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Guadalcanal

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SAMUEL

B. GRIFFITH II

A BATALHA DE GUADALCANAL

EDITORIAL INICIO
Título da edição original:

THE BATTLE FOR GUADALCANAL

Todos os direitos reservados para Portugal por Editorial Início

© 1963 by Samuel B. Griffith II

Capa de

CARLOS SANTOS

Tradução de

ORLANDO NEVES (Livro I)

FERNANDA PINTO RODRIGUES (Livros II a IV)

EDITORIAL INICIO Av. Almirante Reis, 21-2.° Esq.

LISBOA-1

Se está interessado em receber, gratuita e periodicamente, informações


bibliográficas sobre a nossa atividade editorial, queira enviar-nos, num simples
postal, o seu nome e a sua morada. Prontamente ser-lhe-á enviado o nosso
Boletim /Catálogo.


Em 7 de Agosto de 1942, os Fuzileiros Navais americanos desembarcaram em
Guadalcanal, nas ilhas Salomão. Era a primeira ofensiva americana da guerra.
Nos seis meses seguintes, fuzileiros navais, marinheiros, soldados e aviadores
travaram uma luta desesperada com os fanáticos e obstinados japoneses.

Em vez de batalhas com extensas colunas de blindados ou nuvens de pára-


quedistas, travaram-se ferozes combates, a curta distância, e uma luta incessante
com a fome, a fadiga, a doença e a seiva. A pressão nunca afrouxava, os
combates aéreos, navais e terrestres sucediam-se e combinavam-se.

Samuel B. Griffith II, que combateu com os «raiders» de Edson em Guadalcanal,


descreve os terríveis combates em terra, a corajosa defesa do aeródromo
Henderson e as dramáticas batalhas navais que conduziram à vitória americana,
em Fevereiro de 1943. O general Griffith é, neste caso, uma «avis rara», um
militar que participou nas batalhas que descreve, mas que, não obstante, as sabe
contar com a imparcialidade fria, objetiva e desapaixonada de um grande
historiador. Raramente se escreveu um livro tão bem documentado e, ao mesmo
tempo, tão impregnado da atmosfera real da batalha.

Quando os Americanos acabaram por triunfar, os homens entendidos, de ambos


os lados, compreenderam o significado desse triunfo. «Pela primeira vez na
Segunda Guerra Mundial, um exército japonês, contido, dominado e desviado do
seu objetivo, preparava-se para abandonar Guadalcanal [...] Depois de
Guadalcanal, só podiam esperar que a derradeira derrota não fosse totalmente
catastrófica.»
Palavras do almirante Nimitz acerca
do livro

«Felicito Samuel B. Griffith por ter escrito uma excelente obra. Já li muitos
outros relatos acerca da grande batalha, mas este é o mais realista e interessante.
A minha admiração pelo Corpo de Fuzileiros —e por Vandegrift e todos os seus
oficiais e soldados da 1.ª Divisão de Fuzileiros Navais— aumentou muito mais
(se é possível) graças a esta emocionante narrativa. Lamento que tantos dos
participantes da Marinha tenham morrido e não possam ler A Batalha do
Guadalcanal. Tenho a certeza de que Turner, Holsey, Ghormley e muitos outros
não lhe regatariam elogios nem Iho desejariam modificar uma só palavra.»


O AUTOR

O brigadeiro-general Samuel B. Griffith II nasceu em Lewistown, Pensilvânia, e


pertenceu ao curso de 1929 da Academia Naval dos Estados Unidos. Antes da
Segunda Guerra Mundial, prestou serviço na Nicarágua, na China, em Cuba e
em Inglaterra. Ferido em Guadalcanal, refez-se e voltou a combater na
campanha da Nova Geórgia, em Julho-Agosto de 1943. Recebeu a Cruz da
Marinha, em 1942, e a Cruz dos Serviços Distintos do Exército, em 1943.
Depois da guerra desempenhou, entre outros, os cargos do chefe da Polícia
Militar no Norte da China o de chefe de estado-maior do Corpo do Fuzileiros da
Esquadra do Atlântico. Quando da sua reforma, em 1058, pertencia ao estado-
maior do comandante-chefe das Forças dos Estados Unidos na Europa.

Depois de deixar o serviço ativo, o general Griffith recomeçou os seus estudos


de chinês no New College da Universidade de Oxford. Publicou artigos e
ensaios em The New Yorker, Town and Country e The Saturday Evening Post,
assim como artigos técnicos em revistas militares.

Ao escrever acerca do seu livro, o general declarou: «Muitos oficiais japoneses


que combateram em Guadalcanal tiveram a bondade de me ajudar com as suas
reminiscências. Espero que este livro exprima as dificuldades que eles e nós
enfrentámos e também a coragem, a determinação e a resistência de milhares de
soldados, marinheiros e aviadores japoneses que morreram na ilha, nos mares à
sua volta e no céu que a cobre.»
PREFÁCIO

No seu Marlborough, Winston Churchil escreveu acerca das grandes batalhas


que «ganhas ou perdidas, elas mudam totalmente o curso dos acontecimentos,
criam novos tipos de valores, novos comportamentos humanos, novas
atmosferas nos exércitos e nas nações com as quais todos nos devemos
conformar». Assim aconteceu no Pacífico, na II Guerra Mundial com as batalhas
de Midway, de Guadalcanal e mais tarde com a das Marianas.

Para a recaptura do campo de aviação em Guadalcanal que fora reconquistado


pelos «marines» americanos em 7 de Agosto de 1942 os japoneses haviam
destinado um exército (o 17.°) e uma maior proporção ainda de forças imperiais
de terra, ar e submarinos. Após seis meses de quase ininterrupta luta, os
derrotados japoneses abandonaram a ilha e foi-lhes negada a utilização posterior
das áreas circunvizinhas e do espaço aéreo por cima delas. Após esta batalha,
decisiva tanto do ponto de vista estratégico como psicológico, os japoneses que
ainda eram capazes de enfrentar o futuro em termos objetivos compreenderam
que o «tesouro» da Ásia do Sueste, «a terra do eterno Verão» estava fora do seu
alcance.

Nenhum livro do tipo deste poderia escrever-se sem a ajuda de muitas pessoas e
eu tive a sorte de conseguir a completa colaboração de certo número de
japoneses que em 1942 ocupavam posições de grande responsabilidade. O
primeiro de entre eles é o coronel Susumo Nishiura, atualmente chefe da Divisão
de História da Guerra do Departamento de Defesa Japonês. Graças ao seu
interesse e à sua ajuda pude trocar útil correspondência com os antigos tenentes-
generais Shuichi Miyazaki e Kumao Imoto, os antigos majores-generais Tadashi
Sumuyoshi e Toshinaro Shoji e o coronel Kazuo Taguchi. A todos eles estou
profundamente grato.

Muitos oficiais americanos que prestaram serviço em Guadalcanal deram-me


informações do tipo não usualmente encontrado nos relatórios oficiais. Entre
eles cito especialmente o general Alexander Vandegrift, comandante das forças
dos Marine Landing dos Estados Unidos que assaltaram Guadalcanal-Tulagi-
Gavutu-Tanambogo. O general Vandegrift respondeu a dúzias de perguntas,
algumas das quais não teve dúvidas em considerar impertinentes.

O seu antigo chefe de estado-maior, agora general Gerald C. Thomas, U. S. M.


C. {United States Marine Corps (NT)} (reformado), e o seu antigo oficial de
operações, general Merrill B. Twining (também atualmente reformado), fizeram
luz em muitas das questões que nos relatórios oficiais não estavam claras. Um
dos que comandaram a Força Aérea Aliada em Guadalcanal, o tenente-general
Louis Woods, U.S.M.C. (reformado), foi, durante longas e agradáveis
conversações que mantive com ele, o mais prestável e paciente dos
colaboradores. O major-general Richard C. Mangrum, U. S. M. C. (então major),
que desempenhou um papel de vital importância nas fases iniciais da campanha
leu, por duas vezes, os rascunhos do manuscrito deste livro e a sua aguda
memória salvou-me de cometer muitos erros. Como o relatório original
(semimanuscrito) do Quartel-General do I Asa Aérea dos Marines se perdeu, as
contribuições destes dois oficiais revelaram-se essenciais (visto serem únicas)
para a história da luta decisiva pelo controle aéreo.

Estou também agradecido pelo fato de terem lido o manuscrito na sua totalidade
ou em partes a Richard C. West, professor de História da Academia Naval dos
Estados Unidos, William Harbaugh, professor de História da Universidade de
Bucknell, ao contra-almirante Frank P. Mitchell (reformado), ao coronel Saville
T. Clark e ao coronel James E. Herr, ao capitão Robert Asprey, ao coronel
Robert D. Heinl, ao dr. John Miller Jr. e a Henry I. Shaw Jr. Nunca nenhum
aspirante a historiador militar teve tanta sorte em encontrar um núcleo de amigos
tão competentes e prestáveis que o ajudaram com útil espírito crítico.

A Martin Clemens que, com os membros da sua Polícia das Ilhas Salomão, tem
papel importante na narrativa, devo também os meus agradecimentos pelo
acesso que me proporcionou ao seu diário particular (ainda não publicado)
relativo àqueles dias recheados de acontecimentos.

Tanto Shaw, o chefe do Setor Histórico G-3, U. S. M.C., e o dr. Miller, autor da
História oficial do Exército dos Estados Unidos na campanha de Guadalcanal,
simpaticamente me auxiliaram nas minhas pesquisas. Na Divisão de Relatórios
da II Guerra Mundial, Arquivos Nacionais, Wilbur J. Nigh e Joseph Avery
ajudaram-me nas investigações assim como D. M. O’Quinlevan, chefe da Seção
de Pesquisas e Relatórios do Setor Histórico U. S. M.C. e o seu estado-maior.
Lynn Delozier, bibliotecário das Escolas de Marines, em Quantico, na Virgínia,
forneceu-me a possibilidade de consultar livros e jornais. Dean Allard, chefe do
setor de Arquivos Operacionais da Divisão de História Naval e o seu estado-
maior foram infatigavelmente prestáveis e corteses.

Pela tradução das Memórias do major-general Kiyotaki Kawagushi estou


reconhecido a Yukihisa Suzuki que, no final da guerra, era um piloto de treino
kamikaze e atualmente é bibliotecário na Biblioteca Asiática da Universidade do
Michigan em Ann Arbor.

O contra-almirante William W. Wilbomer, U. S. N. (reformado), que, como


oficial de artilharia do cruzador S. Francisco participou em duas noites da
batalha de Savo, confiou-me pessoalmente e durante muito tempo as suas
impressões pessoais acerca daqueles ferozes recontros.

Clarke Kawakami e Roger Pineau indicaram-me a pista de várias fontes de


informação japonesas que eu, de outra forma, nunca teria encontrado.

O almirante Chester W. Nimitz leu o manuscrito na sua forma final e deu várias
e valiosas sugestões. A minha dívida para com ele e para com o general
Vandegrift jamais poderá ser paga.

Qualquer historiador da II Guerra Mundial que tivesse a sorte de encontrar como


editor Hanson Baldwin podia considerar-se afortunado.

Os mapas foram preparados por John Carnes e basearam se naqueles que


inicialmente surgiram nas histórias oficiais Para obter a licença necessária para
os consultar devo a minha gratidão ao chefe do Gabinete de História Militar do
Exército dos Estados Unidos e, ao Diretor do Setor Histórico G-3 dos Marines.

Seria desnecessário acrescentar ainda que sou o único responsável pelos fatos tal
como são apresentados ao longo do livro, assim como pela sua interpretação.

SAMUEL B. GRIFFITH II


LIVRO I

1. «FAZ A BARBA COM UM MAÇARICO»

Quando o crepúsculo descia sobre Tóquio, no domingo, dia 30 de Novembro de


1941, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Shigenori Togo, acabava de
escrever o rascunho de um despacho a enviar para o embaixador japonês em
Berlim 1. Esta mensagem continha a informação que o general Hiroshi Oshima
há algum tempo esperava receber: constatava-se o «extremo perigo» de que a
guerra pudesse «subitamente rebentar entre as nações anglo-saxónicas e o Japão
se houvesse algum recontro armado». Oshima foi instruído para fazer chegar
estas notícias ao ditador nazi «muito secretamente» e para acrescentar que «a
data de início desta guerra pode chegar mais depressa do que pensa» 2.

No dia seguinte, um Conselho de Estado formal elegeu para primeiro-ministro o


general Hideki Tojo na presença do Imperador. Sua Majestade Hirohito ouviu
em silêncio a descrição de Tojo que, com amarga brevidade, narrava as atitudes
hostis e obstruentes dos governos americano, chinês, britânico e holandês a
respeito da «pacífica» expansão do Império japonês no continente asiático em
direção às ricas terras tropicais banhadas pelos mares do Sul. A nação, concluiu
ele, apenas podia ser defendida pela força das armas.

Na verdade, Tojo sabia então (embora o impassível Imperador o não soubesse)


que a data do primeiro repentino «recontro armado» tinha já sido decidida, o
principal alvo fora já escolhido, os Comandos das Forças Navais tinham já
reunido secretamente. O almirante Isoroku Yamamoto, comandante-chefe da
Esquadra Conjunta dera já o sinal «Subir à montanha Niitaka»; os seis porta-
aviões do vice-almirante Chuichi Nagumo, escoltados por couraçados,
cruzadores e contratorpeiros, haviam já deslizado silenciosamente a caminho da
erma baía Tankan nas remotas Curilas e iniciavam uma ilusória caminhada por
entre os nevoeiros dolentes e flutuantes daquela zona 3.

O golpe contra a Esquadra Americana no Pacífico e a sua base no Porto das


Pérolas (Pearl Harbour) fora decidido com a finalidade de adiar a ação
americana e assim os japoneses ganharem tempo para se apoderarem e
consolidarem posições nas «áreas ricas» dos mares do Sul. Numa rápida série de
operações sincronizadas, os japoneses esperavam imobilizar a Armada dos
Estados Unidos e assaltar as fracamente guarnecidas possessões britânicas,
holandesas e americanas no Extremo Oriente. Pretendiam rapidamente integrá-
las na «Grande Esfera de Prosperidade Comum da Ásia Oriental». À volta dos
territórios conquistados construiriam uma barreira defensiva e fariam com que os
Aliados viessem até eles. Eventualmente, acreditavam, «os anglo-saxões»
cansados da guerra, frustrados nos seus ataques costeiros a posições
inexpugnáveis, acabariam por concordar com uma paz negociada nos termos da
qual o império ficaria com o maior quinhão do saque.

Era este o estado de espírito otimista dos japoneses ao iniciarem uma guerra que
seria dirigida inteiramente a seu bel-prazer, uma guerra que se queria limitada no
espaço e no tempo. A experiência na China deveria tê-los feito pensar que é
necessário levar em conta não apenas os desejos de um dos participantes quanto
à limitação de uma guerra, sejam quais forem os termos em que ela se processe.

Exatamente uma semana depois de a aviação japonesa ter feito em pedaços o


couraçado Row, o secretário da Marinha, Frank Knox, regressava a Washington
de uma apressada viagem à base havaiana. Chocado e desiludido com o que vira
e ouvira no Porto das Pérolas, o secretário de Estado concluíra durante a sua
viagem de retorno que tinha de proceder a mudanças radicais, sem demora, nas
camadas superiores da hierarquia de comandos a que presidia. No próprio dia em
que chegou à capital enviou ao presidente as suas sugestões. A mais importante
dizia respeito à futura nomeação de um almirante chamado King, um oficial que
Roosevelt conhecia e admirava.

Na tarde de terça-feira, dia 16 de Dezembro, Knox foi convocado para a Casa


Branca. Os seus acompanhantes eram o chefe das Operações Navais, almirante
Harold R. Stark, e o comandante-chefe da Armada Atlântica, almirante Ernest J.
King. Os três sabiam das razões por que haviam sido chamados: anteriormente, o
secretário informara-os da decisão de Roosevelt em voltar a criar o posto de
comandante-chefe da Armada dos Estados Unidos e em designar King para o
ocupar.

O almirante King, que havia celebrado o seu sexagésimo terceiro aniversário de


nascimento três semanas antes, estava longe de ser o mais popular dos oficiais de
alta patente da Marinha dos Estados Unidos, mas era um dos mais respeitados.
Profissional dedicado, King sempre confiara naqueles que serviam sob as suas
ordens para o ajudarem a tomar as decisões exatas. Não era um autoritário;
durante uma carreira que abrangia quarenta anos de atividade, nunca conseguira
tolerar os que se preocupavam demasiadamente com pormenores ficando com
pouco tempo livre para se concentrarem em qualquer função de comando, salvo
eventuais e constantes perseguições aos seus subordinados.

Oficial há quatro décadas, King adquirira a sua própria reputação no serviço.


Duro mas leal, severo mas justo, segundo a opinião de alguns. Outros
descreviam o almirante em termos menos amáveis: «um crustáceo teimoso»,
«tão duro que faz a barba com um maçarico», «inflexível», «um capataz». À
característica que os detratores do almirante chamavam «inflexibilidade», outros
definiam como «determinação» 4.

King acreditava que o primeiro dever de um comandante era distribuir tarefas e


registar os resultados esperados; o segundo, encorajar inteiramente o exercício
do espírito de iniciativa no cumprimento das ordens recebidas. Os almirantes do
passado — Nelson, Tromp, Earl St. Vincent, Farragut—, cujas proezas
inspiravam King, tinham sido homens em quem havia predominado o espírito de
ataque, homens capazes de reconhecer a oportunidade fugidia e aproveitá-la para
dela extraírem as vantagens.

«Façam o melhor que puderem» era uma das exortações favoritas do almirante:

«Não pode aceitar-se como desculpa para não se agir com prontidão numa
guerra o fato de se aguardar a futura posse de pessoal treinado ou material do
mais moderno (...) o pessoal deve ser treinado e tornado competente (...) o
material de que se dispõe deve ser mantido e utilizado em todas as ocasiões,
extraindo-se-lhe o máximo das suas possibilidades.» 5

Quarenta e oito horas depois da entrevista na Casa Branca, o presidente


Roosevelt assinou a Ordem do Executivo n.° 9894. Esta prescrevia que o
comandante-chefe da Armada dos Estados Unidos exerceria «o supremo
comando das forças operacionais, nestas compreendidas as várias frotas da
Marinha dos Estados Unidos» e tomava-o responsável pela preparação e
execução dos planos «das atuais operações de guerra». No sábado, dia 20 de
Dezembro, King foi designado comandante-chefe da Armada dos Estados
Unidos (Cominch) 6. Dez dias mais tarde, a sua bandeira era hasteada no Vixen,
que se encontrava atracado no Estaleiro da Marinha em Washington.

O «Cominch» pouco tempo demorou a dar as suas primeiras ordens — um


despacho dirigido a Chester W. Nimitz que menos de duas semanas antes
assumira o comando da Armada do Pacífico. Nesse despacho, King ordenava ao
novo «Cincpac» 7 que fizesse a cobertura e sustentasse a «linha Havaí-
Midway», protegesse as comunicações com os Estados Unidos continentais e
mantivesse a segurança das linhas marítimas e aéreas entre a costa ocidental e a
Austrália. Esta última tarefa, obviamente, obrigava à existência de uma cadeia de
ilhas-base. Ernest J. King iniciara a marcha transoceânica da Marinha.

Durante a derradeira semana de Dezembro de 1941 os acontecimentos no


Pacífico sucederam-se com desconcertante rapidez. Quando os oficiais
superiores britânicos chegaram a Washington para a conferência que ficou
conhecida pelo nome de «Arcadia», a bandeira americana fora arreada em Wake,
as tropas americanas e filipinas haviam iniciado uma retirada estratégica para
Bataan, os japoneses tinham chegado já a Sarawak, conquistado Joio em Sulus e
deslocavam-se em marcha inflexível na direção da Malásia, no sul. No dia de
Natal, Hong-Kong rendeu-se. A posição aliada no Extremo Oriente encontrava-
se muito perto de uma situação crítica. Ela viria realmente.

No último dia deste sombrio mês, os conferencistas delinearam uma Área do


Pacífico denominada ABDA (Australiana, Britânica, Holandesa {Dutch em
inglês (NT)}, Americana) e nomearam um general inglês — Sir Archibald
Wavell— para supremo comandante. Embora esta estrutura, criada no papel,
viesse pouco depois a desintegrar-se perante os ataques dos japoneses, dois
resultados da conferência «Arcadia» revelaram-se de efeitos duradouros.

O princípio da unidade de comando, vital para o eventual êxito do esforço de


guerra dos Aliados na Europa, fora criado e fora igualmente aprovado um
conceito de grande estratégia inserto num documento intitulado «ABC-1» 8.
Tratava-se de um apelo à unidade do esforço Aliado contra o Eixo Europeu,
mantendo-se no Pacífico uma atitude defensiva.
Segundo as determinações do «ABC-1», King viria a tornar-se um dos principais
executores de uma estratégia com a qual ele antipatizava por natureza. Porque o
temperamento e a experiência de King não lhe permitiam aceitar o conceito de
uma guerra «defensiva» no Pacífico. O almirante, para quem esperar era um
anátema, estava assim fronte a um dilema. Tinha de apoiar os planos da
estratégia superior. Na verdade, falhasse ele, e Roosevelt rapidamente teria
encontrado outro comandante-chefe da Armada dos Estados Unidos.

O general Alan Brooke, chefe do Estado-Maior General do Império, frequentes


vezes desejou que o presidente assim fizesse. Mais tarde escreveu que de
maneira nenhuma nem ele nem ninguém teria dito «era melhor afastar King do
Pacífico. Era aqui que ele gostava de estar assim como a maior parte das suas
forças navais. A guerra europeia constituía um pesadelo enorme que o fazia ficar
impassível perante a guerra no Pacífico» 9.

Fosse onde fosse, no Extremo Oriente, que os japoneses surgissem,


aparentemente invencíveis, submergiam os desesperados Aliados. Na Malásia, o
comando derrotado do general inglês Sir Arthur Percival, deslocava-se
sucessivamente de uma posição para outra até que bateu em retirada quase
intacto para o beco sem saída de Singapura. Dezembro e Janeiro foram apenas
dois meses de um monótono registo de triunfos japoneses e reveses dos Aliados.
Com exceção da ilha de Wake, os chefes Aliados e as suas tropas não tinham
demonstrado particular inclinação para lutar com a necessária perícia e
determinação. O tema era retirada, retirada, retirada. Após menos de oito
semanas de guerra, ninguém duvidaria de que as possessões inglesas, holandesas
e americanas no Extremo Oriente, bem como aqueles que as defendiam,
deveriam vir a ser inscritas nos anais como perdas completas.

Esta série de desastres confirmava a opinião de King de que tinha de ser


ordenada uma ação imediata para restringir o avanço japonês. No dia 29 de
Janeiro, as forças do Exército dos Estados Unidos tinham guarnecido as Fijis,
um dos elos da tênue cadeia de ilhas-base que fora criada entre o Havaí e a costa
ocidental da Austrália e da Nova Zelândia. Mas isto não satisfaria King que, em
meados de Fevereiro, escreveu ao seu colega, o general George C. Marshall,
chefe do Estado-Maior do Exército, afirmando que era essencial «tão
rapidamente quanto possível (...) ocupar várias outras ilhas no Pacífico central e
sudoeste» 10. Ele indicava exatamente Tongatabu nas ilhas Tonga, a cerca de
quatrocentas milhas a sudoeste das Fijis e Efate nas Novas Hébridas.
Durante algum tempo, o chefe do Estado-Maior não deu resposta a esta carta;
quando o fez pedia a King que delineasse o plano de operações que propunha. A
2 de Março, King assim fez. Essencialmente, sugeria que uma série de «pontos
fortes» deveria ser estabelecida no Pacífico Sul, donde «passo a passo» seria
possível iniciar-se o avanço, através das ilhas Salomão até ao bastião japonês em
Rabaul 11. O «Cominch» ainda não o previa, mas a verdade é que apontava já
para Guadalcanal.

Três dias mais tarde, King concluiu que as suas ideias sobre uma estratégia
ofensiva no Pacífico não teriam grande futuro no Departamento de Guerra e, por
isso, preparou um memorandum dirigido ao presidente. Neste, sugeria uma linha
«útil» para o esforço dos Estados Unidos contra os japoneses e propunha um
plano de operações «conjunto» que resumia em nove palavras:

Aguentar Havaí;

Apoiar Australásia;

Deslocar-se noroeste de Novas Hébridas 12.

O entusiasmo do almirante por uma caminhada em direção a noroeste a partir


das Novas Hébridas pelas ilhas Salomão não era compartilhado pelo secretário
da Guerra, Henry L. Stimson, nem pelo general Marshall, tanto um como outro
— de acordo com as intenções estratégicas aprovadas por Roosevelt e Churchill
— dedicados a criar uma força americana na Inglaterra a fim de tentarem uma
travessia do Canal que, optimisticamente, pensavam pudesse realizar-se nos
finais de 1942 ou nos primeiros dias de 1943. Nestas circunstâncias, o alto-
comando do Exército não estava naturalmente inclinado a examinar propostas
diferentes, perigosamente dispersivas e divisionárias; Marshall lamentava-se a
Alan Brooke de que os constantes pedidos de King se estavam a tornar cada vez
mais um sorvedouro dos escassos recursos militares: o almirante «continuamente
solicita forças terrestres para conquistarem e defenderem bases em terra firme no
Pacífico» 13.

Todavia, o chefe do Estado-Maior pensava que as Novas Hébridas, um feixe de


ilhas infestadas de paludismo a quatrocentas milhas a norte da Nova Caledônia,
deviam ser conservadas para garantir a linha de comunicações de Havaí à
Austrália. Por isso, em meados de Março, ordenou ao major-general Alexander
M. Patch, cuja Divisão «Americal» tinha sido apressadamente transportada aos
poucos para a Nova Caledônia, que fosse reforçar um grupo de infantaria em
Efate, a ilha mais a sul do conjunto. Os Marines contribuíram com o 4.º Batalhão
de Defesa, uma organização mista que englobava artilharia costeira e antiaérea.
Esta força, reunida rapidamente, sob o comando do brigadeiro-general Rose do
Exército, chegou a Vila no final de Março e imediatamente iniciou os trabalhos
de construção de um campo de aviação.

Enquanto os soldados e os marines de Rose cavavam a selva e Marshall confiava


os seus problemas domésticos ao chefe do Estado-Maior General do Império em
Londres, King encontrou-se em Washington com o vice-almirante Robert L.
Ghormley que ele escolhera para futuro comandante da recentemente criada
Área do Pacífico Sul. Este extenso domínio fora separado da vasta Área do
Oceano Pacífico, atribuída a Nimitz por decisão da Junta dos Chefes de Estado-
Maior, e incluía a Nova Zelândia, a Nova Caledônia, as Novas Hébridas, as ilhas
Salomão mais a sul e muitos grupos de outras ilhas — Fijis, Tonga, Samoa,
Phoenix, Society — conhecidas antes da guerra sobretudo pelos viajantes e
missionários. Para ocidente da Área do Pacífico Sul ficava a Área do Pacifico de
Sudoeste, região conferida pela mesma decisão dos chefes de Estado-Maior ao
general Douglas MacArthur.

Não estão inteiramente esclarecidas as razões que levaram King a fazer esta
nomeação. Algum tempo antes, Ghormley fora diretor da Divisão de Planos de
Guerra no Gabinete do Chefe das Operações Navais (CNO) onde adquirira
grande reputação como brilhante estratega, mas nos dois anos imediatamente
anteriores fora um observador especial da Marinha em Londres. Estava
naturalmente imerso diariamente numa variedade de problemas não relacionados
com a zona cujo comando iria em breve assumir. A sua ignorância acerca do
Pacifico Sul e do inimigo japonês que lá defrontaria era igual á de qualquer outro
elemento do Departamento da Marinha.

Mas Ghormley possuía uma qualidade que o recomendava especialmente para o


novo posto: era um diplomata completo — suave, gentil, paciente, hábil. Estas
qualidades seriam úteis tanto nas suas negociações com o Governo da Nova
Zelândia como nas, tantas vezes frustradas, negociações com a volúvel e
recalcitrante França Livre na Nova Caledônia. Contudo, as reais qualidades que
eram óptimas no desempenho de uma função diplomática provaram ser escassas
quando o almirante assumiu o encargo de executar tarefas definidas que,
necessariamente, competiam a um comandante de área em estado de guerra.
As instruções de King a Ghormley eram, evidentemente, vagas:

«Foi escolhido para comandar a Força e a Área do Pacífico Sul. Terá uma
enorme área sob o seu comando e uma árdua tarefa a cumprir. Não tenho os
materiais necessários para lhe fornecer a fim de poder levar a cabo essa tarefa
como o devia fazer. Estabelecerá o seu quartel-general em Auckland, na Nova
Zelândia, com uma base avançada em Tongatabu. Na devida altura,
possivelmente neste Outono [1942], esperamos iniciar uma ofensiva a partir do
Pacífico Sul. Terá então necessidade de deslocar a sua base avançada consoante
as circunstâncias o determinarem e deslocar igualmente o seu quartel-general em
situações especiais. Gostaria que partisse, se possível, de Washington no prazo
de uma semana.» 14

Nesta curta entrevista, o «Cominch» não deu a Ghormley nenhuma indicação


sobre possíveis áreas a servirem de objetivo nem o futuro comandante poderia
saber algo através dos subordinados de King, pois que nenhum deles também
fazia a mínima ideia da magnitude da tarefa que o vice-almirante Ghormley teria
de enfrentar. Os almirante superiores em Washington nada mais podiam oferecer
ao seu colega do que simpatia.

Simpatia era o único item que o gabinete de chefes da Marinha poderia naquela
altura dar com generosidade; os repetidos apelos de Ghormley por unidades de
construção devidamente equipadas corriam de gabinete para gabinete, única e
simplesmente não havia pessoal especializado; maquinaria de remoção de terras,
bombas, tubos, válvulas, cimento, seções de aço pré fabricado para
armazenamento de tanques de gasolina — estes e outros inúmeros e essenciais
seguimentos existiam em parcas quantidades.

Esta informação não constituía novidade para os homens que trabalhavam com
pás e picaretas no campo de aviação da Vila, mas em menos de cinco semanas os
soldados e marines, agora comandados pelo brigadeiro-general Neal C. Johnson,
tinham construído a sua pista para caça, e em 30 de Abril Vila foi considerada
apta a receber aviões de porte ligeiro. Durante quase um mês não chegaram
aviões nenhuns. Em 27 de Maio, um major marine, Harold W. Bauer, trouxe três
Grummans do seu Esquadrão 212 dos Caças Marines. Dez dias depois chegaram
os restantes Wildcats. Nos meses seguintes, séries de caças, bombardeiros de voo
picado e outros aviões de todos os tipos e modelos fariam escala neste campo a
caminho de outros, dos quais muitos dos seus pilotos, incluindo Bauer, não
regressariam jamais.
Nos princípios de Junho, elementos da força de Johnson deslocaram-se para
norte com destino a Efate (nome de código: ROSES) e Espírito Santo (nome de
código: BUTTON) e começaram a construir uma pista para bombardeiros.
Surgiu aqui pela primeira vez no Pacífico um batalhão de construção naval, os
«Seabees», e, todos juntos, começaram a atacar a selva. Esta, no entanto,
dominava-os. Nos finais de Junho, cerca de metade dos oficiais e homens do
conjunto do destacamento estavam de cama com malária. Apressadamente,
equipas de assistência médica voaram do continente trazendo novos
medicamentos, incluindo a repressiva atabrina, e a violenta moléstia foi sendo
gradualmente vencida. Mas nos meses que estavam para vir a malária viria ainda
a causar mais baixas entre os marines e os soldados do que as bombas, as
granadas e as balas japonesas.

Os homens que lutaram contra as florestas nas Novas Hébridas não regressaram
aos Estados Unidos como heróis mas foram eles que tornaram possível que
outros o tivessem feito. Na verdade, a ocupação e o desenvolvimento das Novas
Hébridas constituíram o prelúdio fundamental para Guadalcanal. Sem estas
ilhas, as operações planejadas por King não teriam sido, possivelmente,
realizadas.

A 18 de Junho, Ghormley assumiu formalmente o comando da Força e da Área


do Pacífico Sul em Auckland, na Nova Zelândia. A zona sobre a qual exercia o
seu controle era vastíssima e iminente a ameaça de uma posterior invasão
japonesa. Desde Janeiro último que o inimigo se deslocava persistentemente,
embora com notável lentidão, para sueste. Cada vez com mais insistência se
afigurava a King que este avanço, que ameaçava as Hébridas, devia ser sustido
abruptamente. O homem «tão duro que faz a barba com um maçarico» estava
firmemente convencido de que a Marinha dos Estados Unidos não podia
continuar a manter-se ociosa enquanto os japoneses absorviam, uma a uma, as
estratégicas ilhas do Pacifico Sul 15.

2. «STAIKE AND AIGGS»


Limitado a norte pela Nova Inglaterra e pela extremidade sul da Nova Irlanda, a
ocidente pela sinistra península papua da Nova Guiné e a leste pela cadeia das
ilhas Salomão, encontra-se o pedaço de água conhecido pelo nome de mar
Salomão. Esta traiçoeira extensão líquida, que a norte confina com o mar de
Coral e que banha igualmente a costa da Austrália do cabo Iorque a Brisbane e
as ilhas das Novas Hébridas e Nova Caledônia, fica mil milhas a leste da Grande
Barreira de Recifes.

Exatamente um mês antes do Porto das Pérolas, o general Gen Sugiyama e o


almirante Osami Nagano, respectivamente chefes das Seções do Exército e da
Marinha do Quartel-General Imperial, haviam deslocado a sua atenção para esta
área e em 10 de Novembro chegaram a um acordo para a junção das operações
no sentido de se capturarem «pontos estratégicos no arquipélago Bismark o mais
rapidamente possível, logo após a tomada de Guam» 16. Rabaul na Nova
Inglaterra e Kavieng na vizinha Nova Irlanda foram escolhidas para futuros
centros de apoio do flanco sul da linha Palau-Truk, fornecendo bases a partir das
quais se faria o reconhecimento aéreo e submarino no sentido sul, isto é, em
direção aos mares de Coral e Salomão. Mas havia ainda um dividendo adicional
consequente da ocupação das Bismarck. Porque estas bases não forneceriam
apenas possibilidades de interditar as áreas marítimas a nordeste da Austrália —
permitiriam também que os japoneses dirigissem as suas armas para a Nova
Guiné e para o continente que esta protegia assim como, no sentido sudoeste,
abriam caminho para as ilhas Salomão, as Novas Hébridas, as Fijis, Samoa e a
Nova Caledônia.

Segundo os termos deste Acordo Central, o Destacamento do Exército dos


Mares do Sul (major-general Tomitaro Horii) e a 4.ª Esquadra (vice-almirante
Shigeyoxi Inouye) foram designados para conquistar Rabaul e Kavieng.
Contudo, só três semanas depois da queda de Guam (a 10 de Dezembro de 1941)
é que estes oficiais foram avisados) 17.

As estimativas japonesas acerca das forças australianas existentes nas Bismarck


revelaram-se exatas: havia poucos defensores e os sistemas defensivos não
estavam devidamente apetrechados. Após algumas séries de ataques aéreos
levados a cabo pelos grandes porta-aviões do vice-almirante Nagumo, as tropas
do major-general Horii desembarcaram em Rabaul no alvorecer do dia 23 de
Janeiro de 1942, encontrando fraca resistência. Simultaneamente, os 500 homens
da 2.ª Força Terrestre Especial da Marinha (Maizuru) capturavam Kavieng sem
disparar um só tiro.

Uma semana depois, nove caças Zero voaram de Truk para Vunakanau, cerca de
doze milhas a sudoeste de Rabaul, e batizaram o campo donde mais tarde viria a
partir a maior parte dos ataques contra Guadalcanal 18.

No primeiro dia de Março, os pilotos do 4.° Grupo da Força Aérea da Marinha


(48 bombardeiros médios, bimotores, Betty, 48 caças Zero e 12 quadrimotores
Kawanishi Emily) brindavam pelas últimas conquistas mm clubes de oficiais
apressadamente improvisados em Vunakanau e Lakunai 19.

Estes dois campos de aviação não eram exatamente primitivos mas,


naturalmente, não possuíam depósitos para explosivos, pistas e outras
instalações essenciais para apoio de operações de combate aéreo em maior
escala. A força da base iniciou imediatamente os trabalhos no sentido de corrigir
estas deficiências. Uma pista adicional foi adaptada em dois campos de golpe
vizinhos pertencentes ao clube de golfe local, mas após meia dúzia de aviões
terem caído ao tentarem levantar voo naquela superfície ondulada, a pista foi
posta de parte. As cinzas de Vulcan, um vulcão próximo, caíam sobre
Vunakanau e os vapores do semiativo Tavurvur desgastavam a fuselagem e as
asas dos aviões pousados em Lakunai.

Um piloto japonês que prestou serviço em ambos os campos descreveu-os mais


tarde como autênticos pauis e covas de pó. Os pilotos, as tripulações dos aviões e
o pessoal de manutenção estavam aquartelados em tendas e em choupanas
construídas à pressa na beira das pistas de descolagem. Mas, apesar das
condições, o moral das «águias do mar» do Imperador era elevado. Muitos
pilotos de caça, ases da aviação que tinham voado na China e contra os ingleses
nos céus da Malásia, mostravam-se ansiosos de entrar em combate agora contra
australianos e americanos.

Com a ocupação das Bismarck, levada a efeito praticamente sem derramamento


de sangue, os japoneses tinham completado, pelo menor preço, todas as
operações planejadas como a «Fase I». Tinham garantido os fornecimentos de
petróleo e borracha vitais para manterem as operações militares, bem como o
arroz necessário numa altura de economia de guerra. Mas a Marinha nunca se
sentiu completamente satisfeita com o limitado êxito da operação Bismarck tal
como fora delineada no Acordo Central de 10 de Novembro. Na verdade, já em
meados de Setembro de 1941, a 4.ª Esquadra tentara uma operação de guerra no
Pacífico Sul e concluira que era necessário ocupar Gasmata (na costa sul da
Nova Inglaterra), Lae e Salamaua (leste da Nova Guiné) e Tulagi (uma ilha sul
das Salomão) para efetivamente se defender a posição de Bismark e tornar mais
amplo o reconhecimento aéreo. Sob as constantes pressões da 4.ª Esquadra, o
Estado-Maior Conjunto da Marinha, em fins de Janeiro, ordenou a marcha
imediata em direção à Nova Caledônia e às ilhas Salomão.

A Seção do Exército mostrava-se relutante em concordar com uma futura


expansão na área do Sul. Profundamente empenhado na China, com um milhão
de homens preparados para enfrentar uma ameaça russa na Manchúria e na
Coréia e com os territórios já conquistados a necessitarem de vigilância, o
Exército via as suas capacidades já severamente estranguladas. Os seus oficiais
do Estado-Maior argumentaram que o Japão deveria agora encaminhar-se para
uma estratégia defensiva, integrar os territórios recentemente adquiridos na
«Grande Esfera de Prosperidade Comum da Ásia Oriental» e consolidar as
«áreas ricas» alcançadas com tão escassa perda de tempo, dinheiro e vidas. Mas
os planejadores da Marinha foram insistentes; a 29 de Janeiro de 1942, o
Exército capitulou e as duas seções dos Estados-Maiores concordaram em
diretivas complementares no sentido de um novo avanço.

Essas diretivas ordenavam a ocupação pela Marinha de pontos estratégicos nas


ilhas Salomão, com a simultânea conquista de posições no lado oriental da Nova
Guiné «a fim de cortar as comunicações entre estas áreas e o continente
australiano e neutralizar as águas a norte da Austrália oriental» 20.

Especificamente, o plano prescrevia uma invasão conjunta da área de Lae-


Salamaua na Nova Guiné, enquanto que a tomada de Tulagi e a sua adaptação a
base naval e aérea eram de exclusiva responsabilidade da Marinha. Após
completadas com êxito estas operações, o Exército e a Marinha juntar-se-iam
para levarem a cabo o ambicioso ataque a Port Moresby na costa sul da
península papua, «se possível».

Contudo, só a 16 de Fevereiro, cerca de duas semanas depois de receberem as


diretivas, é que os futuros comandantes finalmente se encontraram para
organizar a invasão da Nova Guiné. Neste encontro, chegou-se a acordo em que
a caminhada para as ilhas Salomão deveria ser adiada para depois da conquista
de Lae e Salamaua. A primeira fase desta operação de dupla penetração foi
executada a 8 de Março contra uma fraca oposição e quatro dias depois os
elementos do Destacamento dos Mares do Sul foram rendidos em Lae e
Salamaua pelas Forças de Instalação Terresrestre da Marinha e reembarcadas
para Rabaul.

Estava-se agora em meados de Março. Desde a ocupação de Guam, nos


princípios de Dezembro, os japoneses tinham conquistado as Índias, ricas de
petróleo, e alargado o seu controle de forma a incluírem nele territórios de vital
importância estratégica que diretamente ameaçavam o continente da Austrália e
punham em situação crítica as linhas de comunicação no Extremo Pacífico. Mas,
durante este período de treze semanas, algo como cinco preciosas semanas
haviam sido perdidas. O tempo é a essência da guerra e, ao passo que uma
derrota pode ser contrabalançada por uma vitória, os dias e as horas — quantas
vezes os minutos — desperdiçados não voltam a ser recuperados.

E agora, com porta-aviões apoiando a retirada para operações no oceano Índico,


a 4.ª Esquadra insistia no adiamento das invasões de Tulagi e de Port Moresby
até que a Esquadra Conjunta pudesse voltar a distribuir os seus conveses de voo.
Entretanto, todavia, os japoneses ocupavam a ilha Buka, Kieta em Bougainville
e Ballale e Faisi nas Shortland, uma ilha ao largo da ponta sul de Bougainville.
Em Buka foi logo demarcada uma pista para caças e a terraplenagem principiou.

Os planejadores da Marinha exploravam agora outra bomba. Esta era nada mais
nada menos do que uma proposta para invasão da Austrália, que um dos porta-
vozes de Sugiyama considerou, com admirável moderação, simplesmente
«ridícula» e «irrefletida». O Exército abrira caminho à Marinha nas Bismarck,
na Nova Guiné e em Tulagi; no dia 28 de Abril, voltou a render-se a novas
solicitações da Marinha. O resultado disto foi o «Plano de Compromisso» que
decidia a conquista da Nova Caledônia, das Fiji e de Samoa o mais depressa
possível logo que Port Moresby e Tulagi fossem conquistadas.

Enquanto as Seções do Exército e da Marinha discutiam os pormenores do Plano


de Compromisso, o estado-maior do almirante Yamamoto no gigantesco
couraçado Yamato, ancorado no Mar Interior, estava ocupado num projeto
destinado a empurrar a Armada dos Estados Unidos para o Pacífico Ocidental
onde se travaria a batalha decisiva. Esta concepção, expressa na frase Yogeky
Sakusen, dominara o pensamento da Marinha japonesa durante pelos menos
duas décadas; o seu principal proponente era exatamente o almirante Yamamoto.

Embora receptivo a novas idéias — sempre encoraraja pessoalmente os jovens


oficiais que acreditavam no extraordinário poder da aviação dos porta-aviões—,
Yamamoto era, essencialmente, um «almirante de couraçado» que tinha digerido
minuciosamente Mahan. Não advogava a concepção ambiciosa para ele, a
decisão da guerra tinha de ser encontrada no clássico recontro entre barcos
exatamente como no tempo de Nelson e, mais tarde, no almirante Togo.

Quando os primeiros representantes de Yamamoto chegaram a Tóquio no início


de Abril de 1942 com um plano para ocupação de Midway — a operação MI —,
nada mais receberam em troca do que uma delicada atenção. O Estado-Maior
General Naval gastara demasiado tempo e energia a persuadir o Exército a que
aceitasse as invasões da Nova Caledônia-Fiji-Samoa (Operação FS) e não estava
com disposição de espírito para analisar tão grandioso esquema como o da
operação MI. Por seu turno, o Estado-Maior General do Exército opunha-se
violentamente ao plano que, representando uma jogada arriscada, mesmo que
fosse realizado com sucesso, não traria grandes lucros de natureza estratégica.

Mas Isoroku Yamamoto era um homem de firme determinação e inflexível


vontade. Era o mais altamente respeitado dos oficiais de patente superior da
Marinha Imperial; os subordinados de todos os escalões tinham já sido
testemunhas da sua inspiradora capacidade de chefia, da sua intrepidez
imaginativa, da sua capacidade de reflexão prolongada e da limpidez da sua
orientação. Convicto de que uma vitoriosa ação da Armada era o único caminho
através do qual o Japão poderia ganhar o tempo necessário para consolidar os
seus lucros e demonstrar à América a futilidade de uma luta posterior,
Yamamoto persistiu na defesa da Operação MI.

Em Tóquio, os homens dos planos do Quartel-General da Marinha «faziam-se


difíceis» mas a 18 de Abril verificou-se um acontecimento que, subitamente, fez
mudar a opinião de forma a que esta apoiasse o projeto de Yamamoto. Foi o caso
do raide aéreo chefiado pelo tenente-coronel James H. Doolittle da Força Aérea.
O ousado ataque de Doolittle ao território japonês, lançado de uma força de
porta-aviões comandada pelo vice-almirante William F. Halsey Jr., produziu uma
reação psicológica muito mais importante do que os seus efeitos materiais. O
dramático empreendimento afetou profundamente Yamamoto que o considerou
como uma afronta feita à Marinha Imperial e julgou necessário pedir desculpa ao
imperador pelo que considerava um descuido no cumprimento dos seus deveres
cometido pela Marinha. Yamamoto garantiu a Sua Majestade Imperial que tal
fato não teria repetição.
A discussão entre as Seções do Exército e da Marinha acerca das operações FS e
MI era característica do tipo de relações existentes entre as duas armas e não é
de interesse secundário sublinhar-se que a decisão de empreender a captura de
Midway apenas se corporizou como direta consequência do raide a Tóquio. O
peso da argumentação do almirante era agora irresistivel; o Plano de
Compromisso foi adiado para meados de Junho e, a 5 de Maio, do Quartel-
General Imperial vinha a ordem para se levar a cabo a Operação MI, a conquista
de Midway e de outros pontos escolhidos das ilhas Aleutas. Sugiyama
concordou em fornecer um regimento, o 28.º de Infantaria reforçado, para
colaborar no assalto às praias de Midway.

Enquanto estes projetos se iam desenvolvendo em Tóquio, o vice-almirante


Inouye, cuja 4.ª Esquadra se encontrava ancorada em Truk, não ficara inativo. Os
seus esforços para conseguir que a há muito adiada operação de Port Moresby
fosse para a frente acabaram por vir a ser premiados no final de Abril quando a
Sexta Divisão de Cruzadores (quatro cruzadores pesados e um contratorpedeiro)
mais o porta-aviões ligeiro Shoho, sob o comando do contra-almirante Aritomo
Goto, foi designada como Força de Apoio. Ao mesmo tempo, a 5.ª Divisão
Pesada de Porta-Aviões (Zuikaku e Shokaku) e a 5.ª Divisão de Cruzadores (os
pesados Miyako e Haguro mais sete contratorpedeiros, sob o comando do vice-
almirante Takeo Takagi, foi nomeada para constituir a Força de Cobertura 21.

Em 25 de Abril, os aviões estacionados na base de Rabaul começaram o assalto


aéreo a Port Moresby e ao nordeste da Austrália; a 28, hidraviões quadrimotores
Kawanishi atacaram Tulagi, Gavutu e Tanambogo. No dia 30, a escalada dos
raides foi acelerada e no dia seguinte um ataque ao amanhecer apanhou dois
Catalina australianos ancorados em Tulagi. Ambos foram atingidos; um,
debateu-se desajeitadamente na água durante algum tempo até que desapareceu
para sempre; o outro, bastante danificado, foi mais tarde rebocado para Aola na
costa norte de Guadalcanal e destruído.

Raides intermitentes continuaram durante o dia e, à luz cinzenta chuvosa do


segundo dia de Maio, o pessoal da emissora de rádio australiana de Tanambogo
lançava para o ar o sinal preestabelecido que anunciava a sua partida iminente:
Staike and aiggs! Staike and aiggs!

Na manhã seguinte, o contra-almirante Goto e a sua força deslizaram ao longo


de uma estreita passagem marítima mais tarde denominada «A Fenda» e
entraram no deserto porto de Tulagi. Aí, Goto desembarcou a 3.ª Kure, cerca de
400 membros do Grupo Aéreo de Iocoama, uma unidade de base de hidraviões,
uma bateria de quatro canhões pesados antiaéreos, uma companhia da 6.ª Sasebo
e o pessoal de comunicações necessário para instalar e operar uma estação de
rádio de alta potência. Pouco tempo depois, o primeiro de uma série de doze
Kawanishis pousou na água e ancorou entre as boias de amarração
apressadamente lançadas. Seguiram-se-lhe 12 caças Zero.

Durante o dia, os transportes de bordo foram desembarcando metodicamente


sem qualquer perturbação. A ocupação destas minúsculas ilhas, cujos nomes,
três meses mais tarde, viriam nos cabeçalhos da primeira página de todos os
jornais americanos, decorreu sem incidentes. Os japoneses desembarcaram uma
enorme quantidade de equipamento de rádio e víveres, arroz, cigarros,
combustível para a aviação, óleo de lubrificação, carne enlatada em molho de
soja, milhares de garrafas de cerveja, um belo suprimento de frascos de meio
galão de saquê, caramelos e caixas de ananás e carne de caranguejo.
Posteriormente, algumas destas iguarias viriam a ser gratuitamente consumidas
pelos marines dos Estados Unidos.

Tais atividades tinham sido observadas com interesse pelos pilotos de


reconhecimento da 17.ª Força Especial de Porta-Aviões do contra-almirante
Frank Jack Fletcher, então cruzando o mar de Coral, 200 milhas a sul das ilhas
centrais de Salomão. Aos primeiros alvores do dia 4 de Maio, os velozes porta-
aviões Lexington e Yorktown corriam ao sabor do vento e lançavam um ataque
aéreo. Alvo: Tulagi.

O ataque apanhou os japoneses de surpresa. Um contratopedeiro, dois draga-


minas e um contratorpedeiro de transporte foram afundados. No mesmo dia, a
impressionante força de ataque do vice-almirante Inouye, sob o comando táctico
do contra-almirante Chiuchi Hara, abandonou lentamente o espaçoso porto de
Rabaul, atravessou o canal de S. Jorge e encaminhou-se para sul em direção à
ponta oriental da Nova Guiné. Alvo: Port Moresby.

Estava preparado o palco para a batalha do mar de Coral.

Esta batalha de porta-aviões nos dias 7 e 8 de Maio, um prelúdio à de Midway,


custou aos Estados Unidos o porta-aviões Lexington, o navio-tanque Neosho e o
contratorpedeiro Sims. Os japoneses perderam o porta-aviões ligeiro Shoho
(afundado); o porta-aviões de combate Shokaku embora seriamente danificado
conseguiu manter-se a flutuar. E se bem que o porta-aviões de combate Zuikaku
tivesse escapado sem beliscaduras, cerca de metade dos aviões pertencentes aos
dois vasos de guerra japoneses foi destruída. Com eles mergulharam no mar os
seus pilotos insubstituíveis. Às 3 horas da tarde, Hara saiu da peleja e dirigiu-se
para norte.

Taticamente, a batalha do mar de Coral foi um empate; estrategicamente foi uma


vitória americana decisiva. A tentativa de conquista de Port Moresby através de
uma invasão conduzida pelo mar fora frustrada. E, apesar da sua maior
importância, a força de porta-aviões do almirante Nagumo, preparando-se então
para avançar a caminho de Midway, perdera o concurso do Shoho, do Shokaku e
do Zuikaku. O Yorktown, embora danificado, conseguiu sobreviver e voltar de
novo ao combate.

O revés do mar de Coral não causou efeitos visíveis quer no plano de


Yamamoto, a operação MI, quer na atmosfera de suprema confiança que reinava
no Quartel-General Imperial. Aqui, tanto a Seção do Exército como a da
Marinha, com o que deve agora parecer-nos um otimismo extraordinário,
continuavam, dia após dia, a estudar os pormenores do adiado Plano de
Compromisso de 28 de Abril. A 18 de Maio a Seção Naval do Quartel-General
Imperial emitia uma ordem de alerta com indicações para imediato
cumprimento:

«Preparar a invasão da Nova Caledônia, de Fiji e das ilhas Samoa, destruir as


principais bases inimigas nessas áreas, estabelecer bases operacionais em Suva e
Nouméa, obter o controle dos mares a leste da Austrália e procurar cortar as
comunicações entre a Austrália e os Estados Unidos.» 22

A data para esta tentativa de progressão para sueste foi marcada para os
primeiros dias de Junho. A Seção Naval imediatamente designou a Esquadra
Conjunta e a 11.ª Esquadrilha Aérea para apoio, enquanto a Seção do Exército
punha em ação o 17.º Exército com quartel-general estabelecido em Rabaul e
ordenou ao tenente-general Harukichi Hyakutake que assumisse o comando.

Por coincidência, neste 18.º dia de Maio, um coronel, Kyanau Ichiki,


comandante de um regimento de escol designado para o ataque às praias de
Midway, chegou ao couraçado Yamato em Kure e teve uma reunião com o seu
estado-maior. Tanto o tenente-general como o coronel viriam a lutar em
Guadalcanal. Hyakutake, um dos mais prometedores «jovens» generais viria a
perder a sua reputação nessa batalha; Ichiki estava destinado a perder algo que
um oficial japonês, talvez mais corretamente, tinha em menor estima — a sua
vida.

Enquanto os homens dos planos estudavam afincadamente os papéis em Tóquio


e Truk e a Esquadra Conjunta fazia os preparativos finais para a sua viagem fatal
a Midway, os japoneses em Gavutu e Tulagi gozavam a vida. Para as vizinhas
ilhas Florida e Savo eram enviadas patrulhas a fim de comerciarem porcos,
galinhas e inhames. Os Kawanishis deslizavam ao longo das boias de amarração
ao amanhecer e levantavam voo indolentemente para explorarem o mar de Coral.
As episódicas aparições dos bombardeiros americanos B-17 Fortress vindos do
longínquo Port Darwin infligiam leves danos e causavam poucas perturbações
mas serviam para manter a guarnição num prudente estado de alerta. Os
invasores davam ainda conta de um estranho fenômeno: os nativos evitavam-nos
como se eles fossem homens atacados por alguma praga.

Só a 28 de Maio, quase quatro semanas após a sua chegada a Tulagi, os


japoneses se dirigiram para Guadalcanal; nesse dia, algumas patrulhas visitaram
as plantações de Lunga, Tenaru e Mamara onde abateram a tiro meia dúzia de
vacas que esfolaram e cuja carne transportaram para Tulagi. Durante as três
semanas seguintes os japoneses não demonstraram o menor interesse por
Guadalcanal exceto como centro abastecedor de carne ou de trabalhadores
nativos para as instalações da base agora quase completadas nas minúsculas
ilhas que protegiam a Florida.

No decorrer da primeira semana de Junho a tranquilidade reinava nas ilhas


Salomão. Sem pressas, as unidades de construção procediam aos melhoramentos
da base a sueste de Bougainville. Embora os japoneses então ignorassem o fato,
todos os seus movimentos eram observados e transmitidos pormenorizadamente
aos quartéis-generais aliados na Austrália.

Os homens que manifestavam tão permanente interesse pelas atividades dos


japoneses eram os membros da organização australiana de observadores
costeiros do comandante Eric Feldt, a invulgar rede de espionagem que forneceu
informações de incalculável valor aos Aliados nas áreas do Pacífico Sul e
Sudoeste. Os homens de Feldt, todos voluntários, não eram por profissão
soldados ou marinheiros, mas habitantes das ilhas — comerciantes, funcionários
coloniais, administradores e plantadores que se tinham oferecido para ficar
enquanto os japoneses iam ocupando as ilhas que serviam de proteção à
Austrália. Cada membro desta subtil rede tinha a seu cargo determinada posição
estratégica e possuía sólido «telerrádio» — transmissor, receptor e gerador —
assim como sistemas de código simples mas eficazes.

Feldt recrutara e instruíra pessoalmente todos estes homens. Alguns minutos


após o ataque japonês a Pearl Harbor ele alertou-os e quando o inimigo avançava
para sueste de ilha para ilha, cada um por sua vez ia-lhe na peugada. Com cada
um desses homens trabalhavam indígenas que ele conhecia e em quem confiava.
Sem a ajuda destes observadores costeiros eles não teriam sobrevivido. Todos,
brancos e nativos, sabiam a aguda inquietação em que viviam e os riscos sempre
presentes que a sua ação envolvia. Se fossem capturados, o melhor que poderiam
esperar era serem rapidamente mortos.

Do Guadalcanal, Martin Clemens, «Snowy» Rhoades e um tenente recentemente


saído da Reserva de Voluntários da Real Marinha Australiana, D. S. Macfarland,
todos na retaguarda, nada tinham de especial a transmitir a não ser que
destacamentos japoneses de saque haviam pilhado os «porcos episcopais»
abandonados pelo bispo anglicano Baddeley quando este se refugiou em
Malaita. Estes bravos e solitários homens, desconheciam, evidentemente, a
tempestade de Midway — «a batalha que votou à morte o Japão» 23 — que se
aproximava do norte.

As baixas japonesas em Midway —quatro porta-aviões e respectiva aviação,


pilotos e restante equipagem aérea— embora escondidas com êxito pela Marinha
da hierarquia do Exército, do Imperador e, claro, do público, puseram um travão
aos planos de progressão para instalação de bases operacionais nas Fiji e na
Nova Caledônia e a 11 de Junho a Operação KS foi «temporariamente adiada».
No momento, o pêndulo chegara a um ponto morto.

Em meados de Junho, o observador de costa Rhoades enviou a seguinte


informação estratégica a respeito da atividade dos japoneses nas Salomão
inferiores:

«Japoneses em Savo metralhadora e capacetes aço perguntam onde estão


brancos em Guadalcanal. Afirmam que estarão lá dentro duas semanas.
Japoneses também em Tenaru e Kukum passeando a cavalo na sexta-feira
passada. Perto apanharam um rapaz da polícia.» 24

Foi talvez um destes desconhecidos cowboys quem teve a ideia de que o


coqueiral que crescia entre Tenaru e Kokum era um óptimo local para um campo
de aviação. Não se sabe. Mas a verdade é que, a 19 de Junho, o comandante da
base de Tulagi enviou um destacamento de vistoria para a plantação de Lunga.
Alguns dias mais tarde, várias lanchas carregadas de japoneses chegaram, vindas
de Tulagi; durante a semana seguinte, foram construídos dois reservatórios de
água e algumas patrulhas visitaram as aldeias da costa a fim de contratarem ou
requesitarem grupos de trabalho indígenas. Mas devido à carência de
equipamentos, os trabalhos na pista que, mais tarde, se tomou um dos campos de
aviação mais famosos da II Guerra Mundial, decorriam com lentidão. O
observador costeiro Clemens relatou estas atividades; não havia dúvidas quanto
às intenções dos japoneses.

Ao amanhecer do dia 1 de Julho, Dovu, cabo de polícia, um dos observadores de


confiança de Clemens destacado para observar as atividades em Lunga, chegou
ao acampamento exausto e sem poder respirar. Depois de ter acordado Clemens
e engolido uma chávena de chá forte, excitadamente, forneceu a sua informação:

«Mil japoneses vêm praia vêm Lunga segunda-feira (29 Junho). Juntamente vêm
praia grandes barcos centena de homens grande canhão.

«Como é que tu sabes que é um milhão deles que desceu em Lunga, Dovu? Que
caminho fizeste tu para levares tanto tempo a dizer-mo?

«Eu estar deitado arbustos e ver dez camaradas a um palmo virem praia capacete
de aço bota caqui grande baioneta. Tem as pernas doridas, os pés inchados». 25

Na verdade, dois cruzadores descarregaram em Lunga tropas e equipamento.


Durante os dias seguintes, 400 homens das Unidades de Guarnição n.º 81 e 84
cavaram trincheiras e instalaram canhões próximo da praia. Os esquadrões
avançados dos 11.º e 13.º Batalhões de Construção Naval da 8.ª Base começaram
a trabalhar na pista de descolagem. Uma semana depois chegaram os restantes
membros destes batalhões e o andamento dos trabalhos de terraplenagem
acelerou notavelmente, caindo os coqueiros às centenas. O progresso destes
trabalhos era conscienciosamente relatado por Macfarland, Rhoades e Clemens,
cujos leais observadores e elementos da polícia se tinham infiltrado nos grupos
de trabalho arregimentados pelos japoneses. Calculavam que cerca de 3000
nipônicos se encontravam em Guadalcanal. Provou-se mais tarde que este
número era notavelmente exato 26.

Clemens escreveu no seu diário que a situação local piorava diariamente, que
parecia haver poucas possibilidades de se fazer alguma coisa e que ele, em
breve, deveria ser forçado a refugiar-se no interior da selva. Mas os japoneses
não eram os únicos interessados na superfície plana da costa norte desta ilha
situada a tantos milhares de milhas de Tóquio.

3. PESADELO NA NOVA ZELÂNDIA PESSIMISMO


EM MELBOURNE FIASCO NAS FIJI

No dia 20 de Março de 1942, o brigadeiro-general Alexander Archer Vandegrift,


um gentleman virginiano, de cinquenta e poucos anos, elegante, maxilares duros
e voz branda, então assistente do comandante da 1.ª Divisão Marine, recebeu
uma chamada telefônica do tenente-general Thomas Holcomb, comandante do
Corpo de Marines. Holcomb informou Vandegrift de que este assumiria o
Comando da Divisão no dia 23 de Março. Nesse dia, Vandegrift foi promovido a
major-general e numa breve cerimônia em New River, na Carolina do Norte, a
sua bandeira de duas estrelas foi hasteada num mastro branco em frente de uma
casa de lavradores reconstruída que lhe viria a servir não só de residência como
de temporário quartel-general.

O novo comandante de Divisão, outrora um protegido do brilhante major-general


Smedley Butler, aprendera deste homem de invulgar carácter uma coisa
fundamental: o mais importante elemento na guerra é o homem. Possivelmente,
por um processo de osmose, o jovem oficial absorvera uma parte do
extraordinário conhecimento de Butler sobre a natureza humana. Mas Vandegrift
não era um extrovertido. Aqueles que com ele se cruzaram, mesmo
fugidiamente, ficaram com a impressão de que se tinham encontrado frente a um
homem de calma determinação. A força e a paciência de Vandegrift iriam ser
postas à prova muitas vezes nos meses que se aproximavam.
Vandegrift não recebeu em herança um negócio em pleno desenvolvimento. A
divisão que iria comandar só existia nominalmente. Ela estava uma vez mais (e
pela terceira vez no espaço de um ano) numa fase simultaneamente de
desintegração e reorganização. Dois dias antes de ele assumir o comando, o seu
predecessor ordenara o embarque de um regimento, o 7.º, para ir guarnecer
Samoa. Para transformar o reforçado 7.º Regimento numa verdadeira força
militar de guerra antes de embarcar foi necessário desguarnecer todas as outras
unidades de muitos dos seus mais experimentados oficiais, subalternos e
especialistas. Vandegrift não hesitou muito tempo. Confiava no 7.º de Marines
para combater; deu-lhe uma desproporcionada quantidade dos melhores homens,
oficiais, armas e equipamento válido. O regimento, levando consigo o melhor
que havia na Divisão, embarcou de Norfolk no dia 10 de Abril de 1942.

Cinco dias depois, Vandegrift foi verbalmente informado de que o seu reduzido
comando começaria a deslocar-se para a Nova Zelândia no dia 1 de Maio e que
nele se incluiria a Força de Desembarque de uma Força Anfíbia do Pacífico
Sul 27. O general recebeu estas notícias com sentimento confusos; embora se
sentisse entusiasmado com a perspectiva de entrada em ação da divisão, não
estava de maneira nenhuma satisfeito com a situação no que respeitava ao treino
da unidade e ao estado do equipamento. Se bem que os seus batalhões de
infantaria tivessem treinado rigorosamente durante os meses de Janeiro,
Fevereiro e Março (e por curiosa coincidência nas ilhas Salomão, na foz do rio
Patuxent, na Marilândia) e a artilharia estivesse bem apetrechada, a divisão não
tinha, segundo as palavras do seu comandante, «atingido um satisfatório estado
de preparação para combate». Mas Vandegrift foi informado de que iria ter
suficiente tempo para posterior e intensivo treino: o comandante dissera-lhe que
não deveria entrar em combate antes de Janeiro de 1943. O comandante recebera
esta informação de uma boa fonte — Ernest J. King.

Em 29 de Abril de 1942, King emitiu uma ordem formal para que fosse
estabelecida uma Força Anfíbia do Pacífico Sul. «É urgentemente necessário que
uma força anfíbia se instale no Pacífico Sul», escreveu ele 28. O título curto para
esta operação escolhido pelo almirante King foi «Lobo Solitário» 29. King, que
acreditava que viaja mais depressa quem viaja sozinho, estava a criar as bases
para o seu grande plano: a marcha para noroeste a partir das Novas Hébridas.

Os quartéis-generais do Corpo de Marines começaram então a mandar pessoal


para New River a fim de transformar o comando de Vandegrift numa força de
guerra; chegavam quase diariamente extravagantes lotes de homens. Constituíam
uma multidão heterogênea. Centenas deles eram jovens recrutas recentemente
saídos dos campos de treino em Paris Island. Outros eram mais velhos;
primeiros-sargentos postos fora dos estaleiross da Marinha, sargentos instrutores,
sargentos artilheiros que tinham combatido em França, eternos soldados com um
longo registo disciplinar. Estes eram os profissionais, a «Velha Geração» dos
Marines dos Estados Unidos. Muitos tinham lutado contra os «cacos» no Haiti,
os «bandidos» na Nicarágua e contra soldados e marinheiros franceses, ingleses,
italianos e americanos nos bares de Xangai, Manila, Tsingtão, Tientsin e Pequim.

Eram jogadores inveterados e larápios completos que preferiam beber tônico


para o cabelo a cerveja («mijo de cavalo»), praguejavam com maravilhosa
fluência e nunca iam à igreja («o caixote de Deus») a não ser quando a isso os
forçavam. Muitos mascavam rapé, fumavam charutos rançosos e mastigavam
tabaco como quem mastiga pastilha elástica (os cigarros feitos eram para as
mulheres e crianças). Não liam praticamente nada nem participavam em provas
atléticas e não sabiam o que haviam de fazer se encontrassem pela frente um
conselheiro de carreira. Podiam viver só com carne de cabra seca, café preto
fortíssimo a que chamavam «mistela escaldante» e cozinhavam a carne picada
nos seus capacetes de aço.

Muitos eram experimentados peritos, condecorados com divisas e galões, pela


sua destreza na utilização de espingardas, pistolas, metralhadoras, granadas de
mão, espingardas automáticas, morteiros ou baionetas. Conheciam as suas armas
e sabiam que eram bons no seu manejo. Eram suficientemente capazes de
transformar a divisão e transmitir aos milhares de jovens parte não só do
invulgar espírito que os animava como da perícia de que eram dotados.

Simultaneamente, começou uma orgia de classificações, rivalidades, distinções,


divisões, manifestações.

Isto continuou até que o último homem do esquadrão da vanguarda embarcou no


Wakefield (outrora o paquete Manhattan) em Norfolk, na Virgínia, a 19 de
Maio 30. Em Nova Orleans, o barco a vapor Del Brazil carregava todo o gênero
de mantimentos necessários para equipar o depósito de base que iria ser
instalado em Wellington 31. Entretanto, um grupo de oficiais voava para a Nova
Zelândia e escolhia um local para essa instalação na zona acidentada e coberta de
arbustos perto de Wellington. O segundo esquadrão, sob o comando do
brigadeiro-general William H. Rupertus, recentemente designado adjunto do
comandante de divisão, embarcou de comboio para a costa ocidental e partiu de
San Francisco 32.

Nenhum destes escalões estava apetrechado para entrar em combate. Toda a


movimentação das tropas tinha um caráter administrativo e processava-se assim
de acampamento para acampamento; o fato primordial era a rapidez. Por isso,
todos os barcos iam carregados de artigos comerciais. Isto não deve ser
considerado como um erro de visão por parte de Vandegrift. As suas instruções
excluíam definitivamente qualquer possibilidade de uma entrada próxima em
combate. E em qualquer caso não bastava embarcar a fim de cumprir um
cuidadosamente elaborado plano de combate, que, em devido tempo, se revelaria
antieconômico.

A 14 de Junho, o escalão da vanguarda chegou a Wellington e Vandegrift


comunicou pela rádio ao almirante Ghormley a sua chegada. Os marines
começaram a desembarcar e a encaminharem-se para os acampamentos da base.
Estavam eles ainda a adaptar-se e a entrarem em contato, pela primeira vez, com
as raparigas da Nova Zelândia, quando Vandegrift decidiu ir ao quartel-general
de Ghormley, em Auckland, a fim de dar conta da situação. Quando o
comandante de divisão e os seus oficiais do estado-maior tomaram um avião no
dia 5 de Junho ninguém pensava que a visita iria ser mais do que mera rotina.
Ninguém, de fato, se fosse interrogado naquela manhã, sabia ainda a exata
localização de Tulagi, Guadalcanal ou Gavutu. Dentro em pouco iriam ser
esclarecidos.

Imediatamente após King ter começado a procurar uma abertura acessível no


sistema defensivo do inimigo, os primeiros relatos acerca das perdas dos
japoneses em Midway foram inteiramente confirmados. Mas Douglas
MacArthur examinara também os relatos de Midway e pretendeu colocar o
almirante King numa situação definitiva. A proposta de MacArthur à Junta dos
Chefes era ousada — e imprudente. O general sugeria nada mais nada menos
que a tomada de Rabaul, feito que ele podia levar a cabo, dizia, com uma divisão
anfíbia experimentada e com o apoio da aviação dos porta-aviões. Isto
significava comprometer na iniciativa porta-aviões velozes — e havia apenas
dois, então, no Pacífico — em pleno mar Salomão repleto de recifes. Os
planejadores da Marinha que temiam que MacArthur pudesse considerar os
porta-aviões como «sacrificáveis» não tinham nenhuma intenção de pôr em
perigo, de forma tão imprudente, aqueles barcos preciosos.

Nem a Marinha se poderia encarregar de apoiar uma partida tão arriscada.


Analisando as circunstâncias, King considerou um assalto anfíbio a Rabaul
como algo que poderia levar os soldados a uma fogueira mortal e, enfaticamente,
vetou a ideia. Algumas semanas antes, com a concordância de MacArthur, tinha
votado contra um plano apresentado por Nimitz que sugeria que os aviadores
marines do tenente-coronel Merritt Edson atacassem e destruíssem Tulagi,
retirando depois. O que King tinha em mente era uma operação de ambições
limitadas mas destinada mais a fazer parar os japoneses que unicamente atrasar o
seu progresso ou a irritá-los e, em meados de Junho, sentiu-se satisfeito consigo
próprio porque a conquista da «área de Tulagi» e a subsequente ocupação de
Ndeni nas ilhas de Santa Cruz poderia ser realizada com os meios de que
dispunha.

Para os seus colegas da Junta de Chefes o feito parecia difícil. O general


Marshall reconheceu a necessidade de uma ação limitada no Pacífico, mas,
corretamente, previa que as operações para recuperação da cadeia de ilhas
frondosas iria inevitavelmente retirar recursos ao teatro de guerra na Europa, ao
qual, aliás, a Junta Estratégica tinha dado absoluta primazia. H. H. Arnold,
general comandante das Forças Aéreas, concordou com Marshall em que a ação
no Pacífico deveria ser defensiva até que a preparação da invasão da Europa
(«Bolero») estivesse bem encaminhada. O presidente fora bem claro ao afirmar
ao chefe do Estado-Maior (mas aparentemente não ao almirante King) que não
queria que se abandonasse a operação «Bolero». Por outro lado, os chefes
concordaram unanimemente em que se devia fazer alguma coisa para obrigar os
japoneses a parar. Após algumas discussões, ratificaram a proposta de King.

Mas continuava a existir o espinhoso problema do comando. Marshall desejava


que fosse MacArthur a conduzir a marcha para as ilhas Salomão; King insistia
em que a primeira fase, ou «Tarefa I» (nome de código. «Torre de Vigia» devia
ser chefiada pela Marinha. O chefe do Estado-Maior manteve-se firme. King,
após chamar a atenção para o fato de as forças a utilizar serem inteiramente
constituídas por elementos da Marinha e Marines, pôs Marshall frente ao que se
tornava equivalente a um ultimato: ou a «Torre de Vigia» era comandada pela
Marinha ou então não haveria «Torre de Vigia».

Perante isto, Marshall, por fim, deu o seu consentimento relutante e concordou
em deslocar o limite da Arca do Pacífico Sul de Ghormley que, originalmente,
passava através da ponta ocidental de Guadalcanal, um grau de longitude para
oeste.
A Nimitz foi, portanto, confiada a responsabilidade da Tarefa I e MacArthur foi
nomeado para executar as Tarefas II e III, a conquista das ilhas norte de Salomão
e de Rabaul. Ele deveria iniciar estas operações o mais rapidamente que lhe
fosse possível após ter vido concluída com êxito a Tarefa I. Uma ordem
definitiva para a primeira fase da operação foi distribuída cm 25 de Junho. O
futuro dia D era marcado para 1 de Agosto.

King não informara previamente os seus comandantes no Pacífico de que ele ou


outrem tencionavam lançar uma tal operação nesta data tão próxima. O contra-
almirante Richmond Kelly Turner, comandante previsto para a Força Anfíbia do
Pacífico Sul, nem sequer tinha chegado à área.

Mais tarde Ghormley escreveu:

«A primeira vez que tomei conhecimento do assunto foi no final de Junho,


quando recebi ordem para ir conferenciar com o general MacArthur acerca da
prevista conquista da área Guadalcanal-Tulagi. Tivesse eu sabido antes e o nosso
trabalho inicial no Pacífico Sul, quanto a planeamento de operações, a apoio
logístico e a recolha de informações, teria sido dirigido mais incisivamente para
o cumprimento do primeiro objetivo.» 33

A primeira «tomada de conhecimento» por parte de Vandegrift deu-se quando


ele passeava no gabinete do almirante Ghormley em Auckland. Ali lhe disseram
que a sua missão era capturar e defender Tulagi (nome de código RINGBOLI), a
área de Guadalcanal (CACTUS) que incluía o campo de aviação que estava a ser
afanosamente construído pelos japoneses e Ndeni nas ilhas de Santa Cruz. A sua
Força de Desembarque seria aumentada, quando a caminho da área-alvo, pelo 2.º
Regimento dos Marines (um regimento reforçado destacado da 2.ª Divisão de
Marines), pelo 1.º Batalhão de Raiders (então na Nova Caledônia) e pelo 1.º
Batalhão de Paraquedistas do 3.º Batalhão de Defesa.

Dois problemas prementes enfrentava agora o comando da Força de


Desembarque. O primeiro constituía em adquirir sem demora informações sobre
o terreno e o inimigo que o habilitassem a formular um esquema básico para
manobrar no interior do terreno. Disto dependia por completo a forma de
desembarque. Do esquema preparado então não era possível extrair planos
pormenorizados no que respeitava aos movimentos dos barcos, ao apoio aéreo
ou de fogo naval, à organização defensiva das praias e à complexa rede de
comunicações necessária para controlar e defender um desembarque do lado
oposto. Para coligir as informações sobre as quais deveria ser elaborado o seu
plano, o general enviou imediatamente para a Austrália o seu oficial de
informações, o tenente-coronel Frank B. Goettge.

Ao mesmo tempo recomendava ao almirante Ghormley que um grupo escolhido


de oficiais, mais algum experiente pessoal dos serviços de comunicações
acompanhado do respectivo equipamento, deveria voar imediatamente para
Townsville, na Austrália, embarcar aí num submarino e seguir até Guadalcanal
para entrar em contato com o observador de costa Martin Clemens. As missões a
executar por esta patrulha deveriam ser a investigação das marés e das condições
das praias, observar as atividades japonesas em Guadalcanal e informar as
disposições do inimigo bem como o seu potencial. Em virtude da escassez de
informações, esta iniciativa era não só lógica como razoável. Mas a sugestão foi
rejeitada pelo almirante Ghormley como «demasiadamente perigosa» 34.

Goettge, no entanto, voou para Melbourne onde o estado-maior de MacArthur e


o Governo australiano lhe forneceram a assistência possível. O comandante
Feldt deu instruções aos seus observadores costeiros para relatarem todo o
gênero de informações que se referisse aos movimentos marítimos e aéreos do
inimigo, ao seu potencial em Guadalcanal e Tulagi, à localização das instalações
japonesas e à rotina diária das forças de guarnição.

Enquanto o pessoal dos serviços secretos de MacArthur coligia todas as


informações que podia obter, Goettge teve entrevistas com antigos funcionários
coloniais, viajantes, capitães de escuna das ilhas, ex-missionários e empregados
da Lever Brothers e da Bum- Philp South Seas Traders que conheciam as ilhas.
Oito deles foram apressadamente integrados no estado-maior de Vandegrift.
Com a sua ajuda, a seção de informações elaborou um mapa tosco — uma mapa
muito tosco — da costa norte de Guadalcanal, de Taivu a Kukum. Um
fragmentário e incompleto esboço aéreo da área forneceu alguns pormenores
relativos ao terreno. Os relatórios diários dos observadores costeiros ampliavam
o quadro de conhecimentos acerca dos sistemas defensivos do inimigo que
pareciam ser primitivos e centrarem-se em torno de Lunga e Kukum.

O outro problema de Vandegrift era igualmente grave. O segundo escalão da sua


divisão vinha ainda no mar e não devia chegar a Wellington antes de 11 de Julho,
três semanas antes do estabelecido dia D. Os navios comerciais transportavam o
1.º Regimento de Marines da Divisão de Artilharia, tanques, tratores anfíbios, e a
maior parte do equipamento de engenharia que devia ser descarregado no cais de
Aotea antes de começar o combate.

Como a Marinha recusou o pedido de Vandegrift para os seus representantes


fiscalizarem o desembarque nos portos, o estado-maior da divisão tinha, quando
muito, uma ideia nebulosa do material que vinha em cada um dos barcos que
transportava o segundo escalão. Esta dificuldade só mais tarde poderia ser
vencida; a tarefa imediata era verificar o material de combate disponível nos
barcos que, com as unidades e equipamento, tinham já chegado a Tararua.

A desculpa dada aos neozelandeses para esta estranha pressa com que os marines
acabados de chegar às suas encantadoras ilhas se preparavam de novo para
partir, foi: «manobras anfíbias».

Em 2 de Julho, o almirante King, agindo como representante da Junta de Chefes


na Tarefa I, enviou a Nimitz uma ordem formal 35. Nesta, o objetivo final das
planejadas operações ofensivas era «conquistar e ocupar as áreas da Nova
Inglaterra, da Nova Zelandia, da Nova Guiné»; a sua finalidade «retirar a área ao
Japão». A Tarefa I era definida como «captura e ocupação das ilhas de Santa
Cruz, Tulagi e posições adjacentes». Não se fazia nenhuma menção a
Guadalcanal nem à necessidade de lá construir um campo de aviação. Nem a sua
carta de 9 de Julho ao comandante da Área e da Força do Pacífico Sul deu a
Nimitz quaisquer instruções relativas à construção de uma pista para a
aviação 36.

A questão que, tanto a Junta de Chefes como o almirante Nimitz, não podiam
esclarecer —ou pelo menos esclarecer de forma a satisfazer o almirante
Ghormley— era básica. Tratava-se exatamente de saber: qual era o objetivo final
desta instalação? Era defensiva: evitar que os japoneses se dirigissem para as
Hébridas e para a Nova Caledônia e dessas posições avançadas cortarem as
linhas de comunicação com a Austrália? Isto, afirmava repetidamente Ghormley,
era o que ele compreendia: retirar a área do domínio das armas japonesas. Mas
os chefes tinham afirmado claramente que a «Torre de Vigia» era o primeiro
passo da longa estrada que levaria a Rabaul. E sem dúvida era esta a ideia que
King expusera no seu memorando de Março ao presidente. Todavia, a história da
campanha revela que o almirante Ghormley nunca teve a certeza da utilização
que deveria dar à «área de Tulagi» uma vez que a tivesse sob seu domínio. E
sejamos justos para com o almirante: não era o único que se encontrava confuso.

A «Torre de Vigia» fora concebida, planejada e posta em andamento numa base


ruidosa em que o elemento de controle era o tempo. A reunião e a análise das
informações, a fixação das forças em jogo, as prolongadas conferências e os
meticulosos planos característicos das futuras operações no Pacífico,
distinguiram-se aqui pela ausência. Por isso, a primeira ofensiva aliada da II
Guerra Mundial estava destinada a revelar séries de improvisações quase
frenéticas e fatais. Este é o inevitável castigo que em guerra impende sobre
aqueles que, por qualquer razão, não realizam cuidadosos estudos ou planos
elaborados conscienciosamente.

