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A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER E SEUS ATORES SOCIAIS: ESTUDO DE

CASO SOBRE UM ASSASSINATO COM A QUALIFICADORA DE FEMINICÍDIO


EM MARABÁ, PARÁ.

Caline Saraiva de Sá1

RESUMO
O feminicídio é a morte de mulheres por questão de gênero, nos mais diversos contextos
sociais e políticos, além de ser a culminação de uma violência fatal: produto final de uma
série de condutas misóginas, como maus-tratos físicos, psicológicos, sexuais e familiares.
Está presente em todas as sociedades e é oriunda de uma cultura de dominação e desequilíbrio
de poder existente entre os gêneros masculino e o feminino, resultando na inferiorização da
condição feminina e, consequentemente em violência extremada com a qual se ceifa a vida de
muitas mulheres. O presente artigo irá apresentar a perspectiva histórica de criação de
algumas leis protetoras dos direitos das mulheres, além de trazer dados epidemiológicos que
demonstram o contexto atual de violência contra mulher no Brasil e no Pará, e descrever
alguns dos tipos de feminicídios elencados pela doutrina e a aplicação da Lei do Feminicídio
no caso ocorrido em Marabá, no assassinato de Eliane de Souza Jorge, em setembro de 2017.

PALAVRAS-CHAVE: Feminicídio. Violência contra mulher. Direito Penal.

INTRODUÇÃO
A submissão do sexo feminino remonta às escrituras bíblicas, a gênese da mulher feita
à imagem e semelhança do homem e sua parte, retirada da costela de Adão, é uma das
diversas histórias que compõe o universo de dominação masculina e patriarcal, em todas as
esferas da vida.
A subordinação das mulheres em relação aos homens tem sua origem no patriarcado,
que pode ser definido como o conjunto de relações sociais cuja base são as estruturas
hierárquicas entre homens e mulheres (SAFIOTI, 2004). O patriarcado traz consigo uma
ordem social pautada numa perspectiva comportamental, com base nisso, homens e mulheres
devem se adequar as características de seu sexo biológico.
O feminicídio é a morte de mulheres por questão de gênero, nos mais diversos
contextos sociais e políticos, além de ser a culminação de uma violência fatal: produto final
de uma série de condutas misóginas, como maus-tratos físicos, psicológicos, sexuais e
familiares. Está presente em todas as sociedades e é oriunda de uma cultura de dominação e
desequilíbrio de poder existente entre os gêneros masculino e o feminino, resultando na

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Graduanda do curso de Direito da Universidade do Sul e Sudeste do Pará – UNIFESSPA.
inferiorização da condição feminina e, consequentemente em violência extremada com a qual
se ceifa a vida de muitas mulheres.
Assim, a violência contra as mulheres é uma espécie de violência de gênero,
reconhecida no art. 1º da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará-1994) como “[...] qualquer ato ou
conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico
à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada”.
Neste artigo iremos demonstrar a perspectiva histórica de criação de algumas leis
protetoras dos direitos das mulheres, trazendo dados epidemiológicos que demonstram o
contexto atual de violência contra mulher no Brasil e no Pará, além de descrever alguns dos
tipos de feminicídios elencados pela doutrina e a aplicação da Lei do Feminicídio no caso
ocorrido em Marabá, no assassinato de Eliane de Souza Jorge, em setembro de 2017.

