Passeggi Souza RevistaPesquisaqualitativa56 302 1 PB
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Resumo
Resumen
1
Professora Titular do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(PPGEd-UFRN). Pesquisadora de produtividade do CNPq. mariapasseggi@gmail.com
2
Professor Titular do Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade, da Universidade do Estado
da Bahia (PPGEduC-UNEB). Pesquisador 1D CNPq. esclementino@uol.com.br
Revista Investigacion Cualitativa
Passeggi, Passeggi, M. C. y Souza, E. C. (2017). O Movimento (Auto)Biográfico no Brasil: Esboço de suas Configurações no
Campo Educacional. Investigación Cualitativa, 2(1) pp. 6-26. DOI: http://dx.doi.org/10.23935/2016/01032
Passeggi y Sousa, O Movimento (Auto)Biográfico no Brasil
Summary
This article aims to study the main approaches and possibilities of the
autobiographical movement in Brazil, within teh field of education. This work is
divided into three parts. Namely: 1) to present some of the epistemological principles
that have guided Brazilian research; 2) to make a brief historical flight for the period
1990 - 2016; And 3) show the different editions of the International Biographical
Research Congress (CIPA), which is held continuously every two years, since this
international forum of researchers constitutes a space for debates to evaluate the
progress and challenges of the movement (auto ) Biographical, in order to promote
new research and theoretical-methodological orientations. This allows us to conclude
that there are new areas of educational scientific research in Brazil that overcome the
idioms and that are installed with wide openings for the other areas of knowledge in
the Human and Social Sciences, which can be observed in the growing interaction
between researchers And their networks at the international level.
A guisa de introdução
nessa área e que são comuns a um grande número de pesquisadores, que têm focalizado, em suas
pesquisas, as potencialidades epistemológica e política do paradigma narrativo nas Ciências
Humanas e Sociais. Faremos, em seguida, um breve sobrevoo histórico correspondente ao
período de 1990 a 2016, objetivando sintetizar dois momentos que se configuram como marcos
do movimento (auto)biográfico em educação, no Brasil: sua emergência, nos anos 1990, e sua
diversificação a partir dos anos 2000. Finalmente, apresentamos as diferentes edições do
Congresso Internacional de Pesquisa (auto)biográfica (CIPA), por considerar que, desde 2004,
esse fórum internacional de pesquisadores constitui-se um espaço de debates para avaliar
avanços e desafios do movimento (auto)biográfico e fomentar novas pesquisa e orientações
teórico-metodológicas.
Queremos chamar a atenção, com Delory-Momberger (op. cit.), para uma questão
fundante do espaço (auto) biográfico na pesquisa educacional. Concordamos com a autora, que
esse espaço não se limitaria à multiplicidade de gêneros biográficos e autobiográficos, mas ele
concerne principalmente à compreensão da natureza do discurso autobiográfico, enraizado na
atitude fundamental do humano “que consiste em configurar narrativamente a sucessão temporal
de sua experiência”. Levar a sério essa atitude singular, praticada desde a mais tenra idade,
constitui um dos pontos centrais da pesquisa (auto) biográfica em Educação. Admite-se, pois,
como pressuposto, que o sujeito, em todas as fases da vida, apropria-se de instrumentos
semióticos (a linguagem, o grafismo, o desenho, os gestos, as imagens etc.) para contar suas
experiências sob a forma de uma narrativa autobiográfica que até então não existia. E nesse
processo de biografização, a pessoa que narra, embora não possa mudar os acontecimentos, pode
reinterpretá-los dentro de um novo enredo, reinventando-se com ele.
3
Christine Delory-Momberger, 2005, p. 14. (Tradução nossa, grifos da autora).
Como campo de pesquisa, cabe nos perguntar sobre que tipo de conhecimento é possível
gerar com base nessas narrativas de si e qual é a sua relevância para a investigação científica no
que concerne os conhecimentos humanos e sociais. Situada no âmbito da pesquisa qualitativa, a
pesquisa (auto) biográfica em Educação tem procurado superar o dilema que lhe é imposto: ou
acomodar-se aos padrões existentes do conhecimento dito científico ou, ciente da especificidade
epistemológica do conhecimento que ela produz, contribuir para a construção de novas formas de
se conceber a pessoa humana e os meios de pesquisa sobre ela e com ela.
