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ARTIGO - A Umbanda de Pai Fabrício No Brasil Com 24 Páginas

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Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ

Programa de Pós-Graduação em História Comparada – PPGHC


Instituto de História – IH

DINE ESTELA MOREIRA MORAIS SANTOS

A UMBANDA DE PAI FABRÍCIO E O OMOLOKÔ


Um acordo de cavalheiros para combater a discriminação

Rio de Janeiro
2021
2022
RESUMO
Quem são, de onde vêm, o que querem e para onde vão. Estes são alguns dos questionamentos
levantados por esse trabalho dissertativo que se propõe a trazer à luz, sob a perspectiva de
análise da história comparada como a ritualística da umbanda africanista com traços da nação
Omolokô, praticada pelo escravizado Fabrício, no século XIX chegou até o século XXI diante
de tantas lutas contra a intolerância religiosa e o racismo. Essa vertente religiosa já foi
identificada em várias regiões do Brasil, mais precisamente nos estados de Espirito Santo,
Minas Gerais e Rio de Janeiro e completou 108 anos em 2022, mas para chegar tão longe fora
preciso muitas adaptações e sincretismos religiosos, principalmente com o catolicismo e o
espiritismo de Kardec, além de um suposto acordo de cavalheiros entre Custódio de Souza
Caravana, precursor desta umbanda no Brasil e o Tata Tancredo da Silva Pinto, considerado o
precursor do Omolokô no país. Deste modo, algumas hipóteses também serão levantadas como
a origem do culto Omolokô no Rio de Janeiro e seus precursores; a comparação da ritualística
original e a praticada pelas casas de Pai Fabrício no século XXI e suas adaptações até os dias
atuais, feitas pelos novos dirigentes que já estão em sua terceira geração.

Palavras-chave: Omoloko, Umbanda Omoloko, Umbanda africanista, matriz africana,


família Caravana, história comparada.
ABSTRACT
Who they are, where they buy from, what they want and where they go. These are some of the
questions raised by this dissertation work that aims to bring to light, from a perspective of
analysis of comparative history as the rituals of Africanist Umbanda with traces of the Omolokô
nation, practiced by the enslaved Fabrício, in the 19th century it reached the century XXI in the
face of so many struggles against religious intolerance and racism. This religious strand has
already been identified in several regions of Brazil, more precisely in the states of Espírito
Santo, Minas Gerais and Rio de Janeiro and completed 107 years in 2021, but to reach this far
it took many adaptations and religious syncretism, especially with Catholicism and Kardec's
spiritism, as well as a supposed gentleman's agreement between Custódio de Souza Caravana,
precursor of Umbanda in Brazil, and Tata Tancredo da Silva Pinto, considered the precursor of
Omolokô in the country. Thus, some hypotheses have also been raised such as the origin of the
Omolokô cult in Rio de Janeiro and its precursors; an original ritual and the one practiced by
the houses of Pai Fabrício in the 21st century and its adaptations to the present day, made by
the new directors who are already in their third generation. Keywords: Omoloko, Umbanda
Omoloko, Africanist Umbanda, African matrix, Caravan family, comparative history.
Data de Aprovação
Rio de Janeiro, __ de ____________ de ____
Data de Submissão -----de-----------de--------

Disponibilidade
dinestela@gmail.com
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 37: Fazenda do secretário (sec. XIX) (Acervo IPHAN)................................................................................ 8


Figura 1 fazenda do secretário (arquivo localizado no intentário da fazenda) ...................................................... 11
Figura 2 possível túmulo do escravizado fabricio .................................................................................................. 13
Figura 38: Tata Tancredo ........................................................................................................................................ 17
Figura 39: Custódio de souza caravana. Fonte: (autor, 2019) ................................................................................ 19
SUMÁRIO

Resumo 1
Abstract 2
1INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................... 6
A chegada do africano fabricio ao brasil ............................................................................................................. 8
A fazenda do Secretário ............................................................................................................................. 11
A origem da família caravana no Brasil de 1800 ....................................................................................... 14
AS ORIGENS DO OMOLOKÔ NO BRASIL .................................................................................................. 15
A UMBANDA DE PAI FABRÍCIO ................................................................................................................... 19
Conclusão ............................................................................................................................................. 22
Referências ............................................................................................................................................. 24
Obras Citadas ............................................................................................................................................. 25
6