1. EPIDEMIOLOGIA
A violência contra a mulher vem desde os primórdios, mas a partir da década de 1980,
esse fenômeno alcançou visibilidade no meio social, através da organização política dos
grupos feministas que reivindicavam o reconhecimento dos direitos das mulheres e políticas
públicas de justiça de gênero (ACOSTA et al., 2015). No entanto, mesmo com os avanços
alcançados em termos de políticas públicas de proteção e da promoção dos direitos humanos
femininos, atualmente, as mulheres continuam sendo alvo de diversos tipos de violência,
inclusive de feminicídio (OLIVEIRA, et. al., 2015).
Dados da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (2015),
através do Balanço 2015 da Central de Atendimento à Mulher (Disque 180), referente ao
primeiro semestre do corrente ano, revelaram que, de 364.627 atendimentos realizados,
32.248 dos casos reportaram-se a relatos de violência contra a mulher. Estes, por sua vez,
foram analisados e qualificados como violência física (51,16%); violência psicológica
(30,92%); violência moral (7,13%); violência patrimonial (1,95%); violência sexual (4,06%);
cárcere privado (4,23%); e tráfico de pessoas (0,55%). Porém, com relação à percepção das
mulheres sobre os riscos das violências sofridas por elas culminarem em feminicídio, apenas
31% dos casos notificados declararam acreditar nessa possibilidade (BRASIL, 2015).
A mais recente publicação do Mapa da Violência (2015), que se encontra voltado
exclusivamente para a violência homicida contra as mulheres, ressalta que o Brasil, entre 83
países, assumiu a quinta colocação em morte de mulheres, com 4,8 mortes por 100 mil
mulheres. A região Norte tem a segunda maior taxa de homicídios contra a mulher, o Pará
ocupa a 10ª colocação em morte de mulheres com 5,8 mortes por 100 mil habitantes. Dentre
os cem municípios mais violentos do país, nove municípios estão no Pará. Entretanto, Marabá
não consta entre eles no referido documento (WAISELFISZ, 2015).
Não obstante, os dados concernentes à violência contra as mulheres no Brasil não são
precisos, pois a articulação entre o setor de segurança pública e os serviços de saúde para
assistência às mulheres em situação de violência são desenvolvidos, quando muito, de forma
precária e conflituosa. Estima-se que os registros das delegacias correspondam a cerca de 10 a
20% dos casos que realmente são notificados, e isto ocorre em virtude de fatores como o
medo, a falta de credibilidade no sistema legal e o silêncio que envolve as vítimas,
dificultando a veracidade da notificação dos casos (VIANA et al., 2015).

