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Livro-Texto - Unidade I

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Farmacoterapia

Autora: Profa. Mariane Fonseca Petroni


Colaboradores: Prof. Juliano Rodrigo Guerreiro
Profa. Marília Tavares Coutinho da Costa Patrão
Professora conteudista: Mariane Fonseca Petroni

Formou-se em Física pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1987) e em Farmácia e Bioquímica pela
Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP) (1999). É mestre em Tecnologia
Nuclear: Aplicações na área de Radiofarmácia pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da USP (Ipen/USP)
desde 2003. É professora adjunta na UNIP desde 2004. Possui experiência na área de farmácia hospitalar e farmácia
clínica, tendo atuado no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (ICr/HCFM‑USP)
e no Hospital Universitário da USP (HU/USP).

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

P497f Petroni, Mariane Fonseca.

Farmacoterapia / Mariane Fonseca Petroni. – São Paulo: Editora


Sol, 2022.

140 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230.

1. Farmacoterapia. 2. Farmacocinética. 3. Farmacovigilância. I.


Título.

CDU 615.03

U514.56 – 22

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor

Profa. Sandra Miessa


Reitora em Exercício

Profa. Dra. Marilia Ancona Lopez


Vice-Reitora de Graduação

Profa. Dra. Marina Ancona Lopez Soligo


Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa

Profa. Dra. Claudia Meucci Andreatini


Vice-Reitora de Administração

Prof. Dr. Paschoal Laercio Armonia


Vice-Reitor de Extensão

Prof. Fábio Romeu de Carvalho


Vice-Reitor de Planejamento e Finanças

Profa. Melânia Dalla Torre


Vice-Reitora de Unidades do Interior

Unip Interativa

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Vannini
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático

Comissão editorial:
Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
Profa. Dra. Angélica L. Carlini
Profa. Dra. Ronilda Ribeiro

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista
Profa. Deise Alcantara Carreiro

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Leonardo do Carmo
Jaci Albuquerque de Paula
Sumário
Farmacoterapia
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 FARMACOLOGIA CLÍNICA E FARMACOTERAPIA......................................................................................9
1.1 Farmacocinética clínica...................................................................................................................... 11
1.1.1 Farmacocinética........................................................................................................................................11
1.1.2 Modelos compartimentais e modelagem farmacocinética.................................................... 14
1.1.3 Esquemas de administração de fármacos..................................................................................... 18
1.1.4 Esquema posológico............................................................................................................................... 22
1.1.5 Monitoração plasmática de fármacos............................................................................................. 22
2 INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS.............................................................................................................. 24
2.1 Conceito de interação medicamentosa....................................................................................... 24
2.2 Classificação das interações medicamentosas.......................................................................... 26
2.2.1 Interações farmacocinéticas............................................................................................................... 28
2.2.2 Interações farmacodinâmicas............................................................................................................. 31
3 FARMACOVIGILÂNCIA.................................................................................................................................... 32
3.1 Métodos em farmacovigilância....................................................................................................... 33
3.1.1 Vigilância passiva..................................................................................................................................... 34
3.1.2 Vigilância intensiva................................................................................................................................. 34
3.1.3 Estudos epidemiológicos...................................................................................................................... 35
3.2 A pesquisa clínica.................................................................................................................................. 35
3.3 Reações adversas a medicamentos................................................................................................ 38
3.3.1 Classificação das reações adversas................................................................................................... 38
3.4 Prevenção de reações adversas oriundas de interações medicamentosas.................... 41
4 FARMACOTERAPIA EM GRUPOS-ALVOS................................................................................................. 43
4.1 Farmacoterapia em idosos................................................................................................................. 43
4.1.1 O envelhecimento.................................................................................................................................... 43
4.1.2 Alterações fisiológicas no idoso......................................................................................................... 46
4.1.3 Idosos — prescrição de medicamentos........................................................................................... 51
4.2 Farmacoterapia em pediatria........................................................................................................... 53
4.2.1 Principais diferenças em termos de parâmetros cinéticos nas crianças........................... 55
4.2.2 Cálculo de doses em pediatria............................................................................................................ 56
4.3 Gestantes e saúde da mulher........................................................................................................... 57
4.3.1 Farmacoterapia na gravidez................................................................................................................ 58
4.3.2 Contraceptivos orais............................................................................................................................... 60
4.3.3 Terapia de reposição hormonal (TRH).............................................................................................. 64
Unidade II
5 PROFILAXIA E TRATAMENTO DE DOENÇAS TROPICAIS..................................................................... 75
5.1 Doenças tropicais negligenciadas.................................................................................................. 75
5.1.1 Doenças parasitárias e seus antiparasitários................................................................................ 76
5.1.2 Outras doenças tropicais de interesse............................................................................................. 82
6 DOENÇA RENAL E DISTÚRBIOS ELETROLÍTICOS................................................................................... 90
6.1 Doença renal........................................................................................................................................... 90
6.1.1 Nefrite.......................................................................................................................................................... 91
6.1.2 Infecção urinária...................................................................................................................................... 91
6.1.3 Cálculo renal.............................................................................................................................................. 92
6.1.4 Doença renal crônica............................................................................................................................. 93
6.2 Distúrbios eletrolíticos........................................................................................................................ 94
6.2.1 Sódio (Na+).................................................................................................................................................. 95
6.2.2 Potássio (K+)............................................................................................................................................... 96
7 FARMACOTERAPIA DAS DOENÇAS OCULARES E OSTEOARTICULARES...................................... 97
7.1 Doenças oculares................................................................................................................................... 97
7.1.1 Principais doenças oculares................................................................................................................. 98
7.2 Doenças osteoarticulares.................................................................................................................108
7.2.1 Osteoporose.............................................................................................................................................108
7.2.2 Osteoartrite...............................................................................................................................................111
7.2.3 Artrite reumatoide................................................................................................................................. 112
8 ATUALIZAÇÃO EM ANTIBIOTICOTERAPIA – RESISTÊNCIA AOS ANTIMICROBIANOS
E ÀS AFECÇÕES BUCODENTÁRIAS...............................................................................................................115
8.1 Resistência bacteriana......................................................................................................................115
8.2 Afecções bucodentárias....................................................................................................................119
8.2.1 Gengivite.................................................................................................................................................. 120
8.2.2 Periodontite............................................................................................................................................. 120
APRESENTAÇÃO

A disciplina de Farmacoterapia tem como principal objetivo oferecer conceitos, ferramentas


e uma visão sobre o uso racional dos medicamentos na prática clínica, abordando certas condições
fisiopatológicas de interesse.

A farmacoterapia permite estabelecer um elo entre os conhecimentos de farmacologia e fisiopatologia,


dando destaque aos esquemas posológicos preconizados na atualidade.

Assim, o objetivo é oferecer ao aluno um caminho para a obtenção de conhecimentos que


permitam a orientação adequada ao paciente, o acompanhamento e seguimento farmacoterapêutico
racional e seguro, e também maior integração à equipe multidisciplinar, tanto no momento de uma
intervenção farmacêutica como no momento da escolha do fármaco, da forma farmacêutica e do
esquema posológico.

É importante ressaltar que a prescrição racional e o acompanhamento farmacoterapêutico são


fundamentais para a terapêutica racional.

INTRODUÇÃO

Este livro-texto se inicia com uma discussão sobre a farmacologia clínica, apresentando conceitos
fundamentais de farmacoterapia. Isso é fundamental para que possamos nos familiarizar com a
linguagem, conceitos e ferramentas empregadas na prática clínica do acompanhamento e seguimento
farmacoterapêutico, visando a terapêutica racional e segura.

A partir disso, abordaremos as interações medicamentosas, tópico que leva em consideração as


possíveis interferências farmacocinéticas e farmacodinâmicas ao se utilizar concomitantemente dois ou
mais medicamentos. Também serão observadas possíveis interações entre fármacos e outras substâncias,
como nutrientes, tabaco etc.

Conheceremos aspectos relacionados à farmacocinética clínica, importante ferramenta empregada


na busca da posologia mais adequada ao paciente, e que também permite compreender variações de
resposta individual.

Além disso, não poderíamos deixar de comentar a farmacovigilância, cujo principal objetivo é a
identificação, avaliação e prevenção de efeitos adversos e/ou outros problemas relacionados ao uso de
medicamentos.

Trataremos de aspectos da farmacoterapia em grupos-alvos, como idosos, crianças e gestantes, cujas


características específicas exigem especial atenção e conhecimento dos profissionais de saúde. Aspectos
relacionados à saúde da mulher também serão abordados.

7
De posse desses conceitos, discutiremos sobre doenças e distúrbios importantes à prática clínica,
como a resistência aos antibióticos e a situação atual do uso de antibacterianos frente à resistência
bacteriana, doenças tropicais negligenciadas, parasitárias, distúrbios renais e hidroeletrolíticos, doenças
oculares, osteoarticulares e afecções bucodentárias.

Bom estudo!

8
FARMACOTERAPIA

Unidade I
1 FARMACOLOGIA CLÍNICA E FARMACOTERAPIA

Há muito a humanidade busca recursos eficazes para o alívio de diversas condições que afetam
o organismo, manifestando-se como doenças. Estas não só comprometem a qualidade de vida e a
produtividade, mas podem levar à morte e, inevitavelmente, impactam os sistemas de saúde. Para tanto,
medidas farmacológicas e não farmacológicas têm sido empregadas durante um longo período de forma
empírica. Com o passar do tempo, a ciência e a tecnologia evoluíram e passaram a oferecer tratamentos
e procedimentos mais eficazes, mas também conhecimento e recursos para avaliar e acompanhar os
resultados das terapêuticas empregadas.

A saúde já foi definida de diversas maneiras. Ausência da doença, falta ou perturbação da saúde. Mas
a definição atualmente aceita é muito mais ampla e não separa o indivíduo do meio em que vive. Desde
1948, a Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde como o completo estado de bem‑estar
físico, mental e social (SOUZA E SILVA; SCHRAIBER; MOTA, 2019).

Tendo em mente que a doença pode ser considerada um desequilíbrio entre o ser humano e o
ambiente, a qualidade de vida tem um papel extremamente importante no que se refere à saúde, pois
depende de condições socioambientais adequadas.

Entretanto, como já discutimos, a doença sempre esteve presente e faz parte da história da
humanidade. Inclusive, grandes eventos epidemiológicos e doenças de alto impacto têm impulsionado
o conhecimento humano em busca de melhor qualidade e expectativa de vida.

Desse modo, podemos observar períodos que caracterizam a evolução de uma doença e que
justificam o emprego de tratamentos. Lembrando que diversas condições se resolvem espontaneamente,
sem o emprego de qualquer tipo de manejo.

Entretanto uma parcela significativa das condições fisiopatológicas exige algum tipo de tratamento.
Assim, conhecer a história natural da doença permite entender sua evolução e qual conduta deve ser
adotada em cada fase, considerando tanto condições agudas como crônicas.

As doenças, em geral, apresentam dois períodos característicos: o período pré-patogênico e o


período patogênico. Normalmente, os sinais e sintomas aparecem no período patogênico. É nessa fase
que costumamos empregar os tratamentos farmacológicos, e o desfecho do tratamento dependerá de
uma série de fatores.

A farmacologia clínica é uma área da farmacologia que atua como uma interface fundamental com
a terapêutica na prática clínica.
9
Unidade I

Observe a figura 1, ela mostra detalhadamente a atual estrutura preconizada da farmacologia, suas
correlações e disciplinas afins.

Terapêutica na Medicina
Psicologia Farmácia Biotecnologia Patologia Química
clínica médica veterinária

Farmacologia Farmacologia Ciências Química


Psicofarmacologia Biofármacos Toxicologia
clínica veterinária farmacêuticas médica

Farmacocinética/ Farmacologia
metabolismo dos bioquímica
fármacos
Farmacologia
Farmacologia Quimioterapia
molecular
Farmacologia de
sistemas
Farmacologia Farmacologia
Neurofarmacologia cardiovascular gastrointestinal
Farmacologia
Imunofarmacologia respiratória

Farmacogenética Farmacogenômica Farmacoepidemiologia Farmacoeconomia

Genética Genômica Epidemiologia clínica Economia da saúde

Figura 1 – A farmacologia e suas subdivisões

Adaptada de: Rang et al. (2007, p. 6).

A farmacologia é responsável por estudar as substâncias farmacologicamente ativas em termos


de estrutura e relação com os alvos biológicos, ou seja, o mecanismo de ação e como o fármaco se
comportará no organismo desde o momento de sua administração até sua eliminação completa.

Avaliar, analisar as propriedades físico-químicas, interações com outras substâncias, reações


adversas, farmacocinética, farmacodinâmica e, finalmente, o emprego terapêutico compõem o universo
da farmacologia clínica.

A farmacologia clínica, graças ao amplo espectro de informações, pode avaliar, analisar e


acompanhar todos os aspectos relacionados à farmacoterapia, relacionando as informações e parâmetros
referentes ao fármaco com a condição fisiopatológica do paciente, visando o uso racional e seguro
dos medicamentos.

Levando em consideração aspectos técnicos e econômicos relativos aos medicamentos, permite a


tomada de decisão no que se refere à escolha mais eficaz e segura em termos de terapia racional.

10
FARMACOTERAPIA

1.1 Farmacocinética clínica

Atualmente, é fundamental conhecer não apenas o mecanismo de ação de um fármaco, mas


também seu comportamento cinético, levando em consideração tanto suas próprias características
e comportamento no ambiente biológico como as particularidades genéticas do indivíduo. Estas
podem proporcionar respostas diferentes em maior ou menor grau à exposição ao fármaco — é a
chamada farmacogenômica.

Do mesmo modo, é fundamental a escolha da forma farmacêutica mais adequada às condições


do paciente e ao objetivo farmacoterapêutico. Outro ponto fundamental a ser levado em conta é a
qualidade do medicamento utilizado.

Posto isso, é possível perceber que durante muito tempo falhas terapêuticas, ajustes posológicos
e outros aspectos relacionados à resposta farmacoterapêutica não foram devidamente tratados por
falta de opção.

Atualmente, na farmacoterapêutica racional, consideramos a importância de conhecer não apenas


o sítio de ação do fármaco, mas também seus parâmetros farmacocinéticos do sistema Adme (absorção,
distribuição, metabolização e excreção).

Lembrete

Fármacos administrados por via endovenosa não passam pela fase


de absorção.

Portanto a farmacocinética clínica pode prever a utilização desses parâmetros (possibilitando o ajuste
de dose quando necessário) e, de modo mais racional, os aspectos particulares da farmacoterapêutica,
principalmente em pacientes crônicos. A farmacocinética clínica permite maior segurança e eficácia, e
diminui os riscos inerentes ao processo farmacoterapêutico, sobretudo em tratamentos prolongados.

Assim, estudaremos os principais modelos e as principais equações matemáticas que são utilizadas em
diversos esquemas posológicos diante de processos farmacocinéticos. Tais conhecimentos e ferramentas
propiciam a escolha apropriada de esquemas posológicos adequados.

1.1.1 Farmacocinética

Didaticamente, as duas principais abordagens da farmacologia são: a farmacocinética e a


farmacodinâmica.

A farmacocinética tem como objetivo estudar todos os aspectos relacionados ao “caminho”


do fármaco no organismo, sendo responsável pelo estudo e a compreensão das fases de absorção,
distribuição, metabolização e excreção de um fármaco.

11
Unidade I

Já a farmacodinâmica estuda e descreve o local e o mecanismo de ação — e, por consequência, os


efeitos farmacológicos das substâncias farmacologicamente ativas.

Todavia, há uma correlação entre a dose que foi administrada, as concentrações plasmáticas e o sítio
de ação do fármaco.

Para que possamos ter a terapia farmacológica adequada, devemos considerar não só a farmacocinética
e a farmacodinâmica do fármaco, mas também a fase farmacotécnica ou biofarmacêutica, conforme
demonstra a figura 2.

I – Fase II – Fase III – Fase


farmacêutica farmacocinética farmacodinâmica

Fármaco disponível Fármaco disponível


Desintegração da para absorção Absorção para ação Interação
Dose forma farmacêutica Distribuição Efeito
fármaco-receptor no
Dissolução da Metabolismo
Disponibilidade Disponibilidade tecido-alvo
substância ativa farmacêutica Excreção biológica

Figura 2 – Fases de ação dos fármacos

Adaptada de: Korolkovas e Burckhalter (1988, p. 8).

Para que o fármaco atinja concentrações plasmáticas adequadas, antes ele precisa alcançar a
corrente sanguínea.

A fase farmacêutica ou biofarmacêutica avalia e acompanha a liberação do fármaco de seu


“aprisionamento”, ou seja, a liberação da forma farmacêutica. Essa fase é de suma importância quando
tratamos de formas farmacêuticas sólidas, pois pode sofrer interferência de diversos fatores relacionados
às características da forma farmacêutica e aos aspectos físico-químicos do ambiente no qual deve
ocorrer a absorção, bem como de fatores relacionados à fisiologia e à fisiopatologia do paciente.

Dependendo da interferência, pode haver comprometimento importante nas fases subsequentes e,


com isso, alterações na resposta farmacológica.

Considerando um esquema posológico adequado e a adesão apropriada por parte do paciente, a


correlação entre os fenômenos farmacocinéticos e farmacodinâmicos permite que a meta farmacoterapêutica
seja alcançada.

Assim, qualquer comportamento ou resposta não esperada podem ser compreendidos por meio desse
conhecimento, permitindo, quando necessário, o ajuste do esquema posológico do paciente.

É sabido que o efeito farmacológico proporcionado por um fármaco tem relação direta com sua
concentração no sítio de ação. Entretanto, devido à distribuição e localização dos alvos farmacológicos,
não podemos chegar diretamente a esses pontos para verificar a concentração do fármaco no local de
ação, por serem inacessíveis. Por exemplo, pensemos num fármaco cujo alvo molecular localiza-se no

12
FARMACOTERAPIA

coração: não é possível coletar amostras do músculo cardíaco para verificação das concentrações dessa
substância no sítio de interesse.

É possível determinar a concentração do fármaco no plasma e, a partir desse dado, prever sua
presença no sítio de ação, em concentrações adequadas para que o efeito terapêutico seja observado.
Dessa maneira, qualquer alteração nas concentrações plasmáticas do fármaco leva a alterações nas
concentrações dessa substância nos diversos tecidos e órgãos, incluindo no sítio receptor.

Contudo, é preciso destacar que a distribuição dos fármacos nos diversos territórios tem relação com
características físico-químicas do ambiente biológico e do fármaco, e a necessidade ou não de o fármaco
atravessar barreiras. Mas, em linhas gerais, é possível considerar que, ao aumentar a concentração
plasmática de um fármaco, aumentaremos sua concentração nos tecidos. O mesmo raciocínio é aplicado
ao se observar a diminuição em suas concentrações.

