Introduçao Estudo Aços
Introduçao Estudo Aços
Introduçao Estudo Aços
1/10/2016
O estudo dos Materiais Metálicos, normalmente apresentado nos cursos de Engenharia Mecânica,
é abordado de duas formas distintas:
a) sob o ponto de vista da Ciência dos Materiais, onde são apresentadas as relações entre a
estrutura e as propriedades dos materiais. Neste caso, procura-se apresentar toda uma
fundamentação científico-metalúrgica, com o enfoque do estudo da estrutura cristalina, dos
mecanismos de endurecimento e respectiva influência nas propriedades dos metais, sejam
estes na forma de metal-puro e/ou de ligas; e
b) sob o ponto de vista da Engenharia dos Materiais, a qual procura abordar o estudo do
projeto e desenvolvimento da estrutura de um material, através de um determinado
processo de fabricação, para atender a um conjunto predeterminado de propriedades, e que
será responsável pela performance e/ou comportamento do material em serviço.
O presente trabalho tem por finalidade apresentar o Estudo dos Aços, de uma forma diferenciada,
procurando-se apresentar os diversos conceitos da Ciência e da Engenharia dos Materiais, na
medida em que os tópicos forem sendo apresentados e os conceitos sendo necessários para o bom
entendimento do assunto tratado.
A estrutura de um material está diretamente relacionada ao arranjo interno dos seus componentes,
respeitando-se as diferentes escalas de grandeza possíveis. Assim sendo, um material pode ter sua
estrutura apresentada a nível:
a) Macroscópico: consistindo em elementos estruturais visíveis a olho nu;
b) Microscópico: apresentando um grande número de átomos agrupados entre si, os quais são
normalmente sujeitos à observação direta em algum tipo de microscópio;
c) Atômico: quando se procura estudar a organização e os arranjos entre os átomos do
material;
d) Subatômico: quando se procura estudar as interações entre os elétrons e os respectivos
núcleos dos átomos que constituem o material.
A Figura 2 apresenta a estrutura microscópica do corpo de prova de aço da Fig. 1, o qual foi
submetido ao ataque químico em Nital-2%, após preparo metalográfico convencional (lixamento,
polimento e ataque químico), e observado com o recurso de um microscópio ótico comum, com
aumento de 500x.
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Na Figura 3, é apresentado o detalhamento da estrutura atômica de uma região de contorno de grão
entre dois cristais de ferrita da Fig.2, o qual pode ser obtido com o recurso de um microscópio de
tunelamento, com aumentos maiores de que 1.000.000x.
Figura 2 – Aço baixo-carbono (Composição química: 0,13 % C - 0,22% Si - 0,42% Mn - < 0,04%
S - < 0,04% P), apresentando microestrutura de grãos grosseiros de ferrita e perlita. Aumento
500x (Microscópio Ótico).
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Átomos e Reticulado
Cristalino do Grão 2
Contorno de Grão
G2
G1
Átomos e Reticulado
Cristalino do Grão 1
Como todo metal, o ferro apresenta estrutura cristalina definida, ou seja, sob condições de
solidificação normal, pode-se observar, no estado sólido, um arranjo repetitivo de átomos, de
longo alcance. Os arranjos atômicos são repetições, nas três dimensões, de uma unidade básica
chamada célula unitária, dando origem ao reticulado cristalino do metal (rede de átomos),
conforme apresentado na Fig. 3.
Figura 4 – Representação de quatro dos sete principais tipos de cristais (Sistemas de Bravais),
(van Vlack, 1970).
As estruturas resultantes da repetição desta unidade padrão (célula unitária) são denominadas de
cristais (ou grãos microscópicos do material), conforme visto na Fig. 3. Os grãos, ou cristais, se
formam a partir da solidificação do material, processo que é termicamente ativado envolvendo
difusão atômica (movimentação de átomos), quando se atinge a temperatura de fusão /
solidificação do material (1538 ºC, para o Ferro puro). A nucleação e o crescimento dos cristais,
durante a solidificação, ocorre espontaneamente para orientações cristalográficas aleatórias. No
final da solidificação, o encontro de dois cristais vizinhos (normalmente crescidos para orientações
cristalográficas distintas) origina um Contorno de Grão (ver Fig. 3).
Define-se:
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A maioria dos cristais, para os metais mais comuns são do tipo cúbico (à exceção do Mg, Zn, Ti,
Co, Cd, os quais são hexagonais). É necessário ressaltar que a maioria dos materiais cerâmicos
(todos os óxidos, carbonetos e nitretos) apresentam também estrutura cristalina definida. A título
de exemplo, o Carboneto de Ferro - Fe3C (fase cerâmica presente nos aços) apresenta estrutura
ortorrômbica.
A repetição tridimensional da célula unitária, nos cristais (ou grãos), é devido à coordenação
atômica no interior do material, resultando em diferentes tipos de empacotamentos atômicos.
Portanto, conhecendo-se a estrutura das células unitárias que se repetem, pode-se descrever a
estrutura do cristal como um todo. A estrutura cristalina é definida pelo tipo de célula, pelo
número de átomos na célula, pelo número de coordenação atômica, pelo fator de empacotamento
atômico e pelos sistemas de escorregamento presentes na célula.
Define-se:
Fator de empacotamento atômico: é a relação entre o volume efetivamente ocupado pelos átomos
e o volume total da célula unitária.
Uma importante característica é que o Ferro é um metal alotrópico, ou seja, modifica o seu
reticulado cristalino em função da temperatura. Para temperaturas de até 912 C, o ferro apresenta
estrutura cúbica de corpo centrado (Fe-, CCC). Acima de 912 C indo até 1394 C o reticulado
cristalino do ferro se modifica para cúbico de face centrada (Fe-, CFC). A transformação de fase
/que ocorre a 912 C, é a principal transformação alotrópica do Ferro no estado sólido, sendo
extremamente importante no estudo dos tratamentos térmicos dos aços, conforme será visto
adiante. Nesta temperatura (912 ºC) os átomos de Ferro, por difusão atômica (movimento dos
átomos), se rearranjam para um novo reticulado cristalino passando para a estrutura CFC. À
temperatura de 1934 C o Ferro sofre nova transformação alotrópica passando para CCC
novamente (Fe-, CCC). A transformação de fase /é mais importante quando do estudo de
processos de soldagem ou de laminação a quente contínua, os quais normalmente envolvem o
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aquecimento do metal à temperaturas muito elevadas, superando a temperatura de fusão do metal
que é de 1538 ºC. Deve-se frisar que as transformações alotrópicas são reversíveis, ocorrendo
tanto no aquecimento quanto no resfriamento do metal. As Figuras 5 e 6 apresentam
respectivamente as principais características das estruturas CCC e CFC do ferro.
CÉLULA CCC
Número de átomos 2
Número de coordenação atômica 8
Fator de empacotamento 0,68
Planos compactos não há
Direções compactas as que contêm a diagonal do cubo
Sistemas de escorregamento “n” sistemas secundários.
CÉLULA CFC
Número de átomos 4
Número de coordenação atômica 12
Fator de empacotamento 0,74
Planos compactos 4 planos octaédricos do cubo
Direções compactas 3 direções da diagonal da face
Sistemas de escorregamento “12” sistemas principais
D = D0 exp(-Q/RT) (1)
sendo:
D, coeficiente de difusão;
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D0, coeficiente de difusão intrínsico;
Q, energia de ativação;
R, constante universal dos gases perfeitos;
T, temperatura absoluta.
A título de exemplo, segundo Eckstein (1950), os coeficientes de difusão do Fe, Cr, Ni e Ti nas
fases CCC) e (CFC) do Ferro, com as respectivas faixas de validade de temperaturas, podem
ser calculados a partir das seguintes fórmulas:
Na Tabela 1 são apresentados alguns valores calculados destes coeficientes para as temperaturas
de 912, 1050, 1150 e 1250 ºC. Pode-se observar que a difusividade dos diferentes átomos
metálicos na estrutura CCC é sempre maior do que na estrutura CFC do Ferro, variando em média
cerca de duas ordens de grandeza, o que está relacionado diretamente com as características das
respectivas estruturas cristalinas.
Tabela 1 - Coeficientes de difusão do Fe, Cr e Ti nas fases CCC e CFC do Ferro. Valores
calculados em (cm2/s).
No caso da autodifusão de átomos de Fe, o que explica sua maior difusividade no reticulado CCC
do que no reticulado CFC, a uma mesma temperatura de 912 ºC, é justamente a diferença no fator
de empacotamento de cada estrutura, o qual é diretamente relacionado com o número efetivo de
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átomos em cada célula. Isto é melhor explicado assim: a célula CCC, cujo fator de empacotamento
é de 0.68, possui cerca de 32% de seu volume não ocupado por átomos. O raciocínio idêntico para
a célula CFC, cujo fator de empacotamento é 0.74, indica que apenas 26% de seu volume é livre, o
que resulta, comparativamente, numa maior facilidade dos átomos metálicos de se difundirem na
estrutura menos ocupada por átomos.
Na Figura 7 é apresentado de modo esquemático o mecanismo de difusão por vazios, que ilustra
como os átomos de metais se movimentam no reticulado cristalino. Vazio ou vacância é o nome
dado a um defeito cristalino adimensional, ou pontual, o qual consiste na ausência de um átomo
normal da rede no reticulado considerado (Fig. 7a). Nas Figuras 7(b) e 7(c) é indicado como a
presença do vazio na rede auxilia o processo de difusão atômica. Deve-se destacar que a densidade
(quantidade) de vazios no reticulado cristalino aumenta exponencialmente com a temperatura, de
acordo com a equação (2), a qual determina a taxa de equilíbrio entre vazios e átomos a uma dada
temperatura.
Nv = N0 exp(-H/RT) (2)
sendo:
Vazio
Tabela 2 – Tamanhos atômicos de elementos não metálicos intersticiais no Ferro (Rothery, 1974).
Na Tabela 3 são apresentadas, para o reticulado cristalino do Ferro, as dimensões das maiores
esferas possíveis que cabem nos interstícios das estruturas CCC e CFC em função do raio atômico
do Ferro (r = 1,24 A) e do tipo de interstício. Estas dimensões são fixas para cada metal, e definem
um parâmetro (tamanho do interstício) extremamente importante, o qual é diretamente relacionado
com a solubilidade dos átomos intersticiais nas diferentes fases (células) do ferro. Fica evidente,
através da comparação dos valores apresentados nesta tabela, que a célula CFC aceita uma maior
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quantidade de átomos intersticiais. Será visto, à frente, quando do estudo dos sistemas de ligas
binárias Fe-C e Fe-N, a aplicação prática deste resultado.
Tabela 3 – Dimensões das maiores esferas possíveis que cabem nos interstícios das estruturas CCC
e CFC em função do raio atômico (r) do metal (Rothery, 1974).
Outros dois tipos de defeitos cristalinos adimensionais (o termo defeito é sempre comparativo ao
cristal puro e perfeito), ou pontuais, apresentam grande importância no estudo dos materiais
metálicos, que são os defeitos (átomos) substitucionais e os defeitos (átomos) intersticiais. A
importância recai no fato de que a presença destes defeitos em metais resulta na obtenção das ligas
metálicas. A Figura 10 exemplifica os defeitos substitucionais e intersticiais.
Define-se:
Átomo ou Defeito Cristalino Substitucional: são átomos estranhos ao reticulado que assumem
posições de átomos normais da rede cristalina, substituindo-os.
Átomo ou Defeito Cristalino Intersticial: são átomos pequenos (ver Tabela 2) que se posicionam
nos interstícios da rede cristalina.
Posição
intersticial
Cr
Fe Posição
normal
na rede
(a) (b)
Em uma solução sólida o átomo de soluto (sempre em menor quantidade) pode se localizar
intersticialmente ou substitucionalmente na rede cristalina do solvente (Fe, no caso das ligas
ferrosas).
Em geral, devido ao tamanho restrito dos sítios disponíveis, apenas os solutos de pequeno raio
atômico podem se dissolver instersticialmente. Conforme já visto, os elementos que usualmente se
apresentam sob essa forma são o C, N, O, H e B. A Tabela 4 mostra alguns dados relativos à
solubilidade desses elementos nas formas alotrópicas alfa (Fe-, CCC- Cúbica de Corpo Centrado)
e gama (Fe-, CFC- Cúbica de Face Centrada) do Ferro.
