Guadalcanal
Guadalcanal
Guadalcanal
B. GRIFFITH II
A BATALHA DE GUADALCANAL
EDITORIAL INICIO
Título da edição original:
Capa de
CARLOS SANTOS
Tradução de
LISBOA-1
Em 7 de Agosto de 1942, os Fuzileiros Navais americanos desembarcaram em
Guadalcanal, nas ilhas Salomão. Era a primeira ofensiva americana da guerra.
Nos seis meses seguintes, fuzileiros navais, marinheiros, soldados e aviadores
travaram uma luta desesperada com os fanáticos e obstinados japoneses.
«Felicito Samuel B. Griffith por ter escrito uma excelente obra. Já li muitos
outros relatos acerca da grande batalha, mas este é o mais realista e interessante.
A minha admiração pelo Corpo de Fuzileiros —e por Vandegrift e todos os seus
oficiais e soldados da 1.ª Divisão de Fuzileiros Navais— aumentou muito mais
(se é possível) graças a esta emocionante narrativa. Lamento que tantos dos
participantes da Marinha tenham morrido e não possam ler A Batalha do
Guadalcanal. Tenho a certeza de que Turner, Holsey, Ghormley e muitos outros
não lhe regatariam elogios nem Iho desejariam modificar uma só palavra.»
O AUTOR
Nenhum livro do tipo deste poderia escrever-se sem a ajuda de muitas pessoas e
eu tive a sorte de conseguir a completa colaboração de certo número de
japoneses que em 1942 ocupavam posições de grande responsabilidade. O
primeiro de entre eles é o coronel Susumo Nishiura, atualmente chefe da Divisão
de História da Guerra do Departamento de Defesa Japonês. Graças ao seu
interesse e à sua ajuda pude trocar útil correspondência com os antigos tenentes-
generais Shuichi Miyazaki e Kumao Imoto, os antigos majores-generais Tadashi
Sumuyoshi e Toshinaro Shoji e o coronel Kazuo Taguchi. A todos eles estou
profundamente grato.
Estou também agradecido pelo fato de terem lido o manuscrito na sua totalidade
ou em partes a Richard C. West, professor de História da Academia Naval dos
Estados Unidos, William Harbaugh, professor de História da Universidade de
Bucknell, ao contra-almirante Frank P. Mitchell (reformado), ao coronel Saville
T. Clark e ao coronel James E. Herr, ao capitão Robert Asprey, ao coronel
Robert D. Heinl, ao dr. John Miller Jr. e a Henry I. Shaw Jr. Nunca nenhum
aspirante a historiador militar teve tanta sorte em encontrar um núcleo de amigos
tão competentes e prestáveis que o ajudaram com útil espírito crítico.
A Martin Clemens que, com os membros da sua Polícia das Ilhas Salomão, tem
papel importante na narrativa, devo também os meus agradecimentos pelo
acesso que me proporcionou ao seu diário particular (ainda não publicado)
relativo àqueles dias recheados de acontecimentos.
Tanto Shaw, o chefe do Setor Histórico G-3, U. S. M.C., e o dr. Miller, autor da
História oficial do Exército dos Estados Unidos na campanha de Guadalcanal,
simpaticamente me auxiliaram nas minhas pesquisas. Na Divisão de Relatórios
da II Guerra Mundial, Arquivos Nacionais, Wilbur J. Nigh e Joseph Avery
ajudaram-me nas investigações assim como D. M. O’Quinlevan, chefe da Seção
de Pesquisas e Relatórios do Setor Histórico U. S. M.C. e o seu estado-maior.
Lynn Delozier, bibliotecário das Escolas de Marines, em Quantico, na Virgínia,
forneceu-me a possibilidade de consultar livros e jornais. Dean Allard, chefe do
setor de Arquivos Operacionais da Divisão de História Naval e o seu estado-
maior foram infatigavelmente prestáveis e corteses.
O almirante Chester W. Nimitz leu o manuscrito na sua forma final e deu várias
e valiosas sugestões. A minha dívida para com ele e para com o general
Vandegrift jamais poderá ser paga.
Seria desnecessário acrescentar ainda que sou o único responsável pelos fatos tal
como são apresentados ao longo do livro, assim como pela sua interpretação.
SAMUEL B. GRIFFITH II
LIVRO I
Era este o estado de espírito otimista dos japoneses ao iniciarem uma guerra que
seria dirigida inteiramente a seu bel-prazer, uma guerra que se queria limitada no
espaço e no tempo. A experiência na China deveria tê-los feito pensar que é
necessário levar em conta não apenas os desejos de um dos participantes quanto
à limitação de uma guerra, sejam quais forem os termos em que ela se processe.
«Façam o melhor que puderem» era uma das exortações favoritas do almirante:
«Não pode aceitar-se como desculpa para não se agir com prontidão numa
guerra o fato de se aguardar a futura posse de pessoal treinado ou material do
mais moderno (...) o pessoal deve ser treinado e tornado competente (...) o
material de que se dispõe deve ser mantido e utilizado em todas as ocasiões,
extraindo-se-lhe o máximo das suas possibilidades.» 5
Três dias mais tarde, King concluiu que as suas ideias sobre uma estratégia
ofensiva no Pacífico não teriam grande futuro no Departamento de Guerra e, por
isso, preparou um memorandum dirigido ao presidente. Neste, sugeria uma linha
«útil» para o esforço dos Estados Unidos contra os japoneses e propunha um
plano de operações «conjunto» que resumia em nove palavras:
Aguentar Havaí;
Apoiar Australásia;
Não estão inteiramente esclarecidas as razões que levaram King a fazer esta
nomeação. Algum tempo antes, Ghormley fora diretor da Divisão de Planos de
Guerra no Gabinete do Chefe das Operações Navais (CNO) onde adquirira
grande reputação como brilhante estratega, mas nos dois anos imediatamente
anteriores fora um observador especial da Marinha em Londres. Estava
naturalmente imerso diariamente numa variedade de problemas não relacionados
com a zona cujo comando iria em breve assumir. A sua ignorância acerca do
Pacifico Sul e do inimigo japonês que lá defrontaria era igual á de qualquer outro
elemento do Departamento da Marinha.
«Foi escolhido para comandar a Força e a Área do Pacífico Sul. Terá uma
enorme área sob o seu comando e uma árdua tarefa a cumprir. Não tenho os
materiais necessários para lhe fornecer a fim de poder levar a cabo essa tarefa
como o devia fazer. Estabelecerá o seu quartel-general em Auckland, na Nova
Zelândia, com uma base avançada em Tongatabu. Na devida altura,
possivelmente neste Outono [1942], esperamos iniciar uma ofensiva a partir do
Pacífico Sul. Terá então necessidade de deslocar a sua base avançada consoante
as circunstâncias o determinarem e deslocar igualmente o seu quartel-general em
situações especiais. Gostaria que partisse, se possível, de Washington no prazo
de uma semana.» 14
Simpatia era o único item que o gabinete de chefes da Marinha poderia naquela
altura dar com generosidade; os repetidos apelos de Ghormley por unidades de
construção devidamente equipadas corriam de gabinete para gabinete, única e
simplesmente não havia pessoal especializado; maquinaria de remoção de terras,
bombas, tubos, válvulas, cimento, seções de aço pré fabricado para
armazenamento de tanques de gasolina — estes e outros inúmeros e essenciais
seguimentos existiam em parcas quantidades.
Esta informação não constituía novidade para os homens que trabalhavam com
pás e picaretas no campo de aviação da Vila, mas em menos de cinco semanas os
soldados e marines, agora comandados pelo brigadeiro-general Neal C. Johnson,
tinham construído a sua pista para caça, e em 30 de Abril Vila foi considerada
apta a receber aviões de porte ligeiro. Durante quase um mês não chegaram
aviões nenhuns. Em 27 de Maio, um major marine, Harold W. Bauer, trouxe três
Grummans do seu Esquadrão 212 dos Caças Marines. Dez dias depois chegaram
os restantes Wildcats. Nos meses seguintes, séries de caças, bombardeiros de voo
picado e outros aviões de todos os tipos e modelos fariam escala neste campo a
caminho de outros, dos quais muitos dos seus pilotos, incluindo Bauer, não
regressariam jamais.
Nos princípios de Junho, elementos da força de Johnson deslocaram-se para
norte com destino a Efate (nome de código: ROSES) e Espírito Santo (nome de
código: BUTTON) e começaram a construir uma pista para bombardeiros.
Surgiu aqui pela primeira vez no Pacífico um batalhão de construção naval, os
«Seabees», e, todos juntos, começaram a atacar a selva. Esta, no entanto,
dominava-os. Nos finais de Junho, cerca de metade dos oficiais e homens do
conjunto do destacamento estavam de cama com malária. Apressadamente,
equipas de assistência médica voaram do continente trazendo novos
medicamentos, incluindo a repressiva atabrina, e a violenta moléstia foi sendo
gradualmente vencida. Mas nos meses que estavam para vir a malária viria ainda
a causar mais baixas entre os marines e os soldados do que as bombas, as
granadas e as balas japonesas.
Os homens que lutaram contra as florestas nas Novas Hébridas não regressaram
aos Estados Unidos como heróis mas foram eles que tornaram possível que
outros o tivessem feito. Na verdade, a ocupação e o desenvolvimento das Novas
Hébridas constituíram o prelúdio fundamental para Guadalcanal. Sem estas
ilhas, as operações planejadas por King não teriam sido, possivelmente,
realizadas.
Uma semana depois, nove caças Zero voaram de Truk para Vunakanau, cerca de
doze milhas a sudoeste de Rabaul, e batizaram o campo donde mais tarde viria a
partir a maior parte dos ataques contra Guadalcanal 18.
Os planejadores da Marinha exploravam agora outra bomba. Esta era nada mais
nada menos do que uma proposta para invasão da Austrália, que um dos porta-
vozes de Sugiyama considerou, com admirável moderação, simplesmente
«ridícula» e «irrefletida». O Exército abrira caminho à Marinha nas Bismarck,
na Nova Guiné e em Tulagi; no dia 28 de Abril, voltou a render-se a novas
solicitações da Marinha. O resultado disto foi o «Plano de Compromisso» que
decidia a conquista da Nova Caledônia, das Fiji e de Samoa o mais depressa
possível logo que Port Moresby e Tulagi fossem conquistadas.
A data para esta tentativa de progressão para sueste foi marcada para os
primeiros dias de Junho. A Seção Naval imediatamente designou a Esquadra
Conjunta e a 11.ª Esquadrilha Aérea para apoio, enquanto a Seção do Exército
punha em ação o 17.º Exército com quartel-general estabelecido em Rabaul e
ordenou ao tenente-general Harukichi Hyakutake que assumisse o comando.
«Mil japoneses vêm praia vêm Lunga segunda-feira (29 Junho). Juntamente vêm
praia grandes barcos centena de homens grande canhão.
«Como é que tu sabes que é um milhão deles que desceu em Lunga, Dovu? Que
caminho fizeste tu para levares tanto tempo a dizer-mo?
«Eu estar deitado arbustos e ver dez camaradas a um palmo virem praia capacete
de aço bota caqui grande baioneta. Tem as pernas doridas, os pés inchados». 25
Clemens escreveu no seu diário que a situação local piorava diariamente, que
parecia haver poucas possibilidades de se fazer alguma coisa e que ele, em
breve, deveria ser forçado a refugiar-se no interior da selva. Mas os japoneses
não eram os únicos interessados na superfície plana da costa norte desta ilha
situada a tantos milhares de milhas de Tóquio.
Cinco dias depois, Vandegrift foi verbalmente informado de que o seu reduzido
comando começaria a deslocar-se para a Nova Zelândia no dia 1 de Maio e que
nele se incluiria a Força de Desembarque de uma Força Anfíbia do Pacífico
Sul 27. O general recebeu estas notícias com sentimento confusos; embora se
sentisse entusiasmado com a perspectiva de entrada em ação da divisão, não
estava de maneira nenhuma satisfeito com a situação no que respeitava ao treino
da unidade e ao estado do equipamento. Se bem que os seus batalhões de
infantaria tivessem treinado rigorosamente durante os meses de Janeiro,
Fevereiro e Março (e por curiosa coincidência nas ilhas Salomão, na foz do rio
Patuxent, na Marilândia) e a artilharia estivesse bem apetrechada, a divisão não
tinha, segundo as palavras do seu comandante, «atingido um satisfatório estado
de preparação para combate». Mas Vandegrift foi informado de que iria ter
suficiente tempo para posterior e intensivo treino: o comandante dissera-lhe que
não deveria entrar em combate antes de Janeiro de 1943. O comandante recebera
esta informação de uma boa fonte — Ernest J. King.
Em 29 de Abril de 1942, King emitiu uma ordem formal para que fosse
estabelecida uma Força Anfíbia do Pacífico Sul. «É urgentemente necessário que
uma força anfíbia se instale no Pacífico Sul», escreveu ele 28. O título curto para
esta operação escolhido pelo almirante King foi «Lobo Solitário» 29. King, que
acreditava que viaja mais depressa quem viaja sozinho, estava a criar as bases
para o seu grande plano: a marcha para noroeste a partir das Novas Hébridas.
Perante isto, Marshall, por fim, deu o seu consentimento relutante e concordou
em deslocar o limite da Arca do Pacífico Sul de Ghormley que, originalmente,
passava através da ponta ocidental de Guadalcanal, um grau de longitude para
oeste.
A Nimitz foi, portanto, confiada a responsabilidade da Tarefa I e MacArthur foi
nomeado para executar as Tarefas II e III, a conquista das ilhas norte de Salomão
e de Rabaul. Ele deveria iniciar estas operações o mais rapidamente que lhe
fosse possível após ter vido concluída com êxito a Tarefa I. Uma ordem
definitiva para a primeira fase da operação foi distribuída cm 25 de Junho. O
futuro dia D era marcado para 1 de Agosto.
A desculpa dada aos neozelandeses para esta estranha pressa com que os marines
acabados de chegar às suas encantadoras ilhas se preparavam de novo para
partir, foi: «manobras anfíbias».
A questão que, tanto a Junta de Chefes como o almirante Nimitz, não podiam
esclarecer —ou pelo menos esclarecer de forma a satisfazer o almirante
Ghormley— era básica. Tratava-se exatamente de saber: qual era o objetivo final
desta instalação? Era defensiva: evitar que os japoneses se dirigissem para as
Hébridas e para a Nova Caledônia e dessas posições avançadas cortarem as
linhas de comunicação com a Austrália? Isto, afirmava repetidamente Ghormley,
era o que ele compreendia: retirar a área do domínio das armas japonesas. Mas
os chefes tinham afirmado claramente que a «Torre de Vigia» era o primeiro
passo da longa estrada que levaria a Rabaul. E sem dúvida era esta a ideia que
King expusera no seu memorando de Março ao presidente. Todavia, a história da
campanha revela que o almirante Ghormley nunca teve a certeza da utilização
que deveria dar à «área de Tulagi» uma vez que a tivesse sob seu domínio. E
sejamos justos para com o almirante: não era o único que se encontrava confuso.
Vários dias antes de ter recebido a carta de Nimitz de 9 de Julho, Ghormley voou
para Melbourne a fim de conferenciar com Douglas MacArthur. O almirante
estava pessimista. Concluíra que a «Torre de Vigia» era uma empresa duvidosa.
