Hidrolise de Diferentes Substratos
Hidrolise de Diferentes Substratos
Hidrolise de Diferentes Substratos
CERRO LARGO
2015
UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL – UFFS
CERRO LARGO – RS
2015
CAROLINE TORRES DE OLIVEIRA
CERRO LARGO - RS
2015
CARACTERIZAÇÃO DE PROTEASE PRODUZIDA PELO ISOLADO
BACTERIANO Bacillus sp. CL33A
_______________
Prof. Dr. Daniel Joner Daroit
Orientador
CERRO LARGO – RS
2015
AGRADECIMENTOS
- Ao Professor Doutor Daniel Joner Daroit pela orientação, apoio, paciência, confiança
e compreensão. Obrigada por esses três anos de pesquisa, aprendizado e incentivo.
- Ao colega e amigo Tiago Rieger pelo auxílio inestimável nos trabalhos de
laboratório. Obrigada pelas conversas, companheirismo e pela paciência durante as longas
horas de trabalho.
- Ao colega Leandro Pellenz pelo auxílio nos trabalhos de iniciação científica.
- Aos professores do Curso de Engenharia Ambiental, principalmente ao Professor
Doutor Bruno Munchen Wenzel pelos ensinamentos especialmente nas inesquecíveis
disciplinas de reatores e transferência de calor e massa.
- Aos técnicos dos laboratórios, especialmente a Fabiana pelas dicas no início dos
trabalhos de pesquisa.
- A FAPERGS e a UFFS pelas bolsas de iniciação científica.
- A Universidade Federal do Rio Grande do Sul pelo apoio nos projetos de pesquisa.
- Aos amigos da UFFS pelos momentos de risos e descontração nos intervalos das
aulas, pela companhia nos finais de semana de estudos que sempre resultavam em boas
conversas e risadas.
- Aos colegas do setor de Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de Capão da Canoa.
Obrigada pelo companheirismo, ensinamentos e amizade durante todo o período de estágio.
- A minha família, meu alicerce. Obrigada por todo o apoio, carinho e incentivo.
SUMÁRIO
2
LISTA DE SÍMBOLOS E ABREVIATURAS
i
RESUMO
ii
ABSTRACT
Caroline Torres de Oliveira. Characterization of the protease produced by the bacterial isolate
Bacillus sp. CL33A.
The growing concern with environmental issues has fostered the use of
microorganisms in biotechnological processes for degrading recalcitrant protein-rich organic
materials, such as chicken feathers and feather meal, as an alternative for its management and
valorization. Among the value-added products are proteolytic enzymes, which have various
commercial and industrial applications. For this purpose, such biocatalysts should be
characterized regarding the that may interfere with enzyme activity. In this context, this study
aimed to evaluate protease production by the keratinolytic bacterium Bacillus sp. CL33A
during submerged cultivation using feathers and FP as organic substrates, and to characterize
the crude protease obtained in cultivations showing higher enzyme yields. Results showed
that higher yields occurred using FP as growth substrate. For crude protease characterization,
a DCCR approach was utilized to determine the best temperature and pH conditions for
enzyme activity, which were, respectively 55 °C and pH 8. At these optimal conditions, the
rate of enzyme activity was analyzed using different concentrations of azocasein substrate.
-1
Through the Michaelis-Menten equation, the apparent values for Vmax (13,39 U mg protein
min-1) and Km (0,515 mg mL-1) were obtained. Subsequently, the influence of reagents
towards the enzyme activity was evaluated. The presence of 5 mmol L-1 of the salts CoCl2,
CuSO4, FeSO4, ZnCl2 and MnCl2, and the protease inhibitors PMSF, EDTA and 1,10-
phenanthroline decreased the protease activity. The MgCl2 salt (1 and 5 mmol L-1) increased
enzyme activity and, similarly, the reagents ethanol, Triton X-100, Tween 20 and DMSO
tended to stimulate the enzyme activity. SDS and β-mercaptoethanol resulted in negative
effects on enzyme catalysis. In the evaluation of crude protease thermal stability, at 50 to 60
°C, higher inactivation occurred with increasing temperatures. The performance of the crude
protease on protein substrates indicated higher hydrolysis of the substrates PIS, casein and FP.
iii
1. INTRODUÇÃO
Enzimas são naturalmente produzidas por todos os organismos, mas além da função
biológica, elas podem ter inúmeras outras aplicações. Novos processos biotecnológicos
baseados na utilização de enzimas vêm sendo desenvolvidos, incluindo a possibilidade de
aplicação desses catalisadores biológicos em substituição a reagentes químicos em
determinados setores industriais, bem como no aumento da eficiência de processos e geração
de produtos. Além destes fatores, a crescente preocupação mundial com as questões
ambientais demanda a utilização de tecnologias mais limpas e, consequentemente, tais
abordagens biotecnológicas surgem como alternativas promissoras.