As solubilidades dependem da fase com a qual a solução sólida está em equilíbrio e variam
amplamente com a presença de outros solutos. Dos elementos intersticiais apresentados na Tabela
4, o Fe é capaz de dissolver comparativamente maiores quantidades de C e N do que os outros
elementos. A baixa solubilidade do O é devida à natureza eletronegativa desse elemento, que
resulta na formação de óxidos estáveis (ligações iônicas) no lugar de soluções sólidas (ligação
metálica). O boro apresenta uma situação específica, uma vez que seu raio atômico é pequeno
demais para facilitar a formação de soluções sólidas substitucionais, mas é demasiadamente
grande para formar soluções sólidas intersticiais. Resulta daí a sua baixa solubilidade no ferro.
Estes dados mostram que, para um dado elemento, a solubilidade é sempre maior no sistema CFC
do que no sistema CCC, o que está de acordo com os tamanhos relativos dos interstícios nas duas
estruturas (Rothery, 1974).
Na metalurgia ferrosa os elementos O, N e C são responsáveis pela formação das fases óxidas,
nitretos e carbonetos, as quais são extremamente importantes, pois normalmente estão presentes
nos aços, na forma de precipitados de partículas de segunda fase, endurecendo-os (através do
mecanismo de endurecimento por partículas de segunda fase), ou na forma de filmes ou camadas
de revestimentos, no sentido de otimizar suas propriedades superficiais. Deve-se ter em mente,
porém, que a estabilidade termodinâmica das fases cerâmicas é sempre maior para os óxidos,
depois para os nitretos e por último para os carbonetos, isto quando da comparação entre as fases
contendo o mesmo metal, lembrando que quanto maior a variação da Energia Livre de Gibbs (G)
na formação de uma fase cerâmica, maior é a sua estabilidade – a Energia Livre de Gibbs é aquela
grandeza de estado que sempre diminui (variação negativa), no sentido da reação espontânea, ou é
igual a zero, no equilíbrio (G = G2 – G1 0) -. A título de exemplo, a variação da energia livre de
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formação das fases TiO2, TiN e TiC é, respectivamente GTiO2 = - 205 kcal, GTiN = - 155 kcal e
GTiC = - 44 kcal, indicando que se o Ti for exposto a uma atmosfera que contém O, N2 e C,
ocorrerá preferencialmente a formação da fase óxida, por ser a de maior estabilidade, suprimindo
qualquer possibilidade de formação das demais fases. Isto explica o porque do cuidado extremo
que se toma quando do processamento de materiais no estado sólido, em relação ao problema da
oxidação, quando da prática de tratamentos térmicos e/ou processamento de materiais envolvendo
plasma. Pois, tomando-se por exemplo o caso da nitretação, onde a priori a atmosfera é nitretante-
redutora (normalmente apresentado mistura de gases N2 + H2), a presença indesejável de O2 na
mistura gasosa necessariamente resultaria primeiramente na oxidação da superfície e não na sua
nitretação, inviabilizando o sucesso do processo (daí serem estes processos realizados sob vácuo).
Voltando ao estudo das soluções, as soluções sólidas do Fe com os demais elementos são todas do
tipo substitucional, onde átomos do soluto ocupam o lugar de átomos de Fe, na estrutura cristalina,
conforme apresentado na Fig. 10. Valores elevados de solubilidade podem ser encontrados, como
no caso de ligas com metais de transição vizinhos do Fe na tabela periódica (é o caso do Ni, Co,
Mn, Cr e V), enquanto em outros casos a solubilidade pode ser restrita (Ti, Cu, P, S). As
solubilidades de um dado elemento são diferentes em cada uma das estruturas alotrópicas do Fe e
dependem do teor de cada um dos outros elementos presentes. A título de exemplo dos valores
envolvidos, a Tabela 5 mostra a solubilidade máxima de alguns elementos no Fe-, na temperatura
ambiente.
Alguns dos elementos mostrados na Tabela 5 podem apresentar solubilidade sólida completa com
o ferro em determinadas faixas de temperatura. Isto ocorre, por exemplo, com o V no Fe-ou com
o Ni no Fe-. Na maior parte dos casos, porém, ocorre uma solubilidade parcial.
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A solubilidade total entre dois componentes químicos ocorre quando os componentes são
totalmente miscíveis e solúveis um no outro para qualquer proporção. Formam-se assim os
chamados sistemas monofásicos ou isomorfos que apresentam para qualquer liga do sistema,
sempre uma mesma e única fase sólida.
A solubilidade total num sistema de liga binário (entre dois diferentes tipos de átomos A e B)
ocorrerá se forem respeitadas as seguintes condições (regras de Humme Rothery):
Qualquer destas condições não sendo verificadas, haverá a formação de uma segunda fase,
obtendo-se assim os chamados sistemas bifásicos (que apresentam mais de uma fase), ou sistemas
de solubilidade parcial. É o caso da maioria dos sistemas de ligas, dentre os quais se destaca o
sistema Fe-C que apresenta à temperatura ambiente as fases Fe- (ferrita) e Fe3C (cementita) para
as ligas contendo até 6,67 %C. Este sistema é extremamente importante por fundamentar todo o
estudo dos aços, conforme será visto à frente.
Os sistemas de ligas dividem-se, assim, em três grandes grupos: a) sistemas de solubilidade total
(isomorfos ou monofásicos); b) sistemas de solubilidade parcial (sistemas bifásicos ou
complexos); e c) sistemas de solubilidade nula (sistemas bifásicos ou complexos). A formação de
uma segunda fase, para os dois últimos casos, está sempre associada a uma reação invariante (que
ocorre para uma composição química e temperaturas fixas), podendo dar origem aos chamados
sistemas eutéticos, eutetóides, peritéticos, entre outros.
Define-se:
Fase: é uma porção de matéria com características próprias, sendo perfeitamente distinguível e
diferenciável uma das outras.
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1.4.1 – SISTEMAS ISOMORFOS OU MONOFÁSICOS
Nos sistemas de ligas isomorfos (Figura 11), formado por dois componentes puros (A e B),
sempre haverá uma mesma e única fase sólida (solução sólida por exemplo), para qualquer liga
do sistema. Nos diagramas de equilíbrio, o eixo das ordenadas é representado pelas temperaturas
(Tf A e Tf B são as temperaturas de fusão de A e B puros, respectivamente) e o eixo das abscissas é
representado pelas composições químicas de todas as ligas metálicas possíveis do sistema, as quais
variam desde 100% A e 0% B (componente puro A) até 0% A e 100% B (componente puro B). No
diagrama dado, a título de exemplo, a liga X, indicada, apresenta composição química de 20% A +
80% B, sendo que o percentual de B cresce no sentido indicado pela seta. O eixo das composições
pode ser representado em % atômico ou em % em massa (peso). Normalmente para os engenheiros
e metalurgistas a representação das composições em % em massa é mais interessante, pois na
fabricação de uma liga, é muito mais prático pesar tantas toneladas de A e de B, do que calcular a
quantidade de moles de A e de B a fim de se determinar a relação em percentual atômico. Esta
última forma de representação é mais usada pelos químicos e físicos.
liquidus
L
solidus Ti
Tii
isoterma
C C
%B
Os sistemas isomorfos apresentam a curva “liquidus” que define o início da solidificação de uma
determinada liga no resfriamento (ou seja, para temperaturas acima da temperatura “liquidus” só
existe fase líquida) e a curva “solidus” que indica o término da solidificação (ou seja, para
temperaturas abaixo da temperatura “solidus” só existe fase sólida). Na região compreendida entre
as curvas “liquidus” e “solidus” tem-se em equilíbrio as fases líquida e sólida. No caso da liga X, a
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solidificação ou fusão da mesma ocorre entre as temperaturas Ti e Tii , dependendo do sentido do
gradiente de temperatura.
A análise completa para uma determinada liga (no caso, liga X), passa necessariamente por duas
etapas (pode-se tomar como um modelo / roteiro didático, a ser seguido sempre):
No resfriamento lento, a partir do campo líquido (L), acima da temperatura Ti toda a liga
apresenta-se com uma única fase, no caso a fase Líquida (L). Exatamente na temperatura Ti
, inicia-se a solidificação da liga. Entre as temperaturas Ti e Tii passam a coexistir duas
fases, a sólida (e a líquida (L) - note-se no diagrama que o campo de fases, entre as duas
temperaturas indicadas é agora ( L + ) -. Exatamente na temperatura Tii é concluída a
solidificação da liga. Abaixo da temperatura Tii , toda a liga apresenta apenas uma fase, a
fase sólida . Esta primeira etapa da análise é concluída fazendo-se a representação
esquemática da microestrutura para cada campo de fase distinto, pelo qual a liga passa com
a diminuição da temperatura (campo monofásico ‘L’, campo bifásico ‘L + ’ e campo
monofásico ‘’), conforme indicado na figura.
Uma aplicação prática direta desta análise responderia à seguinte pergunta:
Que eventos metalúrgicos ocorrem com uma peça da liga X quando colocada dentro de um
forno, na T > Ti , caso, após homogeneizada a temperatura, o forno fosse desligado e o
material resfriado dentro dele mantido fechado?
b) Análise ponto a ponto (definido para a liga em estudo a uma temperatura específica)
das Fases Presentes (FP), das Composições Químicas das Fases Presentes (CQFP) e
das Quantidades Relativas das Fases Presentes (QRFP):
Ex.2: liga X, na temperatura da isoterma indicada Tii < T < Ti (o ponto de estudo cai
no campo bifásico ‘L + ’) Resposta: “fase liquida L e fase sólida ”;
Ex.3: liga X, na temperatura T < Tii (o ponto de estudo cai no campo monofásico
‘’) Resposta: “fase sólida ”.
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A determinação da CQFP depende do campo de fase em que se encontra o ponto de estudo:
a) quando o ponto cai em um campo monofásico, a composição química da fase presente
é igual à composição química da própria liga;
b) Quando o ponto cai em um campo bifásico (é o caso do ponto indicado no diagrama,
formado pela interseção da composição da liga X e a temperatura indicada pela
isoterma) adota-se o seguinte procedimento: i) traça-se uma isoterma no ponto de
estudo, chamada “tie line”; ii) a interseção da isoterma com as fronteiras que limitam o
campo bifásico (de um lado com a curva “solidus”, de outro com a curva “liquidus”)
definem dois novos pontos, os quais apresentam respectivamente as composições C1 e
C2, indicadas no diagrama; iii) a composição C1 do ponto formado pela interseção da
isoterma com a curva “solidus” corresponde à CQFP sólida ‘’, assim como, a
composição C2 do ponto formado pela interseção da isoterma com a curva “liquidus”
corresponde à CQFP líquida ‘L’, na temperatura de estudo (a indicada pela isoterma).
Ex.2: liga X, na temperatura da isoterma indicada Tii < T < Ti (o ponto de estudo cai
no campo bifásico ‘L + ’) Resposta: “CQ da fase é C1 (30% A + 70% B) e a
CQ da fase L é C2 (14% A + 86% B);
Ex.3: liga X, na temperatura T < Tii (o ponto de estudo cai no campo monofásico
‘’) Resposta: “CQ da fase é a composição da própria liga (20% A + 80%
B)”.
Ex.2: liga X, na temperatura da isoterma indicada Tii < T < Ti (o ponto de estudo cai
no campo bifásico ‘L + ’) Resposta: “QR da fase é 37,5% e a QR da fase L é
62,5% (de acordo com os resultados da regra da alavanca apresentada acima);
Ex.3: liga X, na temperatura T < Tii (o ponto de estudo cai no campo monofásico
‘’) Resposta: “QR da fase é 100%”.
No diagrama de equilíbrio Fe-Cr (Figura 12) merece destaque a fase , a qual é CCC e apresenta
solubilidade total entre os dois componentes, ou seja, os átomos de Cr podem substituir os átomos
de Fe para quaisquer proporções, e vice-versa, mantendo-se a fase estável, para determinadas
temperaturas. Já a máxima solubilidade do Cr na fase , CFC, rica em Fe, é de 11,2% Cr, em peso.
Quanto à fase sigma (, evidenciada para teores elevados de Cr, da ordem de 45% Cr, em peso,
esta é uma fase que se enquadra, tipicamente, no grupo das soluções sólidas ordenadas (Figura 13),
apresentando elevada dureza e fragilidade, conferindo, assim, uma baixa tenacidade ao material
quando nele presente. A possibilidade de formação desta fase ( é facilitada quando do uso de
técnicas de soldagem de aços inoxidáveis com elevados teores de Cr, principalmente quando
ocorre resfriamento lento do material soldado próximo à temperaturas de 850 ºC. Deve-se
enfatizar, que o Cr é responsável por conferir, aos aços, a característica de inoxidabilidade, isso
quando presente para teores superiores a 13%, em peso, na forma de solução sólida com o Fe. Por
fim, fica fácil entender o porque do Cr ser o principal elemento alfagêneo (estabilizador da fase ,
CCC) nos aços, devido a sua total solubilidade com o Fe, junto a esta fase.