O planeado dia D, 1 de Agosto, caminhava a passos largos na sua direção; o
grosso da Divisão de Vandegrift vinha ainda no mar. O fator tempo não iria
permitir planos pormenorizados e a execução de atividades preparatórias que ele
considerava essenciais. Mesmo as elementares informações respeitantes ao
terreno, às condições marítimas e de tempo acerca da área-alvo escasseavam. Os
mapas e cartas disponíveis eram antigos, inseguros e, portanto, absolutamente
insatisfatórios. As tabelas das marés mostravam uma alteração estranha de
alguns pés que ocorria com imprevisível irregularidade. As únicas estimativas
quanto às forças, ao material e às instalações japonesas em Tulagi, Gavutu e
Guadalcanal eram apenas as fornecidas pelos observadores costeiros cada vez
mais localizados no interior das selvas e, que, por isso, eram de muito discutível
exatidão.
Estes equívocos poderiam ter sido evitados se Ghormley tivesse ido a Koro
presidir à conferência convocada pelo almirante Fletcher. Mas Ghormley estava
ocupado em Noumea atendendo a variados e aborrecidos pormenores que ele
poderia com vantagem ter confiado ao seu estado-maior. Neste período da
guerra, a maior parte dos oficiais navais de estado-maior não faziam a mínima
ideia do que era um estado-maior nem das suas funções e Ghormley não
constituía exceção. Falhou em não ter ido a Koro e esta sua primeira, mas não
última, abdicação da responsabilidade de comandante iniciou uma série de
trágicos e quase fatais acontecimentos.
Notas
1 Hora de Tóquio. A não ser que sejam especificamente indicadas, todas as horas
são locais.
FORÇA DE REABASTECIMENTO
4 Quando King comandava a Força Aérea, nos últimos anos de 1930, corria uma
história que dizia que logo após o almirante ter ido para o Céu, um aviador naval
foi bater à porta daquele. Foi recebido por S. Pedro que o informou que sendo
aquele o único sítio seguro, tinha sido transformado e reorganizado numa área de
treino de combate para militares. «Não estou surpreendido», replicou o aviador,
«Ernie King sempre pensou ser o Deus Todo-Poderoso.» «Não é esse o nosso
problema», replicou S. Pedro, «é muito pior que isso. Deus Todo-Poderoso é que
pensa que é Ernie King.»
11 Ibid., p. 3113.
12 Ibid., p. 385.
13 Bryant, op. cit., p. 288. Contudo Alan Broke (como era então chamado) não é
uma fonte inteiramente digna de ser acreditada, quanto às informações que dá a
respeito dos motivos ou do comportamento do almirante King. Para
apresentarmos o caso corretamente, poderemos dizer que o CIGS não era um dos
mais entusiásticos admiradores do almirante americano.
15 Uma vez, Roosevelt descreveu King com estas palavras. Corria uma história
em Washington que dizia quo o presidente procurara, para oferecer a King no dia
do seu sexagésimo quarto aniversário, um pequeno maçarico.
18 Nesta altura as designações americanas Zero, Emily, Betty, etc., usadas para
identificar os aviões da força aérea japonesa, ainda não estavam disseminadas.
Mais tarde, a todos os caças fórum dadas designações masculinas (Zero foi
transformado em Zeke); todos os outros tipos tiveram nomes femininos.
22 Daikairei Dai Jukyogo (GQG Imperial. Ordem para a Marinha N.° 19, 1942).
Clemens ligou o seu rádio. O ar vibrava, com as transmissões dos tripulantes dos
aviões de reconhecimento, em voo, a ajustar o fogo dos barcos. Quando
bombardeiros de mergulho largavam as suas cargas e se afastavam, os pilotos
anunciavam, exultantes, os alvos atingidos e pediam que lhes indicassem outros.
No porto de Tulagi, afundavam-se sete Kawanishis ancorados e estavam
danificados nove hidraviões Zero. Tanques de combustível, atingidos por balas
incendiárias, esguichavam nuvens de fumo oleoso; um aglomerado de barracas,
com telhados de chapas de ferro ondulado, foi pelos ares; velhos armazéns, na
doca, vomitavam chamas...
O fato de a esquadra de Turner ter chegado à área do seu objetivo sem ser
descoberta deveu-se, em parte, ao cuidadoso planeamento. A via de acesso,
calculada para reduzir as possibilidades de detecção por aviões japoneses em
patrulhas de rotina sobre o mar de Coral, conduziu a força de ataque, na tarde de
6 de Agosto, a um ponto bem ao sul de Guadalcanal e a uma zona batida pelo
temporal. A coberto da chuva e da escuridão, os barcos viraram para norte e
seguiram a toda a velocidade para o cabo Esperança, a ponta noroeste da ilha.
Depois de contornarem o cabo, viraram 90 graus para leste e penetraram na área-
alvo.
A Força Anfíbia teve sorte: a chuva forte que ocultou os barcos desviou também,
em 5 e 6 de Agosto, as buscas aéreas nipônicas de Rabaul para o sueste. O
relatório das operações menciona apenas, laconicamente: «Buscas canceladas
por via da inclemência do tempo.» A patrulha de busca de Tulagi —três
Kawanishis de longo raio de ação— levantou voo em 6 de Agosto, mas passada
uma hora as nuvens baixas e as rajadas de vento obrigaram todos os aparelhos a
regressar. Os pilotos anunciaram que a visibilidade era inferior a dez milhas,
com tetos de nuvens que chegavam a estar apenas a trinta metros de altitude:
«Resultado das buscas: negativo.»
Vandegrift tinha perfeita consciência de tal situação, mas não podia fazer nada
para a remediar. Desembarcara apenas cinco batalhões de infantaria em
Guadalcanal, e destes conservava, necessariamente, um de reserva. As tropas de
assalto ainda não tinham chegado ao aeródromo, cujos defensores tampouco
haviam, também, revelado a sua força ou as suas posições. O general não teve,
portanto, outro remédio senão manter a sua pequena força de desembarque sob
firme controle. Ceder homens que poderiam ser necessários num combate para
resolver o problema cada vez mais grave da Red Beach não seria um risco
consciente e calculado: seria um risco absolutamente injustificável.
Dos 51 aviões saídos, nesse dia, de Rabaul, 30 não regressaram. Entre os pilotos
regressados encontrava-se Saburo Sakai, o maior às da aviação japonesa. O seu
Zero, apesar de muito atingido, ainda voava. Cego de um olho e a sangrar de
múltiplos ferimentos, Sakai conseguiu, mercê de tremendo esforço de vontade,
chegar a Vunakanau, onde aterrou, a derrapar, e desmaiou. Foi o seu primeiro e
último combate sobre Guadalcanal.
Por incrível que pareça, a Marinha nunca comunicara ao Exército que estava a
construir um aeródromo em Guadalcanal. Quando o coronel Takushiro Hattori,
então adjunto do chefe da Divisão de Operações do Estado-Maior General do
Exército, chegou ao seu gabinete, em 7 de Agosto, ficou surpreendido ao saber
que unidades de construção de bases aéreas navais trabalhavam havia algum
tempo «nesta insignificante ilha dos mares do Sul, habitada apenas por nativos».
A opinião militar de ser «inconcebível» que os desembarques americanos
«excedessem o âmbito de um reconhecimento em força» resultou, pois, em
parte, do fato de o Exército ter sido induzido em erro pela Marinha. Apesar
disso, o Exército e a Marinha concordaram que os americanos deviam ser
repelidos antes de poderem utilizar o praticamente concluído campo de aviação,
e o general Sugiyama passou a manhã de 7 de Agosto à procura de uma unidade
conveniente, para mandar expulsar o inimigo.
Ao fim da tarde, o 1.º de Fuzileiros ainda estava muito longe de «Grassy Knoll»,
e Vandegrift ordenou a Cates que parasse, fortificasse e cavasse abrigos para
passarem a noite. A paragem era absolutamente necessária. Os homens, que
tinham passado duas semanas nos porões sufocantes dos transportes de tropas
superlotados, encontravam-se em deploráveis condignos físicas.
Sobrecarregados com mochilas pesadíssimas e munições extra, arrasados pelo
calor e pela entorpecedora humidade e com falta de água e de pastilhas de sal,
não estavam em estado de continuar a avançar, e muito menos de combater. Por
sorte, os fuzileiros de Cates não encontraram quaisquer japoneses na sua
primeira tarde em terra.
O progresso do 5.º de Fuzileiros não foi mais fácil. Não obstante as repetidas
exortações do comandante, o 1.º Batalhão avançou para oeste a uma velocidade
exasperantemente baixa. No entanto, ao cair da noite, este batalhão atingira o seu
objetivo daquele dia: a margem leste de Alligator Creek, um regato vagaroso,
cerca de duas milhas a oeste de Red Beach.
A resistência surgiu pela primeira vez no antigo bairro chinês que contornava as
docas Bums-Philp, na costa norte oposta à minúscula ilha de Makambo. Foi aí
que, pouco antes do meio-dia de 7 de Agosto, os Fuzileiros Navais sofreram as
primeiras baixas de combate da campanha do Pacífico Sul. Ao tentar prestar
auxílio a três soldados gravemente feridos, o tenente Samuel Miles, jovem
médico naval, foi morto, e um comandante de companhia ficou muito ferido.
Quando os raiders avançaram, cautelosamente, na direção das frágeis cabanas,
os defensores japoneses recorreram aos morteiros ligeiros. O avanço afrouxou e,
ao fim da tarde, Edson mandou parar e estabelecer posições para passar a noite.
Atacaram, de fato. Quatro vezes. Mas cada ataque foi menos impetuoso que o
precedente e todos eles foram repelidos. No entanto, conseguiram infiltrar-se
alguns japoneses. Seis rastejaram para debaixo do alpendre da Residência,
esconderam-se aí e, mal nasceu o dia 8 de Agosto, mataram três fuzileiros. Cinco
minutos depois, as granadas americanas tinham dado cabo deles.
Num abrigo do centro da tênue linha que tanto se esforçara por defender, o
soldado de primeira classe John Ahrens, atirador especial da Companhia Able,
jazia imóvel, de olhos fechados e a respirar devagar. Estava coberto de sangue e
moribundo. A seu lado estava o cadáver de um sargento japonês e, atravessado
nas suas pernas, o de um oficial. Ahrens fora atingido a tiro no peito, duas vezes,
e o sangue escorria-lhe, lentamente, de ferimentos de baioneta. À roda do seu
abrigo estavam estendidos os cadáveres de treze japoneses. Quando o capitão
Lewis W. Walt o ergueu em braços a fim de o levar para a Residência, o
moribundo, ainda agarrado à sua espingarda automática, murmurou:
— Ontem à noite, eles tentaram passar por cima de mim, capitão, mas não creio
que tenham conseguido.
— Não conseguiram, Johnny — respondeu Walt, docemente. — Não
conseguiram.
Por sorte, os raiders tinham uma seção de demolições, comandada por Angus
Gauss, um artilheiro que adorava fazer explodir fosse o que fosse. Para o ouvido
de Gauss, uma explosão era a música mais doce que se podia conceber. Ele e os
seus homens passaram a manhã a improvisar cargas explosivas na ponta de
varas, e cerca do meio-dia os inimigos escondidos começaram a ver uma fona.
Quando dois homens das demolições avançaram, a coberto de granadas de fumo,
metralhadoras de apoio começaram a disparar fogo para as bocas negras de duas
cavernas adjacentes, escolhidas para a experiência. Momentos depois,
estampidos abafados, de mistura com gritos, indicaram que a tentativa de Gauss
fora coroada de êxito. A meio da tarde, a maioria das cavernas estavam fechadas
e só restavam umas duas bolsas de resistentes e meia dúzia de atiradores de
precisão. Ao pôr do Sol, porém, Rupertus pôde informar Vandegrift de que
Tulagi estava tomada. Os raiders tiveram 99 baixas —47 mortos e 52 feridos —
e o batalhão de Rosecrans, do 5.º de Fuzileiros, 56.
Duas horas depois, foram deitados ao mar todos os materiais inflamáveis que se
encontravam acima da linha de água, e quando o Sol se pôs, atrás dos seus
barcos, Mikawa transmitiu um sinal visual:
Mikawa contava com a surpresa e consegui-la-ia, não obstante a sua força ter
sido detectada e seguida, em 8 de Agosto, por dois aviões de reconhecimento da
Real Força Aérea Australiana. Um dos pilotos, não se deu, sequer, ao incomodo
de acompanhar a força inimiga o tempo suficiente para a avaliar com exatidão o,
dando provas de incrível despreocupação, só comunicou que avistara barcos
inimigos depois de completar a patrulha, aterrar e beber o seu chá da tarde. O
seu colega foi menos indolente, mas apresentou um relatório incompleto. Mercê
de uma variedade de razões, a informação não seguiu imediatamente as vias
normais, a transmissão dos dois relatórios foi imperdoavelmente atrasada e só às
19 h. (ou seja, cerca de uma hora depois de os serviços de comunicação de
Turner terem interceptado e decifrado a mensagem de Fletcher para Ghormley)
um dos relatórios chegou ao conhecimento de Turner, que o transmitiu aos
barcos sob o seu comando. Quiçá devido à ambiguidade dos termos da
mensagem — «Três cruzadores, três contratorpedeiros, dois barcos de apoio de
hidraviões ou canhoneiras, rota 120°, velocidade 15 nós.»—, tanto Turner como
Crutchley (que, a pedido de Turner, se apressara a abandonar o seu posto nos
barcos de patrulha e a dirigir-se para o McCawley, no navio almirante Austrália)
chegaram à conclusão precipitada de que os japoneses deviam ir a caminho de
Gizo Bay, a fim de estabelecerem uma base de hidraviões. Não se verificou,
pois, qualquer tentativa de avaliar a potencialidade inimiga. Houve apenas uma
conjectura apressada e desprovida de imaginação quanto às suas intenções.
Não é preciso ser táctico naval para compreender que o almirante inglês dividira
a sua força de maneira tal que cada elemento se encontrava exposto a ser atacado
e destruído separadamente. Ao mesmo tempo, ao escolher o gênero de
patrulhamento adoptado a norte de Savo, privara os cruzadores da capacidade de
estarem constantemente aptos a colocar-se, rapidamente, numa formação que
permitiria às suas baterias principais e às suas peças de costado alvejar o
comprimento de uma coluna atacante. Todos os contratorpedeiros possuíam
torpedos, mas não foram dadas quaisquer ordens relacionadas com o seu
emprego.
O fato de nem Crutchley nem o seu superior imediato terem admitido seriamente
a possibilidade de um ataque inimigo de superfície não constitui desculpa; é,
pelo contrário, um pormenor condenatório. Cerca de dois mil anos antes, o
filósofo militar chinês Sun Tzu advertira: «Na guerra, não presumas que o
inimigo não virá; prepara-te para o enfrentar.» Os japoneses avançavam a toda a
velocidade e nem os barcos aliados nem as suas tripulações estavam preparados
para os enfrentar.
O radar do Blue não assinalou a coluna japonesa, nem os seus míopes vigias
detectaram o inimigo que se aproximava. Na ponte do Chokai, o almirante e o
seu estado-maior ficaram tensos. Mikawa murmurou uma ordem: «Leme à
esquerda. Afrouxar para 22 nós.» Não estava interessado em contratorpedeiros.
Os japoneses voltaram então a fúria dos seus canhões e torpedos para o Chicago:
em sessenta segundos, este cruzador também estava fora de combate, com a proa
destruída. Como um pugilista atordoado por um murro colossal, arrastou-se, aos
ziguezagues, para a escuridão. Era inofensivo e, por isso, Mikawa deixou-o
sobreviver. Os olhos do almirante estavam postos noutra presa... Inutilizara dois
dos cinco cruzadores aliados em menos de dez minutos, a contar do momento
em que abrira fogo. O almirante japonês não perdia tempo e a sorte ajudava a
sua temeridade.
