Ácidos e Bases Apostila
Ácidos e Bases Apostila
Ácidos e Bases Apostila
1. INTRODUO
Os cidos e as bases so os tipos de substncias mais presentes no cotidiano, seja nos laboratrios de qumica, nas indstrias (como componentes dos processos de fabricao ou integrando os produtos fabricados), na vida domstica (como produtos de limpeza, por exemplo), nos alimentos (especialmente nas frutas), no interior das clulas (se constituindo na base da vida) ou nos fluidos (suco gstrico, sangue, seiva) dos organismos vivos. Por esta presena to marcante, h muito tempo se procura descrever os cidos e as bases e, desse esforo, surgiram vrias definies para essas substncias. Para os cidos, talvez a forma mais simples de defini-los se dizer que cidos so substncias de sabor azedo. Esta definio vem da ao causada por tais substncias sobre um dos sentidos humanos, o paladar. certo que esta forma no suficiente para descrev-los, mas no deixa de ser usada sempre que alguma fruta ctrica experimentada, especialmente se esta no estiver bem amadurecida. As bases, freqentemente, so associadas sensao saponcea que estas substncias causam ao tato (outro dos sentidos humanos). Outra forma usada para classificar uma substncia como cida ou bsica verificar a ao desta sobre os indicadores. Sabe-se, por exemplo, que o papel de tornassol fica vermelho na presena de um cido e azul na presena de uma base. Este mtodo de classificao, que depende de outro dos sentidos, a viso, continua sendo til, com resultados prticos importantes nos processos de titulao, desenvolvidos para anlises qumicas. Porm, a definio dos cidos e das bases com o uso de indicadores limitada, aplicando-se, somente, a um grupo no muito numeroso de substncias. No sculo XIX, alguns qumicos observaram que, em algumas substncias, o aumento do contedo de oxignio fazia aumentar a acidez dessas substncias. Entre estes qumicos estava Lavoisier, que chegou a propor uma primeira definio, com alguma base cientfica, para os cidos. Na poca, os cidos clordrico, bromdrico e ioddrico j eram conhecidos, mas, no se sabia quais as suas verdadeiras composies. Ao mesmo tempo, j se conhecia a composio de alguns cidos que contm oxignio (oxicidos, como o HNO3 e o H2SO4, entre outros) e j se observava que a acidez crescia com o aumento do percentual do oxignio nesses compostos. Analisando este fato, Lavoisier associou a acidez presena do oxignio nas substncias, considerando este elemento como o gerador da acidez. Isto, porm, nem sempre acontece, pois existem substncias sem oxignio como o HCl - cuja acidez superior de outras que contm oxignio como o HClO e o HClO2. Mesmo essas idias preliminares no tendo sido suficientes para descrever os cidos e as bases, no se pode dizer que sejam erradas. Elas carecem de uma base cientfica segura, podem ser incompletas e, por vezes equivocadas. Mas, se constituram nos passos iniciais para a consolidao dos conhecimentos sobre os cidos e as bases. A partir da, muitos outros passos foram dados, com o surgimento de vrias definies que hoje enquadram quase todas as substncias como sendo cidas ou bsicas. Essas definies tambm mostram que uma mesma substncia pode funcionar como cido sob determinadas condies, ou como base, sob outras condies, conforme est descrito adiante.
1
Todas as chamadas teorias dos cidos e das bases apresentadas a seguir - que na verdade so definies - continuam sendo utilizadas, pois, cada uma delas pode ser aplicada em sistemas apropriados com bastante proveito, dependendo, portanto, de cada situao particular. Alm disso, pode ser visto que as definies mais restritas, mesmo aquelas emitidas preliminarmente, so sempre compatveis com as mais abrangentes.
2. DEFINIES DOS CIDOS E DAS BASES 2.1 - Definio de Arrhenius A primeira definio, com um carter cientfico consistente, para cidos e bases foi proposta por Svante Arrhenius, em 1884, a partir de estudos feitos sobre reaes destas substncias em meio aquoso. Arrhenius definiu como cidos, substncias que possuem hidrognio e reagem com a gua liberando ons hidrognio (H+) e, como bases, substncias que reagem com a gua liberando ons hidroxila (OH-), como acontece nas reaes: HCl(g) + gua(l) H+(aq) + Cl-(aq); e NaOH(s) + gua(l) Na+(aq) + OH-(aq).
Vale ressaltar que a gua auto-ionisvel, estabelecendo o equilbrio: 2H2O + gua(l) H3O+(aq) + OH-(aq), Nesta equao (ou em solues aquosas de um modo geral), o produto das concentraes dos ons hidrnio e hidroxila igual a uma constante, denominada produto inico da gua (Kw), isto : Kw = [H 3O+][OH-]. O valor de Kw sempre igual a 10-14, a 298 K. Porm, as concentraes dos ons H3O ou OH- variam de acordo com as caractersticas e com as concentraes das substncias que sejam adicionadas gua. Partindo deste fato, a definio de Arrhenius pode ser ampliada, incluindo como cidas as substncias que, quando adicionadas gua, formam solues, fazendo aumentar a concentrao do on hidrnio (H3O+ ou H9O4+). Como exemplos podem ser citadas as reaes:
+
Da mesma forma, as bases podem ser definidas como substncias que, adicionadas gua, formam solues, fazendo aumentar a concentrao de ons hidroxila (OH-). Neste caso, podem ser citados como exemplos as reaes: KOH(s) + gua(l) K+(aq) + OH-(aq); NH3(g) + gua(l) NH4+(aq) + OH-(aq) e
NaCN(s) + gua(l) HCN(aq) + Na+(aq) + OH-(aq). importante dizer que, algumas reaes em solventes diferentes da gua, por vezes, mostram comportamento anlogo ao que ocorre em solues aquosas. Isto acontece quando o solvente se auto-ioniza de forma semelhante que acontece com a gua, como o caso da amnia lquida, que estabelece o equilbrio: 2NH3 + amnia(l) NH4+(am) + NH2-(am) Amnio Amideto Kam = [NH4+][NH2-] = 10-33 (a -35 C). Neste solvente, ao se adicionar o gs clordrico, ocorre uma reao, com o aumento da concentrao do on NH4+ (amnio): HCl(g) + amnia(l) NH4+(am) + Cl-(am)
J a adio de hidrxido de sdio amnia, faz aumentar a concentrao do on NH2- (amideto): NaOH(s) + amnia(l) Na+(am) + NH2-(am) + H2O.
Com estas observaes, poderia se extrapolar a definio de Arrhenius e dizer que, nas reaes acima, o HCl um cido por fazer aumentar a concentrao do on amnio e o NaOH uma base por fazer aumentar a concentrao do on amideto. de se convir, porm, que a definio dos cidos e das bases em funo da variao nas concentraes de cada espcie de ction ou de nion formados na auto-ionizao dos solventes pouco razovel. Isto exigiria um referencial inico - ou uma definio de cidos e de bases - para cada solvente usado como meio de reao. Era necessria, portanto, uma soluo mais racional para definir estas classes de substncias, como a que ser apresentada a seguir. 2.2 - Definio Fundamentada no Sistema Solvente. Muitos compostos usados como solventes se auto-ionizam formando ctions e nions, em processos semelhantes aos que acontecem com a gua, conforme pode ser visto nas equaes seguintes: 2H2O 2NH3 H3O+ + OHNH4+ + NH2Kw = [H3O+][OH-] Kam = [NH4+][NH2-]
2H2SO4 2C2H5OH
2CH3COOH CH3COOH2+ + CH3COO- Khac = [CH3COOH2+][CH3COO-] semelhana do que feito para a gua, o produto das concentraes dos ons produzidos pela auto-ionizao, tambm, chamado de produto inico da substncia. Na tabela 1, so apresentados alguns parmetros relativos auto-ionizao destas substncias. Tabela 1 Parmetros de auto-ionizao de alguns solventes. Solvente Produto inico Faixa de pH Ponto neutro H2SO4 10-4 04 2,0 -13 CH3CCOH 10 0 13 6,5 H2O 10-14 0 14 7,0 C2H5OH 10-20 0 20 10,0 NH3 10-29 0 29 14,5 Por analogia, pode-se ampliar a definio de Arrhenius para cidos e bases em soluo aquosa, estabelecendo-se que, em cada solvente desta natureza, cidos so substncias que fazem aumentar a concentrao do ction resultante da autoionizao do solvente e bases so substncias que fazem aumentar a concentrao do nion resultante da auto-ionizao deste solvente. Assim, nas reaes: NH4Cl + amnia(l) NH4+(am) + Cl-(am) e KNH2 + amnia(l) K+(am) + NH2-(am), o cloreto de amnio (NH4Cl) um cido, j que faz aumentar a concentrao do ction (NH4+) originado pela auto-ionizao do solvente (amnia) e o amideto de potssio (KNH2) uma base porque faz aumentar a concentrao do nion (NH2-) formado na auto-ionizao do mesmo solvente. Analisando-se agora a reao do cloreto de amnio com o amideto de potssio: NH4Cl + KNH2 KCl + 2NH3; cido Base Sal Solvente se pode dizer que esta uma tpica reao cido-base, uma vez que o cido (cloreto de amnio), neutraliza a base (amideto de potssio), formando um sal (KCl) e regenerando o solvente (amnia). 2.3 Definio de Bronsted e Lowry A partir de observaes feitas sobre reaes realizadas em diferentes meios, Thomas Lowry, na Inglaterra, e Johannes Bronsted, na Dinamarca, trabalhando simultaneamente, porm, de forma independente, chegaram concluso que uma forma mais conveniente para se classificar os cidos e as bases seria em funo da transferncia de prtons entre as espcies reagentes, independendo do meio em que estas transferncias aconteam.