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Uma aplicação prática deste diagrama, pode ser facilmente vislumbrada no estudo da deposição de
um filme de Cr (puro) sob um substrato de Fe também puro, por uma técnica qualquer, por
exemplo CVD (“chemical vapor deposition”). Suponha que após a deposição, deseje-se realizar
um tratamento térmico a alta temperatura, que possibilite a difusão de átomos de Cr para dentro do
reticulado do Fe. Ficaria em aberto, para se responder, a seguinte pergunta:
Ex. 4 - Qual a faixa de temperatura mais adequada para se realizar este tratamento?
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A resposta para este questionamento permite a realização de uma análise
mais aprofundada, resgatando alguns conceitos até aqui vistos. A primeira
observação a ser feita diz respeito à atmosfera na qual o tratamento pode ser
realizado. Devido à elevada afinidade do Cr pelo oxigênio (tal qual ocorre
com o Ti - ver pg. 12 -, o Cr também forma um óxido muito estável), o
tratamento teria que ser realizado em atmosfera redutora e/ou em fornos de
alto vácuo. Por outro lado, da análise do diagrama Fe-Cr (Figura 12), duas
faixas de temperaturas se destacam, tomando-se por base o lado do
diagrama cujas ligas são ricas em Fe: a) a faixa entre 912 ºC e 1394 ºC, de
domínio da fase (CFC); e b) a faixa entre 1394 ºC e 1538 ºC, sob domínio
do campo (CCC). Lembrando-se de que a difusividade de um
determinado metal é normalmente maior na fase CCC, do que na fase CFC
do Fe (ver Tabela 1), e associando-se ao fato de que a difusividade cresce
exponencialmente com a temperatura (ver Equação 1), uma temperatura da
segunda faixa, sob o ponto de vista metalúrgico, seria teoricamente a mais
indicada. Assim sendo, a escolha de uma temperatura da primeira faixa,
incorreria no fato de que no início do tratamento, na temperatura
especificada, os átomos de Cr, situados na frente de difusão junto da
interface entre o filme de Cr e o substrato de Fe, se difundiriam na fase
(CFC), rica em Fe, de forma mais lenta. Este fato continuaria a ocorrer até o
momento em que a solução sólida de Fe-Cr, junto à frente de difusão,
superasse o valor de 13,4%, quando, então, a fase (CCC), rica em Fe,
passaria a ser a fase termodinamicamente estável, possibilitando um
incremento na difusividade dos metais em questão.
Átomos de Cr
Átomos de Fe
(a) (b)
No diagrama de equilíbrio Fe-Ni (Figura 14) merece destaque, por sua vez, a fase , a qual é CFC
e apresenta solubilidade total entre os dois componentes, ou seja, os átomos de Ni podem
substituir os átomos de Fe para quaisquer proporções, e vice-versa, mantendo-se a fase estável,
para uma ampla faixa de temperaturas, a qual vai de 912 até 1394 ºC. Por sua vez, a máxima
solubilidade do Ni na fase , CCC, rica em Fe, é de 5,8% Ni, em peso, ocorrendo para uma
temperatura da ordem de 480 ºC.
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Figura 14 – Diagrama de Equilíbrio Fe-Ni (ASM Handbook, L.J. Swartzendruber, V.P. Itkin, and
C.B. Alcock, 1992).
para uma determinada faixa de temperaturas. Da análise dos diagramas Fe-Ni e Fe-Mn, fica fácil
entender o porque de ambos os elementos, Ni e Mn, serem os principais elementos gamagêneos
(estabilizadores da fase , CFC) nos aços, o que é explicado pelas suas totais solubilidades com o
Fe, junto a esta fase.
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A figura 16 apresenta dois sistemas de ligas eutéticos, um de solubilidade nula (Fig. 16a) e outro
de solubilidade parcial (Fig. 16b).
O sistema de solubilidade nula caracteriza-se por não admitir nenhum átomo do componente A em
solução no reticulado cristalino de B, o mesmo ocorrendo para o componente B em relação ao
componente A (Figura 16a). Para qualquer liga do sistema, após solidificação, sua microestrutura
apresentará um conjunto de cristais (grãos), cujas fases presentes A e B apresentarão composições
químicas de 100% A (A puro) e de 100% B (B puro), respectivamente. Todas as ligas deste
sistema apresentam transformação eutética (note-se que a isoterma eutética atravessa todo o
diagrama, o que não ocorre com o diagrama de solubilidade parcial), podendo ser classificadas em:
a) ligas hipoeutéticas (as situadas à esquerda do ponto eutético); b) a liga eutética; e c) ligas
hipereutéticas (situadas à direita do ponto eutético).
A liga eutética, que leva este nome por apresentar a composição química do ponto eutético, é
sempre a liga de menor temperatura de fusão ou solidificação do sistema. Note-se que ela se
comporta como um metal puro, pois sua solidificação ou fusão ocorre para uma temperatura fixa, e
não para uma faixa de temperaturas, conforme se esperaria para uma liga. O líquido do ponto
eutético solidifica-se formando o constituinte eutético, que é uma mistura das fases A + B (Fig.
16a) ou + (Fig. 16b). O constituinte eutético pode se encontrar sob a forma lamelar (forma
mais comum), podendo ainda ser do tipo globular ou acicular. Na Figura 17 tem-se a
representação esquemática da microestrutura lamelar típica de um constituinte eutético, o qual
apresenta lamelas alternadas das fases sólidas A e B puros (Fig. 16a) ou das soluções (fases) e
(Fig. 16b).
Fase sólida A
(ou )
Fase sólida B
(ou )
Por sua vez, nos sistemas de solubilidade parcial (Figura 16b), os componentes que formam o
sistema de ligas admitem, mesmo que em pequenas quantidades, átomos de um elemento no outro,
em seus reticulados cristalinos, formando os campos monofásicos de solubilidade parcial, e ,
respectivamente. Neste sistema a composição C1 corresponde ao valor da máxima solubilidade do
componente B no reticulado de A, assim como a composição C2 corresponde ao valor da máxima
solubilidade do componente A no reticulado de B, ambas as máximas solubilidades ocorrendo para
a temperatura eutética.
Nas Figuras 18, 19 e 20 são apresentados, respectivamente, os diagramas de equilíbrio Fe-P, Fe-S
e Fe-Nb, exemplos típicos de sistemas eutéticos de solubilidade parcial.
Os sistemas Fe-P e Fe-S (Figuras 18 e 19) são extremamente importantes na metalurgia, pois
ambos os elementos, o fósforo e o enxôfre, estão sempre presentes nos aços, mesmo que em
pequenos teores. A presença destes elementos provêm da matéria-prima, carvão coque, usado na
produção do ferro-gusa de primeira fusão, que por sua vez é usado na fabricação do aço. Como
visto, sistemas eutéticos tendem a apresentar as ligas de mais baixo ponto de fusão do sistema.
Ocorre que estes dois elementos, em particular, são responsáveis por formar, com o Fe, pontos
eutéticos com temperaturas de fusão muito baixas. O ponto eutético do sistema Fe-P ocorre para a
composição de 10,2% P, em peso, na temperatura de 1048 ºC. Por sua vez, o ponto eutético do
sistema Fe-S ocorre para a composição de 31,6% S, em peso, na temperatura de 988 ºC. A título
de comparação, é interessante lembrar que o Fe puro possui ponto de fusão de 1538 ºC. A grande
diferença de temperatura de fusão evidenciada entre as ligas eutéticas desses sistemas em relação
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 25
1/10/2016
ao Fe puro, a qual é de 490 ºC, para o eutético do sistema Fe-P e de 550 ºC, para o eutético do
sistema Fe-S, explica o porque destes dois elementos serem considerados os principais
fragilizantes a quente nos aços.
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 26
1/10/2016
Na Figura 20 é apresentado do sistema de ligas binário Fe-Nb. Merece destaque a presença de uma
fase intermetálica (fase intermediária) -Fe2Nb ocorrendo entre 38 e 51% Nb, em peso, sendo que
a fase apresentando 46% Nb, comporta-se como metal puro apresentando ponto de fusão de 1627
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 27
1/10/2016
Figura 20 - Diagrama de equilíbrio Fe-Nb (ASM Handbook, E. Paul and L.J. Swartzendruber,
1992).
ºC. Note-se que entre o Fe puro e esta fase existe uma reação eutética ocorrendo para a
composição de 18,6% Nb, em peso, na temperatura de 1373 ºC. Outras duas reações eutéticas
podem ser observadas neste sistema, para composições aproximadas de 56% e 75% Nb em peso,
nas temperaturas de 1535 e 1400 ºC.
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 28
1/10/2016
Sistemas complexos são sistemas que apresentam mais de um tipo de reação invariante (reações
que ocorrem para uma composição química e uma temperatura fixas). Além da reação eutética,
merecem destaque, ainda, as seguintes reações invariantes: a) peritética; b) eutetóide; e c)
peritetóide.
Define-se:
Reação peritética: reação em que uma fase líquida e outra sólida se transformam, no resfriamento,
em uma outra fase sólida distinta. Esta reação é normalmente representada pela seguinte forma:
L ;
Reação eutetóide: reação em que uma fase sólida se transforma, no resfriamento, em duas outras
fases sólidas distintas. Esta reação é normalmente representada pela seguinte forma: ;
Reação peritetóide: reação em que duas fases sólidas se transformam, no resfriamento, em uma
outra fase sólida distinta. Esta reação é normalmente representada pela seguinte forma:
;
Nas Figuras 21, 22 e 23, são apresentados três diferentes exemplos de sistemas complexos,
respectivamente, os diagramas de equilíbrio Fe-C, Fe-N e Fe-O. Todos estes diagramas são
representativos de sistemas binários formados por elementos intersticiais e o Fe. Estes sistemas são
especialmente importantes no setor metal-mecânico, pois, o sistema Fe-C, é a base do estudo dos
aços e dos ferros fundidos; o sistema Fe-N, fundamenta o estudo dos tratamentos de nitretação em
ligas ferrosas; e o sistema Fe-O, fornece uma noção importante dos diferentes tipos de óxidos de
ferro que podem ser formados em atmosferas e meios oxidantes.
Define-se:
Aço: na sua definição mais simples (baseada do diagrama Fe-C, Figura 21), é uma liga de ferro
cujo teor de carbono que pode variar desde traços até 2,14% C, em peso. Note-se que esta variação
coincide integralmente com a faixa de composições químicas na qual, o campo da fase (CFC),
ocorre no diagrama.
O sistema Fe-C pode ser representado de duas formas (Figura 21): a) diagrama de fases estável
Ferro-Grafita (utilizando-se apenas das linhas contínuas), no qual o eixo das composições varia de
100% Fe até 100% C, em peso; e b) o diagrama de fases metaestável Ferro-Cementita (utilizando-
se das linhas tracejadas), no qual o eixo das composições varia de 100% Fe até 6,7% C, em peso.
No setor metal-mecânico, o diagrama metaestável é o mais utilizado, pois a grafita pura que é a
fase estável do C neste sistema apresenta pouco interesse para o engenheiro. Exatamente o
contrário ocorre em relação à cementita, pois, apesar de ser a fase metaestável na qual o carbono
se apresenta neste sistema, a cementita apresenta grande importância nos estudos dos aços. O
diagrama metaestável indica que as ligas deste sistema sempre apresentarão duas fases à
temperatura ambiente: a fase (CCC), chamada de Ferrita, e a fase carboneto de ferro, Fe3C (ou
Cementita).
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 29
1/10/2016
Define-se:
Ferrita ou Fe-: solução sólida de carbono no ferro, apresentando estrutura cúbica de corpo
centrado, contendo traços de carbono, ou seja, a solubilidade do carbono na ferrita é praticamente
nula a temperatura ambiente, atingindo o valor máximo de 0,021% C a temperatura de 727C.
Apresenta estrutura de grãos poligonais irregulares, é uma fase de baixa dureza (HB 90, “Hardness
Brinell”), de baixo limite de resistência a tração (350 MPa), apresentando porém excelente
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 30
1/10/2016
Figura 22 – Aspecto dos cristais de Ferrita (Fe-, CCC), em Ferro com pureza de 99,99%
(Tratamento: recozimento a 800 ºC durante 2 horas em hidrogênio, laminado). Ataque
químico: Nital 3%. Aumento: 250x. (Metallographic supplies – P.F. Dujardin & CO.
