Guia Necrópsia
Guia Necrópsia
Guia Necrópsia
TÉCNICA DE NECROPSIA EM
CÃES E GATOS E ALTERAÇÕES
POST MORTEM
Conselho Regional de
Medicina Veterinária do
Estado de Minas Gerais
CRMV-MG
ISSN 1676-6024 Editorial
Técnica de Necropsia em Cães e Gatos e
do de Minas Gerais
tualização
ções da
s.
Alterações Post Mortem
A Escola de Veterinária da UFMG e o Conselho Regional
de Medicina Veterinária e Zootecnia de Minas Gerais têm a
satisfação de encaminhar à comunidade veterinária e zootéc-
nica mineira mais um volume dos Cadernos Técnicos, nesta
oportunidade intitulado “Técnica de Necropsia em Cães e
Gatos e Alterações Post Mortem”.
TÉCNICA DE NECROPSIA EM Cães e gatos são os mais comuns animais de companhia
CÃES E GATOS E ALTERAÇÕES
POST MORTEM e podem ser fontes de infecção para seres humanos. Torna-se
.crmvmg.gov.br
importante lembrar sobre os riscos inerentes à necropsia. A
Conselho Regional de
Medicina Veterinária do
Estado de Minas Gerais
CRMV-MG
infecção acidental dos patologistas veterinários e pessoal de
apoio pode ocorrer durante a necropsia. Todos os procedi-
mentos de necropsia devem ser executados com a utilização
de EPI’s adequados, incluindo luvas, óculos, máscara, gorro,
botas plásticas, avental ou macacão impermeável, etc. (vide
CT volume 99). A infecção por Mycobacterium tuberculosis
durante a necropsia de cão foi relatada, por inalação de ae-
rossóis de tecido durante o uso de serra elétrica para abrir
o crânio (Posthaus et al., 2010). Mordidas são problemas
comuns na atuação profissional e devem ter atenção ime-
diata, com desbridamento e desinfecção. Arranhões de
gatos podem resultar em infecção por Bartonella henselae
(Breitschwerdt, 2015). Consistem em preocupação larva mi-
grans, criptosporidiose, dermatofitose e toxoplasmose (Tan,
1997). Além de raiva, entre riscos emergentes e reemergen-
tes, estão as viroses por cowpox em felinos, norovírus, rota-
vírus e influenza, bacterioses por Campylobacter, Leptospira,
Pasteurella, Staphylococcus aureus resistente à meticilina e
Salmonella, parasitoses por Leishmania e Onchocerca e micose
por Sporothrix (Chomel, 2014). Com a premissa da educa-
ção continuada, desejamos que este volume seja de consulta
na rotina de exame post mortem de cães e gatos.
Universidade Federal 1. Breitschwerdt EB. Did Bartonella henselae contribute to the deaths of two vet-
de Minas Gerais erinarians? Parasit Vectors. 2015 Jun 12;8:317. doi: 10.1186/s13071-015-0920-4.
PMID: 26062543; PMCID: PMC4464698.
Escola de Veterinária
Fundação de Estudo e Pesquisa em 2. Chomel BB. Emerging and Re-Emerging Zoonoses of Dogs and Cats. Animals
Medicina Veterinária e Zootecnia (Basel). 2014 Jul 15;4(3):434-45. doi: 10.3390/ani4030434. PMID: 26480316;
PMCID: PMC4494318.
- FEPMVZ Editora
Conselho Regional de 3. Posthaus H, Bodmer T, Alves L, Oevermann A, Schiller I, Rhodes SG, Zimmerli
S. Accidental infection of veterinary personnel with Mycobacterium tuberculo-
Medicina Veterinária do sis at necropsy: a case study. Vet Microbiol. 2011 May 5;149(3-4):374-80. doi:
Estado de Minas Gerais 10.1016/j.vetmic.2010.11.027. Epub 2010 Nov 24. PMID: 21146334.
- CRMV-MG
4. Tan JS. Human zoonotic infections transmitted by dogs and cats. Arch Intern Med.
www.vet.ufmg.br/editora
1997 Sep 22;157(17):1933-43. PMID: 9308505.
Correspondência:
FEPMVZ Editora Méd. Vet. Bruno Divino Rocha
Caixa Postal 567 Presidente do CRMV-MG – CRMV-MG 7002
30161-970 - Belo Horizonte - MG Prof. Afonso de Liguori Oliveira
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Prof. Antônio de Pinho Marques Junior
E-mail:
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Foto da capa: Pixabay: Prof. Nelson Rodrigo da Silva Martins
Editor dos Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia – CRMV-MG 4809
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Presidente:
Méd. Vet. Bruno Divino Rocha - CRMV-MG nº 7002
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pixabay.com
Natália de Melo Ocarino*
Rogéria Serakides*
*Docentes do Setor de Patologia do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinárias, Escola de Veterinária da Universidade Federal de
Minas Gerais, Av. Antônio Carlos 6627, Caixa Postal 567, campus Pampulha da UFMG, CEP 30123-970, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Figura 11. Secção dos ligamentos e dos músculos Figura 12. Desarticulação da cabeça do fêmur
escapulares e costais da região axilar. com o acetábulo.