4
Com este entendimento, em 1923 eles publicaram suas concluses, definindo cidos como sendo substncias doadoras de prtons e bases como sendo substncias receptoras de prtons. Como exemplos, podem ser citadas as reaes: HBr(g) + gua(l) cido Base H3O+(aq) + Br-(aq) cido Base NH4+(aq) + OH-(aq) cido Base NH4Br(s) Sal
A transferncia de prtons entre um cido e uma base sempre um processo rpido, podendo acontecer nas duas direes. Assim, quando um cido - como o HF - ou uma base - como NH3 - so adicionados gua, logo se estabelecem equilbrios dinmicos, que podem ser expressos pelas equaes seguintes: HF(g) + gua(l) H3O+(aq) + F-(aq) cido Base cido Base NH3(g) + gua (l) NH4+(aq) + OH-(aq) Base cido cido Base Estes equilbrios podem ser descritos de forma generalizada, usando-se a equao: cido1 + Base2 cido2 + Bsae1. Nesta equao, a espcie Base1 denominada base conjugada do cido1. Da mesma forma, o cido2 o cido conjugado da Base2. Cada cido com a respectiva base conjugada constituem os pares conjugados das reaes cido-base. A base conjugada de um cido a espcie gerada quando este perde um prton e o cido conjugado de uma base a espcie gerada quando esta recebe um prton. No primeiro equilbrio acima, pode-se dizer que:
o hidrnio (H3O)+ o cido conjugado da base gua (H2O). J no segundo equilbrio diz-se que:
a hidroxila (OH-) a base conjugada do cido gua (H2O); o on amnio (NH4+) o cido conjugado da base amnia (NH3).
Estes exemplos mostram que as espcies constituintes de um par conjugado (cido-base) diferem entre si apenas em um prton. Outra observao importante que: os cidos e as bases fortes, ao reagirem produzem, respectivamente, bases e cidos conjugados fracos. De forma recproca, os cidos e bases fracas, ao reagirem, produzem cidos e bases conjugadas fortes. Por exemplo: HNO3(g) + gua(l) H3O+(aq) + NO3-(aq) cido forte Base fraca cido forte Base fraca
5
NH3(g) + gua (l) NH4+(aq) + OH-(aq) Base fraca cido fraco cido forte Base forte HNO3(aq) + NH3(aq) NH4+(aq) + NO3-(aq) cido forte Base fraca cido forte Base fraca A gua, que numa reao participa como base e na outra como cido, uma substncia classificada como anftera ou anfiprtica. conveniente se fazer algumas consideraes sobre reaes cido-base em meio aquoso, usando a definio de Bromsted-Lowry, j que a maioria destas reaes acontece neste meio. Em primeiro lugar, pode-se dizer que: Um cido forte est completamente deprotonado em soluo; Um cido fraco est incompletamente deprotonado em soluo; Uma base forte est completamente protonada em soluo; Uma base fraca est incompletamente protonada em soluo.
A deprotonao corresponde a perda de um prton e a protonao corresponde ao recebimento de um prton. Nestes processos, a medida da intensidade com que um cido se deprotona ou com que uma base se protona num dado solvente, permite se parametrizar a fora deste cido ou desta base, o que expresso atravs das suas constantes de ionizao ou de outras grandezas, que esto discutidas num item mais adiante. 2.4 - Definio de Lux e Flood Em contraste com a definio de Bronsted, que enfatiza o prton como a principal espcie nas reaes cido-base, a definio proposta por Lux (1939) e ampliado por Flood (1947), descreve o comportamento dos cidos e das bases tendo como referncia a transferncia do on xido (O=) entre as espcies. A reao do xido de clcio (que um anidrido bsico) com o dixido de carbono (que um anidrido cido), realizada em meio aquoso, pode ser descrita pelas seguintes equaes: CaO(s) + H2O(l) Ca(OH)2 CaCO3(s) + 2H2O CO2(g) + H2O(l) H2CO3 Nestas reaes, os produtos das hidrataes so um cido e uma base de Bronsted. Estes, por sua vez, reagem entre si formando um sal (o carbonato de clcio) e regenerando a gua. Conseqentemente, pode-se dizer que a formao do CaCO 3(s) ocorre por tpicas reaes cido-base. Na reao direta entre os dois xidos, sem produo de compostos intermedirios, tambm se forma o carbonato de clcio. CaO(s) + CO2(g) CaCO3(s), ou Ca2+ + O= + CO2 Ca2+ + CO3=.
Conseqentemente, natural se encarar esta reao como, tambm, sendo uma reao cido-base. A diferena, neste caso, que a transferncia que ocorre do on xido e no do on hidrognio. Como ilustraes, outras reaes, com transferncia de oxignio, podem ser citadas: CaO(s) + SiO2(s) CaSiO3(s) 2NaPO 4(s)
3Na2O(s) + P2O5(s)
Nestas reaes, tambm, se constata que os xidos metlicos funcionam como doadores do on xido e os xidos dos elementos ametlicos funcionam como receptores do on xido. Estudando reaes como essas, Lux e Flood definiram bases como sendo doadores de ons xido e cidos como sendo receptores de on xido. Esta definio bastante til quando se estudam reaes que acontecem sem a presena de um solvente, como ocorre nas reaes verificadas a altas temperaturas, o que encontrado nos processos cermicos ou em metalurgia, por exemplo. Um fato importante que estas definies no contrastam com as demais; apenas usam um referencial diferente e, as espcies classificadas como cidos ou como bases segundo Lux-Flood, so, tambm, cidos ou bases segundo as outras definies, como pode ser visto na reao seguinte: MgO + H2O Mg2+ + 2OH-, (Mg + O=) + H2O Base cido Mg(OH)2 ou
De fato, nesta reao, o xido de magnsio funciona como base e a gua como cido, segundo qualquer uma das definies j estudadas. 2.5 - Definio de Lewis No mesmo ano em que Bromsted e Lowry lanaram a sua definio para cidos e bases (1923), G. N. Lewis lanou outra definio para tais espcies, que muito mais abrangente, mas que s veio a alcanar repercusso cerca de dez anos depois. A definio de Lewis no se contrape s outras definies apresentadas. Porm, usa, como novo referencial, a capacidade de recepo ou de doao de pares de eltrons pelas espcies qumicas. Assim que, para Lewis, os cidos so definidos como receptores de pares de eltrons e as bases como doadoras de pares de eltrons. Desta forma, pode-se dizer que, na reao com a gua, para formar o hidrnio (H3O+), ou com a amnia, para formar o on amnio (NH4+), o prton (H+) funciona como cido, uma vez que recebe um par de eltrons da gua ou da amnia. Simultaneamente, a gua e a amnia funcionam como bases, pois doam um par de eltrons para o prton. H+ + : OH2 cido Base H+ + : NH3 cido Base n[H:OH2]+ [H:NH3]+
Da mesma forma, pode ser dito que na reao da amnia com BF 3, este ltimo recebe um par de eltrons do NH3 e, portanto, funciona como um cido, enquanto a amnia, doadora do par de eltrons, funciona como uma base. H3N: Base + BF3 cido H3N:BF3 Aduto
Isto ocorre porque o BF3 uma espcie deficiente de eltrons, tendo somente seis eltrons no seu nvel de valncia. Assim, na presena de um doador de pares de eltrons como o NH3, ele pode completar o seu octeto se ligando a este doador e dele recebendo um par de eltrons. A definio de Lewis inclui grande quantidade de novas espcies qumicas, inicas ou moleculares, como sendo cidos ou bases, que, ao regirem entre si, formam compostos de composio mais complexa do que os sais formados entre os cidos e bases de Arrhenius ou de Bronsted. Estes compostos recebem a denominao genrica de compostos de coordenao, sendo divididos em dois grandes grupos: os complexos e os adutos. Aplicando-se esta definio, pode-se ver que: a) Ctions metlicos podem receber pares de eltrons numa tpica reao cidobase de Lewis, formando os chamados compostos de coordenao. Como exemplos podem ser citadas a hidratao e a aminao do on cobalto(III). Co3+ + 6H2O Co3+ + 6NH3 [Co(H2O)6]3+ [Co(NH3)6]3+
como cidos de Lewis. Podem ser citados o B(CH3)3 e o AlCl3 em reaes do tipo: H3N: + B(CH3)3 H3N:B(CH3)3 AlCl3 + Cl [AlCl4]+
c) Mesmo molculas ou ons com o octeto completos podem rearranjar os seus orbitais de valncia e receber um par de eltrons adicional: CO2 + OHSO3 + H2O HCO3H2SO4
pares de eltrons assumindo configurao superior a de octetos: SiF4 + 2FPF5 + F [SiF6][PF6] [AsCl6]3-
AsCl3 + 3Cl-
e)
Elementos metlicos no estado de oxidao zero, ou at com nmero de oxidao negativo, tambm, podem receber pares de eltrons em seu nvel de valncia, se comportando como cidos de Lewis. Ni Fe Mn+ + + 4CO Ni(CO)4 Fe(CO)5 [Mn(CO)6]-
5CO 6CO
2.6 - Definio de Usanovich M. Usanovich, em 1939, props uma nova definio que amplia ainda mais o conjunto de espcies qumicas que podem ser classificadas como cidos ou como bases. Em sua proposta, Usanovich elimina a restrio contida nas definies de Lewis, nas quais se tem, como referncia, a transferncia de pares de eltrons. Usanovich define cidos como espcies qumicas que reagem com bases, fornecendo ctions ou aceitando nions ou eltrons. J as bases so espcies qumicas que reagem com cidos, fornecendo nions ou eltrons ou se combinando com ctions. Esta definio inclui todas as espcies qumicas classificadas como cidos ou como bases de Lewis e, ainda, as reaes de oxi-reduo, nas quais qualquer nmero de eltrons da camada de valncia pode ser transferido. Exemplos de reaes cido-base de Usanovich, podem ser citados atravs das equaes qumicas: HCl(aq) + F3B WCl6 + + NH3(aq) NH4Cl(aq); :NH3 WCl2 H3N:BF3; 2WCl4.