Entretanto, o Kako iluminara o Vincennes. Mais uma vez, uma das primeiras
salvas japonesas acertou na popa, onde se encontravam os aviões de
reconhecimento, nas catapultas. Jorraram chamas e granadas e torpedos
acertaram, novamente, nos alvos. Pelo menos três torpedos —ou quatro, talvez
— trespassaram o cruzador e rasgaram-lhe as entranhas. Debatia-se na agonia
final, às 2.15 h, quando os japoneses interromperam o fogo. Meia hora depois, o
Vincennes afundava-se, também.
Este assalto durou alguns minutos mais do que o primeiro, mas os resultados
foram idênticos: os navios americanos foram apanhados do surpresa e destruídos
sem terem, sequer, ensejo do ripostar. Algumas salvas acertaram em barcos
japoneses: felizmente para a «Torre de Vigia», uma das poucas disparadas pela
bateria principal do Quincy caiu perto da ponte de comando do Chokai, destruiu-
lhe a sala de operações e matou 30 oficiais e marinheiros cuja presença era
essencial à conduta da batalha.
Foi então que Mikawa decidiu interromper a ação e retirar. Às 2.23 h, o Chokai
ordenou, por sinais luminosos: «Retirada de todas as forças.» E, logo a seguir:
«Em frente, rota 320, velocidade 30 nós.» Na retirada, os navios avistaram e
atacaram o Ralph Talbot. Sucessivamente, as torres e os canhões de costado dos
Furutaka, Tenryu e Yubari alvejaram o Ralph Talbot, mas os japoneses estavam
empenhados numa retirada rápida e, por isso, o seu fogo não foi prolongado nem
certeiro. O contratorpedeiro, atingido por meia dúzia de granadas, ripostou e
disparou torpedos. Por sorte, uma chuvada forte envolveu-o, de súbito. Quando a
chuva parou, o Ralph Talbot estava silencioso, na água, e os japoneses tinham
desaparecido.
Mas o comandante era, agora, um homem cheio de pressa. Antes das seis da
manhã, Turner já possuía informações diretas suficientes para avaliar a extensão
da tragédia da noite anterior. Na realidade, às 5 h., o almirante ordenou que o
Canberra se lhe reunisse imediatamente ou fosse abandonado. Como o cruzador
estivesse muito adernado e não se pudesse deslocar, o Patterson e o Blue
aproximaram-se, para recolher a tripulação, e um contratorpedeiro americano
torpedeou-o, duas horas depois. O Astoria ainda flutuava, mas foram inúteis
todos os esforços para o salvar. Afundou-se poucos minutos depois do meio-dia.
Do lado dos Aliados, o balanço da batalha também não estava, ainda, encerrado.
O contratorpedeiro Jarvis, gravemente atingido no ataque aéreo de sábado,
começara pouco depois a retirar, lentamente, para oeste. Por milagre, conseguiu
escapar, sem novos danos, à tragédia ocorrida ao largo de Savo. Um avião de
reconhecimento de Fletcher avistou-o a sul do cabo Esperança, logo a seguir ao
nascer do dia de domingo, a arrastar-se penosamente para sudoeste, de proa
submersa e a deixar atrás de si uma esteira de óleo. Nunca mais se soube nada a
seu respeito. Presume-se que se afundou, com todos os seus homens. A perda do
Jarvis acrescentou 247 nomes à lista das baixas de Savo. Morreram quase 1300
marinheiros aliados e 700 ficaram queimados ou feridos. As baixas dos
japoneses foram muito inferiores a um décimo das aliadas.
Yamamoto Isoroku.»
Pela primeira vez, mas não pela última, a Rosa de Tóquio dava informações
mais autênticas do que a revista semanal americana.
Enquanto, à tarde, comia feijões frios com Vandegrift, Goettge expôs-lhe o seu
plano. O general não se mostrou muito entusiasmado mas o seu G-2 foi
persistente e, por fim, o comandante da Divisão acedeu a que Goettge
conduzisse pessoalmente uma patrulha ao ponto onde a bandeira branca fora
vista. Ato contínuo, o coronel reuniu 25 homens, a maioria deles do seu
departamento de informações, e pouco depois da meia-noite embarcavam todos
numa barcaça «Higgins», em Kukum.
Em Tulagi, Merritt Edson passava algumas horas diárias a ler a tradução inglesa
da Breve História do Japão, e um comandante de companhia, que «libertara» um
toca-discos e uma coleção de discos japoneses de um armazém de Carpenter’s
Wharf, fornecia música apropriada à messe dos coronéis, à hora do jantar.
Costumava-se dizer de brincadeira, nesses dias, que seria vantajoso para os
fuzileiros trocarem o quartel-mestre do seu Corpo pelo seu equivalente de
Tóquio. «Os homens estão ótimos, bem dispostos e, graças a Deus, ainda de boa
saúde», escreveu o general ao comandante-chefe.
E em meados de Agosto de 1942 a sua dieta diária eram migalhas, pelo menos
no que respeitava à Marinha. Durante semanas, depois dos acontecimentos de
Savo, foram pouquíssimas as que o almirante King se dignou sacudir da sua
mesa. Nesse período, o oficial encarregado de transmitir as informações
perguntou diversas vezes ao almirante o que havia de dizer aos repórteres, que
não o deixavam em paz com pedidos de notícias das Salomão. «Não lhes diga
nada», volvia secamente o irritado King. «Quando acabar, dir-lhes-á quem
ganhou.»
Três dias depois, pela primeira vez após a retirada de Turner, uma semana antes,
surgiram navios americanos, ao largo de Lunga. Tratava-se dos
contratorpedeiros-transportes Little, McKean e Gregory, que traziam consigo um
pequeno destacamento operacional de Fuzileiros Aéreos, comandado pelo major
Charles H. Hayes, 400 tambores de gasolina de aviação, quase 300 bombas,
munições para metralhadoras de aviões, ferramentas e peças sobressalentes.
Outros passageiros importantes eram o guarda-marinha George W. Polk e um
grupo de homens pertencentes ao CUB I, uma unidade de manutenção de base
aeronaval. Os CUBs eram, então, desconhecidos dos fuzileiros, mas estes não
tardariam a estimar os do guarda-marinha Polk.
Talvez isto tenha induzido Vandegrift a ordenar a Rupertus que embarcasse o 2.º
Batalhão, o 5.º de Fuzileiros, os Raiders e os Paraquedistas de Tulagi para
Guadalcanal, assim que dispusesse de transportes.
Esta ordem é importante por duas razões. Primeira, porque reflete a atmosfera de
incrível excesso de confiança que envolvia, então, o Quartel-General imperial;
segunda, porque prenuncia a política de ação de via reduzida que contribuiu
decisivamente para a série de derrotas sofridas pelo Japão em Guadalcanal.
«Sem querer saber para nada da minha opinião... esta ordem impunha que a mais
difícil das operações de guerra — um desembarque de frente para o inimigo—
fosse efetuada por unidades mistas, que não tinham qualquer oportunidade de
ensaiar a manobra nem, sequer, de a estudar preliminarmente... Na estratégia
militar, a conveniência sobrepõe-se, muitas vezes, à prudência, mas esta ordem
era absolutamente insensata. Não me custou compreender que devia reinar
grande confusão no quartel-general da 8.a Esquadra.»
Com a primeira luz parda da manhã houve uma desejada acalmia. De distâncias
superiores a 180 metros, alguns atiradores de Pollock visavam japoneses que
passavam, indistintamente, sob os coqueiros. «Visem-nos e abatam-nos!»
ordenava Pollock àqueles atiradores especiais, na melhor tradição do Corpo de
Fuzileiros. «Até parece ‘dia de recorde’ em Quantico!», exclamou um
metralhador ferido. «Jesus, qualquer azelha poderia ceifar aqueles idiotas!
Andavam de pé, com a breca, nem sequer tinham discernimento suficiente para
rastejarem! Quem diabo disse àqueles cabeças de trampa que eram soldados?»
«...estava num estado lastimoso, incapaz de se levantar. Quase não tive coragem
de o olhar. Arrastámo-lo para trás de um jipe, onde me contou o melhor que
pôde o que se passara, apesar da ferida hiante que tinha na garganta.
A maior parte dos inimigos feridos resistiram aos fuzileiros, que depois da
batalha tentavam ajudá-los e não matá-los. Vários caçadores de recordações
foram abatidos a tiro por japoneses prostrados e aparentemente mortos, e os
tenentes-coronéis Twining, Pollock e Cresswell, que observavam a montureira
de cadáveres, apanharam um grande susto quando um subalterno moribundo
disparou uma pistola automática na direção dos três e depois estoirou a sua
própria cabeça. Um oficial, o capitão Takao Tamioka, sobreviveu ao holocausto.
O coronel Ichiki, que depois da derrota fugira apressadamente para Taivu com o
porta-bandeira, rasgou, com reverência, a bandeira do regimento, despejou
petróleo sobre as tiras, deitou-lhes fogo e praticou haraquiri.
«General, nunca ouvi falar deste gênero de combate, nem nunca li nada que se
lhe assemelhe. Esta gente recusa-se a render-se. Os feridos aguardam que os
soldados se aproximem, para os examinar [...] e despedaçam-se a si próprios e ao
outro tipo, com uma granada de mão.»
Estas sangrentas doze horas deram origem a algumas intrigantes perguntas. Por
que motivo, ao ver a sua patrulha quase totalmente aniquilada, não
compreendera Ichiki que os americanos estavam ao corrente das suas intenções?
Porque atacara tão apressadamente? Porque não reconhecera a linha do rio, uma
milha para o interior? Se o tivesse feito, podia ter atravessado, aí, o grosso da sua
força, virado para norte e tomado a posição do Ilu pela retaguarda. Porque
desencadeara um segundo ataque, de modo tão desastroso como o do primeiro?
Que estranho e obscuro raciocínio levou a este holocausto, por ele próprio
provocado?
A resposta a parte das perguntas é só uma: o coronel fora mal informado. Mas o
mais importante foi a sua arrogante recusa em aceitar a realidade, a sua
obstinação, a sua incrível inflexibilidade tática. As culpas talvez se possam
atribuir também, em parte, à disposição dos japoneses para, num momento de
desespero, aceitarem estoicamente o que consideram os ditames evidentes do
destino. Morrer gloriosamente pelo imperador, ao surgirem obstáculos
intransponíveis, era o dever inelutável —e, na realidade, até, o desejo
inconsciente— de muitos soldados japoneses. O que se evidenciou, primeiro, em
Tulagi e Gavutu e, depois, nas margens do pachorrento rio que os fuzileiros
batizaram de Tenaru, foi uma decisão de resistência total: resistência até ao
último alento do derradeiro homem.
Mas houve algo mais fundamental do que as consequências de uma ação baseada
em más informações, com um coronel temerário e estúpido, soldados dedicados
e disparidades de armamento. Houve uma atitude moral de arrogância, uma
questão de «prestígio». Ichiki, quando manejava a sua espada, tinha de
conquistar ou morrer. Era este o código do Samurai, «O Dogma do Guerreiro»: o
Buchido.
Pelo seu lado, os fuzileiros aprenderam uma lição que não esqueceriam: a partir
desse dia e até aos últimos dias de Okinawa, mais de dois anos e meio depois,
travaram uma guerra sem quartel. Não o pediam para si e não o davam aos
japoneses.
8. «O EXPRESSO DE TÓQUIO»
Esta tática evasiva foi coroada de êxito: as forças de ataque que partiram do
campo Henderson e do Saratoga não conseguiram ver nada através da névoa
crescente. A provação de um ataque aéreo aos seus transportes desprotegidos foi,
assim, adiada, pelo menos, mas a tarde de Tanaka não foi isenta de
contratempos. Depois do almoço, um mensageiro entregou-lhe uma
radiomensagem do quartel-general da Força do Setor de Sueste, na qual lhe
ordenavam que virasse de novo para sul e efetuasse os desembarques, como fora
planeado. O tempo tornava tal manobra impossível, e o desencontro das ordens
recebidas deixou Tanaka pouco tranquilo quanto ao que se passaria em Rabaul.
Nagumo, Kondo e Fletcher talvez tenham pensado que a ação, que mais tarde
seria conhecida por «Batalha das Salomão Orientais», terminara, mas
enganavam-se. Restava ainda o persistente almirante Tanaka, que levara o seu
Grupo de Transporte para sul, em 24 de Agosto, enquanto os porta-aviões se
arrastavam para leste. Na manhã seguinte, encontrava-se apenas cem milhas a
norte de Guadalcanal.
Era carne fresca... Às 8.30 h., um grupo misto de SBD de Mangrum e do «Voo
300» de Caldwell descolaram de Henderson e foram-lhe no encalço. Mas Tanaka
foi difícil de localizar. Por fim, Smith transmitiu a Mangrum a desconcertante
notícia de que os Wildcats de apoio tinham atingido o limite máximo do seu raio
de ação e deviam regressar à base. Dois minutos depois, os caças retrocederam.
Os desprotegidos SBD viraram um pouco para oeste, depois para sul e
retrocederam, também. E, de súbito, eis que descobrem os barcos de Tanaka!
Tanaka sentiu-se frustrado e furioso. Era a segunda vez, em três dias, que recebia
do quartel-general do setor ordens que contradiziam as do almirante Mikawa.
Mas o comandante da Força de Reforço não teve muito tempo para descansar.
Pouco depois do pequeno-almoço, na manhã seguinte, a sua ordenança
anunciou-lhe a presença no navio almirante do major-general Kawaguchi e do
seu estado-maior. O general acabava de chegar no transporte de tropas Sado
Maru e estava ansioso por seguir o seu primeiro escalão para Guadalcanal, com
o grosso da sua brigada, o mais depressa possível. O almirante assegurou-lhe que
isso não constituiria problema nenhum. As incursões «Rato» eram rápidas e,
quando convenientemente preparadas, seguras: a Marinha Japonesa dominava
nas águas que cercavam Guadalcanal, do escurecer ao alvorecer. Além disso, as
«águias do mar» podiam, agora, dispensar uma certa proteção aérea; a pista de
Buka já estava em condições de funcionar, e no dia 29 de Agosto tinham seguido
para lá, de Rabaul, 29 Zeros.
Tanaka não cedeu. As suas ordens, as ordens que lhe tinham dado, eram que
mandasse a 35.ª Brigada em contratorpedeiros. Havia poucas barcaças
disponíveis. Portanto, Kawaguchi iria de contratorpedeiro, ou não iria. O
almirante acrescentou que já se encontravam mil soldados a bordo dos
contratorpedeiros do capitão Murakami, a postos para a operação «Rato IV».
Com relutância, Kawaguchi permitiu que esse grupo partisse nessa noite, como
fora planeado, despediu-se de Tanaka e regressou ao Sado Maru.
Os aviadores dos Fuzileiros Navais faziam tudo quanto podiam para deter as
incursões noturnas de Tanaka, mas a sua missão era quase desesperada. A Lua
estava em quarto minguante e, às vezes, nem as esteiras dos barcos se
conseguiam distinguir. Mangrum só autorizava a voar os seus homens mais
experientes, pois a escuridão era tão densa que parecia palpável. Somente
quando os japoneses abriam fogo conseguiam os pilotos dos SBD discernir os
seus alvos. Tanaka não tardou a proibir que os seus barcos utilizassem
iluminação ou travassem luta com a artilharia antiaérea.