Düsseldorf, 1958).
A comparação dos tamanhos dos campos (CCC), (CFC), e (CCC), junto às ligas deste sistema
(Figura 21), ilustra a ação do carbono como elemento gamagêneo e, portanto, estabilizador da fase
(CFC), chamada de Austenita. Pode-se observar ainda, neste sistema, três reações invariantes
distintas, a saber:
Define-se:
Austenita ou Fe-: solução sólida de carbono no ferro, apresentando estrutura CFC, a qual admite
elevados teores de carbono em solução, apresentando ainda um limite de solubilidade máximo em
torno de 2,14% C à temperatura de 1147C (Figuras 24 e 25). Nos aços-carbonos comuns esta fase
só é estável acima de 727C. Caracteriza-se por grãos poligonais irregulares. Possui boa
resistência mecânica, apreciável tenacidade e é não-magnética.
Note-se que não é por acaso que as Figuras 24 e 25, representando cristais de austenita, foram
obtidas a partir de aços de alta liga (ambos contendo elevados teores de Ni), pois conforme o
diagrama Fe-C (Figura 21), a austenita neste sistema binário só é estável acima de 727 ºC. Para
obter uma imagem da fase austenita deste sistema, seria necessário o recurso de microscopia de
câmara quente. Na Figura 24, em particular, está ilustrado também de forma indireta, o efeito dos
elementos C, Ni e Mn (elementos de liga gamagêneos) sobre o sistema Fe-C, resultando na
ampliação do campo (CFC) para a temperatura ambiente (ver diagramas de equilíbrio Fe-Ni e
Fe-Mn, nas Figuras 14 e 15, respectivamente).
Uma última particularidade do sistema Fe-C, recai no produto obtido da transformação eutetóide
( + Fe3C). Este produto, chamado de Perlita, consiste em um constituinte microscópico
lamelar, bifásico, formado por lamelas alternadas das fases (CCC) + Fe3C (Figura 26). Apresenta
elevada resistência a tração (aproximadamente 830 MPa), uma boa dureza (de HB 250 a 300) e
boa ductibilidade (= 10%, alongamento em 2”). Apenas a título de curiosidade, o produto obtido
da transformação eutética (L + Fe3C) é chamado de Ledeburita, sendo também bifásico,
ocorrendo, porém, apenas nos ferros fundidos. Por fim, a aplicação do diagrama Fe-C no estudo
dos aços será abordada de forma mais aprofundada, à frente.
Cementita
Na Figura 27 é apresentado o diagrama de equilíbrio Fe-N. Este sistema é muito parecido com o
sistema Fe-C, no que se refere às fases (CCC) e (CFC) do Fe. Apresenta, basicamente, as
seguintes características:
No caso específico de aços para nitretação (com adições de Cr, Mo, Al, Ti, V, W) a transformação
(CCC) (CFC), e portanto a temperatura de transformação eutetóide do sistema Fe-N, pode
ser superior à 630 ºC, o que está de acordo com a influência dos elementos de liga na temperatura
da reação eutetóide, de modo idêntico ao verificado para o sistema Fe-C, conforme será visto à
frente.
Com relação às fases nitretos, todos os nitretos de ferro são meta-estáveis, sendo de interesse no
setor metal-mecânico apenas as fases Fe2-3N) e ’(Fe4N). Os diferentes nitretos de ferro
possíveis no sistema Fe-N são:
(Fe2N): estável até 420 ºC a 1 atm, evolui termicamente para a fase Fe2-3N) liberando N.
Indesejável em aplicações mecânicas devido a sua alta fragilidade, baixa aderência e baixa
estabilidade térmica;
” (Fe16N2): esta fase é obtida a partir do revenimento da martensita entre 200 e 250 ºC.
Apresenta uma estrutura de super-reticulado ordenado, evoluindo quando aquecida para a fase
’(Fe4N). Esta fase tem sido o alvo de estudos recentes na busca de novos materiais,
principalmente pelas suas propriedades magnéticas;
’(Fe4N): apresenta estrutura cristalina CFC, possui uma faixa de estequiometria variando
entre 5,30 e 5,75% N, em peso. É a fase mais estável do sistema Fe-N, apresentando
estabilidade térmica até 650 ºC. Esta fase apresenta uma menor dureza e maior ductilidade na
interface entre a camada branca e a matriz, comparativamente à fase Fe2-3N) apresentando
melhores características mecânicas;
Fe2-3N): apresenta estrutura cristalina HC, possui uma larga faixa estequiométrica, variando
entre 5,75 e 11% N, em peso. É estável termicamente até 580 ºC, evoluindo para a fase
’(Fe4N), à temperaturas superiores. Por ser mais dura, é também mais frágil que a fase
’(Fe4N).
16a com a Fig. 28). Conforme visto no item 1.3, a baixa solubilidade do oxigênio é devida à sua
natureza eletronegativa, a qual resulta preferencialmente na formação de óxidos estáveis,
Figura 27 – Diagrama de equilíbrio Fe-N (ASM Handbook, H.A. Wriedt, N.A. Gokcen, and R.H.
Nafziger, 1992).
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 36
1/10/2016
apresentando ligações iônicas, no lugar de soluções sólidas, as quais apresentam ligação metálica.
Merece destaque, neste sistema, a fase Fe3O4, a qual é a principal fase responsável pela proteção
de superfícies ferrosas, quando do uso do tratamento superficial de ferroxidação.
É importante, neste ponto, conhecer de forma bem clara o papel do tipo de ligação interatômica
nas características e nas propriedades dos diferentes tipos de materiais, bem como nas suas
respectivas fases.
Ligação iônica: são encontradas em compostos constituídos por elementos metálicos e não-
metálicos (átomos situados nas extremidades horizontais da tabela periódica). Na ligação
iônica ambos os elementos passam a existir como íons. Os materiais iônicos apresentam
configuração eletrônica estável, decorrente da ligação, sendo que a magnitude da ligação é
igual em todas as direções ao redor do íon (ligações ditas não-direcionais). Ocorre,
predominantemente, nos materiais cerâmicos. Os materiais iônicos são caracteristicamente
duros, frágeis, isolantes térmicos e elétricos, apresentando elevadas temperaturas de fusão,
características estas que são típicas dos materiais cerâmicos (sendo o caso das fases óxidas,
nitretos e carbonetos, normalmente presente no aços).
Ligação covalente: neste caso, a configuração eletrônica estável dos elementos que
constituem o material é obtida através do compartilhamento de elétrons entre os átomos
adjacentes. O número (N) de ligações covalentes possíveis para um determinado átomo é
dado pela fórmula N = 8 - N’, onde N’ representa o número de elétrons de valência. A
ligação covalente é do tipo direcional, o que significa que só ocorre entre os átomos
específicos da ligação e na direção de compartilhamento de elétrons. Ocorre em materiais
sólidos como diamante (carbono), silício e em compostos constituídos por elementos do
lado direito da tabela periódica, sendo o caso do SiC. A ligação covalente pode ser
extremamente forte, como no diamante (funde acima de 3550 ºC e é muito duro) ou muito
fraca, sendo o caso do bismuto (funde a 270 ºC).
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 38
1/10/2016
A maioria dos compostos (ou suas fases) é parcialmente iônica e covalente (poucos
materiais apresentam ligações puramente iônicas ou covalentes). Quanto mais distanciados
na tabela periódica (maior diferença em eletronegatividade) maior é o grau em ligação
iônica. Por outro lado, quanto mais próximos na tabela, maior é o grau de covalência.
Finalizando este capítulo, cabe enfatizar, como não poderia ser diferente, que em todos os sistemas
binários vistos, verifica-se junto ao eixo do Fe, sempre a presença dos três campos monofásicos,
representativos de suas três fases alotrópicas, no estado sólido, que são os campos (CCC)
(CFC) e (CCC), sendo que este último estende-se até a temperatura de fusão do Fe, que é de
1538 ºC, conforme visto.
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 39
1/10/2016
2 – AÇOS
2.1 – OS AÇOS SEGUNDO O DIAGRAMA DE EQUILÍBRIO Fe-C
Conforme visto no capítulo anterior, o sistema Fe-C fundamenta todo o estudo dos aços e dos
ferros fundidos. Aproveitando o diagrama de fases, na Figura 29 é apresentada a classificação dos
aços e dos ferros fundidos em função da reação invariante eutetóide e eutética, respectivamente.
Aços
Hipoeu- Aços Ferros Fundidos Ferros fundidos
tetóides Hipereutetóides Hipoeutéticos Hipereutéticos
Figura 29 – Classificação dos aços e ferros fundidos segundo o diagrama Fe-C (adaptado Metals
Hnadbook, H. Okamoto, 1992).
Centrando a atenção exclusivamente para o caso dos aços, segundo a reação eutetóide, os aços
normalmente são classificados em quatro categorias (Figura 29):
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 40
1/10/2016
Aços que não apresentam transformação eutetóide: ligas apresentando teores de carbono
variando entre traços até 0,021% C, em peso;
Aços hipoeutetóides: ligas apresentando teores de carbono variando entre 0,02 e 0,76% C, em
peso;
Aço eutetóide: a liga que apresenta 0,76% C, em peso, ou seja, exatamente a composição
química do ponto eutetóide; e
Aços hipereutetóides: ligas apresentando teores de carbono variando entre 0,76% e 2,14% C,
em peso;
Assim sendo, na prática, o diagrama focado nos constituintes, torna-se mais interessante. O
diagrama de constituintes do sistema Fe-C é apresentado na Figura 30, sendo dada ênfase para a
faixa de composições que apresenta interesse direto para o estudo dos aços, ou seja, de 100% até
97,86% Fe (ou, de 0% até 2,14% C), em peso.
A comparação direta dos diagramas das Figuras 29 e 30 possibilita identificar, para cada tipo de
aço, os constituintes que formam suas respectivas microestruturas, o que pode ser resumido da
seguinte forma:
Aços que não apresentam transformação eutetóide: sua microestrutura é formada pelos
constituintes Ferrita (matriz) e Cementita (precipitados). (Figura 31);
Aços hipoeutetóides: apresentam microestrutura formada pelos constituintes Ferrita e Perlita
(Figura 32);
Aço eutetóide: apresenta microestrutura formada apenas pelo constituinte Perlita (Figura 33); e
Aços hipereutetóides: apresentam microestrutura formada pelos constituintes Perlita e
Cementita (Figura 34);
Define-se:
Matriz: é uma porção de matéria formada sempre pela fase contínua, interligada.
Acm
912 ºC Fe3C
A3 A1
727 ºC
Fe3C
Ferrita +
Cementita Perlita
Fe %C
Na Figura 30, são ainda indicados os nomes de três importantes curvas do sistema Fe-C, a saber:
A1, A3 e Acm.
Define-se:
Curva A1: a curva A1, representativa da isoterma eutetóide (727 ºC), a qual, em conjunto com a
curva A3, defini uma região conhecida por zona crítica;
Zona crítica: formada pelo conjunto das curvas A1 e A3, leva este nome por separar duas regiões
bem distintas do diagrama, a região (ferrita) e a região (austenita). Em outras palavras, a zona
crítica identifica uma faixa de temperaturas, abaixo da qual não existe a fase (ou constituinte
monofásico) (austenita);
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 42
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Pode-se observar no ponto 1, o início da transformação , onde cristais de ferrita nucleiam-se
de forma estável na matriz de austenita. No ponto 2, a transformação é concluída, dando
lugar a uma microestrutura formada apenas por cristais de ferrita. Com a continuação do
resfriamento, no ponto 3 ocorre a saturação do reticulado da ferrita com átomos de carbono,
indicada pelo cruzamento da liga X com a curva solvus. A partir deste ponto inicia-se a
precipitação do constituinte cementita na matriz de ferrita, conjunto este que representa a
microestrutura final da liga, na temperatura ambiente.
