TeoriadaLiteraturaI Aula 03
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A compreensão do texto literário é produto de uma interação entre o leitor e a obra, que leva em
consideração todo um acúmulo de experiências passadas tanto do leitor atual quanto de várias outras
leituras que a obra sofreu. A ideia de compreensão está muito ligada à de apreciação. Vimos que a
compreensão do texto literário não está necessariamente ligada ao querer-dizer do autor; por outro
lado, como o discurso da literatura é rico em conotações, haverá, por conseguinte, várias formas de
compreendê-lo, ou de apreciá-lo. Segundo T. S. Eliot [1].
Para o poeta Eliot, compreensão e amor são atitudes próximas quando se trata de literatura.
Embora o texto em si seja a fonte privilegiada para a compreensão de uma obra, outros fatores
interferem na leitura. Entre eles, alinham-se as circunstâncias da produção da obra, que podem ser
importantes para sua compreensão; e as circunstâncias de sua recepção (época, lugar, sociedade etc.),
que também podem determinar em grande parte sua compreensão e, consequentemente, a paixão que o
texto suscita.
É preciso, portanto, levar em conta que compreensão diferente não significa traição ao texto. Não
existe, assim, o verdadeiro sentido de um texto; sua recepção certamente será influenciada pelo efeito de
acumulação histórica e pelas idiossincrasias do leitor.
FÓRUM
Vamos estender nossa discussão sobre a constituição do texto literário fazendo uma leitura do
conto “Cães, marinheiros”, do escritor português Herbert Helder. O texto foi publicado no livro Os
passos em volta, que tem edição brasileira (v. bibliografia), mas pode também ser encontrado, em sua
íntegra, no seguinte endereço eletrônico:
http://cercarte.blogspot.com.br/2008/10/ces-marinheiros-de-herberto-helder-os.html [2]
O texto pode ser lido, numa abordagem social, como uma alegoria da opressão, da falta de
liberdade, ou pode ser lido enxergando os eventos narrados como uma reflexão sobre a escrita.
Exercite sua percepção do texto literário, discutindo com os colegas as possibilidades de
interpretação desse texto. Envie seus comentários sobre a narrativa dos cães e seu marinheiro para o
Fórum e depois confira nossos comentários.
Teoria da Literatura I
Aula 03: Literatura - O que Diz, o que se Compreende, o que se Aprecia
Fonte [3]
A Poética [4], de Aristóteles, escrita no século IV a.C., é o primeiro texto conhecido de teoria da
literatura. Seu autor acreditava que as relações da literatura com a realidade se processavam pela
mimese [do gr. mimèsis, 'imitação'], termo mais geral que concebe essas relações. Segundo o
pensador grego, a literatura devia imitar o mundo real, representando os homens e suas ações como
seres melhores, piores ou iguais aos humanos reais, dependendo da intenção do texto.
A teoria da literatura utiliza uma série de termos ligados à relação entre o discurso literário e o
mundo. O mito da referência, da mimese, entretanto, ao ser problematizado, principalmente pelas
teorias que defendem a absolutização do discurso literário, perde-se na cadeia sem origem nem fim
das representações.
TERMOS
Considerando a recepção da obra, a literatura vem a ser aquilo que acontece quando o leitor lê, isto é,
os recebedores é que determinam a recepção final do texto. Assim, pode-se considerar que os leitores
recriam os textos que lêem. Os textos terminam por ser a leitura que os leitores fazem deles. A
experiência da leitura é dual, ambígua, dividida, entre compreensão e amor, entre liberdade e imposição,
entre a atenção ao outro e a preocupação consigo mesmo. Normalmente, o conjunto de recepções das
obras literárias formam as chamadas comunidades interpretativas, que congregam experiências
compartilhadas, tanto literárias como extra-literárias (convenções, um código, uma ideologia etc.). No
dizer de Antoine Compagnon,
CHAT
Após a leitura do texto da aula, do romance Iracema e revendo as aulas anteriores, reflita e
discuta com seus colegas e com o tutor de sua turma, em Chat a ser marcado por ele, as seguintes
questões, que vão servir de base para seus comentários e suas perguntas, bem como de seus
colegas, durante a conversa:
2. Além do texto em si, que outras circunstâncias podem influenciar na compreensão de um texto
literário?
