Livro-Texto - Unidade I
Livro-Texto - Unidade I
Livro-Texto - Unidade I
Formou-se em Física pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (1987) e em Farmácia e Bioquímica pela
Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP) (1999). É mestre em Tecnologia
Nuclear: Aplicações na área de Radiofarmácia pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da USP (Ipen/USP)
desde 2003. É professora adjunta na UNIP desde 2004. Possui experiência na área de farmácia hospitalar e farmácia
clínica, tendo atuado no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (ICr/HCFM‑USP)
e no Hospital Universitário da USP (HU/USP).
CDU 615.03
U514.56 – 22
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permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Unip Interativa
Material Didático
Comissão editorial:
Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
Profa. Dra. Angélica L. Carlini
Profa. Dra. Ronilda Ribeiro
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista
Profa. Deise Alcantara Carreiro
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Leonardo do Carmo
Jaci Albuquerque de Paula
Sumário
Farmacoterapia
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7
Unidade I
1 FARMACOLOGIA CLÍNICA E FARMACOTERAPIA......................................................................................9
1.1 Farmacocinética clínica...................................................................................................................... 11
1.1.1 Farmacocinética........................................................................................................................................11
1.1.2 Modelos compartimentais e modelagem farmacocinética.................................................... 14
1.1.3 Esquemas de administração de fármacos..................................................................................... 18
1.1.4 Esquema posológico............................................................................................................................... 22
1.1.5 Monitoração plasmática de fármacos............................................................................................. 22
2 INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS.............................................................................................................. 24
2.1 Conceito de interação medicamentosa....................................................................................... 24
2.2 Classificação das interações medicamentosas.......................................................................... 26
2.2.1 Interações farmacocinéticas............................................................................................................... 28
2.2.2 Interações farmacodinâmicas............................................................................................................. 31
3 FARMACOVIGILÂNCIA.................................................................................................................................... 32
3.1 Métodos em farmacovigilância....................................................................................................... 33
3.1.1 Vigilância passiva..................................................................................................................................... 34
3.1.2 Vigilância intensiva................................................................................................................................. 34
3.1.3 Estudos epidemiológicos...................................................................................................................... 35
3.2 A pesquisa clínica.................................................................................................................................. 35
3.3 Reações adversas a medicamentos................................................................................................ 38
3.3.1 Classificação das reações adversas................................................................................................... 38
3.4 Prevenção de reações adversas oriundas de interações medicamentosas.................... 41
4 FARMACOTERAPIA EM GRUPOS-ALVOS................................................................................................. 43
4.1 Farmacoterapia em idosos................................................................................................................. 43
4.1.1 O envelhecimento.................................................................................................................................... 43
4.1.2 Alterações fisiológicas no idoso......................................................................................................... 46
4.1.3 Idosos — prescrição de medicamentos........................................................................................... 51
4.2 Farmacoterapia em pediatria........................................................................................................... 53
4.2.1 Principais diferenças em termos de parâmetros cinéticos nas crianças........................... 55
4.2.2 Cálculo de doses em pediatria............................................................................................................ 56
4.3 Gestantes e saúde da mulher........................................................................................................... 57
4.3.1 Farmacoterapia na gravidez................................................................................................................ 58
4.3.2 Contraceptivos orais............................................................................................................................... 60
4.3.3 Terapia de reposição hormonal (TRH).............................................................................................. 64
Unidade II
5 PROFILAXIA E TRATAMENTO DE DOENÇAS TROPICAIS..................................................................... 75
5.1 Doenças tropicais negligenciadas.................................................................................................. 75
5.1.1 Doenças parasitárias e seus antiparasitários................................................................................ 76
5.1.2 Outras doenças tropicais de interesse............................................................................................. 82
6 DOENÇA RENAL E DISTÚRBIOS ELETROLÍTICOS................................................................................... 90
6.1 Doença renal........................................................................................................................................... 90
6.1.1 Nefrite.......................................................................................................................................................... 91
6.1.2 Infecção urinária...................................................................................................................................... 91
6.1.3 Cálculo renal.............................................................................................................................................. 92
6.1.4 Doença renal crônica............................................................................................................................. 93
6.2 Distúrbios eletrolíticos........................................................................................................................ 94
6.2.1 Sódio (Na+).................................................................................................................................................. 95
6.2.2 Potássio (K+)............................................................................................................................................... 96
7 FARMACOTERAPIA DAS DOENÇAS OCULARES E OSTEOARTICULARES...................................... 97
7.1 Doenças oculares................................................................................................................................... 97
7.1.1 Principais doenças oculares................................................................................................................. 98
7.2 Doenças osteoarticulares.................................................................................................................108
7.2.1 Osteoporose.............................................................................................................................................108
7.2.2 Osteoartrite...............................................................................................................................................111
7.2.3 Artrite reumatoide................................................................................................................................. 112
8 ATUALIZAÇÃO EM ANTIBIOTICOTERAPIA – RESISTÊNCIA AOS ANTIMICROBIANOS
E ÀS AFECÇÕES BUCODENTÁRIAS...............................................................................................................115
8.1 Resistência bacteriana......................................................................................................................115
8.2 Afecções bucodentárias....................................................................................................................119
8.2.1 Gengivite.................................................................................................................................................. 120
8.2.2 Periodontite............................................................................................................................................. 120
APRESENTAÇÃO
INTRODUÇÃO
Este livro-texto se inicia com uma discussão sobre a farmacologia clínica, apresentando conceitos
fundamentais de farmacoterapia. Isso é fundamental para que possamos nos familiarizar com a
linguagem, conceitos e ferramentas empregadas na prática clínica do acompanhamento e seguimento
farmacoterapêutico, visando a terapêutica racional e segura.
Além disso, não poderíamos deixar de comentar a farmacovigilância, cujo principal objetivo é a
identificação, avaliação e prevenção de efeitos adversos e/ou outros problemas relacionados ao uso de
medicamentos.
7
De posse desses conceitos, discutiremos sobre doenças e distúrbios importantes à prática clínica,
como a resistência aos antibióticos e a situação atual do uso de antibacterianos frente à resistência
bacteriana, doenças tropicais negligenciadas, parasitárias, distúrbios renais e hidroeletrolíticos, doenças
oculares, osteoarticulares e afecções bucodentárias.
Bom estudo!
8
FARMACOTERAPIA
Unidade I
1 FARMACOLOGIA CLÍNICA E FARMACOTERAPIA
Há muito a humanidade busca recursos eficazes para o alívio de diversas condições que afetam
o organismo, manifestando-se como doenças. Estas não só comprometem a qualidade de vida e a
produtividade, mas podem levar à morte e, inevitavelmente, impactam os sistemas de saúde. Para tanto,
medidas farmacológicas e não farmacológicas têm sido empregadas durante um longo período de forma
empírica. Com o passar do tempo, a ciência e a tecnologia evoluíram e passaram a oferecer tratamentos
e procedimentos mais eficazes, mas também conhecimento e recursos para avaliar e acompanhar os
resultados das terapêuticas empregadas.
A saúde já foi definida de diversas maneiras. Ausência da doença, falta ou perturbação da saúde. Mas
a definição atualmente aceita é muito mais ampla e não separa o indivíduo do meio em que vive. Desde
1948, a Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde como o completo estado de bem‑estar
físico, mental e social (SOUZA E SILVA; SCHRAIBER; MOTA, 2019).
Tendo em mente que a doença pode ser considerada um desequilíbrio entre o ser humano e o
ambiente, a qualidade de vida tem um papel extremamente importante no que se refere à saúde, pois
depende de condições socioambientais adequadas.
Entretanto, como já discutimos, a doença sempre esteve presente e faz parte da história da
humanidade. Inclusive, grandes eventos epidemiológicos e doenças de alto impacto têm impulsionado
o conhecimento humano em busca de melhor qualidade e expectativa de vida.
Desse modo, podemos observar períodos que caracterizam a evolução de uma doença e que
justificam o emprego de tratamentos. Lembrando que diversas condições se resolvem espontaneamente,
sem o emprego de qualquer tipo de manejo.
Entretanto uma parcela significativa das condições fisiopatológicas exige algum tipo de tratamento.
Assim, conhecer a história natural da doença permite entender sua evolução e qual conduta deve ser
adotada em cada fase, considerando tanto condições agudas como crônicas.
A farmacologia clínica é uma área da farmacologia que atua como uma interface fundamental com
a terapêutica na prática clínica.
9
Unidade I
Observe a figura 1, ela mostra detalhadamente a atual estrutura preconizada da farmacologia, suas
correlações e disciplinas afins.
Terapêutica na Medicina
Psicologia Farmácia Biotecnologia Patologia Química
clínica médica veterinária
Farmacocinética/ Farmacologia
metabolismo dos bioquímica
fármacos
Farmacologia
Farmacologia Quimioterapia
molecular
Farmacologia de
sistemas
Farmacologia Farmacologia
Neurofarmacologia cardiovascular gastrointestinal
Farmacologia
Imunofarmacologia respiratória
10
FARMACOTERAPIA
Posto isso, é possível perceber que durante muito tempo falhas terapêuticas, ajustes posológicos
e outros aspectos relacionados à resposta farmacoterapêutica não foram devidamente tratados por
falta de opção.
Lembrete
Portanto a farmacocinética clínica pode prever a utilização desses parâmetros (possibilitando o ajuste
de dose quando necessário) e, de modo mais racional, os aspectos particulares da farmacoterapêutica,
principalmente em pacientes crônicos. A farmacocinética clínica permite maior segurança e eficácia, e
diminui os riscos inerentes ao processo farmacoterapêutico, sobretudo em tratamentos prolongados.
Assim, estudaremos os principais modelos e as principais equações matemáticas que são utilizadas em
diversos esquemas posológicos diante de processos farmacocinéticos. Tais conhecimentos e ferramentas
propiciam a escolha apropriada de esquemas posológicos adequados.
1.1.1 Farmacocinética
11
Unidade I
Todavia, há uma correlação entre a dose que foi administrada, as concentrações plasmáticas e o sítio
de ação do fármaco.
Para que possamos ter a terapia farmacológica adequada, devemos considerar não só a farmacocinética
e a farmacodinâmica do fármaco, mas também a fase farmacotécnica ou biofarmacêutica, conforme
demonstra a figura 2.