Com efeito, a partir dos anos 1980, a crise dos grandes paradigmas, notadamente do
estruturalismo e do behaviorismo, que haviam expulsado o sujeito do seu campo de investigação,
abre novos horizontes para o “retorno do sujeito”, que reaparece sob múltiplas peles: a de autor,
narrador, ator, agente social e personagem de sua história. Essa mudança, que se convencionou
denominar de “giro linguístico” ou “giro discursivo”, está alicerçada numa inversão das relações
entre pensamento/cognição e linguagem. A linguagem deixa de ser concebida, unicamente, como
instrumento de expressão do pensamento para ser entendida como fator estruturante das visões
de mundo, um modo de perspectivar a realidade, como sugere Tomasello (2003) e nessa mesma
direção as representações do outro e de si.
Nesse contexto, a narrativa, oral e escrita, como afirmam Brockmeir e Harré (2003, p.
526), torna-se “a descoberta da década de 1980”, o canal pelo qual circula a voz dos atores
sociais que narram suas próprias experiências e se constituem na e pela linguagem. As narrativas
tornam-se, ao mesmo tempo, um parâmetro linguístico, psicológico, cultural e filosófico
fundamental para explicar a natureza e as condições da existência humana (ibidem),
constituindo-se entradas potencialmente legítimas para se ter acesso aos modos como o sujeito
(ou uma comunidade) dá sentido à sua experiência, organiza suas memórias, justifica suas ações,
silencia outras. Nesse sentido, elas oferecem padrões de interpretação, que contribuirão, tanto
para o conhecimento do humano, quanto para o próprio aprimoramento da pesquisa qualitativa
interpretativa.
É dentro dessa infinita variedade que a pesquisa (auto)biográfica opera um recorte. Seu
interesse recai especificamente sobre as narrativas autobiográficas, que se enraízam nessa atitude
fundamental do ser humano “que consiste em configurar narrativamente a sucessão temporal de
sua experiência”, para contar a história de sua vida, a história de uma experiência, a história de
um momento qualquer.
Para autores como Delory-Momberger (2005, 2013, 2014), Alheit e Dausien (2006), a
pesquisa (auto)biográfica em Educação interroga essa capacidade antropológica de
biografização, mediante a qual a pessoa que narra organiza sua experiência em termos de uma
razão narrativa. A biografização é, portanto, esse processo permanente de aprendizagem e de
constituição sociohistórica da pessoa que narra. A pesquisa (auto)biográfica privilegia pois esses
processos de biografização com o objetivo de compreender como os indivíduos se tornam quem
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eles são. Nesse sentido, ganha força a afirmação de Bruner (2014, p. 75), ao propor que “A
criação do eu é uma arte narrativa”, portanto, um ato performativo, pelo qual dizer é fazer,
biografar-se é tornar-se um outro para construir-se como um si mesmo.
Não se trata, portanto, de uma atitude esporádica e meramente circunstancial, mas de uma
dimensão constitutiva dos processos de individuação e de socialização, estreitamente,
relacionados às condições societais nas quais os indivíduos se biografam e produzem,
narrativamente, formas de existência para eles próprios e para o outro. Nesse sentido, convém
lembrar que o “giro narrativo” se insere num momento de grandes mutações sociais em que as
instituições tradicionais (família, igreja, escola, trabalho), perdendo a sua centralidade, rementem
aos indivíduos a responsabilidade de encontrar por si mesmos meios de se instituir como sujeitos
de direitos na sociedade.
