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Mulheres intelectuais na Idade Média

Mulheres Intelectuais na Idade Média:


Hildegarda de Bingen –
Entre a Medicina, a Filosofia e a Mística

Marcos Roberto Nunes Costa1

RESUMO: É corrente se afirmar que antes da Modernidade não há registro de mulheres na construção
do pensamento erudito. Que, se tomarmos, por exemplo, a Filosofia e a Teologia, que foram as duas
áreas do conhecimento que mais produziram intelectuais, durante a Idade Média, não encontraremos
aí a presença de mulheres. Entretanto, apesar de todas as evidências, se vasculharmos a construção
do Pensamento Ocidental, veremos que é possível identificar a presença de algumas mulheres já nos
tempos remotos, na Antiguidade Clássica e na Patrística (ou Alta Idade Média). Mas é na Escolástica
(Baixa Idade Média) que encontramos as primeiras Pensadoras, responsáveis por um sistema
autônomo, distinguindo-se como fecundas escritoras, donas de obras tão profundas e importantes
quanto as produzidas pelos homens de seu tempo, com os quais muitas vezes dialogaram em pé de
igualdade. Dentro desse maravilhoso universo feminino de intelectuais, destacamos, na Escolástica, a
figura de Hildegarda de Bingen (1098-1165), da qual trataremos um pouco neste artigo.
PALAVRAS-CHAVE: Medicina. Filosofia. Mística. Idade Média. Mulheres Intelectuais.

1 Vida e obras
Segundo Joseph-Ignasi Saranyana, Hildegarda de Bingen (em alemão
Hidelgard von Bingen), última filha do casal de nobres Hildebert e Mechtild,
nasceu em 1098, em Bermersheim – sede dos barões de Sponheim – próximo
de Alzey, na Francônia-Renânia, região do Rio Reno (Cf. SARANYANA,
1999, p. 153, nota 41). Com oito anos de idade, Hildegarda foi confiada à
abadessa e ex-condessa Jutta (Judite), filha do Conde Stephen de Sponheim,
no mosteiro das beneditinas de Disibodenberg, que foi sua tutora, preceptora
ou mestra (magistra).

1
Professor/coordenador da Graduação em Filosofia da UFPE. Professor do Programa de Pós-Graduação
(Mestrado e Doutorado) em Filosofia da UFPE/UFPB/UFRN. E-mail: marcosnunescosta@hotmail.
com

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COSTA, M. R. N.

Além de Jutta (Judite), consta que na instrução de Hildegarda interveio


também o monge Volmar, seu primeiro confessor-copista, os quais iniciaram
sua educação que, como era costume da época, começava pelo estudo das
Escrituras Sagradas, nomeadamente pelos Salmos, a ponto de se dizer que
naquele tempo “aprender a ler é aprender a salmejar”.
Aos quinze anos de idade, Hildegarda fez votos religiosos, tornando-
se monja beneditina, passando a viver (em companhia de Jutta) em regime
de ascetismo, reclusa em uma pequena cela, usando um cilício de ferro. Em
1136, com a morte de Jutta, Hildegard tornou-se abadessa do mosteiro das
beneditinas de Disibodenberg.
Cinco anos depois, aos quarenta e três anos de idade, Hildegarda teve
sua primeira grande experiência mística (que foi seguida de outras, das quais
resultaram várias obras, conforme veremos mais adiante)2, momento em que
recebeu – como ressalta ela – “o encargo de Deus” para escrever e pregar, o que
implicaria uma mudança radical de vida, ou seja, sair da vida de reclusão e iniciar
uma vida de peregrinação/pregação. Por isso, esperou a autorização da Igreja
para começar tal tarefa. Primeiro, em carta, recorreu a São Bernardo de Claraval,
que a encorajou. Mas, como esta continuou em dúvida, o caso foi levado ao
Papa Eugênio III, que, em 1147, durante o Sínodo de Trier, encarregou uma
comissão de teólogos, dentre os quais Albero de Couní, bispo de Verdún, para
examinar os relatos de suas visões e, depois de um parecer favorável, autorizou
que ela escrevesse suas experiências místicas. Tais visões a própria Hildegarda
assim descreve, no seu primeiro livro, Scito vias Domini (Conhecer os caminhos do
Senhor), que depois foi abreviado simplesmente por Scivias:
E sucedeu no 1141º ano da encarnação de Jesus Cristo, Filho de Deus,
quando eu tinha 42 anos e sete meses de idade, uma ardente luz de um
intenso brilho veio do céu para se pôr por completo em minha mente,
como uma chama que não queima mas que ilumina. Ela me preencheu
totalmente, coração e alma, como um sol que esquenta algo com seus raios.
E mais uma vez eu poderia ter o gosto de entender realmente o que diziam
e o que significavam os Sagrados Livros - Os Salmos, os Evangelistas e os

2
Digo a primeira grande experiência mística, porque desde criança Hildegarda tivera várias pequenas
visões, mas foi esta que a levou a escrever e pregar. Segundo relato da própria Hildegarda, contido no
segundo volume de sua Vita, iniciada por seu primeiro biógrafo, o monge Gottfried, “[...] ela teve sua
primeira experiência visionária ainda antes dos 5 anos de idade. Segundo tal relato, enquanto caminhava
com sua ama, a pequena Hildegarda exclamou: ‘Veja que bezerrinho bonitinho dentro desta vaca. Ele é
branco com manchas no peito, nas patas e nas costas’. Quando o bezerro nasceu, algum tempo depois,
constatou-se que era exatamente conforme a descrição de Hildegarda” (POLL, 2010. p. 56).

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Mulheres intelectuais na Idade Média

demais livros do Antigo e Novo Testamento [...] (HILDEGARDA DE


BINGEN, Scivias, 5).

No final, uma voz lhe ordenou, por três vezes consecutivas: “Oh,
mulher frágil, cinza de cinza e corrupção de corrupção, proclama e escreve o
que vês e ouves” (HILDEGARDA DE BINGEN, Scivias, 5).
A partir de então, isto é, tendo recebido o aval da Igreja, Hildegarda
assumiu sua missão como uma verdadeira “profetisa”. Assim, já em 1151,
semelhante a Moisés no Êxodo, que foi o modelo de profetismo escolhido para
seguir desse momento em diante, deixa Disibodenberg e parte na companhia
de algumas monjas para Rupertsberg, próximo a Bingen, com a finalidade
de revitalizar o antigo mosteiro de Monte Rupert, construído no passado
sobre a tumba de São Rupert3. Ali, com um carisma e espírito literário, age
semelhante aos profetas do Antigo Testamento, em que aparecem os três
elementos típicos do profetismo: 1. declaração de sua própria incapacidade;
2. iluminação do alto e 3. graça divina, que a fez superar sua incapacidade, a
exemplo de Jeremias, Isaías etc. Daí afirmar Chiara Zamboni que, em diversos
momentos de seus escritos, Hildegarda se declara ou se apresenta como uma
“pequena mulher” ou “pobre mulherzinha”, ou uma mulher humilde que
não tem estudos4. Ou seja, com a consciência que de “[...] o conhecimento