Define-se:
Pode-se observar no ponto 1, o início da transformação , onde cristais de ferrita nucleiam-se
de forma estável na matriz de austenita. Estes primeiros cristais de ferrita são todos formados à
uma temperatura superior à do ponto eutetóide, durante o resfriamento da liga, antes de se atingí-
la. Em função disso, estes cristais, em particular, levam o nome de ferrita proeutetóide (p). A
composição química (CQ) e a quantidade relativa (QR) de cada constituinte muda ponto a ponto,
com a variação da temperatura no campo bifásico + . Deve-se atentar para o fato de que a
composição química da austenita não transformada evolui para o teor de 0,76% C, segundo a
curva A3, à medida em que a temperatura cai do ponto 1 para o ponto 2, pois a ferrita proeutetóide
nucleada na matriz austenítica apresenta uma quantidade de carbono bastante inferior (< 0,021%
C) em relação àquela inicialmente presente na austenita (X% C, no ponto 1). Em outras palavras,
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 43
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1
912 ºC
2
Fe3C
727 ºC
Isoterma eutetóide
Curva solvus
Fe3C
3
Fe3C
Fe % C
X
Figura 31 - Histórico de resfriamento, evolução dos constituintes e micrografias típicas para uma
liga que não apresenta transformação eutetóide (amostra de ferro com pureza de 99,85% ,
sinterizado em atmosfera levemente carbonetante. Aumento: 1000x).
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 44
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pode-se dizer que a austenita vai enriquecendo de carbono à medida em que a temperatura cai do
ponto 1 para o ponto 2. No ponto 2, a transformação é concluída, pois a austenita não
transformada adquire exatamente a temperatura e a composição do ponto eutetóide, sofrendo
assim a transformação eutetóide, a qual resulta na formação da perlita. A microestrutura final
passa a ser formada pelos constituintes ferrita e perlita, não ocorrendo mais nenhuma
transformação até a temperatura ambiente.
Ainda na Figura 32, a comparação das duas micrografias apresentadas permite evidenciar um
fenômeno extremamente importante, de caráter puramente difusivo, conhecido por crescimento de
grão. Note-se que a micrografia ‘a’ apresenta uma microestrutura bastante refinada, ao contrário
da micrografia ‘b’, onde ambos os grãos de ferrita e de perlita são tipicamente grosseiros. Esta
diferença é decorrente do tratamento de superaquecimento a 1000 ºC, ao qual a amostra ‘b’ foi
submetida, após a laminação a quente.
Define-se:
Crescimento de grão: processo termicamente ativado que consiste na troca de posições de átomos
junto à interface entre dois grãos adjacentes, de modo que átomos do grão menor movimentam-se
através do contorno de grão assumindo a orientação cristalográfica do grão adjacente maior. Em
outras palavras, caracteriza-se pelo crescimento dos grãos maiores às custas dos grãos menores,
pois a movimentação de um contorno de grão tipicamente côncavo só é termodinamicamente
favorável na direção do seu centro de curvatura, o que resulta na liberação de energia do sistema,
conforme ilustrado na Figura 33 (ver também Figura 1.3 e item 1.2).
Para o engenheiro mecânico, este fenômeno começa a ser significativo nos aços, quando aquecidos
à temperaturas acima de 500 ºC. Devido a isso, muito cuidado deve ser tomado na especificação
da temperatura de austenitização, quando da realização de qualquer tratamento térmico. Esta
observação está diretamente relacionada com a influência da temperatura de austenitização, obtida
a partir de uma determinada taxa de aquecimento, no tamanho de grão da austenita. Uma austenita
grosseira resulta em produtos de transformação grosseiros (ferrita, perlita e/ou cementita). Deve-se
lembrar que o tempo de permanência em temperatura elevada, apesar de menos efetivo que a
temperatura, exerce também influência na evolução do crescimento de grão, sendo que quanto
maiores a temperatura e o tempo de exposição, maior também será o efeito de crescimento de grão
da austenita, de acordo com as leis de difusão (Leis de Fick).
Por sua vez, o crescimento de grão deve ser evitado ao máximo em função do comprometimento
de determinadas propriedades do material. Com segurança, pode-se dizer que quanto menor o
tamanho de grão médio, maior é a dureza e a tensão de escoamento de um material. Esta afirmação
foi comprovada a partir de estudos realizados por Hall e Petch, utilizando-se de materiais
metálicos puros. Tais estudos permitiram deduzir as equações, conhecidas como equações de Hall-
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 45
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912 ºC
1
A3 Fe3C
P
2 727 ºC
Isoterma eutetóide
Fe3C
Fe3C e
e
p
p
Perlita lamelar
p
Fe % C
X
a b
Figura 32 - Histórico de resfriamento, evolução dos constituintes e micrografias típicas para uma
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 46
1/10/2016
liga hipoeutetóide (aço de médio teor de carbono com composição química, em peso, de:
0,45% C - 0,245% Si - 0,48% Mn - 0,024% S - 0,062% P): a) laminado a quente; e b)
superaquecido a 1000 ºC). Ataque químico: Nital 2%. Aumento: 250x. (Metallographic
supplies – P.F. Dujardin & CO. Düsseldorf, 1958).
Petch, as quais relacionam, respectivamente, tamanho de grão e dureza (3) e tamanho de grão e
tensão de escoamento (4), a saber:
H = H0 + kH .d-1/2 (3)
= 0 + k .d-1/2 (4)
sendo,
H, dureza;
H0, dureza esperada para um cristal hipotético de tamanho infinito (interseção da reta com o eixo
das ordenadas);
kH, coeficiente angular da reta;
d, diâmetro médio de grão;
tensão de escoamento;
0 e k, constantes equivalentes a H0 e kH;
912 ºC
Fe3C
1
727 ºC
Isoterma eutetóide
Fe3C
Fe3C e
e
Perlita lamelar
Fe % C
X
eutetóide (aço de alto teor de carbono com composição química, em peso, de: 0,76% C,
traços de Si, Mn, S e P). Ataque químico: Nital 2%. Aumento: 250x. (Metallographic
supplies – P.F. Dujardin & CO. Düsseldorf, 1958).
A liga eutetóide apresenta uma única transformação no estado sólido (a partir do campo
austenítico), ocorrendo exatamente no ponto 1. Neste ponto, a austenita sofre a transformação
eutetóide, resultando no constituinte perlita. A microestrutura final passa a ser formada
exclusivamente por perlita, não ocorrendo mais nenhuma transformação até a temperatura
ambiente.
A formação da perlita pode ser explicada de forma simplificada, conforme ilustrado na Figura 35.
Ao se atingir a temperatura de 727 C inicia-se a nucleação de pequenos embriões de ferrita ()
nos contornos de grãos da austenita (), a qual apresenta inicialmente 0,76% C. Como a
solubilidade do carbono na ferrita é muito baixa, sendo de 0,021% C, na temperatura citada, todo
restante de carbono não aceito em solução sólida na ferrita, se difunde para as adjacências destes
embriões enriquecendo-os de carbono. Consequentemente, nas adjacências dos embriões de ferrita
nucleiam-se embriões de cementita (com 6,67% C). Estes embriões vão crescendo até se
completar toda a transformação da austenita em ferrita e cementita, as quais se dispõem em
lamelas alternadas, resultando no constituinte bifásico chamado perlita.
Difusão de
Difusão de
Difusão do C Difusão do C
carbono carbono
FeFe
3C3C Fe3C Fe3C
Fe3C Fe3C
Por fim, na Figura 36 tem-se o histórico de resfriamento a partir do campo austenítico () e a
respectiva evolução dos constituintes, nos diferentes campos do diagrama, para uma liga X,
hipereutetóide. O comportamento desta liga é idêntico para todas as demais ligas hipereutetóides
(ligas com teores de carbono entre 0,76% C e 2,14% C). Note-se que todas essas ligas, de modo
similar ao que ocorre para as ligas hipoeutetóides, cruzam a isoterma eutetóide, apresentando,
deste modo, a transformação eutetóide e, consequentemente, o constituinte perlita quando do
resfriamento dentro do equilíbrio.
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Acm
912 ºC
1
Fe3C p
Fe3C
2 727 ºC
Isoterma eutetóide
Fe3C
e
Fe3C e
Perlita lamelar
Fe3C p
Fe % C
X
Figura 36 - Histórico de resfriamento, evolução dos constituintes e micrografia típica de uma liga
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 50
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hipereutetóide (aço de alto teor de carbono com composição química, em peso, de: 0,76%
C, traços de Si, Mn, S e P). Ataque químico: Nital 2%. Aumento: 250x. (Metallographic
supplies – P.F. Dujardin & CO. Düsseldorf, 1958).
Nas representações esquemáticas que ilustram as evoluções dos constituintes das ligas em estudo
das Figuras 32, 34 e 36, as fases ferrita e cementita, presentes no constituinte perlita, são
representadas pelos símbolos e e Fe3Ce, respectivamente (no caso o sub-índice ‘e’ vem de
eutetóide).
No ferro puro as transformações alotrópicas / (transformação A4) e / (transformação A3)
ocorrem nas temperaturas constantes de 1394 ºC e 912 ºC, respectivamente. Quando um segundo
elemento entra em solução com o Ferro cada uma delas passa a ocorrer para uma determinada
faixa de temperatura. Segundo a natureza do soluto introduzido no reticulado do Ferro, pode-se
observar a ocorrência de dois tipos de efeito. No primeiro, o efeito do soluto é o de elevar a
temperatura de transformação A4 e o de abaixar a temperatura de transformação A3, ampliando o
domínio de existência da fase (CFC). Tais solutos, no caso elementos como o Mn, Ni, C, entre
outros, são denominados de elementos de liga gamagêneos, ou seja, elementos estabilizadores da
fase (CFC). No segundo tipo, a presença do soluto tende a abaixar a temperatura de
transformação A4 e a de elevar a temperatura A3, aumentando o campo de existência da fase
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 51
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(CCC). Os solutos que produzem esse efeito, no caso elementos como o Si, Cr, Mo, entre outros,
são chamados de elementos de liga alfagêneos, ou seja, elementos estabilizadores da fase
(CCC).
O efeito dos elementos, individualmente, nos aços de baixa liga, pode ser melhor visualizado na
Figura 37, onde é mostrada a influência de determinados elementos de liga na temperatura e
Define-se:
Assim sendo, os elementos de liga nos aços podem ser classificados em três grupos distintos, a
saber (estão indicados abaixo apenas os principais):
Elementos de liga gamagêneos: Mn, Ni, Co, Cu, C e N;
Elementos de liga alfagêneos: Si, Cr, W, Mo, V, Ti, Be, Ta, Zr, B, S, P, Ce, Nb;
Elementos de liga formadores de carbonetos (e/ou nitretos, à exceção do W): Cr, Mo, W, V,
Nb, Ta, Ti e Zr.
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 53
1/10/2016
Deve-se destacar que os elementos de liga modificam as propriedades do aço através das
mudanças que introduzem na sua microestrutura. Tais modificações estão diretamente
relacionadas com a forma com que os mesmos se apresentam no material. Os elementos de liga
podem se apresentar sob diferentes formas nos aços:
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 54
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ELEMENTOS
912 ºC DE LIGA
ALFAGÊNEOS
Fe3C
727 ºC
Ponto eutetóide
Curva solvus
ELEMENTOS
DE LIGA Fe3C
GAMAGÊNEOS
Fe % C
Formando solução sólida com o Ferro, sendo que o material tem sua resistência aumentada
pelo mecanismo de endurecimento por formação de solução sólida. Cabe ressaltar que toda
liga (no caso, o aço) é sempre mais dura e resistente que seu respectivo metal base (no caso, o
Ferro puro). Dois exemplos de solução sólida típicas podem ser encontrados nos aços do tipo
inoxidáveis, a saber:
a) os aços inoxidáveis ferríticos, que constituem-se principalmente em ligas do sistema
Fe-Cr-C, apresentando normalmente teores superiores a 13% Cr, em peso, e traços de
carbono, sendo que o Cr é encontrado preferencialmente em solução sólida
substitucional com o Ferro na fase (CCC);
b) os aços inoxidáveis austeníticos, que constituem-se principalmente em ligas do sistema
Fe-Cr-Ni-C, apresentando teores elevados tanto de Cr como de Ni (normalmente
variando entre 13% a 25% para o Cr e entre 7% a 20% para o Ni, em peso) e traços de
carbono, sendo que ambos os elementos Cr e Ni são encontrados em solução sólida
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 55
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É importante ressaltar que um determinado elemento de liga não se localiza exclusivamente num
único constituinte, mas se distribui sob várias formas em diferentes constituintes. É evidente que
cada elemento manifesta, em geral, uma preferência marcada pela forma com o qual o mesmo será
encontrado na microestrutura do material. Assim sendo, pode-se prever, de forma aproximada,
uma tendência genérica na repartição dos elementos de liga presentes no material. Tal repartição
nos diferentes constituintes depende geralmente da quantidade ou concentração dos mesmos e do
histórico térmico a que foi submetido o material ao longo de seu processamento. Certos elementos
como o Ni, Si, Al e Cu são frequentemente encontrados em solução sólida. Outros, como o Cr,
Mo, W, Nb e Ti se apresentam usualmente como carbonetos (ou nitretos, ou óxidos) e, em menor
grau, em solução sólida. Estes últimos, quando em teores elevados, podem formar também
compostos intermetálicos com o Ferro (Fe3W2, Fe3W, Fe2Mo2, FeMo, ...). Alguns elementos,
conforme já visto, podem estar presentes, ainda, como inclusões não-metálicas (MnO, MnS, SiO2,
Al2O3, TiO2, Fe4N, ...).
