Boletim Nº 173
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(semana nº 4)
Boletim Criminal Comentado 173-
Março de 2022
Procurador-Geral de Justiça
Mário Luiz Sarrubbo
Assessores
Fernanda Narezi
Ricardo Silvares
Rogério Sanches Cunha
Valéria Scarance
Paulo de Palma (descentralizado)
Danilo Pugliesi (descentralizado)
Analistas Jurídicos
Ana Karenina
Victor Gabriel Tosetto
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SUMÁRIO
1-Tema: Busca e apreensão. Domicílio como expressão do direito à intimidade. Asilo inviolável.
Exceções constitucionais. Interpretação restritiva. Ausência de fundadas razões. Ausência de
consentimento válido do morador. Indução a erro. Vício da manifestação de vontade. Provas obtidas.
Nulidade................................................................................................................................................7
DIREITO PENAL....................................................................................................................................12
1-Tema: Prescrição. Crimes praticados após a alteração legislativa inserida pela Lei
11.596/2007........................................................................................................................................12
1-Tema: divergência sobre o foro competente para ação penal, com reflexo na atribuição
funcional.............................................................................................................................................17
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NOTÍCIA
O MPSP instituiu o Núcleo de Atendimento às Vítimas de Violência (NAVV) na Capital , por meio da
RESOLUÇÃO Nº 1.435/2022-CPJ, de 4 de março de 2022), que irá atender todas as promotorias de
justiça criminais e da infância e juventude (infratores) do Estado.
O projeto é uma das prioridades da política criminal da instituição, que é justamente a proteção à
vítima. O NAVV será instalado na Promotoria de Justiça Criminal da Barra Funda, com a finalidade de
prestar apoio integral às vítimas de delitos e atos infracionais violentos e a seus familiares,
oferecendo assistência no campo jurídico, psicológico, social e da saúde. Para tanto, em parceria com
outras instituições, contará com uma equipe multidisciplinar coordenada por um (a) promotor (a) de
Justiça.
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ESTUDOS DO CAOCRIM
1-Tema: Art. 311 do CPP e a atuação provocada do juiz na decretação da prisão preventiva
A redação original do art. 311 do CPP permitia que o juiz decretasse a prisão preventiva de ofício,
quer durante as investigações, quer no processo criminal. Essa possibilidade, antes do advento da Lei
nº 12.403, de 2011, já era objeto de crítica da jurisprudência, a se conferir: “A decretação da
preventiva ex officio, durante a fase do inquérito policial, está vedada pelo sistema acusatório, pois
o juiz foi definitivamente afastado da persecução penal. Como não houve provocação da jurisdição
pelo órgão competente, ao contrário manifestou-se só pelo relaxamento da prisão, não pode o
magistrado agir sponte própria para decretar a prisão preventiva do indiciado. A hipótese só é viável
no curso do processo judicial” (TJDF – HC n. 20090020136564 – Rel. Sandra de Santis, j. 01.10.2009).
Corrigindo tal imperfeição, o dispositivo foi alterado pela Lei 12.403/11, que limitou esse poder
durante as investigações. Nessa fase, vedou a decretação da prisão preventiva “ex officio”, devendo
o juiz aguardar provocação do Ministério Público ou da Autoridade Policial. Já no curso do processo,
o juiz poderia decretá-la independentemente de pedido ou representação nesse sentido.
Mesmo com a mudança, importante parcela da doutrina lecionava que o ideal seria a retirada, do
juiz, desse poder de agir de ofício, como forma de preservação do sistema acusatório, que bem define
a posição de cada um no processo penal. Se ao juiz é dado o poder de julgar e se, para tanto, deve
manter uma posição de equidistância e imparcialidade, seria mais adequado que se deixasse às
partes a possibilidade de requerer a prisão preventiva (inclusive durante o curso do processo),
evitando-se, com isso, qualquer ação do juiz “sponte própria”. A Lei 13.964/19, prestigiando o
sistema acusatório, acabou por acolher os ensinamentos acima, alterando novamente o art. 311 do
CPP, agora proibindo o juiz agir de ofício em qualquer das fases da persecução. A decretação da
prisão preventiva, a exemplo da temporária, depende de provocação.
