisavam vê-lo. da ddade de Davi para a casa que lhe edificara; pois
394
disse: Minha mulher não morará na casa de Davi, como a correta leitura em Crônicas, de
rei de Israel, porquanto os lugares nos quais entrou modo que o Rroblema não pode ser resol
a arca do Senhor são santos. 12Então Salomão vido admitindo-se corrupção textual de
ofereceu holocaustos ao Senhor, sobre o altar do
Senhor, que edificara diante do pórtico; 13e isto uma menção original de Tamar.
segundo o dever de cada dia, fazendo ofertas se Mas dos filhos de Israel Salomão não
gundo o mandamento de Moisés, nos sábados e fez escravo algum. Esta declaração faz pa
nas luas novas, e nas três festas anuais, a saber:
na festa dos pães ázimos, na festa das semanas, ralelo com IReis 9.22 e não contradiz
e na festa dos tabernáculos. ‘“Também, conforme IReis 5.13, que menciona o emprego de
a ordem de Davi, seu pai, designou as turmas dos israelitas como trabalhadores forçados.
sacerdotes para os seus cargos, como também os Assim, os israelitas foram convocados so
levitas para os seus cargos, para louvarem a Deus mente para breves turnos, porém os estran
e ministrarem diante dos sacerdotes, como exigia
o dever de cada dia, e ainda os porteiros, pelas geiros designados para servidão permanen
suas turmas, a cada porta; pois assim tinha man te. O emprego de israelitas era comparável
dado Davi, o homem de Deus. 15E os sacerdotes à nossa convocação militar. O cronista se
e os levitas não se desviaram do que lhes man gue um texto muito próximo de IReis aqui.
dou o rei, em negócio nenhum, especialmente no
tocante aos tesouros.16Assim se executou toda a É significativo que Salomão estava reali
obra de Salomãoi, desde o dia em que se lançaram zando o mesmo que Faraó fizera com Is
os fundamentos da casa do Senhoi; até se acabar. rael no Egita Os estrangeiros foram força
Deste modo se completou a casa do Senhor. 17En- dos a construir cidades-armazéns. As mes
tão Salomão foi a Eziom-Geber, e a Elote, à praia mas palavras são empregadas para estas
do mar, na teira de Edom. 18E Hurão, por meio
de seus servos, enviou-lhe navios, e servos práti cidades e este tipo de trabalho no primei
cos do mar; e eles foram com os servos de Salo ro capítulo de Êxodo. Talvez o historiador
mão a Ofir, e de lá tomaram quatrocentos e cin hebreu tenha percebido a incoerência de
qüenta talentos de ouro, e os trouxeram ao rei Salomão. Não ouviu Deus também o cla
Salomão.
mor dessas pessoas exploradas?
Minha mulher não morará na casa de
As atividades mencionadas nos versí Davi. Este evento é descrito em Reis, mas
culos 1-10 previamente tinham o propósito somente o cronista oferece explicação. A
de prover a defesa e segurança nacionais, tradução minha mulher subentende que a
não a expansão. Contudo, eram extensas. declaração limita-se à filha de Faraó e que
No relato do cronista essas ações vão bem ela não tinha permissão de viver em palá
além da situação descrita em IReis 9. A cio por ser estrangeira. Contudo, a frase
captura de Hamote-Zobá não é menciona pode ser traduzida: “Nenhuma esposa mi
da aqui. Atividades em Zobá eram natu nha viverá”, significando que a área sagra
rais, pois o próprio Davi teve dificuldades da seria contaminada se qualquer mulher
lá (cf. 2Sm 8.9; 10.8; lCr 19.6). Mas Ha- vivesse ali. Uma ênfase sobre a impureza
mate ficava bem ao norte. Alguns julgam cerimonial das mulheres levou os edifica
que esta Hamate ficava perto de Zobá, dores do segundo Templo a proverem um
mas sendo, por outro lado, desconhecida. pátio para as mulheres fora do destinado
Tadmor (lRs 9.18 diz Tamar, uma cidade na aos homens. Myers acha que esta idéia é
Judá do Sul) foi mais tarde chamada de encontrada aqui, mas a atitude iluminada
Palmira e estava situada cerca de 80 qui do cronista para com as mulheres em ou
lômetros a nordeste de Damasco. Seria es tros lugares dificilmente a favorece (cf. o
te um caso de exagero do cronista quanto comentário sobre lCr 7.24). Ademais, é
ao que Salomão conseguiu alcançar, ou ti inconcebível que Salomão não mantivesse
nha o cronista informação não familiar ao nenhuma mulher na área do palácio.
editor de Reis? Novamente, nada há de Os lugares nos quais entrou a arca do
conclusivo. A colocação de Tadmor em Senhor são santos. Isto é, literalmente:
ligação com Hamate favorece este nome “Santos são aqueles para os quais a arca
395
do Senhor veio.” O concei.o de santidade 2) Fama Internacional (9.1-12)
do cronista inclui a área do palácio, bem
'Tendo a rainha de Sabá ouvido da fama de
como o Templo. Os aposentos do rei e os Salomão, veio a Jerusalém para prová-lo por
dos sacerdotes eram igualmente sagrados. enigmas; trazia consigo uma grande comitiva, e
Pára ele, Israel não era um Estado secular. camelos carregados de especiarias, e ouro em
O trono do rei era o trono de Deus (9.8, abundância, e pedras preciosas; e vindo ter com
mas cf. IReis 10.9, que declara “trono de Salomão, falou com ele de tudo o que tinha no seu
coração. 2E Salomão lhe respondeu a todas as
Israel”). perguntas; não houve nada que Salomão não lhe
Então Salomão ofereceu holocaustos. soubesse explicar. 3\fendo, pois, a rainha de Sabá
IReis 9.25 também inclui ofertas pacíficas a sabedoria de Salomão, e a casa que ele edificara,
4e as iguarias de sua mesa, e o assentar dos seus
e queima de incenso. Essas práticas gera oficiais, e as funções e os trajes dos seus servos,
ram problemas para o círculo sacerdotal do e os seu copeiros e os trajes deles, e os holocaus
cronista. Parecia a este grupo que Salomão tos que ele oferecia na casa do Senhor, ficou estu
estava exercendo funções sacerdotais, parti pefata. 5Então disse ao rei: Era verdade o que
cularmente a queima de incenso perante ouvi na minha terra acerca dos teus feitos e da tua
sabedoria. ‘Todavia, eu não o acreditava, até que
o santo dos santos. Aqui suas atividades vi e os meus olhos o viram; e eis que não con
estão confinadas ao altar fora do lugar taram a metade da grandeza da tua sabedoria;
santo. Em ambos os casos, todavia, ele es sobrepujaste a fama que ouvi. 7Bem-aventurados
tá dirigindo as atividades, não necessaria os teus homens! Bem-aventurados estes teus
mente envolvido, em pessoa, na ação sa servos, que estão sempre diante de ti, e ouvem a
tua sabedoria! 8Bendito seja o Senhor teu Deus
cerdotal (cf. o comentário sobre 2Cr 4.17). que se agradou de ti, colocando-te sobre o seu
Os versos 13-16ã são uma expansão adicio trono, para ser rei pelo Senhor teu Deus! Porque
nal do cronista, onde atividades detalha teu Deus amou a Israel, para o estabelecer perpe
das do Templo são acrescentadas às três tuamente, por isso te constituiu rei sobre eles, para
executares juízo e justiça. ’Então ela deu ao rei
semanas especiais de IReis. Aqui, ele pode cento e vinte talentos de ouro e especiarias em
estar apresentando uma tradição sacerdo grande abundância, e pedras predosas; e nunca
tal não usada pelo editor de Reis. houve tais especiarias quais a rainha de Sabá deu
Davi, o homem de Deus. Esta descrição ao rei Salomão. l0Tàmbém os servos de Hurão, e
os servos de Salomão, que de Ofir trouxeram ouro,
também ocorre em Neemias 12.24,36, trouxeram madeira de algundns, e pedras pre
quando uma função profética na carreira ciosas. nE o rei fez da madeira de algumins,
de Davi é destacada, por ele ter revelado degraus para a casa do Senhor e para a casa do
em suas atividades reais os caminhos de rei, como também harpas e alaúdes para os
cantores, quais nunca dantes se viram na terra de
Deus ao seu povo Assim, para o cronista, Judá. 12E o rei Salomão deu à rainha de Sabá
o rei foi um homem de Deus, bem como tudo quanto ela desejou, tudo quanto lhe pediu,
um profeta (cf. lRs 13.1 e ss.; 2Cr 11.2). excedendo mesmo o que ela trouxera ao rei.
Assim voltou e foi para a sua terra, ela e os seus
E Hurão, por meio de seus servos, servos.
enviou-lhe. IReis 9.27 reinvidica somente
que ele enviou marinheiros. Como poderia O relato da notoriedade de Salomão que
Hurão enviar seus navios de Tiro ao golfo chegou à rainha de Sabá, vinda do sul da
de Ácaba? Não existia o Canal de Suez. Arábia, é quase idêntico à história de IReis
A única maneira seria navegar ao redor da 10.1-13. Deve ter sido uma narrativa muito
extremidade meridional da África! Isso familiar, cuja forma foi tão bem estabele
dificilmente seria provável naquele tempo. cida que pouca mudança se fez possível.
Talvez Hurão já possuísse navios na área A variação principal é a mudança de tudo
do mar da Pérsia e os remeteu a Salomão; quanto ela desejou (...) excedendo mesmo
ou, mais provavelmente, enviou-os em rota o que ela trouxera. A história original
terrestre, juntamente com os marinheiros, pode ter incluído ambos os aspectos deste
em seções a serem mais tarde reunidas arranjo. O que se quer dizer é que ela levou
nos navios concluídos. presentes, que foram retribuídos por
396
presentes de Salomão. Assim, ela ganhou superior a 20 milhões de dólares. O mesmo
presentes acima dessa troca mútua oficial. montante aparece em Reis. Este é o
Harpas e alaúdes para os cantores. número da besta no livro de Apocalipse
Uma vez que isso ocorre também em Reis, (Ap 13.18), o que pode ser coincidência.
é evidente que a tradição anterior também E um estrado de oura IReis 10.19 não
preservava lembranças de corporações traz esta frase, mas diz que o espaldar do
musicais organizadas. Se esses instrumen trono era redonda
tos eram tão delicados, certamente a exe
O rei tinha navios que iam a Társis.
cução deles deve ter correspondido a isso. IReis simplesmente se refere aos “navios
de Társis”, uma possível expressão idiomá
3) Prosperidade Econômica (9.13-28) tica para navios que viajavam para portos
13Ora, o peso do ouro que se trazia cada ano distantes. Társis ficava, possivelmente, na
a Salomão era de seiscentos e sessenta e seis Espanha meridional. Do Golfo de Ácaba,
talentos, 14afora o que os mercadores e nego
ciantes traziam; também todos os reis da Arábia,
eles teriam que ir ao redor da África,
e os governadores do país traziam a Salomão ouro atravessando o Atlântico, para chegarem
e prata. 15E o rei Salomão fez duzentos paveses à Espanha. As mercadorias que trouxeram
de ouro batido, empregando em cada pavês seis indicam atividade comercial no Oceano
centos siclos de ouro batido; “ como também índica O texto de Crônicas em lide repre
trezentos escudos de ouro batido, empregando em
cada escudo trezentos siclos de oura E o rei senta, provavelmente, um mal-entendido
os depositou na casa do bosque do Líbano. anterior da fonte original. O cronista
17Fez mais o rei um grande trono de marfim, e o preservou-o, ao encontrá-lo (cf. 2Cr 8.18).
revestiu de ouro p u ra lsO trono tinha seis
degraus e um estrado de ouro, que eram ligados
Os servos de Hurão. Reis também
ao trono, e de ambos os lados tinha braços junto registra a presença da frota de Hurão.
ao lugar do assento, e dois leões de pê junto aos O cronista destaca as forças salomônicas.
braços. 19E havia doze leões em pé de um e outro
lado sobre os seus degraus; outro tal não se fizera
Teve também Salomão quatro mil man
em reino algum. 20Também todos os vasos de jedouras para os cavalas de seus carros.
beber do rei Salomão eram de ouro, e todos os IReis 10.26 diz que ele tinha 1.400 carros,
utensílios da casa do bosque do Líbano, de ouro mas IReis 4.26 menciona 40 mil manje
puro; a prata reputava-se sem valor nos dias de douras para cavalos. A estimativa do
S alom ãa 21Pois o rei tinha navios que iam a
Társis com os servos de Hurão; de três em três cronista parece bastante realista e não é
anos os navios voltavam de Társis, trazendo ouro, exagerada.
prata, marfim, bugios, e pavões.22Assim excedeu
o rei Salomão todos os reis da terra, em riqueza 4) Sumário do Reinado de Salomão (9.29-31)
e em sabedoria. “ E todos os reis da terra bus
cavam a presença de Salomão para ouvirem a
sabedoria que Deus lhe tinha posto no coraçãa 29Ora, o restante dos atos de Salomãoi, desde
MCada um trazia o seu presente, vasos de prata, os primeiros até os últimos, porventura não estão
vasos de ouro, vestidos, armaduras, especiarias, escritos na história de Natã, o profeta, e na pro
cavalos e mulas, uma quota de ano em an a “ Teve fecia de Aias, o silonita, e nas visões de Ido, o
também Salomão quatro mil manjedouras para os vidente, acerca de Jeroboão, filho de Nebate?
cavalos de seus carros, e doze mil cavaleiros; e os “ Salomão reinou em Jerusalém quarenta anos
colocou nas cidades dos carros, e junto ao rei em sobre todo o Israel. 3IE dormiu com seus pais, e
Jerusalém. “ Ele dominava sobre todos os reis, foi sepultado na cidade de Davi, seu pai. E Roboão,
desde o rio Eufrates até a terra dos filisteus, e até seu filho, reinou em seu lugar.
o termo do Egita ^Também o rei tornou a prata
tão comum em Jerusalém como as pedras, e
cedros tantos em abundância como os sicômoros Isto é o mesmo que em Reis, com o acrés
que há na baixada. ME cavalos eram trazidos a
Salomão do Egito e de todas as terras. cimo de menção de fontes que o cronista
estivera usando. Estas podem simples
O peso de ouro (...) era de seiscentos e mente ser referências ao material em nosso
sessenta e seis talentos. Em valores atuais, presente livro de Reis, ou, mais provavel-
397
mente, refere-se a um midrash levítico Voltai a mim ao terceiro dia. 13E o rei Roboão
sobre a história de Judá, contendo coleções lhes respondeu asperamente e, deixando o con
selho dos anciãos, 14falou-lhes conforme o conse
proféticas independentes, tanto anteriores lho dos jovens, dizendo: Meu pai fez pesado o
quanto posteriores. Está-se tornando mais vosso jugo, mas eu lhe acrescentará mais; meu pai
óbvio hoje que o cronista se valia de fontes vos castigou com açoites, mas eu vos castigarei
doutro modo não familiares a nós. Antes com escorpiões. lsO rei, pois, não deu ouvidos ao
de oferecer este sumário, ele deixou de fora povo; porque esta mudança vinha de Deus, para
que o Senhor confirmasse a sua palavra, a qual
a descrição da apostasia de Salomão encon falara por intermédio de Aias, o silonita, a Jero
trada em IReis 11. Desejava que os últimos boão, filho de Nebate. 16Vendo, pois, todo o Israel
pensamentos sobre Salomão fossem posi que o rei não lhe dava ouvidos, respondeu-lhe
tivos. dizendo: que parte temos nós em Davi? Não
temos herança no filho de Jessé. Cada um às suas
Ido, o vidente. Na verdade, grafado tendas, ó Israel! Agora olha por tua casa, ó Davi!
como Jedo neste texto. A forma mais fami Então todo o Israel se foi para a suas tendas.
liar “Ido” ocorre em 2Crônicas 12.15; 13.22. 17(Mas quanto aos filhos de Israel, que habitavam
nas cidades de Judá, sobre eles reinou Roboão.)
lsEntão o rei Roboão enviou-lhes Hadorão, que
IV. Judá Pronto Para a Batalha estava sobre a leva de tributários servis; mas os
(10.1-20-37) filhos de Israel o apedrejaram, de modo que morreu.
E o rei Roboão se apressou a subir para o seu
1. O Reinado de Roboão (10.1—12.46) carro, e fugiu para Jerusalém.19Assim se rebelou
Israel contra a casa de Davi, até o dia de hoje.
1) Judá Deixado Só (10.1-19)
Para o cronista, Israel do Norte des-
‘Roboão foi a Siquém, pois todo o Israel se viou-se da direção principal do reino de
congregara ali para fazê-lo rei. 2E Jeroboão, filho Deus quando as tribos setentrionais rejei
de Nebate, que estava no Egito para onde fugira
da presença do rei Salomão, ouvindo isto, voltou taram a casa de Davi. O verdadeiro Israel
do Egito. 3E mandaram chamá-lo; Jeroboão e todo se acharia no sul (cf. 10.17; 11.3; 13.4 e ss.).
o Israel vieram e falaram a Roboão, dizendo: Pbrtanto, ele não tratou a história do
4Tfeu pai fez duro o nosso jugo; agora, pois, alivia Reino do Norte como tal, mas concentrou-
a dura servidão e o seu pesado jugo que teu pai
nos impôs, e nós te serviremos. 5Ele lhes respon -se sobre os acontecimentos de Judá.
deu: Daqui a três dias tornai a mim. Então o povo Somente no que a história de Israel do
se foi. 6E teve o rd Roboão conselho com os Norte envolvia intimamente Judá ele a
anciãos que tinham assistido diante de Salomão, mencionava. Muito do material que real
seu pai, quando este ainda vivia, e perguntou-lhes: mente incluiu é quase idêntico aos relatos
Como aconselhais vós que eu responda a este
povo? 7Eles lhe disseram: Se te fizeres benigno de Reis. Neste trabalho não duplicaremos
para com este povo, e lhes agradares, e lhes falares a discussão da história tratada na exposi
boas palavras, então eles serão teus servos para ção de 1e 2Reis. Antes, nos concentraremos
sempre. 8M as ele deixou o conselho que os sobre a filosofia subjacente que levou o
anciãos lhe deram, e teve conselho com os jovens
que haviam crescido com ele, e que assistiam
cronista a omitir material ou a fazer-lhe
diante dela 9Perguntou-lhes: Que aconselhais vós acréscimos. Presumimos que o leitor esteja
que respondamos a este povo que me falou, familiarizado com a história de Israel apre
dizendo: Alivia o jugo que teu pai nos impôs? sentada nos livros de Reis.
10E os jovens que haviam crescido com ele res Este capítulo segue bem de perto o
ponderam-lhe: Assim dirás a este povo, que te
falou, dizendo: Teu pai fez pesado o nosso jugo, texto de IReis 12.1-19. Há somente umas
mas tu o alivia de sobre nós; assim lhe falarás: poucas variações, mas que revelam plena
O meu dedo mínimo é mais grosso do que os mente o cronista. Seu registro da passagem
lombos de meu p a i.11Assim que, se meu pai vos revela que, embora ele não tivesse o desejo
carregou dum jugo pesado, eu ainda aumentarei
o vosso jugo; meu pai vos castigou com açoites; de ocultar os pecados de Salomão, não
eu, porém, vos castigarei com escorpiões. 12Veio, apreciava falar a respeito dos mesmos.
pois, Jeroboão com todo o povo a Roboão, ao Se te fizeres benigno para com este
terceiro dia, como o rei havia ordenado, dizendo: povo, e lhes agradares. IReis 12.7 diz:
398
“Se hoje te tornares servo deste povo, e o contra Israel a fim de restituírem o reino a
servires!” Sugere que o conselho dos Roboão. 2Veio, porém, a palavra do Senhor a
Semaías, homem de Deus, dizendo: 3Fala a Ro
homens idosos pode ter sido enganoso. boão, filho de Salomão, rei de Judá, e a todo o
Poderia estar insinuando que ele prometesse Israel em Judá e Benjamim, dizendo: 4Assim diz
naquela ocasião qualquer coisa que o povo o Senhor: Não subireis, nem pelejareis contra os
desejasse, e então, quando se tornasse rei, vossos irmãos; volte cada um à sua casa, porque
fizesse o que bem lhe aprouvesse. “Seja de mim proveio isto. Ouviram, pois, a palavra do
Senhor, e desistiram de ir contra Jeroboão.
escravo deles hoje e eles lhe serão escra SE Roboão habitou em Jerusalém, e edificou em
vos para sempre!” Roboão, mantendo a Judá cidades para fortalezas. ‘Edificou, pois,
atitude de um jovem, teria desprezado esta Belém, E tã, Tecoa, 7Bete-Zur, Socó, Adulão,
posição enganosa daqueles que estavam 8Gate, Maressa, Zife, ’Adoraim, Laquis, Azeca,
10Zorá, Aijalom e Hebrom, que estão em Judá e
familiarizados com as intrigas da corte, Benjamim, cidades fortes. uFortificou estas
preferindo a metodologia honesta dos cidades e pôs nelas capitães, e armazéns de
jovens. Ele francamente lhes diria o que víveres, de azeite e de vinha I2E pôs em cada
tencionava fazer; com isto dividiu o reino. cidade paveses e lanças, e fortificou-as grande
O cronista, por seu turno, removeu a mente, de sorte que reteve Judá e Benjamim.
possibilidade de tal interpretação da pas
sagem. “Hoje” não está na declaração para Roboão (...) edificou em Judá cidades
ser contrastada com “para sempre”. Os para fortalezas. Desta lista parece que seu
senhores idosos não sugerem que o filho território já era menos extenso no sul do
que o de Salomão (cf. lRs 9.15b,17,18).
de Davi fosse como escravo do povo, mas
Todas estas cidades ficavam na fronteira
que seja ponderado e seja conciliador. Tal
egípcia; nenhuma delas defrontava com
posição lhe granjearia o respeito e a obedi
ência da parte deles. Em outras palavras, Israel do Norte. Como indicado pela in
o conselho dos idosos não tinha nada de vasão de Sisaque (12.1 e ss.), Roboão fez
reprovável. É de perguntar-se, à luz disto, bem em preocupar-se com esse perigo.
Esta lista de cidades não está em Reis, deri
se o cronista não teria sido ele próprio um
vando de uma fonte independente. A
homem idoso!
arqueologia tem autenticado sua integri
Vendo, pois, todo o Israel (...) se foi. dade, o que tende a aumentar o peso da
Por um lado, as tribos rebeldes do norte são historicidade de outras fontes indepen
referidas como “todo o Israel”. O cronista dentes utilizadas pelo cronista (cf. Myers,
achou difícil empregar o termo Israel sem II, 69,70).
defini-lo como “todo”. Para ele, o povo de De sorte que reteve Judá e Benjamim.
Deus era um só. Esta declaração é tomada por alguns como
Cada um às suas tendas. IReis 12.16 significando que ele empregava as fortifi
não traz “cada um”. Assim o relato do cações para reforçar o seu controle de seu
cronista é mais vívido. próprio reina Contudo, refere-se, provavel
Então o rei Roboão enviou-lhes Hado- mente, à sua habilidade de resistir à pre
rão. O historiador posterior está empre sença egípcia em sua fronteira meridional.
gando um texto diferente do que o seguido
pelos editores de Reis. Ambos os textos 3) Israelitas do Norte Leais (11.13-17)
são, provavelmente, cópias de um original 13lkmbém os sacerdotes e os levitas que havia
mais antigo do que qualquer um deles. em todo o Israel recorreram a ele de todos os seus
termos. 14Pois os levitas deixaram os seus arra
baldes e a sua possessão, e vieram para Judá e
2) Conflitos com Israel (11.1-12) para Jerusalém, porque Jeroboão e seus filhos os
lançaram fora, para que não exercessem o oficio
'Tendo Roboão chegado a Jerusalém, con sacerdotal ao Senhor; lse Jeroboão constituiu
vocou da casa de Judá e Benjamim cento e oitenta para si sacerdotes, para os altos, e para os demô
mil escolhidos, destros na guerra, para pelejarem nios, e para os bezerros que fizera.16Além desses,
399
de todas as tribos de Israel, os que determinaram Ziza e Selomita.21Amava Roboão a Maacá, filha
no seu coração buscar ao Senhor Deus de Israel, de Absalão, mais do que a todas as suas outras
também vieram a Jerusalém, para oferecerem mulheres e concubinas; pois tinha tomado dezoito
sacrificios ao Senhor Deus de seus pais. 17Assim mulheres e sessenta concubinas, e gerou vinte e
fortaleceram o reino de Judá e corroboraram a oito filhos e sessenta filhas. 22E Roboão designou
Roboão, filho de Salomão, por três anos; porque Abias, filho de Maacá, chefe e príncipe entre os
três anos andaram no caminho de Davi e Salomão. seus irmãos, porque queria fazê-lo rei. “ Também
usou de prudência, distribuindo todos os seus
Esta passagem é obra do cronista. IReis filhos por entre todas as terras de Judá e Ben
12.31,32 e 13.33 declaram que Jeroboão jamim, por todas as cidades fortes; e deu-lhes
víveres em abundância, e procurou para eles
designou não-levitas para o sacerdócio, muitas mulheres.
mas não reivindicam que negou o sacer 'E sucedeu que, quando ficou estabelecido o
dócio aos levitas. O cronista diz que ele reino de Roboão, e havendo o rei se tornado forte,
removeu os levitas e substituiu-os pelos de ele deixou a lei do Senhor, e com ele todo o Israel.
sua própria escolha. Isto, provavelmente,
Aqui nos é dito que Roboão foi aben
ocorreu quando os sacerdotes legítimos se
recusaram a associar-se ao seu novo culto. çoado por Deus com muitas esposas e
Aqueles que eram depostos podiam ainda filhos e dotado de sabedoria semelhante à
de seu pai Salomão, apenas para lançar
manter suas terras, mas eles as renuncia
tudo por terra, ao esquecer-se da lei de
ram, para se estabelecerem em Judá, onde Deus. Não nos é dito qual foi o seu pecado.
podiam levar adiante seu chamada Es
Talvez o próprio cronista não o soubesse.
tavam acompanhados por leigos que com
partilhavam de sua desilusão A invasão bem-sucedida de Sisaque do
Egito demonstrou ao cronista que algum
Para os demônios (sátiros, na versão tipo de pecado certamente havia sido
inglesa). Reis não faz menção a eles. São cometido. É mais provável, porém, que
mencionados em Levítico 17.7. Alguns soubesse do que se tratava, mas lhe faltasse
supõem que se tratassem de demônios espaço para descrevê-lo.
peludos, semelhantes a animais. A palavra Maacá, filha de Absalão. 2Samuel
pode simplesmente significar “bodes”.
12.27 diz que Absalão tinha somente
Corroboraram a Roboão, filho de uma filha, Tàmar. 2Crônicas 13.2 diz que
Salomão, por três anos. Após três anos Maacá era filha de Uriel. Portanto, ela era,
perderam a batalha contra a apostasia provavelmente, neta de Absalão.
geral (cf. 12.2, “o quinto ano”). Isto foi E procurou para eles muitas mulheres.
trágico. Deixaram seus lares e proprieda Literalmente: “Ele buscou uma multidão
des somente para serem apanhados noutra de esposas.” Alguns julgam que isto, origi
forma de degeneração. O verso 17b sugere nalmente, descreveria seu pecado. Ele
que até estes que eram leais sucumbiram volveu-se para os deuses de suas esposas,
à nova tentação. tal como Salomão havia feita A declara
No caminho de Davi e Salomão. Estes ção significaria que ele buscou agradar às
dois geralmente não são assim unidos. Em suas muitas mulheres unindo-se a elas em
IReis 11.4 são contrastados. Aqui são seu culto pagão.
ambos endossados por suas virtudes Deixou a lei do Senhor, e com ele todo
comuns. o Israel. Quão facilmente povo seguia
o seu líder no pecado! Conduzi-lo pelos
4) A Apostasia de Roboão (11.18—12.1) caminhos da virtude era bem mais difícil.
18Roboão tomou para si, por mulher, a Maala-
te, filha de Jerimote, filho de Davi; e a Abiail, filha 5) Sisaque do Egito (12.2-12)
de Eliabe, filho de Jessé, 19a qual lhe deu os filhos
Jeús, Semarias e Zaão. “ Depois dela tomou a 2Pelo que, no ano quinto do rei Roboão,
Maacá, filha de Ahsalão; esta lhe deu Abias, Atai, Sisaque, rei do Egito, subiu contra Jerusalém
400
(porque eles tinham transgredido contra o Senhor) Os suquitas eram mercenários egíp
3com mil e duzentos carros e sessenta mil cava cios.15
leiros; e era inumerável a gente que vinha com ele
do Egito: libios, suquitas e etíopes. 4E tomou as Para que conheçam a diferença entre a
cidades fortificadas de Judá, e chegou até Jeru minha servidão e a servidão dos reinos da
salém. 5Então Semafas,o profeta, foi ter com terra. Isto significa que Israel deveria
Roboão e com os príncipes de Judá que se tinham
ajuntado em Jerusalém por causa de Sisaque, e
aprender a diferença entre servir sob um
disse-lhes: Assim diz o Senhor: Vós me deixastes rei estrangeiro e servir sob Deus.
a mim, pelo que eu também w s deixei na mão de Ainda havia coisas boas em Judá.
Sisaque; 6Então se humilharam os principes de Agora o cronista modificou a abrangente
Israel e o rei, e disseram: O Senhor é justa
7Qitanda, pois, o Senhor viu que se humilhavam, generalização que fizera no versículo
veio a palavra do Senhor a Semaías, dizendo: 1. Havia alguns que permaneceram fiéis
Humilharam-se, não os destruirei; mas dar-lhes-ei durante toda essa apostasia. Em lugares
algum socorro, e o meu furor não será derramado tranqüilos as pessoas ainda tomavam sua
sobre Jerusalém por mão de Sisaque. 8Tbdavia
eles lhe serão servos, para que conheçam a dife posição em favor da verdade.
rença entre a minha servidão e a servidão dos
reinos da terra. ’Subiu, pois, Sisaque, rei do
Egito, contra Jerusalém, e levou os tesouros da
6) Sumário do Reinado (12.13-16)
casa do Senhoi; e os tesouros da casa do Rei; levou 13Fortaleceu-se, pois, o rei Roboão em Jeru
tu d a Levou até os escudos de ouro que Salomão salém, e reinou. Roboão tinha quarenta e um anos
fizera. 10E o rei Roboão fez em higar deles es quando começou a reinar, e reinou dezessete anos
cudos de bronze, e os entregou na mão dos em Jerusalém, a cidade que o Senhor escolhera
capitães da guarda, que guardavam a porta da dentre todas as tribos de Israel, para pôr ali o
casa do rei. UE todas as vezes que o rei entrava seu nome. E era o nome de sua mãe Naama, a
na casa do Senhor, vinham os da guarda e os amonita. 14Ele fez o que era mau, porquanto não
levavam; depois tornavam a pô-los na câmara da dispôs o seu coração para buscar ao Senhor.
guarda. 12E humilhando-se ele, a ira do Senhor 15Ora, os atos de Roboãoi, desde os primeiros até
desviou-se dele, de modo que não o destruiu de os últimos, porventura não estão escritos nas
todo; porque ainda havia coisas boas em Judá. histórias de Semaias, o profeta, e de Ido, o vidente,
na relação das genealogias? Houve guerra entre
Essa invasão é também registrada em Roboão e Jeroboão por todos os seus dias.
16E Roboão dormiu com seus pais, e foi sepultado
IReis 14.25-28, mas aquele relato não na cidade de Davi. E Abias, seu filhos reinou em
menciona o número de homens envolvidos seu lugar.
ou a composição das forças egípcias. A
profecia de Semaías é também contribui Isto faz paralelo ao relato de IReis 14,
ção do cronista. A visão do historiador é com o acréscimo da anotação concernente
que Deus nunca favorecia guerra entre a Semaías e Ido. Uma questão enigmática
as duas nações hebréias. O discurso de é a ocorrência no texto hebraico após Idoi,
Semaías afirmava isso, e Roboão atendeu o vidente, da frase “registrar alguém” ou
à admoestação. “para uma lista genealógica” (cf. a RSV,
Mil e duzentos carros e sessenta mil nota marginal)*. A palavra pode ser em
cavaleiros. Os 60 mil eram 60 unidades pregada tanto como verbo quanto como
militares de tamanhos desconhecidos. substantivo. Pode tratar-se de um erro
Mil e duzentos carros seria possível, pois marginal de um escriba, talvez em refe
esta era uma grande campanha. Seus resul rência à própria alistagem dele em seu
tados estão registrados na parede do tem trabalho. Pode, possivelmente, referir-se ao
plo em Camaque, no Egito. IReis dedica nome da fonte sendo utilizada (sua pri-
somente dois versos a este episódio. O
cronista estava cônscio de sua grande
importância. Novamente ele revela pre 15 Cf. W. F. A lbright, em The O ld Testam ait and M o d e m Study, ed.
H . H . Rowley (Londres: Oxford, 1951), p. 18
cisão histórica quando faz acréscimos a Cf. a nossa versão em português, aqui usada, que reza: “n a relação
relatos anteriores. das genealogias”.
401
meira palavra). Ou pode estar declarando uma boa palavra para dizer a respeito de
que uma genealogia seria encontrada na Roboão, e agora faz o mesmo com Abias
obra profética citada. (que é chamado Abião em IReis 14-15,
provavelmente para distingui-lo de Abias,
2. Ábias e Jeroboão (13.1-22) 0 filho de Jeroboão, que o cronista não
menciona). Alguns expositores julgam que
estas boas qualidades que o historiador
1) Sermão num Monte (13.1-12) posterior descreve existem somente em sua
‘No ano décimo oitavo do rei Jeroboão co fértil imaginação, mas é bem provável que
meçou Abias a reinar sobre Judá. Três anos os reis possuíssem virtudes não conside
reinou em Jenisalém; 2o nome de sua mãe era radas pelos editores primitivos, que ava
Micaias, filha de Uriel de Gibeá. E houve guerra
entre Abias e Jeroboão. 3Abias dispôs-se para a liavam seus reinados por outros padrões.
peleja com um exército de varões valentes, quatro O nome de sua mãe era Micaias. Em
centos mil homens escolhidos; e Jeroboão dispôs 11.22 o seu nome é Maacá e também em
contra ele a batalha com oitocentos mil homens
escolhidos, todos homens valentes. 4Então Abias
1 Reis 15.2. Porém a mãe de Asa também
pôs-se em pé em cima do monte Zemaraim, que é Maacá (2Cr 15.16). Em outra parte
está na região montanhosa de Efraim, e disse: Micaias é sempre nome de homem, assim
Ouvi-me^ Jeroboão e todo o Israel: 5Porventura um erro de escriba é evidente no versículo
não vos convém saber que o Senhor Deus de Israel 2. Maacá, citada como filha tanto de
deu para sempre a Davi a soberania de Israel, a
ele e a seus filhos, por um pacto de sal? ‘Contudo Absalão quanto de Uriel, deve ter sido
se levantou Jeroboão, filho de Nebate, servo de neta de Absalão e avó, e não mãe, de Asa.
Salomão, filho de Davi, e se rebelou contra seu Abias dispôs-se para a peleja. Ne
senhor; 7e ajuntaram-se a ele homens vadios
filhos de Belial, e fortaleceram-se contra Roboão,
nhuma referência a essa peleja ocorre em
filho de Salomão, sendo Roboão ainda moço e inde Reis. O cronista sugere que sua fonte é o
ciso de coração, e não podendo resistir-lhes. 8E midrash de Ido (v. 22). A palavra hebraica
agora julgais poder resistir ao reino do Senhor, que midrash deriva de uma raiz que significa
está na mão dos filhos de Davi, visto que sois uma
grande multidão, e tendes convosco os bezerros de
buscar, inquirir, e descreve uma exposição
ouro que Jeroboão vos fez para deuses. ’Não ou interpretação didática. Os exemplos em
lançaste fora os sacerdotes do Senhor, filhos de existência de tais obras judaicas, todas
Arão, e os levitas, e não fizeste para vós sacer posteriores, são às vezes bastante fanta
dotes, como o fazem os _povos das outras terras? siosos. O cronista faz uso de materiais de
Qualquer que vem a consagrar-se, trazendo um
novilho e sete carneiros, logo se faz sacerdote
midrash em seu trabalho. Ele não está
daqueles que não são deuses. 10Mas, quanto a criando um midrash, mas copiando um.
nós, o Senhor é nosso Deus, e nunca o deixamos. O número de homens na peleja concorda
Temos sacerdotes que ministram ao Senhor, os com os dados numéricos dados para o
quais são filhos de Arão, e os levitas para o. seu tempo de Davi, exceto no que se refere a
serviça “Queimam perante o Senhor cada manhã
e cada tarde holocausto e incenso aromático; Judá, que tem 100 mil a menos (cf. 2Sm
também dispõem os pães da proposição sobre a 24.9). Os milhares (’elepim) eram, provavel
mesa de ouro puro, e o castiçal de ouro e as suas mente, unidades, sem indicação do núme
lâmpadas para se acenderem cada tarde; porque ro exato de homens.
nós temos guardado os preceitos do Senhor nosso
Deus; mas vós o deixastes. 12Eis que Deus está Abias pôs-se em pé em cima do monte
conosco, à nossa frente, como também os seus Zemaraim. Este ficava na fronteira entre
sacerdotes com as trombetas, para tocarem Judá e Israel. Em seu inspirado discurso,
alarme contra vós. Ó filhos de Israel, não pelejeis preservado somente pelo cronista, ele
contra o Senhor Deus de vossos pais; porque não
sereis bem-sucedidos.
alegou que somente Judá tinha o verdadeiro
Deus, o verdadeiro reinado e o verdadeiro
O cronista tem uma maneira de ver culto.
excelência nos reis de Judá que outros Um pacto de sal (cf. Lv 2.13; Nm 18.19).
escritores não tinham. Somente ele tinha Mesmo entre os árabes de hoje o sal é
402
empregado para estabelecer alianças dura cito era bem possível, pois Deuteronômio
douras. Visto que o sal preserva, simboliza faz menção de tal costume (Dt 20.2). As
um acordo permanente. declarações no versículo 19 são, certamente,
Homens vadios filhos de Belial autênticas, pois esse mesmo território é alis
(indignos). O quadro da maléfica rebelião tado como posse de Judá em Josué 18.21
contra Roboão aqui expresso é bem diverso e seguintes, numa lista que, provavelmente,
do relato anterior, no capítulo 11 e IReis vem do tempo de Jeosafá.16
12. Esta pode ser a composição do cronista, E o Senhor o feriu. Esta expressão é
mas apresenta um ponto de vista diferente empregada em referência a Nabal (ISm
do que apresentou antes, quando culpou 25.38), que morreu subitamente, mas um
Roboão pela ruptura. Aqui, ele pode ato de Deus pode assumir muitas formas.
simplesmente estar apresentando a perspec Este golpe não é mencionado em Reis, mas
tiva de Abias quanto àqueles o relato da morte do filho de Jeroboão é
acontecimentos. registrado. O cronista pode estar fazendo
referência a isso (lRs 14.1 e ss.).
2) A Batalha com Jeroboão (13.13-22)
13Jeroboão, porém, armou uma emboscada, 3. O Reinado de Asa (14.1—16.14)
para dar sobre Judá pela retaguarda; de maneira
que suas tropas estavam em frente de Judá e a 1) Lealdade a Deus (14.1-5)
emboscada por detrás. 14Então os de Judá
olharam para trás, e eis que tinham de pelejar por ‘Abias dormiu com seus pais, e o sepultaram
diante e pela retaguarda; então clamaram ao Senhor, na cidade de Davi. E Asa, seu filho, reinou em seu
e os sacerdotes tocaram as trombetas. 15E os lugar; nos seus dias a terra esteve em paz por dez
homens de Judá deram o brado de guerra; e sucedeu anos. 2E Asa fez o que era bom e reto aos olhos
que, bradando eles, Deus feriu Jeroboão e todo do Senhor seu Deus; demoveu os altares estra
o Israel diante de Abias e de Judá. 16E os filhos nhos, e os altos, quebrou as colunas, cortou os
de Israel fugiram diante de Judá, e Deus lhos aserins, 4e mandou a Judá que buscasse ao
entregou nas suas mãos. 17De maneira que Abias Senhor, Deus de seus pais, e que observasse a lei
e o seu povo fizeram grande matança entre eles; e o mandamento. s'Bunbém removeu de todas as
pois que caíram mortos de Israel quinhentos mil ddades de Judá os altos e os altares de incenso;
homens escolhidos.18Assim foram humilhados os e sob ele o reino esteve em paz.
filhos de Israel naquele tempo, e os filhos de Judá
prevaleceram, porque confiaram no Senhor Deus
de seus pais. E Abias foi perseguindo Jeroboão, Removeu os altares estranhos, e os altos.
e tomou-lhes cidades: Betei e seus arrabaldes,
Jesana e seus arrabaldes, e Efrom e seus arrabaldes. IReis 15.14 diz que os lugares altos não
“ Jeroboão não recobrou mais a sua força nos dias foram removidos. Contudo, assim o faz o
de Abias; e o Senhor o feriu e ele morreu.21Abias, cronista mais adiante (15.17, onde “Israel”
porém, se fortaleceu, e tomou para si catorze é aplicado para Judá). O que se quer dizer
mulheres, e teve vinte e dois filhos e dezesseis filhas.
220 restante dos atos de Abias, os seus caminhos
é que ele mandou que os lugares altos
e as suas palavras, estão escritos no comentário fossem destruídos, mas isso era mais fácil
do profeta Id a dizer do que fazer, pois ele, provavelmente,
enfrentou considerável resistência em áreas
Superado em número e manobras, remotas. Conquanto Reis mencione que ele
parecia que Abias estava condenado. Mas removeu os prostitutos (em nossa versão
então os sacerdotes soaram as trombetas, em português, “sodomitas”) e os ídolos de
significando a entrada de Iavé na batalha, e seus pais (Roboão e Abias?), o cronista, que
os homens emitiram o grito de batalha (cf. escreve para apresentar os traços positivos
Js 6.16, onde a mesma palavra ocorre). deles, silencia acerca disto.
Quando a vitória foi dada a Judá por Deus,
500 unidades militares foram destruídas.
A presença dos sacerdotes com o exér 16 Cf. C ro s s and W rig h t, JB L 75 (1956), p. 22 2 e s.
403
Os altares do incensa Anteriormente, E Zerá, o etíope (heb., Zerá, o cuxita).
intérpretes julgavam que estas seriam Assim ele poderia ter sido tanto um árabe
imagens do sol. Agora a opinião mudou.17 quanto um etíope A natureza do despojo
Essa reforma foi radical, pois foi além da indica a possibilidade de uma invasão vinda
destruição de altares sacrificais. da Arábia, mas a direção de onde veio o
ataque (sudeste) e a menção de líbios (16.8)
2) A Recompensa de Asa (14.6-15) favorece a Etiópia. O termo milhão (mil
milhares) é figurado. Significa “impossível
‘Edificou cidades fortificadas em Judá; porque de se numerar” (cf. o comentário sobre lCr
a terra estava em paz, e não havia guerra contra
ele naqueles anos, porquanto o Senhor lhe dera 22.14). Os trezentos carros são uma indi
repousa 7Disse, pois, a Judá: Edifiquemos estas cação melhor do número real da força
cidades, e cerquemo-las de muros e torres, portas invasora. Não temos registro dessa guerra,
e ferrolhos; a terra ainda é nossa, porque buscamos exceto em Crônicas. Contudo, tem raízes
ao Senhor nosso Deus; nós o buscamos, e ele nos
deu repouso de todos os lados. Edificaram, pois,
históricas, pois os topónimos citados são
e prosperaram. “Ora, tinha Àsa um exército de proeminentes. O exército pode ter consis
trezentos mil homens de Judá, que traziam pavês tido de mercenários instalados pelo Egito
e lança; e duzentos e oitenta mil de Benjamim, que como um amortecedor do embate entre
traziam escudo e atiravam com aico; todos estes aquele país e a FWestina. É possível que
eram homens valentes. 9E Zerá, o etíope, saiu con
tra eles, com um exército de um milhão de homens, o tamanho do exército tenha sido exagerado
e trezentos carros, e chegou até Maressa. 10Então na tradição antes que o cronista recebesse
Asa saiu contra ele, e ordenaram a batalha no vale a história.
de Zefatá, junto a Maressa. UE Asa clamou ao Ó Senhor, nada para ti é ajudar, quer
Senhor seu Deus, dizendo: Ó Senhor, nada para ti
£ ajudar, quer o poderoso quer o de nenhuma força. o poderoso quer o de nenhuma força. Em
Ajuda-nos, pois, ó Senhor nosso Deus, porque em outras palavras, Deus não faz distinção
ti confiamos, e no teu nome viemos contra esta entre o poderoso e o fraco. Ele pode ajudar
multidãa Ó Senhor, tu és nosso Deus, não preva a quem quer que lhe agrade. Ele foi
leça contra ti o homem. 12E o Senhor desbaratou chamado para auxiliar o fraco nessa
os etíopes diante de Asa e diante de Judá; e os
etíopes fugiram. 13Asa e o povo que estava com ele ocasião, mas o verso afirma que ele não está
os perseguiram até Gerar; e caíram tantos dos automaticamente com qualquer dos lados,
etíopes que já não havia neles resistência alguma; fraco ou forte.
porque foram quebrantados diante do Senhor, e
diante do seu exércita Os homens de Judá levaram Não prevaleça contra ti o homem. No
dali mui grande despojo. 14Feriram todas as hebraico: “que nenhum homem te restrinja”,
cidades nos arredores de Gerar, porque veio sobre que nenhum homem te detenha ou te
elas o terror da parte do Senhor; e saquearam todas bloqueie.
as cidades, pois havia nelas muito despojo.
15Também feriram as malhadas do gado, e levaram Caíram tantos dos etíopes que já não
ovelhas em abundánda, e camelos, e voltaram para havia neles resistência alguma. Isto é, lite
Jerusalém. ralmente: “E sobreveio sobre os etíopes de
modo que nada restou para eles de vida”,
A fidelidade de Asa foi recompensada o que não significa que todos eles morreram,
por um reinado pacífico e notável vitória mas que alguns deles de fato sucumbiram.
sobre um poderoso exército invasor. “Nada restou para eles de vida” poderia
A terra ainda é nossa. Embora Deus significar que perderam a vontade de viver,
tivesse concedido paz a Asa, ele não se ou seja, de lutar.
tornou descuidoso. Preparou-se para a Feriram as malhadas do gado. No
guerra, caso esta viesse. hebraico: “Feriram as tendas do gado.”
Mantinham eles gado em tendas? Isto não
é provável. Aquelas eram tendas associadas
17 W. F. Albright, Archaeology and the Religion of Israel, p. 215,
com gado, onde seus donos moravam. Este
fn. 58 é o entendimento da versão RSV.
404
3) Fervor Religioso Renovado (15.1-19) a naçãp nele confiasse (v. 2); 2) ilustração
da história sagrada, o período dos juizes
'Então veio o Espírito de Deus sobre Azarias,
filho de Odede, 2que saiu ao encontro de Asa e lhe (v. 3-6); 3) exortação e promessa (v. 7). Na
disse: Ouvi-me, Asa, e todo o Judá e Benjamim: verdade, o cronista, nesta seção, parece ter
O Senhor é convosco enquanto vós estais com ele; o ciclo do tempo dos juizes em mente. Um
se o buscardes, o achareis; mas se o deixardes, ele rei busca a Deus, prospera e depois cai em
vos deixará. 3Ora, por muito tempo Israel esteve apostasia, para ser seguido por um novo
sem o verdadeiro Deus, sem sacerdote que o ensi
nasse e sem lei. 4Quandoi, porém, na sua angústia rei, que restaura o reino; então o processo
voltaram para o Senhor, Deus de Israel, e buscaram, descendente começa de novo. Azarias
o acharam. % naqueles tempos não havia paz nem adverte Asa a aprender da história; mas ele
para o que saía nem para o que entrava, mas grandes
perturbações estavam sobre todos os habitantes
assimilou somente a primeira parte da lição:
daquelas terras. 6Pois nação contra nação e ddade aqueles que confiam em Deus prosperam.
contra cidade se despedaçavam, porque Deus as Após ter tido êxitq, pensou que podia negli
conturbara com toda sorte de aflições. 7Vós, genciar Deus e conservar sua posição.
porém, esforçai-vos, e não desfaleçam as vossas
mãos; porque a vossa obra terá uma recompensa.
Sem o verdadeiro Deus, sem sacerdote
8Asa, tendo ouvido estas palavras, e a profecia do que o ensinasse e sem lei. Estas eram as
profeta filho de Odede, cobrou ânimo e lançou fora condições durante o período dos juizes. Não
as abominações de toda a terra de Judá e de que Israel ficasse sem instrução; ele não
Benjamim, como também das cidades que tomara queria recebê-la.
na região montanhosa de Efraim, e renovou o altar
do Senhor, que estava diante do pórtico do Senhor. A profecia do profeta, filho de Odede.
’E congregou todo o Judá e Benjamim, e os de No hebraicoi, “a profecia, Odede, o profeta”.
Efraim, Manassés e Simeão, que com eles pere Obviamente, um erro do escriba omitiu o
grinavam; pois que muitos de Israel tinham vindo
a ele quando viram que o Senhor seu Deus era com
nome Azarias. A versão inglesa RSV o
ele.10Ajuntaram-se on Jerusalém no terceiro mês, restaura devidamente.
no décimo quinto ano do rèinado de Asa. UE no Renovou o altar. Nenhuma menção se
mesmo dia ofereceram em sacrifício ao Senhor, do faz de sua destruição. Provavelmente,
despojo que trouxeram, setecentos bois e sete mil
ovelhas. WE entraram no pacto de buscarem ao ofertas imundas haviam sido oferecidas
Senhor, Deus de seus pais, de todo o seu coração sobre ele, e ocorreu uma purificação e rede-
e de toda a sua alma; 13e de que todo aquele que dicação cerimoniais.
não buscasse ao Senhor, Deus de Israel, fosse morto, E Simeão. Apesar do fato de Simeão ficar
tanto pequeno como grande, tanto homem como
mulher. 14E prestaram juramento ao Senhor em ao sul de Judá após a divisão, deve ter,
alta voz, com júbilo^ ao som de trombetas e businas. teimosamente, mantido sua identidade.
I5E todo o Judá se alegrou deste juramento; Alguns de seus cidadãos mudaram-se agora
porque de todo o seu coração juraram, e de toda para Jerusalém. Fé religiosa vital trans
a sua vontade buscaram ao Senhor, e o acharam;
e o Senhor lhes deu descanso ao redor. uO rei Asa
cendeu o mais forte preconceito nacional.
depôs Maacá, sua mãe, para que não fosse mais Terceiro mês, no décimo quinto ano do
rainha, porquanto d a fizera um abominável ídolo reinado de Asa. A festa ocorreu no tempo
para servir de Asera, ao qual Asa derribou, e do Pentecostes, que celebrava a outorga da
despedaçando-o, o queimou junto ao ribeiro de lei. Não é certo se o povo observou a festa,
Cedrom. 17Os altos, porém, não se tiraram de
Israel; contudo o coração de Asa foi perfeito todos mas teria sido apropriado. O décimo quinto
os seus dias. 18E trouxe para a casa de Deus as ano constitui um enigma. Este aconteci
coisas que seu pai tinha consagrado, e as que ele mento parece ter seguido imediatamente
mesmo tinha consagrado: prata, ouro e utensílios. a batalha de Zerá, pois eles ofereceram do
19E não mais houve guerra até o ano trigésimo
quinto do reinado de Asa. despojo a Deus (v. 11). Se dez anos de paz
precederam a peleja (14.1), o tempo deve
Azarias aparece somente em Crônicas. ter sido o dédmo primeiro ano. Acaso durou
Seu discurso é um excelente exemplo de a guerra quatro anos? O problema será abor
pregação levítica, com suas três ênfases: 1) dado mais plenamente nos comentários
A presença de Deus com Israel enquanto sobre 2Crônicas 16.1 e seguintes.
405
E entraram no pacta Esta foi uma reno indignado contra o vidente, lançou-o na casa do
vação do pacto no seu melhor, pois o povo troncoi, porque estava enfurecido contra ele por
fez o seu voto entusiasticamente. A causa disto; também nesse mesmo tempo Asa
oprimiu alguns do seu pova
persuasão real também esteve por detrás
disso, com a penalidade de morte de Deute- O problema principal, nesta seção, é a
ronômio 17.2 e seguintes pairando sobre data da guerra com Baasa. A famosa esteia
os não-conformistas. de Bene-Hadade autentica a historicidade
Maacá, sua mãe. Muito provavelmente básica do evento, como faz IReis 15, mas
ela era sua avó, que ainda dominava o há um problema bastante difícil. A
cenário. Com certeza o rei comprazeu-se passagem declara que a guerra começou
em livrar-se dela. Sua abominável imagem no trigésimo sexto ano de Asa. No entanto,
(imagem de horror) não é identificada. IReis 16.8 diz que Elá, filho de Baasa,
Algumas versões indicam que ele não só começou a íeinar durante o vigésimo sexto
a removeu, mas destruiu-a até fazer-se pó, ano de Asa. Como poderia Baasa lançar-se
como se dera no episódio do bezerro de ouro em guerra dez anos após a sua morte? IReis
de Arão. 15.16 declara; “Ora, houve guerra entre Asa
As coisas que seu pai tinha consagrada e Baasa, rei de Israel, todos os seus dias.”
Por que já não estavam no Templo? Pode Como, então, Asa pôde ter os dez anos de
riam ter sido oferecidas em outro santuário? paz mencionados em Crônicas, uma vez
Talvez fossem mantidas no palácio sob a que Baasa começou a reinar durante o
mais estrita segurança. terceiro ano de Asa (lRs 15.33)?
Uma solução é considerar 2Crônicas
4) A Apostasia de Asa (16.1-10) 15.19 e 16.1 como erro de escriba e ler, em
vez de “trigésimo sexto”, o que seria mais
'N o trigésimo sexto ano do reinado de Asa, provável: “vigésimo quinto” e “vigésimo
Baasa, rei de Israel, subiu contra Judá e edificou
a Ramá, para não deixar ninguém sair nem entrar
sexto”. Os dez anos de paz, então, ocorre
para Asa, rei de Judá. 2Então Asa tirou a prata riam entre o décimo quinto e vigésimo
e o ouro dos tesouros da casa do Senhor, e da casa quinto anos. Baasa morreu logo após a
do rei, e enviou mensageiros a Bene-Hadade, rei guerra terminar desastradamente para ele,
da Siria, que habitava em Damasco, dizendo: provavelmente pela frustração dela. A
3Haja aliança entre mim e ti, como havia entre
meu pai e o teu. Eis que te envio prata e ouro; vai, invasão de Zerá teria ocorrido durante o
pois, e rompe tua aliança com Baasa, rei de Israel, décimo quarto ano. A declaração de Reis
para que se retire de mim. 4E Bene-Hadade deu de que houve guerra contínua pode ser
ouvidos ao rei Asa, e enviou os comandantes dos interpretada como significando que uma
seus exércitos contra as cidades de Israel, os quais
feriram Ijom, Dã, Abel-Maim e todas as cidades- guerra fria existiu, tendo, finalmente, irrom
-armazéns de Naftali. 5E tendo Baasa notída disto, pido no vigésimo sexto ano de Asa. O
cessou de edificar a Ramá, e não continuou a sua cronista declara mesmo que durante o
obra. ‘Então o rei Asa tomou todo o Judá, e eles tempo de paz Asa estava-se preparando para
levaram as pedras de Ramá, e a sua madeira, com a guerra, provavelmente contra Baasa (14.6
que Baasa edificara; e com das edificou Geba e
Mispá. 7Naquele mesmo tempo veio Hanâni, o e ss.). É bem provável, também, que o
vidente, ter com Asa, rei de Judá, e lhe disse: Porque cronista tivesse um esboço cronológico
confiaste no rei da Síria, e não confiaste no Senhor totalmente diferente do livro de Reis.
teu Deus, por isso o exército do rei da Síria escapou Alguns dizem que trigésimo quinto e trigé
da tua mão. “Porventura não foram os etíopes e
os líbios grande exército, com muitíssimos carros simo sexto referem-se ao tempo transcorrido
e cavaleiros? Confiando tu, porém, no Senhor, ele desde a divisão dos reinos. Isto coincidiria
tos entregou nas mãos. ’Porque, quanto ao Senhor, com a cronologia em Reis.
seus olhos passam por toda a terra, para mostrar-
-se forte a favor daqueles cujo coração é perfeito Hanâni, o vidente. Ele é mencionado
para com ele; nisto procedeste loucamente, pois como o pai do profeta Jeú em IReis 16.1,7.
desde agora haverá guerras contra ti. 10Então Asa, Esta seção particular (v. 7-10) é obra do
406
cronista. O relato de Reis apenas narra a gião não são vistas em oposição uma a
história da manobra de Asa com Bene- outra, mas a fé era fundamental. A medi
-Hadade. O cronista mostra o que estava cina naquele tempo não se assemelhava à
errado com ela. do nosso século. Aqueles médicos podem
O exército do rei da Síria escapou da ter empregado a magia. Na verdade,
tua mão. Deveria rezar “rei de Israel”? (cf. médicos são raramente mencionados no
Myers). Tal como está, diz que Asa poderia Antigo Testamento (Gn 50.2; Jó 13.4; Jr
até ter vencido a Síria se houvesse confiado 8.22). Ben Sirach fa i uma famosa obser
em Deus; poderia, possivelmente, ter unifi vação sobre médicos no Eclesiástico
cado o reino dividido! 38.9-15. Os profetas, contudo, eram freqüen
Porque, quanto ao Senhor, seus olhos temente dotados do dom de cura (Is 28.31).
passam por toda a terra (cf. Zc 4.10). Deus E nem mesmo na enfermidade buscou
está esperando ansiosamente pela oportu ao Senhor. Isto causava assombro ao
nidade de ajudar aqueles que nele confiam. cronista. Este grande rei estava tão endu
Ele estava muito mais disponível do que recido que nada o faria volver-se para Deus.
outro rei, e podia oferecer ajuda bem mais Se Hanâni tivesse revelado mais tato, tal
eficaz! Quão insensato foi da parte do rei endurecimento poderia ser evitado? Asa
recorrer a Bene-Hadade. Não temos registro achava que fora condenado injustamente.
de ameaças de guerra, exceto no que tange No sepulcro que tinha cavado para si.
a Asa com o seu próprio povo. Sob a direção de outros, é claro, e não por
Então Asa, indignada O apelo à Síria suas próprias mãos. Se ele houvesse feito
constituiu política boa e prática. “O que preparos para o futuro de seu povo tão
se passou com este fanático maluco?” Asa cuidadosamente quanto para o lugar de
deve ter pensado. Então prosseguiu, repouso de seu corpo, a imortalidade de seu
fazendo-o silenciar por metê-lo na prisão. nome teria sido melhor assegurada.
Não obstante, o profeta ainda fala mediante Fizeram-lhe uma grande queima. Não
a obra do cronista. se tratava de uma cerimônia de cremação,
mas de uma queima de especiarias (cf. Jr
5) Sumário do Governo de Asa (16.11-14) 34.5).
nEis que os atos de Asa, desde os primeiros
até os últimos, estão escritos no livro dos reis de 4. A Era de Jeosafá (17.1—20.37)
Judá e de Israel. 12No ano trinta e nove do seu
reinado Asa caiu doente dos pés; e era mui grave 1) Sua Fidelidade (17.1-19)
a sua enfermidade; e nem mesmo na enfermidade
buscou ao Senhor, mas aos médicos. ,3E Asa 'Jeosafá, seu filho, reinou em seu lugar, e
dormiu com seus pais, morrendo no ano quarenta fortaleceu-se contra Israel. 2Pôs forças armadas
e um do seu reinada l4E o sepultaram no sepulcro em todas as cidades fortes de Judá e dispôs guar
que tinha cavado para si na cidade de Davi, havendo- nições na terra de Judá, como também nas cidades
-o deitado na cama, que se enchera de perfumes de Efraim que Asa, seu pai, tinha tomada 3E o
e de diversas especiarias preparadas segundo a arte Senhor era com Jeosafá, porque andou conforme
dos perfumistas; e destas coisas fizeram-lhe uma os primdros caminhos de Davi, seu pai, e não
grande queima. buscou aos baalins; 4antes buscou ao Deus de seu
pai, e andou nos seus mandamentos, e não segundo
as obras de Israel. 9Por isso o Senhor confirmou
O cronista não diz que a doença foi o reino na sua mão; e todo o Judá trouxe presentes
punição pelo seu pecado, mas, sim, as a Jeosafá; e ele teve riquezas e glória em abundância.
guerras. Assim, isto bem pode ter ocorrido 6E encorajou-se o seu coração nos caminhos do
13 anos após o episódio de Baasa. Senhor; e ele tirou de Judá os altos e os aserins.
7No terceiro ano do seu reinado enviou ele os seus
Tampouco ele o culpa por consultar os príncipes, Bene-Hail, Obadias, Zacarias, Netanel
médicos, mas por buscá-los de preferência e Micaías, para ensinarem nas cidades de Judá;
a consultar o Senhor. A medicina e a reli 8e com eles os levitas, Semaías, Netanias, Zeba-
407
dias, Âsael, Semiramote, Jônatas, Adonias, Tobias cronista, obviamente, quer dizer que
e Tobadonias e, com estes levitas, os sacerdotes Jeosafá, por decreto real, aboliu os lugares
Elisama e Jeorão. 9E ensinaram em Judá, levando altos, mas que o povo resistiu ao cumpri
consigo o livro da lá do Senhor; foram por todas
as cidades de Judá, ensinando entre o povo. mento da lei. Na aplicação da lei é que
10Então caiu o temor do Senhor sobre todos os residia o problema.
reinos das terras que estavam ao redor de Judá, Enviou de os seus príncipes. Leigos e
de modo que não fizeram guerra contra Jeosafã.
11Alguns dentre os filisteus traziam presentes a também sacerdotes e levitas foram enviados
Jeosafá, e prata como tributo; e os árabes lhe trou para ensinar. Se eles também realizavam
xeram rebanhos: sete mil e setecentos carneiros, o ensino, esta história é, certamente, do
e sete mil e setecentos bodes.12Assim Jeosafá ia- período anterior, pois ao tempo de Oséias,
-se tornando cada vez mais poderoso; e edificou no oitavo século a.C., os sacerdotes eram
fortalezas e cidades-armazéns em Judá; 13e teve
grande quantidade de munições nas cidades de os mestres da lei (Os 4.6 e ss.). É mais
Judá, e soldados, homens valorosos, em Jerusalém. provável que príncipes tenham sido
14Este é o número deles segundo as suas casas enviados juntos para se certificarem de que
paternas: de Judá os comandantes de mil: o coman o povo se reunia para ouvir o ensinamento
dante Adná, com trezentos mH homens valorosos;
15 após ele o comandante Jeoanã com duzentos e dos sacerdotes e levitas. Unham uma audi
oitenta mil; 16após ele Amasias, filho de Zicri, que ência cativa.
voluntariamente se entregou ao Senhor, e com ele O livro da lei do Senhor. Alguns tomam
duzentos mil valorosos; 17e de Benjamim: Eliadá,
homem destemido, com duzentos mil armados de
isto como referindo-se a uma lei real, mas
arco e de escudo; 18e após de Jeozabade, com o cronista e suas fontes o consideravam
cento e oitenta mil armados para a guerra. 19Estes como a lei de Moisés. Conquanto não em
estavam no serviço do rei, afora os que o rei tinha sua forma final, esta era a lei tradicional
posto nas cidades fortes por todo o Judá. tal como existia ao tempo de Jeosafá.
Este capítulo inteiro é contribuição do Este é o número deles. Embora o
cronista. Suas fontes não são utilizadas por problema de números ocorra nos versículos
nenhum outro escritor do Antigo Testa 14-18 (1 milhão e 160 mil ou 1.160 unidades
mento. de composição desconhecida), os nomes e
Andou conforme os primeiros caminhos organização são registros autênticos da
de Davi, seu pai. A versão em inglês RSV época. Não é provável que houvesse mais
apresenta o texto como aplicando-se a Asa, que um milhão de homens no exército ativo
porque em nenhum lugar o cronista faz refe de Jeosafá. Eles foram, inapelavelmente,
rência aos pecados da velhice de Davi. Aqui, superados pelas forças invasoras de Amom,
no entanto, no texto hebraico, ele realmente Moabe e monte Seir! (20.12).
deixa implícita a transgressão posterior de Voluntariamente se entregou ao Senhor.
Davi. O fato de haver deixado fora o Esta é a mesma expressão empregada por
episódio de Bate-Seba não significa que esti Débora para descrever os comandantes que
vesse intencionalmente apresentando Davi se apresentaram voluntariamente para
de modo falso. Aqui, por implicação, ele combater Sísera. Significa isto que todos
deixa o registro em ordem. os demais comandantes de Jeosafá tiveram
E encorajou-se o seu coração, ou seja, que ser convocados para o serviço? Se foi
foi soerguida Noutras partes este verbo é este o caso, esta declaração lança luz consi
sempre empregado num sentido negativo derável sobre a natureza do serviço militar
(cf. 26.16; 32.25; Ez 28.2,5,17; SI 131.1; Pv no Israel antigo.
18.12). Aqui, ele se gloria nos caminhos do
Senhor, não nos seus próprios. O orgulho 2) A Aliança com Acabe (18.1—19.3)
nem sempre é um pecado.
Tirou de Judá os altos. Contudo, a. A Crise de Ramote-Gileade (18.1-34)
IReis 22.43 declara que ele não o fez. ‘Tinha, pois, Jeosafá riquezas e glória em
2Crônicas 20.33 concorda com Reis. O abundância, e aparentou-se com Acaba 2Ao cabo
408
de alguns anos foi ter com Acabe em Samária. E serei um espirito mentiroso na boca de todos os
Acabe matou ovelhas e bois em abundância, para seus profetas. Ao que disse ao Senhor: lb o indu
ele e para o povo que o acompanhava; e o persuadiu zirás, e prevalecerás; sai, e faze assim. “ Agora,
a subir com ele a Ramote-Gileade. 3Perguntou pois, eis que o Senhor pôs um espírito mentiroso
Acabe, rei de Israel, a Jeosafá, rei de Judá: Irás na boca destes teus profetas; o Senhor é quem falou
tu comigo a Ramote-Gileade? E respondeu-lhe o mal a respeito de ti. “ Então Zedequias, filho de
Jeosafá: Como tu és sou eu, e o meu povo como Quenaaná, chegando-se, feriu a Micaías na face
o teu povo; seremos contigo na guerra. 4Disse e disse: ^Por que caminho passou de mim o Espi
mais Jeosafá ao rei de Israel: Consulta hoje a rito do Senhor para {alar a ti? Respondeu Micaías:
palavra do Senhor. 5Então o rei de Israel ajuntou Eis que tu o verás naquele dia, quando entrares
os profetas, quatrocentos homens, e lhes perguntou: numa câmara interior para te esconderes. “ Então
Iremos à peleja contra Ramote-Gileade, ou deixarei disse o rei de Israel: tomai Micaías, e tornai a levá-lo
de ir? Responderam eles: Sobe, porque Deus a entre a Amom, o governador da cidade, e a Joás, filho do
gará nas mãos do rei.6Disse, porém, Jeosafá: Não rei, “ dizendo-lhes: Assim diz o rei: Metei este ho
há aqui ainda algum profeta do Senhor a quem mem no cárcer&e sustentai-o a pão e água até que eu
possamos consultar? 7Ao que o rei de Israel volte em paz. 27M as disse Micaías: Se tu voltares
respondeu a Jeosafá: Ainda há um homem por quem em paz, o Senhor não tem falado por mim. Disse
podemos consultar ao Senhor; eu, porém, o odeio, mais: Ouvi, povos todos! “ Subiram, pois, o rei de
porque nunca profetizava o bem a meu respeito, Israel e Jeosafá, rd de Judá, a Ramote-Gileade
mas sempre o mal; é Micaías, filho de Inlá. Mas 29E disse o rei de Israel a Jeosafá: Eu me disfar
Jeosafá disse: Não fale o rei assim. 8Então o rei çarei, e entrarei na peleja; tu, porém, veste os teus
de Israel chamou um eunuco, e disse: Thize aqui trajes reais. Disfarçou-se, pois, o rei de Israel, e
depressa Micaías, filho de Inlá. ’Ora, o rei de eles entraram na peleja. “ Ora, o rd da Síria dera
Israel e Jeosafá, rei de Judá, vestidos de seus trajes ordens aos capitães dos seus carros, dizendo:
reais, estavam assentados cada um no seu trono, Não pelejareis nem contra pequeno nem contra
na praça à entrada da porta de Samária; e todos grande, senão só contra o rei de Israel. 3IPelo que
os profetas profetizavam diante deles. 10E Zede- os capitães dos carros, quando viram a Jeosafá,
quias, filho de Quenaaná, fez para si uns chifres disseram: Este é o rei de Israel. Viraram-se, pois,
de ferro, e disse: Assim diz o Senhor: Com estes para pelejar contra ele; mas Jeosafá clamou, e o
ferirás os sírios, até que sejam consumidos. UE Senhor o socorreu, e os desviou dele. 32Pois vendo
todos os profetas profetizaram o mesmo, dizendo: os capitães dos cairos que não era o rei de Israel,
Sobe a Ramote-Gileade, e serás bem-sucedido^ pois deixaram de segui-la 33Então um homem entesou
o Senhor a entregará nas mãos do rei. lzO mensa o seu arco e, atirando a esmo, feriu o rei de Israel
geiro que fora chamar Micaías lhe falou, dizendo: por entre a couraça e a armadura abdominal. Pelo
Eis que as palavras dos profetas, a uma voz, são que ele disse ao carreteiro: Dá volta, e tira-me do
favoráveis ao rei: seja, pois, também a tua palavra exército, porque estou gravemente ferida a
como a de um deles, e fala o que é bom. 13Micaías, peleja tornou-se renhida naquele dia; contudo o
porém, disse: vive »Senhor, que o que o meu Deus rei de Israel foi sustentado no carro contra os
me disser, isso falarei. 14Quando ele chegou à sírios até a tarde; porém ao pôr-do-sol morreu.
presença do rei, este lhe disse: Micaías, iremos a
Ramote-Gileade à peleja, ou deixarei de ir?
Respondeu ele: Subi, sereis bem-sucedidos; e eles Após a declaração sumária (v. 1,2), o
serão entregues nas vossas mãos. 15M as o rei lhe relato é idêntico ao de IReis 22. Esta é a
disse: quantas vezes hei de conjurar-te que não me única vez, em toda a sua obra, que o
fales senão a verdade em nome do Senhor? cronista inclui anais do Israel do Norte.
16Respondeu ele: Vi todo o Israel disperso pelos
montes, como ovelhas que não têm pastor; e disse Diante do fato de que ele deixa fora todo
o Senhor: Estes não têm senhor; tome em paz cada o extenso material sobre Elias e Eliseu, por
um para sua casa. 17Então o rei de Israel disse a que inclui esta passagem? É possível que
Jeosafá: Não te disse eu que ele não profetizaria estas tradições independentes não esti
a respeito de mim o bem, porém o mal? P ro s s e
guiu Micaías:Ouvi, pois, a palavra do Senhor! Vi
vessem no texto de Reis. Contudo, deve
o Senhor assentado no seu trono, e todo o exército ainda haver uma razão por que ele sele
celestial em pé à sua direita e à sua esquerda. 19E ciona e segue tão proximamente esta his
o Senhor perguntou: quem induzirá Acabe, o rei tória que não revela o seu herói Jeosafá
de Israel, a subr, para que caia em Ramote-Gileade? sob luz positiva. Seu interesse na profecia
E um respondia de um modo, e outro de outra
“ Então saiu um espirito, apresentou-se diante do cultual (cf. o v. 9 e ss.) seguramente tinha
Senhor, e disse: Eu o induzirei. Perguntou-lhe o algo a ver com isso. Tòdos os profetas
Senhor: De que modo? 21E de disse: Eu sairei, e cultuais que ele menciona de Judá são
409
genuínos. Aqui temos um vislumbre dos quem cabe a última palavra quanto ao
que eram falsos no Israel do Norte. Tam destino pessoal.
bém ele pôde mostrar-nos o corajoso Contudo, alguma virtude se acha em ti.