3
Nesse mosteiro, Hildegarda viveria até o final da vida, conforme veremos mais adiante.
4
Um dos pontos controversos da vida de Hidelgarda é quanto a sua capacidade intelectual, uma
vez que ela mesma se apresenta como uma mulher humilde ou um “[...] frágil ser humano, ingênua
e ignorante” (Scivias, 5), e os principais biógrafos dela dizem que ela não frequentou uma escola
regular, senão que sua formação não passou de pequenos conhecimentos adquiridos no mosteiro, sob
a instrução de Jutta, por isso, para alguns comentadores, trata-se de uma experiência sobrenatural, na
qual ela é apenas um veículo, conforme enfatizam Cirlot e Gari (1999, p. 55): “A palavra de Hildegarda
e sua escritura foram possíveis graças a que ela não era nada, senão só receptáculo e transmissão da
vontade de Deus. Sua autoridade procedia de que não era ela que falava, senão a voz que ouvia na
visão”. E é o que vemos em suas próprias palavras, escritas no prólogo de sua primeira obra, Scivias,
quando escreve: “E eis que foi no ano de quarenta e três do curso de minha vida temporal, quando em
meio a um grande temor, tendo uma celeste visão, vi uma grande claridade em se ouve uma voz que
vinha do céu que dizia: ‘Frágil ser humano [...] escreve o que vez e ouves. Mas como tens medo de falar,
como eis ingênua e ignorante para escrever, fala e escreve não fundamentada na linguagem dos homens,
não na inteligência e na invenção humana, senão fundamentada no fato de que vez e ouves o que vem
de cima, no céu, nas maravilhas de Deus’. E de novo ouvi uma voz que me dizia: ‘Proclama estas
maravilhas, escreve o que tens aprendido’” (Scivias, 5). Mas, apesar de apresentar-se como tal, alguns
“[...] estudiosos de história medieval reconhecem que nos seus escritos há um vasto conhecimento
dos textos mais lidos nas Escolas de Teologia e nas Universidades de seu tempo” (ZAMBONI, 1997,
p. 26), sinal de que ela não era uma mulher sem estudos, como dizia. É o que reforça Santucci,
2012: “Em suas obras, contrariamente à sua pretensão de ser ignorante, Ildegarda provou ter um bom

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profético não tem a sua origem nela: Hildegarda se percebe como a portadora
de um conhecimento. Ela é mensageira de uma verdade. Mas não é ela que
produz esta verdade” (ZAMBONI, 1997, p. 26).
É o que vemos nas palavras da própria Profetisa:
As palavras que digo não provêm de mim, mas eu as vejo em uma suprema
visão [...]. Conservo um lugar na memória para as coisas que apreendo na
visão [...].
Vejo, escuto e reconheço no mesmo instante e no mesmo instante
apreendo. Mas não entendo aquilo que vejo, porque não estudei [...].
Assim não acrescento outras palavras minhas aquilo que escutei na visão e
me exprimo num latim não refinado [...].
As palavras que escuto são como uma chama ardente, assemelhando-
se a nuvens que se movem no ar. E no mesmo céu vejo o brilho, mas
não freqüentemente, de uma outra luz, que chamo luz vivente, que não
sou capaz de explicar, nem como e nem quando (HILDEGARDA DE
BINGEN, Scivias, 5-35).

Portanto, numa época em que a intelectualidade estava reservada aos


homens, “[...] foi o sobrenatural que permitiu a Hildegarda sair dos estreitos
marcos que, em princípio, havia lhe reservado seu mundo, para situar-se em
um primeiro plano da espiritualidade e cultura da época” (CIRLOT; GARI,
1999, p. 51)5.
E dentro desse espírito de humildade, escreveu diversas obras, em
que descreve suas visões ou mensagens recebidas de Deus, dentre as quais:
Scivias (Conhecer os caminhos do Senhor), primeira de suas teológicas obras,
principiada em 1147, após a supracitada autorização do Papa Eugênio III, e
concluída em 1151, em que expõem, de forma ordenada, 26 visões sobre os
conhecimento não só da Bíblia, mas também dos autores latinos, a filosofia neoplatônica e ciências
naturais, como em ‘et curae causae’ uma espécie de manual prática da medicina e da farmacologia, sobre
temas médicos, filosóficos e astrológicos, como em ‘Physica’, sobre as propriedades das plantas, pedras
e animais”. O certo é que não era Hildegarda quem escrevia suas obras, mas um copista ou secretário,
que anotava os relatos de suas visões. O primeiro deles foi Volmar, que, ao falecer, em 1173, foi
substituído por Gottfried, que iniciou sua primeira biografia, mas três anos depois faleceu, em 1176,
ficando em seu lugar Guibert de Gembloux, que continuou a referida biografia. Por tudo isso, todos
concordam que nas suas obras, ou para produzir suas obras, o mais importante são as visões e não o
conhecimento adquirido pelos estudos.
5
E, mais adiante, completa: “A palavra de Hildegarda e sua escrita foram possíveis graças ao fato de que
ela não era nada, senão só receptáculo e transmissão da vontade de Deus. Sua autoridade procedia de
que não era ela quem falava, senão a voz que via na visão” (CIRLOT; GARI, 1999, p. 55).

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Mulheres intelectuais na Idade Média

mistérios da salvação, divididos em três livros: o primeiro (seis visões) sobre a


criação e entrada do mal no mundo, a aurora pela queda de Lúcifer; o segundo
(sete visões), sobre a salvação e a encarnação de Jesus Cristo; e o terceiro (treze
visões), sobre a virtudes de sua tarefa na construção da salvação. Pela estrutura
da obra, pode-se perceber que o objetivo principal da autora é, “[...] através
dos ensinamentos da doutrina cristã, mostrar o caminho que, por meio da
prática das virtudes, deve ser percorrido para se alcançar o reino celeste”
(POLL, 2010, p. 82).
Nos anos seguintes, Hildegarda escreveu mais duas obras: o Líber vitae
meritorum (Livro dos méritos da vida - 1158-1163), um tratado de ética, que
estabelece a oposição entre vícios e virtudes a partir de figuras metafóricas,
onde, por exemplo, os vícios são descritos ou retratados em formas grotescas
que misturam partes humanas e animais, com o objetivo de mostrar e alertar
para o perigo de não encontrar o caminho a ser seguido para alcançar o reino
celeste, já apontado no Scivias, por isso é considerado um complemento ou
aprofundamento deste.
E o Líber divinorum operorum (Livro das divinas obras - 1163-1174),
inspirado no Evangelho de São João, por isso centrado no tema da Caridade
ou Amor Divino (representado na figura simbólica de uma mulher linda
e forte), em que trata de temas como a Trindade, a Criação e a Redenção,
fazendo uma estreita relação entre o homem e o universo, conforme veremos
mais adiante. Nessa obra, Hildegarda traça sua antropologia filosófica, em
que, além da verdade revelada de que o homem foi criado à imagem de Deus,
trabalha a questão da igualdade/diferença entre o homem e a mulher, a qual
veremos na sequência.
Em síntese,
[...] o Livro das divinas obras é inspirado pela visão de uma enorme figura
divina, a Caritas ou Amor Divino, e apresenta as ideias mais maduras
de Hildegarda sobre cosmologia, história da salvação e escatologia,
conduzindo o leitor para um final apocalíptico. Há, na obra, uma
meditação reverente sobre o cosmo e suas proporções, os quais tem seus
análogos microcosmo do corpo humano. Assim a forma humana está
inscrita no centro do universo, Cristo, ou o encarnado, está inscrito no
centro do tempo. (POLL, 2010, p. 85).

