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Direito Processual Civil - T

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FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DO PORTO

DIREITO
PROCESSUAL
CIVIL
- TEÓRICAS

1º SEMESTRE

1º SEMESTRE
Professor Doutor Fernando Pereira (fpereira direito.up.pt)

RITA NUNES
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEÓRICAS

CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO

1. Caracterização do direito processual civil

Artigo 1.º CPC


(Proibição da autodefesa)
A ninguém é licito o recurso à força a fim de realizar ou assegurar o próprio direito, salvo nos casos
e dentro dos limites declarados na lei.

Anteriormente já estudamos 3 figuras que constituem exceção a esta proibição:


• Legítima defesa (artigos 337.º e 338.º CC);
• Ação direta (artigo 336.º CC);
• Estado de necessidade (artigo 339.º CC).

No artigo 1.º do CPC encontra-se consagrada a regra que, pela proibição que consagra, impõe também
como contrapartida o oferecimento de um sistema processual.
Resulta daqui um constrangimento: os membros da comunidade jurídica, fora alguns casos excecionais,
não podem usar da força para a garantia das suas posições jurídicas.

NOTA:
• Por autotutela entende-se a proteção de um direito diretamente realizada pelo respetivo titular
(autos, em grego, significa o próprio).
• Por heterotutela entende-se a proteção de um direito realizada com o auxílio ou com o amparo
de um terceiro (heteros significa, em grego, diferente).
Só em casos excecionais se admite o recurso a mecanismos de autotutela, e, mesmo nesses casos, apenas
em circunstâncias bem delimitadas (ex: ação direta (artigo 336.º CC), legítima defesa (artigos 337º e
338º CC) e estado de necessidade (artigo 339º CC).

Só a falta de alternativa pública de mecanismos de realização do Direito é que consente o
recurso a instrumentos de autotutela.
Mediante tal disposição, a comunidade jurídica chama a si o monopólio do uso da força, ainda que para
o exercício do Direito. Com efeito, se a ninguém é lícito o recurso à força para resolver conflitos (ex:
não cumprimento de obrigações, conflitos, etc.), então revela-se necessário oferecer uma alternativa,
um caminho, que faculte aos membros da comunidade resolverem os respetivos conflitos. E esse
caminho é o PROCESSO. O processo que permite resolver conflitos sem ser pelo uso da força.
Mas além desta, uma outra se encontra: mesmo que alguém tenha o privilégio de proteger, pela força,
o próprio Direito (ex: uma pessoa está legitimada a agir em legítima defesa, pelo que a lei material
permite o uso da força), não tem o privilégio de declarar o próprio Direito – essa possibilidade
continua estritamente reservada ao Estado.
Ainda que alguém aja em legítima defesa, ainda que concretamente estejam verificados todos os
requisitos, em momento posterior a sua conduta pode ser sindicada pelo sistema de justiça para
efetivamente apurar se tais pressupostos estavam verificados.
(ex: imagine-se que o réu diz que agiu em legítima defesa e, portanto, o seu facto positivo não
corresponde a um facto ilícito – no entanto, não é o réu que o declara, é o tribunal que vai declarar se
estavam ou não preenchidos os requisitos. O réu alega, mas não declara, porque a outra parte (autor)
tem uma versão distinta da história)

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEÓRICAS

Cabe assim distinguir entre monopólio do uso da força e monopólio de jurisdição (jurisdição significa
poder de dizer o Direito). A comunidade jurídica chama a si, não só o monopólio do uso da força,
como também o monopólio do poder de dizer o Direito. Num e noutro caso há exceções, mas é esta
a posição de princípio.
Deste modo, cada um dos membros da comunidade jurídica está sujeito a ser destinatário de uma ação
judicial (ex: ser réu não é uma escolha – o autor é que decide intentar a ação, mesmo que esta seja
infundada).

Podemos assim entender o PROCESSO como o modo mediante o qual a comunidade se predispõe
a declarar e executar o Direito.
Esta definição faz alusão à ação declarativa e à ação executiva – artigo 10.º CPC.

Exemplo a propósito do artigo 10.º CPC:


A e B celebram um contrato de compra e venda e A (comprador) incumpre a sua obrigação de pagar o
preço devido, quando B já havia cumprido a sua parte).
Perante o incumprimento de uma parte, que está em mora, é possível transformar a mora em
incumprimento definitivo e resolver o contrato. Mas B não pretende resolver o contrato, logo uma ação
declarativa de condenação seria a solução.

• Se a ação fosse julgada PROCEDENTE (quando o tribunal dá razão ao autor), o tribunal


condena o réu a pagar o que deve ao autor e essa sentença será condenatória (condena a
contraparte à realização de um determinada comportamento que, no caso, é o pagamento de uma
determinada quantia).

Se, mesmo assim, o réu não paga, pese embora tenha sido condenado a fazê-lo, o autor intenta
uma ação executiva para o fazer cumprir o pagamento da quantia certa.
NOTA: Existem várias ações executivas: para o pagamento de quantia certa, para a entrega de coisa
certa ou para a prestação de facto (positivo ou negativo).

• Se a ação for julgada IMPROCEDENTE (o tribunal não dá razão ao Autor), o processo termina
com um CASO JULGADO MATERIAL – é este o objetivo do processo.

Para considerar um litígio como resolvido, a comunidade institui um amplo conjunto de regras, de
pressupostos, de atos, de práticas, etc., isto é, institui um processo, um método específico de resolução
de litígios. A palavra processo provém, aliás, do verbo latino procedo, que significa “andar para a frente”.
Assim é, porque por PROCESSO se entende justamente um caminho que vai da desavença das
partes até à resolução do litígio; pretende-se que através do curso do processo e das suas diferentes
fases se esteja cada vez mais próxima da resolução do litígio que entre as partes estalou.

Assim, como diz o professor LEBRE DE FREITAS, a garantia da norma de Direito Civil, que, como
qualquer norma jurídica, requer a possibilidade de coativamente ser feita respeitar, postula a
recorribilidade aos tribunais para:
1. Reintegrar as situações jurídicas afetadas pela sua violação
2. Prevenir violações ainda não consumadas
3. Exercer direitos potestativos que não possam ser feitos valer extrajudicialmente.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL
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O recurso ao tribunal faz-se mediante a propositura de uma ação, sendo que, através dela, um sujeito
de Direito Privado (o Autor) deduz contra outro (o Réu) um pedido, normalmente afirmando-se titular
de uma situação jurídica para a qual requer a tutela do tribunal.
O Direito Processual Civil é, portanto, o conjunto das normas, com natureza instrumental/adjetiva
relativamente às normas materiais/substantivas de Direito Civil, que visam, direta ou indiretamente,
regular as atuações dos sujeitos de Direito Privado e dos tribunais conducentes à concretização da
garantia dessas normas de conduta do Direito Civil.
O processo termina com um caso julgado material – é este o OBJETIVO DO PROCESSO. Se
estamos perante um processo civil, atentamos nesse específico caminho que a comunidade jurídica
institui para ter como resolvidos litígios entre pares jurídicos, entre iguais (alusão à distinção entre
Direito Público e Direito Privado).

Funções do Processo Civil


1. Defesa e realização das posições jurídicas privadas (se os cidadãos não o podem fazer pela
força, têm de existir mecanismos para tal)

2. Promover uma cultura assente na palavra e não na força


NOTA: tal como concretamente modelado, os atos processuais assentam numa serena troca de
razões e não na força ou violência – deve, contudo, existir a preocupação de evitar que o processo
seja instrumento de promoção de uma cultura de conflitualidade social pela palavra.
3. Exercer um controlo público do sistema jurídico privado e, de tal forma, a correção das
próprias relações jurídicas privadas.
Tenha-se em vista, por exemplo, a celebração de um determinado contrato de compra e venda.
Através do monopólio da jurisdição, garante-se que, ao menos em caso de conflito, o sistema
público de justiça possa apurar da validade daquele contrato, e na medida em que o juiz está
vinculado ao Direito, consegue garantir-se que as valorações que estão na base ou incorporadas no
Direito material conseguem realizar-se.

Direito de ação (iter do processo)


Decorre daqui que a comunidade, por um lado, limita os mecanismos de autotutela e, por outro lado,
coloca ao dispor dos seus membros mecanismos para a declaração e realização das respetivas posições
jurídicas.
Assim, surge o chamado direito subjetivo à tutela jurídica (Justizgewährungsanspruch), direito que
é dirigido contra o Estado.
Tal direito de ação em sentido abstrato tem por objeto a possibilidade de desencadear um processo para
defesa das próprias posições jurídicas. Adiante se verá em que termos as respetivas dimensões se
encontram constitucionalmente tuteladas.

Formas de processo
Nos termos do artigo 547.º CPC, a definição dos atos essenciais da sequência processual é feita pela
lei, embora o juiz deva fazer as adaptações que as especificidades da causa aconselhem, quando a
definição legal abstrata dos atos da sequência a elas não se adequem.
Não há um modelo legal único de processo civil, mesmo considerando apenas a ação declarativa.
Quer esta, quer a ação executiva, podem, em casos expressamente designados na lei (artigo 546.º. n.º2
CPC), normalmente em função do tipo de pretensão deduzido pelo Autor.
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Assim, pode dar lugar a formas de:


• PROCESSOS ESPECIAIS, isto é, sequências ordenadas de atos especificamente predispostas
para se fazer valer esse tipo de pretensão (artigo 878.º e ss. CPC + processos especiais constantes
em leis avulsas).

• PROCESSO COMUM (artigo 546.º, n.º2 CPC), emprega-se quando não há lugar a processo
especial, e a sua forma é única (artigo 548.º, CPC).

Todavia, além deste âmbito de aplicação direta, as normas do processo comum têm também um
âmbito de aplicação indireta, no sentido de que, na falta de disciplina específica num processo
especial, as normas para o processo comum é que serão aplicáveis – artigo 549.º CPC.
NOTA: No CPC de 1961, havia 3 formas de processo declarativo comum – a ordinária, a sumária e a
sumaríssima. A sua distinção fazia-se tendo em conta o valor da causa, com o acrescento, apenas para
o processo sumaríssimo, também do tipo da pretensão deduzida.

Estrutura básica de uma ação declarativa


São três as fases do processo comum na ação declarativa em 1.ª instância (outras distinções são
possíveis)

1. FASE DOS ARTICULADOS (artigo 147.º, n.º 1 CPC’).


Quando as partes sejam representadas por advogados, as peças processuais devem ser redigidas por
artigo.
É a fase em que as partes da ação, Autor e Réu, colocam um litígio à apreciação do tribunal e ‘alegam
a matéria de facto e de direito relevante para a decisão e requerem os meios de prova’ - LF, p.30.

Espécies:
• Articulados normais: petição inicial e a contestação.
• Articulado eventual: réplica
• Articulados supervenientes (também com caráter eventual) aqueles em que qualquer das partes
alega factos supervenientes que completam os articulados deficientes e de resposta às exceções
deduzidas no último articulado apresentado.

Esta abrange os seguintes momentos:


→ Petição inicial (artigo 552.º CPC);
→ Distribuição (artigos 203.º e 204.º CPC);
→ Excecionalmente, despacho judicial liminar após a apresentação da petição inicial, precedendo
a citação (artigos 226.º, n.º4 e 590.º, n.º1 CPC).
→ Citação do Réu (artigos 219.º, nº1 e 225.º CPC);
→ Contestação (artigos 569º n.º1, 571.º e 572.º CPC);
→ Notificação da contestação ao Autor (artigo 220.º, n.º2 CPC);
→ Eventualmente, a seguir, réplica (artigo 584.º CPC);

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O Autor é aquele que age, apresentando a petição inicial, que é dirigida à secretaria do tribunal (artigo
552.º CPC), pela qual dirige um pedido contra o Réu, que, assim o pretendendo (é um ónus, não uma
obrigação), contestará o pedido que contra si é dirigido, através da peça processual contestação (artigo
569.º, 571.º e 572.º CPC).

Se o réu não contestar existem consequências negativas associadas ao regime da REVELIA (pese
embora existam casos em que a revelia é inoperante, ou seja, casos em que os factos não se consideram
confessados – artigo 567.º CPC).
No entanto, sendo dados como confessados os factos, ou seja, sendo a revelia operante, dá-se um
encurtamento do processo.

CONTEÚDO:
Através dos articulados, Autor e Réu (representados ou não por advogado, cuja constituição é
obrigatória por lei nas ações com valor superior à alçada do tribunal de comarca (artigo 40.º, n.º1,
alínea a) CPC)) introduzem no processo os factos principais da causa.

NOTA: Tendo sido constituído mandatário, é feita uma narração seca e concisa dos factos, subordinada
a artigos, cada um dos quais deve conter um facto (artigo 147.º, n.º2 CPC).
Além destes fundamentos de facto, devem as partes (não são obrigadas a fazê-lo por artigos) invocar
as razões que, no seu entender, deverão constituir fundamentos de Direito da decisão, por aplicação
das normas jurídicas aos factos por elas alegados.
Destes fundamentos (de facto e de Direito) extraem as partes a sua conclusão sobre o que deve ser a
sentença, deduzindo pedidos (sempre, o Autor contra o Réu; eventualmente, o Réu contra o Autor),
dizendo da improcedência dos pedidos contra si deduzidos ou entendendo não ser possível, por se
verificar uma exceção dilatória, o conhecimento de mérito. - LF, pp.33 e ss.

Numa e noutra peça processual (petição inicial e contestação) devem apresentar-se os ELEMENTOS
DE FACTO (causa de pedir) e as RAZÕES DE DIREITO pelas quais se entende que o pedido deve
proceder ou improceder: diz-se que um pedido procede quando o tribunal dá razão ao Autor, que
improcede quando a não dá.
NOTA: temos aqui as partes da ação: autor e o réu (podendo haver vários autores e vários réus). Temos,
então os elementos subjetivos da ação, que são o autor e o réu, unidos por uma relação processual, da
qual também faz parte o Tribunal, que está numa posição de supremacia / o pedido e a causa de pedir
→ elementos objetivos de uma ação, que constituem a estrutura vertebral da ação (isto tem
importância ao nível dos casos julgados – ex.: pode pedir a mesma coisa se a causa for diferente, mas
não pode pedir a mesma coisa se a causa de pedir for a mesma).

FORMA: Nos termos do artigo 133.º, n.º1 CPC, os articulados têm de ser redigidos em língua
portuguesa e a sua transmissão ao tribunal deve, sempre que haja mandatário constituído, ser feita por
via eletrónica (artigo 144.º, n.ºs 1 e 7, a contrario).
Não havendo mandatário constituído, o ato pode ser praticado pelo meio da apresentação do articulado
na secretaria, feita pessoalmente ou por correio registado, ou mediante expedição de telecópia (artigo
144.º. n.º7 CPC), sendo que, neste caso, os articulados terão que ser apresentados em duplicado: um
exemplar constituirá peça do processo e o outro destina-se a ser entregue à parte contrária (na citação
ou na notificação).

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DATA : O ato comunicado eletronicamente considera-se praticado na data da expedição (artigo 144º,
n.º7 CPC).
Nos casos de entrega na secretaria judicial, remessa por correio registado e telecópia, vale como data
da apresentação a da entrega, do registo ou da expedição da telecópia, respetivamente.

Podem ainda existir outras peças processuais, designadamente a RÉPLICA (artigo 584.º e ss. CPC) –
peça processual eventual.

A matéria da réplica está relacionada com a RECONVENÇÃO (artigos 266.º e 583.º, n.º1 CPC).
O autor deduz um pedido contra o réu, no entanto, em determinados casos, a lei prevê que o réu pode
deduzir pedidos contra o autor. É como se o réu agisse como autor (pedido reconvencional/
reconvenção). Assim, o réu é tido como ‘réu reconvinte’ e o autor como ‘autor reconvindo’, dando-
se, portanto, uma instância reconvencional.
O réu na contestação defende-se, ao passo que na reconvenção, mais do que defender-se, está a fazer
um contra-ataque. Assim, se houver reconvenção, o autor (que é como se fosse réu), tem a hipótese
de se responder à reconvenção.
Até 2013, além da réplica, que era sempre admissível para a resposta às exceções que o réu tivesse
invocado na contestação, existia ainda outra peça processual, que era a tréplica. Esta peça deixou de
estar prevista, embora o juiz possa dar oportunidade de resposta.

Depois, existem ainda os ARTICULADOS SUPERVENIENTES – artigos 588.º e 589.º CPC, que
servem para admitir no processo factos constitutivos, modificativos ou extintivos do Direito que sejam
supervenientes. Pode tratar-se de uma superveniência subjetiva (os factos já existiam, mas não eram
conhecidos das partes) ou superveniência objetiva (os factos são objetivamente supervenientes – vêm
depois do momento em que foi apresentado o articulado, pelo que não podiam ser apresentados).
Pertencem teleologicamente a esta fase dos articulados, mas aparecem num momento posterior, porque
os factos em causa são supervenientes (artigo 588.º, n.º 3 CPC). Podem ser apresentados na audiência
prévia quando os factos forem conhecidos ou acontecerem até ao respetivo encerramento, ou então nos
10 dias posteriores à data designada para a audiência final ou na própria audiência final, se os factos
forem anteriores aos momentos ocorridos nas fases anteriores.

Modalidades de defesa – Contestação (artigo 571.º CPC)


Existe um ónus de alegação, sendo que o autor tem o ónus de alegar os factos constitutivos do seu
direito, que são aqueles que permitem a aplicação de uma norma jurídica da qual se permite extrair o
efeito jurídico que o autor pretende obter através da propositura da ação (estes são os factos que
integram a causa de pedir) e o réu tem o ónus de impugnação (artigo 574.º CPC) – DEFESA POR
IMPUGNAÇÃO (de facto ou de direito)
Além disso, o réu, na contestação, tem o ónus de alegar os factos que integrem a matéria de exceção –
DEFESA POR EXCEÇÃO (pode ser perentória ou dilatória – artigo 576.º CPC).

NOTA: se o réu não tomar posição quanto aos factos aplica-se o artigo 574.º, n.º 2 CPC, que diz
‘Consideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em
oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou se
só puderem ser provados₁ por documento escrito; a admissão de factos instrumentais pode ser afastada
por prova posterior’.
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As regras de direito probatório formal (como se produz prova) estão no CPC, mas os valores das provas
é um problema de direito probatório material que se encontra no CC (artigos 342.º e ss. CC).

Se o réu não tomar posição quanto aos factos, aplica-se o n.º 2, considerando-se ‘admitidos por acordo’
e o tribunal toma-os como verdadeiros para efeito daquele processo, salvo:
− Se estiverem em oposição com a defesa apresentada
− Se não for admissível confissão sobre eles

NOTA: Só é admissível a confissão em relação a direitos disponíveis – se a parte não pode confessar
um facto, por não se tratar de matéria de direitos disponíveis, também não faria sentido que os factos
se considerassem admitidos.

− Se os factos só se poderem provar mediante documento escrito, uma vez que estamos perante
uma formalidade – ex.: não é possível provar a existência de um contrato de compra e venda de
um imóvel, senão pela existência de um documento e, portanto, não se produz o efeito de
admissão.

NOTA: artigo 574.º, n.º 3 CPC – se o réu não souber a veracidade de um facto, a declaração equivale
a confissão se se tratar de um facto pessoal do réu ou de que deva ter conhecimento e equivale a
impugnação no caso contrário (isto é, caso não seja um facto pessoal ou de que tenha de ter
conhecimento).

Ora, se o autor tem o ónus de alegação dos factos constitutivos do seu direito, o réu tem, então, o ónus
de alegar os factos que integram a matéria de exceção perentória – artigo 576.º, n.º 3 CPC – a
EXCEÇÃO PERENTÓRIA importa a absolvição parcial ou total do pedido (a ação improcede) e
consiste na invocação de factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico dos factos
articulados pelo autor.
Quando o réu se defende por exceção perentória está a alegar factos que integram uma contra norma
que têm efeito modificativo, impeditivo ou extintivo da norma dos direitos do autor.

NOTA: Os factos que integram a causa de pedir e a matéria de exceção são os factos essenciais (artigo
588.º, n.º 3, c).

Até 2013, se o réu se defendia por exceção, depois o autor podia responder à matéria de exceção na
réplica (e a tréplica tinha a mesma função – a tréplica servia para o réu reconvinte responder à defesa
por exceção perentória que o autor reconvindo apresentasse ao pedido reconvencional). Hoje, se virmos
o artigo 584.º CPC, a réplica não serve para o autor responder à matéria de exceção.

Princípio da economia processual – artigo 3.º, n.º 4 CPC ‘às exceções deduzidas no último articulado
admissível pode a parte contrária responder na audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no
início da audiência final’ – portanto, se o réu se defende por exceção e se não fizer reconvenção, depois,
o autor vai responder, não através de réplica como acontecia até 2013, mas na audiência prévia.

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2. FASE DA CONDENSAÇÃO E SANEAMENTO DO PROCESSO


Fase na qual se apura da regularidade da instância, isto é, na qual se apura se estão verificados todos os
pressupostos necessários para que o tribunal conheça daquela causa, e se identificam as questões
fundamentais, de facto e de Direito, carecidas de atividade jurisdicional complementar.
Esta fase visa igualmente ‘… decidir o que possa já ser decidido, enunciar os temas da prova a efetuar
subsequentemente e preparar as diligências probatórias…’ – pág. 37 “A Ação Declarativa Comum’
Esta fase é designada pela lei de gestão inicial do processo e audiência prévia (artigos 590.º a 598.º
CPC).

O artigo 590.º, n.º 1 CPC refere o despacho liminar – apenas há despacho liminar nos casos previstos
na lei ou por determinação do juiz (artigo 226.º, n.º 4 CPC) – a) Nos casos especialmente previstos na
lei; b) Nos procedimentos cautelares e em todos os casos em que incumba ao juiz decidir da prévia
audiência do requerido; c) Nos casos em que a propositura da ação deva ser anunciada, nos termos
da lei; d) Quando se trate de citar terceiros chamados a intervir em causa pendente; e) No processo
executivo, nos termos dos nºs 6 e 7 do artigo 726.º; f) Quando se trate de citação urgente.
O despacho liminar chamava-se, no princípio, assim, porque entra a petição inicial e depois,
liminarmente, o juiz tem de proferir este despacho.
No n.º 2 do artigo 590.º CPC temos o DESPACHO PRÉ-SANEADOR, que é um despacho eventual
e que é proferido pelo juiz depois de findos os articulados – chama-se pré-saneador, porque está
antes do despacho saneador e tem as seguintes funções (previstas no n.º 2):
− Providenciar pelo suprimento de exceções dilatórias, nos termos do artigo 6.º, n.º 2;
− Providenciar pelo aperfeiçoamento dos articulador, nos termos dos números seguintes;
− Determinar a junção de documentos com vista a permitir a apreciação de exceções dilatórias ou
conhecimento, no todo ou em parte, do mérito da causa no despacho saneador;
NOTA: distinção entre o problema de mérito e o problema de admissibilidade – isto leva-nos à
categoria de exceção dilatória e está relacionado com a fase de saneamento e condensação

Assim sendo, no processo colocam-se dois problemas fundamentais:


− PROBLEMA DE MÉRITO – diz respeito ao juízo que o juiz é chamado a proferir sobre a
procedência ou improcedência do pedido deduzido contra o réu pelo autor, ou pelo réu reconvinte
contra o autor reconvinte.
O autor tem o ónus de alegar os factos constitutivos do seu direito e tem também o ónus de os provar,
nos termos da norma do artigo 342.º do CC, mais concretamente o n.º 1. O réu tem o ónus de alegar
os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito alegado pelo autor e tem o réu o ónus de
provar estes factos impeditivos, modificativos ou extintivos, como resulta do artigo 324.º, n.º 2 do CC.
Para que a ação seja julgada procedente, é necessário que sejam dados como provados os factos que
integram as normas jurídicas, as quais permitem a produção do efeito que o autor pretende obter.
Portanto, é necessário que, dentro do processo, os factos constitutivos do direito invocado pelo autor
se deem como provados – depois aplica-se a norma jurídica que, na sua espécie legal, contém esses
factos e, então, o tribunal declara o efeito jurídico que o autor pretende obter.
Se, pelo contrário, for demonstrada no processo a realidade de factos impeditivos, modificativos ou
extintivos que o réu trouxe, através de defesa por exceção perentória, aí o tribunal deve aplicar a
respetiva contra norma, que tem um efeito impeditivo, modificativo ou extintivo.
Da mesma forma, se não forem demonstrados no processo os factos constitutivos do direito, o tribunal
não pode aplicar normas de que deriva o efeito jurídico que o autor pretende obter, e nesse caso a ação
improcede.
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Já se o autor conseguir demonstrar os factos constitutivos do seu direito e o réu não conseguir
demonstrar os factos que integram a exceção perentória, a ação procede.
Mas se o autor conseguir demonstrar os factos constitutivos do seu direito e o réu conseguir demonstrar
a existência de um facto impeditivo, modificativo ou extintivo, a ação improcede, porque o tribunal
aplica a contra norma.

− PROBLEMA DE ADMISSIBILIDADE – isto está relacionado com a matéria dos pressupostos


processuais. Os pressupostos processuais são requisitos de admissibilidade processual.
À falta de um pressuposto processual, chama o Código ‘EXCEÇÃO DILATÓRIA’ (artigos 576.º e
577.º CPC). Portanto, quando o réu se defende por exceção dilatória, o que ele está a fazer é a invocar
a falta de um pressuposto processual.
O problema da admissibilidade precede o problema do mérito. Ou seja, o tribunal só pode entrar
no mérito da causa, se estiverem verificados os pressupostos processuais.

O artigo 576.º, n.º 2 do CPC diz-nos que:


1 - As exceções são dilatórias ou perentórias.
2 - As exceções dilatórias obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa e dão lugar à
absolvição da instância ou à remessa do processo para outro tribunal. → As exceções dilatórias
impedem que o tribunal conheça o mérito da causa.
O tribunal, se verificar a existência de uma exceção dilatória insanável/não sanada, não absolve o réu
do pedido nem julga a ação improcedente (o tribunal não entra no mérito), ele absolve é o réu da
instância. Existe uma relação material e uma relação processual – o processo inicia-se com a
propositura da ação e o réu vai integrar essa relação a partir o momento em que é citado (relação que
une o tribunal e as partes). O tribunal absolve o réu daquela instância sem julgar o mérito da causa, o
que tem por consequência que o autor pode intentar uma nova ação com o mesmo pedido e a mesma
causa de pedido, pois aqui, quando o réu é absolvido da instância, não se vai formar um caso julgado
material, pois o tribunal não entrou no mérito da causa.
Relativamente à última parte do n.º 2 do artigo 576.º, remete-se o artigo 105.º, n.º 3 do CPC, que nos
diz que se a exceção for julgada procedente, o processo é remetido para o tribunal competente.

3 - As exceções perentórias importam a absolvição total ou parcial do pedido e consistem na


invocação de factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico dos factos articulados
pelo autor. → Problema de mérito.
Quando o tribunal se pronuncia sobre o mérito da causa, isto é, julga a ação procedente ou improcedente,
e depois a decisão transita em julgado (a decisão transita em julgado quando não é suscetível de recurso
ordinário ou de reclamação), então forma-se um caso julgado material. Assim, transitada em julgado a
sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material
controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos
580.º e 581.º CPC, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º (artigo 619.º do CPC).

Temos previstos no artigo 278.º do CPC casos de ABSOLVIÇÃO DE INSTÂNCIA, onde


encontramos que:

1 - O juiz deve abster-se de conhecer do pedido e absolver o réu da instância:


e) Quando julgue procedente alguma outra exceção dilatória.

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É de remeter do artigo 278.º, n.º 1, alínea e) CPC para o artigo 577.º do CC, que fala nos tipos de
exceções dilatórias.

As exceções dilatórias podem ser:


− SANÁVEIS - ex.: nos termos do artigo 34.º do CPC, uma determinada ação deve ser intentada
por ambos os cônjuges, mas foi proposta apenas por um, então falta um pressuposto processual
– estamos perante um litisconsórcio necessário ativo, mas neste caso a falta é sanável, porque é
possível chamar ao processo o outro cônjuge através do incidente da intervenção principal
provocada

− INSANÁVEIS – ex.: incompetência de um tribunal

Nesta fase do processo, se estivermos perante exceções sanáveis, o juiz providencia pelo suprimento
(artigo 6.º, n.º 2 do CPC).

Depois, se for necessário, haverá também lugar à AUDIÊNCIA PRÉVIA.
Há casos de não realização (artigo 592.º CPC) e de dispensa de audiência prévia (artigo 593.º CPC).
Esta audiência chama-se prévia porque está antes da audiência final. A audiência prévia pode ter
algumas das funções previstas no artigo 591.º do CPC.

Existe um despacho muito importante que pode ser ditado na audiência, mas normalmente é depois
proferido por escrito e depois o juiz notifica os advogados das partes, que é o DESPACHO
SANEADOR (artigo 595.º CPC).

Segundo o artigo 595.º do CPC:


1 - O despacho saneador destina-se a:
a) Conhecer das exceções dilatórias e nulidades processuais que hajam sido suscitadas
pelas partes, ou que, face aos elementos constantes dos autos, deva apreciar oficiosamente;
O despacho constitui, logo que transite em julgado, caso julgado formal quanto às questões apreciadas
(o caso julgado formal tem que ver com a admissibilidade).
Ex.: o réu diz que o tribunal é incompetente – o tribunal, no despacho saneador vai levantar esse ponto
e se o tribunal decidir que o tribunal é competente, a parte vencida pode recorrer deste despacho
saneador. Se não for interposto recurso, o despacho transita formando-se caso julgado formal.
b) Conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir,
sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos ou de
alguma exceção perentória. – Saneador sentença (decide logo aqui o mérito da causa, formando
um caso julgado material).
Normalmente, o juiz não decide o mérito da causa no saneador. Deste modo, se o processo for
admissível o tribunal declara isso no despacho saneador identificando o objeto do processo e os temas
de prova (artigo 596.º CPC) – FASE DA CONDENSAÇÃO.

2 - O despacho saneador é logo ditado para a ata; quando, porém, a complexidade das questões a
resolver o exija, o juiz pode excecionalmente proferi-lo por escrito, suspendendo-se a audiência
prévia e fixando-se logo data para a sua continuação, se for caso disso.

Rita Nunes 10
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TEÓRICAS

3 - No caso previsto na alínea a) do n.º 1, o despacho constitui, logo que transite, caso julgado
formal quanto às questões concretamente apreciadas; na hipótese prevista na alínea b), fica tendo,
para todos os efeitos, o valor de sentença. – LF, p. 30 e 31).

Se o processo for admissível e for necessária a produção de prova passa-se para a fase seguinte.

3. FASE DA INSTRUÇÃO, DISCUSSÃO E JULGAMENTO


Esta fase tem por finalidade a produção de prova relativa aos factos controvertidos, o debate sobre a
decisão a proferir pelo tribunal – em que, quer o Autor, quer o Réu, procuram influenciar a respetiva
decisão –, e o julgamento da causa (artigos 599.º ss. CPC).
NOTA: ‘Fase da instrução, repartida por atos de produção de cada meio de prova, tendencialmente
concentrados na audiência final (artigos 604.º, n.º 3, als. a) a d) e 607.º, n.º 1 CPC), mas tendo lugar
antes dela quando o meio de prova, como é o caso da perícia, ou outras circunstâncias (…) o
imponham ou aconselhem’

A ação em primeira instância termina com a sentença proferida pelo julgador (artigo 607.º CPC).
Quando já não for admitido recurso ordinário, a sentença transita em julgado (artigo 619.º CPC).
O problema específico do processo civil é, assim, o da determinação dos termos mediante os quais um
caso julgado se tem como legítimo.
“Assim terminado o processo em 1ª instância, pode abrir-se, no prazo do art. 638.º, instância de
recurso ordinário dirigido à Relação. O processo seguirá então novas fases, mediante o encadeamento
de atos processuais igualmente tipificados na lei de processo”. – LF, p. 32

Rita Nunes 11
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2. MODALIDADES DE AÇÕES JUDICIAIS EM FUNÇÃO DO TIPO DA PROVIDÊNCIA


JURISDICIONAL REQUERIDA

A summa divisio no que diz respeito à tipologia de ações é aquela que divide as ações declarativas das
ações executivas (artigo 10.º, n.º 1 CPC)

− As AÇÕES DECLARATIVAS são as que têm por finalidade a declaração do direito e, portanto,
a sua finalidade é alcançada quando através da sentença se fixa aquilo que para a comunidade é
doravante o direito aplicável à causa e atinge-se essa finalidade com o caso julgado material.

“Uma ação é declarativa quando o autor pede ao tribunal que declare a existência ou não
existência de um direito ou de um facto jurídico (ação de simples apreciação), que condene o
réu na prestação duma coisa ou dum facto a que o autor tem direito (ação de condenação) ou
que altere as situações jurídicas das partes em conformidade com um direito potestativo do autor
(ação constitutiva)” – LF, pp.14 e 15

Têm por propósito fixar/ dizer o direito.

− Por sua vez, as AÇÕES EXECUTIVAS têm por finalidade a execução de uma certa obrigação
que é devida ao exequente – artigo 10.º, n.º 4 CPC. Estas têm particular interesse para vencer a
resistência do obrigado ao respetivo cumprimento. É um tipo de ação que, de um modo forçado,
permite ao credor de uma certa obrigação obter a satisfação do seu direito.

Uma ação “é executiva quando visa a reparação material dum direito violado, no pressuposto da sua
existência” – LF, p.15
Têm por finalidade realizar o direito.

Articulação entre a ação declarativa e executiva:
Nem sempre um momento se segue à outra – há títulos extrajudiciais, portanto, pode haver ação
executiva sem ação declarativa prévia, e pode haver ação declarativa que não dê origem a sentença
condenatória e, então, não há nada a executar.
É título executivo a sentença condenatória, ou seja, através da qual o réu é condenado ao cumprimento
de determinada obrigação. Se a sentença é uma sentença condenatória, essa sentença pode servir de
base a uma ação executiva, mas a sentença pode não ser uma sentença condenatória, porque o autor
pode não ter pedido a condenação do réu.

Classificação das ações declarativas:


As ações declarativas podem ser classificadas em função do tipo de tutela que é requerido pelo autor.
Nos termos do artigo 10.º, n.º 3 CPC, distingue-se: as ações de simples apreciação, de condenação e
constitutivas. Esta distinção prende-se com o tipo de tutela jurídica que o autor pretende obter através
da propositura da ação.

1. AÇÕES DE SIMPLES APRECIAÇÃO: são aquelas em que o autor procura ‘obter unicamente a
declaração da existência ou inexistência de um direito ou de um facto’. Estas ações tem por
finalidade colocar termo a uma situação de incerteza que se gerou em torno da existência de um certo
direito ou de um certo facto.

Rita Nunes 12
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Um dos pressupostos processuais neste âmbito é o pressuposto processual do interesse em agir (tem
que existir um interesse atendível na propositura de uma ação de qualquer natureza) – ex.: o professor
não pode intentar uma ação contra os alunos para que o tribunal declare que não choveu.
O que carateriza as ações de simples apreciação é que através delas o autor não procura nenhum
propósito além da declaração pelo tribunal da existência ou inexistência de um simples facto ou direito.

As ações de simples apreciações podem ser positivas ou negativas:

− São POSITIVAS quando se pretende a declaração de que um certo facto ou direito se


verificou – ex.: é negado que uma determinada sociedade é titular de um determinado terreno.
Poderia essa sociedade propor uma ação de simples declaração positiva e o tribunal declarar que
ela é titular desse terreno.
Se julgarmos a ação procedente, significa que o tribunal declararia que a sociedade é titular do direito
de propriedade sobre o tal terreno. A sociedade não se tornaria titular em virtude da sentença – a
sentença limitar-se-ia a declarar uma situação jurídica que já existia, não havendo qualquer
modificação na ordem jurídica.

− Por sua vez, as ações de simples apreciação são NEGATIVAS quando aquilo que se pretende é
a declaração de que um determinado direito ou facto não se verificou – ex.: é afirmado que
uma determinada sociedade é titular de uma certa dívida. Isso pode afetar a imagem da sociedade
no mercado, sendo que essa sociedade pode propor uma ação de simples apreciação negativa
para determinar que não o é.

Estas ações de simples apreciação negativa têm a particularidade de levar a que impenda sobre o réu
o ónus da prova do seu direito, ou seja, são ações que constituem provocatio ad agendum (o autor
(da ação de simples apreciação - sociedade) provoca o réu a agir (aquele que diz que a sociedade tem
a dívida), ou seja, provoca o réu a vir a juízo demonstrar a existência do facto ou do direito que alega
existir).
Isso explica o regime dos artigos 343.º, n.º 1 CC e do artigo 584.º, n.º 2 CPC.
O exemplo mais corrente de ações de simples apreciação são as ações de simples nulidade do negócio
jurídico – uma vez que o negócio jurídico nulo não produz efeitos, trata-se apenas de declarar essa não
produção de efeitos.

2. AÇÕES DECLARATIVAS DE CONDENAÇÃO: são aquelas em que o autor exige do réu a


prestação de uma coisa ou de um facto e, depois, a lei diz ‘pressupondo ou prevendo a violação de
um direito’ (artigo 10.º, n.º 3 CPC) – esta é a modalidade mais frequente de ações judiciais.
A finalidade mais tipicamente procurada por estas ações é a reintegração da ordem jurídica que foi
violada, pressupondo a violação de um direito – ex.: alguém não cumpre uma obrigação na data. houve
uma violação da OJ, justamente porque alguém, contra aquilo que era decido, não realizou a prestação
a que estava adstrito. Então, através de uma ação de condenação ao cumprimento o autor procura obter
um título de condenação contra o réu – artigo 817.º do CC.
ex.: uma pessoa apoderou-se de uma coisa que pertence a terceiro – aqui a violação da OJ está no facto
de ter sido perturbada a propriedade – através de uma ação de reivindicação (artigo 1311.º CC), o
proprietário pode reclamar o exercício de poderes de facto sobre a coisa, assim reintegrando-se a ordem
jurídica.
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Normalmente, portanto, as ações de condenação pressupõem a violação de um direito. Há no entanto


alguns tipos de ação de condenação que exigem considerações adicionais:

− AÇÕES DE CONDENAÇÃO IN FUTURUM (1)


As ações de condenação podem também ter lugar quando se prevê (e não pressupõe) a violação de
um direito.
Neste caso, não se trata de reintegrar a ordem jurídica violada, trata-se de, preventivamente, o réu ser
condenado a reintegrá-la para a eventualidade de a vir a violar. Portanto, preventivamente, para o caso
de a ordem jurídica vir a ser violada, o autor pretende que o réu seja condenado a reintegrá-la nessa
eventualidade.
O autor pretende precaver-se contra a eventualidade de no futuro ter de propor novas ações de
condenação – ações de condenação in futurum. Ou seja, o autor, cautelarmente, protege-se contra a
eventualidade de um incumprimento futuro do réu.
Esta possibilidade não é admitida em termos irrestritos, mas só nos casos em que a lei o prevê – essas
hipóteses são as que estão previstas no artigo 557.º, n.º 1 CPC (ex.: prestações periódicas em que já
houve incumprimento pelo devedor – o autor terá já nas suas mãos um título executivo e não terá de
propor novas ações declarativas em caso de novos incumprimentos) e n.º 2 do mesmo artigo (nesta
matéria coloca-se o problema da articulação com o artigo 610.º CPC, sendo que há uma querela
doutrinal sobre isso).
(ver anotação a este artigo – página 512, ponto 4 – Lebre de Freitas e Isabel Alexandre (CPC
anotado))
NOTA: não podemos confundir as ações de condenação in futurum com um pedido de condenação ao
pagamento de uma indemnização por danos futuros, que é uma coisa que o CC permite no artigo 564.º,
n.º 2.

− AÇÕES DE CONDENAÇÃO EM PRESTAÇÃO NÃO QUANTIFICADA (2)


Um outro caso particular é a condenação ao cumprimento de uma prestação não quantificada. Resulta
do ónus de alegação que recai sobre o autor que ele deve quantificar o montante do pedido que
formula, logo está limitado por aquilo que foi pedido. Mas em determinadas hipóteses (tipificadas na
lei), admite-se que alguns aspetos relativos ao pedido se deixem por concretizar na petição inicial –
artigo 556.º CPC.
Nestes casos, o que vai acontecer é que o autor não quantifica o pedido – faz um pedido que se chama
pedido de condenação genérica e, depois, haverá um incidente (que se chama incidente de liquidação),
para tornar líquido o pedido de condenação genérica (artigos 358.º e ss. CPC). Se não for possível
proceder ainda à liquidação, o tribunal poderá condenar o réu naquilo que se vier a liquidar – pode ser
proferida uma sentença de condenação genérica nos termos do artigo 609.º, n.º 2 CPC.
Esta sentença só constitui título executivo depois de liquidada – artigo 704.º, n.º 6 CPC – embora possa
ser utilizada para o registo de uma hipoteca judicial.
O artigo 556.º CPC diz-nos as situações em que é possível formular pedidos genéricos e, a este
propósito, cabe distinguir dois elementos:
− O chamado an debater (se é devido)
− O chamado quantum debateu (quanto é devido)
O autor pode conseguir provar que algo é devido – ex.: o autor consegue provar que foi sujeito a uma
intervenção médico-cirúrgica mal realizada (an debater), mas o autor ainda não é capaz de quantificar
todos os danos – ex.: ainda está sujeito a exames médicos para determinar a extensão da mazela, ou a
sua situação clínica ainda não se estabilizou (quantum debateu).
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Este seria um dos casos em que seria admissível a dedução de um pedido de condenação genérica –
artigo 556.º, n.º 1, b) CPC
A possibilidade de recurso a um pedido de condenação genérica e depois a possibilidade de haver uma
sentença de condenação genérica, nos termos do artigo 609.º, n.º 2 CPC, diz apenas respeito ao
quantum debater e não ao an debateu – a dúvida está no quanto é que é devido e não no facto de ser
devido algo.
Ora, resultaria da aplicação das regras do ónus da prova que se o autor não consegue demonstrar quanto
é que é devido (isso é um facto constitutivo do seu direito), então a ação deveria ser julgada
improcedente. Todavia, não é essa a solução: se o autor conseguir demonstrar que é devido e não
mostrou quando é que é devido, a ação, ao invés de ser julgada improcedente, é julgada procedente,
mas o tribunal condena naquilo que se vier a liquidar.
Depois, é necessário abrir um incidente de liquidação para quantificar o montante devido – neste
incidente de liquidação não se pode reabrir a discussão sobre o an debater.

− CASOS DE TUTELA INIBITÓRIA (3)


Depois, temos a ação de condenação de tutela inibitória – aqui o autor pretende a abstenção/ inibição
prática de uma ação no futuro (quer que o réu seja condenado a não fazer algo). Nas ações de
condenação in futurum impõe-se a prática de um comportamento futuro positivo, ao passo que nestas
ações de condenação de tutela inibitória se proíbe a prática de um comportamento futuro.
Estas ações inibitórias cumprem a função cautelar definitiva – ex.: o processo especial para a tutela da
personalidade (artigo 70.º, n.º 2 CC e artigos 878.º a 880.º CPC). Aqui está em causa a condenação a
não fazer alguma coisa, a evitar que seja praticado um facto que seja lesivo da personalidade/ no âmbito
do direito das coisas, prevê-se uma ação de prevenção contra dano – artigo 1276.º CC.

3. AÇÕES DECLARATIVAS CONSTITUTIVAS


Aquilo que se pretende através de uma ação constitutiva é uma mudança na ordem jurídica e, portanto,
ao passo que nas ações declarativas de simples apreciação se procura apenas a declaração de um certo
estado de coisas ou facto e nas de condenação se pretende que o réu seja condenado a um determinado
comportamento, nestas é o próprio conteúdo da ordem jurídica que se pretende modificar.
Assim, estas ações constitutivas têm imiscuídas nelas o exercício de direitos potestativos, que são
justamente aqueles em que o titular ativo do respetivo direito pretende alterar a ordem jurídica.
Nos direitos potestativos, o sujeito passivo está em estado de sujeição (a mudança da ordem jurídica
não depende da sua vontade), pelo que nestes casos o tribunal não vai condenar o réu à prática de um
comportamento positivo ou negativo, justamente porque a mudança da ordem jurídica não depende da
sua vontade.
Assim, com a sentença, se a ação for julgada procedente (sendo que há aqui também um momento de
simples apreciação, na medida em que o tribunal só pode ordenar a mudança da ordem jurídica se
primeiro apurar que existe o direito potestativo correspondente), produz-se o efeito modificativo/
conformativo da sentença.
Ex.: ação de anulação – artigo 287.º CC, através da qual se destrói com efeitos retroativos um
determinado negócio jurídico/ ação de divisão de coisa comum/ ação de constituição de uma
servidão legal de passagem (artigo 1550.º e 1547.º CC)
Todas estas ações (declarativas no geral) pressupõem a apreciação da existência ou da inexistência de
certos direitos ou de certos factos – todas as ações têm um momento de simples apreciação – ex.: ação
de condenação ao cumprimento de uma obrigação – o tribunal, para poder condenar o réu ao
cumprimento de uma obrigação, tem primeiro de apurar se existe ou não uma obrigação.

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PRINCÍPIOS DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Distinguem-se 3 grupos de princípios:


1. Princípios atinentes às partes;
2. Princípios atinentes à atividade do juiz;
3. Princípios atinentes à estrutura do processo.

1. Princípios atinentes às partes

• PRINCÍPIO DO PEDIDO – artigo 3.º, n.º 1 CPC.


Artigo 3.º CPC
(Necessidade do pedido e da contradição)
1 - O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução
lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.
2 - Só nos casos excecionais previstos na lei se podem tomar providências contra determinada
pessoa sem que esta seja previamente ouvida.
3 - O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório,
não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto,
mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se
pronunciarem.
4 - Às exceções deduzidas no último articulado admissível pode a parte contrária responder na
audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final.

O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe
seja pedida por uma das partes.
Uma vez que o processo civil visa proteger interesses privados, este só tem lugar na medida em que
particulares solicitem medidas de tutela. Ou seja, o juiz só está habilitado a decidir sobre relações
jurídicas privadas na medida em que tal lhe seja solicitado.
Este princípio é uma decorrência do respeito pela titularidade privada das posições jurídicas em
presença numa ação civil. Se são privadas, apenas mediante o impulso processual dos respetivos
titulares, se deve admitir que essas relações sejam afetadas por uma ação judicial.

Este princípio corresponde aos brocardos latinos ‘ne eat iudex ultra petita partium’ (não vá o juiz
além do pedido das partes) e ‘nemo iudex sine auctore’ (não há juiz sem autor)
De facto, o processo civil está ao serviço de interesses particulares e, nessa medida, a sua composição
básica deve ser determinada pelas partes. Nessa medida, a modelação da causa é apresentada pelo autor
através da petição inicial, ainda que o réu também tenha algo a dizer, designadamente, através da
possibilidade de introduzir factos essenciais no processo, que correspondam à matéria de exceção
perentória. Mas essa modelação cabe sobretudo ao autor através da petição inicial – aqui o autor deve
formular o pedido, não obstante a possibilidade, em casos que a lei prevê, de o réu formular pedidos
contra o autor (via reconvencional).

Na petição inicial o réu formula o PEDIDO (petitum – artigo 552.º, n.º 1, al. e) e 581.º, 3 CPC), assim
se entendendo o efeito jurídico que o autor pretende obter). Este efeito jurídico pode traduzir-se ora na
condenação do réu à realização de um comportamento positivo ou negativo; ora na produção de uma
modificação da ordem jurídica; ora na declaração da existência ou inexistência de um facto ou de um
direito.

Rita Nunes 16
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Por outro lado, cabe também ao autor apresentar a CAUSA DE PEDIR (causa petendi: artigo 552.º,
1, d) e artigo 581.º, 4 CPC), assim se entendendo os factos dos quais o Autor pretende extrair a
produção daquele efeito jurídico, isto é, factos cuja verificação permite a aplicação de uma qualquer
regra que garante a procedência do pedido.
Deve ainda o autor, na petição inicial, designar a pessoa do réu – artigo 552.º, n.º 1, a) CPC.

Estes são os elementos iniciais de uma petição: o pedido e a causa de pedir são os elementos objetivos,
ao passo que as partes são o elemento subjetivo (Autor e Réu). Pedido, causa de pedir e partes são de
grande relevo, uma vez que delimitam os limites da lide e traçam os limites da litispendência (artigo
581.º CPC) e do caso julgado (artigo 619.º, n.º 1 CPC).
«Sem a afirmação prévia da violação do direito, assente na exposição dos factos que estiveram na sua
origem («causa petendi»: n.º 4 do artigo 581.º), e a dedução do pedido de concessão da tutela
correspondente («petitum»: n.º 3 do artigo 581.º), o juiz não pode tomar a iniciativa de ordenar
quaisquer medidas destinadas a proteger os interesses do respetivo titular («nemo iudex sine actore»).»
- p. 18 sebenta

NOTA: Uma vez que o tribunal toma uma decisão sobre o pedido, essa é uma decisão de mérito (já que
o tribunal se pronuncia pela procedência ou improcedência do pedido). Uma vez transitada em julgado
a decisão (quando já não é suscetível de recurso ordinário) forma-se um caso julgado material e,
portanto, o tribunal não pode conhecer novamente daquele pedido com aquela causa
Se for intentada uma nova ação em que se pede a mesma coisa com a mesma causa, verifica-se a falta
de um pressuposto processual negativo.

Normalmente, os pressupostos processuais são positivos, isto é, são coisas que se devem verificar (ex.:
personalidade e capacidade judiciária – as partes devem ter personalidade e capacidade judiciária).
Existem, no entanto, pressupostos processuais negativos (caso julgado e litispendência), isto é, são
coisas que não podem estar verificadas – não pode haver uma situação de litispendência nem um
caso julgado material e, se isso acontecer, o processo não é admissível.
→ CASO JULGADO significa que há uma decisão de mérito transitada em julgado e, depois, há
um novo processo que se repete nos seus elementos subjetivos e objetivos – o processo deve
terminar com a absolvição do réu da instância.

→ A LITISPENDÊNCIA significa que há dois processos que estão a correr ao mesmo tempo, não
havendo em nenhum deles uma decisão transitada em julgado – há uma pendência de lides/ de
ações, sendo que uma delas deve terminar com a absolvição do réu da instância (partes, pedido
e causa de pedir são as mesmas nas duas) – artigo 581.º CPC.

Depois, a lei do processo decide qual das ações continua e qual termina – não é, ao contrário do
que se possa pensar, a ação que seja intentada em segundo lugar que termina, mas aquela em
que o réu foi citado em último lugar – artigo 260.º CPC

NOTA: o pedido pode ser modificado, bem como a causa de pedir – artigos 264.º e 265.º CPC
(por acordo ou sem acordo).