Figura 39. Remoção do conjunto língua-esôfago- Figura 40. Secção longitudinal e exame da glân-
-traqueia até sua entrada no tórax. dula mandibular.
Figura 55. Secção longitudinalmente e disseca- Figura 56. Secção do osso frontal com serra, a
ção da pele da região supraorbitária até a região cerca de 3cm caudalmente às apófises supraor-
occipital, com remoção dos músculos e exposi- bitárias, unindo o extremo caudal de um olho a
ção da calota craniana. outro.
b) Avaliação do sistema
genitourinário
Avaliar o tamanho e a simetria dos
rins, seccioná-los sagitalmente pela sua
parte convexa e remover a cápsula com
a pinça (Fig. 79 e 80). Avaliar as regiões
cortical interna e medular e a pelve renal.
Os ureteres devem ser avaliados e, caso
Figura 81. Abertura da bexiga.
haja alguma alteração visível externa-
mente, devem ser abertos longitudinal-
mente. A bexiga e seu conteúdo devem
ser avaliados com uma secção longitudi-
nal na parede (Fig. 81). Na fêmea, a ure-
Referências
1. Brooks, J.W. Veterinary Forensic Pathology. Vol.
1, 1ed. Cham: Springer, 2018, 155p
2. Beserra, H.E.O, Grandi, F., Cagnini, D.Q.
Necropsia de animais domésticos, silvestres e de
experimentação. 1ed. São Paulo: VetSchool São
Paulo, 2019, 334p.
pixabay.com
Rogéria Serakides*;
Natália de Melo Ocarino*
* Docentes do Setor de Patologia do Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinárias, Escola de Veterinária da Universidade Federal de
Minas Gerais, Av. Antônio Carlos, 6627, Caixa Postal 567, campus Pampulha da UFMG, CEP 30123-970, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Figuras 9 e 10. Cão e gato, respectivamente, com retração intensa do globo ocular causada pelo rigor
mortis.
Figura 18. Coração e aorta de cão sem alterações post mortem. Figura 19. Endocárdio ventricular es-
querdo, válvulas e íntima da aorta de cão com moderada embebição pela hemoglobina. Figura 20.
Endocárdio ventricular esquerdo, válvulas e íntima da aorta de cão com intensa embebição pela
hemoglobina
Figura 24. Cérebro de cão sem alterações post mortem. Figura 25. Cérebro de cão com intensa embe-
bição pela hemoglobina. Figura 26. Cérebro de cão com hemorragias (alteração ante mortem) caracte-
rizadas por extensas áreas vermelhas intensas, com limites bem demarcados.
Figura 31. Articulação de cão sem alteração post mortem. Figura 32. Articulação de cão com líquido
sinovial avermelhado devido à embebição pela hemoglobina.
de gases e às vezes com paredes mais porção cranial e palidez da porção cau-
finas. Os gases são formados pela fer- dal do esôfago, com a presença de uma
mentação e pela putrefação do conteú- linha demarcatória (linha do timpanis-
do gastrointestinal. mo). Nenhuma dessas alterações estará
É importante diferenciar o timpanis- presente no timpanismo ruminal post
mo ou meteorismo post mortem do ante mortem.
mortem, que acontece em qualquer vís-
cera oca. Ao contrário do ante mortem,
2.9 Deslocamento, torção e
ruptura de vísceras
no timpanismo post mortem há ausência
de alterações circulatórias (Fig. 43 e Formam-se em decorrência da
44). No timpanismo ruminal ante mor- fermentação e da putrefação do con-
tem, por exemplo, há congestão da por- teúdo gastrointestinal, que originam
ção cranial da cavidade torácica, palidez gases, que são deslocados para as por-
da porção caudal da carcaça, palidez do ções mais elevadas, em relação ao solo
fígado e do baço devido à compressão e forçam as vísceras a mudarem de po-
do rúmen e do esôfago, congestão da sição e até a se romperem. Rupturas
ante mortem de rúmen, intestinos, es- post mortem das vísceras abdominais é
tômago são sempre acompanhadas de tão intenso que força e vai dilaceran-
distúrbios circulatórios, como hemor- do o músculo diafragmático até que
ragias e edema (Fig. 45 e 46). Além ocorra a sua ruptura. A ausência de
disso, dependendo do tempo entre a hemorragias na área da ruptura é uma
ruptura da parede e o óbito, é possível das características de a alteração ser
observar, na cavidade abdominal, pe- post mortem (Fig. 48).