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COSTA, M. R. N.

Ademais, no Líber divinorum operorum (Livro das divinas obras), há uma


série de pinturas da própria Hildegarda, que aparecem não só como ilustração
(iluminuras), mas como meio pedagógico de transmissão dos conteúdos.
Além disso, escreveu diversas Epístolas (cerca de 400, entre 1147-1179),
dirigidas a papas, cardeais, bispos, abades, reis, imperadores, monges e monjas,
homens e mulheres de todas as classes, tanto da Alemanha como de outros
países, os quais tinham grande admiração e respeito para com seus conselhos,
conforme assevera Azucena Adelina Fraboschi, em Prólogo à tradução de uma
das Epístolas de Hildegarda ao Papa Anastácio IV:
A obra da abadessa de Bingen leva a inconfundível marca do modo
feminino de pensar, de escrever, de atuar, de viver. Em uma palavra, de ser.
E ainda assim logrou em seu tempo a aceitação, o respeito e a veneração
de Papas, Reis, nobreza, hierarquia eclesiástica e religiosa, intelectuais,
médicos, povo, etc. Aceitaram sua ciência, respeitaram sua presença,
veneraram suas virtudes. (FRABOSCHI, 2004, p. 13).

Entre os anos de 1151-1158, escreveu uma grande obra de medicina,


Liber subtilitatum diversarum naturarum creaturarum (Livro das sutilezas das
várias naturezas da criação), que, após sua morte, foi dividido em duas partes:
Physica ou Liber simplicis medicanae (Física ou Livro de medicina simples),
que é um tratado de medicina naturalista, em nove livros, e Causae et curae
ou Liber compositae medicanae (Causas e curas ou Livro da medicina composta).
Estas duas últimas obras tratam das causas das enfermidades, seus remédios e o
funcionamento interno do corpo humano e sua relação com o cosmo, dentro
de uma visão terapêutica de totalidade holística entre os quatro elementos
formadores do universo: terra, água, ar e fogo6.
6
Segundo Debra (apud HILDEGARDA DE BINGEN, 2012), “[...] não se sabe como ela veio a
adquirir seu conhecimento; sua atividade como médica foi toda informal e sua formação nesse campo
aconteceu provavelmente de forma autodidata, mas ela pode ter recebido uma base terapêutica prática
com Jutta e os monges de Disibodenberg durante seu noviciado. Pois, fazia parte das obrigações das
superioras conventuais velar pela saúde de suas monjas, mas a prática profissional do ofício exigia
formação universitária, o que era vedado às mulheres. Seja como for, pelo conteúdo do tratado se
infere que ela estava familiarizada com a medicina de Galeno, de Hipócrates, as práticas árabes e
o curandeirismo tradicional alemão, e deve ter ampliado seus conhecimentos com a prática de
atendimento a doentes no seu mosteiro. Também deve ter conhecido as obras de naturalistas antigos
como Plínio, o Velho, e Isidoro de Sevilha, bem como os bestiários e livros de maravilhas de sua
época, e as teorias dos temperamentos, dos fluidos corporais e dos humores, estabelecidas desde a
Antiguidade, mas fez muitas observações originais e inventou diversas terapias novas. O texto traça
um panorama abrangente das práticas medicinais disponíveis em sua época, derivadas das tradições
pagãs greco-romanas, muçulmanas, cristãs e folclóricas, e fica clara sua concepção de que a natureza

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Aqui, mantendo-se em seu holismo, em que faz uma íntima relação


entre corpo e alma, o homem e a natureza, o natural e o sobrenatural,
Hildegarda defende que boa parte das doenças dos homens é consequência
do pecado original, da perda da harmonia e da integração entre Criador e
criatura, recusando-se a ver a doença como um assunto exclusivamente de
ordem física, fazendo constantes conexões entre os males que afligiam a alma
e aqueles de que padecia o corpo.
Para alguns comentadores, essa “visão religiosa” das doenças e suas
curas é fruto da formação prática que Hildegarda recebeu no mosteiro:
Numa época em que os hospitais ainda eram raros, os mosteiros
representavam uma das poucas possibilidades de obter cuidados
médicos, embora prevaleça a compreensão de que a medicina dos
mosteiros ‘considerava a doença um castigo [...] e exigia, portanto,
orações e arrependimento, a par de cuidados médicos’. É possível que
esta interpretação do caráter eminentemente religioso da medicina nos
mosteiros tenha influenciado a apreciação do trabalho médico de Hildegard
von Bingen como fruto da sua religiosidade. (ALMEIDA, 2009).

Inclusive, é por esse motivo que certos setores da literatura médica


atual não considerem ou não incluem as obras de Hildegarda em seus livros,
conforme observa Cybele Almeida (2009):
[...] de fato, uma pesquisa preliminar demonstra esta resistência no fato
que Hildegard não ser mencionada no verbete Medicina do Dicionário
de Idade Média organizado por LOYN. O verbete MEDIZIN, do
Sachwörterbuch der Mediävistik (DINZELBACHER, 1992, p. 515)
menciona apenas o seu nome e datas de nascimento e morte, sem aludir
a nenhuma de suas obras. Além disso, obras especializadas em história da
medicina, como MARGOTTA e LYONS/PETRUCELLI, a ignoram por
completo. Isso se deve provavelmente a um erro de interpretação bastante
comum que consiste em apresentar o trabalho médico de Hildegard como
resultado puro e simples da sua condição de religiosa.

e o homem são espelhos mútuos e integrados”. Essa informação é confirmada por Almeida (2012):
“A Regra da Ordem dos monges beneditinos – uma das primeiras do ocidente – além de regular o
cotidiano dos monges preocupava-se com a sua saúde e a ocorrência de doenças. O resultado dessa
preocupação foi a organização de um sistema de cuidados médicos nos mosteiros, com enfermarias
para os monges (infirmarium), para os ricos e nobres (domus hospitum) e para os pobres e peregrinos
(hospitale pauperum), com a reprodução da ordem social existente também fora dos mosteiros. Estes
dispunham também de celas para os médicos, os doentes graves, banhos, farmácia e jardim com
ervas medicinais [...] É neste contexto que devemos apreciar a medicina na Idade Média, de modo a
compreender as múltiplas funções dos mosteiros e o seu papel na formação de Hildegard von Bingen”.

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COSTA, M. R. N.

Isso se deve igualmente por se encontrarem elementos da astrologia e


da magia, em suas teorias/práticas médicas, conforme acusa Alic:
Ainda que condenasse a astrologia, Hildegard sustentava que os corpos
celestes podiam revelar em ocasiões sinais de Deus. A lua, por exemplo,
influía na natureza humana e nos assuntos dos homens [...]. Acreditava
ainda que a procriação numa fase inapropriada da lua poderia gerar
crianças deformadas. (ALIC apud ALMEIDA, 2009).