A primeira destas equaes corresponde a uma reao cido-base, de acordo com quase todas as definies, exceto Lux e Flood. A segunda uma reao cidobase de Lewis e de Usanovich. Na terceira, o CO funciona como base de Lewis e o NO como base de Usanovich. A quarta uma reao de oxi-reduo, podendo ser classificada como reao cido-base, apenas, atravs da definio de Usanovich. A definio de Usanovich tambm contempla quebra de insaturaes que podem ocorrer em algumas reaes cido-base, como ocorre com dixido de carbono reagindo com a hidroxila: OOH + OC O HO CO As definies de cidos e bases de Usanovich raramente so apresentadas nos livros de qumica ou utilizadas por pesquisadores. No incio talvez isto se devesse ao fato da bibliografia em que foram apresentadas ser pouco acessvel aos qumicos das vrias partes do mundo. Hoje, porm, este j no um fato relevante. Muitos criticam as definies de Usanovich por incluir praticamente todas as reaes qumicas. Para estes crticos, aceitando-se a definio de Usanovich, bastaria se usar o termo reao, pois o uso da sentena reao cido-base constituiria uma redundncia.
9
fato, porm, que muitos qumicos preferem usar uma ou mais definies de cidos e bases pelo maior poder de sistematizao que isto pode ensejar. Pode-se verificar, por exemplo, que, para muitas espcies qumicas (inclusive compostos orgnicos normalmente no classificados como cidos ou bases) torna-se mais fcil entender a natureza das suas reaes quando se usam os princpios das interaes dos cidos e bases duros e moles, que sero discutidos mais adiante. Essa resistncia ao uso de novas proposies acontece com frequncia. A definio baseada no sistema solvente tambm sofreu restries. Os crticos da mesma consideravam que bastava identificar os novos cidos e bases, definidos em funo do sistema solvente, como sendo cidos anlogos ou bases anlogas (tendo a definio de Arrhenius como referncia). A controvrsia que se estabelece entre as definies de Usanovich e de Lewis semelhante. Talvez isto acontea em funo do amplo alcance e popularidade que a definio de Lewis j alcanou, somado ao fato de tambm incluir reaes de oxireduo, igualmente estudadas e popularizadas. Existem exemplos, porm, que mostram que a transferncia de pares de eltrons (Lewis) ou de outras quantidades de eltrons (Usanovich), inclusive em tpicas reaes de oxi-reduo, no deve ser um fato importante. Isto pode ser visto na reao de formao da piridina N-xido (C5H5NO). C5H5N: + O C5H5N:O Nesta reao, o nitrognio transfere um par de eltrons para o oxignio, o que a caracteriza como uma reao cido-base de Lewis. Ao mesmo tempo, esta reao, sem dvida, uma reao de oxi-reduo, com o oxignio (oxidante) sendo reduzido pelo nitrognio (redutor). J as equaes: K Na + + Cl KCl NaNH2 + H2
NH3
correspondem tpicos processos de oxi-reduo e no so reaes cido-base de Lewis. Porm, pode-se dizer que, os trs casos, se caracterizam como reaes cidobase de Usanovich. 2.7 - Definio ou Conceito Generalizado dos cidos e das Bases Analisando o conjunto de definies de cidos e bases apresentados, pode-se verificar que, em todas elas, os cidos sempre aparecem como doadores de cargas positivas ou recebedores de cargas negativas. Igualmente se verifica que, em todas as definies, as bases aparecem como doadoras de cargas negativas ou receptoras de cargas positivas. As cargas positivas podem ser o prton (H+) ou outros ctions, enquanto as cargas negativas podem ser eltrons ou nions. Com estas observaes, se podem generalizar as definies de cidos e bases conceituando-se cidos como espcies qumicas doadoras de cargas positivas e bases como espcies qumicas receptoras de cargas negativas. Esta generalizao, alm de incorporar o contedo informativo de vrias definies de cidos e bases, estabelece um princpio que correlaciona a fora dos
10
cidos e das bases densidade eletrnica e estrutura molecular das espcies qumicas. Partindo-se dessas generalizaes possvel, tambm, se estabelecer princpios que correlacionam a fora dos cidos e das bases densidade eletrnica e estrutura molecular das espcies, e, com isto, se ter mais elementos que possibilitem um melhor entendimento dos mecanismos das reaes qumicas ou se poder fazer previses sobre o comportamento qumico das espcies qumicas umas sobre as outras. 3. FORA DOS CIDOS DE BRONSTED Apesar do carter cido ou bsico de uma espcie qumica ser bastante modificado pela presena de solventes, ao longo da histria, por convenincia experimental, as reaes dos cidos e das bases tm sido estudadas, predominantemente em soluo, usando-se gua ou outras substncias como solventes. Como conseqncia, para se compreender os mecanismos das reaes cido-base, importante que se possam estimar os efeitos causados pelos solventes ou, ento, minimiz-los. Para isto, os qumicos tm utilizado vrios procedimentos, entre os quais destacam-se o uso da termodinmica, que permite quantificar os efeitos da solvatao, e o uso de solventes apolares (pouco coordenantes), nos quais estes efeitos so pequenos. Para explicar porque as espcies qumicas podem funcionar como cidos ou como bases, sero discutidas em seguida alguns grupos de substncias semelhantes. Antes, porm, sero discutidas formas de expresso das foras dos cidos e das bases em meio aquoso. 3.1 Fora dos cidos em meio aquoso Uma observao importante, fundamentada nas definies de Bronsted, que uma mesma substncia pode funcionar como cido ou como base. Como j foi explicitado, a gua pode receber um prton de uma molcula cida (como o cido actico, CH3COOH), funcionando como uma base. Porm, tambm pode doar um prton para uma base (como o CN- ou o Na2O), funcionando como um cido, sendo, portanto, uma substncia anfiprtica. Substncias desta natureza podem transferir prtons, inclusive, entre suas prprias molculas, conforme est expresso na reao de auto-ionizao da gua: 2H2O(l) H3O+(aq) + OH-(aq)
A constante de equilbrio desta reao dada pela equao: K = [H3O+][OH-] / [H2O]2 Como a concentrao de gua nas solues aquosas ou em gua pura considerado constante ([H2O] = 55,55...mol/l), o seu valor ao quadrado, presente na equao anterior, multiplicado pela constante de equilbrio da equao resulta numa outra constante, que denominada produto inico da gua (Kw), e a equao assume a forma:
11
Kw = [H3O+][OH-] O valor de Kw igual a 10-14 e, na gua pura, as concentraes dos ons hidroxinio e hidroxilo so iguais entre si, portanto iguais a 10-7 mol/l. Nas solues aquosas, quando se adiciona um cido, a concentrao de H3O+ aumenta e, quando se adiciona uma base, a concentrao OH- aumenta. Porm, nas duas situaes, o produto das concentraes permanece constante, e isto significa que quando a concentrao de um dos ons aumenta, a concentrao do outro on (H3O+ ou OH-) diminui simetricamente. Como as concentraes de H3O+ e de OH- podem variar em muitas ordens de grandeza (de prximo a zero at prximo a 10 -14 M), torna-se conveniente express-las atravs de outros parmetros menos complexos, sendo o pH e o pOH, que so os logaritmos negativos das concentraes destes ons, os mais utilizados. pH = - log[H3O+] e pOH = - log[OH-]
Os valores do pH ou do pOH variam, apenas, entre 0 e 14 podendo constituir escalas muito mais simples do que seriam as escalas de concentrao de H3O+ ou de OH-. Nas solues dos cidos ou das bases fortes, o pH ou o pOH tendem a ser iguais aos logaritmos negativos das concentraes do cido ou da base. Porm, para cidos ou bases fracos, isto no ocorre porque estas substncias no se dissociam completamente. Nestes casos so estabelecidos equilbrios, que podem ser descritos pelas equaes: AB(aq) A(aq)+ + B(aq)Ka = [A+][B-]/[AB]; Nesta equao, Ka (ou Kb) so denominados constante de acidez (ou de basicidade) e a concentrao da gua fica implcita no valor de Ka (ou Kb), j que pode ser considerada constante. No caso especfico do cido actico, o prton transferido deste para a gua e as equaes que expressam o equilbrio qumico estabelecido e a constante de acidez, assumem as formas: CH3COOH(aq) H3O(aq)+ + CH3COO(aq)Ka = [H3O+][CH3COO-]/[CH3COOH] A constante de acidez deste cido a 25 oC 1,8 x 10 -5, o que mostra que apenas uma pequena quantidade do cido actico se dissocia, liberando prtons para a soluo, o que o caracteriza como um cido fraco. Para a amnia, o prton transferido da gua para molculas do NH3 e as equaes que expressam o equilbrio estabelecido e a constante de basicidade, passam a ser: NH3aq) NH4(aq)+ + OH(aq)Kb = [NH4+][OH-]/[NH3]
12
Coincidentemente, o valor do Kb da amnia tambm 1,8 x 10-5 a 25 oC, caracterizando-a como uma base fraca. Da mesma forma que feito para as concentraes dos ons H3O+ ou OH-, conveniente que as constantes de acidez ou de basicidade tambm sejam expressas atravs de valores menos complexos, o que, mais uma vez, pode se pode alcanar usando-se os logaritmos negativos destas constantes, definidos pelas equaes: pKa = - logKa, para os cidos, e pKb = - logKb, para as bases.