1 INTRODUÇÃO

No Brasil foram codificadas no último século, vários tipos de umbanda com as mais
variadas ritualísticas, no entanto, neste trabalho de pesquisa com base numa perspectiva
comparada, iremos nos ater em como a ritualística da umbanda africanista com traços da nação
Omolokô, praticada pelo escravizado Fabrício, no século XIX no Norte Fluminense do Rio de
Janeiro chegou até o século XXI diante de tanta intolerância religiosa e racismo. Essa vertente
religiosa já foi identificada em várias regiões do Brasil, mais precisamente nos estados do
Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro e completou 108 anos em 2022, mas para chegar
tão longe e fugir das perseguições policiais e religiosas, fora preciso muitas adaptações e
sincretismos religiosos, principalmente com o catolicismo e o espiritismo de Kardec, além de
um suposto acordo de cavalheiros entre Custódio de Souza Caravana, e o Tata Tancredo da
Silva Pinto, considerado o precursor de Omolokô no país, para que ambas as vertentes religiosas
conseguissem burlar a intolerância religiosa.
Deste modo, algumas hipóteses também serão levantadas como: a verdadeira origem do
culto Omolokô no Brasil e seus precursores; a ritualística original e a praticada pelas casas de
Pai Fabrício e suas adaptações até os dias atuais, feitas pelos novos dirigentes que já estão em
sua terceira geração.
A prática religiosa com traços da Nação Omolokô, começou a ser identificada nas
práticas do escravizado Fabrício em uma fazenda do Rio de Janeiro nos anos de 1830 e também
há informações de ter sido disseminada pela escrava Maria Batayọ e seu filho Dawe de Oxóssi,
babalorixá, filho natural de Batayọ que viveu por cerca de 100 anos. Ele fez a iniciação
espiritual (fazer o santo) em Custódio Caravana batizado com Oxóssi Arranca Toco, babalorixá
que viveu 72 anos. (ACCIOLI, 2019).
Alguns historiadores afirmam que o Omolokô é um culto originário da Nação Angola 1 e
tem uma ritualística muito peculiar. Segundo a versão de um dos precursores do Omolokô no
Brasil, o Tatá Inkice Tancredo da Silva Pinto, descrita no livro de Ornato José da Silva em
1923: “Culto Omolokô - Os Filhos de Terreiro; uma das versões para a morfologia da palavra
que nos leva a crer que Omo signifique: filho e Oko: fazenda ou zona rural, tem origem na
prática do culto realizado dentro das florestas, de forma escondida, por conta da repressão
policial ainda na época da escravidão.

1
Tata N'Kisi David de Xangô - Apostila do Centro Espírita Irmãos do Arco-íris.
7

Não iremos nos aprofundar neste contexto que não é o objetivo central deste artigo, no
entanto, será de suma importância citar algumas características desta ritualística para
entendermos as origens africanistas da Umbanda de Pai Fabrício e como ela teve de se mascarar
perante a sociedade para fugir da repressão policial orquestrada pelo racismo estrutural que
perpetrou por vários séculos até os dias atuais (XXI).
Os relatos e registros históricos da convivência do escravizado Fabrício e da escrava,
Maria Batayọ ainda na década de 1860, na fazenda brasileira, hoje conhecida como Fazenda do
Secretário em Vassouras, nos levam a crer, que este possa ter sido o início da prática dos
ensinamentos do culto Omolokô no Rio de Janeiro, passadas para o filho do administrador da
fazenda, Custódio de Souza Caravana, inclusive com a incorporação do próprio escravizado
neste. O escravizado Fabricio depois de falecido, chegou a ser reconhecido como visitante de
pessoas adoecidas como cita o próprio Tatá Inkice Tancredo da Silva Pinto em uma publicação
do Jornal O Dia, de maio de 1968, citada pela Dr.ª Nilma Teixeira em sua Tese de Doutorado -
Das casas de dar fortuna ao Omolokô:

Todas as vezes que qualquer pessoa ficava muito doente em quaisquer fazendas e os
médicos já os consideravam incuráveis, apareciam pretos velhos (já falecidos) e nestas
aparições, nas horas sagradas da noite, iam à cabeceira de doentes que, ao amanhecer,
estavam plenamente curados. Estas aparições começaram com Pai Manoel da Luz,
Pai Tomás, João D'Angola, Pai Fabrício e Pai João da Costa. (ACCIOLLI, 2017)

Com este trecho, a Dr.ª Nilma Teixeira, acredita que o depoimento de Tancredo, que
destaca a aparição de Pai Fabrício entre os pretos velhos da época, pode sugerir que a prática
do culto Omolokô já existisse e fosse praticada por Pai Fabrício e que já tivesse contato com as
experiências religiosas dos africanos-centrais e seus descendentes vindos de Vassouras, Rio de
Janeiro, assim como a existência da negra Maria de Batayọ e Custódio de Souza
Caravana. Segundo a nota do jornal, mesmo que Tata Tancredo não conhecesse Custódio, já
tinha conhecimento das aparições do preto velho Fabrício e suas histórias de cura.
8

A CHEGADA DO AFRICANO AO BRASIL

FIGURA 1: FAZENDA DO SECRETÁRIO (SEC. XIX) (ACERVO IPHAN).

O escravizado Fabricio possivelmente tenha chegado ao Rio de Janeiro no século XIX


em meados de 1830, época em que o Brasil tinha o maior número de escravizados de sua
história, numa cidade que mais parecia uma cidade africana pela quantidade de negros
africanos perambulando pelos centros urbanos lutando para sobreviver, empregando todo o seu
conhecimento e suas habilidades trazidas de sua terra natal, entre elas a de curandeiros,
barbeiros, sangradores entre outras que ajudaram muito aquela comunidade que sofria com a
escassez de médicos por exemplo.
Eles prometiam curar além dos males do corpo, mas também os males da alma. Assim
também o escravizado Fabricio provavelmente conquistou a admiração dos donos da fazenda e
também a desconfiança da sociedade. Há fortes indícios de que o africano Fabrício possa ter
sido um curandeiro e sangrador, mesmo que não tenhamos conhecimento de que ele tenha se
submetido às provas que lhe concederiam esta licença, mas o fato é que há fortes indícios
históricos de que ele atuava como o médico dos negros na fazenda, já que os donos, não
pagavam médicos oficiais para cuidar dos negros. E foi por conta disso, ele acabou por curar o
filho do administrador da fazenda de epilepsia, segundo relatos da família e este menino viria
9