2. LEGISLAÇÃO E TIPOS DE FEMINICÍDIO


Antes do Brasil se tornar uma República, o assassinato de mulheres com a justificativa
de adultério, o homicídio passional, era considerado legítimo. O Código Criminal de 1830
atenuava este tipo de crime, naquela época a defesa era voltada no sentindo de que o homicida
passional cometia tal conduta por legitima defesa de sua honra. A submissão feminina ao
homem foi um dos motivos que fez o homicídio passional, ser menos reprovado pela
sociedade, do que a própria traição cometida pela mulher.
A partir da década de 70, contudo, especialmente após a aprovação da Convenção
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979), a
Conferência Mundial sobre Direitos Humanos (1993) e a Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará,
ocorrida em 1994), as questões de gênero alcançaram um patamar prioritário no âmbito da
proteção internacional dos direitos humanos (LIMA, 2015).
Em 1985 foi criada no Brasil, a primeira Delegacia Especializada de Atendimento a
Mulher (DEAM), um grande avanço nos objetivos pretendidos pelo movimento feminista. A
Constituição Federal de 1988 igualou os direitos entre homens e mulheres, bem como,
determinou a extinção do crime de adultério (Lei 11.105/15), o crime passional passou a ser
julgado com penas mais severas.
Em 2003 foi efetivada a criação da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres, que
tinha como escopo a erradicação da violência contra as mulheres, mas foi somente em 2006
que se criminalizou de fato a agressão contra a mulher com a criação da Lei nº 11.340,
chamada de Lei Maria da Penha. Esta Lei é o resultado da atuação dos movimentos feministas
e da tramitação do caso Maria da Penha versus Brasil na Comissão Interamericana de Direitos
Humanos no ano de 2001, em homenagem a uma mulher brasileira, que embora tendo feito
várias denúncias contra seu marido, ficou paraplégica, em razão de um tiro nas costas, que
sofreu enquanto dormia. O autor deste disparo foi seu próprio marido, na época.
A Lei Maria da Penha possui uma redação com dispositivos que coíbem e previnem as
agressões domésticas contra a mulher (art1º, Lei 11.340/06). O artigo 5º (quinto) desta Lei
traz e tipifica as formas de violência que uma mulher pode sofrer e também define a
assistência para as vitimas que se enquadram neste tipo de crime.
Entretanto, nenhuma medida política, inclusive a Lei Maria da Penha, foi capaz de
diminuir consideravelmente o número de mortes por esse tipo de agressão, tampouco
proporcionar às mulheres a sensação de segurança e confiabilidade no sistema criminal como
um todo.
Com o intuito de adequar seus sistemas jurídicos aos novos padrões internacionais de
direitos humanos, a criação de leis, em âmbito nacional, visando proteger mulheres em
condição de violência, passa então a ocupar a agenda legislativa de inúmeros países. A
recente Lei n. 13.104/15, conhecida como Lei do Feminicídio, não só altera o artigo 121 do
Código Penal para acrescentar a qualificadora do feminicídio, como também modifica o artigo
1º da Lei n. 8.072/90, incluindo este crime no rol de crimes hediondos.
A Lei nº. 13.104/2015 tipifica o feminicídio como homicídio qualificado, considerado
crime hediondo. Isto quer dizer que os casos de violência doméstica e familiar ou menosprezo
e discriminação contra a condição feminina passam a ser vistos como qualificadores
(condição que agrava a conduta delituosa e, consequentemente, a pena imputada a quem o
pratica) do crime, se, por ventura, essa violência redundar em homicídio. Os homicídios
qualificados têm pena de 12 a 30 anos de reclusão, conforme o art. 121, § 2º do Código Penal
Brasileiro, enquanto os homicídios simples preveem reclusão de 6 a 20 anos de acordo com a
mesma norma. Os crimes hediondos são considerados de extrema gravidade e, por isso,
recebem um tratamento mais severo por parte do legislador.
Ainda assim, nem todo homicídio cometido contra mulheres se constitui em
feminicídio, precisa se enquadrar nas características exigidas pela lei: a violência doméstica e
familiar (art. 121, § 2º-A, I) e o menosprezo ou discriminação da condição de mulher (art.
121, § 2º-A, II); se o homicídio for executado na presença de descendente ou de ascendente da
vítima (art. 121, § 7º, III do Código Penal), ou se for concretizado durante a gestação ou até
três meses após o parto (art. 121, § 7º, I), pois o legislador assimilou que a gestação é um
período de intensa fragilidade feminina, e que além da obrigação do Estado de preservar a
vida e a saúde da gestante, possui igual dever de preservar a vida e a saúde do ser que está em
desenvolvimento – o nascituro. Ainda em face das condições de agravamento da pena para o
feminicídio, a lei impõe que este acréscimo sobrevenha em casos nos quais o homicídio se dê
em desfavor de crianças menores de quatorze anos, em idosas com mais de sessenta anos e em
portadoras de deficiência (art. 121, § 7º, I).
O feminicídio pode ser dividido em duas categorias: ativo ou passivo. No feminicídio
ativo ou direto, a intenção do autor é provocar a morte da mulher, geralmente são resultantes
da violência de gênero praticada pelo cônjuge, ou em relações de intimidade e convivência;
morte de mulheres e meninas em nome da honra; relacionadas a conflitos armados, com
estratégia de guerra, opressão ou conflito étnico; relacionada à identidade de gênero e opção
sexual; infanticídio feminino, aborto, com origem étnica e de identidade indígena. O
feminicídio passivo ou indireto é produto de violência ou negligência, que não tinha como
objetivo a morte da mulher como os decorrentes de aborto clandestino ou inseguro;
mortalidade materna; mortes que resultam de práticas danosas; vinculadas a tráfico de seres
humanos, drogas, armas e crime organizado; negligência por privação de alimento ou maus
tratos; e os atos e omissões deliberados de funcionários públicos ou agentes do Estado
(HEINE, 2016).
O Protocolo Latino-americano de Investigação de Morte Violenta de Mulheres em
Razão de Gênero traz a descrição das diferentes modalidades de feminicídio, a saber:
a) Feminicídio íntimo: morte de uma mulher por um homem com quem a vítima tem ou teve
relação ou vínculo íntimo (marido, ex-namorado, etc.), incluindo o caso em que o assassino
seja um amigo com quem a vítima não quis ter relação íntima.
b) Feminicídio familiar: quando o assassino tem relação de parentesco com a mulher.
c) Feminicídio infantil: quando a vítima é menor de 14 anos e o agressor é um homem que
esta em situação de responsabilidade, confiança ou poder, por ela ser menor de idade.
d) Feminicídio não íntimo: quando o assassino é desconhecido para a vítima, sem qualquer
relação ou vínculo.
e) Feminicídio por conexão: quando uma mulher é assassinada no local onde um homem tenta
matar outra mulher, pode ser conhecida ou não da mulher que o agressor queria matar.
f) Feminicídio sexual sistêmico: quando a mulher é sequestrada, tourturada e/ou violada, pode
ser de dois modos, é desorganizado quando acompanhado por sequestro, tortura e/ou violação,
num determinado período de tempo; supondo que os s ujeitos ativos atuam como uma rede
organizada, por largo e indeterminado periodo de tempo, fala-se que é organizado.
g) Feminicídio por prostituição: quando a mulher exerce a prostituição ou outra atividade
semelhante, cometido por um ou vários homens, incluindo os motivados por ódio e misoginia,
geralmente esta envolvida com a estigmatização social e culpabilização da vítima.
h) Feminicídio por tratamento: captação, transporte, acolhimento ou recepção de pessoas com
uso da força, fraude, coação, sequestro, engano, abuso de poder, etc, inclui a prostituição
alheia, trabalho forçado, escravidão ou extração de órgãos.
i) Feminicídio por tráfico: ocorrida em situação de tráfico de imigrantes.
j) Feminicídio por mutilação genital feminina: morte de menina ou mulher em consequencia
da mutilação genital.
k) Feminicídio transfóbico: morte de mulher transgênero ou transsexual por sua condição de
identidade de genero ou ódio.
l) Feminicídio lesofóbico: morte de mulher lésbica devido sua orientação sexual.
m) Feminicídio racista: morte de mulher por ódio a sua orige, etnica/racial ou seu fenótipo.