Rita Nunes 17
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O pedido carece de ser interpretado – «O pedido é dirigido ao tribunal e à contraparte, apresentando-


se, por isso, como uma declaração receptícia. Logo, levanta-se o problema da determinação do sentido
e do alcance dos termos utilizados para transmitir aos destinatários o resultado concretamente
pretendido com a procedência da ação (ou do incidente). (…) sobre o autor recai o ónus de alegar os
factos constitutivos do direito que pretende ver tutelado, mas não está obrigado a fazê-lo em termos de
absoluta correção jurídica.» - p.20 sebenta
O tribunal, por norma, só pode conceder tutela jurisdicional se tal lhe for pedido, como dissemos, mas
o pedido carece de ser interpretado para que se conclua qual a providência que o autor especificamente
requer (ex.: o autor pode formular mal o pedido).
Admite-se em certos termos que o julgador dê uma solução diferente da que foi requerida pela parte,
desde que resulte, mediante interpretação, que a providência especificamente requerida o foi
erroneamente – é possível pela interpretação do pedido que o autor formulou erroneamente, isto é, que
aquilo que ele pretende é diferente do que formulou – artigo 609.º, n.º 3 CPC.
ex.: artigo 376.º, n.º 3 CPC no âmbito das providências cautelares, faculta a possibilidade de se
conceder uma providência cautelar diferente daquela que foi requerida (o requerente pode requerer
uma determinada providência, mas o tribunal pode entender que, para responder ao periculum in mora,
a providência deve ser outra) / artigo 193.º, n.º 2 CPC – erro na qualificação o meio processual, que
deve ser corrigido oficiosamente pelo juiz.

É necessário que o fim pretendido pelo autor possa ser identificável, isto é, aquilo que o autor pretende
obter precisa de ser identificável. Não é possível que o requerente pretenda obter uma coisa e o tribunal
conceda outra (aí estaríamos perante uma violação do princípio do pedido).
Uma vez formulado o pedido com determinados termos e com tais limites, o juiz deve ocupar-se do
pedido inteiramente, não se ocupando nem de menos nem de mais. «(…) outro dever processual, que
vincula o julgador a pronunciar-se sobre as questões que lhe foram colocadas pelo autor e só sobre elas.
Há, assim, uma regra de correspondência entre o que foi pedido e a decisão do tribunal» - p. 18 sebenta

Caso o tribunal não considere o pedido na sua totalidade, a sentença incorre numa nulidade por
omissão de pronúncia – artigo 615.º, n.º 1, d), 1.ª parte CPC.
Também é nula a sentença quando o juiz condena em quantidade superior ou em objeto diferente do
pedido – artigo 615.º, n.º 1, d), 2.ª parte e al. e) CPC – caso em que a sentença incorre numa nulidade
por excesso de pronuncia.
NOTA: imagine-se que o autor deduz um pedido com parcelas – pede X+Y+Z – há acordos que
admitem que o tribunal determine montantes parcelares diferentes, desde que o total não seja excedente.

CONCLUINDO:
Uma ação civil não se inicia de forma oficiosa, mas apenas por impulso dos particulares; do autor
(através da petição inicial). Só em casos excecionais é que se admite que uma ação seja interposta ex
officio, designadamente, quando haja um interesse público na condução de uma determinada causa
privada (ex.: certas ações de investigação da paternidade ou maternidade, cujo processo de averiguação
pode ser iniciado oficiosamente – artigo 1808.º, n.º 1 CC (maternidade) e 1864.º CC (paternidade))
Isto significa que a regra do pedido acompanha a disponibilidade material das posições jurídicas em
presença e só em casos raros vale o princípio da oficialidade.
«Ao princípio do pedido contrapõe-se o princípio da oficialidade, na medida em que a sua consagração
seja feita de modo a permitir ao tribunal pronunciar-se sobre questões que não lhe foram colocadas,
mas que decorrem da relação jurídica submetida à sua apreciação, sem que por isso incorra em nulidade
da sentença.»
Rita Nunes 18
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• PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA IGUALDADE DAS PARTES – artigo 3.º, n.º 1


CPC (
O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja
pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.
Como correlato passivo do princípio do pedido está o princípio do contraditório – se a cada uma das
partes é dada, em diferentes momentos da ação, a possibilidade de formular um pedido (de requerer
providências, de requerer diligências, de fazer requerimentos, de fazer alegações, etc.), à outra parte
deve ser oferecida a possibilidade de pronúncia e, dessa forma, a possibilidade de influenciar o
conteúdo das decisões que a possam afetar.
Pretensão a ser escutado pelo tribunal – rechtliches Gehör / audiatur et altera pars (que se escute
também a outra parte).
Este princípio do contraditório é uma consagração constitucional como uma das dimensões do
princípio do Estado de Direito – artigo 2.º CRP.

Artigo 3.º, n.º 2 CPC – ‘Só nos casos excecionalmente previstos na lei se podem tomar providências
contra pessoa sem que esta seja previamente ouvida’.
É o que pode acontecer em matéria de providências cautelares. Não estamos, no entanto, nem mesmo
nesses casos excecionais, perante uma derrogação do princípio do contraditório – a parte vai ser ouvida.
Atente-se: ‘previamente’ – excecionalmente pode decretar-se uma providência sem que a parte seja
ouvida previamente, mas ela vai ter de ser ouvida (depois).

Artigo 3.º, n.º 3 CPC – a lei sublinha que o respeito pelo contraditório deve ser procurado pelo juiz ao
longo de todo o processo e em respeito de todas as decisões que, no processo, devam ser tomadas,
salvo o caso de manifesta desnecessidade.
‘3 - O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório,
não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto,
mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas
se pronunciarem’.

Uma matéria pode ser de conhecimento oficioso ou provocado. Quando uma matéria é de
conhecimento provocado significa que o juiz não pode conhecer dessa matéria oficiosamente (devem
ser as partes a provocar o conhecimento do juiz sobre aquela matéria) – ex.: conhecimento de exceções
dilatórias (artigo 578.º CPC). Por regra são de conhecimento oficioso, mas há casos que não são.
ex.: imagine-se que o tribunal não é competente, sendo um caso de incompetência relativa não previsto
no artigo 104.º CPC. O tribunal pode aperceber-se disso, mas não sendo matéria de conhecimento
oficioso, o tribunal não pode conhecer dela.
Isto significa que se uma matéria não é de conhecimento oficioso, o tribunal não pode conhecer dessa
matéria, mesmo que se aperceba disso.

Voltando ao n.º 3 do artigo 3.º CPC…


Portanto, mesmo que uma matéria seja de conhecimento oficioso, resulta do princípio do contraditório
que o juiz deve dar oportunidade às partes de se pronunciarem antes de ele tomar uma decisão sobre
essa matéria. Ambas as partes são protegidas – o princípio do contraditório serve para proteger o Autor
e o Réu.

Rita Nunes 19
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEÓRICAS

«ex.: se o tribunal «ad quem» entender que os factos apurados nos autos devem ser submetidos a enquadramento normativo
diverso daquele que foi considerado pelas partes e pelo tribunal «a quo» e daí resultam consequências práticas que não
foram tidas em conta pelos litigantes, a vinculação do julgador ao contraditório impõe-lhe que adapte a tramitação do
recurso, de maneira a que nela se encaixe, em plano de igualdade, a tomada de posição das partes sobre a mudança que
o tribunal entende ser de efetuar na qualificação jurídica da matéria de facto.» - p.21 sebenta

Na atual compreensão deste princípio, este não está apenas pensado como um princípio dirigido à
possibilidade de defesa contra a pretensão do autor ou de defesa contra a pretensão do réu – tem como
conteúdo a possibilidade de influenciar a decisão a ser proferida na causa.
Daqui decorre que o princípio visa conferir a possibilidade de defesa, não apenas contra alegações da
contraparte, mas também contra decisões do juiz, ou seja, mesmo que se trate de matérias que o juiz
possa conhecer oficiosamente.
Decorre daqui também que se o juiz pretende tomar uma decisão ao abrigo de um fundamento que não
foi sustentado por nenhuma das partes, deve conceder na mesma a uma e a outra a possibilidade de
pronúncia (sob pena de cometer uma nulidade), uma vez que se não o fizer ele profere uma decisão
surpresa (o juiz decidiu com um fundamento novo sobre o qual as partes não tiveram oportunidade de
se pronunciar).

Ora, isto não significa que o juiz não possa decidir com um fundamento novo, porque pode (ele não
está vinculado às alegações das partes em matéria de Direito) – existe a proibição de decisões surpresa,
mas o juiz pode tomar uma decisão ao abrigo de um fundamento que não foi sustentado, desde que dê
oportunidade às partes de se pronunciarem
O princípio do contraditório manifesta-se nos planos da alegação, da prova e do direito:

→ No que diz respeito ao PLANO DA ALEGAÇÃO, este princípio traduz-se na possibilidade de


os factos alegados por uma parte poderem ser contraditados pela parte contrária (pela
contraparte).

→ No PLANO DA PROVA este princípio reclama:


• Em primeiro lugar, que as partes tenham idênticas possibilidades de proposição dos meios
de prova necessários à prova das respetivas alegações de facto, na medida em que sejam
controvertidas, ou seja, sejam impugnadas pela parte contrária
• Em segundo lugar, que a atividade instrutória seja realizada, pelo menos quando o meio
de prova assim o consinta, em audiência, na presença de ambas as partes.
• Depois, que as partes se possam pronunciar sobre o resultado das provas produzidas,
através das alegações finais (de facto e de Direito).

→ No que diz respeito ao PLANO DO DIREITO, deve ser conferida às partes a possibilidade de
discutir efetivamente todos os fundamentos de Direito da decisão – trata-se da proibição da
decisão surpresa.

Este princípio vale também para as hipóteses em que a novidade de uma certa qualificação/
entendimento de Direito é trazido por um juiz – se o juiz pretende tomar uma decisão com base num
fundamento nunca discutido pelas partes, deve oferecer-lhes oportunidade de pronúncia. Caso não o
faça (não dê oportunidade de pronúncia), o processo incorre numa nulidade processual, neste caso por
aplicação das regras gerais sobre a nulidade dos atos (artigos 186.º e ss. CPC/ 195.º CPC)
«A omissão dos atos processuais que ao tribunal incumbia integrar no processo, com o objetivo de
assegurar a efetivação do contraditório, provoca a aplicação do regime das nulidades processuais
previstas no artigo 195.º. na verdade, a falta de iniciativa do julgador na introdução dos ajustamentos
Rita Nunes 20
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEÓRICAS

estruturais necessários para acolher a realização prática do contraditório enquadra-se na omissão de


factos que estava obrigado a praticar e cuja preterição pode influenciar o sentido da decisão final.» -
p.22 sebenta

Se o juiz praticar um ato que a lei não admite ou omitir um ato que a lei prescreva, estamos perante
uma irregularidade – a prática ou omissão só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a
nulidade cometida possa inferir na decisão da causa (o que significa que o ato fica sem efeito, como
fica tudo o que depender desse ato).
Neste caso, se o tribunal desrespeitar o princípio do contraditório, estamos perante uma nulidade, uma
vez que o juiz não praticou um ato que deveria ser praticado (ouvir as partes) com influência na decisão
da causa.

• PRINCÍPIO DA IGUALDADE DAS PARTES – artigo 4.º CPC


Com este princípio do contraditório está relacionada a ideia de que as partes devem ser tratadas com
paridade, usando de meios equivalentes de convencer o tribunal – princípio da igualdade das partes
(artigo 4.º CPC) – se ao autor é dada a possibilidade de pedir, ao réu deve ser dada a possibilidade de
contradizer; se ao autor é dada a possibilidade de agir, ao réu deve ser dada a possibilidade de
excecionar; se ao autor é dada a oportunidade de afirmar, ao réu deve ser dada a oportunidade de negar;
etc.
Havendo vários autores ou vários réus, deve velar-se por que cada um deles, na medida do possível,
possa litigar sobre a sua quota na relação jurídica com autonomia, não sendo prejudicado pelos atos
praticados pela sua comparte.
NOTA: regime de acesso ao direito e aos tribunais: Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, e DL n.º 71/2005,
de 17 de março.

• PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO (EM SENTIDO ESTRITO/MATERIAL) – artigo 5.º, n.º1


CPC
Um dos princípios mais importantes, que vamos falar agora, é o princípio do dispositivo e os seus
correlatos/ manifestações.
Estamos aqui a falar do princípio do dispositivo em sentido material/ estrito – este princípio é a
tradução processual do princípio da autonomia privada e do respeito pela titularidade privada
dos direitos, pelo que o seu âmbito será tendencialmente mais amplo quando a ação diga respeito a
direitos disponíveis e mais restrito quando diga respeito a posições jurídicas indisponíveis.

Manifestações:

→ Está reservada às partes a liberdade de instauração do processo – princípio do pedido, que está
relacionado com o princípio do dispositivo, sendo, aliás, uma manifestação/ corolário do
princípio do dispositivo.

«Ao abrigo de tal princípio pertence ao autor decidir, com inteira autonomia, se e quando toma
a iniciativa de desencadear os meios de tutela do seu direito (proposição da ação: artigo 259.º,
n.º 1)» - p.14 sebenta

Rita Nunes 21
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→ Cabe às partes a conformação da causa – a conformação da causa quanto ao seu objeto (através
das alegações das partes (o autor deve alegar os factos que integram a causa de pedir e o réu
factos que integrem matéria de exceção perentória, ou seja, factos que impedem, modificam ou
extinguem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor) e quanto às suas partes (o autor
deve identificar a pessoa do réu e, depois, pode haver modificações subjetivas – modificação de
partes e entrada de novas partes, o que está relacionado com a matéria da legitimidade)).

NOTA: matéria da intervenção de terceiro, que é um incidente da instância – artigo 292.º - 295.º CPC
e 311.º e ss. CPC
NOTA: artigo 6.º, n.º 2 CPC – há faltas processuais insanáveis, mas também há pressupostos sanáveis
e o juiz deve providenciar o suprimento da falta desses pressupostos processuais suscetíveis de sanação
– ex.: questão do litisconsórcio – sendo necessário trazer uma parte nova, o juiz não pode fazê-lo
(chamar) oficiosamente, tendo apenas que dar oportunidade às partes para o fazerem se quiserem.
Tudo isto para dizer que a conformação da causa, quer nos seus elementos subjetivos (partes) quer nos
objetivos, cabem às partes.

NOTA: artigo 5.º CPC.


Artigo 5.º CPC
(Ónus de alegação das partes e poderes de cognição do tribunal)
1 - Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se
baseiam as exceções invocadas.
2 - Além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz:
a) Os factos instrumentais que resultem da instrução da causa;
b) Os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem
da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar;
c) Os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas
funções.
3 - O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação
das regras de direito.

Artigo 5.º, n.º 1 CPC – manifestação do princípio do dispositivo: às partes cabe alegar os factos
essenciais que constituem a causa de pedir, e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas.

Artigo 5.º, n.º 2, al. a) CPC – factos instrumentais são factos que servem para provar outros factos
Os factos têm de ser sempre resultantes da instrução. O juiz não pode usar conhecimento
extraprocessual dos factos. Segundo o princípio da proibição do conhecimento privado, o juiz não pode
utilizar o conhecimento privado que tem da realidade.

Continuação das manifestações do princípio do dispositivo:


→ As partes podem colocar termo ao processo em qualquer momento e, com limites mais
restritos, suspender a causa. Está na disposição das partes, não o processo propriamente dito,
mas o objeto do processo, a relação material controvertida, que é uma relação privada. Daí que
a delimitação do objeto do processo caiba às partes.

NOTA: O modelo processual em vigor é o Modelo Publicístico-Social, sendo que no século XIX
vigorava um outro modelo processual: o Modelo Liberal-Individualístico, em que o próprio processo
Rita Nunes 22
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estava nas mãos das partes. Mas não é isso que está em vigor, sendo que no modelo atual o processo é
público e o juiz é que é o gestor do processo (e não as partes).

Ou seja, a relação controvertida, que é objeto do litígio, está nas mãos das partes – cabe às partes dizer
ao juiz sobre o que vai decidir (pedido/ causa de pedir) e é por isso que as partes podem pôr fim ao
processo. Assim, se o juiz tiver que decidir, este manda no processo e pode ordenar a realização de
diligências, mas o autor pode desistir do pedido ou da instância; o réu pode confessar o pedido; as
partes podem transigir; ou decidir atribuir a resolução do litígio a um tribunal arbitral; etc. – isto são
negócios jurídicos de autocomposição do litígio (confissão, desistência e transação – artigo 283.º
e ss. CPC)
NOTA: na desistência da instância, se o réu já tiver contestado a ação, depende da aceitação do réu.

«É fundamentalmente nos momentos referidos que se centra o poder de exercício das faculdades
jurídicas conferidas pelo direito material, funcionando o processo como simples instrumento da sua
realização, o que implica a subordinação do tribunal aos termos em que as partes – isoladamente ou de
comum acordo – decidem atuar em juízo.» - p.15 da sebenta
Estávamos a falar dos 3 negócios jurídicos de autocomposição do litígio:
1. Confissão
2. Desistência
3. Transação.

→ Artigos 283.º e ss. CPC

NOTA: Não devemos confundir a confissão do pedido (o réu pode confessar o pedido) com a confissão
do meio de prova!

A CONFISSÃO DO MEIO DE PROVA é justamente um meio de prova que consiste na declaração


da realidade de um facto que é desfavorável ao confitente – a pessoa/a parte declara a realidade de um
facto que lhe é desfavorável (artigo 352.º CC).

Artigo 352.º CC
(Noção)
Confissão é o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e
favorece a parte contrária.

O Código Civil prevê o regime da confissão (capacidade e legitimação, inadmissibilidade, modalidades,


etc.), sendo um regime bastante complexo.
A confissão judicial escrita tem força probatória plena contra o confitente, podendo ser feita nos
articulados, embora se for feita através de advogado é preciso ter em consideração o regime do artigo
46.º do CPC.

Artigo 46.º CPC


(Confissão de factos feita pelo mandatário)
As afirmações e confissões expressas de factos, feitas pelo mandatário nos articulados vinculam
aparte, salvo se forem retificadas ou retiradas enquanto a parte contrária as não tiver aceitado
especificadamente.

Rita Nunes 23
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Isto é, quando um advogado recebe uma peça processual dirigida pela outra parte, se for feita uma
confissão nesse articulado, no articulado de resposta deve-se escrever que se aceita especificadamente
a confissão tal, do facto tal, no articulado X.
NOTA: remissão do artigo 46.º CPC para o artigo 354.º, n.º 1 CC

Pode, por sua vez, obter-se a confissão através de um meio de prova, que é a tal PROVA POR
CONFISSÃO – artigos 452.º e ss. CPC.
Veja-se o artigo 463.º CPC – o depoimento é sempre reduzido a escrito na parte em que houver
confissão, fazendo prova plena e não se admitindo prova em contrário (artigo 354.º, n.º 1 CC).

A confissão é uma declaração de ciência, e não de vontade, uma vez que não se trata de exteriorizar
uma declaração com vista à produção de um efeito negocial. O facto que a parte confessa estão
plenamente provados e, portanto, o juiz parte no momento em que vai proferir a sentença em com a
conformidade realidade daqueles factos, que são tidos como verdadeiros para efeito daquele processo,
sem prejuízo da possibilidade de declaração de nulidade.
A parte pode confessar todos os factos, mas daí não decorre necessariamente a procedência da ação,
porque isso não significa que esteja a dar razão à outra parte (ex: o réu pode não contestar a ação).
Portanto, a confissão de todos os factos não equivale à confissão do pedido.

A CONFISSÃO DO PEDIDO dá-se quando o réu está a reconhecer a razão ao autor.

Retomando ao artigo 283.º CPC…


Artigo 283.º CPC
(Liberdade de desistência, confissão e transação)
2 - É lícito também às partes, em qualquer estado da instância, transigir sobre o objeto da causa
A transação é um contrato, podendo ser judicial ou extrajudicial (artigos 1248.º-1250.º CC).

Artigo 290.º CPC


(Como se realiza a confissão, desistência ou transação)
1 - A confissão, a desistência ou a transação podem fazer-se por documento autêntico ou particular,
sem prejuízo das exigências de forma da lei substantiva, ou por termo no processo.
2 - O termo é tomado pela secretaria a simples pedido verbal dos interessados.
3 - Lavrado o termo ou junto o documento, examina-se se, pelo seu objeto e pela qualidade das pessoas
que nela intervieram, a confissão, a desistência ou a transação é válida, e, no caso afirmativo, assim é
declarado por sentença, condenando-se ou absolvendo-se nos seus precisos termos.
4 - A transação pode também fazer-se em ata, quando resulte de conciliação obtida pelo juiz; em tal
caso, limita-se este a homologá-la por sentença ditada para a ata, condenando nos respetivos termos.
n.º 3: O juiz só aprecia se a confissão ou a transação, pelo seu objeto e qualidades, é válida. A partir
desse momento o juiz deve pronunciar uma SETENÇA HOMOLOGATÓRIA.
n.º 4: remissão para os artigos 594.º, 591.º, nº1, a) e 604.º, n.º 2

No inicio da audiência o juiz chama os advogados das partes e questiona se não há maneira de chegar
a um consenso por acordo.
• Se o autor desiste do pedido, absolve o réu.
• Se o réu confessa o pedido, condena o réu.

Rita Nunes 24
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• Se as partes fazem uma transação (acordo), condena o réu no que for acordado – SETENÇA
HOMOLOGATÓRIA A TÍTULO EXECUTIVO (se não houver, depois, cumprimento, pode
haver execução com base nessa sentença).
Ex: o autor numa ação de condenação ordena que o réu pague 10000€ a título de responsabilidade
civil, depois fazem um acordo e o réu compromete-se a pagar 5000€. O que o juiz decide? Que o réu
pague 5000€.

A desistência do pedido não é a mesma coisa que a desistência da instância.

Artigo 285.º CPC


(Efeito da desistência)
1 - A desistência do pedido extingue o direito que se pretendia fazer valer.
2 - A desistência da instância apenas faz cessar o processo que se instaurara.

Na DESISTÊNCIA DA INSTÂNCIA o direito não se extingue, o que quer dizer que cessa aquele
processo, mas pode haver novo processo para o exercício do mesmo direito.

Artigo 286.º CPC:


n.º 1 – A desistência da instância depende da aceitação do réu.
Isto porque o réu pode legitimamente pretender obter algo mais do que a desistência do autor - pode
querer obter uma decisão de mérito/ um caso julgado material favorável, evitando assim a interposição
de novas ações contra si intentadas, sobre aquele direito.
n.º 2: A desistência do pedido é livre mas não afeta a reconvenção – o processo continua para ser
julgado o processo reconvencional

As partes podem também acordar na suspensão da instância nos termos do artigo 272.º, n.º 4 CPC
(remissão para o artigo 275.º, n.º 4).

• PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE DAS PARTES


Também se pode designar principio da autorresponsabilidade das partes/ princípio do dispositivo em
sentido amplo ou técnico/ princípio da controvérsia
Tem como correlato o princípio da preclusão.
No modelo liberal individualístico, que vigorava no século XIX, entendia-se que as partes tinham não
só o monopólio da relação, mas também do próprio processo. E resultava deste princípio da
responsabilidade das partes que às partes caberia introduzir no processo todos os factos (essenciais e
instrumentais), o que significa que o juiz não tinha poder para reconhecer factos instrumentais, e , por
outro lado, cabe às partes requerer/ produzir as provas, sem que o juiz tivesse capacidade de produção
de prova.
Vigorava uma ideia de que o juiz tinha um papel passivo ‘juiz como convidado de pedra do processo’
– entendia-se que era uma necessidade em virtude do princípio da imparcialidade. O juiz para ser
imparcial, tinha apenas que apreciar o processo dualístico para no fim tomar a decisão.

Rita Nunes 25
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No diploma preambular do diploma legislativo com o qual começou a reforma do processo civil, lê-se
que ‘um dia um advogado quis à viva força fazer adiar uma audiência de julgamento’ – um advogado
queria adiar a audiência e pôs-se a citar todos os artigos do Código.

Hoje tal não poderia acontecer, porque é o juiz que dirige o processo (é ele o gestor do processo).
As partes não são responsáveis pela condução do processo e também não resulta do princípio do
dispositivo em sentido material que apenas às partes caiba a produção de prova, ou que os juízes não
possam conhecer oficiosamente factos instrumentais.

Por isso, existe o princípio atinente ao oficio do juiz, que é o PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO.

Artigo 411.º CPC


(Princípio do inquisitório)
Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao
apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito
conhecer.

Há aqui um poder oficioso do juiz, quer ao nível do conhecimento oficioso de factos (instrumentais,
complementares e concretizadores que resulta na instrução da causa), quer um poder-dever de produção
oficiosa de prova.


No entanto, chama-se à atenção para o facto de que, no entendimento do professor FERNANDO
PEREIRA, vigora um PRINCÍPIO DE RESPONSABILIDADE DAS PARTES e um PRINCÍPIO
DA PRECLUSÃO e isto gera uma certa tensão com este poder de o juiz.

Ora, as partes têm o ónus da prova, e a lei estabelece momentos para isso, e se as partes não fizerem
isso, depois pode o juiz pode ordenar a produção de prova quando já existe um momento de
preclusão?
As partes já não podem porque já se precludiu o seu direito, mas o juiz pode ainda fazê-lo.

Conclui-se que os poderes oficiosos do juiz em matéria de produção de prova não podem constituir uma
forma de sanar a negligência das partes, ou seja, o juiz não se deve substituir às partes. O que significa
que, do ponto de vista do professor, os seus poderes de produção oficiosa de prova devem ser vistos
como poderes complementares (o juiz pode complementar o trabalho das partes, mas não se substituir
a elas).

CONCLUINDO, a ciência jurídico processual evoluiu da seguinte forma:


− As partes já não conduzem o processo;
− O juiz não deve ser inerte;
− Decorre do Princípio da Responsabilidade das Partes e do Princípio da Preclusão que o poder do
juiz não pode ser visto como a possibilidade de se substituir às partes, mas apenas de
complementar/ concretizar o trabalho das partes;

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• PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO
Há pouco falava-se no processo como uma luta, mas entretanto foi surgindo a ideia do processo como
uma comunidade de trabalho. Ou seja, esta aqui presente a ideia de que as partes e o tribunal (o juiz e
a secretaria judicial) devem cooperar para a justa resolução da lide.
Mas claro, no Direito atual, o princípio da cooperação funciona como uma limitação à liberdade
individual, ou seja, a regra é que cada uma das partes cuida dos seus próprios interesses (elas estão
numa posição de antagonismo e cada uma delas pretende obter ganho de causa).
A exceção é que em diferentes dimensões previstas na lei as partes têm a obrigação de cooperar – a lei
tipifica deveres de cooperação. Ou seja, a cooperação não é espontânea – artigo 7.º, n.º 1 CPC.

Casos em que a lei estabelece deveres concretos de colaboração:


- Dever de colaboração para a descoberta da verdade (artigo 417.º CPC). O juiz pode inverter o
ónus da prova se a parte se recusar a colaborar

- Nemo tenetur edere contra se (ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo). Não é assim no
nosso sistema jurídico, sendo que a parte pode, de facto, ser obrigada a produzir prova contra si mesma,
mas não de forma espontânea.

- Dever de colaboração do juiz com as partes (artigo 7.º, n.º4 CPC)

Relacionado com o princípio da cooperação está, por sua vez, o Princípio da Boa-fé (artigo 8.º CPC) ,
uma vez que o dever de observar estes deveres de cooperação são uma manifestação do princípio da
boa-fé.

O princípio da boa-fé pode servir para enquadrar aquelas hipóteses em que se sanciona a prática de atos
abusivos/ emulativos (através dos quais se pretende prejudicar a parte contraria). Ora, tenha-se em conta
a este propósito a possibilidade de condenação de uma parte como litigante de má-fé – artigo 542.º, nº1
e nº2 + artigo 543.º e artigo 545.º CPC.

Tudo isto são comportamentos que, de acordo com o legislador, são representativos de uma litigância
de má-fé, são violação da boa-fé.

3 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau,


da decisão que condene por litigância de má-fé.

Vimos as exceções do artigo 629.º CPC (n.º 2 e n.º 3), mas há outras normas dispersas pelo código de
admissibilidade do recurso e esta é um exemplo.
Tenha-se em consideração a este propósito o artigo 612.º CPC.
O juiz deve agir no sentido de que as partes, por conluio, façam o uso anormal do processo para obterem
um fim proibido pela lei ou para praticarem um ato simulado através do processo. Se isso acontecer, o
juiz deve obstar a que as partes façam um uso anormal do processo para atingir um fim proibido.

Rita Nunes 27
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2. Princípios atinentes à atividade/ ao ofício do juiz:

• PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA (artigo 203.º CRP)


Por independência entende-se que os juízes não estão formalmente sujeitos a um poder superior no que
toca à decisão de um determinado caso, sendo esta independência garantida pelo estatuto específico
dos juízes, que estão sujeitos a um órgão de gestão e disciplina próprio, que é o Conselho Superior de
Magistratura e são sempre inamovíveis.
A independência nunca será completa, mas em todo o caso, o que se deve procurar é garantir-se que o
estatuto do juiz é de tal ordem que se garante que a decisão é resultado de um juízo pessoal seu e não
de uma ingerência estranha ao processo – isto no que diz respeito à independência dos juízes.

• PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE DO TRIBUNAL


Pretende-se que o juiz ocupe uma posição equidistante de ambas as partes, isto é, que não tome partido
a favor de nenhuma das partes/ não se coloque ao lado de nenhuma das partes – imparcialidade no
sentido de equidistância.
Este é um princípio que é garantido por algumas regras, nomeadamente a regra do juiz natural – o
que significa isto? Significa que o juiz competente para a causa é fixado por regras legais e não de outro
modo. Esta é uma regra importante do ponto de vista da imparcialidade judicial.
É através da aplicação de regras legais, e não de outra forma, que se vai determinar qual o tribunal ou
o juízo competente para julgar a concreta ação. Depois cada tribunal ou juízo tem vários juízes. Depois
a distribuição é aleatória, para que o processo seja atribuído a um juiz daquele tribunal ou daquele
juízo, cuja competência foi determinada por regras legais.
Chama-se à atenção ainda para o regime do impedimento (artigos 115.º a 117.º CPC) e da suspeição
(artigo 120.º CPC).
O primeiro, impede o juiz de conhecer de uma certa causa atendendo à sua proximidade com algum ou
alguns sujeitos da causa. portanto, essa proximidade do juiz relativamente a um dos sujeitos da causa
constitui o impedimento.
O segundo, relativo a outras situações menos graves, de suspeição, leva-se a que na presença de uma
causa que permite suspeitar da imparcialidade do juiz seja necessário que o juiz formule um juízo sobre
a sua aptidão para conhecer da causa – caso exista uma circunstância que coloque em causa a sua
imparcialidade.
Os impedimentos e as suspeições encontram-se num título do código que é ‘das garantias de
imparcialidade’.

• PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
O juiz exerce uma posição vinculada, sendo que, por isso, está sujeito à lei – artigo 203.º CRP e artigo
8.º, n.º 2 CC. Procura-se através deste princípio de que o juiz seja independente de todos os homens
para estar apenas sujeito ao direito.
Decorre daqui que a legitimação do juiz não é nem carismática, nem política ou democrática (não é o
processo político democrático que o legitima), sendo sim técnica – é o seu conhecimento do Direito
que legitima a sua função.
O princípio da legalidade significa que as decisões do juiz devem ser conformes ao Direito, decorrendo
daqui a consequência de que em matéria de Direito o juiz não está sujeito às alegações das partes –
artigo 5.º, n.º 2 CPC – e que corresponde ao brocardo latino iura novit curia (o Direito ao juiz compete).
Portanto, as partes têm a oportunidade de fazer alegações de Direito nos seus articulados,
designadamente na petição inicial e na contestação.
Rita Nunes 28
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Aliás, ao abrigo do princípio do contraditório, deve ser dada a oportunidade às partes de se


pronunciarem sobre os fundamentos jurídicos da decisão que o juiz pretenda tomar. Se o juiz pretender
tomar uma decisão com base num fundamento jurídico que não foi discutido pelas partes, deve-lhes dar
a oportunidade de se pronunciarem, sob pena de violação do princípio da proibição de decisões
surpresa. Ou seja, em matéria de Direito, o juiz deve ouvir as partes, mas não está vinculado às
alegações de Direito realizadas.
Portanto, se às partes cabe o domínio sobre as alegações de facto (às quais o juiz está vinculado, no
que diz respeito à delimitação do objeto do processo), ao juiz caberá o exclusivo sobre o direito a
aplicar à causa, não obstante o dever do juiz, ao abrigo do princípio do contraditório, de ouvir as partes.
Só mediante acordo das partes, ou expressa conceção da lei, pode o juiz decidir não de acordo com o
direito estrito, mas segundo regras da equidade – artigo 4.º CC.

• DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO RACIONAL DAS DECISÕES JUDICIÁRIAS (artigos


205º , nº1 CRP e 615.º, nº1 CPC)
Também aqui se manifesta a vinculatividade do juiz ao direito – artigo 205.º, n.º 1 CRP e 154.º CPC.
Se o poder do juiz é globalmente vinculado então as suas decisões deverão ser vinculadas também,
especificando os respetivos fundamentos de facto e de direito, sob pena, aliás, de nulidade da sentença
– artigo 615.º, n.º 1, b) CPC (‘é nula a sentença se não apresentar os respetivos fundamentos…’).
Este dever de fundamentação desempenha várias funções:
1 – Permite ao próprio juiz controlar a sua decisão – o juiz é forçado/ obrigado por lei a explicitar
os respetivos fundamentos, e ao fazê-lo, ele pode assim sindicar a razoabilidade da respetiva decisão,
e verificar se esta é consentânea com os fundamentos que avança.
2 – Permite que o juiz informe as partes das razões que o levaram a tomar aquela decisão –
permite-se que as partes possam conhecer das razões que levaram à decisão e a consideração do juiz
pelas posições das partes é uma forma de demonstração de respeito que é devido aos membros da
comunidade jurídica.
3 – Permite-se e facilita-se o controlo da decisão por parte dos tribunais superiores – estes,
conhecendo das razões que guiaram o juiz podem controlar e corrigir (se for o caso) a respetiva decisão,
pelo que a fundamentação é também muito importante do ponto de vista da sindicância da decisão
pelos tribunais superiores em sede de recurso (quando admissível e interposto).

• PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO (artigo 411.º CPC)


É a regra geral que atribui um poder geral ao juiz de produção oficiosa de prova)
Existem outras normas que atribuem também poder ao juiz de produção oficiosa de prova – ex.: artigos
436.º, 477.º e 487.º, n.º 2 CPC; artigo 490.º, n.º 1 CPC; etc.

O exercício destes poderes pelo juiz não pode funcionar como uma forma de contornar os fenómenos
preclusivos que existam em matéria probatória/ não pode servir para sanar a negligência das partes em
matéria probatória.
NOTA: tensão entre o princípio do inquisitório e o princípio da responsabilidade das partes

Rita Nunes 29
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEÓRICAS

• PRINCÍPIO DA GESTÃO PROCESSUAL


Este é um princípio cujo relevo se procurou destacar na reforma de 2013 do CPC, conformando-se em
letra de lei – aquilo que o princípio da gestão processual abarca duas dimensões, uma com mais
dificuldades do que outra:

1 – O juiz é responsável pela condução do processo, pelo que tem um poder de direção formal do
processo.
Deve, por isso, nos termos do artigo 6.º, n.º 1 CPC, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo
seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao seu normal
prosseguimento, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório, e ouvidas as partes, adotando
mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em
prazo razoável.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 6.º CPC, cabe ao juiz providenciar oficiosamente pelo suprimento de todos
os pressupostos processuais suscetíveis de sanação.

2 – O juiz pode, em certos termos, modelar os próprios termos do processo/ a tramitação do


processo – é o chamado poder de adequação formal (levanta mais dificuldades).
O juiz pode adaptar o modelo padrão de tramitação às especificidades do caso, quando entenda que as
regras processuais previstas não oferecem uma regulação adequada às especificidades do caso. Esta
adequação do processo às especificidades do caso concreto passa normalmente por medidas de
agilização do processo, mas podem conduzir à necessidade de se complexificar a tramitação – ex.: na
lei deixou de se prever que o juiz elabore a base instrutória, na fase de saneamento, ou seja, o juiz no
despacho saneador, antes, elaborava a base instrutória.
Veja-se a este propósito o artigo 547.º CPC e o artigo 630.º, n.º 2 CPC.

Estas medidas que o juiz toma de adequação formal devem respeitar os princípios fundamentais do
processo e as regras injuntivas de proteção das partes, pelo que não se deve perder de vista que a forma
de processo é uma garantia de previsibilidade (ou seja, as partes sabem com o que podem contar). Por
outro lado, essa forma tem por detrás determinadas valorações específicas – o poder do juiz deve servir
para o juiz adaptar o regime existente e não para o substituir.

NOTA: Acórdão 507/10 – Tribunal da Relação de Coimbra

Como se disse, o juiz pode adaptar a forma dada com o objetivo de atingir um processo equitativo – o
juiz não é legislador.

Rita Nunes 30
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TEÓRICAS

3. Princípios atendentes à estrutura do processo

• PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
O processo civil é o resultado da interação de dois elementos: regras jurídicas e atos humanos.
Sobretudo no que diz respeito às regras jurídicas, que no processo balizam os atos que são praticados,
existe um princípio que deve servir de parâmetro de controlo às soluções encontradas, que é o princípio
da proporcionalidade – princípio geral do direito que se aplica aqui na sua tripla dimensão: necessidade,
adequação e proibição do excesso)
Portanto, existirá sempre este critério que serve de parâmetro de controlo às decisões que o tribunal
seja chamado a tomar, por exemplo, sobre a admissão de um requerimento, a admissão de uma
determinada diligencia, etc.

Os próximos três princípios são princípios que não valem para todo o processo – ex.: a fase da sentença
decorre, à partida, sem a presença das partes, pelo que não há princípio da imediação.

• PRINCÍPIO DA IMEDIAÇÃO
Do princípio da imediação resulta que o juiz na matéria de facto deve ter uma relação imediata com
os meios probatórios relevantes para a causa e, dessa forma, poderá o juiz formular um juízo pessoal
sobre as alegações pessoais feitas pelas partes – porque ele tem um contacto direto/ uma relação
imediata com os meios probatórios.
Resulta deste princípio que se deve recorrer aos meios de prova mais próximos do facto a provar
– ex.: deve-se recorrer à testemunha mais próxima: ‘se alguém diz que ouvir dizer, então procura-se a
testemunha que realmente ouviu isso’
Ao serviço deste princípio encontra-se a oralidade e a concentração.
Da oralidade resulta que os meios de prova pessoal devem decorrer, à partida, sob a forma oral , sem
prejuízo da sua gravação, como o artigo 155.º, n.º 1; o 591.º, n.º 4. Quando não são gravados, os atos
presididos pelo juiz são documentados em ata, artigo 155.º, n.º 7 CPC.

• PRINCÍPIO DA CONCENTRAÇÃO
Por sua vez, decorre do princípio da concentração que os atos de instrução e discussão se devem
concentrar na unidade de tempo mais curta possível. Portanto, a audiência de julgamento é continua
e só se interrompe se for necessário - haverá o menor número de interrupções possíveis.

• PRINCÍPIO DA PLENITUDE DA ASSISTÊNCIA DO JUIZ


A decisão quanto à matéria de facto deve ser proferida por um juiz que assistiu a todos os atos
instrutórios necessários para a decisão da causa.

• PRINCÍPIO DA PUBLICIDADE (artigo 206.º CRP e 606.º, n.º 1 CPC)


Por via de regra, as audiências judiciais são públicas, por forma a garantir a transparência do
funcionamento do sistema de justiça e o próprio processo civil é publico, sendo o mesmo facultado a
qualquer interessado.
Este direito só pode ser restringido para proteção de bens de maior relevo, como a proteção da
dignidade das pessoas, da intimidade da vida familiar, da moral pública ou da eficácia da decisão.
O regime geral da publicidade encontra-se regulado nos artigos 163.º e ss. CPC.

Rita Nunes 31
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TUTELA CONSTITUCIONAL
Importa, ao terminar os princípios fundamentais do Processo Civil, apurar de qual o âmbito de proteção
constitucional dos valores fundamentais do processo.
Para bem se compreender a referência ao Direito Constitucional, é importante tomar em linha de conta
que a importância do Direito Constitucional decorre de dois aspetos não coincidentes:
1. Por delimitar o estatuto jurídico fundamental do poder político, em particular dos diferentes
poderes públicos (legislativo, executivo, judicial), sistema de governo, sistema judiciário, etc.: em
síntese, por delimitar a orgânica e competência que o poder público a si se dá. O Direito Constitucional
nasceu aliás com esta intenção, de ser o estatuto fundamental do poder público. Em lugar da ideia de
que o príncipe, o soberano, está livre da lei, surge a ideia de que à lei está vinculado. No que diz respeito
à orgânica judiciária, tenha-se em vista os artigos 202.º ss. CRP.
NOTA: Nos termos do artigo 165.º, 1, p) CRP, a competência para legislar sobre a “organização e
competência dos tribunais e do Ministério Público e estatuto dos respetivos magistrados, bem como das
entidades não jurisdicionais de composição de conflitos” é da reserva relativa da AR.
2. Mas a importância do Direito advém de uma segunda dimensão: através da previsão de certos
catálogos de Direitos Fundamentais e de sistemas de fiscalização de constitucionalidade, o Direito
Constitucional desempenha hoje a função prática de servir de parâmetro de fiscalização do Direito
constituído.

Do ponto de vista pragmático, o Direito Constitucional é assim o instrumento de que o jurista goza para
sindicar e colocar em causa o valor do Direito constituído, garantindo assim por um lado certa liberdade
ao jurista (que se liberta da lei), sem se deixar de mover nos quadros da lei (de valor superior, mas de
teor mais determinando). Assim se explica também porque é que algumas disposições constitucionais
têm um sentido tão indeterminado: é que a
A importância de referir a tutela constitucional de certos valores constitucionais é, pois, também a
seguinte: caso alguém discorde de dada solução, não por ter sido mal aplicada, mas por colocar em
causa a própria razoabilidade da regra, o meio técnico que tem ao dispor para afastar a regra é justamente
pedindo a fiscalização da constitucionalidade.
Esta proteção que é dada é-o, quer ao nível constitucional, quer ao nível supraconstitucional. No que ao
processo respeita, há duas normas que merecem particular referência, o artigo 20.º CRP – acesso ao
direito e à tutela jurisdicional efetiva – e o artigo 6.º CEDH – direito a um processo equitativo. Num e
noutro caso, não se trata de uma exposição como que dos valores fundamentais do processo, mas como
que do recorte de dadas ilhas de proteção jurídica que o Direito Constitucional toma à sua guarda.

As principais dimensões que se entende decorrerem deste regime do artigo 20.º CRP são:

a) O direito de acesso ao Direito (n.º 1), no sentido de direito de acesso aos tribunais. Daqui
entende-se decorrerem quatro consequências:
− O direito de ação, compreendido como o direito de desencadear a atividade judiciária;
− O direito ao processo, compreendido como o direito a poder participar num qualquer
processo que seja adotado para tomar a decisão;
− O direito à decisão da causa pelos tribunais;
− O direito à execução.

b) A proibição da denegação de justiça por insuficiência de meios económicos (artigo 20.º, n.º 1,
in fine). Ao contrário do que acontece em matéria de saúde (artigo 64.º, 2, a)) ou no ensino básico e
universal (artigo 74.º, 2, a)), que devem ser, ora gratuitos, ora tendencialmente gratuitos, não há
qualquer imposição constitucional de que o acesso ao Direito seja gratuito. Há, porém, a proibição de
Rita Nunes 32
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que o acesso seja negado por insuficiência de meios económicos. Para realizar esta injunção
constitucional, encontra-se prevista a possibilidade de requerer apoio judiciário, quer para consulta ou
patrocínio jurídicos, quer para patrocínio judiciário (Lei 34/2004, de 29/7).
NOTA: Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com as respetivas alterações (Acesso ao Direito e aos Tribunais)

c) O direito de acesso à informação e consulta jurídica (n.º 2), garantindo também através daquele
regime.
d) O direito ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar de advogado perante qualquer
autoridade (artigo 20.º, n.º 3). Atendendo à grande complexidade técnica do Direito, pretende-se com
esta regra garantir, a cada membro da comunidade, poder fazer assistir-se de um especialista em Direito,
condição necessária a uma defesa capaz.
e) A criação de procedimentos particularmente céleres destinados à defesa de direitos, liberdades
e garantias (artigo 20.º, n.º 5). Um exemplo em matéria civil é o processo especial para remoção de
ofensas à personalidade (artigo 878.º ss. CPC). Em matéria administrativa, encontramos a intimação
para a defesa de direitos, liberdades e garantias (artigo 109.º ss. CPTA).
f) O direito a uma decisão em prazo razoável (artigo 20.º, n.º 4), [não significa uma decisão
rápida]), o que reclama que a comunidade molde o sistema de justiça de tal forma que consiga tomar as
decisões com certo prazo de brevidade. Não se exige uma decisão rápida, mas em prazo razoável, isto
é, adaptada às especificidades da causa. Por outro lado, tem de ter um prazo suficiente para garantir que
se conseguem respeitar as exigências de um processo equitativo, o que muitas vezes não se te em vista.
Durante muitos anos Portugal foi condenado pelo TEDH por delongas excessivas em matéria processual.
g) O direito a um processo equitativo (artigo 20º., 4, in fine) tem subjacente a jurisprudência do
TEDH sobre esta matéria, uma vez que o artigo 6.º da CEDH lhe faz expressa referência. Trata-se de
uma formulação genérica, ampla, que está preparada para englobar diferentes realidades no seu âmbito.
Tem-se entendido que engloba:
− Direito à igualdade de armas no processo;
− Direito ao contraditório;
− Direito a prazo razoável;
− Direito à fundamentação das decisões;
− Direito de acesso ao processo e aos dados dele constantes;
− Direito à prova.
Note-se que por intermédio deste regime se tutelam muitos dos valores fundamentais do Processo Civil.

h) Tão importante como se identificar qual o âmbito positivo da tutela constitucional do processo é
identificar o que nela não se enquadra.
Em particular, é de referir que considera não se enquadrar na tutela constitucional o direito ao recurso.
A previsão do segundo grau de jurisdição está apenas prevista para matéria penal (artigo 32.º, n.º 1
CRP). Entende-se que me matéria civil se trata de matéria da liberdade de conformação do legislador
ordinário.
Quer dizer: na orgânica judiciária prevêem-se vários níveis de tribunais (artigo 209.º, 1, a)), mas não
se confere sempre o direito de acesso aos tribunais superiores.
Já conhecemos o artigo 649.º, n.º 1 e 44.º LOSJ – a 1.ª e a 2.ª instância têm uma alçada e o recurso
ordinário, por regra, , apenas é admissível quando o valor da ação for superior ao valor da alçada nesse
Tribunal, e a decisão a impugnar seja desfavorável ao recorrente em pelo menos metade desse valor.
Apesar desta solução adotada pelo legislador é de notar que há exceções em que o recurso é sempre
admitido.
Rita Nunes 33
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FORMAS JURÍDICAS DE JURISDIÇÃO


PROVIDÊNCIAS CAUTELARES
A lei prevê (artigo 2.º, n.º 2 CPC e artigo 362.º, n.º1 CPP), que a todo o direito corresponde a ação
adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, assim como a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-
lo coercivamente.
Portanto, mediante este reconhecimento da possibilidade de agir em juízo, através do recurso ao
sistema público de justiça, faculta-se que as partes vejam tuteladas as próprias posições jurídicas
– é isso que pretendem através do recurso a uma ação (é intentada uma ação no tribunal para obter a
tutela de uma determinada posição jurídica)

Mas o que é que acontece?


É que a marcha processual pode demorar um período de tempo tal (isto porque o processo é um caminho
e, por isso, a decisão demora a ser tomada [decisão que depois transita em julgado]) que coloque em
risco as posições jurídicas que se pretendem tutelar através da ação principal (por contraposição a
procedimento cautelar, que está ligado a uma ação principal).
A ação principal tem como objetivo a tutela de uma posição jurídica, mas essa posição jurídica pode
estar em risco durante o tempo que é necessário para que venha a ser tomada na ação uma decisão sobre
aquela posição jurídica.

Como veremos, um dos requisitos gerais para o decretamento de uma providência cautelar é o
periculum in mora, e, por esta razão é que se prevê a possibilidade de decretamento de providência
cautelar que vise ‘assegurar a efetividade do direito ameaçado’ (artigo 2.º, n.º 2, in fine e artigo 362.º,
n.º 1 CPC).
[que se refere à existência de decisões judiciais de caráter provisório com o alcance específico de proteger a integridade
dos efeitos decorrentes da procedência da ação em que o requerente das medidas cautelares procura a solução definitiva
do litígio ou, até, a realização coativa de um direito – p. 127 sebenta]).
Ou seja, o direito pode estar ameaçado e é necessário assegurar a sua efetividade enquanto não há uma
decisão definitiva sobre essa matéria.
Portanto, o propósito das providências cautelares é de oferecerem uma tutela provisória do direito
enquanto não estiver resolvido definitivamente o fundo da causa – portanto, as providências cautelares
valem enquanto não houver uma decisão sobre o fundo da causa.
«Na génese desta tutela transitória está a consideração de uma realidade meramente hipotética, pois
no momento em que os procedimentos cautelares atuam ignora-se se o direito acautelado será ou não
reconhecido pelo tribunal.» - p. 127 sebenta

Logo, têm uma natureza cautelar e temporária, ao contrário do que acontece nas ações inibitórias,
que tem uma função cautelar definitiva. Esta precariedade ou temporalidade das providências cautelares
reflete-se na previsão de um conjunto de causas de extinção do procedimento e de causas de caducidade
da providência (e que são manifestação da precariedade das providências cautelares).
Note-se que as providências cautelares se encontram, então, por via de regra, na dependência de uma
ação principal – artigo 364.º, n.º 1 CPC.
Por via de regra, isto tem que ver com uma solução introduzida em 2013 que é a figura da INVERSÃO
DO CONTENCIOSO (artigo 369.º CPC) – na verdade, permite-se, em determinados casos, o
aproveitamento da providência cautelar para resolver definitivamente a causa, quando o juiz consiga

Rita Nunes 34
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formar uma convicção segura acerca da existência do direito ameaçado, por um lado, e, por outro lado,
a providência cautelar decretada permite alcançar o efeito útil querido pelo requerente.
Assim, em determinados casos, permite-se que se aproveite a providência cautelar para se obter
uma decisão que se pode tornar a decisão definitiva da causa – aqui o juiz inverte o contencioso.

