Endocrinologia de Harrison
Endocrinologia de Harrison
Endocrinologia de Harrison
Organizadores
Dan L. Longo, md Anthony S. Fauci, md
Professor of Medicine, Harvard Medical School; Chief, Laboratory of Immunoregulation;
Senior Physician, Brigham and Women’s Hospital; Director, National Institute of Allergy and Infectious Diseases,
Deputy Editor, New England Journal of Medicine, National Institutes of Health,
Boston, Massachusetts Bethesda, Maryland
ENDOCRINOLOGIA
HARRISON
TM
Organizador
J. Larry Jameson, MD, PhD
Robert G. Dunlop Professor of Medicine;
Dean, University of Pennsylvania School of Medicine;
Executive Vice-President of the University of Pennsylvania
for the Health System, Philadelphia, Pennsylvania
2015
Obra originalmente publicada sob o título Harrison’s endocrinology, 3rd Edition
ISBN 0071814868 / 9780071814867
Original edition copyright (c)2013, McGraw-Hill Global Education Holdings, LLC, New York, New York 10121.
All rights reserved.
Portuguese language translation copyright (c)2015, AMGH Editora Ltda., A Grupo A Educação S.A. company.
All rights reserved.
Nota
A medicina é uma ciência em constante evolução. À medida que novas pesquisas e a experiência clínica ampliam
o nosso conhecimento, são necessárias modificações no tratamento e na farmacoterapia. Os autores desta obra
consultaram as fontes consideradas confiáveis, num esforço para oferecer informações completas e, geralmente, de
acordo com os padrões aceitos à época da publicação. Entretanto, tendo em vista a possibilidade de falha humana ou de
alterações nas ciências médicas, os leitores devem confirmar estas informações com outras fontes. Por exemplo, e em
particular, os leitores são aconselhados a conferir a bula de qualquer medicamento que pretendam administrar, para se
certificar de que a informação contida neste livro está correta e de que não houve alteração na dose recomendada nem
nas contraindicações para o seu uso. Essa recomendação é particularmente importante em relação a medicamentos
novos ou raramente usados.
É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquer formas
ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição na Web e outros),
sem permissão expressa da Editora.
vi
EQUIPE DE REVISÃO TÉCNICA
Medicina Interna de Harrison, 18a Edição
viii
PREFÁCIO
Medicina interna de Harrison tem sido uma fonte de informação con- tabolismo das lipoproteínas; (IV) Distúrbios que afetam múltiplos
fiável há mais de 60 anos. Ao longo do tempo, o tradicional livro- sistemas endócrinos; e (V) Distúrbios dos ossos e do metabolismo
-texto evoluiu para atender às demandas de internistas, médicos de do cálcio.
família e comunidade, enfermeiros e demais profissionais e estudan- Ao mesmo tempo em que Endocrinologia de Harrison é clássi-
tes da área da saúde. O pacote de produtos da marca Harrison agora co em sua organização, os leitores sentirão o impacto dos avanços
também inclui o Manual de medicina de Harrison, o Preparação para científicos ao explorar cada capítulo. Além dos avanços significativos
provas e concursos e o HarrisonBrasil.com. Este livro, Endocrinologia oriundos da genética e da biologia molecular, a introdução de um
a
de Harrison, agora em 3 edição, é uma compilação dos capítulos re- número sem precedentes de novos medicamentos no mercado, par-
lacionados a endocrinologia. ticularmente para o manejo de diabetes e osteoporose, está transfor-
Nossos leitores sempre percebem a qualidade do conteúdo apre- mando a área da endocrinologia. Diversos estudos clínicos recentes
sentado nas obras derivadas do Medicina interna de Harrison, dentro envolvendo doenças comuns como diabetes, obesidade, hipotireoi-
de cada especialidade. Nosso objetivo é disponibilizar os assuntos de dismo e osteoporose oferecem evidências sólidas para a tomada de
maneira mais compacta e dirigida. Incluímos também uma seção de decisão clínica e tratamento. Essas rápidas mudanças na endocrino-
preparação para provas e concursos, que apresenta perguntas e respos- logia estimulam novos estudantes de medicina e evidenciam a neces-
tas para estimular a reflexão, servindo como material didático adicional. sidade de atualização contínua para clínicos mais experientes.
As manifestações clínicas dos distúrbios endócrinos normal- Nosso acesso à informação por meio de publicações científicas
mente podem ser explicadas considerando-se o papel fisiológico e bancos de dados on-line é extremamente eficiente. Embora o valor
dos hormônios, que podem estar deficientes ou em excesso. Assim, dessas fontes de informação seja inestimável, a assustadora quanti-
compreender, em sua totalidade, a ação dos hormônios e os princí- dade de dados cria uma necessidade ainda maior de seleção e síntese
pios do controle por retroalimentação (feedback) proporcionará ao por especialistas da área. Assim, o preparo desses capítulos é uma
clínico utilizar uma abordagem lógica ao diagnóstico e uma estrutu- tarefa especial que requer a habilidade de filtrar informações cruciais
ra conceitual para a escolha do tratamento. O primeiro capítulo do a partir de uma base de conhecimento em constante expansão. Os
livro, “Princípios de Endocrinologia”, apresenta um panorama dos organizadores são muito gratos aos autores, um grupo de autoridades
sistemas. Utilizando diversos exemplos de pesquisa translacional, reconhecidas internacionalmente que se especializou em transformar
este capítulo introdutório relaciona genética, biologia celular e fisio- tópicos específicos em capítulos concisos e interessantes. Também
logia com fisiopatologia e tratamento. A integração da fisiopatologia somos muito gratos aos nossos colegas da McGraw-Hill. Jim Sha-
com o manejo clínico é marca registrada do Harrison, que pode ser nahan é um especialista em Harrison. A produção impecável foi de
encontrada em todos os capítulos subsequentes. O livro é dividido Kim Davis. Esperamos que este livro seja útil no esforço de aprender
em cinco Seções principais, que refletem as raízes fisiológicas da en- continuamente em nome dos pacientes.
docrinologia: (I) Distúrbios da hipófise, tireoide e suprarrenal; (II)
Endocrinologia reprodutiva; (III) Diabetes melito, obesidade e me- J. Larry Jameson, MD, PhD
Esta página foi deixada em branco intencionalmente.
SUMÁRIO
18 Síndrome Metabólica............................................................198
Robert H. Eckel
SEÇÃO I: Distúrbios da Hipófise,
Tireoide e Suprarrenal 19 Diabetes Melito.....................................................................204
Alvin C. Powers
2 Distúrbios da Adeno-Hipófise e do Hipotálamo......................12 20 Hipoglicemia.........................................................................240
Shlomo Melmed/J. Larry Jameson Philip E. Cryer/Stephen N. Davis
3 Distúrbios da Neuro‑Hipófise..................................................39 21 Distúrbios do Metabolismo das Lipoproteínas.....................247
Gary L. Robertson Daniel J. Rader/Helen H. Hobbs
4 Distúrbios da Glândula Tireoide..............................................48
J. Larry Jameson
Anthony P. Weetman SEÇÃO IV: Distúrbios que Afetam
5 Distúrbios do Córtex Suprarrenal...........................................77 Múltiplos Sistemas Endócrinos
Wiebke Arlt
22 Tumores Endócrinos do Trato Gastrintestinal e do
6 Feocromocitoma.....................................................................99 Pâncreas...............................................................................266
Hartmut P. H. Neumann Robert T. Jensen
CAPÍTULO 1
um hormônio circulante tradicional, é produzida no rim e estimula
a eritropoiese na medula óssea. O rim também está integralmen-
Princípios de Endocrinologia te envolvido no eixo renina-angiotensina (Cap. 5) e constitui um
alvo primário para vários hormônios, incluindo o paratormônio
(PTH), os mineralocorticoides e a vasopressina. O trato gastrintes-
J. Larry Jameson
tinal produz um número impressionante de hormônios peptídicos,
tais como colecistocinina, renina, gastrina, secretina e peptídio in-
O tratamento dos distúrbios endócrinos requer uma compreensão testinal vasoativo, entre muitos outros. O tecido adiposo produz a
abrangente do metabolismo intermediário, da fisiologia reprodu- leptina, que atua centralmente para controlar o apetite. Os tumores
Princípios de Endocrinologia
tiva, do metabolismo ósseo e do crescimento. Em consequência, a carcinoides e das ilhotas podem secretar quantidades excessivas
prática da endocrinologia está estreitamente ligada a uma estrutu- desses hormônios, dando origem a síndromes clínicas específicas
ra conceitual que nos permite compreender a secreção hormonal, a (Cap. 22). Muitos desses hormônios gastrintestinais são produzidos
ação dos hormônios e os princípios do controle por retroalimenta- também no SNC, onde suas funções são pouco compreendidas. À
ção (feedback). O sistema endócrino é avaliado sobretudo pela me- medida que hormônios como a inibina, a grelina e a leptina vão
dição das concentrações hormonais, o que confere ao clínico uma sendo descobertos, eles acabam sendo integrados à ciência e à prá-
informação diagnóstica muito valiosa. A maioria dos distúrbios do tica da medicina, com base muito mais em seus papéis funcionais
sistema endócrino é passível de tratamento efetivo, após ter sido es- do que em seus tecidos de origem.
tabelecido o diagnóstico correto. Os distúrbios de deficiência en- A caracterização dos receptores hormonais revela com frequên-
dócrina são tratados com reposição fisiológica dos hormônios; as cia relações inesperadas com fatores existentes em disciplinas não
condições com excesso de hormônio, que habitualmente são causa- endócrinas. Os receptores do hormônio de crescimento (GH) e da
das por adenomas glandulares benignos, são tratadas pela remoção leptina, por exemplo, são membros da família dos receptores das
cirúrgica dos tumores ou por redução dos níveis hormonais através citocinas. Os receptores acoplados à proteína G (GPCR, de G pro-
do uso de medicamentos. tein-coupled receptors), que medeiam as ações de muitos hormônios
peptídicos, estão envolvidos em inúmeros processos fisiológicos, in-
OBJETIVO DA ENDOCRINOLOGIA cluindo visão, olfação e neurotransmissão.
A especialidade da endocrinologia engloba o estudo das glândulas
e dos hormônios que elas produzem. O termo endócrino foi cunha- NATUREZA DOS HORMÔNIOS
do por Starling para diferenciar as ações dos hormônios secreta-
dos internamente (endócrinos) daqueles secretados externamente Os hormônios podem ser divididos em cinco classes principais: (1)
(exócrinos) ou lançados no interior de um lúmen, tais como o trato derivados dos aminoácidos, como dopamina, catecolamina e hormô-
gastrintestinal. O termo hormônio, que deriva da palavra grega que nio tireoidiano; (2) pequenos neuropeptídios, tais como o hormônio
significa “colocar em movimento”, descreve magistralmente as ações de liberação das gonadotrofinas (GnRH), o hormônio de liberação
dinâmicas dos hormônios em sua capacidade de induzir respostas da tireotrofina (TRH), a somatostatina e a vasopressina; (3) grandes
celulares e regular os processos fisiológicos por meio de mecanismos proteínas, tais como a insulina, o hormônio luteinizante (LH) e o
de retroalimentação. PTH, produzidos por glândulas endócrinas clássicas; (4) hormônios
Diferentemente de muitas outras especialidades na medicina, esteroides, como o cortisol e o estrogênio, que são sintetizados a par-
não é possível definir a endocrinologia com exatidão ao longo de tir de precursores com base no colesterol; e (5) derivados das vitami-
linhas anatômicas. As glândulas endócrinas clássicas – hipófise, ti- nas, tais como retinoides (vitamina A) e vitamina D. Vários fatores de
reoide, paratireoides, ilhotas pancreáticas, suprarrenais e gônadas – crescimento peptídicos, cuja maioria atua localmente, compartilham
se comunicam amplamente com outros órgãos por meio do sistema ações com os hormônios. Como regra, os derivados dos aminoácidos
nervoso, dos hormônios, das citocinas e dos fatores de crescimento. e os hormônios peptídicos interagem com os receptores de membra-
Além de suas funções sinápticas tradicionais, o cérebro produz uma na na superfície celular. Os esteroides, os hormônios tireoidianos, a
enorme variedade de hormônios peptídicos, e isso levou à discipli- vitamina D e os retinoides são lipossolúveis e interagem com recep-
na da neuroendocrinologia. Graças à produção dos fatores de libe- tores nucleares intracelulares.
ração hipotalâmicos, o sistema nervoso central (SNC) exerce uma
influência reguladora significativa sobre a secreção dos hormônios ■■ FAMÍLIAS DE HORMÔNIOS E RECEPTORES
hipofisários (Cap. 2). O sistema nervoso periférico estimula a medu- Muitos hormônios e receptores podem ser agrupados em famílias,
la suprarrenal. Os sistemas imunológico e endócrino também estão refletindo suas semelhanças estruturais (Quadro 1.1). A evolução
intimamente entrelaçados. O cortisol, o hormônio das suprarrenais, dessas famílias gera vias diversificadas, mas altamente seletivas de
é um poderoso imunossupressor. As citocinas e as interleucinas (IL) ação hormonal. O reconhecimento dessas relações torna possível a
exercem profundos efeitos sobre as funções da hipófise, da suprarre- extrapolação da informação proporcionada por um hormônio ou re-
nal, da tireoide e das gônadas. Doenças endócrinas comuns, como ceptor para outros membros da família.
a doença tireoideana autoimune e o diabetes melito tipo 1, são cau- A família de hormônios glicoproteicos, que consiste em hormô-
sadas por desregulação da vigilância e tolerância imunes. Doenças nio tireoestimulante (TSH), hormônio folículo-estimulante (FSH),
menos comuns, como a síndrome poliglandular, doença de Addison LH e gonadotrofina coriônica humana (hCG), ilustra muitas carac-
e hipofisite linfocítica, também têm base imunológica. terísticas dos hormônios correlatos. Os hormônios glicoproteicos
A interdigitação da endocrinologia com os processos fisiológi- são heterodímeros que têm em comum a subunidade ; as subuni-
cos em outras especialidades às vezes obscurece o papel dos hormô- dades são distintas e conferem funções biológicas específicas. A
nios. Por exemplo, os hormônios desempenham importante papel arquitetura tridimensional global das subunidades é semelhante,
na manutenção da pressão arterial, do volume intravascular e da refletindo as localizações das ligações dissulfeto conservadas que
resistência periférica no sistema cardiovascular. Substâncias vaso- restringem a conformação das proteínas. A clonagem dos genes
ativas como as catecolaminas, a angiotensina II, a endotelina e o da subunidade de muitas espécies sugere que essa família teve
óxido nítrico participam das alterações dinâmicas do tônus vascu- origem em um gene ancestral comum, provavelmente por duplica-
lar, além de seus inúmeros papéis em outros tecidos. O coração é a ção gênica e subsequente divergência de modo a desenvolver novas
principal fonte do peptídio atrial natriurético, que atua em confor- funções biológicas.
1
quanto o PTHrP se expressa em altos níveis durante o desenvolvi-
QUADRO 1.1 Famílias de receptores de membrana e vias mento, assim como também por meio de uma grande variedade de
sinalizadoras tumores (Cap. 24). Esses hormônios possuem uma semelhança na
sequência de aminoácidos, particularmente em suas regiões amino-
CAPÍTULO 1
2
mônios peptídicos, mas também para certos esteroides (testosterona do TSH são altamente específicas para a glândula tireoide. Sua meia-
→ diidrotestosterona) e para o hormônio tireoidiano (T4 → T3). -vida prolongada é responsável pelos níveis séricos relativamente
O processamento dos precursores hormonais está estreitamente constantes, apesar de o TSH ser secretado em pulsos descontínuos.
ligado às vias de separação intracelular que transportam as proteínas Uma boa compreensão da meia-vida dos hormônios circulantes
CAPÍTULO 1
para vesículas e enzimas apropriadas, resultando em etapas específi- é importante para se poder realizar a reposição hormonal fisiológica,
cas de clivagem, seguidas de dobra das proteínas e translocação para uma vez que a frequência de administração das doses e o período ne-
as vesículas secretórias. Os hormônios destinados a serem secretados cessário para alcançar o estado de equilíbrio dinâmico estão intima-
são transportados através do retículo endoplásmico sob a orientação mente ligados aos ritmos de declínio dos hormônios. Por exemplo, a
de uma sequência de sinalização aminoterminal que, subsequente- T4 tem uma meia-vida circulante de 7 dias. Consequentemente, é ne-
mente, é clivada. Os receptores de superfície celular são inseridos na cessário mais 1 mês para se alcançar um novo estado de equilíbrio di-
membrana através de curtos segmentos de aminoácidos hidrofóbicos nâmico, e as doses diárias únicas são suficientes para se conseguirem
que ficam ancorados na bicamada lipídica. Durante a translocação níveis hormonais constantes. Em contrapartida, a T3 possui meia-vida
Princípios de Endocrinologia
através dos retículos de Golgi e endoplásmico, os hormônios e os de 1 dia. Sua administração está associada a níveis séricos mais dinâ-
receptores estão sujeitos também a uma ampla variedade de modi- micos e deverá ser realizada 2 a 3 vezes/dia. De modo semelhante, os
ficações pós-translacionais, tais como glicosilação e fosforilação, que glicocorticoides sintéticos variam muito quanto à meia-vida; aqueles
pode alterar a conformação das proteínas, modificar a meia-vida de que têm meia-vida mais longa (p. ex., a dexametasona) estão asso-
circulação e alterar a atividade biológica. ciados a maior supressão do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal
A síntese da maioria dos hormônios esteroides baseia-se em mo- (HHSR). A maioria dos hormônios proteicos [por exemplo, ACTH,
dificações do precursor, que é o colesterol. São necessárias várias eta- GH, prolactina (PRL); PTH, LH] têm meia-vida relativamente curta
pas enzimáticas reguladas para que ocorra a síntese da testosterona (menos de 20 min), dando origem a pronunciados picos de secreção
(Cap. 8), do estradiol (Cap. 10), do cortisol (Cap. 5) e da vitamina D e declínio. A única maneira precisa de se obter o perfil da frequência
(Cap. 25). Esse grande número de etapas sintéticas predispõe a inú- e da amplitude dos pulsos desses hormônios consiste em medir os ní-
meros distúrbios genéticos e adquiridos da esteroidogênese. veis em amostras de sangue obtidas a intervalos muito curtos (a cada
Os genes endócrinos contêm elementos do DNA reguladores se- 10 min ou menos) durante longos períodos (8 a 24 h). Levando-se em
melhantes àqueles encontrados em muitos outros genes, porém seu conta que essa conduta não é prática em um ambiente clínico, uma
excelente controle por parte de outros hormônios exige também a estratégia alternativa consiste em juntar três a quatro amostras obtidas
presença de elementos específicos de resposta hormonal. Por exem- a intervalos de aproximadamente 30 min ou em interpretar os resulta-
plo, os genes do TSH são reprimidos diretamente pelos hormônios dos no contexto de uma faixa normal relativamente ampla. O declínio
tireoidianos que atuam por meio do receptor do hormônio tireoi- hormonal rápido é útil em certas circunstâncias clínicas. Por exemplo,
diano (TR), que é um membro da família dos receptores nucleares. a meia-vida curta do PTH permite que se utilizem suas determina-
A expressão dos genes das enzimas esteroidogênicas requer fatores ções intraoperatórias para se confirmar a remoção bem-sucedida de
específicos de transcrição, tais como o fator-1 esteroidogênico (SF-1), um adenoma. Isso é particularmente valioso do ponto de vista diag-
que atua em combinação com os sinais transmitidos pelos hormô- nóstico quando existe a possibilidade de doenças multicêntricas ou
nios tróficos (p. ex., ACTH ou LH). Para alguns hormônios, ocorre de hiperplasia das paratireoides, como ocorre na neoplasia endócrina
uma regulação substancial no nível da eficiência de tradução. A bios- múltipla (NEM) ou na insuficiência renal.
síntese da insulina, apesar de exigir uma transcrição gênica contínua, Muitos hormônios circulam em associação com as proteínas sé-
é regulada principalmente no nível de tradução em resposta aos ní- ricas ligadoras. Os exemplos incluem: (1) ligação de T4 e T3 à globu-
veis elevados de glicose ou de aminoácidos. lina ligadora de tiroxina (TBG), albumina, e pré-albumina ligadora
de tiroxina (TBPA); (2) ligação do cortisol à globulina ligadora do
cortisol (CBG); (3) ligação do androgênio e do estrogênio à globulina
■■ SECREÇÃO, TRANSPORTE E DEGRADAÇÃO DOS HORMÔNIOS ligadora dos hormônios sexuais (SHBG) (também denominada glo-
O nível circulante de um hormônio é determinado por seu ritmo bulina ligadora da testosterona, TeBG); (4) ligação de IGF-I e IGF-II
de secreção e sua meia-vida circulante. Após o processamento das a várias proteínas ligadoras de IGF (IGFBP); (5) interações de GH
proteínas, os hormônios peptídicos (GnRH, insulina, GH) são ar- com a proteína ligadora de GH (GHBP), um fragmento circulante
mazenados nos grânulos secretórios. À medida que esses grânulos do domínio extracelular do receptor GH; e (6) fixação da activina
amadurecem, são estabilizados debaixo da membrana plasmática à folistatina. Essas interações proporcionam um reservatório hor-
para sua liberação iminente na circulação. Na maioria das circuns- monal, previnem a degradação bastante rápida dos hormônios não
tâncias, o estímulo para a secreção hormonal é um fator de liberação ligados (livres), restringem o acesso do hormônio a certos locais (p.
ou um sinal neural que induz mudanças rápidas nas concentrações ex., IGFBP) e modulam as concentrações dos hormônios não ligados
intracelulares de cálcio, acarretando a fusão dos grânulos secretó- ou “livres”. Já foi identificada uma ampla variedade de anormalida-
rios com a membrana plasmática e a liberação de seu conteúdo no des das proteínas ligadoras, porém a maioria não tem consequências
ambiente extracelular e na corrente sanguínea. Em contrapartida, os clínicas, determinando apenas problemas diagnósticos. Por exemplo,
hormônios esteroides se difundem e penetram na circulação à me- a deficiência de TBG pode reduzir acentuadamente os níveis totais
dida que são sintetizados. Assim sendo, seus ritmos secretórios são de hormônios tireoidianos, porém as concentrações livres de T4 e T3
estreitamente alinhados com os ritmos de sua síntese. Por exemplo, continuam sendo normais. Doenças hepáticas e certas medicações
o ACTH e o LH induzem a esteroidogênese ao estimular a atividade também podem interferir nos níveis das proteínas ligadoras (p. ex., o
da proteína de regulação aguda da esteroidogênese (StAR, de steroi- estrogênio induz um aumento da TBG) ou causam deslocamento dos
dogenic acute regulatory) (transporta o colesterol para o interior da hormônios e sua separação das proteínas ligadoras (p. ex., o salsalato
mitocôndria), juntamente com outras etapas que limitam o ritmo (p. separa T4 da TBG). Em geral, apenas o hormônio livre (não ligado)
ex., enzima responsável pela clivagem das cadeias laterais do coleste- está disponível para interagir com os receptores e, dessa forma, indu-
rol, CYP11A1) na via esteroidogênica. zir uma resposta biológica. As perturbações a curto prazo nas pro-
O transporte e a degradação dos hormônios determinam a ra- teínas ligadoras modificam a concentração dos hormônios livres, o
pidez com que um sinal hormonal declina. Alguns sinais hormonais que, por sua vez, induz adaptações compensatórias por meio de alças
são evanescentes (p. ex., somatostatina), enquanto outros são muito de retroalimentação. As modificações na SHBG (globulina ligadora
mais duradouros (p. ex., TSH). Já que a somatostatina exerce efei- dos hormônios sexuais) em mulheres constituem uma exceção a esse
tos em praticamente todos os tecidos, uma meia-vida curta faz sua mecanismo autocorretivo. Quando a SHBG diminui em virtude da
concentração e suas ações serem controladas localmente. As modi- resistência à insulina ou de um excesso de androgênio, a concentra-
ficações estruturais que interferem na degradação da somatostatina ção da testosterona não ligada aumenta, resultando potencialmente
revelaram-se úteis para a geração de análogos terapêuticos de ação em hirsutismo (Cap. 13). O nível aumentado de testosterona não li-
prolongada, como o octreotide (Cap. 2). Em contrapartida, as ações gada não resulta em uma correção por retroalimentação compensa-
3
tória adequada, porque o estrogênio, e não Sete domínios
a testosterona, é o regulador primário do transmembrana acoplados Insulina/IGF-I
Citocina/GH/PRL Tirosinoquinase
eixo reprodutivo. à proteína G
Uma outra exceção à hipótese do hor-
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 1
rilação de membros da família de transdução de sinais e ativadores A maioria dos receptores nucleares se liga ao DNA como dímeros.
da transcrição (STAT, de signal transduction and activators of trans- Consequentemente, cada monômero reconhece um motivo de DNA
cription) – assim como com outras vias da sinalização (Ras, PI3-K, individual, denominado “meio sítio”. Os receptores esteroides, in-
MAPK). As proteínas STAT ativadas se deslocam para o núcleo e es- cluindo os receptores para glicocorticoides, estrogênio, progesterona
timulam a expressão de genes-alvo. e androgênio, se unem ao DNA como homodímeros. Em conformi-
Os receptores serina quinase medeiam as ações das ativinas, fator dade com essa simetria dupla, seus meios sítios de reconhecimento
de crescimento transformador , a substância inibidora mülleriana do DNA são palindrômicos. Os receptores de hormômio tireoideano,
(MIS, também conhecida como hormônio antimülleriano, AMH) e do ácido retinoico, do proliferador do peroxissomo ativado e da vita-
Princípios de Endocrinologia
as proteínas morfogênicas do osso (BMP). Essa família de receptores mina D se ligam ao DNA preferencialmente como heterodímeros em
(que consiste nas subunidades tipos I e II) sinaliza através de pro- combinação com os receptores do retinoide X (RXR). Seus meios-
teínas denominadas smads (fusão dos termos para Caenorhabditis -sítios de DNA se organizam como repetições diretas.
elegans sma + mad dos mamíferos). Assim como as proteínas STAT, O domínio de ligação hormonal carboxiterminal medeia o con-
as smads desempenham o duplo papel de transdução do sinal do re- trole transcripcional. Para os receptores tipo II, como o receptor do
ceptor e de atuação como fatores de transcrição. As ações pleomórfi- hormônio tireoidiano (TR) e o receptor do ácido retinoico (RAR), as
cas desses fatores de crescimento estabelecem que eles atuam princi- proteínas correpressoras se acoplam ao receptor na ausência de ligante
palmente em uma esfera local (parácrina ou autócrina). As proteínas e silenciam a transcrição gênica. A ligação hormonal induz alterações
ligadoras, como a folistatina (que se une à ativina e a outros membros da conformação, acarretando a liberação de correpressores e induzin-
dessa família) funcionam para inativar os fatores de crescimento e do o recrutamento de coativadores que estimulam a transcrição. As-
restringir sua distribuição. sim sendo, esses receptores são capazes de mediar alterações impor-
tantes no nível de atividade gênica. Certos estados patológicos estão
■■ RECEPTORES NUCLEARES associados a uma regulação defeituosa desses eventos. Por exemplo,
A família dos receptores nucleares cresceu até alcançar cerca de as mutações no TR previnem a dissociação do correpressor, resul-
100 membros, muitos dos quais ainda são classificados como re- tando em uma forma dominante de resistência hormonal (Cap. 4).
ceptores órfãos, porque seus ligantes, se é que existem, ainda não Na leucemia promielocítica, a fusão de RAR com outras proteínas
foram identificados (Fig. 1.2). Quanto ao resto, a maioria dos nucleares causa um silenciamento gênico aberrante e impede a dife-
receptores nucleares é classificada com base na natureza de seus renciação celular normal. O tratamento com ácido retinoico reverte
ligantes. Apesar de todos os receptores nucleares atuarem essen- essa repressão e permite a ocorrência de diferenciação celular e de
cialmente no sentido de aumentar e reduzir a transcrição gênica, apoptose. A maioria dos receptores de esteroides tipo I interage fraca-
alguns (p. ex., o receptor para os glicocorticoides) residem princi- mente com os correpressores, porém o acoplamento ao ligante ainda
palmente no citoplasma, enquanto outros (p. ex., o receptor para o induz interações com uma série de coativadores. A cristalografia com
hormônio tireoidiano) estão sempre localizados no núcleo. Após raios X mostra que vários SERM induzem conformações distintas do
o acoplamento do ligante, os receptores localizados no citoplasma receptor estrogênico. As respostas teciduais específicas causadas por
se deslocam para o núcleo. Existe evidência crescente de que cer- esses agentes na mama, no osso e no útero parecem refletir interações
tos receptores nucleares (p. ex., glicocorticoide, estrogênio) podem distintas com os coativadores. O complexo receptor-coativador esti-
atuar também no nível da membrana ou no citoplasma para ativar mula a transcrição gênica por várias vias, incluindo (1) recrutamen-
ou reprimir as vias de transdução dos sinais, proporcionando um to de enzima (histona acetiltransferase), que modifica a estrutura da
mecanismo para a interação (diálogo) entre receptores de mem- cromatina, (2) interação com outros fatores de transcrição no gene-
brana e receptores nucleares. -alvo e (3) interações diretas com componentes do aparelho geral de
transcrição a fim de acelerar o ritmo de
transcrição mediada por RNA polimera-
Receptores esteroides Receptores heterodímeros Receptores órfãos
homodímeros
se II. Os estudos da transcrição mediada
por receptores mostram que esses são
ER, AR, PR, GR TR, VDR, RAR, PPAR SF-1, DAX-1, HNF4α
eventos dinâmicos que envolvem ciclos
Ligantes relativamente rápidos (p. ex., de 30 a 60
min) de complexos de transcrição em
qualquer gene-alvo específico.
– + Basal – + – + ■■ CRESCIMENTO
Hormônio Hormônio Receptor Vários hormônios e fatores nutricio-
Figura 1.2 Sinalização dos receptores nucleares. ER, receptores estrogênicos; AR, receptor androgênico; PR, nais medeiam o complexo fenômeno do
receptor da progesterona; GR, receptor dos glicocorticoides; TR, receptores do hormônio tireoidiano; VDR, receptor da crescimento (Cap. 2). A baixa estatura
vitamina D; RAR, receptor do ácido retinoico; PPAR, receptor ativado por proliferadores de peroxissomo; SF-1, fator pode ser causada por deficiência de GH,
esteroidogênico 1; DAX, hipoplasia congênita suprarrenal com reversão s ; HNF4, fator hepático nuclear 4. hipotireoidismo, síndrome de Cushing,
5
puberdade precoce, desnutrição, doença crônica ou anormalidades envolve uma interação orquestrada de vários hormônios, fenômeno
genéticas que afetam as placas de crescimento epifisárias (p. ex., muito bem ilustrado pelas alterações hormonais dinâmicas que ocor-
mutações FGFR3 e SHOX). Muitos fatores (GH, IGF-I, hormônios rem durante cada ciclo menstrual com duração de 28 dias. No início
tireoidianos) estimulam o crescimento, enquanto outros (esteroides da fase folicular, a secreção pulsátil de LH e FSH estimula a maturação
CAPÍTULO 1
sexuais) resultam em fechamento epifisário. A compreensão dessas progressiva do folículo ovariano. Isso resulta em níveis gradualmente
interações hormonais é importante no diagnóstico e tratamento dos mais elevados de estrogênio e progesterona, determinando uma
distúrbios do crescimento. Por exemplo, o adiamento da exposição maior sensibilidade da hipófise ao GnRH, a qual, quando combinada
aos altos níveis de esteroides sexuais pode melhorar a eficácia do tra- com uma secreção acelerada desse hormônio, desencadeia um pico de
tamento com GH. LH e a ruptura do folículo maduro. A inibina, uma proteína produ-
zida pelas células da granulosa, acelera o crescimento folicular e atua
■■ MANUTENÇÃO DA HOMEOSTASE por retroalimentação sobre a hipófise para suprimir seletivamente o
Apesar de praticamente todos os hormônios afetarem a homeostase, FSH, sem afetar o LH. Certos fatores do crescimento, como EGF e
os mais importantes são os seguintes:
Princípios de Endocrinologia
■■ REPRODUÇÃO
Suprarrenal Gônadas
Os estágios da reprodução são: (1) determinação do sexo durante o
desenvolvimento fetal (Cap. 7); (2) maturação sexual durante a pu-
berdade (Caps. 8 e 10); (3) concepção, gestação, lactação e criação Tireoide
(educação) da prole (Cap. 10); e (4) interrupção da capacidade repro- Figura 1.3 Regulação por retroalimentação dos eixos endócrinos. SNC,
dutiva por ocasião da menopausa (Cap. 12). Cada um desses estágios sistema nervoso central.