A Figura 41 apresenta uma parte da classificação para avaliação micrográfica de inclusões de aços
adotada pela Associação dos Siderúrgicos Suécos de Estocolmo. São apresentadas as
representações de dois tipos de inclusões, da série grossa: a) tipo A - sulfetos ou sulfuretos (para
espessuras de até 6 m), nas classificações 1, 3 e 5, respectivamente; e b) tipo D – óxido, globular
(para espessuras de até 12 m), também nas classificações 1, 3 e 5, respectivamente. Deve-se
ressaltar que a observação das inclusões em amostras de aços é uma importante etapa da análise
metalográfica e é realizada no microscópio ótico imediatamente após o polimento, antecedendo,
porém, à etapa de ataque químico da amostra.
Conforme visto, os aços são ligas ferrosas de baixo teor em carbono, contendo ainda impurezas e,
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1 3 5
A – TIPO SULFETOS OU SULFURETOS
1 3 5
D – TIPO ÓXIDO, GLOBULAR
Figura 41 – Parte da classificação para avaliação micrográfica de inclusões de aços adotada pela
Associação dos Siderúrgicos Suécos de Estocolmo, para dois tipos de inclusões, da série grossa: a)
tipo A - sulfetos ou sulfuretos (para espessuras de até 6 m), nas classificações 1, 3 e 5,
respectivamente; e b) tipo D – óxido, globular (para espessuras de até 12 m), também nas
classificações 1, 3 e 5, respectivamente (a figura original é 4,3 vezes, linearmente, maior do que a
apresentada aqui), (Hubertus Colpaert, 1974).
eventualmente, elementos adicionados como liga. Consideram-se usualmente três tipos principais
de aços, de acordo com a composição química:
aços-ao-carbono: caracterizados como ligas do sistema Fe-C, contendo até 2,14% C, em peso,
além de certos elementos residuais advindos do processo de fabricação. Conforme visto na
Figura 29, o diagrama de equilíbrio Fe-C fundamenta todo o estudo deste grupo de aços;
aços de baixa-liga: caracterizados como ligas do sistema Fe-C contendo elementos adicionados
intencionalmente e/ou apresentando elementos residuais em teores acima dos que são
considerados normais. Neste caso, apresentam um somatório de elementos de liga inferior a
5%;
aços de alta-liga: diferenciam-se dos aços de baixa-liga pela quantidade de elementos de liga,
apresentando um somatório de elementos de liga superior a 5%.
Os objetivos da adição de elementos de liga são específicos para cada um dos dois grupos de aços
ligados. Nos aços de baixa-liga, a adição tem por finalidade atender aos seguintes objetivos:
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 57
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Por outro lado, nos aços de alta-liga a adição tem por finalidade atender a objetivos específicos,
tais como:
o aumento da resistência ao desgaste (é o caso dos aços-ferramentas, aços-rápidos, aços
indeformáveis para trabalho a frio, aços indeformáveis para trabalho a quente, entre outros);
o aumento da resistência à corrosão (sendo o caso típico dos aços inoxidáveis, de um modo
genérico);
o aumento da resistência à elevadas temperaturas (alguns aços inoxidáveis como o austenítico
ABNT 310 - o qual apresenta em média 25% Cr, 20% Ni, 1,5% Mn, 1,5% Si, em peso, além
de traços de carbono e balanço em Fe - são chamados de aços refratários);
a melhoria das propriedades elétricas e magnéticas (a adição de Si e Co em teores elevados
tende a melhorar tais propriedades nos aços); e, por fim,
a melhoria da usinabilidade (pois a adição de S, P ou Pb, para teores acima dos considerados
usuais para estes elementos, normalmente maiores do que 0,05%, em peso, garante tal
predicado no aço).
2.2.1 – AÇOS-AO-CARBONO
A maioria dos aços-ao-carbono contém de 0,10 a l,50% C, em peso. Apesar do estudo destes aços
ser fundamentado no diagrama Fe-C, na prática todo aço-ao-carbono constitui-se em uma liga
complexa, apresentando também concentrações de P, S, Mn e Si, podendo-se observar ainda a
presença de traços de outros elementos tais como N, O e Al, entre outros.
Os elementos Fósforo (P) e Enxôfre (S) são normalmente considerados como impurezas nos aços.
A presença destes elementos advêm do carvão-coque, que é uma das matérias-primas usadas na
fabricação do ferro-guza de primeira fusão (liga de Fe apresentando de 4 a 5% C, em peso), o qual
é obtido na etapa de redução do minério de ferro em altos-fornos e usado na etapa de refino do aço
junto aos fornos conversores.
A presença dos elementos Manganês (Mn) e Silício (Si) nos aços é consequência de dois aspectos
técnicos distintos:
conforme visto no diagrama Fe-S (Figura 19), o enxôfre tende a causar a fragilização a quente
nos aços devido à formação de um constituinte eutético de baixo ponto de fusão com o Fe (988
ºC). Como o enxôfre está presente como contaminante na composição do aço, o efeito negativo
que ele causaria ao se combinar com o Fe tem que ser evitado a todo custo. Isto é conseguido
através da adição do Mn na composição da liga enquanto líquida, durante o banho. Ocorre que
o Mn une-se preferencialmente ao S, formando o sulfeto de manganês (MnS), por ser uma fase
termodinamicamente mais estável que a fase concorrente que formar-se-ia na ausência de Mn
no banho, no caso, o sulfeto de ferro (FeS). Deve-se destacar que a fase MnS apresenta
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 58
1/10/2016
elevado ponto de fusão e alta ductilidade. Daí ser comum encontrar em aços laminados, esta
fase dispersa na matriz apresentando morfologia alongada no sentido da laminação (Figura
41).
O silício, por sua vez, é necessariamente adicionado ao banho da liga, durante o processo de
refino do aço, com a finalidade de se combinar com o oxigênio presente no processo,
resultando na formação do óxido de silício (SiO2), que é removido através da retirada da
escória do banho. Aços que apresentam Si na composição são chamados de aços acalmados.
Este nome decorre do fato de que o oxigênio, usado para controlar o teor de carbono da liga
através da formação de CO e CO2, tende a causar um forte borbulhamento do banho durante a
etapa de refino. Com a retirada do oxigênio através do uso do Si, o banho pára de borbulhar,
dando-se a impressão de se ter acalmado. Quando ao invés de Si usa-se o Alumínio (Al), o
oxigênio presente no banho é removido a partir da formação e retirada pela escória do óxido de
alumínio (Al2O3). Aços que apresentam Al no lugar do Si, em sua composição, são chamados
de aços superacalmados.
Apenas a título de curiosidade, segundo a influência do teor de carbono sobre a dureza do aço,
costuma-se classificar os aços-ao-carbono em seis grupos principais (aqui a palavra “doce” deve
ser entendida com o sentido de mole, macio, dúctil):
aços extra-doces, contendo até 0,15% C, em peso;
aços doces, com teores entre 0,15 e 0,30%, em peso;
aços meio-doces, com teores entre 0,30 e 0,40% C, em peso;
aços meio-duros, com teores entre 0,40 e 0,60% C, em peso;
aços duros, com teores entre 0,60 e 0,70% C, em peso;
aços extra-duros, com teores entre 0,70 e 1,50% C, em peso.
A título de curiosidade, utilizando-se do recurso das técnicas modernas de fabricação, as quais têm
possibilitado a obtenção de aços não-ligados apresentando baixíssimos teores de elementos
intersticiais, recentemente (no final dos anos 90) foi desenvolvido pela indústria siderúrgica um
novo tipo de aço, os chamados “free interstitial steels” ou, simplesmente, aços livres de
intersticiais. Este desenvolvimento vem no sentido de atender as necessidades da indústria
automotiva no setor de fabricação de carrocerias, a qual tem exigido a utilização de chapas de aços
apresentando, cada vez mais, elevadas ductilidade, estampabilidade e profundidade de
embutimento. Estes aços enquadram-se dentro da categoria dos aços extra-doces, pois apresentam
teores de intersticiais inferiores a 0,01%, em peso.
Da mesma forma que o verificado para os aços-ao-carbono, tanto os aços de baixa-liga como os
aços de alta-liga constituem-se em ligas complexas, onde os elementos P, S, Mn e Si ou Al
também estão presentes pelos mesmos motivos acima apresentados.
No caso específico dos aços de baixa-liga, elementos como Cr, Ni, Mo, Si, Mn e B são
adicionados em quantidades moderadas, conforme já visto, com a finalidade principal de aumentar
a temperabilidade do material e possibilitar a otimização de suas propriedades através da
realização de tratamentos térmicos específicos. A escolha correta do tratamento térmico possibilita
a obtenção de microestruturas específicas, as quais são as responsáveis pelo conjunto de
propriedades mecânicas que o aço apresentará após a realização do mesmo, garantindo sua
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 59
1/10/2016
Entre os principais elementos de liga introduzidos no aço para lhe conferir propriedades
específicas destacam-se o Ni, Cr, Si, Mn, Mo, V, W, Ti, Nb. Conforme será visto à frente, a norma
brasileira classifica os aços de alta-liga em duas classes distintas, a saber: a) aços resistentes a
corrosão e a altas temperaturas; e b) aços ferramentas.
Por outro lado, em determinados casos como alguns aços para ferramentas, podem ser encontrados
teores de C superiores a 2,06%, que corresponde ao limite de solubilidade máximo de C na
austenita ou Fe-. Um exemplo típico deste caso é o aço para trabalho a frio ABNT D3, contendo
aproximadamente 2,0% C, 11,5% Cr, 0,2% V, em peso (estão listados apenas os principais
elementos). Esta grande quantidade de carbono é adicionada para garantir a precipitação de
partículas de segunda fase na forma de carbonetos de cromo (Cr23C6), o que garante um aumento
considerável da resistência do material.
Dentre os diversos sistemas de classificação de aços duas linhas básicas são preferencialmente
utilizadas: o sistema americano baseado na norma desenvolvida pela AISI - “American Iron and
Steel Institute” e o sistema europeu baseado na norma alemã DIN - “Deutsche Industrie Norm”.
No Brasil, as normas de classificação de aços são regidas pela ABNT - Associação Brasileira de
Normas Técnicas, que se baseia no sistema americano de classificação (AISI).
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 60
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Estes aços são classificados por meio de 4 números precedidos por uma letra maiúscula que
especifica o processo de fusão. Eventualmente a especificação pode apresentar ainda, de forma
complementar, letras após o quarto número. A norma estabelece as seguintes considerações:
O primeiro número representa o(s) elemento(s) de liga(s) presentes no aço;
O segundo número representa o teor desses elementos de liga (deve-se consultar as tabelas,
junto à norma);
Os terceiro e quarto números representam o teor de carbono multiplicado por 100.
Como exemplos de letras que antecedem os números, destacam-se, dentre outros, E = aço
produzido pelo processo elétrico básico (cujos teores de P e S são inferiores a 0,025%); B =
processo Bessemer básico; C = processo Siemens-Martin básico; D = processo Siemens-Martin
ácido. Como exemplos de letras após o quarto número, pode-se citar: H = aço fornecido como
temperado; L = aço com teor de C inferior ao indicado; F = aços de fácil usinagem. Na Tabela 6 é
apresentada a classificação de aços-ao-carbono e aços de baixa-liga pela norma ABNT.