Micaías a quem certamente admirava. Literalmente^ “boas coisas são achadas con
Este lhe disse: Micaías. O texto hebrai tigo”. Assim como aspectos redentores fo
co de Crônicas (mas não de Reis) contém ram encontrados no Israel Pecador (12.12),
Miquéias. Isto nos ajuda a ver como o são também constatados em Jeosafá. É la
versículo 27b (lRs 22.28b) veio a ser acres mentável que Jeú, da mesma forma, não
centado a esta passagem. Alguns escribas, pudesse ver algum bem em Acabe. Mas ele
equivocadamente, julgaram que Micaías e vivia do outro lado da fronteira. O bem
Miquéias (cujas profecias começam com nas pessoas oferece mais esperança do que
“Ouvi, povos todos!”) eram o mesmo o mal nelas oferece razões para o deses
profeta. pero.
O Senhor o socorreu, e os desviou dele.
Este é o único acréscimo do cronista à 3) Reforma Religiosa (19.4-11)
história.
4Habitou, pois, Jeosafá em Jerusalém ; e
Ao pôr-do-sol morreu. O cronista agora tornou a passar pelo povo desde Berseba até
omite o restante do relato. Ele não está a região montanhosa de Efraim, fazendo com
redigindo a história da vida de Acabe, mas que voltasse ao Senhor Deus de seus pais.
5EstabeIeceu juizes na terra, em todas as cidades
de Jeosafá. fortes de Judá, de ddade em cidade; 6e disse aos
juizes: Vede o que fazeis; porque não julgais da
b. O Encontro com Jeú (19.1-3) parte do homem, mas da parte do Senhor, e ele
está convosco no julgamento. 7Agora, pois, seja o
‘Jeosafá, rei de Judá, voltou em paz à sua temor do Senhor convosco; tomai cuidado no que
casa em Jerusalém. 2M as Jeú, filho de Hanâni, fazeis; porque não há no Senhor nosso Deus
o vidente, saiu ao encontro do rei Jeosafá e lhe iniqüidade, nem acepção de pessoas, nem acei
disse: Devias tu ajudar o ímpio, e amar aqueles tação de presentes. “Também em Jerusalém esta
que odeiam ao Senhor? Por isso virá sobre ti beleceu Jeosafá alguns dos lentas e dos sacerdotes
grande ira da parte do Senhor. 3Contudoi, alguma e dos chefes das casas paternas de Israel sobre o
virtude se acha em ti, porque tiraste para fora da juízo da parte do Senhor, e sobre as causas civis.
terra as aserotes, e dispuseste o teu coração para E voltaram para Jerusalém. % deu-lhes ordem,
buscar a Deus. dizendo: Assim procedei no temor do Senhor, com
fidelidade e com coração perfeito. 10Todas as
vezes que se vos submeter qualquer controvérsia
IReis nada diz sobre isto, mas o cronista da parte de vossos irmãos que habitam nas suas
imagina que o envolvimento de Jeosafá com cidades, entre sangue e sangue, entre lei e manda
Acabe requer esclarecimento adicional. mento), entre estatutos e juízos, admoestai-os a que se
não façam culpados para com o Senhor, e deste
Ele não inventou este encontro, mas modo venha grande ira sobre vós e sobre vossos
descobriu-o em suas fontes e empregou-o irmãos. Procedei assim, e não vos fareis culpados.
para os seus propósitos. nE eis que Amarias, o sumo sacerdote, presidirá
sobre vós em todos os negócios do Senhor; e Zeba-
Aqueles que odeiam ao Senhor. Esta é dias, filho de Ismael, príncipe da casa de Judá, em
uma linguagem forte para ser aplicada a todos os negódos do rei; também os levitas serão
Acabe, que parecia ser um adorador de oficiais perante vós. Procedei corajosamente e seja
Iavé, conquanto um tanto inconsistente. o Senhor com os retos.
Seus filhos traziam nomes compostos com
o termo Iavé (Atalia, Acazias, Jeorão). Este material é da pena do cronista.
O zeloso profeta exagerou em seu enun Desde o tempo de Julius Wellhausen, estu
ciado, mas orientava-se pelas ações de diosos têm sido tentados a suspeitar de sua
Acabe, e não por sua atitude. Afortunada historicidade. Ele sugeriu que o cronista
mente, as facções hostis dentro das co considerou o nome Jeosafá (Iavé julga) e
munidades religiosas não são os juizes a arquitetou uma história para combinar
410
com o nome. Por outro lado, Myers (II, (heb., inseridas) na obra principal que
108) expressa as tendências da erudição estivera empregando, o “Livro dos Reis
hodierna em destacar a historicidade geral de Israel”, que era, provavelmente, um
deste material. A reforma visava, basica midrash levítico (cf. 2Cr 24.27). Elmslie
mente, uma reorganização do sistema duvida que uma tal fonte alguma vez
judicial segundo o modelo da lei deutero- tivesse existido, pois observa que o estilo
nômica (cf. Dt 16.18-20; 17.8 e ss.). deste relato é o do cronista. Contudo, a
O próprio Jeosafá saiu pelo reino para situação pode ser o reverso. O popular
encorajar esta reforma, o que destaca as estilo levítico no midrash empregado pelo
dificuldades em executá-las. As decisões cronista pode também ser o estilo dos
legais não eram somente civis, mas sempre círculos levíticos a que o cronista per
se faziam sob a orientação de Deus, con tencia. Portanto, definir com base em esti
quanto algumas se preocupassem mais lística a diferença entre um e outro é
com questões religiosas do que outras. impossível.
E voltaram para Jerusalém. No hebrai
co, “eles retomaram [para] Jerusalém.” Esta a. O Contexto Histórico (20.1-4)
frase difícil pode estar fora de lugar. Se se
gue o versículo 7, pode estar descrevendo o ‘Depois disto sucedeu que os moabitas e os
amonitas, e com eles alguns dos meunitas vieram
retorno de Jeosafá a Jerusalém. Uma ligei contra Jeosafá para lhe fazerem guerra. 2Vieram
ra mudança em vogais resultou no que alguns homens dar notícia a Jeosafá, dizendo:
consta na versão RSV. Vem contra ti uma grande multidão de Edom,
dalém do mar; e eis que já estão em Hazazom-
Amarias, o sumo sacerdote. A expres -Tamar, que é En-Gedi. 3Então Jeosafá teve medo,
são hebraica é kohen har’osh, e não kohen e pôs-se a buscar ao Senhor e apregoou jejum em
hagadol (grande sacerdote). Somente uma todo o Judá. 4Judá se ajuntou para pedir socorro
ao Senhor; de todas as cidades de Judá vieram
vez o cronista emprega a última expressão para buscarem ao Senhor.
(34.9). É possível que a expressão kohen
har’osh seja a primeira dos dois termos.18
Alguns meunitas (heb., amonitas) —
4) Ataque Moabita-Amonita (20.1-30) desde 20.10; 26.7. Igualmente, “Edom”
(v. 2) é o termo correto, e não Síria (heb.).
Não há paralelo para esta passagem, Buscarem ao Senhor. Este verbo ocorre
exceto em 2Reis 3.4-27. Mas naquele rela três vezes nos versículos 3,4. Esta foi
to Jeosafá e Jorão de Israel, juntamente reação diferente da de Asa ante o infor
com o rei de Edom, partem para a ofensiva túnio (16.12).
contra Moabe. Um milagre da parte de
Deus salva os exércitos hebreus do desastre
e põe os moabitas em fuga, devastando b. A Oração de Jeosafá (20.5-12)
suas terras. Se ambas as histórias se rela 5Jeosafá pôs-se em pé na congregação de
cionam, longos séculos em recontá-las Judá e de Jerusalém, na casa do Senhor, diante
deixam-nas bem separadas. É mais prová do átrio novoi, 6e disse: Ó Senhor, Deus de nossos
vel que se refiram a ocasiões inteiramente pais, não és tu Deus no céu? e não és tu que
diferentes. govemas sobre todos os reinos das nações? e na
tua mão há poder e força, de modo que não há
Parece que o cronista derivou seu relato quem te possa resistir. 7Ó nosso Deus, não
das “crônicas de Jeú, filho de Hanâni” lançaste fora os moradores desta terra de diante
(20.34), que ele afirma estarem registradas do teu povo Israel, e não a deste para sempre à
descendência de Abraão, teu amigo? 8E habita
ram nela e nela edificaram um santuário ao teu
nome, dizendo: 9Se algum mal nos sobrevier,
18 Cf. J. M orgenstern, “A C hapter in the History o f th e High Pries espada, juízoi, peste, ou fome, nós nos apresenta
thood”, A JSL 55 (1938), E 1-24, 183-197, 360-377. remos diante desta casa e diante de ti, pois teu
411
nome está nesta casa, e clamaremos a ti em nossa mulheres, e os seus filhos. 14Então veio o Espírito
aflição, e tu nos ouvirás e livrarás. “ Agora, pois, do Senhor no meio da congregação^ sobre Jaaziel,
eis que os homens de Amom, de Moabe, e do filho de Zacarias, filho de Benaías, filho de Jeiel,
monte Seir, pelos quais não permitiste que pas filho de Matanias, o levita, dos filhos de Asafe,
sassem os filhos de Israel, quando vinham da terra lse disse: Dai ouvidos todo o Judá, e vós, mora
do Egito, mas deles se desviaram e não os destru dores de Jerusalém, e tu, ó rd Jeosafá. Assim vos
íram — "eis como nos recompensam, vindo para diz o Senhor: Não temais, nem vos assusteis por
lançar-nos fora da tua herança, que nos fizeste causa desta grande multidão, porque a peleja não
herdar. 12Ó nosso Deus, não os julgarás? Porque é vossa, mas de Deus. 16Amanhã descereis contra
nós não temos força para resistirmos a esta grande eles; eis que sobem pela ladeira de Ziz, e os acha
multidão que vem contra nós, nem sabemos o que reis na extremidade do vale, defronte do deserto
havemos de fazer; porém os nossos olhos estão de Jeruel. 17Nesta batalha não tereis que pelejar;
postos em ti. postai-vos, ficai parados e vede o livramento que
o Senhor vos concederá, ó Judá e Jerusalém. Não
temais, nem vos assusteis; amanhã saí-lhes ao
Não devemos permitir que perplexida encontro, porque o Senhor é convosco.
des históricas nos ceguem quanto à gran
diosidade desta oração e ao oráculo pro
O profeta levita da família de Asafe
fético que segue. Independentemente de recebe e expressa a resposta de Deus: (1)
uma colocação original, ela expressa o A batalha seria vencida por Deus. (2) Eles
clamor do homem. A fé aqui expressa tem apenas deviam confrontar o inimigo; não
encorajado outros, em sua impossiblidade, haveria batalha; Deus faria tudo. (3) Eles
a se lançarem sobre a misericórdia de
deviam permanecer quietos e observar
Deus, e ter a sua fé confirmada. Aqueles
Deus agindo (cf. Ex 14.13; SI 46).
que tiveram esta experiência não acham Alguns expositores mostram-se per
difícil crer que um milagre tenha aconte plexos diante deste conselho. Não terá o
cido aqui. homem de fazer nada? “Sim”, diz o cro
Diante do átrio nova O cronista está nista, “ele deve ter fé em Deus e seguir sua
usando um termo empregado em seus dias palavra”. Em face de um inimigo tão extra
para o átrio exterior ou grande átrio, com ordinário seria necessário ter mais fé para
o seu novo arranjo no segundo Templo aquietar-se do que para lutar.
(cf. 2Cr 4.9). O cronista não queria dizer que todas
Abraão^ teu amiga O cronista estava as batalhas deviam ser ganhas dessa ma
familiarizado com Isaías 41.8 (cf. Tg 2.23). neira. Agora, porém, esta era a palavra
Um santuário ao teu nome. Seu apelo de Deus para a ocasião. Ele próprio des
é uma descrição magistral da situação: creveu guerras que requeriam participação
1) Deus era capaz de ajudá-los. 2) É à mais ativa.
própria casa de Deus que eles foram para
pedir auxílio. 3) Tinha sido Deus quem d. Cumprindo a Palavra Profética (20.
havia proibido o extermínio do povo que 18-30)
agora os estava inquietando. 4) Este povo
18Então Jeosafá se prostrou com o rosto em
estava tentando fazer a Israel o que os terra; e todo Judá e os moradores de Jerusalém
hebreus foram proibidos de fazer a ele. se lançaram perante o Senhor, para o adorarem.
5) Os seus inimigos deviam ser julgados I9E levantaram-se os levitas dos filhos dos coatitas
por Deus. 6) A única esperança do povo e dos filhos dos coraítas, para louvarem ao Senhor
de Deus estava nEle, de quem se esperava Deus de Israel, em alta voz.
20Pela manhã cedo se levantaram e saíram ao
o auxílio. deserto de Tecoa; ao saírem, Jeosafá pôs-se em pé
e disse: Ouvi-me, ó Judá, e vós moradores de Jeru
c. A Palavra Provinda de Deus (20.13-17) salém. Crede no Senhor vosso Deus, e estareis
seguros; crede nos seus profetas, e sereis bem-
ME todo o Judá estava em pé diante do Se -sucedidos. 21Tendo ele tomado conselho com o
nhor, como também os seus pequeninos, as suas povo, designou os que haviam de cantar ao Senhor
412
e louvá-lo vestidos de trajes santos, ao saírem sacerdotes se reunissem na cena de bata
diante do exército, e dizer: Dai graças ao Senhor, lha, especialmente se tivessem sido instru
porque a sua benignidade dura para sempre.
“ Ora, quando começaram a cantar e dar louvo ídos por um oráculo divino para fazê-lo.
res, o Senhor pôs emboscadas contra os homens Algo assim ocorreu sob Hofni e Finéias
de Amom, de Moabe e do monte Seir, que ti (ISm 4.1 e ss.), embora eles então não esti
nham vindo contra Judá; e foram desbaratados. vessem marchando sob ordens divinas.
“ Pois os homens de Amom e de Moabe se levan
taram contra os moradores do monte Seir, para os Crede no Senhor (.-) crede nos seus
destruir e exterminar; e, acabando eles com os profetas. É por isso que marcharam em
moradores de Seir, ajudaram a destruir-se uns aos ordem santa de batalha na direção do
outros. “ Nisso chegou Judá à atalaia do deserto; inimigo. O profeta de Deus havia dito que
e olharam para a multidão, e eis que eram cadá
veres que jaziam por terra, não havendo ninguém
o deveriam fazer. Agora o resultado estaria
escapada “ Quando Jeosafá e o seu povo vieram assegurado. Observe-se que deveriam crer
para saquear os seus despojos, acharam entre eles no Senhor e apenas acreditar em seus
gado em grande número, objetos de valor e roupas, profetas. Eles deviam colocar sua con
assim como jóias preciosas, e tomaram para si fiança em Deus, não nos profetas.
tanto que não podiam levar mais; por três dias
saquearam o despojo, porque era m uita “ Ao O Senhor pôs emboscadas. Este não
quarto dia eles se ajuntaram no vale de Beraca; foi, necessariamente, um ataque angélico
pois ali louvaram ao Senhor, por isso aquele lugar de surpresa. Pode ter sido por parte de
é chamado o rale de Beraca, até o dia de hoje.
27Então, voltando dali todos os homens de Judá outros inimigos dos edomitas, provavel
e de Jerusalém com Jeosafá à frente deles, retor mente não israelitas, uma vez que haviam
naram a Jerusalém com alegria; parque o Senhor sido instruídos a não lutar. (A instrução no
os fizera regozijar-se sobre os seus inimigos. v. 17, “amanhã saí-lhes ao encontro”,
“ Vieram, pois, a Jerusalém com alaúdes, com
harpas e com trombetas, para a casa do Senhor.
aplicava-se ao confronto cultual, não à
29Então veio o temor de Deus sobre todos os batalha militar, pois os guerreiros mar
reinos daqueles países, quando eles ouviram que chavam atrás dos sacerdotes.) Contudo,
o Senhor havia pelejado contra os inimigos de alguns daqueles que não haviam ido para
Israel. 30Assim o reino de Jeosafá ficou em paz;
pois que o seu Deus lhe deu repouso ao redor.
Jerusalém podem ter agido, ignorantemen
te, por sua conta, sendo usados por Deus.
Acharam (...) roupas. Eles saquearam
Bem cedo na manhã seguinte, diz o esses “corpos mortos” (heb.) Há uma pe
cronista, eles partiram para o deserto de quena alteração no texto da versão em
Tecoa (a cerca de 20 quilômetros). Então inglês RSV.
Jeosafá organizou uma procissão sacra,
com os sacerdotes e os levitas marchando Vale de Beraca. A palavra no hebrai
à frente do exército, na direção do inimigo. co significa “bênção”. A moderna Wadi
Berekut, entre Tecoa e En-Gedi, preserva
Pode realmente ter acontecido dessa ma o nome.
neira? Quem o pode dizer? Talvez o escri
tor, ou sua fonte, estivesse interpretando
condições do período anterior à luz de 1) O Significado do Reinado de Jeosafá
tempos posteriores. Contudo, é comu- (20.31-37)
mente aceito hoje que procissões cultuais 31E Jeosafá reinou sobre Judá; era da idade
marcavam a religião do antigo Israel tanto de trinta e cinco anos quando começou a reinar,
e reinou vinte e cinco anos em Jerusalém. E o
em dias santificados especiais quanto nome de sua mãe era Azuba, filha de Sili. 32Ele
antes de batalha.19 Não é desarrazoado andou no caminho de Asa, seu pai, e não se
supor que numa ocasião incomum os desviou dele, fazendo o que era reto aos olhos do
Senhor. 33Contudo os altos não foram tirados;
nem tinha o povo ainda disposto o seu coração
Cf. F. M. Cross, ‘T h e Divine W arrior in Israel's Early C ult”, Biblical
para o Deus de seus pais. MOra, o restante dos
M otifs Studies and T a ts , ed. Alexander A ltm ann (Cambridge: atos de Jeosafá, desde os primeiros até os últimos,
H arvard University Press, 1966), III, p. 11-30. eis que está escrito nas crônicas de Jeú, filho de
413
Hanâni, que estão inseridas no livro dos reis de Micael e Sefatias; todos estes foram filhos de
Israel. 35Depois disto Jeosafá, rei da Judá, se Jeosafá, rei de Judá. 3Seu pai lhes dera grandes
aliou com Acazias, rei de Israel, que procedeu dádivas, em prata, em ouro e em objetos preciosos,
impiamente; “ aliou-se com ele para construírem juntamente com cidades fortes em Judá; mas o
navios que fossem a Társis; e construíram os reino deu a Jeorão, porque ele era o primogênita
navios em Eziom-Geber. í7Então Eliézer, filho de 4Ora, tendo Jeorão subido ao reino de seu pai, e
Dodavaú, de Maressa, profetizou contra Jeosafá, havendo-se fortificada, matou todos os seus irmãos
dizendo: Porquanto te aliaste com Acazias, o à espada, como também alguns dos príncipes de
Senhor destruiu as tuas obras. E os navios se Israel. sJeorão tinha trinta e dois anos quando
despedaçaram e não puderam ir a Társis. começou a reinar, e reinou oito anos em Jeru
salém. 6E andou nos caminhos dos reis de Israel,
como fazia a casa de Acabe, porque tinha filha de
O cronista segue o sumário em IReis Acabe por mulher; e fazia o que parecia mal aos
22, exceto que emprega uma fórmula dife olhos do Senhor. 7Contudo o Senhor não quis
rente para descrever a aliança com Aca destruir a casa de Davi, em atenção ao pacto que
zias. A passagem de Reis diz que após um tinha feito com ele, e porque tinha dito que lhe
daria por todos os dias uma lâmpada, a ele e a seus
desastre naval Jeosafá rejeitou uma pro filhos.
posta de Acazias para uma aliança. O his
toriador posterior diz que ele estava Uma opinião negativa é dada com
alinhado com ele na construção de navios, respeito à natureza da regência deles.
e que, como conseqüência de uma conde O mal que transpirou é atribuído à influ
nação profética desse relacionamento, seus ência de Atalia sobre Jeorão. Talvez tenha
navios naufragaram. Alguns intérpretes sido ela que o tenha influenciado a matar
conciliam os dois relatos, dizendo que todos os seus irmãos e outros rivais, pois
Acazias trabalhava com Jeosafá na cons esse ato foi bem semelhante ao que ela
trução de navios (v. 36), não lhe tendo, praticou mais taide, após a morte dele.
porém, sido permitido prover as viagens O relato dos homicídios é encontrado
(lRs 22.49). Quanto á referência a Társis, somente aqui, mas não há razão para se
ver o comentário sobre 2Crônicas 9.21. duvidar da confiabilidade do registro.
Alguns dos príncipes de Israel. Oficiais
V. A Luta com o Baalismo de Israel podiam bem ter estado em Judá
(21.1—24.27) durante esse período de íntimos laços polí
ticos. Alguns deles podem ter sido favorá
1. A Casa de Acabe (21.1—22.9) veis às reformas de Jeosafá e agora es
O cronista não estava preocupado com tavam contra.
o Reino de Israel do Norte como tal, mas Não quis destruir a casa de Davi. 2Reis
este tinha tão marcada influência sobre a 8.19 diz: “não quis destruir a Judá.” O
corrupção de Judá durante esse período cronista também substituiu “por causa de
que se sentiu compelido a descrever o rela Davi, seu servo” por em atenção ao pacto
cionamento em maiores detalhes do que que tinha feita Isto é evidência adicional
era seu costume. O casamento de Jeorão, de seu interesse pelas promessas davídicas.
filho de Jeosafá, e Atalia, a filha de Acabe,
foi o catalisador. b. Rebelião de Edom (21.8-10)
8Nos dias de Jeorão os edomeus se revolta
1) Jeorão e Atalia (21.1-20) ram contra o domínio de Judá, e constituíram
para si um rei. 9Pelo que Jeorão passou adiante
a. Sumário de Seu Reinado (21.1-7) com os seus chefes e com todos os seus carros; e,
levantando-se de noite, desbaratou os edomeus,
‘Depois Jeosafá dormiu com seus pais, e com que tinham cercado a ele e aos capitães dos
eles foi sepultado na cidade de Davi. E Jeorão, seu carros. I0Todavia os edomeus ficaram revoltados
filho, reinou em seu lugar. 2E tinha irmãos, filhos contra o domínio de Judá até o dia de hoje. Nesse
de Jeosafá: Azarias, Jeiel, Zacarias, Asarias, mesmo tempo Libna também se revoltou contra
414
o seu domíniq porque ele deixara ao Senhor, de Jeorão, mas teria sido notoriamente
Deus de seus pais. difícil encontrá-lo. Jeosafá dirigiu-se a
Este relato é também encontrado em Eliseu porque ele estava mais facilmente
2Reis 8.20-22, onde está claro que o exér disponível. 2Reis 1.1 e seguintes diz que
cito israelita foi cercado, mas conseguiu Acazias, de Israel, morreu segundo um
romper o cerco e escapulir em confusão. oráculo de Elias e foi sucedido por Jorão
O relatório do cronista deixa de fora a refe “no ano segundo de Jeorão, filho de Jeo
rência à fuga de volta para casa e torna a safá” (2Rs 1.17). Somente Elias poderia
derrota menos notória. Contudo, ele men estar em atividade, pelo menos até o se
ciona que Edom e Libna (na Judá ociden gundo ano de Jeorão. Embora a passagem
tal) permaneceram independentes de Judá, não diga quanto tempo levou para Acazias
o que implica que a campanha de Jeorão morrer, deixa implícito um período curto.
foi um fracasso. Somente o cronista explica Elias escreveu a carta porque não fazia
que essa perda de território deveu-se à aparições pessoais em Judá.
negligência de Iavé por parte de Jeorão. É também possível que o nome Eliseu
aparecesse no original, conquanto não
c. A Carta de Elias (21.11-15) exista evidência textual disso, ou que
algum profeta posterior tomasse as pala
uEle fez também altos nos montes de Judá,
induziu os habitantes de Jerusalém à idolatria e vras de Elias dirigidas a Acabe e as reapli
impeliu Judá a prevaricar. 12Então lhe veio uma casse a Jeorão numa carta a ele endere
carta da parte de Elias, o profeta, que dizia: çada. Outra sugestão ainda é de que um
Assim diz o Senhor, Deus de Davi, teu pai: profeta desconhecido escrevera a carta e a
Porquanto não andaste nos caminhos de Jeosafá, tradição posterior associou-a com Elias.
teu pai, e nos caminhos de Asa, rei de Judá;
13mas andaste no caminho dos reis de Israel, e Talvez a melhor seja admitir a natureza
induziste Judá e os habitantes de Jerusalém a incerta da evidência histórica e reconhecer
idolatria semelhante à idolatria da casa de Acabe, que, a despeito do episódio real (profetas
e também mataste teus irmãos, da casa de teu pai, raramente escreviam seus oráculos; eles
os quais eram melhores que tn; 14eis que o Se
nhor ferirá com uma grande praga o teu povo, os confrontavam as audiências pessoalmen
teus filhos, as tuas mulheres e toda a tua fazenda; te), a detalhada predição da ira de Deus
15tu terás uma grave enfermidade, a saber, um mal sobre o rei estava, certamente, na tradição
nas tuas entranhas, até que elas saiam, de dia em de Elias. O espírito de Elias inspirou este
dia, por causa do mal.
oráculo, e assim era verdadeiramente Elias
que estava em ação.
Este é um episódio deveras intrigante
e tem despertado considerável discussão.
2Reis 3.11 e seguintes sugere que Elias d. A Invasão de Judá (21.16-17)
havia morrido antes da morte de Jeosafá, 16E o Senhor despertou contra Jeorão o espí
pois somente Eliseu estava disponível para rito dos filisteus e dos árabes que estão da banda
a crise. Haveria uma carta preparada por dos etíopes. 17Estes subiram a Judá e, dando
Elias antes de sua morte, antecipando pro sobre ela, levaram toda a fazenda que se achou na
casa do rei, como também seus filhos e suas
feticamente a apostasia de Jeorão? Ou, por mulheres; de modo que não lhe ficou filho algum,
acaso, como alguns rabinos sugeriam, senão Jeoacaz, o mais moço de seus filhos.
falou ele com algum profeta não citado
após sua morte e lhe ditou uma carta? Esta história deriva da fonte do cro
De fato esta passagem pode ter influen nista. Não é necessário supor que Jerusa
ciado os hebreus a antecipar o retorno de lém fosse capturada. A casa do rei era,
Elias nos últimos dias (Ml 4.5). Ele já provavelmente, uma referência à família
havia retornado uma vez! do rei que se achava fora de Jerusalém.
Contudo, Elias pode ter estado vivo O ataque foi uma incursão de fronteira,
ainda durante a primeira parte do reinado que, entretanto, resultou desastrosa para a
415
família real. O nome Jeoacaz significa “o 9Depois buscou a Acazias, o qual foi preso
Senhor tem tomado”, e o seu outro nome, quando se escondia em Samária, trouxeram-no a
Acazias, tem o mesmo significado. Jeú e o mataram. Então o sepultaram, pois
disseram: É filho de Jeosafá, que buscou ao
Senhor de todo o seu coraçãa E já não tinha na
casa de Acazias ninguém que fosse capaz de
e. A Morte Não Lamentada (21.18-20) reinar.
18E depois de tudo isso o Senhor o feriu nas
suas entranhas com uma enfermidade incurável. O desastrado reinado de Acazias está
19No decorrer do tempo, ao fim de dois anos, relacionado com a influência de sua mãe,
saíram-lhe as entranhas por causa da doença, e Atalia, e de seus parentes na casa real de
morreu desta horrível enfermidade £ o seu povo
não lhe queimou aromas como queimara a seus Acabe. A história do cronista diverge da
pais. “ Tinha trinta e dois anos quando começou história narrada em Reis em algumas
a reinar, e reinou oito anos em Jerusalém. Morreu particularidades e é consideravelmente
sem deixar de si saudades; e o sepultaram na abreviada. Aparentemente, ele depende de
cidade de Davi, porém não nos sepulcros dos reis. uma fonte diferente, pois em geral não
abrevia quando decide recontar uma
A doença, provavelmente, foi diarréia história, pelo contrário, a expande.
crônica. Ela ocorreu tal como o profeta Os habitantes de Jerusalém fizeram
havia declarado. A menção a não ter sido reinar (...) Acazias. Este não era o costume
ele sepultado com os outros reis é do normal, mas as condições de instabilidade
cronista. em Judá devem tê-lo exigido. Possivel
Sem deixar de si saudades (lit., sem mente, tal iniciativa não foi bem recebida
desejo). Isto pode significar que ninguém nas áreas adjacentes, onde as pessoas eram
desejava que ele continuasse a viver mais fiéis à tradição dos hebreus do que
(lamentava o seu passamento) ou que ele à família de Acabe.
perdera todo o desejo de viver. Tinha quarenta e dois anos. Se isto fosse
correto, ele teria nascido dois anos antes
2) A Loucura de Acazias (22.1-9) do nascimento de seu pai! Jeorão tinha
apenas 40 anos de idade quando morreu
‘Então os habitantes de Jerusalém fizeram
reinar em seu lugar Acazias, seu filho mais moço,
(2Cr 21.20). 2Reis 8.26 declara que Aca
porque a tropa que viera com os árabes ao arraial zias tinha 22 anos; a Septuaginta, que
tinha matado todos os mais velhos. Assim reinou tinha 20. Talvez essas duas tradições
Acazias, filho de Jeorão, rei de Judá. 2Tinha fossem combinadas, somando-se ambos os
quarenta e dois anos quando começou a reinar, e números (Myers)! Alguns sugerem que os
reinou um ano em Jerusalém. E o nome de sua
mãe era Atalia, filha de Onri. 3Ele também andou algarismos representam a extensão do
nos caminhos da casa de Acabe, porque sua mãe reinado da casa de Onri naquele tempo.
era sua conselheira para proceder impiamente. O hebraico declara que ele “era o filho de
4E fez o que era mau aos olhos do Senhor, como quarenta e dois anos”, que constitui a
fez a casa de Acabe; porque eles eram seus conse maneira comum de indicar a idade de um
lheiros depois da morte de seu pai, para sua
perdiçãa 5Andando nos conselhos deles foi com indivíduo, mas neste ponto pode ter sen
Jorão, filho de Acabe, rei de Israel, a guerrear tido diferente.
contra Hazael, rei da Síria, junto a Ramote-Gilea-
de; e os sírios feriram Jorão, 6o qual voltou para
Filha de Onri. Desta declaração alguns
curar-se em Jizreel, por estar ele doente. 7Foi por intérpretes tentam provar que ela era irmã
vontade de Deus que Acazias, para sua ruína de Acabe, e não sua filha. Contudo, o
visitou Jorão; pois, quando chegou, saiu com termo pode trazer o sentido de neta* e
Jorão contra Jeú, filho de Ninsi, a quem o Senhor seguramente é o correto neste ponto, se
tinha ungido para exterminar a casa de Acabe.
% quando Jeú executava juízo contra a casa de
Acabe, achou os príncipes de Judá e os filhos dos * Com o consta n a veisão RSV, que serve de base para o original deste
irmãos de Acazias, que o serviam, e os matou. com entário (N. do T.)
416
outras declarações forem levadas em conta está, aparentemente, sendo sensível até
(cf. 2Cr 21.6). quanto aos sentimentos maternais da
E Acazias (...) desceu. O texto massoré- ímpia Atalia. Ele torna claro que aquilo
tico reza “Azarias”. A menos que este que não seria levada a fazer, ela própria
seja um nome de trono para Acazias mandava que outros fizessem.
(cf. Jeoacaz, 21.17), ocorreu um erro de
escriba. 3. Jeoiada e Joás (23.1-21)
Foi por vontade de Deus. No hebraico, Esta passagem faz paralelo a 2Reis
a declaração do cronista não tem tanta 11.14-20 em toda a sua extensão, exceto
força: “Foi da parte de Deus.” Ou seja, foi quanto ao fato de que os levitas tomaram
operação de sua providência. o partido da guarda militar na insurreição.
Os filhos dos irmãos de Acazias. Ele Deve-se isso ao fato de que o cronista não
não tinha irmãos sobreviventes após a cria que a guarda estrangeira operasse na
incursão dos filisteus. Estes eram seus área do Templo e, conseqüentemente, pôs
parentes. os levitas lá como mais apropriados? Ou
Depois buscou a Acazias. 2Reis 9.21-28 está ele empregando uma fonte que reca
declara que Acazias e Jorão saíram juntos pitula atuação dos levitas no caso, questão
e que, após o ataque de Jeú, Acazias fugiu. de pouca monta para os redatores de Reis?
Aqui temos dois relatos, um suplemen Em outras palavras, será o caso de que o
tando o outro. O cronista estava empre relato do cronista complemente com ve
gando uma tradição diferente da dos lhas fontes o relato de Reis ou está ele
editores de Reis. reescrevendo esse relato como julga que as
coisas tivessem ocorrido? É mais provável
que ele estivesse reescrevendo a história à
2. Atalia Assume o Trono (22.10-12) luz de registros levíticos, e o relato de Reis
10Vendo Atalia, mãe de Acazias, que sen filho ou do midrash levítico que estava utili
era morto, levantou-se e destruiu toda a estirpe zando preservasse a história na forma
real da casa de Judã. "M as Jeosabeate,filha do como ele a registrou. Certamente, o cro
rei, tomou Joás, filho de Acazias, e o furtou dentre
os filhos do rei, que estavam para ser mortos, e o nista estava empregando registros verda
pôs com a sua ama na câmara dos leitos. Assim deiros, de onde copiou os nomes dos líde
Jeosabeate, filha do rei Jeorão, mulher do sacer res envolvidos (23.1)
dote Jeoiada e irmã de Acazias, o escondeu de A ênfase dupla na história sobre a santi
Atalia, de modo que ela não o matou. 12E esteve dade do Templo e a aliança com Davi
com eles seis anos, escondido na casa de Deus; e
Atalia reinou sobre a terra. favorece o fato de que ele reescreveu a
velha tradição levítica a partir de sua pró
pria perspectiva, em vez de ter copiado
Com duas exceções, esta seção corres palavra por palavra do midrash. Jeoiada
ponde a 2Reis 11.1-3. Jeoseba se torna proclama: “Eis que reinará o filho do rei,
Jeosabeate, que é uma simples variante do como o Senhor falou a respeito dos filhos
nome. Onde Reis diz que Atalia “destruiu” de Davi” (v. 3). Em Reis há somente preo
toda a família real, o cronista emprega a cupação pela segurança do jovem rei; em
forma intensiva do verbo “falar”. Alguns Crônicas essa ansiedade é combinada com
manuscritos hebraicos e gregos apresen uma preocupação de que o Templo fosse
tam “destruiu” em Crônicas, como se dá profanado no excitamento da ocasião
na RSV, mas isso pode ser uma tentativa (v. 6,7). A simples narrativa em 2Reis, deli
de reconciliar Reis com a história pos neando a ordem dos sacerdotes de não
terior. Ambos os relatos podem significar profanarem o Templo com o assassinato de
que ela não os destruiu pessoalmente, mas Atalia, é substituída por um imperativo:
deu ordens nesse sentido. Aqui, o cronista “Não a mateis na casa do Senhor” (v. 14).
417
1) Joás Proclamado Rei (23.1-11) tendência comum do cronista de aplicar
termos militares a funções espirituais.
‘O ra, no sétimo ano Jeoiada, cobrando
ânimo, tomou consigo em aliança com os capitães Aqui os levitas pegam em armas, mas são
de cem, Azarias, filho de Jeroão, Ismael, filho de armas dedicadas (cf. o v. 7 com o v. 9).
Jeoanã, Azarias, filho de Obede, Maaséias, filho Esta foi uma ocasião excepcional, pois os
de Adaías, e Elisafate, filho de Zicri. 2Estes levitas, aparentemente, possuíam suas
percorreram a Judá, ajuntando os levitas de todas próprias armas.
as cidades de Judá e os chefes das casas paternas
de Israel. 3E toda aquela congregação fez aliança Pondo-lhe (...) o testemunho. Teste
com o rei na casa de Deus. E Jeoiada lhes disse: munho deriva da raiz repetir. O substan
Eis que reinará o filho do rei, como o Senhor falou tivo significa testemunho ou preceito, algo
a respeito dos filhos de Davi. Isto é o que haveis
de fazer: uma terça parte de vós, isto é, dos sacer reafirmado. Esta é a palavra empregada na
dotes e dos levitas que entram no sábado, servirá expressão “arca do testemunho”. Não
de porteiros às entradas; soutra terça parte estará sabemos a exata natureza desse teste
junto à casa do rei; e a outra terça parte à porta munho. Provavelmente, continha algo
do Fundamento; e todo o povo estará nos átrios como a incumbência do rei, tal como regis
da casa do Senhor. 6Não entre, porém, ninguém
na casa do Senhor, senão os sacerdotes e os levitas trada em Deuteronômio 17.14 e seguintes
que ministram; estes entrarãq porque são santos; e ISamuel 10.25. Parte da lei estava nele
mas todo o povo guardará a ordenança do incorporada (Dt 17.18). Este incidente
Senhor. 7E os levitas cercarão o rei de todos os pode bem ter inspirado o costume de pre
lados, cada um com as suas armas na mão; e qual
quer que entrar na casa seja morto; mas acom sentear o monarca da Inglaterra com um
panhai vós o rei, quando entrar e quando sair. exemplar da Bíblia por ocasião da co
8Fizeram, pois, os levitas e todo o Judá conforme roação.
tudo o que ordenara o sacerdote Jeoiada; e tomou
cada um os seus homens, tanto aos que haviam de
Jeoiada e seus filhos o ungiram. Isto é
entrar no sábado como os que haviam de sair, pois do cronista.
o sacerdote Jeoiada não despediu as turmas.
’Também o sacerdote Jeoiada deu aos capitães de
cem as lanças, os paveses e os escudos que tinham 2) A Morte de Atalia (23.12-21)
pertencido ao rei Davi, os quais estavam na casa
de Deus. 10E dispôs todo o povo, cada um com as 12Ouvindo, pois, Atalia a voz do povo que
suas armas na mão, desde o lado direito até o lado corria e louvava ao rei, veio ao povo na casa do
esquerdo da casa, por entre o altar e a casa, ao Senhor; 13e quando olhou, eis que o rei estava
redor do rei. nEntão tiraram para fora o filho do junto à coluna, à entrada, e os capitães e os trom-
rei e, pondo-lhe a coroa e o testemunho, o fizeram beteiros perto do rei; e todo o povo da terra se
rei; e Jeoiada e seus filhos o ungiram, e disseram: alegrava, e tocava trombetas; e também os can
Viva o rei! tores tocavam instrumentos musicais e dirigiam os
cânticos de louvor. Então AtaBa, rasgando os seus
Porta do Fundamenta Este é outro vestidos, clamou: Traição! Traição! 14Nisso o
sacerdote Jeoiada trouxe para fora os centuriões
nome para “à porta Sur” de 2Reis 11.6 que estavam sobre o exército e disse-lhes: Trazei-a
Guardará a ordenança do Senhor. Isto por entre as fileiras, e o que a seguir seja morto
é, obedecerão à injunção de permanece a espada. Pois o sacerdote dissera: Não a mateis
na casa do Senhor. 15Então deitaram as mãos
rem na corte exterior, sem entrar no nela; e ela foi até a entrada da porta dos cavalos,
Templo sagrado. Quão proximamente ao que dá para a casa do rei, e ali a mataram.
altar o povo podia chegar no primeiro I6E Jeoiada firmou um pacto entre si e o povo
Templo não é sabido. É evidente, aqui, que e o rei, pelo qual seriam o povo do Senhor.
ocorreu uma reescrita da fonte de Reis. 17Depois todo o povo entrou na casa de Baal, e a
derrubaram; quebraram os seus altares e as suas
A expressão de 2Reis 11.7, “a guarda da imagens, e a Matã, sacerdote de Baal, mataram
casa do Senhor”, é aplicada aos guardas, diante dos altares. 18E Jeoiada dispôs guardas na
e não ao povo. Eles deviam proteger o rei, casa do Senhor, sob a direção dos sacerdotes leví-
e não o Templo. ticos a quem Davi designara na casa do Senhor
para oferecerem com alegria e com cânticos os
E os levitas (._) cada um com as suas holocaustos do Senhor, como está escrito na
armas na mão. Aqui está o oposto da lei de Moisés, e segundo a ordem de Davi.
418
'’Colocou porteiros às portas da casa do Senhor, ao seu lugar. Assim faziam dia após dia, e ajun:
para que não entrasse nela ninguém imundo no taram dinheiro em abundância. 12E o rei e Jeoia
tocante a coisa alguma. “ E tomou os centuriões, da davam-no aos encarregados da obra da casa do
os nobres, os governadores do povo e todo o povo Senhor; e assalariaram pedreiròs e carpinteiros
da terra; e conduziram da casa do Senhor o rei para renovarem a casa do Senhor, como também
e, passando pela poita superior para a casa do rei, os que trabalhavam em ferro e em bronze para
fizeram-no sentar no trono re a l.21Assim todo o repararem a casa do Senhor.13Assim os encarre
povo da terra se alegrou, e a ddade ficou em paz, gados da obra faziam com que o serviço da
depois que mataram Atalia à espada. reparação progredisse nas suas mãos; e restituí
ram a casa de Deus a seu estado anterior, e a
consolidaram. 14Depois de acabarem a obra,
O relato agora segue bem de perto 2Reis trouxeram ao rei e a Jeoiada o resto do dinheiro,
11.13-20. Os acréscimos do cronista são as e dele se fizeram utensílios para a casa do Senhor,
referências a ter Atalia ouvido a voz do para serem usados no ministério e nos holocaus-
povo que corria e louvava ao rei (v. 12), em tos, e colheres, e vasos de ouro e de prata. E se
ofereciam holocaustos continuamente na casa do
lugar de ouvir os guardas e o povo; a colo Senhor, por todos os dias de Jeoiada.
cação de sacerdotes levíticos (v. 18,19); e
o quadro da procissão real (v. 20). Nesta Na passagem paralela de 2Reis 12.1 e
passagem o cronista continuou a reinter- seguintes, parece que Joás pediu aos sacer
pretar o relato de Reis à luz de suas tradições dotes que dessem parte das ofertas regula
levíticas e interesse pessoal. Certamente ele
res a eles apresentadas para o propósito de
adiciona vida à cena descrita.
reparos do Templo. Os sacerdotes resisti
ram passivamente a essa invasão de suas
4. A Restauração do Templo (24.1-14) prerrogativas sacerdotais. Joás logo reco
'Tinha Joás sete anos quando começou a nheceu que precisava empregar uma fór
reinar, e reinou quarenta anos em Jerusalém. mula diferente. Em Crônicas os sacerdotes
O nome de sua mãe era Zíbia, de Berseba. 2E e levitas são ordenados a saírem e levan
Joás fez o que era reto aos olhos do Senhor por to
dos os dias do sacerdote Jeoiada. 5E tomou Jeoia- tarem uma oferta especial para esse pro
da para ele duas mulheres, das quais teve filhos e pósito, em vez de tomá-la de rendimentos
filhas. 4Depois disso Joás resolveu renovar a casa pessoais. Contudo, essa medida também
do Senhor. 5Reuniu, pois, os sacerdotes e os enfrentou resistência passiva da parte dos
levitas e lhes disse: Saí pelas cidades de Judá, e
levantai dinheiro de todo o Israel, anualmente,
levitas. Joás pede explicações ao sacerdote
para reparar a casa do vosso Deus; e vede que chefe por essa negligência, perguntan
apresseis este negótia Contudo os levitas não o do-lhe por que tal foi permitido. Não
apressaram. ‘R io que o rei chamou Jeoiada, o obtém resposta. Aparentemente, os levitas
chefe, e lhe perguntou: Por que não tens obrigado reagiram de forma idêntica à dos sacerdo
os levitas a trazerem de Judá e de Jerusalém o
imposto ordenado por Moisés, servo do Senhor, tes. Não era parte de seus deveres faze
à congregação de Israel, para a tenda do teste rem-se de arrecadadores de dinheiro. Se
munho? 7Pois os filhos de Atalia, aquela mulher esta história complementa a de Reis,
ímpia, tinham arruinado a casa de Deus; e até como, provavelmente, acontece, revela
empregaram todas as coisas sagradas da casa do
Senhor no serviço dos baalins. sO rei, pois, deu
verdadeira iluminação quanto ao conceito
ordem; e fizeram uma arca e a puseram do lado levítico de sua tarefa.
de fora, à porta da cása do Senhor. *E publicou- Teve filhos e filhas. Esta é uma frase que
-se em Judá e em Jerusalém que trouxessem ao se repete por todo o capítulo 5 de Gênesis
Senhor o imposto que Moisés, servo de Deus,
havia ordenado a Israel no deserta 10Então todos
(cf. os v. 4, 5, 10, 13, 16, 22, 26, 30). Isto
os príncipes e todo o povo se alegraram, e trou suscita o problema do relacionamento do
xeram o imposto e o lançaram na arca, até que cronista com as tradições sacerdotais do
ficou cheia. UE quando era trazida a arca pelas Fentateuco.
mãos dos levitas ao recinto do rei, na ocasião em
que viam que havia muito dinheiro, vinham o Anualmente, para reparar a casa do vos
escrivão do rei e o deputado do sumo sacerdote, so Deus. Eles deviam levantar dinheiro sufi
esvaziavam a arca e, tomando-a, tomavam a levá-la ciente para que o Templo pudesse ser
419
mantido em constante reparo, em vez de Senhor entregou nas suas mãos um exército mui
deixá-lo decair por anos e então realizar grande, porquanto abandonaram o Senhor, Deus
um grande esforço para deixá-lo novamen de seus pais. Assim executaram juízo contra
Joás. “ Quando os sírios se retiraram dele,
te em condição apropriada. deixaram-no gravemente ferido; então seus servos
O imposto ordenado por Moisés (cf. conspiraram contra ele por causa do sangue dos
Ex. 30.12 e ss.). filhos do sacerdote Jeoiada, e o mataram na sua
cama, e assim morreu; e o sepultaram na cidade
Os filhos de Atalia, aquela mulher de Davi, porém não nos sepulcros dos reis.
ímpia. Os filhos dela estavam seguindo “ Estes foram os que conspiraram contra ele:
o seu mau exemplo. Zabade, filho de Simeate, a amonita, e Jeozabade,
filho de Sinrite, a moabita. 27Ora, quanto a seus
A puseram do lado de fora. 2Reis 12.9 filhos, e ao grande número de oráculos pronun
diz que a puseram ao lado do altar. Ou o ciados contra ele, e à restauração da casa de Deus,
cronista estava usando uma outra fonte, eis que estão escritos no comentário do livro dos
que localizava a arca num lugar diferente, reis. E Amazias, seu filho, reinou em seu lugar.
ou havia duas arcas.
£ dele se fizeram utensílios. 2Reis 12.13
diz que o dinheiro não foi empregado para A perversidade de Joás revela as profun
tais coisas. Contudo, esse relato pode re didades a que um homem decente pode
ferir-se aos montantes regulares que en descer. Talvez Jedada o tivesse dominado
travam todos os dias. O cronista sugere tanto enquanto ele era jovem que, ao
que, quando permanecia um excesso após tentar assegurar sua própria individuali
os reparos feitos, eles com isso proviam os dade, após a morte do grande homem,
utensílios. simplesmente se tornou sujeito a outros
homens, cujo conselho era o oposto.
5. A Apostasia de Joás (24.15-27) Numa luta por identidade, ele havia tro
cado um bom mestre por outros, maus.
15Jeoiada, porém, envelheceu e, cheio de dias,
morreu; tinha cento e trinta anos quando morreu. O cronista declara-o nestes termos: “E
16E o sepultaram na cidade de Davi com os reis, depois da morte de Jeoiada vieram os prín
porque tinha feito o bem em Israel, e para com cipes de Judá e prostraram-se diante do rei;
Deus e sua casa. 17E depois da morte de Jeoiada então o rei lhes deu ouvidos.”
vieram os príncipes de Judá e prostraram-se
diante do rei; então o rei lhes deu ouvidos. E o sepultaram na cidade de Davi com
18E eles, abandonando a casa do Senhor, Deus de os reis. Somente o cronista nos faz saber
seus pais, serviram aos aserins e aos ídolos; de este sinal de honraria para um sacerdote.
sorte que veio grande ira sobre Judá e Jerusalém Sua idade por ocasião da morte, que
por causa desta sua culpa. 19Contudo Deus enviou
profetas entre eles para os fazer tornar ao Senhor, excedeu a de Moisés ou Arão, tem sido
os quais protestaram contra eles; mas eles não lhes atribuída a um desejo dos tradicionalistas
deram ouvidos. ME o Espírito de Deus apodérou- posteriores de honrá-lo ainda mais. Esta
-se de Zacarias, filho do sacerdote Jeoiada, o qual questão, contudo, não pode ser definida
se pôs em pé acima do povo, e lhes disse: Por que com certeza. Se ele morreu com 130 anos,
transgredis os mandamentos do Senhor, de modo
que não possais prosperar? Porquanto abando estaria nos seus noventa quando Joás se
nastes o Senhor, também ele vos abandonou. tornou rei.
21Mas conspiraram contra ele e, por ordem do rei, Zacarias, filho do sacerdote Jeoiada.
o apedrejaram no átrio da casa do Senhor.
22Assim o rei Joás não se lembrou da bondade
O incidente sobre Zacarias, encontrado
que lhe fizera Jeoiada, pai de Zacarias, antes somente em Crônicas, causou profunda
matou-lhe o filho, o qual, morrendo, disse: Veja-o influência sobre as gerações posteriores.
o Senhor, e o retribua. “ Decorrido um ano,- o Jesus refere-se a ele de modo a indicar que
exército da Síria subiu contra Joás; e vieram a
Judá e a Jerusalém, e destruíram dentre o povo
seu cânon do Antigo Testamento era o
todos os seus príncipes; e enviaram todo o seu mesmo que o nosso. Os judeus haviam
despojo ao rei de Damasco. 240 exército dos assassinado seus profetas de Abel a Zaca
sírios viera com poucos homens, contudo o rias (Mt 23.35). Isto significa que de
420
Gênesis a Crônicas o martírio dos profetas (17.14). Quando um profeta o condenou
tinha prosseguido, pois Crônicas era o por isso, ele liberou os soldados contrata
último livro no cânon hebraico final. dos, o que muito os contrariou, pois eles
Veja-o o Senhoi; e o retribua. Quão dife também tinham direito à participação nos
rente é este clamor do de Estêvão em despojos depois da batalha. Tendo obtido
situação semelhante: “Senhor, não lhes grande vitória sobre Edom, ele totalmente
imputes este pecado” (At 7.60). adorou os deuses deles, e desta vez rejeitou
O exército da Síria subiu contra Joás. as advertências profiéticas. Tao cheio es
2Reis 12.17 e seguintes diz que Hazael, da tava de si, após a gloriosa vitória, que
Síria, aproximou-se de Jerusalém e foi julgou-se invencível e desafiou Jeoás de
comprado por Joás. O cronista descreve um Israel do Norte para a batalha. Foi igno
encontro bem mais sério, em que Hazael miniosamente derrotado por Jeoás, que
captura muito mais despojo e deixa Joás capturou Jerusalém, derrubou parte do
seriamente ferido. Suas fontes são, aparen muro e levou toda a riqueza da cidade.
temente, mais explícitas quanto à primeira A última coisa que sabemos de Amazias
peleja. Ele não alega que Jerusalém fosse é'de sua fuga de diante de conspiradores,
capturada. Após a derrota, Joás, provavel que o apanharam em Laquis e ali o ma
mente, pagou a Hazael para não avançar taram.
mais. Os redatores de Reis não registram
a primeira batalha, somente suas conse 1) Um Ato de Misericórdia sem Prece
qüências. dentes (25.1-4)
A amonita (...) a moabita. Somente o ‘Amazias tinha vinte e cinco anos quando
cronista menciona a nacionalidade das começou a reinar, e reinou vinte e nove anos em
mães dos assassinos de Joás. Estará insi Jerusalém. E o nome de sua mãe era Jeoadã, de
nuando, com isto, suas objeções a casa Jerusalém. 2Ele fez o que era reto aos olhos do
mento de judeus com esposas estrangei Senhor, mas não o fez com coração perfeita
3Quando o reino já lhe tinha sido confirmado, ele
ras? matou os seus servos que tinham assassinado o rei
Oráculos pronunciados contra ele. Isto é seu pai. 4Contudo, não matou os filhos deles, mas
confirmado por 24.19. fez segundo está escrito na lei, no livro de Moisés,
como o Senhor ordenou, dizendo: Não morrerão
Comentário do livro dos reis. Este era os pais pelos filhos, nem os filhos pelos pais; mas
o midrash (heb.), principal fonte do mate cada um morrerá pelo seu pecada
rial do cronista. Ele se refere a isso sob
vários outros títulos (Ver a Introdução).
Amazias reconheceu a diferença entre
a responsabilidade coletiva e a individual
VI. Nos Meados dos Anos pelo crime. Quando Acã pecou contra
(25.1—32.33) Deus, sua família inteira foi apedrejada
(Js 7.14-25). O limite judicial de Amazias
1. Vacilações de Amazias (25.1-28) é mencionado tanto em Reis quanto em
A vida de Amazias é um retrato do Crônicas. Baseia-se em Deuteronômio
homem “inconstante em todos os seus 24.16. Significa isto que esta passagem
caminhos” (Tg 1.8), como Elmslie o assi era conhecida como constando na lei de
nalou. Ele teve um nobre começo, quando Moisés na época? A passagem não diz
poupou as famílias de seus inimigos. exatamente isso; apenas alega ter constado
Depois julgou que havia tomado uma na lei de Moisés ao tempo em que se regis
medida sensata, quando contratou merce trara a história de Israel. No caso de 2Reis,
nários de Israel do Norte por um preço logo após 587 a.C. Acaso Amazias contri
razoável, pois seu exército era muito buiu para a formulação dessa lei, ou
menor do que o de Asa (14.7) ou de Jeosafá apenas prestou-lhe obediência? A pressu-
421
posição crítica de alguém concernente à vindo mais cedo. Mas essa não era a ma
data de Deuteronômio vem à tona neste neira de agir dos profetas.
ponto. Independentemente da conclusão O Senhor não é com Israel. Eles eram
que se tire ante este problema intrigante, uma nação rejeitada, após a divisão ou
deve-se admitir que Amazias, na verdade, separação de Judá.
tivera um começo favorável.
Serás forte para a peleja. A linguagem
no original hebraico é bem menos vívida.
2) Mercenários Israelitas do Norte Pode ser parafraseada: “Se estiveres deter
(25.5-13) minado a lutar, prepara-te bem, pois Deus
5Depois Amazias congregou Judá e o colocou, é contra ti”! Este é um exemplo clássico
segundo as suas casas paternas, sob comandantes de ironia profética.
de milhares e de centenas, por todo o Judá e
Benjamim; e os contou, de vinte anos para cima,
Mas que se fará dos cem talentos?
e achou deles trezentos mil escolhidos que podiam Amazias perderia todo o seu investimento.
ir à guerra e sabiam manejar lança e escuda A resposta foi uma simples declaração de
‘Também de Israel tomou a soldo cem mil varões fé: “Mais tem o Senhor que te dar do que
valentes, por cem talentos de prata. 7Veio ter com isso” (cf. Mt 6.33).
ele, porém, um homem de Deus, dizendo: Õ rei,
não deixes ir contigo o exérdto de Israel, porque Matou dez mil dos filhos de Seir. Esse
o Senhor não ê com Israel, a saber, com todos os êxito é também registrado em 2Reis 14.7.
filhos de Efraim. “Mas se julgas que assim serás Somente o cronista fala dos demais 10 mil
forte para a peleja, Deus te fará cair diante do lançados da rocha e despedaçados. Segu
inimigo; pois Deus tem poder para ajudar e para
fazer cair. 9Então perguntou Ajmazias ao homem ramente Amazias já se havia esquecido de
de Deus: M as que se fará dos cem talentos de sua visão anterior quanto à responsabili
prata que dei às tropas de Israel? Respondeu-lhe dade coletiva. Ou os direitos individuais se
o homem de Deus: Mais tem o Senhor que te dar aplicavam somente aos judeus?
do que isso. 10Então Amazias separou as tropas
que lhe tinham vindo de Efraim, para que vol Saquearam grande despoja Os merce
tassem para a sua terra; pelo que muito se acendeu nários arrecadaram seu despojo de qual
a ira deles contra Judá, e voltaram para a sua terra quer forma do povo de Judá! Às vezes o
ardendo em ira. 11Amazias, cobrando ânimo,
conduziu o seu povo* e foi ao vale do Sal, onde
arrependimento vem muito tarde para
matou dez mil dos filhos de Seir. 12Os filhos de poupar os homens das conseqüências de
Judá prenderam vivos outros dez mil, e trazendo- seu pecado.
-os ao cume da rocha, lançaram-nos dali abaixo,
de modo que todos foram despedaçados. 13Mas
os homens das tropas que Amazias despedira, não 3) Deuses Edomeus São Adorados
deixando que fossem com de à batalha, deram (25.14-16)
sobre as cidades de Judá, desde Samária até
Bete-Horom, e dos seus habitantes mataram três 14Quando Amazias veio da matança dos
mil, e saquearam grande despoja edomeus, trouxe consigo os deuses dos filhos de
Seir e os elevou para serem os seus deuses,
prostrando-se diante deles e queimando-lhes
Os negócios estavam indo bem para incensa 15Pelo que o Senhor se irou contra
Amazias até se encontrar com um profeta. Amazias e lhe enviou um profeta, que lhe disse:
Por que buscaste os deuses deste povo, os quais
Tendo contratado mercenários dentre os não livraram o seu próprio povo da tua mão?
israelitas do Norte, nas vésperas da par 16Enquanto ele ainda falava com o rei, este lhe
tida para a batalha foi confrontado pelo respondeu: Fizemos-te conselheiro do rei? Cala-te!
homem de Deus, que lhe comunicou que Por que haverias de ser morto? Elitão o profeta
todo o plano estava mal formulado e desti calou, havendo ditoc Sei que Deus resolveu des
truir-te, porquanto fizeste isto, e não deste ouvidos
nado ao fracasso, Amazias nunca se recu a meu conselha
perou do choque em relação à sua auto
confiança. Tàlvez pudesse ter sido ajudado Esta é a única vez no Antigo Testa
a ter mais cuidado se a advertência tivesse mento que um rei hebreu adorou os deuses
422
capturados na guerra. Nenhum dos de 5) Sumário do Reinado de Amazias
mais foi tão tolo. Como podiam os deuses (25.25-28)
derrotados por Iavé ser de qualquer ajuda “ Amazias, filho de Joás, rèi de Judá, viveu
a um israelita? O profeta lembrou Amazias quinze anos depois da morte de Jeoás, filho de
disso. Nenhum rei gosta de ser chamado Jeoacaz, rei de Israel. “ Quanto ao restante dos
de tolo em pública Assim, ele mandou que atos de Amazias, desde os primeiros até os últimos,
o profeta se calasse. Ele interrompeu o não estão porventura escritos no livro dos reis de
Judá e Israel? r Desde o. tempo em que Amazias
oráculo (o que ele iria dizer?), mas não o se desviou do Senhor, conspiraram contra ele em
testemunho pessoal. Note-se a distinção Jeru salém , e ele fugiu para Laquis; mas
entre o oráculo divino e a observação perseguiram-no até Laquis, e ali o mataram. 28E
pessoal da parte do profeta. o trouxeram sobre cavalos e o sepultaram junto
a seus pais na cidade de Davi.
423
de seu pai Amazias. 2Ele edificou EJote, e a resti Todo o povo de Judá tomou a Uzias. Era
tuiu a Judâ, depois que o rei dormiu com seus pais. uma ação incomum que o povo se levan
3Tinha Uzias dezesseis anos quando começou a
reinar, e reinou cinqüenta e dois anos em Jerusalém. tasse e coroasse um rei. Aparentemente,
E o nome de sua mãe era Jecolia, de Jerusalém. tratava-se de uma reação ao governo de
4Ele fez o que era reto aos olhos do Senhor, Amazias. Note-se o contraste com a
conforme tudo que fizera Amazias seu pai. 5E ascensão de Acazias (22.1), quando somente
buscou a Deus enquanto viveu Zacarias, que o
instruiu no temor de Deus; e enquanto buscou ao
o povo de Jerusalém prevaleceu.
Senhor, Deus o fez prosperar. ‘Saiu e guerreou Enquanto viveu Zacarias. Não conhe
contra os filisteus, e derrubou o muro de Gate, o cemos sua identidade. Conquanto Uzias
muro de Jabné e o muro de Asdode; e edificou
cidades no país de Asdode e entre os filisteus;
seja referido em Zacarias 14.5, isto não
7porque Deus o ajudou contra os filisteus e contra significa que a passagem fosse escrita parti
os árabes que habitavam em Gur-Baal, e contra cularmente por esse Zacarias. De fato
os meunitas. 8O s amonitas pagaram tributo a Zacarias 9-14 pode ter sido acrescentado
Uzias; e a sua fama se espalhou até a entrada do a Zacarias 1-8, com que tem pouca afini
Egito, pois se tornou muito poderosa ’Também
Uzias edificou torres em Jerusalém, à porta da dade, devido a uma noção posterior fazendo
esquina, à porta do vale e ao ângulo do muro, e ligação dessas profecias com o Zacarias
as fortificou. “Edificou torres no deserta e cavou mencionado nesta passagem de Crônicas.
muitos poços, porque tinha miito gado tanto nos va Foram reunidas às passagens tidas como
les como nas campinas; e tinha lavradores e vinhatei escritas por um Zacarias, embora não fosse
ros nos montes e nos campos férteis, pois era amigo
da agricultura. nTinha também Uzias um exército o mesmo, pois ele pregava após o exílio babi
de homens destros nas armas, que saíam à guerra lónico.
em tropas, segundo o número da sua resenha feita O muro de Jabné. Essa cidade, locali
pelo escrivão Jeiel e o oficial Maaséias, sob as
ordens de Hananias, um dos príncipes do rei. 120 zada entre Jope e Asdode, é a mesma
número total dos chefes das casas paternas, homens Jabneel de Josué 15.11, que mais tarde se
valorosos, era de dois mil e seiscentos. 13E sob as tornou a Jâmnia (IMacabeus 4.15) do
suas ordens havia um exérdto disciplinado de período cristão dos primeiros tempos. Era
trezentos e sete mil e quinhentos homens, que guer a sede do Grande Sinédrio após a destruição
reavam valorosamente, para ajudarem o rei contra
os inimigos. uUzias proveu o exército inteiro de do Templo em 70 d.C. Foi ali que o cânon
escudos, lanças, capacetes, couraças e arcos, e até judaico do Antigo Testamento foi debatido
fundas para atirar pedras. 15E em Jerusalém e acordado.
fabricou mãquiias, inventadas por peritos, para que
fossem colocadas nas torres e nos cantos das mura O número total dos (...) homens valo
lhas, a fim de se atirarem com das flechas e grandes rosos, era de dois mil e seiscentos (...) um
pedras. E voou a sua fama até muito longe, porque exército disdptinado de trezentos e sete mil
foi maravilhosamente ajudado, até que se tornou e quinhentos. Pelo princípio de unidade,
poderosa estes números correspondem a duas
unidades, totalizando 600 para os líderes
e 300 unidades de guerreiros, perfazendo
Reis tem um sumário bem curto do um total de 7.500.
reinado de Uzias, porém Crônicas inclui
Fabricou máquinas, inventadas por
muito mais material. O relato da edificação peritos. Esta é a única menção a tais
de Uzias e de suas atividades agrícolas tem
máquinas de guerra no Antigo Testamento.
sido extraordinariamente confirmado pela Uzias contava com o mais moderno equi
arqueologia (cf. Myers, II, 152,153). Aqui pamento militar.
o cronista preservou-nos registro que doutra
maneira teria se perdido completamente.
Os seus comentários têm sido uma valiosa 2) Conflito com os Sacerdotes (26.16-23)
ajuda para os arqueólogos, ao buscarem
I6Mas, quando ele se havia tornado poderoso,
interpretar o significado do que têm encon se exaltou o seu coração de modo que se corrompeu,
trado. e cometeu transgressões contra o Senhor, seu Deus;
424
pois entrou no templo do Senhor para queimar Ele mesmo se apressou a sair. Agora não
incenso no altar do incensa 17Mas o sacerdote foi problema fazê-lo sair. Ele foi bastante
Azarias entrou após ele, com oitenta sacerdotes
do Senhor, homens valorosos, 18e se opuseram ao
cooperador.
rei Uzias, dizendo-lhe: A ti, Uzias, não compete Foi excluído da casa do Senhor. É-nos
queimar incenso perante o Senhor, mas aos sacer dito hoje, pelas autoridades médicas, que
dotes, filhos de Arão, que foram consagrados para a lepra atualmente é uma das doenças
queimarem incensa Sai do santuárioi, pois come
teste uma transgressão; e não será isto para honra
menos contagiosas. Não é sabido como é
tua da parte do Senhor Deus. 19Então Uzias se transmitida. A lepra moderna, contudo, não
indignou; e tinha na mão um incensário para deve ser automaticamente identificada com
queimar incensa Indignando-se ele, pois, contra a do Antigo Testamento (cf. Lv 13-14).
os sacerdotes, nasceu-lhe a lepra na testa, perante Aquela enfermidade era freqüentemente
os sacerdotes, na casa do Senhor, junto ao altar
do incensa 20Então o sumo sacerdote Azarias transmitida por contato físico.
olhou para ele, como também todos os sacerdotes, Com seus pais (...) o sepultaram, isto é,
e eis que estava leproso na sua testa. E apressu- no campo de sepultura. Isto não representa
radamente o lançaram fora, e ele mesmo se apressou
a sair, porque o Senhor o ferira. 21Assim ficou as mesmas sepulturas, mas uma no campo
leproso o rei Uzias até o dia da sua morte; e, por adjacente ao cemitério real. O estigma da
ser leprosoi, morou numa casa separada, pois foi doença foi-lhe atribuído mesmo após a
excluído da casa do Senhor. E Jotão, seu filho, tinha morte.
o cargo da casa do rei, julgando o povo da terra.
22Quanto ao restante dos atos de Uzias, desde os
primeiros até os últimos, o profeta Isaias, filho de 3. Pai Piedoso, Füho ímpio (27.1—28.27)
Amoz, o escreveu.23Assim dormiu Uzias com seus
pais, e com eles o sepultaram, isto é, no campo de Muito freqüentemente ocorria que um
sepultura que era dos reis; pois disseram: ele é bom rei era sucedido por um mau. Contudo,
leprosa E Jotão, seu filhoi, reinou em seu lugar. o oposto disso também era verdade; um rei
perverso era às vezes seguido por um bom.
As gerações muitas vezes tendem a reagir
O relato é da pena do cronista, con radicalmente com relação umas as outras.
quanto ele deve tê-lo encontrado em suas O filho, numa tentativa de ser diferente de
fontes. 2Reis 15.5 afirma que a lepra de seu pai temente a Deus, abandona os
Uzias deveu-se a um ato de Deus, mas não melhores traços paternos e escolhe os piores.
dá detalhes. Alguns expositores questio Ou, vendo as faltas de um pai ímpio, deter
naram a historicidade do relato do cronista mina ser um homem melhor. Dificilmente
em sua forma presente, porém, certamente, se poderia alegar que o pai ímpio foi
está baseada numa ocorrência real. O fato responsável pela bondade do filho. Nosso
de que a história era tradicionalmente conhecimento do trágico curso de ação de
contada entre sacerdotes e levitas pode Acaz não de\e impedir uma avaliação gene
explicar suas características presentes. rosa de seu pai, Jotão.
A ti, Uzias, não compete. Note-se como
o sacerdote chefe não se dirigiu a ele nos 1) Jotão, Leal a Deus (27.1-9)
termos comumente lisonjeiros aplicados aos 'Tinha Jo tã o vinte e cinco anos quando
reis. Ele despiu-o de todos os títulos reais. começou a reinar, e reinou dezesseis anos em Jeru
Nasceu-lhe a lepra na testa. Havia salém. E o nome de sua mãe era Jerusa, filha de
Zadoque. 2Ele fez o que era reto aos olhos do
muitos tipos de lepra. Naamã teve Senhor, conforme tudo o que fizera Uzias, seu pai;
permissão de cuidar de seus afazeres con todavia não invadiu o templo do Senhor. M as o
quanto fosse leproso (2Reis 5.1 e ss.). A povo ainda se corrompia. 3Ele construiu a porfá
doença do rei Uzias era do tipo que o superior da casa do Senhor, e edificou extetisivã
mente sobre o muro de Ofel. 4Tàmbém edificou
privava de vida pública. O provável sentido cidades na região montanhosa de Judá, e castelos
de seu aparecimento na testa é que cons e torres nos bosques. 5Guerreou contra o rei dos
tituía um julgamento por seu orgulho. amonitas, e prevaleceu sobre eles; de modo que os
425
amonitas naquele ano lhe derem cem talentos de Os amonitas naquele ano lhe deram. O
prata, dez mil coros de trigo e dez mil de cevada. dinheiro totalizaria o correspondente a 180
Isso lhe trouxeram os amonitas também no segundo
e no terceiro ano.6Assim Jotão se tornou pode
mil dólares ao ano, em moeda atual, e o
roso, porque dirigiu os seus caminhos na presença cereal era de cerca de 120 mil bushels (ingl.,
do Senhor seu Deus. 7Ora, o restante dos atos de medida de capacidade para cereais equiva
Jotão, e todas as suas guerras e os seus caminhos, lente ao alqueire) de cada variedade,
eis que estão escritos no livro dos reis de Israel segundo essa tradição.
e de Judá. 8Hnha vinte e cinco anos quando
começou a reinar, e reinou dezesseis anos em Jeru Na presença do Senhor. Isso está em
salém. 9E Jotão dormiu com seus pais, e o nítido contraste com Amazias, que era
sepultaram na cidade de Davi. E Acaz, seu filho, impelido por todo vento que soprava. Jotão
reinou em seu lugac
estabeleceu o seu roteiro e nele permaneceu.
