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Texto Revista UFMG Declaracao Estocolmo

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Pedro Motta, Espaço confinado [Confined Space] 2012. Fotografia [photo].

Impressão de tinta mineral em papel de algodão e terra [mineral print on cotton paper and earth] 45 x 45 cm cada [each]
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declaração da conferência de estocolmo sobre meio ambiente humano, meio século depois: entre o sonho e a realidade
douglas assis

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DECLARAÇÃO DA
CONFERÊNCIA DE
ESTOCOLMO SOBRE
MEIO AMBIENTE
HUMANO, MEIO SÉCULO
DEPOIS: ENTRE O SONHO
E A REALIDADE
doi: https://doi.org/10.35699/2316-770X.2022.39294

Ana Carolina Mendes dos Santos* Geraldo Mendes dos Santos**


resumo A Declaração da Conferência da ONU sobre Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, Suécia, de 5 a
16 de junho de 1972, completa meio século e coincide com a pandemia da covid-19 que já dura dois anos e tem trazido
profundas alterações nos padrões socioeconômicos, nas estratégias políticas e nos hábitos pessoais e coletivos. Trata-
-se, evidentemente, de um momento histórico e que se enquadra perfeitamente no âmbito de um projeto destinado a
potencializar a ideia do verbo reconstruir, ou seja, reavaliar resultados, recompor metas, redefinir trajetórias e restaurar
objetivos. A proposta do presente ensaio é examinar os princípios dessa Declaração à luz da realidade brasileira e mais
especificamente da Amazônia, uma região emblemática do esforço mundial em compatibilizar progresso com preserva-
ção da biodiversidade e dos ecossistemas.

palavras-chave Reconstrução. Análise histórica. Declaração Universal. Amazônia brasileira.

Declaration of conference of Stockholm about environment human, half a


century later: between the dream and reality
abstract The Declaration of the UN Conference on the Human Environment, held in Stockholm, Sweden, June 5-16, 1972,
completes half a century and coincides with the two-year long covid-19 pandemic that has brought profound changes in
socioeconomic patterns, political strategies, and personal and collective habits. It is, of course, an historic moment, and
one that fits perfectly within the scope of a project aimed at enhancing the idea of the verb reconstruct, that is, to reevaluate
results, recompose goals, and restore objectives. The purpose of this essay is to reexamine the principles of this Declaration
in light of the Brazilian reality and, more specifically, of the Amazon, a region that is emblematic of the global effort to make
progress compatible with the preservation of biodiversity and ecosystems.

Keywords Reconstruction. Historical analysis. Universal Declaration. Brazilian Amazon


* Universidade Federal de Minas Gerais
** Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia

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Introdução

E m 1968, por iniciativa da representação sueca no Conselho Econômico Social


das Nações Unidas (Ecosoc), foi lançada a proposta de organizar um encontro de
países para debater as grandes questões ambientais e socioeconômicas e propor rumos
novos com vistas a salvaguardar as bases para uma economia estável e boa qualidade
de vida humana. Para isso, foi criada uma comissão preparatória, constituída por re-
presentantes de 27 países, inclusive o Brasil, para elaborar uma agenda provisória de
temas a serem debatidos e um esboço da Declaração a ser assinada ao final da Assem-
bléia (Brasil, 1972).
A realização da primeira Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU)
voltada prioritariamente para o Meio Ambiente decorreu de fortes questionamentos
acadêmicos, políticos e socioeconômicos a respeito do modelo de desenvolvimento que
a humanidade tem adotado e alicerçado na ideia de máxima produção, acumulação
e rentabilidade financeira, o que acaba gerando excessiva devastação ambiental, con-
centração de renda e proliferação da pobreza. Esse momento corresponde também à
intensa luta dos Estados Unidos e outros países democráticos pelos direitos civis, pelo
amplo debate em torno das questões multilaterais, pelos malefícios trazidos pela polui-
ção e guerras e pela emergência de novos paradigmas de comportamento centrado na
liberdade plena dos indivíduos. Em parte, como decorrência disso, esse momento tam-
bém coincide com a forte pressão da academia e da opinião pública para se livrar dos
regimes ditatoriais e pelo crescente aumento das organizações não governamentais
focadas em programas voltados para a qualidade de vida e a preservação ambiental.
De maneira pontual, mas com grandes reflexos em todo o mundo, também con-
tribuíram para isso uma série de acidentes ecológicos de grandes proporções no final
da década de 1960 e começo de 1970. Como exemplo disso, pode-se citar a intoxicação
de inúmeras pessoas em Minamata, Japão, que ocorreu devido ao consumo de pescado
contaminado por mercúrio e os danos causados nas costas da Inglaterra e França pelo
naufrágio do petroleiro Torrey Canyon. Também contribuíram para esse momento
histórico os estudos desenvolvidos pela comunidade científica e os movimentos eco-
lógicos que denunciavam as consequências negativas do acelerado e inconsequente
processo de industrialização, sobretudo nos países desenvolvidos e que tinham como

