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Diana Palmer - O Homem Misterioso

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O HOMEM MISTERIOSO

Diana Palmer

O magnata Canton Rourke se sentia


arrasado... e tudo por causa de sua vizinha Janine
Curtis. Estava seguro de que se tratava de caçá-lo,
tinha ido ao Cancún, México, a descansar com sua
filha, não a apanhar bandidos, nem perseguir
seqüestradores... nem a salvar a aquela mulher das
confusões nos que se metia!
A opinião que seu vizinho tinha dela não era
um segredo para o Janine. Assim estava disposta a
estar à altura da imagem que se feito dela...
enquanto tratava de ignorar como lhe debilitavam os
joelhos cada vez que a resgatava. estaria-se
apaixonando? Aquele homem era um mistério...

Capítulo 1

ERA UMA noite escura e tormentosa... Um par de olhos verdes olharam


fixamente ao menino de doze anos que pronunciou aquelas debulhadas palavras
em tom fantasmal.
O jovem se encolheu de ombros.
—Todo mundo começa assim os livros de mistério, Janine —lhe disse Kurt
Curtis a sua irmã maior com um sorriso.
Janine deslizou uma inquieta mão por seu cabelo negro e curto.
—Eu não —murmurou distraídamente, voltando a olhar a tela de seu Esse
ordenador é o motivo pelo que vendo tantos.
—Diane Woody —entoou Kurt—, autora de grandes êxitos de venda da
série de mistério Diane Woody —franziu o cenho—. por que utiliza seu
pseudônimo para a protagonista de suas novelas? Não te parece redundante?
—Foi idéia do editor. Importaria-te me perguntar mais tarde? —murmurou
Janine—. Estou entupida.
—Acabo de te dar uma idéia —disse seu irmão, sonriendo. Seu cabelo ruivo
e seus olhos azuis faziam que algumas pessoas se perguntassem se realmente
seriam irmãos. Entretanto, era o vivo retrato de seu avô materno.
Seus pais estavam acostumados a dizer que os gens recessivos sempre
acabavam por aflorar. Eram arqueólogos e estavam em uma nova escavação. Esse
era o motivo pelo que Janine estava trabalhando no Cancún, com o Kurt voltando-
a louca. Dão e Joan Curtem, ambos os professores da universidade de Indiana,
estavam no Yucatán com um grupo de arqueólogos, a maioria dos quais tinham que
voltar para suas classes. Já que a jazida maia recém descoberta parecia estar
intacto, os Curtis tinham pedido uma excedencia temporário para poder escavá-
lo. Não teria sido aconselhável que se levaram ao Kurt à selva com eles, pois
acabava de passar uma forte amidalite. Tampouco podiam deixá-lo no colégio
privado ao que assistia.
De maneira que o tinham tirado do colégio dois meses durante os quais
Janine devia fazer-se carrego dele. Tinham alugado uma bonita casa na praia
onde Janine pudesse cumprir seus compromissos com seu editor além de cuidar
de seu irmão pequeno. Este já se recuperou de sua enfermidade, mas Janine
devia seguir com ele durante ao menos um mês, e devia reunir seus trabalhos de
tutora com seu trabalho. Em sua última mensagem através de Internet, o
professor Curtis dizia que a escavação ia de maravilha e que prometia converter-
se em um lugar de grande importância para a arqueologia.
Janine supunha que assim seria. A vantagem daquela situação era que podia
desfrutar daquela preciosa vila no Cancún junto à praia. Podia escrever
escutando o som das ondas. Normalmente, aquilo a inspirava. Sempre que Kurt
não estivesse tratando de ajudá-la, é obvio.
Além disso, sentia-se um pouco nervosa, porque estavam em setembro,
época do ano em que estava acostumado a concluir a temporada de furacões.
Alguém na televisão tinha falado de «ventos assassinos». Poético. E aterrador.
De momento não tinham chegado até ali. E esperava que não o fizessem. depois
de tudo, quase estavam em outubro.
—Fixaste-te em nossos vizinhos? —perguntou Kurt—. Há um nome grande
com pinta de amargurado e uma garota de minha idade. O nunca está em casa e
ela se passa o dia sentada no mole, olhando ao mar.
—Sabe que não tenho tempo para os vizinhos —murmurou Janine, olhando a
tela.
—É que alguma vez te detém cheirar as flores? —perguntou Kurt, molesto
— Te converterá em uma velha solteirona se seguir assim.
—Converterei-me em uma velha solteirona rica —replicou Janine
distraídamente—. Além disso, está Quentin.
—Quentin Hobard —murmurou Kurt, elevando as mãos—. Deus santo,
Janine, ensina história antiga!
Janine olhou a seu irmão.
—Ensina história medieval, fundamentalmente o Renascimento. Se o
tivesse escutado alguma vez, teria comprovado que sabe muito a respeito.
—Não posso esperar a reviver a Inquisição Espanhola —disse Kurt
burlonamente.
—Não foi tão horrível como sugerem esses velhos filmes —replicou Janine
—. E agora, faz o favor de me deixar tranqüila, ou morreremos de fome.
—Não acredito —disse Kurt, crédulo—. Sempre ficarão os direitos de
autor.
—Assim aos doze anos já é todo um assessor fiscal.
—Tudo o que sei o aprendi que ti. Sou um menino precoce devido a que sou
o filho pequeno de um casal de cientistas.
—Seria precoce embora fosse o filho pequeno de um casal do
Neanderthals.
—Sabia que a «h» do Neanderthal é muda e não se pronuncia? escreveu-se
mau. É uma palavra alemã.
Janine elevou uma mão, exasperada.
—Não necessito classes de pronúncia. Necessito paz e silêncio!
—De acordo, captei a mensagem. Sairei a pescar uma serpente de mar.
Janine nem sequer olhou a seu irmão.
—Estupendo. Se pescas uma, grita. irei tirar te fotos.
—Estaria-te bem empregado que pescasse uma.
—Sim. Com um pouco de sorte, se o fizesse te comeria, e eu me passaria a
vida nesta praia com uma lanterna, como Heathcliff, vagando pelo páramo.
—Equivoca o argumento. Sou seu irmão, não sua noiva.
—Mas que listillo é.
Kurt fez uma careta e abriu a porta trilho do estudo.
—Fecha! —gritou Janine—. Assim escapa o ar frio!
—Deus santo! —Kurt se voltou para sua irmã com olhos brilhantes—. Acabo
de ter uma idéia! Quer saber como se poderia evitar o aquecimento global da
terra? Todo mundo deveria acender o ar condicionado e deixar abertas as portas
e as janelas...
Janine lançou uma almofada em direção a seu irmão. Este saiu
imediatamente e fechou a suas costas as portas corrediças. Logo, com as mãos
nos bolsos, encaminhou-se para a casa vizinha, em cujo mole se achava sentada
uma menina magra vestida com calças curtas, camiseta e uma boina com a viseira
na parte traseira da cabeça.
—Olá —saudou Kurt.
A menina se voltou. Por sua expressão, não parecia sentir-se especialmente
feliz.
—Quer vir comigo a pescar serpentes de mar? —perguntou Kurt.
A menina elevou as sobrancelhas. Sorriu e seu rosto trocou. Baixou
correndo as escadas do mole. Era loira e tinha os olhos azuis.
—Brinca? —perguntou.
Kurt se encolheu de ombros.
—Viu a alguém apanhar uma serpente de mar por aqui?
—Não —respondeu a menina.
—Estupendo! —Kurt sorriu, fazendo ressaltar as numerosas sardas de seu
rosto.
—Estupendo?
—Se ninguém a apanhou, é que ainda segue por aqui —sussurrou Kurt,
assinalando para o oceano—. Pensa nos benefícios. Poderíamos vendê-la a uma das
lojas da zona e nos forrar!
Os olhos da menina brilharam.
—Que grande ideia!
Kurt suspirou.
—É-o. Mas o certo é que não sei como fazer uma serpente de mar.
—Uma faxineira —aventurou a menina—. Um peixe morto. Algumas plumas.
Uma mangueira e pintura cinza.
Uma alma geme-a! Kurt se sentiu no paraíso.
—É um gênio!
A menina sorriu.
—Meu papai sim que é um gênio. Ensinou-me tudo o que sei —suspirou—.
Mas se falsificar algo, castigará-me para o resto de minha vida. Assim suponho
que acontecer...
Kurt fez uma careta.
—Sei a que te refere. Meus pais enviariam a uma academia militar.
—Sério?
—Ameaçam-me com isso cada vez que me meto em alguma confusão. Não
me importa o internato, mas ódio os uniformize!
—Eu também, a menos que sejam uniformizem de beisebol. Este é o ano.
Por fim os Braves ganharão a liga! —assegurou a menina.
Kurt lhe dedicou um largo e pensativo olhar.
—Bom, já veremos.
—É fã dos Braves?
Kurt nunca se preocupou muito pelo beisebol, mas a ela parecia lhe
importar muito.
—É obvio —respondeu.
A menina riu.
—Meu nome é Karie.
—E eu Kurt.
—Me alegro de te conhecer.
—O mesmo digo.
Caminharam juntos pela praia um minuto ou dois. Então Kurt se deteve e
olhou para trás pela deserta franja de terra.
—Sabe onde encontrar uma faxineira? —perguntou finalmente.
Felizmente alheia ao feito de que seu irmão pequeno acabava de dobrar
seu potencial para o desastre, Janine preencheu a tela de seu ordenador com o
que esperava fora o esqueleto de uma nova novela de mistério. Alguns livros
quase se escreviam sozinhos. Outros exigiam grandes esforços. Este parecia um
desses.
—O que preciso —disse, suspirando—, é uma boa dose de fantasia.
Infelizmente, não havia nada na televisão que queria ver. Além disso, logo
que podia entender nada, pois falavam em espanhol.
Apagou o televisor. O pior daquela viagem era que se estava perdendo sua
série favorita de ficção científica. Gostava de todos os personagens que saíam
nela, mas seu favorito era um arrogante comandante alienígeno que às vezes
podia chegar a ser realmente matreiro. Janine se tinha passado a última
temporada suspirando por ele em lugar de fazer o trabalho pelo que lhe pagavam.
Esse era um dos motivos pelos que tinha aceito ir ao Cancún com seus pais e Kurt,
para escapar daquele personagem de ficção que estava danificando sua carreira
de escritora.
—Já basta! —murmurou para si—. Deus santo! Parece que ainda estou no
colégio idolatrando a algum professor!
levantou-se e caminhou pela habitação. Comeu umas bolachas. Escreveu um
pouco no ordenador. Quando começou a ficar o sol, sentiu falta da seu irmão.
Kurt estava em um país estranho e não falava mais espanhol que ela.
Nenhum tinha herdado a facilidade para os idiomas de seus pais. Janine falava
alemão com certa fluidez, mas muito pouco espanhol. No Cancún, muita gente
falava maia e consideravam o espanhol sua segunda língua, mas logo que falavam
inglês.
Apagou o ordenador e saiu à praia. Encontrou o rastro das sapatilhas do
Kurt e o seguiu pela areia. protegeu-se os olhos contra o brilho do sol, que já
estava desço no horizonte. Ao ver outros rastros que se uniam às do Kurt,
deteve-se e se agachou. Tinha trabalhado de detetive privado um par de anos,
mas qualquer aficionado teria adivinhado que eram os rastros de uma menina.
Talvez se tratava da menina que tinha mencionado Kurt, a que vivia na casa
próxima. De fato, Janine se achava virtualmente em frente desta.
O ruído das ondas apagou o som de uns passos que se aproximavam. Um
minuto, Janine estava olhando os rastros. Ao seguinte se encontrou frente a um
brilhante par de sapatos negros. Em torno deles caíam borde de umas elegantes
calças. As pernas pareciam subir sem fim. Muito por cima destas, viu uns olhos de
cor azul pálida sob um cenho franzido. O rosto do homem era alargado, de lábios
magros. O inferior era ligeiramente mais volumoso que o superior. Os maçãs do
rosto eram altos e o nariz largo e reta. O cabelo era liso e castanho.
Duas enormes mãos descansavam nos quadris do recém-chegado.
—Posso lhe perguntar o que faz em minha praia? —perguntou com voz
asperamente aveludada.
Janine se ergueu. Era estranho que um completo desconhecido fizesse que
lhe debilitassem os joelhos.
—Estou rastreando para mim...
—Rastreando? —interrompeu ele, como se Janine lhe estivesse mentindo.
Entrecerró os olhos. Parecia extrañamente perigoso, como se nunca sonriera,
como se pudesse mover-se como um raio e estivesse disposto a fazê-lo a menor
provocação.
O coração do Janine pulsou mais rapidamente.
—chama-se Kurt e só tem doze anos —disse—. É ruivo e assim de alto —
fez uma indicação com a mão no ar.
—Esse —murmurou o homem—. Sim, vi-o por aqui. Onde está minha filha?
Janine elevou as sobrancelhas.
—Tem uma filha? Vá! Está lavrada em pedra como você?
A firme e quadrada mandíbula do homem se elevou, confiriéndole um
aspecto ainda mais ameaçador.
—Não a encontro. Havia-lhe dito que não se afastasse.
—Se estiver com o Kurt, encontra-se perfeitamente a salvo —disse
Janine, recordando a vez que seu irmão se perdeu em meio de Paris aos nove anos
e foi capaz de encontrar sozinho o caminho de volta ao hotel sem assustar-se.
Era um menino com muitos recursos.
Mas antes de que pudesse dizer nada daquilo, o homem deu um passo
adiante e inclinou a cabeça.
—Sabe onde estão?
—Não, mas estou segura de...
—Pode que não lhe importe que seu filho ande brincando de correr por aí
como um delinqüente, mas eu eduquei a minha filha de outra maneira —disse ele
em tom depreciativo.
Deslizou o olhar pela roupa de trabalho do Janine com muito pouca
admiração. Levava postos uns jeans velhos cortados à altura dos joelhos, uma
camiseta velha e frouxa que não deixava entrever o mais mínimo as bonitas
curvas que ocultava e umas sandálias de couro bastante desgastadas. Seu cabelo
curto estava revolto pelo vento. Nem sequer levava maquiagem. Imaginava o
aspecto que tinha. O que havia dito o homem? «Seu filho?»
—Espere um momento... —começou a dizer Janine.
—Onde está seu marido? —perguntou ele, interrompendo-a.
Os olhos do Janine cintilaram.
—Não estou casada!
O homem elevou as sobrancelhas expresivamente.
Janine se ruborizou.
—Minha vida privada não é seu assunto —disse, elevando o queixo. As
hipóteses daquele homem, acrescentadas a seu evidente desprezo, puseram-na
furiosa. Teve uma idéia que lhe fez rir interiormente. Adotou uma pose
adequada, decidida a fazer honra à imagem que aquele tipo se feito dela—. Mas
só se por acaso lhe interessa —acrescentou com suavidade—, direi-lhe que meu
filho nasceu em uma comuna. Em realidade, não estou segura de quem foi seu pai,
é obvio.
A expressão do rosto do desconhecido foi inesquecível. Janine lamentou
não ter tido uma câmara a emano para reviver uma e outra vez aquele momento.
—Uma comuna? Aí é onde aprendeu a rastrear? —perguntou ele
enfaticamente.
—OH, não —Janine procurou outra extravagância que lhe contar—. Isso o
aprendi de um francês com o que convivi no Canadá. Ensinou-me a rastrear e a
fazer casacos com as peles dos animais —sorriu—. Também posso disparar.
—Maravilhosas notícias para a indústria da munição, sem dúvida —disse
ele, sonriendo burlonamente.
Janine apoiou as mãos nos quadris e o olhou ao rosto. Era um homem muito
alto.
—está-se fazendo de noite.
—Então será melhor que rastreie rápido, não lhe parece? —o desconhecido
elevou uma mão e assinalou para um homem que se aproximava deles pela praia—.
Sabe onde estão? —perguntou em fluido espanhol.
—Não, sinto muito, senhor. Ninguém os viu! —replicou o recém-chegado.
—Chame à polícia.
—Sim, senhor!
Janine entendeu a palavra «polícia» e seu pulso se acelerou imediatamente.
—Há dito «polícia» vai chamar a? —grunhiu. O único que lhe faltava era ter
que explicar a um agente que tinha esquecido a hora e seu irmão pequeno se
perdeu.
—Fala espanhola? —perguntou ele com gesto incrédulo.
—Não, mas a palavra «polícia» é parecida em muitas línguas.
—Tem uma idéia melhor?
Janine suspirou.
—Não, suponho que não. É só que...
—Papai!
Ambos se voltaram enquanto Karie e Kurt corriam pela praia para eles,
cada um com um chapéu na cabeça e os braços carregados de «souvenirs».
—OH, sinto muito, papai, esquecemos a hora! —disse Karie, ofegando—.
fomos ao mercado do povo e compramos todas estas coisas bonitas. Olhe meu
chapéu! Há-me flanco um dólar.
—E olhe o que tenho eu, her... —Kurt não chegou a terminar a frase, pois
Janine lhe tampou a boca com a mão.
—Muito bem, filho —disse Janine, sonriendo e enfatizando o de «filho»,
advertindo ao Kurt com o olhar que não a contradissera—. Mas já sabe que não
deveria assustar a sua mãe desta maneira —acrescentou, para recalcar seu
propósito.
Kurt se sentiu intrigado. Era evidente que sua irmã maior queria que aquele
homem de aspecto formidável pensasse que era seu filho. De acordo. Podia lhe
seguir a corrente. No caso de, olhou fixamente ao Karie até que esta captou a
idéia e assentiu para lhe fazer saber que tinha compreendido.
—Sinto muito... mami —disse Kurt com um sorriso de desculpa—. Mas Karie
e eu nos estávamos divertindo tanto que nos esquecemos que a hora. E quando
quisemos voltar, demo-nos conta de que nenhum dos dois falávamos espanhol,
assim não pudemos chamar um táxi. tivemos que procurar a alguém que falasse
inglês para que o fizesse.
—Todos os taxistas sabem suficiente inglês para entender uns gestos —
disse o pai do Karie fríamente.
—Não sabíamos —replicou Karie à Este defensiva é meu amigo Kurt. Vive
na casa do lado.
O pai do Karie tampouco pareceu muito impressionado com o Kurt. Olhou a
sua filha.
—Tenho que deter o José antes de que faça que a polícia saia para lhes
buscar. E logo temos que ir —acrescentou—. Vamos jantar com os Elligers e sua
filha.
—OH, não, eles outra vez não —protestou Karie—. Missy quer casar-se
contigo.
—Karie... —o tom de advertência era muito claro.
A menina suspirou.
—OH, de acordo. Suponho que te verei amanhã, Kurt.
—Claro, Karie.
—Pode que encontremos essa mangueira —acrescentou a menina em tom
conspirador.
O rosto do Kurt se iluminou.
—Boa idéia!
—Para que querem uma mangueira? —perguntou o pai do Karie enquanto se
encaminhava com sua filha para a casa, ignorando por completo ao Janine e ao
Kurt.
—Ufff —soprou Kurt quando estiveram a certa distância—. Esse tipo dá
medo!
—Não, não assusta —disse Janine, incomoda—. Só é presunçoso e
arrogante. crie-se um imperador, ou um pouco parecido. Hei-lhe dito que vivi em
uma comuna, que você foi meu filho e que não sei quem é seu pai. Não te ocorra
lhe dizer o contrário —acrescentou quando Kurt tratou de falar—. Quero fazer
honra à imagem que tem de mim!
Kurt riu.
—Está louca —disse—. Você não revista brigar com ninguém.
—Espera e verá —prometeu Janine, olhando as costas do pai do Karie.
—Recorda a alguém —disse Kurt.
—Provavelmente ao diabo —murmurou ela—. ouvi que tem os olhos azuis.
Alguém escreveu uma canção ao respeito faz uns anos.
—Não —murmurou Kurt, ainda pensativo—. Não te resulta familiar sua
cara?
—Sim —admitiu Janine—. Mas o certo é que não o tinha visto antes.
—Brinca? Não sabe quem é? Não o reconheceste? Já é famoso sendo quem
é. Mas pensa, Janine. Imagine o maquiado de cinza.
—Poderia passar por um caranguejo —murmurou Janine distraídamente.
—Não referia a isso —disse Kurt—. Escuta, a esse tipo o chamam mister
Software. É que alguma vez os periódicos nem vê os informativos?
—Não. Deprimem-me.
Kurt suspirou.
—Mister Software acaba de perdê-lo tudo. Durante o ano passado se viu
envolto em um litígio para acautelar uma fusão que teria salvado seu império.
Perdeu o litígio, e com ele, uma fortuna. Agora não pode fundir sua empresa de
software com uma importante empresa de ordenadores. Está aqui para fugir dos
meios de comunicação e para tratar de recuperar-se antes de voltar para ataque.
Já prometeu a seus acionistas que recuperará todo o dinheiro que perdeu. E
seguro que o fará. É um tigre.
Janine franziu o cenho.
—Como se chama?
—Canton Rourke —respondeu Terceira Kurt geração de americanos, neto
de imigrantes irlandeses. Sua mãe era espanhola, não o nota em seu aspecto?
Ganhou milhões desenhando programas para ordenador, e agora quer construir
ordenadores. A companhia que tratava de comprar fez o ordenador que usa você.
E o processador de textos que utiliza foi desenhado por ele.
—Esse Canton Rourke? —perguntou Janine, surpreendida—. Pensava que
era muito major.
—É bastante maior. Está divorciado. Karie diz que sua mãe fugiu ao ver que
seu pai corria o risco de arruinar-se. Pelo visto, gosta de muito as jóias e viver a
todo trem. buscou-se outro homem rico e se casou com ele um mês depois de
obter o divórcio. foi se viver a Grécia. Mas acredito que nunca estavam juntos.
Ele sempre estava trabalhando em algum novo programa enquanto ela assistia a
alguma festa.
—Não parece um multimilionário —murmurou Janine.
—Agora não o é. Por isso dizem na televisão, só ficam suas economias, e
isso não deve ser muito.
—É dessa classe de homem que voltará a subir ao topo —disse Janine
pensativamente—. Os viciados no trabalho fazem dinheiro porque gostam de
trabalhar. Entretanto, à maioria não preocupa muito o dinheiro.
Kurt entrecerró os olhos.
—Ainda não adivinhaste a quem se parece?
Janine se voltou para seu irmão.
—Havia dito algo sobre uma maquiagem cinza...
—Exato. Pensa —acrescentou Kurt, impaciente—. Esses olhos. Essa voz
profunda e suave. Onde a ouve a cada quatro semanas?
—Nas notícias?
Kurt riu.
—Só se as lesse um alienígena.
As divagações do Kurt começavam a adquirir sentido. Cada quatro ou cinco
semanas havia uma estrela convidada no programa favorito de ficção científica
do Janine. Os batimentos do coração de seu coração se aceleraram
alarmantemente. levou-se uma mão à garganta para assegurar-se de seguir
respirando.
—OH, não —disse, agitando a cabeça. Sorriu nervosamente—. Não, não se
parece com ele!
—É obvio que se parece —disse Kurt, assentindo—. A mesma altura e
compleição, os mesmos olhos, e inclusive a mesma voz. Que coincidência, não?
Vamos até México para te afastar da televisão de maneira que possa escrever
seu livro sem que te distraia seu vilão favorito, e resulta que seu dobro está aqui
mesmo, na casa do lado!

