Em Defesa Da Fé (Apologética) - 2
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Tradução
Alderi S. de Matos
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Pelo mesmo autor
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EDITORA VIDA
Rua Júlio de Castilhos, 280 • Belenzinho
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SALVO El\1 BREVES CITAÇOES, CO:'.I INDICAC,ÃO DA FONIE.
Todas as citações bíblicas foram extraídas da
Nova Versão Internacional (NVI),
©2001, publicada pela Editora Vida,
salvo indicação em contrário.
01-5288 CDD-22ü.6
seu Filho para morrer na cruz por nossos pecados. E ele o ama
tanto que entrará na sua vida e mudará a direção dela e fará de
você uma nova pessoa, não importa quem você seja.
"Você tem certeza que conhece Cristo? Existe um momento
em que o Espírito de Deus o convence, chama, fala que você
deve abrir seu coração e estar certo de seu relacionamento com
Deus. E centenas de vocês aqui esta noite não têm certeza. Vocês
gostariam de ter essa certeza. Vocês gostariam de sair daqui
hoje à noite sabendo que se morressem no caminho de casa
estariam prontos para encontrar-se com Deus."
Desse modo, Graham os desafiou a vir. E eles vieram -
inicialmente, somente uns poucos; então, as comportas se abri-
ram e indivíduos, casais e famílias inteiras encheram o espa-
ço vazio diante da plataforma. Logo postavam-se ombro a
ombro e a multidão cobria os lados do palco, quase três mil
pessoas ao todo. Alguns choravam, tomadas de solene con-
vicção; outros olhavam para baixo, ainda envergonhados de
seu passado; muitos sorriam de orelha a orelha -livres, radi-
antes ... em casa, finalmente.
Caso típico era o de uma senhora casada. "Minha mãe
morreu de câncer quando eu era jovem e naquela época achei
que estava sendo punida por Deus", disse a um conselheiro.
"Esta noite eu compreendi que Deus me ama - é algo que eu
sabia, mas não conseguia apreender de fato. Esta noite uma
grande paz invadiu meu coração.:?
O que é a fé? Não haveria necessidade de defini-la para as
pessoas daquela abafada noite de junho. A fé era quase pal-
pável para elas. Elas estendiam as mãos para Deus como se
esperassem abraçá-lo fisicamente. A fé arrancou a culpa que
as havia oprimido. Substituiu o desalento pela esperança.
Dotou-as de um novo senso de direção e propósito. A fé abriu
os céus, agindo como água fresca embebendo a ressequida
alma delas.
Da fé para a dúvida
Era o ano de 1949. Billy Graham, 30 anos, não sabia que
estava prestes a ser guindado à posição de notoriedade e in-
fluência mundial. Ironicamente, enquanto se preparava para
a cruzada de Los Angeles, que o tornou famoso, ele se viu às
voltas com uma incerteza - não quanto à existência de Deus
ou à divindade de Jesus, mas quanto à questão fundamental
de como ele podia confiar plenamente no que a Bíblia lhe
dizia.
12 q EM DEFESA DA FÉ
Em sua autobiografia, Graham disse que se sentiu como se
estivesse sendo esticado por um instrumento de tortura. Quem
o puxava em direção a Deus era Henrietta Mears, a brilhante e
compassiva educadora cristã que tinha conhecimento com-
pleto da moderna erudição e grande confiança na confiabili-
dade das Escrituras. Era puxado noutra direção por seu amigo
íntimo e colega de pregação Charles Templeton, 33 anos de
idade."
Segundo Templeton, ele tornou-se cristão quinze anos an-
tes, quando se viu cada vez mais insatisfeito com o seu estilo
de vida na redação de esportes do jornal Globe, de Toronto.
Tendo acabado de voltar duma noite em local de baixa repu-
tação, e sentindo-se vulgar e impuro, dirigiu-se ao seu quarto
e ajoelhou-se junto à cama, no escuro.
"De repente", recordaria mais tarde, "foi como se um cober-
tor escuro tivesse sido enrolado em mim. Uma sensação de culpa
invadia toda a minha mente e o meu corpo. As únicas palavras
que saíram foram: 'Senhor, desce. Desce..."'. E então:
Triunfo da fé
Surgia agora o Templeton cético (em contraste com a fervoro-
sa Henrietta Mears}, tentando afastar seu amigo Billy Graham
das insistentes convicções que ela lhe transmitia de que as
Escrituras são fidedignas. "Billy, você está desatualizado cin-
qüenta anos", argumentava. "As pessoas não mais aceitam a
inspiração da Bíblia da maneira que você o faz. A sua fé é
excessivamente simplista".
Templeton parecia estar ganhando a queda de braço. "Se
não fiquei exatamente em dúvida", Graham iria lembrar, "cer-
tamente fiquei perturbado". Ele sabia que se não pudesse con-
fiar na Bíblia não poderia prosseguir. A cruzada de Los Angeles
- o evento que abriria as portas para a pregação mundial de
Graham - estava em jogo.
De pastor a agnóstico
Cerca de 800 km ao norte de onde Billy Graham estava reali-
zando a sua campanha de Indianápolis, localizei Templeton
em um moderno edifício de um bairro de classe média de To-
ronto. Tomando o elevador para o décimo-quinto andar, diri-
gi-me a uma porta com a placa "Penthouse" [cobertura] e aper-
tei a campainha de bronze.
Levava debaixo do braço um exemplar do último livro de
Templeton, cujo título não deixa dúvidas quanto à sua linha
de raciocício: Farewell to God: my reasons for rejecting the
christian faith [Adeus a Deus: minhas razões para rejeitar a
12~ VII.
13Ibid., p. 200-2.
por Deus! Mas passei a minha vida pensando nisso e não vou
mudar agora. Por hipótese, se alguém chegasse a mim e dissesse:
{Olhe, velhote, a razão pela qual você está doente é uma punição
de Deus por sua recusa em continuar no caminho que seus pés
trilhavam' - isso faria alguma diferença para mim?
Respondeu à sua própria pergunta enfaticamente:
- Não - exclamou. - Não. Não pode haver, em nosso
mundo, um Deus de amor.
Seus olhos se fixaram nos meus. - Não pode haver.
A ilusão da fé
Templeton correu os dedos pelos cabelos. Falava em tom en-
fático e pude perceber que estava se cansando. Queria respei-
tar a sua condição, mas tinha algumas outras perguntas a fa-
zer. Com a permissão dele, continuei.
- Neste momento, Billy Graham está em meio a uma série
de campanhas em Indiana - disse a Templeton. - O que o
senhor diria às pessoas que vão à frente para depositar sua fé
em Cristo?
Os olhos de Templeton se arregalaram. - Ora, eu não iria
interferir de modo algum na vida delas - replicou. - Se al-
guém tem fé e isso faz dele uma pessoa melhor, sou totalmen-
te a favor - mesmo achando que é maluco. Tendo sido um
cristão, eu sei como a fé é importante para a vida das pessoas -
como afeta as suas decisões, como as ajuda a lidar com proble-
mas difíceis. Para a maior parte das pessoas, é um benefício
indescritível. Mas é por que existe um Deus? Não, não é.
A voz de Templeton não transmitia qualquer condescen-
dência, no entanto, as implicações do que dizia eram inteira-
mente paternalistas. É isso o que a fé significa - enganar a si
mesmo para tornar-se uma pessoa melhor? Convencer-se de
que existe um Deus de- modo a ficar motivado para elevar a
sua moralidade em alguns graus? Abraçar um conto de fadas
a fim de dormir melhor à noite? Não, obrigado, pensei com os
meus botões. Se a fé é isso, eu não estava interessado.
22 q EM DEFESA DA FÉ
o fascínio de Jesus
A expressão corporal de Templeton se suavizou. Era como se
repentinamente ele se sentisse relaxado e à vontade para falar
Parece-me hoje que não há uma boa razão para uma pessoa
inteligente abraçar a ilusão do ateísmo ou do agnosticismo
e cometer os mesmos erros intelectuais que eu cometi. Eu
gostaria [... ] de ter conhecido então o que conheço agora.
Patrick Glynn, ateu que se tornou cristão/
Superando objeções
Embora pudesse simpatizar com muitas das objeções levan-
tadas por Templeton, ao mesmo tempo eu não era ingênuo o
bastante para aceitá-las tacitamente. Evidente que alguns dos
seus obstáculos à fé não eram absolutamente impeditivos.
Por exemplo, Templeton estava simplesmente errado quan-
to ao fato de Jesus considerar-se um mero ser humano. Mes-
mo que você retroceda às informações mais antigas e elemen-
tares sobre ele - dados. que não poderiam ter sido maculados
por elaborações lendárias - você descobre que Jesus
28 q EM DEFESA DA FÉ
- ~ orno
repórter jovem e idealista, recém-saído da escola de
jornalismo, uma das minhas primeiras tarefas no Chi-
cago Tribune foi escrever uma série de trinta artigos nos
quais iria traçar o perfil das famílias carentes da cidade.
Tendo sido criado nos subúrbios de classe média, em que
ser "necessitado" significava ter somente um Cadillac, ra-
pidamente me encontrei imerso na zona crítica, cercada de
privação e desespero, da cidade de Chicago. Em certo sen-
tido, minha experiência foi semelhante à reação de Charles
Templeton diante da foto da mulher africana com seu bebê
morto.
zv.
Thanksgiving Near; Only Food Rico, de Lee Strobel, publicado
em The Chicago Tribune (25/11/1974).
Uma vez que o mal e o sofrimento existem... 9 33
Compreendendo o sofrimento
Todas as pessoas se defrontam com dor e pesar. Uma enfermi-
dade cardíaca levou o meu pai, quando poderia ter vivido mui-
tos anos para ver os netos crescerem. Fiquei de vigília na unida-
de de tratamento intensivo neonatal enquanto minha filha re-
cém-nascida lutava contra uma enfermidade misteriosa que tanto
ameaçava a sua vida como confundia os médicos. Corri para o
hospital depois da ligação angustiante de um amigo cuja filha
havia sido atingida por um motorista embriagado. Segurava as
mãos deles no momento em que a vida a deixou. Tive de dar aos
dois filhos pequenos de um amigo a notícia que a mãe deles
havia cometido suicídio. Vi colegas de infância sucumbirem di-
ante do câncer, da doença de Lou Gehrig, * de problemas de co-
ração, de acidentes automobilísticos. Vi o mal de Alzheimer de-
vastar a mente de um ente querido. Estou certo de que você po-
deria contar histórias semelhantes de dor pessoal.
Nós emergimos recentemente de um século sem preceden-
tes em sua crueldade e desumanidade, no qual as vítimas de
*Doença de Lou Gehrig (EUA), mal de Charcot (França) e doença do
Neurônio Motor (Reino Unido) são os nomes dados no exterior à
Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). (N. do K)
L • 11 ••• _ 1~.,.LI;~
Uma vez que o mal e o sofrimento existem... P 35
3Peter MAASS, Top ten war crimes suspects, George, Iune 1999.
36 q EM DEFESA DA FÉ
Fé e preconceito
Parei para pensar no argumento de Kreeft, mas ele continuou
antes que eu pudesse responder.
- No entanto - disse, - certamente não quero subesti-
mar Templeton. Ele está reagindo de modo muito honesto e
sincero ao fato de que algo se volta contra Deus. Somente em
um mundo em que ter fé é difícil pode existir fé. Eu não tenho
42 q EM DEFESA DA FÉ
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Uma vez que o mal e o sofrimento existem... p 45
Um problema de lógica
Kreeft tinha apresentado alguns interessantes argumentos ini-
ciais, mas nós circundáramos um pouco o assunto. Chega-
mos ao momento de chegar ao âmago da questão. Lançando
mão de algumas notas rabiscadas no avião, desafiei Kreeft com
uma pergunta que cristalizou a controvérsia.