As fontes de enzimas podem variar, sendo possível obtê-las a partir de vegetais,
animais, bem como a partir de microrganismos. Dentre as enzimas microbianas, as proteases
são bastante estudadas, e suas aplicações variam desde a indústria alimentícia, a indústria de
detergentes, além de aplicações em processos de depilação de couro e de bioconversão de
resíduos.
A produção de enzimas por microrganismos é um processo relativamente simples, que
não exige grandes áreas e também não depende totalmente de condições climáticas. Cultivos
submersos são formas interessantes e práticas para produção de proteases microbianas, sendo
necessários, basicamente, o microrganismo produtor da enzima de interesse, condições
adequadas, e um ou mais substratos como fonte de carbono, nitrogênio e energia para o
desenvolvimento microbiano.
Nesse sentido, a utilização de resíduos orgânicos provenientes de agroindústrias como
substratos é uma alternativa interessante, tanto como estratégia ambiental para o manejo dos
resíduos, quanto por representarem substratos abundantes para a obtenção de produtos com
potencial comercial. Particularmente, penas e farinha de penas são materiais recalcitrantes
produzidos como resíduos e/ou subprodutos da indústria avícola, apresentando baixo custo e,
no caso da farinha de penas, baixo valor nutricional para utilização em rações. Assim, o
presente trabalho abordou a produção de proteases microbianas utilizando estes substratos
queratinosos e a caracterização das condições de atuação da protease bruta produzida durante
os cultivos.
1
2. OBJETIVOS
Avaliar a produção de proteases pelo isolado bacteriano Bacillus sp. CL33A durante
cultivos submersos utilizando substratos queratinosos, além da caracterização da protease
bruta produzida nos cultivos com maior rendimento.
2
3. REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 Biotecnologia
3
da biodegradação pela ação de microrganismos (FALEIRO; ANDRADE; REIS JÚNIOR,
2011). Por exemplo, esta estratégia tem sido considerada uma alternativa no tratamento de
efluentes têxteis pela existência de microrganismos com potencial para degradar substâncias
recalcitrantes (KAMIDA et al., 2005), e também no tratamento e aproveitamento de resíduos
da indústria avícola entre outras aplicações biotecnológicas (ONIFADE et al., 1998).
Tais tecnologias são ambientalmente vantajosas por eliminar certos contaminantes de
origem orgânica como fezes, detergentes, penas, hidrocarbonetos de petróleo, entre outros,
através da destruição permanente dos resíduos, a mineralização, eliminando os riscos de
futuras contaminações (PEDROZO et al., 2002). Assim, microrganismos e/ou suas enzimas
podem ser aplicados na recuperação de áreas contaminadas e na degradação de compostos
poluentes. Esse processo pode ser influenciado por uma série de fatores que interferem na
ação microbiana, dentre eles a presença de metais pesados no contaminante e pH inadequado
do meio (FALEIRO; ANDRADE; REIS JÚNIOR, 2011).
Incluída nas novas tecnologias para a obtenção de produtos de elevado valor agregado,
a biocatálise é um dos campos mais promissores (CARVALHO et al., 2005). É frequente a
descoberta de enzimas que se adéquam à utilização em processos industriais, e para isso tem-
se a necessidade de projetar e otimizar o desempenho da enzima no que se refere à sua
atividade, seletividade, termoestabilidade, tolerância a solventes orgânicos e inibição de
substrato/produto, para que o processo enzimático torne-se comercialmente viável (LUETZ;
GIVER; LALONDE, 2008). Sendo assim, um maior incentivo à aplicação tecnológica desse
tipo de enzima pode trazer inúmeros benefícios econômicos, ambientais e industriais além de
aumentar a representatividade comercial e econômica brasileira no cenário internacional
(BON; GÍRIO; PEREIRA JÚNIOR, 2008). Dentre as enzimas utilizadas podem ser citadas
amilases, celulases, lipases, e proteases (HASAN; SHAH; HAMEED, 2006).