Na percepção de Freire (op. cit.), subestimar o saber que resulta da reflexão sobre a
experiência seria “um erro científico e a expressão inequívoca de uma ideologia elitista”. Nessa
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mesma direção, Boaventura de Souza Santos (2002, p. 81) afirma que “a ciência moderna
consagrou o homem como sujeito epistémico, mas expulsou-o enquanto sujeito empírico”, e com
ele desperdiçava-se sua experiência. Jogava-se, assim, a criança com a água do banho. A
tentativa do movimento (auto)biográfico é de recuperar essa ausência do sujeito empírico, de
carne e osso, focalizando a sua experiência. Essa preferência pelo sujeito epistêmico, abstrato,
objetivo, explica a resistência da pesquisa científica positivista à palavra da criança, da mulher,
do transexual, de pessoas do campo, das ruas, das favelas, da floresta, em função da “pobreza”
de seu pensamento, da “insuficiência” de seus modos de se expressar, de sua “pouca” idade, da
“insignificância” de sua experiência. “Deficiências” assim categorizados em função de critérios
positivistas, coloniais, que desqualificam a legitimidade da palavra de quem foge aos padrões de
racionalidade do adulto, de sexo masculino, branco, letrado.
Em um texto anterior, Passeggi (2015, p. 84) propõe que os estudos desenvolvidos com
narrativas autobiográficas, em suas mais diversas abordagens e por redes de pesquisadores cada
vez mais abrangentes, permitem conceber uma epistemologia do sul ou pós-colonial, que se
sustenta numa “„revolución narrativa‟ en contra de la mera „ilusión biográfica‟”. Com efeito, as
narrativas autobiográficas, analisadas, nos últimos anos, em teses, dissertações, entrevistas
rompem com as dicotomias positivistas, entrelaçando razão e emoção, sujeito e objeto de
reflexão, nos processos de interpretação da experiência e atribuição de sentido à vida.
É nesse sentido que o método biográfico e os Cultural studies encontram-se numa mirada
comum, que estão para além das divisões disciplinares. Nem multi-, nem inter-, nem
transdisciplinar, mas pós-disciplinar. Isso quer dizer que é preciso ir buscar instrumentos
heurísticos e metodológicos no lugar onde eles se encontram: na história social, na
filosofia, na antropologia social e cultural, na etnografia, na psicologia e na psicanálise,
mas também na literatura e na poesia.
É essa perspectiva posdisciplinar, sugerida por Ferrarotti, que nos parece a mais adequada
para pensar propostas metodológica e de análises de fontes biográficas e autobiográficas, que por
sua complexidade fogem aos padrões de análises que focalizam normas ou leis gerais do
comportamento humano. Ela confere ao pesquisador e ao narrador a liberdade necessária para ir
e vir em busca de instrumentos heurísticos tão revolucionários quanto o próprio “giro
autobiográfico”, subjetivo, interpretativo, qualitativo e alheio aos esquemas de “hipótese-
verificação” da perspectiva positivista.
Os estudos em que Ferrarotti (2013, 2014) concebe as histórias de vida, numa perspectiva
crítica, vão ao encontro dessas apostas epistemopolítica, pós-colonial, e posdisciplinar
subjacentes ao movimento (auto)biográfico em Educação, e que no nosso entender necessitam
ser cada vez mais exploradas, investigadas, enriquecidas, no sentido em que os resultados das
pesquisas nessa área possam prestar os serviços que lhes compete nos estudos do humano,
promovendo, como sugere o autor, a democracia e a socialização dos conhecimentos, convictas
de que a construção do conhecimento na pesquisa (auto)biográfica só se faz com o outro e no
respeito ao outro, jamais pelo pesquisador isolado.
Essas grandes orientações servem aqui como pano de fundo para tentar esboçar o que
entendemos como representativo das configurações do movimento (auto)biográfico, no Brasil,
em Educação4. Esse movimento nos parece responder, essencialmente, às demandas da pesquisa
educacional, e às potencialidades de estudos com narrativas autobiográficas para superar
dificuldades das abordagens tradicionais. Podemos propor, face aos desdobramentos desse
movimento, dois grandes períodos: um primeiro momento de eclosão do autobiográfico e das
histórias de vida em Educação, que emerge nos anos 1990, e um segundo momento de expansão
e diversificação dos temas de pesquisa, que se inicia nos anos 2000.