O reinado de Jotão deve ter apresentado Seria bom se pudéssemos conhecer mais
reais problemas aos historiadores judaicos, a respeito desse homem.
conforme ilustram tanto os autores de Reis
como de Crônicas. Tanto quanto podiam 2) Acaz, o Idólatra (28.1-27)
dizer, ele foi um bom rei durante toda a sua
existência. Sua única falha foi sua falta de a. A Guerra Siro-Efraimita (28.1-15)
habilidade para fazer todo o povo seguir 'Tinha Acaz vinte anos quando começou a
sua liderança, particularmente no que reinar, e reinou dezesseis anos em Jerusalém. E
concernia à adoração em lugares altos. não fez o que era reto aos olhos do Senhor, como
Davi, seu pai; %nas andou nos caminhos dos reis
Contudo, todos os bons reis antes dele de Israel, e até fez imagens de fundição para os
falharam na solução desse problema. Se baalins. 3Também queimava incenso no vale do
Deus fazia prosperar o bom rei, conforme filho de Hinom, e queimou seus filhos no fogo,
eles criam, por que Jotão não conseguiu conforme as abominações das nações que o
Senhor expulsara de diante dos filhos de Israel.
realizar mais do que fez, e por que veio a 4E sacrificava e queimava incenso nos altos e nos
morrer tão jovem? Ficou para Jesus outeiros, como também debaixo de toda árvore
demonstrar que as recompensas de Deus frondosa. 5Pelo que o Senhor seu Deus o entre
não são sempre materiais. Para os antigos gou na mão do rei dos sirios, os quais o derro
hebreus este era um enigma insolúvel (cf. taram e tomaram-lhe em cativeiro grande multidão
de presos, que levaram para Damasco. Foi também
o livro de Jó). Nem Reis nem Crônicas vê entregue na mão do rei de Israel, o qual lhe infligiu
qualquer falta neste homem. Contudo^ têm grande derrota, 6pois Peca, filho de Remalias,
pouco a dizer sobre seus êxitos. Há uma matou em Judá, num só dia, cento e vinte mil,
tendência para se prosseguir ao próximo todos homens «alentes; porquanto haviam abando
nado o Senhor, Deus de seus pais. 7E Zicri, varão
rei como que para evitar perguntas emba poderoso de Efraim, matou Maaséias, filho do rei,
raçosas. Na veidade, o cronista inclui e Azricão, o mordomo, e Elcana, o segundo depois
algumas poucas notas breves sobre as do rei. ®E os filhos de Israel levaram cativos de
incursões de Jotão, mas de modo algum se seus irmãos duzentos mil, mulheres, filhos e filhas;
comparam aos feitos de Asa, Jeosafá ou também saquearam deles grande despojo^ que
levaram para Samária. ’M as estava ali um profeta
Uzias. 2Reis 15.32-38 nada diz de explícito do Senhor, cujo nome era Odede, o qual saiu ao
e parece culpar seu abreviado reinado pela encontro do exército que vinha para Samária, e
falha de não remover os lugares altos. Não lhe disse: Eis que, irando-se o Senhor Deus de
admira que 2Crônicas, capítulo 27, vossos pais contra Judá, os entregou na vossa
mão, e vós os matastes com uma raiva que chegou
contenha somente uns poucos versículos. até o céu. 10E agora vós qutreis sujeitar a vós
O cronista está, estranhamente, sem saber os filhos de Judá e de Jerusalém, como escra
o que dizer. vos e escravas; porventura não sois vós mes
Não invadiu o templo do Senhor. Jotão mos culpados para com o Senhor vosso Deus?
imitou o pai em todas as suas virtudes, mas 11Agora, pois, ouvi-me, e tornai a enviar os
cativos que trouxestes dentre vossos irmãos, pois
não em suas falhas. Não tentou usurpar o ardor da ira do Senhor está sobre vós. 12Então
as funções dos sacerdotes. alguns dos chefes dos efraimitas, a saber, Azarias,
426
filho de Joanã, Berequias, filho de Mesilemote, O qual saiu ao encontra Os profetas
Jeizquias, filho de Salum, e Amasa, filho de nem sempre esperavam que as pessoas
Hadlai, se levantaram contra os que voltavam da fossem a eles. Confrontavam-nas em luga
guerra, 13e lhes disseram: Não fareis entrar aqui
estes cativos; porquç além da nossa culpa contra res públicos, onde podiam sofrer resistên
o Senhor, o que vós quereis fazer acrescentaria cia, mas não serem ignorados. O cronista
mais a nossos pecados e a nossas culpas; pois já gosta de empregar imagens de tais con
temos grande culpa, e o ardor da ira do Senhor frontos (cf. 2Cr 16.7; 19.2; 25.7), embora
está sobre Israel. *4Então os homens armados
deixaram os cativos e o despojo diante dos prín ele também falasse do fiel oráculo du
cipes e de toda a congregaçãa 1SE os homens já rante culto público regular (cf. 2Cr 20.14;
mencionados por nome se levantaram e tomaram 24.20).
os cativos, e vestiram do despojo a todos os que
dentre eles estavam nus; vestiram-nos e os cal Uma raiva que chegou até o céu. Pode
çaram e lhes deram de comer e de beber, e os haver uma perífrase aqui, evitando inten
ungiram; e, levando sobre jumentas todos os que cionalmente o nome de Deus, mas é,
estavam fracos, conduziram-nos a Jericó, a cidade
das palmeiras, a seus irmãos. Depois voltaram provavelmente, uma maneira vivida de
para Samária. realçar sua culpa, à semelhança de fumaça
ascendendo ao céu.
Andou nos caminhos dos reis de Israel.
Este era o pior epíteto que o historiador Porventura não sois vós mesmos culpa
podia aplicar-lhe. Ele segue 2Reis 16.1 e dos (...)? Isto traz à mente as palavras de
seguintes aqui e prossegue até o verso 4, Jesus: “Aquele dentre vós que está sem
com a nota adicional de que Acaz “fez pecado seja o primeiro que lhe atire uma
imagens de fundição para os baalins”. pedra” (Jo 8.7).
Muitos desses tipos de ídolos foram encon Tomai a enviar os cativos que trou
trados na Palestina. xestes dentre vossos irmãos. Aqui também
Pelo que o Senhor (...) o entregou na se evidencia a perspectiva do cronista.
mão do rei dos sírios. 2Reis 16.5 diz que Conquanto seu rei fosse um apóstata e,
os reis da Síria e Israel não puderam vencer como naçãoi, Israel do Norte estivesse
Acaz. Isaías 7.1 e seguintes reforça essa de condenada, os indivíduos eram ainda
claração. Seria este um exemplo de invenção parte do povo de Deus e podiam, apre-
de história pelo cronista? Julgou ele que sentando-se em Jerusalém, ser aceitos de
o ímpio Acaz fora merecedor de tal sorte volta à comunidade de Israel. O cronista
e inventou-lhe tal destino? A inclusão de ensinava a todo instante que nenhuma
nomes importantes da lista de baixas de tentativa da parte do Norte ou do Sul para
28.7 dá uma atmosfera de autenticidade prejudicar um ao outro podia ter êxito. Era
ao relato. Crônicas e Reis podem ser recon plano de Deus que todo o seu povo se
ciliados, porque o cronista não alegou que unisse no culto ritual em Jerusalém. O
Jerusalém fora capturada. Contudo, o histo Templo era a causa autêntica do destino
riador posterior descreve a confusão que de Israel.
recaiu sobre as forças de Acaz em Judá
antes do cerco de Jerusalém. O cronista Alguns dos chefes dos efraimitas. Estes
está, aparentemente, empregando o mi- nomes revelam que o cronista estava usan
drash levítico para o relato, o que explica do registros reais para o seu relato, con
o aparente exagero em termos de números. quanto evento original estivesse registrado
O segundo depois do rei. Esta expressão na forma de uma velha tradição.
não é utilizada em parte alguma do Antigo Pois já temos grande culpa — pelo
Testamento, exceto em Ester 10.3. Prova abandono do culto davídico e do rei.
velmente se aplica, aqui, a um membro do Alguns israelitas do Norte reconheciam
gabinete, possivelmente o que fazia os sua culpa, mas não tinham a coragem de
registros. apartar-se dela.
427
Vestiram (...) a todos os que dentre eles na cidade, em Jerusalém; pois não o puseram nos
estavam nus (...) e lhes deiam de corner e sepulcros dos reis de Israel. E Ezequias, seu filho,
de beber (...) levando (...) os que estavam reinou em seu lugar.
fracos (...) a seus irmãos. Esta passagem
pode ser comparada com Mateus 25.35-40: Parece agora que Acaz recorreu a
“Porque tive fome e me destes de comer Tilgate-Pilneser da Assíria não tanto por
(...) sede (...) forasteiro (...) nu (...) sempre causa da Síria e Efraim, mas devido ao
que o fizestes a um destes meus irmãos, perigo edomeu. De fato, ele estava cercado
mesmo dos mais pequeninos, a mim o por todos os lados. 2Reis 16.10 parece estar
fizestes.” dizendo que Acaz e o rei da Assíria es
Esta é uma das poucas vezes em que um tavam em termos amigáveis como aliados,
profeta teve êxito em seu apelo. Teria sido mas o cronista declara que “o pôs em aper
porque ele apelou ao amor, à consideração to, em vez de fortalecê-lo.” Provavelmente,
e ao parentesco, em vez de apresentar um houve um tratado temporário com Tilga
discurso de impacto? Teria sido por apelar te-Pilneser, ignorado tão logo se lhe tomou
à nobreza dos homens, em vez de recordar- vantajoso. Acaz foi mencionado em regis
-lhes sua hostilidade? Contudo, ele o fez tros assírios como um tributário junta
enquanto os lembrava de sua pecaminosi- mente com outras pessoas conquistadas.
dade. Sua pregação de amor não era sen Os problemas de Acaz, diz o cronista,
timentalismo superficial. deviam-se todos à sua negligência em
relação a Iavé, não às inexoráveis opera
ções das foiças políticas mundiais. Acaz
b. A Falta de Fé de Acaz (28.16-27) poderia ter escrito a história de seu tempo
16Naquele tempo o rei Acaz mandou pedir
diferentemente se houvesse sido fiel.
socorro ao r d da Assíria. 17Pois de novo os Este mesmo rd Acaz. Assim, ele é clas
edomeus, tendo invadido Judá, a derrotaram e sificado com Atalia, “aquela mulher
levaram prisioneiros. 18lkmbém os filisteus tinham ímpia” (24.7).
invadido as cidades da baixada e do sul de Judá,
e tinham tomado Bete-Semes, Aijalom, Gederote, Visto que os deuses dos reis da Síria os
Socó e suas aldeias, Timna e suas aldeias, e ajudam, portanto lhes sacrificarei. Alguns
Ginzo e suas aldeias, estabelecendo-se ali. 19Pois
o Senhor humilhou a Judá por causa do rei Acaz,
expositores têm dificuldade com esta de
porque este se houw desenfreadamente em Judá, claração, pois os deuses da Síria não
havendo desprezado ao Senhor. 20E veio a ele haviam ajudado a Síria contra a Assíria.
Tilgate-Pilneser, rei da Assíria, e o pôs em aperto, Este, contudo, é o ponto que o cronista
em vez de fortalecê-la 21Pois Acaz saqueou a casa destaca. Um homem que adorava ídolos não
do Senhor, e a casa do rei, e dos príncipes, e deu
os despojos por tributo ao rei da Assíria; porém podia ser tido como sensato. Ele já havia
isso não o ajudou. 22No tempo da sua angústia perdido o seu bom discernimento. Acaz
houve-se com ainda maior desprezo pelo Senhor, somente pensava em como a Síria o havia
este mesmo rei Acaz. 23Pois sacrificou aos deuses derrotado; ele não considerava a relação da
de Damasco, que o tinham derrotado, e disse: Síria para com a Assíria. Era um típico
Visto que os deuses dos reis da Síria os ajudam,
portanto lhes sacrificarei, para que me ajudem a idólatra insensato!
mim. Eles, porém, foram a ruína dele e de todo Fechou as portas da casa do Senhor.
o Israel. Ajuntou Acaz os utensílios da casa de
Deus, fê-los em pedaços, e fechou as portas da casa 2Reis 16.10 e seguintes, não parece dizer
do Senhor, e fez para si altares em todos os cantos isto. Antes, o culto regular parece que pros
de Jerusalém. 25Ikmbém em cada cidade de Judá seguia, enquanto Acaz tinha seu próprio
fez altos para queimar incenso a outros deuses, altar particular. Reis fala da cooperação do
assim provocando à ira o Senhor, Deus de seus pais.
“ Ora, o restante dos seus atos e de todos os seus
sacerdote principal com a apostasia de
caminhos, desde os primeiros até os últimos, eis Acaz. O cronista não dá ao sacerdote a
que está escrito no livro dos reis de Judá e de Israel. honra de perpetuar sua infame memória.
2’E Acaz dormiu com seus pais, e o sepultaram É possível que Acaz não requereu que a
428
adoração regular fosse suspensa, mas a semelhantes. Myers (II, 177) sugere que
presença de seu altar rival finalmente Deuteronômio foi completado em conexão
conduziu a uma falta geral de preocupação com a reforma de Ezequias e descartado
com a adoração por parte do povo. Há durante a defecção de Manassés, só sen
muitas maneiras de pôr fim a uma insti do redescoberto por Josias.
tuição religiosa. A menos eficaz é ordenar
que seja fechada. A maneira mais provável a. O Apelo de Ezequias (29.1-11)
de êxito é mediante a negligência.
Sepulcros dos reis de Israel. “Israel” é 'Ezequias começou a reinar quando tinha
vinte e cinco anos; e reinou vinte e nove anos em
empregado porque esses sepulcros original Jerusalém. E o nome de sua mãe era Abia, filha
mente não se destinavam aos reis de Judá. de Zacarias. 2Ele fez o que era reto aos olhos do
Davi e Salomão foram reis de Israel. Senhor, conforme tudo quanto fizera Davi, seu pai.
Assim, as sepulturas reais eram para os 3Pois ele, no ano primeiro do seu reinado, no
verdadeiros reis de Israel, filhos de Davi. primeiro mês, abriu as portas da casa do Senhor,
e as reparou. 4Fez vir os sacerdotes e os levitas e,
Acaz não foi sepultado ali, contudo. A ajuntando-os na praça oriental, 5disse-ihes: Ouvi-
declaração em 2Reis 16.20 de que ele -me, ó levitas; santificai-vos agora, e santificai a
“dormiu (...) com seus pais” não significa, casa do Senhor, Deus de nossos pais, e tirai do
necessariamente, que ele foi colocado no santo lugar a imundícia. ‘Porque nossos pais se
cemitério real. O cronista tinha a infor houveram traiçoeiramente, e fizeram o que era
mau aos olhos do Senhor nosso Deus; deixaram-
mação mais específica; 2Reis apenas fez -no e, desviando os seus rostos da habitação do
uma declaração genérica. Senhor, voltaram-lhe as costas. 7Tkmbém fecharam
as portas do alpendre, apagaram as lâmpadas, e não
4. Reavivamento com Ezequias queimaram incenso nem ofereceram holocaustes
no santo lugar ao Deus de Ira e l. 8Pelo que veio
(29.1—32.33) a ira do Senhor sobre Judá e Jerusalém, e ele os
Para o cronista, Ezequias (cujo nome entregou para serem motivo de espanto, de admi
ração e de escárnio, como vós o estais vendo com
ele grafa com Yeschizqiyyahu, e não como os vossos olhos. 9Porque eis que nossos pais
Chizqiyyahu de Reis, uma forma resu caíram a espada, nossos filhos, nossas filhas e
mida) foi um segundo Davi, tal como Davi nossas mulheres estão por isso em cativeira
fora um novo Moisés. Em contraste com 10Agora tenho no coração o propósito de fazer
os editores de Reis, que retratam a invasão um pacto com o Senhor, Deus de Israel, para que
se desvie de nós o ardor da sua ira. “ Filhos meus,
de Sanaqueribe com notáveis detalhes, o não sejais negligentes, pois o Senhor vos escolheu
cronista dedica somente uma porção de para estardes diante dele a fim de o servir, e para
um capítulo (32) a este evento e caracteris serdes seus ministros e queimardes incensa
ticamente se concentra nas reformas
cultuais de Ezequias.
Começou a reinar quando tinha vinte e
1) A Reforma de Ezequias (29.1-36) cinco anos; e reinou vinte e nove anos.
O mesmo é dito sobre Amazias (25.1).
Ezequias, provavelmente, assumiu o A referência ao reinado do primeiro rei
trono em 715 a.C e reinou até 687.20 Sa- pode ter sido confundida com a de Eze
mária já havia caído, e Judá passava por quias, pois parece ser um período de
grandes apertos. È bastante razoável, por reinado muito longo para ele.21
tanto, que Ezequias apelasse a um retorno
Ouvi-me, ó levitas. Esta é uma decla
à fé de seus pais como a única maneira de
ração bastante incomum. Ezequias dirige-
recuperação. Seu êxito, quanto a isso, cer
tamente inspirou Josias a procedimentos -se tanto aos sacerdotes quanto aos levitas
429
como “levitas”. Aqui podemos notar a termo “levita” uma nova dignidade,
dignidade que o cronista atribui ao título. aplicando-o a toda a tribo sacerdotal, ele
No verso 11, Ezequias refere-se a eles como ainda estava convencido de uma distinção
“filhos meus”. entre os sacerdotes que sacrificavam e os
Tirai (...) a imundícia. Esta palavra no que não sacrificavam. Em sua opinião, os
hebraico é freqüentemente empregada primeiros podiam entrar no interior do
com referência à menstruação (cf. Lv santuário. Para o cronista, a função levítica
15.24,25,33, “impureza”). Aqui ela, prova era a mesma do sacerdócio comum de seu
velmente, descreve a poluição do lugar tempo, mas havia adquirido respeitabili
sagrado, não uma mera coleta de lixo. Difi dade. É bem provável que o termo levitas
cilmente ter-lhes-ia requerido duas sema seja também empregado no versículo 12
nas para remover os detritos da área do tanto para sacerdotes quanto para levitas.
Templo. Eles também estavam purifican As três famílias de Levi são apresentadas,
do-se cerimonialmente, conforme atua inclusive os sacerdotes arônicos, entre os
vam. filhos de Coate e depois os cantores levitas.
Pelo que veio a ira do Senhor sobre A levaram para fora, ao ribeiro de
Judá. Isto se refere ao desastre da guerra Cedrom. Este era o regato ao oriente da
siro-efraimita e suas conseqüências, quan cidade, usado paia propósito semelhante
do a Assíria deve também ter acrescentado anteriormente (2Cr 15.16). É pouco
Judá a seus domínios (2Cr 28.20). provável que o lixo fosse abundante, pois,
do contrário, teria bloqueado o ribeira Esta
b. A Purificação do Templo (29.12-19) purificação deve ter sido primariamente
ritualística.
12Então se levantaram os levitas: Maate, filho
de Àmasai, e Joel, filho de Azarias, dos filhos dos
coatitas; e dos filhos de Merári: Quis, filho de Abdi, c. A Oferta Pelo Pecado (29.20-24)
e Azarias, filho de Jealelel; dos gersonitas: Joá,
filho de Zima, e Éden, filho de Joá; 13e dos filhos
“ Então o rei Ezequias se levantou de madru
de EHzafã: Sínri e Jeuel; dos filhos de Asafe: Zaca
rias e Matanias; 14e dos filhos de Hemã: Jeuel e gada, e ajuntou os príncipes da cidade e subiu à
casa do Senhor. 21E trouxeram sete novilhos, sete
Simei; dos filhos de Jedútun: Semaías e Uziel.
15Ajuntaram seus irmãos, santificaram-se e carneiros, sete cordeiros e sete bodes, como oferta
entraram conforme a ordem do rei, segundo as pala pelo pecado a favor do reino, e do santuário e de
vras do Senhoi; para purificarem a casa do Senhor. Judá; e o rei deu ordem aos sacerdotes, que os ofere
“Também os sacerdotes entraram na parte interior cessem sobre o altar do Senhor. 22Os sacerdotes,
pois, imolaram os novilhos, e tomando o sangue
da casa do Senhor para a limparem, e tiraram para
o espargiram sobre o altar; também imolaram os
fora, ao átrio da casa do Senhor, toda a imundícia
carneiros, e espargiram o sangue sobre o altar;
que acharam no templo do Senhor; e os levitas a
semelhantemente imolaram os cordeiros, e espar
tomaram e a levaram para fora, ao ribeiro de
giram o sangue sobre o altan “ Então trouxeram
Cedrom. 17Começaram a santificá-la no primeiro
os bodes, como ofeita pelo pecadq perante o rei
dia do primeiro mês, e ao oitavo dia do mês
e a congregação, que lhes impuseram as mãos, Me
chegaram ao alpendre do Senhor, e santificaram
os sacerdotes os imolaram, e com o seu sangue
a casa do Senhor em oito dias; no décimo sexto
fizeram uma oferta pelo pecado, sobre o altar, para
dia do primeiro mês acabaram. 18Então foram ter
com o rei Ezequias no palácio, e disseram: fazer expiação por todo o Israel. Porque o rei tinha
Acabamos de limpar toda a casa do Senhor, como ordenado que se fizesse aquele holocausto e aquela
também o altar do holocausto com todos os seus oferta pelo pecado por todo o Israel.
utensílios, e a mesa dos pães da proposição com
todos os seus utensílios. 19Todos os utensílios que Sete bodes, como oferta pelo pecada Os
o rei Acaz, no seu reinado^ lançou fora, na sua infi
delidade, já os preparamos e santificamos; e eis que
outros animais eram, provavelmente, para
estão diante do altar do Senhor. a oferta queimada. Contudo, podem
também ter sido para uma oferta pelo
Os sacerdotes entraramna parte interior. pecado, pois se costumava apresentar uma
Conquanto o cronista tenha atribuído ao oferta pelo pecado antecedendo a oferta
430
queimada, em tais ocasiões (cf. Lv 8.1 e ss.). daquilo que Deus tinha preparado a favor do povo;
O holocausto é mencionado novamente pois isto se fizera de improvisa
nesta seção, mas ele a discute mais plena
mente na seção seguinte, em sua própria O culto começou com a assembléia pros
ordem cronológica. trada perante Deus. Ao começar a oferta
A favor do reino, e do santuário e de do holocausto, o coro dos levitas elevou o
Judá. A oferta pelo pecado foi feita pela som de seus instrumentos e vozes em louvor,
rebelde casa real, o Templo poluído e seu o que prosseguiu durante todo o sacrifício.
pessoal, e o errante povo. Quando Ezequias e os sacerdotes solici
Para fazer expiação por todo o Israel. taram que cantassem mais, os levitas o
Ezequias já estava incluindo Israel do Norte fizeram alegremente. Então a assembléia
na área de sua preocupação. foi instada a responder com ofertas volun
tárias, e o fez em tal abundância que os
d. O Serviço do Culto (29.25.36) sacerdotes não estavam preparados para
processá-las. O culto se encerrou com jubi
loso louvor pela bondade de Deus.
25Tàmbém dispôs os levitas na casa do Senhor
com dmbalos, alaúdes e harpas, conforme a ordem Do Senhor, por meio de seus profetas.
de Davi, e de Gade, o vidente do rd, e do profeta Em nenhuma outra parte são Natã e Gade
Natã; porque esta ordem viera do Senhor, por inter
médio de seus profetas. 26E os levitas estavam em descritos como tendo a ver com música
pé com os instrumentos de Davi, e os sacerdotes cultual. Mas talvez o tivessem.
com as trombetas. 27E Ezequias ordenou que se
oferecesse o holocausto sobre o altar; e quando E quando começou o holocausto,
começou o holocausto, começou também o canto começou também o canto do Senhor. No
do Senhor, ao som das trombetas e dos instrumentos caso do holocausto, todo o sacrifício era
de Davi, rei de Israel. “ Então toda a congregação consumido. Nenhuma parte dele era guar
adorava, e os cantores cantavam, e os trombeteiros dada para os sacerdotes ou adoradores.
tocavam; tudo isso continuou até se acabar o holo
causto. 29Tendo eles acabado de fazer a oferta, o Tem-se notado que quando toda a vontade
rei e todos os que estavam com ele se prostraram um homem é deposta sobre o altar de Deus,
e adoraram. ^E o rei Ezequias e os príncipes orde o canto do Senhor sempre se eleva partindo
naram aos levitas que louvassem ao Senhor com de seu coração.
as palavras de Davi, e de Asafe, o vidente; E eles
cantaram louvores com alegria, e se inclinaram e As palavras de Davi e de Asafe, o viden
adoraram. 31Então Ezequias disse: Agora que vos te. Isto indica que já havia uma coletânea
consagrastes ao Senhor, chegai-vos e trazei sacri
fícios e ofertas em ação de graças à casa do Senhor.
de salmos de Davi e de Asafe no tempo do
E a congregação trouxe sacrifícios e ofertas em cronista e talvez até mesmo no tempo de
ação de graças, e todos os que estavam dispostos Ezequias.
de coração trouxeram holocaustos. 32E o número
dos holocaustos que a congregação trouxe foi de Não podiam esfolar todos os holo
setenta novilhos, cem carneiros e duzentos caustos. Em Levítico 1.6 é-nos dito que os
cordeiros, tudo isso em holocausto para o Senhor. leigos esfolavam seus próprios sacrifícios.
33Houve também, de coisas consagradas, seis Provavelmente, no tempo do cronista, se
centos bois e três mO ovelhas. ^Eram, porém, mui
poucos os sacerdotes, de modo que não podiam não na própria época de Ezequias, o clero
esfolar todos os holocaustos; pelo que seus irmãos, profissional havia assumido o papel original
os levitas, os ajudaram, até se acabar a obra, e até do leigo.
que os outros sacerdotes se santificassem, pois os
levitas foram mais retos de coração, para se santi Os levitas foram mais retos de coração,
ficarem, do que os sacerdotes. E houve também para se santificarem, do que os sacerdotes.
holocaustos em abundância, juntamente com a Isto pode revelar prejulgamento da parte
gordura das ofertas pacíficas, e com as ofertas de
libação para cada holocausto. Assim se restabeleceu do cronista, mas é bem provável que os
o ministério da casa do Senhon 36E Ezequias sacerdotes se identificassem mais intima
regozijou-se, e com ele todo o povo, por causa mente com a corte de Acaz, e, portanto,
431
eram mais relutantes em cooperar com parte. Isto finalmente levaria a seu retorno
Ezequias. àquela região para acalmar a situação.
No segundo mês. O tempo regular para
2) Páscoa Rara Todo o Israel (30.1-27) a Páscoa era o primeiro mês. A lei sugeria
que, se isso não fosse possível, o segundo
a. A Proclamação (30.1-12) mês poderia ser utilizado (Nm 9.11).
‘Depois disso Ezequias enviou mensageiros Foram, pois, os correios (...) por todo
por todo o Israel e Judá, e escreveu cartas a Efraim o Israel e Judá. Esta palavra (lit., corredores)
e a Manasses, para que viessem à casa do Senhor é também utilizada com respeito aos
em Jerusalém, a fim de celebrarem a páscoa ao guardas do rei (2Rs 11.4). Eles iriam ou fica
Senhor Deus de Israel. 2Pois o rei tivera conselho
com os príncipes e com toda a congregação em riam, conforme fosse a ordem do rei.
Jerusalém, para celebrarem a páscoa no segundo Todavia alguns. Um pequeno remanes
mês. 3Pois não a puderam celebrar no tempo cente do Israel do Norte respondeu, exceto
próprio, porque não se tinham santificado sacer
dotes em número suficiente^ e porque o povo não o fato de que, aparentemente, não havia
se tinha ajuntado on Jerusalém. 4Isto pareceu ninguém de Efraim. Quanto mais próximo
bem aos olhos do rei e de toda a congregação. SE de Judá, mais hostilidade se manifestava.
decretaram que se fizessem proclamação por todo
o Israel, desde Berseba até Dã, para que viessem
celebrar a páscoa ao Senhor, Deus de Israel, em b. A Observância (30.13-27)
Jerusalém; porque muitos não a tinham celebrado
como está escrita 6Foram, pois, os correios com
as cartas, do rei e dos seus príncipes, por todo o 13E ajuntou-se em Jerusalém muito povo para
Israel e Judá, segundo a ordem do rei, dizendo: celebrar a festa dos pães ázimos no segundo mês,
Filhos de Israel, voltai para o Senhor, Deus de uma congregação mui grandÈ. 14E, levantando-se,
A braãa de Isaque e de Israel, para que ele se volte tiraram os altares que havia em Jerusalém; também
para o restante de vós que escapastes da mão dos tiraram todos os altares de incensa e os lançaram
reis da Assíria. 7Não sejais como vossos pais e no ribeiro de Cedrom. 15Então imolaram a páscoa
vossos irmãos, que foram infiéis para com o Senhor, no décimo quarto dia do segundo mês; e os sacer
Deus de seus pais, de modo que os entregou à deso dotes e levitas, envergonhados, santificaram-se e
lação, como vedes. 8Não endureçais agora a vossa trouxeram holocaustos â casa do Senhor.
cerviz, como fizeram vossos pais; mas submetei- 16Tbmaram os seus lugares segundo a sua ordem,
-vos ao Senhoç e entrai no soi santuário que ele conforme a lei de Moisés, homem de Deus; e
santificou para sempre, e servi ao Senhor vosso os sacerdotes espargiam o sangue, que recebiam
Deus, para que o ardor da sua ira se desvie de vós. da mão dos levitas. nPois havia muitos na congre
’Pois, se voltardes para o Senhor, vossos irmãos gação que não se tinham santificado; pelo que os
e vossos filhos acharão misericórdia diante dos que levitas tiveram que imolar os cordeiros da páscoa
os levaram cativos, e tornarão para esta terra; por todo aquele que não estava limpa para o santi
porque o Senhor vosso Deus é clemente e compas ficarem ao Senhor. >8Porque uma multidão do
sivo, e não desviará de vós o seu rosto, se voltardes povo, muitos de Efraim e Manassés, Issacar e
para ele. 10Os correios, pois, foram passando de Zebulom, não se tinham purificado, contudo
cidade em cidade, pela terra de Efraim e Manassés, comeram a páscoa, ainda que não segundo o que
até Zebulom; porém riam-se e zombavam deles. está escrito; pus Ezequias tinha orado por eles,
nTodavia alguns de Aser, e de Manassés, e de dizendo: O Senhor, que é bom, perdoe todo aquele
Zebulom, se humilharam e vieram a Jerusalém. 19que dispõe o seu coração para buscar a Deus,
12E a mão de Deus esteve com Judá, dando-lhes o Senhor, o Deus de seus pais, ainda que não esteja
um só coração para cumprirem a ordem do rei e purificado segundo a purificação do santuária “ E
dos príncipes conforme a palavra do Senhor. o Senhor ouviu Ezequias, e sarou o pova Z1E os
filhos de Israel que se acharam em Jerusalém cele
braram a festa dos pães ázimos por sete dias com
A notícia dessa tentativa de reunir todo grande alegria; e os lentas e os sacerdotes louvaram
o Israel não seria recebida com favor pela ao Senhor de dia em dia com instrumentos forte
Assíria. Contudo, Sargão èstava envolvido mente retinintes, cantando ao Senhor. 22E
Ezequias falou benignamente a todos os levitas que
em atividades em casa. Uma revolta geral tinham bom entendimento no serviço do Senhor.
estava fermentando na Palestina, de que Assim comeram as ofertas da festa por sete dias,
a manobra de Ezequias era somente uma sacrificando ofertas pacíficas, e dando graças ao
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Senhor, Deus de seus pais. 23E tendo toda a E a sua voz foi ouvida. Isto implica que
congregação resolvido celebrar outros sete dias, tal aceitação nem sempre era verdadeira.
celebraram por mais sete dias com alegria. ^Pois
Ezequias, rei de Judá, apresentou à congregação
A bênção do clero não era garantida por
para os sacrifidos mil novilhos e sete mil ovelhas; Deus.
e os príncipes apresentaram à congregação mil novi Santa habitação de Deus, até o céu. Pa
lhos e dez mil ovelhas; e os sacerdotes se
santificaram em grande númera 2SE regozijaram-
ra o cronista, pòr santo que fosse o Tem
-se toda a congregação de Judá, juntamente com plo, não era o verdadeiro palácio de Deus,
os sacerdotes e levitas, e toda a congregação dos e, sim, representava o seu nome na terra,
que vieram de Israel, como também os estrangeiros tal como se dá com a embaixada de um
que vieram da terra de Israel e os que habitavam
em Judá. “ Assim houve grande alegria em Jeru
rei em terra estrangeira.
salém, pois desde os dias de Salomão, filho de Davi,
rei de Israel, não tinha havido coisa semelhante 3) Lugares Altos Destruídos (31.1)
em Jerusalém. 27Então os levitas sacerdotes se
levantaram e abençoaram o povo; e a sua voz foi ‘Acabado tudo isso, todos os israelitas que ali
ouvida, porque a sua oração chegou até a santa estavam saíram às ddades de Judá e despedaça
habitação de Deus, até o céu. ram as colunas, cortaram os aserins, e derruba
ram os altos e altares por toda a Judá e Benja
mim, como também em Efraim e Manassés, até
Também observada juntamente com a os destruírem de toda Depois voltaram todos os
Páscoa foi a Festa dos Pães Ázimos (heb., filhos de Israel para as suas cidades, cada um
Mazzoth), que se seguiu imediatamente. para sua possessãa
O povo teve um tempo tão favorável que
resolveu acrescentar uma semana extra.
Finalmente se havia erguido um rei que
Os sacerdotes e levitas, envergonhados.
levaria Israel a fazer o que nenhum outro
Os leigos foram mais responsivos á Páscoa
havia feito antes. No zelo de seu espírito,
do que os sacerdotes ou os levitas. O clero
profissional, ocupado com a perpetuação a assembléia saiu de seu jejum, para em
da instituição, havia-se tornado insensível preender uma guerra santa contra a idola
tria por todo o Judá e Israel do Norte. Os
à sua razão de existir.
símbolos da idolatria foram quebrados por
Os levitas tiveram que imolar os toda a terra, segundo a medida dos limita
cordeiros da páscoa. Era responsabilidade dos recursos de Ezequias. Ele tinha des
dos leigos matar esse cordeiro, não dos sacer vantagens particularmente grandes no Is
dotes (Ex 12.6)). Aparentemente, o povo foi rael do Norte, pois os que haviam vindo
considerado impuro, devido à sua apostasia, daquelas regiões eram poucos (30.11).
e, portanto, indigno de matar o cordeiro.
Comeram a páscoa, ainda que não 4) Provisões Para o Clero (31.2-21)
segundo o que está escrita Esta é uma
passagem digna de nota. Aqui vemos que
2E Ezequias estabeleceu as turmas dos sacer
o cronista não era um legalista, a despeito dotes e levitas, turma por turma, cada um segundo
de seus interesses cultuais. o seu serviço, tanto os sacerdotes como os levitas,
O Senhor, que é bom. Somente aqui é para os holocaustos e as ofertas pacíficas, para
ministrarem, renderem ações de graças e cantarem
esta expressão encontrada no Antigo Tes louvores nas portas do arraial do Senhor. 3A
tamento. Tem-se agora tomado proverbial. contribuição da fazenda do rd foi designada para
E o Senhor ouviu Ezequias. Aqui o os holocaustos; os holocaustos da manhã e os da
tarde, e os holocaustos dos sábados, das luas novas
cronista acentua sua confiança na eficácia e das festas fixas, como está escrito na lei do Se
da oração (cf. Tg 5.16). nhor. 4Além disso ordenou ao povo que morava
em Jerusalém que desse a porção pertencente aos
E Ezequias falou benignamente a todos sacerdotes e aos levitas para que des se dedicas
os levitas. O cronista sabia quanto isto os sem à lei do Senhor. 5Logo que esta ordem se di
ajudou, se ele próprio era um deles. vulgou, os filhos de Israel trouxeram em abundân-
433
/
434
ISm 1.21-28). Conquanto leis para o tra pôde livrar o seu povo da minha mão, para que o
balho infantil se tenham tornado necessá vosso Deus vos possa livrar da minha mão? ^Ago
ra, pois, não vos engane Ezequias, nem vos incite
rias, provavelmente subestimemos a con assim, nem lhe deis crédita Porque nenhum deus
tribuição que as crianças podem dar à so de nação alguma, nem de reino algum, pôde livrar
ciedade à sua própria maneira. o seu povo da minha mão, nem da mão de meus
pais; quanto menos o vosso Deus vos poderá li
Em toda a obra (...) para buscar a seu vrar da minha mão? I6E os servos de Senaqueribe
Deus. Ezequias buscou a Deus no que falaram ainda mais contra o Senhor Deus, e con
estava fazendo. Ele esperava encontrar tra o seu servo Ezequias. 17Ele também escreveu
Deus ao trabalhar em seu nome (cf. Mt cartas para blasfemar do Senhor Deus de Israel,
25.40). dizendo contra ele: Assim como os deuses das
nações das terras não livraram o seu povo da mi
nha mão, assim também o Deus de Ezequias não
5) A Invasão de Senaqueribe (32.1-23) livrará o seu povo da minha mão. 18E clamaram
'Depois destas coisas e destes atos de fideli em alta voz, na língua dos judeus, ao povo de Je
dade, veio Senaqueribe, rei da Assíria, e, entrando rusalém que estava em cima do muro, para os ate
em Judá, acampou-se contra as cidades fortes, a morizarem e os perturbarem, a fim de tomarem
fim de apoderar-se delas. 2Quando Ezequias viu a cidade 19E falaram do Deus de Jerusalém como
que Senaqueribe tinha vindo com o propósito de dos deuses dos povos da terra, que são obras das
guerrear contra Jerusalém, 3teve conselho com os mãos dos homens. 2°Mas o rei Ezequias e o pro
seus príncipes e os seus poderosos, para que se feta Isaías, filho de Amoz, oraram por causa dis
tapassem as fontes das águas que havia fora da so, e clamaram ao céu. 21Então o Senhor enviou
cidade; e eles o ajudaram. 4Assim muito povo se um anjo que destruiu no arraial do rei da Assíria
ajuntou e tapou todas as fontes, como também o todos os guerreiros valentes, e os príncipes, e os
ribeiro que corria pelo meio da terra, dizendo: Por chefes. Ele, pois, envergonhado voltou para a sua
que viriam os reis da Assíria, e achariam tantas terra; e quando entrou na casa de seus deus, al
águas? 5Ezequias, cobrando ânimos edificou todo guns dos seus próprios filhos o mataram ali a
o muro que estava demolido^ levantando torres so espada. 22Assim o Senhor salvou Ezequias, e os
bre ele, fez outro muro por fora, fortificou a moradores de Jerusalém, da mão de Senaqueribe,
Milo na cidade de Davi, e fez armas e escudos em rei da Assíria, e da mão de todos; e lhes deu des
abundância. 6Então pôs oficiais de guerra sobre canso de todos os lados. 23E muitos trouxeram
o povo e, congregando-os na praça junto à porta presentes a Jerusalém ao Senhoi; e coisas pre
da cidade, falou-lhes ao coraçãoi, dizendo: 7Sede ciosas a Ezequias, rei de Judá, de modo que des
corajosos, e tende bom ânimo; não temais, nem vos de então foi exaltado perante os olhos de todas
espanteis, por causa do rei da Assíria, nem por as nações.
causa de toda a multidão que está com ele, pois
há conosco um maior do que o que está com ele.
8Com ele está um braço de carne, mas conosco o O cronista está seguindo o relato regis
Senhor nosso Deus, para nos ajudar e para guer trado em 2Reis 18.13—19.37; mas faz adi
rear por nós. E o povo descansou nas palavras de
Ezequias, rei de Judá. ’Depois disso Senaqueribe, ções e reinterpretações em alguns lugares.
rei da Assíria, enquanto estava diante de Laquis, No geral, ele presta bem menos atenção a
com todas as suas forças, enviou os seus servos este episódio do que o livro dos Reis. De
a Jerusalém a Ezequias, rei de Judá, e a todo o fato, parece apresentar problemas reais pa
Judá que estava em Jerusalém, dizendo:10Assim ra a sua teologia. Quando Ezequias era fiel
diz Senaqueribe, rei da Assíria: Em que confiais
vós, para vos deixardes sitiar em Jerusalém? a Deus, prosperava (31.20-21). Então, por
‘‘Porventura não vos engana Ezequias, para vos que Senaqueribe teve permissão de vir
fazer morrer à fome e à sede, quando diz: O Se contra ele?
nhor nosso Deus nos livrará das mãos do rei da
Assíria? 12Esse mesmo Ezequias não lhe tirou os
Depois destas coisas e destes atos de fi
altos e os altares, e não ordenou a Judá e a Jeru delidade, veio Senaqueribe (...) contra as
salém, dizendo: Diante de um só altar adorareis, e cidades. Aqui o cronista honestamente
sobre ele queimareis incenso? 13Não sabeis vós o coloca sua perturbada fé em palavras. Tal
que eu e meus pais temos feito a todos os povos vez isso fosse um teste de fé de Ezequias.
de outras terras? Puderam de qualquer maneira
os deuses das nações daquelas terras livrar a sua
Ele reagiu nobremente ante a situação crí
terra da minha mão? 14Qual é, de todos os deuses tica. Somente o cronista menciona a ten
daquelas nações que meus pais destruíram, o que tativa de Ezequias de impedir os assírios
435
por meio de tapar as fontes das águas per ficou para si ddades, e teve rebanhos e manadas
to da cidade. Ele nada diz da vacilação de em abundância; pois Deus lhe tinha dado muitís
sima fazenda. ^Tkmbém foi Ezequias quem tapou
Ezequias registrada em 2Reis. o manancial superior das águas de Giom, fazendo-
Conosco [está] o Senhor nosso Deus. -as correr em Unha reta pelo lado ocidental da ci
Isto traz à memória Isaías 7.14. O hebrai dade de Davi. Ezequias, pois, prosperou em todas
as suas o bras.31Contudo, no negócio dos embai
co reza Immanu (conosco) — Yahweh (o xadores dos príncipes de Babilônia, que lhe foram
Senhor) — Elohenu (nosso Deus). As pri enviados a perguntarem acerca do prodígio que
meiras e últimas palavras são uma forma fora feito na sua terra, Deus o desamparou para
alongada de “Emanuel”. Iavé foi inserido experimentá-la e para saber tudo o que havia no
entre as duas partes componentes do no seu coraçãa Ora, o restante dos atos de Eze
quias, e as suas boas obras, eis que estão escritos
me. Isto pode significar, possivelmente, na visão do profeta Isaías, filho de Amoz, no livro
que uma geração posterior associou as dos reis de Judá e de Israel. 33E Ezequias dormiu
profecias de Emanuel com Ezequias. com seus pais, e o sepultaram no mais alto dos
Os versos 9-18 seguem Reis, exceto que sepulcros dos filhos de Davi; e todo o Judá e os
habitantes de Jerusalém lhe renderam honras na
o cronista omite a alusão ofensiva de sua morte. E Manassés, seu filha reinou em seu
Rabsaqué quanto ao povo comer seu pró lugar.
prio excremento e beber sua própria urina
(2Rs 18.27) e sua ridicularização do exér
cito de Ezequias. Assim como os grandes reis antes dele,
E falaram do Deus de Jerusalém como Ezequias, que havia sido fiel a Deus em
dos deuses dos povos da terra. O cronista sua mocidade, cedeu lugar ao orgulho
estava surpreso diante de tão blasfemas quando se tornou idoso. As tentações pecu
referências ao único Deus de todos os liares aos anos avançados eram mais
homens. enganosas do que as da juventude. O
E lhes deu descansa Assim Ezequias cronista parece pressupor que seus leitores
passou no teste de sua fé e recebeu a sua conheciam os detalhes da visita da embai
recompensa (cf. SI 23.2, onde a mesma xada de Merodaque-Baladã (2Rs 20.12 e
palavra ocorre). É digno de nota que o ss.), mas sugere que o comportamento de
cronista não registra o total de 185 mil Ezequias por esse tempo evidenciava o
mortos entre os soldados de Senaqueribe orgulho de seu coração. Conquanto Reis
(2Rs 19.35). Possivelmente, não constava diga que esses embaixadores vieram para
em seu texta Ou talvez ele estivesse sen inquirir sobre a saúde de Ezequias, o
do conservador. cronista dá a entender que eles estavam
curiosos quanto ao milagre do relógio de
sol de Acaz. Ambos os fatores estavam logi
6) Sumário de Seu Reinado (32.24-33) camente envolvidos, mas também um
24Naqueles dias Ezequias, adoecendo, estava à terceiro. O rei de Babilônia estava empre
morte; e orou ao Senhor, o qual lhe respondeu, e gando a ocasião para encorajar a rebelião
lhe deu um sinal. z5M as Ezequias não corres contra a Assíria.
pondeu ao benefício que lhe fora feito, pois o seu
coração se exaltou; pelo que veio grande ira sobre Deus o desamparou. Em Gênesis 22.1
ele, e sobre Judá e Jerusalém. “ Todavia Ezequias e seguintes e Jó 1 e 2 temos exemplos de
humilhou-se pela soberba do seu coração, ele e os homens que passaram pelo teste de Deus
habitantes de Jerusalém; de modo que a grande por sua própria força de caráter. É ensino
ira do Senhor não veio sobre eles nos dias de
Ezequias. Z7E teve Ezequias riquezas e honra em do Novo Testamento que, com a presença
grande abundância; proveu-se de tesourarias para de Deus no coração, os crentes não têm que
prata, ouro, pedras preciosas, especiarias, escudos, enfrentar tais testes sozinhos (ICo 10.13).
e toda espécie de objetos desejáveis; “ também de
celeiros para o aumento de trigo, de vinho e de Na visão do profeta Isaías (...) no livro
azeite; e de estrebarias para toda casta de animais, dos reis. Estas parecem ser profecias atri
e de currais para os rebanhos. 2,Além disso edi buídas a Isaías e desconhecidas por nós.
436
É de se lamentar que tais passagens tenham rios e de encantamentos, e dava-se a artes mágicas,
se perdido para a posteridade. e instituiu adivinhos e feiticeiros; sim, fez muito
mal aos olhos do Senhor, para o provocar à ira.
’Também a imagem esculpida do ídolo que tinha
feito, ele a colocou na casa de Deus, da qual Deus
VII. Os Anos Finais (33.1—36.21) tinha dito a Davi e a Salomão, seu filho: Nesta casa,
e em Jerusalém, qué escolhi de todas as tribos de
Israel, porei o meu nome para sempre; 8e nunca
1. A Ruína de Manasses (33.1-25) mais removerei o pé de Israel da terra que destinei
a vossos pais; contanto que tenham cuidado de fazer
Manasses viu-se envolvido em problemas tudo o que eu Dies ordenei, toda a lei, os estatutos
semelhantes aos que confrontaram Acaz, e as ordenanças dados por intermédio de Moisés.
’Manassés tanto fez errar a Judá e aos moradores
e reagiu de modo semelhante. A Assíria de Jerusalém, que eles fizeram o mal ainda mais
dominava o cenário mundial, e Manasses do que as nações que o Senhor tinha destruído de
entendeu que precisava cooperar. Essa diante dos filhos de Israel.
decisão envolvia concessões tanto religiosas
quanto políticas. Evidentemente, ele era O cronista, aqui, permanece fiel ao texto
uma vítima complacente e encontrou segui que concorda com 2Reis 21.1-10. As únicas
dores simpatizantes em sua nação. variações significativas são a ausência da
Aparentemente, a política iconoclástica de comparação com Acabe (o historiador não
Ezequias não foi muito popular em algumas se preocupa em mencioná-lo novamente)
partes, pois o culto nos lugares altos desfru e a falta de uma indicação sobre a mãe de
tava longa tradição. Ademais, as inovações Manassés. Até aqui o cronista deixou de
cultuais em Jerusalém atraíram os mencionar a rainha-mãe somente nos casos
elementos de avant-garde na capital. de Jorão e Acaz, aos quais ele atribuía
Muitos, no partido profético, davam pouco péssima reputação. Após Manassés ele
valor a isso, oontudo. Estavam convencidos deixa de mencionar a mãe de quaisquer
de que a lealdade irrestrita a Deus teste outros reis, até mesmo omitindo a mãe de
munhada pelas velhas tradições de Israel Josias. Evidentemente, ele não julgava um
garantiria o favor divino. Manassés não elogio ter mencionado as mães desses
concedeu qualquer oportunidade para esta últimos reis de Judá, conquanto seja
opinião ser demonstrada, e assim a sabe estranho que a mãe de Josias não seja
doria prática nela contida permaneceu lembrada. Talvez estivesse descontente com
como questão discutível. Certamente as a rejeição da profecia por parte desse rei
reformas de Josias não asseguravam esta (35.22) ou viu que a reforma de Josias era
bilidade, mas o grupo profético insistiu em mais política do que religiosa.
que naquele tempo era demasiado tarde.
2) Seu Arrependimento (33.10-17)
1) Sua Má Influência (33.1-9)
10Falou o Senhor a Manassés e ao seu povo,
‘Unha Manassés doze anos de idade quando porém não deram ouvidos. nPelo que o Senhor
começou a reinar, e reinou cinqüenta e cinco anos trouxe sobre eles os comandantes do exército do
em Jerusalém. *E fez o que era mau aos olhos do rei da Assíria, os quais prenderam Manassés com
Senhor, conforme as abominações dos povos que ganchos e, amarrando-o com cadeias de bronze,
o Senhor lançara fora de diante dos filhos de Israel. o levaram para Babilônia. 12E estando ele angus
3Pois tornou a edificar os altos que Ezequias, seu tiado, suplicou ao Senhor seu Deus, e humilhou-se
pai, tinha derribado; e levantou altares aos baalíns, muito perante o Deus de seu pais; 13sim, orou a
e fez aserotes, e adorou a todo o exército do céu, ele; e Deus se aplacou para com ele, e ouviu-lhe
e o serviu. 4Tàmbém edificou altares na casa do a súplica, e tornou a trazê-lo a Jerusalém, ao seu
Senhor, da qual o Senhor tinha ditoe Em Jerusalém reina Então conheceu Manassés que o Senhor era
estará o meu nome eternamente. 5Edificou altares Deus. 14Ora, depois disso edificou um muro do
a todo o exército do céu, nos dois átrios da casa lado de fora da ddade de Davi, ao oddente de Giom,
do Senhor. 6Além disso queimou seus filhos como no vale, até a entrada da porta dos peixes; e fê-lo
sacrifido no vate do filho de Hinom; e usou de augú passar ao redor de Ofel, e o levantou muito alto;
437
também pôs oficiais do exército em todas as cidades contra o rei Amom, e fez reinar em lugar dele seu
fortificadas de Judá. 15Tirou da casa do Senhor filho Josias.
os deuses estranhos e o ídolo, como também todos
os altares que tinha edificado no monte da casa
do Senhor, e em Jerusalém, e os lançou fora da Tenha Manassés se arrependido ou não,
cidade. 16Também reparou o altar do Senhor, e o mal que fez peidurou após ele. Seu filho
ofereceu sobre ele sacrifícios de ofertas pacíficas Amom seguiu seu padrão de apostasia e
e de ações de graças; e ordenou a Judá que servisse o perpetuou. Isso provocou seu assassinato
ao Senhor Deus de Israel. 17Contudo o povo ainda
sacrificava nos altos, mas somente ao Senhor seu e a execução de seus assassinos, numa
Deus. manobra de último instante para salvar a
honra da coroa.
Tem-se suscitado dúvidas quanto à Sua oração ao seu Deus. A menção dessa
autenticidade desta passagem. É bem literatura levou à criação posterior do
provável que Manassés foi levado perante apócrifo Oração de Manassés, que tentava
o rei da Assíria, o que somente o cronista recriar sua disposição de espírito naquela
menciona, mas que ele se haja reformado ocasião.
depois é muito dúbio. O livro dos Reis Escritos nas crônicas dos videntes (lit.,
silencia sobre isso, e Jeremias apresenta “nas crônicas de Hozai”). Este poderia ser
condenação sem igual por causa das conse um nome próprio, mas nada sabemos sobre
qüências de seu reinado (Jr 15.4). Alguns esse tal profeta. É dessa fonte que o cronista
especialistas sugerem que o cronista obteve seu material sobre o arrependimento
inventou a história por estar convencido de Manassés. Tal referência milita contra
de que nenhum rei poderia ter reinado tão a idéia de sua livre criação do relato. A natu
longamente quanto o ímpio Manassés, a reza literária dessa fonte, porém, não é
menos que se arrependesse em sua vida conhecida.
posterior. Contudo, ainda é possível que ele
se tenha reformado pessoalmente, mas foi 2. A Reforma de Josias (34.1—35.27)
incapaz de mudar a maré que havia
iniciado. O cronista prende-se à história como
narrada em 2Reis 22.1—23-30, pois o li
vro de Reis, nessas passagens, apresentou o
3) Conseqüências de Seu Reinado (33.18-25) tipo de material cultual que o cronista
uO restante dos atos de Manassés, e a sua gostava de preservar. Suas principais adições
oração ao seu Deus, e as palavras dos videntes que são um relato da reforma antes que o livro
lhe falaram em o nome do Senhor, Deus de Israel, da lei fosse descoberto (enquanto Reis
eis que estão nas crônicas dos reis de Israel. destaca os resultados da descoberta), uma
19lkmbém a sua oração, e como Deus se aplacou ênfase característica sobre o trabalho dos
para com ele, e todo o seu pecado, e a sua trans
gressão, e os lugares onde edificou altos e pôs os sacerdotes e levitas nas atividades e uma
aserins e as imagens esculpidas antes de se ter humi- discussão mais detalhada da morte de
Ihado, eis que estão escritas nas crônicas dos Josias.
videntes. 20E dormiu Manassés com seus pais, e
o sepultaram em sua casa; e Amom, seu filho, reinou 1) Destruição da Idolatria (34.1-7)
em seu lugar. aTinha Amom vinte e dois anos
quando começou a reinar, e reinou dois anos em ‘Tinha Josias oito anos de idade quando
Jerusalém. 22Fez o que era mau aos olhos do começou a reinar, e reinou trinta e um anos em
Senhor, como havia feito Manassés, seu pai. Amom Jerusalém. 2Fez o que era reto aos olhos do
sacrificou a todas as imagens esculpidas que Senhor, e andou nos caminhos de Davi, seu pai,
Manassés, seu pai, tinha feito, e as serviu. “ Mas sem se desviar deles nem para a direita nem para a
não se humilhou perante o Senhor, como Manassés, esquerda. 3Pois no oitavo ano de seu reinado,
seu pai, se humilhara; pelo contrário multiplicou sendo ainda moço, começou a buscar o Deus de
Amom os seus delitos. conspiraram contra ele Davi, seu pai, e no duodécimo ano começou a puri
os seus servos, e o mataram em sua casa. “ M as ficar Judá e Jerusalém, dos altos, dos aserins e
o povo da terra matou todos os que conspiraram das imagens esculpidas e de fundição. 4Foram
438
derribados na presença dele os altares dos baalins; nas mãos dos oficiais que eram superintendentes
e ele derribou os altares de incenso que estavam da casa do Senhor; estes o deram aos que faziam
acima deles; os aserins e as imagens esculpidas e a obra e que trabalhavam na casa do Senhor, para
de fundição ele os quebrou e reduziu a pó, que consertarem e repararem a caia. nDeram-no aos
aspergiu sobre as sepulturas dos que lhes tinham carpinteiros e aos edificadores, a fim de comprarem
sacrificada 5E os ossos dos sacerdotes queimou pedras lavradas, e madeiras para junturas e para
sobre os seus altares; e purificou Judá e Jerusalém. servirem de vigas para as casas que os reis de Judá
6E nas cidades de M anassés, de Efraim, de tinham destruída 12E os homens trabalhavam fiel
Simeão e ainda até Naftali, em seus lugares asso mente na obra; e os superintendentes sobre eles
lados ao redor, 7derribou os altares, reduziu a pó eram Jaate e Obadias, levitas, dos filhos de Merári,
os aserins e as imagens esculpidas, e cortou como também Zacarias e Mesulão, dos filhos dos
todos os altares de incenso por toda aterra de Israel. coatitas, para adiantarem a obra; e todos os levitas
Então voltou para Jerusalém. que eram entendidos em instrumentos de música
“ estavam sobre os carregadores e dirigiam todos
Esta passagem é seriamente questionada os que trabalhavam em qualquer sorte de serviço;
também dentre os levitas eram os escrivães, os
por muitos intérpretes, pois não encontra oficiais e os porteiros.
paralelo em parte alguma. Pode estar
seguindo automaticamente um padrão A contribuição distinta do cronista,
registrado no relato dos reinados de Asa nesta seção, é sua menção de que foram
(15.8-15) e Ezequias (cap. 29). Contudo, seria os levitas que coletaram o dinheiro para a
natural que houvesse influências anteriores renovação; e, embora fossem primeiramente
sobre Josias para reverter as políticas de músicos, dirigiram todos os detalhes do
Manassés e Amom, e é fato conhecido que trabalho de reparação. Quando Herodes
o controle dos assírios sobre a Palestina reconstruiu o Templo, esta idéia de atribuir
estava declinando. Tànto Myers quanto tudo que se relacionava com a edificação
Elmslie estão convencidos da autenticidade ao clero foi levado mais a sério ainda. Os
desse movimento anterior. Após a desco sacerdotes eram treinados para fazerem o
berta do livro da lei, a reforma tornou-se trabalho de carpintaria e alvenaria (cf.
mais completa. É bastante razoável que Josefo, Antiq. XV. 11,2)
alguns anos se passassem desde o tempo 3) A Descoberta da Lei 34.14-33)
em que a reforma se iniciou e uma “páscoa
14Ora, quando estavam tirando o dinheiro que
de unificação” pudesse ser observada, pois se tinha trazido à casa do Senhor, Hilquias, o sacer
deve ter havido oposição à destruição global dote, achou o livro da lei do Senhor dada por
dos locais de culto honrados pela tradição. intermédio de Moisés. 15Disse Hilquias a Safã, o
Assim, parece claro no trabalho do escrivão: Achei o livro da lei na casa do Senhor.
cronista que a desooberta do livro de Deute- E entregou o livro a Safã. 16Safã levou o livro ao
rei, e deu conta também ao rei, dizendo: Teus servos
ronômio não inspirou a reforma, antes, ele estão fazendo tudo quanto se lhes encomendou.
foi descoberto durante a reforma. Os ideais 17Tomaram o dinheiro que se achou na casa do
da lei já estavam presentes em Israel e foram Senhor, e o entregaram nas mãos dos superinten
confirmados por essa descoberta. dentes e nas mãos dos que fazem a obra. 18Safã,
o escrivão, falou ainda ao rei, dizendo: O sacerdote
Hilquias entregou-me um Kvra E Safã leu nele
2) Restauração do Templo (34.8-13) perante o rei. 19Quando o rei ouviu as palavras da
lei, rasgou as suas vestes. 20E o rei ordenou a
8No décimo oitaw ano do seu reinado, havendo Hilquias, a Alcão, filho de Safã, a Abdom, filho
já purificado a terra e a casa, ele enviou Safã, filho de Mica, a Saía, o escrivão, e a Asaías, servo do
de Azalias Maaséias, o governador da cidade, rei, dizendo: 21Ide, consultai ao Senhor por mim
e Joá, filho de Joacaz, o cronista, para repararem e pelos que restam em Israel e em Judá, sobre as
a casa do Senhor seu Deus. % foram ter com palavras deste livro que se achou; pois grande é
Hilquias, o sumo sacerdote, e entregaram o dinheiro o furor do Senhor que se tem derramado sobre
que se tinha trazido à casa de Deus, e que os nós por não terem os nossos pais guardado a
levitas, guardas da entrada, tinham recebido da mão palavra do Senhor, para fazerem conforme tudo
de Manassés, de Efraim e de todo o resto de Israel, quanto está escrito neste livra 22Então Hilquias
como também de todo o Judá e Benjamim, e dos e os enviados do rei foram ter com a profetisa Hulda,
habitantes de Jerusalém. 10E eles o entregaram mulher de Salum, filho de Tocate, filho de Hasra,
439
o guarda das vestiduras (ela habitava então em Jeru Os sacerdotes, e os levitas. Esta é uma
salém na segunda parte); e lhe falaram a esse respei emenda característica do cronista. 2Reis
t a “ E ela lhes respondeu: Assim diz o Senhor,
Deus de Israel: Dizei ao homem que vos enviou a 23.2 reza “os sacerdotes, os profetas”.
mim: 24Assim diz o Senhor: Eis que trarei o mal Pára o escritor posterior, os profetas cultuais
sobre este lugai; e sobre os seus habitantes, a saber, eram também levitas. É possível que o
todas as maldições que estão escritas no livro que se midrash levítico empregado pelo cronista
leu perante o r á de Judá. “ Porque me deixaram, e assim rezasse.
queimaram incenso a outros deuses, para me provo
carem à ira com todas as obras das suas mãos; 4) A Grande Páscoa (35.1-19)
portanto o meu furor se derramará sobre este lugar,
e não se apagará. “ Todavia ao rei de Judá que vos ‘Então Josias celebrou a páscoa ao Senhor em
enviou para consultar ao Senhor, assim lhe direis: Jerusalém; imolou-se o cordeiro da páscoa no
Assim diz o Senhor, Deus de Israel: Quanto às pala décimo quarto dia do primeiro mês. 2E estabeleceu
vras que ouviste, ^porquanto o teu coração se os sacerdotes nos seus cargos, e os animou a
enterneceu, e te humilhaste perante Deus, ouvindo servirem na casa do Senhor. 3E disse aos levitas
as suas palavras contra este lugar e contra os seus que ensinavam a todo o Israel e que estavam consa
habitantes, e te humilhaste perante num, e rasgaste grados ao Senhor: Ponde a arca sagrada na casa
as tuas vestes, e choraste perante mim, também que Salomãoi, filho de Davi, rei de Israel, edificou;
eu te ouvi, diz o Senhor. “ Eis que eu te ajuntarei não tereis mais esta carga solve os vossos ombros.
a teus pais, e tu serás recolhido ao teu sepulcro Agora servi ao Senhor vosso Deus e ao seu povo
em paz, e os teus olhos não verão todo o mal que Israel; 4preparai-vos segundo as vossas casas
hei de trazer sobre este lugar e sobre os seus habi paternas, e segundo as vossas turmas, conforme
tantes. E voltaram com esta resposta ao rei. o preceito de Davi, rei de Israel, e o de Salomão,
29Então o rei mandou reunir todos os anciãos de seu filha 5E estai no lugar santo segundo as
Judá e de Jerusalém; “ e o rei subiu à casa do divisões das casas paternas de vossos irmãos, os
Senhor, com todos os homens de Judá, e os habi filhos do povoi, e haja para cada divisão uma parte
tantes de Jerusalém, e os sacerdotes, e os levitas, de uma família levítica. ‘Tunbém imolai a páscoa,
e todo povo, desde o menor até o maior; e ele leu e santificai-vos, e preparai-a para vossos irmãos,
aos ouvidos deles todas as palavras do livro do pacto, fazendo conforme a palavra do Senhor dada por
que fora encontrado na casa do Senhor. 31E o rei intermédio de Moisés. 7Ora, Josias deu aos filhos
pôs-se em pé em seu lugar, e fez um pacto perante do povo, a todos que aü estavam, cordeiros e cabritos
o Senhor, de andar após o Senhoi; e de guardar do rebanho em número de trinta mil, todos para
os seus mandamentos, e os seus testemunhos, e os os sacrifícios da páscoa, e três mil novilhos; isto
seus estatutos, de todo o coração e de toda a alma, era da fazenda do rei. “Também os seus príncipes
a fim de cumprir as palavras do pacto, que estavam fizeram ofertas voluntárias ao povo, aos sacerdotes
escritas naquele livra 32Também fez com que todos e aos levitas; Hilquias, Zacarias e Jeiel, chefes da
quantos se achavam em Jerusalém e em Benjamim casa de Deus, deram aos sacerdote^ para os sacri
o firmassem; e os habitantes de Jerusalém fizeram fícios da páscoa, dois mil e seiscentos cordeiros
conforme o pacto de Deus, do Deus de seus pais. e cabritos e trezentos novilhos. ’Tkmbém Cona-
33E Josias tirou todas as abominações de todas as nias, e Semaías e Netanel, seus irmãos, como
terras que eram dos filhos de Israel; e ainda fez que também Hasabias, Jeiel e Jozabade, chefes dos
todos quantos se achavam em Israel servissem ao levitas, apresentaram aos levitas, para os sacrifí
Senhor seu Deus. E enquanto ele viveu* não cios da páscoa, cinco mil cordeiros e cabritos e
deixaram de seguir ao Senhor, Deus de seus pais. quinhentos novilhos. I0Assim se preparou o
serviço, e puseram-se os sacerdotes nos seus postos,
O cronista faz um paralelo com 2Reis e os levitas pelas suas turmas, conforme a ordem
do rei. uEntão imolaram a páscoa; e os sacerdotes
22.8-20 exatamente aqui, mesmo quanto espargiam o sangue que recebiam das mãos dos
à profecia de Hulda, no verso 28, tu serás levitas, e estes esfolavam as reses. 12E puseram à
recolhido ao teu sepulcro em paz, o que parte os holocaustos para os distribiárem aos filhos
dificilmente teve cumprimento literal, dada do povo, segundo as divisões das casas paternas, a
fim de que os oferecessem ao Senhor, como está es
a morte violenta de Josias. O historiador crito no livro de Moisés; e assim fizeram com os no
posterior poderia facilmente ter eliminado vilhos. 13Assaram a páscoa ao fogo, segundo a
essa declaração problemática de seu relato. ordenança; e as ofertas sagradas cozeram em
Aparentemente, pensou que ela tivesse sido panelas, em caldeirões e em tachos, e prontamente
cumprida essencialmente, pois Josias não as repartiram entre todo o povo. 14Depois prepa
raram o que era preciso para si e para os sacerdotes;
viveu para ver o desastre total que recaiu porque os sacerdotes, filhos de Arão, se ocuparam
sobre Judá. até a noite em oferecer os holocaustos e a gordura;
440
pelo que os levitas prepararam para si e para os renúncia das velhas cerimônias de reno
sacerdotes, filho de A rãa 15Os cantores, filhos de vação do pacto.
Asafe, estavam no seu posto, segundo o mandado
de Davi, de Asafe, de Hemã e de Jedútun, vidente Chefes da casa de Deus. Aqui temos três
do rei; como também os porteiros estavam a cada deles (v. 8), enquanto era costumeiro ter
porta; não precisaram se desviar do seu serviço, somente um sumo sacerdote (cf. lCr 9.11).
porquanto seus irmãos, os levitas, preparavam o E puseram à parte os holocaustos.
necessário para eles. “ Assim se estabeleceu todo Somente o cronista associa os holocaustos
o serviço do Senhor naquele dia, para celebrar a
páscoa, e para oferecer holocaustos sobre o altar com a observância da Páscoa.
do Senhor, segundo a ordem do r à Josias. 17E os Desde os dias do profeta Samuel. 2Reis
filhos de Israel que ali estavam celebraram a páscoa 23.22 diz: “desde os dias dos juizes que
naquela ocasião e, durante sete dias, a festa dos julgaram a Israel”. O cronista desejava
pães ázimos. lsNunca se celebrara em Israel uma
páscoa semelhante a essa, desde os dias do profeta tomar claro que Samuel deveria ser incluído
Samuel; e nenhum dos reis de Israel celebrara tal entre esses juizes. Josué 5.10 menciona uma
páscoa como a que Josias celebrou com os sacer observância da Páscoa no período anterior.
dotes e levitas, e todo o Judá e Israel que ali estavam,
e os habitantes de Jerusalém. 19Foi no décimo 5) A Rebelião Fatal de Josias (35.20-27)
oitavo ano do reinado de Josias que se celebrou
d e p o is de tudo issoi, havendo Josias já prepa
esta páscoa.
rado o templo, subiu Neco, rei do Egito, para
2Reis 23.21-23 menciona a “páscoa de guerrear contra Carquêmis, junto ao Eufrates; e
Josias lhe saiu ao encontro. 21Neco, porém,
unidade” de Josias, mas o cronista a mandou-lhe mensageiros, dizendo: Que tenho eu
descreve com grandes detalhes. Desta vez, que fazer contigo, rei de Judá? Não é contra ti que
em contraste com a de Ezequias, foi obser venho hoje, mas contra a casa à qual faço guerra;
vada durante o mês correto. Sua descrição e Deus mandou que me apressasse. Deixa de te
da festa revela que medidas tomadas como opores a Deus, que está comigo, para que ele não
te destrua. 22Todavia Josias não quis virar dele o
um procedimento excepcional naquela seu rosto, mas disfarçou-se, para pelejar contra ele
ocasião haviam agora se tornado norma e, não querendo ouvir as palavras de Necoi, que
tivas. Os cordeiros pascais deviam ser saíram da boca de Deus, veio pelejar no vale de
mortos pelos levitas, e não pelos leigos, M egida 23E os flecheiros atiraram ao rei Josias.
como havia sido o costume anterior. Então o rei disse a seus servos: Tirai-me daqui,
porque estou gravemente ferida ^Seus servos o
Contudo, ao tempo do Novo Testamento removeram do carro e pondo-o no seu segundo
os leigos haviam readquirido esse papel. carro, o trouxeram a Jerusalém. Ele morreu, e foi
E os animou a servirem. Os sacerdotes sepultado no sepulcro de seus pais. E todo o Judá
precisaram da insistência do rei para e Jerusalém prantearam a Josias. 25Também Jere
mias fez uma lamentação sobre Josias; e todos os
cumprirem o seu dever. Eles não tomaram cantores e cantoras têm falado de Josias nas suas
a iniciativa. O zelo dele iniciou a lamentações até o dia de hoje; e as estabeleceram
observância. por costume em Israel; e eis que estão escritas nas
Ponde a arca sagrada na casa. Onde ela Lamentações. “ Ora, o restante dos atos de Josias,
e as suas boas obras em conformidade com o que
estivera? Alguns supõem que Manassés a está escrito na lei do Senhor, 27e os seus atos,
havia removido ou Josias enquanto estava desde os primeiros até os últimos, eis que estão
fazendo reparos. A declaração traz à escritos no livro dos reis de Israel e de Judá.
memória as palavras de Davi antes de sua
morte: “Também os levitas não terão mais Esta é uma descrição muito mais
de levar o tabernáculo e todos os objetos completa dos acontecimentos que levaram
pertencentes ao serviço do mesmo” (lCr à morte de Josias. Faraó Neco vai lutar em
23.26). Uma vez que Israel continuou a Carquêmis, não “o rei da Assíria” (2Rs
transportar a arca em procissão durante 23.29), uma frase muito ambígua, que por
cerimônias de renovação do pacto, essas algum tempo se julgou querer dizer que
referências podem, possivelmente, indicar Neco lutou “contra” o rei da Assíria (KJV).
não só um retomo no ideal davídico da arca Agora se sabe que Neco era aliado da
permanentemente em repouso, mas uma Assíria, e Josias de Babilônia. O cronista
441
ou sua fonte deve ter conhecido a natureza que praticou, e o que se achou contra ele, eis que
estão escritos no livro dos reis de Israel e de Judá.
do problema. E Joaquim, seu filho, reinou em seu lugar. ’Tinha
A palavras de Neco, que saíram da boca Joaquim oito anos quando começou a reinar, e
de Deus. Esta é uma observação interes reinou três meses e dez dias em Jerusalém; e fez
sante. O cronista cria que Deus estava o que era mau aos olhos do Senhor. 10Na prima
falando a Josias mediante um rei ímpio e vera seguinte o rei Nabucodonozor mandou que
o levassem para Babilônia, juntamente com os vasos
que, se o monarca judaico tivesse sido recep preciosos da casa do Senhor; e constituiu a Zede-
tivo à voz de Deus, teria acolhido a quias, irmão de Joaquim, rei sobre Judá e
advertência. Esta é sua explicação do Jerusalém. "Tinha Zedequias vinte e um anos
porquê de ter o rei, sob o processo de quando começou a reinar, e reinou onze anos em
Jerusalém. 12E fez o que era mau aos olhos do
reforma, sido eliminado tão prematura Senhor seu Deus; e não se humilhou perante o
mente. Ele rejeitou uma proferia divina. O profeta Jeremias, que lhe falara da parte do Senhor.
fato de ter vindo de uma fonte inesperada BTambém rebelou-se contra o rei Nabucodonozor,
não fazia diferença. Ele adverte seus leitores que o tinha ajuramentado por Deus. Mas endureceu
de que devem preparar-se para mensagens a sua cerviz e se obstinou no seu coraçãoi, para
não voltar ao Senhoi; Deus de Israel. 14Álém disso
proféticas de fontes não ortodoxas, não todos os chefes dos sacerdotes e o povo aumentavam
somente de rituais cultuais do Templo. Seu cada vez mais a sua infidelidade, seguindo todas as
Deus era maior do que o Templo, e seu abominações dos gentios; e profanaram a casa do
reinado universal. Senhor, que ele tinha santificado para si em Jeru
salém.
Mas disfarçou-se. Note-se a semelhança
com a morte de Acabe (2Cr 18.29 e ss.):
Também Jeremias fez uma lamentação. O cronista bem depressa se descarta das
Jeremias, estranhamente, não aparece no horas finais do reino. Ele abrevia conside
livro de Reis. O cronista o menciona duas ravelmente o relato em 2Reis 23.31—25.21.
vezes (cf. 36.21 e ss.). Contudo, reservou espaço para declarar que
Escritas nas Lamentações. Não se trata Jeoiaquim foi levado em cadeias para Babi
de nosso livro de Lamentações, que tem a lônia após Nabucodonozor ter vindo contra
ver com a queda de Jerusalém, e não com ele. Daniel 1.1 é outra alusão a este episódio,
a morte de Josias. que não pode ser identificado com a invasão
de 597 a.C., uma vez que Jeoiaquim já
estava morto nesse tempo. É bem possível
3. A Hora Final (36.1-21) que Nabucodonozor visitasse Judá após a
1) Reis Incapazes (36.1-14) batalha de Carquêmis, antes de seu retorno
a Babilônia. Ou isto pode referir-se simples
'O povo da terra tomou Jeoacaz, filho de
Josias, e o constituiu rei em lugar de seu pai, em mente à intimação de Nabucodonozor para
Jerusalém . 2H nha Jeoacaz vinte e três anos Jeoiaquim e outros líderes comparecerem
quando começou a reinar, e reinou três meses'em perante ele enquanto ainda estava em
Jerusalém. 3Porquanto o rei do Egito o depôs em Carquêmis.
Jerusalém, e condenou a terra a pagar um tributo
de cem talentos de prata e um talento de oura
Tinha Joaquim oito anos. 2Reis 24.8 e
4Então o rei do Egito constituiu Eliaquim, irmão a Septuaginta provavelmente preservaram
de Jeoacaz, rei sobre Judá e Jerusalém, e mudou- o texto correto, dizendo “dezoito” anos. Por
lhe o nome em Jeoiaquim; mas a seu irmão, 592 a.C. Joaquim parece ter tido cinco
Jeoacaz, Neco o tomou e o levou para o Egita filhos; ele se tomou rei em 597 (cf. Myers.