3.2 Proteases
4
nos mais diversos organismos incluindo plantas, animais e microrganismos já que proteases
são fisiologicamente necessárias (GUPTA; BEG; LORENZ, 2002)
A classificação das proteases fundamenta-se basicamente em três critérios. O primeiro
é referente ao tipo de reação catalisada, o segundo está relacionado a natureza química e
mecanismo do sítio catalítico e o terceiro contempla a relação evolutiva referente à sequência
de aminoácidos. De acordo com o primeiro critério, as enzimas proteolíticas podem ser
subdivididas em dois grupos principais: exopeptidases, caracterizadas pela clivagem de
ligações peptídicas próximas ao grupo amino ou carboxi terminal do substrato; e as
endopeptidases, que clivam ligações peptídicas nas regiões internas da cadeia polipeptídica,
distantes das porções terminais das proteínas. As endopeptidases são divididas em quatro
subgrupos com base no seu mecanismo catalítico: serino-proteases, aspártico-proteases,
cisteíno-proteases e metaloproteases. As proteases também podem ser classificadas, de acordo
com o pH de atividade máxima, em ácidas, neutras ou alcalinas e conforme o substrato que
degradam em elastase, queratinase, colagenase entre outras (RAO et al., 1998; ELLAIAH;
SRINIVASULU; ADINARAYANA, 2002; SUMANTHA; LARROCHE; PANDEY, 2006).
5
comercialmente são obtidas a partir de microrganismos, e por serem facilmente produzidas
em larga escala são de grande interesse industrial (HAKI e RAKSHIT, 2003).
A produção de enzimas microbianas é realizada principalmente em cultivos submersos
já que esta técnica permite um controle maior dos parâmetros operacionais do sistema (BON;
GÍRIO; PEREIRA JÚNIOR, 2008). Esta produção envolve custos, principalmente no que se
refere à matéria-prima (substrato) para a produção, um dos componentes mais importantes e
que representa de 30-40% dos gastos (JOO; CHANG, 2005; BON; GÍRIO; PEREIRA
JÚNIOR, 2008). A adição de componentes alternativos ao meio de cultivo mostra-se
interessante, representando uma alternativa para o aproveitamento dos resíduos de
agroindustrias (VILLAS-BÔAS; ESPOSITO, 2000). Portanto, considerando a abundância
destes resíduos e seu baixo custo, bem como a diversidade biológica de organismos
produtores de enzimas, observa-se um grande potencial para produção desses biocatalisadores
com aplicação industrial (MUSSATTO; FERNANDES; MILAGRES, 2007).
Proteases de origem microbiana podem ser intracelulares ou extracelulares. As
intracelulares são de grande importância em vários processos metabólicos e celulares, pois
exercem papel vital na regulação do metabolismo; já as extracelulares catalisam a hidrólise de
proteínas em moléculas menores no meio externo e permitem a absorção dos nutrientes pelos
microrganismos (GUPTA; BEG; LORENZ, 2002). No setor industrial, proteases microbianas
extracelulares têm recebido atenção especial, exatamente devido às amplas possibilidades de
aplicação (KASANA; SALWAN; YADAV, 2011), na produção de detergentes, alimentos, na
indústria do couro, entre outras (KIRK; BORCHERT; FUGLSANG, 2002; NIELSEN;
OXENBOLL, 1998). Ainda, proteases bacterianas podem apresentar um tempo de prateleira
mais prolongado, podendo ficar estocadas em condições inferiores às normais por semanas
mantendo sua atividade (GUPTA; BEG; LORENZ, 2002).
Tendo em vista o desenvolvimento de tecnologias ambientais, as proteases podem ser
utilizadas na depilação do couro com o intuito de minimizar os problemas ambientais
resultantes da utilização de produtos químicos (DAYANANDAN et al., 2003). Nas etapas de
tratamento do couro o processo de depilação normalmente envolve a adição de produtos que
tornam os resíduos de curtume um dos grandes responsáveis pela poluição, além de causar
riscos à saúde dos trabalhadores dessa área (THANIKAIVELAN et al., 2004). Com o intuito
de diminuir esses riscos bem como os impactos ambientais existem estudos para aplicação de
um processo biotecnológico na etapa da depilação utilizando enzimas (DAYANANDAN et
6
al., 2003). Além disso, existem aplicações para proteases na indústria de detergentes, pois
essas enzimas são um dos ingredientes que podem ser adicionados a estes produtos, desde os
utilizados para lavagens de uso doméstico até os usados na limpeza de lentes de contato. No
caso de detergentes para roupas, a utilização de proteases corresponde a aproximadamente 25
% do total de vendas mundiais de enzimas (RAO et al., 1998).
