Profissional
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A distinção entre a filosofia acadêmica e as outras correntes talvez possa induzir em erro
no que diz respeito ao seu carácter institucional. Todas as correntes nascem e estão situadas,
sobretudo na universidade, à exceção talvez do pensamento filosófico político e nacionalista que
surge em parte, mas também não exclusivo, na práxis do confronto político, sendo, porém,
também os seus representantes intelectuais com formação acadêmica ocidental.
A quarta definição da filósofa brasileira Marilena Chauí (2013) sobre filosofia consiste
em descrevê-la como uma fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas. Sob
esta perspectiva, fundamentar significa ‘encontrar, definir e estabelecer racionalmente princípios,
causas e condições que determinam a existência, a forma e os comportamentos de alguma coisa,
bem como as leis e as regras de suas mudanças’. A fundamentação crítica significa, portanto,
‘examinar, avaliar e julgar racionalmente os princípios, as causas e condições de alguma coisa’.
Como fundamentação teórica e crítica, a filosofia ocupa-se com os princípios, causas e condições
do conhecimento que pretenda ser racional e verdadeiro; com a origem, a forma e o conteúdo dos
valores éticos, políticos, religiosos, artísticos e culturais; com a compreensão das causas e das
formas da ilusão e do preconceito no plano individual e coletivo; com os princípios, causas e
condições das transformações históricas dos conceitos, das ideias, dos valores e das práticas
humanas.
A correspondência que esta investigação estabelece nesse caso é com o quarto estágio da
filosofia africana denominada de filosofia africana profissional. Seus compromissos,
procedimentos e objetivos guardam forte ligação e é evidente a semelhança entre as duas
concepções. A filosofia acadêmica ou também filosofia profissional, entende a filosofia como
uma área do saber humano que se caracteriza por um caminho particular de pensar, refletir e
raciocinar, dentro de uma orientação geral.
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africana tende a crescer cada vez mais em termos de volume e qualidade de trabalhos filosóficos
e em formas de sua aplicação na realidade africana.
Em relação à África, não é tarefa fácil traçar um perfil dessa filosofia acadêmica moderna
devido à dificuldade de comunicação. Assistimos ainda na fase da época colonial à
institucionalização da etnofilosofia e teologia africanista como pensamento filosófico em
algumas universidades sob influência da Igreja católica. Encontramos a filosofia analítica em
universidades da área colonial britânica, a filosofia de origem francesa na respectiva área
colonial e uma filosofia com forte influência da Igreja católica e da teologia nas áreas de
colonização portuguesa ou, parafraseando as palavras iniciais de Fanon, as bandeiras filosóficas
das nações colonizadoras marcam presença nas poucas universidades que o poder colonial
institui.
Durante o período em que Mobutu esteve no poder, presenciamos uma forte implantação
das tendências etnofilosófica e afrocêntrica no Congo-Zaire, onde a igreja católica conta com
uma presença institucional significativa, também a nível acadêmico. Desenvolve-se aqui uma
escola afrocêntrica significativa, enfrentando alguma crítica pelo setor católico e uma forte
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contestação marxista a partir do exílio. Mudimbe (1988) é o intelectual congolês no exterior
provavelmente mais conhecido da corrente pós-modernista nos EUA.
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Então, nota-se que a separação do antigo modelo colonial de universidade, onde o
preconceito e a discriminação ditavam as regras em relação ao povo de Angola, foi modificado
para uma educação onde são preservados e respeitados os valores nacionais para que assim, a
formação acadêmica possa de fato vir a corroborar com o crescimento e desenvolvimento social
deste país.
Por outro lado, percebe-se um esforço conjunto para a superação das dificuldades
deixadas pelo período da colonização. A partir da sistemática metodológica educacional
"herdada na tradição centralista da administração colonial portuguesa", desenvolvendo-se um
ensino voltado ao catolicismo. Por causa desta imigração, criou-se uma ideologia política
portuguesa, havendo um tratamento educacional diferençado aos povos nativos, levando-os ao
esquecimento. Neste processo, os costumes e tradições alusivos ao conceito de construção de
comunidade, tendo como base suas origens, eram substituídos por um modelo conceitual
característico da comunidade a qual estava integrada, a portuguesa.
Relacionado a essas bases ideológicas, "a dimensão cultural do ensino passava pela
desnaturalização do indígena, negando-lhe os seus próprios valores culturais, o seu saber, e
cerceando, pela raiz, o desenvolvimento natural do seu saber-fazer, considerado selvagem". A
partir desta desnaturalização cultural do indígena - Africanos Angolanos - as práticas
educacionais nesta década eram totalmente voltadas à memorização dos conteúdos, tornando-se
dificultoso para os Africanos a construção de um conhecimento positivo, como forma de
reafirmar a sua inferioridade.
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A segunda fase, a Pombalina (1759 - 1792), surge após o iluminismo europeu, onde o
Marquês de Pombal, inspirado por novas ideias burguesas, trouxe a construção de diversas
fábricas a Portugal, "expulsando os jesuítas e abolindo a escravatura em Portugal". E assim,
"libertando" os primitivos escravos africanos. Fato que só ocorreu em pleno século XX. A
designação de primitivos parece que durará bem mais e a sua única função é de invalidar
completamente qualquer aspecto da identidade africana e do conhecimento que possa existir em
suas comunidades e anular a possibilidade de autonomia africana.
O terceiro período foi o Junino (1792 - 1845). Neste Angola se consolidava como
colônia, com o grande aumento do comércio de escravos com o Brasil e Portugal. Com a vinda
da família real ao Brasil, o país foi invadido pela França e posteriormente pelos holandeses e foi
exatamente neste período em "que floresceu, no seio da grande massa de escravos angolanos, a
consciência da necessidade de uma melhor organização nacional para a luta de libertação".
A quarta etapa deste processo foi a chamada Educação Falcão e Rebelo da Silva (1845 -
1926), caracterizada pela criação de alguns centros escolares no país; seguida pela quinta fase, a
Salazarista (1926 - 1961), conhecido como Estado Novo. Neste período, a visão de Salazar em
relação aos povos angolanos era de uma população escrava e que deveria continuar desta
maneira como uma massa de subdesenvolvidos, considerando assim as colônias portuguesas da
África como um complemento natural da agricultura metropolitana. O subdesenvolvimento
como qualificação inerente às nações africanas estabeleceu-se dessa maneira como uma condição
imposta pelo colonialismo europeu de forma a perpetuar todas as formas de dependência,
principalmente a subordinação intelectual das colônias africanas ao raciocínio eurocentrista
ocidental.
Sendo assim, a partir desta década (1930), o ensino direcionado aos indígenas em
Angola, seguia um modelo educacional, divididos em classes e idades. Entre outras modalidades
de ensino, havia um Ensino Profissional, apresentando um modelo europeu, baseado em modo
que viesse a permitir ao discente a prosseguir os seus estudos até ao ensino superior. Como foi o
caso de Boaventura Cardoso, autor estudado nessa investigação.
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Posteriormente, em função das exigências da exploração capitalista e para justificar a
ocupação efetiva das colônias, por pressão da Comunidade das Nações, o regime passou a
fomentar o capital humano como "semelhantes", considerados estatutariamente como
"colonizador".
Nesse contexto, a formação universitária angolana surgida pós 1962, numa concepção de
formação de profissionais que viessem a atender as necessidades mais imediatas da população,
principalmente a portuguesa. Assim, as políticas educacionais, nesse contexto histórico,
voltavam-se apenas para o bem estar dessa elite que monopolizava os direcionamentos
econômicos desse país.
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pensamento estagnado de que a independência dos países africanos e obviamente Angola faz
parte deste contexto, é a única e possível forma da África crescer. Porém, também são os
Movimentos Sociais, seja de vertente política, educacional, cultural ou econômica que vem
agregar à liberdade e assim, fazer parte da reconstrução dessas nações. Logo, com o passar dos
séculos, percebeu-se que os acordos, quaisquer que sejam com outros países, seriam uma "troca
simbólica" de diversos conhecimentos, para que finalmente a comunidade internacional comece
a reconhecer de fato e de direito, respeitando-os e não mais interferindo, principalmente na
política, nesses países afamados como antidemocráticos. O emprego do termo visa a permitir e
institucionalizar a influência e a intervenção neocolonialista nas nações africanas, impondo um
padrão ocidentalista de orientação política sobre qualquer variação nacionalista que venha a
surgir ou invalidar qualquer crítica à centralização do poder por parte das elites africanas ou
segmento da sociedade seja profissional, étnico, religioso ou cultural.
Deste modo, podemos ressaltar que a educação é, assim, o resultado da consciência viva
duma norma, que rege uma comunidade humana, quer se trate da família, de uma classe ou de
uma profissão, quer se trate dum agregado mais vasto, como um grupo étnico ou um Estado. A
educação faz parte de qualquer sociedade, e seu papel é desenvolver a mão de obra qualificada,
assim como inserir e preservar os valores culturais de um povo.
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Dessa forma, é de fato importante reanalisar dentro do contexto social angolano as
políticas educacionais para o nível superior, e que estas visem à justiça e uma cultura de paz para
o país.
Por certo, sabemos que as Universidades são locais em que a produção acadêmica é
importantíssima. E é através desta que podemos conhecer variados estudos e poder visionar a
produção de outros países porque o conhecimento científico - acadêmico de instituições de
pesquisas podem ajudar em projetos que visam o desenvolvimento social e econômico dos países
em desenvolvimento, ou em países subdesenvolvidos, como é o caso de Angola.
Angola foi eleita em 2013, membro do Comitê que vai trabalhar para a criação do
Conselho Africano das Sociedades de Filosofia durante o 23º Congresso Mundial de Filosofia,
que decorreu de 4 a 10 de Agosto, em Atenas, Grécia. O Comitê, presidido pelo filósofo
beninense Paulin Houtoudji, coadjuvado por cinco representantes da África do Sul, Angola,
Argélia e Etiópia vai além de trabalhar no sentido da criação do Conselho, impulsionar a
pesquisa e divulgação da produção filosófica ao nível do continente africano.
O filósofo angolano Malungo Belo, representou o país no Congresso que teve como tema
central “A Filosofia enquanto questionamento e modo de vida”. O Conselho Africano das
Sociedades de Filosofia é um projeto pensado há algumas décadas, mas que nunca havia chegado
a ser concretizado, segundo Belo. Ele também afirma que o momento de se dar corpo a essa
estrutura é chegado. Os membros do comitê já começaram a trabalhar na criação de um website
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para divulgar os seus projetos, produzir legislação específica e mobilizar outros países africanos
para a concretização da iniciativa. O comitê vai trabalhar com o Conselho Mundial de Filosofia
para criar e estruturar esse órgão importantíssimo que vai defender os interesses de África no
domínio da filosofia. Malungo Belo acrescenta que a eleição de Angola para o referido Comité é
um passo dado no sentido de integrar o futuro Conselho e desta forma fazer passar a sua visão
sobre a filosofia em África. O filósofo angolano considera a África, através do Egito antigo,
como o berço da filosofia, enquanto a Grécia apenas a sistematizou. O historiador congolês
Teophille Obenga escreveu um livro importante sobre a filosofia africana na época faraônica
onde demonstrou as origens da filosofia indiscutivelmente africanas.
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desenvolvimento africano atual. Ultimamente concentra-se no pensamento científico endógeno
africano.
Hountondji publica o seu primeiro livro em 1977 em francês, com o título “Sur la
philosophie africaine: Critique de l’ethnophilosophie”. Como o próprio título indica, trata-se
duma crítica às características da etnofilosofia que, na altura, se encontra presente em ou
subjacente a todas as correntes filosóficas em África. Para Mudimbe (1988, p.158), o livro é “a
Bíblia de todos os anti-etnofilósofos”. Ele publica ainda, como coordenador, dois volumes
bibliográficos sobre a “Philosophical Research in Africa” (1987/1988), virando-se depois para
questões epistemológicas dos saberes africanos em “Les savoirs endogènes: pistes pour une
recherche” (1994). Em 1997 traça, em forma de um auto-retrato explicativo e crítico, o seu
caminho pessoal cultural, filosófico e político em “Combats pour le sens” (1997) Hountondji
publica também diversos artigos em revistas africanas e ocidentais de especialidade ou nas áreas
de cultura ou educação.
Hountondji define como filosofia africana: “(...) uma totalidade de textos, ou mais exato,
essa totalidade de textos compostos por africanos e que os próprios autores definem como
filosóficos.” (1977: p. 21). Por conseguinte, os seus elementos constitutivos configuram-se para
Hountondji; 1º: na intenção consciente de, 2º: escrever um texto de carácter filosófico, 3º: cujo
autor é de origem ou da diáspora africana.
Neste ponto de vista formal, qualquer que seja o conteúdo de um texto intencionalmente
filosófico e escrito por um africano, no passado ou no presente, será assim entendido como parte
integral de uma filosofia africana (1977: p.22). No entanto, o fato de ser um africano a escrever
um texto filosófico, acrescenta apenas um aspecto de carácter geográfico ou empírico relativo à
origem desse autor, pelo que pensa que a sua “(...) [a] nova definição destrói a construção
mitológica dominante de africanidade e coloca em seu lugar a simples verdade de que a África é,
antes de mais nada, um continente (...).“(1977: p.69)
O autor alega que uma suposta africanidade não acrescenta nenhum dado metafísico ao
debate filosófico. Será necessária a desconstrução do conceito mítico de África como um sistema
de valores eterno, único, simplificado, indiferenciado e generalizante que, em princípio, retoma a
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invenção colonial do primitivismo africano. Apenas assim os africanos conseguiriam sair do
beco culturalista sem êxito para onde o discurso colonial os conduziu.