Vamos, contudo, compreender no que consiste essa provocação. Deve haver pedido expresso do
Ministério Público buscando a prisão cautelar do agente? E se o Ministério Público provocar o juiz a
decretar cautelar diversa da prisão preventiva, pode o magistrado decidir pela cautelar máxima,
determinando a prisão preventiva do investigado/acusado? Isso seria agir de ofício, sem provocação?
De acordo com recente decisão da 6ª. T do STJ, a determinação do magistrado pela cautelar máxima,
em sentido diverso do requerido pelo Ministério Público, pela autoridade policial ou pelo ofendido,
não pode ser considerada como atuação ex officio.
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A decisão que decreta a prisão preventiva, desde que precedida da necessária e prévia provocação
do Ministério Público, formalmente dirigida ao Poder Judiciário, mesmo que o magistrado decida
pela cautelar pessoal máxima, por entender que apenas medidas alternativas seriam insuficientes
para garantia da ordem pública, não deve ser considerada como de ofício.
Isso porque uma vez provocado pelo órgão ministerial a determinar uma medida que restrinja a
liberdade do acusado em alguma medida, deve o juiz poder agir de acordo com o seu convencimento
motivado e analisar qual medida cautelar pessoal melhor se adequa ao caso.
Impor ou não cautelas pessoais, de fato, depende de prévia e indispensável provocação. Entretanto,
a escolha de qual delas melhor se ajusta ao caso concreto há de ser feita pelo juiz da causa. Entender
de forma diversa seria vincular a decisão do Poder Judiciário ao pedido formulado pelo Ministério
Público, de modo a transformar o julgador em mero chancelador de suas manifestações, ou de lhe
transferir a escolha do teor de uma decisão judicial.
Em situação que, mutatis mutandis, implica similar raciocínio, decidiu o STF que "... 3. Prisão
preventiva decretada a pedido do Ministério Público, que, posteriormente requer a sua revogação.
Alegação de que o magistrado está obrigado a revogar a prisão a pedido do Ministério Público. 4.
Muito embora o juiz não possa decretar a prisão de ofício, o julgador não está vinculado a pedido
formulado pelo Ministério Público. 5. Após decretar a prisão a pedido do Ministério Público, o
magistrado não é obrigado a revogá-la, quando novamente requerido pelo Parquet. 6. Agravo
improvido (HC n. 203.208 AgR, Rel. Ministro Gilmar Mendes, 2ª T., DJe 30/8/2021).
Saliente-se que esse é igualmente o posicionamento adotado quando o Ministério Público pugna
pela absolvição do acusado em alegações finais ou memoriais e, mesmo assim, o magistrado não é
obrigado a absolvê-lo, podendo agir de acordo com sua discricionariedade.
Fonte: Processo: RHC 145.225-RO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por maioria, julgado
em 15/2/2022.
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1-Tema: Busca e apreensão. Domicílio como expressão do direito à intimidade. Asilo inviolável.
Exceções constitucionais. Interpretação restritiva. Ausência de fundadas razões. Ausência de
consentimento válido do morador. Indução a erro. Vício da manifestação de vontade. Provas
obtidas. Nulidade.
DESTAQUE:
O art. 5º, XI, da Constituição Federal consagrou o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio,
ao dispor que a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro,
ou, durante o dia, por determinação judicial.
O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral (Tema 280), que o ingresso forçado em
domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo - a qualquer hora do dia, inclusive durante
o período noturno - quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas
circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de
flagrante delito (RE 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010). No mesmo sentido,
neste STJ: REsp 1.574.681/RS.
No caso, apesar da menção a informação anônima repassada pela Central de Operações da Polícia
Militar - Copom, não há nenhum registro concreto de prévia investigação para apurar a conformidade
da notícia, ou seja, a ocorrência do comércio espúrio na localidade, tampouco a realização de
diligências prévias, monitoramento ou campanas no local para averiguar a veracidade e a
plausibilidade das informações recebidas anonimamente e constatar o aventado comércio ilícito de
entorpecentes. Não houve, da mesma forma, menção a qualquer atitude suspeita, exteriorizada em
atos concretos, nem movimentação de pessoas típica de comercialização de drogas.