Capítulo 2

EU NÃO GOSTO que ande com esse menino —lhe disse Canton a sua filha
quando estiveram de volta em casa—. Não confio em sua mãe.
Karie teve que mordê-la língua para não dizer a verdade. Evidentemente, o
dueto Curtis queria que seu pai pensasse que eram mãe e filho. Karie manteria o
segredo de seu novo amigo, mas não ia ser fácil.
Seus olhos se moveram para o novo livro de mistério que estava sobre a
mesa de café. Um marcador de couro do Canton assinalava por onde ia. O título
do livro era Catacumba, e sua autora era Diane Woody.
Havia uma foto na parte traseira, mas era de uma mulher com corto
comprido, óculos escuros e um chapéu de palha que lhe cobria parcialmente o
rosto. Não se parecia em nada a sua vizinha. Mas o era. Karie sabia porque Kurt
lhe havia dito, não sem orgulho, quem era sua irmã. ficou assombrada ao saber
que se tratava do Diane Woody, a famosa escritora de livros de mistério. Seu pai
era um grande admirador da autora, mas era impossível que a reconhecesse na
foto da contraportada. Talvez era melhor assim. Ao parecer, ela não queria ser
reconhecida.
—Kurt é muito agradável —disse a seu pai—. Tem doze anos. Gosta da
gente. É honesto e amável. E Janine também é agradável.
Canton elevou as sobrancelhas de uma vez que se voltava para olhar a sua
filha.
—Janine? —murmurou, reconhecendo a seu pesar que gostava do som
daquele nomeie em seus lábios.
—Sua mãe.
—averiguaste todo isso em um dia?
Karie se encolheu de ombros.
—Os atos são mais reveladores que as palavras. Não é isso o que sempre
revista dizer?
A expressão do Canton se suavizou um pouco. Adorava a sua filha.
—Mas não volte a ir por aí com ele sem avisar, de acordo?
—De acordo.
—E não vá a sua casa —acrescentou Canton entre dentes—. Porque embora
não possa evitar ter a mãe que tem, não quero que te relacione com ela. Está
claro?
—Sim, senhor.
—Bem. Agora vá vestir te. Não fica muito tempo.
Nos dias sucessivos, Karie e Kurt se fizeram inseparáveis. Karie, como
sempre, assentia a tudo o que seu pai dizia e logo fazia o que lhe vinha em
vontade. Canton estava tão ocupado tentando reorganizar-se que normalmente
esquecia suas ordens aos cinco minutos.
De maneira que Karie e Kurt reuniram parte a parte seus fragmentos para
a serpente de mar, guardando-os sob as casa do Karie para mantê-los a salvo.
Enquanto isso, observaram como se desenvolvia a terceira guerra mundial entre
seus respectivos parentes.
A primeira salva chegou de repente e sem prévio aviso. Kurt tinha ido
jogar beisebol com o Karie. Infelizmente, e dado que procedia de uma família
eminentemente intelectual, Kurt não era muito experiente com o taco de
beisebol. Entretanto, Karie era muito hábil em todo tipo de esportes. Deu- o taco
de beisebol ao Kurt e lhe disse que o fizesse o melhor que pudesse.
Infelizmente, Kurt o fez no primeiro intento.
Canton Rourke entrou sem chamar e carregando como um touro em casa do
Janine. Esta estava totalmente concentrada no quinto capítulo de sua novela, tão
distraída que apenas se fixou nele. Olhou-o como se não estivesse ali.
Canton parecia furioso. Seus olhos cintilavam sob seu cenho franzido.
Sustentava uma bola de beisebol em uma mão. Colocou-a sob o nariz do Janine.
—É uma bola —disse ela amavelmente.
—Sei muito bem o que é —replicou Canton em um tom que tivesse afetado
ao Janine se não tivesse estado tão concentrada na perseguição que tratava de
escrever—. Acabo de recolher a de minha sala de estar. passou através da janela.
—Não deveria permitir que os meninos jogassem beisebol na casa.
—Não estavam jogando na maldita casa! Seu filho a lançou através da
janela, mas desde fora!
Janine elevou as sobrancelhas. Começava a centrar-se no mundo real. Sua
mente perdeu o último laço de conexão com a trama da novela. Guardou o escrito
no ordenador e girou a cadeira para olhar a seu zangado vizinho.
—Tolices —disse—. Kurt não tem nenhuma bola de beisebol. Acredito que
nem sequer tem um taco de beisebol.
Canton lançou a bola para o alto e a apanhou sem dizer nada e sem deixar
de olhar ao Janine.
—De acordo —disse ela, suspirando—. O que quer que faça?
—Quero que ensine a não lançar Pelotas através das janelas de seus
vizinhos —disse Canton secamente—. É muito complicado encontrar por aqui uma
cristalería, sobre tudo uma que faça a reparação com rapidez.
—Ponha um pouco de plástico sujeito com cinta —sugeriu Janine.
—Seu filho é responsável da o imperfeição —continuou Canton com um
zombador sorriso—, assim que você se fará cargo da reparação.
—Eu?
—Sim, você —Canton deixou a bola na mesa, notando-se no ordenador e a
impressora pela primeira vez. Entrecerró os olhos—. O que faz?
—Escrever um best-seller —disse Janine sinceramente.
Canton riu sem humor.
—Claro.
—vai ser muito bom —continuou Janine com crescente aborrecimento—. É
sobre...
Canton elevou uma de suas grandes mãos.
—Em realidade não me interessa escutar os sórdidos detalhes. Estou
seguro de que poderá extrair muito material de seus anos na comuna.
—Claro que posso —assentiu Janine com um sorriso despreocupado—. Mas
ia dizer que é sobre um presunçoso homem de negócios com delírios de grandeza.
Canton elevou as sobrancelhas.
—Que interessante —colocou as mãos nos bolsos e Janine teve que
combater um crescente sentimento de atração por ele. Estava em perfeita forma
para sua idade, que devia rondar os quarenta. Era esbelto, musculoso e sensual.
Não parecia exatamente um modelo, mas havia algo no porte de sua cabeça, na
forma em que a olhava, que fazia que os joelhos lhe debilitassem.
Uma foto autografada que aparecia sob a catapora do camundongo do
ordenador chamou a atenção do Canton. Janine a tinha escondido ali para que
Kurt não a visse e se burlasse dela. Infelizmente, ao mover o camundongo para
salvar o capítulo tinha movido um pouco a catapora, deixando a foto ao
descoberto.
Canton alargou uma mão e atirou do bordo da foto.
—Eu gosto da série de televisão em que sai —disse Janine enquanto ele
olhava atentamente a foto.
—Sério? —Canton riu com suavidade e deixou a foto de uma vez que se
inclinava ligeiramente para o Janine—. Também é uma de minhas séries favoritas
—disse com voz grave e sensual—. Mas saberá que este é o mau, não o herói.
Janine se esclareceu garganta, notando que Canton a havia tuteado e que
estava muito perto para sentir-se cômoda.
—E o que?
—Não recorda a alguém? —perguntou ele.
Janine olhou ao Canton ao rosto. Estava muito perto. Seu coração se
acelerou.
—Não —murmurou, sem apenas voz.
Canton voltou a erguer-se e a olhou com um sorriso tão arrogante que
Janine poderia havê-lo esbofeteado.
—Não tem um império econômico que salvar, ou algo assim? —perguntou,
irritada.
—Suponho que sim. Mas essa série não a dão aqui, ao menos, não em inglês
—acrescentou Canton.
—Sim, sei. Esse foi o propósito de vir aqui —murmurou Janine
distraídamente
—Ah, já vejo. A te liberar do vício, não?
Janine se levantou.
—Não tem direito A...!
Canton riu, interrompendo-a.
—Tenho coisas que fazer. Fará-te cargo da janela, não?
Janine respirou profundamente antes de responder.
—É obvio.
Canton a olhou de cima abaixo com evidente interesse.
—Estranho —disse.
—O que?
—Importa-te que prove uma teoria?
Janine o olhou com cautela.
—Que classe de teoria?
Canton tirou as mãos dos bolsos e se aproximou dela. deteve-se quando
quase estava tocando-a. Não a tocou, mas seus olhos, seus preciosos olhos azuis,
não se separaram dos dela até que os deslizou para sua boca, detendo-se nela
com tal sensualidade que Janine entreabriu instintivamente os lábios. Canton se
aproximou um pouco mais e seu peito roçou os seios do Janine. Esta pôde cheirar
o aroma limpo e sexy que desprendia.
—Quantos anos tem? —perguntou em tom sensual.
—Vinte e quatro —disse Janine com voz afogada.
—Vinte e quatro —repetiu, Canton, inclinando a cabeça para ela, de
maneira que seus lábios quase se tocaram—. E tiveste muitos amantes?
Janine não estava escutando. Tinha o olhar fixo na boca do Canton. Parecia
firme, dura e muito capaz. perguntou-se como saberia. Desejou...
—Janine...
—Sim...
—Se for a mãe de um menino de doze anos —sussurrou ele com voz grave
—, eu sou um cacto.
Logo elevou a cabeça, dedicou-lhe um sorriso divertido e indulgente,
voltou-se e saiu sem dizer uma palavra.
Janine arrumou o cristal. Não foi fácil, mas o conseguiu. Também disse ao
Kurt que não lhe ocorresse voltar a agarrar um taco de beisebol.
—Não te cai bem, verdade? —perguntou Kurt o dia que repararam o cristal
—. por que? É bom com o Karie, e comigo não é precisamente desagradável.
Janine se moveu, inquieta.
—Estou tratando de trabalhar —disse evasivamente. Não gostava de
recordar seu último encontro com seu vizinho. Era perigoso mostrar-se fraco
perto de um tigre.
—foi-se a Califórnia —acrescentou Kurt.
Os dedos do Janine saltaram sobre o teclado, dispersando algumas letras
desconexas pela tela.
—Ah, sim?
—vai falar com algumas pessoas no Silicon Valley. Seguro que logo voltará a
tirar adiante seu negócio. Seu ex algema se arrependerá de havê-lo deixado
quando o perdeu tudo.
—Não teve vista —assentiu Janine de uma vez que salvava o capítulo. Não
tinha sentido trabalhar com o Kurt conversando a seu lado. levantou-se e se
estirou, aproximando-se da janela que dava à praia. deteve-se ali, olhando com
curiosidade. Karie estava sentada sobre uma toalha. Perto, um homem a
observava; um homem muito moreno com óculos escuros e aspecto suspeito.
—Quem é esse? Viu-o antes? —perguntou ao Kurt.
Kurt olhou pela janela.
—Sim. Ontem também andava por aqui.
—Quem cuida do Karie enquanto seu pai está fora?
—Acredito que a criada que cozinha para eles. Mas Canton só vai estar
fora hoje.
—Isso é suficiente para um seqüestrador —murmurou Janine—. Canton
Rourke era um homem muito rico. Pode que esse tipo não saiba que está arruinado
e tenha intenção de seqüestrar ao Karie.
—Escritores de novelas de mistérios... —burlou-se Kurt—. Sempre
procurando o lado escuro.
—Escuro ou não, não penso deixar que façam mal ao Karie enquanto eu
esteja por aqui —Janine saiu ao alpendre e baixou as escadas.
Caminhou diretamente para o homem. Este a viu aproximar-se e deu um
passo atrás, como se não soubesse bem o que fazer.
Enquanto se aproximava dele, Janine pensou que seus dois anos de artes
marciais poderiam não bastar para reduzi-lo se ficava agressivo. Sempre podia
gritar, e esse dia havia bastante gente na praia.
—Está em minha propriedade. Que deseja? —perguntou ao homem, que era
alto, forte e parecia estrangeiro.
—Não falo inglês —disse em espanhol, e sorriu.
Essa era uma das frases que Janine tinha tido que aprender.
—E eu não falo espanhol —disse, suspirando—. Mas tem que ir-se. Vá-se.
Vá-se —repetiu, fazendo gestos com a mão.
— Ah! Que vá.
—Isso. Que se vá.
O homem assentiu, sorriu e se afastou caminhando pela praia em direção
oposta.
Janine observou como se afastava. Tinha a suspeita de que não estava ali
precisamente de férias.
Foi até onde Karie estava sentada. A menina parecia maravilhada pela cena
que acabava de contemplar.
—Quero que fique com o Kurt e comigo enquanto seu pai está fora —disse
Janine—. Eu não gosto de como te olhava esse homem.
—A mim tampouco —admitiu Karie—. Papai tinha um guarda-costas em
Chicago. Nunca acostumei a ele. Mas aqui tudo é mais tranqüilo.
—Aqui também tem um guarda-costas. Eu.
Karie riu.
—Já me dei conta. Esse homem não te deu nenhum medo, verdade?
—Kurt e eu estudamos artes marciais durante dois anos. Me dá bastante
bem —Janine não acrescentou que também tinha trabalhado como detetive.
—Ensinará-me?
—Pode que não seja má idéia —disse Janine—. Mas teremos que fazê-lo
escondido de seu pai. De momento, já está bastante zangado com o da janela.
—Papai não é mau —replicou Karie—. A maioria do tempo é muito bom. Mas
tem muito mau gênio, certamente.
—Já me dei conta.
Karie sorriu.
—Você também o tem. Esse homem se jogou atrás assim que viu que te
aproximava. Assustaste-o.
—Isso parece —disse Janine, sonriendo com orgulho.
—Estou morta de fome —disse Karie—. María foi a comprar comida e ainda
demorará.
—Podemos preparar uns sándwiches —sugeriu Janine—. Também tenho
bolo de coco de sobremesa.
—Latido! Fantástico!
Janine sorriu. Foram juntas à casa, onde aguardava um divertido Kurt.
—Diane Woody ao resgate! —brincou.
Janine lhe fez uma careta.
—Fazem-me muita publicidade —concedeu—. Mas o homem se foi, não?
—Com o rabo entre as pernas —disse Kurt.
—No que está trabalhando...? OH, é ele! —exclamou Karie, tomando a foto
do personagem da série de ficção científica que Janine tinha sobre a mesa—.
Não é incrível? É minha série favorita. que mais eu gosto de é o capitão, mas este
tipo não está mau. Fixaste-te em que se parece com papai?
Janine não disse nada, mas por dentro grunhiu.
Estava lhes dando aos meninos o bolo de coco quando um familiar e
ameaçador homem entrou sem chamar. Janine lhe dedicou um feroz olhar que
Canton se limitou a ignorar.
—É que já não vive em casa? —perguntou a sua filha, irritado.
—Em nossa casa não há bolo —replicou Karie com calma.
—Onde está a criada? Disse-lhe que ficasse contigo.
—saiu a comprar e ainda não há voltado —disse Janine—. Um homem de
aspecto suspeito esteve observando a sua filha na praia.
—Janine o assustou —Karie sorriu, mostrando todos seus dentes—. Sabe
karate!
O arrogante olhar que Canton dedicou ao Janine foi inquietante.
—Assim sabe karate.
—Só um pouco.
—Foi diretamente para o homem e lhe fez ir-se —continuou Karie—. Logo
me trouxe aqui com ela —olhando a seu pai com olhos brilhantes, acrescentou—:
Podiam me haver seqüestrado!
Canton permaneceu em silêncio um momentos, com o cenho franzido.
—Não deveria ter estado aí fora só —disse finalmente.
—Estava tombada em minha toalha.
—de agora em diante, te tombe no mole —replicou Canton—. Não quero
mais aventuras.
—De acordo —respondeu Karie, e deu outro bocado a seu bolo.
—É bolo de coco —disse Kurt—. Janine sempre o compra. Está muito bom.
—Ofereceria-te uma parte —disse Janine—, mas estou segura de que tem
muchísima pressa.
—Suponho que sim. Vamos, Karie —ordenou Canton.
Sua filha deu um comprido gole de seu copo de leite e se levantou da mesa.
—Obrigado, Janine!
—De nada —Janine olhou ao Canton—. As criadas não são boas guarda-
costas.
—Não pretendia que o fora. Suponho que terei que procurar a alguém mais.
—Seria recomendável.
Canton deslizou o olhar pelos jeans cortados do Janine até seus pés nus.
—Você não gosta dos sapatos?
—Os sapatos se gastam. A pele não.
Canton riu.
—Parece Einstein. Lembrança ter lido que nunca usava meias três-quartos
pelo mesmo motivo.
Janine o olhou ao rosto, notando a mesma sensação de excitação que
experimentou a primeira vez que o viu. parecia-se tanto a seu ator favorito da
série de televisão... Era realmente estranho.
—Está seguro de que não é ator? —perguntou sem pretendê-lo.
Canton lhe dedicou um irônico sorriso.
—Estou seguro. E não penso começar a minha idade.
—Seu gozo em um poço —murmurou Kurt, olhando a sua irmã—. Não é um
alienígena tratando de adaptar-se aos humanos. Má sorte.
Janine se ruborizou.
—Quer te calar?
—O que tem feito com essa foto? —perguntou Canton enquanto passava
junto ao escritório.
—OH, nunca a saca quando está trabalhando —explicou Kurt—. Se o tiver
diante, não deixa de olhá-lo e de suspirar e não escreve uma palavra.
Canton olhou ao Janine, interessado.
—No que trabalha?
—É secretária —disse Kurt por ela, improvisando—. Seu chefe é um
autêntico negreiro, e Janine tem que levar o ordenador incluso estando de férias
para lhe enviar seu trabalho ao escritório.
—Vá chefe —comentou Canton, irritado.
—Pagamento bem —disse Janine, agradecendo a improvisação do Kurt.
Suspirou—. Já sabe o que acontece vivendo em uma comuna; acaba perdendo
contato com a realidade —tratou de adotar uma expressão sonhadora—. Mas ao
final um tem que voltar para mundo real e ganhá-la vida. É duro acostumar-se às
coisas materiais de novo.
A expressão do Canton se endureceu. Olhou ao Janine com uma expressão
que poderia ter interrompido o tráfico e fez um gesto ao Karie para que o
seguisse. Colocou as mãos nos bolsos e saiu sem voltar-se para olhar. Parecia uma
característica dela.
Karie sorriu e se despediu com a mão. Logo seguiu a seu pai
obedientemente.
Quando estiveram a sós, Janine disse:
—E se esse homem não estava vigiando ao Karie? —fazia um momento que
dava voltas a essa idéia—. E se trabalhar para alguma banda de ladrões de
antiguidades?
Kurt franziu o cenho.
—Refere a essa gente que rouba objetos das escavações arqueológicas e
os vende no mercado negro?
—Exato —Janine se cruzou desta braços é uma nova escavação. Mamãe e
papai mencionaram que estava intacta. Os maias trabalhavam exquisitamente o
ouro e as pedras preciosas. E se houver algum tesouro oculto na escavação e
alguém sabe?
Kurt se apoiou contra o corrimão do alpendre,
—Sabem que pode acontecer. De fato, aconteceu nas últimas escavações,
perto do Chichén Itzá. Mas o exército as protegia e os ladrões foram apanhados.
—Sim, mas resulta muito caro manter uma companhia militar para proteger
durante vários meses a uns poucos arqueólogos.
—Papai tem uma pistola.
—E pode dispará-la. Mas não podem estar acordados vinte e quatro horas
ao dia, e inclusive os soldados podem ser subornados.
—É alentador sabê-lo —grunhiu Kurt.
—Sinto muito. Mas penso que devemos permanecer atentos. Esse tipo
poderia ser alguém que tratasse de seqüestrar ao Karie, mas também poderíamos
ser nós seu objetivo, para pressionar a nossos pais.
—Em outras palavras, será melhor que vigiemos nossas costas.
Janine sorriu.
—Isso.
—Não há problema —Kurt suspirou—. Que lástima que seu herói alienígena
não possa aterrissar aqui com sua nave para ajudamos. Estou seguro de que se
comeria a esses tipos de café da manhã.
—OH, ele não come humanos —assegurou Janine.
—Pode que faça uma exceção com os ladrões de peças arqueológicas.
—Nisso tem razão. Vamos. me ajude a esfregar.
—Proponho-te uma coisa —disse Kurt animadamente—. Você esfrega e eu
te escrevo o seguinte capítulo da novela.
—Adiante.
Kurt olhou a sua irmã com cautela.
—Brinca, não?
—Não brinco. Pode fazê-lo.
Excitado, Kurt foi diretamente ao ordenador. Abriu o capítulo que estava
escrevendo Janine e o leu por cima para seguir o argumento.
Para quando Janine terminou de esfregar e recolher a cozinha, Kurt seguia
sentado frente à tela sem ter escrito uma palavra.
—Ainda nada?
Kurt olhou a sua irmã.
—Como o faz? —grunhiu—. Nem sequer posso pensar em uma palavra que
pôr.
—Uma das coisas que não faço é pensar —disse Janine—. Aparta.
Kurt se levantou e ela se sentou. Olhou um minuto a tela, apoiou os dedos
no teclado e começou a escrever. Kurt deixou escapar um comprido suspiro e se
voltou para sair.
—Os escritores são muito estranhos —disse.
Janine sorriu.
—Não sabe bem —assegurou, e continuou escrevendo.

Capítulo 3

DOIS DIAS depois, Janine estava totalmente concentrada em seu livro


quando Karie entrou correndo no estudo.
—vamos celebrar uma festa! —anunciou sem fôlego—. E você e Kurt estão
convidados.
A mente do Janine seguia no limbo. Olhou ao Karie distraídamente.
—OH, sinto-o —disse Karie, que nos últimos dias tinha aprendido que os
escritores tinham sérias dificuldades para voltar para a realidade quando
estavam em meio de uma cena. Saiu do estudo e foi procurar ao Kurt.
—Que classe de festa? —perguntou Kurt quando Janine se reuniu com ele
ao pé das escadas do alpendre.
—É só para alguns amigos de papai, mas o persuadi para que também lhes
convide a vós. sente-se culpado por ter tido que me deixar tanto tempo só
durante os últimos anos. Assim que me consente muitas coisas para tratar de me
compensar —Karie sorriu—. É como se tivesse meu próprio gênio do abajur
maravilhoso.
—Chantageia-o.
Karie riu.
—Exato!
Kurt se encolheu de ombros.
—Não me importaria ir à festa, se houver coisas ricas de comer. Mas
Janine não quererá ir —acrescentou com certeza—. Odeia as festas e as
relações sociais. E tampouco gosta de seu pai, não te fixaste?
—Tampouco lhe cai muito bem ela, mas esse não é motivo pelo que não
possam ser amáveis o um com o outro em uma festa.
—Não sei.
—Eu sim. Papai se comportará muito bem. Sabia que lê os livros de sua
irmã? Mas segue sem saber quem é, é obvio, porque não o hei dito. Mas tem todos
seus livros.
—E não a reconheceu nas fotos das contraportadas? —perguntou Kurt.
—Eu tampouco sou capaz de reconhecê-la nessas fotos.
—O certo é que não gosta de nada ser reconhecida —reconheceu Kurt—.
Lhe dá vergonha. Gosta de escrever livros, mas não gosta da publicidade.
—por que?
—É tímida, pode acreditá-lo? —Kurt riu—. Foge de entrevistas, congressos
e toda classe de publicidade. Ao princípio voltou loucos a seus editores, mas
finalmente encontraram uma forma de tirar proveito a sua excentricidade.
Converteram-na na misteriosa protagonista do livro. Ninguém sabe quase nada
sobre ela, e esse é o motivo pelo que fascina a seus leitores.
—eu adoro seus livros.
—A mim também —disse Kurt—, mas não lhe diga nunca que lhe hei isso
dito. Não quero que lhe suba à cabeça.
Karie se rodeou os joelhos com os braços e olhou o mar.
—Tem noivo?
Kurt grunhiu.
—Sim, se lhe pode chamar assim. É professor na universidade. Ensina
história antiga —disse, fazendo uma careta.
—É agradável?
—É indescritível —respondeu Kurt detrás pensar um momento.
—vão casar se?
Kurt se encolheu de ombros.
—Espero que não. Não é mau tipo, mas pensa que Janine deveria ser menos
excêntrica. Eu não. Minha irmã eu gosto de tal e como é, sem mudanças. Mas ele
é muito antiquado e conservador. Acredito que nem sequer aprova a meus pais.
Eles também são excêntricos.
Karie se voltou para o Kurt.
—O que fazem?
—São arqueólogos —disse—. Ambos ensinam na universidade de Indiana,
onde obtiveram seus doutorados. Eu vivo com eles no Bloomington, mas Janine
vive em Chicago.
—Os dois são doutores? —perguntou Karie com evidente admiração.
Kurt assentiu.
—Sim. Inclusive Janine tem um título, embora o sua é em história e arte.
Temo-me que me vou ver muito pressionado para ir à universidade. Eu não quero
ir.
—O que quer fazer?
Kurt suspirou.
—Quero ser piloto de aviões, ou de helicópteros, ou de algo com ou sem
asas. Levo-o no sangue. Não me canso de ver filmes de aviões, ou do espaço. Isso
se que é voar, sair ao espaço!
—Por isso você gosta tão da série que volta louca ao Janine?
—Mais ou menos. Mas também eu gosto da ação.
Janine sorriu.
—eu gosto porque o mau se parece com papai.
Kurt riu.
—Não é o mau. Só é do outro lado.
—Isso. O inimigo.
—Não é tão mau. Uma vez salvou ao herói.
—Bom, então suponho que não é tão mau.
—O que acontece é que é um incomprendido.
Karie também riu. Logo permaneceram em silêncio um momento.
—Tratará de convencer ao Janine para que venha à festa? —perguntou
Karie.
Kurt sorriu.
—Farei todo o possível. Mas não espere milagres, de acordo?
Karie lhe devolveu o sorriso.
—De acordo!
Janine teve que ir à festa dos Rourke porque Kurt insistiu, lhe
assegurando que iria sozinho se não o acompanhava.
A idéia de deixar ao Kurt solo entre os amigos dos Rourke pôs nervosa ao
Janine. Não se relacionava o suficiente para saber como se comportava a gente
com dinheiro. Mas sabia que alguns bebiam e consumiam drogas. Sua protegida
vida não a tinha preparado para aquela classe de companhia. Agora ia ver-se
imersa em meio dela, ou isso temia. Mas o certo era que não tinha nem idéia de
como eram os amigos do Canton. Talvez fossem pessoas muito agradáveis.
Não tinha nada especialmente apropriado para a festa, mas ficou um
vestido negro do verão com uns saltos altos, um colar de pérolas e uns pendentes
a jogo que lhe tinham agradável seus pais. Acreditava ter bom aspecto. Depois de
vestir-se e pentear-se foi a por sua bolsa negra de couro.
—Nem sequer tive tempo suficiente para ir comprar me um vestido. Odeio-
te —disse ao Kurt com um doce sorriso.
—Perdoará-me. Estou seguro que merecerá a pena ver o Canton Rourke
vestido de forma elegante —replicou Kurt.
—Já o vi assim.
—OH. Bom, conforme diz Karie, a metade das mulheres de Chicago se
arrojaram a seus pés ao longo dos anos, sobre tudo desde que se separou.
—Vivem em Chicago? —Janine tratou de mostrar-se desinteressada.
—Parte do ano. Também têm um apartamento em Nova Iorque, em
Manhattan.
—Pode que não volte a ser tão rico como antes —disse Janine.
—Isso não as desanima —assegurou Kurt—. Todas estão seguras de que um
homem que chegou ao topo em uma ocasião pode voltar a obtê-lo.
Janine teve que admitir que havia certa lógica naquilo.
—Alegra-me não ser rica —disse.
—por que?
—Porque assim sei que há gente a que gosta por mim mesma, não pelo que
tenho.
Kurt se cruzou de braços, olhando-a ironicamente.
—Ah, sim? E o que me diz daquela vez que convidaram a uma festa e a
anfitriã quis que lhe explicasse ao convidado de honra como conseguir que lhe
publicassem um livro que acabava de escrever?
Janine suspirou.
—E a rica senhora que queria conseguir que publicassem o livro de seu
melhor amigo? E o misterioso escritor que te pediu o nome de seu agente e uma
recomendação?
—Rendo-me —disse Janine, elevando as mãos—. Tem razão. Todo mundo
tem problemas.
—Também Canton Rourke. Pode que você goste se chegar a conhecê-lo —
disse Kurt, sonriendo—. E agora, o que te parece se vamos? está-se fazendo
tarde.
Janine fez uma careta.
—De acordo. Mas não quero.
—Passará-o bem —prometeu Kurt—. Ninguém sabe quem é.
O rosto do Janine se iluminou.
—Não tinha pensado nisso.
—Agora pode fazê-lo.
Kurt abriu a porta para sua irmã com uma fioritura. Caminharam pela praia
até a casa dos Rourke, que estava totalmente iluminada e da que chegava uma
suave música através das janelas abertas. Dentro havia várias pessoas
conversando com copos nas mãos. Todos pareciam exquisitamente vestidos e
Janine começou a preocupar-se com seu aspecto.
Kurt se separou dela imediatamente e subiu as escadas do alpendre
correndo para reunir-se com seu amiga Karie. Janine se sujeitou um momento ao
corrimão para sacudir a areia de seus sapatos.
—Necessita ajuda? —perguntou uma suave e conhecida voz. Um comprido e
forte braço rodeou ao Janine pela cintura enquanto esta sacudia nervosamente
seu sapato—. me Deixe —Canton se agachou e tomou o sapato, esvaziando o de
areia antes de voltar a pô-lo no pé do Janine com uma sensualidade que fez que o
coração desta pulsasse mais rapidamente. Logo se ergueu e a olhou aos olhos sem
sorrir.
—Isto foi idéia do Kurt —balbuciou Janine sem fôlego—. Nem sequer tive
tempo de comprar um novo vestido...
—O que acontece com este? —perguntou Canton, deslizando uma mão pelo
pescoço do vestido sem logo que tocar a pele do Janine, que se estremeceu sob
seu contato.
—P... parece que há bastante gente —disse Janine, apartando-se um pouco
dele.
—Agora mesmo eu gostaria que estivessem a quinhentas milhas daqui —
disse Canton com voz grave.
Janine riu nervosamente.
—É essa uma frase feita para ligar? Se o for, suponho que resulta
bastante efetiva, mas sou imune a ela. Tenho um filho e vivi em uma comu...
Canton elevou uma mão e riu.
—Deixa-o já —aconselhou—. Kurt tem doze anos e você vinte e quatro.
Duvido muito que concebesse um filho aos onze anos. Quanto ao da comuna —
acrescentou, aproximando-se ainda mais ao Janine—, nem em sonhos, carinho.
Carinho. Janine recordava ter arrojado um copo de leite a um tipo que
utilizou aquela palavra com ela em tom depreciativo. Mas em boca do Canton
Rourke parecia uma carícia verbal.
—Por favor... —sussurrou com um fio de voz.
Canton lhe acariciou a bochecha com os dedos.
—Sou uma nova experiência para ti, não?
Janine se estremeceu.
—É multimilionário. Eu trabalho para viver ao dia —não era totalmente
certo, mas ao menos era uma boa comparação, pensou Janine freneticamente.
Canton se inclinou para ela com um sorriso fascinante.
—Faz anos que deixei de seduzir meninas. Está a salvo.
Janine o olhou aos olhos.
—Poderia me dar isso por escrito e assinado ante notário?
—Se quiser o farei. Mas normalmente me basta dando minha palavra —
replicou Canton, baixando a mão para tomar a do Janine—. Quanto ao de
multimilionário, isso é história passada. Agora não sou mais que um tipo normal
tratando de voltar a subir a escada para o alto. Passa a conhecer meus amigos.
Janine sentiu os dedos quentes e fortes do Canton em tomo aos seus e
notou que lhe punha a carne de galinha. O que lhe estava passando? Como se
houvesse sentido sua confusão e insegurança, Canton lhe apertou a mão
brandamente. Lhe devolveu o apertão sem dar-se conta do que fazia.
Quando chegaram ao alto das escadas, uma vivaz moréia que teria
aproximadamente a idade do Janine se aproximou deles com um copo de
champanha. Olhou ao Canton com rosto radiante até que viu que este sustentava
uma mão do Janine na sua. Seu sorriso se transformou na de uma gata de afiadas
garras.
—Olá, Canton. Acredito que não conheço seu amiga —disse, olhando ao
Janine.
—Acredito que não. Janine Curtem, esta é Missy Elliger. É a filha de um de
meus velhos amigos.
—Não é tão velho —murmurou a jovem, aproximando-se do Canton. Logo
olhou de novo ao Janine—. Vive aqui?
—OH, não —disse Janine amavelmente—. Vivo em uma comuna em
Califórnia com vários homens.
Missy Elliger ficou boquiaberta.
—te comporte —disse Canton, lhe pressionando brandamente a mão—. Está
aqui de férias com seu irmão pequeno, Kurt, que é o novo amigo do Karie.
—OH —Missy se esclareceu garganta—. O que há dito resulta muito
estranho...
—por que te parece estranho? —perguntou Janine.
—A verdade, o de viver em uma comuna...
Janine se encolheu de ombros.
—Em realidade não era tanto uma comuna como um campo de trabalho. Já
sabe, o lugar ao que mandam aos prisioneiros políticos. Pinjente algumas costure
pouco adequadas sobre o governo Y...
—Nos Estados Unidos? —perguntou Missy, com os olhos abertos como
pratos.
—Deus, não! Em um dos países balcânicos. Não recordo bem em qual. Em
qualquer caso, ali estava, disparando contra franco-atiradores com meu pelotão
quando se foram as luzes...
—Pelotão?
—Não nesta vida, é obvio —continuou Janine, imutável—. Acredito que foi
quando era soldado raso no exército tcheco.
Missy bebeu seu champanha de um gole.
—Devo falar com o Harvey Winthrop —disse precipitadamente,
assinalando com a mão para o interior da casa—. me Desculpem —detrás lançar ao
Canton uma reveladora olhar, escapou.
Canton tratava de não rir. Janine o olhou, piscando.
—Não esteve mal para ser uma história inventada no momento, não?
—Tola!
Janine sorriu, vendo o brilho dos olhos do Canton apesar de que não sorria.
—Sinto-o —disse—. Mas essa garota vai descaradamente a por ti.
—Sim, sei —replicou Canton, elevando a mão em que sustentava a do Janine
—. Por isso estou fazendo isto.
Todas as ilusões do Janine se desmoronaram.
—OH.
—Suponho que não pensava que havia outro motivo, não? —murmurou
Canton—. depois de tudo, quase nos separa uma geração. De fato, só é um ano
maior que Missy.
—Assim que te servi que ajuda visual.
Canton riu, lhe estreitando os dedos.
—Em certo sentido. Pensava que não te importaria. Os inimigos se ajudam
mutuamente em certas ocasiões. Eu farei o mesmo por ti algum dia.
—Eu não estou tão solicitada —disse Janine, sentindo-se incômoda agora
que tinha compreendido o estranho comportamento do Canton—. Mas você pode
ter a quem quer. Tenho-o lido em uma revista.
—Nesse artigo que estava junto ao de quão alienígenas tinham assistido a
um jantar na Casa Branca? —perguntou ele amavelmente.
Janine franziu o cenho.
—Já sabe a que me refiro.
Canton se encolheu de ombros.
—Retirei-me temporalmente das mulheres. Minha esposa me deixou por
fracassado e se buscou a alguém mais rico —acrescentou, com uma falta de
inflexão na voz mais reveladora que o frio vazio de seus olhos.
—Pior para ela —disse Janine com genuíno sentimento—. O recuperará
tudo e se arrependerá.
Canton sorriu, surpreso.
—Não, não o fará. A magia desapareceu durante nosso segundo ano de
matrimônio. Seguimos juntos pelo Karie, mas o certo é que às vezes passávamos
meses sem nos ver. Só era um matrimônio de aparências. Ela é mais feliz com seu
novo marido, e eu sou mais feliz solo —Canton olhou por volta do mar—. A que
pagamento os pratos quebrados é Karie. Concederam-nos a custódia
compartilhada, e minha mulher não está de acordo. Pensa que Karie lhe pertence.
—Como se sente Karie?
—Gosta de estar comigo e me acompanhar em minhas viagens de negócios.
Assim aprende coisas que nunca aprenderia no seleto colégio para meninas em
que a tem Enjoe. Tirei-a do colégio e a trouxe aqui comigo a passar um par de
semanas, sobre tudo para que esteja fora do alcance de sua mãe. Ultimamente
ameaçou reclamando a custódia total.
—A educação é importante.
Canton olhou ao Janine atentamente.
—E Karie obterá a educação necessária. Só vai perder se umas semanas de
classe e é tão inteligente que em seguida ficará ao dia. Mas quero que tenha algo
mais que um título e uma cabeça torcida quando crescer.
Janine se sentiu insultada.
—Você não gosta dos universitários?
Canton se encolheu de ombros.
—Humilharam-me uns quantos enquanto tratavam de copiar meu software
—replicou Canton—. Eu gosto de desenhar os programas de ordenador
pessoalmente. Mas o certo é que passava muito tempo com os ordenadores e
muito pouco com minha filha. Inclusive se não o tivesse perdido tudo, tinha
chegado o momento de tomar um descanso.
—Foi ao Silicon Valley —disse Janine.
—Sim. Entre outras coisas, para procurar alguns coelhinhos de índias —
Canton franziu ligeiramente o cenho—. Pensando-o bem, aqui está você.
—Eu?
—Necessito alguém que prove meu novo programa —continuou Canton—. É
uma variação de um de meus primeiros processadores de textos, mas este tem
uma nova configuração que resulta mais eficaz. Ainda está em processo de
desenvolvimento, mas se pode utilizar. O que te parece?
Janine não estava segura. Já tinha perdido mais de uma vez capítulos
inteiros por utilizar novos programas e estava trabalhando muito pressionada de
tempo.
—Não se preocupe por isso agora mesmo —disse Canton—. Pensa-o e me
diga o que tenha decidido.
—De acordo. É só que... Bom, meu chefe quer que lhe envie este projeto
antes de um mês. Não posso me permitir trocar de programa no meio.
—Não, não pode. E eu não pretendia que descarregasse seu programa
dentro de dez minutos —acrescentou Canton lacónicamente.
—Nesse caso, pensarei-o —respondeu Janine.
Canton lhe apertou brandamente a mão.
—Bem.
A seguir entraram na casa e apresentou aos convidados.
Surpreendentemente, os amigos do Canton procediam de médios muito variados,
e a maioria eram gente corrente. Alguns eram muito ricos, mas não se
comportavam com nenhuma superioridade.
Entretanto, Missy Elliger não deixou de observar ao Janine com olhos
entrecerrados e expressão de desprezo.
—Sua convidada me olhe como se queria me estampar na frente o copo que
sustenta —comentou Janine quando ficaram a sós.
—Ao Missy gosta das provocações. Mas é muito jovem para mim. Além
disso, não estou no mercado para uma segunda senhora Rourke.
—Entendido —disse Janine.
Canton elevou as sobrancelhas.
—Sem discussão?
—Não era consciente de te haver feito nenhuma proposição —disse Janine,
sonriendo ironicamente—. Somos vizinhos temporais e de vez em quando
brigamos. Isso é tudo.
—E se eu quisesse que fôssemos algo mais que vizinhos? —perguntou
Canton com deliberada sensualidade.
Janine não deixou de sorrir. O que percebia no rosto do Canton era
diversão, não autêntico interesse. estava-se burlando dela e não pensava deixar
que se saísse com a sua.
—Acredito que ao Quentin não gostaria.
—Quentin? Há algum marido real entre decorações?
Janine duvidou. Canton não se acreditou a história da comuna, assim
tampouco ia acreditar se a de um marido secreto.
—É um amigo —replicou seriamente.
Canton lhe soltou a mão.
—Não o tinha mencionado antes.
—Não tive oportunidade de fazê-lo —replicou Janine—. É professor
universitário. Ensina história medieval na universidade de Indiana, onde meus
pais ensinam antropologia.
A atitude do Canton trocou imperceptivelmente.
—Seus pais são professores universitários?
—Sim. Agora estão em uma escavação de umas ruínas maias na Quintana
Rôo. Kurt esteve doente de amidalite com outras complicações. Tiraram-no do
colégio para que se recuperasse e eu me tenho feito cargo de lhe dar aulas até
que volte. Nesta vila estamos perto de nossos pais, e eu posso trabalhar um
pouco além de cuidar do Kurt.
Canton já não parecia divertido. Sua atitude era mas bem cautelosa.
—Suponho que você também terá um título, não?
Janine se perguntou por que a estaria olhando com aquela expressão quase
antagônica, mas não lhe deu importância.
—Sim. Sou licenciada em História e em Arte. Também tenho um grau
médio em Línguas Germânicas.
Canton pareceu retirar-se sem nem sequer mover-se. Deixou seu copo em
uma bandeja vazia e colocou as mãos nos bolsos. Deslizou o olhar com inquietação
em torno da habitação.
—Você no que te licenciou? —perguntou Janine.
Era a pergunta equivocada. Canton se fechou por completo.
—vou apresentar te aos Moore —disse, tomando-a pelo cotovelo—. São
pessoas muito interessantes.
Janine sentiu a nova frieza de sua atitude com uma sensação de perda. Ou
tinha ofendido ao Canton ou se ganhou sua antipatia. Talvez tivesse algum
profundo prejuízo em relação à arqueologia, que era o ramo da antropologia em
que estavam especializados seus pais. Estava a ponto de lhe dizer que estes
apoiavam a nova legislação proposta para proteger as escavações de cemitérios e
assegurar que os ossos e esqueletos encontrados nestes se tratassem com
respeito e dignidade.
Mas Canton já a estava apresentando a um jovem casal. Um minuto depois
se desculpou e foi reunir se com seu amiga Missy Elliger. Julgando pela forma em
que tomou sua mão, diria-se que já tinha esquecido que a considerava muito
jovem para ele. Ou talvez tinha pensado que Missy era menos perigosa que ela,
pensou Janine, divertida. Que adulador!
O resto da tarde foi muito aborrecido para o Janine. Canton fez todo o
possível por manter-se afastado dela. Foi amável e educado, mas sua mudança de
atitude para ela tinha sido tão brusco que Janine se sentia aturdida.
Inclusive Karie e Kurt o notaram.
—Durante um momento pareciam sentir-se muito bem juntos —disse Kurt.
—Sim —respondeu Karie, balançando um prato com bolo sobre seu joelho—.
Mas logo se separaram como se se produziu uma explosão.
—Ao Janine não gosta que os homens se aproximem muito —Kurt fez uma
expressiva careta—. O único motivo pelo que Quentin durou tanto é porque
esquece a minha irmã durante semanas quando está traduzindo manuscritos.
—Esquece-a? —perguntou Karie, assombrada.
—Sim —respondeu Kurt pacientemente—. E se levam bem porque não a
pressiona e não trata de casar-se com ela. Janine aprecia sua independência por
cima de tudo. Não quer casar-se.
—Suponho que meu pai sente o mesmo agora —admitiu Karie—. Mas minha
mãe e ele nunca se levaram muito bem. Mamãe o odeia porque não conseguiu que
lhe dêem a custódia completa sobre mim. Jurou que me separaria dele, mas faz
semanas que não tivemos notícias dela. Suponho que o esqueceu. Papai também é
esquecido às vezes, sobre tudo quando está trabalhando em algum novo
programa.
—Janine e ele fariam o casal perfeito —disse Kurt—. Os dois trabalham
em algo novo todo o tempo.
—Não parece que estejam pensando nisso agora —disse Karie com tristeza
—. Vê como sustenta papai a mão do Missy?
—Antes sustentava a do Janine —recordou Kurt a seu amiga.
—Sim, mas agora se estão evitando —Karie suspirou—. Maiores! por que
terão que complicar tanto as coisas?
—Não tenho nem idéia. Toma um pouco mais de bolo.
—Obrigado —Karie deu uma dentada antes de continuar—. Talvez
poderíamos lhes dar uma mão para que se levassem melhor.
—Eu estava pensando o mesmo —disse Kurt. Sorriu a seu cupincha—. Tem
alguma idéia?
—Estou pensando algumas.
Enquanto isso, alheia ao feito de que logo ia se converter em coelhinho de
índias de um experimento distinto ao do novo programa do Canton, Janine passou
a seguinte hora em um rincão, com um casal cuja paixão era a pesca submarina,
mortalmente aborrecida.