Para que o fármaco atinja concentrações plasmáticas adequadas, antes ele precisa alcançar a
corrente sanguínea.
Assim, qualquer comportamento ou resposta não esperada podem ser compreendidos por meio desse
conhecimento, permitindo, quando necessário, o ajuste do esquema posológico do paciente.
É sabido que o efeito farmacológico proporcionado por um fármaco tem relação direta com sua
concentração no sítio de ação. Entretanto, devido à distribuição e localização dos alvos farmacológicos,
não podemos chegar diretamente a esses pontos para verificar a concentração do fármaco no local de
ação, por serem inacessíveis. Por exemplo, pensemos num fármaco cujo alvo molecular localiza-se no
12
FARMACOTERAPIA
coração: não é possível coletar amostras do músculo cardíaco para verificação das concentrações dessa
substância no sítio de interesse.
É possível determinar a concentração do fármaco no plasma e, a partir desse dado, prever sua
presença no sítio de ação, em concentrações adequadas para que o efeito terapêutico seja observado.
Dessa maneira, qualquer alteração nas concentrações plasmáticas do fármaco leva a alterações nas
concentrações dessa substância nos diversos tecidos e órgãos, incluindo no sítio receptor.
Contudo, é preciso destacar que a distribuição dos fármacos nos diversos territórios tem relação com
características físico-químicas do ambiente biológico e do fármaco, e a necessidade ou não de o fármaco
atravessar barreiras. Mas, em linhas gerais, é possível considerar que, ao aumentar a concentração
plasmática de um fármaco, aumentaremos sua concentração nos tecidos. O mesmo raciocínio é aplicado
ao se observar a diminuição em suas concentrações.
A figura 3 apresenta essa correlação. Nela, é possível observar a relação entre a concentração do
fármaco no compartimento principal (sangue/plasma) e nos tecidos, incluindo-se os alvos moleculares
nos tecidos.
Concentração do fármaco no plasma
Concentração
50
Fármaco excretado
25
Fármaco no tecido
0
0 4 8 12 16
Tempo (unidade arbitrária)
Um ponto importante que deve ser levado em consideração é a via de administração do fármaco. No
caso de fármacos administrados por via oral, é possível notar que a velocidade de absorção será maior
que a velocidade de eliminação. Assim, a concentração plasmática do fármaco aumentará em função
do tempo. Tem-se, então, um valor de concentração máxima no plasma (Cmáx) e o tempo necessário para
atingir a concentração máxima (Tmáx). Após essa fase, os valores relacionados às taxas de eliminação são
predominantes até a eliminação completa do fármaco.
É claro que esse sistema é uma representação simplificada que permite a compreensão e o estudo do
comportamento cinético dos fármacos, uma vez que o sistema biológico vivo é extremamente complexo.
Dessa forma, o modelo de compartimentos oferece uma aproximação da realidade, mas trata-se de
uma importante ferramenta em termos de estudos farmacocinéticos.
14
FARMACOTERAPIA
Administração do
fármaco
Compartimento
central (plasma)
Compartimento
Eliminação/excreção periférico
15
Unidade I
Nesse modelo é possível avaliar a distribuição do fármaco do sangue para os tecidos e também seu
retorno para o compartimento central (principal), o sangue.
Um ponto interessante desse modelo é a possibilidade de se observar a diferença entre tecidos com
mais perfusão sanguínea e tecidos com menos.
Observe a figura 7, nela é possível conferir uma representação gráfica do comportamento cinético
de um fármaco após administração em dose única em bolus.
Observação
C0
Nesse gráfico é possível observar que, no início, tem-se alta concentração do fármaco no
compartimento principal (sangue). Em dado momento observa-se o declínio rápido devido à distribuição
do fármaco no compartimento periférico. Por definição, esse período é designado como “fase alfa”
(distribuição). A duração da fase de distribuição está diretamente relacionada à meia-vida (T1/2)
de distribuição. Assim que se estabelece o equilíbrio entre os compartimentos central e periférico,
a queda da concentração plasmática do fármaco estará ligada à eliminação/excreção da substância.
16
FARMACOTERAPIA
Temos então a chamada “fase beta” (eliminação). Nesse caso, ela é medida pela meia-vida (T1/2)
de eliminação.
É possível observar que, em geral, as concentrações plasmáticas do fármaco caem abaixo do nível
considerado terapêutico justamente nessa fase, pois trata-se de uma fase mais lenta se comparada à
distribuição (FUCHS; WANNMACHER, 2017).
Dessa forma, a partir da curva de concentração plasmática (figura 7), podemos calcular
matematicamente os volumes de distribuição, também denominado volume de distribuição aparente,
nos diversos compartimentos utilizando expressões matemáticas. O volume de distribuição (Vd) estabelece
uma relação entre a quantidade de fármaco no organismo e sua concentração (C) no sangue. O volume
de distribuição pode ser calculado por meio da seguinte expressão:
Também é possível calcular o volume de distribuição nos compartimentos. Assim, temos o volume de
distribuição no compartimento central (Vc). Este pode ser calculado por meio da fórmula:
Dose
Volume de distribuição central =
Concentração inicial
Dose
Volume de distribuição de equilíbrio =
C0
Essa é considerada uma concentração hipotética, por refletir uma distribuição imediata do fármaco.
Na realidade, temos o processo de eliminação ocorrendo concomitantemente com o processo de
distribuição do fármaco. Entretanto esse raciocínio permite “compensar” a perda na concentração do
fármaco durante esse processo.
Depuração = Q . E
A meia-vida de eliminação, que expressa o tempo necessário para reduzir pela metade a quantidade
do fármaco no organismo durante o processo de eliminação, apresenta relação direta e proporcional
com o volume de distribuição de equilíbrio, sendo inversamente proporcional à depuração do fármaco.
Ela pode ser calculada a partir da seguinte expressão:
0,693 . Vd
T1 =
2 (eliminação) depuração
Dose única
Eventualmente, se faz necessária a repetição da dose devido à situação clínica em questão. Entretanto,
diante da necessidade de repetição, é preciso fazer uma estimativa de quanto da dose inicial ainda
permanece no organismo. Para tanto, deve-se considerar que a cada T1/2 (meia-vida), a concentração do
fármaco reduz em 50%.
18
FARMACOTERAPIA
Essa expressão é utilizada considerando a administração por via endovenosa, na qual o fármaco não
passa por absorção. No caso do emprego de outra via, como a oral e outras pelas quais o fármaco passa
pela fase de absorção, devemos levar em consideração a sua biodisponibilidade. A biodisponibilidade
é um termo empregado para expressar a fração do fármaco administrado que alcança a circulação
sistêmica na sua forma inalterada. Nesse caso, utiliza-se a seguinte expressão matemática para o
cálculo da dose:
Onde: f = biodisponibilidade
VAD = volume aparente de distribuição
A administração do fármaco por vias nas quais ocorre absorção exigem, normalmente, doses mais
elevadas, uma vez que o fármaco tem que atravessar barreiras até atingir o compartimento principal.
Cabe destacar que o emprego de fármacos em esquema de dose única deve ser cuidadoso no caso de
fármacos de baixo índice terapêutico, em função do risco de ocorrência de reações adversas e toxicidade.
O índice terapêutico (IT) estabelece uma relação entre a dose letal de um fármaco para 50% dos
indivíduos (DL 50%) e a dose eficaz de um fármaco para 50% dos indivíduos (DE 50%). Observe a
expressão a seguir que apresenta a forma de calcular o IT:
DL 50%
Índice terapêutico (IT) =
DE 50%
Assim, o índice terapêutico indica a margem de segurança no emprego de um fármaco por estabelecer
uma relação entre a dose eficaz e a dose tóxica.
Desse modo, para esses fármacos é interessante optar por outra forma de administração parenteral,
como a infusão lenta ou contínua. Diferentemente da administração em bolus, as infusões lenta e
contínua atenuam o pico plasmático do fármaco, minimizando o risco de toxicidade e reações adversas.
19
Unidade I
Injeção em bolo
Concentração plasmática
Injeção lenta
Com absorção
Tempo
Múltiplas doses
De modo geral, o esquema de administração em múltiplas doses é o mais empregado na prática clínica.
Nesse esquema, observa-se o acúmulo do fármaco de tal maneira que seja alcançado o chamado
“estado de equilíbrio”. No estado de equilíbrio, a quantidade do fármaco que “entra” no organismo é
igual à quantidade de fármaco que “sai”, ou seja, quantidade metabolizada e eliminada.
A concentração que reflete o estado de equilíbrio depende da dose, do intervalo estabelecido entre
as doses e das taxas de eliminação.
f.D
CE =
T . Cl
Onde: f = biodisponibilidade
D = dose
T = intervalo entre as doses
Cl = clearance (depuração)
20
FARMACOTERAPIA
Uma vez que o clearance (depuração) está envolvido no cálculo, é possível fazer ajustes de doses
adequados caso haja alguma alteração na eliminação do fármaco.
A figura 9 mostra uma representação gráfica das relações farmacocinéticas fundamentais para a
administração de múltiplas doses de um fármaco.
Estado de equilíbrio
2
• Atingido depois de cerca de quatro meias-vidas
• O tempo decorrido até o estado de equilíbrio não
depende da dose
CSS
Concentração
1
Concentrações no estado de equilíbrio
• Proporcionais à dose/intervalo entre as doses
• Proporcionais à F/CL
Flutuações
• Proporcionais ao intervalo entre as doses/meia-vida
• Atenuadas pela absorção lenta
0
0 1 2 3 4 5 6
Tempo (múltiplos da meia-vida de eliminação)
CL: clearance; Css: concentração média; F: biodisponibilidade
Infusão contínua
Alguns fármacos são administrados necessariamente por infusão contínua; podemos citar
norepinefrina, epinefrina, dopamina, dobutamina, dentre outros. Esquemas de analgesia e sedação com
midazolam e fentanila também são administrados dessa maneira, para garantir o efeito contínuo de
depressão do sistema nervoso central de forma eficaz e segura.