a ser a pessoa que iria levar os seus rituais de cura deste escravizado e sua religiosidade pelos
próximos séculos, e transformar no que conhecemos no século XXI como a Umbanda
Africanista de Pai Fabricio no Brasil. O nome desse menino era Custódio de Souza Caravana.
Para investigar as origens dessa umbanda africanista com traços da nação Omolokô
praticada pelo africano Fabricio será necessário conhecer um pouco mais das origens do próprio
africano. Fabricio, nome dado em batismo pela Igreja Católica ao africano que pode ter vindo
do Congo, Angola, Moçambique, Nigéria ou ainda outros países na Costa do Continente
Africano, um dos primeiros a serem capturados pelos colonizadores, principalmente pela
facilidade de acesso a essas terras. Encontramos vários registros de Fabrício no Arquivo
Nacional advindos de todos estes países citados. No entanto, por conta da prática do Omolokô
citado por tata Tancredo da Silva Pinto como uma cultura de Angola – Congo e Moçambique,
acreditamos que o africano possa ter vindo também destas regiões. Os indícios históricos como
roupas, penteados, língua (bantu), cicatrizes na pele (sem relatos), rituais religiosos, são
elementos que poderiam ajudar a descobrir sua origem africana.
Naquela época existiam várias categorias de escravizados, os de ganho: que trabalhavam
nas ruas e vendiam suas habilidades ou produtos para seus donos, os que trabalhavam na
colheita, os que trabalhavam na casa grande e os que trabalhavam como os curandeiros da
fazenda e faziam o papel do médico, já que os donos não contratavam estes especialistas com
tanta facilidade para cuidar dos enfermos da fazenda. Fabrício, ao que tudo indica, exercecia
esse papel. Ele trabalhava com ervas consideradas hoje como medicinais e também conhecia
as técnicas de sangria segundo relatos passados pela família Caravana (Neto de Custódio).
Não temos a informação de que estivesse registrado na (Fisicatura Mor), uma espécie
de ordem dos curandeiros e sangradores da época, onde eles prestavam provas de que sabiam
lidar com estas técnicas. Este era um órgão responsável por regulamentar, normatizar e
fiscalizar tudo ligado à saúde pública. Existia uma hierarquia de prestígio em que os médicos
oficiais estavam no topo da pirâmide, seguidos dos curandeiros e parteiras que exerciam uma
medicina alternativa e auxiliar. Claro que esta medicina era muito confrontada porque estava
muito ligada a uma religiosidade africana baseada na ancestralidade, muito através das
incorporações. Essa realidade em uma época banhada pelo catolicismo era tradada como
demonização e muito perseguida.
O que se descreve em relação ao Kalundu na época fazia referência às práticas mágicas
ou mediúnicas, cultos com presença de danças, música, batuque de tambores e atabaques. Para
a colônia, era feitiçaria e tratada como crime, tanto pelo código civil das organizações Filipinas,
10

como pelo tribunal eclesiástico. Então adivinhações e adoração aos ancestrais africanos eram
considerados adoração aos demônios pela igreja católica, também criminalizados pela justiça
da época com severas punições que incluíam penas de morte através da forca e fogueia, além
de outras práticas de tortura. As práticas de feitiçaria, por exemplo, eram punidas com pena de
morte. Sempre houve um grande temor sobre os conhecimentos dos africanos, tanto quanto as
ervas, quanto aos conhecimentos espirituais ou mágicos. (ANCINE, 2011).
Mesmo diante da fragilidade das informações contidas no Arquivo Nacional sobre a
origem dos escravizados que chegaram no Brasil no século XIX, foi possível encontrar muitos
registros com o nome de Fabrício que chegaram de vários países da África. Era comum a prática
de se batizar com nomes portugueses todos os que pisavam em terras brasileiras, no entanto,
muitos já chegavam no Brasil com novos nomes de batismo católico.
Esses registros datam do século XIX no caso dos documentos encontrados no Arquivo
Nacional, já as fotos e vídeos já são mais recentes, datam do século XX quando os herdeiros de
Custódio Caravana deram continuidade ao seu trabalho. Nesta época começou a ficar mais
comum os registros como fotos e vídeos, mesmo que em preto e branco, no entanto, muito
onerosos para a sociedade da época. A maioria das documentações disponíveis até o momento
são relativas às fotos, vídeos e documentos liberados pela família, como certidões, inventários,
artigos publicados sobre a família e a fazenda na época em jornais de grande circulação.

EM UMA ÉPOCA MUITO TURBULENTA

Na época da chegada do africano Fabrício ao Brasil, no continente americano, o


abolicionismo chegaria através de leis de emancipação que ocorreram em países como a
Colômbia, Argentina e o México. Já nações localizadas na América como Estados Unidos,
Brasil e Cuba mantiveram a escravidão durante o século XIX. Na América Latina, o último país
a abolir o regime de escravidão foi o Brasil (1888). Ainda neste século ocorrera grandes fatos
históricos como a Promulgação da 1ª Constituição do Brasil em 1824. Em 1831, Dom Pedro I
abdicava do Trono. Em 1835 iniciava a Guerra dos Farrapos no Rio Grande do Sul. Em 1847
ocorrera o Golpe da Maioridade e nesta mesma época Dom Pedro II assumia o trono brasileiro.
Em 1850 é publicada a Lei Eusébio de Queiroz que proibiu o tráfico de escravos. Em 1864 teve
início a Guerra do Paraguai. Em 1888: A princesa Isabel assina a Lei Áurea que aboliu a
escravidão no Brasil; e 1889 ocorre a Proclamação da República. (Bezerra, 2019).
11

Enquanto isso, em África: segundo o compêndio: História Geral da África em seu


volume V, que trata o ´século XIX - pré-colonização e pós-colonização, pág. 8, deixa claro que
os portugueses pretendiam dominar os territórios que vão de Angola a Moçambique e
dominavam intermitentemente a região que se estendia de Loje, a Sul do Cuanza, até Casanga
(Kasanga), a Leste, além de suas feitorias situadas na costa, entre Ambriz e Moçâmedes. Em
Moçambique, a dominação portuguesa limitava‑se, em 1800, à Ilha de Moçambique. Nessa
ilha, os mercadores brasileiros e mulatos desempenhavam um papel mais importante do que os
administradores portugueses. Na Europa, a revolução francesa já dava sinais de vitória.