Vários dias antes de ter recebido a carta de Nimitz de 9 de Julho, Ghormley voou
para Melbourne a fim de conferenciar com Douglas MacArthur. O almirante
estava pessimista. Concluíra que a «Torre de Vigia» era uma empresa duvidosa.
O planeado dia D, 1 de Agosto, caminhava a passos largos na sua direção; o
grosso da Divisão de Vandegrift vinha ainda no mar. O fator tempo não iria
permitir planos pormenorizados e a execução de atividades preparatórias que ele
considerava essenciais. Mesmo as elementares informações respeitantes ao
terreno, às condições marítimas e de tempo acerca da área-alvo escasseavam. Os
mapas e cartas disponíveis eram antigos, inseguros e, portanto, absolutamente
insatisfatórios. As tabelas das marés mostravam uma alteração estranha de
alguns pés que ocorria com imprevisível irregularidade. As únicas estimativas
quanto às forças, ao material e às instalações japonesas em Tulagi, Gavutu e
Guadalcanal eram apenas as fornecidas pelos observadores costeiros cada vez
mais localizados no interior das selvas e, que, por isso, eram de muito discutível
exatidão.

AS possibilidades japonesas de responderem a uma invasão das Salomão


inferiores não podiam ser postas a prova. Ghormley sabia que MacArthur não
dispunha da força aérea necessária para neutralizar Rabaul e Kavieng e muito
menos para impedir os reforços por mar a área Guadalcanal-Tulagi que podiam
vir de nordeste. AS forças designadas eram —ou pelo menos o almirante estava
disso convencido—insuficientes e nem sequer devidamente treinadas. Ele via
poucas hipóteses de que a projetada operação pudesse ser apoiada com
continuidade.

Na medida em que o plano logístico estava elaborado, Ghormley forçosamente


tinha de se mover numa espécie de vácuo. Para os almirantes em Washington,
«logística» era um termo que descrevia uma esotérica ciência peculiar ao
Exército. «Não sei que raio de coisa é essa da logística de que Marshall está
sempre a falar», dissera King no início da Primavera de 1942, «mas quero
saber.» O mesmo desejava Ghormley, mas os seus progressos não eram grandes.

«Um notável falhanço» no Departamento era o fato de que ninguém «tomou o


devido conhecimento do elemento tempo no fornecimento de material para o
trabalho de construção nas mais várias e adversas condições». Como resultado
dos adiamentos do Departamento, o único campo de aviação nas Novas Hébridas
capaz de apoiar, embora limitadamente, as operações estava situado em Vila, em
Efate 37.

O contra-almirante John S. McCain, comandante aéreo do Pacífico Sul,


comandava toda a aviação de costa atribuída a Ghormley. Mas era tão incapaz
como MacArthur de neutralizar o poder aéreo do inimigo na área em causa ou de
impedir os reforços por mar. A maior parte da aviação posta à disposição de
McCain era de curto alcance. Sem cisternas gigantes (não havia nenhuma no
Pacífico Sul) eles não podiam ir mais além do que às Salomão inferiores. Para
reconhecimentos a grande distância, McCain podia utilizar B-17, acompanhados
por dois esquadrões de hidraviões auxiliares Catalina.

O seu potencial de bombardeiros de longa distância era constituído pelos


mesmos B-17. Vinte e sete destas Fortress —o 11.º Grupo de Bombardeamento,
comandado por um corajoso e competente oficial da Força Aérea, o coronel La
Veme Saunders— tinham chegado recentemente à área. O Grupo de Saunders
estava separado: uns em Efate, outros na Nova Caledônia. Mas mesmo de Efate,
os B-17 tinham de voar 710 milhas antes de atingir a área alvo nas ilhas
Salomão.

As condições em que McCain e Saunders deviam trabalhar, teriam feito


desanimar oficiais menos determinados. E embora eles constituíssem uma
equipa agressiva, a vontade e a destreza não podiam compensar a ausência de
campos de aviação, de pilotos substitutos experientes ou tripulações aéreas, nem
a escassez de planos e peças de reserva e as primitivas disponibilidades de
material de manutenção de que dispunham os poucos mecânicos em serviço.

Esta formidável lista das circunstâncias existentes não é, de forma alguma,


exaustiva. Os membros do escasso estado-maior de Ghormley estavam tão
ignorantes como ele das complexidades do ambicioso assalto. O seu chefe de
estado-maior, o contra-almirante Daniel J. Callaghan, era um elegante e bem
parecido oficial cuja principal qualificação para o aludido posto residia no fato
de ter sido ajudante naval do presidente Roosevelt. O oficial do ar de Ghormley
era um jovem aviador inteligente e trabalhador mas muito novo e sem
experiência de operações anfíbias. O almirante não tinha também um quartel-
general adequado para exercer o comando. As possibilidades de comunicação
tática eram limitadas e não havia bastantes oficiais de observação nem
operadores para manobrar devidamente o material existente.

A Nova Zelândia não podia fornecer a alimentação que os planejadores de


Washington lhe haviam garantido que teria prontamente à sua disposição. Os
hospitais na área da retaguarda ainda não estavam prontos. A construção de um
porto avançado, de instalações de carga e descarga e armazenamento
encontravam-se ainda no plano das discussões. Enquanto o avião de Ghormley
se aproximava de Melbourne ele ia ordenando todas estas e outras objecções
para apresentar ao seu famoso colega.

Quando os dois homens se encontraram, MacArthur apressou-se a exprimir a sua


opinião. O general foi imediatamente ao cerne do problema, que ele considerava
corretamente ser a necessidade de se possuir completa superioridade aérea pelo
menos sobre a área alvo. Nenhuma operação daquele tipo, afirmava, podia ser
iniciada sem que fosse possível garantir-se positivamente a adequada cobertura
aérea e o contínuo apoio. Os japoneses diariamente aumentavam a sua força
aérea e terrestre em Rabaul e Kavieng. Confirmava assim as suspeitas de
Ghormley de que com os campos de aviação existentes e a força aérea de que
dispunha não podia neutralizar aquelas bases. O general chamou a atenção para
o fato de que a falta de navios levaria a não haver um fluxo constante de
fornecimentos e equipamentos necessários para garantir a segurança de qualquer
instalação em costa hostil. Acreditava que a realização vitoriosa da «Torre de
Vigia» «apresentava as maiores dúvidas». Em qualquer caso, concluiu
MacArthur, a concepção estratégica deixava muito a desejar. Pensava que as três
fases da arrancada das ilhas Salmão inferiores até Rabaul tinham de ser
efetuadas num «movimento contínuo», como uma onda que, uma vez iniciada,
prosseguiria em direção a noroeste com um movimento de bola de neve.

Em conclusão da sua discussão, os dois comandantes elaboraram e assinaram de


comum acordo uma informação para a Junta dos Chefes de Estado-Maior,
recomendando o adiamento da «Torre de Vigia». Os chefes, em algumas
palavras cuidadosamente escolhidas, rejeitaram imediatamente o conselho
proveniente de Melbourne. Achavam ser necessário deter os japoneses e detê-los
de uma vez para sempre: «não queriam revogar as operações em marcha e a
execução da Tarefa I». 38
Enquanto o almirante Ghormley conferenciava com o seu colega, em
Melbourne, os marines trabalhavam a contrarrelógio em Wellington a fim de
limparem as docas antes da chegada do segundo escalão da divisão. Com este
escalão chegaram as chuvas. Veio também a perturbação com os notavelmente
bem sindicalizados estivadores neozelandeses, cujos chefes, esquecidos dos
rogos do seu Governo, se recusaram a permitir que os seus homens trabalhassem
durante o «inclemente» tempo. Esta dificuldade não foi problema porque foi
peremptoriamente cortada. Os revoltosos chefes sindicais e os seus homens
foram evacuados das docas pela polícia de Wellington. Os marines trabalhavam
duramente em turnos de 8 horas e quando podiam ir à cidade divertiam-se
garatujando referências obscenas aos trabalhadores das docas da Nova Zelândia
nas paredes das casas de banho. «Todos os descarregadores são uns bastardos»
foi possivelmente a mais bem educada de todas as frases gravadas.

O cais de Aotea provocou uma indelével impressão a todos aqueles que o


visitaram durante esse infindável pesadelo. Sob luzes esbatidas, homens
encharcados trabalhavam afincadamente removendo caixas alagadas pela chuva
que continham peças de roupa, alimentos, medicamentos, cigarros, chocolates,
etc. Estas caixas vulgares constituíam as rações da Marinha e os mantimentos
dos marines, agora deteriorados um oficial recorda-se de ter passeado uma
centena de jardas através de um charco de flocos de aveia salpicados de caixas
de farinha Hersey, de esmagados pacotes de charutos, sapatos desirmanados,
molhos de peúgas encharcadas. A falta de tempo, as restritas possibilidades do
porto, o clima terrível, uma embalagem descuidada, um trabalho sem cooperação
juntaram-se para dar origem ao que Vandegrift descreveu em linguagem notável
pela sua moderação como «um problema logístico sem igual». Outros, usando
uma terminologia menos elegante descreveram a área do porto como «um charco
de merda».

Como não havia suficientes barcos, o equipamento individual e da organização


corria o risco de se perder. Todos os sacos de viagem, camas de campanha,
tendas, malas-armários e baús foram armazenados em Wellington. Os
fornecimentos posteriores tiveram de ser limitados a quantidades mínimas de
sabão, tabaco, fósforos e lâminas de barbear. Todos os demais fornecimentos —
rações, gasolina, lubrificantes— foram reduzidos para 60 dias e as munições
distribuídas por um período de 15 a 10 dias de tempo de fogo para todas as
armas. Nos termos da ordem da divisão, os elementos da Força de Desembarque
deveriam levar para bordo dos poucos barcos distribuídos «os artigos
absolutamente necessários para viver e combater».
Os serviços de informações deixavam ainda muito a desejar e no dia 15 de Julho
o tenente-coronel Merrill B. Twining, na companhia de outro oficial marine,
voaram para a Austrália e daí para Port Moresby. Em 17 de Julho os dois
embarcaram num Fortress para observarem a área alvo. Sobre Guadalcanal, o
bombardeiro foi assaltado por três hidraviões Zero e após ter incendiado dois
retirou levando atrás de si o sobrevivente. Twining apenas podia relatar que as
praias não se encontravam obstruídas e a pista que os japoneses estavam a
construir parecia já pronta.

Alguns dias antes, o coronel Charles A. Willoughby, oficial dos serviços de


informação de MacArthur, conseguira um minucioso mapa fotográfico de
Guadalcanal e Tulagi e considerava o projeto «ruinoso». Em 20 de Julho um
mapa das praias de Sunga fora preparado na Austrália. A embalagem que
continha este precioso mapa fotográfico foi mal endereçada e perdeu-se em
Auckland 39.

Neste interim — e mesmo antes ainda de o contra-almirante Turner ter chegado


a Wellington— Ghormley aceitara o plano básico de desembarque apresentado
por Vandegrift. O seu próprio plano, que não foi conhecido formalmente antes de
16 de Julho, ordenava à «Força Expedicionária» que no dia D devia capturar e
ocupar Tulagi e as «posições vizinhas», ou seja as ilhotas de Gavutu e
Tunambobo, e «um pedaço de Guadalcanal suficiente para a construção de
campos de aviação» 40. Esta construção devia ser iniciada «sem perda de
tempo». Depois, Turner desembarcaria um regimento de marines na indefesa
Ndeni nas ilhas de Santa Cruz, onde deveriam ser preparados «sem perda de
tempo» outros campos de aviação 41.

Mas o comandante do Pacífico Sul não tinha informação nenhuma acerca de


como as unidades aéreas deveriam operar a partir do campo que ele esperava que
os marines conquistassem. Além dos Wildcats de Bauer, agora sob as ordens de
McCain, Ghormley não possuía mais do que meia dúzia de cagas da Força
Aérea. O Grupo 23 do Grupo Aéreo dos Marines — dois esquadrões de caças e
dois de bombardeiros de mergulho —, comandado pelo coronel William J.
Wallace, estava em Havaí procedendo a manobras de partidas e largadas em
porta-aviões. Em 4 de Julho não existiam planos específicos sobre a forma como
deveriam agir os aviões no campo de Guadalcanal logo que este fosse
operacional. Na manhã do dia 5 de Julho, dois esquadrões de Marines, um de
caças e outro de bombardeiros de mergulho, foram alertados. Mas ninguém
parecia saber exatamente que estes aviões de alcance ligeiro estavam destinados
a atravessar milhares de milhas de oceano até chegarem à zona de ação
escolhida.

As variadas dificuldades encontradas quanto a carregamentos e recolha e exame


das informações existentes, na preparação e coordenação do complexo fogo
naval, do apoio aéreo e de planos de comunicação que eram absolutamente
necessárias para se ensaiar, levaram imediatamente Ghormley a requerer o
adiamento do dia D. A Junta de Chefes primeiro diferiu a data para 4 de Agosto
e depois para 7. King, agora totalmente informado acerca do progresso do
inimigo no campo de aviação de Guadalcanal, comunicava em termos inflexíveis
ser esta a última concessão e em 22 de Julho a armada invasora partia de
Wellington.

Chefiando a coluna ia o navio de Turner, McCawley, que dentro em pouco se iria


tornar conhecido pela alcunha do «Louco Mac». A meio da tarde de 26 de Julho,
a Força de Tarefa 62 de Turner encontrou-se com a 61 do vice-almirante Fletcher
ao largo de Koro, uma pequena e solitária ilha das Fiji que fora escolhida como
área de ensaio. Aqui estava prevista a troca de impressões entre os estados-
maiores, o aperfeiçoamento dos planos de apoio aéreo e de artilharia, a resolução
das dificuldades que afetavam as comunicações com o ar e com as forças
desembarcadas, a preparação de um fogo de cobertura e o ensaio dos processos
de desembarque.

AS conversações de acerto entre os comandos da primeira ofensiva aliada no


Pacífico não conduziram a execução vitoriosa de uma empresa tão complicada e
perigosa como a «Torre de Vigia». Ghormley, era, evidentemente, o comandante
supremo, mas delegara a execução da operação no vice-almirante Fletcher.
Diretamente sob as ordens de Fletcher, Turner comandava a «Força Anfíbia» —
a Força de Tarefa 62. Tanto Vandegrift, comandando a Força de Desembarque,
como o contra-almirante britânico V. A. C. Crutchley, comandando o Grupo de
Escolta (os cruzadores australianos Austrália, Hobart, Canberra, os americanos
Chicago e San Juan, mais nove contratorpedeiros) estavam sob as ordens de
Turner. Esta organização era, na altura, ortodoxa quanto a operações anfíbias.

Mas havia um ponto fraco muito importante. Tratava-se da anômala posição de


Turner em relação ao contra-almirante McCain, o comandante aéreo, que era
responsável apenas perante Ghormley. Se, por exemplo, Turner desejasse um
reconhecimento aéreo a grande distância ou missões de bombardeamento, teria
de pedir a Fletcher que pedisse a Ghormley que ordenasse a McCain que
executasse o desejado. A carga de dinamite que arderia quase toda na operação,
no entanto, encontrava-se em qualquer outra parte fora da estrutura do comando.

As forças que se reuniram ao largo de Koro no dia 26 de Julho nunca tinham,


anteriormente, operado juntas. O comandante da Força Expedicionária, o vice-
almirante Fletcher, não tinha experiência prévia deste tipo de operações para que
fora designado como comandante executivo. O almirante Ghormley não enviara
a «Carta de Instrução» a Fletcher, nem Fletcher (que acabava exatamente de
regressar ao Pacífico Sul após uma curta estada em Pearl Harbor) submetera
sequer um resumo de seu plano —se na verdade, tinham algum— ao exame de
Ghormley. O resultado foi que o comandante em exercício chegou a Koro com
uma total confusão acerca da natureza da «Torre de Vigia» e das suas
responsabilidades nela.

Estes equívocos poderiam ter sido evitados se Ghormley tivesse ido a Koro
presidir à conferência convocada pelo almirante Fletcher. Mas Ghormley estava
ocupado em Noumea atendendo a variados e aborrecidos pormenores que ele
poderia com vantagem ter confiado ao seu estado-maior. Neste período da
guerra, a maior parte dos oficiais navais de estado-maior não faziam a mínima
ideia do que era um estado-maior nem das suas funções e Ghormley não
constituía exceção. Falhou em não ter ido a Koro e esta sua primeira, mas não
última, abdicação da responsabilidade de comandante iniciou uma série de
trágicos e quase fatais acontecimentos.

Não há atas da conferência realizada a bordo do Saratoga em 26 de Julho, mas a


impressão que ficou tanto a Turner como a Vandegrift foi que Fletcher a
conduziu de maneira arbitrária. O relato posterior de Turner acerca do processo
da conferência não apenas consubstancia esta constatação mas também esclarece
as subsequentes ações de Fletcher. Num encontro anterior em Pearl Harbor «o
vice-almirante Fletcher opusera-se veementemente à empresa contra
Guadalcanal que ele acreditava vir a ser um fracasso». Em Koro ele «emitiu
muitas observações contra a execução do plano» e «acusou o contra-almirante
Turner de instigar o projeto».

«Então, o vice-almirante Fletcher perguntou ao contra-almirante Turner quantos


dias precisava para desembarcar as tropas. O contra-almirante Turner respondeu
que para o fazer necessitava de cinco dias. O vice-almirante Fletcher declarou
então que devia abandonar as vizinhanças das ilhas Salomão em dois dias, em
virtude do perigo dos ataques aéreos contra os porta-aviões e do problema do
abastecimento de combustível e que se as tropas não podiam ser desembarcadas
em dois dias, então não deveriam ser desembarcadas. De qualquer forma, ele
teria de partir a tempo [...] O contra-almirante Turner declarou que as tropas não
podiam ser desembarcadas em dois dias». 42

Vandegrift, aterrado com a perspectiva que a sua Força de Desembarque tinha de


enfrentar, a menos que a atitude de Fletcher se modificasse, fez objeções
violentas, tal como Turner, contra aquele diktat. Em vão tentou explicar a
Fletcher que a «Torre de Vigia» fora concebida para se conseguir uma instalação
permanente, que não se tratava de uma «força naval de desembarque em
manobras mas do desembarque de uma divisão em terreno hostil» que requeria
«uma cobertura aérea de um mínimo de quatro dias» a fim de se ter pessoal,
armas, equipamentos e mantimentos «instalados em terra». 43

O contra-almirante Callaghan, chefe do estado-maior de Ghormley que tinha


vindo de Nouméa, tomava notas em silêncio. Após anunciar que não aceitaria
mais queixas, Fletcher encerrou a conferência, se é que esta reunião assim se
pode chamar com propriedade. Assim, o relato demonstra que a reação do
almirante Fletcher acerca da «Torre de Vigia» foi pelo menos consistente:
opunha-se.

Isto põe em relevo as responsabilidades do almirante Nimitz nos


acontecimentos. Se, em Pearl Harbor, Fletcher expressou a sua opinião a respeito
da «Torre de Vigia» da forma inequívoca descrita por Turner, porque não apelou
Nimitz para outro comandante? Ou então por que razão Fletcher, que não
acreditava na operação, não pediu para ser substituído?

Os acontecimentos dos quatro dias seguintes nada trouxeram que mitigasse o


estado de choque verificado a bordo do Saratoga. O ensaio foi insatisfatório —
segundo as palavras de Vandegrift, «um fiasco», «um total fracasso». Os bancos
de coral impediram muitas unidades de desembarcar nas praias designadas,
muitos barcos avariaram por razões de ordem mecânica, o bombardeamento
aéreo foi desordenado, e o fogo dos barcos sem precisão. Turner e Vandegrift
ficaram desapontados, mas ambos, otimisticamente, agarravam-se à ideia de que
um mau ensaio pressagia um boa estreia e não se mostravam inteiramente
deprimidos. Cada um separadamente tomou as medidas que pôde para corrigir os
erros revelados na execução e retificar as brechas que o plano demonstrava; mais
tarde, combinaram as modificações a introduzir no processo de desembarque,
estabeleceram acordos e fizeram ajustamentos adicionais ao plano de
comunicações de mar para terra.

No fim da tarde do último dia de Julho, os barcos das Forças de Fletcher


assumiram uma disposição contra submarinos e iniciaram pelo sul a caminhada
para oeste. Nesse dia o Sol tombou envolto num disco vermelho e quente que se
assemelhava à bandeira de guerra japonesa, a «almôndega», um augúrio que,
segundo alguns adivinhos amadores, fazia prever um mau sucesso à expedição.
Outros, contudo, afirmavam que isso era sinal de êxito. Minutos depois, a
opressiva noite tropical envolvia a esquadra aliada.

Notas
1 Hora de Tóquio. A não ser que sejam especificamente indicadas, todas as horas
são locais.

2 Tribunal Militar para o Extremo Oriente. Documento apresentado n.° 802.

3 Força de ataque a Pearl Harbor — Vice almirante Chuichi Nagumo.

FORÇA DE ATAQUE — Vice-almirante Nagumo

Navios de transporte: Akagi (navio almirante), Kaga, Soryu, Hiryu, Zkuikatu,


Shokalcu.

FORÇA DE APOIO — Vice-Almirante Gunichi Mikawa

Navios de guerra: Hiei, Kirishima

Cruzadores pesados: Tone, Chikuma.

FORÇA DE RECONHECIMENTO — Contra-almirante Sentaro Omori

Cruzador de pequena tonelagem: Abukuma

Contratorpedeiros: Tanikaze, Hamakaze, Urakaze, Asakaze, Kagero, Shiranuki,


Akigumo.

FORÇA DE REABASTECIMENTO

Ito, Masanori; Pineau, Roger; Kuroda, Andrew W. O fim da Esquadra Imperial


Japonesa (Nova Iorque: W. W. Norton & Cotnp., Inc., 1962), pp. 31 e 32.

4 Quando King comandava a Força Aérea, nos últimos anos de 1930, corria uma
história que dizia que logo após o almirante ter ido para o Céu, um aviador naval
foi bater à porta daquele. Foi recebido por S. Pedro que o informou que sendo
aquele o único sítio seguro, tinha sido transformado e reorganizado numa área de
treino de combate para militares. «Não estou surpreendido», replicou o aviador,
«Ernie King sempre pensou ser o Deus Todo-Poderoso.» «Não é esse o nosso
problema», replicou S. Pedro, «é muito pior que isso. Deus Todo-Poderoso é que
pensa que é Ernie King.»

5 King, almirante Ernest J., e Whitehill, comandante Walter M. Almirante Ernest


J. King, Uma Recordação Naval. (New York: W. W. Norton & Comp., Inc.,
1942).

6 Comandante-Chefe da Armada dos Estados Unidos, posteriormente Cominch.


O gabinete fora abolido a 1 de Fevereiro quando as esquadras dos oceanos
Atlântico, Pacífico e Índico foram criadas como esquadras independentes. O
título prévio era CincUS. Por razões óbvias depois de Pearl Harbor, King julgou
esta denominação, que significava «afundados», singularmente inapropriada.

7 Abreviatura designativa de comandante-chefe no Pacífico. (N. do T.)

8 «ABC» era o título resumido dado às conversações anglo-americanas de


Janeiro de 1941, e tinham o nome de código de «Arcadia».

9 Bryant, Artnur, O Volver da Maré (Garden City, N. Y. Doubleday and Co.,


Inc., 1957), pp. 446 n.

10 King e Whitehlll, Op. cit., p. 3112.

11 Ibid., p. 3113.

12 Ibid., p. 385.
13 Bryant, op. cit., p. 288. Contudo Alan Broke (como era então chamado) não é
uma fonte inteiramente digna de ser acreditada, quanto às informações que dá a
respeito dos motivos ou do comportamento do almirante King. Para
apresentarmos o caso corretamente, poderemos dizer que o CIGS não era um dos
mais entusiásticos admiradores do almirante americano.

14 Ghormley, Vice-almirante Robert L. Manuscrito não publicado (Gabinete dos


Dossiês e Livraria Naval, Arlington, Virgínia), p. 1.

15 Uma vez, Roosevelt descreveu King com estas palavras. Corria uma história
em Washington que dizia quo o presidente procurara, para oferecer a King no dia
do seu sexagésimo quarto aniversário, um pequeno maçarico.

16 Nampo Sakusen Riku Kaigun Chuo Kyotai — «Acordo Central de


Cooperação entre a Armada e o Exército para as áreas do Sul.» Concluído a 10
de Novembro de 1941. Acordos semelhantes foram posteriormente referidos ao
«Acordo Central».

Os japoneses não tinham nenhum organismo como o Estado-Maior da Junta de


Chefes, responsável pela orientação estratégica da guerra. Existiam duas
«Secções» ou «Divisões» no Quartel-General Imperial. Eram a Secção do
Exército (Dai Honei Rikugunpu) e a Secção da Marinha (Dai Honei Kaigunpu),
às quais presidiam respectivamente os chefes do Estado-Maior General da
Marinha (Rikugun Sanbo Honpu) e do Estado-Maior General do Exército
(Kaigun Gunreipu). O conceito estratégico, objetivo e esfera de ação de cada
operação, o perfil do plano e a colocação das tropas eram decididos através de
uma consulta às secções, sendo o trabalho preliminar invariavelmente feito pelas
seções subalternas do Quartel-General. Quando os dois chefes chegavam a
acordo, era preparado um «Acordo Central» na base do qual os chefes emitiam
as diretivas complementares aos serviços de comando responsáveis. Por sua vez
estes eram consultados como instrumentos dinamizadores da ação.

Agradeço penhoradamento ao tenente general Suichi Miyazaki esta descrição do


funcionamento do GQG Imperial.

17 O Destacamento dos Mares do Sul, que mais tarde desempenharia importante


papel na Nova Guiné, era composto por um quartel-general de grupo de
infantaria, um regimento, um batalhão de artilharia de montanha, uma
companhia de engenharia, cavalaria e transportes. A força total compunha-se
aproximadamente de 5000 homens, incluindo oficiais.

18 Nesta altura as designações americanas Zero, Emily, Betty, etc., usadas para
identificar os aviões da força aérea japonesa, ainda não estavam disseminadas.
Mais tarde, a todos os caças fórum dadas designações masculinas (Zero foi
transformado em Zeke); todos os outros tipos tiveram nomes femininos.

19 O Mitsubishi modelo Zero, era um caça da Marinha, manobrável, que voava


bem e tinha bom poder de viragem. O seu armamento era bom: dois canhões de
20 mm e duas metralhadoras. Contudo a carlinga não era blindada e os tanques
de combustível não permitiam que ele se afastasse muito da respectiva base. O
Zero não podia «comandar uma formação» e as balas incendiárias facilmente o
tornavam pasto das chamas.

O bombardeiro naval Betty, bimotor, da Mitsubishi, era facilmente inflamável, e


passível de desempenhar planos de ataque duplos pois podia ser armado com
torpedos ou com bombas.

O Kawanishi era um hidravião vagaroso, pesado, e tinha como missão fazer


reconhecimentos a longa distância.

20 GQG Imperial, Diretiva à Marinha n.° 47, de 29 de Janeiro de 1942, dirigida


ao almirante Yamamoto.

21 Os cruzadores pesados japoneses da classe do Miyako deslocavam 10 000 t


sem combustível, munições e comida, e mediam ao todo 640 pés. A sua
velocidade era de cerca de 32 nós. Os navios tinham dez canhões de oito
polegadas cada, montados em cinco torres, e oito tubos de torpedos. Tal como no
caça Zero, o projeto sacrificou a blindagem em proveito da velocidade e do
poder de manobra. Nenhum navio de combate japonês estava nesta altura
equipado nem com instrumentos de pesquisa nem com controle de radar para o
tiro. Haguro era um navio igual ao Miyako. Jane’s Fighting Ships (Londres:
Sampson Low, Marston & Comp., Lt., 1940. Ed. Francis E. McMurtie, A. I. N.
A. ), p. 310.

22 Daikairei Dai Jukyogo (GQG Imperial. Ordem para a Marinha N.° 19, 1942).

23 Fuchida, Mitsuo, e Okuniya, Masatake. Midway — A Batalha que Derrotou o


Japão. Editado por Clarke Kawakami e Roger Pinoau (Instituto Naval
Americano, Annapolis, Marilandia. Terceira edição, Novembro de 1955).
24 Clemens, Martin. Manuscrito não publicado, p. 50.

25 Clemens, Martin. Manuscrito não publicado.

26 Segundo o capitão Toshikazu Ohmae, oficial de operações da 8.ª Esquadra,


havia nesta altura 2571 oficiais e homens nas 11.ª e 13.ª Bases de Unidades de
Construção na ilha. Toshikazu Ohmae, A Batalha da Ilha de Savo. Editado por
Roger Pineau, com notas esclarecedoras pelo vice-almirante Gunichi Mikawa
Processos do Instituto Naval Americano, Annapolis, Marilândia, Dezembro de
1957).

27 Vandegrift não foi oficialmente informado senão a 23 de Abril de 1942, pela


série CMC 003D11342 dessa data. É interessante notar que como o «serviço de
correio não regular» era eficaz, este documento foi enviado como
correspondência registada.

28 Série Cominch 00322 de 29 de Abril de 1942: «Plano Básico para o


Estabelecimento no Pacífico Sul de uma Força Anfíbia». Gabinete dos Dossiês
Navais e Livraria (posteriormente ONRL), Arlington, Virgínia.

29 Originalmente «Caixa de Cartão». «Lobo Solitário» é revelador.

30 O. S. S. Electra largou de Norfolk a 10 de Maio de 1942; o Wakefield, dez


dias mais tarde.

31 O S. S. Del Brazil largou de Nova Orleans a 12 de Maio.

32 Os marines que viajaram no navio fretado M. V. John Ericsson desde San


Francisco passaram um mau bocado. Tiveram de comer manteiga rançosa, ovos
podres, carne estragada, sem alimentos frescos. Centenas deles foram atacados
de disenteria e todos davam indícios de subalimentação. Os proprietários do
navio e o capitão foram posteriormente enviados para a penitenciária.

33 Ghormley, op. cit., p. 9.

34 Correspondência do General Merrill B. Twining, U. S. M. C. (reformado).


Twining era nesta altura tenente-coronel, assistente G-3 da Primeira Divisão
Marine. Posteriormente esta fonte é citada como «Correspondência de Twining».
Usei a designação «G» para as Secções de Estado-Maior. Nesta época o Corpo
de Marines usava a designação «D» para indicar as Secções de Estado-Maior de
uma Divisão de Marines.

35 Cominch 022100, Julho 1942, ONRL.

36 Cincpac. Instruções «Torre de Vigia» para o ComSoPac de 2 de Julho de


1942, ONRL.

37 Ghormley, op cit. Os itálicos são seus. Ele encontrou uma falha


particularmente grave no Gabinete do Aeronáutica cujo chefe era o contra-
almirante John H. Towers, U. S. N.

38 Ghormley, op. cit., p. 52.

39 O mapa foi mais tarde conseguido e entregue em Dezembro ao G-2 da 1.ª


Divisão, após esta ter chegado à Austrália vinda de Guadalcanal.

40 ComSoac, Plano Operacional 1-42, 16 de Julho de 1942, «Torro de Vigia».


ONRL. Em Mar de Coral, Midway e Missões de Submarinos (Volume IV da
História das Operações Navais dos Estados Unidos durante a II Guerra
Mundial), o contra-almirante Samuel Eliot Morison discute o plano da operação
e escreve (p. 268) que, após Turner ter assumido o comando da Força Anfíbia
em Wellington, em 18 de Julho, ele e o seu pequeno estado-maior «começaram
imediatamente a planear os desembarques, trabalhando dia e noite. Este
almirante, tal como o presidente Roosevelt, tinha uma igual capacidade quer
trabalhasse em planos de grande envergadura quer trabalhasse apenas em
detalhes, e embora esta fosse a primeira operação anfíbia da guerra, ele planeou
cuidadosamente o emprego de cada barcaça de desembarque, os tempos exatos e
os cálculos da potência de fogo necessária que a força naval de apoio deveria
utilizar». A dedução a tirar é que até então não existira tal plano. Mas a verdade
é que os planos completos para o desembarque de pessoal, equipamento e
víveres, emprego de navios, potência de fogo naval e proteção aérea,
organização das praias, etc., foram esboçados antes da chegada de Turner pelas
divisões de reconhecimento do estado-maior de Vandegrift. Nesta altura o
almirante Turner desconhecia quase completamente o processo de planeamento
de um desembarque anfíbio. Ele e o seu estado-maior trabalharam sem dúvida
alguma «dia e noite» durante o héctico intervalo em Wellington, mas o
merecimento da preparação dos planos, múltiplos e detalhados, deve
imparcialmente ser dado àqueles que o conquistaram.

41 De fato, as diretrizes relativas à construção do aeroporto foram insertas a


instâncias da Seção do Operações de Vandegrift.

42 Administração Naval dos Estados Unidos para a Segunda Guerra Mundial.


Comandante-chefe, Frota do Pacífico, Força Anfíbia, Vol. I (não publicado),
ONRL.

43 Correspondência. General Alexander A. Vandegrift, U. S. M. C. (reformado).


LIVRO II

4. UMA ESQUADRA GRANDIOSA

Ao dealbar de 7 de Agosto, o vigia costeiro Martin Clemens foi despertado


subitamente pelos ecos surdos de explosões distantes. Sem perder tempo com os
costumados ritos matinais do chá, agarrou no binóculo e saiu da sua cabana de
telhado de colmo, na encosta da montanha. Acima de Tulagi, onde unidades de
fuzileiros comandados pelo general de brigada Rupertus se preparavam para
desembarcar, erguiam-se novelos de fumo negro. Embora picos escarpados e
grandes árvores da selva lhe ocultassem Lunga Point, Clemens desfrutou uma
visão panorâmica de uma grande esquadra, ao largo das praias de Guadalcanal.
Essa «cidade nas inconstantes vagas a dançar» 1 constituía a mais poderosa força
de ataque anfíbio jamais reunida. Ali, em Lunga Roads, ao largo das ilhas
Florida e Savo, concentrara-se «uma esquadra grandiosa» — cruzadores,
contratorpedeiros e transportes de tropas e de mantimentos—, para o primeiro de
muitos ataques semelhantes às linhas inóspitas e desconhecidas do longínquo
Pacífico.

Enquanto as barcaças cinzentas que transportavam a força de desembarque


avançavam, calculadamente, para posições escolhidas, o almirante Crutchley
dispunha os seus cruzadores e contratorpedeiros a nordeste e a sudoeste da ilha
de Savo, a fim de proteger as áreas de transporte de possível e súbita incursão de
submarinos inimigos e de intensificar a defesa antiaérea na via de acesso mais
provável. Anteriores experiências, no Atlântico, tinham tornado este almirante
inglês particularmente susceptível à ameaça de submarinos. Calculava que
submersíveis japoneses operavam nas imediações e previa rápida e violenta ação
aérea.
Cem milhas a sul de Guadalcanal, o Apoio Aéreo de Fletcher manobrava,
enquanto os porta-aviões Saratoga, Wasp e Enterprise, protegidos por patrulhas
aéreas de combate (CAP), lançavam e recolhiam, com metódica precisão, caças
e bombardeiros de mergulho. O novo e veloz couraçado North Carolina,
coadjuvado por seis cruzadores, protegia os porta-aviões. Dezesseis
contratorpedeiros, com o sonar a sibilar e os homens das cargas de profundidade
a postos, estavam prontos para acolher devidamente quaisquer intrusos
submarinos.

Clemens ligou o seu rádio. O ar vibrava, com as transmissões dos tripulantes dos
aviões de reconhecimento, em voo, a ajustar o fogo dos barcos. Quando
bombardeiros de mergulho largavam as suas cargas e se afastavam, os pilotos
anunciavam, exultantes, os alvos atingidos e pediam que lhes indicassem outros.
No porto de Tulagi, afundavam-se sete Kawanishis ancorados e estavam
danificados nove hidraviões Zero. Tanques de combustível, atingidos por balas
incendiárias, esguichavam nuvens de fumo oleoso; um aglomerado de barracas,
com telhados de chapas de ferro ondulado, foi pelos ares; velhos armazéns, na
doca, vomitavam chamas...

Sobre as praias de Guadalcanal, aviões de reconhecimento catapultados, ao


nascer do dia, do cruzador Autoria, passavam a rasar por cima das filas bem
alinhadas de coqueiros. Os seus observadores anunciavam não haver sinais de
atividade inimiga, informação recebida com natural e considerável ceticismo
pelos oficiais do estado-maior divisionário. No entanto, os relatórios negativos
estavam corretos. Os americanos tinham conseguido o que qualquer comandante
devia sempre ambicionar: completa surpresa tática.

O fato de a esquadra de Turner ter chegado à área do seu objetivo sem ser
descoberta deveu-se, em parte, ao cuidadoso planeamento. A via de acesso,
calculada para reduzir as possibilidades de detecção por aviões japoneses em
patrulhas de rotina sobre o mar de Coral, conduziu a força de ataque, na tarde de
6 de Agosto, a um ponto bem ao sul de Guadalcanal e a uma zona batida pelo
temporal. A coberto da chuva e da escuridão, os barcos viraram para norte e
seguiram a toda a velocidade para o cabo Esperança, a ponta noroeste da ilha.
Depois de contornarem o cabo, viraram 90 graus para leste e penetraram na área-
alvo.

A Força Anfíbia teve sorte: a chuva forte que ocultou os barcos desviou também,
em 5 e 6 de Agosto, as buscas aéreas nipônicas de Rabaul para o sueste. O
relatório das operações menciona apenas, laconicamente: «Buscas canceladas
por via da inclemência do tempo.» A patrulha de busca de Tulagi —três
Kawanishis de longo raio de ação— levantou voo em 6 de Agosto, mas passada
uma hora as nuvens baixas e as rajadas de vento obrigaram todos os aparelhos a
regressar. Os pilotos anunciaram que a visibilidade era inferior a dez milhas,
com tetos de nuvens que chegavam a estar apenas a trinta metros de altitude:
«Resultado das buscas: negativo.»

Em Guadalcanal, os japoneses adormecidos só perceberam que o inimigo se


aproximava quando as granadas do cruzador Quincy explodiram nas palmeiras a
cuja sombra tinham erguido as suas tendas.

Eram 6.41 h. da manhã de 7 de Agosto de 1942. Enquanto as bombas lascavam


coqueiros e fragmentos de aço se enterravam furiosamente na terra, barcos
fizeram-se ao largo da Red Beach e tripulações começaram a preparar e a descer
as barcaças de desembarque. Pelos megafones saíram as palavras que nos
próximos dois anos e meio seriam repetidas tantas vezes: «Desembarcar a força
de desembarque.» Milhares de tensos fuzileiros navais, reunidos em «equipas de
barcos» de 36 homens, começaram a dirigir-se, devagar e em silêncio, para as
redes de carga suspensas das cobertas dos transportes de tropas. O mar estava
calmo e o desembarque decorreu com rapidez e ordem.

As embarcações carregadas afastaram-se dos transportes, rumaram a zonas de


reunião, onde formaram em «grupos de barcos», e quando foi dado o sinal
dirigiram-se para a praia, em levas regulares. Todas as embarcações
atravessaram no tempo previsto a linha de partida. Os timoneiros ligaram os
motores e os fuzileiros, suados, acocoraram-se. Roncavam aviões, a levantar
voo, e os barcos ajustavam o tiro para alvos no interior.

Às 9.09 h., um minuto antes da «hora zero», os cascos da primeira vaga de


barcos tocaram na areia branca da praia, as rampas caíram na água morna, azul-
esverdeada, e os homens, libertos, enfim, do tédio da interminável espera,
começaram a avançar devagar, com as armas erguidas bem acima da água, na
direção de uma sossegada faixa de praia, ao fundo da qual se viam coqueiros
despedaçados pelos bombardeamentos. Estes fuzileiros, o Grupo de Combate
«A» (l.º e 3.º batalhões, 5.º de Fuzileiros Navais), comandados pelo coronel
LeRoy P. Hunt, veterano muito condecorado de uma guerra anterior, chegaram a
Red Beach sem encontrarem oposição numa frente de quase 1800 metros. A
esperança de Vandegrift — desembarcar onde o inimigo não estivesse— tornam-
se, assim, realidade.

Depois desta guarda avançada desembarcou o «Grupo de Combate «B» —l.º de


Fuzileiros Navais—, comandado por Clifton B. Cates, outro coronel que também
ganhara fama em França. O regimento de Cates desembarcou numa coluna de
batalhões, passou através do 5.º de Fuzileiros e começou a avançar para o
«Grassy Knoll» (monte Austen), uma elevação que, do sul, dominava o
aeródromo. Pouco depois de desembarcar, Cates verificou que esta posição
chave, o seu primeiro objetivo, não ficava, como os mapas indicavam
erradamente, a menos de duas milhas para o interior, mas, sim, quase a quatro. À
medida que o seu regimento progredia, o calor aumentava e o andamento das
tropas adquiria uma cadência lenta, arrastada e irregular.

O desembarque continuou sem qualquer contratempo, até ao meio-dia.


«Excepcionalmente bem sucedido», escreveria, mais tarde, Vandegrift. As
operações «desenrolaram-se com a suavidade e a precisão de um treino bem
ensaiado, de tempo de paz». A concentração de barcaças, organizada por
insistência sua, «funcionou admiravelmente». Mas este quadro idílico não tardou
a modificar-se. À medida que peças de artilharia, tanques, jipes, camiões e carros
anfíbios avançavam para o interior, amontoavam-se alarmantemente na Red
Beach caixotes de equipamento, caixas de mantimentos e tambores de gasolina.

Inexperientes timoneiros da Marinha levavam barcaças carregadas de rações


para pontos destinados a receber combustível, enquanto os medicamentos eram
descarregados, sem cerimônia, de mistura com munições. Os fuzileiros
desembarcados nas últimas levas andavam pela praia, à espera do sinal de
avançar para o interior. Uns nadavam, outros partiam cocos e outros limitavam-
se a sentar-se e a observar a reduzida força de terra, que se via e desejava para
transportar a carga preciosa das barcaças para o abrigo dos coqueiros. «Com os
diabos, Mac, nós somos tropas de combate! Descarreguem vocês essa porcaria.»
Estes ociosos ainda não eram tropas de combate, mas sê-lo-iam em breve.

Aliás, o eventual auxílio dos preguiçosos observadores dificilmente conseguiria


fazer mossa na desordem de todo aquele amontoado. A verdade crua é que não
havia nem braços nem rodas suficientes para transportar centenas de pesados
caixotes das embarcações para os depósitos. O que começou por ser
congestionamento acabou por se transformar em caos. A meio da tarde, cem
barcaças carregadíssimas dançavam nas ondas suaves, a pouca distância da
praia, enquanto os timoneiros procuravam em vão uma língua de areia
desimpedida, para desembarcar. Assim, embora o desembarque das tropas se
tivesse desenrolado com uma precisão que ultrapassara todas as expectativas, a
morosidade progressiva das operações logísticas criou um problema de
monumentais proporções e proporcionou à aviação inimiga alvos excelentes.

Vandegrift tinha perfeita consciência de tal situação, mas não podia fazer nada
para a remediar. Desembarcara apenas cinco batalhões de infantaria em
Guadalcanal, e destes conservava, necessariamente, um de reserva. As tropas de
assalto ainda não tinham chegado ao aeródromo, cujos defensores tampouco
haviam, também, revelado a sua força ou as suas posições. O general não teve,
portanto, outro remédio senão manter a sua pequena força de desembarque sob
firme controle. Ceder homens que poderiam ser necessários num combate para
resolver o problema cada vez mais grave da Red Beach não seria um risco
consciente e calculado: seria um risco absolutamente injustificável.

Quando as primeiras bombas explodiram em Tulagi, os emissores japoneses


começaram a anunciar que a ilha se encontrava sob violento ataque de ar e mar,
que uma grande esquadra atacava Guadalcanal e que estavam iminentes
desembarques inimigos. Às 8.05 h., Rádio Tulagi avisou Rabaul de que os
americanos estavam a desembarcar. «E, assim, foi recebida a última e tocante
mensagem, com preces por uma batalha decisiva, até ao último homem, e por
perenes êxitos de guerra. Depois as comunicações cessaram.» 2 O quartel-
general de Rabaul reagiu imediatamente. Enquanto o comandante da 25.ª
Flotilha Aérea da Marinha, com base em Vunakanau, instruía os seus pilotos, o
vice-almirante Gunichi Mikawa, comandante da 8.ª Esquadra, ordenava, pela
rádio, ao contra-almirante Aritomo Goto, cujos quatro cruzadores pesados
estavam em Kavieng, que zarpasse imediatamente, a velocidade de
contornamento, para um rendez-vous perto de Rabaul. Entretanto, reunia um
grupo heterogêneo, com unidades locais disponíveis, e ordenava o início
imediato do embarque. Estas tropas, que incluíam parte da 5.ª Força Especial de
Desembarque da Armada, de Sasebo, embarcaram em diversos transportes, o
maior dos quais era o Meiyo Maru 3, de 5600 toneladas.

Enquanto os desembarques americanos prosseguiam, os aviões da 25.ª Flotilha


Aérea, previamente armados para um voo de rotina sobre Port Moresby, viraram
para sueste, em Rabaul. Este grupo de ataque era constituído por 27
bombardeiros bimotores Betty, protegidos por 18 Zeros. A sugestão de urgência
colhida de uma ordem do almirante Yamamoto impressionou de tal modo o
comandante da esquadrilha que ele decidiu seguir viagem sem trocar as bombas
por torpedos — um bambúrrio monumental para os transportes de tropas de
Turner.

Às 10.30 h. de 7 de Agosto, a força de ataque japonesa, com ordens para


«destruir a força invasora inimiga com todo o seu poderio», passou mesmo por
cima do vigia costeiro P. E. Mason, de serviço nos montes do sul de
Bougainville, o qual, menos de dez minutos depois, transmitia, pelo circuito
«Bells», o seguinte aviso: «De S T O. Vinte e quatro bombardeiros-torpedeiros
seguem para aí.»

O desembarque de equipamento e munições cessou e os desajeitados barcos de


Turner tomaram as posições adequadas para a defesa antiaérea. Quando o ataque
começou, quarenta e cinco minutos depois, os barcos americanos estavam
prontos e manobravam a toda a velocidade. Graças ao aviso de Mason,
concentrou-se sobre a ilha de Savo, cerca de 20 milhas a noroeste da área visada,
uma forte patrulha aérea de combate, pronta a atirar-se aos japoneses. O inimigo,
a bombardear um pouco à toa, apenas logrou infligir estragos insignificantes ao
contratorpedeiro Mugford. Poucos Bettys escaparam.

A meio da tarde, Mason anunciou que vinha a caminho uma dúzia de


bombardeiros de mergulho, sem escolta. Mais uma vez os barcos estavam
preparados para o ataque e os caças a postos. Os pilotos de Fletcher anunciaram
que tinham derrubado quatro e os artilheiros navais gabaram-se, jubilosamente,
de igual número do «certos». Na realidade, porém, foram três bombardeiros
derrubados em combate. A seis outros acabou-se-lhes o combustível, no regresso
à base, e caíram. Os pilotos não foram salvos.

Dos 51 aviões saídos, nesse dia, de Rabaul, 30 não regressaram. Entre os pilotos
regressados encontrava-se Saburo Sakai, o maior às da aviação japonesa. O seu
Zero, apesar de muito atingido, ainda voava. Cego de um olho e a sangrar de
múltiplos ferimentos, Sakai conseguiu, mercê de tremendo esforço de vontade,
chegar a Vunakanau, onde aterrou, a derrapar, e desmaiou. Foi o seu primeiro e
último combate sobre Guadalcanal.

As inesperadas notícias recebidas de Tulagi não alarmaram por aí além o


Quartel-General Imperial, que calculou não serem mais de 2000 os soldados
americanos e julgou tratar-se, provavelmente, de «um reconhecimento em
força». O Quartel-General estava convencido de que, mesmo a ter-se dado um
desembarque em grande escala, não seria difícil reconquistar as posições
perdidas. O chefe do Estado-Maior Naval vestiu o uniforme de gala e dirigiu-se
à residência estival do imperador, em Nikko, a fim de informar Hirohito de que
não havia motivo para alarme.

Os cálculos errados do Estado-Maior do Exército foram, até certo ponto,


desculpáveis. A Marinha não só ocultara ao Exército toda a extensão da tragédia
do Midway, como também aumentara de tal modo as perdas de barcos e aviões
americanos, nessa batalha, que a hierarquia militar se convencera de que a
Marinha americana ficara reduzida a um estado de desesperada impotência.
Baseados nas informações prestadas pela Marinha, os planejadores militares
japoneses tinham concluído que os Estados Unidos não poderiam empreender
uma ofensiva séria, no Pacífico, antes dos princípios de 1943. As escaramuças
nas ilhas Salomão não chegavam para aconselhar a necessidade de rever tal
cálculo.

Por incrível que pareça, a Marinha nunca comunicara ao Exército que estava a
construir um aeródromo em Guadalcanal. Quando o coronel Takushiro Hattori,
então adjunto do chefe da Divisão de Operações do Estado-Maior General do
Exército, chegou ao seu gabinete, em 7 de Agosto, ficou surpreendido ao saber
que unidades de construção de bases aéreas navais trabalhavam havia algum
tempo «nesta insignificante ilha dos mares do Sul, habitada apenas por nativos».
A opinião militar de ser «inconcebível» que os desembarques americanos
«excedessem o âmbito de um reconhecimento em força» resultou, pois, em
parte, do fato de o Exército ter sido induzido em erro pela Marinha. Apesar
disso, o Exército e a Marinha concordaram que os americanos deviam ser
repelidos antes de poderem utilizar o praticamente concluído campo de aviação,
e o general Sugiyama passou a manhã de 7 de Agosto à procura de uma unidade
conveniente, para mandar expulsar o inimigo.

Ao mesmo tempo, o almirante Nagano enviou instruções urgentes ao


comandante-chefe da Esquadra Combinada. Em obediência a essas instruções,
Yamamoto formou uma Força Aérea do Sueste; telegrafou ao vice-almirante
Nishizo Tsukahara, comandante da 11.º Esquadra Aérea, com quartel-general em
Saipan, a ordenar-lhe que voasse imediatamente para Rabaul, a fim de assumir o
comando; recomendou que se desse prioridade absoluta à recaptura de
Guadalcanal, e ordenou que todos os barcos e aviões disponíveis se preparassem
para um contra-ataque decisivo.

Ao fim da tarde, o 1.º de Fuzileiros ainda estava muito longe de «Grassy Knoll»,
e Vandegrift ordenou a Cates que parasse, fortificasse e cavasse abrigos para
passarem a noite. A paragem era absolutamente necessária. Os homens, que
tinham passado duas semanas nos porões sufocantes dos transportes de tropas
superlotados, encontravam-se em deploráveis condignos físicas.
Sobrecarregados com mochilas pesadíssimas e munições extra, arrasados pelo
calor e pela entorpecedora humidade e com falta de água e de pastilhas de sal,
não estavam em estado de continuar a avançar, e muito menos de combater. Por
sorte, os fuzileiros de Cates não encontraram quaisquer japoneses na sua
primeira tarde em terra.

O progresso do 5.º de Fuzileiros não foi mais fácil. Não obstante as repetidas
exortações do comandante, o 1.º Batalhão avançou para oeste a uma velocidade
exasperantemente baixa. No entanto, ao cair da noite, este batalhão atingira o seu
objetivo daquele dia: a margem leste de Alligator Creek, um regato vagaroso,
cerca de duas milhas a oeste de Red Beach.

Enquanto, no primeiro dia da primeira ofensiva do Pacífico, os fuzileiros de


Guadalcanal não encontraram nenhum inimigo, as coisas passaram-se de modo
diferente do lado da Florida. Como era aí que se esperava a oposição mais
concentrada, Vandegrift distribuiu, assim, as suas unidades melhor treinadas e
mais agressivas: 1.° de Raiders, de Edson, para Tulagi, e 1.º de Paraquedistas, do
major Robert H. Williams, para o ilhéu-porto de Gavutu.

A fim de proteger o flanco esquerdo dos raiders, quando desembarcassem na


Blue Beach, às 8 h., a Companhia Baker, 1.º Batalhão do 2.º de Fuzileiros
(tenente-coronel Robert E. Hill), deveria apoderar-se, antecipadamente, do
promontório Haleta, na vizinha Plorida. De modo a proteger os paraquedistas
durante o trajeto de barco para Gavutu, aonde chegariam às 11 h., o resto do
batalhão de Hill ocuparia, antes dessa hora, uma posição de cobertura na ponta
da península Halavo. Este plano, que não deixava de ter as suas complicações,
estava escalonado de maneira a permitir a utilização mais favorável possível da
artilharia naval e da aviação de ataque. Oito barcaças com a companhia do
capitão E. J. Grane chegaram a Haleta escassos minutos antes das 8 h.; passado
pouco tempo, o grosso do batalhão de Hill apoderou-se da ponta de Halavo. Os
primeiros americanos a chegar às praias das ilhas Salomão desembarcaram sem
disparar um tiro. Os japoneses não estavam em nenhum dos objetivos.

Entretanto, o 1.º de Raiders desembarcava dos contratorpedeiros em que partira


da Nova Caledônia. Estas tropas também acusavam os efeitos da falta de
exercício e da escassez de espaço, durante a viagem, mas, ao contrário das que
desembarcariam uma hora depois em Guadalcanal, o equipamento que
transportavam fora reduzido ao mínimo. Edson esperava um combate renhido.
«Não se preocupe com a comida», dissera ao comandante da companhia. «Há
muita, lá. Os japoneses também comem. Bastará apoderarem-se do que
precisarem.»

Às oito horas em ponto, duas companhias de raiders —as Baker e Dog—


começaram a saltar das barcaças «Higgins» varadas nos baixios de coral ao largo
da Blue Beach, uma área de desembarque do extremo ocidental da ilha,
escolhida na esperança de que, em virtude de o desembarque na praia parecer
impossível, não houvesse defensores. Esta esperança concretizou-se, pois não
houve disparos da selva. Enquanto, com a água pela cintura, procuravam, com
dificuldade, apoio no coral coberto de lodo, muitos dos homens submergiram,
em consequência das pesadas cargas que transportavam — tubos de morteiro,
placas de base e rádios. Os companheiros levantavam-nos e encaminhavam-nos
na direção da praia. Os que caíam levantavam-se com as mãos ensaguentadas, as
calças rasgadas e os joelhos esfolados, das saliências aceradas do coral. No
entanto, apesar das dificuldades, as companhias de assalto estavam na praia as
8.15 h. e Edson recebia a seguinte mensagem: «Desembarque coroado de êxito,
sem oposição.» O resto do batalhão desembarcou rapidamente, assim que a
primeira vaga de barcaças regressou aos APD 4 e embarcou as companhias Able
e Cast.

Os raiders escalaram o espinhaço escarpado e deserto que se erguia à sua frente,


viraram à direita e começaram a seguir para sudoeste, ao longo dos lados
agrestes e muito íngremes da ilha. Atrás deles, o 2.º Batalhão do 5.º de Fuzileiros
do coronel Harold E. Rosecrans desembarcava na Blue Beach, atravessava
Tulagi e percorria a sua metade noroeste sem encontrar quaisquer vestígios do
inimigo. A seguir, Rosecrans reuniu o seu batalhão e ocupou as posições
previstas para apoiar Edson.

A resistência surgiu pela primeira vez no antigo bairro chinês que contornava as
docas Bums-Philp, na costa norte oposta à minúscula ilha de Makambo. Foi aí
que, pouco antes do meio-dia de 7 de Agosto, os Fuzileiros Navais sofreram as
primeiras baixas de combate da campanha do Pacífico Sul. Ao tentar prestar
auxílio a três soldados gravemente feridos, o tenente Samuel Miles, jovem
médico naval, foi morto, e um comandante de companhia ficou muito ferido.
Quando os raiders avançaram, cautelosamente, na direção das frágeis cabanas,
os defensores japoneses recorreram aos morteiros ligeiros. O avanço afrouxou e,
ao fim da tarde, Edson mandou parar e estabelecer posições para passar a noite.

Os fuzileiros ocupavam uma linha ao longo de terreno a subir, de Carpenter’s


Warf, ao norte, à Residência, espaçosa casa de madeira onde o comissário do
Governo vivera, até ser obrigado a fugir da ilha, em fins de Abril. Do lado sul da
Residência, uma descida suave levava a um pequeno clube de golfe, perto da
praia. Esta linha defensiva não foi organizada; não houve tempo para isso. Os
raiders abriram abrigos pouco fundos, para dois e três homens, e Rosecrans
dispôs o seu batalhão de modo a apoiar as posições dianteiras.

A configuração do terreno favorecia os fuzileiros. A encosta que ocupavam


descia, íngreme, para uma área plana retangular, utilizada em tempos mais
felizes como campo de críquete e de futebol. Os japoneses tinham as suas
posições num espinhaço acidentado e rochoso, coberto de restolho, que limitava
o lado leste do campo de jogos. Os combates da tarde haviam revelado que os
defensores de Tulagi estavam bem fornecidos de morteiros ligeiros, lança-
granadas e metralhadoras ligeiras e pesadas. O número de homens devia oscilar
entre trezentos e quatrocentos e calculava-se que atacariam a coberto da
escuridão.

Atacaram, de fato. Quatro vezes. Mas cada ataque foi menos impetuoso que o
precedente e todos eles foram repelidos. No entanto, conseguiram infiltrar-se
alguns japoneses. Seis rastejaram para debaixo do alpendre da Residência,
esconderam-se aí e, mal nasceu o dia 8 de Agosto, mataram três fuzileiros. Cinco
minutos depois, as granadas americanas tinham dado cabo deles.

Num abrigo do centro da tênue linha que tanto se esforçara por defender, o
soldado de primeira classe John Ahrens, atirador especial da Companhia Able,
jazia imóvel, de olhos fechados e a respirar devagar. Estava coberto de sangue e
moribundo. A seu lado estava o cadáver de um sargento japonês e, atravessado
nas suas pernas, o de um oficial. Ahrens fora atingido a tiro no peito, duas vezes,
e o sangue escorria-lhe, lentamente, de ferimentos de baioneta. À roda do seu
abrigo estavam estendidos os cadáveres de treze japoneses. Quando o capitão
Lewis W. Walt o ergueu em braços a fim de o levar para a Residência, o
moribundo, ainda agarrado à sua espingarda automática, murmurou:

— Ontem à noite, eles tentaram passar por cima de mim, capitão, mas não creio
que tenham conseguido.
— Não conseguiram, Johnny — respondeu Walt, docemente. — Não
conseguiram.

A ilhota de Gavutu, ligada à ilha ainda mais pequena de Tanambogo por um


estreito passadiço, foi um objetivo mais difícil do que Tulagi, no «Dia D». Os
defensores eram menos, mas os atacantes americanos também. O
bombardeamento aéreo de Gavutu, que mede cerca de 450 metros de
comprimento e menos de 270 de largura, foi breve e absolutamente inútil.
Escondidos no fundo de cavernas e abrigos antiaéreos reforçados, os japoneses
poucos danos sofreram e prepararam-se para oferecer aos paraquedistas uma
sangrenta recepção.

Enquanto as barcaças de assalto se encaminhavam para a praia, os canhões dos


contratorpedeiros neutralizaram o fogo defensivo, mas quando as embarcações
vararam e os fuzileiros saltaram para terra, o logo amigo cessou e os defensores
japoneses tomaram conta da situação. Os paraquedistas, momentaneamente
desorganizados pela saraivada de chumbo disparada contra eles por automáticas
invisíveis, procuraram abrigar-se. Mas os abrigos escasseavam. Antes de
iniciado, sequer, o avanço, o major Williams foi atingido e o comando passou
para o major Charles A. Miller. Morriam homens naquela estreita faixa de praia,
mas os contratorpedeiros de apoio, pouco seguros naquelas águas desconhecidas,
hesitavam em aproximar-se e corrigir o fogo, para obter a necessária precisão.
Só havia uma coisa a fazer: avançar. Por isso, em pequenos grupos, homens
desesperados foram ao encontro do inimigo. A meio da tarde, um pelotão chegou
ao cimo do monte 148, o ponto mais alto da ilha, e um fuzileiro desfraldou a
bandeira americana. Mas a bandeira do Sol Nascente esvoaçava, num desafio,
acima da minúscula Tanambogo, cujos defensores ainda estavam longe de se
considerar vencidos. Equivalia praticamente a morte certa aproximar-se alguém
do passadiço, periodicamente varrido por rajadas de armas automáticas.

Era, pois, evidente que os paraquedistas não podiam proceder à captura de


Tanambogo, que constituía o seu objetivo da Fase Dois. Encontravam-se, por
assim dizer, em cima de um vulcão capaz de entrar em erupção de um momento
para o outro, pois debaixo dos seus pés havia umas duas dúzias de cavernas e
abrigos antiaéreos ocupados por japoneses. Só seria possível aniquilar a
resistência nestas cavernas com cargas explosivas amarradas a varas. Um
corpulento capitão louro, Harry Torgerson, preparou muitas e enfiou-as nas
aberturas, mas a primeira explosão arrancou-lhe as calças.
Assim, quando o Sol se ocultou atrás de Savo, continuava por resolver o
problema de Tanambogo. Rupertus ordenou ataques aéreos à ilhota e incumbiu o
capitão Crane, cuja companhia retirara de Haleta, que não fora defendida, de
embarcar e atacar ao escurecer. O oficial de operações do general, major William
K. Enright, salientou que esta tentativa, planejada de improviso, oferecia poucas
probabilidades de êxito, mas Rupertus discordou. Como Enright previra, os
fuzileiros de Crane foram recebidos com fogo violento, quando as barcaças se
aproximaram do ponto de desembarque. Só uma conseguiu chegar à praia e os
seus ocupantes foram dizimados. As outras duas, com meia dúzia de buracos,
retrocederam apressadamente para Gavutu.

Este ataque malogrado teve, no entanto, o condão do convencer Rupertus de que


precisava de auxílio. Recorreu a Vandegrift e, à meia-noite, Turner cedeu o
batalhão do tenente-coronel Robert G. Hunt, do 2.º de Fuzileiros, escalonado no
plano inicial para ocupar Ndeni. Rupertus ordenou a Hunt que desembarcasse
em Gavutu ao nascer do dia, rendesse os paraquedistas e ocupasse Tanambogo.

A noite e a chuva não proporcionaram nenhuma acalmia em Gavutu. Japoneses


isolados saíam, de rastos, das cavernas, para lançar granadas ou disparar rajadas
esporádicas, de metralhadoras ligeiras. Os fuzileiros não tinham outro remédio
senão suportar tais ataques e esperar pela manhã.

Em Guadalcanal, os americanos podiam ter passado a primeira noite numa paz


relativa, mas, embora os defensores não os incomodassem, não conseguiram
descansar. Sentinelas com a mania do gatilho animaram as longas horas da noite
com centenas de disparos contra alvos imaginários. Os japoneses que se
encontravam para lá de Matanikau ouviram os estampidos, sem saber a que
atribui-los. Claro que os fuzileiros estavam exaustos e nervosos, sentiam-se
todos apreensivos e alguns tinham medo. Haviam desembarcado à espera de
encontrar japoneses e dar-lhes luta, mas o inimigo escondera-se. Estavam
convencidos que os defensores se encontravam algures, na escuridão, e isso
inquietava-os. Na realidade, porém, não havia inimigos, os quais na manhã do
segundo dia continuavam sem dar sinais de vida.

Antes da meia-noite do «Dia D» Vandegrift dera novas ordens. Segundo estas,


Cates deveria esquecer «Grassy Knoll», virar para oeste, avançar para Lunga e
cercar o aeródromo, pelo sul. Ao mesmo tempo, o 5.° de Fuzileiros seguir ia
rapidamente na direção de Lunga Point e prosseguiria para Kukum.
No sábado de manhã, patrulhas que avançavam, hesitantes, para o aeródromo
capturaram alguns trabalhadores coreanos e japoneses. As informações que
obtiveram, por intermédio deles, reforçou a opinião, até aí vaga, de que o
inimigo retirara para oeste, talvez para Kukum ou, até, para mais longe. O
comando da divisão ordenou então a Hunt que avançasse para Kukum. Mas o 5.°
de Fuzileiros não tinha pressa e só a meio da tarde as suas vagarosas patrulhas
chegaram à zona do acampamento abandonado pelos japoneses, nos bosques de
coqueiros perto da ponta norte do campo de aviação.

Uma revista apressada às áreas de aquartelamento revelou que o pessoal da


construção e a força de desembarque naval que o protegia tinham fugido
precipitadamente. As instalações, sem dúvida abandonadas com uma pressa
induzida pelo pânico, encontravam-se num estado de absoluta desordem.
Juncavam o chão, num autêntico caos, uniformes, tabis de sola de borracha,
bonés, capacetes, cobertores, redes contra mosquitos, chávenas, pauzinhos, taças
de arroz e o seu conteúdo semiconsumido.

Dezenas de coqueiros, alvejados por bombas e granadas, tinham esmagado, na


queda, pequenas construções e rasgado a lona das tendas. Em instalações
provisórias, que pareciam ter servido de escritórios, reinava também uma grande
confusão de material de desenho e papelada. Esta cena de caos assumiu, aos
olhos dos recém-chegados fuzileiros, aspectos fantasmagóricos. Tinham ali
vivido e trabalhado homens, até que a catástrofe se abatera, de súbito, sobre o
seu mundo isolado e longínquo.

Entretanto, grupos de reconhecimento menos hesitantes (11.º de Fuzileiros)


tinham encontrado o aeródromo deserto de inimigos. O comandante da artilharia,
coronel Pedro A. del Valle, acompanhara um dos grupos. Como consequência do
seu relatório, foram ordenadas novas sondagens e, antes de escurecer, um dos
batalhões de Cates atravessou a pista de aterragem e estabeleceu posições para
passar a noite, na margem leste do Lunga.

Nesse interim, a descarga prosseguia, à toa, na Red Beach, numa desorganização


total. Numa tentativa para dispersar a excessiva e perigosa concentração de
aprovisionamentos, Vandegrift pediu a Turner que alargasse a descarga a outras
praias apropriadas, cerca de uma milha para oeste da atravancada Red Beach.
Turner recalcitrou, com medo de levar os seus navios para águas que poderiam
estar minadas, mas Vandegrift insistiu. O almirante via perfeitamente que na Red
Beach não havia espaço para uma fracção, sequer, das cargas de combate ainda
nos porões dos barcos. Pouco depois, a descarga começou perto da foz do rio
Block Four. Para evitar a repetição do caos da Red Beach, alguns dos navios
mandaram marinheiros ajudar o exausto grupo de terra.

Enquanto os fuzileiros do lado de Guadalcanal inspecionavam acampamentos


abandonados, partiam cocos, juntavam recordações e provavam os primeiros
cigarros japoneses, os seus irmãos de armas de Tulagi e Gavutu combatiam,
como já tinham combatido no dia anterior.

Quando os fuzileiros de Edson e Rosecrans saíram dos abrigos pouco profundos,


ao alvorecer de sábado, viram pela primeira vez, defronte das suas linhas, os
cadáveres dos homens que, poucas horas atrás, os tinham atacado com uma
determinação que raiara pela loucura. Para alguns, este primeiro encontro com a
morte violenta foi um choque brutal. Mas tiveram, forçosamente, de se habituar
e, em breve, pelotões e patrulhas avançavam para as cavernas onde os defensores
se haviam refugiado.

Nem os bombardeiros de mergulho nem o fogo dos barcos de guerra poderiam


expulsar o inimigo de tais cavernas, e os fuzileiros não dispunham de torpedos
«Bangalore», nem de lança-chamas, nem de tanques. (O único tanque
desembarcado em Tulagi perdera uma lagarta e fora parar a uma vala.)
Começaram por experimentar granadas de mão, mas os japoneses apanhavam-
nas e devolviam-nas à procedência. Pouquíssimos minutos chegaram para os
fuzileiros aprenderem que colocar-se alguém defronte de uma caverna equivalia
a ser condenado a morte certa.

Por sorte, os raiders tinham uma seção de demolições, comandada por Angus
Gauss, um artilheiro que adorava fazer explodir fosse o que fosse. Para o ouvido
de Gauss, uma explosão era a música mais doce que se podia conceber. Ele e os
seus homens passaram a manhã a improvisar cargas explosivas na ponta de
varas, e cerca do meio-dia os inimigos escondidos começaram a ver uma fona.
Quando dois homens das demolições avançaram, a coberto de granadas de fumo,
metralhadoras de apoio começaram a disparar fogo para as bocas negras de duas
cavernas adjacentes, escolhidas para a experiência. Momentos depois,
estampidos abafados, de mistura com gritos, indicaram que a tentativa de Gauss
fora coroada de êxito. A meio da tarde, a maioria das cavernas estavam fechadas
e só restavam umas duas bolsas de resistentes e meia dúzia de atiradores de
precisão. Ao pôr do Sol, porém, Rupertus pôde informar Vandegrift de que
Tulagi estava tomada. Os raiders tiveram 99 baixas —47 mortos e 52 feridos —
e o batalhão de Rosecrans, do 5.º de Fuzileiros, 56.

O batalhão de Hunt, relutantemente cedido por Turner pouco antes da meia-noite


de sexta-feira, começou a desembarcar em Gavutu às 7 da manhã de sábado, 8
de Agosto, e ao meio-dia tinha a ilha sob seu controle. Hunt ordenou a Miller
que embarcasse os seus paraquedistas e fosse com eles para Tulagi. A sangrenta
Gavutu pertencia aos americanos e custara aos paraquedistas 84 mortos e feridos
— uma média de mais do 20% de baixas.

Em seguida, Hunt informou Rupertus de que estava pronto para atacar


Tanambogo e pediu um bombardeamento aéreo preparatório. Seis bombardeiros,
de prevenção num porta aviões à espera de tal ordem, levantaram voo quase
imediatamente, mas a sua ação foi muito pior do que inútil: várias bombas
lançadas cedo demais caíram em Gavutu, despedaçaram três fuzileiros e feriram
gravemente outros nove. Hunt verberou o chefe da esquadrilha em termos
irreverentes.

Quando os aviões regressaram, o cruzador San Juan entrou no porto,


bombardeou Tanambogo durante alguns minutos e retirou-se. Pouco depois,
entrou em cena uma segunda esquadrilha de aparelhos, vinda de um porta-
aviões, com o objetivo anunciado de derrubar a bandeira japonesa, que
continuava içada no ponto mais alto da ilha. Mais uma vez, algumas bombas
caíram em Gavutu e mataram e feriram fuzileiros. As outras caíram na ilha certa,
mas não causaram a mínima beliscadura à bandeira do Sol Nascente. Depois
desta demonstração, Hunt solicitou, enfaticamente, que o «apoio» aéreo fosse
interrompido sem demora.

Às 16 h., esperançado em que já não teria de se haver com os japoneses e com os


bombardeiros da Marinha dos Estados Unidos, Hunt encarregou o
contratorpedeiro Buchanan de disparar, de curta distância, contra Tanambogo. O
Buchanan aproximou-se temerariamente da costa e o seu breve bombardeamento
foi devastador. Cinco minutos depois dos primeiros disparos, a Companhia I
(capitão W. B. Tinsley) desembarcou, de pé, na ilha. Passada uma hora, um
sargento arriava a bandeira em que uma dúzia de pilotos não conseguira tocar.

Sábado, de manhã cedo, o vigia costeiro Jack Read, estacionado em


Bougainville, iniciou a fatigante tarefa de deslocar o seu radiotelefone para uma
nova posição, no cume de um espinhaço íngreme, na esperança de encontrar
melhores condições de recepção e transmissão. Ao subir penosamente, pelo meio
da selva, com os seus extenuados carregadores nativos, Read ouviu o roncar dos
motores de aviões a baixa altitude. Os Bettys, com rumo a sueste, passaram
mesmo por cima deles, em formação de «V», acompanhados por Zeros,
colocados aos seus flancos, mas em altitude superior. Enquanto dois nativos
montavam a antena, Read contou os aviões. Poucos minutos depois, transmitia:
«De J. E. R. Quarenta bombardeiros nessa direção.» Esta mensagem, captada em
Townsville, Austrália, foi transmitida para Melbourne, que por sua vez a
transmitiu para o Porto das Pérolas, e chegou ao conhecimento de Fletcher e
Turner quarenta minutos depois de Read a ter emitido.

O centro diretor de combate do Saratoga encheu de novo o céu de Savo de


Wildcats e, mais uma vez, a descarga cessou e os transportes e os cargueiros
prepararam-se para repelir qualquer ataque aéreo. Mas desta feita, os japoneses
viraram em arco para norte, a cinquenta milhas de Savo, e quando os
bombardeiros-torpedeiros chegaram, a rasar as copas das árvores da ilha Florida,
as CAP sobrevoavam Savo, a altitudes de 300, 450 e 750 metros. Sem
resistência aérea, os atacantes previram um dia em cheio, mas não contaram com
a precisão dos artilheiros de Turner, cujas muitas horas enfadonhas passadas a
seguir o rasto de aviões baixos iam, enfim, ser devidamente recompensadas.

A altitudes de 6 a 12 metros acima da água, os Bettys passaram através do fogo


antiaéreo, direitos aos seus alvos. Esta era a altitude recomendada pela nova
tática de torpedeamento, baseada em ataques bem sucedidos contra barcos
ingleses. Mas os sistemas de correção de fogo dos americanos eram mais
avançados e os seus canhões podiam-se baixar e levantar. Os Bettys foram
acolhidos com uma tempestade de aço. Incendiaram-se um a um, explodiram e
desintegraram-se, alguns tão perto dos navios que uma chuva de destroços de
asas e fuselagens chocou com os cascos e passaram motores pelo cesto da gávea.
Num dos transportes, os marinheiros deitaram pela borda fora braços, pernas e
troncos de aviadores japoneses.

As CAP, finalmente alertadas, travaram uma batalha inconcludente com os Zeros


da escolta. Ambos os lados anunciariam, mais tarde, um excessivo número de
aviões derrubados e barcos afundados. O transporte de tropas George F. Elliott
foi incendiado por um bombardeiro que caiu na sua coberta e explodiu, e o
contratorpedeiro Jarvis foi gravemente atingido. Quanto às perdas de aviões
japoneses, ainda hoje não é possível avaliá-las. Os pilotos americanos afirmaram
ter abatido seis Zeros; os pilotos dos Zeros anunciaram seis aviões americanos a
seu crédito... Pouco depois do meio-dia, Read viu um Betty solitário a voar para
noroeste. O piloto deste aparelho, segundo parece o único sobrevivente, aterrou
em Rabaul e gabou-se de ter afundado um couraçado. Não estava lá ninguém
que o pudesse desmentir.

No domingo de manhã, Hunt deslocou duas companhias para Tanambogo. Cerca


do meio-dia, o seu sargento de demolições estava a neutralizar as posições
inimigas nas cavernas. Um observador imparcial — um dos capelães do
regimento— relatou concisamente esse trabalho:

«O sargento O. S. Bergner abria tranquilamente um buraco fundo, por cima da


caverna, metia-lhe dentro uma boa carga de dinamite, acendia o rastilho, a
caverna explodia e os ocupantes morriam.»

Dois tanques ligeiros, comandados pelo tenente R. J. Sweeney, foram


desembarcados para ajudar a neutralizar as cavernas. Um deles afastou-se muito
da infantaria de apoio — ou talvez o pelotão avançasse muito devagar— e teve
pouca sorte.

«Os soldados japoneses saíram a correr dos seus abrigos e cavernas e


introduziram uma grande barra de ferro na lagarta. Ao tentar livrar-se do ferro, o
tanque recuou, encravou-se no toco de um coqueiro e ficou imobilizado. Os
japoneses arremessaram, então, coktails Molotov e outros produtos inflamáveis,
que mataram todos os ocupantes do veículo, com exceção de um homem, que
conseguiu fugir.»

A meio da tarde de domingo, 9 de Agosto, Rupertus informou o comandante da


Divisão de que a Força de Desembarque do Norte tomara todos os objetivos. Os
Fuzileiros Navais enterraram mais de seiscentos japoneses e encerraram uns cem
em cavernas. É possível que setenta ou oitenta tenham fugido para a vizinha ilha
Florida. Duzentos e noventa e cinco americanos morreram ou ficaram feridos.

Todas as tentativas feitas para induzir os defensores a render-se foram acolhidas


com chumbo. Os japoneses recusaram-se a pedir quartel. Vandegrift descreveu
Tulagi-Gavutu-Tanambogo como «...uma operação violenta... constante e
implacável... decidida pelo extermínio de um ou do outro dos adversários em
luta. O comportamento foi digno de soldados, em todos os recontros com o
inimigo ... e houve uma vontade inquebrantável de aceitar ... os acasos de
sangrentos combates corpo a corpo...»

Os desembarques nas Salomão provaram que a estratégia anfíbia, para a qual


muitos oficiais dos Fuzileiros Navais e alguns da Marinha tinham dado
assinaladas contribuições na década anterior, estava fundamentalmente certa. É
verdade que ainda estavam por resolver vários problemas técnicos, dos quais o
mais premente era o de acelerar e controlar os descarregamentos. Os fuzileiros
de Guadalcanal desconheciam a existência de barcos de desembarque de tanques
(LST) — e, na realidade, em Agosto de 1942 existiam muito poucos. Embora o
trator anfíbio — um veículo que o Corpo de Fuzileiros patrocinara e que
Vandegrift, numa carta pessoal ao general Holcomb, descrevia como «os nossos
salva-vidas»— tivesse já demonstrado a sua versatilidade, o DUKW, esse
híbrido eficiente, ainda estava só na fase experimental.

As exigências severas do combate coordenado por terra, mar e ar revelaram


muitos pontos fracos de planeamento, equipamento e treino. Vandegrift sentiu-se
especialmente preocupado com o mau trabalho das patrulhas, a falta de ligação
entre unidades e o nível execrável da disciplina de fogo. O material de
comunicações, escreveu ao comandante, era «péssimo». Os aparelhos «não
fazem, pura e simplesmente, o serviço a que se destinam, e a culpa não é do
pessoal».

Verificaram-se graves deficiências de chefia em todos os níveis, de regimento a


pelotão. Em Guadalcanal hesitou-se demasiado. Pouco depois, Vandegrift
efetuaria modificações no seu estado-maior e nos comandos regimentais e de
batalhão, a fim de garantir uma chefia mais vigorosa e imaginativa.

As peças navais de calibre médio tinham demonstrado claramente que o


bombardeamento naval de um sistema defensivo de cavernas e abrigos
subterrâneos redundava praticamente num desperdício de munições. Tais alvos
só podiam ser destruídos quando localizados com exatidão e atacados por fogo
direto, de trajetória horizontal, a curta distância. Havia já algum tempo que os
peritos de bombardeamento naval do Corpo de Fuzileiros tentavam dizer isso
mesmo aos almirantes, mas com pouco êxito. Mais tarde, Connolly «Close-in»
demonstraria aos comandantes navais mais cautelosos até que ponto podia ser
eficaz o apoio do bombardeamento naval.

Estrategicamente, a operação prometia concretizar tudo quanto King esperara.


Os Aliados tinham-se lançado na ofensiva e detido a maré japonesa na sua
enchente crucial. Tinham (pelo menos temporariamente) salvo as ilhas de Santa
Cruz e as Novas Hébridas, e estabelecido uma posição da qual poderiam impedir
os japoneses de operar nas Salomão e no mar de Coral. A Austrália soltou um
profundo suspiro de alívio. Mas o júbilo sentido por Washington, Melbourne e
Honolulu seria de curta duração.

5. «A LÍNGUA DE FOGO DA MEIA-NOITE»

Ao princípio da tarde de 8 de Agosto, com os objetivos escolhidos tomados ou


na iminência de o serem, Turner e Vandegrift só tinham — ou, pelo menos,
assim pensavam— um problema importante: apressar o descarregamento. A
esquadra invasora suportara três violentos ataques aéreos em vinte e quatro
horas, e Turner sabia — haviam-lhe dito em termos inequívocos em Koro— que
só podia contar com mais dezoito horas de apoio aéreo. Sabia, também, que
possivelmente não conseguiria despejar os seus navios nesse espaço de tempo.
Acompanhara o progresso — ou a falta de progresso — da descarga e, por isso,
sabia, igualmente, que ainda não se encontrava em terra praticamente nenhum
equipamento pesado. Por todos estes motivos, era um homem preocupado que
observava a cena, da ponte do McCawley. Durante o jantar, uma ordenança
entregou-lhe um papel que iria diminuir ainda mais a extraordinária reserva de
otimismo de Turner e provocar uma das explosões de pitorescas irreverências
que lhe davam justa celebridade.