- Os cristãos crêem em cinco coisas - disse eu. - Pri-
meira, Deus existe. Segunda, Deus é todo-bondade. Terceira,
Deus é todo-poderoso. Quarta, Deus é onisciente. E quinta, o
mal existe. Agora, como podem todas essas cinco afirmações
serem verdadeiras ao mesmo tempo?
Um sorriso enigmático estampou-se no rosto de Kreeft.
- Aparentemente não podem ser - admitiu. - Eu me lem-
bro de um pregador liberal que certa vez tentou me dissua-
dir de me associar aos fundamentalistas. Ele disse: "Existe
um problema lógico aqui - você pode ser inteligente, ou
honesto, ou fundamentalista, ou qualquer combinação de
dois, mas não todos os três". E o meu amigo fundamentalista
disse: "Eu diria que você pode ser honesto, ou inteligente,
ou liberal, ou qualquer combinação de dois, mas não os
três" .
Eu ri da história. - Nós temos o mesmo tipo de problema
lógico aqui - observei.
- Certo. Parece que você tem de deixar de lado uma da-
quelas convicções. Se Deus é todo-poderoso, ele pode fazer
qualquer coisa. Se Deus é todo-bondade, ele quer somente o
bem. Se Deus é onisciente, ele sabe o que é bom. Desse modo,
se todas essas convicções são verdadeiras - e os cristãos acre-
ditam que são - parece então que a conseqüência é que ne-
nhum mal pode existir.
- Mas o mal existe - disse. - Não seria lógico supor que
esse Deus não existe?
Uma vez que o mal e o sofrimento existem... p 47
I .. .1 A.lIIi. I .. 11.,.1.1,1
Uma vez que o mal e o soirimento exístem... 9 51
o megafone da dor
Pista após pista, Kreeft estava lançando mais e mais luz so-
bre o mistério do sofrimento. Mas cada nova percepção pare-
cia gerar novas perguntas.
- Pessoas más ferem os outros e se safam o tempo todo.
Certamente Deus não pode considerar isso justo - eu disse.
- Como ele pode ficar parado observando enquanto isso acon-
tece? Por que ele não intervém e dá um jeito em todo o mal
que há no mundo?
- As pessoas não estão se safando - Kreeft insistiu. -
Justiça tardia não é necessariamente justiça negada. Virá o
dia em que Deus ajustará contas e as pessoas serão
responsabilizadas pelo mal que cometeram e pelo sofrimento
que causaram. Criticar Deus por não agir exatamente agora é
como ler metade de um romance e criticar o autor por não ter
concluído o enredo. Deus fará o acerto de contas no momento
certo - de fato, a Bíblia diz que uma das razões pelas quais ele
o está adiando é que algumas pessoas continuam seguindo as
56 q EM DEFESA DA FÉ
15
2 Pedro 3.9: "O Senhor não demora em cumprir a sua promessa,
como julgam alguns. Ao contrário, ele é paciente com vocês, não queren-
do que ninguém pereça, mas que todos cheguem ao arrependimento".
Uma vez que o mal e o sofrimento existem... p 51
Suportando a dor
Recostei-me na cadeira e refleti sobre o que Kreeft havia dito
até agora. Alguns de seus argumentos eram mais fortes que
outros, mas pelo menos não estava simplesmente oferecendo
explicações pré-fabricadas. As pistas pareciam estar levando
a algum lugar.
Decido perguntar-lhe a respeito de uma citação de Agosti-
nho, que diz: "Uma vez que Deus é o bem supremo, ele não
permitiria que qualquer mal existisse em suas obras, a menos
que sua onipotência e bondade fossem tais que pudessem tirar
18Jeremias 6.130.
"Tsaías 64.60.
poderia deixar de amar esse ser que andou "a segunda mi-
lha" * , que praticou mais do que pregou, que entrou em nosso
mundo, que sofreu as nossas dores, que se oferece a nós no
meio de nossas tristezas? O que mais ele poderia fazer?
Completei:
- Com efeito, então, a resposta à indagação de Templeton
acerca de como Deus poderia suportar todo aquele sofrimen-
to é - ele o suportou.
- Ele o suportou! - Kreeft .exclamou. - A resposta de
Deus ao sofrimento foi ao âmago do problema. Muitos cris-
tãos tentam tirar Deus da dificuldade no que tange ao sofri-
mento; Deus se colocou em dificuldade, por assim dizer - na
cruz. Portanto, a conclusão prática é que se queremos estar
com Deus, temos de estar com o sofrimento, não podemos
evitar a cruz, seja em pensamento seja de fato. Temos de ir
aonde ele está e a cruz é um dos lugares em que ele está. E
quando nos envia o nascer do sol, nós lhe agradecemos pelo
nascer do sol; quando ele nos envia o pôr-da-sol, morte, sofri-
mento e cruz, nós lhe agradecemos por isso.
Eu fiquei inquieto.
- E"' realmente possível agradecer a Deus pela dor que nos
sobrevém?
- Sim. No céu nós faremos exatamente isso. Nós diremos a
Deus: "Muito obrigado por esta pequena dor que não entendo
agora e por aquela pequena dor que não entendi à ocasião; agora
vejo que foram as coisas mais preciosas da minha vida."
- Mesmo que eu não me ache emocionalmente capaz de dizê-
lo neste instante, ainda que eu não possa honestamente dizer a
Deus em meio à dor "Deus, obrigado por esta dor", mas tenha de
rogar "Livra-me do mal", isso é perfeitamente correto e perfeita-
mente honesto - no entanto, creio que essa não é a última pala-
vra. As últimas palavras do pai-nosso não são "livra-nos do mal";
as últimas palavras são "teu é o poder e a glória".
J -lo ,. I .• ~ . . I... ,L ~ l
Uma vez que o mal e o sofrimento existem... P 69
Craig sorriu.
- É engraçado que você pergunte especificamente sobre o
nascimento virginal- ressaltou, - poronc essa foi uma gran-
de objeção para que eu me tornasse cristão. Eu achava que era
totalmente absurdo.
- Verdade? - espantei-me. - O que aconteceu?
- Quando a mensagem cristã me foi comunicada pela pri-
meira vez na minha adolescência, eu já havia estudado biolo-
gia. Sabia que, para o nascimento virginal ser verdadeiro, um
cromossomo y tinha de ser criado do nada no óvulo de Maria,
porque Maria não possuía o material genético para produzir
um filho. Para mim, isso era totalmente fantástico. Simples-
mente não tinha sentido.
- O senhor não está sozinho - observei. - Outros céticos
também têm problemas com isso. Como o senhor prosseguiu?
Craig refletiu por um momento.
- Bem, coloquei essa questão de lado e me tornei um cris-
tão de qualquer maneira, muito embora não cresse realmente
no nascimento virginal. Depois de me tornar cristão, ocorreu-
me que se realmente creio em um Deus que criou o universo,
para ele criar um cromossomo y seria brincadeira!
Disse a Craig que achei interessante o fato de ele ter se
tornado cristão apesar das dúvidas sobre uma doutrina tão
significativa como o nascimento virginal.
- Acho que a autenticidade da pessoa de Jesus e a verda-
de da sua mensagem foram tão poderosas que elas simples-
mente suplantaram quaisquer dúvidas residuais que eu ti-
vesse - respondeu.
Pressionei, perguntando:
- O senhor não estava se jogando de cabeça em algo que
não aceitava totalmente?
- Não, eu acho que esse pode ter sido um bom procedi-
mento - retorquiu. Você não precisa ter respostas para todas
as suas perguntas para chegar à fé. Você simplesmente tem de
dizer: "O peso da evidência parece mostrar que isso é verda-
deiro; assim, embora eu não tenha respostas para todas as
Evidências extraordinárias
Embora pudesse entender o argumento de Craig, queria in-
sistir nesse tópico.
- Alguns críticos dizem que a Ressurreição é um aconteci-
mento extraordinário e, portanto, requer evidências extraordi-
nárias - disse. - Essa afirmação não tem um certo atrativo?
- Sim, isso parece uma questão de bom senso - respon-
deu. - Mas posso demonstrar que é falsa.
- Como assim?
- Porque esse princípio o impediria de crer em todos os
tipos de acontecimentos que abraçamos racionalmente. Por
exemplo, você não acreditaria na informação do noticiário
vespertino de que os números sorteados na loteria da noite
passada foram 4,2,9,7,8 e 3, porque esse seria um evento de
extraordinária improbabilidade. As chances contra isso são
de milhões e milhões contra um e, portanto, você não deve
crer nessa informação quando o noticiário a transmite. Toda-
via, evidentemente nós cremos que somos racionais ao con-
cluir que a notícia é verdadeira. Como isso é possível?
- Bem, os teóricos da probabilidade dizem que se deve
pesar a improbabilidade da ocorrência do evento contra a pro-
babilidade de que as evidências seriam exatamente como são
se o evento não tivesse ocorrido.
Craig fez essa afirmação de modo tão rápido que tive dificulda-
de em assimilá-la. - Espere aí - interrompi, levantando a mão.
- O senhor vai ter de ir mais devagar e dar-me um exemplo.
U ma vez que os milagres contradizem a ciência... p 87
Os milagres de Jesus
- Digamos que o senhor seja um investigador honesto - eu
disse, partindo do seu último pensamento. - O que o senhor
buscaria para convencê-lo de que alguma coisa miraculosa
aconteceu?
- Você teria um certo número de critérios. Teria de inves-
tigar para ver se algo não poderia ser explicado em termos
das forças naturais que atuavam naquele tempo e lugar. E bus-
caria um contexto histórico-religioso.
Uma vez que os milagres contradizem a ciência.: P s9
Milagres e lendas
As conclusões desses estudiosos eram úteis, mas eu queria
mais do que isso.
- Quais são as evidências específicas de que Jesus reali-
zou milagres? - perguntei.
- Parte da resposta é que esses acontecimentos são en-
contrados em todos os estratos das fontes dos evangelhos.
Por exemplo, a milagre da alimentação dos cinco mil é en-
contrado nos quatro evangelhos, de modo que se tem uma
atestação independente e múltipla desses eventos. Não há
"[esus, Berlim, 1926, p. 159.
Uma vez que os milagres contradizem Q ciência... P 91
Jesus e todos foram curados, e com Lucas 4, que diz que todos
foram levados e todos foram curados. Como disse o historia-
dor Archibald Robertson: "Estamos testemunhando o cresci-
mento progressivo de uma lenda". 11
O rosto de Craig ficou crispado.
- Esse argumento é realmente um bocado fantasioso -
disse, "porque os autores dos evangelhos não empregam as
palavras "todos" ou "muitos" do mesmo modo que um relató-
rio policial.
Empurrou para o lado a pasta de Bultmann e apanhou a
sua Bíblia, abrindo-a no Novo Testamento, correndo o dedo
em uma das páginas. Encontrando Marcos 1.5, leu o versículo
em voz alta: "A ele vinha toda a região da Judéia e todo o povo
de Jerusalém. Confessando os seus pecados, eram batizados
por ele no rio Jordão.
- Muito bem, pense sobre isso - recomendou. - Diz
que João Batista estava batizando toda a Judéia e Jerusa-
lém. Seria verdade? Toda a Judéia? Toda Jerusalém? - dis-
se Craig, sua voz se elevando num tom de simulada surpre-
sa. - Toda a província foi esvaziada de pessoas que foram
para o rio Jordão e todas elas foram batizadas - todos os
bebês, cada ancião? Bem, obviamente que não. Essa não
era uma palavra que devia ser lida rigidamente como em
um relatório policial.