Além disso, Hildegarda escreveu outras obras menores, como duas


biografias de santos, estilo literário em moda na época: a Vita S. Disibodi
(Vida de São Disibodo – 1170), escrita a pedido do abade Helenger, de
Disibodenberg, louvando a vocação precoce de São Disibodo e sua humildade,
comparando-o a São João Batista, e a Vita S. Ruperti (Vida de São Ruperto
- 1070-73), produzida certamente para celebrar o santo patrono do mosteiro
que Hildegarda reconstruiu sobre as ruínas de um edifício anterior, que
honrava o local da tumba do santo.
Produziu ainda alguns pequenos trabalhos exegéticos: Explanatio regulae
S. Benedicti (Explanação da regra de São Bento - 1053-65); Explanatio symboli
S. Athanasii (Explanação do símbolo de Santo Atanásio - 1065); Expositiones
Evangeliorum (Exposição do Evangelho), sobre o ano litúrgico; Solutiones
XXXVIII quaestionum (Respostas a 38 questões - 1178), sobre problemas
teológicos propostos pelos monges cistercienses de Villers de Brabante.
Hildegarda é autora também de uma Lingua ignota (Língua desconhecida
ou secreta – 1150), formada por um alfabeto ou Litterae ignotae (Letras
desconhecidas), que, segundo Jeffrey Schnapp, é “[...] uma lista com pouco
mais de mil termos inventados, a grande maioria trazendo ao lado a tradução
latina, seguida da tradução alemã” (SCHNAPP, 2007, p. 70), ou seja, uma
espécie de dicionário ou vocabulário de palavras alegóricas ou metafóricas
usadas por ela em suas obras, para se fazer entender junto ao povo ou para
falar de assuntos científicos com palavras populares7.

7
Ainda segundo o supracitado comentador, como médica, especialmente das mulheres, Hildegarda
usava termos populares em seus escritos sobre medicina, nomeadamente para falar das partes íntimas
do corpo humano, o que foi motivo de críticas por partes de muitos, que a acusaram de obscenidade (cf.
Ibid. p. 74). Outros sugerem que essa língua tenha servido como um código secreto para comunicação
das monjas, quando em presença de estranhos.

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Mulheres intelectuais na Idade Média

Espelhando-se em outras obras similares de seu tempo, mais


especificamente nas Etimologias, de Isidoro de Sevilha, e no Hermeneumatica, do
Pseudo-Dositheano, na Lingua ignota de Hildegarda, as palavras estão dispostas
em grupos hierarquicamente decrescentes, que vão do geral ao particular, isto é,
de cima para o centro e do centro para baixo, quer dizer, de Deus até o homem
e daí aos demais seres naturais. Cada um desses degraus, por sua vez, obedece
a uma disposição hierárquica descendente, como é o caso do homem, por
exemplo, que vai do alto da cabeça até o tórax e deste até a sola dos pés.
Além de escritora, médica, mística e artista plástica, Hildegarda de
Bingen era, também, grande música, compositora e dramaturga, chegando
a compor 77 canções litúrgicas (antífonas, responsórios, sequências, hinos,
um Kyrie eleison e um Alleluia) para o uso do mosteiro, que estão reunidas na
obra Symphonia armonie celestium revelacionum (Sinfonia da harmonia das
revelações celestiais - 1140 – 1150), e um auto dramático-musicado, de cunho
didático-moral, intitulado Ordo virtutem8 (A ordem das virtudes - 1150), que
é um conjunto de 14 peças musicais em forma de um pequeno drama sacro
musicado, como forma didática de síntese do Scivias (Conhecer os caminhos
do Senhor), descrevendo de maneira dramática a origem e destino final do
homem, com uma ilustração teatral e musical das beatitudes do Paraíso9.
Segundo Beverly Mayne Kienzle, em linhas gerais, o Ordo virtutem (A
ordem das virtudes)
[...] é uma dramatização musicada da luta de uma alma que caiu em
pecado em busca de redenção. Os personagens principais são a Alma, o
Demônio e as personificações das várias Virtudes que concorrem para o
resgate da alma caída, e o texto tem uma clara função moralizante. Cada

8
Além dessas obras, na Epístola XXIII, dirigida aos prelados de Mainz, escrita por ocasião do
interdito a que foi submetido seu mosteiro, Hildegarda desenvolve sua concepção de música. Uma
verdadeira teologia musical, a qual está assentada numa visão pitagórica, presente na obra de Regino
de Prum, que alude a uma música celestial (o cântico dos anjos no céu), e na classificação boeciana
da música (mundana, humana e instrumental). Nesta carta, Hildegarda chega a sustentar que uma
das consequências do pecado de Adão foi a “perda da voz”, que significa a perda da semelhança com
Deus e, portanto, da capacidade de conhecimento. Por isso, apresenta a música como instrumento
catequético-pedagógico de recuperação da condição original do homem. A música é colocada no plano
revelacional (cf. CIRLOT; GARI, 1999, p. 63).
9
Os manuscritos das obras de Hildegarda foram reunidos em um arquivo chamado Riesenkodex
(livro gigante), “[...] produzido em Rupertsberg logo após a morte de Hildegarda, sob a supervisão
do monge Gilbert de Gembloux, que se tornou secretário e amigo da religiosa no final da vida
desta. O Riesenkodex preservou todos os textos de caráter proféticos de Hildegarda, incluindo suas
correspondências, com exceção de seus textos médico-cientíticos” (POLL, 2010, p. 15). O Riesenkodex
encontra-se hoje conservado na Biblioteca Estatal de Hesse, na Alemanha.

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COSTA, M. R. N.

Virtude tem pelo menos uma seção solo onde descreve suas características.
No final a Alma redimida é levada para o céu, enquanto que as Virtudes,
lideradas pela Humildade, acorrentam o Demônio. (Kienzle apud
HILDEGARDA DE BINGEN, 2012).

Em acréscimo, Hildegarda era grande oradora, tendo sido autorizada


a proferir Sermões em público, coisa rara entre as mulheres de seu tempo,
conforme informa Carlos Guimarães:
Ela foi uma extraordinária pensadora, uma grande filósofa e teóloga. Ela
era uma freira que - coisa raríssima na época - fazia Sermões públicos,
que, além de atrair pela riqueza de conteúdo o povo de sua época, atraia
multidões pelo carisma e pela grande beleza física que possuía, como
podemos ver pelas iluminuras que a representam e pelos relatos sobre
ela. Dentre outras qualidades, ela era compositora (suas músicas foram
recentemente gravadas), escritora, médica, botânica. Era muito dada ao
estudo. De certa forma, durante o reinado das trevas, ela possivelmente
tenha sido a primeira cientista após a destruição definitiva da Biblioteca de
Alexandria. (GUIMARÃES, 2009)10.

Mais do que escrever, as visões de Hildegarda previam uma missão


profética evangelizadora, por isso, realizou pelos menos quatro grandes viagens
missionárias ao longo dos rios Nahe, Meno, Mosela e Rin (entre 1167 -1171),
das quais se destacam: em 1158, foi do Main até Bamberg; em 1160, foi a
Tréveris; de 1161 a 1163, viajou pelo Rio Rin, indo até Colônia; de 1170 a
1771, passou por Suabia, indo até Hirsau e Zwiefalten.
Nelas, pregou em diversas igrejas e abadias sobre temas que afetavam a
Igreja em seu tempo, principalmente sobre a corrupção do clero e o avanço da
heresia dos Cátaros. Além disso, em suas viagens, exercia o poder taumaturgo
de curar as pessoas de enfermidades diversas.
Por conta de suas pregações, Hildegarda foi muito atacada e hostilizada,
durante toda sua vida. Mas, segundo Carlos Guimarães, a pior retaliação
aconteceu no final de sua vida,

10
Muitos outros comentadores apresentam Hildegarda como uma mulher para além do seu tempo, como,
por exemplo, Cirlot e Gari (1999, p. 49), que enfatizam: “Em pleno século XII Hildegarda de Bingen
transpassou as fronteiras do silêncio a que estava submetido seu sexo, para falar e predicar, para escrever
acerca de Deus e de sua criação, do homem e do universo”. Cf. igualmente CIRLOT (2012, p. 43).