21
Unidade I
Dose de ataque
O esquema posológico é a expressão usada para descrever como um fármaco será administrado,
levando em conta a dose e a duração do tratamento. Este esquema deve considerar também a meta
farmacoterapêutica.
Observamos que os níveis séricos dos fármacos permitem estimar as concentrações deles no sítio de
ação. Isso permite estabelecer e/ou acompanhar a resposta farmacoterapêutica.
A monitoração plasmática torna-se extremamente útil nos casos em que há suspeita de falha terapêutica
em função de subdosagem, bem como nos casos suspeitos ou confirmados de sobredosagem, ou seja,
doses potencialmente tóxicas. Eventualmente, a monitoração plasmática permite o acompanhamento
das concentrações plasmáticas com o intuito de garantir que as concentrações do fármaco estejam
dentro da faixa terapêutica adequada e segura. Pode ser útil também, no ajuste posológico.
Principalmente no ajuste de doses de fármacos de índice terapêutico estreito, ou seja, que apresentam
baixa margem de segurança.
Essa medida garante que o ajuste de dose não levará as concentrações plasmáticas a níveis tóxicos
ou a níveis subótimos.
22
FARMACOTERAPIA
IV
Tóxico
Concentração plasmática
Potencialmente tóxico
PO
Terapêutico
Subótimo
Tempo
IV: intravenosa; PO: por boca, equivale à via oral (VO)
No caso de fármacos administrados por via oral, a biodisponibilidade é a relação da ASC após a
administração oral e a ASC após administração endovenosa, conforme se observa na figura 11.
ASC oral
Biodisponibilidade = x 100
ASC injetada
Concentração plasmática do fármaco
Fármaco
administrado
por via IV
ASC Fármaco
(injetada) administrado
por via oral
ASC
(oral)
Tempo
Fármaco
administrado
ASC: área sob a curva; IV: intravenosa (o mesmo que endovenosa)
23
Unidade I
A meta farmacoterapêutica deve ser bem estabelecida, de modo que a monitoração plasmática seja
uma ferramenta útil no acompanhamento e seguimento farmacoterapêutico.
O quadro 1 apresenta alguns critérios que podem justificar a monitoração dos níveis séricos dos
fármacos, segundo Fuchs e Wannmacher (2017).
Quadro 1
2 INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS
Como já discutido, o conhecimento das propriedades de um fármaco e sua ação farmacológica são
fundamentais para a farmacoterapêutica racional. Para isso, é preciso considerar a complexidade do
organismo em termos estruturais, físico-químicos e bioquímicos.
Nesse contexto, cabe evidenciar que inúmeras substâncias endógenas e exógenas se relacionam no
ambiente biológico. Portanto, é necessário conhecer todos os aspectos referentes aos fármacos para
se alcançar o sucesso farmacoterapêutico, prever e/ou evitar interações que possam comprometer o
resultado da terapêutica empregada e diminuir riscos potenciais à integridade física do paciente.
O conhecimento das propriedades básicas dos fármacos e de sua ação farmacológica é de fundamental
importância para a realização de uma terapêutica adequada, considerando que o corpo humano é
um sistema complexo formado por uma infinidade de substâncias que, inevitavelmente, entrarão em
contato com os fármacos ingeridos no ambiente biológico.
24
FARMACOTERAPIA
Além disso, é preciso estar ciente da farmacodinâmica dos fármacos envolvidos na terapêutica
para se evitar interações prejudiciais e possíveis efeitos adversos dos fármacos que aumentem os riscos
ao paciente.
De acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) n. 140, de 29 de maio de 2003, da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), temos a seguinte definição de interação medicamentosa:
Quando há uma interação farmacológica entre dois ou mais fármacos, pode ocorrer a interferência
de um dos fármacos sobre os outros, alterando o efeito esperado, qualitativa ou quantitativamente.
Assim, pode-se obter um sinergismo de ação ou um antagonismo (parcial ou total) desses efeitos.
Estudos apontam que pacientes que recebem dois medicamentos apresentam risco de 13% de ter
interações medicamentosas. Em pacientes que recebem quatro medicamentos, esse número passa a
ser de 28%, e em pacientes que recebem sete medicamentos ou mais, o número eleva-se para 82%
(GALLAGHER, 2007 apud RIBEIRO NETO; COSTA JUNIOR; CROZARA, 2017). Tais dados permitem a
percepção do impacto das interações medicamentosas na farmacoterapia.
Entretanto as interações medicamentosas podem apresentar efeitos benéficos para o organismo, e até
mesmo ser utilizadas para aumentar os efeitos terapêuticos ou reduzir a toxicidade de um determinado
fármaco, em função da dose necessária para atingir a resposta terapêutica adequada. Temos, então, a
adição ou a somação dos efeitos.
25
Unidade I
Na adição, a resposta farmacológica é obtida como resultado dos efeitos combinados de cada
fármaco. Nesse caso, os fármacos apresentam o mesmo mecanismo de ação. Por exemplo, podemos
citar a associação de dois anti-inflamatórios não esteroidais (Aines), como o ácido acetilsalicílico e a
dipirona, que apresentam o mesmo mecanismo de ação — ambos são inibidores da ciclo-oxigenase.
No caso da somação, temos a associação de dois fármacos com mecanismos de ação diferentes, mas
que levam ao mesmo efeito farmacológico. Por exemplo, podemos citar a associação de codeína com
paracetamol. A codeína, um opioide, apresenta ação central, enquanto o paracetamol, um inibidor da
ciclo-oxigenase, tem ação predominantemente periférica. Observe que nos dois casos há a combinação
dos efeitos analgésicos dos fármacos associados.
• Interações farmacêuticas:
— São interações físico-químicas que ocorrem “fora” do paciente, pois entre fármacos diferentes
podem ocorrer numerosas incompatibilidades, que levam a reações quando estas são misturadas
em infusão intravenosa, frascos ou seringas, podendo ocasionar a inativação dos fármacos em
questão. Um exemplo é a precipitação da anfotericina B coloidal quando colocada em solução
fisiológica.
• Interações terapêuticas:
26
FARMACOTERAPIA
Gravidade alta A interação pode oferecer ameaça à vida, sendo necessário tratamento ou
intervenção médica para minimizar ou prevenir os efeitos adversos graves
Gravidade moderada A interação pode piorar o quadro clínico do paciente, sendo necessária a
alteração da terapia
A interação pode comprometer os efeitos clínicos esperados. As manifestações
Gravidade baixa podem aumentar a frequência ou a gravidade dos efeitos adversos, mas
geralmente não é necessária a modificação na terapia
Segundo Pivatto Junior, Bernardi e Barros (2010), há outras maneiras de classificar as interações
medicamentosas. São elas:
• Conforme o início:
27
Unidade I
Como pudemos observar, as interações farmacocinéticas ocorrem num ponto do processo cinético
do fármaco no ambiente biológico — ou seja, na absorção, distribuição, metabolização ou excreção.
Durante o processo de absorção de um fármaco administrado por via oral, é possível que ocorra
alteração na velocidade de absorção e, consequentemente, na concentração plasmática de um fármaco
na presença de outros.
Assim, substâncias que alterem as condições físico-químicas do sítio de absorção podem comprometer
a absorção de outros fármacos, quando associados.
Como exemplo, podemos citar o uso de antiácidos, inibidores da bomba de prótons ou bloqueadores
H2, que podem interferir na absorção de fármacos de caráter ácido, que são, preferencialmente,
28
FARMACOTERAPIA
absorvidos no estômago. É o caso do cetoconazol, cuja absorção será reduzida quando associado à
cimetidina, pois o aumento do pH gástrico leva a uma diminuição da absorção do cetoconazol. Outro
exemplo é o hidróxido de magnésio, que reduz a absorção estomacal do pentobarbital, que apresenta
caráter ácido.
Além das condições físico-químicas, temos que considerar a motilidade do trato gastrintestinal.
Assim, o tempo do trânsito pode interferir na absorção dos fármacos. Dependendo da substância
utilizada, podemos ter aumento ou diminuição da motilidade, e o resultado dessa interação dependerá
de quais substâncias estão associadas. Como exemplos, podemos citar a associação de metoclopramida
e paracetamol numa terapêutica combinada. A metoclopramida aumenta a velocidade de esvaziamento
gástrico e, por consequência, aumenta a absorção do paracetamol, que é absorvido predominantemente
no intestino. Outro caso que pode ser observado é o uso de metoclopramida e digoxina, em que o
aumento da velocidade do processo de esvaziamento gástrico leva à redução da absorção da digoxina.
Outro mecanismo digno de nota é a formação de complexos insolúveis. Esse fenômeno não
tem relação com a ação farmacológica dos fármacos envolvidos, mas sim com as características
químicas das substâncias. Nesse caso, dois fármacos interagem um com o outro de tal forma que
ocorre comprometimento e, até mesmo, inibição da absorção dessas substâncias. É o clássico caso da
administração de tetraciclina com leite. Na presença de metais bivalentes — no caso, o cálcio (Ca2+) —,
ocorre a formação de um complexo insolúvel que diminui a absorção de ambos. Outro exemplo é a
ciprofloxacina na presença de cálcio ou ferro, também ocorre a formação de um complexo insolúvel que
reduz a absorção do fármaco e dos metais.
Isso explica por que muitos medicamentos precisam ser administrados em horários distantes das
refeições — por exemplo, uma hora antes ou duas horas depois —, ou esquemas que determinam
intervalos de tempo específicos entre a administração de duas ou mais substâncias.
Entretanto é fundamental que as proporções entre fármaco livre e fármaco ligado às proteínas
plasmáticas devem ser adequadas para que não haja aumento ou diminuição da fração livre do fármaco,
alterando o efeito farmacológico desejado ou aumentando sua toxicidade.
Podemos observar que fármacos distintos podem competir pelas proteínas plasmáticas e, dependendo
da maior ou menor afinidade pelas proteínas, alterar as proporções individuais de fármaco livre e
fármaco ligado à proteína plasmática.
Observe o equilíbrio cinético entre as concentrações de fármaco livre (Flivre), proteína plasmática
(Pplasmática) e fármaco ligado à proteína plasmática (FP).