- Agora, voltando aos relatos que você mencionou antes
- qual é o fato principal que querem mostrar? Certamente,
que as multidões estavam indo a Jesus em busca de cura e
exorcismo, e isto está bem atestado. O fato é que todos esses
relatos concordam plenamente que houve milagres operados
por Jesus e que isso envolveu muitas pessoas.
Acrescentou
,-
mais um ponto:
- E importante lembrar que em relação ao maior dos
milagres, a Ressurreição, sabemos pelas pesquisas históricas
Os "milagres" de Maomé
Supondo que existam evidências históricas de que Jesus re-
almente realizou feitos que as testemunhas oculares consi-
deraram milagrosos, o que dizer dos milagres de outras reli-
giões? Para o crítico Hume, os milagres de diferentes religi-
ões cancelam uns aos outros como evidências da verdade.
Por exemplo, a tradição islâmica diz que Maomé subiu ao
céu em uma mula, que curou a perna quebrada de um compa-
nheiro, que alimentou grandes grupos com pouco alimento,
que transformou um galho de árvore em uma espada de aço e
que foi responsável por outros feitos sobrenaturais.
- Se tanto ele como Jesus realizaram milagres semelhan-
tes - disse a Craig, - isso não dilui a singularidade de Jesus
e nega os milagres como evidências da sua verdade?
Craig franziu a sobrancelha.
- Acho que isso está baseado em uma falsa interpretação
do islã - disse um pouco hesitante. - Corrija-me se eu estiver
errado, mas quando leio o Alcorão basicamente não existe qual-
quer milagre, a não ser o suposto milagre do próprio Alcorão.
- Concordo - respondi. - À exceção de umas poucas
passagens contestadas, considero que os estudiosos em geral
interpretam o Alcorão dessa maneira. Mas eu disse que esses
milagres são mencionados na tradição islâmica, que é onde
eles realmente proliferam. 1 2
Craig pensou e se concentrou na questão.
- Ah, sim, correto - os milagres são mencionados na tradi-
ção chamada Hadith - disse. - E aqui está o que importa: essa
tradição islâmica aparece centenas de anos depois de Maomé
15God, are you there?, de Willian Lane Craig [Norcross, Geórgia: Ravi
Zacharias International Ministries, 1999.
16The nature of space and time New Jersey: Princeton University
Press, 1996), p. 20.
Uma vez que os milagres contradizem a ciência... p 101
teoria do Big Bang, pelo menos se ele for ateu, deve crer que
o [... ] universo veio do nada e pelo nada" .17
Craig riu.
- Evidentemente, algo que vem do nada não tem sentido!
Lee, você tem citado bastante o famoso cético David Hume em
nossa entrevista. Bem, até ele disse: "Mas deixem-me dizer-lhes
que eu nunca afirmei uma proposição tão absurda como a de
que alguma coisa poderia surgir sem uma causa". 18 Os ateus re-
conhecem isso. Por exemplo, um dos ateus mais destacados da
filosofia contemporânea, Kai Nielsen, disse uma vez: "Suponha
que você repentinamente ouça uma forte explosão [...] e você me
pergunte: 'O que causou essa explosão?', e eu responda: 'Nada,
ela simplesmente aconteceu'. Você não aceitaria isso". 19 Ele está
absolutamente correto. No entanto, pense um pouco: se deve
haver uma causa para uma pequena explosão, não é lógico que
deve haver uma causa para uma grande explosão?
Era uma pergunta que parecia não precisar de resposta. -
Assim sendo, como o senhor resumiria esse argumento inici-
al? - perguntei.
A" medida que mencionava cada ponto, Craig agarrava um
dedo para contá-los.
- Primeiro, tudo o que começa a existir tem uma causa.
Segundo, o universo começou a existir. Terceiro, portanto, o
universo tem uma causa. Como escreveu o eminente cientista
sir Arthur Eddington: "O princípio parece apresentar dificul-
dades insuperáveis a menos que concordemos em encará-lo
como francamente sobrenatural'. 20
Interrompi.
- Está bem, isso aponta para um Criador, mas será que
nos diz muita coisa sobre Deus?
17The five ways: St. Thomas Aquinas' proofs of God's esistence, New
York: Schocken Books, 1969, p. 66.
18John S1EWART, The letters ofDavid Hume, Oxford: Clarendon Press, 1932,
vol. I, p. 187.
19Reason and practice, New Yark: Harper & Row, 1971, 48.
2üThe expanding universe, New York: Macrnillan, 1933, p. 124.
102 q EM DEFESA DA FÉ
3V. DNA tests clear twa men in prison, de Charles T. Iones, publicado
em The Oklahoman, 16/4/1999.
A evolução explica a origem da vida... p 119
com o outro. Ou seja, sua cor, forma e textura pareciam seme-
lhantes. Assim, os fios de cabelo da cena do crime podiam ter
vindo de Williamson - ou talvez pudessem ter vindo de ou-
tra pessoa.
Longe de ser tão incriminadora como as impressões digitais,
a análise de fios de cabelo tem sido chamada "pseudo-ciência"
por alguns analistas jurídicos. Com freqüência os jurados ou-
vem testemunhos impressionantes sobre o que parece ser uma
prova cientificamente válida e concluem - incorretamente -
que ela demonstra a culpa do réu. Sabe-se que alguns promoto-
res, no calor da batalha judicial, têm até mesmo caracterizado
erroneamente ou exagerado sutilmente o valor da análise de ca-
belos no decorrer de seus argumentos finais."
No caso de Williamson, um juiz federal denominou a pro-
va do cabelo "não-confiável cientificamente" e disse que nun-
ca deveria ter sido utilizada contra o réu. O que é ainda mais
perturbador, nos últimos 25 anos a prova do cabelo havia sido
usada contra dezoito prisioneiros do Corredor da Morte que
posteriormente foram declarados inocentes."
O caso de Ronald Keith Williamson é um exemplo clamo-
roso de uma justiça equivocada. Sua condenação infundada
demonstra como é fácil que jurados tirem conclusões radicais
que não estão realmente alicerçadas em fatos científicos con-
cretos. E, em certo sentido, a história de Williamson estabele-
ceu um paralelo com a minha investigação de um dos mais
poderosos elementos de evidência científica que são comu-
mente usados contra a existência de Deus.
o feito de Darwin
Embora muitas coisas tenham contribuído, acho que poderia
dizer que perdi os últimos resquícios da minha fé em Deus
15Darwin's black box, New York: The Free Press, 1996, p. 232.
A evolução explica a origem da vida... p 12}
A conclusão do desígnio inteligente flui naturalmente dos
próprios dados - não de livros sagrados ou crenças sectári-
as [... ] A hesitação da ciência em abraçar a conclusão do
desígnio inteligente [...] não tem um fundamento justificável
[... ] Muitas pessoas, inclusive muitos cientistas importantes
e respeitados, simplesmente não querem que exista algo além
da rratureza.t"
37The end o] certainty: time, chaas, and the new laws af nature, New
Yark: The Free Press, 1997, p. 71.
A evolução explica a origem da vida... p 141
Mas Bradley desprezou essa teoria por uma razão seme-
lhante.
- Outra vez - afirmou, - você precisa de um nível mui-
to baixo de informação para criar cristais de gelo em compa-
ração com o elevado nível de informação necessário para or-
ganizar os aminoácidos com o fim de criar moléculas de pro-
teína. É por isso que essa teoria também não colou.
Bradley disse que há uma diferença significativa entre a
"ordem" encontrada em algumas coisas inanimadas e a "com-
plexidade específica" das células vivas.
- Os cristais de gelo exigem uma certa dose de ordem,
mas ela é simples, repetitiva e necessita de uma baixa quan-
tidade de informações, mais ou menos como preencher um
livro com as palavras "eu amo você, eu amo você" eu amo
você' muitas e muitas vezes. Em contraposição, o tipo de com-
plexidade que vemos na matéria viva tem um alto conteúdo
de informações que especificam como reunir os aminoácidos
na seqüência certa, a exemplo de livro que foi escrito com
frases de significado preciso e que contam uma história.
Inquestionavelmente, a energia pode criar padrões de ordem
simples. Por exemplo, você pode ver marcas na areia de uma
praia e saber que foram criadas pela ação das ondas. Mas se
você visse as palavras "João ama Maria" e um coração com
uma flecha, você saberia que a energia sozinha não criou aqui-
lo. E" por isso que o renomado teórico de informações H. P.
Yockey disse: "As tentativas de relacionar a idéia de ordem[... ]
com organização biológica[... ] devem ser consideradas um jogo
de palavras que não pode resistir a um exame cuidadoso.":"
49V. Genetic takeover and the mineral origine o] life, New York:
Carnbridge University Press, 1982.
50Infarmation and the origin af life, The creation hypothesis, Dawners
Grave, Illinais: InterVarsity Press, 1994, p. 194.
A evolução explica a origem da vida.: P 141
poderiam ter ocorrido na terra primitiva, mas esses cenários
somente funcionam se o computador for programado para eli-
minar alguns dos obstáculos intransponíveis que as substân-
cias químicas teriam efetivamente encontrado no mundo real.
Quando um cientista do Instituto Santa Fé, onde algumas
simulações de computador têm sido feitas, comentou: "Se
Darwin tivesse um computador em sua mesa, quem sabe o que
ele poderia ter descoberto", comentou maldosamente o especi-
alista em origem da vida [ohn Horgan: "De fato, Charles Darwin
poderia ter descoberto muita coisa sobre computadores e mui-
to pouco sobre a natureza."51
Com tantas teorias se evaporando sob o crivo do exame
minucioso, pedi a Bradley sua avaliação pessoal do estado
das pesquisas sobre o surgimento da vida.
- Não há qualquer dúvida que a ciência, pelo menos nes-
te momento, está em um beco sem saída - respondeu. - O
otimismo dos anos 50 já se foi. O estado de ânimo na confe-
rência internacional de 1999 sobre a origem da vida foi des-
crito como sombrio - cheio de frustração, pessimismo e de-
sânímo." Ninguém faz de conta que qualquer alternativa ofe-
reça uma explicação racional de como a vida evoluiu espon-
taneamente desde as substâncias químicas simples até as pro-
teínas e daí até as formas básicas de vida.
Bradley apanhou um livro e localizou rapidamente a cita-
ção que buscava.
- Klaus Dose, o bioquímico que é considerado um dos
maiores especialistas na área, sintetizou muito bem a situa-
ção - disse Bradley, lendo as palavras dele:
Bradley continuou:
- Shapiro argumenta incisivamente que todas as atuais
teorias estão falidas.v' Crick afirmou movido pela frustração:
"Toda vez que escrevo um trabalho sobre a origem da vida,
juro que nunca mais escreverei outro, porque existe um ex-
cesso de especulação correndo atrás de muito poucos fatos". 55
Mesmo Miller, cerca de quarenta anos após a famosa experi-
ência, declarou ao periódico Scientiftc American, minimizando
a questão: "O problema da origem da vida acabou sendo mui-
to mais difícil do que eu e a maior parte das pessoas havíamos
imaginado";"
Por coincidência, mais ou menos na mesma época da mi-
nha entrevista com Bradley, o loquaz evolucionista Stephen
Iay Gould, da Universidade Harvard, foi convidado a escre-
ver um ensaio para a revista Time respondendo se os cientis-
tas algum dia descobrirão como a vida começou. O resultado
foi um texto vago, equivocado e hesitante que nunca chegou
perto de sugerir uma única hipótese sequer para explicar como
a vida conseguiu surgir da matéria írianlmada.:"
- O que fazer com esse impasse científico? - perguntei a
Bradley.