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Mulheres intelectuais na Idade Média

[...] visto que ela, caridosamente, enterrou, em seu mosteiro um jovem


revolucionário que havia sido excomungado, quebrando assim uma das
mais rígidas leis eclesiásticas da Igreja. Os Bispos exigiram que ela exumasse
o corpo, considerado indigno de repousar em terra santa. Ela recusou-se.
Dizendo que o jovem morrera em graça e em comunhão com Deus. Seu
mosteiro foi imediatamente interditado e ela e suas irmãs foram proibidas
de participarem da missa. (GUIMARÃES, 2009).11

Somente alguns meses antes de sua morte é que seus direitos foram
restaurados.

2 Seu pensamento
Como médica, herdeira da tradição médica de Galeno, Hildegarda de
Bingen fazia uma estreita correspondência entre o ser humano e o cosmo. Para
tanto, dizia que,
[...] assim como o ano é dividido em quatro estações. Como o dia é dividido
em quatro partes. Quatro são os temperamentos dos seres humanos: aquele
melancólico, aquele colérico, aquele sanguinário e o paciente. Quatro são,
também, os elementos do corpo humano: a bile negra, a biles, o sangue e
a flegma. Um certo caráter está ligado a uma determinada parte do dia e
estação do ano, como está determinado por um certo elemento do corpo.
(ZAMBONI, 1997, p. 23).

A idea de complementariedade entre homem e natureza era, para


Hildegarda, indispensável. E essa relação de intimidade entre homem e natureza
era tal que, segundo o que escreveu, o comportamento humano era capaz de
alterar o meio ambiente e vice-versa, atribuindo a irregularidade do clima ao
estado de incessante inquietude humana, pois essa agitação confundia os
elementos (os quatro elementos: terra, água, ar e fogo) e os fazia saírem de seus
limites, com resultados desastrosos, antecipando uma sombria prefiguração dos
problemas ecológicos de hoje12. É o que vemos, por exemplo, no Liber divinorum

11
Poll (2010, p. 90) acrescenta a informação de que o “[...] interdito, a excomunhão coletiva, postulava
que, enquanto durasse, as freiras não poderiam nem receber a Comunhão e nem cantar o Ofício
Divino, podendo apenas recitá-lo”.
12
A esse respeito, escreve Duran (apud HILDEGARDA DE BINGEN, 2012): “O dado mais original
em seu pensamento foi sua forte tendência a analisar tudo numa perspectiva holística, e disso deriva
o seu grande apelo para os movimentos ecológicos, pacifistas e naturistas modernos. Ao interligar

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COSTA, M. R. N.

operum (Livro das obras divinas), quando, tomando as dores dos elementos da
naturais, os faz clamarem por justiça divina contra a insensatez humana:
Todos os elementos e todas as criaturas choram em alta voz diante da profanação
da natureza e da devoção maligna da humanidade ao seu modo de vida de
rebelião contra Deus, enquanto que a natureza irracional cumpre submissa as
leis divinas. Eis o motivo pelo qual a natureza protesta tão amargamente contra
a humanidade. (HILDEGARDA DE BINGEN, 2012).

Ao que responde Deus:


Eu os purgarei com minhas varas e os atormentarei até que voltem para
mim… os ventos terão fedor de putrefação e o ar vomitará tanta sujeira
que as pessoas não ousarão sequer abrir suas bocas. (HILDEGARDA DE
BINGEN, 2012).

O Liber divinorum operum (Livro das divinas obras) é um vasto painel


de toda criação, em que faz uma correlação entre a descrição da constituição e
forma do ser humano, compreendendo seu corpo físico e sua alma, com vários
aspectos do microcosmo e do macrocosmo.
A forma humana é vista, pois, como o modelo divino da Encarnação,
de acordo com o conceito básico apresentado no Gênesis, e é louvada como
uma manifestação da vitalidade, amor e beleza de Deus. Corpo e alma são
concebidos como uma unidade integral, onde as forças da natureza e do
espírito interagem em harmonia e servem como um espelho para toda a obra
da Criação: “Deus inscreveu toda sua obra na forma humana”.
Dentro dessa teoria da integração, Hildegarda acabou por defender
uma necessidade de complementaridade entre o homem e a mulher. Assim,
embora trate da questão mais especificamente nas obras Liber vitae meritorum
(Livro dos méritos da vida) e Liber divinorum operum (Livro das divinas obras),
já no Scivias (Conhecer os caminhos do Senhor), fazendo uma analogia com
os textos paulinos (Ef. 5), compara o amor esposal de Cristo (esposo) e a
Igreja (esposa) com o amor entre um homem e uma mulher. E aqui coloca

várias correntes distintas de pensamento em um corpo conceitual bastante integrado, seu trabalho
tem afinidade com o de pensadores contemporâneos que não podem ser encaixados facilmente em
uma única escola, como Alan Watts e Fritjof Capra. Para Hildegarda, não fazia sentido analisar
um fenômeno específico isoladamente, mas era essencial ter uma visão do todo e dos múltiplos
relacionamentos estabelecidos entre suas partes”.

198 Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial


Mulheres intelectuais na Idade Média

o matrimônio como verdadeiro sacramento de amor, que, numa perspectiva


cristológico-eclesiológica, aparece como sinônimo de fidelidade, tanto entre
Cristo e a Igreja, como entre um homem e uma mulher. Nesse sentido, contra
a seita herética dos Cátaros, define o prazer sexual no matrimônio como algo
querido por Deus.
Mas é, sobretudo, nas duas supracitadas obras, em que relaciona o ser
humano com o resto do Universo, que sua antropologia é evidenciada. Para
tal, fazendo uma leitura filosófico-religiosa, considera o ser humano como um
microcosmo dentro da criação, em que deve assumir uma atitude de respeito
para com a ordem criada e governada por Deus.
Através dessa lógica, estabelece uma complementaridade biológica e
psicológica entre homens e mulheres, com igual dignidade entre ambos. No
Liber vitae meritorum (Livro dos méritos da vida), por exemplo, salienta que a
perfeição de uma pessoa está precisamente em unir harmonicamente em si as
características masculinas e femininas ao mesmo tempo. Por isso, a brandura
feminina que leva à debilidade necessita do complemento da força masculina,
enquanto a força masculina necessita da mansidão e clemência, para não
degenerar em dureza e crueldade. Ou seja, para Hildegarda de Bingen, “[...] a
sabedoria é uma mulher forte” (SARANYANA, 1999, p. 155).
Igualmente ao falar de sexualidade, Hildegarda vê o ato sexual e o
prazer como algo positivo, daí, mesmo condenando veementemente a luxúria,
defende o relacionamento sexual entre um homem e uma mulher – num
sentido lato – como essencial para a própria definição de seus gêneros, pois,
conforme assinala Heinrich Schipperges, para Hildegarda,
[h]omem e mulher foram atraídos um para o outro desde um plano
espiritual, e se manifestaram na encarnação como seres sexuados [...].
Homem e mulher estavam assim tão interligados que um era o verdadeiro
produto do outro. Sem a mulher, o homem não poderia ser chamado de
homem; sem o homem a mulher não poderia ser chamada de mulher.
Homem e mulher obviamente haviam sido criados um para o outro.
(Schipperges apud HILDEGARDA DE BINGEN, 2012).