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Por ocasião do julgamento do HC 598.051/SP (Rel. Ministro Rogerio Schietti, DJe 15/3/2021), a Sexta
Turma desta Corte Superior de Justiça, à unanimidade, propôs nova e criteriosa abordagem sobre o
controle do alegado consentimento do morador para o ingresso em seu domicílio por agentes
estatais. Na ocasião, foram apresentadas as seguintes conclusões: a) Na hipótese de suspeita de
crime em flagrante, exige- se, em termos de standard probatório para ingresso no domicílio do
suspeito sem mandado judicial, a existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de modo
objetivo e devidamente justificadas, de maneira a indicar que dentro da casa ocorre situação de
flagrante delito; b) O tráfico ilícito de entorpecentes, em que pese ser classificado como crime de
natureza permanente, nem sempre autoriza a entrada sem mandado no domicílio onde
supostamente se encontra a droga. Apenas será permitido o ingresso em situações de urgência,
quando se concluir que do atraso decorrente da obtenção de mandado judicial se possa objetiva e
concretamente inferir que a prova do crime (ou a própria droga) será destruída ou ocultada; c) O
consentimento do morador, para validar o ingresso de agentes estatais em sua casa e a busca e
apreensão de objetos relacionados ao crime, precisa ser voluntário e livre de qualquer tipo de
constrangimento ou coação; d) A prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o
ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com
declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que
possível, testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo e
preservada tal prova enquanto durar o processo; e) A violação a essas regras e condições legais e
constitucionais para o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas obtidas em
decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em relação de
causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal do(s) agente(s) público(s) que
tenha(m) realizado a diligência.
Na hipótese em análise, ainda que o acusado haja admitido a abertura do portão do imóvel para os
agentes da lei, ressalvou que o fez apenas porque informado sobre a necessidade de perseguirem
um suposto criminoso em fuga, e não para que fossem procuradas e apreendidas drogas. Ademais,
se, de um lado, deve-se, como regra, presumir a veracidade das declarações de qualquer servidor
público, não se há de ignorar, por outro lado, que a notoriedade de frequentes eventos de abusos e
desvios na condução de diligências policiais permite inferir como pouco crível a versão oficial
apresentada no inquérito policial, máxime quando interfere em direitos fundamentais do indivíduo
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e quando se nota indisfarçável desejo de se criar narrativa que confira plena legalidade à ação estatal.
Essa relevante dúvida não pode, dadas as circunstâncias concretas - avaliadas por qualquer pessoa
isenta e com base na experiência quotidiana do que ocorre nos centros urbanos - ser dirimida a favor
do Estado, mas a favor do titular do direito atingido (in dubio pro libertas).
Em verdade, caberia aos agentes que atuam em nome do Estado demonstrar, de modo inequívoco,
que o consentimento do morador foi livremente prestado, ou que, na espécie, havia em curso na
residência uma clara situação de comércio espúrio de droga, a autorizar, pois, o ingresso domiciliar
mesmo sem consentimento válido do morador. Entretanto, não se demonstrou preocupação em
documentar esse consentimento, quer por escrito, quer por testemunhas, quer, ainda e
especialmente, por registro de áudio-vídeo.
Sobre a gravação audiovisual, aliás, é pertinente destacar o recente julgamento pelo Supremo
Tribunal Federal dos Embargos de Declaração na Medida Cautelar da ADPF 635 ("ADPF das Favelas",
finalizado em 3/2/2022), oportunidade na qual o Pretório Excelso - em sua composição plena e em
consonância com o decidido por este Superior Tribunal no já citado HC 598.051/SP - reconheceu a
imprescindibilidade de tal forma de monitoração da atividade policial e determinou, entre outros,
que "o Estado do Rio de Janeiro, no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, instale equipamentos
de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de
segurança, com o posterior armazenamento digital dos respectivos arquivos". Dessa forma, em
atenção à basilar lição de hermenêutica constitucional segundo a qual exceções a direitos
fundamentais devem ser interpretadas restritivamente, prevalece, quanto ao consentimento, na
ausência de prova adequada em sentido diverso, a versão apresentada pelo morador de que apenas
abriu o portão para os policiais perseguirem um suposto autor de crime de roubo.