A figura 3 apresenta essa correlação. Nela, é possível observar a relação entre a concentração do
fármaco no compartimento principal (sangue/plasma) e nos tecidos, incluindo-se os alvos moleculares
nos tecidos.
Concentração do fármaco no plasma

Concentração do fármaco nos tecidos

Figura 3 – Correlação entre as concentrações do fármaco no sangue e nos tecidos

Adaptada de: Storpirtis et al. (2008, p. 281).

Dessa forma, parâmetros importantes, como concentração plasmática terapêutica e tóxica,


são estabelecidos a partir desse raciocínio. Prevendo a correlação direta entre dose, concentração
plasmática do fármaco e resposta/efeito terapêutico, é possível também determinar a concentração (C)
de um fármaco em função do tempo (T) em diversos fluidos biológicos, como sangue, urina e saliva, após
a administração de uma dose.

A figura 4 apresenta a curva de concentração versus tempo (C × T), mostrando basicamente a


variação na concentração de um fármaco em função do tempo após a administração deste. Essa curva
é a chamada “curva de decaimento”.
13
Unidade I

(%) EV = via endovenosa C (mg/L)


100 VO = via oral
Fármaco no sangue (EV)

Porcentagem da dose administrada 75


Metabólito excretado

Fármaco no sangue (VO)

Concentração
50

Fármaco excretado

25
Fármaco no tecido

0
0 4 8 12 16
Tempo (unidade arbitrária)

Figura 4 – Curva de decaimento de um fármaco

Adaptada de: Storpirtis et al. (2008, p. 281).

Um ponto importante que deve ser levado em consideração é a via de administração do fármaco. No
caso de fármacos administrados por via oral, é possível notar que a velocidade de absorção será maior
que a velocidade de eliminação. Assim, a concentração plasmática do fármaco aumentará em função
do tempo. Tem-se, então, um valor de concentração máxima no plasma (Cmáx) e o tempo necessário para
atingir a concentração máxima (Tmáx). Após essa fase, os valores relacionados às taxas de eliminação são
predominantes até a eliminação completa do fármaco.

Levando-se em conta as propriedades de homogeneidade cinética, é possível observar que a curva


cinética do fármaco no sangue será semelhante à curva cinética do fármaco no tecido.

1.1.2 Modelos compartimentais e modelagem farmacocinética

Existem modelos matemáticos capazes de descrever os parâmetros cinéticos, nos quais o


organismo é representado por um sistema compartimentalizado que leva em consideração suas
características intrínsecas.

É claro que esse sistema é uma representação simplificada que permite a compreensão e o estudo do
comportamento cinético dos fármacos, uma vez que o sistema biológico vivo é extremamente complexo.

Dessa forma, o modelo de compartimentos oferece uma aproximação da realidade, mas trata-se de
uma importante ferramenta em termos de estudos farmacocinéticos.
14
FARMACOTERAPIA

O modelo monocompartimental (um compartimento) considera o organismo de forma única e


com características homogêneas. Nesse modelo, considera-se que ao se administrar um determinado
fármaco, este é imediatamente distribuído pelos mais diversos territórios orgânicos, não considerando
condições físico-químicas, anatômicas ou travessia de barreiras. A finalização do processo se dá por
eliminação/excreção. Observe a figura 5, ela apresenta uma representação esquemática do modelo de
um compartimento.

Administração do Distribuição Eliminação/excreção


fármaco (compartimento)

Figura 5 – Representação esquemática do modelo monocompartimental

No modelo de dois compartimentos (bicompartimental) é possível observar a divisão do organismo


em central e periférico. O compartimento central é representado pelo sangue (plasma) e territórios
nos quais se observa elevada perfusão, como cérebro, coração, rins, pulmões, fígado e as glândulas
endócrinas. Nestes, são observadas altas concentrações do fármaco logo após sua administração.

O segundo compartimento é representado pelo tecido adiposo, a pele e a musculatura estriada.


Nesses territórios, observa-se que o fármaco chega mais lentamente.

A figura 6 traz uma representação esquemática do modelo bicompartimental.

Administração do
fármaco

Compartimento
central (plasma)

Compartimento
Eliminação/excreção periférico

Figura 6 – Modelo bicompartimental

15
Unidade I

Nesse modelo é possível avaliar a distribuição do fármaco do sangue para os tecidos e também seu
retorno para o compartimento central (principal), o sangue.

Um ponto interessante desse modelo é a possibilidade de se observar a diferença entre tecidos com
mais perfusão sanguínea e tecidos com menos.

Observe a figura 7, nela é possível conferir uma representação gráfica do comportamento cinético
de um fármaco após administração em dose única em bolus.

Observação

“Em bolus” é uma expressão muito utilizada na prática clínica. Trata-se


de uma forma de administração endovenosa de um medicamento injetável de
modo rápido, aumentando sua concentração rapidamente no sangue.

Concentração inicial (pico)

Fase alfa (distribuição)


Concentração plasmática

C0

Fase beta (eliminação)

Tempo após a administração

Figura 7 – Representação esquemática da concentração plasmática de um fármaco administrado por


via endovenosa, em dose única (modelo bicompartimental)

Fonte: Fuchs e Wannmacher (2017, p. 77).

Nesse gráfico é possível observar que, no início, tem-se alta concentração do fármaco no
compartimento principal (sangue). Em dado momento observa-se o declínio rápido devido à distribuição
do fármaco no compartimento periférico. Por definição, esse período é designado como “fase alfa”
(distribuição). A duração da fase de distribuição está diretamente relacionada à meia-vida (T1/2)
de distribuição. Assim que se estabelece o equilíbrio entre os compartimentos central e periférico,
a queda da concentração plasmática do fármaco estará ligada à eliminação/excreção da substância.

16
FARMACOTERAPIA

Temos então a chamada “fase beta” (eliminação). Nesse caso, ela é medida pela meia-vida (T1/2)
de eliminação.

É possível observar que, em geral, as concentrações plasmáticas do fármaco caem abaixo do nível
considerado terapêutico justamente nessa fase, pois trata-se de uma fase mais lenta se comparada à
distribuição (FUCHS; WANNMACHER, 2017).

Dessa forma, a partir da curva de concentração plasmática (figura 7), podemos calcular
matematicamente os volumes de distribuição, também denominado volume de distribuição aparente,
nos diversos compartimentos utilizando expressões matemáticas. O volume de distribuição (Vd) estabelece
uma relação entre a quantidade de fármaco no organismo e sua concentração (C) no sangue. O volume
de distribuição pode ser calculado por meio da seguinte expressão:

Quantidade de fármaco no organismo


Vd =
C

Também é possível calcular o volume de distribuição nos compartimentos. Assim, temos o volume de
distribuição no compartimento central (Vc). Este pode ser calculado por meio da fórmula:

Dose
Volume de distribuição central =
Concentração inicial

Após a fase de distribuição entre os compartimentos central e periférico, temos o volume de


distribuição no equilíbrio (Ve). Esse parâmetro é calculado por meio da fórmula:

Dose
Volume de distribuição de equilíbrio =
C0

Onde: C0 = concentração plasmática do fármaco.

Essa é considerada uma concentração hipotética, por refletir uma distribuição imediata do fármaco.
Na realidade, temos o processo de eliminação ocorrendo concomitantemente com o processo de
distribuição do fármaco. Entretanto esse raciocínio permite “compensar” a perda na concentração do
fármaco durante esse processo.

Assim, o volume de distribuição no equilíbrio equivale ao volume de distribuição aparente.

Observamos que, após a fase de equilíbrio, a queda da concentração do fármaco está


relacionada com as taxas de eliminação, ou seja, com a depuração (eliminação) plasmática ou
clearance. Existe uma expressão matemática que permite o cálculo da depuração de um fármaco
por um determinado compartimento. Tal expressão leva em conta o fluxo plasmático do órgão e a
capacidade de extração.
17
Unidade I

Depuração = Q . E

Onde: Q = fluxo plasmático do órgão


E = capacidade de extração

Para fármacos cuja velocidade de metabolização é diretamente proporcional à concentração do


fármaco livre, a capacidade de extração de um determinado órgão expressa a capacidade desse órgão
de extrair todo o fármaco presente na corrente sanguínea. Os rins e o fígado são os órgãos com maiores
taxas de extração, contribuindo de forma importante na depuração dos fármacos. A depuração renal é
a mais fácil de ser determinada. Ela pode ser feita por meio da análise da concentração plasmática do
fármaco presente no plasma ou na urina.

A meia-vida de eliminação, que expressa o tempo necessário para reduzir pela metade a quantidade
do fármaco no organismo durante o processo de eliminação, apresenta relação direta e proporcional
com o volume de distribuição de equilíbrio, sendo inversamente proporcional à depuração do fármaco.
Ela pode ser calculada a partir da seguinte expressão:

0,693 . Vd
T1 =
2 (eliminação) depuração

Onde: Vd = volume de distribuição

Essas expressões matemáticas permitem os cálculos necessários para o planejamento racional de


diversos esquemas posológicos, como dose única, infusão contínua e múltiplas doses.

1.1.3 Esquemas de administração de fármacos

Dose única

Dependendo do objetivo terapêutico estabelecido, o tratamento consiste na administração do


fármaco em esquema de dose única.

Eventualmente, se faz necessária a repetição da dose devido à situação clínica em questão. Entretanto,
diante da necessidade de repetição, é preciso fazer uma estimativa de quanto da dose inicial ainda
permanece no organismo. Para tanto, deve-se considerar que a cada T1/2 (meia-vida), a concentração do
fármaco reduz em 50%.

Portanto, se considerarmos de 4 a 5 meias-vidas após a administração da dose, é possível considerar


que o fármaco foi eliminado.

Para o cálculo de dose única, utiliza-se a seguinte fórmula:

Dose única = concentração eficaz . VAD

18
FARMACOTERAPIA

Onde: VAD = volume aparente de distribuição

Essa expressão é utilizada considerando a administração por via endovenosa, na qual o fármaco não
passa por absorção. No caso do emprego de outra via, como a oral e outras pelas quais o fármaco passa
pela fase de absorção, devemos levar em consideração a sua biodisponibilidade. A biodisponibilidade
é um termo empregado para expressar a fração do fármaco administrado que alcança a circulação
sistêmica na sua forma inalterada. Nesse caso, utiliza-se a seguinte expressão matemática para o
cálculo da dose:

Concentração eficaz . VAD


Dose única =
f

Onde: f = biodisponibilidade
VAD = volume aparente de distribuição

A administração do fármaco por vias nas quais ocorre absorção exigem, normalmente, doses mais
elevadas, uma vez que o fármaco tem que atravessar barreiras até atingir o compartimento principal.

Cabe destacar que o emprego de fármacos em esquema de dose única deve ser cuidadoso no caso de
fármacos de baixo índice terapêutico, em função do risco de ocorrência de reações adversas e toxicidade.

O índice terapêutico (IT) estabelece uma relação entre a dose letal de um fármaco para 50% dos
indivíduos (DL 50%) e a dose eficaz de um fármaco para 50% dos indivíduos (DE 50%). Observe a
expressão a seguir que apresenta a forma de calcular o IT:

DL 50%
Índice terapêutico (IT) =
DE 50%

Assim, o índice terapêutico indica a margem de segurança no emprego de um fármaco por estabelecer
uma relação entre a dose eficaz e a dose tóxica.

Desse modo, para esses fármacos é interessante optar por outra forma de administração parenteral,
como a infusão lenta ou contínua. Diferentemente da administração em bolus, as infusões lenta e
contínua atenuam o pico plasmático do fármaco, minimizando o risco de toxicidade e reações adversas.

Na figura 8, é possível observar o comportamento da concentração plasmática de um fármaco após


ter sido administrado por via endovenosa em esquema de dose única.

19
Unidade I

Injeção em bolo

Concentração plasmática

Injeção lenta

Com absorção

Tempo

Figura 8 – Perfil da concentração plasmática de um fármaco administrado em dose única de três


maneiras: em bolus (bolo), endovenosa lenta e uma via com absorção

Fonte: Fuchs e Wannmacher (2015, p. 100).

Múltiplas doses

De modo geral, o esquema de administração em múltiplas doses é o mais empregado na prática clínica.

Nesse esquema, observa-se o acúmulo do fármaco de tal maneira que seja alcançado o chamado
“estado de equilíbrio”. No estado de equilíbrio, a quantidade do fármaco que “entra” no organismo é
igual à quantidade de fármaco que “sai”, ou seja, quantidade metabolizada e eliminada.

O estado de equilíbrio depende do cumprimento adequado do esquema posológico — ou seja, que


as doses e o intervalo entre as doses sejam respeitados. Caso contrário, flutuações importantes nas
concentrações do fármaco impedem o estabelecimento do equilíbrio cinético.

A concentração que reflete o estado de equilíbrio depende da dose, do intervalo estabelecido entre
as doses e das taxas de eliminação.

A principal fórmula que permite o cálculo estimado da concentração de equilíbrio é:

f.D
CE =
T . Cl

Onde: f = biodisponibilidade
D = dose
T = intervalo entre as doses
Cl = clearance (depuração)
20
FARMACOTERAPIA

Uma vez que o clearance (depuração) está envolvido no cálculo, é possível fazer ajustes de doses
adequados caso haja alguma alteração na eliminação do fármaco.

Levando-se em consideração o estado de equilíbrio do fármaco, ao aumentar o intervalo de tempo


entre as doses, se faz necessário aumentar a dose para que sejam mantidas as concentrações de equilíbrio.

A figura 9 mostra uma representação gráfica das relações farmacocinéticas fundamentais para a
administração de múltiplas doses de um fármaco.
Estado de equilíbrio
2
• Atingido depois de cerca de quatro meias-vidas
• O tempo decorrido até o estado de equilíbrio não
depende da dose
CSS
Concentração

1
Concentrações no estado de equilíbrio
• Proporcionais à dose/intervalo entre as doses
• Proporcionais à F/CL

Flutuações
• Proporcionais ao intervalo entre as doses/meia-vida
• Atenuadas pela absorção lenta
0
0 1 2 3 4 5 6
Tempo (múltiplos da meia-vida de eliminação)
CL: clearance; Css: concentração média; F: biodisponibilidade

Figura 9 – Relações farmacocinéticas fundamentais para a


administração de múltiplas doses de um fármaco

Fonte: Hilal-Dandan e Brunton (2015, p. 62).

Infusão contínua

Essa modalidade de infusão é empregada na administração de fármacos que apresentam meia-vida


curta, ultracurta ou com índice terapêutico estreito. Dessa maneira, evita-se as altas concentrações de
pico características de administrações repetidas.

Alguns fármacos são administrados necessariamente por infusão contínua; podemos citar
norepinefrina, epinefrina, dopamina, dobutamina, dentre outros. Esquemas de analgesia e sedação com
midazolam e fentanila também são administrados dessa maneira, para garantir o efeito contínuo de
depressão do sistema nervoso central de forma eficaz e segura.

21
Unidade I

Dose de ataque

Em algumas circunstâncias, se faz necessário atingir rapidamente altas concentrações plasmáticas


do fármaco; geralmente, são empregadas antes dos esquemas de múltiplas doses ou infusão contínua.
Assim, a dose de ataque consiste na administração de uma dose inicial mais elevada em relação às
demais doses, com o intuito de alcançar mais rapidamente as concentrações plasmáticas do fármaco
dentro da faixa terapêutica desejada.

1.1.4 Esquema posológico

O esquema posológico é a expressão usada para descrever como um fármaco será administrado,
levando em conta a dose e a duração do tratamento. Este esquema deve considerar também a meta
farmacoterapêutica.

1.1.5 Monitoração plasmática de fármacos

Observamos que os níveis séricos dos fármacos permitem estimar as concentrações deles no sítio de
ação. Isso permite estabelecer e/ou acompanhar a resposta farmacoterapêutica.

A monitoração plasmática torna-se extremamente útil nos casos em que há suspeita de falha terapêutica
em função de subdosagem, bem como nos casos suspeitos ou confirmados de sobredosagem, ou seja,
doses potencialmente tóxicas. Eventualmente, a monitoração plasmática permite o acompanhamento
das concentrações plasmáticas com o intuito de garantir que as concentrações do fármaco estejam
dentro da faixa terapêutica adequada e segura. Pode ser útil também, no ajuste posológico.
Principalmente no ajuste de doses de fármacos de índice terapêutico estreito, ou seja, que apresentam
baixa margem de segurança.

Essa medida garante que o ajuste de dose não levará as concentrações plasmáticas a níveis tóxicos
ou a níveis subótimos.

A figura 10 mostra as faixas de concentração plasmática de um fármaco e o efeito esperado.

Considerando a concentração plasmática do fármaco em função do tempo, é possível calcular a


área sob a curva (ASC), também conhecida por curva AUC, do inglês area under the curve. Essa medida
aponta a extensão da absorção de um fármaco.

22
FARMACOTERAPIA

IV
Tóxico

Concentração plasmática
Potencialmente tóxico
PO

Terapêutico

Subótimo

Tempo
IV: intravenosa; PO: por boca, equivale à via oral (VO)

Figura 10 – Relação entre concentração plasmática do fármaco e efeitos terapêuticos e tóxicos

Fonte: Silva (2010, p. 64).

No caso de fármacos administrados por via oral, a biodisponibilidade é a relação da ASC após a
administração oral e a ASC após administração endovenosa, conforme se observa na figura 11.
ASC oral
Biodisponibilidade = x 100
ASC injetada
Concentração plasmática do fármaco

Fármaco
administrado
por via IV

ASC Fármaco
(injetada) administrado
por via oral

ASC
(oral)

Tempo
Fármaco
administrado
ASC: área sob a curva; IV: intravenosa (o mesmo que endovenosa)

Figura 11 – Determinação da biodisponibilidade de um fármaco

Fonte: Whalen, Finkel e Panavelil (2016, p. 8).

23
Unidade I

Não se deve levar em consideração apenas as informações obtidas a partir da monitoração


plasmática, uma vez que essas informações serão, provavelmente, utilizadas para ajuste do esquema
posológico. Portanto, devem ser contextualizadas levando em consideração aspectos relacionados ao
processo fisiopatológico, características do paciente e sinais e sintomas referidos e/ou manifestados
pelo paciente.

A meta farmacoterapêutica deve ser bem estabelecida, de modo que a monitoração plasmática seja
uma ferramenta útil no acompanhamento e seguimento farmacoterapêutico.

O quadro 1 apresenta alguns critérios que podem justificar a monitoração dos níveis séricos dos
fármacos, segundo Fuchs e Wannmacher (2017).

Quadro 1

Critérios que justificam a determinação de níveis plasmáticos de fármacos


1 Concentrações mínima eficaz e tóxica muito próximas
2 Necessidade de estabelecimento de concentrações de equilíbrio em tratamentos com doses repetidas
3 Efeito farmacológico proporcional à concentração plasmática
4 Efeito farmacológico de difícil mensuração (uso profilático)
5 Existência de significativas diferenças individuais em absorção, distribuição ou eliminação
6 Existência de conhecimentos farmacocinéticos padrão
7 Disponibilidade de método de dosagem confiável

Fonte: Fuchs e Wannmacher (2017, p. 80).