Os aços resistentes a corrosão e a altas temperaturas são classificados com três números. Como
exemplo, pode-se citar:
Aço ABNT 430 (aço inoxidável ferrítico);
Aço ABNT 403 (aço inoxidável martensítico);
Aço ABNT 304 (aço inoxidável austenítico);
Aço ABNT 304L (aço inoxidável austenítico com teor de C abaixo do especificado);
É interessante destacar que os aços inoxidáveis da classe 300 são todos austeníticos, assim como
os aços da classe 400 podem ser ferríticos ou martensíticos. A Tabela 9 apresenta exemplos de
aços de alta-liga resistentes a corrosão e a altas temperaturas, detalhando-se a microestrutura de
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Por sua vez, os aços ferramentas são classificados segundo uma letra que retrata de alguma forma
o material, seguida de um ou dois números. Destacam-se as seguintes categorias de aços de acordo
com as respectivas letras:
W: aços temperáveis em água;
O: aços temperáveis em óleo;
A: aços temperáveis ao ar;
S: aços resistentes ao impacto;
T: aço rápido ao W;
M: aço rápido ao Mo;
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A título de exemplo tem-se o aço ABNT D6, apresentando 2,1% C, 11,5% Cr, 0,7% W, 0,2%V.
Este aço, usado na fabricação de ferramentas como punções e matrizes, é normalmente
classificado como um aço indeformável para trabalho a frio. A Tabela 10 apresenta exemplos de
aços de alta-liga ferramentas, detalhando-se suas respectivas composições.
A norma DIN classifica os materiais de três modos distintos, podendo ser pela composição
química, pela resistência mecânica (utilizando-se ou da tensão de ruptura ou da tensão de
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 65
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Aço Equivalente
ABNT 1008 DIN C8
ABNT 1010 DIN C10
ABNT 1015 DIN C15
ABNT 1020 DIN C20
ABNT 1025 DIN C25
ABNT 1035 DIN C35
ABNT 1045 DIN C45
ABNT 1060 DIN C60
ABNT 1084 DIN C84
ABNT 1095 DIN C95
Estes materiais são classificados pelo teor de carbono multiplicado por 100, seguido dos elementos
de liga presentes e seus respectivos teores multiplicados por um fator de multiplicação. Alguns
valores típicos de fatores de multiplicação: Mn = 4; Cr = 4; Ni = 4; Mo = 10; .... Os exemplos
abaixo são representativos de especificações deste grupo de aços:
Aço DIN 16 MnCr 5: aço com 0,16% C, 1,25% Mn e traços de Cr;
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 66
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Aço Equivalente
ABNT 4140 DIN 42 Cr Mo 4
ABNT 4130 DIN 25 Cr Mo 4
ABNT 8660 DIN 60 Ni Cr Mo 2
ABNT 5140 DIN 41 Cr 4
ABNT 52100 DIN 100 Cr 6
ABNT 6150 DIN 50 Cr V 4
ABNT 9260 DIN 60 Si 7
Esta classificação especifica o aço através do seu limite de resistência a tração (tensão de ruptura)
ou do seu limite de escoamento, dados em N/mm2 (ou MPa). Algumas letras usadas na
especificação desta norma são: R = aço acalmado; Ro = aço no estado bruto de fusão; RR = aço
super-acalmado; U = aço não acalmado; St = tensão de ruptura; Ste = tensão de escoamento,.... A
título de exemplo são apresentados dois casos ilustrativos:
- Aço DIN RSt 37: aço acalmado, com rup = 370 MPa;
- Aço DIN RoSt 33: aço no estado bruto de fusão, com rup = 330 MPa.
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Tabela 14 – Equivalentes dos aços ferramentas da Tabela 10 segundo a norma DIN (Villares).
Esta classificação utiliza 7 números, sendo o primeiro referente ao tipo de material, os quatro
números seguintes indicando o tipo de aço e a composição química e os dois últimos números
sendo utilizados para dados complementares. Esta forma de especificação torna-se mais
complicada uma vez que necessita de tabela para consulta, não sendo auto-explicativa como nos
casos anteriores. Como exemplo: aço DIN 1.7035 = aço DIN 41Cr 4 (aço com 0,40% C e 1,00%
Cr). De forma genérica: aço DIN X.XXXX.XX
Basicamente, pode-se dizer que a realização de tratamento térmico nos aços possibilita a obtenção
de microestruturas especiais, as quais conferem ao material um conjunto de determinadas
propriedades mecânicas o qual é indicado para uma gama de aplicações específicas.
Todo tratamento térmico abrange três etapas distintas e igualmente importantes: a) aquecimento;
b) permanência na temperatura especificada; e c) resfriamento. A nível introdutório, especial
atenção é normalmente dada somente à etapa de resfriamento, pois uma vez austenitizado de
forma adequada o aço, a transformação da austenita poderá ocorrer para diferentes constituintes, o
que é uma função do tipo (se contínuo ou isotérmico) e da forma (rápida, intermediária ou lenta)
em que o resfriamento ocorrer.
Por outro lado, regras práticas normalmente indicadas pelo próprio fabricante do aço garantem
uma boa condição de aquecimento, quando da austenitização da liga, onde se procura evitar
basicamente o crescimento de grão excessivo bem como a “queima” do material.
Define-se:
Os diagramas TTT (tempo, temperatura, transformação) são conhecidos também por Diagramas de
Transformação Isotérmica, pelo fato de que nele são apresentados os produtos de transformação da
austenita quando esta se transforma isotermicamente, ou seja, a uma determinada temperatura
constante. Estes diagramas, por apresentarem em um dos eixos a variável tempo (eixo das
abscissas), relacionam-se diretamente com a cinética de transformação e, portanto, com a
velocidade com que a austenita se transforma a uma determinada temperatura (eixo das
ordenadas), diferentemente dos diagramas de equilíbrio, os quais relacionam-se exclusivamente
com os aspectos termodinâmicos, ou seja, com as fases de equilíbrio previstas para cada liga do
sistema em função da temperatura, conforme já visto. As curvas presentes nos diagramas TTT
indicam os tempos de início e fim de transformação da austenita na temperatura considerada. Estas
curvas são chamadas de curva de início (Ci) e curva de fim (Cf) de transformação da austenita e,
para os aços-ao-carbono apresentam o formato característico de um C.
A Figura 42 mostra um diagrama TTT esquemático para o aço eutetóide. Cabe ressaltar que cada
aço apresenta um diagrama TTT próprio, valendo exclusivamente para o aço considerado. Devido
a enorme quantidade de aços diferentes, existe uma infindável quantidade de diagramas TTT, o
que torna fundamental o bom entendimento dos mesmos. Esta observação decorre do fato de que
estes diagramas, associados aos diagramas TRC (transformação sob resfriamento contínuo)
tornam-se ferramentas poderosas na prática dos tratamentos térmicos.
Voltando à Figura 42, a análise detalhada do diagrama indica a presença de dois campos distintos
para a fase austenita, podendo-se observar:
a) o campo da austenita estável, o qual ocorre para temperaturas acima da temperatura A1 (727
ºC), de acordo com o diagrama de equilíbrio Fe-C;
b) o campo da austenita meta-estável, o qual está situado entre as temperaturas A1 (727 ºC) e Mi
(Mi = temperatura de início de transformação martensítica), bem como à esquerda da curva de
início de transformação da austenita, ou seja, para tempos menores do que aqueles nos quais a
austenita meta-estável começa a se transformar isotermicamente em um produto determinado.
Pode-se observar também (Figura 42), um campo específico para a fase/constituinte martensita,
situado para temperaturas abaixo da temperatura Mi. Cabe explicar que, quando a austenita é
resfriada bruscamente para temperaturas abaixo de Mi, a transformação isotérmica deixa de
ocorrer, dando lugar a uma transformação dita atérmica, não-difusional e independente do tempo,
chamada de transformação martensítica, a qual ocorre por meio de cizalhamento de planos
cristalográficos da estrutura do ferro, dando origem à fase de não-equilíbrio conhecida por
martensita (definida no ítem 2.1.1). A transformação martensítica é dita uma transformação
militar, pois porções de martensita são formadas, à velocidades próximas da do som, para cada
gradiente de temperatura abaixo de Mi, prosseguindo de forma régia com a queda de temperatura e
interrompendo-se caso a temperatura for mantida constante. Pelo fato da temperatura Mi ser muito
baixa, a difusividade atômica torna-se muito baixa, mesmo para elementos instersticiais como o
carbono. Com a queda brusca da temperatura, o carbono fica obrigado a se manter em solução
sólida no Ferro, dando origem à estrutura TCC (tetragonal de corpo centrado), não prevista no
diagrama de equilíbrio. O tratamento térmico de têmpera, responsável pela obtenção da estrutura
martensítica nos aços, é apresentado à frente, com o recurso dos diagramas TRC, uma vez que o
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1/10/2016
À direita da curva de fim de transformação da austenita (Figura 42), ou seja, para tempos maiores
do que aqueles nos quais a austenita meta-estável termina a sua transformação isotérmica, pode-se
verificar a formação de diferentes produtos, dependendo da temperatura em que a transformação
ocorreu. Para o caso em estudo, pode-se observar no diagrama TTT, a obtenção de dois tipos
distintos de perlita, apresentando morfologias diferenciadas, as quais são denominadas de perlita
grosseira e de perlita fina, em função da temperatura em que a transformação ocorre. A obtenção
de perlita, para o aço considerado, é verificada para uma faixa de temperaturas aproximada
variando entre A1 e 550 ºC. Pode-se observar que quanto menor a temperatura em que a
transformação ocorre, mais refinada é a microestrutura resultante e, consequentemente, maior a
dureza do constituinte e do material obtido, o que é explicado pelo mecanismo de aumento de
resistência por refino de grão, conforme visto no ítem 2.1. Além da perlita, já definida no ítem
1.4.3, o diagrama TTT do aço eutetóide apresenta um outro produto de transformação da austenita,
o qual é chamado de bainita. Ambos os produtos, perlita e bainita, são obtidos através de
transformação envolvendo difusão atômica, caracterizando-se portanto por uma transformação
termicamente ativada e dependente do tempo, conforme esperado.
800
T (ºC)
estável
A1
700 meta-estável
Perlita grosseira
(HRC 5 a 20)
600
Perlita fina
(HRC 30 a 40)
500
Ci Cf
Bainita superior
(HRC 40 a 45)
400
meta-estável Bainita inferior
(HRC 50 a 60)
300
Mi
200
M50% Martensita + retida
M90% (HRC 65 a 67)
100
0
10-1 1 10 102 103 104 105
Tempo (s)
Define-se:
Bainita: constituinte bifásico formado por agregados de ferrita em forma de pena (bainita superior,
obtida para temperaturas da ordem de 450 ºC) ou por ferrita acicular em forma de agulhas (bainita
inferior, obtida para temperaturas da ordem de 200 ºC) apresentando uma dispersão extremamente
refinada de carboneto de ferro (cementita) ao longo da ferrita. Sua dureza pode variar de HRC 40 a
60. Caracteriza-se por conferir aos aços uma excelente relação entre resistência mecânica e
ductilidade, ou seja, excelente tenacidade, sendo especialmente indicado para a fabricação de
cabos de elevadores, cordas de instrumentos musicais, entre outras aplicações.
Na Figura 43 é apresentado o aspecto típico do constituinte bainita nos aços. Pelo fato da fase
cementita ser extremamente refinada na estrutura bainítica, normalmente não se consegue
distinguir a fase carboneto distribuída na ferrita. Neste caso específico, seria necessário o recurso
da microscopia eletrônica, usando-se aumentos da ordem de 15.000X, inviáveis por microscopia
ótica.
Figura 43 – Aspecto da bainita obtida em aço tratado isotermicamente. Ataque químico Nital-3%.
(Metallographic supplies – P.F. Dujardin & CO, 1958).
Cabe ressaltar que a obtenção de uma microestrutura bainítica nos aços somente é garantida
quando da transformação isotérmica da austenita, o que é conseguido a partir do tratamento
conhecido por austêmpera, conforme evidenciado na Figura 44.
Voltando à Figura 42, resta ainda explicar a ocorrência de austenita retida ( retida), evidenciada
no campo martensítico, definido para temperaturas abaixo de Mi. Sua presença, evidenciada em
aços contendo teores acima de 0,4% C, em peso, é explicada pelo fato de que a transformação
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 72
1/10/2016
Na Figura 44 é apresentado o diagrama TTT esquemático do aço eutetóide, estando indicado (em
vermelho) a simulação de um percurso típico de resfriamento e de transformação da liga
austenitizada para a obtenção de uma microestrutura bainítica (comparar com a Figura 42). Deve-
se ressaltar que, uma vez cruzada a curva em C de fim de transformação da austenita, nenhuma
800
T (ºC) 727 ºC A
700
600 A
+
F F+C
500 +
C
400
Am
300
Mi
200
M50%
M + Ar
M90%
100
0
10-1 1 10 102 103 104 105
Tempo (s)
transformação adicional ocorre no aço, sendo que a estrutura obtida permanece estável até a
temperatura ambiente. No caso em estudo, a transformação é concluída com a obtenção da
estrutura bainítica. A reprodução da condição de resfriamento e de transformação, acima
considerada, é normalmente realizada, na prática, através do tratamento térmico conhecido por
austêmpera.