[ FP ] ↔ [Flivre] + [Pplasmática]
29
Unidade I
Nota-se que fármacos que se ligam extensamente e apresentam baixo volume de distribuição podem
levar ao deslocamento da ligação às proteínas. É o caso, por exemplo, da varfarina ou da fenitoína. A
varfarina, quando utilizada com a fenilbutasona, sofre deslocamento e, por consequência, tem sua
fração livre aumentada; o resultado é o aumento do risco de hemorragia.
A rifampicina, também um indutor enzimático, diminui os níveis séricos dos contraceptivos orais.
Observa-se que a competição pela secreção tubular representa o principal mecanismo em termos de
alterações por interação na eliminação de fármacos.
30
FARMACOTERAPIA
O verapamil inibe a secreção tubular da digoxina; como consequência, ocorre aumento das
concentrações séricas da digoxina, podendo aumentar sua toxicidade. No caso do lítio, sua excreção
estará aumentada na presença de diuréticos osmóticos; já na presença de inibidores da enzima conversora
de angiotensina (ECA) ocorre aumento na reabsorção tubular, com aumento das concentrações
séricas do lítio.
Podem ser consideradas diretas (a interação ocorre no alvo molecular, ou seja, no sítio receptor) e
indiretas (a interação ocorre entre fármacos que apresentam mecanismos de ação distintos). Em geral,
a maioria das interações farmacodinâmicas se dão de maneira indireta.
Nas interações farmacodinâmicas diretas, os fármacos envolvidos estão competindo por determinados
receptores. Um exemplo é a interação entre salbutamol (agonista β2) e os β-bloqueadores não seletivos,
como o propranolol ou timolol.
Cabe considerar, então, que a administração de fármacos com mecanismo de ação e efeitos
farmacológicos semelhantes pode resultar em diversos tipos de respostas. Isso pode ser útil ou deletério
em termos farmacoterapêuticos.
A resposta farmacológica será considerada aditiva quando o efeito da combinação dos fármacos
for igual à soma dos efeitos proporcionados por cada substância, quando comparada com as respostas
proporcionadas pelos fármacos empregados isoladamente, podendo ser terapêutica ou tóxica.
31
Unidade I
Desse modo, os profissionais de saúde precisam conhecer e ter acesso às informações sobre
interações medicamentosas, pois isso permite acompanhar e planejar adequadamente a terapêutica
medicamentosa.
Também é fundamental informar o prescritor sobre o uso concomitante de fármacos que possam
causar problemas clínicos ou ser potencialmente perigosos. O paciente também deve participar
de maneira ativa, relatando todo e qualquer sinal e sintoma que aponte para uma reação adversa.
Outro ponto fundamental é o acompanhamento e seguimento farmacoterapêutico, que propicia uma
intervenção de tal forma que medidas de contenção e controle sejam instituídas com a maior brevidade,
minimizando danos e riscos ao paciente. Mas o planejamento racional permite antever as possíveis
interações, o que proporciona uma farmacoterapia mais segura.
Saiba mais
3 FARMACOVIGILÂNCIA
Segundo a OMS (WHO, 2002), a farmacovigilância tem por objetivo atividades ligadas a detecção,
avaliação, compreensão e prevenção de reações adversas ou outros problemas relacionados ao uso
de medicamentos.
Dessa maneira, a farmacovigilância visa melhorar os cuidados destinados aos pacientes em relação
ao uso de medicamentos, mas também procedimentos médicos e outros aspectos relacionados aos
cuidados à saúde.
32
FARMACOTERAPIA
Mas, para que a farmacovigilância seja efetiva, é fundamental a participação dos profissionais de
saúde. O envolvimento contínuo e ativo desses profissionais, por meio dos mecanismos de notificação
voluntária de suspeita e/ou sinais de reações adversas, garante a dinâmica apropriada dos sistemas
de farmacovigilância. Entretanto, para que seja possível o cumprimento dessa tarefa, é necessário um
sistema de notificações bem estruturado e que permita a análise criteriosas dessas informações.
O Brasil faz parte do PIMM desde 2001, e é representado pelo Centro Nacional de Monitorização de
Medicamentos com sede na Anvisa.
O VigiMed conta com três versões de ferramentas para notificação destinadas a cada tipo de usuário.
Uma versão é dedicada a cidadãos e profissionais liberais de saúde, ou seja, sem vínculo com uma
instituição. Uma segunda versão é voltada a serviços de saúde e a órgãos de vigilância sanitária locais.
A terceira é destinada a detentores de registro dos medicamentos.
Saiba mais
De acordo com a literatura, as práticas em farmacovigilância podem ser realizadas por meio de três
métodos: vigilância passiva, vigilância ativa e estudos epidemiológicos.
33
Unidade I
Esse método consiste, basicamente, nos relatos de casos a partir de notificações espontâneas de
eventos adversos a medicamentos realizadas por profissionais de saúde.
A OMS preconiza esse método por ser de baixo custo, fácil acesso aos sistemas de notificação e os
profissionais notificadores estarem próximos ao evento.
Entretanto o método passivo de farmacovigilância apresenta uma limitação que pode comprometer
o real impacto relacionado às reações adversas — trata-se da subnotificação. Diversos são os motivos que
podem levar à subnotificação, entre eles, podemos destacar: o desinteresse ou a falta de conhecimento
sobre processos de notificação e sobre a importância da notificação, além de dúvidas pessoais quanto à
necessidade ou não de notificar, diante da incerteza sobre a relação de causa e efeito. O profissional
pode sentir-se responsável por prescrever, dispensar ou administrar o medicamento que causou a
reação adversa.
Esse método compreende três técnicas: busca sistemática ou ativa, rastreadores de reações adversas
e sistema de mineração de dados.
34
FARMACOTERAPIA
Essa técnica consiste em utilizar indicadores de eventos-sentinela (eventos graves indesejáveis que
ocorrem em ambientes hospitalares selados e exigem investigação criteriosa).
Observação
Nesse sistema, são aplicados algoritmos capazes de identificar padrões não detectados em bases de
dados e estabelecer correlações entre os parâmetros ou variáveis que estão sendo analisadas.
A OMS dispõe da maior base de dados de relatos de reações adversas a medicamentos, e emprega
essa técnica para poder detectar novos sinais em termos de farmacovigilância.
É importante destacar que a amostra para esses estudos deve ser estatisticamente significativa, de
modo que seja possível extrapolar os resultados para a população geral.
Para que esse método seja bem-sucedido, é necessário estabelecer protocolos clínicos adequados e
criteriosos para acompanhar os pacientes e uma equipe clínica qualificada e capacitada para trabalhar
com essa metodologia.
Embora o método permita estudar apenas um evento adverso, variados fatores de risco podem ser
identificados e avaliados.
35
Unidade I
Nas etapas in vivo são utilizados modelos animais e humanos. A partir das informações previamente
obtidas dos estudos in vitro e in vivo (ainda com modelos animais), e comprovando-se a eficácia e a
segurança, iniciam-se as pesquisas em seres humanos: é a chamada pesquisa clínica. Essa pesquisa é
realizada em algumas fases, conforme expõe a figura 12.
Fase IV
Fase III
Fase II
Fase I
Tolerabilidade
Segurança
Farmacocinética
Eficácia
Fase I
Nessa fase, observamos os primeiros estudos em seres humanos, geralmente realizados em um
número pequeno de voluntários sadios (eventualmente, indivíduos portadores de determinadas
patologias). Esses estudos têm por objetivo estabelecer, preliminarmente, a segurança do fármaco, seu
perfil farmacocinético e, quando for possível, o perfil farmacodinâmico.
36
FARMACOTERAPIA
Os estudos de fase III são realizados em um grupo maior e variado de pacientes voluntários,
portadores da patologia para a qual o medicamento foi desenvolvido. Nessa fase, o objetivo é determinar
o risco/benefício em curto e longo prazo do medicamento e, de forma geral, o valor terapêutico relativo.
Também são avaliadas as reações adversas mais frequentes e características específicas do medicamento
e/ou especialidade farmacêutica (como interações importantes), fatores que podem interferir no efeito
(como idade) etc.
Os estudos realizados nessa fase ocorrem após o medicamento ter sido aprovado, registrado e já
estar sendo comercializado no mercado. Todo e qualquer estudo nessa fase deve seguir os mesmos
preceitos éticos e científicos adotados nas fases anteriores.
Cabe destacar que, após a comercialização de um medicamento, todos os estudos com o objetivo
de estabelecer novas indicações, formas de administração etc. são considerados como estudos de um
novo medicamento.
Assim, sendo o medicamento aprovado nas fases I, II e III da pesquisa clínica, é possível
observar evidências de que o medicamento traz benefícios à população-alvo. Ou seja, as vantagens
farmacoterapêuticas superam os riscos como reações adversas. Assim, o produto recebe o registro do
órgão regulador — que, no Brasil, é a Anvisa — e passa a ser comercializado.
Contudo, por mais bem estruturada e conduzida que seja a pesquisa clínica (estudos clínicos), não é
possível elucidar todos os pontos relacionados a eficácia e segurança.
Devemos lembrar que as fases da pesquisa clínica são conduzidas com um número específico de
sujeitos de pesquisa e com características específicas — ou seja, são grupos controlados. Dessa maneira,
apresentam baixo grau de variabilidade estatística.
Infelizmente, os ensaios de pesquisa clínica não permitem detectar, identificar e compreender todas
as possíveis reações adversas, devido a certas limitações do método, encaradas como desvantagens. Por
exemplo, o período de condução dos ensaios e a exclusão de determinados grupos (como gestantes,
crianças e idosos) que apresentam características fisiológicas particulares e podem interferir em
parâmetros farmacocinéticos e farmacodinâmicos. Tal exclusão leva em conta a exposição não justificada
37
Unidade I
desses grupos a riscos ainda não conhecidos do medicamento. Outro ponto que deve ser considerado
é a polifarmácia (ou polimedicação), que, durante os ensaios clínicos, é extremamente controlada para
minimizar o risco de mascaramento de resultados farmacoterapêuticos ou reações adversas.
Uma vez que o medicamento passa a ser comercializado em escala global, observamos a exposição
do medicamento aos mais diversos grupos humanos e nas mais diversas condições. Passamos, então, a
levar em consideração variabilidade genética, hábitos alimentares, estilos de vida, perfil de prescrição,
condições fisiopatológicas, entre outros fatores. Portanto passamos a atentar também à variabilidade
estatística, devido ao aumento substancial no número de indivíduos expostos ao medicamento.