Por regra, as providências cautelares estão ligadas a uma ação principal e podem operar de duas formas:

1. COMO INCIDENTE DA AÇÃO PRINCIPAL – significa isto que a providência cautelar é


instaurada já na pendência da ação principal (a ação principal já está a correr e depois intenta-se a
providência cautelar – o procedimento cautelar não vai, portanto, correr em autos próprios, estando
apensado à ação principal)
É competente para dela (da providência cautelar) conhecer o tribunal competente para o
conhecimento da ação principal – artigo 364.º, n.º 3 CPC. Requerido no decurso da ação, deve o
procedimento ser instaurado no tribunal onde esta corre e processado por apenso, a não ser que a
ação esteja pendente de recurso [onde o processo fisicamente está no tribunal de recurso e não na 1.ª
instância].

2. ANTES DA AÇÃO PRINCIPAL – A providência cautelar pode ser intentada em momento


anterior àquele em que a ação principal é intentada – artigo 364.º, n.º 2 CPC.
Se a ação principal vier a correr num tribunal diferente daquele onde está a correr a providência cautelar
para aí é remetido o apenso – artigo 364.º, n.º 2 CPC.
Onde deve ser intentada a providência cautelar quando é intentada antes da ação principal?
Se for como incidente da ação principal a providência é intentada no tribunal onde corre a ação, mas
se for intentada a providência antes da ação principal temos de olhar ao artigo 78.º, n.º 1 CPC. «O
procedimento cautelar corre no tribunal que tenha competência, em atenção aos critérios previstos no
n.º 1 do artigo 78.º, mas os autos são remetidos, com vista à apensação, ao tribunal do lugar da
proposição da ação principal, se for diferente daquele onde o requerimento da providência deu entrada
(artigos 78.º, n.º 2 e 364.º, n.º 2)» - p. 140 sebenta
• alínea a) - trata dos casos específicos do arresto e do arrolamento, sendo que estes podem ser
requeridos quer no tribunal onde deva ser proposta a ação respetiva, quer no lugar onde os bens
se entrou (no caso de haver bens em várias comarcas então pode ser intentada para qualquer
umas dessas comarcas).

• alínea b) - prevê que nos casos de embargo para uma obra nova é competente o tribunal do lugar
da obra.
• alínea c) - prevê que para os restantes procedimentos cautelares é competente o tribunal em que
deva ser proposta a ação respetiva.

A relação de dependência entre a providência cautelar e a ação principal manifesta-se em algumas


causas de caducidade que estão previstas na lei – artigo 373.º CPC - pp.152-154 da sebenta
• alínea a) – apenas se considera que se propõem a ação principal, para efeitos de evitar o efeito
previsto, se a ação que propuser tiver por objetivo a tutela da posição jurídica que a providência
cautelar pretende proteger.

• alínea b) – a tutela provisória apenas se justifica na medida em que aquele que dela beneficia
procure em simultâneo a tutela definitiva do direito.

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• alínea c) – o requerente tem o ónus de intentar a ação principal, e se esta for julgada
improcedente, então o procedimento cautelar caduca.

• alínea d) – aqui temos de fazer uma remissão para o artigo 279.º, n.º2 CPC, que prevê que os
efeitos das primeira proposição se mantêm, quando tal for possível.

• alínea e) – neste caso já não há nada para tutelar.

No que diz respeito, por sua vez, à relação entre o julgamento da providência e o julgamento da ação
principal, a relação entre ambos é de autonomia, ou seja, o julgamento da providência cautelar é
independente do julgamento da ação principal e decidido com autonomia – artigo 364.º, n.º 4 CPC.
Portanto, a relação de dependência que existe entre as duas tramitações é meramente externa ou formal
– isto significa que a providência pode ser decretada e depois improceder a ação principal, como pode
a providência cautelar não ser decretada e depois a ação principal proceder.
Ex.: a providência cautelar pode ser decretada com a mera aparência de bom direito (fumus boni iuris),
onde o requerente deve apenas fazer prova sumária do direito, e depois na ação principal o autor não
conseguir convencer o tribunal da existência do direito.
Ex.: a providência cautelar pode não ser decretada, porque o requerente não conseguiu demonstrar o
periculum in mora.

As providências cautelares não têm a natureza jurídica nem de ação nem de incidente, sendo uma forma
de tutela sui generis – não são ação porque não oferecem a composição definitiva do litígio (obtido pela
ação principal), mas também não são um mero incidente da instância.

Elas podem surgir antes da ação ou incidentalmente, mas não são um incidente na medida em que não
estão ao serviço da ação principal – constituem, na verdade, um meio autónomo de tutela, isto porque
os incidentes são tramitações que são enxertadas na ação principal e que estão ao serviço da ação
principal (ex.. um incidente de verificação do valor da causa; o incidente de habilitação; o incidente de
intervenção de terceiros – são tramitações que estão ao serviço da ação principal.).
Aqui a providência cautelar não está ao serviço da ação principal, correspondendo a um meio de tutela
autónomo – É UM MEIO DE TUTELA SUI GENERIS.

Classificações das Providências Cautelares


As providências cautelares podem ser objeto de diversas classificações.

1. Quanto ao tipo de efeitos produzidos:


• PROVIDÊNCIAS CAUTELARES ANTECIPATÓRIAS – são aquelas que, como o próprio
nome indica, antecipam o resultado pretendido com a ação principal (ex.: é o caso da restituição
provisória da posse [artigo 377.º CPC e 1279 CC] – o tribunal ordena as medidas indispensáveis para
que o requerente obtenha a reposição da situação anterior ao esbulho, ainda que a definição da titularidade da posse
tenha que aguardar o desfecho da ação principal; dos alimentos provisórios [artigo 384.º CPC e 2007.º
CC] – é solicitada ao tribunal a fixação de uma quantia mensal que se destina a cobrir os encargos estritamente
necessários ao sustento, habitação e vestuário do requerente, enquanto este aguarda o pagamento da primeira
prestação definitiva; do arbitramento de reparação provisória [artigo 388.º, n.º 1 CPC] – a
providência traduz-se na fixação de uma renda mensal que antecipa em alguma medida a indemnização dos danos
causados ao requerente)

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«(…) visam conceder ao requerente parte ou, até mesmo, a totalidade dos efeitos práticos que resultam
da procedência da ação principal, mediante um despacho de condenação suscetível de funcionar como
título executivo, no caso de a determinação provisória do tribunal não ser acatada pelo requerido.» -
p. 132 sebenta
A providência cautelar pode abarcar direitos ou posições jurídicas a constituir apenas na ação principal,
que será uma ação declarativa constitutiva – artigo 362.º, n.º 2 CPC.

Artigo 362.º CPC


(Âmbito das providências cautelares não especificadas)
1 - Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente
reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente
adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado.
2 - O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de
decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor.
3 - Não são aplicáveis as providências referidas no n.º 1 quando se pretenda acautelar o risco de
lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas no capítulo seguinte.
4 - Não é admissível, na dependência da mesma causa, a repetição de providência que haja sido
julgada injustificada ou tenha caducado.

É possível acautelar um direito através de uma providência cautelar quando esse direito não existe?
O legislador deixa claro que sim.
Imagine-se, por exemplo, uma providência cautelar antecipatória do efeito pretendido com a
constituição de uma servidão legal de passagem – a ação declarativa em causa (ação principal) é
constituída, mas pretende-se obter através de uma providência cautelar uma antecipação do efeito
pretendido por essa constituição. Esta seria uma providência cautelar não especificada e o direito em
causa é um direito a constituir.

• PROVIDÊNCIAS CAUTELARES CONSERVATÓRIAS – aquelas que procuram conservar um


certo estado de coisas anterior ou contemporâneo da propositura da ação (ex.: suspensão de
deliberações sociais - artigo 381.º, nº 3; arresto - artigo 391.º, n.º 2; embargo de obra nova - artigo
397.º, n.º 1; e arrolamento - artigo 406.º, nº 5).
2. Por outro lado pode distinguir-se o procedimento cautelar comum (artigos 362.º e ss. CPC) do
procedimento cautelar especificado (artigos 377.º e ss. CPC)
• PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM (artigos 362.º e ss. CPC) vs. PROCEDIMENTO
CAUTELAR ESPECIFICADO (artigos 377.º e ss. CPC)
Estes encontram-se numa relação de generalidade e especialidade, o que significa que, à falta de um
procedimento especificado, se não for de aplicar ao caso um procedimento especificado, então
aplicam-se as regras do procedimento cautelar comum – isto resulta do artigo 362.º, n.º 3, CPC.

Artigo 362.º CPC


(Âmbito das providências cautelares não especificadas)
1 - Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente
reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente
adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado.
2 - O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de
decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor.
3 - Não são aplicáveis as providências referidas no n.º 1 quando se pretenda acautelar o risco de
lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas no capítulo seguinte.
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4 - Não é admissível, na dependência da mesma causa, a repetição de providência que haja sido
julgada injustificada ou tenha caducado.

O legislador, para responder a determinadas situações de periculum in mora (perigo na demora), criou
providências cautelares especificadas: se não for de aplicar uma providência cautelar especificada,
aplicam-se as regras do procedimento cautelar comum.

Pode haver depois PROCEDIMENTOS ESPECIFICADOS ESPECIALÍSSIMOS – é o caso dos


arrolamentos especiais previstos no artigo 409.º CPC. Existe uma providência especificada que é o
arrolamento e o art.409º prevê arrolamentos especiais. Os arrolamentos especiais constantes deste
artigo são especiais em relação ao arrolamento comum (artigo 403.º CPC), que por seu turno é especial
em relação ao procedimento cautelar – é duplamente especial.
Nalguns casos, os requisitos que se aplicam aos procedimentos cautelares especificados são diferentes
(mais ligeiros) do que os requisitos aplicados em geral.

Artigo 376.º CPC


(Aplicação subsidiária aos procedimentos nominados)
1 - Com exceção do preceituado no n.º 2 do artigo 368.º, as disposições constantes deste capítulo são
aplicáveis aos procedimentos cautelares regulados no capítulo subsequente, em tudo quanto nele se não
encontre especialmente prevenido.
2 - O disposto no n.º 2 do artigo 374.º apenas é aplicável ao arresto e ao embargo de obra nova.
3 - O tribunal não está adstrito à providência concretamente requerida, sendo aplicável à cumulação de
providências cautelares a que caibam formas de procedimento diversas o preceituado nos n.os 2 e 3 do artigo
37.º.
4 - O regime de inversão do contencioso é aplicável, com as devidas adaptações, à restituição provisória da
posse, à suspensão de deliberações sociais, aos alimentos provisórios, ao embargo de obra nova, bem como
às demais providências previstas em legislação avulsa cuja natureza permita realizar a composição definitiva
do litígio.
NOTA: Nominados têm o mesmo significado que especificados.

Requisitos de decretamento de uma providência cautelar:


Do ponto de vista metódico, o juiz deve começar por apurar se há alguma providência cautelar
especificada adaptada às particularidades do caso e, se assim não for, aí é que recorre à providência
cautelar comum e, neste caso, valem os pressupostos gerais do decretamento.
São dois os pressupostos comuns do decretamento (artigo 368.º, n.º 1 CPC):

1) É necessário que exista a APARÊNCIA DE BOM DIREITO (fumus boni iuris), isto é, a
probabilidade séria de existência do direito («(…) baseia-se na simples demonstração da
probabilidade de o requerente obter ganho de causa no processo de que é dependência o
procedimento cautelar» - p. 138 sebenta).

Basta a aparência de bom direito, não sendo necessária a prova concludente da existência do
direito. Na ação principal é necessário que o autor faça prova concludente da existência de um
direito, senão a ação não procede. No entanto, no âmbito das providências cautelares é suficiente
que o requerente faça prova sumária do direito ameaçado (artigo 365.º, n.º 1 CPC).

Rita Nunes 38
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TEÓRICAS

2) É necessário o RECEIO SUFICIENTEMENTE FUNDADO DA LESÃO DO RESPETIVO


DIREITO por força da demora ao proferir a decisão, isto é, deve ser feita a prova do
periculum in mora, que deve ser firme e segura.

«Os factos dos quais o julgador infere o esvaziamento da decisão judicial futura têm de ser alegados e
submetidos a prova completa, isto é, a demonstração da realidade tem de assentar no grau de convicção
que normalmente se exige para o tribunal decidir, sem atenuações similares às que estão pressupostas
nos juízes de primeira aparência ou de simples verosimilhança» - p. 139 sebenta
Estes dois requisitos aplicam-se apenas a título subsidiário aos procedimentos especificados (artigo
376.º, n.º 1 CPC). «Quanto a estes procedimentos prevalecem as disposições privativas que contêm a disciplina de
cada um deles, aí se incluindo os pressupostos de que depende a concessão das medidas destinadas a fazer frente aos
riscos específicos que justificam a sua autonomização relativamente aos restantes meios de tutela cautelar.» - p. 138
sebenta

3) NÃO DESPROPORÇÃO DA MEDIDA (artigo 368.º, n.º 2 CPC) – tem por base uma ideia de
proporcionalidade.
O tribunal pode recusar o requerimento da providência cautelar quando o prejuízo dela resultante
para o requerido seja consideravelmente superior ao dano que o requerente pretende evitar. No
entanto, a lei impõe que este requisito só deva ser autonomamente ponderado nos procedimentos
cautelares comuns e não nos procedimentos cautelares especificados (artigo 376º, nº1, CPC).

Então porquê que este juízo de proporcionalidade não se aplica aos procedimentos cautelares
especificados?
Entende-se que a ponderação entre os dois bens, entre o prejuízo que o requerente pretende evitar e o
prejuízo que pode ser causado ao requerido, já foi feita em sede legislativa, quando o legislador criou
um regime específico para uma determinada situação especifica. Portanto, não se aplica esta regra do
artigo 368º, nº2, CPC aos procedimentos cautelares especificados (artigo 376.º, n.º 1, 1.ª parte, CPC).
No entanto, o princípio da proporcionalidade é um princípio diretor do processo civil, pelo que se num
procedimento cautelar especificado houver duas ou mais possibilidades de proteger o interesse do
requerente deve-se optar pela que é menos onerosa para o requerido.

3. Uma característica das providências cautelares é que o juiz não está adstrito à providência cautelar
que tenha sido concretamente requerida. – pp. 160-162 sebenta
O tribunal deve fixar qual a tutela pretendida pelo requerente (qual a situação de perigo na demora que
ele pretende que o tribunal dê resposta), depois o juiz deve adotar a medida que, na sua interpretação,
entenda mais adequada às circunstâncias do caso. Portanto, não é que o juiz possa decretar uma coisa
que não foi pedida: o tribunal tem de identificar o que foi requerido, mas o tribunal pode depois
entender que medida concretamente adequada a dar resposta àquela situação não é a requerida, mas
outra (artigo 376.º, 1.ª parte CPC).
Pode acontecer que seja requerida uma providência comum e o tribunal decrete uma providência
especificada, pode acontecer precisamente o contrário, etc.

Ex.: O artigo 379.º CPC refere a possibilidade de, tendo sido requerida a restituição provisória da posse,
ser decretada a providência ao abrigo do regime comum. Existe uma providência cautelar especificada
que é a providência do artigo 379.º CPC, mas pressupõe que tenha havido um esbulho violento (artigo
377.º CPC).

Rita Nunes 39
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TEÓRICAS

A VINCULAÇÃO DO JUIZ aos procedimentos cautelares especificados é DUPLA


– Por um lado, ele está vinculado a decretar uma providência cautelar especificada quando a lei o
determine
- Por outro lado, o juiz não deve decretar qualquer providência cautelar comum quando ela seja
incompatível com a exclusão de tutela que resulta do procedimento cautelar especificado.
Ex.: uma das providências cautelares especificadas é a providência para arbitramento de indemnização
provisoria – o legislador admite-a só para determinados tipos de danos (artigo 388.º CPC), o que
significa que o juiz não poderá ao abrigo da providência cautelar comum decretar uma indemnização
provisória para outros casos. Ou seja, o regime especial permite a indemnização provisoria naqueles
casos e exclui ara acasos diferentes.
Portanto, o juiz não deverá decretar indemnização provisória para casos diferentes ao abrigo do
procedimento cautelar comum. Já no exemplo anterior, no caso da restituição provisória da posse, o
legislador já diz que se não estiverem verificados os requisitos (se não houve esbulho violento), é
possível o decretamento da procidência ao abrigo do regime comum.

TRAMITAÇÃO NOS PROCEDIMENTOS CAUTELARES

Para o regime do procedimento cautelar vale em primeiro lugar o regime especialmente previsto para
as providências cautelares (artigos 362.º e ss, CPC) e, depois, supletivamente, por remissão do 8,
aplica-se o regime previsto para os incidentes da instância.
Deve ainda aplicar-se as regras da ação declarativa que sejam compatíveis com as particularidades
das providências cautelares.
Portanto, aplicam-se:
- As regras especialmente previstas para as providências cautelares (artigo 362º e ss. CPC);
- As disposições gerais dos incidentes da instância por força da remissão do artigo 365º, nº3, CPC;
- As regras da ação declarativa compatíveis com as particularidades das providências.

O procedimento cautelar inicia-se mediante a APRESENTAÇÃO DE UMA PETIÇÃO (artigo 365.º,


n.º 1, CPC), sujeita, por isso, à aplicação das regras que valem para este articulado (regras dos artigos
552.º a 558.º CPC).

Recebida a petição a SECRETARIA ABRE A CONCLUSÃO DO PROCESSO A UM JUIZ.
Segundo o artigo 226.º, n.º 4, alínea b), CPC, a providência cautelar é um dos casos em que há sempre
despacho liminar, que é o despacho proferido em imediata resposta ao requerimento formulado, sem
prévia audição da parte contrária. Isto significa que há DESPACHO LIMINAR ainda antes de ser dado
conhecimento ao requerido de que foi proposto a respetiva providência cautelar.

O despacho liminar pode ter vários conteúdos: pode ser um despacho de indeferimento liminar (artigo
590.º, n.º 1 CPC).

Rita Nunes 40
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• Se houver exceções dilatórias de conhecimento oficioso insupríveis → DESPACHO DE


INDEFERIMENTO LIMINAR.
• Se houver irregularidades, mas elas forem suscetíveis de sanação → DESPACHO DE
APERFEIÇOAMENTO.

Depois, no âmbito das providências cautelares, caberá ao juiz no despacho liminar decidir do
diferimento ou não (atrasar ou não no tempo) do contraditório, decidindo se o contraditório vai ter
lugar antes ou depois do decretamento da providência. Este passo é importante, dado que a tramitação
será diferente consoante ou diferimento ou não diferimento do contraditório.
Se o requerido for logo citado ou notificado (porque se a providência for incidental ele já foi citado para
a ação principal e, por isso, será apenas notificado), ele vai ter um prazo para se opor, depois poderá
haver uma audiência de produção de provas e depois o juiz determina a decisão.

Mas e se o requerido não for ouvido antes?


Pode haver produção de prova e depois, sendo decretada a providência, se dá conhecimento ao requerido
que terá um prazo para fazer oposição ou para poder recorrer da decisão. Portanto, a tramitação é
diferente consoante o requerido seja ouvido antes ou depois de o tribunal se pronunciar.
Assim, no despacho liminar, o tribunal vai decidir sobre o diferimento ou não do contraditório.
Segundo o princípio do contraditório, por regra, não pode ser aplicada uma medida a uma pessoa sem
ela ser previamente ouvida. No entanto, há casos em que tal é possível, sendo este um deles.

NOTA: Sendo a providência cautelar antecipatória aplicam-se as regras do artigo 78.º CPC. A violação
das regras deste artigo (regras da competência em razão do território) origina uma situação de
incompetência relativa, que é de conhecimento oficioso somente nos casos previstos no artigo 104.º
CPC.
Um dos casos é este (artigo 104º, n.º 1, alínea a) CPC), o que significa que nas providências cautelares
a incompetência territorial é de conhecimento oficioso.
Nos termos do artigo 105.º, n.º 3 CPC, o juiz pode e deve no despacho liminar (já que neste caso a
incompetência territorial é de conhecimento oficioso) ordenar a remessa dos autos para o tribunal
territorialmente competente, quando o processo lhe permita tomar essa decisão.
Artigo 105º CPC
(Instrução e julgamento da exceção)
1 - Produzidas as provas indispensáveis à apreciação da exceção deduzida, o juiz decide qual é o
tribunal competente para a ação.
2 - A decisão transitada em julgado resolve definitivamente a questão da competência, mesmo que
esta tenha sido oficiosamente suscitada.
3 - Se a exceção for julgada procedente, o processo é remetido para o tribunal competente.
4 - Da decisão que aprecie a competência cabe reclamação, com efeito suspensivo, para o presidente
da Relação respetiva, o qual decide definitivamente a questão.

Portanto, o juiz pode indeferir liminarmente, mas também pode enviar para o tribunal competente
(consequência se houver uma situação de incompetência relativa).
Se não houver nenhuma exceção dilatória nem nenhuma deficiência que dê para ser suprida ou sanável,
então o processo vai avançar e o juiz vai decidir se o contraditório vai ser diferido ou não. Se o
contraditório não for diferido (como é a regra), este será um despacho de citação, ou seja, o juiz vai
ordenar a citação do requerido, vai ordenar à secretaria que promova a citação do requerido.
Rita Nunes 41
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A partir daqui, a tramitação prossegue com uma distinção: ou o contraditório foi diferido ou não
diferido.

Começamos já a ver que nas providências cautelares existe sempre despacho liminar – artigo 226.º,
n.º 4, al. b) CPC. Aqui (no despacho liminar) o juiz vai pronunciar-se sobre a questão de saber se o
contraditório vai o não ser diferido. Se, como é a regra, a parte contrária dever ser ouvida, então ordenará
à secretaria que promova a citação/notificação do requerido (conforme os casos).
Isto para dizer que a exposição subsequente parte desta distinção: casos em que o contraditório é
diferido e casos em que o contraditório não é diferido (que são a regra).

EXCEÇÃO – caso o contraditório seja diferido – pp. 150 e ss. da sebenta


O tribunal decide não ouvir previamente o requerido, pese embora tenha sido pedido pelo requerente.
Ou então, estamos perante um dos casos em que a lei determina que o contraditório é sempre diferido.
Se for decidido que o requerido não será ouvido previamente – temos que foi apresentado
requerimento; o requerente, normalmente, terá requerido a produção de determinadas provas, terá
juntado outros documentos no requerimento, etc. O juiz tem, portanto, à sua frente o requerimento
apresentado pelo requerente que segue as regras da petição inicial (tendo aqui também o ónus de
apresentar um rol de testemunhas, em virtude de uma remissão que é feita para as normas dos incidentes
da instância).
Excecionalmente, o juiz pode entender decretar logo a providência cautelar (1), quando entenda que
já tem elementos suficientes dos quais depende a respetiva concessão da providência cautelar. Segundo
o artigo 367.º, n.º 1 CPC a produção de provas em audiência final tem lugar ‘quando necessário’, o
que significa que o juiz pode entender que não é necessária a produção de prova, decretando logo a
providência cautelar requerida (ou a que entenda mais adequada) com base nos elementos que o
requerente apresentou (eventualmente, com base na prova documental que apresentou).

Caso contrário, deverá ser designado um dia para o início da audiência de produção de prova (2)
(prova requerida pelo requerente da providencia [ou seja, é uma audiência que vai ter lugar sem a
presença do requerido]. Nesse sentido, os depoimentos serão gravados para permitir o futuro exercício
do direito do contraditório (pelo requerido) – artigo 155.º CPC.

NOTA: há autores que consideram isto uma agressão ao princípio do contraditório – uma das
manifestações de respeito ao plano probatório diz respeito ao facto de a prova ser produzida na presença
de ambas as partes. Ora, isso aqui não acontecerá, porque ainda não foi dado o conhecimento a uma
das partes de que a providência cautelar foi intentada.

Com base na prova que se produza (a requerida pelo requerente da providência cautelar), o juiz
tomará uma decisão, podendo decidir ou não decretar a providência cautelar (a requerida ou outra que
considere mais adequada). Só depois disso é que se vai notificar o requerido da decisão tomada, sendo
que nesse momento o requerido pode reagir de duas formas (artigo 372.º CPC):
• Pode recorrer do despacho que tenha decretado a providência
• Pode deduzir oposição à providência cautelar

Rita Nunes 42
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Repare-se que o juiz já tomou uma decisão (ex.: ordenou o decretamento da providência
[imediatamente ou depois de produzida a prova necessária]), mas a contraparte ainda não teve a
oportunidade de se opor – mas já houve a decisão e é por isso que tem estas duas alternativas.

Quando é que faz uma coisa e outra? Pode recorrer do despacho que tenha decretado a providencia
quando entenda que essa providência não devesse ter sido concedida (há lugar a recurso de apelação)
– artigo 644.º, n.º 1, a) CPC.

Sendo assim, quando é que o requerido recorre?


Quando entenda, face aos elementos que o tribunal tinha à sua frente, que ele não deveria ter ordenado
a providência. Depois será o tribunal de recurso que vai decidir da manutenção ou não da providência
cautelar.

Pode deduzir oposição à providência cautelar, quer nos casos em que não admissível recurso, quer
pretenda produzir novos meios de prova que permitam modificar a convicção do tribunal – artigo 372.º,
n.º 1, b) CPC – aqui é o juiz que vai decidir da manutenção, redução ou revogação da providência que
anteriormente concedeu.
A decisão que venha a ser proferida considera-se parte integrante daquela que foi inicialmente proferida
– artigo 372.º, n.º 3 CPC.
Portanto, o requerido pode requerer e opor-se, sendo este mais ou menos o percurso da tramitação –
requerimento, decisão do juiz, audiência da produção de prova (se necessário), notificação da decisão
ao requerido que, no caso de o tribunal ter decidido decretar a providência, pode recorrer da decisão
(quando entenda que o juiz decidiu mal com base nos elementos que tinha à sua frente) ou opor-se
(quando o recurso não seja admissível ou quando pretenda trazer para o processo
elementos/factos/provas novos).

REGRA - quando o contraditório não seja diferido


O requerido vai ser citado para deduzir oposição (vai-se citar o requerido e ele terá a oportunidade de
deduzir oposição). Um aspeto técnico: o requerido será notificado e não citado se já tiver sido citado
para a causa principal – repare-se que a citação é a forma de chamar a primeira vez alguém ao processo.
Ora, se a providência cautelar for incidental e não preliminar, isso significa que o requerido/ réu já foi
citado na causa principal, pelo que a providência cautelar vai correr por apenso à causa principal. Nesse
sentido, o requerido será notificado e não citado novamente.

O prazo de oposição é de 10 dias – este prazo resulta da remissão que o artigo 365.º, n.º 3 CPC faz
para as disposições gerais dos incidentes da instância, e encontra-se no artigo 293.º, n.º 2 CPC (293.º,
n.º 2 ex vi 365.º, n.º 3 CPC)

À revelia do requerido (ou seja, à não apresentação de oposição) aplica-se o regime específico do
processo comum de declaração (artigo 567.º, n.º 1 CPC) – os factos articulados pelo requerente
consideram-se admitidos por acordo.

Claro que através da oposição, que é apresentada sob a forma de articulado se a parte estiver
representada por advogado (artigo 147.º, n.º 2 CPC), o requerido tem o ónus de apresentar todas as
questões que interessam à defesa (quer no que diz respeito à matéria de facto, quer no que diz respeito
Rita Nunes 43
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aos pressupostos jurídicos de decretamento da providência). É também este o momento oportuno para
o requerido dar conta dos eventuais prejuízos decorrentes do decretamento da providência – princípio
da proporcionalidade do artigo 368.º, n.º 2 CPC.
Se a providência cautelar for deduzida como incidente, o juiz deve tomar em consideração o
conjunto da defesa apresentada pelo réu/ requerido, ou seja, o juiz pode tomar em consideração os
elementos da contestação que o réu apresentou no âmbito da ação principal e que possam contribuir
para a negação da atendibilidade da providência.
Uma vez apresentada a oposição (ou não, caso em que se aplica o regime da revelia), o juiz estará em
condições de apurar se há algum obstáculo ao conhecimento do mérito da providência cautelar – se o
detetar, pode em despacho pré-saneador (artigo 590.º, n.º 2 CPC) convidar as partes à regularização
da instância (sob pena de depois extrair consequências em despacho saneador [artigo 595.º, n.º 1, al.
a) CPC]. Pode também, quando entender que não há necessidade de realização de atividade instrutória,
decidir logo da causa no despacho saneador (artigo 595.º, n.º 1, al. b) CPC).
Agora, o fundamento para estes despachos é o princípio da adequação formal – artigo 547.º CPC.
Se for necessária a produção da atividade instrutória, então avança-se para a audiência final –
artigo 367.º CPC: será produzida a prova que as partes tiverem requerido e a que o tribunal entender
realizar por sua própria iniciativa com base no exercício dos seus poderes instrutórios – artigo 411.º
CPC. A audiência deverá ser gravada (artigo 151.º, n.º 1 CPC) permitindo a sindicância da decisão por
parte do tribunal superior no que diz respeito à matéria de facto.
Encerrando-se a produção de prova, segue-se uma breve alegação oral, sendo proferida de imediato
decisão por escrito (artigo 295.º ex vi 365.º, n.º 3 CPC). O despacho decisório seguirá a estrutura da
sentença – artigo 607.º CPC.

A tramitação das providências cautelares é marcada pela preocupação de celeridade: as providencias


cautelares são de tramitação urgente, precedendo a prática dos atos que lhe respeitam a qualquer outro
serviço judicial não urgente – artigo 363.º, n.º 1 CPC.
A contagem dos respetivos prazos não se suspende nas férias judiciais – artigo 138.º, n.º 1, in fine
CPC. Preveem-se também prazos curtos de decisão: se houver audiência prévia do requerido, a decisão
deve ser proferida no prazo de dois meses; caso não haja audiência prévia do requerido, deve ser
proferida no prazo de 15 dias – artigo 363.º, n.º 2 CPC.
A dilação do prazo para oposição que possa ter lugar nos termos da norma do artigo 366.º, n.º 3 CPC
nunca deverá exceder a duração de 10 dias. Ao prazo de resposta pode acrescer uma dilação, sendo um
prazo dilatório aquele em que se faz juntar a um perentório e que vai retardar início da contagem do
prazo perentório. - p.133 da sebenta

Voltando ao contraditório e à proteção do requerido…


O princípio do contraditório é um princípio geral do processo civil, pelo que nenhuma decisão deve
ser tomada contra alguém sem que a ela lhe seja dada a oportunidade de sobre ela se pronunciar –
também é assim nas providências cautelares, onde vale a regra de que o requerido deve ser ouvido, nos
termos do artigo 366.º, n.º 1 CPC.
Mas a regra tem uma exceção: pode o tribunal decretar a providência sem a audiência prévia do
requerido, quando a audição prévia do requerido coloque em causa o fim ou a eficácia da providência
(FUNDAMENTO DO DIFERIMENTO).
Ou seja, deverá existir o fundado risco de que o requerido, se conhecer o pedido de providência (se
souber que foi apresentado o pedido de providência), adote atos que coloquem em causa a eficácia da
providência cautelar – esse é que é o risco que fundamenta o diferimento do contraditório. Se assim

Rita Nunes 44
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acontecer, o juiz, através de despacho fundamentado, pode ordenar o diferimento e, nesse caso, o
requerido só será notificado da decisão depois da realização da providência cautelar (artigo 366.º, n.º
6 CPC), aplicando-se à notificação o regime da citação (artigos 219.º e ss. CPC).
Exemplo:
Uma das providências cautelares especificadas é a do arrolamento – é um caso em que a lei não prevê
que o contraditório seja sempre diferido. Este é um caso em que, muitas vezes, se requer o diferimento
do contraditório – artigo 406.º, n.º 1 CPC.
ex.: imagine-se uma ação de divórcio (pese embora aqui se esteja perante um arrolamento especial
sujeito ao regime do artigo 409.º, n.º 1 CPC), havendo, a seguir à separação, a partilha dos bens que
integram a comunhão conjugal. No entanto, um dos cônjuges tem medo de que o outro esconda
determinados bens de valor que pertencem a ambos os cônjuges.
Por isso é que uma parte pode pedir o arrolamento dos bens – vai-se fazer uma descrição dos bens
(artigo 406.º, n.º 1 CPC). A lei não prevê que no arrolamento o contraditório é sempre diferido, mas
normalmente o requerente pede sempre, porque tem medo que a contraparte, antes mesmo de o
arrolamento ser decretado e efetuado, esconda ou dissipe os bens.

Existem 3 casos particulares em que não se ouve o requerido:

1. Restituição provisória da posse – artigo 377.º CPC e 1279.º CC – providência cautelar


especificada que pressupõe que houve um esbulho violento. Portanto, pressupõe que a pessoa foi
privada da posse de um determinado bem com violência.
O artigo 379.º CPC refere que é possível, se não houver esbulho ou perturbação da posse com
violência, que seja decretada a restituição da posse ao abrigo do procedimento cautelar comum (e
não o regime específico). Este regime específico desta providência especificada pressupõe, portanto,
sempre o esbulho violento – se assim for, a condenação é ordenada sem a audiência prévia do
esbulhador – artigo 378.º CPC (aqui a lei indica que não há audiência prévia)
Aqui «a utilização de meios violentos para a concretização do esbulho foi considerada como reveladora de tal grau de
antijuridicidade na atuação do requerido que justifica a reação imediata da ordem jurídica com vista à reposição
provisória da situação anterior» - p. 151 da sebenta

2. Arresto – uma vez verificados os respetivos pressupostos, não se exige a audiência do requerido
(obtém-se um efeito surpresa para que o requerido não consiga ocultar os seus bens) – artigo
393.º, n.º 1 CPC: aplica-se ao arresto as regras da penhora, que visa justamente antecipar os
efeitos da penhora.
No arresto o contraditório também é sempre diferido.
«O objetivo de conferir solidez à garantia patrimonial do crédito do requerente, aliado à frequência com que o devedor
procura subtrair o património à ação dos credores comuns, foram as circunstâncias que levaram o legislador a
consentir que a apreensão judicial de bens se efetue de maneira a surpreender o requerido» - p. 151 sebenta

3. O terceiro caso tem que ver com as situações em que seja de recorrer à citação edital (artigos
240.º e ss. CPC) – artigo 366.º, n.º 4 CPC
Porque se dispensa neste caso a audiência prévia? Porque aqui vai demorar a fazer-se a citação e
há uma probabilidade muito grande de não ser eficaz. Ou seja, demorar-se-ia muito tempo para
provavelmente ninguém chegar a comparecer.

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Portanto, com exceção destes 3 casos, a regra é que o contraditório será prévio e, portanto, um modo
de proteção do requerido. Ora, há outras disposições que também visam proteger a posição do
requerido.
As providências cautelares estão sujeitas a diversas causas de caducidade – remissão para o que vimos.
→ Artigo 374.º, n.º 1 CPC – se a providência for considerada injustificada ou caducar por facto
imputável ao requerente (ex.: a não propositura da ação principal) ele responderá perante o
requerido.
Chama-se também a atenção para o n.º 2 deste artigo 374.º CPC – o juiz pode estabelecer que seja
prestada uma caução pelo requerente para que possa ser decretada a providência cautelar (a caução
que é um meio de acautelar a eventual responsabilidade do caucionante).
Nos termos do artigo 376.º, n.º 2 CPC, a regra do artigo 374.º, n.º 2 CPC apenas é aplicável ao
arresto e ao embargo de obra nova (aplica-se subsidiariamente apenas a estes dois procedimentos
cautelares especificados).

→ Artigo 368.º, n.º 3 CPC – pode o próprio requerido pedir a substituição da providência cautelar
por caução (caução que se mostre suficiente para prevenir a lesão ou para a reparar na sua
totalidade).

→ Por último, sendo recusada a providência cautelar ou tendo caducado, o requerente não pode
repetir o pedido da mesma causa (artigo 362.º, n.º 4 CPC), a menos que haja uma necessidade
de tutela que derive de factos supervenientes ao primeiro procedimento.

Efeitos do decretamento e recurso


«Por vezes, a natureza das medidas cautelares decretadas permite que, numa primeira fase, ainda se
aguarde o respetivo cumprimento espontâneo, passando-se à execução forçada apenas na hipótese de
o sujeito passivo se mostrar renitente em acatá-las.» - p. 136 sebenta
No que diz respeito aos respetivos efeitos, as providências cautelares podem gozar de força executiva
– artigo 703.º, n.º 1, al. a) e artigo 705.º, n.º 1 CPC. Portanto, podem ser executadas com recurso à
força pública do Estado, quando isso se revele necessário para produzir o efeito da providência (isto
quando o despacho que decrete a providência seja um despacho que condene na realização de algum
comportamento, sob pena de não haver nada a executar).
Há outros casos em que a tutela é ainda mais forte, em que o próprio decretamento da providência
impõe logo a prática de atos que permitam a respetiva realização – ex.: arresto (artigo 391.º CPC e
619.º CC) em que se apreende de imediato o bem arrestado – se a providência for decretada, o tribunal
ordenará de imediato que o bem ou os bens em causa sejam arrestados. Portanto, o arresto é uma
providência cautelar de natureza mista: simultaneamente declarativa e executiva.
NOTA: a ação principal é uma ação declarativa, mas as providências cautelares podem estar ligadas a
ações executivas (e não só a ações declarativas) – ex.: o arresto pode estar ligado a uma ação executiva
para pagamento de quantia certa.

Por último, a providência cautelar goza de dois tipos de tutela compulsória que visa reforçar a sua
força:
→ Uma vez que na providencia cautelar está em jogo o império do Estado, comete crime de
desobediência aquele que a infrinja – artigo 375.º CPC e artigo 348.º, n.º 2 CP
→ Depois, pode ser decretada uma sanção pecuniária compulsória (artigo 829.º-A CC) que se revele
necessária para assegurar efetividade da providência (artigo 365.º, n.º 2 CPC).

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A sanção pecuniária compulsória é a forma prevista no ordenamento para compelir ao cumprimento de


obrigações de prestação de facto infungíveis e que se traduz na condenação do devedor ao pagamento
de uma certa quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada dia de infração.

No que diz respeito ao recurso, da decisão proferida em sede de providência cautelar cabe recurso para
o Tribunal da Relação, mas já não para o STJ (artigo 370.º, n.º 2 CPC), salvo nos casos particulares
previstos no artigo 629.º, n.º 2 CPC (casos em que o recurso é sempre admissível).
NOTA: isto pode ser considerado ainda um corolário do estatuto de urgência dos procedimentos
cautelares – p. 133 da sebenta

INVERSÃO DO CONTENCIOSO
As providências cautelares, no que diz respeito à sua função, pressupostos e estrutura, encontram-se
separadas da ação principal, mas, em certos termos, admite-se que a providência cautelar seja
aproveitada para obter uma decisão quanto ao fundo da causa, ou seja, possa ser uma decisão que se
venha a converter na decisão definitiva da causa – materialmente, estamos aqui perante uma forma de
tutela sumária definitiva.
Com esta possibilidade (a chamada ‘inversão do contencioso’ ou ‘reversal of the procedural burden’)
pretende-se obter ganhos de economia processual. Acontece que a consequência da inversão do
contencioso não é oferecer a imediata composição definitiva do litígio – o que acontece é que se
dispensa o requerente de ter de propor a ação principal - - «(…) situação processual que muda a
natureza provisória com que o procedimento nasceu, abrindo-se a possibilidade de nele mesmo ser
declarado, em termos definitivos, o direito que o requerente invoca, sem necessidade de proposição da
ação principal» - p. 139 sebenta
Ou seja, normalmente, sendo a providência cautelar preliminar, o requerente tem o ónus de intentar a
providência cautelar num determinado prazo que a lei prevê e se não intentar a ação nesse prazo a
providência caduca.
O que acontece aqui é que se dispensa o requerente do ónus de intentar a ação principal e a iniciativa
passa a caber ao requerido, ou seja, em vez do contencioso principal ser da iniciativa do requerente, isto
é, em vez de ser o requerente a ter o ónus de intentar a ação principal, o contencioso principal passa a
ser de iniciativa do requerido. Assim, o requerido é que tem o ónus de intentar uma ação principal
para pôr em causa o direito, sob pena de a decisão se converter na decisão definitiva do litígio.
Normalmente o autor tem o ónus de intentar a ação principal e se não o fizer a providência caduca.
Aqui é ao contrário: o ónus está no requerido e, portanto, se ele não o fizer, a providência consolida-se
e transforma-se na decisão definitiva do litígio.

Assim, o efeito da inversão do contencioso é a criação de um ónus de ação sobre o requerido.

A inversão do contencioso está sujeita a alguns requisitos:


→ É necessário que o juiz tenha formado no decurso do procedimento uma convicção segura
acerca da existência do direito acutelado, ou seja, não basta a aparência de bom direito (que é
um dos requisitos gerais para o decretamento da providência) – artigo 369.º, n.º 1 CPC
Claro está que esta convicção segura dificilmente se pode formar sem o contraditório do requerido,
porque sem ele não se afasta a dúvida quanto a eventuais fatores não ponderados pelo juiz e que

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TEÓRICAS

justamente o requerido pode trazer ao processo. Quer isto dizer que esta convicção só poderá ser obtida
depois do exercício do contraditório.

→ Depois, nos termos ainda do artigo 369.º, n.º 1 CPC, é necessário que a providência
concretamente requerida seja apta a realizar a composição definitiva do litígio – ex.: um caso
típico de providência incompatível com a inversão do contencioso é o arresto, através do qual
se apreendem bens do devedor para antecipar o resultado obtido com a penhora (artigo 391.º, n.º
2 CPC), não se antecipando a sorte do direito na ação principal, mas apenas conservando-se a
garantia patrimonial do credor. Assim, a natureza do arresto é conservar a garantia patrimonial,
não se ajustando esta natureza com a composição definitiva do litígio. – p.144 da sebenta

Ou seja, a inversão do contencioso ajusta-se às providências antecipatórias – não obstante, esta


afirmação não é absoluta. Note-se que o legislador diz quais são as providências especificadas às quais
entende ser aplicável o regime da inversão do contencioso (artigo 376.º, n.º 4 CPC), sendo uma delas
o regime da impugnação de deliberações sociais (exemplo de providencia conservatória e não
antecipatória).

→ Em terceiro lugar, é necessário que haja um requerimento (artigo 369.º, n.º 1 CPC) devendo
esse requerimento ser feito até ao encerramento da audiência final. Por norma, o requerente só
fará o pedido após a instrução e não no requerimento inicial, uma vez que só nesse momento é
que é possível avaliar o resultado da atividade instrutória.
NOTA: Note-se que nos procedimentos sem contraditório prévio, o requerido pode opor-se à inversão
do contencioso em conjunto com a oposição à providência decretada – artigo 369.º, n.º 2, 2.ª parte
CPC. Por sua vez, veja-se o artigo 370.º, n.º 1 CPC
«Só muito dificilmente se concebe que o tribunal possa “formar convicção segura acerca da existência do direito
acautelado”, quando não dispôs dos elementos de prova que o requerido podia trazer aos autos. Neste caso, permite-se
que o requerido se oponha à inversão do contencioso “conjuntamente com a impugnação da providencia decretada” sem
a sua audição prévia (artigo 369.º, n.º 2, 2.ª parte), servindo-se para o efeito, tanto do recurso de apelação, como do
incidente da oposição, previstos no n.º 1 do artigo 372.º» - p. 145 sebenta

Decretada a inversão do contencioso, o requerido dispõe do prazo de 30 dias para a propositura da


ação principal, ação principal essa que deve ter por objeto o convencimento do tribunal acerca da
inexistência do direito a acautelar. Ou seja, esta ação que o requerido tem o ónus de intentar tem por
objeto um qualquer conteúdo que ponha em causa a providência decretada (à partida poderíamos pensar
que tinha de ser uma ação de simples apreciação negativa, mas não tem que ser assim).
ex.: foi intentada uma providência para a restituição provisoria da posse (o requerente possuía algo que
lhe foi esbulhado). Ora, a parte contrária (o requerido) pode reagir através de uma ação de reivindicação,
que não é uma ação de simples apreciação, mas uma ação de condenação (que tem um momento de
simples apreciação).
Pode ser uma ação de simples apreciação negativa do direito invocado pelo requerente, mas também
pode ser uma ação de simples apreciação positiva – ex.: tratando-se de uma deliberação social,
mostrando que é válida.
Portanto, não tem que ser necessariamente uma ação de simples apreciação negativa, mas sendo-o (o
que será por norma) coloca-se uma questão interessante acerca da norma do artigo 371.º, n.º 1, 1.ª
parte CPC – este artigo diz ‘sem prejuízo das regras sobre a distribuição do ónus da prova…’.

Veja-se: o requerido é que passa a ter o ónus de ação, mas nas ações de simples apreciação negativa há
uma regra especial em matéria de ónus da prova e é o réu que tem esse ónus. Ora, se pensarmos, o réu
Rita Nunes 48
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neste caso vai ser o requerente (a retomar em aula prática). O requerido tem o ónus de intentar a ação,
mas numa ação de simples apreciação negativa, o réu é o requerente (há aqui uma inversão).
Assim, das duas uma:
→ Ou o requerido intenta a ação principal
→ Ou não intenta

É ele que tem agora a iniciativa da promoção do processo - artigo 371.º, n.º 2 e 373.º, n.º 3, al. b) e d)
CPC
→ Se ele intentar a ação e se esta proceder, caduca a providência que o tribunal decretou – artigo
371.º, n.º 3 CPC.
→ Caso a ação não proceda ou se verifique alguma das causas previstas no artigo 371.º, n.º 2 CPC
(se o processo estiver parado por mais de 30 dias por negligencia do autor ou o réu for absolvido
da instância e o autor não propor nova ação em tempo de aproveitar os efeitos da ação anterior)
o efeito da providência cautelar consolida-se, resolvendo-se definitivamente a causa.
E se o requerido não cumprir o ónus de intentar a ação principal? Aí a providência cautelar
consolida-se, resolvendo-se definitivamente o litígio (artigo 371.º, n.º 1 CPC) – trata-se de uma forma
de composição definitiva do litígio. Portanto, trata-se de atribuir um duplo valor à mesma providência
(aquilo que valia como providência cautelar pode valer, em certos termos, como forma de resolução
definitiva da lide [nos casos de inversão do contencioso]).

Providências especificadas previstas na lei


NOTA: Há providências cautelares especificadas que não estão previstas no CPC.

→ Restituição provisória de posse – este procedimento permite a célere restituição da posse (tem
por base o exercício da posse, designando-se, por isso, providência possessória) quando o
possuidor seja dela perturbado/ privado com violência – artigo 377.º, n.º 1 CPC. Portanto,
permite que seja exercida processualmente a pretensão substantiva que consta do artigo 1279.º
CC.

Devem ser alegados os factos que constituem a posse, o esbulho e a violência (bem como devem
ser provados). Se não se provarem estes factos, resolve-se o caso com base no regime da providência
cautelar comum.
Convencido o juiz de que houve o esbulho da posse, ordena a restituição sem citação nem audiência
do requerido – artigo 378.º CPC.

→ Suspensão de deliberações sociais – permite-se aqui, através desta providência cautelar


especificada, a célere impugnação de deliberações sociais de uma associação, ou de uma
sociedade (artigo 380.º CPC) ou, ainda, de assembleias de condóminos de prédios em
propriedade horizontal (artigo 383.º, n.º 1 CPC).
É uma providência conservatória.
Quais os seus pressupostos? Houve uma deliberação social, considera-se ser ilegal e, portanto, quer-
se suspender essa deliberação para que ela não seja executada. Depois, na ação principal discute-se
a sua validade.

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Os pressupostos são: a contrariedade à lei (aos estatutos ou ao contrato); a qualidade de sócio/


associado/ condómino do requerente e a demonstração de que a execução da deliberação causaria
um dano apreciável.
Se a deliberação já estiver executada não se pode recorrer a esta providência, porque não há
periculum in mora. O que se pretende aqui é que não seja executada, alegando-se que pode resultar
um dano apreciável da execução dessa mesma deliberação. O juiz pode no entanto deixar de
suspender quando o prejuízo da suspensão seja manifestamente superior ao dano causado ao
requerente pela execução – artigo 381.º, n.º 2 CPC.
O procedimento deverá ser instruído com a ata da deliberação – artigo 380.º, n.º 2 CPC – podendo
ser exigida a respetiva cópia com uma cominação de que, se não for apresentada, a respetiva
oposição apresentada pelo requerido não será recebida – artigo 381.º, n.º 1 CPC.

→ Alimentos provisórios – esta providência cautelar serve para se obterem alimentos provisórios
enquanto não forem concedidos alimentos definitivos (artigo 384.º CPC) – a ação principal será
a ação através da qual se pretendem obter os alimentos definitivos, pelo que este é um caso em
que pode haver inversão do contencioso, nos termos do artigo 376.º, n.º 4 CPC.

Já se sabe que a obrigação de alimentos é uma obrigação instituída entre os membros de uma família
e que se funda em deveres de recíproco auxílio (artigos 2003.º e ss. CC). Pode haver urgência na
obtenção de alimentos (do valor para o sustento da pessoa) e este regime tem a particularidade de
se designar logo dia para o julgamento (artigo 385.º, n.º 1 CPC), procurando o juiz obter um acordo
(artigo 385.º, n.º 2 CPC).
Não sendo possível obter o acordo, o juiz ordena a prova necessária e decide oralmente (artigo 385.º,
n.º 3 CPC).

Prevê-se também um regime especial de responsabilidade no artigo 387.º CPC.


→ Arbitramento de indemnização provisória – pretende-se a concessão de uma indemnização
provisória enquanto não se decida a ação principal, da qual se pretende obter, justamente, uma
indemnização (ação de indemnização). A ação principal é uma ação através da qual se pretende
obter uma indemnização, mas pretende-se uma indemnização provisória, que é requerida sob a
forma de renda mensal (artigo 388.º, n.º 1 CPC).

NOTA: não se confunda o artigo 565.º CPC (‘Indemnização provisória’) com o que estamos a falar.
A indemnização provisória a que este artigo se refere diz respeito aos casos em que o tribunal já formou
a sua convicção quanto à indemnizabilidade de parte dos danos.
Pode o tribunal entender que já há um quantitativo provado e condenar provisoriamente nesse
quantitativo, sem prejuízo de liquidação posterior – isto não tem nada que ver com a questão do
arbitramento de indemnização provisória.

Quando é que é permitido este arbitramento de indemnização provisória?


1. Como dependência de ação de indemnização fundada em morte ou lesão corporal (artigo 388.º,
n.º 1 CPC), quando o juiz conclua que o requerente dela necessita em consequência dos danos
sofridos e haja prova sumária da existência do direito do requerido (do direito a obter a
indemnização).