Tratava-se de uma mensagem interceptada, de um relatório operacional com


prioridade, de Fletcher para Ghormley, que continha informações que o
comandante da Força Anfíbia considerou, segundo a sua própria e inequívoca
qualificação, «inacreditáveis». Na sua mensagem, Fletcher comunicava a
presença no setor de grande número de aviões torpedeiros e bombardeiros
inimigos, dizia que os seus aviões de combate tinham sido reduzidos de 99 para
78 e que as suas reservas de combustível eram desesperadamente baixas, e
recomendava a retirada imediata dos porta-aviões. O comandante da Força
Expedicionária tomava esta «infelicíssima» decisão sem consultar Turner nem
Vandegrift.
Embora Fletcher pudesse acalentar a esperança de que os seus navios não
houvessem sido detectados, não tinha a certeza e parecia convencido de que o
haviam sido ou o seriam em breve. Sabemos agora que nem submarinos
inimigos nem aviões de reconhecimento aéreo haviam localizado a Unidade
Naval 61; que os depósitos de Fletcher continham combustível suficiente para
manobrar no setor durante pelo menos mais dois dias, sem necessidade de
reabastecimento; que tinha mais do dobro da força de combate japonesa dos
aeródromos das ilhas Bismarck, e que começou a retirar doze horas antes de
receber autorização de Ghormley para isso. A sua «deserção dos pontos vitais da
força», como Turner descreveria mais tarde a retirada, prosseguiu, não obstante a
informação — da qual Fletcher tomou conhecimento duas horas depois do seu
pedido de retirada— de que uma força de superfície japonesa avançava para as
ilhas Salomão. Ghormley relutou em deixar Turner e Crutchley sem proteção
aérea, mas achou que não devia ordenar a Fletcher que ficasse. No fim de contas,
ele não podia ler os registos de combustível dos navios de Fletcher...

A decisão não deixou a Turner outra alternativa senão a de retirar os seus


vulneráveis e valiosos anfíbios, os únicos do gênero a oeste do Havaí — e
quanto mais depressa melhor. Por isso, chamou Vandegrift e Crutchley ao
«Wacky Mac».

Quando os porta-aviões americanos viraram para sueste, a coluna de cinco


cruzadores pesados e dois ligeiros e um contratorpedeiro do vice-almirante
Gunichi Mikawa, com o Chokai à frente, passava pelo estreito a norte da ilha de
Nova Geórgia. O homem que se encontrava na ponte do navio almirante não se
sentia atormentado por dúvidas nem por terríveis apreensões. Mikawa procedia
temerariamente ao som dos canhões, sabia muito bem o que ia fazer: destruir a
força de invasão anglo-americana num ataque noturno.

Reconhecimentos feitos de manhã por hidraviões de patrulha permitiram a


Mikawa avaliar, com razoável exatidão, a força dos aliados. Baseado nos
relatórios dos seus observadores, o almirante traçou o seu plano de batalha, que
previa uma incursão de surpresa, a toda a velocidade, ao sul de Savo, ataque
imediato aos cruzadores e transportes aliados ao largo de Guadalcanal,
destruição das embarcações ao largo de Tulagi e retirada para o norte de Savo. A
simplicidade e a audácia desta concepção teriam agradado a Horácio Nelson.
Cerca das 14.20 h., Mikawa transmitiu as suas instruções, que foram breves e
precisas:
«Penetraremos pelo sul da ilha de Savo e torpedearemos a força principal
inimiga em Guadalcanal. Depois avançaremos para o setor avançado e
atacaremos com torpedos e artilharia, e em seguida retiraremos para norte da ilha
de Savo.»

Embora os navios japoneses nunca tivessem operado juntos, Mikawa achou


desnecessário pormenorizar as suas ordens. A tática do combate noturno estava
muito difundida na Marinha Imperial, os comandantes eram veteranos
experientes e as tripulações estavam excelente treinadas. Além disso, os torpedos
«Long Lance» de 24 polegadas, grande velocidade e propulsão a oxigênio
constituíam uma arma letal, em que os japoneses depositavam uma confiança
que os acontecimentos do futuro imediato justificariam amplamente.

Duas horas depois, foram deitados ao mar todos os materiais inflamáveis que se
encontravam acima da linha de água, e quando o Sol se pôs, atrás dos seus
barcos, Mikawa transmitiu um sinal visual:

«Combateremos o inimigo em batalha noturna, na melhor tradição da Marinha


Imperial. Espera-se que todos os homens deem tudo por tudo.»

Mikawa contava com a surpresa e consegui-la-ia, não obstante a sua força ter
sido detectada e seguida, em 8 de Agosto, por dois aviões de reconhecimento da
Real Força Aérea Australiana. Um dos pilotos, não se deu, sequer, ao incomodo
de acompanhar a força inimiga o tempo suficiente para a avaliar com exatidão o,
dando provas de incrível despreocupação, só comunicou que avistara barcos
inimigos depois de completar a patrulha, aterrar e beber o seu chá da tarde. O
seu colega foi menos indolente, mas apresentou um relatório incompleto. Mercê
de uma variedade de razões, a informação não seguiu imediatamente as vias
normais, a transmissão dos dois relatórios foi imperdoavelmente atrasada e só às
19 h. (ou seja, cerca de uma hora depois de os serviços de comunicação de
Turner terem interceptado e decifrado a mensagem de Fletcher para Ghormley)
um dos relatórios chegou ao conhecimento de Turner, que o transmitiu aos
barcos sob o seu comando. Quiçá devido à ambiguidade dos termos da
mensagem — «Três cruzadores, três contratorpedeiros, dois barcos de apoio de
hidraviões ou canhoneiras, rota 120°, velocidade 15 nós.»—, tanto Turner como
Crutchley (que, a pedido de Turner, se apressara a abandonar o seu posto nos
barcos de patrulha e a dirigir-se para o McCawley, no navio almirante Austrália)
chegaram à conclusão precipitada de que os japoneses deviam ir a caminho de
Gizo Bay, a fim de estabelecerem uma base de hidraviões. Não se verificou,
pois, qualquer tentativa de avaliar a potencialidade inimiga. Houve apenas uma
conjectura apressada e desprovida de imaginação quanto às suas intenções.

Se Fletcher tivesse permanecido com a esquadra e mandado aviões proceder a


um reconhecimento pré-crepuscular, na direção do noroeste —elementar medida
de precaução notoriamente ditada pelas circunstâncias —, a esquadra de Mikawa
poderia ter sido detectada. Ou se todos os relatórios de observadores que tinham
avistado a força inimiga (um total de quatro) houvessem sido estudados,
comparados e avaliados... Ou se os B-17 de Saunders não tivessem sido
obrigados a ficar em terra, no dia 8, devido ao temporal... Ou se tivesse sido
efetuado um reconhecimento suplementar do estreito, anteriormente solicitado
por Turner ao almirante McCain...

A acumulação de erros, o azar, o mau discernimento e a pura negligência,


ingredientes a que não tardariam a juntar-se os assomos de audácia de Mikawa e
a competência dos seus homens, combinaram-se para formar uma beberagem
que os marinheiros australianos e americanos dos navios que protegiam os
acessos de noroeste às áreas ocupadas pelos transportes em breve ingurgitariam
até às fezes.

Passava das 21 h. Enquanto Crutchley e Vandegrift (que desembarcara do seu


posto de comando perto de Lunga) conferenciavam com Turner, a bordo do
McCawley às escuras, os homens dos cruzadores de Mikawa, apenas cem milhas
a noroeste de Savo, preparavam-se para o ataque de surpresa. Nos barcos de
proteção, que navegavam lenta e metodicamente a noite e a sul de Savo, tudo
estava sereno. Nenhum dos comandantes parecia consciente de que o relatório
pouco antes enviado por Turner podia pressagiar perigo. Nenhum, com exceção
de Bode, a comandar provisoriamente o Chicago, sabia sequer que Crutchley
retirara o Australia da patrulha e se encontrava 20 milhas a leste — e Bode não
se incomodou a comunicar essa informação a ninguém. O almirante britânico
dera vagas instruções, mas não transmitira ordens específicas de batalha noturna,
nem nenhum dos comandantes lhas pedira. Embora em Koro tivesse havido
oportunidade de convocar uma conferência em que se estudassem as
possibilidades de uma ação noturna de superfície e em que o almirante
delineasse o procedimento aconselhável em tais circunstâncias, Crutchley não se
dignara chamar os seus Comandantes ao navio almirante.

As suas disposições geométricas pareciam, sem dúvida satisfatórias — num


mapa. A sul de Savo, com ordens para patrulhar entre essa ilha e o cabo
Esperança, estavam três cruzadores —Australia, Canberra e Chicago— e dois
contratorpedeiros. Os cruzadores Vincennes, Astoria e Quincy, também com dois
contratorpedeiros, bloqueavam o acesso norte, entre as ilhas Savo e Florida.
Além disso, um contratorpedeiro munido de radar encontrava-se de sentinela
umas seis a oito milhas a oeste de cada um dos dois grupos do Crutchley em
Savo. A leste da área ocupada pelos transportes, em Lengo Channel, o contra-
almirante Norman Scott patrulhava no San Juan. Sob o seu comando estavam
também o cruzador Hobart e os contratorpedeiros Monssen e Buchanan. Uma
disposição infeliz, pois dos oito cruzadores o oito contratorpedeiros de que
Crutchley dispunha só o San Juan estava equipado com o novo radar de
superfície (SG).

Não é preciso ser táctico naval para compreender que o almirante inglês dividira
a sua força de maneira tal que cada elemento se encontrava exposto a ser atacado
e destruído separadamente. Ao mesmo tempo, ao escolher o gênero de
patrulhamento adoptado a norte de Savo, privara os cruzadores da capacidade de
estarem constantemente aptos a colocar-se, rapidamente, numa formação que
permitiria às suas baterias principais e às suas peças de costado alvejar o
comprimento de uma coluna atacante. Todos os contratorpedeiros possuíam
torpedos, mas não foram dadas quaisquer ordens relacionadas com o seu
emprego.

O fato de nem Crutchley nem o seu superior imediato terem admitido seriamente
a possibilidade de um ataque inimigo de superfície não constitui desculpa; é,
pelo contrário, um pormenor condenatório. Cerca de dois mil anos antes, o
filósofo militar chinês Sun Tzu advertira: «Na guerra, não presumas que o
inimigo não virá; prepara-te para o enfrentar.» Os japoneses avançavam a toda a
velocidade e nem os barcos aliados nem as suas tripulações estavam preparados
para os enfrentar.

Uns minutos antes da meia-noite, o almirante japonês mandou novamente


hidraviões para o ar e ordenou-lhes que procedessem a reconhecimentos das
águas a leste de Savo, localizassem navios inimigos, lhe transmitissem relatórios
constantes e iluminassem com bombas luminosas, como lhes fora recomendado.
Estes aparelhos, com as luzes de voo encarnadas e verdes despreocupadamente
acesas, chegaram à meia- -noite ao ponto onde se encontravam as vítimas
escolhidas por Mikawa e sobrevoaram-nas durante meia hora, a inspecionar a
esquadra invasora, obscura mas adequadamente recortada na escuridão pelo
encalhado Elliott, que continuava a arder. As tripulações aliadas ouviram os
aparelhos e viram as luzes, mas julgaram que eram «amigos». Mikawa
encontrava-se na feliz situação do caçador manhoso, cuja presa tem vaga
consciência da sua presença, mas é tão insensata que não presta atenção aos
presságios inequívocos de iminente destruição.

À meia-noite e quarenta minutos, os vigias do Chokai avistaram o


contratorpedeiro de patrulha no sul, U. S. S. Blue, a aproximar-se do lado de
estibordo. A distância que separava os dois navios era de dez mil metros — o
que desmente a ignorante suposição de que os japoneses são curtos de vista.

O radar do Blue não assinalou a coluna japonesa, nem os seus míopes vigias
detectaram o inimigo que se aproximava. Na ponte do Chokai, o almirante e o
seu estado-maior ficaram tensos. Mikawa murmurou uma ordem: «Leme à
esquerda. Afrouxar para 22 nós.» Não estava interessado em contratorpedeiros.

Mas o Blue continuou a aproximar-se:

«Deduzia-se, pelo seu avanço despreocupado e deliberado, que estava alheio à


nossa presença, ao fato de que o vigiávamos e ao de que todas as peças da nossa
força lhe estavam diretamente apontadas. Os segundos arrastaram-se, enquanto
aguardávamos o momento Inevitável em que por força nos avistaria... e, do
súbito, o contratorpedeiro inimigo mudou de direção!»

Dir-se-ia um momento predestinado, um momento escolhido pelo destino para


uma das suas partidas. Ainda os japoneses não tinham «avaliado inteiramente» a
sua «sorte», outro vigia anunciou um barco à proa, vinte graus a bombordo. Era
o Ralph Talbot, que seguia para norte, em direção oposta à da coluna. A porta
estava aberta.

Mikawa mandou imediatamente aumentar a velocidade para 30 nós. A 1.37 h.,


exatamente quatro minutos depois de avistar cruzadores no lado de estibordo
(Canberra e Chicago), o Chokai lançou o seu terrível «peixe». Com a distância a
encurtar-se à incrível velocidade de meia milha por minuto, os cruzadores que
seguiam na esteira do navio almirante abriram fogo. À 1.46 h., o Canberra,
adernado e em chamas, estava perdido.

Os japoneses voltaram então a fúria dos seus canhões e torpedos para o Chicago:
em sessenta segundos, este cruzador também estava fora de combate, com a proa
destruída. Como um pugilista atordoado por um murro colossal, arrastou-se, aos
ziguezagues, para a escuridão. Era inofensivo e, por isso, Mikawa deixou-o
sobreviver. Os olhos do almirante estavam postos noutra presa... Inutilizara dois
dos cinco cruzadores aliados em menos de dez minutos, a contar do momento
em que abrira fogo. O almirante japonês não perdia tempo e a sorte ajudava a
sua temeridade.

Enquanto o Chicago se arrastava penosamente ha direção do cabo Esperança, o


Chokai, seguido pelos Aoba, Kako e Kimigasa, virava para nordeste. Mais ou
menos ao mesmo tempo, os restantes três cruzadores da coluna — Furutaka,
Tenryu e Yubari — executavam sucessivas voltas de 90 graus, para a esquerda, e
formavam em coluna, quase para norte. Seguiam uma rota aproximadamente
paralela à de Mikawa, mas cerca de duas milhas a oeste da sua esteira,
ligeiramente escalonados para a esquerda. Os três restantes cruzadores
americanos — Astoria, Quincy e Vincennes — continuavam a navegar
pachorrentamente, a uma velocidade de dez nós. Numa questão de minutos, de
segundos, até, os braços de ferro de Mikawa, os braços da morte, envolveriam,
sucessivamente, cada uma das tranquilas vítimas, que de nada suspeitavam.

À 1.49 h. explodiram por cima dos navios americanos bombas luminosas,


iluminaram-nos implacáveis projetores e, menos de dois minutos depois, as
primeiras salvas de oito polegadas caíram na água, a roda deles. Passados seis
minutos, o Astoria ardia, atingido por torpedos. Os artilheiros japoneses
atiraram-lhe centenas de rajadas, enquanto o navio em chamas se arrastava para
sueste. Mas, apesar de atingido, o Astoria ripostou e a sua última descarga
desmantelou uma torre do Chokai.

Mais ou menos ao mesmo tempo, os projetores do Aoba incidiam em cheio no


Quincy. Segundos depois, uma descarga de 8 polegadas fazia explodir, na
catapulta, um dos seus aviões. Irromperam labaredas e os japoneses
«continuaram a lutar tranquilamente, sem quaisquer preocupações». Sobre o
Quincy, envolto em chamas, caiu um dilúvio de granadas, disparadas de ambos
os lados. No entanto as suas peças — ou algumas, pelo menos — estavam
servidas e disparavam. Mas por pouco tempo. Um torpedo entrou na caldeira
número 4, uma torre explodiu, a ponte ficou destroçada e o comandante morreu.
Em poucos minutos a proa submergia e, às 2.35 h., o Quincy voltava-se e
afundava-se.

Entretanto, o Kako iluminara o Vincennes. Mais uma vez, uma das primeiras
salvas japonesas acertou na popa, onde se encontravam os aviões de
reconhecimento, nas catapultas. Jorraram chamas e granadas e torpedos
acertaram, novamente, nos alvos. Pelo menos três torpedos —ou quatro, talvez
— trespassaram o cruzador e rasgaram-lhe as entranhas. Debatia-se na agonia
final, às 2.15 h, quando os japoneses interromperam o fogo. Meia hora depois, o
Vincennes afundava-se, também.

Este assalto durou alguns minutos mais do que o primeiro, mas os resultados
foram idênticos: os navios americanos foram apanhados do surpresa e destruídos
sem terem, sequer, ensejo do ripostar. Algumas salvas acertaram em barcos
japoneses: felizmente para a «Torre de Vigia», uma das poucas disparadas pela
bateria principal do Quincy caiu perto da ponte de comando do Chokai, destruiu-
lhe a sala de operações e matou 30 oficiais e marinheiros cuja presença era
essencial à conduta da batalha.

Foi então que Mikawa decidiu interromper a ação e retirar. Às 2.23 h, o Chokai
ordenou, por sinais luminosos: «Retirada de todas as forças.» E, logo a seguir:
«Em frente, rota 320, velocidade 30 nós.» Na retirada, os navios avistaram e
atacaram o Ralph Talbot. Sucessivamente, as torres e os canhões de costado dos
Furutaka, Tenryu e Yubari alvejaram o Ralph Talbot, mas os japoneses estavam
empenhados numa retirada rápida e, por isso, o seu fogo não foi prolongado nem
certeiro. O contratorpedeiro, atingido por meia dúzia de granadas, ripostou e
disparou torpedos. Por sorte, uma chuvada forte envolveu-o, de súbito. Quando a
chuva parou, o Ralph Talbot estava silencioso, na água, e os japoneses tinham
desaparecido.

A primeira claridade do dia 9 de Agosto revelou mais de mil marinheiros


cobertos de óleo, muitos deles queimados e outros gravemente feridos,
agarrados, com a força do desespero, a cápsulas vazias de granadas, jangadas,
caixotes de laranjas e a todos os destroços susceptíveis de lhes conservar as
cabeças fora da água. Rastos de sangue atraíam tubarões. Durante a longa noite
vários homens tinham desaparecido, com espantosa rapidez. As operações de
salvamento, iniciadas ao romper do dia, prolongaram-se pela manhã fora. Em
cinco horas foram salvos mais de 700 feridos e mortos doze tubarões, com
espingardas tiradas pelos marinheiros dos salva-vidas e das cobertas dos
contratorpedeiros.

Na praia, só houve consciência dos resultados do combate naval quando os


barcos começaram a chegar com homens ensopados em óleo e seminus. Os
relatos sem coerência dos sobreviventes exaustos deram a impressão de que o
violento combate fora, talvez, um ataque de passagem, inferência confirmada
pela presença dos transportes, alguns dos quais estavam a descarregar. O fato de
a Marinha ainda estar presente — ou, pelo menos, de os seus anfíbios estarem—
foi considerado um bom prenúncio.

Mas o comandante era, agora, um homem cheio de pressa. Antes das seis da
manhã, Turner já possuía informações diretas suficientes para avaliar a extensão
da tragédia da noite anterior. Na realidade, às 5 h., o almirante ordenou que o
Canberra se lhe reunisse imediatamente ou fosse abandonado. Como o cruzador
estivesse muito adernado e não se pudesse deslocar, o Patterson e o Blue
aproximaram-se, para recolher a tripulação, e um contratorpedeiro americano
torpedeou-o, duas horas depois. O Astoria ainda flutuava, mas foram inúteis
todos os esforços para o salvar. Afundou-se poucos minutos depois do meio-dia.

Embora os danos sofridos pelos barcos de Mikawa, em Savo, fossem apenas


superficiais e poucas as baixas das tripulações, nem todos estavam destinados a
chegar ao porto seguro das Bismarck. Quando os seus vitoriosos cruzadores
retiravam pelo estreito ao norte da ilha de Nova Geórgia, Mikawa fez sinal a
Goto para se afastar com os Aoiba, Furutaka, Kinugam e Káko e seguir para
Kavieng. O almirante, no Chokai, rumou a Rabaul, acompanhado polos Tenryu o
Yubari e pelo contratorpedeiro Yunagi. Cada um dos grupos seguiu a razoável
velocidade, durante o resto do dia, na direção do porto que lhe fora indicado. Na
segunda-feira, de manhã cedo, os quatro cruzadores com destino a Kavieng,
agora protegidos por um avião em patrulha antissubmarino, desviaram-se 90°
para a esquerda e encaminharam-se para o porto, a menos de 70 milhas de
distância, onde os esperavam as merecidas boas-vindas.

Kako, o último da coluna, não as receberia. Às 8 h, restavam-lhe exatamente 13


minutos de vida, pois nesse momento o primeiro-tenente John R. Moore, do
submarino S-44, escolhera-o para alvo. Moore seguiu-o, durante alguns minutos,
e por fim, a uma distância de 640 metros, disparou os torpedos da proa. Às 8.08
h., quatro torpedos atingiram o Kako, que desaparecia cinco minutos depois. No
meio da confusão, o S-44 esgueirou-se silenciosamente.

Do lado dos Aliados, o balanço da batalha também não estava, ainda, encerrado.
O contratorpedeiro Jarvis, gravemente atingido no ataque aéreo de sábado,
começara pouco depois a retirar, lentamente, para oeste. Por milagre, conseguiu
escapar, sem novos danos, à tragédia ocorrida ao largo de Savo. Um avião de
reconhecimento de Fletcher avistou-o a sul do cabo Esperança, logo a seguir ao
nascer do dia de domingo, a arrastar-se penosamente para sudoeste, de proa
submersa e a deixar atrás de si uma esteira de óleo. Nunca mais se soube nada a
seu respeito. Presume-se que se afundou, com todos os seus homens. A perda do
Jarvis acrescentou 247 nomes à lista das baixas de Savo. Morreram quase 1300
marinheiros aliados e 700 ficaram queimados ou feridos. As baixas dos
japoneses foram muito inferiores a um décimo das aliadas.

No seu relatório pela rádio para o comandante-chefe da Esquadra Conjunta,


Mikawa anunciou o afundamento de cinco cruzadores pesados e quatro
contratorpedeiros, além de danos causados a outros navios. Acrescentou que dois
cruzadores haviam retirado. Havia um pouco de exagero nestes números, mas,
mesmo assim, Mikawa e os seus homens mereciam a mensagem de felicitações
que os esperava em Rabaul:

«Apreciei a luta valente e corajosa de todos os homens sob as suas ordens.


Espero que multiplique as suas proezas e faça todos os esforços para apoiar as
forças terrestre do Exército Imperial, agora empenhadas numa luta desesperada.

Yamamoto Isoroku.»

No Japão, a Imprensa e a Rádio mostraram-se justificadamente exultantes.


Enormes cabeçalhos e noticiários exaltados anunciavam «grandes resultados na
guerra [...] inigualados na História do mundo». Em todas as cidades houve
gigantescas paradas a celebrar a vitória e multidões jubilosas congestionaram as
ruas de Tóquio. Em consequência dos acontecimentos de Savo, proclamou a
Rádio de Tóquio, a Austrália tornara-se «absolutamente uma órfã do sudoeste do
Pacífico». Tinham sido afundados vinte e quatro navios de guerra e onze
transportes, «cheios a abarrotar de fuzileiros navais»!

A Câmara dos Pares decidiu que fosse imediatamente lavrado e entregue ao


ministro da Marinha um certificado de gratidão. Em 15 de Agosto, uma
transmissão em língua inglesa informava os ouvintes (entro os quais se
contavam fuzileiros navais que se encontravam em Guadalcanal e Tulagi) de que
a Marinha americana não dispunha, agora, de transportes nenhuns: tinham sido
todos «destruído no mar do Coral e no Midway». O locutor acrescentou que o
oceano Pacífico se encontrava sob o domínio do Japão, e qualificou os fuzileiros
navais das Salomão de «insetos de Verão, que por si próprios se tinham lançado
ao fogo». Nas esferas onde realmente interessava, estas fanfarronices eram
acolhidas com zombarias.
Ao mesmo tempo que aumentavam o volume das perdas aliadas, os
propagandistas de Tóquio aumentavam também os tributos pagos à Marinha,
cuja «força, tão profunda e incompreensível [sic] para o inimigo», aniquilara os
«restos» anglo-americanos e isolara a Austrália. Aos fuzileiros ouvintes garantia-
se «morte certa», que não tardaria, e advertia-se a Marinha americana de que
ainda havia «espaço suficiente no fundo do Pacífico para mais esquadras
americanas. Ah! Ah! Ah!»

A decisão do almirante japonês de retirar no momento em que retirou tem sido


severamente criticada. A tal respeito foi, até, particular e delicadamente
repreendido pelo almirante Yamamoto. Diz-se que devia ter procurado os
transportes, mas esquece-se de que sobre ele pairava, nessa noite, a ameaça da
aviação de Fletcher. O almirante tinha perfeita consciência de que os seus barcos
seriam destruídos e a vitória absolutamente anulada se os pilotos americanos
atacassem a sua desprotegida coluna com a pontaria e a determinação
demonstrada no Midway. O que ele talvez não soubesse era que Fletcher retirara
havia muito, «partira para outras regiões», no dizer de Turner. O procedimento
de Mikawa deve ser julgado à luz das informações que ele possuía no momento
em que tomou a vital decisão. Sim, porque foi, de fato, uma decisão vital. Se se
tivesse lançado para o meio dos transportes, tê-los-ia, sem dúvida, destruído.
Mas, como a maioria dos seus contemporâneos de alta patente do Exército e da
Marinha japoneses, naquele momento Mikawa não considerava a ameaça a
Guadalcanal uma coisa séria. Os americanos eram poucos, em número,
desprezíveis como combatentes, e o seu Exército Imperial ajustaria contas com
eles, a seu tempo. Além disso, a tática da ação decisiva de superfície—Yogeki
Sakusen—dominava o pensamento do almirante. Os alvos adequados para os
barcos de guerra eram os barcos de guerra. Isto era um dogma.

Em Pearl Harbor e em Washington a reação oficial foi um silêncio de


atordoamento. Os primeiros relatórios apressados sugeriam uma derrota; os
relatórios mais pormenorizados davam a impressão de uma quase catástrofe. Era
evidente que não se podia divulgar nada à Imprensa. O porta-voz de King
limitou-se a declarar laconicamente que as operações «prosseguiam». Incapaz de
arrancar informações específicas ao relutante departamento, a revista Time
acabou por se resolver a divulgar as proezas da Marinha, apesar do silêncio,
nesse capítulo, do seu comandante-chefe. Assim, em 24 de Agosto, revelou que,
na noite de 8 de Agosto, «cruzadores e contratorpedeiros japoneses tentaram
destruir a esquadra invasora. Verificou-se então o que os marinheiros americanos
desejavam havia muito tempo: o primeiro confronto, canhão-a-canhão, da força
de superfície americana e japonesa. Resultado: os japoneses foram vencidos».

Pela primeira vez, mas não pela última, a Rosa de Tóquio dava informações
mais autênticas do que a revista semanal americana.

Durante semanas recusou-se ao povo americano um relatório oficial e completo


da desastrosa batalha naval. King sabia que a divulgação de pormenores
específicos só serviria para baixar o moral, aplicar um monumental olho negro à
sua Marinha e ajudar a envaidecer o inimigo. Sabia, também, que quando fossem
reveladas as perdas navais aliadas começaria a inevitável procura de um bode
expiatório. Para certo setor da Imprensa americana, o contra-almirante Crutchley
parecia talhado à medida para esse papel. Ora se este fraco almirante tinha as
suas culpas no cartório, a verdade era que muitos outros as tinham, também.

Embora a disposição que deu aos seus barcos de patrulhamento parecesse


convidar à derrota, o certo é que o plano de Crutchley fora estudado e aprovado
por Turner. Infelizmente, nem este nem o seu subordinado britânico estavam ao
corrente da capacidade e das limitações do radar dos dois contratorpedeiros de
patrulha, aos quais destinaram posições que tornaram inúteis os diagramas do
radar, devido às massas de terra adjacentes.

A transmissão de informações foi imperfeitíssima e a interpretação de Turner


desastrosa. As comunicações eram detestáveis. Este aspecto da situação foi bem
resumido da seguinte maneira:

«O sistema físico cedeu, o que é compreensível se considerarmos o equipamento


de que a esquadra então dispunha, mas as faltas mais graves ficaram-se a dever
ao elemento humano, ao fato de os comandantes não comunicarem uns aos
outros as informações que tinham. A noite foi fértil em falhas trágicas da cadeia
informativa. O almirante Crutchley não informou as forças de cruzadores do
norte e do leste de que abandonava a posição, nem comunicou ao almirante
Turner que não retomava o seu lugar no patrulhamento. A força do sul não
informou a do norte, durante minutos de importância vital, que se encontrava sob
ataque inimigo. Os almirantes Turner e Crutchley não transmitiram a nenhum
dos grupos uma apreciação dos dados que eram do seu conhecimento à meia-
noite. A omissão mais prejudicial foi a de anunciar que os porta-aviões tinham
retirado. Se tal fato fosse conhecido, quaisquer aviões que sobrevoassem os
navios seriam, ato contínuo, considerados inimigos. Cada um dos comandantes
adormeceu num manto de suposições pessoais, todas diferentes umas das outras
e todas erradas. Acordou-os a todos um espantoso pesadelo de morte.»

Os comandantes e as tripulações dos barcos não faziam ideia das dificuldades e


dos acasos dos combates noturnos. Tanto o Quincy como o Vincennes haviam
sido recentemente transferidos da Esquadra do Atlântico, na qual, durante quinze
meses, não tinham enfrentado o inimigo nem realizado exercícios de combate
noturno.

Mais tarde, Turner interrogou muitos sobreviventes de Savo. Verificou, então,


que muito poucos tinham consciência da tensão que uma batalha deve gerar. Um
número razoável de homens cujo dever era estar acordado, dormia; só uma
minoria estava psicologicamente preparada, e nenhum dos barcos se encontrava
materialmente em condições de travar combates daquela natureza. Todos os
navios estavam em condições péssimas, no que respeitava a riscos de fogo. A
armazenagem descuidada de gasolina de aviação, de elevado índice de octana, e
de outras matérias inflamáveis causaram a perda de diversos navios e centenas
de vidas. Oficiais e marinheiros deram repetidas provas de coragem, em Savo;
mas a coragem, só, não podia chegar.

O alto-comando naval encontrava-se perante um desagradável dilema. O


comandante da Força Expedicionária demonstrara uma monumental falta de
discernimento, para não dizer mais. O comandante do setor, que não
comparecera a transcendente conferência de Koro e não dera ao chefe do seu
estado-maior os poderes necessários para falar em seu nome, nessa conferência,
e com todo o apoio da sua autoridade, também não se distinguiu por aí além. No
entanto, mais uma vez devemos tentar julgar a situação à luz das informações de
que então dispunham King e Nimitz. Só decorridas semanas chegou às mãos de
qualquer deles um relatório coerente do que se passou em Savo. Quando
dispunham de conhecimentos suficientes para agir objetivamente, Savo fora
surpreendida por acontecimentos explosivos. Em essência, talvez se tratasse de
uma questão de «quanto menos se fala mais se acerta».

Ao meio-dia do dia seguinte a esta quase catástrofe, os transportes e os navios de


carga de Turner começaram a recolher barcaças. Ao fim da tarde, o último navio
do almirante, acompanhado pelos Austrália, Hobart, San Juan e pelo danificado
Chicago, passou pelo Lengo Channel, rumo a leste.

Os fuzileiros estavam entregues a si próprios.


6. «TEMOS UM PEQUENO PONTO DE APOIO»

ÀS nove horas da manhã de domingo, Vandegrift convocou para uma


conferência o seu estado-maior e os seus comandantes de regimento. Depois de
algumas especulações pessimistas quanto às consequências da batalha naval, o
general decidiu que:

1) as operações em terra se resumissem a ativo patrulhamento;

2) se organizassem imediatamente defesas para repelir ataques pelo mar;

3) os aprovisionamentos fossem transferidos para depósitos dispersos;

4) se tomassem, o mais depressa possível, as providências necessárias para


apoiar operações aéreas.

Grupos escolhidos começaram a trabalhar nestes quatro projetos e, ao fim da


tarde, estava estabelecido um cordão rudimentar de defesa costeira, que se
estendia do Ilu (Tenaru) para oeste, contornava Lunga e seguia para um ponto
cerca de 900 metros a oeste e a sul de Kukum. Este esquema defensivo, com
poucos homens, estava reforçado por peças de 37 mm e calibre 50, dispostas de
maneira a fazer frente ao contradesembarque que o general considerava
iminente.

Vandegrift deslocou um batalhão para uma posição central, como Força de


Desembarque de reserva, o reteve o controle dos tanques e de peças
semicaterpilar de 75 mm. Durante o dia, o coronel Robert H. Pepper,
comandante do 3.º Batalhão de Defesa, colocou os seus canhões antiaéreos de 90
mm perto do aeródromo. Tudo isto exigiu uma prodigiosa quantidade de
trabalho, mas ao fim da tarde de segunda-feira Vandegrift achou que as
disposições por si ordenadas tinham progredido o suficiente para garantir uma
calorosa recepção a quaisquer atacantes vindos do mar.

Infelizmente, só tinham sido desembarcados dezoito rolos de arame farpado. Nos


porões dos navios que regressavam a Nouméa, viajavam milhares de sacos de
areia, assim como todas as ferramentas de esquadra, pelotão e companhia:
machados, serras, escavadores de buracos para estacas, pás, machadinhas e
picaretas. Não havia minas antitanque nem antipessoal, nem nada que as
substituísse. Em contrapartida, os sacos de palha de arroz tecida deixados pelos
japoneses substituíam muito bem os sacos de areia que seguiam para a Nova
Caledônia.

O material abandonado pelo inimigo era abundante e valioso e minorava, até


certo ponto, a escassez de equipamento mecânico necessário para completar o
campo de aviação: quatro tratores pesados, seis rolos compressores, duas
locomotivas a gasolina, com vagonetas, e uma dúzia de camiões Chevrolet, que
tinham escapado ilesos as bombas e às granadas dos canhões navais e que foram
postos imediatamente em funcionamento. Os sapadores viram-se perante um
problema difícil. Os japoneses tinham começado a trabalhar das pontas para o
meio, onde havia uma depressão de quase 60 metros de comprimento, que exigia
um enchimento de cerca de 6000 metros cúbicos. As pás mecânicas, os camiões
basculantes e as niveladoras tinham ficado nos porões dos navios. No entanto,
numa das primeiras levas fora desembarcada uma escavadora média, da qual o
seu experimentado operador soube tirar o maior partido possível e que, dadas as
circunstâncias, valia muito mais do que o seu peso em ouro.

Outras faltas, porém, eram irremediáveis e graves. Aparelhos de radar,


equipamento de rádio terra-ar, sereias de aviso de ataque aéreo iminente,
instrumentos de agrimensura, de cartografia e de cópia — tudo isso ia a caminho
do sul. Mas os japoneses tinham tido o cuidado de improvisar um eficaz sistema
de alarme contra ataques aéreos e abandonado uma extraordinária quantidade de
material de desenho.

No dia 9 de Agosto, um grande número dos fuzileiros de Guadalcanal


transferiram aprovisionamentos de um lado para outro e escavaram abrigos.
Outros efetuaram patrulhas. Uma das patrulhas, um grupo de reconhecimento de
doze homens, foi encarregada de inspecionar o Matanikau, um rio ameaçador e
não vadeável, milha e meia a oeste de Kukum. Os fuzileiros chegaram à margem
leste sem incidentes, mas quando os homens da frente estavam com a água pelos
tornozelos, na faixa de areia da embocadura do rio, foram alvejados a tiro, do
que resultou a morte de um oficial e ferimentos em diversos soldados. No dia
seguinte, outra patrulha, constituída por um pelotão de combate, forçou a
travessia, mas foi obrigada a retroceder para a margem leste. Como as incursões
feitas a leste e pelo Lunga acima não tinham encontrado inimigos, pareciam de
certo modo confirmadas as suposições de que os japoneses haviam fugido para
oeste. Trabalhadores coreanos — «térmitas», como lhes chamavam os seus
captores— confirmaram tal hipótese. No dia 12 de Agosto, foi capturado um
marinheiro japonês, um indivíduo rude, de uniforme branco com colarinho e
punhos azuis. Após um interrogatório demorado, ajudado por alguns golos de
brande medicinal, o tipo admitiu, relutantemente, que na selva se encontravam
centenas de esfaimados camaradas seus, ansiosos por se render.

Esta história, com foros de possibilidade, confirmou um curioso relatório que o


oficial das informações recebera na véspera, quando uma patrulha afirmara ter
visto uma «bandeira branca» içada na margem ocidental do Matanikau. Foi o
suficiente para o tenente-coronel Goettge decidir investigar pessoalmente e sem
demora o assunto.

Enquanto, à tarde, comia feijões frios com Vandegrift, Goettge expôs-lhe o seu
plano. O general não se mostrou muito entusiasmado mas o seu G-2 foi
persistente e, por fim, o comandante da Divisão acedeu a que Goettge
conduzisse pessoalmente uma patrulha ao ponto onde a bandeira branca fora
vista. Ato contínuo, o coronel reuniu 25 homens, a maioria deles do seu
departamento de informações, e pouco depois da meia-noite embarcavam todos
numa barcaça «Higgins», em Kukum.

Jamais se saberão pormenores da tragédia que se abateu sobre esta imprudente


expedição. Os três únicos sobreviventes foram unânimes em declarar que a
patrulha desembarcou cerca da meia-noite a oeste do Matanikau, foi logo
descoberta pelos japoneses e praticamente dizimada num tiroteio que durou
menos de cinco minutos. Os três sobreviventes fugiram a nado, a rastejar e a
vau, para leste, e chegaram ao nascer do dia aos postos avançados, com as mãos
e os joelhos profundamente lacerados pelo coral e arrasados de fadiga. Nada
mais se soube da sorte de Goettge ou daqueles que, presumivelmente, com ele
pereceram.

Pouco antes do G-2 partir na missão donde não regressaria, um Catalina,


pilotado pelo ajudante do contra-almirante «Slew» McCain, aterrou na pista a
que em breve seria posto o nome de «Campo de Aviação Henderson», em
memória de um piloto de bombardeiro, dos Fuzileiros Navais, morto na batalha
de Midway. Foi o primeiro aparelho a utilizar a pista, acabada de completar
pelos fuzileiros. A pista não «atapetada», media apenas 780 metros de
comprimento e faltavam-lhe muitas coisas, como sistema de drenagem, áreas de
estacionamento revestidas, etc., Mas o ajudante de McCain achou-a em
condições de ser usada pelos caças.

O mau tempo detivera as «águias» de Rabaul em terra, em 9 de Agosto, mas nos


três dias seguintes elas vingaram-se e não deram descanso à improvisada e
primitiva pista. Mal levantavam voo, os sapadores corriam a encher os sulcos
abertos pelos aviões. Em 12 de Agosto, a artilharia antiaérea de Pepper começou
a funcionar e, vários dias depois, a 11.ª Esquadra Aérea informou Tóquio que
cinco Bettys tinham ficado gravemente danificados no ataque aéreo daquele dia:
«A artilharia antiaérea inimiga está a demonstrar uma pontaria muita certeira.»
Os bombardeiros, advertidos desse fato, passaram de três mil para sete mil e
quinhentos metros de altitude, com a consequente perda de precisão.

Esperava-se agora ansiosamente a chegada dos prometidos aparelhos dos


Fuzileiros Navais. Dia a dia, os engenheiros aumentavam a pista. Com dinamite
japonesa abatiam as árvores que impediam o avanço, na extremidade norte, e
com calcadeiras de terra acionadas por compressores de ar japoneses
comprimiam entulho, arrancado por pás e picaretas japonesas manejadas por
fuzileiros e transportado para o aeródromo em camiões japoneses, alimentados a
gasolina japonesa.

Entretanto, os sapadores utilizavam vigas japonesas para construir pontes e


material japonês para reparar cais japoneses, danificados pelos
bombardeamentos do «Dia D». Os cozinheiros preparavam as refeições em
fogões de campanha, com petróleo japonês, e os fuzileiros faziam bicha para se
servirem das latrinas, construídas com madeira japonesa e protegidas das moscas
por redes japonesas. Quando a sereia japonesa anunciava a aproximação de
aviões japoneses, os fuzileiros abrigavam-se em buracos abertos e tapados pelos
japoneses. Todos os homens fumavam cigarros japoneses, bebiam cerveja
japonesa e escutavam a Rosa de Tóquio.

Alguns variavam as rações de emergência com conservas de algas japonesas,


comidas em tigelas japonesas com pauzinhos japoneses, e um reduzido número
de felizardos empanturrava-se de carne de caranguejo e deliciosas fatias fininhas
de carne de vaca com molho de soja, refeição japonesa requintada, que
completavam com rebuçados japoneses e saquê, bebido sofregamente por
delicadas tacinhas japonesas. Muitos escreviam cartas em papel de arroz
japonês, contavam o número de dias que faltavam para o seu alistamento
terminar com o auxílio de um ábaco japonês e utilizavam dinheiro de ocupação
japonês para comprar recordações japonesas. Um sargento artilheiro abriu uma
pequena escola em que dava lições acerca de arranjos florais japoneses,
servindo-se para isso de um livro maravilhosamente ilustrado, acerca da matéria,
publicado havia pouco tempo em Tóquio.

Em Tulagi, Merritt Edson passava algumas horas diárias a ler a tradução inglesa
da Breve História do Japão, e um comandante de companhia, que «libertara» um
toca-discos e uma coleção de discos japoneses de um armazém de Carpenter’s
Wharf, fornecia música apropriada à messe dos coronéis, à hora do jantar.
Costumava-se dizer de brincadeira, nesses dias, que seria vantajoso para os
fuzileiros trocarem o quartel-mestre do seu Corpo pelo seu equivalente de
Tóquio. «Os homens estão ótimos, bem dispostos e, graças a Deus, ainda de boa
saúde», escreveu o general ao comandante-chefe.

Os fuzileiros falavam, esperançados, em regressar à Nova Zelândia dentro de


três semanas. Assim que as «forças de guarnição» do Exército chegassem, os
heróis das Salomão embarcariam e seguiriam, através dos mares azuis, para sul,
onde encontrariam excitantes e, talvez, condescendentes jovens, se regalariam
com pequenos-almoços de bife e ovos e bateriam os bares de Wellington e
Auckland. Alguns, porém, encaravam a situação mais objetivamente.

Um deles era o general de divisão Millard F. Harmon, o oficial do Exército de


maior patente no setor de Ghormley. Ao abrigo do ComSoPac, Harmon
comandava todas as unidades do Exército e da Força Aérea dos Estados Unidos
no Pacífico Sul. Tanto ele como o seu chefe de estado-maior, o general de
brigada Nathan B. Twining (irmão mais velho do adjunto de operações de
Vandegrift), eram indivíduos realistas, de idéias claras, e ambos consideravam
com ceticismo a possibilidade de a Marinha poder apoiar a posição conquistada.
Em 11 de Agosto, Harmon confiou as suas preocupações ao general Marshall,
num bilhete pessoal:

«O que sobretudo me impressiona, relativamente à ação nas Salomão, é o fato de


não estarmos preparados para “prosseguir" [... | Poderão os Fuzileiros aguentá-
la? Há motivos consideráveis para duvidar.»
Harmon não estava a ser pessimista. Havia, de fato, motivos consideráveis para
duvidar. Felizmente, esta carta sombria não caiu nas mãos da imprensa
americana, cujos representantes em Washington estavam ávidos por quaisquer
migalhas de informação.

E em meados de Agosto de 1942 a sua dieta diária eram migalhas, pelo menos
no que respeitava à Marinha. Durante semanas, depois dos acontecimentos de
Savo, foram pouquíssimas as que o almirante King se dignou sacudir da sua
mesa. Nesse período, o oficial encarregado de transmitir as informações
perguntou diversas vezes ao almirante o que havia de dizer aos repórteres, que
não o deixavam em paz com pedidos de notícias das Salomão. «Não lhes diga
nada», volvia secamente o irritado King. «Quando acabar, dir-lhes-á quem
ganhou.»

Poucos dias depois da batalha de Savo, os japoneses tinham chegado à conclusão


de que a Marinha americana já não constituía uma ameaça para as águas entre
Guadalcanal e Tulagi. Assim, diariamente, a partir de 11 de Agosto, um cruzador
ou diversos contratorpedeiros deslizavam, insolentes, para cima e para baixo, a
uma distância apenas suficiente para estarem fora do alcance dos velhos canhões
navais de 5 polegadas do coronel Pepper. De vez em quando, um submarino
atrevia-se a emergir e, indolentemente, bombardeava Tulagi e perseguia as
barcaças «Higgins» que se encontrassem nas imediações. Os observadores de
Tulagi viram pela primeira vez uma destas aventuras de «polícias e ladrões» na
manhã de 12 de Agosto. Cerca das dez da manhã, um posto de observação
localizou duas barcaças «Higgins» duas milhas ao largo. Ninguém prestou
grande atenção; tratava-se do começo do que todos julgavam seria um serviço
rotineiro de correios e passageiros.

Os observadores não tardaram, porém, a compreender que estavam a


testemunhar a mais dramática das cenas imagináveis: uma autêntica corrida entre
a vida e a morte. A cerca de 300 metros a oeste das barcaças, que de nada
suspeitavam, emergiu da água encapelada um vulto preto. Enquanto o submarino
se virava para as «Higgins», figuras vestidas de branco saíam da torre blindada e
corriam para o canhão da proa. Os tripulantes das barcaças viram, então, o
submarino e a espuma começou a voar, diante das proas, quando os timoneiros
ligaram os motores. De súbito, ergueu-se fumo azulado de uma das barcaças,
cuja velocidade diminuiu.

— Jesus, o motor avariou-se! — exclamou em voz emocionada um fuzileiro, a


chorar.

Enquanto, na praia, os homens impotentes praguejavam e rezavam, a barcaça da


frente reduziu a velocidade, a segunda colocou-se a seu lado, tripulantes e
passageiros transferiram-se de uma para a outra e a primeira readquiriu
velocidade. Um gêiser de nove metros esguichou 90 metros atrás da embarcação
superlotada e outro a igual distância, à frente. O submarino disparou, mas
ultrapassou o alvo. Encurtara a distância para menos de uma milha. Pelo seu
lado, a «Higgins» tinha de percorrer uma milha para alcançar a segurança do
porto de Tulagi.

De súbito, quatro esguichos de água encharcaram os japoneses que serviam o


canhão da proa. Uma bateria de artilharia dos fuzileiros dava, pela primeira vez,
provas da eficiência que tão falada viria a ser no Pacífico. Uma granada de uma
segunda salva de enquadramento pareceu atingir o submarino. Os artilheiros
correram para a torre blindada e o comandante mandou imergir. Passados alguns
minutos, as «Higgins» chegaram ao Carpenter’s Wharf e atracaram.

Três dias depois, pela primeira vez após a retirada de Turner, uma semana antes,
surgiram navios americanos, ao largo de Lunga. Tratava-se dos
contratorpedeiros-transportes Little, McKean e Gregory, que traziam consigo um
pequeno destacamento operacional de Fuzileiros Aéreos, comandado pelo major
Charles H. Hayes, 400 tambores de gasolina de aviação, quase 300 bombas,
munições para metralhadoras de aviões, ferramentas e peças sobressalentes.
Outros passageiros importantes eram o guarda-marinha George W. Polk e um
grupo de homens pertencentes ao CUB I, uma unidade de manutenção de base
aeronaval. Os CUBs eram, então, desconhecidos dos fuzileiros, mas estes não
tardariam a estimar os do guarda-marinha Polk.

Isto deu ao oficial de informações do almirante King a oportunidade de dizer


qualquer coisa. No dia seguinte, o New York Times anunciava, em cabeçalho,
que os fuzileiros estavam «REFORÇANDO A POSIÇÃO» nas Salomão, pois:
«A MARINHA CONTINUA A MANDAR APROVISIONAMENTOS».
Segundo o correspondente financeiro daquele jornal, um especialista digno de
toda a confiança, a confirmação oficial de que a Marinha dos Estados Unidos
dominava firmemente a situação provocara grande entusiasmo na Wall Street,
onde os preços «subiram um a dois pontos». O especialista financeiro do Herald
Tribune, porém, denunciava acentuado ceticismo e limitava-se à seguinte e
comedida observação: «Os negociantes profissionais parecem inclinados a
manter-se na expectativa, enquanto aguardam o resultado da invasão das ilhas
Salomão.» Os «profissionais» estavam condenados a manter-se na expectativa
durante muito tempo.

Os relatórios japoneses deste período revelam um curioso misto de mistificação


e um contentamento crescente com a situação. Porque não eram reforçados os
imobilizados americanos? Se estavam, realmente, abandonados naquela «ilha
insignificante», poder-se-ia liquidá-los sem grande dificuldade. Mas primeiro era
conveniente estabelecer contato com os elementos esfaimados que se
encontravam a oeste do Matanikau. Por isso, em 16 de Agosto, o
contratorpedeiro Oite desembarcou, em pleno dia, provisões e uma guarda
avançada de 200 homens da 5.ª Força Especial de Desembarque, de Sasebo. No
dia anterior, aviões de transporte tinham lançado cestos com comida, munições
de armas ligeiras, remédios e exortações de coragem. Uma grande parte dos
cestos caiu nas linhas dos fuzileiros. Um deles continha uma mensagem
ominosa: «Vêm socorros a caminho! Banzai!»

Talvez isto tenha induzido Vandegrift a ordenar a Rupertus que embarcasse o 2.º
Batalhão, o 5.º de Fuzileiros, os Raiders e os Paraquedistas de Tulagi para
Guadalcanal, assim que dispusesse de transportes.

Surgiu, então, um novo problema, que ameaçou debilitar a força de combate da


Divisão: em virtude do desrespeito da disciplina sanitária, propagou-se
rapidamente uma forma aguda de disenteria que roubava quilos de peso a um
homem entre o nascer e o pôr do Sol. Centenas de padecentes visitavam as
latrinas vinte a trinta vezes por dia, e em meados de Agosto um homem em cada
cinco estava tão fraco que quase não se podia arrastar para os fétidos cubículos.
Alguns tinham de ser ajudados a baixar o a subir as calças.

O médico da Divisão dominou o problema e a incidência da disenteria começou


a baixar lentamente, mas ao mesmo tempo surgiram infecções provocadas por
fungos, sobretudo nos pés. Conscientes de que poderiam ter de correr para um
buraco em qualquer das vinte e quatro horas do dia, era natural que os homens
hesitassem em descalçar as peúgas e os sapatos e despir as calças. A maioria dos
fuzileiros estavam incrivelmente sujos. Um banho no Lunga, experiência digna
de ser invejada, era coisa que pouquíssimos apreciavam.

Em 17 e 18 de Agosto, Tulagi e Guadalcanal foram bombardeadas, do mar, e nos


mesmos dias Bettys lançaram bombas de ação retardada, que explodiam
esporadicamente sob a pista de aviação e complicavam a tarefa dos sapadores.
Estes sofreram baixas após cada ataque aéreo, ao tentarem reparar o aeródromo
para os aviões prometidos. Mas quando chegariam eles?

A tensão cresceu, gradualmente, e as brincadeiras dos primeiros dias quase


desapareceram. Sem japoneses sobre quem descarregar os seus agravos e a sua
crescente frustração, os fuzileiros não poupavam invectivas desdenhosas aos
«mestres-do-lambaz», que tinham «levantado ferro»; aos «focinhos-de-cão» do
Exército, «repimpados no traseiro em Nova Caledônia», e ao «Doug Abrigo»
MacArthur. Os fuzileiros de Vandegrift estavam em ponto de rebuçado para uma
batalha. Não desejavam outra coisa.

Desde o aniquilamento da patrulha de Goettge que Vandegrift pensava numa


operação limitada, para limpar a margem ocidental do Matanikau e libertar,
assim, a sua posição da ameaça lá existente. Tal ameaça era, contudo, mais
potencial do que real — o que não impedia que os japoneses entrincheirados
nesse reduto estivessem demasiado perto e a sua presença lançasse uma sombra
sinistra na cabeça-de-ponte da praia. Por isso, em 17 de Agosto, o general
decidiu atacar o inimigo de três direções, simultaneamente.

A Companhia Love, do 5.º de Fuzileiros (capitão Lyman D. Spurlock), seguiria


por terra até um ponto cerca de 900 metros a montante da foz do rio, atravessá-
lo-ia, viraria para a direita e atacaria na direção do mar. A Companhia Baker
(capitão William L. Hawkins), que serviria de força de diversão, estabeleceria
posições na margem leste, atacaria o inimigo a tiro e, se possível, atravessaria a
língua de areia. Uma terceira companhia (comandada pelo capitão Bert W.
Hardy Júnior) seguiria de barco até um ponto várias milhas a oeste do rio,
desembarcaria, atravessaria a aldeia de Kokumbona e atacaria para leste. Esta
operação coordenada seria precedida de concentrado fogo de artilharia sobre
prováveis posições inimigas.

Às nove da manhã de 19 de Agosto, Spurlock abandonou o seu bivaque no


interior, onde chegara na véspera à noite, e avançou para norte, na direção da
aldeiazinha costeira de Matanikau. As dificuldades surgiram quase
imediatamente, provocadas tanto pelo terreno desconhecido como pelos
japoneses. Dois comandantes de pelotão foram mortos e vários soldados feridos
por fogo de automáticas, mas ele continuou a avançar para a costa marítima.
Entretanto, imobilizado na margem leste do rio por certeiro fogo de
metralhadora, Hawkins via-se impossibilitado de se mexer, quanto mais de
atravessar a língua de areia.

A companhia de Hardy, que deveria avançar do oeste depois de desembarcar,


ainda não chegara ao ponto de ação quando os batedores de Spurlock pararam à
entrada da selva que cercava o conjunto de cabanas desertas, com telhados de
folhas de palmeira, conhecido por aldeia de Matanikau. A guarda avançada viu-
se debaixo de fogo, que retribuiu com vigor.

Os japoneses reuniram-se apressadamente e, antes que os homens de Spurlock


soubessem o que estava a acontecer, viram-se alvo da primeira carga-banzai de
baioneta, à luz do dia, da guerra do Pacífico. Em menos de dez minutos estava
tudo acabado — para os japoneses. Meia dúzia de Brownings automáticas
dizimaram os atacantes, pela frente e pelos flancos, e os poucos inimigos que
não tinham participado no banzai dispararam alguns tiros e fugiram para Point
Cruz. Contaram-se sessenta e cinco japoneses mortos, contra quatro fuzileiros
mortos e onze feridos.

Mais ou menos ao mesmo tempo, a companhia de Hardy desembarcava de


barcaças «Higgins» nas imediações da aldeia Kokumbona. A sua viagem fora
aventurosa. Alvos, primeiro, das granadas de um submarino e, depois, das de
dois contratorpedeiros, a demora era compreensível. Mas o desembarque foi
coroado de êxito e os derrotados defensores de Kokumbona fugiram para a
selva. Nesse interim, Spurlock examinava o campo de batalha, recolhia armas,
diários e outros documentos e retirava, de barco, para Kukum.

O fato de este combate ter culminado com um pequeno êxito deveu-se à


serenidade, à determinação e à vigilância do capitão Spurlock e dos seus
homens. Embora sem exercer qualquer influência no desenrolar da campanha, a
escaramuça proporcionou algumas lições. As comunicações tinham falhado,
como de costume; os aparelhos de fonia demonstraram, mais uma vez, ser
absolutamente inúteis, naquela gênero de terreno, e a coordenação dos
movimentos de unidades muito separadas foi um completo malogro. A marcha
de Spurlock demonstrou claramente quanto tempo e quanta energia eram
necessários para uma coluna com a força de uma companhia, apenas, avançar na
selva. Em 19 de Agosto, Spurlock levara quatro horas extenuantes para percorrer
menos de uma milha.

No mesmo dia, Roosevelt mandou o seguinte telegrama a Stalin: «Creio que


temos um pequeno ponto do apoio no sudoeste do Pacífico, donde os japoneses
verificarão que será muito difícil expulsar-nos. Sofremos perdas navais
volumosas, mas a vantagem ganha valeu o sacrifício e continuaremos a exercer
forte pressão sobre o inimigo.»

Possivelmente, o presidente ainda não lera as mensagens de 16 e 17 de Agosto,


enviadas por Ghormley a King e a Nimitz. Nelas, o ComSoPac advertia os seus
superiores de que os japoneses poderiam retomar Guadalcanal, a não ser que as
forças ocupantes recebessem mais apoio naval e mais reforços. Ghormley teria
ficado, pelo menos, muito surpreendido se lesse uma cópia do telegrama do
presidente americano para o marechal soviético. Naquela altura, nem os
japoneses nem os americanos tinham no Pacífico Sul os meios necessários para
exercer muita pressão. Mas em Tóquio e em Rabaul os planejadores japoneses já
estudavam um plano destinado a pisar, com força e o mais depressa possível, os
calos aos americanos.

7. «A MORTE É MAIS LEVE DO QUE UMA


PENA» 5

Na manhã de 10 de Agosto, o Quartel-General imperial recebeu uma mensagem


que confirmou a opinião já existente de que os desembarques americanos nas
Salomão eram insignificantes. Esta mensagem descrevia os invasores como uma
força de alguns milhares de soldados cujo moral era baixo e cuja missão
consistia apenas em destruir o aeródromo e retirar. Esta informação errada
partira do adido militar japonês em Moscou. Já não era só a Marinha Imperial a
enganar o Exército; os russos também davam uma ajuda.

Na mesma tarde, o almirante Nagano encontrou-se com o general Sugiyama,


encontro de que resultou um novo Acordo Central em que se delinearam futuras
operações na Nova Guiné oriental e nas Salomão, «de acordo com a mudança
operada na situação». Este documento salientava a importância de se exercer
constante pressão contra Port Moresby e ordenava a Hyakutake que retomasse
imediatamente Tulagi e Guadalcanal, com tropas que seriam postas à sua
disposição. A Seção do Exército do Quartel-General imperial apressou-se a
designar a 35.ª Brigada de Infantaria e mais dois regimentos reforçados para a
ordem de batalha do 17.º Exército.

Na realidade, porém, as disposições deste documento não melhoraram muito a


situação do general Hyakutake. A 35.ª Brigada estava no Palaus e um dos
regimentos de infantaria nas Filipinas. A unidade que se encontrava mais
próximo do campo de ação, o 28.º de Infantaria do coronel Kiyanao Ichiki,
estava em Guam, a preparar-se para regressar ao Japão. Afinal, o regimento de
Ichiki não invadira as praias do Midway.

Dois dias depois (12 de Agosto), o vice-chefe do Estado-Maior General, tenente-


general Moritake Tanabe, decidiu resolver o problema de Hyakutake:

«A amplitude das operações de retomada dos pontos estratégicos das ilhas


Salomão será decidida pelo comandante do Exército, baseado no seu parecer
acerca da situação do inimigo. O Quartel-General crê que é possível utilizar a
35.ª Brigada de Infantaria e o Destacamento Aoba, se a situação o exigir. No
entanto, como nas circunstâncias atuais a oportunidade tática deve ser uma
consideração essencial, acha-se preferível, se possível, retomar imediatamente as
referidas zonas, utilizando apenas o Destacamento Ichiki e as Forças Especiais
de Desembarque da Armada.»

Esta ordem é importante por duas razões. Primeira, porque reflete a atmosfera de
incrível excesso de confiança que envolvia, então, o Quartel-General imperial;
segunda, porque prenuncia a política de ação de via reduzida que contribuiu
decisivamente para a série de derrotas sofridas pelo Japão em Guadalcanal.

Houve, no Quartel-General imperial, quem se opusesse, veementemente, ao


emprego «apenas do Destacamento Ichiki e das Forças Especiais de
Desembarque da Armada». Um desses oficiais (anteriormente secretário do
estado-maior de Tojo e então chefe da Divisão Administrativa, Seção do
Exército, Q. G. imperial) foi o coronel Susumu Nishiura. Quando teve
conhecimento do plano, recordou «o que acontecera já tantas vezes. Em
Nomanhan, contra os russos, e mais tarde, repetidamente, na China, quando
empenhámos forças inadequadas para o objetivo em vista».
Nishiura ficou tão preocupado com o projeto que telefonou para a residência do
primeiro ministro e ministro da Defesa, Tojo. «Mas ele [Tojo] respondeu que não
podia fazer nada, que a decisão pertencia ao general Sugiyama e que não
interferiria.» Nishiura procurou, então, ser ouvido pelo seu chefe. Sugiyama
escutou-o atentamente, e respondeu: «As ordens foram dadas; não podem agora
ser revogadas. «O coronel voltou para o seu gabinete. «Não podia fazer mais
nada. Não teria sido melhor aguardar alguns dias, para poder reunir uma força
maior, e não repetir, assim, os erros anteriores? Só me restava ter esperança de
que o coronel Ichiki fosse bem sucedido.»

Os elementos militares encarregados da Operação «KA», ou seja, do


aniquilamento das tropas americanas e da «imediata recaptura de pontos
estratégicos das ilhas Salomão», embarcaram em Guam, sem demora, e partiram
logo para Truk. Aí, passados poucos dias, o comandante do regimento recebeu
instruções de um oficial do Estado-Maior, que viera de avião do quartel-general
de Hyakutake. Era o seguinte o teor das ordens recebidas pelo coronel Ichiki:

«Quartel-General, 17.º Exército, 15.30 h. de 13 de Agosto. Rabaul.

a) A potencialidade da força invasora que desembarcou no setor das Salomão


ainda é desconhecida, mas não houve qualquer atividade inimiga, como
esperáramos. Até hoje, 13 de Agosto, sabe-se de certeza que não utilizaram o
campo de aviação lá existente.

b) O Exército colaborará com a Marinha, atacará sem demora e destruirá o


inimigo desembarcado nas Salomão, enquanto ele tenta completar a ocupação.
Retomará e manterá esses pontos vitais.

c) O Destacamento Ichiki colaborará com a Marinha, recuperará sem demora


e manterá os campos de aviação de Guadalcanal.

d) Se isto não for possível, este destacamento ocupará uma parte de


Guadalcanal e aguardará a chegada de tropas, pela retaguarda. Para este efeito,
será organizada uma unidade ponta de lança, de aproximadamente 900 homens,
que embarcará em seis contratorpedeiros que se encontram perto e seguirão para
Guadalcanal por via direta.»

As forças avançadas desembarcariam em Taivu Point, cerca de 22 milhas aéreas


a leste da posição americana, pouco depois da meia-noite de 18 de Agosto. Um
destacamento de uma Força Naval de Desembarque (cerca de 250 oficiais e
soldados) desembarcaria perto da abandonada Kokumbona, numa manobra de
diversão. O resto do regimento do coronel Ichiki, num total de quase 1500
homens, desembarcaria em Taivu, durante a semana.

O almirante Mikawa protestou contra a incorporação de uma unidade do


Exército à qual fora anteriormente dito que regressaria à pátria. Receava que a
inesperada mudança de decisão prejudicasse o moral das tropas. Dispunha, em
Rabaul, de três unidades de força de desembarque, preparadas para combate, que
lhe pareciam mais apropriadas do que as tropas do coronel Ichiki. O almirante
observou, ainda, que o setor Tulagi-Guadalcanal era, antes do mais nada, uma
responsabilidade da Marinha. As suas sugestões não foram aceites.

A responsabilidade da entrega, em segurança, da «unidade de ponta de lança» foi


confiada ao comandante da Força de Reforço, contra-almirante Raizo Tanaka,
um homem cujo nome ombreia, com justiça, com os dos melhores comandantes
de ambos os lados. Tanaka recebeu as suas ordens com apreensão e, mais tarde,
escreveu a tal respeito:

«Sem querer saber para nada da minha opinião... esta ordem impunha que a mais
difícil das operações de guerra — um desembarque de frente para o inimigo—
fosse efetuada por unidades mistas, que não tinham qualquer oportunidade de
ensaiar a manobra nem, sequer, de a estudar preliminarmente... Na estratégia
militar, a conveniência sobrepõe-se, muitas vezes, à prudência, mas esta ordem
era absolutamente insensata. Não me custou compreender que devia reinar
grande confusão no quartel-general da 8.a Esquadra.»

A ordem que Tanaka recebeu não era «absolutamente insensata». Tampouco o


era a que fora entregue a Ichiki, em Truk. Mas as ordens de Ichiki baseavam-se
em informações muito vagas e que não mereciam a mínima confiança. Tinham
dito ao coronel que se encontravam cerca de 2000 americanos nessa «cabeça-de-
ponte da selva», que o moral desses homens era baixo, que alguns fugiam de
Guadalcanal para Tulagi e que pareciam todos ansiosos por abandonar uma ilha
que se encontrava «sob o domínio da Força Aeronaval japonesa».

Ichiki era um oficial distinto, com uma extraordinária folha de serviços,


considerado no Exército japonês como homem valente e resoluto e perito em
tática de infantaria. Na China, comandara batalhões durante vários anos. Ao ler
as ordens recebidas e ao recordar as informações que lhe tinham dado em Truk,
deve ter concluído que um dos seus batalhões chegaria para resolver o assunto,
sem precisar de esperar pelo resto do regimento. Salta aos olhos, sem dúvida,
que o coronel pouca atenção prestou às instruções de Hyakutake. Um indivíduo
mais circunspecto não agiria com a pressa impetuosa que perderia Ichiki.

Poucos minutos antes da meia-noite de 18 de Agosto, os fuzileiros de serviço


nos postos de escuta ouviram a rebentação provocada pela passagem de barcos
perto da praia, a grande velocidade. Cerca das três da madrugada, comunicaram,
mais uma vez, ter ouvido essa rebentação. Ao nascer do dia, corriam boatos de
um desembarque noturno, a leste, e o G-3, coronel Gerald C. Thomas, tomou
imediatamente as precauções necessárias para averiguar o que se passava.
Chamou, para isso, o ex-agente colonial britânico Martin Clemens. Depois de
beber uma chávena de chá tépido e de comer um quantidade de panquecas
ressequidas, Clemens (que aparecera nas linhas dos fuzileiros quatro dias antes,
com uma dúzia de batedores) ordenou ao primeiro-sargento Vouza que chefiasse
uma patrulha de nativos, de leste para oeste, em redor da posição americana.

Vouza, ex-membro da Polícia da Ilha, era um velho e experimentado batedor de


Guadalcanal. Perseguira, através das suas selvas, assassinos, ladrões de porcos e
de galinhas e perturbadores da paz de Sua Majestade britânica. Em 1939, após
25 anos de serviço honroso, Vouza reformara-se e fora para Malaita cultivar
inhame, mas quando os japoneses chegaram à ilha regressou apressadamente,
numa canoa, e solicitou readmissão no serviço ativo. Este nativo experiente,
inteligente e leal provaria que era um homem do invulgar coragem e indómita
força do vontade.

Antes mesmo de Vouza e os seus homens partirem, o capitão Charles Brush,


acompanhado pelo cabo Daniel Pule e três outros polícias nativos, atravessara o
Ilu à frente de uma forte patrulha de combate da Companhia Able, 1.º de
Fuzileiros, e seguira para leste, ao longo do caminho do Governo. Ao meio-dia,
Brush estava nas imediações de Koli Point, onde a sua guarda avançada
anunciou a vinda ao seu encontro de um grupo de japoneses, por entre os
coqueiros existentes entre o caminho e a praia. Brush desdobrou imediatamente
os seus homens e susteve o fogo até o inimigo estar a cerca de 90 metros. Só
então atacou.

Enquanto o grosso da sua patrulha imobilizava os japoneses, o tenente Joseph


Jachym virava rapidamente para a esquerda, com um pelotão, e ocupava
posições à retaguarda e à esquerda do inimigo. Este ficou, assim, entre fogo
automático convergente e, dos 34 que constituíam o grupo, só escaparam 3. Os
fuzileiros tiveram 6 baixas. Depois desta vitória, Brush «apertou as correias do
capacete», colocou sentinelas a leste e a sul, contatou, pela rádio, com o quartel-
general regimental e revistou pessoalmente os cadáveres.

Os capacetes dos japoneses mortos tinham a estrela do Exército imperial, e não o


crisântemo da Marinha. Quatro eram oficiais, usavam espada e binóculo, botas
engraxadas e uniformes bem passados a ferro, adornados com séries de fitas
multicores. Brush não perdeu tempo a revistar os estojos dos mapas; regressou
ao princípio da tarde, com documentos preciosos, que foram imediatamente
entregues ao capitão «Pappy» Moran, da seção de língua japonesa — constituída
apenas por ele — dos serviços de informações da Divisão. Uma vista de olhos
apressada convenceu-o de que os fuzileiros estavam na iminência de se ver em
sérios apuros. Os mapas apreendidos revelavam um conhecimento preciso,
extraordinariamente exato da disposição da artilharia nas imediações do
aeródromo. (Durante algum tempo, ninguém compreendeu como conseguira o
inimigo tais informações. Só mais tarde se descobriu que um posto de
observação japonês, situado no «Grassy Knoll», transmitia relatórios diários da
atividade dos americanos no aeródromo. Fotografias aéreas, tiradas de baixa
altitude, tinham fornecido ao inimigo pormenores valiosos. Não fora
desembarcado nenhum material de camuflagem...)

Vandegrift viu-se, então, perante a necessidade de tomar a primeira de muitas


decisões cruciais, que só ele podia tomar. Os diários apreendidos por Brush
revelavam que a força inimiga do leste consistia de parte de um destacamento
regimental do Exército nipônico, vindo de Guam. Mas, infelizmente, os
diligentes escrevinhadores dos diários tinham-se esquecido de mencionar
pormenores importantes, como a força e o armamento do destacamento, a sua
atual localização e as suas intenções. Vandegrift estudou, e rejeitou
acertadamente, a sugestão que lhe apresentaram de mandar um batalhão para
oeste. Sem uma reserva, estaria praticamente paralisado, se o atacassem ao
mesmo tempo de um ou de ambos os flancos e do mar. Não havia, pois, mais
nada a fazer senão intensificar as providências defensivas, reforçar os postos
avançados e sobretudo, estar sempre vigilante.

Assim, puseram-se os tanques de prevenção, distribuiu-se uma quantidade


suplementar de munições antipessoal, carregadas de metralha, às peças de 37
mm antitanques, encheram-se de areia centenas de sacos de arroz deixados pelos
japoneses e estendeu-se apressadamente, ao longo da posição do Ilu (Tenaru) o
arame farpado arrancado das cercas das plantações. Os observadores avançados
do 11.º de Fuzileiros de Del Valle reuniram-se aos defensores da linha do rio e,
depois de efetuadas experiências de comunicações pelo rádio e pela telegrafia,
um batalhão do obuses de 75 mm e de 105 de cano curto instalou-se na margem
leste e no areal da foz.

Além disso, vinham a caminho socorros importantes. Durante a tarde de 20 de


Agosto, o porta-aviões-escoltador Long Island —em que, pouco antes, fora
transformado o S. S. Mormacmail — chegou a uma posição a sueste de San
Cristobal e lançou o primeiro avião da Esquadrilha 232, do major Richard C.
Mangrum. A Esquadrilha 223, do capitão John L. Smith — 19 caças Wildcat,
ventrudos —, seguiu-se aos 12 bombardeiros Dauntless de Mangrum.

Uma hora depois, na suave claridade do anoitecer, Mangrum encontrou a pista,


sobrevoou-a uma vez e foi orientado, na descida, pelo major Charles H. («Fog»)
Hayes, ex-oficial de «sinalização para aterragem» de porta-aviões. Em poucos
momentos, os SBD e os Wildcats que seguiam Mangrum aterravam na pista, aos
ressaltos, e dirigiam-se, deselegantemente, para as áreas de estacionamento que a
flaqueavam. Centenas de oficiais e soldados de fato-macaco sujo saudaram com
entusiasmo a chegada da esquadrilha MAG 23. Um espectador, talvez
excessivamente exaltado, bateu palmas, saltou e gritou: «Agora os bastardos
podem vir!»

Poucas horas depois, «os bastardos» começaram a chegar.

Passava pouco da meia-noite, vigias de sentinela no bosque de coqueiros da


margem oriental do Ilu anunciaram «ruídos metálicos» inidentificáveis,
murmúrios e outros sons ominosos, e o tenente-coronel Edwin A. Pollock,
comandante do 2.º Batalhão do 1.º de Fuzileiros, mandou-os retirar para lugar
seguro. Um silêncio pesado, interrompido apenas, de vez em quando, por uma
restolhada de folhas de palmeira, envolvia as margens do rio. As ondas mornas
do mar desfaziam-se monotonamente na areia da foz.

Às 2.40 h. da manhã, os japoneses atacaram. As metralhadoras e as armas


automáticas ligeiras entoaram os seus lamentos fúnebres, explodiram granadas
nas posições americanas e a fantasmagórica luz verde das bombas luminosas
iluminou um corpo compacto de japoneses, a correr pelas águas baixas da
margem. Os defensores estavam preparados. À queima-roupa, as peças de 37
mm despejaram metralha sobre as filas atacantes. Os gritos de banzai! foram
subitamente substituídos por gritos de angústia. Os poucos japoneses que
sobreviveram a tal inferno rastejaram por cima dos corpos destroçados dos seus
camaradas mortos e moribundos para a margem oriental.

A primeira tentativa de Ichiki falhara, mas ele reorganizou as tropas e tentou de


novo. Depois de castigar as posições dos fuzileiros com fogo de canhão e de
morteiro, mandou uma companhia reforçada para o lado do mar do areal, a fim
de atacar à baioneta. Às cinco da manhã, este grupo chegou à posição, na praia,
de Pollock, cercada por uma fraca cerca de arame. Os atacantes hesitaram, ao
chegar ao arame, e ficaram expostos ao fogo de flanco das metralhadoras
montadas na praia, a oeste. Poucos segundos depois, a artilharia provocava
gêiseres de areia e envolvia a praia em chamas e morte.

Com a primeira luz parda da manhã houve uma desejada acalmia. De distâncias
superiores a 180 metros, alguns atiradores de Pollock visavam japoneses que
passavam, indistintamente, sob os coqueiros. «Visem-nos e abatam-nos!»
ordenava Pollock àqueles atiradores especiais, na melhor tradição do Corpo de
Fuzileiros. «Até parece ‘dia de recorde’ em Quantico!», exclamou um
metralhador ferido. «Jesus, qualquer azelha poderia ceifar aqueles idiotas!
Andavam de pé, com a breca, nem sequer tinham discernimento suficiente para
rastejarem! Quem diabo disse àqueles cabeças de trampa que eram soldados?»

Pouco antes de nascer o Sol, um nativo gravemente ferido chegou, de rastos, às


linhas dos fuzileiros. Era o primeiro-sargento Vouza. Os fuzileiros levaram-no
para o posto de comando de Pollock. Quando Clemens chegou, encontrou Vouza
quase morto:

«...estava num estado lastimoso, incapaz de se levantar. Quase não tive coragem
de o olhar. Arrastámo-lo para trás de um jipe, onde me contou o melhor que
pôde o que se passara, apesar da ferida hiante que tinha na garganta.

«Partira, para efetuar a sua patrulha, e levara uma bandeira americana em


miniatura, que lhe tinham dado como recordação. Ao pretender escondê-la numa
casa de Volonavua, deparara com três ou quatro pelotões de japoneses,
espalhados por toda a aldeia. Não tivera oportunidade de fugir com a sua
bandeira americana. Apanhado em flagrante, fora levado ao comandante
nipônico. Estava lá Yishimoto, um japonês que estivera nas Salomão, em tempo
de paz, e falava inglês. Vouza não pudera negar que estivera com os americanos.
Os inimigos tentaram arrancar-lhe informações e, como não o conseguissem,
irritaram-se e amarraram-no a uma árvore, com cordas de palha. Depois de lhe
baterem com as coronhas das espingardas, espicaçaram-no com baionetas, até
ele desmaiar. Tinha sete ferimentos no peito e um — o maior de todos — no
pescoço. Ao escurecer, tinham-no abandonado, julgando-o morto, e haviam-se
preparado para o ataque.

«Muitas horas depois, recuperara os sentidos e conseguira partir as cordas, com


os dentes. Pusera-se a caminho, para tentar comunicar com os fuzileiros, mas a
certa altura sentira-se tão fraco que tivera de se arrastar, de gatas. Deve ter-se
arrastado assim quase três milhas, durante toda a batalha. Como se não bastasse
tudo quanto passara, insistiu em fazer uma descrição muito útil do que era a
força japonesa, do número de soldados e das armas de que dispunham. Todas
estas informações foram imediatamente transmitidas ao comando. Uma bala
atingiu o jipe, enquanto eu telefonava.

«Vouza perdera litros de sangue e encontrava-se em estado desesperado. Estava


tão convencido de que morreria que, antes de perder de novo a consciência, me
confiou uma longa mensagem de despedida para a mulher e para os filhos. Uma
vez cumprido o seu dever, no meio de tremenda tensão, desmaiou. Levámo-lo
para o hospital e os médicos não perderam tempo. Operaram-no, fizeram-lhe
transfusões de sangue e ficaram convencidos de que sobreviveria — se o
hospital não fosse alvo de ataques aéreos, evidentemente. Que lealdade e que
espantosa vitalidade a daquele homem! Senti-me cheio de um imenso orgulho.»

Vouza resistiu e sobreviveu para comandar ainda muitas patrulhas na selva.

Os fuzileiros tinham repelido dois ataques desesperados. As centenas de corpos


sem vida espalhados pela areia eram prova do grave revés sofrido pelo
persistente inimigo. Mas qual era a extensão do golpe vibrado aos japoneses? O
matraquear esporádico das metralhadoras ligeiras Nambu, o bup-bup-bup mais
lento e metódico das ocultas metralhadoras pesadas e os movimentos furtivos
sob as palmeiras, do outro lado do rio, tudo isso dava a Thomas a desagradável
impressão de que, não obstante a derrota sofrida, o inimigo ainda estava muito
vivo. «Não podemos permitir que aqueles tipos fiquem ali todo o dia», declarou,
e sugeriu o envolvimento imediato da posição inimiga. Vandegrift concordou e
destacou para isso a reserva da Divisão, o 1.º Batalhão do 1.º de Fuzileiros de
Cate, comandado pelo tenente-coronel Lenard B. Cresswell.

Thomas explicou o plano da manobra: Cresswell atravessaria o rio a montante


dos japoneses, o mais depressa possível, viraria 90º para norte, desdobraria e
avançaria na direção do mar, enquanto o batalhão de Pollock imobilizava o
inimigo, da margem ocidental. Pouco depois do meio-dia, o batalhão de
Cresswell completara o seu desdobramento secreto, à retaguarda de uma linha de
retirada ao longo da orla da selva, que envolvia o bosque de coqueiros do sul.
Quando o ataque começou, o batalhão avançou lenta, mas firmemente.
Apanhados numa saraivada de fogo cruzado e com granadas de artilharia a
explodir nas copas dos coqueiros, por cima deles, os japoneses abandonaram os
seus abrigos e desataram a correr desesperadamente em todas as direções.

Mas não havia fuga possível. Enquanto três companhias os comprimiam,


implacavelmente, uma quarta cortava a retirada para leste. A artilharia martelou
o que restava da bolsa formada pelos sobreviventes do 1.º Batalhão do coronel
Ichiki, ao mesmo tempo que os aviões recém-chegados bombardeavam e
metralhavam, sem parar. Às três da tarde, um esquadrão de tanques ligeiros
atravessou o areal, a vomitar metralha e a esmagar, com as lagartas de aço,
vivos, moribundos e mortos. Vandegrift, ao descrever esta fase final da batalha,
observou que «as retaguardas dos tanques pareciam máquinas de picar carne».

A batalha do Tenaru tornou-se histórica. A «influência divina» das «afiadas


baionetas subjugadoras do demônio» 6 do Exército imperial fora anulada.
Tinham sido mortos quase 800 japoneses e feitos prisioneiros 15 inimigos
feridos. Cerca de 30 sobreviventes desmoralizados rastejaram para a selva, onde
alguns, gravemente feridos, acabaram por morrer de fome. Um pequeno
punhado, incluindo Ichiki, conseguiu regressar a Taivu e juntar-se ao grupo que
lá se encontrava. O batalhão de Pollock teve 69 baixas e o de Cresswell apenas
20.

A maior parte dos inimigos feridos resistiram aos fuzileiros, que depois da
batalha tentavam ajudá-los e não matá-los. Vários caçadores de recordações
foram abatidos a tiro por japoneses prostrados e aparentemente mortos, e os
tenentes-coronéis Twining, Pollock e Cresswell, que observavam a montureira
de cadáveres, apanharam um grande susto quando um subalterno moribundo
disparou uma pistola automática na direção dos três e depois estoirou a sua
própria cabeça. Um oficial, o capitão Takao Tamioka, sobreviveu ao holocausto.
O coronel Ichiki, que depois da derrota fugira apressadamente para Taivu com o
porta-bandeira, rasgou, com reverência, a bandeira do regimento, despejou
petróleo sobre as tiras, deitou-lhes fogo e praticou haraquiri.

Pelo custo total de 99 baixas 7, incluindo 43 mortos, os fuzileiros eliminaram um


dos melhores destacamentos de assalto do Exército japonês, mas na realidade foi
muito mais o que conseguiram: o mito da invencibilidade nipônica, abalado em
Tulagi e Gavatu, foi despedaçado no Tenaru. Aí, segundo se diz no próprio
relatório japonês, «o comandante do destacamento lançou gradualmente no
combate todas as suas forças, mas de nada serviu [... ] A maior parto do primeiro
escalão [...] agora sem quaisquer vantagens, morreu heroicamente».