Muito embora quebrando um pouco essa ideia de igualdade, em alguns


momentos, ao interpretar o Livro do Gênesis (2, 18-22) acerca da criação
da mulher, coloca a mulher como mais perfeita ou superior ontologicamente
que o homem, visto que, se Eva foi criada ou tirada do homem (da costela),

Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial 199


COSTA, M. R. N.

esta não veio diretamente da terra, como o homem, mas de uma substância
superior à terra, o homem. Daí que, comparando o caráter ou temperamento
do homem e da mulher, enfatiza que o homem é mais cruel e violento do que
a mulher, dada a sua origem ontológica13.
Da mesma maneira, quando fala da concepção de uma criança, apresenta
uma visão totalmente revolucionária em relação à concepção aceita na época,
especialmente àquela aristotélica, que afirmava ser o homem o responsável pela
definição dos caracteres de uma criança, sendo a mulher apenas um elemento
passivo, “[...] um depósito ou receptáculo onde o homem colocava o esperma”,
como sustentava Aristóteles. Para Hildegarda de Bingen, é o calor do útero
materno que define ou dá a forma a uma criança, a partir do seu sangue.
Assim, mantendo-se no seu esquema de diferença e complementaridade
entre ambos, afirma que o versículo bíblico de que “[...] o homem foi feito
à imagem e semelhança de Deus” deve ser entendido em sentido genérico,
como o “ser humano”, no qual está incluído a mulher, o que significa dizer
que também a mulher é imagem de Deus, ou melhor, que nem o homem nem
a mulher, separadamente, é imagem de Deus.
Mais do que isso, diferentemente de alguns Padres da Igreja que
asseguraram a semelhança do homem com Deus apenas pela alma, Hildegarda
de Bingen inclui aí também o corpo e, é evidente, o corpo feminino, conforme
acentua J.-I. Saranyana:
Convém assinalar que para Hildegarda de Bingen, a mulher não é só
imagem de Deus enquanto alma, senão também enquanto corpo, quer
dizer, pela carne [...] tanto do varão como da mulher. (SARANYANA,
1999, p. 155).

Todavia, apesar dessa supervalorização da mulher, deixando


transparecer, nas entrelinhas, certo feminismo em seu pensamento, o que levou
muitos comentadores atuais a classificá-la como uma “teóloga feminista” – ou
a ser reverenciada pelos movimentos feministas do século XX, através, por
exemplo, de Bárbara Newman, especialmente em sua obra Sister of wisdom: St.
Hildegard’ theology of th feminine, de 1997 –, não podemos dizer que de fato

13
Não é por acaso que a maioria das personagens simbólicas das visões de Hildegarda aparece com
formas femininas, como, por exemplo, quando descreve e pinta a Caridade ou Amor Divino, tema
central de sua obra Líber divinorum operorum (Livro das obras divinas), como uma bela e forte mulher, o
que levou muitos comentadores a fazer dela uma “teóloga feminista”, conforme veremos mais adiante.

200 Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial


Mulheres intelectuais na Idade Média

Hildegarda tivesse tal pretensão, muito menos que buscasse uma emancipação
da mulher, haja vista que, em nenhum momento, questiona o papel ou a
situação social da mulher na Igreja e na sociedade. Em função disso, ressalta
Maria Carmen Poll que, “[...] embora Hildegarda tenha sido, de fato, em
muitos aspectos uma mulher à frente do seu tempo, ela nunca reivindicou
para si ou para o papel das mulheres de sua época qualquer mudança” (POLL,
2010, p. 28-29): pelo contrário, a esse respeito, em muitos pontos defende
posições conservadoras ou tradicionais.
Um dos pontos em que Hildegarda é declaradamente conservadora
refere-se à não ordenação sacerdotal de mulheres, na Igreja, entendendo que,
na grande interação holística do cosmo, na qual o micro deve estar em sintonia
com o macro, “[...] as mulheres estavam designadas a ter filhos e criá-los”
(Scivias, II, 6), de forma que o sacerdócio era uma atividade incompatível
com a função biológica. Por isso, Hildegarda dava capital importância ao
casamento, o que a tornava fiel e querida pela ortodoxia católica, segundo
comenta Maria Carmen Poll:
A pronta aceitação de Hildegarda no meio eclesiástico não se deve a um
único fator, mas um motivo se destaca: a clara ortodoxia de Hildegarda.
Não há dúvida que os prelados se sentiram em grande parte atraídos por
essa ortodoxia: no Scivias, Hildegarda enfatiza doutrinas como a origem
divina do casamento, a santidade da eucaristia e a dignidade do sacerdócio,
que os Cátaros negavam veementemente. (POLL, 2010, p. 66).

Em acréscimo, apesar de bater forte no clero da época, em suas cartas


e sermões, Hildegarda nunca questionou a Igreja em si, não tentou inaugurar
uma nova corrente de pensamento religioso, dentro ou fora da Igreja; sempre
permaneceu fiel à ortodoxia da Igreja Católica. Pelo contrário, nesse ponto, foi
até considerada conservadora ou tradicional. Por exemplo, quanto à famosa
polêmica acerca da estrutura hierárquica e da riqueza na Igreja, mas não só
na Igreja, mas em relação às diferenças socioeconômicas na sociedade como
um todo, se posicionou contra aqueles que defendiam a chamada “pobreza
evangélica”, como, por exemplo, os franciscanos espirituais. Para ela, até
entre os anjos há uma hierarquia, daí sua famosa iluminura “As Hierarquias
Angélicas”, contida no Scivias (Conhecer os caminhos do Senhor).
Também permitiu entre suas monjas o uso de vestes e ornamentos
luxuosos, defendendo que, se as mulheres devem se apresentar bem vestidas
para seus esposos, quanto mais a Igreja, que é esposa de um rei – Cristo. Por isso,

Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial 201


COSTA, M. R. N.

[...] em dias de festa, Hildegarda elaborava um ritual em que suas irmãs iam
para a igreja rezando os Salmos e tiaras de ouro com um emblema do cordeiro
de Deus, anéis de ouro nos seus dedos, e véus de seda branca que chegavam ao
chão, sob os quais os cabelos estavam soltos. (POLL, 2010, p. 75).

O uso da tiara de ouro, do véu branco e dos cabelos soltos, por parte das
monjas de Hildegarda, foi motivo de severas críticas por setores da Igreja, como
por parte do monge Guibert de Gembloux, que questionou o uso da tiara de
ouro, o que levou Hildegarda, em carta, a remeter a uma de suas visões:
Vi que todos os níveis da Igreja têm emblemas brilhantes de acordo com
o brilho celestial; mas a virgindade não tem emblema brilhante – nada
além de um véu negro e uma imagem na cruz. Então eu vi que esse seria
o emblema da virgindade: que a cabeça da virgem seria coberta com um
véu branco, por causa da vestimenta branca radiante que os seres humanos
tinham no paraíso, e perderam. Na cabeça dela [da virgem], havia uma tiara
de três cores que se congregariam em uma cor. Porque essa tiara simboliza a
Trindade sagrada. (HILDEGARDA, Carta 130 apud POLL, 2010, p. 760).