Quanto menores os valores das constantes de acidez ou de basicidade, maiores so os valores dos pKa ou dos pKb e mais fracos so os cidos ou as bases correspondentes. Tabela 2 Constantes de acidez, de basicidade, pKa e pKb de alguns cidos e bases cido ou base Ka Kb pKa pKb cido iodridrico, HI 1011 -11 cido perclrico, HClO4 1010 -10 -1 cido tricloroactico, CCl3COOH 3,0 x 10 0,52 cido benzenosulfnico, C6H5SO3H 2,0 x 10-1 0,70 cido idico, HIO3 1,7 x 10-1 0,77 cido sulfuroso, H2SO3 1,5 x 10-2 1,81 -2 cido cloroso, HClO2 1,0 x 10 2,00 cido fosfrico, H3PO4 7,6 x 10-3 2,12 cido cloroactico, CH2ClCOOH 1,4 x 10-3 2,85 cido nitroso, HNO2 4,3 x 10-4 3,37 -4 cido fluordrico, HF 3,5 x 10 3,45 cido frmico, HCOOH 1,8 x 10-4 3,75 cido benzico, C6H5COOH 6,5 x 10-5 4,19 cido actico, CH3COOH 1,8 x 10-5 4,75 -7 cido carbnico, H2CO3 4,3 x 10 6,37 cido hipocloroso, HClO 1,8 x 10-5 7,53 cido hipobromoso, HBRO 2,0 x 10-9 8,69 cido brico, B(OH)3 7,2 x 10-10 9,14 -10 cido ciandrico, HCN 4,9 x 10 9,31 Fenol, C6H5OH 1,3 x 10-10 9,89 cido hipoiodoso 2,3 x 10-11 10,64 Trietilamina, (C2H5)3N 1,0 x 10-3 2,99 -4 Etilamina, C2H5NH2 6,5 x 10 3,19 Dimetilamina, (CH3)2NH 5,4 x 10-4 3,27 Metilamina, (CH3)NH2 3,6 x 10-4 3,44 Trimetilamina, (CH3)3N 6,5 x 10-5 4,19 -5 Amnia, NH3 1,8 x 10 4,75 Hidrazina, NH2NH2 1,7 x 10-6 5,77 Morfina, C17H19O3N 1,6 x 10-6 5,79 Nicotina, C10H14N2 1,0 x 10-6 5,98 -6 Hidroxilamina, NH2OH 1,1 x 10 7,97 Piridina, C5H5N 1,8 x 10-9 8,75 Anilina, C6H5NH2 4,3 x 10-10 9,37 Uria, CO(NH2)2 1,3 x 10-14 13,90
13
Na tabela 2 so apresentados valores de Ka, Kb, pKa e pKb de vrios cidos e bases, e, na tabela 3, so apresentados alguns cidos e as suas respectivas bases conjugadas. Tabela 3 Alguns cidos e as respectivas bases conjugadas cidos Base conjugada Fora cida Frmula Nome Frmula Nome cidos fortes HClO4 Perclrico ClO4perclorato 100% ionizados H2SO4 sulfrico HSO4sulfato cido HI ioddrico I iodeto Ka HBr bromdrico Brbrometo HCl clordrico Clcloreto HNO3 ntrico NO3nitrato H3O+ hidrnio H2O gua cidos fracos Cl3CCOOH tricloroactico Cl3CCOOtricloroacetato HSO4sulfato cido SO4-sulfato -2 -5 10 Ka 10 H3PO4 fosfrico H2PO4 bifosfato HNO2 nitroso NO2nitrito HF fluordrico Ffluoreto HCOOH frmico HCOOmetanoato CH3COOH Actico CH3COOacetato cidos muito H2CO3 carbnico HCO3hidrogenocarbonato fracos H2S sulfdrico HSsulfeto cido + NH4 on amnio NH3 amnia Ka 10-5 HCN ciandrico CNcianeto HSsulfeto cido S-sulfito H2O gua OHhidroxila NH3 amnia NH2amideto H2 hidrognio H- = hidreto CH4 metano CH3on metdio Nos sub-itens seguintes, sero discutidas a acidez ou a basicidade de alguns grupos de substncias. 3.2 Compostos binrios do hidrognio Entre estes compostos esto alguns cidos e bases de uso muito comum pelos profissionais da qumica. Nestes, um parmetro de grande importncia para se entender as suas propriedades qumicas, a prton afinidade (PA). Esta grandeza se relaciona diretamente com as interaes cido-base, razo pela qual alguns aspectos sobre a mesma sero discutidos em seguida. A prton afinidade de uma base definida como a energia necessria para romper a ligao do prton com a base, podendo ser determinada a partir do estabelecimento da entalpia do processo: B(g) + H+(g) BH+(g); H = -PA Esta reao de difcil realizao em laboratrio, mas possvel determinar o valor da prton afinidade (PA) correspondente, usando o ciclo termodinmico seguinte: -HA(BH) B(g) + H(g) BH(g)
14
H = - HI(H) - HA(BH) + HI(BH) PA = - H onde: H = entalpia de reao HA(BH) = entalpia de atomizao; HI(H) = potencial de ionizao do hidrognio e HI(BH) = potencial de ionizao do BH.