Por conseguinte, Hountondji argumenta que, numa perspectiva de conteúdo, não se pode
falar de uma filosofia de características africanas. Segundo ele, existe apenas um discurso
filosófico que entende que deve ser científico. Considera que
Demarca-a de uma concepção popular e espontânea que tome por filosofia cada elemento
de sabedoria, individual ou coletiva, de qualquer pensamento coerente com princípios que
tencionam orientar a vida cotidiana de um povo. Hountondji encontra essa concepção subjacente
à literatura filosófica africana (1977: p.44,45). Ao mesmo tempo opõe-se ao seu carácter
metafísico e especulativo que, na sua perspectiva, nada de científico tem, nem apresenta provas
pelas suas asserções (1977: p.98).
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Uma verdadeira filosofia africana pode existir apenas enquanto forma específica de uma
literatura científica universal, contudo, Hountondji é omisso sobre o seu objeto particular e
também não oferece nenhuma justificação substancial sobre essa omissão dentro da sua
perspectiva filosófica.
Para ele, a história, também da filosofia, não passa por um processo de desenvolvimento
contínuo e linear em que os novos elementos apenas se juntam aos já existentes, seguindo a
lógica metafísica do sempre igual, da existência de uma disposição natural. A filosofia sucede
por saltos qualitativos a que correspondem níveis descontínuos e diferentes dos modos e
conteúdos do pensamento filosófico.
É nos eventos linguísticos que uma verdadeira ciência se manifesta: “Nenhuma ciência,
nenhum ramo de aprendizagem consegue manifestar-se a não ser como um evento linguístico, ou
melhor, como um produto de discussão” (1977: p.71).
A verdadeira filosofia africana surge neste processo, não no sentido de uma substância
uniformizada, mas como afirmação plural. A liberdade de opinião constitui um elemento chave
para a construção da filosofia em África.
Hountondji argumenta ainda que a filosofia é, por definição, uma forma de literatura, de
escrita. A sua ideia de textualidade pressupõe, na verdade, a escrita alfabética o que, nos anos
70/80, significa o uso de uma língua europeia, mesmo que tenha como característica de ser ou ter
sido língua de opressão colonial. Contudo, a literatura apresenta essa mudança de representação
do africano do simples selvagem para um ser educável para o trabalho sob a tutela europeia
como prova da modernidade, da capacidade inovadora europeia ou como uma aptidão
especificamente portuguesa de adaptação aos trópicos, como nos tenta convencer a teoria do
luso-tropicalismo de Gilberto Freyre (1940).
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na reconstrução do passado, na criação de uma história de filosofia africana. Considera esta
insistência no passado como um prolongamento do discurso colonial do eterno atraso do
africano, a continuação da escravatura mental passadista e a não-admissão do direito a um
pensamento livre.
Nessa altura, também não penetra de fundo nos conteúdos do próprio pensamento
histórico e atual africano que ele próprio deposita, de forma generalizante, no seu grande saco de
etnofilosofia. Wamba-dia-Wamba (1985), no estudo sobre o “palaver”, mostra a sua importância
e o dogmatismo acadêmico elitista de Hountondji. Hountondji sublinha a necessidade de que a
filosofia se torna ciência através da sua libertação da ideologia. Invocando os escritos de Karl
Marx, por volta de 1845, rejeita a filosofia como parte da ideologia a favor da criação de uma
relação científica com a realidade no sentido das ciências empíricas (HOUNTONDJI 1993,
p.106-107). Argumenta que existe uma ligação intrínseca entre as ciências e a filosofia pelo que,
em África, a criação das ciências condiciona a existência da filosofia.
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ciência. Essa definição, da qual nos apropriaremos neste trabalho, traz elementos importantes
para entendermos o papel dos filósofos dentro de uma sociedade. As palavras do filósofo são:
Bertrand Russsell ainda confirma a natureza inexata da filosofia amparada por duas bases
distintas; uma religiosa e a outra científica:
Para a sua constituição como ciência, será primordial a presença generalizada da escrita
enquanto contributo para a criação sistemática de uma prática acadêmica (1994: p.112). Uma
verdadeira filosofia africana, caracterizada pela especificidade dos seus temas, poderá existir
apenas como literatura em forma de um texto escrito. A literatura escrita encontra-se no centro
da abordagem epistemológica da filosofia em Hountondji.
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que seja necessário proceder à documentação, avaliação e sistematização dos saberes que, por si
só, não conseguem chegar ao ponto onde se encontra o saber moderno ocidental. Reconhece-o
como a tarefa talvez mais urgente para a filosofia africana na atualidade “(...) a transcrição
sistemática dos discursos dos nossos velhos, sábios e eruditos que ainda estão vivos” (1994:
p.37).
De qualquer modo, uma coisa é certa, seja o que for que a expressão “Filosofia Africana”
designe hoje, certamente inclui o debate prolongado e muitas vezes passional das últimas três
décadas sobre o que é “Filosofia Africana”. Como diz o autor de um livro de “leituras
essenciais” todas elas tratando deste tema.
Sartre afirma que o “oprimido pela técnica, quer-se técnico, porque sabe que a técnica
será seu instrumento de libertação” (SARTRE, 1965, pg. 96). Para o filósofo francês, o caminho
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da libertação exige o reconhecimento da consciência: o reconhecimento de si, não como parte,
mas como um todo.
Trata-se, no presente caso, de um intervalo histórico único e paradoxal que separa duas
épocas distintas da humanidade, dois “reinados”, mas também, duas lógicas igualmente díspares,
em termos de valores e simbolismos a serem cultuados ou rejeitados socialmente. De fato, havia
uma maneira que regia forçosamente a percepção e compreensão africanas do mundo e de si
mesmo até então, que compreendia o âmbito do natural, divino, misterioso, que existe por si, que
emerge espontaneamente, que se originaria na mãe natureza ou, segundo os crentes, em Deus
(“reinado” decadente, que se perde); por outro lado, o tecnológico, humano, mundano, que é
produzido intencional e artificialmente por nós, seres humanos, por meio de nossas técnicas e
tecnologias ancestrais (“reinado” ascendente, que se conquista).
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O método de sagacidade filosófica na filosofia sagacidade Philosophic Africano é uma das
abordagens da filosofia Africano. Ele foi desenvolvido como um projeto para alguns fins, e mais tarde
evoluiu como um intermediário entre os dois dominante, embora abordagens antagônicas à filosofia
Africano - os métodos de etnofilosofia e filosofia profissional (Oruka 1990, 65). Por um lado, ele
procurou contestar a implicação negativa de etnofilosofia (o que é que há a existência de filosofia
Africano sem figuras filosóficas africanos identificáveis). Por outro lado, procurou-se afirmar que os
sábios indígenas satisfazem as características necessárias de filosofia como identificado por defensores
da escola profissional ou universalista em filosofia Africano.
No que diz respeito a esta distinção, Oruka afirma: Sage-Filosofia no meu uso consiste nos
pensamentos expressos por homens sábios e mulheres em qualquer comunidade ... Sage-Filosofia é
uma maneira de pensar e de explicar o mundo que oscila entre a sabedoria popular ( bem conhecido
máximas comunais, aforismos e verdades gerais do senso comum) e sabedoria didática, uma sabedoria
e expôs um pensamento racionalizado de algumas pessoas que têm dentro de uma comunidade.
Enquanto a sabedoria popular é frequentemente conformista a sabedoria didáctica é, por vezes crítica
do comunal set-up e a sabedoria popular (Oruka 1990, 51).
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do rigor do pensamento como um método sem enquadramento concreto, nem finalidade, o rigor
pelo rigor; da escrita como condição do pensamento crítico, como forma de restringir o
pensamento a um modo comunicacional único como prolongamento da sua posição de que os
“africanos são indiferentes à reflexão1” (1979: p.237), que perpetua a afirmação senghoriana
segundo a qual o pensamento seria uma característica helênica: aos africanos resta assim apenas
a emoção.
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neocolonializado na respectiva disciplina acadêmica de antropologia ou, mais tarde, em estudos
de área africanos, atualmente também na linguística, sociologia, história, cultura etc., mas,
sobretudo em biologia, farmacêutica, como forma de “bio-pirataria”. Sobretudo na fase atual,
que o mainstream acadêmico designa por pós-colonial, assistimos a uma autêntica caça aos
saberes indígenas - africanos e de outras partes do mundo -, em nome de um direito universal ao
saber (vide Smith 1999; Depelchin 2005; Bala & Joseph 2007) que, por sua vez, é
regulamentado pelos direitos intelectuais - do autor ocidental ou ocidentalizado.
Sob essas condições, ser inteligente, razoável, racional, civilizado... é para ser
permeável à lógica e à racionalidade inscritos nessas estruturas. As massas
estruturalmente marginalizadas são desse modo declaradas imbecis, ignorantes,
surdo-mudas, etc...3 (WAMBA-DIA-WAMBA 1979, p.241).
É importante notar que, à medida que o tempo foi passando, o mais ferrenho crítico da
etnofilosofia, Paulin Hountondji, modificou sua posição. Ele refletiu sobre o debate que foi
iniciado por sua crítica à etnofilosofia e disse em 2002 que sua rejeição anterior do pensamento
3
“Dans ces conditions, être intelligent, raisonnable, rationnel, civilisé... c’ést être perméable à la logique et à la rationalité
inscrites dans ces structures. Les masses structurellement marginalisées sont de ce fait même déclarées imbéciles, ignorantes,
sourdes-muettes, etc...”
4
“Science seems to have been assumed to be essentially Western. Traditional scientific knowledge, African fractals for example,
has not been seized by African philosophy. This is one reason why philosophy has tended to be a projection on the Western
mirror.”
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coletivo foi excessiva. Ele explicou que a cultura coletiva deve ser levada a sério, e que a
individualidade é formada a partir de uma personalidade básica, que tem raízes. Enquanto ele
concordou que o pensamento individual deve ser visto no contexto cultural, ele observou que ele
não deve ficar preso lá. Raízes não devem se tornar uma "prisão" (HOUNTONDJI, 2002; 128,
151-52, 204-05).
Além disso, uma das maiores queixas de Hountondji sobre os etnofilósofos como
Tempels era que eles eram estrangeiros, ou se não estrangeiros, pelo menos, eles estavam
escrevendo para um público estrangeiro, respondendo aos debates e critérios criados no exterior.
Hountondji chamou isso de "extroversão", e queria em vez disso ter a Filosofia Africana sendo
escrito por africanos e respondendo aos interesses e necessidades dos africanos (HOUNTONDJI,
1997). Certamente, a trajetória dos interesses de Oruka nos sábios africanos mostrou que ao
longo do tempo, a questão de provar algo para os estrangeiros diminuiu em importância, de
modo que a questão de como a filosofia dos sábios e sua reflexão poderiam ajudar a África
assumiu o centro do palco (OCHIENG'-ODHIAMBO 2006, pg.21, 2002, pg.29, e 2009, pg.78).
Em 1931, Kwasi Wiredu nasce em Kumasi, então sob o domínio colonial britânico em
Gana. Ele é originário e membro da sociedade Akan. Durante a sua frequência do ensino
secundário, confronta-se com Platão e Russell. Diferente da maioria dos restantes pensadores que
apresentamos neste trabalho, Wiredu restringe-se ao exercício da sua atividade acadêmica, se
incluir aqui também a sua função de vice-presidente do “Inter-African Council for Philosophy”.
Nas suas obras principais, “Philosophy and an African culture” (1980), “Person and
community” (1992, com Gyékyè), “Cultural universals and particulars” (1996) e “A companion
to African philosophy” (2003), Wiredu aborda comparativamente, na perspectiva da filosofia
analítica, questões sobre conceitos e categorias filosóficos africanos, tendo a sua própria cultura
Akan como base de abordagem e de questionamento conceitual crítico. Debruça-se sobre o
relacionamento entre conceitos filosóficos universais e particulares, o caráter da comunicação
intercultural, sobre a personalidade africana e a religião, além da questão política do consenso
democrático como possível forma de governação africana. Defende a necessidade de
descolonizar conceitualmente a filosofia africana.
50
A experiência contemporânea da filosofia em África é constituída por uma característica
pouco comum: o continente está exposto a uma interação entre um legado cultural indígena
africano e culturas de caráter colonial com origem no estrangeiro. Também a filosofia moderna
africana se encontra amarrada, de forma dupla, por uma dependência conceitual do Ocidente que,
por outro lado, também tem a sua expressão em relação ao pensamento africano antigo e na sua
representação filosófica colonial.
Durante a história colonial, a descrição dos pensamentos e das culturas africanos pelos
viajantes, militares, missionários e antropólogos europeus sucede nas suas línguas e conforme os
seus paradigmas ocidentais, passando depois para a linguagem e o pensamento africanos no
processo de missionação e sobretudo de educação na língua colonizadora (Wiredu 1998). Daí
que os intérpretes da filosofia moderna africana pensem habitualmente as suas conceitualizações
em línguas não africanas.
5
“[I]f you are instructed in philosophy in a given foreign language, that language tends to become not only your
medium of expression, but also your medium of thought. Consequently, the categories of thought embedded are apt
to seem to you natural and inescapable.”
51
próprio filósofo, acabam por ter o seu efeito na repetição da lógica colonizadora que conduz a
uma mentalidade colonial (WIREDU 1996, p.4; MASOLO 2006).
Kwasi Wiredu foi um dos primeiros filósofos africanos a explorar este campo de
mudança de crenças religiosas aonde Boaventura Cardoso conduz o seu comboio de Mãe,
Materno Mar. Na verdade, ele insistiu que a mudança tinha que vir para a África tradicional,
porque ele sentia que algumas idéias antigas eram prejudiciais. Por exemplo, ele delineou três
principais obstáculos à regeneração cultural africana: anacronismo, o autoritarismo, e
supernaturalismo. Mas ele também insistiu que a África tinha pessoas muito sábias e filosóficas,
de quem se pode aprender muito, especialmente se nós prestarmos atenção nas nuances dos
significados dos conceitos em línguas africanas (WIREDU, 1980).