Já para o uso dos cabelos soltos, Hildegarda justificava que estes eram
símbolo da virgindade, daí as monjas deveriam mostrá-los quando iam como
noivas ao encontro do seu Esposo – Cristo.
Mais do que isso, Hildegarda se posicionou politicamente a favor dos
movimentos hierocratas que, baseados no princípcio agostinianao de que o
espiritual é superior ao temporal, defendiam a subordinação do poder temporal
ao espiritual, que na prática resultava na defesa da pletinude do poder papal.
Nisso, ela foi considerada uma mulher conservadora.
E, mesmo quando de suas admoestações às autoridades eclesiásticas e
civis da época, nunca questionou o poder em si, apenas chamava a atenção para
que cumprissem suas obrigações, como, por exemplo, sua carta ao Impedador
Frederico Barba Roxa:
Sê vigilante, porque no momento todos os reinos da região estão domidados
por reis falciosos que destroem a justiça [...]. Saiba, pois, que o Rei supremo
te olha: e não sejais acusado diante d’Ele de não ter exercido corretamente
teu ofício e não venhas assim a envergonhar-te [...]. Tome cuidado para
que o Supremo Rei não te lance por terra por culpa da cegueira dos teus
olhos. Sejai tal, que a graça de Deus não te falte. (HILDEGARDA DE
BINGEN apud SOCIEDADE..., 2012).

202 Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial


Mulheres intelectuais na Idade Média

Ou quando escreve ao Papa Anastácio IV, admoestando-o acerca do


males morais cometidos pelo clero da época:
Por que não cortaz a raiz do mal que sufoca a erva boa? Por que
negligenciais a justiça que vos foi confiada? Como permitais que esta filho
do Rei [a Igreja] seja jogada por terra e que seus diademas e ornamentos de
sua túnica sejam drestruidos pela grosserei dos homens? Vós que pareceis
ter sido cosntituído pastor, levantai-vos e correi em direção á justiça de
modo que, diante do Médico supremo, não sejais acusado de não ter
purificado os teus campos das imundices. Vós homem, mantende-vos
no bom caminho e sereis salvo! (HILDEGARDA DE BINGEN apud
SOCIEDADE..., 2012)

Ou ainda em sermão, pregando aos clérigos, na Catedral de Trier,


em Colônia: “Vejo que sois constituídos como o sol que deve brilhar para
os homens pelo fogo da verdadeira doutrina e pelo brilho de uma boa
reputação. Vós deveis ser luz, mas sois noite. Escolhei de que lado quereis
ficar!” (HILDEGARDA DE BINGEN apud SOCIEDADE..., 2012)
Em síntese, em assuntos políticos e eclesiológicos, o que Hildegarda fez
foi combater os males civis, as heresias dentro do seio da Igreja, nomeadamente
os Cátaros, a que chama de “lobos em pele de ovelha”, e a corrupção moral
do clero. Portanto, longe de ser uma “reformista”, precursora da “reforma
protestante”, como querem alguns.

3 Importância e atualidade de seu pensamento


Hildegarda faleceu em 17 de setembro de 1179, aos 80 anos de idade,
no mosteiro de Monte Rupert (Ruperstberg – próximo de Bingen), onde viveu
desde 1151, quando deixou Disibodenberg. No momento de seu falecimento,
segundo a Vita Sanctae Hildegardis (Vida de Santa Hildegarda)14,
[...] sobre a habitação em que a santa virgem entregou sua feliz alma a
Deus no primeiro crepúsculo da noite do domingo, apareceram no céu

14
A Vita Sanctae Hildegardis (Vida de Santa Hildegarda) foi iniciada pelo monge copista Gottfried,
que, em fins de 1174 ou no início de 1175, substituíu o antigo copista e confessor Volmar, que havia
falecido em 1173. Mas este faleceu em 1176 sem terminá-la. Gottfried foi subsituído por Guibert
de Gembloux, que se empenhou em terminar a referida biografia, mas também não completou o
trabalho, abordando apenas seus anos iniciais. Somente uma década após a morte de Hildegarda, o
monge Theoderic de Echternach retomou o trabalho, acrescentado mais dois volumes e um prefácio
(cf. CIRLOT; GARI, 1999, p. 70).

Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial 203


COSTA, M. R. N.

dois arcos brilhantes e de diversas cores, que se prolongaram por um logo


caminho estendendo-se pela terra em quatro partes, dos quais um foi de
Norte a Sul e outro de Leste a Oeste. No vértice, ali onde os arcos se
cruzavam, surgiu uma clara luz em forma de círculo lunar que parecia
apartar as trevas da noite de sua habitação [...] o que deve-se crer com
quanta claridade havia iluminado a sua amada nos céus. Tampouco
faltaram, antes que fora sepultada, milagres que atestam o mérito de sua
santidade. Pois dois homens, que cheios de fé tocaram em seu santo corpo.
Foram curados de uma grave enfermidade [...]. Seu corpo foi sepultado em
lugar santo [...] de onde exala um maravilhoso odor de suavidade, doçura
e fragrância saem de seu sepulcro e inunda os sentidos dos homens. (Vita
Sanctae Hildegardis, III, XXVII apud CIRLOT; GARI, 1999, p. 70-71).

Além, disso, cultiva-se na memória popular a história de que “[...] seu


espírito, rejuvenescido, foi visto várias vezes andando e cantando pela capela,
com uma expressão de doce júbilo no rosto. Ela cantava a sua mais conhecida
canção: ‘O virgia ac diadema’” (GUIMARÃES, 2009).
Hildergada foi sepultada na igreja do mosteiro de Monte Rupert
(Rupertsberg – próximo a Bingen). Suas relíquias permaneceram ali até
1632, quando o mosteiro foi destruído pelos suecos. Atualmente, seus restos
mortais encontram-se em uma urna, num dos mosteiros fundados por ela, em
Eibingen - Alemanha.
Segundo Andréa Frazão, Hildegarda
[...] não foi oficialmente canonizada pela Igreja, a despeito dos diversos
processos que foram instituídos, mas foi considerada santa pela população
desde a Idade Média. Diversos milagres foram-lhe atribuídos ainda em
vida e registrados por seus hagiógrafos. Seu nome figura no martirológio
romano e sua festa é celebrada em diversas dioceses da atual Alemanha.
(SILVA, 2011)15.