- Isto depende bastante da metafísica - afirmou.
- Shapíro, a quem muito respeito, diz que devem existir
algumas leis físicas que ainda não descobrimos, que final-
mente nos mostrarão como a vida surgiu naturalmente.
Porém, não há nada na ciência que garanta uma explicação
Ponderações
Perguntas para reflexão ou estudo em grupo
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"Malaquias 3. 6a.
164 q EM DEFESA DA FÉ
E quanto às crianças?
Intelectualmente, poderia até aqui entender a resposta de
Geisler. Emocionalmente, todavia, ela não avançava o sufici-
ente. Eu continuava inquieto.
- Mas as crianças... - insisti.
Geisler, ele mesmo pai de seis filhos e avô de nove, simpa-
tizava com a idéia.
- Física e socialmente, o destino das crianças ao longo da
história sempre esteve ligado aos seus pais, seja para o bem
ou para o mal - observou.
- Lee, você precisa compreender a situação dos amale-
quitas. Naquela cultura inteiramente ímpia, violenta e depra-
vada, não havia esperança para aquelas crianças. Essa nação
estava tão corrompida quanto uma gangrena que estivesse se
Se Deus mata crianças inocentes, ele não é digno de adoração P 167
apossando da perna de uma pessoa; Deus tinha de amputar a
perna, senão a gangrena se espalharia e não sobraria nada.
Em certo sentido, a ação de Deus foi um ato de misericórdia.
- Misericórdia? - espantei-me. - Como assim?
- De acordo com a Bíblia, toda criança que morre antes da
idade da razão vai para o céu a fim de passar a eternidade na
presença de Deus - respondeu. - Ora, se elas tivessem con-
tinuado a viver naquela sociedade horrível além da idade da
razão, certamente iriam se corromper e assim perder-se para
sempre.
- O que o faz pensar que as crianças vão para o céu quan-
do morrem? - indaguei.
- Isaías 7.16 fala de certa idade antes que a criança seja
moralmente responsável, antes que a criança "saiba rejeitar o
erro e escolher o que é certo". O rei Davi falou em estar com o
seu filho que morreu ao nascer. Jesus disse: "Deixem vir a
mim as crianças, não as impeçam; pois o Reino de Deus per-
tence aos que são semelhantes a elas", o que indica que elas
irão para o céu.!' Ainda existem muitas outras evidências
bíblicas em defesa dessa posição.
Apontei uma aparente inconsistência.
- Se, em última análise, foi melhor que aquelas crianças
morressem antes da idade da razão, porque assim elas iriam
para o céu, por que não se pode dizer o mesmo quanto a cri-
anças ainda não nascidas que são abortadas em nossos dias?
- perguntei. - Se elas forem abortadas, certamente irão para
o céu, mas se nascerem e crescerem poderão rebelar-se contra
Deus e acabar no inferno. Esse não é um forte argumento a
favor do aborto?
A resposta de Geisler veio rapidamente.
- Não, essa é uma falsa analogia - insistiu. - Primeiro,
Deus não ordena a ninguém que faça hoje em dia um aborto;
de fato, isso é contrário aos ensinamentos da Bíblia. Lembre-
se, ele é o único que pode decidir tirar uma vida porque ele é
l1Marcos 10.14.
168 q EM DEFESA DA FÉ
Massacre cósmico?
O profeta Eliseu estava percorrendo a estrada para Betel quan-
do se encontrou com alguns meninos que o importunaram
fazendo graça da sua calvície. "Suma daqui, careca!", eles ca-
çoaram. "Suma daqui, careca!" Ele reagiu amaldiçoando-os
em nome de Deus. Então, em um impressionante ato de puni-
ção, duas ursas repentinamente saíram do bosque e despeda-
çaram 42 merrinos.P
- Dr. Geisler, o senhor insistiu que Deus não é caprichoso -
rebati. - Mas isso parece uma reação excessiva para uma ofensa
pequena e tola. Despedaçar 42 criancinhas inocentes só porque
fizeram troça de um indivíduo careca é rigoroso demais.
Geisler estava bem familiarizado com a questão.
- A pressuposição da sua pergunta está errada - respon-
deu. - Não se tratava de criancinhas inocentes.
Tendo previsto sua resposta, peguei uma fotocópia desta
passagem bíblica e a empurrei em sua direção.
- Sim, eram - retruquei. - Veja bem aí - disse apontan-
do para as palavras. - Diz "criancinhas".
Disse Deus: "Eis que lhes dou todas as plantas que nascem
em toda a terra e produzem sementes, e todas as árvores
que dão frutos com sementes. Elas servirão de alimento
para vocês. E dou todos os vegetais como alimento a tudo o
que tem em si fôlego de vida; a todos os grandes animais
da terra, a todas as aves do céu e a todas as criaturas que se
movem rente ao chão". E assim foi. 16
18Provérbios 12.10.
19Atheism: the case against God, p. 210-1.
2°Farewell to God, p. 38.
Se Deus mata crianças inocentes, ele não é digno de adoração P 111
vida corrompido que estava em flagrante conflito com os seus
preceitos.
O tempo que passei com Geisler foi uma rara oportunidade
para ouvir em primeira mão a razão de ter chegado à conclu-
são oposta para defender tão zelosamente a Bíblia como um
livro fidedigno. Levantei-me para esticar as pernas, caminhan-
do até uma estante para passar uma vista de olhos informal-
mente nos títulos. Voltei-me e disse:
- Tudo depende de a Bíblia ser verdadeira. Qual é o seu
motivo para crer que ela o seja?
Com a segurança característica, Geisler respondeu:
- Existem mais evidências de que a Bíblia é uma fonte
confiável do que em qualquer outro livro do mundo antigo.
Para mim, no entanto, isso mais parecia uma conclusão
que uma evidência.
- O senhor terá de dar-me alguns fatos para sustentar isso
- disse, sentando-me na ponta da poltrona, antecipando-me
à resposta de Geisler.
- Existem muitas evidências das quais eu poderia falar",
começou. - Poderia falar da unidade da Bíblia - 66 livros
escritos em diferentes estilos literários por talvez quarenta
autores diferentes, com formação diferente, durante 1 500 anos,
e ainda assim a Bíblia apresenta de modo notável um drama
contínuo com uma mensagem central. Isso aponta para a exis-
tência da Mente divina que os escritores afirmaram tê-los ins-
pirado. Outra coisa é o poder transformador da Bíblia - des-
de o início ela tem renovado pessoas; tem-lhes dado esperan-
ça, coragem, propósito, sabedoria, direção e poder; e tem sido
uma âncora para a sua vida. Enquanto o islamismo em seu
início foi difundido pela espada, o cristianismo dos primórdios
se expandiu pelo Espírito, embora muitos cristãos estivessem
sendo mortos pelas espadas romanas.
- Contudo, creio que as evidências mais convincentes re-
pousam em duas categorias. Primeiro, existe confirmação ar-
queológica da sua confiabilidade e, em segundo lugar, existe
confirmação miraculosa da autoridade divina.
178 q EM DEFESA DA FÉ
21João 3.12.
22\Z Rocks, relics and biblical relíability, de Clifford A. Wilson (Grand
o
respeitado historiador do período romano Colin J.
Hemer, em The book of acts in the setting ofhellenistic history
[O livro de Atos no contexto da história helenística], mostra
como a arqueologia confirmou, não dezenas, mas centenas e
centenas de detalhes do relato bíblico da igreja primitiva -
disse Geisler. - Até mesmo pequenos detalhes têm sido cor-
roborados, como a direção em que sopra o vento, qual a pro-
fundidade da água a certa distância da praia, que tipo de do-
ença existia em uma ilha em particular, os nomes dos funci-
onários locais e assim por diante. Ora, Atos foi escrito pelo
historiador Lucas. Hemer fornece mais de doze razões pelas
quais Atos tinha de ter sido escrito antes de 62 A.D., ou cerca
de trinta anos após a crucificação de Jesus. Ainda antes dis-
so, Lucas escreveu o seu evangelho, que é substancialmente
igual aos outros relatos bíblicos da vida de Jesus.
- Você tem aqui um historiador impecável, que demons-
trou estar correto em centenas de detalhes e nunca se com-
provou estar errado ao escrever toda a história de Jesus e da
igreja primitiva. E ela foi escrita no espaço de uma geração,
quando as testemunhas oculares ainda viviam e poderiam
tê-la contestado se fosse exagerada ou falsa. Você não tem
nada semelhante a isso em qualquer outro livro religioso do
mundo antígo.>
- Seria Hemer uma voz solitária? - perguntei.
- De modo algum - foi a resposta. - O destacado histo-
riador sir William Ramsay era inicialmente um cético, mas
depois de estudar o livro de Atos concluiu que "em distintos
detalhes a narrativa mostrou uma maravilhosa verdade". 25
O grande historiador clássico da Universidade de Oxford, A.
N. Sherwin-White, disse: "Quanto a Atos, a confirmação
da historicidade é esmagadora" e que "qualquer tentativa
Geisler continuou:
- Obviamente, essa não é uma referência a Adolf Hitler. A
palavra não é "Hitler", mas "Hister", e certamente não é uma
pessoa, mas um lugar. A expressão latina de Germain deve ser
interpretada como "irmão" ou "parente próximo", e não como
Germânia. Ele não cita quaisquer datas ou mesmo uma refe-
rência cronológica geral. Além disso, o que ele quer dizer com
"bestas" e 'gaiola de ferro"? É algo tão confuso que toda a pro-
fecia fica sem sentido. O que se nota é que as predições de
Nostradamus são muito ambíguas e poderiam se encaixar em
uma grande variedade de eventos. Os seus seguidores são in-
consistentes na maneira como interpretam o que ele disse. E
algumas de suas profecias foram demonstradas como falsas.
De fato, nem uma única predição de Nostradamus jamais foi
comprovada como genuína.
- Admito que muitos videntes, como Nostradamus, são va-
gos em suas predições - desafiei. - Mas o senhor tem de ad-
mitir que o mesmo se pode dizer de algumas profecias bíblicas.
- Concordo, nem todas as profecias bíblicas são nítidas -
Geisler respondeu. "Todavia, muitas profecias são bastante
específicas. Quão mais detalhado se podia ser que prever com
precisão quando Jesus iria morrer, como fez Daniel 9.24-26?
Quando você faz as contas, verifica que essa passagem espe-
cifica quando Jesus entraria na história humana. E que dizer
das predições do local do seu nascimento ou de como ele iria
Enfrentando as contradições
Quando perguntei sobre as pretensas contradições da Bíblia,
Geisler se recostou na poltrona e sorriu. Essa era uma questão
que ele passara a vida toda estudando.
- Meu passatempo é colecionar alegadas discrepâncias,
imprecisões e afirmações conflitantes da Bíblia - explicou.
"Tenho uma lista de cerca de oitocentas. Há poucos anos fui
co-autor de um livro chamado Manual popular de dúvidas,
enigmas e "contradições" da Bíblia, que dedica quase 600 pá-
ginas ao esclarecimento dos fatos.:" Tudo o que posso lhe di-
zer é que, na minha experiência, quando os críticos levantam
essas objeções violam invariavelmente um dos dezessete prin-
cípios de interpretação da Escritura.
- Quais são eles? - perguntei.
36Norman GEISLER & Thomas HOWE, São Paulo: Mundo Cristão, 1999.