Daí que Wiredu deduza a necessidade de investigar as línguas africanas num processo de
avaliação cultural, cruzando os conceitos do pensamento africano e europeu no nível da
linguagem. Trata-se de desmantelar as conceitualizações impostas ou assimiladas sob a
influência colonial como passo para proceder à avaliação intercultural das ideias filosóficas,
independente do conteúdo concreto das respectivas línguas (KRESSE 2000b, § 27). A
descolonização do pensamento africano torna-se uma questão central: “Por descolonização,
quero dizer desinvestir o pensamento filosófico Africano de todas as influências indevidas que
emanam do nosso passado colonial6” (WIREDU, 1998).
Wiredu não apresenta a ideia de descolonização como modo de fazer tábula rasa de todo
o pensamento existente em relação à África, mas pretende integrar no espólio filosófico tudo que
seja benéfico para o desenvolvimento do pensamento africano como pensamento humano.
Pretende criar uma atitude crítica relativa às categorias filosóficas ocidentais, mas também
questionar as construções ultrapassadas do pensamento africano antigo. Ele mostra a necessidade
do aproveitamento universal das virtudes do pensamento africano, concretamente o conceito de
“Ser em comunidade”, segundo o qual nenhum indivíduo se consegue desenvolver por si só ou
em isolamento dos outros. Este conceito não questiona apenas a posição filosófica kantiana do
6
“By decolonization, I mean divesting African philosophical thinking of all undue influences emanating from our colonial past.”
52
desenvolvimento autônomo do indivíduo, como também constitui uma esperança para o
relacionamento humano no mundo.
Para ele, são os universais de cultura que permitem o diálogo intercultural como condição
essencial para o entendimento entre os diversos grupos humanos. O universal humano mostra-se
na presença comum das capacidades intelectuais constituintes de percepção reflexiva, de
abstração e inferência que, por sua vez, reencontramos como competências linguísticas
fundamentais constituindo as raízes da compreensibilidade entre as diversas línguas.
Wiredu salienta a existência de filósofos indígenas africanos que ainda pouco sofreram a
influência de ideias filosóficas de origem estrangeira. Relata a sua capacidade individual de se
pronunciar de forma profunda e pormenorizada sobre problemas filosóficos no contexto do
pensamento africano antigo, contudo, indo para além do seu limite descritivo: “Apenas a
narração não é boa o suficiente, nós temos que interpretar. Tentar a interpretação é que é
efetivamente se tornar conceitual7” (WIREDU apud KRESSE 2000b, p.18).
7
“Just narrating is not good enough, we have to interpret. Trying to interpret is actually getting conceptual.”
53
Tsenay Serequeberhan salienta uma concepção filosófica extremamente pertinente neste
ponto:
Para um corpus de pensamento ser legitimamente associado com determinada
raça, povo, região ou nação é sufiente que seja, ou deva tornar-se, uma tradição
viva naquele lugar. É indiferente se desenvolvida localmente ou tomada
emprestada inteiramente ou parcialmente de outros povos.
SEREQUEBERETAN, 1991 pg.106)
Wiredu argumenta que é importante distinguir entre crenças populares e visões de mundo
que podem ser encontrados inerentemente e são distintivas em todas as culturas e filosofias. Ele
é, portanto, opositor das abordagens da Etnofilosofia e da Sagacidade Filosófica para a Filosofia
Africana; tal “filosofia popular”, como ele denomina, pode formar parte de uma filosofia genuína
- de fato, ele disse sobre seu próprio trabalho que era “devedor ao pensamento dos metafísicos
anônimos que legaram à cultura Akan enigmas cosmológicos na linguagem dos tambores”
WIREDU, 2004, p.204) -, mas apenas com a adição de argumentação rigorosa e análise crítica
essa própria filosofia se estabelecerá firmemente posicionada no campo da filosofia profissional.
8
“[T]hese antecedents in the literature established paradigms which (...) remain operative to this day.”
54
Ele mesmo é um dos maiores e mais talentosos realizadores nesse campo da moderna filosofia
africana através do desenvolvimento científico do pensamento oriundo da sua filosofia
tradicional Akan.
Este processo foi registrado por Peter J. King em seu livro Filósofos: Um Guia dos 100
Pensadores Mais Importantes do Mundo:
A figura do ancião, desde o início dos relatos das primeiras civilizações, é muito controversa e
discutida. No mundo ocidental, o senso comum das principais culturas muitas vezes discordava dos
ensinamentos das filosóficas clássicas sobre as contribuições da velhice para a sociedade. O estudo das
reais condições trazidas pelo avanço da idade gerou diversas discussões éticas sobre as percepções
biossociais dos processos de mudança do corpo. Médicos, biólogos, psicólogos e antropólogos ainda
hoje não conseguem obter consenso sobre esse fenômeno em suas respectivas áreas.
Muitas culturas ocidentais descrevem o estereótipo do jovem como corajoso, destemido, forte e
indolente. Já a figura do idoso é retratada como um peso morto, um chato em decadência corporal e
mental. Percepção preconceituosa que foi levada ao extremo no século XX pelos portugueses durante a
ditadura de antonio salazar, notório por usar a perseguição aos idosos como bandeira política. Atletas e
artistas cotidianamente debatem o avanço da idade com medo e desgosto, enquanto especialistas da
saúde questionam se há deteriorização ou mudança adaptativa no corpo humano.
Nas culturas africanas e orientais, assim como na maioria das filosofias clássicas, a velhice é vista
de um ângulo positivo, sendo fonte de sabedoria e meta para uma vida guiada com prudência. O sábio
ancião, que personifica a figura do homem calmo, austero, e que muitas vezes é capaz de prever certas
situações e aconselhar, se destaca em relação ao jovem cheio de energia e de hormônios instáveis.
Porém apesar dos filósofos apreciarem o avanço da idade, nem todos eles tinham a mesma opinião
sobre a velhice.
55
O jovem platão tinha como inspiração o velho sócrates. Apesar de ser desfavorecido
materialmente, sócrates possuía muita experiência e uma sabedoria ímpar que marcou a história do
pensamento. Na sociedade ideal desse filósofo, jovens muitas vezes eram retratados como
inconsequentes e ingênuos. Nesta sociedade ideal, crianças e adolescentes não recebiam diretamente o
ensino da Filosofia. Por ser um conhecimento difícil, era somente ensinada para pessoas de idade mais
avançada.
O quadro que nos é aqui apresentado por Hofstede assemelha-se perfeitamente àquele que
está implícito na Sagacidade Filosófica (Filosofia da Sagacidade), uma das correntes da Filosofia Africana,
na proposta de Oruka (1990). É verdade que a Filosofia e a Epistemologia africanas constituem uma área
sobre a qual há ainda pouco consenso (NASSEEN, 1992). No entender de Hountondji (1996), isso se deve
ao fato de se tratar de esferas do plano cultural, sendo que, pela sua natureza, “as tradições culturais
são sempre uma herança complexa, contraditória e heterogénea; um conjunto de opções, algumas das
quais são atualizadas por uma certa geração que, ao adotar uma escolha, sacrifica todas as outras”
(HOUNTONDJI, op. cit, p.161 – tradução do autor).
Apesar disso, a corrente da Sagacidade Filosófica se apresenta como sendo a que melhor pode
ancorar o nosso argumento. Com efeito, esta corrente sustenta que as verdadeiras fontes e agentes do
conhecimento e valores em sociedade africanas sob o peso da tradição são os seus ‘sábios’(sages) e não
toda a comunidade. Os ‘sábios’ são indivíduos cuja sabedoria é vista como transcendendo a da
comunidade, sugerindo-se, inclusive, que eles possuam capacidade inata de reflexão crítica. Sob tal
percepção, os ‘sábios’ são encarados não só como conhecedores reconhecidos mas também como
pensadores eleitos, cujas opiniões e recomendações devem ser (e efectivamente são) tácita e
comummente aceites e respeitadas (Oruka, op. cit.). É caso para dizer que não é por acaso que, mesmo
na atualidade, no continente africano, persiste a prática de nomear os chamados “Comités de Sábios”.
56
Sobre o livro e o comitê de sábios
Tshiamalenga Ntumba nasceu em 1932 no Zaire. Teólogo e Filósofo deixou sua marca na
busca filosófica e teológica na África, especialmente na República Democrática do Congo.
Desenvolveu uma filosofia baseada na categoria de "Nós". A concepção de si mesmo como
membro integrante de um social, de uma comunidade que protege e apoia toda a existência
humana é a condição prévia para qualquer nova percepção humana.
Agora na África do Sul, país onde se aplicou muito precocemente e de maneira racista, o
termo bantu, tem sido um dos lugares onde se tem feito distintas investigações afins. Pois em um
ambiente onde os autóctones, em sua maioria bantu, eram discriminados, marginalizados e
estigmatizados pela cor de sua pele, a tal ponto de ser negado a eles sua humanidade (ubuntu);
em um ambiente onde o branco era sinônimo da força (armas), do poder, do bem estar e do belo,
em detrimento do negro; em um país onde “negro era não apenas a ausência de luz na África do
Sul, mas a ausência de identidade”10; obviamente a reação dos nativos sul-africanos deveria ser
diversa: aceitar humilhações do homem branco e todos os valores “brancos”, ou buscar uma
9
http://es.wikipedia.org/wiki/Lenguas_bant%C3%BAes
10
Battle, Michael, Reconciliation. The Ubuntu theology of Desmond Tutu, the Pilgrim Pres, Cleveland, Ohio, 2009, p.2.
57
terceira via que, mutatis mutandis, poderíamos definir com uma analogia ao personagem de
Shakespeare, “Caliban”; aprender os valores e a língua impostos, para logo servir-se deles para
operar uma “transmutação axiológica” (ROIG,1991 pg.51) dos mesmos. Muitas dessas reações
foram articuladas por alguns intelectuais e políticos sul-africanos como Steve Biko, Nelson
Mandela, Masolo, Desmond Tutu, entre outros.
Este último é também, como Mandela, prêmio nobel da paz. Este prêmio foi a apoteose
de sua luta contra o sistema do Apartheid, cujos muros foram derrubados pela abertura daquele
país ao multipartidarismo que levou à eleição de Nelson Mandela, como primeiro presidente
negro, em 1994. Sendo Tutu um bispo anglicano da etnia Xhosa, e conhecendo tão bem tanto a
cultura e a tradição de seu povo como a cultura e tradição dos brancos, tem funcionado como
uma verdadeira dobradiça na luta empreendida por seu povo, e logo na reconciliação de uma
África pós-apartheid. O fato de ser um pastor anglicano africano tem sido determinante na
elaboração de um pensamento arraigado tanto na tradição e cultura africana bantu, como na
tradição cristã anglicana. O conceito chave que tem manejado é o de “Ubuntu”.
Falando deste conceito, o expoente mais cabal do pensamento de Desmond Tutu, Michael
Battle aponta:
Ubuntu é a forma plural da palavra africana Bantu, cunhada por Wilhelm Bleek
para identificar uma ligação linguística similar entre falantes africanos. Ubuntu
significa “humanidade” e é relacionada tanto a umuntu, a qual é uma categoria da
força humana inteligente que inclui espítritos, os mortos humanos, e os vivos,
como a ntu, que é o Ser de Deus como metadinâmico (mais ativo do que
metafísico). Tutu é do povo Xhosa, e seu senso de ubuntu deriva da proverbial
expressão Xhosa “ubuntu ungamuntu ngabanye abantu”, a qual, traduzida
significa “cada humanidade individual é idealmente expressa em relação com
outros” ou “uma pessoa depende de outras pessoas para ser uma pessoa”
(BATTLE, Op.Cit., pg.39)
58
Essas expressões ou ditados tem um campo muito amplo de aplicação, já que resume em si um
pensamento e uma prática ética que, nas sociedades africanas, são considerados como a base do
entendimento do ser humano e do humano mesmo. Muitas das traduções que tem sido dadas a
essas máximas são as seguintes “A pessoa é [faz-se] humano através de outras pessoas”, “Eu sou
eu porque nós somos” (Desmond Tutu), “Humanidade pelos outros”, “Uma pessoa é pessoa em
razão das outras pessoas”, “A crença é um enlace universal de compartilhamento que conecta
toda a humanidade”, etc...
11
Buatu, Batubenge, Omer, Elementos historico-culturales en la construccion de la democracia para Africa y su importância
para America Latina. El caso de la Conferencia Nacional Soberana Africana (tesis doctoral en Estudios Latinoamericanos,
FFyL/UNAM, 2003)
12
Munanga, Kabengele, Origens africanas do Brasil contemporâneo. História, línguas, culturas e civilizações, Ed. Global, São
Paulo, 2009, PP. 88-90.
13
De Carvalho, Platão Eugênio, A Conquista da África meridional e o tráfico de escravos para o Brasil, Grupo Editorial
Scortecci, Sao Paolo, 2007, p.86.
59
comunidade nas sociedades africanas. O mesmo que Tempels aponta, na sua “Filosofia Bantu”,
que o pior dos castigos que poderia acontecer a um muntu é ser excluído de sua comunidade14.
Esta visão comunitarista tem sido criticada por vários autores tanto africanos como
estrangeiros, e também tem sido abusada por alguns dirigentes “oportunistas” africanos. A crítica
mais importante consiste em “sacrificar” o indivíduo no aras da comunidade. Como nossas
propostas vão pela linha do pensamento de Tutu, pensamos com ele que se pode contestar a
partir de uma aproximação com a interdependência. Foi desta forma que Tutu transcendeu
algumas aproximações com a filosofia africana que, no seu afã da busca da “originalidade”
africana frente a uma imponente filosofia ocidental, tem ressaltado sobretudo o comunitário em
detrimento do individual. Tutu parte de um horizonte cristão, para respaldar seu pensamento.