Capítulo 4

NÃO vou deixar que me ate nunca mais para ir a uma festa dos Rourke —
lhe disse Janine a seu irmão ao dia seguinte—. Antes preferiria que me pegassem
um tiro.
—Karie me há dito que ela foi se casa com seus pais depois da festa —
disse Kurt com cautela.
—Ela? Quem? —perguntou Janine, tratando de não mostrar-se
interessada.
—Missy Elliger. Já sabe, a garota que tinha ao Canton sujeito pela mão.
—Me teria dado quão mesmo o tivesse tido sujeito pelo nariz —disse
Janine despectivamente.
Kurt olhou a sua irmã e sorriu secretamente, mas não disse nada.
—Acredito que vou convidar ao Quentin para o fim de semana —disse
Janine ao cabo de um minuto.
As sobrancelhas do Kurt se elevaram expresivamente.
—por que?
Janine não quis admitir por que.
—por que não? —replicou em tom beligerante.
Kurt se encolheu de ombros.
—Faz o que te pareça.
—Sei que não te cai bem, mas é um homem muito agradável quando chega a
conhecê-lo.
—Não está mau. O que acontece é que ódio a história antiga.
—você adorará quando da estude na universidade.
Kurt suspirou, irritado.
—Eu não gostarei.
—Dá uma oportunidade ao Quentin —rogou Janine.
—Se você gostar, suponho que está bem. O que passa é que sempre me dá a
sensação de que trata de fazer que troque —Kurt observou a sua irmã com os
olhos entrecerrados—. Está segura de que você não gosta do papai do Karie?
Janine se contraiu interiormente ao recordar o receptiva que se mostrou a
passada noite às insinuações do Canton, até que viu o que pretendia. Só a estava
utilizando para manter ao Missy a raia. E para que se incomodou em fazê-lo se
logo se passou a noite com ela fazendo manitas?
—Sim, estou segura —mentiu—. E agora, me deixe trabalhar.
—ficará aqui Quentin? —perguntou Kurt antes de ir-se.
—por que não? Você pode ser nossa carabina.
Kurt suspirou.
—A mamãe e a papai não gostará.
—Já sou mayorcita, e o mais provável é que Quentin queira casar-se
comigo —disse Janine—. O que passa é que ainda não sabe.
—Espero que não te ocorra te casar com ele! —exclamou Kurt, horrorizado.
—por que não? vou fazer vinte e cinco anos. Deveria me casar. Quero me
casar. Quentin é uma pessoa equilibrada, leal e inteligente.
E também a pessoa equivocada para o Janine, pensou Kurt, mas se mordeu
a língua. Não era boa idéia desgostar a sua irmã mais do que já estava. Além
disso, o fato de que Quentin passasse uns dias ali faria que o papai do Karie se
sentisse um pouco ciumento. Havia toda classe de possibilidades que se voltavam
mais e mais excitantes conforme passavam os minutos. Sorriu para si enquanto se
despedia de sua irmã com um gesto da mão.
—O noivo do Janine vai vir a ficar uns dias —disse ao Karie mais tarde,
assegurando-se de falar o suficientemente alto como para que o pai desta, que
estava sentado a uns metros deles na praia, ouvisse-o.
—Seu noivo? —perguntou Karie, aturdida—. Quer dizer que tem um noivo?
—OH, sim —disse Kurt, irritado, deixando cair sobre a areia—. Ensina
história antiga. Tem muito talento e está louco por ela.
Karie fez uma careta de desagrado.
—Acreditava que havia dito que não estava interessada em casar-se.
—Esta manhã há dito que sim o está. Espero não terminar com o Quentin
de cunhado.
Karie riu.
—É velho?
—Sim —disse Kurt em tom pessimista—. Ao menos tem trinta e cinco anos.
—Então é velho —assentiu Karie.
Perto deles, um homem jovem de trinta e oito anos olhou em sua direção.
Trinta e cinco não era velho. E como ocorria ao Janine carregar com um
acadêmico? Canton desejou arrojar algo contra o chão. Mas Janine tinha um
título universitário, recordou. Seus pais eram professores; inclusive seu noivo o
era.
Entretanto, ele só tinha um certificado dizendo que tinha feito um curso
que equivalia ao bacharelado. Tinha estado muito ocupado ganhando dinheiro para
ir à universidade. Agora já era muito tarde. Não podia competir com uma mulher
educada a esse nível.
Mas, muito a pesar dele, sentia-se atraído por ela.
Recém divorciado, submerso em muito dificuldades financeiras, quão
último precisava era uma nova mulher em sua vida. Especialmente uma jovem,
bonita e inteligente como Janine. penetrou-se por alguma mulher outras vezes,
mas nunca tão rapidamente nem com tanta intensidade. Não sabia o que fazer.
Mas sim estava seguro de uma coisa: não queria que aquele professor se
levasse a sua vizinha.
Janine chamou o Quentin a última hora.
—por que não deves passa um par de dias comigo? —sugeriu.
—Não posso ir no meio do semestre do verão, tendo classe todos os dias —
respondeu Quentin—. Tenho estudantes que estão preparando seus exames.
Janine suspirou.
—Poderia tomar um avião na sexta-feira pela manhã e voltar no domingo.
—Seria muito gasto para só dois dias.
Janine sentiu que seu gênio estava a ponto de ferver.
—Nisso tem razão —replicou acaloradamente—. Não merece a pena que te
gaste o dinheiro em um bilhete de avião só para ver-me.
—O que...?
—Não importa. Que passe um bom verão, Quentin —disse Janine e
pendurou.
Kurt apareceu a cabeça pela janela.
—vai vir?
Janine o olhou e lançou uma almofada em sua direção.
Kurt se apartou a tempo e saiu ao alpendre assobiando.
Janine se afundou em uma profunda depressão durante a seguinte hora.
Quentin e ela eram bons amigos, e durante os passados meses tinham saído
freqüentemente juntos. Mas o certo era que Quentin nunca tinha mencionado o
matrimônio, nem sequer um sério noivado. Uns ligeiros beijos não substituíam a
uma proposição de matrimônio. Janine sabia que estava voltando a viver de
sonhos, e devia deter-se.
Mas aquele era o pior momento possível para descobrir que não tinha um
noivo estável, quando queria lhe provar ao Canton Rourke que não havia lugar para
ele em sua vida. Como se o que ela quisesse fora um ex-milionário fracassado!
Falso. Parecia-lhe tão atrativo que lhe punha a pele de galinha cada vez que
o via. Mas não queria que ele soubesse. Se ao menos Quentin não tivesse sido tão
irrazonable! por que não podia deixar tranqüilamente suas classes, arriscar-se a
ser despedido e gastar suas economias para ir ao Cancún a salvá-la?
Janine rompeu a rir. Sem dúvida, analisar as coisas com objetividade tinha
seu efeito.
O telefone soou nesse momento. Desprendeu o auricular.
—Janine? —murmurou Quentin—. O reconsiderei. Acredito que eu gostaria
de passar aí o fim de semana. Posso lhe pedir ao Mills que me substitua na sexta-
feira. Necessito um descanso.
Janine sorriu.
—Estupendo, Quentin!
—Mas terei que ir no domingo —acrescentou ele com firmeza—. Tenho que
preparar um exame.
—De todas formas será agradável. Este sítio você adorará.
—Levarei-me suficiente água engarrafada.
—Não a precisará —disse Janine—. Temos de sobra. E não tivemos nenhum
problema nos restaurantes.
—Então, de acordo. Chamarei-te do aeroporto quando chegar. Tratarei de
sair pela manhã cedo, se houver vôo. Chamarei-te.
—te traga o traje de banho.
Houve uma pausa.
—Janine, já sabe que não nado.
Ela suspirou.
—Tinha-o esquecido.
—Onde estão seus pais?
—Ainda seguem na escavação.
—Então será melhor que me reserve habitação em um hotel próximo.
—Pode ficar aqui comigo e com o Kurt...
—Não me parece prudente, Janine —murmurou Quentin em tom indulgente
—. Não somos essa classe de pessoas e tenho que cuidar minha reputação. Se
formos ter algum futuro juntos, deveria pensar mais convencionalmente.
Era a primeira vez que Quentin mencionava a possibilidade de ter um
futuro com ela. E, de repente, Janine não quis pensar a respeito.
—Os espanhóis desembarcaram perto do Cancún, no Cozumel —continuou
Quentin—. Eu gostaria de passar umas horas investigando na biblioteca local, se
abrirem os sábados. Já sabe que leão espanhol.
Janine sabia. Quentin não perdia ocasião de recordar-lhe Também falava
latim, francês, alemão e um pouco de russo. Era brilhante. Isso foi o que a atraiu
dele ao princípio. Agora, começava a perguntar-se como lhe tinha ocorrido a
brilhante ideia de lhe sugerir que fora a vê-la. Quentin se dedicaria a investigar
sobre a história dos espanhóis no Novo Mundo até que seu avião estivesse
preparado para partir. Por outro lado, isso podia não estar mau.
—Veremo-nos no aeroporto.
—Bem. Até na sexta-feira. E Janine, esta vez trata de recordar que deve
tirar a chave do motor de arranque antes de fechar as portas do carro, de
acordo?
Janine pendurou e olhou pela janela. O que tinha feito? Tinha esquecido
que o passatempo favorito do Quentin era humilhá-la. Mas agora começava a
recordar com claridade por que se havia sentido tão feliz ao deixar Bloomington
uns meses atrás, e se transladou a seu pequeno apartamento em Chicago. Como
podia havê-lo esquecido?
Mais tarde aquele mesmo dia, voltou a ver o homem moreno que esteve
observando ao Karie na praia. Estava na cidade quando levou aos meninos a esta
em um táxi para visitar uma de suas antigas catedrais em busca de uns dados que
necessitava para seu livro.
O homem não se aproximou deles nem lhes falou, mas observou seus
movimentos cuidadosamente. Tinha um telefone móvel que tratou de ocultar
antes de que Janine o visse. Ela se aproximou de um policial próximo com
intenção de lhe pedir que interrogasse ao homem, mas este se deu conta de suas
intenções e subiu rapidamente a um carro que desapareceu em seguida. Aquilo
inquietou ao Janine, que se perguntou se devia comentar-lhe ao Canton. Não o
mencionou ao Karie nem ao Kurt. depois de tudo, podia tratar-se de uma mera
coincidência. Não tinha sentido inquietar a todo mundo sem uma boa razão.
Voltaram para a casa da praia cansados e suarentos. Fazia um calor
insuportável. Janine preparou limonada para os três. Estavam bebendo-a
tranqüilamente no alpendre quando viram o Canton aproximando-se da casa a
grandes pernadas.
Sua expressão era de evidente aborrecimento. Subiu as escadas de dois
em dois. Quando chegou ao alto, olhou a sua filha com o cenho franzido.
—Quando tornei da Tulsa me encontrei a casa vazia e não havia nenhuma
nota —disse—. Sua falta de consideração começa a ser excessiva. Acaso quer que
lhe prohíba sair de casa para obter um pouco de cooperação?
—Sinto muito, papai! —exclamou Karie, saltando da cadeira—. Janine e
Kurt me perguntaram se queria ir com eles à cidade. Excitou-me tanto a idéia que
esqueci te deixar uma nota. Não te zangue comigo.
—perdi meio-dia me perguntando onde estaria —disse Canton—. chamei a
toda a gente que conheço por aqui, incluindo à polícia.
—Pode me deixar sem pagamento três anos. Seis —acrescentou Karie
amavelmente—. Deixarei de tomar bolo de chocolate para sempre.
—Odeia o chocolate —murmurou Canton, irritado.
—Sim, mas por ti, deixarei de comê-lo.
Canton riu a contra gosto.
—Vete a casa. E a próxima vez que não me deixe uma nota ficará
encerrada para o resto de sua vida.
—Sim, senhor! Até manhã, Janine e Kurt. Obrigado pelo passeio!
—Tenho que banhar a minha enguia —disse Kurt imediatamente, dedicando
um sorriso a sua irmã antes de afastar-se da linha de fogo.
—Covarde traidor —murmurou Janine atrás dele.
—Retirada estratégica —disse Canton, entrecerrando os olhos ao olhá-la—.
Está corrompendo a minha filha.
—Que estou o que?
—Corrompendo a minha filha. Não estava acostumado a ser tão
irresponsável —o olhar do Canton se tornou geada ao acrescentar—: E se pensa
ter aqui a seu noivo vivendo contigo, sem vigilância, não penso permitir que Karie
se aproxime desta casa até que se foi!
Janine ficou boquiaberta.
—Exatamente de que século procede? —perguntou.
—Conforme tenho entendido, essa é a especialidade de seu noivo, história
antiga —replicou Canton secamente—. Vi muitos estilos de vida permissivos para
sentir respeito por algum. Não penso expor a minha filha ao teu!
—Permissivo... expor... —Janine abria e fechava a boca como um peixe—.
Olhe quem foi falar, com todas essas mulheres derretendo-se a seu redor e
vocês... seus amantes jovencitas!
—Acompanhantes —disse Canton escuetamente—. Nunca fui infiel a minha
mulher. Coisa que ela não poderia dizer! Não estou criando ao Karie para que saia
como ela.
Janine aferrou com força os braços da cadeira em que estava sentada.
—Meu noivo é um respeitado professor de universidade com um severo
caráter moral —disse, indignada—. E para sua informação, insiste em ficar em um
hotel, não aqui!
Canton permaneceu onde estava, com as mãos nos bolsos, elevando
amenazadoramente sua grande estatura sobre ela, respirando apenas enquanto
seus olhos azuis se deslizavam pelo ligeiro vestido de algodão que Janine tinha
posto até as dobras abertas de sua saia, que revelava muito de suas
encantadoras e moréias pernas.
Atirou dos borde da saia e se levantou da cadeira, furiosa.
—Mas embora decidisse ficar aqui, não seria teu assunto! Pode deixar ao
Karie encerrada em casa se temer minha corruptora influência. E você também
pode ficar encerrado se quiser! Maldito seja!
A velocidade com que Canton tirou as mãos de seus bolsos e tomou pelos
braços foi surpreendente. Baixou o olhar e contemplou os assombrados olhos
verdes do Janine.
—Maldita você seja também! —disse entre dentes, com uma intensidade
quase dolorosa—. É muito jovem, muito frívola, muito emocional, muito tudo!
Arrependo-me de ter trazido aqui ao Karie!
—E eu de que tenha vindo você! —espetou Janine—. me Solte! —exclamou,
golpeando a perna do Canton com seu pé nu.
A ação, muito violenta para ser controlada, fez-lhe perder o equilíbrio, mas
Canton a sujeitou com rapidez, rodeando-a com as mãos pelas costas.
—Cuidado —disse, e sua voz foi tão sensual, que Janine perdeu todo afã de
luta.
Seus dedos aferraram a parte dianteira da camisa do Canton. Não se
atreveu a elevar o olhar. A sensação de seu corpo já era suficientemente
capitalista para enfrentar-se a seus olhos azuis. Não se moveu. Não acreditava
poder fazê-lo. Pela abertura de sua camisa aparecia um arbusto de pêlo e se
perguntou se descenderia até suas calças. Desejou acariciá-lo com as mãos, com
a bochecha, com a boca. Seus próprios pensamentos a escandalizaram.
Canton deslizou as mãos pelas costas do Janine, atraindo-a ainda mais para
si, lhe acariciando a têmpora com seu fôlego.
Moveu o nariz contra sua frente, contra sua bochecha. Seus finos lábios
acariciaram esta e o bordo de sua boca, detendo-se ali um momento.
Ela sentiu que quão único havia no mundo era a boca do Canton. Olhou-a
com tal fome que nada mais existiu.
Canton elevou uma mão e deslizou o polegar com suavidade sobre o lábio
inferior da boca do Janine, atirando dele. De uma vez que os lábios do Janine se
entreabriam, Canton inclinou a cabeça. Ela sentiu o doce fôlego de sua boca com
tremente antecipação, com faminta curiosidade.
—Fecha os olhos —sussurrou Canton—, mas não a boca...
Ela imaginou o beijo. Já podia senti-lo. Seria tão inesperado e repentino
como a brisa que acabava de entrar pela janela. Sentiu que seu corpo ficava
rígido de desejo. Nunca tinha tido uma reação tão imediata ante um homem.
Canton devia ter experiência, é obvio. Janine se sentiu perdida do primeiro
contato. Com os olhos fechados, como lhe havia dito, e a boca entreabierta.
—Sabe quem sou? —perguntou Canton de repente.
Janine abriu os olhos. Canton não se moveu. Não a tinha beijado. Ela... tinha
imaginado o beijo. Elevou o olhar, tratando de controlar suas emoções enquanto
notava que os joelhos lhe tremiam.
—Não sou seu professor universitário —murmurou Canton—. O joga tanto
de menos que inclusive eu posso substitui-lo? —acrescentou com um zombador
sorriso.
Janine se separou dele, com o rosto vermelho de ira.
—Sim! —exclamou—. Jogo muito de menos! Por isso o convidei a vir ao
Cancún!
Canton colocou as mãos nos bolsos de sua calça com gesto despreocupado.
—Ainda é muito jovem —murmurou—. Mas é evidente que seu noivo
exerceu muito pouco efeito sobre ti.
—Exerce um efeito maravilhoso sobre mim!
Canton entrecerró os olhos.
—Como eu acabo de fazer?
—Isso foi... foi...
Canton se aproximou dela com gesto sensualmente ameaçador.
—Explosivo. Apaixonado. E isso que nem sequer te beijei.
A mão do Janine se moveu como um raio, mas Canton a apanhou na sua e se
levou a palma até seus lábios em um gesto que deixou ao Janine sem fôlego. Seu
olhar era intenso, perigosa.
—Vamos de diferentes mundos —disse com calma—. Mas há algo em nosso
interior que reconhecemos mutuamente imediatamente. Não o negue. Soube
assim que nos conhecemos, e me aconteceu o mesmo.
—Sim, claro, quando fui soldado no exército tcheco em uma vida passada...!
Canton apoiou um dedo sobre os lábios do Janine, fazendo-a calar.
—Não acredito na reencarnação. Mas estou seguro de que nos conhecemos
algum nível. É impossível negá-lo.
—Não te desejo! —espetou Janine.
Canton tomou a mão.
—Eu sim te desejo —disse com simplicidade—. Mas comigo está totalmente
a salvo. Estaria-o inclusive embora não tivesse noivo. Não quero uma nova relação.
—Isso já o havia dito.
—Volto a dizê-lo para que fique claro. Somos vizinhos. Isso é tudo.
—Sei —Janine se apartou, liberando sua mão—. Deixa de me tocar.
—Trato de não fazê-lo —replicou ele com um estranho sorriso—. Mas é
como tratar de deixar de fumar.
—Eu não gosto que me toque —mentiu ela.
Ele nem sequer se incomodou em responder.
—Não me ocorreria te beijar —disse—. Os vícios são perigosos.
—Exato.
Os pálidos olhos do Canton contemplaram os do Janine por um comprido
momento e o mundo se desvaneceu a seu redor durante uns segundos.
—Quando tiver tido um par de aventuras sérias e eu tenha recuperado
minha fortuna, voltarei por ti.
Janine o olhou com gesto desafiador.
—Eu não gosto da gente rica.
Canton elevou as sobrancelhas.
—Não sou rico e você não gosta.
—Ainda segue sendo rico por dentro —murmurou ela.
—E você só é uma jovem universitária com um chefe desumano —replicou
ele, sonriendo—. Poderia dever trabalhar para mim. Desfrutaria de férias pagas.
—Não tem nenhum negócio.
—Ainda —replicou Canton com total segurança em si mesmo.
—Mas o terá —acrescentou Janine.
Ele assentiu.
—E necessitarei empregados eficientes e leais.
—E como sabe que eu o serei?
—Trabalha durante suas férias. Que mais pode pedir-se?
Janine evitou o olhar do Canton.
—Pode que não seja exatamente o que pareço.
—Sim o é. É a mulher mais refrescante que conheci nos últimos anos —
confessou Canton a contra gosto—. É sincera, leal e desinteressada. Estou
cansado de mulheres que tratam de captar a atenção com cada movimento e que
não podem viver afastadas dos focos. É um alívio conhecer uma mulher que se
sente satisfeita sendo uma engrenagem de uma máquina em lugar da máquina
inteira.
Janine sentiu que se ruborizava. Canton não tinha idéia de como era sua
vida normal. Era uma autora famosa e ia caminho de ser muito rica. Não era uma
engrenagem, era a máquina inteira. Mas Canton se sentiria muito desiludido se
soubesse. Tinha perdido muito por confiar na gente equivocada. Como se sentiria
se soubesse que lhe tinha mentido?
Mas isso em realidade não importava, porque nem ele nem ela queriam uma
relação íntima.
—Bom, entre vizinhos, direi-te que você também é bastante refrescante.
Nunca tinha conhecido um milionário tão arruinado.
Canton sorriu.
—As novas experiências sempre são boas. Exceto a de te beijar. Não me
sinto tão valente como para isso. Não me convém jogar muito com minha tensão
em uma só tarde.
—Tem-na alta? —perguntou Janine, sinceramente preocupada.
Canton se encolheu de ombros.
—Tende a ser alta. Mas não perigosamente —olhou ao Janine aos olhos—.
Não se preocupe por mim. É a última complicação que necessito.
—Estava a ponto de dizer o mesmo. Além disso, tenho noivo.
—Pois lhe desejo sorte —Canton riu brevemente—. Se for tão pura aos
vinte e quatro anos, é que lhe falta algo.
Janine abriu a boca sem que nenhum som surgisse dela, mas Canton já se
afastava quando lhe ocorreu uma resposta adequada. E de todos os adjetivos nos
que pensou, «descarado» lhe pareceu o mais adequado.