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Depois na ação principal tem de fazer a demonstração da existência do direito, mas aqui basta a prova
sumária da existência do direito a obter a indemnização. Além disso, como dissemos, é necessário que
o tribunal demonstre a necessidade de obter esta indemnização provisória.
Ex. 1: indemnização fundada em morte – uma pessoa a quem o de cujus prestava alimentos, sendo que
essa pessoa ficou sem alimentos, porque o de cujus faleceu – aqui a pessoa pode obter uma
indemnização pelo dano da morte, mas necessita de uma reparação ‘já’, ainda que provisória, para se
sustentar.
NOTA: não se trata de alimentos provisórios.

Ex. 2: lesão corporal – um sujeito foi acidentado e sofreu danos graves que o impedem de trabalhar.
Em virtude da lesão corporal que sofreu, há urgência numa reparação provisória – pode recorrer a esta
providência cautelar

2. É também admitida esta providência nos casos em que a pretensão indemnizatória se funde em
dano suscetível de pôr seriamente em causa o sustento ou a habitação do lesado – artigo 388.º,
n.º 4 CPC

Ao processamento desta providência e à execução em caso de incumprimento aplica-se o mesmo


regime previsto para os alimentos provisórios – artigo 389.º CPC

→ Arresto – deve ter-se em consideração o artigo 822.º CC


Artigo 822.º
(Preferência resultante da penhora)
1. Salvo nos casos especialmente previstos na lei, o exequente adquire pela penhora o direito de ser
pago com preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior.
2. Tendo os bens do executado sido previamente arrestados, a anterioridade da penhora reporta-se
à data do arresto.
Arresto (continuação)
Segundo o artigo 882.º CC, o credor que obtém a penhora de um bem tem o direito de ser pago com
preferência a qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior.
Ora, o n.º2 deste artigo diz que se o bem tiver sido arrestado, então a anterioridade da penhora reporta-
se á data do arresto.
O alcance deste artigo é um alcance prático e importante.
Ex.: A e B são credores de C. C tem uma dívida face a A, e uma dívida face a B. C constitui uma hipoteca
(garantia real) em favor de A, constituída sobre o imóvel X. B intenta uma ação executiva (para
pagamento de quantia certa) contra C e obtém a penhora do imóvel X.

A ação executiva é singular, isto é, ao contrário do processo de insolvência, que tem uma natureza
universal (se for declarada a insolvência de uma pessoa) e onde todos os credores têm o ónus (se
quiserem obter satisfação pelas forças da massa insolvente) de vir ao processo reclamar os seus créditos.
Desta forma, se na ação executiva houver outros credores da mesma pessoa, esses outros credores não
podem aproveitar essa ação executiva para reclamarem os seus créditos.

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Ex.: neste caso, a ação executiva foi intentada pelo B. Ora, o A não pode dizer que como B intentou
essa ação executiva, e ele também é credor de C, então eles aproveitam e penhoram mais alguns bens.
Isto não é possível

NOTA: não obstante, existe o regime das Citações e concurso de credores (garantidos) (artigos 786.º
e ss CPC).
A ação executiva cria este mecanismo que permite aos credores, com uma garantia sobre o bem que
foi penhorado, virem ao processo executivo reclamar os seus créditos. Aliás, o agente de execução
deve citá-los (eles podem vir espontaneamente se não forem citados, mas devem ser citados)

Voltando ao exemplo, a hipoteca está sujeita a registo, portanto o agente de execução, consultando o
registo, sabe que há uma hipoteca e deve citar o credor e o credor tem o ónus de reclamar o seu crédito
no processo executivo.
Se a execução avançar e o bem for vendido, quem vai ser pago em primeiro lugar é o credor que tinha
a garantia real sobre aquele bem (A). Assim, o bem vai ser vendido e uma parte vai servir para pagar a
execução e a outra vai para A que tinha a garantia real daquele bem.
No entanto, o caso já teria outra figura caso B intentasse a ação executiva, obtivesse a penhora e só
depois disso é que C constituísse essa hipoteca a favor de A. Isto porque neste caso a hipoteca já era
posterior à penhora (e não anterior).

Fazendo o ponto com o arresto:


No caso de os bens terem sido previamente arrestados, a anterioridade da penhora reporta-se à data do
arresto.
Exemplo: A e B são credores de C, sendo que B obtém o arresto do imóvel X. Posteriormente, é
constituída a hipoteca a favor de A, sobre o imóvel X. Ora, B intenta uma ação executiva contra C e
obtém a penhora do imóvel X. A diferença neste caso é que houve um arresto: aqui já não é posição de
A que prevalece, mas sim a posição de B, pois este obteve o arresto daquele bem.
Nesta penhora a favor B, os seus efeitos retroagem à data do arresto – é como se a penhora tivesse sido
feita quando foi feito o arresto.
Portanto, primeiro está a penhora e só depois a hipoteca – prevalece a posição de B porque tinha o
arresto. Como os efeitos retroagem à data do arresto, B tem esta preferência.
Ou seja, pelo produto da venda daquele bem ele tem o direito a ser pago em primeiro lugar face aos
outros credores (que não têm uma garantia real anterior)
Ora, o arresto é uma providência cautelar especificada e serve para a proteção do credor que tenha
justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito – artigo 391.º, n.º 1 CPC e artigo 619.º
CC.
Desta forma, arresto consiste numa apreensão judicial de bens a que se aplica, com as necessárias
adaptações, o regime da penhora – artigos 391.º, n.º 2 e artigo 365.º e ss + artigo 622.º, n.º 2 CC.
O requerente deve, neste caso, deduzir os factos que, por um lado, mostrem a probabilidade da
existência do crédito (há aqui uma relação creditícia) e, por outro, os factos que justificam o receio
invocado.

Em 2013, foi introduzida uma novidade no artigo 396.º, n.º 3 CPC. Ora, se estiver em causa obter o
arresto de um bem que foi transmitido, quando estiver em dívida o preço da respetiva aquisição, pelo
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menos no seu alcance nominal, resulta desta norma que o arresto apenas da probabilidade da existência
do crédito.
Em geral, o credor tem de demonstrar a probabilidade da existência do crédito e o justo receio de
perda da garantia patrimonial desse crédito.
Deverá ainda relacionar os elementos necessários à diligência de apreensão (artigo 392.º CPC).
Convencido o juiz da verificação dos pressupostos, decreta o arresto sem audiência prévia do requerido
(artigo 393.º, n.º 1 CPC).

Desta forma, o arresto consiste numa apreensão judicial de bens, às quais se aplicam as regras da
penhora.
Nós temos 3 tipos de penhoras:
− Penhora de bens móveis;
− Penhora de bens imóveis;
− Penhora de direitos.
NOTA: nós não temos de saber agora as regras da penhora.
Como é que se faz o arresto de um bem?
Aplicam-se as regras da penhora e consiste nesta apreensão judicial dos bens.
Assim, credor tem medo que o devedor dissipe/ oculte o seu património e depois não haja nada para
executar, por isso é que quer o arresto dos bens que vão ser apreendidos judicialmente.
Além disso, arresto antecipa os efeitos da penhora. De facto, o credor que tem uma penhora tem o
direito de ser pago com preferência face aos demais credores que não tenham uma garantia real anterior
(tem preferência de ser pago pelo produto daquela venda). Pode haver várias penhoras sobre o mesmo
bem, mas prevalece a mais antiga, a menos que haja insolvência – se houver insolvência, a preferência
da penhora não vale.

EM SUMA: O bem foi arrestado. Depois é intentada a ação executiva, o credor obtém a penhora. Assim,
é como se a penhora tivesse sido feita à data do arresto. Se houver garantias reais ou penhoras
posteriores, prevalece a posição do credor que tinha previamente obtido o arresto

O arresto está sujeito a limites de proporcionalidade.


Desta forma, se o arresto é requerido em mais bens do que aqueles que são suficientes, reduz-se aos
seus justos limites (artigo 393.º, n.º 1 CPC). Ou seja, juiz não deve permitir que sejam arrestados mais
bens do que aqueles que são necessários para garantir o cumprimento da obrigação.
No arresto não há contraditório prévio e, portanto, o juiz deve ativamente velar pela posição do
arrestado de forma que o arresto não seja concedido em termos superiores àqueles que são necessários.
A par disto, o arresto compreende uma causa própria de caducidade.
Ou seja, o arresto caduca se não for promovida ação excetiva no prazo de 2 meses subsequentes ao
trânsito em julgado da sentença proferida na ação declarativa, ou se o processo ficar sem andamento
por mais de 30 dias em resultado de negligência do exequente (artigo 395.º CPC).
Assim, o requerente tem o ónus de intentar a ação principal num determinado prazo, sob pena de
caducidade da providência, e aqui há um duplo ónus: tem de intentar a ação principal (artigo 373.º,
nº1, al. a) CPC), e depois, havendo trânsito em julgado da sentença que seja proferida (e que seja
favorável/procedente (artigo 373.º, nº1, al. c) CPC), tem o prazo de 2 meses a contar da mesma para
intentar a ação executiva, e se não o fizer caduca a providência.
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Isto porque o arresto serve para antecipar os efeitos da penhora. Ora, a penhora é um ato que se vai
praticar na ação executiva para pagamento de quantia certa, por isso é que o requerente tem este ónus
de intentar a ação executiva no prazo de 2 meses, a contar do trânsito em julgado da sentença.
Do ponto de vista da competência territorial, existe uma regra especial em matéria de arresto, que
está prevista no artigo 78.º, n.º 1, al. a) CPC. O arresto e o arrolamento tanto podem ser requeridos no
tribunal onde deva ser proposta a ação principal, como no do lugar onde os bens se encontrem ou, se
houver bens em várias comarcas, no de qualquer destas.
Existem também casos especiais de arresto: artigo 394.º CPC quanto ao aresto de navios e sua carga.

Embargo de obra nova


Esta é uma providência que visa o embargo (ou seja, a paralisação) de uma obra nova que se esteja a
realizar e que ofenda direito real ou direito pessoal de gozo de outra pessoa – artigo 397.º, n.º 1 CPC.
Este deve ser efetuado no prazo de 30 dias desde o momento do conhecimento do facto – artigo 397.º,
n.º 1 CPC.
Portanto, a sua finalidade é a ordem de suspensão imediata do trabalho.
Também aqui vale o requisito da proporcionalidade – artigo 401.º CPC.

Trata-se de um procedimento de suspensão e não de destruição de uma obra. No entanto, se na


pendência do embargo, o embargado continuar a executar a obra pode o embargante requerer que de
destrua a parte nova – artigo 402.º, n.º 1 CPC. O embargo é uma providência conservatória (para já
não se destrói, conserva-se o estado das coisas, só depois, se necessário é que se destrói).

Quanto à competência territorial, existe uma norma especial, que é a norma do artigo 78.º, n.º 1, al.
b) CPC, a providência deve ser intentada para o tribunal do lugar da obra.
Arrolamento
Tem por finalidade conferir ao requerente uma possibilidade de se precaver contra o justo receio de
extravio, ocultação ou dissipação de bens móveis ou imóveis ou de documentos – artigo 403.º, n.º 1
CPC.
Nos termos do n.º 2, o arrolamento é a dependência da ação à qual interessa a especificação dos bens
ou a prova da titularidade dos direitos relativos às coisas arroladas.
NOTA: Não confundir o arrolamento com o arresto. No arresto o que está em causa é um sujeito ser
credor de outro e tem receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito.
Aqui há também um receio de extravio, ocultação ou dissipação de bens, mas o requerente tem um
direito sobre esses bens e tem receio que eles se percam – a providência está na dependência da ação à
qual interessa a prova da titularidade do direito desses bens.
No caso do arresto, o credor não tem um direito sobre os bens do devedor, simplesmente os bens do
devedor são a garantia geral daquela obrigação.
Ex.: divórcio – A e B vão divorciar-se, e B tem receio que A extravie bens que são dos dois cônjuges
Ex.: um herdeiro que tem medo que desapareçam bens da herança e, por isso, quer arrolar os bens que
pertencem à herança.

Rita Nunes 54
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O arresto consiste na descrição, avaliação e depósito dos bens – artigo 406.º, n.º 1 CPC – e é decretado
de for feita prova sumária do direito relativo aos bens (fumus boni iuris) e dos factos que justificam o
receio do seu extravio – artigo 405.º, n.º 1 CPC.
Encontram-se previstos arrolamentos especiais, também conhecidos como procedimentos cautelares
especialíssimos – artigo 409.º, n.º 1 e 2 CPC

«(…) dentro de determinada zona de interesses abrangida por um procedimento cautelar especificado
foi ainda possível identificar o aparecimento de planos mais limitados, onde a demora processual
obrigou a prover o tribunal com mecanismos de intervenção concretamente dirigidos para os riscos
de perturbação da eficácia da tutela definitiva que aí se manifestam» p. 154 sebenta.
Ex.: o divórcio, onde não é necessário fazer demonstração do periculum in mora
«Assim, para o requerente conseguir o arrolamento de bens comuns ou de bens próprios que estejam
sob a administração do outro cônjuge, basta que alegue e prove o casamento com a outra parte,
anuncie que vai propor alguma das referidas ações (caso se trate de arrolamento preliminar), e
demonstre, em termos de prova sumária, que os bens a arrolar são comuns ou próprios do requerente,
embora se encontrem sob a administração do requerido», sendo dispensado o requisito estabelecido
para o arrolamento em geral de mostrar o justo receio de extravio, ocultação ou dissipação de bens ou
de documentos estabelecido no artigo 403.º, n.º 1 CPC – p. 155 sebenta
Quanto à competência territorial, temos a norma do artigo 78.º, n.º 1, al. a) CPC – o arrolamento
tanto podem ser requeridos no tribunal onde deva ser proposta a ação respetiva, como no do lugar onde
os bens se encontrem ou, se houver bens em várias comarcas, no de qualquer destas – é a mesma regra
do arresto.

Regime da locação financeira (DL n.º 149/95, de 24 de junho, com as respetivas alterações):
No artigo 1.º DL temos a noção de locação financeira (ou em inglês leasing).
Ex.: comprar um automóvel a leasing – a parte que pretende ter o automóvel é que escolhe o automóvel.
No entanto é uma entidade financeira que vai comprar o automóvel, e depois a pessoa paga uma renda
mensal para utilização do mesmo. Depois de decorrido o tempo contratual tem uma opção de compra
por um preço que está pré-estipulado.
Assim, o locador cede o gozo temporário da coisa e o locatário obriga-se a pagar uma retribuição –
artigos 9.º e 10.º CPC respetivamente.
Quanto ao prazo, temos o artigo 6.º CPC.
Este contrato é muito utilizado para a aquisição de automóveis, que são bens de desvalorização muito
rápida, daí que o legislador tenha sentido a necessidade de criar uma forma procedimental especial
para os casos de incumprimento da obrigação de restituição do bem por parte do locatário, de forma a
permitir ao locador rapidamente reaver o bem e colocá-lo novamente no mercado.
Ex.: o locatário deixa de pagar as rendas e o locador quer reaver rapidamente o bem e colocá-lo
novamente no mercado.

No artigo 21.º do DL está prevista ao mecanismo de providência cautelar de entrega judicial.


Ora, se, findo o contrato por resolução ou pelo decurso do prazo sem ter sido exercido o direito de
compra, o locatário não procede à restituição do bem pode o locador requerer ao tribunal uma
providência cautelar que consiste na entrega imediata da coisa ao requerente.

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Portanto, trata-se de uma providencia cautelar deste Regime jurídico da locação financeira através do
qual o requerente pode obter a restituição imediata do bem locado.

Ora, este regime tem importância prática, sendo que tem uma particularidade no n.º 7 deste artigo:
caso o tribunal goze dos elementos necessários para a decisão da causa principal, ele deve antecipar o
juízo da causa principal. Ou seja, o procedimento cautelar continua para a ação principal.
Isto, exceto se não tiverem sido trazidos ao procedimento os elementos necessários à resolução
definitiva do caso, sendo que, neste caso, o processo avança para a ação principal.
Trata-se aqui de um processo declaratório abreviado («(…) que permitirá condenar o locatário na
entrega do bem, fruto do reconhecimento do direito do locador à sua recuperação fundada no
incumprimento do contrato de locação financeira» - p. 147 sebenta). O tribunal decretou a providência,
ouve as partes e antecipa um juízo sobre a causa principal, a menos que não tenha elementos para isso
(artigo 21.º, n.º 7 DL n.º 149/95).
«Semelhante resultado pressupõe que o julgador adquira no processo em curso o conhecimento de
factos bastantes para alcançar a convicção de que o contrato foi resolvido por o locatário haver deixado
de pagar as rendas convencionadas ou de que, tendo-as satisfeito, findo o contrato não exerceu a opção
de compra, mantendo a recusa de restituição do bem que ilicitamente conserva em seu poder» - p. 147
sebenta

NOTA: uma coisa que se discute é se nesta antecipação da causa principal podem ser cumulados outros
pedidos, designadamente o pagamento de rendas vencidas e não pagas.
Ora, tem se entendido que não, porque a finalidade deste procedimento é apenas reaver rapidamente o
bem locado. Assim, outros pedidos como esses devem ser deduzidos de acordo com o processo comum,
e, portanto, mediante a propositura de uma ação principal autónoma.
«As quantias peticionadas em ligação com o incumprimento do contrato não podem, em princípio, ser envolvidas nas
consequências da chamada “antecipação do juízo sobre a causa principal”, devendo, quanto a elas, seguir-se a tramitação
comum que lhes couber, ainda que o tribunal reconduza o processo ao campo da tutela definitiva no que respeita à parte do
pedido referente à restituição» - p. 148 sebenta

Assim sendo, o Tribunal toma uma decisão definitiva ainda não transitada em julgado, podendo haver
recurso dessa decisão. O tribunal, exceto se não tiver elementos para isso, ouve as partes e antecipa o
juízo sobre a causa principal – portanto, temos uma decisão definitiva.

Não é este o regime da inversão do contencioso, visto que aí, quando o juiz inverte o contencioso, trata-
se de uma decisão que se pode tornar em decisão definitiva, se o requerido não intentar uma ação
principal (pois inverteu-se o ónus de intentar a ação principal.
Ou seja, no caso da inversão do contencioso, o juiz decreta a providência, inverte o contencioso e a
decisão não é uma decisão definitiva. Isto porque, o réu pode intentar uma ação para pôr em causa a
existência do direito. Caso o réu não intente essa ação ou se essa ação improceder então a decisão que
foi tomada no procedimento converte-se em decisão definitiva.
O regime aqui é outro – o tribunal já tomou a decisão definitiva e as partes podem recorrer dessa decisão
nos termos gerais.

NOTA: Nós temos uma figura que tem uma certa proximidade com as providências cautelares, que são
as diligências antecipadas de produção de prova – artigo 419.º CPC.

Rita Nunes 56
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TEÓRICAS

No âmbito da Lei da Arbitragem Voluntária, elas são tratadas no campo da tutela cautelar – artigo 20.º,
n.º 1, al. d) LAV.
Este é um instituto que permite que determinadas atividades instrutórias sejam realizadas antes do
momento em que normalmente teriam lugar dentro de uma ação ou mesmo antes da propositura da ação.
O pressuposto para estas diligências é também o periculum in mora, mas apenas o perigo na demora
quanto à possibilidade de realização da diligência.
Ex.: eu vou intentar uma ação, e sei que para essa ação é importante o depoimento de dada pessoa, mas
essa pessoa é muito velhinha. Então, eu tenho fundado receio de que quando essa pessoa for para ser
ouvida como testemunha já não vai ser possível.
Ex.: inspeção de um objeto perecível. Eu suspeito que quando fosse feita a prova o objeto já se tinha
destruído. Eu posso pedir uma diligência antecipada de prova.
Este é um instituto autónomo.
Quanto à competência territorial, ver o artigo 78.º, n.º 1, al. d) CPC.

JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
Em matéria processual distingue-se a jurisdição contenciosa e os processos de jurisdição voluntária.
Estes processos de jurisdição voluntária são processos com grande diversidade interna entre si (são
processos muito variados), mas que têm uma marca em comum, que é o facto de neles o juiz se guiar
por critérios de razoabilidade e de oportunidade.
Ou seja, ao passo que os processos de jurisdição contenciosa são processos cuja matriz comum é de
reconhecimento de direitos (ou existem ou não existem e essa é que é a sua matriz [se existem são
reconhecidos e se não existem não são reconhecidos*]) e, portanto, o respetivo processo decisório
implica a averiguação de determinados factos que se reconduzem à aplicação de um determinada norma
jurídica e, depois, à aplicação da consequência prevista nessa mesma norma (aqui a dimensão vinculada
é muito mais intensa do que a dimensão discricionária); nos processos de jurisdição voluntária, pelo
contrário, as regras jurídicas que cabe aplicar consentem ao julgador um amplo conjunto de soluções
possíveis – ou seja, em lugar de dar uma só resolução, elas colocam na disponibilidade do julgador a
possibilidade de adotar a solução que lhe pareça mais conveniente.

Portanto, a preocupação nos processos de jurisdição voluntária é que o Tribunal, em lugar de


determinar o direito de cada um, se siga por critérios de razoabilidade e de oportunidade para chegar
às soluções mais convenientes.
O CPC refere-se a esta distinção e, por isso, dedica um Título em especial aos processos de jurisdição
voluntária (Título V – artigos 986.º e ss. CPC). À semelhança do que acontece com outros segmentos
normativos, temos um regime geral (artigos 986.º a 988.º CPC - conjunto de disposições comuns que
tendencialmente têm aplicação em todos os casos de jurisdição voluntaria) e regimes especiais (artigos
989.º e ss. CPC).
Ex.: como veremos no âmbito do regime de litisconsórcio necessário ativo, a ação deve ser intentada
por ambos os cônjuges ou por um com o conhecimento do outro – ora, esse conhecimento pode ser
suprido e o regime que se segue é este.
*O respetivo processo decisório implica, em primeiro lugar, a verificação da existência de
determinados factos que se reconduzem à aplicação de uma norma jurídica e à aplicação da
consequência prevista nessa norma jurídica, havendo aliás uma interação entre factos e normas – o juiz
Rita Nunes 57
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TEÓRICAS

olha para os factos pensando já na aplicação de normas e olha para as normas pensando nos factos que
tem à sua frente (há uma influência mútua entre os factos e a norma).
Existem também, além do regime do CPC, um amplo conjunto de processos de jurisdição voluntária
do RGPTC – Regime Jurídico do Processo Tutelar Cível – Lei n.º 41/2015, de 8 de setembro, com
respetivas alterações. Nos termos do artigo 12.º desta Lei, estes processos têm a natureza de processos
de jurisdição voluntária e, portanto, aplicam-se as disposições gerais dos artigos 986.º, 987.º e 988.º
CPC.

Principais caraterísticas deste tipo de jurisdição:


Não temos oportunidade de ver cada um destes processos de jurisdição voluntária, mas vamos ver as
principais caraterísticas deste tipo de jurisdição (estando aqui no âmbito das disposições gerais dos
artigos 986.º a 988.º CPC, que se aplicam a qualquer processo de jurisdição voluntária).
1. Vale o princípio da liberdade de investigação dos factos – artigo 986.º, n.º 2 CPC – o tribunal
pode, no entanto, investigar livremente os factos/ coligir as provas/ ordenar os inquéritos e
recolher as informações convenientes; só sendo admitidas as provas que o juiz considere
necessárias. Aqui, no âmbito dos processos de jurisdição voluntária, existe não apenas uma
liberdade de instrução dos factos controvertidos, como existe também uma liberdade de
investigação dos factos.

Qual é que é a diferença disto face ao que vimos no que diz respeito à jurisdição contenciosa? Aqui,
no âmbito dos processos de jurisdição voluntaria, existe, não apenas, uma liberdade de instrução dos
factos controvertidos, como uma liberdade de investigação dos factos. Portanto, cabe a este propósito
distinguir estas duas coisas:
→ Liberdade de instrução dos factos controvertidos
→ Liberdade de investigação dos factos
Em qualquer ação (seja de jurisdição contenciosa ou de jurisdição voluntária) o juiz tem a liberdade de
ordenar a prática de todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade – artigo 411.º CPC
(princípio do inquisitório/ oficialidade). Ou seja, em qualquer ação temos uma liberdade de instrução,
se bem que este poder de o juiz ordenar oficiosamente a realização de todas as provas necessárias ao
apuramento da verdade quanto aos factos que lhe compete reconhecer esteja sujeito a limites
estabelecidos pelo princípio da liberdade das partes.
A diferença encontra-se no seguinte:
→ Nos processos de jurisdição contenciosa, o julgador só pode conhecer em princípio dos factos
essenciais invocados pelas partes (artigo 5.º, n.º 1 CPC), sob pena de nulidade da sentença
(artigo 615.º, n.º 1, al. b CPC) – ou seja, o juiz está limitado pelos factos essenciais alegados
pelas partes, podendo conhecer oficiosamente dos factos instrumentais que resultem da instrução
da causa, mas está limitado pelos factos essenciais trazidos para o processo pelas partes e que
são aqueles que integram a causa de pedir ou a matéria de exceção perentória – não pode conhecer
oficiosamente de factos essenciais não carreados pelas partes, não obstante a possibilidade, nos
termos do artigo 5.º, n.º 1 CPC, de conhecer oficiosamente dos factos concretizadores que
resultem da instrução da causa, desde que a parte tenha tido oportunidade de se pronunciar sobre
eles.

→ Isto não acontece nos processos de jurisdição voluntária, pelo que o juiz não está adstrito a esses
concretos factos que hajam sido alegados pelas partes, podendo conhecer de outros factos que
possam importar para o apuramento/ apreciação de uma providência que lhe é solicitada – isto
porque existe um interesse público na escolha das melhores providências e é isso que explica
este poder qualificado do julgador.

Rita Nunes 58
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Assim, existe uma liberdade de investigação dos factos – da mesma forma e reforçando os
poderes do julgador, permite-se que este recuse as provas que entenda não ser necessário
realizar-se (provas que tenha por não necessárias – artigo 986.º, n.º 2 CPC)

2. Carateriza os processos de jurisdição voluntária o critério de julgamento – artigo 987.º CPC


Nas providências a tomar, o Tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes
adotar em cada caso a solução que considere mais conveniente e oportuna. Ao contrário, a matriz
comum dos processos de jurisdição contenciosa é de reconhecimento de direitos que existem ou não
existem – o juiz aplica critérios de legalidade estrita (subsume os factos à aplicação de uma norma e
aplica a consequência resultante dessa norma). Aqui a dimensão discricionária do juiz é muito maior –
as regras jurídicas permitem ao julgador um amplo conjunto de soluções possíveis e, portanto, colocam
na sua disponibilidade a possibilidade de adotar a solução que lhe pareça mais conveniente – daí
justamente o reforço dos poderes conferidos ao julgador.
Se ao julgador é pedido que tome a decisão mais oportuna e conveniente, então devem ser-lhe
oferecidos os meios para conhecimento dos factos que permitam concluir o que é que naquele processo
é mais conveniente.

3. Em consequência desta mesma caraterística, quando as resoluções tomadas o sejam com


recurso a critérios de conveniência ou oportunidade, como é a regra e, portanto, em que a
margem de discricionariedade é muito grande, não é admissível o recurso para o STJ –
artigo 988.º, n.º 2 CPC (SÓ NESTES CASOS)
Esta limitação decorre da teleologia (do fim) do recurso de revista, que é o nome do recurso ordinário
para o STJ, fim esse que o exclui sempre que ele não possa realizar qualquer função de harmonização
da aplicação da lei – porque essa é que é a finalidade do recurso de revista.
Aqui essa função não se cumpriria – o STJ está vinculado nas decisões que tome em via de recurso de
revista aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, aplicando-lhe o regime jurídico que entenda
adequado – artigo 682.º, n.º 1 CPC (o STJ, ao contrário do Tribunal da Relação, conhece apenas da
matéria de direito, sendo que o recurso tem, nessa medida, uma função de harmonização da aplicação
da lei).
Ora, no âmbito da jurisdição voluntária, a providência é tomada no âmbito da valoração gerada no
espírito julgador através do exame crítico dos elementos probatórios com que o julgador contactou,
atividade a que o STJ não se pode substituir. Por isso é que resulta do artigo 988.º, n.º 2 CPC que
quando as resoluções tenham sido proferidas segundo critérios de conveniência ou oportunidade, e
apenas nessa medida, não é admitido recurso para o STJ.
Se se tratar de critério de legalidade estrita (ex.: a verificação dos pressupostos de aplicação de um
certo instituto jurídico) já pode haver recurso para o STJ – ex.: Ac. em que estava em causa a fixação
de uma obrigação de alimentos, mas em que se discutia, antes, se se podia impor uma obrigação de
alimentos a um pai que estava no estrangeiro. Ora, quanto à parte de quais os alimentos devidos, o juiz
deverá chegar à conclusão que entenda mais oportuna (com base nos factos e provas que tenha à sua
frente, o juiz decide de acordo com um critério de conveniência e oportunidade); coisa diferente é saber
se os alimentos são devidos ou não (isto já é um problema de legalidade estrita, não havendo nenhuma
margem de discricionariedade – sobre isto o STJ pode pronunciar-se, porque é um problema de direito).

4. Há a possibilidade de modificação das providencias antes decretadas – artigo 988.º, n.º 1


CPC

Rita Nunes 59
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“Nos processos de jurisdição voluntária, as resoluções podem ser alteradas, sem prejuízo dos efeitos
já produzidos, com fundamento em circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração; dizem-
se supervenientes tanto as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão como as anteriores, que
não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso”.
Portanto, o fundamento da alteração é superveniência das circunstâncias face ao primitivo processo,
quer se trate de uma superveniência objetiva, quer de superveniência subjetivas, quando não tenham
sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso.

NOTA: No âmbito da jurisdição contenciosa, podemos apontar a seguinte norma no que diz respeito à
possibilidade de modificação por alteração das circunstâncias – artigo 619.º, n.º 2 CPC
No âmbito do artigo 988.º, n.º 1 CPC é claro que se exclui da possibilidade de modificação as hipóteses
em que a providência já tenha consumado os seus efeitos – ex.: se foi autorizada, nos termos do artigo
1000.º, a prática de um ato, suprindo o consentimento que seja necessário à prática desse ato e tendo o
ato sido praticado, então não se pode revogar a providência depois de o ato autorizado ter sido praticado
– portanto, a possibilidade de modificação supõe o efeito duradouro da providência autorizada.

Depois disto siga-se que se encontram ainda nos processos de jurisdição voluntária especificidades no
que diz respeito ao rito do procedimento. Tendo em vista a celeridade da providência a tomar, aos
processos de jurisdição voluntária aplica-se, por remissão do artigo 986.º, n.º 1 CPC, a tramitação
própria dos incidentes da instância (artigos 292.º e 295.º CPC), que é mais ligeira do que a tramitação
prevista para a ação declarativa comum, devendo, por sua vez, nos termos do artigo 986.º, n.º 3 CPC,
a sentença ser proferida no prazo de 15 dias. Por outro lado, não é obrigatória nos processos de
jurisdição voluntária a constituição de advogado, salvo na fase de recurso – artigo 986.º, n.º 4 CPC

Outros processos…
Decreto-Lei n.º 272/2001, com as respetivas alterações (a última da qual introduzida pela Lei n.º
85/2019, de 3 de setembro) - este diploma determina a atribuição e transferência de competências
relativas a um conjunto de processos especiais dos tribunais judiciais para o Ministério Público e para
as conservatórias de registo civil, regulando os correspondentes procedimentos.

Aplicação da lei processual no tempo. Critérios de resolução dos conflitos intemporais de normas
de direito adjetivo. Sentido e alcance do formalismo processual. Formas do processo e
correspondente âmbito de aplicação
Entre o momento em que surge o litígio e o momento da sentença, recurso e caso julgado pode haver
uma alteração da lei aplicável ao processo. Perante um problema de sucessão de leis no tempo, da duas
uma:
1. Ou é estabelecido direito particular para regular os conflitos que possam surgir – existem normas
de direito transitório;
2. Se não houver uma norma de direito transitório, é necessário determinar o regime aplicável a
partir de diretrizes gerais.

O problema da aplicação da lei no tempo sente-se com muta intensidade no DPC. Em 1995 e 1996
houve uma reforma importante do CPC – entre a Reforma de 1995 e 1996 e o dito novo CPC, o Código
contou com 42 versões.

Rita Nunes 60
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TEÓRICAS

No processo civil, tal como acontece ao nível do direto substantivo, vale como diretriz fundamental o
princípio de que a lei dispõe apenas para o futuro (artigo 12.º, n.º 1 do CC). Só a partir desse momento
é que as partes podem prever as consequências resultantes da aplicação dessa lei e, nessa medida,
podem conformar o seu comportamento àquilo que é exigido, facultado ou proibido pela referida lei –
por isso é que o princípio geral é que a lei vale para o futuro.

Mas no campo do processo, este princípio tem uma consequência particular: é que o processo é
constituído por uma sequência de atos. Ora, entende-se que estando uma ação pendente, a nova lei se
aplica de imediato a todos os atos que tenham de ser praticados nessas ações já pendentes, ficando,
todavia, conservada a eficácia e a validade de todos os atos que tenham sido praticados ao abrigo da
lei anterior.

Importa tratar de casos particulares:


• Competência dos tribunais – qual é que é a lei que fixa a competência de um tribunal, sendo
certo que por competência se entende o quantum de jurisdição que é atribuído a cada tribunal?
A regra é que a lei que determina a competência de um determinado tribunal para conhecer de uma
causa é fixada ao tempo da propositura da ação (artigo 38.º, n.º 2 da Lei de Organização do Sistema
Judiciário). A competência do tribunal é determinada pela lei em vigor no momento em que a ação
é proposta (artigo 38.º, n.º 2 LOSJ) e este momento é determinado pelo artigo 259.º, n.º 1 do CPC.
O problema da sucessão da lei no tempo coloca-se, depois, quando na pendência da ação há uma
alteração da lei no que diz respeito à determinação da competência desse tribunal, mas a regra que
resulta do artigo 38.º, n.º 2 da LOSJ (e que tem duas exceções) é que o tribunal competente ao
tempo da propositura da ação sê-lo-á para sempre.
Portanto, se depois entrar em vigor uma nova lei que lhe retire a competência, a lei não se vai aplicar,
porque o tribunal competente ao tempo da propositura da ação sê-lo-á para sempre – semel
competens semper competens (uma vez competente, sempre competente); ubi acceptum est semel
iudicium, ibi et finem accipere debet (onde foi aceite uma vez um juiz, aí também se deve aceitar o
seu fim). Usa-se ainda a expressão perpetuatio iurisdictions (perpetuação da jurisdição).

Este artigo 38.º, n.º 2 da LOSJ tem exceções:


1. Quando seja suprimido o tribunal a que a causa estava afeta – neste caso o processo deve ser
oficiosamente remetido ao novo tribunal;
2. Exceção à regra de que a competência se afere com base na aplicação da lei em vigor no
momento em que a ação é proposta;
3. Quando venha a ser atribuída ao tribunal onde a ação foi intentada a competência de que
inicialmente ele carecia para conhecer da causa. Ou seja, o tribunal onde a ação foi intentada
não era competente, mas entretanto entrou em vigor uma lei que lhe atribuiu competência –
então o processo permanece lá.

• Formalismo processual – nesta matéria vale plenamente o princípio geral visto anteriormente:
a nova lei aplica-se de imediato e, portanto, a forma de cada ato processual é estabelecida pela
lei vigente ao tempo da respetiva prática – artigo 136.º, n.º 1 do CPC. A forma de um ato é regida
pela lei em vigor no momento da prática desse ato. A forma do próprio processo determina-se,
por sua vez, pela lei vigente ao tempo da propositura da ação (artigo 136.º, n.º 2 do CPC).
Rita Nunes 61
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• Recursos e alçadas (acesso aos tribunais superiores) – aqui vale o princípio de que se aplica a
lei de recursos vigente ao tempo da prolação da sentença.
Assim:
i. Se é introduzida a possibilidade de recurso depois de proferida a sentença, as partes já
não poderão recorrer, uma vez que nenhuma expectativa há a tutelar quanto à
possibilidade de recurso. No momento em que a decisão foi proferida, ela era irrecorrível
e, portanto, assim deverá conservar-se, embora seja possível em sede de legislação
especial que o legislador admita a possibilidade de recurso para sentenças já proferidas
mas ainda não transitadas em julgado.
ii. Se a lei nova reduz a possibilidade de recurso, a lei nova não se aplica a recursos já
interpostos ou ainda na pendência do prazo para a respetiva interposição. Na pendência
de certo prazo, todos os dias são igualmente hábeis para a interposição de recurso, de
modo que a modificabilidade da possibilidade de recurso não deve atingir as partes.
iii. Na eventualidade de ainda não ter sido proferida decisão no momento da entrada em vigor
da lei nova, entende-se que a lei nova se aplica de imediato. Aumente-se ou reduza-se a
possibilidade de recorrer, é ela determinada pela lei vigente ao tempo da prolação da
decisão da causa.

NOTA: Já regra diferente se aplica no que diz respeito ao regime da alçada (artigo 44.º, n.º 3 da
LOSJ): A admissibilidade dos recursos por efeito das alçadas é regulada pela lei em vigor ao tempo
em que foi instaurada a ação. Em matéria das alçadas, a admissibilidade dos recursos é regulada pela
lei em vigor ao tempo em que foi instaurada a ação. → O DR. TAVARES DE SOUZA trata da regra
do artigo 44.º, n.º 3 da LOSJ.

• Matéria de provas: é preciso fazer uma distinção entre direito probatório formal e direito
probatório material:
1. Direito probatório formal: conjunto de regras que regem a atividade probatória (artigos
410.º e ss. do CPC) – nestes casos, aplica-se de imediato a lei nova. Portanto, se entrar em
vigor uma lei nova na pendência de um processo que altere o regime de produção de um
determinado meio de prova, essa lei entra em vigor imediatamente – entende-se que introduz
uma valoração mais adequada quanto ao modo de produção de prova.
2. Direito probatório material: regras previstas nos artigos 341.º e ss. do CC; estes artigos
contêm as regras referentes aos meios de prova admissíveis – quanto ao valor dos diferentes
meios de prova e ao regime para os casos de insuficiência probatória (regras do ónus da prova,
que são regras que o juiz deve aplicar quando está em dúvida sobre os factos). Da aplicação
destas regras de direito probatório material depende a consistência prática posições jurídicas
materiais – “não ter uma prova ou não ter um direito é a mesma coisa”.
Uma vez que se trata aqui de regimes atinentes a situações jurídicas materiais, regimes esses com
os quais as partes contavam ao tempo da constituição dessas posições jurídicas substantivas, então
aqui deverá continuar a aplicar-se a lei antiga (tempus regit actum), ou seja, continuará a aplicar-se
a lei que estava em vigor ao tempo da constituição da respetiva situação jurídica substantiva, desde
que existam legítimas expectativas das partes que mereçam tutela, como acontecerá na maior parte
dos casos.

• Matéria de prazos: neste campo o regime é o que consta do artigo 297.º do CC.

Rita Nunes 62
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n.º 1 do artigo 297.º: “A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o
fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se
conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos
tempo para o prazo se completar”.
Portanto, a lei estabelecia um determinado prazo para a prática de um ato e entra em vigor uma nova
lei que estabelece para a prática desse mesmo ato um prazo mais curto. Neste caso a lei nova aplica-
se de imediato, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da lei nova, a não ser que segundo
a lei antiga falte menos tempo para o prazo se completar. Portanto, a regra é que se a lei introduz um
prazo mais curto, a lei nova aplica-se de imediato, mas o prazo só se conta a partir da entrada em
vigor da nova lei. Exemplo: prazo de 30 dias; prazo novo de 10 dias – a nova lei entra logo em vigor.
Imaginando que nos encontramos no dia 10, quando entrou em vigor a lei nova que veio estabelecer
o prazo de 10 dias, já tinham passado 10 dias de prazo, faltavam mais 20 – a lei nova entra em vigor,
mas os 10 dias de prazo previstos pela lei nova só começam a contar a partir daí. Depois é preciso
ter em consideração a salva da parte final – ex.: encontramo-nos no dia 25 e o prazo era de 30 dias;
faltavam 5 dias, então contam-se apenas 5 dias e não 10 por força da ressalva final.
n.º 2 do artigo 297.º: “A lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já
estejam em curso, mas computar-se-á neles todo o tempo decorrido desde o seu momento inicial”.
A regra aqui é que se alei aumenta o prazo, aplica-se a lei de imediato, mas conta-se o período já
decorrido. Exemplo: prazo antigo de 10 dias; prazo novo de 30 dias – dia 8 é modificado o prazo; a
lei entra em vigor de imediato, mas computa-se o tempo que já passou (contam-se 22 dias, porque
se computam no novo prazo os 8 dias já decorridos).
n.º 3 do artigo 297.º: “A doutrina dos números anteriores é extensiva, na parte aplicável, aos prazos
fixados pelos tribunais ou por qualquer autoridade”.

Rita Nunes 63
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CAPÍTULO II
PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

1. Noção e regime dos pressupostos processuais


Pressupostos gerais do processo civil
Pressupostos que se colocam ao processo no seu todo, por contraposição aos pressupostos específicos
da prática de certos atos processuais – ex.: pressupostos a que deve obedecer a citação. Quando se fala
de pressupostos processuais, entendem-se os pressupostos da relação processual em bloco.

Ao tratar os pressupostos processuais, o seu modo de conhecimento, o modo de sanação da sua falta,
tomar-se-á como modelo a ação declarativa sob a forma de processo comum, que é um modelo de
regulação do DPC português. A cada ordem jurídica cabe a determinação da forma processual que
serve de paradigma à regulação do processo civil – no DPC português distinguem-se formas comuns
e formas especiais (artigo 546.º, n.º 1 do CPC). No atual processo civil o processo comum de
declaração tem forma única (artigo 548.º do CPC). Sem prejuízo da tendencial unidade do processo
comum de declaração, que até 2013 não era assim (podia seguir forma ordinária, sumária e
sumaríssima), continua a haver diferenças consoante o valor do processo:

• Nas ações de valor não superior a metade da alçada do Tribunal da Relação (não superior a 15
mil €) parece expectável para o legislador que sejam introduzidas alterações à marcha processual
(artigo 597.º, al. d) do CPC). Neste caso, há também limitações à perícia colegial (artigo 468.º,
n.º 5 do CPC).
• Por sua vez, nas ações de valor não superior à alçada da 1ª instância (não superior a 5 mil €)
decorre do artigo 511.º, n.º 1, parte final do CPC que as partes só podem oferecer 5 testemunhas
e os tempos das alegacões orais e de réplica são respetivamente de 30 e de 15 minutos (metade
do tempo normalmente concedido – artigo 604.º, n.º 5, parte final).

A finalidade do recurso a uma ação judicial está em obter uma sentença de mérito que coloque termo
à causa (artigo 152.º, n.º 2 quanto à noção de sentença; artigo 619.º sobre o caso julgado material).
Nos termos dos artigos 619.º, n.º 1 e 581.º do CPC, os limites da causa são dados por três elementos
(os sujeitos, o pedido e a causa de pedir) e, por isso, a causa é um pedido de uma pessoa dirigido contra
outra pessoa com fundamento numa certa causa de pedir. Mas para que o tribunal possa conhecer do
fundo da causa, é necessário que se verifiquem certos requisitos de ordem processual, sem os quais o
tribunal se deve abster de conhecer o mérito – esses requisitos são os pressupostos processuais.
Portanto, os pressupostos processuais são as condições que se devem concretamente verificar para que
o tribunal profira uma decisão de mérito.
Esta matéria é importante já que a autonomização doutrinal no processo civil esteve ligada a uma obra
de um autor (Oskar von Büllow, Die Lehre von den Processeinreden und den Processvoraussetzungen)
obra essa que teve por objeto, entre outros aspetos, o estudo dos pressupostos processuais, ou seja,
daquilo que seria específico do processo e, portanto, irredutível a qualquer categoria de direito material
e característico da relação jurídica processual – daí a autonomização doutrinal do DPC.

Importa distinguir dois planos que marcam simultaneamente presença no processo:


• Plano da admissibilidade (Zulässigkeit, admissility) – que reúne um conjunto de regras que
respeitam aos pressupostos processuais de verificação necessária para que o tribunal conheça do

Rita Nunes 64
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fundo da causa. Assim, sempre que estivermos na presença de uma regra necessária para que o
tribunal conheça do fundo da causa, estamos perante um pressuposto processual.
Se uma decisão for tomada neste plano (seja no que diz respeito à verificação ou não dos
pressupostos processuais), uma vez transitada em julgado, formar-se-á um simples caso julgado
formal, apenas com força obrigatória dentro do processo (artigo 620.º, n.º 1 do CPC). O elenco dos
pressupostos processuais consta do artigo 577.º do CPC.

• Plano do mérito/procedibilidade (Begründeheit, merits) – diz respeito ao conhecimento da


questão de mérito. Neste plano conhece-se do fundo da causa. A decisão proferida a respeito
sobre o fundo da causa (sobre a procedência ou improcedência do pedido), uma vez transitada
em julgado, tem força de caso julgado material – tem fora obrigatória dentro e fora do processo
(artigos 619.º + 577.º, al. i) do CPC).

A questão da admissibilidade precede a questão de mérito, porque justamente são requisitos dos quais
depende a possibilidade de o tribunal se pronunciar sobre o mérito. Isso manifesta-se nos diferentes
momentos em que o juiz é chamado a contactar com um processo:

1) Nos casos em que a petição inicial seja apresentada a despacho liminar (artigos 226.º, n.º 4 +
590.º, n.º 1 CPC), a petição é indeferida, entre outras razões, quando ocorram exceções dilatórias
insupríveis (artigo 590.º n.º 1 CPC). Portanto, não estando verificados os pressupostos de
admissibilidade e sendo insanável essa falta, o tribunal não chega sequer a ordenar a citação do
réu, porque não estão verificados os pressupostos para que ele possa conhecer do mérito.
2) Findos os articulados, o juiz profere eventualmente despacho destinado ao suprimento de
exceções dilatórias, que é o despacho pré-saneador (artigo 590.º, n.º 2, al. a) do CPC). Por sua
vez, no despacho saneador o juiz começa por conhecer das exceções dilatórias que hajam sido
suscitadas e das nulidades processuais (artigo 595.º, n.º 1, al. a) CPC). Por sua vez, na sentença
o juiz conhece em primeiro lugar dos pressupostos processuais (artigo 608.º, n.º 1 do CPC).
NOTA: Os pressupostos processuais podem ser objeto de diferentes classificações (elenco não
exaustivo previsto no artigo 577.º do CPC)

Quanto ao OBJETO:
• Pressupostos processuais relativos às partes: respeitam às partes do processo os pressupostos
processuais da personalidade (artigo 577.º, al. c) CPC), capacidade judiciária (artigo 577.º, al.
c) CPC), representação judiciária, patrocínio judiciário (artigo 577.º, al. h) CPC), assim como
autorização especial, ou deliberação, que o autor devesse obter (artigo 577.º, al. d) CPC).
• Respeita ao tribunal o pressuposto processual da competência (artigo 577.º, al. a) CPC).
• Respeita ao objeto do processo a não litispendência e a ausência de caso julgado (artigo 577.º,
al. i) CPC).
• Respeita à relação entre as partes e o objeto do processo a legitimidade (artigo 577.º, als. e), f),
g) CPC).
Por sua vez, os pressupostos processuais podem ser SANÁVEIS (quando a sua falta possa ser
colmatada) OU NÃO SANÁVEIS. Sendo sanáveis, o juiz deve ordenar a prática dos atos necessários
à respetiva sanação ou convidar as partes à prática dos atos necessários à respeitava sanação (artigo 6.º,
n.º 2 CPC).

Rita Nunes 65
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TEÓRICAS

Os pressupostos processuais podem ser de CONHECIMENTO OFICIOSO ou de


CONHECIMENTO PROVOCADO (artigo 578.º CPC) – vale a regra do conhecimento oficioso,
mas em certos casos a falta do pressuposto processual carece de ser invocada pelas partes (as partes
têm o ónus de provocar o conhecimento do tribunal sobre aquela matéria – o tribunal não poderá
conhecer dessa matéria oficiosamente).
Portanto, a parte que quiser valer-se da exceção dilatória deve provocar o conhecimento do tribunal
sobre essa matéria, porque o tribunal não o poderá fazer ociosamente. É o que acontece em alguns
casos de incompetência relativa (aqueles que não estão englobados pelo artigo 104.º do CPC) e é o
que acontece também no caso de preterição de tribunal arbitral voluntário, que é uma situação geradora
de incompetência absoluta do tribunal (artigos 97.º, n.º 1 e 578.º do CPC).
Mesmo quando sejam de conhecimento oficioso, em certos casos só podem ser conhecidos até certo
momento, como acontece por exemplo com a incompetências relativa, que deve ser decidida
normalmente até ao despacho saneador (artigo 104.º, n.º 3 do CPC). Portanto, mesmo que sejam de
conhecimento oficioso, a lei pode determinar que a exceção dilatória só pode ser conhecida até certo
momento.
Noutros casos, como acontece em alguns da incompetência absoluta, pode ser conhecida a qualquer
momento – até que haja uma sentença transitada em julgado. Em síntese, a regra (artigo 578.º do CPC)
é que as exceções dilatórias são de conhecimento oficioso e serão de conhecimento provocado nos
casos previstos na mesma norma.
Distinguem-se ainda os pressupostos processuais no que diz respeito à legitimidade para o respetivo
suprimento no caso de eles serem sanáveis, consoante o juiz tenha legitimidade exclusiva para o fazer
ou, pelo contrário, o suprimento tenha de ser requerido pelas partes – ex.: o juiz tem competência para
ordenar a regularização da instância em caso de irregularidade de representação (artigo 28.º, n.º 1),
mas já não terá competência para chamar à instância novas partes, o que significa que em caso de
preterição de um litisconsórcio necessário ou de uma coligação necessária em que a regularização da
instância pressupõe a chamada de novas partes ao processo através do incidente de intervenção
principal provocada, o juiz não pode desencadear esse incidente oficiosamente e deve convidar as
partes a sanar a falta.
Os pressupostos processuais podem ser positivos ou negativos:
1) POSITIVOS: quando a sua presença seja necessária à entrada no mérito da causa;
2) NEGATIVOS: quando a sua verificação obste à consideração do mérito da causa (são
pressupostos processuais negativos o caso julgado e a litispendência).