Mas, pelo menos de momento, tal realismo confinava-se apenas a Rabaul. Era
verdade que o Quartel-General imperial não estava satisfeito com os progressos
conseguidos, mas os oficiais de estado-maior de Tóquio ainda não se sentiam tão
preocupados com os pequenos êxitos dos americanos que achassem necessário
seguir o conselho claro de Mikawa. No entanto, no mesmo dia, o Quartel-
General imperial emitiu instruções que davam prioridade operacional à
«retomada imediata de Guadalcanal». Esta ordem estipulava que se
interrompessem as operações ofensivas na Nova Guiné, enquanto se utilizavam
todas as forças militares e navais disponíveis para retomar as posições perdidas
nas Salomão.
Assim, todo o peso das forças japonesas no setor sueste ia incidir diretamente no
campo Henderson e nos destroçados bosques de coqueiros que o rodeavam.
Wallace foi um tônico que estava a ser muito preciso. Um dos maiores
comandantes do Corpo de Fuzileiros, além de excelente aviador, este homem
divertido, paciente e compreensivo transmitiu parto da sua calma aos oficiais
aviadores e às tripulações que até ali viviam de pouco mais do que nervos
esfrangalhados e obstinada coragem. Os fuzileiros de todas as patentes sentiam-
se justamente orgulhosos dos «seus» aviadores. Quando um cabo perguntava,
«Capitão, já sabe o resultado?», e o capitão respondia, «Doze a um, rapaz!», ou
«Onze a três!», não se tratava de nenhum jogo nem de nenhuma brincadeira
infantil.
O centro que dava estas informações básicas estava instalado na fábrica de gelo
que os japoneses tinham tido a generosidade de deixar a funcionar. Da porta
pendiam dois grandes letreiros. Um deles proclamava, em letras de todo o
tamanho:
Nova Gerência
«Se os reforços pedidos não forem fornecidos, Guadalcanal não poderá ser
abastecida e, consequentemente, não poderá ser mantida.»
O general não sabia nada acerca do terreno sobre o qual se propunha conduzir as
suas tropas. Não dispunha de mapas exatos nem de fotografias aéreas aceitáveis,
mas não pensou em proceder a um reconhecimento antes de lançar quatro
batalhões numa marcha através da selva desconhecida. O já citado filósofo
militar chinês Sun Tzu escreveu, também: «Aqueles que não conhecem as
condições de montanhas e florestas, perigosos desfiladeiros, charcos e pântanos,
não podem comandar a marcha de um exército. Aqueles que não utilizam guias
nativos estão impossibilitados de aproveitar as vantagens do terreno». Não havia
guias nativos, pois os nativos eram, todos, leais à causa aliada. As aldeias de
Taivu, Tasimboko e Tetere tinham sido abandonadas havia já muito tempo.
Os serviços informativos de Kawaguchi também deixavam muito a desejar. O
general estava convencido de que os defensores, poucos em número, cederiam à
avassaladora autoridade «espiritual» das espadas e baionetas nipônicas. Por isso,
não lhe custou nada ler à sua maneira as instruções de Hyakutake, embora elas
fossem absolutamente claras. O general comandante do 17.º Exército ordenava a
Kawaguchi que «observasse a força, a posição e o terreno inimigos», para ver se
«era ou não possível obter rápido êxito no ataque ao campo de aviação com a
[sua] força presente». Mas Kawaguchi não esteve para perder tempo a
«observar» a força, a posição e o terreno inimigos.
d) o ataque principal seria apoiado pela artilharia naval e por ataques aéreos.
Na mesma noite, a força anfíbia partiu da costa sul da ilha Isabel, escoltada pelo
cruzador Sendai e por três contratorpedeiros:
9. MORRE, MALINE! 9
O general Vandegrift compreendeu que a batalha do Ilu fora apenas um prelúdio
de tentativas mais sérias para a retomada dos poucos acres preciosos que os seus
fuzileiros tinham conquistado. Eram muitos os indícios de atividade
intensificada fora da posição tão precariamente ocupada. Batedores nativos
anunciavam desembarques japoneses a oeste, em Tassafaronga e Kamimbo Bay,
e a leste, perto da abandonada aldeia de Tasimboko.
Foi trágico o resultado das dez horas inúteis que os raiders passaram a subir e a
descer as vertentes agrestes do extinto vulcão de Savo. Carregados de homens
ensopados em suor, Litlle e Gregory chegaram ao largo de Kukum quando
começava a escurecer. Depois de desembarcarem os seus exaustos passageiros e
de içarem as barcaças, verificaram que não tinham tempo de chegar ao porto de
Tulagi antes de escurecer por completo. Por isso navegaram lentamente de oeste
para leste, e de novo para oeste, no Sealark Channel. Foi aí que os descobriram e
surpreenderam os contratorpedeiros bem armados e velozes de Tanaka, na
primeira etapa da viagem de regresso de outra bem sucedida operação «Rato»
que tivera Taivu como destino.
Geiger era brusco, frio e, no dizer de alguns, implacável. Do que ninguém tinha
dúvidas era de que vinha disposto a exigir o máximo de homens e máquinas. E
obteve o que queria. Do «pagode» legado pelos japoneses, Geiger e o seu
pequeno estado-maior passaram a dirigir pessoalmente as operações aéreas. Os
aviadores tinham atuado de modo soberbo antes da chegada do brigadeiro, mas
este homem de feições severas e carácter de general romano impregnou-os de
renovado ânimo. Tanto ele como Woods tinham feito a sua carreira de aviadores
em carlingas abertas e não em cadeiras giratórias; eram ambos fracos
administradores e orgulhavam-se disso.
Geiger era feito da mesma massa de Vandegrift; nenhum deles tolerava a ideia
de permitir ao inimigo o prazer, livre de obstáculos, da iniciativa. Em 4 de
Setembro, e novamente no dia seguinte, os seus SBD bombardearam,
metralharam e desbarataram as tropas de Kawaguchi que desembarcavam na
ponta sul da ilha Isabel; nos dois dias seguintes, os bombardeiros levantaram voo
e foram atacar a base japonesa de hidraviões de Gizo Bay.
Os japoneses de Taivu não eram uma coisa nem outra, mas a sorte prega, às
vezes, estranhas partidas, na guerra, e a dessa manhã nevoenta foi muito
especial. Quando as barcaças se dirigiam para a praia, os transportes Fuller e
Bellatrix, em viagem para Lunga, protegidos por um cruzador e quatro
contratorpedeiros, surgiram ao longe, a leste. O atarantado escalão da retaguarda
de Kawaguchi demorou-se apenas o tempo suficiente para transmitir uma
frenética mensagem, segundo a qual estava iminente um grande desembarque,
abandonou o pequeno-almoço quente, espingardas e duas peças antitanques —
que chegariam para destruir as barcaças —, e fugiu. Os raiders desembarcaram,
sem que os molestassem, tiraram os blocos de culatra aos canhões, atiraram-nos
ao mar, infiltraram-se meia milha, para o interior, e viraram para oeste, através
duma plantação de coqueiros. Quando Kawaguchi recebeu a inesperada
mensagem do seu escalão da retaguarda — cerca de 300 homens dos serviços de
aprovisionamento e comunicações—, não pôde fazer outra coisa senão ordenar-
lhes que «fizesse frente ao inimigo». Ele não podia voltar atrás.
A presa era rica, mas não havia tempo para transportar as armas, o equipamento
e os alimentos abandonados, apesar de poderem ser muito úteis aos americanos.
Tudo aquilo em que os fuzileiros puseram as mãos, com exceção de meia dúzia
de Nambus com as respectivas munições, foi sistematicamente destruído.
Cinquenta homens foram encarregados de esburacar, à baioneta, vários milhares
de latas de bifinhos de vaca e carne de caranguejo, enquanto outros despejavam
no mar centenas de sacas de arroz.
Enquanto o general mudava o seu posto de comando para uma área que lhe
parecia menos exposta às bombas japonesas, Ghormley, em Nouméa, meditava
numa estranha mensagem recebida de Nimitz. Este ordenava-lhe que entregasse
a MacArthur um regimento reforçado de «tropas anfíbias experimentadas»,
assim como os três transportes e o navio do aprovisionamento necessários para
as transportar para o setor de combate. O almirante sentia-se perplexo. Os chefes
conjuntos, autores da estranha ordem, deviam saber tão bem como ele que as
únicas tropas em tais condições em todo o sul do Pacífico eram as que
defrontavam o inimigo nas Salomão. Talvez quisessem que entregasse o 7.º de
Fuzileiros, que vinha a caminho do seu setor, ao general MacArthur?
Sem saber que fazer, perguntou a Turner o que pensava. O comandante da Força
Anfíbia foi comedido:
A noite que o almirante passou em Guadalcanal não foi tranquila. Durante quase
duas horas, a artilharia naval nipônica martelou o espinhaço próximo. Anos
depois, Vandegrift observaria: «Kelly julgava-nos com a “mania do gatilho”,
mas quando as granadas nos começaram a atingir mudou de idéias. Os japoneses
humanizaram-no. Antes de partir, no dia seguinte, disse-me que traria o 7.º de
Fuzileiros e o desembarcaria onde eu quisesse.»
«Não podemos permitir que Guadalcanal seja outra Bataan, Bill», disse Thomas.
«Iremos para os montes, para a nascente do Lunga, levaremos as nossas
provisões e as nossas balas.»
Twining concordou e foi para a sua tenda. Aí, sozinho, passou horas a redigir, à
mão, uma ordem de operações, que guardou no cofre. O documento não tinha
data nem número de série.
Como aviso, chegou. Homens que tinham dormido apenas aos bocados, nas 48
horas anteriores, apressaram-se a aprofundar os abrigos, a cortar restolho, para
melhorar as áreas de fogo de artilharia nas últimas linhas de proteção, e a colocar
os últimos rolos de arame farpado, tirado de posições menos ameaçadas e
trazidos de jipe. Levaram-se para as plataformas das peças granadas
suplementares e munições de fita. Vandegrift transferiu a sua reserva para o lado
sul do aeródromo e o comandante, capitão Joseph J. Dudkowski (o tenente-
coronel Rosecrans sofrera uma distensão muscular, num ataque aéreo da
véspera), o seu estado-maior e os oficiais da companhia efetuaram
reconhecimentos das vias de acesso a utilizar, se o batalhão recebesse ordem de
avançar para o espinhaço, a coberto das trevas. O batalhão de Cresswell, do 1.º
de Fuzileiros, ocupou posições para proteger Dudkowski. Fez-se, em suma, tudo
quanto era possível fazer-se.
A escuridão trouxe chuva e, pouco antes das dez horas, um cruzador e três
contratorpedeiros iniciaram o bombardeamento noturno. Mas desta vez o alvo
não foi o aeródromo. As granadas, cujo barulho lembrava o de comboios de
mercadorias, rebentaram nas imediações do espinhaço: umas caíram antes,
enquanto outras explodiram na selva, a oeste do Lunga. Quando o
bombardeamento cessou, começaram as operações de sondagem do inimigo.
Soaram tiros de espingarda e metralhadora, ora ao longo do flanco direito, ora ao
longo do esquerdo, e, de vez em quando, os morteiros entraram no coro.
Ocasionalmente, a artilharia de Del Valle desbaratou concentrações planejadas,
na selva, a frente das linhas. Só à direita, onde os japoneses se esgueiravam
através do matagal denso, o inimigo logrou deslocar os defensores. Aí passou
pelo meio de um pelotão de raiders, que recuou para a vertente oeste do
espinhaço. Desapareceram sete homens.
Pouco antes de nascer o dia, Edson mandou recuar o flanco esquerdo, onde os
paraquedistas, que tinham sido atacados meia dúzia de vezes, estavam em
desordem. Quando a manhã chegou, finalmente — com que ansiedade os
fuzileiros a tinham desejado! —, o tiroteio esmoreceu e, à medida que os
japoneses se ocultavam na selva, um contra-ataque permitiu recuperar a posição
do flanco direito, perdida durante a noite. A única coisa que não se recuperou foi
a mochila do sargento do pelotão, cheia de correspondência acabada de chegar e
que ainda não fora possível distribuir. Também nunca foram encontrados os
corpos dos sete fuzileiros desaparecidos.
«... mas por causa da maldita selva a brigada dispersou-se por toda a parte e foi
impossível controlá-la. Nunca me senti tão impotente em toda a minha vida.
Quando olhava à minha volta só via o ajudante Yamamoto, a minha fiel
ordenança, Noguchi, e quatro ou cinco outros homens. Foi uma tragédia. Se não
tivéssemos recebido a ordem do Quartel-General e só desencadeássemos o nosso
ataque na noite de 13, este desgraçado malogro talvez se tivesse evitado.»
Às 9 horas daquela noite, «Louie the Louse» chegou a Kukum, calou os motores,
aguardou um minuto e depois lançou uma bomba luminosa, que se desfez numa
pálida claridade esverdeada sobre o meio do aeródromo. Ao verem o sinal, sete
contratorpedeiros que se encontravam em Lunga Roads começaram a
bombardear Henderson. A ação durou uma hora. Durante esses longos 60
minutos, os homens de Edson combatiam, no espinhaço — e por muito mais do
que pela própria vida.
Assim terminaram as ações que, então, ficaram conhecidas por vários nomes: «O
Espinhaço dos Raiders», «O Espinhaço Sangrento» ou, apenas, «O Espinhaço».
Nenhum fuzileiro precisava de perguntar qual espinhaço. Mais tarde, este cabeço
coberto de erva passou a ser apropriadamente denominado «Espinhaço de
Edson». Os raiders tiveram 135 baixas e os paraquedistas 128. Neste total de 263
contavam-se 49 mortos e 10 desaparecidos.
Notas
1 Shakespeare, Henrique V, terceiro ato, prólogo. (N. do A.)
3 Foi afundado no dia seguinte pelo submarino americano S-38. (N. do A.)
7 Incluindo sete sofridas pela patrulha do capitão Brush e três pelo 3.º Batalhão.
(N. do A.)
Antes mesmo de a 38.ª Divisão ser notificada de que devia sair das Índias
Orientais Holandesas para uma nova frente, já tinham chegado às Shortlands os
1.º e 3.º batalhões do 4.º de Infantaria, além de quartéis-generais regimentais e
um batalhão de artilharia ligeira de 75 mm. Em 11 de Setembro, Tanaka mandou
seguir o 3.º Batalhão, que desembarcou perto do cabo Esperança à meia-noite.
Após uma noite breve, estas tropas repousadas, bem aprovisionadas e equipadas
e ansiosas por combater, começaram a marchar para leste, pelo caminho da
costa, a fim de reforçarem a posição de combate do coronel Oka. No dia 14, o
comandante de regimento, coronel Nomasu Nakaguma, desembarcou em
Kamimbo com o restante batalhão, o seu quartel-general e mais artilharia.
Acompanhava-o o major-general Yumio Nasu, comandante da 2.ª Divisão,
Grupo de Infantaria.
O problema de Hyakutake não era fácil de resolver. Tinha à sua frente duas
operações, mas faltavam-lhe tropas e meios para as reforçar e apoiar
simultaneamente. Havia que escolher entre as duas e o general recomendou ao
Quartel-General imperial a suspensão do ataque à Nova Guiné. Foi uma decisão
dolorosa, tanto mais que o major-general Tomitaro Horii anunciara que a
vanguarda do seu Destacamento dos Mares do Sul avistara na noite de 14 de
Setembro as vertentes da Owen Stanley Range, as luzes de Port Moresby, a
menos de 50 quilômetros de distância.