• erros de medicação.
De acordo com a OMS, as reações adversas aos medicamentos podem ser definidas como
qualquer evento nocivo e não intencional que ocorreu na vigência do uso de medicamentos em
doses normalmente usadas em humanos com finalidade terapêutica, profilática ou diagnóstica (WHO, 1969).
Elas também são conhecidas como efeito indesejável ou doença iatrogênica (iatrogenia). Sobredose
(overdose) e abuso de drogas ilícitas não fazem parte desse conceito, assim como reações indesejáveis
determinadas por falha terapêutica, erros de administração e não adesão ao tratamento.
As reações adversas aos medicamentos têm uma relação direta entre morbidade e mortalidade de
uma população, impactando os serviços de saúde.
Há distintas formas de classificar as reações adversas, mas a classificação mais aceita atualmente e
citada por diversos autores é a proposta por Rawlins e Thompson (1977 apud RAWLINS, 1981).
38
FARMACOTERAPIA
Nessa classificação, podemos observar dois grupos de reações, as do tipo A e as do tipo B, também
chamadas de imprevisíveis.
Nas reações adversas do tipo A, temos uma resposta exacerbada de um determinado fármaco
como resultado de seu mecanismo de ação primário. Em geral, são previsíveis e ocorrem depois da
administração de doses preconizadas do fármaco. Podemos citar como exemplo a hemorragia na
vigência de um tratamento com anticoagulantes.
Ainda como reações do tipo A, temos a resposta farmacológica secundária, que pode ser vista na
manifestação de cefaleia durante o uso de vasodilatadores.
Eventualmente, observa-se a ação do fármaco em outros sítios de ação. É possível verificar isso com
o haloperidol, que pode causar efeito extrapiramidal em alguns pacientes.
A classificação das reações adversas do tipo A também pode levar em consideração as causas das
reações. Temos, então:
• Causas farmacocinéticas: relacionadas aos processos cinéticos que podem interferir nas
concentrações do fármaco e, por consequência, na resposta farmacológica. Parte desse processo
pode estar relacionado a interações medicamentosas ou a características do próprio indivíduo
(polimorfismo genético).
• Causas farmacodinâmicas: ocorrem nos sítios de ação dos fármacos, envolvendo os mecanismos
pelos quais os efeitos farmacológicos se processam. Ou seja, a resposta do alvo ao fármaco é
modificada pela ação de um segundo fármaco, por exemplo, por competição pelo mesmo
receptor específico.
Reações adversas do tipo A podem ser, em geral, controladas com ajustes de dose ou substituição
do fármaco empregado.
As reações adversas classificadas como do tipo B são classificadas como “bizarras”, inesperadas
em relação à ação farmacológica do fármaco. Não são comuns, independem da dose administrada e
ocorrem em alguns indivíduos.
39
Unidade I
Segundo Aronson e Ferner (2003), essa classificação das reações adversas tem sido ampliada de
forma a incluir o tipo C (reações dependentes da dose e do tempo), tipo D (reações tardias), tipo E
(síndromes de retirada) e tipo F (reações que levam à falha terapêutica).
Outra forma de classificar as reações adversas aos medicamentos é segundo a intensidade da reação
adversa. Essa classificação também considera as medidas a serem tomadas em cada caso.
• Leve: quando não requer tratamento específico e não leva à suspensão do fármaco.
• Moderada: quando exige modificação da terapêutica, sem suspensão do fármaco. Pode exigir
tratamento específico.
Como as reações adversas aos medicamentos constituem um dos principais alvos da farmacovigilância,
fica nítida a importância de se conhecer seus mecanismos, classificação, modo de identificação, medidas
preventivas e corretivas, os principais tipos e possível desfecho. O quadro 4 apresenta algumas reações
adversas de interesse em termos de farmacovigilância.
40
FARMACOTERAPIA
Cabe destacar que alguns fármacos podem aumentar o risco de manifestação de reações adversas.
A seguir, podemos observar alguns exemplos de acordo com suas características próprias.
Cabe destacar que o etanol é um indutor enzimático, assim como a nicotina. Dessa forma, essas
substâncias podem interferir no comportamento de outras substâncias e fármacos.
A nicotina, substância ativa presente no tabaco, pode causar interações farmacocinéticas por
interferir na metabolização hepática e na excreção de alguns fármacos, como benzodiazepínicos,
opioides, insulina, bloqueadores H2, nitratos, bloqueadores de canais de Ca2+, furosemida etc. (FRANKEN
et al., 1996).
O processo farmacoterapêutico pode ser considerado de alta complexidade por abarcar uma
série de fatores inerentes ao próprio processo e a todos os envolvidos — isso ao mencionarmos o emprego
de um único fármaco. Contudo, ao considerarmos o uso concomitante de vários fármacos, caso da
polifarmácia, o cenário fica ainda mais complexo, e diversos pontos críticos devem ser observados
pelos profissionais de saúde.
Ao pensar suas prescrições, é fundamental observar as necessidades que atendam a meta terapêutica,
mas também verificar se o paciente já utiliza medicamentos isentos de prescrição, fitoterápicos,
terapêuticas complementares, chás ou, eventualmente, medicamentos “escolhidos” por conta própria.
Isso possibilita uma avaliação melhor e mais segura no momento de prescrever as medicações e de
acompanhar os resultados do tratamento instituído.
41
Unidade I
Na ocorrência de reações inesperadas ou falha terapêutica, de posse dessas informações, será possível
compreender melhor o que está ocorrendo para justificar o problema e, com isso, tomar decisões mais
seguras e racionais.
Segundo Pivatto, Bernardi e Barros (2010), como não é possível memorizar todas as interações
medicamentosas, é importante ter em mente alguns princípios gerais. Observe os principais:
• Monitorar fármacos com índice terapêutico estreito, como anticoagulantes, citotóxicos, digitálicos,
imunossupressores, anticonvulsivantes.
• A anamnese bem conduzida garante informações fundamentais quanto aos hábitos do paciente,
principalmente em termos de medicamentos ou substâncias usadas por conta própria.
Saiba mais
42
FARMACOTERAPIA
4 FARMACOTERAPIA EM GRUPOS-ALVOS
4.1.1 O envelhecimento
Estamos observando no Brasil e no mundo um acelerado processo de envelhecimento. Tal processo
aponta nitidamente para o aumento da expectativa de vida da população. Essa mudança no perfil
demográfico teve início nos países desenvolvidos como resultado da redução das taxas de fecundidade e
de mortalidade, melhor acesso aos serviços de saúde, avanços em diversas áreas da medicina e acesso à
informação. Também é possível observar melhorias nas condições sociais e econômicas e de saneamento
básico. Esses fatores permitiram substancial aumento na expectativa de vida da população.
No Brasil, considera-se idosa a pessoa com 60 anos ou mais, conforme definido pela Política Nacional
do Idoso (BRASIL, 1994) e pelo Estatuto do Idoso (BRASIL, 2003a). Em 2020, 9,8% da população brasileira
estava na faixa dos 65 anos ou mais, e, em 2030, essa faixa deverá representar 13,5% da população
brasileira, segundo projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2021), como
pode‑se observar na figura 13.
90+
85-89
80-84
75-79
70-74
65-69
60-64
55-59
50-54
45-49
40-44
35-39
30-34
25-29
20-24
15-19
10-14
5-9
0-4
5 0 0 5
Homens Mulheres
43
Unidade I
Saiba mais
Além dos aspectos positivos relacionados ao aumento da expectativa de vida, devemos lembrar que
as patologias características dessa população — não só pela gravidade e cronicidade, mas também pela
probabilidade de reações adversas aumentada em função da polifarmácia — acabam por aumentar o
risco de morbimortalidade. Assim sendo e levando em consideração esse conjunto de pontos críticos
inerentes ao processo, o envelhecimento tem alto impacto nos sistemas de saúde. Para se ter uma ideia
desse impacto, estima-se que 10,7% do produto interno bruto (PIB) nacional em 2050 será destinado a
gastos com a saúde (KILSZTAJN et al., 2003).
Esses dados nos levam a uma questão importante. Para que os idosos tenham qualidade de vida é
fundamental garantir acesso adequado a todos os serviços destinados à população, sem deixar de lado
a atenção apropriada e dirigida às necessidades específicas dessa população. Levando em consideração
esses elementos, o profissional de saúde deve estar preparado para atender essa população em todos
os aspectos.
Observação
Dessa forma, observa-se com frequência o emprego da polifarmácia no idoso, o que leva ao aumento
substancial do risco de reações adversas, interações medicamentosas, erros de medicação, intoxicações,
falha terapêutica, comprometimento da adesão e até a morte. Entretanto devemos considerar que o
emprego da polifarmácia se faz necessário para que o paciente receba o tratamento adequado.
44
FARMACOTERAPIA
Lembrete
Em geral, o paciente idoso está sob os cuidados de diversos profissionais de saúde que podem
prescrever e/ou indicar terapêuticas medicamentosas ou não medicamentosas distintas, sem que
haja, eventualmente, a interação entre esses profissionais. Isso aumenta o risco de associações
medicamentosas e/ou terapêuticas que podem comprometer o idoso. Deve-se levar em consideração
também hábitos do idoso como uso, por conta própria, de medicamentos isentos de prescrição, alimentos,
chás, fitoterápicos etc.
Em termos de adesão ao tratamento, o paciente idoso não apresenta menor aderência, se comparado
aos demais pacientes. Contudo, a diminuição das capacidades sensoriais e/ou cognitivas pode contribuir
para que o paciente desenvolva dificuldade de leitura de bulas ou orientações escritas, não compreenda
ou esqueça instruções, esqueça de tomar o medicamento, o que pode comprometer o resultado esperado
e necessário (SOUZA; SANTOS; SILVEIRA, 2008).
Também é fundamental que o idoso receba todas as informações sobre o plano farmacoterapêutico
instituído, para que sua adesão seja plena e consciente. Orientação, suporte, apoio e esclarecimento
são fundamentais.