Partindo dessa premissa, isto é, de que a autorização foi obtida mediante indução do acusado a erro
pelos policiais militares, não pode ser considerada válida a apreensão das drogas, porquanto viciada
a manifestação volitiva do paciente. Se, no Direito Civil, que envolve direitos patrimoniais disponíveis,
em uma relação equilibrada entre particulares, a indução da parte adversa a erro acarreta a
invalidade da sua manifestação por vício de vontade (art. 145, CC), com muito mais razão deve fazê-
lo no Direito Penal (lato sensu), que trata de direitos indisponíveis do indivíduo diante do poderio do
Estado, em relação manifestamente desigual.
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todos os atos dela decorrentes - relativa ao delito descrito no art. 33 da Lei n. 11.343/2006 -, porque
apoiada exclusivamente nessa diligência policial.
Ressalta-se que, conquanto seja legítimo que os órgãos de persecução penal se empenhem em
investigar, apurar e punir autores de crimes mais graves, os meios empregados devem,
inevitavelmente, vincular-se aos limites e ao regramento das leis e da Constituição Federal. Afinal, é
a licitude dos meios empregados pelo Estado que justificam o alcance dos fins perseguidos, em um
processo penal sedimentado sobre bases republicanas e democráticas.
Processo: HC 674.139-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em
15/02/2022.
COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
Em acréscimo ao que foi decidido pelo STJ no caso em análise, importante lembrar ser válida a
autorização expressa para busca e apreensão em sede de empresa investigada dada por pessoa que
age como sua representante. Aplica-se, no caso, a teoria da aparência. Embora tal teoria tenha
encontrado maior amplitude de aplicação jurisprudencial na seara civil, processual civil e no Código
de Defesa do Consumidor, nada há que impeça sua aplicação também na seara penal.
Contudo, para sua aplicação, há de reforçar a necessidade de conjugação da boa-fé com o erro
escusável e alguns requisitos essenciais. Segundo a doutrina, são seus requisitos essenciais objetivos:
a) uma situação de fato cercada de circunstâncias tais que manifestamente a apresentem como se
fora uma situação de direito;
b) situação de fato que assim possa ser considerada segundo a ordem geral e normal das coisas;
c) e que, nas mesmas condições acima, apresente o titular aparente como se fora titular legítimo, ou
o direito como se realmente existisse.
a) a incidência em erro de quem, de boa-fé, a mencionada situação de fato como situação de direito
considera;
b) a escusabilidade desse erro apreciada segundo a situação pessoal de quem nele incorreu. Assim,
reputa-se válida a autorização de ingresso da autoridade policial no estabelecimento dada por
empregados da empresa, ou quem se apresenta como tal, observados os requisitos supracitados, em
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face da teoria da aparência (RMS 57.740-PE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma,
por unanimidade, julgado em 23/03/2021).
"'A decisão que recebe a denúncia possui natureza interlocutória e emite juízo de mera prelibação.
Logo, não há como reconhecer nulidade na decisão que, ao receber a denúncia, adotou
fundamentação sucinta, como no caso dos autos, notadamente porque expressamente consignado
estarem presentes os requisitos do art. 41 do CPP, com o destaque de não ser o caso de rejeição da
denúncia conforme o art. 395 do mesmo dispositivo legal' (AgRg no HC 535.321/RN, Rel. Ministro
Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 17/3/2020)."
AgRg no RHC 117.623/PR, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 09/11/2021,
DJe 16/11/2021.
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DIREITO PENAL:
1-Tema: Prescrição. Crimes praticados após a alteração legislativa inserida pela Lei 11.596/2007.
"No HC 176.473/RR, o Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou a tese de que o acórdão
condenatório sempre interrompe a prescrição, inclusive quando confirmatório da sentença, seja ao
manter, reduzir ou aumentar a pena anteriormente imposta. [...] A Terceira Seção deste Superior
Tribunal estabeleceu que 'o posicionamento do STF firmado no HC 176.473/RR somente se aplica aos
crimes praticados após a alteração legislativa inserida pela Lei 11.596/2007, que incluiu o acórdão
condenatório no rol das hipóteses de interrupção da prescrição. A delito anterior aplica-se o
entendimento vigente à época, no sentido de que o marco interruptivo da prescrição é apenas a
sentença condenatória recorrível.'"