6
duz um aumento rápido na secreção de TRH e TSH, resultando em tível de supressão pelos glicocorticoides administrados à noite, pois
estimulação da tireoide e maior produção de hormônio tireoidiano. estes atenuam a elevação matinal do ACTH. A compreensão desses
Quando o hormônio tireoidiano alcança um nível normal, volta a atu- ritmos torna possível uma reposição dos glicocorticoides que simula
ar no sentido de suprimir o TRH e o TSH, sendo alcançado um novo a produção diurna pela administração de doses mais altas pela manhã
CAPÍTULO 1
estado estável (de equilíbrio dinâmico). A regulação por retroalimen- do que durante a tarde. Os ritmos do sono interrompidos podem alte-
tação ocorre também para os sistemas endócrinos que não envolvem a rar a regulação hormonal. Por exemplo, a privação de sono causa uma
hipófise, como o feedback do cálcio sobre o PTH, a inibição da secre- ligeira resistência à insulina, compulsão por alimento e hipertensão,
ção de insulina pela glicose e o feedback da leptina sobre o hipotálamo. que são reversíveis pelo menos a curto prazo.
Uma boa compreensão da regulação por retroalimentação proporcio- Outros ritmos endócrinos ocorrem em conformidade com uma
na grande entendimento acerca dos paradigmas dos testes endócrinos escala temporal mais rápida. Muitos hormônios peptídicos são se-
(ver adiante). cretados em picos descontínuos a cada poucas horas. As secreções
O controle por retroalimentação positiva também ocorre, porém de LH e de FSH são extremamente sensíveis à frequência dos pul-
Princípios de Endocrinologia
não é bem compreendido. O principal exemplo é a estimulação me- sos de GnRH. São necessários pulsos intermitentes de GnRH para
diada por estrogênio do pico de LH na metade do ciclo. Apesar de os manter a sensibilidade hipofisária, enquanto a exposição contínua
níveis cronicamente baixos de estrogênio serem inibitórios, as eleva- ao GnRH acarreta a dessensibilização dos gonadotrofos hipofisários.
ções graduais nesses níveis estimulam a secreção de LH. Esse efeito, Esta característica do eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadotrofino
que é ilustrativo de um ritmo endócrino (ver adiante), envolve a ativa- constitui a base para a utilização de agonistas de GnRH a longo prazo
ção do gerador de pulsos hipotalâmicos de GnRH. Além disso, os go- para tratar puberdade precoce central ou para reduzir os níveis de
nadotrofos estrogênio-condicionados são extraordinariamente sen- testosterona no tratamento do câncer de próstata.
síveis ao GnRH, acarretando uma amplificação na liberação de LH. É importante estar ciente da natureza pulsátil da secreção hor-
monal e dos padrões rítmicos da produção dos hormônios para
■■ CONTROLE PARÁCRINO E AUTÓCRINO relacionar as mensurações séricas dos hormônios com os valores
Os exemplos anteriormente mencionados de controle por re- normais. Para alguns hormônios, foram desenvolvidos marcadores
troalimentação envolvem as vias endócrinas clássicas em que os integrados capazes de evitar flutuações hormonais. Os exemplos in-
hormônios são liberados por uma glândula e atuam sobre uma cluem coleta de urina de 24 h para cortisol, IGF-I como marcador
glândula-alvo distante. No entanto, os sistemas reguladores locais, biológico de ação de GH e HbA1c como indicador do controle a lon-
que costumam envolver fatores do crescimento, são cada vez mais go prazo (semanas a meses) da glicose sanguínea.
reconhecidos. Regulação parácrina refere-se aos fatores liberados Com frequência, devem ser interpretados os dados endócrinos
por uma célula que atuam sobre uma célula adjacente no mesmo apenas no contexto de outros hormônios. Por exemplo, os níveis de
tecido. Por exemplo, a secreção de somatostatina pelas células PTH são avaliados em combinação com as concentrações séricas
das ilhotas pancreáticas inibe a secreção de insulina pelas células de cálcio. Um alto nível sérico de cálcio em associação com PTH
próximas. Regulação autócrina descreve a ação de um fator so- elevado é sugestivo de hiperparatireoidismo, enquanto um PTH
bre a mesma célula pela qual ele é produzido. O IGF-I atua sobre suprimido nessa situação é causado mais provavelmente pela hi-
muitas células que o produzem, incluindo condrócitos, epitélio percalcemia da malignidade ou por outras causas de hipercalcemia.
mamário e células gonadais. Diferentemente das ações endócri- De maneira semelhante, o TSH deveria estar elevado quando as
nas, os controles parácrino e autócrino são difíceis de documen- concentrações de T4 e T3 são baixas, refletindo uma inibição por
tar, pois as concentrações locais do fator de crescimento não po- retroalimentação reduzida. Quando isso não ocorre, é importante
dem ser medidas prontamente. pensar em hipotireoidismo secundário, que é causado por um de-
As relações anatômicas dos sistemas glandulares também in- feito no nível da hipófise.
fluenciam acentuadamente a exposição hormonal – a organização
física das células das ilhotas aprimora sua comunicação intercelular;
O sistema vascular porta-hipofisário expõe a hipófise a altas concen- MECANISMOS PATOLÓGICOS DE DOENÇA ENDÓCRINA
trações dos fatores de liberação hipotalâmica. Os túbulos seminífe- As doenças endócrinas podem ser divididas em três tipos principais:
ros testiculares acabam sendo expostos a altos níveis de testosterona (1) excesso hormonal, (2) deficiência hormonal e (3) resistência hor-
produzidos pelas células de Leydig interdigitadas; o pâncreas recebe monal (Quadro 1.2).
informação acerca dos nutrientes e exposição local a hormônios pep-
tídicos (incretinas) do trato gastrintestinal; e o fígado é o alvo proxi- ■■ CAUSAS DE EXCESSO HORMONAL
mal da ação da insulina, por causa da drenagem portal proveniente As síndromes de excesso hormonal podem ser causadas por cresci-
do pâncreas. mento neoplásico de células endócrinas, doenças autoimunes e admi-
nistração excessiva de hormônio. Os tumores endócrinos benignos,
■■ RITMOS HORMONAIS incluindo os adenomas das paratireoides, da hipófise e da suprarrenal,
Os sistemas reguladores por retroalimentação descritos anteriormen- costumam ter a capacidade de produzir hormônios, o que talvez refli-
te se superpõem aos ritmos hormonais que são utilizados para adap- ta o fato de serem relativamente bem diferenciados. Muitos tumores
tação ao meio ambiente. As modificações sazonais, a ocorrência diária endócrinos exibem defeitos sutis em seus “pontos de ajuste” para a
do ciclo de luz-escuro, o sono, as refeições e o estresse são exemplos regulação por retroalimentação. Por exemplo, na doença de Cushing,
ambientais que afetam os ritmos hormonais. O ciclo menstrual se re- o comportamento da inibição por retroalimentação da secreção de
pete em média a cada 28 dias, refletindo o período necessário para a ACTH está associada à função autônoma. Contudo, as células tumo-
maturação folicular e a ovulação (Cap. 10). Essencialmente, todos os rais não são totalmente resistentes à retroalimentação, conforme se
ritmos dos hormônios hipofisários estão atrelados ao sono e ao ciclo evidencia pela supressão do ACTH por doses mais altas de dexameta-
circadiano, gerando padrões reprodutíveis que são repetidos apro- sona (p. ex., teste da dexametasona em altas doses) (Cap. 5). Defeitos
ximadamente a cada 24 h. O eixo HHSR, por exemplo, exibe picos semelhantes no ponto de ajuste são típicos também dos adenomas de
característicos de produção de ACTH e de cortisol de manhã bem paratireoides assim como dos nódulos autônomos de tireoide.
cedo, com um nadir durante a noite. O reconhecimento desses ritmos As bases moleculares de alguns tumores endócrinos, como as
é importante para os testes endócrinos e o tratamento. Quando com- síndromes NEM (NEM 1, 2A, 2B), proporcionaram grande com-
parados aos indivíduos normais (Cap. 5), os pacientes com síndrome preensão acerca da tumorigênese (Cap. 23). A NEM 1 se caracteri-
de Cushing exibem caracteristicamente níveis aumentados de cortisol za principalmente por uma tríade de tumores das paratireoides, das
à meia-noite. Em contrapartida, os níveis de cortisol pela manhã são ilhotas pancreáticas e da hipófise. A NEM 2 predispõe a carcinoma
semelhantes nesses grupos, pois o cortisol é normalmente alto nesse medular da tireoide, feocromocitoma e hiperparatireoidismo. O gene
período do dia em indivíduos normais. O eixo HHSR é mais susce- para NEM1, localizado no cromossomo 11q13, codifica um supos-
7
carcinoma medular da tireoide. A elucidação desse mecanismo pa-
QUADRO 1.2 Causas de disfunção endócrina togenético tornou possível a triagem genética precoce para as muta-
Tipo de distúrbio endócrino Exemplos ções RET em indivíduos que correm risco de NEM 2, possibilitando
a identificação daqueles que podem ser beneficiados por tireoidecto-
CAPÍTULO 1
Ectópica Secreção ectópica de ACTH, SIADH -se predominantemente nos domínios transmembrana e induzem o
acoplamento do receptor com a Gs até mesmo na ausência do hor-
Neoplasia endócrina múltipla NEM 1, NEM 2
mônio. Consequentemente, a adenilato ciclase é ativada, e os níveis
Autoimune Doença de Graves de monofosfato de adenosina (AMP) cíclico aumentam de modo
Iatrogênica Síndrome de Cushing, hipoglicemia a simular uma ação hormonal. Um fenômeno semelhante resulta
Infecciosa/inflamatória Tireoidite subaguda das mutações ativadoras da Gs. Quando estas mutações ocorrem
Mutações ativadoras dos Receptores de LH, TSH, Ca2+ e PTH, Gs precocemente durante o desenvolvimento, causam a síndrome de
receptores McCune-Albright. Quando ocorre apenas nos somatotrofos, as
mutações ativadoras da Gs causam tumores secretores de GH e
Hipofunção acromegalia (Cap. 2).
Autoimune Tireoidite de Hashimoto, diabetes melito Na doença de Graves autoimune, as interações dos anticorpos
Tipo 1, doença de Addison, insuficiência com o receptor do TSH simulam a ação desse hormônio (TSH), re-
poliglandular sultando em superprodução hormonal (Cap. 4). De maneira análoga
Iatrogênica Hipopituitarismo induzido por irradiação, aos efeitos das mutações ativadoras do receptor do TSH, esses auto-
hipotireoidismo, cirúrgico anticorpos estimuladores induzem mudanças conformacionais que
Infecciosa/inflamatória Insuficiência suprarrenal, sarcoidose
liberam o receptor de um estado reprimido, induzindo dessa forma o
hipotalâmica acoplamento do receptor às proteínas G.
Mutações hormonais GH, LH, FSH, vasopressina
■■ CAUSAS DE DEFICIÊNCIA HORMONAL
Defeitos enzimáticos Deficiência de 21‑hidroxilase
A maioria dos exemplos dos estados de deficiência hormonal pode
Defeitos do Síndrome de Kallmann, síndrome de ser atribuída à destruição glandular causada por autoimunidade, ci-
desenvolvimento Turner, fatores de transcrição
rurgia, infecção, inflamação, infarto, hemorragia ou infiltração tu-
Deficiência nutricional/ Deficiência de vitamina D, deficiência de moral (Quadro 1.2). A destruição autoimune da tireoide (tireoidite
vitamínica iodo de Hashimoto) e das células das ilhotas pancreáticas (diabetes me-
Hemorragia/infarto Síndrome de Sheehan, insuficiência lito tipo 1) é uma causa prevalente de doença endócrina. Mutações
suprarrenal em vários hormônios, receptores hormonais, fatores de transcrição,
enzimas e canais também podem resultar em deficiências hormonais.
Resistência hormonal
Mutações dos receptores ■■ RESISTÊNCIA HORMONAL
De membrana GH, vasopressina, LH, FSH, ACTH, GnRH, A maioria das síndromes graves de resistência hormonal é causada
GHRH, PTH, leptina, Ca2+ por defeitos hereditários nos receptores de membrana, nos receptores
Nucleares AR, TR, VDR, ER, GR, PPAR nucleares ou nas vias que realizam a transdução dos sinais. Esses dis-
Mutações nas vias Osteodistrofia hereditária de Albright túrbios se caracterizam por ação hormonal defeituosa, não obstante
sinalizadoras a presença de maiores níveis de hormônios. Na resistência completa
Pós‑receptor Diabetes melito tipo 2, resistência à aos androgênios, por exemplo, as mutações no receptor dos androgê-
leptina nios resulta em um aspecto fenotípico feminino nos homens genéti-
cos (XY), apesar de os níveis de LH e de testosterona estarem aumen-
Nota: AR, receptor do androgênio; ER, receptor do estrogênio; GR, receptor dos glicocorticoides; tados (Cap. 7). Além desses distúrbios genéticos relativamente raros,
PPAR, receptor ativado por proliferadores de peroxissomo; SIADH, síndrome de secreção inapro-
priada de hormônio antidiurético; TR, receptor do hormônio tireoidiano; VDR, receptor da vitamina
as formas adquiridas mais comuns de resistência hormonal funcio-
D. Para todas as outras abreviações, ver o texto. nal incluem a resistência à insulina no diabetes tipo 2, a resistência
à leptina na obesidade e a resistência ao GH nos estados catabólicos.
A patogênese da resistência funcional envolve a down regulation dos
receptores e dessensibilização das vias sinalizadoras pós-receptor; em
to gene supressor tumoral, denominado menina. À semelhança do geral, as formas funcionais de resistência são reversíveis.
paradigma descrito pela primeira vez para o retinoblastoma, o in-
divíduo acometido herda uma cópia mutante do gene para NEM 1,
e a tumorigênese ocorre depois que um “segundo golpe” somático
ABORDAGEM AO
resulta em perda da função do gene para NEM 1 normal (por meio Doença endócrina
PACIENTE
da deleção ou de mutações pontuais).
Ao contrário da inativação de um gene supressor tumoral, como Como a maioria das glândulas é relativamente inacessível, o
ocorre na NEM 1 assim como em outras síndromes cancerosas here- exame geralmente se concentra nas manifestações do excesso
ditárias, a NEM 2 é causada por mutações ativadoras em um único ou de deficiência hormonal, assim como no exame direto das
alelo. Nesse caso, as mutações ativadoras do proto-oncogene RET, glândulas palpáveis, como a tireoide e as gônadas. Por esses
que codifica um receptor tirosinoquinase, resulta em hiperplasia das motivos, é importante avaliar os pacientes no contexto de seus
células C da tireoide na infância antes do desenvolvimento de um
8
sintomas de apresentação, rever os sistemas, a história fami- O valor das mensurações hormonais quantitativas reside em
liar e social e a exposição a medicações que possam afetar o sua interpretação correta em um determinado contexto clínico.
sistema endócrino. É necessária perspicácia clínica para se A variação normal para a maioria dos hormônios é relativamente
CAPÍTULO 1
detectarem sinais e sintomas sutis sugestivos de doença en- ampla, às vezes variando por um fator de 2 a 10 vezes. As varia-
dócrina subjacente. Por exemplo, um paciente com síndrome ções normais para muitos hormônios são específicas para o sexo
de Cushing pode manifestar achados específicos, como re- e a idade. Assim sendo, a utilização de um banco de dados nor-
distribuição central da gordura, estrias e fraqueza muscular mativos corretos constitui parte essencial na interpretação dos
proximal, além das características comumente observadas na testes hormonais. A natureza pulsátil dos hormônios e os fatores
população em geral, tais como obesidade, pletora, hipertensão que podem afetar sua secreção, como o sono, as refeições e as me-
e intolerância à glicose. De modo semelhante, o início insidio- dicações, também devem ser considerados. Os níveis de cortisol
so do hipotireoidismo – com lentidão mental, fadiga, resse- aumentam 5 vezes entre meia-noite e o amanhecer; os níveis dos
camento da pele e outras características – pode ser difícil de hormônios da reprodução variam drasticamente durante o ciclo
Princípios de Endocrinologia
distinguir de achados inespecíficos semelhantes encontrados menstrual feminino.
na população em geral. É necessário um raciocínio clínico, Para muitos sistemas endócrinos, grande parte da infor-
baseado no conhecimento da prevalência e da fisiopatologia mação pode ser obtida a partir de testes hormonais basais, em
da doença, para decidir quando se deve realizar uma avaliação especial quando diferentes componentes de um eixo endócrino
mais extensa desses distúrbios. Os testes laboratoriais desem- são avaliados simultaneamente. Por exemplo, níveis de testos-
penham papel essencial na endocrinologia por possibilitarem terona baixos e de LH elevados sugerem um problema gonadal
a determinação quantitativa e dinâmica dos níveis hormonais. primário, enquanto um distúrbio hipotalâmico-hipofisário é
Os exames de imagem, como a TC, a ressonância magnética, provável quando tanto os níveis do LH quanto os da testosterona
a cintilografia e a ultrassonografia, também são usados para são baixos. Como o TSH é um indicador sensível da função ti-
se estabelecer o diagnóstico dos distúrbios endócrinos. Entre- reoidiana, em geral é recomendado como teste de primeira linha
tanto, esses exames em geral são utilizados apenas depois que para doenças da tireoide. Um nível elevado de TSH resulta quase
uma anormalidade hormonal foi estabelecida através de testes sempre de hipotireoidismo primário, enquanto um TSH baixo é
bioquímicos. causado mais frequentemente por tireotoxicose. Podem-se con-
MENSURAÇÕES HORMONAIS E TESTES ENDÓCRINOS Os imunoen-
firmar essas predições determinando-se o nível de tiroxina livre.
saios são o instrumento diagnóstico mais importante na endo- Níveis elevados de cálcio e de PTH sugerem hiperparatireoidis-
crinologia, pois permitem determinações sensíveis, específicas e mo, enquanto o PTH é suprimido na hipercalcemia causada por
quantitativas dos níveis basais e das alterações dinâmicas das con- doenças malignas ou granulomatosas. Um ACTH suprimido na
centrações hormonais. Os imunoensaios utilizam anticorpos para vigência de hipercortisolemia, ou de cortisol livre urinário au-
detectar hormônios específicos. Para muitos hormônios peptídi- mentado, são observados com os adenomas hiperfuncionantes
cos, essas mensurações são configuradas atualmente para utilizar da suprarrenal.
dois anticorpos diferentes a fim de aumentar a afinidade e a es- Não é raro, porém, que os níveis basais dos hormônios as-
pecificidade de ligação. Existem muitas variações desses ensaios; sociados a condições endócrinas patológicas se sobreponham à
um formato comum consiste na utilização de um único anticorpo variação normal. Nessas circunstâncias, os testes dinâmicos são
para capturar o antígeno (hormônio) sobre uma superfície imo- úteis para distinguir entre os dois grupos. Existem vários testes
bilizada e um segundo anticorpo, acoplado a um sinal quimio- endócrinos dinâmicos, mas todos se baseiam nos princípios da
luminescente [ensaio imunoquimioluminescente (ICMA) ou en- regulação por retroalimentação, e a maioria das respostas pode
saio imunonorradiométrico (IRMA)], para detectar o antígeno. ser relembrada com base nas vias que regem os eixos endócri-
Esses ensaios são sensíveis o bastante para detectar concentrações nos. Os testes de supressão são usados na vigência de suspeita de
plasmáticas do hormônio na variação picomolar a nanomolar, e hiperfunção endócrina. Um exemplo é o teste de supressão com
conseguem distinguir prontamente as proteínas estruturalmente dexametasona usado para avaliar a síndrome de Cushing (Caps.
relacionadas, tais como PTH do PTHrP. Uma ampla variedade 2 e 5). Os testes de estímulo em geral são usados para avaliar hi-
de outras técnicas é utilizada para medir hormônios específicos, pofunção endócrina. O teste de estímulo com ACTH, por exem-
incluindo a espectroscopia de massa, várias formas de cromato- plo, é utilizado para determinar a resposta da glândula suprarre-
grafia e métodos enzimáticos; atualmente os bioensaios são rara- nal nos pacientes com suspeita de insuficiência dessa glândula.
mente utilizados. Outros testes de estímulo utilizam os fatores de liberação hipo-
A maioria das mensurações hormonais baseia-se em amos- talâmicos, tais como CRH e GHRH, para avaliar a reserva de
tras de plasma ou de soro. Entretanto, as determinações dos hormônios hipofisários (Cap. 2). A hipoglicemia induzida por
hormônios urinários continuam sendo úteis para avaliação de insulina também evoca respostas hipofisárias do ACTH e do
algumas condições. As coletas urinárias durante um período de GH. Os testes de estímulo baseados na redução ou na inibição
24 h proporcionam uma avaliação integrada da produção de um dos hormônios endógenos são usados raramente hoje. Os exem-
hormônio ou de um metabólito, muitos dos quais variam duran- plos incluem a inibição da síntese do cortisol com metirapona e
te o dia. É importante certificar-se de que foram obtidas coletas a inibição do feedback dos estrogênios com clomifeno.
completas de amostras de urina de 24 h; a mensuração simultânea TRIAGEM E AVALIAÇÃO DE DOENÇAS ENDÓCRINAS COMUNS Mui-
da creatinina proporciona um controle interno para a adequação tas doenças endócrinas são prevalentes na população adulta
da coleta e pode ser utilizada com a finalidade de normalizar al- (Quadro 1.3) e podem ser diagnosticadas e tratadas por clínicos
gumas mensurações hormonais. Uma mensuração do cortisol gerais, médicos de família ou outros provedores da assistência
livre na urina de 24 h reflete em grande parte a quantidade de de saúde primária. A alta prevalência e o impacto clínico de
cortisol não ligado, proporcionando assim um indicador razoável certas doenças endócrinas justificam uma certa vigilância às ca-
do hormônio biologicamente disponível. Outras determinações racterísticas desses distúrbios durante o exame físico de rotina;
urinárias comumente utilizadas incluem 17-hidroxicorticosteroi- a triagem laboratorial está indicada em algumas populações de
des, 17-cetosteroides, ácido vanilmandélico, metanefrina, cateco- alto risco.
laminas, ácido 5-hidroxindolacético e cálcio.
9
QUADRO 1.3 Exemplos de doenças endócrinas e metabólicas prevalentes no adulto
Doença Prevalência aproximada em adultosa Recomendações para triagem/testesb Capítulo
CAPÍTULO 1
10
SEÇÃO I
Distúrbios da Hipófise, Tireoide
e Suprarrenal
CAPÍTULO 2 ANATOMIA E DESENVOLVIMENTO
■■ ANATOMIA
SEÇÃO I
12
TRH SRIF GHRH
Capítulo 2
Núcleos das células
Dopamina neuroendócrinas
Hipotálamo
Hipotálamo
–
Artéria
13
crianças exibem combinações variáveis de fenda palatina, sindactilia,
QUADRO 2.2 Etiologia do hipopituitarismo* deformidades auriculares, hipertelorismo, atrofia óptica, micropênis
e anosmia. A disfunção hipofisária resulta em diabetes insípido, de-
De desenvolvimento/estrutural
ficiência de GH e baixa estatura, bem como, ocasionalmente, defi-
Defeito de fator de transcrição
SEÇÃO I
ciência de TSH.
Displasia/aplasia hipofisária
Massa congênita no SNC, encefalocele Mutações dos fatores específicos para tecidos
Sela vazia primária Vários fatores de transcrição específicos das células hipofisárias,
como Pit-1 e Prop-1, são essenciais para determinar o desenvolvi-
Distúrbios hipotalâmicos congênitos (displasia septoóptica, síndrome de
Prader‑Willi, síndrome de Laurence‑Moon‑Biedl, síndrome de Kallmann)
mento e a função comprometida de linhagens celulares diferenciadas
da adeno-hipófise. As mutações do Pit-1 autossômicas dominantes
Traumático
ou recessivas causam deficiências combinadas de GH, PRL e TSH.
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
14
ciência de GnRH ocorre em 75% dos homens e em 50% das mulheres nal após uma dose mediana de 50 Gy (5.000 rads) dirigida à base do
acometidas. A degeneração retiniana começa no início da infância, crânio. O surgimento de hipopituitarismo ocorre ao longo de 5-15
e a maioria dos pacientes estará cega por volta dos 30 anos de ida- anos e reflete habitualmente muito mais um dano hipotalâmico que
de. Numerosos subtipos da síndrome de Bardet-Biedl (SBB) foram a destruição primária das células hipofisárias. Apesar de o padrão
Capítulo 2
identificados, com ligação genética a pelo menos nove loci diferentes. de perda hormonal ser variável, a deficiência de GH é mais comum,
Vários desses loci codificam genes envolvidos na função basal dos acompanhada por deficiência de gonadotrofinas e ACTH. Quando
cílios corporais, o que pode ser responsável pelas manifestações clí- se documenta a deficiência de um ou mais hormônios, passa a ser
nicas diversificadas. bastante alta a possibilidade de uma reserva reduzida de outros hor-
mônios. Por conseguinte, a função da adeno-hipófise deve ser conti-
Mutações da leptina e do receptor de leptina As deficiências de lepti-
nuamente avaliada a longo prazo nos pacientes previamente irradia-
na ou de seu receptor causam um amplo espectro de anormalidades
dos, devendo a terapia de reposição ser instituída quando apropriada
hipotalâmicas que inclui hiperfagia, obesidade e hipogonadismo cen-
(ver adiante).
tral (Cap. 16). Menor produção de GnRH nesses pacientes resulta em
15
lencioso e involução, com desenvolvimento de uma sela parcial ou MASSAS HIPOTALÂMICAS, HIPOFISÁRIAS E OUTRAS MASSAS
totalmente vazia, e com o líquido cerebrospinal (LCS) enchendo a SELARES
herniação dural. Raramente, adenomas hipofisários pequenos, po-
rém funcionantes, podem surgir dentro da margem de tecido hipofi-
■■ TUMORES HIPOFISÁRIOS
SEÇÃO I
16
QUADRO 2.3 Testes de suficiência hipofisária
Hormônio Teste Amostras de sangue Interpretação
Capítulo 2
Hormônio do Teste de tolerância à insulina: insulina – 30, 0, 30, 60, 120 min para Glicose < 40 mg/dL; o GH deveria ser > 3 g/L
crescimento regular (0,05‑0,15 U/kg IV) a glicose e o GH
Teste com GHRH: 1 g/kg IV 0, 15, 30, 45, 60, 120 min A resposta normal é GH > 3 g/L
para o GH
Teste com l‑arginina: 30 g IV durante 30 min 0, 30, 60, 120 min para o GH A resposta normal é GH > 3 g/L
Teste com l‑dopa: 500 mg VO 0, 30, 60, 120 min para o GH A resposta normal é GH > 3 g/L
Prolactina Teste com TRH: 200‑500 g IV 0, 20 e 60 min para o TSH e A prolactina normal é > 2 g/L e aumenta para >
a PRL 200% do nível basal
A perda de heterozigos (PDH), característica em vários cromos- hipogonadismo primário) e a angiogênese mediada por estrogênio
somos, foi documentada em macroadenomas volumosos ou invasi- ou parácrina. As características do crescimento e o comportamento
vos, sugerindo a presença de hipotéticos genes supressores tumorais neoplásico também podem ser influenciados por vários oncogenes
nesses loci. A PDH das regiões cromossômicas em 11q13, 13 e 9 está ativados, como RAS e o gene transformador de tumor hipofisário
presente em até 20% dos tumores hipofisários esporádicos, como os (PTTG), ou por inativação de genes supressores do crescimento, in-
adenomas produtores de GH, PRL e ACTH, assim como em alguns cluindo MEG3.
tumores não funcionantes.
Existem evidências concretas que também favorecem a promo- Síndromes genéticas associadas aos tumores hipofisários
ção da proliferação dos tumores hipofisários por fatores de cres- Várias síndromes familiares estão associadas a tumores hipofisários
cimento. O fator de crescimento do fibroblasto básico (bFGF) é e os mecanismos genéticos de algumas delas já foram desvendados
abundante na hipófise, tendo sido demonstrado que estimula a mi- (Quadro 2.6).
togênese das células hipofisárias. Outros fatores envolvidos na inicia- A neoplasia endócrina múltipla (NEM) 1 é uma síndrome autos-
ção e promoção dos tumores hipofisários são a perda de inibição por sômica dominante, caracterizada principalmente por predisposição
feedback negativo (conforme observada com o hipotireoidismo ou genética aos adenomas das paratireoides, das ilhotas pancreáticas e
17
QUADRO 2.4 Terapia de reposição hormonal para o QUADRO 2.5 Classificação dos adenomas hipofisários*
hipopituitarismo no adulto* Origem da célula do Produto
Déficit de adenoma hormonal Síndrome clínica
SEÇÃO I
*Todas as doses indicadas devem ser individualizadas conforme o paciente e devem ser reava-
liadas durante o estresse, a cirurgia ou a gestação. de hipopituitarismo. Derivam da bolsa de Rathke e surgem nas pro-
Nota: Para abreviações, ver o texto. ximidades da haste hipofisária, estendendo-se comumente à cisterna
suprasselar. Com frequência, os craniofaringiomas são volumosos,
císticos e localmente invasivos. Muitos deles são parcialmente cal-
da hipófise (Cap. 23). A NEM 1 é causada por mutações inativadoras cificados, exibindo um aspecto característico nas imagens de radio-
da linhagem germinativa no MENIN, um gene supressor tumoral de grafia e TC de crânio. Em mais de 50% dos pacientes, manifestam-se
expressão constitutiva localizado no cromossomo 11q13. A perda de antes dos 20 anos de idade, habitualmente com sinais de aumento
heterozigos, ou mutação somática do alelo MENIN normal, resulta da pressão intracraniana, incluindo cefaleia, vômitos, papiledema e
em tumorigênese. Cerca de 50% dos pacientes acometidos desenvol- hidrocefalia. Os sintomas associados consistem em anormalidades
ve prolactinomas; a acromegalia e síndrome de Cushing são observa- no campo visual, mudanças da personalidade e deterioração cogniti-
das menos comumente.