Poucos dias depois, Vandegrift conseguiu arranjar tempo para escrever a


Holcomb:

«General, nunca ouvi falar deste gênero de combate, nem nunca li nada que se
lhe assemelhe. Esta gente recusa-se a render-se. Os feridos aguardam que os
soldados se aproximem, para os examinar [...] e despedaçam-se a si próprios e ao
outro tipo, com uma granada de mão.»

Estas sangrentas doze horas deram origem a algumas intrigantes perguntas. Por
que motivo, ao ver a sua patrulha quase totalmente aniquilada, não
compreendera Ichiki que os americanos estavam ao corrente das suas intenções?
Porque atacara tão apressadamente? Porque não reconhecera a linha do rio, uma
milha para o interior? Se o tivesse feito, podia ter atravessado, aí, o grosso da sua
força, virado para norte e tomado a posição do Ilu pela retaguarda. Porque
desencadeara um segundo ataque, de modo tão desastroso como o do primeiro?
Que estranho e obscuro raciocínio levou a este holocausto, por ele próprio
provocado?

A resposta a parte das perguntas é só uma: o coronel fora mal informado. Mas o
mais importante foi a sua arrogante recusa em aceitar a realidade, a sua
obstinação, a sua incrível inflexibilidade tática. As culpas talvez se possam
atribuir também, em parte, à disposição dos japoneses para, num momento de
desespero, aceitarem estoicamente o que consideram os ditames evidentes do
destino. Morrer gloriosamente pelo imperador, ao surgirem obstáculos
intransponíveis, era o dever inelutável —e, na realidade, até, o desejo
inconsciente— de muitos soldados japoneses. O que se evidenciou, primeiro, em
Tulagi e Gavutu e, depois, nas margens do pachorrento rio que os fuzileiros
batizaram de Tenaru, foi uma decisão de resistência total: resistência até ao
último alento do derradeiro homem.

Mais tarde, o almirante Tanaka diria:


«Conhecia o coronel Ichiki da operação do Midway e tinha conhecimento das
suas magníficas qualidades de chefe e do seu indómito espírito de combate. Mas
este episódio demonstrou à saciedade que a infantaria, armada de espingardas e
baionetas, nada podia contra um inimigo equipado com moderno armamento
pesado. Esta tragédia devia ter-nos mostrado a inutilidade da tática da “lança de
bambu”.»

Mas houve algo mais fundamental do que as consequências de uma ação baseada
em más informações, com um coronel temerário e estúpido, soldados dedicados
e disparidades de armamento. Houve uma atitude moral de arrogância, uma
questão de «prestígio». Ichiki, quando manejava a sua espada, tinha de
conquistar ou morrer. Era este o código do Samurai, «O Dogma do Guerreiro»: o
Buchido.

Pelo seu lado, os fuzileiros aprenderam uma lição que não esqueceriam: a partir
desse dia e até aos últimos dias de Okinawa, mais de dois anos e meio depois,
travaram uma guerra sem quartel. Não o pediam para si e não o davam aos
japoneses.

8. «O EXPRESSO DE TÓQUIO»

O Enquanto o coronel Ichiki avançava de Taivu para destruir, «de um só golpe»,


os presunçosos americanos, o Quartel-General imperial transferia a direção das
operações de Guadalcanal da Marinha para o 17.º Exército, e o general
Hyakutake ordenava ao major-general Kyotaki Kawaguchi, comandante da 35.ª
Brigada de Infantaria, em Truk, que se preparasse para seguir para Guadalcanal
com os seus veteranos do Bornéu, assumir o comando de todas as unidades
militares e navais que lá se encontravam e acabar com quaisquer americanos que
porventura tivessem escapado a Ichiki. O general colocou imediatamente a sua
brigada de prevenção para embarcar.
Ao mesmo tempo, o contra-almirante Tanaka — cujos contratorpedeiros de ação
noturna (que formavam o célebre «Expresso de Tóquio») seriam, em breve, mais
uma adaga do que um espinho no flanco dos Fuzileiros Navais americanos —, o
contra-almirante Tanaka embarcava a 5.ª Força Especial de Desembarque da
Armada, de Yokosuka, e o resto do regimento de Ichiki, estacionado em Truk, no
transporte de tropas Kinryu Maru e em quatro contratorpedeiros adaptados.

Resolvidos estes preliminares, Yamamoto ordenou que os couraçados da


Esquadra de Kondo e os porta- aviões da 3.ª Esquadra de Nagumo zarpassem de
Truk. Missão: localizar e destruir porta-aviões americanos assinalados na área
entre as Novas Hébridas e San Cristobal; destruir o novo aeródromo de
Guadalcanal; bombardear as posições dos fuzileiros, e proteger e apoiar o
desembarque da 5.ª Força Especial de Desembarque da Armada, de Yokosuka, e
o resto do 28.º de Infantaria. Os otimistas do seu estado-maior —e eram muitos
— estavam convencidos de que o almirante Yamamoto estava a utilizar um
martelo pilão para quebrar uma avelã. Mas Yamamoto aprendera uma lição no
Midway: ficara com um salutar respeito pelos aparelhos dos porta- aviões
americanos.

Pouco antes do meio-dia de 22 de Agosto, o general Vandegrift teve


conhecimento de que a Esquadra Combinada abandonara a sua base e navegava
a caminho das Salomão. Poucas horas depois, um relatório de observação visual
enviado para Guadalcanal localizava várias unidades da esquadra inimiga ao
alcance de Henderson. Ponderou-se, cuidadosamente, a decisão de atacar. Seria
justificado o risco de expor os poucos aviões disponíveis? Vandegrift achou que
sim o ordenou ao seu comandante aéreo, coronel Charles L. Fike, que localizasse
e atacasse os barcos japoneses.

Mangrum comandou o grupo de ataque, com os seus bombardeiros de mergulho


protegidos pelos caças do capitão Smith. Não faltou quem considerasse
desesperada esta missão. Com o estado do tempo a agravar-se, a formação
seguiu para norte, sobrevoou Tulagi e a ilha Florida e prosseguiu na direção da
passagem entre Santa Isabel e Malaita. Aí, com a chuva a cair em rajadas fortes
que obscureciam os vidros e uma visibilidade quase nula, o grupo de ataque
retrocedeu. Quando os decepcionados aviadores regressaram, encontraram o
general Vandegrift a andar de um lado para o outro no chão de madeira
enlameada da construção em forma de pagode, donde os japoneses tinham
planeado dirigir as suas operações aéreas. «Mostrou-se calmo e reconfortante ao
grupo de frustrados aviadores, mas era evidente que estava preocupadíssimo
com as desencorajadoras perspectivas», como diria, mais tarde, na sua
correspondência, o major-general Mangrum.

Mas não era só ele que estava preocupado. Em Nouméa, o major-general


Harmon pegou na caneta para escrever uma carta pessoal a «Hap» Arnold. Nessa
missiva exprimia a sua convicção de que os fuzileiros das Salomão pagariam
caro o fato de a «Torre de Vigia» ter sido apressadamente concebida e planejada,
sem apoio logístico adequado. A campanha «fora prevista pelos seus
planejadores como [uma] operação anfíbia apoiada pelo ar, não como meio de
estabelecer uma forte ação aérea com base em terra».

Enquanto Harmon escrevia esta carta, a Força de Proteção de Kondo e a Força


de Ataque de Nagumo navegavam cerca de 200 milhas a norte das Salomão do
sul. Os Saratoga, Enterprise e Wasp de Fletcher, a operar como três unidades
navais independentes em águas em que abundavam os submarinos japoneses,
encontravam-se 300 milhas a sueste. A meio da manhã, o Saratoga captou um
aviso, muito fraco, de um dos Catalinas de longo raio de ação do almirante
McCain: um grupo de transporte inimigo encontrava-se cerca de 300 milhas a
norte de Guadalcanal e seguia para sul, à velocidade de 17 nós. Esta informação
também foi recebida em Henderson, onde se armaram os aviões de ataque e se
deram instruções aos pilotos. Semelhante manobra se efetuou no navio almirante
de Fletcher.

O objetivo desta comparticipação de interesses e de atividades era o contra-


almirante Tanaka, cuja força de transporte fora avistada muito a oeste dos porta
aviões de Nagumo. No navio almirante Jintsu, Tuimka, que deveria desembarcar
tropas na noite seguinte, sabia que fora localizado. Informara imediatamente
Rabaul da presença do intrometido Catalina e, enquanto o grande hidravião
desaparecia, engolido pelas nuvens cor de chumbo, o comandante da 8.ª
Esquadra ordenava a Tanaka que virasse o rumo do seu comboio para norte.

Esta tática evasiva foi coroada de êxito: as forças de ataque que partiram do
campo Henderson e do Saratoga não conseguiram ver nada através da névoa
crescente. A provação de um ataque aéreo aos seus transportes desprotegidos foi,
assim, adiada, pelo menos, mas a tarde de Tanaka não foi isenta de
contratempos. Depois do almoço, um mensageiro entregou-lhe uma
radiomensagem do quartel-general da Força do Setor de Sueste, na qual lhe
ordenavam que virasse de novo para sul e efetuasse os desembarques, como fora
planeado. O tempo tornava tal manobra impossível, e o desencontro das ordens
recebidas deixou Tanaka pouco tranquilo quanto ao que se passaria em Rabaul.

Nessa altura, tanto Nagumo como Fletcher estavam convencidos de que os


porta-aviões um do outro estavam perto. Mas onde? Fletcher decidiu tirar isso a
limpo e, ao princípio da tarde, mandou um grupo de busca e ataque levantar voo
do Saratoga. O comandante do grupo, Harry D. Felt, em vão procurou os alvos.
Com as agulhas indicadoras do nível de combustível quase no zero, resolveu
conduzir o grupo Sara para Henderson, onde os pilotos passaram a noite. Na
manhã seguinte, em troca da hospitalidade e do combustível de que Felt
precisava para regressar com os seus aviões ao Saratoga, os fuzileiros tiraram as
bombas de mil libras debaixo dos seus SBD. Eram as primeiras «meias
toneladas» a chegar a ilha.

Entretanto, o almirante americano, sempre ansioso por ter os depósitos cheios de


combustível, aproveitou o intervalo para mandar o grupo do Wasp reabastecer-
se, ao sul. Com esta infeliz e, como se provou, desnecessária decisão Fletcher
privou-se da superioridade marginal que poderia ter modificado o resultado final
da batalha que se preparava.

Na manhã de 24 de Agosto, Kondo, informado da posição geral de Fletcher,


destacou o porta-aviões Ryujo, o cruzador Tone e dois contratorpedeiros da
Força de Ataque de Nagumo e mandou-os rumar para sul, a fim de engodarem
os americanos. Conseguiram-no. O Ryujo foi detectado, violentamente atacado e
abandonado em chamas e adernado. Mas o sacrifício proporcionou a Nagumo o
que pretendia: uma aberta para as duas cobertas de voo de Fletcher. O Enterprise
começou a ser alvejado às 16.41 h. Quatro minutos depois, fora atingido três
vezes, em cheio, em ataques sucessivos de mais de 30 bombardeiros de
mergulho. Mas «O Grande E», navio resistente e bem tripulado, sobreviveu. O
Saratoga, assim como os Shokaku e Zuikaku de Nagumo, ficaram incólumes. O
escurecer acentuava-se quando Fletcher interrompeu a batalha, virou para sul e
se foi reabastecer.

Uma força de ataque de 11 SBD e 12 torpedeiros (TBF) do Saratoga ainda se


encontrava no ar, à procura dos navios japoneses. Mas a sorte não os
acompanhava. Os bombardeiros, com o nível de combustível perigosamente
baixo, não tiveram outro remédio senão largar as cargas e tentar chegar ao
campo Henderson. Enquanto o «Voo 300» do tenente Turner F. Caldwell —um
grupo misto de bombardeiros do «5.º de Reconhecimento» e «6.º de
Bombardeamento» — era entusiasticamente recebido pelos pilotos da reduzida
Força Aérea Cacto, os TBF, de maior raio de ação, aterravam, com êxito, na
coberta do atingido Enterprise. Na manhã seguinte, o porta-aviões abandonou o
setor, a fim de ser reparado, e ofereceu o «Voo 300» ao campo Henderson. Esta
inesperada e bom acolhida adição ao componente aéreo de Vandegrift esteve em
terra mais de um mês e contribuiu muito para os danos infligidos aos barcos
japoneses.

Nagumo, Kondo e Fletcher talvez tenham pensado que a ação, que mais tarde
seria conhecida por «Batalha das Salomão Orientais», terminara, mas
enganavam-se. Restava ainda o persistente almirante Tanaka, que levara o seu
Grupo de Transporte para sul, em 24 de Agosto, enquanto os porta-aviões se
arrastavam para leste. Na manhã seguinte, encontrava-se apenas cem milhas a
norte de Guadalcanal.

Era carne fresca... Às 8.30 h., um grupo misto de SBD de Mangrum e do «Voo
300» de Caldwell descolaram de Henderson e foram-lhe no encalço. Mas Tanaka
foi difícil de localizar. Por fim, Smith transmitiu a Mangrum a desconcertante
notícia de que os Wildcats de apoio tinham atingido o limite máximo do seu raio
de ação e deviam regressar à base. Dois minutos depois, os caças retrocederam.
Os desprotegidos SBD viraram um pouco para oeste, depois para sul e
retrocederam, também. E, de súbito, eis que descobrem os barcos de Tanaka!

A primeira bomba acertou no cruzador ligeiro Jintsu, à frente da ponte. A


explosão torceu chapas, provocou incêndios, atirou ao chão todos quantos
estavam na ponte e avariou as comunicações. Tanaka, momentaneamente
inconsciente, recobrou depressa os sentidos e transferiu a sua bandeira para o
contratorpedeiro Kagero, em cuja ponte apareceu a tempo do ver o transporte
Kinryu Maru, de 9000 toneladas, ser atingido por uma bomba de mil libras,
largada polo guarda-marinha Fink, que pertencera ao Enterprise. O almirante
ordenou que os contratorpedeiros Mitsuki e Yayoi se aproximassem do
transporte, para trabalho de salvamento. Os pilotos de Henderson, consumidas as
suas bombas, observaram a cena de longe, formaram e partiram.

Mas os trabalhos de Tanaka estavam longe de ter acabado. Mal os SBD


desapareceram, ao sul, chegou à área uma esquadrilha de B-17 de «Blondie»
Saunders, com base nas Hébridas. O Mitsuki foi para o fundo e o Yayoi, atingido
de raspão, mantinha-se precariamente ao cimo de água. O Jintsu arrastava-se, a
muito custo. Tanaka recebeu ordem para se retirar para as Shortlands, com o que
lhe restava da sua força.
A primeira grande tentativa para retomar Guadalcanal, por ataque direto do mar,
falhara.

Enquanto os queimados e encharcados sobreviventes do segundo escalão do


falecido coronel Ichiki viajavam, em contratorpedeiros, para as Shortlands,
estudavam-se novos planos para aniquilar os americanos. Recomendava-se agora
uma firme concentração de forças em Guadalcanal, por meio de sorrateiros
desembarques noturnos de tropas transportadas em contratorpedeiros. O quartel-
general do setor encarregou Tanaka de organizar a primeira de tais incursões —
adequadamente designados por «Operações Rato»— para a noite de 27 de
Agosto. O almirante embarcou rapidamente um batalhão do regimento de Ichiki
em três contratorpedeiros e mandou-os seguir para Guadalcanal. Duas horas
depois de os barcos saírem do porto das Shortlands, a 8.ª Esquadra mandou o
almirante chamar os barcos; o desembarque fora adiado por 24 horas.

Tanaka sentiu-se frustrado e furioso. Era a segunda vez, em três dias, que recebia
do quartel-general do setor ordens que contradiziam as do almirante Mikawa.

«Recebera, mais uma vez, ordens contraditórias e diferentes do comandante do


Setor e do meu superior imediato, e não sabia que fazer. Se aquilo continuasse
assim, pensei, como poderíamos vencer alguma batalha? Pareceu-me, mais uma
vez, que a operação não dava indícios de ter merecido um estudo cuidadoso e
atento; dir-se-ia que se decidira tudo à toa. Tal estado de coisas colocava-me
numa situação muito difícil, na minha qualidade de comandante da Força de
Reforço.»

O almirante pôs, de fato, o dedo na ferida; havia pouca coordenação em Rabaul.


O comandante do Setor e o seu subordinado nominal, o comandante da 8.ª
Esquadra, operavam em quartéis-generais separados e, aparentemente, rivais.
Cada um tirava dos relatórios dos serviços de informações as conclusões que lhe
convinham e planejava os seus projetos, de acordo com elas. O resultado
inevitável era confusão e impetuosidade.

Depois de mandar os contratorpedeiros regressar, Tanaka serenou o suficiente


para gizar os planos da «Rato II», uma incursão de quatro navios, para a noite
seguinte. Mas mais uma vez o quartel-general superior estragou tudo, ao insistir
numa partida demasiado cedo. Em consequência do horário ordenado por
Rabaul, os quatro contratorpedeiros chegaram ao alcance dos aviões do campo
Henderson pouco antes do crepúsculo de 28 de Agosto. Foram imediatamente
atacados pelos bombardeiros de mergulho de Mangrum. O Asagiri foi atingido
nas caldeiras por uma bomba de meia tonelada e explodiu; o Shirakumo foi
abandonado a flutuar, mas perdido, e o Yugiri afastou-se, muito atingido.
Quando estas desencorajadoras notícias chegaram às Shortlands, o almirante
Tanaka ferveu. Mais tarde, numa linguagem louvavelmente comedida, escreveu
que os contratorpedeiros tinham sido perdidos sem necessidade. Pois não era
«pura negligência» tentar efetuar uma operação de desembarque sem
«neutralização preliminar do potencial aéreo do inimigo»?

Embora já só restasse, em condições de utilização, um barco do complemento de


quatro da Divisão de Contratorpedeiros 20, o almirante encontrou algum consolo
no fato de a Divisão 24, que partira no mesmo dia das Shortlands, mas mais
tarde, ter desembarcado tropas, com êxito, à meia-noite. A «Rato I» fora
mandada regressar e a «Rato II» destruída, mas a «Rato III» salvara, até certo
ponto, a situação. Tanaka comunicou a notícia a Rabaul e preparou-se para
algumas horas de precisado repouso.

Mas o comandante da Força de Reforço não teve muito tempo para descansar.
Pouco depois do pequeno-almoço, na manhã seguinte, a sua ordenança
anunciou-lhe a presença no navio almirante do major-general Kawaguchi e do
seu estado-maior. O general acabava de chegar no transporte de tropas Sado
Maru e estava ansioso por seguir o seu primeiro escalão para Guadalcanal, com
o grosso da sua brigada, o mais depressa possível. O almirante assegurou-lhe que
isso não constituiria problema nenhum. As incursões «Rato» eram rápidas e,
quando convenientemente preparadas, seguras: a Marinha Japonesa dominava
nas águas que cercavam Guadalcanal, do escurecer ao alvorecer. Além disso, as
«águias do mar» podiam, agora, dispensar uma certa proteção aérea; a pista de
Buka já estava em condições de funcionar, e no dia 29 de Agosto tinham seguido
para lá, de Rabaul, 29 Zeros.

Kawaguchi ouviu-o delicadamente, mas quando Tanaka acabou de falar declarou


que não queria nada com os transportes das «Operações Rato». Recordou que,
por via do espaço limitado dos contratorpedeiros, o coronel Ichiki desembarcara
com rações reduzidas e pouco equipamento — apenas dois canhões, morteiros
pesados insuficientes, munições inadequadas, nenhum telefone de campanha e
somente um rádio. A brigada de Kawaguchi viajaria em barcaças grandes e
pequenas e com o equipamento necessário para apoiar as suas operações
punitivas contra os americanos, ou então não partiria. O general salientou que
tinham sido essas as ordens que recebera do 17.º Exército e que eram essas as
suas intenções.

Tanaka não cedeu. As suas ordens, as ordens que lhe tinham dado, eram que
mandasse a 35.ª Brigada em contratorpedeiros. Havia poucas barcaças
disponíveis. Portanto, Kawaguchi iria de contratorpedeiro, ou não iria. O
almirante acrescentou que já se encontravam mil soldados a bordo dos
contratorpedeiros do capitão Murakami, a postos para a operação «Rato IV».
Com relutância, Kawaguchi permitiu que esse grupo partisse nessa noite, como
fora planeado, despediu-se de Tanaka e regressou ao Sado Maru.

Esta conversa levou o almirante a consultar Rabaul, mas a resposta tardou. A


única mensagem que Tanaka recebeu foi da 8.ª Esquadra, a informá-lo de que
estavam a descarregar, ao largo de Lunga, dois transportes de tropas, um
cruzador pesado e dois contratorpedeiros americanos. Os contratorpedeiros de
Murakami deviam atacá-los, depois de desembarcarem as tropas em Taivu.

Murakami regressou às Shortlands ao fim da manhã de 30 de Agosto e informou


que, embora tivesse desembarcado as tropas com êxito, não atacara os barcos
americanos por causa do «estado da Lua» e de andarem no ar aviões do
Henderson. Tanaka, momentaneamente mudo de espanto, não tardou a recuperar
a faculdade de falar. Destituiu imediatamente Murakami, comunicou a Rabaul a
desobediência do capitão as ordens recebidas e convocou uma reunião do
estado-maior, antes de ter novo encontro com o general Kawaguchi. A atmosfera
da reunião foi perturbada por mensagens furiosas do comandante do Setor e do
almirante Mikawa acerca do não cumprimento das ordens recebidas por parte de
Murakami.

O comandante da Força de Reforço, de péssimo humor, encontrou o general


Kawaguchi tão obstinado como no dia anterior: ou barcaças ou nada. Mas o
astuto almirante tinha uma surpresa para o general: um contratorpedeiro e dois
contratorpedeiros-transportes estavam, naquele momento, a receber a bordo as
suas tropas, para a operação «Rato V»! Apesar dos protestos do coronel
Akinosuka Oka, seu comandante regimental, e de vários membros do seu estado-
maior, o general consentiu que o grupo partisse. Os homens desembarcaram sem
novidade, em Taivu, pouco depois da meia-noite.

A oposição de Tanaka ao transporte por barcaças tinha razão de ser. As barcaças


de doze metros de que dispunha eram lentas e, com mau tempo, impróprias para
navegação no mar alto. Com carregamento completo, a sua velocidade máxima
era de cerca de sete nós. O almirante salientou, repetidamente, que a navegação
costeira, durante a noite, e a imobilização, durante o dia, eram um sistema lento
e perigoso. Mas, pelo seu lado, Kawaguchi já manobrara com barcaças e os
resultados tinham sido satisfatórios. Preferia-as aos contratorpedeiros, e pronto!

No encontro do dia seguinte, Kawaguchi acedeu, com relutância, em partir de


contratorpedeiro, nessa mesma noite, com 1500 oficiais e soldados, desde que os
restantes 1000 homens da sua brigada partissem em barcaças, o mais depressa
possível. Rabaul aconselhou Tanaka a aceder e, ao meio-dia, Kawaguchi
embarcou com pessoal do quartel-general e um batalhão reforçado em oito
contratorpedeiros. Desembarcou em Taivu no último dia de Agosto.

Os aviadores dos Fuzileiros Navais faziam tudo quanto podiam para deter as
incursões noturnas de Tanaka, mas a sua missão era quase desesperada. A Lua
estava em quarto minguante e, às vezes, nem as esteiras dos barcos se
conseguiam distinguir. Mangrum só autorizava a voar os seus homens mais
experientes, pois a escuridão era tão densa que parecia palpável. Somente
quando os japoneses abriam fogo conseguiam os pilotos dos SBD discernir os
seus alvos. Tanaka não tardou a proibir que os seus barcos utilizassem
iluminação ou travassem luta com a artilharia antiaérea.

Entretanto, o vice-almirante Mikawa, o vencedor de Savo, ponderava as lições


colhidas das recentes operações. Sentia-se descontente com a cooperação
Exército-Marinha — ou, talvez, mais exatamente, com a falta de cooperação.
Num resumo datado de 31 de Agosto, informou a Esquadra Combinada e os seus
subordinados de que a tática de reforços às prestações só poderia conduzir à
tragédia. «Devem envidar-se todos os esforços para utilizar grandes unidades,
todas ao mesmo tempo.» Estas unidades, acrescentava, deviam ser transportadas
em navios rápidos. Além disso, o mau hábito de «subestimar o inimigo e
sobrestimar as próprias forças» poria em perigo toda a operação «KA»:

«A resistência e os contra-ataques inimigos no setor de Guadalcanal e das


Salomão têm sido obstinadíssimos e as nossas operações do primeiro período
foram absolutamente incapazes de lhes fazer frente. A não ser que operemos de
acordo com planos cuidadosamente estudados e pormenorizados, feitos com
base em informações exatas, as probabilidades de êxito são reduzidas.»

Mas, pelo menos de momento, tal realismo confinava-se apenas a Rabaul. Era
verdade que o Quartel-General imperial não estava satisfeito com os progressos
conseguidos, mas os oficiais de estado-maior de Tóquio ainda não se sentiam tão
preocupados com os pequenos êxitos dos americanos que achassem necessário
seguir o conselho claro de Mikawa. No entanto, no mesmo dia, o Quartel-
General imperial emitiu instruções que davam prioridade operacional à
«retomada imediata de Guadalcanal». Esta ordem estipulava que se
interrompessem as operações ofensivas na Nova Guiné, enquanto se utilizavam
todas as forças militares e navais disponíveis para retomar as posições perdidas
nas Salomão.

Assim, todo o peso das forças japonesas no setor sueste ia incidir diretamente no
campo Henderson e nos destroçados bosques de coqueiros que o rodeavam.

A estreita pista de aterragem que os japoneses estavam decididos a conquistar e


os fuzileiros um nadinha mais decididos a conservar, fora muito maltratada nos
últimos dez dias de Agosto. Mas, mesmo assim, os extenuados pilotos
conseguiam levantar voo e regressar. Ao fazê-lo, eles, as suas tripulações e os
seus aparelhos destruíram outro mito. «Os caças da Cacto», escreveu Robert
Sherrod, «prestaram uma grande contribuição à guerra ao destruir a teoria da
invencibilidade do Zero. Os fuzileiros começaram a derrubar esse mito em 24 de
Agosto.» Nesse dia, antes de ser afundado, o porta-aviões Ryujo lançou todos os
seus aviões contra Guadalcanal. O ataque foi interceptado pelos Wildcats de
Smith, que abateram 16 aviões japoneses. Perderam-se quatro aparelhos dos
fuzileiros e um piloto lançou-se de paraquedas e foi recolhido ao largo de Tulagi.
Um rudimentar mas eficiente serviço de salvamentos ar-mar já anteriormente
salvara vários outros pilotos.

Dois dias depois, aviões vindos de Rabaul infligiram ao campo consideráveis


danos. Quarenta tambores de valioso combustível desfizeram-se em fumo,
quando fragmentos ígneos atingiram bombardeiros de mergulho estacionados.
Os rapazes de Smith, temporariamente iludidos pelos Zeros em voo, apanharam
os bombardeiros no regresso e incendiaram 13.

Os pilotos dos bombardeiros de mergulho, que em 25 de Agosto tinham pregado


um valente susto ao almirante Tanaka, voltaram a merecer o seu soldo no dia 28.
No dia seguinte, caças derrubaram 8 japoneses, e em 30 de Agosto abateram 14.
Na semana anterior, tinham chegado de Espírito Santo 14 P-400, munidos de
canhões, que formavam a 67.ª Esquadrilha de Caças da Força Aérea do Exército
dos Estados Unidos, comandada pelo capitão Dale D. Brannon. Foram os
responsáveis pelo derrube de quatro aviões inimigos, que desceram abaixo de
3600 metros, mas perderam igual número, acima dessa altitude. O P-400 —uma
versão para exportação do P-39 e um aparelho do qual o general Arnold se sentia
imoderadamente orgulhoso — tinha falta de compressores e de equipamento de
oxigênio adequado e não servia para combate em grandes altitude. Após seis
dias, apenas, de operações, só 3 dos 14 P-400 mandados para a ilha estavam
aptos a funcionar. Vandegrift destacou esse resto para operações de apoio
próximo. Nessa capacidade, sim, foram auxiliares valiosos. Além da peça de 37
mm, cada aparelho podia transportar uma bomba de 500 libras.

Em 26 de Agosto, as perdas operacionais e em combate tinham reduzido as


forças aéreas em Vunukanau e Lakunai a 19 Zeros e 29 Bettys, mas no dia
seguinte chegaram 24 Zeros, trazidos das ilhas Marshall por porta-aviões
escoltadores. Os japoneses estavam em apuros, as circunstâncias eram
consideradas «péssimas» e a situação «difícil de remediar». Os pilotos
americanos teriam ficado muito contentes se tivessem conhecimento destes
fatos.

Os aparelhos com base no campo Henderson também lutavam com as suas


dificuldades. Conservavam-nos em estado de funcionamento equipas de
manutenção que «canibalizavam» 8 um aparelho gravemente atingido com o
mesmo extremo cuidado com que, um século antes, os ilhéus das Salomão
desmembravam um missionário rechonchudo. Abastecer de combustível e armar
um caça ou um bombardeiro eram operações complicadas, em que o
equipamento essencial se resumia a uma bomba manual, um filtro de camurça,
músculo e paciência. Não havia camiões-cisternas, nem carros de mão, nem
gruas, nem máquinas para colocar nas fitas as munições das metralhadoras de
calibre 50 dos aviões, nem pneus sobressalentes, nem para-brisas, nem rodas,
nem hélices. Quando chovia, o campo transformava-se, em poucos minutos, num
lamaçal esburacado; quando o sol batia, uma hora a fio, nessa papa, a camada
superior ficava ressequida e transformava-se num pó sufocante. Cada aterragem
e decolagem era uma aventura.

Os pilotos, os tripulantes e os mecânicos passavam a maior parte das noites em


buracos e comiam carne picada, arroz e feijão ao pequeno-almoço e ao jantar.
Esta dieta monótona tinha ainda a desvantagem de ser perigosa para os pilotos
que voavam em grandes altitudes. Os aviadores queixavam-se constantemente de
dores insuportáveis, causadas por gases, e o problema de lhes arranjar uma
alimentação adequada assumiu grande importância. A disenteria grassava no
campo e não havia papel higiênico. Mas os aviões não deixavam de voar, apesar
de todas estas dificuldades. Vandegrift sentia-se orgulhosíssimo dos seus pilotos
e numa carta que escreveu à mulher, nessa altura, dizia, simplesmente: «Meu
Deus, estes rapazes são verdadeiros lutadores!»

No dia 30 de Agosto, o barco de reabastecimento Athena chegou com


aprovisionamento, equipamento e pessoal para a aviação. No mesmo dia, e por
sorte durante um violento ataque aéreo, chegaram reforços aéreos. Comandados
pelo coronel William J. Wallace, os restantes dois esquadrões do seu Grupo
Aéreo 23 de Fuzileiros desceram na superfície irregular do campo Henderson. A
esquadrilha de caça (VMF 224) era comandada pelo major Robert E. Galer; a de
bombardeiros (VMSB 231), pelo major Leo R. Smith. Os pilotos dos caças
estavam no ar e a atacar os Zeros menos de 24 horas depois.

Wallace foi um tônico que estava a ser muito preciso. Um dos maiores
comandantes do Corpo de Fuzileiros, além de excelente aviador, este homem
divertido, paciente e compreensivo transmitiu parto da sua calma aos oficiais
aviadores e às tripulações que até ali viviam de pouco mais do que nervos
esfrangalhados e obstinada coragem. Os fuzileiros de todas as patentes sentiam-
se justamente orgulhosos dos «seus» aviadores. Quando um cabo perguntava,
«Capitão, já sabe o resultado?», e o capitão respondia, «Doze a um, rapaz!», ou
«Onze a três!», não se tratava de nenhum jogo nem de nenhuma brincadeira
infantil.

O centro que dava estas informações básicas estava instalado na fábrica de gelo
que os japoneses tinham tido a generosidade de deixar a funcionar. Da porta
pendiam dois grandes letreiros. Um deles proclamava, em letras de todo o
tamanho:

FÁBRICA DE GELO TOJO

Nova Gerência

J. Genung, sargento F. N., gerente

O outro letreiro tinha apenas um título: «RESULTADOS DE HOJE». Era aí que


o «gerente» da Fábrica de Gelo Tojo registava cuidadosamente, com um pincel
de escrita japonês, os resultados das atividades aéreas, para informação do
pessoal de terra que, aparecia, sem falta, poucos minutos depois de deixarem de
cair nos abrigos, ainda quentes, caixas de munições de calibre 50. «Já não caem
mais caixas. Vamos à fábrica de gelo!»
Mas, não obstante as dificuldades, os resultados dos combates aéreos eram
decisivamente a favor dos fuzileiros. Os japoneses estavam surpreendidos,
sentiam-se, até, escandalizados. «O inimigo, em vez de sucumbir aos repetidos
ataques aéreos das nossas unidades, lança-se em obstinados combates no ar.» Era
evidente, pois, que Guadalcanal não seria uma repetição da China, da Malásia ou
das Filipinas.

Mas quanto tempo ainda os pilotos, mortos de sono, poderiam continuar a


lançar-se «em obstinados combates no ar» contra as «águia marinhas» da
Armada japonesa? Este problema preocupava o almirante McCain que, no dia
seguinte àquele em que os aviões de Wallace aterraram, comunicou ao CincPac
que os pilotos de Guadalcanal estavam «muito fatigados» e que deviam ser
enviados imediatamente mais aparelhos e tripulações. Insistiu em que
mandassem sem demora, para a ilha, dois esquadrões completos de Lightnings
ou Wildcats. «A situação», afirmou, «não permite demoras de qualquer
espécie...»

«Com os reforços pedidos, Guadalcanal poderá transformar-se num túmulo para


o poderio aéreo japonês, poderá ser fortificada, desenvolvida e explorada, com
prejuízo mortal para o inimigo. Se perdermos Guadalcanal, acontecerá
precisamente o contrário.»

E McCain foi ainda mais explícito:

«Se os reforços pedidos não forem fornecidos, Guadalcanal não poderá ser
abastecida e, consequentemente, não poderá ser mantida.»

Como McCain dava a entender, os acontecimentos encaminhavam-se, rápida e


inexoravelmente, para um clímax. Embora durante o dia os pilotos dos fuzileiros
dominassem no ar, sobre o campo Henderson, e a Marinha conseguisse, de vez
em quando, mandar-lhes um barco, as noites pertenciam aos japoneses e eram
longas e angustiosas. Hidraviões com base em Faisi, nas Shortlands, tornaram o
sono impossível. Estes, cognominados «Washing Machine Charlie» ou «Maytag
Charlie», lançavam bombas de percussão, depois de «Louie the Louse» ter
iluminado com bombas luminosas de longa duração. Quase todas as noites, os
contratorpedeiros de Tanaka, nas suas idas e vindas em cumprimento da
«Operação Rato», disparavam centenas de granadas na direção do campo
Henderson. As vítimas consideravam estes ataques absolutamente
indiscriminados e, por isso mesmo, elos cumpriam o seu principal objetivo:
impossibilitar os fuzileiros de descansar, enervá-los e esgotá-los. Os intrusos
noturnos não tinham por missão atacar alvos físicos específicos; destinavam-se a
destruir o moral. E não davam tréguas.

Os batedores de Clemens todos os dias traziam notícias de novos japoneses


chegados às imediações de Kokumbona, a oeste, e de Taivu, a leste. Turner
estava preocupado. Em 1 de Setembro, envia a seguinte radiomensagem a
Ghormley:

«Embora sempre tenha aconselhado um desembarque em Tulagi, convém não


esquecer que sempre disse, também, que, para que tal desembarque tivesse êxito
permanente, seria necessário o apoio ininterrupto de grandes forças navais e
aéreas [...] a consolidação imediata da nossa posição Cacto é agora possível e
aconselhável, apresenta-se uma oportunidade extraordinária, que não deve ser
desperdiçada.»

Na noite anterior ao envio desta mensagem o major-general Kawaguchi


desembarcou com o seu estado-maior perto da Taivu Point, mais ou menos na
mesma zona onde o infortunado Ichiki passara as suas primeiras horas em
Guadalcanal. Esta coincidência não perturbou o general, que estabeleceu uma
base de aprovisionamento e ordenou imediatamente a um grupo de sapadores
que abrissem caminho através da selva, da plantação Tetere para sul do campo
de aviação. Kawaguchi não aprendera nada com o desastre que coroara o ataque
apressadamente organizado e inabilmente desencadeado por Ichiki, e tratou não
só de repetir alguns dos erros que tinham culminado com o suicídio do derrotado
coronel, como também de introduzir no mesmo tema algumas variações
pessoais.

O general não sabia nada acerca do terreno sobre o qual se propunha conduzir as
suas tropas. Não dispunha de mapas exatos nem de fotografias aéreas aceitáveis,
mas não pensou em proceder a um reconhecimento antes de lançar quatro
batalhões numa marcha através da selva desconhecida. O já citado filósofo
militar chinês Sun Tzu escreveu, também: «Aqueles que não conhecem as
condições de montanhas e florestas, perigosos desfiladeiros, charcos e pântanos,
não podem comandar a marcha de um exército. Aqueles que não utilizam guias
nativos estão impossibilitados de aproveitar as vantagens do terreno». Não havia
guias nativos, pois os nativos eram, todos, leais à causa aliada. As aldeias de
Taivu, Tasimboko e Tetere tinham sido abandonadas havia já muito tempo.
Os serviços informativos de Kawaguchi também deixavam muito a desejar. O
general estava convencido de que os defensores, poucos em número, cederiam à
avassaladora autoridade «espiritual» das espadas e baionetas nipônicas. Por isso,
não lhe custou nada ler à sua maneira as instruções de Hyakutake, embora elas
fossem absolutamente claras. O general comandante do 17.º Exército ordenava a
Kawaguchi que «observasse a força, a posição e o terreno inimigos», para ver se
«era ou não possível obter rápido êxito no ataque ao campo de aviação com a
[sua] força presente». Mas Kawaguchi não esteve para perder tempo a
«observar» a força, a posição e o terreno inimigos.

O general japonês traçara o seu plano antes de deixar as Shortlands. Tomaria o


aeródromo em 13 de Setembro, com um ataque simultâneo, de três direções:

a) O golpe principal, um ataque de surpresa por um batalhão do 124.º de


Infantaria e pelos dois batalhões restantes do regimento do coronel Ichiki, seria
comandado por ele próprio e aproximar-se-ia pelo sul do aeródromo;

b) um batalhão do 124.º atacaria simultaneamente, vindo de oeste, através da


selva e do Tenaru;

c) o coronel Oka, com dois batalhões reforçados, partiria de Matanikau,


avançaria para nordeste na direção da Lunga Point, atravessaria o Lunga e
atacaria o aeródromo pelo noroeste;

d) o ataque principal seria apoiado pela artilharia naval e por ataques aéreos.

Este improvável plano táctico dá a impressão de que o general Kawaguchi


passara mais tempo a consultar livros de estudo do que a comandar manobras em
campanha. Por isso, o general já estava em apuros mesmo antes de chegar a ilha.

A última discussão do comandante da brigada com o almirante Tanaka também


deu os seus frutos amargos. O almirante opusera-se tenazmente a mandar de
barcaça, para Guadalcanal, os últimos 1000 homens da brigada de Kawaguchi,
mas Rabaul acedera, com o desejo de preservar a já muito tensa harmonia
Exército-Marinha. Assim:

«O resto do Destacamento de Kawaguchi, no total de 1000 homens, embarcou


em 48 barcaças de desembarque, grandes e pequenas, e partiu na noite de 2 de
Setembro do norte da ilha Isabel. A força, que se escondia durante o dia e
avançava durante a noite, devia deixar a ponta sul da ilha Isabel na noite de 4 de
Setembro e desembarcar na ponta noroeste de Guadalcanal ao nascer do dia 5 de
Setembro.»

Tanaka entregou as barcaças ao seu destino e, em 4 de Setembro, efetuou uma


incursão noturna coroada de êxito:

«A força de desembarque “Rato” desembarcou sem qualquer interferência do


inimigo. Depois de desembarcar as tropas, o grupo de contratorpedeiros avançou
para o ancoradouro inimigo e atacou e afundou um cruzador auxiliar. A seguir
bombardeou o aeródromo de Guadalcanal, provocou incêndios que duraram uma
hora e regressou sem quaisquer baixas.»

Na mesma noite, a força anfíbia partiu da costa sul da ilha Isabel, escoltada pelo
cruzador Sendai e por três contratorpedeiros:

«A força anfíbia separou-se 21 milhas náuticas a norte do ponto de desembarque


previsto, ao princípio da manhã de 5 de Setembro, e prosseguiu viagem
independentemente.»

As barcaças encontraram mar agitado e foram localizadas pelas patrulhas de


reconhecimento matinal de Henderson. Durante horas, as embarcações batidas
pelas vagas e os seus indefesos ocupantes foram bombardeadas e metralhadas
ininterruptamente.

«Em virtude da inclemência do tempo e de ataques da aviação inimiga, no


caminho, as baixas foram pesadas e a força desintegrou-se.»

Em Savo desembarcaram cerca de 300 homens e um grupo um pouco maior, do


qual fazia parte o coronel Oka, desembarcou perto do cabo Esperança. Os de
Savo chegaram a Kamimbo na noite seguinte. Morreram no mar 400 oficiais e
soldados.

9. MORRE, MALINE! 9
O general Vandegrift compreendeu que a batalha do Ilu fora apenas um prelúdio
de tentativas mais sérias para a retomada dos poucos acres preciosos que os seus
fuzileiros tinham conquistado. Eram muitos os indícios de atividade
intensificada fora da posição tão precariamente ocupada. Batedores nativos
anunciavam desembarques japoneses a oeste, em Tassafaronga e Kamimbo Bay,
e a leste, perto da abandonada aldeia de Tasimboko.

Durante a primeira semana de Setembro, Vandegrift, que era homem prudente


mas não hesitante, resolveu atacar em qualquer ponto, com força suficiente para
desequilibrar o inimigo, que estava a reunir as suas forças. Sabia que o 7.º de
Fuzileiros, reforçado, partira de Samoa para o Pacífico Sul, mas não ignorava,
também, que Ghormley desejava enviar este grupo de combate, tão
desesperadamente necessário em Guadalcanal, para as ilhas de Santa Cruz.
Portanto, o 7.º de Fuzileiros era um recurso muito duvidoso. Mas a situação
tinha os seus imperativos e não permitia a Vandegrift adiar por mais tempo a
descoberta do que se passava à sua volta. No entanto, o general não ousava
empreender qualquer operação que não fosse susceptível de se efetuar entre o
nascer e o pôr do Sol.

O general encontrava-se perante um daqueles problemas tácticos para os quais


os livros de estudo não indicam qualquer solução. Devido à recente chegada de
Tulagi do 2.º Batalhão do 5.º de Fuzileiros, ambos os seus regimentos de
infantaria estavam completos. Mas as praias que lhe competia defender de
previsíveis ataques desencadeados do mar ocupavam uma extensão de cerca de
7200 metros, do Ilu a um ponto a oeste de Kukum. Os flancos leste e oeste
penetravam, ambos, na selva, numa distância de 1370 metros. Portanto, seis
batalhões não eram força adequada para defender esta frente, proporcionar a
necessária profundidade e fornecer as indispensáveis reservas. A fim de obter
uma certa flexibilidade operacional, Vandegrift ordenara a Rupertus, no último
dia do mês, que embarcasse os raiders e os paraquedistas para Guadalcanal.

Menos de uma hora depois de chegar à ilha, Edson começou a insistir na


necessidade de um reconhecimento em força, tanto na direção do cabo
Esperança como na de Taivu. Na realidade, em face dos relatórios nativos da
presença de japoneses em Savo, mandara para a ilha, em 4 de Setembro, uma
patrulha de duas companhias. Em Savo não havia inimigos, mas as praias
estavam cheias de destroços saturados de óleo e de covas pouco fundas, nas
quais os nativos enterravam os cadáveres que continuavam a dar à costa e que
testemunhavam a violência da batalha naval que ficou conhecida pelo nome
daquela outrora pacífica ilha.

Foi trágico o resultado das dez horas inúteis que os raiders passaram a subir e a
descer as vertentes agrestes do extinto vulcão de Savo. Carregados de homens
ensopados em suor, Litlle e Gregory chegaram ao largo de Kukum quando
começava a escurecer. Depois de desembarcarem os seus exaustos passageiros e
de içarem as barcaças, verificaram que não tinham tempo de chegar ao porto de
Tulagi antes de escurecer por completo. Por isso navegaram lentamente de oeste
para leste, e de novo para oeste, no Sealark Channel. Foi aí que os descobriram e
surpreenderam os contratorpedeiros bem armados e velozes de Tanaka, na
primeira etapa da viagem de regresso de outra bem sucedida operação «Rato»
que tivera Taivu como destino.

A ação unilateral foi breve. Os japoneses abriram fogo às 2.08 h. da manhã, e


sete minutos depois o Little e o Gregory, com as frágeis chapas dos costados
rasgadas pelo fogo certeiro dos canhões inimigos, estavam reduzidos a destroços
em chamas, que explodiam e procuravam o lugar onde repousariam na
Ironbottom Bay. Os marinheiros lutavam pela sobrevivência nas águas negras
que tinham engolido, tão depressa, os seus barcos manchados de sangue.

Uma hora depois de escurecer, no dia 3 de Setembro, chegou às Operações


Aéreas uma mensagem urgente, a informar que aterraria dentro de momentos um
DC-3 e a pedir que iluminassem a pista. Prepararam-se imediatamente sete jipes,
que foram estacionar na ponta sul do campo. O aparelho não tardou a fazer-se à
pista, com as rodas a pouca distância da cabeça dos motoristas dos veículos. Este
avião levou a Guadalcanal um brigadeiro da Aviação do Corpo de Fuzileiros,
Roy S. Geiger, um indivíduo de ombros largos e cabelos brancos. Desde que
conquistara as suas asas, em 1916, Geiger pilotara todos os tipos de aviões,
desde os DH e Jennies da Primeira Guerra Mundial até aos mais modernos
aviões de combate Grumman, passando pelos transportes Fokker e Ford. Com
ele viajavam o igualmente experimentado chefe de estado-maior da sua Primeira
Ala de Aviação do Corpo de Fuzileiros, coronel Louis E. Woods, e o seu oficial
de informações, tenente-coronel John C. Munn.

Geiger era brusco, frio e, no dizer de alguns, implacável. Do que ninguém tinha
dúvidas era de que vinha disposto a exigir o máximo de homens e máquinas. E
obteve o que queria. Do «pagode» legado pelos japoneses, Geiger e o seu
pequeno estado-maior passaram a dirigir pessoalmente as operações aéreas. Os
aviadores tinham atuado de modo soberbo antes da chegada do brigadeiro, mas
este homem de feições severas e carácter de general romano impregnou-os de
renovado ânimo. Tanto ele como Woods tinham feito a sua carreira de aviadores
em carlingas abertas e não em cadeiras giratórias; eram ambos fracos
administradores e orgulhavam-se disso.

Geiger era feito da mesma massa de Vandegrift; nenhum deles tolerava a ideia
de permitir ao inimigo o prazer, livre de obstáculos, da iniciativa. Em 4 de
Setembro, e novamente no dia seguinte, os seus SBD bombardearam,
metralharam e desbarataram as tropas de Kawaguchi que desembarcavam na
ponta sul da ilha Isabel; nos dois dias seguintes, os bombardeiros levantaram voo
e foram atacar a base japonesa de hidraviões de Gizo Bay.

O espírito de ofensiva que transbordava de Geiger e de Woods era contagioso.


Poucos dias depois da sua chegada, o número 1 da «Hit Parade» de Guadalcanal
era cantado em toda a ilha, com a música de «On the Road to Mandalay»:

Nas «Operações» da Cacto,

Onde ninguém se atrapalha,

Nunca falta ação para o 23 de Fuzileiros.

Mal as granadas explodem nos coqueiros, Ouvimos «Operações» dizer:

«Toca a encher os tanques, rapazes,

Levem os Scouts para Gizo Bay,

Levem os Scouts para Gizo Bay.»

Oh, levem uma boa carga para Gizo,

Onde a Esquadra amarela passa o dia! Ouvem-se roncar os Bettys,


De Rabaul ao cais de Lunga.

Toca a andar para Gizo Bay,

Onde os hidraviões Zeros se açoitam E as bombas caem como saraiva Nos


nativos do outro lado.

Alguns que, neste período, tiveram de ir a Henderson tratar de qualquer assunto,


ao regressarem aos quartéis-generais da retaguarda informaram que a força aérea
de Geiger estava a dar as últimas. No entanto, o sentimento de urgência que os
relatórios destes visitantes refletia não chegou para inspirar a ação rápida
necessária: «atapetamento» para a pista, bombas, gasolina e equipamento de
construção chegavam com «uma lentidão lamentável». Só 300 metros de pista
estavam «atapetados». Por isso, depois de cada chuvada, a extensão restante
ficava transformada num pântano esburacado, onde até os jipes tinham
dificuldade em andar. Por sorte, o solo secava relativamente depressa.

Na manhã de 6 de Setembro, Edson visitou «Operações», a fim de conferenciar


com o G-3. Encontrou Thomas e o seu agressivo ajudante, Merril Twining, a
planejar exatamente o ataque que lhes ia propor. Ao fim da tarde, Twining foi de
jipe ao bosque de coqueiros à retaguarda de Kukum, a fim de informar Edson de
que Vandegrift aprovara a sua ideia de uma Incursão a leste, para desfazer a
concentração inimiga localizada em Tasimboko.

No momento preciso em que Twining conversava com Edson, os


contratorpedeiros da «Rato» de Tanaka aproximavam-se do cabo Esperança. À
meia-noite, desembarcavam, perto de Kokumbona, o quartel-general do 124.º de
Infantaria do coronel Akinosuka Oka, assim como o seu 2.º Batalhão. Ao nascer
do dia, as tropas de Oka, com a bandeira do regimento, começaram a avançar
para Matanikau, a fim de tomarem as posições necessárias para ajudarem a força
de Kawaguchi, que desfecharia o ataque principal. Cerca do meio-dia de 7 de
Setembro, Oka foi informado pela rádio de que o general estava a encontrar
demoras imprevistas, na selva.

Esta mensagem enfureceu Rabaul e Tóquio. O Quartel-General imperial tivera


conhecimento de que, no dia 5, chegara às Fiji um poderoso comboio americano,
possivelmente em viagem do Havaí para Guadalcanal 10. Impunha-se, claro, que
Kawaguchi avançasse a toda a velocidade, e Hyakutake ordenou que o ataque
fosse desencadeado na noite de 12. O general respondeu que faria tudo quanto
pudesse para cumprir a ordem, e mandou um correio informar o coronel Oka da
mudança de planos. Mikawa ajustou o seu esquema de apoio. O quartel-general
da 11.ª Esquadra Aérea mandou pôr de prevenção uma esquadrilha de Zeros, a
fim de levantar voo para Henderson no dia 12 ou depois do dia 12, e
recomendou ao comandante do destacamento de transporte aéreo que estivesse
preparado para mandar peças sobressalentes essenciais e pessoal de manutenção
para o campo, assim que Vandegrift se rendesse.

Depois de escurecer, no dia 7 de Setembro, os raiders embarcaram para


Tasimboko nos ADP Manley e McKean e nos YP — «Yippies», na gíria dos
fuzileiros — 346 e 289, que tinham motores diesel. A vomitar cascatas de
centelhas encarnadas e com os motores a roncar, enquanto cortavam a escuridão
direitos a leste, os «Yippies» só não denunciavam a sua presença a cegos e
surdos.

Os japoneses de Taivu não eram uma coisa nem outra, mas a sorte prega, às
vezes, estranhas partidas, na guerra, e a dessa manhã nevoenta foi muito
especial. Quando as barcaças se dirigiam para a praia, os transportes Fuller e
Bellatrix, em viagem para Lunga, protegidos por um cruzador e quatro
contratorpedeiros, surgiram ao longe, a leste. O atarantado escalão da retaguarda
de Kawaguchi demorou-se apenas o tempo suficiente para transmitir uma
frenética mensagem, segundo a qual estava iminente um grande desembarque,
abandonou o pequeno-almoço quente, espingardas e duas peças antitanques —
que chegariam para destruir as barcaças —, e fugiu. Os raiders desembarcaram,
sem que os molestassem, tiraram os blocos de culatra aos canhões, atiraram-nos
ao mar, infiltraram-se meia milha, para o interior, e viraram para oeste, através
duma plantação de coqueiros. Quando Kawaguchi recebeu a inesperada
mensagem do seu escalão da retaguarda — cerca de 300 homens dos serviços de
aprovisionamento e comunicações—, não pôde fazer outra coisa senão ordenar-
lhes que «fizesse frente ao inimigo». Ele não podia voltar atrás.

O general não exagerara ao queixar-se das dificuldades encontradas, ao tentar


abrir caminho, com mais de 3000 homens, através da selva húmida e pútrida.
Ora ensopados pelas chuvas torrenciais, ora encharcados em suor, os seus
soldados, numa coluna irregular com mais de três milhas de comprimento,
escorregavam e tropeçavam, com lama até aos tornozelos, ao avançar, passo a
passo, para as posições donde desencadeariam o planeado ataque de surpresa ao
aeródromo.
Em Rabaul, a notícia do contradesembarque americano causou preocupação.
Pessimista, Hyakutake transmitiu uma radiomensagem ao Quartel-General
imperial, a informar que Kawaguchi tinha inimigos pela frente e pela retaguarda;
Mikawa planeou um bombardeamento noturno, por um cruzador e oito
contratorpedeiros; Tóquio ordenou a dois batalhões que se encontravam em
Batávia que se preparassem para partir imediatamente; Tanaka embarcou, logo,
um batalhão do Destacamento Aoba nos contratorpedeiros de que dispunha e
mandou-o para Kamimbo, e o comandante do 17.º Exército ordenou ao 41.º de
Infantaria que se concentrasse em Kokoda, na rota Buna-Moresby, a fim de ir da
Nova Guiné para as Salomão. Edson, mais do que ninguém, teria achado muito
divertido todos os aspectos da balbúrdia colossal causada pela sua incursão.

Quando os raiders começaram a seguir de Taivu para leste, os contratorpedeiros


e os «Yippies» apressaram-se a regressar a Kukum a fim de transportar os
paraquedistas. Entretanto, o escalão da retaguarda de Kawaguchi recompusera-se
o suficiente para acionar dois canhões de montanha e dois obuses ocultos no
bosque de coqueiros. As Nambus iniciaram o seu mortífero matraquear. Edson
compreendeu que estava em maus lençóis, pois apenas dispunha de um pelotão
do morteiros de 60 mm. Pediu imediatamente apoio aéreo e, passados 50
minutos, os P-400 focinho de tubarão, de Dale Brannon, estava no ar, à espera de
instruções.

Ao mesmo tempo, uma companhia de raiders, guiada pelos batedores de


Clemens, meteu por um caminho da selva, a fim de cercar o flanco direito do
inimigo. Ao meio-dia, este grupo ocupou posições perto de Tasimboko, mesmo
na retaguarda do inimigo. Surpreendidos, os japoneses fugiram, deixando 27
mortos junto das peças de artilharia e caídos em cima de seis metralhadoras
pesadas. Muitos deles tinham sido atingidos a tiro nas costas.

A presa era rica, mas não havia tempo para transportar as armas, o equipamento
e os alimentos abandonados, apesar de poderem ser muito úteis aos americanos.
Tudo aquilo em que os fuzileiros puseram as mãos, com exceção de meia dúzia
de Nambus com as respectivas munições, foi sistematicamente destruído.
Cinquenta homens foram encarregados de esburacar, à baioneta, vários milhares
de latas de bifinhos de vaca e carne de caranguejo, enquanto outros despejavam
no mar centenas de sacas de arroz.

Dick Tregaskis, o magro corresponde da I. N. S. adoptado pelos raiders, encheu


uma manta militar japonesa de jornais, livros de apontamentos e mapas. Os
fuzileiros destruíram um potente aparelho de rádio e queimaram cinco cabanas
cheias de mantimentos. Edson observou a cena com satisfação. Às quatro horas,
deu ordem de embarque e, poucos minutos depois, iam todos a caminho de
Kukum.

Cheio de curiosidade, no apressado regresso à base, o comandante do batalhão


descobriu que não havia oficial nem soldado que não levasse um bom
carregamento de carne de caranguejo e bifinhos de conserva, em molho de soja.
A bordo do Manley iam, também, 21 caixas de cerveja japonesa e 17 garrafas de
meio galão de saquê.

«Não se trata de nenhum grupo desorganizado de japoneses», disse Edson,


preocupado, a Thomas, nessa noite. Passadas poucas horas, depois de ter
examinado o material entregue na sua fétida e escura barraca dos serviços de
informações, «Pappy» Moran confirmou que não se tratava, de fato, de nenhum
grupo desorganizado. Os batedores de Clemens acrescentaram os seus
cuidadosos relatórios: uma grande força de japoneses — talvez mais de 3000 —
avançava, mais ou menos a sudoeste de Tetere.

Na manhã seguinte, os mapas e as fotografias foram espalhados na mesa do


departamento de «Operações» e estudados os últimos relatórios das patrulhas e
dos batedores. Por fim, após demorada discussão, Thomas disse a Edson: «Eles
vêm aí.» Edson desconfiou, também, de que assim era. Mas de que direção
viriam? Deslizou com a ponta do indicador ao longo de uma fotografia aérea e
disse, na sua voz baixa e gutural: «Este parece um bom acesso».

A mancha clara que o dedo de Edson percorreu representava um espinhaço de


coral acidentado e irregular, que corria paralelamente ao Lunga, a sul do
aeródromo. A selva invadia as vertentes do sul, do leste e do oeste e, ao norte, o
terreno descia suavemente para o castigado Henderson. Surdo aos protestos do
seu estado-maior, Vandegrift decidira estabelecer um novo posto de comando
perto deste espinhaço. Estava farto e cansado de saltar para dentro e para fora do
abrigo existente ao lado do aeródromo, e esperava encontrar ali alguma paz.

Enquanto o general mudava o seu posto de comando para uma área que lhe
parecia menos exposta às bombas japonesas, Ghormley, em Nouméa, meditava
numa estranha mensagem recebida de Nimitz. Este ordenava-lhe que entregasse
a MacArthur um regimento reforçado de «tropas anfíbias experimentadas»,
assim como os três transportes e o navio do aprovisionamento necessários para
as transportar para o setor de combate. O almirante sentia-se perplexo. Os chefes
conjuntos, autores da estranha ordem, deviam saber tão bem como ele que as
únicas tropas em tais condições em todo o sul do Pacífico eram as que
defrontavam o inimigo nas Salomão. Talvez quisessem que entregasse o 7.º de
Fuzileiros, que vinha a caminho do seu setor, ao general MacArthur?

Sem saber que fazer, perguntou a Turner o que pensava. O comandante da Força
Anfíbia foi comedido:

«As únicas tropas anfíbias experimentadas do Sul do Pacífico estão em


Guadalcanal e não é aconselhável tirá-las de lá.»

O 7.º de Fuzileiros, prosseguiu Turner, estivera vários meses em Samoa como


tropas de guarnição, e não se encontrava, de modo nenhum, apto a efetuar um
desembarque de ataque. Embora Ghormley não lhe tivesse pedido conselhos,
Turner deu-lhos. O almirante precisava, sem dúvida, deles.

«Chamo respeitosamente a atenção para a posição insegura de Guadalcanal [...]


Não lhes foi proporcionada a força naval e aérea adequada [...] Vandegrift tem
pedido com insistência o reforço imediato de pelo menos um regimento [...]
Concordo com ele.»

Em princípios de Setembro, todos os comandantes — Kawaguchi, Ghormley,


Hyakutake, Turner, Vandegrift— tinham as suas preocupações. Geiger e Woods
não constituíam exceções. Para os aviadores, cada dia era um desafio, e um
desafio que não vinha só do céu. As perdas operacionais subiam
alarmantemente. Em 8 de Setembro, 8 aparelhos falharam, ao levantar voo. Os
primitivos meios de reparação de que dispunham permitiram pôr dois em estado
de funcionamento, mas os outros seis foram rebocados para o estaleiro, a fim de
serem desmantelados e de se aproveitarem as peças em condições de utilização
noutros aparelhos. Dois dias depois, Geiger só contou 11 Wildcats em estado de
funcionar dos 38 que tinham chegado ao campo. Enquanto ele olhava tristemente
para o cada vez maior monte de sucata, um piloto de caça observava a um
membro do estado-maior de Harmon: «Por este andar, vamos desaparecendo
sem precisar da ajuda dos japoneses.»

Ao mesmo tempo, iam-se esgotando, sucessivamente, bombas, oxigênio, balas


incendiárias e contra blindados, pneus e óleo lubrificante. Para não falar no
eterno problema fundamental: a gasolina. A força aérea subsistia, dia a dia, num
estado crônico de crise. A cada problema que se resolvia, surgiam dois
problemas novos. Os pilotos estavam quase exaustos; a malária alastrava pouco
a pouco e eles não tinham sido vacinados.

Já em fins de Agosto o subsecretário da Marinha, James Forrestal, então em


visita ao Pacífico Sul, enviara uma radiomensagem ao seu amigo e colega
Robert Lovett, subsecretário da Aeronáutica, a informá-lo da necessidade
desesperada de mais caças capazes de voar a altitudes que permitissem a
intercepção. Os P-400 do Exército não podiam, pura e simplesmente, subir tão
alto. Os indicados eram os novos Lightning P-38. Três dias depois do apelo de
Forrestal a Lovett, Ghormley fez idêntico apelo a MacArthur. O almirante pediu
uma «pequena força» de P-38. MacArthur não o pôde atender; só tinha seis.

Mas enquanto McCain, Turner e Vandegrift bombardeavam Ghormley com


pedidos urgentes de caças, havia Wildcats parados no Pacífico Sul: parte do
grupo aéreo do Saratoga, que tinham voado para bases na Nova Caledônia e nas
Hébridas no último dia de Agosto, quando o grande porta-aviões fora atingido
por um torpedo disparado pelo submarino inimigo I-26. Estavam imobilizados,
desde esse dia.

Tecnicamente, estes aparelhos do porta-aviões não estavam sob o comando de


Ghormley e, portanto, o almirante não podia dispor livremente deles. Pertenciam
ao vice-almirante Fletcher, que continuava a operar no setor de Ghormley,
embora ainda sob as ordens de Nimitz. Fletcher, compreensivelmente ansioso
por manter a integridade do seu grupo aéreo de porta-aviões —embora, de
momento, não tivesse nenhum porta-aviões donde catapultasse os aparelhos—,
obtivera de Ghormley a promessa de que os seus caças não iriam para
Guadalcanal. A situação era, portanto, a seguinte: a Marinha tinha caças
disponíveis, com pilotos experientes, que podiam chegar a Guadalcanal em três
horas; mas esses aviões estavam presos a bases da retaguarda — e não apenas
por um pormenor técnico de comando, mas também porque o código naval
determinava que os aparelhos de porta-aviões deveriam, «normalmente», operar
a partir de porta-aviões.

No entanto, em 10 de Setembro, Nimitz enfrentou a realidade e pôs ao dispor de


Ghormley, para que os utilizasse como entendesse conveniente, todos os
aparelhos de porta-aviões «que pudessem ser dispensados». O ComSoPac agiu,
então, com um vigor que nem sempre o caracterizou e, no dia seguinte, ordenou
ao primeiro-tenente LeRoy C. Simpler que levasse os 24 Wildcats do seu «Caças
Cinco» de Espiritu para Henderson, «imediatamente». Simpler levantou voo,
«imediatamente».

O esquadrão não tardou a distinguir-se. Ao meio-dia do dia seguinte à sua


chegada, os pilotos de Simpler levantaram voo, a fim de travar combate com
uma esquadrilha de bombardeiros escoltada por 20 Zeros, que atacou tudo, no
raio de uma milha do «pagode», com bombas incendiárias, explosivos fortes e
«daisy cuters». Os aviadores da Marinha incendiaram 16 aparelhos japoneses.
Um piloto americano morreu numa aterragem de emergência.

Vinte e quatro horas depois, verificaram-se dois novos ataques. Os combates


aéreos foram violentos. A «Luz Vermelha», anunciada ao meio da manhã,
manteve se em vigor durante a maior parte do dia. Entre os alertas, chegaram
outros aparelhos de porta-aviões. Em três dias, Ghormley mandou para
Guadalcanal um total de 60 aviões. Talvez o suficiente para manter, durante
algum tempo, uma situação de equilíbrio — talvez não. É que, só num dia —12
de Setembro —, o contra-almirante Yamagata mandou mais do dobro desse
número para Vunukanau e Lakunai.

No dia 10 de Setembro, depois de um pequeno-almoço de arroz espapaçado e


batatas desidratadas, raiders e paraquedistas levantaram o acampamento e
puseram-se a caminho de um espinhaço a sul do aeródromo. «Aqui, perto da
praia, caem demasiadas bombas e granadas», observou Edson, a sorrir. «Vamos
para um sítio mais sossegado.» A marcha para o setor que o coronel escolhera
como «acampamento de descanso» foi interrompida duas vezes por ataques
aéreos, mas, apesar disso, os elementos avançados do seu grupo combinado —
700, ao todo— começaram a chegar ao espinhaço. Edson foi-lhes destinando as
posições, à medida que chegavam: raiders, a roda do cabeço do sul, com a
companhia do flanco direito espalhada, com pouca densidade, na direção do
Lunga; paraquedistas, agora comandados por Torgerson, à esquerda.

A depressão onde foi instalado o posto de comando ficava cerca de 90 metros a


sul do recém-transferido quartel-general da Divisão. Foi aí que a reserva de
Edson, uma companhia incompleta, cavou abrigos pouco fundos, e que o pessoal
de comunicações do capitão William D. Stevenson enterrou o seu telefone.

Na manhã seguinte, alguns fuzileiros cortaram trepadeiras com as baionetas,


outros estenderam os poucos metros de arame farpado de que dispunham e
outros cavaram abrigos. A notícia de que o ataque aéreo da praxe estava
próximo, não perturbou ninguém: os japoneses bombardeavam sempre o
aeródromo. Mas desta vez o alvo não seria o aeródromo e, sim, o espinhaço. Foi
nele que 26 Bettys descarregaram, sucessivamente, as suas bombas de 500
libras, judiciosamente misturadas com «daisy cutters». Os fuzileiros que se
afundaram o mais possível nos seus abrigos ou se atiraram para trás de troncos,
ficaram abalados, mas vivos. Os que estavam de pé ou corriam à toa —e alguns
procederam exatamente assim — foram mortos ou feridos por estilhaços. Depois
do ataque, enquanto sacudiam silenciosamente a terra dos fatos, os homens
compreenderam, de súbito, que naquela noite, ou em qualquer noite próxima, os
japoneses irromperiam, aos gritos, da selva, como acontecera no Tenaru.

«Raio de campo de descanso!», praguejou um cabo. «Raio de campo de


descanso!»

Os reconhecimentos efetuados antes de escurecer por Edson e pelo seu ajudante,


até à distância de meia milha, para sul, deram resultados negativos. Mas os
batedores de Clemens, que tinham um raio de ação muito maior e eram mais
rápidos, anunciaram a presença de uma comprida coluna inimiga, que avançava
do leste na direção da nascente do Lunga. Não havia, pois, dúvida de que o
inimigo estava presente. Mas onde, ao certo? E em que força? Vandegrift só
podia esperar, preparar-se e confiar que as suas disposições estivessem certas.
Tinham de estar. Excetuando o 2.º Batalhão do 5.º de Fuzileiros, que constituía
agora a reserva da Divisão, todas as tropas estavam empenhadas na defesa e nas
posições da praia.

Durante a tarde de 11 de Setembro, Kelly Turner foi de avião a Henderson, de


Espírito Santo. Recentemente passara algum tempo em Nouméa, onde
conferenciara com o almirante Ghormley e o seu oficial planejador, DeWitt
Peck, um coronel de Fuzileiros muito instruído e autoritário. Quando Turner pôs
os pés em terra, Vandegrift estendeu-lhe a mão e ofereceu-lhe a hospitalidade da
ilha. No mesmo instante, a sereia tocou, a anunciar um ataque aéreo. A «Luz
Vermelha» estava em vigor.

Mais tarde, o general acompanhou o visitante ao novo posto de comando e


prometeu-lhe uma cama. Turner, visivelmente perturbado, tirou da algibeira do
peito uma folha de papel dobrada, da Marinha dos Estados Unidos, e entregou-a
a Vandegrift, sem proferir uma palavra. O general desdobrou o papel e começou
a ler. Pouco a pouco, a cor fugiu-lhe do rosto e Vandegrift pareceu encolher-se.
Tão silenciosamente como recebera a mensagem, passou-a ao coronel Thomas,
que a leu. A atmosfera da cabana parecia carregada de eletricidade, e havia boas
razões para isso.

A mensagem continha um cálculo da situação do inimigo, elaborado pelo estado-


maior do ComSoPac e por ele aprovado 48 horas antes. Dizia, em resumo, que
se estavam a concentrar em Rabaul e Truk enormes forças navais nipônicas; que
a força aérea em Vunukanau e Lakunai aumentava diariamente, e que se
encontravam em Simpson Harbor várias dúzias de transportes, a carregar tropas
e mantimentos. Previa-se o desencadeamento de um ataque de grande
envergadura em dez dias, duas semanas ou, com certeza, antes de três semanas.

Mas isto era só o preâmbulo.

Seguia-se um sumário da situação do ComSoPac, que enumerava a escassez de


cruzadores, porta-aviões, contratorpedeiros e barcos de carga. O cálculo
rematava com a aterradora afirmação de que o ComSoPac não podia continuar a
apoiar os fuzileiros de Guadalcanal.

Thomas dobrou a mensagem e guardou-a na algibeira da camisa. (Conservá-la-ia


aí até ao dia em que partiu da ilha, quase três meses depois.) Turner abriu a mala
e tirou uma garrafa de uísque escocês, que pôs em cima da mesa nua.
«Vandegrift», declarou, «não encaro a situação com tanto pessimismo como o
Ghormley. Ele não acredita que eu consiga fazer cá chegar o 7.º de Fuzileiros,
mas eu julgo ter um plano capaz de enganar os japoneses e ser coroado de êxito.
Agora vamos tomar uma bebida e, mais tarde, discutiremos o assunto.» Como
resultado da discussão ulterior, recomendou-se urgentemente ao ComSoPac que
mandasse avançar, sem demora, o 7.º de Fuzileiros.

A noite que o almirante passou em Guadalcanal não foi tranquila. Durante quase
duas horas, a artilharia naval nipônica martelou o espinhaço próximo. Anos
depois, Vandegrift observaria: «Kelly julgava-nos com a “mania do gatilho”,
mas quando as granadas nos começaram a atingir mudou de idéias. Os japoneses
humanizaram-no. Antes de partir, no dia seguinte, disse-me que traria o 7.º de
Fuzileiros e o desembarcaria onde eu quisesse.»

Depois de se despedir de Turner, Vandegrift foi conferenciar com Geiger. Que


deveriam fazer se o estado de emergência que Ghormley considerava iminente se
verificasse, de fato? Claro que todos os aviões deviam estar preparados para
levantar voo sem demora. E Geiger? A sua resposta foi inequívoca: ficaria.
Ao mesmo tempo, Thomas e Twining conversavam, também, acerca do assunto.

«Não podemos permitir que Guadalcanal seja outra Bataan, Bill», disse Thomas.
«Iremos para os montes, para a nascente do Lunga, levaremos as nossas
provisões e as nossas balas.»

Twining concordou e foi para a sua tenda. Aí, sozinho, passou horas a redigir, à
mão, uma ordem de operações, que guardou no cofre. O documento não tinha
data nem número de série.

Na manhã da chegada de Turner, o comandante da artilharia da Divisão, «Don


Pedro» del Valle, resolveu dar um passeio a pé com o seu ajudante, o tenente-
coronel John Bemis, e levar a sua seção de mapas ao espinhaço que Edson
estava a ocupar. O trabalho da seção não foi interrompido. A aviação interceptou
o ataque aéreo diário a pouca distância de Henderson, e os cartógrafos da
artilharia regressaram em segurança, com os dados colhidos, ao centro de
direção de fogo. Bemis suou a noite inteira, a estudar mapas e a elaborar planos
de fogo.

Entretanto, os obuses de 105 mm de Del Valle foram transferidos para novas


posições, donde poderiam apoiar melhor as defesas do espinhaço, se fosse
necessário. Observadores avançados reuniram-se a Edson num posto de
observação da ponta sul o estabeleceram comunicações com o FDC.

Pouco depois do meio-dia, a «Luz Vermelha» advertiu, de novo, que se


aproximavam bombardeiros inimigos. Desta vez, os fuzileiros correram,
depressa, para os abrigos. Lançadas com boa pontaria, as bombas caíram, com
insistência, ao longo do espinhaço. Bombas de um quarto de tonelada de
explosivos potentes esfrangalharam a orla da selva, enquanto «daisy cutters» de
250 libras cortavam a vegetação que se agarrava às árvores e segavam a erva
kunai, de 1,80 m de altura.

Como aviso, chegou. Homens que tinham dormido apenas aos bocados, nas 48
horas anteriores, apressaram-se a aprofundar os abrigos, a cortar restolho, para
melhorar as áreas de fogo de artilharia nas últimas linhas de proteção, e a colocar
os últimos rolos de arame farpado, tirado de posições menos ameaçadas e
trazidos de jipe. Levaram-se para as plataformas das peças granadas
suplementares e munições de fita. Vandegrift transferiu a sua reserva para o lado
sul do aeródromo e o comandante, capitão Joseph J. Dudkowski (o tenente-
coronel Rosecrans sofrera uma distensão muscular, num ataque aéreo da
véspera), o seu estado-maior e os oficiais da companhia efetuaram
reconhecimentos das vias de acesso a utilizar, se o batalhão recebesse ordem de
avançar para o espinhaço, a coberto das trevas. O batalhão de Cresswell, do 1.º
de Fuzileiros, ocupou posições para proteger Dudkowski. Fez-se, em suma, tudo
quanto era possível fazer-se.

A escuridão trouxe chuva e, pouco antes das dez horas, um cruzador e três
contratorpedeiros iniciaram o bombardeamento noturno. Mas desta vez o alvo
não foi o aeródromo. As granadas, cujo barulho lembrava o de comboios de
mercadorias, rebentaram nas imediações do espinhaço: umas caíram antes,
enquanto outras explodiram na selva, a oeste do Lunga. Quando o
bombardeamento cessou, começaram as operações de sondagem do inimigo.
Soaram tiros de espingarda e metralhadora, ora ao longo do flanco direito, ora ao
longo do esquerdo, e, de vez em quando, os morteiros entraram no coro.
Ocasionalmente, a artilharia de Del Valle desbaratou concentrações planejadas,
na selva, a frente das linhas. Só à direita, onde os japoneses se esgueiravam
através do matagal denso, o inimigo logrou deslocar os defensores. Aí passou
pelo meio de um pelotão de raiders, que recuou para a vertente oeste do
espinhaço. Desapareceram sete homens.

Pouco antes de nascer o dia, Edson mandou recuar o flanco esquerdo, onde os
paraquedistas, que tinham sido atacados meia dúzia de vezes, estavam em
desordem. Quando a manhã chegou, finalmente — com que ansiedade os
fuzileiros a tinham desejado! —, o tiroteio esmoreceu e, à medida que os
japoneses se ocultavam na selva, um contra-ataque permitiu recuperar a posição
do flanco direito, perdida durante a noite. A única coisa que não se recuperou foi
a mochila do sargento do pelotão, cheia de correspondência acabada de chegar e
que ainda não fora possível distribuir. Também nunca foram encontrados os
corpos dos sete fuzileiros desaparecidos.

Antes de começar a comer a sua lata de guisado, na manhã de 13 de Setembro,


Edson convocou uma conferência de comandantes de companhia. Sentado num
tronco, enchia colheradas da mistura fria de carne e batatas e mastigava, lenta e
deliberadamente.

«Estiveram a experimentar», disse. «Apenas a experimentar. Voltarão. Mas


talvez em menor número.» A sua boca sorria, mas o sorriso não era
compartilhado pelos olhos. Mastigou nova colherada. «Ou talvez em maior...
Quero todas as posições melhoradas, todas as linhas de arame farpado fixas e
uma refeição quente para os homens. Hoje cava-se, prende-se bem o arame e
dorme-se um bocado. Todos nós precisamos de dormir.» Os oficiais do estado-
maior e os comandantes das companhias, que estavam acocora- dos, em
semicírculo, a beber café morno e a fumar, levantaram-se. «O inimigo voltará e
eu quero surpreende-lo», concluiu Edson.

A base da surpresa consistia numa retirada ao longo do espinhaço e numa


contração e num encolhimento das linhas ao longo dos seus lados. Esta manobra
beneficiava muito as áreas de fogo de automáticas e impunha ao atacante um
percurso de quase 90 metros, a partir da orla da selva até poder estabelecer
contato físico com a posição. Ao transpor este espaço aberto, ficava exposto ao
fogo mortífero dos defensores.

Na realidade, porém, Edson estava enganado ao supor que o inimigo estivera a


«experimentar», durante a noite. Kawaguchi desencadeara o ataque com a
intenção de que fosse decisivo.

«... mas por causa da maldita selva a brigada dispersou-se por toda a parte e foi
impossível controlá-la. Nunca me senti tão impotente em toda a minha vida.
Quando olhava à minha volta só via o ajudante Yamamoto, a minha fiel
ordenança, Noguchi, e quatro ou cinco outros homens. Foi uma tragédia. Se não
tivéssemos recebido a ordem do Quartel-General e só desencadeássemos o nosso
ataque na noite de 13, este desgraçado malogro talvez se tivesse evitado.»

Kawaguchi sentia-se frustrado e sem saber que fazer, mas os comandantes


japoneses em Rabaul encontravam-se em muito pior situação, pois desde o
ataque de Edson a Tasimboko estava impossibilitados de comunicar quer com o
escalão da retaguarda da brigada quer com o general. Em Vunukanau e Lakunai,
Zeros e transportes carregados, com os motores a trabalhar sem carga e os
pilotos e as tripulações de prevenção, aguardavam ansiosamente a ordem de
seguir para Guadalcanal e assistir às cerimônias da rendição. As últimas notícias
de Kawaguchi tinham chegado havia cerca de 36 horas e, segundo elas, deveria
ocupar o aeródromo em 12 de Setembro. Parecia natural supor que assim
acontecera, mas era estranho que não tivessem chegado mais notícias.

O comandante da 11.ª Esquadra Aérea mandou quatro aviões averiguar a


situação:
«Não havia a certeza, mas parecia natural supor que o aeródromo fora ocupado.
Assim, era necessário tomar as devidas providências e notificar todas as
unidades interessadas. Mas quando os aparelhos de reconhecimento voltaram
soube-se que o aeródromo ainda não fora ocupado. Supôs-se que as forças do
Exército tinham adiado o ataque e, por isso, a execução dos planos previstos
sofreu também o adiamento de um dia.»

No entanto, o quartel-general da 11.ª Esquadra Aérea não achou seguro


bombardear o aeródromo nem o espinhaço e preferiu atacar o único alvo que lhe
pareceu tentador: os fuzileiros que tinham desembarcado seis dias antes em
Taivu e que supunham ainda nas imediações. Ao meio-dia, 26 Bettys escoltados
por uma dúzia de Zeros passou a baixa altitude sobre a ilha Florida e
bombardeou o faminto e desorganizado escalão da retaguarda de Kawaguchi.
Como não houvesse oposição, no ar, os pilotos aproveitaram a oportunidade para
metralhar furiosamente Tasimboko. Os alvos, membros apavorados dos
destacamentos de sinalização e aprovisionamento de Kawaguchi, foram
chacinados ao tentar desfraldar bandeiras da «almôndega» perto da beira-mar.
Estes estandartes ensanguentados e perfurados foram mais tarde recolhidos por
batedores nativos.

Às 9 horas daquela noite, «Louie the Louse» chegou a Kukum, calou os motores,
aguardou um minuto e depois lançou uma bomba luminosa, que se desfez numa
pálida claridade esverdeada sobre o meio do aeródromo. Ao verem o sinal, sete
contratorpedeiros que se encontravam em Lunga Roads começaram a
bombardear Henderson. A ação durou uma hora. Durante esses longos 60
minutos, os homens de Edson combatiam, no espinhaço — e por muito mais do
que pela própria vida.

Dois batalhões japoneses reforçados —quase 2000 homens— atacaram, em


vagas, as vertentes escorregadias. Os morteiros dos defensores, localizados em
desenfiamento, lançavam granadas tão depressa quanto os carregadores as
conseguiam introduzir nos canos quentes. A artilharia rasgava as carnes dos
japoneses com estilhaços de aço. À direita, os banzais morriam em gemidos
surdos, mas o grito de batalha jorrava das gargantas da esquerda. «Ao ataque!
Ao ataque!», gritavam os japoneses, ao avançarem sob a luz esverdeada dos
foguetes luminosos. «Morre, Maline!»