Capítulo 5

Ao longo da seguinte hora, Janine fez todo o possível por desejar a pronta
visita do Quentin.
Mas o que tinha experiente com o Canton Rourke era tão explosivo que só
conseguia pensar em que um dia próximo teria que ir-se a Chicago e não o voltaria
a ver. A crua verdade era que o desejava tanto como ele a desejava a ela, apesar
de que a maioria do tempo o fazia sentir-se furiosa. Mas estava vivendo de
sonhos outra vez, e tinha que parar. Ter ao Quentin ali durante o fim de semana
poderia resultar útil para esquecer o absurdo teimosia adolescente que sentia
pelo Canton Rourke.
Quentin chegou três dias depois. Desceu do avião no Cancún, suarento,
cansado e de mau humor. Lançou um escuro olhar a uma jovem mulher ruiva que
lhe sorriu docemente de uma vez que lhe mandava um beijo com a mão.
Quentin seguia olhando à mulher quando se reuniu com o Janine. Não
parecia precisamente feliz.
—Estes licenciados ingleses —disse com desprezo—. Acreditam que sabem
tudo!
—Alguns sabem —disse Janine—. Um de meus professores ingleses falava
cinco línguas e tinha uma memória fotográfica.
—Eu tive ao velho professor Blake, que nunca conseguia recordar onde
tinha estacionado o carro.
—Sei como se sentia —murmurou Janine distraídamente enquanto tratava
de localizar com a vista o carro de aluguel que conduzia.
Quentin grunhiu.
—tornaste a te deixar as chaves dentro?
Janine tirou as chaves de sua bolsa e as balançou ante o rosto do Quentin.
—Não. Mas não posso recordar onde deixei o carro. Em seguida o
recordarei. Vamos. tiveste um vôo agradável?
—Não. A professora inglesa se sentou a meu lado e se dedicou a me
contradizer todo o momento. Miúda grosseira!
Janine teve que mordê-la língua para não lhe recordar que ele fazia o
mesmo com ela constantemente.
—Miúdo calor! Faz mais afresco no hotel?
—Não muito —respondeu Janine—. Embora o ar condicionado ajuda um
pouco. E sempre há brisa na praia.
—O primeiro que quero fazer é localizar a biblioteca —disse Quentin—. E
logo a sociedade histórica local. Falo espanhol, assim poderei me entender com
eles bastante bem.
—Falas maia? —perguntou Janine com um sorriso—. Espero que sim, porque
muita gente daqui fala maia em lugar de espanhol.
Quentin pareceu tão incômodo para ouvi-la que Janine se sentiu culpado.
—Mas quase todo mundo sabe um pouco de inglês —acrescentou
rapidamente—. Irá bem.
—Espero que essa ruiva de língua viperina não fique em meu hotel. Onde
está o hotel, por certo?
—A umas três milhas de minha casa. Posso te levar e te trazer. aluguei um
carro por um mês.
—É perigoso conduzir aqui?
—Não mais que em Chicago —replicou Janine—. Ah! Aí está o carro!
—Pensava que seu irmão estava contigo.
—E assim é. Tem uma companheiro de jogos e está acontecendo o dia com
sua família —Janine não acrescentou que Kurt se negou a ir recolher ao Quentin,
que não era precisamente um de seus conhecidos favoritos.
—Já vejo. Segue sendo tão mal educado como sempre?
Janine odiava aquele sorriso de superioridade do Quentin. Nesse instante
compreendeu que as férias foram ser um fracasso.
Kurt foi amável com o Quentin; simplesmente amável, nada mais. Passou o
fim de semana brincando de correr com o Karie, evitando a casa, que Quentin
tinha cheio de fotocópias de uns velhos manuscritos que tinha encontrado na
biblioteca local. Todos estavam em espanhol. Em espanhol antigo.
—Isto é do século dezesseis —murmurou distraídamente, rodeado de
páginas dispersas pelo chão e o sofá enquanto ele permanecia sentado com as
pernas cruzadas sobre o tapete—. Não reconheço algum destes verbos. Pode que
sejam arcaicos, é obvio...
Estava falando para si mesmo. Frente a ele, Janine estudava um volume de
medicina forense, procurando novos métodos para apanhar vilãos.
Mediada a estudiosa tarde, Kurt e Karie voltaram da praia com o pai desta
seguindo-os com gesto ameaçador. Ambos os meninos pareciam acalorados e
tinham expressão de culpabilidade.
Janine deixou a um lado o livro e suspirou.
—O que tem feito agora? —perguntou a seu irmão com resignação.
—Recorda a mangueira que lhes comprei? —respondeu

Canton, sem logo que fixar-se no homem que estava sentado no chão,
rodeado de papéis.
—Sim.
—Estavam cortando-a com um facão muito afiado debaixo do alpendre de
nossa casa.
—Um facão? De onde o tiraste, Kurt? —perguntou Janine com severidade.
antes de que o menino pudesse responder, Quentin ficou em pé.
—Disse-te que nunca conseguiria dirigir sozinha ao Kurt.
Janine lhe dedicou um frio olhar.
—Eu não «dirijo» ao Kurt. Não é nenhum objeto, Quentin.
Canton tinha as mãos metidas nos bolsos. Olhava ao Quentin com uma
mescla de curiosidade e velado desprezo.
—Este é nosso vizinho, o senhor Rourke —disse Janine—. E este é Quentin
Hobard, um colega de meus pais. Ensina história antiga na universidade de
Indiana.
—Estou especializado no Renascimento —especificou Quentin.
Sustentando em alto uma fotocópia de um dos manuscritos, acrescentou—: Estou
investigando...
Canton tomou a fotocópia em meio da frase do Quentin e a examinou com o
cenho franzido.
—É de um jornal. É parecido ao do Bernal Díaz quando veio pela primeira
vez da Espanha ao Novo Mundo com Cortês.
Quentin parecia impressionado.
—É certo!
—Mas estes escritos tratam sobre os maias, não sobre os astecas —
Canton leu a página em alto, traduzindo-a ao inglês sem aparente esforço.
Finalmente, elevou o olhar do papel e perguntou—. Quem tem escrito isto?
Quentin piscou. Como outros, tinha escutado enfeitiçado as antigas
palavras lidas com tanta eloqüência pelo visitante.
—Ninguém sabe —respondeu—. São uns manuscritos anônimos, mas o estilo
é o de um sacerdote, não lhe parece? Como pôde lê-lo? Alguns desses verbos
estão obsoletos.
—Minha mãe era espanhola —respondeu Rourke—. Nasceu no Valladolid e
conhecia um dialeto que logo que tinha trocado da Retomada.
—Sim, quando Isabel e Fernando uniram seus reino através do matrimônio
e jogaram aos árabes da Espanha, em mil quatrocentos e noventa e dois.
casaram-se no Valladolid —Quentin acrescentou—: esteve ali?
—Sim —respondeu Canton—. Ainda tenho primos no Valladolid.
Aquilo era fascinante. Janine o olhou com aberta curiosidade e se
ruborizou quando seus olhares se encontraram.
—Obrigado pela tradução —disse Quentin—. Se tiver tempo, agradeceria-
lhe que me traduzira outras páginas.
—Sinto-o —respondeu Rourke—, mas tenho que voar a Nova Iorque amanhã
pela manhã. Não estarei de volta até meia-noite, e queria lhe perguntar ao Janine
se podia fazer-se carrego do Karie enquanto estou fora.
—É obvio —respondeu ela imediatamente—. eu adorarei fazê-lo.
—Trarei-a para aqui antes de ir.
—Espero que tenha sorte para conseguir bilhete —disse Quentin.
Canton sorriu.
—Por esse lado não há problema. Tenho um avião privado. Então, até manhã
—quando estava a ponto de voltar-se, Canton se fixou no livro que havia sobre o
sofá e elevou as sobrancelhas—. Medicina forense? Pensava que sua
especialidade era a história —disse, olhando ao Janine.
—É-o —respondeu ela.
—Faz isso para seus livros —disse Quentin despreocupadamente.
—Os que trato de vender —acrescentou Janine rapidamente, olhando ao
Quentin.
Este não compreendeu. Estava a ponto de falar quando Janine se levantou
e acompanhou ao Canton à porta.
—Por certo, tirei-lhes o facão e o guardei —disse ele, olhando aos meninos,
que tinham saído ao alpendre—. Não deixe que se afastem de sua vista. Não sei o
que se trazem entre mãos. por que estariam cortando essa mangueira nova?
—Para usá-la como ceva para pescar jardineiros? —sugeriu Janine.
Canton grunhiu. Depois deles, Quentin tinha voltado para enfrascarse na
leitura, aparentemente alheio ao resto do mundo..
—entrega-se a seu trabalho seriamente, não? —murmurou Canton.
—Ama a história. Eu também, mas meu período é a América Vitoriana. Não
me interessa muito o anterior —depois de uma pausa, Janine disse—: Sua cultura
é muito notável. Os espanhol como um nativo.
—Quase o sou —replicou Canton, elevando o queixo—. Quanto ao da
cultura, estava muito ocupado em minha juventude para passar do décimo grau.
Tenho um certificado que equivale a ter acabado o bacharelado. Isso é tudo.
Janine se ruborizou intensamente. Em nenhum momento lhe tinha passado
pela cabeça a possibilidade de que Canton não tivesse ido à universidade.
O rubor do rosto do Janine fascinou ao Canton.
—Assim, como vê, não tenho nada de universitário. Eduquei-me na rua.
Ela o olhou aos olhos.
—Nenhum ignorante poderia ter desenvolvido os programas de ordenador
que você criaste. É um autêntico gênio.
Canton pareceu momentaneamente surpreso pelo comentário do Janine.
—Seus pais não tinham dinheiro? —perguntou ela.
—Se referir a si herdei deles o dinheiro com o que pus em marcha minha
empresa, a resposta é não —replicou Canton—. Meu pai era um operário e eu tive
que deixar a escola para manter a minha irmã quando ele morreu de câncer. Então
tinha dezesseis anos. Minha mãe tinha morrido dois anos antes.
—E chegou tão longe sozinho? —perguntou Janine, assombrada.
—Não completamente sozinho, mas ganhei cada centavo honestamente —
Canton riu—. Sou um viciado no trabalho. Não se nota?
Janine assentiu.
—Também se nota a inteligência.
Canton sorriu burlonamente.
—Está-me adulando se por acaso volto a ser rico?
—Parece-te que o dinheiro me importa muito?
—As mulheres são tortuosas —replicou Canton—. Poderia parecer um anjo
e entretanto ser uma cazafortunas.
Janine se sentiu ferida em seu orgulho.
—Obrigado pelo completo —disse, voltando-se para entrar.
Canton a agarrou pelo braço, fez-lhe sair e fechou a porta.
—Seu amiguito é universitário —disse entre Esse dentes é o motivo pelo
que o tem aqui, não? E eu nem sequer cheguei a entrar na universidade.
—E o que importa isso? —replicou Janine em tom igualmente venenoso—. A
quem lhe importa que tenha ou deixe de ter um título? A mim não! Só somos
vizinhos temporais —acrescentou em tom zombador—. Simplesmente amigos.
Canton olhou sua carnuda boca.
—Eu gostaria de ser algo mais —murmurou.
de repente, amaldiçoando entre dentes, inclinou a cabeça e roçou com seus
lábios os do Janine, tão brandamente que esta não soube se realmente o tinha
feito.
—Obrigado por cuidar do Karie. Devo-te o favor.
—Não me custa nada.
—Você gosta dos meninos, verdade? —perguntou Canton.
Janine sorriu com ternura.
—Muito.
—Eu adoro a minha filha. E também eu gostaria de ter um filho —Canton
olhou ao Janine aos olhos e viu que suas pupilas se dilatavam repentinamente. Sua
mandíbula se esticou—. Não te deite com ele —disse com aspereza, assinalando
com a cabeça para a porta.
Janine ficou boquiaberta.
—Que não me...!
—Nem com ele nem com nenhum outro —Canton voltou a inclinar-se para
ela. Essa vez o beijo foi duro, breve, exigente, possessivo. Seus olhos brilhavam
quando elevou a cabeça—. Oxalá não te tivesse conhecido —murmurou, e, sem
acrescentar uma palavra mais, afastou-se a grandes pernadas, deixando ao
Janine completamente aturdida, perguntando-se o que teria feito para que a
beijasse... e para que voltasse a zangar-se de repente com ela.
Era uma alegria ter ao Karie ao redor, mas Kurt e ela pareciam encontrar
constantemente novas formas de irritar ao Quentin, desde pôr a música muito
alta até negar-se a deixar ao Janine a sós com ele.
E havia outra silenciosa complicação. O homem suspeito havia tornado. Não
se tinha aproximado da casa, mas Janine via quase todas as manhãs seu carro na
estrada. limitava-se a permanecer sentado nele, observando. Em uma ocasião se
encaminhou para ele e o carro se afastou. Janine começava a ficar realmente
nervosa. E ainda não tinha tido notícias de seus pais.
Tratou de explicar suas preocupações ao Quentin, mas este tinha
encontrado uma referência ao Chichén Itzá em seus manuscritos e estava
desejando ir ali.
—Há um ônibus que vai diariamente às ruínas, mas demora muito em chegar
e voltaria muito tarde.
—Isso não importa! —exclamou Quentin—. Tenho na sábado livre. Vamos,
podemos ir juntos.
—Não posso levar ao Kurt a uma viagem assim. Ainda se está recuperando.
—Não posso me perder a viagem —disse Quentin, olhando-a com gesto
culpado—. É a oportunidade de uma vida. Tenho que ver os glifos do templo.
Janine sorriu.
—Então, adiante. Que o passe bem.
Quentin franziu os lábios e assentiu.
—Sim, farei-o. De verdade que não te importa?
—É obvio que não —disse Janine—. Adiante.
Ele sorriu.
—Obrigado, Janine, sabia que seria pormenorizada.
Quando não o tinha sido?, perguntou-se ela. Ao Quentin não importava
deixá-la apesar de que se supunha que foram passar esses dias juntos. Mas assim
era Quentin, desconsiderado e teimado em fazer o que queria.
—Seu vizinho me resulta conhecido —disse Quentin de repente.
Janine não pôde evitar sentir um comichão por todo o corpo para ouvir
mencionar ao Canton.
—Não sente saudades. Não tem lido os periódicos recentemente? Soa-te
Canton Rourke, o fundador do Chipgrafix software?
—Deus santo!
—Esse era ele.
—Uma mente como essa... —murmurou Quentin—. Não tem um aspecto tão
importante, não? Se tivesse passado junto a ele na rua, não me teria fixado. Mas
ainda recorda a alguém... Estraga! Já o tenho! O alienígena da série de ficção
científica...
—Não —disse Janine, movendo a cabeça—. Em realidade não se parece
muito a ele quando acostuma a vê-lo.
—Pois sim me recorda —replicou isso Quentin—. Tem uma voz bonita.
supunha-se que não devia lhe gostar de Canton Rourke. supunha-se que
devia estar ciumento dele. Janine suspirou. Nada estava saindo segundo o plano.
Nada absolutamente.
Karie passou o dia seguinte com o Janine enquanto Quentin se ia de
excursão. Retornou a tarde seguinte, caminho do aeroporto.
—Passei-o muito bem no Chichén Itzá —disse ao Janine—. É obvio, a
sabionda inglesa também ia no ônibus —acrescentou com aspereza—.
Desgraçadamente, trabalha no Indianápolis e vai tomar o mesmo vôo que eu. Sabe
tudo sobre a cultura maia. Fala espanhola com fluidez —acrescentou, enojado—.
É doutora em língua inglesa e em arqueologia.
—Está casada? —perguntou Janine.
—Quem a agüentaria? —perguntou Quentin—. É tão creída... De todas
formas, me alegro muito de ter vindo, Janine. Me alegro de que me convencesse
para fazê-lo. tirei muitas fotos do Chichén Itzá para o departamento de
arqueologia. Crie que gostará de ter algumas a seus pais?
Janine duvidou se lhe mencionar que seus pais já tinham tirado carretéis e
mais carretéis do lugar.
—Pode perguntar o disse com tato.
—Farei-o. Bom, suponho que voltarei a verte quando for visitar seus pais.
Tem notícias de como vai na nova escavação?
Janine negou com a cabeça.
—Estou começando a me preocupar. Não tive notícias deles há duas
semanas, nem sequer pelo correio eletrônico.
—Deve ser difícil encontrar tomadas e conectores em plena selva —disse
Quentin, rendo a seguir sua própria brincadeira.
Janine não sorriu.
—Têm um gerador de emergência e uma conexão via satélite para os
ordenadores.
—Já darão sinais de vida —disse Quentin animadamente, ignorando a
evidente preocupação do Janine—. Tenho que me dar pressa ou perderei o vôo.
Me alegro de te haver visto. Tinha razão, Janine. Necessitava um descanso.
Depois de beijar rapidamente ao Janine na bochecha, Quentin voltou para
táxi que o esperava.
E isso foi tudo.
Janine lia seu tiro de remédio forense enquanto Kurt e Karie estavam na
praia vendo um menino que fazia parapente. A repentina chamada à porta a
sobressaltou. Os batimentos do coração de seu coração se aceleraram ao ver que
entrava Canton.
—Estou procurando o Karie —disse ele, sem preâmbulos.
Janine ainda estava doída pelas frite palavras com que se despediu dela o
dia que leu o manuscrito em castelhano.
—Estão na praia, vendo um menino que faz parapente.
Canton se aproximou do corrimão do alpendre e utilizou uma mão a modo de
viseira para olhar em direção à praia.
—Já os vejo —murmurou. Logo se voltou para o Janine e a olhou ao rosto—.
Onde está seu noivo?
—voltou para Indiana. Acaba de ir-se.
—Que lástima —disse Canton lánguidamente.
Janine riu sem alegria.
—Sim.
Canton se fixou na tela do ordenador. O processador de textos estava em
marcha, mas não havia nenhum arquivo aberto.
—Esse processador está obsoleto —afirmou—, por que não usa o novo?
—Porque me leva muito tempo aprendê-lo —Janine sorriu—. Suponho que
para ti são um jogo de meninos. Eu não poderia escrever um programa de
ordenador nem que minha vida dependesse disso!
—por que não?
—Porque não sei nada de matemática —respondeu Janine com simplicidade
—. E tampouco entendo as máquinas. Seu deve ter um talento natural para a
informática.
Canton se sentiu menos inferior para ouvir aquilo.
—Suponho que há algo disso.
—Não foi a nenhuma escola para aprender a programar?
—Não. Mas trabalhei com dois homens que tinham sido empregados da
Nasa. Aprenderam informática no programa espacial. Aprendi muito deles.
Começamos juntos a empresa. Logo comprei sua parte e segui por minha conta.
—Suponho que soube escolher a gente mais brilhante com a que trabalhar.
Canton sorriu.
—Não é exatamente o que esperava —disse inesperadamente.
—Desculpa?
—Alguns universitários utilizam sua educação para fazer sentir-se
insignificantes a aqueles que não a têm —explicou Canton.
—Não estaria mal poder fazer sentir-se insignificante a um milionário por
ser licenciada em história.
—Como emprega seu título? Dá classes, como seus pais?
—Não.
—por que não? É que você gosta de trabalhar de secretária para esse
negreiro que tem por chefe?
Janine recordou o falso trabalho que Kurt tinha inventado para ela.
—OH. Bom, não, em realidade não. Mas há muitos licenciados e pouco
trabalho. Conheço um doutor em filosofia e letras que trabalha de garçom em um
restaurante de comida rápida próximo a minha casa. Foi o único trabalho que
pôde conseguir.
Canton se apoiou contra a parede, com as mãos nos bolsos.
—Escreve rápido a máquina?
—Pouco mais de cem palavras por minuto.
Canton assobiou.
—Não está mau.
—Obrigado.
—Se consigo o financiamento que necessitar, poderia dever trabalhar
comigo —sugeriu.
Janine se perguntou se aquela seria sua maneira de desculpar-se por
haver-se despedido dela dizendo que lamentava havê-la conhecido.
—É uma oferta agradável —disse.
—Nesse caso, pense-lhe isso Canton se separou da parede—. vou dizer lhe
ao Karie que tornei.
—averiguaste algo sobre esse homem que a vigia? —perguntou Janine,
preocupada.
Canton franziu o cenho.
—Não. tornou a aparecer?
Janine suspirou.
—Sim. O certo é que me preocupa.
—Sei. Seguirei investigando e veremos o que descubro.
Janine olhou o ordenador, que parecia observá-la com seu grande olho,
esperando-a.
—Está ocupada? —perguntou Canton.
—Deveria está-lo.
Ele alargou uma mão.
—me acompanhe a recolher ao Karie. Seu trabalho seguirá aqui quando
voltar.
Janine sorriu, tentada. Aquilo ia ser um desastre, mas por que não? A fim
de contas, só era um passeio.
Apagou o ordenador e, indecisa, tomou a mão que lhe oferecia Canton. Os
dedos de este se fecharam quentes e firmes em tomo aos seus.
—Pode estar tranqüila —disse Canton ao ver que Janine se ruborizava um
pouco—. Só nos tiraremos da mão, como dois velhos amigos, e simularemos que
nos conhecemos faz vinte anos.
—Faz vinte anos eu tinha quatro...
—Eu tenho trinta e oito. Não tem por que te dedicar a recalcar a
diferença de quatorze anos que nos separa. Sou consciente dela.
—Só brincava —disse Janine.
—Eu não me rio —replicou Canton enquanto baixavam à praia.
Kurt os olhou de longe com curiosidade ao vê-los com as mãos unidas.
Saudou com a mão, sorriu e retomou a caça de caranguejos em que estava
concentrado nesses momentos. Karie estava um pouco mais longe, falando com
umas meninas de sua idade.
—Quando vão voltar seus pais? —perguntou Canton.
—Nem idéia —respondeu Janine com cautela—. Se inundam em seu
trabalho e esquecem o passado do tempo. Às vezes são como meninos. Kurt e eu
temos que vigiá-los para que não se metam em problemas. Esta vez estamos um
pouco preocupados com os ladrões de tesouros arqueológicos. A escavação em
que estão meus pais é nova e pode que contenha peças importantes. Se for assim,
seguro que haverá problemas. O governo mexicano não pode permiti-la classe de
amparo que necessitariam. Espero que estejam vigiando suas costas.
—Deveriam estar aqui, cuidando de vós dois.
Janine sorriu.
—Quando fiz doze anos me converti na maior da família. Após cuidei que o
Kurt e deles.
Canton entrelaçou seus dedos sensualmente com os dela.
—Deveria te casar e ter filhos próprios.
O coração do Janine deu um tombo. Até esse momento, nunca tinha
pensado nessa possibilidade em términos reais. Sentiu a força e a atração do
homem que estava junto a ela e pensou em quão maravilhoso seria ter um filho
com ele.
Seus pensamentos a assombraram.
Ele deixou de caminhar e a olhou aos olhos. Por uns segundos, pareceram
falar-se sem pronunciar palavra.
Involuntariamente, Janine deu um passo para o Canton, de maneira que
pôde sentir o calor de seu corpo e aspirar o aroma a limpo que desprendia.
Lhe soltou a mão.
—Quatorze anos —recordou com suavidade, apoiando ambas as mãos nos
ombros do Janine—. E agora mesmo sou um homem pobre.
Ela sorriu com doçura.
—O dinheiro não é a meta. Não é o motivo pelo que trabalha.
—Surpreendente.
—O que?
—Sempre pensei assim.
Os olhos do Janine percorreram lentamente o rosto do Canton em silêncio.
—Isto não é boa idéia, verdade?
—Não —respondeu ele com sinceridade—. Sou vulnerável e você também o
é. Ambos estamos fora de nosso elemento natural —suspirou profundamente—.
Me parece muito atrativa, mas só devemos pensar que somos dois velhos amigos
que se gosta. Ponto. Nada profundo. Nada permanente. Simplesmente amigos.
—De acordo. Por mim não há problema.
Seguiram caminhando pela praia. E se Janine se sentiu afetada pela
cercania do Canton, não o demonstrou.
Karie estava falando com uma mulher maior que sustentava vários ponchos
em um braço. Estavam a uns quatrocentos metros da casa.
—Papai! —gritou a menina, correndo para tomar a mão de seu pai e atirar
dele para a mulher— Me alegra que haja tornado. tiveste uma boa viagem?
Escuta, já sabe que não sei falar espanhol, e preciso comprar esse poncho. Pode
dizer-lhe perguntou precipitadamente, assinalando um delicioso poncho azul e
vermelho.
Canton riu e traduziu a petição de sua filha. Logo tirou a carteira e pagou à
mulher, que entregou ao Karie seu poncho e logo se afastou caminhando pela
praia.
—Não volte a fazer isso! —arreganhou Canton a sua filha—. Não quero que
te afaste sem avisar.
—De acordo, não voltarei a fazê-lo —disse Karie—. Mas vi este poncho tão
bonito e não pude resistir. E agora vou acostumar se o ao Kurt! —acrescentou
antes de sair correndo para onde Kurt seguia com sua caça.
—Falas muita bem espanhola —disse Janine—. Como o aprendeu?
—Nos joelhos de minha mãe. Já te disse que era espanhola, do Valladolid —
Canton sorriu—. Fui ali quando tive suficiente dinheiro para viajar. Queria
conhecer uns primos aos que não tinha tido ocasião de ver antes.
—Seus pais foram felizes juntos?
Canton assentiu.
—Isso acredito. Mas meu pai trabalhava muito e não estava bem. Minha
mãe se dedicou a limpar casas até que morreu. Sinto que Karie tenha tido que
ver-se rasgada entre sua mãe e eu. Ainda quer a sua mãe, como é lógico. Mas
agora apareceu um padrasto em cena. E é muito «afetuoso» para nos gostar da o
Karie ou a mim. Assim procuramos desculpas para nos assegurar que não esteja
quando a menina vai visitar sua mãe.
—E o que passa se aparecer enquanto Karie está ali?
—OH, tive uma larga conversação com ele —disse Canton—. Sabe que
tenho mau gênio e não quer acontecer o resto de sua vida cantando de soprano.
Conseqüentemente, manterá suas mãos afastadas de minha filha. Mas Enjoe quer
conseguir a custódia do Karie e ultimamente se há posto muito pesada a respeito.
Hei-lhe dito o que penso e sabe o que farei se me pressiona muito. Pode que já
não tenha dinheiro, mas ainda conservo meu temperamento ardente e meus
contatos.
Janine sorriu.
—Então é certo que os homens com sangue latino são ardentes e
apaixonados?
Canton franziu seus finos lábios e a olhou.
—Se não fôssemos só velhos amigos, demonstraria-lhe isso.
—Mas o somos, é obvio. Refiro a velhos amigos.
—É obvio!
Seguiram caminhando pela praia, satisfeitos com sua mútua companhia.
Janine pensou distraídamente que nunca se havia sentido tão feliz em sua vida.
Quando retornaram à casa, Canton ficou ao pé das escadas.
—Tenho que voar amanhã a Miami por assuntos de trabalho.
—Mas acaba de voltar de Nova Iorque! —exclamou Janine.
—Trato de reagrupar a empresa, e esta fase do trabalho exige muita
atividade —explicou Canton—. vou reunir me com um grupo de possíveis
investidores em Miami. Esta vez vou levar me ao Karie comigo no jato. Você
gostaria de vir com o Kurt?
Os batimentos do coração do coração do Janine se aceleraram
imediatamente. Podia negar-se, mas seu irmão não voltaria a lhe falar se
rechaçava um vôo em um jato privado.
—Caberemos todos? —perguntou com sincera curiosidade.
—Cabem mais de quatro pessoas.
—Terá que levar piloto e co-piloto...
—Eu jogo bola o avião —replicou Canton—. Não te surpreenda tanto. Levo
anos voando. Não chocaremos com nada, pode estar tranqüila.
Janine se ruborizou.
—Não pretendia...
—É obvio que não. Gosta de vir?
Janine se encolheu de ombros.
—Ao Kurt apaixonam os aviões e voar. Se disser que não, enterrará-me
esta noite na areia e deixará que os caranguejos dêem conta de mim.
Canton riu.
—Bem. Virei a lhes recolher pela manhã.
—Obrigado.
—De nada —murmurou ele.
Seus olhos se entrecerraron enquanto observava ao Janine. Logo olhou em
direção à praia, onde Karie e Kurt se trabalhavam em excesso em construir um
castelo de areia, alheios ao que os rodeava.
—O que acontece? —perguntou Janine.
—Nada especial —replicou Canton, aproximando-se dela—. Só queria
responder a pergunta que me tem feito sobre o temperamento ardente e
apaixonado dos latinos.
—Que pre...?
A boca do Canton interrompeu ao Janine em meio da frase. Rodeou-a pela
cintura com o braço e a atraiu para si, pegando seu corpo totalmente ao dela das
coxas até o peito. Sua boca era dura, cálida e tão insistente que Janine sentiu
que o coração lhe ia sair do peito. de repente, a língua do Canton penetrou em sua
boca, deslizando-se nela com uma intimidade que provocou uma explosão de
cálidas sensações em seu interior. Sentiu que o mundo começava a dar voltas a
seu redor.
Quando, finalmente, Canton apartou a cabeça, Janine se deu conta que
tinha as unhas cravadas nos músculos de seus ombros. Os lábios lhe tremiam
devido à pressão e à paixão do beijo. Canton a olhou aos olhos, satisfeito.
—É muito jovem para uma mulher de sua idade —sussurrou com voz rouca.
Janine foi incapaz de dizer nada. Estava muito ocupada tratando de
recuperar a respiração.
Canton acariciou com seu dedo inflamados lábios.
—Não voltarei a fazê-lo —prometeu solenemente—. Não me tinha dado
conta de... do vulnerável que é —suspirou, apartando uma mecha de cabelo da
frente do Janine—. Me perdoa?
Ela assentiu.
Ele sorriu e deixou cair a mão.
—Passarei a lhes recolher a ti e ao Kurt pela manhã.
—De acordo.
Canton lhe piscou os olhos um olho e logo se afastou pela praia, totalmente
despreocupado, ao menos aparentemente. por dentro fervia de emoção. Uma
inocência como a do Janine não podia ser simulada. Essa classe de mulher
esperava o matrimônio antes que a intimidade. Não era moderna nem sofisticada.
Como seus acadêmicos pais, vivia em um mundo distinto ao que ele habitava, cheio
de interesses e depredadores.
Embora o matrimônio não seria tão mau se fosse com uma mulher que
gostasse e a que compreendesse. Aquele tolo pensamento lhe fez rir. Acaso não
tinha cometido esse mesmo equívoco com sua primeira esposa? Seria melhor que
se concentrasse em recuperar seu império e deixasse o amor para as pessoas que
soubessem dirigi-lo.
De todas formas, pensou enquanto entrava em sua casa, beijar ao Janine
era como estar no paraíso.