45
Unidade I
Dessa forma, é possível observar alterações no comportamento cinético dos fármacos no que se
refere a absorção, distribuição, metabolização e eliminação. Observamos também, em alguns pacientes,
problemas de deglutição que exigem atenção à escolha da forma farmacêutica apropriada às condições
do paciente idoso. Alterações farmacodinâmicas também são observadas, mas são menos frequentes
que as alterações farmacocinéticas.
Absorção
Lembrete
Apesar das alterações relacionadas à idade — como diminuição da superfície do intestino delgado,
redução do tempo do esvaziamento gástrico e aumento do pH estomacal —, observa-se que, para a
maioria dos fármacos, as alterações na fase de absorção para fármacos administrados por via oral
são irrelevantes.
Segundo Bernardi e Barros (2011), estudos não têm apontado para diferenças entre jovens e
idosos quanto à absorção pela mucosa oral. Essa via proporciona rápida absorção, indicando ser útil
e interessante para transpor certos problemas de biodisponibilidade que podem ocorrer com os idosos.
46
FARMACOTERAPIA
Ponto importante a ser considerado ao se utilizar essa via tem relação com a possibilidade de
redução de doses, por meio da redução do metabolismo de primeira passagem, também chamado
de metabolismo pré-sistêmico. Cabe destacar que o metabolismo de primeira passagem é observado na
administração por via oral e, em menor extensão, por via retal.
O mesmo autor aponta que há poucos estudos sobre as vias de administração percutânea, pulmonar
e retal. Contudo, a administração transdérmica tem sido estimulada em função do perfil de liberação do
fármaco para a corrente sanguínea.
Observação
Distribuição
No indivíduo idoso, é possível observar aumento da gordura corporal e redução de 10% a 15% da
água corporal (líquido corporal). Também se observa diminuição da massa magra.
Como consequência dessas alterações são observados aumento no volume de distribuição (Vd) para
fármacos de caráter lipofílico e diminuição do Vd para fármacos hidrofílicos. A redução do Vd leva ao
aumento das concentrações plasmáticas do fármaco.
Onde: [ ] = concentração
Cabe destacar que a meia-vida (T1/2) é o tempo necessário para as concentrações no plasma
diminuírem pela metade (50%), e é sabido que o aumento da meia-vida (T1/2) de um fármaco pode
ocorrer também por causa de alterações no volume de distribuição.
O volume de distribuição (Vd) também é fundamental para a determinação de doses de ataque para
fármacos que exigem esse regime farmacoterapêutico.
47
Unidade I
Lembrete
Considerando a taxa de ligação à proteína plasmática, observa-se, nos idosos, redução nas concentrações
de albumina e aumento nas concentrações de α1-glicoproteína ácida.
Observação
A queda nas concentrações de albumina também pode ter relação com doenças, desnutrição e
pós-operatório. A preocupação com a queda nas concentrações da albumina sérica tem relação com
o aumento da fração livre do fármaco, o que pode levar o idoso a um quadro de intoxicação mesmo
quando as doses administradas são adequadas ao paciente.
Podemos exemplificar esse caso citando a fenitoína e a varfarina. Esses fármacos apresentam alto
risco em termos de efeito tóxico caso os níveis de albumina diminuam.
48
FARMACOTERAPIA
Se faz necessário considerar outra situação: o uso de fármacos simultaneamente, caso da polifarmácia,
que competem pela albumina. Essa situação também pode levar a quadros de intoxicação em função do
aumento da fração livre do fármaco ou dos fármacos com menor afinidade à albumina.
Metabolização
O principal responsável pela metabolização dos fármacos é o fígado. Mas cabe lembrar que os
fármacos também podem ser metabolizados em outros territórios, como pulmões, rins e intestino.
Nos idosos, observa-se redução da perfusão sanguínea hepática e da própria massa do fígado, o
que provoca diminuição no número de hepatócitos. Dessa maneira, o envelhecimento leva à redução
da atividade do sistema enzimático do citocromo P-450. Normalmente, é possível observar uma
redução de 30% a 40% na depuração de alguns fármacos. Dessa forma, em tese, se faz necessária a
redução das doses de manutenção. Contudo, é sabido que as taxas de metabolização hepática variam
individualmente, portanto o ajuste de dose deve ser individualizado (RUSCIN; LINNERBUR, 2018).
Entretanto fármacos que são metabolizados por conjugação não são afetados em termos de
metabolização. Há indícios de que esse sistema não seja afetado pelo envelhecimento. Podemos citar,
nesse caso, o lorazepam e o oxazepam. Daí a preferência, entre outros fatores, do emprego desses
benzodiazepínicos em idosos.
Excreção/eliminação
Observa-se que, com o envelhecimento, a depuração dos fármacos diminui. São percebidas reduções
no número de néfrons e no peso dos rins, acarretando reduções nas taxas de filtração glomerular,
reabsorção e secreção tubular.
De acordo com Bernardi e Barros (2010), há redução de 25% na filtração glomerular em indivíduos
de 20 a 50 anos de idade, e de 50% naqueles de até 75 anos. Também são observadas diferenças entre
os sexos masculino e feminino.
49
Unidade I
A literatura aponta que, nessa faixa etária, os níveis plasmáticos de ureia ou de creatinina podem
não representar de maneira adequada a função renal. Desse modo, propõe-se a utilização da depuração
(clearance) de creatinina.
Ainda segundo Bernardi e Barros (2010), também destacam que, atualmente, recomenda-se o uso de
um algoritmo específico para estimar, com maior precisão, a taxa de filtração glomerular (TFG) em idosos.
Saiba mais
Assim, é possível observar porque se recomenda iniciar uma terapia medicamentosa nos idosos com
a menor dose possível que promova os efeitos terapêuticos desejados e ajustá-la conforme a resposta
do paciente, preferencialmente, usando a TFG.
Alterações farmacodinâmicas
No idoso, observa-se que alterações farmacodinâmicas que podem levar a algum comprometimento
são menos frequentes que as alterações farmacocinéticas. Entretanto o processo de senescência causa
alterações na quantidade e/ou qualidade funcional de receptores, neurotransmissores e hormônios,
e alterações no metabolismo ou biodisponibilidade da glicose e do oxigênio. Observa-se também
aumento da permeabilidade seletiva da barreira hematoencefálica (BHE). O fato de a BHE ter sua
permeabilidade alterada faz com que certos fármacos alcancem concentrações maiores no sistema
nervoso central dos idosos, provocando, assim, efeitos adversos que devem ser observados com atenção.
50
FARMACOTERAPIA
De acordo com a literatura, a prescrição para idosos deve levar em consideração os cinco “is” da
geriatria. São eles:
• iatrogenia;
• incontinência;
• instabilidade postural;
• imobilidade;
• incapacidade cognitiva.
• insuficiência familiar;
• incapacidade comunicativa.
Ainda segundo os autores, as grandes síndromes geriátricas caracterizam-se por diversas condições
de saúde que ocorrem quando o comprometimento combinado em múltiplos sistemas torna o indivíduo
vulnerável a situações que desafiem o idoso.
Essas são síndromes geriátricas que afetam a qualidade de vida do idoso, principalmente em termos
de funcionalidade e autonomia, e compreendem uma série de situações que tendem a ocorrer com maior
frequência e prevalência ao envelhecer, como consequência das alterações fisiológicas relacionadas ao
processo de senescência ou senilidade (MORAES; MARINO; SANTOS, 2010).
51
Unidade I
Pensando em prescrição racional e segura no caso dos idosos, observamos que diversos fatores de
risco para efeitos adversos — como comorbidades, alterações farmacocinéticas e farmacodinâmicas
52
FARMACOTERAPIA
Nesse contexto, é possível observar fatores importantes, como a presença de patologias específicas,
os sinais e sintomas (que, eventualmente, são inespecíficos), a necessidade de um cuidador para viabilizar
a condução da farmacoterapêutica e, ainda, a dificuldade de expressão dependendo da faixa etária e/ou
condições que comprometem a capacidade de expressão e comunicação.
Há alguns pontos críticos que podem ser discutidos, como a escassez de estudos destinados a essa
população, uma vez que a investigação clínica em pediatria apresenta critérios particulares e bem mais
específicos em termos éticos e técnicos se comparados aos estudos realizados em adultos.
Dessa maneira, problemas éticos, logísticos e a complexidade dos consentimentos necessários podem
dificultar ou, até mesmo, inviabilizar protocolos de pesquisa clínica em pediatria. Isso reflete na falta (ou
na baixa quantidade) de informações sobre farmacocinética e perfil de segurança de fármacos utilizados
nessa população.
Outro ponto importante tem relação com a prescrição off-label no tratamento ambulatorial ou
hospitalar — ou seja, medicamentos ainda não aprovados para o uso pediátrico ou para determinada
faixa etária pediátrica. Essa é uma prática comum no mundo todo: a falta de aprovação não significa
que o fármaco não deva ser utilizado nessa população — apenas aponta que não há informações
suficientes para garantir resultados eficazes, seguros e que permitam a identificação dos riscos para
as crianças. Dessa forma, o uso off-label deve ser extremamente cuidadoso, e não deve ser a primeira
opção terapêutica para o paciente pediátrico (FUCHS; WANNMACHER, 2017).
53
Unidade I
Laughon et al. (2011), destacam que a pesquisa clínica envolvendo crianças constitui um desafio, e
que são necessários estudos clínicos inovadores destinados às populações pediátricas, embora diversos
estudos já tenham sido realizados na área da farmacocinética pediátrica.
Observa-se que os efeitos farmacológicos e as reações adversas são parecidos em adultos e crianças,
mas as diferenças farmacocinéticas devem ser consideradas.
As crianças são categorizadas em faixas etárias por diversos motivos, principalmente pensando em
fases de desenvolvimento físico, intelectual, amadurecimento dos sistemas metabólicos, amadurecimento de
órgãos etc. Assim, a observação dessas fases permite entender e acompanhar o comportamento cinético
de um fármaco dependendo da faixa etária da criança. A tabela 1 apresenta a classificação das crianças
conforme a faixa etária.
Dessa maneira, em linhas gerais, podemos observar que processos fisiopatológicos influenciam o
comportamento do fármaco no ambiente biológico da criança. Essa influência se modifica à medida que
os sistemas biológicos da criança amadurecem.