O discurso literário é marcado por seu estilo. Mas o que é o estilo? Essa palavra assume diversas
conotações no decorrer da história da literatura: pode ser a individualidade de um artista, a singularidade
de uma obra, uma escola literária, um gênero.
Desde Aristóteles (384 a 322 a.C.), a noção de estilo assume vários aspectos, conforme as crenças de
uma época em determinada sociedade:
2 - O estilo é um ornamento
Variação contra um fundo comum, efeito ou “toque especial” conferido a uma
determinada obra por um certo autor (a suspeita que plana sobre o estilo: bajulação,
hipocrisia, mentira, imperfeição moral).
3 - O estilo é um desvio
Em relação ao uso corrente da língua (“há várias maneiras de dizer a mesma
coisa”). Essa concepção de estilo é que torna inconfundível, por exemplo, a escrita de
Machado de Assis ou de Guimarães Rosa, a escrita que carrega a marca do gênio.
O estilo, pois, está longe de ser um conceito puro; é uma noção complexa, rica, ambígua,
múltipla. Em vez de ser despojada de suas acepções anteriores à medida que adquiria outras, a
palavra acumulou-as e hoje pode comportá-las todas: norma, ornamento, desvio, tipo, sintoma,
cultura, é tudo isso que queremos dizer, separadamente ou simultaneamente, quando falamos
de um estilo. (COMPAGNON, 1999, p. 173)
Dizer de forma diferente uma coisa é dizer a mesma coisa? O estilo implica uma escolha entre
diferentes maneiras de dizer a mesma coisa (tornando-as diferentes). A sinonímia, por exemplo, que é um
rico recurso das línguas que admite várias maneiras diferentes de se dizer coisas semelhantes, pressupõe
a referência (uma coisa a ser dita), e a intenção (uma escolha entre diferentes maneiras de dizer). Uma
revisão do conceito de sinonímia pode salvar o estilo:
Excetuando-se sua concepção como norma, prescrição ou cânone, o estilo continua vivo em três
aspectos principais:
A discussão acerca do estilo nos leva a uma outra questão: as avaliações literárias podem ter um
fundamento objetivo ou mesmo sensato? Em toda a trajetória da arte e da literatura na chamada
civilização ocidental, deparamo-nos com conceitos ligados ao valor, tais como: cânone, tradição,
clássicos, grandes escritores, panteão, obra-prima, autoridade, originalidade, revisão, reabilitação.
O cânone, por exemplo, é o patrimônio de uma literatura, que a memória coletiva consolidou como
uma classificação relativamente estável.
O valor literário, entretanto, é relativo, instável: as obras entram e saem do cânone ao sabor das
variações do gosto, cujo movimento não se faz racionalmente. Conclui-se, portanto, que não há padrões
definidos de excelência para uma obra literária.
LEITURA COMPLEMENTAR
O texto, de Antoine Compagnon, coloca em evidência a questão do valor relacionado à literatura.
Clique aqui. (Visite a aula online para realizar download deste arquivo.)
REFERÊNCIAS
COMPAGNON, Antoine. O demônio da teoria. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1999.
1 - http://pt.wikipedia.org/wiki/T._S._Eliot
2 - http://cercarte.blogspot.com.br/2008/10/ces-marinheiros-de-herberto-helder-os.html
3 - http://images.livrariasaraiva.com.br/imagemnet/imagem.aspx/?pro_id=3672824&qld=90&l=430&a=-1
4 - http://pt.wikipedia.org/wiki/Po%C3%A9tica_(Arist%C3%B3teles)