«Primeiro vocês comerão merda, seus pulhas!», ripostou, esganiçadamente, um


atirador americano.
Este ataque feroz obrigou as defesas que contornavam o espinhaço a ceder, como
um ferreiro obrigaria uma ferradura em brasa a dobrar-se. A ferradura dobrou,
mas não partiu, e às 11 da noite houve uma acalmia: Kawaguchi retirou as suas
tropas de assalto, para as reagrupar. Os japoneses palravam, à entrada da selva, e
os fuzileiros aproveitavam a folga e preparavam-se.

Poucos minutos antes da meia-noite, o general nipônico desencadeou outro


ataque, apoiado por fogo de canhão e morteiro. Embora o contrafogo de morteiro
dos fuzileiros não fosse eficaz, as concentrações de artilharia, à frente da última
linha de proteção, esfrangalhavam os japoneses que avançavam. Mas isso não
impedia outros de avançar. «Retraiam o fogo!», ordenou Edson ao observador
avançado de Del Valle. «Mais perto.» E de novo: «Mais perto.» O oficial
obedeceu.

Os japoneses que saltaram para os abrigos americanos, na ânsia de fugir à morte


que os envolvia, foram de lá tirados em peso. Dúzias de fuzileiros e japoneses
mortos e moribundos, alguns com braços e mãos arrancados, outros com pernas
esfaceladas, outros com o peito transpassado, o ventre furado ou o rosto coberto
de lama e sangue, foram arrastados para um primitivo posto de socorros onde
dois médicos da Marinha e os seus auxiliares, à luz de lanternas eléctricas
veladas por capotes, aplicavam torniquetes, faziam transfusões, limpavam e
ligavam ferimentos.

À meia-noite, os fuzileiros de Edson tinham repelido dois ataques de grande


envergadura e resistido a um inimigo obstinado, numa luta de perto. A ferradura
continuava a envolver o espinhaço. As metralhadoras ligeiras e as espingardas
automáticas tinham esgotado as munições; nas posições avançadas, não havia
mais granadas. O major Kenneth D. Bailey, único membro da seção de
aprovisionamento, percorreu diversas vezes, de gatas, o espinhaço batido pelo
fogo, para levar granadas e munições a fuzileiros encolhidos em abrigos. Edson,
de pé logo atrás das linhas da frente, verberava os homens atordoados, que
cambaleavam na sua direção: «Volta para onde vieste. A única coisa que eles têm
e que tu não tens é coragem!»

Às 2 da manhã, uma barragem de morteiro martelou ambos os lados do


espinhaço e cortou as comunicações com a Divisão e a artilharia de apoio. Cinco
minutos depois, os foguetões luminosos voltaram a iluminar o espinhaço. Ao
mesmo tempo, os japoneses corriam, encolhiam-se e gritavam: «Morre,
Maline!», «Banzai!», «Morre, Maline!», «Banzai!» Estavam a menos de 900
metros do campo Henderson.

Mas os fuzileiros não tinham intenção nenhuma de morrer e as suas pragas e


obscenidades ouviam-se acima do fragor das armas automáticas. Um jovem
artilheiro-observador atingido foi substituído por um sargento, que gritou ordens
de fogo por uma linha de comando suplementar, acabada de montar pelos
homens das comunicações.

Às duas e meia, os japoneses recuaram de novo. Edson imitou-os, a fim de


preparar as posições no último cabeço. Reinava o silêncio no espinhaço.
«Podemos aguentar», disse Edson, pela linha geral, a Thomas. O G-3 já
começara a mandar para a frente a reserva da Divisão, uma companhia de cada
vez.

O 2.º Batalhão do 5.º de Fuzileiros ajudou a suster os dois ataques


desencorajados que Kawaguchi desencadeou antes de nascer o dia. Aliás, estes
ataques não surtiram qualquer efeito. A artilharia, que não parava de martelar a
entrada da selva, anulou-os. As seis da manhã, os caças de Brannon, munidos de
canhões e a voar a uma altitude de seis metros acima dos fuzileiros, começaram
a lançar granadas de 37 mm no emaranhado da selva. O general japonês deu
ordem de retirada.

Deixou atrás de si um espinhaço ensanguentado e cheio de cadáveres. Nas


grotescas atitudes características dos surpreendidos por morte súbita e violenta,
jaziam os corpos de mais de 500 homens, caídos gloriosamente pelo imperador.
De cabeças pendentes e bocas escancaradas, os mortos fitavam, com olhos
vítreos e cegos, o Sol nascente.

Entretanto, os «caçadores de narcejas» não perdiam tempo e atiravam, dos seus


esconderijos, sobre os americanos. Equipas de fuzileiros começaram a dar-lhes
caça e a escorraçá-los das árvores e do matagal. Um oficial japonês, de espada
em punho, irrompeu pelo posto de comando de Vandegrift e atirou a espada,
como se arremessasse uma lança, a um sardento artilheiro, cujo corpo
atravessou. O primeiro-sargento Shepherd Banta, que nesse momento estava a
verberar um escriturário, ouviu um grito de «Banzai», saiu a correr da tenda,
tirou a pistola e matou o japonês, com um tiro. Depois regressou à tenda e
completou a tarefa interrompida.

No espinhaço continuavam a morrer fuzileiros. Às oito horas, um jipe que


transportava cinco feridos dirigia-se lentamente para o aeródromo. Os ocupantes,
entre os quais se contava o oficial de operações de Edson, major Robert S.
Brown, foram mortos por três rajadas certeiras de uma Nambu oculta.

Enquanto Kawaguchi desencadeava os seus ataques contra o espinhaço, outro


batalhão da sua brigada atacava o batalhão do tenente-coronel William J.
McKelvy, do 1.º de Fuzileiros, numa posição protegida por arame farpado, ao
longo do Ilu, uns 1800 metros a leste de Edson. As várias tentativas foram
repelidas com pesadas baixas para o inimigo. De manhãzinha, cinco tanques dos
fuzileiros aventuraram-se, sem apoio, no terreno lamacento. Três atolaram-se e
foram imediatamente atingidos por fogo antitanque. Mas os japoneses deste
batalhão também estavam desencorajados e não tardaram a retirar para leste, na
direção da Koli Point. Durante a tarde, um ataque do oeste, tardiamente
desencadeado pelo coronel Oka, foi igualmente repelido, com pequenas baixas
para ambos os lados.

Assim terminaram as ações que, então, ficaram conhecidas por vários nomes: «O
Espinhaço dos Raiders», «O Espinhaço Sangrento» ou, apenas, «O Espinhaço».
Nenhum fuzileiro precisava de perguntar qual espinhaço. Mais tarde, este cabeço
coberto de erva passou a ser apropriadamente denominado «Espinhaço de
Edson». Os raiders tiveram 135 baixas e os paraquedistas 128. Neste total de 263
contavam-se 49 mortos e 10 desaparecidos.

A brigada de Kawaguchi foi gravemente atingida. Os 225 oficiais e 6005


soldados que participaram nos ataques tiveram quase 20 % de baixas, assim
distribuídas:

Mortos e desaparecidos em ação, 708, sendo 29 oficiais e 679 soldados.

Feridos em ação, 505, sendo 13 oficiais e 492 soldados.

Mil duzentos e treze oficiais e soldados mortos, desaparecidos e feridos, dos


quais Kawaguchi deixou quase 600 no espinhaço. Número sinistro, sem dúvida,
sobretudo depois de se saber — e soube-se pelas «Memórias» publicadas depois
da guerra por Kawaguchi— que dos três batalhões destinados àquela fase da luta
um não combateu. Os dois que combateram foram quase totalmente aniquilados.

Que aconteceu, afinal, ao batalhão do tenente-coronel Kusukichi Watanabe, a


unidade encarregada de avançar para o aeródromo?
Todo o batalhão «passou a noite sem participar em qualquer ação. Esta força
poderosa, aquela com a qual eu mais contava, estava pessimamente comandada.
Quando tive conhecimento disso, não pude conter lágrimas de decepção, cólera e
desgosto».

Depois de serenar, o general mandou chamar Watanabe e gritou-lhe, ao vê-lo:


«Cobarde! Pratique haraquiri!»

Talvez os japoneses não o compreendessem na manhã de 14 de Setembro, mas


as suas provações estavam longe de ter acabado. Kawaguchi tinha uma escolha
desesperada a fazer: ou retirar na direção de Taivu ou abrir caminho através da
selva e alcançar a margem ocidental do Matanikau. Optou pela segunda hipótese
e, a meio da manhã, começou a recuar para sul, a abrir caminho na direção da
nascente do Matanikau. Acompanhavam a coluna mais de 400 feridos,
transportados em macas improvisadas, carregadas umas vezes por quatro
soldados, outras por seis. Pôde retirar sem interferências. Não havia nenhuma
unidade de fuzileiros disponíveis e em condições de efetuar a perseguição.

O Batalhão de Paraquedistas estava destroçado: dos 377 oficiais e soldados


desembarcados em Gavutu no dia 7 de Agosto, 212 tinham já sido mortos ou
feridos, o que equivalia a uma percentagem de baixas superior a 55 %. Os
raiders encontravam-se pouco melhor: tinham desembarcado em Tulagi uma
força um pouco superior a 750, mas haviam sofrido 234 baixas em combate, ou
seja, mais de 30 %. A reserva da Divisão, que combatera em pequenas parcelas,
estava temporariamente desorganizada. Tudo isto permitiu a Kawaguchi retirar o
melhor possível.

A medida que a sua longa e lenta coluna se debatia com intermináveis


espinhaços e vales profundos, onde o emaranhado da vegetação formava bolsas
de ar húmido e pesado e do incestos, o arroz começou a escassear. Embora ao
abrigo do implacável fogo das metralhadoras e da artilharia inimigas, os
japoneses enfrentavam um novo inimigo — a fome—, ainda mais persistente e
mais mortífero do quo as granadas, as balas e as bombas. Ao percorrerem, a uma
velocidade desesperantemente lenta, as encostas sul do Mount Austen, comeram
os últimos míseros bagos de arroz. Três dias depois, aqueles homens esfaimados
arrancavam cortiça das árvores, devoravam raízes, erva e folhas, roíam as
correias das espingardas e bebiam de poças e charcos. Enterraram morteiros e
metralhadoras pesadas antes de atravessarem os braços superiores do Lunga;
depois abandonaram também as Nambus, os morteiros ligeiros, as munições, os
capacetes e as mochilas.

Na tarde do oitavo dia desta agonia, a vanguarda de Kawaguchi encontrou a


retaguarda do coronel Oka. Escaveirados, imundos, descalços, fracos, com o
vestuário esfrangalhado e munidos apenas de espingardas, os restos
desorganizados da 35.ª Brigada reuniram-se, gradualmente, perto de Point Cruz.

«O Exército», observaria mais tarde um oficial da Marinha japonesa, «estava


habituado a combater os chineses.»

Notas
1 Shakespeare, Henrique V, terceiro ato, prólogo. (N. do A.)

2 Diário de Guerra, 8.ª Esquadra Japonesa, 7 de Agosto de 1942. ONRL.


Documento 161 259, p. 6. (N. do A.)

3 Foi afundado no dia seguinte pelo submarino americano S-38. (N. do A.)

4 Designação dada pela Marinha americana aos contratorpedeiros transformados


em transportes de tropas. Estes vasos de guerra da Primeira Guerra Mundial
transportavam 175 oficiais e soldados, em acomodações que deixavam muito a
desejar. (N. do A.)

5 Verso do conhecido couplet do édito do imperador Meiji a soldados e


marinheiros: «A morte é mais leve do que uma pena; / O dever tão pesado como
uma montanha.» (N. do A.)

6 Frases atribuídas ao general Matsui, comandante das tropas japonesas que


saquearam Nanquim. (N. do A.)

7 Incluindo sete sofridas pela patrulha do capitão Brush e três pelo 3.º Batalhão.
(N. do A.)

8 Cannibalize significa, em inglês, desmantelar uma máquina ou um aparelho


para aproveitar as suas peças no reparo de outra. Traduziu-se à letra, em
português, para aproveitar o jogo de palavras do autor. (N. da T.)

9 Morre, Marine, ou seja, fuzileiro naval. Como se sabe, os japoneses trocam o


«r» pelo «l». (N. da T.)

10 Tratava-se do comboio que partira de Samoa e que transportava o 7.º de


Fuzileiros e o 5.º Batalhão de Defesa. (N. do A.)
LIVRO III

10. «TÃO PRECARIAMENTE MANTIDAS»

Se as vencidas e exaustas tropas de Kawaguchi esperavam descansar e refazer-se


nos calmos e verdes bosques a oeste de Matanikau, estavam enganadas, pois os
japoneses que já lá se encontravam não tinham comida que pudessem ceder. O
coronel Oka, que desembarcara com o quartel-general do seu 124.º de Infantaria
e mais dois batalhões enfraquecidos, tinham rações suficientes apenas para
aguentar os seus homens até Kawaguchi tomar Henderson. Depois da rendição,
o coronel esperava, naturalmente, que as tropas subsistissem do arroz americano
ou do que os fuzileiros comessem em sua substituição. Tinham sido
desembarcadas provisões, com regularidade, em Kamimbo Bay, mas o coronel
estava longe — quase 80 quilômetros, por terra — do centro abastecedor. Entre
o arroz de Kamimbo e as suas tropas estavam uns 2000 membros da 8.º Força de
Base, que tinham voado, de mãos vazias, das imediações do aeródromo, em 7 de
Agosto. Destacamentos de várias força de desembarque navais acrescentavam
umas 700 bocas à população japonesa faminta do lado oeste de Guadalcanal.

Tudo correra inexplicavelmente mal. O inimigo «abandonado» em terra


continuava a agarrar se, com teimosia, ao aeródromo. Com os seus próprios
homens a rações reduzidas, Oka não podia alimentar os indesejados visitantes
que lhe caíam, de súbito, em cima. Dezenas dos feridos no espinhaço estavam
atacados de malária; centenas sofriam de disenteria, e estavam todos
enfraquecidos pelos horrores passados na selva inclemente. Oka, responsável
pela defesa da linha do rio, não teve outro remédio senão empurrá-los todos para
oeste, assim que chegaram, aos tropeços, ao seu setor. Em Kokumbona, em
Tassafaronga e no cabo Esperança havia médicos, arroz e quinino.
Um japonês escreveu, no seu diário, «nunca ter sonhado» que os cocos lhe
salvariam a vida «nesta horrível selva». Os seus camaradas eram «só pele e
osso», «homens pálidos e selvagens». Fumara o seu último cigarro e, «com um
pavio aceso», andou a suplicar restos de tabaco aos amigos mais frugais. Todas
as manhãs os sobrevoavam aviões e bombardeiros; passava a maior parte das
horas de luz encolhido num buraco húmido. «Embora tenha visto passar os
nossos aviões, parece que não produzem nenhum efeito, pois o domínio do mar e
do ar está completamente nas mãos do inimigo. Transformei-me num homem
primitivo.» Este desconsolado japonês deve ter sentido um certo prazer ao ouvir
a rádio de Tóquio dizer que os seus adversários morriam lentamente de fome
enquanto, paralisados de terror, aguardavam as «baionetas justiceiras» que em
breve lhes traspassariam as entranhas.

As primeiras notícias vagas da tragédia que se abatera sobre o major-general


Kawaguchi chegaram a Rabaul em 15 de Setembro e provocaram uma série de
conferências a que assistiram oficiais do estado-maior de Yamamoto e
planejadores de Hyakutake. O resultado de tais reuniões foi o pedido de tropas
suplementares. Dois dias depois, o Quartel-General imperial decidiu que a 38.ª
Divisão, que combatera em Hong-Kong, em Java, em Timor e na Samatra,
reforçaria o 17.º Exército.

Antes mesmo de a 38.ª Divisão ser notificada de que devia sair das Índias
Orientais Holandesas para uma nova frente, já tinham chegado às Shortlands os
1.º e 3.º batalhões do 4.º de Infantaria, além de quartéis-generais regimentais e
um batalhão de artilharia ligeira de 75 mm. Em 11 de Setembro, Tanaka mandou
seguir o 3.º Batalhão, que desembarcou perto do cabo Esperança à meia-noite.
Após uma noite breve, estas tropas repousadas, bem aprovisionadas e equipadas
e ansiosas por combater, começaram a marchar para leste, pelo caminho da
costa, a fim de reforçarem a posição de combate do coronel Oka. No dia 14, o
comandante de regimento, coronel Nomasu Nakaguma, desembarcou em
Kamimbo com o restante batalhão, o seu quartel-general e mais artilharia.
Acompanhava-o o major-general Yumio Nasu, comandante da 2.ª Divisão,
Grupo de Infantaria.

O problema de Hyakutake não era fácil de resolver. Tinha à sua frente duas
operações, mas faltavam-lhe tropas e meios para as reforçar e apoiar
simultaneamente. Havia que escolher entre as duas e o general recomendou ao
Quartel-General imperial a suspensão do ataque à Nova Guiné. Foi uma decisão
dolorosa, tanto mais que o major-general Tomitaro Horii anunciara que a
vanguarda do seu Destacamento dos Mares do Sul avistara na noite de 14 de
Setembro as vertentes da Owen Stanley Range, as luzes de Port Moresby, a
menos de 50 quilômetros de distância.

Os homens de Horii, já com rações inferiores a 2,5 dl de arroz por dia, estavam
exaustos e famintos, mas poderiam — ou, pelo menos, assim julgava o seu
comandante—, se fosse necessário, subsistir apenas dos seus recursos espirituais,
até alcançarem a desejada meta. Hyakutake recusou-se a perfilhar esta opinião e
ordenou peremptoriamente a Horii que retirasse sem detenças para Kokoda.
Como consequência do ataque de Edson a Tasimboko, em 8 de Setembro, uma
parte do 41.º de Infantaria tivera de retirar para Buna, onde preparava posições
defensivas enquanto aguardava transporte para as Salomão.

Assim, os acontecimentos de Guadalcanal, nas duas primeiras semanas de


Setembro, detiveram a ameaça imediata, por terra, do Exército imperial a
Moresby. Esta extensão da «estrada da selva para Tóquio», mais tarde percorrida
pelo general americano Eichelberger, ficou reduzida a um setor de importância
secundária, em consequência de combates travados a centenas de quilômetros de
distância.

Antes de Hyakutake ordenar, com relutância, a Horii que detivesse o avanço para
Moresby, o almirante Ghormley tentava, havia dias, decidir o que fazer com o 7.º
de Fuzileiros reforçado (coronel James W. Webb) e com um destacamento do 5.º
Batalhão de Defesa, comandado pelo tenente-coronel William F. Parks. Estas
unidades, embarcadas em Samoa alguns dias antes, iam a caminho da Nova
Zelândia quando, inesperadamente, o CincPac as desviara para Espírito Santo.
Aí aguardavam a decisão que Ghormley relutava em tomar.

Em 12 de Setembro, depois da sua breve visita a Vandegrift, Turner regressou a


Espírito, onde o esperava uma mensagem de Ghormley. Tratava-se da resposta à
sua urgente recomendação de reforços (para a qual Vandegrift colaborara) e não
era muito encorajadora. Ghormley continuava a ganhar tempo. Embora, «em
princípio», aprovasse o reforço, não o autorizaria enquanto a situação não se
tornasse «conhecida». O almirante não dava a entender quando se verificaria —
se é que alguma vez se verificaria — este adequado estado de coisas. Por
enquanto, bastava-lhe deixar a iniciativa ao inimigo. Este procedimento não
costuma ser adoptado por comandantes bem sucedidos.

Na guerra, as situações são produto de vontades mutuamente exclusivas e


incompatíveis. Daí resulta serem, praticamente sempre, fluidas. É esta fluidez
que gera o miasma conhecido por «nevoeiro de guerra». Não raro, o catalisador
necessário para dissipar este nevoeiro é uma ação temerária, um risco calculado.
Ghormley tinha à mão os meios necessários para empreender uma dessas ações.
Restava saber se tentaria mandar as tropas frescas para a frente.

Infelizmente, Turner não evidenciou uma reação imediata à mensagem hesitante


do seu superior. No entanto, continuou a fazer preparativos para mandar seguir
os reforços, convencido de que Ghormley não deixaria de reconsiderar. Assim
aconteceu e, no dia seguinte, o ComSoPac mandou Turner proceder como
recomendara. Uma vez tomada, finalmente, a decisão de reforçar, Ghormley não
esteve com meias medidas, deu tudo quanto tinha. Talvez Rádio Tóquio o tenha
ajudado a decidir-se... Os comentários sarcásticos acerca de «uma temerária
invasão» que deixara «dez mil homens desesperadamente abandonados» feriu,
sem dúvida, o já muito dilacerado amour-propre da Marinha dos Estados Unidos.
É que tais comentários continham verdade suficiente para ferir.

O almirante encarregou os seus dois porta-aviões disponíveis de proteger, à


distância, os cinco transportes e dois barcos de aprovisionamentos que Turner
mandou partir de Espírito Santo ao romper do dia 14 de Setembro, com escolta
de cruzador e contratorpedeiro. Nessa manhã, mais ou menos ao mesmo tempo,
o major general Kawaguchi decidiu suspender os ataques ao espinhaço sangrento
ao sul do campo Henderson.

14 de Setembro foi um longo dia na vida de Kelly Turner. Enquanto a sua coluna
seguia, aos ziguezagues, para noroeste, os oficiais das comunicações suavam. E
tinham razão para isso, pois viam-se a braços com a chegada ininterrupta de
mensagens em código, para traduzir, a avisar os barcos americanos da presença
de porta-aviões, submarinos e aviões de reconhecimento japoneses. Mas a
batalha só se desencadearia na tarde seguinte, e então, seria breve e mortífera.

Cerca das duas e meia da tarde, dois submarinos japoneses — I-19 e I-15 —,
estacionados em águas que os marinheiros do Pacífico Sul já conheciam por
«Entroncamento dos Torpedos», subiram os periscópios. Cada comandante viu
uma unidade de porta-aviões. As 14.45 h., o I-19 torpedeou o Wasp. Meia hora
depois, o contratorpedeiro estava transformado num inferno e o seu comandante,
Forrest Sherman, deu ordem para o abandonar. Mas o valente Wasp, a quem
Churchill atribuíra o crédito de salvar Malta, não se afundou; flutuou durante
horas, com as suas chapas incandescentes transformadas numa pira para quase
200 marinheiros americanos. Os contratorpedeiros recolheram 366 feridos de
jangadas e da água. Às 21 h., o contra-almirante Norman Scott ordenou ao
contratorpedeiro Landsdowne que torpedeasse o navio em chamas. No Pacífico
Sul ficou um porta-aviões em estado de funcionar: o Hornet.

O Wasp foi apenas a primeira baixa do dia. Sete minutos depois de o I-19 o
atingir, o I-15 aplicou a mesma receita ao North Carolina. O torpedo introduziu-
se abaixo da faixa blindada e arrancou 37 m2 de aço do lado de bombordo do
Carolina. O controle dos estragos foi rápido e o couraçado corrigiu quase
imediatamente uma ligeira inclinação e seguiu o seu caminho, majestoso, a uma
velocidade de 25 nós — façanha que teria surpreendido o comandante do I-15,
se ele por acaso estivesse a observar.

Mas não estava. Tinha o periscópio —e os torpedos da proa — apontados ao


contratorpedeiro O’Brien. Dois minutos depois de o North Carolina ter sido
atingido, um segundo torpedo acertou no O’Brien. Resultado de nove minutos:
um porta-aviões, um couraçado e um contratorpedeiro. Os dois submarinos
nipônicos, com um ótimo dia de trabalho atrás de si e 15 contratorpedeiros à
superfície, partiram para águas menos perigosas. O mesmo fizeram os restantes
navios da unidade naval do contra-almirante Leigh Noyes.

Kelly Turner procurou, também, regiões mais saudáveis e, assim que escureceu,
virou de novo os seus transportes para sueste. Continua a retirar até meio da
tarde do dia seguinte e, às 15 h., inverteu bruscamente a rota, curvou 15 nós e
seguiu para Lunga Point. É fácil imaginar o que os torpedos japoneses poderiam
fazer aos seus frágeis transportes. Mas se havia alguns submarinos na sua rota,
Turner esquivou-se-lhes.

Custou a compreender, então —e ainda hoje custa —, por que motivo os


japoneses não recorreram mais aos submarinos para deter os reforços para
Guadalcanal. Os alvos decisivos e importantes para os seus rápidos e certeiros
torpedos não eram, nas circunstâncias vigentes, porta-aviões, couraçados ou
contratorpedeiros, e sim, transportes e barcos de aprovisionamento. No entanto,
a teoria de que os alvos principais dos submarinos deviam ser os navios de
combate, parecia cristalizada. Para os oficiais da Marinha que se encontravam
em Tóquio —o, também, para Yamamoto —, a destruição da Esquadra
americana fora sempre, e continuaria ser, um caso de absoluta prioridade.

Como já vimos, os japoneses estavam ao corrente de que o comboio chegara a


águas do Pacífico Sul, e tiveram oportunidade de reunir submarinos suficientes
para o destruir. Não procederam assim, porém. A quase total falta de imaginação,
a rígida inflexibilidade intelectual que caracterizava os altos-comandos do
Exército e da Marinha nipônicos e que, com raríssimas exceções, se estendia aos
oficiais superiores de ambas as armas, viria a ficar muito cara ao Japão, até ao
fim da guerra no Pacífico.

Poucos minutos antes das seis da manhã do dia 18 de Setembro, o comboio de


Turner chegou, triunfantemente, ao largo de Lunga. Aos olhos dos homens
silenciosos e de barba crescida que, com os seus comandantes, observavam o
desembarque das novas tropas, a Marinha dos Estados Unidos estava,
finalmente, justificada.

Com o 7.º de Fuzileiros chegaram tanques, um batalhão de artilharia e


sapadores; companhias médicas e de transportes motorizados; pessoal de terra,
da aviação, e pessoal de comunicações. Além de mais de 3000 soldados e
oficiais, o coronel Webb trazia rações, gasolina, todo o gênero de munições e
provisões de cantina. Entre estas vinham polimento para botões, pomada para
sapatos, tabaco moído, goma, alvaiade para as perneiras e 20 000 caixinhas
pequenas de alumínio. Vários dias depois, nas bichas para o pequeno-almoço,
cada fuzileiro recebeu três «Troianas» grátis. Embora não unissem muito bem,
estas caixinhas foram muito úteis para guardar objetos deterioráveis, como
cigarros, fósforos, rebuçados e cartas das suas namoradas deixadas nos Estados
Unidos.

Ao escurecer, os navios levantaram ferro, levando consigo os restos do l.º


Batalhão de Paraquedistas. Os homens que sobreviveram a Gavutu e ao
«Espinhaço de Edson» nunca tinham saltado de paraquedas, em missão de
combate. Nem saltariam.

Enquanto os fuzileiros recebiam um chocolate grátis por homem, as seções do


Exército e da Marinha do Quartel-General imperial redigiam diretivas
suplementares em que ordenavam a ambas as armas que «desdobrassem a sua
força de combate combinada, a fim de atacar e retomar o aeródromo de
Guadalcanal» assim que pudessem ser mandados para a frente reforços e
provisões. O Quartel-General imperial marcou o dia 17 como data provável do
«ataque decisivo» e ordenou ao tenente-general Tadayoshi Sano, comandante da
38.ª Divisão, que partisse imediatamente das Índias para Rabaul e se
apresentasse em pessoa ao comandante-geral do 17.º Exército. A Esquadra
Combinada forneceria barcos de apoio e Isoroku Yamamoto coordenaria as
operações.

Entretanto, o público japonês era mal informado acerca do que se passava nas
Salomão, e o público americano não era, sequer, informado. Nos seus
comunicados, King dizia umas coisitas que, na realidade, só serviam para tornar
a situação mais obscura. Só as esferas superiores estavam ao corrente da
gravidade da situação. Enquanto os fuzileiros passavam fome em Guadalcanal,
onde quase tudo escasseava, em Nouméa estavam ancorados 60 barcos, à espera
de descarregar. A maioria destes navios tinha tripulações da Marinha Mercante,
que cobravam ordenados exorbitantes por serviço em «zonas de combate».
Como se isso não chegasse, tripulações e oficiais exigiam «horas
extraordinárias». Forrestal era um dos que sabiam o que se passava e dizia que,
se o povo americano também soubesse, haveria revolução no país.

Roosevelt pressentiu o aproximar da crise. No seu discurso à nação no Dia do


Trabalho, o presidente depreciou a importância estratégica da operação das ilhas
Salomão e referiu-se cautelosamente à situação crítica de Guadalcanal, «porque
sabia, e o povo não, as graves perdas navais que tivéramos e pretendia preparar
os Americanos para a possível notícia de que os japoneses tinham expulsado os
fuzileiros das posições tão precariamente mantidas».

O ceticismo campeava no Ministério da Guerra, onde a hierarquia militar


reconhecia que a Marinha estava «em grandes apuros em Guadalcanal». Em 16
de Setembro, numa reunião dos chefes do Estado-Maior Conjunto, o almirante
King, após admitir — fato nele absolutamente sem precedentes — que a
Marinha estava «em maus lençóis neste momento particular», apresentou um
pedido urgente de caças P-38 (Lightning). O general Arnold acedeu, com
relutância, a desviar da ARCHOTE —a invasão da África do Norte— todos
quantos podia dispensar: quinze. Mas havia um pequeno senão: estes Lightnings
não estavam imediatamente disponíveis, nem estariam durante algum tempo,
ainda.

Esta contrariada concessão não satisfez o exasperado almirante, que se retirou


para o seu gabinete e, com data de 17 de Setembro, redigiu um extenso
memorando, dirigido a Marshall. Neste documento, King esclarecia que, dos 62
Wildcats entregues em Guadalcanal desde 21 de Agosto, só 30 estavam em
estado de funcionamento; que a Marinha estava «impossibilitada de fazer frente
a esta taxa de desgaste e, além disso, ter porta-aviões em atividade», e que era,
portanto, «imperioso que a futura entrega contínua de caças do Exército fosse
planejada, a partir daquele momento, independentemente de, e com maior
prioridade do que, as entregas para qualquer outro teatro de operações». No
destino, esta comunicação foi para a gaveta.

Poucos dias depois, Arnold chegou ao Havaí. Em Pearl Harbor falou com o
comandante das Forças Aéreas do Pacífico, tenente-general Delos Emmons, e
visitou o almirante Nimitz. Emmons, havia pouco regressado de uma viagem ao
Pacífico Sul, afirmou categoricamente ser impossível conservar Guadalcanal.
Para dar peso a esta opinião derrotista, citou um parecer, igualmente sinistro, que
MacArthur lhe confiara. Quanto a Nimitz, mostrou-se tão certo de que os
fuzileiros poderiam aguentar como Emmons estava certo de que não
aguentariam. Mas Arnold não se impressionou muito com as opiniões
manifestadas pelo almirante Nimitz. O comandante-chefe da Aeronáutica Militar
partiu do Havaí a respirar pessimismo e seguiu para o setor comandado pelo
vice-almirante Ghormley.

Em Guadalcanal, felizmente, a atmosfera estava menos saturada de dúvida. No


dia seguinte ao desembarque do 7.º de Fuzileiros, Vandegrift falou aos
correspondentes de guerra, no seu posto de comando:

— Manterá esta cabeça-de-ponte, general? Continuará aqui? — perguntou um


deles.

— Sim, com os diabos! — replicou, enérgico, Vandegrift. — Porque não?

Durante esta entrevista, uma lancha a motor aproximou-se do cais de Kukum.


Ao leme vinha um nativo atarracado e muito musculoso, de lava-lava, cujo
cabelo encarapinhado se espetava bons 20 centímetros acima da testa. Um
branco alto e magro, de cara chupada, tomava conta do ruidoso motor. A lancha
parou e o estranho par saltou para terra. Depois do so identificarem, pediram um
jipe emprestado. O branco era Marion Carl, piloto de caça localmente famoso, e
o negro, o cabo Eroni, um dos batedores de Martin Clemens.

Carl, abatido sobre Koli Point em 14 de Setembro, lançara-se de paraquedas,


caíra na água, nadara para terra e encontrara Eroni, que o tomara ao seu cuidado.
A embarcação em que este homem modesto — um dos melhores pilotos da
Segunda Guerra Mundial— chegou a Kukum era a lancha-patrulha de Eroni, que
Clemens lhe dera para transportar os aviadores amigos que porventura caíssem
perto do lugar onde se encontrasse.

Carl e Eroni dirigiram-se imediatamente para o quartel-general da Aeronáutica,


onde encontraram o general Geiger. O comandante ficou agradavelmente
surpreendido, pois Carl fora dado como perdido. Entre os presentes estava o
capitão John L. Smith, o qual, nos cinco dias em que Carl estivera ausente,
elevara para catorze o número de japoneses abatidos. Depois de saudar Carl,
Geiger disse-lhe:

— Tenho más notícias, Marion. O Smitty já abateu catorze e você continua


apenas com doze. Que havemos de fazer a tal respeito, hem?

Carl hesitou, um momento, antes de responder:

— Com os diabos, general, deixe-o ficar cinco dias em terra!

Com a sua divisão reunida pela primeira vez, Vandegrift pôde rever o seu plano
de defesa e estudar a maneira de derrotar os japoneses que continuavam,
obstinadamente, na margem ocidental do Matanikau. O general dispunha agora,
em Guadalcanal, de nove batalhões de Infantaria, um batalhão incompleto de
raiders, quatro batalhões de artilharia, duas companhias de tanques ligeiros e um
batalhão de armas especiais, comandado pelo major Robert B. Luckey, com
veículos de meia lagarta providos de peças de 75 mm.

Mas das unidades primitivamente desembarcadas nenhuma se encontrava, nem


de longe, em condições aceitáveis. Embora as baixas em combate ainda não
tivessem atingido os mil homens, o dobro deste número sofria de subnutrição,
das consequências da disenteria, de infecções virulentas causadas por fungos e
de exaustão. A malária, que não tardaria a abater tantos, começava a aparecer,
também. Em meados de Setembro apenas cinquenta casos eram considerados
suficientemente graves para exigir hospitalização. Em 10 de Setembro, iniciou-
se o tratamento preventivo, em massa, com «atabrine». Imediatamente se
espalharam pelo campo boatos de que as pílulas amarelas tornavam um homem
impotente, e os fuzileiros recusaram-se, pura e simplesmente, a tomá-las. «O
pessoal médico [...] era obrigado a colocar-se nas bichas para o rancho e não só a
fiscalizar a aceitação do medicamento», mas também a espreitar na boca dos
homens, para se certificar de que engoliam os comprimidos. Os que se
recusavam a tomá-los não comiam.

Quando o 7.º de Fuzileiros chegou, as suas unidades ficaram sob o controle das
que já se encontravam em terra e os batalhões de infantaria passaram a ocupar
novas posições. A aviação de Geiger, embora reduzida, constituía uma garantia
razoável contra um ataque anfíbio de grande envergadura, e as reduzidas defesas
da praia passaram a estar ocupadas, durante a noite, por sapadores, batedores e
tripulações de veículos anfíbios. No interior, Vandegrift ordenou que se formasse
um cordão de defesa, que ia da foz do Tenaru, a leste, até à linha de serranias, a
oeste de Lunga. A linha semicircular passava, do maneira geral, por terreno
elevado, ao sul incluía o «Espinhaço de Edson» e a partir daí descia para o
intransponível Tenaru.

Não se podia pensar em defesa em profundidade, exceto nas posições em terreno


elevado. No terreno baixo e empapado, entre lombas cobertas de erva kunai, a
vegetação da selva reduzia a visibilidade a poucos metros. Desbravar áreas de
fogo para armas automáticas era trabalho debilitante e interminável para os
homens imundos que nas últimas seis semanas tinham vivido com rações
reduzidas e quase sem dormir. No entanto, era preciso cavar e desbravar, e eles
cavaram e desbravaram.

Os abrigos foram cobertos com telhados de troncos de coqueiros, protegidos


com sacos de areia e abastecidos de munições, granadas, rações suplementares e
água. Havia, finalmente, arame farpado em quantidade que chegava para
proteger as posições de combate principais com uma cerca dupla. Enquanto nos
setores do sul não havia possibilidade de estabelecer muitas posições que se
apoiassem mutuamente, a área à frente do perímetro era constantemente
patrulhada pelos defensores e, também, pelos batedores de Clemens. Em virtude
de lhes faltar profundidade, estas defesa poderiam ser transpostas com
facilidade, mas as posições de alternativa, a ocupar em caso de necessidade por
tropas de setores adjacentes, ofereciam garantias razoáveis de que as penetrações
seriam contidas sem dificuldade.

Mas Vandegrift não encarava uma atitude puramente passiva; planejava uma
defesa ativa. Com as tropas de que dispunha, agora, podia manter o terreno
conquistado e, ao mesmo tempo, atacar os japoneses, em operações limitadas,
destinadas a manter o inimigo desnorteado e sob constante tensão. Não podia
arriscar-se e não ignorava que seriam de prever novos ataques de grande
envergadura. Todas as ações deviam ser estudadas com o fito de prejudicar o
mais possível o inimigo, física e psicologicamente, sem exporem, contudo, a
força americana ao risco de ficar diminuída. «O Segundo Matanikau» foi a
primeira de tais operações de desgaste.
Esta ação, destinada a dispersar uma concentração, cada vez mais ameaçadora,
entre Point Cruz e Matanikau, começou em 23 de Setembro, quando o tenente-
coronel Lewis B. («Chesty») Puller, comandante do 1.º Batalhão do 7.º de
Fuzileiros, iniciou um avanço por terra na direção da nascente deste rio de mau
agouro. Depois de vários contatos com os postos avançados de Oka, nos quais
teve 7 mortos e 25 feridos, Puller acercou-se do Matanikau.

Encontrou os vaus bloqueados e todas as suas tentativas para atravessar


suscitaram violenta resistência. Na manhã de 26 de Setembro, Puller pediu apoio
da aviação e da artilharia mas os japoneses estavam bem abrigados e mostraram-
se tão persistentes e prontos a combater como ele próprio. Na esperança de
conseguir atravessar mais a baixo, Puller virou para norte e seguiu por uma
estreita vereda da selva, na direção da costa. No caminho, a sua coluna foi
alvejada por fogo intenso, de morteiro, da outra margem. O extenuado batalhão
chegou ao caminho da costa ao pôr do Sol. A operação demonstrou claramente
que os japoneses se encontravam ao longo do rio, em força, o tencionavam
manter em seu poder a margem ocidental.

Ao princípio da tarde, a seção de Operações da Divisão concluíra, esperançada,


que, se aplicasse um pouco mais de força, conseguiria expulsar o inimigo das
posições a montante do rio, que tão tenazmente defendera de manhã.
Apressadamente, improvisou-se uma ação mais ou menos semelhante no esforço
efetuado em Agosto, na mesma zona. Como seria de esperar, encontraram-se
várias das dificuldades já encontradas da outra vez. Enfermavam ambos do
mesmo denominador comum: foram planejadas e conduzidas numa ignorância
total do terreno e da situação do inimigo.

Nesta altura, os japoneses já tinham mais de 4000 soldados na linha do


Matanikau e de reserva, atrás dessa linha. Alguns estavam famintos e outros
doentes, mas tinham chegado reforços e vinham novas tropas a caminho. Havia,
pois, uma certa justificação para o convencimento dos japoneses de que o
objetivo pelo qual tanto tinham sofrido estava, agora, à vista. Aliás, de qualquer
maneira, estavam firmemente dispostos a conservar a posição ao longo do
Matanikau. Foi nestas circunstâncias que a Divisão encarregou Merritt Edson,
então comandante do 5.º de Fuzileiros, de estabelecer um posto de comando
perto da foz do Matanikau e de coordenar a operação planejada. Esta consistia
essencialmente, no seguinte:

O 1.º de Raiders (tenente-coronel Samuel B. Griffith) avançaria para o interior


(sul), ao longo da margem oriental do rio, até às imediações do passadiço de
troncos conhecido por «Ponte dos Japoneses». Forçaria a passagem aí, ou onde
pudesse, viraria para a direita e atacaria para jusante, na direção do mar. Poderia
solicitar o apoio da artilharia e da aviação.

Para ajudar esta manobra, o 2.º Batalhão do 5.º de Fuzileiros (capitão Joseph J.
Dudkowski), apoiado pela artilharia, por concentrações de fogo de morteiro e
por aviões de combate munidos de canhões, atacaria do outro lado da língua de
areia.

Simultaneamente, o batalhão de Puller, embarcado em barcaças e escoltado pelo


porta-hidraviões Ballard, seguiria para Point Cruz, desembarcaria a oeste deste
promontório, viraria para o lado esquerdo e atacaria a leste, pelo caminho da
costa abaixo.

AS complicações começaram antes do meio-dia, quando os raiders, em fila ao


longo do estreito carreiro ladeado, à esquerda, por serranias e, à direita, pelo rio,
se aproximaram da «Ponte dos Japoneses». A vanguarda da coluna foi
subitamente atingida por fogo de morteiro ligeiro e de armas automáticas,
disparado da frente. Os japoneses, em posições bem ocultas, tinham colocado
um tampão no gargalo da selva, que media cerca de 18 metros do rio às escarpas.
Numa curta batalha encontrou a morte o major Bailey, que ganhara a Medalha de
Honra no espinhaço, e ficaram feridos vários soldados.

Griffith deixou uma companhia reforçada, para conter a força-tampão inimiga,


procurou espaço para manobrar e subiu com o resto do batalhão uma vertente
íngreme, coberta de selva, da qual poderia descer para a retaguarda inimiga. A
lenta e exaustiva deslocação, em fila indiana, só ficou concluída ao meio da
tarde e foi descoberta pelos japoneses que se encontravam numa encosta
adjacente. Os americanos foram, de novo, recebidos pelo fogo inimigo, que feriu
o comandante do batalhão. Quaisquer tentativas para avançar, ao longo do vale
ou da encosta, provocavam uma reação imediata de fogo de morteiros,
metralhadoras e automáticas. Os raiders estavam imobilizados.

Para cúmulo, verificou-se uma colossal baralhada de comunicações. Uma série


de mensagens deturpadas convenceu a Divisão e Edson de que os raiders tinham,
de fato, atravessado o rio e estavam prontos a avançar na direção do mar. Edson
ordenou, por isso, ao 2.º Batalhão do 5.º de Fuzileiros que atacasse do outro lado
da língua de areia, e ao batalhão de Puller (menos Puller, que ficou com Edson
para o ajudar) que desembarcasse, como estava planejado. O ataque na foz do rio
foi repelido e os poucos homens que chegaram à margem ocidental foram
mandados regressar.

Entretanto, o batalhão de Puller (comandado, na sua ausência, pelo major Otho


L. Rogers) desembarcava. Rogers avançou para o interior, a preparar a viragem
para a esquerda, mas, por pouca sorte, o desembarque efetuara-se mesmo
defronte do bivaque de um batalhão japonês. Alertado, o inimigo ocultou-se e
deixou os fuzileiros penetrar cerca de 360 metros. Caiu-lhes então em cima, de
três lados. O combate foi violento e feroz e, em menos de cinco minutos, Rogers
e mais meia dúzia de americanos encontraram a morte. As baixas subiam
alarmantemente, à medida que o inimigo manobrava para isolar o batalhão da
praia. A situação era crítica. Edson ordenou aos fuzileiros que retirassem e pediu
apoio aéreo.

Antes que tal fosse possível, Henderson foi alvo de violento ataque aéreo que
avariou todas as comunicações da Divisão. Por sorte, Puller não perdeu tempo.
Durante o ataque aéreo, dirigiu-se a toda a pressa a Kukum, requisitou um barco
e acostou ao Ballard. Com barcaças de desembarque na sua esteira, o porta-
hidraviões dirigiu-se imediatamente para Point Cruz, estabeleceu contato visual
com os fuzileiros cercados num cabeço coberto de kunai, algumas centenas de
metros para o interior, e iniciou o bombardeamento. Assim ajudado, o batalhão
começou a retirar, pelo corredor marcado pela explosão das granadas do Ballard.
Os fuzileiros levaram consigo os corpos de 24 mortos, assim como 23 feridos,
entre oficiais e soldados, a maioria dos quais impossibilitados de andar.

O sargento Robert Raysbrook, que fez repetidos sinais ao Ballard sob o fogo
inimigo, recebeu mais tarde a Medalha de Honra, condecoração que também foi
atribuída, postumamente, ao sinaleiro Douglas Munro, da Guarda Costeira.
Munro, que conduziu as barcaças de desembarque para a praia, foi morto pelo
fogo inimigo enquanto disparava a metralhadora de uma barcaça, a fim de
proteger os fuzileiros que embarcavam. Entretanto, chegaram aviões que
metralharam o inimigo, a fim de proteger uma segunda vaga de cinco barcaças
em retirada. Pouco antes de escurecer, o batalhão de Puller chegou a Kukum.

Edson ordenara também aos raiders que retirassem e, assim, à meia-noite de 27


de Setembro encontravam-se no perímetro todos os fuzileiros. O «Segundo
Matanikau», nome dado a esta série de desastrosas operações, causou quase 200
baixas: 67 mortos e 125 feridos. Só o batalhão de Puller teve 79 baixas.
Provou-se, mais uma vez, ser quase impossível a coordenação de um sistema
táctico complicado quando a ação exigia movimento em caminhos estreitos e
através da selva desconhecida. Provou-se, mais uma vez também, ser condição
prévia indispensável, ao planejar-se um ataque na selva — ou, na realidade,
qualquer ataque —, a sondagem por patrulhas, a fim de determinar a localização
e a força aproximadas das posições inimigas. Neste caso, excessivamente
confiante como sempre, Edson dispersou a sua força ao acaso, para atacar um
inimigo bem armado, bem escondido e numericamente superior. O «Segundo
Matanikau» fez Vandegrift compreender que um comandante que se permite, ou
permite a um subordinado, lançar-se à toa numa ação, paga sempre o preço dessa
leviandade.

Nesta altura, com Guadalcanal em equilíbrio precário, o general Arnold chegou


a Noumóa, onde encontrou os oficiais da Marinha «sob terrível tensão» e
«amuados». O almirante Ghormley andara, segundo Arnold, tão atarefado, que
não pudera sair do seu navio almirante «durante quase um mês». Arnold incitou
o almirante a deixar de travar uma guerra de papelada e advertiu-o de que
ninguém podia passar a vida «sentado num pequeno gabinete [...] sem sofrer
mental, moral e nervosamente». Aconselhou-lhe uma mudança de cenário e,
embora não o diga, deduz-se que lhe sugeriu uma visita a Guadalcanal.

Arnold saiu do quartel-general do almirante numa estranha disposição. «A


Marinha», escreveria mais tarde, levara «uma valente tareia [...] estava presa por
arames.» A «organização logística [...] para garantir o êxito» era deficiente. A
Marinha prestara pouca atenção à necessidade de aeródromos e ao abastecimento
de gasolina. Os oficiais superiores do setor «não compreendiam a técnica de
operações terrestres nem a das operações aéreas», mas estavam «decididos a
prosseguir com a campanha nesse teatro de operações», e igualmente decididos
«a fazê-lo com o mínimo possível de auxílio do Exército. Era o seu combate, o
combate da Marinha: era a sua guerra contra os japoneses, e haviam de ganhá-la,
se pudessem».

Estas declarações deturpam a atitude do comando naval do Pacífico. Durante


semanas, antes de Arnold partir de Washington, toda a gente do Pacífico Sul,
incluindo o subsecretário da Marinha, Forrestal, suplicara o envio de aviões de
combate. King pedira, em vão, alguns caças para combates em grandes altitudes,
e Arnold só acedera a dar-lhos em 16 de Setembro. Depois disso, durante
semanas —e os Americanos têm o direito de perguntar por ordem de quem—, o
estado-maior de Arnold desdenhou, insolentemente, redigir uma resposta ao
memorando de King de 17 de Setembro. Nessa altura, mais uma dúzia de aviões
de combate em grande altitude significariam literalmente, em Guadalcanal, a
diferença entre a vida e a morte para centenas de homens.

O major-general Alexander Patch, comandante da Divisão Militar americana na


Nova Caledônia, confirmou a opinião do seu distinto visitante quanto às
deficiências dos serviços de intendência e reabastecimento da Marinha.
Informou, até Arnold, de que mandara tirar 20 000 pares de sapatos das
prateleiras do seu quartel-mestre e enviá-los para Guadalcanal, a fim de que os
fuzileiros não fossem obrigados a continuar a combater descalços.

Não haverá exagero em descrever a situação logística como uma desordem de


proporções monumentais. Em Nouméa, Ghormley encontrou uma balbúrdia
indescritível. Faltava praticamente tudo quanto era necessário para descarregar
os barcos que se encontravam no porto: cais, gruas móveis, batelões, barcaças,
camiões e estivadores. O almirante e o seu estado-maior viram-se e desejaram-se
para resolverem estes problemas. Claro que Ghormley foi acusado de ter a culpa
de tudo e calou-se, mas os verdadeiros culpados estavam tranquilamente
sentados à secretária, no Ministério, em Washington.

As críticas de Arnold ao almirante Ghormley, a este respeito, foram


injustificadas, e a sua atitude pouco menos do que deplorável. A decisão de
invadir as Salomão, que Arnold ratificou como um dos chefes do Estado-Maior
Conjunto, fora aprovada pelo presidente dos Estados Unidos. Era, pois,
obrigação de Arnold fazer tudo quanto pudesse para ajudar a Marinha a haver-se
com as ameaças que punham em perigo o êxito da primeira ofensiva no Pacífico.

Mas as impressões do general não foram todas negativas. Antes de abandonar a


Nova Caledônia o de se dirigir ao quartel-general de MacArthur, em Brisbane,
Arnold visitou Tantouta, a base aérea a partir da qual operavam os transportes
Douglas do coronel de fuzileiros Perry K. Smith.

«Os aviões de transporte dos Fuzileiros Navais, assim como as suas outras
unidades, estavam a fazer excelente trabalho. Um extraordinário trabalho!
Percorriam a distância de 800 milhas até Guadalcanal com gasolina suficiente
para o regresso e cerca de 1500 quilos de carga, e no regresso traziam tantos
feridos quantos conseguiam alojar.»

Em Rabaul, o tenente-general Masao Maruyama conferenciou com Hyakutake,


recebeu as suas ordens e tratou de todos os pormenores para o envio para
Guadalcanal da 2.ª Divisão («Sendai»). Em 3, 8 e 11 de Outubro o «Expresso de
Tóquio» de Tanaka proporcionaria transportes, além do porta-hidraviões Nisshin
com canhões, anfíbios, tanques e camiões. Destino: Tassafaronga. Maruyama
decidiu partir com o primeiro grupo. Mas Hyakutake não tinha intenção
nenhuma de confiar a direção do ataque, previsto para 17 de Outubro, ao
comandante-chefe da Divisão Sendai. Não estava disposto a permitir que outro
comandante precipitado provocasse uma repetição dos dolorosos sacrifícios
feitos no Ilu e no Espinhaço. Por isso ordenou a transferência do quartel-general
do 17.º Exército para Guadalcanal, na noite de 9 de Outubro. Decidira assumir
pessoalmente o comando das operações. Hyakutake também não tencionava
atacar enquanto não dispusesse das forças suficientes. Ordenou, portanto, ao
tenente-general Sano que começasse imediatamente a mandar a 38.ª Divisão
para as Shortlands.

As figuras principais iam ficar frente a frente. Yamamoto, Tanaka e Hyakutake


não tardariam a defrontar Ghormley, Turner e Vandegrift, numa série de batalhas
em terra, no mar e no ar que o Quartel-General imperial considerava muito
capazes de «decidir a sorte da Guerra da Grande Ásia do Extremo Oriente».

11. «SINTO-ME SÓ E PENSO NA MINHA ALDEIA


NATAL»

No último dia de Setembro, meia dúzia de fuzileiros, de calças imundas,


observavam com grande atenção um B-17 que deslizava penosamente, na lama,
direito a um grupo de oficiais reunidos sob as palmeiras destroçadas do lado
ocidental da pista. Os fuzileiros desejavam que o aparelho viesse carregado de
enfermeiras, raparigas da Cruz Vermelha, ou pelo menos, de barras de chocolate.
Um momento depois de o piloto desligar os motores, e antes mesmo de as
nuvens de pó sufocante assentarem, um oficial magro e grisalho, com quatro
estrelas no colarinho da camisa, desceu apressadamente a escada. Vandegrift foi
ao seu encontro, sem demora, e fez a continência. Depois apertaram as mãos.
Nem guarda de honra e banda, nem uniformes de gala, nem salvas de canhão
acolheram o almirante Chester Nimitz, comandante-chefe dos setores do
Pacífico, na sua primeira visita a Guadalcanal.

Nimitz partira do seu quartel-general no Havaí a fim de tomar conhecimento, em


primeira mão, do que se passava no Pacífico Sul. Vandegrift tinha muito que lhe
mostrar e mais ainda que lhe dizer. No intervalo dos ataques aéreos, Nimitz foi
conduzido ao Espinhaço de Edson, às Operações da Aeronáutica, onde falou
com Geiger e Woods, e ao hospital da Divisão, onde alguns feridos do «Segundo
Matanikau» ainda aguardavam transporte nos aviões de abastecimento e
evacuação do coronel Perry Smith, que os levariam para hospitais das calmas
ilhas do sul. O almirante disse palavras de encorajamento e conforto aos
escaveirados feridos e doentes. Mais tarde, no posto de comando de Vandegrift,
foi menos animador. Um das qualidades de grande comandante de Nimitz —e
ele tinha muitas — era a faculdade de ser calmamente objetivo, mesmo sob
constante tensão. Nimitz não era otimista nem pessimista; era realista. Tinha
consciência não só de que Guadalcanal estava precariamente mantido, mas
também de que se preparava um ataque japonês de grande envergadura, para
retomar a ilha.

Antes de partir para as Novas Hébridas, na manhã seguinte, o almirante


condecorou doze oficiais e soldados. Ao dirigir-se, de carro, para o campo
Henderson, debaixo de chuva miudinha, prometeu a Vandegrift «o máximo
auxílio que os recursos permitissem».

Enquanto o CincPac conferenciava com Vandegrift, o almirante Turner


entregava-se à elaboração dos planos de ocupação de Ndeni, nas ilhas de Santa
Cruz, umas trezentas milhas à retaguarda da zona crítica de batalha. Esta
operação, ordenada pelos chefes dos Estados-Maiores Conjuntos nas instruções
de 2 de Junho para a «Torre de Vigia», fora adiada várias vezes, em
consequência das exigências insistentes de soldados para as linhas da frente. Mas
Ndeni, uma verdadeira diversão estratégica, era um projeto caro ao almirante
Ghormley, que ficou encantado ao receber as recomendações de Turner a tal
respeito.

O comandante dos Fuzileiros Navais opusera-se sempre à ocupação de Ndeni.


Vandegrift estava em apuros e não via necessidade nenhuma de transferir
homens e material tão precisos em Guadalcanal. Por isso encarava tais sugestões
com profunda desaprovação — e o mesmo lhe acontecia em relação a certos
outros projetos elaborados a bordo do navio almirante da força anfíbia. O
problema constante de Vandegrift, nas suas relações com o seu superior nominal
na escala do comando, era conservar o marinheiro no lugar que lhe pertencia.

Em 29 de Agosto, sem autorização, Turner começara a fragmentar os restos


inativos do 2.º Regimento de Fuzileiros, que levara consigo em 9 de Agosto, ao
retirar de Lunga, a fim de formar um batalhão de raiders. Ao mesmo tempo,
informara o almirante Ghormley de que, assim que apanhasse o 7.º e o 8.º de
Fuzileiros, ordenaria aos seus comandantes que formassem batalhões
semelhantes. Vandegrift opôs-se imediata e veementemente, e Nimitz ordenou a
Turner que deixasse de meter o nariz na organização do Corpo de Fuzileiros. De
vez em quando, Richmond Kelly Turner comportava-se como um general
frustrado.

Em 3 de Outubro, Nimitz chegou à Nova Caledônia e fechou-se imediatamente


com o vice-almirante Ghormley, cujo resumo pessimista dos acontecimentos lhe
causou — como mais tarde se provaria — profunda impressão. Quando se
discutiu a questão de reforçar Guadalcanal, Ghormley objetou ser pouco seguro
privar as ilhas da retaguarda das suas guarnições. Parecia-lhe subsistir a
possibilidade de os japoneses «se infiltrarem e atacarem as nossas linhas de
comunicação». Felizmente, um dos comandantes seus subordinados tinha melhor
percepção das exigências imperativas do momento do que o próprio almirante.

Tratava-se do major-general Harmon, que meditava, havia algum tempo, na


situação. As renovadas recomendações de Turner acerca de Ndeni cristalizaram,
por assim dizer, os seus pensamentos nesse assunto. Embora não tivesse
manifestado formalmente a sua opinião, Harmon também considerava a muito
adiada ocupação de Santa Cruz um completo desperdício de esforços, e o reforço
de Guadalcanal uma necessidade urgente. Por fim, em 6 de Outubro, enviou um
longo e bem apresentado memorando ao seu superior imediato.

Neste memorando, um documento de importância decisiva na história da


campanha de Guadalcanal, Harmon exprimia a sua forte convicção de que o
inimigo era capaz de retomar a ilha, e que a retomaria, num futuro próximo, a
não ser que a posição fosse «materialmente reforçada». Depois de fazer uma
análise minuciosa da situação, recomendava que as operações em Ndeni fossem
adiadas até se conseguir, nas Salomão inferiores, «um estado de razoável
estabilidade e segurança». Solicitava também, insistentemente, que Guadalcanal
fosse reforçada, sem demora, com um Grupo de Combate de Infantaria, que as
forças de superfície navais intensificassem os seus esforços para impedir as
atividades cada vez mais perigosas e enervantes do «Expresso de Tóquio», e que
se mandasse imediatamente para Guadalcanal o maior número possível de
pessoal de construção de aeródromos e todo o material disponível.

O almirante aprovou. No dia seguinte, o Grupo Regimental de Combate do


coronel Bryant E. Moore, do 164.º de Infantaria da Divisão Americal de Patch,
recebeu a ordem de se preparar para embarque imediato.

Entretanto, o pessoal de Operações de Vandegrift estudava outro plano para


expulsar o inimigo das posições que ocupava ao longo do Matanikau.
Conseguido isto, o general tencionava estabelecer uma posição avançada, de
combate, perto de Kokumbona, assim como uma posição fortificada, donde
dominassem a foz do rio. A língua de areia, que já absorvera tanto sangue
americano, era a única via leste-para- oeste de tanques, artilharia e veículos de
rodas.

As Operações escalaram para o «Terceiro Matanikau» cinco dos dez batalhões


de infantaria disponíveis. O plano previa que dois deles desencadeariam ataques
de imobilização ao longo do rio, enquanto os outros três o atravessavam, bem no
interior, viravam para a direita, desdobravam e atacavam com o apoio aéreo e da
artilharia, ao longo das escarpas e na direção do mar. Edson foi encarregado de
comandar esta operação, em 8 de Outubro. Embora, naturalmente, Vandegrift
ignorasse esse fato, o tenente-general Masao Maruyama já chegara à ilha, com
uma grande parte da sua Divisão Sendai, e ordenara um ataque limitado ao longo
do rio, na mesma data. O seu objetivo era estabelecer uma posição avançada de
combate, na margem leste do Matanikau.

O comandante japonês pretendia, simultaneamente, garantir a travessia em


segurança dos tanques a utilizar no ataque geral de 17 de Outubro, e proteger as
áreas de fogo escolhidas para os obuses de 15 cm que chegariam em breve,
segundo Rabaul lhe prometera. Com estes obuses, Hyakutake pulverizaria o
aeródromo antes do ataque que, como garantia, lhe passaria o campo Henderson
para as mãos de um só golpe.

A presença de Maruyama levantara o moral dos japoneses, que descera muito na


semana anterior à chegada do general. Restos dos grupos de Ichiki e Kawaguchi,
destinados a zonas da retaguarda a fim de recuperarem a saúde e a força,
ocupavam as defesas da praia de Kokumbona ao cabo Esperança. Nenhum dos
grupos se refizera por completo da recente provação. Muitos homens sofriam,
ainda, os efeitos da exaustão e do clima, a malária grassava e as rações das
tropas da linha de comunicações estavam reduzidas a uma chávena de arroz por
dia. Em 5 de Outubro, um soldado que marchara com Kawaguchi e se estava a
refazer perto de Tassafaronga, escreveu as seguintes palavras, que embora
arrancassem lágrimas a uma pedra não as arrancariam a um fuzileiro naval:

«As rações acabaram e o nosso vestuário está em farrapos. Pergunto a mim


mesmo quanto tempo ainda isto durará e rezo para que termine em breve. Sinto-
me como um passarinho à chuva, sinto-me só e penso na minha aldeia natal.»

E dois dias depois:

«Desde manhã que estamos metidos em buracos, no chão. Encontramo-nos


absolutamente abandonados.»

As tropas da frente estavam melhor abastecidas e não se mostravam tão


desconsoladas como o autor do diário acima citado.

Na primeira semana de Outubro, pequenas patrulhas de combate travaram


escaramuças diárias com duas companhias japonesas açoitadas no espinhaço que
dominava a nascente do agora detestado rio Matanikau. Em todos estes breves
recontros houve fuzileiros mortos e feridos. As baixas tinham de ser aceitas, pois
Vandegrift não voltaria a atacar o inimigo às cegas. Pelo patrulhamento
agressivo e constante procurava manter os japoneses desnorteados e, ao mesmo
tempo, ter uma ideia exata das posições inimigas.

Pelo seu lado, as «águias marinhas» imperiais aumentaram os ataques a


Henderson. Nos primeiros três dias de Outubro, os ataques foram mais violentos
do que de costume. Em Rabaul, o vice-almirante Yamagata tinha quase 200
aviões, metade dos quais eram Zeros. Em contrapartida, em 5 de Outubro (por
exemplo) Geiger tinham apenas 29 Wildcats em estado de funcionamento, 16
bombardeiros de mergulho, 3 aviões torpedeiros e seis P-400, do Exército. Os
prometidos Lightnings ainda não havia chegado — e nas tendas e barracas de
Henderson corria, até, o boato de que tais aparelhos não existiam, na realidade.

O dia 2 de Outubro foi difícil, no ar, para Guadalcanal. Um dos melhores pilotos
— Robert Galer —, que acabava de abater o seu undécimo avião japonês, foi por
seu turno abatido, também. Lançou-se de paraquedas, recolheram-no e pôde
participar em mais missões de combate.

Durante 7 dias, a partir de 4 de Outubro, o inimigo interrompeu os ataques


aéreos em massa a Henderson. Mas «Washing Machine Charlie» não deixava de
fazer a sua perninha todas as noites, embora as peças antiaéreas de 90 mm do
coronel Pepper tentassem em vão exterminar a omnipresente carraça. Apesar de
se dizer, em tom de brincadeira, que as suas bombas nunca acertavam em nada, a
possibilidade de uma poder acertar chegava para que os fuzileiros se
levantassem dos cobertores empapados e corressem para os abrigos, onde a água
atingia alturas de 12 a 16 cm. Melhorar os abrigos era o entretenimento
universal, na ilha, nesta altura.

Embora as operações estivessem principalmente interessadas em resolver a


situação do lado ocidental, também havia problemazinhos no lado oriental, em
Gurabusu e Koilotumaria, onde os batedores de Clemens tinham descoberto
destacamentos inimigos, quiçá encarregados do funcionamento de postos de
rádio. Por motivos evidentes, Vandegrift estava ansioso por liquidar tais bolsas.
Por isso encarregou duas companhias do batalhão do tenente-coronel Robert
Hills, do 2.º de Fuzileiros — as quais, desde princípios de Agosto, só tinham
participado em pequenas ações de patrulhamento—, encarregou, dizíamos, duas
companhias de seguir de barco de Tulagi para essas imediações, desembarcar
perto de Gurabusu, a coberto da escuridão, surpreender os destacamentos
inimigos e liquidá-los. Calculava-se que as forças inimigas em cada um dos
postos deviam oscilar pelos 50 homens.

Em 7 de Outubro, Clemens saiu do quartel-general com uma equipa de


radiotelegrafistas e três polícias nativos. O seu barco, a navegar junto à praia,
chegou a Aola à tarde e o grupo desembarcou sem ser detectado. Clemens
montou o seu rádio no matagal, comunicou com a Divisão e iniciou o
reconhecimento. Esperava-se que Hill desembarcasse pouco antes da meia-noite,
dois dias depois. Na noite de 9, Clemens distribuiu os seus batedores pela praia,
cada um com uma lanterna eléctrica velada, e Hill desembarcou à hora prevista,
com um pequeno grupo de homens. O paradeiro do resto desta pequena força de
ataque era, porém, desconhecido. Ao nascer do dia apareceram dois «Yippies»,
com barcaças Higgins na sua esteira. Um dos barcos perdera-se, no caminho, e
os seus ocupantes deviam-se ter afogado. Mesmo assim, Hill dispunha de
homens suficientes para cumprir a sua missão.
O ataque a Gurabusu, desencadeado ao nascer do dia 11 de Outubro, foi um
êxito espetacular. Morreram 32 japoneses, só dois conseguiram fugir, e os
fuzileiros tiveram uma baixa: o capitão Richard T. Stafford, comandante da
companhia. No entanto, o ataque a Koilotumaria constituiu um malogro. A
companhia encarregada de o desencadear não conseguiu estabelecer posições e,
quando chegou, descobriu que a maioria dos japoneses tivera o bom senso de
fugir. Mesmo assim, os fuzileiros ainda mataram três inimigos. Um dos
cadáveres foi identificado pelos batedores como o de um japonês chamado
Ishimoto, responsável pelo assassínio de dois padres e duas freiras da Missão
Católica Romana do Ruavatu. Os fuzileiros recolheram as vestes dos padres e
das freiras, que Ishimoto não se dera ao trabalho de enterrar nas sepulturas
anônimas em que enterrara os corpos das suas vítimas.

Pouco depois do nascer do dia 7 de Agosto, a força de ataque de cinco batalhões


marchou de Kukum para oeste, ao longo da costa, a caminho do Matanikau.
Passado pouco tempo, dois batalhões do 7.º de Fuzileiros (agora comandados
pelo coronel Amor Leroy Sims) abandonaram a cauda da coluna e seguiram para
sudoeste, através de escarpas agrestes, para um ponto a montante da «Ponte dos
Japoneses». Acamparam para passar a noite a poucas centenas de metros do
ponto de travessia escolhido.

Às 10.15 h. da manhã, a oitocentos metros do rio, a guarda avançada (3.º


Batalhão, 5.º de Fuzileiros) foi detida por fogo de metralhadoras. Cerca do meio-
dia, porém, o inimigo, que se calculou ser uma companhia reforçada, começou a
recuar, lentamente, para posições de antemão preparadas. Entretanto, o 2.º
Batalhão, 5.º de Fuzileiros, subiu para a esquerda do batalhão em combate e
avançou, livremente, para a linha do rio. Ao mesmo tempo, um grupo reforçado,
sob o comando do coronel William J. Whaling, saiu da formação e marchou para
sul, direto a um bivaque previsto perto da «Ponte dos Japoneses».

Excluindo a oposição inesperada ao longo do caminho costeiro, o


desdobramento efetuou-se no tempo calculado e sem incidentes. Mas os
japoneses ocultos cerca de 180 metros a leste da língua de areia não estavam
dispostos a retirar. Edson ordenou a uma companhia de raiders que os
imobilizasse, para permitir ao 3.º Batalhão, 5.º de Fuzileiros, que atravessasse o
rio na manhã seguinte. Na manhã de 8 de Outubro, porém, não houve ataque
nenhum. A chuva torrencial que caiu durante a noite alterou o programa por
completo e transformou os terrenos adjacentes ao rio em pântanos onde os
homens se enterravam até aos tornozelos. Os aviões não puderam levantar voo
de Henderson e Vandegrift adiou as operações por 24 horas. Edson, porém, não
deu tréguas aos japoneses escondidos do lado leste do rio. Durante todo o dia,
disparou contra eles esporádicas concentrações de artilharia e fogo metódico, de
morteiro. O inimigo aguardou, encafuado nos abrigos, e os raiders, que tiveram o
cuidado de se proteger com arame farpado, pouca atenção lhe mereceram.

Poucos minutos depois de escurecer, os japoneses decidiram que não estavam


dispostos a levar mais pancada e, à uma, levantaram-se dos seus buracos e
correram, aos gritos, para os raiders. Durante 45 minutos travou-se luta furiosa,
nesta bolsa, mas por fim os gritos e os tiros cessaram tão repentinamente como
tinham começado. Caiu o silêncio; deixou de chover. Ao abrigo de capotes
colocados de modo a ocultar a luz das lanternas eléctricas empunhadas por
voluntários, médicos e enfermeiros trabalharam até nascer o dia. De um número
inferior a 100 raiders, tinham morrido 12 e ficado feridos 22. Depois de nascer o
Sol, foram retirados do arame farpado os cadáveres de 59 japoneses. Edson
mandou os raiders regressar ao perímetro. O «Terceiro Matanikau» foi a última
das suas cinco batalhas nas Salomão inferiores.

O ataque prosseguiu, então, como Vandegrift planejara. O grupo de Whaling


vadeou o rio, virou para a direita e avançou, sem resistência, por uma linha de
serranias, na direção do mar. Logo atrás de Whaling, o batalhão do tenente-
coronel Herman H. Hanneken, do 7.º de Fuzileiros, passou pelo mesmo vau,
avançou para um espinhaço cerca de 180 metros a oeste do destinado a Whaling,
virou à direita e seguiu, também, para norte. Puller alargou a frente ainda mais
para oeste, virou para norte e atacou na direção de Point Cruz.

Das três seções de batalhão em movimento lento, só a de Puller encontrou


resistência. Ao avançar ao longo da orla da floresta, perto do fundo de uma
ravina, as tropas dos seus flancos encontraram japoneses, ao que parece numa
área de bivaque. Puller deu imediatamente ordem de recuar à sua pequena
patrulha e pediu fogo de artilharia. Em poucos minutos, granadas de 105 mm
começaram a cair, com efeitos devastadores, sobre os indefesos japoneses, que
correram da selva que os ocultava na direção da escarpa oposta. Ao emergirem
da densa vegetação, os morteiros e as metralhadoras dos fuzileiros expulsaram-
nos para a ravina.

«Foi uma manobra muito eficaz de extermínio metódico, e Puller e os seus


homens mantiveram-na até as munições dos morteiros escassearem.»
Uma ordem inesperada da Divisão pôs fim à matança: todas as unidades deviam
cessar imediatamente os combates, passar através do 5.º de Fuzileiros (que tinha
ordens para manter e melhorar as suas posições na foz do rio) e regressar a
Lunga. Neste vale do horror, o batalhão de Puller deixou os cadáveres de mais de
700 japoneses do 3.º Batalhão do 4.º de Infantaria. As baixas dos fuzileiros
foram ligeiramente inferiores a 200. O Matanikau continuava a cobrar a sua taxa
de carne e sangue.

No dia anterior ao ataque dos fuzileiros, Maruyama mandou Kawaguchi a


Rabaul, dar notícias da situação. Kawaguchi informou comandantes e estados-
maiores do Exército e da Marinha da tragédia do Espinhaço de Edson e dos seus
antecedentes imediatos, dos métodos de combate americanos e do terreno da ilha
«KA». O enviado de Maruyama frisou, sobretudo, a dificuldade de abrir
caminho através da selva. Infelizmente para o êxito de futuras operações, os
oficiais de estado-maior que assistiram à reunião não atribuíram particular
importância aos aspectos desagradáveis do relatório de Kawaguchi. O general
partiu nessa mesma noite para as Shortlands, a fim de se reunir a Hyakutake, que
esperava, aí, transporte num contratorpedeiro para Guadalcanal.

Hora e meia antes da meia-noite de 9 de Outubro, o tenente-general Hyakutake,


acompanhado pelo substituto do chefe do seu estado-maior, coronel Haruo
Konuma, e pelo major-general Tadashi Sumuyoshi, comandante do 17.º de
Artilharia, desembarcou na ilha donde tencionava expulsar os fuzileiros
americanos. Algumas horas depois, estabeleceu o seu posto de comando «no
vale de um rio sem nome, cerca de três quilômetros a oeste de Kokumbona». O
chefe do seu estado-maior, major-general Shuichi Miyazaki, ficara em Rabaul, a
fim de manter ligação com a Marinha e coordenar o embarque de reforços,
armas, alimentos, munições e outros aprovisionamentos.

As más notícias não esperaram que o general chegasse ao seu novo posto de
comando; foram ao seu encontro. Assim que Hyakutake pôs pé em terra, foi
abordado por um oficial mandado por Maruyama, a fim de lhe comunicar a
perturbadora notícia de que a artilharia americana «massacrara» o 4.º Regimento
de Infantaria e que Maruyama fora obrigado a retirar as suas linhas da frente
para um ponto cerca de duas milhas a oeste do Matanikau. Hyakutake convocou
imediatamente uma conferência, para o nascer do dia. A exposição
pormenorizada que lhe fizeram, então, não foi nada encorajador:

... a 2.ª Divisão recuara e os pontos-chave ofensivos e as posições de artilharia


para bombardeamento do aeródromo tinham sido perdidas... Os destacamentos
de Kawaguchi e de Ichiki estavam praticamente incapacitados...

Os alimentos e os remédios escasseavam, não havia estradas nem caminhos e as


munições de artilharia eram escassas.

O general escutou em silêncio este enumerado de misérias e anunciou a sua


decisão: as operações ofensivas deviam prosseguir como estava planeado. No
entanto, transmitiu uma mensagem com prioridade a ordenar ao quartel-general
da 38.ª Divisão, a um regimento de infantaria e a um regimento de sapadores que
seguissem imediatamente das Shortlands para Guadalcanal. Depois informou o
Quartel-General imperial de que a situação em Guadalcanal era «muito mais
grave do que se supusera».

Pediu insistentemente, também, que se intensificassem as atividades de reforço.


Destacaram-se mais contratorpedeiros para viagens noturnas e, a fim de reforçar
o «Expresso», reuniu-se um certo número de grandes o pequenas embarcações
de desembarque e barcaças, para operarem entre as Shortlands e a Kamimbo.
Durante o dia, as barcaças ocultavam-se em lagoas e enseadas de Vella Lavella,
Kolombangara, Nova Geórgia, Vangunu e nas Russells. As viagens eram longas,
enfadonhas e perigosas. O «Transporte de Formigas», como os japoneses
chamavam a estas operações, seria em breve abandonado.

A ordem súbita de Vandegrift para que fosse suspensa a operação bem sucedida
de 9 de Outubro, baseou-se numa informação recebida de Ghormley, segundo a
qual estava iminente um ataque de grande envergadura. Os vigias costeiros que
observavam Simpson Harbor, em Rabaul, assim como os que não perdiam de
vista as atividades nas Shortlands, anunciaram grandes concentrações de
cruzadores, contratorpedeiros, transportes e cargueiros. O esquivo «Expresso de
Tóquio» também intensificara a sua atividade. Documentos retirados dos corpos
de japoneses mortos em ações de patrulhamento e diários analisados pelo capitão
Moran, permitiam supor que a tentativa de ocupação da margem leste do
Matanikau era apenas um preliminar do ataque geral que poderia incluir,
também, ataque direto do mar.

Felizmente, um fator que complicara o cálculo do curso de ação do inimigo,


antes da batalha do Espinhaço deixara de existir: os japoneses já não estavam em
força a leste. Vandegrift achou, portanto, que no reajustamento a que tinha de
proceder podia, sem risco, deixar a linha do Ilu com uma força mínima. Sabia
que o 164.º de Infantaria vinha a caminho e que, se não sucedessem imprevistos
infelizes, poderia contar com ele em 13 de Outubro, o mais tardar.

Este regimento reforçado (menos um batalhão) embarcara em Nouméa no dia 8


de Outubro, nos transportes McCawley e Zeilin. Turner mandou os dois navios
zarpar na manhã seguinte, com uma escolta antissubmarino de três
contratorpedeiros e três lança-minas. Ghormley escolheu a Unidade Naval 64 do
contra-almirante Norman Scott —dois cruzadores pesados e dois ligeiros e cinco
contratorpedeiros— como força de proteção, e mandou para norte duas forças de
ataque, uma concentrada à volta do porta-aviões Hornet e outra à volta do
couraçado Washington. Era evidente que a carta de Harmon de 6 de Outubro
dera um forte impulso à imaginação de Ghormley e incutira nova determinação
ao seu espírito hesitante. Guadalcanal seria reforçada custasse o que custasse! As
forças inimigas que interferissem seriam atacadas e destruídas.

Este programa agradava ao agressivo comandante da Unidade Naval 64, que viu
na sua missão uma oportunidade caída do céu para redimir a vergonha de Savo.
Durante três semanas inteiras, antes desta missão, a força naval de Scott fizera
exercícios de combate noturno, durante os quais o almirante não se poupara, nem
aos seus marinheiros. Mas agora sabia que os seus navios e as suas tripulações
estavam prontos e à altura da tarefa.

Ao fim da tarde de 11 de Outubro, Scott navegava a sul de Guadalcanal quando


recebeu a notícia que esperava: os japoneses, sob as ordens do contra-almirante
Aritomo Goto, vinham a caminho. A força de Goto, segundo informava um
Fortress de reconhecimento, constava de dois cruzadores e seis
contratorpedeiros. Na realidade, porém, era muito mais forte.

Scott apressou-se a ordenar formação de combate noturno previamente estudada


e ensaiada. Na vanguarda, três contratorpedeiros da «Desron 12» do capitão
Robert G. Tobin (Farenholt, Duncan e Laffey); u seguir, os San Francisco
(almirante), Boise, Salt Lake City e Helena, e na retaguarda os restantes dois
contratorpedeiros de Tobin, Buchanan e McCalla. A uma velocidade acelerada, a
coluna seguiu para uma posição de intercepção, perto de Savo. A ideia de Scott
era, como se dizia em gíria, pôr o traço no T: varrer a tiro, da proa à popa, todos
os navios da coluna inimiga. Eram 23 h. Durante 35 minutos, Scott navegou na
rota 050°, na direção de Savo. A ilha surgiu, ameaçadora, a estibordo, e às 23.35
h. o almirante ordenou à coluna um movimento de 180° para a esquerda, para a
rota 230°. 1
Mas, por qualquer razão, o contratorpedeiro da frente não executou
imediatamente o movimento da coluna, e o comandante Ralph E. Wilson
também não virou o Buchanan, que seguiu os cruzadores 2. Tobin, ao
compreender que interpretara erradamente o sinal, apressou-se a virar a sua
coluna 180° para a esquerda, a ordenar velocidade de flanqueamento e a tentar
ultrapassar os cruzadores pelo estibordo destes — o lado por onde o inimigo
apareceria, se viesse, como esperavam, ao seu encontro. E vinha.

O Helena, o último cruzador da coluna e o único equipado com o novo tipo de


radar anunciava contatos havia algum tempo. A seguir anunciou barcos
estranhos à vista e às 23.45 h., pediu autorização para abrir fogo.

Trocou-se, então, uma série de mensagens confusas e mal interpretadas entre o


almirante Scott, no navio almirante San Francisco, e o capitão Hoover, no
Helena. O almirante relutava em dar permissão para disparar e Hoover estava,
praticamente, quase a ser abalroado pelos japoneses, cada vez mais próximos.
Por sorte, o capitão Hoover interpretou à sua maneira as respostas de Scoot e,
passado um minuto, abriu fogo contra um alvo que se encontrava a menos de
4500 metros de distância e se acercava a toda a velocidade. A segunda salva dos
canhões da torre do Helena atingiu o navio almirante de Goto, Aoba, que
decorridos dois minutos era também alvejado pelos Salt Lake City e Boise.
Mortalmente ferido na ponte desmantelada do seu navio, o almirante Goto
transmitiu o comando ao capitão Kikunori Kijima.

Scott, que entretanto percebera que os contratorpedeiros de Tobin estavam a


ultrapassar os seus navios e a passar entre eles e os japoneses, encontrava-se
perante um dilema. Estariam os seus navios a alvejar os contratorpedeiros de
Tobin? 3 Receava que sim. Por isso ordenou, pela radiofonia, que todos os
navios suspendessem o fogo e mostrassem as luzes de reconhecimento. O
Furutaka era um inferno de chamas. O cenário iluminado pelas labaredas
convenceu Scott de que a situação lhe era favorável e, por isso, ordenou que se
reatasse o fogo. Mas o hiato de minutos foi fatal às suas esperanças.