Usando-se tcnicas adequadas a cada situao possvel calcular as afinidades protnicas de muitas espcies, algumas das quais esto listadas na tabela 4. A prton afinidade um parmetro importante como indicador da tendncia de uma espcie qumica receber ou perder um prton e, portanto, de funcionar como base ou como cido. A afinidade protnica pode funcionar, ainda, como um bom indicador para se classificar um cido ou uma base como sendo forte ou fraco. Tabela 4 Afinidade protnica e acidez relativa de Afinidade protnica (kJ/mol) CH3NH2OHFCH4 < 1745 1689 1635 1554 ^ SiH3PH2SHClSiF4 < 1554 1548 1474 1395 ^ GeH3AsH2-2 SeHBrGeH4 1509 1500 1420 1355 I1315 hidretos de ametais Acidez relativa NH3 < H2O ^ ^ PH3 < H2S ^ ^ AsH3 < H2Se
HF ^ HCl ^ HBr ^ HI
Para ilustrar o uso deste parmetro sero discutidas, a seguir, as prton afinidades dos hidretos de halognios (HF, HCl, HBr e HI) que esto entre os cidos mais estudados em meio aquoso. Nestes compostos as ligaes HX so covalentes polares, apresentando um carter inico que varia para cada halognio (H+X-). Assim que, dentro da srie, o momento dipolar ( = d x , onde d o comprimento da ligao) de cada molcula diminui do flor para o iodo, conforme se ver na tabela 5. Como conseqncia poderia se pensar que o prton seria liberado mais facilmente do flor do que dos outros halognios. Ou seja: que o HF seria o cido mais forte da srie. Tabela 5 Momento dipolar de algumas espcies. Diferena de Momento dipolar Espcies qumicas eletronegatividade em Debye (D) HH 0,0 0,00 HF 1,9 1,91 HCl 0,9 1,03 HBr 0,7 0,79
15
HI
0,4
0,38
Ocorre, porm, que o comprimento das ligaes entre o hidrognio e os halognios aumenta do flor para o iodo, em virtude do aumento do volume dos tomos desses elementos, provocando a diminuio da energia de ligao e favorecendo a desprotonao das respectivas molculas. Assim, pode-se dizer que a acidez dos haletos de hidrognio cresce na seqncia: HF < HCl < HBr < HI Ao mesmo tempo, se verifica que, entre as bases conjugadas destes cidos, o iodeto (I-) a que apresenta menor afinidade protnica. Portanto, a que deve ser desprotonada com mais facilidade. Pelos dados apresentados na tabela 4, pode-se dizer que a basicidade dos haletos varia na forma: F- > Cl- > Br- > Io que, mais uma vez, indica que a acidez dos haletos de hidrognio cresce do flor para o iodo. Mesmo em presena de solventes, estes efeitos ainda so significativos, e os experimentos mostram que, em soluo aquosa, o HF se comporta como um cido fraco, com uma constante de dissociao igual a 3,5x10 -4, enquanto o HCl, o HBr e o HI tm constantes de dissociao tendendo para valor infinito, sendo, portanto, cidos fortes. Os dados da tabela 4 indicam, ainda, que a acidez dos hidretos dos ametais (em termos das posies na tabela peridica) cresce da esquerda para a direita e de cima para baixo. Isto acontece porque, ao longo de um perodo, medida que o nmero atmico cresce, a eletronegatividade tambm cresce. Uma explicao para o aumento da acidez em cada perodo pode ser dada analisando-se a relao entre a carga do on e o nmero de pares de eltrons isolados da respectiva base conjugada. Assim que, o on amideto (NH2-) uma base conjugada mais forte do que o on hidroxila (OH-), em virtude da relao entre a carga do on e o nmero de pares isolados, no primeiro, ser igual a 1/2; enquanto, no segundo, esta relao igual a 1/3. Esta explicao pode ser mais bem compreendida imaginando-se que, no amideto, a carga do on fica mais concentrada sobre os dois pares isolados do nvel de valncia do nitrognio. J, no on hidroxila, carga semelhante se distribui sobre os trs pares isolados do nvel de valncia do oxignio estando, portanto, mais dispersa, atraindo menos ao prton. 3.3 Acidez de ons metlicos em soluo aquosa Nas solues de sais de metais em gua ocorrem interaes de dimenses variadas entre os ons e as molculas do solvente. Se a interao fraca diz-se que ocorre hidratao dos ons, isto : cada on fica, apenas, envolvido por uma certa quantidade de molculas do solvente. Quando a interao forte, alm da hidratao, ocorre rompimento de ligao HO em algumas molculas de gua e, neste caso, dizse que ocorre uma reao de hidrlise. Como exemplos para estas duas situaes, podem ser descritas as dissolues do cloreto de sdio (NaCl) e do cloreto frrico (FeCl3).
16
No caso do cloreto de sdio, constitudo por um cido conjugado fraco (Na +) e uma base conjugada fraca (Cl-), ocorre apenas hidratao dos ons. Ou seja: NaCl(s) + gua Na(H2O)n+ + Cl(H2O)mJ no caso do cloreto frrico verifica-se que a soluo produzida apresenta carter cido. Isto acontece porque como o on ferro tem uma carga elevada (+3), se liga fortemente ao oxignio da gua, rompendo algumas das ligaes HO, formando espcies como: [Fe(H2O)6]3+ + gua [Fe(H2O)5(OH)]2+ + H3O+ e [Fe(H2O)5(OH)]2+ + gua [Fe(H2O)4(OH)2]+ + H3O+ Esta , portanto, uma reao de hidrlise e, nela, o on Fe3+ funciona como um cido por qualquer das definies que se queira utilizar, exceto a de Lux e Flood. Comportamento semelhante ao do Fe(III) normalmente observado para ctions pequenos (como o Be 2+) ou com cargas elevadas (M+3 ou 4), que apresentam altos valores para o parmetro eletrosttico (), que definido pela equao: = z2/r + d, onde z a carga do on metlico, r o raio inico e d o dimetro da molcula de gua. Na tabela 6 so apresentados indicativos sobre a acidez dos metais em soluo. Tabela 6 Indicativos de acidez de ons metlicos em gua Metais Carga do on Acidez Alcalinos +1 No apresentam Alcalinos terrosos +2 No apresentam, exceto o Be De transio d +2 Muito moderada De transio d +3 Moderada De transio d +4 ou superior Bastante pronunciada 3.4 xidos cidos e xidos bsicos em meio aquoso Os xidos binrios em presena da gua podem se comportar como cidos ou como bases. Vale lembrar que a relao entre a acidez (ou basicidade) e a presena do oxignio nos compostos levou Lavoisier a propor uma definio para cidos e bases, que deixou de ser usada, em virtude de existirem muitos compostos sem oxignio que assumem carter cido (ou bsico) em meio aquoso. Para um grande conjunto de xidos binrios, porm, basta observar se o elemento ligado ao oxignio um metal ou um no-metal para classific-los como xidos cidos ou xidos bsicos. Em geral se verifica que os xidos de no-metais, ao se dissolverem na gua, formam solues cidas, enquanto os xidos de metais formam solues bsicas no mesmo solvente. Estudando-se os oxicidos mononucleares, verifica-se que a acidez depende da eletronegatividade do tomo central, da quantidade de oxignio ao redor deste tomo e do efeito indutivo causado por substituintes. Isto acontece porque estes fatores esto diretamente relacionados com a polaridade da ligao HO. A polaridade, por sua vez, um dos fatores determinantes da interao entre o oxicido e a gua. Esta interao,
17
por fim, a responsvel pela liberao do prton para o meio solvente, fazendo aumentar a concentrao de H3O+ na respectiva soluo. Pode-se ver, por exemplo, que:
o HClO4 e o HNO3 esto entre os cidos mais fortes que se conhece; o HClO2 e o HNO2 so mais fracos do que o HClO4 e o HNO3, respectivamente; o H2SO4 ligeiramente mais fraco que o HClO4 e HNO3; o H2SO3 mais fraco do que o H2SO4; o H2SeO4 mais fraco do que o H2SO4; o H3PO3 e o o H3PO4 tm comportamento anmalo e o H2CO3 e o H3BO3 so muito mais fracos.
Estas afirmaes indicam que, em geral, os cidos mais oxigenados so mais fortes do que os semelhantes menos oxigenados. Ao mesmo tempo, verifica-se que a acidez destes compostos aumenta com a eletronegatividade do tomo central, cujo posicionamento em termos deste parmetro : Cl N > C S > P > B Eletronegatividade cresce Estes efeitos so bem demonstrados atravs dos dados contidos na tabela 7, onde so apresentados alguns parmetros relativos a cidos formados a partir de alguns oxicidos. A principal razo para o aumento do nmero de oxignios fazer aumentar a acidez das espcies conseqncia do aumento da polaridade da ligao OH causada pelo aumento da eletronegatividade do grupo ligado ao oxignio de onde liberado o prton.
Tabela 7 Alguns parmetros relativos oxicidos. Influncias da eletronegativade e do nmero de oxidao. EletronegatiNmero de Estrutura vidade de X oxidao de X cido cido hipoiodoso, HIO I O H 2,7 +1 cido hipobromoso,HBrO cido hipocloroso, HClO cido cloroso, HClO2 cido clrico, HClO3 Br O H Cl O H O Cl O H O Cl O H O O O Cl O H O 3,0 3,2 3,2 3,2 +1 +1 +3 +5
3,2
+7
Forte
18
Da mesma forma, a introduo de outros tomos ou grupos substituintes que faam aumentar a eletronegatividade deste oxignio, tende a fazer aumentar a acidez da substncia. Por exemplo: quando se substitui os hidrognios metlicos do cido actico por tomos de cloro, formando o cido tricloroactico, por induo, a eletronegatividade do grupo ligado ao OH aumenta, polariza mais esta ligao e facilita a liberao do on H+, resultando num cido muito mais forte. H O HCC H OH cido actico Cl O Cl C C Cl OH cido tricloroactico
A anlise de fatos como estes levaram Linus Pauling a propor duas regras importantes sobre o comportamento dos xidos cidos. A primeira regra estabelece que, nos policidos do tipo XO n(OH)m, os valores de pKa podem ser estimados pela expresso: pKa = 8 5n Isto significa que quanto maior o valor de n, maior ser a constante de acidez e, portanto, mais forte ser o cido, como pode ser visto na tabela 8. A segunda regra diz que, nestes cidos, as constantes de acidez sucessivas diminuem da ordem de 10.000 a 100.000 vezes - ou expressando de outra forma, os valores de pKa -aumentam de cinco unidades de uma dissociao para a seguinte. Ou seja: XOn(OH)m + gua H3O+ + XOn + 1 (OH)m 1; Ka1, pKa1 H3O+ + XOn + 2 (OH)m 2; ou Ka2, pKa2
Nestas equaes, m o nmero de grupos OH e n o nmero de tomos de oxignio alm dos integrantes dos grupos OH.