2 INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS

Como já discutido, o conhecimento das propriedades de um fármaco e sua ação farmacológica são
fundamentais para a farmacoterapêutica racional. Para isso, é preciso considerar a complexidade do
organismo em termos estruturais, físico-químicos e bioquímicos.

Nesse contexto, cabe evidenciar que inúmeras substâncias endógenas e exógenas se relacionam no
ambiente biológico. Portanto, é necessário conhecer todos os aspectos referentes aos fármacos para
se alcançar o sucesso farmacoterapêutico, prever e/ou evitar interações que possam comprometer o
resultado da terapêutica empregada e diminuir riscos potenciais à integridade física do paciente.

2.1 Conceito de interação medicamentosa

O conhecimento das propriedades básicas dos fármacos e de sua ação farmacológica é de fundamental
importância para a realização de uma terapêutica adequada, considerando que o corpo humano é
um sistema complexo formado por uma infinidade de substâncias que, inevitavelmente, entrarão em
contato com os fármacos ingeridos no ambiente biológico.

24
FARMACOTERAPIA

Além disso, é preciso estar ciente da farmacodinâmica dos fármacos envolvidos na terapêutica
para se evitar interações prejudiciais e possíveis efeitos adversos dos fármacos que aumentem os riscos
ao paciente.

Interação medicamentosa pode ser definida como a influência recíproca de um medicamento


sobre outra substância. Ou seja, quando um medicamento é administrado isoladamente, produz um
determinado efeito. Porém, quando este é associado a outro medicamento, a alimentos ou a outras
substâncias (como tabaco, drogas de abuso ou substâncias diversas com que o paciente possa entrar em
contato, como inseticidas, produtos de limpeza, cosméticos etc.), ocorre um efeito diferente do esperado,
o que caracteriza uma interação — e pode apresentar efeitos nocivos, diminuindo ou eliminando a ação
dos medicamentos.

De acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) n. 140, de 29 de maio de 2003, da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), temos a seguinte definição de interação medicamentosa:

Interação medicamentosa: é uma resposta farmacológica ou clínica,


causada pela combinação de medicamentos, diferente dos efeitos de dois
medicamentos dados individualmente. O resultado final pode aumentar ou
diminuir os efeitos desejados e, ou, os eventos adversos. Podem ocorrer entre
medicamento-medicamento, medicamento-alimentos, medicamento‑exames
laboratoriais e medicamento-substâncias químicas. A confiabilidade dos
resultados dos exames laboratoriais pode ser afetada por sua interação com
medicamentos (BRASIL, 2003b).

Quando há uma interação farmacológica entre dois ou mais fármacos, pode ocorrer a interferência
de um dos fármacos sobre os outros, alterando o efeito esperado, qualitativa ou quantitativamente.
Assim, pode-se obter um sinergismo de ação ou um antagonismo (parcial ou total) desses efeitos.

Muitos pacientes utilizam dois ou mais medicamentos diariamente. Portanto a possibilidade de


interação medicamentosa tende a ser mais frequente, favorecendo o aparecimento de problemas
relacionados aos medicamentos (PRM) (RIBEIRO NETO; COSTA JUNIOR; CROZARA, 2017). Cabe destacar
que a polifarmácia — caracterizada pelo uso de quatro ou mais medicamentos — aumenta o risco de
reações adversas e interações medicamentosas.

Estudos apontam que pacientes que recebem dois medicamentos apresentam risco de 13% de ter
interações medicamentosas. Em pacientes que recebem quatro medicamentos, esse número passa a
ser de 28%, e em pacientes que recebem sete medicamentos ou mais, o número eleva-se para 82%
(GALLAGHER, 2007 apud RIBEIRO NETO; COSTA JUNIOR; CROZARA, 2017). Tais dados permitem a
percepção do impacto das interações medicamentosas na farmacoterapia.

Entretanto as interações medicamentosas podem apresentar efeitos benéficos para o organismo, e até
mesmo ser utilizadas para aumentar os efeitos terapêuticos ou reduzir a toxicidade de um determinado
fármaco, em função da dose necessária para atingir a resposta terapêutica adequada. Temos, então, a
adição ou a somação dos efeitos.
25
Unidade I

Na adição, a resposta farmacológica é obtida como resultado dos efeitos combinados de cada
fármaco. Nesse caso, os fármacos apresentam o mesmo mecanismo de ação. Por exemplo, podemos
citar a associação de dois anti-inflamatórios não esteroidais (Aines), como o ácido acetilsalicílico e a
dipirona, que apresentam o mesmo mecanismo de ação — ambos são inibidores da ciclo-oxigenase.

No caso da somação, temos a associação de dois fármacos com mecanismos de ação diferentes, mas
que levam ao mesmo efeito farmacológico. Por exemplo, podemos citar a associação de codeína com
paracetamol. A codeína, um opioide, apresenta ação central, enquanto o paracetamol, um inibidor da
ciclo-oxigenase, tem ação predominantemente periférica. Observe que nos dois casos há a combinação
dos efeitos analgésicos dos fármacos associados.

2.2 Classificação das interações medicamentosas

As interações medicamentosas são classificadas, quanto à origem, em dois tipos: interações


farmacêuticas e interações terapêuticas.

• Interações farmacêuticas:

— São interações físico-químicas que ocorrem “fora” do paciente, pois entre fármacos diferentes
podem ocorrer numerosas incompatibilidades, que levam a reações quando estas são misturadas
em infusão intravenosa, frascos ou seringas, podendo ocasionar a inativação dos fármacos em
questão. Um exemplo é a precipitação da anfotericina B coloidal quando colocada em solução
fisiológica.

• Interações terapêuticas:

— As interações terapêuticas ocorrem no ambiente biológico, após a administração do


medicamento, e podem ser farmacocinéticas ou farmacodinâmicas.

– As interações farmacocinéticas ocorrem durante os processos de absorção, distribuição,


biotransformação e excreção dos fármacos. Por exemplo, a cimetidina (anti-histamínico
H2), que inibe a biotransformação do paracetamol.

– As interações farmacodinâmicas ocorrem nos sítios de ação dos fármacos, envolvendo os


mecanismos pelos quais os efeitos farmacológicos se processam. Esse processo pode ser de
dois tipos: interações farmacodinâmicas sinérgicas (como ocorre com a ação analgésica do
paracetamol e da codeína) ou antagônicas (antitussígeno com um xarope expectorante).

Outra classificação importante das interações medicamentosas leva em consideração a gravidade


das interações. O quadro 2 apresenta de forma sucinta essa classificação.

26
FARMACOTERAPIA

Quadro 2 – Classificação das interações medicamentosas


segundo a gravidade

Gravidade alta A interação pode oferecer ameaça à vida, sendo necessário tratamento ou
intervenção médica para minimizar ou prevenir os efeitos adversos graves

Gravidade moderada A interação pode piorar o quadro clínico do paciente, sendo necessária a
alteração da terapia
A interação pode comprometer os efeitos clínicos esperados. As manifestações
Gravidade baixa podem aumentar a frequência ou a gravidade dos efeitos adversos, mas
geralmente não é necessária a modificação na terapia

Adaptado de: Ribeiro Neto, Costa Junior e Crozara (2017).

A combinação das formas de classificar e observar as interações possíveis ou em andamento nos


permite condutas mais apropriadas em termos de acompanhamento e seguimento farmacoterapêutico e
de estabelecimento de relações de causa e efeito. A prescrição racional também se beneficia bastante
dessa conduta.

Segundo Pivatto Junior, Bernardi e Barros (2010), há outras maneiras de classificar as interações
medicamentosas. São elas:

• Conforme o início:

— Rápido: até 24 horas após a administração do fármaco.

— Tardio: mais de 24 horas após a administração do fármaco.

• Conhecimento sobre a interação medicamentosa:

— Excelente: estudos fornecem dados confiáveis e estabelecem adequadamente a interação.

— Bom: os dados disponíveis sugerem fortemente a existência da interação. Entretanto são


necessários estudos controlados mais apropriados.

— Razoável: poucos dados, mas as informações farmacológicas apontam para a suspeita de


existência da interação.

— Pobre: a documentação é pobre e limitada, levando em consideração apenas relatos de casos,


entretanto, pode ser possível.

— Improvável: documentação é pobre e carece de mais estudos com embasamento farmacológico.

As interações medicamentosas também podem ser classificadas conforme o mecanismo que as


originaram. O quadro 3 contém essa classificação.

27
Unidade I

Quadro 3 – Exemplos de interações maiores, moderadas ou menores

Pode resultar em um aumento do risco de


Ácido acetilsalicílico + heparina sangramento
Maiores
Captopril + cloreto de potássio Pode resultar em hipercalemia

Codeína + morfina Pode resultar em depressão respiratória aditiva


Pode resultar em hipoglicemia (depressão do
Ácido acetilsalicílico + insulina sistema nervoso central, convulsões)
Pode resultar em redução da concentração
Interações Moderadas Carbamazepina + sinvastatina sérica da sinvastatina, pela indução enzimática
provocada pela carbamazepina
Pode resultar em toxicidade digitálica (náuseas,
Digoxina + furosemida vômitos, arritmias)
Ciprofloxacino + propranolol Pode resultar em bradicardia, hipotensão
Pode resultar em aumento da resposta à
Furosemida + hidralazina
Menores furosemida
Pode resultar em diminuição da absorção da
Omeprazol + vitamina B12 vitamina B12

Adaptado de: Pivatto, Bernardi e Barros (2010, p. 105).

2.2.1 Interações farmacocinéticas

Como pudemos observar, as interações farmacocinéticas ocorrem num ponto do processo cinético
do fármaco no ambiente biológico — ou seja, na absorção, distribuição, metabolização ou excreção.

Durante o processo de absorção de um fármaco administrado por via oral, é possível que ocorra
alteração na velocidade de absorção e, consequentemente, na concentração plasmática de um fármaco
na presença de outros.

A absorção de um fármaco está diretamente ligada a características físico-químicas intrínsecas desse


fármaco, do ambiente físico-químico e da porção do trato gastrintestinal no qual o fármaco é absorvido.

Dessa maneira, alterações no pH do digestório podem influenciar os processos de dispersão da forma


farmacêutica e a dissolução do fármaco no ambiente estomacal ou intestinal. Cabe destacar que, de
acordo com os parâmetros cinéticos do fármaco — como pKa, lipossolubilidade e o pH do ambiente
gastrintestinal —, ele estará predominantemente em sua forma ionizada ou na forma não ionizada
(neutra). Para ser absorvido adequadamente, ele precisa estar na forma não ionizada, de modo que seja
possível a travessia das barreiras de natureza lipofílica.

Assim, substâncias que alterem as condições físico-químicas do sítio de absorção podem comprometer
a absorção de outros fármacos, quando associados.

Como exemplo, podemos citar o uso de antiácidos, inibidores da bomba de prótons ou bloqueadores
H2, que podem interferir na absorção de fármacos de caráter ácido, que são, preferencialmente,
28
FARMACOTERAPIA

absorvidos no estômago. É o caso do cetoconazol, cuja absorção será reduzida quando associado à
cimetidina, pois o aumento do pH gástrico leva a uma diminuição da absorção do cetoconazol. Outro
exemplo é o hidróxido de magnésio, que reduz a absorção estomacal do pentobarbital, que apresenta
caráter ácido.

Além das condições físico-químicas, temos que considerar a motilidade do trato gastrintestinal.
Assim, o tempo do trânsito pode interferir na absorção dos fármacos. Dependendo da substância
utilizada, podemos ter aumento ou diminuição da motilidade, e o resultado dessa interação dependerá
de quais substâncias estão associadas. Como exemplos, podemos citar a associação de metoclopramida
e paracetamol numa terapêutica combinada. A metoclopramida aumenta a velocidade de esvaziamento
gástrico e, por consequência, aumenta a absorção do paracetamol, que é absorvido predominantemente
no intestino. Outro caso que pode ser observado é o uso de metoclopramida e digoxina, em que o
aumento da velocidade do processo de esvaziamento gástrico leva à redução da absorção da digoxina.

Outro mecanismo digno de nota é a formação de complexos insolúveis. Esse fenômeno não
tem relação com a ação farmacológica dos fármacos envolvidos, mas sim com as características
químicas das substâncias. Nesse caso, dois fármacos interagem um com o outro de tal forma que
ocorre comprometimento e, até mesmo, inibição da absorção dessas substâncias. É o clássico caso da
administração de tetraciclina com leite. Na presença de metais bivalentes — no caso, o cálcio (Ca2+) —,
ocorre a formação de um complexo insolúvel que diminui a absorção de ambos. Outro exemplo é a
ciprofloxacina na presença de cálcio ou ferro, também ocorre a formação de um complexo insolúvel que
reduz a absorção do fármaco e dos metais.

Isso explica por que muitos medicamentos precisam ser administrados em horários distantes das
refeições — por exemplo, uma hora antes ou duas horas depois —, ou esquemas que determinam
intervalos de tempo específicos entre a administração de duas ou mais substâncias.

Em relação à distribuição, há a preocupação no que se refere à ligação com as proteínas plasmáticas,


principalmente a albumina. Para que o fármaco proporcione a resposta farmacológica, este deverá estar
na sua forma livre para que possa atravessar barreiras e também interagir com seu alvo molecular.

Entretanto é fundamental que as proporções entre fármaco livre e fármaco ligado às proteínas
plasmáticas devem ser adequadas para que não haja aumento ou diminuição da fração livre do fármaco,
alterando o efeito farmacológico desejado ou aumentando sua toxicidade.

Podemos observar que fármacos distintos podem competir pelas proteínas plasmáticas e, dependendo
da maior ou menor afinidade pelas proteínas, alterar as proporções individuais de fármaco livre e
fármaco ligado à proteína plasmática.

Observe o equilíbrio cinético entre as concentrações de fármaco livre (Flivre), proteína plasmática
(Pplasmática) e fármaco ligado à proteína plasmática (FP).

[ FP ] ↔ [Flivre] + [Pplasmática]

29
Unidade I

Nota-se que fármacos que se ligam extensamente e apresentam baixo volume de distribuição podem
levar ao deslocamento da ligação às proteínas. É o caso, por exemplo, da varfarina ou da fenitoína. A
varfarina, quando utilizada com a fenilbutasona, sofre deslocamento e, por consequência, tem sua
fração livre aumentada; o resultado é o aumento do risco de hemorragia.

Quando associadas ao metotrexato num esquema terapêutico, as sulfonamidas deslocam o


metotrexato; nesse caso, pode ocorrer aumento da toxicidade atribuída ao metotrexato.

Ao se estudar o metabolismo, é possível observar uma parcela importante das interações


medicamentosas, uma vez que a maioria dos fármacos são metabolizados no fígado. Um fármaco pode
interferir na metabolização de outro, aumentando ou diminuindo sua taxa de metabolização. Isso
pode acontecer por indução enzimática ou inibição enzimática.

No caso da indução enzimática, observa-se aumento da atividade do citocromo P-450. O


citocromo P-450 ou CYP-450, localizado no retículo endoplasmático do hepatócito, caracteriza-se por
uma superfamília de enzimas envolvidas no metabolismo de uma grande variedade de substâncias,
inclusive fármacos. Dessa forma, o aumento da atividade enzimática pode levar à metabolização
mais rápida e comprometer as concentrações adequadas do fármaco que permitem a resposta
farmacoterapêutica apropriada.

Como indutores enzimáticos, podemos citar os barbitúricos, carbamazepina ou rifampicina. Como


exemplos de interações podemos citar o fenobarbital, que por indução enzimática leva à diminuição das
concentrações séricas da varfarina, ou o caso da carbamazepina e da fenitoína, que reduzem os níveis
séricos de corticoides, também por indução enzimática.

A rifampicina, também um indutor enzimático, diminui os níveis séricos dos contraceptivos orais.

Em contrapartida, temos a inibição enzimática. Nesse processo, observa-se a redução da metabolização


de um ou mais fármacos e, como resultado, o aumento do tempo de meia-vida plasmática do(s)
fármaco(s) cuja biotransformação foi inibida.

A cimetidina e a eritromicina são inibidores enzimáticos, assim como cloranfenicol, corticoides,


fluconazol, cetoconazol, ciprofloxacina, inibidores da monoaminaoxidase (MAO), entre outros. O cetoconazol,
por exemplo, por inibição enzimática, aumenta os níveis plasmáticos de bloqueadores de canis de cálcio,
carbamazepina e ciclosporina.

Interações também podem ocorrer no processo de excreção. Nesse caso, a interação se dá


predominantemente nos rins, principal órgão de eliminação.

Observa-se que a competição pela secreção tubular representa o principal mecanismo em termos de
alterações por interação na eliminação de fármacos.

30
FARMACOTERAPIA

O verapamil inibe a secreção tubular da digoxina; como consequência, ocorre aumento das
concentrações séricas da digoxina, podendo aumentar sua toxicidade. No caso do lítio, sua excreção
estará aumentada na presença de diuréticos osmóticos; já na presença de inibidores da enzima conversora
de angiotensina (ECA) ocorre aumento na reabsorção tubular, com aumento das concentrações
séricas do lítio.

2.2.2 Interações farmacodinâmicas

As interações farmacodinâmicas caracterizam-se por modificação na resposta farmacológica


do fármaco.

Podem ser consideradas diretas (a interação ocorre no alvo molecular, ou seja, no sítio receptor) e
indiretas (a interação ocorre entre fármacos que apresentam mecanismos de ação distintos). Em geral,
a maioria das interações farmacodinâmicas se dão de maneira indireta.

Nas interações farmacodinâmicas diretas, os fármacos envolvidos estão competindo por determinados
receptores. Um exemplo é a interação entre salbutamol (agonista β2) e os β-bloqueadores não seletivos,
como o propranolol ou timolol.

Cabe considerar, então, que a administração de fármacos com mecanismo de ação e efeitos
farmacológicos semelhantes pode resultar em diversos tipos de respostas. Isso pode ser útil ou deletério
em termos farmacoterapêuticos.

A resposta farmacológica será considerada aditiva quando o efeito da combinação dos fármacos
for igual à soma dos efeitos proporcionados por cada substância, quando comparada com as respostas
proporcionadas pelos fármacos empregados isoladamente, podendo ser terapêutica ou tóxica.

Nas interações farmacodinâmicas em que se observa uma resposta farmacológica potencializada,


temos um efeito final maior que a somatória dos efeitos farmacológicos esperados das substâncias
envolvidas. Como exemplo podemos citar a interação do álcool com benzodiazepínicos. Nesse caso,
pode-se observar maior efeito depressivo sobre o sistema nervoso central, se comparado ao efeito
esperado das substâncias utilizadas isoladamente.