A síndrome de Carney se caracteriza por pigmentação cutânea
salpicada (irregular), mixomas e tumores endócrinos que consistem
em adenomas testiculares, suprarrenais e hipofisários. A acromegalia QUADRO 2.6 Síndromes familiares associadas a tumores
ocorre em cerca de 20% desses pacientes. Um subgrupo de pacientes hipofisários
apresenta mutações na subunidade reguladora R1 da proteinoqui-
Gene que sofreu
nase A (PRKAR1A).
mutação Manifestações clínicas
A síndrome de McCune-Albright consiste em displasia fibrosa
poliostótica, áreas cutâneas pigmentadas e uma grande variedade Neoplasia endócrina NEM1 Hiperparatireoidismo
de distúrbios endócrinos, incluindo acromegalia, adenomas supra- múltipla 1 (NEM 1) Tumores neuroendócrinos
-renais e função ovariana autônoma (Cap. 10). A hipersecreção hor- (11q13) pancreáticos
monal resulta da produção constitutiva do AMP cíclico causada pela Carcinoides do intestino
inativação da atividade GTPase de Gs. As mutações de Gs são de anterior
ocorrência pós-zigótica, dando origem a um padrão em mosaico de Adenomas suprarrenais
expressão mutante. Lesões cutâneas
Adenomas hipofisários (40%)
A acromegalia familiar é um distúrbio raro no qual membros da
família podem manifestar acromegalia ou gigantismo. O distúrbio Neoplasia endócrina CDKNIB Hiperparatireoidismo
está associado à PDH em um locus do cromossomo 11q13 distin- múltipla 4 (NEM 4) Adenomas hipofisários
to daquele do MENIN. Foi constatado que um subgrupo de famílias (12p13) Outros tumores
com predisposição a tumores hipofisários familiares, particularmen- Complexo de Carney PRKAR1A Hiperplasia e adenomas
te acromegalia, são portadores de mutações inativadoras no gene (17q23‑24) hipofisários (10%)
AIP, que codifica a proteína de interação do receptor de aril hidro- Mixomas atriais
carboneto. Schwannomas
Hiperplasia suprarrenal
■■ OUTRAS MASSAS SELARES Adenomas hipofisários AIP Lentigos
Os craniofaringiomas são massas císticas suprasselares benignas que familiares (11q13.3) Acromegalia/gigantismo
(15%)
se manifestam com cefaleia, déficit de campo visual e graus variáveis
18
va, dano aos nervos cranianos, dificuldade de dormir e aumento do de diferenciação. Esses tumores podem expressar excessivamente os
peso. O hipopituitarismo pode ser documentado em cerca de 90%, neuropeptídios hipotalâmicos, como GnRH, GHRH e CRH. Nos tu-
e ocorre diabetes insípido em aproximadamente 10% dos pacientes. mores produtores de GnRH, as crianças se apresentam com puber-
Cerca de 50% das crianças acometidas apresentam retardo no cres- dade precoce, retardo psicomotor e crises convulsivas gelásticas. O
Capítulo 2
cimento. A RM geralmente é superior à TC para avaliar a estrutura tratamento clínico dos hamartomas produtores de GnRH com aná-
cística e os componentes teciduais dos craniofaringiomas. A TC é útil logos de GnRH de ação prolongada suprime efetivamente a secreção
para definir as calcificações, bem como para avaliar a invasão das de gonadotrofinas e controla o desenvolvimento puberal prematuro.
estruturas ósseas circundantes e dos seios. Raramente, os hamartomas também estão associados a anormalida-
O tratamento consiste habitualmente em ressecção cirúrgica des craniofaciais; ânus imperfurado; distúrbios cardíacos, renais e
transcraniana ou transesfenoidal seguida por irradiação pós-opera- pulmonares; e insuficiência hipofisária como características da sín-
tória do tumor residual. A cirurgia como único tratamento é curativa drome de Pallister-Hall, causada por mutações na região carboxiter-
em menos de 50% dos pacientes, devido à ocorrência de recidivas em minal do gene GLI3. Com frequência, os hamartomas hipotalâmicos
19
como puberdade precoce ou hipogonadismo, diabetes insípido, dis-
QUADRO 2.7 Características das lesões selares expansivas* túrbios do sono, distermia e distúrbios do apetite.
Estrutura atingida Impacto clínico
RM
Hipófise Hipogonadismo
SEÇÃO I
20
Avaliação oftalmológica sários que necessitam de reposição hormonal antes de qualquer teste
ou cirurgia adicional.
Levando em conta que os tratos ópticos podem estar em contigui-
dade com uma massa hipofisária em expansão, deve-se efetuar uma Avaliação histológica
Capítulo 2
avaliação reprodutível dos campos visuais usando técnicas de peri-
A imuno-histoquímica dos tumores hipofisários, obtida por ocasião
metria em todos os pacientes com lesões selares expansivas que en-
da cirurgia transesfenoidal, serve para confirmar os exames clínicos
tram em contato com o quiasma óptico. A hemianopsia bitemporal
e laboratoriais, bem como proporciona um diagnóstico histológico
ou os defeitos bitemporais superiores são observados classicamente,
quando os estudos hormonais são duvidosos assim como nos casos
refletindo a localização desses tratos dentro das partes inferior e pos-
de tumores clinicamente não funcionantes. Ocasionalmente, a avalia-
terior do quiasma. Os déficits homônimos refletem lesões pós-quias-
ção ultraestrutural por microscopia eletrônica é necessária para fazer
mais, e os déficits de campos monoculares refletem lesões pré-quias-
o diagnóstico.
mais. A perda de percepção da cor vermelha é um sinal precoce de
pressão sobre o trato óptico. O diagnóstico precoce reduz o risco de
21
Quiasma óptico
IRRADIAÇÃO A irradiação é usada como terapia primária para as
Tumor hipofisário massas hipofisárias ou parasselares, ou, mais comumente, como
Nervo
oculomotor Artéria carótida adjuvante da cirurgia ou terapia clínica. A irradiação enfocada por
interna megavoltagem é obtida pela localização precisa por RM, utilizan-
SEÇÃO I
Esfenoide
to-60 (bisturi-gama), de um acelerador linear ou de um cíclotron.
Septo nasal Os efeitos de longo prazo da cirurgia com bisturi-gama não estão
Cureta cirúrgica bem definidos, mas parecem ser semelhantes àqueles observados
com a irradiação convencional.
O papel da radioterapia no tratamento dos tumores hipofisá-
rios depende de múltiplos fatores, como a natureza do tumor, a
idade do paciente e a disponibilidade de competência na área da
cirurgia e irradiação. Por causa de seu início de ação relativamen-
te lento, a radioterapia fica reservada habitualmente para o tra-
tamento pós-cirúrgico. Como adjuvante da cirurgia, a irradiação
pode ser usada para tratar o tumor residual e em uma tentativa de
prevenir um novo crescimento. Proporciona o único meio efeti-
vo de eliminar potencialmente uma quantidade significativa de
tecido tumoral não funcionante residual no pós-operatório. Em
contrapartida, os tecidos tumorais que secretam PRL e, algumas
vezes, GH são passíveis de terapia clínica.
Efeitos colaterais A curto prazo a irradiação pode causar náu-
Tumor seas e fraqueza transitórias. A alopecia e perda do paladar e do
hipofisário
olfato podem ser consequências mais duradouras. A falência da
síntese dos hormônios hipofisários é comum nos pacientes que
foram submetidos a uma irradiação dirigida à cabeça e ao pesco-
ço, ou à hipófise. Mais de 50% dos pacientes desenvolvem perda
Seio da secreção de GH, ACTH, TSH e/ou gonadotrofina em 10 anos,
esfenoidal habitualmente em virtude do dano hipotalâmico. Portanto, o
acompanhamento vitalício com testes para a reserva dos hormô-
nios adeno-hipofisários é necessária após radioterapia. O dano do
Figura 2.5 Ressecção transesfenoidal de massa hipofisária pela aborda-
gem endonasal. (Adaptada de R Fahlbusch: Endocrinol Metab Clin 21:669, 1992.) nervo óptico com visão alterada em virtude de uma neurite óptica
é relatado em cerca de 2% dos pacientes cuja hipófise foi irradia-
da. O dano dos nervos cranianos é incomum agora que as doses
de irradiação são ≤ 2 Gy (200 rads) em cada sessão de tratamento
tar a probabilidade de hipopituitarismo e necessidade de reposi- e que a dose máxima é de < 50 Gy (5.000 rads). A utilização da
ção hormonal vitalícia. radioterapia estereotáxica pode reduzir o dano das estruturas ad-
Os efeitos expansivos (de massa) pré-operatórios, incluindo jacentes. A radioterapia para tumores hipofisários tem sido asso-
os defeitos nos campos visuais e a função hipofisária comprome- ciada a taxas de mortalidade adversas, principalmente por doença
tida, podem ser eliminados pela cirurgia, particularmente quando vascular encefálica. O risco cumulativo de vir a desenvolver um
esses déficits não forem de longa duração. Para os tumores volu- tumor secundário após a irradiação convencional é de 1,3% após
mosos e invasivos, é necessário determinar o equilíbrio ideal entre 10 anos e de 1,9% após 20 anos.
ressecção máxima do tumor e preservação da função da adeno- TRATAMENTO CLÍNICO O tratamento clínico para os tumores hipo-
-hipófise, especialmente para preservar o crescimento e a função fisários é altamente específico, dependendo do tipo de tumor. Para
reprodutiva em pacientes mais jovens. Outrossim, a invasão pelo os prolactinomas, os agonistas dopaminérgicos constituem o trata-
tumor fora da sela raramente é passível de cura cirúrgica; o cirur- mento de escolha. Para a acromegalia, indica-se o uso de análogos
gião terá que julgar a relação risco-benefício de ressecção tumoral da somatostatina e antagonistas dos receptores de GH. Para tumo-
extensa. res secretores de TSH, estão indicados análogos da somatostatina
Efeitos colaterais O tamanho do tumor, o grau de invasão e a ex- e, ocasionalmente, agonistas dopaminérgicos. Os tumores que
periência do cirurgião determinam, em grande parte, a incidência secretam ACTH e tumores não funcionantes geralmente não res-
de complicações cirúrgicas. A taxa de mortalidade operatória é pondem às medicações, necessitando de cirurgia e/ou irradiação.
de aproximadamente 1%. Diabetes insípido e hipopituitarismo
transitórios ocorrem em até 20% dos pacientes. Diabetes insípi-
do permanente, dano aos nervos cranianos, perfuração do septo PROLACTINA
nasal ou distúrbios visuais podem ser observados em até 10% dos
pacientes. Fístulas liquóricas ocorrem em 4% dos pacientes. As ■■ SÍNTESE
complicações menos comuns consistem em lesões da artéria ca- A PRL consiste em 198 aminoácidos e possui massa molecular de
rótida, perda da visão, dano hipotalâmico e meningite. Os efeitos 21.500 kDa; é fracamente homóloga ao GH e lactogênio placentá-
colaterais permanentes são raros após uma cirurgia para micro- rio humano (hPL), refletindo a duplicação e divergência de um gene
adenomas. precursor de GH-PRL-hPL. A PRL é sintetizada nos lactotrofos, que
constituem cerca de 20% das células da adeno-hipófise. Os lactotro-
22
fos e somatotrofos derivam de uma célula precursora comum, que ■■ HIPERPROLACTINEMIA
pode dar origem a um tumor que secreta tanto PRL quanto GH. Ins-
tala-se acentuada hiperplasia dos lactotrofos durante a gestação e nos Etiologia
primeiros meses de lactação. Essas alterações funcionais transitórias A hiperprolactinemia é a síndrome de hipersecreção dos hormônios
Capítulo 2
na população dos lactotrofos são induzidas pelo estrogênio. hipofisários mais comum tanto em homens quanto em mulheres. Os
adenomas hipofisários secretores de PRL (prolactinomas) consti-
■■ SECREÇÃO tuem a causa mais comum de níveis de PRL > 200 g/L (ver adiante).
Os níveis séricos de PRL em adultos normais são de aproximadamen- Uma elevação menos pronunciada de PRL pode ser observada tam-
te 10 a 25 g/L em mulheres e de 10-20 g/L em homens. A secreção bém com os microprolactinomas, porém é causada mais comumente
de PRL é pulsátil, ocorrendo os picos secretórios mais altos durante o por medicamentos, compressão da haste hipofisária, hipotireoidismo
sono com movimentos oculares rápidos. Os níveis séricos máximos ou insuficiência renal (Quadro 2.9).
de PRL (de até 30 g/L) ocorrem entre 4 e 6 h. A meia-vida circulan- A gravidez e a lactação são as causas fisiológicas importantes da
24
Manifestação e diagnóstico nho tumoral. Entretanto, a retração do tumor habitualmente não
As mulheres se apresentam habitualmente com amenorreia, inferti- é observada naqueles que não respondem com níveis reduzidos
lidade e galactorreia. Se o tumor se estende para fora da sela, podem de PRL. Para os macroadenomas, os testes formais dos campos vi-
Capítulo 2
ser observados defeitos dos campos visuais ou outros efeitos expansi- suais devem ser realizados antes de iniciar a terapia com agonistas
vos (tipo massa). Com demasiada frequência, os homens se apresen- dopaminérgicos. A RM e os campos visuais podem ser avaliados
tam com impotência, perda da libido, infertilidade ou sinais de com- com intervalos de 6-12 meses até ocorrer a redução da massa, e
pressão do SNC, como cefaleia e defeitos visuais. Admitindo que as anualmente daí em diante, até que tenha ocorrido uma redução
causas fisiológicas e induzidas por medicações da hiperprolactinemia máxima do tamanho.
já foram excluídas (Quadro 2.9), o diagnóstico de prolactinoma será
provável com um nível de PRL > 200 g/L. Níveis de PRL < 100 g/L TRATAMENTO CLÍNICO Os agonistas dopaminérgicos orais (cabergo-
podem ser causados por microadenomas, outras lesões selares que lina e bromocriptina) constituem o esteio da terapia para os pacien-
reduzem a inibição da dopamina ou causas não neoplásicas de hiper- tes com microprolactinomas ou macroprolactinomas. Os agonistas
TRATAMENTO DO PROLACTINOMA
Prolactinoma sintomático
Testar os
campos visuais
Microadenoma Macroadenoma
Testar a função de
reserva hipofisária
25
controle inicial dos níveis de PRL, a cabergolina deve ser reduzida aumentam acentuadamente de tamanho, porém 15 a 30% dos
para a dose de manutenção mais baixa que seja efetiva. macroadenomas crescem durante a gravidez. A bromocriptina
Em cerca de 5% dos pacientes tratados portadores de mi- foi utilizada por mais de 30 anos com a finalidade de restaurar a
croadenoma, a hiperprolactinemia pode regredir e não recidivar fertilidade em mulheres com hiperprolactinemia, sem evidência
SEÇÃO I
quando os agonistas dopaminérgicos são suspensos após um tra- de efeitos teratogênicos. Não obstante, a maioria dos autores reco-
tamento a longo prazo. A cabergolina também pode ser efetiva menda a adoção de estratégias capazes de minimizar a exposição
nos pacientes resistentes à bromocriptina. Efeitos adversos e into- fetal ao fármaco. Para as mulheres que tomam bromocriptina e
lerância ao medicamento são observados menos comumente que que desejam engravidar, a contracepção mecânica deve ser usada
com a bromocriptina. ao longo de três ciclos menstruais regulares, a fim de proporcio-
nar-lhes o momento mais apropriado à concepção. Quando a gra-
Bromocriptina O alcaloide do esporão-do-centeio mesilato bro-
videz é confirmada, a bromocriptina deve ser suspensa, e os níveis
mocriptina é um agonista do receptor da dopamina que suprime
de PRL acompanhados em série, especialmente quando ocorrem
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
26
expresso no hipotálamo e na hipófise. A somatostatina se une a cinco crinas locais que parecem ser tanto dependentes quanto independen-
subtipos distintos de receptor (SSTR1 a SSTR5); os subtipos SSTR2 tes do GH. Assim, a administração de GH induz ao IGF-I circulante,
e SSTR5 suprimem preferencialmente a secreção de GH (e de TSH). além de estimular sua produção em múltiplos tecidos.
A secreção de GH é pulsátil, ocorrendo os níveis mais altos de Tanto o IGF-I quanto o IGF-II se unem a proteínas de ligação do
Capítulo 2
noite, em geral correlacionando-se com o início do sono. Os ritmos IGF (IGFBP) circulantes de alta afinidade, que regulam a bioativida-
secretórios de GH declinam acentuadamente com a idade, razão pela de do IGF. Os níveis de IGFBP3 dependem do GH, e essa proteína
qual os níveis hormonais na meia-idade são aproximadamente 15% funciona como a principal proteína carreadora do IGF-I circulante.
dos níveis puberais. Essas modificações mantêm paralelismo com o A deficiência de GH e a desnutrição estão associadas habitualmente
declínio da massa muscular magra relacionado com a idade. A se- a baixos níveis de IGFBP3. A IGFBP1 e a IGFBP2 regulam a ação
creção de GH também é reduzida nos indivíduos obesos, porém os tecidual local do IGF, porém não se ligam a quantidades apreciáveis
níveis de IGF-I podem não ser suprimidos, sugerindo uma mudança do IGF-I circulante.
no ponto preestabelecido no controle por feedback. Níveis elevados As concentrações de IGF-I são profundamente afetadas por fato-
28
quada de GH prenuncia a ocorrência de déficits hormonais subse- TRATAMENTO DA DEFICIÊNCIA DE GH EM ADULTOS
quentes. A ordem sequencial de perda hormonal geralmente é GH →
FSH/LH → TSH → ACTH. História de patologia hipofisária
Presença de características clínicas
Capítulo 2
Manifestação e diagnóstico GH provocado < 3 µg/L
As características clínicas da AGHD incluem mudanças na composição
Excluir as contraindicações
corporal, no metabolismo lipídico e na qualidade de vida, assim como
disfunção cardiovascular (Quadro 2.10). As mudanças na composição Tratar com GH
corporal são comuns e consistem em menos massa corporal magra, 0,1-0,3 mg/dia
maior quantidade de gordura com a deposição seletiva da gordura vis-
ceral intra-abdominal e aumento da relação cintura-para-quadril. A Verificar o IGF-I após 1 mês
hiperlipidemia, a disfunção ventricular esquerda, a hipertensão e níveis
plasmáticos elevados de fibrinogênio também podem estar presentes. Titular a dose de
Carcinoma de células do GH ou metástases megalia são evidentes apenas em pequena minoria de pacientes com
Neoplasia endócrina múltipla 1 (adenoma de células doença carcinoide. O GHRH excessivo também pode ser elaborado
do GH) por tumores hipotalâmicos, geralmente coristomas ou neuromas.
Síndrome de McCune‑Albright
Adenoma hipofisário ectópico de esfenoide ou de Manifestação e diagnóstico
seio parafaríngeo As diversas manifestações da hipersecreção de GH e IGF-I são vaga-
Tumor extra‑hipofisário rosas, e, com frequência, não são diagnosticadas clinicamente por 10
Tumor de células das ilhotas pancreáticas <1 anos ou mais. O excessivo crescimento dos ossos acrais resulta em bos-
Linfoma sas frontais, maior tamanho das mãos e dos pés, aumento mandibular
com prognatismo e espaço alargado entre os dentes incisivos inferiores.
Secreção excessiva do hormônio de liberação do hormônio do Em crianças e adolescentes, o início da hipersecreção de GH antes do
crescimento fechamento das epífises dos ossos longos está associado ao surgimento
Central <1 de gigantismo hipofisário (Fig. 2.8). A tumefação dos tecidos moles re-
sulta em maior espessura do coxim do calcanhar, tamanho aumentado
Hamartoma hipotalâmico, coristoma, <1
ganglioneuroma dos calçados ou das luvas, anéis apertados, feições fisionômicas faciais
grosseiras características bem como nariz grande e polpudo. Outras
Periférica <1
características clínicas encontradas comumente incluem hiperidrose,
Carcinoide brônquico, tumor de células das ilhotas
voz profunda e abafada, pele oleosa, artropatia, cifose, síndrome do
pancreáticas, câncer pulmonar de pequenas células,
túnel do carpo, fraqueza e fadiga dos músculos proximais, acanthosis
adenoma suprarrenal, carcinoma medular de
tireoide, feocromocitoma nigricans e apêndices cutâneos. Ocorre visceromegalia generalizada, in-
cluindo cardiomegalia, macroglossia e aumento do volume da tireoide.
Nota: GH, hormônio do crescimento; PRL, prolactina. O impacto clínico mais significativo do excesso de GH ocorre
Fonte: Adaptado de S Melmed: N Engl J Med 322:966, 1990. com relação ao sistema cardiovascular. A doença arterial coronaria-
na (DAC), a miocardiopatia com arritmias, a hipertrofia ventricular
GH decorrente de pequeno adenoma secretor de GH dentro da mar- esquerda, a diminuição da função diastólica e a hipertensão ocorrem
gem comprimida de tecido hipofisário, podendo alguns desses casos na maioria dos pacientes se não foram tratados. A obstrução das vias
refletirem a necrose espontânea de tumores previamente maiores. Os respiratórias superiores com apneia do sono ocorre em mais de 60%
A C
Figura 2.8 Características da acromegalia/gigantismo. Homem de 22 anos de idade, com gigantismo devido ao excesso de hormônio do crescimento, é mostrado à
esquerda de seu gêmeo idêntico. A maior altura e o prognatismo (A), bem como a mão (B) e o pé (C) aumentados do gêmeo acometido são aparentes. Suas características
clínicas começaram a divergir aproximadamente aos 13 anos de idade. (Reproduzida de R Gagel, IE McCutcheon: N Engl J Med 324:524, 1999, com autorização.)
30
dos pacientes e está associada tanto à obstrução produzida pelos te-
lhorar as comorbidades, restaurar as taxas de mortalidade para o
cidos moles das vias respiratórias laríngeas quanto à disfunção cen-
normal e preservar a função hipofisária.
tral do sono. O diabetes melito manifesta-se em 25% dos pacientes
A ressecção cirúrgica dos adenomas secretores de GH consti-
com acromegalia, e a maioria deles tem intolerância à glicose (pois o
Capítulo 2
tui o tratamento inicial para a maioria dos pacientes (Fig. 2.9). Os
GH contrabalança a ação da insulina). A acromegalia está associada
análogos da somatostatina podem ser usados como tratamento
a maior risco de pólipos colônicos e mortalidade por malignidade
adjuvante para conseguir a diminuição pré-operatória dos gran-
colônica; os pólipos são diagnosticados em até 33% dos pacientes. A
des macroadenomas invasivos, alívio imediato dos sintomas debi-
mortalidade global é cerca de 3 vezes maior, sendo decorrente prin-
litantes e redução da hipersecreção de GH; nos pacientes frágeis
cipalmente de distúrbios cardiovasculares e cerebrovasculares, assim
que estão sendo vítimas de alguma morbidade; e em pacientes
como de doença respiratória. A menos que os níveis de GH sejam
que recusam se submeter a cirurgia ou quando a cirurgia não
controlados, a sobrevida será reduzida em cerca de 10 anos em com-
consegue levar ao controle bioquímico. A irradiação ou uma nova
paração com uma população-controle de idade equivalente.
cirurgia podem ser necessárias aos pacientes que não conseguem
O tratamento tem por objetivo controlar a hipersecreção de GH * N. de R. T.: Os níveis de IGF-I podem levar de 3 a 6 meses para normalizar
e de IGF-I, eliminar ou interromper o crescimento do tumor, me- após uma cirurgia bem-sucedida.
TRATAMENTO DA ACROMEGALIA
Adenoma
secretor de GH
Desbastamento necessário
Cirurgia para os efeitos compressivos
sobre o SNC
controlado elevado controlado
Medir o Medir o
GH/IGF-I GH/IGF-I
Análogo da somatostatina
Monitorar Monitorar
controlado Medir o
GH/IGF-I
• Antagonista do
controlado Medir o descontrolado receptor de GH
Monitorar
GH/IGF-I • Radioterapia
• Reoperação
Figura 2.9 Tratamento da acromegalia. GH, hormônio do crescimento; SNC, sistema nervoso central; IGF, fator de crescimento semelhante à insulina. (Adaptada de S
Melmed et al.: J Clin Endocrinol Metab 94:1509-, 1517; © The Endocrine Society.)
31
ANÁLOGOS DA SOMATOSTATINA Os análogos da somatostatina IRRADIAÇÃO A radioterapia externa ou as técnicas estereotáxicas
exercem seus efeitos terapêuticos por meio dos receptores SSTR2 e de alta energia são usadas como terapia adjuvante para a acrome-
SSTR5, ambos os quais são expressos invariavelmente pelos tumo- galia. Uma vantagem da irradiação é que deixa de ser necessária a
res secretores de GH. O acetato de octreotide é um análogo sinté- adesão do paciente com o tratamento a longo prazo. A massa tu-
SEÇÃO I
tico da somatostatina com oito aminoácidos. Diferente da soma- moral se reduz, e os níveis de GH são atenuados com o passar do
tostatina nativa, o análogo é relativamente resistente à degradação tempo. Entretanto, 50% dos pacientes necessitam de pelo menos 8
plasmática. Possui meia-vida sérica de 2 h e comporta uma potên- anos a fim de que os níveis de GH sejam suprimidos para < 5 g/L.
cia 40 vezes maior que a somatostatina nativa na supressão do GH. Esse nível de redução do GH é conseguido em cerca de 90% dos pa-
O octreotide é administrado por injeção subcutânea, começando cientes após 18 anos, mas representa uma supressão do GH que não
com 50 g, 3x/dia. A dose pode ser aumentada gradualmente até chega a ser ideal. Os pacientes podem necessitar de terapia clínica
1.500 g/dia. Menos de 10% dos pacientes não respondem ao aná- temporária por vários anos antes de serem alcançados os benefícios
logo. O octreotide suprime os níveis de GH integrados e normaliza máximos da irradiação. A maioria dos pacientes experimenta tam-
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
os níveis de IGF-I em cerca de 75% dos pacientes tratados. bém dano hipotalâmico-hipofisário que resulta em deficiência de
As formulações de depósito de somatostatina de ação prolon- gonadotrofinas, ACTH e/ou TSH 10 anos após o início da terapia.
gada, o octreotide e o lanreotide, representam o tratamento clínico Em resumo, a cirurgia é o tratamento primário preferido para
preferido para os pacientes com acromegalia. O sandostatin-LAR os microadenomas secretores de GH (Fig. 2.9). A alta frequência de
é uma formulação de ação longa e de liberação prolongada de oc- hipersecreção de GH após a ressecção dos macroadenomas costuma
treotide incorporada em microesferas que proporcionam níveis do tornar necessária a terapia clínica adjuvante ou a primária para esses
medicamento por várias semanas após a injeção intramuscular. A tumores mais volumosos. Os pacientes incapazes de receber ou de
supressão do GH continua ocorrendo até 6 semanas após uma in- responder ao tratamento clínico unimodal podem ser beneficiados
jeção intramuscular de 30 mg; o tratamento mensal a longo prazo pelo tratamento combinado ou receber irradiação.
proporciona a supressão do GH e IGF-I e também reduz o tamanho
do tumor hipofisário em cerca de 50% dos pacientes. O lanreotide
autogel, um preparado de somatostatina de depósito de liberação
lenta, é um análogo octapeptídio cíclico da somatostatina que su- HORMÔNIO ADRENOCORTICOTRÓFICO
prime a hipersecreção de GH e IGF-I após uma injeção subcutânea (Ver também o Capítulo 5.)
de 60 mg. A administração mensal a longo prazo controla a hiper-
secreção de GH em 66% dos pacientes tratados e melhora a adesão ■■ SÍNTESE
do paciente devido ao longo intervalo necessário entre as injeções Os corticotrofos secretores de ACTH constituem cerca de 20% da po-
do medicamento. Ocorre rápido alívio da cefaleia e do edema dos pulação de células hipofisárias, o ACTH (com 39 aminoácidos) deri-
tecidos moles em 75% dos pacientes dentro de poucos dias a várias va da proteína precursora POMC (com 266 aminoácidos), que gera
semanas após o início do análogo da somatostatina. A maioria dos também vários outros peptídios, como a -lipotrofina, -endorfina,
pacientes relata uma melhora sintomática, incluindo alívio da cefa- met-encefalina, hormônio estimulante dos melanócitos (MSH) e
leia, sudorese, apneia obstrutiva e insuficiência cardíaca. proteína do lobo intermediário semelhante à corticotrofina (CLIP).
Efeitos colaterais Os análogos da somatostatina são bem-tolerados O gene POMC é poderosamente suprimido pelos glicocorticoides e
na maioria dos pacientes. Os efeitos adversos são de curta duração e induzido por CRH, arginina vasopressina (AVP) e citocinas proinfla-
relacionados principalmente com a supressão, induzida pelo fárma- matórias, incluindo a IL-6, assim como o fator inibidor da leucemia.
co, da motilidade e secreção gastrintestinais. Náuseas, desconforto O CRH, um peptídio hipotalâmico com 41 aminoácidos sinte-
abdominal, má absorção das gorduras, diarreia e flatulência ocor- tizado no núcleo paraventricular assim como nos centros cerebrais
rem em 33% dos pacientes, e, em geral, esses sintomas regridem em superiores, é o estimulador predominante da síntese e liberação do
2 semanas. O octreotide suprime a contratilidade pós-prandial da ACTH. O receptor de CRH é um GPCR que é expresso no cortico-
vesícula biliar e retarda seu esvaziamento; até 30% dos pacientes de- trofo e sinaliza para induzir a transcrição de POMC.
senvolvem a longo prazo lama biliar ou cálculos de colesterol assin-
tomáticos. Outros efeitos colaterais consistem em ligeira intolerância ■■ SECREÇÃO
à glicose em virtude da supressão transitória da insulina, bradicardia A secreção de ACTH é pulsátil, exibindo um ritmo circadiano carac-
assintomática, hipotiroxinemia e desconforto no local da injeção. terístico, com um pico às 6 h, sendo alcançado um nadir por volta
da meia-noite. A secreção dos glicocorticoides suprarrenais, acio-
ANTAGONISTA DO RECEPTOR DE GH O pegvisomanto antagoniza nada pelo ACTH, adota um padrão diurno paralelo. A ritmicidade
a ação do GH endógeno ao bloquear a ligação periférica do GH circadiana do ACTH é determinada por variações na amplitude dos
ao seu receptor. Consequentemente, os níveis séricos de IGF-I são pulsos secretórios e não por mudanças na frequência dos pulsos. So-
suprimidos, reduzindo os efeitos deletérios do GH endógeno ex- brepondo-se a esse ritmo endógenio, os níveis de ACTH são aumen-
cessivo. O pegvisomanto é administrado por injeção subcutânea tados pelo estresse físico e psicológico, pelo exercício, doença aguda
diária (10-20 mg) e normaliza o IGF-I em mais de 90% dos pa- e hipoglicemia induzida pela insulina.
cientes. No entanto, os níveis de GH continuam elevados, pois o A perda de inibição por feedback do cortisol, como ocorre na fa-
fármaco não exerce ações antitumorais. São efeitos colaterais a ele- lência suprarrenal primária, resulta em níveis extremamente altos de
vação reversível das enzimas hepáticas, lipodistrofia e dor no local ACTH. A regulação negativa mediada por glicocorticoides do eixo
da injeção. O tamanho do tumor deve ser monitorado por RM. hipotálamo-hipófise-suprarrenal (HPA) ocorre como consequência
O tratamento combinado com análogos da somatostatina tanto da supressão hipotalâmica do CRH quanto da atenuação direta
mensalmente e com injeções semanais ou bissemanais de pegvi- da expressão do gene POMC hipofisário e da liberação de ACTH.
somanto tem sido usado efetivamente nos pacientes resistentes. Os insultos inflamatórios ou sépticos agudos ativam o eixo HPA
AGONISTAS DOPAMINÉRGICOS A bromocriptina e a cabergoli- por meio das ações integradas das citocinas proinflamatórias, toxinas
na podem suprimir modestamente a secreção de GH em alguns bacterianas e sinais neurais. A cascata sobreposta de citocinas indu-
pacientes. As altas doses de bromocriptina (≥ 20 mg/dia) ou de toras de ACTH [fator de necrose tumoral (TNF); IL-1, IL-2 e IL-6; e
cabergolina (0,5 mg/dia) são habitualmemente necessárias para fator inibidor da leucemia] ativa a secreção hipotalâmica de CRH e
obter uma eficácia terapêutica moderada sobre o GH. O trata- AVP, expressão do gene POMC hipofisário e as redes locais das citoci-
mento combinado com octreotide e cabergolina pode induzir um nas hipofisárias parácrinas. A elevação resultante do cortisol restringe
controle bioquímico aditivo em comparação a qualquer medica- a resposta inflamatória, tornando possível a proteção do hospedeiro.
mento usado isoladamente. Concomitantemente, a resistência do receptor glicocorticoide cen-
tral mediada por citocinas prejudica a supressão do HPA pelos gli-
32
cocorticoides. Assim, a resposta ao estresse neuroendócrino reflete o tores de cortisol, o carcinoma suprarrenal e a hiperplasia suprarrenal
resultado global de sinais altamente integrados hipotalâmicos, intra- são responsáveis pelas outras causas; raramente, constata-se a produ-
-hipofisários bem como dos hormônios periféricos e das citocinas. ção ectópica de CRH por um tumor.