Quanto ao regime dos pressupostos processuais, o efeito próprio da falta de um pressuposto


processual é a abstenção do juiz de conhecer o mérito da causa (artigo 576.º, n.º 2, 1ª parte), isto não
obstante o disposto na norma do artigo 278.º, n.º 3.
Mesmo que o pressuposto processual seja sanável e mesmo que seja expectável a sua regularização, o
juiz, na presença de uma exceção dilatória, deve abster-se de praticar quaisquer atos que conduzam à
decisão de mérito – portanto, não se trata só de não tomar a decisão de mérito; se o processo é
inadmissível, o juiz deve também abster-se de praticar quaisquer atos que têm por fim a tomada de uma
decisão de mérito.
Portanto, deve abster-se não só de proferir sentença quanto ao mérito, como também se deve abster de
entrar na apreciação e discussão da matéria que interessa à decisão de mérito, nomeadamente
sustando/parando a produção de prova sobre os fundamentos do pedido.
Do ponto de vista da defesa, a falta do pressuposto processual pode ser invocada como forma de obstar
a que o tribunal conheça do fundo da causa e, por isso, é uma exceção dilatória (artigo 576.º, n.º 2 e
577.º do CPC). Perante esta situação, o juiz deve então absolver o réu da instância ou, nos casos da
incompetência relativa (artigo 105.º, n.º 3), ordenar a remessa para o tribunal competente. Procura-se,
Rita Nunes 66
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TEÓRICAS

no entanto, se a falta for sanável, que haja oportunidade de se regularizar a instância – o juiz tem esse
poder-dever de velar pela regularização da instância (artigo 6.º, n.º 2 do CPC).
Deverá o juiz providenciar pela regularização da instância logo que se aperceba da falta do pressuposto
processual. Portanto, havendo despacho liminar, é de entender que o juiz possa nesse momento proferir
um despacho de regularização da instância ou convidar o autor à regularização (argumento de
economia processual). Se não houver despacho liminar ou se o juiz se deparar perante a falta do
pressuposto processual num momento ulterior, o momento próprio para ordenar ou convidar a prática
dos atos necessários à regularização da instância é o despacho pré-saneador (artigo 590. n.º 2, al. a)).
O convite ao aperfeiçoamento ou a ordem oficiosa para a prática do ato necessário à regularização da
instância tem lugar no despacho pré-saneador. O efeito da absolvição da instância é apenas a extinção
daquela concreta relação processual – por sua própria definição, a absolvição da instância obsta à
consideração do mérito da ação.
Por essa razão, o despacho que ordena a absolvição do réu da instância não obsta a que se proponha
outra ação com o mesmo objeto (artigo 279.º, n.º 2), porque se produz apenas caso julgado formal,
portanto, tem apenas força dentro do processo em que se formou (artigo 620.º).
Ou seja, o caso julgado formal não constitui uma exceção dilatória fora do processo em que se formou,
ao contrário do que acontece com o caso julgado material, que constitui uma exceção dilatória fora do
processo em que se formou. O caso julgado corresponde a um pressuposto processual negativo –
portanto, não pode haver um caso julgado material; se há um caso julgado que se formou num processo,
ele vale fora desse processo, por isso constitui um pressuposto processual negativo a inexistência de
um caso julgado.

Para dois tipos de efeitos permite-se, no entanto, o aproveitamento da ação proposta mas que era
inadmissível:
• Admite-se, primeiro, que os efeitos civis resultantes da propositura da primeira ação e da citação
do réu se conservem se nova ação for intentada no prazo de 30 dias a contar da absolvição da
instância (artigo 279.º, n.º 2 CPC).
• O efeito civil próprio da propositura da ação é a interrupção da caducidade do direito (artigo
331.º, n.º 1 CC).
• O efeito civil próprio da citação diz respeito à cessação da boa-fé do possuidor (artigo 564.º, al.
a) do CPC), da prescrição (artigo 323.º, n.º 1 CC), da usucapião (artigo 1292.º do CC), da mora
nos termos do artigo 805.º, n.º 3 do CC.
• Por outro lado, no caso de absolvição da instância por causa diferente da prevista nas alíneas a)
a d) do artigo 278.º, n.º 1 podem aproveitar-se as provas produzidas na primitiva ação (artigo
279.º, n.º 3).

Regime do artigo 278.º, n.º 3 do CPC (esta norma tem pouca aplicação):
Mesmo quando estamos perante uma exceção dilatória e não seja possível fazer a regularização da
instância ou ela não seja feita, admite-se excecionalmente que o tribunal se possa validamente
pronunciar sobre o mérito da causa. Nos termos desta norma, há três pressupostos para que isso seja
possível:
1. O pressuposto processual deve destinar-se a tutelar apenas o interesse de uma das partes;
2. Não esteja presente qualquer outra exceção dilatória;
3. A decisão de mérito que se pode tomar/proferir seja integralmente favorável à parte tutelada.
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Portanto, por regra, perante esta situação, o juiz deve absolver o réu da instância, mas excecionalmente
o juiz pode tomar uma decisão de mérito se se verificarem os pressupostos do artigo 278.º, n.º 3 do
CPC.
ex.: pressuposto processual da representação – há sujeitos que devem estar representados no processo;
o facto de a lei impor que essa pessoa deve estar representada prende-se justamente com a necessidade
de essa pessoa estar representada por alguma razão, mas o que está em causa é proteger essa pessoa.
Imaginemos que a parte não está representada como deveria estar, mas a decisão de mérito seria
integralmente favorável a essa parte, então haveria razão para não proferir uma decisão de mérito.

Aula n.º6 – 05/11/2021


Os primeiros pressupostos de que vamos tratar são o da personalidade judiciária e o da capacidade
judiciária, que são pressupostos processuais atinentes às partes da causa.

Primeiramente é importante tecer algumas considerações em relação à noção de ‘parte’: adota-se em


processo civil a noção formal de ‘parte’, sendo que são partes em processo civil as pessoas que movem
ou contra quem se move uma determinada ação judicial e que, nessa medida, veem produzir-se na sua
esfera jurídica os efeitos da decisão que venha a ser proferida.
Não importa para este efeito se essas pessoas são, do ponto de vista material, a parte da relação material
controvertida, importando apenas quem move a ação e contra quem é movida a ação.

É parte quem move a ação e contra quem é movida a ação, independentemente de essas pessoas
terem legitimidade material ou não?
Ex.: A intenta uma ação contra B afirmando que celebrou um contrato com B e que determinada
prestação lhe é devida. Depois vem, afinal, a apurar-se que o contrato foi celebrado, não entre A e B,
mas entre A e C, o que significa que o réu não é parte da relação material controvertida (cuja une, afinal
o A e o C e não o A e o B – no entanto, o B é parte da causa/ ação, porque tem a posição de réu).
Ou seja, não seria no caso parte da relação material, mas é parte da relação processual, pelo simples
facto de a ação ter sido intentada contra si.

Note-se que se a ação for movida por um representante (alguém que em representação de outrem
intenta uma ação), a parte da ação é o representado (quem arca com os efeitos) e não o representante
(que é quem conduz a ação) – ex.: se os pais do menor intentarem uma ação em representação do filho,
a parte da ação não são os pais, mas o filho.
Por outro lado, as partes devem ser as identificadas na petição inicial (o autor através da propositura da
ação [que já assim fica identificado] deve identificar a pessoa do réu – artigo 552.º, n.º 1, al. a) CPC).
Se não for identificado o réu, a secretaria deve recusar a petição inicial (artigo 558.º, al. b) CPC). A
partir do momento em que o réu é citado para a causa, a instância considera-se estável (artigo 260.º
CPC), devendo, salvas as possibilidades de modificação previstas na lei (artigo 265.º CPC), a instância
manter-se a mesma quanto ao pedido, à causa de pedir e às partes.

No que diz respeito às partes, admite-se, no entanto, que novas partes sejam chamadas à instância,
mediante dois tipos de incidentes:
→ Os incidentes de intervenção de terceiros (artigos 311.º e ss. CPC – através destes permite-se
que se acrescentem novas partes à instância)

Rita Nunes 68
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→ Ou através dos incidentes de habilitação (artigo 262.º CPC - que servem, não para acrescentar
uma nova parte à instância, mas para substituir uma parte primitiva – ex.: no caso de uma parte
morrer [ou se extinguir, se for uma pessoa coletiva], é através do incidente de habilitação que se
pode chamar à instância o sucessor – artigo 551.º e ss. CPC)
NOTA: com a morte ou a extinção, a instância pode tornar-se inútil (perdendo a ação o seu interesse).
No entanto, se não houver inutilidade da ação, tem de chamar-se os sucessores. Além do mais, pode
ser uma sucessão mortis causa ou inter vivos.
NOTA: Se houver a preterição de um litisconsórcio necessário (casos de ações em que deve haver uma
pluralidade de partes do lado ativo ou do lado passivo), o CPC permite a regularização da instância
através de um incidente de intervenção de terceiros – ex.: a ação deveria ser intentada por A e B, mas
foi apenas intentada por A – nestes casos o CPC permite chamar quem devia estar na instância e não
está.

A outra possibilidade que existe tem que ver com a figura de PLURALIDADE SUBJETIVA
SUBSIDIÁRIA (artigo 39.º CPC), que consiste no seguinte: se o autor tem dúvidas sobre quem é a
pessoa contra quem deve intentar a ação, pode deduzir um pedido subsidiário contra uma pessoa (artigo
316.º, n.º 2 CPC).
Portanto, se tinha dúvidas se celebrou o contrato com B ou C, pode intentar o pedido contra o B e
prever um pedido subsidiário contra C. Nesse sentido, se depois B vier dizer que não é parte do contrato,
chamar-se-ia o C.

No que diz respeito à sua posição na instância, pode distinguir-se entre parte principal e parte acessória:

→ A parte principal é a que arca diretamente na sua esfera jurídica com os efeitos da sentença que
venha a ser proferida,
→ Ao passo que a parte acessória é aquela que assiste uma das partes principais (pode acontecer
no processo civil que uma parte esteja apenas a assistir uma parte principal, estando a sua
atividade subordinada à da parte principal – artigo 328.º, n.º 1 CPC – ex.: figura da assistência:
o assistente não é parte principal, mas fica obrigado a aceitar o caso julgado que se tenha
proferido na ação em que assistiu uma parte principal).

PERSONALIDADE JUDICIÁRIA
Quer a personalidade, quer a capacidade judiciária são a tradução processual, com especificidades, dos
conceitos de personalidade jurídica e capacidade jurídica. Quem tem personalidade jurídica, tem
também personalidade judiciária (artigo 11.º, n.º 2 CPC – princípio da equiparação ou da
coincidência).
Portanto, a dificuldade desta matéria tem mais que ver com os casos em que o CPC atribui
personalidade judiciária a entidades que nos temos do direito material não tem personalidade jurídica
ou, de outra forma, lhes atribui personalidade jurídica apenas para o efeito de serem partes de uma ação
(é uma personalidade jurídica limitada para efeitos processuais).
A mesma coisa vale para a capacidade judiciária, que nos termos do artigo 15.º, n.º 2 CPC tem por
base e por medida a capacidade do exercício de direitos.

Rita Nunes 69
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Não confundir a personalidade judiciária com capacidade judiciária:


A personalidade judiciária consiste em poder ser parte de uma relação processual e, nessa medida,
ser sujeito ativo ou passivo de efeitos jurídicos processuais. Assim, a personalidade judiciária é a
suscetibilidade de ser parte como autor ou como réu, não dizendo respeito à suscetibilidade de estar
por si (ou através de um representante voluntariamente eleito [eu posso agir em processo através de
um advogado escolhido por mim]) em juízo – isso já é o pressuposto da capacidade judiciária.
O princípio da equiparação diz-nos que quem tem personalidade jurídica tem, por inerência,
personalidade judiciária – ora, personalidade jurídica têm em primeira linha as pessoas singulares, nos
termos do artigo 66.º, n.º 1 CC, a partir do nascimento completo e com vida. Além das pessoas
singulares, a possibilidade de participar no tráfego jurídico como ‘pessoa’ é também atribuída a certas
corporações, das quais podemos salientar as associações e fundações com personalidade jurídica
(artigo 158.º CC) e as sociedades comerciais a partir do registo do contrato que as constitui (artigo 5.º
CSC).

NOTA: as sociedades comerciais adquirem personalidade jurídica a partir do registo do contrato de


sociedade, que constitui a respetiva sociedade comercial. Assim, a partir da data do registo as
sociedades comerciais tem personalidade judiciaria por inerência, mas o CPC atribui personalidade
judiciária até à data do registo.
A personalidade judiciária é estendida pelo CPC a algumas entidades que ao nível do Direito
substantivo não têm personalidade jurídica – trata-se da atribuição de uma personalidade jurídica para
efeitos processuais (casos do artigo 12.º CPC).

Casos particulares de personalidade judiciária do artigo 12.º CPC – extensão da personalidade


judiciária:
→ Artigo 12.º, al. a) CPC – tem personalidade jurídica a herança jacente e os patrimónios
autónomos semelhantes, cujo titular não estiver determinado.

Explicação:
A herança é um património autónomo.
Quando é que a herança está jacente? Diz-se jacente, nos termos do artigo 2046.º CC, a herança que
já está aberta (artigo 2031.º CC – a abertura da herança dá-se com a morte do autor [de cujos] e no
lugar do último domicílio), mas ainda não aceita nem declarada vaga a favor do Estado.
Por seu turno, a jacência da herança termina logo que todos os sucessíveis aceitem a herança (artigo
2049.º CC) ou que ela seja declarada vaga a favor do Estado.
Ora, durante este período de jacência da herança, a própria herança pode ser parte de uma ação judicial
– é a própria herança que intenta uma ação ou contra ele é movida uma ação (obviamente que ela tem
de ser representada, no entanto, é a própria herança que é parte da ação [a pessoa que morreu perdeu a
personalidade jurídica, portanto não poderia intentar uma ação, nem contra ela ser movida qualquer
ação// nem vai ser movida por ou contra os herdeiros]).
Não devemos confundir a herança jacente com a herança indivisa. A herança indivisa também é um
património autónomo, mas os seus titulares estão determinados. Neste âmbito, a herança já foi aceite
pelos herdeiros, mas ainda não foi partilhada. Nestes casos, a herança não deixa de ser património
autónomo, mas os seus titulares estão determinados – aqui a ação deve ser intentada contra todos os
herdeiros ou por todos os herdeiros (artigo 2091.º CPC – temos aqui um exemplo de litisconsórcio
necessário).

Rita Nunes 70
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TEÓRICAS

→ Estávamos a ver casos particulares da personalidade judiciária: já vimos o da herança jacente,


sendo que o segundo grupo de casos diz respeito a entidades de feição coletiva às quais não se
atribui personalidade jurídica de direito material, mas às quais se oferece a subjetivação
consistente na personalidade judiciária.

É o caso das:
→ Associações sem personalidade jurídica e comissões especiais (artigo 12.º, al. b) CPC e 195.º e
ss. CC);
→ Sociedades civis (artigo 12.º, al. c) CPC e 980.º e ss. CC)
→ Sociedades comerciais até à data do registo definitivo do contrato que as constitui (artigo 12.º,
al. d) CPC e 5.º CSC – a partir da data do registo deste contrato elas adquirem personalidade
jurídica e, inerentemente, passam a ter personalidade judiciária nos termos do artigo 11.º CPC).

→ É preciso ter em consideração igualmente o caso do condomínio resultante da propriedade


horizontal, no que diz respeito às ações que se inscrevem dentro das funções do administrador
(artigo 12.º, al. e) CPC). O condomínio é um instituto jurídico que tem lugar na propriedade
horizontal (artigo 1414.º e ss. CC), que é um direito que tem por conteúdo não só a propriedade
exclusiva da respetiva fração autónoma, mas também a propriedade em comum das partes
comuns (artigo 1420.º, n.º 1 CC).
Ora, o condomínio é constituído para a administração das partes comuns e as funções do administrador
estão referidas nos artigos 1436.º e 1437.º CC. Portanto, o condomínio pode intentar uma ação, como
contra si pode ser movida uma ação (o condomínio pode ser parte numa ação [sendo representado pelo
administrador]).

→ É ainda atribuída personalidade judiciária aos navios nos termos de legislação especial (artigo
12.º, al. f) CPC) – também o próprio navio pode ser parte numa ação. O artigo 7.º do DL 201/98,
de 10 de julho define o estatuto legal de ‘navio’.
→ Artigo 13.º CPC – temos outro grupo de casos: também as sucursais, agências, filiais,
delegações ou representações podem demandar ou ser demandadas quando a ação proceda de
facto por elas praticado (artigo 13.º, n.º 1 CPC). Por seu turno, nos termos do artigo 13.º, n.º 2
CPC, “se a administração principal (porque estamos a falar de sucursais, agências, filiais,
delegações ou representações) tiver a sede ou domicílio em país estrangeiro, as sucursais,
agências, filiais, delegações ou representações estabelecidas em Portugal podem demandar e ser
demandas, ainda que a ação derive de facto praticado por aquela, quando a obrigação tenha sido
contraída com português ou com estrangeiro domiciliado em Portugal”.
Caso não tenha personalidade judiciária, a sua falta pode ser sanada (artigo 14.º CPC). Se a ação for
proposta por uma sucursal, agência, filial, delegação ou representação ou contra sucursal, agência, filial,
delegação ou representação mas ela careça de personalidade jurídica, pode a sua falta ser sanada,
mediante a intervenção da administração principal e a ratificação ou repetição do processado.

→ Fora do elenco do artigo 12.º CPC é ainda de salientar a atribuição de personalidade judiciária
ao órgão de fiscalização das sociedades comerciais para efeitos de declaração de nulidade ou de
anulação de deliberações sociais – artigo 57.º, n.º 2 CSC.

Rita Nunes 71
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Regime da falta de personalidade judiciária:


A falta de personalidade judiciária dá lugar a uma exceção dilatória (é o nome que o Código dá à falta
de um pressuposto processual, cabendo distinguir consoante essa falta seja sanável ou não) – artigo
278.º, n.º 1, al. c) e artigo 577.º, al. c) CPC.
Nos termos do artigo 14.º CPC, a falta de personalidade judiciária das sucursais, agências, filiais,
delegações ou representações é sanável nos termos em que vimos; à falta de um instrumento de
regularização previsto na lei, nos termos do artigo 14.º CPC, a falta é insanável.
Se o processo comportar despacho liminar (que normalmente não comporta [artigo 590.º, n.º 1 e 226.º,
n.º 4 CPC]), e se uma parte carece de personalidade judiciária, sendo a falta insanável, o juiz profere
um despacho de indeferimento liminar. Por seu turno, caso já tenha havido oportunidade de
contraditório (se o réu já foi citado para a ação), o juiz, no despacho saneador (artigo 595.º, n.º 1, a)
CPC), em face de uma falta insanável, absolve o réu da instância (tal como também pode haver
absolvição do réu na sentença final – artigo 608.º, n.º 1 CPC).
Se a falta for sanável, o juiz, ao abrigo dos seus poderes de gestão processual (artigo 6.º, n.º 2 CPC),
deve convidar as partes à regularização da instância em sede de despacho liminar. Se houver (sendo
que normalmente não há) fá-lo logo no despacho liminar; se não houver despacho liminar, faz em
despacho pré-saneador (artigo 590.º, n.º 2, al. a) CPC).

Cessação superveniente da personalidade judiciária:


Este pressuposto da personalidade judiciária naturalmente deve verificar-se ao longo de todo o processo
– é claro que se uma parte perde a personalidade judiciária, deixa de ser destinatária de decisões
judiciais. Assim, se no decurso da ação uma das partes perder a personalidade judiciária, estamos
perante a falta superveniente de um pressuposto processual.

Neste âmbito temos de distinguir duas situações: a instância pode tornar-se inútil OU tal, como
normalmente acontece, pode conservar a sua utilidade (ex.: A propõe uma ação contra B para que B se
abstenha de praticar atos lesivos da sua posse. Com a morte de B a ação torna-se inútil, já que
desaparece o risco de perturbação da posse)
Aqui verifica-se o fenómeno da inutilidade superveniente, que é, nos termos do artigo 277.º, al. e), a
inutilidade superveniente da lide – é uma causa de extinção da lide.
No entanto, normalmente, a morte (da pessoa singular) ou extinção (da pessoa coletiva) de uma das
partes não gera a inutilidade superveniente da lide, pelo que a instância não se vai extinguir por essa
razão. Aqui aplicar-se-á o regime da sucessão de parte. Normalmente, então, a morte ou a extinção de
uma das partes suspende a instância (artigo 269.º, al. a) CPC).
Nos termos do artigo 270.º. n.º 2 CPC, qualquer uma das partes tem o dever de dar a conhecer no
processo o facto da morte da sua comparte (no caso de litisconsórcio ou coligação) ou da parte contrária,
devendo juntar o documento comprovativo de tal facto (artigo 270.º, n.º 1 CPC), sendo o
incumprimento deste dever fonte potencial de responsabilidade civil para a remoção dos danos gerados
pelo respetivo incumprimento, devendo ainda ser condenado a pagar as custas dos atos que tenham
ficado sem qualquer efeito.
Este aspeto relaciona-se com o facto de que, ainda que a instância só se suspenda a partir do momento
em que se junta ao processo a prova do falecimento ou da extinção, são nulos todos os atos praticados
a partir dessa data (do falecimento ou extinção – artigo 270.º, n.º 3 CPC), salvo quando esses atos
venham a ser ratificados pelos sucessores da parte falecida (artigo 270.º, n.º 4 CPC).
A suspensão com este fundamento só cessará quando for notificada a decisão que considere habilitado
certo sucessor da parte falecida – artigo 276.º, n.º 1, al. a) CPC. Para regularizar a instância deve,

Rita Nunes 72
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEÓRICAS

portanto, requerer-se a habilitação dos sucessores, nos termos do regime de direito material (através
deste regime da habilitação vão ser admitidos à instância aqueles que, nos termos do direito material,
sucedem na titularidade da posição jurídica litigada artigo 351.º CPC).
Existe uma exceção a este regime que decorre do artigo 162.º CSC – nos termos deste regime, no caso
da extinção da sociedade, a ação prossegue contra a generalidade dos sócios representados pelos
liquidatários.

CAPACIDADE JUDICIÁRIA
A capacidade judiciária traduz para o processo o conceito substantivo da capacidade de exercício de
direitos. Portanto, ela tem por conteúdo a suscetibilidade de estar por si (ou através de um representante
voluntariamente nomeado) em juízo – artigo 15.º, n.º 1 CPC – e tem por base e por medida a capacidade
de exercício dos direitos – artigo 15.º, n.º 2 CPC.
Portanto, o regime processual procura trazer para o processo as valorações de direito material – ex.: os
menores não podem agir por si próprios em juízo, uma vez que nos termos do artigo 123.º CC são
incapazes para o exercício de direitos. Mas se o regime de direito material introduzir uma exceção
como acontece no artigo 127.º CC (no que diz respeito aos menores), então eles já poderão agir
sozinhos numa ação civil, sem representantes legais.
Assim, se estivermos perante um dos casos do artigo 127.º CC, que são exceções à incapacidade de
exercício dos menores, já estes menores poderão estar por si em juízo.

Para determinar a quem compete a representação, é necessário considerar o regime material aplicável
– em matéria de pessoas singulares, tratando-se de menores ou maiores acompanhados sujeitos a
representação (artigos 138.º e ss. CC), só podem estar em juízo por intermédio dos seus representantes
(exceto quanto aos atos que possam estabelecer e exercer livremente [no caso dos menores, são os
casos do artigo 127.º CC]) - artigo 16.º, n.º 1 CPC. Nos termos do n.º 2 do artigo 16.º CPC, os menores
cujo exercício das responsabilidades parentais compete a ambos os pais são por estes representados em
juízo, sendo necessário o acordo de ambos para a propositura de ações.
Por fim, nos termos do n.º 3, quando seja réu um menor sujeito ao exercício das responsabilidades
parentais dos pais, devem ambos ser citados para a ação (o filho é citado na pessoa dos pais, mas quem
é considerado parte é o filho).
Se houver desacordo entre os pais na representação do menor, aplica-se o regime do artigo 18.º CPC
– o n.º 1 diz ‘se, sendo o menor representado por ambos os pais, houver desacordo entre estes acerca
da confiança para intentar a ação, pode qualquer um deles requerer ao tribunal competente para a causa
a resolução do conflito’. Depois, o n.º 2 refere-se a uma situação em que o desacordo surge apenas no
decurso e orientação do processo.

Artigo 19.º, n.º 1 CPC – no caso de maiores acompanhados que não sejam sujeitos a representação (foi
aplicada medida de acompanhamento sem representação) estes maiores acompanhados podem intervir
em todas as ações em que sejam parte e devem ser citados quando tiverem a posição de réu, sob pena
de se verificar a nulidade correspondente à falta de citação, ainda que tenha sido citado o
acompanhamento. Quanto à nulidade decorrente da falta de citação – remissão para o artigo 187.º;
188.º e 189.º CPC

A intervenção do maior acompanhado quanto a atos sujeitos a autorização fica subordinada à orientação
do acompanhante, que prevalece em caso de divergência – artigo 19.º, n.º 2 CPC – ele pode intervir e

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TEÓRICAS

deve ser citado, mas a sua intervenção, no que diz respeito aos atos sujeitos a autorização, fica sujeito
à orientação do acompanhante.
Se não houver representante geral, deve requerer-se nomeação ao tribunal competente, podendo
designar-se um curador especial ou provisório (artigo 17.º, n.º 1 CPC), sendo que isto também vale
para aqueles que estiverem impossibilitados de receber a citação em virtude de anomalia psíquica ou
outro motivo grave (artigo 20.º, n.º 1, n.º 2 e n.º 4 CPC).
Se o ausente ou o incapaz não deduzirem oposição, é o MP que assume a defesa (artigo 21.º CPC), MP
esse que representa também os incertos (artigo 22.º CPC).
Já no que diz respeito a pessoas coletivas, atente-se o artigo 25.º e o artigo 26.º CPC – de acordo com
o artigo 25.º, n.º 1 CPC, as demais pessoas coletivas e as sociedades são representadas por quem a lei,
os estatutos ou pacto social da sociedade designarem (ex.: uma sociedade por quotas é representada
em juízo pelos seus gerentes, que aliás não podem depor como testemunhas/ um gerente de uma
empresa que seja parte numa ação não pode depor como testemunha).
No artigo 21.º, n.º 2 e n.º 3 está prevista a hipótese de representação orgânica (princípio da
especialidade do fim – artigo 160.º CC).
No artigo 26.º CPC lê-se que “Salvo disposição especial em contrário, os patrimónios autónomos são
representados pelos seus administradores e as sociedades e associações que careçam de personalidade
jurídica, bem como as sucursais, agências, filiais ou delegações, são representadas pelas pessoas que
ajam como diretores, gerentes ou administradores”.

A falta e o suprimento da capacidade judiciária


A incapacidade judiciária é uma exceção dilatória que obsta a que o tribunal conheça do mérito da
causa, tendo como consequência, se não for sanável, a absolvição do réu da instância – artigo 278.º,
n.º 1, c) CPC e 577.º, al. c) CPC.
Mas a incapacidade judiciária é sanável, mediante a intervenção ou citação do representante legítimo
do incapaz – artigo 27.º, n.º 1 CPC. Vale aqui a particularidade de que o juiz deve ter a iniciativa do
respetivo suprimento, ordenando a prática dos atos necessários à regularização da instância – artigo
28.º, n.º 1 CPC. Assim, o tribunal tem o poder de providenciar pelo suprimento da falta do pressuposto
processual e, oficiosamente, ordenar os atos necessários à regularização da instância.
O representante que será citado pode ratificar os atos anteriormente praticados ou pode recusar a
respetiva ratificação e se a recusar fica sem efeito todo o processado posterior ao momento em que a
falta se deu – artigo 27.º, n.º 2 CPC.

Chama-se ainda à atenção do artigo 27.º, n.º 3 CPC – “Se a irregularidade verificada consistir na
preterição de algum dos pais, tem-se como ratificado o processado anterior, quando o preterido,
devidamente notificado, nada disser dentro do prazo fixado”; nos termos do artigo 27.º, n.º 3, 2.ª parte
CPC, havendo desacordo dos pais acerca da repetição da ação ou da renovação dos atos, é aplicável o
disposto no artigo 18.º.

→ Artigo 27.º, n.º 4 CPC – prescrição e caducidade


Se a ação comportar despacho liminar, o juiz deve ordenar a prática dos atos necessários à regularização
da instância logo no despacho liminar – artigo 590.º, n.º 1 CPC (ao abrigo da norma do artigo 6.º, n.º
2 CPC). Nos casos regra em que o despacho liminar não tem lugar (que são a regra), o juiz deverá
ordenar a citação ou notificação de quem deve intervir na causa como representante no despacho pré-
saneador (artigo 590.º, n.º 2, a) CPC + artigo 28.º, n.º 1 e 2 CPC), e não no despacho liminar.

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O mesmo regime da incapacidade judiciária aplica-se com as necessárias adaptações aos casos em que
a lei exija autorização ou deliberação para a prática de um certo ato – artigo 29.º CPC:
→ ex. 1: artigo 1938.º, n.º 1, al. e) CC (tem que ver com a matéria do tutor);
→ ex. 2: Ac. Relação de Guimarães de 30/11/2017 (Relator José Manuel Alves Flores – caso de
uma providência cautelar que tem por objeto a discussão de uma servidão de passagem sobre um
imóvel pertencente a um condomínio, em que o condomínio é o requerido na providência cautelar
[apresentado pela sua administração]. Depois lê-se que a falta de prova no prazo fixado pelo
tribunal da atribuição à administração de poderes especiais para o efeito por parte da assembleia
de condóminos que é exigida nos termos do artigo 1437.º, n.º 3 CC importa que se considere
sem efeito a oposição deduzida, nos termos da norma do artigo 29.º, n.º 2 CPC).

Artigo 29.º, n.º 2 CPC – “Não sendo a falta sanada dentro do prazo, o réu é absolvido da instância,
quando a autorização ou deliberação devesse ser obtida pelo representante do autor; se era ao
representante do réu que incumbia prover, o processo segue como se o réu não deduzisse oposição”:
se a falta de deliberação diz respeito ao autor, o réu é absolvido da instância, mas se disser respeito ao
réu a consequência é que o processo prossegue como se o réu não deduzisse oposição (artigo 29.º, n.º
2, 2.ª parte CPC).

O problema da legitimidade processual


O pressuposto processual da legitimidade processual diz respeito à correspondência que deve existir
entre as concretas partes da ação (Autor e Réu/ Autores e Réus – pessoa que intenta a ação e pessoa
contra quem é intentada a ação) e as partes da relação material objeto da lide (relação material
controvertida tal e qual alegada pelo autor).
Já se vê uma diferença entre este pressuposto e os vistos anteriormente – é que este pressuposto da
legitimidade processual só se pode aferir por relação a um concreto processo (legitimatio ad
causam).

Ou seja, é possível dizer, abstratamente, se uma determinada pessoa (singular ou coletiva) tem
personalidade judiciária e o mesmo acontece quanto à capacidade judiciária. No entanto, não se pode
dizer abstratamente que uma pessoa tem legitimidade processual, porque é uma relação (fala-se da
legitimidade como uma posição perante uma determinada ação – uma relação entre a parte do
processo e o seu objeto).

Perspetivas de autores:

1. DR. ALBERTO DOS REIS diz “A questão da legitimidade é uma questão de posição quanto
à relação jurídica substancial”
2. DR. ANTUNES VARELA “Trata-se de uma posição da parte perante uma determinada ação”
3. DR. CARLOS FERNANDES “A legitimidade é uma posição de Autor e Réu em relação ao
objeto da lide, qualidade que justifica que possa ser aquele Autor ou aquele Réu a ocupar-se em
juízo daquele objeto do processo”
A não verificação do pressuposto da legitimidade processual dá lugar à existência de uma exceção
dilatória – artigo 278.º, n.º 1, al. d) CPC e artigo 577.º, al. c) CPC.

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Finalidade deste pressuposto:


Claro, a finalidade do pressuposto da legitimidade é garantir a produção do efeito útil da ação, porque
o caso julgado tem como limites as partes da ação (artigo 581.º, n.º 1 e 619.º, n.º 1 CPC). Desta forma,
se o caso julgado tem como limites as partes da ação, então, o destino de uma determinada relação
material controvertida só estará definitivamente resolvido se na ação intervierem as alegadas partes
dessa relação material.

LEGITIMIDADE MATERIAL/ LEGITIMAÇÃO:


A distinguir da legitimidade processual está a chamada “legitimidade material ou legitimação”. O
termo “legitimidade” é um termo instaurado no ordenamento jurídico – ex.: é nula a venda de bens
alheios sempre que o vendedor careça de legitimidade para a realizar.
Portanto, quando se fala de legitimação/ legitimidade material está-se a designar a relação que deve
existir entre o autor de um ato e o objeto desse ato, para que o efeito jurídico que é pretendido por essa
pessoa possa ser reconhecido pela ordem jurídica ou para que a utilização que a pessoa faz de um
determinado bem seja considerada a problemática do ordenamento jurídico – ex.: é o proprietário que,
por via de regra, tem legitimidade para dispor do direito de propriedade. Se não for o proprietário a
dispor, estamos perante uma alienação de bens alheios.

O pressuposto da legitimidade material distingue-se do da legitimidade processual da mesma


maneira que se distingue o problema do mérito da admissibilidade da ação – ou seja:
• O apuramento da legitimidade material importa ao juízo de mérito/ procedência ou
improcedência da ação.
• A legitimidade processual importa para a admissibilidade da ação.
Mas, na medida em que o pressuposto da legitimidade processual se afere por referência à titularidade
da relação material controvertida, as regras de legitimidade material importam para determinar quem
é que é a parte legitima da ação (as regras e não a efetiva titulação).
Portanto, a REGRA DE AFERIÇÃO DA LEGITIMIDADE passará justamente por considerar parte
legítima para a ação os titulares da relação material controvertida (pressupondo a aplicação das regras
materiais relativas à titularidade) tal como configurada pelo Autor na petição inicial – artigo 30.º, n.º
3 CPC.

ex.: Se A afirma na petição inicial que o seu devedor é B, mas intenta a ação contra C → então C não
é parte legítima para a ação. Nos termos em que o Autor apresentou a relação material controvertida,
B é que responderia e não C. Mas se o Autor diz que o devedor é B, então B será parte legítima, mesmo
que depois no decurso da ação se venha a concluir que o real devedor é C. Assim, para a legitimidade
processual importam as regras da legitimidade material e não a efetiva titulação das posições
jurídicas.

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Desta feita, deve atender-se à configuração da relação material feita pelo Autor e às regras da
legitimidade material – ex.: A indica na petição inicial que celebrou um contrato com B e B vem dizer
que não (impugna dizendo que o contrato foi celebrado com D).
→ Vemos como foi configurada a relação pelo Autor (legitimidade processual) – partimos daqui, sendo
que temos um contrato entre A e B (que é o que está na petição inicial).
→ Aqui aplicam-se as regras de legitimidade material e atenta-se à relação material como foi
configurada pelo Autor – quem é que é devedor da obrigação partindo do que o Autor diz? B (pelas
regras de titulação, B é a parte legítima)
→ Mas se depois se vem a concluir que o verdadeiro devedor é D e não B, então a ação será julgada
improcedente, mas essa é já uma questão de mérito e não de admissibilidade.

NOTA: Atente-se à configuração da relação material controvertida pelo Autor, mas desde que ela faça
sentido para o Direito.
Ex.: nos termos do artigo 800.º, n.º 1 CC, que diz respeito à responsabilidade por atos de auxiliares, o
devedor é responsável perante o credor por atos praticados por representantes legais ou auxiliares
(pelos atos das pessoas que utilize para o cumprimento das obrigações, como se tais atos fossem
praticados pelo próprio devedor). Portanto, imagine-se uma ação de responsabilidade contratual em
que o Autor na petição inicial diz que celebrou um contrato com B, sendo que no cumprimento da
obrigação o B serviu-se de C (mas quem responde contratualmente face ao Autor é o devedor (B) e
não o auxiliar (C)).
No entanto, o Autor vem intentar a ação contra C – o Autor até pode escrever na petição inicial que a
responsabilidade é do auxiliar, mas nós aplicamos as regras de titulação do direito material (e não
a efetiva titulação), sendo que, nos termos do direito material, quem responde é B (que é o devedor).

LEGITIMIDADE SINGULAR – artigo 30.º CPC


NOTA: não é o mesmo o problema da legitimidade como parte principal e como parte acessória, ou
seja, a legitimidade como parte acessória tem o seu requisito próprio – agora estamos a ver a
legitimidade como parte principal.
A legitimidade para a ação, nos termos do artigo 30.º, n.º 1, é fixada pelo interesse direto em demandar
e contradizer. Claro que esta forma de delimitação da legitimidade levanta dificuldades operativas –
como é que opera este critério? Quem tem interesse direto em demandar e em contradizer? Como se
afere isto na prática?
Isto artigo diz ‘na falta de disposição em contrário’.
O conceito de interesse é um dos mais polissémicos conceitos jurídicos – ora, quer no n.º 2, quer no
n.º 3 deste artigo 30.º CPC se procura densificar esta noção – nos termos do n.º 2 do artigo 30.º CPC,
o interesse em demandar exprime-se ‘pela utilidade derivada da procedência da ação’ e o interesse
em contradizer ‘pelo prejuízo que dessa procedência advenha’. É uma fórmula que não é
particularmente valiosa pela sua generalidade – como se afere da utilidade derivada da procedência da
ação? É demasiado genérica
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O próprio professor TAVARES DE SOUSA considera que este se refere ao pressuposto do interesse
em agir e não ao pressuposto da legitimidade.
Ex.: imagine-se que A é locatário de um imóvel e que o senhorio é B – imagine-se que C é o vizinho.
A (arrendatário da casa de B) emite muitos ruídos e o vizinho não consegue dormir.
Ora, o C (vizinho) tem interesse na resolução do contrato de arrendamento celebrado entre A e B. Tem
legitimidade para propor uma ação em que peça esta resolução? Não tem (ele não está legitimado a
pedir numa ação judicial a produção deste efeito resolutivo), dado que não é parte do contrato (pese
embora tenha interesse na resolução). Óbvio que o vizinho poderia recorrer aos meios próprios de tutela
da s relações de vizinhança (artigo 1346.º CC).
Ao Direito, como ordem de repartição de posições jurídicas, que fixa aquilo que é de uma pessoa ou
de outra, importa menos os efeitos económicos dos atos do que aqueles que estão titulados a fruir de
um certo bem. É este o caminho que é seguido pelo artigo 30.º, n.º 3 CPC.

A fórmula do artigo 30.º, n.º 3 CPC compreende 3 elementos fundamentais:


1. A aplicação da regra da titularidade do direito material como critério padrão de aferição da
legitimidade processual (aplicam-se as regras de direito material) e, portanto, o interesse de que
fala a lei é um interesse-titularidade

O critério regra de aferição da legitimidade será a titularidade das posições jurídicas que estão
na base do caso jurídico que será apreciado no processo.
Nesta medida, a legitimidade processual decalca-se das regras de legitimidade material – vai ser aferida
de acordo com a bitola que é traçada pelo Direito material. Assim é atendendo ao próprio sentido deste
pressuposto, que tem como objetivo garantir que o caso julgado dirima definitivamente o litígio
jurídico e, se assim é, tem de haver correspondência com as categorias do direito material.

2. A sua aferição, por referência aos termos em que o Autor haja delineado a relação material
controvertida. Por outras palavras, atente-se à relação material controvertida tal como
configurada pelo Autor na petição inicial
O segundo elemento é que esta aferição da legitimidade tem por referência os termos em que o Autor
haja delineado a relação material controvertida. Portanto, a efetiva titulação das posições jurídicas
litigadas constitui já um problema de mérito e não de admissibilidade. Há cerca de um século, o âmbito
deste pressuposto processual da legitimidade foi objeto de controvérsia entre o professor ALBERTO
DOS REIS e o professor BARBOSA MAGALHÃES – na origem da controvérsia teve um caso em
que uma sociedade comercial tinha sido citada como Ré, mas a Ré alegou que interviera como mera
intermediária e assim foi provado na ação. Assim, questionava-se se a Ré deveria ser absolvida do
pedido ou da instância

→ O professor ALBERTO DOS REIS vinha dizer que o pressuposto processual da legitimidade
só tinha interesse caso a ação fosse dirigida efetivamente contra aquele que realmente é parte da

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relação material controvertida (defendia que a Ré não tinha legitimidade processual e, por isso,
deveria ser absolvida da instância).
Um dos argumentos utilizado pelos defensores desta posição seria permitir, ainda, a vinda ao
processo dos verdadeiros sujeitos da relação controvertida – para responder a esse problema se criou
a figura da pluralidade subjetiva subsidiária.

→ O professor BARBOSA DE MAGALHÃES entendia que o requisito da legitimidade se deveria


aferir pela titularidade da relação material controvertida tal como configurada pelo Autor e
também apresentava argumentos nesse sentido – (estamos a falar de um pressuposto processual
e ele deve poder ser aferido no início da ação) – se para efeitos do pressuposto processual da
legitimidade se atender à real titularidade é preciso que o processo siga o seu curso e só chegado
a uma fase final é que é possível dizer se o processo é admissível ou não.
Para efeito do pressuposto processual da legitimidade atenta-se à titularidade da relação material
controvertida tal como configurada pelo Autor – se a Ré é parte, ela terá legitimidade; a efetiva
titularidade é já um exemplo de mérito. Assim, a Ré deveria ser absolvida, não da instância, mas
do pedido.
NOTA: perante a dúvida do Autor sobre o sujeito da relação material controvertida, o Autor pode, logo
na petição inicial, deduzir um pedido subsidiário ou chamar essa pessoa para deduzir sobre ela um
pedido subsidiário – artigo 39.º e 316.º, n.º 2 CPC.

3. O caráter supletivo da regra


Quanto ao 3.º elemento fundamental do artigo 30.º, n.º 3 CPC – trata-se de um regime supletivo, ou
seja, há exceções: aplica-se o critério que já vimos (a titularidade da relação material controvertida tal
como configurada pelo Autor) na falta de disposição da lei em contrário.
→ TEMOS EXCEÇÕES – o principal conjunto de exceções diz respeito aos casos de
LEGITIMIDADE EXTRAORDINÁRIA, onde o legislador atribui legitimidade a quem não é parte
ou tenha uma quota parte da legitimidade.

A aplicação deste critério a casos particulares
(na ação de constituição, na ação de condenação e na ação de simples apreciação)
Antes de olharmos aos diferentes casos de legitimidade extraordinária, vamos ver a aplicação do
critério geral que vimos no caso das ações de constituição, de condenação e de simples apreciação.

• Ações de condenação (+ caso particular da ação de reivindicação)


Tratando-se de uma ação de condenação, quem tem legitimidade ativa é o alegado titular do direito que
se pretende ver tutelado naquela concreta ação, sendo que tem legitimidade passiva o alegado devedor.
Tratando-se do cumprimento de um direito de crédito, tem legitimidade ativa o alegado credor e
legitimidade passiva o alegado devedor.

Rita Nunes 79
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Caso particular da ação de reivindicação:


Esta ação pode ter um duplo propósito: o de reaver o bem e o de ajuizar da titularidade do direito –
artigo 1311.º CPC (1 – O proprietário pode exigir judicialmente de qualquer possuidor ou detentor da
coisa o reconhecimento do seu direito de propriedade e a consequente restituição do que lhe pertence.
/ 2. Havendo reconhecimento do direito de propriedade, a restituição só pode ser recusada nos casos
previstos na lei.)
Artigo 1315.º CPC – As disposições precedentes são aplicáveis, com as necessárias correções, à defesa
de todo o direito real.

→ A norma do artigo 1311.º, n.º 1 CPC fala no possuidor ou mero detentor


A posse tem dois elementos: o corpus e o animus (por um lado, o possuidor tem poderes de facto sobre
a coisa [corpus], mas para ser possuidor ele deve exercer esse poder como titular do respetivo direito
[animus]) – ex.: o arrendatário tem o poder de facto sobre a casa (tem a chave e habita a casa); tem a
posse precária da casa, mas não é possuidor em nome próprio, porque não é o proprietário e, nesse
sentido, não tem animus.
Note-se que com o mero detentor o Autor da ação não pode discutir a questão da titularidade do direito,
porque o mero detentor tem poderes sobre a coisa, mas em nome de outra pessoa – não é possível
discutir a titularidade de um direito real com o mero detentor.
Portanto, permite-se através desta regra da legitimidade passiva do artigo 1311.º, n.º 1 CPC alcançar
o trânsito em julgado da decisão e a formação de um título executivo para a entrega da coisa, mas sem
a necessidade de o Tribunal emitir um juízo positivo sobre a titularidade do direito real que o Autor
invocar – ou seja, se se tratar de uma ação que é intentada contra o mero detentor, é apenas
possível obter um título executivo para a restituição da coisa, não sendo possível discutir a
questão da titularidade do direito (neste caso está em causa a mera tutela restitutória).
Mas se o Autor quiser ver discutida com o Réu a questão da titularidade do direito, aí deve intentar
contra o respetivo possuidor.
A legitimidade ativa tem quem é o alegado titular do direito, pelo que saber se tem a efetiva titulação
é um problema de mérito e de procedibilidade do processo. Se o Tribunal determinar que o sujeito não
tem a propriedade, a ação improcede.

NOTA: Se a ação for intentada contra o mero detentor/ possuidor em nome alheio, ele pode querer
alargar o thema decidendo de modo a abarcar também a titularidade da coisa reivindicada – ou seja, o
Autor pretende reaver a coisa, pelo que pode intentar a ação contra o mero detentor, mas este mero
detentor pode querer que na ação seja discutida a titularidade da coisa reivindicada e, nesse sentido,
pode chamar à ação a pessoa em nome de quem possui para com ela ser discutida a questão da
titularidade do direito (artigo 316.º, n.º 1 CPC). Sendo o Réu o mero detentor (possui em nome de
outrem), pode chamar à ação a pessoa em nome de quem possui (e é assim que se alarga o thema
decidendo).
Mas pode acontecer uma coisa diferente: posição do Réu (mero detentor) que está disposto a devolver
a coisa, mas não sabe de quem é a coisa - se tiver dúvidas sobre quem é o proprietário pode pedir a
intervenção daquele que julga ser o proprietário da coisa, por oposição ao Autor (artigo 318.º CPC) –

Rita Nunes 80
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incidente de oposição (o Réu está disposto a realizar o que lhe é pedido, mas quer realizar perante
quem é efetivamente titular do direito).

• Ações constitutivas
Nas ações constitutivas tem legitimidade ativa aquele que se apresente como titular do direito
potestativo que se pretende exercer através do processo. Já a legitimidade passiva é determinada em
função de quem o Autor indicar na petição inicial como titular passivo do direito (ou seja, a pessoa que,
segundo o Autor alega, está em estado de sujeição, isto é, a pessoa que terá de suportar na sua esfera
jurídica as modificações que se pretendem produzir).
Esta é que é a aplicação do critério geral nas ações constitutivas.

• Ações de simples apreciação


Nas ações de simples apreciação negativa terá legitimidade como Autor aquele que pretende libertar
a sua esfera jurídica da situação desvantajosa ligada à afirmação de determinados factos ou direitos
pelo Réu. Por seu turno, terá legitimidade para ser Réu quem gera essa situação de incerteza contra a
qual o Autor pretende reagir.
Nas ações de simples apreciação positiva terá legitimidade ativa aquele que, segundo o alegado na
petição inicial, beneficiará com o reconhecimento pelo tribunal pela existência de um determinado
facto ou determinado direito e deverá ter a posição de Réu aquele em cuja esfera se vão projetar os
efeitos próprios do direito que o Autor pretende ver reconhecido na ação.

Diferentes casos de legitimidade extraordinária


Há determinados interesses que só podem ser adequadamente protegidos em juízo se forem criados
mecanismos de atribuição de legitimidade que permitam que a condução de determinadas ações seja
feita por quem não é titular do direito submetido à apreciação do julgador ou que tem só uma quota
parte desse direito – casos de legitimidade extraordinária.
Estes são casos em que o julgamento da matéria de fundo só se torna admissível no caso de ser feita
prova dos requisitos de legitimação do Autor.

Não temos um regime comum para todos os casos: o professor TEIXEIRA DE SOUSA distingue
legitimidade direta (a que decorre da titularidade da relação jurídica litigada) e legitimidade indireta
(casos de substituição processual).

• Caso de transmissão da coisa ou do direito na pendência do litígio – artigo 263.º CPC “No
caso de transmissão, por ato entre vivos, da coisa ou de direito litigioso, o transmitente continua
a ter legitimidade para a causa enquanto o adquirente não for,
por meio de habilitação, admitido a substituí-lo”
Na pendência da ação, a coisa ou o direito litigioso são transmitidos, pelo que se verifica um fenómeno
de transmissão inter vivos – ex.: vamos imaginar que é uma ação através da qual está a ser exigido o

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cumprimento de uma obrigação (de crédito). Na pendência da ação, pode acontecer que o credor
transmita o seu crédito a um terceiro - quanto à cessão de créditos pode ver-se os artigos 577.º a 588.º
CC
NOTA: pode também acontecer uma transmissão singular de dívida – artigo 595.º e ss. CPC.

Vamos imaginar que houve uma cessão de créditos – isto quer dizer que o Autor, que era o titular daquela
relação jurídica, deixou de o ser, porque ele já não é titular do crédito (porque o cedeu a terceiro).
Na solução destes casos, ao contrário do que acontece quando há uma transmissão mortis causa, isto
é, em que na pendência da ação, tratando-se de um sujeito individual, a parte morre (havendo uma
cessação do pressuposto processual da personalidade judiciária, a instância suspende-se até que seja
feita a habilitação dos herdeiros), neste caso de transmissão inter vivos o transmitente mantém a
legitimidade processual passando a agir como substituto processual do transmissário – a ação não se
vai suspender, mantendo-se como parte da ação o transmitente/ substituinte.
Os efeitos da ação repercutem-se na esfera jurídica do transmissário - artigo 263.º CPP + artigo 356.º
CPP (quanto à habilitação)

Voltando ao artigo 263.º, n.º 1 CPC, o transmitente continua a ter legitimidade para a causa enquanto
o adquirente não for, por meio de habilitação, admitido a constituí-la – é uma legitimidade
extraordinária, porque já não é parte da relação.

Nos termos do n.º 2 do artigo 356.º CPP, “A habilitação pode ser promovida pelo transmitente ou
cedente, pelo adquirente ou cessionário, ou pela parte contrária; neste caso, aplica-se o disposto no
número anterior, com as adaptações necessárias”.
O transmitente continua a ter legitimidade para a causa enquanto o adquirente, por meio de habilitação,
não for admitido a substituí-lo – enquanto a habilitação não for feita, o transmitente ou cedente continua
a ter legitimidade extraordinária. Deve ter se em consideração o artigo 263.º, n.º 2 e n.º 3 – nos termos
do n.º 2 a substituição é admitida quando a parte contrária esteja de acordo.