Os japoneses, momentaneamente atordoados, refizeram-se depressa e


começaram a alvejar os contratorpedeiros Farenholt e Duncan. Em troca, os
americanos alvejaram o contratorpedeiro Fubuki, que explodiu e desapareceu do
radar. Scott, que parece ter-se convencido de que a ação fora concluída com
êxito, ordenou inexplicavelmente a todos os seus navios que cessassem fogo.
Mas os japoneses não tinham intenção nenhuma de abandonar o teatro de
operações sem disparar uns tiros de despedida. O Kinugasa, ainda incólume,
juntou-se ao atingido Aoba e ao fatalmente danificado Furutaka num ataque
concentrado ao Boise. Assim terminou — ou quase — a batalha do cabo
Esperança. A sua última baixa, o contratorpedeiro Duncan, foi abandonado às
duas da madrugada e mergulhou definitivamente nas águas ao largo de Savo,
poucas horas depois.

A corajosa tentativa de Scott poupou aos fuzileiros a provação de outro


bombardeamento noturno e foi boa para o moral, nos Estados Unidos. No
entanto, a sua vitória inconclusiva, apesar de adquirir foros de grande triunfo na
Imprensa americana, não impediu o inimigo de desembarcar reforços: enquanto
Scott atacava Goto, o contra-almirante Takaji e Joshima descarregava em
Tassafaronga os barcos de apoio Nisshin e Chitose e seis contratorpedeiros.
Contudo, o moral japonês ficou abalado:

«Durante a batalha noturna ao largo de Savo, a Providência abandonou-nos e as


nossas baixas subiram. Sobretudo em virtude de o inimigo utilizar radar que lhe
permitia disparar eficazmente, a partir da primeira salva, sem o emprego de
holofotes, o futuro parecia negro para as nossas forças de superfície, cujo forte
eram os combates noturnos.»

O almirante Ghormley recebeu os primeiros relatórios da vitória de Scott em 12


de Outubro, e redigiu imediatamente uma mensagem de louvor: «Mais uma vez
os planos do inimigo foram transtornados. Felicitações.» Que este combate naval
tivesse transtornado, por pouco que fosse, os seus planos, seria novidade para o
almirante Yamamoto.

Durante o combate noturno a noroeste do cabo Esperança, e enquanto o contra-


almirante Joshima descarregava tanques, artilharia, alimentos e munições,
Turner avançava à melhor velocidade possível. Chegou ao largo de Lunga Point
pouco depois de nascer o Sol, na terça-feira, 13 de Outubro. O McCawley e o
Zeilin pararam e começaram a desembarcar quase 3000 oficiais e soldados do
164.º de Infantaria. Desembarcou, também, pessoal de terra da 1.ª Ala de
Aeronáutica de Fuzileiros. Os barcos descarregaram jipes, camiões, canhões
antitanque, munições, material para tendas e provisões gerais para 70 dias.

As últimas, como os fuzileiros não tardariam a verificar, incluíam centenas de


caixas de doces diversos. Às nove da manhã, negociava-se a todo o vapor, na
praia. Todos quantos conseguiam arranjar um pretexto para ir a Lunga,
esgueiravam-se por entre os sombrios bosques de coqueiros, a caminho da
inesperada fartura. Muitos iam munidos de espingardas, sabres, pistolas,
bandeiras, capacetes e caixas de mapas japoneses. Uma espada de samurai valia,
nesse dia, três dúzias de barras Hershey, das grandes; uma bandeira de
«almôndega» —que os fuzileiros confeccionavam, quando havia escassez do
produto original...—, valia uma dúzia.

Às onze da manhã, bombardeiros japoneses interromperam temporariamente o


animado mercado, mas o regateio recomeçou, assim que terminou o alarme. O
sossego foi, porém, de curta duração, pois ao meio-dia a «Luz Vermelha»
anunciou uma grande formação de Bettys, escoltados por Zeros. Duas séries de
bombas de 500 libras, caídas na praia, encerraram a singular «bolsa». O 164.º
sofreu, aí, as suas primeiras baixas. Cinco horas depois, os recém-instalados
obuses de 15 cm do major-general Sumuyoshi começaram a atroar os ares e, pela
primeira vez, mas não pela última, obrigaram os Wildcats a passar do Henderson
para o «Fighter One», uma pista estreita, cerca de 1800 metros a leste.

A chegada do 164.º de Infantaria aumentou a força de Vandegrift em


Guadalcanal para pouco mais de 23 000 homens, além dos 4500 que tinha em
Tulagi. Mas este regimento trouxe algo mais, ainda, a milhares de fuzileiros
imundos e fatigados: a chegada dos soldados era um sinal de que, algures,
alguém estava realmente interessado em tentar manter Guadalcanal, de que, num
dia feliz do futuro distante e imprevisível, talvez conseguissem sair daquela
maldita ilha. Se vivessem até lá.

Yamamoto, que não tinha a mínima intenção de deixar os americanos viver


muito mais tempo, preparara uma recepção «calorosa» aos soldados. Se as
«águias marinhas» não conseguiam pôr Henderson fora de combate, talvez isso
fosse possível com um bombardeamento contínuo feito pelos Kongo e Haruna,
da 3.ª Divisão de Couraçados do vice-almirante Takeo Kurita. Por isso ordenou
que um cruzador e sete contratorpedeiros reforçassem o fogo dos couraçados. A
força de Yamamoto, com porta-aviões e outros navios de guerra, dispensaria
apoio distante, cerca de 100 milhas ao norte.

Às 23.30 h., de 13 de Outubro, quando dois grandes navios navegavam, com


extraordinária confiança, de Savo para posições de fogo, «Louie the Louse»
lançou sobre o aeródromo o primeiro de uma série de foguetes luminosos. A
bordo do Kongo e do Haruna, mergulhados em trevas, os oficiais artilheiros
começaram a resolver os problemas matemáticos inerentes a tais operações e, à
1.40 h., 16 canhões de grande calibre abriram simultaneamente fogo sobre
Henderson. Em menos de 70 minutos, os dois couraçados dispararam mais de
900 salvas de munições altamente explosivas, de 36 cm, na área restrita do
aeródromo.

«A [...] cena era impossível de descrever, quando os incêndios e as explosões


provocadas pelas granadas de 36 cm se propagavam aos aviões, aos depósitos de
combustível e aos paióis de munições do inimigo. A coroar este inferno de fogo,
os aviões de observação que sobrevoavam o campo lançavam as suas bombas
luminosas. Perante tal espetáculo, o fogo de artifício de Ryogoku pareceria uma
simples brincadeira de crianças. A escuridão tenebrosa da noite foi transformada
pelo fogo na claridade do dia. Nos nossos barcos ouviam-se gritos espontâneos,
de excitação e alegria.»

Durante 70 minutos, fuzileiros e soldados enterraram-se o mais que puderam na


lama dos abrigos, enquanto o solo tremia e os coqueiros caíam. Ao mesmo
tempo que os foguetes luminosos se aproximavam suavemente de terra, as
chamas devoravam tendas e abriam caminho para os depósitos de alimentos e
munições. Os contratorpedeiros de Kurita aproximaram-se do litoral norte e
começaram a disparar granadas de cinco polegadas. Poucos bombardeamentos
da Segunda Guerra Mundial igualaram este na quantidade de munições de
grande calibre lançadas em pouco mais de uma hora contra um alvo tão pequeno.

AS 2.50 h. o bombardeamento cessou e os homens atordoados saíram, trêmulos


e aos tropeções, dos seus buracos e abrigos. A primeira luz da manhã revelou
uma cena de destruição infernal, em Henderson. Bocados torcidos de
«atapetamento» de aço, arrancados da pista, foram encontrados a centenas de
metros de distância, depois de terem atravessado tendas, cobertores e camas.
Tinham sido destruídas dezenas e dezenas de coqueiros, uma parte do hospital
estava em ruínas, depósitos de combustível ainda vomitavam fumo e,
esporadicamente, explodiam bombas e munições. Uma granada de 36 mm
acertou num depósito de mantimentos e destruiu-o. Durante dias, encontraram-se
latas arrombadas de Spam 4 cujo conteúdo estava colado em todos os coqueiros,
num raio de 800 metros. Os ratos que infestavam os bosques de coqueiros não
teriam problemas alimentares durante algum tempo.

Os americanos podiam passar sem Spam, mas não podiam passar sem aviões.
Quando se recolheu, na terça-feira, 14 de Outubro, Geiger tinha 39 SBD em
estado de funcionar; quando saiu do seu abrigo, ao amanhecer do dia seguinte,
tinha 5. 16 dos 40 Wildcats estavam transformados num montão de ferros
torcidos, e os 24 restantes precisavam, todos, de reparações: pneus novos, rodas,
lemes, caudas e para-brisas. A maioria dos aviões-torpedeiros, recentemente
chegados, estavam também reduzidos a um monte de sucata. Vandegrift pediu 20
bombardeiros de mergulho, «imediatamente». Precisaria deles, assim como
precisaria de caças, pilotos, tripulações e pessoal de manutenção. O
bombardeamento concentrado no aeródromo causara mais de 60 baixas, das
quais 41 mortos. A maioria dos mortos e feridos pertencia ao pessoal da aviação,
incluindo seis pilotos.

Quarta-feira foi um dia relativamente calmo em Guadalcanal. Dois dos cinco


SBD ainda em condições de voar levantaram voo a meio da manhã, numa
viagem de reconhecimento para noroeste. O que os seus pilotos viram em The
Slot, não foi nada tranquilizador: vinham a caminho seis grandes transportes de
tropas, escoltados por cruzadores e contratorpedeiros. Claro que, como de
costume, não faltavam Zeros e Bettys. No campo, mecânicos, pilotos e
tripulantes colaboraram no esforço para reparar imediatamente o maior número
possível de bombardeiros. Conseguiram pôr em estado de funcionamento menos
de uma dúzia.

Na tranquila Nouméa, Ghormley considerou a situação crítica e informou Nimitz


de que os reforços inimigos tinham de ser detidos, «se quisessem manter a
posição conquistada em Guadalcanal». Neste momento de crise, o grupo de
porta-aviões reunidos à volta do Hornet estava a reabastecer-se, na Nova
Caledônia. A Unidade Naval 64, de Scott, encontrava-se em Espírito Santo, a
lamber as suas feridas. Portanto, nenhum dos grupos poderia chegar a tempo de
interceptar a unidade naval nipônica que ia a caminho da Ilha.

Durante a manhã, Geiger mandou o seu punhado de SBD para The Slot, a fim de
bombardearem os navios, que navegavam em ziguezague. No regresso, os
aviadores anunciaram ter afundado um transporte e danificado outro. Na
realidade, porém, as suas bombas falharam por pouco, mas não causaram
quaisquer estragos aos japoneses. Tampouco minaram a determinação do
inimigo de conduzir o comboio ao seu destino.

Vandegrift mandou uma mensagem breve, com prioridade, ao almirante


Ghormley: «É urgentemente necessário que esta força receba máximo apoio de
unidades aéreas e de superfície.»
Antes de chegar a resposta a este apelo, Henderson foi alvo de mais um
bombardeamento, desta vez efetuado pelos cruzadores Chokai e Kinugasa, da 8.ª
Esquadra. Enquanto no aeródromo caíam os projéteis altamente explosivos e
incendiários disparados pelas suas peças de 8 polegadas, os seis transportes
aproximavam-se de Tassafaronga e iniciavam a manobra de desembarque. Ao
nascer do dia de quinta-feira, já estavam em terra mais de 2000 soldados e fora
desembarcada mais de metade dos carregamentos. Os alimentos, munições,
peças antitanque, obuses e remédios que as barcaças tinham levado para a praia,
tinham sido escondidos nos bosques de coqueiros.

A aviação de Henderson interveio. Três horas depois, após repetidos ataques a


baixa altitude, o comandante do comboio ordenou a três transportes danificados
que encalhassem. Os capitães obedientes atiraram os seus navios contra a areia e,
sob uma chuva implacável de balas e bombas, o desembarque prosseguiu. À dez
da manhã, oitenta por cento da carga fora descarregada em segurança.
Entretanto, os três restantes transportes retiravam, sensatamente, para um
compasso de espera a norte e a oeste das ilhas Russell.

Onde estava a Marinha dos Estados Unidos? — perguntavam-se,


constantemente, os fuzileiros. Mas haveria uma Marinha dos Estados Unidos? Se
havia, que diabo estava a fazer? Vandegrift, homem normalmente comedido,
estava furioso e indignado e tentou, mais uma vez, fazer ver a Ghormley a
urgência da situação. A artilharia pesada continuava a castigar as suas posições,
ao mesmo tempo que os barcos inimigos andavam à vontade, pelas águas em
redor de Guadalcanal, e bombardeavam impunemente a ilha. Restavam poucos
galões de gasolina de aviação.

Na realidade, porém, naquela altura encontrava-se perto uma unidade da


Marinha dos Estados Unidos: a Frota de Lanchas Torpedeiras 3 (MTB 3), que
chegou a Tulagi em 12 de Outubro. As quatro vedetas do tenente Alan R.
Montgomery tinham vindo das Novas Hébridas, rebocadas pelos
contratorpedeiros Hovey e Simthard. Os seus marinheiros, habituados ao mar
alto e propensos a duvidar da eficiência de travar combate naquelas
temperamentais cascas de noz, certamente achavam, também, vergonhoso ser
rebocado para o local da ação. Mas se as tripulações de Montgomery sofriam de
um complexo de inferioridade, não parecia. Na noite de 13 para 14 de Outubro,
o tenente conduziu-as, a coberto da escuridão, ao encontro do Kongo e do
Haruna.
Esta pequena, mas obstinada, unidade de combate esgueirou-se, em coluna, do
porto de Tulagi, antes da meia noite, e seguiu para Savo, com os motores a
trabalhar devagar. Os couraçados japoneses não foram difíceis de encontrar e,
depois, as vedetas dispuseram-se de maneira a lançar torpedos. Os vigias
inimigos tinham-nas localizado, porém, e os gigantes vasos de guerra
desencadearam ação de esquiva. No entanto, os japoneses ficaram tão
impressionados com a audácia do ataque que registraram o episódio no relatório
do trabalho daquela noite.

Durante toda a manhã de quinta-feira, equipas de terra trabalharam febrilmente,


a extrair gasolina dos aparelhos avariados (um B-17, que ficara imobilizado em
Henderson no dia anterior, rendeu 400 galões) e a reparar Wildcats. Ao meio-dia,
Geiger pôde mandar para o ar vinte aviões. Em grupos, alguns voavam alto,
como proteção, enquanto outros, com as fitas das suas seis metralhadoras de
calibre 50 cheias de balas luminosas, incendiárias e contra-blindados, atacavam
os transportes encalhados e varriam a praia a rajadas. A gasolina que os
japoneses tinham transportado penosamente para terra, durante a noite,
consumiu-se em fumo, e vários caças, em voo baixo, foram desviados da rota e
atirados para cima pelas ondas de pressão resultantes da explosão de um paiol de
munições. Estendeu-se sobre as praias, de Kokumbona a Doma Cove, um véu de
fumo negro.

Encontrava-se, por acaso, no campo um grupo de visitantes ilustres, que tiveram


ocasião de presenciar o espetáculo. Entre eles contava-se o major-general
Harmon, que chegara de manhã e pôde ver como os aviadores dos Fuzileiros, do
Exército e da Marinha pagavam aos japoneses, na mesma moeda, a terrível noite
a que haviam sobrevivido.

De tarde, agora de novo com falta de gasolina, entraram outros em cena. O


ajudante de Geiger, major Jack Cram, pousou o pesado anfíbio do general, o
«Ganso Azul», na pista de Henderson, a meio da tarde. O «Ganso», vindo das
Novas Hébridas em viagem de emergência, trazia «provisões»: dois torpedos
para a Esquadrilha 8, da Marinha. Cram alegou que tinha direito, pelo menos, a
um deles, e um guarda-marinha, que já cumprira bem a sua obrigação, naquele
dia, disse que o major podia, até, ficar com os dois. Os torpedos foram montados
de maneira que Cram os pudesse largar ao puxar alavancas improvisadas, e o
major levantou de novo voo, para Kokumbona, escoltado por um único caça.

Durante a longa viagem para o alvo, tanto Cram como o «Ganso» levaram fortes
sacudidelas, ao rebentar-lhes por cima e por baixo fogo antiaéreo de cinco
contratorpedeiros japoneses. Cram aguentou a rota e largou os dois torpedos. Um
entrou por um transporte ancorado, explodiu e destroçou-o. O «Ganso» voltou,
lentamente, na direção de Henderson, com três Zeros na pegada. A artilharia
antiaérea e os caças americanos escorraçaram-nos, mas não antes de o «Ganso»
estar feito num crivo. Quando Cram comunicou a Geiger o êxito da sua missão,
o general foi ver o seu avião de comando e contou cinquenta buracos na
fuselagem, nas asas e na cauda. Geiger ameaçou Cram com um conselho de
guerra, por destruição deliberada de propriedade governamental, regressou ao
seu gabinete e recomendou que fosse concedida a Cruz da Marinha no seu
ajudante, que efetuara um dos ataques mais audaciosos de toda a história da
aviação em tempo de guerra.

Nas Hébridas, as tripulações de «Blondie» Saunders passaram a manhã de 15 de


Outubro a meter combustível em Fortresses, e pouco depois de Cram regressar à
base uma esquadrilha de B-17 sobrevoou Henderson, rumo a oeste, a uma
altitude inferior a 1500 metros. Minutos depois, largaram metodicamente a sua
carga na praia, viraram majestosamente, a ganhar altitude, e iniciaram o longo
voo de regresso.

O memorável dia estava findo. Henderson perdera sete aviões em combates


aéreos e, em contrapartida, os pilotos de Geiger tinham abatido cinco Zeros e
três Bettys.

À meia-noite, os japoneses retaliaram. Desta vez os barcos participantes —os


cruzadores Maya e Miyako, com canhões de 8 polegadas, e dois
contratorpedeiros— eram comandados pessoalmente pelo almirante Kondo. De
distâncias entre 7300 e 9000 metros, Kondo despejou no campo quase 1500
granadas, durante mais de uma hora. A terra tremeu, de novo, mas não como
tremera n’«A Noite». No entanto, mais uma vez houve mortos e feridos, mais
uma vez as chamas lamberam os paióis e fragmentos de granadas rasgaram a
fuselagem dos aviões estacionados. A contagem efetuada de madrugada foi
deprimente: 15 Wildcats completamente destroçados. A Geiger já só restavam 27
aviões diversos, metade deles a precisar de reparações.

Mas vinham socorros a caminho. Smith mandou vários transportes da Nova


Caledônia, com tambores de gasolina, peças sobressalentes e brigadas de terra, e
às cinco da tarde o tenente-coronel Harold Bauer chegou com a Esquadrilha de
Combate 212, dos Fuzileiros: 19 Wildcats. Quando o último aparelho aterrou, as
Operações Aéreas anunciaram «Luz Amarela», o que significava que vinham
aviões inimigos a caminho. O comandante da esquadrilha, que ainda não se
apresentara a Geiger, observou nervosamente as tripulações de terra, que metiam
combustível em parte dos seus caças. Os aviões ligaram os motores e, pouco
depois, estavam no ar. Bauer, que estivera em terra menos de 60 minutos,
regressou passada quase uma hora. Nesse espaço de tempo abatera quatro
bombardeiros japoneses. O seu ajudante comentou, mais tarde, a proeza, cheio
de admiração: «O comandante coseu quatro dos bastardos de ponta a ponta!»

12. «TODOS OS HOMENS DARÃO BOA CONTA


DE SI»

O dia 15 de Outubro de 1942 foi um dia significativo na carreira profissional do


tenente-general Masao Maruyama, oficial que atribuía grande valor a sua
importância histórica. O dia começou bem. O general saboreou um modesto
pequeno-almoço de chá, peixe, picles e arroz, e depois palitou os dentes, lavou a
boca, limpou o rosto com uma toalha fumegante, abotoou o dólmã e sentou-se à
sua secretária da campanha. Um ajudante solícito estendeu-lhe um documento,
para assinatura.

Este documento continha a ordem de marcha do comando de Maruyama, por um


caminho secreto, de Kokumbona para pontos de reunião a sul do campo
Henderson. No «Dia X», a Divisão Sendai desdobrar-se-ia, a partir destas
posições, e ao cair da noite desencadearia um ataque de surpresa, aniquilaria os
americanos e apoderar-se-ia do aeródromo. O «Dia X» estava, em princípio,
previsto para 22 de Outubro. O movimento, pela selva, seria feito por uma trilha
estreita, que curvava para sul do monte Austen. O general estipulou que esta
trilha, que estava a ser aberta pelos sapadores, se chamaria «A Estrada de
Maruyama».
O plano de ataque do tenente-general Hyakutake previa assaltos simultâneos ao
objetivo, em três pontos muito afastados. O ataque principal seria comandado
pelo general Maruyama, e para esse golpe decisivo foi destinada uma força da
ordem dos sete mil homens. Maruyama achava este número suficiente para
submergir os defensores, apanhados de surpresa numa linha que presumia —
aliás com razão — pobremente guarnecida. Penetrada essa linha, seriam
alcançadas as zonas vitais do aeródromo, onde ficavam o quartel-general e os
depósitos de combustível, alimentos e munições: em suma, os centros nervosos
das defesas americanas. E onde ficava, também, a artilharia. Mas, primeiro,
havia que romper a casca do melão. Depois comer-se-ia tranquilamente a polpa
madura.

A força de Maruyama era composta por dois grupos, ou alas, e uma reserva.
Kawaguchi comandava a ala direita; o major-general Yumio Nasu, a esquerda. A
ala de Kawaguchi compunha-se de três batalhões de infantaria, além de canhões
antitanques, morteiros, artilharia de montanha e sapadores. A de Nasu, também
com três batalhões de infantaria, dispunha de idênticos apoios. Maruyama
deixou um regimento de reserva —o 16.º de Infantaria, do coronel Hitoshi
Hiroyasu—, com a incumbência de explorar o êxito de cada uma das alas. As
tropas auxiliares contavam com unidades de sapadores, sinaleiros, pessoal
médico e de aprovisionamento de água.

A fim de apoiar a arrancada decisiva de Maruyama, Hyakutake preparou um


grupo de infantaria-tanques-artilharia, comandado pelo major-general
Sumuyoshi. Este efetuaria uma operação coordenada de diversão, ao longo do
Matanikau, enquanto os seus obuses pesados continuariam a castigar o
aeródromo e as instalações circundantes. Sumuyoshi dispunha das peças
grandes: oito obuses de 15 cm e outros canhões de menor calibre,
desembarcados dos porta-hidraviões Nisshin e Chitose, durante o combate naval
de Scott com Goto. Tinha, também, 16 tanques. Para o grupo de artilharia,
Hyakutake destinou o que restava do 4.º Regimento do coronel Nomasu
Nakaguma, um batalhão e vários suplementos. Nakaguma, apoiado por tanques e
artilharia, atravessaria o rio na faixa de areia. O omnipotente coronel Oka, com o
seu 124.º de infantaria (menos um batalhão, mas mais um batalhão do 4.º de
Infantaria) deveria atravessar o rio a vau, secretamente, cerca de dois
quilômetros e meio a montante, seguir para leste, virar para norte, isolar a
posição de batalha americana do Matanikau e liquidar os seus defensores.

A partir de Rabaul, Bettys efetuariam ataques aéreos a Henderson, protegidos


por Zeros da base de Huin, enquanto comandados pessoalmente por Yamamoto
couraçados e cruzadores pesados efetuariam bombardeamentos incessantes, com
munições de alto calibre. Um batalhão reforçado do 228.º de Infantaria — o
«Destacamento Koli»— foi posto de prevenção, para desembarcar, assim que
para tal recebesse ordem, a leste do objetivo.

Portanto, se tudo corresse bem, os americanos seriam alvo, simultaneamente, de


três ataques independentes, de terra, e também do ar e do mar. No papel, o plano
parecia perfeito. Mas fora traçado sem uma avaliação objetiva do terreno, do
tempo e do inimigo, e sem que fosse tomado em consideração outro pormenor
talvez ainda mais importante. Este pormenor, que pareceu não ter acudido ao
espírito de Hyakutake nem ao de Maruyama, resumia-se numa pergunta: «Estes
movimentos poderiam ser coordenados no tempo e no espaço?» Um sistema de
comunicações rápidas e eficientes era condição prévia indispensável para tal
coordenação.

Ao meio-dia de 16 de Outubro, batedores do grupo do major-general Nasu


seguiram para sul, a partir da costa, a fim de percorrerem o primeiro trecho da
longa marcha. Maruyama e um pequeno grupo do quartel-general partiram com
Nasu, seguiu-se-lhes o comando de Kawaguchi, e o 16.º de Infantaria, do
coronel Hiroyasu, mais as tropas auxiliares, fechavam a marcha. Hiroyasu
recebeu ordem de marchar na direção do Lunga superior 48 horas depois de a
retaguarda do corpo principal deixar o caminho da costa.

Antes de a sua coluna partir, Maruyama conferenciou com Hyakutake. O


comandante-chefe do 17.º Exército informou o seu subordinado de que os
bombardeamentos noturnos, por barcos de guerra, constituíam «um grande abalo
para o inimigo», cuja força e cujo moral «enfraqueciam gradualmente». Nenhum
fuzileiro, soldado ou marinheiro que tivesse sobrevivido aos recentes
bombardeamentos poria em dúvida a primeira da parte da afirmação do general
japonês; alguns, até, no isolamento dos seus abrigos abertos no chão, talvez
fossem capazes de concordar, também, com a segunda.

Além da sua arma, das suas munições, de várias granadas de mão, do


equipamento individual e de rações para 12 dias, cada oficial, cada subalterno e
cada soldado de infantaria da coluna de Maruyama transportava, presa à
mochila, uma — ou mais do que uma— granada de morteiro ou de artilharia.
Cada soldado transportava, pois, uma média de 27/28 quilos. O general
Maruyama comandava um exército formidável, mas, ao contrário de Kawaguchi,
ignorava, o que a selva aparentemente pacífica lhe reservava.

Enquanto os seis batalhões de infantaria de Maruyama serpenteavam, em coluna,


na direção do Lunga superior, os soldados e os fuzileiros americanos
preparavam-se para os ataques que todos consideravam iminentes. Mas onde
seria desfechado o golpe principal? Qual seria o setor decisivo? As especulações
eram muitas, mas saber, ninguém sabia. Bombardeiros de mergulho e
metralhadores atacavam barcos e barcaças japoneses, áreas prováveis de
concentração de tropas entre Point Cruz e Esperança e locais que pareciam
adequados para posições de artilharia.

O dia 16 de Outubro foi aziago para os americanos. O porta-hidraviões


McFarland, que protegia duas barcaças carregadas de tambores de gasolina de
aviação e navegava no Sealark Channel a caminho do porto de Tulagi, foi
atacado por bombardeiros de mergulho. A proa explodiu e morreram ou ficaram
feridos onze homens da sua tripulação. Uma das bombas atingiu uma barcaça, do
que resultou explodirem vinte mil galões de potente gasolina, com chamas a
jorrar em todas as direções. A própria água queimava. Ao pôr do Sol, uma
esquadrilha de bombardeiros atacou instalações da praia, em Kukum.

Na manhã seguinte, 19 Aichi 99, protegidos por 8 Zeros interromperam o


pequeno-almoço. Uma mensagem operacional japonesa, a informar Hyakutake
deste ataque e com pormenores tão interessantes como a hora, a rota e o número
e os tipos de aviões participantes, fora interceptada pelo quartel-general do
Nimitz, na noite anterior. Geiger mandou caças para o ar, ao nascer do dia. Às 7
da manhã, a esquadrilha, em formação impecável, aproximou-se, pelo norte, a
3000 metros de altitude. Os pilotos dos Wildcats atacaram e abateram oito
bombardeiros de mergulho e dois Zeros. Seis aparelhos japoneses, a pique,
foram apanhados pela artilharia antiaérea certeira, antes de terem tempo de fugir,
e um Aichi afastou-se a deitar fumo. Ao meio-dia houve segundo ataque, a que
Vandegrift aludiu num relatório conciso:

«15 bombardeiros bimotores, acompanhados por muitos Zeros, bombardearam a


posição 1315. Os nossos aviões não puderam ganhar altitude a tempo de
interceptar. Supõe-se que foi abatido um bombardeiro. Do nosso lado não houve
perdas.»

Em Nouméa, o centro de comunicações do almirante Ghormley fazia horas


extraordinárias. Enviaram-se pedidos urgentes a MacArthur, para intensificar os
ataques contra Vunakanau e Lakunai, e a Nimitz, para mandar reforços aéreos.
Por seu turno, o CincPac apelou para King, mas Cominch não tinha mais nada.
No Pacífico Sul, a Marinha já não estava a esgaravatar o fundo do barril: isso já
se fizera.

Apesar dos recentes reforços, a posição de Vandegrift era precária. Em terra, o


seu perímetro de defesa oscilava geralmente da foz do Matanikau para sul e
leste, através do Lunga. Daqui, seguia para leste, pelas escarpas na direção do
Ilu, e para norte, ao longo do rio, para o mar. O cordão da praia, do Ilu ao
Matanikau, estendia-se numa extensão de quase 11 000 metros; o semicírculo,
para sul, abrangia mais 13 700 metros. Vandegrift dispunha, para guarnecer esta
frente, de treze batalhões de infantaria. Seis deles (três do 1.º de Fuzileiros de
Cate e três do 5.º de Edson) estavam fatigados e mais do que dizimados pela
malária. O 7.º de Fuzileiros estava em boa forma, mas os soldados ainda não
tinham dado provas, e o batalhão de Hunt do 2.º de Fuzileiros, agora na reserva
da Divisão, estava reduzido a menos de 70 % dos seus efetivos completos, de
quase 1000 homens.

A possibilidade de um ataque esmagador, vindo do mar, não poderia jamais ser


eliminada. Por isso, havia que manter a todo o custo as posições do Ilu e do
Matanikau. Os fuzileiros não dispunham de canhões capazes de fazer frente aos
grandes obuses de Sumuyoshi. Vandegrift aproveitava a vantagem inerente a
uma posição no «interior das linhas». De dia, podia mudar tropas, rapidamente,
de um setor para outro, podia concentrar a artilharia, para apoiar setores
ameaçados, e os seus aviadores tinham demonstrado que eram capazes de
dominar as operações aéreas. Embora muito castigados pela aviação, os
japoneses continuavam, a coberto da noite, a desembarcar tropas, canhões,
mantimentos e munições. Na opinião do CincPac, este estado de coisas não
admitia mais demoras. Informou King, a tal respeito, e acrescentou: «A
distribuição de mais forças [...] é da maior urgência.» Ao mesmo tempo, Nimitz
garantiu a Ghormley que não se poupariam esforços para lhe proporcionar os
meios necessários para conservar Guadalcanal.

Em Washington, tanto o presidente Roosevelt como o secretário Knox tinham


consciência de que se aproximavam de novo, rapidamente, dias decisivos para as
Salomão. O presidente, cuja principal preocupação era a iminente invasão aliada
da África do Norte, todos os dias passava horas na sala dos mapas da Casa
Branca, onde o instruíam acerca da situação no Pacífico Sul. O comandante-
chefe das forças militares americanas estava preocupado com a situação
americana, mas não achava necessário, pelo menos por enquanto, intervir junto
dos chefes conjuntos.

Numa solene conferência de imprensa, em 17 de Outubro, o secretário da


Marinha respondeu evasivamente a algumas perguntas embaraçosas.

— Acha que podemos conservar Guadalcanal? — perguntou-lhe um repórter.

Mr Knox, de semblante mais carregado do que era hábito, teve o cuidado de não
se comprometer.

— Desejo e espero sinceramente que sim. Não farei quaisquer predições, mas
todos os homens darão boa conta de si. Está a travar-se uma boa luta, violenta, e
toda a gente espera que resistamos.

O New York Times descreveu Guadalcanal como o fulcro de uma batalha que
parecia «suscetível de se transformar num dos combates decisivos da guerra no
Pacífico». Durante estes dias de ansiedade, Rádio Tóquio teve muito pouco que
dizer acerca do progresso das operações nas Salomão.

Às 14 h. de 18 de Outubro, um quadrimotor Coronado sobrevoou Nouméa a


baixa altitude e descreveu um círculo gracioso por cima do navio almirante de
Ghormley, o U. S. S. Argonne. O piloto desceu os flutuadores, puxou as
alavancas e pousou suavemente nas cintilantes águas do porto. Antes mesmo de
o aparelho ancorar, parou a seu lado uma baleeira e o vice-almirante William F.
Halsey desceu desajeitadamente do Coronado e entrou na embarcação, que
dançava ao sabor da corrente.

Halsey, que viajava pelo Pacífico Sul, para se familiarizar com o setor, antes de
assumir o comando de uma unidade naval de porta-aviões, não esperara visitar
Nouméa em 18 de Outubro. Segundo o seu plano de viagem, nesse dia devia
estar em Guadalcanal. Mas, no caminho, recebera uma mensagem inesperada, de
Nimitz, a ordenar-lhe que fosse imediatamente a Nouméa.

Antes mesmo de o almirante se dirigir para a proa, um jovem segundo-tenente


entregou-lhe um sobrescrito fechado, que Halsey se apressou a abrir. Dentro
encontrou segundo sobrescrito fechado, com a palavra «SECRETO». O
almirante abriu-o, também, tirou uma folha de papel, leu-a duas vezes e
estendeu-a ao coronel de Fuzileiros Julian P. Brown, seu conselheiro e
confidente. «Valha-me Jesus Cristo e o general Jackson!», exclamou Halsey. «É
a batata mais quente que jamais me atiraram para as mãos!»

A nota do CincPac era concisa:

«ASSUMA IMEDIATAMENTE O COMANDO DO SETOR DO PACÍFICO


SUL E DAS FORÇAS DO PACÍFICO SUL.»

Apoderou-se de Halsey uma emoção muito forte. Mais tarde, recordou que os
seus primeiros sentimentos tinham sido de «espanto, apreensão e mágoa, por
esta ordem». Em silêncio, o almirante e a sua pequena comitiva seguiram para o
Argonne.

Poucos minutos depois de entrar a bordo, Halsey substituiu um velho e querido


amigo. Não houve qualquer cerimônia formal de mudança de comando.
Tampouco se notaram quaisquer indícios de apreensão ou desgosto, quando a
notícia chegou a Guadalcanal. Um oficial do serviço de informações,
enfraquecido por consecutivos ataques de febre, ouviu a notícia e escreveu o
seguinte, a tal respeito: «Jamais esquecerei! Num momento, estávamos tão
alquebrados pela malária que nem tínhamos coragem para rastejar para fora dos
nossos abrigos; no seguinte, corríamos e gritávamos como garotos.»

Assim que tomou nas suas mãos confiantes as rédeas do comando, Halsey pediu
a Vandegrift, pelo rádio, que se apresentasse a bordo do Argonne logo que a
situação local lhe permitisse. Halsey queria um relatório direto, em primeira
mão, e em Nouméa ninguém lhe podia dar. Nenhum oficial superior do estado
maior de Ghormley tinha qualquer conhecimento do que se passava em
Guadalcanal, e, por outro lado, nem Ghormley nem o seu chefe de estado-maior,
contra-almirante Daniel J. Callaghan, tinham, nas dez semanas precedentes,
disposto de um dia em que pudessem abandonar a papelada e voar para norte, a
fim de ver o que se passava.

A conferência com Halsey, a bordo do Argonne, começou no dia 23 de Outubro,


depois do jantar. Os principais participantes, além de Halsey e de Vandegrift,
foram os majores-generais Patch, Kelly Turner e Millard Harmon e o tenente-
general Thomas Holcomb, comandante do Corpo de Fuzileiros Navais, que
estivera recentemente em Guadalcanal. Depois de Vandegrift expor a situação
em que se encontrava, falou Harmon.

«Archie Vandegrift e “Miff” Harmon contaram as suas tristes histórias [...]


Perguntei: “Vamos evacuar a ilha ou continuar lá?” Archie respondeu-me:
“Posso aguentar, mas para isso preciso de apoio mais ativo do que tenho
recebido.”»

Halsey virou-se, então, para Kelly Turner. O comandante da Força Anfíbia


também tinha problemas, os quais eram numerosos e profundamente
perturbadores. Faltavam-lhe cargueiros e lutava com uma escassez angustiosa de
barcos de guerra para proteger os poucos que possuía; a aviação e os submarinos
inimigos eram uma ameaça constante... Halsey escutou calmamente o resumo
pessimista, e quando Turner acabou voltou-se para Archer Vandegrift e disse-
lhe: «Volte. Prometo-lhe tudo quanto tiver.»

Quando a Ndeni, o ComSoPac foi inequívoco: «Cancelar.»

King manteve a mudança de comando secreta durante uma semana. Quando a


notícia se tomou, enfim, pública, provocou uma tempestade de especulações em
Tóquio, onde um comentador exprimiu o parecer de que a nomeação de Halsey
pressagiava a «retirada de todas as forças navais americanas do Pacífico Sul».

Quando Vandegrift recebeu ordem para se apresentar em Nouméa, o tenente-


general Maruyama estava havia quatro dias na trilha a que modestamente deu o
seu nome. O comandante-geral não se sentia, porém, muito satisfeito com o
estado dessa artéria... a coluna do major-general Nasu avançava devagar, e a de
Kawaguchi ia ficando para trás. As cargas dos homens eram pesadas, o terreno
áspero, o calor húmido terrível e as geladas chuvas noturnas violentíssimas. Os
canhões de montanha e antitanque estavam já muito para trás, e os homens que
tinham de os conduzir, por vertentes escorregadias e inúmeros vales lamacentos,
sentiam-se exaustos. Uma a uma, as peças do artilharia foram abandonadas ao
longo da trilha esburacada onde homens e armas se atolavam. A fazer-lhes
companhia, iam ficando minas antitanque, granadas de artilharia e outro material
pesado, que dificultava o avanço. Em 21 de Outubro, Maruyama adiou o ataque
por 48 horas.

E os homens continuaram a avançar, teimosamente. Durante esta marcha, os


soldados japoneses, alimentados apenas com alguns punhados de arroz
amolecidos pela chuva até ficarem com uma consistência que permitia comê-los,
demonstraram mais uma vez as suas inigualáveis qualidades de tenacidade e
resistência. Mas seriam essas virtudes, aumentadas pelo espírito encorajador do
Bushido, garantia suficiente de vitória? Hyakutake, pelo menos, pensava que sim
e, no dia 22 de Outubro, ordenou ao Destacamento Koli que embarcasse no dia
seguinte, nas Shortlands e se preparasse para desembarcar perto de Koll Point,
quando ele transmitisse a mensagem significativa de que o aeródromo fora
conquistado. Essa mensagem seria formada por uma única palavra: «Banzai.»

Embora sem consciência disso, Hyakutake tinha ainda outra razão para se sentir
otimista: o comando dos Fuzileiros ainda não fazia a mínima ideia da ameaça de
um grande ataque, pelo sul. As ações anteriores, perto da foz do Matanikau,
tinham gerado o convencimento potencialmente perigoso de que qualquer
tentativa séria só poderia vir desse lado. Esta opinião parecia ser confirmada
pelo comportamento de Sumuyoshi desde 12 de Outubro, data em que os obuses
pesados do comandante da artilharia japonesa começaram a bombardear
espasmodicamente o aeródromo.

A primeira granada a explodir na pista revelou que o inimigo conseguira


desembarcar novas armas de calibre desconcertantemente grande. De vez em
quando, granadas de ação retardada explodiam debaixo da pista e mutilavam
membros das equipas de reparações. Estes ataques irregulares, mas certeiros,
obrigaram a uma mudança das operações aéreas para o «Fighter One». Os
fuzileiros, sempre prontos a arranjar alcunhas, não tardaram a dar à nova ameaça
à sua saúde e paz de espírito o nome de «Pistol Pete». «Pete» era uma ameaça
em muitos sentidos. Não só conseguia paralisar o campo Henderson, como
também causava um sentimento de frustração aos artilheiros de Del Valle,
anteriormente transbordantes de confiança. Por mais que tentassem, não o
conseguiam localizar. Não dispunham de equipamento de medição de som e
clarão, e o comandante da aviação não se podia dar ao luxo de gastar gasolina a
mandar aviões observadores para o ar, horas a fio, a fim de localizarem aquela
mais recente fonte de tormentos.

Enquanto a aviação atacava repetidamente os japoneses ativos a oeste do


Matanikau, os pilotos e os observadores apresentavam constantes relatórios
negativos acerca de outras áreas. Todos os dias, o 3.º Batalhão do 1.º de
Fuzileiros e o 3.º Batalhão do 7.º de Fuzileiros, que guarneciam a posição de
combate do Matanikau, trocavam tiros com os japoneses, através do rio.
Sumuyoshi esforçava-se por concentrar a atenção dos defensores nesse setor.

Em 20 de Outubro, ordenou uma operação de sondagem a dois tanques apoiados


por infantaria, que se prepararam ostensivamente para atravessar a faixa de areia.
Um deles foi atingido e posto fora de combate. O outro apressou-se a retroceder.
Sumuyoshi retaliou com as primeiras concentrações de artilharia dos japoneses,
até então, e os Fuzileiros ficaram a saber o que era estar do lado que recebia o
fogo pesado da artilharia. Pouco depois do pôr do Sol do dia seguinte,
apareceram na mesma área nove tanques inimigos. Os americanos voltaram a
pôr um fora de combate, e os outros, numa grande algazarra de motores,
desapareceram antes de os artilheiros os poderem visar.

Ao princípio da manhã de 23 de Outubro, os dois batalhões de assalto do major-


general Nasu dirigiu-se para os pontos de reunião final, à retaguarda das suas
linhas de partida, e Nasu comunicou a Maruyama que podia atacar na data
prevista. As suas tropas descansaram. Terminada a extenuante caminhada, as
copas das gigantescas árvores da selva protegiam-nas e ocultavam-nas da
observação aérea. O seu moral era elevado. Grupos de oficiais abriram cuidado
amente caminho através do emaranhado da vegetação, a fim de assestarem os
seus binóculos no aeródromo. O dia estava muito claro. Numa excitação
crescente, os observadores japoneses descreviam aos seus homens as atividades
em que os americanos, alheios a proximidade do inimigo, se ocupavam, dentro
do seu perímetro.

A atividade aérea era grande, àquela hora desusada. Os japoneses raramente


fugiam ao padrão estabelecido dos ataques ao meio-dia. Nesse dia, 20 Zeros
escoltavam 16 Bettys. Todos os caças inimigos foram abatidos, quatro deles por
um comandante de esquadrilha, major Joseph E. Foss, recentemente chegado à
ilha. Um bombardeiro despenhou-se, em chamas, e outros três fugiram para
oeste, a deitar fumo.

Logo depois de este ataque ser repelido, Maruyama recebeu más notícias. A ala
direita — de Kawaguchi — ainda não chegara aos pontos de reunião e,
provavelmente, não poderia atacar ao pôr do Sol, como estava previsto. O
comandante da divisão não teve outro remédio senão adiar o seu ataque para as
17 h. do dia seguinte. Depois disso, telefonou a Kawaguchi, do seu posto de
comando no «Espinhaço em Forma de Centopeia», e, bruscamente, tirou-lhe o
comando da ala direita e entregou-o ao coronel Toshinaro Shoji.

Surgiram, então, outras dificuldades, inerentes a todos os planos complexos. As


radiocomunicações entre Maruyama e Sumuyoshi falharam. No entanto,
Maruyama conseguiu falar com Hyakutake e o 17.º Exército pôde informar
Yamamoto (cuja Esquadra Combinada devia proporcionar fogo direto de apoio e
cortar a esperada retirada americana) do adiamento de 24 horas. Yamamoto,
desencorajado por estes percalços, marcou encontro com os navios-tanques da
esquadra e retirou a sua força de ataque para norte, a fim de se reabastecer.

Há uma máxima muito respeitada, da Marinha dos Estados Unidos e do Corpo


de Fuzileiros, que contém uma profunda verdade militar: «Há sempre um pobre
idiota qualquer que não recebe o aviso.» Neste caso, o infeliz — e sem culpa
nenhuma — foi o major-general Sumuyoshi. O comandante da artilharia,
atacado de malária, jazia no seu abrigo, em estado de coma. Se a última
mensagem de Maruyama, a adiar novamente o ataque principal, alguma vez
chegou ao quartel-general de Sumuyoshi, a oeste do Matanikau, o general não a
viu e nenhum membro do seu estado-maior tomou quaisquer previdências a tal
respeito. Por isso, os tanques médios de Sumuyoshi arrancaram poucos minutos
depois das 18 h. do dia 23 de Outubro, exatamente como estava previsto, a
caminho da faixa de areia. Foi a última vez que os seus motores atroaram os
ares.

Os fuzileiros esperavam precisamente isso. Os peritos artilheiros do coronel Del


Valle, sempre prontos a responder a pedidos de apoio, dispararam, em fogo
concentrado, para a faixa de areia, para a margem do rio ocupada pelos
japoneses e ao longo do caminho costeiro, a oeste. Peças antitanque, ocultas,
contiveram o fogo enquanto os homens que as serviam contavam os tanques que
emergiam da selva e se dirimam para a língua de areia. Contaram nove, ao todo,
seguidos por alguns soldados de infantaria. Finalmente, os capitães artilheiros, a
suar em bica, receberam a ordem ansiosamente esperada, e tudo quanto podia
disparar, disparou. Em menos de três minutos os tanques pararam, todos eles
atingidos, menos um. A medida que as munições contidas no interior das torres
explodiam, os tripulantes sobreviventes saltavam para terra e fugiam, mas eram
atingidos pelas costas. Os soldados de infantaria retiraram, em silencio.

Um dos tanques conseguiu chegar à margem oriental. Um fuzileiro de reflexos


rápidos meteu-lhe uma granada de mão na lagarta esquerda, quando o veículo
passou convenientemente próximo do seu abrigo. A explosão espatifou a lagarta
e o tanque virou bruscamente para a esquerda, na direção da faixa de areia Três
granadas disparadas pela peça do 75 mm de um semilagarta perfuraram-lhe a
fina chapa blindada e explodiram surdamente. Não saíram homens nenhuns do
seu interior. A infantaria japonesa não chegou, na realidade, a entrar em ação, e
por um bom motivo: a artilharia matou mais de 600 homens que esperavam nos
pontos de reunião. O fogo concentrado no caminho costeiro destruiu mais três
tanques.
Mas o general Sumuyoshi foi, até certo ponto, bem sucedido: conseguiu atrair a
atenção para o Matanikau, com exclusão dos outros setores. Os americanos
continuavam a não ter a mínima noção do perigo iminente na área onde, dentro
de poucas horas, o batalhão de Puller e o 2.º Batalhão do 164.º de Infantaria
seriam postos à prova. Por sinal, até, no dia anterior fora retirado das defesas do
setor sul e mandado para o Matanikau o batalhão de Hanneken, do 7.º de
Fuzileiros. Durante a marcha, Hanneken recebeu ordem para prolongar para
sueste o flanco esquerdo da posição de combate. No dia seguinte às ruidosas
manobras de diversão de Sumuyoshi, que tão caro lhe saíram, aquele batalhão
começou a abrir abrigos num espinhaço que constituía uma forte posição
defensiva natural.

Entretanto, a Divisão encarava, com justa apreensão, o problema da gasolina e


das munições. Nas 48 horas anteriores, os obuses de 75 e 105 mm de Del Valle
tinham disparado praticamente todas as granadas de artilharia restantes na ilha. A
gasolina existente mal chegava, também, para abastecer os caças para uma
intercepção. Seguiram para Nouméa mensagens urgentes, a pedir granadas e
gasolina, e nessa tarde chegaram transportes Douglas com quantidades de ambas
as coisas suficientes para manter a artilharia e os aviões cerca de dois dias.

Durante o dia, Maruyama conferenciou com os seus subordinados, no posto de


comando a sul do «Espinhaço em Forma de Centopeia», e distribuiu uma ordem
final de ataque. Este modelo de concisão era muito vago:

ORDENS DA 2.ª DIVISÃO «(Transmitidas às 12 h. de 24 de Outubro)

«A Divisão conseguiu chegar, em absoluto segredo, no flanco inimigo da


retaguarda.

«De acordo com os planos por mim elaborados, tenciono exterminar o inimigo
que se encontra nas Imediações do aeródromo de um só golpe.

«Ambas as alas esquerda e direita iniciarão o ataque às 17 h. e perfurarão as


linhas inimigas.

«Permanecerei na presente posição até às 14 h. e então seguirei na direção do


aeródromo, atrás da unidade da ala esquerda.»

Foi então que a Natureza resolveu intervir. Exatamente às 15 h., quando as


tropas japonesas começavam a dirigir-se para as linhas de partida, desatou a
chover torrencialmente e, decorridos poucos minutos, o solo da selva estava
transformado num pântano. As comunicações entre as unidades interromperam-
se, comandantes de batalhão perderam companhias, companhias perderam
pelotões, pelotões perderam esquadras... O ataque não se desencadeou às 17 h.,
como estava previsto, e durante duas horas reinou a confusão. Quando a chuva
parou, os oficiais nipônicos começaram a reunir as suas unidades dispersas, e
embora a ala direita de Shoji ainda não tivesse ocupado a posição que lhe fora
destinada, o impaciente Maruyama ordenou a Nasu que atacasse pela esquerda o
mais depressa possível. Pouco depois da meia-noite, o coronel Shojiro Ishimiya,
à frente do 1.º Batalhão do seu 29.º de Infantaria, disparou um foguete luminoso,
a anunciar o ataque. Nuvens obscureceram a Lua e começou outra vez a chover,
embora com menos violência. A primeira vaga dos homens de Ishimiya atacou
um posto avançado dos Fuzileiros, submergiu-o e, em dois pontos, forçou a
passagem através do arame farpado que protegia uma das companhias de Puller.
Mas o avanço foi contido e morta a maior parte dos atacantes.

A chuva engrossou. À medida que a artilharia e os morteiros continham as


repetidas investidas nipônicas, a Divisão começou a reforçar as linhas de Puller
com elementos do 3.º Batalhão do 164.º de Infantaria. Eram bem precisos. Os
soldados, conduzidos em pequenos grupos para o seu primeiro recontro com o
inimigo, comportaram-se de modo magnífico. Em esquadras e pelotões,
colmataram brechas, confinaram penetrações e, lado a lado com os fuzileiros de
Puller, repeliram todos os ataques, menos um.

Este ataque foi, a bem dizer, um esforço individual, efetuado pelo comandante
do 29.º de Infantaria nipônico. Ishimiya, acompanhado apenas por nove oficiais
e soldados e com a bandeira do seu regimento dobrada sob o dólmã, conseguiu
infiltrar-se profundamente na posição de Puller, onde permaneceu 48 horas, com
o seu grupo cada vez mais reduzido. Antes de amanhecer, Hyakutake recebeu
uma mensagem a anunciar que o aeródromo estava nas mãos dos japoneses.

Sem esperar pela confirmação, Hyakutake mandou a notícia para o ar. Esta falsa
notícia teria sido provocada pela proeza do temerário coronel Ishimiya? Nunca
se conseguiu averiguar. De qualquer modo, a investida do coronel fortaleceu a
determinação de Maruyama, que decidiu reagrupar e reatar o ataque. O
comandante de uma divisão orgulhosa não podia «ignorar que o comandante do
29.º de Infantaria levara uma bandeira do Sol Nascente [...] para o interior das
linhas inimigas».
O 29.º de Infantaria fora terrivelmente castigado, deixara quase mil cadáveres
defronte do arame farpado e em redor dos abrigos e posições dos americanos. No
domingo, à medida que o Sol subia, os cadáveres começaram a decompor-se.
Tornou-se, então, evidente, que o ataque do sul era o principal, e de manhã cedo
novas unidades começaram a ocupar posições, a fim de apoiar os fuzileiros de
Puller e os soldados comandados pelo tenente-coronel Robert K. Hall. Várias
baterias de artilharia mudaram, também, de posição, a fim de poderem reforçar o
fogo do batalhão único que apoiava diretamente o setor sul. O sol escaldava e o
repugnante cheiro da morte invadia as vertentes cobertas de erva, onde fuzileiros
e soldados se preparavam para resistir a novo ataque.

Vandegrift calculou que o inimigo teve «pelo menos 2000» mortos, e


acrescentou que os cadáveres, empilhados defronte das suas linhas, constituíam
um «grave problema de remoção». Anunciou que as suas baixas nos últimos dias
tinham sido de 86 mortos e 119 feridos.

13. «ATACAR REPITO ATACAR»

Ao alvorecer do dia que ficaria conhecido por «Domingo dos Abrigos», os


obuses de 6 polegadas de Sumuyoshi recomeçaram a castigar Henderson. No
«Fighter One», onde os aviões tinham anteriormente procurado refúgio, os
pilotos de serviço suaram durante horas, à espera de que a pista empapada
secasse o suficiente para lhes permitir levantar voo. Os aviões de combate a
grande altitude, de Rabaul, ao verificarem que não encontravam oposição,
apressaram-se a comunicar à base que os aviões dos defensores não podiam
levantar voo. Minutos depois, a primeira esquadrilha de Zeros percorria a pista
de Buin, para tirar partido de uma oportunidade havia muito esperada: atacar os
americanos sem receio de serem expulsos do ar pelos Grummans em voo picado.

Enquanto o dia escaldante avançava, os fuzileiros de Puller e os soldados de Hall


cavavam abrigos e estendiam arame farpado, em silêncio. No «Espinhaço em
Forma de Centopeia», Maruyama preparava ordens para um novo ataque
noturno, enquanto no porto de Tulagi os contratorpedeiros de convés corrido, da
Primeira Guerra Mundial, Trever e Zane (primeiros-tenente Dwight M. Agnew e
Peyton L. Wirtz) Concluíam calmamente o desembarque de torpedos, gasolina
especial, óleo e munições para as quatro lanchas-torpedeiras que tinham
rebocado na noite anterior. O «Yippie» 284 e o rebocador Semniole partiram de
Tulagi para Kukum, numa viagem de rotina, com passageiros e carga. Esta
calma desusada não duraria muito.

Às 9.52 h., vigias do Trever assinalaram três velozes contratorpedeiros


japoneses, que passavam por Savo e seguiam na direção do Sealark Channel.
Estes navios transportavam o Destacamento Koli de Hyakutake para o seu
destino, a leste das posições americanas. O vice-almirante Mikawa planejara esta
manobra cuidadosamente e dera o sinal para que fosse posto em prática —
«BANZAI» — na noite anterior, poucos momentos depois de Hyakutake o
informar erradamente de que o aeródromo estava nas mãos dos japoneses.

Agnew, do Trever, não teve tempo para discutir possíveis cursos de ação com o
seu colega, primeiro-tenente Wirtz, do Zane. Só havia uma coisa a fazer: sair do
porto de Tulagi o mais depressa possível. Caso contrário, as peças de cinco
polegadas dos navios japoneses destruiriam os rivais americanos, mais
pequenos.

Às 10.04 h., com o Trever a atingir a velocidade de 26 nós, os dois


contratorpedeiros iam a caminho do Sealark Channel. Por qualquer estranha
razão —talvez porque todos os olhares se viravam, apreensivamente, para o céu
—, os japoneses não deram por eles, durante quase 15 minutos. Mas depois o
comandante do contratorpedeiro-guia viu-os, emitiu sinais de batalha, ordenou
velocidade de flanqueamento e virou para uma rota de colisão. Os três
contratorpedeiros inimigos aproximaram-se depressa e, às 10.33 h., os seus
primeiros tiros perseguiram os fugitivos americanos, cujas peças de 3 polegadas
não serviam de nada, na emergência. Uma das granadas japonesas explodiu no
canhão da popa do Trever, destruiu-o e matou três marinheiros e feriu nove.
«Nesta altura, a fuga parecia impossível.» Mas Agnew virou bruscamente para a
esquerda, de novo bruscamente para a direita, e entrou no Nggela Channel, uma
passagem semeada de rochas de coral. O Trever e o Zane navegavam a 29 nós. O
revestimento da caldeira número 2 do primeiro ardeu. De súbito, porém, três
Wildcats que tinham conseguido levantar voo do «Fighter One», surgiram no céu
e afugentaram os japoneses para oeste.

Perseguidos pelos caças e apanhados numa tempestade de balas incendiárias e


perfurantes, os contratorpedeiros chocaram, praticamente, com o rebocador
Seminole e o «Yippie» 284. Estes inocentes acabavam de chegar ao largo de
Kukum quando avistaram os japoneses. Viraram ambos e retrocederam na
direção de Tulagi. Os velozes contratorpedeiros nipônicos dispararam tudo
quanto tinham, o «Yippie» afundou-se em menos de dois minutos e o Seminole,
carregado de gasolina de aviação, incendiou-se num ápice, da proa à popa. As
peças de 5 polegadas do coronel Pepper, instaladas perto de Point, intervieram e
acertaram num dos intrusos, ao mesmo tempo que levantava voo uma
esquadrilha mista de Wildcats e SBD, com a missão de bombardear e metralhar
os barcos japoneses. Bombardeiros de mergulho acertaram duas vezes em cheio,
e o inimigo fugiu na direção de Savo, com as cobertas ensanguentadas.

O cruzador ligeiro Yura e cinco contratorpedeiros deviam proporcionar fogo de


apoio ao desembarque, agora malogrado, do Destacamento Koli. Antes de
chegarem a Savo, estes cinco navios viraram para nordeste, a fim de seguirem a
costa norte da ilha Florida. Ultrapassaram a ponta oriental da ilha, a grande
velocidade, rumo ao estreito Indispensable, mas ao longo da Florida um avião de
reconhecimento, desarmado, viu-os, comunicara imediatamente o achado e
regressara à base. As Operações escalaram o grupo para ser atacado assim que os
SBD atestados pudessem levantar voo.

Os pilotos de Geiger atacaram o Yura às 12.55 h. O primeiro-tenente Eldridge,


que comandava a primeira esquadrilha, picou no meio de uma chuva de logo
antiaéreo e largou uma bomba de 500 libras no castelo da proa do cruzador. A
bomba perfurou a coberta e arrancou um bom bocado da proa. O Yura virou,
com muita dificuldade e rumou para o largo, a norte de Santa Isabel. De tarde,
foi atacado por três esquadrilhas, a última das quais — novamente comandada
por Eldridge — o deixou adernado e a arder.O contratorpedeiro Akizuke também
ficou danificado. Ao entardecer, B-17 de Espírito e outra esquadrilha de SBD de
Henderson atingiram outra vez o Yura, transformando-o num destroço que o
comandante teve de abandonar. O contratorpedeiro Yudachi torpedeou-o e
meteu-o no fundo.

O submarino Amberjack assistiu ao espetáculo, pelo periscópio. A presença


desta unidade dá uma idéia da gravidade da situação, no capítulo de combustível.
Em Espírito Santo tinham-no adaptado apressadamente, para transportar 9000
galões de gasolina de aviação e, no compartimento dos torpedos da proa, 100
bombas de cem libras. Atestado com tão preciosa carga, o Amberjack aguardou
pacientemente que as coisas acalmassem, oculto abaixo da superfície, no Scalark
Channel. Esperou 24 horas.

Se nas águas em redor de Guadalcanal reinava a perturbação, no ar também não


havia paz. Ao princípio da tarde, chegaram 16 Bettys e 27 Zeros. Destes, foram
abatidos 17, dos quais 4 pelo major Foss, que já na véspera abatera outros tantos.
Dois pilotos de Grummans tiveram de saltar de paraquedas e foram recolhidos,
da água; 4 Wildcats, de regresso da missão, aterraram em condições precárias, e
6 ficaram empanados, ao tentarem levantar voo da pista ainda traiçoeira. 4
Bettys caíram, em chamas, no Sealark Channel e outro despenhou-se a
quilômetro e meio de Henderson. Uma hora depois, 9 Aichis, com escolta,
desperdiçaram as suas bombas no estaleiro de sucata de Geiger. Depois de toda
esta atividade, o estado de alarme, em vigor desde manhã cedo, terminou,
finalmente, e todos quantos puderam apressaram-se a ir ver o Betty derrubado.
Ao entardecer de domingo tinham-no «depenado» por completo.

Em Rabaul, compreensivelmente preocupado com os acontecimentos do dia, e


«em virtude das circunstâncias», o vice-almirante Mikawa decidiu retirar as suas
forças para águas mais seguras, «até a reconquista do aeródromo de Guadalcanal
ser definitivamente comunicada».

Os ataques e os combates aéreos do «Domingo dos Abrigos» favoreceram os


desígnios de Maruyama. Deixado em paz, passou o dia a reorganizar as suas
duas alas para um ataque noturno final e decisivo. O combate começou depois de
escurecer e foi apenas mais uma matança descomedida. O major-general Nasu
foi morto ao comandar uma investida; o coronel Hiroyasu tombou, em combate,
e o mesmo aconteceu a quatro outros comandantes de batalhão. Metade dos
oficiais da Divisão Sendai foram mortos ou gravemente feridos neste holocausto.

«Ao comandante da Divisão não restava uma única reserva. Não havia
alimentos, nem se esperava que chegassem [... ] Ainda que todos morressem a
combater, não seria possível desmantelar as posições inimigos. Perdera-se toda a
esperança.»

Maruyama ordenou a Shoji que abrisse caminho pura leste, para Taivu, enquanto
ele conduzia os restos da sua destroçada força pela trilha a que com tanto
otimismo dera o seu nome, em 15 de Outubro, e informava Hyakutake da sua
intenção de constituir uma base forte no Lunga superior, a fim de se preparar
para novas ofensivas.

Que fizera o coronel Oka durante o ataque de Maruyama de 24 de Outubro, com


o qual estava planeado que os seus movimentos se coordenariam? Ao dirigir-se
para o ponto donde deveria desencadear a ofensiva, Oka deparou com terríveis
condições de terreno. Não procedera a nenhum reconhecimento, embora não lhe
tivesse faltado oportunidade para isso, e os seus homens tiveram de abrir
caminho, palmo a palmo. Em dois dias percorreram menos de três quilômetros.
Por isso, só desencadeou o seu ataque na manhã de 26 de Outubro, altura em que
a sorte de Maruyama já se cumprira. Oka também foi repelido, com pesadas
baixas. Após uma batalha breve e violenta, foi expulso do ponto de apoio que
conquistara na posição de Hanneken por um grupo apressadamente reunido de
cozinheiros, músicos e estafetas. Em poucos minutos, a batalha atingiu o apogeu
e começou a declinar, mas tanto bastou para morrerem 25 fuzileiros e ficarem
feridos 14. Não tardou a correr o boato de que um dos cozinheiros abatera um
oficial japonês com uma panqueca...

A ofensiva terrestre nipônica dos fins de Outubro não se malogrou apenas por a
artilharia americana ser flexível e de fogo certeiro e os fuzileiros e os soldados
combaterem com perícia e determinação. Estes fatores foram, sem dúvida,
fundamentais, mas o conceito japonês das operações também contribuiu para o
resultado obtido. Mais uma vez, o plano táctico se desmoronou sob o peso das
complexidades inerentes, das más comunicações, da incapacidade do fogo de
apoio e da falta de coordenação no espaço e no tempo.

A derrota anteriormente sofrida por Kawaguchi devia ter servido de lição ao


tenente-general Hyakutake e tê-lo levado a traçar um plano relativamente
simples, que não só excluísse o movimento de grandes corpos de forças através
da selva, em distâncias grandes, mas que permitisse, também, à artilharia, aos
morteiros e às peças antitanque, de trajetória horizontal, proteger a infantaria. A
impetuosidade, a arrogância e a falta de flexibilidade tática do inimigo foram
vantagens para Vandegrift, que pela terceira vez as aproveitava.

As posições que os japoneses se esforçaram em vão por «desmantelar» foram


defendidas —e valentemente— pelo batalhão de Puller, com o auxílio de
esquadras e pelotões de infantaria. Os soldados, que tiveram de avançar às
escuras e debaixo de chuva, ocuparam as suas posições nas linhas num momento
crítico e, juntamente com os fuzileiros, salvaram o campo Henderson, à
semelhança do que sucedera seis semanas atrás no «Espinhaço de Edson».

Nesta sua primeira batalha, o 164.º de Infantaria conquistou todo o respeito dos
fuzileiros. Antes da meia-noite de 24 de Outubro, «cãozinho» era um termo
depreciativo, que os fuzileiros empregavam ao referir-se aos membros do
Exército dos Estados Unidos; depois do combate com a Divisão Sendai, os
homens do coronel Bryant Moore passaram a ser respeitosamente tratados por
«soldados». Tinham conquistado o título. Poucos dias depois do «Domingo dos
Abrigos», Clifton Bledsoe Cates, coronel comandante do 1.º de Fuzileiros,
escreveu a Moore:

« Os oficiais e os soldados do 1.º de Fuzileiros felicitam-no pelo excelente


trabalho feito [...] queira ter a bondade de tornar as nossas sinceras felicitações
extensivas a todos os interessados. Sentimo-nos honrados por combater com
uma unidade como a sua.»

As baixas americanas nas ações terrestres do fim de Outubro foram pequenas,


comparadas com as sofridas pelos japoneses: menos de 200 soldados e fuzileiros
mortos e outros 200 feridos.

Nunca se saberá quantos membros de Divisão Sendai morreram, na retirada para


o Lunga superior, mas foram centenas. Nos últimos dias de Outubro, a
desbaratada coluna de Maruyama sofreu os mesmos tormentos da de
Kawaguchi, cerca de seis semanas antes. Mais uma vez, os soldados japoneses
comeram cascas de árvores e raízes, dessedentaram-se em charcos estagnados e
rilharam as correias do seu equipamento. Mas resistiriam —e muitos resistiram
— para combater de novo.

Embora o apogeu da ofensiva de Outubro tivesse por cenário a área a sul do


campo Henderson, em serranias gretadas pelo calor e na selva que as circundava,
o último ato deste drama desenrolou-se no mar alto e no céu, a mais de 480
quilômetros a leste de Guadalcanal. Yamamoto mandara para aí a sua «Força de
Apoio de Guadalcanal», composta pelas 2.ª e 3.ª Esquadras. A missão confiada a
esta força era a de interceptar comboios de reforços ou —e isso parecia mais
provável a Yamamoto— liquidar os americanos que tentavam fugir às «baionetas
justiceiras» de um Exército Imperial vitorioso. O vice-almirante Nagumo era
responsável pelo Comando Táctico.
TERCEIRA ESQUADRA

(Vice-almirante Chuichi Nagumo)

Porta-aviões: Shokaku e Zuikaku

Porta-aviões ligeiro: Zuiho

Couraçados: Hiei e Kiriahima

Cruzadores pesados: Suzuya, Kumano, Tone e Chikuma

Cruzador ligeiro: Nagara

Contratorpedeiros: 12

SEGUNDA ESQUADRA

(Vice-almirante Nobutake Kondo)

Porta-aviões: Junyo

Couraçados: Kongo e Haruna

Cruzadores pesados: Atago, Takao, Chokai, Maya, Myako e Haguro

Cruzador ligeiro: Jintsu

Contratorpedeiros: 12

A fim de fazer frente às poderosas esquadras de Yamamoto, Halsey tinha a


Unidade Naval 61 (contra-almirante Thomas C. Kinkaid), que, segundo os seus
cálculos, devia chegar à sua área em 24 de Outubro, vinda de Pearl Harbor.
Ordenou a Kinkaid que se encontrasse, nessa data, com a Unidade Naval 17, do
contra-almirante George D. Murray, ao norte das Novas Hébridas, e assumisse o
comando táctico. Ao mesmo tempo, ordenou ao contra-almirante Willis
Augustus Lee que manobrasse separadamente a sua Unidade Naval 64
(couraçado Washington, três cruzadores e seis contratorpedeiros).
UNIDADE NAVAL 61

(Contra-almirante Thomas C. Kinkaid, OCT)

Porta-aviões: Enterprise

Couraçado: South Dakota

Cruzadores: Portland e San Juan

Contratorpedeiros: 8

UNIDADE NAVAL 17

(Contra-almirante George D. Murray)

Porta-aviões: Hornet

Cruzadores: Northampton, Pensacola, San Diego e Juneau

Contratorpedeiros: 6

Nagumo comandava uma força que, convenientemente utilizada, permitiria


conquistar a vitória decisiva que Yamamoto procurava, em vão, desde 7 de
Dezembro de 1941. Os japoneses lançavam na batalha 4 porta-aviões com 212
aparelhos contra 2 com 171; 4 encouraçados contra 1; 12 cruzadores contra 6, e
24 contratorpedeiros contra 14. Nagumo tinha, pois, motivos sobejos para
respirar confiança. Em 25 de Outubro, reabasteceu-se de combustível 450 milhas
a norte das ilhas de Santa Cruz e rumou para sul. As tripulações das cobertas de
voo prepararam os seus aviões de combate para abaterem quaisquer aparelhos
americanos de reconhecimento que avistassem.

Entretanto, a unidade naval muito mais pequena e mais fraca de Kinkaid


navegava para norte. Como já acontecera outras vezes, cada um dos almirantes
estava convencido de que porta-aviões inimigos se encontravam, ou se
encontrariam em breve, a distância de fogo dos seus navios. Todos enfrentavam
o mesmo problema: localizar o inimigo e atingir-lhe as cobertas de voo, se
possível antes de ele ter tempo de mandar aviões para o ar. Onze minutos depois
da meia-noite de 5 de Outubro, um Catalina de reconhecimento das forças
aéreas, com base em terra, do contra-almirante Aubrey Fitch, esclareceu os
americanos e deu o sinal para o primeiro assalto da «Batalha das ilhas de Santa
Cruz».

O piloto que localizou a unidade naval inimiga iluminou-a com bombas


luminosas, anunciou a sua força e localização aproximada e lançou uma bomba
mais ou menos na direção do Zuikaku. Os japoneses inverteram o rumo e
navegaram para norte. O piloto do PBY seguiu a esquadra o suficiente para
transmitir esta manobra e desaparecer na noite.

Poucas horas depois, Halsey enviou aos comandantes seus subordinados uma
mensagem de três palavras:

«ATACAR REPITO ATACAR»

Esta ordem imperiosa gerou ação rápida. Antes de amanhecer, foram


catapultados das cobertas de voo americanas aviões bombardeiros e torpedeiros,
com a missão de procurar e atacar os porta-aviões de Nagumo. A sua primeira
vítima foi Zuiho: um piloto americano, com boa pontaria, acertou-lhe uma vez
na coberta de voo. Minutos depois, o barco inimigo estava em chamas e o seu
comandante declarava-o «impotente para receber ou lançar aviões».

Os grandes porta-aviões começaram, então, a alvejar-se mutuamente. Às 7.27 h.,


SBD americanos lançaram sobre o Shokaku uma enfiada de bombas de 1000
libras, seis das quais perfuraram a coberta de voo, explodiram nos hangares,
danificaram os elevadores, rebentaram condutas de combustível, arrancaram
cabos e mataram e feriram cerca de cem homens. Vinte bombardeiros de
mergulho concentraram as suas atenções no Chikuma. Depois de atingido cinco
vezes em cheio, o cruzador perdeu velocidade, virou para norte e afastou-se
devagar, todo adernado. Kinkaid assinalou dois porta-aviões inimigos e um
cruzador pesado postos fora de combate.

Duas horas e meia depois, Nagumo teve o prazer de assinalar um porta-aviões


americano fora de combate: o Hornet. Entre as 10.10 h. e as 10.20 h., o Hornet
foi atingido por duas bombas de 500 libras, na coberta de voo; duas outras
bombas, que falharam por pouco, puseram-lhe em perigo as chapas do casco; um
avião-torpedeiro desarmado caiu-lhe no convés e explodiu; dois torpedos
perfuraram-lhe o casco, e um bombardeiro de mergulho —quiçá o primeiro
kamikaze de que há memória— esmagou-se na sua superestrutura. Em menos de
dez minutos, pois, o Hornet foi atingido por duas bombas, dois torpedos e dois
aviões.

O porta-aviões ficou imobilizado, mas os seus oficiais e tripulantes esforçaram-


se corajosamente para o salvar. Enquanto equipas de controle de avarias e de
bombeiros trabalhavam para repor os motores a funcionar e confinar os
incêndios, médicos e enfermeiros recolhiam os queimados, os feridos e os
moribundos e iniciavam a sua batalha para salvar membros e vidas. O cruzador
Northampton aproximou-se, lançou cabos e rebocou o porta-aviões. Entretanto,
o submarino nipônico I-21 afundou o contratorpedeiro Porter. Quinze
marinheiros ficaram presos na casa das caldeiras e foram para o fundo com o seu
navio.

Nagumo não tinha a certeza se não haveria um segundo porta-aviões americano


na área. Mas, passados poucos minutos, a intercepção de transmissões orais
indiscretas tirou-lhe as dúvidas e, às 10.30 h., o almirante japonês mandou
catapultar do Zuikaku uma esquadrilha de reconhecimento e ataque. Os aviões
localizaram o Enterprise 40 minutos depois, e durante hora e meia o «Grande E»
repeliu diversos ataques consecutivos. A primeira vaga, constituída por 24
bombardeiros de mergulho, surgiu de surpresa, do meio das nuvens O porta-
aviões foi atingido duas vezes e escapou por um triz de uma terceira bomba. Por
sorte, as bombas não lhe afetaram nem os motores nem a navegação. A seguir
chegaram 17 aviões torpedeiros, 9 dos quais se aproximaram — 5 de estibordo e
4 de bombordo. O capitão Osborne B. Hardison ordenou ação evasiva, a grande
velocidade, e os seus homens da artilharia antiaérea fizeram o resto: os 9
aparelhos japoneses desapareceram do ar.

Até esse momento, Kinkaid não recebera «correspondência» do porta-aviões


Junyo mas não tardou a recebê-la, por via aérea. Poucos minutos antes do meio-
dia, grupos de bombardeiros de mergulho desceram a pique contra o couraçado
South Dakota e o contratorpedeiro Hughes, e um avião torpedeiro despenhou-se
em cima do contratorpedeiro Smith. Dez dos atacantes foram parar à água,
derrubados pela artilharia antiaérea dos barcos.

Os americanos estavam resolvidos a dar o dia por findo, mas Nagumo tinha
opinião diferente e ordenou outra série de ataques. Entre as 12.20 h. e as 12.45
h., 20 bombardeiros de mergulho atacaram o porta-aviões, em voo plano, e 4
aviões alvejaram o cruzador San Juan, que foi atingido uma vez em cheio e
abalado por cinco bombas que falharam por pouco. Às 16.20 h., os aviões de
Nagumo atacaram de novo o Hornet. Todos os ataques foram desencadeados
com determinação.

Enquanto o Northampton lançava cabos de reboque, o capitão Charles P. Mason


mandava abandonar o Hornet, ordem que os tripulantes cumpriram com
relutância. O porta-aviões estava moribundo, mas resistia, agarrava-se
teimosamente à vida, como acontecera com o Wasp. Como naquela área
abundavam os submarinos inimigos, Kinkaid decidiu, sensatamente, que o
Enterprise, o único porta-aviões americano que restava no Pacífico Sul, não
deveria ser posto em perigo.

Ordenou aos contratorpedeiros Mustin e Anderson que afundassem o


abandonado Hornet. Assim como resistia às bombas japonesas, assim resistiu o
valente porta-aviões — o sétimo da Marinha com o seu nome — às granadas e
torpedos que lhe perfuraram os flancos esfacelados. Por fim, Kinkaid ordenou ao
Mustin e ao Anderson que retirassem. De um número de baixas superior a 200,
salvaram-se 108 feridos. O Hornet foi encontrado na manhã seguinte, muito
cedo, por contratorpedeiros japoneses, e morreu, finalmente, às suas mãos.

Entretanto, o Enterprise recuperara os seus aviões e a maior parte dos do Hornet.


Mas, com o convés de voo atravancado, não pôde receber os últimos 13
bombardeiros de mergulho e mandou-os seguir para Espírito Santo, onde
aterraram em segurança — com gasolina suficiente para mais cinco minutos de
voo.

Do ponto de vista táctico, a Batalha de Santa Cruz foi um empate. A Esquadra


Combinada regressou a Truk, e as unidades navais americanas às suas bases nas
Novas Hébridas e em Nouméa. No entanto, a batalha teve influência na luta pela
posse do campo Henderson, pois contribuiu muito para o terrível desgaste da
arma aeronaval japonesa. Depois de Santa Cruz, 69 pilotos experimentados não
regressaram às suas cobertas de voo, e no período de dez dias que culminou com
esta batalha os japoneses perderam 200 aparelhos. Ao despenharem-se no mar
ou na selva, este aviões levavam consigo pilotos, bombardeiros, artilheiros,
navegadores e telegrafistas. Desde a última emana de Agosto, a Força Aeronaval
Nipônica perdera quase 500 aparelhos em combate no Pacífico Sul e, corno
resultado direto da inexperiência dos pilotos que substituíram os abatidos,
sofrera também gravíssimas perdas operacionais.

Mas o público nipônico não fazia ideia nenhuma de tal catado de coisas. A
Marinha, com a reserva do costume, também mantinha o Exército na ignorância
do que, ao certo, se passava. Noticiários radiodifundidos em chinês, japonês,
francês e inglês anunciavam que, em Santa Cruz, a «invencível Marinha» mais
uma vez «conseguira brilhantes resultados», que constituíam «novas proezas nos
anais do combate naval». Num sumário apresentado em 28 de Outubro, o porta-
voz da Marinha anunciou que, desde o começo das hostilidades, tinham sido
afundados 609 barcos de guerra e transportes inimigos, danificados 131 e
apreendidos 9. Indicou, também, o número de aviões aliados abatidos ou
destruídos, até àquela data: 3702.

Mas o Quartel-General imperial não se deixou convencer por completo pelos


seus próprios serviços informativos, e o desgaste contínuo em terra, no mar e no
ar levou-o a proceder a uma nova avaliação da situação. O otimismo
característico dos anteriores cálculos de Tóquio não se dissipara por completo, e
nem mesmo depois dos acontecimentos da última semana de Outubro o Exército
e a Marinha foram capazes de encarar objetivamente os desagradáveis fatos. Não
se consideravam assuntos de conversa próprios para as reuniões do Estado-
Maior a série de derrotas sofridas pelo invencível exército do imperador; a
impossibilidade de as suas «águias marinhas» demonstrarem superioridade aérea
em Guadalcanal, e o fato de a Marinha não poder apoiar eficazmente as
operações do Exército.

Na realidade, o Quartel-General imperial foi novamente mal informado pelos


relatórios dos comandantes das operações navais. Assim como depois de
Midway tinham guardado segredo da gravidade das suas perdas e exagerado as
dos americanos, assim, depois de Santa Cruz, induziram em erro os seus
superiores de Tóquio. Santa Cruz, afirmaram, custara aos americanos dois
couraçados e três porta-aviões afundados, além de outras unidades gravemente
atingidas.

O Exército achou, por isso, possível continuar a ofensiva mediante uma


«concentração sistemática de forças de combate», cujos ataques seriam apoiados
por canhões navais, bombardeamento aéreo e fogo de artilharia. A tática de
«fazer ataques de surpresa, de perto», deveria ser substituída por um esforço
direto maciço. De acordo com esta decisão, o Quartel-General imperial destacou
a 21.ª Brigada Mista Independente (menos um batalhão, que guarnecia a ilha
Wake) para o O/B do 17.º Exército e ordenou à 51.ª Divisão que seguisse para
Rabaul. O coronel Takushiro Hattori, chefe da seção de operações do Quartel-
General, foi nomeado oficial de ligação do estado-maior de Hyakutake. Os
novos planos previam a concentração de todas as forças no Lunga superior e a
oeste do Matanikau. O coronel Shoji, que se encontrava perto de Koli Point com
mais de 2000 sobreviventes da ala direita de Maruyama, recebeu ordem para
começar a marchar em redor do perímetro em 3 de Novembro.

Entretanto, porém, um certo número de oficiais japoneses que se encontravam na


frente de batalha começavam a sentir dúvidas crescentes quanto ao êxito de
qualquer plano que não proporcionasse a neutralização do poderio aéreo
americano na área-alvo. Estavam convencidos de que só se conseguiria quebrar a
resistência americana mediante bombardeamentos com forte proteção de caças, e
transmitiram essa opinião ao Quartel-General imperial. O almirante Mikawa
sugeriu, sem êxito que se suspendessem as tentativas de reforço, até ser possível
reunir em Rabaul uma grande força de bombardeiros e enviar mais Zeros para
Buin. «Com mágoa nossa, porém, o Alto Comando insistiu, obstinadamente, em
reforçar Guadalcanal...»

A Marinha dera a Halsey tudo quanto pudera, mas a situação, no capítulo de


aviões de combate, continuava precária, em Guadalcanal. Marshall e Arnold
relutavam em ceder mais aparelhos, pois estavam ambos empenhados em formar
reservas no Reino Unido (BOLERO) e para a iminente ARCHOTE. As decisões
de transferir forças americanas para as Ilhas Britânicas e de invadir a África do
Norte tinham sido tomadas pelo presidente dos E. U. e pelo primeiro-ministro
inglês, de acordo com a estratégia que impunha a liquidação do Eixo europeu
antes de desencadear uma ofensiva em grande escala no Pacífico. Marshall e
Arnold encontravam-se, pois, numa situação muito desagradável. De um lado, o
insistente almirante King; do outro, Roosevelt e Churchill, inteiramente apoiados
pelos chefes militares britânicos.