Os adenomas produtores de ACTH consistem em cerca de 10
Capítulo 2
■■ AÇÃO a 15% dos tumores hipofisários. Levando em conta que as caracte-
A principal função do eixo HPA consiste em manter a homeostase rísticas clínicas da síndrome de Cushing permitem, com demasia-
metabólica assim como mediar a resposta neuroendócrina ao es- da frequência, fazer o diagnóstico precoce, a maioria dos tumores
tresse. O ACTH induz esteroidogênese adrenocortical ao sustentar a hipofisários produtores de ACTH é constituída por microadenomas
proliferação e função das células suprarrenais. O receptor do ACTH, relativamente pequenos. No entanto, os macroadenomas também
designado como receptor da melanocortina-2, é um GPCR que induz são observados, enquanto alguns adenomas que expressam ACTH
a esteroidogênese por meio da estimulação de uma cascata de enzi- mostram-se clinicamente silenciosos. A doença de Cushing é 5-10
mas esteroidogênicas (Cap. 5). vezes mais comum em mulheres que em homens. Esses adenomas
33
crianças e nas mulheres jovens, a osteoporose precoce pode ser parti-
cularmente proeminente. A causa primária da morte é a doença cardio- QUADRO 2.13 Diagnóstico diferencial da síndrome de Cushing
vascular, porém as infecções e o risco de suicídio também aumentam. dependente de ACTH*
O rápido desenvolvimento das características do hipercortisolis- Tumor hipofisário Secreção ectópica
SEÇÃO I
mo, associado à hiperpigmentação da pele e à miopatia grave, sugere secretor de ACTH de ACTH
uma fonte ectópica do ACTH. Hipertensão, alcalose hipopotassêmi-
ca, intolerância à glicose e edema também são mais pronunciados Etiologia Adenoma hipofisário Carcinoides
nesses pacientes. Os níveis séricos de potássio < 3,3 mmol/L são de corticotrofos brônquico, abdominal
evidentes em cerca de 70% dos pacientes com secreção ectópica de Adenoma pluriormonal Câncer pulmonar de
ACTH, sendo, porém, observados em menos de 10% dos pacientes pequenas células
com a síndrome de Cushing que dependem da hipófise. Timoma
Sexo F>M M>F
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
Investigação laboratorial
Características clínicas Início lento Início rápido
O diagnóstico da síndrome de Cushing baseia-se na documentação la-
boratorial de hipercortisolismo endógeno. A mensuração do cortisol li- Pigmentação
vre urinário (CLU) de 24 h é um teste de triagem preciso e custo-eficaz. Miopatia grave
Como alternativa, a incapacidade de suprimir o cortisol plasmático após Potássio sérico < 10% 75%
um teste de supressão noturna com 1 mg de dexametasona pode ser < 3,3 g/L
utilizada para identificar os pacientes com hipercortisolismo. Sabendo Cortisol livre urinário de Alto Alto
que os níveis mais baixos de cortisol ocorrem de noite, as amostras da 24 h (CLU)
meia-noite com cortisol elevado são sugestivas da síndrome de Cushing. Nível basal de ACTH Inadequadamente alto Muito alto
Os níveis plasmáticos de ACTH costumam distinguir os pacientes com
Supressão com
a síndrome de Cushing ACTH-independente (glicocorticoides suprar-
dexametasona,
renais ou exógenos) da variante dependente de ACTH (ACTH hipofi- 1 mg de noite
sário, ectópico). Os níveis basais médios de ACTH são cerca de 8 vezes
Pequena dose (0,5 mg Cortisol > 5 g/dL* Cortisol > 5 g/dL*
mais altos nos pacientes com secreção ectópica de ACTH do que naque-
a cada 6 h)
les com adenomas hipofisários secretores de ACTH. Entretanto, a ex-
tensa superposição dos níveis de ACTH nesses dois distúrbios impede Alta dose (2 mg a Cortisol < 5 g/dL** Cortisol > 5 g/dL**
a utilização das determinações do ACTH para fazer tal distinção. Pelo cada 6 h)
contrário, os testes dinâmicos, baseados na sensibilidade diferencial à CLU > 80% suprimido Microadenomas: 90% 10%
retroalimentação dos glicocorticoides ou à estimulação do ACTH em Macroadenomas: 50%
resposta ao CRH ou a uma redução do cortisol são usados para distin- Amostragem do seio
guir entre as fontes ectópicas e hipofisárias de ACTH excessivo (Quadro petroso inferior (IPSS)
2.13). Muito raramente, os níveis circulantes de CRH encontram-se ele- Basal
vados, refletindo a secreção tumoral ectópica de CRH e, com frequên-
IPSS: periférico >2 <2
cia, de ACTH. Para uma discussão adicional dos testes dinâmicos para a
síndrome de Cushing, ver Capítulo 5. Induzido por CRH
A maioria dos tumores hipofisários secretores de ACTH tem < 5 IPSS: periférico >3 <3
mm de diâmetro e, em cerca de 50%, não é identificável pela RM. A
*As causas de síndrome de Cushing que independem do ACTH são diagnosticadas pelos níveis
alta prevalência de microadenomas hipofisários incidentais reduz a suprimidos de ACTH e por uma massa supra-renal na presença de hipercortisolismo. A síndrome
capacidade de distinguir com exatidão os tumores hipofisários secre- de Cushing iatrogênica é excluída pela anamnese.
tores de ACTH dos incidentalomas não secretores. Nota: ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; CRH, hormônio de liberação de corticotrofina; F,
feminino; M, masculino.
Amostragem de sangue venoso do seio petroso inferior * N. de R. T.: O ponto de corte utilizado atualmente, de acordo com as diretrizes da “Endocrine
Levando em conta que a RM da hipófise com realce pelo gadolínio Society”de 2008 é de 1,8.
não é suficientemente sensível para identificar os pequenos adeno- ** N. de R. T.: Supressão do cortisol sérico maior que 50% em relação ao valor basal é sugestiva
de tumor hipofisário secretor de ACTH. A ausência deste critério sugere secreção ectópica de
mas (< 2 mm) hipofisários secretores de ACTH, a amostragem bi-
ACTH.
lateral do seio petroso inferior para a determinação do ACTH antes
e após a administração de CRH* pode ser necessária para distinguir
essas lesões dos tumores ectópicos secretores de ACTH que podem
apresentar características clínicas e bioquímicas semelhantes. A de- TRATAMENTO Síndrome de Cushing
terminação simultânea das concentrações de ACTH em cada veia
petrosa inferior e na circulação periférica proporciona uma estraté- A ressecção transesfenoidal seletiva é o tratamento de escolha
gia para confirmar e localizar a produção hipofisária de ACTH. A para a doença de Cushing (Fig. 2.10). A taxa de remissão para
amostragem é realizada em condição basal e 2, 5 e 10 minutos após a esse procedimento é de cerca de 80% para os microadenomas,
injeção intravenosa de CRH bovino (1 g/kg). Uma razão aumenta- porém inferior a 50% para os macroadenomas. Após a ressecção
da (> 2) de ACTH na veia petrosa inferior:veia periférica confirma a bem-sucedida do tumor, a maioria dos pacientes experimenta um
síndrome de Cushing hipofisária. Após a injeção de CRH, as relações período pós-operatório de deficiência sintomática de ACTH que
máximas de ACTH na veia petrosa:veia periférica ≥ 3 confirmam a pode durar até 12 meses. Isso habitualmente exige uma reposição
presença de tumor hipofisário secretor de ACTH. A sensibilidade com pequenas doses de cortisol, visto que os pacientes apresen-
desse teste é superior a 95%, com resultados falsos positivos muito tam sintomas de privação dos esteroides e possuem um eixo HPA
raros. Os resultados falsos negativos podem ser observados nos pa- suprimido. A recidiva bioquímica ocorre em cerca de 5% dos pa-
cientes com drenagem venosa aberrante. As cateterizações do seio cientes nos quais a cirurgia inicialmente havia sido bem-sucedida.
petroso são tecnicamente difíceis e cerca de 0,05% dos pacientes de- Quando a cirurgia inicial não é bem-sucedida, a repetição
senvolvem complicações neurovasculares. O procedimento não deve da cirurgia às vezes é indicada, particularmente quando fonte hi-
ser realizado nos pacientes com hipertensão nem na presença de ade- pofisária para o ACTH é bem-documentada. Nos pacientes mais
noma hipofisário bem visualizado pela RM. idosos, nos quais os problemas de crescimento e fertilidade são
menos importantes, uma hemiipofisectomia, ou hipofisectomia
* N. de R. T.: No Brasil, o CRH não está disponível, sendo substituído pelo total, poderá ser necessária se um adenoma hipofisário distinto
DDAVP (10 g IV).
34
TRATAMENTO DA SÍNDROME DE CUSHING GONADOTROFINAS: FSH E LH
Hipercortisolismo ■■ SÍNTESE E SECREÇÃO
dependente de ACTH
Capítulo 2
Os gonadotrofos constituem cerca de 10% das células da adeno-hi-
pófise e produzem duas gonadotrofinas – LH e FSH. À semelhança
Amostragem do TSH e da hCG, o LH e o FSH são hormônios glicoproteicos que
do seio petroso
para ACTH* consistem em subunidades e . A subunidade é comum a esses
Considerar exames de
imagem de tórax/abdome hormônios glicoproteicos; a especificidade é conferida pelas subuni-
Excluir o ACTH ectópico dades , que se expressam por genes distintos.
Adenoma hipofisário
A síntese e liberação das gonadotrofinas são reguladas dinamica-
secretor de ACTH
mente. Isso é particularmente verdadeiro nas mulheres, nas quais os
níveis rapidamente flutuantes dos esteroides gonadais variam durante
Nas mulheres na pré-menopausa, o hipogonadismo hipogonadotró- Os adenomas hipofisários não funcionantes incluem os que secretam
fico se manifesta como função ovariana diminuída que evolui para pouco ou nenhum hormônio hipofisário, assim como os tumores que
oligomenorreia ou amenorreia, infertilidade, secreções vaginais re- produzem pouquíssimo hormônio para que possam resultar em ca-
duzidas, diminuição da libido e atrofia das mamas. Em homens adul- racterísticas clínicas reconhecíveis. Constituem o tipo mais comum
tos hipogonadais, a insuficiência testicular secundária está associada de adenoma hipofisário e, em geral, são macroadenomas por ocasião
à diminuição da libido e potência, infertilidade, menor massa mus- do diagnóstico, pois as características clínicas não são aparentes até
cular com fraqueza, menor crescimento da barba e dos pêlos corpo- a ocorrência de efeitos expansivos do tumor. Com base na imuno-
rais, testículos amolecidos e pregas (rugas) faciais delicadas caracte- -histoquímica, é possível mostrar que a maioria dos adenomas cli-
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
rísticas. A osteoporose ocorre tanto em mulheres hipogonadais não nicamente não funcionantes tem origem nos gonadotrofos. Esses
tratadas quanto em homens. tumores produzem pequenas quantidades de gonadotrofinas intactas
(habitualmente FSH) assim como as subunidades , LH e FSH
Investigação laboratorial não combinadas. A secreção pelo tumor pode produzir subunidades
O hipogonadismo central está associado a níveis séricos baixos ou e FSH elevadas, bem como, raramente, produzir maiores níveis
inadequadamente normais de gonadotrofinas na vigência de concen- da subunidade LH . Alguns adenomas expressam a subunidade
trações baixas dos hormônios sexuais (testosterona nos homens, es- sem FSH ou LH. Com frequência, a administração de TRH induz
tradiol nas mulheres). Como a secreção das gonadotrofinas é pulsátil, a um aumento atípico das gonadotrofinas ou das subunidades que
as avaliações válidas podem tornar necessárias mensurações repeti- derivam do tumor.
das ou o uso de amostras de soro misturadas. Os homens apresentam
uma redução do espermograma. Manifestação e diagnóstico
O GnRH intravenoso (100 g) estimula os gonadotrofos a secre- Com frequência, os tumores clinicamente não funcionantes se ma-
tarem LH (que alcança um pico em 30 minutos) e FSH (que alcança nifestam com pressão sobre o quiasma óptico e outros sintomas de
um platô durante os 60 minutos subsequentes). As respostas normais expansão local, ou podem ser descobertos incidentalmente em RM
variam em conformidade com o estágio do ciclo menstrual, a idade realizada para outra indicação (incidentaloma). Raramente, ocorrem
e o sexo do (da) paciente. Em geral, os níveis de LH aumentam cerca distúrbios menstruais ou hiperestimulação ovariana nas mulheres
de 3 vezes, enquanto as respostas do FSH são menos pronunciadas. com grandes tumores que produzem FSH e LH. Mais comumente,
Na presença de deficiência de gonadotrofinas, uma resposta normal a compressão pelo adenoma da haste hipofisária ou do tecido hipo-
desses hormônios ao GnRH indica função intacta dos gonadotrofos fisário circundante resulta em LH atenuado assim como em caracte-
hipofisários e sugere anormalidade hipotalâmica. No entanto, uma rísticas de hipogonadismo. Os níveis de PRL geralmente mostram-
resposta ausente não permite distinguir, de forma confiável, as causas -se ligeiramente aumentados também em virtude da compressão da
hipofisárias das hipotalâmicas do hipogonadismo. Por esse motivo, o haste. É importante distinguir esta circunstância dos prolactinomas
teste do GnRH costuma acrescentar muito pouco à informação ob- verdadeiros, visto que os tumores não funcionantes não regridem em
tida por meio da avaliação basal do eixo hipotalâmico-hipofisário- resposta ao tratamento com agonistas dopaminérgicos.
-gonadotrófico, exceto nos casos de deficiência isolada de GnRH
(p. ex., síndrome de Kallmann). Investigação laboratorial
A RM da região selar e a avaliação das outras funções hipofisá- A meta dos exames de laboratório nos tumores clinicamente não
rias estão habitualmente indicadas nos pacientes com hipogonadis- funcionantes reside em classificar o tipo de tumor, identificar os mar-
mo central documentado. cadores hormonais da atividade tumoral e detectar um possível hipo-
pituitarismo. Os níveis de subunidade livre podem estar elevados
em 10 a 15% dos pacientes com tumores não funcionantes. Nas mu-
TRATAMENTO Deficiência de gonadotrofinas lheres, é difícil diferenciar as concentrações basais perimenopáusicas
ou pós-menopáusicas do FSH da elevação desse hormônio que deri-
Nos homens, a reposição de testosterona é necessária para obter e va do tumor. Nas mulheres pré-menopáusicas, os níveis de FSH são
manter o crescimento e o desenvolvimento normais da genitália cíclicos, o que também impede fazer uma distinção diagnóstica clara
externa, as características sexuais secundárias, o comportamen- do FSH derivado do tumor. Nos homens, podem ser diagnosticados
to sexual masculino e os efeitos anabólicos androgênicos que tumores secretores de gonadotrofinas por causa de seus níveis ligei-
incluem a manutenção da função muscular e da massa óssea. A ramente aumentados (FSH > LH) na vigência de massa hipofisária.
testosterona pode ser administrada por injeções intramusculares
Os níveis de testosterona em geral estão baixo, não obstante o nível
a cada 1-4 semanas, ou utilizando adesivos cutâneos que são subs-
normal ou aumentado de LH, refletindo, talvez, a bioatividade redu-
tituídos diariamente (Cap. 8). Dispõe-se também de géis de tes-
zida do LH ou a perda da pulsatilidade normal do hormônio. Como
tosterona. As injeções de gonadotrofinas [hCG ou gonadotrofina
esse padrão de resultados de testes hormonais também é observado
menopáusica humana (hMG)] durante 12-18 meses são usadas
na insuficiência gonadal primária e, até certo ponto, com o envelhe-
para restaurar a fertilidade. A terapia pulsátil com GnRH (25-150
cimento (Cap. 8), o achado de aumentos apenas das gonadotrofinas
ng/kg a cada 2 h), administrada por uma bomba de infusão sub-
é insuficiente para fazer o diagnóstico de um tumor secretor de go-
cutânea, também é eficaz para o tratamento do hipogonadismo
nadotrofinas. Na maioria dos pacientes com adenomas dos gonado-
hipotalâmico quando a fertilidade é desejada.
trofos, a administração de TRH estimula a secreção das subunidades
Nas mulheres na pré-menopausa, a reposição cíclica do es-
do LH; mas, essa resposta não é observada em indivíduos normais.
trogênio e da progesterona preserva as características sexuais se-
No entanto, os testes do GnRH não são úteis ao diagnóstico. Para os
cundárias e a integridade da mucosa do trato geniturinário, bem
como previne a osteoporose prematura (Cap. 10). A terapia com tumores não funcionantes e secretores de gonadotrofinas, o diagnós-
gonadotrofina é usada para a indução da ovulação. O crescimento e tico baseia-se, habitualmente, nas análises imuno-histoquímicas do
a maturação dos folículos são iniciados utilizando hMG ou FSH re- tecido tumoral cirurgicamente ressecado, visto que os efeitos expan-
combinante; a hCG ou o hormônio luteinizante humano (hLH) são sivos desses tumores exigem habitualmente a sua ressecção.
injetados subsequentemente para induzir à ovulação. Como acon- Embora a acromegalia ou a síndrome de Cushing em geral se
tece nos homens, a terapia pulsátil com GnRH pode ser usada para manifestem com características clínicas ímpares, os adenomas de
tratar as causas hipotalâmicas da deficiência de gonadotrofinas. somatotrofos ou corticotrofos clinicamente inaparentes (silenciosos)
só podem ser diagnosticados por imunocoloração do tecido tumoral
36
TRATAMENTO DE MASSA HIPOFISÁRIA NÃO FUNCIONANTE
Capítulo 2
Diagnóstico diferencial baseado nas características da RM e clínicas
Baixo risco de
perda visual Cirurgia
Diagnóstico histológico
Observar Cirurgia
ressecado. Se os níveis de PRL forem < 100 g/L em um paciente por- roglutamil histidil-prolinamida) que atua por meio de um GPCR para
tador de massa hipofisária, deve-se considerar um adenoma não fun- estimular a síntese e secreção de TSH; estimula também o lactotrofo a
cionante que pode estar causando a compressão da haste hipofisária. secretar PRL. A secreção de TSH é estimulada pelo TRH, enquanto os
hormônios tireoidianos, a dopamina, a somatostatina e os glicocorti-
coides suprimem o TSH por sobrepujarem a indução do TRH.
Adenomas hipofisários não funcionantes e O crescimento dos tireotrofos e a secreção de TSH são induzidos
TRATAMENTO
produtores de gonadotrofinas quando é removida a inibição por meio de retroalimentação negativa
Os microadenomas não funcionantes assintomáticos que não pelos hormônios tireoidianos. Assim, o dano à tireoide (incluindo
ameaçam a visão podem ser acompanhados com exames regu- tireoidectomia cirúrgica), o hipotireoidismo induzido por irradiação,
lares de RM e dos campos visuais sem intervenção imediata. No a tireoidite crônica e a exposição prolongada a bociogênicos estão
entanto, para os macroadenomas, a cirurgia transesfenoidal está associados a um TSH aumentado. O hipotireoidismo não tratado de
indicada para reduzir o tamanho do tumor e aliviar os efeitos ex- longa duração pode evoluir para a hiperplasia dos tireotrofos e au-
pansivos (Fig. 2.11). Embora não seja habitualmente possível re- mento de volume da hipófise, o que pode ser evidenciado pela RM.
mover todo o tecido do adenoma cirurgicamente, a visão melhora
em 70% dos pacientes com defeitos pré-operatórios nos campos ■■ AÇÃO
visuais. O hipopituitarismo preexistente que resulta dos efeitos O TSH é secretado em pulsos, porém as excursões são moderadas,
expansivos do tumor pode melhorar ou regredir por completo. em comparação a outros hormônios hipofisários, por causa da baixa
Começando cerca de 6 meses após a operação, a RM deve ser amplitude dos pulsos e da meia-vida relativamente longa do TSH.
realizada a cada ano para detectar um novo crescimento do tu- Consequentemente, as determinações isoladas do TSH são sufi-
mor. Dentro de 5-6 anos após ressecção cirúrgica bem-sucedida, cientes para determinar seus níveis circulantes. O TSH une-se a um
cerca de 15% dos tumores não funcionantes recidivam. Quando GPCR nas células foliculares da tireoide para estimular a síntese e
permanece uma quantidade substancial de tumor após a cirurgia liberação do hormônio tireoidiano (Cap. 4).
transesfenoidal, a radioterapia adjuvante pode ser indicada para
prevenir o novo crescimento do tumor. A radioterapia poderá ser ■■ DEFICIÊNCIA DE TSH
protelada se não houver massa residual pós-operatória evidente.
As características do hipotireoidismo central por uma deficiência de
Os tumores hipofisários não funcionantes respondem preca-
TSH simulam as observadas com o hipotireoidismo primário, porém
riamente ao tratamento com agonistas dopaminérgicos, e os aná-
geralmente são menos graves. O hipotireoidismo hipofisário carac-
logos da somatostatina são, em grande parte, ineficazes para pro-
teriza-se por baixos níveis basais de TSH na vigência de um hor-
duzir redução desses tumores. O antagonista seletivo de GnRH,
mônio tireoidiano livre baixo. Em contrapartida, os pacientes com
Nal-Glu GnRH, suprime a hipersecreção de FSH, mas não exerce
hipotireoidismo de origem hipotalâmica (devido presumivelmente
efeito sobre o tamanho do adenoma.
à falta de TRH endógeno) podem exibir níveis normais ou mesmo
ligeiramente elevados de TSH. O TSH produzido nestas circunstân-
cias parece possuir uma atividade biológica reduzida por causa da
HORMÔNIO TIREOESTIMULANTE glicosilação alterada.
O TRH (200 g) injetado na veia acarreta um aumento de 2-3
■■ SÍNTESE E SECREÇÃO vezes nos níveis de TSH (e de PRL) em 30 minutos. Os testes do TRH
Os tireotrofos secretores de TSH constituem 50% da população de cé- podem ser usados para determinar a reserva de TSH, porém as anor-
lulas da adeno-hipófise. O TSH está relacionado estruturalmente ao malidades do eixo tireóideo podem ser habitualmente detectadas
LH e FSH; compartilha uma subunidade , porém contém uma subu- com base nos níveis basais de T4 livre e TSH, razão pela qual os testes
nidade específica de TSH; o TRH é um tripeptídio hipotalâmico (pi- do TRH apenas raramente são indicados.
37
A terapia de reposição tireóidea deve ser iniciada após ter sido
dos pacientes e melhora os campos visuais em 75% desses pacien-
estabelecida uma função supra-renal adequada. O ajuste posológico
tes; o eutireoidismo é restaurado na maioria dos pacientes. Como
baseia-se muito mais nos níveis de hormônio tireoidiano e nos parâ-
os análogos da somatostatina produzem uma acentuada supres-
metros clínicos que no nível de TSH.
são do TSH, o hipotireoidismo bioquímico frequentemente exige
SEÇÃO I
pofisário.
É importante excluir as outras causas da secreção inapropriada
de TSH, tais como a resistência ao hormônio tireoidiano, um distúr-
bio autossômico dominante causado por mutações no receptor dos BIBLIOGRAFIA
hormônios tireoidianos (Cap. 4). A presença de massa hipofisária e Castinetti F et al: Long-term results of stereotactic radiosurgery in secre-
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reoidiano, também se caracterizam por níveis elevados de hormônio Fernandez A et al: Prevalence of pituitary adenomas: A community-ba-
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são obtidos em cerca de 66% dos pacientes após a cirurgia. Pode- 2011
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da subunidade , reduz as dimensões da massa tumoral em 50% Society Clinical Practice Guideline. J Clin Endocrinol Metab 93:1526,
2008
38
CAPÍTULO 3 o limiar médio, ou ponto de controle para a liberação de AVP corres-
ponde a uma osmolaridade ou a um sódio plasmático de cerca de 280
CAPÍTULO 3
mOsmol/L ou 135 mEq/L, respectivamente; níveis de apenas 2 a 4%
mais altos normalmente resultam em antidiurese máxima.
Distúrbios da Embora seja relativamente estável no adulto sadio, o ponto de
controle do sistema osmorregulador pode ser reduzido em conse-
Neuro‑Hipófise quência de gravidez, ciclo menstrual, estrogênio e reduções agudas
e relativamente grandes da pressão arterial ou do volume sanguíneo.
Essas reduções são mediadas, em grande parte, por aferentes
Gary L. Robertson
neuronais, que se originam nos receptores de pressão transmural do
coração e das grandes artérias e que se projetam, por meio dos nervos
Distúrbios da Neuro‑Hipófise
A neuro-hipófise, ou hipófise posterior, é formada por axônios que
vago e glossofaríngeo, para o tronco encefálico, a partir do qual pro-
têm sua origem em grandes corpos celulares nos núcleos supra-óp-
jeções pós-sinápticas ascendem até o hipotálamo. Essas vias mantêm
tico e paraventricular do hipotálamo. A neuro-hipófise produz dois
um tônus inibitório tônico, que diminui quando o volume sanguíneo
hormônios: (1) a arginina vasopressina (AVP), também conhecida
ou a pressão arterial caem em mais de 10 a 20%. Esse sistema ba-
como hormônio antidiurético, e (2) a ocitocina. A AVP atua sobre os
rorregulador é provavelmente de menor importância na fisiologia da
túbulos renais, reduzindo a perda de água por meio da concentração
secreção da AVP, visto que as alterações hemodinâmicas necessárias
da urina. A ocitocina estimula a ejeção do leite no pós-parto em res-
para afetá-lo habitualmente não ocorrem durante as atividades nor-
posta à sucção. A deficiência de AVP provoca diabetes insípido (DI),
mais. Entretanto, o sistema barorregulador desempenha, sem dúvida
que se caracteriza pela produção de grandes quantidades de urina
alguma, um papel importante na secreção de AVP em pacientes com
diluída. A produção excessiva ou inapropriada de AVP predispõe à
grandes distúrbios agudos da função hemodinâmica.
hiponatremia se a ingestão de água não for reduzida paralelamente
A secreção de AVP também pode ser estimulada por náusea, hi-
ao débito urinário.
poglicemia aguda, deficiência de glicocorticoides, tabagismo e, pos-
sivelmente, hiperangiotensinemia. Os estímulos eméticos são extre-
VASOPRESSINA mamente potentes, visto que eles provocam aumentos imediatos, de
■■ SÍNTESE E SECREÇÃO 50 a 100 vezes, na AVP plasmática, mesmo quando a náusea é tran-
sitória e não está associada a vômitos ou a outros sintomas. Parecem
A AVP é um nonapeptídio que possui moléculas de cisteína nas posi-
atuar através do centro emético do bulbo e podem ser bloqueados
ções um e seis ligadas por uma ponte dissulfeto e uma cauda tripeptí-
por completo pelo tratamento com antieméticos, como a flufenazi-
dica (Fig. 3.1). É sintetizada por meio de um precursor polipeptídico,
na. Não existem evidências de que a dor ou outros estresses nocivos
que inclui a AVP, a neurofisina e a copeptina, todas codificadas por
exerçam qualquer efeito sobre a AVP, a não ser que induzam uma
um único gene no cromossomo 20. Após processamento preliminar
reação vasovagal, com sua náusea e hipotensão associadas.
e dobramento, o precursor é acondicionado em vesículas neurosse-
cretoras, nas quais é transportado ao longo do axônio, sofre processa-
■■ AÇÃO
mento adicional em AVP e é armazenado em vesículas neurossecre-
toras até que o hormônio e outros componentes sejam liberados no A ação fisiológica mais importante, se não a única, da AVP consis-
sangue periférico por exocitose. te em reduzir a excreção de água, promovendo a concentração da
A secreção de AVP é regulada principalmente pela pressão os- urina. Esse efeito antidiurético é obtido pelo aumento da permea-
mótica “efetiva” dos líquidos corporais. Esse controle é mediado por bilidade hidrosmótica das células que revestem o túbulo distal e os
células especializadas do hipotálamo, conhecidas como osmorrecepto- ductos coletores medulares do rim (Fig. 3.2). Na ausência de AVP,
res, que são extremamente sensíveis a pequenas mudanças na concen- essas células são impermeáveis à água e reabsorvem pouco ou ne-
tração plasmática de sódio e de alguns outros solutos, mas que nor- nhum do volume relativamente grande do filtrado diluído que entra
malmente são insensíveis a outros solutos, como a ureia e a glicose. a partir do néfron proximal. Isso resulta na excreção de volumes mui-
Os osmorreceptores parecem incluir componentes inibitórios, assim to grandes (de até 0,2 mL/kg por minuto) de urina de maximamente
como estimulatórios, que funcionam em conjunto para formar um diluída (densidade específica e osmolaridade de cerca de 1.000 e 50
sistema de controle baseado em limiar ou em ponto de ajuste. Abaixo mOsmol/L, respectivamente), uma condição conhecida como diurese
desse limiar, a AVP plasmática é suprimida para níveis que possibi- de água (ou hídrica). Na presença de AVP, essas células tornam-se se-
litam o aparecimento de uma diurese hídrica máxima. Acima dele, letivamente permeáveis à água, permitindo a sua difusão de volta ao
a AVP plasmática aumenta acentuadamente, em proporção direta longo do gradiente osmótico criado pela medula renal hipertônica.
com a osmolaridade plasmática, alcançando rapidamente níveis su- Em consequência, o líquido diluído que passa através dos túbulos é
ficientes para provocar uma antidiurese máxima. Os níveis absolutos concentrado, e a velocidade do fluxo de urina diminui. A magnitude
de osmolaridade/sódio plasmáticos nos quais ocorrem níveis efetivos desse efeito varia na proporção direta da concentração plasmática de
mínimos e máximos de AVP plasmática variam de modo apreciável AVP e, em níveis máximos, aproxima-se de uma velocidade de flu-
de uma pessoa para outra, aparentemente em virtude de influências xo urinário de apenas 0,35 mL/min e de uma osmolaridade urinária
genéticas sobre a regulação e a sensibilidade do sistema. Entretanto, elevada, de até 1.200 mOsmol/L. Essa ação é mediada pela ligação
aos receptores V2 acoplados à proteína G na superfície serosa da cé-
lula, pela ativação da adenilato ciclase e pela inserção na superfície
luminal de canais de água constituídos por uma proteína, conhecida
S S como aquaporina 2 (AQP 2). Os receptores V2 e a aquaporina 2 são
DDAVP –Cys–Tyr–Phe–Gln–Asp–Cys–Pro–D–Arg–Gly–NH2 codificados por genes localizados nos cromossomos Xq28 e 12q13,
respectivamente.
S S Em altas concentrações, a AVP também provoca contração do
AVP NH2–Cys–Tyr–Phe–Gln–Asp–Cys–Pro–L–Arg–Gly–NH2 músculo liso nos vasos sanguíneos e, no trato gastrintestinal, induz
a glicogenólise no fígado, além de potencializar a liberação do hor-
S S
mônio adrenocorticotrófico (ACTH) pelo fator de liberação da cor-
Ocitocina NH2–Cys–Tyr–Ile–Gln–Asp–Cys–Pro–L–Leu–Gly–NH2
ticotrofina. Esses efeitos são mediados pelos receptores V1a ou V1b,
Figura 3.1 Estruturas primárias da arginina vasopressina (AVP), da ocito- que estão acoplados à fosfolipase C. Seu papel se houver algum, na
cina e da desmopressina. fisiologia/fisiopatologia humana permanece incerto.