5Tinha Jeoiaquim vinte e cinco anos quando
começou a reinar, e reinou onze anos em Jerusalém; II, 218).
e fez o que era mau aos olhos do Senhor seu Deus.
‘Contra ele subiu Nabucodonozor, rei de Babi 2) A Ira de Deus (36.15-21)
lônia, e o amarrou com cadeias, a fim de o levar
para Babilônia. 7Tàmbém alguns dos vasos da casa 15E o Senhor, Deus de seus pais, falou-lhes
do Senhor levou Nabucodonozor para Babilônia, persistentemente por intermédio de seus mensa
e pô-los no seu templo em Babilônia. 8Ora, o geiros, porque se compadeceu do seu povo e da
restante dos atos de Jeoiaquim, e as abominações sua habitaçãa l6Eles, porém, zombavam dos
442
mensageiros de Deus, desprezando as suas pala Pós-escrito: Começa uma Nova Era
vras e mofando dos seus profetas, até que o furor (36.22-23)
do Senhor subiu tanto contra o seu povo, que mais
nenhum remédio houve. 17Por isso fez vir sobre 22Ora, no primeiro ano de Ciro, rei da Pérsia,
eles o rei dos caldeus, o qual matou os seus para que se cumprisse a palavra do Senhor profe
mancebos à espada, na casa do seu santuário, e rida pela boca de Jeremias, despertou o Senhor
não teve piedade nem dos mancebos, nem das o espírito de Ciro, rd da Pérsia, de modo que ele
donzelas, nem dos velhos, nem dos decrépitos; fez proclamar por todo o seu reina, de viva voz e
entregou-lhes todos nas mãos. 18E todos os vasos também por escrito, este decreto:23Assim diz Ciro,
da casa de Deus, grandes e pequenos, os tesouros rei da Pérsia: O Senhor Deus do céu me deu todos
da casa do Senhor, e os tesouros do rei e dos seus os reinos da terra, e me encarregou de lhe edificar
príncipes, tudo levou para Babilônia. 19Tàmbém uma casa em Jerusalém, que é em Judá. Quem
queimaram a casa de Deus, derribaram os muros há entre vós de todo o seu povo suba, e o Senhor
de Jerusalém, queimaram a fogo todos os seus palá seu Deus seja com ele.
cios, e destruíram todos os seus vasos preciosos. É estranho que o decreto de Ciro, que
2(IE aos que escaparam da espada, a esses levou
para Babilônia; e se tornaram servos dele e de seus tão obviamente se refere a Isaías 44.28, seja
filhos, até o tempo do reino da Pérsia, 21para se mencionado como cumprimento da
cumprir a palavra do Senhor proferida pela boca profecia de Jeremias, em vez da de Isaías.
de Jeremias, até haver a terra gozado dos seus Possivelmente, o cronista estava ciente do
sábados; pois por todos os dias de desolação
repousou, até que os setenta anos se cumpriram. fato de que o autor desta seção de Isaías
era contemporâneo de Ciro, e não de Isaías
O cronista alega que Deus fez tudo do oitavo século, profetizando 150 anos
quanto podia para salvar Israel. Ele apenas antecipadamente. Doutro modo, os 70 anos
abandonou seu povo quando nada mais de Jeremias pareceriam pouca coisa em
poderia ser feito. Seu pecado fatal foi sua comparação
falha em atender à advertência profética. Esta passagem também ocorre como os
versos de abertura do livro de Esdras, que
Sua transgressão original poderia ter sido
perdoada se houvessem se arrependido. originalmente talvez fossem uma conti
nuação ininterrupta da história do cronista.
Para se cumprir a palavra do Senhor, Quando Esdras-Neemias foram aceitos no
proferida pda boca de Jeremias (cf. Jr. cânone hebraico, esses livros foram sepa
25.12; 587-516 a.C. = 70 anos). rados de Crônicas, que veio a ser
Repousou, até que os setenta anos se reconhecido como canônico senão depois,
cumpriram. Alguns crêem que isso se refere sendo colocado como última admissão no
aos 70 x 7 anos ou os aproximadamente cânon (cf. a Introdução). Quando Crônicas
490 anos de rebelião em Israel desde foi aceito, os versos de abertura de Esdras
Salomão a Zedequias, incluindo 70 anos foram a ele acrescentados, a fim não só de
sabáticos. É mais natural entender que o concluí-lo com uma nota de esperança, mas
cronista está dizendo que finalmente a terra para tomar lembrado ao leitor que a história
observou seus sábados há muito negligen continuava em Esdras-Neemias. Em nosso
ciados para cumprir a profecia de Jeremias cânon, a repetição é bem supérflua, uma
sobre os 70 anos, antes que para cumprir vez que Crônicas-Esdras-Neemias são orga
setenta anos sabáticos. nizados em sua ordem original.
443
Esdras-Neemias
EMMETT WILLARD HAMRICK
Introdução
445
II. S eq ü ên cia de Acontecim entos correspondência descrita em Esdras 4.6-23.
0 Templo foi reconstruído durante o
Há um consenso geral entre os estu reinado de Dario I. Contudo, em meio à
diosos de que os acontecimentos relatados narrativa um escritor inseriu correspon
em Esdras-Neemias não estão agora em dência relativa a período bem posterior. Há
estrita ordem cronológica. Há menos referência, em 4.6, a uma carta escrita
concordância quanto a se essa desordem
contra os judeus durante o reinado de
foi obra do próprio cronista ou de algum Assuero (Xerxes, 486-465 a.C.). E duas
redator posterior. Os antigos escritores cartas, a segunda das quais é citada, são
judeus não se preocupavam basicamente datadas do reino de Artaxerxes) (quase,
com a história como história e sentiam certamente, Artaxerxes I, 465-424 a.C.).
pouca necessidade de relatar os dados histó Ademais, a correspondência entre Reum
ricos em seqüência cronológica exata. Não e Sinsai e Artaxerxes tem a ver com a refor-
obstante* o leitor moderno preocupa-se com tifícação da cidade sem fazer referência ao
a ordem original dos acontecimentos. Templo.
1. Esdras 1—6 Esdras 4.6-23 com toda a probabilidade
O primeiro bloco de material significati foi inserido na história da reedificação do
vo é encontrado nos capítulos 1—6 do livro Templo para ilustrar o tipo de atrito que
de Esdras. Relata a história da restauração provocou a interrupção da construção por
pós-exílica de Judá a partir do edito de Ciro, cerca de 16 anos entre Ciro e Dario I, A
passando pela reconstrução e rededicação troca de cartas entre Reum e Sinsaí e Arta
do Templo. xerxes pertence ao período pouco anterior
Há dois problemas principais de seqüên a Neemias 1 e propicia o fundo histórico
cia cronológica nessa narrativa. O primeiro imediato para o sofrimento e preocupação
diz respeito à relação entre Sesbazar e Zoro- de Neemias.1
babel. A relação entre os dois homens é
extremamente vaga, e a transição entre os 2. Esdras 7—10; Neemias 1—13
dois está completamente perdida. Ocronista Há três problemas principais de seqüên
tinha uma tradição de que Sesbazar liderou cia cronológica nas porções restantes de
o primeiro retorno do exílio, restabeleceu Esdras-Neemias. São a ordem cronológica
0 culto em Jerusalém e lançou os funda de Esdras e Neemias, a seqüência de even
mentos para um novo Templo (cf. Esdras tos na carreira de Neemias e a seqüência
1.5-11; 5.14-16). Imagina-se que esta tradição de eventos no ministério de Esdras.
seja exata e que a obra de Sesbazar foi A presente narrativa deixa a impressão
superposta à de seu sucessor (e sobrinho?) de que Esdras veio primeiro, no sétimo ano
Zorobabel Sendo que Ageu não menciona de um rei chamado Artaxerxes (Ed 7.7).
qualquer tentativa prévia da parte de Zoro Ele conduziu de volta um grupo de exilados
babel para reedificar o Templo, chega-se à carregados com tesouros para o Templo
conclusão de que sua atividade de cons (Ed 7—8), a seguir deu assistência ao pro
trução não se iniciou até o reinado de Dario blema de reforma dos casamentos mistos
1 (552-486 a.C.). Portanto, referências a (Ed 9—10). Neste ponto, sem qualquer tran
Zorobabel em Esdras 3 e 4 seriam prema sição, Neemias é introduzido. Ele chegou
turas, e se entenderia que ele se tornou a Jerusalém no vigésimo ano de um rei
governador de Judá no interregno entre a chamado Artaxerxes (Ne 2.1). Teve êxito
falha de Sesbazar de concluir o Templo* em em reedificar os muros (Ne 1 — 6) e tomou
cerca de 536 a.C., e a pregàção de Ageu, medidas para o repovoamento da cidade
em 520 a.C.
O segundo problema cronológico de 1 Cf. Alben van Hoonacker, “N éhém ie et Esdras. U ne Nouvelle Hypo-
thõse sur la C h rondogie de la Restauration”, Lê M usêon, 1890, p.
maior monta nesta narrativa é criado pela 159-174).
446
(7.1-73a). Nessas alturas, Esdras é nova o escriba, ia adiante dele” deve ser uma
mente apresentado, e ele lidera o povo na interpolação posterior, porque a liderança
renovação de sua aliança com Deus e a sua da primeira companhia dos que marchavam
lei (Ne 7.73b—9.37). A narrativa que se já havia sido atribuída a Hosaías (v. 32),
segue (9.38—10.37) apresenta uma lista de e a presença de Esdras prejudica a simetria
homens que assinaram um acordo e os votos das duas companhias. E muito improvável
que fizeram, mas a passagem parece não que a história original de Esdras mencio
ter relação com o que se segue ou precede nasse Neemias ou vice-versa.
imediatamente. Em Neemias 11, a história 2) Eliasibe era sumo sacerdote durante
volta à descrição das reformas da população, as missões de Neemias (Ne 3.1; 13.4-9,28);
que fora interrompida no capítulo 7. No mas Jonatã (Joanã), neto de Eliasibe (Ne
capítulo 12, após uma série de listas 12.10,11,22), parece ter sido o sumo sacer
miscelâneas (v. 1-26), é apresentado o relato dote ao tempo de Esdras (Ed 10.6). Além
da rededicação dos muros (v.27-43). Final disso, os Papiros Elefantinos mostram que
mente, seguindo-se à introdução do cronista Jônatas foi sumo sacerdote em 408 a.C.,
à passagem (12.44—13.3), temos a história pelo menos uma geração após o tempo de
das reformas executadas por Neemias ao Neemias.3
tempo de sua segunda visita. 3) Neemias foi contemporâneo de
Os editores finais do livro obviamente Sambalá (Ne 4.1; 6.1). Contudo, os Papiros
criam que Esdras precedeu Neemias e que Elefantinos mostram que os filhos de
os dois líderes foram contemporâneos. Este Sambalá eram a autoridade em Samária ao
ponto de vista tem sido cada vez mais desa tempo de Joanã (ibid.), contemporâneo de
fiado, contudo, desde a criteriosa pesquisa Esdras.
de Alben van Hoonacker2 há quase um 4) O silêncio de Neemias com respeito
século. Tomamos a posição, neste tratado a Esdras em Neemias 1-2 é incrível, se a
de Esdras-Neemias, de que os dois homens missão de Esdras teve início 13 anos antes
não foram contemporâneos mas que e ainda estava em progresso.
Neemias veio primeiro, no vigésimo ano 5) A ação de Neemias quanto aos casa
de Artaxerxes I (445 a.C.) e foi seguido por mentos mistos envolvia tão-somente uma
Esdras no sétimo ano de Artaxerxes II (398 promessa de que não mais continuariam
a.C.). Evidência típica desta posição pode a ser contraídos (Ne 13.25; cf. 10.30). A
ser assim brevemente sumariada: dissolução de Esdras dos casamentos proi
1) Os dois homens, aparentemente, bidos deve ter-se seguido às medidas menos
ignoram um o outro e não colaboram real severas tomadas por Neemias.
mente em seus respectivos trabalhos. A 6) Neemias encontrou Jerusalém arrui-
história do reavivamento de Esdras, con nadaequase despovoada (2.17;17.4). Esdras
quanto no livro de Neemias (7.73b—9.37), encontrou a cidade cheia de atividade e vida
interrompe o relato de Neemias sobre as (Ed 9.4; 10.1; ele não está alistado entre os
reformas da população e está, obviamente, edificadores do muro em Neemias 3).
fora de lugar. Ademais, a referência única 7) A corporação de tesoureiros estabele
a Neemias na narrativa de Esdras (Ne 8.9) cida por Neemias (13.13) estava ainda,
não ocorre na passagem correspondente em aparentemente, funcionando, mas com
lEsdras e é quase, certamente, uma glosa pessoal novo, quando Esdras chegou (Ed
posterior. A referência a Esdras em Neemias 8.33).
12.33, por outro lado, não o identifica como Esforços para resolver o problema da
o escriba e entra em conflito com o papel relação entre Esdras e Neemias por
atribuído a ele em Neemias 12.36. Na emendar o texto de Esdras 7.7,8 de modo
passagem derradeira, a declaração “e Esdras,
3 A . Cowley, A ram aic Papyri o f th e Fifth C en tu ry B.C. (Oxford:
2 Op. cit., p. 151-184; 317-351; 389-401 C larendon Press, 1923), p. 108119.
447
que reze o ano “vinte e sete” ou “trinta e A história de Esdras é composta de três
sete” de Artaxerxes não contam com o episódios principais: (1) o Documento de
apoio da evidência textual e não resolvem Artaxerxes e a jornada a Jerusalém (Ed 7-8),
os problemas básicos, tais como por que (2) a crise dos casamentos mistos (Ed 9-10)
Esdras e Neemias ignoravam tão comple e (3) a leitura da lei (Ne 7.73b—9.37). A
tamente a obra um do outro. narrativa não está em sua ordem original,
A seqüência de acontecimentos durante porque a leitura da lei ocorreu entre a
a carreira de Neemias tem dado margem chegada em Jerusalém e as reformas matri
a somente alguns problemas de pequena moniais. Esdras chegou em Jerusalém no
monta. Partindo da rededicação do Templo quinto mês do ano 398 a.C. (Ed 7.7). Ele
em 515 a.C. (Ed 6), o relato do cronista salta, leu a lei e liderou o povo em suas reformas
cronologicamente, para o início da história religiosas no sétimo mês (Ne 7.73b). Esse
de Neemias (Ne 1). Esdras 4.6-23 pertence reavivamento conduziu à renovada preo
a este período de silêncio e, juntamente cupação quanto aos casamentos mistos
com o livro de Malaquias e talvez partes (cf. Ne 9.2), e essas reformas foram iniciadas
de Isaías 56—66, forma material de base no nono mês (Ed 10.9).
para uma compreensão da obra de Neemias. Em suma, o material em Esdras-
Com exceções menores, os primeiros sete -Neemias começa com o edito de Ciro em
capítulos de Neemias refletem uma seqüên torno de 539 a.C. e continua ao longo da
cia histórica lógica. O capítulo 5 faz, real rededicação do Templo em cerca de 515 a.C.
mente, no comentárioi, apenas uma pequena (Ed 1—6). Segue-se então um intervalo de
observação sobre o muro; contudo, ocupa cerca de 70 anos, iluminado somente por
uma posição lógica, uma vez que foram as uns poucos dados de Esdras 4.6-23. A
exigências rigorosas da edificação dele que história de Neemias começa em 445 a.C.
fizeram evoluir a uma situação crítica os Seu primeiro mandato como governador
abusos sociais e econômicos de longa data. pode ter durado 12 anos (Ne 5.14). A parte
A lista do censo (Ne 7.6-73a) é compli final de seu segundo mandato é desconhe
cada e de origem incerta, mas associava-se cida, mas teve início pouco depois de 432
às reformas populacionais iniciadas em a.C. (Ne 13.6-8). A partir das reformas do
7.1-5. Essa história foi concluída em segundo mandato de Neemias, a narrativa
Neemias 11, e o material interveniente silencia até a missão de Esdras, em cerca
interrompe a narrativa. Os capítulos de 398 a.C. Todos os acontecimentos de sua
7.73b—9.37 já foram identificados com a missão são datados dentro de cerca de um
história de Esdras, mas Neemias 8.38— ano, e o cronista não oferece qualquer infor
10.39 apresenta um problema especial, e, mação adicional.
por isso, é melhor compreendido como um
relato anônimo da confecção de uma III. As Fontes
aliança destinada a implementar as Uma comparação de Crônicas com
reformas empreendidas por Neemias em Samuel-Reis mostra que o cronista muitas
13.4-31 (cf. Batten, p. 372,373) e, portanto, vezes interpretava suas fontes à luz de suas
pertence ao período de sua segunda admi próprias convicções religiosas. Não
nistração. A história da dedicação do muro, obstante, ele não era, primariamente, um
(12.27-43), certamente, se situa logo após inventor de história. Ele empregava valiosos
a conclusão do muro, mas não é necessário documentos de referência, muitos dos quais
presumir que as reformas populacionais não podem ser isolados e identificados. Con
podem ter precedido a cerimônia. Isto deixa quanto seu propósito fosse religioso e
Neemias 13 e 10 (nessa ordem) como a cultual, seu relato em Esdras-Neemias, pelo
única evidência disponível no que concerce menos, parece ser substancialmente histó
à segunda administração de Neemias. rico. Somente os documentos de referência
448
mais importantes empregados nesta narra memórias de Neemias, mesmo não sendo
tiva serão mencionados. empregada a primeira pessoa.
1. O Edito de Ciro e as Fontes Aramaicas
3. As Memórias de Esdras
O cronista preservou dois editos relativos A fonte mais controvertida de todas
à permissão para os judeus retornarem a as atribuídas ao cronista são as memórias
Jerusalém e reconstruírem seu Templo. O de Esdras. Não há consenso quanto à
primeiro edito está no hebraico (Ed 1.2-4) extensão das memórias, sua confiabilidade
e o outro na língua semítica da antiga Síria
como uma fonte histórica ou mesmo sua
e parente próxima do hebraico, o aramaico real existência. O vocabulário e estilo da
(Ed 6.3-5). Este comentário reflete a opinião
narrativa total de Esdras são essencialmente
contemporânea de que os dois decretos são os mesmos do cronista e nem mesmo as
pronunciamentos independentes e que passagens na primeira pessoa (Ed 7.27—
ambos podem ser vistos como substancial 8.34; 9.1-15) podem ser identificadas como
mente exatos (cf. Bickerman, p. 249-275).
citações ao pé da letra da obra de Esdras.
O edito aramaico é parte de uma
Estudiosos contemporâneos geralmente
coletânea maior de documentos escritos mantêm que o cronista realmente em
nessa língua (Ed 4.8—6.18; 7.12-26), que pregou um relatório ou registro memo
trata, sobretudo, de comunicados oficiais rial do próprio Esdras e que a narrativa de
entre os reis persas e seus subordinados. O Esdras é substancialmente histórica. Perma
fato de que o aramaico é, reconhecidamente,
nece incerto se o cronista reescreveu
a língua diplomática comum no Império
integralmente as memórias de Esdras em
Persa confere credibilidade a essas narra seu próprio estilo ou se o estilo dos dois
tivas. O cronista, que tinha este documento homens é simplesmente indistinguível. Há
à sua disposição, incorporou-lhe partes subs indicações positivas, contudo, de que o
tanciais com pouco ou nenhum refina cronista empregou fontes na composição
mento de texto. O caráter judaico de certas da história de Esdras (que não foi, portanto,
passagens (Ex 6.3-5; 7.12-26) não precisa do próprio Esdras) e que um desses
ser atribuído ao cronista nem a um editor
documentos derivou da pena de .Esdras.
judaico anterior que havia compilado a Somente evidência típica será sugerida.
fonte aramaica. Reis persas estavam em (1) O cronista alterna o uso da primeira
consulta com líderes judaicos, e a linguagem e terceira pessoas. Se estivesse tentando
de seus editos, naturalmente, refletia mesmo inventar uma memória de Esdras, como
os detalhes cultuais específicos das exigên Torrey (p. 238-248) imaginou, seria impen
cias judaicas.
sável que iniciasse compondo 7.1-11 na
2. As Memórias de Neemias terceira pessoa. É mais provável que ele
simplesmente não tenha dado importância
A fonte menos controvertida de todas à uniformidade de pessoa, ao revisar as
as empregadas em Esdras-Neemias é o memórias de Esdras.
documento de Neemias. O cronista utilizou (2) A narrativa de Esdras inclui material
grandes blocos de material para um diário, pouco lisonjeiro para os favoritos do
memória ou inscrição memorial escrita por cronista, os levitas. Ele deve ter sido inco-
Neemias. As passagens na primeira pessoa mumente fiel a um documento de referên
(Ne 1.1—2.20; 4.1—7.5; 12.27-43; 13.4-31), cia, para admitir que os levitas relutaram
conquanto refletindo alguns toques ocasio em acompanhar Esdras a Jerusalém (8.15)
nais pelo cronista, foram extraídas desse ou que eram culpados de casamentos ilegais
documento com um mínimo de mudança (10.23).
editorial. Além disso, outras partes do livro, (3) Esdras 7.6-10, composto na terceira
especialmente 11.1,2, podem derivar das pessoa, é um sumário antecipatório de
449
7.27—8.34, escrito na primeira pessoa. Essa de contexto e são de significação desconhe
duplicação de material sugere que o autor cida.
começou a história em suas próprias pala
vras e então passou a seguir mais de perto IV. Avaliação dos Três Líderes
os detalhes das memórias de Esdras. 1. Zorobabel, o herói de Esdras 1-6,
desempenhou o papel principal na recons
4. As Listas trução do Templo durante o reinado de
Dario I. Ele era um homem cauteloso e
O cronista, em Esdras-Neemias, como pode nunca ter arriscado reacender a ira
também em Crônicas, fez uso abundante da população local não-exílica, não fossem
de listas. Uma vez que cada lista é tratada os incitamentos dos profetas Ageu e Zaca
em seu próprio lugar, no comentário, rias (Ed 5.1,2; 6.14; cf. Ageu 1-2). Uma vez
somente umas poucas observações precisam que ele e o sumo sacerdote Jesua come
ser feitas por esse tempo. Em primeiro lugar, çaram o projeto, contudo, não houve
a origem da maioria das listas não pode ser relutância ouJiesitação, mesmo em face da
determinada. Visto que tratam primaria investigação descrita em 5.3-17. Zacarias
mente da comunidade cultual, podem ter louva o seu trabalho em termos entusiás
sido encontradas nos arquivos do Templo. ticos (Zc 4.1-14).
A melhor evidência de que o cronista não Zorobabel foi um príncipe real e um
deu, ele próprio, origem às listas pode ser descendente da linhagem do rei Jeoiaquim
vista em sua freqüente confusão quanto ao (Jeconias; cf. lCr 3.16-20). Como tal, muitos
significado delas. Pbr exemplo, ele inter criam que ele seria o Messias há muito espe
preta a longa lista em Esdras 2.1-70 (Ne rado. Essa esperança foi encorajada por
7.6-73a) como um registro de judeus que Ageu (2.20-23) e Zacarias (3.6-10; 4.4-14;
retornaram durante o reinado de Ciro. Na 6.9-14). Não há evidência de que Zorobabel
realidade, essa lista parece compor uma planejasse uma insurreição contra a Pérsia
coletânea heterogênea de dados de recen ou que tivesse ambições de realeza. O nacio
seamento que se acumularam durante um nalismo fervoroso que acompanhou o seu
período de quase um século (observe-se trabalho, contudo, pode ter alarmado os
também as diferentes interpretações de um persas, pois Zorobabel foi, aparentemente,
único documento de referência em Ne removido de sua posição antes de se
11.3-24 e lCr 9.2-34). completar o Templo (cf. Ed 6.14,15).
Não é possível generalizar sobre a auten 2 Neemias é a estrela mais brilhante do
ticidade de todas as listas em Esdras- período de restauração. Ele veio para Jeru
Neemias. Algumas das listas podem ser salém em 445 a.C, cerca de 70 anos após
essencialmente precisas e estar em seu a rededicação do Templo. O colapso das
contexto original. Isto pode ser verdade, por esperanças nacionalísticas, tão evidente em
exemplo, quanto às listas: daqueles que Esdras 1-6, Ageu e Zacarias, tinha deixado
retornaram com Esdras (8.1-20), dos que a comunidade deprimida e derrotada, com
eram culpados de casamentos mistos resultante negligência moral, espiritual e
(10.18-43), dos que reconstruíram o muro cultual (cf. Ml; Is 57.1-21; 58.3-14; 59.1-15).
(Ne 3), dos que assistiram à leitura da lei Ademais, Jerusalém estava, em grande
(Ne 8.4-8), dos que assinaram a aliança de parte, em ruínas, porque os esforços para
Neemias (Ne 10.1-27) e dos que partici reconstruí-la haviam sido violentamente
param da dedicação do muro (Ne 12.27-43). frustrados por Reum e Sinsai (Ed 4.8-23).
Por outro lado, a lista dos ancestrais de
Esdras (Ed 7.1-5) é manifestamente defei 5. Outras Fontes
tuosa, e os registros clericais diversificados Neemias 3 merece menção adicional
em Neemias 12.1-26 estão, obviamente, fora porque contém um relato valioso da recons-
450
trução dos muros que é independente das condenou-os categoricamente e rejeitou
memórias de Neemias (cf. Batten, p. todas as tentativas para íjma conferência.
206,207). Semelhantemente, Neemias Outras questões são suscitadas quanto
9.38—10.39 parece preservar uma fonte às suas orações. Em duas ocasiões diferentes
independente dessas memórias, e que narra ele orou pela condenação de seus inimigos
a história de um concerto destinado a por parte de Deus (Ne 4.4,5; 13.29). Certa
garantir a observância das reformas de mente que esse fato reflete uma reação
Neemias descritas em 13.4-31. humana compreensível ante a provocação
As orações apresentam um problema (cf. Jr 12.3; 20.12), conquanto indique uma
especial. A maior parte das orações em compreensão imperfeita do amor de Deus
Neemias são concisas e claramente autên (cf. Lc 23.34; At 7.60).
ticas. A oração em 1.5-1 la, contudo, é Na maior parte de suas outras orações,
composta, sobretudo, de citações de Deute- Neemias pedia para que Deus lhe conce
ronômio e reflete o estilo do cronista. A desse lembrança especial e crédito pelo seu
longa oração em Neemias 9.6-37 pode ter trabalho como governador (5.19;
sido atribuída a Esdras (como na LXX, mas 13.14,22,31). Muitos escritores atribuem
não no TM), mas é, na verdade, um salmo esta preocupação indevida com seu futuro
que não se enquadra no contexto e pode pessoal ao fato de ele ser um eunuco (ver
ter sido tomado por empréstimo de um livro o comentário sobre Ne 1.11b—2.8; 5.14-19)
de liturgias do Templo. A oração de Esdras e não acalentar esperança de deixar uma
em Esdras 9.6-15 é parte indispensável do família para perpetuar-lhe a memória.
cenário total e, sem dúvida, reflete o Neemias, obviamente, desejava que sua
conteúdo da súplica real de Esdras por obra fosse um memorial permanente para
ocasião da crise quanto aos casamentos. o seu nome, e esta pode ter sido a motivação
Neemias chegou a Judá em plena auto de ter escrito suas memórias.
ridade da parte de Artaxerxes I para 3. Qualquer apreciação de Esdras é
reedificar os muros de Jerusalém e servir complicada pelo fato de que não se pode
como governador da comunidade judaica. distinguir claramente entre as memórias de
Ele reconstruiu e rededicou os muros Esdras e a aplicação que o cronista delas
(1.1—6.16; 12.27-43); restaurou e repovoou faz. Contudo, sendo que o cronista compôs
a cidade (7.1-5; 11.1,2). Ademais, atacou sua obra pouco depois da missão de Esdras,
vigorosamente todos os abusos morais e pode-se presumir que seu relato da obra de
cultuais, tanto durante sua primeira admi Esdras é substancialmente digno de crédito.
nistração (cap. 5) quanto na segunda
(13.4-31). Ele era dedicado a Deus e um A história de Esdras revela ter ele desem
governador eficiente. Se alguém merece ser penhado um papel, no judaísmo pós-exílico,
considerado o pai do judaísmo, certamente que foi de importância permanente, mas
é Neemias. talvez relativamente menor quando compa
rado com as contribuições de Neemias.
Contudo, certas questões devem ser Esdras fora comissionado por Artaxerxes
aventadas a respeito do homem. É intri II para ir a Judá por volta de 398 a.C., a
gante, por exemplo, por que Neemias não fim de conduzir de volta uma caravana de
tentou uma fórmula mais conciliatória em judeus carregados de dádivas para o Templo
relação a Sambalá e seus outros adversá e para estabelecer a Tora judaica como a
rios locais. Ele estava penetrando em lei legítima da comunidade judaica (Ed 7-8).
território que eles consideravam como Logo após sua chegada a Jerusalém, ele
estando sob sua jurisdição, mas em tempo levou o povo a uma nova devoção à lei de
algum os informou de suas credenciais da Deus (Ne 7.73b—9.37) e logo a seguir deu
parte de Artaxerxes I. Em vez disso, assistência à dissolução dos casamentos
451
mistos (Ed 9-10), que haviam anteriormente o decorrer de seu trabalho, o cronista estava,
sido condenados por Neemias (13.25-28). primeiramente, interessado nas percepções
Todas as suas atividades em Judá parecem religiosas que considerava relevantes para
ter requerido menos de um ano. o seu próprio tempo. Ele empregou a
Não há evidência de que Esdras redigisse história de seu povo desde Adão, para
ou promulgasse um novo código de leis ou dramatizar essas mensagens. Somente
que mereça ser referido como o fundador ênfases típicas com relevância particular
do judaísmo. Essas idéias surgiram nos para Esdras-Neemias serão apresentadas.
círculos judaicos posteriores (cf. a literatura 1. O cronista cria que havia uma comu
apocalíptica conhecida como IV Esdras, o nidade de Deus legítima e que a sua própria
Mishnah e o Talmude) e, infelizmente, sobrevivência dependia de manter-se pura
influenciaram muitas avaliações modernas em relação à contaminação pagã. Portanto,
da obra de Esdras. ele concordava que os exilados que tinham
A obra de Neemias e Esdras foi ainda retornado não deviam ousar aceitar os
vista em perspectiva apropriada até o povos locais da Palestina, conquanto
segundo século a.C. Na passagem de Ben adorassem o mesmo Deus (Ed 4.1-3).
Sirach em louvor dos pais (Eclesiástico Neemias e Esdras não podiam tolerar casa
44-50), Neemias é louvado (49.13), mas mentos mistos, porque contaminavam o
Esdras é ignorado (cf. 2Macabeus 1, onde povo santo. Listas de registros e genealo
Neemias recebe grande crédito, sem qual gias eram empregadas para legitimar a
quer menção a Esdras). semente santa, e quem quer que não
Tradição posterior, contudo, tornou pudesse provar sua linhagem era separado
Esdras a figura central da restauração, em do restante da comunidade (cf. Ed 2.59,60).
vez de Neemias, e, indubitavelmente, Estas idéias particularistas não têm lugar
influenciou algum escriba desconhecido a na igreja cristã, mas para o cronista eram
transpor os relatos sobre dois homens. Era questão de sobrevivência ou destruição.
fácil um editor posterior justificar tal trans 2. Ele, semelhantemente, cria que havia
posição, em vista do fato de que o sétimo um culto legítimo. Sua organização e
ano de Artaxerxes (Esdras 7.7) devia, logi funções, que remontavam a Davi (cf. Ed
camente, preceder o vigésimo ano de 3.10; Ne 12.36), deviam ser autênticas e sem
Artaxerxes (Ne 2.1). desvio. A manutenção de um culto puro
V. As Ênfases Religiosas era essencial para o bem-estar da comuni
dade, e mesmo os sacerdotes que não
As investigações históricas e literárias pudessem estabelecer suas genealogias
feitas nos escritos do cronista repre sacramentais eram “destituídos” (Ed
sentam empreendimentos de valor. Às 1.61-63).
vezes, contudo, resultam em avaliações 3. Ele cria em retribuição imediata e
indevidas da obra do autor, visto que seus proporcional a todas as ofensas contra Deus.
propósitos primários e ênfases eram reli Esta é a explicação oferecida para o exílio
giosos. babilónico (Ed 5.12) e para todos os sofri
As mensagens religiosas e pressuposições mentos que os judeus suportaram desde
encontradas em Esdras-Neemias não então (cf. Ed 9.7; Ne 1.8,9; 9.26-37).
podem ser separadas das de Crônicas, e o 4.0 cronista, contudo, não estava desti
leitor deve familiarizar-se com esta parte tuído de uma doutrina da graça. Esdras
anterior do trabalho do cronista.4Em todo admite a culpa de seu povo e a justiça da
4 Veja a introdução de Crônicas neste volume, em The In terp reter’s punição de Deus e ainda assim ousa lançar
Bible, vol. I ll, e em The A nchor Bible, vols. X II e X III. Veja tam bém
W. F. Stinespring, “Eschatology in Chronicles”, Jo u rn a l of Biblical
a comunidade sobre a misericórdia de Deus
Literature, setembro de 1961, p. 209-219 (asegiirabreviada para J.B.L.); sem uma defesa (Ed 9.10-15). O mesmo tema
Robert Worth, “Thedogy of the Chronicler”, J.R L ., dezembro de 1963,
p. 369-381. permeia o salmo-oração de Neemias 9.6-37.
452
5. O cronista acentua a soberania de 3. Pessoal do Templo (2.36-58)
Deus na História e o papel da graça divina 4. Famílias não certificadas (2.59-63)
na consecução de seus propósitos eternos. 5. Totais em Sumário (2.64-67)
Israel havia freqüentemente sido poupado, 6. Dádivas para o Templo (2.68,69)
quando merecia a destruição (Ne 9.16-31). 7. A terra repovoada (2.70)
A nação foi salva do exílio porque Deus III. Restauração do culto (3.1-13)
“despertou (...) o espírito de Ciro” (Ed 1.1). 1. A reconstrução do altar (3.1,2)
Foi Deus quem moveu Artaxerxes I a enviar 2. A reinstituição dos rituais (3.3-6)
Neemias (Ne 2.8), que induziu Artaxerxes 3. A primeira tentativa de recons
II a comissionar Esdras (Ed 7.6), e por cuja trução do Templo (3.7-13)
graciosa assistência a restauração foi levada IV. A edificação do Templo é interrom
a cabo (Ed 6.22; 8.22,23; Ne 6.16). pida (4.1-24)
6. Para o cronista, religião era um privi 1. Encontro com adversários (4.1-5)
légio e uma fonte de infindável gozo. 2. Conflitos posteriores (4.6-23)
Mesmo as minúcias cultuais eram consi 3. A obra do Templo é abandonada
deradas uma maneira feliz de responder (4.24)
positivamente a Deus. Havia cântico, excla V. A segunda tentativa de reconstruir
mações e ações de graças em toda ocasião o Templo (5.1—6.22)
possível (Ed 3.10,11; Ne 8.12,17; 12.43). O 1. O início da obra (5.1,2)
povo sentia uma relação íntima com Deus 2. O episódio Tatenai (5.3—6.13)
e agia à sua bondade com música e cântico. 3. A conclusão da obra (6.14-18)
7. O cronista estava dividido entre um 4. Observância da Páscoa (6.19-22)
senso de escatologia admitida e uma ansiosa VI. A viagem de Esdras a Jerusalém
antecipação do futuro. Por um lado, o (7.1—8.36)
Templo havia sido reedificado, os muros 1. Introdução (7.1-10)
erigidos, o culto restaurado e a comunidade 2. O documento de Artaxerxes
purificada do paganismo. Contudo, sente- (7.11-26)
se, por todo o trabalho, que o cumprimento 3. Relato do retorno na primeira
final ainda estava por vir. Zorobabel não pessoa (7.27—8.34)
havia sido o Messias, e o Davi escatológico 4. Epílogo (8.35,36)
era ainda uma esperança futura. O povo VII. Crise relativa aos casamentos mistos
de Deus vivia ainda sob o jugo da Pérsia, (9.1—10.44)
e assim o escritor devia incluir declarações 1. A queixa a Esdras (9.1,2)
tais como “somos escravos” (Ed 9.9) e 2. A reação de Esdras em relação aos
“estamos em grande angústia” (Ne 9.37). casamentos mistos (9.3-15)
Ele estava entusiasmado quanto ao que 3. A reação dos judeus (10.1-4)
Deus havia realizado com o Judá de seu 4. A liderança de Esdras nas reformas
tempo (cf. Ne 12.44-13.3), contudo ansiava matrimoniais (10.5-17)
por um cumprimento mais completo dos 5. Lista dos transgressores matrimo
propósitos de Deus no futuro. niais (10.18-44)
453
II. Neemias assume o governo (2.9-20) 1. Leitura da lei (7.73b—8.8; heb.
1. A chegada no ocidente (2.9,10) 7.72b—8.8)
2. Inspeção de Jerusalém (2.11-16) 2. Reação do povo (8.9-12)
3. Desafio aos oficiais locais (2.17,18) 3. Observância da festa dos taberná
4. A reação de autoridades vizinhas culos (8.13-18)
(2.19,20) 4. Jejum e confissão (9.1-5)
III. Organização dos edificadores do 5. Oração e arrependimento (9.6-37)
muro (3.1-32) IX. Uma aliança escrita (9.38—10.39;
1. A reconstrução dos muros do norte heb. 10.1-40)
e do oeste (3.1-15) 1. O documento e as testemunhas
2. A contração do novo muro oriental (9.38—10.27; heb. 10.1-28)
(3.16-32) 2. Sumário dos compromissos
IV. Construindo sob pressão (4.1-23; heb. (10.28-39; heb. 10.29-40)
3.33—4.17)5 X. Distribuição da população (11.1-36)
1. Reação adicional das autoridades 1. Repovoamento de Jerusalém
vizinhas (4.1-3; heb. 3.33-35) ( 11. 1, 2 )
2. A oração de Neemias (4.4,5; heb. 2. Líderes residentes na cidade
3.36,37) (11.3-24)
3. Progresso em meio a ameaças 3. Cidades habitadas por judeus
(4.6-12; heb. 3.38—4.6) (11.25-36)
4. Medidas de defesa de Neemias XI. Registros clericais (12.1-26)
(4.13-23; heb. 4.7-17) 1. Sacerdotes e levitas que vieram com
V. Exploração econômica dos constru Zorobabel (12.1-9)
tores (5.1-19) 2. Sumos sacerdotes e levitas pós-
1. Queixa dos trabalhadores (5.1-5) -exílicos (12.10,11)
2. O confronto de Neemias com os 3. Sacerdotes e levitas do tempo de
exploradores (5.6-13) Joiaquim (12.12-26)
3. O exemplo de Neemias como XII. Dedicação do muro (12.27-43)
governador (5.14-19) 1. Preparativos (12.27-30)
VI. Importunação posterior feita a 2. Cerimônias de dedicação (12.31-43)
Neemias (6.1-19) XIII. A norma litúrgica (12.44—13.3)
1. Convite a uma conferência (6.1-4) 1. Os serviços do templo (12.44-47)
2. Acusação de traição (6.5-9) 2. A exclusão de estrangeiros (13.1-3)
3. Ardis dos falsos profetas (6.10-14) XIV. As reformas de Neemias (13.4-31)
4. A conclusão do muro (5.15,16) 1. Tobias é expulso do Templo (13.4-9)
5. Os aliados de Tobias em Judá 2. As finanças do Templo postas em
(6.17-19) ordem (13.10-14)
VII. A restauração de Jerusalém (7.1-73a; 3. A observância do sábado é regu
heb. 7.1-72a) lamentada (13.15-22)
1. Organização de defesas (7.1-3) 4. Proibição dos casamentos mistos
2. Necessidade de repovoamento (13.23-29)
(7.4,5) 5. Conclusão (13.30,31)
3. A lista do censo (7.6-73a; heb.
7.6-72a)
VIII. O reavivamento de Esdras Bibliografia Selecionada
(7.73b—9.37; heb. 7.72b—9.37)
ACKROYD, PETER R. Exile and Restora
5 As divisões no texto hebraico que diferem dasdivisões n a Bíblia verná tion. Philadelphia: Westminster Press,
cula são indicadas. 1968.
454
ALBRIGHT) W. F. Hie Biblical Period KAPELRUD, A. S. The Question of Au
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Torchbooks). New \brk: Harper and Dybwad, 1944.
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ed. H. H. Rowley. Edinburgh: T. & T. to Jerusalem. London: Tyndale Press,
Clark, 1950. 1958.
455
compreensível que o cronista considerasse de que tal escolha é desnecessária. A
este o seu primeiro ano. passagem hebraica é melhor compreen
O edito que se segue foi apresentado dida como o anúncio oral feito pelos arautos
como um pregão oral e como um reais, enquanto a aramaica parece ser um
documento por escrito. Bickerman (p. 274) memorando oficial para o tesouro real
mostrou que essa promulgação dupla de concernente à reedificação do Templo.
um decreto era normal na Roma antiga. Não mais é considerado surpreendente
Era, presumivelmente, comum também no que um rei persa se preocupasse com o bem-
Oriente Próximo, e, aparentemente, foi estar do povo judeu e seu culto. Uma
empregado por Ezequías por ocasião do impressionante quantidade de evidência
anúncio da Páscoa (2Cr 30.1). A frase “ fez arqueológica está disponível para demons
passar pregão” pode ser traduzida mais lite trar que o governo persa, de fato, revelou
ralmente como “fez com que uma voz fosse preocupação específica por povos subju
passada”. Refere-se â prática bem conhecida gados e suas religiões. O Cilindro de Ciro
de se despachar arautos para apresentarem tipifica o número impressionante de
mensagens oralmente (cf. 10.7; Ne 8.15). documentos antigos que ilustram as polí
A palavra traduzida como escrito é um ticas refletidas no livro de Esdras. Ciro
termo técnico bem raro, que designa algum declara:
tipo de cartaz em que a mensagem era repro
duzida, para o exame público. Assim, o edito Retornei para essas sagradas cidades de outro
de Ciro foi anunciado oralmente pelos lado do Tigre, ós santuários das quais têm estado
arautos e por escrito mediante os boletins em ruínas, por longo tempo, as imagens que (costu
mavam) ali viver, e estabeleci para elas santuários
publicamente expostos. permanentes. Eu (também) reuni todos os seus
(antigos) habitantes e devolvi-(lhes) suas habi
2) O Decreto (1.2-4) tações.7
2Assim diz Ciro, rei da Pérsia: o Senhor do céu
me deu todos os reinos da terra, e me encarregou O argumento mais comum contra a
de lhe edificar uma casa em Jerusalém que é em autenticidade do edito é sua judaicidade.
Judá. ’Quem há entre vós de todo o seu povo (seja Esta qualidade, conquanto discernível em
seu Deus com ele) suba para Jerusalém, que é em
Judá, e edifique a casa do Senhor, Deus de Israel;
ambas as formas do decreto, é claramente
ele é o Deus que habita em Jerusalém. 4E todo perceptível na passagem hebraica. De fato,
remanescente, seja qual for o lugar em que é pere é inimaginável que o conteúdo específico
grino, seja ajudado pelos homens desse lugar com desse documento se originasse inteiramente
prata, com ouro, com bens e com animais, afora da iniciativa de um persa. Ademais, não
a oferta voluntária para a casa de Deus, que está
em Jerusalém. precisamos concluir que o documento tenha
sido redigido por um secretário judeu ou
O edito de Ciro relativo aos judeus é preparado por algum tipo de departamento
preservado pelo cronista em duas formas. de assuntos judaicos na burocracia persa.
Além do edito hebraico, nesta passagem, É necessário presumir, contudo, que os
há um edito aramaico algo diferente em persas estavam em consulta com os líderes
6.3-5. Eruditos que aceitaram a autentici em Jerusalém. É possível, na verdade, que
dade do edito em princípio sentiram-se o cronista tenha retocado o documento. A
compelidos a escolher entre as passagens frase todo o seu povo, no versículo 3, por
hebraica e aramaica.6 Vários eruditos exemplo, destina-se a incluir os israelitas
recentes, inclusive Myers (p. 5), acataram do Norte, a quem o cronista via como
o ponto de vista de Bickerman (p. 250-253) vivendo na Judá pré-exílica (cf. 2Cr 30.21;
31.6).
6 M artin N oth, por exemplo, considera o hebiaico com o a paráfrase do,
cronista do decreto aramaico original (The H isto ry of Israel, tradu-,
zido p ara o inglês per G odm an. Londres: A lam a n d Charles Black, 7 J. R Pritchard, ed., Antient N ear Eastern Tects Relating to O ld Testa-
1958, p. 307). m ent, p. 316 (a seguir abreviada p ara ANEI>.
456
Assim diz Ciro, conquanto reminiscente incluísse não-judeus, uma vez que os
do “assim diz o Senhor”, era uma fórmula exilados tinham tido permissão para manter
persa oficial (cf. Bowman, p. 571). Rei da suas próprias comunidades judaicas locais
Pérsia não ocorre em inscrições persas da em Babilônia.
realeza. As palavras da Pérsia se entendem
melhor como tendo sido surgidas pelo 2. O Retorno (1.5-11)
cronista, segundo terminologia corrente na
parte ocidental do Império (cf. Bickerman, 1) Reação dos Líderes (1.5)
p. 255,256). A expressão Deus do céu não
é encontrada na literatura hebraica mais sEntão se levantaram os chefes das casas
antiga, mas é comum tanto em fontes paternas de Judá e Benjamim, e os sacerdotes, e
judaicas bíblicas como não-bíblicas durante os levitas, todos aqueles cujo espirito Deus desper
tara, para subirem a edificar a casa do Senhor, que
o período persa. É fato bem documentado está em Jerusalém.
que os persas referiam-se aos deuses de
povos subjugados pelos títulos que estes Um dos temas freqüentemente repetidos
preferiam (cf. Bickerman, p. 256,257). na Bíblia é o de que Deus se manifesta e
Quando Ciro diz que o Deus dos judeus
o homem responde à sua revelação. Deus,
me deu todos os reinos da terra, está empre por sua própria iniciativa, suscitou o espí
gando o mesmo tipo de terminologia que rito de Ciro para livrar os judeus do exílio.
costumeiramente empregava com respeito
Os judeus, por seu turno, cujo espírito havia
a outros deuses não-persas. No Cilindro de também sido suscitado por Deus, reagiram
Ciro, por exemplo, ele diz que foi Marduque, positivamente à revelação de Deus,
o deus de Babilônia, que lhe deu soberania iniciando preparativos para o retorno a
sobre o mundo. Tal reconhecimento dos Judá.
deuses dos povos subjugados era astúcia Os chefes das casas paternas de Judá
política, mas, sem dúvida, ia além disso.
são os chefes de clãs. A sociedade judaica
Ciro quase certamente cria que sua auto
permaneceu substancialmente patriarcal ao
ridade política derivava dos vários deuses longo do período bíblico, e as decisões mais
que eram adorados dentro de seu Império. importantes eram tomadas pelos cabeças
Bickerman (p. 258) presume que seja seu dos grupos familiares.
Deus com de não é mais que uma típica
Conquanto o edito possa ter tido apli
expressão oriental de bom desejo. É melhor
cação para “todo o seu povo” (1.3),
compreendida, porém, sob luz diferente.
incluindo, presumivelmente, as tribos do
Segundo o Cilindro de Ciro, cada pessoa Norte, o cronista está sendo realista, ao fazer
deslocada tinha permissão de levar o seu notar que a reação ao edito veio de Judá
deus de volta à sua terra natal. Os judeus
e Benjamim. Essas duas tribos tinham cons
também tiveram tal privilégio, conquanto, tituído o reino meridional de Judá (lRs
logicamente, não trouxessem qualquer
12.21) após a morte de Salomão, e eram
imagem de seu Deus para levar de volta
reconhecidas pelo cronista como consti
fisicamente consigo (cf. Bowman, p. 572).
tuindo a comunidade pós-exílica em Judá
O hebraico dos versículos 3 e 4 é (cf. Ne 11.4).
complexo e tem resultado numa tradução Ao tempo do cronista, o clero judaico
um tanto ambígua. O sentido, contudo, é estava rigidamente dividido em dois grupos
claro. É dada permissão para que qualquer principais: um sacerdócio de primeira classe,
judeu que assim o desejasse retornasse a chamado os sacerdotes, e um sacerdócio
Judá. Ele deveria ser assistido financeira de segunda classe, chamado os levitas.
mente por aqueles que decidissem Embora escritores posteriores buscassem
permanecer em Babilônia. Não há razão remontar esta divisão ao período mosaico
para se entender que homens desse lugar (cf. Nm 3.9,10), a evidência bíblica total
457
indica que não teve lugar; té o período pós- mente, não é premeditado. Tudo o que se
-exílico ou a era exílica anterior.8 ofereceu voluntariamente deve ser entendido
como referindo-se à “oferta voluntária” de
2) Ássistência de Companheiros Judaicos 1.4. Esta última expressão representa um
(1.6) termo técnico que designa uma categoria
6E todos os seus vizinhos os ajudaram com especial de ofertas litúrgicas.
utensílios de prata, com oura, com bens, com
animais e com coisas preciosas, afora tudo o que 3) Retorno dos Vasos Sagrados (1.7-11)
se ofereceu voluntariamente:
Segundo o edito, cada exilado que retor 7Também o rei Ciro tirou os utensílios que
pertenciam à casa do Senhor e que Nabucodonozor
nava deveria receber ajuda dos “homens tinha trazido de Jerusalém e posto na casa de seus
desse lugar” (1.4), mas o cronista diz que deuses. 8Ciro, rei da Pérsia, tirou-os pela mão de
todos os seus vizinhos os ajudaram. A decla Mitredate, o tesoureiro, que os entregou contados
ração posterior geralmente é tida como a Sesbazar, príncipe de Judá. ’Este é o número
deles: Trinta bacias de ouro, mil bacias de prata,
incluindo os babilônios. Não se pode, vinte e nove incensários, ‘“trinta taças de ouro,
porém, dizer com segurança se os babilô quatrocentas e dez taças de prata e mil outros uten
nios fizeram ou não contribuições. Não é sílios. nTodos os utensílios de ouro e de prata
improvável, contudo, que isto estivesse na foram cinco mil e quatrocentos; todos estes levou
mente do cronista. Segundo Isaías havia Sesbazar, quando os do cativeiro foram conduzidos
de Babilônia para Jerusalém.
ressaltado claramente, o retomo de Babi
lônia se compararia ao êxodo do Egito (cf. Em 597 e 587 a.C. Nabucodonozor
Is. 41.17,18; 43.16,17; 48.21). O cronista, havia pilhado os utensílios sagrados
interpretando o edito de Ciro à luz da narra (incluindo uma variedade de objetos de
tiva de Êxodo (Ex 3.21,22; 11.2,3; 12.35,36), culto) do Templo de Salomão (cf. 2Rs 24.13;
crê que os babilônios, como os egípcios an 25.13,14; Jr 52.17-19), transportando-os
teriormente, tinham concedido assistência como troféus para os seus deuses em Babi
financeira aos hebreus que partiam (cf. lônia. Ciro, em harmonia com sua atitude
Myers, p. 8,9). benevolente para com as várias religiões em
Dois pequenos erros de escribas podem seu Império, permitiu que os judeus
ser detectados no Texto Massorético. fizessem retornar esses utensílios para Jeru
lEsdras 2.9 revela que a expressão “com salém. M itredate, que participou da
vasos” (que consta na KJ V-N.T.) tinha, origi transação em nome de Ciro, tinha um nome
nalmente, no hebraico, o sentido de “com tipicamente persa e é chamado de tesou
tudo”. A expressão hebraica traduzida como reiro, que se trata de uma palavra tomada
afora tudo é desconhecida em outra parte. por empréstimo do idioma persa. O judeu
Bowman (p. 573) alega, de modo convin a quem os utensílios foram entregues é
cente, que rezaria, originalmente, “em chamado Sesbazar, príncipe de Judá. Foi
abundância, em adição a”. Assim, a RSV ele, de acordo com o versículo 11, que
deveria ser corrigida para “ajudaram-nos liderou o primeiro retomo para Judá.
com tudo, com prata (...) e com objetos A identidade de Sesbazar é incerta. O
preciosos em abundância, além de tudo problema é agravado pela falha do cronista
quanto lhes foi oferecido voluntariamente”. em distinguir claramente entre a obra de
A última parte do verso é ambígua. Sesbazar e a do seu sucessor Zorobabel.
Parece estabelecer um contraste entre o que Muitos estudiosos contemporâneos aceitam
os judeus eram forçados a dar e o que davam o ponto de vista de Albright (“The Date
voluntariamente. Tal contraste, aparente and Personality of the Chronicler”, p.
108-110) de que Sesbazar deve ser identifi
8 Para u m a discussão dos levitas, ver R olandde Vaux, A n d en t Israel:
Its Life and InstítatiDiis, trad. p ara o inglês por Jo h n M cH ugh (New
cado com o Senazar de lCrônicas 3.18. Este
York: M acG raw -H il, 1961), p. 358-397. último era o quarto filho do exilado rei
458
Jeoiaquim e tio do governador subseqüente contudo, parece ter sido corrigida e revisada
Zorobabel. por um considerável período de tempo e
A palavra traduzida utensílios é empre incluir tanto exilados que retornaram
gada para implementos e utensílios em quanto aqueles que não estiveram em Babi
geral. O caráter especifico dos objetos lônia (cf. Albright, The Biblical Period from
enumerados não é bem conhecido. Os Abraham to Ezra, p. 92 e nota de rodapé n.°
números mencionados no inventário são 180, p. 110,111).
confusos. No Texto Massorético, o total A RSV interpreta o verso 2a como uma
dado é 5.400, que diverge bastante da soma lista de líderes pós-exílicos de vários perío
de números para cada item. A RSV (em dos diferentes. A presença de Neemias (445
inglês) tratou do problema adotando a inter a.C.) juntamente com Zorobabel e Jesuá
pretação encontrada em lEsdras 2.13,14, (520 a.C.) indicariam que esta interpretação
mas não se tem certeza de que esta seja a é correta. A versão da lista dada em Nee
solução acertada. mias 7.7 contém 12 nomes, que, indubita
velmente, era o número original. Este nú
II. A Lista do Censo (2.1-70) mero é reminiscente das 12 tribos de Israel
1. Introdução (2.1,2a) que saíram do Egito e possivelmente outro
reflexo da idéia popular de que o retorno de
1 Estes são os filhos da província que subiram do Babilônia foi um segundo êxodo.
cativeiro, dentre os exilados, a quem Nabucodo-
nozor, rei de Babilônia, tinha levado para Babilônia, 2. Famílias Leigas (2.2b-35)
e que voltaram para Jerusalém e para Judá, cada
um para a sua cidade; 2os quais vieram com Zoro
babel, Jesuá, Neemias, Seraías, Reelaías, Mardo- 1) Por Ancestral (2.2b-20)
queu, Bilsã, Mizpar, Bigvai, Reum e Baaná.
O número dos homens do povo de Israel: 3Os
A origem da lista, neste capítulo (repeti filhos de Parós, dois mil cento e setenta e dois. 4Os
da com variações pequenas em Ne 7.6-73a), filhos de Sefatias, trezentos e setenta e dois. 5Os
tem sido material para considerável debate. filhos de Ará, setecentos e setenta e cinca 6Os filhos
Propõe-se ser uma lista dos exilados que de Paate-Moabe, dos filhos de Jesuá e de Joabe,
dois mil oitocentos e doze. 7Os filhos de Elão, mil
retornaram de Babilônia para a Judéia sob duzentos e cinqüenta e quatro. 8Os filhos de Zatu,
a direção de Zorobabel. Assim foi entendida novecentos e quarenta e cinca 9Os filhos de Zacai,
pelo cronista, que claramente tencionou tê- setecentos e sessenta. 10Os filhos de Bani, seis
la como uma enumeração dos exilados que centos e quarenta e dois. nOs filhos de Bebai,
seiscentos e vinte e três. 12Os filhos de Azgade, mil
retornaram referidos em 1.11. Que o cronis duzentos e vinte e dois. 13Os filhos de Adonicão,
ta pudesse associar uma lista encabeçada seiscentos e sessenta e seis. 14Os filhos de Bigvai,
por Zorobabel com um retorno liderado dois mil e cinqüenta e seis. 15Os filhos de Adim,
por Sesbazar ilustra sua confusão sobre os quatrocentos e cinqüenta e quatro. 16Os filhos de
dois homens. De fato, sugere que ele ten Ater, de Ezequias, noventa e oita 17Os filhos de
Bezai, trezentos e vinte e três. 18Os filhos de Jora,
ciona identificá-los. cento e doze. 19Os filhos de Hasum, duzentos e vinte
A lista em sua forma presente não deve e três. ;(lOs filhos de Gibar, noventa e cinca
ser interpretada como um simples registro
daqueles que retornaram, seja com Sesbazar A primeira parte da lista (até o v. 20)
ou com Zorobabel. Essa lista guarda indí identifica cada grupo familiar pelo ancestral
cios de período posterior e, provavelmente, remoto que se imagina ser seu fundador. A
contém material que alcança o tempo de expressão filhos de significa, na verdade,
Neemias, com quem está associada em descendentes de, como é freqüentemente o
Neemias 7. Crê-se tratar-se de uma lista de caso do Antigo Testamento.
censo autêntica da comunidade judaica pós- Há numerosas diferenças em nomes e
-exílica e possivelmente iniciada já ao tem números entre as listas de Esdras 2 e as de
po de Zorobabel. Em sua forma presente, Neemias 7. Muitas podem ser explicadas
459
como simples erros de escr ba. H. L. Allrik9 Acredita-se que a localização das cidades
constatou a maior parte das variações em seja um indício da extensão da comunidade
números como sendo erros feitos ao copiar- judaica no quinto século a.C. Que Neemias
se um sistema de enumeração pré-massoré- 3 mencione cidades como Tecoa, Bete-Zur
tico, em que os números não eram regis e Queila, não citadas nesta lista, pode ser
trados em palavras, como se dá no texto indício de que a lista precede Neemias. As
massorético. cidades se estendem de Belém a Netofá, no
Muitos dos nomes de ancestrais na lista sul de Betei, e Ai no norte, e de Senaá a
são usados pelo cronista noutras listas ge Jericó, no leste, a Lode e Ono no oeste. É
nealógicas, mas poucos deles podem ser digno de nota não constar referência a
identificados com personalidades conhe cidades no Neguebe judaico. Esse detalhe
cidas em outra parte do Antigo Testa pode assinalar que essa área, invadida e se
mento. parada de Judá em 597 a.C. (Jr 13.19), não
era habitada por judeus ao tempo em
2) Por Cidade (2.21-35) que foi feito este censo.
21Os filhos de Belém, cento e vinte e três. 22Os
homens de Netofá, cinqüenta e seis. 23Os homens 3. Pessoas do Templo (2.36-58)
de Anatote, cento e vinte e oito. MOs filhos de
Azmavete, quarenta e dois. “ Os filhos de Quiriate- 1) Os Sacerdotes (2.36-39)
-Arim, de Cefira e de Beerote, setecentos e quaren
ta e três. 26Os filhos de Ramá e de Gaba, seis %Os sacerdotes: os filhos de Jedaías, da casa de
centos e vinte e um. 27Os homens de Micmás, Jesuá, novecentos e setenta e três. 37Os filhos de
cento e vinte e dois. “ Os homens de Betei e de Ai, Imer, mil e cinqüenta e dois. wOs filhos de Pasur,
duzentos e vinte e três. 29Os filhos de Nebo, mil duzentos e quarenta ê sete. 39Os filhos de
cinqüenta e dois. “ Os filhos de Magbis, cento e Harim, mil e dezessete.
cinqüenta e seis. 31Os filhos do outro Elão, mil Após enumerar as famílias leigas, a lista
duzentos e cinqüenta e quatro. 32Os filhos de
Harim, trezentos e vinte. 33Os filhos de Lode, de se preocupa com os vários grupos de oficiais
Hadide e de Onoi, setecentos e vinte e cinca 34Os de culto. São organizados por classe e iden
filhos de Jericó, trezentos e quarenta e cinca 35Os tificados por ancestrais, como em 2.2b-20.
filhos de Senaá, três mil seiscentos e trinta. Os sacerdotes compreendem, destacada-
mente, o maior grupo de pessoal do Templo.
Sem nenhum aviso ou transição, a lista Conquanto somente quatro clãs sejam
deixa de identificar as famílias por ances mencionados, constituem quase um décimo
tral e começa a identificá-las por cidade de todas as pessoas enumeradas no
natal. Esta mudança abrupta na lista é um documento. Os vários retornos de Babilônia,
argumento contra sua unidade. Conquanto sem dúvida, incluíam um número expressivo
o cronista possa ter entendido que essas de sacerdotes. Isto seria de se esperar não só
famílias eram de exilados que retornaram porque muitos sacerdotes haviam sido inclu
às suas cidades natais pré-exílicas, a lista, ídos entre os exilados originais, mas também
provavelmente, deriva de um censo feito porque os sacerdotes jamais poderiam sentir-
após a terra ter sido substancialmente re se realmente à vontade em Babilônia. As
povoada. O fraseado alterna entre “filhos reformas deuteronômicas haviam limitado
de” e “homens de”. Embora essa alternân a prática do culto a Jerusalém. Conseqüen
cia dê margem a ambigüidade, pode-se temente, Jerusalém era o único lugar no
presumir que ambas as frases significam mundo onde um sacerdote judaico podia
“habitantes de”. A falta de uniformidade operar legalmente como sacerdote.
nessa fórmula pode ser evidência adicional Os sacerdotes incluídos na lista são todos
da origem múltipla da lista. descendentes do sacerdote de Davi, Zadoque
9 ‘T h e Lists o f Zerubbabel (N ehem iah 7 and Ezra 2) a n d th e Hebrew (lCr 24).10Contudo, no período pós-exílico
Num eral Notation”, BuOetin of tbe American Schools o f Oriental Rese
arch, dez. de 1954, p 21-27. 50 Cf. De Vaux, op. d t., p. 388, e Bowman, p. 582,583.
460
os critérios genealógicos para definição do os filhos de Ater, os filhos de làlmom, os filhos de
sacerdócio estavam mudando. Acube, os filhos de Hatita, os filhos de Sobai, ao to
Conquanto as linhagens não fossem do, cento e trinta e nove. 43Os netinins: os filhos de
Ziá, os filhos de Hasufà, os filhos de Ikbaote, 44os
traçadas estritamente em primeiro lugar (cf. filhos de Querós, os filhos de Siá, os filhos de Pa-
os filhos de Davi como sacerdotes, 2Sm dom, 45os filhos de Lebana, os filhos de Hagaba, os
8.18), a tribo de Levi emergiu como a tribo filhos de Acube, 46os filhos de Hagabe, os filhos de
sacerdotal ao tempo da monarquia (cf. a Sanlai, os filhos de Hanã, 47os filhos de Gidel, os
filhos de Gaar, os filhos de Reaías, “ os filhos de
Bênção de Moisés, Dt 33). Já no sétimo Rezim, os filhos de Necoda, os filhos de Gazão, 49os
século a.C., membros desta tribo sem filhos de Uzá, os filhos de Passéia, os filhos de Be-
distinção constituíam o sacerdócio (Dt sai, 50os filhos de Asná, os filhos de Meunim, os
10.6-9; 18.1-7). Após as reformas deutero- filhos dos nefusins,51os filhos de Baquebuque, os
nômicas de 621 a.C., contudo, o sacerdócio filhos de Hacufa, os filhos de Harur, 52os filhos de
Bazlute, os filhos de Meída, os filhos de Harsa, s3os
zadoquita no Templo de Salomão alcançou filhos de Barcos, os filhos de Sisera, os filhos de
preeminência. A despeito de um movimento Tainá, 54os filhos de Nezias, os filhos de Hatifa.
abortivo para restringir o sacerdócio dos 5SOs filhos dos servos de Salomão: os filhos de
zadoquitas (Ez 44.9-16), durante e após o Sotai, os filhos de Soferete, os filhos de Peruda, “ os
filhos de Jaalá, os filhos de Darcom, os filhos de
exílio um sacerdote chegou a ser definido Gidel, 57os filhos de Sefàtias, os filhos de Hatil, os
como qualquer descendente de Arão (cf. Lv filhos de Poquerete-Hazebaim, os filhos de Ami.
21.1; Ex 29.1-9; lCr 24; Ne 10.38). Os zado 58Todos os netinins e os filhos dos servos de
quitas não foram excluídos, mas supridos Salomão foram trezentos e noventa e dois.
com uma genealogia arônica (lCr 24.3). Os 128 cantores mencionados na lista
pertenciam ao clã de Asafe. São alistados
2) Os Levitas (2.40) separadamente dos levitas neste documento,
40Os levitas: os filhos de Jesuá, e de Cadmiel,
como o são em 7.7,24; 10.23,24 e em
dos filhos de Hodavias, setenta e quatro. Neemias 13.5. Ao tempo do cronista, no
entanto, parecem ter sido incluídos entre os
Membros da tribo de Levi que foram levitas (lCr 16.4-7,41,42). O cronista atribui
excluídos do sacerdócio como resultado das a organização dos cantores do Templo a
reformas de Josias vieram a ser chamados Davi (lCr 25). A história de Davi em Sa-
levitas. Constituíam uma espécie de sacer muel-Reis não lhe dá tal crédito. Ademais,
dócio de segunda classe, encarregados dos uma vez que os cantores do Tèmplo como
serviços em favor dos sacerdotes e da con uma corporação não são mencionados na
gregação (Nm 3.5-10). Muito poucos levitas literatura pré-exílica, presume-se que a insti
estão alistados entre os que retornaram de tuição familiar ao cronista era de origem
Babilônia. Nesta lista constam somente 74, pós-exílica. Por outro lado, como de Vaux"
em contraste com os 4.289 sacerdotes; e assinala, provavelmente houvesse cantores
Esdras teve que fazer um esforço especial no Templo pré-exílico. O cântico litúrgico
para descobrir quaisquer levitas que esti claramente antecede o exílio, como é indi
vessem dispostos a retornar (8.15-19). Fode- cado pela referência a ele em Amós 5.23,
-se presumir que devido à sua posição de in pelo fato de que muitos salmos primitivos
ferioridade menos levitas foram levados foram escritos para serem cantados e pela
cativos por Nabucodonozor. Daqueles em presença de cantores entre os que retor
Babilônia, muitos, sem dúvida, preferiram naram de Babilônia (7.7-24).
as oportunidades seculares ali às tarefas Os 139 porteiros pertenciam a seis clãs
grosseiras que os esperavam em Jerusalém. pequenos. À semelhança dos cantores, são
alistados separadamente dos levitas (cf.
3) Outros Ministrantes (2.41-58) 7.7-24), mas o cronista, aparentemente, os
considerou como uma divisão dos levitas
41Os cantores: os filhos de Asafe, cento e vinte
e oito. 42Os filhos dos porteiros: os filhos de Salum, 11 Op. dt., p. 382.
461
(lCr 9.26; 23.2-5). Os porteiros eram prima a.C. os dois grupos tenham-se fundido
riamente assistentes que guardavam as como assistentes especiais dos levitas.
portas do Templo. Havia, sem dúvida, tais
porteiros no Templo pré-exílico, conquanto 4. Famílias Não Certificadas (2.59-63)
não seja certo que os três “guardas da porta”
(2Reis 23.4; 25.8) fossem o tipo de servos de 59Estes foram os que subiram de Tel-Mela, de
trabalhos servis indicado pelo ofício pós- Tel-Harsa, de Querube, de Adã e de Imer; porém
não puderam provar que as suas casas paternas
-exílico. Seja como for, a elaborada e a sua linhagem eram de Israel: 60os filhos de
organização (lCr 26.1-19), atribuída pelo Delaias, os filhos de Tobias, os filhos de Necoda,
cronista a Davi (lCr 9.22), parece ser pós- seiscentos e cinqüenta e dois. 61E dos filhos dos
-exílica. No próprio tempo do cronista, pelo sacerdotes: os filhos de Habaías, os filhos de Hacoz,
menos, os porteiros cumpriam não só os filhos de Barzilai, que tomou mulher das filhas
de Barzilai, o gileadita, e que foi chamado do seu
simples tarefas como guardiães à porta do nome. “ Estes procuraram o seu registro entre os
Tfemplo como também deveres gerais como que estavam arrolados nas genealogias, mas não
seus zeladores (lCr 9.23-29). O salmista, foi encontrado; pelo que, por imundos, foram exclu
obviamente, considerava o ofício como um ídos do sacerdócio; 61e o governador lhes intimou
que não comessem das coisas santíssimas, até que
dos menos prestigiados mantidos por qual se levantasse um sacerdote com Urim e Tumim.
quer membro do pessoal do Templo (SI
84.10). O primeiro apêndice para a lista principal
Os netinins e os filhos dos servos de relata que havia três famílias leigas e três
Salomão são de identificação obscura. Os famílias sacerdotais que não podiam
dois grupos são contados juntos (v. 58; cf. comprovar a sua linhagem. Sendo que suas
Ne 10.28, onde somente um grupo é men genealogias não podiam ser certificadas de
cionado) e devem ter sido intimamente rela registros cuidadosamente preservados,
cionados. O substantivo nethinim tem a tiveram, temporariamente, negado status
conotação de “dados”, ou seja, os que foram pleno na comunidade. Na ausência da prova
dados e dedicados ao serviço do Templo. convencional de origem, foram identifi
Eles eram subordinados aos levitas (lCr cados pelas cinco cidades babilónicas de
9.2),12e lhes serviam de assistentes (8.20). que haviam procedido.
Conquanto B. A. Levine13tenha argumen Esta passagem é uma pista valiosa para
tado que se teriam originado como uma o significado da lista precedente. Era, mani
corporação de mercadores reais, a origem festamente, um instrumento de
deles é, na verdade, ignorada. Uma vez que Iegitimização.15 Após a queda da nação
os nomes dos nethinim são sobretudo estran houve um decidido aumento em ênfase
geiros (cf. Bowman, p. 584), alguns deles sobre pureza étnica e litúrgica. Um esforço
podem ter começado como escravos ou especial foi feito para manter “sangue puro”
prisioneiros de guerra. O cronista, caracteris e guardar contra os perigos duplos de assi
ticamente, associa a instituição com Davi milação e contaminação.
(8.20), e tais servos, sem dúvida, estavam A pessoa que acrescentou este apêndice
entre os assistentes do Templo pré-exílico. De combinou dois casos inteiramente dife
Vaux14pode estar correto em presumir que rentes. As famílias leigas estavam sob
os nethinim fossem descendentes daqueles suspeita porque não podiam comprovar que
que assistiam o clero pré-exílico, que os eram constituídas de israelitas autênticos.
filhos dos servos de Salomão fossem descen No caso das famílias sacerdotais, contudo,
dentes de servidores seculares do palácio a questão era se pertenciam ou não ao sacer
real e que após a queda do Estado em 587 dócio legítimo. Devido à crença de que
sacerdotes não certificados poderiam conta-
Cf. E. A. Speiser, “Unrecognized Dedication” Israel Exploration
Journal, 1963, p. 69-73.