Assim aponta Battle:
60
importância da intersubjetividade no processo de definição e apropiação de uma identidade; os
dois últimos, Peter16 e Bárbara17, por seu lado, a partir de um enfoque antropológico-teológico,
trazem alívio ao mistério da Santa Trindade, onde se vive uma feliz interdependência sem a qual
não se pode entender ao Deus de Jesus Cristo, ou o Deus cristão: o Pai não é o Filho, e o Filho
não é o Espírito, como tampouco este é o Pai e nem o Filho; mas o Pai, o Filho e o Espírito Santo
não são senão o mesmo Deus. Através da encarnação do Deus-Filho, fomos feitos partícipes
dessa divindade, ou em outros termos, fomos incorporados na comunidade trinitária, isto é,
temos recebido o abraço trinitário, ou seja, do Pai, pelo Filho, no Espírito; por tanto, desde então
nossa identidade de filhos e filhas de Deus se definem a partir da relação entre Deus e nós, e
entre nós mesmos.
Conceitualizando mais sua proposta, Forester formula algumas categorias para entender
melhor o Ubuntu: fala da objetividade, da interobjetividade, da subjetividade e da
intersubjetividade.
16
O teólogo jesuíta alemão Peter Knauer (obra de referência: “Para comprender nuestra fé”, UIA Librería Parroquial, México,
1989).
17
A teóloga mexicano-alemã Bárbara Andrade (obra de referência: “Dios en medio de nosotros”, Secretariado Trinitario,
Salamanca, 1999).
61
Fig.1 (Forester, 2006)
62
tecnológicos e o crescimento das cidades têm ocasionado o isolamento das pessoas em
detrimento do diálogo com o outro. Podemos caracterizar o homem deste início de século como
um ser isolado, preocupado consigo e longínquo da realidade ao seu redor.
Não queremos, ao apresentar os problemas citados acima, firmar uma acepção pessimista
sobre o homem atual, mas enfatizar como ele vem se distanciando de um princípio relevante para
sua própria realização enquanto ser humano, a relação. O homem atual restringe-se a proferir a
palavra-princípio Eu-Isto, colocando-se diante das coisas em vez de confrontá-las no fluxo da
ação recíproca, preferindo um relacionamento unidirecional entre o Eu (egótico) e um objeto
manipulável (Isto). Buber, contudo, posicionou-se de maneira radical quando ao analisar a
atitude Eu-Isto, para ele assim como para o Ubuntu “aquele que vive somente com Isto não é
homem” (BUBER, 1977:39).
A filosofia hermenêutica caracteriza-se como aquela que faz análises das línguas
africanas em torno da busca de conteúdos filosóficos. Uma filosofia de interpretação do contexto
africano, ou seja, segue um modelo universal, mas parte do intrínseco do ser africano, tornando-o
objeto do seu pensamento, intentando responder o questionamento sobre o ser africano no mundo
e sua ligação com o divino, com o outro e consigo mesmo. Encontramos os trabalhos de Kwame
Gyekye, Sodipo Jo, Maurier, Laleye, Barry Hallen e Tshiamalenga dentro dessa perspectiva.
Como uma arqueóloga das ideias, Séverine Kodjo-Grandvaux explora nos seus trabalhos
as camadas de uma epistomologia que, ao longo do último século, foi construída essencialmente
em reação ao Ocidente. Num primeiro momento, sob o jugo da influência imperialista colonial, e
posteriormente, em uma reação contra esse domínio. Na medida em que os movimentos de
independência se espalhavam pelo continente (nos anos 50), a filosofia de busca do retorno à
“identidade africana” e de afastamento do molde ocidental tornou-se mais forte. Kodjo-
Grandvaux argumenta que tal ideologia de “retorno às origens” é uma proposta arriscada. Ela
escreve: “À medida que a filosofia se encaixa na busca de um padrão ‘regionalista’, isto é,
continental, nacional ou étnico, ela deve evitar várias armadilhas, entre elas, a do pensamento
homogêneo e do isolamento excessivo”. A contribuição da filosofia ocidental e de outras
correntes de pensamento não devem ser rejeitadas.
63
Kodjo-Grandvaux destaca o debate sobre etnofilosofia, com o qual filósofos africanos
vêm lidando por muito tempo: a ideia de que uma cultura ou região em particular possui uma
filosofia específica, fundamentalmente diferente de outras tendências filosóficas, é em si
controversa. No entanto, muitos filósofos africanos modernos argumentam que o trabalho deles é
uma reflexão crítica sobre lideranças africanas e de seus impactos nas vidas diárias de seus
compatriotas. Consequentemente, é fundamental que a filosofia africana se desenvolva no
contexto do continente africano e que se comunique com uma audiência africana.
Inicialmente no deparamos com o título: Mãe, Materno Mar. Primeiro fica clara a
referência ao universo matriarcal africano em contraste com o sistema de mundo patriarcal
ocidental que o suplantou de maneira abrupta e ineficiente. Sobre essa perspectiva esta
investigação vem explicitar que a narrativa inicia-se e desenvolve-se sob a égide da mulher
(mãe), da água (mar), da filosofia (coruja) e do negro (letra M). Esses são os semagramas
determinantes principais que impulsionam a compreensão em direção à consciência do saber
criador feminino, da força elementar da natureza, da busca pela abedoria humana e do
conhecimento de si próprio e das relações de alteridade.
Retomando o título segundo outro de seus aspectos, o elemento água está associado à
palavra mar. A diferença geográfica entre mar e oceano é que os oceanos tem profundidade
desconhecida e delimitam as terras emersas e já os mares têm profundidades conhecidas em
algumas centenas de metros. Os mares são, por sua vez, delimitados pelos continentes, aqueles
trechos do oceano mais próximos aos acidentes geográficos terrestres, possuindo uma grande
importância para inúmeros povos que se localizam nas proximidades. O mar possui um caráter
mais nacional e particular que oceano.
Outra observação que pode ser feita é a repetição deliberada da letra M nas iniciais das
três palavras que constituem o sintagma-título do livro. Essa estruturação remete à gramática da
língua bantu. O radical inicial da palavra que tem a função sintática de sujeito na oração permeia
as outras palavras que a compõe para indicar a importância e a dominação sintática, semântica e
morfológica sobre as outras com as quais se relaciona. Esse vínculo fica expresso semântica e
morfologicamente também além das evidências sintáticas reveladas pelo enunciador. As línguas
bantu juntam as palavras com características semânticas comuns numa classe e não, como as
64
línguas europeias, por gênero. Cada classe tem prefixos diferentes para designar o singular ou o
plural que, nos outros elementos da frase, antecedem a raiz de cada palavra, reaparecendo nos
prefixos. A sistemática dessa estrutura pode ser constatada através deste exemplo retirado do
ensaio brilhante de Pedro Miguel que inspirou este trabalho intitulado Da Foz à Fonte: A
Literatura Angolana como Antropologia Filosófica (2002).
Nessas frases cabe notar o seguinte: enquanto no idioma português o adjetivo “esta” e a
frase relativa integrante permaneceram inalterados nas três frases, no idioma kimbundu, já não
acontece o mesmo. Não só isso, mas também em português pode-se mudar a ordem dos adjetivos
sem alterar nada. Significa que estamos perante uma estrutura universal e universalizante. Em
outras palavras, estamos perante uma língua conceitual. À equivalência de condições, semelhante
arbitrariedade não se pode efetuar na língua kimbundu. Esta é uma estrutura que caracteriza as
línguas do tronco bantu, registrando-se uma diferenciação apenas no plano lexical (MIGUEL
2002).
Nos exemplos acima citados em kimbundu notamos que a partícula com a qual uma frase
inicia repercute-se em todas as palavras que têm relação com a palavra inicial. E assim se
procede, por mais longa que seja a frase: pedindo a consequente de uma partícula, ela é
encontrada no seu correlato antecedente. Assim sendo, é igualmente legítimo perguntar qual é o
correlato antecedente da partícula da palavra inicial do sintagma-título.
A significação de uma realização análoga no sintagma Mãe, Materno Mar pode ser a de
uma interferência linguística reversa onde a gramática autóctone subvalorizada e subjugada da
língua bantu se materializa como forma dominante dos vocábulos do vernáculo português
imposto pelos colonizadores. A letra M (eme) é a décima terceira letra do alfabeto português e é
também a décima consoante. É utilizada em 4,74% das palavras portuguesas. A letra M na
escrita hierática egípcia é a transliteração do sinal representado pela coruja e depois no alfabeto
fenício recebeu a denominação de "mem" que significava água e era simbolizada por uma linha
65
Hieróglifo Egípcio >>> Escrita Hierática >> Proto-Semítico > Fenício > Etrusco > Grego
ondulada representando as ondas do mar, dando origem ao "mi" dos gregos e à letra M que
utilizamos atualmente.
Hieróglifo Egípcio
Fig.2
Preto (adjetivo) Mar (substantivo) Água (substantivo)
O sinal identificado com a coruja é um fonograma unilítero, tem o som de “M” e é usado
para escrever palavras que tenham o som de “M”. Em egípcio a palavra preto é lida “kem”, e o
sinal da coruja nesse caso é usado como um fonograma (complemento fonético) para escrever a
palavra preto. O ideograma da coruja, por exemplo, é uma maneira de se referir a uma coruja
sem ter que escrever as letras C – O – R – U – J – A. Nesse caso o sinal representa o que ele é.
Então já sabemos que um mesmo sinal poderá ser um fonograma em uma frase ou um ideograma
em outra, e isso dependerá apenas do contexto em que ele está inserido.
Na mitologia egípcia, Neith (também denominada de Nit, Net e Neit) é a deusa da guerra
e da caça, criadora de Deuses e homens, divindade funerária e deusa inventora. Neith, também
chamada Tehenut, é uma antiga Deusa egípicia cujo culto provém do período pré-dinástico, na
qual tinha forma de escaravelho, depois foi deusa da guerra, da caça e deusa inventora além de
protetora dos mortos. Platão afirmou que em Saís, Atena fundia-se com Neith, pelos atributos da
guerra e da tecelagem, e tinham um mesmo animal simbólico, a coruja. O símbolo da Deusa
grega da sabedoria, Atena, é uma coruja do género Athene: o mocho-galego. Também
considerada o símbolo da filosofia.
66
a escrita hieroglífica. Hieróglifo é um termo originário de duas palavras gregas: hierós
"sagrado", e glýphein "escrita". Apenas os sacerdotes, membros da realeza, altos cargos, e
escribas conheciam a arte de ler e escrever esses sinais "sagrados".
Mesmo que não existissem filósofos africanos conhecidos, a filosofia foi praticada na
África. Isso pode ser apoiado através da observação da literatura grega. Na Ilíada e em outras
obras podem ser observados conceitos filosóficos como a arrogância, o heroísmo e a
superioridade da cultura grega vigentes antes do período final da Antiguidade Clássica Grega.
Assim, uma forma de filosofia natural sempre esteve presente na África desde tempos muito
antigos.
67
Etiópia é um termo geográfico que aparece pela primeira vez nas fontes arcaicas e
clássicas da Grécia Antiga referindo-se à região do Alto Nilo, bem como a todas as regiões
situadas ao sul do deserto do Saara. Sua primeira menção ocorre nas obras de Homero: duas
vezes na Ilíada, e três vezes na Odisseia.
Lembrei-me da notável passagem onde diz Heródoto: "E quanto a mim, julgo
serem os colchianos uma colônia dos egípcios porque, iguais a estes, são
negros de cabelo lanudo". Em outras palavras, os antigos egípcios antigos
eram verdadeiros negros, do mesmo tipo que todos os nativos africanos. (...)
Pensem só, que esta raça de negros, hoje nossos escravos e objeto de nosso
desprezo, é a própria raça a quem devemos nossas artes, ciências e até mesmo
o uso da palavra! (apud NASCIMENTO, 1996, p. 43)
Plínio, o Velho descreveu Adulis, porto que segundo ele era o principal centro comercial
dos etíopes. Segundo ele, o termo "Etiópia" seria derivado de um indivíduo chamado Étiops, que
seria filho de Hefesto (o Vulcano dos romanos). Esta etimologia foi adotada com unanimidade
até por volta de 1600, quando Jacob Salianus, no primeiro tomo de seus Annales, propôs pela
68
primeira vez uma hipótese alternativa, que derivava a designação das palavras gregas aithein,
"queimar", e ops, "rosto"; o fato é mencionado a um padre espanhol chamado Francisco Colin
(1592–1660), que o menciona em seu livro Sacra India, que contém um longo capítulo sobre a
Etiópia. Colin menciona a opinião de Salianus como uma possível nova hipótese para a origem
do nome. O significado de 'rosto queimado' aparece em seguida nas obras dos autores alemães
Christopher Von Waldenfels (1677) e Johannes Minellius (1683), e logo foi adotada como
padrão pela maior parte dos estudiosos europeus.
Pelo lado da ciência e da tecnologia, mais especificamente o das ciências exatas como a
matemática que representam a base do desenvolvimento tecnológico da civilização ocidental
encontramos o discurso que denuncia a incompatibilidade, a incapacidade para a ciência e
evidencia a incompetência do povo subdesenvolvido da África. A questão surge durante a
narrativa: “Que ganhariam eles com a visão científica do mundo?” (CARDOSO, 2001; pg.203).
69
opinião na África que rejeita as diretrizes das agências internacionais que frequentemente vão de
encontro á vontade dos cidadãos africanos.
A mudança social provocada pelo fato colonial faz parte dessa história, mesmo que a
intenção da colonização fosse acabar com ela. O período colonial africano é recente, durando de
1883-1885 até pouco mais da metade do século XX. Nesse período, os governos europeus
dividiram e reagruparam as sociedades tradicionais da África em colônias, cujas fronteiras não
correspondiam aos seus territórios originais.
70
conforme interesses externos aos dessas sociedades produtoras e dos povos que as constituem,
modificando as relações sociais e impondo um novo modelo de pensar e agir.
Um dos grandes pensadores moçambicanos, Castiano, faz uma crítica aos críticos, ou os
que dizem não à existência da filosofia africana, pois para ele, “a filosofia dos críticos parece ser
uma filosofia envergonhada”. Pois, eles recusam os textos orais, e esqueceram que “à boa
maneira platônica que, graças a isso, conseguimos saber o que Sócrates andava a apregoar pelos
mercados de Atenas”. Para Cheikh Anta Diop a origem da filosofia deve ser procurada em
África, especial na civilização egípcia, ou seja, o lugar que a Grécia ocupa na história do
pensamento científico filosófico, deveria ser ocupado pelo Egito antigo.