Dentre as classes particulares de enzimas proteolíticas, classificadas de acordo com o
substrato que degradam, encontram-se as queratinases, que são geralmente serino ou
metaloproteases com potencial de degradação de proteínas denominadas queratinas
(BRANDELLI; DAROIT; RIFFEL, 2010). Estas enzimas podem ser produzidas tanto por
fungos quanto bactérias e são enquadradas no grupo das endopeptidases (KAUL; SUMBALI,
1997; RIFFEL; BRANDELLI, 2006). Visando a aplicação biotecnológica, microrganismos
queratinolíticos e suas proteases têm sido investigados quanto ao seu potencial industrial em
processos no setor de couros, produção de rações, degradação e aproveitamento de resíduos
da indústria avícola, entre outras (ONIFADE et al., 1998). Os microrganismos produtores de
queratinases podem ser obtidos a partir de diferentes locais, inclusive a partir de amostras de
solo, e testados quanto à capacidade de utilização da queratina como substrato (GUPTA;
RAMNANI, 2006). De fato, tem-se encontrado uma diversidade de microrganismos capazes
de produzir proteases queratinolíticas e, consequentemente, capazes de degradar resíduos
queratinosos para o crescimento microbiano (BRANDELLI; DAROIT; RIFFEL, 2010).
Proteases alcalinas estão entre aquelas de maior importância comercial devido,
principalmente, à alta capacidade de produção e atividade catalítica (JISHA et al., 2013). No
entanto, outras proteases microbianas também podem ser aplicadas em diversos processos e,
neste sentido, a caracterização da atividade enzimática é fundamental para propor potenciais
aplicações.
7
queratinas, que possuem característica fibrosa e insolúvel, sendo encontrada principalmente
em peles, pelos, unhas, cascos, escamas e penas, e tem como função principal dar estrutura e
proteger os organismos. Devido ao forte empacotamento da cadeia de proteína em α-hélice ou
estrutura β-pregueada, uma cadeia polipeptídica superenrolada, a queratina é caracterizada
pela estabilidade mecânica e resistência à digestão proteolítica. A presença de cisteína na
estrutura das queratinas possibilita a formação de pontes dissulfeto que, por sua vez, conferem
um alto índice de ligações intercadeias a esse tipo de proteína. Além disso, interações
hidrofóbicas e pontes de hidrogênio colaboram para a força, estabilidade e resistência
proteolítica da queratina (ONIFADE et al., 1998; BRANDELLI; DAROIT; RIFFEL, 2010).
As queratinas onde predominam formações em α-hélice são denominadas α-
queratinas, já aquelas que possuem estruturas secundárias em β-folha são as chamadas β-
queratinas. Considerando-se as propriedades físico-químicas dessas proteínas as mesmas
podem ser subdivididas em “leves” ou “rígidas”. As “leves” são compostas por aminoácidos
como glicina, alanina e serina, com cadeias laterais pequenas, e contém baixa quantidade de
cisteína; queratinas “rígidas” ao contrário das leves são compostas por grandes quantidades de
cisteína, e são formadas por muitas ligações dissulfeto e contém a maioria dos aminoácidos na
sua composição. As α-queratinas “rígidas” estão presentes em maior quantidade nos cabelos e
lãs, as α-queratinas “leves” na epiderme, enquanto que as β-queratinas são encontradas em
quantidades mais significantes nas penas (ONIFADE et al., 1998; ROUSE; VAN DYKE,
2010; DAROIT; BRANDELLI, 2014), sendo mais comum a ocorrência de hidrólise
microbiana da β-queratina em relação à α-queratina, devido à estrutura menos compacta da
primeira e menor quantidade de pontes dissulfeto (BRANDELLI, 2005; PILLAI;
ARCHANA, 2008).
8
As penas de aves são constituídas por 90 % ou mais de queratina (SANGALI;
BRANDELLI, 2000) e devido à grande produção mundial de frangos pode ocorrer o acúmulo
desses resíduos queratinosos. No ano de 2014 foram produzidos a nível mundial em torno de
86,3 milhões de toneladas de frangos (USDA, 2015). Considerando que as penas representam
entre 5 % e 10 % do peso dessas aves (BRANDELLI, 2008), a geração de penas como resíduo
do seu processamento chegou a aproximadamente 4,3-8,6 milhões de toneladas. No Brasil a
produção de frangos no ano de 2014 foi de cerca de 12,5 milhões de toneladas, chegando a
1,6 milhões de frangos apenas no estado do Rio Grande do Sul (RS) (IBGE, 2015) o que
significa que foram geradas em torno de 80-160 mil toneladas de penas somente no RS.
Pelo fato das penas serem resíduos abundantes e de difícil degradação devido à sua
composição, observa-se a importância do desenvolvimento de métodos alternativos, eficientes
e economicamente viáveis, para disposição e manejo desses resíduos queratinosos, o que
poderia reduzir significativamente problemas ambientais e até mesmo de saúde pública
(VASILEVA-TONKOVA; GOUSTEROVA; NESHEV, 2009).