“T h e N ethinim ”, J B L , junho de 1963, p. 207*212. 15 Cf. K urt Galling, “The ’Gola-Líst’ according to Ezra 2/Nehemias T
14 O p. d t., p. 89,90. JB L , ju n h o de 1951, p. 149*158; N o rth , op. d t , p. 372.
462
minar o culto e, daí, pôr em grande perigo e trinta e cinco; os jumentos, seis mil setecentos
a comunidade, foram excluídos do sacer e vinte.
dócio até que a questão pudesse ser
resolvida por autoridade competente. A O total dado para toda esta congregação
identidade do governador que tomou a não condiz com os números dados na
iniciativa na questão é desconhecida. própria lista. A discrepância pode derivar
Os sacerdotes não certificados foram de erro de copista ou ser resultante das
excluídos dos deveres e privilégios do sacer origens heterogêneás do documento. Os
dócio, inclusive de comer das coisas algarismos dados no sumário, segundo se
santíssimas. O alimento assim denominado crê, refletem a população de Judá no fim
era, sem dúvida, o que se reservava expres do quinto século a.C. e podem representar
samente para o sacerdócio. Consistia do um total corrigido com base em algarismos
peito e da coxa dos animais sacrificais e da posteriores aos constantes dessa lista.
farinha que sobrava das ofertas de cereais A maioria das teorias que têm sido apre
(Lv 2.3; 7.31-33). sentadas para justificar a inclusão de
Uma solução permanente para o escravos16 e gado na lista não é convin
problema foi postergada, até que se levan cente. Não é necessário ir-se além do
tasse um sacerdote com Urim e Tumim. reconhecimento do fato de que os antigos
Estes últimos eram os dados sagrados judeus consideravam sua propriedade como
empregados para determinar a vontade de parte de sua personalidade integral. O autor
Deus em determinada situação. Não se sabe de Jonas, por exemplo, observa que quando
se se tratava de pequenas pedras moldadas os ninivitas se arrependeram, seu gado foi
ou de pequenas varas ou de algum outro incluído no jejum e coberto com pano de
tipo de pequeno objeto. É claro, entretanto, saco e cinzas (Jn 3.7,8).17 O compilador
que o seu emprego era bastante semelhante deste segundo apêndice à lista julga que
ao lançamento de uma moeda (cf. ISm a comunidade judaica devia incluir seus
14.36-42). Por que o Urim e Tumim não escravos e, animais domésticos.
podiam ser consultados por sacerdotes certi
ficados da oomunidade não está claro. A 6. Dádivas Para o Templo (2.68,69)
Bênção de Moisés sugere que qualquer 68Alguns dos chefes das casas paternas, vindo
membro da tribo de Levi podia usá-los (Dt à casa do Senhor em Jerusalém, deram ofertas
33.8). A legislação sacerdotal pós-exílica, voluntárias para a casa de Deus, para a edificação
aparentemente, reservou o uso desse deter no seu lugar; “ conforme as suas posses, deram
minante da sorte ao sumo sacerdote (cf. Lv para a tesouraria da obra, em ouro sessenta e um
mil dáricos, e em prata cinco mil minas, e cem vestes
8.8); várias versões antigas rezam “sumo sacerdotais.
sacerdote” nesta passagem. Se este verso
sugere que nenhum sumo sacerdote havia A passagem equivalente em Neemias
sido ainda consagrado, o apêndice parece 7.70-72 mostra que este apêndice foi editado
ser bem antigo, uma vez que Jesuá (ou mais rigorosamente do que qualquer outra
Josué) já era sumo sacerdote em 520 a.C. parte da lista. O cronista empregou a lista
(Ag. 1.1; Zc 3.1). em dois contextos inteiramente diferentes
e em cada caso teve que fazer certos ajustes.
5. Totais em Sumário (2.64-67) Nesta versão, o cronista antecipa a história
que tem seu início no capítulo seguinte e
64Toda esta congregação junta somava
quarenta e dois mil trezentos e sessenta, 6Safora
N ão só eram escra\os os servos e servas, mas tam bém os cantores e
os seus servos, e as suas servas, que foram sete cantoras. Estes últimos n ão devem ser confundidos com os cantores
mil trezentos e trinta e sete; também havia duzentos do Templo de 2,41. A ntes, eram escravos m antidos p ara o entreteni
cantores e cantoras. 66Os seus cavalos eram sete m ento dos ricos (cf.Ec 2.8; 2C r 35.25), e devem ser com parados com
os que E zequias deu com o trib u to a Senaqueribe (ANÈT, p. 288).
centos e trinta e seis; os seus mulos, duzentos e Cf. A. R. Johnson, The O ne and the M any in the Israelite C oncep
quarenta e cinco; 67os seus camelos, quatrocentos tion of G od (Cardiff: University o f Wales Press, 1961), p. 6,7.
463
declara que as dádivas foram feitas para III. Restauração do Culto (3.1-13)
a edificação do Templo. A versão em
Neemias interpreta as dádivas como sendo 1. A Reconstrução do Altar (3.1,2)
feitas para a obra do culto. A última parece
ser a versão original, sobretudo tendo em 'Quando chegou o sétimo mês, estando já os
filhos de Israel nas suas cidades, ajuntou-se o povo,
vista que cem vestes sacerdotais dificilmente como um só homem, em Jerusalém. zEntão se
seriam uma dádiva apropriada para a cons levantou Jesuá, filho de Jozadaque, com seus
trução do Templo. irmãos, os sacerdotes, e Zorobabel, filho de Seal-
Os dáricos de ouro seriam moedas persas tiel, e seu irmãos; e edificaram o altar do Deus de
que pesavam 8,424 gramas cada. As minas Israel, para oferecerem sobre ele holocaustos, como
está escrito na lei de Moisés, homem de Deus.
de prata não se referem a moedas, mas a
peso. O padrão não era uniforme por todo
o mundo antigo; mas o uso palestino de De acordo com o cronista, a primeira
mina parece ter sido de 1,26 libra. Batten coisa que os exilados recém-retornados
(p. 99) estima que o valor total das dádivas fizeram foi reconstruir o altar e restabelecer
seria de cerca de meio milhão de dólares a rotina prescrita das funções cultuais. Que
em moeda atual. Pode ter havido tal riqueza ele está substancialmente correto é fora de
na comunidade judaica pelo final do quinto dúvida, uma vez que o motivo principal
século, mas Ageu torna claro que seus para o retorno a Jerusalém foi restaurar o
recursos eram consideravelmente menos culto. Não obstante, a narrativa está repleta
abundantes ao tempo da reedificação do de ambigüidades e pontos obscuros.
Templo (cf. Ag 2.3). O primeiro verso é quase idêntico à intro
Os ofertantes deram conforme as suas dução da leitura da lei (Ne 7.73b; 8.1a; cf.
posses. Os dízimos, as primícias e a maior lEsdras 9.37b-38a), que segue a lista do
parte das outras ofertas esperadas dos censo no livro de Neemias. A intima
antigos judeus refletem este princípio de concordância verbal entre as duas passa
dar. Paulo fornece-lhe expressão clássica gens tem levado alguns estudiosos a crer
em ICoríntios 16.2. que a maior parte da declaração (exceto no
que diz respeito ao local da reunião) ficava,
originalmente, na porção final do
7. A Terra Repovoada (2.70) documento do censo (ex. Bowman, p. 588).
Mais provavelmente, contudo, é que o
70Ora, os sacerdotes e os levitas, e alguns do cronista começou duas histórias diferentes
povo, tanto os cantores como os porteiros e os neti- com uma fórmula quase idêntica (cf. Myers,
nins habitaram nas suas cidades e todo o Israel p. 26). Foi, presumivelmente, a coincidência
nas suas cidades.
de que ambos os acontecimentos (de Esdras
3 e Neemias 8) tiveram lugar no sétimo mês
O Texto Massorético omite as palavras (setembro-outubro) que levou o cronista a
“em Jerusalém e sua vizinhança” (que começar as duas passagens com as mesmas
constam na RSV, em inglês — N.T.). A RSV palavras. O sétimo mês mencionado em
recuperou essa frase que falta de lEsdras Neemias 7.73b é, provavelmente, aquele do
5.40. Esta passagem pressupõe um tempo ano em que Esdras chegou em Jerusalém
muito após Sesbazar, quando Jerusalém e (398 a.C.). Nesta passagem, contudo, o
outras cidades de Judá haviam sido edifi cronista pode estar ainda fazendo alusão
cadas e repovoadas. Também reflete uma ao primeiro ano de Ciro (cf. 1.1).
vez mais a idéia de que o retorno de Babi O cronista, inadvertidamente, misturou
lônia foi um segundo êxodo. A segunda as carreiras de Sesbazar e Zorobabel (ver
conquista está agora completa, e o povo está a introdução). Foi Sesbazar quem primeiro
confortavelmente instalado em suas cidades empreendeu a restauração do culto em Jeru
(cf. Js 11.23). salém (1.8-11; 5.14-16). Os capítulos 3 e 4
464
devem estar refletindo basicamente sua principais perturbadores. Eram descen
obra, que foi empreendida durante o reinado dentes dos israelitas do Norte, adoradores
de Ciro. Se esses dois capítulos preservam de Iavé que tinham-se misturado com os
dados autênticos sobre Zorobabel (como mesopotâmios trazidos a Israel por Sargão
bem pode ser o caso), tais dados, cronolo 11 (2Rs 17.24), Esar-Hadom (Ed 4.2) e
gicamente, se encaixam após 5.1. Ageu e Osnapar (isto é, Assurbanipal, Ed 4.9,10).
Zacarias situam o início da atividade de Os exilados que haviam retornado tinham
construção de Zorobabel e Jesuá no razão de esperar interferência por parte dos
segundo ano de Dario I (520 a.C.). samaritanos. Uma vasta parte do Judá
O altar foi erigido de acordo com as pres setentrional, incluindo Jerusalém, ficara sob
crições da lei de Moisés, o que significa controle samaritano desde pouco depois da
que foi construído de pedras do campo não queda de Judá (cf. Bright, p. 324). Os que
lavradas (Ex 20.25; Dt 27.6). Foi, aparen haviam retornado eram imigrantes não
temente, completado e posto em uso no convidados numa terra que não mais lhes
mesmo dia (cf. 3.6). É estranho que o altar pertencia. O temor que sentiam de seus vizi
devesse ser erguido no primeiro dia do nhos logo se tornaria justificado.
sétimo mês (3.1-6), uma vez que tanto o O catálogo do cronista de observâncias
Código de Santidade (Lv 23.23-25) quanto cultuais, sem dúvida, reflete as práticas de
a legislação sacerdotal (Nm 29.1) proíbem seu próprio tempo. Não obstante, chama
o trabalho nesse dia. Se a data do cronista a atenção para alguns aspectos básicos do
estiver correta, deve-se presumir que a edifi culto que remontam ao tempo de Sesbazar
cação do altar antecede este regulamento e mesmo ao período pré-exílico.
específico. O holocausto contínuo era aquele ofere
cido duas vezes diariamente, pela manhã
2. A Reinstituição dos Rituais (3.3-6) e à tarde. Em cada ocasião um cordeiro era
3Colocaram o altar sobre a sua base (pois o oferecido inteiro sobre o altar, acompanhado
terror estava sobre eles por cansa dos povos de por uma mistura de óleo de oliva e farinha,
outras terras) e ofereceram sobre ele holocaustos e uma libação de vinho (Ex 29.38-42; Nm
ao Senhor, holocaustos pela manhã e à tarde. 4E 28.1-8). O número de holocaustos era aumen
celebraram a festa dos tabernáculos como está tado em ocasiões especiais. Por exemplo,
escrito, e ofereceram holocaustos diários segundo
o número ordenado para cada dia, 5e em seguida dois eram oferecidos no sábado (Nm 28.9)
o holocausto continuo, e os das luas novas e de todas e sete (junto com dois bois e um carneiro)
as festas fixas do Senhor, como também os de qual eram oferecidos em cada um dos sete dias
quer que fazia oferta voluntária ao Senhor. 6Desde seguindo-se à Páscoa (Nm 28.16-24).
o primeiro dia do sétimo mês começaram a oferecer
holocaustos ao Senhor; porém ainda não haviam
Durante a festa dos tabernáculos os requi
sido lançados os alicerces do templo do Senhor. sitos para cada dia eram diferentes, variando
de 32 animais no primeiro dia da festa para
O cronista atribui a pressa da comuni 12 no oitavo dia (Nm 29.12-38).
dade em restaurar o culto ao fato do A festa dos tabernáculos foi observada
terror(...) dos povos de outras terras. Esta começando no décimo quinto dia do sétimo
declaração deve ser entendida à luz dos mês, duas semanas após o altar ter sido
problemas descritos nos capítulos 4-6. construído. Era, originalmente, uma festa
Como povos de outras terras, o cronista, de alegria para celebrar a colheita de cereais
provavelmente, queria incluir todos os e uvas (Dt 16.13-15). A palavra tabernáculos
diversos habitantes da área palestina, exceto (heb., sukkoth) tinha a ver com as cabanas
os exilados que haviam retomado e uns feitas de galhos de árvores e erigidas nos
poucos espíritos relacionados que tiveram campos para servirem como depósitos de
permissão de a eles se unir (cf. 6.21). Ele colheitas durante as mesmas (cf. Is 1.8). No
destaca, contudo, os samaritanos como os período pós-exílicoi, a festa era, basicamente,
465
uma comemoração da experiência no Após o culto ter sido restabelecido, os
deserto, e as cabanas, associadas com as que haviam retornado do exílio volveram
habitações temporárias usadas pelos isra sua atenção para a urgente questão da
elitas após o êxodo (Lv 23.39-43). O cronista reconstrução do centro de culto, o Templo.
considerou particularmente apropriado que A narrativa traz fortemente à lembrança
esta festa devesse ser observada no contexto a história da edificação do Templo de
próximo do novo êxodo e do novo estabe Salomão (lRs 5; lCr 22; 2Cr 2), mas
lecimento na terra. Wilhelm Rudolf (p. 31) observa, correta
Sacrifícios adicionais foram prescritos mente, que isto não é argumento contra a
para a ocasião da lua nova (Nm 28.11-15). historicidade essencial do relato.
Nesse dia, trombetas eram sopradas (Nm Pedreiros foram empregados para traba
10.10), o trabalho cessava (Amós 8.5) e lharem as pedras e carpinteiros para
refeições eram preparadas (ISm 20.5). trabalharem pedra, madeira e metal (cf.
As festas fixas do Senhor incluíam a Bowan, p. 592). Cedros do Líbano foram
festa dos tabernáculos, bem como outros cortados e trazidos para os portos fenícios
festivais cultuais que ocorriam anualmente de Sidom e Tiro, de onde eram transpor
em tempos determinados. As três festas que tados em jangadas até Jope (cf. lRs 5.9).
recebiam atenção especial no período pré- O pagamento era feito parcialmente em
-exílico eram os antigos festivais da pere prata (dinheiro) e parcialmente por troca
grinação: Páscoa e a Festa dos Pães Ázi (cf. lRs 5.11). (O fato de nenhuma menção
mos, a Festa das Semanas e a Festa dos ser feita da vasta quantidade de ouro e de
Tabernáculos (Ex 34.18,22,23; Dt 16.1-16). prata citada em 2.68,69 é evidência de que
O festival de ano-novo e o Dia da Expiação a lista do censo não pertence totalmente
recebiam atenção igual no calendário pós- ao tempo do primeiro retorno.) A concessão
-exílico (Lv 23.4-44), e sacrifícios especiais que lhes tinha feito Ciro autorizava que as
eram ordenados para cada uma das cinco despesas fossem pagas pelo tesouro real
ocasiões (Nm 28.16—29.39). (6.4). Não está claro, contudo, se todos os
A maioria dos sacrifícios e ofertas do pagamentos vinham dos cofres persas.
período pós-exílico era regulamentada por
legislação explícita. Exceção parcial ocorria 2) Organização do Trabalho (3.8,9)
com a oferta voluntária. Esta constituía
uma oferta não motivada por qualquer lei 8Ora, no segundo ano da sua vinda à casa de
Deus em Jerusalém, no segundo mês, Zorobabel,
ou voto, mas feita inteiramente segundo a filho de Sealtiel, e Jesuá, filho de Jozadaque, e os
vontade do adorador. Conquanto devesse outros seus irmãos, os sacerdotes e os levitas, e
ser feita conforme uma fórmula específica todos os que vieram do cativeiro para Jerusalém,
(Nm 15.1-10), era tão livre de restrições que deram início à obra e constituíram os levitas da
idade de vinte anos para cima, para a superinten
podia incluir até um animal defeituoso (Lv derem, a obra da casa do Senhor. 9Então se
22.23). levantaram Jesuá com seus filhos e seus irmãos,
Cadmiel e seus filhos, os filhos de Judá, como um
só homem, para superintenderem os que faziam
3. A Primeira Tentativa de Reconstrução a obra na casa de Deus; como também os filhos
do Templo (3.7-13) de Henadade, com seus filhos e seus irmãos, os
levitas.
1) Doações em Mão-de-Obra e Materiais O cronista credita a Zorobabel e Jesuá
(3.7) o lançamento dos alicerces do Templo, tal
como lhes fora dado crédito pela edificação
7Deram dinheiro aos pedreiros e aos carpin do altar (3.2). A declaração explícita em
teiros; como também comida e bebida, e azeite aos
sidônios, e aos tírios, para trazerem do Líbano 5.16 de que Sesbazar havia lançado os fun
madeira de cedro ao mar, para Jope, segundo a damentos do Templo revela que o cronista
concessão que lhes tinha feito Ciro, rei da Pérsia. confundiu os esforços abortivos de Sesbazar
466
(durante o reinado de Ciro) com as ativi lançamento do alicerce assinalava o des
dades de Zorobabel vários anos depois pontar de um novo dia. Somente havia sido
(5.1—6.15). Aorganização dos obreiros, que possível porque o Senhor é bom e porque
se centraliza em torno de Zorobabel e Je- a sua benignidade dura para sempre.
suá, deve, provavelmente, ser associada com Três grupos participaram da cerimônia.
a segunda tentativa de reconstruir o Tem Os sacerdotes sopravam as longas e
plo. Detalhes específicos sobre a obra de delgadas trombetas, que lhe eram atribuídas
Sesbazar, possivelmente não disponível ao (Nm 10.8). Os levitas eram representados
cronista, parecem ter sido substituídos jjor por um grupo de músicos chamados filhos
detalhes extraídos de um episódio posterior. de Asafe (cf. 2.41). Os últimos, cuja orga
Os leigos, sacerdotes e levitas contribu nização remontava a Davi (cf. lCr 25.1-6;
íram no lançamento dos alicerces do Tem 2Cr 29.25), tocavam os cimbalos e ento
plo. Responsabilidade especial foi dada aos avam um hino (citado de Salmos 106.1 e
levitas que serviam regularmente como 136.1; cf. lCr 16.34; 2Cr 5.13; 7.3). O povo
assistentes dos sacerdotes. A idade mínima respondeu com grande brado. O brado,
para os levitas servirem nessa capacidade provavelmente, era mais do que uma mera
era 20 anos, conquanto em outros contextos explosão espontânea de alegria. Parece ser
a idade mínima para o serviço era 25 anos parte integral da cerimônia. Brados litúr-
(Nm 8.24) e 30 anos (Nm 4.3). Cadmiel e gicos eram comuns no antigo Israel (cf. Js
Henadade são nomes levíticos comuns no 6.5-20; ISm 4.5,6; 2Sm 6.15; 2Cr 13.15;
período pós-exílico, mas os indivíduos 15.14) e eram freqüentemente acompa
mencionados aqui não são conhecidos por nhados por música.
outro modo. Dois outros nomes levíticos,
aparentemente, se perderam no Texto 4) Reação da Comunidade (3.12,13)
Massorético. Os textos gregos sugerem que 12Muitos, porém, dos sacerdotes e dos levitas,
seus filhos deveria rezar “Binnui”, e Judá e dos chefes das casas paternas, os idosos que
ter a grafia “Hodevah” (cf. Bowman, tinham visto a primeira casa, choraram em altas
p. 593). vozes quando, à sua vista, foi lançado o fundamento
desta casa; também muitos gritaram de júbilo; 13de
maneira que não podia o povo distinguir as vozes
do júbilo das vozes do choro do povo; porque o
3) Colocando os Alicerces (3.10,11) povo bradava em tão altas vozes que o som se ouvia
de mui longe.
10Quando os edificadores lançaram os alicerces
do templo do Senhor, os sacerdotes, trajando suas O começo do novo Templo era uma
vestes, apresentaram-se com trombetas, e os levitas, ocasião alegre, e o ar estava cheio de sons
filhos de Asafe, com cimbalos, para louvarem ao festivos. Mas os idosos que tinham visto
Senhor, segundo ordem de Davi, rei de Israel. "E
cantavam a revezes, louvando ao Senhor e dando- a primeira casa misturaram suas lágrimas
-lhe graças com estas palavras: Porque ele é bom; com os alegres clamores. Aquelas eram
porque a sua benignidade dura para sempre sobre lágrimas de tristeza porque o novo Templo
Israel. E todo o povo levantou grande brado, quando jamais poderia igualar-se ao que se erguera
louvaram ao Senhor, por se terem lançado os no mesmo sítio meio século antes (cf. Ag
alicerces da casa do Senhor.
2.3; Zc 4.10).
I Era conveniente que o lançamento dos
alicerces do templo fosse acompanhado por
IV. A Edificação do Templo é
um serviço religioso de louvor e gratidão.
Interrompida (4.1-24)
Desde 587 a.C. o local do Templo havia si 1. Encontro com Adversários (4.1-5)
do uma massa de ruínas. O culto fora inter
rompido, a nação destruída e o povo espa 1) A Oferta a Zorobabel (4.1,2)
lhado. Agora, mediante iniciativa divina, ‘Ora, ouvindo os adversários de Judá e de
Ciro tinha permitido um novo começo. O Benjamim que os que tornaram do cativeiro edifi-
467
cavam o templo ao Senhor, Deus de Israel, nosso Deus; mas nós sozinhos a edificaremos ao
zchegaram-se a Zorobabel e aos chefes das casas Senhor, Deus de Israel, como nos ordenou o rei
paternas, e disseram-lhes: Deixai-nos edificar Ciro, rei da Pérsia.
convosco; pois, como vós, buscamos o vosso Deus;
como também nós lhe temos sacrificado desde os Zorobabel rejeitou rudemente e de modo
dias de Esar-Hadom, rei da Assíria, que nos fez
subir para aqui.
definitivo o oferecimento dos samaritanos
para ajudarem a reconstruir o Templo. De
A obra do Templo atraiu a atenção das seu ponto de vista era esta a única decisão
populações não-exílicas da terra (cf. 3.3). que poderia tomar. Enquanto os hebreus
Um desses grupos buscou Zorobabel,18 e tivessem seu próprio Templo e seu próprio
pediu-lhe que lhes permitisse participarem Estado, podiam permitir-se certa tolerância
do projeto. Identificaram-se como descen- para com os forasteiros. Mas após 587 a.C.,
lentes dos imigrantes trazidos à terra houve exigência para a rígida exclusão de
lurante o reinado de Esar-Hadom. tudo quanto fosse estrangeiro (cf. Ez
Era política dos assírios transplantar 44.4-31). O perigo de que os judeus fossem
populações de países conquistados. Estran assimilados por seus vizinhos e que sua reli
geiros haviam sido estabelecidos na parte gião fosse contaminada por influências de
setentrional da Palestina desde a conquista fora impunha uma nova exigência de pure
de Israel por Sargão II em 722 a.C. (2Rs za étnica e religiosa.
14.24; cf. ANET, p. 284). Esar-Hadom Zorobabel considerava os samaritanos
(681-669 a.C.) conquistou Tiro e Sidom particularmente inadequados para se
(ANET, p. 290), e pode ter sido nessa unirem ao seu grupo de exilados que ha
xinexão que ele trouxe novos imigrantes viam retornado. (Conquanto o cisma final
oara Israel. Esses não-israelitas recém- entre judeus e samaritanos pode não ter
chegados misturaram-se com os israelitas ocorrido até o tempo de Neemias ou poste
íativos (cf. ANET, p. 284,285) e passaram riormente, decididamente não houve perío
i ser chamados samaritanos. do de relacionamento harmonioso entre os
Não há razão para se presumir que o dois grupos.) Em primeiro lugar, eles eram
xmtato inicial desse grupo fosse no espí- etnicamente mesclados. Tinham sido tra
ito de adversários. Eles, na verdade, zidos dos recantos distantes de Babilônia
idoravam o mesmo Deus e tinham estado e da Assíria (cf. 2Rs 17.24; Ed 4.9) e
.acrificando a ele por muitas gerações (cf. tinham, seguramente, incorrido em casa
2Rs 17.26-28,32; 2Cr 30.11; 34.9; 35.18; mentos mistos com os israelitas que Sargão
lr 41.5). Mesmo Sambalá, contemporâneo deixou na terra. Em segundo lugar, a reli
ie Neemias, deu a seus filhos nomes rela gião deles era sincretista. Eles, por certo,
cionados com Iavé.19 Não é demais adoravam a Iavé, mas em certa medida
presumir que os samaritanos estivessem tinham também se apegado às religiões de
agindo de boa fé quando vieram a Judá e suas antigas terras de origem (cf. 2Rs
Benjamim (cf. 1.5)_e ofereceram sua assis 17.29-34). Em terceiro lugar, haviam
tência na edificação do Templo. violado a proibição deuteronômica de sa
crifício fora de Jerusalém. Conquanto
2) Zorobabel Rejeita o Auxílio (4.3) tivessem adorado em Jerusalém de tempos
em tempos, a maior parte de seus sacrifí
3Responderam-lhes, porém, Zorobabel, Jesuá cios tinha, claramente, ocorrido nos pontos
e os outros chefes das casas paternas de Israel:
Não convém que vós e nós edifiquemos a casa a de adoração do Norte. A aceitação de tal
grupo ameaçaria a pureza “racial” e reli
Deve perm anecer incerto se este episódio poderia ser associado com
giosa dos judeus e recriaria as exatas
Sesbazar e Zorobabel. O cronista entendeu que o evento pertencia ao condições que criam terem causado a
tem po de Ciro e quelevara à interrupção cti edificação do Templo (cf.
4.24). destruição da nação em primeiro lugar (cf.
19 Cowley, op. d t , p 114. 2Rs 17.7-23; 2Cr 36.14). Seria impensável
468
que tais pessoas tivessem permissão de to os conselheiros alugados nem especifica
car as pedras sagradas do Templo de Iavé. como se propuseram a frustrarem os cons
É também possível que Zorobabel fosse trutores. Diz, contudo, que debilitavam as
influenciado em sua decisão por motivos mãos do povo de Judá (isto é, os exilados que
mais mundanos. Sua referência ao edito de haviam retornado). A expressão hebraica
Ciro pode indicar uma tentativa ciumenta traduzida por debilitava significa, literal
de manter suas prerrogativas. Qualquer mente, “enfraqueceram as mãos deles”. Esta
gesto de cooperação com os samaritanos é uma expressão idiomática comum do
poderia ter comprometido o já ambíguo hebraico, que significa incapacitar por levar
status político de Judá.20 ao desespero (cf. 2Sm 4.1; Is 13.7; Jr 6.24);
Nossa compreensão dos motivos de e as cartas de Laquis [ANET, p. 322]).
Zorobabel não torna sua atitude arrogante
para com os samaritanos mais atraente. Os
judeus, que haviam sido tão desprezados, 2. Conflitos Posteriores (4.6-23)
estavam agora batendo a porta na cara
daqueles que desejavam compartilhar de O cronista tinha à sua disposição alguns
sua comunidade e unir-se a eles na adoração documentos informativos valiosos escritos
de seu Deus. Sementes de racismo estavam no aramaico (ver a Introdução). Um desses
sendo espalhadas e estas produziriam frutos documentos relatava a história das dificul
amargos nos dias futuros e por muitos dades encontradas pelos judeus para a
séculos, dali para a frente. Em vez de aten reedificação do Templo e a cidade de Jeru
tarem ao apelo missionário do Segundo salém. O cronista empregou este documento
Isaías para propagar a fé, Zorobabel como base para a narrativa em 4.6—6.18.
procurou mantê-la pura, cercando-a com Ele copiou livremente de sua fonte, com
um muro. Paradoxalmente, pode ter sido somente pequenas mudanças editoriais. A
esse muro de racismo e particularismo que linguagem do aramaico foi preservada em
realmente protegeu a fé nesse período das 4.8—6.18.
incursões de compromisso e diluição. É O cronista inseriu em sua narrativa sobre
convicção bíblica que, se os propósitos de a reconstrução do Templo algum material
Deus não podem ser alcançados mediante que está cronologicamente fora do lugar. Os
a sabedoria humana, eles, não obstante, o versos 5 e 24 relatam que a edificação do
serão mediante sua loucura. Templo foi retardada desde o reino de Ciro
até o segundo ano de Dario I (520 a.C.). Os
3) Os Edificadores São Hostilizados (4.4,5) capítulos 5 e 6 relatam a história da tenta
tiva bem-sucedida para reconstruir o Templo
4Então o povo da terra debilitava as mãos do
povo de Judá, e os inquietava, impedindo-os de
sob o rei posterior. Contudo, os versos 6-23
edificar; 5e assalariaram contra eles conselheiros tratam de acontecimentos associados aos
para frustrarem o seu plano, por todos os dias de reinados de Xerxes (486-465) e Artaxerxes
Ciro, rei da Pérsia, até o reinado de Dario, rei da I (465-424). Esses versos, que se preocu
Pérsia. pavam com a reconstrução dos muros da
A rejeição pouco diplomática dos sama cidade (4.12), estão fora do contexto e origi
ritanos por Zorobabel provocou uma reação nalmente nada tinham a ver com a
desfavorável entre eles e entre o outro povo reedificação do Templo.
da terra. Hostilidade para com os edifica Pode-se depreender que a fonte aramaica
dores foi o resultado inevitável, de modo que original relatava a história da reedificação
nada pôde ser realizado até o reinado de do Templo sob Dario, e então prosseguia
Dario (cf. o v. 24). O cronista não identifica com a história de frustrações semelhantes
em relação a tentativas de reconstruir a
20 Cf. A . A lt, “Die Rolle Sam arias bei der Entstehung ((es Judentum s”,
Kleine Schriften z ir Geschichte des Voltes Israel (M üchen: C. H.
cidade sob Xerxes e Artaxerxes. O cronista,
Beck’sche Verlagsbuchhandlung, 1953), B, p. 327-329. entretanto, estava preocupado com o
469
problema da reedificação do Templo. Espe visto que comemos do sal do palácio, e não nos
cificamente, ele precisava de dados para convém ver a desonra do rei, por isso mandamos dar
ilustrar o tipo de atrito que provocou o adia aviso ao rei, ,5para que se busque no livro das
crônicas de teus pais; e acharás no livro das crônicas
mento da reedificação do Templo até o reino e saberás que aquela é uma cidade rebelde, e danosa
de Dario. Ele não dispunha de tais dados e a reis e províncias, e que nela houve rebelião em
substituiu-os por histórias sobre eventos do tempos antigos; por isso é que ela foi destruída.
tempo de Xerxes e Artaxerxes. Essas histó l6Nós, pois, estamos avisando ao rei que, se aquela
cidade for reedificada e os seus muros forem restau
rias, que descobriu na parte final de seu rados, não terás porção alguma a oeste do Ria”
documento, ilustravam o atrito, mas seu
contexto confundia grandemente o quadro
cronológico. Embora houvesse três reis persas
chamados Artaxerxes, foi Artaxerxes I
1) Acusação a Xerxes (4.6) (465-424 a.C.) que seguiu Xerxes e que segu
ramente é o focalizado nesta passagem.
6No reinado de Assuero, no princípio do seu Visto que ele começou a reinar cerca de 50
reinado, escreveram uma acusação contra os habi anos após o Templo ter sido completado, os
tantes de Judá e de Jerusalém.
acontecimentos relatados nesta narrativa
Se Assuero (cf. Et 10.1; Dn 9.1) deve ser novamente não têm relação com o Templo.
identificado como Xerxes (486-465 a.C.), Têm, antes, a ver com uma tentativa abor
este verso alude a um episódio que teve lugar tada para refortificar Jerusalém durante as
cerca de três décadas após a edificação do duas décadas imediatamente anteriores a
Templo ter sido concluída. Conseqüente Neemias.
mente, a acusação contra os habitantes de A fonte aramaica continha o relato de
Judá e de Jerusalém não tem relação com duas cartas diferentes escritas da Palestina,
esse evento. Se a fonte aramaica dava os deta endereçadas a Artaxerxes I. O cronista fez
lhes dessa acusação, o cronista preferiu não apenas breve menção à primeira numa curta
empregá-la. declaração hebraica (verso 7). Ele relata que
ela foi escrita por um homem que tinha o
2) Carta a Artaxerxes (4.7-16) nome persa Mitredate e o outro que tinha
o nome aramaico Tabeel (cf. o nome
7Também nos dias de Artaxerxes escreveram hebraico Tobias). Podemos apenas depre
Bislão, Mitredate, IkbeeI, e os companheiros destes, ender que o primeiro foi um representante
a Artaxerxes, rei da Pérsia; e a carta foi escrita em do rei persa e o último um líder local, talvez
caracteres aramaicos, e traduzida na língua
aramaica. 8Reum, o comandante, e Sinsai, o em Samária.
escrivão, escreveram uma carta contra Jerusalém, Bislão não é nome próprio, mas uma
ao rei Artaxerxes, do teor seguinte, 9isto é, escre palavra aramaica que significa “em paz”.
veram Reum, o comandante, Sinsai, o escrivão, e os Rudolph (p. 34) está, sem dúvida, certo em
seus companheiros, os juizes, os governadores, os
admitir que o original continha “contra Jeru
oficiais, os persas, os homens de Ereque, os babilô
nios, os susanquitas, isto é, os elamitas, 10e as salém”. Assim nos é dito somente que dois
demais nações que o grande e afamado Osnapar oficiais e os companheiros destes escreveram
transportou, e que fez habitar na cidade de Samãria “contra Jerusalém”. A substância da
e no restante da província dalém do R ia '‘Eis, pois, acusação não é fornecida.
a cópia da carta que mandaram ao rei Artaxerxes:
“ Teus servos, os homens de além do Rio, assim Escrita em caracteres aramaicos, tendo
escrevem: l2Saiba o rei que os judeus que subiram sido o aramaico a principal língua da diplo
de ti a nós foram a Jerusalém, e estão reedificando macia e comércio empregada por toda a
aquela rebelde e malvada cidade, e vão restaurando parte ocidental do Império. Foi, presumivel
os seus muros e reparando os seus fundamentos.
13Agora saiba o rei que, se aquela cidade for reedi mente, traduzida para o hebraico, para
ficada e os muros forem restaurados, eles não benefício dos judeus locais, ou para o persa,
pagarão nem tributo, nem imposto, nem pedágio; e beneficiando o rei. As palavras “caracteres
assim se danificará a fazenda dos reis. 14Agora, aramaicos” encontradas no texto hebraico
470
no final do verso 7 indicam, simplesmente, de Jerusalém e restaurando os seus muros
que o que se segue no início do verso 8 está fortificados. Na ausência de qualquer auto
na língua aramaica. rização persa para transformar Jerusalém
A história da segunda carta endereçada num bastião fortificado, Reum e Sinsai inter
a Artaxerxes é apresentada em sua inteireza pretaram esta atividade como traição e como
e contém o texto da carta dirigida ao rei e uma ameaça a toda a região de além do Rio
sua resposta. A correspondência não está (o nome oficial para a satrápia persa que fica
datada, mas geralmente se concorda que entre o Eufrates e o Mediterrâneo). Os persas
pertence ao período imediatamente anterior permitiram o máximo de autonomia local
à missão de Neemias. por todo o Império, mas nunca toleraram
A carta endereçada a Artaxerxes é atri qualquer sinal de insubordinação. Com toda
buída a Reum, o comandante, e Sinsai, o probabilidade, os judeus estavam edificando
escrivão. Ambos os homens têm nomes defesas contra vizinhos hostis, e não contra
babilónicos e presume-se terem sido repre a Pérsia. Não obstante, Jerusalém tinha uma
sentantes do governo persa. A palavra reputação bem merecida de cidade rebelde,
traduzida por comandante não se refere a um e danosa (cf. 2Rs 18.13—19.37; 14.1-16;
oficial militar, mas a um comissário de alta 24.20—25.21). Tudo estava registrado no
patente, encarregado dos negócios reais. De livro das crônicas de teus pais (dos reis
igual modo, o título de escrivão para Sinsai persas). Reum e Sinsai não podiam deixar
denota uma posição oficial de importância que a desautorizada fortificação de Jeru
consideravelmente maior do que de um salém ficasse sem ser denunciada. O povo
mero amanuense. Ambos os homens são, da terra estava contente em acrescentar seu
provavelmente, inspetores oficiais do endosso, porque os judeus tinham por
governo enviados pela coroa para acompa décadas representado uma ameaça à sua
nhar os interesses reais no ocidente (cf. posição política e econômica na região.
Bowman, p. 599,600). Comemos do sal do
palácio (v. 14) significa que o compromisso 3) A Resposta de Artaxerxes (4.17-23)
deles era com o rei. Os judeus entenderam
a expressão idiomática porque tinham uma 17Então o rei enviou esta resposta a Reum, o
ligação sagrada com Deus, a que chamavam comandante, e a Sinsai, o escrivão, e aos demais seus
companheiros, que habitavam em Samária e no
aliança de sal (Lv 2.13; Nm 18.19; 2Cr 13.5). restante do país a oeste do Rio: “ Paz! 18A carta que
Reum e Sinsai recebem o reforço, em sua nos enviastes foi claramente lida na minha presença.
queixa, de uma variedade de companheiros. 19E, ordenando-o eu„ buscaram e acharam que
desde tempos antigos aquela cidade se tem levantado
Os juizes, os governadores, os oficiais e os contra os reis, e que nela se tem feito rebelião e
persas eram, sem dúvida, membros da sedição. 20E tem havido reis poderosos sobre Jeru
hierarquia política na Palestina e vizi salém , os quais dominavam igualmente toda
nhança. Os outros grupos eram provinda dalémdo Rio; e a eles se pagavam tributos,
descendentes de imigrantes estabelecidos no impostos e pedágia 21Agora, pois, dai ordem para
que aqueles homens parem, a fim de que não seja
ocidente durante o período do Império edificada aquela cidade até que eu dê ordem. 22E
Assírio, alguns dos quais chegaram a ser guardai-vos de serdes remissos risto; não suceda que
conhecidos como samaritanos. Estas são as o dano cresça em prejuízo dos reis.” 23Então, logo
pessoas referidas pelo cronista como “os que a cópia da carta do rei Artaxerxes foi lida
perante Reum e Sinsai, o escrivão, e seus compa
adversários” (4.1) e “o povo da terra” (4.4). nheiros, foram eles apressadamente a Jerusalém,
Assurbanipal (669-663 a.C.) é o rei mencio aos judeus, e os impediram à força e com violência.
nado como Osnapar. Sabe-se dele que
seguiu a política assíria regular de deportar Os assistentes de Artaxerxes pesquisaram
e tornar a estabelecer povos conquistados. nos arquivos reais e confirmaram a acusação
A acusação feita a Artaxerxes é de que de que Jerusalém se tem levantado contra
os judeus estavam reconstruindo a cidade os reis. Tal evidência estaria facilmente
471
disponível nos registros caldeus que caíram Jerusalém; em nome do Deus de Israel lhes profe
nas mãos de Ciro em 539 a.C. tizaram. 2Então se levantaram Zorobabel, filho de
Sealtiel, e Jesuá, filho de Jozadaque, e começaram
Artaxerxes, provavelmente, não estava a edificar a casa de Deus, que está em Jerusalém;
bem informado de que reis em Jerusalém e com eles estavam os profetas de Deus, que os
haviam dominado sobre toda a província ajudavam.
dalém do Ria Contudo, sob Davi e Salomão,
Jerusalém foi o centro principal de poder Após um intervalo de cerca de dezesseis
entre o Eufrates e o Nilo. anos, os profetas Ageu e Zacarias persua
diram Zorobabel e Jesuá a renovarem os
De modo algum Artaxerxes poderia
esforços para a reconstrução do Templo. A
tolerar edificação não autorizada de fortifi
fonte aramaica, diferentemente do cronista,
cações militares dentro das fronteiras de seu
Império. Reum e Sinsai tiveram ordem de não confunde Sesbazar e Zorobabel. Faz
pôr um fim imediato na atividade judaica. notar claramente que Sesbazar lançou os
Até que eu dê ordem deve-se entender como fundamentos do Templo durante o reinado
de Ciro, mas que nunca concluiu a obra
um retoque editorial por alguém; este
mesmo rei de fato mais tarde autorizou (5.13-16). Concorda com Ageu e Zacarias em
Neemias a refortificar a cidade. que os esforços de construção de Zorobabel
Reum e Sinsai, num repente, impediram tiveram lugar durante o reinado de Dario.
à força e com violência a continuação da Portanto, parece que a narrativa em 3.1—4.5
reconstrução dos muros de Jerusalém. Este reflete a obra de Sesbazar, conquanto talvez
suplementada com detalhes extraídos da
deve ter sido um choque violento, que
resultou na derrota dos judeus e destruição carreira posterior de Zorobabel.
de sua obra. Foi, ostensivamente, esta catás O profeta Ageu pregou em Jerusalém
trofe que levou Hanâni e Susã para relatar durante o segundo ano de Dario I, ou seja,
a Neemias que “está derribado o muro de em 520 a.C. Em seu primeiro sermão, ele
Jerusalém, e as suas portas queimadas a instou Zorobabel e Jesuá (Josué) a reedifi
carem o Templo (Ag 1.3-11). A passagem
fogo” (Ne 1.3).
seguinte indica que eles responderam à sua
3. A Obra do Templo É Abandonada (4.24) pregação e puseram-se a trabalhar na cons
Z4Então cessou a obra da casa de Deus, que trução dentro de um mês (Ag 1.12-15). Ageu
estava em Jerusalém, ficando interrompida até o não menciona qualquer tentativa prévia de
segundo ano do reinado de Daria, rei da Pérsia. reconstrução do Templo por Sesbazar ou por
qualquer outro. Isso provavelmente não
Este verso foi composto pelo cronista significa mais do que dizer que os inícios de
para resumir a história da reedificação do Sesbazar foram tão escassos que o projeto
Templo. Então não pode significar que a precisou ser recomeçado desde o princípio.
obra do Templo tenha parado após o Dois meses após Ageu ter começado a
episódio precedente do reinado de Arta pregar, Zacarias, cujo ministério é datado de
xerxes I. Se então é temporal, deve estar-se 520 a 518 a.C., uniu-se a ele (Zc 1.1; 7.1). Ao
referindo à interrupção descrita nos versos tempo em que Zacarias começou a pregar,
1-5. É difícil imaginar que o cronista tencio a obra do Templo já estava em andamento.
nasse dar a entender que os reinados de Ele louva a obra de Zorobabel e prediz que
Xerxes e Artaxerxes ocorressem entre os de ele teria êxito em concluir a tarefa (Zc
Ciro e Dario. 4.6-lOa).
V. A Segunda Tentativa de Reconstruir Zorobabel era filho de Sealtiel, o filho
o Templo (5.1—6.22) mais velho de Jeoiaquim (Jeconias; cf. lCr
3.17). Este último, e não Zedequias, era geral
1. O Início da Obra (5.1,2) mente considerado o último rei legítimo de
'Ora, os profetas Ageu e Zacarias, filho de Ido, Judá. Assim, Zorobabel era visto como o
profetizaram aos judeus que estavam em Judá e em cabeça da casa de Davi. Não nos é dito se
472
ele acompanhou o seu tio Sesbazar (Senazar; Bardia e o suicídio de Cambises em 522 a.C.
cf. lCr 3.18) a Jerusalém ou se veio em Esses acontecimentos foram vistos em Judá
algum tempo subseqüente. Ageu deixa a como sinal de que Deus estava intervindo
impressão de que Zorobabel e Jesuá tinham para libertar os judeus do domínio estran
estado em Judá por algum tempo antes de geiro. Ageu havia predito a violenta
520 a.C. derrocada do Império Persa (2.21,22) e
prometera aos judeus que os tesouros do
2. O Episódio Tatenai (5.3—6.13) mesmo lhes pertenceriam (2.6-9). Zacarias,
em termos semelhantes, havia anunciado a
1) A Investigação (5.3-5) intervenção divina “para derrubarem os
3Naquele tempo vieram ter com eles Tatenai, o
chifres das nações” (1.21)eentregá-lascomo
governador da província a oeste do Rio, e Setar- “presa daqueles que os serviram” (2.9).
-Bozenai, e os seus companheiros, e assim lhes Ambos os profetas tinham mais do que suge
perguntaram: Quem vos deu ordem para edificar esta rido que a regência de Zorobabel tomaria o
casa, e completar este muro? 4Ainda lhes pergun lugar da regência da Pérsia. Ageu referiu-se
taram : quais são os nomes dos homens que
constroem este edifício? 5Os olhos do seu Deus, a ele como um “anel de selar” (2.23). E Zaca
porém, estava sobre os anciãos dos judeus, de modo rias, em termos mais ousados e explícitos,
que eles não os impediram até que o negócio se comu anunciou que ele receberia “a honra real”
nicasse a Daria, e então chegasse resposta por carta e se assentaria “no seu trono” e dominaria
sobre isso. (6.13). Não admira que Tatenai se sentisse
A nova tentativa de reconstruir o Templo obrigado a conferir as credenciais desses
judeus.
atraiu a atenção de dois oficiais persas,
Tatenai, o governador da província a oeste Que Tatenai não pusesse um fim imediato
do Rio, e Setar-Bozenai. Eles indagaram à construção é atribuído à providência de
sobre a autorização dos judeus para edifi Deus. Deus, que havia mandado sua
carem o Templo e requereram os nomes dos punição mediante Nabucodonozor e sua
edificadores. Permitiram que a construção libertação mediante Ciro, ainda é soberano.
Sua benevolente vigilância é vista na paci
prosseguisse, porém dependendo de uma
troca de cartas com Dario I. Os 18 anos que ência do governador persa.
se haviam passado desde que Ciro autorizara
a edificação do Templo haviam acarretado 2) A Carta de Dario (5.6-17)
uma mudança importante no governo persa. 6A cópia da carta que Iktenai, o governador da
Não é de surpreender que Tatenai, membro província a oeste do Rio, e Setar-Bozenai, e os seus
companheiros, os governadores que estavam deste
do novo regime de Dario I, não estivesse lado do Rio, enviaram ao rei Dario; 7enviaram-lhe
familiarizado com o edito. um relatório, no qual estava escrito: “Ao rei Dario,
É extraordinário, contudo, que um gover toda a paz. 8Saiba o rei que nós fomos à província
nador persa fosse tão desconfiado na de Judá, à casa do grande Deus, a qual se edifica
construção de um edifício para cultos. A com grandes pedras e já a madeira está sendo posta
nas paredes, e esta obra vai-se fazendo com dili
benevolência do governo persa para com as gência, e se adianta em suas mãos. 9Então
religiões dos povos sujeitos é bem atestada perguntamos àqueles anciãos, falando-lhes assim:
em todos os períodos. Quem vos deu ordem para edificar esta casa, e
Ageu e Zacarias revelam as circuns completar este muro? roAlém disso lhes pergun
tamos pelos seus nomes, para tos declararmos, isto
tâncias que podem ter levado Tatenai é, para te escrevermos os nomes dos homens que
a ver o projeto de edificação com suspeita. entre eles são os chefes. nE esta é a resposta que
A edificação do Templo foi acompanhada nos deram: Nós somos servos do Deus do céu e da
por um movimento nacionalista em fermen terra, e reedificamos a casa que há muitos anos foi
tação, e talvez por isso motivada. O Império edificada, a qual um grande rei de Israel edificou e
acabou. 12Mas depois que nossos pais provocaram
Pfersa havia sido dominado por confusão e à ira o Deus do céu, ele os entregou na mão de Nabu
turbulência, como resultado da rebelião de codonozor, o caldeu, rei de Babilônia, o qual destruiu
473
esta casa, e transportou o povo para Babilônia. Em resposta à inquirição de Tatenai, os
l3Porém, no primeiro ano de Ciro, rei de Babilônia, anciãos judeus apresentaram uma longa
o rei Ciro baixou decreto para que esta casa de Deus
fosse reedificada. I4E até os utensílios de ouro e de recapitulação de sua história desde o tempo
prata da casa de Deus, que Nabucodonozor tinha de Salomão (v. 11-16). Tais revisões históricas
tomado do templo que estava em Jerusalém e levado são comuns no Antigo Testamento (cf. Dt
para o templo de Babilônia, o rei Ciro os tirou do 1.5—3.29; Am 2.9-12; Ne 9.6-37), pois o
templo de Babilônia, e eles foram entregues a um
homem cujo nome era Sesbazar, a quem ele tinha povo israelita sempre se apercebeu em
constituído governador; lse disse-lhe: Toma estes termos de seu passado. A explicação dos
utensílios, vai, e leva-os para o templo que está em anciãos de por que estavam reedificando o
Jerusalém, e reedifique-se a casa de Deus no seu Templo logicamente foi feita a partir de
lugar. 16Então veio o dito Sesbazar, e lançou os
fundamentos da casa de Deus, que está em Jeru
Salomão, que havia ali edificado o Templo
salém; de então para cá ela vem sendo edificada, não em primeiro lugar.
estando ainda concluída.17Agora, pois, se parece Os anciãos atribuíram a destruição de
bem ao rei, busque-se nos arquivos reais, ali em Babi Judá e perda do primeiro Templo à ira de seu
lônia, para ver se é verdade haver um decreto do rei Deus (v. 12). Era convicção dos autores
Ciro para se reedificar esta casa de Deus em Jeru
salém, e sobre isto nos faça o rei saber a sua vontade” bíblicos que Deus empregara estrangeiros
para punir o seu povo por causa de seus
Tatenai enviou uma carta a Dario, rela pecados (cf. Am 3.11; Jz 2.13-15; 2Cr
tando a atividade de edificação dos judeus. 36.15-17). Nunca tencionaram dar a
Na carta, ele referiu a conversação que havia entender, contudo, que Deus aprovasse o
tido com os anciãos judeus e solicitou invasor ímpio ou que seus pecados perma
instruções de Dario. Na remessa da carta ele neceriam impunes (cf. Is 10.5-19).
teve participação não só de seu colega persa Tatenai solicitou que'Dario pesquisasse
Setar-Bozenai, mas também de seus compa os arquivos reais em Babilônia para deter
nheiros, os governadores. Estes últimos minar se Ciro havia ou não emitido o decreto
eram autoridades persas, muitas vezes tidos reclamado pelos anciãos (v. 17). Que Babi
como investigadores reais. A palavra repro lônia era de fato um lugar apropriado para
duzida como “governadores” não é o título se buscar os registros antigos de Ciro é indi
aplicado a Tatenai ou a Zorobabel (Ag 1.1). cado pela descoberta ali do famoso Cilindro
A tradução incorreta na RSV baseia-se em de Ciro, que fala da conquista do Império
lEsdras 6.7. A palavra poderia ser traduzida Caldeu por Ciro e de seus atos iniciais para
como “autoridade” ou “oficiais”, uma vez a restauração dos cultos dos povos subju
que o status exato refletido pelo termo é gados.
desconhecido.
Tatenai, em persa, não se referiu ao
Templo judaico como a casa do grande Deus 3) O Decreto de Ciro (6.1-5)
(v. 8). A recensão em lEsdras 6.9 revela que
grande modifica casa, e não Deus. Assim, 'Então o rei Dario o decretou, e foi feita uma
busca nos arquivos onde se guardavam os tesouros
ele estava se referindo ao tamanho do em Babilônia. 2E em Ecbatana a capital, que está
edifício, por outro lado, conquanto ele esti na província da Média, se achou um rolo, e nele
vesse impressionado com o tamanho da estava escrito um memorial, que dizia assim: 3“ No
estrutura, a palavra traduzida por grandes primeiro ano do rei Ciro, o rei Ciro baixou um
na sentença seguinte não se refere ao decreto com respeito à casa de Deus em Jerusalém:
Seja edificada a casa, o lugar em que se oferecem
tamanho das pedras. É uma palavra pouco sacrifícios, e sejam os seus fundamentos bem firmes;
conhecida que parece designar um tipo de a sua altura será de sessenta côvados, e a sua largura
pedra (cf. Bowman, p. 610). de sessenta côvados, 4com três carreiras de grandes
No verso 10, como também no 4, é-nos pedras, e uma carreira de madeira nova; e a despesa
se fará do tesouro do rei. sAlém disso sejam resti
dito que os persas solicitaram os nomes dos tuídos os utensílios de ouro e de prata da casa de
edificadores. Contudo, nenhum nome é Deus, que Nabucodonozor tirou do templo em Jeru
mencionado, nem mesmo o de Zorobabel. salém e levou para Babilônia e que se tornem a levar
474
para o templo em Jerusalém, cada um para o seu côvados de largura, e trinta côvados de
lugar, e tu os porás na casa de Deus.” altura”.22
O Templo é corretamente descrito como
Após uma inútil busca nos arquivos (...) o lugar em que se oferecem sacrifícios. A
em Babilônia, uma cópia do edito de Ciro
frase seja edificada a casa aparentemente se
foi descoberta em Ecbatana. Ecbatana era
refere a trazer materiais para os alicerces.
a antiga capital da Média e uma das capitais
O tipo de construção indicado pelas
do Império ftrsa, porém a palavra traduzida carreiras de pedras e carreiras de madeira não
para “capital” aqui significa “fortaleza”. Ciro está claro. Grandes pedras é a mesma
partiu de Babilônia para essa cidade- expressão incorretamente traduzida em 5.8.
-fortaleza dentro de poucos meses, após ter Este método foi, aparentemente, empregado
conquistado o Império Caldeu (Olmstead,
na construção do Templo de Salomão (lRs
p. 57), e dali emitiu o edito. O documento
7.12), e Tatenai observou que os judeus o
foi, então, arquivado “na casa dos rolos, onde estavam empregando por ocasião de sua
os tesouros estão depositados” (KJV).21 visita (5.8). Crê-se que seja uma técnica
A linguagem do decreto nos versos 3-5 arquitetônica destinada a proteger contra
assemelha-se com o que os anciãos tinham terrem otos.23
dito a Tatenai em 5.13-15. A semelhança
entre as duas passagens não significa, neces 4) A Resposta a Tatenai (6.6-13)
sariamente, que qualquer delas tenha sido
6“Agora, pois, Tatenai, governador de além do
inventada pelo autor. É mais provável que Rio, Setar-Bozenai, e os vossos companheiros, os
os construtores estivessem inteiramente governadores que estais além do Rio, retirai-vos desse
familiarizados com a linguagem do edito e lugar; 7deixai de impedir a obra desta casa de Deus;
haviam memorizado parte dele. edifiquem o governador dos judeus e os seus anciãos
esta casa de Deus no seu lugar. *Além disso, por
As diferenças entre este documento mim se decreta o que haveis de fazer para com esses
anciãos dos judeus, para a edificação desta casa de
aramaico e o edito no hebraico em 1.2-4 têm Deus, a saber, que da fazenda do rei, dos tributos
recebido muita atenção. Bickerman argu da província dalém do Rio, se pague prontamente
menta, de modo persuasivo, que eles não a estes homens toda a despesa. ’Igualmente o que
devem ser vistos como duas versões do for necessário, como novilhos, carneiros e cordeiros,
mesmo anúncio (ver o comentário sobre para holocaustos ao Deus do céu; também trigo, sal,
vinho e azeite, segundo a palavra dos sacerdotes que
1.2-4). O último foi uma proclamação oral estão em Jerusalém, dê-se-lhes isso de dia em dia
feita aos judeus por arautos. O edito sem falta; “ para que ofereçam sacrifícios de cheiro
aramaico, contudo, era um “memorando” suave ao Deus do céu e orem pela vida do rei e de
escrito (memorial), arquivado no tesouro, seus filhos. "Também por mim se decreta que todo
homem que alterar este decreto, se arranque uma
porque envolvia dispêndio de verbas reais. viga da sua casa, e que ele seja pregado nela; e da
sua casa se faça por isso um monturo. ,20 Deus,
As instruções para a construção do novo pois, que fez habitar ali o seu nome derribe todos
Templo (que reflete consulta com súditos os reis e povos que estenderem a mão para alterar
judeus) destinavam-se a restaurar o Templo, o decreto e para destruir esta casa de Deus, que está
que os caldeus haviam destruído. Portanto, em Jerusalém. Eu, Darioi, baixei o decreta Que com
diligência se execute”. 13Então Tatenai, o gover
é claro que os impossíveis sessenta côvados nador a oeste do Rio, Setar-Bozenai, e os seus
por sessenta côvados (v. 3) representam uma companheiros, executaram com toda a diligência o
versão distorcida das dimensões encontradas que mandara o rei D aria
em IReis 6.2.0 Templo restaurado, à seme
lhança do Templo de Salomão, deveria ser O côvado era o comp-imento do antebraço, uma vez padronizado como
45 centímetros. O côvado m encionado aqui pode ser o “côvado longo”
de “sessenta côvados de comprimento, vinte (Ez4 L 8 ), con tu d o ,q u e tinha 51 centim etres (cf. Bowman, p. 615).
475
Tao logo Dario viu o memorando de Ciro, Adicionalmentea animais para sacrifício,
enviou uma severa resposta a Tatenai, Setar- o culto requeria outros produtos. IHgo era
-Bozenai e seus companheiros de inquirição. usado para ofertas de cereais, o que, geral
Os judeus não só deviam ter permissão de mente, requeria também o uso de azeite e
continuar a construção, mas seriam subsi sal (cf. Lv 2.1-16). Vinho era regularmente
diados generosamente pela fazenda do rei. empregado como uma libação ou oferta de
Ameaças foram acrescentadas, para asse bebida, para acompanhar sacrifícios
gurar que não houvesse interferência públicos (Ex 29.40-42). A extensão em que
ulterior no culto judaico. os persas realmente forneceram todas estas
A introdução epistolar costumeira está coisas da fazenda do rei é desconhecida. É-
faltando na carta. O compilador, utilizando -nos dito que Tatenai e seus companheiros
a fonte aramaica, estava atento ao edito. Ele executaram com toda a diligência o que
prosseguiu diretamente da história de sua mandara o rei Dario. Todavia, o silêncio de
descoberta à citação de seu conteúdo. A Ageu e Zacarias sobre qualquer tipo de
carta era parte da resposta a Tatenai, mas subsídios sugere que o auxílio, se houve, foi
o começo dela foi, inadvertidamente, apenas simbólico. É bem sabido que a
omitido. vontade real nem sempre era plenamente
Dario compartilhava da preocupação dos implementada em províncias distantes.
outros reis persas quanto às religiões dos Dario decretou a mais severa punição
povos subjugados. Noutra ocasião, Dario para quem ousasse alterar o seu edito. Sua
interveio também para proteger um culto casa deveria ser derribada e transformada
não-persa contra interferência governa num monturo, isto é, transformada numa
mental.24 latrina pública (cf. 2Rs 10.27). Ademais o
A motivação de Dario para proteger os homem culpado deveria ser tomado de sua
direitos religiosos dos judeus era, em parte família desabrigada e executado sendo atra
pelo menos, a de que orassem pela vida do vessado por uma viga pontiaguda retirada
rei e de seus filhos. Ele pode ter tido motivos de sua própria casa. Esse tipo de execução
políticos também, pois o Egito se havia rebe é particularmente bem comprovado em
lado em 522 a.C., e não foi reconquistado registros assírios e por Heródoto (História,
por Dario até 518 (Olmstead, p. 113,142). A III. 159), que também confirma ter sido essa
amizade dos judeus, que estavam tão uma prática dos persas.
próximos da fronteira do Egito, era, certa Dario esperava que o próprio Deus
mente, uma preocupação de Dario. estaria pronto para punir quem quer que
O conteúdo geral da instrução de Dario alterasse o edito ou, doutra maneira, inter
enviada a Tatenai é historicamente crível. ferisse no que dizia respeito ao seu Templo.
A linguagem cultual do versículo 9, A sentença O Deus (...) que fez habitar ali
contudo, não pode ter-se originado de Dario. o seu nome25 é distintamente deuteronô-
Pode ser explicada como o resultado da mica (ver Dt 12.11; 14.23). Se é original do
consulta com líderes judeus, ou como decreto, deve ser atribuída a um dos asses
linguagem suprida por um escriba judeu da sores judeus de Dario.
corte persa (cf. Rudolph, p. 57,58). Não
obstante, neste caso, há inegáveis indícios da 3. A Conclusão da Obra (6.14-18)
linguagem e estilo do cronista. A lista de
ofertas e a expressão dia após dia melhor se 14Assim os anciãos dos judeus iam edificando e
prosperando pela profecia de Ageu, o profeta, e de
entenderá como ampliações supridas pelo Zacarias, filho de Id a Edificaram e acabaram a casa
cronista, ao adaptar a fonte aramaica à sua de acordo com o mandado de Deus de Israel, e de
narrativa.
O nom e divino compartilhava da própria entidade de D eus e era quase
24 Para sua intervenção no caso G ada tas, ver G W. Botsford e E. G. Sihler, identificado com a própria entidade de Deus. N o período pós-exílico
Hellenic Gvilization (New York: Columbia U niversity Press, 1920), “o nome” realm entese to m a um su b stitu to d o term o “D eus” (cf. Lv
p. 162. 24.11-16).
476
acordo com o decreto de Ciro, e de Dario, e de Arta- segundo mês do ano). De acordo com
xerxes, reis da Pérsia. 15E acabou-se esta casa no lEsdras 7.5, porém, a obra foi concluída no
terceiro dia do mês de Adar, no sexto ano do reinado
do rei D aria ,6E os filhos de Israel, os sacerdotes vigésimo terceiro dia de Adar. A última das
e os levitas, e o resto dos filhos do cativeiro fizeram datas é preferível, uma vez que o terceiro dia
a dedicação desta casa de Deus com alegria. era, aparentemente, um sábado, em que
17Ofereceram para a dedicação desta casa de Deus nenhum trabalho podia ser realizado (cf.
cem novilhos, duzentos carneiros e quatrocentos
cordeiros; e como oferta pelo pecado por todo o Bowman, p. 619). Assim, a edificação do
Israel, doze bodes, segundo o número das tribos de Templo chegou a uma conclusão bem-
Israel. ,8E puseram os sacerdotes nas suas divisões sucedida no início da primavera do ano 515
e os levitas nas suas turmas, para o serviço de Deus a.C.
em Jerusalém, conforme o que está escrito no livro A história da dedicação do novo Templo
de Moisés.
indica que houve uma tentativa consciente
A carta de Dario preparou o caminho de imitar a cerimônia associada com a dedi
para a rápida conclusão do Templo. Quando cação do Templo de Salomão (lRs 8; 2Cr
5-7). Isto seria de se esperar. A confiabilidade
a obra foi concluída, a construção foi dedi
cada, e os sacerdotes e levitas se geral do relato é indicada pelo número rela
organizaram, para suas funções cultuais tivamente modesto de animais sacrificados.
oficiais. A comunidade pós-exílica não poderia arcar
com o grande número de animais sacrifi
Ageu e Zacarias estão associados com os
estágios finais da obra. De fato, eles podem cados na dedicação do primeiro Templo.
Os versos 16-18 não parecem ser homo
ter permanecido ativos em Jerusalém por
muitos anos. Contudo, os livros atribuídos gêneos em relação ao restante da fonte
aos dois profetas não refletem qualquer aramaica. Na primeira parte da narrativa,
o povo de Jerusalém era “os judeus”, mas
conhecimento da conclusão do Templo.
Todas as mensagens em Ageu são datadas aqui eles são os filhos de Israel, que oferecem
como pertencendo ao ano 520 a.C., e a sacrifício pelo pecado por todo o Israel (...)
segundo o número das tribos de Israel. Essa
última data em Zacarias é o ano 518 a.C. (Zc
7.1). Conquanto Ageu e Zacarias possam ter descrição da comunidade judaica como
estado ainda presentes em Jerusalém sendo formada pelas 12 tribos originais de
Israel sem dúvida reflete uma mudança de
quando o Templo foi completado, em 515
a.C., é razoavelmente certo que Zorobabel autoria. O segundo autor não é o cronista,
não estava. A obra foi completada pelos contudo, pois este último, de modo caracte
rístico atribui a organização dos sacerdotes
anciãos dos judeus, e nada mais é dito sobre
Zorobabel. Presume-se que os persas e levitas a Davi (lCr 23-26). O autor desco
ouviram falar da fermentação nacionalista nhecido deste breve apêndice à fonte
em Judá, e se lembraram dele. aramaica atribui-a ao livro de Moisés.
Os decretos de Ciro e de Dario foram
instrumentalidades para tornar possível a 4. Observância da Páscoa (6.19-22)
reconstrução do Templo. A menção de Arta- 19E os que vieram do cativeiro celebraram a
xerxes cria, contudo, um problema, uma vez páscoa no dia catorze do primeiro mês. 20Pois os
que esse rei não começou a reinar senão 50 sacerdotes e levitas se tinham purificado como se
anos após o Templo ter sido concluído. A fosse um só homem; todos estavam limpos. E
imolaram o cordeiro da páscoa para todos os filhos
expressão e de Artaxerxes, reis da Pérsia é, do cativeiro, para seus irmãos, para os sacerdotes
provavelmente, uma adição por alguém que e para si mesmos. 21Assim comeram a páscoa os
não compreende o significado de 4.7-23. filhos de Israel que tinham voltado do cativeiro com
O templo foi concluído no sexto ano do todos os que, unindo-se a eles, se apartaram da imun
dícia das nações da terra para buscarem o Senhor,
reinado do rei Dario. O Texto Massorético Deus de Israel; 22e celebraram a festa dos pães
diz no dia terceiro do mês de Adar (o nome ázimos por sete dias com alegria; porque o Senhor
babilónico para fevereiro/março, o décimo os tinha alegrado, tendo mudado o coração do rei
477
da Assíria a favor deles, para lhes fortalecer as mãos A celebração das festas foi acompanhada
na obra da casa de Deus, o Deus de Israel. por grande regozijo. O Senhor os tinha
alegrado, porque ele os tinha favorecido aos
Cerca de três semanas após a dedicação olhos do rei e assim tornara possível que
do Templo, os judeus celebraram outra completassem o seu Templo. O rei da Assíria
ocasião festiva: a Páscoa e a Festa dos Pães é, logicamente, Dario, cuja carta a Tatenai
Ázimos. A celebração dessas festas foi havia preparado o caminho para a conclusão
também associada à rededicação do Templo da obra. Ele era realmente rei da Pérsia, mas
no reinado de Ezequias (2Cr 30.13-22) e no ambos os títulos podem ter sido aplicados
de Josias (2Rs 23.21-23; 2Cr 35.1-19). a ele, uma vez que a Pérsia incluía tudo
O cronista, ao apresentar esta história, quanto outrora havia sido Império Assírio.
abandonou a linguagem aramaica e
retornou ao hebraico, em que havia VI. A Viagem de Esdras a Jerusalém
composto de 1.1 a 4.7. (7.1-8.36)
A origem da Páscoa pode ser remontada
a um festival pastoral primitivo e a Festa dos 1. Introdução (7.1-10)
Pães Ázimos a uma comemoração agrícola. 1) A Genealogia de Esdras (7.1-5)
Contudo, os israelitas combinaram as duas
festas e as utilizaram para comemorar o ‘Ora, depois destas coisas, no reinado de Arta
êxodo do Egito (Ex 12.1-27; 2Cr 35.1-19). A xerxes, rei da Pérsia, Esdras, filho de Seraías, filho
de Azarias, filho de Hilquias, 2filho de Salum, filho
Páscoa foi celebrada no dia catorze do de Zadoque, filho de Aiítube, 3fiIho de Amarias, filho
primeiro mês (Nisã ou Abibe), e a Festa dos de Azarias, filho de Meraiote, 4filho de Zeraías,
Pães Ázimos nos sete dias subseqüentes. filho de Uzi, filho de Buqui, 5filho de Abisua, filho
Conquanto o Texto Massorético seja de Finéias, filho de Eleazar,'filho de Arão, o sumo
sacerdote —
ambíguo, foram, aparentemente, os levitas
que se tinham purificado e que imolaram o Após completar a história da recons
cordeiro da páscoa para todos os filhos do trução do Templo, o presente texto entra
cativeiro, para seus irmãos, os sacerdotes e diretamente na narrativa de Esdras.
para si mesmos. A purificação era uma Observa-se um hiato cronológico significa
limpeza ritual com água (Ex 29.4; Nm 8.7), tivo entre 6.22 e 7.1. Por qualquer
destinada a remover qualquer contaminação interpretação dos dados, a carreira de Esdras
que pudesse torná-los desqualificados para deve ser datada muitas décadas após 515
participarem do sacrifício. a.C. Tàis hiatos na seqüência do tempo eram
A festa foi observada pelos filhos de Israel preocupação menor para o antigo judeu.
que tinham voltado do cativeiro. O cronista, Seu propósito primário era revelar “as
de modo característico, encara estes como justiças do Senhor” (Mq 6.5), e não apre
constituindo o âmago e cerne da comuni sentar uma história completa e ininterrupta.
dade pós-exilica. Observa, entretanto, que A obra de Esdras é datada como sendo
os exilados que haviam retornado tiveram do remado de Artaxerxes, rei da Pérsia. Três
a companhia de certos indivíduos que se reis persas receberam o nome de Artaxerxes.
apartaram da imundícia das nações da terra. Conquanto o cronista não especifique qual
À luz de 4.1-3, a identidade dos que tiveram tem em mente, a tradição presume tratar-se
permissão para unir-se aos exilados que de Artaxerxes I (465-424 a.C.). Existem
haviam retornado na celebração da Páscoa razões persuasivas, contudo, para se identi
permanece incerta. Possivelmente tratava- ficar o rei como Artaxerxes II (404-358 a.C.;
se de judeus não exilados que concordaram ver a Introdução). O seu sétimo ano (7.7) foi
em aceitar a rígida ortodoxia daqueles que 398 a.C., e este, aparentemente, é o ano em
vieram de Babilônia. Por outro lado, mesmo que Esdras veio para Jerusalém.
estrangeiros circuncidados qualificavam-se Se a narrativa estiver agora em sua or
para participar da festa (Nm 9.14; Ex 12.48). dem original, depois destas coisas seria refe
478
rência a, aproximadamente, 117 anos em de Israel tinha dado; e, segundo a mão do Senhor
retrocesso até a dedicação do segundo seu Deus, que estava sobre ele, o rei lhe deu tudo
Templo. Há razão para se crer, contudo, que quanto lhe pedira. 7lkmbém subiram a Jerusalém
alguns dos filhos de Israel, dos sacerdotes, dos
a história de Neemias uma vez esteve em levitas, dos cantores, dos porteiros, e dos netinins
correta seqüência cronológica entre os capí no sétimo ano do rei Artaxerxes. “No quinto mês
tulos 1.6 e 7-10 (ver a Introdução). Neste Esdras chegou a Jerusalém, no sétimo ano deste rei.
evento, a frase pode estar-se referindo à obra 9Pois no primeiro dia do primeiro mês ele partiu de
de Neemias, que foi concluída somente cer Babilônia, e no primeiro dia do quinto mês chegou
a Jerusalém, graças à mão benéfica de seu Deus
ca de três décadas antes da missão de sobre ele. '“Porque Esdras tinha preparado o seu
Esdras. coração para buscar e cumprir a lei do Senhor, e pa
As credenciais de Esdras como sacerdote ra ensinar em Israel os seus estatutos e as suas
são apresentadas na forma de uma genea ordenanças.
logia. Ele é indicado como descendente de
Arão, que era o critério costumeiro de legi- Após apresentar as credenciais sacerdo
timização no período pós-exílico. Mas é tais de Esdras, o cronista oferece um breve
também apresentado como descendente de sumário da obra de Esdras, composta na
Zadoque. Este dado tornava-o aceitável a terceira pessoa. Este sumário antecipa, espe
qualquer que ainda mantivesse que o sacer cificamente, a passagem da primeira pessoa
dócio devesse ser estritamente zadoquita (cf. em 7.27—8.34 e considera, adiante, mais
40-48). genericamente, o resto da carreira de Esdras.
A genealogia de Esdras está baseada em Esdras é referido como um escriba. Origi
lCr 6.3-15, mas, aparentemente, foi afetada nalmente, um escriba (sopher) era alguém
pela transmissão. Seis nomes (que aparecem que possuía a habilidade de cifrar (saphar).
em lCr 6.7-11) estão faltando entre Azarias Gradualmente, o termo veio a ser aplicado
e Meraiote do versículo 3. Estes nomes a quem quer que cultivasse a arte de
foram, provavelmente, omitidos inadverti números e escrita. Uma vez que tal habili
damente por um escriba que se confundiu dade era indispensável no governo, os
com a aparência dupla do nome Amarias escribas sempre eram encontrados entre os
em sua lista (lCr 6.7,11; Cf. Bowman, oficiais de um rei. Observe-se o papel dos
p. 623). escribas no governo de Davi (2Sm 8.17;
O mesmo tipo de erro pode ter resultado 20.25); Salomão (lRs 4.3); Ezequias (Is
na omissão de quatro ou mais nomes entre 36.1-22); Josias (2Rs 22.3-20); e Jeoiaquim
Esdras e Seraías. O pai de Esdras pode ter (Jr 36.20,21).
tido o nome de Seraías, mas Seraías, filho A habilidade de escriba era também culti
de Azarias, não era o pai de Esdras. Ele foi vada para propósitos religiosos, com o
o sumo sacerdote morto pelos caldeus ao resultado de que o termo escriba veio
tempo da queda de Jerusalém em 587 a.C. designar alguém que se especializava na
(2Rs 25.18-21). O cronista pode ter tencio interpretação da Tora. Este uso técnico da
nado dizer somente que Esdras foi um palavra, contudo, não é encontrado senão
descendente (outro significado para filho) do até mais adiante no período pós-exílico (cf.
sumo sacerdote Seraías. É igualmente lCr 2.55; 2Cr 34.13; Siraque 38.24—39.11;
possível, contudo, que o olho de um escriba Mt 2.4; 13.52). Tanto a conotação política
passou de Seraías, pai de Esdras, a Seraías, quanto a religiosa da palavra podem ser rele
o sumo sacerdote, omitindo, acidentalmente, vantes em certa proporção no caso de
as gerações intermediárias. Esdras.