Depois, nos termos do n.º 3 “A sentença produz efeitos em relação ao adquirente, ainda que este não
intervenha no processo, exceto no caso de a ação estar sujeita a registo e o adquirente registar a
transmissão antes de feito o registo da ação”.
Ex.: A (credor) intentou uma ação contra B (devedor) – na pendência da ação o A cede o crédito a C: a
partir do momento em que o A cede o crédito a terceiro, ele passa a agir em substituição do terceiro (a
quem transmitiu o crédito). Pode agir como substituto processual até o fim da ação, porque pode não
haver habilitação (pode não ser requerida ou não ser concedida)

Havendo substituição processual (se o transmitente/ cedente estiver a agir como substituto processual
do transmissário) haverá uma situação de litispendência se o adquirente/ cessionário demandar a
contraparte inicial noutra ação com o mesmo pedido e causa de pedir – se depois de transmitido o
crédito a C, o C não for habilitado e intentar uma nova ação contra B, haverá um caso de
litispendência – o caso terá o mesmo pedido e causa de pedir, e as partes não são as mesmas, mas é
como se fossem.

Rita Nunes 82
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• Casos que dizem respeito à administração de patrimónios alheios


Este é um grupo de casos que é dado por certos administradores de patrimónios alheios que nos termos
da lei são admitidos a litigar em exclusivo sobre posições jurídicas que integram a esfera jurídica de
terceiros.
Os principais exemplos são: o cabeça de casal, o testamenteiro e o administrador de insolvências.

→ Relativamente ao cabeça de casal vejamos o artigo 2079.º e ss. CC – ao cabeça de casal cabe a
administração da herança até à sua liquidação e partilha (no caso da herança jacente ela é representada
pelo cabeça de casal);
→ Diz-se testamenteiro a pessoa nomeada pelo de cujos com a função de vigiar o cumprimento do
testamento e de o executar. Entre as diferentes funções que podem ser atribuídas ao testamenteiro cabe-
lhe supletivamente sustentar a validade das posições testamentárias em juízo (artigo 2326.º, al. b) CPC).
Ora, ao sustentar a validade das posições testamentárias em juízo, o testamenteiro está a intervir sobre
posições jurídicas integrantes da herança, herança esta que integra a esfera jurídica dos herdeiros e não
do testamenteiro.

→ Um outro exemplo clássico é dado pelo administrador de insolvências – na pendência da ação de


insolvência é o administrador de insolvências que tem legitimidade para dispor sobre as posições
jurídicas integrantes da massa insolvente (que é a parcela dos bens do devedor que se encontra ao
serviço da satisfação da finalidade do processo insolvencial).

• Casos que dizem respeito aos meios de conservação da garantia patrimonial


Aqui referem-se duas figuras que se integram na matéria da legitimidade extraordinária: sub-rogação
do credor ao devedor e impugnação pauliana.
→ A sub-rogação do credor ao devedor – artigo 606.º, n.º 1 CC – é um instituto que tem por
finalidade abrir ao credor a possibilidade de exercer posições jurídicas patrimoniais do seu devedor em
caso de inércia do devedor – um sujeito é credor de outrem e o devedor é titular de uma determinada
posição jurídica patrimonial que não quer exercer.
Este mecanismo permite ao credor exercer essa posição jurídica em nome do devedor, perante a inércia
do devedor.
Ex.: um herdeiro que repudiou a herança – os seus credores podem aceitar a herança em nome dele
(devedor que não quer aceitar a herança). O devedor é titular de uma posição jurídica patrimonial que
não quer exercer. Claro que se os credores exercerem a posição em nome do devedor isso legitima-os
para a proposição das ações jurídicas necessárias à defesa dos direitos integrados no património
herdado.
Este trata-se de um instituto cujo propósito é permitir a alguém que não é titular de uma certa posição
jurídica exerça esse direito/ posição – nemo liberalis, nisi liberatus (ninguém pode ser liberal se não
está liberado – aquele sujeito deve a alguém e pretende ser liberal com outrem [não o pode fazer]).
Em caso de sub-rogação será parte ativa na ação o credor e será parte passiva aquele contra quem é
exercido o direito, mas, nos termos do artigo 608.º CC será necessária a citação do devedor. Portanto,
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o credor age em substituição do devedor, perante a inércia deste, mas o devedor deverá ser citado para
a ação.

→ Depois, a impugnação pauliana trata-se de um caso em que alguém (um credor) é admitido a
impugnar atos praticados pelo seu devedor com um terceiro – artigos 610.º e ss. CC. Aqui o quer
acontece é que o credor dispõe de legitimidade para conduzir uma ação que diz respeito a uma relação
jurídica de que não é parte (ele pretende que seja declarada a ineficácia de um ato que foi praticado
pelo seu devedor com um terceiro).
Claro que não basta que ele alegue ser o credor, é necessária a verificação dos requisitos do artigo 610.º
CC para intentar a impugnação pauliana.

• Casos da contitularidade de posições jurídicas


São casos em que a um só dos contitulares de uma determinada relação jurídica é dada a possibilidade
de litigar sobre o conjunto da relação – é um caso de legitimidade extraordinária, porque age em
substituição processual dos demais contitulares da relação jurídica (ele é que é parte da ação, mas só
tem uma quota parte da titularidade da relação jurídica).
Sendo a prestação indivisível, qualquer dos credores pode exigi-la por inteiro – artigo 538.º CC. Depois,
cada um dos compossuidores (artigo 1286.º, n.º 1 CC) ou comproprietários (artigo 1405.º, n.º 2 CC)
ou co-herdeiros (artigo 2078.º, n.º 1 CC) pode exigir a totalidade do bem possuído ou titulado em
conjunto.
Ex.: na compropriedade – a regra é que os comproprietários exercem conjuntamente os respetivos
direitos, mas para a ação de reivindicação da coisa cada um deles tem legitimidade para agir sozinho –
para exigir de terceiro coisa comum / possuída em conjunto, cada um dos comproprietários tem
legitimidade para agir sozinho, não tendo de ficar à espera dos outros.

Qual é que é a regra?


→ Se ação proceder, o resultado aproveita a todos;
→ Mas se a ação não for julgada procedente ela pode ser repetida por outro contitular
Ou seja, o caso julgado favorável aproveita a todos, mas o caso julgado desfavorável não pode invocado
contra os demais.

Então a posição dos demais comproprietários/ compossuidores ou co-herdeiros está protegida – mas
então e a posição da contraparte (Réu)?
→ Se o Réu perder o caso pode-lhe ser imposto pelos demais contitulares;
→ Ao passo que se ganhar podem os restantes contitulares repetir a ação.
Mas o Réu não está totalmente desprotegido, porque tem uma forma de se precaver contra a repetição
das ações – pode requerer a intervenção principal provocada dos restantes contitulares – artigo 316.º,
n.º 3, al. b) CPC.

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RESUMO DA LEGITIMIDADE SINGULAR


O pressuposto da legitimidade diz respeito a uma relação que deve existir entre as partes da relação
material tal como configurada pelo Autor e as partes da ação – se não existir esta correspondência há
um problema de ilegitimidade e a falta de legitimidade singular não é sanável – artigo 30.º, n.º 1; n.º
2; n.º 3 CPC.
Simplesmente o artigo 30.º, n.º 1 CPC diz ‘na falta de disposição da lei em contrário’ – ora, estivemos
a ver na aula passada diversos grupos de casos a que chamamos de casos de ilegitimidade
extraordinária: vimos, em primeiro lugar, a hipótese da transmissão da coisa ou do direito na pendência
do litígio (se, na pendencia da ação, há uma transmissão da coisa ou direito prometido [ex.: quando
está em causa o exercício de um direito de crédito, na pendência da ação, o Autor cede o crédito e, a
partir do momento em que o cede, já não é titular daquela posição jurídica material. E a lei do processo
permite que seja habilitado na ação o cessionário ou transmissário]). Nos termos do artigo 263.º, n.º 2
CPC a habilitação tem lugar quando a parte contrária esteja de acordo – sendo requerida a habilitação
ela é aceite.
Se a parte contrária estiver em desacordo só não há habilitação se se demonstrar que a transmissão foi
feita para prejudicar a parte contraria. Ou seja, em princípio, a habilitação é admitida, mesmo que a
parte contrária esteja em desacordo – de acordo com o artigo 356.º, n.º 2 CPC pode pedir a habilitação
o transmitente ou cedente; o adquirente ou cessionário; ou a parte contrária.
Nos termos do artigo 263.º, n.º 2 CPC a habilitação pode não ser requerida ou ser recusada – o tribunal
não tem aqui iniciativa, sendo que nenhuma das partes pode tomar a iniciativa de a requerer. Enquanto
o cessionário ou transmissário não for admitido na ação (sendo que pode nunca ser) vai continuar na
ação/ terá legitimidade para permanecer na ação o transmitente, que, a partir do momento da
transmissão, deixou de ser titular daquela relação material controvertida. Ou seja, ele passa a agir como
substituto processual do transmissário em cuja esfera jurídica se vai produzir o efeito jurídico do caso
julgado, com a única ressalva do artigo 263.º, n.º 3 CPC.
NOTA: se a ação estiver sujeita a registo e houver registo da transmissão antes do registo da ação
coloca-se o problema
Havendo substituição processual, coisa que acontece enquanto o transmissário ou cessionário não for
habilitado para a ação, haverá litispendência se o adquirente demandar a contraparte inicial noutra ação
– ex.: o A exerceu um direito de crédito face a B e, depois, A transmitiu/cedeu esse mesmo crédito ao
C – mas o C não foi habilitado na ação, pelo que continua A na ação (pese embora seja agora o C titular
do crédito). Mas, depois, o C vem intentar uma ação contra B. Quid iuris?

Estariam a correr duas ações (uma entre A e B [em que o Autor é o A] e outra entre C e B [em que o
Autor é o C]) em que estaria a ser cobrado o mesmo crédito. Não obstante, naquela em que A é Autor,
o A está em substituição processual de C – ou seja, temos aqui uma situação de litispendência, pelo
que a segunda ação deve terminar com a absolvição do Réu da instância. Temos duas situações em que
o pedido e a causa de pedir é a mesma e apesar de as partes não serem as mesmas, praticamente são-
no, porque A atua em substituição de C.
Depois vimos um segundo grupo de casos, que é o caso da administração de patrimónios alheios –
vimos o caso do testamenteiro (NOTA: quando uma pessoa morre, nos termos da lei, há uma parte que
o de cujos pode dispor através de um testamento, sendo que no testamento é nomeado um testamenteiro
[com função de vigiar, nomeadamente através da sustentação em juízo a validade das disposições

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testamentárias]. Ao fazer isso está a intervir sobre posições jurídicas que não lhe dizem respeito, porque
não é herdeiro).
Depois vimos o exemplo do cabeça de casal e vimos a figura do administrador de insolvência. Além
disto, vimos os casos relativos aos meios de conservação da garantia patrimonial (sub-rogação do
credor ao devedor e impugnação pauliana) e, por fim, os casos de contitularidade de posições jurídicas.

• Casos que dizem respeito à ação direta


NOTA: não tem que ver com a autotutela.
É um grupo de casos que diz respeito à possibilidade OU ao dever de o credor de um determinado
crédito indemnizatório agir diretamente contra o segurador do seu lesante/ do responsável civil.

Aqui cabe distinguir o regime comum do regime particular:


→Nos termos comuns do regime jurídico do contrato de seguro (DL 72/2008, de 16 de abril) – nos
termos do artigo 146.º, n.º 1 deste DL, tratando-se de seguro obrigatório de responsabilidade civil, o
lesado PODE agir diretamente contra o segurador.
Ora, o titular passivo direto da obrigação não é o segurador, mas sim o lesante. A lei atribui legitimidade
passiva ao segurador na respetiva ação de responsabilidade civil (em que o lesado pretende obter uma
indemnização pela violação do seu direito).

→ Especificamente em matéria de responsabilidade civil automóvel, se a ação em causa tiver


um valor dentro do capital mínimo obrigatoriamente seguro, a ação é dirigida em exclusivo
contra a seguradora (aqui já é um DEVE) – artigo 64.º, n.º 1, al. a) do Regime de Sistema de
Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel (DL n.º 291/2007).
Tudo isto, embora a seguradora possa chamar à ação o tomador do seguro (a pessoa responsável pelo
acidente e que fez o seguro/ lesante) para auxiliar na defesa – artigo 64.º, n.º 2 DL n.º 291/2007.
Já se o pedido indemnizatório exceder o capital de seguro, aí deverá ser demandado também o
responsável/ o lesante a título de litisconsórcio necessário passivo – artigo 64.º, n.º 1, al. b) DL n.º
291/2007.

O que acontece se for desconhecida a seguradora?


Nos termos do artigo 64.º, n.º 3 do DL n.º 291/2007 o lesado pode instar o responsável civil para que
identifique a empresa de seguros. Mas pode acontecer uma outra coisa que é: pode faltar o seguro (pese
embora seja este obrigatório nos termos da lei). Existe uma entidade que se chama Fundo de Garantia
Automóvel, sendo que à falta de seguro deverá ser demandado o responsável civil e este Fundo de
Garantia Automóvel (artigo 62.º, n.º 1 DL n.º 291/2007 – é outro caso de litisconsórcio necessário
passivo).
E se o Autor/ lesante/ responsável civil for desconhecido?
Nesse caso, a ação é dirigida em exclusivo contra o Fundo de Garantia Automóvel, nos termos do
artigo 62.º DL n.º 291/2007.

• Casos que dizem respeito à ação popular para a tutela de interesses difusos – artigo 31.º CPC
e Lei n.º 83/95, de 31 de agosto – p. 252

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Interesses difusos são situações subjetivas da relação com determinados bens insuscetíveis de
apropriação individualizada. Portanto, as decisões que tenham por objeto a defesa destes interesses
difusos não atingirão a sua finalidade se não vincularem o próprio grupo enquanto portadora da
situação jurídica a tutelar.
Portanto, daqui decorre a necessidade de intervenções legislativas no sentido de configurar institutos
como o instituto da legitimidade processual ou a eficácia subjetiva do caso julgado material em termos
diversos dos tradicionais.
Ora, qual o caminho que é seguido neste artigo 31.º CPC e na lei n.º 83/95?
É o de atribuir a qualquer cidadão, no gozo dos seus direitos civis e políticos, a legitimidade de intentar
uma ação desta natureza (para tutelar interesses difusos)

→ Artigo 31.º CPC – “Têm legitimidade para propor e intervir nas ações e procedimentos cautelares
destinados, designadamente, à defesa da saúde pública, do ambiente, da qualidade de vida, do
património cultural e do domínio público, bem como à proteção do consumo e de bens e serviços,
qualquer cidadão no gozo dos seus direitos civis e políticos, as associações e fundações defensoras dos
interesses em causa, as autarquias locais e o Ministério Público, nos termos previstos na lei”.
→ Lei n.º 83/95, de 31 de agosto – regula o direito de participação procedimental e do exercício de
ação popular – nos termos do artigo 14.º deste diploma, nos processos de ação popular o Autor da ação
representa por iniciativa própria, com dispensa de mandato ou de autorização expressa, todos os demais
titulares do direito ou interesses em causa que não tenham exercido o direito de autoexclusão. Depois,
o artigo 15.º refere-se a este direito de autoexclusão.
Temos depois a referência ao regime geral de recolha de provas e de eficácia dos recursos – artigo 17.º
e 18.º
Salvo quando julgadas improcedentes por insuficiência de prova ou quando o julgador deva decidir
por forma diversa fundado em motivações próprias do caso concreto, os efeitos das sentenças
transitadas em julgado abrangem os titulares dos direitos ou interesses que não tiverem exercido o
direito de se autoexcluírem, nos termos do artigo 16.º – há um alargamento da eficácia do caso julgado
(artigo 19.º)

LEGITIMIDADE PLURAL
Temos agora de estudar as situações de pluralidade de partes (legitimidade plural). A relação jurídica
processual (à qual também se chama instância), via de regra, tem duas partes, mas pode ter mais,
consoante o modo como o Autor decida exercer o seu direito de ação e o modo como o Réu decida
exercer o seu direito de contradição (a ação pode ser mais complexa).
O Autor é livre de conformar o objeto do processo – cabe-lhe deduzir o pedido e alegar os factos que
integram a causa de pedir (princípio do dispositivo). Mas o Autor tem também a liberdade de
conformar a instância no que diz respeito às suas partes subjetivas – e esta liberdade de conformação
subjetiva da instância tanto está reservada às partes (o Réu também tem uma palavra a dizer – o Réu
não escolhe ser Réu, ao passo que o Autor é quem toma a decisão de intentar a ação. Mas o Réu pode
tomar a iniciativa de chamar também partes à instância, nos termos em que a lei o autoriza) que, nos
casos em que a lei imponha presença de mais que um sujeito do lado ativo ou passivo (casos de
litisconsórcio necessário), a regularização da instância não pode ser desencadeada oficiosamente pelo
tribunal, devendo ser precedida de impulso da parte.

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Portanto, se o tribunal se aperceber ou o Réu invocar o vício (como exceção dilatória) de que foi
preterido o litisconsórcio necessário, o tribunal não pode corrigir essa falta oficiosamente.
O tribunal deve, nos termos do artigo 6.º, n.º 2 CPC, oficiosamente, providenciar pela regularização
da instância – neste caso, também deve fazer isso, mas convidando as partes a fazê-lo, porque a
regularização pressupõe o impulso das partes através da abertura deste incidente das partes, que é o
incidente de terceiros.
ex.: imagine-se um credor de uma obrigação solidária (artigo 519.º, n.º 1 CC) – aqui o Autor tem a
opção de intentar a ação contra um ou contra todos. Ora, consoante o modo como o Autor opte por
exercer o seu direito de ação, a instância será singular ou plural.

NOTA: há dois regimes que existem no que diz respeito à pluralidade de devedores – a conjunção e a
solidariedade. No Código Comercial a regra é da solidariedade ao passo que no Código Civil a regra é
da conjunção, não obstante haver casos no Código Civil de solidariedade (ex.: responsabilidade do
comitente por atos do comissario – artigo 500.º CC)
ex.: se A, B e C são devedores conjuntos, cada um deles responde por uma parte da divida. No entanto,
não é assim no regime da solidariedade – aqui acontece que nas relações internas entre devedores
solidários, a menos que se trate de casos de solidariedade imperfeita, presume-se que os codevedores
solidários respondem apenas por uma parte. No entanto, nas relações externas há um dever de prestação
integral – ou seja, o credor, sendo uma obrigação solidária, pode exigir a totalidade do cumprimento a
apenas um dos codevedores solidários (pode exigir a todos ou apenas a um).
Não obstante, se for exigido tudo a um dos codevedores, esse que pagou tem, depois, o direito de
regresso.
NOTA 2: relações externas são as relações entre o credor e os devedores.

A conformação subjetiva da instância também pode resultar da iniciativa do Réu – ex.: numa obrigação
solidária, imagine-se que o Autor opta por intentar a ação apenas contra um dos codevedores solidários.
Como dissemos, esse codevedor tem o direito de regresso. Ora, nos termos do artigo 317.º CPC
(efetivação do direito de regresso), o codevedor que foi demandado sozinho pode chamar os demais
codevedores à instância.
Portanto, depende da iniciativa do Réu, que tem aqui uma palavra a dizer – se chamar os outros, a
instância será plural por iniciativa do Réu.
Nos termos do regime do artigo 317.º CPC, o Réu pode chamar os codevedores solidários, mas não é
para serem condenados conjuntamente com ele – no caso, o chamamento é para que os outros fiquem
vinculados por aquilo que se está a decidir e sejam condenados em termos de direito de regresso (não
ficam condenados a pagar ao credor).

Esta liberdade de conformação subjetiva da instância está, no entanto, limitada de duas formas:
• Por um lado, nalguns casos, é imposta a pluralidade de partes – portanto, aí as partes têm a sua
liberdade limitada neste sentido. ex.: o litisconsórcio necessário, não é automático: a lei impõe,
mas depende da vontade das partes. Estamos perante um pressuposto processual e a ação é
inadmissível se isto não for respeitado.
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• Depois, há limites à pluralidade de partes (impostos pela lei), porque a pluralidade de partes pode
constituir um obstáculo à eficiência processual – está aqui presente uma ideia de praticabilidade.

Classificações das situações de pluralidade de partes

1. Quanto ao polo da relação processual a que diz respeito a pluralidade


A pluralidade de partes pode ser ativa, passiva ou mista:
→ É ativa quando diz respeito ao lado ativo da relação (quando há mais que um autor);
→ É passiva quando diz respeito ao lado passivo da relação (quando tem mais que um Réu);
→ É mista quando diz respeito a ambos os lados da relação

2. Quanto ao fundamento da situação de pluralidade


Pode ter uma fonte voluntária ou pode ser necessária.
→ Voluntária (da vontade das partes):
A situação de pluralidade voluntária pode nascer logo na petição inicial, mas pode nascer na pendencia
da ação e, portanto, ser uma situação de pluralidade superveniente.
→ Necessária no sentido de ser imposta pela lei (ex.: litisconsórcio necessário – que é um
pressuposto processual). Quando a situação de pluralidade de partes é necessária, a existência da
situação de pluralidade constitui um pressuposto processual. Se na instância não tiver essa pluralidade
de partes, a instância é inadmissível (exceção dilatória sanável, mediante o ingresso na ação da parte
que lá deveria estar)

3. Quanto ao momento em que situação de pluralidade tem lugar


A pluralidade pode ser originária (quando se constitui logo no início da ação – ou seja, quando vários
Autores se apresentam na ação, ou quando o Autor/Autores predem a citação de vários Réus no início
da ação) ou superveniente (quando se constitui no curso da ação)
Esta superveniente pode dar-se por duas formas: por chamamento de uma terceira parte (aqui o
incidente é de INTERVENÇÃO PRINCIPAL PROVOCADA – artigo 316.º CPC), mas também
pode acontecer que um terceiro, espontaneamente, pretenda intervir numa causa (aqui o incidente é de
INTERVENÇÃO PRINCIPAL ESPONTÂNEA – artigo 338.º e ss. CPC). Evidentemente que estes
incidentes devem ser julgados e o tribunal decidirá se a parte pode ou não intervir.

4. Quanto à natureza da pluralidade


No que diz respeito à natureza, existem duas modalidades básicas de pluralidade de partes:
litisconsórcio e coligação
O critério de distinção entre o litisconsórcio e a coligação é a unidade ou pluralidade de relações
jurídicas que hajam de ser apreciadas na ação. Ou seja, se é só uma relação jurídica material com
pluralidade de partes ou se é mais que uma relação jurídica.

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→ Artigo 32.º, n.º 1 CPC – no texto da lei, o litisconsórcio é apresentado como uma hipótese em que
uma relação material controvertida respeita a várias pessoas. Assim, no litisconsórcio, a relação
material litigada é plural, mas é só uma. Portanto, esta figura do litisconsórcio traduz processualmente
a existência de uma só relação, mas uma relação com pluralidade de partes.
→ Já a figura da coligação traduz a agregação processual de relações materiais distintas. Há limites à
possibilidade de, numa ação judicial, agregar relações materiais distintas (há limites à coligação).
A pluralidade da relação material controvertida pode ou, noutros casos, deve, por força da lei, traduzir-
se numa pluralidade de partes na relação processual, consoante o litisconsórcio seja voluntário ou
necessário.

NOTA: A estas duas formas de pluralidade (litisconsórcio e coligação) devem acrescentar-se outras
duas hipóteses em que pode haver uma pluralidade na ação, que são a oposição (artigo 333.º e ss. CPC)
e a assistência (artigo 326.º e ss. CPC) – são duas figuras estudadas no âmbito dos incidentes de
intervenção de terceiros.

LITISCONSÓRCIO
Traduz a existência de uma só relação jurídica material, com uma pluralidade de partes. Este
litisconsórcio pode ser ativo, passivo ou misto; tal como pode ser inicial ou sucessivo.

Além do mais, o litisconsórcio pode ser voluntário ou necessário:


1. VOLUNTÁRIO – a regra é que o litisconsórcio é voluntário, que acompanha uma outra regra, que
é a regra da divisibilidade das relações jurídicas (artigo 32.º, n.º 1 CPC – “Se a relação material
controvertida respeitar a várias pessoas, a ação respetiva pode ser proposta por todos ou contra
todos os interessados; mas, se a lei ou o negócio for omisso, a ação pode também ser proposta por
um só dos interessados, devendo o tribunal, nesse caso, conhecer apenas da respetiva quota-parte
do interesse ou da responsabilidade, ainda que o pedido abranja a totalidade”)

2. NECESSÁRIO – é a exceção (artigo 33.º, n.º 1 CPC – “Se, porém, a lei ou o negócio exigir a
intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de
ilegitimidade” [está aqui o ‘porém’, porque esta é a exceção. Depois, o n.º 2 diz “É igualmente
necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica,
ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal” e o n.º 3 “A decisão
produz o seu efeito útil sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular
definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado”).

a. De fonte legal
o Por disposição expressa da lei (artigo 33.º, n.º 1 CPC)
o Pode resultar do preenchimento do critério geral (artigo 33.º, n.º 2 e n.º 3 CPC)

b. De fonte negocial

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Portanto, a regra que acompanha a regra da divisibilidade das relações jurídicas materiais é que o
litisconsórcio é voluntário, mas a lei ou o negócio podem impor a intervenção dos vários interessados
na relação controvertida (aí o litisconsórcio é necessário). Quando se diz ‘por força da lei’, isso pode
resultar de disposição expressa da lei, mas pode também resultar do preenchimento de um critério geral
do artigo 33.º, n.º 2 complementado com o n.º 3 CPC.

LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO:
O litisconsórcio necessário é a primeira forma de puridade subjetiva. Trata-se de uma técnica
processual destinada a que a decisão vincule em termos idênticos o conjunto dos titulares de uma
determinada relação jurídica plural.

«A autonomia da atuação de cada um dos sujeitos reunidos por força do litisconsórcio desaparece em
atenção à unidade e indivisibilidade “sub specie iuris” da relação material que une as partes. É este
o sentido que o artigo 35.º, 1.ª parte, procura expressar, quando alude à existência de “uma só ação”
como base do regime do litisconsórcio necessário.» - p. 324 da sebenta

Pretende-se que uma determinada decisão vincule os vários sujeitos numa relação jurídica plural e por
isso é que se força a presença na ação de todos esses sujeitos, que se pretende que fiquem vinculados
pela autoridade do caso julgado. Portanto, pretende-se que a ação gere/origine uma decisão de mérito
que valha para todos os titulares daquela relação jurídica plural – isto por força das regras do caso
julgado, mais concretamente dos limites subjetivos do caso julgado (artigo 619.º, n.º 1 e 581.º, n.º 1
do CPC).
NOTA: esta técnica processual do litisconsórcio necessário não é a única forma de conseguir uma certa
uniformização do caso julgado. Existe uma outra técnica, que é aquela que consiste em admitir a
invocação do caso julgado por terceiro (que não uma das partes) – técnica do caso julgado secundum
eventum litis, que se trata de uma regulação da amplitude dos efeitos do caso julgado material,
distinguindo a decisão de mérito em função do benefício ou prejuízo que acarreta a quem esteve no
processo, com o objetivo de estender apenas as vantagens dele resultantes a outros cointeressados.

Exemplos:
• Artigo 522.º CC para a solidariedade entre devedores;

• Artigo 538.º, n.º 2 CC para a pluralidade de credores em caso de prestação indivisível.

• Artigo 635.º, n.º 1 e n.º 2 CC para a fiança.

A fiança é uma garantia pessoal de uma obrigação. A designação que o professor MIGUEL PESTANA
DE VASCONCELOS dá à fiança é a seguinte: é uma garantia que assenta no reforço quantitativo do
crédito, na medida em que existe um património que responde pela obrigação, que é o património do
devedor, e a esse património vai-se somar o património do fiador. Mas o fiador responde
subsidiariamente e com benefício da expulsão prévia

Rita Nunes 91
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TEÓRICAS

ex.: A é credor de B e C é um fiador – o crédito não é satisfeito, pelo que o credor vai intentar uma
ação e pode intentar uma ação só contra o devedor, ficando de fora o fiador, mas também pode intentar
uma ação contra o fiador, deixando de fora o devedor.

Quanto aos efeitos do caso julgado, o caso julgado entre credores e devedor não é oponível ao fiador,
mas a este é lícito invocá-lo a seu benefício, salvo se respeitar a circunstâncias pessoais do devedor
que não excluam a responsabilidade do fiador (artigo 635.º, n.º 1 CC).

O caso julgado desfavorável não pode ser invocado contra o fiador, mas o fiador pode invocar o caso
julgado desfavorável.
A mesma coisa no que toca à relação controvertida contra o fiador: O caso julgado entre credor e fiador
aproveita ao devedor, desde que respeite à obrigação principal, mas não o prejudica o caso julgado
desfavorável (artigo 635.º, n.º 2 CC).

Portanto, se a ação foi intentada contra o fiador, o caso julgado favorável aproveita ao devedor se disser
respeito à obrigação principal – é mais um caso em que, em vez de o legislador atuar ao nível da
legitimidade passiva, impondo a presença do devedor (n.º 2), alargam-se diretamente ao devedor os
efeitos do caso julgado obtidos no confronto com o fiador, na medida em que lhe sejam benéficos (caso
julgado secundum eventum litis). Portanto, consegue-se assim a vinculação do devedor principal que
foi parte na ação, mas apenas quando o conteúdo da decisão seja favorável – evita-se uma contradição
de julgados no caso de a decisão ser favorável.

Nestes casos a lei refere isto expressamente. Noutros casos, o facto de estarmos perante um caso
julgado secundum eventum litis retira-se do sentido global do instituto. É o caso da hipótese do artigo
1405.º, n.º 2 CC, que diz respeito à ação de reivindicação de uma coisa que pertença a vários sujeitos
– a lei atribui legitimidade a cada um deles para que cada um deles, sozinho, possa reivindicar a coisa
comum (caso de litisconsórcio voluntário).

Código de Processo Civil anotado de Lebre Freitas e Isabel Alexandre – da norma do artigo 1405.º,
n.º 2 CC resulta que a decisão proferida a favor de um coproprietário aproveita aos restantes, o que
sempre evitará a contradição de julgados em caso de procedência da ação (portanto, a decisão aproveita
aos demais – evita-se uma contradição dos julgados em caso de procedência da ação), não se vendo
mal em que a mesma extensão subjetiva dos efeitos não se dê em caso de improcedência.

Portanto, também aqui, a propósito da norma do artigo 1405.º, n.º 2 CC, o caso julgado favorável
aproveitará aos demais e o caso julgado desfavorável não poderá ser imposto aos demais cointeressados.
Portanto, em todos estes exemplos o que acontece é que em caso de procedência da ação se evita uma
contradição de julgados, porque não há o risco de ser intentada depois uma nova ação com um resultado
diferente dado que o caso favorável aproveita aos demais. No caso julgado desfavorável não, mas o
Réu pode chamar os demais cointeressados para resolver definitivamente perante todos o litígio e não
correr o risco de ver novas ações intentadas contra si.

Rita Nunes 92
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TEÓRICAS

Há várias modalidades do litisconsórcio necessário, que pode ter fonte legal ou fonte negocial:

• LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO DE FONTE LEGAL – o litisconsórcio necessário tem


fonte legal quando é a própria lei que impõe, para que se possa litigar sobre uma determinada
posição jurídica, a presença de todos os afetados/titulares da relação jurídica plural. Impunha-se
uma copresença na ação.

Esta imposição legal pode ser feita de duas formas:


• Pode haver uma regra específica que a estabelece;
• Pode essa necessidade resultar do preenchimento do critério geral constante do artigo 33.º,
n.º 2 e n.º 3.
Hipóteses de litisconsórcio necessário de fonte legal por disposição expressa da lei:
a. Nas ações propostas por ambos ou contra ambos os cônjuges deve observar-se a copresença de
ambos nos termos resultantes do artigo 34.º. O artigo 34.º também prevê a hipótese de
litisconsórcio voluntário.
«as ações de que possa resultar a perda ou a oneração de bens que só por ambos os cônjuges possam
ser alienados ou a perda de direitos que só por ambos possam ser exercidos, incluindo as ações que
tenham por objeto, direta ou indiretamente, a casa de morada de família (artigo 34.º, n.º 1, b)); as
ações emergentes de facto praticado por ambos os cônjuges ou apenas por um deles, mas em que
pretenda obter-se decisão capaz de ser executada sobre bens comuns ou sobre bens próprios do outro
cônjuge (artigo 34.º, n.º 3, c))…» - p. 325 da sebenta

b. No incidente de habilitação mortis causa (artigo 351.º), que serve para substituir a parte falecida
na parte da ação (artigo 262.º, al. a) CPC), existe litisconsórcio necessário entre todos os sucessores
da parte falecida.
c. Se o devedor pretender fazer a consignação do depósito (forma de distinção das obrigações que
permite ao devedor liberar-se em casos em que o credor se recuse a receber a prestação), isto é, se
houver incerteza da pessoa do credor (artigo 841.º, n.º 1, al. a) CC) e se o devedor pretender
consignar judicialmente em depósito a prestação (note-se que existe um processo especial para este
efeito, que está regulado nos artigos 916.º e ss. CPC), neste caso, sendo incerta a pessoa do credor,
há litisconsórcio necessário entre os dois possíveis credores (artigo 922.º, n.º 1 CPC).

d. Se um dos comproprietários de um determinado bem pretender dividir a coisa comum, dessa


forma, colocando termo à compropriedade, que é um direito que também têm os comproprietários
(artigo 1412.º, n.º 1 CC), e fazendo-o nos termos da lei do processo (artigo 1413.º CC), devem ser
chamados à ação todos os demais consortes (artigo 925.º CPC – ação para divisão de coisa comum).

e. Se o direito de preferência pertencer a vários titulares, o mesmo só pode ser exercido em conjunto
(artigo 419.º, n.º 1 do CC) – caso de litisconsórcio necessário ativo. Vale regime diferente na hipótese
específica de compropriedade, em que qualquer um dos comproprietários tem um direito de
preferência (artigo 1409.º, n.º 1 CC).

Rita Nunes 93
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TEÓRICAS

f. Sendo a prestação indivisível com pluralidade de devedores, a prestação deve ser exigida de todos
os devedores (artigo 535.º, n.º 1 CC). Mas se for com pluralidade de credores, qualquer uma pode
exigir (artigo 538.º, n.º 1 CC).

g. Configura uma hipótese muito atípica de litisconsórcio necessário aquela que ocorre nos casos de
sub-rogação do credor ao seu devedor no exercício dos seus direitos (artigos 606.º e ss. CC).
Nesta hipótese, o devedor deve ser chamado à demanda nos termos do artigo 608.º CC – o credor
está a exercer em nome do devedor uma posição jurídica deste perante a inércia do devedor, mas o
devedor vai ser chamado à demanda.
Exemplo no regime societário – o CSC prevê a seguinte possibilidade para os sócios de uma
sociedade: dentro de determinados requisitos previstos na lei, num caso de responsabilidade dos
gerentes de uma sociedade comercial perante a própria sociedade, e se a sociedade não agir contra
esses gerentes, podem os sócios, em determinadas condições, agir eles contra esses gerentes em
substituição da sociedade comercial. Este exemplo configura um caso de legitimidade
extraordinária: o sujeito da relação controvertida é a sociedade comercial, que tem direito de pedir
uma indemnização ao gerente por atos de má gestão. A lei prevê que a sociedade deve ser citada para
a instância (artigo 77.º, n.º 4 CSC) – caso de litisconsórcio atípico.
h. A ação de investigação da maternidade, tratando-se de filho nascido ou concebido na constância
do matrimónio, deve ser intentada também contra o marido e se houver perfilhação, também contra
o perfilhante (artigo 1822.º, n.º 1 CC).

i. Na ação de impugnação da paternidade devem ser demandados a mãe, o filho e o presumido pai
quando figurem como autores (artigo 1846.º, n.º 1 CC).

j. «a impugnação pauliana que, do lado passivo, obriga o litisconsórcio entre o devedor alienante e o
terceiro adquirente, de modo a proporcionar ao credor um título executivo que lhe permita executar
os bens transmitidos (artigos 616.º, n.º 1 do Cód. Civ. E 821.º, n.º 2 do Cód. Proc. Civ.)» - p. 325 da
sebenta

k. Os direitos relativos à herança, fora do caso da ação de petição/reivindicação da herança (artigo


2078.º, n.º 1 CC – caso de legitimidade extraordinária), só podem ser exercidos em conjunto por
todos os herdeiros ou contra todos os herdeiros (artigo 2091.º CC) em litisconsórcio necessário ativo
ou passivo.

«as ações relativas a herança indivisa quando haja pluralidade de herdeiros que, em regra, devem
ser propostas conjuntamente por todos eles ou contra todos em simultâneo (artigo 2091.º Cód. Civ.)»
- p. 325 da sebenta

Relativamente ao critério geral e subsidiário, este está previsto no artigo 33.º, n.º 2 e n.º 3 CPC, sendo
esse critério o da posição do efeito útil normal: quando seja necessária a presença de vários
cointeressados para que a decisão possa produzir o seu efeito útil normal. O n.º 3 densifica este critério
dizendo que assim é quando possa ter lugar uma efetiva e definitiva composição do litígio entre aquelas
concretas partes sem necessidade de intervenção de quaisquer outros sujeitos.

Rita Nunes 94
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TEÓRICAS

No CPC anotado de Lebre Freitas pode ler-se o seguinte: “a pedra de toque do litisconsórcio
necessário é a impossibilidade de, tido em conta o pedido formulado, compor definitivamente o litígio
sem a presença de todos os interessados. Dito de outra forma, são hipóteses em que o efeito pretendido
com a atribuição de uma certa posição jurídica a alguém só pode ser alcançado na presença de uma
pluralidade de partes na instância.
Estes casos são também chamados de LITISCONSÓRCIO NATURAL – é um critério que cria
dificuldades objetivas. Como diz o professor ALBERTO DOS REIS, deve procurar-se neste critério
não um critério perfeito e acabado, mas apenas um princípio, uma regra de orientação que sirva de guia
e de fio condutor no mare magnum da vida real. De facto, é difícil, na prática, utilizar este critério.
Apenas nos casos em que o único modo de obter uma decisão com o mínimo de utilidade seja a
copresença na instância de uma pluralidade de partes é que essa presença é exigida como um
pressuposto da regular constituição da instância

→ Exemplo retirado da jurisprudência: caso de litisconsórcio legal pelo efeito útil normal da
decisão num acórdão da Relação de Lisboa – caso em que se pedia a constituição de um direito
de servidão legal de passagem (direito potestativo – artigo 1550.º CC), que tem por finalidade
que o proprietário do prédio encravado se possa servir de prédio(s) contíguo(s) para aceder à via
pública, e que é um direito que deve ser exercido através do prédio ou dos prédios que sofram
menor prejuízo (artigo 1553.º do CC).

No caso concreto, o caminho dos possíveis para aceder à via pública que causava menor prejuízo
obrigava a aceder a um conjunto de prédios, mas foi demandado apenas o proprietário do prédio
mais próximo – entendeu o tribunal que sentença teria um resultado juridicamente inútil,
porque nunca produziria o seu efeito útil normal, uma vez que a passagem apenas por aquele
terreno não garantiria o acesso à via pública, não produzindo, assim, a decisão o seu efeito útil
normal.

Este é um caso de litisconsórcio natural, mas este critério levanta sérias dificuldades operativas. Há
alguns casos duvidosos – ex.: legitimidade passiva na ação de preferência; ação de impugnação
pauliana (na sebenta diz que a impugnação pauliana resulta expressamente da lei – tirar dúvida).

• LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO DE FONTE NEGOCIAL: pode resultar por


convenção das partes. Terá fonte negocial o litisconsórcio necessário quando, através de
negócio jurídico, se preveja que em caso de litigância sobre uma certa relação jurídica deve
intervir uma pluralidade de partes.
ex.: a ação destinada a exigir a restituição da coisa depositada por duas ou mais pessoas, tendo-se
estipulado que a coisa só podia ser levantada por todos os depositantes em conjunto. Propondo-se uma
ação contra o depositário, haverá litisconsórcio necessário ativo, por força daquele negócio jurídico.

Regime do litisconsórcio necessário:


Note-se que os diferentes aspetos do regime do litisconsórcio necessário refletem a circunstância de,
como se pode ler no artigo 35.º CPC, existir uma única ação com pluralidade de sujeitos.

1. No que diz respeito à falta de citação (artigo 219.º, n.º 1 CPC), se um dos litisconsortes não for
citado, existe um regime específico de nulidade processual, que é a nulidade decorrente de falta de

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citação do Réu. Se há falta de citação, depois a lei diz quando é que se considera entender haver
falta de citação (artigos 187.º, al. a), 188.º e 189.º CPC).
O artigo que estabelece quando é que se considera haver falta de citação é o artigo 188.º, n.º 1 CPC.
Como está bom de ver, se há falta de citação, será nulo tudo o que se processe depois da petição inicial
(artigo 187.º) – esta nulidade não afeta a petição inicial, afeta o que se processar depois disso.

O artigo 190.º trata da falta de citação no caso de pluralidade de Réus e o regime é diferente consoante
estejamos perante uma situação de litisconsórcio necessário ou uma situação de litisconsórcio
voluntário, porque, voltando ao artigo 35.º CPC, no litisconsórcio voluntário há uma simples
acumulação de ações, conservando cada litigante uma posição de independência em relação aos seus
compartes. Portanto, no caso do litisconsórcio voluntário, dada a divisibilidade da relação jurídica, as
diferentes ações são acumuláveis ao processo (há uma mera acumulação de ações; cada litigante
mantém autonomia na condução da ação). Assim não é no litisconsórcio necessário, em que há uma
simples ação com pluralidade de sujeitos, e isso tem reflexos no regime.

Voltando à citação, nos termos do artigo 190.º, n.º 1, al. a) CPC, a falta de citação de um, obriga à
anulação de todo o processado posterior, portanto, basta que não seja citado um para que se verifique
este efeito. Portanto, sendo o litisconsórcio necessário, a falta de citação de um dos Réus obriga à
anulação de todo o processado posterior ao momento da falta (artigo 190.º, al. a) CPC). Assim acontece
para que todos os co-réus gozem das mesmas chances de influenciar o curso do processo.

«(…) salvando-se unicamente a petição inicial e os atos que lhe estejam ligados. (…) A invalidação
assume toda esta amplitude, para que os co-réus fiquem colocados em situações idênticas, após sanada
a falta da citação, ato que terá de ser praticado com vista ao preenchimento do pressuposto da
legitimidade plural.» - pp. 325 e 326 da sebenta

2. A confissão (meio de prova) consiste no reconhecimento da realidade de um facto que é


desfavorável ao confitente. Para que a confissão tenha a força própria que a lei lhe atribui (a
confissão faz prova plena do facto) é necessário que se verifiquem certos requisitos, senão essa
confissão pode ser apreciada ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova.
No caso de uma ação com pluralidade de partes em que apenas um dos Réus ou um dos Autores
reconvindos confessa um facto, o regime do litisconsórcio necessário diz-nos que a confissão só é
atendível enquanto confissão se provier em simultâneo de todos os litisconsortes (artigo 353.º, 2ª parte
CC).

«Compreende-se que, na presença de interesses insuscetíveis de divisão entre a pluralidade dos co-
interessados seus titulares, não possa ser valorada pelo julgador como confissão a atitude de um ou de
alguns deles reconhecerem a realidade de um facto que a todos prejudica» - p. 237 da sebenta

ex.: a ação foi intentada contra A, B e C e A confessou o facto X – é preciso identificar se se está perante
um litisconsórcio necessário ou voluntário*:
→ No caso de litisconsórcio necessário a confissão só vale enquanto tal se provier
simultaneamente de todos os litisconsórcios;
→ Se provier apenas de um não goza deste valor confessório, embora possa ser livremente
apreciada pelo julgador (artigo 361.º CC e artigo 607.º, n.º 5 CPC).

Rita Nunes 96
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«Tal não significa, porém, que o conteúdo desse depoimento seja de todo em todo irrelevante no plano
da formação da convicção do julgador. Poder-se-á estar perante um depoimento de parte desprovido
de valor confessório, mas passível de ser utilizado no âmbito da livre apreciação da prova em conjunto
com outros elementos fornecidos pelos autos (artigos 361.º do Cód. Civ. e 607.º, n.º 5 do Cód. Proc.
Civ.» - - p. 327 da sebenta

*o professor pode pedir-nos para caracterizar a situação de pluralidade de partes como litisconsórcio
necessário ou voluntário.

3. A confissão do pedido (ato de disposição do objeto do pedido), a desistência ou a transação não


produzem efeitos sobre a relação processual se forem estes atos praticados apenas por um dos
sujeitos que integra a relação processual. Se apenas um confessar o pedido, desistir do pedido ou
celebrar transação, e estando perante um litisconsórcio necessário, esse ato de confissão, de
desistência ou de transação não produz efeitos sobre a relação processual, valendo apenas para
efeitos de custas (artigos 288.º, n.º 2 e 528.º, n.º 2 CPC).

4. Em matéria de recursos, se apenas um dos sujeitos recorrer da decisão, a solução, se estivermos


perante um litisconsórcio necessário, passa pelo seguinte: o princípio que vale é o princípio da
realidade para referir os casos em que o recurso aproveita ao não recorrente (isto por oposição do
princípio da personalidade, em que o recurso aproveita só àquele recorrente e não aproveita os
demais).

«Por vezes, a decisão impugnada vai ser objeto de reavaliação pelo tribunal “ad quem” com eficácia
para todas as partes derrotadas, apesar de o impulso recursório provir de só uma ou de algumas delas.
Trata-se, agora, de um sistema de definição do âmbito subjetivo do recurso inspirado pelo princípio da
realidade, uma vez que se atribui prevalência à vantagem de se alcançar, também em sede de recurso,
uma decisão uniforme para o conjunto das partes vencidas.» - pp. 329 e 330 da sebenta

Portanto, se estivermos perante um litisconsórcio necessário, o princípio que vale é o princípio da


realidade, aproveitando o recurso aos não recorrentes (artigo 634.º, n.º 1 CPC).
ex.: uma ação é intentada contra dois Réus e os Réus são condenados, sendo que apenas um recorre –
se os efeitos deste recurso não se estenderem ao não recorrente, a decisão transita quanto a um, mas não
transita quanto ao outro, a menos que este recurso aproveite ao outro.

NOTA: Esta é também forma indireta de perguntar numa pergunta de exame se estamos perante um
litisconsórcio necessário ou voluntário.

Constituição do litisconsórcio necessário


Tratando-se de um litisconsórcio necessário ativo, deverão marcar presença na ação ambos os Autores.
Portanto, deve a ação ser intentada pelos dois sujeitos ou mais daquela relação jurídica plural no caso
de a lei impor essa presença. Mas pode acontecer que um dos sujeitos dessa relação jurídica se recuse
a intentar a ação, sendo que nesse caso o Autor pode intentar a ação e, depois, o meio que tem ao seu
dispor é intentar a ação sozinho e de seguida requerer o chamamento do outro sujeito que deveria

Rita Nunes 97
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TEÓRICAS

figurar na ação como Autor – é possível requerer a intervenção principal provocada de um sujeito ao
outro (artigo 316.º, n.º 1 CPC).

O mesmo não é possível no caso de estarmos perante um caso de litisconsórcio voluntário ativo – se
estivermos perante um litisconsórcio voluntário ativo, o Autor não pode chamar outro litisconsorte
ativo, o que pode é o Réu chamar outros litisconsortes ativos. Mas aqui estamos a falar de uma hipótese
de litisconsórcio necessário ativo e aqui sim o Autor pode recorrer ao incidente da intervenção
principal provocada para chamar os outros sujeitos que não quiseram intentar a ação.

Tratando-se de um litisconsórcio necessário passivo, o meio próprio é a sua indicação como Réu na
petição inicial e requerer a sua citação – o Autor na petição inicial indica a pessoa do Réu (artigo 522.º,
n.º 1, al. a) CPC). Se for preterido o litisconsórcio, então deverão ser chamados através do incidente
de intervenção principal provocada (artigos 316.º e ss. do CPC), sem prejuízo de poderem também
intervir espontaneamente.

Inobservância do litisconsórcio necessário


A preterição do litisconsórcio necessário é causa de ilegitimidade, portanto, dá lugar a uma exceção
dilatória (artigo 577.º, al. e) CPC) que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e deva
absolver o Réu da instância (artigo 278.º, n.º 1, al. d) CPC), não obstante estarmos perante a não
verificação de um pressuposto processual sanável.

Esta falta é sanável, mas o juiz não está em condições de oficiosamente regularizar a instância – deve
providenciar pela sanação, mas deve fazê-lo convidando as partes, porque a regularização da instância
pressupõe aqui a prática de atos que só podem ser praticados pelas partes (a iniciativa da sanação é das
partes).

Portanto, nos termos do artigo 6.º, n.º 2 CPC, o juiz deve convidar as partes a esta sanação:
→ Nos casos excecionais em que há despacho liminar, ele deve fazer isso logo no despacho liminar,
dando um prazo ao autor para requerer a indicação de outros sujeitos através do incidente próprio.
→ Mas tirando os casos em que não há despacho liminar, o juiz vai exercer este poder no despacho
pré-saneador – vai dar um prazo para que seja regularizada a instância, sob pena de depois o
despacho saneador absolver o Réu da instância.

São fundamentalmente duas as formas de regularização da instância:


1. Chamada à ação do terceiro através do incidente da intervenção principal provocada (artigo
316.º, n.º 1 CPC).
Nos termos do artigo 318.º, n.º 1, al. a) CPC, “O chamamento para a ação deve ser deduzido até
ao termo da fase dos articulados, sem prejuízo no entanto no disposto no artigo 261.º do CPC”.

2. Através da intervenção principal espontânea do terceiro (terceiro no plano processual) – artigo


311.º CPC.

Rita Nunes 98
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TEÓRICAS

Esta é uma intervenção que pode ocorrer de duas formas:


i. Mediante a mera adesão aos articulados de uma das partes (intervenção principal espontânea
por adesão) – pode a intervenção ocorrer enquanto a causa não estiver definitivamente julgada
(artigo 313.º CPC);
ii. Através de articulado próprio – só pode intervir na ação até ao termo da fase dos articulados
(artigo 314.º CPC). Entende-se que termina a fase dos articulados com o primeiro ato da fase
seguinte, que pode ser o despacho pré-saneador.

Aproveitamento dos efeitos da ação (artigo 261.º, n.º 1 e n.º 2 do CPC): ainda que haja absolvição
da instância, ou seja, ainda que o Réu seja absolvido da instância por ilegitimidade plural (a falta é
sanável), podem aproveitar-se os efeitos daquela concreta relação processual, seja ainda antes do
trânsito em julgado da respetiva decisão (artigo 261.º, n.º 1), seja depois do trânsito em julgado.

• Antes do trânsito em julgado da decisão, pode ser requerida a intervenção da parte preterida
(artigo 261.º, n.º 1 CPC).