A potencialização pode ser interessante no planejamento racional de um esquema farmacoterapêutico


combinado, pois permite que a dose do fármaco considerado mais tóxico seja reduzida sem que haja
comprometimento no resultado terapêutico do paciente.

Em contrapartida, alguns fármacos, ao serem empregados em combinação, podem comprometer de


forma negativa a resposta farmacológica deles próprios e de outros fármacos.

Destaca-se o caso do uso concomitante de fármacos hipoglicemiantes e glicocorticoides. Observa‑se,


nesse caso, o bloqueio dos efeitos hipoglicemiantes. Ou, então, a diminuição dos efeitos opioides
do tramadol.

31
Unidade I

Desse modo, os profissionais de saúde precisam conhecer e ter acesso às informações sobre
interações medicamentosas, pois isso permite acompanhar e planejar adequadamente a terapêutica
medicamentosa.

Também é fundamental informar o prescritor sobre o uso concomitante de fármacos que possam
causar problemas clínicos ou ser potencialmente perigosos. O paciente também deve participar
de maneira ativa, relatando todo e qualquer sinal e sintoma que aponte para uma reação adversa.
Outro ponto fundamental é o acompanhamento e seguimento farmacoterapêutico, que propicia uma
intervenção de tal forma que medidas de contenção e controle sejam instituídas com a maior brevidade,
minimizando danos e riscos ao paciente. Mas o planejamento racional permite antever as possíveis
interações, o que proporciona uma farmacoterapia mais segura.

Saiba mais

Leia este interessante artigo sobre o uso de fitoterápicos e os potenciais


riscos de interações medicamentosas:

DIAS, E. C. M. et al. Uso de fitoterápicos e potenciais riscos de interações


medicamentosas: reflexões para prática segura. Revista Baiana de Saúde
Pública, Salvador, v. 41, n. 2, p. 297-307, abr./jun. 2017. Disponível em:
https://cutt.ly/RUHWNYU. Acesso em: 7 dez. 2021.

3 FARMACOVIGILÂNCIA

Segundo a OMS (WHO, 2002), a farmacovigilância tem por objetivo atividades ligadas a detecção,
avaliação, compreensão e prevenção de reações adversas ou outros problemas relacionados ao uso
de medicamentos.

O Terceiro Consenso de Granada define problemas relacionados a medicamentos (PRM) como


situações nas quais o uso de medicamentos pode provocar resultados deletérios durante seu uso,
interferindo de diversas formas no resultado farmacoterapêutico esperado (FORO, 2006 apud COMITÊ DE
CONSENSO, 2007). O mesmo Consenso propõe uma classificação dos PRM que leva em consideração os
principais requisitos para a utilização racional dos medicamentos, como: ser necessário, efetivo e seguro.

Atualmente, o campo de atuação da farmacovigilância é mais amplo e inclui também fitoterápicos,


vacinas, produtos para a saúde, produtos biológicos, hemoterápicos, medicamentos tradicionais e
complementares.

Dessa maneira, a farmacovigilância visa melhorar os cuidados destinados aos pacientes em relação
ao uso de medicamentos, mas também procedimentos médicos e outros aspectos relacionados aos
cuidados à saúde.

32
FARMACOTERAPIA

As informações geradas pelos programas de farmacovigilância permitem não apenas monitorar a


ocorrência de problemas relacionados aos medicamentos, mas, principalmente, melhorar a saúde pública
e a segurança sobre o uso de medicamentos, avaliar o equilíbrio risco/benefício, risco/efetividade dos
medicamentos, promover educação, treinamento sobre o tema e proporcionar efetiva comunicação
com a população.

Mas, para que a farmacovigilância seja efetiva, é fundamental a participação dos profissionais de
saúde. O envolvimento contínuo e ativo desses profissionais, por meio dos mecanismos de notificação
voluntária de suspeita e/ou sinais de reações adversas, garante a dinâmica apropriada dos sistemas
de farmacovigilância. Entretanto, para que seja possível o cumprimento dessa tarefa, é necessário um
sistema de notificações bem estruturado e que permita a análise criteriosas dessas informações.

No Brasil, o VigiMed é o sistema nacional em vigor para notificações de eventos adversos


relacionados ao uso de medicamentos e vacinas. Foi instituído em 2018 pela Anvisa em parceria com
o Uppsala Monitoring Centre (UMC). Esse centro é responsável mundialmente por todos os aspectos
tecno‑operacionais do Programa Internacional de Monitoramento de Medicamentos (PIMM) da OMS.
Também auxilia a implantação e desenvolvimento de programas de farmacovigilância nos países que
fazem parte desse programa.

O Brasil faz parte do PIMM desde 2001, e é representado pelo Centro Nacional de Monitorização de
Medicamentos com sede na Anvisa.

O VigiMed conta com três versões de ferramentas para notificação destinadas a cada tipo de usuário.
Uma versão é dedicada a cidadãos e profissionais liberais de saúde, ou seja, sem vínculo com uma
instituição. Uma segunda versão é voltada a serviços de saúde e a órgãos de vigilância sanitária locais.
A terceira é destinada a detentores de registro dos medicamentos.

Saiba mais

Para que você entenda melhor o Programa Internacional de


Monitoramento de Medicamentos da OMS, recomendamos que consulte:

UPPSALA MONITORING CENTRE. The WHO Programme for International


Drug Monitoring. [s.d.]. Disponível em: https://cutt.ly/5UHEqjE. Acesso em:
8 dez. 2021.

3.1 Métodos em farmacovigilância

De acordo com a literatura, as práticas em farmacovigilância podem ser realizadas por meio de três
métodos: vigilância passiva, vigilância ativa e estudos epidemiológicos.

33
Unidade I

3.1.1 Vigilância passiva

Esse método consiste, basicamente, nos relatos de casos a partir de notificações espontâneas de
eventos adversos a medicamentos realizadas por profissionais de saúde.

A OMS preconiza esse método por ser de baixo custo, fácil acesso aos sistemas de notificação e os
profissionais notificadores estarem próximos ao evento.

Entretanto o método passivo de farmacovigilância apresenta uma limitação que pode comprometer
o real impacto relacionado às reações adversas — trata-se da subnotificação. Diversos são os motivos que
podem levar à subnotificação, entre eles, podemos destacar: o desinteresse ou a falta de conhecimento
sobre processos de notificação e sobre a importância da notificação, além de dúvidas pessoais quanto à
necessidade ou não de notificar, diante da incerteza sobre a relação de causa e efeito. O profissional
pode sentir-se responsável por prescrever, dispensar ou administrar o medicamento que causou a
reação adversa.

Para minimizar esse problema, educação, treinamento e conscientização dos profissionais de


saúde são fundamentais. É muito importante que esses profissionais tenham sempre em mente suas
responsabilidades em relação ao paciente e ao sistema de saúde.

As notificações espontâneas funcionam como um “termômetro” em termos de problemas


relacionados aos medicamentos. A percepção desses problemas pelas agências reguladoras é essencial
para acompanhar as necessidades de intervenção e tomada de decisão.

Outro problema relacionado às notificações espontâneas e que pode comprometer as informações


tem relação com erros no preenchimento da notificação e falta de dados. Desse modo, a qualidade da
notificação também é muito importante para que os dados relevantes não sejam perdidos.

3.1.2 Vigilância intensiva

Esse método compreende três técnicas: busca sistemática ou ativa, rastreadores de reações adversas
e sistema de mineração de dados.

Busca sistemática ou ativa

Consiste na investigação e no monitoramento de pacientes internados em unidades hospitalares.


O objetivo é identificar reações adversas nesses pacientes provenientes da farmacoterapêutica
empregada durante o tratamento hospitalar. A busca se dá por meio da avaliação de prontuários e a
análise de prescrições e exames realizados. São observados também relatos da própria equipe de saúde
e conversas com o paciente.

Esse método é considerado um pouco mais custoso em função da necessidade de contratação de


profissionais treinados e qualificados, ou de proporcionar o treinamento adequado à equipe.

34
FARMACOTERAPIA

Rastreadores de reações adversas (trigger tools)

Essa técnica consiste em utilizar indicadores de eventos-sentinela (eventos graves indesejáveis que
ocorrem em ambientes hospitalares selados e exigem investigação criteriosa).

Observação

A expressão hospital selado refere-se ao selo do Compromisso com a


Qualidade Hospitalar (CQH). O modelo de gestão do CQH tem como objetivo
contribuir para a melhoria da qualidade das instituições hospitalares.

Sistema de mineração de dados (data mining)

Nesse sistema, são aplicados algoritmos capazes de identificar padrões não detectados em bases de
dados e estabelecer correlações entre os parâmetros ou variáveis que estão sendo analisadas.

A OMS dispõe da maior base de dados de relatos de reações adversas a medicamentos, e emprega
essa técnica para poder detectar novos sinais em termos de farmacovigilância.

3.1.3 Estudos epidemiológicos

Trata-se de um método observacional para detecção de eventos adversos a medicamentos. Nesse


método, um grupo de pacientes é exposto a um certo fármaco e é acompanhado durante determinado
período, a fim de se verificar a ocorrência de reações adversas. Esses pacientes são divididos em dois
grupos: o grupo daqueles que manifestam uma reação adversa e o grupo sem manifestações. Nesse tipo
de estudo, não há interferência do pesquisador.

É importante destacar que a amostra para esses estudos deve ser estatisticamente significativa, de
modo que seja possível extrapolar os resultados para a população geral.

Para que esse método seja bem-sucedido, é necessário estabelecer protocolos clínicos adequados e
criteriosos para acompanhar os pacientes e uma equipe clínica qualificada e capacitada para trabalhar
com essa metodologia.

Embora o método permita estudar apenas um evento adverso, variados fatores de risco podem ser
identificados e avaliados.

3.2 A pesquisa clínica

Sabemos que, atualmente, antes de um medicamento ser efetivamente disponibilizado ao mercado,


este é submetido a um processo de pesquisa e desenvolvimento envolvendo etapas in vitro e in vivo.

35
Unidade I

Nas etapas in vivo são utilizados modelos animais e humanos. A partir das informações previamente
obtidas dos estudos in vitro e in vivo (ainda com modelos animais), e comprovando-se a eficácia e a
segurança, iniciam-se as pesquisas em seres humanos: é a chamada pesquisa clínica. Essa pesquisa é
realizada em algumas fases, conforme expõe a figura 12.

Voluntários População-alvo Estudos Novas indicações


sadios/estáveis randomizados, Farmacovigilância
multicêntricos Estudos de vida real

Fase IV

Fase III
Fase II
Fase I

Tolerabilidade

Segurança

Farmacocinética
Eficácia

Figura 12 – Fases da pesquisa clínica

Disponível em: https://cutt.ly/pUHEybE. Acesso em: 15 dez. 2021.

De acordo com a Resolução n. 251, de 7 de agosto de 1997, do Conselho Nacional de Saúde


(BRASIL, 1997), e a Resolução n. 129/1996 do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL, 1996), essas fases
se organizam da seguinte maneira:

Fase I
Nessa fase, observamos os primeiros estudos em seres humanos, geralmente realizados em um
número pequeno de voluntários sadios (eventualmente, indivíduos portadores de determinadas
patologias). Esses estudos têm por objetivo estabelecer, preliminarmente, a segurança do fármaco, seu
perfil farmacocinético e, quando for possível, o perfil farmacodinâmico.

Fase II (estudo terapêutico piloto)


Os estudos dessa fase têm por objetivo demonstrar a atividade e a segurança do fármaco em curto
prazo. Participam dessa fase um pequeno número de indivíduos voluntários, portadores de determinada

36
FARMACOTERAPIA

patologia ou processo fisiopatológico. São definidos os intervalos de doses e busca‑se estabelecer a


relação dose-resposta.

Fase III (estudo terapêutico ampliado)

Os estudos de fase III são realizados em um grupo maior e variado de pacientes voluntários,
portadores da patologia para a qual o medicamento foi desenvolvido. Nessa fase, o objetivo é determinar
o risco/benefício em curto e longo prazo do medicamento e, de forma geral, o valor terapêutico relativo.
Também são avaliadas as reações adversas mais frequentes e características específicas do medicamento
e/ou especialidade farmacêutica (como interações importantes), fatores que podem interferir no efeito
(como idade) etc.

Fase IV (pesquisa pós-comercialização)

Os estudos realizados nessa fase ocorrem após o medicamento ter sido aprovado, registrado e já
estar sendo comercializado no mercado. Todo e qualquer estudo nessa fase deve seguir os mesmos
preceitos éticos e científicos adotados nas fases anteriores.

Nessa fase temos os estudos de vigilância pós-comercialização, objetivando estabelecer o


valor terapêutico, detectar e compreender novas reações adversas, confirmar as reações adversas já
conhecidas em relação a frequência de ocorrência e estratégias terapêuticas. Incluem-se aqui estudos
de farmacoepidemiologia, farmacovigilância e bioequivalência.

Cabe destacar que, após a comercialização de um medicamento, todos os estudos com o objetivo
de estabelecer novas indicações, formas de administração etc. são considerados como estudos de um
novo medicamento.

Assim, sendo o medicamento aprovado nas fases I, II e III da pesquisa clínica, é possível
observar evidências de que o medicamento traz benefícios à população-alvo. Ou seja, as vantagens
farmacoterapêuticas superam os riscos como reações adversas. Assim, o produto recebe o registro do
órgão regulador — que, no Brasil, é a Anvisa — e passa a ser comercializado.

Contudo, por mais bem estruturada e conduzida que seja a pesquisa clínica (estudos clínicos), não é
possível elucidar todos os pontos relacionados a eficácia e segurança.

Devemos lembrar que as fases da pesquisa clínica são conduzidas com um número específico de
sujeitos de pesquisa e com características específicas — ou seja, são grupos controlados. Dessa maneira,
apresentam baixo grau de variabilidade estatística.

Infelizmente, os ensaios de pesquisa clínica não permitem detectar, identificar e compreender todas
as possíveis reações adversas, devido a certas limitações do método, encaradas como desvantagens. Por
exemplo, o período de condução dos ensaios e a exclusão de determinados grupos (como gestantes,
crianças e idosos) que apresentam características fisiológicas particulares e podem interferir em
parâmetros farmacocinéticos e farmacodinâmicos. Tal exclusão leva em conta a exposição não justificada
37
Unidade I

desses grupos a riscos ainda não conhecidos do medicamento. Outro ponto que deve ser considerado
é a polifarmácia (ou polimedicação), que, durante os ensaios clínicos, é extremamente controlada para
minimizar o risco de mascaramento de resultados farmacoterapêuticos ou reações adversas.

Uma vez que o medicamento passa a ser comercializado em escala global, observamos a exposição
do medicamento aos mais diversos grupos humanos e nas mais diversas condições. Passamos, então, a
levar em consideração variabilidade genética, hábitos alimentares, estilos de vida, perfil de prescrição,
condições fisiopatológicas, entre outros fatores. Portanto passamos a atentar também à variabilidade
estatística, devido ao aumento substancial no número de indivíduos expostos ao medicamento.

Dessa maneira, fica evidente a importância da monitoração contínua dos medicamentos


disponibilizados no mercado, em especial os medicamentos novos. Isso faz da fase IV (pós-comercialização)
uma etapa extremamente importante, por ser caracterizada pela farmacovigilância.

3.3 Reações adversas a medicamentos

É possível afirmar que os principais problemas observados em farmacovigilância são:

• reações adversas a medicamentos;

• inefetividade terapêutica (falha terapêutica);

• desvios de qualidade de medicamentos;

• erros de medicação.

De acordo com a OMS, as reações adversas aos medicamentos podem ser definidas como
qualquer evento nocivo e não intencional que ocorreu na vigência do uso de medicamentos em
doses normalmente usadas em humanos com finalidade terapêutica, profilática ou diagnóstica (WHO, 1969).
Elas também são conhecidas como efeito indesejável ou doença iatrogênica (iatrogenia). Sobredose
(overdose) e abuso de drogas ilícitas não fazem parte desse conceito, assim como reações indesejáveis
determinadas por falha terapêutica, erros de administração e não adesão ao tratamento.

É importante destacar que fatores relacionados ao paciente, como características genéticas,


comorbidades, sedentarismo etc., podem não só influenciar a resposta farmacológica de um fármaco,
mas também as reações adversas.

As reações adversas aos medicamentos têm uma relação direta entre morbidade e mortalidade de
uma população, impactando os serviços de saúde.

3.3.1 Classificação das reações adversas

Há distintas formas de classificar as reações adversas, mas a classificação mais aceita atualmente e
citada por diversos autores é a proposta por Rawlins e Thompson (1977 apud RAWLINS, 1981).
38
FARMACOTERAPIA

Nessa classificação, podemos observar dois grupos de reações, as do tipo A e as do tipo B, também
chamadas de imprevisíveis.

Nas reações adversas do tipo A, temos uma resposta exacerbada de um determinado fármaco
como resultado de seu mecanismo de ação primário. Em geral, são previsíveis e ocorrem depois da
administração de doses preconizadas do fármaco. Podemos citar como exemplo a hemorragia na
vigência de um tratamento com anticoagulantes.

Ainda como reações do tipo A, temos a resposta farmacológica secundária, que pode ser vista na
manifestação de cefaleia durante o uso de vasodilatadores.

Eventualmente, observa-se a ação do fármaco em outros sítios de ação. É possível verificar isso com
o haloperidol, que pode causar efeito extrapiramidal em alguns pacientes.

A classificação das reações adversas do tipo A também pode levar em consideração as causas das
reações. Temos, então:

• Causas farmacêuticas: relacionadas à qualidade dos produtos farmacêuticos no que se refere


ao teor do princípio ativo na forma farmacêutica, características físicas da forma farmacêutica,
tamanho de partículas, qualidade e quantidade dos excipientes etc.

• Causas farmacocinéticas: relacionadas aos processos cinéticos que podem interferir nas
concentrações do fármaco e, por consequência, na resposta farmacológica. Parte desse processo
pode estar relacionado a interações medicamentosas ou a características do próprio indivíduo
(polimorfismo genético).

• Causas farmacodinâmicas: ocorrem nos sítios de ação dos fármacos, envolvendo os mecanismos
pelos quais os efeitos farmacológicos se processam. Ou seja, a resposta do alvo ao fármaco é
modificada pela ação de um segundo fármaco, por exemplo, por competição pelo mesmo
receptor específico.

Reações adversas do tipo A podem ser, em geral, controladas com ajustes de dose ou substituição
do fármaco empregado.

As reações adversas classificadas como do tipo B são classificadas como “bizarras”, inesperadas
em relação à ação farmacológica do fármaco. Não são comuns, independem da dose administrada e
ocorrem em alguns indivíduos.

Nessa categoria de reações adversas observamos a hipersensibilidade alérgica, idiossincrasia,


intolerância, problemas de degradação dos componentes da formulação, presença de impurezas ou
contaminantes, adjuvantes farmacotécnicos.