Há muito se mantém que Esdras era um
2) Sumário Antecipatório da Obra de Es oficial na burocracia persa e que veio a Judá
dras (7.6-10) em missão oficial. Seu título pode ter sido
6este Esdras subiu de Babilônia. E ele era transmitido por sua posição, pois é sabido
escriba hábil na lei de Moisés, que o Senhor Deus que havia escribas no serviço do governo
479
persa (4.8,9; cf. Et 3.12; 8.9). Que ele levitas, e, portanto, concluiu que havia sido
ocupasse qualquer cargo antes de sua passado por alto.
comissão de ir para Judá deve permanecer O cronista possuía profunda consciência
como tema de conjectura. A própria da soberania e benevolência de Deus nos
comissão, contudo, propiciou-lhe posição negócios de seu povo. A missão de Esdras
oficial. foi tornada possível graças a uma generosa
Embora o título de Esdras possa ter-se doação da parte do rei, mas Esdras recebeu
derivado, originalmente, de um papel polí a doação somente porque a mão do Senhor
tico, o cronista o percebeu de modo diverso. seu Deus (...) estava sobre ele. De igual
Para ele, Esdras foi um escriba porque era modo, a longa e perigosa viagem de Babi
hábil na lei de Moisés. A legitimidade do lônia à Judéia foi segura e bem-sucedida
uso que o cronista faz do título não pode porque tinha a mão benéfica do seu Deus
ser negada. Esdras era, sobretudo, um estu sobre ele. Era convicção do cronista que
dioso e mestre da lei, e o cronista vivia bem Deus estava operando o seu propósito na
próximo de seu tempo (ver a Introdução) História e que havia escolhido Esdras como
para que seu emprego do título fosse um um instrumento desse propósito.
anacronismo. Se Esdras mantinha o ofício Esdras é descrito como um homem
político de escriba, mantinha-o porque de completamente dedicado à tarefa de que
fato era um especialista em legislação Deus o incumbira. Ele tinha preparado o
judaica. seu coração para buscar (...) a lei do Senhor
O cronista não preservou a história da e aprendeu o seu sentido para sua própria
entrevista de Esdras como Artaxerxes II. vida e para a de seu povo. Ele não só apren
Ele simplesmente nos conta que o rei lhe deria da lei, mas o fazia para a cumprir,
deu tudo quanto lhe pedira. Está implícita qualificando-se, assim, para ensinar em
a idéia de que Esdras tomou a iniciativa Israel os seus estatutos e as suas orde
de fazer um pedido específico ao rei e que nanças.
o rei respondeu concedendo-lhe o que
consta no versículo 12-26. 2. A Carta de Artaxerxes (7.11-26)
A viagem de Esdras a Jerusalém
requereu cerca de quatro meses. Ela teve 1) A Introdução do Cronista (7.11)
início no primeiro mês (Nisã: março-abril) "Esta é, pois, a cópia da carta que o rei Arta
e foi completada no quinto mês (Abibe: xerxes deu a Esdras, o sacerdote, o escriba instruido
julho-agosto). O primeiro dia do mês pode nas palavras dos mandamentos do Senhor e dos
ter sido o dia em que a primeira etapa da seus estatutos para Israel:
viagem teve inicio ou ter sido o dia em que O cronista oferece o documento
uma firme decisão sobre a jornada foi aramaico nos versículos 12-26 como a cópia
tomada. (Uma pequena mudança nos da carta que o rei Artaxerxes deu a Esdras,
pontos vocálicos dos massoretas permitirá o sacerdote. Conquanto a maior parte dos
a última interpretação; cf. Bowman, p. 625.) estudiosos defenda a autenticidade essen
A partida final, do rio Ava, não teve lugar cial do documento, muitos permanecem
até o décimo segundo dia, contudo (8.31). incertos quanto a ser uma cópia palavra
Esdras foi acompanhado, em seu retorno, por palavra, livre de adições editoriais.
por um grupo de leigos e de pessoal rela Mesmo os críticos mais conservadores
cionado com o culto. A lista correspondente, admitem que um judeu desempenhou
no capítulo 8, não especifica cantores e algum papel na composição do decreto. Tal
porteiros. Estes termos podem ter sido inse suposição é possível pelo fato de que o
ridos por um redator posterior, ao não documento reflete uma familiaridade com
considerar que o cronista, de um modo as minúcias da religião judaica, não
característico, inclui esses grupos entre os possuída por um persa. Não é necessário
480
concluir, porém, que o edito foi revisado pelos Papiros de Elefantina, por exemplo.
ou suplementado por um editor judeu poste A ortografia do aramaico em Esdras é, em
rior. É possível que a doação simplesmente certos aspectos, menos arcaica do que a dos
refletia pedidos específicos feitos ao rei por Papiros de Elefantina do quinto século. Isto
Esdras (cf. o v. 6). De qualquer modo, Arta- não deve ser considerado evidência contra
xerxes não ditou o decreto sem antes a autenticidade do anterior, contudo. É bem
consultar os judeus.26 sabido que a ortografia dos livros bíblicos
Mais intrigante do que o caráter judaico foi modernizada por copistas (cf. Albright,
da carta é o fato de que concede a Esdras The Date and Personality of the Chronicler,
amplos poderes, que, aparentemente, nunca p. 118).
empregou. Há marcado contraste entre a Esdras é referido como escriba da lei do
autoridade concedida a Esdras no decreto Deus do céu. O fato de que a palavra lei
e a que ele realmente exerceu durante sua é persa, e não hebraica ou aramaica,
missão. A solução mais fácil para o empresta força à opinião de que Esdras deve
problema é propor que o edito original ter ocupado algum tipo de posição oficial
tenha sido suplementado e ampliado por no governo persa. Conquanto esta teoria
um admirador extremamente zeloso de deva permanecer, por falta de evidência
Esdras. Conquanto tal possibilidade não clara, lançaria luz sobre a origem da missão
possa ser inteiramente descartada, não pode de Esdras e a judaicidade do decreto de
também ser provada. A discrepância Artaxerxes.
poderia ser constatada de outras maneiras. A permissão de Artaxerxes para qual
O edito reflete as esperanças ambiciosas e quer judeu que desejasse ir a Jerusalém era
planos dos judeus que nunca estiveram na simplesmente uma reafirmação da bem
Judéia e que viviam centenas de milhas estabelecida política de seus predecessores
distantes, em Babilônia. Não seria surpresa (cf. 1.3). A linguagem da doação, porém,
se a real implementação da comissão de é de origem judaica. A divisão do povo em
Esdras fosse substancialmente diferente das povo de Israel (...) sacerdotes e levitas não
esperanças idealísticas projetadas antes do se originou com um persa. Ademais, quem
início da viagem. quiser ir é uma expressão judaica estere
otipada, que se originou com o pedido de
2) Autorização Para a Viagem (7.12-14)
Esdras ou com os assessores judeus do rei.
12“Artaxerxes, rei dos reis, ao sacerdote Esdras, Esdras foi comissionado pelo rei e dos
escriba da lei do Deus do céu: Saudações. 13Por seus sete conselheiros (cf. Et 1.14; Xeno-
mim se decreta que no meu reino todo aquele do
povo de Israel, e dos seus sacerdotes e levitas, que
fonte, Anabasis 1.6.4,5) para investigar em
quiser ir a Jerusalém, vá contigo. 14Porquanto és que proporção a lei judaica estava sendo
enviado da parte do rei e dos seus sete conselheiros observada em Judá e Jerusalém. A inves
para indagares a respeito de Judá e de Jerusalém, tigação, logicamente, estava associada com
conforme a lei do teu Deus, a qual está na tua mão; sua comissão de promulgar a lei judaica
A carta de Artaxerxes a Esdras está na entre todos os judeus que viviam ao
língua aramaica. Isto por si só é um argu ocidente do Eufrates (v. 25,26). Era política
mento para a sua genuinidade. O aramaico persa encorajar tal autonomia local entre
era a língua regular da diplomacia na parte todos os povos pacíficos e leais do
ocidental do Império Persa (cf. 4.8-22; Império.27Que a lei judaica, e não a persa,
5.7—6.12), como é tão claramente atestado era usada na Judéia durante o período persa
é evidente das memórias de Neemias (cf.
E m 419 a.C., um judeu cham ado Y edonàh escreveu u m a carta aos Ne 5,13). Ademais, se a Tora tivesse sido
judeus de Elefantina, n o E g ita E le incluii, nessa carta, u m decreto
de D ario II, form ulando instruções especificas para a observância da proscrita pelos persas, tal evento teria
Páscoa e da Festa dos Pães Ázim os (ANET, p. 491). N ão é necessário
duvidar-se da autenticidade desse decreta Contudo, tan to a concessão
d o decreto q uanto a natureza de seu conteúdo devem ser atribuídas 27 Cf. R. W. Rogers, A H istory o f Ancient f tr s ia (New York: Charles
á iniciativa ju daica Scribner’s Sons, 1929), p. 188,189.
481
deixado uma marca indelével na literatura ramente crível que o rei e os seus
da época. conselheiros se uniriam ao povo e aos sacer
A lei do teu Deus, a qual está na tua mão dotes na provisão de generoso apoio para
não se refere a algum rolo específico que o culto do Deus de Jerusalém. Foi neces
Esdras estivesse carregando, o que é tomado sário, contudo, que Esdras tivesse permissão
claro no versículo 25, onde temos a frase real para transportar essa riqueza por
sinônima “a sabedoria do teu Deus, que muitas milhas até Judá e destiná-la ao uso
possuis”. Esdras estava autorizado a regular que deveria ter. Tal permissão foi especifica
os negócios da comunidade judaica pela mente assegurada. Muitas vezes o fato de
lei judaica em geral. Tem sido freqüente que Esdras teve autorização para levar a
mente alegado que Esdras foi comissionado prata e o ouro que encontrasse em toda a
para introduzir algum código anteriormente província de Babilônia tem sido mal compre
desconhecido na Judéia. Que este não foi endido. Obviamente, não significa que
o caso é visto pelo fato de que a lei que estava recebendo acesso indiscriminado a
ele ensinava ali já era conhecida pela toda riqueza de Babilônia. Simplesmente
maioria dos judeus (v. 25). Eles até quer dizer que estava recebendo uma
choraram quando ouviram a leitura das permissão de exportação para todos os
palavras familiares (Ne 8.9). Foi claramente fundos que pudesse levantar.
o papel de Esdras chamar os judeus de volta Novamente, nesta passagem, pode-se
à Tora com a qual já estavam familiarizados. observar a influência judaica. As referên
É possível determinar exatamente que cias a ofertas voluntárias, ofertas de
forma a Tora havia tomado no tempo de manjares e ofertas de libações, por exemplo,
Esdras. Havia um rolo chamado “o livro mostram que a carta foi formulada com o
da lei de Moisés” (Ne 8.1), mas a evidência fim de acertar necessidades específicas e
é insuficiente para identificá-lo com qual técnicas do culto judaico.
quer documento específico, como A permissão para a retirada de supri
Deuteronômio ou o Fentateuco completos. mentos da casa dos tesouros do rei para
uso do culto judaico não cria problema
3) Dádivas de Babilônia (7.15-20) algum de credibilidade. Ciro, Cambises e
15e para levares a prata e o ouro qne o rei e os tanto Dario I quanto Dario II são notáveis
seus conselheiros voluntariamente deram ao Deus pela sua generosidade para com cultos não-
de Israel, cuja habitação está em Jerusalém, I6com -persas em várias partes do Império.
toda a prata e o ouro que achares em toda a
província de Babilônia, e com as ofertas voluntá 4) Instruções aos Oficiais no Ocidente
rias do povo e dos sacerdotes, que voluntariamente
as oferecerem para a casa do seu Deus, que está
(7.21-24)
em Jerusalém; 17portanto com toda a diligência 21E eu, o rei Artaxerxes, decreto a todos os
comprarás com este dinheiro novilhos, carneiros, tesoureiros que estão na província dalém do Rio,
e cordeiros, com as suas ofertas de cereais e as que tudo quanto vos exigir o sacerdote Esdras,
suas ofertas de libações, e os oferecerás sobre o escriba da lei do Deus do céu, prontamente se
altar da casa do vosso Deus, que está em Jerusalém. lhe conceda, Z2até cem talentos de prata, cem
r8lkmbém o que a ti e a teus irmãos parecer bem coros de trigo, cem batos de vinho, cem batos de
fazerdes do resto da prata e do ouro, o fareis azeite, e sal à vontade. 23Tudo quanto for ordenado
conforme a vontade do vosso Deus. I9Os vasos que pelo Deus do céu, isso precisamente se faça para
te foram dados para o serviço da casa do teu Deus, a casa do Deus do céu; pois, por que haveria ira
entrega-os todos perante ele, o Deus de Jerusalém. sobre o reino do rei e de seus filhos? 24Também
20E tudo o mais que for necessário para a casa do vos notificamos acerca de todos os sacerdotes e
teu Deus, e que te convenha dar, o darás da casa levitas, cantores, porteiros, netinins, e outros servos
dos tesouros do rei. desta casa de Deus, que não será lícito exigir-lhes
nem tributo, nem imposto, nem pedágia
A carta antecipava que Esdras seria libe
ralmente suprido de dádivas para o Templo A autorização de Esdras para usar supri
e o culto, antes de partir para Judá. É intei mentos reais não poderia ser implantada
482
sem a cooperação dos tesoureiros que estão que julguem todo o povo que está na província dalém
na província dalém do Rio. Conseqüente do Rio, isto é, todos os que conhecem as leis do teu
mente, Artaxerxes incluiu um parágrafo de Deus; e ensina-as ao que não ?s conhece. 2f>E todo
aquele que não observar a lei do teu Deus e a lei do
instruções para esses oficiais. rei, com zelo se lhe execute a justiça: quer seja morte,
Limites muito generosos foram estabe quer seja desterro, quer confiscação de bens, quer
lecidos quanto ao montante de prata, trigo, prisão.
vinho e azeite, que Esdras poderia requisitar
dos tesouros reais. O próprio fato de que O parágrafo final do edito parece dar a
limites são prescritos, contudo, pode ser Esdras uma boa margem de poder político.
evidência da autenticidade geral desta parte Ele foi comissionado para montar a engre
do decreto. Não há evidência de que Esdras nagem política (constitui magistrados e
tenha alguma vez recebido ou requisitado juizes) necessária para a implantação da
tão vasta quantidade desses suprimentos. Tora como a lei oficialmente reconhecida
O motivo de Artaxerxes para subsidiar para os judeus. Sua autoridade estendia-se
o culto judaico era assegurar a boa vontade aos judeus apóstatas (que deveriam ser
do Deus do céu (...) sobre o reino do rei instruídos na lei), mas, certamente, não a
e de seus filhos. Este é o mesmo motivo todo o povo que está na província dalém do
expresso por Ciro, para seus atos benevo Rio. Sua jurisdição confinava-se aos que
lentes para com os deuses não-persas conhecem as leis do teu Deus, que, logica
(ANET, p. 316). Haveria, sem dúvida, consi mente, eram os judeus de Judá.
derações terrenas também. Estava Não é de surpreender que o poder para
claramente nos interesses da Pérsia cultivar punir estivesse incluído no poder para imple
boa vontade entre os povos vassalos. Era mentar a Tora. A Tora provia punição,
particularmente importante para Arta mesmo execução. Verdadeira autonomia
xerxes II ter amizade de Judá nesse tempo. local para os judeus de Judá, necessaria
Somente poucos anos antes o Egito havia- mente, incluía o poder de impor punições
se rebelado e se liberto, temporariamente, prescritas pela Tora. A lei do teu Deus e a lei
do Império (cf. Olmstead, p. 373,374). Um do rei não devem ser entendidas como duas
Judá amistoso seria importante para a leis diferentes. A frase simplesmente signi
prevista reconquista do Egito. fica que a lei judaica dispunha de sanções
As autoridades no ocidente foram noti reais e, portanto, o respaldo do governo
ficadas de que nem tributo, nem imposto, persa.
nem pedágio deveriam ser requeridos de
qualquer pessoal clerical associado com esta 3 .0 Relato do Retorno na Primeira Pessoa
casa de Deus. A listagem de sacerdotes e (7.27—8.34)
levitas, cantores, porteiros, netinins e outros 1) A Doxologia de Esdras (7.27,28)
servos da casa de Deus pode ser admitida
como judaica quanto à sua origem. A polí 27Bendito seja o Senhor Deus de nossos pais,
tica de isentar pessoal religioso de que pôs no coração do rei este desejo de ornar a casa
pagamento de impostos, contudo, era genui do Senhor, que está em Jerusalém; “ e que estendeu
sobre mim a sua benevolência perante o rei e os seus
namente persa. Dario I repreendeu Gadatas conselheiros e perante todos os príncipes poderosos
por impor tais encargos ao pessoal religioso do rei. Assim encorajado pela mão do Senhor, meu
no templo de Apoio na Magnésia.28 Deus, que estava sobre mim, ajuntei dentre Israel
alguns dos homens principais para subirem comiga
5) Prerrogativas Políticas de Esdras
(7.25,26) Seguindo-se à carta de Artaxerxes, escrita
em aramaico, a narrativa retorna à língua
Z5E tu, Esdras, conforme a sabedoria do teu hebraica. Estes versos compreendem uma
Deus, que possuis, constitui magistrados e juizes,
curta doxologia, em que Esdras louva a Deus
28 Botsford e Sihler, op. dt., p. 162. como Aquele que tornou sua missão
483
possível. Para este homem de fé, não foi sua Daniel, descendente de Arão mediante seu
própria iniciativa ou mesmo a motivação filho Itamar (Nm 3.2). feio tempo de Esdras,
derradeira de Artaxerxes II, mas o soberano o sacerdócio legítimo era ocupado pelos
propósito de Deus que pôs no coração do rei descendentes de Arão. Não se deve ter a
este desejo de ornar a casa do Senhor. impressão de que houvesse somente dois
A doxologia introduz uma passagem sacerdotes na companhia de Esdras. Doze
substancial, composta na primeira pessoa. sacerdotes adicionais são mencionados no
Tais passagens em que Esdras é orador versículo 24, e, provavelmente, havia muitos
podem não ser excertos palavra por palavra mais. Gérson e Daniel eram chefes de suas
de uma memória de Esdras. São, porém, casas paternas, mas o número de sacerdotes
importante evidência de que o cronista que os acompanharam não é indicado.
empregou um diário de Esdras na prepa A terceira pessoa mencionada é Hatus.
ração da narrativa de Esdras (ver a Diferentemente da maioria dos outros
Introdução). homens enumerados na genealogia, Hatus
não era chefe de casa paterna. Ele foi
2) Genealogia dos Que Retornaram com alistado separadamente por tratar-se de um
Esdras (8.1-14) príncipe real da casa de Davi e um descen
1Estes, pois, são os chefes de suas casas dente do rei Jeoiaquim.
paternas, e esta é a genealogia dos que subiram Doze famílias leigas estão enumeradas
comigo de Babilônia no reinado do rei Artaxerxes: nos versículos 3-14. A fórmula incluía o
2Dos filhos de Finéias, Gérson; dos filhos de Itamar, nome do ancestral remoto que fundou a
Daniel; dos filhos de Davi, Hatus; ’dos filhos de família, o nome do representante (com o
Secanias, dos filhos de Parós, Zacarias; e com ele,
segundo as genealogias dos varões, se contaram nome de seu pai) que acompanhou Esdras
cento e cinqüenta; 4dos filhos de Paate-Moabe, Elio- e o número de indivíduos do sexo masculino
enai, filho de Zeraías, e com ele duzentos homens; que retornaram com ele. A fórmula é incom
5dos filhos de Zatu, Secanias, o filho de Jaaziel, e pleta no versículo 3, onde o nome do pai de
com ele trezentos homens; 6dos filhos de Adim,
Ebede, filho de Jônatas, e com ele cinqüenta homens; Zacarias está faltando. Os nomes Zatu e
7dos filhos de Elãa, Jesafas, filho de Atalias, e com Bani foram perdidos do Texto Massorético,
ele setenta homens; 8dos filhos de Sefatias, Zeba- mas recuperados com o auxílio de lEsdras.
dias, filho de Micael, e com ele oitenta homens; 9dos A última recensão mostra também que Utai
filhos de Joabe^ Obadias, filho de Jeiel, e com ele
duzentos e dezoito homens; l0dos filhos de Bani,
era o filho de Zabude e que o texto deveria
Selomite, filho de Josifias, e com ele cento e sessenta rezar “e com ele setenta homens” (lEsdras
homens; udos filhos de Bebai, Zacarias, o filho de 8.40). O verso 13 é tão obscuro no Texto
Bebai, e com ele vinÉe e oito homens; 12dos filhos de Massorético quanto na RSV, mas as
Azgade, Joanã, o filho de Hacatã e com ele cento recensões gregas do texto sugerem que a
e dez homens; 13dos filhos de Adonicão, que eram
os últimos, eis os seus nomes: Elifelete, Jeuel e frase traduzida que eram os últimos significa
Semaias, e com eles sessenta homens; Me dos filhos que Elifelete, Jeuel e Semaias foram os
de Bigvai, Utai e Zabude, e com eles setenta homens. últimos membros da família de Adonicão a
retornarem do exílio babilónico.
Ao final da passagem precedente, Esdras Todos os pais fundadores mencionados
diz: “ajuntei dentre Israel alguns dos homens nos versículos 3-14são também enumerados
principais para subirem comigo” (7.28), isto em 2.3-15 (cf. Ne 7.8-20). Isto não significa
é, a Jerusalém. Antes de narrar a história da que qualquer das listas tenha sido forjada
viagem em si, ele provê uma breve genea a partir da outra (cf. Rudolph, p. 79). Não
logia de legitimação daqueles que deviam é de surpreender que as mesmas famílias
ir com ele. proeminentes de judeus que voltaram do
Os primeiros dois nomes são de sacer exílio fossem mencionadas em mais de um
dotes. Gérson era descendente de Arão contexto. Ademais, as duas listas são signi
mediante seu neto Finéias (cf. Ex 6.25); ficativamente diferentes.
484
3) Recrutamento dos Levitas (8.15-20) 4) Jejum e Oração (8.21-23)
2,Então proclamei um jejum ali junto ao rio Ava,
15Ajuntei-os à margem do rio que corre para para nos humilharmos diante do nosso Deus, a fim
Ava; e ficamos ali acampados três dias. Então passei de lhe pedirmos caminho seguro para nós, para
em revista o povo e os sacerdotes, e não achei ali nossos pequeninos e para toda a nossa fazenda.
nenhum dos filhos de Levi. '‘'Mandei, pois, chamar 22Pois tive vergonha de pedir ao rei escolta de
Eliézer, Ariel, Semaías, Elnatã, Jaribe, Elnatã, Natã, soldados e cavaleiros para nos defenderem do
Zacarias e Mesulão, os chefes, como também Joia- inimigo pelo caminho, porquanto havíamos dito ao
ribe e Elnatã, que eram mestres. 17E os enviei a Ido, rei: A mão do nosso Deus é sobre todos os que o
chefe em Casífia, e lhes pus na boca palavras para buscam, para o bem deles; mas o seu poder e a sua
dizerem a Ido e aos seus irmãos, os netinins, em ira estão contra todos os que o deixam. 23Nós, pois,
Casífia, que nos trouxessem ministros para a casa jejuamos, e pedimos isto ao nosso Deus; e ele atendeu
do nosso Deus. 18E pela boa mão de nosso Deus às nossas orações.
sobre nós, trouxeram-nos um homem entendido, dos
filhos de Mali, filho de Levi, filho de Israel; e Sere-
bias, com os seus filhos e irmãos, dezoito; 19e A despeito da eficiência geral do governo
Hasabias, e com ele Jesaías, dos filhos de Merári, persa, a estrada de Babilônia a Judá não era
com seus irmãos e os filhos deles, vinte; Me dos neti segura (cf. o v. 31). Uma grande caravana,
nins, que Davi e os príncipes tinham dado para o com mulheres e crianças, e ricos tesouros (v.
serviço dos levitas, duzentos e vinte, todos eles 25-27) seria vulnerável a qualquer bando de
mencionados por nome.
ladrões, ao longo do caminho. Neemias, que
Esdras reuniu sua grande caravana29em não era menos homem de fé do que Esdras,
campo aberto, a fim de fazer as necessárias havia aceito a sensata precaução de uma
preparações para a longa e perigosa jornada. escolta militar (Ne 2.9). Esdras, contudo,
Identificação positiva para o rio que corre teve vergonha de pedir ao rei uma escolta de
para Ava está faltando, mas, sem dúvida, soldados e cavaleiros, para não dar a
tratava-se de um pequeno regato ou canal impressão de que duvidava da providência
no vale do Eufrates. de Deus. Em vez disso, ele próprio assumiu
Enquanto organizava e passava em a responsabilidade pela segurança da cara
revista a caravana, Esdras descobriu não vana e promoveu um culto especial de
haver filhos de Levi entre o grupo. O acam oração, para pedir caminho seguro. A frase
pamento foi ampliado de três dias para doze para nos defenderem do inimigo pelo
(v. 31), para que essa situação pudesse ser caminho consta no Texto Massorético como
remediada. Uma delegação foi enviada a “ajudar-nos contra o inimigo” (KJV). Isto
Ido, chefe em Casífia (ambos não identifi pressupõe que Esdras queria que os
cados de outro modo) para procurar membros de sua caravana empregassem
ministros (servidores cultuais) para o todos os meios ao seu dispor para se prote
Templo. Como resultado, três levitas impor gerem. Sua oração, portanto, não é
tantes e 38 de seus colegas, juntamente com substituto para medidas de segurança, mas
mais 220 servidores do Templo, foram uma petição para que Deus as tornasse
convencidos a participar da caravana. eficazes.
Os nomes dos delegados foram um tanto A ocasião de oração de Esdras foi acom
confundidos na transmissão. lEsdras 8.44 panhada de jejum. O jejum era um meio pelo
revela que Joiaribe e Elnatã é uma repetição qual o suplicante expressava sua humildade
acidental de Jaribe, Elnatã que a precede, e fervor perante Deus. O tipo certo de jejum,
e deveria ser omitida. Assim, os que eram cria-se, era eficaz em fazer “ouvir a voz [do
mestres, corretamente, se aplica ao grupo suplicante] no alto.”
inteiro.
5) Pondo em Segurança os Tesouros
(8.24-30)
O núm ero total de indivíduos do sexo masculino n a genealogia alcança
1.500, aproximadamente. Além disso, deve-se d ar m argem a mulheres,
crianças e ao núm ero não especificado de sacerdotes que acom pa 24Então separei doze dos principais dentre os
nharam G érson e Daniel. sacerdotes: Serebias, Hasabias, e com eles dez dos
485
seus irmãos. 25e pesei-lhes a prata, o ouro e os vasos, 6) Jornada e Chegada (8.31-34)
a oferta para a casa do nosso Deus, que o rei, os seus
conselheiros, os seus príncipes e todo o Israel que 31Então partimos do rio Ava, no dia doze do
estava ali haviam oferecido; 26entreguei-lhes nas primeiro mês, a fim de irmos para Jerusalém; e a
mãos seiscentos e cinqüenta talentos de prata, e em mão do nosso Deus estava sobre nós, e ele nos livrou
vasos de prata cem talentos; e cem talentos de ouro; da mão dos ininigos, e dos que nos armavam dladas
27e vinte taças de ouro no valor de mil dáricos e dois pelo caminha 32Chegamos pás, a Jerusalém e re
vasos de bronze claro e brilhante, tão preciosos como pousamos ali três dias. 33No quarto dia se pesou a
oura 28E disse-lhes: Vós sois santos ao Senhor, e prata, e o ouro, e os vasos na casa do nosso Deus,
santos são estes vasos; como também esta prata e para as mãos de Meremote, filho do sacerdote Urias;
este ouro são ofertas voluntárias oferecidas ao e com ele estava Eleazar, filho de Finéias, e com eles
Senhor, Deus de vossos pais. 29Vigiai-os, pois, e os levitas Jozabade,filho de Jesuá eNoadias, filho
guardai-os até que os peseis na presença dos prin de Binuí. l4Tudo foi entregue por número e peso; e
cipais dos sacerdotes e dos levitas, e dos príncipes o peso de tudo foi registrado na ocasiãa
das casas paternas de Israel, em Jerusalém, nas
câmaras da casa do Senhor. 30Então os sacerdotes A caravana de Esdras partiu do rio Ava,
e os levitas receberam o peso da prata, e do ouro,
e dos vasos a fim de os trazerem para Jerusalém, no dia doze do primeiro mês (março-abril)
para a casa do nosso Deus. e chegou a Jerusalém no primeiro dia do
quinto mês (julho-agosto; cf. 7.9). A jornada
Após orar para que Deus concedesse uma foi longa e perigosa, porém completada sem
viagem segura, Esdras tomou precauções maiores incidentes. Crédito pela chegada
especiais para a segurança dos tesouros. Ele segura foi atribuído a Deus, que os havia
delegou esta importante responsabilidade a livrado da mão dos inimigos e dos que lhes
doze dos principais dentre os sacerdotes e armavam ciladas pelo caminha
a doze levitas, inclusive Serebias e Hasabias, Os primeiros três dias em Jerusalém
que recentemente haviam-se unido ao grupo foram, sem dúvida, ocupados com os
(cf. 8.18,19).30 Os sacerdotes, provavel arranjos da chegada e as amenidades sociais
mente, tinham a responsabilidade principal costumeiras (cf. Ne 2.11). No quarto dia,
pelas ofertas, enquanto os levitas ficaram o tesouro foi depositado com as autoridades
com o encargo do transporte em si (cf. Nm apropriadas no Templo. Tudo foi entregue
3.8,31; 4.1-15). Era de praxe que os oficiais por número e peso, e o peso de tudo foi regis
consagrados do culto supervisionassem os trado. Esse inventário foi judicioso por
objetos que haviam sido dedicados ao muitas razões, mas era absolutamente
serviço de Deus. necessário exonerar os sacerdotes e levitas
A quantidade do tesouro é impressio a quem o tesouro havia sido confiado
nante. O cronista às vezes revela-se durante a viagem. Esdras havia pesado tudo
sobremaneira entusiasmado ao registrar os ao passá-lo às mãos deles em Ava (8.25-27),
números (contrastar 2Sm 24.24 com lCr e eles ficaram legalmente responsáveis pelo
21.25), e é possível que os valores aqui depósito.
tenham sido aumentados. Por outro lado, era Um dos sacerdotes que receberam o
de se esperar que o montante do tesouro tesouro no Templo foi Meremote, filho do
fosse substancial. Tinha sido doado em parte sacerdote Urias, da família de Coz, uma
pelo rei, os seus conselheiros, os seus prín das famílias sacerdotais que a princípio não
cipes, preocupados que estavam em pôde comprovar suas credenciais (2.61-63).
conquistar a boa vontade dos judeus e as Meremote fora um proeminente edificador
bênçãos de seu Deus. Representava também do muro ao tempo de Neemias (Ne 3.4,21),
as doações de todo o Israel que permanecera mas na época não chegou a ser citado como
em Babilônia. sacerdote. Conjectura-se que seu status
sacerdotal tenha-se tomado claro entre o
tempo da construção do muro (445 a.C.)
A passagem correspondente em 1Esdras 8.54 m ostra que devia haver
um a conjunção antes de Serebias. Serebias e H asabias eram levitas
e a chegada de Esdras (398 a.C.). Os dados
(8.18,19), com o o eiam , logicamente, os dez dos seus irm ãos. concernentes a Meremote são, freqüente-
486
mente, empregados como evidência de que V II. Crise Relativa aos Casamentos
Neemias precedeu Esdras. M istos (9.1— 10.44)
487
levado os líderes da comunidade a fazerem 2. Reação de Esdras em Relação aos Casa
pressão contra os casamentos ilícitos. mentos M istos (9.3-15)
Esdras não era o tipo de líder vigoroso
e agressivo que Neemias havia sido. Assim 1) Lamentação e Auto-Humilhação (9.3-5)
como ele esperou para ler a lei até ser con
vidado a fazê-lo (Ne 8.1), tomou medidas Ouvindo eu isto, rasguei a minha túnica e o
meu manto, e arranquei os cabelos da minha cabe
quanto aos casamentos mistos somente an ça e da minha barba, e me assentei atônita 4Então
te a iniciativa dos líderes da comunidade. se ajuntaram a mim todos os que tremiam das pa
Os príncipes que dele se aproximaram não lavras do Deus de Israel por causa da transgressão
são identificados por nome ou ofício, mas dos do cativeiro; porém eu permaneci sentado
atônito até a oblação da ta rd a 5A hora da oblação
o termo empregado é o utilizado por da tarde levantei-me da minha humilhação, e com
Neemias para referir-se a líderes distritais a túnica e o manto rasgado, pus-me de joelhos,
(Ne 3.9; 12.31,32). estendi as mãos ao Senhor meu Deus,
A acusação feita a Esdras era de que os
judeus não se têm separado dos povos des A excessiva reação de Esdras ao relatório
tas terras, das abominações, mas estavam sobre os casamentos mistos implica que,
se casando entre si. Os povos destas terras conquanto ele estivesse em Jerusalém por
são aqui identificados como sendo a popu mais de quatro meses, esta foi a primeira
lação local não-judaica. Conquanto ca- vez que ouvira sobre abusos quanto aos
naneus, heteus, perizeus e jebuseus ti casamentos. Há fortes evidências, contudo,
vessem há muito deixado de ser minorias de que este não era o caso. Secanias
identificáveis na terra, seus nomes ainda menciona conselho dado por Esdras e
foram usados em típico estilo deuteronô- alguns dos judeus com respeito aos casa
mico (cf. Dt 7.1; 20.17) para designar os mentos mistos (10.2,3), o que, aparen
habitantes não-judeus. Amonitas, moabitas temente, precede a crise principal. O
e egípcios, sem dúvida, deveriam ainda ser conselho, sem dúvida, deve ser associado
encontrados entre a população local. com a instrução que acompanhou a leitura
Amorreus, provavelmente, seja um erro do da lei (Ne 8.7,8). Durante a assembléia que
escriba para edomitas (cf. lEsdras 8.69). concluiu essas cerimônias do sétimo mês,
Os israelitas não condenaram original o povo levou Esdras a crer que estavam de
mente os casamentos mistos. José era fato se separando de todos os estrangeiros
casado com uma egípcia (Gn 41.45), Moi (Ne 9.2). Foi a notícia de que o povo não
sés com uma cuchita (Nm 12.1), Davi com havia mantido o seu compromisso solene
uma gesurita (2Sm 3.3); e os haréns de e não se havia separado “dos povos destas
todos os reis desde o reinado de Salomão terras” (v. 1) que deixaram Esdras atônito.
estavam repletos de mulheres estrangeiras. Ele sentiu que sua missão corria grande
Devido aos perigos de idolatria os deutero- risco de fracasso, porque os ofensores eram
nomistas restringiram severamente os os próprios homens que haviam tremido
casamentos mistos (Dt 7.1-4), mas não os diante das palavras do Deus de Israel umas
condenaram em princípio (Dt 21.10-14). No poucas semanas antes.
período pós-exílico, contudo, todos os casa Esdras expressou sua dor e desespero
mentos mistos foram por fim banidos. O pelos gestos convencionais de rasgar as
povo judeu buscou manter sua identidade vestes e arrancar cabelos da cabeça e da
como a raça santa32 mediante estrita barba. A lamentação de Esdras foi genuína
atenção à circuncisão, à observância sabá e sincera, mas Josefo (Antiq. XI. 5.3.) faz
tica e aos casamentos dentro do grupo. notar, corretamente, que foi também um
meio engenhoso de moldar a opinião
32 Lit., “a santa semente” (cf. Is 6.13). A referência é à sem ente (“descen-
pública para as medidas que viriam depois.
dência”) de A braão (G n 15.5,18; 2C r 20.7). Ao estar Esdras sentado com as roupas
488
rasgadas e os cabelos em desalinho, uma se vê. Eis que estamos diante de ti em nossa culpa;
multidão, naturalmente, se ajuntou ao seu e, por causa disto, ninguém há que possa subsistir
na tua presença.
redor. Então, ao tempo da oblação da tarde
(por volta das 3h), ele levantou-se de sua
humilhação, para assumir a liderança da Como esta oração reflete certos aspectos
multidão reunida. Conduziu-a por meio de do vocabulário e estilo do cronista, alguns
oração, confissão e pranto, para propor estudiosos têm-se recusado a atribuí-la a
exatamente as medidas que desejava impor Esdras. O conteúdo e função da oração,
(10.1-3). contudo, revelam que ela se ajusta perfei
tamente dentro de seu presente contexto.
2) A Oração de Esdras (9.6-15) Não só são convincentes as transições que
a precedem e seguem como a própria ora
6e disse: Ó meu Deus! Estou confuso e enver ção é uma parte sutil e indispensável à
gonhado, para levantar o meu rosto a ti, meu Deus, cena total. O cronista pode tê-la obtido sem
porque as nossas iniqüidades se multiplicaram so muita alteração das memórias de Esdras.
bre a nossa cabeça e a nossa culpa tem crescido
até o céu. 7Desde os dias de nossos pais até o dia A òração começa com uma confissão de
de hoje temos estado em grande culpa, e por causa culpa, e tem sido classificada como uma
das nossas iniqüidades fomos entregues, nós, os “doxologia de julgamento”, porque é tanto
nossos reis e os nossos sacerdotes, na mão dos reis uma confissão de culpa quanto preito de
das terras, à espada, ao cativeiro, à rapina e à confu
são do rosto, como hoje se vê. 8Agora, por um louvor a Deus pela justeza de suas
pequeno momento se manifestou a graça da parte punições.33 Na primeira cláusula, Esdras
do Senhor, nosso Deus, para nos deixar um restan utiliza a primeira pessoa do singular, para
te que escape, e para nos dar estabilidade no seu mudar imediatamente para a primeira
santo lugar a fim de que o nosso Deus nos alumie
os olhos, e nos dê um pouco de refrigério em nossa
pessoa do plural. Desse modo, ele se iden
escravidão; 9pois somos escravos; contudo o nosso tifica com a comunidade coletiva que fala
Deus não nos abandonou em nossa escravidão, em seu nome. Conquanto ele próprio não
mas estendeu sobre nós a sua benevolência perante se tivesse envolvido num casamento misto,
os reis da Pérsia, para nos dar a vida, a fim de devia falar em termos de nossa culpa,
levantar a casa do nosso Deus e repararmos as
suas assolações, e para nos dar um abrigo em porque não podia dissociar-se do grupo
Judá e em Jerusalém. '“Agora, ó nosso Deus, que corporativo.
diremos depois disto? Pois temos deixado os teus A culpa que ele confessa não é apenas
mandamentos, "os quais ordenastes por inter a de sua geração contemporânea, mas a do
médio dos teus servos, os profetas, dizendo: A período inteiro: Desde os dias de nossos
terra em que estais entrando para a possuir, é uma
terra imunda pelas imundícias dos povos das ter pais até o dia de hoje. A comunidade cor
ras, pelas abominações com que, na sua cor porativa incluía e transcendia as gerações,
rupção, a encheram duma extremidade à outra. de modo que Esdras podia falar dos peca
12Por isso não deis vossas filhas a seus filhos, e dos de seus antepassados como nossas
não tomeis suas filhas para os vossos filhos, nem
procureis jamais a sua paz e a sua prosperidade; iniqüidades (cf. Dt 5.3). Foi por nossas
para que sejais fortes e comais o bem da terra, e iniqüidades, diz ele, que fomos entregues,
a deixeis por herança a vossos filhos para sempre. nós, os nossos reis e os nossos sacerdotes,
°E depois de tudo o que nos tem sucedido por na mão dos reis das terras.
causa das nossas más obras, e da nossa grande
culpa, ainda assim tu, ó nosso Deus, nos tens casti Nos versículos 8 e 9, a orientação da
gado menos do que merecem as nossas iniqüida oração muda dramaticamente. Conquanto
des, e ainda nos deixaste este remanescente; a punição do exílio tivesse sido justa e até
14tornaremos, pois, agora a violar os teus manda mesmo misericordiosa, a graça de Deus
mentos, e a aparentar-nos com os povos que
cometem estas abominações? Não estarias tu in havia introduzido um novo tempo. Por um
dignado contra nós até de todo nos consumires, pequeno momento (desde o edito de Ciro,
de modo que não ficasse restante, nem quem esca
passe? lsO Senhor Deus de Israel, justo és, pois 33 G erhard von Rad, O ld Testament Theology, trad, para o ingles por
ficamos qual um restante que escapou, como hoje D. M. G. Stalker (New York: H arp er and Bros., 1962), I. 358.
489
em 538 a.C.) Deus havia manifestado ime poderia ser esperada. Deus é justo e sua
recida graça ao seu povo. O restante, justiça seria servida mediante a aniquilação
predito pelos profetas pré-exílicos, tinha total da rebelde comunidade. Esdras não
tido permissão para retornar e tinha con oferece qualquer palavra de esperança. Ele
quistado estabilidade (a firmeza do prego podia apenas confessar que estamos diante
de uma tenda) no seu santo lugar. Não de ti em nossa culpa.
eram uma nação independente, certamen E, por causa disto ninguém há que possa
te, mas Deus havia mostrado a sua bene subsistir na tua presença, provavelmente,
volência mediante os bondosos atos dos significa que por causa dos abusos quanto
reis da Pérsia. Mediante tais reis, ele havia aos matrimônios ninguém podia ser vindi
devolvido o brilho dos seus olhos, recons cado ou absolvido perante Deus.
truído o Templo e lhes dado abrigo,34 na
terra. 3. A Reação dos Judeus (10.1-4)
Referência é feita, aparentemente, a
muros menores, menos pretensiosos, em 'Ora, enquanto Esdras orava e fazia confissão,
chorando e prostrando-se diante da casa de Deus,
pregados mais comumente para resguardar ajuntou-se a ele, de Israel, uma grande congregação
vinhas (cf. Is 5.5; Nm 22.24,25). O empre de homens, mulheres e crianças; pois o povo chorava
go da palavra em Esdras, então, seria meta amargamente. 2Então Secanias, filho de Jeiel, um
fórico, com referência ao muro de abrigo dos filhos de Elão, dirigiu-se a Esdras dizendo: Nós
temos sido infiéis para com o nosso Deus, e casamos
que Deus erigiu em torno de sua vinha com mulheres estrangeiras dentre os povos da terra;
restaurada em Judá. contudo, no tocante a isto, ainda há esperança para
Mas Judá tinha dado uma resposta Israel. 3Agora, pois, façamos um pacto com o
inapropriada à benevolência que Deus havia nosso Deus, de que despediremos todas as mulheres
revelado mediante os reis persas. Não havia e os que delas são nascidos, conforme o conselho
do meu senhor, e dos que tremem ao mandamento
desculpas e nada que pudesse ser dito, a não do nosso Deus; e faça-se conforme a lei. 4Levanta-
ser que temos deixado os teus manda -te; pois a ti pertence este negócio, e nós somos
mentos. contigo; tem bom ânimo, e faze-a
Os mandamentos que os judeus violaram
mediante seus casamentos mistos estão arti A oração de Esdras, junto com o fato
culados nos versículos 11 e 12. A citação de estar chorando e prostrando-se diante
atribuída a teus servos, os profetas não é da casa de Deus, atraiu uma grande congre
citação literal de qualquer passagem isolada gação de homens, mulheres e crianças ao
da Escritura. Muito dela é encontrado em recinto do Templo, onde ele estava orando.
Deuteronômio 7.1-3 e 23.3-6, mas se trata Eles também choraram, amargamente.
de uma colcha de retalhos de frases e idéias Esdras, astutamente, tinha levado os judeus
de várias fontes diferentes (cf. Myres, p. 79). a iniciarem voluntariamente as reformas,
A oração se encerra de uma maneira, que teria, por certo, o poder de lhes impor
sem dúvida, calculada, para induzir o povo pela força (cf. 7.25,26).
a imediata confissão e ação drástica. Os Secanias, cujo pai Jeiel era um dos trans
pecados do passado haviam ocasionado o gressores (10.26), falou em nome da mul
exílio, mas Deus o havia reduzido e preser tidão contrita. Ele encontrou esperança
vado um restante. Agora, porém, o restante para Israel na tradicional afirmação de que
havia pecado e nenhuma misericórdia o arrependimento e a restituição levaram
34 A palavra traduzidapor abrigo (proteção, no inglês) (KJ V: “wall”) tem Deus a revelar misericórdia ao seu povo (cf.
causado considerável controvérsia. Obviamente, refere-se a algum tipo
de muro. Se está se referindo a um m uro de cidade, esta passagem
lRs 8.33,34; 2Cr 7.14; SI 106). Mas somen
poderia ser empregada com o evidênciá d eq u e a edificação do m uro te lágrimas não eram o bastante. Secanias
por N eem ias precedeu o m inistério de Esdias. A sas de vasos inscritas,
extraídas de antigasescavações em G ib eãa contudo, oferecem signi propôs que as esposas estrangeiras com seus
ficativo reforço à evidência de q ue um m u ro de cidade não é
intencionado (J. B. R itchard, H ebrew In so ip tio n s and Stam ps from
filhos fossem separados dos maridos e pais,
Gibeon, [Philadelphia: T he University M useum , 1959], p. 9,10). respectivamente. Uma vez que isto era cla-
490
ramente o que Esdras e seus companheiros administração da ordem foi delegada aos
já haviam aconselhado, Esdras não precisou oficiais e anciãos.
de qualquer persuasão para aceitar o A referência a Joanã, filho de Eliasibe,
convite de Secanias de efetuar as reformas. é importante para a datação da missão de
Esdras. Segundo as listas de sumos sacer
4. A Liderança de Esdras nas Reformas dotes em Ne 12.10,11,22, Joanã (Jônatas
Matrimoniais (10.5-17) e Joanã são claramente grafias alternadas
do mesmo nome) era neto de Eliasibe e o
1) Preparo Para a Assembléia Pública segundo sumo sacerdote depois dele. O
(10.5-8) Papiro n.° 30 de Elefantina supre a evidên
5Então Esdras se levantou, e ajuramentou os cia adicional de que Joanã foi sumo sacer
principais dos sacerdotes, os levitas, e todo o Israel, dote em Jerusalém em 411 e 408 a.C. 35O
de que fariam conforme esta palavra; e eles jura
ram. 6Em seguida Esdras se levantou de diante da
avô de Joanã, por outro lado, foi contem
casa de Deus, entrou na câmara de Joanã, filho porâneo de Neemias tanto ao tempo de sua
de Eliasibe; e, chegando lá, não comeu, nem bebeu primeira (Ne 3.1) como no de sua segunda
água, porque pranteava por causa da infidelidade missão (Ne 13.4,7,28). Assim, a prioridade
dos do cativeiro. 7E fizeram passar pregão por de Neemias parece estar firmemente esta
Judá e Jerusalém, a todos os que vieram do cativeiro,
para que se ajintassem em Jerusalém; 8e que todo belecida.
aquele que dentro de três dias não viesse, segundo
o conselho dos oficiais e dos anciãos, toda a sua 2) A Assembléia de Jerusalém e sua
fazenda se pusesse em interdito, e fosse ele excluído Comissão (10.9-17)
da congregação dos que voltaram do cativeiro.
’Pelo que todos os homens de Judá e de
O ativo apoio da comunidade foi vital Benjamim dentro de três dias se ajuntaram em Je
para o êxito do plano de Esdras de dissolver rusalém. Era o nono mês, aos vinte dias do mês;
os casamentos ofensivos. Agora que lhe fo e todo o povo se assentou na praça diante da casa
de Deus, tremendo por causa deste negócio e por
ra assegurado esse apoio, agiu vigorosamen causa das grandes chuvas. l0Então se levantou
te, para implementar a proposta que Seca Esdras, o sacedote, e disse-lhes: Vós tendes trans
nias havia feito. Mesmo já antes de deixar gredido, e casastes com mulheres estrangeiras,
o local de oração, ele obteve um juramento aumentando a culpa de Israel. "Agora, pois, fazei
confissão ao Senhor, Deus de vossos pais, e fazei
da parte dos líderes daqueles reunidos do o que é do seu agrado; separai-vos dos povos das
arredor, de que o apoiariam em seus terras, e das mulheres estrangeiras. 12E toda a
esforços. congregação respondeu em alta voz: Conforme as
Após administrar o juramento, Esdras tuas palavras havemos de fazer. ,3Porém o povo é
retirou-se, para a noite, para a câmara de muito; também é tempo de grandes chuvas, e não
se pode estar aqui fora. Isso não é obra de um dia
Joanã. Ali, ele não somente passou a noite, nem de dois, pois somos muitos os que transgre
jejuando porque pranteava, mas, aparente dimos neste negócio. 14Ponham-se os nossos
mente, dirigiu alguns negócios muito oficiais por toda a congregação, e todos os que em
importantes. Uma vez que Joanã era quase, nossas cidades casaram com mulheres estrangeiras
venham em tempos apontados, e com eles os an
certamente, o sumo sacerdote nesse tempo, ciãos e juizes de cada cidade, até que se desvie de
teria sido judicioso, para Esdras, planejar nós o ardor da ira do nosso Deus no tocante a este
sua estratégia em consulta com ele. negócio. >s(Somente Jônatas, filho de Asael, e
Mensageiros foram mandados por Judá Jazéias, filho de Ticvá, se opuseram a isso; e
com o pregão de que dentro de três dias Mesulão, e Sabetai, o levita, os apoiaram.) l6Assim
o fizeram os que tornaram do cativeiro: foram indi
toda a comunidade judaica (os que vieram cados o sacerdote Esdras e certos homens, cabeças
do cativeiro) se ajuntasse em Jerusalém. A de casas paternas, segundo as suas casas paternas,
penalidade pela falta de não atender era cada um designado por nome; e assentaram-se no
severa, mas estava de acordo com a auto primeiro dia do décimo mês, para averiguar este
ridade que havia sido concedida a Esdras,
pelo documento de Artaxerxes (7.26). A 35 Cf. Cowley, op. d t., p. 108-119.
491
negócio. ,7E no primeiro dia do primeiro mês 2.10-16) ou arranjar tais casamentos para
acabaram de tratar de todos os homens que ti os próprios filhos (cf. Myers, p. 77). Como
nham casado com mulheres estrangeiras.
as esposas que estavam sendo rejeitadas
procediam de famílias não-judias destacadas
Dentro dos três dias permitidos, todos
e poderosas, a questão de fazer arranjos
os homens de Judá e de Benjamim (cf. 4.1)
apropriados teria que ser extremamente
se ajuntaram em Jerusalém. Era aos vinte delicada.
dias do nono mês (nov.-dez.), e uma fria
chuva de inverno ensopava a multidão que 5. Listas dos Transgressores Matrimoniais
ali permanecia, desabrigada, na praça em (10.18-44)
frente ao Templo. O povo estava tremendo
de temor e devido à chuva fria, enquanto 1) O Pessoal da Liturgia (10.18-24)
Esdras lhe dirigia a palavra. l8Entre os filhos dos sacerdotes acharam-se
O discurso de Esdras foi misericordiosa estes que tinham casado com mulheres estrangeiras:
dos filhos de Jesuá, filho de Jozadáque e seus
mente curto e ao ponto. O povo havia irmãos, Maaséias, Eliézer, Jaribe e Gedalias. 19E
transgredido e aumentado a culpa de deram a sua mão, comprometendo-se a despedirem
Israel. Agora devia fazer confissão e ex suas mulheres; e, achando-se culpados, ofereceram
cluir de seu convívio os povos das terras um carneiro do rebanho pela sua culpa. 20Dos
filhos de Imer: Hanâni e Zebadias.21Dos filhos de
e as mulheres estrangeiras. Harim: Maaséias, Elias, Semaías, Jeiel e Uzias.
A multidão prontamente concordou, 22E dos filhos de Pasir: Elioenai, Maaséias, Ismael,
mas a implementação da decisão era dema Netanel, Jozabade e Elasa. ^D os levitas: Joza-
siado complexa para ser praticada enquanto bade, Simei, Quelaías (este é Quelita), Petaías, Judá
ali permaneciam encharcados pela chuva. e Eliézer. 24Dos cantores: Eliasibe. Dos porteiros:
Salum, Telem e Úri.
Foi proposto que se apontasse uma
comissão para cuidar da questão de modo A lista de transgressores matrimoniais
ordenado e expedito. foi, presumivelmente, preparada pela
Esdras designou, para a comissão, comissão de Jerusalém. Apresentando mau
cabeças de casas paternas (líderes de clãs) estado de conservação, a lista é surpreen
e por três meses eles se assentaram em dentemente curta, em razão dos três meses
assembléias em Jerusalém. Os anciãos e em que a comissão foi organizada. Esta lista
juizes de cada cidade trouxeram os casos pode representar apenas um fragmento da
de toda a terra, mas a natureza dos proce lista original (cf. Bowman, p. 87,88).
dimentos legais não é explicada. Visto que Membros culpados da família sumo-
a decisão de dissolver os casamentos já -sacerdotal de Jesuá estão alistados em
havia sido estabelecida por consentimento primeiro lugar, seguidos pelos nomes dos
popular, o litígio não se preocupava, com ofensores de outras três importantes famí
isso. Com toda probabilidade a comissão lias sacerdotais zadoquitas (cf. 2.36-39).
tratava dos complexos acertos sobre proprie Uma lista mais curta de levitas, cantores
dades, incluindo os direitos de herança das e porteiros completa a enumeração do clero
crianças dispensadas e o retorno de dotes ofensor.
para as esposas rejeitadas. Cada membro da família sumo-
O principal motivo de casamento com -sacerdotal ofereceu um carneiro de rebanho
mulheres estrangeiras era quase, certa por sua culpa (cf. Lv 5.14-16). As ofertas
mente, econômico. Os judeus egressos de pela culpa dos outros ofensores não são
Babilônia encontraram a maior parte da especificadas, mas o tipo de oferta reque
terra em Judá, se não toda, possuída por rida dependia do status do culpado (cf. Lv 4).
famílias estrangeiras. A maneira mais rápida
e fácil de obter posse de uma porção de terra 2) Leigos Israelitas (10.25-44)
era divorciar-se de esposas judias e tomar 25E de Israel: dos filhos de Parós: Ramias,
as filhas de entrangeiros ricos (cf. Ml Izias, Malquias, Miamim, Eleazar, Hasabias e
492
Benaías. “ Dos filhos de Elão: Matanias, Zacarias, O verso 44 é particularmente obscuro
Jeiel, Abdi, Jerimote e Elias. 27Dos filhos de Zatu: no TM (cf. a KJV). A tradução RSV, que
Elioenai, Eliasibe, Matanias, Jeimote, Zabade e se baseia em lEsdras 9.36, parece, contudo,
Aziza. “ Dos filhos de Bebai: Jeoanã, Hananias,
Zabai e Atlai. 29Dos filhos de Bani: Mesulão, preservar a conclusão original da história.
Maluque, Adaías, Jasube, Seal e Jerimote. 30Dos Há pouca dúvida de que as reformas tinham
filhos de Paate-Moabe: Adná, Quelal, Benaías, sido completadas e as esposas entrangeiras
Maaséias, Matanias, Bezaleel, Binuí e Manassés. com seus filhos meio-israelitas expulsos de
31Dos filhos de Harim: Eliézer, Issijá, Malquias,
Semaías, Simeão, 328enjamim, Maluque e Sema- seus lares.
rias. "Dos filhos de Hasum: Matenai, Matatá, Um temor compulsivo de contaminação
Zabade, Elifelete, Jeremai, Manassés e Simei. étnica e religiosa levou Esdras e os outros
34Dos filhos de Bani: M aadai, Anrão e Uel,
35Benaías, Bedéias, Queluí, 36Vanias, Meremote, líderes de Judá a essas medidas drásticas
Eliasibe, 37Matanias, Matenai, Jaasu. 38Dos filhos e sem precedentes. Com total desrespeito
de Binuí: Simei, 39Selemias, N atã, Adaías, pelos sentimentos humanos e direitos indi
40Macnadbai, Sasai, Sarai, 41Azarei, Selemias, viduais, eles desfizeram os lares, despediram
Semarias, 42Salum, Amarias e José. 43Dos filhos
de Nebo: Jeiel, Matitias, Zabade, Zebina, Jadai, as inocentes esposas e abandonaram as
Joel e Benaías. 44Todos estes tinham tomado indefesas crianças. Conquanto se possa
mulheres estrangeiras; e se despediram das compreender os motivos que inspiraram
mulheres e dos filhos. esta ação, não se pode deixar de discordar
A lista dos leigos é, como seria de se da necessidade de praticar tal brutalidade
esperar, mais longa do que a dos clérigos. para a preservação da fé.
Os nomes são apresentados segundo as Esta passagem, provavelmente, marca o
famílias, e cada família é identificada pelo fim da narrativa de Esdras. Neemias 9 é,
nome ancestral tradicional. A maioria das às vezes, considerado a seqüência de Esdras
famílias representadas é também represen 10, mas é melhor compreendido em
tada na lista de censo no capítulo 2. conexão com a leitura da lei.
493
o pequeno grupo que lutava para iniciar mais de cento e quarenta anos antes.
uma nova vida na terra natal. Ele, portanto, Neemias dificilmente iria lamentar por
ficou grandemente angustiado quando alguns dias uma situação que era de seu
recebeu notícias de que nem tudo estava conhecimento por toda a existência. A
bem em Judá. destruição de Jerusalém narrada por Hanâ
A data da missão de Neemias está firme ni era quase, certamente, um acontecimen
mente estabelecida. O Artaxerxes, durante to recente. É geralmente identificada como
cujo “vigésimo ano” de reinado (2.1) ele obra de Reum e Sinsai, aos quais Artaxer
veio a Jerusalém era Artaxerxes I (465-424 xes havia antes instruído para suspenderem
a.C.). Isto é claramente indicado no Papiro a reedificação e refortificação da cidade
30 de Elefantina (Cowley, op. cit., p. (Ed 4.8-23). Os judeus de Judá são chama
108-119). Esse documento, com a data de dos, por Neemias, de os que tinham esca
408 a.C., estabelece que nesse tempo Joanã pado. Isto contrasta com a terminologia
era sumo sacerdote em Jerusalém e que os empregada pelo cronista, que, geralmente,
filhos de Sambalate eram as autoridades a eles se refere como “os que tornaram do
em Samária. Visto que Neemias foi con cativeiro” (cf. Esdras 4.1; 10.16). A comu
temporâneo tanto de Sambalate (4.1) quan nidade judaica era, sem dúvida, composta
to do avô de Joanã, Eliasibe (3.1; cf. 12.22), de ambos.
sua missão deve ser datada como tendo
ocorrido antes de 408 a.C. Assim Neemias 2. A Oração de Neemias (1.5-lla)
não pode ter servido sob Artaxerxes II
(404-358 a.C.). Sua missão começou no 5e disse: Ó Senhor, Deus do céu, Deus grande
e temível, que guardas o pacto e usas de misericór
vigésimo ano de Artaxerxes I, 445 a.C. dia para com aqueles que te amam e guardam os
É dito que Neemias recebeu as notícias teus mandamentos: 6Estejam atentos os teus
de Judá no mês de quisleu, no ano vigé ouvidos e abertos os teus olhos para ouvires a ora
simo. Sua entrevista com Artaxerxes é ção do teu servo, que eu hoje faço perante ti, dia e
noite, pelos filhos de Israel, teus servos, confessan
datada no “mês de nisã, no ano vigésimo” do eu os pecados dos filhos de Israel, que temos
(2.1). Uma vez que quisleu era o nono mês cometido contra ti; sim, eu e a casa de meu pai pe
do calendário babilónico, e nisã era o camos; 7na verdade, temos procedido perversa
primeiro, é difícil conciliar as duas datas. mente contra ti, não temos guardado os manda
A maior parte dos eruditos presume que mentos, nem os estatutos, nem os juízos, que orde
naste a teu servo Moisés. 8Lembra-te, pois, da
Neemias estivesse utilizando o calendário palavra que ordenaste a teu servo Moisés, dizendo:
sírio, segundo o qual o ano começava no Se vós transgredirdes, eu vos espalharei por entre
Outono.36 Neste caso, quisleu teria sido o os povos; 9mas se vos converterdes a mim, e guar
terceiro mês e nisã o sétimo, e ambas as dardes os meus mandamentos e os cumprirdes,
ainda que os vossos rejeitados estejam na extre
datas poderiam pertencer ao vigésimo ano. midade do céu, de lá os ajuntarei e os trarei para
Neemias estava no seu posto real em o lugar que tenho escolhido para ali fazer habitar
Susã quando Hanâni (geralmente tido por o meu nome. 10Eles são os teus servos e o teu
irmão de sangue de Neemias e que mais povo, que resgataste com o teu grande poder e com
tarde foi posto sobre Jerusalém, 7.2), com a tua mão poderosa. "Ó Senhor, que estejam
atentos os teus ouvidos à oração do teu servo, e
alguns de Judá, trouxeram-lhe tristes novas à oração dos teus servos que se deleitam em temer
sobre a comunidade na pátria. Fôi dito a o teu nome; e faze prosperar hoje o teu serm, e
Neemias que está derribado o muro de dá-lhe graça perante este homem.
Jerusalém, e as suas portas queimadas a
fogo. Sua reação ao relatório mostra clara Neemias era um homem de oração (2.4;
mente que esta catástrofe não poderia ser
4.4,5; 5.19; 6.14; 13.14,22,29,31). Era de
aquela perpetrada por Nabucodonozor
sua natureza voltar-se para Deus em mo
36 Cf. Julius Wellhausai, IsraeHtische und Jüd sch e Geschictate, 3? edição
mentos de angústia ou vitória. Ele, segu
(Berlim: G . Reimer, 1897), p. 169. ramente, orou quando ouviu o relatório de
494
Hanâni (cf. o v. 4), e, sem dúvida, registrou to diante dele, que eu apanhei o vinho e o dei ao
a oração em suas memórias. Contudo, a rei. Ora, eu nunca estivera triste na sua presença.
2E o rei me disse: Por que está triste o teu rosto,
oração, nesta passagem, provavelmente, não visto que não estás doente? Não e isto senão tris
é uma citação literal da pena de Neemias. teza de coração. Então temi sobremaneira, 3e disse
O cronista, segundo o bem conhecido ao rei: Viva o rei para sempre! Como não há de es
costume literário de escritores antigos, às tar triste o meu rosto, estando a cidade, o lugar
dos sepulcros de meus pais, assolada, e tendo sido
vezes compunha orações ou discursos para consumidas as suas portas pelo fogo? 4Então o rei
expressar os sentimentos de seus heróis. me perguntou: Que me pedes agora? Orei, pois,
Visto que esta oração é tão diferente das ao Deus do céu, 5e disse ao rei: Se for do agrado
outras orações de Neemias (cf. 4.4,5; 5.19; do rei, e se o teu servo tiver achado graça diante
6.14), pode-se suspeitar que foi complemen de ti, peço-te que me envies a Judá, à cidade dos
sepulcros de meus pais, para que a reedifique.
tada pela mão do cronista. 6Então o rei, estando a rainha assentada junto a
A referência de Artaxerxes como este ele;, me disse: Quanto durará a tua viagem, e quan
homem, em vez de ser indicado por nome, do voltarás? E aprouve ao rei enviar-me, apon-
levou Bowman (p. 666-670) a concluir que tando-lhe eu certo praza 7E disse ainda ao rei: Se
for-do agrado do rei, dêem-se-me cartas para os
esta é uma versão ampliada de uma oração governadores dalém do Rio, para que me permitam
que outrora ficava em 2.4. Ele sugere que passar até que eu chegue em Judá; 8como também
a breve oração em Josefo (Antiq. XI, 5.6) uma carta para Asafe, guarda da floresta do rei, a
pode estar preservando a substância da fim de que me dê madeira para as vigas das portas
oração que Neemias proferiu após ouvir do castelo que pertence à casa, e para o muro da
cidade, e para a casa que eu houver de ocupar. E
as palavras de Hanâni. o rei mas deu, graças à mão benéfica do meu Deus
Seja qual for a sua autoria, esta oração sobre mim.
é particularmente valiosa pela visão que
nos conceder do caráter da oração pós-exíli- Neemias era copeiro de Artaxerxes I,
ca em geral. Certos aspectos da oração são rei da Pérsia. Era, contudo, muito mais do
especialmente dignos de nota. 1) Como as que um simples criado doméstico. Por todo
orações em 9.6-37 e em Daniel 9.4-19, é o Oriente Médio esse ofício significava
composta, sobretudo, de frases deuteronô- posição de influência e honra. A arte persa
micas estereotipadas (cf. Dt 7.9,21; 9.29; retrata o copeiro próximo ao príncipe
21.15; 30.1-5). Esta parece ter sido a coroado que assistia o rei.
linguagem tipica de oração formal durante O copeiro estava associado intimamente
esse período. 2) O suplicante, embora, com o interior da casa real (cf. o v. 6) e,
presumivelmente, inocente, identifica-se aparentemente, sempre era um eunuco.
com as pessoas culpadas (cf. Ed 9.6-15; Dn Tradicionalmente, o eunuco era excluído
9.4-19; Ne 9.32-37). 3) A dispersão é atri da “assembléia do Senhor” (Dt 23.1), mas
buída aos pecados da comunidade de modo ao tempo de Neemias esta restrição havia
coletivo (v. 7.8; Esdras 9.7; Ne 9.29,30; Dn sido relaxada (Is 56.3-5). Não é impossível,
9.7,8). 4) Um remanescente é reconhecido contudo, que Neemias tivesse que comba
(v. 10; cf. Ed 9.8,15; Ne 9.31; Dn 9.15). 5) ter os vestígios desse preconceito durante
O pacto é reafirmado (v. 5; cf. Ne 9.32; Dn sua gestão como governador de Judá.
9.4). 6) Esperança para a comunidade é Neemias, normalmente, mostrava bom
buscada na confissão e arrependimento (v. espírito quando servia ao rei. As notícias
6-9; cf. Ed 9.15; Ne 9.32-37; Dn 9.15-19). que Hanâni havia trazido de Jerusalém,
contudo, haviam-no deixado ansioso e
deprimido. O rei notou, corretamente, sua
3. A Concessão de Artaxerxes a Neemias tristeza de coração, e uma tristeza genuí
(1.11b—2.8) na. Conquanto ele próprio desfrutasse de
llb(Era eu então copeiro do rei.) boa posição na Pérsia e, aparentemente,
‘Sucedeu, pois, no mês de nisã, no ano vigé jamais houvesse pensado em emigrar para
simo do rei Artaxerxes, quando o vinho estava pos Judá, sentiu profundo senso de identifi-
495
cação com a comunidade judaica de lá, e Líbano) para suas necessidades de cons
os problemas deles tornaram-se seus. trução. E, finalmente, uma escolta militar
Mais de três meses decorreram entre o foi provida (v. 9).
tempo em que Neemias recebeu as notícias Neemias estava perfeitamente cons
de Hanâni, no mês de quisleu (nov.-dez.), ciente da grandiosa presença de Deus com
e a entrevista com Artaxerxes, no mês de ele ao longo dessas delicadas negociações
nisã (mar.-abr.). Geralmente se sugere que com o rei. Havia uma oração em seus
Artaxerxes esteve ausente de Susã durante lábios, ao discorrer sobre o futuro de Judá,
essa época de tempestades do inverno. É e gratidão em seu coração, ao serem com
também possível que o atraso tenha sido pletados os arranjos.
ocasionado pela relutância de Neemias em
apresentar o assunto ao rei e que ele tenha II. Neemias Assume o Governo (2.9-20)
ocultado seus reais sentimentos até sentir
1. A Chegada no Ocidente (2.9-10)
que não mais poderia postergar a questão.
Em qualquer das hipóteses, parece que 9Então fui ter com os governadores dalém do
Neemias tinha sérios receios de aproximar- Rio, e lhes entreguei as cartas do rei. Ora, o rei
-se de Artaxerxes, para tratar da sorte de tinha enviado comigo oficiais do exército e cava
leiros. ,0O que ouvindo Sambalate, o horonita, e
Jerusalém. A hesitação e temor de Nee Tobias, o servo amonita, ficaram extremamente
mias não são de surpreender, em vista do agastados de que alguém viesse a procurar o bem
fato de que Artaxerxes havia tão recente dos filhos de Israel.
mente comissionado Reum e Sinsai para A chegada de Neemias na província
interromperem a reconstrução e reedifi-
dalém do Rio, com uma escolta militar e
cação de Jerusalém (Ed 4.8-23).
com cartas oficiais de Artaxerxes I, alar
Neemias recebeu a permissão para reedi mou os governadores locais na região.
ficar Jerusalém e seus muros a despeito Sambalate, o representante do governo
do fato de que Artaxerxes havia, recente persa em Samária, tinha razão especial
mente, proibido isso. Os judeus, cuja para preocupar-se. O Judá ao norte, in
atividade de construção fora detida por cluindo Jerusalém, estava sob sua juris
Reum e Sinsai, haviam estado construindo dição. Não está claro se a intenção de
sutilmente e criado uma compreensível Artaxerxes era ou não retirar esta região
suspeita de traição. Neemias, por outro la do controle samaritano. Mas Sambalate
do, era um auxiliar de confiança do rei e sentiu que esta era a intenção de Neemias,
não lhe oferecia motivos de suspeita. e reagiu de um modo previsivelmente
Ademais, ele referiu-se a Jerusalém como hostil.
a cidade onde estão os sepulcros de meus Sambalate teve, em sua oposição a
pais, tornando, assim, o seu apelo pessoal Neemias, o concurso de Tobias, que é
e sentimental e, cautelosamente, apolítico. chamado de o servo amonita. O termo
Arranjos detalhados foram feitos para “servo” não significa que fosse um servo
a missão de Neemias. Foi feito um acordo de Sambalate. Semelhantemente a Samba
sobre quando Neemias partiria e quando late, ele era um servo da coroa e um
retornaria. (Segundo 5.4, a primeira gestão vice-governador sob a direção do sátrapa
de Neemias como governador de Judá da província. Amonita é usado aqui num
durou 12 anos.) Cartas foram preparadas, sentido político, e não étnico. Tobias, cujo
instruindo os governadores dalém do Rio nome significa “Iavé é bom”, foi membro
a concederem passagem livre por seus duma famosa família judaica em Amom.
distritos. Uma carta especial foi dirigida a Sendo que Judá fazia fronteira com o
Asafe, guarda da floresta do rei, autori- distrito de Amom, a chegada de Neemias
zando-o a conceder a Neemias madeira representava uma ameaça contra o poder
(provavelmente, os famosos cedros do e influência de Tobias.
496
2. Inspeção de Jerusalém (2.11-16) claro que esse muro seguia a crista ocidental
da colina oriental, dando vistas ao que mais
"Cheguei, pois, a Jerusalém, e estive ali três tarde se chamaria de Vale do Tiropeiom.
dias. 12Então de noite me lavantei, eu e uns poucos
homens comigo; e não declarei a ninguém o que A porta do vale, através da qual Neemias
o meu Deus me pusera no coração para fazer por saiu da cidade, deve ter-se localizado perto
Jerusalém. Não havia comigo animal algum, senão dos limites setentrionais do muro oeste da
aquele que eu montava. 13Assim sai de noite pela cidade de Davi. Seguindo na direção sul,
porta do vale, até a fonte do dragão, e até a porta
do monturo, e contemplei os muros de Jerusalém, Neemias acompanhou os declives do vale,
que estavam demolidos, e as suas portas, que tinham passando pelas não identificadas fonte do
sido consumidas pelo fogo. 14E passei adiante até dragão, porta do monturo e porta da fonte,
a porta da fonte, e à piscina do rei; porém não havia até chegar à piscina do rei. Esta última é
lugar por onde pudesse passar o animal que eu
montava. 15Ainda de noite subi pelo ribeiro, e
identificada, por Miss Kenyon, como o Pbço
contemplei o muro; e, virando, entrei pela porta do de Siloé ou o Birket el Hamra, que ficava
vale, e assim voltei. 16E não souberam os magis próximo, perto do qual o muro fazia uma
trados onde eu fora nem o que eu fazia; pois até curva fechada, rumo ao norte, seguindo os
então eu não havia declarado coisa alguma, nem declives, mais abaixo, do vale de Cedrom.
aos judeus, nem aos sacerdotes, nem aos nobres,
nem aos magistrados, nem aos demais que faziam Ao tentar seguir o muro do leste, rumo ao
a obra. norte, Neemias descobriu que não havia por
onde passar com sua montaria. Então teve
que inspecionar o muro leste de uma
Após os costumeiros três dias (cf. Ed posição mais abaixo, do vale de Cedrom.