Castiano na sua obra referenciais da filosofia africana salienta que é preciso desmitificar,
por exemplo, o mito de que Grécia é o berço do saber universal mostrando como muitos gregos
tiveram ímpeto de viajar para o Egito porque consideravam, naquela altura, este território como a
fonte do saber e do conhecimento.
Se nós falarmos de um pensamento racional dos antigos egípcios, concluímos que sempre
existiram os pensadores africanos com certo nível de desenvolvimento reflexivo como o logos
helênico, isto em diversos campos de saber e de ser.
71
Tal declaração corrobora com o testemunho matemático conhecido mais antigo que é o
“osso Ishango, com mais de 8000 anos de idade, encontrado em Ishango, às margens do lago
Edward, no Zaire (atualmente República Democrática do Congo) no continente africano,
mostrando números preservados por meio de entalhes no osso” (EVES, 2004, p. 26). O bastão de
Ishango, como também é conhecido esse osso petrificado, nos sugere pensar que encontraremos
na África um dos berços das mais antigas experiências matemáticas. Na ciência matemática, há
um volume enorme de conhecimento africano. Sem mencionar as pirâmides egípcias, cuja
construção exigiu o desenvolvimento de um conhecimento avançadíssimo de matemática,
geometria e engenharia (capaz de projetar, 2.700 anos antes de Cristo, ângulos com 0,07° de
precisão), podemos citar o sistema iorubá de matemática, baseado, como outros na África, em
múltiplos de 20. Uma visão geral do desenvolvimento da ciência matemática na África está no
trabalho de Cláudia Zaslavski (1973).
O epistemicídio antiafricano que retirou o Egito dos mentefatos e artefatos africanos está
intimamente ligado ao paradigma científico da natureza greco-européia, que contribui para um
processo de educação e desenvolvimento marcadamente eurocêntrico e associados a uma
sistemática de dominação e a estrutura de poder desse processo. Diante disso, George G. M.
James citado por Nascimento (1996, p.46) indica a apropriação indébita do patrimônio cultural
africano pela civilização greco-romana, que urge por uma revisão histórico-epistemológica.
72
O legado egípcio nos é apresentado como “primitivo” e o legado grego é diametralmente
oposto e assimetricamente empoderado. É evidente o enaltecimento valorativo do mundo grego e
de suas identidades culturais. Tradicionalmente, o pai da matemática e filosofia gregas é Tales de
Mileto, um mercador que visitou a Babilônia e o Egito na primeira metade do século VI a.C.
(STRUIK, 1997, p.73). Esta afirmativa – no singular – desvela um pouco da presença do ideário
colonizador que escreve a história propondo uma ideia de marco inaugural ou ponto de origem.
Utilizando-se de dados “ficcionais”, o discurso colonial produz sentidos com marcas ideológicas.
Mesmo quando reconhecido seu aspecto ficcional ou lendário, o “mito histórico” confunde-se
com o “realismo histórico”. Uma infinidade de lendas existe em torno das descobertas de Tales
de Mileto, como também, pouco pode afirmar ou comprovar da matemática e logo filosofia
gregas daquela época, como afirma Boyer (1994):
Da matemática grega da época nada sabemos. [...] passaram-se ainda quase dois
séculos até haver alguma citação, mesmo indireta, da matemática grega. [...]
Tales e Pitágoras também são figuras imprecisas historicamente, [...]. não
sobreviveu nenhuma obra de qualquer deles, nem se sabe se Tales ou Pitágoras
jamais compuseram tal obra. O que fizeram deve ser reconstituído com base
numa tradição não muito digna de confiança, que se formou em torno desses dois
matemáticos antigos. [...] as mais antigas referências gregas à história da
matemática, que não sobreviveram, atribuem a Tales e Pitágoras um bom número
de descobertas matemáticas definidas [...] mas o leitor deve entender que é sobre
tradições persistentes e não sobre documentos históricos que o relato se baseia.
(BOYER, 1994, p.31)
73
Aquilo que não nos contam e o que a história que aprendemos na escola esconde. O que a
história nos conta sobre a filosofia, a ciência e a própria civilização ocidental é que elas surgem
abruptamente na Grécia Antiga, negando suas raízes no Egito Antigo, ou seja, negando suas
raízes na África. Cheikh Anta Diop afirma que:
Diop segue afirmando que “O Antigo Egito esteve na origem de um sistema filosófico
elaborado e não de uma mera cosmogonia, como muitos ainda sustentam” (Idem, p. 308).
Seguindo o mesmo texto, o autor ainda nos diz que “os gregos foram forçados a vir
humildemente beber na fonte da cultura egípcia” (ibidem, p.312).
Diversas pesquisas provam que já não há como questionar essa realidade. Tal negação
entende-se desde o ponto de vista de que “‘filosofia’ é o rótulo de maior status no humanismo
ocidental” (APPIAH, 1997, p. 131). A filosofia eurocêntrica apropriou-se dos conhecimentos
vindouros não apenas do Egito, mas também de outros países africanos. Aprendemos, dentre
tantas outras coisas, que a origem da filosofia está na Grécia Antiga.
Claro que a Filosofia Ocidental não se resume apenas a essa consideração e dela também
se pode beber, ou seja, não renegar o pensamento europeu, apenas escolher, como não poderia
deixar de ser, pensar desde o seu próprio lugar de fala, lugar este que advém da ancestralidade
entranhada em corpos africanos.
74
Partilhamos a compreensão de que: não há nenhuma base ontológica para negar a
existência de uma filosofia africana. Também argumentamos que, frequentemente, a luta pela
definição de filosofia é, em última análise, o esforço para adquirir poder epistemológico e
político sobre os outros (RAMOSE, 2011, p.14).
Severino Elias Ngoenha, moçambicano, considera que colonizar, para o Ocidente, era
arrebatar os povos africanos de sua perdição, libertando-os de suas trevas, trazendo-os à luz
natural da razão que eles ainda não possuíam, os colonizadores consideravam que estavam
humanizando os colonizados.
Esses preconceitos escondem fatos históricos que nos mostram o quanto devemos ao
Continente Africano, a história que nos é ensinada não nos conta fatos como: As pirâmides do
Egito Antigo foram construídas ao longo de vários milênios, sendo feitas com um intenso e
desenvolvido conhecimento; também não expõe que o calendário do Egito Antigo era mais exato
que o moderno e os hieróglifos egípcios e seus antecedentes são os primeiros sistemas da escrita.
Tinham conhecimento de uma avançada matemática abstrata 13 séculos antes de Euclides,
desenvolviam sofisticadas técnicas de geometria, matemática e engenharia. Dois milênios e meio
antes do grego Hipócrates ser considerado fundador da medicina, os egípcios Imhotep e Atótis
juntamente com seus sucessores desenvolveram os fundamentos da medicina.
75
O conhecimento tecnológico estava presente em diversos ambientes culturais e sociais
África antiga. O saber médico, sanitário, os cálculos matemáticos e o universo astronômico
eram em graus diferenciados parte deste continente. A medicina egípcia, por exemplo, tinha
seu conhecimento a partir dos experimentos e estudos voltados para o interior do organismo
humano, elaborado em função da prática da mumificação, do embalsamento do corpo dos
faraós e de pessoas influentes desta sociedade. Deste modo se a medicina tem um pai é o
cientista clínico egípcio Imhotep, que acerca de 3.000 anos antes de Cristo já aplicava os
conhecimentos médicos e de cirurgia (SOUZA e MOTTA, 2003; NASCIMENTO, 1996).
O conhecimento médico não esteve situado apenas no norte africano, na região que
hoje compreende Uganda, país da África Central, encontramos os Banyoro que já fazia a
cirurgia de cesariana antes do ano de 1879, quando o Dr. R. W. Felkin, cirurgião inglês
conheceu essa técnica desempenhada com extrema eficácia e técnicas de assepsia, anestesia,
hemostasia e cauterização. O conhecimento médico cirúrgico antigo e tradicional na África,
também, operava os olhos removendo as cataratas. Essa técnica foi encontrada no Mali e no
Egito, bem como acerca de 4.600 anos atrás, neste último país mencionado, já se fazia a
cirurgia para a retirada dos tumores cerebrais (NASCIMENTO, 1996, p. 26). Os Banyoro,
também, detinham séculos atrás o conhecimento acerca da vacinação e da farmacologia,
logo as técnicas médicas e terapêuticas africanas não estavam voltadas, somente, para o
mundo mágico, mas eles produziam conhecimento científico, pela a observação atenta do
paciente (NASCIMENTO, 1996, p. 27).
76
setentrional, que corresponde ao espaço euro-asiático – onde o clima forjou
atitudes e mentalidades específicas. (DIOP apud MOORE, 2007, p. 106 -107).
Diop afirma, dessa forma, que a humanidade tinha desembocado, em consequência de ser
resultado da interação do homem com meios ambientais completamente opostos, em duas
lógicas de evolução socioeconômicas opostas. A obra de Cheikh Anta Diop irá reestabelecer, por
meio de rigorosa pesquisa científica, as verdades negadas, apresentando-se como referência
básica do resgate desse legado egípcio, esse legado civilizatório. Ele nos diz que: “o Egito
Antigo foi o berço científico de onde emergem muito tempo depois, as contribuições científicas
dos gregos” (MOORE, 2007a, p. 309, Entrevista com Cheikh Anta Diop).
Ao não fazer mistério acerca das suas fontes e do lugar de sua formação filosófica, é que
alguns filósofos e historiadores gregos confirmam a tese da origem egípcia da filosofia, das
ciências e das artes em geral. O fundador da Egiptologia africana Cheikh Anta Diop foi aquele
que dedicou maior tempo a essa questão fundamental da história e da filosofia, sua pesquisa fora
continuada pelo seu discípulo Théophile Obenga, este demonstrou em sua obra L’Egypte, La
Gréce et l’Ecole d’Alexandrie (O Egito, a Grécia e a Escola de Alexandria) que muitos filósofos
e homens da ciência grega estiverem no Egito para serem instruídos pelos sacerdotes dos
Templos da Vida nas diversas Escolas do pensamento filosófico egípcio-faraônico, demonstrou
ainda a influência do pensamento egípcio nas reflexões de muitos filósofos e pensadores gregos.
77
Podemos citar vários nomes que beberam das fontes egípcias, tais como: Tales, Platão, Pitágoras,
Sólon, Anaximandro, Anaxímenes, Demócrito, Anaxágoras, Aristóteles e tantos outros. Não se
pode negar a dívida da Filosofia Grega com o Egito Antigo, ou seja, o Egito Africano.
Credita-se que a história só começa à medida que o homem se põe a escrever, a registrar
os acontecimentos, desse modo, o passado africano antes do início do imperialismo europeu, só
podia ser reconstituído a partir dos testemunhos de restos materiais, dos costumes primitivos e da
linguagem. Mas, não dizem que a escrita tem origem no Egito e na Suméria.
É importante dizer que, na atualidade, as diversas maneiras de fazer filosofia não deixam
dúvida do caráter polissêmico do termo. Mas, sem dúvida, tudo leva a crer que mesmo que
filósofos pragmatistas discordem muito de filósofos continentais, que tratam das mesmas
questões por vias distintas e caminhos especulativos, nos dois casos, a Filosofia ainda é
entendida como atividade, exercício, aventura do espírito humano ou protocolos intelectuais que
têm origem grega. Maldonado-Torres identifica na leitura do filósofo Frantz Fanon uma das mais
contundentes críticas à mentalidade racista e colonial que demarca a formação da maioria das
pessoas que se dedicam à Filosofia no Ocidente. Nós estamos de acordo com Maldonado-Torres;
é muito sintomático que a “Filosofia” se recuse a examinar a interferência do espaço na produção
de conhecimento, e o esquecimento da espacialidade e das disputas geopolíticas apenas reiteram
e reforçam a Europa como lugar epistêmico privilegiado. Ou seja, a Europa, e por tabela, a
cultura ocidental, é a referência fundamental para a produção de conhecimento filosófico.
78
a realidade mais elaborado, sofisticado da humanidade, digno de povos mais “civilizados” ou
mais “desenvolvidos”. Existe um pressuposto embutido: a dominação política, econômica e
social que o Ocidente empreendeu por meio da invasão, colonização, trocas assimétricas e
assujeitamento não só dos povos africanos, mas dos ameríndios, asiáticos e da Oceania vem
sempre articulada com a dominação intelectual, com o estabelçecimento de cânones acadêmicos
ocidentais e com a recusa da validade epistêmica dos povos “colonizados”. Por isso, a tese de
que a Filosofia – essa área tão sofisticada que funciona como signo do refinamento e suprassumo
do humanismo ocidental – poderia ter uma origem fora da Grécia e logo, da Europa, é tão
rechaçada. O que também é motivo para reunir as mais diferentes escolas, linhas e perspectivas
(ocidentais) da Filosofia numa aliança pragmática contra a emergência de outras vozes
filosóficas, vozes que dizem que referenciais de filosofia não são exclusividade do ocidente. A
coalizão ocidental usa o epistemicídio, isto é, o assassinato das formas de conhecer, pensar e agir
de outros povos, ou ainda, a recusa sistemática da validade dos argumentos, mesmo que esses
sejam consistentes, em favor da blindagem de uma perspectiva intelectual.
As imagens veiculadas pelo cinema, literatura e pelo aparato midiático em nada ajudam a
elucidar ou ampliar nossa compreensão sobre o Egito africano, principalmente se quisermos
sustentar nossa hipótese de que os textos egípcios anteriores aos gregos já eram filosóficos. Tal
como dizem Cheikh Diop, George James, Molefi Asante, Maulana Karenga, Martin Bernal,
Théophile Obenga, Marimba Ani, Nkolo Foé, Mogobe Ramose e José Nunes Carreira, o racismo
79
antinegro que questionava os avanços técnicos, filosóficos, científicos e culturais do Egito
faraônico deu origem a discursos que desacreditavam a capacidade dos egípcios de construir
pirâmides e aquedutos, embalsamar corpos, represar rios, criar sistemas sofisticados de cultivo e
agricultura.
