Casos Hematológicos
Casos Hematológicos
Casos Hematológicos
01- Caso
Mulher com 48 anos de idade procurou assistência médica devido à sua palidez e fadiga aos menores esforços. O exame clínico
revelou anemia e o médico solicitou os seguintes exames laboratoriais:
Perguntas:
1) Como você faria a interpretação dos resultados laboratoriais?
Respostas:
1) A paciente tem anemia microcítica e hipocrômica, com deficiência de ferro e elevação da capacidade de transporte (CTLFe ou
TIBC). Há plaquetose que pode indicar sangramento ativo.
2) A causa mais comum desses resultados em mulheres jovens (que não é o presente caso) é a menorragia. Em mulheres ou
homens com idade superior a 40 anos, as causas mais comuns (deficiência alimentar) sendo excluídas, se deve pesquisar
presença de tumores no trato gastrointestinal por meio de sangue oculto nas fezes. Exames mais refinados como imagens do
trato gastrointestinal e endoscopia devem ser também realizados.
02- Caso
Homem com 35 anos de idade e há 15 anos diagnosticado como portador de Doença de Crohn foi submetido a várias cirurgias
nos últimos dez anos. Sua mais recente cirurgia envolveu a ressecção e anastomose do intestino delgado. Os exames realizados
recentemente mostraram os seguintes resultados:
Resposta: O homem com doença de Crohn tem anemia normocítica e normocrômica. O RDW elevado indica que há aniso-
poiquilocitose. Ele tem deficiência de ferro, vit. B12 e folatos. A doença de Crohn é uma inflamação do intestino envolvendo todo
o trato gastro-intestinal e, consequentemente, prejudica a absorção de ferro, folatos e vit. B12. Pelo fato de ter deficiências de
ferro, folatos e vit. B12 os índices hematimétricos (VCM e HCM) se apresentaram normais. É importante lembrar que na
deficiência de ferro o HCM e VCM diminuem, e na deficiência de B12 e folatos o VCM aumenta e o HCM permanece normal.
03- Caso:
Mulher com 55 anos de idade é portadora de hipertensão essencial, com pressão arterial
constantemente elevada apesar do uso de quatro drogas diferentes para o tratamento.
Há poucas semanas o médico iniciou o tratamento com metildopa, porém ontem ela teve
que procurar a emergência pois não estava se sentindo bem. Foram solicitados vários
exames laboratoriais, cujos resultados foram os seguintes:
* Urobilinogênio urinário, contagem de reticulócitos e teste de Coombs (antiglobulina direta) foram solicitados posteriormente.
Pergunta-se:
1) Interprete os resultados.
Respostas:
1) A paciente tem anemia normocítica e normocrômica, com perfil de ferro normal, valores de folato e vit. B12 também normais.
Entretanto a elevação da bilirrubina, urobilinogênio positivo e reticulocitose sugerem anemia hemolítica. O teste de Coombs
direto positivo indica que há anticorpos envolvendo os eritrócitos.
2) O diagnóstico obtido pelo conjunto das informações é de anemia hemolítica auto-imune, que foi induzida pelo tratamento
com metildopa.
04- O que é a anemia normocítica?
A anemia normocítica é uma conseqüência da baixa produção de hemácias por diminuição das células precursoras nas doenças
medulares ou da ineficiência da eritropoietina nas doenças sistêmicas, resultando na diminuição do número de hemácias.
Sem alterações associadas como a deficiência da hemoglobinização ou as alterações dos processos mitóticos durante a maturação dos
eritroblastos, as hemácias formadas têm conteúdo de hemoglobina (HCM) e volume (VCM) normais. A anisopoiquilocitose, proporcional à
intensidade do processo, é sempre variável conforme mostra a figura 1.
Figura 1: Discreta anisocitose e poiquilocitose com leptócitos e esferócitos em anemia hemolítica da malária. Esse paciente apresentou
VCM e HCM normais apesar de várias hemácias estarem morfologicamente alteradas.
05 - Como a anemia normocítica é investigada?
A anemia normocítica, diferente das anemias micro e macrocíticas, não possui um plano de
investigação definido.
Na falta de outros achados morfológicos, as doenças sistêmicas devem ser investigadas: doenças
renais (uréia e creatina), doenças hepáticas (ALT, AST, DHL e g-GT) e doenças hormonais
(TSH e T4L).