No entanto, durante as longas semanas de Outubro, Roosevelt estivera atento ao


que se passava nas ilhas Salomão, com crescente ansiedade. Por fim, preocupado
com a relutância dos Chefes Conjuntos em conceder recursos que permitissem
manter aquela importante posição, dirigiu-lhes um memorando, em 24 de
Outubro:

«Preocupa-me o sudoeste do Pacífico e desejo ter a certeza de que seguem para


esse setor todas as armas possíveis, a fim de se defender Guadalcanal, e que,
defendida a ilha nesta crise, para lá sigam munições, aviões e tripulações, para
que se tire proveito do nosso êxito.»

O Quartel-General imperial compreendia, como Washington, que o valor de


Guadalcanal transcendia o de uma posição estratégica, no sentido em que o
termo é empregado na fraseologia militar. Em ambas as capitais, a ilha tornara-se
um símbolo e a sua posse uma questão de prestígio nacional.

Na terça-feira, 27 de Outubro de 1942, o New York Times dizia que nenhuma


autoridade de Washington «arriscaria uma opinião quanto ao resultado do
combate que se trava», mas que todos admitiam que deveria ser travado «até um
final decisivo» e determinaria, provavelmente, o curso «da guerra no sudoeste do
Pacífico, no ano próximo». Knox recusou-se a fazer comentários, e King, que
detestava os jornalistas com um fervor igual ao demonstrado pelo general da
Guerra Civil americana William Tecumseh Sherman, manteve o seu habitual
silêncio gelado. Em Pearl Harbor, Nimitz limitou-se a observar que a crise ainda
não se verificara.

Reinava uma atitude menos pessimista em Guadalcanal, onde as Operações


traçavam plenos para repelir os japoneses para oeste do rio Poha e estabelecer
uma posição de combate avançada em Kokumbona.

14. «QUANTO TEMPO ELES PODEM


AGUENTAR?»

Já antes das instruções de Roosevelt, de 24 de Outubro, aos Chefes Conjuntos, se


tinham tomado algumas providências para fortalecer as posições americanas no
Pacífico. Em 19 de Outubro, o general Marshall avisou a 25.ª Divisão (major-
general J. Lawton Collins), em serviço de guarnição no Havaí, para seguir,
conforme as ordens recebidas, quer para o setor de Halsey quer para o de
MacArthur. No dia seguinte, Halsey cancelava a operação Ndeni e ordenava ao
147.º de Infantaria (anteriormente destacado da 37.ª Divisão e escalado como
força ocupante) que se preparasse para marchar.

Um escalão avançado da 43.ª Divisão do Exército, também a caminho, sofreu


um atraso. Em 26 de Outubro, o President Coolidge, um paquete transpacífico
transformado em transporte de tropas e que levava um dos regimentos daquela
divisão para Espírito Santo, chocou com duas minas americanas e afundou-se, ao
entrar no porto. Perderam-se poucas vidas, mas todo o equipamento militar se
afundou com o navio.

Este percalço não foi fatal, pois iam outras tropas a caminho da ilha. Entre elas,
contavam-se o 8.º de Fuzileiros reforçado (coronel Richard H. Jeschke), vindo
de Samoa; unidades de artilharia; Seabees, e o 2.º Batalhão Raider de Fuzileiros
(tenente-coronel Evans F. Carlson). Não tardariam a chegar, também, aviões e
pilotos, que naquela conjuntura eram ainda mais precisos do que novas tropas de
terra. Em 26 de Outubro, os efetivos de Geiger limitavam-se a 29 aparelhos de
combate: doze Wildcats, onze SBD, três P-400 e três P-39, quase todos a
precisar de reparações.

Enquanto a desbaratada coluna de Maruyama se arrastava, através da selva


implacável, para sul do monte Austen, e o coronel Shoji avançava penosamente
para leste, na direção de Koli Point, Vandegrift elaborava planos para mais um
ataque do outro lado do Matanikau. O 2.º de Fuzileiros reforçado (menos um
batalhão de infantaria) do coronel John M. Arthur partiu de Tulagi, a fim de
participar nesta arrancada para o Poha, que ficava cerca de 2,5 quilômetros a
oeste de Kokumbona. O 5.º de Fuzileiros e o 3.º Batalhão Reforçado do 7.º — o
«Whaling Group» — foram postos de prevenção. O ataque, previsto para o
nascer do dia 1 de Novembro, seria apoiado por concentrações de artilharia,
bombardeiros de mergulho e artilharia naval.

Desta vez, não se tentaria forçar uma travessia sangrenta do Matanikau pela
faixa de areia. Em vez disso, o 5.º de Fuzileiros atravessaria a montante, por
pontes de infantaria, construídas pelos sapadores com pranchas e tambores de
combustível vazios. O «Whaling Group» passaria a vau, nos pontos de
confluência, atacaria para oeste e protegeria o flanco esquerdo do 5.º de
Fuzileiros. O coronel Edson, que já passara muito tempo naquelas desagradáveis
vizinhanças, comandaria a operação.
Um plano mais imaginativo exigiria que o 2.º de Fuzileiros, apoiado pelo
batalhão disponível do 164.º e com o «Whaling Group» a proteger o flanco
interno de Arthur, avançasse ao longo da estrada costeira, enquanto o 5.º de
Edson, já experimentado em combate, seguiria por mar, a fim de envolver
decisivamente as posições vitais nipônicas, entre Kokumbona e Tassafaronga.
Este plano, ou outro semelhante, chegou, até, a ser encarado, mas vários fatores
desaconselharam-no.

Primeiro, era evidente a Vandegrift e aos homens em cuja opinião depositava


grande confiança —Thomas, Twining, Cates, Del Valle e Edson — a vantagem
de tirar, sem demora, todo o partido possível da derrota de Maruyama. Uma
operação como a descrita exigiria pré-reconhecimento minucioso da zona
costeira, até Doma Cove. Em fins de Setembro, dada a sua ignorância acerca do
inimigo e do terreno, Vandegrift estivera quase a lançar o batalhão de Puller aos
leões, numa manobra semelhante. Não repetiria esse erro.

Segundo, este ataque seria o baptismo de combate do comando de Arthur, e é


difícil avaliar a verdadeira força de uma unidade —de qualquer unidade—
enquanto ela não é posta à prova. O comandante será excessivamente cauteloso,
hesitante, ir resoluto? Ou será, pelo contrário, impulsivo, temerário, descuidado
quanto aos seus flancos? Estas interrogações, e outras semelhantes,
aconselhavam que o 2.º de Fuzileiros combatesse pela primeira vez sob a égide
do 5.º.

Finalmente, uma operação de tal gênero poderia receber o necessário apoio do


mar e do ar? Era aí que residia o verdadeiro ponto crucial da operação. Ora os
registos navais, até àquela data, e um inventário dos aviões disponíveis levaram
a concluir que não seria possível. As circunstâncias aliavam-se para impor um
ataque direto.

Por isso, à meia-noite de sábado, 31 de Outubro, os sapadores começaram a


colocar três pontes através do Matanikau. O trabalho ficou concluído ao nascer
do dia e, cinco minutos depois, a artilharia de Del Valle disparou a primeira
concentração planejada, no campo de ação do 5.º de Fuzileiros. SBD e P-39
voavam ao longo da estrada costeira; dezanove B-17 de Espírito lançaram 350
bombas de 100 libras em Kokumbona, e o San Francisco, o Helen e o
contratorpedeiro Sterrett, que durante a noite tinham impedido a passagem,
aproximaram-se de Point Cruz, a fim de dispararem de curta distância.
A travessia efetuou-se, como estava previsto, e o ataque foi desencadeado às sete
horas. Mas os japoneses estavam bem abrigados. Ao longo da costa, o 1.º
Batalhão, do 5.º, encontrou obstinada resistência. A sua esquerda, o 2.º Batalhão
(major Lewis W. Walt) avançava e, mais para o interior, o «Whaling Group»
apenas encontrava grupos isolados de japoneses. Depois de o 5.º de Fuzileiros
atravessar, os sapadores montaram uma ponte para veículos de 10 toneladas.
Antes do escurecer de 1 de Novembro, Edson parou a pouca distância de Point
Cruz e organizou as suas tropas para a passagem da noite. As unidades
ocupavam boas posições, para o ataque que planejava desencadear na manhã
seguinte.

Ao amanhecer, Edson ordenou a Walt, um dos mais agressivos comandantes de


batalhão da campanha de Guadalcanal, que virasse o seu batalhão 90º para a
direita e atacasse na direção do mar. A meio da manhã, as companhias de assalto
de Walt chegaram à costa, a oeste de Point Cruz. Os japoneses — calcula-se que
um batalhão — estavam encurralados. Edson mandou, então, avançar o 2.º de
Fuzileiros, de Arthur. Em coluna de batalhão, ultrapassaram o 5.º de Fuzileiros e
reataram o avanço para oeste. Edson utilizou tudo quanto tinha, mas precisava de
mais, ainda, para obter depressa os resultados desejados. A Divisão enviou lhe o
1.º Batalhão do 164.º (tenente-coronel Frank C. Richards), e Edson fez dele a sua
reserva.

Na terça-feira, 3 de Novembro, a bolsa da Point Cruz foi dominada pelo 5.º de


Fuzileiros: contaram-se mais de 300 japoneses mortos e foram apreendidos 12
canhões antitanque, um obus e 34 metralhadoras. Por ordem da Divisão, Edson
transmitiu o comando a Arthur e o 5.º de Fuzileiros regressou à base.

Os japoneses esforçaram-se desesperadamente para deter o avanço para oeste.


Maruyama estava «longe, na nascente do rio Lunga», e não podiam esperar
qualquer auxílio desse lado. Hyakutake tentou colmatar as brechas com pessoal
do quartel-general, doentes, feridos, sapadores e tropas auxiliares. Todos os
indivíduos aptos da retaguarda foram apressadamente mandados para a frente, a
fim de participarem no combate.

Ao anoitecer do terceiro dia de ataque, os americanos tinham forçado o inimigo


a retroceder para uma posição cerca de mil e seiscentos metros a oeste de Point
Cruz, e Hyakutake pediu reforços imediatos. Nas Shortlands, o major-general
Takeo Ito, comandante do Grupo de Infantaria da 38.ª Divisão, previra este
pedido e começou a embarcar o seu quartel-general e o 228.º de Infantaria
(menos o 3.º Batalhão) minutos depois de receber a mensagem. Nessa noite, 17
contratorpedeiros transportaram as suas tropas, em segurança, para Kamimbo e
Tassafaronga. Mais uma vez, Ito não perdeu tempo: assim que desembarcavam,
os homens formavam e marchavam para leste.

Enquanto o ataque prosseguia a oeste do Matanikau, a situação modificava-se


em Tetere, uns 19 quilômetros a leste do aeródromo, onde o coronel Shoji
acabava de chegar com cerca de 2500 oficiais e soldados da sua ala direita, que
tinham sobrevivido aos ataques noturnos de fins de Outubro. Em Tetere, Shoji
encontrou 131 feridos, aos quais, apesar da escassez de pessoal e material
médico, prestou assistência rudimentar. Quando o coronel iniciou a sua marcha
para a costa, informaram-no de que desembarcariam reforços perto de Koli,
cerca da meia-noite de 3 de Novembro. Na noite do dia 2, Shoji mandou
distribuir uma ração dupla de arroz aos seus homens famintos.

No mesmo dia, os serviços de espionagem de Halsey informaram Vandegrift de


que o «Expresso» chegaria na noite seguinte e descarregaria a leste de Koli. A
Divisão mandou retirar das linhas o experimentado, mas exausto, batalhão de
Hanneken e ordenou-lhe que seguisse para leste. Ao fim da tarde de 3 de
Novembro, após uma marcha de 12 horas, Hanneken vadeou o Metapona, cerca
de 5 quilômetros a leste de Koli Point, e preparou-se para receber visitantes
vindos do mar. Menos de quilômetro e meio a leste, em Gavaga Creek, Shoji
preparou-se, também, para dar as boas-vindas às novas tropas e ao arroz e às
balas que lhe traziam. Nenhum dos comandantes sabia da presença do outro.

Cerca da meia-noite, fuzileiros que vigiavam na praia distinguiram os vultos de


cinco navios, que identificaram corretamente como sendo um transporte, um
cruzador e três contratorpedeiros. Os vultos aproximaram-se e começaram a
descarregar, mas em Gavaga e não em Koli. Não havia lua e Hanneken não pôde
intervir. Tampouco pôde informar a Divisão do que se passava, pois os seus
rádios, saturados de água da chuva e dos muitos rios e regatos que o batalhão
vadeara, não alcançavam o quartel-general. No entanto, resolveu atacar de
manhãzinha cedo. Quando as suas companhias de assalto se puseram a caminho,
colidiram com um grupo de japoneses que marchavam na direção de Koli.

Ambos os lados se refizeram da surpresa inicial, mas os japoneses reagiram


primeiro e, numa questão de minutos, alvejaram os fuzileiros com fogo de
obuses ligeiros e morteiros de 90 mm. De súbito, no aceso da luta, Hanneken foi
atacado também pela retaguarda. Decidiu retirar e, nas seis horas seguintes,
executou, com êxito, uma ação de retirada. Ao fim da tarde, o seu batalhão
chegou à margem ocidental do rio Nalimbiu e os seus operadores de rádio
conseguiram, finalmente, comunicar com a Divisão.

Vandegrift ordenou, ato contínuo, as providências necessárias para remediar a


situação. Partiram aviões para bombardear e metralhar a zona costeira a leste do
Nalimbiu, e os cruzadores e contratorpedeiros que, dias antes, tinham
bombardeado Point Cruz zarparam, a velocidade de franqueamento, para leste. A
série de mensagens recebidas e registadas no diário de operações da Divisão,
levam a crer que a aviação não se saiu muito bem, nesse dia:

17.17 — Aviões amigos a bombardear e a metralhar.

17.35 — Os aviões bombardeiam-nos a nós. Detenham-nos.

17.55 — Pede-se que todos os aviões deixem de bombardear até a confusão se


esclarecer.

Enquanto aviões americanos matavam e feriam soldados americanos, o batalhão


de Puller embarcava em barcaças, em Kukum, e o 164.º de Infantaria, de Moore
(menos o batalhão de Richard, a combater no flanco ocidental), punha-se a
caminho, a fim de envolver o inimigo, pelo sul.

Ao mesmo tempo que alguns fuzileiros e soldados procediam a operações de


limpeza a oeste de Point Cruz e outros combatiam ao longo do Nalimbiu, Kelly
Turner dirigia, em Aola Bay, cerca de 50 quilômetros a leste de Koli, uma das
ações mais estúpidas de toda a guerra do Pacífico. Havia dois meses que Turner
ansiava por estabelecer uma posição de retirada, com um campo de aviação, em
Aola. Vandegrift, Geiger, Woods, McCain e Fitch encaravam o projeto com
unânime desaprovação, mas Turner, tão persuasivo quanto obstinado, teve artes
de convencer, primeiro, Ghormley e, depois, Halsey.

Assim, em 4 de Novembro, quando levou o 8.º de Fuzileiros para Lunga, Turner


deixou em Aola, com ordens para construírem uma pista, o 2.º de Raiders, de
Carlson, o 1.º Batalhão do 164.º de Infantaria, e 500 Seabees (urgentemente
necessários para trabalhos no aeródromo e outras construções no perímetro do
Henderson), além de canhões antiaéreos e de defesa costeira dos Fuzileiros e
uma bateria de artilharia da Divisão Americal. Os Seabees atiraram-se ao
trabalho com denodo, mas o terreno pantanoso onde Turner as deixara não
servia, de maneira nenhuma, para uma pista de aviação. Aliás, fora esse o
veredicto dado anteriormente por um grupo de sapadores dos Fuzileiros, que
examinara o local.

Só um mês depois, e após novos protestos e objeções de Vandegrift, Harmon,


Geiger e Fitch, Halsey decidiu cancelar a malograda operação. Entretanto, tropas
que podiam ter sido úteis noutros lados desperdiçaram semanas, à espera de que
as levassem daquele malfadado lugar. Sempre que trocava o sextante pelo
bastão, Turner cometia um erro clamoroso. Aola não fugiu à regra.

Vandegrift, decepcionado com os progressos feitos a leste e exasperado com a


aventura de Turner em Aola, decidiu liquidar, pelo menos, os japoneses do leste.
Em 4 de Novembro, suspendeu temporariamente a operação de Point Cruz e
ordenou a Rupertus que deixasse Tulagi e assumisse o comando em Koli. Depois
de ouvir os relatórios de Hanneken e de estudar as informações fornecidas pelos
batedores nativos, o comandante táctico chegou à conclusão de que nas
imediações existiam mais japoneses do que julgara. Decidiu, por isso, esperar,
perto de Koli, que Moore chegasse, antes de desencadear o seu ataque.

Quando os soldados atravessaram o rio, a cerca de 2700 metros da sua foz, e


avançavam para norte, através da selva, o coronel Shoji recebeu ordem de retirar
para a nascente do Lunga. Retirou na direção de Tetere e deixou uma retaguarda
de cerca de 500 homens, para entreterem os americanos em Gavaga Creek
enquanto ele seguia para sul. As suas baixas no Nalimbiu tinham sido pequenas.
Entretanto (e, como se verificaria, tardiamente), Vandegrift ordenara a Carlson
que saísse de Aola e fosse atacar os japoneses pela retaguarda.

No sábado, 7 de Novembro, os dois batalhões de Moore — depois de


encontrarem apenas um punhado de japoneses e de travarem com eles uma
escaramuça noturna, ruidosa mas incruenta e inconclusiva para ambos os lados
— chegaram ao mar, e a força combinada iniciou um avanço cauteloso na
direção do Metapona. Ao cair da noite, instalaram-se em abrigos, para repelir
qualquer possível desembarque, mas não houve nenhum. No dia seguinte, os
atacantes envolveram a posição de Gavaga e iniciou-se uma série de combates
violentos e a curta distância. Ao mesmo tempo, Rupertus adoeceu, com dengue,
e o brigadeiro-general do Exército Edmund B. Sebree, que acompanhara Moore
como observador, assumiu o comando.

O almirante Halsey passou o domingo em Guadalcanal. Desejava visitar a ilha


desde que se tornara ComSoPac, mas circunstâncias várias tinham-no obrigado
diversas vezes a adiar a visita. Halsey apreciou muito a sua breve estada.
Vandegrift acompanhou-o, de jipe, ao Tenaru, ao Espinhaço, ao Henderson e ao
Matanikau, lugares que tinham significado especial para o general, assim como
para todos os homens sob o seu comando.

De noite, «Washing Machine Charlie» fez a visita do costume, e


contratorpedeiros bombardearam Henderson. Quando Halsey e Vandegrift
correram para o abrigo do general, o inimigo lançou uma bomba luminosa. Os
holofotes de Pepper começaram a sondar o céu, as peças antiaéreas dispararam e
«Charlie» desligou o motor. Intermináveis segundos depois, explodiu
surdamente uma bomba de 250 libras.

«Tem aqui uma estrutura sólida, Archie», comentou Halsey, e esmurrou um saco
de areia com o punho peludo. A areia começou a escorrer suavemente para o
chão. Explodiu outra bomba, o «Charlie» afastou-se, para oeste e soou o sinal de
«fim do alarme». Quando Halsey saía do abrigo, o saco de areia apodrecido
rebentou. Os augures da Divisão —e eram nada menos de 15 000...—
consideraram isso bom presságio.

Na manhã seguinte, antes do pequeno-almoço, Halsey distribuiu doze


condecorações e deu uma breve conferência de Imprensa. Um correspondente
estúpido perguntou ao almirante quanto tempo pensava que a guerra duraria.
«Quanto tempo julga que eles podem aguentar?», replicou-lhe, secamente,
Halsey.

Outro repórter perguntou ao almirante como tencionava vencer a campanha do


Pacífico Sul.

«A matar japoneses, a matar japoneses, e a continuar a matar japoneses»,


respondeu-lhe Halsey.

Antes de regressar a Nouméa, o ComSoPac disse a Vandegrift que encontrara em


Guadalcanal «a malta mais formidável» que jamais conhecera.

Foi um novo comandante da aviação, o brigadeiro-general de Fuzileiros Louis


Woods, que recebeu Halsey, em 8 de Novembro. Woods rendera Geiger e
herdara o título não oficial de «ComAirCACTUS» apenas na véspera. Na
semana anterior à sua nomeação para comandante, a Primeira Ala recebera
reforços importantes. Em fins de Outubro, o II Grupo Aéreo de Fuzileiros (do
tenente-coronel William O. Brice) chegou à Nova Caledônia, e o comandante do
grupo começou a mandar aviões e pilotos para a frente. No primeiro dia do mês,
chegara, com a sua Esquadrilha 132, o major Joseph Sailer Júnior, que viria a ser
um dos mais ousados pilotos de bombardeiros da Segunda Guerra Mundial, e no
dia 2 o major Paul Fontana trouxera nove pilotos de caças de VMF 112. Os
havia muito esperados Lightnings ainda não tinham chegado, mas em
contrapartida viera uma esquadrilha de aviões torpedeiros dos Fuzileiros,
comandada pelo tenente-coronel Paul Moret.

Dois aviões de reconhecimento, com peritos fotográficos competentes,


permitiram elaborar os mapas de toda a segunda metade oeste de Guadalcanal.
Uma semana depois de os pilotos concluírem o seu trabalho, havia, finalmente,
mapas exatos dessa parte da ilha. Em princípios de Novembro, Seabees abriram,
na selva a oeste de Kukum, uma nova pista, o «Fighter Two».

Com a chegada de duas baterias de peças de 155 mm, a artilharia podia penetrar
a fundo na retaguarda nipônica. Recentemente tinham desembarcado, também,
outras peças e obuses, e Del Valle, entretanto promovido a brigadeiro-general,
tinha, enfim, à sua disposição um grupo de artilharia versátil e flexível.

Durante este período, os japoneses também não pararam de guarnecer o ninho.


Em 2, 5, 7, 8, 9 e 10 de Novembro um total de dois cruzadores e 65
contratorpedeiros desembarcaram tropas e aprovisionamentos. Em 7 de
Novembro, 11 contratorpedeiros de Tanaka desembarcaram em Tassafaronga
mais de 1300 oficiais e soldados do escalão avançado da 38.ª Divisão; duas
noites depois, o «Expresso» chegou, sem novidade, com o comandante da
divisão, tenente-general Tadayoshi Sano o seu estado-maior, o pessoal do seu
quartel-general e mais de 600 soldados. A aviação de Henderson atacou ambos
os grupos, quando se aproximavam das Russells, mas nenhum sofreu grandes
perdas.

Começara o grande assalto.

15. «HORRÍVEL, SANGRENTA E PARA FICAR» 5


Com o 8.º de Fuzileiros em terra e os japoneses de Gavaga cercados, a Divisão
ordenou a Arthur que reatasse o avanço para Poha. O recém-chegado regimento
de Jeschke (menos um batalhão) foi incorporado e partiu de Henderson na
segunda-feira, 9 de Novembro. Nesse dia choveu incessantemente; o ataque de
Arthur progrediu com lentidão.

Na terça-feira, o sol brilhou com uma violência a que os oficiais e os soldados do


8.º de Fuzileiros ainda não estavam habituados, e os batalhões de Jeschke, que
passaram pelas linhas da frente de manhã cedo, praticamente não avançaram
nada. Nos vales sufocantes, os homens sobrecarregados arfavam, a respirar a
custo, enquanto se arrastavam penosamente, e às suas metralhadoras e aos seus
morteiros, pelas encostas cobertas de erva kunai. O sol inclemente batia em
cheio nos capacetes de aço e nos canos das armas e quase os deixava em brasa.
No dia seguinte, o calor ainda aumentou mais e o regimento só avançou cerca de
360 metros.

No dia 11 de Novembro não se celebrou em Guadalcanal o aniversário do


armistício que pôs fim às hostilidades da Primeira Guerra Mundial. Houve dois
ataques aéreos inimigos e as perdas dos japoneses foram pouco superiores às que
eles próprios infligiram: onze Zeros contra sete Wildcats. As «águias marinhas»
já tinham perdido uma grande parte do entusiasmo demonstrado anteriormente,
quando escaladas para atacar Guadalcanal. A atitude das tripulações dos Bettys,
sobretudo das dos bombardeiros dos flancos - sempre os primeiros a serem
atingidos pelos Wildcats em voo picado —, era de estoica aceitação de um fim
que podia apenas ser adiado, por vinte e quatro horas de cada vez.

O progresso das operações a oeste de Cruz preocupava Vandegrift, assim como


as notícias ameaçadoras acerca do movimento naval em The Slot. Quando
recebeu um relatório elaborado pelo estado-maior de Halsey, decidiu chamar as
tropas que se encontravam a oeste do Matanikau, reforçar as linhas e preparar-se
para o ataque violento que parecia provável. Na tarde de 11 de Novembro,
ordenou a Arthur que retirasse. Os fuzileiros trouxeram consigo 11 obuses e
peças antitanque inimigas, 32 metralhadoras e 28 morteiros. As tropas que
participaram no combate tiveram 65 mortos e 125 feridos, e nunca se
conseguiram determinar as baixas nipônicas durante a última fase deste ataque.
A leste, os japoneses de Gavaga tentaram repetidamente romper o cerco, e
alguns conseguiram-no. Mas o grosso da força estava encurralado: pelo fogo
inimigo, a sul, leste e oeste; pelo mar, a norte. Para eles, o tempo de vida
contava-se por horas e minutos, apenas. Em 12 de Novembro, os últimos
defensores obstinados foram mortos ou suicidaram-se. 450 japoneses jaziam,
insepultos, onde tinham combatido e tombado, mas o seu sacrifício permitira a
Shoji e aos seus 2000 homens avançar para sul e oeste. Os batedores de Clemens
anunciaram este movimento, e Carlson, que seguia para oeste, na direção de
Tetere, recebeu ordem para meter pela selva e interceptar Shoji. Assim fez, e
pôs-se a caminho da nascente do rio Balesuna.

Em Gavaga os americanos sofreram 40 mortos e 120 oficiais e soldados feridos,


entre os quais o indestrutível Puller. Foram apreendidos dois obuses, grandes
quantidades de arroz, morteiros, metralhadoras, armas automáticas e 50 barcos
de borracha. Sebree recebeu ordem para destruir imediatamente todos os
alimentos e material apreendidos e regressar à base.

Com 71 mortos e desaparecidos e 193 feridos em ação no oeste, e 160 mortos e


feridos no Nalimbiu e em Gavaga, as baixas em combate, nos primeiros dez dias
de Novembro, foram superiores a 400 homens — preço relativamente alto, se
atentarmos em que no oeste nada de importante se ganhara. Por outro lado,
porém, as operações no flanco leste haviam eliminado a possibilidade de
qualquer perigo imediato, dessa direção.

Quando, mais tarde, recordaram os primeiros onze dias de Novembro, alguns


dos que lhes sobreviveram consideraram a sua ilha «sossegada». Assim era, de
fato, em comparação com os movimentados dias e noites de Setembro e Outubro
— e com os que estavam para vir.

A sua chegada a Nouméa, em 9 de Novembro, Halsey foi informado, pelo chefe


do seu estado-maior, de que elementos da Esquadra Combinada tinham zarpado
de Truk; de que se estavam a reunir em Rabaul outros barcos de guerra; de que
se estavam a reunir transportes em Simpson Harbor, e de que reinava atividade
desusada nas Shortlands. Comunicados recebidos de guardas costeiros,
submarinos e aviões de reconhecimento confirmavam mensagens japonesas
interceptadas e decifradas. Não havia dúvida de que se preparava um ataque
decisivo, comparada com o qual a ofensiva de fins de Outubro podia ser
considerada insignificante.
O novo plano nipônico era mais simples do que vários dos seus predecessores. À
meia-noite de 12 de Novembro, parte da 2.º Esquadra de Kondo, comandada
pelo vice-almirante Hiroaki Abe, aproximar-se-ia da costa norte de Guadalcanal
e bombardearia Henderson, os aviões estacionados à sua volta e as instalações
circundantes, até reduzir tudo a polpa. O grupo de Abe compunha-se dos
couraçados Hiei e Kirishima, do cruzador Nagara e de 14 contratorpedeiros. Os
barcos grandes disparariam, como de costume, munições de grosso calibre, e
utilizar-se-ia pela primeira vez pólvora sem clarão (inventada pelos japoneses).

O resto da Esquadra de Kondo navegaria cerca de 150 milhas a norte de Savo, a


proporcionar proteção à distância, e incluía os porta-aviões Junyo e Hiyo, que
transportavam quase cem caças, bombardeiros de mergulho e aviões torpedeiros;
os couraçados Kongo o Haruna; 4 cruzadores, e 19 contratorpedeiros.

O comandante-chefe da 8.ª Esquadra, vice-almirante Mikawa, deveria apoiar de


perto o desembarque, próximo de Tassafaronga, da 38.ª Divisão do tenente-
general Sano. Mikawa, que dispunha de 6 cruzadores e igual número de
contratorpedeiros, confiou 3 cruzadores e 4 contratorpedeiros ao contra-
almirante Shoji Nishimura e encarregou-o de bombardear a praia, quando lhe
ordenassem.

O contra-almirante Tanaka, que retomara o seu posto de comandante da Força de


Reforço, recebeu 12 contratorpedeiros para proteger 11 transportes, nos qual
embarcou o grosso da divisão veterana de Sano.

Uma força de desembarque naval combinada, especialmente constituída e com


quase 3000 oficiais e soldados, desembarcaria simultaneamente. Proteção aérea
contínua, proporcionada por caças com base em terra e em porta-aviões,
permitiria a estes marinheiros e aos 11 000 soldados de Sano e às suas provisões
chegar à praia sem que os aparelhos americanos os molestassem excessivamente.
Desta vez, não se receava qualquer ameaça de Henderson e das suas pistas
satélites: seriam neutralizadas, assim como os seus aviões, pela artilharia dos
couraçados de Abe. O desembarque foi previsto para as 22 h. de 13 de
Novembro, e enquanto decorresse os cruzadores e os contratorpedeiros de
Mikawa completariam a destruição de todas as instalações de aeronáutica de
Guadalcanal. Os aparelhos americanos que porventura sobrevivessem aos
bombardeamentos seriam rapidamente liquidados pelas «águias marinhas».

Três horas depois da meia-noite de 12 de Novembro, Kondo mandou o grupo de


Abe seguir para Savo. Às 18 h., Tanaka, a bordo do contratorpedeiro Hayashio,
navio almirante, conduziu os transportes de tropas e a escolta para fora do porto
das Shortlands. O almirante não se sentia muito entusiasmado. Não sabia para
que lado a sorte penderia e perguntava a si mesmo quantos dos seus barcos
sobreviveriam.

Como o almirante Mikawa recomendara insistentemente no seu memorando de


fins de Agosto, uma grande força —uma força capaz de destruir os americanos
— ia finalmente a caminho, «toda de uma vez, em barcos grandes». Dispunha,
também, de aviões suficientes para conquistar e conservar a superioridade aérea
e proteger assim, eficazmente, as unidades navais atacantes e as zonas do litoral
onde as tropas e os aprovisionamentos desembarcariam.

Os serviços de espionagem de Halsey tinham feito um cálculo espantosamente


exato da força e das possibilidades do inimigo. O ComSoPac sabia que tinha de
lançar mão de tudo quanto possuía, do seu único porta-aviões às cascas de noz
de Tulagi, para tentar deter os japoneses. Entre o porta-aviões e as vedetas
torpedeiras, era pouco o que tinha e as suas forças estavam muito dispersas.

A Unidade Naval 61, de Kinkaid (o Enterprise, dois couraçados, dois cruzadores


e oito contratorpedeiros), estava em Nouméa, onde eletricistas, soldadores e
mecânicos ainda trabalhavam denodadamente para reparar as avarias sofridas
pelo porta-aviões em Santa Cruz. Apesar dos seus esforços, porém, o elevador
da proa continuava obstinadamente encravado, o que significava que todos os
aviões tinham de subir do hangar para a coberta e descer desta para aquele pelo
elevador da popa. Dos dois couraçados, um (South Dakota) estava parcialmente
inutilizado.

O Grupo Naval 62.4, do contra-almirante Norman Scott (cruzador Atlanta e


quatro contratorpedeiros), que chegara ao largo de Lunga na véspera, ainda
estava presente. Kelly Turner, com o grosso do 182.º Grupo de Combate
Regimental de Infantaria da Divisão Americal embarcada em quatro transportes,
ia em viagem de Nouméa para Guadalcanal, escoltado pelo Portland e por quatro
contratorpedeiros. Durante a tarde, encontrou-se a sul de San Cristobal com o
Grupo Naval 67.4, «Grupo de Apoio» do contra-almirante Daniel J. Callaghan:
dois cruzadores pesados, um cruzador ligeiro e meia dúzia de contratorpedeiros.

Quando Turner ancorou ao largo de Kukum, na manhã seguinte, os soldados e


fuzileiros apressaram-se a desembarcar, e o centro de comando, no «Wacky
Mac», recebeu as primeiras mensagens de aviso de aviões e submarinos amigos.
À tarde, Turner já podia fazer uma ideia relativamente certa de parte, pelo
menos, da situação inimiga, pois o grupo de Abe fora avistado a meio da manhã
a pouco mais de 300 milhas a noroeste de Guadalcanal, e a sua composição
corretamente transmitida. Desta vez, Turner não pensou que a intenção do
inimigo fosse estabelecer uma base de hidraviões... Deduziu, acertadamente, que
Abe tencionava bombardear o aeródromo, e ordenou a Callaghan que o
impedisse de realizar os seus desígnios.

Turner chamou o grupo de Scott, menos um contratorpedeiro, para reforçar


Callaghan, o que deu ao Grupo Naval 67.4 maior potencial de canhões e
torpedos. É duvidoso, porém, que o acréscimo aumentasse, em última análise, a
eficiência combativa da força de Callaghan. As circunstâncias impuseram, mais
uma vez, o improviso, e, como já acontecera antes (e voltaria a acontecer
depois), barcos que nunca tinham manobrado conjuntamente participariam
juntos numa batalha noturna.

As tripulações de todos os barcos estavam fatigadas. É verdade que dispunham


de confortos negados aos homens que tinham por missão proteger e que eram a
única razão de se encontrarem onde se encontravam, que não suavam e tremiam
de frio, alternadamente, sob os efeitos da malária, nem tinham de passar longas
horas metidos em abrigos cheios de lama; mas a maioria andava no mar havia
muitos meses, já. Alguns barcos lutavam com tanta falta de homens que oficiais
e marinheiros estavam de quarto quatro horas sim, quatro horas não. E os
«quartos gerais», pelo menos metade do tempo que o barco levava desde que
partia das Novas Hébridas até que lá regressava, deixavam à tripulação pouco
tempo para aproveitar o sono, os banhos e as refeições quentes que os fuzileiros
e soldados tanto lhes invejavam. A tensão era contínua e extenuava. Turner
envelhecera muito, em três meses, e alguns membros do seu estado-maior,
sobretudo das comunicações, andavam positivamente a cambalear.

Callaghan não constituía exceção. Duas semanas antes fora rendido pelo capitão
Miles Browning, como chefe do estado-maior de Halsey, e desde que assumira o
comando do Grupo Naval «quase não descansara. O almirante encontrava-se
num estado de exaustão física».

A bordo dos barcos, a tarde de 12 de Novembro não foi nada repousante. Os


últimos marinheiros a quem foi servido o rancho do meio-dia estavam a devorá-
lo quando soou o alerta e a ordem de ocuparem todos os seus postos. Quarenta
minutos depois, o inimigo chegou: 25 bombardeiros-torpedeiros protegidos por 9
Zeros. Pilotos do Exército e dos Fuzileiros atacaram a formação, e os barcos de
Turner encheram o ar de aço. Os caças abateram 16 Bettys e a artilharia
antiaérea incendiou 4. Um bombardeiro despenhou-se à popa do San Francisco,
matou 30 homens e feriu 24. Entretanto, os Zeros metralhavam repetidamente
Henderson, a baixa altitude.

Ao anoitecer, Callaghan escoltou, sem incidentes, os transportes já


descarregados, de Turner, através do Lengo Channel, na viagem de regresso às
Novas Hébridas. Às 22 horas desejou «bon voyage» a Turner, pela radiofonia, e
virou os seus 5 cruzadores e 8 contratorpedeiros na direção das águas escuras
que lambiam suavemente as praias de Savo.

O contra-almirante Dan Callaghan sabia que defrontaria dois couraçados


inimigos com canhões de 14 polegadas, e não ignorava que teria de surpreender
os japoneses e de disparar os seus torpedos e as suas primeiras salvas antes de os
grandes barcos de Abe o descobrirem e os seus canhões afundarem
tranquilamente os cruzadores americanos. A sua única probabilidade era
aproximar-se rápida e secretamente e começar a atacar, e a acertar, antes de o
inimigo suspeitar da sua presença. «Queremos apanhar os grandes», recomendou
ao oficial artilheiro do navio almirante San Francisco. Mas bastaria a
determinação do corajoso almirante?

A disposição que Callaghan escolheu, para a batalha noturna, leva-nos a crer que
não analisara cuidadosamente a experiência do almirante Scott, no mês anterior,
durante o combate travado à meia-noite, com Goto. Como Scott fizera,
Callaghan colocou os seus barcos em coluna e dividiu os seus contratorpedeiros,
quatro à frente dos seus cinco cruzadores e quatro à retaguarda. Mas tal
formação não era a mais adequada para a situação que iria enfrentar, pois privava
os contratorpedeiros, automaticamente, de qualquer possibilidade de fuga, a fim
de efetuarem um torpedeamento súbito e coordenado, a curta distância.

Como acontecera com Crutchley, também não deu instruções especificas quanto
à batalha noturna, nem definiu o papel que esperava os seus contratorpedeiros
desempenhassem. Na realidade, o capitão Robert G. Tobin, comandante dos
quatro contratorpedeiros da retaguarda, não recebeu ordens absolutamente
nenhumas do almirante. Callaghan preparava-se, pois, para lançar as suas forças
contra um inimigo superior sem ter tomado providências elementares que
garantissem um mínimo de controle das operações. Talvez achasse que seriam
supérfluas quaisquer instruções, visto ser inevitável uma batalha barco a barco, a
curta distância. Os Chineses têm uma frase eloquente, a este respeito: «É preciso
penetrar no covil do tigre para apanhar os seus filhotes». Alguns entram
bruscamente, enquanto outros procedem com mais astúcia. As circunstâncias
tinham-se combinado para obrigar este almirante a entrar de supetão «no covil
do tigre».

A seguir, Callaghan complicou ainda mais as coisas. Ao colocar os seus barcos


numa longa coluna, não prestou a mínima atenção às aptidões dos aparelhos de
radar de busca à superfície. Faria alguma ideia de que estes aparelhos de radar
eram a principal garantia de poder efetuar o ataque de surpresa que pretendia?
Parece que não. No entanto, um mês antes, o capitão Hoover, do Helena,
confiara no seu radar, para grande azar dos japoneses. Dos contratorpedeiros da
vanguarda, só o O’Bannon possuía o último modelo de radar de busca.
O’Bannon era o quarto da coluna. Dos cinco cruzadores, o Helena possuía a
melhor instalação, e era também o quarto da coluna de cruzadores, guiados pelo
Atlanta, que estava munido de radar rudimentar. O San Francisco seguia o
Atlanta e navegava «cego». A escolha do San Francisco para navio almirante
não fora sensata, pois embora possuísse radares para a bateria principal e para as
baterias antiaéreas, não possuía radar SG (busca de superfície). 6

Poucos minutos depois de os contratorpedeiros da vanguarda passarem por


Lunga Point, os écrans de radar do Helena emitiram blips a anunciar a presença
do inimigo. O Helena apressou-se a transmitir a notícia. Passados seis minutos
—à 1.24 h.— o Helena informou todos os barcos de que o inimigo se encontrava
à retaguarda, a bombordo, a 13 300 metros de distância, a uma velocidade de 23
nós e numa rota de 105°. Os gráficos do Helena indicavam que as duas forças se
aproximavam a uma velocidade de quase 900 metros por minuto. Entretanto, do
navio almirante não vinha qualquer mensagem. Não veio, sequer, durante muitos
longos minutos.

À 1.41 h., o contratorpedeiro Cushing, guia da coluna americana, executou uma


viragem de emergência, de 90º, para a esquerda, a fim de evitar chocar com o
Yudachi, o contratorpedeiro guia da coluna de Abe. Callaghan falou, enfim, mas
não para dar, embora já tardiamente, a ordem de abrir fogo.

«Que está a fazer?», perguntou ao comandante do Cushing, pela radiofonia. A


cada segundo que passava, o almirante americano deixava fugir, como areia a
escorrer-lhe por entre os dedos, a incalculável vantagem da surpresa até então
conseguida. Entretanto, os segundos passavam, uns atrás dos outros. Por fim, 24
minutos depois de o Helena ter identificado positivamente barcos inimigos,
Callaghan ordenou:

«Preparar para abrir fogo!»

Tarde demais. Os vigias japoneses já tinham visto os americanos.

O Atlanta, o navio almirante do contra-almirante Norman Scott, foi o primeiro a


ser atingido por granadas e torpedos. Antes mesmo de Callaghan dar ordem de
abrir fogo, já um torpedo, pelo menos, penetrara no casco do Atlanta. A força da
explosão «levantou-o em peso da água e depois largou-o, danificado e sacudido
por estremecimentos».

Nos seis ou sete minutos seguintes, dois contratorpedeiros americanos, o


Cushing e o Laffey, atacaram o Hiei. Ao mesmo tempo que virava para se
esquivar aos torpedos inimigos, o couraçado japonês disparou contra os
atacantes uma salva de munições de bombardeamento de 14 polegadas. O Laffey
iniciou a sua viagem para o fundo da Ironbottom Bay.

Os dois contratorpedeiros seguintes, o Sterrett e o O’Bannon, atacaram o Hiei


com torpedos e tiros de canhão. Os torpedos ou passaram sob o alvo ou, se
acertaram, não explodiram. Os contratorpedeiros americanos, ao meterem-se no
meio da formação de Abe, passaram tão perto do Hiei que quase o poderiam ter
abordado. Esta forma de ataque assustou o almirante japonês, que mandou retirar
os couraçados.

Callaghan sentia-se confuso, mas não perdera a coragem nem tinha qualquer
intenção de se retirar. Pareceu-lhe no entanto que, em toda aquela balbúrdia,
havia canhões americanos a disparar contra barcos americanos. (E havia.) Pela
radiofonia, o almirante ordenou: «Deixem de alvejar os nossos próprios navios!»
No súbito silêncio que se seguiu, os artilheiros americanos esperaram. E os
japoneses também. Após uma pausa de alguns minutos que pareceram uma
eternidade, um canhão de 5 polegadas abriu fogo. Ato contínuo, os holofotes
nipônicos iluminaram o San Francisco. Passados menos de dois minutos, tiros
certeiros demoliram-lhe a ponte, mataram instantânea- mente Callaghan e três
membros do seu estado-maior, feriram de morte o comandante do cruzador,
capitão Cassin Young. O San Francisco começou a ser pilotado pelo quartel-
mestre de terceira classe Floyd A, Rogers. Todo o sistema de comunicações
estava avariado, e o oficial artilheiro, primeiro-tenente Wilbourne, «dirigiu-se
imediatamente à ponte de comando a abrir caminho pelo meio de destroços,
corpos, sangue e incêndios provocados por curto-circuitos. Jorrava água de
canos rebentados...»

Portland e Helena, os dois cruzadores seguintes da coluna, tinham-se juntado à


sangrenta refrega, mas o Portland não o pôde fazer durante muito tempo. Os
canhões da sua bateria principal apontaram a um alvo, mas o capitão de um
contratorpedeiro japonês disparou-lhe quatro torpedos. Apenas um acertou, na
proa, mas chegou. A explosão arrancou a maior parte da proa do Portland e duas
das suas quatro hélices. Tornou-se impossível pilotá-lo e o cruzador começou a
andar tontamente, às voltas. O Helena teve melhor sorte. O seu comandante,
Gilbert C. Hoover, meteu o cruzador no meio da confusão, com uma perícia
admirável, e a principal bateria do Helena disparou com êxito contra sucessivos
inimigos. À sua ré, os canhões do Juneau abriram fogo. Momentos depois, um
torpedo atingiu-o e explodiu na caldeira número 1. Começou a meter água,
perdeu a direção e imobilizou-se.

Os quatro contratorpedeiros do capitão Robert G. Tobin (Desron 12) ainda não


tinham entrado na batalha. Como já dissemos, Callaghan não transmitira
quaisquer ordens de combate a Tobin, e o seu navio almirante, o Aaron Ward,
possuía apenas radar de busca obsoleto. Tobin estava, digamos, às escuras, em
muitos sentidos, mas o Aaron Ward abriu fogo, de 6400 metros de distância,
sobre navios que identificou como inimigos. À sua ré o Barton lançou quatro
torpedos contra um alvo a bombordo, e recebeu, ato contínuo, uma resposta de
dois. Em poucos segundos partiu-se ao meio e desapareceu, levando consigo
90% dos seus homens. O Monssen durou poucos minutos mais. O último
contratorpedeiro de Tobin, o Fletcher, teve melhor sorte, talvez por possuir radar
novo, talvez por o seu capitão estar familiarizado com ele e confiar nele. Fosse
pelo que fosse, o certo é que o comandante William M. Cole pilotou o seu barco
segura e confiantemente, pelo meio dos destroços.

«Em virtude de a visibilidade ser fraca, a batalha travou-se em duelos a curta


distância e em melées violentas, com cada um dos barcos a agir
independentemente» — eis o sumário do relatório nipônico.

Num voo de reconhecimento matinal, pilotos de Henderson dirigiram-se na


direção da silenciosa Savo, sobre um mar calmo, que a vitória de Mikawa
deixara coalhado de caixotes, tábuas, jangadas salva-vidas e quase 1000 homens
exaustos, muitos deles queimados o feridos, que perguntavam a si mesmos
quanto tempo mais os coletes cinzentos a que tinham confiado a vida os
continuariam a manter à superfície. Os aviadores encontraram oito navios —
cinco americanos e três japoneses. Uma milha a noroeste de Savo, o gigante Hiei
arrastava-se, ajudado por um contratorpedeiro, o Yukikaze. O Yudachi, veterano
de outras batalhas, jazia morto, na água, o Akatsuki desaparecera pouco antes,
com a maior parte da sua tripulação, e o Amatsukaze e o Ikasuchi tinham-se
retirado, avariados.

À primeira luz da manhã, Wilbourne voltou à ponte destroçada do San


Francisco. Uma casa das máquinas trabalhava e o cruzador conseguia arrastar-se,
lentamente, na direção de Lunga Point. A estibordo da ponte de comando,
Wilbourne encontrou o cadáver do almirante Callaghan:

«Uma série de cigarros Philip Morris levava do maço aberto, na sua mão, à
cabina de emergência. Aparentemente, ao ser disparado o único tiro, ele saira a
correr do seu camarote...»

E, nesse instante, fora o holocausto.

Foi quase uma vitória de Pirro: outra vitória como esta, e a Marinha americana
estaria perdida. O Atlanta, n Cushing, o Laffey, o Barton e o Monssen tinham-se
afundado, ou não tardariam a afundar-se. O San Francisco, o Juneau, o Portland,
o Helena, o Sterrett, o O’Bannon e o Aaron Ward estavam danificados. Só o
Fletcher escapara sem uma beliscadura. Pelo menos 700 oficiais e marinheiros
que participaram na batalha com Callaghan e Scott não viram nascer o dia 13 de
Novembro, nem mais nenhum outro. Em termos de vidas e barcos, as perdas
americanas excederam em muito as japonesas. Mais uma vez, a Marinha dos
Estados Unidos levara uma tremenda tareia. Mas vencera a sinistra e sangrenta
batalha, descrita pelo almirante King como «um dos mais furiosos combates
navais jamais travados» — vencera-a porque Abe não conseguira o seu intento
de bombardear Henderson. E fugira.

Enquanto o capitão Hoover, no Helena, reunia os restos, ainda em condições de


navegar, do Grupo Naval 67.4 de Callaghan, o Portland era rebocado para o
porto de Tulagi, a fim de ser reparado. Hoover desceu o Lengo Channel com o
Juneau, o San Francisco, o O’Bannon, o Sterrett e o Fletcher. Atrás dele, dúzias
de pequenos barcos, vindos de Lunga e Tulagi, recolhiam homens das águas
cobertas de óleo. Como doutras vezes, praticamente todos os sobreviventes
japoneses preferiram morrer. A muitos fez-se a vontade. Trinta e tanto, porém,
foram recolhidos à força, apesar dos seus esforços, a fim de serem interrogados.

Entretanto, o grupo de Hoover continuava a retirar para leste. Poucos minutos


antes das onze horas, o submarino japonês I-26 avistou os seus barcos. Às 10.59
h., disparou os torpedos da proa; às 11.01 h., um torpedo atingiu o Juneau, que se
desintegrou e desapareceu em dois minutos.

Hoover viu-se perante um terrível dilema: deveria arriscar outro barco — ou


possivelmente dois — para recolher sobreviventes, se é que havia alguns?
Decidiu que não podia correr tal risco e enviou a seguinte mensagem a um
Fortress, que os sobrevoava:

«Juneau torpedeado e afundado lat. 10° 32' 5", long. 102° 2' E, às 11.09 h.
Sobreviventes na água. Informar ComSoPac.» 7

Halsey não recebeu a mensagem. Dos 100 homens que conseguiram sobreviver à
explosão, apenas 10 viveram para contar o que se passou. Perderam-se cerca de
700. 8

16. «VENCEMOS OS PULHAS»

Enquanto Callaghan navegava, na noite sem lua, a caminho da batalha que lhe
seria fatal, a Esquadra Combinada ordenara a Tanaka que mudasse de rumo e
reconduzisse os seus transportes a porto seguro, nas Shortlands. O almirante
chegou ao meio-dia de 13 de Novembro. Uma hora depois, ordenaram-lhe que
seguisse de novo para Guadalcanal. O comandante da Força de Reforço «tinha o
pressentimento de que o aguardava um desatre», e os americanos estavam
dispostos a confirmar as suas apreensões.
Com o elevador da proa ainda encravado na posição de «Subida» — nem o
próprio Halsey ousaria premir o botão de «Descida»—, o Enterprise navegava
para norte, a 26 nós. Equipas de operários continuavam a trabalhar
freneticamente, a bordo, a fim de preparar o grande porta-aviões para o combate.
Acompanhava-o a Unidade Naval 64, de Willis Augustus Lee, composta pelos
couraçados Washington e South Dakota e por 4 contratorpedeiros.

Entretanto, pilotos de Henderson e B-17 de Espírito Santo revezavam-se a


bombardear o Hiei. Os primeiros pilotos torpedeiros dos Fuzileiros Navais no
Pacífico Sul (VMSB-131 do tenente-coronel Paul Moret) adquiriram muita
experiência, nesse dia. Mas as baterias antiaéreas do Hiei continuavam a
disparar. Cinco contratorpedeiros que navegavam à sua volta expeliam densas
nuvens de fumo preto e atiravam saraivadas de aço a todos os atacantes que se
aproximavam. Oito Zeros encarregados de proteger as operações de salvamento
foram imediatamente abatidos. Os pilotos americanos eram persistentes e
desejavam, acima de tudo, afundar o Hiei. Ao fim da tarde, o grande navio já
tinha a sua conta e, antes do pôr do Sol, começou a afundar-se pela popa, com as
bandeiras de combate desfraldadas.

Enquanto a água submergia o convés principal do Hiei, a noroeste de Savo, o


almirante Halsey recebia, em Nouméa a informação de que a força de Tanaka ia
de novo a caminho. O ComSoPac deduziu, acertadamente, que navios mais
pesados protegeriam a entrada do inimigo, na Ironbottom Bay, e ordenou a
Kinkaid que mandasse o grupo de Lee para o Cabo Esperança, a fim de
interceptar. Mas ventos adversos retardaram ainda mais as operações aéreas, que
continuavam dependentes apenas de um elevador. Kinkaid não conseguiu
percorrer a distância que calculara, e não devia ser possível aos barcos de Lee
chegar ao objetivo à meia-noite.

Anteriormente, Kinkaid catapultara oito bombardeiros, com uma escolta de seis


caças, e ordenara ao comandante da esquadrilha que se reunisse aos pilotos de
Woods no ataque ao Hiei e, depois, seguisse para Henderson. Outros aviões
chegaram, também, a fim de aumentar a potencialidade de defesa e ataque aéreos
de Woods. Dale Brannon, entretanto promovido a major, conduziu a primeira e
havia muito esperada remessa de Lightnings. Pouco depois de este grupo aterrar,
chegaram mais oito aviões do mesmo tipo, vindos do setor de MacArthur, e
Harmon transferiu duas esquadrilhas de bombardeiros B-26 da Nova Caledônia
para Espírito. Assim, quando a noite desceu sobre as suas pistas, em 13 de
Novembro, o general Woods contou 58 caças de elevada altitude, 39 SBD, 19
aviões torpedeiros e dois P-400. Pela primeira vez na história febril da ilha,
havia mais de cem aviões, em estado de combater, em Guadalcanal. Este feliz
estado de coisas, porém, não se prolongaria durante mais de sete horas.

Competia ao contra-almirante Shoji Nishimura cumprir naquela noite a missão


que Abe não pudera cumprir na anterior: neutralizar o poderio aéreo americano.
Poucos minutos depois da meia-noite, os seus cruzadores Maya e Suzuya,
munidos de canhões de 8 polegadas, chegaram a águas que, desde 8 de Agosto,
se tinham aberto com determinação para engolir tantos e tão valentes navios.
Mas os cruzadores de Nishimura não encontraram inimigos a travar-lhe o passo
— pelo menos durante os primeiros 50 minutos. Neste espaço de tempo,
dispararam quase mil projéteis de bombardeamento no Henderson e nas «Fighter
One» e «Fighter Two».

Mais uma vez, metodicamente, «Louie the Louse» utilizou o seu aparentemente
inexaurível fornecimento de bombas luminosas. Chegaram a pairar no ar três e
quatro de uma vez, de modo que, mal uma se apagava, logo outra se acendia.
Como tantas vezes já sucedera, irromperam chamas, direitas ao céu, e
estampidos ensurdecedores, das granadas de 90 mm, sublinharam o tema mais
surdo das explosões das granadas dos cruzadores de Nishimura. Durante as
momentâneas acalmias, o firme roncar do motor do «Washing Machine Charlie»
recordava aos fuzileiros, aos soldados e aos setecentos e tal marinheiros salvos
naquele dia que seria perigoso levantarem-se da lama onde jaziam, à espera, de
olhos abertos. Os homens tremeram, nesta noite, embora a brisa noturna não
fosse fria.

O bombardeamento parou tão depressa como começara, e reinou o silêncio,


interrompido apenas pelo crepitar das chamas que consumiam tendas, latrinas e
barracas existentes perto das pistas de aviarão. Nishimura, atacado por vedetas
torpedeiras, retirou depois de danificar 18 aviões. Os prejuízos causados nas
pistas foram apenas superficiais.

Antes do nascer do dia 14 de Novembro, enquanto as chamas devoravam paióis


e munições explodiam sob a ação do calor, pilotos de bombardeiros e caças
correram para aviões armados: navegava em The Slot, rumo a sueste, o maior
«Expresso» da história.

Quando este aviso chegou às Operações aéreas, Tanaka encontrava-se 150


milhas a noroeste de Esperança e navegava na direção de Guadalcanal, a uma
velocidade de 11 nós, protegido por 11 Zeros. Os seus transportes navegavam
em quatro colunas, e os seus contratorpedeiros, dispostos num grande «V»,
proporcionavam proteção antissubmarino à frente e aos flancos. Mas o almirante
tinha a certeza de que o perigo maior não seriam os submarinos. E, mais uma
vez, não se enganava.

Sofreu dois pequenos ataques aéreos às 8.30 h., durante os quais os pilotos dos
Zeros anunciaram ter abatido cinco atacantes. A esquadrilha seguinte passou
muito a sul e a oeste dos transportes. A força de Mikawa, que retirava
apressadamente e se encontrava a sul da Nova Geórgia e a navegar para oeste,
foi o alvo desta «grande formação», que Tanaka avistou cerca das 9.45 h. O
grupo de ataque do Enterprise, comandado pelo primeiro-tenente James R.
(«Bucky») Lee, VOOU sem hesitar na direção dos cruzadores em fuga. Havia
muito tempo para «tratar» de Tanaka.

O Kinugasa já fora atingido duas vezes por aviões torpedeiros com base em
Henderson, e Lee voltou a ataca-lo e liquidou-o. Depois os pilotos dedicaram as
suas atenções aos Chokai, Maya e Isuzu, que danificaram antes de esgotarem as
bombas. A esquadrilha de Lee seguiu para sudoeste, Mikawa aproveitou o
intervalo para reorganizar as suas forças e navegar rumo às Shortlands.

Tanaka dispunha somente de um punhado de Zeros ineficazes. Kondo, que se


encontrava apenas a 150 milhas de distância, estava, sem dúvida, nervoso. Os
aviões que mandou, aos poucos, para proteger os transportes, foram abatidos.
Grupos de ataque mistos, da Marinha e dos Fuzileiros, com base em Guadalcanal
e no Enterprise, começaram a atacar, quase sem oposição, os desprotegidos
barcos de Tanaka. Os ataques foram violentos e insistentes, às 11.50, às 12.45, às
14, às 15.40 h. e ao pôr do Sol. De Espírito levantaram voo B-17, para
participarem na matança, pois de matança se tratava. Seis transportes foram para
o fundo e um sétimo, o Sado Maru, retrocedeu, danificado, para as Shortlands,
escoltado por contratorpedeiros.

«Em seis ataques desencadeados hoje [...] o inimigo afundou seis transportes de
tropas [... ] As tripulações estão quase exaustas [... ] Os restantes transportes
passaram a maior parte do dia a esquivar-se, aos ziguezagues, e estão espalhados
em todas as direções.»

Mas Tanaka reuniu os seus barcos dispersos e navegou, obstinadamente, na


direção de Tassafaronga. Três contratorpedeiros protegiam, agora, só quatro
transportes. Por fim a noite tão desejada desceu sobre os «tristes restos» da força
que saíra das Shortlands.

A mesma escuridão que protegeu os «tristes restos» do contra-almirante Tanaka


protegeu, também, Kondo, que vinha do norte com o couraçado Kirishima, os
cruzadores Atago, Takao, Sendai e Nagara e nove contratorpedeiros. Kondo,
decidido a vingar-se dos desastres infligidos a Abe, Mikawa e Tanaka, esperava
encontrar oposição e estava preparado para lhe fazer frente. «Chegara um
momento em que o bombardeamento de Guadalcanal e o apoio dos comboios
não podiam ser adiados por mais tempo [... ] a Esquadra de Kondo [...] navegava
resolutamente para sul.» Com igual resolução, o contra-almirante Lee, a bordo
do Washington, com o South Dakota à ré e protegido por quatro
contratorpedeiros, navegava para norte. Parecia iminente um recontro colossal.

Lee foi o primeiro a chegar a Ironbottom Bay. O seu radar de busca não
assinalou nada até às 23.15 h. De súbito, porém, emitiu três «blips»,
identificados como um possível couraçado e dois cruzadores, a uma distância de
cerca de 17 400 metros e a aproximarem-se a grande velocidade. O radar da
artilharia de Lee fixou-se nos alvos, as torres procuraram o azimute adequado e
as peças subiram. Os oficiais premiram os botões de disparar e os canhões da
torre grande ribombaram. A primeira salva ultrapassou o alvo e o radar indicou
que o inimigo virava, para retirar. Passados seis minutos de fogo, às 23.21 h., os
couraçados deixaram de disparar. As suas peças de 16 polegadas tinham
dispersado a escolta dos cruzadores de Kondo.

Lee virou para a rota 300° (ligeiramente a noroeste), a fim de passar a sul de
Savo, que surgiu, numa silhueta negra, a estibordo. Quando a sua formação
começou a navegar nesta rota, os contratorpedeiros da vanguarda, 4500 metros à
frente, localizaram alvos. Uma segunda formação inimiga, desta vez de
contratorpedeiros, avançava para os americanos. Os quatro contratorpedeiros de
Lee abriram fogo, e surpreenderam os japoneses. Mas a surpresa durou pouco:
em escassos segundos, a água estava cheia de torpedos nipônicos, muitos dos
quais, como de costume, acertaram. No minuto seguinte, os canhões dispararam
e as suas granadas acertaram em todos os navios americanos. Um torpedo
desintegrou o castelo de proa do Walke até à ponte, as chamas envolveram-no e
começou a afundar-se. O Preston afundou-se às 23.34 h., e Lee ordenou ao Gwin
e ao Benham, ambos atingidos, que retirassem. Queria o campo livre para o
terceiro assalto.
Os relógios da ponte marcavam exatamente meia-noite quando os dois
couraçados americanos se aproximaram do corpo principal da força de Kondo —
três cruzadores seguidos pelo Kirishima—, à velocidade de 26 nós. A cerca de
7770 metros, a bateria principal do Washington disparou contra o couraçado
japonês. As primeiras granadas acertaram. Um cruzador japonês, depois outro e
ainda um terceiro iluminaram o South Dakota, cujas baterias secundárias
apagaram as luzes que o procuravam, mas não antes de um dilúvio de granadas
lhe desmantelar a superestrutura e destruir o radar de busca e todos os aparelhos
de radar de artilharia, menos um. As antenas da rádio também foram destruídas.
Cego, surdo e mudo, o South Dakota deixou de ser útil e transformou-se num
obstáculo. Por isso, à meia-noite e dez, o seu capitão «decidiu sensatamente
retirar, com grande alívio do comandante da Unidade Naval». Kondo também
retirou para norte, com o danificado Kirishima, e deixou Lee, no majestoso
Washington, senhor da área.

O almirante americano decidiu então, procurar os restantes transportes de


Tanaka. Estes passavam, nesse momento, pelas ilhas Russell, cerca de 60 milhas
a oeste de Esperança, e a busca foi infrutífera. Convencido de que destruíra os
planos de Kondo para aquela noite e de que a aviação trataria de Tanaka na
manhã seguinte, o contra-almirante Lee navegou para sul de Guadalcanal.

Homem modesto, o comandante da Unidade Naval G4 atribuiu os créditos desta


vitória decisiva a todos menos a si próprio. Tampouco deixou de aludir às
provadas qualidade de combate dos japoneses:

«Iniciámos esta ação convictos de que podíamos vencer o inimigo. Assim que o
inimigo retirou, depois das primeiras salvas, compreendemos que estava
derrotado. Mas compreendemos também, e não o devemos esquecer, que a nossa
margem de superioridade se deveu quase exclusivamente ao fato de possuirmos
radar. Não levamos a palma aos japoneses em experiência, perícia, treino e
persistência de pessoal.»

Quando Tanaka soube da derrota de Kondo, compreendeu que ia ter grandes


sarilhos. Não conseguiria chegar a Tassafaronga muito antes do nascer do dia 15
de Novembro, e por isso pediu a Mikawa, pela rádio, autorização para encalhar
os transportes na praia, assim que chegassem. Mikawa respondeu com um seco
«não». Mas Kondo anulou a ordem de Mikawa:

«Encalhe e desembarque as tropas.»


Esta «aprovação resoluta» de um pedido sem precedentes foi «gratamente
acolhida» e, ao alvorecer, os quatro transportes dirigiram-se para a praia.

Os aviadores de Woods, no ar desde o romper do dia, precisaram de voar apenas


quinze minutos para iniciar o sangrento tiro ao alvo daquele dia, em que
participaram indiscriminadamente aparelhos do Exército, da Marinha e dos
Fuzileiros Navais. Del Valle apressou-se a deslocar os seus canhões de 155 mm
para o Matanikau, a fim de bombardear os barcos encalhados durante os curtos
intervalos de pausa concedidos pela aviação. Alguns aviões lançaram bombas e
«cestos de bombas» incendiárias sobre os indefesos navios, cujas cobertas se
tingiam de sangue; outros metralharam-nos, em voo baixo. Às nove da manhã,
os cascos dos quatro transportes estavam amolgados e as suas superestruturas em
chamas. Mas os ataques continuaram. Apesar da incessante saraivada de
granadas e balas, e dos incêndios que devoravam os navios, 2000 soldados
japoneses conseguiram chegar a terra em segurança. Lograram, também,
desembarcar 260 caixotes de munições e 1500 sacas de arroz. A meio da manhã,
o contratorpedeiro Meade zarpou do porto de Tulagi para dar o coup de grace
aos barcos encalhados, o que fez calmamente e sem pressas. Depois, a navegar
devagar, recolheu os 264 oficiais e marinheiros do Walke e do Preston, que
tinham passado quase doze horas na água.

As primeiras notícias fragmentárias desta série de violentos combates noturnos,


que culminaram com a destruição, em 15 de Novembro, dos derradeiros
transportes de Tanaka e com o afundamento do Kirishima pelo seu comandante,
foram recebidos em Washington com certa reserva. Mas quando começaram a
chegar confirmações, a reserva transformou-se em confiante otimismo.

Em Tóquio, o Quartel-General imperial anunciou outra grande vitória. Protegido


pela Marinha, o Exército imperial estava a desembarcar, em grande escala, em
Guadalcanal; inúmeros barcos americanos tinham ido para o fundo, enquanto
outros, «envoltos em chamas», vogavam sem destino e sem direção nas águas
dominadas pela «heróica» esquadra de Kondo... A vitória final estava iminente.
Havia, no entanto, um pequeno problema: os americanos ainda lá estavam;
inexplicavelmente, ainda tinham barcos e aviões — e, o mais paradoxal, ainda
pareciam dispostos a lutar! Mas, claro, o espírito indómito que animava os
soldados, os marinheiros e os aviadores japoneses levaria a melhor. Os
americanos, um povo que dependia inteiramente das suas máquinas de guerra,
em breve estariam enterrados na lama da «insignificante ilha, habitada apenas
por nativos». Os japoneses que sabiam a verdade sentiam-se, porém,
preocupados. Mais tarde, o almirante Tanaka escreveria: «Verificara que eram
absolutamente justificados a minha preocupação e os meus receios acerca de
todo o empreendimento.»

Na segunda-feira, 16 de Novembro, quando chegaram os comunicados finais,


Knox mostrou-se, pela primeira vez em meses, quase jovial. Os seus
comentários, para a Imprensa, foram breves: «Podemos vencê-los. Podem
publicar isso. Vencê-los-emos.» Vandegrift enviou a Halsey uma mensagem a
dizer que os «capacetes amolgados» dos homens de Guadalcanal se «erguiam no
mais profundo preito aos contra-almirantes Callaghan, Scott, Lee e Kinkaid, e às
suas forças». Hanson Baldwin, crítico militar do New York Times, escreveu: «O
futuro está nas nossas mãos.»

Em Nouméa, Halsey leu os comunicados, sorriu aos membros do seu estado-


maior e exclamou: «Vencemos os pulhas!»

Se comparássemos apenas as perdas relativas em barcos de combate, como


aprouve à Rádio Tóquio fazer, as batalhas navais de meados de Novembro
poderiam ser consideradas uma vitória japonesa. Mas nenhuma batalha pode ser
avaliada por uma bitola tão estreita. É que, além de dois couraçados, um
cruzador e três contratorpedeiros, a Marinha japonesa perdeu a maior parte de
uma força de desembarque, naval, composta por 3000 homens, e dez transportes
de tropas, e o Exército perdeu pelo menos metade da sua 38.ª Divisão de
Infantaria, com todas as suas armas pesadas e todo o seu equipamento.

Mais importante, ainda, é o fato de dois almirantes nipônicos, Mikawa e Kondo,


terem perdido para sempre parte da sua subtileza e élan. Como explicar, de outro
modo, que Kondo não tenha lançado na batalha os seus caças, em 13, 14 e 15 de
Novembro? Como explicar, de outro modo, a partida apressada de Mikawa, da
cena do combate? Mas as interrogações não ficam por aqui. Porque não ordenou
Kondo, na manhã de 14 de Novembro, uma retirada geral, para fora do alcance
dos aviões com base em Henderson, antes de a maior parte do comboio de
Tanaka e da sua preciosa carga terem sido destruídos? Porque não tomou Tanaka
a iniciativa e não recomendou uma retirada, para reorganização? O primeiro
ataque aéreo ao seu comboio, em 14 de Novembro, devia-lhe ter feito
compreender que o bombardeamento de Nishimura, da noite anterior, não
lograra neutralizar o aeródromo Henderson.

Mas os comandantes japoneses preferiram, mais uma vez —como já acontecera


no Tenaru, no «Espinhaço de Edson» e nos ataques de Outubro—, persistir
teimosamente num curso de ação que só podia conduzir à derrota.

Notas
1 A má interpretação deste sinal ficaria cara aos americanos. Ao que parece, o
que Scott pretendia era que o barco-guia de cada divisão virasse para a esquerda,
para a rota 230°, e, simultaneamente, todos os barcos da mesma divisão virassem
no mesmo sentido (Divisons 230 Corpen). Isto teria, automaticamente, invertido
os papéis dos contratorpedeiros. Isto é, os dois navios que, antes, se encontravam
à ré dos cruzadores, ficariam à proa, enquanto os três que, antes se encontravam
à proa passariam para a ré. (N. do A.)

2 Wilson deve ter interpretado a ordem recebida pela radiofonia (TBS) como
«230° Corpen», o que significaria que a coluna viraria para a esquerda, para a
rota 230°, com cada um dos navios a virar na mesma direção do guia. Por isso
continuou a seguir a esteira do Helena e virou para onde ele virara. Devo ao
contra-almirante William W. Wilboume, então capitão-de-fragata e oficial
artilheiro do San Francisco, os pormenores da «trágica confusão» que se seguiu
ao sinal de mudança de rota de Scott. (N. do A.)

3 Há motivos para crer que um ou mais estavam, de fato. O Duncan foi atingido
no seu lado de bombordo. (N.do A.)

4 Marca registada de um alimento que consta de presunto picado, condimentado


e cozido. (N. da T.)

5 Frase usada num artigo do New York Times, numa data anterior, mas
igualmente apropriada, aqui. (N. do A.)

6 Diga-se, em defesa do almirante Callaghan, que a maioria dos oficiais


superiores da Marinha daquele tempo não avaliavam devidamente as tremendas
vantagens proporcionadas pelo radar ao lado que o possuía. Mas isto não era
culpa exclusiva dos almirantes em serviço nas zonas de combate. O
Departamento da Marinha mostrava-se tão cioso das informações relacionadas
com o radar de busca e de controle de fogo que a maioria daqueles que deveriam
ser minuciosamente instruídos quanto as suas potencialidades e limitações só
tinham delas uma ideia muito vaga. (N. do A.)

7 Mensagem de Hoover, segundo Morison. Halsey tirou o comando a Hoover,


mas, mais tarde, reviu cuidadosamente o caso e mudou de opinião. Na História
do Almirante Halsey, pp. 133-134, o almirante confessa ter cometido «um erro
grave»: as operações de salvamento «teriam, quase com certeza», provocado um
segundo torpedeamento. E, naquele momento crítico, a perda de outro barco —e
possivelmente de mais— poderia pôr em risco toda a campanha».

O contra-almirante McCandless (A História do San Francisco) viu, da ponte do


San Francisco, o Juneau desintegrar-se. O cruzador «não se afundou; explodiu
com toda a fúria de uma erupção vulcânica. Ouviu-se um estrondo tremendo,
viu-se uma pluma de água branca, logo oculta por um enorme hemisfério
castanho, com 900 metros de largura, do qual saíam os estampidos de outras
explosões [...] Quando a nuvem escura se ergueu da água, cerca de um minuto
depois, não restava nada do excelente cruzador de 6000 toneladas nem dos 700
homens que transportava». (N. do A.)

8 O chefe do Gabinete de Medicina e Cirurgia declarou (correspondência de


Junho de 1962) indicarem os registos uma perda do 377 homens. Segundo
Morison, a tripulação do Juneau era constituída por mais de 700 homens. Um
erro tão evidente, que o Gabinete nunca corrigiu, gera dúvidas quanto à exatidão
dos cálculos de todas as baixas apresentadas pelo Gabinete de Medicina e
Cirurgia. (N. do A.)
LIVRO IV

17. EMPATE

Durante todo o dia 16 de Novembro, «Patrulhas Abutre», de Henderson,


debicaram as carcaças que tinham estraçalhado na véspera. As chapas lambidas
pelo fogo e os porões dos barcos encalhados expeliam uma fumaça densa e
oleosa. Ocasionais e violentas explosões, ao longo do caminho costeiro a oeste
de Tassafaronga, assinalavam a destruição de munições e combustível
desembarcados pelo preço de tantas vidas e tantos barcos. Vandegrift achou ser
aquele o momento propício de avançar de novo para oeste, a fim de alcançar o
Poha e liquidar o que restasse do presumivelmente desorganizado 17.º Exército.
A Divisão constituiu uma formidável força de ataque destinada ao comandante
do setor ocidental, brigadeiro-general Sebree: 182.º de Infantaria, de Hogan
(menos um batalhão); 164.º, de Moore; 8.º de Fuzileiros, de Jeschke e, na reserva
do setor, o 1.º de Fuzileiros, de Cates. Del Valle dispôs a artilharia de modo a
prestar apoio direto e geral.

Sebree planejava atravessar o Matanikau de manhã cedo, em 18 de Novembro,


estabelecer, no mesmo dia, uma linha de partida, para sul, de Point, Cruz ao
Monte 66 (quase 2300 metros para o interior), e arrancar na manhã seguinte.
Depois tencionava avançar para oeste, numa frente larga, expulsar os japoneses
do sistema de serranias dominante e apoderar-se da linha do Poha. Na segunda
semana de Novembro, meia dúzia de patrulhas de reconhecimento (uma delas
comandada pessoalmente por Sebree) tinham encontrado a área entre o
Matanikau e Point Cruz limpa de inimigos. Por isso, Sebree previa poucas
dificuldades no estabelecimento da sua linha de partida. Mas Hyakutake tinha
outras idéias, as quais não incluíam uma retirada para a linha do rio, que era o
objetivo de Vandegrift. O secretário da Marinha, Knox, e o almirante Halsey
tinham-se esquecido de informar o comandante do 17.º Exército imperial de que
ele e os seus famintos soldados estavam vencidos...

Alguns membros dos estados-maiores do Exército e da Marinha estavam ainda


mais convencidos do que Hyakutake de que a situação poderia modificar-se a
favor do Japão. No entanto, a sequência de ações que tinham custado muito
caras e haviam culminado com o afundamento do Kirishima, obrigaram o
Quartel-General imperial a rever a crítica situação do sul das ilhas Salomão. Os
planejadores de Tóquio chegaram à conclusão de que «era indispensável, para o
estabelecimento de uma situação vantajosa na Ásia Oriental, esmagar o contra-
ataque dos E. U. [...] e manter as zonas importantes das ilhas Salomão e da Nova
Guiné».

De acordo com este objetivo, Sua Majestade Imperial tirou, em 16 de


Novembro, o comando da Terceira Esquadra ao vice-almirante Nagumo, e
nomeou o vice-almirante Jisaburo Ozawa para o substituir em tão importante
posto. Simultaneamente, o Quartel-General imperial chamou ao ativo o Exército
da 8.ª Área, com quartel-general em Rabaul, e nomeou seu comandante o
tenente-general Hitoshi Imamura. No mesmo dia, o Departamento do Exército
criou o 18.º Exército, designou o tenente-general Hatazo Adachi para o
comandar e ordenou-lhe que se apresentasse a Imamura. A missão de Adachi era
ressuscitar a moribunda operação da Nova Guiné, mas não lhe concederam
novas tropas.

Hyakutake, embora também ficasse subordinado a Imamura, conservou o


comando do 17.º Exército e o encargo de retomar Guadalcanal. Desde fins de
Agosto que este objetivo absorvia a atenção do general e, nesse espaço de
tempo, dizimara pelo menos 75 % dos recursos disponíveis na Área do Sueste.
Do seu posto de comando na selva, perto de Kokumbona, Hyakutake não podia,
naturalmente, controlar os acontecimentos da Nova Guiné, onde a posição
japonesa piorava, havia algum tempo, lenta mas firmemente, sob a crescente
pressão aliada. A criação de um quartel-general na área e de um exército
especificamente destinado a operar lá, permitiriam, sem dúvida, ao comandante
do 17.º Exército remediar a situação na ilha «KA». Mas a nova decisão, por
muito desejável que fosse do ponto de vista de Hyakutake, não correspondia à
necessidade comprovada de unificar a direção do esforço ao nível daquela área,
pois Imamura e Yamamoto atuariam como comandantes coordenados, em pé de
igualdade.
Antes de partir de Tóquio, o general Imamura recebeu instruções semelhantes às
que foram, ao mesmo tempo, enviadas ao almirante Yamamoto. Segundo essas
instruções, o Exército e a Marinha cooperariam para apressar a criação de novas
bases aéreas nas Salomão e para reforçar as instalações já lá existentes. Claro
que isto já devia ter sido feito havia muito tempo. Desde princípios de Setembro
que alguns oficiais, de posto relativamente alto, da aviação naval tentavam, com
pouco êxito, fazer ver ao Quartel-General imperial que o domínio do ar e do mar,
em Guadalcanal, era importantíssimo. Mas, apesar dos desastres de Setembro,
Outubro e meados de Novembro, o Exército recusava-se a ver o que saltava aos
olhos. A Marinha suportara toda a responsabilidade da ação aérea na Área do
Sueste. A Força Aérea do Exército operava no continente asiático, nas Índias e
na Malásia, e o Exército não contribuíra com um só aeroplano para a campanha
de Guadalcanal. Mas, finalmente, o estado-maior general capitulava, rendia-se à
insistente pressão da Marinha. A Força Aérea do Exército cooperaria.

A medida que se processasse o fortalecimento do potencial aéreo, o 17.º Exército


deveria estabelecer posições-chave, para futuras ofensivas, e a Marinha usaria
«todos os meios» para impedir que o inimigo recebesse reforços e para apoiar
Hyakutake. Depois de neutralizado o poderio aéreo americano, a Marinha
transportaria reforços, e, mais tarde, numa data não especificada pelo Quartel-
General imperial, o Exército e a Marinha efetuariam uma ação conjunta,
retomariam os aeródromos de Guadalcanal e aniquilariam os seus defensores.

Escalonaram-se imediatamente novas tropas de terra, para o Exército da Área,


destinadas a seguir sem demora para Rabaul. Incluíam, além de unidades de
artilharia, tanques, transportes e sapadores, as 6.ª e 51.ª divisões de Infantaria e a
21.ª Brigada Mista. Imamura recebeu, também, a promessa de aumento
substancial dos seus efetivos aéreos, mas a 6.ª Divisão Aérea (do Exército)
continuou por constituir.

Imamura calculou que todas as disposições preliminares poderiam estar


terminadas, com êxito, em princípios de Janeiro, e marcou o dia 15 desse mês
para o desencadeamento de uma ofensiva geral, destinada a expulsar os
americanos de Guadalcanal. Imamura se esqueceu de consultar a Marinha. A
maioria das unidades escalonadas para o O/B do seu 8.º Exército estavam muito
longe de Rabaul: no Império, na Coréia, na Manchúria e no norte da China.
Além disso, ninguém aludiu, nem sequer em termos gerais, ao que o Quartel-
General imperial e o comandante do Exército da 8.ª Área previam (ou temiam)
que os americanos fizessem nessas oito ou nove semanas, para melhorar as suas
posições.

Enquanto unidades de Sebree formavam bicha, no interior do perímetro, para


receber rações de emergência, munições suplementares, pastilhas de sal e
atabrine, um batalhão de Fuzileiros continuava a operar fora dos seus confins.
Tratava-se do 2.º de Raiders, de Evans Carlson, cuja divisa, «Gung Ho»
(Trabalhai Juntos) se tornaria, em breve, uma frase-padrão do vocabulário não
oficial do Corpo de Fuzileiros. Separado da Força Aola havia quase duas
semanas, com ordem de marchar para Koli e atacar Shoji pela retaguarda,
Carlson recebera, depois, instruções para interceptar a coluna nipônica em
retirada. Atalhara imediatamente para o interior, na direção da nascente do rio
Balesuna, e em 10 de Novembro estabelecera uma base na deserta aldeia de
Binui. Aí foi atacado por duas companhias da retaguarda de Shoji e, durante 48
horas, os seus 400 raiders foram alvo de uma série de ataques japoneses. Pouco
depois de repelido o último, o primeiro-tenente Vouza, a comandar um grupo
escolhido de batedores nativos e de carregadores, reuniu-se a Carlson.

Vouza, completamente refeito dos ferimentos que sofrera em fins de Agosto e a


ostentar orgulhosamente a medalha Estrela de Prata que Vandegrift lhe
concedera pessoalmente, por valentia em ação contra o inimigo comum, estava
pronto para avançar. O mesmo acontecia com os raiders. Assim, em 12 de
Novembro, Vouza conduziu um grupo, através de estreitas trilhas da selva, até
Asimana, uma aldeia do lado da nascente do rio Metapona. Aí, sorrateiramente,
Carlson cercou uma companhia de despreocupados japoneses, a maioria dos
quais estava a tomar banho. A matança durou poucos minutos e não houve
sobreviventes. Os raiders também não perderam tempo a sepultar os 120 mortos.