Capítulo 6

A NOTÍCIA de que ao dia seguinte foram voar no jato do Canton fez que a
cabeça do Kurt começasse a dar voltas. Logo que dormiu essa noite. À manhã
seguinte estava acordado antes do amanhecer, esperando a que sua irmã
despertasse e se vestisse para poder sair.
—Ainda não vai vir —grunhiu Janine—. Nem sequer há luz!
—Mas devemos estar preparados para quando chegar! —exclamou Kurt,
excitado—. Um verdadeiro Learjet. Não posso acreditá-lo!
—Você e os aviões —murmurou Janine enquanto preparava café—. por que
você não gosta dos ossos e coisas dessas?
—por que você gosta dos livros antigos?
—Nem idéia.
—Vê-o?
Janine não via nada. Levava postos umas calças curtas e uma camiseta
branca, seu habitual traje para dormir, e nenhum de seus olhos parecia
funcionar. Uma taça de café resolveria o problema, pensou enquanto punha a
cafeteira ao fogo.
—Ouço passos? —perguntou Kurt de repente, saltando de sua cadeira—.
vou ver se houver alguém na porta.
Incrivelmente, era Canton.
—por que não vais fazer companhia ao Karie enquanto sua irmã se prepara?
—sugeriu—. Tem donuts e pastelitos de queijo.
—Fantástico! Date pressa, hermanita! —exclamou Kurt por cima do ombro
enquanto saía disparado.
Janine se voltou, reprimindo um bocejo enquanto Canton entrava na
cozinha.
—Sinto muito, não te esperava tão logo.
—Kurt sim —disse Canton, sonriendo.
—Logo que dormiu. Quer café?.
Canton deslizou o olhar pela camiseta do Janine. Baixo esta, a escuridão
dos mamilos era visível e tentadora. Enquanto os observava, reagiram
repentinamente de forma igualmente visível.
Aturdida, Janine foi cruzar se de braços, mas Canton foi muito rápido.
Deslizou suas mãos sob a camiseta. Inclinou a cabeça e a beijou enquanto seus
polegares se deslizavam pelos suaves seios do Janine até suas duras pontas.
Janine deixou escapar um gemido. A boca do Canton se endureceu.
Empurrou-a contra a parede e a sustentou ali com os quadris enquanto explorava
com as mãos seu corpo, sem deixar de beijá-la.
—Ao diabo com isto —grunhiu.
Enquanto a aturdida mente do Janine tratava de assimilar as palavras,
Canton lhe tirou a camiseta. Segundos depois, ele se tinha tirado a camisa e
estavam abraçados, nus de cintura para acima, os seios do Janine enterrados no
espesso arbusto de cabelo que cobria o peito do Canton.
Janine gemeu ao sentir um inesperado broto de paixão que nunca tinha
experiente. Rodeou o pescoço do Canton com seus braços e se elevou para ele,
sentindo que os músculos de suas coxas se esticavam sob seu contato.
Canton a olhou aos olhos.
—Que diabos estamos fazendo? —sussurrou.
—A sua idade, deveria sabê-lo —brincou Janine com voz rouca.
Canton apertou seus quadris contra ela.
—Sente isso? Se não te apartar agora mesmo, te vou ensinar umas quantas
coisas que deveria saber a minha idade.
Janine se sentiu tentada. Nunca se havia sentido tão tentada em sua vida.
Assim o disseram seus olhos ao Canton.
Aquela vulnerabilidade o surpreendeu. Esperava que Janine se apartasse,
que se sentisse ofendida e lhe exigisse uma desculpa. Mas não estava fazendo
nada disso. Estava esperando. Pensando.
—Sente curiosidade? —perguntou brandamente.
Janine assentiu.
—Eu também —confessou ele. separou-se dela, lhe sustentando os braços
aos lados para contemplar as deliciosas curvas de seu corpo—. Eu gosto de te
olhar —disse, mas ao cabo de uns segundos a soltou.
Janine recolheu sua camiseta, a pôs e olhou ao Canton com curiosidade.
Canton se estava grampeando a camisa com divertida indulgência.
—Agora já sabe —disse.
—O que é o que sei?
—Que sou um homem fácil —murmurou Canton, fazendo que Janine
sonriera—. Que me pode chavecar com um beijo. Não tenho autocontrol nem
vontade. Pode fazer o que quiser comigo. Estou tão envergonhado...
Janine rompeu a rir.
—Seguro —sussurrou.
Canton elevou uma mão.
—Não me envergonhe.
—Ja!
—Não brinco. vou começar a me ruborizar em qualquer momento. Faz o
favor de seguir com a camiseta posta e deixa de me atormentar com esse corpo
perfeito.
Janine o olhou aos olhos, fascinada. Nunca tinha sonhado que a intimidade
pudesse ser divertida.
—Bom, ao menos estabelecemos uma coisa —disse Canton, apoiando as
mãos em seus quadris—. Eu sei muito e você não sabe nada.
—Sim sei —replicou Janine.
Ele riu.
—Não muito.
Janine se olhou os pés nus.
—Quereria completar minha educação?
Canton sentiu que seu coração deixava de pulsar. Duvidou, escolhendo suas
palavras.
—Sim.
Janine elevou o olhar a seu rosto.
—Então?
—Temos que voar a Miami —recordou Canton.
—Não referia a agora mesmo.
—Melhor, porque até que não tomo duas taças de café não sou capaz de me
pôr em marcha.
Janine sorriu.
Canton se aproximou dela e tomou pela cintura.
—Juntos somos explosivos —disse, ficando repentinamente sério ao
acrescentar—: É evidente que te desejo, mas tudo o que posso te oferecer é uma
aventura do verão. estive casado. Eu não gostei. Agora sou livre e quero seguir
sendo-o.
—Já vejo.
—Isto não é algo que não haja dito antes, Janine. Se me desejar sem
ataduras, perfeito. Faremos o amor tanto como queira. Mas depois voltarei para
minha casa sem olhar atrás. Será uma relação física. Nada mais. Ao menos para
mim.
Janine se sentiu totalmente confundida. Sabia com certeza quanto
desejava ao Canton. Mas era algo meramente físico? Acaso queria algo mais que
umas noites em seus braços?
Canton o fazia sentir-se incômoda. passou-se sua vida de adulta frente ao
ordenador ou com o nariz enterrado nos livros. Nunca tinha tido a aula de vida
noturna que tinham seus amigos e conhecidos. A intimidade sexual era algo muito
solene para ela para considerá-la frívolamente. Mas com aquele homem, ali,
nesses momentos, não podia pensar em outra coisa.
Canton lhe acariciou a bochecha.
—Quer a verdade? É uma virgem reprimida sentindo os primeiros impulsos
da sexualidade, e sente curiosidade. Sinto-me adulado. Mas depois de que passe
uma noite em meus braços, por boa que seja, vais ter dúvidas e não vais sentir te
precisamente feliz por ter perdido o controle. Tem que lhe pensar isso bem
antes de fazer algo do que possa te arrepender. O que me diz de seu amigo de
Indiana? Como encaixa ele em tudo isto? E se tiver uma aventura comigo, o que
sentirá ele por ti depois? É a classe de homem ao que lhe daria o mesmo?
—Não —respondeu Janine.
Canton assentiu.
—Então não te lance de cabeça sem lhe pensar isso duas vezes.
Janine suspirou. Canton fazia que tudo parecesse tão complicado... Era
incrível que desejando-a como a desejava estivesse tratando de convencê-la para
que o esquecesse. Talvez sim a queria um pouco. Do contrário, por que não
aceitava o que lhe oferecia tão abertamente e seguia depois com sua vida como
se nada tivesse passado?
—Simplesmente amigos —disse, olhando-o—. Velhos amigos.
—Isso.
—De acordo. Mas tem que deixar de me beijar, porque me volta louca.
—Já somos dois —Canton colocou as mãos nos bolsos de sua calça para as
manter quietas—. E você tem que deixar de andar sem prendedor.
—Não sabia que foste vir tão cedo. Do contrário o teria posto.
Canton sorriu.
—Melhor —confessou—. Não quereria me haver perdido o espetáculo por
nada do mundo.
Janine fez uma reverência.
—Obrigado.
—Então vístete, de acordo? —disse Canton—. antes de que me esgote a
paciência.
Janine lhe dedicou um travesso sorriso e foi vestir se.
A viagem em avião foi estupendo e divertido. Canton deixou que Kurt
ocupasse o assento de co-piloto e falaram de aviões e jatos durante todo o vôo a
Miami.
Quando chegaram, uma enorme limusine branca os esperava no aeroporto.
Para o Kurt, que estava acostumado a viajar de táxis e em velhas tartanas, foi
uma experiência incrível. Explorou cada rincão do veículo sob o atento e divertida
olhar do Canton.
—É só um carro grande —lhe informou—. Ao cabo do tempo todos parecem
iguais.
—É a primeira vez que subo em uma limusine e vou desfrutá-lo —assegurou
Kurt, seguindo com sua exploração.
Janine, que estava acostumado a viajar freqüentemente naquela classe de
carros, também observou a seu irmão, divertida.
—Você não sente curiosidade? —perguntou-lhe Canton—. Parece te sentir
totalmente a suas largas.
Janine elevou as sobrancelhas.
—Sério? A verdade é que estou muito excitada —sorriu com doçura e
voltou a olhar a seu irmão, que não parava.
Mais tarde, enquanto Canton assistia a sua reunião, Karie e Kurt foram a
um grande centro comercial com o Janine, onde jogaram uma olhada a algumas
das lojas mais caras da cidade. Terminaram o passeio em uma exclusiva
chocolatería em que compraram bombons e trufas.
Canton aceitou uma enquanto voltavam para aeroporto.
—Minha única debilidade —disse—. eu adoro o chocolate.
—É um viciado —esclareceu Karie—. Uma vez saiu correndo a meia-noite
para comprar uma barra de chocolate.
—Então é como Janine —disse Kurt—. Esconde chocolate por toda a casa.
—Esconde-o? —perguntou Canton.
—Lhe impedimos de comê-lo se encontrarmos algum de seus esconderijos.
Está acostumado a ter terríveis enxaquecas quando o come —explicou Kurt—.
Embora isso nunca a deteve. Assim tratamos de fazê-lo nós.
—Acaba de comer-se duas trufas enormes —disse Karie, preocupada.
Janine olhou aos meninos.
—Estou perfeitamente. Além disso, não sempre me provoca enxaquecas —
esclareceu, olhando a seu irmão com firmeza.
Essa noite, tombada na cama e quase gritando de dor, Janine recordou
vividamente o que havia dito ao Kurt.
perdeu-se a comida e logo o jantar. A dor era tão forte que desejou uma
morte rápida e misericordiosa.
Nem sequer se deu conta de que Kurt tinha ido a pelo Canton até que
sentiu que este tomava a mão.
—Não tem nenhum analgésico? —perguntou-lhe ele.
—Não —sussurrou Janine.
Canton lhe soltou a mão e chamou o médico. Uns minutos depois, um homem
moreno e trajeado lhe administrou uma injeção. E só um pouco depois, a dor deu
passo ao bendito esquecimento.
Janine despertou sentindo um peso sobre o braço. Abriu os olhos. Sentia a
cabeça acorchada, mas a dor se suavizou muito. Voltou o rosto e viu o Canton com
uma bata granada e o rosto apoiado em seu braço. Estava dormido, sentado em
uma cadeira e com o torso totalmente inclinado sobre a cama.
—O que faz aqui? —perguntou Janine com voz débil.
Canton a ouviu e abriu os olhos. ergueu-se. Necessitava um barbeado e
tinha o cabelo totalmente revolto. Parecia muito cansado, mas sorria.
—Sente-se melhor? —perguntou.
—Sim —Janine se levou uma mão à cabeça—. Embora ainda me dói um
pouco.
—O médico deixou umas pastilhas e uma receita se por acaso necessita
mais. Sinto-o —acrescentou Canton—. Não sabia que Karie te ia levar a
chocolatería.
—Não teria podido me deter —replicou Janine, tratando de sorrir—. As
trufas eram tão deliciosas que a dor de cabeça mereceu a pena. Onde
encontraste um médico em meio da noite?
—Karie teve apendicite faz um par de anos enquanto estávamos aqui. O
doutor Valdez a atendeu muito bem, e tem um grande coração.
—Sim, tem-no. E você também. Obrigado por me cuidar —disse Janine
sinceramente.
Canton se encolheu de ombros.
—Você teria feito o mesmo por mim.
Janine pensou um momento a respeito.
—Sim, o teria feito.
Canton sorriu e a seguir se estirou, bocejando.
—Vêem a cama —ofereceu Janine, aplaudindo o colchão a seu lado—. É
muito tarde para que volte para casa.
—Isso mesmo estava pensando eu.
Canton rodeou a cama, mas conservou a bata posta enquanto se metia sob
os lençóis.
—Normalmente utilizo a calça do pijama, mas estavam todos na cesta da
roupa suja —esclareceu—. Por isso trouxe a bata.
Janine suspirou. Ainda se sentia bastante incômoda.
—Volta a dormir —disse Canton, lhe passando um braço por detrás e lhe
fazendo descansar a cabeça em seu ombro—. Se voltar a te doer a cabeça,
desperta e te trarei uma pastilha.
—É muito bom —murmurou Janine.
—Sim, sou-o. E não o esqueça. Agora, durma.
Janine acreditou não poder fazê-lo tendo ao Canton tão perto. Mas o
pesado e regular batimento do coração de seu coração, unido ao calor de seu
corpo, atuou como um autêntico sonífero. Uns segundos depois estava dormida.
Despertou para ouvir um ruído de passos e de recipientes de metal
golpeando entre si. O estrépito de algo caindo fez abrir os olhos, sobressaltada.
—Onde estão as frigideiras? Não tem frigideiras? —perguntou Canton em
tom beligerante da cozinha.
Janine se ergueu na cama.
—Não acredito.
—E como faz ovos mexidos?
—Não os faço. Não gostam a ninguém nesta casa.
—A mim sim —disse Canton—. E a ti começarão a te gostar de assim que
encontre uma frigideira.
—Embora a encontre, não te servirá de nada, porque não tenho ovos.
Canton apareceu à porta com uma cesta cheia de ovos.
—Nossa criada veio esta manhã carregada de comida. Tenho inclusive
beicon e pão recém feito.
—Agora mesmo me sinto incapaz de comer nada —murmurou Janine
fracamente—. E vou necessitar um desses analgésicos.
Canton os aproximou imediatamente, junto com um copo de água.
—Toma. traga-lhe isso
Janine fez o que lhe dizia e voltou a tombar-se.
—Sinto-me fatal —disse.
—Volta a ter dor de cabeça?
—Sim. Não é tão forte como o de ontem, mas me dói.
—Deixa de comer chocolate.
Janine suspirou.
—Estou acostumado a esquecer quão mau o passo com a enxaqueca quando
não a tenho.
—Isso diz Kurt.
—Acredito que há uma frigideira metida no forno —disse Janine.
Canton abriu o forno e tirou uma frigideira diminuta.
Suspirou.
—Espero que pelo menos caiba um ovo. Tenho que tomar um ovo. Não posso
viver sem um ovo cada manhã, e ao diabo o colesterol.
—Os vícios são um inferno —murmurou Janine.
Canton apareceu de novo à porta.
—Fixei-me em que você não pode passar sem seu café pela manhã. Por não
mencionar o chocolate...
—Não, por favor... —gemeu Janine.
—A próxima vez que vá às compras te acompanharei. Terá que passar por
cima de meu cadáver para comprar um tablete.
—Isso sonha muito possessivo.
Canton a olhou calidamente, sonriendo.
—Sim, verdade? —o sorriso se desvaneceu de seu rosto—. Mas recorda
que não estou disposto a me casar. Já não.
—De acordo. Prometo não te pedir que te case comigo —disse Janine,
grunhindo devido à dor que lhe produziu mover a cabeça.
tombou-se de flanco, apoiando um braço dobrado sobre sua cabeça.
—A pastilha te fará efeito em seguida —disse Canton—. E vou servir te
uma taça de café. Tenho lido que quando se está acostumado a tomar café,
deixar de fazê-lo pode produzir dor de cabeça.
—Eu também recordo havê-lo lido —disse Janine, erguendo-se de novo
para tomar a taça que lhe aproximou Canton—. Mas o chocolate também tem
cafeína.
—É certo. Gosta de uma trufa?
Janine o olhou, fazendo uma careta de sincero desagrado.
—Sinto-o —disse Canton—. foi um golpe baixo.
Janine voltou a tombar-se.
—por que está sendo tão bom comigo?
—Sinto debilidade pelos viciados no chocolate —respondeu Canton,
sonriendo—. Além disso, somos velhos amigos.
—É certo —murmurou Janine, fazendo uma careta de dor.
Canton voltou para a cozinha e rebuscou nas gavetas.
—Não tem batedor manual —protestou ao cabo de uns segundos.
—Eu não gosto de torturar a comida.
—Um batedor não é um instrumento de tortura. É um utensílio
imprescindível para fazer ovos mexidos e algumas molhos deliciosos.
—Vejo que parece um gourmet.
—Posso cozinhar. tive que fazê-lo muitas vezes ao longo dos anos. Não
nasci rico.
—Onde cresceu? —perguntou Janine.
—Na parte baixa do leste de Manhattan. Depois da morte de minha mãe,
meu pai teve que cuidar de mim e de minha irmã, que era muito pequena. Eu tive
que me ocupar dos dois quando meu pai ficou doente. Já te disse que morreu de
câncer. Como não tínhamos dinheiro, não pudemos contratar uma enfermeira para
que se fizesse cargo dele em casa. Só contávamos com a ajuda do hospital da
segurança social —Canton suspirou enquanto removia os ovos—. Eu tinha dois
trabalhos, um em uma fotocopiadora e outro de botões em uma assessoria
financeira. Aí foi onde aprendi os fundamentos. Um dos executivos de maior
idade perdeu a seu filho em um acidente de tráfico a mesma semana que meu pai
morreu. Trabalhava até tarde e de vez em quando falávamos. Quando averiguou
quão dura era minha vida, começou a me ensinar todo o relacionado com o
investimento financeira. Mas nunca pude chegar a agradecer-lhe Morreu de um
ataque ao coração antes de que eu ganhasse meus primeiros dólares com seus
conselhos —moveu a cabeça—. É irônico como funcionam as coisas.
—Sim —Janine observou os ombros do Canton, a sensual arrogância com
que se movia. Era um prazer vê-lo—. Segue vendo sua irmã?
Canton demorou para responder.
—Minha irmã morreu de uma overdose quando tinha dezesseis anos. Foi por
minha culpa.

Capítulo 7

O QUE QUER dizer com que foi por sua culpa? —perguntou Janine.
—mesclou-se com má gente. Eu não sabia —disse Canton—. Estava muito
ocupado trabalhando e tratando de tirar adiante meu matrimônio. Tratei da ter
controlada, mas não sabia com quem saía. Resultou que se relacionava com o
traficante de nosso bairro. Era ele o que lhe subministrava a droga. Uma noite
tomou muita. Chamaram-me de emergências. O miserável escapou assim que
minha irmã entrou em parada cardíaca.
—Suponho que se livrou de tudo.
Canton apartou a frigideira do fogo antes de responder.
—Não, não se livrou, embora demorei uns anos em ser o suficientemente
rico para ir a por ele. Agora está fazendo dez anos por tráfico. Contratei
detetives privados para que o vigiassem. Não levou muito tempo apanhá-lo com
suficientes prova para mandá-lo ao cárcere. Mas isso não fez ressuscitar a minha
irmã.
Janine pôde sentir sua dor. sentou-se na cama.
—Sei. Mas é difícil evitar que uma pessoa decidida a meter-se em
problemas o faça. Por muito que a queira, não pode detê-la.
Canton a olhou um momento antes de servir os ovos no prato.
—Você vê mais à frente que a maioria das pessoas. Muito mais à frente.
Janine se encolheu de ombros.
—Isso pode fazer que a vida resulte muito dura às vezes.
—Também pode fazer que mereça mais a pena viver.
—Suponho que sim —replicou Janine, sonriendo.
—Suponho que tampouco terá um torrador —disse Canton, trocando de
tema.
—Seria esbanjar o dinheiro —respondeu Janine—. A torrada nunca sai o
suficientemente quente para lhe pôr manteiga. Eu as faço no forno.
—Isso me temia.
Uns minutos depois, Canton lhe fez comer ao Janine um delicioso ovo
revolto com uma torrada e mais café.
Ela sorriu quando apartou o prato.
—É um homem muito bom —disse.
—Parece surpreendida —respondeu Canton, sonriendo.
—Um homem que levantou seu império a sós —continuou Janine.
—Tive muita ajuda. O problema é que a gente que se faz famosa deixa de
ser gente para outros. Não sou distinto ao jovem que preparava a seu hermanita
pelas manhãs para levá-la ao colégio. Solo sou maior e vou melhor vestido. E o
certo é que nunca trabalhei pelo dinheiro em si. O que acontece é que desfruto
muito com a informática, criando programas.
—Mas ganhou muito dinheiro.
—Certamente —disse Canton, assentindo—. E foi agradável enquanto
durou. Mas sabe o que? —perguntou, inclinando-se por volta do Janine—. Sou
igualmente feliz agora com a provocação de recuperá-lo tudo.
Janine compreendia essa sensação. lhe acontecia o mesmo com cada novo
livro. perguntou-se o que diria Canton se soubesse que era escritora e que lhe
tinha enganado lhe fazendo pensar que era uma secretária de férias.
—Está pálida —disse Canton, apartando uma mecha de cabelo da frente do
Janine—. aconteceste uma má noite. por que não trata de dormir um pouco mais?
Eu me encarregarei do Kurt.
—Obrigado. Acredito que me viria bem.
—Estará bem aqui só ou prefere que fique?
—Estarei bem —disse Janine, sentindo que a pastilha começava a lhe fazer
efeito—. Obrigado.
Canton se encolheu de ombros.
—Os velhos amigos se ajudam mutuamente.
—Recordarei-o se alguma vez tem problemas —replicou Janine, tombando-
se e fechando os olhos.
Canton recolheu a cozinha rápida e eficientemente e logo se foi, fechando
a porta silenciosamente a suas costas.
A primeira hora da tarde, Janine se sentiu o suficientemente bem para
levantar-se e vestir-se.
—Que jovem é —disse Canton quando a viu entrar na sala de estar.
Janine elevou as sobrancelhas.
—Desculpa?
—É jovem —murmurou Canton, com as mãos nos bolsos, contemplando ao
Janine com os olhos entrecerrados.
—Vinte e quatro anos não é precisamente a idade de ir ao colégio —disse
ela enfaticamente—. E você tampouco é tão velho.
Canton riu.
—Às vezes sinto que o sou. Mas obrigado de todos os modos.
A seguir se produziu um silêncio. O intenso olhar do Canton fez que o pulso
do Janine se acelerasse.
—Vêem aqui —sussurrou ele com voz aveludada.
As pernas do Janine obedeceram imediatamente, embora sua mente
protestou pelo tom imperativo da ordem.
Mas quando Canton tomou entre seus braços, nada importou, exceto a
fome com que devorou sua boca. apoiou-se contra ele com um suspiro, esquecendo
todas suas reservas. Aquela situação podia havê-los levado muito mais longe, mas
umas excitadas vozes que se aproximavam da casa lhes advertiram da eminente
chegada dos meninos.
Acabavam de separar-se precipitadamente quando Kurt e Karie entraram
na casa levando umas enormes plumas.
—De onde as tirastes? —perguntou Janine.
—Um homem as estava vendendo na praia. Sabe onde podemos conseguir
um esqueleto?
Janine piscou.
—Um quê?
—Não um de verdade —Kurt se esclareceu garganta—. Karie e eu estamos
estudando anatomia. Necessitamos uma caveira. Ou algo.
—Vendem caveiras de vaca no mercado da cidade —Canton tirou dois
bilhetes de vinte dólares do bolso—. Com isto deveria bastar.
—Obrigado, papai! —exclamou Karie—. E o que me diz do dinheiro para o
táxi?
Canton tirou mais bilhetes.
—Voltem em seguida —disse com firmeza—. E se lhes perderem, procurem
um policial e lhe digam que me chame.
—É obvio. Obrigado!
Os meninos saíram correndo de novo. Janine e Canton saíram ao alpendre a
ver como se afastavam. Um movimento chamou a atenção do Janine.
Ali estava de novo.
O homem moreno junto a seu carro. Os meninos acabavam de deter um
táxi. Entraram nele e Janine viu com horror que o homem se dispunha a segui-los.
—Viu isso? —perguntou, preocupada.
—O que?
—Um homem entrou em seu carro para seguir ao táxi.
Canton franziu o cenho.
—Não me fixei. Que carro conduzia?
—Um sedan bastante desmantelado. Já o tinha visto antes —disse Janine,
preocupada—. Pode que não tenha sido boa idéia deixar que se vão sozinhos. Se
meus pais encontraram algum tesouro na escavação, quem sabe o que estaria
disposto a fazer algum ladrão por consegui-lo? E se forem detrás o Kurt?
Canton suspirou profundamente.
—Estava pensando o mesmo, mas já é muito tarde. Irei atrás deles. Não se
preocupe. Inclusive um ladrão de tesouros arqueológicos o pensará duas vezes
antes de seqüestrar a um menino norte-americano em meio das ruas do Cancún.
—Não estou tão segura.
Janine não deixou de caminhar de um lado a outro do alpendre até que
Canton voltou com os meninos. Traziam sua caveira e ficaram jogando com ela na
praia, perto da casa. Entretanto, Janine seguia preocupada, e não só pelo homem
misterioso.
—Ainda não tive notícias de meus pais —disse—. chamei esta manhã à
universidade e ali tampouco sabem nada deles.
—Como ficam em contato contigo?
—Utilizam um enlace via satélite —respondeu Janine—. Podem enviar
correio eletrônico a meu ordenador quando quiserem. Mas nem sequer o serviço
de guia local conseguiu ficar em contato com eles. Não o hei dito ao Kurt. pensei
que seria melhor não fazê-lo. A nova escavação é algo muito sério. Não posso
suportar pensar que lhes tenha passado algo.
—por que não me há isso dito até agora? —perguntou Canton—. Pode que já
não tenha milhões, mas sigo tendo influência. me dê esse telefone.
Foi impossível seguir a conversação, mas Janine reconheceu com toda
claridade um dos nomes mencionados.
—Conhece presidente de México? —exclamou assim que Canton pendurou.
—Não dizia que não falava espanhol?
—reconheci seu nome —explicou Janine—. O conhece?
—Sim, conheço-o. vão enviar a alguém agora mesmo em helicóptero à
escavação a procurar a seus pais. Iria eu mesmo, mas meu jato não é adequado
para aterrissar nesse lugar.
—Como saberão onde buscá-los?
—Suponho que tiveram que ficar em contato com o ministério adequado
para obter a permissão de escavação, não?
Janine sorriu, aliviada.
—É obvio. Obrigado, Canton.
—De nada. E agora te beba o café.
O telefone soou quando começava a anoitecer. Janine sentiu que se o fazia
um nó no estômago enquanto Canton respondia.
—Seus pais estão bem —disse ele, depois de pendurar a auricular umas
segundas depois—. Sua equipe de comunicação se danificou e tiveram que enviar a
alguém em busca de um perito em eletrônica. Não chegou até hoje. Pelo resto,
tudo vai bem.
—OH, graças a Deus! —disse Janine fervientemente.
Canton sorriu com gesto travesso.
—Não vai dar nada?
Janine se aproximou dele.
—O que você gostaria? —perguntou, consciente de que os meninos não se
achavam muito longe da casa—. Uma recompensa?
—Isso estaria bem —murmurou Canton.
—Um presente?
Canton tomou o rosto do Janine entre suas mãos e o elevou para o seu.
—Tinha pensado algo mais... físico.
—até que ponto físico? —sussurrou ela, sem fôlego.
Sem incomodar-se em responder, Canton cobriu a boca do Janine com a
sua, beijando-a suave e profundamente. Rodeou-a com seus braços e o beijo foi
crescendo em intensidade. Finalmente, apartou-se para respirar.
—É uma droga —disse com voz tremente.
—Sei. Você também —Janine se aproximou ainda mais, mas Canton apoiou
as mãos em seus ombros, apartando-se dela.
—É a classe de mulher que acabaria querendo casar—lhe recordou—. Eu
não.
—Pode que isso não importe.
—Importaria.
Janine suspirou.
—Dissimulado.
Canton riu.
—Reconheço que neste caso o sou.
—Seguro que faz o amor maravilhosamente —sussurrou Janine.
A boca do Canton se curvou em um lento e confiada sorriso.
—Assim é.
Janine baixou a vista timidamente.
—demonstre-me isso
Por um instante, Canton ficou sem fôlego. Apertou os punhos a ambos os
lados do corpo.
—Isto não é um jogo. Não te burle.
Janine voltou a elevar o rosto e viu os olhos brilhantes do Canton, sua
tensa mandíbula.
—Não me estou burlando. Digo totalmente a sério.
—Eu também —replicou ele—. Não penso te levar a cama.
Janine elevou as mãos, fazendo um gesto de impotência.
—É sempre tão precavido? É assim como ganhou todos esses milhões?
—Com o dinheiro, não me importa o risco calculado. Mas eu não gosto de
me arriscar com o corpo humano. cometem-se equívocos no calor da paixão. Não
penso correr riscos contigo. Casará-te com um homem normal e equilibrado como
seu noivo o professor e viverão felizes para sempre.
—É uma ordem?
—É obvio!
Os olhos do Janine se entristeceram.
—Passaria-me o dia sonhando contigo.
—Você é uma jovem secretária e eu um homem experiente que foi
multimilionário. É inevitável que me tenha idealizado um pouco.
—Crie que o que me atrai é seu dinheiro? —disse Janine, perguntando-se o
que pensaria Canton se soubesse que era famosa e ganhava bastante dinheiro.
—Não, não acredito que procure meu dinheiro —respondeu ele
enfaticamente—. Mas sim acredito que se sente atraída por uma imagem que em
realidade não existe.
—As imagens não beijam como você.
—Vou. Eu não gosto de perder as discussões.
—A mim tampouco. Fique e termina esta.
Canton negou com a cabeça.
—Nem pensar. Será melhor que te vás dormir. Veremo-nos amanhã. Karie!
—chamou, elevando a voz— É hora de ir-se!
—Vou, papai!
Canton foi até a porta e um segundo depois Karie se reuniu com ele,
seguida do Kurt. Pai e filha se afastaram detrás despedir-se.
—Mamãe e papai estão bem —disse Janine a seu irmão pequeno, passando
afetuosamente um braço por seus ombros enquanto observavam aos Rourke
afastando-se pela praia—. Canton chamou o despacho do presidente e em seguida
enviaram um helicóptero à escavação.
Kurt assobiou.
—Miúdos contatos tem, não?
—Vieram-nos muito bem —assentiu Janine—. É um alívio saber que papai e
mamãe estão bem.
—Certamente —Kurt olhou a sua irmã—. Sabe que lê seus livros?
O coração do Janine pulsou mais depressa.
—Canton Rourke?
—Karie diz que tem tudo o que tem escrito, incluindo Catacumba. Menos
mal que não se fixou na foto da contraportada.
—Não me teria reconhecido embora a tivesse cuidadoso com lupa. Espero.
—por que não o diz? —perguntou Kurt com curiosidade.
Janine fez uma careta.
—É muito tarde para dizer-lhe agora. Quereria saber por que não o contei
antes. Acredito que não gosta das mulheres famosas.
—Mas você sim gosta. Não lhe importaria.
—Você crie? Eu não estou tão segura —disse Janine, pensativa.
—É um grande tipo.
—Isso diz Karie —ao mencionar à menina, Janine recordou o carro que os
tinha seguido essa manhã—. tornaste a ver o homem moreno? O tipo ao que
joguei faz uns dias da praia?
—Sim. Estava na cidade quando fomos ao mercado —disse Kurt—. Se deu
conta de que o tínhamos visto e se foi assim que viu que me aproximava de um
policial.
—Eu não gosto.
—A mim tampouco. Vai atrás de algo. Crie que quererá nos seqüestrar?
—Não sei. Mas a partir de agora penso emprestar mais atenção ao que
acontece a nosso redor.
Pouco depois, Kurt e Janine estavam na cama. Mas a lembrança dos beijos
do Canton manteve a esta acordada muito momento. Finalmente, decidindo que
devia distrair-se, ficou a bata e saiu ao alpendre.
À luz da lua, viu uma figura na praia, volta para a casa dos Rourke. Algo
brilhou na escuridão, um pouco parecido a um metal. Seria um telescópio? Havia
luz na sala de estar da casa do Canton. Uma silhueta se recortava contra as
cortinas. O objeto voltou a brilhar. O coração do Janine pulsou mais depressa. E
se era um rifle apontando ao Canton?
Não pensou nas conseqüências. Sem pensar em sua própria segurança, saiu
correndo para o homem, gritando de uma vez.
O homem se surpreendeu, como Janine tinha esperado, mas reagiu muito
depressa. Elevou uma braço e fez um gesto. antes de que Janine pudesse frear,
antes de que se desse conta do que acontecia, dois homens saíram da escuridão
com um lençol. Esta caiu sobre a cabeça do Janine e a envolveu. Sentiu um golpe
secou e forte na cabeça e depois tudo foi escuridão e esquecimento.
Despertou com náuseas e uma forte dor de cabeça. O chão se balançava
debaixo dela, e sua cama parecia mais dura do normal. Abriu os olhos e girou
sobre si mesmo. Ao erguer-se viu onde estava. Aquela não era sua casa. Era a
cabine de um navio, e nela estava o homem moreno que tinha estado vigiando aos
meninos. Gritava furioso a dois homens mais baixos que ele. Estes pareciam lhe
suplicar com as mãos unidas, mas ele lhes gritava cada vez mais.
Janine gemeu involuntariamente e os três homens se voltaram para ela com
gesto ameaçador. Janine soube nesse instante que se não mantinha a cabeça
limpa morreria ali mesmo. O homem alto apoiou a mão na pistola que tinha
encaixada no cinturão.
Janine fechou os olhos e simulou seguir inconsciente. Se o homem se dava
conta de que o tinha visto, não havia dúvida que a mataria. Um minuto depois a
jogaram em um camastro e lhe ataram as mãos à costas.
—Não é a garota Rourke, idiotas! É uma mulher, é sua vizinha! —gritou o
homem em espanhol.
Janine não entendeu mas que «garota Rourke» e «não», mas lhe bastou
para compreender que a tinham confundido com o Karie. Pretendiam seqüestrar à
filha do Canton e ao vê-la aparecer de repente na escuridão tinham acreditado
que era ela!
Agora, a vida da menina podia depender dela. Se estavam dispostos a
chegar a aqueles extremos para conseguir ao Karie, era evidente que foram
muito a sério. E ela era uma testemunha potencializa, assim podiam decidir matá-
la em qualquer momento. Tinha que fugir. Devia advertir ao Canton.
Simulou dormir. Os homens seguiam perto dela, falando rapidamente. O
mais alto disse algo que soou ameaçador e seus dois companheiros o seguiram à
ponte.
ouviu-se o som de um motor, mas não era o suficientemente forte para ser
o da embarcação em que se encontrava. Aquele navio era grande e caro.
Obviamente, devia haver uma lancha com a que foram e vinham da costa. Depois
daquele intento de seqüestro havia dinheiro. Mas de quem? E que benefício
tiraria com aquilo? Canton não tinha dinheiro, ao menos, ainda não. Talvez tivesse
uma conta na Suíça sobre a que ninguém sabia nada.
O coração do Janine pulsou enlouquecido enquanto relaxava os braços e as
bonecas. Tinha-os esticado deliberadamente enquanto a atavam; era um velho
truque que lhe tinha ensinado seu professor de karate. Agora as ataduras
estavam mais frouxas do que teriam estado. Levaria-lhe tempo e concentração
livrar-se delas, mas ao menos tinha uma oportunidade. Com ajuda de Deus poderia
soltar-se. Quando o fizesse, preocuparia-se de como escapar. Se o navio estava
perto da costa, poderia saltar e nadar até ela.
Agora, tudo o que precisava era sorte e um pouco de tempo.