O que evidenciam esses estudos, realizados com base em resumos de teses, dissertações
de mestrado, livros e artigos publicados, é que essa abordagem contribuiu, essencialmente, para
renovar a pesquisa no campo da Didática, sobre a formação docente no país, e fazer aflorar o
interesse por temáticas vinculadas à profissão, à profissionalização e à identidade docente. Eles
florescem ainda na história da educação brasileira, mediante o estudo da memória de seus
educadores, como demonstra o trabalho pioneiro de Demartini (1988), no território da pesquisa
histórico-sociológica. Cabe insistir desde já sobre essas duas grandes tendências como linhas de
força que permanecem atuantes no movimento (auto)biográfico no Brasil.
5
Memória(s), lembranças, relatos de vida, depoimentos, biografias, biografias educativas, memória educativa,
histórias de vida, história oral de vida, narrativas, narrativas memorialísticas, método biográfico, método
autobiográfico, método psicobiográfico, perspectiva autobiográfica.
6
Movimento liderado por Gaston Pineau, no Canadá e na França; Pierre Dominicé, Marie-Christine Josso e
Matthias Finger, na Suíça; Guy de Villers, na Bélgica; Bernadette Bonvalot, na França, e António Nóvoa, em
Portugal. Os pioneiros criam a primeira grande rede de pesquisa em histórias de vida em Educação, que se consolida
com a criação da Association Internationale des Histoires de Vie en Formation (ASIHVIF), em 1990. No site da
ASIHVIF, encontra-se a Carta da Associação <www.asihvif.com> na qual se definem os objetivos, princípios éticos
e deontológicos no uso das histórias de vida no contexto da formação continuada de adultos.
O princípio ético orientador das pesquisas com histórias de vida é que as narrativas da
experiência, longe de comunicar o que já se sabe, constituem-se verdadeiros processos de
descoberta e reinvenção de si. A dimensão heurística e autopoiética dessa reflexão permitiria
transformar saberes implícitos em conhecimentos. E no processo permanente de interpretação e
reinterpretação dos acontecimentos, para dar sentido às experiências, a pessoa que narra
reelabora o processo histórico de suas aprendizagens e se reinventa. É nesse sentido que se pode
conceber o uso das histórias de vida, ou de narrativas autobiográficas, como processos de
formação docente.
Para Pineau, é preciso conceber de outra maneira as perguntas que legitimam um campo
científico (Quem pesquisa o quê? Como? Por que?), relacionadas a aspectos práticos,
ideológicos, metodológicos e, essencialmente, epistemopolítico e, por assim dizer, pós-colonial.
O que diferencia a pesquisa-formação da pesquisa tradicional é que se acrescenta ao processo de
investigação a pessoa que se forma, legitimada a produzir e não a ingurgitar saberes sobre elas, o
que permite democratizar as instâncias produtivas do conhecimento. No modelo clássico, os
objetos de pesquisa têm em vista resultados que otimizem a ação educativa, independente de
quem refletiu sobre ela. Na pesquisa-formação, ao contrário, se sobressaem as práticas não-
instituídas e as aprendizagens experienciais. São elas que se constituem objetos de investigação
com amplas aberturas para as aprendizagens não formais e informais. Contrariamente ao modelo
tradicional, fundado em divisão disciplinar e na dicotomia teoria-prática, a pesquisa-formação
adota metodologias interativas, simbolizadas pelo traço de união que torna inseparáveis os
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Os memoriais, um gênero autobiográfico universitário, foi instituído na universidade brasileira nos anos 1930,
como requisito para ingresso e ascensão na carreira no magistério superior. Nos anos 1990, no contexto das reformas
nas políticas de formação docente, ele é retomado, em 1994, como prática de formação docente, dentro de uma
perspectiva de reflexão sobre a prática, aproximando-se do que Pineau caracteriza como pesquisa-formação.
(Passeggi, 2000, 2006, 2008, 2011a; 2011b.; Passeggi, Barbosa, 2011; Cordeiro e Souza, 2010; Abrahão, 2008;
Prado, Soligo 2008, Câmara, 2012).
