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Castelo Do Ego

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O Castelo do Ego - Chögyam Trungpa Rinpoche

Recontado por Jack Niland a John Rockwell, em Novembro de 2007

Jack Niland conheceu Trungpa Rinpoche no verão de 1970 no Tail of the Tiger* em Barnet, Vermont. Mais tarde
nesse mesmo ano, Rinpoche havia lido o livro O PEQUENO PRÍNCIPE, de Antoine St. Exupéry. Logo antes do
Natal, Rinpoche reuniu um grupo na sala-de-estar do Tail of the Tiger por volta das quatro horas da tarde, e contou
uma história que, disse ele, continha todo o vajrayana.

* Originalmente conhecido como "Cauda do Tigre", Karmê Chöling é um centro e comunidade de retiros de
meditação budista de Shambhala em Barnet, Vermont, EUA. (wikipedia)

Era uma vez um pequeno menino que era uma criança arco-íris. Ele vivia em um vasto deserto e
não sabia de onde veio, nem qual era o seu nome. Ele estava completamente só e nunca havia
encontrado mais ninguém. Ele era totalmente feliz e amava o nascer do sol, o pôr do sol, a lua e as
estrelas.
Um dia, ele estava cavando casualmente na areia e encontrou uma pedra sólida, com um formato
de tijolo. Ele a recolheu, colocou sobre a areia e então cavou mais um pouco. Ele continuou a
encontrar mais e mais tijolos, então começou a empilhá-los. Ele construiu um castelo gigantesco,
pelo qual ficou completamente fascinado. Ele se sentou, olhando para seu castelo até que o sol se
pusesse e a lua se elevasse no céu. Porém, enquanto passava sobre o gigantesco castelo, a lua ficou
presa e o tempo repentinamente parou.

O pequeno menino se desesperou e pensou que nunca mais veria o sol nascer novamente. Ele
percebeu que teria que entrar no castelo para libertar a lua. Ele caminhou até o portão da frente,
voltado para o Leste. Diante dele havia dois guardas de aparência feroz, carregando grandes
sabres. O pequeno menino dirigiu-se a eles: “Tenho que chegar ao topo do castelo para libertar a
lua.” Os guardas ficaram furiosos e disseram “Não! Isso simplesmente não é permitido.” Então o
pequeno menino simplesmente sentou-se, pacificamente, e observou por um longo tempo.
Finalmente, alguém tocou um apito e os guardas foram embora, marchando. No pequeno intervalo,
antes que os próximos guardas chegassem ao portão, o pequeno menino esgueirou-se para dentro
do portão do Leste. Ele havia encontrado um pequeno intervalo na raiva!

Então, o pequeno menino dirigiu-se ao portão do Sul. Lá havia um grande e assustador general,
com botas de arco-íris e uma aparência autoritária. Ele gritava ordens em todas as direções. O
pequeno menino disse: “Tenho que chegar ao topo do castelo para libertar a lua.” O general
vociferou: “Não! Você deve obedecer minhas ordens”, e seguiu gritando ordens continuamente:
“Atenção! Marche! Alto!” O pequeno menino ouviu por algum tempo, e então olhou o general
diretamente nos olhos e disse: “NÃO!” O general, surpreso, ficou paralisado. Ninguém nunca
havia dito não a ele. Sua bravata desintegrou-se e ele fugiu, humilhado. O pequeno menino entrou
pelo portão do Sul.

Em seguida, o pequeno menino chegou ao portão do Oeste. Havia um belo príncipe e uma bela
princesa sentados juntos, admirando um ao outro. As paredes eram vermelhas, adornadas com
flores e espelhos, e lustres pendiam do teto. O pequeno menino disse: “Tenho que chegar ao topo
do castelo para libertar a lua.” O casal da realeza respondeu: “Não, não, não. Você não pode nos
deixar. É tão bonito aqui. Nós vamos a uma festa e não sabemos o que vestir.” Eles prosseguiram,
muito solenemente, perguntando sobre suas roupas, adornos, maquiagem e tudo mais. O pequeno
menino pensou: “Eles são tão sérios. Uma festa deveria ser divertida. Eu me pergunto se alguma
vez eles já deram risada ou ouviram uma boa piada.” [Ele então perguntou a eles: “Por que o leão
não come o palhaço?”]* O casal parou e refletiu sobre a questão por um longo minuto, sem se
mover. O pequeno menino respondeu, [“Porque os palhaços têm um gosto engraçado.”] Parecendo
confusos, eles olharam um para o outro, e então caíram na gargalhada. De fato, eles nunca tinham
ouvido uma piada. Enquanto rolavam de tanto rir, o pequeno menino passou discretamente por eles
e entrou pelo portão do Oeste.