54
FARMACOTERAPIA
Em termos de absorção e lembrando que a maior parte dos medicamentos usados em pediatria
são administrados por via oral, salvo em condições específicas, o processo de absorção depende
basicamente das condições físico-químicas e da velocidade do trânsito do trato digestório. Desse
modo, observa-se que os processos fisiológicos se modificam de forma importante ao longo do
primeiro ano de vida.
Já a velocidade do trânsito intestinal chega a níveis encontrados nos adultos por volta dos 2 anos
de vida.
Em termos de distribuição, observa-se que a albumina sérica está diminuída, o que leva à redução
da taxa de ligação à proteína plasmática. A barreira hematoencefálica (BHE) apresenta-se imatura, de
modo que se observa maior penetrabilidade através dela.
Dessa forma, constata-se que o volume de distribuição muda conforme a idade. Por exemplo, para
fármacos hidrossolúveis, são necessárias doses mais elevadas em crianças menores em função da maior
proporção de água na composição corporal.
55
Unidade I
menores no período neonatal, e a atividade máxima apresenta uma relação de dependência com o nível
de maturidade e do sistema enzimático em questão (FUCHS; WANNMACHER, 2017).
A tabela 2 apresenta uma comparação entre a meia-vida de alguns fármacos no neonato e no adulto.
Segundo Fuchs e Wannmacher (2017), os medicamentos que apresentam dados a partir de estudos
clínicos adequados oferecem a dose devidamente ajustada, levando em consideração o peso ou a
superfície corpórea, dependendo do caso.
Entretanto, em alguns casos, é possível estimar a dose a ser empregada em relação à dose preconizada
para os adultos. Lembrando que a dose para a criança não pode extrapolar a dose para o adulto.
56
FARMACOTERAPIA
A seguir, são apresentadas algumas fórmulas para o cálculo estimado de doses em pediatria. Observe,
no quadro 7, que cada fórmula leva em consideração o peso ou a idade da criança. A escolha fica a cargo
do pediatra que escolherá a forma que mais se adequa à criança em questão. Cabe ressaltar que tais
fórmulas não se aplicam à neonatologia: Shirkey (apud SILVA, 2010) comenta que elas são adequadas
para crianças entre 6 meses e 2 anos.
Idade ( em anos )
× Dose do adulto = Dose aproximada para a criança
Idade ( em anos ) + 12
Fórmula de Young: para
pacientes com 2 anos Superfície do corpo da criança
de idade ou mais × Dose do adulto = Dose da criança
Superfície do corpo adulto
Uma ideia equivocada que, eventualmente, ganha força é considerar que as crianças são “adultos
pequenos”, principalmente quando tratamos de farmacoterapia. Durante muito tempo, extrapolou-se
as doses dos fármacos estabelecidas para os adultos para que se pudessem ser utilizados em crianças
(BUCK, 2003 apud STORPIRTIS et al., 2008).
Neste item, trataremos de tópicos de grande relevância em termos de saúde, bem-estar e qualidade
de vida da mulher. Abordaremos a farmacoterapia na gestação, a terapia de reposição hormonal (TRH)
no climatério e a contracepção.
57
Unidade I
A gravidez humana dura aproximadamente 280 dias, sendo dividida em três trimestres. Durante
esse período, a maioria das mulheres utilizarão algum tipo de medicamento, prescrito ou não. Nos
últimos anos, tem-se observado aumento no uso de medicamentos durante a gestação, e são diversos os
motivos. Apesar dessa crescente utilização de medicamentos, diretrizes específicas que possam direcionar
e embasar cientificamente o uso racional e seguro de fármacos na gestação ainda são escassas.
Infelizmente, poucos são os fármacos devidamente testados para uso durante a gestação. Implicações
éticas limitam esses estudos, e os dados disponíveis são oriundos dos ensaios pré-clínicos a partir de
modelos animais.
Os fármacos que, em geral, são mais utilizados durante a gestação são os antieméticos, antiácidos,
anti-histamínicos, analgésicos, antimicrobianos, hipnóticos-sedativos e diuréticos. Vitaminas e
suplementos vitamínicos também são de uso comum nesse período.
Uma recomendação específica deve ser destacada: a suplementação de ácido fólico em mulheres em
idade fértil, 30 dias antes de engravidar e nos três primeiros meses de gestação. O objetivo é prevenir
defeitos na formação do tubo neural do feto (BRASIL, 2013).
Cabe ressaltar que a gestação é considerada uma condição de alto risco, portanto é fundamental
que haja uma avaliação criteriosa e cautelosa acerca do uso de medicamentos nessa fase.
Em função das mudanças que ocorrem no organismo materno, observam-se alterações fisiológicas
nos sistemas cardiovascular, respiratório, digestório, na composição de fluidos corpóreos, na função
renal e no sistema hormonal.
A absorção, por exemplo, pode estar alterada em função da diminuição no tempo de esvaziamento
gástrico, e também devido aos episódios de vômitos.
Segundo Wells et al. (2016), o volume plasmático da gestante, o débito cardíaco e a taxa de filtração
glomerular aumentam cerca de 30% ou mais. Isso implica redução da concentração plasmática de
fármacos eliminados pelos rins.
58
FARMACOTERAPIA
Como a concentração de albumina estará reduzida, observa-se aumento nos volumes de distribuição
de fármacos com alta taxa de ligação às proteínas plasmáticas. Entretanto não são observadas alterações
significativas na fração livre do fármaco no sangue, pois a fração não ligada será rapidamente eliminada.
Como resultado disso, podem ser observados defeitos letais, levando ao aborto, defeitos teratológicos
(morfológicos, bioquímicos, fisiológicos e comportamentais) e defeitos não teratológicos, cuja natureza
é diversa e o aparecimento pode ser precoce ou tardio.
São utilizadas classificações de risco que os fármacos oferecem durante a gestação. Entretanto tais
classificações são incompletas, pois não atentam a condições como dose, via de administração, duração
do tratamento e fatores relacionados às características particulares da gestante, seu histórico familiar
e seu estado de saúde.
Finalmente, no caso dos fármacos da categoria X, há indicação de que os riscos superam qualquer
benefício, são fármacos que não devem ser utilizados em gestantes ou em mulheres em idade fértil.
59
Unidade I
Estudos controlados em mulheres não demonstraram risco para o feto no primeiro trimestre
Categoria A de gestação, e não há evidência de risco em trimestres posteriores. A possibilidade de dano
fetal parece remota
Estudos de reprodução animal não demonstraram risco fetal, mas inexiste estudo controlado
Categoria B em mulheres grávidas; ou estudos de reprodução animal mostraram algum efeito adverso
no feto (que não seja diminuição de fertilidade), não confirmado em estudos controlados em
mulheres durante o primeiro trimestre (e não há evidência de risco em trimestres posteriores)
Estudos em animais demonstraram efeitos adversos no feto (teratogenia, morte fetal ou
Categoria C outro) e não há estudos controlados em mulheres; ou estudos em mulheres e animais não
estão disponíveis. Esses fármacos só devem ser administrados se o benefício justificar o risco
potencial para o feto
Há evidência positiva de risco fetal humano, mas os benefícios de uso em mulheres grávidas
Categoria D podem justificar o uso a despeito do risco (p. ex., se o fármaco é necessário em uma situação
de risco à vida para uma doença grave, para a qual medicamentos mais seguros não podem
ser usados ou não são eficazes)
Estudos em animais e seres humanos demonstraram anomalias fetais ou há evidência de
Categoria X risco fetal baseada em experiências em humanos, ou ambos, e o risco de uso do fármaco em
mulheres grávidas está claramente acima do possível benefício. O fármaco é contraindicado
em mulheres que estejam ou possam ficar grávidas
Assim, como a gestação é considerada uma condição de alto risco, é fundamental uma avaliação
criteriosa e cautelosa acerca do uso de medicamentos nessa fase. Assim, farmacoterapia racional durante
a gestação deve levar em consideração a natureza do fármaco, esquema posológico e fase da gravidez.
Os contraceptivos hormonais (ou anticoncepcionais) são utilizados desde o final da década de 1950,
quando foi lançado o primeiro produto no mercado norte-americano. Atualmente, são amplamente
empregados e considerados um método seguro, eficaz e reversível. E não só para prevenir a gravidez:
também são empregados em diversas condições, como dismenorreia, TRH, síndrome pré-menstrual,
menorragia, acne, hirsutismo e mastalgia.
• Métodos “naturais”: ritmo (Ogino-Knaus, tabelinha), muco cervical, coito interrompido, ducha
vaginal e método sintotérmico (medição da temperatura basal).
60
FARMACOTERAPIA
Os contraceptivos hormonais agem de diversas formas, impedindo a liberação do óvulo pelo ovário,
e promovem o espessamento do muco cervical, o que dificulta a chegada do espermatozoide ao útero.
Estão disponíveis em diversas formas de administração, e cada uma delas apresenta vantagens e
desvantagens que devem ser discutidas entre a paciente e seu médico.
Também existem diversos fatores que devem ser considerados na escolha do método e do hormônio
(ou combinações de hormônios) que será empregado.
Em suma, os métodos mais comuns são: “pílula” (administração oral), anel vaginal, adesivos
transdérmicos, injetáveis e implantes. Aqui trataremos dos anticoncepcionais orais.
Anticoncepcionais orais combinados
São associações de hormônios sintéticos (como etinilestradiol) e progestogênios (como desogestrel,
gestodeno, levonorgestrel, ciproterona, drospirenona, norgestrel, noretisterona, linestrenol e clormadinona).
Outra classificação existente é por geração. Nesta, leva-se em consideração o momento em que
o contraceptivo foi lançado no mercado, a dose de etinilestradiol e qual o progestogênio presente.
Observe o quadro.
Apesar dos inúmeros benefícios, é importante destacar os riscos relacionados ao uso dos
anticoncepcionais combinados.
61
Unidade I
As reações adversas observadas têm relação direta com o hormônio em questão. Entre as reações
relacionadas aos estrogênios podemos citar: cefaleia, náusea, vômito, irritação, cãibras e flatulência. Já
entre as relacionadas ao progestogênio observam-se: depressão, alteração da libido, acne, fadiga, rash
cutâneo e ganho de peso.