A FAZENDA DO SECRETÁRIO

FIGURA 2 FAZENDA DO SECRETÁRIO (ARQUIVO LOCALIZADO NO INVENTÁRIO DA FAZENDA)

A fazenda para onde o escravizado Fabrício era cativo foi construída em meados do
século XIX (1830) por Laureano Corrêa e Castro, o Barão de Campo Belo. O título de Barão
lhe foi agraciado em 1854 pelo Imperador Dom Pedro II. Ela despontava no final do século
XIX, com a cafeicultura, na Freguesia de São Sebastião dos Ferreiros e se destacou no cenário
da região por seu avanço em relação a outras localidades pela ousadia em acreditar na utilização
de outros sistemas de trabalho em substituição à escravidão.
12

Localizada no Município de Vassouras, a propriedade chegou a possuir 500.000


(quinhentos mil) pés de café e 366 escravizados. Consta de seu inventário, parte da sua tulha,
localizada do lado direito da casa, onde situavam-se 51 lances de senzalas, identificadas no
inventário como “Casa de Colono”, 5 enfermarias e dez casas para empregados.
As senzalas já não existem mais, mas há um cemitério clandestino, que segundo relatos
da família Caravana seria para os escravizados e onde acredita-se estar os restos mortais de
Fabrício, dentre muitos outros. No entanto, nem mesmo uma exumação seria suficiente para se
ter certeza de que estes possam ser os restos mortais de Fabricio, haja vista, não haver nenhum
componente genético de comparação para a realização de tal acareação, mas este túmulo está
identificado como pertencente ao escravizado.
13

FIGURA 3 POSSÍVEL TÚMULO DO ESCRAVIZADO FABRICIO (ARQUIVO DA FAMÍLIA)


14

A ORIGEM DA FAMÍLIA CARAVANA NO BRASIL E SUA LIGAÇÃO


COM O ESCRAVIZADO

A história da família Caravana no Brasil começou efetivamente quando dois


portugueses, oriundos de Barcelos, Portugal, Luís Maria de Sousa Caravana (+8/7/1840) e
Alberto de Sousa Caravana (+15/6/1851), decidiram emigrar para o Brasil. A família passou
por Minas Gerais e depois se fixou em São Sebastião de Ferreiros, Vassouras, Norte Fluminense
do Rio de Janeiro. O mais velho, Luís, casou-se, em 28/07/1870 com Cândida Clara na
Freguesia de São Sebastião dos Ferreiros. Nasceu o primeiro filho do casal, Custódio de Sousa
Caravana. Luis Maria veio a falecer em 28/05/1874. O irmão mais novo, João, casou-se com a
cunhada, Cândida Clara, em 21/09/1874, falecido em 03/12/1927. Ambos eram filhos de
Antônio José Caravana e Luiza Rosa de Souza Caravana. Do casamento de João Alberto
nasceram em 02/05/1877 Alberto de Sousa Caravana, falecido em 02/08/1962 e em 1881,
Antenor de Sousa Caravana, falecido em 25/04/1941.
A família era tradicional católica como toda família portuguesa (ou quase). Só a parte
de Custódio de Souza Caravana, que passou a praticar o espiritismo com uma mistura de
Omolokô, cabula, Calundu e kardecismo. Adjalmira Caravana (Janaina), mesmo sendo a caçula
de Custódio Caravana Filho, não seguiu a linha religiosa do pai. Chegou a liderar um centro
espírita Kardecista no Rio de Janeiro por muitos anos, mas a medicina não lhe deixara sobrar
muito tempo para outras atividades. Em termos religiosos, a família é muito eclética.
Segundo fragmentos históricos contados pela própria família, os Caravanas que vieram
para o Brasil, foram para Minas gerais, na região de Juiz de Fora, logo em seguida para
Vassouras, onde está localizada a fazenda do Secretário. A família Corrêa e Castro, seria
formada por primos dos Caravana, que teriam os convidado a morar na fazenda quando
chegaram de Portugal, assumindo assim, a administração do local, onde através de seus
serviços, conseguiram formar capital e comprar as terras que seriam de Custódio de Souza
Caravana, no município do Rio de Janeiro, então capital da república, localizadas em
Madureira, arredores de Senador Vasconcelos e em outros municípios como Nova Iguaçu, onde
hoje é Queimados e Vassouras, distrito de Barão de Juparana.
15