39
Unidade I

Segundo Aronson e Ferner (2003), essa classificação das reações adversas tem sido ampliada de
forma a incluir o tipo C (reações dependentes da dose e do tempo), tipo D (reações tardias), tipo E
(síndromes de retirada) e tipo F (reações que levam à falha terapêutica).

Outra forma de classificar as reações adversas aos medicamentos é segundo a intensidade da reação
adversa. Essa classificação também considera as medidas a serem tomadas em cada caso.

Nesse contexto, categorizamos pelas intensidades:

• Leve: quando não requer tratamento específico e não leva à suspensão do fármaco.

• Moderada: quando exige modificação da terapêutica, sem suspensão do fármaco. Pode exigir
tratamento específico.

• Grave: quando ameaça a vida do paciente. É potencialmente fatal, requer interrupção do


tratamento, prolongamento da permanência hospitalar, hospitalização. Requer intervenção para
prevenção de incapacidade ou dano permanente.

• Letal: quando contribui direta ou indiretamente para a morte do paciente.

O quadro 4 apresenta algumas reações adversas de interesse em termos de farmacovigilância.

Quadro 4 – Reações adversas de interesse em farmacovigilância

Reações adversas a medicamentos


Agranulocitose Lúpus eritematoso sistêmico
Alveolite Miocardite
Anafilaxia Necrólise epidérmica tóxica
Anemia aplástica Necrose hepática
Cegueira Nefrite intersticial
Fibrilação atrial Rabdomiólise
Fibrose pulmonar Síndrome de Reye
Focomelia Síndrome maligna neuroléptica
Hipertermia maligna Síndrome óculo-mucocutânea
Insuficiência hepática Síndrome de Stevens-Jonhson

Adaptado de: Storpirtis et al. (2008, p. 49).

Como as reações adversas aos medicamentos constituem um dos principais alvos da farmacovigilância,
fica nítida a importância de se conhecer seus mecanismos, classificação, modo de identificação, medidas
preventivas e corretivas, os principais tipos e possível desfecho. O quadro 4 apresenta algumas reações
adversas de interesse em termos de farmacovigilância.

40
FARMACOTERAPIA

Cabe destacar que alguns fármacos podem aumentar o risco de manifestação de reações adversas.
A seguir, podemos observar alguns exemplos de acordo com suas características próprias.

• Fármacos com baixo índice terapêutico: digoxina, varfarina, lítio.

• Inibidores do citocromo P-450 (inibidores enzimáticos): cetoconazol, claritromicina, eritromicina,


itraconazol, ritonavir, sertralina.

• Indutores do citocromo P-450 (indutores enzimáticos): carbamazepina, fenitoína, fenobarbital,


rifampicina.

Cabe destacar que o etanol é um indutor enzimático, assim como a nicotina. Dessa forma, essas
substâncias podem interferir no comportamento de outras substâncias e fármacos.

A nicotina, substância ativa presente no tabaco, pode causar interações farmacocinéticas por
interferir na metabolização hepática e na excreção de alguns fármacos, como benzodiazepínicos,
opioides, insulina, bloqueadores H2, nitratos, bloqueadores de canais de Ca2+, furosemida etc. (FRANKEN
et al., 1996).

Assim, é extremamente importante a monitoração do uso dos medicamentos, permitindo a detecção


das reações adversas e, consequentemente, garantindo estudos e avaliações pós-comercialização
continuados, de forma que seja possível proporcionar o uso mais seguro e eficaz dos medicamentos.

3.4 Prevenção de reações adversas oriundas de interações medicamentosas

O processo farmacoterapêutico pode ser considerado de alta complexidade por abarcar uma
série de fatores inerentes ao próprio processo e a todos os envolvidos — isso ao mencionarmos o emprego
de um único fármaco. Contudo, ao considerarmos o uso concomitante de vários fármacos, caso da
polifarmácia, o cenário fica ainda mais complexo, e diversos pontos críticos devem ser observados
pelos profissionais de saúde.

Dessa maneira, o objetivo de otimizar e tornar seguro o processo farmacoterapêutico exige do


profissional de saúde não só conhecimentos técnicos, mas também a habilidade de prever e detectar
problemas relacionados ao uso dos medicamentos.

Ao pensar suas prescrições, é fundamental observar as necessidades que atendam a meta terapêutica,
mas também verificar se o paciente já utiliza medicamentos isentos de prescrição, fitoterápicos,
terapêuticas complementares, chás ou, eventualmente, medicamentos “escolhidos” por conta própria.

Isso possibilita uma avaliação melhor e mais segura no momento de prescrever as medicações e de
acompanhar os resultados do tratamento instituído.

41
Unidade I

Na ocorrência de reações inesperadas ou falha terapêutica, de posse dessas informações, será possível
compreender melhor o que está ocorrendo para justificar o problema e, com isso, tomar decisões mais
seguras e racionais.

Ao se suspeitar de interações medicamentosas, é necessário suspender os fármacos “desnecessários”,


ajustar a dose dos fármacos suspeitos e, no caso de reações adversas graves, suspender ou trocar
o fármaco.

A monitoração plasmática não é rotineiramente realizada em todos os casos. É uma ferramenta


muito útil ao se lidar com fármacos de índice terapêutico estreito e que não podem ser suspensos
ou substituídos. Isso permite verificar os níveis séricos e ajuda a avaliar a adesão do paciente ao
tratamento, as reações adversas e a toxicidade — e possibilita, sobretudo, o ajuste de dose de maneira
mais segura.

Segundo Pivatto, Bernardi e Barros (2010), como não é possível memorizar todas as interações
medicamentosas, é importante ter em mente alguns princípios gerais. Observe os principais:

• Monitorar fármacos com índice terapêutico estreito, como anticoagulantes, citotóxicos, digitálicos,
imunossupressores, anticonvulsivantes.

• Atenção aos fármacos indutores enzimáticos (como carbamazepina, barbitúricos, rifampicina e


fenitoína) e aos inibidores enzimáticos.

• Idosos, em função da senescência, estão mais expostos ao risco de interação medicamentosa.

• A anamnese bem conduzida garante informações fundamentais quanto aos hábitos do paciente,
principalmente em termos de medicamentos ou substâncias usadas por conta própria.

Saiba mais

Leia este interessante material sobre como fazer uma anamnese


farmacêutica na farmácia:

SOUZA, A. Como fazer uma anamnese farmacêutica na farmácia.


Clinicarx, Curitiba, 16 jun. 2021. Disponível em: https://cutt.ly/rUHEm7D.
Acesso em: 8 dez. 2021.

42
FARMACOTERAPIA

4 FARMACOTERAPIA EM GRUPOS-ALVOS

4.1 Farmacoterapia em idosos

4.1.1 O envelhecimento
Estamos observando no Brasil e no mundo um acelerado processo de envelhecimento. Tal processo
aponta nitidamente para o aumento da expectativa de vida da população. Essa mudança no perfil
demográfico teve início nos países desenvolvidos como resultado da redução das taxas de fecundidade e
de mortalidade, melhor acesso aos serviços de saúde, avanços em diversas áreas da medicina e acesso à
informação. Também é possível observar melhorias nas condições sociais e econômicas e de saneamento
básico. Esses fatores permitiram substancial aumento na expectativa de vida da população.
No Brasil, considera-se idosa a pessoa com 60 anos ou mais, conforme definido pela Política Nacional
do Idoso (BRASIL, 1994) e pelo Estatuto do Idoso (BRASIL, 2003a). Em 2020, 9,8% da população brasileira
estava na faixa dos 65 anos ou mais, e, em 2030, essa faixa deverá representar 13,5% da população
brasileira, segundo projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2021), como
pode‑se observar na figura 13.
90+
85-89
80-84
75-79
70-74
65-69
60-64
55-59
50-54
45-49
40-44
35-39
30-34
25-29
20-24
15-19
10-14
5-9
0-4
5 0 0 5

Homens Mulheres

Exibindo ano de: 2030 Brasil SP

Figura 13 – Pirâmide etária 2010-2060: Brasil e São Paulo

Adaptada de: IBGE (2021).

43
Unidade I

Saiba mais

Conheça as projeções e estimativas da população brasileira e de cada


unidade federativa, produzidas pelo IBGE. Nesta página você encontrará
inúmeras estatísticas, com dados organizados em gráficos interativos.

IBGE. Projeção da população do Brasil e das Unidades da Federação. Rio


de Janeiro: IBGE, 2021. Disponível em: https://cutt.ly/BUHRqoq. Acesso em:
15 ago. 2021.

Além dos aspectos positivos relacionados ao aumento da expectativa de vida, devemos lembrar que
as patologias características dessa população — não só pela gravidade e cronicidade, mas também pela
probabilidade de reações adversas aumentada em função da polifarmácia — acabam por aumentar o
risco de morbimortalidade. Assim sendo e levando em consideração esse conjunto de pontos críticos
inerentes ao processo, o envelhecimento tem alto impacto nos sistemas de saúde. Para se ter uma ideia
desse impacto, estima-se que 10,7% do produto interno bruto (PIB) nacional em 2050 será destinado a
gastos com a saúde (KILSZTAJN et al., 2003).

Esses dados nos levam a uma questão importante. Para que os idosos tenham qualidade de vida é
fundamental garantir acesso adequado a todos os serviços destinados à população, sem deixar de lado
a atenção apropriada e dirigida às necessidades específicas dessa população. Levando em consideração
esses elementos, o profissional de saúde deve estar preparado para atender essa população em todos
os aspectos.

Considerando o envelhecimento como um processo biológico natural no qual observa-se um


declínio gradativo das funções de diversos órgãos e sistemas, é esperado que o comportamento cinético
dos fármacos no ambiente biológico do idoso sofra alterações. Também é comum a presença de
processos fisiopatológicos nessa faixa etária, tanto agudos como crônicos, quer seja por senescência ou
por senilidade.

Observação

Senescência: processo natural de envelhecimento.

Senilidade: processo patológico de envelhecimento.

Dessa forma, observa-se com frequência o emprego da polifarmácia no idoso, o que leva ao aumento
substancial do risco de reações adversas, interações medicamentosas, erros de medicação, intoxicações,
falha terapêutica, comprometimento da adesão e até a morte. Entretanto devemos considerar que o
emprego da polifarmácia se faz necessário para que o paciente receba o tratamento adequado.

44
FARMACOTERAPIA

Lembrete

A polifarmácia, segundo a OMS, é o uso rotineiro e concomitante


de quatro ou mais medicamentos (com ou sem prescrição médica) por
um paciente.

Segundo Ramos et al., em artigo publicado em 2016, no Brasil, a prevalência de ao menos


um medicamento de uso crônico entre idosos é de 93%, sendo que 18% utilizam pelo menos cinco
medicamentos.

Em 2017, reconhecendo o elevado risco relacionado ao uso de medicamentos, a OMS lançou o


terceiro Desafio Global de Segurança do Paciente com o tema “Medicação sem Danos”. Nessa publicação,
observa-se a preocupação em reduzir danos graves e evitáveis relacionados aos medicamentos por parte
de todos os envolvidos no processo farmacoterapêutico. Entre as categorias elencadas como prioritárias
está a polifarmácia.

Em geral, o paciente idoso está sob os cuidados de diversos profissionais de saúde que podem
prescrever e/ou indicar terapêuticas medicamentosas ou não medicamentosas distintas, sem que
haja, eventualmente, a interação entre esses profissionais. Isso aumenta o risco de associações
medicamentosas e/ou terapêuticas que podem comprometer o idoso. Deve-se levar em consideração
também hábitos do idoso como uso, por conta própria, de medicamentos isentos de prescrição, alimentos,
chás, fitoterápicos etc.

Em termos de adesão ao tratamento, o paciente idoso não apresenta menor aderência, se comparado
aos demais pacientes. Contudo, a diminuição das capacidades sensoriais e/ou cognitivas pode contribuir
para que o paciente desenvolva dificuldade de leitura de bulas ou orientações escritas, não compreenda
ou esqueça instruções, esqueça de tomar o medicamento, o que pode comprometer o resultado esperado
e necessário (SOUZA; SANTOS; SILVEIRA, 2008).

Assim, fica evidente a necessidade de seguimento farmacoterapêutico pelo profissional de saúde, em


destaque o farmacêutico. Este tem a tarefa de acompanhar as prescrições do idoso e as possíveis reações
adversas, avaliar as possíveis interações medicamentosas. É preciso traçar um plano de acompanhamento
e seguimento farmacoterapêutico durante o tratamento, seja ele agudo ou crônico. Tal medida permite
o suporte adequado e seguro ao paciente e aos profissionais envolvidos nos cuidados ao idoso.

Também é fundamental que o idoso receba todas as informações sobre o plano farmacoterapêutico
instituído, para que sua adesão seja plena e consciente. Orientação, suporte, apoio e esclarecimento
são fundamentais.

45
Unidade I

4.1.2 Alterações fisiológicas no idoso

Na fase de senescência, o ser humano passa a apresentar diversas mudanças fisiológicas.


Podemos destacar mudanças importantes no fígado, rins, sistema nervoso central, trato digestório
e na musculatura.

Dessa forma, é possível observar alterações no comportamento cinético dos fármacos no que se
refere a absorção, distribuição, metabolização e eliminação. Observamos também, em alguns pacientes,
problemas de deglutição que exigem atenção à escolha da forma farmacêutica apropriada às condições
do paciente idoso. Alterações farmacodinâmicas também são observadas, mas são menos frequentes
que as alterações farmacocinéticas.

Discutiremos as principais alterações induzidas pelo envelhecimento em cada território e as


implicações em termos farmacocinéticos e farmacodinâmicos que provocarão alterações na resposta
farmacoterapêutica e exigirão ajustes apropriados no esquema farmacoterapêutico e acompanhamento
adequado do paciente.

Absorção

O envelhecimento leva a algumas alterações em termos de estrutura e função do digestório. Isso


pode alterar a absorção de fármacos que sejam administrados por via oral e outras substâncias como
nutrientes e vitaminas.

Lembrete

A absorção é a primeira etapa do processo farmacocinético


para medicamentos de uso oral e muito importante em termos de
biodisponibilidade.

A presença de comorbidades, os processos que modifiquem o trato digestório e a polifarmácia são


comuns no paciente idoso e influenciam a biodisponibilidade dos fármacos.

Apesar das alterações relacionadas à idade — como diminuição da superfície do intestino delgado,
redução do tempo do esvaziamento gástrico e aumento do pH estomacal —, observa-se que, para a
maioria dos fármacos, as alterações na fase de absorção para fármacos administrados por via oral
são irrelevantes.

Segundo Bernardi e Barros (2011), estudos não têm apontado para diferenças entre jovens e
idosos quanto à absorção pela mucosa oral. Essa via proporciona rápida absorção, indicando ser útil
e interessante para transpor certos problemas de biodisponibilidade que podem ocorrer com os idosos.

46
FARMACOTERAPIA

Ponto importante a ser considerado ao se utilizar essa via tem relação com a possibilidade de
redução de doses, por meio da redução do metabolismo de primeira passagem, também chamado
de metabolismo pré-sistêmico. Cabe destacar que o metabolismo de primeira passagem é observado na
administração por via oral e, em menor extensão, por via retal.

O mesmo autor aponta que há poucos estudos sobre as vias de administração percutânea, pulmonar
e retal. Contudo, a administração transdérmica tem sido estimulada em função do perfil de liberação do
fármaco para a corrente sanguínea.

Observação

No metabolismo de primeira passagem ocorre metabolismo pré‑sistêmico.


Ou seja, o fármaco é biotransformado pela microbiota intestinal ou pelo
fígado, antes de atingir a circulação sistêmica.

Distribuição

No indivíduo idoso, é possível observar aumento da gordura corporal e redução de 10% a 15% da
água corporal (líquido corporal). Também se observa diminuição da massa magra.

Como consequência dessas alterações são observados aumento no volume de distribuição (Vd) para
fármacos de caráter lipofílico e diminuição do Vd para fármacos hidrofílicos. A redução do Vd leva ao
aumento das concentrações plasmáticas do fármaco.

O volume de distribuição pode ser calculado da seguinte maneira:

[fármaco] = [plasmática do fármaco] . Vd

Onde: [ ] = concentração

A equação a seguir expressa a relação do volume de distribuição (Vd) e a meia-vida de eliminação


de um fármaco:

Vd = depuração total do fármaco . meia-vida (T1/2)/0,693

Cabe destacar que a meia-vida (T1/2) é o tempo necessário para as concentrações no plasma
diminuírem pela metade (50%), e é sabido que o aumento da meia-vida (T1/2) de um fármaco pode
ocorrer também por causa de alterações no volume de distribuição.

O volume de distribuição (Vd) também é fundamental para a determinação de doses de ataque para
fármacos que exigem esse regime farmacoterapêutico.

47
Unidade I

Lembrete

Dose de ataque de um fármaco é a dose capaz de elevar rapidamente a


sua concentração na corrente sanguínea. O objetivo é alcançar de maneira
rápida a concentração considerada alvo.

O quadro 5 apresenta exemplos de alterações na distribuição de alguns fármacos em idosos.

Quadro 5 – Alterações na distribuição de fármacos em idosos

Mecanismo Efeito Fármacos


↓ Vd de fármacos hidrossolúveis
↓ água corpórea
↑ da concentração plasmática de fármacos Lítio, sotalol, álcool, digoxina
↓ massa magra polares hidrossolúveis
↑ dose de ataque
↓ dose de manutenção
Oxazepam, diazepam, lidocaína,
↑ gordura corpórea ↑ tempo de latência do efeito inicial barbitúricos, fenotiazinas
↑ T1/2
↑ Vd
Anticoagulantes orais, furosemida,
↓ albumina sérica ↑ fração livre do fármaco no plasma salicilatos, sulfonilureias, valproato,
naproxeno

Adaptado de: Bernardi e Barros (2010, p. 145).

Considerando a taxa de ligação à proteína plasmática, observa-se, nos idosos, redução nas concentrações
de albumina e aumento nas concentrações de α1-glicoproteína ácida.

Observação

Fármacos ácidos ligam-se à albumina. Fármacos básicos ligam-se à


α1‑glicoproteína ácida.

A queda nas concentrações de albumina também pode ter relação com doenças, desnutrição e
pós-operatório. A preocupação com a queda nas concentrações da albumina sérica tem relação com
o aumento da fração livre do fármaco, o que pode levar o idoso a um quadro de intoxicação mesmo
quando as doses administradas são adequadas ao paciente.

Podemos exemplificar esse caso citando a fenitoína e a varfarina. Esses fármacos apresentam alto
risco em termos de efeito tóxico caso os níveis de albumina diminuam.

48
FARMACOTERAPIA

Se faz necessário considerar outra situação: o uso de fármacos simultaneamente, caso da polifarmácia,
que competem pela albumina. Essa situação também pode levar a quadros de intoxicação em função do
aumento da fração livre do fármaco ou dos fármacos com menor afinidade à albumina.