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meta explorar os recursos naturais até à exaustão. Além disso, a opinião pública mun-
dial foi fortemente sacudida pelas ideias difundidas em filmes e livros de forte cunho
ambientalista, como Silent Spring (1962), de Rachel Carson; This Endangered Planet
(1971), de Richard Falk; The Tragedy of Commons (1968) e Exploring new ethics for sur-
vival (1972), de Garrett Hardin e Blueprint for Survival, publicado em janeiro de 1972,
pela revista inglesa The Ecologist (Brasil, 1972; Lago 2006).
O estudo realizado por destacados cientistas a pedido do Clube de Roma, criado
em 1968 e que resultou no documento denominado The limits to growth, foi decisivo
para a ONU dar início na articulação de uma assembleia geral para tratar das questões
socioeconômicas e ambientais ali levantadas, pois as conclusões do estudo indicavam
iminente colapso do sistema econômico global, induzido pela drástica redução dos
recursos naturais não renováveis e, consequentemente, pelo perigo de falência de par-
ques industriais que utilizavam matéria-prima explorada da natureza ou mesmo da
agricultura, bem como do sistema de serviços vinculados a elas. Além disso, o relató-
rio destacava a enorme desigualdade entre os países desenvolvidos, que representavam
a minoria da população do planeta, mas consumiam a maior parte dos recursos natu-
rais e desfrutavam de melhor qualidade de vida, enquanto os países subdesenvolvidos
contavam com uma população bem maior, mas necessitavam de condições básicas
referentes à saúde, alimentos e moradia.

Conferência e declaração
A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano foi realizada en-
tre os dias 5 e 16 de junho de 1972, sendo presidida por Ingemund Bengtsson, Ministro
da Agricultura e chefe da delegação da Suécia; secretariada pelo diplomata canadense
Maurice Strong e tendo a participação de 115 países, 19 órgãos intergovernamentais e
cerca de 400 outras organizações intergovernamentais e não governamentais (Lago,
2006). Nela foram aprovados vários planos, resoluções e programas, sendo de maior
relevo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), com o objeti-
vo de coordenar as ações internacionais de proteção ao meio ambiente e de promoção
do desenvolvimento sustentável; o Plano de Ação para o Meio Ambiente Humano, com
109 recomendações; a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimen-
to (CMMAD) e a Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente

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Humano, sendo todos eles instrumentos voltados para o estabelecimento de bases


para a preservação ambiental e o progresso humano em todas suas dimensões. Mais
do que isso, tais instrumentos trouxeram como novidade a institucionalização da pro-
blemática ambiental como foco específico de ação pública (Bursztyn, 2002).
A Declaração da ONU possui 26 Princípios que versam sobre a necessidade de se
cuidar do planeta Terra; de promover melhorias nas condições de vida das pessoas e de
garantir esse mesmo estado de prosperidade às gerações futuras. Em junho de 2022
ela completa meio século e coincide com a pandemia da covid-19, que já dura dois anos
e tem trazido profundas alterações nos padrões socioeconômicos, nas estratégias po-
líticas e nos hábitos pessoais e coletivos. Trata-se, portanto, de um momento histórico
e que se enquadra perfeitamente no âmbito de um projeto destinado a potencializar
a ideia do verbo reconstruir, ou seja, reavaliar resultados, recompor metas e restaurar
objetivos.
Ao longo das últimas cinco décadas, diversas conferências internacionais foram
realizadas e muitos acordos ambientais foram firmados e aqui compete indagar que
balanço é possível fazer. De que forma os princípios da Declaração se traduziram em
ações concretas? Estamos realmente caminhando para o futuro sonhado em 1972 ou é
momento de reconstrução, de redefinição de novos processos e trajetórias?
Assim sendo, a proposta do presente ensaio é examinar os princípios dessa Decla-
ração à luz da realidade do Brasil e mais especificamente da Amazônia, uma região
que ocupa mais da metade do seu território; detém a maior reserva da biodiversidade,
das florestas tropicais e da água doce do planeta e se constitui num dos mais destaca-
dos ícones dos ideais de preservação do planeta. Ao final, são feitas considerações so-
bre a abrangência, desafios e perspectivas que a região apresenta para um futuro mais
promissor. Como muitos dos princípios da Declaração possuem estreita relação entre
si, a fim de que o texto não se tornasse repetitivo, eles foram compilados em cinco gru-
pos, aqui denominados “fundamentos”, de modo que os comentários aos princípios
serão feitos a partir desses conjuntos.

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Discussão
Fundamento 1:
Todos os homens são iguais e, portanto, todos possuem direitos e deveres em re-
lação a um planeta saudável. Ainda que os países apresentem realidades e estágios
diferentes de desenvolvimento, habitamos todos um mesmo planeta e os problemas
ambientais não possuem fronteiras, portanto, a cooperação internacional é fundamen-
tal (Princípios 1, 4, 9, 10, 12, 22, 23 e 24)
Princípio 1 - O homem tem direito fundamental à liberdade, igualdade e condições
de vida em um ambiente de qualidade que permita viver com dignidade e bem-estar,
cabendo-lhe a solene responsabilidade de proteger e melhorar o meio ambiente para as
gerações atuais e futuras. A esse respeito condenam-se e devem ser eliminadas as polí-
ticas que promovem ou fazem durar o apartheid, a segregação racial, a discriminação,
o colonialismo e outras formas de opressão e dominação estrangeira.Princípio 4 - O
homem tem a especial responsabilidade de salvaguardar e administrar sabiamente o
patrimônio da vida selvagem e seu habitat, ora gravemente ameaçados por uma com-
binação de fatores adversos. A conservação da natureza deve, portanto, receber impor-
tância no planejamento para o desenvolvimento econômico.
Princípio 9 - As deficiências ambientais geradas pelas condições de subdesenvolvi-
mento e desastres naturais apresentam graves problemas e o melhor modo de corrigi-
-las é o desenvolvimento acelerado, mediante a transferência de quantidades substan-
ciais de assistência financeira e tecnológica, como complemento aos esforços internos
dos países em desenvolvimento, e à ajuda conjuntural que se tornar necessária.
Princípio 10 - Para os países em desenvolvimento, a estabilidade de preços e os
ganhos adequados para os produtos de base e matérias-primas são elementos essen-
ciais para a gestão do meio ambiente, uma vez que tanto os fatores econômicos quanto
ecológicos devem ser levados em conta.
Princípio 12 – Recursos devem ser disponibilizados para preservar e melhorar as
condições ambientais, tendo em conta as circunstâncias e os requisitos particulares
dos países em desenvolvimento, bem como quaisquer custos que possam incorrer a
esses países; é necessário incorporar salvaguardas ambientais em seu planejamento
de desenvolvimento, assim como a de colocar à sua disposição, a seu pedido, toda as-
sistência técnica e financeira internacional.