Se Deus mata crianças inocentes, ele não é digno de adoração P 191
- Por exemplo, supor que o não-explicado é inexplicável.
Estou certo que algum crítico mordaz poderia me interpelar:
"E quanto a essa questão?", embora eu tenha estudado estes
assuntos durante 42 anos, seria incapaz de responder-lhe. O
que isso prova - que a Bíblia contém erro ou que Geisler é
ignorante? Conferiria o benefício da dúvida à Bíblia, porque
entre as oitocentas objeções estudadas não encontrei um úni-
co erro na Bíblia, ao passo que localizei muitos erros cometi-
dos pelos críticos.
Ergui a cabeça.
- Será que isso é de fato razoável, dar à Bíblia o benefício
da dúvida?
- Sim, é - insistiu. - Quando um cientista se depara
com uma anomalia na natureza, ele abandona a ciência? Quan-
do a nossa sonda espacial encontrou anéis trançados em tor-
no de Júpiter, isso foi de encontro a todas as explicações cien-
tíficas. Você se lembra de algum cientista da NASA ter pedido
demissão porque não pôde explicar o fenômeno?
Sorri.
- Claro que não.
- Exatamente. Não desistiram. Persistiram: "Bem, deve ha-
ver uma explicação", e continuaram a pesquisar. Abordo a
Bíblia mesmo modo. Ela tem provado repetidamente estar
correta, mesmo quando inicialmente achei que não estava.
Por que não deveria conceder-lhe o benefício da dúvida ago-
ra? Nós precisamos tratar a Bíblia da maneira que alguém deve
ser tratado no tribunal: presunção de inocência até que seja
provada a culpa.
- Os críticos fazeram o oposto. Negaram que os hititas
do Antigo Testamento tivessem existido algum dia. Recen-
temente os arqueólogos descobriram a biblioteca hitita. Os
críticos dizem: "Bem, acho que a Bíblia estava certa nesse
versículo, mas não aceito o resto". Pois bem, quando de-
monstrou estar certa caso após caso, em centenas de deta-
lhes, o peso da prova deve recair sobre o crítico, e não sobre
a Bíblia.
192 q EM DEFESA DA FÉ
Ponderações
Perguntas para reflexão ou estudo em grupo
~~~;,i;4!!:8:@d;o:;;;#~~~~~--;m ~\EIiI$!t$!~V ;r~. '{mUi mrwm%~,:"-";W'f'''jM). nu .'.I!~
45João 8.58.
198 q EM DEFESA DA FÉ
você faria para buscar uma resposta? Tente formular a
sua pergunta de modo tão sucinto quanto puder e faça
uso de recursos da internet ou de bibliotecas, inclusive
os livros listados abaixo, e veja se há uma explicação
que possa satisfazê-lo.
3\1: Robert J. WAGMAN, The First Amendment book, New York: Pharos
Books, 1991, p. 106. \1: tb. Chaplinsky versus New Hampshire, 315
U.S.,568 (1942).
4\1: Cohen versus Califórnia, 403 U.S., 15 (1971).
5João 14.6.
6\1. The myth of Christiati uniqueness, (Londres: seM Press, 1987), p.
141.
"Dis porrível em: http://cnn.com/transcripts/OOO 1/12/lkl. OO.htrnl.
Acesso em: 13 jan. 2000.
É ofensivo aiirmar que Jesus é o único caminho para Deus 9 201
"Citadc em Paul COPAN, True for you, but not for me, p. 34.
"Ravi ZACHARIAS, Pode o homem viver sem Deus?, São Paulo: Mundo
Cristão, 1995, na introdução escrita por Charles Colson, IX.
l°Farewell to God, p. 27.
l1Atos 4.12.
12Farewell to God, p. 27, (ênfase minha).
202 q EM DEFESA DA FÉ
A arrogância do cristianismo
- Perdoe-me por ser tão direto - exclamei ao introduzir a
minha pergunta - , mas não seria muito arrogante da parte
dos cristãos insistir que Jesus é o único e exclusivo caminho
para Deus? Por que os cristãos imaginam ter direito de asse-
verar que estão certos e o resto do mundo está errado?
Apesar do sotaque de Zacharias e de seu traje executivo
conservador - camisa branca engomada e gravata sóbria -
lhe dessem um ar formal, comportou-se de modo entusiásti-
co, caloroso e simpático em suas respostas.
- Lee, eu tenho ouvido tantas vezes essa pergunta, especi-
almente no Oriente - disse com voz animada e com olhos
que pareciam sinceros e preocupados. - A primeira coisa que
procuro fazer é tentar lidar com as informações errôneas que
são inerentes à indagação.
- Informações errôneas? - perguntei. - Como o quê?
- Primeiro - rebateu - é importante entender que o
É ofensivo afirmar que Jesus é o único caminho para Deus P 205
cristianismo não é a única religião que manifesta exclusivi-
dade. Por exemplo, os muçulmanos reivindicam exclusivi-
dade de modo radical - não só teologicamente, mas tam-
bém lingüisticamente. Os muçulmanos acreditam que o úni-
co, suficiente e consumado milagre do islã é o Alcorão. Di-
zem, contudo, que só é inteligível em árabe, e que qualquer
tradução o dessacraliza. E não se exige apenas uma noção
elementar do árabe, mas o conhecimento sofisticado dessa
língua. Quanto ao budismo, surgiu quando Gautama Buda re-
jeitou duas afirmações fundamentais do hinduísmo - a auto-
ridade última dos Vedas, que são as suas escrituras, e o siste-
ma de castas. O próprio hinduísmo é absolutamente intransi-
gente em duas ou três questões: a lei do carma (que é a lei de
causa e efeito moral, de modo que todo nascimento é um
renascimento que recompensa a vida anterior), a autoridade
dos Vedas e a reencarnação.
Interrompi.
- Mas ouvi alguns hindus dizerem com muita nobreza
que o hinduísmo é uma fé muito tolerante - insisti, pensan-
do em afirmações como a que foi feita por Swami Vivekenanda
na parte inicial deste capítulo.
Ele sorriu.
- Toda vez que você ouvir essa afirmação, não a enten-
da no seu sentido aparente - explanou. - O que realmen-
te significa é que o hinduísmo lhe permite praticar a sua
religião contanto que ela aceite a noção hinduísta de ver-
dade, que é sincretista. O sincretismo é a tentativa de mis-
turar crenças diferentes ou até mesmo opostas. Quanto ao
siquismo - continuou - , surgiu como um desafio tanto ao
hinduísmo quanto ao budismo. Depois existem os ateus -
rejeitam os pontos de vista dos que crêem em Deus. E até
mesmo o hahaísmo, que afirma ser um abraço cósmico de
todas as religiões, acaba excluindo os exclusivistas! Portan-
to, a afirmação de que os cristãos são arrogantes por reivin-
dicarem exclusividade ignora a realidade de que todas as
outras grandes religiões fazem o mesmo. Assim, quando as
206 q EM DEFESA DA FÉ
Sobre os elefantes e a fé
Mesmo que Zacharias estivesse certo a respeito do cristianis-
mo, isto significaria necessariamente que todas as outras reli-
giões são falsas ? Talvez no fundo todas elas ensinem as mes-
mas verdades fundamentais utilizando uma linguagem dife-
rente, imagens distintas e tradições diversas para comunicar
convicções essencialmente idênticas.
- Algumas pessoas dizem que, quando se retiram os as-
pectos secundários, todas as religiões mundiais ensinam em
essência a paternidade universal de Deus e a fraternidade
universal da humanidade - disse. - Isso significaria que to-
dos os sistemas religiosos do mundo são igualmente válidos.
Zacharias balançou a cabeça, expressando desaprovação
em seu rosto:
- Somente quem não compreende as religiões mundiais
afirmaria que elas basicamente ensinam a mesma coisa -
retrucou.
- O que elas querem dizer com paternidade universal de
Deus quando o budismo nem mesmo insiste que haja um
Deus? O que queremos dizer com a paternidade de Deus
quando Shankara, um dos mais respeitados filósofos hindus,
14
2 Pedro 1.16.
212 q EM DEFESA DA FÊ
16João 1.1,14.
214 q EM DEFESA DA FÉ
E quanto a Gandhi?
Ainda assim, a minha mente estava voltada para Gandhi.
- Ele não seguiu Jesus - alertei. - Portanto, suponho
que o senhor diria que não foi redimido.
17Gênesis 18.25c.
18~ Salmos 24.3,4.
É ofensivo aiirmar que Jesus é o único caminho para Deus 9 217
21Atos 17.26,27.
É ofensivo afirmar que Jesus é o único caminho para Deus P 221
Tirando os óculos, Zacharias voltou-se para mim.
- Isso é importante - disse - porque mostra que existe
um plano soberano na criação em que se atribuiu a cada pes-
soa um lugar de nascimento. Deus sabe onde iremos nascer e
crescer, e nos coloca em uma posição em que poderemos buscá-
lo. É-nos dito claramente que, onde quer que vivamos, em
qualquer cultura, em qualquer nação, ele está ao alcance de
cada um de nós. Sempre existe a possibilidade de uma pessoa
clamar de joelhos: "Deus, ajude-me", e se isso acontecer exis-
tem meios que estão além da nossa compreensão pelos quais
Deus pode servi-la.
- Por exemplo?
- Por exemplo, poderia enviar alguém para partilhar o evan-
gelho com eles. Deixe-me dizer o que aconteceu com uma mu-
çulmana que trabalhava para uma instituição muito conhecida
do seu país. Ela me disse que estava saindo do escritório no
final de uma jornada de trabalho e se sentia muito infeliz. En-
quanto caminhava, murmurou: "Não sei por que estou tão va-
zia", e em seguida, sem mais nem menos, disse: "Jesus, podes
ajudar-me?". Ela parou na calçada e disse para si mesma: "Por
que mencionei o nome dele?". Bem, essa mulher acabou tor-
nando-se cristã. No caso dela, acho que Deus viu um coração
faminto por ele, mas não sabia como alcançá-lo no claustro da
sua existência. Acho que nesse caso Deus estava rompendo as
barreiras do ambiente dela porque ela já estava rompendo as
barreiras da sua vida interior, buscando por ele. Desse modo,
Deus pode estender-se em qualquer cultura, para responder a
alguém que queira conhecê-lo. Outra maneira de encarar essa
questão vem de Romanos, em que Paulo diz que a divindade e o
poder infinito de Deus são revelados a todos através da criação."
Paulo afirma que Deus colocou a lei no nosso coração e na nossa
consciência para que possamos buscá-lo;" E ele fala sobre a pa-
lavra de Cristo, que é necessária para que uma pessoa venha a
22Romanos 1.20.
23Romanos 2.14,15.
222 q EM DEFESA DA FÉ
24Romanos 10.14,15.
É ofensivo afirmar que Jesus é o único caminho para Deus » 223
Ponderações
Perguntas para reflexão ou estudo em grupo ..->;,,;;";;::;.:;~";;;;;;::;;o;;-;t;'o:,,":;;);:;):,,t::;~;:6:;t';;;;';;:-.,.j;;.:;t<:;ol~~;t:;;:::I:;;t;;;l~u';;%~l.id~;.;t,ilt;d:2l'~;:':::-'oi~~:;;:\1.;;;d;:;.ui.,~mri;l;.;:;:i!:!1i~~;~ii~u;:iúiin.iól;1i~l.~w0
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25Jeremias 29.13.
228 q EM DEFESA DA FÉ
mente absurda?". 4
Essas são questões difíceis e de forte conteúdo emocional.