Figura 2: Empilhamento de hemácias (roleaux) e um plasmócito em paciente com mieloma múltiplo. A anemia era discreta (Hb:
10,5g/dL) com VCM e HCM normais.
Figura 3: Eletroforese de proteínas séricas em dois casos diferentes de mieloma (1) e (2), comparadas com proteínas normais (3 a 6).
No caso 1 há uma gama monoclonal na região típica de IgG, com 35% de concentração. No caso 2 a gama monoclonal está posicionada
na região típica de IgA e tem concentração de 65%.
06 - O que é a anemia ferropênica ou ferroriva?
Pelas quantificações do ferro sérico e ferritina. Raramente, pode ser necessário quantificar o
ferro medular pela coloração do azul-da-prússia (coloração de Perls), CTLFe e saturação da
transferrina.
A ANEMIA HEMOLÍTICA
A anemia falciforme e a anemia esferocítica são cosequências de contínua destruição de hemácias no baço (hemólise extravascular),
retidas pela diminuição da deformabilidade e fagocitadas por macrófagos (figura 7).
Figura 7: Um esferócito é fagocitado por macrófago no sistema reticulo-endotelial do baço. Microscopia eletrônica de varredura obtida
pelo Prof. Marcel Bessis.
Na anemia falciforme, a rigidez do citoesqueleto é decorrência da presença da hemoglobina anormal polimerizada, tendo como achado
morfológico as hemácias alongadas e afiladas em diferentes formas, entre as quais a forma de foice é a mais comum (figura 8).
Na esferocitose hereditária, a rigidez do citoesqueleto é decorrência da presença de proteínas da membrana anormais, tendo como
achado morfológico as hemácias esféricas, redondas e hipercoradas (figura 9).
Figura 9: Microscopia eletrônica de esferócitos juntos com alguns eritrócitos normais de sangue coletado de paciente com anemia
esferocítica.
11 - Quais os achados do hemograma e os exames complementares para a Anemia Falciforme?
No hemograma, a anemia geralmente grave (Hb: 5 a 8g/dL), anisopoiquilocitose evidente com células falcizadas em diferentes
intensidades, policromasia e alguns codócitos. A presença de eritroblastos e hemácias com corpúsculos de Howell-Jolly circulante é
indicativo de asplenia funcional (diminuição da remoção pelo baço).
Figura 10: Eletroforese alcalina em gel de agarose com muitas hemoglobinas variantes, entre elas os genótipos de Hb AS, SF, SS e SC,
os três últimos agrupados como doença falciforme.
12 - Quais os achados do hemograma e os exames complementares
para a esferocitose hereditária?
Qualquer que seja o processo da falcização (induzido “in vitro”, ou espontâneo “in vivo”) a
deformação se deve à desoxigenação da Hb S (figura 11). Essa deformação morfológica,
geralmente afilada longitudinalmente e que se parece com a forma de uma foice se deve ao
ajuntamento de moléculas de Hb S desoxigenadas que se dispõem formando inúmeros
polímeros num determinado sentido (figura 12). Essa disposição dos polímeros no interior do
eritrócito força a célula a adquirir uma forma alongada, caracterizando a falcização. O processo
da falcização pode ser resumido em três fases de modificação morfológica, conforme mostra a
figura 13, em que há uma fase em que o eritrócito com Hb S oxigenada tem a forma
discóide (a), quando inicia a desoxigenação da Hb S e célula deixa de ser discóide e
gradualmente se alonga (b), nesta fase se o eritrócito receber oxigênio ele “desfalciza”; e
finalmente os polímeros de Hb S se alongam longitudinalmente e o eritrócito adquire a forma
de foice nesta fase a falcização se torna irreversível, ou seja, mesmo que haja oxigênio
disponível às moléculas de Hb S estão estruturalmente comprometidas em agregados
polimerizados que não captam o oxigênio.
Figura 11: Microscopia eletrônica de varredura de eritrócitos falcizados em comparação com outro
discóide.
Figura 12: Microscopia eletrônica plana de eritrócito falcizado onde é possível observar inúmeros
polímeros de agregados moleculares de Hb S desoxigenada, dispostos longitudinalmente na célula
afoiçada.
Figura 13: Microscopia óptica de sangue com anemia falciforme (Hb SS). (a) eritrócito com Hb S
oxigenada com a forma discóide; (b) duas situações que representam a fase inicial da falcização; (c)
eritrócito falciforme irreversível.