Os resíduos de penas geralmente são incinerados, porém tal processo envolve alto
custo além de resultar em elevadas emissões de NH3 e H2S, e desperdício de energia
(MARCONDES et al., 2008; MATSUI et al., 2009). Ainda, o acúmulo desses resíduos
queratinosos acaba dificultando o processo de degradação e quando esse processo ocorre de
forma anaeróbia formam-se substâncias tóxicas como NH3 e H2S (SINGH, 2002).
Outra utilização convencional desse resíduo é a conversão em farinha de penas. Nesse
sentido normalmente os subprodutos rejeitados em abatedouros são enviados as indústrias de
processamento de subprodutos frigoríficos ou fábrica de farinha e óleo de origem animal onde
os resíduos de aves como penas, vísceras, cabeças, pés, sangue, entre outros são processados
(PICCHI, 1994). O processamento das penas por cocção sob alta pressão e moagem provoca a
destruição de aminoácidos essenciais, e o produto obtido é de baixa digestibilidade e baixa
qualidade nutricional, limitando a sua utilização como ingrediente em rações animais
(ONIFADE et al., 1998; KARTHIKEYAN; BALAJI; SEHGAL, 2007).
Contudo, microrganismos são capazes de crescer diretamente em função de uma única
fonte complexa de carbono e energia, atuando na degradação deste material (PEDROZO et
al., 2002). Geralmente, o tipo de material presente no meio de cultura pode induzir a produção
de enzimas específicas. Assim, uma potencial aplicação dos resíduos pode ser a utilização
como fonte de carbono em bioprocessos para obtenção de produtos químicos e de produtos de
9
maior valor agregado, como enzimas, proteínas, ácidos orgânicos, aminoácidos, metabólitos
secundários biologicamente ativos (SOCCOL & VANDENBERGHE, 2003; MEDEIROS et
al., 2000).
Assim, investigações têm focado na biodegradação das penas e obtenção de produtos
úteis, como proteases microbianas (BRANDELLI; DAROIT; RIFFEL, 2010). Embora a
farinha de penas seja produto de uso limitado em rações, seu processo de produção provoca a
desnaturação da queratina através do tratamento térmico, diminuindo a resistência da mesma
ao ataque microbiano. Tendo em vista que a produção de proteases microbianas usando
farinha de pena como substrato em meios de cultura vem sendo descrita, tem-se uma
possibilidade de aplicação da farinha de penas como substrato na produção biotecnológica de
proteases (DAROIT; BRANDELLI, 2014).
10
4. MATERIAIS E MÉTODOS
O meio de cultura Caldo Farinha de Pena (CFP) foi composto por meio mineral (0,3 g
L K2HPO4; 0,4 g L-1 KH2PO4; 0,5 g L-1 NaCl) e o substrato orgânico farinha de penas (FP;
-1
10 g L-1), enquanto que o meio Caldo Pena (CP) foi composto por meio mineral e o substrato
orgânico pena (10 g L-1). Em Erlenmeyers de 250 mL contendo 50 mL de CFP ou CP, o pH
inicial foi ajustado para 7,0 utilizando NaOH (1 mol L-1) e, em seguida, os meios foram
esterilizados em autoclave (121 °C, 1,1 atm, 15 min).
Para inoculação dos meios foi preparada uma suspensão bacteriana em solução salina
estéril (8,5 g L-1 NaCl) com aproximadamente 1,0 unidade de absorbância mensurada em
espectrofotômetro a um comprimento de onda de 600 nm. Cada meio de cultura foi inoculado
com 1 mL da suspensão. Os meios inoculados foram incubados em estufa com agitação
11
orbital (shaker; 30 °C, 125 rpm) por até 11 dias. Amostras foram retiradas a cada 24 horas,
centrifugadas (10.000 g por 5 min), e o sobrenadante (protease bruta) utilizado para avaliação
da atividade proteolítica.
Foi determinada a concentração de proteína solúvel pelo método descrito por Lowry et
al. (1951). Para tanto foram utilizados dois reagentes (A e B). O reagente A foi preparado
com 50 mL de solução de NaOH (0,1 mol L-1) contendo Na2CO3 (20 g L-1) e 1 mL de solução
de sulfato de cobre (5 g L-1) e tartarato de sódio e potássio (10 g L-1). No preparo do reagente
B foi utilizado reagente Folin-Ciocalteau diluído em água destilada na proporção de 1:1.
No ensaio foram utilizados 2,5 mL do reagente A e 100 µL de sobrenadante
convenientemente diluído em água destilada. Esta mistura foi incubada por 10 min no escuro
e, após, 300 µL do reagente B foram adicionados. A mistura foi mantida em local escuro por
30 minutos à temperatura ambiente. Em seguida foi mensurada a absorbância em
espectrofotômetro a um comprimento de onda de 750 nm. Os dados de absorbância foram
12
interpretados utilizando curva padrão de albumina sérica bovina. Estes resultados de proteína
solúvel foram utilizados para os cálculos da cinética da enzimática.