Precisava das respostas de uma autoridade firme, de alguém
que não recuasse diante de desafios honestos. Olhava pela
janela do avião enquanto os subúrbios de Los Angeles passa-
vam rápido, reluzindo ao sol brilhante. Estava ansioso para
ter o meu encontro pessoal com um filósofo respeitado que
tem se debatido longamente com a perturbadora doutrina da
condenação eterna.
determinado fim, exigindo que elas façam algo que não que-
rem. É isso o que aconteceria se Deus obrigasse todas as pesso-
as a ir para o céu. Se Deus concedeu livre-arbítrio às pessoas,
Lee, então não há nenhuma garantia de que todos preferirão
cooperar com ele. A opção de obrigar todo mundo a ir para o
céu é imoral, porque é desumanizante; priva-as da dignidade
de tomar a própria decisão; nega a liberdade de escolha; e os
trata como meio para um determinado fim. Deus não pode for-
mar o caráter das pessoas em seu lugar, e as pessoas que fazem
o mal ou cultivam falsas crenças iniciam um afastamento de
Deus que finalmente acabará no inferno. Deus respeita a liber-
dade humana. De fato, seria cruel, uma espécie de estupro di-
vino, obrigar as pessoas a aceitar o céu e Deus se realmente
não os quisessem. Quando Deus permite que as pessoas digam
"não" a ele, na verdade as está respeitando e dignificando.
1 lI.~ L .. ~ • j j • I.' I j ~
Um Deus amoroso jamais torturaria pessoas no inferno p 255
se Deus é realmente amoroso, por que não daria uma segun-
da oportunidade às pessoas após a morte no sentido de to-
marem a decisão de segui-lo e irem para o céu?
- Se as pessoas experimentassem o inferno, isso não
lhes daria uma forte motivação para mudarem de idéia? -
perguntei.
- Essa pergunta pressupõe que Deus não fez tudo o que
podia antes de as pessoas morrerem, e eu rejeito isso - ex-
clamou Moreland. - Deus faz tudo o que pode no sentido
de dar uma oportunidade às pessoas, e não haverá uma úni-
ca pessoa que poderá dizer a Deus: "Se o senhor simples-
mente não tivesse permitido que eu morresse prematuramen-
te, se o senhor tivesse me dado mais doze meses, eu sei que
teria tomado a decisão de segui-lo". A Bíblia nos diz que Deus
está protelando o retorno de Cristo à terra para dar a todos o
tempo necessário a fim de que se acheguem a ele. 1 3 Se tudo
que uma pessoa precisasse um pouco mais de tempo para ir
a Cristo, então Deus estenderia o seu tempo de vida na terra
para dar-lhe essa oportunidade. Assim, não há ninguém que
apenas precise de um pouco mais de tempo ou que tenha
morrido prematuramente e que teria respondido a outra opor-
tunidade de receber a Cristo. Deus é justo. Ele não está ten-
tando tornar as coisas difíceis para as pessoas. Creio que cer-
tamente é possível que os que respondem à luz da natureza
que lhes foi dada receberão a mensagem do evangelho, ou
então pode ser que Deus os julgue com base no conhecimen-
to do que eles teriam feito caso tivessem a oportunidade de
ouvir o evangelho. O fato puro e simples é que Deus recom-
pensa os que o huscam.!"
Tratava-se somente de parte da questão.
- Espere um pouco - pedi. - A morte e a consciência da
presença ou da ausência de Deus após a morte não seria algo
muito motivador para as pessoas?
2 Pedro 3.9.
13\1:
Ponderações
Perguntas para reflexão ou estudo em grupo
'~~:i~~i" ,~' 'c; c__ ,- ".0 - ,--." .'. < ~~~~~~:i~;';';' ":,,, ':'~'~~;~;~ _" ;>," '.':''.. _;,', ~ >,~ u' '_OH ,. - _... c;;"" ;~~;: ~".-.~,"~:;:::;"''~"'"i'""-~~~:~~l ,::·i-;·i~~:~3:~2""',";';; ;;.;i:'~~'--;;:;;~:;~~~~~~·~~ ~ V"":~'~;i:; o:: ;"?'.; '" ;'"'~;,~;"'" i""":'~;'i~:~;~~;~"~~~ ~\; ~~; c~
3Court hears how FBl agents bugged judge, de Maurice Possley, pu-
blicado em The Chicago Tribune, 26/4/1985.
4Judge liked "people who take dough", Greylord file shows, de Maurice
Possley, publicado em The Chicago Tribune, 27/4/1985.
268 q EM DEFESA DA FÉ
que ele tem uma misteriosa semelhança com o ator Peter Boyle,
Esse homem de 59 anos, parcialmente calvo e pais de três
filhos, usava um suéter branco tipo rede de pescador sobre
uma camisa azul. Nós nos sentamos frente a frente junto à
sua mesa de jantar, coberta de papéis com anotações para um
livro que estava escrevendo em seu período sabático.
Não havia jeito de entrar de leve na nossa conversa. Não com
este tema. Embora a nossa entrevista tenha ocorrido poucos meses
antes de o papa João Paulo II ter feito a histórica confissão públi-
ca pedindo perdão a Deus pelos pecados cometidos ou tolerados
pela Igreja Católica Romana durante seus dois milênios de exis-
tência.?" eu peguei um recorte de jornal em que se noticiava um
reconhecimento anterior de culpa por parte do papa e apontei
para a matéria ao lançar o meu primeiro desafio.
12Mateus 7.21-23.
274 q EM DEFESA DA FÉ
Pecado D. o 1: As Cruzadas
- Vamos em frente - propus a Woodbridge. - Os cruza-
dos cristãos durante dois séculos tentaram expulsar os mu-
çulmanos da Terra Santa.
Abri um livro de história e o folheei até achar a citação cor-
reta. - Um relato horripilante descreveu da seguinte maneira
A história da igreja está repleta de opressão e violência P 279
a entrada dos cruzados em Jerusalém na Primeira Cruzada -
iniciei, lendo para Woodbridge a seguinte descrição de uma
testemunha ocular:
Pecado D. o 2: A Inquisição
A Inquisição começou em 1163 quando o papa Alexandre l i
instruiu os bispos a buscar provas de heresia e a tomar medidas
282 q EM DEFESA DA FÉ
21Dale & Sandy LARSEN, Sete mitos sobre o cristianismo, São Paulo:
Vida, 2000.
A história da igreja está repleta de opressão e violência P 287
Essa questão falou de perto a Woodbridge, cuja família tem
uma longa tradição de serviço missionário. Porém, pareceu
não receber esse desafio em termos pessoais, respondendo com
o equilíbrio e imparcialidade característicos.
- Deixe-me começar com o exemplo da incursão espanhola
na América Latina, porque ilustra como essa questão pode se
tornar complicada - observou.
Acenei com a cabeça concordando, e ele continuou.
- Houve exploração e abuso da população nativa daquela
região? Sim, infelizmente houve. Mas teria sido conseqüên-
cia dos missionários? Bem, a história nos diz que o movimen-
to missionário muitas vezes esteve associado à política eco-
nômica das potências coloniais conhecida por mercantilismo.
- O senhor poderia definir isso?
- O mercantilismo era a crença de que o país que possuís-
se mais ouro seria o mais poderoso. Considerava-se que o equi-
líbrio do poder político na Europa era determinado em parte
pelo país que explorasse com êxito a América Latina e outras
regiões. Em conseqüência, motivações mercantilistas infeliz-
mente se mesclaram com certos empreendimentos missioná-
rios. Certamente é verdade que os espanhóis fizeram coisas
horríveis na América Latina, porém grande parte do que acon-
teceu foi instigado por aventureiros e indivíduos mercanti-
listas, ao passo que muitos missionários fizeram coisas lou-
váveis.
Woodbridge abriu um livro que estava por perto.
- Com efeito, o historiador Anthony Grafton, da Uni-
versidade de Princeton, fala sobre atos apreciáveis que os
missionários praticaram - ressaltou, passando a ler um
excerto do livro New worlds, ancient text [Novos mundos, texto
antigo]:
Pecado n, o 5: Anti-semitismo
Uma das manchas mais feias da história cristã tem sido o
anti-semitismo - uma circunstância certamente irônica, uma
vez que Jesus era judeu e afirmou ser o longamente esperado
Messias de Israel e do mundo. Os seus discípulos eram ju-
deus e foram judeus que escreveram todo o Novo Testamento,
A história da igreja está repleta de opressão e violência P 2"91
à exceção de Atos e do terceiro evangelho, que foram escritos
pelo médico não judeu Lucas.
Em 1998, a Igreja Católica Romana pediu desculpas pe-
los "erros e falhas" de alguns católicos por não terem auxili-
ado os judeus durante o Holocausto, ao passo que o cardeal
Iohn O'Cormor, de Nova York, expressou "profunda triste-
za" devido ao anti-semitismo existente nas igrejas ao longo
dos anos, dizendo: "Nós queremos sinceramente iniciar uma
nova era. "24
Woodbridge admitiu de pronto que, lamentavelmente, o
anti-semitismo maculou a história cristã. A questão principal
é por que isso afinal aconteceu.
- Um dos fatores foi o seguinte: a maioria dos judeus
achava que Jesus não era o Messias. A recusa dos judeus em
aceitá-lo muitas vezes os transformava, na mente de alguns
cristãos, em inimigos de Cristo - afirmou. - Acrescente-se a
isso o fato de que os judeus eram considerados os responsá-
veis pela crucificação de Jesus e você terá dois poderosos com-
ponentes do anti-semitismo "cristão".
Não foi o suficiente para mim.
- Tem de haver algo mais do que isso - insisti.
- Sim, acredito que há - respondeu. - Heiko Oberman,
o conceituado historiador da Universidade do Arizona, tem
tentado identificar alguns outros fatores. Por exemplo, quan-
do se chega à Idade Média e à Reforma, havia um grande nú-
mero de falsos rumores acerca dos judeus que lançavam mais
lenha nas fogueiras anti-semitas.
- Que tipo de rumores?
- De que tinham se envolvido no envenenamento de po-
ços na época da Peste Negra de 1348, que profanavam os sacra-
mentos cristãos sempre que podiam, realizavam sacrifícios
humanos secretamente, adulteravam as Escrituras cristãs, e
assim por diante. Tenha em mente que essas acusações eram
Um retrato do cristianismo
Poderíamos continuar analisando outras manchas históricas
do cristianismo, incluindo a opressão às mulheres, que tem
ocorrido a despeito da atitude contracultural de Jesus com
relação a elas, e a maneira pela qual muitas pessoas do sul
dos Estados Unidos outrora citavam a Bíblia na tentativa
distorcida de justificar o racismo e a escravidão. Mas já passa-
ra bastante tempo interrogando Woodbridge. Sem tentar de-
fender o indefensável, procurou fornecer algum esclarecimen-
to e explicações. A fim de averigüar se tais episódios eram
exceções ou a regra do cristianismo, era hora de explorar o
outro lado da história cristã.
~ Levando em conta tudo o que analisamos - disse, -
qual é a conclusão? O mundo está em melhor ou pior situação
com o cristianismo?
Woodbridge endireitou-se na poltrona.
~ Em melhor situação - ponderou. - Não há dúvida
quanto a isso. Esses são exemplos históricos lamentáveis que
não devem ser varridos para baixo do tapete. Devemos nos
desculpar por eles e fazer um esforço para assegurar que não
voltem a ocorrer. Ao mesmo tempo, porém, a vasta amplitude
da história cristã tem sido muito benéfica para o mundo.