Define-se:
Os diagramas TRC são assim chamados pelo fato de que nele são apresentados os produtos de
transformação da austenita quando esta se transforma sob condições de resfriamento contínuo.
Estes diagramas apresentam no eixo das abscissas a variável tempo e no eixo das ordenadas a
variável temperatura e relacionam-se diretamente com a cinética de transformação, neste caso,
definida pela velocidade com que a austenita se transforma a uma determinada taxa de
resfriamento. As curvas presentes nos diagramas TRC indicam também os tempos de início e fim
de transformação da austenita nas diferentes taxas de resfriamento consideradas. Estas curvas são
igualmente chamadas de curva de início (Ci) e curva de fim (Cf) de transformação da austenita. Em
relação ao diagrama TTT, as transformações obtidas sob condições de resfriamento contínuo
normalmente sofrem um pequeno retardo tanto em termos de temperaturas como de tempos, ou
seja, ocorrem para temperaturas ligeiramente menores e para tempos ligeiramente maiores. Resulta
disso que as curvas TRC sempre apresentam-se ligeiramente deslocadas para baixo e para a direita
em relação às respectivas curvas do diagrama TTT do mesmo aço considerado. A Figura 45 ilustra
adequadamente este fato. Deve-se ressaltar também que cada aço apresenta um diagrama TRC
próprio, valendo exclusivamente para o aço considerado, existindo, portanto, uma infindável
quantidade de diagramas TRC.
A análise do diagrama TRC do aço eutetóide permite evidenciar que através de resfriamento
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 74
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contínuo não é possível a obtenção da microestrutura bainítica, o que se repete para os demais
aços-ao-carbono. Note-se que a parte inferior das curvas em C do diagrama isotérmico desaparece
no diagrama TRC, indicando apenas a possibilidade de obtenção de perlita, grosseira ou refinada,
dependendo da taxa de resfriamento utilizada, além da possibilidade de obtenção de uma
microestrutura martensítica, para o caso de se utilizar uma taxa de resfriamento mais rápida que a
taxa crítica de resfriamento, indicada na Figura 45. A taxa crítica é aquela que tangencia a curva
de início de transformação da austenita (Ci) no seu ponto mais extremo à esquerda. Caso a taxa de
resfriamento utilizada em um determinado tratamento cruze a curva de início de transformação
(Ci), porém não cruze com a curva de fim de transformação da austenita (Cf), a liga apresentará à
temperatura ambiente uma mistura de perlita e martensita, além de um pouco de austenita retida.
800
T (ºC) 727 ºC estável
700
Ci Perlita grosseira
600 Cf
Perlita fina
500
400
300
meta-estável
Mi
200
M50%
Martensita + retida
M90%
100
Taxa crítica de resfriamento
0
10-1 1 10 102 103 104 105
Tempo (s)
Na prática, a aplicabilidade do diagrama TRC é bem mais ampla do que a do diagrama TTT, pois a
maioria dos tratamentos térmicos de interesse na engenharia são realizados utilizando-se
resfriamentos contínuos. Na Figura 46 é apresentado o diagrama TRC esquemático do aço
eutetóide, com a superposição de curvas de resfriamento contínuo típicas dos tratamentos térmicos
de têmpera em água, têmpera em óleo, normalização e de recozimento pleno, estando indicados,
ainda, os respectivos constituintes obtidos para cada tratamento.
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1/10/2016
800
T (ºC) A1
700
600
500
Recozimento pleno
400 Normalização
Têmpera
em água
300
Têmpera
Mi em óleo
200
Perlita
Perlita fina grosseira
100 Martensita
+ retida Martensita + Perlita
0
10-1 1 10 102 103 104 105
Tempo (s)
Define-se:
Têmpera: tratamento que consiste no aquecimento da liga acima da zona crítica (linhas A3 e A1 do
diagrama Fe-C, respectivamente para os aços hipoeutetóides e para os aços hipereutetóides),
seguido de um resfriamento rápido (contínuo), o qual pode ser feito em água, óleo, ou mesmo ao
ar, dependendo da temperabilidade do aço, a qual é responsável por definir a taxa de resfriamento
mais adequada para a liga considerada (ver Figura 45), promovendo a transformação da austenita
em martensita, em temperaturas abaixo da temperatura Mi. Quando a temperatura final do
tratamento de têmpera é superior à temperatura Mf (temperatura de fim de transformação
martensítica da liga considerada), parte da austenita permanece associada à martensita, não
sofrendo a transformação e ficando retida entre as agulhas de martensita, recebendo assim o nome
de austenita retida (ver item 2.3.1). O tratamento de têmpera, em geral, tem por objetivo o
aumento da dureza, do limite de escoamento, da resistência a tração, à compressão e ao desgaste,
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 76
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Mi
Temperatura Mi (ºC)
’
(% vol.)
% vol. relativo
de martensita
massiva (’) (% vol.)
% vol. de
retida
TeorTeor
de carbono (% em
de carbono peso)
(% em peso)
Por fim, deve-se especificar de forma correta o tempo de manutenção na temperatura especificada,
precedendo-se à etapa de resfriamento no tratamento de têmpera. O tempo de permanência na
temperatura especificada de tratamento, para uma adequada homogeneização da temperatura na
peça, ou completa austenitização do material, é via de regra, da ordem de 20 minutos para cada
centímetro de espessura da peça, ou seja, cerca de 2 min/mm de seção transversal. Esta regra, para
definição do tempo de permanência, é válida também para os demais tipos de tratamentos.
Por outro lado, é fundamental ressaltar que sempre e de forma imprescindível, imediatamente após
a têmpera, faz-se necessário a realização do tratamento térmico de revenido, visando o alívio de
tensões. Isto se deve à condição de extrema fragilidade conferida ao aço, pelo tratamento de
têmpera, quando da transformação martensítica (ver item 2.1.1), decorrente da elevada dureza da
martensita formada e das tensões internas e residuais inerentes à esta transformação.
Define-se:
Revenido: tratamento que consiste em reaquecer a peça ou o material temperado até uma
temperatura conveniente, abaixo da zona crítica (linha A1 do diagrama Fe-C), e resfriá-la
novamente até a temperatura ambiente. São usuais tempos de permanência da ordem de 1, 2 ou até
4 horas, na temperatura adotada, a qual é escolhida normalmente para valores variando entre 150 e
650 ºC (a faixa de temperatura entre aproximadamente 200 e 300 ºC não é recomendada por
apresentar o problema associado à fragilidade ao revenido, que se caracteriza pela diminuição da
resistência ao choque do aço). A escolha da temperatura de revenido é uma função direta do
conjunto de propriedades mecânicas que se deseja obter no aço, após a realização dos ciclos
térmicos de têmpera e revenido, informações, essas, disponíveis nos diagramas de revenimento,
os quais são fornecidos normalmente pelo fabricante do aço, conforme visto à frente. O revenido
tem por objetivo o alívio de tensões internas perigosas e a diminuição da dureza e da fragilidade
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 78
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Deve-se enfatizar que em todas as etapas do revenido onde se verifica a redistribuição de átomos
de carbono ou a precipitação de fases carbonetos, estes eventos ocorrem simultaneamente à saída
do carbono de solução sólida da martensita, por meio de difusão atômica, resultando na
transformação progressiva da estrutura TCC (martensítica) para a estrutura CCC (ferrítica). Daí se
explica o termo típico usado para a martensita revenida, a qual é chamada de martensita cúbica.
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800
T (ºC) A1
700
600
500
Curva de resfriamento
400 contínuo da superfície
Curva de resfriamento
300 contínuo do núcleo
Mi
200
0
10-1 1 10 102 103 104 105
Tempo (s)
Define-se:
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1/10/2016
Define-se:
Normalização: consiste num tipo de recozimento com o resfriamento contínuo do material sendo
realizado ao ar e não dentro do forno. A normalização tem por objetivo refinar a microestrutura,
quando comparada àquela obtida no recozimento pleno, o que é conseguido pela maior taxa de
resfriamento imposta ao material quando este é resfriado ao ar, resultando na passagem da
temperatura pela zona crítica a uma velocidade maior e, consequentemente, na obtenção de um
super-resfriamento mais elevado.
2.3.3 – TEMPERABILIDADE
Pode-se dizer que o afastamento do cotovelo da curva de início de transformação do eixo das
ordenadas, do diagrama TTT do aço considerado (Fig. 42), é proporcional à temperabilidade do
material, ou seja, quanto maior for esse afastamento menor será a velocidade de resfriamento
necessária para garantir a formação de martensita e, portanto, garantir o seu endurecimento.
1.25” de diâmetro
Corpo-de-prova
de diâmetro
de diâmetro
Orifício do
jato de água -
diâmetro .5”
Dureza
60
(HRC) Curva 1
55
50
45
40
35
30 Curva 2
25
20
0 8 16 24 32 40 48 56 64
Distância da ponta temperada (em 1/16”)
A versatilidade deste ensaio é evidenciada pelo fato de que em um único corpo-de-prova diferentes
taxas de resfriamento contínuo são simuladas ao longo da geratriz do cilindro, conforme mostrado
na Figura 51, uma vez que a troca térmica e a respectiva perda de calor do corpo austenitizado se
faz preferencialmente de modo unidirecional, a partir da base na qual o jato de água incide. Deste
modo, no mesmo corpo-de-prova são efetivamente simuladas taxas de resfriamento típicas de
tratamentos térmicos de têmpera em diferentes meios de resfriamento, de normalização e de
recozimento pleno.
Martensita
Perlita fina
Perlita
Para o melhor entendimento do efeito dos elementos de liga e do carbono nas propriedades dos
aços é importante conhecer como estes influenciam as propriedades dos seus constituintes, com
ênfase para a ferrita e a martensita.
em solução sólida. Comportamento similar é evidenciado com o enxôfre (S). Ambos estes
elementos são utilizados na fabricação de aços de usinabilidade fácil, conforme já visto na Tabela
6, uma vez que ao endurecerem fortemente a ferrita, mesmo para pequenas quantidades de liga,
tem-se facilitada a quebra do cavaco durante a usinagem, diminuindo-se o risco de desgaste da
ferramenta pelo aquecimento gerado pelo atrito desta com o cavaco formado durante o corte.
Pode-se verificar, ainda, que o Si e o Mn são também fortes endurecedores da ferrita em solução
sólida. Este efeito é mais suave para os elementos Ni, Mo, V, W e Cr.
Figura 53 - Efeito da adição de elementos de liga sobre a dureza, após a realização de tratamento
de nitretação. Composição base do aço: 0.25% C, 0.3% Si e 0.7% Mn (Thelning, 1984).
NORMALIZADO RECOZIDO
C (%) ESC MÁX (%) Dureza ESC MÁX (%) Dureza
2
(kgf/mm ) (kgf/mm ) 2
em 2” Brinell 2
(kgf/mm ) (kgf/mm ) 2
em 2” Brinell
0,01 18 31 45 90 12 29 47 90
0,20 31 45 35 120 25 41 37 115
0,60 42 76 19 220 34 67 23 190
0,80 49 94 13 260 36 80 15 220
1,00 70 106 7 295 36 75 22 195
1,40 67 103 1 300 35 69 19 215
Ainda na Figura 55, são apresentadas em função do teor de carbono, para fins de comparação, a
evolução da dureza de ligas apresentando estrutura perlítica, obtidas a partir do tratamento de
normalização (resfriadas ao ar) e, também, apresentando estrutura de carboneto esferoidizado,
obtidas a partir do tratamento de esferoidização. Os resultados apresentados nesta figura indicam
claramente a importância da estrutura martensítica em termos de otimização da dureza do material,
a qual é a estrutura, quando devidamente revenida, mais indicada na fabricação de componentes
que exigem alta tenacidade e elevada resistência mecânica.
ABNT 4340
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01/10/16
ABNT 4140
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 96
01/10/16
ABNT 4130
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 99
01/10/16
ABNT
8660
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 101
01/10/16
ABNT 8650
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 104
01/10/16
ABNT 8640
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DOS AÇOS – SILVIO FRANCISCO BRUNATTO 107
01/10/16
ABNT 8630