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Princípio 22 - Os Estados devem cooperar para desenvolver ainda mais o direito


internacional e garantir a responsabilidade e compensação para as vítimas de poluição
e outros danos ambientais causados por atividades dentro da sua jurisdição ou controle
para danos fora de sua área de jurisdição.
Princípio 23 - Sem prejuízo dos critérios eventualmente acordados pela comuni-
dade internacional ou para padrões que deverão ser definidos no plano nacional, em
todos os casos será indispensável considerar os sistemas de valores prevalecentes em
cada país, bem como a aplicabilidade de padrões que são válidos para os países mais
avançados, mas que podem ser inadequados e de custo social injustificado para os
países em desenvolvimento.
Princípio 24 – Assuntos internacionais relativos à proteção e melhoria do meio
ambiente devem ser tratados com espírito cooperativo por todos os países, grandes
e pequenos e em pé de igualdade. A cooperação através de acordos multilaterais ou
bilaterais ou outros meios apropriados é essencial para controlar, prevenir, reduzir e
eliminar os feitos ambientais adversos resultantes de atividades realizadas em todas
as esferas, de tal modo que a soberania e os interesses de todos os Estados recebam a
devida consideração.
Infelizmente a realidade é bem diferente. A desigualdade é imensa, tanto em
âmbito global, com países muito desenvolvidos e outros muito pobres, quanto dentro
do próprio Brasil.
Internacionalmente, a desigualdade em termos de responsabilidades e capacida-
des quanto aos problemas ambientais foi reconhecida pelo princípio das “responsa-
bilidades comuns, porém diferenciadas” da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento (Conferência Rio-92). Segundo esse princípio, as imputações aos
países não devem ser iguais, visto que historicamente os Estados contribuíram de
maneira diferente para a poluição do mundo. Os países desenvolvidos devem ser os
primeiros a reduzir suas emissões de gases de efeito estufa e devem proporcionar
apoio financeiro e técnico aos países em desenvolvimento.
Ocorre que as mudanças climáticas em curso, devido ao aquecimento global, têm
aumentado as desigualdades entre as nações, puxando para baixo o crescimento eco-
nômico dos países mais pobres e aumentando a prosperidade de alguns dos países
mais ricos do planeta. O abismo entre as nações mais pobres e as mais ricas do mundo
é 25% maior do que seria sem o aquecimento global entre 1961 e 2010 (Diffenbaugh
& Burke, 2019).
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Em relação às desigualdades internas, o Brasil está entre os dez países mais de-
siguais do mundo, de acordo com o índice de Gini, instrumento que mede o grau de
concentração de renda no grupo a ser avaliado (IBGE, 2020). Em 2018, o 1% da popu-
lação mais rica detinha 28,3% da renda do país, quase um terço do total (PNUD, 2019).
Quando se trata de patrimônio, as desigualdades são ainda maiores do que as de renda
e também uma das mais altas do mundo. Em 2021, os 50% mais pobres possuíam ape-
nas 0,4% da riqueza brasileira, entendida como ativos financeiros e não financeiros,
como propriedades imobiliárias. E a pandemia do novo coronavírus só fez aumentar
ainda mais essa disparidade (Chancel et al., 2022).
Mesmo que a relação entre pobreza e meio ambiente seja complexa (Bucknall et al.
2000), é sabido que as pessoas mais pobres são mais diretamente impactadas e mais
vulneráveis aos problemas ambientais, seja porque dependem diretamente dos recur-
sos naturais (em áreas rurais) seja porque normalmente habitam áreas impróprias
para o assentamento humano (áreas urbanas). Ainda que o Brasil não sofra com ter-
remotos e tsunamis, que são os acidentes que afetam milhares de pessoas em outras
regiões do mundo, o país está entre os que possuem o maior número de pessoas afe-
tadas por acidentes naturais, com destaque para deslizamentos e inundações (Bruna
& Pisani, 2010).
Se os pobres não possuem boas condições de vida (muitos apenas lutam para so-
breviver) e acabam sofrendo mais por problemas ambientais, como exigir deles a mes-
ma responsabilidade em proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações atuais
e futuras?
A Amazônia ocupa cerca de 60% do território brasileiro, mas é uma região com
baixa densidade populacional e que apresenta alguns dos piores indicadores socioe-
conômicos do país (Viana et al., 2015). Os nove Estados que compõem a região apre-
sentam Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)) menor do que a média nacional,
indicando que políticas tradicionais de desenvolvimento econômico adotadas na região
ainda não foram suficientes para aproximar a região da renda média do país. Além
disso, estudos mostram que os municípios campeões em desmatamento na Amazônia
são os menos desenvolvidos da região (Santos et al., 2021).
A pobreza tem sido constante na região e normalmente está associada a diferen-
tes fenômenos, como a baixa produtividade, baixo crescimento econômico e elevado