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Passeggi y Sousa, O Movimento (Auto)Biográfico no Brasil
A partir dos anos 2000, observa-se nos estudos pós-graduados no Brasil, uma tendência
cada vez mais consistente na diversificação das preocupações de pesquisa dentro do movimento
(auto)biográfico. Ela se expressa, notadamente, na explosão de teses e de dissertações de
mestrados que recorrem ao “biográfico” e “autobiográfico”. Stephanou (2008) observa que entre
1990 e 2006 houve um deslocamento significativo dos temas de pesquisa. O uso desses termos
passa de 2% em 1997, para 21%, em 2006, nas teses e dissertações examinadas na área de
educação. Essa mudança é, possivelmente, impulsionada pelos trabalhos que se multiplicaram
nos grupos de pesquisa em diferentes universidades brasileiras que tomam como objeto ou
método de investigação as histórias de vida e os memoriais autobiográficos.
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Gaston Pineau (1983, 2013) utiliza o termo autobiografia no livro inaugural do movimento das histórias de vida
em formação “Produire sa vie: autoformation et autobiographie”.
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Passeggi y Sousa, O Movimento (Auto)Biográfico no Brasil
É importante ressaltar ainda aqui, segundo Passeggi (2016), uma característica importante
dos trabalhos de Christine Delory-Momberger para a diversificação do movimento
(auto)biográfico no Brasil, nos últimos anos. Observamos que sua reflexão é tributária de duas
grandes correntes em Educação nos estudos com as narrativas autobiográficas: a tradição alemã
da Biographieforschun (pesquisa biográfica), inaugurado pelo livro de Dieter Baake e Theodor
Shulze (Aprender a partir das histórias, 1979), e o movimento socioeducativo das histórias de
vida em formação, que emerge, simultaneamente, em países de língua francesa, e que tem no
livro de Gaston Pineau e Marie Michèle (1983) seu marco inaugural. Enquanto, a primeira
corrente está mais voltada para o mundo da educação de jovens, crianças e das relações
intergeracionais, a segunda preocupa-se mais precisamente com a formação permanente do
adulto e suas preocupações com o mundo do trabalho.
As temáticas das distintas edições, sua periodicidade e itinerância num país continental,
atestam decisões e ações inaugurais de uma comunidade de pesquisadores que tem se
preocupado com discussões sobre questões de fundo para o avanço da pesquisa (auto)biográfica.
Situamos abaixo as diferentes edições do Congresso, procurando tecer como vai evoluindo a
consolidação do movimento impulsionado, tanto pelas reuniões intermediárias que antecedem o
Congresso, cujo objetivo é analisar seus propósitos, seu formato, seus convidados, em função das
edições anteriores e do que resulta do Congresso para projeções futuras.
Dois anos depois, em 2012, o V CIPA retorna a Porto Alegre, e se realiza mais uma vez
na PUCRS. A formação, como espaço-tempo narrativo, que tem sido um dos lugares de destaque
das pesquisas, ganha, nessa edição uma maior centralidade. Isso se justifica pelas implicações
dos grupos de pesquisas voltados para o campo da formação inicial e profissional de professores.
O congresso indaga, sobremaneira, os desafios sobre perspectivas epistemológicas e teórico-
metodológicas das pesquisas e dos diferentes modos como têm sido construídos no campo
educacional a multiplicidade de temas, fontes e procedimentos de análises.
A edição mais recente, o VII CIPA, foi realizado, em Cuiabá, na Universidade Federal do
Mato Grosso (UFMT), em 2016. Podemos destacar quatro marcos relativos aos avanços do
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ANPED (Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação); SBHE (Sociedade Brasileira de História da
Educação); ASIHVIF (Association Internationale des Histoire de Vie en Formation); ANNIVIF (Associação Norte-
Nordeste das Histórias de Vida em Formação); AFIRSE (Association Francophone Internationale de Recherche en
Sciences de l’ Education).