ritonite, caracterizada por alterações No deslocamento e na torção de vís-
circulatórias, como hiperemia, hemor- ceras ante mortem, como de alças intes-
ragias, entre outras, associada ao con- tinais ou estômago, por exemplo, tam-
teúdo ruminal, gástrico ou intestinal. bém é esperada uma série de distúrbios
Essas alterações não são observadas circulatórios que não são evidenciados
quando a ruptura é post mortem (Fig. quando as alterações acontecem após a
47). Há casos em que o timpanismo morte.
Figura 44. Cavidade abdominal de equino com dilatação de alça intestinal e intensa hemorragia da
serosa causada por torção (ante mortem).
Figura 48. Cavidade torácica de equino com ruptura e dilaceração post mortem do diafragma.
da, a qual pode ser evidenciada em vá- enfisematosos estão aumentados de vo-
rios tecidos, como mucosas, meninges lume, ficando a impressão dos dedos à
palpação (Fig. 58 e 59). Ao corte, o ór-
(Fig. 57), fígado, pulmões, entre outros,
sem significado clínico para o animal, gão enfisematoso murcha como se fosse
sendo um achado acidental à necropsia. um balão que se esvaziou. O enfisema
cadavérico forma-se durante o processo
3.2 Enfisema cadavérico de putrefação, pela proliferação de bac-
Caracteriza-se pela térias e pela produção
presença de crepitação Enfisema cadavérico de pequenas bolhas de
no tecido subcutâneo, Caracteriza-se pela gás sulfídrico. O meca-
no tecido muscular e presença de crepitação nismo de formação é se-
em órgãos parenqui- [gasosa] no tecido melhante ao do timpa-
matosos, como fígado, subcutâneo, no tecido nismo ou meteorismo.
baço, rins, entre outros. muscular e em órgãos Mas o nome é distinto,
Geralmente os órgãos parenquimatosos... sendo enfisema quando
Figuras 52-54. Alças intestinais, fígado e baço de cão, respectivamente, com pseudomelanose (altera-
ção post mortem) caracterizada por manchas de coloração esverdeada.
Figura 56. Cavidade torácica de cão com pleura parietal acinzentada ou esverdeada (pseudomelanose).
Figura 58. Baço de cão com enfisema cadavérico caracterizado por aumento de volume do órgão com
impressão dos dedos.
Figura 59. Baço de cão aumentado de volume pelo enfisema cadavérico e acinzentado pela pseudome-
lanose. No omento, há mancha amarelada causada pela embebição pela bile e manchas avermelhadas
provocadas pela embebição pela hemoglobina.
Figura 60. Estômago de cão com desprendimento post mortem da mucosa (maceração). Figura 61.
Intestino de cão com desprendimento post mortem da mucosa (maceração). Há também embebição
pela hemoglobina post mortem. Figura 62. Rúmen com desprendimento post mortem da mucosa.
Figura 63. Estômago de cão com mucosa pregueada sem alterações post mortem. Figura 64. Estômago
de cão com presença de sulcos formados pelo desprendimento post mortem da mucosa (maceração).
Figura 65. Estômago de cachorro do mato com úlceras recentes enegrecidas (alteração ante mortem).
Figura 66. Estômago de cão com úlceras antigas com fibrose nas bordas (alteração ante mortem).
e mais obeso for o animal, menor será a dem antecipar ou potencializar a ocor-
dissipação de calor e maior a velocidade rência da embebição pela hemoglobina.
de instalação das alterações post mortem. Anemias podem retardar o aparecimen-
Causa mortis: infecções bacteria- to de embebicão pela hemoglobina e de
nas, principalmente quando generaliza- outras alterações post mortem, uma vez
das, podem antecipar ou potencializar que o sangue é um excelente meio de
a ocorrência das alterações post mortem cultura para promover o crescimento
por heterólise. Doenças neurológicas bacteriano.
com sinais de convulsão e tremores Cobertura tegumentar: pelos, pe-
imediatamente antes do óbito, as quais nas, lã e gordura atuam como isolantes
consomem as reservas musculares de térmicos, dificultando a dissipação de
glicogênio, podem antecipar o apare- calor e, por isso, aceleram a instalação e
cimento do rigor mortis. Doenças que a progressão das alterações post mortem.
resultam em congestão generalizada po-