Tabela 8 Relao entre oxigenao e fora dos cidos e das bases N Ka1 Fora do cido
19
3 2 1 0
Isto ocorre porque a carga gerada na formao do nion pode ser mais extensivamente deslocalizada nas espcies com maior nmero de oxignios. Assim, em espcies com muitos oxignios e poucos prtons, como o HNO3 ou o HClO4, a carga negativa dos nions (NO3- ou ClO4-) resultantes da dissociao destes cidos, ficam espalhadas sobre os trs ou quatro tomos de oxignio dos nions, conferindo estabilidade aos mesmos, o que favorece a dissociao dos cidos. Quanto diminuio continuada das constantes de acidez sucessivas (Ka1, Ka2, Ka3), natural esperar-se que isto ocorra, uma vez que o aumento da carga negativa dos nions formados, certamente dificulta a sada de mais um prton de uma espcie que j est com carncia de carga positiva. Sobre os xidos metlicos, como j foi dito anteriormente, de um modo geral, eles reagem com a gua produzindo hidrxidos ou formando solues bsicas, especialmente se estiverem em baixo estado de oxidao, em processos como: Na2O(s) + H2O(l) 2NaOH(aq); Na2O(s) + gua 2Na(aq)+ 2OH(aq)- ou Fe2O3(s) + 3H2O(l) 2Fe(OH)3(s) A tendncia dos xidos metlicos em formar bases est diretamente relacionada ao parmetro eletrosttico da ligao MO, verificando-se que, quanto mais inica for a ligao, maior a possibilidade do xido funcionar como base. Por esta razo, num mesmo grupo da tabela peridica, para um mesmo estado de oxidao, a basicidade dos xidos cresce de cima para baixo. Verifica-se, por exemplo, que entre os xidos dos alcalinos terrosos, o BeO anftero (como se pode ver no diagrama seguinte), enquanto os demais (MgO, CaO, SrO e o BaO) so bsicos.
Grupos
15
16
17
As Sb Bi representativos
Os xidos metlicos anfteros produzem reaes cidas ou bsicas, dependendo do meio reacional em que estejam, como visto nas reaes dos xidos de berlio ou alumnio.
20
BeO(s) + H3O+ + H2O [Be(OH)4]2-(aq) Al2O3(s) + 6H3O+(aq) + 3H2O 2[Al(OH)6]3+(aq) Al2O3(s) + 2OH-(aq) + 3H2O 2[Al(OH)4]-(aq BeO(s) + H3O+ + H2O [Be(OH)4]2-(aq) Alguns elementos do bloco d, como mostra o diagrama seguinte, tambm apresentam este comportamento. O ZnO, por exemplo, pode neutralizar o H3O+ ou o HO-, formando compostos de coordenao, atravs de reaes como: ZnO(s) + 2H3O+(aq) + H2O(l) [Zn(H2O)4]2+, ou
Anfteros
Estudos sobre hidrocarbonetos mostram que quanto maior a eletronegatividade dos tomos de carbono que funcionem como centros cidos, maior a sua acidez. Assim, na srie de hidrocarbonetos etano (C2H6), eteno (C2H4) e etino (C2H2), a acidez cresce do primeiro para o ltimo ou, pode-se dizer, tambm, cresce com o aumento do carter s do orbital de valncia do carbono, conforme pode ser visto na ilustrao seguinte. Hidrocarboneto Etino HCCH H H
21
Carter s 50,00 %
Orbitais hbridos sp
Fora cida
Etano H
CC H H H HCCH H H
33,33 %
sp2
Etano
25,00 %
sp3
Este fato talvez se torne mais compreensivo raciocinando-se sobre o efeito causado pelo aumento do nmero de tomos de hidrognio na eletronegatividade dos tomos de carbono. Como o hidrognio menos eletronegativo do que o carbono, quando mais tomos de hidrognio vo se ligando aos carbonos, estes vo recebendo mais eltrons e se tornando menos eletronegativo. Com isto, a polarizao das ligaes CH diminui e, conseqentemente, as possibilidades de rompimento destas ligaes, liberando H+, tambm diminui, do etino para o etano (C2H2 > C2H4 > C2H6). Pode-se raciocinar, ainda, da forma: O carbono menos saturado deve ter maior capacidade para receber eltrons, sendo, portanto, mais cido do que os mais saturados. 3.6 Basicidade de alguns derivados da amnia Os principais derivados da amnia so as aminas e, estas se caracterizam por apresentar os tomos de hidrognio substitudos por um (amina primria, RNH2), dois (amina secundria, R2NH) ou trs (amina terciria, R3N) grupos alquilas ou arilas ( R ). Nestes compostos, a basicidade bastante afetada pelos grupos substituintes, sendo aumentada ou diminuda em funo da maior ou menor capacidade doadora ou receptora destes grupos. Se a substituio feita por espcies receptoras de eltrons, como os halognios, a basicidade diminui. Por outro lado, se a substituio for feita por grupos doadores, como o CH3, a basicidade aumenta como pode ser verificado nos compostos: F3N H3N (CH3)3N
F F F
N:
H H H
Basicidade cresce Acidez cresce N:
Nestes compostos, o flor (o elemento mais eletronegativo da tabela peridica) torna o nitrognio menos doador de eltrons. Conseqentemente, a trifluoroamina menos bsica do que a amnia. J o CH3 (que um grupo doador, em virtude do carbono est ligado a trs tomos de hidrognio, que um elemento de baixa eletronegatividade) torna a trimetilamina mais bsica do que a amnia.
22
Em meio aquoso, pode-se dizer que o pK b das aminas, de uma forma genrica, se refere a equaes qumicas do tipo: RmNHn + H2O RmNHn+1 + OHNestas reaes, conforme indicado pelos valores de pKb apresentados na tabela 9, a variao da basicidade no uniforme para cada adio de um grupo substituinte. Para as alquilaminas, a adio do primeiro substituinte faz aumentar significativamente a basicidade do composto. A adio do segundo grupo aumenta numa intensidade menor, o que compreensvel pelo fato do nitrognio j haver satisfeito parcialmente sua necessidade de cargas negativas. Porm, a adio do terceiro grupo faz diminuir o pKb para um valor prximo (ou at maior) do que o apresentado pelas monoalquiaminas.
Tabela 9 Basicidade da amnia e de algumas aminas Amina Nome NH3 Amnia NH2OH Hidroxialmina NH2NH2 Hidrasina MeNH2 Metilamina Me2NH Dimetilamina Me3N Trimetilamina EtNH2 Etilamina Et2NH Dietilamina Et3N Trietilamina i-PrNH2 Isopropilamina i-Pr2NH Diisopropilamina i-BuNH2 Isobutilamina i-Bu2NH Diisobutilamina i-Bu3N Triisobutilamina
pKb 4,74 7,97 5,77 3,36 3,29 4,28 3,25 2,90 3,25 3,28 2,95 3,51 3,32 3,58
Isto poderia ser explicado pelo aparecimento de impedimentos estricos, causados pelo maior volume ocupado pelos grupos R, que dificultariam a entrada do prton na camada de valncia do nitrognio. Ocorre, porm, que o prton muito pequeno e, conseqentemente, no deve sofrer efeitos dessa natureza. Se existissem, estes efeitos seriam mais relevantes nas trialquilaminas, onde todos os hidrognios foram substitudos por grupos maiores. Porm, dados relativos prton afinidade das metilaminas mostram que, no estado gasoso, a basicidade relativa destes compostos aumenta na seqncia: NH3 < MeNH2 < Me2NH < Me3N, o que indica que o fator estrico no deve ser importante na interao destas aminas com o prton. Portanto, a aparente anomalia observada nos valores de pK b deve ser causada por algum fator relativo solvatao das aminas que, certamente, envolve vrios outros fatores alm da simples protonao do nitrognio.
23
Uma melhor compreenso, sobre a no uniformidade no comportamento das aminas quando tm os seus hidrognios substitudos por grupos alquila ou arila, pode ser alcanada analisando-se as equaes qumicas seguintes:
H O H + RNH2 + 4H2O OH + RN H H O H
H O H
H H O H
H H
O H
24
Como pode ser visto, na primeira amina (a menos substituda) pode se formar um maior nmero de ligaes de hidrognio, o que favorece o estabelecimento de uma solvatao mais intensa com possibilidade de uma maior basicidade. A medida que os hidrognios vo sendo substitudos por grupos R, a intensidade da solvatao diminui, fazendo a basicidade, tambm, diminuir. Porm, no se deve esquecer o efeito doador dos grupos R, que tendem a fazer aumentar a basicidade da amina. Portanto estabelecido um confronto entre a diminuio da capacidade de solvatao e o aumento da capacidade doadora causada pelos grupos R, influindo, em sentidos contrrios sobre a basicidade e, pelos dados da tabela 8, conclui-se que o efeito doador favorecido pela entrada do terceiro grupo R suplantado pela diminuio na solvatao nas aminas tercirias. 3.7 Fora dos cidos e das bases de Lewis de se esperar que quanto maior a capacidade de uma espcie qumica em receber pares eletrnicos, maior seja a sua acidez de Lewis. Similarmente, quanto maior a capacidade de uma espcie doar pares eletrnicos, maior deve ser a sua basicidade. Assim, pode-se dizer que a basicidade de Lewis dos derivados trisubstitudos da amnia variam na ordem inversa da eletronegatividade dos substituintes, como se ver na seqncia: (CH3)3N > H3N > F3N Da mesma forma, a acidez de Lewis dos boranos trisubstitudos, aumenta com o crescimento da eletronegatividade dos substituintes, ou seja: (CH3)3B < H3B < F3B Existem, porm, outros fatores que podem alterar esta correlao da acidez (ou basicidade) com a eletronegatividade. Tomando-se como exemplos os haletos de boro, poderia se pensar que acidez de Lewis observaria a ordem: BF3 > BCl3 > BBr3. No entanto, experimentalmente, o que se verifica o oposto. Isto : BF3 < BCl3 < BBr3 Isto acontece porque, como os haletos de boro tendem a ser planares, com o boro hibridizado em sp2, o orbital p vazio deste tomo estabelece ligaes com orbitais cheios dos haletos, tornando-se mais estveis. Estas ligaes so mais fortes entre o boro e o flor, em virtude dos dois apresentarem dimenses aproximadas e, conseqentemente, simetria adequada para fazer ligaes bem efetivas. Quando o boro se liga a um quarto tomo, o grupo BX 3Y formado assume a simetria piramidal, rompendo a ligao (BX). Como esta ligao mais forte com o flor (F), ento o BF3 ser o composto que resistir mais a uma interao com uma base, seguido pelo BCl3. Pela mesma razo, os steres do tipo B(OR) 3 so cidos de Lewis extremamente fracos.