O que está em jogo aqui é a autoridade ocidental por classificar alguns discursos como
filosóficos e outros como “pensamento”, uma perspectiva política de valorização dos gregos na
Antiguidade, dando supremacia ao Ocidente. Existem contra-argumentos que defendem que a
filosofia não precisa ser tão valorizada, e que não deveríamos nos preocupar em enquadrar um
pensamento africano ou asiático em seu modelo ocidental. Por que não questiona-se quem
autorizou o Ocidente a ser a “régua” da Filosofia? Isto não seria resultado de uma disputa
geopolítica, como nos ensinam Fanon e Maldona-Torres? Afinal, na maior parte das instituições
universitárias e de pesquisa do Brasil e do Mundo, a área de Filosofia agrega e reúne incentivos,
investimentos, reconhecimento público, mas a área “Pensamento” permanece livre e fora da
disputa dos recursos e reconhecimento social. A recusa do caráter filosófico ao pensamento
africano, assim como a tantos outros, faz parte de um projeto geopolítico de manutenção do
status quo. Um projeto tão bem articulado que filósofos que discordam em quase tudo
convergem quando se trata da primazia grega.
80
como sendo características comuns de toda África o matriarcado, a espiritualidade, o humanismo
e o pacifismo.
O continente africano ainda continua sendo visto como categoria unificada e coerente,
negando sua diversidade, olhando o contexto folclórico e escravista, localizando a filosofia e a
cultura em grupos étnicos. Mudimbe (1988) articula isso defendendo que a África foi uma
construção da Europa, no sentido de que a Europa necessitava dos seus outros para projetar seus
medos e suas aspirações. Historiadores do século XIV até início do XX ponderam que a história
da África, teria principiado no período em que os europeus começaram a ter contato com aquele
continente. Não apenas pelo registro e relato feito pelos viajantes, comerciantes, administradores
e missionários que passavam por lá, do século XV ao XIX, mas especialmente pelas mudanças
introduzidas pelos europeus na África. Confabulam que todos os elementos de destaque da
cultura africana seriam frutos de interferências de outras civilizações, cópias inferiores e não uma
criação propriamente africana.
A história colonial da África é muito diferente da sua verdadeira história. É então, que no
fim do século XIX os africanos começam a deixar por escrito o que conheciam sobre a história
de seus povos para evitar que os europeus tragassem as suas histórias, contando uma história que
não os pertencia, além de uma história que vangloriaria os colonizadores europeus inferiorizando
os demais, especialmente a África e América Latina.
81
exterior da camada dirigente africana, face ao desenraizamento dos intelectuais, ao menosprezo
social e cultural dos próprios poderes pelas massas africanas, mas sobretudo pelas profundas
mudanças estruturais sociais e econômicas ocorridas no processo de neocolonialização. A
exigência de um retorno constitui assim apenas um modo idealista de não enfrentar as ou, no
caso de Mobutu, o mentor da “autenticidade” (TUTASHINDA 1978), de esconder as realidades
políticas africanas (WAMBA-DIA-WAMBA 1979). Fanon (1975) caricatura essa posição da
seguinte maneira:
Ficaríamos muito contentes por saber que existiu uma correspondência entre tal
filósofo negro e Platão. Mas em absoluto não vemos em que é que esse fato
poderia modificar a situação das crianças de oito anos que trabalham nos campos
de cana na Martinique ou em Guadalupe. (p.240).
Assim, os referenciais de subjetivação na filosofia africana são, de fato, uma teorização das
diferentes fases de tomada de consciência e de ação para a liberdade do continente. Tão somente.
Vladimir Lenin, fundador do Estado Soviético, quando indagado, certa vez, porque motivo
os fundamentos da filosofia libertária do operariado na sociedade capitalista, o marxismo,
haviam sido desenvolvidos por filósofos “burgueses” respondeu mais ou menos nos seguintes
termos: “nos palácios pensa-se de forma diferente do que nas palhotas”, ou seja, o
desenvolvimento mais amplo, menos militante, do pensamento científico, só será possível depois
de vencermos a fase das necessidades básicas: da fome e da pobreza em geral, da liberdade
política e da liberdade intelectual.
Apenas a liberdade política é uma realidade para toda a África, porém, a pobreza é ainda
um grande desafio para todos e, em alguns países, mesmo a liberdade intelectual não foi
conseguida.
Ao longo do texto somos confrontados diversas vezes com questionamentos e afirmações que
possuem extrema relevância para a filosofia acadêmica profissional africana. Entre elas podemos
destacar algumas que ocupam posições fundamentais para o debate filosófico profissional
africano:
82
Em África meu senhor, as águas de baixo se unem às aguas de cima.
Regressavam assim a terra para renascer.
Isto é uma terra de pretos e está tudo dito.
Sofrer até o extremo é morrer?
Depois da capital o resto do país eram os selváticos ares.
Então foi surgindo entre os crentes a ideia de paz, que a violência não era a melhor forma
de resolver os casos.
Somos todos africanos e sabemos que muitas vezes fazemos às escondidas aquilo que
publicamente não pode ser feito, nem sequer dito.
Esta última com teor altamente religioso e teológico que podemos relacionar com latinismos
originários da cultura ocidental católica erudita. São empregados ao constatar-se a falácia das
Igrejas Africanas e seus pastores e profetas. Os exemplos recolhidos concernentes a essa tradição
são:
A mulher na rua é sempre uma excelentíssima senhora dona, mesmo que não o
merecendo e quando na alcova, nos íntimos ares, devia de dar livre curso a todos os
velados instintos.
83
Sempre o mesmo fingimento, a discrição que os homens gostam de ver nas mulheres que
se prezam.
A mulher é como o antílope, consegue de apanhar até no cão mais magro!
Uma santa preta? Santa preta só podia ser uma bruxa, que ele se lembrou do que sempre
tinha ouvido dizer.
É preferível confiá-lo [segredo] ao vento, mas nunca à mulher.
Os homens gostam de abusar nas mulheres que lhe são inteiramente submissas.
'Humanismo', porém, não significa 'humanidade', mas 'homem'. As mulheres ainda vão
esperar muito tempo antes que os movimentos feministas comecem a lutar para incluí-las em
igualdade de condições no mundo dos 'seres humanos'. Segundo o filósofo Roberto Romano, em
seu livro Lux in Tenebris: meditações sobre filosofia e cultura, “o mesmo Kant, que defendeu a
saída corajosa da humanidade de seu estado infantil, menor, mantém este último para a mulher”
(ROMANO, 1987, p. 125).
Para comprovar o que diz, cita um trecho onde o filósofo do séc. XVIII define o estatuto
da mulher na sociedade:
Kant não está sozinho entre os grandes filósofos que destacam a inferioridade das
mulheres. Entre muitos outros como Platão, Kierkegaard e Schopenhauer, temos Hegel (1770-
1831), que na sua Filosofia do Direito diz:
As mulheres [...] podem ser cultivadas, mas não foram feitas para as ciências
nobres, nem para a filosofia, nem para certas formas artísticas, que exigem o
universal. As mulheres podem ter pensamento, gosto, elegância, mas o Ideal não
lhes é acessível [...] Se as mulheres estão no ápice do governo, o Estado corre
perigo, pois elas não agem segundo as exigências do Universal mas segundo
inclinações e opiniões contingentes [...] (HEGEL apud ROMANO, p.126 e 131).
84
doutora em filosofia Rosa Maria Rodríguez Magda (RODRÍGUEZ MAGDA, 2007) estende a
crítica aos filósofos mais recentes, começando pela clara e reconhecida misoginia de Nietzsche e
incluindo, em sua crítica, autores considerados pós-modernos, referindo-se a uma ausência de
estudos sobre a mulher na História da Sexualidade de Foucault, embora ressalte a importância
desse autor para o pensamento feminista, ao 'esquecimento' da diferença sexual na noção de
corpo em Deleuze, ao uso que Baudrillard faz do 'feminino' como puro artifício a partir de uma
ritualidade masculina.
85
experiência histórica e feminina. O feminismo teológico convida a pensar de novo as próprias
crenças e a situá-las a partir das necessidades dos diferentes grupos e dos diferentes tempos.
A teologia feminista é parte de uma revolução cultural dos séculos XX e XXI, uma
revolução que ainda está em seus primeiros passos. Se persistir nessa luta de desnudamento de
certos conceitos religiosos em favor da dignidade feminina, estará sinalizando um novo
momento criativo na história das religiões, visto que as mulheres estarão expressando dentro das
diferentes tradições religiosas sua experiência, seus valores e sentidos. É o movimento
caracterizado por uma teologia humanista como orientação filosófica.
O feminismo é um termo genérico para uma gama de pontos de vista sobre a injustiça
perpetrada contra as mulheres. Ele pode ser definido como um movimento que busca igualdade
de direitos entre homens e mulheres; daí a sua convicção básica de que as mulheres estão em
desvantagem em relação aos seus direitos na sociedade. No entanto, como a filosofia feminista é
variável e de grande alcance que se torna inviável falar sobre feminismo sem especificar as
particularidades de um determinado grupo de feministas ou estudiosos individuais. A este
respeito, Omofolabo Ajayi-Soyinka afirma que:
[...] Para além dos objetivos comuns fundamentais do feminismo para acabar
com a opressão, a impotência e a exploração patriarcal das mulheres, cada
feminista deve identificar, definir e adotar estratégias de resistência dentro de
seus limites culturais. (AJAYI-SOYINKA 2003: 168)
86
Mesmo que as especificidades do feminismo diferem de acordo com um determinado
contexto cultural, o princípio fundamental, para ajudar as mulheres a se libertar opressões com
base no gênero, é universal.
87
(HUDSON-WEEMS 2007, 293) para benefícios óbvios que incluíram a visibilidade,
possibilidades de emprego e de publicação.
No entanto, quando a XVª Emenda da Constituição dos Estados Unidos foi ratificada em
1870, concedendo aos homens africanos o direito ao voto e negando ainda esse privilégio para as
mulheres – a atitude destas mulheres brancas, em particular, mudou em relação aos negros. Ao
contrário das mulheres negras, que estavam exultantes com essa vitória para a raça negra, por
saberem que a possibilidade do voto podeia melhorar as condições da comunidade negra, as
mulheres brancas em geral ficaram desapontadas, e com razão, pois o fato de terem assumido
com benevolência a seguridade de cidadania plena para as pessoas africanas acabaria por
beneficiá-los. Assim, um movimento organizado entre as mulheres brancas da década de 1880
mudou o pêndulo de uma postura liberal para uma conservadora radical.
Carrie Chapman Catt, líder sufragista conservadora ferrenha e outras mulheres em seu
grupo social insistiram nos valores anglo-saxões e na supremacia branca. Quiseram unir-se com
homens brancos para fixar o voto para brancos puros, excluindo tanto imigrantes pretos quanto
88
imigrantes brancos. No livro de Peter Carrol e Noble Davi Livres, ‘The Free and the Unfreet’(Os
Livres e os Não libertos), Carrie Catt é citada:
Há apenas uma maneira de evitar o perigo. Cortar o voto das favelas e dar-lhe as
mulheres brancas. [Os homens brancos devem perceber] a utilidade do sufrágio
para a mulher como um contrapeso à votação estrangeira, e como um meio de
preservar legalmente a supremacia branca no sul do país. (Citado em The Free
and the Unfreet, p. 296).
Abraçando uma firme crença na inferioridade inerente aos negros, estas mulheres
acreditavam que estes não deviam ser autorizados ao direito do voto antes delas, como não
aconteceu até 1920, na XIXª Emenda. Embora seja compreensível que as mulheres brancas se
sentiram excluídas da agenda política do direito ao voto, sua hostilidade racista e atitudes racistas
para com os africanos foram injustificáveis e, portanto, não podem ser negligenciadas.
Claramente, sua lealdade mudou quando a questão do direito do homem negro ao voto
tornou-se central para o poder político global na comunidade negra. Anna Julia Cooper
reconhece em, ‘A Voice from the South’(Uma voz do Sul) que “a causa das mulheres é a causa
dos homens: (nós) emergimos ou afundamos juntos, diminuímos ou ascendemos, seremos
escravos ou livres. (Cooper, pg.61). Além disso, Mary Church Terrell, presidente da Associação
Nacional de Mulheres de Cor, afirmou que
não somos apenas mulheres de cor... deficientes por causa de nosso sexo, mas
somos perplexamente ridicularizadas por causa de nossa raça. Não só porque
somos mulheres, mas porque somos mulheres de cor. (FREEMAN 531).
89
No centro do Mulherismo Africano está a necessidade de auto-nomeação; Nommo.