A história da igreja está repleta de opressão e violência P 295
- Suponho que seja fácil, ao mencionar os pecados do cris-
tianismo, esquecer o papel do ateísmo no desrespeito aos direi-
tos humanos - observei. Peguei um livro e li para Woodbridge
alguns comentários feitos pelo destacado cristão Luis Palau:
As dádivas do cristianismo
As palavras apaixonadas de Woodbridge ainda ressoavam na
minha mente quando cheguei de volta em casa, exausto com
aquele longo dia. Deixei-me cair na poltrona favorita e apa-
nhei uma revista para folhear. Nela, por muita coincidência,
encontrei um artigo em que vários estudiosos, escrevendo nos
últimos dias do século xx, especulavam sobre onde estaria a
civilização sem o cristianismo. Suas observações retomaram
a discussão exatamente no ponto em que Woodbridge havia
parado.:"
Michael Novak exaltou a dádiva da dignidade existente
no cristianismo. "Tanto Platão como Aristóteles sustenta-
ram que a maior parte dos seres humanos é, por natureza,
servil e própria para a escravidão", escreveu. "A maioria
não tem a natureza digna da liberdade. Os gregos aplica-
vam o termo "dignidade" somente a uns poucos seres hu-
manos, e não a todos. Em contrapartida, o cristianismo in-
sistiu que cada ser humano é amado pelo Criador, foi feito
à imagem do Criador e está destinado a uma eterna amiza-
de e comunhão com ele."
Novak apontou as idéias civilizadoras de liberdade, cons-
ciência e verdade que podem ser atribuídas ao cristianismo.
"Sem os fundamentos cristãos a nós oferecidos na alta Idade
Média e novamente no século XVI, a nossa vida econômica e
política em seu conjunto não somente seria muito mais po-
bre", insistiu, "mas também muito mais brutal."
David N. Livingstone, professor da Escola de Geociências
da Queen's University, em Belfast, Irlanda do Norte, concen-
trou-se na dádiva cristã da ciência. "A idéia de que o cristia-
nismo e a ciência estão constantemente em conflito é uma gros-
seira distorção do testemunho histórico", escreveu. "Na ver-
dade, Robert Boyle, o grande químico inglês, acreditava que os
Ponderações
Perguntas para reflexão ou estudo em grupo
~~,·~M~!.':Wit.,.~,~k
.. t. 0.0 1J..Wó.;.,,'! ..!:.l
•• "~'O B#.i:W:i*;i;!~''';!;!,i,mlll~1Hl;ij?U ~1t\lítmw~~~~~lt!'ij.t:<l,M:.mjJ;ij~~
3Y: Reformed Hood comes back to pay his dues, de Lee Strobel, publi-
cado em The Chicago Tribune, 27/10/1977 e do mesmo autor, God's
outrageous claims, Grand Rapids, Michigan: Zondervan, 1997, p. 63-7.
Eu ainda tenho dúvidas, portanto não posso tomar-me cristão p 307
A minha atitude inicial em relação a ele lembra as dúvidas
que havia levantado quando era um cético espiritual. Inicial-
mente, expressei objeções sinceras e conscientes quanto à fé
cristã. Porém, com o passar do tempo, depois que comecei a
encontrar respostas adequadas para essas questões, passei a
levantar outros desafios, cada vez mais secundários.
Certo dia lembrei-me do comentário de Leslie sobre Ron
Bronski e imaginei como ela poderia confrontar-me novamente
com palavras semelhantes: "Lee, você está tentando encon-
trar buracos no cristianismo porque realmente pensa que é
uma ilusão - ou você está levantando objeções porque não
quer que ele seja verdadeiro?"
Aquilo machucou. Quando era ateu, certamente tinha
muitas motivações para encontrar defeitos no cristianismo.
Sabia que meu estilo de vida beberrão, imoral e egocêntrico
teria de mudar se me tornasse um seguidor de Jesus, e não
estava certo de que queria abandonar essas coisas. Afinal, era
tudo o que eu conhecia. Conseqüentemente, em vez de tentar
encontrar a verdade, me vi tentado a afastar a verdade com
dúvidas fabricadas e objeções forjadas.
Não acho que estou sozinho nisto. Muitos que buscam a ver-
dade têm perguntas legítimas acerca do cristianismo e precisam
encontrar respostas que satisfarão o seu coração e a sua alma.
Todavia, acho que alguns aspirantes à verdade chegam ao ponto
em que, inconscientemente, levantam cortinas de fumaça para
disfarçar suas profundas motivações para rejeitar a fé.
O mesmo se pode dizer dos cristãos que se tornam presa de
dúvidas sobre suas convicções. Com freqüência, fazem
irromper um surto de dúvidas sinceras sobre algum aspecto
da sua fé; outras vezes, porém, as alegadas dúvidas da reali-
dade podem ser um sutil mecanismo de defesa. Podem achar
que estão presos à certa objeção a alguma parte do cristianis-
mo, quando na realidade estão apenas buscando uma descul-
pa - qualquer desculpa - para não levar Jesus mais a sério.
Para muitos cristãos, simplesmente ter dúvidas de qual-
quer tipo pode ser assustador. Ficam imaginando se os seus
3 0 8 O EM DEFESA DA FÉ
As raízes da dúvida
Os pais de Anderson eram cristãos comprometidos que per-
tenciam a uma igreja pequena, porém coesa, localizada em
uma região onde havia poucos cristãos. Conta que herdou
sua identidade e senso de valor da família e da igreja, mas
mesmo assim as dúvidas acerca do cristianismo começa-
ram cedo.
- Ainda garoto, tinha uma personalidade triste e contem-
plativa - começou. - Refletia bastante. Estava sempre exa-
minando o lado complicado das coisas, não aceitando nada
de imediato, sempre questionando, sempre sondando um ní-
vel mais profundo. Nunca consegui desvencilhar-me totalmen-
te disso.
Eu sorri. Também tenho sido acusado muitas vezes de fa-
zer perguntas demais.
Eu ainda tenho dúvidas, portanto não posso tomar-me cristão p 311
- Quando o senhor se tornou cristão? - indaguei.
- Fiz profissão de fé em um acampamento de verão quan-
do tinha onze anos, mas me senti espiritualmente mal de-
pois. Esperava-se que eu tivesse entregue minha vida a Jesus,
mas nem mesmo estava certo de que havia um Jesus. Eu me
senti induzido em erro.
- O senhor mencionou os seus sentimentos a alguém?
- Falei com um pastor, mas pareceu não me entender - ,
redargüiu. - Porém, evidentemente ainda orava por cer-
tas coisas. Lembro-me de orar muito para ganhar uma bici-
cleta e jamais ganhei. Isso me fez sentir como se Deus não
estivesse ligado a mim. Pensei: "Vamos ser honestos. Quan-
do a gente ora, não existe nada no alto a não ser o céu azul".
Perguntei se apenas tinha dúvidas ou se houve época em
que a fé floresceu.
- Às vezes realmente sentia a presença de Deus - con-
fiou-me. - Eu cavalgava da escola para casa sob uma tempes-
tade de neve, ao anoitecer, cantando hinos e me sentindo nas
mãos de Deus. Porém, na maior parte do tempo não acredita-
va nele - pelo menos não da maneira como os meus colegas
da igreja acreditavam.
- O senhor tinha medo de que eles pudessem descobrir?
- Com certeza, porque eu tinha uma imensa necessidade
de ser amado e aceito e conquistar uma posição naquela co-
munidade de fé. Tinha muito medo que achassem que eu era
mau; ficariam zangados, pensariam que os meus pais eram
fracassados espirituais. Temia que os meus pais ficassem de-
sapontados ou envergonhados.
É claro, os pais podem desempenhar um papel significati-
vo na formação da idéia que a criança tem de Deus. Na reali-
dade, um estudo mostrou que a maioria dos ateus mais famo-
sos da história - entre eles Bertrand Russell, Jean Paul Sartre,
Friedrich Nietzsche, Albert Camus, Sigmund Freud, Madalyn
Murray O'Hair e Karl Marx - tiveram um relacionamento di-
fícil com o pai ou o pai morreu cedo ou os abandonou em
tenra idade, criando dificuldades para que eles acreditassem
312 q EM DEFESA DA FÉ
Espécies de dúvida
Anderson já se descreveu como um "questionador nato" ou
alguém que está sempre perguntando: "Que tal se?" Como
advogados e contadores que são treinados para identificar o
que poderia dar errado, os questionadores natos são atraídos
como ímãs para incertezas e indagações. Podem estar ansio-
sos e preocupados ou portar uma personalidade tristonha. Para
eles, a fé não acorre naturalmente.
Mas esta é só uma espécie de dúvida. Pedi a Anderson para
me dar exemplos de outros tipos.
Recostou-se na cadeira, inclinando-a levemente para trás,
balançando-a suavemente para cá e para lá.
- Oh, existem muitos tipos diferentes - agregou. - Al-
guns céticos são rebeldes, muito embora possam não conside-
rar-se assim. Exibem aquela atitude: "Eu não vou deixar que
alguém dirija a minha vida ou pense por mim". Isso pode as-
sumir a forma de um orgulho arrogante. Às vezes, um jovem
314 q EM DEFESA DA FÉ~
o que a fé não é
Sabia que idéias errôneas a respeito da fé com freqüência
abrem portas para as dúvidas, porque podem criar falsas
expectativas ou incompreensões sobre a natureza de Deus.
Por exemplo, se as pessoas pensarem equivocadamente que
Deus prometeu curar a todos ou tornar todos ricos se apenas
316 q EM DEFESA DA FÉ
A decisão de crer
Quando pedi que Anderson falasse mais sobre o papel da fé e
da vontade, ele imediatamente trouxe à tona, à guisa de ilus-
tração, o personagem do Antigo Testamento, Abraão.
- Ele foi chamado o "pai da fé" - lembrou Anderson, -
mas isso não significa que nunca teve dúvida, que sempre fez a
coisa certa, que os seus motivos sempre foram puros. Abraão
falhou nesses três aspectos. Mas ouça - Abraão nunca aban-
donou a sua vontade de seguir a Deus. Dizia: "Eu vou confiar
nele - não faria o rei de toda a terra o que é certo7". Ele não
desistiu de Deus. Uma definição de fé é a vontade de crer. É a
decisão de seguir a melhor luz que se tem a respeito de Deus e
não desistir. A idéia da escolha percorre toda a Escritura. Ob-
serve [osué, Ele diz que você deve escolher hoje a quem irá
servir, mas que ele e a sua casa servirão ao Senhor. Assim, a fé,
na sua raiz mais profunda, é uma decisão da vontade.
322 q EM DEFESA DA FÉ
8 Grifo do autor.
Eu ainda tenho dúvidas, portanto não posso tomar-me cristão p 323
- É uma escolha que devemos fazer sem ter em mãos as
informações completas que gostaríamos de ter - observei.
- Correto. Do contrário, oque teríamos seria conhecimen-
to, e não fé.
- Fale sobre esta diferença.
Anderson colocou a Bíblia de volta sobre a mesa e percor-
reu a sala com o olhar em busca de urna ilustração improvisa-
da. Aparentemente sem ter achado o auxílio procurado, en-
fiou a mão no bolso e a puxou. - Bem - disse - estou segu-
rando algo. Você sabe o quê?
- Uma moeda - tentei adivinhar.
- Mas você não tem certeza - retrucou. - Essa é a sua
opinião. A nossa fé não é a nossa opinião. Digo que tenho um
quarto de dólar na mão. Você acredita nisso?
- Claro - rebati.
- Estou lhe dizendo que é verdade, mas você não a viu. Isso
é fé. Hebreus diz que a fé é a prova das coisas que não vemos.