Complementado as supracitadas palavras, a Enciclopédia Virtual


Wikipédia traz as seguintes informações:
Hildegarda nunca foi canonizada oficialmente pela Igreja Católica. Uma
tentativa nesse sentido foi orquestrada logo após sua morte por seus
amigos e suas monjas, que incluiu o incentivo a romarias à sua tumba, a
compilação de uma lista de seus milagres, a construção de um altar para ela,

15
Informação confirmada por Cirlot e Gari, 1999, p. 75.

204 Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial


Mulheres intelectuais na Idade Média

a confecção de versões de luxo de seus escritos - a origem dos manuscritos


iluminados e do Riesencodex que chegaram à contemporaneidade - e, é
claro, um pedido formal ao papa Gregório IX, que deu início ao processo
regulamentar em 1227, continuado por seus sucessores. Depois de várias
delongas, somente em torno de 1233 a comissão encarregada foi ouvir
as testemunhas e os recipientes de seus milagres, mas nesta altura muitos
já haviam morrido, as curas milagrosas póstumas haviam cessado e sua
popularidade já declinara bastante. O resultado foi o de se abandonar
o processo por ausência de evidências suficientes, mas conseguiu-se sua
beatificação oficial. Ao longo do século XIII se desenvolveu um culto
popular dirigido a ela, em 1324 o papa João XXII autorizou sua veneração
pública, e suas relíquias foram autenticadas no encerramento do século
XV. Finalmente seu nome foi inscrito como santa na primeira edição do
Martirológio Romano, de 1584, aprovada pelo papa Gregório XIII, e sua
inclusão foi ratificada na edição revista de 2001 publicada sob os auspícios
do papa João Paulo II, que a descreveu como “uma santa extraordinária,
uma luz para seu povo e sua época que nos dias de hoje brilha ainda mais
intensamente” (HILDEGARDA DE BINGEN, 2012).

Não obstante a Vita Sanctae Hildegardis (Vida de Santa Hildegarda) lhe


atribuir
[...] vinte e cinco curas milagrosas, entre elas a cura de um edema no peito
e garganta de uma serva do seu mosteiro ao fazer o sinal da cruz sobre a
região afetada; a restauração da visão de um menino com a água do rio
Reno, e a cura à distância de um sangramento crônico em uma mulher
através do contato de uma carta sua contendo uma bênção, e depois de
sua morte foram relatadas outras curas de peregrinos junto ao seu túmulo.
(HILDEGARDA DE BINGEN, 2012).

Analisando a importância de Hildergada para atualidade, Barbara


Newman salienta que
[...] sua contribuição foi tão excepcional em se tratando de uma mulher de
sua época, que os pesquisadores modernos, com todo seu aparato teórico e
instrumental, ainda consideram difícil analisá-la com suficiente objetividade
e avaliar sua real importância. Alguns a consideram simplesmente uma
anomalia bem sucedida; muitos compreensivelmente duvidam da origem
divina de seus escritos, mas em geral não se dá imprópria a elevadíssima
estima que ela desfrutou entre seus contemporâneos, que a chamaram de ‘A
Sibila do Reno’, a ‘Profetisa dos Teutões’ e outros epítetos grandiloquentes,
nem se vê como injusto ela ter-se tornado um dos ícones do movimento

Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial 205


COSTA, M. R. N.

feminista do século XX. É de assinalar algumas de suas conquistas: foi a


primeira mulher a ser considerada uma autoridade em assuntos teológicos;
a única mulher medieval a quem se concedeu o direito de pregar a doutrina
cristã em público; a autora do primeiro auto sacro jamais escrito e o único
dramaturgo no século XII que não permaneceu anônimo; a única mulher
medieval a ser lembrada como compositora de um extenso e qualificado
corpo de obras musicais; o primeiro autor a escrever sobre sexualidade
e ginecologia de um ponto de vista feminino, e o primeiro santo a ter
uma biografia oficial que inclui trechos autobiográficos. (Newman apud
HILDEGARDA DE BINGEN, 2012).

Uma prova da importância e reconhecimento da figura de Hildergada,


em nossos tempos, são os títulos e monumentos a ela dedicados, como, por
exemplo: ela é a patrona do Prêmio Hildegard von Bingen, criado em 1995, na
Alemanha, para distinguir jornalistas e publicitários que tenham dado uma
contribuição humanitária importante no seu campo e promovido a pluralidade
e o diálogo entre homens e mulheres. É nome de uma escola em Rüdesheim –
Alemanha. É um dos vultos históricos relembrados no Templo de Walhalla, em
Regensburg - Alemanha (placa comemorativa nº 46). É patrona da Medalha
Hildegard von Bingen da Bundesvereinigung Prävention un Gesundheitförderung
e.V. para personalidades destacadas no campo da educação sanitária mundial.
Sua vida foi objeto de um filme de Margarethe von Trotta, intitulado Vision
- Aus dem Leben der Hildegard von Bingen, lançado em 2009. Entre outros
exemplos, já existem duas sociedades internacionais dedicadas ao estudo de
sua vida e obra, a Internationale Gesellschaft Hildegard von Bingen, fundada na
Suíça em 1980, organizando grupos de trabalho, conferências e publicando
uma revista, contando com cerca de 1  800 membros de vários países do
mundo, e a International Society of Hildegard von Bingen Studies, sediada, desde
1983, nos Estados Unidos, também desenvolvendo uma atividade intensa (Cf.
HILDEGARDA DE BINGEN, 2012).

206 Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p. 187-208, 2012. Edição Especial


Mulheres intelectuais na Idade Média

Costa, Marcos Roberto Nunes. Women intellectuals in the Middle Ages: Hildegard of
Bingen - between medicine, philosophy and mysticism. Trans/Form/Ação, Marília, v. 35, p.
187-208, 2012. Edição Especial.

ABSTRACT: It is common to say that before modernity there is no record of women in the
construction of classical thought. What if we take, for example, to philosophy and theology, which
were the two areas of knowledge that produced more intellectuals during the Middle Ages, we find
there the presence of women. However, despite all the evidence, if we search the construction of
Western Thought, we see that it is possible to identify the presence of some women already in ancient
times, in Classical Antiquity and Patristics (or Middle Ages). But it is in Scholastic (Middle Ages) we
find the first thinkers, responsible for an autonomous system, especially as fertile writers, owners of
works so profound and important as those produced by men of his time, who often conversed on an
equal footing. In this wonderful universe of female intellectuals, highlight, in Scholastic, the figure of
Idelgarda of Bingen (1098-1165), which is discussed a bit in this article.
KEYWORDS: Medicine. Philosophy. Mystique. Middle Ages. Women Intellectuals.

Referências
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história da medicina na Idade Média. In: Revista de História – UFRGS. Porto Alegre, v.
2, n. 2, 2009. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/aedos/article/view/9830/5643>. Acesso
em: 03 mar. 2012.
CIRLOT, Victoria. Hildegard de Bingen, uma “artista” mística e profética. In: IHU
ONLENI - Revista Eletrônica do Instituto Humanitas Unisinos. São Leopoldo, ano XI,
edição 385, 2012. Disponível em: <http://www.ihuonline.unisinos.br/media/pdf/
IHUOnlineEdicao385.pdf>. Acesso em: 16 mar. 2012.
CIRLOT, Victoria ; GARI, Blanca. La mirada interior: escritoras místicas y visionárias en la
Idade Média. Barcelona: Martinéz Roca, 1999.
FRABOSCHI, Azucena Adelina. Prólogo. In: Carta de Hildegarda de Bingen al Papa
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Traducciones Filosóficas. Buenos Aires: Centro “Afonso el Sabio”, n. 06, p. 13-17, 2004.
GUIMARÃES, Carlos Antônio Fragoso. O misticismo e os grandes místicos. Disponível em:
<http://geocities.yahoo.com.br/carlos.guimaraes/misticos.html>. Acesso em 24 fev. 2009.
HILDEGARDA DE BINGEN. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hildegarda_
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