39
■■ METABOLISMO DEFICIÊNCIAS DA SECREÇÃO E DA AÇÃO DA VASOPRESSINA
A AVP distribui-se rapidamente em um espaço aproximadamente
■■ DIABETES INSÍPIDO
igual ao volume de líquido extracelular. É depurada de modo irrever-
sível com t1/2 de 10 a 30 minutos. A maior parte da depuração da AVP Características clínicas
SEÇÃO I
é devida à sua degradação no fígado e nos rins. Durante a gravidez, a A diminuição da secreção ou da ação da AVP manifesta-se habi-
depuração metabólica da AVP aumenta em três a quatro vezes, devi- tualmente como diabetes insípido, uma síndrome caracterizada pela
do à produção placentária de uma peptidase N-terminal. produção de volumes anormalmente grandes de urina diluída. O vo-
lume de urina de 24 horas é de 50 mL/kg de peso corporal, enquanto
SEDE a osmolaridade é < 300 mOsmol/L. A poliúria produz sintomas de
Como a AVP é incapaz de reduzir a perda de água abaixo de determi- frequência urinária, enurese e/ou nictúria, que podem perturbar o
nado nível mínimo estabelecido pela carga de solutos urinários e pela sono e causar ligeira fadiga ou sonolência diurnas. Resulta também
em ligeira elevação da osmolaridade plasmática, que estimula a sede
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
Glomérulo
Células principais
do ducto coletor
180 L/dia
(290)
Túbulo Receptor V2
Na + H2O coletor
Vesícula AVP
AQP 2 cAMP
H2O H2O
24 L/dia
AQP3
36 L/dia (60)
AQP4
(290)
Na
Alça de Henle Junções firmes
H2O Apical Basal
1 L/d
H2O
Figura 3.2 Efeito antidiurético da arginina vasopressina (AVP) na regulação do volume urinário. Em um adulto típico de 70 kg, o rim filtra cerca de 180 L/
dia de plasma. Deste volume, cerca de 144 L (80%) sofrem reabsorção isosmótica no túbulo proximal, enquanto outros 8 L (4 a 5%) são reabsorvidos sem soluto no ramo
descendente da alça de Henle. O restante é diluído até uma osmolaridade com cerca de ~ 60 mmol/kg por reabsorção seletiva de sódio e de cloreto no ramo ascendente. Na
ausência de AVP, a urina que sai da alça passa, em grande parte, sem qualquer modificação através dos túbulos distais e ductos coletores, resultando em máxima diurese de
água (hídrica). Na presença de AVP, a água isenta de solutos é reabsorvida osmoticamente através das células principais dos ductos coletores, resultando na excreção de um
volume muito menor de urina concentrada. Esse efeito antidiurético é mediado por um receptor V2 acoplado à proteína G, que aumenta o AMP cíclico intracelular, induzindo,
assim, a translocação dos canais de água aquaporina 2 (AQP 2) para a membrana apical. O consequente aumento de permeabilidade permite um influxo de água, que se
difunde para fora da célula através dos canais de água AQP 3 e AQP 4 na superfície baso-lateral. A velocidade final do fluxo através da célula é determinada pelo número de
canais de água AQP 2 na membrana apical e pela força do gradiente osmótico entre o líquido tubular e a medula renal. As junções firmes na superfície lateral das células
servem para impedir o fluxo desregulado de água.
40
QUADRO 3.1 Causas de diabetes insípido
Diabetes insípido hipofisário Diabetes insípido nefrogênico
CAPÍTULO 3
Adquirido Adquirido
Traumatismo cranioencefálico (fechado e penetrante), incluindo cirurgia da Fármacos
hipófise Lítio
Neoplasias Demeclociclina
Primárias Metoxiflurano
Craniofaringioma Anfotericina B
Adenoma hipofisário (suprasselar) Aminoglicosídios
Disgerminoma Cisplatina
Distúrbios da Neuro‑Hipófise
Meningioma Rifampicina
Metastáticas (pulmão, mama) Foscarnet
Hematológicas (linfoma, leucemia) Metabólicas
Granulomas Hipercalcemia, hipercalciúria
Sarcoidose Hipopotassemia
Histiocitose Obstrução (ureter ou uretra)
Xantoma disseminado Vasculares
Infecciosas Doença e traço falciformes
Meningite crônica Isquemia (necrose tubular aguda)
Encefalite viral Granulomas
Toxoplasmose Sarcoidose
Inflamatórias Neoplasias
Infundibuloneuro‑hipofisite linfocítica Sarcoma
Granulomatose com poliangiite (de Wegener) Infiltração
Lúpus eritematoso Amiloidose
Esclerodermia Gravidez
Toxinas químicas Idiopático
Tetrodotoxina Genéticas
Veneno de cobra Recessiva ligada ao X (gene do receptor‑2 de AVP)
Vasculares Autossômica recessiva (gene da AQP 2)
Síndrome de Sheehan Autossômica dominante (gene da AQP 2)
Aneurisma (carótida interna) Polidipsia primária
Bypass aortocoronário Adquirida
Encefalopatia hipóxica Psicogênica
Gravidez (vasopressinase) Esquizofrenia
Idiopática Transtorno obsessivo‑compulsivo
Malformações congênitas Dipsogênica (sede anormal)
Displasia septo óptica Granulomas
Defeitos craniofaciais da linha média Sarcoidose
Holoprosencefalia Infecciosas
Hipogenesia, ectopia da hipófise Meningite tuberculosa
Genéticas Traumatismo cranioencefálico (fechado e penetrante)
Autossômica dominante (gene AVP‑neurofisina) Desmielinização
Autossômica recessiva (gene AVP‑neurofisina) Esclerose múltipla
Autossômica recessiva‑Wolfram (4p – gene WFS 1) Fármacos
Recessiva ligada ao X (Xq28) Lítio
Deleção do cromossomo 7q Carbamazepina
Idiopática
Iatrogênica
após o nascimento, progredindo de um DI parcial para um DI grave forma é designada como DI gestacional, visto que os sinais e os sin-
e permanente. Parecem resultar do acúmulo do precursor mutante tomas manifestam-se durante a gestação e regridem habitualmente
com dobramento incorreto, seguido de degeneração seletiva dos neu- várias semanas após o parto.
rônios magnocelulares produtores de AVP. Foram também descritas As deficiências secundárias de AVP resultam da inibição da
uma forma autossômica recessiva, decorrente de uma mutação ina- secreção pela ingestão excessiva de líquidos. São designadas como
tivadora na porção AVP do gene, uma forma recessiva ligada ao X polidipsia primária e podem ser divididas em três subcategorias.
devida a um gene não identificado no Xq28, e uma forma autossômi- Uma delas, denominada DI dipsogênico, caracteriza-se por sede ina-
ca recessiva causada por mutações do gene WFS 1 responsável pela propriada, causada por uma redução da “regulação” do mecanismo
síndrome de Wolfram [diabetes insípido, diabetes melito, atrofia óp- osmorregulador. Algumas vezes, ocorre em associação a doenças
tica e surdez neural (DIDMOAD)]. Pode ocorrer também deficiência multifocais do cérebro, como neurossarcoidose, meningite tubercu-
primária de AVP plasmática devido a seu metabolismo aumentado losa e esclerose múltipla, embora seja frequentemente idiopático. O
por uma aminopeptidase N-terminal produzida pela placenta. Essa segundo subtipo, a polidipsia psicogênica, não está associado à sede, e
41
a polidipsia parece constituir uma característica de psicose ou trans- ligeiramente a água corporal, reduzindo, assim, a osmolaridade plas-
torno obsessivo-compulsivo. O terceiro subtipo, a polidipsia iatrogê- mática, a secreção de AVP e a concentração urinária. Esta última re-
nica, resulta de recomendações para aumentar a ingestão de líquidos sulta em aumento compensatório da excreção urinária de água livre,
em virtude de seus supostos benefícios para a saúde. que varia em proporção direta com a ingestão. Por conseguinte, a hi-
SEÇÃO I
As deficiências primárias na ação antidiurética da AVP resultam ponatremia ou a hiper-hidratação clinicamente reconhecível são in-
em DI nefrogênico (Quadro 3.1). Podem ser genéticas, adquiridas ou comuns, a não ser que a polidipsia seja muito grave ou que a diurese
induzidas por fármacos. A forma genética é habitualmente transmi- aquosa compensatória seja impedida por algum fármaco ou doença
tida de modo semirrecessivo ligado ao X e é causada por mutações capaz de estimular ou de simular a AVP endógena.
na região codificadora do gene do receptor V2, que comprometem Na forma dipsogênica da polidipsia primária, a ingestão de líqui-
o trânsito e/ou o acoplamento do ligante do receptor mutante. As dos é excessiva, visto que o limiar osmótico para a sede parece ser re-
formas autossômicas recessivas ou dominantes são causadas por ajustado para a esquerda, frequentemente bem abaixo daquele para a
mutações do gene da AQP 2, que resultam em defeitos parciais ou liberação de AVP. Quando privados de líquidos ou quando submetidos
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
completos no fluxo e na função dos canais de água nos túbulos distais a outro estímulo osmótico ou não osmótico agudo, esses indivíduos
e coletores do rim. sempre aumentam a AVP plasmática normalmente, porém o aumento
As deficiências secundárias na resposta antidiurética à AVP re- resultante na concentração da urina é habitualmente subnormal, visto
sultam da própria poliúria. São causadas pela eliminação do gradien- que a capacidade renal dos indivíduos de concentrar a urina também
te de concentração medular e/ou supressão da função das aquapo- está temporariamente atenuada pela poliúria crônica. Por conseguinte,
rinas. Em geral, regridem dentro de 24 a 48 horas após a correção o nível máximo de osmolaridade urinária alcançado é habitualmente
da poliúria, mas podem complicar a interpretação de alguns testes indistinguível daquele observado em pacientes com DI hipofisário
agudos usados para o diagnóstico diferencial. parcial, gestacional parcial ou nefrogênico parcial. Os pacientes com
polidipsia psicogênica ou iatrogênica respondem de modo semelhante
Fisiopatologia à restrição de líquidos, porém não se queixam de sede e, em geral, ofe-
Quando a secreção ou a ação da AVP caem abaixo de 80 a 85% do recem outras explicações para sua alta ingestão de líquidos.
normal, a concentração da urina cessa, e a taxa de sua produção au-
menta até níveis sintomáticos. Se o defeito for devido ao DI hipofi- Diagnóstico diferencial
sário, gestacional ou nefrogênico, a poliúria resulta em uma pequena Quando existem sintomas de frequência, enurese, nictúria e/ou sede
diminuição (1 a 2%) da água corporal e um aumento proporcional da persistente, deve se avaliar a possibilidade de DI após exclusão de
osmolaridade plasmática e da concentração de sódio que estimulam glicosúria, mediante coleta de urina de 24 horas com ingestão ad
a sede e que produzem aumento compensatório na ingestão de água. libitum (livre) de líquidos. Se o volume ultrapassar 50 mL/kg por
Em consequência, não há desenvolvimento de hipernatremia e outros dia (3.500 mL em um homem de 70 kg) e a osmolaridade for > 300
sinais físicos ou laboratoriais óbvios de desidratação, a não ser que o mOsmol/L, o diagnóstico de DI é confirmado, e o paciente deve ser
paciente também tenha um defeito na sede ou deixe de ingerir líquidos avaliado para determinar o tipo de DI.
por algum outro motivo. Para a diferenciação entre os vários tipos de DI, a anamnese por
A gravidade do defeito antidiurético varia acentuadamente de si só pode ser suficiente se ela revelar um provável antecedente, como
um paciente para outro. Em alguns, as deficiências na secreção ou cirurgia da hipófise. Todavia, em geral, esse tipo de indicador está
na ação da AVP são tão graves que até mesmo um estímulo inten- ausente, é ambíguo ou enganoso, e outras abordagens são necessá-
so, como náusea ou desidratação grave, não produz elevação da AVP rias. Exceto no raro paciente com desidratação hipertônica em con-
plasmática o suficiente para concentrar a urina. Em outros pacientes, dições basais, a diferenciação deve começar com um teste de privação
a deficiência é incompleta, e um estímulo moderado, como algumas hídrica. Esse exame pode ser realizado de modo ambulatorial, se os
horas de privação de líquido, tabagismo ou reação vasovagal, aumen- profissionais e equipamentos necessários estiverem disponíveis. Para
ta a AVP plasmática o suficiente para elevar a osmolaridade urinária minimizar o desconforto do paciente, evitar a desidratação excessiva
até 800 mOsmol/L. O máximo alcançado é habitualmente abaixo do e maximizar as informações obtidas, o teste deve ser iniciado pela
normal, porém isso ocorre em grande parte pelo fato de que a capaci- manhã e continuado com monitoração, a cada hora, do peso corpo-
dade máxima de concentração está temporariamente comprometida ral, da osmolaridade plasmática e/ou concentração de sódio, volume
pela poliúria crônica. e osmolaridade da urina, até alcançar um dos dois parâmetros finais
Na polidipsia primária, a patogênese da polidipsia e da poliúria de avaliação. Se a privação hídrica não resultar em concentração da
é o inverso daquela observada no DI hipofisário, nefrogênico e ges- urina (osmolaridade > 300 mOsmol/L, densidade específica > 1.010)
tacional. Por conseguinte, a ingestão excessiva de líquidos aumenta antes de uma diminuição do peso corporal em 5%, ou se a osmola-
1.000 60
Osmolaridade urinária, mOsmol/L
40
800
20
600
15
400
10
200 5
0 0
0,1 0,5 1 3 10 30 60 270 280 290 300 310
Vasopressina plasmática, pg/mL Osmolaridade plasmática, mOsmol/L
Figura 3.3 Relação da AVP plasmática com a osmolaridade urinária (esquerda) e a osmolaridade plasmática (direita) antes e durante o teste de privação
hídrica e infusão de solução salina hipertônica em pacientes normais ou que apresentam polidipsia primária (zonas azuis), diabetes insípido hipofisário (zonas verdes) ou
diabetes insípido nefrogênico (zonas cor-de-rosa).
42
ridade/sódio plasmáticos aumentarem acima do limite superior da Desmopressina 20 mcg IN
normalidade, o paciente apresenta DI hipofisário ou nefrogênico
600
grave. Esses distúrbios podem ser habitualmente diferenciados pela
administração de desmopressina (0,03 g/kg SC ou IV), com repeti-
CAPÍTULO 3
Osmolaridade
urinária, 300
ção da determinação da osmolaridade urinária dentro de 1 a 2 horas. mOsmol/L
Um aumento > 50% indica DI hipofisário grave, enquanto uma res-
posta menor ou ausente é fortemente sugestiva de DI nefrogênico. 0
Por outro lado, se a privação hídrica resultar em concentração 12 12
da urina, são excluídos defeitos graves na secreção e na ação da 9 9
Volume Ingestão de
AVP, e o problema é estabelecer se o paciente apresenta DI hipofi-
urinário, 6 6 líquidos,
sário parcial, DI nefrogênico parcial ou polidipsia primária. Os ní- L/dia L/dia
veis de osmolaridade urinária alcançados antes e depois da injeção 3 3
Distúrbios da Neuro‑Hipófise
de desmopressina não são úteis nesse aspecto, visto que os valores 0 0
nos três grupos variam amplamente e exibem superposição, devido 71
Peso
ao comprometimento da capacidade de concentração renal causado
corporal, 70
pela própria poliúria. Por conseguinte, é necessária outra abordagem kg
para diferenciar essas formas. O método mais fácil e menos dispen- 69
dioso consiste em determinar a AVP plasmática antes e durante o 296 143
teste de privação hídrica e analisar os resultados em relação à osmo-
Osmolaridade 294 142 Sódio
laridade plasmática e urinária (Fig. 3.3). Essa abordagem diferencia plasmática, 292 141 plasmático,
invariavelmente o DI nefrogênico parcial do DI hipofisário parcial e mOsmol/L mEq/L
da polidipsia primária. Diferencia também o DI hipofisário parcial 290 140
43
de comprometer, direta ou indiretamente, a excreção urinária de 20 Faixa normal
água livre. 18
A poliúria e a polidipsia do DI nefrogênico não são afetadas
a resistência for parcial, ela pode ser superada com doses dez ve- 14
a
zes maiores; todavia, esse tratamento é demasiado dispendioso e
12
inconveniente para ter utilidade de longo prazo. Entretanto, o tra-
tamento com doses convencionais de um diurético tiazídico e/ou 10
amilorida, juntamente com uma dieta hipossódica e um inibidor
8
da síntese de prostaglandinas (p. ex., indometacina), reduz habi-
tualmente a poliúria e a polidipsia em 30 a 70% e pode eliminá- 6
-las por completo em alguns pacientes. Os efeitos colaterais, como HA parcial
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
4 b
hipopotassemia e irritação gástrica, podem ser minimizados pelo P
uso de amilorida ou suplementos de potássio ou pela administra- 2 c T
ção das medicações com as refeições. 0 d HA total
44
osmorregulação não são conhecidos. O defeito na osmorregulação pode
perdas insensíveis e urinárias continuadas, deve ser administra-
assumir qualquer uma de quatro formas distintas (Fig. 3.5). Em uma das
da no decorrer de um período de 24 a 48 horas. A monitoração
formas mais comuns (reajuste de osmostato), a secreção de AVP conti-
rigorosa do sódio sérico, bem como da ingestão de líquidos e
nua totalmente responsiva a mudanças da osmolaridade/sódio plasmá-
CAPÍTULO 3
do débito urinário, é essencial, visto que, dependendo do grau
ticos, porém o limiar ou ponto de ajuste do sistema osmorregulador está
de deficiência dos osmorreceptores (Fig. 3.5), alguns pacientes
anormalmente baixo. Esses pacientes diferem daqueles com outros tipos
irão desenvolver DI com deficiência de AVP, exigindo terapia
de defeito osmorregulador, visto que são capazes de suprimir ao máximo
com desmopressina para obter uma reidratação completa; ou-
a AVP plasmática e diluir a sua urina quando a ingestão de líquidos é alta
tros irão desenvolver hiponatremia e uma síndrome com quadro
o suficiente para reduzir a osmolaridade/sódio plasmáticos para o novo
semelhante à antidiurese inapropriada (SIAD) se houver hipe-
ponto de ajuste. Outro subgrupo menor (cerca de 10% do total) exibe
ridratação. Na presença de hiperglicemia e/ou hipopotassemia,
antidiurese inapropriada, sem defeito demonstrável na osmorregulação
devem-se administrar insulina e/ou suplementos de potássio
da AVP plasmática (Fig. 3.5). Em alguns deles, todos meninos de pouca
com a expectativa de que ambos possam ser interrompidos tão
Distúrbios da Neuro‑Hipófise
idade, a antidiurese inapropriada foi atribuída a uma mutação ativadora
logo a reidratação estiver completa. A ureia/creatinina plasmáti-
constitutiva do gene do receptor V2. Essa variante incomum pode ser
ca devem ser rigorosamente monitoradas à procura de sinais de
designada como SIAD nefrogênica familiar para distingui-la de outras
insuficiência renal aguda.
causas possíveis da síndrome.
Após o paciente ter sido reidratado, devem-se efetuar uma
As formas secundárias de antidiurese osmoticamente inapro-
RM do cérebro e provas de função da adeno-hipófise à procura
priada também apresentam múltiplas causas. São habitualmente sub-
da causa e de defeitos colaterais em outras funções hipotalâmicas.
divididas em três tipos, dependendo da natureza do estímulo anor-
Além disso, deve-se elaborar um plano de tratamento de longo
mal e do estado do volume de líquido extracelular. O tipo I ocorre
prazo destinado a prevenir ou minimizar a recidiva do desequi-
nos estados de retenção de sódio e formação de edema, como insufi-
líbrio hidreletrolítico. Isso deve incluir um método prático que
ciência cardíaca congestiva, cirrose e nefrose. Esse tipo está associado
pode ser usado para regular a ingestão de líquidos de acordo com
a uma retenção acentuadamente excessiva de água e de sódio, que
as variações diárias do balanço hídrico. A maneira mais efetiva
se acredita seja estimulada por uma importante redução do volume
de atingir essa meta consiste em prescrever desmopressina para
sanguíneo “efetivo” causada por um baixo débito cardíaco e/ou pela
controlar o DI, se estiver presente, e ensinar ao paciente como
redistribuição de plasma do espaço intravascular para o espaço in-
ajustar a ingestão diária de líquidos de acordo com as mudanças
tersticial. O tipo II ocorre em estados de depleção de sódio, como
diárias do peso corporal ou do sódio sérico, determinadas por
gastrenterite grave, abuso de diuréticos e deficiência de mineralocor-
analisadores de monitoração de uso domiciliar. A prescrição de
ticoides. Esse tipo é devido ao estímulo da AVP por uma grande re-
uma ingestão constante de líquidos é ineficaz e potencialmente
perigosa, visto que não leva em consideração as grandes variações
não controladas da perda insensível, que resultam inevitavelmente
QUADRO 3.2 Causas da síndrome de antidiurese inapropriada
de mudanças na temperatura ambiente e atividade física.
(SIAD)
Neoplasias Neurológicas
SECREÇÃO E AÇÃO EXCESSIVAS DA VASOPRESSINA
Carcinomas de Síndrome de Guillain‑Barré
■■ HIPONATREMIA Pulmão Esclerose múltipla
Características clínicas Duodeno Delirium tremens
A secreção ou ação excessivas da AVP resultam na produção de vo- Pâncreas Esclerose lateral amiotrófica
lumes diminuídos de urina mais altamente concentrada. Se não for Ovário Hidrocefalia
acompanhada de uma redução proporcional na ingestão de líquidos Bexiga, ureter Psicose
ou de um aumento da perda insensível, a redução do débito urinário Outras neoplasias Neuropatia periférica
resulta em retenção excessiva de água com expansão e diluição de Timoma Malformações congênitas
todos os líquidos corporais. Em alguns pacientes, a ingestão exces-
Mesotelioma Agenesia do corpo caloso
siva resulta de uma sede inapropriada. Se a hiponatremia se instalar
gradualmente, ou se já está presente há mais de alguns dias, ela pode Adenoma brônquico Fenda labial/palatina
ser em grande parte assintomática. Entretanto, quando se desenvolve Carcinoide Outros defeitos da linha média
agudamente, é habitualmente acompanhada de sinais e sintomas de Gangliocitoma Metabólicas
intoxicação hídrica, que podem incluir cefaleia leve, confusão, anore- Sarcoma de Ewing Porfiria intermitente aguda
xia, náusea, vômitos, coma e convulsões. A hiponatremia grave pode Traumatismo cranioencefálico Pulmonar
ser letal. Outros sinais e sintomas clínicos variam acentuadamente, (fechado e penetrante) Asma
dependendo da patogênese do defeito na função antidiurética. Infecções Pneumotórax
Etiologia Pneumonia, bacteriana ou viral Ventilação com pressão positiva
A hiponatremia e a incapacidade de diluir a urina podem ser causados Abscesso, do pulmão ou cérebro Fármacos
por um defeito primário ou secundário na regulação da secreção ou Cavitação (aspergilose) Vasopressina ou desmopressina
da ação da AVP. As formas primárias são, em geral, designadas como Tuberculose, pulmão ou cérebro Clorpropamida
síndrome de antidiurese inapropriada. Apresentam muitas causas dife- Meningite, bacteriana ou viral Ocitocina, altas doses
rentes, incluindo produção ectópica de AVP por câncer de pulmão ou Encefalite Vincristina
outras neoplasias; liberação eutópica por várias doenças ou fármacos; e Aids
administração exógena de AVP, desmopressina ou grandes doses de oci- Carbamazepina
Vasculares Nicotina
tocina (Quadro 3.2). As formas ectópicas resultam da expressão anor-
mal do gene AVP-NPII por neoplasias malignas primárias ou metastá- Oclusões cerebrovasculares, Fenotiazinas
ticas. As formas eutópicas ocorrem mais frequentemente em pacientes hemorragia
Ciclofosfamida
com infecções agudas ou com acidentes vasculares encefálicos, mas Trombose do seio cavernoso
Antidepressivos tricíclicos
também têm sido associadas a muitas outras doenças e lesões neuroló- Genéticas
Inibidores da monoaminoxidase
gicas. Neste caso, a SIAD é habitualmente autolimitada e sofre remissão Recessiva ligada ao X
Inibidores da recaptação da
espontânea dentro de 2 a 3 semanas, porém cerca de 10% dos casos são (Gene do receptor V2) serotonina
crônicos. Os mecanismos pelos quais essas doenças interferem com a
45
dução do volume sanguíneo e/ou da pressão arterial. Em ambos os ti- líquidos corporais, resultando em hiponatremia. Entretanto, diferen-
pos, a secreção aumentada de AVP parece ser devida a um reajuste do temente da SIAD, a filtração glomerular encontra-se reduzida, e a ati-
osmostato para baixo. O tipo III é devido a estímulos não osmóticos vidade da renina plasmática e os níveis de aldosterona estão elevados,
não hemodinâmicos da AVP, como náusea ou deficiência isolada de devido à hipovolemia efetiva (tipo I) ou hipovolemia absoluta (tipo II).
SEÇÃO I
glicocorticoides, que produzem uma forma de hiponatremia euvolê- Por conseguinte, a excreção urinária de sódio está baixa (a não ser que
mica, semelhante à SIAD (Quadro 3.3). São diferenciados, visto que a reabsorção de sódio esteja reduzida por um diurético), e a hipona-
a causa da secreção excessiva de AVP no tipo III pode ser corrigida tremia é habitualmente acompanhada de hipopotassemia, azotemia e
rapidamente e de forma completa por tratamentos (antieméticos ou hiperuricemia. A retenção de sódio constitui uma resposta compen-
glicocorticoides) que não são úteis na SIAD. satória apropriada à grave depleção de volume e de sódio no tipo II,
porém é inapropriada e deletéria no tipo I, visto que o sódio corporal e
Fisiopatologia o volume extracelular já estão acentuadamente aumentados, conforme
Quando a supressão osmótica da antidiurese está comprometida evidenciado pela presença de edema generalizado.
por qualquer motivo, ocorre retenção de água e diluição dos líqui-
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
dos corporais somente quando a ingestão ultrapassa a taxa de perdas Diagnóstico diferencial
obrigatórias e insensíveis e urinárias. A ingestão excessiva de água é A SIAD é um diagnóstico de exclusão, que habitualmente pode ser
algumas vezes provocada por um defeito associado na osmorregu- estabelecido a partir da anamnese, exame físico e dados laboratoriais
lação da sede (dipsogênica), mas também pode ser psicogênica ou básicos. A possibilidade de que a hiponatremia seja causada por um
iatrogênica, incluindo administração IV de líquidos hipotônicos. desvio da água impulsionada osmoticamente do espaço intracelular
Na SIAD, a retenção excessiva de água expande os volumes ex- para o espaço extracelular pode ser excluída, se o nível plasmático
tracelular e intracelular, aumenta a filtração glomerular e os níveis de de glicose não estiver alto o suficiente para explicar a hiponatremia
hormônio atrial natriurético, suprime a atividade plasmática de re- [o sódio sérico diminui em cerca de 1 mEq/L para cada elevação da
nina e aumenta a excreção urinária de sódio. Essa natriurese reduz o glicose de 2 mmol/L (36 mg/dL)] e/ou se a osmolaridade plasmática
sódio corporal total, e isso serve para contrabalançar a hipervolemia estiver reduzida proporcionalmente ao sódio (cada redução no nível
extracelular, porém agrava a hiponatremia. O aumento do volume in- sérico de sódio de 1 mEq/L deve reduzir a osmolaridade plasmática
tracelular osmoticamente impulsionado resulta em edema das células em cerca de 2 mOsmol/L). Em seguida, pode-se determinar o tipo de
cerebrais e provoca elevação da pressão intracraniana; esse processo hiponatremia hipotônica pelos indicadores clínicos padronizados do
é provavelmente responsável pelos sintomas de intoxicação hídrica volume de líquido extracelular (Quadro 3.3). Se esses achados forem
aguda. Dentro de poucos dias, esse edema pode ser contrabalançado ambíguos ou contraditórios, pode ser útil medir a taxa de excreção
pela inativação ou eliminação dos solutos intracelulares, resultando urinária de sódio ou a atividade da renina plasmática, contanto que
na remissão dos sintomas, embora a hiponatremia persista. A fisio- a hiponatremia não esteja na fase de recuperação, ou seja, devido a
patologia da hiponatremia tipo III (euvolêmica) provavelmente é se- um defeito primário na conversão renal de sódio, ao abuso de diuré-
melhante àquela da SIAD. ticos ou à presença de hipoaldosteronismo hiporreninêmico. Pode-se
Na hiponatremia tipo I (hipervolêmica) ou tipo II (hipovolêmica), suspeitar deste último se o nível sérico de potássio estiver elevado,
o efeito antidiurético da liberação de AVP induzida hemodinamica- em lugar de estar baixo, como ocorre habitualmente na hiponatremia
mente é intensificado pela liberação distal diminuída do filtrado glo- tipos I e II. Na atualidade, as mensurações da AVP plasmática não
merular, que resulta da reabsorção aumentada de sódio nos néfrons têm nenhum valor para diferenciar os três tipos de hiponatremia,
proximais. Se a redução acentuada do débito urinário não estiver visto que as anormalidades são semelhantes. Nos pacientes que pre-
associada a uma redução proporcional na ingestão de água ou a um enchem os critérios clínicos para a hiponatremia tipo III (euvolêmi-
aumento da perda insensível, ocorrerão a expansão e a diluição dos ca), o cortisol plasmático pela manhã também deve ser medido para
QUADRO 3.3 Diagnóstico diferencial da hiponatremia com base na avaliação clínica do volume de líquido extracelular (VLEC)
Achados clínicos Tipo I, Hipervolêmica Tipo II, Hipovolêmica Tipo III, Euvolêmica SIAD Euvolêmica
Anamnese
ICC, cirrose ou nefrose Sim Não Não Não
Perda de sal e de água Não Sim Não Não
Deficiência de ACTH‑cortisol e/ou náusea e vômitos Não Não Sim Não
Exame físico
Edema generalizado, ascite Sim Não Não Não
a
Hipotensão postural Talvez Talvez Talvez Não
Laboratório
Ureia sanguínea, creatinina Altas‑normais Altas‑normais Baixas‑normais Baixas‑normais
Ácido úrico Altas‑normais Altas‑normais Baixas‑normais Baixas‑normais
b
Potássio Sérico Baixo‑normal Baixo‑normal Normalc Normal
Albumina sérica Baixa normal Alta normal Normal Normal
d
Cortisol sérico Normal‑alto Normal alto Baixoe Normal
f
Atividade plasmática de renina Alta Alta Baixa Baixa
g
Baixoh i
Sódio urinário (mEq por unidade de tempo) Baixo Alto Altoi
a
Pode ocorrer hipotensão postural na insuficiência suprarrenal secundária (dependente de ACTH), embora o volume de líquido extracelular e a aldosterona estejam habitualmente normais.
b
O potássio sérico pode estar elevado, se a hipovolemia for devida à deficiência de aldosterona.
c
O potássio sérico pode estar baixo, quando os vômitos causam alcalose.
d
O cortisol sérico está baixo se a hipovolemia for devida à insuficiência suprarrenal primária (doença de Addison).
e
O cortisol sérico estará normal ou elevado se a causa consistir em náusea e vômitos, e não em insuficiência suprarrenal secundária (dependente de ACTH).
f
A atividade plasmática de renina pode estar alta, se a causa consistir em insuficiência suprarrenal secundária (ACTH).
g
O sódio urinário deve ser expresso como taxa de excreção, e não como concentração. Em um adulto com hiponatremia, uma taxa de excreção > 25 mEq/dia (ou 25 Eq/mg de creatinina) pode ser
considerada alta.
h
Taxa de excreção urinária de sódio pode estar alta, se a hipovolemia for decorrente de abuso de diuréticos, insuficiência suprarrenal primária ou outras causas de perda renal de sódio.
i
A taxa de excreção urinária de sódio pode estar baixa, se a ingestão for limitada pelos sintomas ou pelo tratamento.
Nota: ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; ICC, insuficiência cardíaca congestiva; SIAD, síndrome de antidiurese inapropriada.