A protease bruta foi obtida a partir do sobrenadante centrifugado (10.000 g por 5 min)
dos cultivos de Bacillus sp. CL33A em CFP, realizados por 3 dias (30 °C, 125 rpm).
13
A variável dependente estudada foi a atividade proteolítica (U mL-1). Utilizou-se o
software Statistica 5.0 para análise dos resultados e obteve-se coeficientes de regressão (p <
0,05) que foram empregados na obtenção de um modelo matemático para explicação dos
efeitos da temperatura e pH sobre a atividade da enzima. Avaliou-se o ajuste do modelo
através do coeficiente de determinação (R2) e análise de variância (ANOVA). Considerando
os graus de liberdade (5 para os ensaios; e 6 para o erro + falta de ajuste) as variâncias das
regressões dos experimentos foram comparadas com a variação dos erros experimentais.
Então, em caso de significância do modelo, foi gerada superfície de contorno.
14
proteolítica com substrato azocaseína. Os ensaios foram realizados em duplicata.
Resultados desses ensaios foram apresentados na forma de atividade relativa/residual
(%), considerando-se o controle (sem adição da substância testada) como 100 %.
O desempenho da protease bruta produzida pelo isolado Bacillus sp. CL33A em CFP
foi avaliado na hidrólise de diferentes substratos orgânicos. Utilizou-se nessa avaliação a
farinha de penas, cabelos, penas, proteína isolada de soja (PIS) e caseína, na concentração de
10 g L-1. Os frascos contendo 25 mL da solução de substrato foram pré-incubados a 50 °C por
10 min em banho-maria com agitação recíproca, no intuito de estabilizar a temperatura do
meio. Em seguida, adicionou-se 500 µL da protease bruta nos frascos e a incubação ocorreu a
50 °C sob agitação, por até 4 horas.
Foram coletadas amostras de 500 µL nos tempos de incubação 0, 1, 2, 3 e 4 horas e
15
adicionados 500 µL de TCA (10%, m v-1) para finalizar a reação. Em seguida, a mistura foi
centrifugada (10.000 g por 5 min) e o sobrenadante convenientemente diluído em água
destilada, realizando-se a leitura da absorbância em espectrofotômetro a um comprimento de
onda de 280 nm. Os ensaios foram realizados em duplicata e os resultados expressos em
unidades de absorbância.
16
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO
O isolado Bacillus sp. CL33A foi obtido a partir de uma composteira e mostrou-se
capaz de produzir proteases extracelulares em Ágar Leite. Nos testes realizados em ágar
farinha de penas (AFP) o isolado apresentou capacidade de desenvolvimento em uma faixa de
pH de 6-10 e em temperaturas de 30-45 °C (PELLENZ, MEDEIROS; DAROIT, 2014). Foi
avaliado também o potencial de degradação de penas por este microrganismo em cultivos
submersos, observando-se solubilização de 95% da massa seca das penas após 216 h
(OLIVEIRA; DAROIT, 2015). Diante dos resultados obtidos nesses estudos anteriores é
interessante uma avaliação mais aprofundada no que se refere às características das enzimas
produzidas.
17
Figura 1: Produção de proteases pelo isolado CL33A em CP (□) e CFP (■).
A produção mais acelerada de protease em CFP justifica-se pelo fato desse substrato
possuir uma menor resistência, já que o tratamento térmico ao qual foi submetido é capaz de
desnaturar a queratina que o compõe (BRANDELLI; RIFFEL, 2005), tornando o mesmo mais
acessível e homogêneo se comparado com as penas inteiras (CORRÊA, 2009). A farinha de
penas vem sendo utilizada como substrato para produção de proteases microbianas
(CASARIN; CLADERA; BRANDELLI, 2008; KHARDENAVIS; KAPLEY; PUROHIT,
2009). Em estudos similares com Bacillus sp. P7 (CORRÊA, 2009) e Bacillus sp. P45
(DAROIT; CORRÊA; BRANDELLI, 2009), também optou-se pela utilização de farinha de
pena como melhor substrato para produção de enzimas proteolíticas. Portanto, a conversão
microbiana da farinha de penas, um substrato queratinoso abundante e de baixo custo,
representa, ao mesmo tempo, uma forma de manejo ecologicamente adequada e uma
estratégia de agregação de valor a este substrato através da obtenção de proteases microbianas
com potencial aplicação industrial (GUPTA; RAMNANI, 2006; BRANDELLI, 2008).