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Passeggi y Sousa, O Movimento (Auto)Biográfico no Brasil
movimento (auto)biográfico. Pela primeira vez a sede do Congresso se desloca do litoral para o
interior do país, objetivando uma maior participação de associados de regiões mais afastadas do
eixo Sudeste, Sul e Nordeste. Na ocasião, é lançado o primeiro número da Revista da BIOgraph
– a RBPAB – enquanto periódico científico especializado na área de conhecimento com fontes
(auto)biográficas. Publiciza-se a criação do portal da BIOgraph e do seu Sistema de
Gerenciamento Acadêmico-Financeiro. Finalmente, por ocasião das reuniões intermediárias,
constitui-se um consenso sobre os eixos temáticos do CIPA, que se configuram, por uma lado,
como sínteses das seis edições anteriores, permitindo reunir de forma abrangente a diversidade
de pesquisas produzidas no Brasil e, por outro lado, como modos de fomentar outras indagações
epistemológicas, teóricas e metodológicas, considerando a diversidade de fontes (orais, escritas,
imagéticas, fotográficas, virtuais) que têm contribuído para outras modalidades de pesquisa em
suas diferentes manifestações.
centram nas narrativas de crianças, sobre a infância e para a infância, em diálogo com
perspectivas intergeracionais, focalizando questões sobre história da infância, da cultura escrita e
da educação, do ethos infantil e escolar, implicando em estudos sobre adoecimento, inclusão,
sexualidade, ludicidade, acompanhamento e reflexividade, no território do universo
autobiográfico infantil.
A afluência de pesquisadores em cada edição do CIPA, que reúne entre 1000 a 1300
participantes, é a prova de sua vitalidade. Em 2016, mesmo tendo se realizado à distância dos
centros de investigação situados no Sudeste, Sul e Nordeste, o VII CIPA contou com a
participação de um total de 591 associados da BIOgraph 11, entre pesquisadores universitários,
estudantes de pós-graduação e graduação, assim como professores da educação básica e
integrantes de movimentos sociais. Entre pesquisadores estrangeiros, destacam-se suas
vinculações a instituições da Europa (Alemanha, Espanha, França, Inglaterra, Portugal) e da
América Latina (Argentina, Colômbia, México, Peru, Porto Rico, Uruguai).
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É importante observar que as modalidades Rodas de conversa e Simpósios reúnem vários trabalhos, o que
multiplicaria por 4, por exemplo, o número de trabalhos aprovados em cada Simpósio.
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Em relação ao número de associados para o VI CIPA, realizado em novembro de 2014, na UERJ, identificamos
no Sistema de inscrição um total de 782 associados e de 902 trabalhos submetidos nos diferentes eixos. Para maiores
esclarecimentos sobre essas questões, consultar a análise construída por Bragança e Balassiano (2014, p. 12), na
„Carta Convite aos congressistas‟, publicada no livro de programa do VI CIPA (Mignot e Souza, 2014).
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Passeggi y Sousa, O Movimento (Auto)Biográfico no Brasil
Considerações em aberto
Ao longo dos últimos doze anos, conforme tentamos sintetizar aqui, o Congresso
Internacional de Pesquisa (Auto)Biográfica (CIPA) vem reunindo, a cada dois anos, um número
cada vez mais significativo de pesquisadores de diferentes nacionalidade e de diversas áreas do
conhecimento para participar, no Brasil, deste fórum de discussão com o objetivo de colaborar
para os avanços do movimento (auto)biográfico do ponto de vista nacional e internacional e
pensar os seus desafios. O Congresso, que se inscreve como uma iniciativa acadêmico-científica,
constitui um espaço privilegiado de partilha de conhecimentos e de democratização de saberes
decorrentes de pesquisas, fomentando a cooperação internacional, pesquisas e práticas de
formação que têm, nas narrativas biográficas e autobiográficas, seu campo de inserção, atuação e
sua centralidade.
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www.biograph.org.br/
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Passeggi y Sousa, O Movimento (Auto)Biográfico no Brasil
Referências
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http://www.revistas.uneb.br/index.php/rbpab
Investigación Cualitativa 2(1) 2016
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