Os homens de Horii, já com rações inferiores a 2,5 dl de arroz por dia, estavam
exaustos e famintos, mas poderiam — ou, pelo menos, assim julgava o seu
comandante—, se fosse necessário, subsistir apenas dos seus recursos espirituais,
até alcançarem a desejada meta. Hyakutake recusou-se a perfilhar esta opinião e
ordenou peremptoriamente a Horii que retirasse sem detenças para Kokoda.
Como consequência do ataque de Edson a Tasimboko, em 8 de Setembro, uma
parte do 41.º de Infantaria tivera de retirar para Buna, onde preparava posições
defensivas enquanto aguardava transporte para as Salomão.
Antes de Hyakutake ordenar, com relutância, a Horii que detivesse o avanço para
Moresby, o almirante Ghormley tentava, havia dias, decidir o que fazer com o 7.º
de Fuzileiros reforçado (coronel James W. Webb) e com um destacamento do 5.º
Batalhão de Defesa, comandado pelo tenente-coronel William F. Parks. Estas
unidades, embarcadas em Samoa alguns dias antes, iam a caminho da Nova
Zelândia quando, inesperadamente, o CincPac as desviara para Espírito Santo.
Aí aguardavam a decisão que Ghormley relutava em tomar.
14 de Setembro foi um longo dia na vida de Kelly Turner. Enquanto a sua coluna
seguia, aos ziguezagues, para noroeste, os oficiais das comunicações suavam. E
tinham razão para isso, pois viam-se a braços com a chegada ininterrupta de
mensagens em código, para traduzir, a avisar os barcos americanos da presença
de porta-aviões, submarinos e aviões de reconhecimento japoneses. Mas a
batalha só se desencadearia na tarde seguinte, e então, seria breve e mortífera.
Cerca das duas e meia da tarde, dois submarinos japoneses — I-19 e I-15 —,
estacionados em águas que os marinheiros do Pacífico Sul já conheciam por
«Entroncamento dos Torpedos», subiram os periscópios. Cada comandante viu
uma unidade de porta-aviões. As 14.45 h., o I-19 torpedeou o Wasp. Meia hora
depois, o contratorpedeiro estava transformado num inferno e o seu comandante,
Forrest Sherman, deu ordem para o abandonar. Mas o valente Wasp, a quem
Churchill atribuíra o crédito de salvar Malta, não se afundou; flutuou durante
horas, com as suas chapas incandescentes transformadas numa pira para quase
200 marinheiros americanos. Os contratorpedeiros recolheram 366 feridos de
jangadas e da água. Às 21 h., o contra-almirante Norman Scott ordenou ao
contratorpedeiro Landsdowne que torpedeasse o navio em chamas. No Pacífico
Sul ficou um porta-aviões em estado de funcionar: o Hornet.
O Wasp foi apenas a primeira baixa do dia. Sete minutos depois de o I-19 o
atingir, o I-15 aplicou a mesma receita ao North Carolina. O torpedo introduziu-
se abaixo da faixa blindada e arrancou 37 m2 de aço do lado de bombordo do
Carolina. O controle dos estragos foi rápido e o couraçado corrigiu quase
imediatamente uma ligeira inclinação e seguiu o seu caminho, majestoso, a uma
velocidade de 25 nós — façanha que teria surpreendido o comandante do I-15,
se ele por acaso estivesse a observar.
Kelly Turner procurou, também, regiões mais saudáveis e, assim que escureceu,
virou de novo os seus transportes para sueste. Continua a retirar até meio da
tarde do dia seguinte e, às 15 h., inverteu bruscamente a rota, curvou 15 nós e
seguiu para Lunga Point. É fácil imaginar o que os torpedos japoneses poderiam
fazer aos seus frágeis transportes. Mas se havia alguns submarinos na sua rota,
Turner esquivou-se-lhes.
Entretanto, o público japonês era mal informado acerca do que se passava nas
Salomão, e o público americano não era, sequer, informado. Nos seus
comunicados, King dizia umas coisitas que, na realidade, só serviam para tornar
a situação mais obscura. Só as esferas superiores estavam ao corrente da
gravidade da situação. Enquanto os fuzileiros passavam fome em Guadalcanal,
onde quase tudo escasseava, em Nouméa estavam ancorados 60 barcos, à espera
de descarregar. A maioria destes navios tinha tripulações da Marinha Mercante,
que cobravam ordenados exorbitantes por serviço em «zonas de combate».
Como se isso não chegasse, tripulações e oficiais exigiam «horas
extraordinárias». Forrestal era um dos que sabiam o que se passava e dizia que,
se o povo americano também soubesse, haveria revolução no país.
Poucos dias depois, Arnold chegou ao Havaí. Em Pearl Harbor falou com o
comandante das Forças Aéreas do Pacífico, tenente-general Delos Emmons, e
visitou o almirante Nimitz. Emmons, havia pouco regressado de uma viagem ao
Pacífico Sul, afirmou categoricamente ser impossível conservar Guadalcanal.
Para dar peso a esta opinião derrotista, citou um parecer, igualmente sinistro, que
MacArthur lhe confiara. Quanto a Nimitz, mostrou-se tão certo de que os
fuzileiros poderiam aguentar como Emmons estava certo de que não
aguentariam. Mas Arnold não se impressionou muito com as opiniões
manifestadas pelo almirante Nimitz. O comandante-chefe da Aeronáutica Militar
partiu do Havaí a respirar pessimismo e seguiu para o setor comandado pelo
vice-almirante Ghormley.
Com a sua divisão reunida pela primeira vez, Vandegrift pôde rever o seu plano
de defesa e estudar a maneira de derrotar os japoneses que continuavam,
obstinadamente, na margem ocidental do Matanikau. O general dispunha agora,
em Guadalcanal, de nove batalhões de Infantaria, um batalhão incompleto de
raiders, quatro batalhões de artilharia, duas companhias de tanques ligeiros e um
batalhão de armas especiais, comandado pelo major Robert B. Luckey, com
veículos de meia lagarta providos de peças de 75 mm.
Quando o 7.º de Fuzileiros chegou, as suas unidades ficaram sob o controle das
que já se encontravam em terra e os batalhões de infantaria passaram a ocupar
novas posições. A aviação de Geiger, embora reduzida, constituía uma garantia
razoável contra um ataque anfíbio de grande envergadura, e as reduzidas defesas
da praia passaram a estar ocupadas, durante a noite, por sapadores, batedores e
tripulações de veículos anfíbios. No interior, Vandegrift ordenou que se formasse
um cordão de defesa, que ia da foz do Tenaru, a leste, até à linha de serranias, a
oeste de Lunga. A linha semicircular passava, do maneira geral, por terreno
elevado, ao sul incluía o «Espinhaço de Edson» e a partir daí descia para o
intransponível Tenaru.
Mas Vandegrift não encarava uma atitude puramente passiva; planejava uma
defesa ativa. Com as tropas de que dispunha, agora, podia manter o terreno
conquistado e, ao mesmo tempo, atacar os japoneses, em operações limitadas,
destinadas a manter o inimigo desnorteado e sob constante tensão. Não podia
arriscar-se e não ignorava que seriam de prever novos ataques de grande
envergadura. Todas as ações deviam ser estudadas com o fito de prejudicar o
mais possível o inimigo, física e psicologicamente, sem exporem, contudo, a
força americana ao risco de ficar diminuída. «O Segundo Matanikau» foi a
primeira de tais operações de desgaste.
Esta ação, destinada a dispersar uma concentração, cada vez mais ameaçadora,
entre Point Cruz e Matanikau, começou em 23 de Setembro, quando o tenente-
coronel Lewis B. («Chesty») Puller, comandante do 1.º Batalhão do 7.º de
Fuzileiros, iniciou um avanço por terra na direção da nascente deste rio de mau
agouro. Depois de vários contatos com os postos avançados de Oka, nos quais
teve 7 mortos e 25 feridos, Puller acercou-se do Matanikau.
Para ajudar esta manobra, o 2.º Batalhão do 5.º de Fuzileiros (capitão Joseph J.
Dudkowski), apoiado pela artilharia, por concentrações de fogo de morteiro e
por aviões de combate munidos de canhões, atacaria do outro lado da língua de
areia.
Antes que tal fosse possível, Henderson foi alvo de violento ataque aéreo que
avariou todas as comunicações da Divisão. Por sorte, Puller não perdeu tempo.
Durante o ataque aéreo, dirigiu-se a toda a pressa a Kukum, requisitou um barco
e acostou ao Ballard. Com barcaças de desembarque na sua esteira, o porta-
hidraviões dirigiu-se imediatamente para Point Cruz, estabeleceu contato visual
com os fuzileiros cercados num cabeço coberto de kunai, algumas centenas de
metros para o interior, e iniciou o bombardeamento. Assim ajudado, o batalhão
começou a retirar, pelo corredor marcado pela explosão das granadas do Ballard.
Os fuzileiros levaram consigo os corpos de 24 mortos, assim como 23 feridos,
entre oficiais e soldados, a maioria dos quais impossibilitados de andar.
O sargento Robert Raysbrook, que fez repetidos sinais ao Ballard sob o fogo
inimigo, recebeu mais tarde a Medalha de Honra, condecoração que também foi
atribuída, postumamente, ao sinaleiro Douglas Munro, da Guarda Costeira.
Munro, que conduziu as barcaças de desembarque para a praia, foi morto pelo
fogo inimigo enquanto disparava a metralhadora de uma barcaça, a fim de
proteger os fuzileiros que embarcavam. Entretanto, chegaram aviões que
metralharam o inimigo, a fim de proteger uma segunda vaga de cinco barcaças
em retirada. Pouco antes de escurecer, o batalhão de Puller chegou a Kukum.
«Os aviões de transporte dos Fuzileiros Navais, assim como as suas outras
unidades, estavam a fazer excelente trabalho. Um extraordinário trabalho!
Percorriam a distância de 800 milhas até Guadalcanal com gasolina suficiente
para o regresso e cerca de 1500 quilos de carga, e no regresso traziam tantos
feridos quantos conseguiam alojar.»
O dia 2 de Outubro foi difícil, no ar, para Guadalcanal. Um dos melhores pilotos
— Robert Galer —, que acabava de abater o seu undécimo avião japonês, foi por
seu turno abatido, também. Lançou-se de paraquedas, recolheram-no e pôde
participar em mais missões de combate.
As más notícias não esperaram que o general chegasse ao seu novo posto de
comando; foram ao seu encontro. Assim que Hyakutake pôs pé em terra, foi
abordado por um oficial mandado por Maruyama, a fim de lhe comunicar a
perturbadora notícia de que a artilharia americana «massacrara» o 4.º Regimento
de Infantaria e que Maruyama fora obrigado a retirar as suas linhas da frente
para um ponto cerca de duas milhas a oeste do Matanikau. Hyakutake convocou
imediatamente uma conferência, para o nascer do dia. A exposição
pormenorizada que lhe fizeram, então, não foi nada encorajador:
A ordem súbita de Vandegrift para que fosse suspensa a operação bem sucedida
de 9 de Outubro, baseou-se numa informação recebida de Ghormley, segundo a
qual estava iminente um ataque de grande envergadura. Os vigias costeiros que
observavam Simpson Harbor, em Rabaul, assim como os que não perdiam de
vista as atividades nas Shortlands, anunciaram grandes concentrações de
cruzadores, contratorpedeiros, transportes e cargueiros. O esquivo «Expresso de
Tóquio» também intensificara a sua atividade. Documentos retirados dos corpos
de japoneses mortos em ações de patrulhamento e diários analisados pelo capitão
Moran, permitiam supor que a tentativa de ocupação da margem leste do
Matanikau era apenas um preliminar do ataque geral que poderia incluir,
também, ataque direto do mar.
Este programa agradava ao agressivo comandante da Unidade Naval 64, que viu
na sua missão uma oportunidade caída do céu para redimir a vergonha de Savo.
Durante três semanas inteiras, antes desta missão, a força naval de Scott fizera
exercícios de combate noturno, durante os quais o almirante não se poupara, nem
aos seus marinheiros. Mas agora sabia que os seus navios e as suas tripulações
estavam prontos e à altura da tarefa.
Os americanos podiam passar sem Spam, mas não podiam passar sem aviões.
Quando se recolheu, na terça-feira, 14 de Outubro, Geiger tinha 39 SBD em
estado de funcionar; quando saiu do seu abrigo, ao amanhecer do dia seguinte,
tinha 5. 16 dos 40 Wildcats estavam transformados num montão de ferros
torcidos, e os 24 restantes precisavam, todos, de reparações: pneus novos, rodas,
lemes, caudas e para-brisas. A maioria dos aviões-torpedeiros, recentemente
chegados, estavam também reduzidos a um monte de sucata. Vandegrift pediu 20
bombardeiros de mergulho, «imediatamente». Precisaria deles, assim como
precisaria de caças, pilotos, tripulações e pessoal de manutenção. O
bombardeamento concentrado no aeródromo causara mais de 60 baixas, das
quais 41 mortos. A maioria dos mortos e feridos pertencia ao pessoal da aviação,
incluindo seis pilotos.
Durante a manhã, Geiger mandou o seu punhado de SBD para The Slot, a fim de
bombardearem os navios, que navegavam em ziguezague. No regresso, os
aviadores anunciaram ter afundado um transporte e danificado outro. Na
realidade, porém, as suas bombas falharam por pouco, mas não causaram
quaisquer estragos aos japoneses. Tampouco minaram a determinação do
inimigo de conduzir o comboio ao seu destino.
Durante a longa viagem para o alvo, tanto Cram como o «Ganso» levaram fortes
sacudidelas, ao rebentar-lhes por cima e por baixo fogo antiaéreo de cinco
contratorpedeiros japoneses. Cram aguentou a rota e largou os dois torpedos. Um
entrou por um transporte ancorado, explodiu e destroçou-o. O «Ganso» voltou,
lentamente, na direção de Henderson, com três Zeros na pegada. A artilharia
antiaérea e os caças americanos escorraçaram-nos, mas não antes de o «Ganso»
estar feito num crivo. Quando Cram comunicou a Geiger o êxito da sua missão,
o general foi ver o seu avião de comando e contou cinquenta buracos na
fuselagem, nas asas e na cauda. Geiger ameaçou Cram com um conselho de
guerra, por destruição deliberada de propriedade governamental, regressou ao
seu gabinete e recomendou que fosse concedida a Cruz da Marinha no seu
ajudante, que efetuara um dos ataques mais audaciosos de toda a história da
aviação em tempo de guerra.
A força de Maruyama era composta por dois grupos, ou alas, e uma reserva.
Kawaguchi comandava a ala direita; o major-general Yumio Nasu, a esquerda. A
ala de Kawaguchi compunha-se de três batalhões de infantaria, além de canhões
antitanques, morteiros, artilharia de montanha e sapadores. A de Nasu, também
com três batalhões de infantaria, dispunha de idênticos apoios. Maruyama
deixou um regimento de reserva —o 16.º de Infantaria, do coronel Hitoshi
Hiroyasu—, com a incumbência de explorar o êxito de cada uma das alas. As
tropas auxiliares contavam com unidades de sapadores, sinaleiros, pessoal
médico e de aprovisionamento de água.
Mr Knox, de semblante mais carregado do que era hábito, teve o cuidado de não
se comprometer.
— Desejo e espero sinceramente que sim. Não farei quaisquer predições, mas
todos os homens darão boa conta de si. Está a travar-se uma boa luta, violenta, e
toda a gente espera que resistamos.