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desmatamento (Diniz et al., 2007; Rudel et al., 2015). O que vem a contribuir também
com o empobrecimento da região é a extração predominante das riquezas naturais
que tem refletido diretamente na reprodução da pobreza econômica, exclusão social
e degradação ambiental. A extração e exploração insustentável dos recursos naturais
tem priorizado o lucro imediato e sem considerar culturas locais e dinâmicas naturais
que regem os ecossistemas.
A Amazônia, que sempre foi chamada exageradamente de “pulmão do mundo”,
por seu papel em absorver uma enorme quantidade de gás carbônico e liberar oxigênio
a partir da fotossíntese, parece que agora emite mais gases poluentes do que absorve,
se considerar o balanço de toda a bioquímica do bioma, em consequência do desma-
tamento (Covey et al., 2021). Mais do que perder sua contribuição à estabilização do
clima global, a Amazônia pode ter parte de sua floresta tropical transformada em sa-
vanas estéreis se o desmatamento não for contido, devido à alteração no fluxo de umi-
dade que esse fenômeno provoca. Uma perda de 20 a 25% das florestas amazônicas
seria suficiente para precipitar essa transição (Lovejoy & Nobre, 2018).
A preocupação com o destino da Amazônia é grande, não somente no Brasil, mas
em outros países, principalmente com relação aos efeitos que a sua destruição pode ter
na estabilidade do clima global. Por isso, fortalecer a cooperação internacional é fun-
damental para a solução dos problemas ambientais e reparação das vítimas dos danos
ambientais, assegurando que as organizações internacionais desempenhem um papel
coordenado, eficiente e dinâmico na proteção e na melhoria do meio ambiente.
Fundamento 2:
A vida selvagem e seu habitat já sofrem ameaças e, por isso, é preciso respeitar a
capacidade de suporte da Terra, salvaguardando os recursos naturais em benefício das
gerações presentes e das futuras (Princípios 2, 3, 5, 6 e 16).
Princípio 2- Os recursos naturais da terra, incluindo ar, água, terra, flora e fauna
e especialmente amostras representativas de ecossistemas naturais devem ser salva-
guardadas em benefício das gerações presentes e futuras, através de planejamento e
gerenciamento cuidadoso, conforme os casos.
Princípio 3 - A capacidade da Terra de produzir recursos vitais renováveis deve ser
mantida e, sempre que possível, restaurada ou melhorada.
Princípio 5 - Os recursos não renováveis da Terra devem ser empregados de forma
a precaver contra o perigo de sua futura exaustão e assegurar que os benefícios de sua
utilização sejam compartilhados por toda a humanidade.
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Princípio 6 - A descarga de substâncias tóxicas ou de outras substâncias nocivas e


a liberação de calor, em quantidades ou concentrações que excedam a capacidade do
ambiente para neutralizá-los devem ser interrompidas, a fim de garantir que danos
graves ou irreversíveis não sejam infligidos aos ecossistemas. Deve-se apoiar a justa
luta dos povos de todos os países contra a poluição.
Princípio 16 - Políticas demográficas que não prejudiquem os direitos humanos
básicos e considerados apropriadas pelos governos interessados devem ser aplicadas
nas regiões onde a taxa de crescimento populacional ou suas concentrações excessivas
sejam suscetíveis de efeitos adversos sobre o ambiente e o desenvolvimento humano.
A realidade e a tendência mundial parecem apontar para uma direção contrária ao
que prega a Declaração, devido principalmente ao aumento da população, da poluição,
da exploração dos recursos naturais renováveis, como o pescado, as nascentes e rios
ou dos recursos não renováveis como petróleo, gás, carvão, xisto betuminoso e outros
combustíveis fósseis, os quais vêm alimentando o processo industrial e desenvolvi-
mentista ao longo dos últimos séculos.
Na mesma época em que a Declaração foi assinada, o planeta Terra sofreu uma
guinada em termos de sustentabilidade. Foi exatamente a partir da década de 1970
que o mundo passou de um superávit para um déficit ambiental, ou seja, quando a
pegada ecológica total ultrapassou a biocapacidade total (Alves, 2020). No entanto,
ao contrário de ser mantida ou melhorada, como se almejava naquele momento, esse
déficit ecológico foi só aumentando ao longo dos anos e hoje a humanidade consome o
equivalente a 1,75 Terras para fornecer os recursos e absorver os resíduos (York Univer-
sity Ecological Footprint Initiative & Global Footprint Network, 2022). Frente a essa
situação é óbvio que a capacidade da Terra de produzir recursos vitais renováveis só
será mantida mediante a mudança dos padrões de consumo (Martine & Alves, 2015).
Além disso, a velocidade em que a biodiversidade está sendo perdida é assustadora
e compromete os serviços ecossistêmicos, dos quais os homens são dependentes. Es-
pecialistas estimam que a perda de espécies presenciada hoje está entre 100 e 1.000
vezes acima da taxa de extinção natural (De Vos et al., 2014). As populações de espé-
cies de vertebrados silvestres caíram em média quase um terço (31%) em nível mun-
dial, entre 1970 e 2006, com o declínio especialmente grave nos trópicos (59%) e nos
ecossistemas de água doce (41%) (Brasil, 2010).