Nommo destaca a necessidade de nomeação adequada de uma disciplina por mulheres de
ascendência africana e sua rejeição ao feminismo construído. Além de nomno, teóricas do
Mulherismo Africano insistem em uma agenda orientada aos africanos que "prioriza raça, classe
e gênero" (HUDSON – WEEMS 2007, p.302). O Mulherismo Africano é lucidamente
caracterizado como um princípio
Por causa do fator racial crítico para os negros, outra estudiosa, Audrey Thomas
McCluskey, conclui que "as mulheres negras devem adotar um termo culturalmente específico
para descrever a sua experiência racializada", na medida em que ela é astutamente ciente de que,
para as mulheres negras, estando dispostas ou não de perseguir esta questão ao ponto de nomear-
se de forma independente, “o debate sobre os nomes reflete questões mais profundas do direito à
90
auto-validação e das reivindicações de suas próprias tradições intelectuais" (McCLUSKEY,
1994, p.2). Daí, a necessidade crucial de auto-nomeação e auto-definição, um fenômeno
interligante, tornar-se crucial conforme devemos entender que quando você dá nome a uma coisa
particular, você dá simultaneamente significado. Nommo, então, um termo que o teórico cultural
africano, Molefi Asante, chama de "o poder gerador e produtivo da palavra falada" (ASANTE,
1997, p.17), significa a nomenclatura adequada de uma coisa que por sua vez revela a sua
essência. Ao particularizar o conceito,
Aptheker deixa claro que tratar de questões de raça para mulheres negras é um pré-
requisito para abordar as questões de gênero. O reconhecimento das diferenças na luta específica
das mulheres brancas contra a dominação masculina branca dentro e fora de seu domínio privado
e das mulheres negras em uma luta de libertação compartilhada com os seus pares do sexo
masculino torna-se crucial para a discussão. Linda LaRue, cinco anos antes de Bettina Aptheker,
compreendeu os vários graus de dominação branca masculina em relação aos homens negros e
mulheres brancas. LaRue diz:
91
os negros são oprimidos e isso significa excessivamente sobrecarregados, injusta,
severa, cruel e duramente agrilhoados pela autoridade branca. As mulheres
brancas, por outro lado, só são suprimidas, e isso significa que são verificadas,
contidas e excluídas da atividade consciente e evidente. Esta é uma diferença
(LaRue, 218).
A Mulherismo Africano deve sua origem a uma dinâmica diferente do que aquela que
gerou o Feminismo Ocidental. Tem sido amplamente moldada pela resistência das mulheres
africanas em face da hegemonia ocidental e seu legado na cultura africana. (Mikell 1997: 4) Ela
especifica mais as diferenças entre as mulheres ocidentais e africanas: as mulheres ocidentais
foram enfatizando a autonomia feminina indivídual, enquanto as mulheres africanas têm
enfatizado as formas culturalmente relacionadas de participação pública (ibid.). Portanto, mesmo
o termo feminismo parece inadequado para muitas teóricas femininas africanas; como eles
preferem usar o termo womanism (mulherismo).
Nem todas as mulheres africanas ativistas se opõem ao termo feminismo embora seus
esforços divirjam do feminismo ocidental. Pode-se dizer que o 'mulherismo' africano não é
totalmente diferente de 'feminismo' ocidental, especialmente à luz da vida moderna, onde a
mulher africana está relativamente enfrentando os mesmos desafios que a ocidental; violência
doméstica, direitos das mães solteiras cujos números estão crescendo diariamente e
92
discriminação no local de trabalho. Nós não só precisamos concentrar nossa atenção sobre a
mulher africana tradicional que é a guardiã real da sua cultura, mas que também sofreu imensa
transformação e está enfrentando os desafios da globalização e exigências da vida moderna
assim como a mulher ocidental. No entanto, tanto o feminismo ocidental e o mulherismo
africano são teorias que favorecem um grupo na sociedade, o das mulheres, e uma perspectiva
feminista reveste-se de um caráter essencialmente tendencioso.
Um dos principais pontos fortes da Teoria Mulherista Africana é a constatação de que "as
mulheres não são um bloco monolítico; eles são divididos por raça, classe, cultura e por
experiências de vida" (Ferris, 2006). As diferenças entre essas categorias são muito grandes e,
portanto, generalizar sobre elas pode ser difícil embora às vezes as conexões surjam nos
elementos mais inesperados como na "linguagem comum de opressão" (Tanya 2004, 3). Como
ponto de partida, mulheristas africanas isolam as mulheres africanas da categoria geral que inclui
as mulheres não-africanas.
A teoria não só isola mulheres africanas do resto da categoria mulher, também permite às
mulheres de ascendência africana uma oportunidade para conectar umas com as outras e unir
forças a partir de suas condições compartilhadas ao explorar os laços que as unem, levando à
solidariedade internacional. Este é o caso, porque a teoria refere-se às realidades das mulheres
africanas no continente, bem como na sua diáspora. O termo e a disciplina do mulherismo
africano
preenche uma lacuna criada pela desvinculação das mulheres africanas dos
movimentos promovem desigualdade e os mantêm definhando nos limites do
mundo branco (Ntiri-Quenum de 2007, 315).
93
feminino é o centro da vida, o ímã que mantém o centro do cosmos intacto" (Sofola citado em
Hudson-Weems, 2004, pg.66).
Talvez seja por isso que a maior parte dos trabalhos das escritoras negras opera dentro da
cultura ideologicamente dominante do feminismo convencional. O aspecto racial não é apenas
mínimo em seus escritos, mas nem sempre faz parte dos desafios diários para as mulheres
africanas contemporâneas do continente africano. Assim, configura-se como se essas escritoras
africanas no continente não estivessem operando dentro das paredes do mulherismo africano; isto
pode ser discernido dos vários trabalhos literários escritos por mulheres em alguns países da
África.
A maioria dos trabalhos existentes que podem ser classificados como literatura feminista
africana hoje são principalmente o resultado de pesquisas pioneiras sobre as condições das
mulheres africanas, tanto no passado quanto na contemporaneidade. Muitos estudiosos e
escritores que trabalham dentro das disciplinas sócio-históricas têm se engajado na crítica
feminista de um tipo rigoroso. Mas quando se trata da filosofia propriamente dita, parece que as
principais figuras na disciplina, têm quase, de forma conspiratória, evitado a discussão feminista.
O feminismo no Ocidente de hoje refere-se a uma ampla gama de abordagens e teorias, os quais
abordam diferentes aspectos da discriminação social contra as mulheres.
94
Já vimos o funcional, estrutural, marxista, socialista, psicanalítico, e, mais recentemente,
o feminismo pós-modernista. Estes movimentos sociopolíticos e teorias às vezes levantam e
discutem questões filosóficas. No entanto, seu objetivo comum é identificar políticas e
programas que serão úteis para promover a emancipação social, econômica e política das
mulheres. A Filosofia Feminista, no entanto, é um envolvimento na análise crítica direta e
análise de diferentes visões de mundo e posições filosóficas sobre a natureza da realidade, do
homem e da mulher, e como estas servem como justificativas para o tipo de relação que existe
entre os dois sexos. O principal objetivo é expor as diferentes teorias cientificamente falsas, e os
princípios racionalmente injustificáveis.
Seja como for, os problemas das mulheres Africanas além do racismo, incluindo
brutalidade física, assédio sexual, e subjugação do sexo feminino em geral, exercida tanto dentro
quanto fora da comunidade Africana, em última instância tem que ser resolvidos numa base
coletiva dentro de suas comunidades. Porque
95
alguma alienação do movimento de mulheres proviniente de um aspecto de classe média, que
percebe o feminismo como um ataque aos homens ao invés de um ataque a um sistema que
prospera na desigualdade (Steady, The Black Woman, 23-24)
Além disso, em seu artigo Women in Africa and the African Diaspora (Mulheres em
África e na Diáspora Africana), ela afirma ainda que:
Para a maioria das mulheres negras, a pobreza é um modo de vida. Para a maioria
das mulheres negras o racismo também tem sido o obstáculo mais importante na
aquisição das necessidades básicas para a sobrevivência. Através da manipulação
do racismo, as instituições da economia mundial têem produzido uma situação
que afeta negativamente os negros, especialmente as mulheres negras […] O que
temos, então, não é simplesmente uma questão de diferenças de sexo ou classe,
mas uma situação que, por causa do fator racial, foi moldada em escala nacional
e global (Steady, African Feminism 18-19).
Apesar da posição geral na academia, as mulheres africanas não veem os seus homólogos
masculinos como seu principal inimigo como o faz a feminista branca, que está travando uma
batalha milenar com o seu homólogo por subjugá-la como sua propriedade. De acordo com a
primeira mulher dramaturga da Nigéria, ‘Zulu Sofola:
96
O manifesto de Awa Thiam “La parole aux négresses” (1978) mostrou que o momento
havia chegado, para as mulheres, de sair do silêncio e de expor “seus males” através das
“palavras”. Awa Thiam reivindica com brio a liberação das mulheres, como atestam as
expressões que utiliza ao longo de sua obra: “agir”, “extinguir”, “tomar a palavra”, “encarar”,
“afirmar a recusa”, “revolta”, “não se sujeitar”, etc...
Pela palavra das mulheres, Awa Thiam questiona o patriarcado que avilta as mulheres e
lhes confere um papel secundário na sociedade:
É sabido que, nas sociedades patriarcais, as mulheres não tem opinião. Sob uma
poligamia institucionalizadas, quando não têm uma atividade remunerada,
dedicam-se, de acordo com tal ou tal etnia, à agricultura de arroz, algodão, milho,
amendoim e desempenham as tarefas domésticas. Os homens tem a supremacia
do poder, as grandes decisões lhes cabem, sem que as mulheres sejam a elas
associadas (Thiam, 1998: 21-22).
Não se pode perder de vista, porém, que o manifesto de Awa Thiam havia levantado uma
vaga de reprovação. Como todas as mulheres que tomam posição para denunciar a dominação
masculina, Awa Thiam era considerada como uma mulher “desenraizada”, guiada pelas idéias
vindas do Ocidente.
O elitismo, no cerne destes movimentos, não permitiu que se levassem em conta as outras
camadas da sociedade, o que os tornou mais frágeis. Apesar do excelente trabalho realizado por
estes movimentos, não houve, entretanto, uma renovação de seus membros para assegurar a
continuidade com as jovens gerações.
97
Uma vez atuando como chefe do departamento de filosofia da universidade de Lagos,
Nigéria, e Presidente da Associação Nigeriana Filosófica, ela recente se aposentou como
Professora de Filosofia na Universidade de Lagos. Para Oluwole, o pensamento filosófico
acontece em todas as partes do mundo, em toda África, mas em cada contexto tem suas
peculiaridades. A questão seria saber se há algum componente filosófico que esteja permeando e
abarcando todas as diferenças culturais, uma vez que não é possível continuar considerando os
sistemas ocidentais de argumento e racionalidade como aqueles que trazem as verdades
apodíticas. Ela é fundadora do Imódòye: Jornal de Filosofia Africana e editora da Coleção de
Filosofia Africana publicada pela Excel (Lagos). Ela tem publicado sobre tradições orais Yoruba
e filosofia, especialmente o corpus Ifá, e sobre perspectivas africanas relativas às mulheres e ao
desenvolvimento.
Os primeiros negros africanos que defendiam a cultura africana e visão de mundo contra
a intimidação ocidental foram Edward Wilmot Blyden (1832-1912) Aimé Césaire (1912-) e
Léopold Sédar Senghor (1906). (1998: 97). Eles foram, contudo, acusados por Wole Soyinka
pela formulação de uma visão de mundo africano simplesmente em oposição e, portanto, em
98
termos de uma visão ocidental do mundo (Soyinka). De acordo com Oluwele, o Padre Placide
Tempels, com seu livro Filosofia Bantu (1959) pode justificadamente ser considerado como:
Tempels tem sido respondido ou duramente criticado por, entre outros F. Crahay de
Kinshasha, P. Hountondji, Henry Oruka, Lucius Outlaw, a própria S. B. Oluwele e Zulu Sofala.
Sophie Oluwele sugere que os textos orais fornecem uma entrada importante para a consciência
africana.
Seu trabalho intitulado Witchcraft, Reincarnation and the God-Head; Issues in African
Philosophy (Feitiçaria, Reencarnação e a Cabeça-Divina; Questões da Filosofia Africana, Lagos,
1992), contém ensaios e palestras a partir de 1976 até a década de 1990. Ele é dividido em duas
seções: Problemas Eternos (1) e Questões Políticas (2).
99
liberdade política é exercida sob a égide da liberdade acadêmica, o engajamento das instituições
políticas se justifica, na opinião de Oluwole.
100
jogado a África em um monólogo patriarcal em que o componente matricentrista da humanidade
africana tem notoriamente desaparecido. Infelizmente, muitos estudiosos africanos do feminismo
encontraram-se enredados nesse dilema intelectual como seus mentores europeus. Uma via de
ascenção de gênero foi mesmo construído no discurso pós-colonial de "forma cuidadosamente
hierárquica" de tal forma que "o outro racial, figurou como a fêmea ou afeminado", sempre foi
falocolonizado. Aqui cabe uma reflexão sobre o personagem Manecas, um menino-feminino.
Esta orientação de reflexão do gênero e diferenciação sexual tem sua conceituação arquetípica na
genuína fonte da própria ortodoxia feminista, o Ocidente, onde "as mulheres foram colocadas em
um papel subordinado em textos judiciários, culturais e históricos" (Quayson, 2000: 109). A
óbvia definição errônea por gêneros na África pela erudição ocidental, e seus asseclas africanos,
não é alheia à subordinação do intelecto cultural do continente em relação à máquina de guerra
das realizações dos estudos acadêmicos euro-americanos. A visão da diferença está atrelada com
a intenção de polarizar.
101
fêmea cultural e material ocidental. Ao criticar o estudo feminista de Julia Kristeva de mulheres
chinesas pela sua fundação histórica superficial e generalização especulativa, Gayatri Spivak
(1981) expressa desgosto com a forma como o discurso feminista ocidental opera através de um
prisma estreito e superficialmente marca o universal através do específico.
Nzegwu (2004) adverte, assim, contra as "más interpretações do ethos cultural das
sociedades africanas", especialmente por feministas africanos para quem,
102
Até mesmo na própria cosmologia Bantu, o coração feminino e o corpo, assim como o
masculino, é equilibrado por ser um depósito de províncias criativo-destrutivas da natureza - um
paradigma cujo misticismo influenciou muito o matricentrismo e o patricentrismo na produção
literária de Boaventura Cardoso. O ativismo de gênero de Boaventura Cardoso, então, depende
da norma correspondente que postula uma respiração no cruzamento entre o macho-fêmea e em
seções e resoluções de conflitos de natureza bem-mal da humanidade.