EDcl no AgRg no REsp 1.432.917/RS, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em
10/08/2021, DJe 16/08/2021.
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COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
O art. 117, inciso IV, do Código Penal foi modificado pela Lei nº 11.596/07 para anunciar que, além
da sentença condenatória, também o acórdão condenatório interrompe o curso da prescrição. Antes,
tão somente a sentença condenatória recorrível era causa de interrupção.
De acordo com a nova redação legal, além da inclusão do acórdão como causa interruptiva
estabeleceu-se que a interrupção ocorre pela publicação da decisão, não pelo julgamento.
Com a edição da lei, duas orientações passaram a debater qual espécie de acórdão condenatório
recorrível teria efeito interruptivo. Há quem sustente que a alteração, alinhando-se a decisões
judiciais recorrentes, contempla somente os acórdãos condenatórios em ações penais originárias e
os reformatórios da absolvição em primeira instância. Por isso, tendo havido condenação em
primeira instância, o acórdão que simplesmente a confirme, negando provimento ao recurso da
defesa, ou que somente majore a pena, não interrompe o prazo prescricional. Aqueles adeptos desta
orientação se alicerçam no fato de que a lei lança mão da partícula “ou” entre as expressões
“publicação de sentença” e “acórdão condenatório”; logo, exclui-se a possibilidade de que ambos
irradiem efeitos interruptivos do prazo fatal.
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Outra orientação sustenta que a interrupção do prazo prescricional se dá inclusive pelo acórdão que
se limita a confirmar a condenação de primeira instância ou a aumentar a pena, segundo, aliás,
deixou claro o relatório do projeto da lei que viria a alterar o Código Penal:
“O texto atual do Código Penal se refere à sentença condenatória recorrível. O Projeto passa a fixar
a data da publicação, não deixando margem a dúvidas quanto ao momento da sentença, que será o
da publicação, e não o de sua prolação. Também o Projeto inclui, nesse inciso, a publicação do
acórdão condenatório recorrível, contemplando a hipótese de confirmação de condenação de
primeira instância em grau recursal”.
“Nos termos do inciso IV do artigo 117 do Código Penal, o Acórdão condenatório sempre interrompe
a prescrição, inclusive quando confirmatório da sentença de 1º grau, seja mantendo, reduzindo ou
aumentando a pena anteriormente imposta".1
Os ministros que votaram pela tese da interrupção o fizeram sob o fundamento de que a prescrição
é uma penalidade pela inércia estatal, o que não se verifica quando atuam os órgãos de justiça
criminal em segunda instância, mesmo que em caráter apenas reiterativo. Além disso, o texto do
inciso IV do art. 117 não faz nenhuma distinção entre o acordão condenatório e o confirmatório, e
não há razões plausíveis para interromper a prescrição quando um réu é absolvido na primeira
instância e condenado na segunda e não o fazer quando é condenado nas duas instâncias.
No STJ a orientação majoritária era de que o acórdão confirmatório não interrompia a prescrição2,
mas ambas as turmas com competência criminal têm conformado seus julgamentos ao que decidiu
o STF:
“[...] 2. Pacífico era o entendimento desta Corte Superior no sentido de que o acórdão que confirma
a condenação, ainda que majore ou reduza a pena, não constitui marco interruptivo da prescrição.
Precedentes. 3. O Plenário do STF, no recente julgamento do AGRG no HC n. 176.473/RR, ocorrido
em 27/4/2020, firmou a tese no sentido de que, nos termos do inciso IV do artigo 117 do Código
2. AgRg nos EDcl no AREsp 359.573/SP, Rel. Min. Antônio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, j. 05/09/2019.
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Mas, segundo o tribunal, essa orientação adotada pelo STF se aplica somente nos crimes cometidos
posteriormente à Lei 11.596/07. Se o crime é anterior, deve ser aplicada a orientação jurisprudencial
precedente, segundo a qual somente o acórdão que reformasse a sentença absolutória tinha efeito
interruptivo.