Metabolização

O principal responsável pela metabolização dos fármacos é o fígado. Mas cabe lembrar que os
fármacos também podem ser metabolizados em outros territórios, como pulmões, rins e intestino.

Nos idosos, observa-se redução da perfusão sanguínea hepática e da própria massa do fígado, o
que provoca diminuição no número de hepatócitos. Dessa maneira, o envelhecimento leva à redução
da atividade do sistema enzimático do citocromo P-450. Normalmente, é possível observar uma
redução de 30% a 40% na depuração de alguns fármacos. Dessa forma, em tese, se faz necessária a
redução das doses de manutenção. Contudo, é sabido que as taxas de metabolização hepática variam
individualmente, portanto o ajuste de dose deve ser individualizado (RUSCIN; LINNERBUR, 2018).

Como resultado da diminuição na atividade desse sistema enzimático, observa-se o aumento da


meia-vida (T1/2) de fármacos metabolizados por esse sistema. Podemos citar como exemplos diazepam,
fenitoína, imipramina, entre outros. Assim, o uso contínuo desses fármacos pode proporcionar um
aumento das concentrações plasmáticas e da toxicidade. Em compensação, pró-fármacos podem ter
sua biodisponibilidade diminuída, uma vez que precisam de ativação hepática.

Entretanto fármacos que são metabolizados por conjugação não são afetados em termos de
metabolização. Há indícios de que esse sistema não seja afetado pelo envelhecimento. Podemos citar,
nesse caso, o lorazepam e o oxazepam. Daí a preferência, entre outros fatores, do emprego desses
benzodiazepínicos em idosos.

Excreção/eliminação

Observa-se que, com o envelhecimento, a depuração dos fármacos diminui. São percebidas reduções
no número de néfrons e no peso dos rins, acarretando reduções nas taxas de filtração glomerular,
reabsorção e secreção tubular.

De acordo com Bernardi e Barros (2010), há redução de 25% na filtração glomerular em indivíduos
de 20 a 50 anos de idade, e de 50% naqueles de até 75 anos. Também são observadas diferenças entre
os sexos masculino e feminino.

Isso é extremamente importante no caso da utilização de fármacos como a digoxina, em


função do aumento do risco de toxicidade — inclusive, vale lembrar que a digoxina apresenta baixo
índice terapêutico.

49
Unidade I

Também, deve-se levar em consideração todo e qualquer fármaco de eliminação, em função do


risco de ocorrer acúmulo da substância no organismo do idoso, devido à diminuição da função renal
pela senescência.

Desse modo, em termos farmacoterapêuticos seguros, é de fundamental importância compreender


o processo de senescência e o impacto nos sistemas biológicos, assim como avaliar a função renal do
paciente idoso.

A literatura aponta que, nessa faixa etária, os níveis plasmáticos de ureia ou de creatinina podem
não representar de maneira adequada a função renal. Desse modo, propõe-se a utilização da depuração
(clearance) de creatinina.

Ainda segundo Bernardi e Barros (2010), também destacam que, atualmente, recomenda-se o uso de
um algoritmo específico para estimar, com maior precisão, a taxa de filtração glomerular (TFG) em idosos.

Saiba mais

Podem-se realizar cálculos online para estimativa da função renal, entre


outros parâmetros, pelo site do National Institute of Diabetes and Digestive
and Kidney Diseases (NIDDK). Para isso, consulte a seção “Laboratory
Evaluation” (Avaliação de Laboratório):

NIDDK. National Kidney Disease Education Program. Bethesda: United States


National Institutes of Health, [s.d.]. Disponível em: https://cutt.ly/tUHRbmK.
Acesso em: 23 dez. 2021.

Assim, é possível observar porque se recomenda iniciar uma terapia medicamentosa nos idosos com
a menor dose possível que promova os efeitos terapêuticos desejados e ajustá-la conforme a resposta
do paciente, preferencialmente, usando a TFG.

Essas condutas permitem a adoção de um esquema farmacoterapêutico mais seguro e eficaz.

Alterações farmacodinâmicas

No idoso, observa-se que alterações farmacodinâmicas que podem levar a algum comprometimento
são menos frequentes que as alterações farmacocinéticas. Entretanto o processo de senescência causa
alterações na quantidade e/ou qualidade funcional de receptores, neurotransmissores e hormônios,
e alterações no metabolismo ou biodisponibilidade da glicose e do oxigênio. Observa-se também
aumento da permeabilidade seletiva da barreira hematoencefálica (BHE). O fato de a BHE ter sua
permeabilidade alterada faz com que certos fármacos alcancem concentrações maiores no sistema
nervoso central dos idosos, provocando, assim, efeitos adversos que devem ser observados com atenção.

50
FARMACOTERAPIA

Um exemplo clássico refere-se ao uso de benzodiazepínicos. Nos idosos, prefere-se o uso de


benzodiazepínicos de curta duração, como o lorazepam, oxazepam ou temazepam, e a dose também
deverá ser reduzida.

Observa-se também aumento da sensibilidade a opioides, exigindo redução de dose. O idoso


apresenta risco aumentado de manifestar depressão respiratória, constipação e confusão mental
durante a terapêutica com opioides.

4.1.3 Idosos — prescrição de medicamentos

De acordo com a literatura, a prescrição para idosos deve levar em consideração os cinco “is” da
geriatria. São eles:

• iatrogenia;

• incontinência;

• instabilidade postural;

• imobilidade;

• incapacidade cognitiva.

De acordo com Moriguchi et al. (2016), mais recentemente, foram incluídas:

• insuficiência familiar;

• incapacidade comunicativa.

Ainda segundo os autores, as grandes síndromes geriátricas caracterizam-se por diversas condições
de saúde que ocorrem quando o comprometimento combinado em múltiplos sistemas torna o indivíduo
vulnerável a situações que desafiem o idoso.

Essas são síndromes geriátricas que afetam a qualidade de vida do idoso, principalmente em termos
de funcionalidade e autonomia, e compreendem uma série de situações que tendem a ocorrer com maior
frequência e prevalência ao envelhecer, como consequência das alterações fisiológicas relacionadas ao
processo de senescência ou senilidade (MORAES; MARINO; SANTOS, 2010).

O quadro 6 mostra uma série de medicamentos considerados potencialmente inadequados para


serem utilizados em idosos.

51
Unidade I

Quadro 6 – Lista Priscus de medicamentos potencialmente


inadequados para idosos (adaptada à farmacopeia brasileira)

Anti-inflamatórios Anti-histamínicos Inibidores da MAO*


Cetoprofeno Clemastina Tranilcipromina
Etoricoxibe Clorfeniramina
Fenilbutazona Dimetindeno BZDs* de longa duração
Indometacina Hidroxizina Bromazepam
Meloxicam Tripolidina Clobazam
Piroxicam Clorazepato
Antieméticos Clordiazepóxido
Anti-hipertensivos Dimenidrinato Diazepam
Clonidina Flunitrazepam
Doxazosina Ergotamina e derivados Flurazepam
Metildopa Di-hidroerocriptina Nitrazepam
Nifedipino Ergotamina
Prazosina BZDs de curta-média duração
Reserpina Neurolépticos típicos e atípicos Alprazolam
Terazosina Clozapina Lorazepam > 2 mg
Flufenazina
Antiagregantes plaquetários Haloperidol > 2 mg Agentes “Z”
Ticlodipina Levomepromazina Zolpidem > 5 mg
Olanzapina > 10 mg Zopliclona > 3,75 mg
Antiarrítmicos Tioridazina
Digoxina Outros sedativos
Quinidina Antidepressivos tricíclicos Difenidramina
Sotalol Amitriptilina
Clomipramina Anticonvulsivantes
Antibióticos Imipramina Fenobarbital
Nitrofurantoína Maprotilina
Opioides, laxantes e diversos
Miorrelaxantes ISRS* Pentoxifilina
Baclofeno Fluoxetina Naftidrofuril
Nicergolina
Antiespasmódicos Piracetam
Oxibutinina
Tolterodina
*BZD: benzodiazepínicos; ISRS: inibidor seletivo da recaptação da serotonina; MAO: monoaminaoxidase

Adaptado de: Gorzoni, Fabbri e Pires (2012).

Pensando em prescrição racional e segura no caso dos idosos, observamos que diversos fatores de
risco para efeitos adversos — como comorbidades, alterações farmacocinéticas e farmacodinâmicas
52
FARMACOTERAPIA

próprias da senescência e a polifarmácia — justificam o suporte multidisciplinar no atendimento ao


idoso e, principalmente, o acompanhamento e seguimento farmacoterapêutico.

4.2 Farmacoterapia em pediatria

Ao se pensar a prescrição de medicamentos em pediatria, nos deparamos com algumas particularidades


relativas às características da criança. É preciso estar atento aos aspectos relacionados à fase do
desenvolvimento da criança com base em sua idade. Além disso, deve-se considerar a criança como um
paciente especial, devido às condições e características dessa população.

Nesse contexto, é possível observar fatores importantes, como a presença de patologias específicas,
os sinais e sintomas (que, eventualmente, são inespecíficos), a necessidade de um cuidador para viabilizar
a condução da farmacoterapêutica e, ainda, a dificuldade de expressão dependendo da faixa etária e/ou
condições que comprometem a capacidade de expressão e comunicação.

Há alguns pontos críticos que podem ser discutidos, como a escassez de estudos destinados a essa
população, uma vez que a investigação clínica em pediatria apresenta critérios particulares e bem mais
específicos em termos éticos e técnicos se comparados aos estudos realizados em adultos.

Dessa maneira, problemas éticos, logísticos e a complexidade dos consentimentos necessários podem
dificultar ou, até mesmo, inviabilizar protocolos de pesquisa clínica em pediatria. Isso reflete na falta (ou
na baixa quantidade) de informações sobre farmacocinética e perfil de segurança de fármacos utilizados
nessa população.

Comumente, as crianças são consideradas “órfãos terapêuticos” em função de evidências clínicas


insuficientes e a escassez de formas farmacêuticas destinadas às crianças.

Outro ponto importante tem relação com a prescrição off-label no tratamento ambulatorial ou
hospitalar — ou seja, medicamentos ainda não aprovados para o uso pediátrico ou para determinada
faixa etária pediátrica. Essa é uma prática comum no mundo todo: a falta de aprovação não significa
que o fármaco não deva ser utilizado nessa população — apenas aponta que não há informações
suficientes para garantir resultados eficazes, seguros e que permitam a identificação dos riscos para
as crianças. Dessa forma, o uso off-label deve ser extremamente cuidadoso, e não deve ser a primeira
opção terapêutica para o paciente pediátrico (FUCHS; WANNMACHER, 2017).

Contudo, sabemos que em função do processo fisiopatológico, as opções de medicamentos


aprovados para essa faixa etária são restritas ou inexistentes. Portanto, para não expor a criança a riscos,
a prescrição racional de medicamentos, off-label ou aprovados, e o seguimento e acompanhamento
farmacoterapêutico são essenciais.

Em geral, informações sobre dosagem, parâmetros farmacocinéticos e reações adversas em pediatria


não estão disponíveis quando um determinado fármaco é liberado para comercialização.

53
Unidade I

Laughon et al. (2011), destacam que a pesquisa clínica envolvendo crianças constitui um desafio, e
que são necessários estudos clínicos inovadores destinados às populações pediátricas, embora diversos
estudos já tenham sido realizados na área da farmacocinética pediátrica.

Observa-se que os efeitos farmacológicos e as reações adversas são parecidos em adultos e crianças,
mas as diferenças farmacocinéticas devem ser consideradas.

A legislação de diversos países destaca o problema e reivindica pesquisas inovadoras destinadas à


pediatria, exigindo informações e recomendações na bula.

De qualquer forma e apesar de diversas iniciativas, ainda há um longo caminho a percorrer no


sentido de desenvolvermos protocolos clínicos destinados às crianças em suas diversas fases, de modo a
garantir eficácia e segurança em todo e qualquer tratamento farmacoterapêutico.

Para compreendermos o universo farmacoterapêutico pediátrico, precisamos entender a classificação


das crianças conforme a faixa etária. Isso permite observar a fase de desenvolvimento na qual se encontra
o paciente pediátrico.

As crianças são categorizadas em faixas etárias por diversos motivos, principalmente pensando em
fases de desenvolvimento físico, intelectual, amadurecimento dos sistemas metabólicos, amadurecimento de
órgãos etc. Assim, a observação dessas fases permite entender e acompanhar o comportamento cinético
de um fármaco dependendo da faixa etária da criança. A tabela 1 apresenta a classificação das crianças
conforme a faixa etária.

Tabela 1 – Classificação segundo as faixas etárias em pediatria

Classificação Faixa etária


Neonato prematuro < 37 semanas de gestação
Neonato Até 1 mês de vida
Lactente 1 mês a 1 ano de vida
Criança 1 a 12 anos de vida
Adolescentes 12 a 18 anos de vida

Adaptada de: Sagraves (2003 apud STORPIRTIS et al. 2008, p. 378).

Como já discutido, diferenças farmacocinéticas características e diretamente relacionadas à fase de


desenvolvimento da criança podem ocasionar alterações no efeito farmacológico dos medicamentos.

Dessa maneira, em linhas gerais, podemos observar que processos fisiopatológicos influenciam o
comportamento do fármaco no ambiente biológico da criança. Essa influência se modifica à medida que
os sistemas biológicos da criança amadurecem.

54
FARMACOTERAPIA

4.2.1 Principais diferenças em termos de parâmetros cinéticos nas crianças

Em termos de absorção e lembrando que a maior parte dos medicamentos usados em pediatria
são administrados por via oral, salvo em condições específicas, o processo de absorção depende
basicamente das condições físico-químicas e da velocidade do trânsito do trato digestório. Desse
modo, observa-se que os processos fisiológicos se modificam de forma importante ao longo do
primeiro ano de vida.

No nascimento, em função da presença de líquido amniótico no estômago, o pH é neutro; nas


primeiras horas de vida passa para uma faixa de pH de 2 a 3; e no período de 24 a 48 horas eleva-se para
uma faixa de pH de 6 a 7, permanecendo assim por aproximadamente 10 dias. A partir desse período, o
pH cai lentamente até atingir valores de pH como nos adultos por volta dos 2 anos de vida.

A velocidade de esvaziamento gástrico eleva-se gradativamente, sendo menor em bebês prematuros


e mais elevada nos neonatos e lactentes.

Já a velocidade do trânsito intestinal chega a níveis encontrados nos adultos por volta dos 2 anos
de vida.

Isso significa que são observadas diferenças importantes em termos de biodisponibilidade de


fármacos administrados por via oral. As diferenças em termos de condições do trato digestório são
relevantes, pois podem levar à absorção aumentada, normal ou diminuída após administração por via
oral, em relação aos adultos e crianças maiores que já atingiram condições de trânsito semelhantes aos
adultos. Por exemplo, a penicilina é um fármaco de absorção aumentada após administração por via oral
em recém-nascidos; a digoxina, neste mesmo contexto, apresenta absorção normal; e o fenobarbital,
absorção diminuída.

Em termos de distribuição, observa-se que a albumina sérica está diminuída, o que leva à redução
da taxa de ligação à proteína plasmática. A barreira hematoencefálica (BHE) apresenta-se imatura, de
modo que se observa maior penetrabilidade através dela.

Alterações em termos de composição corporal também são relevantes para a distribuição


compartimental. No recém-nascido, observa-se a água total e o fluido extracelular aumentados —
porém, o tecido adiposo e o músculo esquelético diminuídos.

Dessa forma, constata-se que o volume de distribuição muda conforme a idade. Por exemplo, para
fármacos hidrossolúveis, são necessárias doses mais elevadas em crianças menores em função da maior
proporção de água na composição corporal.

No caso do metabolismo dos fármacos, observa-se imaturidade dos sistemas, principalmente no


prematuro. Entretanto os sistemas de metabolização atingem níveis apropriados durante o primeiro
mês de vida e, considerando que a maior parte dos fármacos são metabolizados no fígado, é sabido que
a atividade enzimática (principalmente do sistema do citocromo P-450) e os sistemas de conjugação são

55
Unidade I

menores no período neonatal, e a atividade máxima apresenta uma relação de dependência com o nível
de maturidade e do sistema enzimático em questão (FUCHS; WANNMACHER, 2017).

Isso implica menores taxas de depuração e aumento da meia-vida de eliminação.

Concomitantemente à imaturidade dos processos de biotransformação, devemos considerar a


imaturidade da função renal, principal sistema de excreção. Segundo Fuchs e Wannmacher (2017), a
taxa de filtração glomerular atinge níveis semelhantes aos adultos por volta dos 7 meses de vida.

A tabela 2 apresenta uma comparação entre a meia-vida de alguns fármacos no neonato e no adulto.

Tabela 2 – Meias-vidas de alguns fármacos em neonatos e adultos

Fármaco Neonato T1/2 (horas) Adulto T1/2 (horas)


Paracetamol 2,2-5 1,9-2,2
Diazepam 25-100 40-50
Digoxina 60-107 30-60
Fenobarbital
0 a 5 dias 200
5 a 15 dias 100
1 a 30 meses 50 64-140
Fenitoína
0 a 2 dias 80
3 a 14 dias 18
14 a 50 dias 6 12-18
Salicilato 4,5-11 10-15
Teofilina
Neonato 13-26
Criança 3-4 5-10

Adaptada de: Silva (2010, p. 1170).

4.2.2 Cálculo de doses em pediatria

Segundo Fuchs e Wannmacher (2017), os medicamentos que apresentam dados a partir de estudos
clínicos adequados oferecem a dose devidamente ajustada, levando em consideração o peso ou a
superfície corpórea, dependendo do caso.

Entretanto, em alguns casos, é possível estimar a dose a ser empregada em relação à dose preconizada
para os adultos. Lembrando que a dose para a criança não pode extrapolar a dose para o adulto.

56
FARMACOTERAPIA

A seguir, são apresentadas algumas fórmulas para o cálculo estimado de doses em pediatria. Observe,
no quadro 7, que cada fórmula leva em consideração o peso ou a idade da criança. A escolha fica a cargo
do pediatra que escolherá a forma que mais se adequa à criança em questão. Cabe ressaltar que tais
fórmulas não se aplicam à neonatologia: Shirkey (apud SILVA, 2010) comenta que elas são adequadas
para crianças entre 6 meses e 2 anos.

Quadro 7 – Fórmulas para cálculo de doses pediátricas

Fórmula de Fried: para Idade em meses


pacientes com menos × Dose do adulto = Dose aproximada para o lactente
de 1 ano de idade 150

Fórmula de Clark: para Peso em quilogramas


pacientes com 2 anos × Dose do adulto = Dose aproximada para a criança
de idade ou mais 70

Idade ( em anos )
× Dose do adulto = Dose aproximada para a criança
Idade ( em anos ) + 12
Fórmula de Young: para
pacientes com 2 anos Superfície do corpo da criança
de idade ou mais × Dose do adulto = Dose da criança
Superfície do corpo adulto

Superfície do corpo da criança (em m2) × Dose por m2 = Dose da criança

Adaptado de: Silva (2010, p. 1173).