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A Bacia Amazônica contém cerca de 10% de todas as espécies conhecidas, com


mais de 1.000 espécies de árvores num único quilômetro quadrado; cerca de 40% das
florestas tropicais restantes do mundo desempenha um papel vital na regulação do
clima da Terra (Rankin-de-Mérona, 1992). Só por isso, ela merece atenção e cuidado.
No entanto, estima-se que entre 103.000 e 190.000 Km2 da floresta amazônica foram
impactados só por incêndios, desde 2001, afetando 95% de todas as espécies amazôni-
cas e até 85% das espécies listadas como ameaçadas na região (Feng et al., 2021). Por
causa do desmatamento, mais de 8 mil espécies de plantas endêmicas ou nativas do
bioma e 2,3 mil animais enfrentam um alto risco de extinção até o final deste século
(Nobre et al. 2021).
Fundamento 3: Necessidade de conciliar o desenvolvimento econômico com a con-
servação da natureza (Princípio 8 e 21).
Princípio 8 - O desenvolvimento econômico e social é indispensável para as-
segurar ao homem um ambiente favorável de vida e de trabalho, e criar na Terra as
condições que são necessárias para que se melhore a qualidade de vida.
Princípio 21 - De acordo com a Carta das Nações Unidas e os princípios do direito
internacional, os Estados têm o direito soberano de explorar seus próprios recursos
em conformidade com suas próprias políticas ambientais, cabendo a eles a responsa-
bilidade de garantir que as atividades realizadas nos limites de sua jurisdição, ou sob
seu controle, não causem prejuízo ao meio ambiente de outros Estados ou de áreas
situadas fora dos limites da jurisdição nacional.
O conceito de desenvolvimento sustentável, surgido a partir do Relatório Brun-
dtland (Nosso Futuro Comum) e consolidado na Conferência Rio-92, trouxe a ideia
de que o uso do meio ambiente e dos recursos naturais não é um obstáculo, mas uma
oportunidade para um desenvolvimento duradouro, sustentável (Amazonas, 2003).
Ampliou-se o entendimento de que não é possível pensar em desenvolvimento sem a
variável ambiental, da mesma forma que é idealista crer que a sociedade terá cuidado
com a conservação do meio ambiente se essa atividade não gerar benefícios econômi-
cos e sociais a ela.
De fato, conciliar objetivos de desenvolvimento econômico e de conservação am-
biental tem sido um desafio de todos os governos. O Brasil é uma das principais po-
tências agrícolas mundiais, ocupando a segunda posição no ranking internacional
de exportações de grãos (Brasil, 2022) e dispondo das mais avançadas tecnologias de

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agricultura tropical do planeta (Hopewell, 2016). Ao mesmo tempo, o país também é


considerado uma potência ambiental, abrigando mais de 60% de área da maior flo-
resta tropical contínua do planeta e importantes hotspots de biodiversidade (Colombo
& Joly, 2010).
No entanto, o país parece estar degradando o meio ambiente sem gerar melhoria
de vida à sociedade. Na contramão do mundo, o Brasil aumentou as emissões de CO2
em plena pandemia da covid-19. A emissão brasileira de gases de efeito estufa em
2020 cresceram 9,5%, enquanto no mundo inteiro elas despencaram em quase 7%
no mesmo período. O setor de mudança de uso da terra foi o desencadeador desse
fenômeno. Representadas em sua maior parte pelo desmatamento na Amazônia e no
Cerrado (que, somados, perfazem quase 90% das emissões do setor), as mudanças de
uso da terra emitiram quase um bilhão de toneladas de CO2e em 2020, um aumento
de 24% em relação a 2019 (807 milhões, segundo SEEG (2021). Lastimavelmente, o
descontrole sobre o desmatamento faz com que a curva de emissões do Brasil ainda
seja dominada por uma atividade que é majoritariamente ilegal e que não contribui
com o PIB nem com a geração de empregos.
A Amazônia é uma região riquíssima em recursos naturais e com diversas pe-
culiaridades ambientais, geográficas, culturais e logística e isso exige a elaboração
de políticas públicas específicas. A adoção de formas de produção e desenvolvimen-
to respeitando o conceito de sustentabilidade, isto é, promovendo o desenvolvimento
econômico e material sem agredir o meio ambiente, usando os recursos naturais de
forma inteligente, pode ser o caminho mais rápido para o seu desenvolvimento. Trata-
-se da necessidade de repensar o uso da biodiversidade, agregando valor aos produtos
extrativistas e valorizando o conhecimento tradicional dos povos da floresta (Silva et
al. 2016).
Muito se pensa sobre alternativas econômicas para a Amazônia. No entanto, os
grandes projetos de desenvolvimento pensados para a região - extração da borracha,
construção de estradas e hidrelétricas, mineração, agricultura, assentamentos rurais,
pecuária – não foram capazes de gerar verdadeiro desenvolvimento. Normalmente os
produtos extraídos são exportados em estado bruto ou de pouquíssimo valor agregado
para outras regiões.
Cerca de 38% dos pequenos produtores da região comercializam menos de 50% do
que produzem (IBGE, 2010). No caso do consumo do pescado na região Norte, para o

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período de 2008 a 2009, as estimativas sugerem que a produção voltada ao autoconsu-