25
No caso das aminas descritas anteriormente, era de se esperar que a basicidade de Lewis sempre aumentasse da amnia para as aminas tercirias. Porm, observa-se que isto no acontece, e isto fcil de ser entendido. Basta lembrar que, para a interao cido-base ocorrer, necessria a aproximao dos centros doadores e receptores de pares de eltrons e que a entrada de um maior nmero de grupos alquil ou aril em torno destes centros vai ocupar um maior espao em torno do tomo de nitrognio, dificultando a aproximao dos cidos de Lewis que poderiam se coordenar ao centro bsico (nitrognio), especialmente se este cido tambm for volumoso. Como ilustrao para isto, pode-se analisar o composto formado pela adio da tripropilamina (C3H7)3N ao trietilborano B(C2H5)3, que o aduto tripropilaminatrietilborano (C3H7)3N:B(C2H5)3, ou seja:
CH3 CH2
N
CH3 CH2
B CH2
CH3 CH2
CH2
CH2
CH2
CH3
Durante a formao deste composto, desenvolvida uma tenso frontal (FStrain) devido a aproximao dos grupos ligados ao N e ao B nas molculas da tripropilamina (C3H7)3N e o trietilborano B(C2H5)3, dificultando a ligao entre o cido e a base. Outro fator que afeta a basicidade das aminas o nitrognio tender a assumir a hibridizao sp3, ficando com estrutura tetradrica. Quando a amnia se liga a um prton esta tendncia plenamente satisfeita. Porm, quando ocorre a substituio dos hidrognios por grupos volumosos o nitrognio tende para a hibiridizao sp2, com estrutura planar, como pode ser visto nos modelos seguintes:
R1 R1 R1 N R2
R2 R2 N R3
R3 N R3
Nestes modelos o volume dos grupos R aumenta de R1 para R3 (R1 < R2 < R3) e, nas espcies qumicas correspondentes, a densidade eletrnica, nos espaos ocupados pelos substituintes, fora a reorientao do orbital ligante que contm o par de eltrons isolados da base (nitrognio), quebrando a simetria tetradrica.
26
Este efeito sendo mais forte em aminas com substituintes mais volumosos, o que gera instabilidade (pela repulso entre os grupos R dentro da prpria base, B-strain), independendo do cido ao qual ele venha a se ligar. Alm disso, quando ocorre a coordenao, o grupo a se ligar amina (o cido) fora os grupos R da amina na direo inversa, tendendo a faz-la recuperar a simetria tetradrica, o que no ser to fcil se os grupos R forem volumosos. 4. CIDOS E BASES DUROS E MOLES H muito tempo os qumicos vm observando que os ons metlicos podem ser divididos em dois grupos, tendo como referncia os tipos de bases com as quais tenham preferncia em se combinar. Verifica-se que para um dado grupo de bases (que na qumica de coordenao so chamadas de ligantes), existe um grupo de metais (sobretudo ons metlicos) que funcionam como cidos de Lewis formando compostos de coordenao (complexos e adutos) mais estveis. E existe um outro grupo de bases que forma compostos de coordenao mais estveis com outro grupo de ons metlicos, conforme est expresso na tabela 10. Tabela 10 Estabilidade dos compostos de coordenao em funo dos cidos e das bases. Compostos de Compostos de coordenao dos coordenao dos metais do tipo a. Bases (ou ligantes) metais do tipo b. R3N R2O F-
Estabilidade
Estabilidade
BrBrI-
Pode-se observar que os ons dos metais alcalinos, dos alcalinos terrosos, outros ons metlicos leves com carga elevada e umas poucas espcies moleculares formam compostos mais estveis com bases tambm leves e bastante compactas. Estas espcies qumicas constituem o grupo a. Por outro lado, ons de metais mais pesados, com nmero de oxidao baixo (podendo ser at negativos nas carbonilas e nitrosilas metlicas) e algumas espcies moleculares formam compostos mais estveis com bases mais pesadas e menos compactas. Estas espcies constituem o grupo b. Analisando-se estes grupos de ons ou tomos metlicos, verifica-se que as espcies do grupo a, bem como as bases que interagem melhor com eles, so pequenos, eletronicamente mais densos e pouco polarizveis. Por estas caractersticas, R. G. Pearson props a denominao de cido ou bases duros, para as espcies integrantes do grupo a. Neste grupo podem ser citadas, como cidos duros, as espcies catinicas ou moleculares seguintes: Li+, Na+, Be2+, Ca2+, Sc3+, U4+, Ti4+, Cr3+, Fe3+, Co3+, Sn4+, BF3, BCl3, CO e N3+. Como bases duras, integrantes do mesmo grupo, podem ser citadas as espcies:
27
NH3, RNH2, N2H4, H2O, OH-, O2-, F- e Cl-. J as espcies inicas, atmicas ou moleculares do grupo b, juntamente com as bases que interagem mais fortemente com elas, so mais volumosas, eletronicamente menos densas e mais polarizveis e, por isto, Pearson props a denominao de cidos ou bases moles para as espcies integrantes deste grupo. Como exemplos de cidos deste grupo, podem ser citadas as espcies: Pd2+, Pt2+, Cu+, Ag+, Au+, Hg2+, Ti+, Tl+, Br+, I+, O, Cl e N. Como bases, podem ser citados os ons e molculas: H-, R-, CN-. CO, SCN-, R3P, S2O3, R2S e I-. Os termos duro e mole esto relacionados polarizabilidade dos metais e dos ligantes, e esta grandeza est associada a energia de ligao entre os eltrons de valncia e os respectivos ncleos do cido ou da base. Para uma melhor compreenso, pode-se dizer tomos pequenos (ionizados ou no) so menos polarizveis do que tomos maiores com mesma configurao eletrnica no nvel de valncia, conforme pode ser visto nas ilustraes seguintes:
a) ons isolados
b) Espcies do grupo a, pouco polarizados, mmcom a ligao cido-base tendendo para mmeletrosttica.