Uma ideia equivocada que, eventualmente, ganha força é considerar que as crianças são “adultos
pequenos”, principalmente quando tratamos de farmacoterapia. Durante muito tempo, extrapolou-se
as doses dos fármacos estabelecidas para os adultos para que se pudessem ser utilizados em crianças
(BUCK, 2003 apud STORPIRTIS et al., 2008).

Entretanto, para utilizarmos as substâncias farmacologicamente ativas em pediatria, é fundamental


levar em consideração o processo de maturidade de cada sistema, desde o nascimento até a adolescência,
momento que consideramos a transição para a fase adulta.

Esses conhecimentos são fundamentais para o adequado ajuste posológico e o acompanhamento


da farmacoterapia pediátrica.

4.3 Gestantes e saúde da mulher

Neste item, trataremos de tópicos de grande relevância em termos de saúde, bem-estar e qualidade
de vida da mulher. Abordaremos a farmacoterapia na gestação, a terapia de reposição hormonal (TRH)
no climatério e a contracepção.

57
Unidade I

4.3.1 Farmacoterapia na gravidez

A gravidez humana dura aproximadamente 280 dias, sendo dividida em três trimestres. Durante
esse período, a maioria das mulheres utilizarão algum tipo de medicamento, prescrito ou não. Nos
últimos anos, tem-se observado aumento no uso de medicamentos durante a gestação, e são diversos os
motivos. Apesar dessa crescente utilização de medicamentos, diretrizes específicas que possam direcionar
e embasar cientificamente o uso racional e seguro de fármacos na gestação ainda são escassas.

Infelizmente, poucos são os fármacos devidamente testados para uso durante a gestação. Implicações
éticas limitam esses estudos, e os dados disponíveis são oriundos dos ensaios pré-clínicos a partir de
modelos animais.

Sempre há preocupação ao se utilizar um fármaco, não importa a idade, e sempre é necessário


avaliar o risco-benefício. Entretanto, ao se considerar esse uso durante a gestação, a preocupação é
ainda maior, pois a atenção deve ser direcionada tanto para a gestante como para o feto.

Os fármacos que, em geral, são mais utilizados durante a gestação são os antieméticos, antiácidos,
anti-histamínicos, analgésicos, antimicrobianos, hipnóticos-sedativos e diuréticos. Vitaminas e
suplementos vitamínicos também são de uso comum nesse período.

Uma recomendação específica deve ser destacada: a suplementação de ácido fólico em mulheres em
idade fértil, 30 dias antes de engravidar e nos três primeiros meses de gestação. O objetivo é prevenir
defeitos na formação do tubo neural do feto (BRASIL, 2013).

Cabe ressaltar que a gestação é considerada uma condição de alto risco, portanto é fundamental
que haja uma avaliação criteriosa e cautelosa acerca do uso de medicamentos nessa fase.

Em função das mudanças que ocorrem no organismo materno, observam-se alterações fisiológicas
nos sistemas cardiovascular, respiratório, digestório, na composição de fluidos corpóreos, na função
renal e no sistema hormonal.

Nesse período, também são observadas alterações farmacocinéticas importantes e fundamentais


que não podem ser desconsideradas quando se faz necessário o uso de medicamentos.

A absorção, por exemplo, pode estar alterada em função da diminuição no tempo de esvaziamento
gástrico, e também devido aos episódios de vômitos.

O aumento nos níveis de estrogênio e progesterona podem alterar a metabolização de alguns


fármacos devido à alteração na atividade enzimática no fígado. Dependendo do fármaco, pode ocorrer
aumento ou diminuição nas taxas de metabolização.

Segundo Wells et al. (2016), o volume plasmático da gestante, o débito cardíaco e a taxa de filtração
glomerular aumentam cerca de 30% ou mais. Isso implica redução da concentração plasmática de
fármacos eliminados pelos rins.
58
FARMACOTERAPIA

Como a concentração de albumina estará reduzida, observa-se aumento nos volumes de distribuição
de fármacos com alta taxa de ligação às proteínas plasmáticas. Entretanto não são observadas alterações
significativas na fração livre do fármaco no sangue, pois a fração não ligada será rapidamente eliminada.

Mas, um ponto considerado de extrema importância e que limita expressivamente o número


de fármacos que podem ser utilizados durante a gestação é a barreira placentária. Esta apresenta
permeabilidade seletiva e, dessa forma, os fármacos lipofílicos podem atravessar com mais facilidade
se comparados com os fármacos de natureza hidrofílica. O tamanho da molécula também é um fator
importante quanto à possibilidade de atravessar a barreira placentária.

Em função da imaturidade dos sistemas, do feto, de depuração e da distribuição diferenciada,


observam-se diferenças significativas no comportamento dos fármacos. No feto, os fármacos podem
exercer efeitos diretos em órgãos ou tecidos em que ocorrem a interação fármaco-receptor, assim como
influenciar a circulação placentária ou os sistemas enzimáticos responsáveis por processos vitais.

Como resultado disso, podem ser observados defeitos letais, levando ao aborto, defeitos teratológicos
(morfológicos, bioquímicos, fisiológicos e comportamentais) e defeitos não teratológicos, cuja natureza
é diversa e o aparecimento pode ser precoce ou tardio.

Durante a gravidez é comum que a gestante precise se submeter a um tratamento medicamentoso,


seja por uma condição aguda, seja por uma condição crônica, com a demanda de administração de
um ou mais fármacos. Nesse contexto, é fundamental avaliar criteriosamente a real necessidade da
terapêutica medicamentosa, e sua escolha deve considerar a seleção dos fármacos que ofereçam maior
segurança para a gestante e para o feto.

São utilizadas classificações de risco que os fármacos oferecem durante a gestação. Entretanto tais
classificações são incompletas, pois não atentam a condições como dose, via de administração, duração
do tratamento e fatores relacionados às características particulares da gestante, seu histórico familiar
e seu estado de saúde.

O quadro 8 mostra as categorias de risco para o aparecimento de defeitos congênitos da Food


and Drug Administration (FDA), agência reguladora vinculada ao Departamento de Saúde dos Estados
Unidos. Em 2014, a FDA atualizou a regra para colocação de informações nas bulas dos medicamentos,
informando profissionais de saúde e pacientes sobre os riscos e benefícios no uso dos medicamentos.

Considerando a classificação de risco gestacional da FDA, é possível observar que os fármacos


classificados nas categorias A e B podem ser administrados em gestantes.

Os pertencentes à categoria C podem ser administrados apenas se os benefícios superarem os riscos


de utilização. Fármacos na categoria D podem ser empregados em situações estritamente necessárias.

Finalmente, no caso dos fármacos da categoria X, há indicação de que os riscos superam qualquer
benefício, são fármacos que não devem ser utilizados em gestantes ou em mulheres em idade fértil.

59
Unidade I

Quadro 8 – Categorias de risco gestacional conforme a FDA

Estudos controlados em mulheres não demonstraram risco para o feto no primeiro trimestre
Categoria A de gestação, e não há evidência de risco em trimestres posteriores. A possibilidade de dano
fetal parece remota
Estudos de reprodução animal não demonstraram risco fetal, mas inexiste estudo controlado
Categoria B em mulheres grávidas; ou estudos de reprodução animal mostraram algum efeito adverso
no feto (que não seja diminuição de fertilidade), não confirmado em estudos controlados em
mulheres durante o primeiro trimestre (e não há evidência de risco em trimestres posteriores)
Estudos em animais demonstraram efeitos adversos no feto (teratogenia, morte fetal ou
Categoria C outro) e não há estudos controlados em mulheres; ou estudos em mulheres e animais não
estão disponíveis. Esses fármacos só devem ser administrados se o benefício justificar o risco
potencial para o feto
Há evidência positiva de risco fetal humano, mas os benefícios de uso em mulheres grávidas
Categoria D podem justificar o uso a despeito do risco (p. ex., se o fármaco é necessário em uma situação
de risco à vida para uma doença grave, para a qual medicamentos mais seguros não podem
ser usados ou não são eficazes)
Estudos em animais e seres humanos demonstraram anomalias fetais ou há evidência de
Categoria X risco fetal baseada em experiências em humanos, ou ambos, e o risco de uso do fármaco em
mulheres grávidas está claramente acima do possível benefício. O fármaco é contraindicado
em mulheres que estejam ou possam ficar grávidas

Adaptado de: Briggs e Freeman (2014 apud FUCHS, 2017, p. 772).

Assim, como a gestação é considerada uma condição de alto risco, é fundamental uma avaliação
criteriosa e cautelosa acerca do uso de medicamentos nessa fase. Assim, farmacoterapia racional durante
a gestação deve levar em consideração a natureza do fármaco, esquema posológico e fase da gravidez.

4.3.2 Contraceptivos orais

Os contraceptivos hormonais (ou anticoncepcionais) são utilizados desde o final da década de 1950,
quando foi lançado o primeiro produto no mercado norte-americano. Atualmente, são amplamente
empregados e considerados um método seguro, eficaz e reversível. E não só para prevenir a gravidez:
também são empregados em diversas condições, como dismenorreia, TRH, síndrome pré-menstrual,
menorragia, acne, hirsutismo e mastalgia.

Quando usados corretamente, apresentam eficácia superior a 99% na contracepção.

Há diversos métodos contraceptivos atualmente disponíveis, e são classificados como irreversíveis


e reversíveis. Como métodos irreversíveis, podemos citar a ligadura das trompas e a vasectomia. Os
métodos reversíveis são:

• Contracepção hormonal: hormônios combinados, minipílula (apenas progestogênio, como o


desogestrel), anticoncepcionais injetáveis.

• Métodos de barreira: preservativo, diafragma, capuz cervical, espermicidas.

• Métodos “naturais”: ritmo (Ogino-Knaus, tabelinha), muco cervical, coito interrompido, ducha
vaginal e método sintotérmico (medição da temperatura basal).
60
FARMACOTERAPIA

Os contraceptivos hormonais agem de diversas formas, impedindo a liberação do óvulo pelo ovário,
e promovem o espessamento do muco cervical, o que dificulta a chegada do espermatozoide ao útero.
Estão disponíveis em diversas formas de administração, e cada uma delas apresenta vantagens e
desvantagens que devem ser discutidas entre a paciente e seu médico.
Também existem diversos fatores que devem ser considerados na escolha do método e do hormônio
(ou combinações de hormônios) que será empregado.
Em suma, os métodos mais comuns são: “pílula” (administração oral), anel vaginal, adesivos
transdérmicos, injetáveis e implantes. Aqui trataremos dos anticoncepcionais orais.
Anticoncepcionais orais combinados
São associações de hormônios sintéticos (como etinilestradiol) e progestogênios (como desogestrel,
gestodeno, levonorgestrel, ciproterona, drospirenona, norgestrel, noretisterona, linestrenol e clormadinona).

São classificados conforme a concentração de hormônios nos comprimidos da cartela:

• Monofásicos: todos os comprimidos da cartela têm a mesma concentração de hormônio.

• Bifásicos: há duas concentrações de hormônio nos comprimidos da cartela.

• Trifásicos: os comprimidos apresentam três concentrações diferentes.

Outra classificação existente é por geração. Nesta, leva-se em consideração o momento em que
o contraceptivo foi lançado no mercado, a dose de etinilestradiol e qual o progestogênio presente.
Observe o quadro.

Quadro 9 – Classificação dos anticoncepcionais orais por geração

Primeira geração AO com 50 µg ou mais de etinilestradiol


Segunda geração AO com 30 ou 35 µg de etinilestradiol, associado a levonorgestrel ou norgestrel

Terceira geração AO com 30 µg ou menos de etinilestradiol, associado a desogestrel, gestodeno ou


norgestimato
Acetato de ciproterona e drospirenona não são classificados por gerações
AO: anticoncepcional oral

Adaptado de: Fuchs e Wannmacher (2015, p. 1041).

Atualmente, os anticoncepcionais orais monofásicos e com baixas doses de estrogênios e combinados


com levonorgestrel são os considerados de escolha.

Apesar dos inúmeros benefícios, é importante destacar os riscos relacionados ao uso dos
anticoncepcionais combinados.

61
Unidade I

No caso de mulheres consideradas saudáveis, os riscos de complicações como doença


cardiovascular e cerebrovascular relacionadas ao uso de hormônios são baixos. Entretanto o
risco cardiovascular aumenta em mulheres com fatores de risco e hábitos de vida associados como
hipertensão, dislipidemia, diabetes, tabagismo, obesidade, sedentarismo. O tempo de utilização e a dose
também são fatores a serem considerados.

As reações adversas observadas têm relação direta com o hormônio em questão. Entre as reações
relacionadas aos estrogênios podemos citar: cefaleia, náusea, vômito, irritação, cãibras e flatulência. Já
entre as relacionadas ao progestogênio observam-se: depressão, alteração da libido, acne, fadiga, rash
cutâneo e ganho de peso.

As contraindicações são diversas e devem ser consideradas com muita atenção e cuidado. Os
estrogênios não devem ser administrados em pacientes portadoras de neoplasias estrogênio-dependentes,
como o carcinoma de endométrio, ou em pacientes com carcinoma de mama ou que apresentem alto
risco de desenvolver o câncer de mama. Devem ser evitados em pacientes com sangramento genital não
diagnosticado, distúrbios tromboembolíticos e hepatopatias. Com pacientes fumantes o uso deve ser
extremamente cauteloso — de preferência, deve ser evitado em fumantes compulsivas, com consumo
elevado de cigarros e conforme avança a idade (o risco é ainda maior em mulheres com mais de 35 anos).

Entretanto cabe destacar alguns benefícios relacionados ao uso de contraceptivos orais, como
redução do volume e do tempo de sangramento menstrual, redução da dismenorreia, melhora nos
quadros de acne e hirsutismo, redução no risco de ocorrência de câncer de ovário e endométrio,
diminuição ou controle dos sintomas do climatério. Esse último foi tratado na seção “Terapia de
reposição hormonal (TRH)”.

Anticoncepção de emergência

Também conhecida como “pílula do dia seguinte”, é utilizada com o intuito de prevenir a gravidez
após uma relação sexual sem proteção, uso inadequado ou incorreto de métodos anticoncepcionais ou
numa situação em que houve sexo sem consentimento.

Apresenta alta eficácia quando utilizada até 72 horas após a relação sexual sem proteção, pois o
método não interrompe a gravidez após a implantação do óvulo fecundado no útero.

A “pílula do dia seguinte” está disponível em duas apresentações: levonorgestrel — 2 comprimidos


de 0,75 mg e 1 comprimido de 1,5 mg.

Recomenda-se, no caso da apresentação de levonorgestrel 0,75 mg, tomar o primeiro comprimido o


mais rápido possível e antes das 72 horas após a relação sexual sem proteção, e o segundo comprimido
12 horas após a primeira dose. No caso do levonorgestrel 1,5 mg, tomar o comprimido o mais rápido
possível após a relação sexual desprotegida, preferencialmente, em até 72 horas após a relação sexual
sem proteção. Ambas as formulações podem ser utilizadas até 5 dias após a relação sexual, mas as taxas
de sucesso diminuem.

62
FARMACOTERAPIA

Na tabela 3 estão elencados os anticoncepcionais disponíveis no Brasil.


Tabela 3 – Hormônios e concentrações de anticoncepcionais
orais disponíveis no Brasil

Estrogênios (µg) Progestogênios (mg) Apresentação


Monofásicos com 50 µg
EE 50 Linestrenol: 1 Combinado 21 cp ativos e 7 placebo
EE 50 Norgestrel: 0,50 Combinado 21 cp
EE 50 Noretindrona: 0,25 Combinado 21 cp
EE 50 Norgestrel: 0,25 Combinado 21 cp
Monofásicos com 37,5 ou 35 µg
EE 37,5 Linestrenol: 0,75 Combinado 22 cp
EE 35 Ciproterona: 2 Combinado 21 cp
Monofásicos com 30 µg
EE 30 Levonorgestrel: 0,25 Combinado 21 cp
EE 30 Gestodeno: 0,075 Combinado 21 cp
EE 30 Desogestrel: 0,15 Combinado 21 cp
EE 30 Levonorgestrel: 0,15 Combinado 21 cp
EE 30 Drospirenona: 3 Combinado 21 cp
Monofásicos com 20 µg
EE 20 Gestodeno: 0,075 Combinado 21 cp
EE 20 Desogestrel: 0,15 Combinado 21 cp
Monofásico com 15 µg
EE 15 Gestodeno: 0,06 Combinado 21 cp
Orais progestogênicos (minipílula)
Desogestrel: 0,075 Uso contínuo
Linestrenol: 0,5 Uso contínuo
Noretisterona: 0,35 Microdose 35 cp
Orais bifásicos
EE 40 (7 cp) Desogestrel: 0,025
Combinado 22 cp
EE 30 (15 cp) Desogestrel: 0,125
Orais trifásicos
EE 30 (6 cp) Levonorgestrel: 0,05
EE 40 (5 cp) Levonorgestrel: 0,075 Combinado 21 cp ativos
EE 30 (10 cp) Levonorgestrel: 0,125
EE 35 (7 cp) Noretisterona: 0,5
EE 35 (7 cp) Noretisterona: 0,75 Combinado 21 cp ativos
EE 35 (7 cp) Noretisterona: 1
cp: comprimido; EE: etinilestradiol

Adaptada de: Fuchs e Wannmacher (2015, p. 1042).

63
Unidade I

4.3.3 Terapia de reposição hormonal (TRH)

A menopausa marca o momento em que ocorre o último ciclo menstrual — por volta dos 50 anos de
idade para a maioria das mulheres, podendo variar em função de diversos fatores, incluindo a menopausa
induzida cirurgicamente.

Contudo, muito antes dessa data tem início a diminuição da função ovariana. Esse período que
antecede o último ciclo é denominado climatério e caracteriza-se por uma transição entre a fase
reprodutiva (fértil) e a não reprodutiva.

De maneira geral, observa-se que a função ovariana começa a diminuir gradativamente por volta dos
35 aos 40 anos de idade. Nessa fase, o ovário responde menos às gonadotrofinas hipofisárias, implicando
a queda das taxas dos hormônios femininos — os estrogênios e a progesterona. Consequentemente,
observa-se o aumento dos hormônios folículo-estimulante e luteinizante.

Essas alterações hormonais levam a sintomas típicos desse período. Podemos citar a irregularidade
do ciclo menstrual, ciclos anovulatórios (em que não há ovulação), fogachos (sensação de calor na
face, pescoço e tronco, rubor e mal-estar), alterações de humor, perda da libido, ressecamento vaginal,
infecções do trato urinário. Além desses sintomas, a queda da função ovariana e a relação direta com o
climatério, temos a osteoporose e a cardiomiopatia isquêmica.