DESTAQUE:
3. EDcl no AgRg no AREsp 1.625.691/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 02/06/2020.
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Nota-se que não há falar em ausência de autonomia entre a corrupção passiva e a lavagem de
dinheiro, com a consunção do segundo delito pelo primeiro. Isso porque não é possível ao agente, a
pretexto de não ser punido pelo crime anterior ou com o fim de tornar seguro o seu produto, praticar
novas infrações penais, lesando outros bens jurídicos.
Em outras palavras, embora o tipo penal constante no art. 317 do CP preveja a possibilidade do
recebimento da vantagem indevida de forma indireta, quando o agente pratica conduta dissimulada
que lhe permita não apenas a posse do recurso ilícito, mas também sirva para conferir-lhe aura de
legalidade, imprimindo-lhe feição de licitude, deve responder pelo crime de lavagem de dinheiro.
Dessa forma, se for confirmado, a partir do devido processo legal e da consequente disposição de
todos os meios de prova ao alvitre das partes, notoriamente o contraditório e a ampla defesa, que o
denunciado enfunou ares de legalidade ao dinheiro recebido e transferido, estará configurado o
crime de lavagem de capitais.
Processo: APn 989-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Corte Especial, por unanimidade, julgado em
16/02/2022, DJe 22/02/2022.
COMENTÁRIOS DO CAOCRIM
Embora autônomo em relação à infração penal que lhe rende a matéria-prima para a sua prática, o
delito de lavagem de dinheiro pode ser cometido tanto por pessoa distinta, quanto pelo próprio autor
do injusto penal antecedente.
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Países como Alemanha, Áustria, Suécia e Itália não permitem a criminalização da autolavagem,
vinculando, em seus tipos penais, que as condutas de lavagem devem ser praticadas sobre bens ou
valores provenientes de crime praticado por pessoa distinta do autor da lavagem.
Como bem explica o promotor de Justiça Francisco de Assis Machado Cardoso, do MP RJ, a prática
da autolavagem não apenas é possível, como merece efetiva reprimenda estatal. O autor do crime
antecedente, já de posse do proveito financeiro obtido, poderia perfeitamente se satisfazer com os
atos criminosos até então praticados, usufruindo dos bens e valores que já se encontravam à sua
disposição. No entanto, com motivação completamente distinta, ele inicia a prática de uma nova
série de condutas, buscando agora dar aparência de licitude ao recurso por ele obtido com a prática
da infração penal anterior. Portanto, não nos parece razoável afastar a sua punição autônoma pelo
crime de lavagem de dinheiro.
Por outro lado, outro fato que reforça a necessidade de punição da autolavagem é que a lavagem de
dinheiro afeta bem jurídico distinto daquele protegido pela infração penal antecedente, merecendo,
assim, reprimenda penal de natureza autônoma.
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1-Tema: divergência sobre o foro competente para ação penal, com reflexo na atribuição funcional.
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Segundo se apurou, Rafael era gerente de duas unidades da rede Bullguer, onde RICHARD
trabalhou como ajudante de cozinha. Ocorreu, porém, que RICHARD teve seu contrato de trabalho
rescindido e acreditou ser por culpa de Rafael, razão pela qual telefonou para ele, bem como enviou
uma carta para a residência da vítima, ameaçando-o, dizendo “você prejudicou minha vida, vou
estourar sua cara na rua, vou cortar sua língua, espere para ver”.
Recebido o feito pelo Douto Promotor de Justiça em exercício na 1ª Vara Criminal do Foro
Regional II (Santo Amaro), este, após observar que o delito em apuração consubstancia infração de
menor potencial ofensivo, entendeu que, nos termos do art. 63 da Lei nº 9.099/95, o foro
competente para sua apuração seria o do local em que o delito foi praticado, vale dizer, o local em
que a conduta se realizou. Nesse sentido, no caso em apreço, como a ameaça foi praticada por
telefone e por missiva, seria de se presumir que foi perpetrado na residência do sujeito ativo, situada
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na Rua João Rodrigues Nunes, nº 400, Jardim Mutinga, Barueri. Ademais, pontuou que, ainda que
assim não fosse, nos termos do art. 72 do CPP, não conhecido o local da prática delituosa, a
competência seria determinada pela residência do autor do fato. Por esse motivo, requereu a
redistribuição dos autos a uma das Varas do Juizado Especial Criminal da Comarca de Barueri (fls.