c) tomos ou ons do grupo b, bastante polarizveis, com as interaes cido-base tendendo para covalente. Observaes sobre a formao dos compostos de coordenao levaram Pearson a estabelecercomo princpios que, de forma genrica: os cidos duros interagem mais fortemente com as bases duras e os cidos moles interagem mais fortemente com as bases moles. Nas tabelas 11 e 12 esto relacionados vrios cidos e bases, classificados segundo suas dureza ou moleza. a partir das quais possvel se equacionar um grande
28
Tabela 11 Alguns cidos classificados entre duros e moles. cidos Duros Mdios Moles H+, Li+, Na+, K+ (Rb+, Cs+) Fe2+, Co2+, Ni2+, Cu2+, Zn2+ CO(CN)52-, Pd2+, Pt2+, Pt4+ Be2+, Be(CH3)2, Mg2+, Ca2+, Sr2+ (Ba2+) Sc+3, La+3, Ce4+, Gd3+, Lu3+, Th4+, U4+, UO22+, Pu4+ Ti4+, Zr4+, Hf4+, VO2+, Cr3+, MO3+, Cr6+, MO3+, WO4+, Mn2+, Mn7+, Fe3+, Co3+ BF3, BCl3, Al3+, Al(CH3)3, AlCl3, AlH3, Ga3+, In3+ CO, RCO+, NC+, Si4+, Sn4+, CH3Sn3+, (CH3)2Sn2+ N3+, RPO2+, ROPO2+, As3+ SO3, RSO2+, ROSO2+ Cl3+, Cl7+, I5+, I7+ HX Rh3+, Ir3+, Ru3+, Os2+ B(CH3)3, GaH3 R3C+, C6H5+, Sn2+, Pb2+ NO+, Sb3+, Bi3+ SO2 Cu+, Ag+, Au+, Cd2+, Hg22+, Hg2+, CH3Hg+, BH3, Ga(CH3)3, GaCl3, GaBr3, GaI3, Tl+, Tl(CH3)3 CH2, carbenos Aceptores , nitrobenzeno, quinonas, tetracianoetileno HO+, RO+, RS+, RSe+, Te4+, RTeO+ Br2, Br+, I2, I+, ICN O, Cl, Br, I, N, RO, RO2 tomos metlicos M0
Tabela 12 Alguns bases classificadas entre duras e moles. Bases Duras Mdias NH3, RNH2, N2H4 C6H5NH2, C5H5N, N3-, N2 HH2O, OH-, O2-, ROH, RO-, NO2-, SO3-, R2O CH3COO-, CO32-, NO3-, Br32PO4 , SO4 , ClO4 F- (Cl-)
Moles
R-, C2H4, C6H6, CN-, RCN, CO SCN-, R3P, (RO)3P, R3As R2S, RSH, RS-, S2O32-
29
5. PARMETROS TERMODINMICOS DE CIDOS E BASE. A estabilidade de uma espcie qumica definida pelos seus parmetros termodinmicos (H, S e G). Porm, nem sempre estes parmetros podem ser determinados com facilidade. Procurando superar esta dificuldade, em 1965, R. R. Drago e B.B. Wailand propuseram uma forma para se calcular a entalpias de formao em reaes envolvendo cidos e bases de Lewis. Pelo mtodo proposto, a entalpia de reao cido-base, equacionada na forma: A + B AB; dada por: - Hr = EA.EB + CA.CB. Hr
Nesta equao, Hr a entalpia de formao do aduto, EA e EB so parmetros relacionados suscetibilidade do cido e da base formarem ligaes inicas e CA e CB so parmetros relacionados a suscetibilidade do cido e da base se ligarem por covalncia. Estes parmetros, tambm conhecidos como parmetros de Drago-Wayland (tabela 13), so determinados empiricamente, a partir das entalpias de formao de adutos resultantes de reaes entre cidos e bases em solventes inertes (apolares ou no-coordenantes) ou no estado gasoso. Para se determinar os valores de E e de C, inicialmente, se atribui valores arbitrrios para os mesmos e, a partir destes, se calcula os valores finais, usando-se entalpias de reaes determinadas experimentalmente como referencias. Com estes dados possvel se estimar as entalpias de reao em processos inditos com uma preciso menor do que 3kJ mol-1. Como exemplo, pode ser citada a reao da trimetilamina com o dixido de enxofre. Para esta pode-se escrever: (CH3)3N + SO2 (CH3)3NSO2 ; Hr(exp) = - 40,2 kj mol-1
- Hr(calc) = ESO2E(CH3)3N + CSO2C(CH3)3N - Hr(calc) = 0,56 x 1,21 + 1,52 x 5,61 - Hr(calc) = 9,2048 kcal mol-1 Hr(calc) = - 38,5 kJ mol-1 Erro = - 1,7 kJ mol-1; ou Erro = 4,22 %
Por este mtodo j foi possvel se determinar entalpias de formao de milhares de adutos e centenas dessas determinaes apresentam excelente correlao com dados experimentais obtidos em laboratrio.
30
Tabela 13 - Parmetros de Drago-Wayland para alguns cidos e bases cido EA CA Base EB CB I2 0,50 2,00 NH3 2,31 2,04 H2O 1,54 0,13 MeNH2 2,16 3,12 H2S 0,77 1,46 (Me)2NH 1,80 4,21 HF 2,03 0,30 (Me)3N 1,21 5,61 HCN 1,77 0,50 C5H5N 1,78 3,54 CH3OH 1,25 0,75 C5H5NO 2,29 2,33 C6H5OH 2,27 1,07 CH3CN 1,64 0,71 C2H5OH 1,34 0,29 CH3COCH3 1,74 1,26 AsF3 1,48 1,14 (C2H5)2O 1,80 1,63 SbCl5 3,61 2,51 (CH3)2SO 2,40 1,47 ICl 2,49 0,41 C6H6 0,70 0,45 BF3 4,83 0,79 CH3OH 1,80 0,65 (Me)3B 3,01 0,83 C2H5OH 1,85 1,09 CHCl3 1,48 0,08 (CH3)2S 0,24 3,92 CHF3 1,32 0,91 (CH3)3P 1,46 3,44 Uma limitao para aplicao deste mtodo de determinao de interaes entre cidos e bases que ele, em princpio s pode ser aplicado reaes que se processem no estado gasoso ou em solventes no coordenantes. Porm, alm das aplicaes que se pode fazer com resultados muito prximos dos reais, ainda possibilita tornar mais consistentes a aplicao dos conceitos duro e mole. Ou seja, pode-se acrescentar classificao dos cidos ou bases como duros e moles, os qualificativos forte e fraco, ampliando as possibilidades de se fazer anlises de processos com uma fundamentao mais concreta. Finalizando estas consideraes, pode ser dito que todos os conceitos, teorias ou definies a respeito dos cidos e das bases certamente trazem mais subsdios para que se possam entender as reaes qumicas com mais facilidade, uma vez que permitem enquadrar um nmero de espcies qumicas cada vez maior nestas classes de substratos, tratando as interaes entre estas atravs de um conjunto de propriedades no muito numeroso. 6. SUPERCIDOS E A FUNO ACIDEZ DE HAMMET Muitas solues lquidas no aquosas apresentam acidez at cerca de 1010 vezes mais elevada do que solues concentradas de cidos como o ntrico ou o sulfrico em meio aquoso, que esto entre os cidos mais fortes que se conhece neste meio.
31
Estes sistemas so conhecidos como supercidos e, muitos deles, so capazes de protonar praticamente todos os compostos orgnicos, apesar de muitos destes, no serem bons receptores de prtons. O comportamento supercido no existe em solues aquosa porque o cido mais forte que se pode ter neste meio o H 3O+. Assim, um supercido em meio aquoso tende a ser consumido, protonando a gua, com o meio podendo ficar, apenas, com a acidez dos ons hidrnio (H3O+). Logicamente para se medir a acidez de um meio com essas caractersticas no se poderia usar a escala de pH, uma vez que esta se limita valores entre 0 e 14, sendo que, perto destes limites, as solues comeam a assumir comportamento diferente do que seria esperado em termos de acidez ou basicidade, tomando-se como base as suas concentraes. Para superar este problema Hammet props um novo parmetro - a funo acidez, H0 - que funciona como se fosse uma continuao da escala de pH com valores abaixo de zero, sendo definida pela equao: H0 = pKBH+ - log[BH+]/[B] onde B uma base indicadora, BH+ o cido conjugado desta base e pK BH+ o pKa deste cido. Como os valores destes dois ltimos parmetros so conhecidos para muitos indicadores, torna-se fcil definir os valores de H0. Os valores de H0 de uma soluo podem ser obtidos atravs da espectrofotometria, determinando-se as concentraes BH+ e B e resolvendo-se a equao acima., onde o valor de pKBH+ conhecido para muitos indicadores. Para uma soluo de cido sulfrico a 60 % em peso, por exemplo, usando-se a 2,4-dinitroanilina como indicador (pKBH+ = - 4,38), verifica-se que o valor de H0 - 4,32. Porm, solues mais concentradas de H2SO4, o valor da funo acidez pode chegar a 12 ou at 15, se for adicionado SO3 at formar a soluo conhecida como oleum. Os meios supercidos mais aplicados pelos qumicos so obtidos dissolvendo-se AsF5 ou do SbF5 em cido fluordrico ou cido flurosulfnico (HSO3F). SbF5 + 2HF SbF5 + HSO4F SbF6- + H2F+ SbF5OSO2F - + H2SO3+
Como o SbF5 um cido de Lewis muito forte, os dois complexos de antimnio formados nas reaes so muito estveis. Por outro lado, os dois ctions formados duplamente protonados convertem-se em cidos de Bronsted muito fortes. Isto : convertem-se em supercidos. Um dos meios supercidos mais presente nas industrias qumica ocorre na produo do H2SO4, que resulta da reao do anidrido sulfrico (SO3) com a gua. SO3 + H2O H2SO4 ; H << 0 Ocorre, porm, que esta reao extremamente exotrmica, trazendo o problema de remover grande quantidade de calor dos reatores usados na fabricao. Ocorre, porm, que o SO3 um cido de Lewis forte (podendo receber um par de eltrons sobre o enxofre) e uma base de Lewis fraca (no liberando facilmente pares de eltrons dos tomos de oxignio). Isto possibilita a que se conduza o processo de fabricao por uma rota em que as liberaes de calor so menores, realizando-o em duas etapas.
32
Inicialmente se dissolve o trixido de enxofre em cido sulfrico j produzido, formandose o supercido conhecido como leum, j mensionado, ou seja:
O S O O : S
O O O
O S
O S O O
O H
O H
SO3
H2SO4
H2S2O7
Depois o H2S2O7 hidrolisado, se convertendo em cido sulfrico, que um processo muito menos exotrmico. H2S2O7 + H2O 2H2SO4
33