• O artigo 261.º, n.º 2 prevê que nos 30 dias subsequentes ao trânsito em julgado é admitido
o chamamento, a instância que se extinguiu considera-se renovada, mas recai sobre o
reconvinte ou sobre o Autor o encargo das custas em que tiver sido condenado.

LITISCONSÓRCIO VOLUNTÁRIO:
NOTA: «Importa não confundir o litisconsórcio voluntário com as situações de litisconsórcio
necessário que resultam da vontade das partes (n.º 1 do artigo 35.º)» - p. 323 da sebenta

A figura do litisconsórcio é a tradução processual da existência de uma relação jurídica plural – temos
uma situação de litisconsórcio é não só relação material, mas uma relação plural. Estamos perante uma
situação de litisconsórcio voluntário (artigo 32.º CPC) quando essa relação, embora única, admita uma
certa divisibilidade de posições de cada um dos seus contitulares – portanto, quando estejamos perante
uma relação jurídica divisível. Estas situações são a regra.
«No litisconsórcio voluntário a legitimidade processual está desenhada de modo a permitir que cada
uma das partes, em caso de litígio, trate individualmente da posição jurídica que lhe diz respeito» - p.
324 da sebenta
A estas situações de relações jurídicas divisíveis acrescem os casos em que a lei admite, muito embora
se trate de uma relação jurídica indivisível, que um só dos seus titulares esteja presente em juízo – casos
de legitimidade extraordinária (também nesses casos estamos perante um litisconsórcio voluntário).
Se a lei admite a presença de um só dos cotitulares da relação jurídica em juízo, se for intentada por
todos os sujeitos da relação material controvertida sê-lo-á a título de litisconsórcio voluntário, porque
nesse caso a lei não impõe a presença, justamente porque prevê um caso de legitimidade extraordinária.
Se a lei autoriza um só dos titulares da relação a agir, se não estão todos presentes, não estamos perante
uma exceção dilatória.

Rita Nunes 99
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TEÓRICAS

Esta diretriz geral de divisibilidade das posições jurídica traduz-se, por um lado, na liberdade de cada
um dos litisconsortes voluntários de por si conduzirem a ação e, por outro lado, traduz-se na necessária
delimitação do objeto do processo à quota parte do seu interesse.
O nosso Direito parte de um princípio geral de divisibilidade da relação jurídica (artigo 32.º CPC), mas
em muitos casos é o próprio texto da lei que prevê a possibilidade de uma certa pessoa autonomamente
litigar sobre uma relação jurídica e esta possibilidade que está ressalvada no artigo 32.º, n.º 2 CPC.

Exemplos disto:
1. Sendo a obrigação solidária, que é uma modalidade da obrigação plural, responde cada devedor
pela prestação integral (artigo 512.º, n.º 1 do CC) – o credor pode demandar apenas um dos
devedores, o que significa que se opta por demandar todos os codevedores solidários estaremos
perante um caso de litisconsórcio voluntário.
Ou seja, o credor exigir o cumprimento apenas a um dos codevedores solidários – se, contudo, o
credor decidir intentar a ação contra todos os codevedores solidários fá-lo-á a título de litisconsórcio
voluntário.

2. Praticando duas pessoas um certo facto ilícito culposo e respondendo solidariamente ao abrigo
do artigo 490.º e 497.º, n.º 1 CC, estão em litisconsórcio voluntário.

3. Havendo pluralidade de credores de uma prestação indivisível, qualquer um pode exigi-la por
inteiro (artigo 538.º, n.º 1, 1.ª parte CC), o que significa que se vários em conjunto a exigem
estará em litisconsórcio voluntário ativo.

4. Qualquer um dos compossuidores pode servir-se dos meios de defesa da posse (artigo 1286.º
CC). Da mesma forma qualquer um dos comproprietários pode recorrer à ação de reivindicação
(artigo 1405.º, n.º 2 CC). E, da mesma forma, cada um dos co-herdeiros pode recorrer à ação de
petição da herança (artigo 2078.º, n.º 1 CC).

5. A estas hipóteses acrescentam-se quaisquer outras a que se possa descortinar um conjunto de


posições jurídicas divisíveis.

Exemplo: o caso das obrigações conjuntas, que é uma modalidade específica de obrigações plurais
que não está desenvolvida legalmente, mas sim doutrinalmente, pese embora encontremos uma
referência no artigo 649.º, n.º 2 CC e que é um caso em que cada um dos devedores conjuntos deve
apenas uma quota parte da obrigação e só responde por ela, ou em que cada um dos credores conjuntos
pode apenas exigir uma parte da obrigação (tem só a titularidade de uma parte, portanto, só pode exigir
uma parte) – a obrigação é fracionável, portanto cada um pode agir autonomamente, cada um está
limitado a agir sobre a sua quota-parte.

Mas em litisconsórcio voluntário podem agir todos os titulares ativos, tal como podem em litisconsórcio
voluntário passivo serem demandados todos os titulares passivos. O que não pode acontecer é que um
credor de uma obrigação conjunta exija apenas de um devedor a totalidade, porque o devedor de uma
obrigação conjunta só responde por uma parte. Haverá, nos termos do artigo 32.º, n.º 1 CPC, uma
redução automática do objeto do processo – ex. de devedores conjuntos: o credor não pode intentar uma

Rita Nunes 100


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ação só contra um exigindo-lhe a totalidade; pode intentar uma ação contra todos os devedores
conjuntos, exigindo-lhes a totalidade no caso de litisconsórcio voluntário.

Se intentar uma ação só contra um dos devedores exigindo-lhe a totalidade, o objeto da ação reduz-se
automaticamente nos termos do artigo 32.º, n.º 1 CPC e o tribunal deve limitar-se a conhecer da quota
parte do interesse ou da quota parte da responsabilidade do concreto autor ou do concreto réu.

Constituição do litisconsórcio voluntário:


O litisconsórcio voluntário pode ser da iniciativa do Autor (artigo 316.º, n.º 2 CPC) – o Autor pode,
por outro lado, logo quando intenta a petição inicial, intentar a ação contra vários Réus ou vários
Autores intentarem a ação a título de litisconsórcio voluntário ativo ou passivo. Pode também o Autor
desencadear o incidente da chamada dos sujeitos a título de litisconsórcio voluntário nos termos do
artigo 316.º, n.º 2 CPC. Também pode ser da iniciativa do Réu mediante chamamento (artigo 316.º,
n.º 3 CPC).

Deve ser requerida até ao fim da fase dos articulados esta intervenção. Entende-se que a fase dos
articulados termina com o primeiro ato da fase seguinte que é o despacho pré-saneador, embora este
seja um ato eventual.

No que diz respeito ao litisconsórcio voluntário ativo, não pode ser o Autor a desencadeá-lo para forçar
algum dos cotitulares da relação jurídica à ação (alteração introduzida em 2013 – até 2013 aquela
possibilidade ela possível, agora já não é). Como estamos perante relações divisíveis, em que cada um
mantém a posição de autonomia e conduz autonomamente a ação, esta solução respeita a esta posição
de autonomia. Como estamos perante posições relativamente autónomas, deixa-se a cada um dos
cotitulares a possibilidade ou a decisão sobre intervir ou não intervir, quando e como intervir.
Esta liberdade só é restringida para tutela dos interesses do Réu, que é um interesse atendível (interesse
do Réu em ver definitivamente resolvida aquela relação jurídica naquela ação). Isto para dizer que o
litisconsórcio voluntário ativo pode ser da iniciativa do Réu, do Autor é que não. Isto não obsta a que
vários Autores intentem uma ação a título de litisconsórcio ativo, também não impede que algum
eventual litisconsorte voluntário ativo intervenha espontaneamente na ação.
Regime do litisconsórcio voluntário:
Artigo 35.º do CPC – ideia de que estamos perante uma mera acumulação de ações e que cada litigante
pode autonomamente conduzir a ação e o regime vai refletir isso mesmo:

1. Relativamente à citação, a falta de citação de um dos litisconsortes voluntários já não implica a


anulação do processado posterior ao momento em que se verificou a falta de citação (artigo 190.º,
al. b) CPC).
«Quanto ao réu atingido pela falta de citação, nada impede que seja tratado como não fazendo parte
da instância, porque a sua presença não é necessária para assegurar a legitimidade passiva» - p. 326
da sebenta
«Todavia, dá-se ao autor a possibilidade de requerer que se efetue corretamente a citação e falta, “se
o processo ainda não estiver na altura de ser designado dia para a discussão e julgamento da causa”,
de modo a permitir que a sentença vincule todos os inicialmente demandados. (…) Em consequência
desta intervenção, da iniciativa do autor, há que suspender a instância em relação aos demais réus,

Rita Nunes 101


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TEÓRICAS

durante o período de tempo necessário para que o réu citado posteriormente exerça no processo a
atividade a quem tem direito como parte principal.» - p. 326 da sebenta
2. A confissão consiste no reconhecimento da realidade de um facto que é desfavorável. A confissão
aproveita apenas ao confitente, não devendo o efeito confessório estender-se às demais partes.
Outra coisa é haver uma confissão em bloco.
«(…) o efeito de tal confissão restringe-se ao “interesse do confitente”, devendo o tribunal, no
julgamento da matéria de facto, abster-se de estender o resultado probatório assim obtido às restantes
partes unidas no litisconsórcio.» - p. 326 da sebenta

3. Em matéria de atos de auto disposição do objeto do processo, a confissão do pedido, a desistência


e a transação são livres na medida do interesse de cada um (artigo 288.º, n.º 1 CPC). Portanto, pode
o co-réu num caso de litisconsórcio voluntário passivo confessar o pedido – caso em que o tribunal
deve condenar o preterido; mas como os outros não confessaram, não tem efeitos contra os outros.
«Havendo litisconsórcio voluntário, cada um dos litisconsortes é livre de confessar ou desistir do
pedido, assim como de celebrar individualmente transação, desde que se limite a dispor da quota-
parte do seu interesse na causa (n.º 1 do artigo 288.º)» - p. 328

4. Em matéria de recursos, vale agora a regra do princípio da personalidade – o recurso aproveita


apenas àquele que o tenha interposto. Pode, portanto, a decisão transitar em julgado contra um e
contra outro ou outros não.
«(…) a regra é a inversa, pois as posições jurídicas que correspondem a cada um dos membros da
parte plural são juridicamente autonomizáveis. A limitação dos efeitos do recurso a quem tomou a
iniciativa de impugnar a decisão do tribunal “a quo” pode conduzir ao resultado de não haver
uniformidade do que for decidido a final, em relação aos litisconsortes.» - p. 330 da sebenta
«Num número restrito de situações, porém, a ponderação dos interesses envolvidos foi determinante no
sentido de se consagrarem soluções que, em alguma medida, se afastam da obediência estrita ao
referido princípio da personalidade» - p. 330 da sebenta
Ou seja, estendem-se os efeitos do recurso àqueles que não interpuseram quando a parte que não
interpõe recurso aderir ao recurso (artigo 634.º, n.º 2, al a) e n.º 3 CPC) e nos demais casos previstos
no artigo 634.º, n.º 2 CPC (al. b)1 e al. c)2).
• Artigo 634.º, n.º 2, al. b)1 – ex.: se o devedor principal e o seu fiador foram condenados na mesma ação a cumprir a obrigação
afiançada, a revogação dessa sentença com base no recurso interposto tão-só pelo devedor principal aproveita ao garante, apesar de não
ter recorrido, nem aderido ao recurso

• Artigo 634.º, n.º 2, al. c)2 – excetuam-se desta ampliação do âmbito subjetivo do recurso as situações em que o tribunal “ad
quem” tiver dado provimento ao recurso com base em razões que digam respeito unicamente à pessoa do devedor que impugnou a decisão,
como acontece se estiver em causa a incapacidade, o erro, o dolo ou a coação que afetaram o recorrente

NOTA: «Existe, assim, um mecanismo de extensão da base subjetiva do recurso, se bem que dependente
da vontade dos litisconsortes que não recorreram de inicio e que deixa de fora aqueles que não se
dispuseram a aderir (artigo 634.º, n.os 2, al. a), e 3)» - p. 330 da sebenta

Qualquer uma destas características denota/reflete a ideia de que em matéria de litisconsórcio


voluntário há uma mera acumulação de ações, podendo por isso cada uma delas, em termos bastante
amplos, gozar de tratamento relativamente autónomo.

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COLIGAÇÃO
Ao contrário do que acontece no litisconsórcio, na coligação encontramos uma pluralidade de relações
jurídicas – aquilo que define a coligação é a presença na ação de uma pluralidade de relações jurídicas.
Ora, isso acarreta um risco de complexificação da marcha processual, razão pela qual são colocadas
particulares limitações à sua admissibilidade (para não entravar o normal funcionamento do processo).
Se não forem observados os pressupostos de admissibilidade da coligação, estamos perante uma
exceção dilatória, portanto, há uma exceção dilatória que corresponde à existência de uma situação
coligatória sem estarem verificados os seus pressupostos de admissibilidade – artigo 577.º, al. f) e
278.º, al. e) CPC
São dilatórias, entre outras, as seguintes exceções: “A coligação de autores ou réus, quando entre os
pedidos não exista a conexão exigida no artigo 36.º” (artigo 577.º, al. f) CPC). O artigo 278.º CPC
refere-se aos casos de absolvição da instância e nele se pode ler que o juiz deve abster-se de conhecer
do pedido e absolver o réu da instância “Quando julgue procedente alguma outra exceção dilatória”.
Portanto, a absolvição do réu ou dos réus da instância com fundamento na inadmissibilidade da
coligação subsume-se à alínea e) do n.º 1 do artigo 278.º CPC.

Quais os pressupostos da admissibilidade da coligação?


Esses pressupostos encontram-se previstos nos artigos 36.º e 37.º CPC.

Para que seja admissível a coligação exigem-se 3 pressupostos fundamentais:

• É necessário que haja uma conexão entre as diferentes relações jurídicas integrantes do objeto
do processo – artigo 36.º CPC
A conexão entre as diferentes relações jurídicas pode resultar da verificação de qualquer um dos fatores
previstos no artigo 36.º CPC. Se não se verificar nenhum dos fatores de conexão previstos neste artigo,
então a coligação será inadmissível e estaremos perante uma exceção dilatória.

Quais as possibilidades? Quais os fatores?


→ Artigo 36.º, n.º 1 – a unicidade da causa de pedir, ou seja, a causa de pedir ser única em relação
aos vários pedidos
(ex. 1: imagine-se que A coage B à celebração de um contrato com C [um sujeito exerce coação sobre
o outro para celebrar um contrato com um terceiro]. B, que foi sujeito à coação propõe uma ação de
anulação do contrato celebrado com C [artigo 256.º CC] e ao mesmo tempo uma ação indemnizatória
contra o A → a causa de pedir é essencialmente a mesma [a coação é causa de pedir das duas ações]).
(ex. 2: caso de dois legatários [pessoas a quem foram deixados legados através de disposição
testamentária, cada um deles titular de uma posição jurídica autónoma, resultante daquilo que lhes tenha
sido legado] propõem uma ação de cumprimento contra os herdeiros – a causa de pedir é essencialmente
a mesma, que é a disposição testamentária onde estão instituídos os legados, mas cada um dos legatários
é titular de uma posição jurídica autónoma).
(ex. 3: há um acidente de viação e esse acidente atinge diferentes passageiros. Portanto, várias pessoas
sofrem danos na sua esfera física em virtude de um acidente provocado pela pessoa X, por
responsabilidade sua → portanto, existe uma relação de responsabilidade civil extracontratual que une
o sujeito que praticou o facto ilícito e culposo e cada um dos lesados, sendo que cada um deles tem
direito a pedir uma indemnização, mas, no entanto, a causa de pedir é a mesma [o acidente]. Podem
os diferentes lesados, na mesma ação, agir através de uma coligação de autores contra o mesmo réu,

Rita Nunes 103


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mas cada um deles deduzindo um pedido distinto. Ora, não se trata do mesmo pedido deduzido por um
conjunto de autores; cada um deles é titular de uma pretensão indemnizatória autónoma).
→ Também existe uma conexão relevante para este efeito quando exista uma relação de
prejudicialidade ou de dependência entre os pedidos – artigo 36.º, n.º 1 CPC.
(ex.: numa sucessão de doações, A fez uma doação a B de um determinado bem e, depois, B doou esse
mesmo bem a C. Depois, o A [que fez a primeira doação] pretende anular a doação que fez a B → trata-
se de uma ação constitutiva extintiva que intenta contra o donatário. Mas, ao mesmo tempo, pretende
também deduzir um pedido de restituição do bem contra aquele a quem o bem foi entretanto doado [C].
Claro que esta possibilidade de exigir de C depende da anulação do contrato que fez com B, isto sem
prejuízo da aplicação das regras da proteção da boa-fé previstas no Código Civil)

→ Nos termos do artigo 36.º, n.º 2 CPC, também é possível a coligação quando a procedência dos
pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos
(ex.: anteriormente falamos do acidente de viação; neste caso, poderia ser subsumido aqui, uma vez
que temos diferentes pedidos indemnizatórios, tendo todos por base a apreciação dos mesmos factos
(factos esses dos quais resultaram danos para os mesmos lesados)

→ Nos termos do artigo 36.º, n.º 2 CPC, é admissível a coligação quando a procedência dos pedidos
principais dependa essencialmente da aplicação das mesmas regras de Direito ou cláusulas de
contratos perfeitamente análogas
(ex.: fenómeno dos contratos celebrados em série (com recurso a cláusulas contratuais gerais) / em
que uma empresa celebra um conjunto de contratos com um conteúdo de teor semelhante –
sociedade de telecomunicações a agir contra vários clientes com base em incumprimento de
contratos que são iguais. Ou vários clientes a agir contra essa sociedade de telecomunicações em
que esteja em causa na ação a análise de cláusulas de contratos que são perfeitamente análogas
justamente, porque foram celebrados com recurso a cláusulas contratuais gerais)

→ Nos termos do artigo 36.º, n.º 3 CPC, é admitida a coligação quando os pedidos se baseiam na
invocação da obrigação cartular quanto a um e da respetiva relação subjacente quanto a outro –
invoca-se aqui o regime dos títulos cambiários, em particular, das letras de crédito.

→ Nalguns casos, a possibilidade de coligação encontra-se normativamente prevista.


- No artigo 1820.º CC faz-se referência à coligação de investigantes na ação de investigação da
maternidade;
- No artigo 1872.º CC também se faz esta referência, mas na ação de investigação da paternidade.

• É necessário que se verifique uma compatibilidade formal da tramitação prevista para a


consideração das diferentes pretensões deduzidas em juízo – artigo 37.º, n.º 1, 1ª parte CPC
É também necessário que o tribunal seja absolutamente competente para o conhecimento de
todos os pedidos – artigo 37.º, n.º 1, 2.ª parte CPC

Este é um requisito que se desdobra em dois elementos:


1. É necessário que se siga a mesma forma de processo quanto a todos os pedidos – artigo 37.º, n.º
1 CPC

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Mas, nos termos do artigo 37.º, n.º 2 CPC, admite-se que o juiz autorize a coligação quando este
requisito não se verifique, mas as formas previstas para o juízo de cada uma das pretensões não seja
manifestamente incompatíveis e, ao mesmo tempo, quando se vislumbre o interesse relevante na
apreciação conjunta das pretensões ou quando essa apreciação conjunta das pretensões seja
indispensável para a justa composição do litígio.
Nos termos do n.º 3 da mesma norma, se o juiz autorizar a coligação, deve adaptar o processado à
coligação que haja autorizado (são formas diferentes que a lei prevê). Trata-se de uma concretização
concreta do poder-dever de gestão processual (artigo 6.º, n.º 1 CPC) e, mais precisamente, do poder-
dever de adequação formal (artigo 547.º CPC).
2. É necessário também que o tribunal seja absolutamente competente para o conhecimento de
todos os pedidos – são as normas de competência, cuja violação origina a incompetência absoluta
do tribunal (artigo 37.º, n.º 1, 2.ª parte – englobam a competência internacional, em razão da
matéria e em razão da hierarquia), o que significa que a preterição das regras de competência
relativa (competência em razão do território ou do valor) não obstam à admissibilidade da
coligação.

• É necessário que não haja rejeição da coligação pelo tribunal (requisito negativo) – artigo
37.º, n.º 4 CPC. Ou seja, mesmo que estejam verificados os 2 primeiros requisitos, pode o
tribunal, nos termos que vamos analisar, rejeitar a coligação, pelo que também é requisito
que o tribunal não a rejeite
Nos termos do artigo 37.º, n.º 4 CPC, pode o juiz rejeitar a coligação mesmo que se verifiquem esses
pressupostos anteriormente vistos, com fundamento na grave inconveniência da coligação para a
instrução, discussão e julgamento em conjunto dos processos cumulados.
Neste caso, caso entenda existir este inconveniente grave, deve observar-se o regime constante do
artigo 37.º, n.º 4 CPC – deve ser notificado o autor ou autores, para que indique, num certo prazo, qual
ou quais os pedidos que continuarão a ser apreciados naquele processo.

NOTA: o artigo 37.º, n.º 4 remete para os n.º 2 (pluralidade de autores – a indicação deve ser feita por
acordo e por todos os autores) e n.º 3 do artigo 38.º CPC.

Por força do princípio do pedido, é ao autor que cabe a iniciativa de propulsionar a pronúncia por parte
do tribunal sobre uma determinada relação jurídica, daí que caiba ao autor decidir qual o pedido relativo
a qual relação material que pretende que seja apreciada pelo tribunal. Fazer ou não fazer uso desta
opção é uma escolha sua.
→ Se o autor fizer esta indicação, tem lugar a absolvição da instância em relação aos sujeitos
passivos das relações materiais respeitantes aos pedidos preteridos (pedidos que ficaram sem
efeito) – artigo 38.º, n.º 3 ex vi artigo 37.º, n.º 4 CPC
Acrescente-se que, em caso de pluralidade de autores, a indicação deve ser feita por acordo e por
todos os autores – artigo 38.º, n.º 2 ex vi artigo 37.º, n.º 4 CPC

→ Nada sindicando, são todos os réus absolvidos da instância quanto a todos os pedidos – artigo
37.º, n.º 4 CPC
Nos termos do artigo 37.º, n.º 5 CPC, há uma possibilidade de aproveitamento dos efeitos civis
decorrentes da propositura da ação e da citação do réu, se forem propostas novas ações no prazo de 30
dias a contar do trânsito em julgado do despacho que ordena a separação. Estes efeitos civis vão ser
estudados a propósito da citação (artigo 331.º, n.º 1 CC, 323.º, n.º 1 CC, 805.º, n.º 3 CC e 564.º CPC).
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Este regime do artigo 37.º, n.º 4 e n.º 5 tem que ver com os casos em que o juiz entende haver um
inconveniente grave. Mas o que acontece se houver uma coligação irregular?
Temos uma coligação irregular quando não estiverem verificados os pressupostos que autorizam a
consideração conjunta dos diferentes pedidos relativos a diferentes relações materiais. Se um autor
contra o reu, ou vários autores contra vários réus intentarem pedidos, mas sem estarem verificados os
pressupostos que autorizam a coligação, estamos perante uma coligação irregular, que dá origem a uma
exceção dilatória (artigos 577.º, al. f) e 278.º, al. e) CPC).
Em lugar da integral absolvição da instância, procura-se que, apesar de tudo, haja conhecimento do
mérito pelo menos em relação a uma das ações, daí que o autor seja chamado no prazo que seja fixado
pelo juiz a indicar qual ou quais os pedidos que pretende ver apreciado/os no processo – artigo 38.º,
n.º 1 CPC. Se o autor ou autores indicarem quais os pedidos que pretendem ver considerados, o réu ou
réus são absolvidos da instância quanto aos demais pedidos – artigo 38.º, n.º 3 CPC (“Feita a indicação
a que aludem os números anteriores, o juiz absolve o réu da instância relativamente aos outros
pedidos”).
Resta atender à norma do artigo 279.º, n.º 2 e n.º 3 CPC, sendo que nos termos da mesma é possível
aproveitar os efeitos da primitiva ação se for intentada nova ação nos termos previstos nesta norma (n.º
2). O n.º 3 tem que ver com a possibilidade do aproveitamento de provas.

A diferença entre o artigo 279.º e o artigo 37.º, n.º 5 é a seguinte: quanto à possibilidade de
aproveitamento, aplicámos o artigo 37.º, n.º 5 há pouco, e a possibilidade de aproveitamento no caso
de absolvição da instância resulta do regime geral do artigo 279.º. A diferença entre o n.º 5 do artigo
37.º e o n.º 2 do artigo 279.º decorre do facto de no primeiro bastar que a ação seja proposta no prazo
de 30 dias a contar do transito em julgado do despacho que ordenou a separação, ao passo que no
segundo os efeitos civis decorrentes da citação dependem de o réu ser citado dentro do prazo de 30
dias a contar do trânsito em julgado da decisão de absolvição da instância.
Em que momento deve o tribunal fazer isso? No despacho pré-saneador, para que depois no despacho
saneador se considere já a única ou únicas relações jurídicas que deve/devem ser julgadas na instância.

Regime do artigo 34.º CPC – diz respeito a ações que têm de ser propostas por ambos ou contra
ambos os cônjuges
Por intermédio deste regime, procura trazer-se ao processo um conjunto de valorações de direito
material, mais concretamente, o chamado “direito matrimonial patrimonial”, ou seja, o conjunto de
disposições que regem as posições patrimoniais daqueles que contraíram casamento (a noção de
casamento encontra-se no artigo 1577.º CC).
Estas disposições têm um propósito duplo: algumas delas, em particular, através do chamado “regime
das ilegitimidades conjugais” pretende-se introduzir limitações à liberdade de disposição dos bens
integrantes do património familiar em sentido amplo, tendo por referência o regime de comunhão de
bens adquiridos, não só os bens comuns do casal, mas também de bens próprios.
Ora, as regras especiais introduzidas no CPC e que procuram traduzir processualmente as valorações
constantes nestas regras de direito matrimonial patrimonial, procuram obstar/ impedir a que, através
da condução de um processo por parte por apenas um dos cônjuges, se frustrasse a tutela que é
concedida pelo direito substantivo – ou seja, o direito substantivo tutela os bens que integram o
património familiar em sentido amplo através de um conjunto de limitações aos atos de disposição
desses bens e esta tutela fornecida pelo direito material seria apurada se um dos cônjuges pudesse estar
num processo sem o consentimento do outro a litigar sobre bens que envolvam bens da relação aos
quais existem estas limitações de disposição.

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Por isso é que em determinados casos, em virtude dos bens que estejam em causa, a lei impõe a
presença de ambos os cônjuges ou a presença de um com o consentimento do outro. Assim, neste
primeiro conjunto de casos em que a lei pretende proteger o património familiar, o direito substantivo
exige, por regra, o consentimento do outro cônjuge, para que os atos de disposição sobre certos bens
sejam válidos ou as sanções previstas no artigo 1687.º CC.
Mas, e uma vez que estas regras são colocadas ao serviço da proteção do interesse da família, é possível
ao cônjuge interessado na disposição sobre um certo bem, nos termos do direito material, obter o
suprimento judicial desse consentimento, isto quando exista uma injusta recusa na sua prestação –
artigo 1684.º, n.º 3 CC.
Isto significa o seguinte (do ponto de vista do processo civil): muito embora estejamos, à partida,
perante um caso de litisconsórcio necessário por proscrição legal, admitirá a lei, em certos casos, que
um dos cônjuges seja admitido a litigar singularmente, quando tenha obtido este suprimento. Portanto,
os cônjuges devem estar em conjunto na ação ou só um com o consentimento do outro; ou sem o
consentimento do outro desde que tenha obtido o suprimento judicial desse consentimento.

Depois, existe um segundo grupo de regras especiais constantes do Livro do CC respetivo ao Direito
da Família, que tem já em vista um conjunto de outras preocupações, que não a proteção do património
familiar, mas a proteção daqueles que interagem com os cônjuges, determinado quem e quais massas
de bens respondem pelas dívidas de cada um dos cônjuges – referimo-nos ao Regime das dívidas dos
cônjuges (artigos 1690.º e ss. CC).

• É importante perceber que vale, por princípio, que pelas dívidas de um dos cônjuges respondem os
seus bens próprios, se a dívida for singular, e subsidiariamente a sua meação nos bens comuns
(artigo 1696.º, n.º 1 CC).
NOTA: existe uma comunhão patrimonial e cada um dos cônjuges tem uma meação sobre os bens, ou
seja, é metade para cada um.
Fazendo uma ponte com a ação executiva, é executado um cônjuge (devedor) e são penhorados bens
seus e, depois, o agente de execução pretende penhorar bens comuns, porque os próprios não são
suficientes – isto tem consequências, e o outro cônjuge vai ser chamado ao processo, podendo pedir
pela separação de bens.

• Já no caso de dívidas de ambos os cônjuges, respondem os bens comuns do casal e, na sua falta ou
insuficiência, solidariamente, os bens próprios de cada um – artigo 1695.º, n.º 1 CC.
As regras processuais que procuram traduzir as disposições de direito material que dizem respeito às
dívidas dos cônjuges têm em primeira atenção os interesses de terceiros que interagem com a família.
Se puder responder por uma certa dívida, mesmo que tenha sido constituída por apenas um dos cônjuges,
também os bens do outro, o credor terá interesse em chamar ambos os cônjuges à instância, para que
ambos fiquem vinculados pelo caso julgado e, assim, possa intentar uma ação executiva contra ambos,
no caso de não cumprimento da obrigação.
Dito isto, vamos ver os casos específicos do artigo 34.º CPC:

• Grupo de casos referente à casa de morada de família – remissão do artigo 34.º CPC para o
artigo 1682.º-A CC
NOTA: artigo 1682.º-A CC – “Carece do consentimento de ambos os cônjuges, salvo se entre eles
vigorar o regime de separação de bens: a) A alienação, oneração, arrendamento ou constituição de

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outros direitos pessoais de gozo sobre imóveis próprios ou comuns; b) A alienação, oneração ou
locação de estabelecimento comercial, próprio ou comum.

Ou seja, para a alienação de um bem imóvel, mesmo que ele seja próprio do cônjuge que o pretende
alienar, onerar, arrendar, etc., é necessário o ato de consentimento do outro cônjuge, salvo se vigorar
entre eles o regime da separação de bens.
No entanto, nos termos do n.º 2: “A alienação, oneração, arrendamento ou constituição de outros
direitos pessoais de gozo sobre a casa de morada de família carece sempre do consentimento de ambos
os cônjuges”. Assim, se o bem em causa for a casa de morada de família, é necessário o consentimento
de ambos os cônjuges para a prática de atos de disposição, inclusive se os cônjuges forem casados em
regime de separação de bens.

→ A primeira hipótese em que se exige a presença de ambos os cônjuges na instância diz respeito à
casa de morada de família, caso em que a ação deve ser proposta por ambos os cônjuges (artigo 34.º,
n.º 1 CPC) ou contra ambos os cônjuges (artigo 34.º, n.º 1 CPC ex vi 34.º, n.º 3). Trata-se, pelo menos
em parte, da tradução processual da regra constante do artigo 1682.º-A do CC, que é a regra pela qual,
justamente, se exige o consentimento de ambos os cônjuges para qualquer ato de disposição sobre a
casa de morada de família, independentemente do regime de bens em causa. a casa de morada de família
é o bem familiar que goza da mais forte proteção do Direito, a par dos móveis que são usados
conjuntamente na vida do lar (artigo 1682.º, n.º 3, al. a) CPC)

A proteção que o CPC concede vai mais além da proteção que é dada pelo CC, mas pelas mesmas
razões que justificam o regime de direito material – ou seja, no regime de direito material prevê-se a
necessidade de consentimento do outro cônjuge quando um deles o pretenda alienar, onerar, ou
constituir outro direito pessoal de gozo sobre a casa de morada de família, mas o CPC vai mais longe,
na medida em que estende esta proteção às ações em que os cônjuges são titulares passivos da relação
jurídica, ou seja, aos casos em que a iniciativa que pode levar à perda não é do outro cônjuge, mas de
um terceiro (também aqui a lei impõe o litisconsórcio necessário [passivo] para que ambos os
cônjuges possam contribuir na defesa do bem).
Portanto, quanto a este grupo de casos há que analisar o objeto do processo, se envolve a casa de
morada de família, e perceber quais é que são as consequências da ação (se pode resultar da ação uma
perda ou uma oneração desse bem). Se a ação tiver por objeto este bem e puder resultar dessa ação a
perda ou oneração desse bem, então, seja do lado ativo ou do lado passivo da relação processual, devem
marcar presença ambos os cônjuges, sob pena de exceção dilatória.

• Grupo de casos de bens cuja disposição exige o consentimento do outro cônjuge


Devem ser propostas por ambos os cônjuges (artigo 34.º, n.º 1 CPC) ou contra ambos os cônjuges
(artigo 34.º, n.º 1 ex vi 34.º, n.º 3 CPC) as ações de que possa resultar a perda ou a oneração de bens
que só por ambos possam ser alienados ou a perda de direitos que só por ambos possam ser exercidos.
Claro que uma das hipóteses cujos bens só podem ser alienados por ambos os cônjuges é o caso da
morada de família que já vimos anteriormente (que tem como particularidade exigir o consentimento
dos cônjuges, qualquer que seja o regime de bens).
Sempre que estejamos perante um bem cuja alienação não possa ocorrer isoladamente por um dos
cônjuges ou um direito que não possa ser exercido singularmente por um dos cônjuges, haverá
litisconsórcio necessário por disposição expressa da lei. Mas isto obriga, em primeiro lugar, a
considerar o objeto da ação (se ação tem por objeto algum destes bens ou direitos), mas obriga também
a atender às possíveis consequências (se pode a ação atingir a titularidade do bem ou do direito). No
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entanto, é preciso também atender ao regime de bens do casamento para apurar se a disposição daqueles
bens era livre ou se colocava alguma restrição (é preciso atender ao regime de direito material que rege
as relações de ambos os cônjuges – artigos 1682.º e ss. CC).
Também aqui o regime do CPC vai mais longe que o CC, porque impõe a presença dos cônjuges na
ação, tanto do lado ativo, como do lado passivo – se se tratar de um bem imóvel, o regime a aplicar do
ponto de vista do direito material é aquele que resulta do artigo 1682.º-A CC (é necessário o
consentimento de ambos os cônjuges, exceto se forem casados em regime de separação de bens).
Portanto, se uma ação tiver por objeto um bem imóvel próprio de um cônjuge e eles forem casados em
regime de separação de bens, aí já não há litisconsórcio necessário.

• Grupo de casos que, nos termos do artigo 34.º, n.º 3 CPC, respeitam às ações de
responsabilização (trata-se de responsabilizar os cônjuges por uma dívida)
Ações de responsabilização:
→ Ações de responsabilização emergentes de facto praticado por ambos os cônjuges – se há
uma dívida que foi praticada por ambos os cônjuges, esta é uma dívida geneticamente comum,
no sentido de que o ato em causa do qual resulta a dívida foi praticado por ambos. A ação de
responsabilização, neste caso, deve ser intentada contra ambos (estamos no âmbito de um caso
de litisconsórcio necessário passivo). Os bens que respondem pela dívida, em primeiro lugar,
serão os bens comuns.

→ Deve também ser intentada contra ambos os cônjuges a ação de responsabilização emergente
de um facto que foi praticado apenas por um dos cônjuges, mas em que se pretende obter
uma decisão suscetível de ser executada sobre bens próprios do outro cônjuge. Se o autor
pretende obter uma decisão que possa executar contra ambos os cônjuges (inclusive o que não
praticou o ato) terá de intentar a ação contra os dois, pelo que há um litisconsórcio necessário
passivo por força do pedido que seja formulado também contra o outro cônjuge. Se não formular
esse pedido, então pode agir apenas contra o cônjuge que praticou o ato (não temos um
litisconsórcio necessário, mas voluntário – ele não tem que agir contra os dois, mas apenas contra
um)
NOTA: Lebre de Freitas considera que temos um litisconsórcio voluntário.
(páginas 502.º e ss. do Manual de Ação Executiva de Rui Pinto)
Dívidas comuns vs. Dívidas comunicáveis
São da responsabilidade de ambos os cônjuges as dívidas que se subsumem às previsões do artigo
1691.º e 1692.º, al. b), 2.ª parte, 1693.º, n.º 2 e 1694.º, n.º 1 CC. Estas previsões permitem-nos
distinguir dívidas comuns e dívidas comunicáveis.

• As DÍVIDAS COMUNS são geneticamente comuns (nasceram assim), pelo que são
intrinsecamente da responsabilidade do casal – artigo 1691.º, n.º 1, al. a) CC.
Se for este o caso, a ação de responsabilização deverá ser intentada contra ambos os cônjuges –
caso de litisconsórcio necessário por força da lei.

• As DÍVIDAS COMUNICÁVEIS são dívidas funcionalmente comuns – são comuns, não


intrinsecamente, mas extrinsecamente, pela ponderação de uma realidade exterior ao ato
constitutivo da dívida. O ato constitutivo da dívida não foi praticado por ambos, mas por um.
No entanto, apesar disso, pode suceder que ainda assim estejamos perante dívidas
comunicáveis, cujas têm por fonte um facto praticado por um dos cônjuges, mas que

Rita Nunes 109


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vinculam o outro em razão da natureza comum dos bens que a dívida onera ou em razão da
função económica comum que desempenham na vida do casal.
Artigo 1691.º (Dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges) 1. São da responsabilidade de
ambos os cônjuges: a) As dívidas contraídas, antes ou depois da celebração do casamento,
pelos dois cônjuges, ou por um deles com o consentimento do outro; b) As dívidas contraídas
por qualquer dos cônjuges, antes ou depois da celebração do casamento, para ocorrer aos
encargos normais da vida familiar; c) As dívidas contraídas na constância do matrimónio pelo
cônjuge administrador, em proveito comum do casal e nos limites dos seus poderes de
administração; d) As dívidas contraídas por qualquer dos cônjuges no exercício do comércio,
salvo se se provar que não foram contraídas em proveito comum do casal ou se vigorar entre
os cônjuges o regime de separação de bens; e) As dívidas consideradas comunicáveis nos
termos do n.º 2 do artigo 1693.º.
Nos termos da lei, apesar de o facto ter sido praticado só por um dos cônjuges, a responsabilidade
pela dívida estende-se ao outro cônjuge, cujos bens próprios podem também responder
subsidiariamente, ou seja, a dívida seguirá o regime de dívida comum.

A questão é a seguinte: para isto acontecer, isto é, para seguir o regime de dívida comum, é preciso
que seja adquirido no processo o fator da comunicabilidade da dívida. Ora, se há uma ação
declarativa para obter um título executivo (respetiva sentença condenatória), para que o credor possa
obter uma sentença que possa executar contra o cônjuge que não praticou o ato, deverá intentar a ação
contra ambos, invocando que a dívida é comum – temos uma hipótese de litisconsórcio necessário
mediante opção do autor (porque se o autor pretender obter uma decisão que possa ser executada contra
ambos, ele tem o ónus de intentar contra ambos e se não o fizer, depois, não poderá executar a ação
contra ambos os cônjuges).
Isto merece uma ponte com a ação executiva, mais concretamente com os artigos 741.º e 742.º CPC.
Regula-se nestes artigos um incidente da instância executiva, que se chama de “incidente de
comunicabilidade”. Os títulos executivos podem ser judiciais ou extrajudiciais, sendo que o título por
excelência é judicial (sentença condenatória), pelo que, se o credor não dispõe do título judicial, resta-
lhe intentar uma ação declarativa de condenação para obter a condenação do devedor ao cumprimento.
O artigo 703.º do CPC determina quais é que são as espécies de títulos executivos – a alínea a) refere-
se às sentenças condenatórias, mas nas outras alíneas temos outros tipos de títulos executivos (estes já
extrajudiciais). Se o credor tiver na mão um título executivo extrajudicial, ele pode intentar logo uma
ação executiva sem passar pela ação declarativa.

Voltando às dívidas dos cônjuges…


O facto foi praticado só por um dos cônjuges, mas o exequente ou o executado entendem que aquela
dívida é comunicável ao outro cônjuge. Então, na ação executiva podem invocar isso através do
incidente de comunicabilidade.

Nos termos do artigo 741.º, n.º 1 do CPC, “Movida execução apenas contra um dos cônjuges, o
exequente pode alegar fundamentadamente que a dívida, constante de título diverso de sentença, é
comum” – o exequente não tem um título executivo contra os dois; se o facto tivesse sido praticado
pelos dois, resultava do título que a dívida era dos dois → mas o exequente pode invocar que a dívida
é comum, embora do título executivo só conste a presença de um dos cônjuges e não dos dois, se o
título executivo não for uma sentença. Se for uma sentença, não pode invocar. Ora, isto tudo está ligado
partindo do artigo 34.º, n.º 3.

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Se o título executivo for uma sentença, porque é que o exequente não pode invocar que a dívida é
comum?
Porque se o título executivo é suma sentença, isso significa que decorreu uma ação declarativa, onde
nasceu esta sentença condenatória que está a ser executada. Ora, se houve uma ação declarativa prévia
que deu origem a esta sentença que está a ser executada, se o credor queria obter uma sentença que
podia executar contra ambos, devia ter intentado a ação contra ambos (coisa que não fez) – se o tivesse
feito, tinham sido na sentença condenados os dois, mas só foi condenado um, porque o credor só
intentou a ação contra um dos cônjuges.

Se o título é extrajudicial, na ação executiva, constando no título apenas um dos cônjuges como devedor,
o exequente pode invocar que a dívida é dos dois cônjuges. Se o título, contudo, for uma sentença, já
não poderá condenar, porque isso significa que decorreu uma ação declarativa e que, nesse sentido, se
o credor pretender ter uma sentença que podia executar contra ambos, tinha tido o ónus quando intentou
a ação, nos termos do artigo 34.º, n.º 3, de ter intentado a ação contra os dois cônjuges. Como não fez
isso e intentou a ação apenas contra um, agora já não pode vir invocar só agora a ação executiva que a
dívida é comum (se o credor entendia que a dívida era comum, devia ter intentado a ação declarativa
contra os dois cônjuges).

Relativamente à matéria do consentimento do outro cônjuge…


1. Nas hipóteses em que devam estar ambos os cônjuges em juízo (no lado ativo), ou seja, nas
hipóteses em que uma ação deva ser proposta por ambos os cônjuges, admite-se no entanto que
um dos cônjuges, pese embora a sua falta de legitimidade (em princípio) para conduzir
autonomamente a ação, o possa fazer desde que haja obtido para tal o consentimento do outro
cônjuge → ou seja, pode estar só um cônjuge
2. Em alternativa, pode o cônjuge que pretende intentar uma determinada ação para a qual necessita
do consentimento do outro pedir ao tribunal o suprimento do referido consentimento,
previamente ao momento da propositura da ação que se pretende intentar.
3. Por fim, pode essa apreciação relativa ao suprimento do consentimento ser feita no âmbito da
própria ação que se propõe.
São estas as três possibilidades: relativamente à primeira, o cônjuge cujo consentimento seja
necessário deve prestá-lo nos termos do artigo 1684.º CC – nos termos desta disposição, o
consentimento conjugal deve ser especial para cada um dos atos a praticar (o consentimento deve
especificar a ação que se aceita que seja proposta – artigo 1684.º, n.º 1CC). Quanto à forma exigida
para este consentimento, nos termos do artigo 1684.º, n.º 2 CC, ele deve observar a forma exigida para
a procuração (artigo 262.º CC e artigo 117.º Código de Notariado).

No segundo caso, em vez de haver consentimento do outro cônjuge na condição do processo pode
haver lugar ao suprimento judicial da recusa do consentimento – artigo 1684.º, n.º 3 CC). Trata-se de
uma ação que segue a forma de processo de jurisdição voluntária (artigo 1000.º CPC) → o juiz deve
apurar da conveniência do ato para a família e, se for o caso, autorizará que a ação seja conduzida por
apenas um dos cônjuges, aplicando-se aqui os princípios que se aplicam na jurisdição voluntária.
Pode por último dar-se o caso de a ação em causa ser proposta sem o consentimento do outro cônjuge
e sem que tenha sido intentada uma ação com vista a obter o suprimento judicial desse consentimento
e, nesse caso, dispõe especificamente o artigo 34.º, n.º 2 CPC que se aplica o disposto no artigo 29.º,
n.º 1 CPC, com as necessárias adaptações, decidindo o tribunal do consentimento. O que vai acontecer
é que vai haver uma suspensão da instância; o juiz, ao abrigo do princípio da adequação formal, devera
aplicar as regras que regem no processo especial para obtenção do consentimento/ as regras que regem

Rita Nunes 111


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o processo de jurisdição voluntária (artigo 1000.º CPC), mas estamos aqui no artigo 34.º, n.º 2 CPC
perante um incidente que corre junto de um tribunal que decide a causa principal
Caso seja recusado o respetivo suprimento judicial, haverá a suspensão do Réu da instância, nos termos
do artigo 29.º, n.º 2 CPC, para o qual o artigo 34.º, n.º 2 CPC remete.
Suprimento da ilegitimidade (em geral)
Consideramos um grupo de hipóteses de ações que devem ser propostas por ambos ou contra ambos
os cônjuges e a não verificação deste pressuposto tem como consequência o surgimento de uma
exceção dilatória por preterição das regras de legitimidade processual – artigo 577.º, al. e) CPC
Se a instância não for regularizada, no limite, pode ter lugar à absolvição do Réu da instância, nos
termos do artigo 278.º, n.º 1, d) CPC. Mas o juiz, nos termos do artigo 6.º, n.º 2 CPC, deve convidar
as partes à regularização da instância.

Temos aqui duas hipóteses:


• Tratando-se de um caso de ilegitimidade ativa (uma ação que deveria ter sido intentada por ambos
os cônjuges), são configuráveis as seguintes formas de sanação:

a. Ao nível substantivo, pode o cônjuge obter o consentimento do outro cônjuge – artigo 34.º,
n.º 1 CPC e 1684.º CC. E depois pode haver suprimento judicial nos termos que acabamos
de ver.

b. No plano processual, pode o cônjuge cuja presença haja sido preterida intervir
espontaneamente na ação através da dedução do incidente da intervenção principal
espontânea – artigo 311.º CPC, como pode também ser pedida a intervenção principal deste
outro cônjuge através do incidente da intervenção principal provocada – artigo 316.º CPC
Em qualquer um destes casos (espontânea e provocada), uma vez que nestes casos de
ilegitimidade ativa o que se pretende é que o cônjuge que não moveu a ação possa manifestar
o seu entendimento quanto à ação proposta pelo outro cônjuge, será ainda necessário para a
regularização da instância, que este cônjuge entretanto chamado manifeste o seu consentimento
com a propositura daquela concreta ação e ratifique a atividade processual desenvolvida pelo
outro cônjuge.

Se o outro cônjuge recusar intervir no processo ou não ratificar o processado, então resta ao
autor a possibilidade de obter o suprimento judicial do consentimento, suspendendo-se a
instância e aplicando-se as regras do processo de jurisdição voluntaria constantes do artigo
1000.º CPC. Nos termos do artigo 34.º, n.º 2 CPC trata-se de um incidente que correrá junto
do tribunal que decide a causa principal. Se não for procedente, ou seja, se não se obter o
suprimento judicial do consentimento, absolve-se o Réu da instância nos termos do artigo 29.º,
n.º 2 CPC

• Tratando-se de um caso de ilegitimidade passiva (uma ação deveria ter sido intentada contra ambos
os cônjuges), o que vai acontecer é que o tribunal, em princípio, no despacho pré-saneador, vai
conceder um prazo para a intervenção do outro cônjuge ou para que ele seja chamado, ou seja, a
instância pode ser regularizada através da intervenção principal espontânea do outro cônjuge ou
através do chamamento do outro cônjuge através do incidente da intervenção principal provocada.
se isso não acontecer o tribunal deverá absolver o Réu da instância, sendo certo que mesmo depois
do transito em julgado desta decisão de absolvição, pode ser deduzido o incidente da intervenção
principal provocada (no prazo previsto nessa norma) – artigo 261.º, n.º 2 CPC

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PLURALIDADE SUBJETIVA SUBSIDIÁRIA


É uma hipótese que cabe ainda mencionar dentro das situações comuns de pluralidade subjetiva e que
foi introduzida em 1995 – trata-se da hipótese de, na propositura de uma ação, duas ou mais partes
demandam ou são demandadas em relação de subsidiariedade. Significa que caso o primeiro pedido
com as partes colocadas em primeira linha não proceda, o tribunal passa a conhecer da relação jurídica
das partes subsidiárias e, portanto, estamos perante uma disposição (artigo 39.º CPC) que permite dar
uma forma processual às hipóteses em que existe uma dúvida quanto ao verdadeiro titular subjetivo da
posição jurídica que se pretende exercer no processo.
Ora, com a presença de todos os potenciais interessados garante-se a definitiva resolução da lide.
Na medida em que a parte subsidiaria pode ser realizada até ao termo da fase dos articulados (artigo
316.º, n.º 2 e 318.º, n.º 1, al. b) CPC), permite-se ainda com esta possibilidade prolongar o efeito útil
da primitiva ação, isto é, no caso de o reu alegar na contestação ser outro o titular passivo da relação
controvertida pode o autor deduzir um pedido subsidiário contra tal sujeito.
Em vez de ação terminar com uma absolvição do pedido, se o tribunal vier a concluir que é outra a
parte material da relação controvertida, consegue-se resolver definitivamente na ação a questão da
titularidade passiva da ação, condenando-se a parte subsidiária, se for esse o caso.
Ex.: quando um autor intenta uma ação e há dúvidas quanto ao titular passivo da relação material
controvertida (mas as dúvidas podem ser quanto ao titular ativo) – imagine-se uma ação de
responsabilidade civil movida contra dois sujeitos, pelo facto de o autor ignorar quem é que praticou o
facto lesivo OU uma ação proposta contra dois sujeitos por o autor ignorar se aquele que agiu o fez em
nome próprio ou em nome de outrem.
Consoante estejamos perante a presença de uma ou várias relações jurídicas, estaremos perante uma
situação de litisconsórcio ou coligação.