AS ORIGENS DO OMOLOKÔ COM PAI FABRÍCIO


O culto Omolokô era conhecido no século XIX, como Kalundu ou Cabula, e era
praticado assim pelo escravizado Fabricio quando chegou ao Brasil e foi instalado na fazenda
do Secretário em Vassouras. Vale ressaltar, que Custódio de Souza Caravana, praticava nesta
mesma linha e fundou a primeira casa de santo na cidade de Queimados em 1914 e Tata
Tancredo fundou a primeira federação de umbanda Omolokô em 1950 em Belo Horizonte. Ou
seja, depois de 36 anos de existência da casa de Pai Fabrício no Rio de Janeiro que completou
em 2022, 108 anos de existência no Brasil.
No início de suas práticas religiosas, por conta da repressão policial, Custódio Caravana
não utilizava o tambor para não chamar a atenção, assim como também não fazia aglomerações
com as famosas rodas de umbanda atuais. Seu trabalho se resumia em um quartinho onde ele
recebia as entidades e atendia as pessoas com as suas orações. Esse quartinho funcionava na
Rua João Bernardo, (Centro), Queimados, RJ. Nesta rua hoje estão instalados o Banco do Brasil
e a Controladoria Geral do município.
Depois de sua morte, seu filho Custódio de Souza Caravana Filho (Custodinho), abriu a
Casa de Pai Fabrício na rua Custódio de Souza Caravana, 27, Centro de Queimados, resgatando
algumas características do culto Omolokô: com filhos de santo, cantos e danças para os Orixás,
comidas de santo, abate religioso, no entanto, mantendo o sincretismo religioso com o
catolicismo e o espiritismo de Kardec iniciados por seu pai.
Essa prática também foi identifica nos rituais de Maria de Batayọ, na mesma época. Não
se sabe se os dois conviveram na mesma fazenda, mas pelos relatos históricos publicados pelo
site Acervos, o fato de seu trigésimo-sexto e último filho-de-santo revelar que embora tenha
sido feito em casa de Batayọ, aprendeu muito do que sabia com Custódio Caravana, de Oşoọsi,
babalorişa, feito por seu filho biológico, projeta-se uma ligação de ambos com as origens do
culto Omolokô, disseminados por pai Fabrício e Maria de Batayo.

ACORDO DE CAVALHEIROS
Segundo relatos da família Caravana, havia um “acordo de cavalheiros” entre o
Caravana (1867-1939) viveu 72 anos e o Tata Tancredo, este teria nascido 37 anos depois de
Caravana (1904-1979) e viveu 75 anos: O acordo na época teria se dado da seguinte forma
como relatam os membros da família Caravana:
16

Por se tratar na época de uma sociedade elitista, não tinha como propagar os rituais
africanos livremente, devido a influência da recém abolição, já que muitos Barões do
Café, ainda estavam revoltosos. Então, preferiu Custódio de Souza Caravana (avô) de
Fabricius Custódio de Souza Caravana, criar a linha de Pai Fabrício, misturando os
aprendizados adquiridos na senzala da Fazenda do Secretário com Pai Fabrício e
Maria de Batayọ, pois há relatos de que o Omolokô teria sido instituído no Rio de
Janeiro também por ela, uma escrava nascida na África em 1797, quando de sua
iniciação no Omolokô por Dawe, unindo a prática do kardecismo com suas teorias,
estudos e práticas, que estavam sendo aceitas pela sociedade na época, como também,
associando alguma parte do catolicismo no sincretismo religioso da época. Dessa
forma, ele não foi elevado ao grau de um dos criadores do Omolokô, mas já existia
desde sua época, preferindo criar um segmento próprio, de acordo com suas teorias e
aprendizados. Sendo divulgado entre seus seguidores e consulentes. Lembrando que
Custódio de Souza Caravana, estava no meio político, tinha então que se preocupar
em manter sua imagem e respeito, para não ser atacado pelos intolerantes e
perseguidores da fé advinda da África. (entrevista concedida pelo neto de Custódio de
Souza Caravana e atual zelador da Cabana de Pai Fabrício em Queimados concedida
em 19/02/2019).

Mesmo depois deste acordo, em 1934, o filho de Custódio que já estava na


administração das casas de santo, chegou a ser preso por conta de suas práticas religiosas. Neste
ano, o presidente da República, Governo Vargas, instituiu o decreto nº 24.531/34, publicado
em 2 de julho de 1934, que estabelecia em seu art. 33, que caberia à 1ª Delegacia Auxiliar,
processar a cartomancia, mistificações, magias, exercício ilegal da medicina e todos os crimes
contra a saúde pública e o fato da umbanda de Pai Fabricio se utilizar das ervas para a realização
de curas, foi um dos motivos para a invasão dos terreiros e a prisão de Custódio de Souza
Caravana Filho que tinha apenas 28 anos de idade. No entanto, logo foi libertado devido ao
reconhecimento de seu trabalho social junto à comunidade e a grande relação política de seu
avô, Custódio de Souza Caravana.

SIMILITUDES E DIFERENÇAS

Segundo Tata Tancredo da Silva Pinto, organizador e o maior incentivador


da Umbanda Omolokô no Brasil, o culto chegou ao país proveniente do sul de Angola, onde
era praticado por uma pequena tribo pertencente ao grupo Lunda-Quiôco, que ficava às margens
17