8.32), presumivelmente dedicados às típicas Daí Neemias refez seus passos para a porta
amenidades sociais do Oriente, Neemias do vale.
começou a formular planos específicos para A escavação de Miss Kenyon revelou,
a reconstrução dos muros de Jerusalém. dramaticamente, por que a montaria de
Neemias, sempre um administrador Neemias não pôde continuar ao longo do
esperto e prático, não desejava envolver as muro oriental da cidade pré-exíüca. Os escar
autoridades locais em seus planos enquanto pados declives de Ofel tinham sido
ele próprio não tivesse uma clara idéia sobre edificados com gigantescos terraços de
como devia proceder. Portanto, inspecionou rocha. Quando Nabucodonozor destruiu a
os muros da cidade secretamente, à luz da cidade, esses terraços, com as edificações
lua, acompanhado somente por alguns firmadas sobre eles, começaram a despencar
poucos servos pessoais. pelo vale abaixo. Ao tempo de Neemias, a
As recentes escavações de Kathleen área inteira ao longo do muro leste era uma
Kenyon37 em Jerusalém tornaram neces incrível massa de rochas caídas. Neemias
sário revisar todas as interpretações abandonou oalinhamento pré-exílico intei
anteriores das referências topográficas ramente e construiu uma nova linha ao
encontradas nesta passagem. Aparente longo da crista oriental da colina.
mente, as ruínas do muro pré-exílico que
Neemias inspecionou circundavam
somente a colina oriental. É certo que a
parte sul da colina ocidental, pelo menos, 3. Desafio aos Oficiais Locais (2.17,18)
não estava incluída na cidade até o período 17Então eu lhes disse: Bem vedes vós o triste
pós-exílico. Conquanto o remanescente estado em que estamos, como Jerusalém está asso
verdadeiro do muro ocidental da cidade pré- lada, e as suas portas queimadas a fogo; vinde, pois,
-exílica não tivesse sido encontrado, está e edifiquemos o muro de Jerusalém, para que não
estejamos mais em opróbrio. 18Então lhes declarei
como a mão do meu Deus me fora favorável, e bem
assim as palavras que o rei me tinha dita Eles
37 Jerusalem : Excavating 3000 Years of H istory (New York: M cGraw- disseram: Levantemo-nos, e edifiquemos. E forta
Hill, 1967), p. 107-111. leceram as mãos para a boa obra.
497
Quando chegou a um firme plano de cação de Jerusalém seria clara indicação
operação, Neemias revelor. pela primeira de que Neemias tencionava separar Judá
vez sua intenção de reedificar o muro. O da administração samaritana. Se Neemias
triste estado para o qual ele chamou a tinha qualquer documento de Artaxerxes,
atenção do povo era de mais de um tipo. autorizando-o, especificamente, a recons
Havia, com certeza, a angústia física, criada truir os muros da cidade, ele não o revelou.
pela incapacidade dos judeus de se defen Na ausência de tal autoridade escrita, não
derem contra vizinhos hostis. Mas havia é de surpreender que os governantes locais
também a vergonha persistente e o opró sugerissem que Neemias podia estar-se rebe
brio, associados à humilhação sofrida nas lando contra o rei. Contudo, surpreende que
mãos de Nabucodonozor e mais recente Artaxerxes não tenha sido mais explícito
mente nas mãos de Reum e Sinsai. O povo quanto à autoridade que concedera a
reagiu com previsível entusiasmo, quando Neemias, em suas cartas a seus subordi
Neemias lhe contou como Deus interviera nados no oeste.
para remover suas frustrações e tornar
possível a restauração da cidade. Eles se Sambalate e Tobias tiveram, em sua
apresentaram como voluntários para apoiar hostilidade, o concurso de Gesem, o arábio.
a operação de reconstrução e começaram Contrariamente a Sambalate e Tobias,
imediatamente a fazer preparativos para a Gesem era mais do que um governador
boa obra. local administrando em favor da coroa
persa. Era um aliado do rei persa e, possi
4. A Reação de Autoridades Vizinhas velmente, um vassalo, mas governava uma
(2.19,20) vasta área, que se estendia do norte da
Arábia até o Egito, inclusive o que outrora
190 que ouvindo Sambalate, o horonita, e havia sido Moabe e Edom. Controlava áreas
Tobias, o servo amonita, e Gesem, o arábio, que antes haviam sido partes de Judá, de
zombaram de nós, desprezaram-nos e disseram:
Que é isso que fazeis? Quereis rebelar-vos contra
modo que qualquer ressurgimento de nacio
o rei? “ Então lhe respondi: O Deus do céu é quem nalismo judaico lhe representaria uma
nos fará prosperar; e nós, seus servos, nos levan ameaça.
taremos e edificaremos; mas vós não tendes parte,
nem direito, nem memorial em Jerusalém. Poder-se-ia esperar que a reação de
Neemias para com seus vizinhos fosse uma
Uma vez que o capítulo 3 deve ser consi explicação direta da autoridade que o rei
derado uma versão independente da lhe concedera. Contudo, ele permaneceu
construção do muro inserida nas memórias silente quanto à sua autoridade, seja porque
de Neemias pelo cronista, a relação entre não podia documentá-la, seja porque não
esses dois versos e 4.1-3 é deixada obscura. desejava qualquer tipo de intercâmbio com
Esta passagem pode ser compreendida os outros oficiais da área. O último caso
como a reação dos vizinhos de Neemias a é indicado por sua franca e rápida exclusão
seus preparativos iniciais para a construção, deles de qualquer parte, direito e memorial
enquanto 4.1-3 pode refletir uma reação em Jerusalém. Esta não só era uma decla
subseqüente após a construção ter estado ração de independência da administração
em andamento. O cronista, entretanto, não samaritana, mas uma espécie de excomu
preservou a transição entre as duas passa nhão pessoal de Sambalate e Tobias da
gens. comunidade religiosa judaica.38
Sambalate e Tobias tinham estado
descontentes quando Neemias chegou a
Em bora S am balate fosse um nom e babíltaico, sua adoração a Iavé
Judá (v. 10), mas as notícias de que plane é indicada pelos nomes Delaías e Selemias,que derivam do oom e Iavé,
java reconstruir os muros de Jerusalém e que ele deu aos filhos (Cowley, op. d t , p. 110). Tobias tam bém é u m
nom e que se originado term o Iavé, e ele eram aride e sogro de mulheres
intensificaram sua hostilidade. A refortifi- judias (6.18).
498
III. Organização dos Edificadores do da própria história de Neemias encontrada
Muro (3.1-32) nos capítulos 4—6. A narrativa anterior,
que, provavelmente, prooedèu dos arquivos
1. Á Reconstrução dos Muros do Norte e do Templo (cf. Myers, p. 112), interrompe as
do Oeste (3.1-15) memórias de Neemias e em parte alguma
se refere a Neemias. Tem a intenção de
'Então se levantou Eliasibe, o sumo sacerdote, ressaltar o papel do clero na reedificação
juntamente com os seus irmãos, os sacerdotes, e do muro.
edificaram a porta das ovelhas, a qual consagraram
e lhe assentaram os batentes. Consagraram-na até
A narrativa delineia, aproximadamente,
a torre dos cem, até a torre de Hananel. ZE junto 40 seções de proporções e extensões desi
a ele edificaram os homens de Jericó; também ao guais. São enumeradas em ordem anti-
lado destes edificou Zacur, filho de Inri. 3Os filhos horária, começando e terminando com a
de Hassenaá edificaram a porta dos peixes, colo porta das ovelhas. Cada grupo de edifica
caram-lhe as vigas, e lhe assentaram os batentes,
com seus ferrolhos e trancas. 4Ao seu lado fez os dores recebeu a responsabilidade de edificar
reparos Meremote, filho de Urias, filho de Hacoz; uma ou mais seções.
ao seu lado Mesulão, filho de Berequias, filho de O trabalho nos muros setentrional e
Mesezabel; ao seu lado Zadoque, filho de Baaná;
sao lado destes repararam os tecoítas; porém os
ocidental estava, provavelmente, limitado
seus nobres não meteram o pescoço ao serviço de inteiramente à reparação e reconstrução da
seu Senhor. linha do muro pré-exílico. As portas e tor
Moiada, filho de Paséia, e Mesulão, filho de res que se erguiam no muro anterior foram
Besodéias, repararam a porta velha, colocaram-lhe restauradas, e é improvável que o alinha
as vigas, e lhe assentaram os batentes com seus
ferrolhos e trancas. 7Junto deles fizeram os mento do muro se desviasse em qualquer
reparos Melatias, o gibeonita, e Jadom, o mero- sentido daquele do período monárquico
notita, homens de Gibeão e de Mizpá, que per posterior.
tenciam ao domínio do governador dalém do Rio;
8ao seu lado Uziel, filho de H araías, um dos Nenhum segmento dos muros seten
ourives; ao lado dele Hananias, um dos perfumis- trional e ocidental pertencentes ao tempo
tas; e fortificaram Jerusalém até o muro larga ’Ao de Neemias foi identificado com certeza.
seu lado fez os reparos Refaías, filho de Hur, go Portanto, é impossível fazer qualquer corre
vernador da metade do distrito de Jerusalém; 10ao lação exata dos pontos destacados men
seu lado Jedaias, filho de Harumafe, defronte de
sua casa; ao seu lado Hatus, filho de Hasabnéias. cionados com a topografia contemporânea
"Malquias, filho de Harim, e Hassube, filho de da cidade. A porta das ovelhas estava clara
Paate-Moabe, repararam outra parte, como tam mente no muro do norte, e, sem dúvida,
bém a torre dos fornos; 12e ao seu lado Salum, era uma entrada importante para se chegar
filho de Haloés, governador da outra metade do
distrito de Jerusalém, ele e suas filhas. 13A porta às vizinhanças das instalações do Templo.
do vale, repararam-na Hanum e os moradores de Crê-se que o nome esteja associado com
Zanoa; estes a edificaram, e lhe assentaram os um mercado próximo, onde eram vendidas
batentes, com seus ferrolhos e trancas, como ovelhas para os sacrifícios no Templo. A
também mil côvados do muro até a porta do torre dos cem e a torre de Hananel, prova
monturo. 14A porta do monturo, reparou-a
Malquias, filho de Recabe, governador do distrito velmente, estavam associadas com o “caste
de Bete-Haquerem; este a edificou, e lhe assentou lo que pertence à casa” (2.8), que reforçava
os batentes, com seus ferrolhos e trancas. I5A a vulnerável linha de defesa setentrional da
porta da fonte, reparou-a Salum, filho de Col-Hoze, cidade. A porta dos peixes tinha tal nome
governador do distrito de Mizpã; edificou-a e a
cobriu, e lhe assentou os batentes, com seus ferro
devido aos mercadores que traziam seus
lhos e trancas; edificou também o muro da piscina peixes para a cidade através dessa entrada
de Selá, do jardim do rei, até os degraus que (cf. 13.16). Sua localização, contudo, é
descem da cidade de Davi. incerta, porque não é sabido se a parte se
tentrional da colina ocidental era parte da
O capítulo 3 é um relato da reedificação cidade já no tempo de Neemias. A mesma
do muro que é paralelo, mas independente, incerteza ocorre quanto à localização da
499
porta velha, o muro largo e a torre dos os reparos até defronte dos sepulcros de Davi, até
fornos, conquanto estivessem todos associa a piscina artificial, e até a casa dos homens pode
rosos. ,7Depois dele fizeram os reparos os levitas:
dos com a parte setentrional da cidade. Reum, filho de Bani, e, ao seu lado, Hasabias, gover
A porta do vale, usada por Neemias na nador da metade do distrito de Queila, por seu
noite de sua inspeção do muro (2.13,15) da distrito; 18depois dele seus irmãos: Bavai, filho de
va vistas para o Vale do Tiropeiom. Locali Henadade, governador da metade do distrito de
Queila. I9Ao seu lado Ézer, filho de Jesuá, gover
zava-se no muro ocidental da cidade de nador de Mizpá, reparou outra parte, defronte da
Davi, pouco abaixo de sua junção com a subida para a casa das armas, no ângulo. 20Depois
extensão que Salomão havia feito para dele reparou Baruque, filho de Zabai, outra parte,
incluir a área do Templo. A longa linha do desde o ângulo até a porta da casa de Eliasibe, o
muro, desde a porta do vale até a porta do sumo sacerdote. 21Depois dele reparou Meremote,
filho de Urias, filho de Hacoz, outra parte, desde
monturo, seguia ao longo da crista ociden a porta da casa de Eliasibe até a extremidade da
tal da colina oriental. Conquanto mine mesma. 22Depois dele fizeram os reparos os sacer
rações posteriores tenham destruído os dotes que habitavam na campina; 23depois
verdadeiros resquícios do muro, as esca Benjamim e Hassube, defronte da sua casa; depois
vações de Miss Kenyon39 determinaram deles reparou Azarias, filho de Maaséias, filho de
Ananias, junto à sua casa. MDepois dele reparou
seu alinhamento aproximado. A porta da Binui, filho de Henadade, outra parte, desde a casa
fonte, a piscina de Selá e os degraus de Azarias até o ângulo e até a esquina. “ Palal,
associam-se com a extremidade meridional filho de Uzai, reparou defronte do ângulo, e a torre
da cidade de Davi (a piscina de Selá pode que se projeta da casa real superior, que está junto
ao átrio da guarda; depois dele Pedaías, filho de
ser identificada com o Birket el Hamra). Parós. 26(Ora, os netinins habitavam em Ofel, até
Foi aproximadamente nesse ponto que defronte da porta das águas, para o oriente, e até
Neemias deixou de seguir o alinhamento a torre que se projeta.) 27Depois repararam os
do muro pré-exílico e começou um novo tecoitas outra parte, defronte da grande torre que
se projeta, e até o muro de Ofel. “ Para cima da
muro no sentido este. porta dos cavalos fizeram os reparos os sacerdotes,
Esta lista de trabalhadores lança luz cada um defronte da sua casa; 29depois deles
valiosa sobre a distribuição geográfica dos Zadoque, filho de Imer, defronte de sua casa; e
judeus na comunidade pós-exílica. A lista, depois dele Semaías, filho de Secanias, guarda da
contudo, pode estar incompleta, pois é porta oriental. 30Depois dele repararam outra
parte Hananias, filho de Selemias, e Hanum, o sexto
digno de nota que Belém não é menciona filho de Zalafe. Depois dele reparou Mesulãoi, filho
da. Algumas cidades podem, simplesmente, de Berequias, uma parte defronte da sua câmara.
ter recusado cooperar. Os nobres de Tecoa 31Depois dele reparou Malquias, um dos ourives,
não meteram o pescoço ao serviço de seu uma parte até a casa dos netinins e dos mercadores,
defronte da porta da guarda, e até a câmara supe
Senhor, possivelmente por serem leais a rior da esquina. 32E entre a câmara da esquina e
seu vizinho Gesem (cf. 6.1-9). A tradução a porta das ovelhas repararam os ourives e os merca
do versículo 7 é confusa. A cláusula que dores.
pertenciam ao domínio do governador
dalém do Rio parece supérflua, uma vez As elevações orientais da colina oriental
que todos os judeus estavam sob sua juris estavam cobertas por uma enorme quan
dição. Ela consta como uma aposição a tidade de rochas caídas dos terraços e
Mizpá e deveria rezar: “a sede do go edificações acima.40 Não era possível
vernador da província dalém do Rio” restaurar o alinhamento oriental do muro,
(Bowman, p. 686). e o tamanho grandemente reduzido da
comunidade judaica após o cativeiro tomou
2. A Construção do Novo Muro Oriental possível Neemias diminuir a área circun
(3.16-32) dada pelo muro. A escavação de Miss
16Depois dele Neemias, filho de Azbuque, Kenyon revela que ele edificou um novo
governador da metade do distrito de Bete-zur, fez alinhamento de muro ao longo da crista
39 Op. d t., p. 106-110. 40 Cf. Kenyon, op. d t., p. 106-111.
500
da colina, deixando fora dos muros as Quando Sambalate ouviu que o muro
elevações escarpadas de terraços da cidade de Jerusalém havia realmente sido iniciado,
antiga. realizou uma conferência com seus oficiais
Os locais mencionados em ligação com associados, seus aliados e seus oficiais do
a edificação do muro oriental sugerem que exército. O texto do versículo 2 não está
um novo alinhamento do muro fora reali bem preservado, mas é claro que Sambalate
zado, em lugar da reedificação do antigõ. estava tentando avaliar os motivos de
Uma seção foi construída desde a porta da Neemias e seus construtores. Isto é indicado
casa de Eliasibe até a extremidade da pela pergunta: Oferecerão sacrifícios? Os
mesma. Uma equipe construiu defronte da judeus haviam tido permissão oficial por
sua casa, e os sacerdotes construíram cada parte dos persas desde o tempo de Ciro para
um defronte da sua casa. Quando as portas sacrificarem em Jerusalém. A pergunta de
do antigo muro leste são mencionadas, não Sambalate dá a entender que a refortifi-
se diz que foram reconstruídas. A cons cação de Jerusalém era um ato político, e
trução foi feita defronte da porta das águas, não litúrgico, e, portanto, não estava enco
para cima da porta dos cavalos e defronte berto pela permissão de sacrificar. A reação
da porta da guarda. Mesmo ao norte da de Sambalate é compreensível se ele ainda
colina de Ofel, o alinhamento do muro esta não tinha notificação da mudança de polí
belecido no oitavo século a.C., nas elevações tica por parte de Artaxerxes com respeito
mais baixas do Cedrom, foi abandonado a Judá.
e recuado até a crista, onde tinha estado A referência ao exército de Samária não
ao tempo de Salomão.41 Conquanto o deve causar surpresa. Sambalate, como
alinhamento do muro leste de Neemias representante local da autoridade persa,
tenha sido localizado e parcialmente esca tinha tropas sob o seu comando. Neemias
vado, a maioria dos pontos de destaque claramente esperava intervenção armada
citados na passagem não é passível de iden (cf. 4.13-23).
tificação. Contudo, pode-se presumir que Foi Tobias que introduziu uma nota de
os versículos 16-27 descrevem o alinha ridículo na conferência. Ele predisse que
mento do muro desde os seus limites o muro de Neemias seria tão frágil que até
meridionais até o começo da extensão seten mesmo uma raposa (ou chacal) poderia
trional de Salomão e que os versículos 18-32 derrubá-lo. Isto era infundado, pois a esca
localizam o muro ao redor da área do vação feita por Miss Kenyon42 revela que
palácio e do Templo. o muro de Neemias tinha 2,75 metros de
espessura.
IV. Construindo Sob Pressão (4.1-23) 2. A Oração de Neemias (4.4,5)
1. Reação Adicional das Autoridades Vizi 4Ouve, ó nosso Deus, pois somos tão despre
nhas (4.1-3) zados; fáze recair o opróbrio deles sobre as suas
cabeças, e faze com que eles sejam um despojo,
'Ora, quando Sambalate ouviu que edificá numa terra de cativeiro. 5Não cubras a sua iniqüi
vamos o muro, ardeu em ira, indignou-se muito e dade, e não se risque de diante de ti o seu pecado,
escarneceu dos judeus; 2e falou na presença de pois te provocaram à ira na presença dos edifica
seus irmãos e do exército de Samária, dizendo: Que dores.
fazem estes fracos judeus? Fortificar-se-ão? Ofere Notícias da conferência de Sambalate
cerão sacrifícios? Acabarão a obra num só dia? levaram Neemias a uma infeliz perda de
Vivificarão dos montões de pó as pedras que foram
queimadas? 3Ora, estava ao lado dele Tobias, o compostura. Ele orou para que os seus
amonita, que disse: Ainda que edifiquem, vindo uma inimigos sofressem a mesma sorte de sofri
raposa derrubará o seu muro de pedras. mento por que os judeus haviam passado,
501
e que Deus não lhes perdoasse os seus os arábios controlavam toda a área do sul.
pecados. Tal explosão emocional é uma Os asdoditas, que são identificados como
reação compreensível para com a provo inimigos de Neemias pela primeira vez,
cação, particularmente em vista do fato de eram os filisteus pelo oeste.
que Neemias cria que o próprio Deus havia A reação de Neemias às ameaças de
sido ofendido. violência foi orar e pôr guardas contra eles.
Neemias era homem de oração e de grande
3. Progresso em Meio a Ameaças (4.6-12) fé, mas era também administrador prático.
Ele não cria que a oração fosse substituto
6Assim edificamos o muro; e todo o muro se
completou até a metade da sua altura; porque o para um esforço máximo de sua parte.
coração do povo se inclinava a trabalhar.' 7Mas, Os rumores de violência potencial foram
ouvindo Sambalate e Tobias, e os arábios, os transmitidos pelos judeus que habitavam
amonitas e os asdoditas, que ia avante a reparação nas áreas exteriores, próximos de seus
dos muros de Jerusalém e que já as brechas se come inimigos. Esses informantes podem ter sido
çavam a fechar, iraram-se sobremodo; 8e
coligaram-se todos para virem guerrear contra Jeru leais a Neemias ou colaboradores dos
salém, e fazer confusão ali. 9Nós, porém, oramos inimigos (cf. 6.17,18), empenhados numa
ao nosso Deus, e pusemos guarda contra eles de guerra de nervos contra os edificadores (cf.
dia e de noite. I0Então disse Judá: Desfalecem as Myers, p. 126). A irritação de Neemias para
forças dos carregadores, e há muito escombro; não
poderemos edificar o m ura nE os nossos inimigos com os fomentadores de rumores se
disseram: Nada saberão nem verão, até que evidencia quando ele os acusa de dez vezes
entremos no meio deles, e os matemos, e façamos o dizerem. Tal expressão transmite, de modo
cessar a obra. 12Mas sucedeu que, vindo os judeus característico, exasperação e desaprovação
que habitavam entre eles, dez vezes nos disseram: (cf. Gn 31.7; Nm 14.22; Jó 19.3).
De todos os lugares onde moram subirão contra nós.
502
nesse tempo eu disse ao povo: Cada um com o seu houvesse uma força adequada de comba
moço pernoite em Jerusalém, para que de noite tentes, em caso de um ataque noturno.
nos sirvam de guardas, e de dia trabalhem.23Desta
maneira nem eu, nem meus irmãos, nem meus Neemias e seu próprio círculo de associados
moços, nem os homens da guarda que me acom e moços dormiam com a roupa do corpo,
panhavam largávamos as nossas vestes; cada um a fim de estarem preparados para qualquer
ia com a arma à sua direita. emergência.
Não está claro o que se quer dizer com
É improvável que Sambalate e seus e os chefes estavam por detrás de toda a
aliados tivessem atacado Neemias sem auto casa de Judá, a menos que signifique que
rização de Artaxerxes (cf. 6.7; Ed 4.6—8,23; serviam como uma segunda força de segu
5.5), mas Neemias não podia correr o risco. rança dentro da linha do muro.
Além disso, o seu povo estava num estado
de pânico e tinha abandonado o trabalho V. Exploração Econômica dos Constru
no muro (v. 15). Neemias não tinha escolha tores (5.1-19)
senão de estabelecer um estrito sistema de
segurança para os obreiros. 1. Queixa dos Trabalhadores (5.1-5)
A primeira ação de Neemias foi armar 'Então se levantou um grande clamor do povo
o povo e posicioná-los por detrás do muro, e de suas mulheres contra os judeus, seus irmãos.
de modo que esta estrutura, embora incom zPois havia alguns que diziam: Nós, nossos filhos
pleta, pudesse servir como cobertura, em e nossas filhas somos muitos, que se nos dê trigo,
para que comamos e vivamos. 3Também havia os
caso de ataque. Ele procurou, ademais, que diziam: Estamos empenhando nossos campos,
fortalecer sua fé, fazendo-os recordar a as nossas vinhas e as nossas casas, para conse
presença de Deus com eles e o dever deles guirmos trigo durante esta fome. 4Havia ainda
para com Deus e para com suas famílias. outros que diziam: Temos tomado dinheiro empres
Quando Sambalate e seus aliados viram que tado até para o tributo do rei sobre os nossos
campos e as nossas vinhas. 5Ora, a nossa carne
os judeus estavam determinados a oferecer é como a carne de nossos irmãos, e nossos filhos
resistência armada, diminuíram seus desa como os filhos deles; e eis que estamos sujeitando
fios, e o trabalho do muro foi reencetado. nossos filhos e nossas filhas para serem servos, e
A fim de prevenir problemas futuros e algumas de nossas filhas já estão reduzidas à escra
desfazer os temores dos construtores, vidão. Não está em nosso poder evitá-lo, pois outros
têm os nossos campos e as nossas vinhas.
Neemias estabeleceu um sistema de defesa
que serviria por toda a duração do projeto. A edificação do muro foi interrompida
Metade de seus auxiliares militares (moços), não somente pela confusão de fora da
fortemente armados e em completa pron comunidade judaica, mas também pela
tidão para lutar, estavam estacionados em discórdia interna. A pobre condição finan
torno do muro. Cada um dos que levavam ceira da maior parte dos edificadores havia
as cargas e dos que faziam a obra (pedreiros) sido agravada pela fome e pelas exigências
estava bem armado, de modo que pudesse rigorosas do trabalho de construção.
lutar, se necessário, sem qualquer atraso. Agiotas inescrupulosos aproveitaram-se dos
Vigias foram posicionados ao redor da trabalhadores e tornavam uma situação já
cidade, para soarem o alarma A Septua- ruim em intolerável. Levantou-se um grande
ginta e a Pbshita apóiam o ponto de vista clamor da parte dos oprimidos, que exigiram
de Josefo (Antiq. XI, 5.8) de que havia a imediata atenção de Neemias.
muitos vigias estacionados ao lado dos edifi Os abusos econômicos de que o povo
cadores em volta da cidade. Todos foram se queixava dificilmente se originaram
intruídos a convergirem a um ponto onde durante os 52 dias da edificação do muro.
a trombeta soasse. Para aumentar ainda Não obstante, foi a emergência precipitada
mais a segurança da cidade, todos os pela edificação do muro e pelos recentes
obreiros tiveram ordens de estarem dispo fracassos de colheitas que levou a situação
níveis 24 horas por dia, de modo que a atingir proporções críticas.
503
Havia duas queixas principais. Os Mesmo que não estivessem avançando
credores exigiam garantias exorbitantes para a letra da lei, contudo, estavam, segura
seus empréstimos e estavam escravizando mente, violando o seu espírito, ao requerer
os filhos e filhas dos devedores que não tão revoltantes penhores, ao ponto de
possuíam propriedade. Desafortunada deixarem os pobres na contingência de dedi
mente, ambas as práticas eram carem os filhos como garantia ou
tecnicamente legais. pagamento para o débito. Os oprimidos,
Se um credor o preferisse, ele tinha o compreensivelmente, ficaram irados por
direito de requerer e receber um penhor verem membros de sua própria carne e
como garantia para o empréstimo que comunidade aplicando a lei de maneira tão
fizesse a um compatriota hebreu (Ex 22.26; brutal e insensível.
Dt 24.10-13). Ele tinha a permissão para
tomar posse do penhor e usá-lo até que o 2 .0 Confronto de Neemias com os Explo
débito fosse pago (cf. o v. 5c). A preocu radores (5.6-13)
pação fraternal requeria que o penhor fosse ‘Ouvindo eu, pois, o seu clamor, e estas pala
razoável; e o homem verdadeiramente justo vras, muito me indignei. 7Então consultei comigo
é descrito como alguém que não impõe mesmo; depois contendi com os nobres e com os
qualquer penhor (Ez 18.16). Não obstante, magistrados, e disse-lhes: Estais tomando juros,
os agiotas do tempo de Neemias estavam cada um de seu irmão. E ajuntei contra eles uma
grande assembléia. *E disse-lhes: Nós, segundo as
tomando campos, vinhas e casas, e assim nossas posses, temos resgatado os judeus, nossos
estavam reduzindo o pobre a abjeta pobreza irmãos, que foram vendidos às nações; e vós vende
e inanição. A fim de obterem comida para ríeis os vossos irmãos, ou seriam vendidos a nós?
se alimentarem e dinheiro para pagarem o Então se calaram, e não acharam o que responder.
tributo do rei (não o referido no v. 5.15, mas 9Disse mais: Não é bom o que fazeis; porventura
não devíeis andar no temor do nosso Deus, por
o tributo imperial, que tinha de ser pago causa do opróbrio dos povos, os nossos inimigos?
em metal [cf. Ed 6.8]), dos pobres estava l0Tkmbém eu, meus irmãos e meus moços lhes
sendo requerido que entregassem suas temos emprestado dinheiro e triga Deixemos, peço-
fontes de renda. A restauração de uma -vos, este ganho. 11Restituí-lhes hoje os seus
campos, as suas vinhas, os seus olivais e as suas
única letra hebraica no versículo 2 torna casas, como também a centésima parte do dinheiro,
possível traduzir: “Estamos entregando do trigo, do mosto e do azeite, que deles tendes
nossos filhos e nossas filhas como penhor, exigida 12Então disseram: Nós lho restituiremos,
a fim de garantir cereal, para que possamos e nada lhes pediremos; faremos assim como dizes.
Entãoi, chamando os sacerdotes, fi-los jurar que
comer e viver” (Tradução Americana). fariam conforme prometeram. °Também sacudi as
Um homem pobreque não tivesse garan minhas vestes, e disse: Assim sacuda Deus da sua
tias para oferecer ou que não pudesse casa e do seu trabalho todo homem que não cumprir
corresponder às suas obrigações financeiras esta promessa; assim mesmo seja ele sacudido e
despojada E toda a congregação disse: Amém! E
tinha a permissão de empenhar seu filho louvaram ao Senhor; e o povo fez conforme a sua
ou sua filha, e o credor, o direito de requerer promessa.
os serviços de tal pessoa por um período
que não excedesse seis anos (Ex 21.1-6; Dt Quando a triste condição do povo pobre
15.12-18). Os agiotas podiam não estar foi apresentada à atenção de Neemias, ele
violando a letra da Tora, a menos que alguns ficou muito indignado (cf. 13.8,25) e
tivessem ultrapassando seus limites por confrontou os nobres e magistrados com
violarem as garotas escravas. A RSV (bem acusações de exploração. A fim de reforçar
como a nossa versão) traduz o versículo 5: súas exigências de reforma, ele convocou
algumas de nossas filhas já estão reduzidas uma grande assembleia contra os ofensores.
à escravidão, mas a passagem, provavel Segundo a RSV, a principal acusação
mente, significa: “algumas de nossas filhas que Neemias fez contra os denunciados foi
já foram violadas” (cf. Et 7.8). que estavam tomando juros. Esta tradução
504
está, sem dúvida, incorreta. O clamor dos declaração Deixemos, pois, este ganho não
pobres não havia incluído tal queixa. significa, necessariamente, que ele próprio
Ademais, era uma explícita violação da Tora estivesse exigindo penhores. (O próprio
que um judeu cobrasse juros de outro judeu Esdras se identifica com os transgressores
(Ex 22.25; Dt 23.20). Contudo, Neemias matrimoniais [Ed 9.6], conquanto ele não
não acusou ninguém de violar a letra da houvesse contratado um casamento ilícito.)
lei. A ofensa real da qual os credores foram A comunidade era uma coletividade inte
chamados a darem contas foi a de empres gral, e cria-se que o pecado de qualquer
tarem exigindo penhor (cf. a Tradução grupo dentro da comunidade (de toda a
Judaica Americana). Deixemos (...) este coletividade) traria a culpa sobre todos.
ganho significa “paremos de exigir garan Neemias exigiu que todos os credores
tias para empréstimos” (cf. Wilhelm devolvessem aos devedores suas terras,
Rudolph, p. 130). Esta prática, conquanto vinhas (...) olivais (...) casas que passaram
legal, era condenável, por estar causando a possuir como penhores.
severas dificuldades entre os pobres. A referência à centésima parte do
Neemias procurou envergonhar os ofen- dinheiro etc é obscura. A palavra hebraica
sores, para levá-los a desistirem de suas traduzida como centésima não tem tal signi
práticas abusivas. Lembrou-lhes que ele e ficado em qualquer outro contexto, e,
seus associados estavam resgatando os aparentemente, é um antigo erro de
judeus que haviam-se tornado escravos dos escriba.43 A palavra original deve ter feito
gentios (v. 8). Este era um procedimento referência a penhores. O contexto sugere
normal (Lv 25.47-49), mas era revoltante que Neemias estivesse exigindo a restituição
ter de redimir escravos de seus irmãos de tudo que havia sido estipulado para os
judeus. Neemias está apelando para uma empréstimos de dinheiro, trigo, vinho e
emancipação humanitária de todos os azeite. Devido à fome e sobrecarga de
escravos. impostos, o dinheiro e alimento devem ser
Os exploradores não só estavam entendidos como empréstimos dos ricos, e
tornando a vida dificílima para os seus não como penhores oferecidos pelos pobres.
irmãos menos abastados, mas também Os ofensores prometeram restituir os
pondo em perigo a segurança da comuni penhores e não mais fazer tais extorsões
dade. Estavam dando ajuda e conforto ao no futuro. Mas Neemias não estava satis
inimigo em meio a uma perigosa emer feito com uma simples afirmação. Ele
gência militar. Enfraquecendo a chamou os sacerdotes, para imporem um
comunidade a partir de dentro, estavam juramento de que os abusos não seriam
encorajando o opróbrio dos povos e sola repetidos. Então Neemias sacudiu as suas
pando os esforços de Neemias em vestes no lugar onde guardava os seus
reconstruir o muro. Neemias sugere que o pertences pessoais, para dramatizar o que
interesse pessoal esclarecido, se nada mais aconteceria ao homem que quebrasse o seu
além disso, deveria motivá-los a andar no juramento. Seria destituído de sua casa e
temor do nosso Deus, o que inclui a idéia meio de vida assim como alguém sacode
de manter uma correta relação com os seus do bolso o seu conteúdo.
semelhantes.
3. O Exemplo de Neemias Como Gover
Muitos estudiosos acham que Neemias nador (5.14-19)
incluía-se nos abusos econômicos. É
verdade que disse que ele e seus associados 14Além disso, desde o dia em que fui nomeado
tinham estado emprestando dinheiro e seu governador na terra de Judá, desde o ano vinte
trigo. Os versos 14-19, contudo, sugerem até o ano trinta e dois do rei Artaxerxes, isto é,
que ele está contrastando o seu comporta 43 Cf. E. Neufeld, “The R a te o f Interest and theT extof N ehem iah 5.11”,
mento com o dos cobiçosos nobres. A Jew ish Q uarterly Review, janeiro de 1954, p. 199,200.
505
por doze anos, nem eu nem meus irmãos comemos como governador (v. 14). O propósito da
o pão devido ao governador. 15Mas os primeiros apologia era religioso (cf. o v. 19). Neemias,
governadores, que foram antes de mim, oprimiram
o povo, e tomaram-lhe pão e vinho e, além disso, em harmonia com o ensino deuteronômico
quarenta siclos de prata; e até os seus moços domi ortodoxo, cria que sua recompensa da parte
navam sobre o povo. Porém eu assim não Hz, por de Deus seria proporcional à sua lealdade
causa do temor de Deus. l6Tkmbém eu prossegui à Tora. Este registro explícito de suas boas
na obra deste muro, e terra nenhuma compramos;
e todos os meus moços se ajuntaram ali para a obra.
ações destinava-se a demonstrar que ele era
17 Sentavam-se à minha mesa cento e cinqüenta homem temente a Deus, digno de ser por
homens dentre os judeus e os magistrados, além Deus lembrado.44
dos que vinham ter conosco dentre as nações que Neemias tinha preocupação fora do
estavam ao redor de nós. 18Ora, o que se prepa comum quanto ao futuro (cf. 13.14,22,31),
rava para cada dia era um boi e seis ovelhas
escolhidas; também se me preparavam aves e, de porque era um eunuco. Sua recompensa não
dez em dez dias, provisão de toda qualidade de vinha incluiria a perpetuação de seu nome em
Todavia, nem por isso exigi o pão devido ao gover seus herdeiros (cf. 2Sm 18.18). A oração dele
nador, porquanto a servidão deste povo era pesada. a Deus foi que fosse lembrado por suas boas
,9Lembra-te de mim para meu bem, ó meu Deus,
e de tudo quanto tenho feito em prol deste pova
ações. Esta era, de fato, a promessa apre
sentada por um escritor pós-exílico em
Isaías 56.4,5.
Não só Neemias não explorou os pobres
mediante práticas econômicas egoístas, VI. Importunação Posterior Feita a
como também nem sequer aceitou o pão Neemias (6.1-19)
devido ao governador. Em lugar disso, ele
próprio sustentou a despesa da alimentação 1. Convite a uma Conferência (6.1-4)
dos oficiais administrativos e visitantes 1 Quando Sambalate, Tobias e Gesem, o arábio,
estrangeiros que tinham o direito à mesa e o resto dos nossos inimigos souberam que eu tinha
do governador. Viu que a servidão deste edificado o muro e que nele já não havia brecha
povo era pesada, e não se dispunha a alguma, ainda que até este tempo não tinha posto
as portas nos portais, 2Sambalate e Gesem
aumentar a sua carga de maneira alguma. mandaram dizer-me: Vem, encontremo-nos numa
Ele não adquiriu terra (que estava em pouca das aldeias da planície de O n a Eles, porém, inten
disponibilidade), e a mansão do governador tavam fazer-me mal. 3E enviei-lhes mensageiros a
que havia planejado construir (2.8) aparen dizer: Estou fazendo uma grande obra, de modo
temente nunca foi edificada. que não poderei descer. Por que cessaria esta obra,
enquanto eu a deixasse e fosse ter convosco? 4Do
A identidade dos primeiros governadores mesmo modo mandaram dizer-me quatro vezes;
não é revelada. Uma vez que não foi senão e do mesmo modo lhes respondi.
até o tempo de Neemias que Judá se
desligou de Samária como um distrito admi A narrativa sobre os abusos econômicos
nistrativo à parte, os governadores referidos (cap. 5) interrompe a história da recons
eram, provavelmente, governadores sama- trução do muro, mas serve para indicar
ritanos. Esses governadores oprimiram o progresso contínuo na construção. Em 4.6,
povo, mas no hebraico isso não pode signi o muro está apenas meio completado, mas
ficar que o pão e o vinho fossem além dos quando a narrativa é reencetada tudo é
quarenta siclos de prata. O texto da Vulgata concluído, exceto a colocação das portas
sugere que os governadores impuseram um de madeira em suas aberturas.
tributo de quarenta siclos por dia para Quando os inimigos de Neemias desco
prover comida e vinho para a mesa do gover briram que não estavam conseguindo nada
nador (cf. Bowman, p. 712). com as ameaças de interferência militar,
Neemias não apresentou esta defesa de recorreram a tentativas mais sutis e mali
seu governo por ocasião da grande assem ciosas, para frustrarem o trabalho de
bléia. Ela foi composta algum tempo após
44 Cf. W althcr E ichrcdt, Tbeology of ttae Old Tesumient (Piladelphia:
o encerramento de sua primeira gestão Westminster, 1961), II, p. 346,347.
506
Neemias. Enviaram-lhe quatro convites repetia o pedido para uma conferência, mas
diferentes, instando para que se encontrasse desta vez incluía um ultimato. Foi dito a
com eles para uma conferência na planície Neemias que, a menos que ele concordasse
de Ono. Neemias estava convencido de que em encontrar-se com seus inimigos, um rela
eles tentavam atraí-lo para longe da segu tório seria remetido ao rei persa e que essa
rança de Jerusalém, e então recusou-se a carta o estaria acusando de traição.
ir. Porém ele não lhes ofereceu uma recusa Se Neemias tivesse de fato estado forti
categórica, mas valeu-se do trabalho do ficando Jerusalém sem autorização persa,
muro como uma desculpa para não se como Sambalate aparentemente cria, isto
encontrar com eles. Aparentemente, estava poderia ser interpretado como traição. Tal
ganhando tempo, a fim de concluir o atitude, da parte de um grupo anterior,
trabalho antes de arriscar um confronto. havia levado Reum e Sinsai a apresentarem
Neemias havia, sem dúvida, avaliado os queixa junto a Artaxerxes I (Ed. 4.8-16).
motivos de seus inimigos corretamente. Neemias, certamente, não havia consti
Gestos amistosos eram freqüentemente tuído profetas para o proclamarem rei,45
utilizados com o fim de atrair um homem mas não é impossível que Sambalate tivesse
para uma armadilha fatal (2Sm 13.23-29; ouvido tais rumores. Assim como Ageu
Jr 41.1-3), e Neemias não podia correr risco. (2.23) e Zacarias (3.8; 6.10-14) haviam
Entretanto, se Neemias dispunha de expressado esperanças políticas quanto a
documentos de Artaxerxes, autorizando o Zorobabel, profetas anônimos um século
trabalho em que estava empenhado, fica-se depois podem ter estado sussurrando tais
a imaginar por que não propôs uma confe planos para Neemias. À luz dos versos
rência em seus próprios termos, para que 10-14, é possível que profetas inescrupulosos
a questão ficasse esclarecida. tivessem feito circular falsos rumores sobre
A planície de Ono era parte do vale de as ambições de Neemias, no propósito de
Sarom, cerca de 20 milhas a nordeste de criar-lhe problemas.
Jerusalém. Este local pode ter sido consi Neemias negou inteiramente quaisquer
derado território neutro (cf. Bowman, p. planos de rebelião contra a Pérsia e acusou
715,716), conquanto judeus ali vivessem Sambalate de inventar as acusações. Ele
durante o período pós-exílico (7.37; cf. recusou-se a amedrontar-se ou a ser inter
Esdras 2.33). rompido em seu trabalho. Em vez disso,
tomou coragem e renovou os seus esforços.
2. Acusação de Traição (6.5-9) A última sentença, no versículo 9, não é
5Então Sambalate ainda pela quinta vez me uma oração. No Texto Massorético, o verso
enviou o seu moço com uma carta aberta na mão, está no imperativo, mas as palavras ó Deus
6na qual estava escrito: Entre as nações se ouviu, foram acrescentadas pelos tradutores. As
e Gesem o diz, que tu e os judeus intentais revoltar
mos, e por isso tu estás edificando o muro, e segundo versões grega e latina mostram que Neemias
se diz, queres fazer-te rei deles; 7e que constituíste fortaleceu as suas próprias mãos, o que
profetas para proclamarem a respeito de ti em Jeru significa que ele revigorou a sua coragem
salém: H á rei em Judá. Ora, estas coisas chegarão e aumentou a sua determinação. Bowman
aos ouvidos do rei; vem, pois, agora e consultemos
juntamente. 8Então mandei dizer-lhe: De tudo o
(p. 718) prefere a tradução da Vulgata: “Eu
que dizes, coisa nenhuma sucedeu, mas tu mesmo fortaleci minhas mãos ainda mais.”
o inventas. 9Pois todos eles nos procuravam atemo
rizar, dizendo: As suas mãos hão de largar a obra, 3. Ardis dos Falsos Profetas (6.10-14)
e não se efetuará. Mas agora, ó Deus, fortalece
as minhas mãos. 10Fui à casa de Semaías, filho de Delaías, filho
de Meetabel, que estava em recolhimento; e disse ele:
A quinta carta (carta aberta, provavel M esm oseN eem ias tivesse sido desleal a Artaxerxes, dificilmente iria
mente, refere-se ao ostracon, comumente aspirar ao tro n a Efe, aparentem ente, não era m em bro d a linhagem
de Davi. A demais, como eunuco, ele, sem dúvida, seria inelegível (cf.
usado, cf. Bowman, p. 716) de Sambalate D t 23.1).
507
Ajuntemo-nos na casa de Deus, dentro do templo, enredá-lo, orou novamente para que os
e fechemos as suas portas, pois virão matar-te; sim, juízos de Deus caíssem sobre os seus
de noite virão matar-te. "Eu, porêm, respondi: Um
homem como eu fugiria? e quem hã que, sendo tal inimigos (cf. 4.4,5).
como eu, possa entrar no templo e viver? De
maneira nenhuma entrarei. I2E percebi que não era 4. A Conclusão do Muro (6.15,16)
Deus que o enviara; mas ele pronunciou essa
profecia contra mim, porquanto Tobias e Samba 15Acabou-se, pois, o muro aos vinte e cinco do
late o haviam subornada l3Eles o subornaram mês de elul, em cinqüenta e dois dias. I6Quando
para me atemorizar, a fim de que eu assim fizesse, todos os nossos inimigos souberam disso, todos
e pecasse, para que tivesse de que me infamar, e os povos que havia em redor de nós temeram, e
assim me vituperassem. I4Lembra-te, meu Deus, de abateram-se muito em seu próprio conceito; pois
Tobias e de Sambalate, conforme estas suas obras, perceberam que fizemos esta obra com o auxílio
e também da profetisa Noadias, e dos demais do nosso Deus.
profetas que procuravam atemorizar-me.
Não há razão convincente para que se
Neemias não tinha o apoio unânime de rejeite a informação bíblica de que o muro
todos os judeus de Judá. Havia alguns foi completado em cinqüenta e dois dias.
profetas e pelo menos uma profetisa que O relato completo da construção reflete um
simpatizavam com os inimigos de Neemias. grande senso de urgência e pressa. A tarefa
Tobias e Sambalate exploraram essa desu foi completada com velocidade tão feno
nião interna, num esforço adicional para menal, que os povos circunvizinhos ficaram
solapar a obra de Neemias. maravilhados e atribuíram a realização à
Um homem chamado Semaías, presu ajuda de Deus (v. 16).
mivelmente um profeta judeu local, foi Pode-se presumir que,.exceto quanto ao
contratado para tentar levar Neemias ao muro leste, Neemias simplesmente reparou
pânico, para que cometesse atos de covardia o muro pré-exílico. As escavações de Miss
e sacrilégio. Disse a Neemias que ele estava Kenyon46 revelam que Neemias de fato
para ser assassinado e deveria buscar construiu um muro leste inteiramente novo,
imediatamente refúgio dentro do santuário mas, ao fazê-lo, reduziu grandemente o
do Templo. A frase que estava em recolhi tamanho da cidade, e assim reduziu a tarefa
mento não tem sido explicada de refortificá-la. Não é historicamente
satisfatoriamente. improvável que Neemias tenha concluído
Neemias recusou-se a dar atenção ao o muro aos vinte e cinco do mês de elul
conselho de Semaías mesmo antes de (agosto-setembro), no mesmo ano em que
perceber que este estava a soldo de seus recebeu a permissão de Artaxerxes (cf 2.1).
inimigos. Encerrar-se dentro do Templo lhe A jornada de Susã e a reconstrução do muro
custaria a confiança do povo e teria desmo podiam muito bem ser concretizadas em
ralizado aqueles que estavam trabalhando seis meses.
no muro. Ademais, seria uma séria ofensa O verso 16 contém alguns problemas de
cultual entrar Neemias no edifício do tradução e interpretação. Em primeiro lugar,
Templo. Leigos tinham a permissão de o Tèxto Massorético reza “viram” (cf. a nota
entrar no pátio do Templo, mas não no marginal da RSV), em lugar de temeram.
edifício propriamente dito (cf. Nm 18.7). Os inimigos em Samária e outros lugares
Sem dúvida, teria sido duplamente ofensivo distantes ouviram que o muro estava termi
um eunuco entrar no Templo (cf. Lv nado, enquanto as pessoas que moravam
21.17-24; Dt 23.1). perto o “viram” por si mesmas. Em segundo
Neemias enfrentou bravamente o lugar, abateram-se muito em seu próprio
suposto perigo e recusou macular sua repu conceito é tradução bastante duvidosa do
tação por qualquer ato de indiscrição. texto hebraico. A correção de somente um
Quando descobriu que o relatório era
simplesmente mais uma armadilha para 46 Op. d t., p. 110.
508
letra hebraica oferece a versão “e foi extre dores em potencial dentro da comunidade.
mamente maravilhosos a seus olhos” (cf. Medidas tinham que ser tomadas imedia
Bowman, p. 722). Esta tradução harmoniza- tamente para a segurança da cidade.
se perfeitamente com o contexto à luz da Porteiros foram designados para contro
declaração final pois perceberam que larem o acesso à cidade. Os porteiros de 7.45
fizemos esta obra com o auxilio do nosso eram os guardas à entrada do Templo.
Deus. Confusão entre os dois grupos resultou com
a adição das palavras os cantores e os levitas
5. Os Aliados de Tobias em Judá (6.17-19) ao versículo 1, onde, obviamente, não se
ajustam. Dentre os moradores de Jeru
16Além disso, naqueles dias os nobres de Judá salém guardas foram postados na
enviaram muitas cartas a Tobias, e cartas de Tobias
vinham para eles. ,8Pois muitos em Judá estavam vizinhança de seus lares como uma
ligados a ele por juramento, por ser ele genro de precaução adicional. Exceto à luz do dia,
Secanias, filho de Ará, e por haver seu filho Joanã todas as entradas para a cidade foram
casado com a filha de Mesulão, filho de Berequias. fechadas e barradas.
1’Também as boas ações dele contavam perante
mim, e as minhas palavras transmitiam a ele. Tobias, Possivelmente, em antecipação de seu
pois, escrevia cartas para me atemorizar. retorno a Susã, Neemias colocou o seu
irmão Hanâni (cf. 1.2) a cargo da cidade.
Neste apêndice à história da recons A posição acarretava uma pesada respon
trução do muro, Neemias explica por que sabilidade e requeria um homem fiel e
Tobias era inimigo particularmente perigoso temente a Deus. O título de Hanâni, gover
para ele. Muitos dos nobres de Judá eram nador do castelo, pode sugerir que ele fosse
amigos e patentes de Tobias e não compar comandante da fortaleza do Templo (cf.
tilhavam da antipatia que Neemias sentia 2.8), antes de ser colocado sobre a cidade
por ele. Mas o próprio Tobias e seu filho inteira.
Joanã eram aparentados por matrimônio Hanâni e Hananias são formas variadas
com as famílias de destacados edificadores do mesmo nome, e, sem dúvida, referem-se
do muro (cf. 3.4,29,30). É possível que os ao mesmo homem. A conjunção e serve
amigos de Tobias em Judá tentassem since freqüentemente, no hebraico, como um
ramente mediar entre ele e Neemias, mas explicativo e deveria ser traduzido aqui
Neemias considerou-os delatores. como “ou seja” ou “isto é” (cf. Bowman,
P, 724).
VII. A Restauração de Jerusalém
(7.1-73a) 2. Necessidade de Repovoamento (7.4,5)
4Ora, a cidade era larga e grande, mas o povo
1. Organização de Defesas (7.1-3) dentro dela era pouco, e ainda as casas não estavam
‘Ora, depois que o muro foi edificado, tendo edificadas. sEntão o meu Deus me pôs no coração
eu assentado as portas, e havendo sido designados que ajuntasse os nobres, os magistrados e o povo,
os porteiros, os cantores e os levitas, 2pus Hanâni, para registrar as genealogias. E achei o livro da
meu irmão, e Hananias, governador do castelo, genealogia dos que tinham subido primeiro, e achei
sobre Jerusalém; pois ele era homem fiel e temente escrito nele o seguinte:
a Deus, mais do que muitos; 3e eu lhes disse: Não
se abram as portas de Jerusalém até que o sol O novo muro em torno de Jerusalém
aqueça; e enquanto os guardas estiverem nos postos poderia ser verdadeiramente eficiente
se fechem e se tranquem as portas; e designai dentre somente quando a cidade tivesse sido plena
os moradores de Jerusalém guardas, cada um por
seu turno, e cada um diante da sua casa. mente restaurada e repovoada. Neemias
convocou os nobres, os magistrados e o
A conclusão do muro não eliminou todo povo com o propósito de elaborar um plano.
o perigo para Jerusalém. Havia ainda O próprio plano, que até 11.1,2 não é
inimigos nas províncias circundantes e trai descrito, requeria que dez por cento da
509
população local se mudass; para dentro da três; 30os homens de Ramá e Gaba, seiscentos e
cidade. vinte e um ;51os homens de Micmás, cento e vinte
dois; 3zos homens de Betei e Ai, cento e vinte e
A cidade de Jerusalém era esparsamente três; 33os homens do outro Nebo, cinqüenta e dois;
povoada ao tempo da construção do muro, Mos filhos do outro Elão, mil duzentos e cinqüenta
porém umas poucas pessoas ali viviam (7.3; e quatro; 35os filhos de Harim, trezentos e vinte;
cf. 3.21,23,28,29; 11.1). Talvez a declaração 36os filhos de Jericó, trezentos e quarenta e cinco;
de que ainda as casas não estavam edifi 37os filhos de Lode, de Hadide e de Ono, setecentos
e vinte e um; 38os filhos de Senaá, três mil nove
cadas signifique que nenhuma casa nova centos e trinta.
havia sido construída durante ou após a 3,Os sacerdotes: os filhos de Jedaías, da casa
reconstrução do muro. de Jesuá, novecentos e setenta e três; 40os filhos
É possível que Neemias tenha levado a de Imer, mil e cinqüenta e dois; 41os filhos de
efeito um registro genealógico de algum tipo Pasur, mil duzentos e quarenta e sete; 42os filhos
de Harim, mil e dezessete.
em conexão com o seu programa de restau 43Os levitas: os filhos de Jesuá, de Cadmiel, dos
ração de Jerusalém. Porém, se os resultados filhos de Hodevá, setenta e quatro. ““Os cantores:
desse registro foram achados nas memórias os filhos de Asafe, cento e quarenta e oito. 45Os
de Neemias, o cronista preferiu não porteiros: os filhos de Salum, os filhos de Ater, os
empregá-los. Em vez disso, ele apresenta filhos de Tàlmom, os filhos de Acube, os filhos de
Hatita, os filhos de Sobai, cento e trinta e oito.
uma lista genealógica que se entendia 46Os netinins: os filhos de Ziá, os filhos de
conter os nomes daqueles que tinham Hasufa, os filhos de labaote, 47os filhos de Querós,
subido primeiro (presumivelmente, ao os filhos de Siá, os filhos de Padom, “ os filhos de
tempo do primeiro retorno, durante o Lebana, os filhos de Hagaba, os filhos de Salmai,
4,os filhos de Hanã, os filhos de Gidel, os filhos
reinado de Ciro). de Gaar, 50os filhos de Reaias, os filhos de Rezim,
os filhos de Necoda,51os filhos de Gazão, os filhos
3. A Lista do Censo (7.6-73a) de Uzá, os filhos de Paséia, S2os filhos de Besai,
6Estes são os filhos da província que subiram os filhos de Menuim, os filhos de Nefusesim, 53os
do cativeiro dentre os exilados, que Nabucodonozor, filhos de Baquebuque, os filhos de Hacufa, os filhos
rei de Babilônia, transportara e que voltaram para de Harur, 54os filhos de Bazlite, os filhos de Meída,
Jerusalém e para Judá, cada um para a sua cidade, os filhos de Harsa, 5Sos filhos de Barcos, os filhos
7os quais vieram com Zorobabel, Jesuá, Neemias, de Sísera, os filhos de Tamá, 56os filhos de Nezias,
Azarias, Raamias, Naamâni, Mardoqueu, Bilsã, e os filhos de Hatifa.
Misperete, Bigvai, Neum e Baaná. Este é o número 57Os filhos dos servos de Salomão: os filhos de
dos homens do povo de Israel: 8foram os filhos de Sotai, os filhos de Soferete, os filhos de Perida, ^os
Parós, dois mil cento e setenta e dois; 9os filhos filhos de Jaala, os filhos de Darcom, os filhos de
de Sefatias, trezentos e setenta e dois; 10os filhos Gidel, S9os filhos de Sefatias, os filhos de Hatil, os
de Ará, seiscentos e cinqüenta e dois; nos filhos filhos de Poquerete-Hazebaim e os filhos de Amom.
de Paate-Moabe, dos filhos de Jesuá e de Joabe, “ Todos os netinins e os filhos dos servos de
dois mil oitocentos e dezoito; 12os filhos de Elão, Salomão, eram trezentos e noventa e dois.
mil duzentos e cinqüenta e quatro; I3os filhos de 61Estes foram os que subiram de Tel-Mela, Tel-
Zatu, oitocentos e quarenta e cinco; 14os filhos' de -Harsa, Querube, Adom, e Imer; porém não
Zacai, setecentos e sessenta; Isos filhos de Binuí, puderam provar que as suas casas paternas e a sua
seiscentos e quarenta e oito; 16os filhos de Bebai, linhagem eram de Israel: 62os filhos de Delaias, os
seiscentos e vinte e oito; l7os filhos de Azgade, dois filhos de Tobias, os filhos de Necoda, seiscentos
mil trezentos e vinte e dois; 18os filhos de Adonicão, e quarenta e dois. 63E dos sacerdotes: os filhos de
seiscentos e sessenta e sete; l9os filhos de Bigvai, Habaías, os filhos de Hacoz, os filhos de Barzilai,
dois mil e sessenta e sete; 20os filhos de Adim, seis que tomara por mulher uma das filhas de Barzilai,
centos e cinqüenta e cinco; 21os filhos de Ater, de o gileadita, e que foi chamado do seu nome. “ Estes
Ezequias, noventa e oito; 22os filhos de Hasum, buscaram o seu registro entre os arrolados nos
trezentos e vinte e oito; 23os filhos de Bezai, registros genealógicos, mas não foi encontrado; pelo
trezentos e vinte e quatro; 24os filhos de Harife, que, tidos por Imundos, foram excluídos do sacer
cento e doze; Mos filhos de Gibeão, noventa e dócio. 6SE o governador lhes disse que não
cinco; 26os homens de Belém e de Netofá, cento comessem das coisas sagradas, até que se levantasse
e oitenta e oito; 27os homens de Anatote, cento e um sacerdote com Urim e Tumim.
vinte e oito; 28os homens de Bete-Azmavete, "Toda esta congregação junta somava quarenta
quarenta e dois; 29os homens de Quiriate-Jearim, e dois mil trezentos e sessenta, 67afora os seus
de Cefira, e de Beerote, setecentos e quarenta e servos e as suas servas, que foram sete mil trezentos
510
e trinta e sete; e tinham duzentos e quarenta e cinco disseram a Esdras, o escriba, que trouxesse o livro
cantores e cantoras. “ Os seus cavalos foram sete da lei de Moisés, que o Senhor tinha ordenado a
centos e trinta e seis; os seus mulos, duzentos e Israel. 2E Esdras, o sacerdote, trouxe a lei perante
quarenta e cinco; mos seus camelos, quatrocentos a congregação, tanto de homens como de mulheres,
e trinta e cinco; os seus jumentos, seis mil setecentos e de todos os que podiam ouvir com entendimento,
e vinte. no primeiro dia do sétimo mês. 3E leu nela diante
70Ora, alguns dos cabeças das casas paternas da praça que está fronteira à porta das águas, desde
contribuíram para a obra. O governador deu para a alva até o meio-dia, na presença dos homens e
a tesouraria mil dáricos de ouro, cinqüenta bacias, das mulheres, e dos que podiam entender; e os
e quinhentas e trinta vestes sacerdotais. 71E alguns ouvidos de todo o povo estavam atentos ao livro
dos cabeças das casas paternas deram para a tesou da lei. 4Esdras, o escriba, ficava em pé sobre um
raria da obra vinte mil dáricos de ouro, e duas mil estrado de madeira, que fizeram para esse fim; e
e duzentas minas de prata. 720 que o resto do povo estava em pé junto a ele, à sua direita, Matitias,
deu foram vinte mil dáricos de ouro, duas mil minas Sema, Anaías, Urias, Hilquias e Maaséias; e à sua
de prata, e sessenta e sete vestes sacerdotais. esquerda, Pedaías, Misael, Malquias, Hasum,
73Os sacerdotes, os levitas, os porteiros, os Hasbadana, Zacarias e Mesulão. 5E Esdras abriu
cantores, alguns dentre o povo, os netinins e todo o livro à vista de todo o povo (pois estava acima
o Israel habitaram nas suas cidades. de todo o povo); e, abrindo-o ele, todo o povo se
pôs de pé. 6Então Esdras bendisse ao Senhor, o
Esta lista é encontrada quase palavra por grande Deus; e todo o povo, levantando as mãos,
palavra na narrativa da restauração do culto respondeu: Amém! Amém! E, inclinando-se,
(ver a discussão de Esdras 2.1-70). adoraram ao Senhor, com os rostos em terra.
7Iambém Jesuá, Bani, Serebias, Jamim, Acube,
Uma lista dessas seria de valor para Sabetai, Hodias, Maaséias, Quelita, Azarias, Joza-
Neemias nos arranjos para o repovoamento bade, Hanã, Pelaías e os levitas explicavam ao povo
de Jerusalém, e ele pode, presumivelmente, a lei; e o povo estava em pé no seu lugar. 8Assim
ter tido acesso a ela. Foi o cronista, contudo, leram no livro, na lei de Deus, distintamente; e deram
que se responsabilizou por incluí-la nesta o sentido, de modo que se entendesse a leitura.
narrativa. Se Neemias tivesse inserido o
documento em suas memórias, ele dificil A história da leitura da lei e das ceri
mente teria empregado o material mônias associadas a ela é parte da narrativa
irrelevante dos versículos 64-73. Ademais, de Esdras e está cronologicamente fora de
ele certamente teria feito alusão à lista em lugar no presente contexto. Os eventos rela
conexão com a reforma populacional em cionados com esta passagem melhor se
questão, descrita em 11.1,2. A ausência de entendem como tendo tido lugar pouco
qualquer referência a uma lista de censo após os de Esdras 7-8 e logo após os de
em 11.1,2 sugere que Neemias não utilizou Esdras 9-10. É bem provável que a própria
tal documento. A segunda parte de 7.5, a narrativa ficasse originalmente nessa
começar com as palavras “para registrar as posição.
genealogias”, é freqüentemente entendida Como a narrativa de Esdras chegou a
como a própria introdução do cronista à ficar deslocada é incerto. Pbde ser signifi
lista. A razão de Neemias convocar os cativo, contudo, o fato de a história da
líderes e o povo de Jerusalém pode ter sido leitura da lei começar com a declaração:
para que lançasse sorte (11.1,2), e não de Quando chegou o sétimo mês, já se achavam
tê-los registrados pelas genealogias. os filhos de Israei nas suas cidades. Também
o fato de esta ser quase exatamente a mesma
VIII. O Reavivamento de Esdras declaração encontrada em Esdras 3.1,
(7.73b—9.37) seguindo-se imediatamente à lista do censo
(Ed 2.1-70), pode ter influenciado um
1. Leitura da Lei (7.73b—8.8) escriba a inserir o relato da leitura da lei
imediatamente após a lista do censo em
Quando chegou o sétimo mês, já se achavam
os filhos de Israel nas suas cidades.
Neemias 7.6-73a. O testemunho de lEsdras
‘Então todo o povo se ajuntou como um só é de que o erro foi descoberto posterior
homem, na praça diante da porta das águas; e mente e que foi feita uma tentativa para
511
restaurar a passagem à nar rativa de Esdras. Esse ritual para introduzir a leitura da lei
Por esse tempo, contudo, não mais se sabia já era plenamente conhecido pelo povo.
onde, dentro da história de Esdras, se encai A narrativa não indica por iniciativa de
xava a leitura da lei. Portanto, o último quem a assembléia foi convocada, mas os
relato (e, inadvertidamente, uma porção da líderes comunitários tiveram parte impor
conclusão da lista do censo) foi anexado ao tante no culto. Esdras leu a convite de
final de Esdras 7-10, onde permanece na algum porta-voz dentre o povo (v. 1), e
recensão. líderes de destaque, da comunidade,
A recuperação da seqüência original de acompanharam-no na plataforma. Os
eventos revela a obra de Esdras em sua pers levitas explicavam ao povo a lei, traduzindo-
pectiva histórica apropriada. Ele chegou a -a do hebraico para o aramaico vernacular
Jerusalém no primeiro dia do quinto mês do povo.
(Ed 7.9) e empregou as primeiras poucas Nenhuma tentativa para identificar o
semanas para conhecer as pessoas e saber conteúdo específico do rolo do qual Esdras
de suas necessidades. Durante o sétimo mês leu tem sido convincente. E claro, contudo,
(7.73b) ele conduziu o povo na renovação que Esdras não introduziu um código novo
de sua devoção para com a Tora e na obser ou anteriormente desconhecido. O rolo do
vação da Festa dos Tabernáculos. O qual ele leu já era conhecido e aceito pela
reavivamento religioso preparou a comu comunidade como o livro da lei de Moisés,
nidade para aceitar as reformas que o Senhor tinha ordenado a Israel. O
matrimoniais, que se seguiram no nono mês povo levantou-se em atitude de respeito para
(Ed 10.9). com ela e chorou quando ouviu suas pala
vras familiares (8.9; ver comentário sobre
O primeiro dia do sétimo mês tornou-se Esdras 7.12-14). Esdras deve ter lido de uma
um feriado no Judá pós-exílico (cf. Lv
porção da Tora que já era considerada auto
23.24,25; Nm 29.1-6), mas a assembléia
rizada e canônica pela comunidade.
diante da porta das águas não parece ter
sido uma assembléia rotineira. Preparativos 2. Reação do Povo (8.9-12)
especiais tinham sido feitos, incluindo a
construção de um estrado de madeira, e 9E Neemias, que era o governador, e Esdras,
mesmo as mulheres e crianças mais velhas sacerdote e escriba, e os levitas que ensinavam o
tinham sido reunidas para o que claramente povo, disseram a todo o povo: Este dia é consagrado
ao Senhor vosso Deus; não pranteeis nem choreis.
tratou-se de uma ocasião extraordinária. Pois todo o povo chorava, ouvindo as palavras da
Esdras, o mestre da Tora, que havia lei. l0Disse-Ihes mais: Ide, comei as gorduras, e
bebei as doçuras, e enviai porções aos que não têm
recentemente chegado de Babilônia, -foi nada preparado para si; porque este dia é consa
convidado a ler o livro da lei de Moisés. grado ao nosso Senhor. Portanto, não vos
Ele, assistido pelos levitas (cf. o v. 8), leu entristeçais, pois a alegria do Senhor é a vossa força.
deste a alva até o meio-dia. "O s levitas, pois, fizeram calar todo o povo,
dizendo: Calai-vos porque este dia é santo; por isso
Ao iniciar-se o culto, Esdras abriu o livro não vos entristeçais. 12Então todo o povo se foi
para comer e beber, e para enviar porções, e para
(desenrolou o rolo) e todo o povo se pôs em fazer grande regozijo, porque tinha entendido as
pé, em reverente respeito pelo santo livro. palavras que lhe foram referidas.
Pfermaneceram de pé, enquanto Esdras
pronunciava uma oração de louvor, e então, A geração que antecedera o tempo da
erguendo as mãos, disseram: Amém! Amém! liderança religiosa efetiva de Neemias havia
(uma resposta litúrgica pela qual os adora transmitido negligência e frouxidão na
dores expressam sua participação de observância da Tora. A leitura da lei tornou
coração inteiro na oração). Finalmente, eles o povo agudamente consciente de sua falha
se prostraram com seus rostos em terra. e culpa, levando-o a chorar e lamentar.
512
Mas a leitura da lei não era uma ocasião 3. Observância da Festa dos Ihbernáculos
para pensar em tristeza no Israel antigo. Era (8.13-18)
ocasião para alegria e ações de graças (cf. 13Ora, no dia seguinte ajuntaram-se os cabeças
SI 19.7-10; Dt 12.12). Esdras confortou o das casas paternas de todo o povo, os sacerdotes
povo e proclamou uma festa, para celebrar e os levitas, na presença de Esdras, o escriba, para
a renovação de sua dedicação a Deus. A examinarem as palavras da lei; 14e acharam escrito
religião proclamada pela Bíblia nunca é na lei que o Senhor, por intermédio de Moisés, orde
nara que os filhos de Israel habitassem em cabanas
uma carga a ser suportada, mas uma opor durante a festa do sétimo mês; 15e que publicassem
tunidade para genuína alegria e realização e fizessem passar pregão por todas as suas cidades,
espiritual. Quando o escritor declara que e em Jerusalém, dizendo: Saí ao monte, e trazei
a alegria do Senhor é a vossa força ele está ramos de oliveiras, de zambujeiros e de murtas,
folhas de palmeiras, e ramos de outras árvores fron
expressando uma profunda verdade para dosas, para fazerdes cabanas, como está escrita
todas as gerações. "’Saiu, pois, o povo e trouxe os ramos, e todos
O grande regozijo, porém, não devia ser fizeram para si cabanas, cada um no eirado da sua
expresso mediante incontrolável balbúrdia. casa, nos seus pátios, nos átrios da casa de Deus,
na praça da porta das águas, e na praça da porta
A presença de Deus pode ser ocasião para de Efraim. 17E toda a comunidade dos que tinham
alegria e mesmo para exclamações de júbilo, voltado do cativeiro fez cabanas, e habitaram nelas;
mas pode também ser ocasião para silêncio. pois não tinham feito assim os filhos de Israel desde
Quando os levitas disseram ao povo: Calai- os dias de Josué, filho de' Num, até aquele dia. E
houve mui grande regozija 18E Esdras leu o livro
-vos, porque este dia é santo (v. 11), estavam da lei de Deus todos os dias, desde o primeiro até
expressando a rara percepção de que o o último, e celebraram a festa por sete dias e no
silêncio reverente em si pode ser uma reação oitavo dia houve uma assembléia solene, segundo
positiva à presença e grandeza de Deus (cf. a ordenança.
Zc 2.13; Hc 2.20; Sf 1.7). O estudo formal da lei não cessou após
O nome de Neemias, no versículo 9, é a grande assembléia no primeiro dia do
quase, certamente, uma intromissão. À sétimo mês. Um grupo menor de líderes
parte da forte evidência de que Esdras e comunitários tornou a reunir-se no dia
Neemias não foram contemporâneos (ver seguinte, para continuar o estudo. Nessa
a Introdução), há razões para se crer que ocasião, Esdras dirigiu sua atenção para
o seu nome não é original neste contexto. uma passagem que continha instruções
Em primeiro lugar, a passagem paralela, em sobre a observância da Festa dos Taberná
lEsdras 9.49, omite o nome de Neemias culos (ver o comentário sobre Esdras 3.3-6).
e simplesmente contém “o governador”. Em Sendo que o tempo designado para a cele
segundo lugar, a palavra usada para gover bração dessa festa estava próximo, planos
nador (tirshatha), no versículo 9, foram feitos, e o próprio festival logo se
aparentemente não era o título correto para seguiu.