mo alcançava 11% nas regiões urbanas e 68% nas regiões rurais (Leite, 2020). Guedes
et al. (2015) estimaram que a monetarização da produção voltada para o autoconsumo
reduziria a pobreza amazônica em 58%.
Soma-se a isso o fato de que muitas atividades relacionadas à exploração dos re-
cursos naturais na Amazônia ocorrem de maneira ilegal e estão atreladas a crimes
violentos, fraudes, corrupção, tráfico de drogas, desmatamento, extrações de madeira
e minerais, especialmente ouro; grilagem de terras e atividades agropecuárias com
enorme passivo ambiental.
O estilo organizado da criminalidade ambiental, aliada a um cenário de falta de
dados, fragilidades institucionais e insuficiente vontade política para responsabilizar
atores envolvidos em atividades com grande impacto na destruição da floresta, cria
um verdadeiro oásis para o crime na Amazônia (Waisbich et al., 2022). Trata-se de
uma exploração dos recursos naturais que degrada o meio ambiente, coloca em risco
a segurança climática do planeta, não paga impostos e não gera nenhum benefício à
sociedade. Ao contrário: impacta negativamente a vida das populações amazônicas,
sobretudo de povos indígenas e comunidades tradicionais.
Fundamento 4: O planejamento racional é um instrumento essencial e os Estados
e as Organizações Internacionais possuem papel preponderante (Princípios 7, 11, 13,
14, 15, 17, 25 e 26).
Princípio 7 - Os Estados deverão tomar todas as medidas possíveis para prevenir
a poluição dos mares por substâncias capazes de criar perigo à saúde humana, causar
danos aos seres vivos ou prejudicar os meios naturais de recreação ou interferir com
outros usos legítimos do mar.
Princípio 11 - As políticas ambientais de todos os Estados devem reforçar e não
afetar adversamente o potencial de desenvolvimento presente ou futuro, nem afetar
adversamente esse potencial, nem impedir a conquista de melhores condições de vida
para todos. Os estados e as organizações internacionais devem tomar as medidas apro-
priadas com vistas a acordos sobre os meios necessários para fazer frente às possíveis
consequências econômicas, nacionais e internacionais, resultantes da aplicação de me-
didas de proteção ambiental.
Princípio 13 - A fim de conseguir uma gestão mais racional dos recursos e, assim,
melhorar as condições ambientais, os Estados devem adotar um sistema integrado e

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coordenado no sistema de planejamento do desenvolvimento, de modo a assegurar


a compatibilidade do desenvolvimento, com a necessidade de proteger e melhorar o
meio ambiente humano, em benefício de sua população.
Princípio 14 - O planejamento racional constitui um instrumento essencial para
conciliar qualquer conflito entre as necessidades de desenvolvimento e de proteção e
melhoria do meio ambiente.
Princípio 15 – O planejamento deve ser aplicado aos assentamentos humanos e à
urbanização, com vistas a evitar efeitos adversos sobre o meio ambiente e obter o máxi-
mo de benefícios sociais, econômicos e ambientais para todos. A este respeito, devem
ser abandonados os projetos que visam à dominação colonialista e racista.
Princípio 17 - Deve confiar-se a instituições nacionais apropriadas a tarefa de plane-
jar, administrar ou controlar a utilização dos recursos naturais dos Estados com vistas
a melhorar a qualidade ambiental.
Princípio 25 - Os Estados devem assegurar que as organizações internacionais de-
sempenhem um papel coordenado, eficiente e dinâmico na proteção e na melhoria do
meio ambiente.
Princípio 26 – O homem e seu ambiente devem ser poupados dos efeitos das ar-
mas nucleares e de todos os outros meios de destruição em massa. Os Estados devem
se esforçar para alcançar acordo, nos órgãos internacionais competentes, sobre a elimi-
nação e completa destruição de tais armas.
Sem dúvida alguma, a Conferência de Estocolmo foi um marco na institucionali-
zação da questão ambiental no Brasil. A primeira das ações significativas do Governo
Federal foi a criação, em 1973, da Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA). Em
1981, com a Lei nº. 6.938/81, foi definida uma Política Nacional de Meio Ambiente;
criado o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e instituído o Conselho
Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). As décadas seguintes foram palco do sur-
gimento de novas instâncias e políticas na área, sinalizando que a proteção e o uso
sustentável dos recursos naturais haviam se tornado uma prioridade para o Brasil.
Entretanto, essa tendência sofreu revezes nos últimos anos, com o sucateamento dos
órgãos ambientais e a paralisação de várias iniciativas então em curso.
O Plano Plurianual da União (PPA) é um instrumento de planejamento gover-
namental que define as diretrizes, objetivos e metas da administração pública fede-
ral para o horizonte de quatro anos. O orçamento do Plano Plurianual 2020-2023,

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aprovado pelo governo, define um ‘eixo ambiental’ dotado de quase R$ 140 bilhões
para o período, mas com um único tema: agropecuária e meio ambiente. Nele, 98,5%
fica com o Ministério da Agricultura, que deve aplicar R$ 133 bilhões para a pecuária
sustentável. O pouco restante fica com o quase invisível Ministério do Meio Ambiente
(ClimaInfo, 2019).
O Conselho Nacional da Amazônia Legal, criado em 1993, e então subordinado
ao Ministério do Meio Ambiente, teve sua coordenação repassada à vice-presidência
da República em fevereiro de 2022. Formado pela vice-presidência da República e por
14 ministérios do governo federal, tem como objetivo coordenar e integrar os esfor-
ços federais pela preservação e proteção da Amazônia. Ainda que entre suas atribui-
ções gerais esteja a coordenação e integração das ações governamentais relacionadas à
Amazônia Legal, parece que o órgão tem sido incapaz de integrar os trabalhos das For-
ças Armadas e das agências ambientais na Amazônia ao longo dos últimos dois anos.
Apesar da expectativa de que a articulação promovida pelo Conselho pudesse pos-
sibilitar ações mais rápidas de controle contra as queimadas, o envio de tês mil milita-
res à floresta em 2021 e um orçamento três vezes maior do que o dos órgãos ambien-
tais (incluindo Ibama, ICMBio e INPE) não foram suficientes para evitar o aumento de
22% no desmatamento da Amazônia em 2021 em relação ao ano anterior (Salomon,
2021; Medina, 2022).
Fundamento 5: A ciência e o saber devem ser empregados nas soluções aos proble-
mas ambientais (Princípios 18, 19 e 20).
Princípio 18 - Como parte de sua contribuição ao desenvolvimento econômico e
social e bem comum da humanidade, a Ciência e a Tecnologia devem ser aplicadas na
identificação, prevenção, controle e solução de riscos ambientais.
Princípio 19 - É indispensável um esforço para a educação em assuntos ambien-
tais, dirigida para jovens e adultos, com a devida atenção aos menos favorecidos. Isso
é essencial para fundamentar e ampliar as bases de uma opinião pública esclarecida e
de uma conduta responsável dos indivíduos, das empresas e das comunidades quanto
a proteger e melhorar o meio ambiente em sua plena dimensão humana. É igualmente
essencial que os meios de comunicação de massa evitem contribuir para a deterioração
de meio ambiente, mas pelo contrário, disseminem informações de caráter educativo
sobre a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente de modo a possibilitar o

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desenvolvimento do homem em todos os aspectos.