do rio Zambeze, que lhes fornecia alimentação no período das cheias. Ele explica que no culto
Omolokô as divindades possuem nomes em língua Yorùbá, Fon-Ewe ou Congo-Angola.
Tata Tancredo afirmava que: “a Umbanda africana é um
patrimônio da raça negra” Para ele, a Umbanda é um culto de origem
africana e esse viés africanista da Umbanda pode ser visto em uma
de suas afirmações: “Terreiro de Umbanda que não usar tambores e
outros instrumentos rituais, que não cantar pontos em linguagem
africana, que não oferecer sacrifício de preceito e nem preparar
comida de santo, pode ser tudo, menos Terreiro de Umbanda.” Tata
Tancredo.
FIGURA 4: TATA TANCREDO
Na Umbanda Omolokô há iniciação para Orixá, Vodun 2 ou
Bacuro 3, com recolhimento do iniciando à camarinha 4 por um período não inferior a três dias,
tem casos de até 21 dias de recolhimento. Além da chamada divindade tutelar, que é assentado
primeiro, o membro de um Terreiro de Umbanda Omolokô é iniciado para mais duas outras
divindades, que farão parte do “enredo” espiritual do adepto. Muito destes preceitos são
5
realizados também pela umbanda de Pai Fabrício no Brasil.
No ritual da umbanda africanista de Pai Fabrício, mesmo depois das adaptações de
Custódio de Souza Caravana, ainda é possível encontrar muitos traços da nação Omolokô
trazidos ao Brasil pelo africano curandeiro Fabrício, seja através das cantigas em Bantu, nas
comidas de santo, as cantigas que exaltam as qualidades dos Orixás e no passe 6 com a chegada
dos pretos velhos e caboclos, principalmente. A Umbanda de Pai Fabrício também saúda o povo

2
Voduns, "Vodum" pode designar tanto a religião quanto os espíritos centrais nessa religião. Fonte: disponível
em: https://www.dicionarioinformal.com.br/vodum/
3
Bacuro: substantivo masculino [Folclore] Filho ou protetor no culto dos negros bantos. Em antigos cultos bantos
brasileiros, “bacuro” era o nome de uma classe de espíritos da natureza que jamais encarnaram. Também pode-se
escrever “baculo”. Fonte: https://caminhosdoaxe.com.br/encyclopedia/bacuro/
4
Carmarinha: os dicionários apresentam essa palavra como um substantivo feminino que significa: pequeno
quarto de dormir. Já nos rituais de umbanda, é conhecido como um rito que como todos os outros é a
“concretização” do mito por meio da linguagem simbólica. Já o símbolo ocupa lugar privilegiado, pois é a própria
expressão da vivência religiosa na camarinha. Ele ordena a expressão, constitui o visível do enredo ligado à
linguagem fundante mitológica. Fonte:
https://periodicos.ufpb.br/index.php/religare/article/download/15808/9052/#:~:text=A%20camarinha%20%C3
%A9%20um%20rito,ligado%20%C3%A0%20linguagem%20fundante%20mitol%C3%B3gica.
5
Essa definição foi escrita em 2012 e revisada em 2017, por Mário Alves da Silva Filho. Sacerdote afro-
religioso, dirigente do Templo Espiritual Pantera Negra e do Ilé Ifá Ajàgùnmàlè Olóòtọ́ Aiyé . Especialista e
Mestre em Ciências da Religião, pela PUC/SP; especialista em História da África e do Negro do Brasil, pela
UCAM; especialista em Políticas Públicas de Segurança Pública, pela PUC/SP; Bacharel e Mestre em Ciências
Policiais de Segurança e Ordem Pública, pela APMBB. Endereço eletrônico: ezezide@gmail.com.
6
Rezas feitas pelos santos incorporados nas pessoas que estão procurando algum tipo de cura ou orientação
espiritual. Geralmente é feito com ervas através de banhos, chás e orações que utilizam as energias das plantas
através da aromatização.
18

da mata como índios e caboclos e o povo de rua que são os exus, assim como no Omolokô
citado por Tata Tancredo da Silva Pinto.
19

2 A UMBANDA DE PAI FABRÍCIO

FIGURA 5: CUSTÓDIO DE SOUZA CARAVANA. FONTE: (ARQUIVO DA FAMÍIA)

Ao nascer em uma fazenda no Sul Fluminense do Rio de Janeiro, mais precisamente na