Capítulo 8
AS CORDAS estavam muito bem atadas. Depois de vários minutos de
retorcer-se, Janine não conseguiu as afrouxar nem sequer o suficiente para tirar
um dedo.
Parecia um de seus livros, pensou com negro humor. A diferença era que a
essas alturas seu protagonista já se teria solto e teria mandado a seus captores
ao diabo.
Odiou a realidade mais que nunca.
Ouviu o som da lancha que retornava e sentiu autêntico pavor. O homem
tinha uma pistola. Estava impaciente e zangado pelo engano cometido no
seqüestro. Talvez lhe pegasse um tiro.
Janine pensou em seus pais e no Kurt. Pensou no Canton. A morte nunca
tinha sido uma de suas preocupações, mas agora não podia escapar a ela. Talvez
morrera ali mesmo, com sua bata branca, sem ter a oportunidade de despedir-se
de seus seres queridos. E quase tão duro foi recordar que a continuação de seu
livro Catacumba se achava ainda pela metade. A editorial o daria a outro escritor
para que o terminasse. Que horror!
Enquanto renovava seus esforços por liberar-se, voltou a ouvir vozes. de
repente, a porta da cabine se abriu, dando passo ao homem alto, que se tinha
posto um pasamontañas e óculos. Evidentemente, disfarçou-se porque acreditava
que Janine ainda não o tinha reconhecido. Isso era esperanzador. Se tivesse
intenção de matá-la não se teria disfarçado. Mas sustentava a pistola na mão.
aproximou-se do Janine, notando-se em que estava acordada e o observava,
Com voz áspera, ordenou-lhe em inglês que se levantasse e lhe fez sair a
coberta, empurrando-a para o corrimão.
—Salta! —ordenou.
—Não posso saltar com as mãos atadas! —exclamou Janine.
Apoiando o canhão da pistola em suas costas, o homem lhe soltou as
ataduras com uma navalha.
—Agora salta ou morre —disse—. É a única oportunidade que vais ter.
Janine não discutiu. Era boa nadadora e havia lua. A costa não estava
longe. De ali se viam luzes em alguma casa da praia. Era estranho que houvesse
luzes acesas a aquela horas da madrugada...
A pistola pressionou de novo suas costas e Janine saltou à água.
Estava mais fria do que tinha esperado, mas em seguida se acostumou.
Começou a nadar para a costa com o coração em um punho, sem saber se o homem
dispararia sobre ela agora que estava na água. Se estava disposto a seqüestrar a
uma menina, por que ia sentir reparos na hora de assassinar a uma testemunha?
Seguiu nadando, contando cada braçada, sem deter-se.
O homem não disparou.
Uns minutos depois começou a notar o cansaço. O golpe na cabeça, a
desorientação e a falta de sonho combinados, faziam-na muito vulnerável naquela
situação. tombou-se de costas, flutuando, enquanto no alto a lua desenhava um
halo através das nuvens. Parecia irreal, fantasmagórico. de repente, Janine ouviu
ruído de chapinho perto. Quase de uma vez, um braço a rodeou pelo pescoço.
Gritou.
—Já te tenho —aquela voz soou como música celestial nos ouvidos do
Janine—. Tranqüila, sou eu, Canton. vou arrastar te até a costa. Encontra-te
bem?
—Dói-me a cabeça —sussurrou ela—. Me golpearam.
Canton amaldiçoou entre dentes antes de ficar a nadar de costas para a
costa com um braço, atirando do Janine com o outro. Era um nadador poderoso, e
logo chegaram à praia. Uma vez nesta, tomou ao Janine em braços e se
encaminhou para a casa.
—Há... luzes acesas —conseguiu dizer ela fracamente.
—Ouvi-te gritar —explicou Canton—. Não te encontrei na cama nem em
nenhum outro sítio. depois de te buscar durante mais de uma hora me fixei no
navio que estava ancorado a uma milha da costa. Esta tarde não estava ali, assim
que me pareceu suspeito. Agora já se foi, mas avisei aos guarda-costeira para
que o persigam. Pensei que estaria nele. Estava observando-o com os prismáticos
quando te vi sair a coberta com alguém detrás. Logo saltaste.
—O homem que vigiava aos meninos na praia me obrigou a saltar —disse
Janine, levando uma mão à têmpora—. OH, Deus santo, estou tão farta de dores
de cabeça! Quem me golpeou o fez com todas suas forças.
Os braços do Canton se contraíram. Não disse nada, mas seu silêncio foi
eloqüente.
—É um milagre que não te tenha afogado —disse entre dentes—, Alguém
vai pagar por isso!
—Queriam seqüestrar ao Karie —sussurrou Janine—. O homem alto
mencionou seu nome.
O rosto do Canton se endureceu visivelmente.
—Enjoe —resmungou—. Como não pude fazer frente a suas exigências
econômicas, recorreu ao seqüestro para me tirar o dinheiro que quer. Maldita
seja!
—Mas não seria capaz de fazer mal a sua própria filha... —disse Janine,
aturdida.
—Não intencionadamente. Mas lhe golpearam pensando que foi Karie, não?
—Temo-me que sim.
Canton murmurou algo mais enquanto subia as escadas do alpendre.
—Kurt está acordado? —perguntou Janine, preocupada.
—Não—Canton foi até o dormitório, pô-la em pé junto à cama, despiu-a e a
colocou sob os lençóis sem dizer uma palavra—. Fique aqui enquanto vou trocar
me. vou levar te a hospital.
—Mas Karie...
—Iremos todos. Despertarei ao Kurt antes de sair. Sente náuseas ou
enjôos?
—De momento não...
—Em seguida volto.
Janine ouviu que Canton batia na porta do Kurt. A cabeça lhe doía tanto
que logo que podia pensar. Uns segundos depois, Kurt entrou em sua habitação,
nervoso e preocupado ao ver o branco rosto de sua irmã.
—O que passou?
—Uns homens me seqüestraram e me levaram a um navio —explicou Janine
fracamente—. Por favor, coloca essa bata empapada na banheira e me tire uma
camisola dessa gaveta.
—Seqüestraram-lhe? —perguntou Kurt, assombrado.
—Pensaram que era Karie —murmurou Janine, levando-as mãos às
têmporas—. Acredito que a cabeça me vai estalar.
—Como lhe apanharam?
—Não podia dormir e saí ao alpendre. À luz da lua, vi uma arma que
apontava para a casa do Canton e pensei que foram disparar.
—E te lançou ao resgate —Kurt moveu a cabeça de um lado a outro—.
Oxalá pudesse te convencer de que não é Diane Woody antes de que te aconteça
um pouco realmente mau.
—Já me convenci —assegurou Janine—. A bata?
—Agora mesmo.
Kurt levou a bata ao banho, deixando ao Janine sozinha. Ao cabo de uns
minutos, voltou Canton.
—Onde está sua roupa? —perguntou, impaciente, e começou a procurar
antes de que ela pudesse lhe responder—. Isto valerá.
Fechou a porta, entregou a roupa interior ao Janine e a desentupiu.
—Não há tempo para que te dê um banho —disse—. Terá que ir como está.
Ajudou-a a vestir-se como se o tivesse feito toda a vida. Logo saíram da
habitação. Tudo foi muito rápido como para que Janine se sentisse envergonhada.
—Quero minha bolsa e minha maquiagem —disse fracamente.
—Não necessita nenhuma maquiagem para ir ao hospital.
—Tenho um aspecto horrível sem ele.
—Isso depende do ponto de vista.
Canton chamou o Kurt, que saiu com eles e fechou a porta da casa. Karie já
estava esperando no carro de aluguel do Canton.
—vai se pôr bem? —perguntou a menina, preocupada.
Canton ajudou ao Janine a entrar no carro.
—É obvio que vai se pôr bem.
Conduziu como um louco ao hospital, ignorando os sinais de tráfico. Sua
decidida expressão impediu que os meninos fizessem perguntas.
Quando chegaram ao hospital, Canton tomou ao Janine em braços e entrou
com ela pela porta de emergências, dando ordens em espanhol a destro e sinistro.
Uma vez feitos as análise, Janine foi transladada a uma habitação privada.
—Tem uma ligeira comoção sem complicações —disse Canton uns minutos
depois, sentando-se em uma cadeira junto à cama.
—Os meninos? —murmurou Janine, sonolenta.
—Estão em uma habitação habilitada para os acompanhantes.
—E você?
Canton tomou sua mão e se inclinou para ela.
—Não penso te deixar reveste nem um segundo.
Janine se sentiu calidamente protegida e querida. Pressionou com
suavidade a mão do Canton. Deviam lhe haver posto algo para dormir na injeção,
pensou enquanto o mundo começava a desvanecer-se. Estava muito adormecida.
Já era de dia quando despertou. Canton estava de pé junto à janela,
olhando-a. Janine sorriu carinhosamente ao vê-lo.
Não lhe devolveu o sorriso. Seu olhar parecia cautelosa.
—Como se sente? —inclusive o tom de sua voz parecia diferente.
—Melhor. Acredito.
Canton não se aproximou da cama. Enquanto Janine se perguntava o que
teria provocado aquela repentina mudança de atitude, a porta da habitação se
abriu, dando passo a uma enfermeira.
—Estou a ponto de acabar meu turno —disse. Levava um livro sob o braço e
se aproximou da cama com bastante acanhamento—. Não quero incomodá-la,
porque sei que não se encontra bem. Mas comprei Catacumba assim que saiu e me
está parecendo a novela de mistério mais entretida que tenho lido em minha vida.
Reconheci-a assim que a vi, embora a foto da contraportada é bastante enganosa.
Tenho todos seus livros —se aproximou mais, sonriendo timidamente ao Canton—.
Estava dizendo ao senhor Rourke quão emocionante resultava vê-la em pessoa. Só
queria saber se lhe importaria me dedicar o livro se o deixo aqui. deixei uma
folha de papel com meu nome dentro.
—Será um prazer —disse Janine, sonriendo calidamente.
—Obrigado! —a jovem enfermeira deixou o livro na mesinha—. foi um
prazer. Penso que é uma escritora maravilhosa. Espero que se melhore logo.
Obrigado de novo —acrescentou antes de sair da habitação.
—Assim já sabe —murmurou Janine assim que a porta se fechou, sem
atrever-se a olhar ao Canton.
—me poderia haver isso dito. Sabia que leão seus livros. Viu Catacumba em
minha casa o dia da festa.
—Sabia. Karie disse ao Kurt que os lia —Janine se olhou as mãos—. Disse
que você não gostava das atrizes e autoras que freqüentavam o mundo em que te
movia —se encolheu de ombros—. Não soube como lhe dizer isso depois disso.
Canton não falou. Seu olhar ameaçava tormenta.
—Há-lhe isso dito a enfermeira?
—Não —respondeu ele—. Foi Kurt quem me deu a pista ao dizer que
sempre te metia em confusões porque acreditava ser seu própria protagonista.
Perguntei-lhe o que queria dizer e Karie disse que atuava como Diane Woody.
Depois não me custou muito deduzir a verdade. A enfermeira havia trazido o
livro consigo para lê-lo durante os descansos. Quando te viu no hospital,
reconheceu-te imediatamente.
—Toda uma conspiração.
A risada do Canton careceu de humor.
—Mas bem o destino.
Janine não soube o que dizer. O homem que a tinha cuidado com tanta
ternura parecia não querer saber nada mais dela.
—O que se sabe dos homens que me seqüestraram? —perguntou, trocando
de tema.
—Ainda os perseguem —respondeu Canton escuetamente.
—depois de tudo, não foram atrás de meus pais —disse Janine depois de
um comprido silencio—. Mas sinto que tratassem de levar-se ao Karie.
—tomei medidas para que esteja protegida.
—Boa idéia.
—Kurt me disse o que fez.
Janine se encolheu de ombros.
—Tenho o cacoete de atuar sem refletir.
—Pensou que o homem tinha uma pistola me apontando —continuou Canton.
Ela se esclareceu garganta.
—Isso me pareceu. Provavelmente fossem uns prismáticos, mas não estava
segura.
—Assim, em lugar de pedir ajuda, saiu correndo a por ele. Brilhante!
Janine se ruborizou.
—Agora mesmo poderia estar morto em lugar de me gritando!
—E você também! —vozeou Canton, perdendo o controle—. Está assobiada
ou o que?
—Não me chame isso!
Canton se aproximou do Janine e esta agarrou o primeiro que teve à mão, uma
jarra de plástico cheia de gelo, disposta a arrojar-lhe
Ele se deteve e ela fez o mesmo. Nesse momento entraram Kurt e Karie,
que se detiveram bruscamente ao ver o que acontecia.
—Recorda que é o bom do filme —disse Kurt, tratando de tranqüilizar a
sua irmã.
—Isso é o que você te crie! —replicou ela, furiosa.
—Deixa a jarra —disse Kurt, aproximando-se da cama—. Não está em condições
de brigar —acrescentou, tirando-lhe
—A voz da razão —murmurou Janine, cedendo.
—A firme voz da razão —acrescentou Kurt, sonriendo—, Sente-se melhor?
—Sentia-me melhor —disse Janine, olhando para o Canton.
A expressão de este era inescrutável.
—Tenho algumas costure que fazer —disse—. Enquanto isso, Kurt ficará
contigo.
—Quando posso voltar para casa? —perguntou Janine em tom rígido.
—Se não haver complicações, a última hora da tarde —respondeu Canton,
lhe dedicando uma última e largo olhar antes de lhe fazer um sinal a sua filha
para que o acompanhasse.
Não disse «adeus», nem «que melhore», nem nada convencional.
Simplesmente se foi com o Karie.
—É minha culpa —disse Kurt, compungido—. Fui da língua.
—Era inevitável que alguém o fizesse —disse Janine, tranqüilizando-o—.
Não passa nada. Um milionário e uma escritora de novelas de mistério não fazem
bom casal.
—Não é milionário.
—Voltará a sê-lo. Eu não me movo nesses círculos. Sempre evitei fazê-lo.
—ficou-se contigo toda a noite.
Janine se encolheu de ombros.
—Suponho que se sentia responsável. foi muito amável. Mas agora já posso
cuidar de mim mesma —olhou a seu irmão—. Espero que não te tenha ocorrido
tratar de te pôr em contato com papai e mamãe para lhes contar o acontecido.
Kurt negou com a cabeça.
—pensei que seria melhor esperar.
—Graças a Deus! —Janine se ergueu. A cabeça ainda lhe doía muito. Voltou
a tombar—. Me pergunto com o que me golpearam. Deveu ser algo muito pesado.
—O médico há dito que teve sorte. de agora em diante, deixa que a polícia se
faça cargo desse tipo de coisas, de acordo?
Janine sorriu.
—Suponho que tem razão.
Permaneceu uma noite mais no hospital, acompanhada do Kurt. foram-se à
manhã seguinte, depois de fazer tudas as papeladas necessárias.
Voltaram para a casa da praia em um táxi, justo quando Canton e Karie
estavam a ponto de sair no carro alugado.
Enquanto pagava ao taxista, Janine se cuidou de não olhar ao Canton, mas
não serve de nada. Este se aproximou do carro a grandes pernadas, enfurecido.
—Que diabos faz aqui? Agora mesmo saía para o hospital a te recolher.
—E como ia ou seja o? —perguntou Janine em tom beligerante—. Foi sem
aparente intenção de voltar. Sei cuidar de mim mesma.
Canton a olhou com gesto vagamente culpado. Logo olhou a sua filha e lhe
disse que voltasse para casa. Karie saudou com a mão e obedeceu.
—Vou com o Karie enquanto vós dois discutem —disse Kurt, sonriendo.
—Todo mundo me abandona —murmurou Janine, encaminhando-se para a
casa.
—Eu não o teria feito se tivesse sido sincera comigo desde o começo. Ódio
que me mintam.
Janine se voltou para ele.
—Não tem direito a fazer perguntas sobre mim. Não é membro de minha
família. Nem sequer é um amigo próximo. O que te faz pensar que devo te contar
a história de minha vida?
—Não sei, mas quero que o faça. Quero sabê-lo tudo sobre ti —disse
Canton, surpreendendo ao Janine tanto como a si mesmo.
—Para que? —perguntou ela ao cabo de um momento—. dentro de uns dias
irei e não é provável que voltemos a nos ver. Eu não me movo em seus círculos
sociais. Pode que seja um pouco famosa, mas não sou millonada nem acredito que
chegue a sê-lo. Não sou um animal social.
—Sei —Canton sorriu, embora deixou de fazê-lo ao acrescentar—: Enjoe
sim o era. sentia-se morta sem ruído e sem festas constantes. Gostava de sair e
eu gostava de ficar em casa —se encolheu de ombros—. Fomos totalmente
opostos. Por outro lado, você e eu quase temos muito em comum.
—Já te disse que não penso te propor matrimônio —disse Janine
solenemente—. Eu gosto de minha independência. Você precisa encontrar uma
mulher tranqüila, agradável e amorosa que te prepare uns ovos mexidos enquanto
luta por voltar para o topo. Alguém a quem não lhe importe que lhe gritem —
acrescentou em tom mordaz.
—Não te gritei.
—Sim o tem feito.
—Sim foi assim, é que lhe merecia —replicou isso Canton—. A quem lhe
ocorre sair correndo depois de uns tipos armados?
Janine o olhou ao rosto.
—Disse que tinha lido meus livros. Não leíste as lapelas?
—Sim.
—Então saberá o que fazia para viver antes de me dedicar a escrever.
Canton franziu o cenho, olhando-a. Finalmente pareceu recordar e abriu os
olhos de par em par.
—Deus santo! Não me diga que o que punha era certo!
—Sim o era. Fui detetive privado com licença. Ainda tenho permissão para
levar armas, embora não o faço.
—Assim foi como aprendeu karate.
Janine assentiu.
—E a seguir a um suspeito. O problema é que quando pensei que esse tipo
te ia disparar cometi a estupidez de sair correndo a por ele.
—E quase consegue que lhe matem.
—Felizmente, tenho a cabeça bem dura.
Canton assentiu de uma vez que acariciava com suavidade o cabelo do
Janine.
—Sinto te haver gritado.
Ela se encolheu de ombros.
—Digo-o a sério —insistiu ele, sonriendo.
Janine suspirou.
—De acordo.
Canton sentiu que Janine se achava muito longe dele. Não estava seguro de
poder salvar a distância que os separava, mas tinha pensado uma forma de tentá-
lo.
—Segue tendo sua licença de detetive? —perguntou.
Ela assentiu.
—Então por que não trabalha comigo para tratar de resolver este caso?
Janine franziu os lábios.
—Me está acabando o prazo para entregar minha novela.
—Não pode trabalhar todo o tempo.
Janine considerou a possibilidade. Seria excitante dar caça aos
seqüestradores. Mas mais importante ainda seria impedir que lhe acontecesse
nada Karie. O golpe que tinha recebido ela na cabeça teria sido para a menina.
Terei que deter esses tipos como fora.
—De acordo. Farei-o.
Canton sorriu.
—Não poderei te pagar imediatamente. Mas te darei várias ações de minha
empresa. Asseguro-te que algum dia valerão o bastante.
Janine riu.
—Acredito-te. De todas formas, necessito um par de dias para me
recuperar. Ainda tenho um bom galo na cabeça.
—Não sente saudades —murmurou Canton, franzindo o cenho—. Está
assobiada.
—O fato de contratar meus serviços não te dá direito a me insultar —
disse Janine, elevando o queixo.
Canton elevou ambas as mãos.
—De acordo. Prometo me reformar.
Canton se aproximou dela e a empurrou com suavidade, lhe fazendo
tombar-se de costas.
—Isso é o que você crie —sussurro, inclinando a cabeça para ela.
Não o fez. Ainda murmurava vários dias depois, enquanto permaneciam
ocultos depois de uma duna na praia, à espera de que os seqüestradores dessem o
seguinte passo enquanto os meninos construíam um castelo de areia na praia.
—Isto é muito aborrecido —grunhiu.
—Bem-vindo ao mundo real dos detetives —disse Janine—. Vê muita
televisão.
Canton a olhou.
—Suspeito que você também. Sobre tudo as séries de ficção científica.
—Isso foi um golpe baixo.
—Essa não é forma de falar com um homem de minha fila. Sabe que
poderia fazer que lhe interrogassem —disse Canton, imitando o tom zombador
que utilizava o personagem favorito da série que tanto gostava ao Janine—.
Embora também poderia fazê-lo pessoalmente. Sinto certa debilidade pelas
moréias.
Janine se esclareceu garganta.
—Deixa-o já.
—Hei meio doido seu ponto débil? —burlou-se Canton.
—Não tenho pontos débeis —replicou Janine.