46
excluir a possibilidade de insuficiência suprarrenal secundária. Se
com muita rapidez. Um deles, um antagonista combinado V2/V1a
estiver normal, e se não houver nenhuma história de náuseas/vômito,
(conivaptana), foi aprovado para tratamento IV hospitalar de curto
o diagnóstico de SIAD é confirmado, e deve-se efetuar uma pesqui-
prazo da SIAD e da hiponatremia da insuficiência cardíaca conges-
sa cuidadosa à procura de câncer pulmonar oculto ou outras causas
CAPÍTULO 3
tiva. Trata-se de um substrato e inibidor do citocromo P450, que
comuns da síndrome (Quadro 3.2). Se houver suspeita de mutação
não deve ser usado em associação a outros fármacos metaboliza-
ativadora do gene do receptor V2, a AVP plasmática deve ser medida
dos por essas vias. Outros antagonistas do receptor V2 estão sendo
na presença de hiponatremia e antidiurese. Se os níveis foram inde-
atualmente objetos de ensaios clínicos de fase III.
tectáveis, deve-se obter uma amostra de DNA para análise do gene
Na hiponatremia tipo I, a restrição de líquidos também é
do receptor V2.
apropriada e ligeiramente efetiva, se for possível mantê-la. Entre-
tanto, a infusão de solução salina hipertônica está contraindicada,
TRATAMENTO Hiponatremia visto que ela aumenta ainda mais o sódio corporal total e o edema
e pode precipitar uma descompensação cardiovascular. Os estu-
Distúrbios da Neuro‑Hipófise
O tratamento da hiponatremia difere, dependendo não apenas dos preliminares com antagonistas dos receptores V2 indicam que
do tipo, como também da gravidade e da duração dos sintomas. eles são quase tão efetivos na hiponatremia tipo I quanto na SIAD.
Em um paciente com SIAD e poucos sintomas, o objetivo consiste Na hiponatremia tipo II, o defeito na secreção de AVP e no
em reduzir gradualmente a água corporal por meio da restrição balanço hídrico em geral pode ser corrigido rápida e facilmente
da ingestão total de líquidos para menos que a soma das perdas com a interrupção da perda de sódio e de água e/ou reposição dos
urinárias e insensíveis. Tendo em vista que a água derivada dos déficits por via oral ou por infusão IV de solução salina normal ou
alimentos (300 a 700 mL/dia) aproxima-se habitualmente das hipertônica. À semelhança do tratamento de outras formas de hi-
perdas insensíveis basais nos adultos, a ingestão total (todos os ponatremia, é preciso ter cuidado para assegurar que o sódio plas-
líquidos) deve ser pelo menos 500 mL menor do que o débito uri- mático não aumente muito rapidamente. A restrição de líquidos
nário. Se for possível atingir essa quantidade, ela habitualmente e a administração de antagonistas da AVP estão contraindicadas
reduz a água corporal e aumenta o sódio sérico em cerca de 1 a para o tipo II, visto que apenas agravariam a depleção de volume
2% por dia. Se os sinais ou sintomas de intoxicação hídrica forem subjacente, podendo resultar em colapso hemodinâmico.
mais graves, a hiponatremia pode ser corrigida mais rapidamente Na hiponatremia euvolêmica causada por náusea e vômitos
ao suplementar a restrição de líquidos com infusão IV de solução prolongados ou pela deficiência isolada de glicocorticoides (tipo
salina hipertônica (3%). Esse tratamento também tem a vantagem III), todas as anormalidades podem ser corrigidas rapidamente e
de corrigir a deficiência de sódio, que é parcialmente responsável de modo completo pela administração de um antiemético ou de
pela hiponatremia na SIAD e produz diurese de solutos, que ser- doses de estresse de hidrocortisona. A exemplo de outros trata-
ve para remover parte do excesso de água. Entretanto, se o sódio mentos, é preciso ter cuidado para assegurar que o sódio sérico
plasmático for elevado muito rapidamente ou de modo excessivo, não aumente muito rapidamente ou até valores excessivos.
e a hiponatremia já estiver presente por mais de 24 a 48 horas, CONSIDERAÇÕES GLOBAIS A incidência, as característi-
isso também tem o potencial de produzir mielinólise pontina cas clínicas, a etiologia, a fisiopatologia, o diagnóstico
central, uma síndrome neurológica aguda e potencialmente fatal, diferencial e os tratamentos dos distúrbios hidreletrolí-
caracterizada por quadriparesia, ataxia e movimentos extraocu- ticos nos países tropicais e não industrializados, diferem, em al-
lares anormais. O risco dessa complicação pode ser minimizado guns aspectos, daqueles nos Estados Unidos e em outras partes
obedecendo a várias precauções: a solução salina a 3% deve ser industrializadas do mundo. Por exemplo, a hiponatremia parece
infundida em uma velocidade de ≤ 0,05 mL/kg de peso corpo- ser mais comum e tem mais tendência a ser causada por doenças
ral por minuto; o efeito deve ser continuamente monitorado por infecciosas, como cólera, shigelose e outros distúrbios diarreicos.
determinações do sódio sérico, pelo menos a cada 2 horas; e a in- Nessas circunstâncias, a hiponatremia resulta, provavelmente, de
fusão deve ser interrompida tão logo ocorra aumento do sódio sé- perdas gastrintestinais de sal e de água (hipovolemia tipo II), po-
rico em 12 mmol/L ou até 130 mmol/L, aquele que for observado rém outras anormalidades também podem contribuir, incluindo
primeiro. O débito urinário deve ser monitorado continuamente, toxinas infecciosas não definidas. As causas do DI são semelhan-
visto que a SIAD pode sofrer remissão espontânea a qualquer mo- tes no mundo inteiro, à exceção da malária e de venenos de cobras
mento, resultando em diurese aquosa aguda, que acelera acentua- ou picadas de insetos, que são muito mais comuns.
damente a taxa de elevação do sódio sérico produzida pela restri-
ção de líquido e pela infusão de solução salina a 3%.
Na SIAD crônica, a hiponatremia pode ser corrigida pelo tra- BIBLIOGRAFIA
tamento com demeclociclina, 150 a 300 mg VO, 3 ou 4 vezes ao
Bichet D: Vasopressin receptor mutations in nephrogenic diabetes insipi-
dia, ou com fludrocortisona, 0,05 a 0,2 mg VO, 2 vezes ao dia. O
dus. Semin Nephrol 28:245, 2008
efeito da demeclociclina manifesta-se em 7 a 14 dias e é devido à
Biswas M, Davies JS: Hyponatremia in clinical practice. Postgrad Med J
produção de uma forma reversível de DI nefrogênico. Os efeitos 83:373, 2007
colaterais potenciais consistem em fototoxicidade e azotemia. O
Christensen JH, Rittig S: Familial neurohypophyseal diabetes insipi-
efeito da fludrocortisona também leva 1 a 2 semanas e deve-se, dus—an update. Semin Nephrol 26:209, 2006
em parte, à retenção aumentada de sódio e, possivelmente, à ini- Feldman BJ et al: Nephrogenic syndrome of inappropriate antidiuresis. N
bição da sede. O fármaco também aumenta a excreção urinária Engl J Med 352:1884, 2005
de potássio, o que pode exigir uma reposição por meio de ajustes Kristof RA et al: Incidence, clinical manifestations and course of water
dietéticos ou suplementos, e pode induzir hipertensão, exigindo, and electrolytes metabolism disturbances following transsphenoidal
em certas ocasiões, a interrupção do tratamento. pituitary adenoma surgery: A prospective observational study. J Neu-
Os antagonistas não peptídicos da AVP que bloqueiam o efeito rosurg 111:555, 2009
antidiurético da AVP também têm sido usados experimentalmente Liamis G et al: A review of drug induced hyponatremia. Am J Kidney Dis
para tratar a SIAD. Esses fármacos produzem um aumento dose 52:144, 2008
dependente na excreção urinária de água livre que, quando combi- Loonen AJM et al: Aquaporin 2 mutations in nephrogenic diabetes insipi-
nado com uma restrição moderada da ingestão de líquidos, reduz dus. Semin Nephrol 28:252, 2008
a água corporal e corrige a hiponatremia. Os antagonistas não pa- Robertson GL: Antidiuretic hormone: Normal and disordered function.
recem ter efeitos colaterais adversos; todavia, à semelhança da so- Endocrinol Metab Clin North Am 30:671, 2001
lução salina hipertônica, eles provavelmente comportam o risco de Sitprija V: Altered fluid, electrolyte and mineral status in tropical disease
induzir desmielinização osmótica, se a hiponatremia for corrigida with an emphasis on malaria and leptospirosis. Nature Clin Pract Ne-
phrol 42:91, 208
47
CAPÍTULO 4 produzem calcitonina, um hormônio redutor do cálcio. As células
C ficam espalhadas por toda a glândula, apesar de sua densidade ser
maior na junção do terço superior com os dois terços inferiores da
SEÇÃO I
I I
NH2
3' 3
HO 5' O 5 CH2 CH COOH
I I
Tiroxina (T4)
3,5,3',5'-tetraiodotironina
Desiodases 1 ou 2 Desiodase 3 > 2
(5'-deiodinação) (5-deiodinação)
I I I I
NH2 NH2
I I
Triiodotironina (T3) T3 reverso (rT3)
3,5,3'-triiodotironina 3,3',5'-triiodotironina
Figura 4.1 Estruturas dos hormônios tireoidianos. A tiroxina (T4) contém quatro átomos de iodo. A desiodação resulta na produção do potente hormônio triiodotironina
(T3) ou do hormônio inativo, o T3 reverso.
48
QUADRO 4.1 Causas genéticas do hipotireoidismo congênito
Proteína defeituosa do gene Herança Consequências
Capítulo 4
PROP‑1 Autossômica recessiva Deficiências combinadas dos hormônios hipofisários com
a preservação do hormônio adrenocorticotrófico
PIT‑1 Autossômica recessiva Deficiências combinadas de hormônio do crescimento,
Autossômica dominante prolactina e hormônio tireoestimulante (TSH)
TSH Autossômica recessiva Deficiência de TSH
TTF‑1 (TITF‑1) Autossômica dominante Hipoplasia tireoidiana variável, coreoatetose, problemas
pulmonares
TTF‑2 (FOXE‑1) Autossômica recessiva Agenesia da tireoide, atresia de coana, cabelos eriçados
Tg + I–
da síntese e secreção do TSH. O pico da secreção de TSH ocorre TSH pl
am
cerca de 15 minutos após a administração de TRH exógeno. A do- + e n t o Iodação
pamina, glicocorticoides e somatostatina suprimem o TSH, porém
não comportam uma grande importância fisiológica, exceto quan-
do esses agentes são administrados em doses farmacológicas. Os Tireoide
Folículo tireoidiano
níveis reduzidos de hormônio tireoidiano elevam a produção basal
de TSH e realçam a estimulação de TSH mediada por TRH. Os al-
tos níveis de hormônio tireoidiano suprimem rápida e diretamente T4 T3
a secreção da expressão gênica do TSH e inibem a estimulação do
TSH pelo TRH, indicando que os hormônios tireoidianos consti-
tuem os reguladores dominantes da produção de TSH. Como ou-
Ações
tros hormônios hipofisários, o TSH é liberado de maneira pulsátil periféricas
e exibe um ritmo diurno; seus níveis mais altos ocorrem a noite.
Entretanto, essas excursões do TSH são moderadas em comparação Figura 4.2 Regulação da síntese dos hormônios tireoidianos. À esquer-
àquelas dos outros hormônios hipofisários, em parte porque o TSH da. Os hormônios tireoidianos T4 e T3, por meio de um mecanismo de retroalimen-
tação, inibem a produção hipotalâmica do hormônio liberador de tireotrofina (TRH)
possui meia-vida plasmática, relativamente, longa (50 minutos).
e a produção hipofisária do hormônio tireoestimulante (TSH). O TSH estimula a
Consequentemente, as mensurações isoladas do TSH são adequa- produção de T4 e T3 pela tireoide. À direita. Os folículos tireoidianos são formados
das para determinar seu nível circulante. O TSH é medido utilizan- por células epiteliais tireoidianas que circundam o coloide proteico, o qual contém
do ensaios imunorradiométricos altamente sensíveis e específicos, tireoglobulina. As células foliculares, que são polarizadas, sintetizam a tireoglo-
os quais estabelecem prontamente a diferenciação entre os valores bulina e realizam a biossíntese dos hormônios tireoidianos (ver o texto para mais
do TSH normais e os suprimidos; assim, o TSH pode ser usado para detalhes). TSH-R, receptor do hormônio tireoestimulante; Tg, tireoglobulina; NIS,
fazer o diagnóstico de hipertireoidismo (TSH baixo) assim como de co-transportador do sódio-iodeto; TPO, peroxidase tireoidiana; DIT, diiodotirosina;
hipotireoidismo (TSH alto). MIT, monoiodotirosina.
49
SÍNTESE, METABOLISMO E AÇÃO DOS HORMÔNIOS TIREOIDIANOS A deficiência de iodo é prevalente em muitas regiões
montanhosas assim como na África Central, centro da
■■ SÍNTESE DOS HORMÔNIOS TIREOIDIANOS América do Sul e no norte da Ásia (Fig. 4.3). A Europa con-
Os hormônios tireoidianos derivam da Tg, uma grande glicoproteína tinua apresentando uma leve deficiência de iodo, e os levantamentos
SEÇÃO I
iodada. Após ser secretada no folículo tireoidiano, a Tg é iodada aos realizados sobre saúde indicam um declínio da ingestão de iodo nos
resíduos de tirosina, subsequentemente acoplados através de uma li- Estados Unidos e na Austrália. A Organização Mundial da Saúde
gação ao éter. A recaptação de Tg dentro da célula folicular da tireoide (OMS) estima que aproximadamente 2 bilhões de pessoas são defi-
torna possível a proteólise e a liberação de T4 e T3 recém-sintetizados. cientes em iodo, com base nos dados da excreção urinária. Em áreas
de relativa deficiência de iodo, observa-se maior prevalência do bó-
Metabolismo e transporte do iodo cio e, quando a deficiência é acentuada, hipotireoidismo e cretinismo,
A captação do iodo é uma primeira etapa extremamente importante que se caracteriza por deficiência mental e do crescimento, ocorren-
na síntese dos hormônios tireoidianos. O iodo ingerido fixa-se nas do quando as crianças que vivem em regiões com deficiência de iodo
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
proteínas séricas, particularmente a albumina. O iodo livre é excre- não são tratadas com iodo ou hormônio tireoidiano para restaurar os
tado na urina. A tireoide extrai o iodo da circulação de maneira al- níveis normais desse hormônio durante o início da vida. Com bas-
tamente eficiente. Por exemplo, 10 a 25% do marcador radioativo (p. tante frequência, tais crianças nascem de mães com deficiência de
ex., I-123) são captados pela tireoide normal durante um período de iodo, sendo provável que a deficiência materna de hormônio tireoi-
24 horas, valor que pode subir para 70 a 90% na doença de Graves. diano possa agravar essa condição. A deficiência concomitante de
A captação do iodo é mediada pelo NIS, que é expresso na membra- selênio também pode contribuir para as manifestações neurológicas
na basolateral das células foliculares da tireoide. O NIS se expressa do cretinismo. A suplementação de iodo no sal, no pão e em outras
mais altamente na tireoide, porém níveis baixos estão presentes nas substâncias alimentares reduziu acentuadamente a prevalência do
glândulas salivares, na mama que está produzindo leite e na placen- cretinismo. Lamentavelmente, porém, a deficiência de iodo conti-
ta. O mecanismo de transporte do iodo é altamente regulado, per- nua sendo a causa mais comum da deficiência mental prevenível, na
mitindo a adaptação às variações no suprimento dietético. Os baixos maioria das vezes por causa da resistência da sociedade aos aditivos
níveis de iodo fazem aumentar a quantidade de NIS e estimulam a alimentares ou do custo da suplementação. Além do cretinismo evi-
captação, enquanto os altos níveis de iodo suprimem a expressão e dente, uma ligeira deficiência de iodo pode acarretar sutil redução
captação de NIS. A expressão seletiva de NIS na tireoide torna pos- no QI. O suprimento excessivo de iodo, por meio de suplementos ou
sível o escaneamento isotópico*, tratamento do hipertireoidismo e alimentos enriquecidos com iodo (p. ex., moluscos, algas marinhas),
ablação do câncer de tireoide com os radioisótopos do iodo, sem está associado a maior incidência de doença autoimune da tireoide.
efeitos significativos sobre os outros órgãos. A mutação do gene A ingestão diária média recomendada de iodo é de 150-250 g/dia
para NIS é uma causa rara do hipotireoidismo congênito, enfatizan- para adultos, 90-120 g/dia para crianças e 250 g/dia para mulhe-
do sua importância na síntese dos hormônios tireoidianos. Outro res grávidas e durante a amamentação. O iodo urinário é > 10 g/dL
transportador do iodo, a pendrina, localiza-se na superfície apical nas populações com suficiência de iodo.
das células tireoidianas e medeia o efluxo de iodo para dentro do
lúmen. A mutação do gene para pendrina causa a síndrome de Pen- Organificação, acoplamento, armazenamento, liberação
dred, um distúrbio caracterizado por organificação defeituosa do Depois que o iodo penetra na tireoide, é captado e transportado até
iodo, bócio e surdez sensorineural. a membrana apical das células foliculares tireoidianas, onde é oxida-
do em uma reação de organificação que envolve TPO e peróxido de
hidrogênio. O átomo de iodo reativo é acrescentado a resíduos sele-
* N. de R.T.: O termo “escaneamento isotópico” refere-se ao exame de cintilografia cionados de tirosil dentro da Tg, uma grande proteína dimérica (660
da tireoide feito com um radiomarcador (p. ex. I-123; I-131; Tc-99). kDa) que consiste em 2.769 aminoácidos. A seguir, as iodotirosinas
50
na Tg são acopladas por meio de ligação éter em uma reação também xina (TBG), a transtiretina (TTR, antigamente conhecida como pré-
catalisada pela TPO. Tanto T4 quanto T3 podem ser produzidos por -albumina de ligação da tiroxina ou TBPA) e albumina. As proteínas
essa reação, dependendo do número de átomos de iodo presentes nas plasmáticas de ligação fazem aumentar o reservatório de hormônio
iodotirosinas. Após o seu acoplamento, a Tg é levada de volta para a circulante, retardam a depuração hormonal e podem modular o for-
Capítulo 4
célula tireoidiana, onde é processada nos lisossomos para liberar T4 necimento do hormônio para certos locais teciduais. A concentração
e T3. As monoiodotirosinas e diiodotirosinas (MIT, DIT) não aco- de TBG é relativamente baixa (1 a 2 mg/dL) – porém, em virtude de
pladas são desiodadas (desionizadas) pela enzima desalogenase, reci- sua alta afinidade pelos hormônios tireoidianos (T4 > T3), carreia cer-
clando desse modo qualquer iodo que não tenha sido transformado ca de 80% dos hormônios ligados. A albumina possui uma atividade
em hormônios tireoidianos. relativamente baixa pelos hormônios tireoidianos, porém possui alta
Os distúrbios da síntese dos hormônios tireoidianos são causas concentração plasmática (cerca de 3,5 g/dL) e fixa até 10% da T4 e
raras do hipotireoidismo congênito. A grande maioria desses distúr- 30% da T3. TTR carreia cerca de 10% de T4, porém pouca T3.
bios é decorrente de mutações recessivas na TPO ou Tg, porém os de- Quando os efeitos de várias proteínas de ligação são combinados,
51
QUADRO 4.3 Condições associadas à hipertiroxinemia eutireoidiana
Distúrbio Causa Transmissão Características
Hipertiroxinemia disalbuminêmica Mutações da albumina, AD T4 aumentada
SEÇÃO I
(Quadro 4.3). Esses distúrbios resultam em maiores quantidades de propranolol, amiodarona, glicocorticoides). A desiodase tipo III ina-
T4 e/ou T3 totais, porém os níveis dos hormônios não ligados (livres) tiva T4 e T3, sendo a fonte mais importante do T3 reverso (rT3). Os
mantêm-se normais. A natureza familiar dos distúrbios e o fato de hemangiomas maciços que expressam a desiodase tipo III são uma
que os níveis de TSH são normais em vez de suprimidos deveriam causa rara do hipotireoidismo em lactentes.
sugerir esse diagnóstico. Os níveis hormonais livres (medidos prefe-
rencialmente por diálise) mostram-se normais na HDF. O diagnósti- ■■ AÇÃO DO HORMÔNIO TIREOIDIANO
co pode ser confirmado utilizando os testes que medem as afinidades Transporte do hormônio tireoidiano
da ligação dos hormônios radiomarcados às proteínas transportado-
Os hormônios tireoidianos circulantes penetram nas células por
ras específicas, ou realizando as análises de sequência do DNA dos
difusão passiva e por meio de transportadores específicos, como o
genes das proteínas transportadoras anormais.
transportador monocarboxilato 8 (MCT8). Foram identificadas mu-
Certas medicações, como os salicilatos e o salsalato, podem
tações no gene MCT8 em pacientes com retardo psicomotor ligado
deslocar os hormônios tireoidianos das proteínas de ligação circu-
ao X e com anormalidades da função tireoidiana (T4 baixa, T3 alta e
lantes. Apesar de tais fármacos perturbarem transitoriamente o eixo
TSH alto). Após penetrarem nas células, os hormônios tireoidianos
tireoidiano e aumentarem os níveis dos hormônios tireoidianos li-
atuam principalmente por meio dos receptores nucleares, embora
vres, o TSH é suprimido até ser alcançado um novo estado estável
também tenham ações não genômicas por meio da estimulação da
(equilíbrio dinâmico), restaurando dessa forma o eutireoidismo. Os
membrana plasmática e das respostas enzimáticas mitocondriais.
fatores circulantes associados a uma enfermidade aguda relacionada
também podem deslocar o hormônio tireoidiano das proteínas de
Receptores nucleares dos hormônios tireoidianos
ligação (ver “Síndrome do enfermo eutireoidiano”, adiante).
Os hormônios tireoidianos ligam-se com alta afinidade aos receptores
dos hormônios tireoidianos (TR) nucleares e . Tanto TR quanto
Desiodases TR se expressam na maioria dos tecidos, porém seus níveis relativos
A T4 pode ser considerada um precursor para a T3, mais potente, de expressão variam entre os órgãos; o TR é particularmente abun-
sendo transformada na T3 pelas enzimas desiodases (Fig. 4.1). A de- dante no cérebro, nos rins, nas gônadas, no músculo e no coração,
siodase tipo I, que se localiza principalmente na tireoide, no fígado enquanto a expressão de TR é relativamente alta na hipófise e no fí-
e nos rins, possui afinidade relativamente baixa pela T4. A desioda- gado. Ambos os receptores se unem de maneira variável para formar
ses tipo II possui uma afinidade mais alta pela T4, sendo encontrada isoformas ímpares. A isoforma TR2, um aminoterminal ímpar, se
principalmente na hipófise, cérebro, gordura marrom e tireoide. A expressa seletivamente no hipotálamo e na hipófise, onde desempe-
expressão da desiodase tipo II lhe permite regular localmente as con- nha um papel proeminente no controle por retroalimentação do eixo
centrações de T3, propriedade que pode ser importante no contexto tireoidiano (ver anteriormente). A isoforma TR2 contém um carbo-
da reposição de levotiroxina (T4). A desiodase tipo II também é regu- xiterminal ímpar que impede a ligação do hormônio tireoidiano; ela
lada pelo hormônio tireoidiano; o hipotireoidismo induz à enzima, pode funcionar bloqueando a ação das outras isoformas TR.
resultando em conversão acelerada de T4 em T3 nos tecidos, como o Os TR contêm um domínio central de ligação do DNA e um do
cérebro e hipófise. A conversão de T4 em T3 é prejudicada pelo jejum, mínio de união ao ligante C-terminal. Eles se unem a sequências es-
enfermidade sistêmica ou traumatismo agudo, agentes de contraste pecíficas de DNA, denominadas elementos de resposta tireoidianos
orais, e em ampla variedade de medicações (p. ex., propiltiouracila, (TRE), nas regiões promotoras dos genes-alvo (Fig. 4.4). Os recepto
52
esquelética retardada, taquicardia e respostas metabólicas prejudica-
das ao hormônio tireoidiano.
Núcleo
A RTH é causada por mutações no gene do receptor de TR.
T3
Essas mutações, localizadas em regiões restritas do domínio de aco-
Capítulo 4
plamento do ligante acarretam a perda da função dos receptores. No
T4
T3 CoR
entanto, levando em conta que os receptores mutantes conservam
1 a capacidade de se dimerizar com os RXR, de se ligar ao DNA e de
2 recrutar as proteínas correpressoras, funcionam como antagonistas
T3 dos receptores de TR e TR normais restantes. Tal propriedade, de-
CoA 3 nominada de atividade “dominante negativa”, explica a modalidade
RXR TR autossômica dominante de transmissão. O diagnóstico é suspeitado
Citoplasma quando os níveis de hormônios tireoidianos livres mostram-se au-
53
suprimido, normal ou elevado. Com raras exceções (ver adiante), um ensaio. Inversamente, um nível suprimido de TSH, particularmente
nível normal de TSH exclui uma anormalidade primária da função < 0,1 mU/L, indica habitualmente tireotoxicose, mas pode ser obser-
tireoidiana. Essa estratégia depende da utilização dos ensaios imuno- vado também durante o primeiro trimestre da gestação (por causa
quimiluminométricos (ICMA) para o TSH suficientemente sensíveis da secreção de hCG), após o tratamento do hipertireoidismo (pois
SEÇÃO I
para estabelecer a diferença entre o limite inferior da variação de re- o TSH pode continuar suprimido por vários meses) e em resposta a
ferência e os valores suprimidos que ocorrem com a tireotoxicose. certas medicações (p. ex., altas doses de glicocorticoides ou dopami-
Ensaios extremamente sensíveis (da quarta geração) conseguem de- na). Ainda mais importante, o hipotireoidismo secundário, causado
tectar níveis de TSH ≤ 0,004 mU/L, porém para finalidades práticas por doença hipotalâmico-hipofisária, está associado a um nível de
os ensaios sensíveis para ≤�����������������������������������������
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0,1 mU/L são suficientes. A ampla dispo- TSH variável (baixo a alto-normal), inapropriado para o nível de T4
nibilidade do ICMA para o TSH tornou obsoleto o teste de estimula- baixo. Por conseguinte, o TSH não deve ser usado como exame labo-
ção com TRH, visto que a ausência de elevação do TSH após um bolo ratorial isolado para avaliar a função tireoidiana em pacientes com
intravenoso de 200-400 g de TRH comporta as mesmas implicações doença hipofisária suspeitada ou conhecida.
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
de um TSH basal suprimido medido pelo ICMA. Os testes para os efeitos em órgãos-alvos do excesso ou depleção
O achado de um nível anormal de TSH deve ser acompanhado dos hormônios tireoidianos, como estimativa da taxa metabólica basal,
pelas mensurações dos níveis circulantes de hormônios tireoidianos as taxas de relaxamento dos reflexos tendinosos ou o colesterol sérico,
a fim de confirmar o diagnóstico de hipertireoidismo (TSH supri- não são úteis como determinantes clínicos da função tireoidiana.
mido) ou de hipotireoidismo (TSH elevado). Estão amplamente
disponíveis radioimunoensaios para os níveis séricos de T4 total e Testes para determinar a etiologia da disfunção tireoidiana
T3 total. T4 e T3 exibem alta ligação às proteínas, e inúmeros fatores A doença tireoidiana autoimune é identificada mais facilmente me-
(enfermidade, medicações, fatores genéticos) podem influenciar a dindo os anticorpos circulantes contra TPO e Tg. Sabendo que os
ligação às proteínas. Por isso, é útil medir os níveis hormonais livres anticorpos para Tg isoladamente são incomuns, seria razoável medir
ou não ligados, que correspondem ao reservatório de hormônios apenas os anticorpos para TPO. Cerca de 5 a 15% das mulheres euti-
biologicamente disponíveis. Dois métodos diretos são usados para reoidianas e até 2% dos homens eutireoidianos possuem anticorpos
medir os hormônios tireoidianos livres (não ligados): (1) competição tireoidianos; esses indivíduos correm maior risco de vir a desenvol-
dos hormônios tireoidianos livres com a T4 radiomarcada (ou a um ver disfunção da tireoide. Quase todos os pacientes com hipotireoi-
análogo) pela ligação a um anticorpo da fase sólida e (2) separação dismo autoimune e até 80% dos com a doença de Graves possuem
física da fração hormonal livre por ultracentrifugação ou diálise de anticorpos TPO, habitualmente em altos níveis.
equilíbrio. Os primeiros ensaios para a identificação dos hormônios As TSI (imunoglobulinas tireoestimulantes) são anticorpos que
livres sofriam de alguns artefatos, porém os ensaios mais recentes se estimulam o TSH-R na doença de Graves. Podem ser medidas em
correlacionam muito bem com os resultados dos métodos de separa- bioensaios ou indiretamente em ensaios para imunoglobulinas inibi-
ção física tecnicamente muito mais difíceis e mais caros. Um método doras da ligação do TSH (TBII), que detectam a ligação do anticorpo
indireto de estimar os níveis de hormônios tireoidianos livres consis- ao receptor. A principal indicação para esses ensaios consiste em pre-
te em calcular o índice da T3 ou T4 livre a partir da concentração total ver a tireotoxicose neonatal causada por altos níveis maternos de TSI
de T4 ou T3 e a relação de ligação dos hormônios tireoidianos (THBR). no último trimestre da gestação.
O último método deriva do teste de captação de T3 por resina, que Os níveis séricos de Tg mostram-se maiores em todos os tipos
determina a distribuição da T3 radiomarcada entre uma resina ab- de tireotoxicose, exceto a tireotoxicose factícia causada pela autoad-
sorvente e as proteínas de ligação do hormônio tireoidiano não ocu- ministração do hormônio tireoidiano. Os níveis de Tg ficam maio-
padas na amostra. A ligação da T3 marcada à resina aumenta quando res particularmente na tireoidite, refletindo a destruição do tecido
existe um número reduzido de locais não ocupados de ligação às pro- tireoidiano e a liberação de Tg. Entretanto, a mensuração de Tg tem
teínas (p. ex., deficiência de TBG) ou maior quantidade de hormônio seu principal papel no acompanhamento dos pacientes com câncer
tireoidiano total na amostra; essa ligação diminui nas circunstâncias de tireoide. Após tireoidectomia total e radioablação, os níveis de Tg
opostas. O produto de THBR e a T3 ou T4 total proporcionam o índice devem ser indetectáveis; na ausência de anticorpos anti-Tg, os níveis
de T3 ou T4 livre. Com efeito, o índice serve para corrigir os valores mensuráveis indicam uma ablação incompleta ou recidiva do câncer.
hormonais totais anômalos causados por anormalidades na ligação
hormônio-proteína. Captação de iodo radioativo e cintilografia da tireoide
Os níveis totais de hormônios tireoidianos ficam elevados quan- A glândula tireoide transporta seletivamente os isótopos radioativos
123 125 131 99m
do a TBG aumenta em virtude dos estrogênios (gestação, contra- do iodo ( I, I, I) e pertecnetato marcado com Tc, tornando
ceptivos orais, terapia hormonal, tamoxifeno) e reduzidos quando a possível obter imagens da tireoide e a quantificação da captação fra-
fixação de TBG é menor (androgênios, síndrome nefrótica). Os dis- cional do marcador radioativo.
túrbios genéticos e as enfermidades agudas também podem causar A imagem nuclear da doença de Graves caracteriza-se por uma
anormalidades nas proteínas de ligação dos hormônios tireoidia- glândula aumentada e maior captação do marcador que se distribui
nos, e vários medicamentos (fenitoína, carbamazepina, salicilatos e homogeneamente. Os adenomas tóxicos aparecem como áreas focais
agentes anti-inflamatórios não esteroides [AINE]) podem interferir de maior captação, com a captação do marcador suprimida no res-
na ligação dos hormônios tireoidianos. Como os níveis dos hormô- tante da glândula. No BMN tóxico, a glândula aumenta de volume –
nios tireoidianos livres são normais e o paciente encontra-se em um na maioria das vezes, com arquitetura distorcida, e existem múltiplas
estado eutireoidiano em todas essas circunstâncias, os ensaios que áreas de captação do marcador relativamente aumentada ou dimi-
medem o hormônio livre são preferíveis àqueles para a determinação nuída. A tireoidite subaguda está associada a uma captação muito
dos hormônios tireoidianos totais. baixa por causa do dano às células foliculares e supressão de TSH. A
Para a maioria das finalidades, o nível de T4 livre é suficiente tireotoxicose factícia também está associada a uma baixa captação.
para confirmar a tireotoxicose, porém 2 a 5% dos pacientes possuem A utilização da punção aspirativa com agulha fina (PAAF) re-
apenas o T3 elevado (toxicose induzida por T3). Assim, os níveis de duziu o uso das cintilografias da tireoide na avaliação dos nódulos
T3 livre devem ser medidos nos pacientes com um TSH suprimido, tireoidianos solitários, porém as características funcionais dos nódu-
porém com níveis normais de T4 livre. los tireoidianos comportam algum significado prognóstico. Os de-
Existem várias condições clínicas nas quais o uso de TSH como nominados nódulos frios, que exibem menor captação do marcador,
um teste de triagem pode ser enganoso, particularmente sem deter- geralmente são benignos. Contudo, é mais provável que esses nódu-
minações simultâneas de T4 livre. Qualquer enfermidade não tireoi- los sejam malignos (cerca de 5 a 10%) que os denominados nódulos
diana grave pode causar níveis anormais de TSH (ver adiante). Ape- quentes, quase nunca malignos.
sar de o hipotireoidismo ser a causa mais comum de um nível elevado A cintilografia da tireoide é usada também no acompanhamento
de TSH, as causas raras consistem em um tumor hipofisário secretor do câncer dessa glândula. Após a tireoidectomia e ablação utilizando
131
de TSH (Cap. 2), resistência aos hormônios tireoidianos e artefato do I, haverá menor captação de iodo radioativo no leito da tireoide,
54
o que torna possível a identificação dos depósitos metastáticos do Manifestações clínicas
câncer de tireoide que conservam a capacidade de transportar iodo.