O New York Times descreveu Guadalcanal como o fulcro de uma batalha que
parecia «suscetível de se transformar num dos combates decisivos da guerra no
Pacífico». Durante estes dias de ansiedade, Rádio Tóquio teve muito pouco que
dizer acerca do progresso das operações nas Salomão.
Halsey, que viajava pelo Pacífico Sul, para se familiarizar com o setor, antes de
assumir o comando de uma unidade naval de porta-aviões, não esperara visitar
Nouméa em 18 de Outubro. Segundo o seu plano de viagem, nesse dia devia
estar em Guadalcanal. Mas, no caminho, recebera uma mensagem inesperada, de
Nimitz, a ordenar-lhe que fosse imediatamente a Nouméa.
Apoderou-se de Halsey uma emoção muito forte. Mais tarde, recordou que os
seus primeiros sentimentos tinham sido de «espanto, apreensão e mágoa, por
esta ordem». Em silêncio, o almirante e a sua pequena comitiva seguiram para o
Argonne.
Assim que tomou nas suas mãos confiantes as rédeas do comando, Halsey pediu
a Vandegrift, pelo rádio, que se apresentasse a bordo do Argonne logo que a
situação local lhe permitisse. Halsey queria um relatório direto, em primeira
mão, e em Nouméa ninguém lhe podia dar. Nenhum oficial superior do estado
maior de Ghormley tinha qualquer conhecimento do que se passava em
Guadalcanal, e, por outro lado, nem Ghormley nem o seu chefe de estado-maior,
contra-almirante Daniel J. Callaghan, tinham, nas dez semanas precedentes,
disposto de um dia em que pudessem abandonar a papelada e voar para norte, a
fim de ver o que se passava.
Embora sem consciência disso, Hyakutake tinha ainda outra razão para se sentir
otimista: o comando dos Fuzileiros ainda não fazia a mínima ideia da ameaça de
um grande ataque, pelo sul. As ações anteriores, perto da foz do Matanikau,
tinham gerado o convencimento potencialmente perigoso de que qualquer
tentativa séria só poderia vir desse lado. Esta opinião parecia ser confirmada
pelo comportamento de Sumuyoshi desde 12 de Outubro, data em que os obuses
pesados do comandante da artilharia japonesa começaram a bombardear
espasmodicamente o aeródromo.
Logo depois de este ataque ser repelido, Maruyama recebeu más notícias. A ala
direita — de Kawaguchi — ainda não chegara aos pontos de reunião e,
provavelmente, não poderia atacar ao pôr do Sol, como estava previsto. O
comandante da divisão não teve outro remédio senão adiar o seu ataque para as
17 h. do dia seguinte. Depois disso, telefonou a Kawaguchi, do seu posto de
comando no «Espinhaço em Forma de Centopeia», e, bruscamente, tirou-lhe o
comando da ala direita e entregou-o ao coronel Toshinaro Shoji.
«De acordo com os planos por mim elaborados, tenciono exterminar o inimigo
que se encontra nas Imediações do aeródromo de um só golpe.
Este ataque foi, a bem dizer, um esforço individual, efetuado pelo comandante
do 29.º de Infantaria nipônico. Ishimiya, acompanhado apenas por nove oficiais
e soldados e com a bandeira do seu regimento dobrada sob o dólmã, conseguiu
infiltrar-se profundamente na posição de Puller, onde permaneceu 48 horas, com
o seu grupo cada vez mais reduzido. Antes de amanhecer, Hyakutake recebeu
uma mensagem a anunciar que o aeródromo estava nas mãos dos japoneses.
Sem esperar pela confirmação, Hyakutake mandou a notícia para o ar. Esta falsa
notícia teria sido provocada pela proeza do temerário coronel Ishimiya? Nunca
se conseguiu averiguar. De qualquer modo, a investida do coronel fortaleceu a
determinação de Maruyama, que decidiu reagrupar e reatar o ataque. O
comandante de uma divisão orgulhosa não podia «ignorar que o comandante do
29.º de Infantaria levara uma bandeira do Sol Nascente [...] para o interior das
linhas inimigas».
O 29.º de Infantaria fora terrivelmente castigado, deixara quase mil cadáveres
defronte do arame farpado e em redor dos abrigos e posições dos americanos. No
domingo, à medida que o Sol subia, os cadáveres começaram a decompor-se.
Tornou-se, então, evidente, que o ataque do sul era o principal, e de manhã cedo
novas unidades começaram a ocupar posições, a fim de apoiar os fuzileiros de
Puller e os soldados comandados pelo tenente-coronel Robert K. Hall. Várias
baterias de artilharia mudaram, também, de posição, a fim de poderem reforçar o
fogo do batalhão único que apoiava diretamente o setor sul. O sol escaldava e o
repugnante cheiro da morte invadia as vertentes cobertas de erva, onde fuzileiros
e soldados se preparavam para resistir a novo ataque.
Agnew, do Trever, não teve tempo para discutir possíveis cursos de ação com o
seu colega, primeiro-tenente Wirtz, do Zane. Só havia uma coisa a fazer: sair do
porto de Tulagi o mais depressa possível. Caso contrário, as peças de cinco
polegadas dos navios japoneses destruiriam os rivais americanos, mais
pequenos.
«Ao comandante da Divisão não restava uma única reserva. Não havia
alimentos, nem se esperava que chegassem [... ] Ainda que todos morressem a
combater, não seria possível desmantelar as posições inimigos. Perdera-se toda a
esperança.»
Maruyama ordenou a Shoji que abrisse caminho pura leste, para Taivu, enquanto
ele conduzia os restos da sua destroçada força pela trilha a que com tanto
otimismo dera o seu nome, em 15 de Outubro, e informava Hyakutake da sua
intenção de constituir uma base forte no Lunga superior, a fim de se preparar
para novas ofensivas.
A ofensiva terrestre nipônica dos fins de Outubro não se malogrou apenas por a
artilharia americana ser flexível e de fogo certeiro e os fuzileiros e os soldados
combaterem com perícia e determinação. Estes fatores foram, sem dúvida,
fundamentais, mas o conceito japonês das operações também contribuiu para o
resultado obtido. Mais uma vez, o plano táctico se desmoronou sob o peso das
complexidades inerentes, das más comunicações, da incapacidade do fogo de
apoio e da falta de coordenação no espaço e no tempo.
Nesta sua primeira batalha, o 164.º de Infantaria conquistou todo o respeito dos
fuzileiros. Antes da meia-noite de 24 de Outubro, «cãozinho» era um termo
depreciativo, que os fuzileiros empregavam ao referir-se aos membros do
Exército dos Estados Unidos; depois do combate com a Divisão Sendai, os
homens do coronel Bryant Moore passaram a ser respeitosamente tratados por
«soldados». Tinham conquistado o título. Poucos dias depois do «Domingo dos
Abrigos», Clifton Bledsoe Cates, coronel comandante do 1.º de Fuzileiros,
escreveu a Moore:
Contratorpedeiros: 12
SEGUNDA ESQUADRA
Porta-aviões: Junyo
Contratorpedeiros: 12
Porta-aviões: Enterprise
Contratorpedeiros: 8
UNIDADE NAVAL 17
Porta-aviões: Hornet
Contratorpedeiros: 6
Poucas horas depois, Halsey enviou aos comandantes seus subordinados uma
mensagem de três palavras:
Os americanos estavam resolvidos a dar o dia por findo, mas Nagumo tinha
opinião diferente e ordenou outra série de ataques. Entre as 12.20 h. e as 12.45
h., 20 bombardeiros de mergulho atacaram o porta-aviões, em voo plano, e 4
aviões alvejaram o cruzador San Juan, que foi atingido uma vez em cheio e
abalado por cinco bombas que falharam por pouco. Às 16.20 h., os aviões de
Nagumo atacaram de novo o Hornet. Todos os ataques foram desencadeados
com determinação.
Mas o público nipônico não fazia ideia nenhuma de tal catado de coisas. A
Marinha, com a reserva do costume, também mantinha o Exército na ignorância
do que, ao certo, se passava. Noticiários radiodifundidos em chinês, japonês,
francês e inglês anunciavam que, em Santa Cruz, a «invencível Marinha» mais
uma vez «conseguira brilhantes resultados», que constituíam «novas proezas nos
anais do combate naval». Num sumário apresentado em 28 de Outubro, o porta-
voz da Marinha anunciou que, desde o começo das hostilidades, tinham sido
afundados 609 barcos de guerra e transportes inimigos, danificados 131 e
apreendidos 9. Indicou, também, o número de aviões aliados abatidos ou
destruídos, até àquela data: 3702.
Este percalço não foi fatal, pois iam outras tropas a caminho da ilha. Entre elas,
contavam-se o 8.º de Fuzileiros reforçado (coronel Richard H. Jeschke), vindo
de Samoa; unidades de artilharia; Seabees, e o 2.º Batalhão Raider de Fuzileiros
(tenente-coronel Evans F. Carlson). Não tardariam a chegar, também, aviões e
pilotos, que naquela conjuntura eram ainda mais precisos do que novas tropas de
terra. Em 26 de Outubro, os efetivos de Geiger limitavam-se a 29 aparelhos de
combate: doze Wildcats, onze SBD, três P-400 e três P-39, quase todos a
precisar de reparações.
Desta vez, não se tentaria forçar uma travessia sangrenta do Matanikau pela
faixa de areia. Em vez disso, o 5.º de Fuzileiros atravessaria a montante, por
pontes de infantaria, construídas pelos sapadores com pranchas e tambores de
combustível vazios. O «Whaling Group» passaria a vau, nos pontos de
confluência, atacaria para oeste e protegeria o flanco esquerdo do 5.º de
Fuzileiros. O coronel Edson, que já passara muito tempo naquelas desagradáveis
vizinhanças, comandaria a operação.
Um plano mais imaginativo exigiria que o 2.º de Fuzileiros, apoiado pelo
batalhão disponível do 164.º e com o «Whaling Group» a proteger o flanco
interno de Arthur, avançasse ao longo da estrada costeira, enquanto o 5.º de
Edson, já experimentado em combate, seguiria por mar, a fim de envolver
decisivamente as posições vitais nipônicas, entre Kokumbona e Tassafaronga.
Este plano, ou outro semelhante, chegou, até, a ser encarado, mas vários fatores
desaconselharam-no.
«Tem aqui uma estrutura sólida, Archie», comentou Halsey, e esmurrou um saco
de areia com o punho peludo. A areia começou a escorrer suavemente para o
chão. Explodiu outra bomba, o «Charlie» afastou-se, para oeste e soou o sinal de
«fim do alarme». Quando Halsey saía do abrigo, o saco de areia apodrecido
rebentou. Os augures da Divisão —e eram nada menos de 15 000...—
consideraram isso bom presságio.
Com a chegada de duas baterias de peças de 155 mm, a artilharia podia penetrar
a fundo na retaguarda nipônica. Recentemente tinham desembarcado, também,
outras peças e obuses, e Del Valle, entretanto promovido a brigadeiro-general,
tinha, enfim, à sua disposição um grupo de artilharia versátil e flexível.
Callaghan não constituía exceção. Duas semanas antes fora rendido pelo capitão
Miles Browning, como chefe do estado-maior de Halsey, e desde que assumira o
comando do Grupo Naval «quase não descansara. O almirante encontrava-se
num estado de exaustão física».
A disposição que Callaghan escolheu, para a batalha noturna, leva-nos a crer que
não analisara cuidadosamente a experiência do almirante Scott, no mês anterior,
durante o combate travado à meia-noite, com Goto. Como Scott fizera,
Callaghan colocou os seus barcos em coluna e dividiu os seus contratorpedeiros,
quatro à frente dos seus cinco cruzadores e quatro à retaguarda. Mas tal
formação não era a mais adequada para a situação que iria enfrentar, pois privava
os contratorpedeiros, automaticamente, de qualquer possibilidade de fuga, a fim
de efetuarem um torpedeamento súbito e coordenado, a curta distância.
Como acontecera com Crutchley, também não deu instruções especificas quanto
à batalha noturna, nem definiu o papel que esperava os seus contratorpedeiros
desempenhassem. Na realidade, o capitão Robert G. Tobin, comandante dos
quatro contratorpedeiros da retaguarda, não recebeu ordens absolutamente
nenhumas do almirante. Callaghan preparava-se, pois, para lançar as suas forças
contra um inimigo superior sem ter tomado providências elementares que
garantissem um mínimo de controle das operações. Talvez achasse que seriam
supérfluas quaisquer instruções, visto ser inevitável uma batalha barco a barco, a
curta distância. Os Chineses têm uma frase eloquente, a este respeito: «É preciso
penetrar no covil do tigre para apanhar os seus filhotes». Alguns entram
bruscamente, enquanto outros procedem com mais astúcia. As circunstâncias
tinham-se combinado para obrigar este almirante a entrar de supetão «no covil
do tigre».
Callaghan sentia-se confuso, mas não perdera a coragem nem tinha qualquer
intenção de se retirar. Pareceu-lhe no entanto que, em toda aquela balbúrdia,
havia canhões americanos a disparar contra barcos americanos. (E havia.) Pela
radiofonia, o almirante ordenou: «Deixem de alvejar os nossos próprios navios!»
No súbito silêncio que se seguiu, os artilheiros americanos esperaram. E os
japoneses também. Após uma pausa de alguns minutos que pareceram uma
eternidade, um canhão de 5 polegadas abriu fogo. Ato contínuo, os holofotes
nipônicos iluminaram o San Francisco. Passados menos de dois minutos, tiros
certeiros demoliram-lhe a ponte, mataram instantânea- mente Callaghan e três
membros do seu estado-maior, feriram de morte o comandante do cruzador,
capitão Cassin Young. O San Francisco começou a ser pilotado pelo quartel-
mestre de terceira classe Floyd A, Rogers. Todo o sistema de comunicações
estava avariado, e o oficial artilheiro, primeiro-tenente Wilbourne, «dirigiu-se
imediatamente à ponte de comando a abrir caminho pelo meio de destroços,
corpos, sangue e incêndios provocados por curto-circuitos. Jorrava água de
canos rebentados...»
«Uma série de cigarros Philip Morris levava do maço aberto, na sua mão, à
cabina de emergência. Aparentemente, ao ser disparado o único tiro, ele saira a
correr do seu camarote...»
Foi quase uma vitória de Pirro: outra vitória como esta, e a Marinha americana
estaria perdida. O Atlanta, n Cushing, o Laffey, o Barton e o Monssen tinham-se
afundado, ou não tardariam a afundar-se. O San Francisco, o Juneau, o Portland,
o Helena, o Sterrett, o O’Bannon e o Aaron Ward estavam danificados. Só o
Fletcher escapara sem uma beliscadura. Pelo menos 700 oficiais e marinheiros
que participaram na batalha com Callaghan e Scott não viram nascer o dia 13 de
Novembro, nem mais nenhum outro. Em termos de vidas e barcos, as perdas
americanas excederam em muito as japonesas. Mais uma vez, a Marinha dos
Estados Unidos levara uma tremenda tareia. Mas vencera a sinistra e sangrenta
batalha, descrita pelo almirante King como «um dos mais furiosos combates
navais jamais travados» — vencera-a porque Abe não conseguira o seu intento
de bombardear Henderson. E fugira.
«Juneau torpedeado e afundado lat. 10° 32' 5", long. 102° 2' E, às 11.09 h.