Capítulo 9

POR UM instante, Janine cedeu a seus desejos e se entregou por completo


a exigente de boca do Canton. Gemeu, atraindo-o para si, esquecendo o perigo
enquanto se entregava a seu desejo.
Mas seu sentido de auto—amparo estava muito desenvolvido como para que
não acabasse por impor-se. Quando Canton começou a tratar de lhe fazer
separar as pernas com sua coxa, ficou rígida e se separou dele rapidamente,
rendo nervosa.
—Deixa-o já —murmurou—. Estamos trabalhando.
Canton respirava agitadamente e seus olhos brilhavam.
—Desmancha-prazeres —disse com voz rouca—. Além disso, foi você a que
tratou de me seduzir faz uns dias.
Janine se levou uma mão ao palpitante peito.
—Dou-te minha palavra de que não voltarei a tentá-lo —prometeu.
Canton entrecerró os olhos.
—Não pedi nenhuma promessa. te tire a camiseta e tumba lhe aqui de
barriga para baixo —disse, aplaudindo a areia junto a si—. Assim poderemos
discuti-lo.
—Temos que apanhar a um seqüestrador —recordou Janine, ainda
sorridente—. Assim não me distraia —acrescentou, voltando-se e olhando
sigilosamente depois da duna.
Suspirando, Canton voltou a tombar-se junto a ela.
Os meninos seguiam jogando tranqüilamente e não havia ninguém mais à
vista.
—Apesar de todas as complicações de seu matrimônio, Karie parece feliz
contigo —disse Janine ao cabo de um momento.
—Acredito que sim. No passado não fui um pai precisamente exemplar para
ela. Agora trato de compensá-la —Canton olhou ao Janine e sorriu—. E o que me
diz de ti e do Kurt? Eles cuidam bem seus pais?
Janine sorriu com doçura.
—A sua maneira. A verdade é que somos nós os que cuidamos deles.
Canton voltou a suspirar, movendo a cabeça.
—A paternidade não é para os fracos de coração.
—Suponho que não. Mas os meninos são encantadores. Sempre me gostou
de ter ao Kurt perto.
Canton a olhou, entrecerrando os olhos.
—Quer ter filhos?
—Sim.
Canton não disse nada, mas seguiu olhando ao Janine com uma intensidade
que fez que esta se ruborizasse.
—Nunca conheci a ninguém como você —disse, finalmente—. Não imaginava
que uma escritora famosa pudesse ser assim. Não é presumida nem
condescendente. Nem sequer te comporta como uma escritora famosa.
—Conheço várias escritoras e todas são pessoas estupendas —replicou
Janine.
—Não todas —disse Canton burlonamente.
Ela se encolheu de ombros.
—Sempre há uma ou duas maçãs más em um cesto. Mas meus amigas são
boas pessoas.
—Todas escrevem novelas de mistério?
—Não. Algumas escrevem romances de amor, outras de mistério, outras de
detetives... Estamos acostumados a nos comunicar através de Internet —Janine
se esclareceu garganta—. Às vezes falamos do mau da série de ficção científica.
Pensamos que é muito atrativo.
—Tenho sorte de me parecer com ele, não? —disse Canton, sonriendo
satisfeito.
Janine riu e o empurrou. Ele a apanhou entre seus braços e voltou a tombá-
la de costas, ficando repentinamente sério. Seus olhares se encontraram e
Janine viu em seus olhos algo que não tinha captado até então. Mas não lhe deu
tempo a pensar nisso, pois Canton se inclinou e voltou a beijá-la.
Mas aquele beijo foi distinto a todos. A infinita ternura com que seus
lábios acariciaram os do Janine despertou nesta um sentimento de tal
intensidade que esteve a ponto de romper a chorar de emoção.
Quando Canton elevou a cabeça, Janine viu refletida em seus olhos aquela
mesma emoção. Parecia tão confundido e inseguro como ela.
—Não tenho um centavo —disse ele lentamente—. Pode que recupere minha
fortuna e pode que não. Poderia acabar com um programador de ordenadores
trabalhando por um salário.
O coração do Janine pulsou mais depressa.
—Tenho a impressão de que está falando de algo permanente.
Canton assentiu.
—Assim é.
—Refere-te A... viver juntos.
—Não.
Janine se ruborizou.
—Sinto muito. Suponho que me precipitei tirando essa...
Canton lhe pôs um dedo sobre os lábios, fazendo-a calar.
—É muito logo para tomar uma decisão desse calibre —disse—, mas
poderia começar a pensar no matrimônio.
Janine ficou boquiaberta.
Sua reação atacou diretamente o orgulho do Canton. Era evidente que nem
sequer tinha considerado a possibilidade de viver permanentemente com ele.
Amaldiçoou entre dentes e se separou dela, ficando em pé. Olhou para os
meninos, por volta do mar, com as mãos metidas nos bolsos.
Janine não compreendia seu estranho comportamento. levantou-se junto a
ele, duvidando.
Canton a olhou com cautela.
—Tenho trinta e oito anos —disse.
—Sei.
—Você tem vinte e quatro —continuou ele—. Suponho que seu professor se
aproxima mais à idade adequada. Além disso tem um título universitário. Encaixa
melhor com sua família.
—Mas eu não quero ao Quentin, Canton —disse Janine, percebendo nele
uma vulnerabilidade que não tinha captado até então.
Canton se voltou lentamente para ela.
—Eu gosto de como diz meu nome —sussurrou.
Janine sorriu.
—eu gosto de como diz o meu —replicou com acanhamento—. Lamenta ter
mencionado o matrimônio? —acrescentou, baixando o olhar.
Canton deu um passo para ela.
—Pareceu-me que te incomodou que o fizesse. Ficaste-te boquiaberta,
como se te parecesse algo impensável.
—Só faz uns dias que disse que não pensava voltar a te casar nunca —
explicou ela.
—Um homem diz muitas coisas que não quer dizer quando uma mulher o
apanha —murmurou Canton—, Não te dá conta? Desejo-te. Mas tenho quase
quarenta anos, minha mulher me deixou por outro assegurando que era melhor
que eu na cama... o que faz?
Enquanto Canton falava, Janine tinha começado a lhe desabotoar os botões
da camisa.
—Estou-te tirando a roupa —disse, simplesmente—. Te importa? —
perguntou, olhando ao Canton com seus grandes olhos verdes.
Ele tinha a boca aberta, mas parecia incapaz de falar.
Janine apartou a camisa a um lado e enterrou o rosto em seu peito,
beijando-o. Canton se estremeceu.
—Você já me viu totalmente nua, embora me doía tanto a cabeça pelo golpe
que não tive ocasião de desfrutá-lo —disse Janine, acariciando-o lentamente—.
Agora me toca .
—P... mas estamos em... em uma praia pública —balbuciou Canton.
—É você o que me tem feito a proposição.
—Não é certo. Hei dito que queria que o pensasse.
—Já o pensei.
—E?
—Eu gosto dos meninos —disse Janine, olhando ao Canton aos olhos, sem
deixar de acariciá-lo—. Quero ter vários. Ganho bastante bem a vida escrevendo.
Posso me fazer carrego das faturas até que ditas o que queira fazer, ou até que
recupere sua fortuna. Sou boa administradora e ao Karie gosta. E ela eu gosto .
—Está-me voltando louco —murmurou ele entre dentes.
Janine elevou as sobrancelhas. Olhou suas mãos movendo-se sobre o peito
nu do Canton e logo elevou a vista de novo para seus brilhantes olhos.
—Só com isto? —perguntou, fascinada.
—Ultimamente estive muito ocupado para dedicar minha atenção a
nenhuma mulher. passei um comprido período de celibato —explicou Canton e
acrescentou—: Compreende?
—Mais ou menos.
—Suponho que não sou o único que passa muito tempo frente ao ordenador.
Janine se apartou um pouco.
—Nunca encontrei fisicamente atrativos aos homens.
—Não?
—até agora —corrigiu ela—. Estava acostumada sonhar em viajar. Agora
tenho sonhos muito embaraçosos contigo.
Canton sorriu.
—Conta-me os
—Não me atrevo.
—Se te casar comigo, podemos fazer algo a respeito.
—Tenho que me casar contigo antes?
—Minha mãe era espanhola e me educou à antiga. Nunca andei brincando
com vírgenes e sou muito major para começar a fazê-lo agora.
—Em outras palavras, as garotas boas se casam antes de...
—Lavarei-te a boca com sabão se o diz —prometeu Canton.
Janine enrugou o nariz.
—Seguro que você o diria.
—E mais —assentiu Canton—. Tenho muito mau gênio.
—Já o notei.
—Então já sabe o pior. E já que não tem experiência e não pode me
comparar com outros na cama, parecerei-te muito sábio e experiente —disse
Canton, sonriendo—. Esse sim que é um pensamento alentador.
Janine lhe rodeou o pescoço com os braços.
—Quero-te —disse brandamente—. Para mim será como Dom Juan Tenorio.
Canton se ruborizou.
—Não devo dizer que te quero? —perguntou Janine.
—Diga-o muitas vezes —respondeu ele imediatamente—. Karie o diz às
vezes, mas Enjoe nunca o fez. É estranho, mas nunca o notei —sorriu—. Eu gosto
de como sonha.
—Você também pode dizê-lo —disse Janine.
Canton se esclareceu garganta.
—Não sei.
—É fácil —Janine pareceu momentaneamente preocupada—. Se o sente.
—Claro que o sinto —disse Canton, dando-se conta com surpresa de até
que ponto era certo. Janine gostava, desejava-a, adorava estar com ela... e, sem
dúvida alguma, amava-a.
Os olhos do Janine brilharam.
—Sério?
Canton assentiu.
—Mas te advirto que o matrimônio é um risco —disse.
—Não o é. Amaremo-nos mutuamente e cuidaremos do Karie e do Kurt
quando for necessário. Teremos filhos, quereremo-los muito e nunca te deixarei.
A mandíbula do Canton se esticou. Rodeou ao Janine com seus braços e a
estreitou com força comprido momento, sem falar, emocionado.
Janine fechou os olhos e suspirou, movendo a bochecha contra o espesso
pêlo do peito do Canton.
—Eu gosto dos homens peludos —sussurrou—. É como abraçar a um osito
de peluche.
Canton riu.
—Graças a Deus. Não me teria gostado de nada ter que me barbear o peito
todas as manhãs.
Janine o abraçou com força.
—Quando? —perguntou com voz sonhadora.
Canton trocou de tema sem dificuldade.
—Quando quiser. Temos que conseguir os anéis e organizar a cerimônia.
Não será difícil em México —disse, elevando a cabeça—. Tenho uma casa no
Lincoln Park e um apartamento em Nova Iorque. Tratarei de conservar este
último. Pode que queira acudir a Manhattan de compras de vez em quando, ou a
visitar seus editores.
Janine sorriu.
—É um príncipe.
—Um príncipe pobre —insistiu Canton.
Ela suspirou.
—Isso não importa. Eu gosto mais assim. Sempre saberá que me casei
contigo pelo que não tinha.
Canton rompeu a rir e elevou ao Janine para o alto em seus braços.
—É certo —disse.
Os meninos se aproximaram deles para averiguar a que vinham aquelas
risadas.
—vamos casar nos —disse isso Canton, sentindo um grande alívio ao ver
como se iluminava o rosto de sua filha.
—vais casar te com o Janine? Que bem! —exclamou Karie, saltando de
alegria—. É o melhor presente de aniversário que podia me fazer!
—Hoje é seu aniversário? —pergunto Janine, assombrada—, Não sabia!
—Temos um bolo e presentes. Lhes íamos convidar ao Kurt e a ti esta noite
para celebrá-lo —explicou Canton—. Mas depois disto, tinha-o esquecido.
—E o que vou fazer eu? —perguntou Kurt, franzindo o cenho—. Não
poderei viver mais contigo? Terei que ficar com... eles? —sua voz se foi apagando
enquanto olhava com assombro para a casa—. Que diabos estão fazendo aqui?
Janine se voltou e viu seus pais, suarentos e talheres de pó, ambos os
vestidos de caqui e com chapéus de asa larga, saudando do alpendre.
—Deve ter acontecido algo —disse—. Vamos —tomou ao Canton da mão e
todos caminharam pela praia para a casa, esquecendo momentaneamente aos
seqüestradores.

As apresentações se fizeram rapidamente. Os professores Dão e Joan


Curtis ficaram fascinados com o Canton Rourke, sobre o que tinham ouvido falar,
certamente. Averiguar que ia casar se com sua filha os deixou momentaneamente
mudos.
—Ainda não lhes conhecem muito bem —advertiu Joan, preocupada.
—Temos tanto em comum que ir descobrindo-o será um prazer que durará
toda a vida —disse Canton, ganhando à mãe do Janine no ato.
Joan sorriu com seus olhos verdes. Janine era seu vivo retrato. Dão era
alto e magro e tinha o cabelo cinza e os olhos azuis. sentou-se com evidente
cansaço em uma cadeira e deu um sorvo a uma garrafa de água.
No meio da sala de estar havia uma enorme gaveta de embalagem. Dão o
assinalou com um gesto da cabeça.
—Esse é o motivo pelo que retornamos.
Janine elevou as sobrancelhas.
—Algo especial?
—Umas boas peças —respondeu Dão—. Tratamos de localizar a nosso
contato no governo mexicano, mas nosso enlace com o satélite foi sabotado.
—O que? —exclamou Janine—. Sabia que havia problemas, mas não até
esse ponto.
—tivemos a um ladrão atrás de nossos passos —explicou Dão—. Um muito
decidido. Disparou-nos.
Janine teve que sentar-se. Canton o fez a seu lado.
—Estamos bem —disse Joan—. Mas pensamos que seria aconselhável voltar
para a civilização o antes possível. Saltamos ao Land Rover com as peças e
conduzimos de volta a toda velocidade. Perdemos a nosso guia no caminho. Ia
atrás de nós em seu todoterreno, mas não voltamos a vê-lo. chamamos à polícia
nada mais chegar. Suponho que virão em seguida.
—Se posso fazer algo, eu gostaria de ajudar —se ofereceu Canton.
—Graças a ele, soubemos que tinham um problema com o enlace do satélite
e que estavam bem —acrescentou Janine—. Conhece presidente de México em
pessoa.
Os Curtis ficaram impressionados. Ambos olharam ao Canton com renovado
interesse.
—Criem que os ladrões seriam capazes de tentar algo aqui, no Cancún? —
perguntou Janine, preocupada.
—Por isso há nessa gaveta, sim —disse Dão—. Em certo modo, lamento que
encontrássemos um lugar tão maravilhoso para escavar. Fizemos mapas de tudo e
tiramos fotos e documentado cada passo da escavação para não passar nada por
alto. Isso ajudará a futuras expedições em suas escavações.
—Não enviará o governo a alguém para que se faça cargo das peças? —
perguntou Janine.
—Certamente —replicou Joan com um sorriso—. Mas antes terá que
conseguir que venham. E enquanto isso terá que manter afastados aos ladrões.
Dão Curtis tirou uma pistola de seu bolso e a deixou na mesa.
—Este trabalho começa a ser muito perigoso.
—A arqueologia sempre o foi —disse Janine—. Mas merece a pena.
—Nós sempre o acreditamos assim, verdade, carinho? —disse Joan,
apoiando amorosamente uma mão no ombro de seu marido.
—Sim —respondeu Dão, sonriendo—. Mas me temo que nos estamos
fazendo majores para seguir com esta vida. Espero que isto não nos vá causar
problemas —disse, assinalando a gaveta—. Estivemos a ponto de ficar em um
hotel, mas finalmente decidimos que seria mais prudente vir aqui.
—É-o —disse Canton com firmeza—. Tenho a um homem vigiando minha
casa. Podemos conseguir outro para que vigie esta.
Joan franziu o sobrecenho.
—por que tem a um homem vigiando sua casa?
—Porque minha mamãe tratou de me seqüestrar —explicou Karie—. Mas se
equivocaram e se levaram ao Janine por engano. Golpearam-na na cabeça e foi ao
hospital Y...
—O que...?
—Estou bem —disse Janine, elevando uma mão—. Não esqueci meu
treinamento.
—Você e seu trabalho de detetive —se lamentou Joan—. Sempre te disse
que a arqueologia era muito mais segura!
—Ja! É a vós a quem tem disparado, recorda? —replicou Janine—. Em
qualquer caso, salvamos ao Karie dos seqüestradores, mas não estamos seguros
de que estes tenham renunciado a seu propósito. As coisas estiveram um tanto
revoltas durante a última semana.
—E ainda por cima vamos nós com mais problemas —grunhiu Dão.
Janine lhe aplaudiu o ombro.
—Não se preocupe, papai. Agora somos mais para proteger ao Karie e as
peças que trouxestes. Estaremos bem.
—É obvio —assentiu Canton.
Dão e Joan sorriram, embora não pareciam convencidos.
—Só por curiosidade, o que há na caixa? —perguntou Janine.
—Várias estátuas funerárias maias, um pouco de cerâmica, algumas
pranchas com glifos e jóias com pedras preciosas. E uma máscara funerária de
ouro e pedras preciosas.
Janine abriu os olhos de par em par.
—Que maravilha.
—E tudo é propriedade do governo mexicano —acrescentou Dão—. Assim
que, possamos devolver-lhe certamente. Esperamos poder ficar uma ou duas
peças de cerâmica para nossa coleção da universidade, mas isso depende deles.
—Tendo em conta o que lhes há flanco consegui-lo, suponho que lhes
deixarão ficar com uma ou duas peças —disse Canton, levantando—. Me alegra
muito lhes haver conhecido. Agora tenho que levar ao Karie a casa e fazer um par
de chamadas. Veremo-nos mais tarde.
—Acompanho-te —disse Janine depois de que seus pais se despedissem do
Canton.
Karie saiu diante deles.
—Complicações —murmurou Canton, passando um braço pelos ombros do
Janine.
—Mais e mais. Pode que os seqüestradores desistam havendo tanta gente
por aqui.
—Ou pode que se unam aos ladrões de tesouros arqueológicos —murmurou
Canton.
Janine lhe deu em um flanco com um cotovelo.
—Não seja pessimista. Tudo sairá bem. Tem que ser assim, e logo. Quero
me casar.
—Que coincidência, eu também!
Janine riu e voltou o rosto para ele.
—quanto antes melhor.
Canton assentiu.
—quanto antes melhor —repetiu e se inclinou para beijá-la—. Agora vete a
casa.
—Tome cuidado.
—Você também. Chamarei-te mais tarde. Fecha as portas com chave. vou
fazer umas chamadas para ver o que pode fazer-se para arrumar as coisas.
—Faz que prendam a seu ex algema —sugeriu Janine.
—Não seria prático —disse Canton—. De todas formas, pode que haja
alguma forma de desanimá-la. Já a encontrarei —piscou os olhos um olho—. te
Cuide.
—O mesmo digo.
Capítulo 10

NÃO POSSO acreditá-lo —disse Joan Curtis—. Minha filha vai casar se
com o senhor Software. Tem idéia de quão famoso é e de quanto dinheiro
ganhou?
—Agora mesmo está arruinado —disse Janine.
—Tendo uma mente como a sua, não acredito que vá estar o muito tempo —
disse Dão com um sorriso—. É um tipo realmente preparado. Seguro que
recuperará sua fortuna com interesses.
—Embora não o faça, não me importa. Estou louca por ele —confessou
Janine.
—O sentimento parece ser mútuo. E eu que pensava que ia ter que esperar
uma eternidade a que Quentin te propor matrimônio... —brincou Joan—. Mas me
alegra que não o fizesse. Quentin não era o homem adequado para ti.
—Agora sei —disse Janine, sonriendo—. Só estava fazendo tempo para
conhecer o Canton.
—Escuta —disse Joan de repente, notando-se na televisão—. Falam de um
furacão que se dirige para aqui!
—Um furacão? —grunhiu Dão—. Justo o que necessitávamos! —olhou a sua
filha—. Não nos tinha mencionado isso.
—Não sabia —disse Janine—. Não falo espanhol.
—Shhh —Joan fez um gesto para que baixassem a voz—. Agora o estão
dizendo em inglês.
—A verdade é que estes últimos dias não vi muito a televisão —se
desculpou Janine.
—Não sente saudades —disse Dão.
Joan suspirou.
—Acabam de dizer que pode que terei que evacuar a costa se o furacão se
aproximar mais. E parece que vai fazer o.
—Esperava que pudéssemos tomar um vôo de volta aos Estados Unidos —
disse Dão, olhando com gesto preocupado a gaveta de embalagem—. O que vamos
fazer agora?
—Ir ao interior —respondeu Janine imediatamente—. Canton tem um carro
alugado—. Nós necessitaremos uma caminhonete para levar a gaveta.
Dão suspirou.
—Com os ladrões e os seqüestradores nos perseguindo.
—Não fica mais remedeio que fazê-lo —Joan já estava em pé, recolhendo
coisas—. lhes Ponha em marcha. Temos que recolher e sair daqui quanto antes.
Uns minutos depois, chegaram Canton e os meninos.
—O furacão Opal se dirige para aqui —disse, notando-se na desordem que
havia na sala de estar.
—Sabemos —disse Janine—. Estamos recolhendo para ir ao interior.
Precisamos alugar uma caminhonete.
—Eu me ocuparei disso. Será melhor que vamos juntos. Tenho um amigo que
possui uma fazenda a meio caminho entre o Cancún e Chichén Itzá. Poderá nos
alojar. E conta com uma pequena unidade de segurança.
—Uma unidade de segurança? —repetiu Janine, intrigada.
—Foi um mercenário em sua juventude. Agora está casado e tem dois
filhos.
—Que gente tão interessante conhece, Canton —disse Dão.
—Sim, tenho alguns amigos bastante especiais. Agora vou ocupar me dessa
caminhonete. Karie, você fique aqui com o Kurt e com o Janine.
—Tem televisão seu amigo, papai? —perguntou a menina, preocupada—.
Tenho que ver a partida dos Braves. É a final!
—Nunca ganharão a liga —disse Canton burlonamente.
—claro que sim ganharão! —protestou Janine—. Eu acredito neles!
Canton se limitou a mover a cabeça.
Duas horas mais tarde, dirigiam-se sob a chuva e contra o vento para a
fazenda do amigo do Canton. A selva crescia a ambos os lados da estrada e
passaram por vários povos sem deter-se.
—Está muito calada, Janine —disse Joan, que nesses momentos conduzia a
caminhonete—. Teria preferido ir com os Rourke?
—Eles levam ao Kurt —disse Janine—. pensei que seria mais conveniente
ficar com vós.
Dão sorriu.
—Para nos proteger?
—Nenhum de vós sabe artes marciais —replicou Janine, lhe devolvendo a
seu pai o sorriso.
—Isso é certo, carinho —Joan alargou uma mão para acariciar a de sua
filha—. O que faríamos sem ti?
—Não quero nem imaginar o disse Janine ironicamente, e o disse a sério,
embora seus pais não o suspeitaram.
Quando chegaram à fazenda do amigo do Canton se encontraram a dois
homens vigiando a entrada. Fora o que fosse o que lhes disse Canton, ambos
sorriram ampliamente e abriram a grade. Canton tirou um braço pelo guichê para
indicar aos que viajavam na caminhonete que o seguissem.
A casa frente à que se detiveram era branca, com o teto de telhas
vermelhas, tinha arcos e estava rodeada de flores de vivas cores. Estavam
descendo dos carros quando saíram a recebê-los um homem alto e moreno com
bigode e uma mulher loira que levava um bebê em braços. Um menino de uns nove
anos os seguiu.
O homem se aproximou e estreitou calidamente a mão do Canton.
—Quanto tempo, amigo —disse carinhosamente—. Imagino que estes são os
Curtem, dos que me falaste. Bem-vindos. Sou Diego Laremos. Esta é minha
esposa, Melissa, nosso filho Matt e nossa filhinha, Carmina —se voltou para
dirigir-se a sua Este mulher é Canton Rourke, do que tanto me ouviste falar.
—Me alegro muito de lhes conhecer todos —disse a mulher, que falava com
um ligeiro acento britânico—. Para o Diego e para mim é um prazer lhes ter em
nossa casa. Aqui estarão totalmente seguros.
—Obrigado por nos acolher —disse Dão, alargando uma mão—. Levamos
conosco algumas peças às que estão desejando jogar mão uns ladrões de tesouros
arqueológicos. Esperávamos voar hoje mesmo aos Estados Unidos, mas tem terá
que evacuar Cancún devido ao furacão.
—Isso nos contou Canton —replicou Diego solenemente—. Os ladrões de
tesouros arqueológicos são sempre um problema. O mesmo acontecia na
Guatemala, onde Melissa e eu vivemos antes.
—Também tratamos de viver em Chicago, mas os invernos eram muito
duros —disse Melissa, sonriendo—. Finalmente acabamos aqui. Não lhes parece
um lugar precioso?
—Certamente —disse Janine—. Deve ser um prazer viver todo o ano neste
paraíso.
Canton lhe aconteceu um braço pelos ombros.
—Parece-te o paraíso? —perguntou com suavidade—. Então tratarei de
comprar umas terras por aqui assim que possa.
—De verdade? —exclamou Janine—. Que maravilha. Poderíamos dever
visitar a Melissa.
O rosto da Melissa se iluminou.
—Seria um prazer lhes ter de vizinhos —disse—. Tenho todos seus livros
—acrescentou timidamente, olhando ao Janine.
—Isto sim que é uma autêntica bem-vinda. Deixa-me sustentar a sua
menina em braços? —perguntou Janine, aproximando-se do bebê com olhos
brilhantes e intrigados.
—É obvio —Melissa lhe entregou à menina e Janine tomou em seus braços
com supremo cuidado. Sua expressão se voltou radiante quando a cria a olhou
com seus ojitos azuis e começou a fazer ruiditos.
—Que preciosidade! —exclamou Janine, emocionada.
Olhando-a, Canton teve uma nítida imagem mental dela sustentando a seu
próprio bebê, e ficou sem fôlego. Janine o olhou aos olhos, sonriendo.
—Podemos ter vários como este? —perguntou.
—Tantos como quer —replicou ele com voz rouca.
—Tomo a palavra.
Diego Laremos era uma das pessoas mais interessantes que Janine tinha
conhecido, e tinha conhecido a várias. Diego tinha outros dois amigos ex-
mercenários em Chicago, um que trabalhava de advogado e outro que dirigia uma
academia de um corpo de segurança de alguma classe. Ambos estavam casados e
tinham família.
—Há outro membro do velho grupo em Telhas —acrescentou—.Também
está casado e tem um rancho. E logo está o que vive em Montana. cansou-se da
cidade e se levou ali a sua mulher e a seus filhos. Estamos acostumados a
reunimos todos os anos, no verão.
—São uma autêntica dente —disse Canton, sonriendo—, E todos ex-
mercenários. Surpreende-me que todos tenham chegado a lhes casar e a ter
família.
Diego se inclinou para ele.
—Nós mesmos somos os mais surpreendidos.
Canton sorriu ao Janine sobre a grande mesa em que estavam comendo.
—Conheci esta panda em uma época em que tinha muitos problemas com
uma empresa de hardware que tinha estabelecido em um país do terceiro mundo.
A minha era ecológicamente amistosa, mas havia uma companhia rival que se
dedicava a destroçar a selva e a assassinar aos nativos. Quando o governo disse
que não tinha o dinheiro nem o poder suficiente para fazer algo a respeito, enviei
ali ao Diego e a seus homens para que dessem algumas surpresas desagradáveis,
mas não letais, a meus desleais competidores. E conseguiram jogá-los do país.
—Me alegro —disse Janine com admiração.
—Também criamos um fundo e compramos um terreno para a tribo que
agora lhes pertence legalmente. Eu não gosto de obter benefícios a apóie de
destruir —disse Canton—. Nunca me gostou.
—Espero que o recupere tudo, amigo —disse Diego sinceramente—.
Necessitamos mais industriais como você, homens que saibam manter um
equilíbrio entre os benefícios e o respeito aos trabalhadores e à natureza.
—O que menos me preocupa agora são os benefícios —disse Canton,
apoiando-se contra o respaldo de seu assento—. Espero que a gente que vai atrás
de nós se desanime. Acredito que nos seguiram até aqui.
—Seguro que o têm feito —disse Laremos—, mas seus perseguidores se
levarão uma grande surpresa se lhes ocorre tratar de entrar aqui. Meus homens
estão muito bem treinados. E vão armados.
—Fixamo-nos —disse Janine, com os olhos brilhantes—. Já estou tirando
idéias para outro livro.
—Sairemos nós nele? —perguntou Melissa—. Quero ser uma sereia loira e
sexy que volte louco a este forte latino —disse, olhando carinhosamente a seu
marido.
—Volta-me louco todos os dias de minha vida, meu amor —disse Diego,
tomando a mão da Melissa e levando-lhe aos lábios—. Não faz falta que o mundo
se inteire.
Melissa se limitou a sorrir. Janine pensou que devia ser maravilhoso levar
tanto tempo casados e seguir apaixonados. Olhou ao Canton e viu que este a
contemplava. Não disse uma palavra, mas seus olhos lhe revelaram que a ele e
lhes aconteceria o mesmo.
Tiveram que ficar dois dias na fazenda antes de que a tormenta passasse.
Os ladrões de tesouros e os seqüestradores não deram sinais de vida, mas
quando os Curtis e os Rourke ficaram de novo em rota, comprovaram que
voltavam a segui-los. E nessa ocasião o faziam dois veículos que não se
incomodaram em dissimular.
Chegaram a um cruzamento de caminhos e Canton fez um repentino sinal a
Dão Curtis para que o seguisse. Tomou rapidamente o caminho da direita e girou
em seguida o carro, tirando-o do caminho e ocultando-o depois de umas árvores.
Dão fez o mesmo.
O esconderijo era o suficientemente denso e a chuva se encarregou de
apagar os rastros em poucos minutos. Quando os dois carros perseguidores
chegaram ao cruzamento, detiveram-se. Finalmente, cada um tomou uma direção.
Imediatamente, Canton deu marcha atrás ao carro e ficou à altura da
caminhonete.
—Podemos voltar para último povo pelo que passamos e de ali tomar a
estrada do Cancún. Mantén a calma.
—Por isso não há problema —disse Dão—. Adiante.
Canton ficou em marcha com Dão seguindo-o. Conseguiram distanciá-lo
suficiente de seus perseguidores para ter uma boa vantagem, mas ainda não
estavam fora de perigo. Quando se dessem conta de que lhes tinham enganado,
retrocederiam para seguir perseguindo-os.
Chegaram ao Cancún ao anoitecer e foram a um hotel, decidindo que seria
menos perigoso que as casas de praia. Descarregaram a gaveta de embalagem
com as peças arqueológicas e devolveram a caminhonete à agência de aluguel para
alugar outra em uma agência distinta. Janine pensou que essa seria uma maneira
de despistar a seus perseguidores.
E poderia havê-lo sido. Mas os seqüestradores viram por acaso ao Canton e
ao Janine na agência de aluguel e em seguida compreenderam o que estava
passando. Não seguiram à nova caminhonete até o hotel. Um de seus homens
tinha uma prima que era conhecida de um empregado da agência de aluguel de
carros. Tudo o que teve que fazer esta foi paquerar um pouco com o empregado.
Ao cabo de uma hora, não só sabiam em que hotel se hospedavam os Curtis e os
Rourke, mas também em que habitações.
Para piorar as coisas, o homem que ia depois das peças arqueológicas
também era do Cancún e tinha conexões familiares com um dos tipos que
pretendia seqüestrar ao Karie. Decidiram unir-se e repartir os benefícios.
Sem saber nada disto, Canton, Janine e outros ocuparam suas habitações
contigüas no hotel enquanto esperavam a tomar o seguinte vôo a Chicago.
Karie descobriu desencantada que não ia haver maneira de que visse sua
partida por televisão. Devido ao furacão, virtualmente todas as comunicações
com o exterior tinham ficado cortadas. Como disse a seu pai, talvez não tivessem
praias tropicais em Chicago, mas ao menos tinham televisão por cabo.
Os Curtis também estavam preparados para voltar para casa. Não só
tinham conseguido objetos arqueológicos muito interessantes para o governo
mexicano; também tinham recolhido suficiente material de investigação para
escrever um livro e para vários anos de conferências.
Um representante do governo ia encontrar se com eles no hotel à manhã
seguinte para recolher as peças que tanto lhes estavam custando proteger.
Mas não podiam suspeitar que o representante ao que esperavam tinha sido
atacado para ser substituído por um dos ladrões.
—vai ser um grande alívio nos liberar deste tesouro —disse Dão Curtis
enquanto jantavam—. Não é que sinta havê-lo encontrado, mas o certo é que
supõe uma grande responsabilidade.
—Sabiam que a princípios de século muitos dos arqueólogos que foram a
Galo Itzá eram assassinados? —disse Joan.
—Vi um documentário sobre isso na televisão —disse Janine—. Era muito
interessante. Uma mente supersticiosa pensaria imediatamente em alguma
maldição —acrescentou em tom malicioso.
Dão riu e piscou os olhos um olho a sua esposa.
—Sobre tudo a mente calenturienta de um escritor. Mas o nosso não foi
uma maldição, a não ser má sorte. O senhor Pérez, conhecido ladrão de tesouros
arqueológicos, esteve-nos seguindo desde que descemos do avião. Ao princípio
tratou de nos subornar, mas ao ver que isso não lhe servia de nada começou a
fazer ameaças veladas sobre uma intervenção do governo mexicano. Tínhamos
tudas as permissões legais necessárias, assim que as ameaças tampouco lhe
serviram para nada.
Então estabeleceu um acampamento próximo ao nosso e começou a
perseguimos.
—A lhes perseguir? Como? —perguntou Janine.
—Ruídos repentinos em meio da noite. Fornecimentos que não chegavam.
Desaparecimento de ferramentas. Não podíamos acusá-lo concretamente de
nada, embora sabíamos que era ele —Dão moveu a cabeça—. Ao final foi muito
para nós, sobre tudo depois de perder a conexão com o satélite. Recolhemos o
que tínhamos e fomos.
—E a escavação? —perguntou Canton—. Não a saqueará?
—Acredita que nos levamos tudo o que merecia a pena —explicou Joan—.
Fomos tão cautelosos com o novo descobrimento que nem sequer permitimos que
os trabalhadores se aproximassem. Selamo-lo e marcamos a localização em
nossos mapas pessoais. Asseguraremo-nos que caiam em boas mãos. Enquanto
isso, temos que conseguir que as peças que trouxemos sejam entregues antes de
que o senhor Pérez nos localize e faça algo drástico.
—Seria capaz? —perguntou Janine.
Dão assentiu.
—Faz uns anos uma expedição arqueológica perdeu um de seus membros
junto com umas peças de ouro e várias jóias de valor incalculável. Pérez esteve
comprometido, mas não se encontraram suficientes prova para julgá-lo. Sempre
paga a outros para que façam o trabalho sujo por ele.
Janine sentiu um calafrio. alegrou-se de que Kurt e Karie estivessem no
balcão e não escutando aquilo.
—Tenho dois homens vigiando o hotel —disse Canton—. Aqui estaremos
seguros até que chegue a hora de tomar o avião.
Karie e Kurt saíram do balcão e foram à habitação de este. Um momento
depois saíram com uma grande bolsa na mão.
—Podemos baixar um momento à praia? —perguntou Karie, com a câmara
pendurando do pescoço—. Queremos tirar umas fotos.
—Não acredito que seja boa idéia —disse Canton.
—OH, por favor, papai —gemeu Karie—. Aqui estamos seguros. Você o há
dito antes. Há gente vigiando —acrescentou, se tirando sua boina dos Braves e
secando o suor da frente—. Por favor.
Pareciam desesperados. Era duro para os meninos estar encerrados todo o
dia.
—De acordo. Mas antes vou fazer umas chamadas —disse Canton—. lhes
Assegure de que aos pais do Kurt não lhes importa.
—Se estão vigiados, não há problema —disse Dão.
Os meninos intercambiaram olhadas cúmplices.
—Obrigado, papai! —exclamou Karie, entusiasmada.
Canton fez sua chamada. Os meninos tomaram sua bolsa e baixaram à
praia.
—lhes mantenha afastados da água! —disse Canton do balcão.
—Sim, papai!
—O que levam na bolsa? —perguntou Janine com curiosidade.
—Provavelmente vão guardar búzios nos cubos, ou algo assim —disse
Canton, deslizando um braço pelos ombros do Janine—. Não se preocupe.
Assegurarei-me que não tragam nada vivo de volta com eles.
Janine se estremeceu.
—Está seguro de que seu homem os vigiará bem?
Canton assentiu.
—É um dos melhores no negócio. Quando não trabalha para mim, faz-o para
o governo federal.
—Ah, sim? Do que?
Canton riu.
—Não sei. Diz que é algo secreto. Viaja muito —olhou ao Janine e sorriu—.
Mas faz muito bem seu trabalho. Os meninos estarão a salvo.
—De acordo.
Kurt olhou por cima de seu ombro enquanto ele e Karie corriam pela areia
para a água.
—Buf —disse, passando uma mão pela frente—. Pensava que nunca foram
deixar nos sair da habitação! depois do que nos há flanco consegui-lo tudo!
—Sei —disse Karie, igualmente aliviada—. E, por sorte, tampouco nos
perguntaram o que havia na bolsa.
—Será melhor que comecemos. Não temos muito tempo.
—Estúpidos ladrões e seqüestradores —murmurou Karie enquanto abria a
cremalheira da bolsa—. Não há dúvida de que sabem como chatear a uns jovens
com visão para os negócios.