3. APLICAÇÃO AO CASO CONCRETO


Descrição do caso retirado de site jornalístico, até o momento não consta na base de
dados do Tribunal de Justiça do Estado do Pará o processo sobre este caso:
“Márcio Basílio Furtado foi preso no dia 21 de setembro e autuado em flagrante pela
ocultação do cadáver da ex-companheira Eliane de Souza Jorge, em Marabá. Além disso, na
época, foi aberto o inquérito na Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam)
para investigar o homicídio da mulher, com quem ele foi casado por 20 anos e cujo crime
confessou ter cometido. A prisão aconteceu após ele apontar onde estava o cadáver de Eliane,
às margens da Rodovia BR-230, à altura do km 15, sentido Itupiranga. Ela estava
desaparecida desde a tarde do dia anterior e ele havia procurado por ela antes do
desaparecimento. Márcio chegou a sofrer um acidente de trânsito após ocultar o corpo, sendo
socorrido e internado no Hospital Municipal de Marabá, onde foi localizado pela Polícia
Civil. Ele confessou o crime, fornecendo detalhes cruéis sobre como assassinou a mulher,
com golpes de faca” (fonte: G1 PARÁ, 2017).
De acordo com os dados fornecidos pela matéria jornalística é possível identificar o
assassinato da mulher como crime de feminicídio. O artigo 121 fala:
Art. 121. - Matar alguém:
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos
[...]
Feminicídio
VI – contra a mulher por razões da condição de sexo feminino;
Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.
[...]
§ 2º - A. Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime
envolve:
I – violência doméstica e familiar. (Código Penal Brasileiro)

O ato praticado contra a vítima se enquadra no art. 121, pois ocasionou a morte de
alguém. Além disso, a vítima é uma mulher e o agressor seu ex-marido, o que acrescenta a
ocorrência de violência doméstica e familiar nos termos do art. 5º, inciso III, da Lei
11.340/2006, in verbis:
Art. 5º Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a
mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
[...]
III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha
convivido com a ofendida independente de coabitação.