18
5.3 Caracterização da protease bruta produzida em CFP
19
Tabela 2: Atividade proteolítica obtida através do DCCR.
Atividade proteolítica
Ensaio T (cod) T (°C) pH (cod) pH real
(U mL-1)
1 1 65,6 1 9,4 74
2 1 65,6 -1 6,6 119
3 -1 44,4 -1 6,6 82
4 -1 44,4 1 9,4 123
5 1,41 70,0 0 8,0 187
6 -1,41 40,0 0 8,0 134
7 0 55,0 1,41 10,0 226
8 0 55,0 -1,41 6,0 111
9 0 55,0 0 8,0 325
10 0 55,0 0 8,0 320
11 0 55,0 0 8,0 319
12 0 55,0 0 8,0 323
20
Os coeficientes de regressão obtidos foram submetidos ao teste de análise de variância
(ANOVA) sendo obtido um valor de F-calculado 2,6 vezes maior que o valor de F-tabelado
(0,95;5df,6df), indicando a possibilidade de utilização do modelo matemático (Equação (1)), que
explicou 89 % da variabilidade observada nos ensaios. A superfície de contorno gerada a
partir deste modelo é apresentada na Figura 2. A partir dela observa-se que a atividade
máxima da enzima ocorre na área central abrangendo uma ampla faixa de temperaturas e
valores de pH.
U mL-1
21
Em estudos realizados por Bach et al. (2011), a protease de Chryseobacterium
indologenes A22 apresentou atividade ótima em uma faixa de pH de 7 a 8, e temperatura de
45 °C. De forma similar ao observado no presente estudo, a protease bruta de Bacillus sp.
BL16 apresentou atividade máxima em pH 9 e 55 °C (GIONGO, 2006), e a protease de
Bacillus cereus BG1 apresentou atividade ótima a 50 °C e pH 8,0 (GHORBEL; SELLAMI-
KAMOUN; NASRI, 2003). Por outro lado, protease de Bacillus licheniformis NH1
demonstrou atividade ótima a 65-70 °C e pH 10-11 (EL HADJ-ALI et al., 2007). De fato,
geralmente, proteases produzidas por espécies de Bacillus sp. atuam em uma faixa de pH de 7
a 11, e em temperaturas de 40-70 °C (ELLAIAH; SRINIVASULU; ADINARAYANA, 2002;
BRANDELLI; DAROIT; RIFFEL, 2010).
22
Figura 3: Catálise da protease bruta em função da concentração de substrato (○). A curva
representa o ajuste dos pontos utilizando equação de Michaelis-Menten (R2 = 0,96).
23
pontes entre hidróxido de zinco (ZnOH) e íons de zinco catalítico no sítio ativo (RIFFEL et
al., 2007).
24
Dentre os reagentes testados, Tween 20 (0,5%, v v-1) e DMSO (0,5 e 1%, v v-1)
tenderam a estimular a atividade enzimática, enquanto SDS e β-mercaptoetanol apresentaram
efeito negativo sobre a catálise (Tabela 5).
25
Bacillus licheniformis NH1 (EL HADJ-ALI et al., 2007), e diferentemente dos resultados
obtidos para a protease de Bacillus sp. P45 (DAROIT; CORRÊA; BRANDELLI, 2011).
Protease de Bacillus licheniformis RP1 não foi afetada pela presença de Triton X-100 e
Tween 20 (SELLAMI-KAMOUN et al., 2008).
A diminuição da atividade enzimática relativa na presença de β-mercaptoetanol, um
agente redutor de pontes dissulfeto, também foi observada em estudos realizados por Daroit;
Corrêa; Brandelli (2011), e perfil de redução da atividade proteolítica com o aumento da
concentração deste reagente ocorreu para proteases de Rhizobium sp. e Bradyrhizobium sp.
(OLIVEIRA; OLIVEIRA; ANDRADE, 2010). A influência negativa do β-mercaptoetanol
sobre a atividade pode indicar que pontes dissulfeto sejam necessárias à atuação de proteases.
Do ponto de vista da aplicação da protease, tal resultado é potencialmente negativo, visto que
o β-mercaptoetanol poderia ser utilizado para desestabilizar pontes dissulfeto em substratos
queratinosos, como penas e cabelos, facilitando a degradação (MITSUIKI et al., 2004).
O SDS é detergente aniônico que usualmente provoca a desnaturação de proteínas,
incluindo diversas proteases microbianas (RIFFEL et al., 2007). Da mesma forma que nos
ensaios realizados (Tabela 5), este detergente também diminuiu a atividade de proteases de
Chryseobacterium indologenes A22, Serratia marcescens P3, mas aumentou a atividade da
protease bruta de Aeromonas hydrophila K12 (BACH et al., 2011). Contudo, na concentração
de 0,1% (m v-1), o SDS não afetou protease de Bacillus licheniformis NH1 (EL HADJ-ALI et
al., 2007) e Bacillus licheniformis KBDL4 (PATAK; DESHMUKH, 2012).