Capítulo 11

OS MENINOS jogavam na praia. Dão e Joan Curtis registravam a gaveta


de embalagem dos achados da escavação, comprovando duas vezes cada objeto,
pois preparavam a chegada do delegado do departamento de antiguidades do
governo.
Enquanto isso, Canton e Janine estavam sentados na terraço porque não
queriam perder de vista ao Kurt e ao Karie nem um instante.
—O que estão fazendo? —perguntou Janine ao ver que os meninos tiravam
algo da bolsa.
—Pode que se levaram umas taças e uns copos para fazer um castelo de
areia —sugeriu Canton—. Karie sempre vazia o armário de louça quando joga na
praia.
—Sim, talvez —murmurou Janine. Mas o que estavam tirando os meninos
não pareciam taças nem copos, a não ser partes de mangueira, a caveira de uma
vaca, fragmentos de borracha, uma bolsa de plumas, várias Pelotas e uma parte
de pele curtida—. De verdade crie que vão fazer um castelo com esses
cacarecos?
Canton apareceu a terraço e observou aos meninos.
—Um castelo muito estranho...
de repente, o timbre do telefone distraiu sua atenção e ouviram que Dão
atendia a chamada.
—Sim, poderia fazê-lo —dizia Dão em tom cauteloso—. Mas por que razão?
Houve uma pausa.
—Já vejo. Mas me parece muito trabalho empacotar e transladar tudo de
novo —continuou Dão—. por que não pode vir você ao hotel?
Canton entrou na habitação com gesto preocupado.
—Quem é? —sussurrou.
—O representante do departamento de antiguidades —respondeu Dão,
enquanto com uma mão tampava o auricular.
—Como se chama? —perguntou Canton. Dão repetiu a pergunta a seu
interlocutor.
—Carlos Ramírez —repetiu detrás escutar a resposta.
—lhe pergunte se souber como gosta ao Lupe que lhe cozinhem os ovos —
disse Canton com expressão suspicaz. Era uma estranha pergunta, mas Dão a fez.
Um segundo depois, a comunicação se cortou.
—Sabia —afirmou Canton, satisfeito.
—Falas igual a ele —disse Janine, ensimismada.
—Igual a quem? —perguntou Canton, olhando-a inquisitivo.
—OH, não importa —respondeu ela, ruborizando-se.
—Não sou nenhum alienígena —protestou Canton—. E tampouco sou ator!
—Sinto-o —se desculpou Janine, baixando a vista.
—Depois falaremos —disse Canton, lhe lançando um olhar feroz. Logo se
voltou para Dão—. O que queria esse homem que fizesse?
—Pedia-me que embalasse todos os objetos da escavação e os levasse a
cidade, a um armazém do governo.
—Era uma armadilha —afirmou Canton, zangado—. Devem haver-se dado
conta de que temos este lugar sob vigilância. tentaram te enganar e lhes saiu
mau. Entretanto, não se deterão aí.
—O que farão agora? —perguntou Joan, preocupada.
—Não sei —afirmou Canton—. Mas o primeiro que temos que fazer é falar
com o verdadeiro delegado do departamento de antiguidades, ou averiguar o que
lhe passou.
Canton desprendeu o telefone e fez uma chamada a México capital.
Quando lhe puseram com os escritórios do governo, dirigiu-se por seu nome ao
oficial que respondeu
Houve saudações e um rápido intercâmbio de perguntas. Janine ouviu
mencionar o nome do Lupe.
—Lupe é a mulher do delegado —lhe informou Joan, que também estava
escutando a conversação—. E não come ovos porque é alérgica.
Houve mais pergunta até que, depois de um rápido «obrigado», Canton
pendurou o telefone.
—O delegado vai enviar agora mesmo alguns homens para aqui —disse—. E
virão armados.
Janine estava escutando atentamente e de repente recordou que Karie e
Kurt estavam sozinhos na praia. Saiu precipitadamente a terraço e percorreu a
praia com o olhar. Seu coração se deteve um instante. Os meninos não estavam à
vista. Só ficava um estranho montículo de areia onde tinham estado jogando.
—foram-se! —gritou Janine.
Canton e Dão saíram imediatamente em busca dos meninos, Janine os
seguiu e Joan ficou vigiando as peças. Desceram pelas escadas à planta principal
e correram para a praia, dividindo-se automaticamente para dar a volta ao hotel.
Dão foi por um lado e Janine e Canton pelo outro.
Um forte grito os alertou. Procedia das sombras de um barraco vazio de
aluguel de objetos de submarinismo.
Dois homens tinham ao Karie e ao Kurt e outros dois corriam para eles. A
gente tinha uma pistola.
—OH, Meu deus, é ele! —exclamou Janine ao fixar-se no homem que
sustentava a arma—. É o seqüestrador!
—que tem ao Kurt é Pérez —disse Dão Curtem, furioso—. Parece que os
seqüestradores e os ladrões se uniram —grunhiu—. Solte aos meninos, covardes!
Os dois homens que sujeitavam ao Karie e ao Kurt saíram à luz, com o
homem da pistola a seu lado. Janine se contraiu, disposta a lançar-se sobre ele.
—Não —disse Canton entre dentes, ao dar-se conta do que ia fazer—. Tem
que confiar em mim, Janine. Tenho um ás na manga. me dê a oportunidade de
jogá-lo!
Dão, que estava junto a sua filha, não compreendeu o que queria dizer
Canton. Tampouco Janine. Mas a voz do Canton transmitia tal convicção e certeza
que lhes fez duvidar.
Janine esperou, contendo o fôlego, sem logo que atrever-se a olhar os
assustados rostos dos meninos.
—Queremos o tesouro maia, senhor Curtis —disse Pérez—. O queremos
agora. Se nos der isso, deixaremos que os meninos se vão. Do contrário,
levaremo-nos isso e os reteremos até que satisfaça nossa petição.
—unistes suas forças, não? —disse Canton—. Que conveniente.
—É uma vantagem ser mais numerosos que o contrário —replicou Pérez—.
Mas o certo é que pedi ajuda e estes homens só querem receber seu dinheiro
pelo trabalho. Já não desejam trabalhar para sua esposa, senhor Rourke; até a
data não lhes pagou nem um centavo por seus serviços.
—Típico de Enjoe —replicou Canton—. Deveriam haver o pensado melhor.
Como você. Esta vez se o. E pagará com uma larga estadia na prisão.
—Somos nós quem tenho a arma, senhor.
—Sério? —Canon fez um gesto para o homem alto e moreno que sustentava
a pistola. Movendo-se com uma rapidez inusitada, este liberou o Karie e ao Kurt
de seus captores, deixando-os gemendo e tombados sobre a areia. Pérez se
tornou atrás, unindo as mãos em gesto de súplica. A pistola apontava agora em
sua direção e o homem que a sustentava tinha cara de poucos amigos.
Janine deixou escapar um pequeno grito de alívio enquanto Dão estendia os
braços para o Kurt e Karie.
—Deveria matá-los por ter assustado aos meninos dessa maneira —disse o
homem alto e moreno com voz carente de expressão. Pérez tragou audiblemente.
—Há... foi um mal... mal-entendido —balbuciou.
—Seu —assentiu o homem moreno. Voltou seu frio olhar para o Canton—. E
bem?
—As autoridades mexicanas se farão cargo deles —disse Canton—. E
espero que o façam com a dureza que se merecem. O seqüestro é um delito muito
covarde. Se tivesse feito mal a minha filha o teria matado pessoalmente.
—Eu estive a ponto —replicou o homem moreno—. E meu companheiro
também —fez um sinal para um homem que observava da praia—. Mas lhe
asseguro que não houve nenhum momento em que os meninos tenham deslocado
perigo —voltou a olhar ao Pérez—. Poderia lhe haver matado em qualquer
momento.
—Acredito que sabe —disse Canton—. Obrigado pela ajuda, Rodrigo.
O homem moreno se encolheu de ombros.
—De nada. Devia-lhe um favor —a seguir fez um gesto com a arma para
que Pérez e os outros dois homens ficassem em movimento.
—Mas esse homem me fez saltar do navio —disse Janine entre dentes
junto ao Canton—. Não recorda o que te contei sobre ele?
—infiltrou-se no grupo de seqüestradores —explicou Canton—. Eu não
podia te dizer quem era. Um simples deslize poderia lhe haver flanco a vida.
Embora o certo é que nunca lhe há flanco arriscá-la por uma boa causa —
acrescentou. Logo olhou ao Karie—. Está bem, coração?
—Sim, papai. foi muito excitante!
—Certamente! —acrescentou Kurt, olhando a sua redor—. Onde está mamãe?
Tenho que contar-lhe
—Antes lhe diga que se sente —recomendou Dão.
Karie saiu correndo para o hotel com o Kurt. Janine moveu a cabeça,
pensando na capacidade de recuperação dos meninos.
—Agora compreendo por que via esse homem quase diariamente —disse—.
Deveriam me retirar minha licença de detetive por ter estado tão cega.
—É muito bom em seu trabalho —disse Canton.
—Trabalha para a CIA?
—Não sei. Já lhe disse isso. Nunca consegui saber com exatidão para que
agência trabalha. Quando o conheci era um mercenário, como Diego Laremos.
Esteve com seu grupo na África.
Janine enrugou os lábios.
—Começo a esboçar um novo livro em minha mente...
—Neste poderia fazer que Pérez fora devorado por crocodilos gigantes —
sugeriu Dão—. Embora, pensando-o bem, preferiria que se afundasse lentamente
em areias movediças.
—Uma boa temporada na prisão soa melhor, não te parece? —disse Janine
—. Não se preocupe. Farei-me cargo desse pequeno detalhe —olhou ao Canton—.
Crie que Enjoe o tentará de novo? —perguntou, preocupada.
Ele se encolheu de ombros.
—Duvido-o. É basicamente preguiçosa, e quando se der conta de que
poderia ver-se implicada pela imprensa amarela em um caso de seqüestro,
desistirá. Terá que esperar para receber sua pensão.
—Como pode receber uma pensão se tiver tornado a casar-se? —perguntou
Janine.
—Ela alega que é para manter a nossa filha.
—Mas é você quem cuida do Karie.
—Assim é —assentiu Canton.
—Acredito que necessita um bom advogado.
—Suponho que tem razão —Canton tomou a mão do Janine na sua e
acrescentou—: E um pastor.
Ela sorriu silenciosamente.
—OH, sim. E um pastor.
Dão se afastou enquanto Canton e Janine seguiam olhando-se, pensando
que fariam bom casal. Quando entrou na habitação do hotel encontrou a sua
mulher escutando com gesto horrorizado a narração que lhe estavam fazendo do
incidente os meninos.
—Não cria tudo o que lhe contem —disse—. Quase tudo são mentiras.
—Estamos animando-a —protestou Kurt.
—Pois deixem de fazê-lo —sugeriu Dão—. Agora já aconteceu tudo.
Joan suspirou.
—Ainda tem que vir o representante mexicano a levar o tesouro maia.
—O tipo ao que Janine jogou da praia era um espião e estava trabalhando
para o Canton —disse Kurt, olhando a sua mãe—. Deveria ter visto a facilidade
com que derrubou aos homens que nos sujeitavam. Parecia um filme...
—Mas era real —acrescentou Karie. Olhou seu relógio—. A partida já
começou —grunhiu—. Não sei se for poder ver se minha equipe chega a final!
—Amanhã poderemos voltar para casa —disse Dão Curtis, suspirando
aliviado enquanto se sentava junto a sua esposa—. Nesta ocasião não posso dizer
que o sinta.
—Nem eu —disse Joan—. foram umas semanas muito duras. Onde estão os
outros dois? —perguntou de repente, olhando a seu redor.
—Na praia, olhando-se como dois tortolitos.
—Superassem-no em uns trinta anos —murmurou Dão.
Joan sorriu.
—Isso crie? Então ainda ficam uns quantos.
—Certamente.
Canton caminhava para o hotel com o Janine da mão, mas parecia
preocupado. Ela sabia que algo lhe rondava a cabeça, mas não sabia o que era.
—Está totalmente segura de que não foi meu parecido com seu herói da
série de ficção científica o que te decidiu a te casar comigo?
Assim era isso. Janine se sentiu aliviada. Estreitou calidamente os dedos
do Canton.
—Sim, estou segura. Já lhe havia isso dito.
—É certo. Mas não deixa de fazer essas pequenas comparações. É
preocupe-se.
—Sinto-o —disse ela com sinceridade—. Não voltarei a fazê-lo.
Canton suspirou, voltando o rosto para olhá-la aos olhos.
—estive pensando no de nos casar.
Janine o via vir, como se tivesse percebido as dúvidas que se deram
procuração do Canton.
—Não quer fazê-lo?
—Sim quero —disse ele, indeciso—. Mas ainda não.
Janine sentiu que lhe rasgava o coração. Apesar de tudo, sorriu.
—De acordo.
—De qualquer jeito?
—Não quero que possa dizer-se que te obriguei a te casar comigo —disse
ela, apartando o olhar—. Tenho que entregar minha novela antes de que acabe o
prazo, assim para mim também seria conveniente que deixássemos nossos planos
em suspense. Assim poderemos meditá-lo com mais calma.
Canton colocou as mãos nos bolsos de sua calça.
—Então, de acordo. Chamarei-te dentro de um mês e falaremos.
—De acordo.
Em realidade passaram dois meses antes de que Janine voltasse ou seja
algo sobre o Canton. Nesse período de tempo, os Atlanta Braves ganharam a final
da liga em um partido histórico. Kurt recebeu uma chamada de uma Karie quase
histéricamente feliz, que pouco depois lhe enviou uma boina de seus adorados
Braves e uma camiseta comemorando a partida. Mas não houve notícias do
Canton. Nem sequer Karie o mencionou em sua chamada Telefónica. Ao parecer,
sua mãe tinha deixado de persegui-la a ela e a seu ex-marido, e isso eram boas
notícias.
Enquanto isso, Janine terminou seu livro e começou outro cuja ação situou
no Cancún. Voltou a ver sua série favorita e notou que seu herói já não lhe
parecia tão atrativo. Preferia ao Canton, embora seu coração se sentia mais e
mais doído enquanto transcorriam os dias sem ter notícias dele.
Quando se aproximava o natal, Janine foi a casa de seus pais. Quentin a
chamou para saudá-la e mencionou que tinha saído algumas vezes inglesa que
conheceu na viagem ao Cancún. referiu-se a ela com tal calidez que Janine
deduziu que seu tema de conversação não devia limitar-se na atualidade à
história. alegrou-se por ele. Quentin e ela nunca teriam tido futuro como casal.
—Este artigo é para escrever um livro! —exclamou Kurt um dia—. Olhe!
Janine tomou a revista que lhe entregou seu irmão. Dentro havia um artigo
sobre o importante acordo que acabavam de assinar duas empresas do mundo da
eletrônica. Na foto que ilustrava o artigo aparecia Canton Rourke estreitando a
mão de um conhecido homem de negócios longínquo.
—Dizem que recuperará tudo o que perdeu e mais —explicou Kurt—. Te
disse que o conseguiria.
Janine apartou o olhar.
—Disse-o. Melhor para ele.
—Não te importa?
—por que ia importar me? passaram dois meses e nem sequer se incomodou
em chamar por telefone. Estou segura de que me esqueceu como um ligue do
verão mais, e por que não? Pode ter as mulheres mais formosas do mundo. por
que ia ficar comigo?
Kurt ficou surpreso. Janine era um bombom. Ela não era consciente disso,
mas Kurt estava seguro de que ao Canton Rourke parecia irresistível. Karie o
disse no Cancún. Embora era certo que não a tinha chamado em dois meses.
Resultava bastante estranho. Ele pensava que pareciam o um para o outro.
Kurt quis dizer algo para consolar a sua irmã, mas Janine já tinha voltado
para enfrascarse em seu livro.
perguntou-se o que teria feito Karie com as fotos que tiraram o Cancún.
Ele também levava tempo esperando notícias de seu amiga a respeito. Conforme
lhe havia dito Karie, ela tinha contatos, e lhe assegurou que encontraria a alguém
que se interessasse por elas. Mas, até a data, não tinha tido notícias. Talvez
Karie tinha renunciado à idéia, ou era possível que seu pai lhe tivesse confiscado
as fotos. Em qualquer caso, temia que todos seus planos se foram ao traste.
Dois dias depois, a primeira página de um periódico sensacionalista
mostrava a foto de um «monstro marinho» aparecido nas praias do Cancún. Tinha
plumas e uma grosa pele verde. Seu crânio tinha grande parecido com o de um
bovino. Os cientistas diziam que era uma forma desconhecida de vida.
Kurt comprou três cópias e correu a casa a acostumar-lhe a seus pais. Logo
colocou o titular sob o nariz de sua irmã.
—Olhe! —exclamou—. Olhe! Encontraram-na na praia em que estivemos!
Janine olhou a criatura que mostrava a foto com o cenho franzido. Algo em
seu aspecto lhe resultava familiar.
antes de que tivesse tempo de pensá-lo, bateram na porta.
—Vete a abrir —disse, apartando a um lado o periódico—. E antes de fazê-
lo olhe quem é.
Kurt foi à porta, apareceu à mira e abriu imediatamente, rendo.
—Olá! —saudou.
Canton Rourke lhe dedicou um sorriso. Karie estava com ele, sonriendo de
orelha a orelha, com sua boina dos Braves na cabeça.
—Onde está Janine? —perguntou Canton.
—No estudo de papai. por aí —indicou Kurt.
A profunda voz do Canton já tinha anunciado sua visita, mas Janine sentiu
que seu coração se enchia ao vê-lo. Dois meses era muito tempo, pensou. Tinha-o
jogado tanto de menos... Seus olhos disseram ao Canton que para ela nada tinha
trocado.
Ele não pareceu necessitar palavras. Sorriu com ternura e alargou os
braços para o Janine. Ela correu a abraçá-lo e elevou o rosto para receber um
beijo que pareceu não ter fim.
Uns segundos depois, se acurrucó contra ele, tremente.
—Não preciso perguntar se me sentiste falta de —disse ele com voz rouca
—. Podemos conseguir uma licença em três dias, ou podemos voar a México e nos
casar em um. Você decide.
—Aqui —respondeu Janine imediatamente—. Para que meus pais e Kurt
possam vir.
Canton assentiu.
—Também eu gostaria. Não tenho muitos amigos, mas os que tenho são os
melhores do mundo.
—meu também —Janine elevou uma mão e acariciou o rosto do Canton.
Parecia mais magro—. Tem aspecto de estar esgotado.
—Estou-o. foram dois meses muito ocupados. Mas já solucionei todos meus
assuntos financeiros. E Enjoe já é história.
—Como?
—Voei a Grécia com meu advogado e esclareci com ela todo o relacionado
com o Karie —explicou Canton—. O seqüestro é um delito muito grave. Assegurei-
lhe que se me empenhava podia obter que o governo mexicano encontrasse uma
maneira de fazer que a extraditassem para julgá-la. Ela sabia que podia fazê-lo.
Capitulou sem protestar e aceitou o que lhe ofereci. Poderá visitar a menina,
embora não acredito que o faça muito. depois do acontecido, Karie não está
precisamente iludida com a idéia de vê-la.
—Imagino —Janine olhou ao Canton aos olhos uns momentos antes de
acrescentar—. Não podia me haver chamado ao menos uma vez?
Ele sorriu com gesto arrependido.
—Queria me assegurar que soubesse quem era.
—Já sabia —assegurou Janine—. quanto mais vejo a série, mais diferencia
vejo entre meu herói e você. Ainda penso que ele está muito bem. Mas você está
melhor! E é a ti a quem quero —acrescentou timidamente, baixando a vista.
Canton suspirou, satisfeito.
—E eu quero a ti. Nunca quis a ninguém assim. Nunca em minha vida —
acrescentou com voz rouca.
—Eu tampouco —disse Janine, sem fôlego.
Canton voltou a beijá-la, faminto, interrompendo-se só para ouvir umas
jovens vozes que se aproximavam.
—Não me contem —disse isso Kurt em tom irônico ao vê-los abraçados—.
ides casar lhes, correto?
—Correto —respondeu Janine soñadoramente.
—Bravo! —exclamou Karie, entusiasmada—. Pode que agora deixe de estar
tão irritável, papai.
Canton olhou a sua filha com o cenho franzido.
Kurt sorriu.
—O mesmo te digo, Janine.
Canton deslizou o olhar do alegre rosto dos meninos ao do Janine.
—Viu o periódico desta semana? —perguntou, mencionando a seguir o nome
de um dos mais importantes.
—Sim. Kurt me ensinou isso. Sai em primeira página a foto de uma criatura
que apareceu nas costas de México.
—Não a reconheceste? —Canton colocou a mão no bolso de sua camisa e
desdobrou uma cópia da primeira página do periódico.
Kurt e Karie pareceram repentinamente inquietos.
Janine olhou a foto com gesto pensativo.
—A verdade é que me resulta bastante familiar...
—A caveira de vaca? —disse Canton—. A mangueira atalho? As plumas?
Janine se levou a mão à boca e olhou ao Kurt com os olhos totalmente
abertos.
—Não pode ser!
Karie se esclareceu garganta.
—Escuta, papai... —começou a dizer ao ver que Canton a olhava
entrecerrando os olhos.
—Cobrimo-la de areia assim que tiramos a foto —explicou Kurt—. Nos
asseguramos que a maré a levasse.
—por que? —perguntou Canton.
Karie enrugou os lábios, olhou ao Kurt e tirou um cheque do bolso de sua
calça.
—Por isso —disse.
Canton desdobrou o cheque, estendido em nome de sua filha, e quase se
engasgou.
—Brinca?
Karie negou com a cabeça.
—Não estava segura de que fosses recuperar seu dinheiro, assim que me
ocorreu esta idéia. Em realidade foi do Kurt. Nos íamos repartir o dinheiro.
Canton não sabia se brigar ou abraçar a sua filha.
—Mas isto é um camelo! vais devolver esse dinheiro. E terá que explicar
por escrito o acontecido para que o periódico se retrate da notícia.
—Já lhes expliquei a verdade na carta que lhes enviei —assegurou Karie—.
Guardei uma cópia. Disseram que não importava, que o monstro dava o pego —
apoiou uma mão em seu quadril, adotando uma pose—. Sejamos realistas, papai.
De verdade crie que Elvis vive em Marte, como publicaram nesse mesmo
periódico a semana passada?
Karie parecia tão maior e tão sofisticada que os dois adultos romperam a
rir, embora Canton seguia decidido a que se esclarecessem coisas.
—Não há dúvida de que é tua filha —disse Janine entre lágrimas de risada.
—Assim que o anel esteja em seu dedo, também o será tua —lhe recordou
Canton.
—Que sorte tem —disse Karie, sonriendo.
—E eu —Kurt sorriu traviesamente antes de acrescentar—: Pensa em quão
bem o vamos passar juntos.
Canton e Janine olharam a foto do periódico e logo aos meninos.
—Internos —disse Canton.
—Em diferentes estados —assentiu Janine.
Os meninos se olharam com gesto cúmplice e saíram correndo da
habitação.
Canton fechou a porta.
—E agora —murmurou enquanto tomava ao Janine entre seus braços—,
acredito que estávamos falando sobre nossas próximas bodas. Segundo
lembrança, tinha-me interrompido justo... aqui.
inclinou-se e beijou ao Janine com lenta e cálida firmeza, e ela sorriu de
pura felicidade. E não foi nenhum mistério que ele a amasse. Ou viceversa.

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