A maioria dos lactentes parece normal por ocasião do nascimento,
As cintilografias corporais totais com a utilização de 111-185 MBq
e menos de 10% são diagnosticados com base nas características
(3-5 mCi) de 131I, são realizadas após a suspensão dos hormônios ti-
Capítulo 4
clínicas, que incluem icterícia prolongada, problemas alimentares,
reoidianos a fim de elevar o nível de TSH ou após a administração de
hipotonia, língua aumentada de volume, maturação óssea retarda-
TSH humano recombinante.
da e hérnia umbilical. Ainda mais importante, se o tratamento for
Ultrassonografia da tireoide retardado o resultado será um dano neurológico permanente. As ca-
racterísticas típicas do hipotireoidismo adulto também podem estar
A ultrassonografia é utilizada com uma frequência cada vez maior
presentes (Quadro 4.5). Outras malformações congênitas, especial-
para ajudar a fazer o diagnóstico de doença nodular da tireoide, o
mente cardíacas, são quatro vezes mais comuns no hipotireoidismo
que constitui um reflexo das limitações do exame físico e dos apri-
congênito.
moramentos na tecnologia ultrassônica. Utilizando instrumentos de
55
tão de iodo pode acarretar um aumento no risco de hipotireoidismo
QUADRO 4.5 Sinais e sintomas de hipotireoidismo (na ordem autoimune em virtude dos efeitos imunológicos ou da toxicidade ti-
descendente de frequência) reoidiana direta. Não existe evidência convincente apontando para
um possível papel das infecções, exceto para a síndrome da rubéola
Sintomas Sinais
SEÇÃO I
Constipação pela granzima B. Além disso, a produção local de citocinas pelas cé-
Aumento de peso com apetite Relaxamento retardado dos lulas T, como o fator de necrose tumoral (TNF), IL-1 e interferon
precário reflexos tendinosos (IFN-), pode tornar as células tireoidianas mais suscetíveis à apop-
Dispneia Síndrome do túnel do carpo tose mediada pelos receptores da morte, como Fas, ativados por seus
Voz rouca Derrames serosos das cavidades respectivos ligantes nas células T. Estas citocinas prejudicam também
diretamente a função das células tireoidianas e induzem à expressão
Menorragia (oligomenorreia ou
de outras moléculas proinflamatórias pelas próprias células tireoidia-
amenorreia subsequentes)
nas, como as citocinas, moléculas do HLA classes I e II, moléculas de
Parestesia adesão, CD40 e óxido nítrico (NO). A administração de altas con-
Audição prejudicada centrações de citocinas com finalidades terapêuticas (especialmente
de IFN-) está associada a um maior número de casos de doença
tireoidiana autoimune, possivelmente por mecanismos semelhantes
Prevalência aos que funcionam na doença esporádica.
A taxa de incidência anual média do hipotireoidismo autoimune é de Os anticorpos contra TPO e Tg são marcadores clinicamente úteis
até 4 por 1.000 mulheres e 1 por 1.000 homens, sendo mais comum da autoimunidade tireoidiana, porém qualquer efeito patogênico se
em certas populações, como os japoneses, provavelmente por causa restringe a um papel secundário na amplificação de resposta autoimu-
de fatores genéticos e da exposição crônica a dieta rica em iodo. A ne permanente. Os anticorpos contra TPO fixam o complemento, e
média etária a ser feito o diagnóstico é de 60 anos, e a prevalência de os complexos de ataque à membrana do complemento estão presentes
hipotireoidismo aumenta com a idade. O hipotireoidismo subclínico na tireoide, no hipotireoidismo autoimune. Entretanto, a passagem
é observado em 6 a 8% das mulheres (10% depois dos 60 anos) e 3% transplacentária dos anticorpos contra Tg ou TPO não exerce qual-
quer efeito sobre a tireoide fetal, o que sugere que a lesão mediada pela
dos homens. O risco anual de vir a desenvolver hipotireoidismo clí-
célula T é necessária para iniciar o dano autoimune à tireoide.
nico é de aproximadamente 4% quando o hipotireoidismo subclínico
Até 20% dos pacientes com hipotireoidismo autoimune possuem
está associado a anticorpos TPO positivos.
anticorpos contra o TSH-R, o qual, ao contrário da TSI, não estimu-
Patogenia la o receptor, mas previne a ligação do TSH. Por isso, tais anticorpos
bloqueadores de TSH-R causam hipotireoidismo e, especialmente em
Na tireoidite de Hashimoto, existe acentuada infiltração linfocítica da
pacientes asiáticos, atrofia da tireoide. Sua passagem transplacentária
tireoide com a formação de centros germinativos, atrofia dos folícu-
pode induzir a um hipotireoidismo neonatal transitório. Raramente,
los tireoidianos acompanhada por metaplasia oxifílica, ausência de
os pacientes possuem uma mistura de anticorpos TSI e bloqueadores
coloide e fibrose ligeira a moderada. Na tireoidite atrófica, a fibrose
de TSH-R, e a função tireoidiana pode oscilar entre hipertireoidismo e
é muito mais extensa, a infiltração linfocítica é menos pronunciada,
hipotireoidismo quando um ou o outro anticorpo se torna dominan-
e os folículos tireoidianos estão quase completamente ausentes. A ti-
te. Nesses indivíduos, é difícil prever a evolução da doença, razão pela
reoidite atrófica representa provavelmente muito mais o estágio final
qual necessitam de um atento monitoramento da função tireoidiana.
da tireoidite de Hashimoto que um distúrbio distinto.
Os bioensaios podem ser utilizados para documentar que os anticor-
À semelhança da maioria dos distúrbios autoimunes, a susceti- pos bloqueadores de TSH-R reduzem o efeito de indução do AMP
bilidade ao hipotireoidismo autoimune, determinada por uma com- cíclico do TSH sobre as células cultivadas que expressam TSH-R, ape-
binação de fatores genéticos e ambientais, assim como o risco de sar de a execução desses ensaios ser difícil. Os ensaios para TBII que
hipotireoidismo autoimune ou doença de Graves são maiores entre medem a ligação dos anticorpos ao receptor por competição com TSH
irmãos. Os polimorfismos HLA-DR são os fatores de risco genéticos radiomarcado não estabelecem a diferença entre os anticorpos TSI e
mais bem documentados para o hipotireoidismo autoimune, espe- bloqueadores de TSH-R, porém um resultado positivo em um paciente
cialmente HLA-DR3, HLA-DR4 e HLA-DR5 em caucasianos. Existe com hipotireoidismo espontâneo constitui poderosa evidência sobre a
uma fraca associação entre os polimorfismos em CTLA-4, um gene presença dos anticorpos bloqueadores. O uso desses ensaios em geral
regulador da célula T, e o hipotireoidismo autoimune. Essas duas não altera a conduta clínica, porém pode ser útil para confirmar a cau-
associações genéticas são compartilhadas por outras doenças autoi- sa do hipotireoidismo neonatal transitório.
munes, o que pode explicar a relação entre hipotireoidismo autoi-
mune e outras doenças autoimunes, especialmente diabetes melito Manifestações clínicas
tipo 1, doença de Addison, anemia perniciosa e vitiligo (Cap. 23). As principais características clínicas do hipotireoidismo estão resu-
Os polimorfismos de HLA-DR e CTLA-4 são responsáveis por cerca midas no Quadro 4.5. O início costuma ser insidioso, e o paciente
de metade da suscetibilidade genética ao hipotireoidismo autoimu- poderá tornar-se ciente dos sintomas somente depois que o eutireoi-
ne. Ainda não foram identificados outros loci que possam contribuir. dismo tiver sido restaurado. Os pacientes com tireoidite de Hashi-
Um gene no cromossomo 21 pode ser responsável pela associação moto podem apresentar-se em virtude do bócio e não dos sintomas
entre hipotireoidismo autoimune e síndrome de Down. A preponde- de hipotireoidismo. O bócio pode não ser volumoso, porém geral-
rância feminina da autoimunidade tireoidiana é decorrente mais pro- mente é irregular e de consistência firme. Com frequência, mostra-se
vavelmente dos efeitos dos esteroides sexuais sobre a resposta imune, possível palpar um lobo piramidal, que representa normalmente um
porém um fator genético relacionado com o cromossomo X também vestígio do ducto tireoglosso. Raramente, a tireoidite de Hashimoto
é possível e pode ser responsável pela alta frequência de hipotireoi- não complicada está associada a dor.
dismo autoimune na síndrome de Turner. Os fatores ambientais da Os pacientes com tireoidite atrófica ou no estágio final da ti-
suscetibilidade ainda não foram devidamente definidos. Alta inges- reoidite de Hashimoto se apresentam com sinais e sintomas de hi-
56
produzindo extremidades frias. Os derrames pericárdicos ocorrem
em até 30% dos pacientes, porém raramente comprometem a função
cardíaca. Apesar de terem sido documentadas alterações na expressão
das isoformas das cadeias pesadas da miosina, a miocardiopatia é in-
Capítulo 4
comum. O líquido pode acumular-se também em outras cavidades se-
rosas e no ouvido médio, dando origem a surdez condutiva. Em geral,
a função pulmonar é normal, porém a dispneia pode ser causada por
derrame pleural, função prejudicada dos músculos respiratórios, im-
pulso ventilatório diminuído ou apneia do sono.
As síndromes do túnel do carpo e de outros tipos de encarcera-
mento são comuns, o mesmo ocorrendo com o comprometimento da
função muscular com rigidez, cãibras e dor. Ao exame, podem-se cons-
57
ção intelectual quando o início ocorre antes dos 3 anos de idade e a a deficiência isolada de TSH é muito rara (Cap. 2). Os níveis de TSH
deficiência hormonal é grave. podem ser baixos, normais ou mesmo ligeiramente aumentados no
hipotireoidismo secundário; o último evento é decorrente da secre-
Avaliação laboratorial ção de formas imunoativas, porém bioinativas, de TSH. O diagnós-
SEÇÃO I
A Figura 4.6 fornece um resumo da investigação para determinar a tico é confirmado pela identificação de um nível baixo de T 4 livre.
existência e causa do hipotireoidismo. Um nível normal de TSH ex- A meta do tratamento consiste em manter níveis de T4 na metade
clui o hipotireoidismo primário (porém não a forma secundária). Se superior da faixa de referência, visto que os níveis de TSH não podem
o TSH estiver elevado, é necessária a determinação do nível de T4 li- ser usados para monitorar a terapia.
vre para confirmar a presença de hipotireoidismo clínico, porém a T4
é inferior ao TSH quando utilizada como teste de triagem, uma vez
que não irá detectar o hipotireoidismo subclínico. Os níveis circulan- TRATAMENTO Hipotireoidismo
tes de T3 livre são normais em cerca de 25% dos pacientes, refletindo
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
respostas adaptativas das desiodases ao hipotireoidismo. Por isso, as HIPOTIREOIDISMO CLÍNICO Se não houver função tireoidiana resi-
mensurações de T3 não estão indicadas. dual, a dose diária de reposição de levotiroxina geralmente deverá
Uma vez confirmado o hipotireoidismo clínico ou subclínico, ser de 1,6 g/kg do peso corporal (100-150 g). Em muitos pa-
a etiologia costuma ser estabelecida facilmente ao demonstrar a cientes, porém, as doses mais baixas são suficientes até que o te-
presença de anticorpos contra TPO, presentes em mais de 90% dos cido tireoidiano residual tenha sido destruído. Nos pacientes que
pacientes com hipotireoidismo autoimune. As TBII podem ser en- desenvolvem hipotireoidismo após o tratamento da doença de
contradas em 10 a 20% dos pacientes, porém essas determinações Graves, existe com frequência uma função autônoma subjacen-
não costumam ser necessárias. Se houver alguma dúvida acerca da te, razão pela qual são necessárias doses de reposição mais baixas
causa de um bócio associado ao hipotireoidismo, a biópsia PAAF (75-125 g/dia).
pode ser usada para confirmar a presença de tireoidite autoimune. Os pacientes adultos com menos de 60 anos de idade e sem
Outros achados laboratoriais anormais no hipotireoidismo podem evidência de cardiopatia podem começar recebendo 50-100 g
incluir o aumento da creatinofosfoquinase, colesterol e triglicerídios de levotiroxina (T4) diariamente. A dose deve ser ajustada tendo
elevados e anemia (habitualmente normocítica ou macrocítica). Ex- como base os níveis de TSH, consistindo o objetivo do tratamen-
ceto quando acompanhada por deficiência de ferro, a anemia e outras to em um TSH normal, preferencialmente na metade inferior da
anormalidades regridem gradualmente com a reposição da tiroxina. variação de referência. As respostas ao TSH são graduais, devendo
ser medidas cerca de dois meses após ser instituído o tratamento
Diagnóstico diferencial ou após qualquer modificação subsequente na posologia de levoti-
Um bócio assimétrico na tireoidite de Hashimoto pode ser confundi- roxina. O aparecimento dos efeitos clínicos da reposição de levoti-
do com um bócio multinodular ou carcinoma de tireoide, nos quais roxina é lento. Os pacientes podem não obter um alívio pleno dos
podem estar presentes também anticorpos tireoidianos. A US pode sintomas até 3 a 6 meses após a restauração dos níveis normais de
ser usada para mostrar a presença de lesão solitária ou bócio multi- TSH. O ajuste na posologia de levotiroxina é feito por acréscimos
nodular em vez do aumento heterogêneo da tireoide típico da tireoi- de 12,5 ou de 25 g se o nível de TSH for alto; deverão ser feitas
dite de Hashimoto. A biópsia PAAF é útil na investigação dos nódu- reduções da mesma amplitude quando se constatar a supressão do
los focais. As outras causas do hipotireoidismo são abordadas adiante TSH. Os pacientes com um TSH suprimido por qualquer causa,
e no Quadro 4.4, porém raramente geram confusão diagnóstica. como o tratamento com quantidades excessivas de T4, correm
maior risco de fibrilação atrial e densidade óssea reduzida.
■■ OUTRAS CAUSAS DO HIPOTIREOIDISMO Apesar de estarem disponíveis preparados tireoidianos ani-
O hipotireoidismo iatrogênico é uma causa comum do hipotireoi- mais dessecados (extrato de tireoide USP), não são recomendados,
dismo e, com frequência, pode ser detectado pela triagem antes do uma vez que a razão entre T3 e T4 não é fisiológica. O uso de levo-
surgimento dos sintomas. Nos primeiros 3-4 meses após o tratamen- tiroxina combinada com liotironina (triiodotironina, T3) foi inves-
to com iodo radioativo, o hipotireoidismo transitório pode ocorrer tigado, porém os benefícios não foram confirmados em estudos
em virtude do dano actínico reversível. O tratamento com pequenas prospectivos. Não há lugar para a liotironina isoladamente como
doses de tiroxina pode ser suspenso quando ocorre a recuperação. reposição a longo prazo, pois a meia-vida curta torna necessárias
Sabendo que os níveis de TSH são suprimidos pelo hipertireoidis- 3-4 doses diárias, além de estar associada a níveis de T3 flutuantes.
mo, os níveis de T4 livre constituem melhor medida da função tireoi- Nos pacientes com peso corporal normal que estão tomando
diana que o TSH nos meses subsequentes ao tratamento com iodo ≥ 200 g de levotiroxina por dia, um nível elevado de TSH cos-
radioativo. Um hipotireoidismo ligeiro após tireoidectomia subtotal tuma ser sinal de adesão precária ao tratamento. Essa é também
também pode regredir após vários meses, pois o resíduo glandular é a provável explicação para os níveis de TSH flutuantes, não obs-
estimulado pelos maiores níveis de TSH. tante uma posologia constante de levotiroxina. Com frequência,
A deficiência de iodo é responsável pelo bócio endêmico e cretinis- esses pacientes possuem níveis normais ou altos de T4 livre, não
mo, sendo, porém, uma causa incomum do hipotireoidismo em adul- obstante um TSH elevado, visto que lembram de tomar a medi-
tos, a menos que a ingestão de iodo seja muito baixa ou estejam pre- cação por alguns dias antes de serem testados, o que é suficiente
sentes fatores intercorrentes, como o consumo de tiocianatos presentes para normalizar os níveis de T4, porém não os de TSH. É impor-
na mandioca ou deficiência de selênio. O hipotireoidismo devido à de- tante considerar uma adesão variável, visto que esse padrão de
ficiência de iodo pode ser tratado com tiroxina, porém as medidas de provas da função tireoidiana é também sugestivo de distúrbios as-
saúde destinadas a aprimorar a ingestão de iodo devem ser aconselha- sociados a uma secreção inapropriada de TSH (Quadro 4.3). Sa-
das para eliminar esse problema. Sal e pão iodados ou um único bolo bendo que a T4 possui meia-vida longa (7 dias), os pacientes que
de um óleo iodado oral ou intramuscular foram utilizados com sucesso. omitem uma dose podem ser aconselhados a ingerir duas doses
Paradoxalmente, o excesso crônico de iodo também pode indu- dos comprimidos omitidos de uma única vez. As outras causas de
zir ao bócio e hipotireoidismo. Os eventos intracelulares responsá- maiores demandas de levotiroxina devem ser excluídas, particu-
veis por esse efeito são obscuros, porém os indivíduos com tireoidite larmente má absorção (p. ex., doença celíaca, cirurgia do intestino
autoimune mostram-se particularmente suscetíveis. O excesso de delgado), terapia estrogênica e medicamentos que interferem na
iodo é responsável pelo hipotireoidismo que ocorre em até 13% dos absorção ou depuração de T4, como a colestiramina, sulfato fer-
pacientes tratados com amiodarona (ver adiante). Outros fármacos, roso, suplementos de cálcio, lovastatina, hidróxido de alumínio,
particularmente o lítio, também podem causar hipotireoidismo. O hi- rifampicina, amiodarona, carbamazepina e fenitoína.
potireoidismo transitório causado pela tireoidite é abordado adiante. HIPOTIREOIDISMO SUBCLÍNICO Por definição, o hipotireoidismo
O hipotireoidismo secundário é diagnosticado habitualmente no subclínico refere-se à evidência bioquímica de deficiência dos
contexto de outras deficiências dos hormônios da hipófise anterior;
58
hormônios tireoidianos em pacientes que apresentam poucas ou aconselhado porque a conversão de T4 em T3 é prejudicada no
nenhuma característica clínica aparente de hipotireoidismo. Não coma mixedematoso. Entretanto, o excesso de liotironina com-
existem recomendações universalmente aceitas para o tratamen- porta o potencial de provocar arritmias. Outra opção consiste em
Capítulo 4
to do hipotireoidismo subclínico, porém as diretrizes publicadas combinar a levotiroxina (200 g) e a liotironina (25 g) como
mais recentemente não recomendam o tratamento de rotina quan- uma única injeção IV inicial, seguida de tratamento diário com
do os níveis de TSH estão abaixo de 10 mU/L. É importante con- levotiroxina (50-100 g/dia) e liotironina (10 g a cada 8 h).
firmar que qualquer elevação do TSH persistiu por um período A terapia de apoio deve ser proporcionada para corrigir qual-
de 3 meses antes de iniciar o tratamento. Desde que seja evitado quer distúrbio metabólico associado. O aquecimento externo está
um tratamento excessivo, não existe qualquer risco em corrigir um indicado somente quando a temperatura é inferior a 30°C, pois isso
TSH ligeiramente aumentado. Além disso, há o risco de que os pode resultar em colapso cardiovascular. Os cobertores espaciais
pacientes possam progredir para o hipotireoidismo clínico, parti- devem ser usados para prevenir qualquer perda adicional de calor.
cularmente quando o nível de TSH se mostra elevado e estão pre- A hidrocortisona parenteral (50 mg a cada 6 h) deve ser adminis-
59
■■ DOENÇA DE GRAVES
QUADRO 4.7 Sinais e sintomas de tireotoxicose (na ordem
Epidemiologia descendente de frequência)
A doença de Graves é responsável por 60 a 80% dos casos de tireoto-
Sintomas Sinaisa
SEÇÃO I
Capítulo 4
SPECS é inadequado para descrever plenamente a doença ocular, e os
pacientes não progridem necessariamente de uma classe para outra.
Quando a doença ocular de Graves é ativa e intensa, indica-se o en-
caminhamento a um oftalmologista e são necessárias as mensurações
objetivas, como a largura da fissura palpebral; coloração da córnea
com fluoresceína; e avaliação da função dos músculos extraoculares
(p. ex., gráfico de Hess), da pressão intraocular e dos campos visuais,
da acuidade e da visão colorida.
A dermopatia tireoidiana ocorre em menos de 5% dos pacientes
Avaliação laboratorial
constituem a oftalmopatia de Graves (Fig. 4.7A). Essa condição é tam-
As investigações usadas para determinar a existência e a causa da tire-
bém denominada oftalmopatia associada à tireoide, visto que ocorre
otoxicose estão resumidas na Fig. 4.8. Na doença de Graves, o nível de
na ausência na doença de Graves em 10% dos pacientes. A maioria
TSH é suprimido, e os níveis dos hormônios tireoidianos totais e livres
desses indivíduos exibe hipotireoidismo autoimune ou é portador de
se mostram aumentados. Em 2 a 5% dos pacientes (e ainda mais nas
anticorpos tireoidianos. O início da oftalmopatia de Graves ocorre ao
áreas com ingestão limítrofe de iodo), apenas a T3 se mostra aumen-
longo do ano precedente ou após fazer o diagnóstico de tireotoxicose
tada (toxicose de T3). O estado inverso de toxicose pela T4, com níveis
em 75% dos pacientes, porém às vezes pode preceder ou acompanhar
totais e livres de T4 elevados, bem como de T3 normais, é observado
a tireotoxicose em vários anos, sendo responsável por alguns casos de
ocasionalmente quando o hipertireoidismo é induzido pelo excesso
oftalmopatia com eutireoidismo.
de iodo, proporcionando um substrato excedente para a síntese dos
Alguns pacientes com doença de Graves possuem pouca evidên-
hormônios tireoidianos. A mensuração dos anticorpos contra TPO ou
cia clínica de oftalmopatia. Entretanto, os músculos extra-oculares
TBII pode ser útil, se o diagnóstico não estiver clinicamente definido,
aumentados, típicos da doença, e outras características sutis podem
porém não é rotineiramente necessária. As anormalidades associadas
ser detectados em quase todos os pacientes quando investigados pela
que podem causar confusão diagnóstica na tireotoxicose incluem uma
US ou por imagens da TC das órbitas. Os sinais unilaterais são en-
elevação da bilirrubina, nas enzimas hepáticas e na ferritina. A anemia
contrados em até 10% dos pacientes. As manifestações mais precoces
microcítica e trombocitopenia também podem ocorrer.
de oftalmopatia consistem habitualmente em uma sensação de are-
nosidade, desconforto ocular e lacrimejamento excessivo. Cerca de
Diagnóstico diferencial
33% dos pacientes exibem proptose, detectada mais facilmente pela
O diagnóstico da doença de Graves é simples em paciente com ti-
visualização das escleróticas entre a borda inferior da íris e a pálpe-
reotoxicose bioquimicamente confirmada, bócio difuso à palpação,
bra inferior, com os olhos na posição primária. A proptose pode ser
oftalmopatia e, com frequência, história pessoal ou famíliar de dis-
medida utilizando um exoftalmômetro; nos casos mais graves, pode
túrbios autoimunes. Para os pacientes com tireotoxicose que não exi-
causar exposição e dano à córnea, especialmente quando as pálpebras
bem essas características, o método diagnóstico mais confiável con-
não se fecham durante o sono. Edema periorbitário, injeção das escle-
siste em determinar a TBII ou a TSI. Uma alternativa é realizar uma
róticas e quemose também são frequentes. Em 5 a 10% dos pacientes, 99m 123 131
cintilografia com radionuclídios ( Tc, I ou I) da tireoide, que
a tumefação muscular é tão intensa que acaba resultando em diplopia,
diferencia a captação difusa e intensa na doença de Graves da doença
porém não exclusivamente, quando o paciente olha para cima e late-
tireoidiana nodular, da tireoidite destrutiva, do tecido tireoidiano
ralmente. A manifestação mais grave é a compressão do nervo óptico
ectópico e da tireotoxicose factícia. No hipertireoidismo secundário
no ápice da órbita, resultando em papiledema, defeitos nos campos
devido a tumor hipofisário secretor de TSH, existe também um bócio
periféricos e, se não for tratada, perda permanente da visão.
difuso. Um nível de TSH não suprimido e o achado de tumor hipofi-
Foram usados muitos sistemas de escore para aferir a extensão e
sário à TC ou RM identificam prontamente esses pacientes.
a atividade das alterações orbitárias na doença de Graves. O esque-
As manifestações clínicas da tireotoxicose podem simular certos
ma “NO SPECS” é um acrônimo que deriva das seguintes alterações
aspectos de outros distúrbios, incluindo ataques de pânico, mania,
oculares:
feocromocitoma e perda de peso associada à neoplasia maligna. O
0 = nenhum sinal ou sintoma (No signs) diagnóstico de tireotoxicose poderá ser facilmente excluído se os ní-
1 = apenas sinais (retração ou retardo palpebral), sem sintomas veis de TSH e de T4 e T3 livres esiverem normais. Um TSH normal
(Only signs) exclui também a doença de Graves como causa do bócio difuso.
2 = acometimento dos tecidos moles (edema periorbitário) (Soft
tissue) Evolução clínica
3 = proptose (> 22 mm) (Proptosis) Em geral, as características clínicas são agravadas sem tratamento; a
4 = acometimento dos músculos extra-oculares (diplopia) (Ex- mortalidade era de 10 a 30% antes da introdução da terapia satisfató-
traocular muscle) ria. Alguns pacientes com a doença de Graves leve experimentam re-
61
AVALIAÇÃO DA TIREOTOXICOSE
TSH baixo, T4 TSH baixo, T4 livre TSH normal ou aumentado, TSH e T4 livre
livre alta normal T4 livre alta normais
Características da Acompanhamento
doença de Gravesa? em 6-12 semanas
Sim Não
Sim Não
Sim Não
Figura 4.8 Avaliação da tireotoxicose. aBócio difuso, anticorpos contra TPO positivos, oftalmopatia, dermopatia; bpode ser confirmado pela cintilografia com radionuclí-
dios. TSH, hormônio tireoestimulante
62
dos por vários meses e, por isso, não proporcionam um indicador clínicas, como a gravidade da tireotoxicose, o tamanho do bócio
sensível da resposta ao tratamento. As doses de manutenção diárias (são necessários aumentos da dose) e o nível de captação do iodo
habituais dos agentes antitireoidianos, no esquema com titulação, radioativo (são necessárias reduções das doses). Em geral, a dose de
Capítulo 4
131
consistem em 2,5-10 mg de carbimazol ou metimazol, e de 50-100 I varia entre 185 MBq (5 mCi) e 555 MBq (15 mCi). O tratamen-
mg de propiltiouracila. No esquema com reposição em bloco, a dose to incompleto e a recidiva precoce são mais comuns em homens e
inicial do agente antitireoidiano deve ser mantida constante, e a nos pacientes com menos de 40 anos de idade. Muitos autores pre-
dose de levotiroxina deve ser ajustada de forma a manter normais ferem uma abordagem que tenha como meta a ablação da tireoide
os níveis de T4 livre. Quando a supressão do TSH for minorada, os (em oposição ao eutireoidismo), pois a reposição de levotiroxina é
níveis desse hormônio poderão ser usados para monitorar a terapia. extremamente simples e a maioria dos pacientes acaba progredin-
As taxas máximas de remissão (de até 30 a 50% em algumas do para o hipotireoidismo ao longo dos 5-10 anos, frequentemente
populações) são conseguidas após 18-24 meses para o esquema de com algum retardo no diagnóstico do hipotireoidismo.
titulação e após 6 meses para o esquema com reposição em bloco. São necessárias algumas precauções de segurança para a ir-
63
transferência transplacentária desses anticorpos causa tireotoxicose dia), às vezes combinados com ciclosporina. As doses dos glico-
fetal ou neonatal. O crescimento intra-uterino precário, frequência corticoides devem ser reduzidas em 5 mg a cada 2 semanas, porém
cardíaca fetal > 160 bpm e altos níveis de TSI maternos no último essa redução costuma resultar em reaparecimento dos sintomas
trimestre podem prenunciar essa complicação. Os agentes antiti- congestivos. É utilizada também a pulsoterapia com metilpredni-
SEÇÃO I
reoidianos administrados à mãe podem ser usados para tratar o sona IV (p. ex., 500-1.000 mg de metilprednisolona em 250 mL de
feto, podendo ser necessários por 1-3 meses após o parto, até que solução salina infundida durante 2 h, diariamente, durante 1 sema-
os anticorpos maternos tenham desaparecido da circulação do na), seguida por um esquema oral. Quando os glicocorticoides se
bebê. O período pós-parto é uma época de grande risco para a pos- revelam ineficazes, a descompressão orbitária pode ser conseguida
sível recidiva da doença de Graves. A amamentação é segura com removendo o osso de qualquer parede da órbita, tornando, assim,
as pequenas doses de agentes antitireoidianos. A doença de Graves possível o deslocamento da gordura e dos músculos extraoculares
em crianças pode ser controlada habitualmente com agentes anti- tumefeitos. A via transantral é usada com mais frequência, visto
tireoidianos, administrados com frequência na forma de uma se- que dispensa excisão externa. A proptose retrocede por uma média
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
quência prolongada do esquema de titulação. A cirurgia ou o iodo de 5 mm, porém pode ocorrer diplopia residual ou mesmo piora.
radioativo podem ser indicados na doença grave. Depois que a doença ocular tiver sido estabilizada, a cirurgia po-
A crise tireotóxica, ou tempestade tireoidiana, são raras, ma- derá ser indicada para o alívio da diplopia e correção do aspecto
nifestando-se como exacerbação do hipertireoidismo capaz de externo. A radioterapia com feixes externos da órbita foi utilizada
ameaçar a vida, acompanhada por febre, delirium, crises convul- por muitos anos, porém a sua eficácia permanece incerta, sendo
sivas, coma, vômitos, diarreia e icterícia. A taxa de mortalidade mais bem reservada para aqueles que não responderam ou que não
devida à insuficiência cardíaca, arritmia ou hipertermia pode são candidatos à terapia com glicocorticoides.
alcançar os 30% mesmo com tratamento. A crise tireotóxica é A dermopatia tireoidiana não costuma exigir tratamento, mas
desencadeada habitualmente por uma enfermidade aguda (p. ex., pode causar problemas estéticos ou interferir na adaptação dos
AVE, infecção, traumatismo, cetoacidose diabética), cirurgia (es- calçados. A exérese cirúrgica não está indicada. Se necessário, o
pecialmente na tireoide) ou tratamento com iodo radioativo de tratamento consiste em pomada tópica de glicocorticoides de alta
paciente com hipertireoidismo tratado parcialmente ou não tra- potência debaixo de curativo oclusivo. O octreotide pode ser be-
tado. A conduta terapêutica requer um intensivo monitoramento néfico em alguns casos.
e cuidados de apoio, identificação e tratamento da causa desenca-
deante, bem como medidas capazes de reduzir a síntese dos hor- ■■ OUTRAS CAUSAS DE TIREOTOXICOSE
mônios tireoidianos. As altas doses de propiltiouracila (600 mg A tireoidite destrutiva (tireoidite subaguda ou silenciosa) se mani-
como dose de impregnação e 200-300 mg a cada 6 h) devem ser festa com uma curta fase tireotóxica devido à liberação de hormô-
administradas oralmente ou por sonda nasogástrica ou por via nios tireoidianos pré-formados e catabolismo da Tg (ver “Tireoidi-
retal; a ação inibitória do medicamento sobre a conversão de T4 te subaguda”, adiante). Não existe um hipertireoidismo verdadeiro,
em T3 faz ser este o agente antitireoidiano de escolha. Uma hora conforme demonstrado por uma baixa captação do radionuclídio.
após a primeira dose de propiltiouracila, o iodeto estável deve ser Os níveis circulantes de Tg costumam estar aumentados. Outras
administrado para bloquear a síntese dos hormônios tireoidianos causas da tireotoxicose com captação baixa ou ausente do radionu-
graças ao efeito de Wolff-Chaikoff (a demora permite ao agente clídio pela tireoide são a tireotoxicose factícia; o excesso de iodo e,
antitireoidiano impedir que o excesso de iodo seja incorporado raramente, o tecido tireoidiano ectópico, particularmente os tera-
ao novo hormônio). Uma solução saturada de iodeto de potássio tomas do ovário (struma ovarii) e carcinoma folicular metastático
(5 gotas de SSKI a cada 6 h), ou o ipodato ou ácido iopanoico (500 funcional. Os estudos com radionuclídios do corpo inteiro podem
mg a cada 12 h), pode ser administrada por via oral. (O iodeto demonstrar tecido tireoidiano ectópico, e a tireotoxicose factícia
de sódio, 0,25 g IV a cada 6 h, constitui uma alternativa, porém deve ser diferenciada da tireoidite destrutiva pelas características
geralmente não está disponível.) O propranolol também deve ser clínicas e baixos níveis de Tg. O tratamento com amiodarona está
administrado para reduzir a taquicardia e outras manifestações associado à tireotoxicose em até 10% dos pacientes, particularmen-
adrenérgicas (40-60 mg, VO a cada 4 h; ou 2 mg IV a cada 4 h). te nas áreas com baixa ingestão de iodo (ver adiante).