Os inibidores de proteases fluoreto de fenilmetilsufonil (PMSF), ácido etileno-
diamino-tetraacético (EDTA) e fenantrolina, diminuíram a atividade da protease bruta,
conforme dados da Tabela 6.
Como foi observada diminuição da atividade proteolítica na presença dos inibidores de
metaloproteases (EDTA e 1,10-fenantrolina), possivelmente a protease bruta contenha
enzimas deste grupo (GHORBEL; SELLAMI-KAMOUN; NASRI, 2003). A inibição
provocada por PMSF, um inibidor de serino proteases, sugere a possível presença de serino-
proteases (GENCKAL; TARI, 2006). Alguns estudos relatam a inibição parcial de serino
proteases por EDTA, indicando a importância de íons metálicos na estabilização da
conformação ativa destas enzimas (BOECKLE; GALUNSKY; MUELLER, 1995; NAM et al.
2002).
26
Tabela 6: Efeito de inibidores de protease na atividade enzimática.
Inibidor Concentração (mmol L-1) Atividade relativa (%)
Controle - 100,00 ± 3,2
PMSF 1 75,93 ± 6,7
5 74,36 ± 8,5
EDTA 1 65,52 ± 3,5
5 64,76 ± 6,5
1,10-fenantrolina 1 69,66 ± 6,5
5 69,06 ± 8,1
27
55 °C, no mesmo tempo de pré-incubação, a atividade diminuiu em aproximadamente 45 e
70%, respectivamente. Para a temperatura de 57,5°C, em apenas 15 minutos a atividade já
havia diminuído em torno de 80% e, a 60 °C foram necessários apenas 7 minutos para
redução de mais de 80% da atividade enzimática.
A protease utilizada no presente estudo mostrou-se mais estável em relação a protease
produzida pelo fungo Endothia parasítica (KALISZ, 1998) que foi inativada em apenas 5
minutos a 60 °C. Tal como ocorreu com os isolados BL16 e BL20 (GIONGO, 2006) após 20
minutos a 55 °C a atividade residual foi menos de 50 % da atividade inicial, característica que
pode resultar em menor gasto com energia no caso de aplicação em processos indústrias já
que tais enzimas atuam em temperaturas moderadas (GUPTA et al., 2002).
A partir dos dados obtidos (Figura 5) elaborou-se a Figura 5, um gráfico
semilogaritmíco da atividade residual da protease bruta em função do tempo. Foram obtidas
as constantes de inativação (kd), dadas pelo coeficiente angular das retas, considerando uma
cinética de primeira ordem.
28
Então, a partir da Equação 2, foram calculados os tempos de meia-vida (t1/2) para as
temperaturas testadas, conforme a Tabela 7.
A protease bruta também foi avaliada quanto à hidrólise dos substratos pena, FP,
caseína, PIS e cabelo, sendo observado que os substratos caseína e PIS foram os mais
hidrolisados (Figura 6). Em 1 h de incubação para hidrólise do substrato PIS, observou-se
uma absorbância superior a 0,3 unidades, que continuou aumentando até as 4 h, atingindo 0,5
unidades. Desempenho levemente inferior foi detectado para a hidrólise do substrato caseína e
29
FP. No entanto, os substratos penas e cabelo foram pouco atacados pela protease bruta, de
acordo com o método utilizado.
Figura 6: Hidrólise dos substratos pena (◊), FP (♦), caseína (□), PIS (■) e cabelo (▲),
pela protease bruta de CL33A.
30
al., 2004). É importante considerar ainda que a hidrólise proteica realizada a por enzimas
usualmente produz hidrolisados com perfil de peptídeos bem definidos e os substratos caseína
e proteína de soja são bastante utilizados nesse processo (MARTINS; GALEAZZI, 1996).
31
6. CONCLUSÕES
A protease bruta obtida nos cultivos em CFP atuou de forma ótima em amplas faixas
de temperatura e pH, o que indica versatilidade em processos enzimáticos. A atividade
enzimática foi potencializada pela adição do sal MgCl2, que pode ter atuado na estabilização
de enzimas. A ação de inibidores de protease sugere que a protease bruta de Bacillus sp.
CL33A contenha mais de uma protease, possivelmente de grupos diferentes. Quanto à
estabilidade térmica, a inativação em temperaturas moderadas pode indicar maior
possibilidade de controle de processos enzimáticos.
32
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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