APENSAÇÃO DE AÇÕES
Até agora consideramos casos de pluralidade de partes numa concreta ação, admite-se, no entanto, uma
outra coisa que é o regime: nos termos do regime de apensação de ações (artigo 267.º CPC), admite-
se que ações que foram regularmente propostas em separado venham a ser apensadas para que haja
uma tramitação em conjunto dessas diferentes ações apensadas. Portanto, elas foram intentadas
separadamente (são ações diferentes), mas podem ser apensadas para efeitos de ter lugar uma
tramitação conjunta.
Ao contrário do que acontece nas situações de pluralidade de partes na ação, na apensação o que existe
é uma mera agregação externa de ações que são autónomas (há uma agregação externa para efeitos
de ter lugar uma atividade processual conjunta). O que está em causa é o princípio de economia
processual e a garantia de uniformidade de julgados – economia essa que se obtém através da instrução,
discussão e julgamento em conjunto das diferentes causas.
Ora, podem distinguir-se dois grupos de causas de apensação de ações:
• Pode essa apensação resultar de uma prescrição normativa expressa (a lei impor a
apensação) – estaremos neste âmbito quando é a própria lei que dispõe perante várias ações
autónomas com certas características que elas devam ser apensadas – nos termos do artigo
60.º, n.º 2 CSC, se estiverem pendentes ações de anulação da mesma deliberação social,
mesmo que elas tenham diferente fundamento, devem ser apensadas.

• Pode resultar dos critérios gerais do CPC – os requisitos gerais estão previstos no artigo
267.º, n.º 1 CPC – a apensação é admissível quando se verifiquem os pressupostos do
litisconsórcio, da coligação, da oposição (artigos 333.º e ss. CPC) ou da reconvenção (artigo
266.º CPC).
Rita Nunes 113
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Quando estiverem verificados estes pressupostos pode haver apensação de ações nos termos
gerais.

A apensação pode ser requerida por qualquer parte com interesse atendível na junção (artigo 267.º, n.º
1 CPC), através de um requerimento que deve ser dirigido ao tribunal em que esteja pendente o
processo a que os outros devem ser apensados (artigo 267.º, n.º 3 CPC).
As outras partes devem ser notificadas para se pronunciarem (princípio do contraditório – artigo 3.º,
n.º 3 CPC); não se encontra fixado o momento em que deve ser requerida a apensação – à partida, as
razoes de conveniência que guiam este regime sugerem que a apensação deve ser requerida antes da
instrução e discussão da causa, mas nada obsta a que mesmo nesta fase do processo a apensação ainda
possa ser conveniente.
A apensação deve ser rejeitada quando (artigo 267.º, n.º 1 CPC) o estado do processo ou outra razão
especial torne inconveniente a apensação.
Refira-se ainda o artigo 267.º, n.º 2 CPC, que diz que os processos são apensados ao que tiver sido
instaurado em primeiro lugar, salvo se os pedidos forem dependentes uns dos outros, caso em que a
apensação é feita na ordem da pendência, ou se alguma das causas pender em instância central, a ela
se apensando as que corram em instância local (matéria da competência).
Por último, nos termos do artigo 267.º, n.º 4 CPC, quando se trate de processos que pendam sobre o
mesmo juiz, este pode determinar oficiosamente, depois de ouvidas as partes, a respetiva apensação
(artigo 267.º, n.º 4 CPC).

INCIDENTES DE INTERVENÇÃO DE TERCEIROS


O meio processual adequado para promover o ingresso de novas partes no processo é o recurso aos
incidentes de intervenção de terceiros, pelo que se impõe o seu tratamento sistemático, seja para
conhecer as suas características e o seu modo próprio de tramitação, seja porque é a propósito destes
incidentes de intervenção de terceiros que surgem duas figuras: figura do opoente e parte acessória.
Os diferentes incidentes de intervenção de terceiros podem agrupar-se de acordo com dois critérios: o
da iniciativa para o ingresso e nessa medida pode tratar-se de uma intervenção espontânea ou
provocada e, por outro lado, mediante a posição que o interveniente vai ocupar no processo e, nessa
medida, poderá tratar-se de uma parte principal, englobando aqui a figura do opoente, ou de uma
parte acessória.
A exposição subsequente tem por base a intervenção que o interveniente vai ocupar na ação em curso,
o que significa que vamos começar pela intervenção principal (primeiro incidente)

→ Incidente da intervenção principal


A intervenção principal pode ser espontânea ou provocada. Tem legitimidade para ser chamado ou para
intervir espontaneamente como parte principal, ao abrigo deste incidente da intervenção principal,
aquele que nos termos das alegações das partes seja titular ativo ou passivo da relação material
controvertida alegada, sendo certo que o réu também tem uma palavra a dizer no que diz respeito à
configuração desta relação.
NOTA PRÉVIA – tem-se colocado nos tribunais a seguinte questão: se for requerida a intervenção
principal de um sujeito (espontânea ou provocada), mas não estão verificados os pressupostos para essa
intervenção, mas estando verificados os pressupostos para a intervenção como parte acessória, Quid
Iuris? Pode o tribunal admitir a intervenção, mas a um título diferente do que foi requerido? Depende.

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Ora, a intervenção a título principal deve ser negada, porque não estão verificados os pressupostos,
mas depois a resposta depende → O requerimento dirigido ao tribunal é um ato declarativo e, portanto,
deve ser interpretado (artigo 236.º CC). Ora, se o tribunal puder concluir que foi requerida a
intervenção principal mas mal, e aquilo que se queria era intervir a título acessório, o tribunal admite;
no entanto, se a intenção era mesmo intervir a título principal, ainda que sem esses requisitos, não
admite

INCIDENTE DE INTERVENÇÃO PRINCIPAL ESPONTÂNEA


Destina-se a facultar o ingresso no processo de um terceiro como parte principal por sua própria
iniciativa (ex sponte sua). Nos termos do artigo 311.º CPC, esta possibilidade só é admitida quando o
terceiro interveniente tenha um interesse igual ao do autor ou do reu nos termos dos artigos 32.º, 33.º
e 34.º CPC (disposições que regem o litisconsórcio).
Em todo o caso e, aliás, por força desta remissão, será de admitir a entrada de um qualquer sujeito que
não tendo rigorosamente um interesse igual pudesse, no entanto, ser litisconsorte (para o poder ser, há
casos em que o interesse não tem de ser exatamente igual – ex.: relações de dependência jurídica,
como acontece na fiança: o fiador pode intervir com o devedor em litisconsórcio, mas a sua posição
não é igual).
Quando se possa formar um litisconsórcio, o terceiro pode requerer a sua intervenção como parte
principal (artigos 32.º, 33.º e 34.º CPC). A estes casos deve acrescentar-se, embora a lei não o preveja,
as hipóteses de coligação → embora o CPC não o diga, é de entender que nos casos de coligação
NECESSÁRIA (e não voluntária) que deve existir a possibilidade de regularização da instância,
regularização essa que pressupõe o recurso ao incidente da intervenção principal espontânea ou de
intervenção principal provocada.

Seguro é que nos casos de coligação voluntária não se admite o recurso a este incidente – afastada pela
revisão do CPC de 2013. Não fica, no entanto, inteiramente vedada a possibilidade de existir uma
tramitação conjunta das ações – diferentes ações que dizem respeito a relações conexas e que poderiam
ser agregadas na mesma ação.
Porque não fica totalmente vedada? Pode ser intentada uma nova ação e, depois, ser requerida a
apensação. Uma das hipóteses da apensação é aquela em que estejam reunidos os pressupostos da
coligação.

Requerida a intervenção, o requerimento é apresentado a despacho liminar, através do qual ou o


tribunal recusa liminarmente o pedido (se faltarem os pressupostos da intervenção – ex.: o terceiro
invoca a titularidade de uma relação jurídica estruturalmente autónoma daquela que é a relação litigada
na ação), ou, caso contrário, não havendo razoes para recusar liminarmente o pedido, devem ser
notificadas as partes primitivas para responderem ao requerimento (artigo 315.º, n.º 1 CPC)
Em seguida, o juiz decide no âmbito daquele incidente, ora admitindo a intervenção do terceiro, ora
não admitindo e assim termina o procedimento de intervenção (consoante a decisão que seja tomada,
a instancia modifica-se nas suas partes subjetivas ou não, consoante o juiz admita ou não a sua
intervenção no processo).

A intervenção principal espontânea pode revestir duas modalidades, consoante o modo como o terceiro
intervém (artigo 312.º CPC):

Rita Nunes 115


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• Pode tratar-se de uma intervenção por apresentação de articulado próprio – na medida em que se
trata de uma nova peça processual, onde potencialmente se dá conta de certos factos e
fundamentação própria, se assim é, então esta intervenção só é admitida até ao termo da fase dos
articulados – artigo 314.º CPC – porque esta é a fase do processo que se destina à composição do
objeto da lide
NOTA: deverá entender-se que a fase dos articulados termina com o primeiro ato da fase seguinte (o
despacho pré-saneador é o primeiro ato possível da fase seguinte)
Sendo admitida, seguem-se os demais articulados, contando-se o prazo para a sua apresentação da
notificação do despacho que tenha aceite a intervenção – artigo 315.º, n.º 2 CPC.

• Pode tratar-se de uma intervenção por adesão aos articulados da parte a quem ele se pretende
associar – realizada através de simples requerimento, em que o interveniente faz seus os articulados
do autor ou do réu consoante a parte a que se associa – artigo 313.º, n.º 2 CPC. Aqui o interveniente
limita-se a aderir aos articulados da parte a quem se associa.
Trata-se de uma modalidade de intervenção admissível a todo o tempo, enquanto não estiver
definitivamente julgada a causa (ou seja, é possível ainda que na fase de recurso) – artigo 313.º, n.º 2
CPC. Só não será admissível, nos termos do artigo 313.º, n.º 4 CPC, quando a parte contrária alegar
fundadamente que o estado em que o processo está já não lhe permite fazer valer o meio de defesa
processual que tenha contra o interveniente.
Ex.: na compensação de crédito uma parte poderia ter tido a possibilidade de a invocar contra o
interveniente, mas deve ser feita em reconvenção (artigo 266.º, n.º 2, al. c) CPC). Portanto, o estado
do processo pode já não permitir a invocação da compensação de créditos.
O aderente sujeita-se a aceitar a causa no estado em que se encontrar, sendo considerado revele quanto
aos atos e termos anteriores, mas gozando do estatuto de parte principal a partir do momento da sua
intervenção – artigo 313.º, n.º 3 CPC.

INCIDENTE DE INTERVENÇÃO PRINCIPAL PROVOCADA – artigo 316.º e ss. CPC


É um grupo de casos em que a intervenção vai resultar de uma interpelação que alguma das partes
primitivas dirige ao terceiro. Este incidente destina-se a proporcionar o ingresso na instância de
possíveis litisconsortes do autor ou do réu – portanto, a vinda ao processo de novas partes em hipótese
de litisconsórcio – e em casos de coligação necessária, embora a lei não preveja diretamente.

Seguindo a estrutura do artigo 316.º CPC, cabe agora considerar 3 grupos de casos para os quais o
atual regime do CPC permite a intervenção principal provocada:
1. Casos de litisconsórcio necessário – isto quer dizer que se estivermos perante um caso de
litisconsórcio necessário (seja ativo, passivo, ou misto) em que estamos perante uma exceção
dilatória sanável pelo recurso a este incidente, quer o autor quer o réu podem ter a iniciativa de
abrir este incidente.
Admite-se a intervenção principal provocada, em primeiro lugar, para corrigir a preterição de um
litisconsórcio necessário. O incidente pode, neste caso, ser deduzido, quer pelo autor, quer pelo réu,
sendo a forma de sanar a ilegitimidade processual decorrente da preterição das regras da
legitimidade processual (forma de sanar a respetiva exceção dilatória).
Nos termos do artigo 318.º, n.º 1, al. a) CPC, o incidente deverá ser deduzido até ao termo da fase
dos articulados, mas a norma ressalva o disposto no artigo 261.º CPC (regra que permite a dedução
do incidente já depois de proferida a sentença de absolvição, inclusive já depois do transito em
julgado desta decisão – n.º 1 e n.º 2).
Rita Nunes 116
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Há jurisprudência que se pronuncia no sentido de que é possível recorrer a este incidente mesmo
depois da fase dos articulados, já que, lê-se em alguns Acórdãos, mal se compreenderia que as partes
tivessem que aguardar a decisão de absolvição da instância para poderem recorrer a este incidente
e regularizar a instância (isto sempre de acordo com a ressalva do regime do artigo 261.º CPC).

2. Casos de litisconsórcio voluntário por iniciativa do autor – a intervenção principal pode ser
desencadeada pelo autor para chamar novos réus à instância em litisconsórcio com os primitivos
réus (litisconsórcio necessário passivo) ou para deduzir um pedido subsidiário – artigo 316.º, n.º
2 CPC
Portanto, para além das hipóteses em que estamos perante a preterição de um litisconsórcio
necessário, há mais estas duas causas que facultam o chamamento de novos réus pelo autor: a
verificação dos pressupostos do litisconsórcio voluntário para o lado passivo ou a verificação dos
pressupostos da pluralidade subjetiva subsidiária nos termos do artigo 39.º CPC.
Em qualquer um destes casos, um pedido de intervenção pode servir para adaptar a instância às
alegações feitas pelo réu na contestação. Perante a alegação feita pelo réu de que existem outros
titulares da relação jurídica ou de que é um terceiro o seu titular, o autor solicita a sua integração na
instância – ex. para o primeiro caso: o réu, na contestação, vai alegar que um certo facto danoso que
lhe é imputável, na verdade, foi também praticado por um terceiro – pode o autor, perante esta
contestação, pretender demandar também o referido terceiro, com base no disposto no artigo 490.º
CC → se forem vários os autores do ato, os vários respondem // ex. para o segundo caso das várias
hipóteses de pluralidade subjetiva subsidiária – hipóteses típicas em que o réu, na contestação, vem
dizer que um determinado facto lesivo não foi praticado por si, mas por um terceiro. Ora, o autor
pode chamar o terceiro para deduzir subsidiariamente contra ele o pedido que deduziu
primariamente contra o réu primitivo.

Nestes casos, o articulado do réu contribui também para modelar a legitimidade para a ação – uma
vez que o réu alegou que certo terceiro é titular daquela relação, a partir desta alegação do réu, o
terceiro torna-se parte legítima da ação (até ao momento não era, mas passa a ser). Assim, a
contestação também tem uma palavra a dizer no que diz respeito à modelação da legitimidade da
ação.
O que o autor não pode fazer é chamar à instância outros autores a título de litisconsórcio voluntário
ativo – é uma solução que pretende respeitar as posições jurídicas dos diferentes possíveis autores
que são autonomizáveis; deixa-se ao titular a liberdade de escolher exercer ou não as posições
jurídicas de que é titular, pelo que, no fundo, trata-se de respeitar a autonomia individual e, como
falamos de posições autonomizáveis, estamos no âmbito do litisconsórcio voluntário
Este interesse só deve ceder no confronto com o contra interesse do réu em pretender ver resolvida
definitivamente naquela ação a sorte da relação jurídica litigada, em relação a todos os titulares.
Portanto, o réu pode chamar outros litisconsortes voluntários ativos para proteger a sua posição,
resolvendo definitivamente a sua questão naquela relação jurídica, mas o autor não pode chamar
outros litisconsortes voluntários ativos
Depois, dispõe o artigo 318.º, n.º 1, al. b) CPP que pode a intervenção principal provocada ser
requerida até ao termo da fase dos articulados, que se entende terminar com a prática do primeiro
ato da fase processual seguinte e não com o ultimo articulado (repare-se que um dos objetivos do
recurso a este incidente neste grupo de casos é que o autor possa adaptar a instancia à defesa
apresentada pelo réu e a contestação é, em principio, o ultimo articulado → se o autor só pudesse
requerer a intervenção até ao ultimo articulado, significava que poderia ter de o fazer antes da
contestação).

Rita Nunes 117


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3. Casos de litisconsórcio voluntário por iniciativa do réu – o chamamento pode ser da iniciativa
do réu, uma vez verificados os pressupostos do artigo 316.º, n.º 3 CPC.
São duas as causas que justificam esta iniciativa pelo réu: a entrada na ação de outros litisconsortes
voluntários passivos OU o ingresso na ação de possíveis contitulares do direito invocado pelo autor
(portanto, a título de litisconsórcio voluntário ativo)
A primeira hipótese que justifica o litisconsórcio voluntário por iniciativa do réu é a verificação
dos pressupostos do litisconsórcio voluntário passivo – artigo 316.º, n.º 3, al. a) CPP –,
aumentando-se, desta forma, por iniciativa do réu, o âmbito subjetivo dos efeitos da procedência do
pedido – ex.: pode o fiador que seja demandado sozinho pedir a intervenção na instância do seu
devedor (artigo 641.º, n.º 1 CC)
Em suma, em caso de litisconsórcio voluntário passivo, a iniciativa da sua formação pode ser do
réu.
NOTA: talvez seja de fazer aqui uma interpretação restritiva – a lei não diz, nem sequer a doutrina,
mas é um princípio do processo civil que só deve ser admitido a litigar aquele que tem alguma coisa
a ganhar ou a perder com aquilo que foi pedido na ação. Ora, pode haver casos em que não haja
interesse no chamamento por parte do réu de outros litisconsortes voluntários passivos – ex.: é
razoável que o fiador possa chamar o devedor (porque o fiador, se cumprir, vai ficar sub-rogado na
posição jurídica que o devedor tem com o credor), mas se estiver na ação o devedor, faz sentido
chamar o fiador? Não parece.
Se estiverem na ação o fiador e o devedor, eles estão a título de litisconsórcio voluntário passivo e,
portanto, seria um caso admissível; mas há interesse neste chamamento (o devedor chamar o
fiador)? Poderá, por exemplo, o comissário que seja demandado sozinho chamar o comitente? Se
não houver culpa in eligendo ou culpa in instruendo, sendo demandado o comissário, o comissário
tem interesse em chamar o comitente? Talvez não haja aqui concretamente interesse em agir –
eles são responsáveis solidários e se estão os dois na ação estão a título de litisconsórcio voluntário
passivo, mas o comissário que seja demandado sozinho não tem interesse em chamar o comitente
no que diz respeito a este concreto incidente.

É também de admitir o chamamento por iniciativa do réu, quando o réu pretenda provocar uma
intervenção na ação de possíveis contitulares do direito ou da posição jurídica que o autor exerce,
ou seja, chamar eventuais litisconsortes voluntários ativos, coisa que o autor não pode fazer – artigo
316.º, n.º 3, al. b) CPC – ex.: casos de legitimidade extraordinária - sendo uma ação de reivindicação
intentada por um dos comproprietários (se agem em conjunto será a titulo de litisconsórcio
voluntario ativo, porque a lei permite que atuem individualmente) pode o réu chamar os demais
comproprietários, formando um litisconsórcio voluntário ativo. Esta regra pretende oferecer ao réu
um meio de tutela contra a propositura de novas ações com o mesmo objeto processual movida
pelos demais titulares da posição jurídica (caso julgado secundum eventum litis).

Ainda dentro destas hipóteses de desencadeamento do incidente da intervenção principal provocada


por iniciativa do réu, fora dos casos de litisconsórcio necessário, encontra-se previsto um regime
especial para as obrigações solidárias → nos termos do direito material (artigo 512.º, n.º 1 CC), neste
regime de obrigações de titularidade plural, o cumprimento da obrigação pode ser exigido a qualquer
um dos codevedores, pelo que há um dever de prestação integral. Sendo cumprida a obrigação por um
dos codevedores há um efeito extintivo recíproco, ou seja, todos os codevedores, perante o credor,
ficam liberados, o que significa que apenas ao nível das relações internas (dos codevedores entre si) é
que há diferentes quotas de responsabilidade.

Rita Nunes 118


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Isto significa que se um dos codevedores satisfizer a prestação em montante superior à sua quota interna
de responsabilidade terá um direito de regresso contra os demais codevedores na parte que,
internamente, a estes compete – artigo 524.º CC.
O meio processual próprio para o exercício destas posições jurídicas é a intervenção principal
provocada, ou seja, nesta hipótese o chamamento pode ter por fim o reconhecimento, mas não só,
também a condenação na satisfação do direito de regresso que lhe possa vir a assistir (ao devedor que
foi demandado sozinho) se tiver que realizar a prestação na sua totalidade – artigo 317.º, n.º 1 CC.
À luz deste regime, há um pedido que é formulado pelo réu contra os seus litisconsortes para a
eventualidade de ser condenado, o que significa que, rigorosamente, temos dois pedidos – o pedido do
autor contra o réu (com vista à satisfação da totalidade do crédito por parte daquele réu) e o pedido do
réu contra os seus litisconsortes/ codevedores (no que diz respeito ao eventual direito de regresso que
se venha a constituir). Portanto, temos dois pedidos com partes diferentes na mesma ação e esta é a
especialidade deste regime. Alem do mais, isto explica o que está previsto no artigo 317.º, n.º 2 CPC
(“No caso previsto no número anterior, se apenas for impugnada a solidariedade daa dívida e a
pretensão do autor de imediato ser julgada procedente, é o primitivo réu logo condenado no pedido
no despacho saneador, prosseguindo a causa entre o autor do chamamento e o chamado, circunscrita
à questão do direito de regresso.”, ou seja, se não for posta em causa a existência de crédito, mas for
impugnada a solidariedade da divida, pode no despacho saneador o tribunal condenar o réu primitivo
no pedido que o autor deduziu e o autor sai da instância, já tendo um caso favorável. Como foi posta
em causa a solidariedade da divida, a ação continua, não com o autor, mas com o réu primitivo e os
demandados, isto é, as pessoas que o réu chamou para ser reconhecido o seu direito de regresso contra
elas e para serem condenadas a título de direito de regresso.
NOTA: este é um caso de litisconsórcio voluntário passivo, que é desencadeado pela iniciativa do réu
e é especial, porque aqui não se trata de o réu chamar outros sujeitos daquela relação material para
serem condenados conjuntamente com ele.
Quer os casos do artigo 316.º, n.º 3 CPC, quer os casos do artigo 317.º CPC, em qualquer um deles,
deve o pedido ser deduzido na contestação ou, não pretendendo o réu contestar, em requerimento no
prazo de que dispõe para o efeito – artigo 318.º, n.º 1, al. c) CPC.

TRAMITAÇÃO E EFEITOS DA INTERVENÇÃO PROVOCADA (EM GERAL)


Requerida a intervenção, o juiz deve ouvir a parte contrária, decidindo depois a admissibilidade do
chamamento (artigo 318.º, n.º 2 CPC). Se for admitido o chamamento, o interessado é chamado
mediante citação para a ação (vai ser citado, nos termos do artigo 319.º, n.º 1 CPC) → o chamamento
é sempre precedido de uma apreciação judicial liminar (caso em que a lei prevê a existência de
despacho liminar) – artigo 226.º, n.º 4, al. d) CPC
Tal como acontece na intervenção espontânea, o chamado pode apresentar um articulado próprio ou
aderir aos articulados da parte em que se associa (é uma opção do interveniente). Em todo o caso,
admitida a intervenção, é dada ao interveniente a possibilidade de apresentar um articulado, no prazo
para a contestação (artigo 318.º, n.º 1, al. c) CPC – prazo de 30 dias [artigo 569.º, n.º 1 CPC], seguindo-
se os demais articulados).
O efeito específico da intervenção provocada é modificar subjetivamente a instância. A decisão que
venha a ser proferida sobre o mérito da causa constitui caso julgado em favor do chamado, que vai
arcar com os efeitos da ação – artigo 320.º CPC (corresponde à regra geral do caso julgado).
Mesmo que não intervenha efetivamente no processo, o chamado está sujeito aos efeitos da ação, ou
seja, trata-se de ficar sujeito e não ter de aceitar os efeitos de ação – dito de outra forma, o chamado
não pode recusar os efeitos do chamamento (não é uma opção sua – fica sujeito ao caso julgado mesmo
que não tenha uma intervenção efetiva no processo).
Rita Nunes 119
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INCIDENTE DA OPOSIÇÃO
Estivemos a ver situações normais em que num processo há dois polos processuais – o lado ativo e o
lado passivo, sendo que pode haver uma pluralidade de partes, quer de um lado como de outro. Os
incidentes que vimos até agora servem para, em algum destes polos (passivo ou ativo), criar uma
pluralidade.
Mas, em lugar de haver um processo com dois polos processuais, pode haver lugar a uma verdadeira
triangularidade processual, quando contra o Autor e Réu seja ou venha a ser admitido um opoente.
Trata-se de uma verdadeira parte principal, que é considerada a propósito deste incidente da oposição,
que faz valer no confronto com ambas as partes um direito próprio (isto partindo da configuração da
oposição espontânea – artigo 333.º, n.º 1 CPC).
Portanto, opoente é aquele que no confronto com a posição do Autor ou do reconvinte é admitido a
litigar em defesa de uma posição jurídica própria – o exemplo clássico de oposição é a intervenção do
alegado titular do direito em ação respeitante ao bem objeto do seu alegado direito (ex.: imagine-se
uma ação de reivindicação em que A reivindica uma coisa de B – depois, há um terceiro que diz que
aquilo não é nem do Autor [A] nem do Réu [B] → portanto, tem uma posição jurídica própria que não
se reconduz nem à posição do Autor, nem do Réu [é verdadeiramente um terceiro polo processual].
NOTA: isto no âmbito da oposição espontânea).
Não obstante o opoente ser uma parte principal (e não acessória), a oposição distingue-se do incidente
da intervenção principal em virtude do modo como a posição do interveniente se articula com a da
parte na instância. Isto é, na intervenção principal o interveniente vem, se for admitida a sua vinda ao
processo, ocupar uma posição paralela e, nessa medida, não conflituante com a posição do Autor; já na
oposição vem a ocupar uma posição conflituante com a do primitivo Autor. →“Por via do incidente
da oposição, o opoente «atravessa-se» numa ação pendente para fazer valer uma posição jurídica
própria” (Código Anotado de José Alberto dos Reis)

Claro que as consequências na conformação da instância são diferentes, porque a pretensão do opoente
pode ser reconhecida por algumas partes na instância, mas também pode não ser reconhecida:
• Se for reconhecida por alguma das partes, a ação prossegue com a outra parte e com o
opoente
• Mas se nenhuma delas aceita a posição do opoente, então passam a existir duas ações
conexas (uma entre as partes primitivas e uma entre elas e o opoente)

Ainda de um ponto de vista geral, tratando-se do ingresso na ação de uma nova parte principal sujeita
ao estatuto de opoente coloca-se um problema específico de legitimidade – tem, legitimidade para ser
opoente aquele que nos termos dos articulados processuais alega ter um direito total ou parcialmente
incompatível com a pretensão deduzida pelo autor ou pelo reconvinte OU que é chamado para deduzir
uma posição própria conflituante com a do autor ou reconvinte.

São duas as modalidades de oposição, consoante a iniciativa:


• ESPONTÂNEA – artigo 333.º a 337.º CPC
No caso de oposição espontânea, o opoente tem legitimidade para a ação na medida em que, no seu
próprio articulado (no articulado que apresente), ao qual se aplicam as regras vigentes para a petição
inicial (artigo 334.º e 552.º CPC), afirma uma posição incompatível com a do Autor ou do Reconvinte
– artigo 333.º, n.º 1 CPC
O principal exemplo de oposição, como vimos, contante das ordenações filipinas é a intervenção na
ação daquele que se considera titular do direito litigado pelas partes na instância.

Rita Nunes 120


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A oposição é deduzida por via de petição (artigo 334.º CPC), à qual se aplicam as regras da petição
inicial, com as necessárias adaptações (artigo 552.º CPC). No que diz respeito ao termo da intervenção,
ela só é admitida enquanto não estiver designado o dia para a audiência final em primeira instância, ou,
não havendo lugar a audiência final, enquanto não tiver sido proferida sentença – artigo 333.º, n.º 2
CPC
Pode não haver audiência final nas hipóteses de revelia operante (artigo 567.º CPC); quando o tribunal
conhece do pedido em despacho saneador (artigo 595.º, n.º 1, alínea b) CPC) e nos processos especiais
sem audiência final.
A oposição está sujeita a despacho liminar (artigo 335.º CPC). Se for admitida, o opoente adquire a
posição de parte principal e deverão ser notificadas as partes primitivas para contestarem o seu pedido,
no praxo ordinário da ação principal – artigo 335.º, n.º 1 CPC. No n.º 2 deste artigo lê-se que os
articulados seguem a forma do processo aplicável à causa principal, limitados, no entanto, à questão
suscitada no incidente.
Como já se disse, consoante a atitude das partes primitivas em relação à pretensão do opoente, podem
ser diferentes as consequências sobre a ação principal. Aquilo que cabe distinguir é entre o
reconhecimento ou a contestação da pretensão que ele apresenta no seu articulado: se for reconhecida,
então o opoente vai adquirir a posição de Autor ou de Réu, consoante aquele que reconheça a sua
posição (artigo 337.º, n.º 1 CPC) e, nesse caso, uma das partes principais abandona a ação. Se não for
reconhecida a sua posição por nenhuma das partes, a instância continua com três partes, havendo duas
causas conexas (uma entre as partes primitivas e uma entre as partes primitivas e o opoente – artigo
337.º, n.º 2 CPC).
Claro que o opoente afirma um direito contra o Autor e contra o Réu.
Ora, terminados os diferentes articulados relativos à oposição, procede-se ao saneamento e
condensação quanto à matéria do incidente – artigo 336.º CPC.

• PROVOCADA – artigo 338.º a 341.º CPC


Trata-se de um incidente que só pode ser deduzida pelo Réu ou pelo reconvindo e que tem em vista
oferecer um meio de atuação preventiva àquele que pretendendo cumprir o quer lhe está a ser exigido,
mas tem dúvidas fundadas relativas ao titular ativo da prestação e, portanto, o Réu ou reconvindo
pretendem obstar, quando recorrem a este incidente, à realização da prestação àquele que dúvida ser o
titular do direito.
Ou seja, pretende evitar cumprir face àquele que tem dúvidas que seja o verdadeiro titular do direito
(querem cumprir bem; querem cumprir face àquele que é o verdadeiro titular do direito). Neste sentido,
pretendem prevenir o risco que o cumprimento que aconteça não seja considerado liberatório (não
libere o devedor da sua obrigação [isto porque a regra no Código Civil é que o cumprimento só é
liberatório se for realizado ao credor da prestação]).
NOTA: aliás o Réu corre mesmo de entrar numa situação de incumprimento definitivo se se tratar de
uma coisa infungível e não realizar a prestação perante o verdadeiro credor

Exemplos:
→ Caso de cessão de créditos – a cessão foi notificada ao devedor pelo alegado cessionário – A é
credor de B e, depois, B (devedor) é notificado por um outro sujeito (C) de que aquele crédito
que A tinha contra B lhe foi cedido – agora é C que exige o cumprimento e B (devedor) tem
receio que não seja e quer chamar A

→ Caso de sucessão – A é credor de B e A falece. Os herdeiros de A vêm exigir judicialmente ao


devedor (B) o cumprimento de um crédito que A tinha contra B. no entanto, B (o devedor) tem a
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suspeita de que aquele crédito que os herdeiros lhe estão a exigir tenha sido atribuído a um
legatário (portanto, se assim for, o titular ativo daquela posição jurídica não são os herdeiros,
mas o legatário. Assim, o devedor quer chamar à ação o legatário).

Ou seja, trata-se de uma modalidade de oposição “para uma hipótese em que o Réu confessa o pedido
perante quem o tribunal declare ser o verdadeiro titular do crédito” (TAVARES DE SOUZA).
Portanto, esta oposição provocada só é permitida quando o Réu não conteste o direito que lhe é exigido,
mas apenas a sua titularidade.
Assim, o pedido de oposição deve ser acompanhado do depósito da quantia (se o que está a ser exigido
é uma quantia pecuniária) ou da coisa devida (se o que está a ser exigido é uma coisa) – artigo 338.º,
parte final CPC.
Admitida a oposição, o terceiro será citado para deduzir a sua pretensão em prazo idêntico àquele que
o Réu tem para a sua defesa – a citação é precedida de despacho prévio (artigo 226.º, n.º 4, al. d) CPC)
e o terceiro é citado com a cominação de que, caso não se oponha (isto é, não venha ao processo deduzir
a sua pretensão) a obrigação é declarada extinta a favor do Autor ou do Réu reconvinte – artigo 339.º
CPC.
Neste caso a sentença é proferida nos termos do artigo 340.º, n.º 1 e n.º 2 CPC e, verdadeiramente, não
é necessária a condenação do Réu, porque este já depositou a coisa ou a quantia devida.
Se, pelo contrário, o terceiro reagir, nesse caso o processo continua a correr entre o primitivo Autor e
o terceiro, sendo o devedor exonerado da prestação – artigo 922.º, n.º 3 ex vi artigo 341.º CPC. A
pretensão do opoente é apresentada com recurso a uma contestação.

Figura da oposição mediante embargos de terceiro – artigo 342.º e ss. CPC


É uma última modalidade de oposição e trata-se de um mecanismo que se encontra ao dispor de um
qualquer sujeito para reagir à prática de atos executivos que ofendam a sua posse sobre um determinado
bem ou seu direito sobre um determinado bem – artigo 342.º, n.º 1 CPC e artigo 1258.º CPC.
O principal ato executivo que pode conflituar com o direito ou a posse de um terceiro é a penhora.
Portanto, ao contrário dos outros casos que vimos, os embargos de terceiro são um incidente de cariz
marcadamente executiva, já que permitem que o embargante reaja face a uma ação executiva do
tribunal.
(ex.: A intentou uma ação executiva contra B para pagamento de quantia certa e nessa ação executiva
é penhorado um bem que pertence a C – C pode reagir a essa penhora mediante o incidente de
intervenção da figura da oposição mediante embargo de terceiro)
NOTA: o regime só veremos para o ano.

INCIDENTE DA INTERVENÇÃO ACESSÓRIA


Ao contrário das hipóteses que consideramos até aqui, a parte acessória não assume nem arca com os
efeitos principais da ação, embora fique vinculada àquilo que se decida na ação (limita-se a ocupar
uma posição subordinada a uma das partes principais).
Portanto, no regime da intervenção acessória cria-se também uma situação de pluralidade de partes
num dos lados da instância, mas, ao contrário do que acontece na intervenção principal, o estatuto que
têm essas partes é diferente. Ou seja, de um lado da instância estão mais do que um sujeito/ mais do
que uma parte, mas essas partes têm um estatuto jurídico diferenciado.

Rita Nunes 122


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São três as modalidades de intervenção acessória:


• INTERVENÇÃO ACESSÓRIA ESPONTÂNEA/ INCIDENTE DA ASSISTÊNCIA –
artigos 326.º e ss. CPC
A assistência pressupõe uma regra de legitimidade especifica. Nos termos do artigo 326.º, n.º 1 CPC
tem legitimidade para esta intervenção quem tenha interesse jurídico numa decisão favorável à parte
que assiste ou que pretende assistir → é assim que o CPC configura a legitimidade para intervir numa
ação espontaneamente como parte acessória ou seja como assistente
TAVARES DE SOUZA “Na mesma instância apresentam-se dois problemas de legitimidade
processual, cada um com um sentido e uma intensidade própria” – o de parte principal, cuja disciplina
se encontra no artigo 30.º, n.º 3 CPC e outro no que diz respeito à parte acessória, em que o critério de
aferição da legitimidade se baseia no interesse jurídico em que a ação seja decidida em favor da parte
assistida.
Trata-se aqui de mais um dos muitos casos em que o texto da lei se serve do termo ‘interesse’, que é
um dos conceitos mais polissémicos do discurso jurídico. Assim o que cabe aqui considerar é qual o
sentido de ‘interesse’ nesta hipótese particular para, assim, determinar quem é que tem legitimidade
para intervir na ação como assistente:
1. Ora, primeiro, não será suficiente que se trate de um interesse intelectual, humanitário ou de uma
simples curiosidade → não merece tutela o interesse puramente intelectual – ex.: caso de um
jurista que estivesse empenhado em ver triunfar uma certa doutrina (tal não é suficiente); também
não é suficiente o interesse de ordem moral – ex.: caso do filantropo que tinha o desejo de ver
vencer a parte mais fraca

2. Ou seja, deverá tratar-se de algo mais que um interesse meramente genérico, ou seja, deverá
existir uma conexão entre a esfera jurídica do assistente e a esfera jurídica da parte assistida. Ao
mesmo tempo, no entanto, não é necessário que o assistente tenha um interesse paralelo e com a
mesma intensidade ao da parte principal; se for esse o caso, ele pode intervir como parte principal
(NOTA: embora seja de admitir, na intervenção acessória espontânea, porque o mesmo não se
pode dizer acerca da intervenção acessória provocada, que aquele que pudesse intervir como
parte principal, pretenda intervir apenas como parte acessória).

Assim sendo, parece que as razões justificativas da assistência são:


→ A titularidade do assistente de uma posição jurídica que esteja na dependência jurídica da relação
que é objeto da instância
→ OU a titularidade pelo assistente de uma posição que esteja dependente da posição jurídica
litigada na ação, mas do ponto de vista da sua consistência económica

Exemplos:
→ Casos de contratos em cadeia com o mesmo objeto
• O locador move uma ação contra o locatário para pôr fim à relação de arrendamento – tem
interesse em intervir na ação ao lado do Réu o sublocatário
(A arrenda a casa a B e nos termos do contrato A autoriza B a fazer um subarrendamento, sendo
que B subarrenda a C → depois A intenta uma ação contra B para pôr fim ao arrendamento. Se
a ação proceder, cai a posição de B e automaticamente, cairá a de C [que está na dependência
da posição de B]. Ora, se B contestar, C tem interesse em intervir).
• Numa ação de revogação com justa causa de um mandato em interesse comum (mandato
também no interesse do mandatário – artigo 1170.º, n.º 2 CC), pode intervir na ação pelas
mesmas razões o submandatário

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→ Ação que é proposta a favor ou contra uma sociedade comercial ou uma ação de
responsabilização dos gerentes ou administradores de uma sociedade comercial, tem interesse
em intervir na ação como assistente o sócio da sociedade comercial (tem interesse, porque o
destino daquela ação vai, mediatamente, afetar a posição do sócio, sócio esse que tem um crédito
de dividendos contra a sociedade).
Nesse sentido, a robustez económica da sociedade tem um efeito mediato no que diz respeito aos
sócios.

→ Se for declarada insolvência de uma pessoa, o seu património passa a ser gerido pelo
administrador de insolvência, que tem legitimidade para ser parte nas ações que digam respeito
ao património que integra a massa insolvente – tem interesse em intervir como assistente/parte
acessória o devedor.

Em qualquer um destes casos o assistente tem uma posição que tem uma consistência jurídica ou
económica que é afetada pela sorte/ destino da ação principal

A assistência é admitida a todo o tempo tendo, porém o assistente que aceitar o processo tal qual o
encontre – artigo 327.º, n.º 1 CPC. A assistência causa pouca perturbação processual – são casos em
que a posição do terceiro que pretende intervir no processo não conflitua com a posição das partes.
O requerimento para a assistência (artigo 327.º, n.º 2 CPC) está sujeito a despacho liminar que pode
ser indeferido ou não. Se não for indeferido será notificada a parte contrária àquela que o terceiro
pretende assistir para se pronunciar – Não havendo motivo para indeferir liminarmente o pedido de
intervenção, ordena-se a notificação da parte contrária à que o assistente se propõe auxiliar; haja ou
não oposição do notificado, decide-se imediatamente, ou logo que seja possível, se a assistência é
legítima – artigo 327.º, n.º 3 CPC

Além do mais, podemos distinguir os efeitos normais e eventuais da assistência:


• O efeito normal é a sua colocação como parte auxiliar da parte principal, ocupando uma
função subordinada;
• Ao passo que o efeito eventual é a sua chamada a substituir a parte principal. Nesse sentido,
via de regra, o assistente limita-se a auxiliar a parte principal – artigo 328.º, n.º 1 CPC.
Em caso de conflito entre os atos praticados pela parte e pelo assistente, prevalece a posição da parte
principal – artigo 328.º, n.º 2 CPC. Ou seja, trata-se aqui de uma atividade de cariz subordinado
(atividade do assistente). Assim, a atividade do assistente completa, mas não supre nem contraria a
atividade da parte principal.
Da mesma forma, o facto de haver assistência não prejudica a parte das partes principais de disporem
sobre o objeto do processo, podendo ser praticados atos de confissão, desistência ou transação, casos
em que cessa a assistência – artigo 331.º CPC.
Naquilo que não conflitue com a posição da parte principal, o assistente é qualificado como parte,
estando sujeito aos mesmos deveres e gozando dos mesmos direitos que a parte assistida (artigo 328.º,
n.º 2 CPC).

• Depõe como parte e não como testemunha (artigo 328.º, n.º 3 CPC).
• Pode-se fazer uso de qualquer meio de prova, mas em matéria testemunhal pode apenas
completar o rol de testemunhas apresentado – artigo 330.º CPC.

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• Em matéria de recursos, em princípio, poderá o assistente, apenas, acompanhar a parte


assistida com a apresentação de alegações destinadas a completar ou a desenvolver os
fundamentos apresentados pela parte principal, porque nos termos do artigo 631.º, n.º 1 CPC,
via de regra, apenas as partes principais podem interpor recurso. Mas, nos termos do n.º 2 do
artigo 631.º já temos um critério material e não formal, sendo que pode recorrer quem tiver
sido direta e efetivamente prejudicado pela decisão proferida.
O efeito eventual da assistência é o seguinte: no caso da eventualidade de a parte assistida ser revele,
o assistente substitui-a – artigo 329.º CPC – atuando, doravante, como parte principal e assumindo os
seus poderes. Ou seja, existe a possibilidade no caso de revelia de o assistente substituir a parte assistida
atuando doravante como parte principal e assumindo os seus poderes.
Trata-se portanto, de uma modalidade de substituição processual ou de legitimidade
extraordinária, em que alguém, a título extraordinário, é admitido a conduzir o processo em relação
a uma posição jurídica alheia. Não obstante, não pode praticar atos que o assistido tenha perdido o
direito de praticar. Por outro lado, uma vez que não é o titular do interesse litigado na ação não pode
confessar (artigo 353.º, n.º 3 CC), desistir, nem transigir (artigo 283.º CPC).
Na medida em que o assistente não é parte principal na instância, ele não será sujeito passivo do pedido
– o objeto do processo conserva-se inalterado (ex.: se o Autor pede a condenação do Réu e depois um
terceiro assiste o Réu, a admissão da assistência não tem como objetivo alargar o âmbito subjetivo do
pedido, ou seja, se a ação proceder, apenas o Réu será condenado e não o assistente).
Os efeitos da assistência são outros → o assistente fica apenas vinculado a aceitar a matéria de facto e
o julgamento de Direito que, no que toca ao âmbito da assistência, se tenha decidido na ação. Só assim
não será em alguma das hipóteses do artigo 332.º CPC. Portanto, nestas hipóteses, fica sujeito aos
efeitos do caso julgado, embora não seja parte do pedido.

• INTERVENÇÃO ACESSÓRIA PROVOCADA – artigos 321.º e ss. CPC – que se destina


ao exercício da ação de regresso contra terceiros
A iniciativa para o ingresso na instância de uma nova parte a título acessório é das partes da instância
que dirigem um chamamento específico a um terceiro para esse efeito. Uma das partes da instância, mais
concretamente o réu. A intervenção acessória provocada só é possível do lado passivo da instância e só
pode ser requerida pelo réu (artigo 321.º, n.º 1 e 322.º, n.º 1 CPC).

De um ponto de vista material, trata-se de uma modalidade de intervenção que só é admitida mediante
a verificação de 2 pressupostos:

i. Por um lado, deve faltar ao chamado legitimidade para intervir como parte principal
da instância. Ou seja, se se tratar de um terceiro que tenha legitimidade para intervir na
ação como parte principal então não pode requerer-se a sua intervenção como parte
acessória (artigo 321.º CPC).

ii. Por outro lado, destina-se este incidente a que o réu possa chamar um qualquer
terceiro contra o qual tenha ação de regresso para ser indemnizado no prejuízo que
cause a perda da demanda/ação.

Mas para este efeito não se deve identificar a ação de regresso com a figura técnica do direito
de regresso tal e qual se encontra prevista para a solidariedade (regime das obrigações
solidárias). Trata-se antes de toda e qualquer hipótese em que se constitua um direito contra
um terceiro destinado a remover o prejuízo que o réu tenha pela procedência da ação
principal.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEÓRICAS

→ Ex. 1: este incidente serve para enquadrar o chamamento por parte do adquirente de um
certo bem daquele de quem adquiriu o bem – caso de uma ação de reivindicação: A
intenta uma ação de reivindicação contra B e B tinha adquirido o bem em causa de C. B
tem de poder chamar C, porque se a ação de reivindicação proceder constitui-se na esfera
jurídica do réu um direito a ser indemnizado por aquele de quem adquiriu o bem (artigo
892.º e ss. do CC).
Ora, o réu pode ter interesse em tornar indiscutível perante aquele de quem adquiriu
o bem a questão da ilegitimidade da transmissão e, por isso, a verificação dos
pressupostos do seu direito contra o alienante e, por isso, tem interesse em chamá-lo
à instância para ele ficar vinculado àquilo que foi decidido nesta ação.

→ Ex. 2: justifica o recurso a este instituto as hipóteses de sucessão subordinada de contratos


com o mesmo objeto – é celebrado um contrato de empreitada e o empreiteiro da obra
para a execução de um determinado contrato celebra um contrato de subempreitada (há
2 contratos); quem responde perante o credor, o dono da obra, é o empreiteiro; o
subempreiteiro é um mero auxiliar (artigo 800.º do CC) que o devedor utilizou no
cumprimento e que não tem legitimidade para ser parte principal na instância.
Portanto, numa ação que seja intentada contra o empreiteiro pode o empreiteiro
chamar o subempreito porque se for condenado e se realmente a culpa dou do
subempreiteiro, depois não tem uma ação de regresso contra si – não é um
chamamento como parte principal, é um chamamento como parte acessória. O réu
neste caso pode chamar o subempreiteiro para ele ficar vinculado ao que for decidido
pelo tribunal.
→ Ex. 3: caso de uma ação contra um mandatário que seja demandado numa ação de
prestação de contas e que pode chamar o submandatário.

→ Ex. 4: chamamento do sublocatário se for intentada uma ação contra o locatário por danos
que sejam causados à coisa locada.

Se tiver dúvidas em relação àquele em relação ao qual tenha direito de regresso é de admitir o
chamamento em relação de subsidiariedade. Para que o indecente seja admitido é necessário,
portanto, que o tribunal se convença que a questão que o réu alega discutir-se em regresso está
na dependência da ação discutida na ação.

Além dos pressupostos anteriormente vistos, há mais 2 requisitos:

1. É pressuposto positivo do chamamento de terceiro a viabilidade potencial da ação de


regresso (artigo 322.º, n.º 1 CPC) – é necessário que a ação de regresso seja viável, ou seja,
está aqui em causa um juízo previsional de aparência de bom direito (fumus boni iuris) no
que diz respeito à ação de regresso.

2. A ação de regresso pode ser recusada quando perturbe indevidamente o normal


funcionamento do processo (artigo 322.º, n.º 2 CPC) – requisito negativo.

Assim como o incidente pode ser desencadeado pelo réu, ele pode ser também desencadeado pelo
chamado (artigo 323.º, n.º 3 CPC). Mediante esta sucessão de chamamentos visa-se trazer à instância
uma cadeia de relações matérias – esta possibilidade traz um risco de causar uma certa morosidade
processual e nessa medida prevê o artigo 324.º CPC o seguinte para acautelar o interesse do autor:
“Passados 60 dias sobre a data em que foi inicialmente deduzido o incidente sem que se mostrem
realizadas todas as citações a que este haja dado lugar, pode o autor requerer o prosseguimento da

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TEÓRICAS

causa principal após o termo do prazo de que os réus já efetivamente citados beneficiaram para
contestar”.
O momento próprio para a dedução do incidente é a contestação (artigo 322.º, n.º 1 CPC). É na
contestação que o réu deve dar conta das razões que entende justificativas do chamamento do terceiro e
também dos elementos aptos a convencer o tribunal da viabilidade da possível ação de regresso que
venha a propor (há aqui um requisito de aparência de bom direito).

A parte contrária é ouvida antes que se decida a intervenção (artigo 322.º, n.º 2 CPC). Se o juiz admitir
o requerimento deverá ordenar a citação de terceiro, que é citado para contestar (artigo 323.º, n.º 1 CPC)
– mais um caso em que existe despacho liminar (artigo 226.º, n.º 4, al. d) do CPC). A parte chamada
goza de um estatuto paralelo ao do assistente (artigos 328.º e ss. ex vi 323.º, n.º 1 CPC), estando a sua
intervenção limitada à discussão das questões que tenham repercussão na ação de regresso (artigo 321.º,
n.º 2 CPC) – goza sempre do direito de contestar.

Também neste caso o chamado não é sujeito passivo do pedido principal – a ação de condenação foi
movida contra a parte principal, a parte acessória não via ser condenada no pedido, mas a sentença
proferida constitui caso julgado quanto ao julgado nos termos previstos no artigo 332.º CPC
relativamente às questões de que dependa o direito de regresso do autor do chamamento (o reu) por este
invocável em anterior ação de indemnização (artigo 323.º, n.º 4 CPC). Portanto, o propósito deste
chamamento é que em posterior ação de regresso o autor dessa ação possa já utilizar com autoridade do
caso julgado os elementos da primeira decisão. A condenação em regresso não vai ocorrer nesta ação –
uma nova ação deve ser intentada.

• Intervenção acessória do MP – artigo 325.º CPC


Não deve confundir-se isto com os casos previstos no artigo 21.º CPC que são os casos em que o MP
representa ao ausente ou o incapaz e também não deve confundir-se com os casos de ações em que o
MP possa intervir como parte principal (artigo 5.º, n.º 1 do estatuto do MP – Lei n.º 47/86 de 15 de
outubro com as respetivas alterações).

Os interesses que justificam a intervenção acessória no MP são aqueles que constam do artigo 5.º, n.º 4
do seu estatuto.

O MP goza dos poderes que se conferem à parte acessória e exerce-os no interesse da parte assistida
(artigo 325.º, n.º 2 do CPC). Pode mesmo agir como substituto processual em caso de revelia do
assistido, mas tem legitimidade para recorrer quando considere necessário para defender o interesse
público ou o interesse da parte assistida (artigo 325.º, n.º 3 CPC).

O n.º 4 do artigo 325.º diz-nos que, podendo oralmente ou por escrito alegar o que entenda conveniente
para defesa dos interesses da parte assistida. O MP é oficiosamente notificado logo que a instância se
inicie (artigo 325.º), ou seja, logo que a petição inicial seja recebida na secretaria, nos termos do artigo
259.º, n.º 1.

Se os pressupostos de que depende a sua intervenção como parte acessória só se constituírem em


momento posterior, então só nesse momento é que ele há de ser chamado. A falta de vista ou exame ao
MP quando ele deva intervir como parte acessória é causa de nulidade processual (artigo 194.º, n.ºs 1 e
2 CPC) de conhecimento oficioso (artigo 196.º CPC), nulidade esta que se considera sanada desde que
a entidade a que devia ser prestada assistência tenha feito valer os seus direitos no processo por
intermedio do seu representante (artigo 194.º, n.ºs 1 e 2 CPC).

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