Logo o pequeno menino chegou ao portão do Norte. Havia um grande armazém, repleto de bens de
todos os tipos. Ministros vestidos com longos mantos e chapéus pontudos corriam de um lado para
o outro com livros de contabilidade e canetas, tomando nota de tudo. Eles gritavam, um para o
outro, “Você contabilizou isso?” e “Você contabilizou aquilo?” O pequeno menino disse : “Eu
tenho que chegar ao topo do castelo para libertar a lua.” Os ministros retrucaram, “Não nos
perturbe. Estamos ocupados demais. Temos que contabilizar tudo e apresentar nossos resultados
ao Rei.” O pequeno menino viu como eles estavam acelerados, e disse: “Você contabilizou isso?
Será que você não deixou aquilo passar na sua contagem? E isso? E aquilo?” Muito irritados, os
ministros entraram num turbilhão de atividade ainda mais frenética. Distraídos, eles não
perceberam o pequeno corpo esgueirando-se pelo portão do Norte.

Agora, o pequeno menino chegou à sala do trono, no centro do castelo. Sentado no trono estava um
majestoso rei, que o cumprimentou: “Bem-vindo, meu súdito. É muito bom que você tenha vindo
me visitar. Como um um súdito leal, você deve curvar-se diante de mim, e permanecer aqui para
me servir.” Agindo como se estivesse prestes a curvar-se, o pequeno menino olhou cuidadosamente
para toda a sala, e viu que havia alguém atrás do trono. O pequeno menino parou e disse ao rei:
“Não, é você quem deve se curvar — ao conselheiro espiritual que está atrás de você.”
Envergonhado, o rei admitiu, “Sim, você está certo. Eu devo me curvar a ele.” Enquanto o rei se
curvava diante de seu conselheiro espiritual, que era o verdadeiro poder por trás do trono, o
pequeno menino correu, contornando o trono, e ficou frente a frente com o conselheiro espiritual.

O conselheiro espiritual era alto e imponente, e proclamou: “Eu estou no comando de tudo, e faço
tudo acontecer.”

O pequeno menino disse. “Eu tenho que chegar ao topo do castelo para libertar a lua.”

“Não. Como eu disse, sou eu que faço tudo aqui.”, respondeu o conselheiro espiritual.

O pequeno menino exclamou: “Eu sei de uma coisa que você não é capaz de fazer.”

“Vá em frente e me diga. Não há nada que eu não possa fazer.”, vangloriou-se o conselheiro
espiritual.

“Primeiro, nós temos que ir até o topo do castelo”, disse o pequeno menino. Eles subiram até o
topo da torre em silêncio.

Uma vez que chegaram ao terraço no topo do castelo, o conselheiro espiritual demandou: “Muito
bem, qual é o meu desafio?”
“Primeiro fique em pé sobre o muro”, disse o pequeno menino, gentilmente. Ele observou enquanto
o conselheiro espiritual escalou o muro e ficou em pé, com grande confiança, sobre a beirada.
Então o pequeno menino gritou, repentinamente: “Eu aposto que você não consegue saltar!” Sem
pensar por nem um instante sequer, o conselheiro espiritual saltou no espaço e caiu,
desaparecendo de vista.

Instantaneamente, o castelo desapareceu, a lua foi liberta, e o pequeno menino caiu sobre a terra.
Ele sentou-se no chão como se nada tivesse acontecido. Ao final da noite, ele assistiu, com grande
deleite, o sol levantar-se no Leste.

Traduzido por Pedro Lemme e revisado por Henrique Lemes em outubro de 2021. Texto original:
https://www.chronicleproject.com/castle-of-ego/

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