59/60), o que foi determinado pelo MM. Juízo a fls. 61.
A MM. Juíza da Vara do Juizado Especial Criminal de Barueri, então, acolheu a manifestação
ministerial e determinou a redistribuição do feito à Vara do Juizado Especial Criminal que tenha
competência na área abrangida pelo Foro Regional II de Santo Amaro (fls. 67/69).
É a síntese do necessário.
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Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do
Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado
(conflito negativo), ou quando dois ou mais deles manifestam, simultaneamente, atos que importem
a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime
Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pp. 486-487).
Pois bem.
Com a devida vênia ao Douto Suscitante, razão assiste ao Ilustre Suscitado; senão, vejamos.
Verte dos autos que o investigado, ex-funcionário de restaurante no qual o ofendido trabalha
como gerente, ameaçou a vítima após ter sido demitido. Segundo relatou o ofendido, uma semana
depois de ser demitido, o investigado ligou para ele, em seu celular, dizendo “você prejudicou minha
vida; vou estourar sua cara na rua; vou cortar sua língua; espere para ver”, e enviou uma carta para
a sua residência contendo as mesmas ameaças.
Inicialmente, cumpre considerar que o crime de ameaça, previsto no artigo 147, caput, do
Código Penal, possui pena máxima cominada de seis meses de detenção, tratando-se de crime de
menor potencial ofensivo. E, neste caso, a definição da competência, nos crimes sujeitos ao Juizado
Especial Criminal, deve ser verificada com base no que dispõe o artigo 63, da Lei nº 9.099/95:
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Ocorre, porém, que o dispositivo transcrito não está isento de controvérsias e suscita dúvidas
quanto à real vontade do legislador. E isto porque, de sua previsão legal, não se extrai ao certo, se
ele buscava a literal previsão do local da prática da infração, como aquele em que a ação é
efetivamente praticada ou, deixando de apontar tecnicamente seu objetivo, elegeu o local onde se
considera praticada a ação, segundo a teoria do resultado, qual seja o local de consumação do delito,
nos mesmos moldes previstos no artigo 70 do CPP.
Com relação a esta peculiaridade da lei, Guilherme de Souza Nucci ensina que a Lei estipulou
uma concorrência de juízos competentes. Vejamos:
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“c) teoria mista: face a expressão dúbia utilizada pelo art. 63 da Lei
nº 9.099/95 - "praticada a infração penal" -, que confere a impressão
de se referir à "execução", mas também parece trazer em si o
significado de "levar a efeito" ou "realizar", que daria o sentido da
consumação, prevalece a orientação segundo a qual a Lei nº
9.099/95 adotou uma teoria mista, podendo o foro competente ser
tanto o do lugar da ação ou omissão quanto o do lugar do resultado,
o que, de certa forma, atende ao critério da celeridade previsto no
art. 62 da Lei nº 9.099/95. (LIMA Renato Brasileiro de. Legislação
Criminal Especial Comentada. 2 ed. Salvador: Jus Podivm, 2014.p.
202).
Portanto, no caso concreto, há de se considerar que não havendo como se precisar onde a
ação delitiva foi deflagrada, pois ausente qualquer informação sobre o local de onde, supostamente,
partiram as ameaças, é prematuro supor que a ação foi deflagrada do endereço residencial do
investigado.
Desta forma: (i) constando dos autos que o ofendido tomou ciência das ameaças em sua
residência, conforme boletim de ocorrência de fls. 02/03; (ii) tratando-se de crime formal, que indica
que a consumação se deu no endereço da vítima, (iii) devendo-se definir a competência nos termos
da legislação especial do juizado (art. 63, da Lei 9.099/95), que pressupõe uma competência
concorrente nos moldes supra expostos; e (iv) sendo incerto o local onde praticada a ação; a
competência no caso concreto deve se fixar pelo local onde ocorreu o resultado do delito, ou seja,
no Juízo da Comarca da Capital.
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