Importante salientar que do total de homicídios contra as mulheres, na América Latina


e no Brasil, grande parte acontece no ambiente doméstico e a vítima geralmente conhece o
agressor, comprovando o fato de que o homicídio feminino é fruto da violência privada que
permeia as relações intersubjetivas entre homens e mulheres, diferente do homicídio dos
homens, que remete ao narcotráfico, às disputas territoriais, à violência urbana de todas as
ordens, relacionadas ao espaço público (OLIVEIRA et al., 2015).
Quanto à tipificação do crime em questão, o homicídio praticado por Marcio, pode ser
classificado como feminicídio ativo e de foro íntimo. De acordo com Romero (2014), dentre
os tipos de feminicídio, o íntimo é o que mais acomete as mulheres, pois se encontra
estreitamente vinculado à violência conjugal, sendo perpetrado por pessoas com as quais as
mulheres mantinham ou mantiveram relações afetivas. Essas observações remetem àquelas
divulgadas no Mapa da Violência 2015, em que as estimativas de feminicídio no País
indicavam que 50,3% dos homicídios foram perpetrados por familiares das mulheres em
situação de violência e 33,2% das mulheres foram mortas pelos seus parceiros ou ex-
parceiros (WAISELFISZ, 2015).
A violência doméstica e conjugal é um elemento caracterizador do feminicídio. O
ambiente doméstico desponta como o segundo lugar (27,1%) onde mais ocorrem mortes
femininas (WAISELFISZ, 2015), tal fato corrobora com os fatores históricos envolvidos na
violência contra a mulher, onde o espaço privado da relação contribuiu para a sua
naturalização e invisibilização.
Uma observação pertinente a ser feita é o uso de arma branca para concretização do
crime em questão. A faca não é um objeto que geralmente se encontra em poder do agressor
no momento de uma discussão ou alteração física e, por conseguinte, utilizada para o crime
contra a mulher. Pelo contrário, a presença da faca aparece como elemento do planejamento
dos crimes (GOMES, 2015).
Esse planejamento seria a conclusão de um processo de dominação subjacente e
histórico entre vítima e agressor, muitas vezes naturalizado e tolerado pela sociedade. Essa
tolerância é observada para além da vida privada, através da tardia intersecção do Estado,
como exemplo, no reconhecimento do feminicídio como crime e sua consequente
judicialização (OLIVEIRA, 2015).

CONCLUSÃO
O feminicídio carrega em si a compreensão de que a morte de mulheres em dadas
circunstâncias é um fenômeno que está intrinsicamente relacionado aos papéis socioculturais
a elas designados ao longo do tempo, e que pode ocorrer de diversas formas, incluindo
assassinatos perpetrados por parceiros íntimos, com ou sem violência sexual, crimes em série,
violência sexual seguida de morte, ou mesmo o extermínio.
Nesses termos o crime cometido contra Eliane é a consecução de atos violentos e
desrespeito perpetrado contra as mulheres historicamente. O homicídio contra a mulher
geralmente é o ultimo ato de covardia que os homicidas cometem contra suas vítimas, ou seja,
o feminicídio é uma resposta da ineficiência das políticas públicas responsáveis por proteger a
vida, a integridade corporal, dentre outros bens jurídicos da mulher.
Apesar das constantes modificações nas Leis estatais, a legislação e as políticas
públicas de promoção e proteção a esses direitos não garantem a diminuição da violência
contra as mulheres, tampouco o empoderamento delas, de modo a refutar este tipo de
situação.
A criminalização do feminicídio é importante como uma simbologia social e jurídica,
em face da luta por justiça de gênero, como um dos meios para a efetivação da igualdade
entre as pessoas e da dignidade humana. Mudar essa realidade requer que o Poder Público
incorpore a luta pela erradicação da violência e do feminicídio como uma política de Estado,
pois o extermínio de mulheres, em virtude da violência de gênero e da discriminação, ultraja a
consolidação dos direitos humanos.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 13.104, de 9 de março de 2015. Altera o art. 121 do Decreto-Lei no 2.848, de
7 de dezembro de 1940 - Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância
qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, para
incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos. Diário Oficial da União, Brasília, DF,
10.3.2015.

_______. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência
doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal,
da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e
da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher;
dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera
o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras
providências Diário Oficial da União, Brasília, DF, 8.8.2006.

_______. Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. Balanço dos


atendimentos realizados em 2015 pela Central de Atendimento à Mulher – Disque 180.
Brasília, DF, 2015. Disponível em: <http://www.spm.gov.br/assuntos/violencia/ligue-180-
central-de-atendimento-a-mulher/balanco1sem2015-versao-final.pdf>. Acesso: 19 dez. 2017.

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