Princípio 20 - Devem ser estimulados em todos os países, especialmente nos pa-
íses em desenvolvimento, a pesquisa e o desenvolvimento científico no contexto dos
problemas ambientais, tanto nacionais quanto multinacionais. A este respeito, deve-se
promover e ajudar a circulação livre de informações e a transferência de experiências
científicas atualizadas, de modo a facilitar a solução dos problemas ambientais; tec-
nologias ambientais devem ser postas à disposição dos países em desenvolvimento
em condições tais que favoreçam sua ampla disseminação, sem constituir um fardo
econômico para esses países.
Tanto o meio ambiente como a sociedade humana são sistemas complexos e a rela-
ção entre ambos, ou seja, como um interfere no outro e quais as consequências disso,
ainda não estão completamente identificadas. Por isso, a pesquisa é tão importante. A
ciência deve orientar decisões políticas.
Da mesma forma, a educação ambiental é um instrumento necessário diante da
crise ambiental existente que provoca questionamentos sobre a necessidade de mu-
danças de atitudes e paradigmas. A partir do pensamento crítico, ela permite a for-
mação de um sujeito com responsabilidade social, que compreenda o seu papel en-
quanto cidadão, para a aplicabilidade de valores e condutas sociais nas práticas diárias
e mitigação dos problemas de cunho cultural, econômico e/ou ambiental (Silveira &
Lorenzetti, 2021).
No Brasil, a educação ambiental é pouco trabalhada no contexto escolar e os edu-
cadores não possuem, em decorrência de falhas na formação curricular, competências
necessárias à melhor utilização do tema em sala de aula, para lidar com ele de maneira
interdisciplinar e trazendo o ambiente local para a realidade dos alunos (Dimas et al.
2021).
Com relação à pesquisa, comparado o investimento brasileiro em P&D (cerca de
1,26%) com países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômi-
co (OCDE), o Brasil está abaixo da média dos países deste bloco, que possuem gastos
em torno 2,3% do PIB. Em relação à Coreia do Sul (3,6%), o investimento é três vezes
menor. A grande diferença entre o Brasil e esses países é o volume de despesas em
CT&I feitas principalmente pela iniciativa privada. Enquanto nos países da OCDE as
empresas investem 1,3% do PIB, (Coreia 2,6%) no Brasil o percentual da iniciativa

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privada patina em 0,6%. Desde 2013, os investimentos federais em CT&I vêm caindo
de forma significativa em termos reais (cerca de 37% entre 2013 e 2020), chegando em
2020 a um nível inferior ao observado em 2009 (De Negri, 2021).
A região Norte do país é a que concentra o menor número de profissionais das
ciências entre a população ocupada. Conta hoje com apenas 10% dos programas de
pós-graduação em biodiversidade do Brasil, assim como cerca de 8% dos institutos
nacionais de ciência e tecnologia implementados pelo Conselho Nacional de Desenvol-
vimento Científico e Tecnológico. Ainda que esses números pareçam razoáveis diante
da baixa densidade demográfica da região, se levar em consideração a extensão do
território, o número potencial de espécies e as lacunas de conhecimento, fica clara a
disparidade entre a importância socioecológica da Amazônia e os investimentos para
concretização do seu potencial (Stegmann et al. 2021).

Considerações finais
A Declaração de Estocolmo representa não somente um marco no processo de
proteção da biodiversidade e dos ecossistemas, mas também no gerenciamento dos
recursos naturais e na jurisprudência que trata das questões ambientais. Trata-se do
primeiro diploma legal e em nível internacional a reconhecer o meio ambiente ecologi-
camente preservado como um direito pessoal e coletivo. Embora não se constitua como
deveres obrigatórios, seus conceitos e princípios são norteadores e encorajadores de
um gerenciamento ambiental adequado e equilibrado com o processo econômico. Tan-
to na Constituição do Brasil, promulgada em 1988, como de outros países que tiveram
suas leis magnas editadas posteriormente à Conferência de Estocolmo, as questões
ambientais foram formalmente incluídas. Outras leis nacionais e internacionais são
fortemente embasadas nessa declaração histórica.
Analisando em conjunto os 26 princípios da Declaração da ONU percebe-se que
eles se referem basicamente a três grandes temas ou postulados, com seus respectivos
papéis, responsabilidades e representações. O primeiro se refere de modo especial ao
meio ambiente, incluindo os recursos naturais, os ecossistemas e o próprio planeta; o
segundo, aos direitos humanos, incluindo liberdade, igualdade, bem-estar, qualidade
de vida e soberania das nações; e o terceiro ao conjunto de Ciência e Tecnologia, in-
cluindo seu potencial para proteger e melhorar o meio ambiente humano. Em quase