Guiados pelos batedores de Vouza e com uma ração reforçada de arroz, passas,
chá e toucinho fumado, puseram-se a caminho das vertentes do sul do monte
Austen, em perseguição de Shoji. Mas o coronel japonês também avançava
depressa e, embora os raiders localizassem e apanhassem de emboscada meia
dúzia de grupos isolados, não conseguiram alcançar o dizimado corpo principal.

Os comunicados que chegavam ao quartel-general do 17.º Exército, em meados


de Novembro, não constituíam leitura agradável. Dos quase 10 000 oficiais e
soldados da Divisão Sendai desembarcados em Outubro e Novembro, Maruyama
já só comandava pouco menos de 5500. A 38.ª Divisão não se encontrava em
melhor estado, pois Sano perdera metade das suas tropas no tremendo desastre
que se abatera sobre o último «Expresso» de Tanaka. Os restos do 28.º
Regimento do coronel Ichiki (dois batalhões enfraquecidos) e da 35.ª Brigada de
Kawaguchi completavam o quadro da infantaria disponível. No entanto, nessa
altura havia em Guadalcanal 30 000 japoneses de todas as armas e de ambos os
serviços.

Mas Hyakutake não podia aceitar este número pelo seu valor facial, pois nele se
incluíam milhares de subalimentados, assim como doentes e feridos. Os serviços
médicos, no Exército japonês, eram na melhor das hipóteses, primitivos,
comparados com os que prevaleciam no Ocidente — e nem sequer se podiam
comparar aos mais baixos níveis verificados em Guadalcanal. Não se fazia a
mínima tentativa organizada para evacuar os feridos para as áreas da retaguarda,
a não ser os de maior gravidade. Os outros, assim como os doentes, arranjavam-
se como podiam ou eram tratados pelos camaradas.

«A força, na linha da frente, estava dividida de maneira que os impossibilitados


de andar, devido a doença ou a ferimentos, ocupassem as posições de defesa. Os
que podiam andar apoiados a uma bengala encarregavam-se dos transportes e da
cozinha, na retaguarda, e os que se podiam considerar relativamente saudáveis
repeliam o inimigo, pela retaguarda.»

Mas as tropas de Sebree não tardariam a descobrir que a vontade de combater do


inimigo não diminuíra. A soldadesca nipônica, que se recusava a admitir a
derrota, empenhava-se com afinco em «acalmar a ansiedade» do seu imperador.

Esta obstinação era fortalecida pelo baixo apreço em que os japoneses tinham os
combatentes americanos. Continuavam a acreditar que as vitórias americanas se
deviam exclusivamente a preponderância material, mas que essa vantagem
técnica pouco importava. Na balança do combate, acabaria, inevitavelmente, por
ser ultrapassada pelas superiores qualidades espirituais nipônicas.

Os comandantes japoneses que se encontravam na ilha compreendiam muito


bem —embora os americanos ainda não tivessem dado por isso— quo o 17.º
Exército já não possuía potencialidade ofensiva. O melhor que podiam esperar
era lograr manter uma posição o mais para leste possível. Não desesperavam de
o conseguir e o terreno favorecia-os. Os japoneses eram, ao mesmo tempo,
engenhosos e diligentes na construção de obras defensivas. Pareciam possuir
uma noção instintiva da qualidade do terreno (que faltava quase por completo
aos americanos) o que resultava, sem dúvida, do fato de o Exército nipônico ser
essencialmente um exército de camponeses. Talvez por serem um povo de
qualidades artísticas inatas, eram excelentes camoufleurs. A selva
proporcionava-lhes material único e ilimitado, para aproveitamento das suas
habilidades individuais e coletivas.

O complexo de posições contra-encosta fortemente escoradas e inteiramente


ocultas que o 17.º Exército preparava a oeste do Matanikau abrigava
metralhadoras leves e pesadas, morteiros, lança-granadas e canhões de montanha
de 77 mm. Estas armas de Infantaria, mais alguma artilharia para a qual as
munições eram muito limitadas, eram tudo quanto o 17.º Exército possuía para
conter os americanos até à nova ofensiva, marcada por Imamura para 17 de
Janeiro.

Poucos minutos depois da alvorada de quarta-feira, 18 de Novembro, o batalhão


do 182.º de Infantaria, comandado pelo tenente-coronel Bernard B. Twombley,
atravessou o Matanikau numa ponte montada pelos sapadores, para infantaria, e
iniciou uma marcha, em fila indiana, para o Monte 66, a extremidade, do lado do
interior, da linha de partida escolhida. Esta marcha difícil, a corta-mato, teria
submetido a rude prova um batalhão excelentemente treinado, e o de Twombley
estava muito longe disso. As suas tropas, que tinham desembarcado apenas seis
dias antes, ainda não estavam habituadas ao calor húmido [...] levavam
carregamentos completos de munições, água e comida. Muitos, que não tinham
tomado pastilhas de sal, desmaiaram [...]». Mas, mesmo assim, os soldados
chegaram ao seu objetivo ao fim da tarde e, enquanto a noite descia sobre os
vales circundantes, organizaram a defesa do Monte 66. O ataque noturno
previsto não se verificou.

Na manhã seguinte, o comandante regimental atravessou o rio com o seu 1.º


Batalhão e, cerca do meio-dia, as companhias de assalto do tenente-coronel
Francis F. MacGowan cavavam abrigos nas escarpas, menos de 90 metros a leste
de Point Cruz. Entre a esquerda de MacGowan e a direita de Twombley, havia
uma brecha de quase quilômetro e meio de cabeços arredondados, cristas
alcantiladas e barrancos estrangulados.

Ao nascer do dia de sexta-feira, os japoneses, mais uma vez a provar a sua


extraordinária capacidade de adivinhar os pontos fracos, atacaram o flanco
esquerdo da posição de MacGowan e, em poucos minutos, desencadeou-se luta
acesa, de fogo, ao longo da frente de 650 metros. À medida que a pressão
nipônica aumentava, o batalhão cedia. Foi neste momento de crise latente que
Sebree avançou. O general encontrou o batalhão «um tanto ou quanto abalado»,
mas a sua intervenção pessoal, os esforços do seu G-3, tenente-coronel Paul A.
Gavan, e as exortações do comandante do batalhão chegaram para deter a
retirada. Os soldados reagruparam-se, passaram ao ataque e infiltraram-se para
além das suas linhas daquela manhã. Mas a artilharia e os morteiros japoneses
não tardaram a suster esta nova tentativa.

Sebree colocou, depois, o 164.º na brecha entre MacGowan e Twombley, mas os


japoneses estavam decididos a não deixar avançar os americanos. Sebree,
igualmente decidido a avançar, chamou o 8.º de Fuzileiros. Ao mesmo tempo,
ordenou aos soldados que recuassem 280 metros, enquanto a artilharia fazia fogo
de preparação, durante meia hora. Momentos depois de terminadas as
concentrações de fogo, os batalhões de assalto de Jeschke passaram através do
164.º Mas os fuzileiros não conseguiram justificar as expectativas otimistas do
general.

«Os fuzileiros tiveram uma surpresa. Avançaram confiantemente, para mostrar


ao Exército como se faziam as coisas, e foram repelidos.»

O ataque foi sustido. Em 23 de Novembro, Vandegrift ordenou a Sebree que


suspendesse as operações e fortificasse ao longo da linha que estabelecera.

Esta foi a linha de partida da sua ofensiva para o Poha.

Na quinta-feira, 26 de Novembro, o tenente-general Imamura assumiu


formalmente o comando do Exército da 8.ª Área. As suas perspectivas eram
pouco brilhantes, na Nova Guiné e em Guadalcanal. Dependentes da chegada
dos prometidos reforços, os japoneses não tinham outro remédio senão defender
com a sua habitual tenacidade. Foi assim mesmo que o seu novo comandante os
incitou a proceder:

ALOCUÇÃO A TODOS OS OFICIAIS E SOLDADOS

Em obediência à ordem imperial, comandarei, doravante, o Exército da 8.ª Área.

Todos os oficiais e soldados sob o meu comando que têm participado nas
operações das Salomão e da área oriental da Nova Guiné, travam, há muito
tempo, difíceis e árduas batalhas, em condições tormentosas, com o calor e a
fome, selvas insondáveis e montanhas íngremes, além dos ataques constantes da
aviação inimiga. Assim têm frustrado a contraofensiva das forças americanas e
australianas e lançado entre elas o pânico.

A lealdade e a bravura desses oficiais e soldados conseguem comover, até, os


próprios deuses. Gostaria de exprimir o meu sincero respeito e a minha gratidão
a esses oficiais e a esses soldados, pela coragem com que têm lutado, e, ao
mesmo tempo, a minha sincera mágoa pelas almas daqueles que morreram de
ferimentos e doença.

O resultado da guerra por uma Ásia maior, que decidirá o destino do nosso
Império, depende exclusivamente do exército desta área.

Estou firmemente decidido, como o estais todos vós, oficiais e soldados, a


derrotar o inimigo, vencendo todas as dificuldades com ardente e indómito
espírito de luta.

Todos vós, oficiais e soldados, compreendeis a responsabilidade imposta ao


exército desta área, e tudo fareis para o cumprimento dos vossos respectivos
deveres, com espírito de lealdade e patriotismo, a fim de serenar o coração de
Sua Majestade.

Era isto que queria dizer a todos vós.

Nessa mesma quinta-feira comemorava-se em Guadalcanal o Dia de Ação de


Graças, e Halsey arranjou maneira de que houvesse peru e molho de uva-do-
monte para todos os homens. Enquanto saboreavam o seu quinhão, os membros
da Divisão de Vandegrift davam graças, e tinham bons motivos para isso. É que
a 1.ª Divisão de Fuzileiros recebera ordem de marcha e deveria sair da ilha em
princípios de Dezembro e seguir para a Austrália, a fim de descansar e se
reorganizar. Para a substituir, o general Marshall mandou seguir para
Guadalcanal a 25.ª Divisão do Exército, dependente da área de MacArthur. Só se
conseguira chegar a acordo, a este respeito, depois de muito regatear.
MacArthur, que queria uma divisão anfíbia, oferecera a 25.ª em troca da 1.ª. Mas
se o ComSouWesPac soubesse em que estado se encontravam as tropas de
Vandegrift, é muito pouco provável que tivesse aceitado a troca. Na realidade, a
1.ª Divisão de Fuzileiros não se encontrava em estado de combater, pois estava
exausta e dizimada pela malária.
As estatísticas médicas não contam a história toda, mas os números são
elucidativos: em Outubro, registaram-se quase 2000 casos de malária; até à
última semana de Novembro (exclusive) mais 2500. Isto refere-se, apenas, aos
casos tratados nos hospitais da Divisão. Outras centenas de homens tomavam as
pastilhas de quinino, que só se distribuíam a casos declarados, em enfermarias
improvisadas. Muitos homens, que, em circunstâncias menos imperiosas,
estariam com «baixa total» ou a quem seriam distribuídos, apenas, trabalhos
leves, em Guadalcanal trabalhavam, patrulhavam e combatiam. 39° era a
temperatura crítica. Aqueles cuja febre não atingia este número, não eram
considerados doentes.

Como um só homem, a Divisão tremia, suava, tomava quinino e esperava.

18. TANAKA DE TASSAFARONGA

O contra-almirante Raizo Tanaka, que não celebrou a festa americana, passou o


dia a bordo do seu navio almirante, no porto das Shortlands, a elaborar ordens
para mais um «expresso». Anteriormente, Vandegrift recebera, tanto de Halsey
como de vigias costeiros, informações que sugeriam um aumento de atividade
naquela zona e que o levaram a suspender o ataque de Sebree. A fim de avaliar o
potencial da ofensiva que por certo se preparava, Vandegrift recomendou a
Woods que mantivesse The Slot sob constante observação. Os aviadores não
encontraram alvos.

Halsey, a quem foi atribuída uma quarta estrela no dia de Ação de Graças, tinha
sob o seu comando barcos de superfície suficientes para fazer frente a qualquer
esforço nipônico. A dificuldade residia no fato de, como de costume, os seus
barcos estarem dispersos. Talvez Pearl Harbor tivesse ensinado aos almirantes
uma lição que não conseguiam esquecer. Mas, fossem quais fossem as razões, o
certo é que esta crise encontrou o Enterprise, o Washington e um cruzador
ligeiro tranquilamente ancorados em Nouméa; o Saratoga, inativo, em Nandi,
nas Fijis, com os couraçados North Carolina, Colorado e Maryland, e os
cruzadores Northampton, Pensacola, New Orleans, Minneapolis e Honolulu,
além de quatro contratorpedeiros, em Espírito Santo, ou prestes a lá chegar.

Alguns dias antes, Halsey ordenara a Kinkaid que fosse de avião a Espírito, a
fim de assumir o comando da unidade naval de cruzadores apressadamente
reunida e elaborar planos para deter a tentativa de reforço que parecia iminente.
Kinkaid começou logo a gizar um plano operacional para a viagem a Ironbottom
Bay e para a batalha noturna que esperava travar. Dava-lhe os retoques finais,
em 28 de Novembro, quando foi substituído no comando pelo contra-almirante
Carleton H. Wright, por ordem do almirante King.

Dadas as circunstâncias, Halsey poderia, justificadamente, pedir um adiamento


de alguns dias, no cumprimento das ordens recebidas por Kinkaid, visto «ele não
ter obrigações prementes em qualquer outro lado». A razão porque não o fez
nunca foi esclarecida. Kinkaid, que já era um veterano das batalhas do Pacífico
Sul, sabia o que podia esperar, ao passo que Wright, almirante ainda não
experimentado, ia comandar barcos que nunca vira e conduzi-los para águas
desconhecidas, onde provavelmente travaria uma batalha noturna, em condições
com as quais não estava familiarizado e com um inimigo experiente.

Depois de estudar o plano de Kinkaid, que adoptou — exceto num pormenor de


importância vital—, e de conferenciar com os seus comandantes, o contra-
almirante Wright mandou catapultar hidraviões e ordenou-lhe que seguissem
para Tulagi e lá aguardassem ordem para levantar voo e iluminar o inimigo. Nos
últimos minutos de sábado, 29 de Novembro, mandou a Unidade Naval 67 fazer-
se ao mar. Nessa noite, Halsey informara-o de que um grupo inimigo, que se
supunha constar de oito contratorpedeiros e seis transportes. Era esperado ao
largo de Esperança cerca da meia-noite do último dia do mês.

O almirante Tanaka levantara ferro das Shortlands poucas horas antes. Teria sido
prematura a declaração de Nimitz, de 22 de Novembro, de que a fase «crítica»
passara?

Desta vez, a missão de Tanaka era mais prosaica do que a habitual, de


desembarcar tropas: conduzia um comboio de aprovisionamentos de urgência. O
Exército imperial em Guadalcanal estava à beira de uma grande tragédia, como
Tanaka admitiria mais tarde: «[...] nos últimos dias do mês [...] todas as
provisões essenciais se tinham esgotado. Os homens estavam reduzidos a comer
plantas silvestres e animais. Encontravam-se todos à beira da inanição, o número
de doentes aumentava e até os saudáveis estavam exaustos.»

A situação, apesar de muito grave, ainda não era, contudo, catastrófica.


Impunham-se expedientes ousados, e Tanaka já demonstrara ser um almirante
possuidor de grandes dotes de coragem e engenho.

O método de reabastecimento que planejara era, sem dúvida, novo. Eis como,
mais tarde, o descreveu: «Esterilizavam-se grandes caixas ou tambores metálicos
e enchiam-se de provisões médicas ou de alimentos indispensáveis —como
cereais—, deixando apenas ar suficiente para garantir a flutuação. Estes
tambores eram carregados em contratorpedeiros e unidos uns aos outros com
cordas fortes, durante a viagem para Guadalcanal. À chegada, as latas eram
todas atiradas à água, simultaneamente, enquanto os contratorpedeiros
continuavam o seu caminho. Um barco a motor apanhava a ponta da corda, que
flutuava, e puxava-a para a praia, onde as tropas recolhiam os tambores. Deste
modo, o tempo de descarga ficava reduzido ao mínimo e os contratorpedeiros
regressavam à base praticamente sem demora.»

Seis dos seus oito contratorpedeiros tinham a coberta cheia de tais tambores.
Para acomodar essa carga, houvera que remover todos os torpedos, exceto um
para cada tubo. O navio almirante, Naganami, e o do comandante da divisão,
Takanami, não transportavam tambores.

Durante a manhã de 30 de Novembro, Tanaka navegou apenas a 24 nós, para se


manter fora do alcance dos bombardeiros de Henderson, mas ao princípio da
tarde encontrou mau tempo e aumentou a velocidade para 30 nós. Ao mesmo
tempo, um avião de reconhecimento nipônico, de regresso a Buin, comunicou
que se aproximava de Guadalcanal uma formação de barcos de guerra e
transportes americanos.

Pouco antes das 22 h., deixou de chover, o céu clareou e a visibilidade


aumentou, de quase zero para quatro milhas. Os barcos de Tanaka passaram a sul
de Savo 45 minutos depois. A bordo, os tripulantes estavam nos seus postos,
junto dos canhões e dos tubos de torpedos. Anteriormente, o almirante
«exortara» os seus comandantes nos seguintes termos:

«É muito possível que tenhamos um encontro com o inimigo, esta noite. Se


assim suceder, far-se-ão os máximos esforços para destruir o adversário, sem nos
preocuparmos com a descarga dos mantimentos.»

Ao mesmo tempo, Tanaka ordenara que não disparassem canhões de 5 polegadas


e que atacassem apenas com torpedos.

Tanaka estava pronto para a batalha. E Wright, estaria?

Na escuridão, a Unidade Naval 67 passou por Aola, onde se lhe reuniram dois
contratorpedeiros, o Lamson e o Lardner, que o almirante Wright mandou para a
retaguarda da sua coluna. À frente, com instruções para desencadear um
torpedeamento controlado pelo radar, Wright colocara a divisão de
contratorpedeiros do primeiro-tenente William M. Cole, composta pelos
Fletcher, Perkins, Maury e Drayton. O plano de Kinkaid estabelecia que dois
destes contratorpedeiros deveriam navegar bem à frente, a fim de comunicarem,
com toda a antecedência possível, a presença do inimigo. Wright, porém,
ignorou esta sensata precaução. Os cruzadores formavam em coluna atrás dos
contratorpedeiros: Minneapolis, New Orleans, Pensacola, Honolulu e
Northampton. A fechar a marcha, sem terem recebido quaisquer ordens, o
Lamson e o Lardner.

Wright entrou na Ironbottom Bay uma hora antes da meia-noite. Seis minutos
depois, apareceram os primeiros sinais nos écrans do radar. A distância era de 21
000 metros. Wright virou levemente para a esquerda e foi ao encontro do
inimigo. Às 23.16 h., o Fletcher tinha a coluna de Tanaka bem visível no seu
radar, e o comandante da divisão pediu licença para torpedear. Enquanto Wright
protelava, a coluna de Tanaka, que navegava numa rota oposta e quase paralela
passou pela sua à distância de 6400 metros. A distância, até então a encurtar,
começou a aumentar rapidamente, e quando Wright autorizou Cole a torpedear
era tarde demais.

Quando os torpedos americanos foram lançados, e antes de os canhões


começarem a disparar, os vigias de Tanaka anunciaram sete «contratorpedeiros»
inimigos. O almirante ordenou, ato contínuo: «Interromper a descarga; todos aos
postos de combate.» Um momento depois, quando explodiram sobre os seus
navios granadas incandescentes, ordenou: «Aproximar e atacar!» Ao mesmo
tempo, disse ao seu capitão que desviasse o Naganami para uma rota quase
paralela e aumentasse a velocidade para 40 nós. Nem uma hesitação. Decisão
firme. Em poucos minutos, o navio almirante nipônico alcançara os americanos
e, ao ficarem flanco com flanco, lançou os torpedos. Explodiram granadas na
água, em redor do Naganami, mas não lhe tocaram.

Não é possível reconstituir com exatidão os pormenores desta batalha. Mas os


atiradores de Tanaka estavam a acertar. Ao mesmo tempo que os torpedos
penetravam no Minneapolis e no New Orleans e lhes arrancavam pedaços
inteiros da proa, as chamas invadiam a superestrutura do Pensacola. Os
japoneses «gritavam de alegria». Mas os canhões dos barcos de Wright também
acertavam, o que não era difícil, com três cruzadores americanos e um
contratorpedeiro japonês a arder. O combate barco-a-barco continuou, pois, com
todo o ímpeto. O Northampton, o último da coluna, foi a derradeira vítima:
acertaram-lhe dois torpedos que lhe abriram no casco um buraco do tamanho de
uma casa. O cruzador meteu água, imediatamente, e adernou, de modo perigoso.
Nenhuma ação de controle de avarias, por muito heróica, o poderia salvar.
Afundar-se-ia passadas algumas horas. O Honolulu escapou a sorte semelhante
devido apenas às manobras inteligentes do seu oficial de convés, o primeiro-
tenente George F. Davis.

Cerca das 23.50 h., depois de um combate que durara menos de meia hora, o
almirante nipônico ordenou aos seus contratorpedeiros que retirassem. Tanaka
fizera a sua descarga, mas não de arroz enlatado. Atrás dele, o Takanami e quatro
cruzadores americanos afundavam-se. Quanto ao Pensacola, ao Minneapolis e ao
New Orleans, ficaram fora de ação quase um ano. Mais uma vez, a Marinha
americana recebera uma dura lição.

Como foi possível acontecer tal desastre, que teve ainda menos desculpa que o
de Savo? Neste combate, os barcos americanos, munidos de radar, tinham,
novamente, possuído a vantagem da surpresa, mas, novamente também, haviam
mostrado não a saber utilizar. Wright dispusera de quatro cruzadores pesados,
com um total de 37 canhões de 8 polegadas, contra oito contratorpedeiros
frágeis. Logicamente, deveria ter afundado o «Expresso» de Tanaka. Mas, apesar
de terem tudo contra eles, os japoneses confirmaram a sua superioridade como
marinheiros e como torpedeiros. Aqui como em Savo, só a coragem não chegou.
Depois desta batalha, Tanaka enfileirou com Mikawa, como um dos muito
poucos excelentes comandantes navais japoneses da Segunda Guerra Mundial.

Claro que era preciso um bode expiatório, sobre cujos ombros se pudesse lançar
oficialmente a culpa da catástrofe que se abatera sobre a Unidade Naval 67.
Naturalmente, como era de esperar, esse bode expiatório não foi o contra-
almirante Carleton H. Wright, da Marinha dos Estados Unidos, que saiu
airosamente do grandíssimo sarilho em que meteu os seus navios ao aceitar
«toda a responsabilidade pelos danos causados pelos torpedos». O único oficial
censurado foi o primeiro-tenente William M. Cole, que guiava os
contratorpedeiros da vanguarda, no Fletcher.

A vitória de Tanaka deu início ao último mês de 1942 com uma nota amarga.
Mas o pessimismo não era muito, no quartel-general de Halsey. E no de
Vandegrift não havia, sequer, nenhum. O general passou os primeiros dias de
Dezembro a visitar as suas tropas e a preparar-se para passar o testemunho ao
major-general Patch. O chefe do seu estado-maior, coronel Thomas, e as seções
que chefiava, instruíam os oficiais do Exército que os substituiriam. O médico da
Divisão, capitão Warwick T. Brown, e o oficial comandante do hospital,
primeiro-tenente Don Knowlton, chefiaram um exame-amostra do comando de
Vandegrift, a fim de determinar a condição física das tropas. Concluiu-se, daí,
que mais de um terço dos oficiais e dos soldados estavam inaptos para qualquer
serviço que incluísse combate.

Em 7 de Dezembro, um ano depois de Pearl Harbor, Vandegrift saudou a sua


Divisão e todos aqueles que com ela tinham combatido no céu, no mar e em
terra:

«Ao abandonar o comando desta área, espero poder exprimir-vos, embora


modestamente, o orgulho que sinto pelos vossos extraordinários feitos e os meus
agradecimentos pela ilimitada lealdade e abnegação e pela elevada coragem que
tomaram possíveis tais feitos.

«Aos soldados e fuzileiros que enfrentaram o inimigo na fúria dos combates


noturnos; aos pilotos do Exército, da Marinha e dos Fuzileiros, cujas façanhas
incríveis transformaram o nome de Guadalcanal em sinônimo de morte e derrota
na linguagem do inimigo; aos que labutaram e suaram no interior das linhas em
todos os gêneros de trabalhos prodigiosos e vitais; aos homens do comando de
torpedeiros que atacaram o inimigo em surtidas noturnas; ao pequeno grupo de
aliados dedicados que tanto nos ajudaram, em proporção ao seu número
reduzido; às forças de superfície da Marinha, associadas a nós em significativos
triunfos próprios — a todos digo que suportaram desde o princípio, sem hesitar,
o pior que o inimigo pôde lançar contra nós.
«É muito possível que esta modesta operação, iniciada há quatro meses, tenha,
mercê dos vossos esforços, conseguido contrariar as grandes ambições do nosso
inimigo no Pacífico. A luta pelas Salomão ainda na o está ganha, mas, aconteça
o que acontecer, sei que vós, como homens corajosos e de boa vontade,
mantereis a cabeça erguida e vencereis no futuro como vencestes no passado.

A. A. Vandegrift Major-General,

Corpo de Fuzileiros Navais dos E. U.»

Dois dias depois, Vandegrift guardou alguns minutos de silêncio nos cemitérios
onde jaziam os corpos de homens tombados na primeira ofensiva americana da
Segunda Guerra Mundial. Depois, numa cerimônia simples, transmitiu o
comando da área CACTUS- RINGBOLT ao major-general Alexander M. Patch.
Durante essas horas, o 5.º de Fuzileiros, de Edson, marchava pela última vez em
Guadalcanal. Nesse dia, o seu destino era Kukum e não o Matanikau.

O embarque não foi tão rápido como os capitães dos navios tinham previsto.
Alguns homens estavam tão fracos que não podiam subir as redes oscilantes que
tinham descido havia 125 dias, numa manhã escaldante. Ao chegarem às
cobertas dos transportes e encolherem os ombros para se livrarem das mochilas
de combate, procuraram todos, cada um de per si, um canto sossegado, limpo e
seco, donde pudessem deitar uma boa vista de olhos à ilha em que sentiam,
embora vagamente, ter ajudado a escrever História americana.

Citada em nome do Presidente dos Estados Unidos

A 1.ª DIVISÃO DE FUZILEIROS, REFORÇADA, sob o comando do

Major-General Alexander A. Vandegrift, C. F. E. U.

CITAÇÃO

Os oficiais e soldados da l.° Divisão de Fuzileiros, Reforçada, demonstraram de


7 a 9 de Agosto de 1942, extraordinária valentia e determinação, ao efetuar com
êxito desembarques de assalto contra um número de posições japonesas
fortemente defendidas em Tulagi, Gavutu, Tanambogo, Florida e Guadalcanal,
nas ilhas Salomão britânicas, pondo em debandada todas as forças inimigas e
apoderando-se de uma valiosíssima base e de um aeródromo da zona de
operações inimiga no Pacífico Sul. Do período acima até 9 de Dezembro de
1942, esta Divisão Reforçada não só defendeu e manteve as suas importantes
posições estratégicas, apesar de violentos e repetidos ataques japoneses
terrestres, navais e aéreos, como também, mercê de uma série de operações
ofensivas, que encontraram forte resistência, expulsou os japoneses das
proximidades do aeródromo e lhes infligiu grandes perdas, em ataques por terra
e pelo ar. A coragem e a determinação demonstradas nestas operações
constituíram um exemplo encorajador.

Frank Knox

Secretário da Marinha

19. O EXÉRCITO TOMA POSSE

Depois de avaliar as forças de que dispunha, o general Patch, cuja missão


consistia em defender os aeródromos e destruir o 17.º Exército de Hyakutake,
quando visse que tinha efetivos para isso, chegou à conclusão de que devia adiar
os ataques até à chegada da 25.ª Divisão. Calculou — corretamente que a força
inimiga era da ordem dos 25 000 homens. A sua excederia, quando a divisão de
Collins chegasse, os 35 000. O general presumiu que os japoneses deviam ter
dificuldades em apoiar a sua posição, mas não podia imaginar que apenas uma
pequena fracção das tropas de Hyakutake estivesse em condições de desencadear
qualquer ação ofensiva. Sabia, porém, que o seu potencial defensivo chegara
para deter o esforço de Sebree, de Novembro, e não viu necessidade de sacrificar
mais homens, a oeste do Matanikau, enquanto não pudesse ter uma certa garantia
de êxito decisivo.
A batalha de Tanaka com Wright demonstrara que a Marinha japonesa
continuava a ser um fator importante e poderoso. As «Operações Rato», para
Kamimbo, prosseguiam com regularidade e sem que os americanos tentassem
seriamente impedi-las. Halsey, que lutava com uma pequena escassez de
cruzadores, reservava os couraçados para a primeira grande ameaça que surgisse.
As vedetas torpedeiros faziam o que podiam para dificultar as viagens do
«Expresso», mas este continuava, apesar de tudo, e Patch não tinha possibilidade
de saber o que transportavam os contratorpedeiros. A sua suposição errada de
que estavam a ser desembarcados reforços tinha a sua razão de ser em anteriores
experiências.

No papel, Patch dispunha de cinco regimentos de infantaria, mas destes apenas


três possuíam experiência de combate. O 164.º, de Moore, agora reduzido a uma
força efetiva inferior a 2000 —primitivamente fora de 3325 —, sofrera quase
500 baixas em combate, desde fins de Outubro. Igual número, considerado
impossibilitado de combater, devido a doença, fora evacuado, e a malária
grassava entre os restantes. O 2.º de Fuzileiros, de Arthur, não sofrera tantas
baixas em combate como as tropas de Moore, mas os seus homens encontravam-
se na área desde 7 de Agosto, estavam exaustos e atacados, também, de malária.
O 8.º de Fuzileiros, de Jeschke, que passara meses em Samoa antes de ir para a
frente, também não se encontrava em boa forma física. Desde a sua ação no
Matanikau, onde tinham sido mortos e feridos 103 oficiais e soldados, o
regimento fizera patrulhas constantes e agressivas e sofrera mais 111 baixas. O
moral, porém, era bom e todos confiavam em que o 8.º daria boa conta de si.
Mas todos os dias nove ou dez homens davam baixa à enfermaria, com
tumefacções dolorosas nas axilas ou nas virilhas. Estes inchaços eram os
primeiros indícios, retardados, do «mumu» — filaríose (elefantíase) —,
contraído em Samoa.

Ao 182.º de Infantaria faltava um batalhão completo — quase mil oficiais e


soldados — dos seus efetivos autorizados, e ainda não dera verdadeiras provas
de eficiência em combate. O regimento restante da Divisão Americal, o 132.º,
chegara havia apenas dois dias, nos barcos que, depois, tinham transportado a
primeira leva dos fuzileiros de Vandegrift. Estes soldados precisavam de tempo
para se aclimatar e enrijar, para adquirir um mínimo de experiência de selva em
ações de patrulha, antes de poderem ser lançados contra os obstinados japoneses.
Não estavam mental nem fisicamente preparados para prolongadas operações de
combate.
O 147.º de Infantaria encontrava-se todo, como força de guarnição, em Koli,
onde proporcionava defesa local aos Seabees e aos sapadores que construíam
uma pista para bombardeiros, nas planícies cobertas de erva das proximidades de
Volinavua — precisamente a zona que, vários meses antes, Vandegrift
recomendara a Turner, para a construção de um novo aeródromo. O 2.º de
Raiders, de Carlson, após a épica patrulha de quase trinta dias, na selva, durante
a qual matara 450 japoneses, regressara à base, mas seria evacuado em breve.

A força aérea da Cactus encontrava-se em forma relativamente boa e as suas


possibilidades operacionais tinham melhorado muito, depois da chegada do 1.º
de Sapadores da Aviação, do major de Fuzileiros F. Riley. A «Fighter One»,
onde nem sequer o 6.º de Seabees conseguira resolver o problema da drenagem,
fora abandonada, e a «Fighter Two» entrara em funcionamento em meados de
Novembro. Woods contava com quase 200 aviões, incluindo 100 caças. O moral
era elevado, como, na generalidade, fora quase sempre.

Da Nova Caledônia, o SCAT (South Pacific Combat Air Transport Command)


do coronel de Fuzileiros Perry Smith continuava a efetuar voos de rotina à ilha,
para efeitos de aprovisionamento e evacuação. Até 10 de Dezembro, os seus
bimotores Douglas DC-3 tinham transportado quase 3000 oficiais e soldados
feridos e doentes, ou seja, o triplo dos evacuados por mar. Estes excelentes
aviões, pilotados por experientes e hábeis aviadores dos Fuzileiros e da Força
Aérea, voavam fossem quais fossem as condições atmosféricas e transportavam
tudo, de munições, tambores de gasolina, bombas, chocolates e arame farpado,
às peças de tecido de algodão de desenhos exóticos, das quais os batedores de
Clemens, que manejavam a linha e a agulha com tanta habilidade como as
espingardas, faziam os confortáveis e frescos lava-lavas, que preferiam,
sensatamente, às calças de cotim.

As condições de vida não tinha, contudo, melhorado muito, desde os primeiros


dias. As ementas continuavam a ser monotonamente iguais: salsichas enlatadas,
batatas desidratadas, Spam, arroz (que, preparado pelos cozinheiros do Exército
e dos Fuzileiros, parecia cola de sapateiro e sabia ainda pior), vagens, cenouras
aguadas, ameixas e ovos em pó. De vez em quando, os barcos de Turner
desembarcavam rações, para alguns dias, de maçãs, laranjas, couves e lombos
congelados de vaca ou carneiro (imediatamente batizados de «bode morto» e
uniformemente detestados por todos). Os capitães e as tripulações dos barcos
também costumavam ser generosos e distribuir o que podiam, das reservas dos
seus navios. Já ninguém tinha falta de tabaco ou doces. Oficiais da intendência e
manhosos sargentos da messe tinham estabelecido um comércio muito ativo com
os marinheiros e trocavam Nambus, bandeiras da «almôndega», pistolas Luger e
espadas de samurai por batatas e ovos «a sério», presunto, bacon e frangos
congelados. Uns comiam melhor do que outros, mas ninguém passava fome.

Como os seus predecessores, os soldados e os fuzileiros de Patch viviam em


tendas pequenas, discutiam constantemente por causa da comida, da chuva e da
lama, vangloriavam-se de imaginárias proezas sexuais, amaldiçoavam a
estupidez dos seus comandantes, injuriavam a Marinha e MacArthur, coçavam as
picadas dos mosquitos, visitavam frequentemente as latrinas e metiam-se a
correr nos enlameados abrigos sempre que, todas as noites, «Washing Machine
Charlie» pagava os seus respeitos. Três ou quatro caças noturnos teriam limpo o
céu daquela peste, mas tais aparelhos, apesar de repetidamente pedidos, nunca
tinham aparecido.

Os homens desejavam, acima de tudo, acabar com aquele compasso de espera


aparentemente interminável e, por isso, não gostaram muito da decisão de Patch
de aguardar a chegada de novas tropas, antes de preparar um ataque final. Este
ataque, aprovado por Halsey e Nimitz e por Washington, obrigaria ao recomeço
das operações em meados de Janeiro. Mais uma vez, o planeamento americano e
japonês parecia unânime.

Embora Tanaka, entregue a outra ocupação, não tivesse descarregado os


aprovisionamentos na noite de 30 de Novembro, os seus contratorpedeiros
continuaram as suas idas e vindas, para mandar para terra tambores flutuantes de
comida. Como não tiveram muito êxito, em princípios de Dezembro a Esquadra
Combinada inaugurou um transporte suplementar, com o nome de código de
«Ratinho». Os «ratinhos» eram submarinos da esquadra. «O sistema deu
resultados satisfatórios», até que «barcos PT inimigos começaram a interferir
[...] e o método tornou-se gradualmente ineficaz.» Em 9 de Dezembro, um barco
torpedeiro de Tulagi «interferiu» ao ponto de afundar o submarino I-9, quando
este emergia, ao largo de Esperança, para iniciar o descarregamento. Foi um
indício claro de que as operações «Ratinho» deviam ser interrompidas.

Os japoneses encontravam-se num estado quase frenético. Recorreram a todos os


expedientes possíveis e imaginários para entregar quantidades mínimas, que
fosse, de alimentos, remédios e munições de armas ligeiras e morteiros. Bettys,
em voos baixos, tentaram lançar volumes com arroz e balas, mas quando algum
conseguia fugir à perseguição dos caças, os volumes caíam no mar ou no
coração da selva. O método foi rapidamente abandonado. Utilizaram-se, a seguir,
barcos à vela e pequenos barcos a motor, que navegavam para a ilha a coberto da
escuridão e se ocultavam durante o dia. D. G. Kennedy, major das Forças de
Defesa das Ilhas Salomão, com base perto de Segi, na Nova Geórgia, não perdia
de vista este tráfico. Do seu quartel-general na selva, Kennedy comandava uma
força anfíbia particular de nativos que, em canoas de guerra de 12 homens,
percorriam as baías, lagoas e enseadas da sua ilha, do nascer ao pôr do Sol. O
serviço de espionagem de Kennedy era perfeito, tão perfeito que pouquíssimas
das embarcações descobertas pelos seus batedores conseguiam fugir. Os
«Rapazes de Kennedy», como eles orgulhosamente se intitulavam, não faziam
prisioneiros, a não ser que recebessem ordens nesse sentido. Matavam rápida e
metodicamente e decapitavam os cadáveres dos inimigos com um simples golpe
das espadas de samurai apreendidas, usadas por muitos deles suspensas de
cinturões japoneses, cingidos aos lava-lavas.

Os homens da organização de vigilantes costeiros das Salomão centrais e


inferiores tiveram seis semanas de trabalho muito ativo, desde o dia 1.º de
Novembro a meados de Dezembro. Os japoneses tinham descoberto a existência
da rede do primeiro-tenente Feldt e, nas Salomão setentrionais e centrais, as suas
patrulhas fizeram esforços desesperados para apanhar os brancos que
continuavam a comunicar os movimentos naval e aéreo. Em Guadalcanal,
Martin Clemens partiu, em gozo de merecida — e necessária — licença, e foi
substituído por David Trench. Dick Horton e Henry Josselyn, que
desembarcaram com o 1.º de Raiders em Tulagi, continuaram de serviço, Horton
oculto nas Russell e Josselyn em Vella Lavella. K. D. Hay também permaneceu
no seu posto em Gold Field Ridge, nas montanhas sobranceiras à planície de
Lunga. A sua única companheira era uma freira idosa, que sobrevivera a uma
matança cometida por uma patrulha japonesa.

Vários dias depois de Patch assumir o comando, Harmon chegou de avião a


Guadalcanal, a fim de discutir planos para a ofensiva de Janeiro. Harmon tinha
empenho em que o monte Austen fosse tomado o mais depressa possível, e Patch
também considerava a ocupação desta acidentada massa montanhosa um
preliminar essencial ao êxito das operações seguintes. Patch apresentou ao seu
superior um plano de manobra ortodoxo, em duas fases. Na primeira, tomaria o
monte Austen; na segunda, avançaria para oeste, numa frente larga, com o flanco
direito protegido pelo litoral. O flanco esquerdo seria, pois, o de manobra.

Alguns oficiais do estado-maior manifestaram discreta oposição a este projeto,


que insinuavam ser dificílimo de apoiar, dispendioso e demorado. O terreno a
oeste do Matanikau formava um corredor, de norte a sul, ladeado por uma série
de escarpas íngremes, que os atacantes teriam de assaltar sucessivamente. Os
japoneses haviam organizado as suas defesas contra um avanço leste-oeste e
fortificado as contra-encostas das escarpas com plataformas de fogo que se
apoiavam mutuamente. Os defensores encontravam-se, aí, quase totalmente
imunes ao fogo de artilharia. Exceto numa estreita faixa ao longo da costa, o
terreno não era adequado para tanques nem veículos de rodas. O
aprovisionamento de alimentos, munições e água ao flanco do interior — e a
evacuação dos seus feridos — levantaria problemas de grandes proporções.

Parecia a estes oficiais que uma penetração anfíbia — ou uma séria delas — na
retaguarda japonesa anularia não só as dificuldades físicas inerentes a um ataque
por um corredor, como permitiria, também, surpresa tática, cortaria as linhas de
aprovisionamento nipônicas de Kamimbo-Esperança para Kokumbona e
simplificaria muito os problemas de apoio logístico. Outros, favoráveis a um
ataque ainda mais decisivo do que tais operações praia-a-praia, a curta distância,
sugeriam um desembarque de grande envergadura, na costa sul, imediatamente
seguido por um ataque a oeste do cabo Esperança. Esta manobra, coordenada
com uma investida ao longo da costa norte, deixaria os japoneses a braços com
uma situação muito embaraçosa. Estes oficiais argumentavam que se conseguiria
reunir barcos de combate e aviões suficientes para proteger e apoiar tais
operações.

Por outras palavras, havia que escolher entre derrubar uma série de muros de
pedra ou abrir o portão do jardim a pontapé. Como tantas vezes acontece na
guerra, prevaleceram as opiniões menos imaginativas. A razão apontada para a
recusa do acesso indireto, em favor do direto, era a falta de cruzadores,
contratorpedeiros e embarcações de desembarque. Mas ainda faltava quase um
mês para o «Dia D» provisório, e se se fizesse um esforço intenso ter-se-iam
arranjado os barcos e as tripulações necessários. Isso provocaria, sem dúvida,
uma agitação temporária no ramerrão administrativo das zonas da retaguarda,
mas prometia, por outro lado, a perspectiva da rápida liquidação do inimigo, por
um preço relativamente baixo. Talvez o espectro da derrota em pormenores
dominasse estas reuniões, como acontecera tantas vezes nas do antecessor do
general Patch. No entanto, no tempo de Vandegrift houvera maiores motivos
para tomar esse fator em consideração.

Em 10 de Dezembro, o brigadeiro-general Sebree ordenou ao oficial comandante


do 132.º de Infantaria que mandasse uma companhia «ocupar» o monte Austen.
No decurso da sua demorada patrulha, os raiders de Carlson tinham passado a
sul desta complexa ramificação de espinhaços, vales e cabeços, sobranceira ao
perímetro e de cuja entrada o inimigo observava a atividade dos americanos.
Nessa passagem, descobriram um esquema complicado de instalações defensivas
nipônicas, na área, as quais não estavam, contudo, bem guarnecidas. Ao que
parece, Sebree julgou que uma companhia seria suficiente para a missão, mas
disse ao coronel Leroy E. Nelson que se uma não fosse suficiente, mandasse um
batalhão. A companhia de Love partiu em 16 de Dezembro.

No dia 17, estabeleceu contato com o inimigo; no dia 18, Nelson mandou para a
frente o resto do 3.º Batalhão. Na mesma tarde, o general Sebree procedeu a um
reconhecimento pessoal da área e chegou à conclusão de que Nelson poderia
utilizar, com vantagem, outro batalhão. Mandou, por isso, o 1.º Batalhão (menos
uma companhia) ao comandante do regimento. No dia seguinte, o 3.º Batalhão
comunicou que 200 a 300 japoneses defendiam uma posição muito bem
organizada, a sua frente. Em três dias —19, 20 e 21 —, as metralhadoras
nipônicas detiveram vários ataques limitados, com o apoio de artilharia e SBD.
O fogo da artilharia pouco efeito produzia nos abrigos de troncos em que o
inimigo se ocultava, e os observadores dos SBD não podiam, pura e
simplesmente, localizá-los. Se os soldados, em terra, não conseguiam encontrar
os japoneses, não admira que os aviadores também não conseguissem.

Em 21 de Dezembro, Nelson pediu o seu 2.º Batalhão. Lutava com dificuldades,


no abastecimento de água e comida. As suas tropas, que ainda não se tinham
aclimatado e estavam em deplorável forma física, eram tão incapazes de suportar
o calor de rachar como os fuzileiros de Cates, em 7 de Agosto. Da base
informaram o coronel, em resposta ao seu pedido, de que o 2.º Batalhão não
estava disponível; encontrava-se a guarnecer posições defensivas, na praia.
Sebree não esteve com delicadezas: «Não peça mais o 2.º Batalhão. Decisão
final.» Nelson não teve outro remédio senão resignar-se à recusa. No entanto, ele
e os seus comandantes tinham aprendido uma lição: as informações antigas —e a
de Carlson envelhecera, entretanto— raramente mereciam confiança.

Para apoiar o seu ataque na manhã seguinte, Nelson pediu intenso fogo
preparatório, na zona de ação do 3.º Batalhão. O seu pedido foi aprovado e o
coronel ordenou imediatamente ao batalhão que recuasse 900 metros. Na manhã
seguinte, a artilharia do Exército e dos Fuzileiros efetuaram o mais violento
bombardeamento da história de Guadalcanal, até àquela data, e a aviação atacou
supostas posições inimigas. Quando o fogo cessou e os aviões partiram, o
coronel ordenou ao seu batalhão que regressasse à sua linha de partida e
desencadeasse o ataque. O avanço para a posição anterior levou o dia todo.
Desperdiçara-se, em vão, uma grande quantidade de valiosas munições de
artilharia e de bombas.

No dia de Natal, os soldados do monte Austen comeram feijões frios. Mas as


suas patrulhas de reconhecimento julgavam ter delineado os limites gerais da
posição a que os japoneses chamavam «Gifu». Nelson ordenou ao 1.º Batalhão
que se deslocasse para uma nova zona de partida e atacasse no dia 7 de
Dezembro, a fim de liquidar a posição inimiga. O batalhão desdobrou-se na
selva densa, avançou para a sua linha de partida e foi detido. Ao meio-dia do
14.º dia desta batalha, que degenerara num autêntico desastre, Patch mandou,
finalmente, o 2.º Batalhão ao comandante do regimento. Estas novas tropas
chegaram em 31 de Dezembro.

Mais ou menos ao mesmo tempo, o coronel Nelson, atacado de malária,


preocupado com o número de baixas e submetido a incessante pressão, pediu
sensatamente que o substituíssem. De 19 a 30 de Dezembro, os seus 1.º e 3.º
batalhões tinham sofrido 182 baixas em combate, além de 131 oficiais e
soldados evacuados, alguns tão doentes com malária e disenteria, ou ambas as
coisas, que não se tinham de pé. O moral estava muito baixo. Os ataques, mal
planejados e inabilmente executados, haviam causado a morte a meia dúzia de
japoneses e não fizeram a mínima mossa na «Gifu».

O Exército americano repetiu, neste caso, um erro já anteriormente cometido


pelos fuzileiros e pelos japoneses: atacar sem reconhecimento preliminar
minucioso. Claro que este reconhecimento requer tempo e pessoal ousado e
experiente. Se se tivessem concedido quatro ou cinco dias a este projeto e tirado
e estudado as necessárias fotografias aéreas, a «Gifu» talvez pudesse ser vencida
em poucos dias e sem grandes baixas. O segundo erro consistiu em mandar um
regimento recém-chegado atacar um ponto tão forte. O argumento de que se
desconhecia a verdadeira força do «Gifu» não tem cabimento, pois a verdade é
que se deviam ter mandado patrulhas determinar essa força, assim como a
extensão da posição, antes de desencadear o ataque. Como se estes erros
fundamentais não chegassem, o comando confiara uma missão a um comandante
e depois negara-lhe os meios de a cumprir rápida e convenientemente. Por fim,
as ridículas marchas e contramarchas a que Nelson sujeitara o seu 3.º Batalhão
deviam ter sugerido a sensatez de se nomear um comandante de regimento
menos timorato.

À medida que a desastrosa operação do monte Austen se prolongava por Janeiro,


tornou-se evidente que tanto o major-general Patch como o seu ajudante tinham
muito que «desaprender» — e talvez ainda mais que aprender.

20. JANEIRO DE 1943

Mais ou menos ao mesmo tempo que o 132.º de Infantaria iniciava o ataque


contra a «Gifu», começavam no Quartel-General imperial conferências
igualmente indecisas e hesitantes. Em fins de Novembro e princípios de
Dezembro, alguns membros do Exército e da Marinha exprimiram discretamente
a crescente apreensão que lhes causava o convencimento de que não era possível
continuar a apoiar Hyakutake. Este pessimismo confesso era considerado
derrotista pelos escalões superiores da hierarquia militar e naval. «Ninguém se
atrevia a expor ou discutir abertamente tal opinião.»

Os oficiais da Marinha, que representavam o serviço responsável pelo


reabastecimento e reforço do 17.º Exército, encaravam a situação de modo mais
realista do que os seus colegas do Exército. As perdas de barcos de guerra,
sobretudo de contratorpedeiros, causavam à Marinha crescente preocupação.
Mas mais crítico ainda era o problema da substituição de aviões, pilotos e
tripulações. Em meados de Dezembro, até os planejadores mais otimistas tinham
pouca esperança de que a ilha «KA» pudesse ser eficazmente reforçada.

O Quartel-General imperial encarregou um grupo de ligação de recolher


opiniões de membros da Esquadra Combinada, do Exército da 8.ª Área do Sueste
e da 8.ª Esquadra. «Chegou-se à conclusão de que não havia possibilidade de
êxito.» Com esta desencorajadora opinião, os viajantes regressaram a Tóquio,
onde ulteriores estudos só serviram para confirmar a conclusão a que tinham
chegado durante a viagem.

O aprovisionamento e a redistribuição de forças largamente dispersas pelos


territórios conquistados e atoladas na interminável campanha da China,
causavam constantes e crescentes preocupações ao Quartel-General imperial.
«Eram precisos mais navios, cada vez mais navios [... ] mas o número total dos
que existiam decrescia diariamente, devido a grandes perdas inesperadas.» A
campanha dos submarinos americanos contra as linhas de comunicação entre o
Império e a «área de recursos» do sul, começava a dar excelentes resultados.
Portanto, não eram só os êxitos americanos e aliados em Guadalcanal e na Nova
Guiné que impunham medidas de economia.

Em 31 de Dezembro, o general Gen Sugiyama e o almirante Osami Naguno


apresentaram-se, de uniforme de gala, no palácio imperial, aonde tinham sido
chamados. Aí obtiveram autorização do Trono para retirar de Guadalcanal. As
Seções do Exército e da Marinha redigiram, então, o habitual «Acordo Central»,
e oficiais do estado-maior começaram a escrever ordens destinadas aos
respectivos comandantes interessados. Ao mesmo tempo, o Alto Comando
reconhecia que a decisão constituía «um grande ponto decisivo da guerra nesta
área».

Em 4 de Janeiro, um oficial-correio, o major-general Ayabe, entregou uma cópia


numerada, secreta, da ordem do Exército ao tenente-general Hitoshi Imamura,
no seu quartel-general de Rabaul. Durante vários dias, Imamura hesitou, à beira
da insubordinação. Só quando o convenceram de que a desagradável ordem fora
aprovada pelo imperador, se resignou a obedecer.

O comandante naval principal em Rabaul, vice-almirante Jinichi Kusaka,


também desaprovou vivamente a ordem. Achava que uma retirada minaria a
posição estratégica japonesa no sueste e desmoralizaria o Exército e a Marinha.
Além disso, a retirada transferiria a iniciativa para os americanos, dar-lhes-ia
confiança crescente e permitir-lhes-ia «desencadear, com audácia, operações
contra os nossos pontos vulneráveis». Mas, como «não havia esperança de
modificar as coisas», o almirante decidiu, relutantemente, cooperar com o
Exército e «em conjunto com ele, tentar todos os meios possíveis de evacuar as
forças de Guadalcanal de fins de Janeiro a princípios de Fevereiro».

Embora houvesse que abandonar Guadalcanal, o general Ayabe explicou que se


intensificariam as operações na Nova Guiné. As bases operacionais de Lae,
Salamaua, Madang e Wewak seriam reforçadas, a fim de poderem apoiar uma
nova ofensiva contra Port Moresby. A construção do aeródromo nas Salomão
setentrionais deveria ser acelerada, e a Nova Geórgia e Santa Isabel bem
defendidas. Este programa de futuros projetos não levantou o moral em Rabaul,
e foi com uma relutância igual à do almirante Kusaka que o comandante do 8.º
Exército abandonou a sua «firme determinação de aniquilar o inimigo em
Guadalcanal» e se dedicou ao planeamento de «uma tarefa jamais empreendida
por um exército japonês» — uma retirada por mar.

Entretanto, houvera algumas mudanças em Guadalcanal. O major-general J.


Lawton Collins chegara com a sua 25.ª Divisão de Infantaria, e o 6.º do
Fuzileiros, reforçado (coronel Gilder T. Jackson), preparava acampamentos sob
os destroçados coqueiros. Com a chegada destas tropas, a 2.ª Divisão de
Fuzileiros estava completa.

Aconteceu então uma coisa peculiar. Alguém descobriu (sem dúvida por acaso)
que o major-general John Marston, do C. F. E. U., comandante da divisão, tinha
um posto superior ao do general Patch. Mas Halsey prometera o comando a
Patch, quando este rendera Vandegrift, e, por isso, Marston foi substituído pelo
seu ajudante de campo, brigadeiro-general Alphonse de Carre. Enquanto se
resolvia este contratempo, o general Marshall formava o XIV Corpo e Harmon
nomeava Patch seu comandante. Sebree ficou com a Divisão Americal.

Patch tinha, agora, na ilha, três divisões com a força total, no papel, de 40 000
homens. Este número, porém, era ilusório, pois incluía muitos não efetivos,
sobretudo na Divisão Americal. As tropas de Collins eram frescas, assim como
as do 6.º de Fuzileiros, mas nenhuma companhia de atiradores, dos regimentos
de infantaria, estava completa. Muitas estavam, até, muito abaixo da força
autorizada. Eram estes oficiais e estes homens que tinham, como sempre, de
suportar a carga maior, de rastejar, cavar abrigos, passar a noite na lama e abrir
caminho de manhã. Eles que, suados e sequiosos, teriam de localizar as
metralhadoras japonesas e silenciá-las, uma por uma, estavam de novo, também
como sempre, em último, lugar, em matéria de apetrechamento.

Alguns dias antes da formação do Corpo, Woods transmitira o seu cargo de


«ComAirCACTUS» ao brigadeiro-general Francis P. Mulcahey, do C. F. E. U.
Mulcahey herdou uma empresa em franco progresso. Henderson, muito
aumentado, era já um aeródromo completamente «atapetado», em condições de
funcionar fossem quais fossem as condições atmosféricas, do qual levantavam
voo B-17, para missões de bombardeamento em Rabaul. Também tinham
chegado bombardeiros bimotores e, para reconhecimentos distantes, havia uma
esquadrilha de Hudsons, com tripulações da Nova Zelândia.

Aparelhos auxiliares de todos os tipos, da Marinha, enchiam o porto de Tulagi,


onde se encontravam quase duas dúzias de barcos torpedeiros, destinados a
impedir as operações «Rato», «Ratinho» ou «Formiga». Em princípios de
Janeiro de 1943, «a ilha» crescia. Até já havia cinema, uma vez por outra. Mas
continuava a não haver mulheres.

Quando a calma primeira semana do sexto mês de Guadalcanal terminou, o 35.º


de Infantaria do coronel Robert B. McClure saiu do perímetro, a fim de retomar
a ofensiva contra a «Gifu» e de expulsar os japoneses de um monte —o «Cavalo
Marinho»— que ficava cerca de 900 metros a oeste dessa posição. Estas eram as
únicas posições defensivas organizadas que o inimigo mantinha a leste do
Matanikau. Os homens que as guarneciam, elementos dos 124.º e 128.º
regimentos de Infantaria, não representavam grande ameaça para os americanos.
Mas, das suas posições neste terreno elevado, os soldados nipônicos podiam
efetuar ataques à retaguarda, molestar as colunas de evacuação e de
aprovisionamento, atirar de emboscada— em suma, causar grandes
aborrecimentos.

Era, pois, manifestamente desejável começar por isolá-los dos seus camaradas a
oeste do rio e, depois, liquidá-los. O general americano esperava conseguir este
último objetivo induzindo-os a render-se. Se eles recusassem, proceder-se-ia ao
extermínio por bombardeamentos contínuos e metódicos. O regimento do
coronel McClure foi encarregado de acelerar o cumprimento dessas tarefas.
Enquanto um dos seus batalhões avançava para comprimir a «Gifu» e os outros
ocupavam posições para atacar o «Cavalo Marinho» pelo sul, os elementos
encarregados de iniciar o avanço para oeste completavam os preparativos para
desencadear a sua ofensiva.

Os japoneses que iam atacar, esses, encontravam-se em estado deplorável. O


comando de Hyakutake já não era mais do que o esqueleto de um exército.
Estavam todos famintos, incluindo o general e o seu chefe de estado-maior. Mas
tinham balas. E determinação. Lutariam e continuariam a lutar até não terem
força para carregar as Nambus, meter granadas nos morteiros e disparar.
Merecem o nosso respeito os oficiais e soldados deste exército tristemente
estropiado, mas de modo nenhum desmoralizado.
Foi contra estes homens, que esperavam morrer nos seus abrigos, que o major-
general Patch lançou, na manhã de 10 de Janeiro de 1943, o seu XIV Corpo.

O Corpo desencadeou o seu ataque ao flanco esquerdo (do lado do interior) às


5.50 h., com seis batalhões de artilharia a disparar as primeiras 6000 salvas
contra uma área a oeste do Matanikau chamada «Cavalo Galopante». O
bombardeamento intensivo durou 30 minutos. Um momento depois de as
últimas granadas explodirem, cada um de 12 aviões de combate lançou uma
bomba de 250 quilos em pontos que se supunham ser posições japonesas. A estes
aviões seguiram-se 12 SBD, que em mergulhos sucessivos lançaram 36 cargas
de profundidade de 325 libras contra posições inimigas que os morteiros da
Infantaria tinham assinalado com granadas fosforescentes.

O 1.º Batalhão do 27.º de Infantaria avançou depressa e não teve dificuldade em


se apoderar do seu primeiro objetivo no «Cavalo Galopante». À sua esquerda,
embora encontrasse resistência esporádica, o 3.º Batalhão também alcançou o
objetivo que lhe fora destinado ao fim da tarde. Na manhã seguinte, após
bombardeamento preliminar, ambos os batalhões atacaram de novo. Mas o 3.º
teve dificuldades. Os soldados não tinham recebido água e continuaram sem a
receber até ao meio-dia. Entretanto, várias dezenas de homens ressequidos,
desidratados e exaustos não resistiram ao sol esbraseador. O batalhão pouco ou
nada progredia e, a meio da tarde, o seu comandante, tenente-coronel George E.
Bush, decidiu mandar retirar os seus elementos avançados para posições
sustentáveis. Este dia, desesperante para o batalhão de Bush, culminou com o
lançamento, pelos japoneses, de granadas de morteiros de 90 mm contra vários
grupos de soldados em retirada.

Na manhã seguinte, o 2.º Batalhão rendeu o 3.º e atacou imediatamente ao longo


de um espinhaço coberto de erva kunai, na direção de uma posição japonesa bem
escondida e fortemente defendida, na ponta sul do espinhaço, designada por
«Monte 53». O batalhão não sabia, ao lançar as suas companhias no ataque, que
a sua batalha solitária, naquela serrania desolada, granjearia merecidos louvores
ao batalhão, ao regimento e à própria 25.ª Divisão.

Durante todo o seu curso, a campanha de Guadalcanal foi uma série de ações de
pelotões, companhias o batalhões. Exceto na decisão de pedir apoio da artilharia,
organizar ataques aéreos ou chamar a sua reserva à frente de batalha, um
comandante de regimento — ou, até, de batalhão— pouco controle podia exercer
nos combates travados. Assim, jovens oficiais comandantes de companhias e
oficiais subalternos, possuidores de habilidade para planejar combinações
indicas engenhosas e dirigir a sua execução, tiveram sobejos ensejos para pôr à
prova os seus talentos, que não são tão frequentes como às vezes se supõe. Pois a
luta pela posse do lado sul do «Cavalo Galopante», travada em 13 de Janeiro,
iria desenrolar-se, precisamente, num combate deste gênero, travado e decidido
de tão perto que se chegaram a trocar granadas de mão a distâncias inferiores a
18 metros.

O primeiro problema que se apresentou ao tenente-coronel Herbert V. Mitchell,


ao seu ajudante, capitão Charles W. Davis, e ao seu estado-maior foi localizar o
centro de resistência donde metralhadoras ligeiras e pesadas disparavam contra
qualquer soldado que se expusesse. Durante o dia escaldante, sem água, duas
companhias, uma de cada lado do espinhaço, tentaram repetidamente aproximar-
se da ponta sul. Todas as tentativas foram repelidas e, à tarde, com o vestuário
enegrecido de suor e terra e a garganta seca como lixa, os homens estavam todos
à beira do colapso. Mas uma patrulha de três oficiais, comandada pelo capitão
Davis, descobrira as posições japonesas, que se apoiavam mutuamente, no
«Monte 53» —o objetivo de Mitchell —, e Davis tinha a certeza de que poderia
apoderar-se da maior apenas com uma pequena patrulha.

Antes do meio-dia de 13 de Janeiro, ele e a sua patrulha de cinco homens


conseguiram-no, de fato. Primeiro rastejaram até nove metros da posição, depois
lançaram uma chuva de granadas contra os japoneses e, por fim, entraram e
mataram a maior parte dos inimigos que lá encontraram. Alguns homens
atordoados saíram do abrigo e fugiram para a selva. Esta «investida temerária»
foi observada por centenas de soldados nas encostas adjacentes e encorajou-os a
imitar os camaradas e a fazer o mesmo às restantes posições japonesas no
«Cavalo Galopante». O flanco esquerdo do XIV Corpo encontrava-se
firmemente apoiado, a 4100 metros do mar, e Collins dispunha do espaço de
manobra de que precisava.

Os japoneses não tardaram a compreender que se preparava um esforço decisivo,


mas Hyakutake muito pouco podia fazer além de exortar as suas tropas a resistir.
Não tinha reserva, nem para contra-atacar nem para localizar as penetrações
americanas. Em 10 de Janeiro, o primeiro dia do ataque, o 17.º Exército
queimara o seu arquivo secreto e começara a preparar-se para transferir o
quartel-general para Tassafaronga.

Os últimos aprovisionamentos que chegaram aos obstinados que guarneciam a


«Gifu» foram entregues em 13 de Janeiro, por um pequeno grupo de transporte
que abriu caminho através das linhas americanas. Ao mesmo tempo, o 17.º
Exército ordenou o abandono da posição. Talvez os japoneses isolados tenham
ignorado deliberadamente essa ordem, ou talvez o oficial comandante julgasse
que a tentativa inimiga não resultaria. Fosse pelo que fosse, o certo é que ficaram
e, durante alguns dias, continuaram a repelir todos os ataques do 2.º Batalhão do
35.º de Infantaria.

Em 14 de Janeiro, o contra-almirante Koniji Koyanagi, que substituíra Tanaka


como comandante da Força de Reforço em 29 de Dezembro, mandou um
«expresso» importante descer The Slot. A noite estava escura, a visibilidade era
má e os contratorpedeiros aproximaram-se, devagar, de Esperança. Depois de
desembarcarem passageiros e carga com a habitual celeridade, começaram a
retirar a toda a velocidade. Mus não estavam sós naquelas águas fustigadas por
chuvadas intermitentes. Aguardavam-nos sete barcos torpedeiros. O tiroteio
durou poucos minutos, durante os quais os comandantes japoneses apanharam
uma série de grandes sustos. Mas conseguiram safar-se em segurança. Dois
torpedeiros ficaram danificados, na refrega, fato que não intimidou as
tripulações, que mereceram, até, um elogio dos japoneses: «O inimigo tem usado
barcos torpedeiros agressivamente [...] por causa deles, os nossos navios têm
sido obrigados a engolir muitas pílulas amargas. Não faltam exemplos das
enormes dificuldades que têm causado ao transporte de aprovisionamentos.»

Um grupo de ataque que partiu de Henderson de manhã localizou os japoneses


ao largo da costa da Nova Geórgia, mas, como acontecera aos torpedeiros, não
conseguiu impedir a fuga do «Expresso». No entanto, o dia 15 de Janeiro de
1943 ficaria memorável nos anais da aviação dos Fuzileiros Navais, pois Foss
abateu três aviões nipônicos e tornou-se o maior ás da Aviação americana, com
21 aparelhos inimigos destruídos em combate.

Também nesse dia, uma primeira leva do 2.º de Fuzileiros disse, finalmente,
adeus à ilha. A retirada deste regimento reduziu a 2.ª Divisão de Fuzileiros a
duas equipas de combate, das quais o 8.º estava a precisar de descanso. O
general Patch mandou-o retirar para a base e formou uma Divisão mista do
Exército e dos Fuzileiros (CAM), composta por quartel-general, 2.º Divisão de
Fuzileiros, 182.º de Infantaria e 147.º de Infantaria. Esta divisão improvisada
atacaria ao longo do litoral marítimo, na segunda ofensiva do novo ano, marcada
para começar em 22 de Janeiro de 1943.
A desagradável tarefa de entregar a ordem de Imamura para abandonar a ilha
«KA» e explicar os planos futuros a Hyakutake fora confiada ao tenente-coronel
Kumao Imoto. Ele e um grupo de oficiais e soldados das Operações do Exército
da 8.ª Área desembarcaram no cabo Esperança poucos minutos antes da meia-
noite de 14 de Janeiro e, após breve descanso, puseram-se a caminho do posto de
comando do 17.º Exército. Cada oficial e cada soldado transportava uma mochila
com 45 quilos de «prendas de consolação»: frasquinhos de uísque, bolos, peixe
seco e cigarros.

Pouco depois de alvorecer, apareceram aviões americanos para bombardear e


metralhar o caminho costeiro. O coronel e os seus companheiros abrigaram-se
atrás de árvores caídas. Ao retomarem a marcha na direção do rio Bonegi, viram
os cadáveres de «muitos soldados que tinham morrido de fome e doença, e
observaram que as instalações hospitalares eram deploráveis». A viagem
deprimente, e frequentemente interrompida, ao longo da costa, levou 18 horas.

Quando o grupo extenuado chegou à foz do Bonegi, o breve crepúsculo tropical


dava lugar à noite. No céu, roncavam aviões, de regresso a Henderson. Apareceu
um guia, que conduziu os visitantes desde a foz do rio à zona do quartel-general,
a montante. Quando chegaram, identificaram-se e perguntaram pelo chefe do
estado-maior. Enquanto avançavam, às apalpadelas, para a tenda do general
Miyazaki, este chamou Imoto pelo nome. O tenente-coronel entrou na tenda
fracamente iluminada por uma vela.

O coronel Haruo Konuma, oficial superior do estado-maior do 17.º Exército,


estava deitado numa cama feita de gravetos. Miyazaki apagou a vela e, às
escuras, Imoto começou a explicar a sua missão. Enquanto falava, no meio de
um silêncio pesado, adivinhou o espanto dos dois oficiais que o escutavam.
Aparentemente, ambos esperavam que lhes levasse ordens de uma nova
ofensiva. Quando Imoto acabou, Miyazaki declarou, em tom brusco: «Apesar
dessa ordem, o exército não pode retirar, nas presentes circunstâncias.» Imoto
ouviu, então, o chefe do estado-maior e o seu ajudante explicar
pormenorizadamente a situação em que o exército se encontrava.

«Se tomássemos a ofensiva», afirmou Miyazaki, «depois de reforçados e


suficientemente reabastecidos, isso modificaria a situação. Mas se o exército não
puder ser reforçado e suficientemente reabastecido, então não teremos outro
remédio senão abrir caminho através das linhas inimigas e conquistar um
derradeiro fulgor de glória.» Fora esta a decisão tomada por Hyakutake e os seus
comandantes. Retirar, concluiu o chefe do estado-maior, seria «mais difícil do
que passar por cima de mares tempestuosos». A discussão prolongou-se até
romper o dia. Com o nascer do Sol, aviões começaram a percorrer o céu, «como
falcões em busca de presa», e do leste «continuaram a chegar ecos abafados de
violento tiroteio». Poucos minutos depois, Imoto foi conduzido à presença do
comandante-geral.

«Encontrei-o sentado num cobertor, num buraco aberto sob as raízes de uma
grande árvore. Entreguei-lhe a ordem de retirada e os planos futuros, assim como
uma carta pessoal do general Imamura. Ouviu, de olhos fechados, as minhas
explicações. Quando acabei, disse-me, muito devagar: «O problema é muito
grave. Quero estudá-lo tranquilamente e sozinho, por momentos. Queira deixar-
me só, até eu o chamar.»

Ao meio-dia, Imoto foi chamado ao abrigo de Hyakutake, que lhe falou devagar:

«É muito difícil ao exército retirar nas circunstâncias existentes. No entanto, as


ordens do Exército da Área, baseadas em ordens do Imperador, devem ser
cumpridas, custe o que custar, e, por isso, cumpri-las-ei, respeitosamente.»

Imoto teve, então, de explicar a ordem recebida a todos os oficiais do estado-


maior. Foi uma audiência hostil, a que encontrou. Quando acabou, um dos
oficiais disse: «Não podemos, na realidade, fazer outra coisa senão abrir
caminho através das linhas inimigas e morrer com honra.» Imoto observou que
não era esse o objetivo da ordem que trouxera. Depois de uma discussão geral
que se prolongou por algum tempo, todos os presentes se comprometeram «a
fazer os maiores esforços para que fosse efetuada a necessária coordenação».

Nessa tarde, o coronel Konuma dirigiu-se para a frente, a fim de explicar as


ordens aos majores-generais Maruyama e Sano. Regressou na noite seguinte, 18
de Janeiro, com a notícia de que os dois comandantes de divisão «tinham
resolvido obedecer à decisão do comandante-geral do 17.º Exército».

No mesmo dia, o XIV Corpo ocupou posições 900 metros a oeste do Matanikau.
Os fuzileiros de Collins e os soldados de Carre dedicaram-se a consolidação das
posições conquistadas nas escarpas quo se estendiam 4100 metros para o
interior, do litoral a extremidade sul do «Cavalo Galopante». Alguns destes
americanos e muitos japoneses morreriam violentamente, nas duas semanas
finais da última batalha da «Ilha da Morte».
A ofensiva que, anteriormente, abarcara a Malásia, Guam, as Filipinas, Hong-
Kong, as Índias e as Bismarck, encontraria aí o seu ponto final. Foi aí que, pela
primeira vez na Segunda Guerra Mundial, um exército japonês dominado,
imobilizado e impossibilitado de cumprir o seu objetivo, se preparou para
abandonar o campo ao inimigo. Mas não sem responder aos ataques, ao retirar.

Também não foi em desonra que o seu comandante se preparou para salvar o que
pudesse ser salvo do 17.º Exército e para o conduzir «por cima de mares
tempestuosos».

21. EPÍLOGO

O fato de o exército estar a recuar, a fim de preparar a retirada da ilha, era um


segredo conhecido somente pelos comandantes principais e pelos oficiais do seu
estado-maior. Aos soldados disse-se que as tropas estavam a ser dispostas para
futura ofensiva. A chegada de um novo batalhão de Rabaul, em 15 de Janeiro,
seguida imediatamente pelo desdobramento das suas companhias por posições
críticas da linha da frente, pareceu confirmar que assim era, na realidade.
Entretanto, pequenos destacamentos, compostos por homens em condições
físicas ligeiramente melhores do que a maioria dos que estavam nas linhas da
frente, infiltraram-se, a fim de render soldados tão fracos que mal se podiam
arrastar. Todos estes movimentos eram efetuados de noite.

Foram distribuídas instruções pormenorizadas, para que, no último momento,


fossem destruídas ou enterradas peças de artilharia, camiões e tratores. Todas as
munições — exceto as necessárias para armas pessoais— bem como
metralhadoras pesadas e ligeiras, morteiros, canhões antitanque e obuses,
deveriam ser lançados ao mar ou enterrados na selva. Em Kokumbona,
Tassafaronga, Esperança e Kamimbo estavam armazenadas rações de
emergência, desembarcadas por contratorpedeiros. Os doentes foram reunidos
nas imediações do cabo Esperança. Aqueles para quem as esperanças de
salvação eram poucas ou nenhumas, seriam abandonados. Talvez isto fosse
cruel, mas naquele momento era de primordial importância salvar tudo quanto
pudesse ser salvo do 17.º Exército.

À medida que os japoneses recuavam, devagar, o XIV Corpo avançava para


oeste. Todos os dias, concentrações maciças de artilharia bombardeavam as
posições japonesas; todos os dias, aviões de combate e SBD metralhavam e
bombardeavam as escarpas do interior e o caminho da costa; todos os dias,
morriam americanos e japoneses. No flanco esquerdo (sul), dois regimentos de
Infantaria avançavam rapidamente, ao longo dos espinhaços, e em 22 de Janeiro
o 1.º Batalhão do 27.º de Infantaria avistou Kokumbona. Nesta fase da ofensiva
do XIV Corpo, a divisão de Collins teve exatamente 300 baixas. Entretanto, a
Divisão CAM, a atacar com o flanco direito apoiado no caminho costeiro,
encontrou uma série de posições que os japoneses defenderam até ao fim. Foi aí
que um comandante de companhia de bigodes façanhudos, o capitão Henry P.
Crowe, reativou um ataque que os japoneses tinham detido: «Levantem-se, seus
filhos de uma cabra! Não ganharão Purple Hearts metidos nesses malditos
buracos!»

Nos últimos dias de Janeiro de 1943, enquanto as «águias marinhas»


desencadeavam uma nova ofensiva aérea contra os aeródromos de Guadalcanal,
vigias costeiros anunciaram, de novo, que se estavam a reunir barcos de guerra
no Simpson Harbor e nas Shortlands e que, mais uma vez, a Esquadra
Combinada saíra de Truk. Estes fatos foram interpretados pelo almirante Halsey
e pelo general Patch como indícios claros de outra tentativa de reforço em
grande escala. Patch suspendeu a ofensiva e mandou regressar a 25.ª Divisão, a
fim de defender os aeródromos de um ataque pelo mar.

Este procedimento tem sido alvo de muitas críticas, nem todas imparciais. Do
ponto de vista psicológico os japoneses tinham os americanos precisamente onde
lhes convinha. Talvez o mal residisse no fato de os dois comandantes principais
terem tentado, mais uma vez, adivinhar as intenções do inimigo, em vez de
analisar as suas possibilidades. O que os americanos receavam era que, com o
grosso da força de Infantaria a combater no oeste, o inimigo aproveitasse para
atacar o único ponto vital. Talvez um comando mais audacioso tivesse tentado
jogar pelos dois lados, mas Halsey e Patch acharam a prudência aconselhável.

Às 21.30 h. do dia 1 de Fevereiro de 1943, a primeira leva dos 2316 debilitados


oficiais e soldados que restavam dos quase 8000 que o major-general Tadayoshi
Sano levara para a ilha, entrou silenciosamente na água e encaminhou-se para as
barcaças que esperavam perto do cabo Esperança. Em menos de duas horas, os
vultos dos contratorpedeiros do «Expresso» do contra-almirante Tomiji
Koyanagi afastaram-se daquele «Cabo da Esperança», agora tão familiar aos
capitães que tinham servido sob as ordens do almirante Tanaka.

Três noites depois, o corpo principal da Divisão Sendai, de Maruyama,


embarcou sem interferência inimiga. Ao mesmo tempo, o general Hyakutake e
os principais membros do seu estado-maior subiram, fatigados, a escada que o
mar atirava, ritmadamente, contra o casco manchado do contratorpedeiro
Hamakaze. O general saudou o comandante e dirigiu-se imediatamente para o
seu camarote. Não olhou para trás. Em 7 de Fevereiro, a retaguarda do coronel
Matsuda, pouco mais de 3000 homens, partiu de Kamimbo.

Nestas três noites, a Marinha levou da ilha quase 11 000 oficiais e soldados. O
17.º Exército deixara atrás de si quase 21 000 cadáveres, muitos deles insepultos,
onde as granadas da artilharia ou a metralha dos aviões os tinham abatido.
Outros, que já não sentiam os tormentos da doença, nem da fome, nem do
cansaço, estavam encolhidos nos abrigos abertos sob as raízes das grandes
árvores e seguravam nas mãos ossudas, sobre as quais a pele pergaminhada se
esticava, os canos ferrugentos de espingardas que nunca mais apontariam nem
disparariam. A ponta ocidental da ilha transformava-se num silencioso anfiteatro
de morte e decomposição, onde os únicos seres vivos eram as aves da selva e os
gulosos batalhões de formigas. Dos mortos, 8500 tinham caído em combate e
mais de 12 300 tinham morrido de ferimentos, doença ou fome. Dos evacuados,
600 morreram antes de lhes poder ser ministrado tratamento médico adequado e
3000 refizeram-se lentamente, em hospitais da retaguarda.

O fato de este pequeno Dunquerque, qualificado pelo chefe do 17.º Exército


como um «extraordinário milagre», ter sido efetuado sem a perda de um só
homem, é um tributo notável ao meticuloso planeamento japonês e à sua soberba
marinharia. Aquilo que os japoneses mais temiam, em fins de Janeiro, era que os
americanos os atacassem com ímpeto e transformassem uma retirada organizada
numa fuga desordenada e sangrenta. Mas os americanos perderam a
oportunidade de destruir o exército de Hyakutake e, assim, 10 000 veteranos da
Força de Desembarque nipônica sobreviveram para travar outras batalhas.

Na fria perspectiva da História, a importância relativa de uma campanha militar


não se pode julgar pelas estatísticas. O número maior ou menor de homens
mortos ou mutilados, de barcos afundados, de aviões abatidos e de prisioneiros
capturados, é sem dúvida, um fator, são dados; mas o que deve ser considerado,
em última análise, é o efeito produzido pela batalha, ou série de batalhas inter-
relacionadas, na conduta e no resultado da guerra.

Guadalcanal durou quase seis meses. Durante esse período, travaram-se seis
batalhas navais e foram afundados sessenta e cinco barcos de guerra. As perdas
japonesas em aviões foram impressionantes. Embora nunca se tenha podido
calcular o número certo, a arma aeronaval nipônica perdeu, entre 7 de Agosto de
1942 e 7 de Fevereiro de 1943, mais de 800 aviões e 2362 pilotos e tripulantes.
O Exército japonês não foi, segundo as palavras do major-general Kawaguchi, o
único serviço que ficou «sepultado no cemitério de Guadalcanal».

Esta batalha prolongada e violenta minou os alicerces da arrogância que impedia


o Alto Comando japonês de encarar a desagradável realidade. Pela primeira vez,
alguns oficiais superiores de Tóquio e das frentes de batalha tentaram avaliar,
seriamente, as perspectivas futuras. Alguns pelo menos, ficaram a saber que os
ilusórios sonhos de um império perene, a abraçar as estranhas, quentes e
luxuriantes ilhas dos mares do Sul, jamais se tornariam realidade. Depois de
Guadalcanal, só podiam esperar que a derrota final não fosse um desastre
completo. Naquela «ilha insignificante, habitada apenas por nativos», os que não
eram voluntariamente cegos tinham aprendido que não podiam vencer:

«Não há dúvida de que o destino do Japão ficou traçado com o fim da luta pela
posse de Guadalcanal.

Raizo Tanaka.»

Mas os americanos também tinham aprendido algumas coisas: ficaram a saber


que a selva podia ser amiga ou inimiga; que a guerra insular exigiria tudo quanto
soldados, marinheiros, fuzileiros e aviadores tivessem para dar; que a estrada
para o império seria longa e sangrenta. Mas Guadalcanal tirou-lhes todas as
dúvidas, demonstrou-lhes, claramente, que podiam vencer.

Basta olhar para um mapa do imenso Pacífico Sul e Central para compreender o
que a tomada e defesa de Guadalcanal significaram em termos de estratégia para
a causa dos Aliados. Não só afastaram a ameaça às extensas linhas de
comunicação com a Austrália e a Nova Zelândia, como também deixaram as
forças aliadas com base na ilha no flanco da linha Palau-Truk-Marshalls, o
cordão exterior da defesa do Império, atrás do qual se abrigavam as Marianas.
De Guadalcanal, partiria um dia a 1.ª Divisão de Fuzileiros, para se apoderar das
ilhas Palau, e a 3.ª para expulsar, primeiro, o inimigo de Bougainville e, depois,
retomar Guam. Dos aeródromos de Guadalcanal partiriam aviões que apoiariam
diretamente as operações de 1943 contra a Nova Geórgia e Bougainville, e
desses aeródromos se efetuariam os sucessivos ataques aéreos que reduziriam
Rabaul à impotência e ao isolamento.

Um dia, dizem os nativos, os americanos voltarão. Dessa vez não trarão armas,
mas, sim, barcos carregados de tabaco negro e forte e peças de tecido de
algodão, para lava-lavas...
Em 7 de Agosto de 1962, o primeiro-sargento Vouza enviou o seguinte
telegrama à Associação da 1.ª Divisão de Fuzileiros:

«Digam-lhes que os amo a todos. Estou velho, agora, e já não tenho bons olhos,
mas nunca me esqueço.»

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