Estudiosos africanos, então, tem o mandato para serem cautelosos com a bolsa de estudos
da moda e seus enquadramentos, por vezes estereotipados. Ser verdadeiro à realidade metafísica
do continente é recomendado como o antídoto mais potente para o furioso dilema intelectual
afro-modernista e seu enlaçamento com a via da legislação feminista ortodoxa. Um profundo
conhecimento de filosofia operativa de um escritor é imperativo para críticos que escolherem o
caminho feminista, para fazer declarações e contribuições críticas profundas e bem afiadas para
as realizações dos estudos acadêmicos literários e teatrais africanos. A crítica afro-feminista deve
levar em conhecer a metafísica de gênero, em vez de políticas de gênero. Na verdade, isso é o
que a criatividade de Soyinka e alguns outros escritores neo-primitivistas africanos exploram.
Soyinka é um místico de gênero. É nessa categoria que pretendemos enquadrar a partir desta
investigação o próprio Boaventura Cardoso com Mãe, Materno Mar.
103
dentro do qual as mulheres código integralmente funcionam como parceiros iguais e capazes no
projeto social de desenvolvimento. Este é um fato histórico incontestável.
O Clássico de Clarissa Pinkola Estes Mulheres que correm com os lobos: Mitos e
Histórias da Arquétipo da Mulher Selvagem (1992), visa restaurar a vitalidade de sinalização das
mulheres através de extensas "escavações arqueológicas psíquicos nas ruínas do submundo do
sexo feminino". O que Estes faz referência como o companheiro de Eu-Infantil/Eu-Alma
associado à feminilidade nunca é uma força em falta na originária sistematização matriarcal ou
patriarcal de gênero sócio-espiritual africano. Para "Womanity" (Mulheridade, em oposição à
Humanidade) ser resgatada da tendência ao esquecimento do que ela é e do que são suas
responsabilidades, que ela deve ser constantemente interrogada.
104
preservam a memória, elas igualmente validam as verdades sobre os mitos, lendas e outros fatos
remotos. Eles validam a verdade sobre nós: a verdade sobre a única humanidade da mulher e do
homem. A literatura é indubitavelmente uma das vias imprescindíveis para uma aproximação
deles à realidade social, política e cultural do continente africano.
As informações e análises produzidas sobre as sociedades matrilineares até aos anos 70-
80 do século XX revelam alguma ignorância, uma visão distorcida e preconceitos, tanto da parte
de investigadores homens como mulheres, devido ao modelo de sociedade dominante de que se
parte e à dificuldade de entender e aceitar sociedades com características diferentes. Nestas
análises, a matrilinearidade é muitas das vezes entendida como a contraparte da patrilinearidade,
ou como uma forma primordial de organização social desaparecida no contexto de relações de
produção capitalistas e patriarcais, de acordo com uma visão evolucionista.
As análises feministas sobre a história das mulheres em várias partes do mundo, a maior
visibilidade e reconhecimento das feministas do chamado Terceiro Mundo no estudo das suas
sociedades, no passado e no presente, e o acumulo de informações acerca de sociedades na
Europa, no período do Paleolítico, entre 6500-3500 AC, permitiram que o campo de estudos
sobre as sociedades matricêntricas voltasse a estar no centro das atenções.
105
apenas alguns exemplos, dá conta da sua existência, num contexto de relações capitalistas de
produção, que provocaram mudanças e processos de negociação e de acomodação com outras
formas de organização da sociedade, mas também da sua resistência contra a perda da terra e de
outros recursos importantes, contra as mudanças no estatuto das mulheres.
Alguns autores adiantam como uma das possíveis razões para a sua resistência o fato de a
matrilinearidade minimizar o controle masculino individual do poder e dos recursos e implicar a
percepção de abundância e de acesso irrestrito aos recursos, enquanto a patrilinearidade está
associada à percepção de escassez econômica e acesso restrito aos recursos, em contextos de
instabilidade provocada pelas mudanças na divisão de trabalho, pela perda gradual dos recursos,
especialmente a terra, pelas transformações na constituição das famílias e nas relações de poder
entre os seus membros, mulheres e homens, jovens e idosos, com ou sem posições de poder.
O ressurgir dos estudos sobre as sociedades matrilineares tem revelado que as formas
matrilineares de organização e ideologia dão maior espaço social e político às mulheres, o que
contradiz a ideia prevalecente de que a matrilinearidade não assegura maior autoridade para as
mulheres, mas que esta apenas circula através do irmão da mãe e não através do pai (Bonate
2003a, 2003b, 2005, 2006). Os investigadores fazem igualmente referência ao maior grau de
independência, autonomia, autoridade formal nas políticas locais e nos rituais, no controle de
rendimento, nas decisões respeitantes à educação dos filhos e relações familiares, vividos pelas
mulheres nos grupos matrilineares (Amadiume 1987, 1997, 2005, Arnfred 1999, Peters 1997a,
1997b).
106
As sociedades matrilineares ainda existentes não são transitórias, foram capazes de se
adaptar a sistemas competitivos e não se desenvolveram do mesmo modo, em direção ao
patriarcado, sendo reveladoras de variadas dinâmicas entre diferentes forças na sociedade. A
variedade de sociedades humanas é infinita e tem até agora sido difícil compreender a sua
diversidade ‘[...] a partir de quadros teóricos e analíticos que foram construídos pelas ciências
sociais hegemônicas noutros espaços geopolíticos [...]’ (Santos 2004).
107
o passado historicamente não significa reconhecê-lo “como verdadeiramente foi”. Significa
apoderarmo-nos de uma memória tal como ela relampeja num momento de perigo’.
108
social, política e ambiental, para mulheres e homens (Meena 1992b, Elson 1997, Casas et all
1998).
No seu livro Male Daughters, Female Husbands (Filhas masculinas, maridos femininos),
de 1987, Ifi Amadiume pôs em causa grande parte dos discursos de gênero das décadas
precedentes, precisamente porque colocou as dinâmicas societais dos Nnobi (da Nigéria
Oriental), que forneceram os dados de campo, nos seus próprios termos, sem embarcar em
inquietações injustificadas acerca do que teriam a dizer ou a pensar sobre este fato, os autores
das narrativas universais de gênero.
18
No culture has just one system of norms at any time.
109
Na obra Mãe, Materno Mar o personagem Manecas é diversas vezes referido como
“menino-feminino”, podemos fazer uma analogia inversa em relação ao papel que um ser
andrógino, mesmo que apenas em sua essência, pode representar dentro de uma comunidade
política e culturalmente. Ele representa o ‘filho-feminino’. Uma graduação entre o ‘menino-
masculino’ e a ‘menina-feminina’. Certamente ‘menino-feminino’ simboliza uma identidade que
não é nem uma nem outra das referidas anteriormente.
Este ‘raciocínio baseado no corpo’, argumenta ela, foi imposto à leitura das sociedades
africanas e dos dados etnográficos, mesmo que nessas sociedades a interação entre o biológico e
o social apontasse numa direção diferente. Colocado de forma mais simples,
antes da colonização pelo Ocidente, o conceito gênero não fazia parte dos
princípios organizativos da sociedade Yorùbá... Pelo contrário, o princípio
fundamental da organização social era a senioridade definida pela idade relativa
(Oyewumi 1997:31).
110
A linguagem Yorùbá não é genderizada, e categorias como ‘masculino’ e ‘feminino’ são
de difícil tradução linguística uma vez que há muito pouco sobre a associação de tais categorias
socialmente construídas com a masculinidade ou feminilidade anatômicas (1997:33). ‘Okùnrin’ e
‘Obinrin’ (a tradução das noções de masculino e feminino, respectivamente) ‘não se referem a
categorias de gênero conotadas com privilégios ou desvantagens sociais... [:] não expressam
dimorfismo sexual’ (1997:34-5). ‘Um superior é um superior independentemente da forma do
corpo’ (1997:38).
Assim, nada é rigidamente fixado ou dicotomizado pelo corpo (1997:43). Tal como nos
dados de Amadiume, Oyewumi encontrou também uma matrifocalidade marcante e uma situação
de estatuto de senioridade baseado em relações consanguíneas, por oposição a diferenciações
biológicas. O princípio da maternidade informa o quadro ideológico da ordem e relações sociais
a ponto de serem atribuídos poderes sagrados e míticos à condição da mulher enquanto grávida
ou educadora dos filhos (Oyewumi 1997:38). A rede de parentesco baseia-se em princípios
idênticos aos dos que compartilham o mesmo ventre; o parentesco uterino definido à volta da
maternidade. Mesmo sendo patrilineares na maioria dos caos, os Oyo Yòrúba, tal como a
generalidade das sociedades Yòrúbas, são melhor compreendidos numa espécie de linhagem
dupla.
111
exemplos de segunda instância, particularmente porque se relacionam com ‘as instituições de
parentesco, ideologias de parentesco e o Estado’ (2005:83).
112
Ao contrário de Wendy James (1998), Amadiume argumenta que é preciso dar um passo
em frente e estabelecer uma ligação com o matriarcado mesmo em contextos patrilineares e
patriarcais. É comum perder-se tal ligação. Para perceber o matriarcado e a matrilinhagem, assim
como a recusa fácil da “ligação entre gênero e um tipo particular de descendência, especificamente as
possibilidades de autoridade e poder das mulheres na matrilinhagem” (Amadiume 2005:90).
113
James sobre a maioria das sociedades africanas, quer sejam patrilineares ou
matrilineares, ‘existe um nível mais profundo e historicamente duradouro em que
a natureza e capacidade das mulheres têm a primazia na definição da condição
humana, ela própria.
Muito foi já escrito para denunciar os estudos centrados na origem. Todavia, para os
povos colonizados, a profundidade e continuidade histórica das quais depende o estatuto não
colonial constitui um imperativo fortemente demonstrado por Diop.
O valor das ideias seminais dos estudos de gênero na África representados pelos
trabalhos de Amadiume, Oewumi e outros autores não se limita apenas à ruptura epistêmica no
que se refere ao como nós compreendemos as relações de gênero, para além do determinismo
biológico ou bio-lógico. Por si, isto já constituiria um notável contributo para os estudos
sociológicos universais. Mas a matrifocalidade, nos estudos de gênero na África, tem um valor
114
heurístico que vai para além da forma como teorizamos gênero. Ela oferece um quadro analítico
que dá sentido a uma gama de outros fenômenos sociais: repensar o quadro de parentesco, como
teorizar a ‘identidade’, etc...
Grande parte dos discursos dos últimos vinte anos, centrados na identidade, procuraram
destacar questões de etnicidade, raça, religião, etc., do conceito de classe. Quando se fala em
políticas de identidade, por exemplo, refere-se geralmente a formas de construção do Eu
(individual ou coletivo) distintas da classe, e às suas implicações para o ativismo social.
Mas, para Buber, somente quando o indivíduo conhece o outro em toda a sua alteridade
como a si próprio, como homem ou como mulher, experiência a partir da qual irrompe na direção
do outro, conseguirá romper sua solidão, em um encontro estrito e transformador. Ele insiste que
o fato fundamental da existência humana não é nem o indivíduo, como tal, nem agregado como
tal. Cada uma dessas categorias, considerada em si, não passa de uma abstração.
115
Para exprimir a realidade, que liga o homem à mulher, Buber criou o termo especial
inter-humano ou entre os homens (zwischenmenschlich). No interhumano um sujeito se defronta
efetivamente com o outro, e nesse confronto, que não é simples experiência psicológica, há uma
realidade em que os dois sujeitos convivem. Como enfatizamos, a principal característica dessa
esfera é a espontaneidade, em que toda aparência, toda “dissimulação” seria fatal. O inter-
humano é oriundo de um referencial intersubjetivo de pensamento. No inter-humano a verdade
assume uma dimensão quase corpórea, pois, o homem se comunica com a mulher (o outro)
naquilo que eles são. Somente assim a intercomunicação existencial se torna possível, isto é, o
diálogo autêntico, em que o outro se afirma como aquilo que realmente é e se confirma em sua
natureza de criatura.
O homem como ser-ao-mundo não é um ser-em-si, mas essencialmente uma abertura. Ele
é abertura graças à palavra originária. O homem instaura o emergir dinâmico de sua existência
pela palavra. Como manifestação do si mesmo, o logos torna-se uma abertura ao outro, dia-
logos. E somente quem toma a decisão de proferir a palavra da relação, a palavra-princípio Eu-
Tu, poderá fundar o “nós essencial”, do autêntico interhumano. Aproximação, contatos,
experiências e reações comuns definem o social, este implica um estar-um-ao-lado-do-outro,
enquanto que proximidade, relação dialógica, responsabilidade, decisão, liberdade, presença no
face a face definem o interhumano que é o estar-junto-com-o-outro.
Muitas das lógicas subjacentes aos discursos identitários, especialmente quando tratam de
raça e gênero, derivam de uma lógica patrifocal e patriarcal. É dentro desta lógica de
116
descendência patrifocal e patrilinear que a obsessão com a certeza da ligação biológico-genética
do filho em relação ao pai se transforma na base para a construção das fronteiras de inclusão e
exclusão. No quadro destas demarcações raciais, a pigmentação e os atributos fisiológicos
tornam-se os sinais de tal certeza genética, e o fundamento de ideologias e práticas sociais
racistas.
117
Finalmente, as ativistas africanas a favor da igualdade de gênero não necessitam de
recorrer a discursos feministas ocidentais para a organização normativa e fontes de códigos desta
luta social singularmente importante. Os trabalhos de Amadiume e Oyewumi fornecem a base
para a apropriação de um ‘passado útil’ em termos de diversidade de histórias africanas pré-
coloniais, para a igualdade de gênero no contexto africano contemporâneo. Fica uma última
palavra, dita por Amadiume (1997:23):
118
A filosofia africana tem os mesmo estatutos epistemológicos que os da filosofia helênica,
já referiu-se Ferreira na sua análise sobre o pensamento do africano. A filosofia africana deve ser
vista como as outras filosofias, isto é, as filosofias ocidentais.
Realizar uma experiência que cria e recria identidades, conceitos e ideologias, uma
valorização da cultura e não a sua exotização, re-conhecimento do seu valor e da sua
grandiosidade. Então;
119