Neemias (a LXX omite o título em 10.1). Os preparativos começaram imediata
A última referia-se a seu ofício como pehah mente, mas a verdadeira celebração,
(palavra diferente para governador; cf. 5.18). provavelmente, não começou antes do
Finalmente, o verbo disseram, no versículo décimo quinto dia (cf. Lv. 23.34,39). O
9, está no singular. Conquanto isto não seja último dia da festa teria caído no vigésimo
gramaticalmente impossível com um sujeito primeiro dia, e a assembléia solene no vigé
no plural, é provável que somente uma simo segundo. A próxima convocação
pessoa tenha falado (cf. o v. 10) e que essa ocorreu dois dias depois, no vigésimo quarto
pessoa fosse Esdras. Pode-se presumir que dia (9.1).
o nome de Neemias encontrasse o seu A observância da festa seguiu bem de
caminho para esta passagem como resul perto as especificações encontradas no
tado da transposição da passagem em meio Código de Santidade (Lv 23.33-36,39-43),
à narrativa de Neemias. que, presumivelmente, superavam as
513
instruções menos exatas de Deuteronômio parte do reavivamento de Esdras e como
16.13-15. Não está claro, porém, o que uma seqüência dos acontecimentos do capí
houve, quanto à festa, que levou o cronista tulo 8. A assembléia solene subseqüente à
a sugerir que não tinha havido celebração Festa dos Tabernáculos teve lugar no vigé
assim desde os dias de Josué, filho de Num, simo segundo dia do mês (8.18), e o jejum
até aquele dia. É improvável que Esdras seguiu-se diretamente no dia vinte e quatro.
tenha restaurado qualquer aspecto da festa Tal jejum não precisa ser tido como ines
que havia sido abandonado desde o tempo perado. Conquanto o povo fosse instado a
de Josué. Talvez tenhamos aqui uma regozijar-se, em vez de chorar, quando a lei
fórmula literária convencional que mera foi lida primeiro (8.9-12), o alvo final do
mente expressa a qualidade superlativa da reavivamento foi, seguramente, o arrepen
ocasião (cf. 2Rs 23.22; 2Cr 30.26; 35.18; dimento e a rededicação. Uma cerimônia
Is 7.17; Mt 24.21). de confissão e renovação era um clímax
adequado para as três semanas de estudo
4. Jejum e Confissão (9.1-5) da lei em regozijo.
A separação dos estrangeiros fora um
'Ora, no dia vinte e quatro desse mês, se ajun
taram os filhos de Israel em jejum, vestidos de sacos
passo preliminar, para a reforma matrimo
e com terra sobre as cabeças. 2E os da linhagem nial de Esdras 9 e 10, e não sua
de Israel se apartaram de todos os entrangeiros, conseqüência. Os estrangeiros mencionados
puseram-se em pê e confessaram os seus pecados no versículo 2 obviamente não incluem
e as iniqiiidades de seus pais. 3E, levantando-se no esposas e filhos. A leitura da lei fez os judeus
seu lugar, leram no livro da lei do Senhor seu Deus,
uma quarta parte do dia; em outra quarta parte novamente cônscios de que suas relações
fizeram confissão, e adoraram ao Senhor seu Deus. com não-judeus eram ilícitas. A exclusão
4Então Jesuá, Bani, Cadmiel, Sebanias, Buni, de estrangeiros perto do fim do sétimo mês
Serebias, Bani e Quenâni se puseram em pé sobre foi o início de um processo, que culminou
os degraus dos levitas, e clamaram em alta voz ao
Senhor seu Deus. SE os levitas Jesuá, Cadmiel,
na separação de esposas e filhos no nono
Bani, Hasabnéias, Serebias, Hodias, Sebanias e (Ed 9-10).
Petaías disseram: Levantai-vos, bendizei ao Senhor Os levitas desempenharam um papel de
vosso Deus de eternidade em eternidade. Bendito linha de frente nas cerimônias do vigésimo
seja o teu glorioso nome, que está exaltado sobre quarto dia, como o fizeram nas cerimônias
toda bênção e louvor.
do primeiro dia (8.7-12). Contudo, o texto
A transição de regozijo, no capítulo 8, dos versículos 4 e 5 tinha sido muito mal
para o jejum, no capítulo 9, é abrupta. Isto preservado, e é impossível descobrir a
tem levado à sugestão de que o capítulo 9 relação entre os dois grupos de levitas.
ficava, originalmente, após Esdras 10 e
descreve a resposta do povo às reformas 5. Oração e Arrependimento (9.6-37)
matrimoniais, e não ao estudo da lei. Tal
1) Os Poderosos Atos de Deus e a Resposta
solução para o problema deve, contudo, ser
rejeitada. Isso não explica como 23 dias de Israel (9.6-31)
podem ter transcorrido entre o fim da obra 6Tu, só tu, és Senhor; tu fizeste o céu e o céu
da comissão dos casamentos mistos (Ed dos céus, juntamente com todo o seu exército, a
terra e tudo quanto nela existe, os mares e tudo
10.17) e a implementação de suas decisões quanto neles há, e tu os conservas a todos, e o exér
(cf. o v. 1). Ademais, deixa de ressaltar que cito do céu te adora. 7Tu és o Senhor, o Deus que
os versículos 1-5 não mencionam a despe elegeste a Abrão, e o tiraste de Ur dos caldeus, e
dida de esposas e filhos de modo algum, lhe puseste por nome Abraão; 8e achaste o seu
mas fazem referência a uma separação mais coração fiel perante ti, e fizeste com ele o pacto
de que darias à sua descendência a terra dos cana-
geral, de estrangeiros. neus, dos heteus, dos amorreus, dos perizeus, dos
O jejum e a confissão mencionados nesta jebuseus e dos girgaseus; e tu cumpriste as tuas
passagem devem ser interpretados como palavras, pois és justa
514
’Também viste a aflição de nossos pais no e engordaram, e viveram em delidas, pela tua grande
Egito, e ouviste o seu clamor junto ao M ar bondade.
Vermelho; 10e operaste sinais e prodígios contra “ Não obstante foram desobedientes, e se rebe
Faraó, e contra todos os seus servos, e contra todo laram contra ti; lançaram a tuá lei para trás das
o povo da sua terra; pois sabias com que soberba costas, e mataram os teus profetas que protestavam
eles os haviam tratado; e assim adquiriste renome, contra eles para que voltassem a ti; assim cometeram
como hoje se vê. nFendeste o mar diante deles, de grandes provocações. 27Pelo que os entregaste nas
modo que passaram pelo meio do mar em seco; mãos dos seus adversários, que os afligiram; mas
e lançaste os sois perseguidores nas profundezas, no tempo da sua angústia, quando eles clamaram
como uma pedra nas águas impetuosas. 12Além a ti, tu os ouviste do céu; e segundo a multidão das
disso, tu os guiastes de dia por uma coluna de nuvem tuas misericórdias lhes deste libertadores que os
e de noite por uma coluna de fogo, para os alumiares libertaram das mãos de seus adversários. “ Mas,
no caminho por onde haviam de ir. 13Desceste tendo alcançado repouso, tornavam a fazer o mal
sobre o monte Sinai, do céu falaste com eles, e lhes diante de ti; portanto tu os deixavas nas mãos dos
deste juízos retos e leis verdadeiras, bons estatutos seus inimigos, de modo que estes dominassem sobre
e mandamentos; 14o teu santo sábado lhes fizeste eles; todavia, quando eles voltavam e clamavam a
conhecer; e lhes ordenaste mandamentos e estatutos ti, tu os ouvias do céu, e segundo a tua misericórdia
e uma lei, por intermédio de teu servo Moisés. os livraste muitas vezes; 2,e testemunhaste contra
15Do céu lhes deste pão quando tiveram fome, e da eles, para os fazeres voltar para a tua lei; contudo
rocha lhes fizeste brotar água quando tiveram sede; eles se houveram soberbamente, e não deram
e lhes ordenaste que entrassem para possuir a terra ouvidos aos teus mandamentos, mas pecaram contra
que com juramento lhes havias prometido dar. - os teus juízos, pelos quais viverá o homem que os
16Eles, porém, os nossos pais, se houveram cumprir; viraram o ombro, endureceram a cerviz
soberbamente, e endureceram a cerviz, e não deram e não quiseram ouvir. ^N ão obstante, por muitos
ouvidos aos teus mandamentos, I7recusando ouvir- anos os aturaste, e testemunhaste contra eles pelo
te e não se lembrando das tuas maravilhas, que teu Espírito, por intermédio dos teus profetas;
fizeste no meio deles; antes endureceram a cerviz todavia eles não quiseram dar ouvidos; pelo que
e, na sua rebeldia, levantaram um chefe, a fim de os entregaste nas mãos dos povos de outras terras.
voltarem para a sua servidão. Di, porém, és um Deus 31Contudo pela tua grande misericórdia não os
pronto a perdoar, clemente e misericordioso, tardio destruíste de todoi, nem os abandonaste, porque és
em irar-te e grande em beneficência, e não os aban um Deus clemente e misericordiosa
donaste. 18Ainda mesmo quando fizeram para si
um bezerro de fundição, e disseram: Este é o teu Esta longa oração, que segue a história
Deus, que te tirou do Egito, e cometeram grandes da cerimônia de rededicação, é atribuída
blasfêmias, 19todavia tu, pela multidão das tuas
misericórdias, não os abandonaste no deserta A a Esdras na LXX, mas não no Tèxto Masso-
coluna de nuvem não se apartou deles de dia, para rético. Muitos eruditos mantêm que era
os guiar pelo caminho, nem a coluna de fogo de originalmente atribuída aos levitas e que
noite, para lhes alumiar o caminho por onde haviam é uma continuação da doxologia do verso
de ir. “ Também lhes deste o teu bom espírito para 5b. É mais provável, contudo, que as pala
os ensinar, e o teu maná não retiraste da sua boca,
e água lhes deste quando tiveram sede. 21Sim, por vras E Esdras disse* foram perdidas do
quarenta anos os sustentaste no deserto; não lhes Texto Massorético. Oito levitas podem ter
faltou coisa alguma; a sua roupa não envelheceu, proferido a declaração litúrgica do verso 5b
e os seus pés não se incharam.22Além disso lhes em uníssono, mas a longa oração deve ser
deste reinos e povos, que lhes repartiste em porções;
assim eles possuíram a terra de Siom, a saber, a atribuída, originalmente, a um homem
terra do rei de Hesbom, e a terra de Ogue, rei de somente.
Basã. 23Outrossim multiplicaste os seus filhos A origem da oração é desconhecida. Foi
como as estrelas do céu, e os introduziste na terra composta num tempo em que os judeus
de que tinhas dito a seus pais que nela entrariam passavam por grande agonia e sendo brutal
para a possuírem. 24Os filhos, pois, entraram e
possuíram a terra; e abateste perante eles, os mora
mente explorados por reis estrangeiros (v.
dores da terra, os cananeus, e lhos entregaste nas 36,37). Isto exclui o tempo de Neemias e
mãos, como também os reis, e os povos da terra, Esdras, ambos tendo simpatias pelo gover
para fazerem deles conforme a sua vontade. nante persa e gratos por seus benefícios em
25Tomaram cidades fortificadas e uma terra fértil, e favor dos judeus (cf. 2.6-8; Esdras 7.27,28).
possuíram casas cheias de toda sorte de coisas boas,
cisternas cavadas, vinhas e olivais, e árvores frutí * N ão constam n a Versão Alm eida Revisada da IBB, adotada para esta
feras em abundância; comeram, pois, fartaram-se tradução do Com entário (N. do T.).
515
A oração foi empregada em seu contexto adverti-los. Deus os castigou repetidamente,
presente porque ela expressa o espírito de numa tentativa de atraí-los de volta a si,
arrependimento e renovação que era apro mas sem êxito. Finalmente, ele permitiu que
priado à cerimônia de rededicação. os caldeus destruíssem sua terra. Mas
O tema básico da oração é a graciosa mesmo no cativeiro não acabou com eles
auto-revelação do próprio Deus na História nem os desamparou (v. 31). Os atos de Deus
e a lamentável reação de Israel para com tinham sido coerentemente graciosos e
sua revelação. Este, de fato, é um dos temas amoráveis, a despeito da indigna reação de
mais comuns do Antigo Testamento, desde Israel.
a literatura mais antiga até a mais recente
(cf. Amós 2.9-12; Mq 6.1-8; Dt 1—5; Dn 2) Apelo por Misericórdia (9.32-37)
9.3-16). O autor desta passagem está reafir
mando a confissão freqüentemente repetida 32Agora, pois, 6 nosso Deus, Deus grande,
poderoso e temível, que guardas o pacto e a bene
de que a benevolente iniciativa de Deus tem ficência, não tenhas em pouca conta toda a aflição
sido, de modo sistemático, retribuída com que nos alcançou a nós, a nossos reis, a nossos prín
descaso e egoísmo por parte do homem. cipes, a nossos sacerdotes, a nossos profetas, a
O suplicante confessa que os poderosos nossos pais e a todo o teu povo, desde os dias dos
atos de Deus em benefício de Israel come reis da Assíria até o dia de hoje. 33Tu, porém, és
justo em tudo quanto tem vindo sobre nós; pois tu
çaram com a criação dos céus e da terra. fielmente procedeste, mas nós perversamente. MOs
A expressão céu dos céus é idiomática, com nossos reis, os nossos príncipes, os nossos sacer
o sentido de “o mais alto dos céus”, e reflete dotes e os nossos pais não têm guardado a tua lei,
a idéia comum de que havia vários céus (cf. nem têm dado ouvidos aos teus mandamentos e aos
Dt 10.14; Ef 4.10). Todo o seu exército teus testemunhos, que testificaste contra eles.
35Porque eles, no seu reino, na muita abundância
refere-se aos seres angélicos, criados por de bens que lhes deste, na terra espaçosa e fértil
Deus para servirem junto ao seu trono celes que puseste diante deles, não te serviram, nem se
tial (cf. lRs 22.19).47 A graciosa iniciativa converteram de sua más obras. 36Eis que hoje
de Deus continuou na eleição de Abrão e somos escravos, e quanto à terra que deste a nossos
pais, para comerem o seu fruto e o seu bem, eis
no estabelecimento de um concerto com que somos escravos nela. 37E ela multiplica os seus
ele. A escravidão do Egito não frustrou o produtos para os reis que puseste sobre nós por
plano de Deus, pois ele interveio, para tirar causa dos nossos pecados; também eles dominam
o povo da escravidão e conduzi-lo segura sobre os nossos corpos e sobre o nosso gado como
mente através do deserto. No Sinai, ele lhes bem lhes apraz, e estamos em grande angústia.
deu sua lei e o seu santo sábado, e supriu
todas as necessidades. Na porção final da oração, o suplicante
Em desafiante reação aos atos maravi apela a Deus por misericórdia sobre si e
lhosos de Deus e seu benevolente cuidado, sobre o seu povo. Terríveis desgraças tinham
porém, os filhos de Israel se houveram recaído sobre o povo do pacto desde os dias
soberbamente e não deram ouvidos aos dos reis da Assíria, que destruíram Israel
mandamentos. Não obstante, Deus foi (722 a.C.) e devastaram Judá (701 a.C.). A
paciente e perdoador, mesmo quando punição foi merecida; e ao longo disso tudo
fizeram para si um bezerro de fundição. Ele Deus tinha sido justo e em tudo procedeu
os susteve por quarenta anos no deserto, fielmente para com o seu povo ímpio (ver
depois deu-lhes vitória sobre Siom e Ogue, os comentários sobre Esdras 9.6-15).
e guiou-os para tomarem posse das riquezas Nenhuma tentativa é feita na oração para
de Canaã. desculpar os judeus ou minimizar sua culpa.
Novamente Israel respondeu com Mas, ao longo da história, Deus revelou-se
desobediência e rebelião, e matou os misericordioso e perdoador. É devido a esta
profetas que Deus havia enviado para graça divinamente revelada que o suplicante
pode procurar piedade e alívio em sua
47 Para um excelente tratam ento daexpressãq ver A . R . Johnson, up. d t aflição.
516
IX. Uma Aliança Escrita (9.38—10.39) Parece ser um documento histórico inde
pendente, possivelmente preservado nos
1. Documento e as Testemunhas arquivos do Templo. Pode ter sido associado,
(9.38—10.27) incorretamente, com o reavivamento de
Esdras por causa da referência à separação
“ Contudo, por causa de tudo isso firmamos “dos povos de outras terras para seguir a
um pacto e o escrevemos; e selam-no os nossos prín lei de Deus” (10.28; cf. 9.1-3).
cipes, os nossos levitas e os nossos sacerdotes.
'Os que o selaram foram: Neemias, o gover Oitenta e quatro rtomes estão alistados
nador, filho de Hacalias, Zedequias, 2Seraías, como signatários do pacto. Se a lista foi
Azarias, Jeremias, 3Pasur, Amarias, Malquias, preservada em sua forma original, este
4Hatus, Sebanias, Maluque, 5Harim, Meremote, emprego de um múltiplo de 12 pode repre
Obadias, ‘Daniel, Ginetom, Baruque, 7Mesulão, sentar uma tentativa adicional, para
Abias, Miamim, 8Maazias, Bilgai e Semaías; estes
foram os sacerdotes. % os levitas: Jesuá, filho de simbolizar o povo de Israel como um todo.
Azanias, Binuí, dos filhos de Henadade, Cadmiel, O nome de Neemias encabeça a lista.
10e seus irmãos, Sebanias, Quelita, Pelaías, Hanã, O título governador aparece, estranha
“Mica, Reobe, Hasabias,12 Zacur, Serebias, Seba mente, após o seu nome no Texto
nias, 13Hodias, Bani e Benínu. l4Os chefes do povo:
Parós, Paate-Moabe, Elão, Zatu, Bani, lsBuni,
Massorético, mas não é encontrado na
Azgade, Bebai, 16Adonias, Bigvai, Adim, 17Ater, Septuaginta. O nome Zedequias, que se
Ezequias, Azur, 18Hodias, Hasum, Bezai, ‘’Harife, segue ao de Neemias, pode ser o do escriba
Anatote, Nobai, 20M agpias, Mesulão, Hezir, (possivelmente, chamado pela variante
21Mesezabel, Zadoque, Jadua, 22Pelatias, Hanã,
Anaías, 23Oséias, Hananias, Hassube, 24Haloés,
Zadoque em 13.13) que preparou o
Pilá, Sobeque, 2SReum, Hasabna, Maaséias, documento (cf. Myers, p. 176).
26Aias, Hanã, Anã, 27Maluque, Harim e Baaná. O documento foi assinado também por
grupos de sacerdotes (v. 2-8), levitas (v. 9-13)
Esta narrativa apresenta o relato de um e chefes do povo (v. 14-27). A seqüência
pacto em que o povo de Judá se compro desses grupos, na lista, ê diferente daquela
mete a obedecer a certas ordenanças da declaração introdutória (9.38). Isto pode
específicas, relativas a casamento, sábado ser uma pista para o caráter composto da
e ofertas do Templo. Em seu contexto narrativa.
presente, a passagem parece descrever acon Muitos dos que assinaram o documento
tecimentos associados com a conclusão do são identificados apenas pelos nomes de
reavivamento de Esdras. O nome de Esdras, seus ancestrais remotos. O uso do nome dos
contudo, está, manifestamente, ausente na pais fundadores, para identificar o represen
narrativa. Ademais, é difícil compreender tante contemporâneo da família, era uma
como as cerimônias de renovação dos capí forma conveniente para expressar a legiti
tulos 8 e 9 poderiam ser os antecedentes midade de sua genealogia.
para os juramentos específicos incorporados
no pacto do capítulo 10. Por outro lado, a
presença do nome de Neemias sugere que 2. Sumário dos Compromissos (10.28-39)
a passagem tem relação com sua missão,
e não com a de Esdras. Ainda por outro 1) Introdução (10.28,29)
lado, os abusos com que Neemias lidou
durante sua segunda missão (cap. 13) são 28E o resto do povo, os sacerdotes, os levitas,
os porteiros, os cantores, os netinins, e todos os
de fato aqueles que o pacto busca corrigir. que se tinham separado dos povos de outras terras
Os acontecimentos do capítulo 10 são mais para seguir a lei de Deus, suas mulheres, seus filhos
bem compreendidos como tendo-se seguido e suas filhas, todos os que tinham conhecimento
diretamente aos acontecimentos do capítulo e entendimento, “ aderiram a seus irmãos, os seus
nobres, e convieram num juramento sob pena de
13. maldição de que andariam na lei de Deus, a qual
O capítulo 10 não pode ser atribuído às foi dada por intermédio de Moisés, servo de Deus,
memórias de Neemias ou ao cronista. e de que guardariam e cumpririam todos os manda-
517
mentos do Senhor, nosso Senhor, e os seus juízos sábado. Neemias observou vasto abuso do
e os seus estatutos; sábado em Judá (13.15-22), mas o problema
mais sério foi criado pelos não-judeus
O texto antecipado do “pacto” (9.38) no mercadores, que traziam peixes e outras
início da narrativa não é dado. Em vez disso, mercadorias para venderem em Jerusalém
o autor apresenta um relato do estabeleci no dia de sábado. O juramento por escrito
mento de votos e fornece um sumário dos destinava-se a tratar da quebra mais patente
compromissos assumidos. da ordenança sabática. Sem dúvida, tinha-
A comunidade inteira uniu-se para fazer -se por seguro que outras infrações também
votos solenes de viver segundo a lei de Deus. cessariam.
Os líderes apuseram suas assinaturas ao O voto era extensivo, para incluir qual
documento, e o resto do povo, leigos e clero, quer dia santificado em que se proibiam
pais e filhos mais velhos aceitaram os transações comerciais. Compra e venda
compromissos como sendo deles próprios. eram proibidas no dia do festival da lua nova
Mesmo os judeus não-exílicos que se tinham (Am 8.5), e, provavelmente, nos vários dias
separado dos povos de outras terras (cf. Ed de santa convocação (cf. Ex 12.16; Nm
6.21) foram aceitos como participantes do 28.18,25,26; 29.1).
pacto. Conquanto o ano sabático não seja
O povo fez um juramento sob pena de mencionado no capítulo 13, a recordação
maldição de que andariam na lei de Deus. de abusos descritos no capítulo 5, provavel
Isso significa que se comprometeram a viver mente, fez com que fosse incluído no pacto.
segundo a lei e concordaram em aceitar as Durante esse ano a terra devia ser deixada
penalidades (cf. Dt 29.20,21) se quebrassem sem plantio; e a produção dos campos não
o voto. A fórmula hebraica regular de voto cultivados e vinhas não podadas se desti
convida a maldição de Deus sobre quem naria aos pobres (Ex 23.11; Lv 25.2-7). Ao
quer que falhe em cumprir o seu voto final do sétimo ano, os débitos deveriam ser
solene. cancelados e os empréstimos remitidos (cf.
Dt 15.1-4). A observância regular do ano
2) Reformas Matrimoniais e do Sábado sabático, com sua provisão para os pobres,
(10.30,31) ajudaria a assegurar que o tipo de emer
3°de que não daríamos as nossas filhas aos
gência refletida no capítulo 5 não ocorreria
povos da terra, nem tomaríamos as filhas deles para novamente.
os nossos filhos; 31de que, se os povos da terra trou
xessem no dia de sábado qualquer mercadoria e 3) Compromisso de Apoio ao Templo
quaisquer cereais para venderem, nada lhes compra (10.32-39)
ríamos no sábado, nem em dia santificado; e de que
abriríamos mão do produto do sétimo ano e da 32Tàmbém sobre nós impusemos ordenanças,
cobrança nele de todas as dívidas. obrigando-nos a dar cada ano a terça parte dum
siclo para o serviço da casa do nosso Deus; 33para
os pães da proposição, para a contínua oferta de
Logo em seguida ao breve sumário ante- cereais, para o contínuo holocausto dos sábados
cipatório da feitura do pacto (v. 28,29), o e das luas novas, para as festas fixas, para as coisas
autor enumera os compromissos específicos sagradas, para as ofertas pelo pecado a fim de fazer
que o povo assumiu. O primeiro voto era expiação por Israel, e para toda a obra da casa do
nosso Deus. nós, os sacerdotes, levitas e o povo
o de não promover mais nenhum casa lançamos sortes acerca da oferta da lenha que
mento entre judeus e os povos da terra. O havíamos de trazer à casa do nosso Deus, segundo
voto era o correspondente formal, por as nossas casas paternas, a tempos determinados,
escrito, do juramento que Neemias já havia de ano em ano, para se queimar sobre o altar do
obtido dos ofensores (13.26). Senhor nosso Deus, como está escrito na lei.
35Ikmbém nos obrigamos a trazer de ano em ano
O segundo voto foi o de não comprarem à casa do Senhor as primícias da nossa terra, e as
mercadorias de não-judeus no dia de primícias de todos os frutos de todas as árvores;
518
%e a trazer os primogênitos dos nossos filhos, e especiais aos sábados, luas novas e festas
os do nosso gado, como está escrito na lei, e os
primogênitos das nossas manadas e dos nossos reba
fixas (ver o comentário sobre Esdras 3.3-6).
nhos à casa do nosso Deus, aos sacerdotes que A expressão coisas sagradas é obscura, mas,
ministram na casa do nosso Deus; 37e as primicias provavelmente, refere-se aos suprimentos
da nossa massa, e as nossas ofertas alçadas, e o fruto considerados essenciais às várias ofertas. As
de toda sorte de árvores, o mosto e o azeite, aos ofertas pelo pecado eram sacrifícios expia
sacerdotes, para as câmaras da casa do nosso Deus;
e os dízimos da nossa terra aos levitas; pois eles, tórios especiais para fazer expiação por
os levitas, recebem os dízimos em todas as cidades Israel, por pecados cometidos involuntária
por onde temos lavoura. 38E o sacerdote, filho de ou inadvertidamente (Nm 15.22-31; Lv
Arão, deve estar com os levitas quando estes rece 4.1—5.13). Toda a obra da casa do nosso
berem os dízimos; e os levitas devem trazer o dízimo Deus pode referir-se à manutenção física
dos dízimos à casa do nosso Deus, para as câmaras,
dentro da tesouraria. 39Pois os filhos de Israel e do santuário, uma vez que isto não é de
os filhos de Levi devem trazer ofertas alçadas dos outra forma providenciado no pacto.
cereais, do mosto e do azeite para aquelas câmaras,
em que estão os utensílios do santuárioi, como Uma segunda obrigação que o povo
também os sacerdotes que ministram, e os porteiros, assumiu para manutenção do culto era a
e os cantores; e assim não negligenciaremos a casa provisão de lenha para o grande altar de
do nosso Deus. sacrifícios (cf. 13.31). Uma vez que o fogo
devia estar aceso perpetuamente (Lv
A seção final do pacto inclui uma série 6.12,13), fazia-se necessário um suprimento
de votos para o sustento do Templo e de regular de madeira. Os sacerdotes, levitas
seu clero. Ao tempo de sua segunda admi e o povo lançaram sortes, para determinar
nistração, Neemias havia considerado tal a ordem em que as respectivas casas
sustento lamentavelmente insuficiente (Ne paternas (grupos familiares) seriam respon
13.10—13,31). Convencido de que a negli sabilizadas pelo suprimento de madeira.
gência do culto ameaçava a própria
existência da comunidade, ele empreendeu Ao se comprometerem a trazer as primí
reformas totais. O povo respondeu, cias (...) à casa do Senhor, o povo estava
comprometendo-se a assumir obrigações reconhecendo uma antiga obrigação (cf. Ex
financeiras específicas. 23.19; 34.26; Dt 26.1-11). Este dever era
Eles se comprometeram a pagar anual particularmente importante para Neemias
mente a terça parte dum siclo. Conquanto (cf. 13.31), porque as primícias eram para
essa taxa possa ter sido coletada anterior uso do clero (Nm 18.13), que estava sendo
mente (cf. Ex 30.13),48 ela foi inadequadamente sustentado durante sua
particularmente importante no período pós- segunda administração (cf. 13.10-13).
-exílico. O subsídio da dinastia davídica não As primícias da terra eram os primeiros
estava mais disponível, e o apoio ocasional frutos da colheita trazidos ao Templo, em
da Pérsia (cf. Ed 6.4; 7.20-23) era insufi grato reconhecimento a Deus, como o
ciente para cobrir as contínuas despesas. possuidor da terra e o propiciador de seu
A taxa do Templo deveria ser empregada produto. Enquanto as primícias não fossem
para propiciar uma variedade de ofertas trazidas, ninguém tinha permissão de comer
culturais. Os pães da proposição (Ex 25.30) nada da nova colheita (Lv 23.14).
consistiam de uma dúzia de bolos, dispostos
sobre uma mesa no Templo como oferta a De modo semelhante, os primogênitos
Deus (Lv 24.5-9). A contínua oferta de do gado e dos seres humanos eram dedi
cereais e o contínuo holocausto eram os que cados a Deus (Ex 13.2). Animais
se faziam regularmente duas vezes por dia, ritualmente limpos eram sacrificados, e a
e estas eram complementadas com ofertas carne deles comida pelos sacerdotes (Nm
18.17,18). Os primogênitos dos homens e
48 Segundo Êxodo 30.13 (cf. M t 17.24-27), a taxa era de m eio siclo. A
dç animais impuros eram resgatados por
diferença, sem dúvida, deve ser explicada per padrões diferentes de pesa dinheiro (Nm 18.15,16).
519
Intimamente associada com as primícias mivelmente como fiscais da exatidão do
havia a oferta do melhor (isto é, o que de trabalho.
mais primoroso havia) ou certos tipos de Os compromissos para com o sustento
produtos (Nm 18.12; Dt 18.4). Embora uma do Templo são, apropriadamente, conclu
diferente palavra hebraica seja usada para ídos com as palavras: Não negligenciaremos
primícias, a distinção entre os dois tipos a casa do nosso Deus. Este voto sumário
de oferta nem sempre é tornada clara. Em pode ser entendido como uma resposta espe
Deuteronômio 26.1-11, por exemplo, as cífica à pergunta de Neemias: “Por que se
primícias é, aparentemente, usada com refe abandonou a casa de Deus?” (13.11).
rência aos primeiros frutos. Crê-se,
geralmente, contudo, que as duas constitu
íram categorias separadas de presente. X. Distribuição da População (11.1-36)
Aparentemente, as primícias eram obriga
tórias legalmente, enquanto os produtos 1. Repovoamento de Jerusalém (11.1,2)
especiais eram contribuições voluntárias (cf. 'Ora, os príncipes do povo habitaram em Jeru
Bowman, p. 767). A massa era um prepa salém; e o restante do povo lançou sortes, para tirar
rado com a mais fina farinha, apresentado um de cada dez que habitasse na santa cidade de
aos sacerdotes como uma oferta a Deus (cf. Jerusalém, ficando nove nas outras cidades. ZE o
Nm 15.20,21; Ez 44.30). povo bendisse todos os homens que voluntariamente
se ofereceram para habitar em Jerusalém.
O compromisso final registrado no pacto
era levar os dízimos da nossa terra aos Este capítulo é uma continuação da
levitas. A falha em fazê-lo tinha sido a causa história iniciada em 7.1-5, conquanto a
principal da crise descrita em 13.10-13. verdadeira transição da primeira parte da
Durante o período pós-exílico, os dízimos narrativa para a segunda não seja clara. A
eram compartilhados com os levitas (Dt passagem prévia fazia notar a necessidade
14.22-29), mas durante a era pós-exílica era de as pessoas se mudarem para dentro dos
a fonte principal de sua subsistência (Nm novos muros de Jerusalém e dizia como
18.21-32). Neemias havia reunido uma assembléia,
O retoque editorial do cronista é obser presumivelmente para o propósito de
vado no pacto em sua inteireza, mas em atender a essa necessidade. Esta passagem
parte nenhuma é mais claro do que na seção final pode ser vista como descritiva da ativi
sobre o dízimo. Num breve suplemento (v. dade principal dessa assembléia. Os judeus
37b-39a), ele explica como os dízimos eram que viviam nas cidades circunvizinhas
arrecadados em seu próprio tempo. Em lançaram sortes, para tirar um de cada dez
lugar de os dízimos serem trazidos aos que habitasse na santa cidade de Jerusalém.
levitas, como se dava no tempo de Neemias Embora os príncipes do povo já resi
(v. 37a), os levitas saíam a campo para dissem dentro da cidade, “o povo dentro dela
coletá-los. Cidades por onde temos lavoura era pouco” (7.4). A eficácia dos novos muros
não reflete o sentido do texto hebraico, que dependia de uma plena repopulação e reedi-
reza, literalmente, “cidades de nosso ficação de toda a área. Portanto, Neemias
trabalho”. Isso se refere às cidades da Pales levou o povo a selecionar 10 por cento de
tina onde o culto judaico era praticado seu número total para unir-se a seus líderes
(Bowman, p. 768). Esta qualificação era rele dentro dos muros. A escolha foi feita impar
vante, porque durante o período pós-exílico cialmente, por sortes, e, sem dúvida,
cidades judaicas e não-judaicas localizavam- segundo os grupos familiares. Os voluntá
se, muitas vezes, bem próximas umas das rios que se ofereceram para habitar em
outras. Os levitas eram acompanhados por Jerusalém mereceram louvor especial,
representantes do sacerdócio arônico (ver porque era um grande sacrifício abandonar
o comentário sobre Esdras 2.36-39), presu lares já estabelecidos, para edificar novos.
520
2. Líderes Residentes na Cidade (11.3-24) estava às ordens do rei, em todos os negócios concer
nentes ao povo.
3Estes, pois, são os chefes da província que
habitaram em Jerusalém; porém nas cidades de Duas listas foram adicionadas à história
Judá habitou cada um na sua possessão, nas suas do repovoamento de Jerusalém. A primeira
cidades, a saber, Israel, os sacerdotes, os levitas, é identificada como uma lista dos príncipes
os netinins e os filhos dos servos de Salomão. 4E
habitaram em Jerusalém alguns dos filhos de Judá ou líderes que já tinham seus lares dentro
e dos filhos de Benjamim. Dos filhos de Judá: da cidade (cf. 11.1). A segunda propõe-se
Ataías, filho de Uzias, filho de Zacarias, filho de a ser um catálogo das cidades na área
Amarias, filho de Sefatias, filho de Maalelel, dos circunvizinha, onde habitavam os restantes
filhos de Pérez; 5e Maaséias, filho de Baruque,
filho de Col-Hoze, filho de Hazaías, filho de Adaías,
dos judeus (11.25-36). Ambas as listas
filho de Joiaribe, filho de Zacarias, filho de Silôni. parecem estar fora do contexto e têm valor
6Todos os filhos de Pérez que habitaram em Jeru dúbio para o tempo de Neemias.
salém foram quatrocentos e sessenta e oito homens A data e o propósito original da lista dos
valentes. 7São estes os filhos de Benjamim: Saiu, líderes que residiam em Jerusalém perma
filho de Mesulão, filho de Joede, filho de Pedaías,
filho de Colaías, filho de Maaséias, filho de Itiel, necem incertos, por várias razões. Em
filho de Jesaías. 8E depois dele Gabai, Salai, ... primeiro lugar, esta lista está intimamente
novecentos e vinte oito. 9Joel, filho de Zicri, supe relacionada com a lista encontrada em
rintendente sobre eles; e Judá, filho de Senua, o lCrônicas 9.2-34. Uma vez que a metade
segundo sobre a cidade.
10Dos sacerdotes: Jedaías, filho de Joiaribe,
dos nomes nas duas listas é idêntica, ou
Jaquim , "Seraías, filho de Hilquias, filho de quase, deve-se concluir que derivam de uma
Mesulãoi, filho de Zadoque, filho de Meraiote, filho fonte histórica comum. Contudo, a lista em
de Aitude, príncipe da casa de Deus, 12e seus lCrônicas 9 é identificada como a dos
irmãos que faziam a obra da casa, oitocentos e vinte primeiros residentes de Jerusalém após o
e dois e Adaías, filho de Jeroão, filho de Pelalias,
filho de Anzi, filho de Zacarias, filho de Pasur, filho retorno de Babilônia, enquanto esta lista
de Malquias, 13e seus irmãos, cabeças de casas em Neemias 11 reivindica ser a dos líderes
paternas, duzentos e quarenta e dois; e Amassai, que viviam em Jerusalém após o muro ter
filho de Azarei, filho de Aazai, filho de Mesilemote, sido concluído, quase cem anos depois. Em
filho de Imer, 14e os irmãos deles, homens valentes,
cento e vinte e oito; e o superintendente sobre eles
segundo lugar, “Zacur, filho de Inri” (3.2),
era Zabdiel, filho de Hagedolim. que ajudara a reedificar o muro, parece ser
>5Dos levitas: Semaías, filho de Hassube, filho o avô de Ataías (11.4), que encabeça os juda-
de Azricão, filho de Hasabias, filho de Buni; ístas nesta lista. Zacur é uma forma
l6Sabetai e Jozabade, dos cabeças dos levitas, reduzida de Zacarias e Inri é forma abre
presidiam o serviço externo da casa de Deus.
17Matanias, filho de Mica, filho de Zabdi, filho de viada de Amarias (cf. Bowman, p. 773). Isto
Asafe, o dirigente que iniciava as ações de graças sugeriria que a lista foi compilada muitos
na oração, e Baquebuquias, o segundo entre seus anos após a reedificação do muro. O mesmo
irmãos; depois Abada, filho de Samua, filho de tipo de evidência pode ser visto nos nomes
Galai, filho de Jedútun. 18Todos os levitas na santa
cidade foram duzentos e oitenta e quatro. Sabetai e Jozabade, que eram contem
1’Também os porteiros, Acube, Talmom, e seus porâneos de Esdras (8.7; Esdras 8.33; 10.15),
irmãos, os guardas das portas, foram cento e setenta e não de Neemias. Finalmente, há evidência
e dois. 20O resto de Israel e dos sacerdotes e de que a lista foi suplementada muito após
levitas, habitou em todas as cidades de Judá, cada ter sido originalmente compilada. Uzi, que
um na sua herança. 21Os netinins porém habitaram
em Ofel; e Ziá e Gispa presidiram sobre eles. é chamado de superintendente dos levitas
220 superintendente dos levitas em Jerusalém (v. 22), foi o bisneto de Matanias, um líder
era Uzi, filho de Bani, filho de Hasabias, filho de levítico quando a lista foi primeiro formu
Matanias, filho de Mica, dos filhos de Asafe, os lada (v. 17).
cantores; ele estava encarregado do serviço da casa
de Deus. 23Pois havia uma ordem da parte do rei
Conquanto este documento não possa
acerca deles, e uma norma para os cantores, esta ser atribuído às memórias de Neemias, pode
belecendo o dever de cada dia. 24E Petaías, filho oferecer alguma informação valiosa sobre
de Mesezabel, dos filhos de Zerá, filho de Judá, a situação em Jerusalém durante o século
521
seguinte. Por exemplo, cada grupo principal X I. Registros Clericais (12.1-26)
da população tinha o seu superintendente
(v. 9,14 e 22). E mesmo que nada mais seja 1. Sacerdotes e Levitas Que Vieram com
dito sobre esses oficiais, deve-se presumir Zorobabel (12.1-9)
que funcionassem como parte do governo 'Ora, estes são os sacerdotes e os levitas que
municipal. Outro dado importante revelado subiram com Zorobabel, filho de Sealtiel, e com
Jesuá: Seraias, Jeremias, Esdras, 2Amarias,
pela passagem é que a comunidade judaica Maluque, Hatus, 3Secanias, Reum, Meremote,
tinha um representante na corte persa (v. 4ldo, Ginetói, Abias, sMiamim, Maadias, Bilga,
24). Tal enviado teria desempenhado um 6Semaías, Joiaribe, Jedaías, 7Salu, Amoque,
papel crucial em aconselhar o rei sobre as Hilquias, Jedaías; estes foram os chefes dos sacer
necessidades específicas e desejos da comu dotes e de seus irmãos, nos dias de Jesuá. 8E os
levitas: Jesuá, Binuí, Cadmiel, Serebias, Judá,
nidade. Matanias; este e seus irmãos dirigiam os louvores.
Várias alusões no documento são 9E Baquebuquias e Uni, seus irmãos, estavam
obscuras. Não sabemos, por exemplo, se o defronte deles segundo os seus cargos.
mandado do rei a respeito dos cantores (v. Os judeus pós-exílicos criam que a segu
23) se refere às intruções davídicas em rança da comunidade dependia da legi
Crônicas ou se se refere a algum edito do
timidade do clero (cf. 7.61-65; Ed 2.59-63).
rei persa, negociado, talvez, pelo enviado O compilador de Esdras-Neemias inves
judeu. tigou suas fontes, portanto, para encontrar
toda lista genealógica que pudesse ajudar
3. Cidades Habitadas por Judeus (11.25-36) a estabelecer a autenticidade do pessoal do
25E quanto às aldeias com os seus campos, Templo. Várias dessas listas foram reunidas
alguns dos filhos de Judá habitaram em Quiriate- no início deste capítulo.
-Arba e seus arrabaldes, em Dibom e seus A primeira lista (v. 1-7) propõe-se a
arrabaldes, e em Jecabzeeí e suas aldeias, “ em enumerar os sacerdotes que retornaram a
Jesuá, em Molada, em Bete-Pelete, 27em Hazar-
-Sual, em Berseba e seus arrabaldes, 28em Judá com Zorobabel e Jesuá. Essa reivin
Ziclague, em Mecona e seus arrabaldes, 29em En- dicação não pode ser, porém, substanciada,
-Rimom, em Zorá, em Jarmute, Mcm Zanoa, em porque uma lista diferente é atribuída ao
Adulão e suas aldeias, em Laquis e seus campos, tempo de Zorobabel, em 7.39-42 (Ed
e em Azeca e seus arrabaldes. Acamparam-se, pois,
desde Berseba até o vale de Hinom.11Os filhos de 2.36-39). A origem da lista é desconhecida,
Benjamim também habitaram desde Geba em mas, sem dúvida, deriva do quinto, e não
diante, em Micmás, Aíja, em Betei e seus arrabaldes, do sexto século.
32em Anatote, em Nobe, em Ananias, "em Hazor, A lista é, provavelmente, composta. O
em Ramá, em Gitaim, 34Em Hadide, em Zeboim, Texto Massorético traz a conjunção “(e)”
em Nebalate, 35em Lode, e em Ono, vale dos artí
fices. 36E dos levitas que habitavam em Judá, antes de Joiaribe. Seu nome é também
algumas turmas foram unidas a Benjamim. precedido pela conjunção em 12.19; e a lis
ta em 10.2-8 conclui com o nome prece
Esta lista é oferecida como guia às dente Semaías. Os seis nomes, de Joiaribe
cidades de aldeias fora de Jerusalém, onde a Jedaías, podem ser considerados como
cerca de nove décimos da população judaica um suplemento posterior.
da Palestina residia (cf. o v. 1). A origem A segunda lista (v. 8,9) oferece os nomes
da lista é desconhecida, mas não parece ter dos levitas que se supunha terem retornado
sido elaborada durante a administração de com Zorobabel. A lista, contudo, parece
Neemias. Isto é indicado pelo fato de que alcançar pelo menos o tempo de Esdras,
a distribuição geográfica dos judeus, em vista de que Matanias e Baquebuquias
segundo esta lista, é inteiramente diferente estão associados com contemporâneos de
da refletida no capítulo 3. As duas listas Esdras (Sabetai e Jozabade) em 11.16,17.
têm somente a cidade de Zanoa (3.13) em A maioria dos nomes pode ser identifi
comum. cada como nomes ancestrais levíticos,
522
porque ocorre em listas de vários contextos Uzi; 20por Salai, Calai; por Amoque, Eber; 21por
pós-exílicos (cf. 7.43; 8.7; 10.9). Hilquias, Hasabias; por Jedaías, Netanel. 22Nos
dias de Eliasibe, Joiada, Joanã e Jadua foram
inscritos, dos levitas, os chefes dás casas paternas;
2. Sumos Sacerdotes Pós-Exílicos (12.10,11) e assim também os dos sacerdotes, no reinado de
l0Jesuá foi pai de Joiaquim, Joiaquim de Elia Daria, o persa. 23Os filhos de Levi, chefes de casas
sibe, Eliasibe de Joiada, "Joiada de Jonatã, e paternas, foram inscritos no livro das crônicas, até
Jonatã de Jadua. os dias de Joanã, filho de Eliasibe. 24Foram, pois,
os chefes dos levitas: Hasabias, Serebias, Jesuá,
Sem qualquer transição da lista anterior, filho de Cadmiel, e seus irmãos que ficavam
defronte deles, turma contra turma, para louvarem
o compilador inclui a genealogia dos pri e darem graças, segundo a ordem de Davi, homem
meiros seis sumos sacerdotes que ocupavam de Deus. 25Matanias, Baquebuquias, Obadias,
sua posição durante a era pós-exílica. Mesulão, lalmom e Acube eram porteiros, e fa
Sendo que a lista abrange muito mais do ziam a guarda junto aos celeiros das portas.
“ Estes viveram nos dias de Joiaquim, filho de
que um século, é possível que alguns no Jesuá, filho de Jozadaque, como também nos dias
mes não apareçam. Ademais, Jadua pode de Neemias, o governador, e do sacerdote Esdras,
ter sido acrescentado por um editor subse o escriba.
qüente. O verso 22 (cap. 12) reza “Joanã e
Jadua”, como se o último nome tivesse sido Os sacerdotes alistados nos versículos
inserido por mão posterior. Jesua (Josué) 12-21 são identificados como aqueles que
foi o primeiro sumo sacerdote pós-exílico oficiavam nos dias de Joiaquim (entre o
e estava associado com Zorobabel (Esdras tempo de Zorobabel e Neemias). A lista dá
3.2), Ageu (Ag 1.1) e Zacarias (Zc 3.1). o nome ancestral e também o nome do
Joiaquim ocupou a posição durante o representante contemporâneo da família.
longo e pouco conhecido período entre a Por exemplo, Meraías foi o sacerdote que,
reedificação do Templo e o governo de durante o tempo de Joiaquim, era o chefe
Neemias. As listas em 12.12-21, 24,25 são da família que havia sido fundada por
atribuídas ao período de sua gestão no Seraías (cf. 2Rs 25.18). Os nomes ancestrais
cargo. Eliasibe era sumo sacerdote durante ou de família são essencialmente os mes
ambas as administrações de Neemias (3.1; mos que em 12.1-7.
13,28). Joiada, aparentemente, ocupou o Após completar a lista de sacerdotes, o
cargo por pouco tempo, entre Neemias e compilador volve a atenção para a lista
Esdras (cf. 13. 28), mas Joanã (“Jonatã” é correspondente de levitas. Antes de apre
claramente um erro, em lugar de Joanã, cf. sentar os nomes dos levitas (v. 24-26),
12.22) ocupou a posição durante o minis contudo, ele insere uma nota sobre o regis
tério de Esdras (Esdras 10.6). Jadua pode tro de genealogias na era pós-exílica (v.
ter sido filho de Joanã, mas, se foi, Josefo 22.23). O verso 22 pode ser interpretado
(Antiq. XI, 8.2) pode ter-se equivocado como querendo dizer que o registro incluía
quanto a ele estar no cargo ao tempo de tanto os chefes das casas paternas (os
Alexandre, o Grande. nomes ancestrais) como os nomes dos sa
cerdotes individuais que representavam
3. Sacerdotes e Levitas do Tempo de Joia essas famílias.
quim (12.12-26) A expressão traduzida por no reinado
12E nos dias de Joiaquim foram sacerdotes, de Dario, o persa, é obscura no Texto
chefes de casas paternas: por Seraías, Meraías; por Massorético. Se Dario I (522-486 a.C.) é
Jeremias, Hananias; 13por Esdras, Mesulão; por indicado, deve ter significado que o registro
Amarias, Jeoanã; l4por Malúqui, Jonatã; por começou durante o seu reinado. Se a refe
Sebanias, José; lspor Haim, Adná; por Meraiote,
Helcai; 16por Ido, Zacarias; por Ginetom, rência for a Dario II (423-404 a.C.) pode
Mesulão; l7por Abias, Zicri; por Miniamim, por significar que o registro continuou até
Moadias, Piltai; l8por Bilga, Samua; por Semaías, aquele tempo ou que os nomes foram regis
Jeonatã; 19por Joiaribe, Matenai; por Jedaías, trados durante o seu reinado. Seja como
523
for, os nomes foram registrados somente até trazerem a Jerusalém, a fim de celebrarem a dedi
a gestão de Joanã, que ocorreu durante o cação com alegria e com ações de graças, e com
canto, címbalos, alaúdes e harpas.28Ajuntaram-se
reinado de Dario II. Jadua deve ser uma os filhos dos cantores, tanto da campina dos arre
interpolação secundária, como em 12.11. dores de Jerusalém , como das aldeias dos
Os nomes dos levitas foram registrados netofatitas; Z9como também de Bete-Gilgal, e dos
até o mesmo período (presumivelmente, o campos de Geba e de Azmavete; pois os cantores
tinham edificado para si aldeias ao redor de Jeru
tempo em que o próprio compilador viveu). salém. 30E os sacerdotes e os levitas se
O livro das crônicas, em que os nomes purificaram, e purificaram o povo, as portas e o
foram preservados, não pode referir-se aos m ura
livros canônicos por meio desse nome. Era,
aparentemente, um livro de registro oficial O relato da dedicação do muro (princi
do Templo (cf. os livros pré-exílicos simi palmente com base nas memórias de
lares: lRs 14.29; 15.23). Neemias) é removido na história da edifi
Os chefes dos levitas durante o tempo cação (caps. 2-6) por vários capítulos. Os
de Joiaquim incluíam cinco nomes ances dois eventos, contudo, provavelmente não
trais. Jesuá não era o filho de Cadmiel; os eram separados por qualquer período de
dois nomes representavam famílias sepa tempo significativo. Nas memórias de
radas. A palavra traduzida como o filho de Neemias, as cerimônias de dedicação se
devia ser lida como o graficamente seme encontravam, sem dúvida, relatadas imedia
lhante Binuí (12.8), ou, possivelmente, Bani tamente após a conclusão do muro (6.15)
(9.4). A divisão dos levitas em turmas ou ou após as reformas quanto à população
vigias, para louvor e ações de graças, é, de (U.1,2).
modo característico, atribuída a Davi, o Não é de surpreender que Neemias
homem de Deus (cf. lCr 25; 2Cr 8.14). planejasse uma cerimônia formal para a
Seis nomes identificados no Texto dedicação do muro da cidade. Ele não
Massorético como porteiros estão incluídos pensou nos interesses de sua administração
no registro levítico. Mesulão (forma alter como estando divididos entre sagrados e
nativa de Salum), Talmom e Acube são seculares. Todo o seu trabalho estava a
nomes ancestrais de porteiros (7.45; 11.19; serviço de Deus, e a construção do muro
lCr 9.17). Matanias, Baquebuquias e em particular era vista como um exercício
Obadias, por outro lado, foram, sem dúvida, religioso (cf. 2.12; 4.4,5; 6.16). Mediante a
identificados como músicos originalmente cerimônia de dedicação, o muro foi formal
(cf. 11.17, onde Obadias é grafado como mente confiado ao serviço de Deus, para
Abda), mas a designação foi perdida. que havia sido construído.
A lista dos levitas, como a dos sacerdotes, Sendo que as cerimônias envolviam
é atribuída aos dias de Joiaquim. A adição música e cântico, os músicos levitas tinham
dos nomes de Neemias e Esdras, contudo, atribuições de um importante papel. Alguns
é equívoco. Os três homens pertenciam a deles, presumivelmente, viviam em Jeru
gerações sucessivas. Neemias estava asso salém (cf. 11.15-18), mas os outros tinham
ciado com o filho de Joiaquim, Eliasibe que ser convocados de aldeias circunvizi
(3.1), e Esdras como o neto de Eliasibe, nhas. Eles cantavam os hinos de ações de
Joanã. Os nomes de Neemias e Esdras graças com o acompanhamento de
foram, provavelmente, inseridos em ante címbalos, alaúdes e harpas. Harpas e
cipação à narrativa que se segue. alaúdes eram tocados somente em ocasiões
de grande regozijo (cf. Is. 5.12; 24.8; Gn
XII. Dedicação do Müro (12.27-43) 31.27; SI 137.2). Eram ambos instrumentos
de corda que podiam ser tocados em procis
1. Preparativos (12.27-30) sões. A harpa era tocada com os dedos,
27Ora, na dedicação dos muros de Jerusalém enquanto o alaúde com um plectro de
buscaram os levitas de todos os lugares, para os palheta (Bowman, p. 793).
524
Antes de a cerimônia de dedicação do recém-completado muro da cidade.49Os
começar, o clero purificou-se e, em seguida, participantes foram organizados em duas
purificou o povo, as portas e o muro. O ritual grandes companhias, que se congregaram
de purificação não é descrito aqui, prova na parte setentrional da cidade. A primeira
velmente porque era suficientemente bem companhia marchava para a direita (rumo
conhecido. A purificação de pessoas às ao sul) numa direção contrária ao do
vezes envolvia abstinência sexual, abluções, ponteiro do relógio. A outra companhia
aspersão com água ou sangue, raspagem prosseguia em direção horária, em sentido
do corpo, lavagem das vestimentas e sacri oposto. Elas se encontraram no átrio do
fícios especiais (cf. Ex 19.10-15; Lv 14.1-9; Templo, no setor setentrional da cidade,
Nm 8.5-8; 19.17-19). A purificação do muro onde teve lugar uma grande celebração.
pode ter incluído algumas das cerimônias Vários pontos de destaque são mencionados
prescritas para a purificação de uma casa em relação ao ròteiro das procissões, mas
(Lv 14.48-53). não há evidência disponível para permitir
identificação exata deles em termos de
2. Cerimônias de Dedicação (12.31-43) aspectos topográficos modernos da cidade.
31Então fiz subir os príncipes de Judá sobre o Embora o presente texto não esteja intei
muro, e constituí duas grandes companhias para ramente claro, parece que ambas as
darem graças e andarem em procissão, uma das
quais foi para a direita sobre o muro, em direção
companhias estavam constituídas exata
à porta do monturo; 32e após elas seguiam mente da mesma maneira. À frente de cada
Hosaías, e a metade dos príncipes de Judá, 33e procissão havia um coro, que cantava hinos
Azarias, Esdras, Mesulão, 34Judá, Benjamim, de louvor. Então seguiam os oficiais secu
Semaías, e Jeremias; 35e dos filhos dos sacerdotes, lares com o seu líder, e, depois deles, o
levando trombetas, Zacarias, filho de Jonatã, filho
de Semaías, filho de Matanias, filho de Micaías,
sacerdotes e os levitas.
filho de Zacur, filho de Asafe, 36e seus irmãos, Acompanhando o coro, na primeira
Semaías, Azarei, Milalai, Gilalai, Maai, Netanel, companhia, estava um importante líder,
Judá e Hanâni, com os instrumentos musicais de chamado Hosaías, que se fazia acompanhar
Davi, homem de Deus; e Esdras, o escriba, ia pela metade dos príncipes de Judá.
adiante deles. 37À entrada da porta da fonte
subiram diretamente as escadas da cidade de Davi, Seguiam-se então sete sacerdotes (v. 33,34),
onde começa a subida do muro, acima da casa de com suas trombetas (cf. Ed 3.10), e um
Davi, até a porta das águas a leste. 38A outra levita, chamado Zacarias, juntamente com
companhia dos que davam graças foi para a oito de seus irmãos, que portavam seus
esquerda, seguindo-os eu com a metade do povo,
sobre o muro, passando pela torre dos fornos instrumentos musicais. Filhos dos sacer
até a muralha larga, 39e seguindo por cima da dotes (v. 35) é uma expressão idiomática,
porta de Efraim, e da porta velha, e da porta que se refere ao grupo de sacerdotes recém-
dos peixes, e pela torre de Hananel, e a torre -enumerados (cf. 12.28), e não aos nomes
dos Cem até a porta das ovelhas; e pararam à porta
da guarda. 46Assim as duas companhias dos que levíticos que se seguem.
davam graças pararam na casa de Deus, como Na segunda companhia, Neemias
também eu e a metade dos magistrados que estavam assumiu o papel comparável ao de Hosaías
comigo, 41e os sacerdotes Eliaquim, Maaséias, (v. 32), como líder da metade dos magis
Miniamim, Micaías, Elioenai, Zacarias e Hana-
nias, com trombetas, 42como também Maaséias,
trados (v. 40). Novamente, havia os sete
Semaías, Eleazar, Uzi, Jeoanã, Malquias, Elão, sacerdotes com trombetas (v. 41) e um levita,
Ézer; e os cantores cantavam tendo Jezraías por chamado Jezraías, com seus oito colegas
dirigente. “^Naquele dia ofereceram grandes sacri (v. 42).
fícios, e se alegraram, pois Deus lhes dera motivo As palavras Esdras, o escriba, ia adiante
de grande alegria; também as mulheres e as crianças
se alegraram, de modo que o júbilo de Jerusalém deles devem ser entendidas como uma inter-
se fez ouvir de longe.
Os serviços de dedicação começaram O segm ento recentonente escavado do muro de N eem ias tem cerca
de nove pés de largura (Kenyon, op. cit., p. 111). Assim, havia espaço
com uma procissão ritual ao longo do topo suficiente p ara que u m a procissão marchasse em seu to p a
525
polação posterior na narrativa do cronista. das memórias de Neemias.) Em dois pará
A presença do nome de Esdras perturba grafos, o escritor esboçou, primeiro, o
a simetria das duas companhias; porém o procedimento normal na liturgia do Templo
que importa é que há evidência convincente (12.44-47), e, segundo, a posição exclusiva
de que Neemias e Esdras não foram contem normal para os gentios (13.Í-3). No mesmo
porâneos (ver a Introdução). dia (também 13.1) não se refere a nenhuma
Quando as duas companhias se encon outra ocasião, mas ao período geral de Zoro
traram no Templo, ofereceram grandes babel e Neemias.
sacrifícios, e se alegraram. Com a ajuda O escritor assegura, em primeiro lugar,
de Deus haviam completado a sua tarefa. que o povo era, geralmente, fiel às suas
Foi uma experiência jubilosa responder à responsabilidades financeiras para com o
sua benevolência e soberania com a dedi clero (contrastar 13.10-13; Ml 3.6-12). O
cação do muro ao seu serviço. povo estava alegre, porque os sacerdotes
O júbilo de Jerusalém se fez ouvir de e os levitas ministravam ali e entregavam
longe. Os sons de louvor e ações de graças as porções designadas para a manutenção
soaram por toda a terra. Mas, além de nas deles. Os tesoureiros do Templo reuniam,
cercanias da cidade, o júbilo foi ouvido em nas câmaras dos tesouros, as ofertas, primí
Samária, Amom e Filístia, declarando as cias e dízimos que o povo de cada cidade
poderosas obras que Deus estava realizando oferecia de seus campos ao redor.
pelo seu povo (cf. Jr 31.1-14). O autor afirma mais que o clero, normal
mente, se conduzia de modo impecável,
XIII. A Norma Litúrgica (12.44—13.3) conforme a ordem de Davi (cf. lCr 23-26)
1. Os Serviços do Templo (12.44-47) e de seu filho Salomão (cf. 2Cr 8.14). O verso
46 explica que a organização da música do
44No mesmo dia foram nomeados homens
sobre as câmaras dos tesouros para as ofertas Templo remontava ao tempo de Davi e de
alçadas, as primícias e os dízimos, para nelas reco Asafe (cf. lCr 6.31-48). Os levitas execu
lherem, dos campos das cidades, os quinhões taram os seus deveres, incluindo o de
designados pela lei para os sacerdotes e para os purificação (v. 45; cf. 12.30), e pagaram os
levitas; pois Judá se alegrava por estarem os sacer
dotes e os levitas no seu posto, 4Sobservando os
seus dízimos aos sacerdotes, filhos de Arão
preceitos do seu Deus, e os da purificação, como (v. 47; cf. 10.38). Os cantores e porteiros
também o fizeram os cantores e porteiros, conforme eram fiéis às suas respectivas responsabili
a ordem de Davi e de seu filho Salomão. 46Pois dades. Assim, o leitor é assegurado de que
desde a antigüidade, já nos dias de Davi e de Asafe, o episódio mencionado em 13.10 foi
havia um chefe dos cantores, e havia cânticos de
louvor e de ação de graças a Deus. 47Pelo que todo incomum e extraordinário (observe-se,
o Israel, nos dias de Zorobabel e nos dias de contudo, a negligência clerical em Ml
Neemias, dava aos cantores e aos porteiro as suas 1.6—2.9).
porções diárias; e separava as porções destinadas
aos levitas, e os levitas separavam as porções desti 2. A Exclusão de Estrangeiros (13.1-3)
nadas aos filhos de A rãa 'Naquele dia leu-se no livro de Moisés, na
O compilador da narrativa de Neemias presença do povo, e achou-se escrito nele que os
estava preocupado, porque as memórias de amonitas e os moabitas não entrassem jamais na
assembléia de Deus; 2porquanto não tinham saído
Neemias tinham tanto a dizer sobre abusos ao encontro dos filhos de Israel com pão e água,
e infrações litúrgicos (especialmente mas contra eles assalariaram Balaão para os amal
13.1-31). A fim de que o leitor não tenha diçoar; contudo o nosso Deus converteu a maldição
a impressão de que tais desvios fossem em bênção. 3Ouvindo eles esta lei, apartaram de
Israel toda a multidão mista.
comuns durante o período pós-exílico, ele
compôs esta passagem para mostrar que O escritor continua a sua defesa do culto,
o culto geralmente funcionava suave e buscando mostrar que a norma durante o
eficazmente. (A referência a Neemias, v. 47, período pós-exílico era a separação de toda
demonstra que a passagem é independente a multidão mista. Este princípio pode, verda
526
deiramente, ter sido bem estabelecido ao dias, contudo, ele solicitou que Artaxerxes
tempo do cronista, mas o problema de lhe permitisse retornar a Judá. Nem a data
mistura com os gentios ocorria repetida nem a duração da segunda missão podem
mente no período pós-exílico anterior. O ser estabelecidas. Presumivelmente, ele
abuso é claramente atestado em Malaquias ficou na Pérsia o tempo suficiente para que
2.10-12, ao longo de ambas as adminis a situação em Judá se deteriorasse tão seria
trações de Neemias (6.17-19; 13.4-9,23-30) mente, e podem ter sido as notícias de tais
e durante o ministério de Esdras (Ne 9.1,2; acontecimentos que induziram Neemias a
Ed 9—10). solicitar um segundo mandato como gover
O escritor cita Deuteronômio 23.3-5 nador. Esta parte do capítulo 13 é entendida
como a base legal para excluir os gentios como um relato de reformas levadas a efeito
da assembléia de Deus. Esta passagem por Neemias quando chegou a Judá na
refere-se somente aos amonitas e moabitas, segunda vez.
que deveriam ser excluídos devido à sua Enquanto Neemias estava na Pérsia, um
antipatia para com Israel, antes da sacerdote, chamado Eliasibe (provavel
conquista de Canaã (Nm 22-24). O cronista, mente, o sumo sacerdote; cf. o v. 28 e 3.1),
contudo, considera que esta passagem designou para Tobias (...) uma câmara
fornece fundamento suficiente para a grande nos recintos do Templo. Tobias tinha
exclusão de todos os estrangeiros da comu parentesco próximo de Eliasibe, bem como
nidade de adoradores judeus. Ao assegurar com outros líderes judeus (6.17-19), mas
que a separação foi efetuada, ele prepara estava entre os arquiinimigos de Neemias.
o leitor para ver os episódios do capítulo Tobias, embora, sem dúvida, ele mesmo um
13 (v. 4-9,23-30) como desvios incomuns judeu, era governador de Amom; e
do padrão de comportamento ideal. Neemias, provavelmente, utilizou isso como
pretexto (cf. Dt 23.3) para expulsá-lo da
XIV. As Reformas de Neemias (13.4-31) câmara e pôr para fora os seus pertences.
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para o seu campo. O povo de Judá, care dizendo-lhes: Por que passais a noite defronte do
cendo de liderança dedicada, havia deixado muro? Se outra vez o fizerdes, hei de lançar mão
em vós. Daquele tempo em diante não vieram no
de pagar os dízimos (cf. Ml 3.8-10). Os sábado. 22Também ordenei aos levitas que se puri
levitas, assim privados de seu sustento, ficassem, e viessem guardar as portas, para
deixaram o seu posto no Templo e foram santificar o sábada Nisso também, Deus meu,
para casa, onde podiam encontrar um meio lembra-te de mim, e perdoa-me segundo a
de vida. abundância da tua misericórdia.
Neemias repreendeu os magistrados por
Conquanto a literatura israelita dos
terem permitido o desenvolvimento de tal
primeiros tempos muitas vezes ressaltasse
situação. Trouxe os levitas de volta às suas motivos humanitários para a observância
posições no Templo, e o povo reagiu por do sábado (cf. Ex 23.12; Dt 5.12-15), lite
recomeçar a pagar os dízimos. Uma vez que
ratura posterior destacava a importância
o clero como um grupo nem sempre era
da observância do sábado como sinal espe
fiel e digno de confiança (cf. Ml 1.6—2.9),
cial do povo do pacto (cf. Ex 31.12,16,17;
ele estabeleceu um corpo de tesoureiros Ez 20.12). Desconsiderar ou violar o sábado
para fazerem apropriada administração dos era romper com o pacto e atrair a ira de
ingressos do Templo. Deus sobre a comunidade (cf. Jr 17.19-27;
A oração de Neemias no versículo 14
Ez 20.13; 23.38). A guarda do sábado distin
reflete, novamente, sua ansiedade quanto
guia o judeu do não-judeu, e isto era
ao seu próprio futuro. Não tendo descen particularmente crucial após o colapso do
dência para perpetuar-lhe o nome e tendo Estado, quando os perigos de assimilação
uma compreensão imperfeita da graça de eram tão grandes.
Deus, Neemias deseja que suas boas obras
Neemias estava, portanto, especialmente
se lhe tornem um memorial. Ele roga a
perturbado quando verificou que os judeus
Deus para não eliminá-lo do livro divino
estavam ignorando o dia santo. Em sua
de registros (cf. Ex 32.32; Dn 12.1).
maneira característica, ele repreendeu os
nobres de Judá, não só porque eles próprios
3. A Observância do Sábado É Regulamen eram culpados, mas porque estavam dando
tada (13.15-22)
um péssimo exemplo ao povo. Depois, em
lsNaqueles dias vi em Judá homens que sua maneira direta, tomou medidas práticas
pisavam lagares no sábado, e traziam molhos, que para impor a observância do dia. Ordenou
carregavam sobre jumentos; como também vinho, que os portões da cidade fossem fechados
uvas e figos, e toda sorte de cargas, que eles traziam
a Jerusalém no dia de sábado; e protestei contra
quando o sábado começasse, ao pôr-do-sol,
eles quanto ao dia em que estavam vendendo manti para não serem reabertos até o pôr-do-sol
mentos. 16E em Jerusalém habitavam homens de do dia seguinte. Os mercadores, que expres
Tiro, os quais traziam peixes e toda sorte de merca saram sua impaciência (cf. Am 8.5),
dorias, que vendiam no sábado aos filhos de Judá, acampando-se fora do muro da cidade,
e em Jerusalém. 17Então contendi com os nobres
de Judá, e lhes disse: Que mal é este que fazeis, foram ameaçados de ação física, se persis
profanando o dia de sábado? 18Porventura não tissem nessa ofensa. Neemias empregou
fizeram vossos pais assim, e não trouxe o nosso membros de seu próprio pessoal para guar
Deus todo este mal sobre nós e sobre esta cidade? darem os portões, a princípio, mas depois
Contudo vós ainda aumentais a ira sobre Israel, substituiu-os por levitas, uma vez que a
profanando o sábado. 19E sucedeu que, ao começar
a fazer-se escuro nas portas de Jerusalém, antes imposição do sábado era um empreendi
do sábado, eu ordenei que elas fossem fechadas, mento de caráter cultual.
e mandei que não as abrissem até passar o sábado; Na tentativa de empregar sua autoridade
e pus às portas alguns de meus moços, para que secular, para requerer submissão às regula
nenhuma carga entrasse no dia de sábado. 20Então
os negociantes e os vendedores de toda a sorte de mentações sabáticas, Neemias defrontou-se
mercadorias passaram a noite fora de Jerusalém, com um problema especial. Alguns dos
uma ou duas vezes. “ Protestei, pois, contra eles, transgressores eram homens de Tiro, os
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quais traziam peixes e toda sorte de merca durante sua primeira administração, tinha,
dorias. Esses estrangeiros eram forasteiros presumivelmente, tolerado casamentos que
na comunidade judaica e, contudo, foi considerava perigosos para a comunidade
requerido deles observarem um regula (cf. 6.17-19). Durante a era pós-exílica,
mento cultual judaico. Aqueles que contudo, houve crescente convicção de que
estabelecem as leis hoje defrontam dile tais casamentos ameaçavam a pureza física
ma semelhante com respeito aos judeus, e espiritual e a segurança da comunidade
adventistas do sétimo dia e descrentes que (cf. Ml 2.10-12).
não têm a preferência de observar o Neemias estava particularmente preo
domingo como dia santificado. cupado porque os filhos dos casamentos
Esta passagem, à semelhança de muitas mistos não podiam falar a língua santa em
outras, conclui com uma breve oração. Esta que a Tora foi escrita. Ele tomou medidas
oração, contudo, é diferente da maioria das diretas e violentas contra os ofensores e
demais. Neemias não somente inclui um forçou-os a fazerem juramento de que tais
pedido para que Deus se lembrasse de suas casamentos não mais seriam realizados.
boas ações, mas reconhece que sua salvação Contudo, não tentou dissolver os casa
dependia da abundância da misericórdia de mentos já existentes, como Esdras haveria
Deus, e não da multiplicidade de suas boas de fazer na geração seguinte (cf. Ed 9,10).
obras. A doutrina da graça, no Antigo Testa A pregação de Neemias, nessa oca
mento, é, muitas vezes, tragicamente sião, incluía um lembrete de que mesmo
passada por alto. o incomparável Salomão havia sido indu
zido ao pecado por esposas estrangeiras (cf.
4. Proibição dos Casamentos Mistos lRs 11.1-11). Com tal exemplo diante deles,
(13.23-29) era impensável que a comunidade conti
nuasse a ofender a Deus em arranjar tais
23Vi também naqueles dias judeus que tinham
casado com mulheres asdoditas, amonitas, e laços matrimoniais.
moabitas; 24e seus filhos falavam meio asdodita, e O escritor relata um exemplo notório de
não podiam falar judaico, senão segundo a língua um casamento entre um neto do sumo
de seu povo. “ Contendi com eles, e os amaldiçoei; sacerdote e uma filha de Sambalate. Devido
espanquei alguns deles e, arrancando-lhes os à antipatia de Neemias para com Samba
cabelos, os Bz jurar por Deus, e lhes disse: Não
dareis vossas filhas a seus filhos, e não tomareis late, esse casamento era particularmente
suas filhas para vossos filhos, nem para vós mesmos. ofensivo para ele, e o ofensor foi expulso
“ Não pecou nisto Salomão, rei de Israel? Entre da comunidade.50
muitas nações não havia rei semelhante a ele, e ele Esta passagem conclui com uma oração
era amado de seu Deus, e Deus o constituiu rei
sobre todo o Israel. Contudo, mesmo a ele as
em que Neemias pede o julgamento de
mulheres estrangeiras o fizeram pecar. 27E dar-vos- Deus sobre aqueles que haviam contami
-íamos nós ouvidos, para fazermos todo este grande nado suas vocações clericais, participando
mal, esta infidelidade contra o nosso Deus, casando de casamentos com não-judeus.
com mulheres estrangeiras? 28Tkmbém um dos
filhos de Joiada, filho do sumo sacerdote Eliasibe, 5. Conclusão (13.30,31)
era genro de Sambalate, o horonita, pelo que o
afugentei de mim. 2,Lembra-te deles, Deus meu, 30Âssim os purifiquei de tudo que era estran
pois contaminaram o sacerdócio, como também o geiro, e determinei os cargos para os sacerdotes
pacto do sacerdócio e dos levitas. e para os levitas, cada um na sua função; 3>como
também o que diz respeito à oferta da lenha em
Os casamentos entre judeus e não-judeus tempos determinados, e bem assim às primícias.
tinham sido comuns ao longo da maior Lembra-te de mim, Deus meu, para o meu bem.
parte do período pré-exílico, e, aparente
Josefo Antjq.. XI, 12) relata o mesmo episódio, mas confunde aciono-
mente, nenhuma tentativa havia sido feita logia, p o r deixar de reco n h ecer q u e havia vários go v ern an tes
para proibi-los até os escritos deuteronô- sam aritanos cham ados Sambalate. Ver Fiank M . Cross, “The Disco
very o f the Sam aria Papyri”, T he Biblical Archaeologist, dez. de 1963,
micos (Dt 7.3; cf. Ex 34.16). Neemias, p. 121.
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Nos dois versos finais do livro, Neemias prometeu que Deus daria um “memorial
sumaria a obra que empreendera. O propó e um nome melhor do que o de filhos e
sito do sumário é indicado pela última filhas” aos eunucos que fossem fiéis à sua
sentença: Lembra-te de mim, Deus meu, vontade.
para o meu bem. Em sua oração final,
Neemias apela a Deus para que lhe dê Conquanto a oferta da lenha e primícias
crédito apropriado pelo que realizara. Como não tivessem sido mencionadas antes no
eunuco, sem esperança de descendentes, capítulo 13, o relato da assembléia que se
para levarem o nome da família, ele expressa seguiu a essas reformas mostra que
uma ansiedade quase que desesperada de provisões para tais coisas haviam sido feitas
que poderia perpetuar sua memória pela durante a segunda gestão de Neemias como
obra que realizara. O autor de Isaías 56.4,5 o governador de Judá (10.34-37).
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