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Dislexia em Adultos

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Dislexia em Adultos

Nos últimos anos, muito tem se falado sobre os Transtornos da Aprendizagem e a


Dislexia do Desenvolvimento. Porém, a maior parte das informações divulgadas se refere às
crianças que estão no período escolar. Mas, afinal, adultos também podem ter Dislexia? Como
ela se manifesta em adultos e como lidar com as dificuldades de leitura e de escrita nessa fase?
Uma vez que a Dislexia é um transtorno com bases genéticas que afeta o desenvolvimento
neurológico, mesmo que o diagnóstico seja geralmente realizado nos primeiros anos escolares,
esse quadro permanece presente em todas as fases da vida.
A Dislexia, também conhecida como transtorno específico da leitura, é o transtorno de
aprendizagem mais comum. Os transtornos de aprendizagem são de três tipos e se caracterizam
por dificuldades persistentes na leitura (Dislexia), na escrita (Disgrafia) e/ou na aritmética
(Discalculia), apesar de o sujeito afetado possuir nível de inteligência adequado e não apresentar
problemas emocionais, ambientais, sensoriais e neurológicos que sejam capazes de explicar as
dificuldades. Esses transtornos frequentemente estão associados, ou seja, existem disléxicos que
também possuem Disgrafia ou Discalculia. Porém, a associação mais comum é entre a Dislexia
e o Transtorno de Déficit de Atenção e/ou Hiperatividade (TDAH). Dados epidemiológicos
internacionais estimam que de 5 a 10% das crianças em idade escolar tenham Dislexia e que
esse transtorno está mais presente em meninos do que em meninas.
Em nosso país, devido à recente disseminação da importância do diagnóstico e
tratamento da Dislexia, muitos adultos com dificuldades de leitura e escrita buscam avaliação
especializada apenas depois que seus filhos são diagnosticados com Dislexia. Além disso,
outros adultos que cursaram a escola com extremas dificuldades de aprendizagem não
identificadas podem buscar avaliação diagnóstica após ingressarem em cursos superiores ou
outros que exijam constante uso da leitura e da escrita. Diante disso, considerando que a
Dislexia possui bases genéticas, quando alguém é disléxico, existe probabilidade maior de que
outras pessoas em sua família também sejam. O risco de uma criança com um dos pais
afetados desenvolver Dislexia é de 40 a 60%. Já o risco de um irmão afetado ter outro irmão
com Dislexia aumenta entre 3 e 10 vezes em relação ao resto da população.
Apesar de a avaliação diagnóstica da Dislexia ser realizada por especialistas, é possível,
no cotidiano, identificar alguns sinais que podem ser decorrentes deste quadro e, desta maneira,
solicitar avaliações multidisciplinares para investigação aprofundada. Os disléxicos podem
apresentar atraso para começar a falar; frequentemente esquecem os nomes e usam palavras
substitutas como “coisa” ou “negócio”; se confundem nos conceitos de direita/esquerda;
confundem letras por similaridade visual (b-d) ou por similaridade auditiva (f-v), pois possuem
dificuldades para diferenciar sons e símbolos semelhantes. Também apresentam dificuldades
para manipular sílabas e fonemas.
As principais características da Dislexia são relacionadas ao baixo desempenho em
leitura, tanto para compreender o material lido quanto em relação à velocidade em que o
sujeito lê. A leitura de disléxicos adultos pode ser lenta e com erros na identificação de letras,
o que faz com que o leitor não consiga compreender adequadamente o sentido do texto ou,
ainda, que ele tenha de reler diversas vezes o mesmo trecho para que possa compreendê-lo.
Frequentemente as dificuldades se refletem na escrita, com erros de trocas de letras e
esquecimento ou confusão em relação às regras ortográficas e gramaticais. Além disso,
dificuldades severas podem acompanhar o aprendizado de línguas estrangeiras. No que se
refere a outras habilidades, os disléxicos podem confundir instruções verbais breves e
números de telefone, além de apresentar dificuldade com planejamento, organização e manejo
do tempo, de matérias e tarefas. Contudo, são competentes na linguagem oral, são sociáveis e
frequentemente possuem boas habilidades visoespaciais.
Considerando que sujeitos adultos podem apresentar níveis diferentes de dificuldades de
leitura e de escolaridade e graus variados de exigência de leitura no trabalho, podem existir