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todos os princípios aparecem verbos que denotam ações necessárias para a conserva-
ção, a proteção, a manutenção ou salvaguarda dos recursos naturais e das condições
ambientais adequadas a uma boa qualidade de vida humana.
De maneira direta e didática, a Declaração aponta para o fato de que os aspectos
ambientais e socioeconômicos são igualmente importantes para a dignidade, a sobe-
rania e a qualidade de vida humana. Ela define direitos e deveres, tanto individuais
como institucionais, sendo que todos eles podem e devem contribuir para o combate
às mazelas humanas e ambientais, como poluição, esgotamento dos recursos naturais,
apartheid, segregação racial, discriminação, opressão colonial, dominação estrangeira
e guerra atômica. Ao mesmo tempo, a Declaração conclama à promoção de ações que
garantam e promovam a dignidade e qualidade da vida humana, sem que isso compro-
meta o direito das gerações futuras ao mesmo tipo de benefício.
Evidentemente, o não comprometimento do direito das futuras gerações aos recur-
sos naturais do planeta depende de uma drástica redução do consumismo exagerado
de uma parcela pequena, mas voluptuosa da sociedade, a qual desperdiça mais que
consome. De outro lado, também depende do combate às mazelas típicas da pobreza
que grassa sobre a maior parcela da humanidade, incluindo poluição, violência, doen-
ças crônicas como disenteria, malária, verminoses e incapacidade para o trabalho. É
preciso uma reorientação nos padrões de vida ditados pelo capitalismo selvagem, pela
globalização e onde os níveis de produção e consumo parecem não obedecer a limites.
Nessas condições, o desenvolvimento sustentável não passa de álibi ou quimera dis-
cursiva.
Conforme afirmado na proclamação desses Princípios, “a maioria dos problemas
ambientais tem sua causa no subdesenvolvimento; milhões de pessoas continuam vi-
vendo muito abaixo dos níveis mínimos necessários a uma existência humana decen-
te, pois são desprovidas de abrigo, alimentação, vestuário, educação, saúde e sanea-
mento adequados. Por outro lado, nos países desenvolvidos, os problemas ambientais
estão ligados à poluição oriunda do processo industrial e tecnológico. Assim, os países
em desenvolvimento devem dirigir seus esforços no sentido do desenvolvimento, cons-
cientes de suas prioridades e tendo em mente a necessidade de, juntamente com os
países desenvolvidos, salvaguardar e melhorar o meio ambiente.
Ainda com base naquela proclamação, o futuro do meio ambiente e da humani-
dade está nas mãos do próprio homem. Somente ele é capaz de criar oportunidades e

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benefícios do desenvolvimento; no entanto, isso só será viável se sua capacidade trans-


formadora for utilizada de maneira sensata, prudente e responsável. Caso contrário,
o avanço da ciência, da tecnologia, da produção e mesmo daquilo que vem sendo cha-
mado de progresso não conseguirão refrear o caos que se abaterá sobre a humanidade
num futuro próximo, caso sejam aumentadas ou mesmo mantidas as atuais taxas de
consumismo e natalidade humana, combinadas com as taxas de poluição, depaupera-
mento da biodiversidade e exaustão dos recursos naturais não renováveis. Em suma,
defender e melhorar o meio ambiente para as gerações atuais e futuras, mantendo o
abastecimento material e a paz universal, tornou-se um objetivo imperativo para todos
os níveis da sociedade, dos governos, das empresas e demais instituições formais e in-
formais. Ou seja, a Terra é nossa, mas também é nossa a responsabilidade de mantê-la
em condições adequadas para a vida do homem e de toda a biodiversidade que com ele
compartilha este planeta.
Os princípios estipulados na Declaração da Assembleia da ONU em Estocolmo
são fundamentais para todo esforço e para as ações preconizadas no processo de de-
senvolvimento sustentável. Tanto é assim, que eles reaparecem de forma idêntica ou
similar nos princípios de Declarações mundiais posteriores, como na Conferência das
Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, em 1992;
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, em Joanesburgo,
em 2002 e a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, co-
nhecida também como Rio+20, realizada no Rio de Janeiro, em 2012.
A partir do conjunto de princípios estipulados nessas declarações, a humanida-
de já dispõe de arcabouço teórico básico que deve embasar e orientar as estratégias
geopolíticas e as políticas nacionais quanto aos rumos das ações desenvolvimentistas
planejadas e implementadas pelos diversos países e empresas. No entanto, é preciso
que esse arcabouço não fique restrito apenas à academia, agências governamentais ou
instituições internacionais. É preciso que ganhe o mundo, que seja disseminado pela
sociedade, que adquira o estatuto de cartilha-primária e que seja observado antes e
durante todo empreendimento de natureza pública ou particular.
É indispensável um esforço para a educação em assuntos ambientais, dirigida para
jovens e adultos, com a devida atenção aos menos favorecidos. Isso é essencial para
fundamentar e ampliar as bases de uma opinião pública esclarecida e de uma conduta

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responsável dos indivíduos, das empresas e das comunidades quanto a proteger e


melhorar o meio ambiente em sua plena dimensão humana.
Os atuais problemas ambientais e sociais enfrentados pela humanidade são enor-
mes e talvez ainda maiores sejam os desafios que se apresentam para um futuro não
muito distante, sobretudo, impostos pela poluição, consumismo exagerado, exaustão
dos recursos naturais, aumento populacional e concentração da riqueza. No entanto,
há que se considerar também a imensa capacidade humana de criar, recriar, transfor-
mar e tomar novos rumos. Assim, é preciso manter a coragem e a esperança, revigorar
os ânimos e tocar em frente com otimismo. Nesse contexto, vale lembrar a lição de
Edward Wilson, renomado biólogo da conservação, criador do termo biodiversidade
e falecido no final de 2021, aos 92 anos: - Já que dependemos de uma abundância de
ecossistemas funcionais para purificar nossa água, enriquecer nosso solo e fabricar o
próprio ar que respiramos, a biodiversidade claramente não é uma herança a ser des-
cartada descuidadamente.

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