Anderson sorriu.
- Observe como destruo completamente a sua fé. Abriu a
mão e mostrou um quarto de dólar.
- Agora não é mais fé; é conhecimento. Jogou a moeda
sobre a mesa. - Às vezes as pessoas acham que ter fé é saber
que alguma coisa é verdadeira acima de qualquer dúvida, e as-
sim procuram provar a fé através de evidências empíricas -
sentenciou. - Mas essa é uma abordagem incorreta.
Apontou para a moeda.
- Você pode ver e tocar a moeda; portanto, não necessita
de fé. Deus, por suas próprias razões, não se sujeitou a esse
tipo de prova.
- Em vez disso, as pessoas deviam fazer o que você fez no
livro Em defesa de Cristo - você se apoiou em evidências
corroborativas. Você mostrou como diferentes conjuntos de
evidências apontam de modo convincente para Deus. E isso
constrói algo muito importante- abre espaço para fazer uma
escolha ao darmos um passo de fé na direção que as evidênci-
as apontam.
324 q EM DEFESA DA FÉ
o exercício da fé
Decidir acreditar, ir aonde a fé se encontra, utilizar recursos que
edificam a fé, esclarecer o objeto da fé - todas essas recomen-
dações certamente eram boas. Mas algo ainda parecia faltar.
- Em algum momento, a jornada da fé precisa começar -
repisei. - Como isso pode acontecer?
- Ficar sentado e refletir a respeito da fé e da dúvida nun-
ca fará de ninguém um crente - foi a resposta de Anderson.
- Nem o fará a leitura de todos os livros certos ou a compa-
nhia das pessoas certas ou até mesmo a tomada da decisão de
crer. Em última análise, você precisa iniciar o exercício da fé
fazendo o que a fé faria. Jesus disse que se permanecermos
firmes na sua Palavra - isto é, continuarmos a fazer o que ele
diz - seremos verdadeiramente seus discípulos." Ser discí-
pulo significa que você é um "seguidor aprendiz". E se for um
seguidor aprendiz, você conhecerá a verdade e a verdade o
libertará. Conhecer a verdade não significa encher a sua cabe-
ça de conhecimentos; trata-se de "conhecer" em hebraico, que
não é reunir informações. É conhecimento experimental. Como
Adão e Eva - ele simplesmente não sabia o nome e endereço
dela; ele a experimentou. Para exercitar a verdade e ser liber-
to, você precisa ser um seguidor aprendiz. Em outras pala-
vras, faça o que Jesus diz e você experimentará a validade de
suas palavras. É mais ou menos como andar de bicicleta. Não
dá para aprender assistindo a um vídeo ou lendo um livro;
você precisa montar na bicicleta e sentir como é.
9João 8.31,32: Disse Jesus aos judeus que haviam crido nele: "Se
vocês permanecerem firmes na minha palavra, verdadeiramente serão
meus discípulos. E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará".
Eu ainda tenho dúvidas, portanto não posso tomar-me cristão p 327
- E como uma pessoa deve agir? - perguntei.
- Você diz: - Ouvi algumas coisas que Jesus ensinou. Pare-
cem boas idéias, mas não sei se são verdadeiras. Por exemplo,
ouvi Jesus dizer que mais bem-aventurado é dar que receber.
Como posso saber se isso é verdade?' Bem, mil debates não irão
prová-lo. Mas quando você se tornar generoso, compreenderá
que é verdade. Você poderia dizer: "Oh, talvez Jesus tenha adivi-
nhado isso por acaso". Então continue exercitando. Você ficará
surpreso em ver quantas vezes Jesus "adivinhou" corretamente!
Eu peguei a Bíblia de Anderson, folheando-a até chegar a
salmos 34.8.
- O rei Davi declarou: "Provem, e vejam como o SENHOR é
bom - disse. - E-- disso que o senhor está falando?
- Essa é a idéia. Quanto mais você fizer isso - enfatizou,
- mais você será fortalecido experimentalmente pela evidên-
cia da fé."
Esperava que Anderson explicasse melhor, mas ele estan-
cou com esse comentário. Olhou de lado enquanto punha em
ordem suas idéias. Passou a falar comovidamente sobre exer-
cício da fé.
A fé como verbo
- Eu sei, Lee, que você é um ex-ateu - disse Anderson. -
Provavelmente, você poderia levantar uma centena de per-
guntas a respeito de Deus que eu não saberia responder. Mas
sabe de uma coisa? Isso não importa, porque eu descobri que
essas coisas são verdadeiras. Eu não desenvolvi um sorriso
abobalhado e olhar sem brilho. Descobri que é mais abençoa-
do dar que receber. Tenho convivido com isso. Toda vez que
descubro uma nova idéia, toda vez que Jesus fala comigo pes-
soalmente do jeito que nem sei reproduzir, toda vez que prati-
co os seus ensinos e experimento os resultados - bem, de-
pois de algum tempo não me importo quantas perguntas inte-
lectuais você pode formular, querendo demonstrar por que
isso não pode ser verdade. Eu sei que é verdade.
32-8 q EM DEFESA DA FÉ
Tendo fé na dúvida
Voando de volta para Chicago naquela mesma noite, o avião
semi-vazio, reproduzi mentalmente a entrevista com Ander-
sono Descobri que concordava com a sua avaliação sobre o
papel da dúvida. Embora possa ser desconcertante e eventu-
almente tornar-se destrutiva se deixada sem solução, a dúvi-
da certamente pode trazer benefícios. Identifiquei-me com a
posição de Gary Parker no seu livro The gift of doubt [O dom
da dúvida]:
Ponderações
Perguntas para reflexão
i', """
ou
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estudo
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em grupo ;.:;, i ;,~~:;;m,;; ,~;";:::,,,:::~ i;;
'~.~.l.;.~~~i:i;:;J~<i"\~W i~~;"\;"\~~~~~~~~\'::"\x;~p,a,-;n~~~~::::;;, ;~:; H "'~i.~; ~".;;-;.,' ";.::,.;;~,.,,,;., ,;;r<-i; ; ;~,.r;,.,:;':',>.;~;;:;;ri; ";.;~;.;~;., ,;:0.,; ";+<C, ;~; ''i':'''i;'':';~":'i''; ~'.:i'~;';~i."'G.' ,; ;~i:;~;';'i:"fJ~f"r;i:'!-!'::~:'~ ii:~;i:~F:; ;;'"'" ;;,=;-; ",1"., ,+i~+~'::,~ ,,.i.;f?il-i .'' "';::i<-!'i:'!-i''
tranho, mas simplesmente não pode ser verdade que ela es-
teja me traindo. Tem de haver outra explicação." Suponha
agora que, sem eu saber, ela tenha recebido um telefonema
de um homem que a ajudou a tornar-se um cristão há vinte
anos. Ele estava na cidade e ela não o via há duas décadas;
encontraram-se no shopping e estavam mostrando fotos das
famílias, contando reminiscências. Ele estava se preparando
para viajar para outro país e talvez ela nunca mais o visse.
Desse modo, como irmão e irmã, inocentemente seguraram
as mãos um do outro e assim foram vistos. Bem, isto é seme-
lhante à análise da racionalidade do inferno. Você pode estar
336 q EM DEFESA DA FÉ
Explicando as evidências
Cada uma das "oito grandes" objeções precisa ser avaliada
à luz dessas esmagadoras evidências positivas a favor da exis-
tência de Deus e da divindade de Jesus Cristo. Por exemplo,
como Peter Kreeft admitiu em nossa entrevista, o sofrimento
que há no mundo representa uma certa evidência contrária à
existência de Deus - mas no fim ele é soterrado por uma
avalanche de outras evidências de que Deus existe, que ele
nos ama e que até pode redimir o nosso sofrimento e extrair
dele o bem. Essa montanha de evidências pode nos dar a cer-
teza que, muito embora possamos não entender plenamente
a razão da existência do sofrimento ou do inferno, podemos
confiar que Deus é justo, que ele age de modo apropriado e
que um dia teremos uma explicação mais profunda.
Embora cada um dos oito obstáculos seja sério, nenhum
deles foi capaz de suplantar os outros dados que apontam de
modo persuasivo para a veracidade do cristianismo. Quando
era ateu, percebi que precisaria fazer mais do que simples-
mente levantar objeções ao acaso a fim de invalidar o cristia-
nismo; teria de apresentar um cenário não-teísta que iria in-
cluir todos os fatos que acabei de relacionar. Mas o ateísmo
não pode explicar de maneira crível o big-bang, o ajuste preci-
so do universo, o surgimento da vida, a existência de leis
Conclusão: o poder da fé }) 341
A vontade de crer
A reflexão de Willard chegou ao cerne da minha jornada
espiritual. Se quisesse, poderia continuar tentando subesti-
mar a palavra dos especialistas entrevistados, não importa
quão bizarros ou detalhistas meus argumentos eventualmen-
te tivessem sido. E, creia-me, a minha mente é plenamente
capaz de forjar todos os tipos de réplicas, desculpas e contra-
argumentos - mesmo em face de uma verdade evidente.
Em última análise, no entanto, a fé não consiste em ter
respostas perfeitas e completas para cada uma das "Oito
Grandes" objeções. Afinal, nós não exigimos esse nível de
prova conclusiva em qualquer outra área da existência. O
ponto principal é que certamente temos evidências sufici-
entes sobre Deus com base em que devemos agir. No fim,
essa é a questão. A fé diz respeito a uma escolha, um passo
adiante da vontade, uma decisão de querer conhecer a Deus
pessoalmente. Significa dizer: "Eu creio, por favor, ajude-
..-
me na minha incredulidade!". Como disse Willard: "E à pes-
soa que quer conhecer a Deus que Deus se revela". Ou como
Lynn Anderson me disse: "Quando se cava debaixo da su-
perfície, ou sobrexiste a vontade de crer ou a vontade de
não crer. Esse é o âmago da questão".
Estava grato por não ter de jogar fora o meu intelecto para
me tornar um cristão. As evidências positivas de que Jesus é
o Filho de Deus, único, e as respostas convincentes às "oito
Conclusão: o poder da fé 9 345
nAlguém santo"
Contudo, a transformação de Moore foi tão profunda que
as pessoas começaram a prestar atenção. Madre Teresa e outras
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Reafirmando a fé
Essas três cenas sintetizaram a minha procura por respos-
tas para as "Oito Grandes" questões, ao longo de um ano. A
primeira cena enfatiza a magnitude do argumento geral a favor
de Cristo e a disponibilidade de respostas sólidas às pergun-
tas mais difíceis sobre a fé cristã. Em outras palavras, existe
72 Coríntios 5.17.
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Tiragem Ano
123456789 09 08 07 06 05 04 03 02
Formato. 14 x 21 em
Mancha _ 11,5 x 17,5 em
Tipo e corpo/entrelinha _ ZapfElliPtBt 11113 (texto),
10/12 (citações), 7/8,4 (cabeçalho ímpar),
10/14,2 (texto em destaque);
Oprima 20/20,4 (títulos);
ZapfElliPtBt 12/14,2 (subtítulos) e
Equipe de realização 7/8,4 (cabeçalho par)
Papel. Off-Set 75 g/m 2 (miolo),
Produção gráfica Cartão Supremo 250 g/m 2 (capa)
•
Produção editorial
Coordenação
ROGÉRIO PORTELLA
Edição de texto
MAXALTMAN
Revisão de provas
REGINALDO DE SOUZA
Projeto grdfico
DOUGLAS LUCAS
Diagramação
IMPRENSA DA FÉ
Capa
DOUGLAS LUCAS