Dessa maneira, a TRH baseia-se na administração de estrogênios e progestogênios, isoladamente ou


combinados, com o objetivo de proporcionar alívio dos sintomas relacionados ao período da menopausa
(SILVA et al., 2019). A ideia é mimetizar o comportamento dos hormônios endógenos, embora sejam
observadas controvérsias sobre as vantagens e desvantagens, e a recomendação fica a critério do
profissional que acompanha a mulher.

Entretanto a indicação dessa reposição deve ser extremamente criteriosa. Segundo Silva et al. (2019),
o uso prolongado tem sido amplamente discutido e analisado com base em muitas informações
desencontradas, o que levanta diversas questões sobre os reais benefícios e eficácia da TRH, e gera
dúvidas e insegurança a todos os envolvidos. Diante desse cenário, fica evidente a necessidade de
estudos relacionados ao tema.

À medida que as pesquisas e o conhecimento sobre o tema avançam, tem sido possível correlacionar
a sintomatologia à qualidade de vida da população feminina na menopausa — ou seja, há relação
com outros fatores não apenas associados à diminuição de estrogênio, mas associados ao processo de
senescência (envelhecimento), bem como fatores sociais e psicológicos (SOBRAC, 2018).

Da mesma forma que oferece uma série de benefícios, é importante direcionar a atenção também
aos riscos inerentes ao processo. Assim, a indicação da TRH, além de criteriosa, deve ser individualizada,
por tempo limitado e com administração da menor dose que proporcione alívio aos sintomas.

A prática clínica aponta para resultados positivos em termos de controle de fogachos (ondas de calor),
na lubrificação vaginal, disposição, depressão climatérica, entre outros. Contudo, não há indicação para
64
FARMACOTERAPIA

prevenção de doença cardiovascular; além disso, é preciso ter cuidado com os casos de osteoporose, pois
existem outras alternativas para sua prevenção e seu tratamento.

Cabe destacar que a terapia estrogênica oral aumenta o risco de trombose venosa e embolia
pulmonar. Outro risco que já está estabelecido é o de câncer de mama, principalmente em mulheres com
histórico pessoal ou familiar. Dados evidenciam que a reposição feita com estrogênio por um período de
cinco anos ou menos não parece aumentar o risco de câncer de mama; contudo, estudos apontam para
aumento desse risco em esquemas mantidos por mais de cinco anos com a TRH combinada, e tem-se
observado riscos aumentados de acidente vascular encefálico (AVE) em pacientes sob TRH combinada
(RAMOS; GUIMARÃES, 2010).

Dessa maneira, a TRH deve ser criteriosamente analisada, ponderando-se cuidadosamente as


vantagens e desvantagens em sua instituição. A segurança da mulher, nesse caso, é prioritária. Contudo,
é fundamental avaliar conjuntamente com a paciente suas necessidades e expectativas, pensando no
impacto da TRH na qualidade de vida da mulher, uma vez que a menopausa é um período fortemente
marcante não apenas em termos fisiológicos, mas também psicológicos, com impacto em seu bem-estar
e sua autoestima.

Atualmente, o mercado farmacêutico oferece uma série de substâncias, combinações, formas


farmacêuticas, esquemas de reposição hormonal e dispositivos. Os mais utilizados são o estradiol
e os estrogênios equinos conjugados. Entre os progestogênios, a medroxiprogesterona é a mais
amplamente empregada.

O modo de administração é variado, atendendo, assim, às mais variadas necessidades de cada


mulher. Nesse sentido, cabe destacar alguns pontos fundamentais na escolha da forma farmacêutica
de administração.

A via vaginal é preferencialmente utilizada em mulheres com queixas de natureza urogenital.

Os adesivos representam uma forma de aplicação confortável e prática, pois permite a liberação da
dose de maneira controlada através da pele e mantém concentrações plasmáticas estáveis durante o
período de liberação do fármaco pelo adesivo. Outra vantagem que cabe ressaltar refere-se à comodidade
posológica, uma vez que evita esquecimentos, garantindo a administração diária no mesmo horário.

Os adesivos devem ser aplicados em áreas que permitam sua completa aderência, sem a formação de
dobras ou rugas. Assim, as áreas preferenciais de aplicação são o abdome e as nádegas, e recomenda-se
evitar a aplicação nas mamas, bem como fazer um esquema de rodízio entre as regiões de aplicação.

Geralmente, a via oral é uma das formas mais utilizadas. Esta costuma ser a escolha preferencial no
caso de mulheres com hipercolesterolemia; contudo, deve ser evitada em casos de mulheres com altas
taxas de triglicerídeos, quando recomenda-se escolher outra via. No caso de mulheres hipertensas e que
apresentem risco de trombose, também se dá preferência a outras vias, como parenteral, transdérmica
(adesivo), entre outras.

65
Unidade I

As reações adversas devem ser observadas com atenção, pois variam conforme o hormônio empregado.
É preciso analisá-las e manejá-las de acordo com os relatos da paciente, e devem ser continuamente
monitoradas. Veja a seguir as reações mais comuns:

• Estrogênios: náusea, vômito, anorexia, diarreia, colestase, colelitíase, hepatite, pancreatite, cefaleia,
enxaqueca, edema, trombose venosa, hipertensão, mamas sensíveis, sangramento, alterações na
libido, depressão, ansiedade, alterações de peso. O risco de câncer de mama aumenta em terapias
de 5 a 10 anos ou mais.

• Progestogênios: insônia, sonolência, tontura, depressão, cefaleia, fadiga, edema, anorexia,


tromboembolismo, nervosismo, náusea, fraqueza muscular, colestase, intolerância à glicose,
hirsutismo, alteração de peso, sangramento, alopecia.

Como qualquer outro fármaco, as interações medicamentosas deverão ser consideradas. Em


consultas em geral, a paciente deve sempre informar à equipe médica caso esteja sob TRH e qual tipo
ou combinação de hormônios está recebendo.

Os estrogênios podem diminuir a concentração sérica de barbitúricos, fenitoína, carbamazepina,


primidona, cefalotina, cefalexina, tetraciclinas, sulfas, ampicilina e rifampicina, e levam a um aumento
dos efeitos dos corticoides.

No caso dos progestogênios, a griseofulvina e acitretina podem reduzir os efeitos do hormônio. Os


fármacos indutores enzimáticos que podem diminuir os níveis plasmáticos dos progestogênios são a
carbamazepina, fenitoína, fenobarbital, rifampicina e nevirapina.

A paciente sob TRH deverá ser acompanhada continuamente por meio de exames ginecológicos de rotina
completos, inclusive mamografia. Em geral, não são necessários exames laboratoriais de dosagem hormonal,
pois o controle é realizado clinicamente, e a paciente estará com aporte de hormônios exógenos.

O quadro a seguir apresenta os principais hormônios utilizados na TRH e as apresentações disponíveis


no Brasil.

Quadro 10 – Estrogênios, progestogênios e combinações disponíveis

Estrogênios Apresentações

Estradiol Spray nasal, adesivos transdérmicos, gel para a pele,


injetável*, comprimidos

Estriol Comprimidos, injetável*, creme vaginal

Estrogênio conjugado Drágea, comprimido, creme vaginal

Promestrieno Comprimidos vaginais, creme vaginal

Valerato de estradiol Comprimidos

66
FARMACOTERAPIA

Progestogênios Apresentações
Didrogesterona Comprimidos
Medroxiprogesterona Comprimidos
Nomegestrol Comprimidos
Noretisterona Comprimidos
Progesterona Creme vaginal
Progesterona natural micronizada Comprimidos
Tibolona Comprimidos
Associações de hormônios Apresentações
Estradiol + didrogesterona Comprimidos
Estradiol + drospirenona Comprimidos
Estradiol + gestodeno Comprimidos
Estradiol + noretisterona Comprimidos, adesivos transdérmicos
Estradiol + norgestimato Comprimidos
Estradiol + trimegestona Drágeas
Estrogênios conjugados + medroxiprogesterona Drágeas, comprimidos
Valerato de estradiol + ciproterona Drágeas, comprimidos
Valerato de estradiol + hidroxiprogesterona Injetável*
Valerato de estradiol + levonorgestrel Drágeas
Valerato de estradiol + medroxiprogesterona Comprimidos
Valerato de estradiol + noretisterona Comprimidos
* Uso intramuscular

Adaptado de: Ramos e Guimarães (2010, p. 379-381).

Saiba mais

Conheça o site da Associação Brasileira de Climatério (Sobrac). Nele


você encontrará diversas publicações atualizadas sobre o tema, inclusive o
Consenso Brasileiro de Terapêutica Hormonal da Menopausa, de 2018.

Disponível em: https://cutt.ly/0UHRYMt. Acesso em: 3 jan. 2022.

67
Unidade I

Resumo

Nesta unidade, vimos aspectos fundamentais pertinentes ao uso racional


dos medicamentos.

Para tanto, foram abordados elementos relacionados a farmacologia


e farmacoterapia, dando ênfase às interações medicamentosas e
considerando que o fármaco administrado isoladamente promove
determinado efeito, mas, quando administrado em associação a outros
fármacos ou substâncias, pode ter seu comportamento farmacocinético
e/ou farmacodinâmico modificado.

Isso se deve ao fato de participarem conjuntamente de processos cinéticos,


como absorção, distribuição, metabolização e eliminação. Dessa maneira,
pode ocorrer a interferência de um fármaco no comportamento do outro,
levando a resultados diferentes em termos de resposta farmacológica, a
depender da interação que esteja ocorrendo.

Assim, ao se conhecer os tipos, a classificação e as principais interações


medicamentosas, é possível desenvolver o planejamento e o seguimento
farmacoterapêutico de modo racional e seguro.

No contexto do acompanhamento e seguimento farmacoterapêutico,


vimos alguns aspectos da farmacovigilância.

A farmacovigilância é essencial para o monitoramento do uso e do


comportamento dos fármacos na prática clínica. Embora os medicamentos
comercializados estejam devidamente aprovados pelas autoridades
sanitárias e tenham sido submetidos, durante seu desenvolvimento, a
criteriosos ensaios pré-clínicos e clínicos, os estudos pós-comercialização
são de fundamental importância para entendermos o real comportamento
do fármaco na população em geral e em escala global. Observa-se,
então, não apenas o comportamento farmacológico do fármaco, mas
principalmente as reações e os eventos adversos que ocorrem na vigência
do tratamento farmacológico.

Assim, a farmacovigilância tem por objetivo uma série de ações relacionadas


a detecção, avaliação, compreensão e prevenção de reações adversas e/ou
problemas relacionados ao uso de medicamentos.

68
FARMACOTERAPIA

As informações geradas a partir dos programas de farmacovigilância


permitem o acompanhamento de problemas relacionados ao uso de
medicamentos, mas são também uma garantia do uso seguro.

Para melhor compreender a farmacovigilância, vimos os métodos


empregados nessa área, alguns aspectos da pesquisa clínica e as reações
adversas aos medicamentos. Nesse contexto, fica evidente a importância
do monitoramento do comportamento dos fármacos por meio dessa
importante ferramenta de vigilância contínua.

Ao estudarmos aspectos relacionados à farmacoterapia voltada aos


grupos-alvos, podemos observar as particularidades próprias desses grupos.

Abordamos a farmacoterapia no idosos; uma vez que tem havido


um crescimento dessa população, devido ao aumento da expectativa de
vida, é fundamental a compreensão das alterações farmacocinéticas e
farmacodinâmicas próprias da senescência, uma vez que o envelhecimento
também altera o comportamento dos fármacos.

Os idosos, além de comorbidades próprias da idade, apresentam


alterações na distribuição da massa magra, no trânsito intestinal,
na distribuição da água corporal, nos processos de metabolização e
eliminação. Tais aspectos provocam alterações no comportamento cinético
dos fármacos, exigindo, assim, um planejamento adequado da terapia
medicamentosa — principalmente no caso da polifarmácia.

As alterações farmacodinâmicas são menos frequentes se comparadas


às farmacocinéticas, mas também são importantes: observa-se alterações
na quantidade e qualidade funcional dos receptores, os alvos moleculares
dos fármacos, o que interfere na resposta farmacológica do fármaco.

Observa-se também mudanças na permeabilidade seletiva da barreira


hematoencefálica, e isso afeta os fármacos que agem no sistema nervoso
central, pois alguns fármacos podem alcançar concentrações maiores
no cérebro dos idosos, exigindo atenção e cuidado ao prescrevê-los e
planejamento adequado do esquema posológico.

Um ponto importante é a recomendação de se considerar os cinco “is”


da geriatria ao prescrever ao idoso. Essa abordagem contempla as principais
síndromes que afetam a qualidade de vida e tornam o idoso mais vulnerável
a diversas situações, entre elas cuidados e adesão à farmacoterapia.

69
Unidade I

A farmacoterapia pediátrica também nos apresenta diversos desafios.


Mas, nesse caso, os sistemas e órgãos das crianças estão em fase de
desenvolvimento e amadurecimento, o que interfere nos processos
farmacocinéticos.

No caso das crianças, os desafios são maiores, uma vez que os estudos
clínicos nessa faixa etária são restritos. Dessa maneira, para garantir a
farmacoterapia pediátrica segura, é fundamental considerar o processo de
amadurecimento de cada sistema.

Já no caso das gestantes, é preciso dedicar atenção especial à saúde do


feto. Embora a gestante sofra algumas alterações fisiológicas próprias da
gestação, a maior preocupação com a farmacoterapia tem relação com a
possibilidade de o fármaco afetar o feto ao atravessar a barreira placentária.

Dessa maneira, o uso de fármacos durante a gravidez apresenta uma


série de restrições para garantir a segurança do feto. Além disso, a prescrição
de fármacos durante a gestação deve considerar cuidadosamente os riscos
e benefícios do tratamento medicamentoso.

Ao final da unidade, tratamos ainda de terapias importantes para


a saúde da mulher, abordando a contracepção e a TRH. Essa última,
apesar de controversa em função dos riscos inerentes ao uso de
hormônios, mostra‑se uma relevante ferramenta no controle das
manifestações próprias do climatério, proporcionando melhor qualidade
de vida à mulher nessa fase.

70
FARMACOTERAPIA

Exercícios

Questão 1. O perfil farmacocinético é a representação gráfica dos fenômenos de absorção,


distribuição, biotransformação e excreção de fármacos — administrados por diferentes vias — em
relação ao tempo.

Observe o gráfico a seguir, que mostra o perfil farmacocinético dos fármacos A, B, C e D, e assinale
a alternativa correta.

A
Concentração plasmática

B
do fármaco

Tempo

Figura 14

Adaptado de: https://cutt.ly/TUCg08y. Acesso em: 2 dez. 2021.

A) O fármaco A foi administrado por infusão intravenosa contínua.

B) Os fármacos B e C apresentam a mesma biodisponibilidade.

C) O perfil do fármaco D é compatível com a administração em adesivo transdérmico do tipo matricial.

D) O tempo de meia-vida plasmática é igual para os quatro fármacos, pois esse parâmetro não sofre
influência da via de administração.

E) O fármaco B foi administrado a partir de comprimido revestido gastrorresistente.

Resposta correta: alternativa C.

71
Unidade I

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: o fármaco A foi administrado em bolus, ou seja, toda a dose foi injetada diretamente na
circulação sistêmica de uma única vez. Essa conclusão pode ser tomada a partir da observação do pico
de concentração plasmática, que é atingido no momento da administração (no tempo zero).

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: a biodisponibilidade é a fração do fármaco inalterado que atinge a circulação sistêmica.


Ela pode ser calculada a partir da área sob a curva (AUC, ou area under the curve), que é notadamente
menor para o fármaco C.

C) Alternativa correta.

Justificativa: nos adesivos transdérmicos do tipo matricial, o fármaco é liberado gradativamente de


uma matriz. Por conta disso, a absorção através da pele ocorre de maneira uniforme e constante, o que
resulta em concentração plasmática relativamente inalterada ao longo do tempo.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: o tempo de meia-vida plasmática é o tempo necessário para que a concentração


do fármaco no plasma caia pela metade em relação ao valor do pico de concentração plasmática.
Ao analisar o gráfico, percebemos que os dois únicos fármacos que apresentam tempo de meia-vida
plasmática semelhante são o B e o C. Além disso, o tempo de meia-vida plasmática sofre influência da
via de administração.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: o perfil compatível com administração a partir de comprimido gastrorresistente é o


do fármaco C. Note que não há absorção durante o período em que o comprimido permanece no
estômago, o que corresponde aos três primeiros pontos da curva.

72
FARMACOTERAPIA

Questão 2. O processo de envelhecimento é acompanhado por alterações fisiológicas que tornam


os idosos mais vulneráveis aos efeitos prejudiciais dos fármacos. De fato, alterações importantes na
farmacocinética de uma série de substâncias são observadas em indivíduos que alcançaram a terceira
idade. Some-se a isso a alta prevalência da polifarmácia nessa população e a maior probabilidade de
descumprimento do esquema terapêutico.

Com relação aos parâmetros farmacocinéticos em idosos, analise as afirmativas:

I – Com a idade, a velocidade de biotransformação diminui. Portanto é necessário aumentar a


dosagem ou diminuir o intervalo entre as doses da maioria dos medicamentos.

II – O tempo de meia-vida plasmática de uma série de fármacos é maior nos idosos do que na
população mais jovem.

III – O volume de distribuição de fármacos lipossolúveis diminui com a idade, pois a concentração
plasmática aumenta.

IV – A velocidade de depuração dos fármacos excretados por via urinária diminui com a idade, como
resultado da diminuição da taxa de filtração glomerular.

É correto apenas o que se afirma em:

A) I e II.

B) II e III.

C) III e IV.

D) II e IV.

E) I e III.

Resposta correta: alternativa D.

Análise das afirmativas

I – Afirmativa incorreta.

Justificativa: de fato, a velocidade de biotransformação diminui com a idade, em resposta à


diminuição da perfusão hepática e da redução da atividade das enzimas do citocromo P-450. Como
resultado, observa-se aumento da meia-vida plasmática dos fármacos, o que demanda a diminuição da
dose ou o aumento do intervalo entre as doses, e não o contrário.

73
Unidade I

II – Afirmativa correta.

Justificativa: a diminuição da velocidade de biotransformação e da taxa de filtração glomerular


resultam no aumento da meia-vida plasmática. Lembre-se que a biotransformação visa à formação de
moléculas mais hidrossolúveis, que são excretadas mais rapidamente.

III – Afirmativa incorreta.

Justificativa: com a idade, a proporção relativa de tecido adiposo aumenta e, como consequência, a
concentração plasmática de fármacos lipossolúveis tende a diminuir. Portanto o volume de distribuição
não diminui, mas sim aumenta.

IV – Afirmativa correta.

Justificativa: no idoso, a taxa de filtração glomerular diminui como resultado da perda de


tecido funcional nos rins. Assim, fármacos que são excretados por via renal têm sua velocidade
de excreção diminuída.

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