cidade de Sebastião dos Ferreiros, distrito de Vassouras, em uma fazenda que cultivava cana-
de-açúcar e café, como tantas outras na região de Vassouras, RJ, e em pleno regime
escravagista, o filho de Luiz de Souza Caravana e de Dona Cândida Clara Caravana, que
mantinham ideologias abolicionistas, no Sul Fluminense, pelos arredores de Vassouras e
Miguel Pereira, quando estava com cerca de seis para sete anos, foi diagnosticado com
epilepsia, na época doença que considerada incurável e sem tratamento (relatos de membros
vivos da família).
Ao ter uma crise, perante um negro da senzala da fazenda, batizado como Fabrício, o
mesmo mencionou que poderia curar o menino. Este africano detinha conhecimentos de cura
através de fórmulas e porções feitas com ervas, hoje consideradas medicinais, mas naquela
época, fora motivo para muitos negros irem parar nas fogueiras da inquisição.
A oralidade histórica familiar da conta de que de início o negro fora rechaçado pelo Sr.º
Luiz, (pai de Custódio Caravana), mas devido às constantes crises do menino, Dona Cândida
(mãe), pediu a seu marido que deixasse o negro, cuidar de seu filho, então se dirigiram até ele
e lhe pediram para que curasse a criança daquele mal, mas o negro pediu em troca: que
deixassem o menino mais tempo com eles na senzala, para que pudesse também aprender o que
ele conhecia, o que foi aceito, e assim o menino passou a estar sempre no meio dos negros e ser
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querido por todos. Fato que revela um pouco à miúde, o sistema adotado entre o administrador
da fazenda e seus “escravos”. Numa fazenda comum de escravos, não há concessão ou condição
para que os mesmos sirvam seus donos, mas neste caso, fica claro o poder de negociação entre
o negro e o administrador, revelando de forma velada, o sistema diferenciado praticado na
fazenda que difere do sistema escravocrata da época.
Mesmo tendo essa grande quantidade de escravos, há indícios históricos de que essa
fazenda não tratava seus cativos como era de costume, ela se identificava mais como um
quilombo disfarçado, onde os donos da fazenda, liberavam pedaços da terra para os
escravizados cultivassem o seu próprio sustento e as sobras das mercadorias eram compradas
pelos próprios administradores da fazenda e com esse dinheiro, compravam suas alforrias e até
de outros familiares e amigos que haviam sido vendidos para outras fazendas da região.
Esta prática de alguns fazendeiros é relatada inclusive no livro “Mocambos e
Quilombos” de Flávio Gomes: “Em Vassouras, em 1854, preocupados com as insurreições
escravas, recomendavam que fosse permitido aos cativos, possuírem roças para que se ligassem
“ao solo pelo amor da propriedade”. (Gomes, 2015, p. 31).
Alguns anos depois, o negro faleceu, assim como seus pais, e Caravana com a abolição
da escravatura, a divisão das terras pelos herdeiros, diminuiu o patrimônio adquirido pela
família, passando então a se valer de seus conhecimentos adquiridos com o curandeiro Fabricio
e também pelos conhecimentos passados pelo filho da escrava Maria Batayọ, o Dawe de Oxóssi,
babalorixá, filho natural de Batayọ, que viveu perto de 100 anos. Segundo a oralidade histórica,
há relatos de que ele teria desenvolvido a mediunidade em Custódio Caravana que passou a
trabalhar com o Orixá Oxóssi Arranca Toco:
(...) Quando Sinhazinha morreu, por volta de 1867, Batayọ tinha cerca de setenta anos.
Muito velha para viver na fazenda, veio para a cidade e ocupou sua terra no morro de
São Carlos, fundando a Roça e iniciando sua vida de mãe-de-santo. Batayọ casou-se
no Brasil, teve vários filhos naturais e fez vários filhos-de-santo em sua Roça. Apesar
de ter vindo feita da África, aprendeu com africanos ex-escravos muito sobre os
fundamentos das religiões africanas praticadas aqui no Brasil naquela época,
especialmente o Omolokô, tanto durante o período em que viveu na fazenda quanto
em seu primeiro ano na Roça do morro de São Carlos. Batayọ casou-se no Brasil, teve
vários filhos naturais e fez vários filhos-de-santo em sua Roça. (acervos, 2019).

Com isso, nas décadas de 30/40/50 do século XIX, surge a figura de Tatá Tancredo, que
alguns dizem ter sido orientado também por Custódio de Souza Caravana e por Fugenko, filho
de Maria de Batayọ, que traz ao mundo os conhecimentos sobre o Omolokô, o que lhe confere
o título de Rei do Omolokô, divulgando por diversos estados brasileiros:
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Inclusive, Tancredo da Silva Pinto, Tatá Tancredo, viveu lá no morro de São Carlos.
Onde segundo relatos, depois que veio do interior, ali ele organizou o Omolokô, pois
foi lá que Maria de Batayọ, viveu até sua morte. Que as terras ali, pertenciam a um
fazendeiro também amigo de Custódio Caravana, que haviam organizado, uma
espécie de confraria para o crescimento do Rio de Janeiro, conforme ele fez na região
de Madureira, cedendo parte de suas terras para o crescimento da cidade e também
para que alguns habitantes pudessem povoar a cidade atreves de lotes doados para
pessoas carentes. (entrevista concedida em 2019 pelo neto de Custódio de Souza
Caravana, Fabrício Custódio de Souza Caravana).

Segundo relatos da família Caravana, mais tarde, depois de feito no santo, Custódio de
Souza Caravana, passou a manifestar o espírito de Fabricio, proporcionando curas pela região,
tendo inclusive ganho o codinome de “seu Grumenta do Alto da Serra”, fazendo as suas
intervenções espirituais desde Vassouras, passando pelos municípios conhecidos atualmente
por Miguel Pereira, Paraíba do Sul, Paty de Alferes, Nova Iguaçu, Queimados, chegando a
Senador Vasconcelos e Madureira.
Nos terreiros de Pai Fabrício, o ponto que rende homenagem a ele conta um pouco de
sua trajetória pelas serras do Sul do Estado do Rio de Janeiro para dar continuidade aos
trabalhos de cura através do auxílio espiritual do curandeiro africano Fabrício como espírito
incorporador: No entanto, ainda não se tem conhecimento de que o espírito de Custódio
Caravana tenha voltado à terra através de incorporação mediúnica, mas sua presença é
constantemente sentida pelo médium e neto, Fabrícius Custódio de Souza Caravana:
Seu Grumenta do alto da Serra
Seu Grumenta da Serra Grande
Seu Grumenta do Alto da Serra
Seu Grumenta da Serra grande
Ora vem me ajudar,
Oh segura seu ponto e a sua Congá...