As contraindicações são diversas e devem ser consideradas com muita atenção e cuidado. Os
estrogênios não devem ser administrados em pacientes portadoras de neoplasias estrogênio-dependentes,
como o carcinoma de endométrio, ou em pacientes com carcinoma de mama ou que apresentem alto
risco de desenvolver o câncer de mama. Devem ser evitados em pacientes com sangramento genital não
diagnosticado, distúrbios tromboembolíticos e hepatopatias. Com pacientes fumantes o uso deve ser
extremamente cauteloso — de preferência, deve ser evitado em fumantes compulsivas, com consumo
elevado de cigarros e conforme avança a idade (o risco é ainda maior em mulheres com mais de 35 anos).
Entretanto cabe destacar alguns benefícios relacionados ao uso de contraceptivos orais, como
redução do volume e do tempo de sangramento menstrual, redução da dismenorreia, melhora nos
quadros de acne e hirsutismo, redução no risco de ocorrência de câncer de ovário e endométrio,
diminuição ou controle dos sintomas do climatério. Esse último foi tratado na seção “Terapia de
reposição hormonal (TRH)”.
Anticoncepção de emergência
Também conhecida como “pílula do dia seguinte”, é utilizada com o intuito de prevenir a gravidez
após uma relação sexual sem proteção, uso inadequado ou incorreto de métodos anticoncepcionais ou
numa situação em que houve sexo sem consentimento.
Apresenta alta eficácia quando utilizada até 72 horas após a relação sexual sem proteção, pois o
método não interrompe a gravidez após a implantação do óvulo fecundado no útero.
62
FARMACOTERAPIA
63
Unidade I
A menopausa marca o momento em que ocorre o último ciclo menstrual — por volta dos 50 anos de
idade para a maioria das mulheres, podendo variar em função de diversos fatores, incluindo a menopausa
induzida cirurgicamente.
Contudo, muito antes dessa data tem início a diminuição da função ovariana. Esse período que
antecede o último ciclo é denominado climatério e caracteriza-se por uma transição entre a fase
reprodutiva (fértil) e a não reprodutiva.
De maneira geral, observa-se que a função ovariana começa a diminuir gradativamente por volta dos
35 aos 40 anos de idade. Nessa fase, o ovário responde menos às gonadotrofinas hipofisárias, implicando
a queda das taxas dos hormônios femininos — os estrogênios e a progesterona. Consequentemente,
observa-se o aumento dos hormônios folículo-estimulante e luteinizante.
Essas alterações hormonais levam a sintomas típicos desse período. Podemos citar a irregularidade
do ciclo menstrual, ciclos anovulatórios (em que não há ovulação), fogachos (sensação de calor na
face, pescoço e tronco, rubor e mal-estar), alterações de humor, perda da libido, ressecamento vaginal,
infecções do trato urinário. Além desses sintomas, a queda da função ovariana e a relação direta com o
climatério, temos a osteoporose e a cardiomiopatia isquêmica.
Entretanto a indicação dessa reposição deve ser extremamente criteriosa. Segundo Silva et al. (2019),
o uso prolongado tem sido amplamente discutido e analisado com base em muitas informações
desencontradas, o que levanta diversas questões sobre os reais benefícios e eficácia da TRH, e gera
dúvidas e insegurança a todos os envolvidos. Diante desse cenário, fica evidente a necessidade de
estudos relacionados ao tema.
À medida que as pesquisas e o conhecimento sobre o tema avançam, tem sido possível correlacionar
a sintomatologia à qualidade de vida da população feminina na menopausa — ou seja, há relação
com outros fatores não apenas associados à diminuição de estrogênio, mas associados ao processo de
senescência (envelhecimento), bem como fatores sociais e psicológicos (SOBRAC, 2018).
Da mesma forma que oferece uma série de benefícios, é importante direcionar a atenção também
aos riscos inerentes ao processo. Assim, a indicação da TRH, além de criteriosa, deve ser individualizada,
por tempo limitado e com administração da menor dose que proporcione alívio aos sintomas.
A prática clínica aponta para resultados positivos em termos de controle de fogachos (ondas de calor),
na lubrificação vaginal, disposição, depressão climatérica, entre outros. Contudo, não há indicação para
64
FARMACOTERAPIA
prevenção de doença cardiovascular; além disso, é preciso ter cuidado com os casos de osteoporose, pois
existem outras alternativas para sua prevenção e seu tratamento.
Cabe destacar que a terapia estrogênica oral aumenta o risco de trombose venosa e embolia
pulmonar. Outro risco que já está estabelecido é o de câncer de mama, principalmente em mulheres com
histórico pessoal ou familiar. Dados evidenciam que a reposição feita com estrogênio por um período de
cinco anos ou menos não parece aumentar o risco de câncer de mama; contudo, estudos apontam para
aumento desse risco em esquemas mantidos por mais de cinco anos com a TRH combinada, e tem-se
observado riscos aumentados de acidente vascular encefálico (AVE) em pacientes sob TRH combinada
(RAMOS; GUIMARÃES, 2010).
Os adesivos representam uma forma de aplicação confortável e prática, pois permite a liberação da
dose de maneira controlada através da pele e mantém concentrações plasmáticas estáveis durante o
período de liberação do fármaco pelo adesivo. Outra vantagem que cabe ressaltar refere-se à comodidade
posológica, uma vez que evita esquecimentos, garantindo a administração diária no mesmo horário.
Os adesivos devem ser aplicados em áreas que permitam sua completa aderência, sem a formação de
dobras ou rugas. Assim, as áreas preferenciais de aplicação são o abdome e as nádegas, e recomenda-se
evitar a aplicação nas mamas, bem como fazer um esquema de rodízio entre as regiões de aplicação.
Geralmente, a via oral é uma das formas mais utilizadas. Esta costuma ser a escolha preferencial no
caso de mulheres com hipercolesterolemia; contudo, deve ser evitada em casos de mulheres com altas
taxas de triglicerídeos, quando recomenda-se escolher outra via. No caso de mulheres hipertensas e que
apresentem risco de trombose, também se dá preferência a outras vias, como parenteral, transdérmica
(adesivo), entre outras.
65
Unidade I
As reações adversas devem ser observadas com atenção, pois variam conforme o hormônio empregado.
É preciso analisá-las e manejá-las de acordo com os relatos da paciente, e devem ser continuamente
monitoradas. Veja a seguir as reações mais comuns:
• Estrogênios: náusea, vômito, anorexia, diarreia, colestase, colelitíase, hepatite, pancreatite, cefaleia,
enxaqueca, edema, trombose venosa, hipertensão, mamas sensíveis, sangramento, alterações na
libido, depressão, ansiedade, alterações de peso. O risco de câncer de mama aumenta em terapias
de 5 a 10 anos ou mais.
A paciente sob TRH deverá ser acompanhada continuamente por meio de exames ginecológicos de rotina
completos, inclusive mamografia. Em geral, não são necessários exames laboratoriais de dosagem hormonal,
pois o controle é realizado clinicamente, e a paciente estará com aporte de hormônios exógenos.
Estrogênios Apresentações
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FARMACOTERAPIA
Progestogênios Apresentações
Didrogesterona Comprimidos
Medroxiprogesterona Comprimidos
Nomegestrol Comprimidos
Noretisterona Comprimidos
Progesterona Creme vaginal
Progesterona natural micronizada Comprimidos
Tibolona Comprimidos
Associações de hormônios Apresentações
Estradiol + didrogesterona Comprimidos
Estradiol + drospirenona Comprimidos
Estradiol + gestodeno Comprimidos
Estradiol + noretisterona Comprimidos, adesivos transdérmicos
Estradiol + norgestimato Comprimidos
Estradiol + trimegestona Drágeas
Estrogênios conjugados + medroxiprogesterona Drágeas, comprimidos
Valerato de estradiol + ciproterona Drágeas, comprimidos
Valerato de estradiol + hidroxiprogesterona Injetável*
Valerato de estradiol + levonorgestrel Drágeas
Valerato de estradiol + medroxiprogesterona Comprimidos
Valerato de estradiol + noretisterona Comprimidos
* Uso intramuscular
Saiba mais
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Unidade I
Resumo
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FARMACOTERAPIA
69
Unidade I
No caso das crianças, os desafios são maiores, uma vez que os estudos
clínicos nessa faixa etária são restritos. Dessa maneira, para garantir a
farmacoterapia pediátrica segura, é fundamental considerar o processo de
amadurecimento de cada sistema.
70
FARMACOTERAPIA
Exercícios
Observe o gráfico a seguir, que mostra o perfil farmacocinético dos fármacos A, B, C e D, e assinale
a alternativa correta.
A
Concentração plasmática
B
do fármaco
Tempo
Figura 14
D) O tempo de meia-vida plasmática é igual para os quatro fármacos, pois esse parâmetro não sofre
influência da via de administração.
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Unidade I
A) Alternativa incorreta.
Justificativa: o fármaco A foi administrado em bolus, ou seja, toda a dose foi injetada diretamente na
circulação sistêmica de uma única vez. Essa conclusão pode ser tomada a partir da observação do pico
de concentração plasmática, que é atingido no momento da administração (no tempo zero).
B) Alternativa incorreta.
C) Alternativa correta.
D) Alternativa incorreta.
E) Alternativa incorreta.
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FARMACOTERAPIA
II – O tempo de meia-vida plasmática de uma série de fármacos é maior nos idosos do que na
população mais jovem.
III – O volume de distribuição de fármacos lipossolúveis diminui com a idade, pois a concentração
plasmática aumenta.
IV – A velocidade de depuração dos fármacos excretados por via urinária diminui com a idade, como
resultado da diminuição da taxa de filtração glomerular.
A) I e II.
B) II e III.
C) III e IV.
D) II e IV.
E) I e III.
I – Afirmativa incorreta.
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Unidade I
II – Afirmativa correta.
Justificativa: com a idade, a proporção relativa de tecido adiposo aumenta e, como consequência, a
concentração plasmática de fármacos lipossolúveis tende a diminuir. Portanto o volume de distribuição
não diminui, mas sim aumenta.
IV – Afirmativa correta.
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