Sobreviventes na água. Informar ComSoPac.» 7
Halsey não recebeu a mensagem. Dos 100 homens que conseguiram sobreviver à
explosão, apenas 10 viveram para contar o que se passou. Perderam-se cerca de
700. 8
Enquanto Callaghan navegava, na noite sem lua, a caminho da batalha que lhe
seria fatal, a Esquadra Combinada ordenara a Tanaka que mudasse de rumo e
reconduzisse os seus transportes a porto seguro, nas Shortlands. O almirante
chegou ao meio-dia de 13 de Novembro. Uma hora depois, ordenaram-lhe que
seguisse de novo para Guadalcanal. O comandante da Força de Reforço «tinha o
pressentimento de que o aguardava um desatre», e os americanos estavam
dispostos a confirmar as suas apreensões.
Com o elevador da proa ainda encravado na posição de «Subida» — nem o
próprio Halsey ousaria premir o botão de «Descida»—, o Enterprise navegava
para norte, a 26 nós. Equipas de operários continuavam a trabalhar
freneticamente, a bordo, a fim de preparar o grande porta-aviões para o combate.
Acompanhava-o a Unidade Naval 64, de Willis Augustus Lee, composta pelos
couraçados Washington e South Dakota e por 4 contratorpedeiros.
Mais uma vez, metodicamente, «Louie the Louse» utilizou o seu aparentemente
inexaurível fornecimento de bombas luminosas. Chegaram a pairar no ar três e
quatro de uma vez, de modo que, mal uma se apagava, logo outra se acendia.
Como tantas vezes já sucedera, irromperam chamas, direitas ao céu, e
estampidos ensurdecedores, das granadas de 90 mm, sublinharam o tema mais
surdo das explosões das granadas dos cruzadores de Nishimura. Durante as
momentâneas acalmias, o firme roncar do motor do «Washing Machine Charlie»
recordava aos fuzileiros, aos soldados e aos setecentos e tal marinheiros salvos
naquele dia que seria perigoso levantarem-se da lama onde jaziam, à espera, de
olhos abertos. Os homens tremeram, nesta noite, embora a brisa noturna não
fosse fria.
Sofreu dois pequenos ataques aéreos às 8.30 h., durante os quais os pilotos dos
Zeros anunciaram ter abatido cinco atacantes. A esquadrilha seguinte passou
muito a sul e a oeste dos transportes. A força de Mikawa, que retirava
apressadamente e se encontrava a sul da Nova Geórgia e a navegar para oeste,
foi o alvo desta «grande formação», que Tanaka avistou cerca das 9.45 h. O
grupo de ataque do Enterprise, comandado pelo primeiro-tenente James R.
(«Bucky») Lee, VOOU sem hesitar na direção dos cruzadores em fuga. Havia
muito tempo para «tratar» de Tanaka.
O Kinugasa já fora atingido duas vezes por aviões torpedeiros com base em
Henderson, e Lee voltou a ataca-lo e liquidou-o. Depois os pilotos dedicaram as
suas atenções aos Chokai, Maya e Isuzu, que danificaram antes de esgotarem as
bombas. A esquadrilha de Lee seguiu para sudoeste, Mikawa aproveitou o
intervalo para reorganizar as suas forças e navegar rumo às Shortlands.
«Em seis ataques desencadeados hoje [...] o inimigo afundou seis transportes de
tropas [... ] As tripulações estão quase exaustas [... ] Os restantes transportes
passaram a maior parte do dia a esquivar-se, aos ziguezagues, e estão espalhados
em todas as direções.»
Lee foi o primeiro a chegar a Ironbottom Bay. O seu radar de busca não
assinalou nada até às 23.15 h. De súbito, porém, emitiu três «blips»,
identificados como um possível couraçado e dois cruzadores, a uma distância de
cerca de 17 400 metros e a aproximarem-se a grande velocidade. O radar da
artilharia de Lee fixou-se nos alvos, as torres procuraram o azimute adequado e
as peças subiram. Os oficiais premiram os botões de disparar e os canhões da
torre grande ribombaram. A primeira salva ultrapassou o alvo e o radar indicou
que o inimigo virava, para retirar. Passados seis minutos de fogo, às 23.21 h., os
couraçados deixaram de disparar. As suas peças de 16 polegadas tinham
dispersado a escolta dos cruzadores de Kondo.
Lee virou para a rota 300° (ligeiramente a noroeste), a fim de passar a sul de
Savo, que surgiu, numa silhueta negra, a estibordo. Quando a sua formação
começou a navegar nesta rota, os contratorpedeiros da vanguarda, 4500 metros à
frente, localizaram alvos. Uma segunda formação inimiga, desta vez de
contratorpedeiros, avançava para os americanos. Os quatro contratorpedeiros de
Lee abriram fogo, e surpreenderam os japoneses. Mas a surpresa durou pouco:
em escassos segundos, a água estava cheia de torpedos nipônicos, muitos dos
quais, como de costume, acertaram. No minuto seguinte, os canhões dispararam
e as suas granadas acertaram em todos os navios americanos. Um torpedo
desintegrou o castelo de proa do Walke até à ponte, as chamas envolveram-no e
começou a afundar-se. O Preston afundou-se às 23.34 h., e Lee ordenou ao Gwin
e ao Benham, ambos atingidos, que retirassem. Queria o campo livre para o
terceiro assalto.
Os relógios da ponte marcavam exatamente meia-noite quando os dois
couraçados americanos se aproximaram do corpo principal da força de Kondo —
três cruzadores seguidos pelo Kirishima—, à velocidade de 26 nós. A cerca de
7770 metros, a bateria principal do Washington disparou contra o couraçado
japonês. As primeiras granadas acertaram. Um cruzador japonês, depois outro e
ainda um terceiro iluminaram o South Dakota, cujas baterias secundárias
apagaram as luzes que o procuravam, mas não antes de um dilúvio de granadas
lhe desmantelar a superestrutura e destruir o radar de busca e todos os aparelhos
de radar de artilharia, menos um. As antenas da rádio também foram destruídas.
Cego, surdo e mudo, o South Dakota deixou de ser útil e transformou-se num
obstáculo. Por isso, à meia-noite e dez, o seu capitão «decidiu sensatamente
retirar, com grande alívio do comandante da Unidade Naval». Kondo também
retirou para norte, com o danificado Kirishima, e deixou Lee, no majestoso
Washington, senhor da área.
«Iniciámos esta ação convictos de que podíamos vencer o inimigo. Assim que o
inimigo retirou, depois das primeiras salvas, compreendemos que estava
derrotado. Mas compreendemos também, e não o devemos esquecer, que a nossa
margem de superioridade se deveu quase exclusivamente ao fato de possuirmos
radar. Não levamos a palma aos japoneses em experiência, perícia, treino e
persistência de pessoal.»
Notas
1 A má interpretação deste sinal ficaria cara aos americanos. Ao que parece, o
que Scott pretendia era que o barco-guia de cada divisão virasse para a esquerda,
para a rota 230°, e, simultaneamente, todos os barcos da mesma divisão virassem
no mesmo sentido (Divisons 230 Corpen). Isto teria, automaticamente, invertido
os papéis dos contratorpedeiros. Isto é, os dois navios que, antes, se encontravam
à ré dos cruzadores, ficariam à proa, enquanto os três que, antes se encontravam
à proa passariam para a ré. (N. do A.)
2 Wilson deve ter interpretado a ordem recebida pela radiofonia (TBS) como
«230° Corpen», o que significaria que a coluna viraria para a esquerda, para a
rota 230°, com cada um dos navios a virar na mesma direção do guia. Por isso
continuou a seguir a esteira do Helena e virou para onde ele virara. Devo ao
contra-almirante William W. Wilboume, então capitão-de-fragata e oficial
artilheiro do San Francisco, os pormenores da «trágica confusão» que se seguiu
ao sinal de mudança de rota de Scott. (N. do A.)
3 Há motivos para crer que um ou mais estavam, de fato. O Duncan foi atingido
no seu lado de bombordo. (N.do A.)
5 Frase usada num artigo do New York Times, numa data anterior, mas
igualmente apropriada, aqui. (N. do A.)
17. EMPATE
Guiados pelos batedores de Vouza e com uma ração reforçada de arroz, passas,
chá e toucinho fumado, puseram-se a caminho das vertentes do sul do monte
Austen, em perseguição de Shoji. Mas o coronel japonês também avançava
depressa e, embora os raiders localizassem e apanhassem de emboscada meia
dúzia de grupos isolados, não conseguiram alcançar o dizimado corpo principal.
Mas Hyakutake não podia aceitar este número pelo seu valor facial, pois nele se
incluíam milhares de subalimentados, assim como doentes e feridos. Os serviços
médicos, no Exército japonês, eram na melhor das hipóteses, primitivos,
comparados com os que prevaleciam no Ocidente — e nem sequer se podiam
comparar aos mais baixos níveis verificados em Guadalcanal. Não se fazia a
mínima tentativa organizada para evacuar os feridos para as áreas da retaguarda,
a não ser os de maior gravidade. Os outros, assim como os doentes, arranjavam-
se como podiam ou eram tratados pelos camaradas.
Esta obstinação era fortalecida pelo baixo apreço em que os japoneses tinham os
combatentes americanos. Continuavam a acreditar que as vitórias americanas se
deviam exclusivamente a preponderância material, mas que essa vantagem
técnica pouco importava. Na balança do combate, acabaria, inevitavelmente, por
ser ultrapassada pelas superiores qualidades espirituais nipônicas.
Todos os oficiais e soldados sob o meu comando que têm participado nas
operações das Salomão e da área oriental da Nova Guiné, travam, há muito
tempo, difíceis e árduas batalhas, em condições tormentosas, com o calor e a
fome, selvas insondáveis e montanhas íngremes, além dos ataques constantes da
aviação inimiga. Assim têm frustrado a contraofensiva das forças americanas e
australianas e lançado entre elas o pânico.
O resultado da guerra por uma Ásia maior, que decidirá o destino do nosso
Império, depende exclusivamente do exército desta área.
Halsey, a quem foi atribuída uma quarta estrela no dia de Ação de Graças, tinha
sob o seu comando barcos de superfície suficientes para fazer frente a qualquer
esforço nipônico. A dificuldade residia no fato de, como de costume, os seus
barcos estarem dispersos. Talvez Pearl Harbor tivesse ensinado aos almirantes
uma lição que não conseguiam esquecer. Mas, fossem quais fossem as razões, o
certo é que esta crise encontrou o Enterprise, o Washington e um cruzador
ligeiro tranquilamente ancorados em Nouméa; o Saratoga, inativo, em Nandi,
nas Fijis, com os couraçados North Carolina, Colorado e Maryland, e os
cruzadores Northampton, Pensacola, New Orleans, Minneapolis e Honolulu,
além de quatro contratorpedeiros, em Espírito Santo, ou prestes a lá chegar.
Alguns dias antes, Halsey ordenara a Kinkaid que fosse de avião a Espírito, a
fim de assumir o comando da unidade naval de cruzadores apressadamente
reunida e elaborar planos para deter a tentativa de reforço que parecia iminente.
Kinkaid começou logo a gizar um plano operacional para a viagem a Ironbottom
Bay e para a batalha noturna que esperava travar. Dava-lhe os retoques finais,
em 28 de Novembro, quando foi substituído no comando pelo contra-almirante
Carleton H. Wright, por ordem do almirante King.
O almirante Tanaka levantara ferro das Shortlands poucas horas antes. Teria sido
prematura a declaração de Nimitz, de 22 de Novembro, de que a fase «crítica»
passara?
O método de reabastecimento que planejara era, sem dúvida, novo. Eis como,
mais tarde, o descreveu: «Esterilizavam-se grandes caixas ou tambores metálicos
e enchiam-se de provisões médicas ou de alimentos indispensáveis —como
cereais—, deixando apenas ar suficiente para garantir a flutuação. Estes
tambores eram carregados em contratorpedeiros e unidos uns aos outros com
cordas fortes, durante a viagem para Guadalcanal. À chegada, as latas eram
todas atiradas à água, simultaneamente, enquanto os contratorpedeiros
continuavam o seu caminho. Um barco a motor apanhava a ponta da corda, que
flutuava, e puxava-a para a praia, onde as tropas recolhiam os tambores. Deste
modo, o tempo de descarga ficava reduzido ao mínimo e os contratorpedeiros
regressavam à base praticamente sem demora.»
Seis dos seus oito contratorpedeiros tinham a coberta cheia de tais tambores.
Para acomodar essa carga, houvera que remover todos os torpedos, exceto um
para cada tubo. O navio almirante, Naganami, e o do comandante da divisão,
Takanami, não transportavam tambores.
Na escuridão, a Unidade Naval 67 passou por Aola, onde se lhe reuniram dois
contratorpedeiros, o Lamson e o Lardner, que o almirante Wright mandou para a
retaguarda da sua coluna. À frente, com instruções para desencadear um
torpedeamento controlado pelo radar, Wright colocara a divisão de
contratorpedeiros do primeiro-tenente William M. Cole, composta pelos
Fletcher, Perkins, Maury e Drayton. O plano de Kinkaid estabelecia que dois
destes contratorpedeiros deveriam navegar bem à frente, a fim de comunicarem,
com toda a antecedência possível, a presença do inimigo. Wright, porém,
ignorou esta sensata precaução. Os cruzadores formavam em coluna atrás dos
contratorpedeiros: Minneapolis, New Orleans, Pensacola, Honolulu e
Northampton. A fechar a marcha, sem terem recebido quaisquer ordens, o
Lamson e o Lardner.
Wright entrou na Ironbottom Bay uma hora antes da meia-noite. Seis minutos
depois, apareceram os primeiros sinais nos écrans do radar. A distância era de 21
000 metros. Wright virou levemente para a esquerda e foi ao encontro do
inimigo. Às 23.16 h., o Fletcher tinha a coluna de Tanaka bem visível no seu
radar, e o comandante da divisão pediu licença para torpedear. Enquanto Wright
protelava, a coluna de Tanaka, que navegava numa rota oposta e quase paralela
passou pela sua à distância de 6400 metros. A distância, até então a encurtar,
começou a aumentar rapidamente, e quando Wright autorizou Cole a torpedear
era tarde demais.
Cerca das 23.50 h., depois de um combate que durara menos de meia hora, o
almirante nipônico ordenou aos seus contratorpedeiros que retirassem. Tanaka
fizera a sua descarga, mas não de arroz enlatado. Atrás dele, o Takanami e quatro
cruzadores americanos afundavam-se. Quanto ao Pensacola, ao Minneapolis e ao
New Orleans, ficaram fora de ação quase um ano. Mais uma vez, a Marinha
americana recebera uma dura lição.
Como foi possível acontecer tal desastre, que teve ainda menos desculpa que o
de Savo? Neste combate, os barcos americanos, munidos de radar, tinham,
novamente, possuído a vantagem da surpresa, mas, novamente também, haviam
mostrado não a saber utilizar. Wright dispusera de quatro cruzadores pesados,
com um total de 37 canhões de 8 polegadas, contra oito contratorpedeiros
frágeis. Logicamente, deveria ter afundado o «Expresso» de Tanaka. Mas, apesar
de terem tudo contra eles, os japoneses confirmaram a sua superioridade como
marinheiros e como torpedeiros. Aqui como em Savo, só a coragem não chegou.
Depois desta batalha, Tanaka enfileirou com Mikawa, como um dos muito
poucos excelentes comandantes navais japoneses da Segunda Guerra Mundial.
Claro que era preciso um bode expiatório, sobre cujos ombros se pudesse lançar
oficialmente a culpa da catástrofe que se abatera sobre a Unidade Naval 67.