grandes diferenças de desempenho entre os próprios disléxicos. Além disso, caso o indivíduo
tenha sido diagnosticado na infância ou adolescência e tenha recebido intervenção
especializada, provavelmente ele apresentará menor nível de dificuldade do que os não
diagnosticados previamente. Durante o ensino superior, disléxicos experimentam com
frequência dificuldades importantes em relação às demandas acadêmicas, tais como tomar notas
durante aulas e palestras, escrever resenhas, sintetizar materiais dos cursos para exames ou
compreender grande quantidade de material escrito complexo. Além disso, podem ser mais
lentos na elaboração de textos e produzir menor volume de material do que adultos sem
problemas de leitura. Pesquisas com análises da escrita de disléxicos adultos apontam que o
esforço e o tempo maiores exigidos são decorrentes de déficits no domínio das regras
ortográficas e da persistência no uso de estratégias fonológicas de escrita.
Recentemente, um grupo de pesquisadores liderados por Margaret Snowling, nos
Estados Unidos, realizou um estudo em que adultos disléxicos responderam a um questionário
de sintomas de leitura e habilidades relacionadas, a um questionário de sintomas de TDAH e
realizaram testes de leitura de palavras, de pseudopalavras e de escrita. O resultado mostrou
que houve forte correlação entre as respostas do questionário dos sintomas da Dislexia e o
desempenho na tarefa de leitura e nomeação verbal, o que significa que quanto maior foi a
presença de sintomas, menor foi o desempenho na leitura. Os adultos com formação superior
com dificuldades leves de leitura perceberam-se como pessoas com graves problemas de
desempenho no trabalho mais do que seus pares. Eles, portanto, têm maior probabilidade de
responderem positivamente ao questionário do que uma pessoa com o mesmo grau de
dificuldades de leitura que exerça um trabalho manual.
A Dislexia não é um quadro que configura uma deficiência, uma vez que é um
transtorno específico do desenvolvimento da leitura. Mesmo assim, é uma condição na qual é
necessária a adoção de práticas educativas especiais, pois os disléxicos processam as
informações de maneiras e em tempos diferentes para aprender e elaborar tarefas acadêmicas. A
LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) garante que os sujeitos com necessidades
educacionais especiais sejam atendidos na criação de condições satisfatórias de aprendizagem
em todas as fases de ensino, incluindo o Ensino Superior. Disléxicos que queiram prestar
vestibulares, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), concursos públicos e participar de
outros processos seletivos têm direito a solicitar os recursos que julgarem ser os mais adequados
para que obtenham um melhor desempenho. Dentre os recursos, é possível solicitar a presença
de um ledor, o uso de computador, a prova impressa em fonte maior e com maior espaçamento
entre linhas, bem como maior tempo para a execução da prova.
Algumas estratégias simples podem ser adotadas por disléxicos adultos para melhorar
seu desempenho no dia a dia do trabalho e dos estudos, como usar gravador durante as aulas
para não precisar anotar as falas do professor; aprender a grifar as principais ideias dos textos,
anotar as expressões-chave de parágrafos e posteriormente elaborar resumos; fazer um
dicionário com as palavras mais utilizadas no cotidiano que são de difícil memorização; e criar
estratégias de memorização por associação de ideias para aumentar a memória breve. Essas
informações sucintas podem auxiliar adultos com Dislexia a experimentar maior qualidade de
vida e autoconhecimento sobre suas necessidades e potencialidades a serem desenvolvidas.
Espera-se que, assim como tem ocorrido com as crianças e adolescentes, os adultos também
tenham mais acesso ao diagnóstico e tratamento da Dislexia, bem como maiores oportunidades
de desenvolvimento nas áreas acadêmica, profissional e pessoal.

Cindy Morão. Psicóloga, fez aprimoramento em reabilitação cognitiva e especialização


em neuropsicologia. Atualmente é psicóloga colaboradora do Laboratório de Neurociência da
Universidade Mackenzie e psicóloga do Ambulatório de Diagnóstico da APAE-SP.

Darlene Godoy de Oliveira. Psicóloga, mestre e doutoranda em Distúrbios do


Desenvolvimento. Professora do curso de especialização em Psicopedagogia da Universidade
Mackenzie.

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