Este ponto é entoado no início de todas as sessões mediúnicas da casa em homenagem à


Custódio de Souza Caravana. Para homenagear o negro e mentor espiritual da Casa, Fabricio,
entoa-se:
Pai Fabricio olhai seus filhos
Pai Fabricio, vem nos ajudar
Salve seus filhos de pemba, Pai Fabrício
Na fé de Oxalá...
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CONCLUSÃO

A ritualística de Pai Fabrício se utilizou das características de várias religiões,


principalmente, o catolicismo romano e o espiritismo de Kardec para se manter viva na
sociedade até os dias atuais (sec. XXI) com base nos discursos de poder de cada época, como
destaca o professor Drº. Babalawô Carlos Alberto Ivanir dos Santos com a devida maestria, já
que além de ser um historiador das religiões de matriz africana, também tem suas origens
religiosas fundadas no Omolokô. Ele vai dizer que a intolerância religiosa foi o pano de fundo
para justificar a dominação e a colonização das populações negras:

A intolerância religiosa, contra os adeptos das religiões de matrizes africanas, é um


processo histórico, político e social, entrelaçado no desenvolvimento da sociedade
brasileira. Fruto do desenvolvimento da ideologia racista, fomentada entre os séculos
XVIII e XIX, a intolerância religiosa serviu para justificar a dominação e a
colonização das populações negras em África, o traslado e a escravidão dos mesmos
nas Américas, principalmente no Brasil. (Santos, 2018, p. 5).

Mesmo diante do século XXI as religiões de matriz africana ainda precisam mascarar
muitas de suas práticas religiosas, como o abate religioso, as guias, roupas de santo, muitas são
expulsas de seus locais de origem por bandidos que se intitulam “exército de jesus”, pessoas
são agredidas e até mesmo mortas. Os relatos históricos são muitos e revelam o quanto ainda é
possível identificar processos de escravidão e racismo pelo mundo, principalmente no
continente africano.
Estimativas indicam que existam, hoje, 29,8 milhões de pessoas que vivem em regime
de escravidão. A África é o continente que tem a maior concentração de escravos no mundo. A
região do Paquistão e Índia também não fica muito atrás (a Índia, inclusive, é o país que mais
tem escravizados em números brutos: quase 14 milhões de pessoas). Os dados são do Global
Slavery Index, que estima o número de escravizados nas nações.
Mesmo que para muitos, principalmente brancos, reclamar de racismo seja considerado
vitimismo, basta um olhar mais atento para as atitudes das pessoas para identificar o racismo
estrutural em plena função até mesmo dentro das academias, e não somente os discentes sofrem
esta agressão, mas os docentes também. Recentemente um professor negro foi proibido de
participar de uma banca avaliadora com a justificativa estapafúrdia de que ele não estava
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preparado psicologicamente, vale ressaltar que ele era o mais qualificado para a função. O
processo contra estes profissionais da UFRJ estava em curso até o fechamento deste artigo.
Fanon faz uma análise tão aprofundada da questão do racismo estrutural que nos remete
a repensar como o negro foi uma criação do colonizador para abalizar sua dominação territorial
e psicológica. Até os dias atuais, ainda se apresenta o negro como ser inferior, que deva ser por
tanto, escravizado, colonizado, aculturado e sujeito a todo o tipo de humilhação, assim como a
sua religião, principalmente se essa for de matriz africana. (Santos, 2021).
Voltando à tese do professor Ivanir ao citar dois grandes eventos religiosos: A Marcha
para Jesus” e a “Caminhada Inter-religiosa”, vemos claramente mais um grande exemplo de
racismo estrutural ao verificar o grande aporte financeiro e institucional oferecido à “Marcha
para Jesus”, em detrimento da “Caminhada”, que há 14 anos continua relegada à segundo plano,
como um evento secundário no Rio de Janeiro, mesmo tendo arrebanhado milhões de
caminhantes e destacar uma violência secular contra a humanidade,
A “Marcha”, além de ganhar um aporte financeiro incomparável e institucional, ainda
ganhou um lugar cativo, por força de Lei no calendário oficial de eventos da cidade. Logo, as
adaptações feitas por Custódio de Souza Caravana à sua religião se justificam até os dias de
hoje e revela o quanto a sociedade ainda precisa evoluir nas questões dos direitos humanos.
Ainda destacando do artigo sobre o texto de Frantz Fanon: Pele Negra, Máscaras
Brancas, ibid. (Santos, 2021): Fanon entende que uma outra solução é possível, mas que ela
implica uma reestruturação do mundo. O autor vai levantar a hipótese da existência de um
complexo de inferioridade como algo pré-existente à colonização:
Podemos dizer que, quase em todos os lugares em que os europeus fundaram
colônias do tipo aqui “em questão”, eles eram esperados e até mesmo
inconscientemente desejados pelos nativos. Em todas as partes, lendas os
prefiguravam sob a forma de estrangeiros vindos do mar e destinados a trazer
benefícios. (Fanon, 2008).

Até hoje, em pleno século XXI, me pergunto o que faz o homem se achar melhor do que
o outro partindo do princípio da cor da pele ou de sua cultura. Vale ressaltar aqui a grande
importância do discurso de poder incutido em todas estas práticas, sejam violentas ou políticas
encontradas no cerne da sociedade.
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REFERÊNCIAS
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ANCINE (Produtor), & Ancine: (Diretor). (2011). O sangrador e o Dourtor, Rio de janeiro,
1820 – Histórias do Brasil [Filme Cinematográfico]. BRASIL: TV BRASIL. Acesso
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file:///F:/mestrado/2021/Prof.%20Ivanir/Frantz_Fanon_Pele_negra_mascaras_brancas.
pdf
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MÁSCARAS BRANCAS - uma análise sobre racismo estrutural de Fanon. Acesso em
20 de SETEMBRO de 2021, disponível em www.minhabaixada.com.br:
https://manage.wix.com/dashboard/05f8a3c0-e52c-4eba-b800-
06531ee14ee6/blog/scheduled?lang=pt

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