Naturalmente, como era de esperar, esse bode expiatório não foi o contra-
almirante Carleton H. Wright, da Marinha dos Estados Unidos, que saiu
airosamente do grandíssimo sarilho em que meteu os seus navios ao aceitar
«toda a responsabilidade pelos danos causados pelos torpedos». O único oficial
censurado foi o primeiro-tenente William M. Cole, que guiava os
contratorpedeiros da vanguarda, no Fletcher.
A vitória de Tanaka deu início ao último mês de 1942 com uma nota amarga.
Mas o pessimismo não era muito, no quartel-general de Halsey. E no de
Vandegrift não havia, sequer, nenhum. O general passou os primeiros dias de
Dezembro a visitar as suas tropas e a preparar-se para passar o testemunho ao
major-general Patch. O chefe do seu estado-maior, coronel Thomas, e as seções
que chefiava, instruíam os oficiais do Exército que os substituiriam. O médico da
Divisão, capitão Warwick T. Brown, e o oficial comandante do hospital,
primeiro-tenente Don Knowlton, chefiaram um exame-amostra do comando de
Vandegrift, a fim de determinar a condição física das tropas. Concluiu-se, daí,
que mais de um terço dos oficiais e dos soldados estavam inaptos para qualquer
serviço que incluísse combate.
A. A. Vandegrift Major-General,
Dois dias depois, Vandegrift guardou alguns minutos de silêncio nos cemitérios
onde jaziam os corpos de homens tombados na primeira ofensiva americana da
Segunda Guerra Mundial. Depois, numa cerimônia simples, transmitiu o
comando da área CACTUS- RINGBOLT ao major-general Alexander M. Patch.
Durante essas horas, o 5.º de Fuzileiros, de Edson, marchava pela última vez em
Guadalcanal. Nesse dia, o seu destino era Kukum e não o Matanikau.
O embarque não foi tão rápido como os capitães dos navios tinham previsto.
Alguns homens estavam tão fracos que não podiam subir as redes oscilantes que
tinham descido havia 125 dias, numa manhã escaldante. Ao chegarem às
cobertas dos transportes e encolherem os ombros para se livrarem das mochilas
de combate, procuraram todos, cada um de per si, um canto sossegado, limpo e
seco, donde pudessem deitar uma boa vista de olhos à ilha em que sentiam,
embora vagamente, ter ajudado a escrever História americana.
CITAÇÃO
Frank Knox
Secretário da Marinha
Parecia a estes oficiais que uma penetração anfíbia — ou uma séria delas — na
retaguarda japonesa anularia não só as dificuldades físicas inerentes a um ataque
por um corredor, como permitiria, também, surpresa tática, cortaria as linhas de
aprovisionamento nipônicas de Kamimbo-Esperança para Kokumbona e
simplificaria muito os problemas de apoio logístico. Outros, favoráveis a um
ataque ainda mais decisivo do que tais operações praia-a-praia, a curta distância,
sugeriam um desembarque de grande envergadura, na costa sul, imediatamente
seguido por um ataque a oeste do cabo Esperança. Esta manobra, coordenada
com uma investida ao longo da costa norte, deixaria os japoneses a braços com
uma situação muito embaraçosa. Estes oficiais argumentavam que se conseguiria
reunir barcos de combate e aviões suficientes para proteger e apoiar tais
operações.
Por outras palavras, havia que escolher entre derrubar uma série de muros de
pedra ou abrir o portão do jardim a pontapé. Como tantas vezes acontece na
guerra, prevaleceram as opiniões menos imaginativas. A razão apontada para a
recusa do acesso indireto, em favor do direto, era a falta de cruzadores,
contratorpedeiros e embarcações de desembarque. Mas ainda faltava quase um
mês para o «Dia D» provisório, e se se fizesse um esforço intenso ter-se-iam
arranjado os barcos e as tripulações necessários. Isso provocaria, sem dúvida,
uma agitação temporária no ramerrão administrativo das zonas da retaguarda,
mas prometia, por outro lado, a perspectiva da rápida liquidação do inimigo, por
um preço relativamente baixo. Talvez o espectro da derrota em pormenores
dominasse estas reuniões, como acontecera tantas vezes nas do antecessor do
general Patch. No entanto, no tempo de Vandegrift houvera maiores motivos
para tomar esse fator em consideração.
No dia 17, estabeleceu contato com o inimigo; no dia 18, Nelson mandou para a
frente o resto do 3.º Batalhão. Na mesma tarde, o general Sebree procedeu a um
reconhecimento pessoal da área e chegou à conclusão de que Nelson poderia
utilizar, com vantagem, outro batalhão. Mandou, por isso, o 1.º Batalhão (menos
uma companhia) ao comandante do regimento. No dia seguinte, o 3.º Batalhão
comunicou que 200 a 300 japoneses defendiam uma posição muito bem
organizada, a sua frente. Em três dias —19, 20 e 21 —, as metralhadoras
nipônicas detiveram vários ataques limitados, com o apoio de artilharia e SBD.
O fogo da artilharia pouco efeito produzia nos abrigos de troncos em que o
inimigo se ocultava, e os observadores dos SBD não podiam, pura e
simplesmente, localizá-los. Se os soldados, em terra, não conseguiam encontrar
os japoneses, não admira que os aviadores também não conseguissem.
Para apoiar o seu ataque na manhã seguinte, Nelson pediu intenso fogo
preparatório, na zona de ação do 3.º Batalhão. O seu pedido foi aprovado e o
coronel ordenou imediatamente ao batalhão que recuasse 900 metros. Na manhã
seguinte, a artilharia do Exército e dos Fuzileiros efetuaram o mais violento
bombardeamento da história de Guadalcanal, até àquela data, e a aviação atacou
supostas posições inimigas. Quando o fogo cessou e os aviões partiram, o
coronel ordenou ao seu batalhão que regressasse à sua linha de partida e
desencadeasse o ataque. O avanço para a posição anterior levou o dia todo.
Desperdiçara-se, em vão, uma grande quantidade de valiosas munições de
artilharia e de bombas.
Aconteceu então uma coisa peculiar. Alguém descobriu (sem dúvida por acaso)
que o major-general John Marston, do C. F. E. U., comandante da divisão, tinha
um posto superior ao do general Patch. Mas Halsey prometera o comando a
Patch, quando este rendera Vandegrift, e, por isso, Marston foi substituído pelo
seu ajudante de campo, brigadeiro-general Alphonse de Carre. Enquanto se
resolvia este contratempo, o general Marshall formava o XIV Corpo e Harmon
nomeava Patch seu comandante. Sebree ficou com a Divisão Americal.
Patch tinha, agora, na ilha, três divisões com a força total, no papel, de 40 000
homens. Este número, porém, era ilusório, pois incluía muitos não efetivos,
sobretudo na Divisão Americal. As tropas de Collins eram frescas, assim como
as do 6.º de Fuzileiros, mas nenhuma companhia de atiradores, dos regimentos
de infantaria, estava completa. Muitas estavam, até, muito abaixo da força
autorizada. Eram estes oficiais e estes homens que tinham, como sempre, de
suportar a carga maior, de rastejar, cavar abrigos, passar a noite na lama e abrir
caminho de manhã. Eles que, suados e sequiosos, teriam de localizar as
metralhadoras japonesas e silenciá-las, uma por uma, estavam de novo, também
como sempre, em último, lugar, em matéria de apetrechamento.
Era, pois, manifestamente desejável começar por isolá-los dos seus camaradas a
oeste do rio e, depois, liquidá-los. O general americano esperava conseguir este
último objetivo induzindo-os a render-se. Se eles recusassem, proceder-se-ia ao
extermínio por bombardeamentos contínuos e metódicos. O regimento do
coronel McClure foi encarregado de acelerar o cumprimento dessas tarefas.
Enquanto um dos seus batalhões avançava para comprimir a «Gifu» e os outros
ocupavam posições para atacar o «Cavalo Marinho» pelo sul, os elementos
encarregados de iniciar o avanço para oeste completavam os preparativos para
desencadear a sua ofensiva.
Durante todo o seu curso, a campanha de Guadalcanal foi uma série de ações de
pelotões, companhias o batalhões. Exceto na decisão de pedir apoio da artilharia,
organizar ataques aéreos ou chamar a sua reserva à frente de batalha, um
comandante de regimento — ou, até, de batalhão— pouco controle podia exercer
nos combates travados. Assim, jovens oficiais comandantes de companhias e
oficiais subalternos, possuidores de habilidade para planejar combinações
indicas engenhosas e dirigir a sua execução, tiveram sobejos ensejos para pôr à
prova os seus talentos, que não são tão frequentes como às vezes se supõe. Pois a
luta pela posse do lado sul do «Cavalo Galopante», travada em 13 de Janeiro,
iria desenrolar-se, precisamente, num combate deste gênero, travado e decidido
de tão perto que se chegaram a trocar granadas de mão a distâncias inferiores a
18 metros.
Também nesse dia, uma primeira leva do 2.º de Fuzileiros disse, finalmente,
adeus à ilha. A retirada deste regimento reduziu a 2.ª Divisão de Fuzileiros a
duas equipas de combate, das quais o 8.º estava a precisar de descanso. O
general Patch mandou-o retirar para a base e formou uma Divisão mista do
Exército e dos Fuzileiros (CAM), composta por quartel-general, 2.º Divisão de
Fuzileiros, 182.º de Infantaria e 147.º de Infantaria. Esta divisão improvisada
atacaria ao longo do litoral marítimo, na segunda ofensiva do novo ano, marcada
para começar em 22 de Janeiro de 1943.
A desagradável tarefa de entregar a ordem de Imamura para abandonar a ilha
«KA» e explicar os planos futuros a Hyakutake fora confiada ao tenente-coronel
Kumao Imoto. Ele e um grupo de oficiais e soldados das Operações do Exército
da 8.ª Área desembarcaram no cabo Esperança poucos minutos antes da meia-
noite de 14 de Janeiro e, após breve descanso, puseram-se a caminho do posto de
comando do 17.º Exército. Cada oficial e cada soldado transportava uma mochila
com 45 quilos de «prendas de consolação»: frasquinhos de uísque, bolos, peixe
seco e cigarros.
«Encontrei-o sentado num cobertor, num buraco aberto sob as raízes de uma
grande árvore. Entreguei-lhe a ordem de retirada e os planos futuros, assim como
uma carta pessoal do general Imamura. Ouviu, de olhos fechados, as minhas
explicações. Quando acabei, disse-me, muito devagar: «O problema é muito
grave. Quero estudá-lo tranquilamente e sozinho, por momentos. Queira deixar-
me só, até eu o chamar.»
Ao meio-dia, Imoto foi chamado ao abrigo de Hyakutake, que lhe falou devagar:
No mesmo dia, o XIV Corpo ocupou posições 900 metros a oeste do Matanikau.
Os fuzileiros de Collins e os soldados de Carre dedicaram-se a consolidação das
posições conquistadas nas escarpas quo se estendiam 4100 metros para o
interior, do litoral a extremidade sul do «Cavalo Galopante». Alguns destes
americanos e muitos japoneses morreriam violentamente, nas duas semanas
finais da última batalha da «Ilha da Morte».
A ofensiva que, anteriormente, abarcara a Malásia, Guam, as Filipinas, Hong-
Kong, as Índias e as Bismarck, encontraria aí o seu ponto final. Foi aí que, pela
primeira vez na Segunda Guerra Mundial, um exército japonês dominado,
imobilizado e impossibilitado de cumprir o seu objetivo, se preparou para
abandonar o campo ao inimigo. Mas não sem responder aos ataques, ao retirar.
Também não foi em desonra que o seu comandante se preparou para salvar o que
pudesse ser salvo do 17.º Exército e para o conduzir «por cima de mares
tempestuosos».
21. EPÍLOGO
Este procedimento tem sido alvo de muitas críticas, nem todas imparciais. Do
ponto de vista psicológico os japoneses tinham os americanos precisamente onde
lhes convinha. Talvez o mal residisse no fato de os dois comandantes principais
terem tentado, mais uma vez, adivinhar as intenções do inimigo, em vez de
analisar as suas possibilidades. O que os americanos receavam era que, com o
grosso da força de Infantaria a combater no oeste, o inimigo aproveitasse para
atacar o único ponto vital. Talvez um comando mais audacioso tivesse tentado
jogar pelos dois lados, mas Halsey e Patch acharam a prudência aconselhável.
Nestas três noites, a Marinha levou da ilha quase 11 000 oficiais e soldados. O
17.º Exército deixara atrás de si quase 21 000 cadáveres, muitos deles insepultos,
onde as granadas da artilharia ou a metralha dos aviões os tinham abatido.
Outros, que já não sentiam os tormentos da doença, nem da fome, nem do
cansaço, estavam encolhidos nos abrigos abertos sob as raízes das grandes
árvores e seguravam nas mãos ossudas, sobre as quais a pele pergaminhada se
esticava, os canos ferrugentos de espingardas que nunca mais apontariam nem
disparariam. A ponta ocidental da ilha transformava-se num silencioso anfiteatro
de morte e decomposição, onde os únicos seres vivos eram as aves da selva e os
gulosos batalhões de formigas. Dos mortos, 8500 tinham caído em combate e
mais de 12 300 tinham morrido de ferimentos, doença ou fome. Dos evacuados,
600 morreram antes de lhes poder ser ministrado tratamento médico adequado e
3000 refizeram-se lentamente, em hospitais da retaguarda.
Guadalcanal durou quase seis meses. Durante esse período, travaram-se seis
batalhas navais e foram afundados sessenta e cinco barcos de guerra. As perdas
japonesas em aviões foram impressionantes. Embora nunca se tenha podido
calcular o número certo, a arma aeronaval nipônica perdeu, entre 7 de Agosto de
1942 e 7 de Fevereiro de 1943, mais de 800 aviões e 2362 pilotos e tripulantes.
O Exército japonês não foi, segundo as palavras do major-general Kawaguchi, o
único serviço que ficou «sepultado no cemitério de Guadalcanal».
«Não há dúvida de que o destino do Japão ficou traçado com o fim da luta pela
posse de Guadalcanal.
Raizo Tanaka.»
Basta olhar para um mapa do imenso Pacífico Sul e Central para compreender o
que a tomada e defesa de Guadalcanal significaram em termos de estratégia para
a causa dos Aliados. Não só afastaram a ameaça às extensas linhas de
comunicação com a Austrália e a Nova Zelândia, como também deixaram as
forças aliadas com base na ilha no flanco da linha Palau-Truk-Marshalls, o
cordão exterior da defesa do Império, atrás do qual se abrigavam as Marianas.
De Guadalcanal, partiria um dia a 1.ª Divisão de Fuzileiros, para se apoderar das
ilhas Palau, e a 3.ª para expulsar, primeiro, o inimigo de Bougainville e, depois,
retomar Guam. Dos aeródromos de Guadalcanal partiriam aviões que apoiariam
diretamente as operações de 1943 contra a Nova Geórgia e Bougainville, e
desses aeródromos se efetuariam os sucessivos ataques aéreos que reduziriam
Rabaul à impotência e ao isolamento.
Um dia, dizem os nativos, os americanos voltarão. Dessa vez não trarão armas,
mas, sim, barcos carregados de tabaco negro e forte e peças de tecido de
algodão, para lava-lavas...
Em 7 de Agosto de 1962, o primeiro-sargento Vouza enviou o seguinte
telegrama à Associação da 1.ª Divisão de Fuzileiros:
«Digam-lhes que os amo a todos. Estou velho, agora, e já não tenho bons olhos,
mas nunca me esqueço.»