Apesar de outros betabloqueadores também poderem ser usados, O adenoma hipofisário secretor de TSH é uma causa rara da ti-
as altas doses de propranolol reduzem a conversão de T4 em T3 e reotoxicose e pode ser identificado pela presença de nível inapro-
as doses podem ser ajustadas facilmente. A cautela é necessária priadamente normal ou elevado de TSH em paciente com hiper-
para evitar os efeitos inotrópicos agudos negativos, porém o con- tireoidismo, bócio difuso e níveis elevados de T4 e T3 (Cap. 2). Os
trole da frequência cardíaca é importante, pois alguns pacientes níveis elevados da subunidade de TSH, liberada pelo adenoma
desenvolvem uma forma de insuficiência cardíaca de alto débito. secretor de TSH, apoiam esse diagnóstico, que pode ser confir-
As medidas terapêuticas adicionais incluem glicocorticoides (p. mado ao demonstrar o tumor hipofisário pela RM ou TC. Uma
ex., dexametasona IV, 2 mg a cada 6 h), antibióticos na presença combinação de cirurgia transesfenoidal, irradiação da sela turca e
de infecção, esfriamento, oxigênio e líquidos intravenosos. octreotide pode ser necessária para normalizar o TSH, visto que
A oftalmopatia não requer tratamento ativo quando leve ou muitos desses tumores são volumosos e localmente invasivos por
moderada, visto que ocorre habitualmente uma melhora espontâ- ocasião do diagnóstico. O iodo radioativo ou os agentes antiti-
nea. As medidas gerais incluem o meticuloso controle dos níveis reoidianos podem ser usados para controlar a tireotoxicose.
de hormônios tireoidianos, abandono do fumo e explicação sobre A tireotoxicose causada por BMN tóxico e nódulos solitários
a história natural da oftalmopatia. O desconforto pode ser aliviado hiperfuncionantes é abordada adiante.
com lágrimas artificiais (p. ex., metilcelulose a 1%), pomada oftál-
mica e uso de óculos escuros com armações laterais. O edema pe-
riorbitário pode responder a uma posição mais verticalizada para TIREOIDITE
dormir ou um diurético. A exposição corneana durante o sono Uma classificação clinicamente útil da tireoidite baseia-se no início e
pode ser evitada com a utilização de vendas oculares ou mantendo duração da doença (Quadro 4.8).
as pálpebras fechadas com uma fita adesiva. Os menores graus de
diplopia melhoram com prismas adaptados aos óculos. A oftalmo- ■■ TIREOIDITE AGUDA
patia grave, com o acometimento do nervo óptico ou quemose que
A tireoidite aguda é rara, sendo decorrente de uma infecção supurati-
resulta em dano corneano, constitui emergência que requer abor-
va da tireoide. Em crianças e adultos jovens, a causa mais comum é a
dagem conjunta com um oftalmologista. Podem ser conseguidos
presença de um seio piriforme, que representa um resíduo da quarta
benefícios a curto prazo em cerca de 66% dos pacientes com o uso
bolsa branquial que conecta a orofaringe com a tireoide. Esses seios
de glicocorticoides em altas doses (p. ex., prednisona, 40 a 80 mg/
estão localizados predominantemente no lado esquerdo. Um bócio
64
100 40 50
QUADRO 4.8 Causas da tireoidite VHS
TSH
Aguda 30
Capítulo 4
FT4
Infecção bacteriana: especialmente Staphylococcus, Streptococcus e 5
TSH (mU/L)
VHS (mm/h)
FT4 (pmol/L)
Enterobacter
Infecção fúngica: Aspergillus, Candida, Coccidioides, Histoplasma e 50 20
Pneumocystis
Tireoidite actínica após tratamento com 131I
10 0,5
Amiodarona (pode ser também subaguda ou crônica)
Subaguda
Tireoidite viral (ou granulomatosa) 0 0 0,01
Tireoidite silenciosa (incluindo a tireoidite pós‑parto) 0 6 12 18
dia) para permitir que haja uma recuperação mediada por TSH. tireoidiana devem ser evitados nos pacientes agudamente enfermos.
O padrão hormonal mais comum na síndrome do enfermo euti-
reoidiano (SEE) é uma redução nos níveis de T3 total e livre (síndro-
■■ TIREOIDITE SILENCIOSA me da T3 baixa), bem como com níveis normais de T4 e TSH. A mag-
A tireoidite indolor, ou tireoidite “silenciosa”, ocorre nos pacientes nitude da queda na T3 se correlaciona com a gravidade da doença. A
com doença autoimune subjacente da tireoide. Comporta evolução transformação de T4 em T3 por desiodação periférica é prejudicada,
clínica semelhante à da tireoidite subaguda, exceto por haver pouca resultando em maior T3 reverso (rT3). Apesar desse efeito, a principal
ou nenhuma hipersensibilidade da tireoide. Essa condição ocorre em base para uma rT3 aumentada é muito mais uma depuração dimi-
até 5% das mulheres 3-6 meses após o final da gestação e, em tais nuída que uma produção aumentada. Além disso, a T4 é metaboli-
circunstâncias, recebe a designação de tireoidite pós-parto. As pacien- zada alternadamente no sulfato hormonalmente inativo da T3. Em
tes exibem uma breve fase de tireotoxicose que dura 2-4 semanas, geral, admite-se que esse estado com a T3 baixa seja um fenômeno
seguida por hipotireoidismo durante um período de 4-12 semanas e, adaptativo, pois pode ser induzido nos indivíduos normais pelo je-
a seguir, resolução dos sintomas; no entanto, com bastante frequên- jum. Teleologicamente, a queda na T3 pode limitar o catabolismo nos
cia é evidenciada apenas uma única fase. A condição está associada pacientes vítimas de inanição ou de alguma enfermidade.
à presença de anticorpos contra TPO antes do parto, sendo 3 vezes Os pacientes muito enfermos podem evidenciar uma queda
mais comum nas mulheres com diabetes melito tipo 1. Como aconte- drástica nos níveis totais de T4 e T3 (síndrome da T4 baixa), estado
ce na tireoidite subaguda, inicialmente a captação do iodo radioativo que comporta um prognóstico sombrio. Um fator essencial da queda
é suprimida. Além do bócio indolor, a tireoidite silenciosa pode ser nos níveis de T4 é uma ligação alterada à TBG (globulina fixadora da
diferenciada da tireoidite subaguda por VHS normal e a presença tiroxina). Os ensaios para a T4 demonstram habitualmente um nível
de anticorpos contra TPO. O tratamento com glicocorticoides não normal de T4 livre nesses pacientes, dependendo do método de en-
está indicado na tireoidite silenciosa. Os sintomas tireotóxicos mais saio utilizado. A flutuação nos níveis de TSH também cria desafios
intensos podem ser controlados com uma curta sequência de pro- na interpretação da função tireoidiana em indivíduos enfermos. Os
pranolol, 20-40 mg, 3 ou 4x/dia. A reposição da tiroxina poderá ser níveis de TSH podem variar de < 0,1 a > 20 mU/L; estas alterações
necessária para a fase hipotireoidiana, porém deverá ser suspensa são revertidas após a recuperação, confirmando a ausência de doença
após 6-9 meses, pois a recuperação constitui a regra. Daí em diante, tireoidiana subjacente. Elevação no cortisol ou administração de gli-
recomenda-se o acompanhamento anual, visto que uma certa pro- cocorticoides podem proporcionar uma explicação parcial para os
porção desses pacientes desenvolve hipotireoidismo permanente. A menores níveis de TSH. Os mecanismos exatos responsáveis pelo
condição pode sofrer recidiva em gestações subsequentes. TSH anormal, observado em 10% dos indivíduos enfermos, e pelo
TSH aumentado, observado em 5%, continuam sendo obscuros, po-
■■ TIREOIDITE INDUZIDA POR FÁRMACOS rém podem ser mediados pelas citocinas, como IL-12 e IL-18.
Os pacientes que recebem citocinas, tais como IFN- ou IL-2, podem Qualquer enfermidade grave pode induzir a mudanças nos ní-
desenvolver tireoidite indolor. O IFN-, usado para tratar as hepa- veis de hormônios tireoidianos, porém alguns distúrbios exibem um
tites B ou C crônicas e as malignidades hematológicas e cutâneas, padrão distintivo de anormalidades. A doença hepática aguda está
causa disfunção tireoidiana em até 5% dos pacientes tratados. Está associada a uma elevação inicial nos níveis totais (porém não nos ní-
associada a tireoidite indolor, hipotireoidismo e doença de Graves, veis livres) de T3 e T4 por causa da liberação de TBG; esses níveis se
sendo mais comum em mulheres com anticorpos contra TPO antes tornam subnormais com a progressão para a insuficiência hepática.
do tratamento. Para uma discussão sobre a amiodarona, ver Efeitos Um aumento transitório nos níveis de T4 total e livre, habitualmente
da amiodarona sobre a função tireoidiana, adiante. com um nível normal de T3, é observado em 5 a 30% dos pacientes
psiquiátricos agudamente enfermos. Os valores do TSH podem fi-
■■ TIREOIDITE CRÔNICA car transitoriamente baixos, normais ou altos nesses pacientes. No
A tireoidite focal está presente em 20 a 40% dos casos de necropsia primeiro estágio da infecção pelo HIV, os níveis de T3 e T4 sobem
eutireoidianos, estando associada à evidência sorológica de autoimu- mesmo na vigência de redução ponderal. Os níveis de T3 caem com a
nidade, particularmente a presença de anticorpos contra TPO. Esses progressão para a Aids, porém o TSH costuma continuar sendo nor-
anticorpos são 4-10 vezes mais comuns em mulheres, sadias nos de- mal. Com bastante frequência, a doença renal é acompanhada por
mais aspectos, que em homens. A causa mais comum clinicamente baixas concentrações de T3, porém com níveis de rT3 normais em vez
aparente da tireoidite crônica é a tireoidite de Hashimoto, um distúr- de aumentados, o que é devido a um fator desconhecido que induz a
bio autoimune que se manifesta frequentemente como bócio resis- maior captação de rT3 no interior do fígado.
tente ou firme de tamanho variável (ver anteriormente). A tireoidite O diagnóstico de SEE (síndrome do enfermo eutireoidiano) é
de Riedel é um distúrbio raro que ocorre em mulheres de meia-idade, desafiador. A informação anamnésica pode ser limitada e, com bas-
manifestando-se com um bócio indolor e insidioso com sintomas lo- tante frequência, os pacientes exibem múltiplos desarranjos metabó-
cais provocados por compressão do esôfago, traqueia, veias cervicais licos. O que precisa ser levado em conta consiste em história prévia
ou nervos laríngeos recorrentes. Uma fibrose densa destrói a arquite- de doença tireoidiana e as provas de função tireoidiana, avaliação da
tura glandular normal, podendo estender-se para fora da cápsula da gravidade e evolução temporal da enfermidade aguda do paciente,
tireoide. Apesar dessas extensas alterações histológicas, a disfunção documentação das medicações que podem afetar a função tireoi-
tireoidiana é incomum. O bócio é firme, insensível, com bastante fre- diana ou os níveis de hormônios tireoidianos e as mensurações de
quência assimétrico e fixo, gerando a suspeita de se tratar de malig- rT3 juntamente com os hormônios tireoidianos livres e de TSH. O
nidade. O diagnóstico depende de uma biópsia aberta, pois a biópsia diagnóstico de SEE costuma ser puramente presuntivo em virtude do
por PAAF costuma ser inadequada. O tratamento é dirigido ao alívio contexto clínico e padrão de valores laboratoriais; apenas a resolução
66
dos resultados dos testes com recuperação clínica poderá estabele- tipo 2 podem regredir espontaneamente ou, ocasionalmente, podem
cer, de forma clara, o diagnóstico desse distúrbio. O tratamento da evoluir para o hipotireoidismo. O Doppler de fluxo colorido mostra
SEE com hormônio tireoidiano (T4 e/ou T3) é controverso, porém a maior vascularização na TIA tipo 1, porém menor vascularização na
maioria dos autores recomenda o monitoramento das provas de fun- TIA tipo 2. As cintilografias da tireoide são difíceis de interpretar
Capítulo 4
ção tireoidiana do paciente durante a recuperação, sem administrar o nestas circunstâncias, pois os altos níveis de iodo endógeno reduzem
hormônio tireoidiano, a não ser quando existe evidência na história a captação do marcador. Entretanto, a presença de uma captação nor-
ou clínica sugestiva de hipotireoidismo. É extremamente improvável mal ou, raramente, aumentada fala a favor de uma TIA tipo 1.
que ensaios controlados e randomizados suficientemente extensos Na TIA, o medicamento deve ser suspenso, se possível, porém
com a utilização do hormônio tireoidiano venham a solucionar essa isto costuma ser pouco prático por causa do distúrbio cardíaco sub-
controversa terapêutica em um futuro próximo, pois as manifesta- jacente. A interrupção da amiodarona não tem um efeito agudo por
ções clínicas e os resultados são altamente variáveis. causa de seu armazenamento e meia-vida prolongada. As altas doses
de medicamentos antitireoidianos podem ser utilizadas na TIA tipo 1,
ma bociosa da tireoidite de Hashimoto ocorre por causa dos defeitos ad- respiratório e a TC ou RM devem ser utilizadas para avaliar o bócio
quiridos na síntese hormonal, dando origem a níveis elevados de TSH e subesternal nos pacientes com sinais ou sintomas obstrutivos.
aos seus efeitos sobre o crescimento. A infiltração linfocítica e os fatores As provas de função tireoidiana devem ser realizadas em todos
de crescimento induzidos pelo sistema imune também contribuem para os pacientes com bócio para excluir uma tireotoxicose ou hipotireoi-
o aumento de volume da tireoide na tireoidite de Hashimoto. A doença dismo. Não é raro, particularmente na deficiência de iodo, encontrar
nodular caracteriza-se pelo crescimento desordenado das células tireoi- uma T4 total baixa, com T3 e TSH normais, refletindo uma conversão
dianas, combinado frequentemente com o desenvolvimento gradual de exacerbada de T4 em T3. Um TSH baixo com níveis normais de T3 e de
fibrose. Como o tratamento do bócio depende da etiologia, a identifica- T4 livres, particularmente em pacientes mais idosos, sugere a possibili-
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
ção de um aumento de volume da tireoide pelo exame físico leva-nos a dade de autonomia tireoidiana ou de doença de Graves não diagnosti-
realizar uma avaliação adicional destinada a identificar sua causa. cada, denominada tireotoxicose subclínica. O benefício do tratamento
A doença nodular da tireoide é comum, ocorrendo em cerca de (com iodo radioativo) na tireotoxicose subclínica versus acompanha-
3 a 7% dos adultos quando avaliada pelo exame físico. Se forem uti- mento e implementação do tratamento se os níveis de T3 ou de T4 livres
lizadas técnicas mais sensíveis, como a US, estará presente em mais se tornarem anormais, não está bem definido, porém o tratamento está
de 25% dos adultos. sendo cada vez mais recomendado no indivíduo idoso para reduzir
Os nódulos da tireoide podem ser solitários ou múltiplos e po- o risco de fibrilação atrial e perda óssea. Os anticorpos contra TPO
dem ser funcionantes ou não funcionantes. podem ser úteis para identificar os pacientes que correm maior risco
de doença autoimune da tireoide. Os baixos níveis urinários de iodo
■■ BÓCIO DIFUSO ATÓXICO (SIMPLES) (< 10 g/dL) confirmam o diagnóstico de deficiência de iodo. A cintilo-
Etiologia e patogenia grafia da tireoide em geral não é necessária, porém pode revelar maior
captação na deficiência de iodo assim como a maioria dos casos de di-
Quando o aumento difuso da tireoide ocorre na ausência de nódulos e
sormonogênese. A US geralmente não está indicada na avaliação do bó-
de hipertireoidismo, recebe a designação de bócio difuso atóxico. Às ve-
cio difuso, a não ser quando um nódulo é palpável ao exame físico.
zes, este é denominado bócio simples por causa da ausência de nódulos
ou bócio coloide por causa da presença de folículos uniformes cheios de
coloide. Em âmbito mundial, o bócio difuso é causado mais comumente TRATAMENTO Bócio difuso atóxico (simples)
pela deficiência de iodo e recebe a designação de bócio endêmico quan-
do afeta mais de 5% da população. Nas regiões não endêmicas, ocorre O iodo ou a reposição dos hormônios tireoidianos induzem a uma
o bócio esporádico, e a causa costuma ser desconhecida. O aumento de regressão variável do bócio na deficiência de iodo, dependendo do
volume da tireoide em adolescentes às vezes é denominado bócio juve- período durante o qual esteve presente e do grau de fibrose que se
nil**. Em geral, o bócio é mais comum em mulheres que em homens, instalou. Por causa da possibilidade de autonomia tireoidiana subja-
provavelmente em virtude da maior prevalência de doença autoimune cente, convém ter cautela ao instituir a terapia supressiva com tiro-
subjacente e das maiores demandas de iodo associadas à gravidez. xina nos pacientes com bócio, particularmente se o TSH basal esti-
Nas áreas com deficiência de iodo, o aumento de volume da ti- ver na variação baixa/normal. Nos pacientes mais jovens, a dose de
reoide reflete um esforço compensatório destinado a captar o iodo e levotiroxina pode ser iniciada em 100 g/dia e ajustada de forma a
produzir uma quantidade suficiente de hormônio em condições nas suprimir o TSH na variação baixa/normal, porém ainda identificá-
quais a síntese hormonal se mostra relativamente ineficiente. É bas- vel. O tratamento dos pacientes idosos deve ser iniciado com 50 g/
tante surpreendente que os níveis de TSH em geral sejam normais dia. A eficácia do tratamento supressivo é maior nos pacientes mais
ou apenas ligeiramente aumentados, sugerindo maior sensibilidade jovens e nos com bócios macios. Observa-se habitualmente uma re-
ao TSH ou a ativação de outras vias que induzem ao crescimento da gressão significativa no transcorrer de 3-6 meses de tratamento; de-
tireoide. O iodo parece exercer ações diretas sobre a árvore vascular pois desse período, a ocorrência da regressão torna-se improvável.
da tireoide, podendo afetar indiretamente o crescimento por meio Nos pacientes mais velhos e nos com um certo grau de doença no-
de substâncias vasoativas, como as endotelinas e o óxido nítrico. O dular ou fibrose, menos de 33% demonstram redução significativa
bócio endêmico é também causado pela exposição a bociogênicos am- do bócio. A cirurgia raramente está indicada para o bócio difuso. As
bientais, como a raiz da mandioca, que contém um tiocianato; vege- exceções incluem evidência documentada de compressão traqueal
tais da família das Cruciferae (conhecidos como vegetais crucíferos) ou a de obstrução da saída torácica, associadas mais provavelmente
(p. ex., couve-de-bruxelas, repolho e couve-flor); e leite das regiões a bócios multinodulares subesternais (ver adiante). A tireoidecto-
em que os bociogênicos estão presentes na grama. Apesar de serem mia subtotal ou quase total, realizada com essas finalidades ou por
relativamente raros, os defeitos hereditários na síntese dos hormô- motivos estéticos, deve ser executada por um cirurgião experiente
nios tireoidianos dão origem a um bócio difuso atóxico. As anorma- a fim de minimizar as taxas de complicações. A cirurgia deve ser
lidades em cada etapa na síntese hormonal, como o transporte do seguida de reposição com levotiroxina, com a finalidade de manter
iodo (NIS), síntese de Tg, organificação e acoplamento (TPO), além o nível de TSH na extremidade inferior da faixa de referência, a fim
da regeneração do iodeto (desalogenase), já foram descritas. de evitar um novo crescimento do bócio. O iodo radioativo reduz
o tamanho do bócio em cerca de 50% na maioria dos pacientes no
■■ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E DIAGNÓSTICO decorrer de 6-12 meses. Raramente está associado a uma tumefação
Quando a função tireoidiana é preservada, a maioria dos bócios se aguda transitória da tireoide, que não costuma ter consequências, a
mostra assintomática. A hemorragia espontânea para o interior de um não ser quando existe estreitamento traqueal pronunciado. Se não
cisto ou nódulo pode ser responsável pelo súbito início de dor locali- forem tratados com levotiroxina, os pacientes deverão ser acompa-
zada e tumefação. O exame de um bócio difuso revela uma glândula nhados após o tratamento com iodo radioativo devido ao possível
simetricamente aumentada, indolor e geralmente macia sem nódulos risco de surgimento do hipotireoidismo.
palpáveis. O bócio é definido, de uma forma bastante arbitrária, como
um lobo lateral com um volume maior que o polegar do indivíduo
que está sendo examinado. Se a tireoide estiver acentuadamente au- ■■ BÓCIO MULTINODULAR ATÓXICO
mentada de volume, poderá causar compressão traqueal ou esofágica.
No entanto, essas características são incomuns na ausência de doença Etiologia e patogenia
nodular e de fibrose. O bócio subesternal pode obstruir a entrada torá- Dependendo da população estudada, o BMN ocorre em até 12% dos
adultos. O BMN é mais comum em mulheres que em homens e au-
** N. de R.T.: Bócio juvenil também chamado de bócio puberal. menta de prevalência com a idade. É mais comum nas regiões com
68
deficiência de iodo, porém ocorre também nas regiões com suficiên-
tamanho do bócio e da captação de iodo radioativo, mas costuma
cia de iodo, refletindo múltiplas influências genéticas, autoimunes e
ser de aproximadamente 3,7 MBq (0,1 mCi) por grama de tecido
ambientais sobre a patogenia.
corrigido para captação (dose típica de 370 a 1.070 MBq [10 a 29
Existe uma ampla variação no tamanho dos nódulos. A histologia
Capítulo 4
mCi]). Pode ser necessário repetir o tratamento, e pode-se aumen-
revela um espectro de morfologias que oscilam desde as regiões hi-
tar a sua eficiência por meio da administração concomitante de
percelulares até áreas císticas cheias de coloide. A fibrose costuma ser
TSH recombinante. É possível conseguir uma redução de 40 a 50%
extensa, podendo ser observada área de hemorragia ou de infiltração
no tamanho do bócio na maioria dos pacientes. A preocupação ini-
linfocítica. Com a utilização de técnicas moleculares, a maioria dos nó-
cial acerca da tumefação da tireoide induzida por irradiação e da
dulos dentro de um BMN é de origem policlonal, sugerindo uma res-
compressão traqueal diminuiu; os estudos realizados mostraram
posta hiperplásica aos fatores de crescimento produzidos localmente
que essa complicação é rara. Quando ocorre compressão aguda,
e as citocinas. O TSH, que não costuma estar elevado, pode desempe-
poderá ser necessário o tratamento com glicocorticoides ou uma
nhar um papel permissivo ou acessório. As lesões monoclonais ocor-
cirurgia. O hipotireoidismo induzido pela irradiação é menos co-
Capítulo 4
8 História de irradiação da cabeça e História familiar de câncer de
Taxa por 100.000/ano
Os cânceres de tireoide são de origem monoclonal, o que é compatí- trole de outros promotores, dando origem a uma expressão excessiva
vel com a ideia de que surgem como consequência de mutações que do receptor. Os rearranjos de RET ocorrem em 20 a 40% dos CPT em
conferem uma vantagem de crescimento a uma única célula. Além diferentes séries, tendo sido observados com maior frequência nos tu-
das maiores taxas de proliferação, alguns cânceres de tireoide exibem mores que se manifestaram após o acidente de vazamento radioativo
reduzida apoptose e características que aceleram a invasão, angiogê- em Chernobyl. Os rearranjos no CPT foram observados também para
nese e ocorrência de metástases. As neoplasias da tireoide foram ana- outro gene da tirosinoquinase, TRK1, localizado no cromossomo 1.
lisadas para uma variedade de alterações genéticas, porém sem qual- Até agora, a identificação de CPT com os rearranjos RET ou TRK1 não
quer evidência clara de aquisição ordenada de mutações somáticas à se revelou útil para permitir prever o prognóstico ou as respostas ao
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
medida que progridem do estado benigno para o estado maligno. Por tratamento. As mutações BRAF parecem ser a alteração genética mais
outro lado, certas mutações são relativamente específicas da neopla- comum no CPT. Essas mutações ativam a quinase, que estimula a cas-
sia da tireoide, alguma das quais se correlacionam com a classificação cata da quinase MAP (MAPK) das proteínas ativadas por mitógenos.
histológica (Quadro 4.12). As mutações RAS, que também estimulam a cascata MAPK, são en-
Conforme descrito anteriormente, as mutações ativadoras do contradas em cerca de 20 a 30% das neoplasias da tireoide, incluindo
TSH-R e da subunidade Gs estão associadas a nódulos com fun- tanto CPT quanto CFT. Convém assinalar que as mutações simultâneas
cionamento autônomo. Apesar de tais mutações induzirem ao cres- em RET, BRAF e RAS não ocorrem no mesmo tumor, sugerindo que a
cimento das células tireoidianas, esse tipo de nódulo é quase sempre ativação da cascata MAPK é de primordial importância para o desen-
benigno. volvimento do tumor, independentemente da etapa que inicia a cascata.
Nota: TSH, hormônio tireoestimulante; Gs, subunidade estimulante da proteína G; RET, reorganizado durante a transfecção do proto-oncogene; CPT, câncer papilífero de tireoide; TRK, receptor
de tirosinoquinase; RAS, proto-oncogene do sarcoma do rato; p53, gene supressor tumoral p53; MET, proto-oncogene MET (receptor do fator de crescimento dos hepatócitos); c-MYC, homólogo
celular do proto-oncogene do vírus da mielocitomatose; PTEN, homólogo da fosfatase e tensina; PAC, polipose adenomatosa do colo; MTS, supressor tumoral múltiplo; CDKN2A, inibidor 2A da qui-
nase ciclina-dependente; p21; supressor tumoral p21; WAF, fragmento p53 ativado tipo selvagem; GPCR, receptor acoplado à proteína G; ELE1/TK, gene RET-ativador ele1/tirosinoquinase; NEM 2,
neoplasia endócrina múltipla 2; PAX8, par do fator de transcrição de domínio; PPAR1, receptor ativado de peroxissomo-proliferador 1; BRAF, homólogo v-raf, B1; MEK, quinase regulada por sinal
de mitógeno extracelular.
Fonte: Adaptado, com autorização, de P Kopp, JL Jameson, em JL Jameson (ed.): Principles of Molecular Medicine. Totowa, NJ, Humana Press, 1998.
72
As mutações RAS também ocorrem no CFT. Além disso, um re- 100 Estágio I
arranjo do fator de transcrição desenvolvimental da tireoide PAX8 Estágio II
com o receptor nuclear PPAR é identificado em uma fração signifi-
Sobreviventes ao carcinoma
80
Capítulo 4
Estágio III
vel com deleções dos genes supressores tumorais, também é comum
60
nos CFT.
A maioria das mutações observadas nos cânceres diferenciados
de tireoide foi identificada também nos CAT. Foram observadas mu- 40
tações BRAF em até 50% dos CAT. As mutações no CTNNB1, que
codificam a -catenina, ocorrem em cerca de 66% dos CAT, porém 20
não nos CPT nem nos CFT. As mutações do supressor tumoral p53 Estágio IV
também desempenham um papel importante no desenvolvimento 0
Sobreviventes ao carcinoma
cer de tireoide está em fase de investigação. Em princípio, as análises 80 Estágio II
nhamento de longo prazo ao eliminar o tecido residual normal lografia pré-tratamento e prosseguir diretamente para a ablação, a
ou neoplásico. menos que haja a suspeita de que a quantidade de tecido residual
possa alterar a terapia. A dose ambulatorial máxima de 131I é de
TERAPIA DE SUPRESSÃO DO TSH Levando em conta que a maioria
1.110 MBq (29,9 mCi) nos EUA, porém a ablação costuma ser
dos tumores ainda responde ao TSH, a supressão desse hormônio
mais completa ao utilizar doses mais altas [1.850-3.700 MBq (50-
com levotiroxina constitui um esteio do tratamento do câncer de
100 mCi)]. Os pacientes devem receber uma dieta pobre em iodo
tireoide. Apesar de a supressão do TSH proporcionar benefícios
(< 50 g/dia de iodeto urinário) a fim de aumentar a captação
terapêuticos incontestáveis, não existem estudos prospectivos
de iodo radioativo. Nos pacientes com câncer residual conheci-
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
74
NEM 2A, e o CMT familiar é mais agressivo que o CMT esporádico.
aumentar o TSH, o que envolve transferir os pacientes da levotiro-
A calcitonina sérica elevada representa um marcador de doença re-
xina (T4) para o hormônio liotironina (T3) depurado mais rapida-
sidual ou recorrente. É razoável testar todos os pacientes com CMT
mente, permitindo, dessa forma, um aumento mais rápido do TSH.
para as mutações RET, pois o aconselhamento genético e os testes
Capítulo 4
Sabendo que o TSH estimula os níveis de Tg, as mensurações de Tg
dos membros da família poderão ser oferecidos aos indivíduos com
devem ser obtidas após a administração de rhTSH ou quando os
testes positivos para essas mutações.
níveis do TSH subirem após a privação do hormônio tireoidiano.
O tratamento do CMT é principalmente cirúrgico. Diferente-
Nos pacientes de baixo risco que não possuem evidência clí-
mente dos tumores que derivam das células foliculares da tireoide,
nica de doença residual após a ablação e com uma Tg basal < 1
esses tumores não captam o iodo radioativo. O tratamento com irra-
ng/mL, existe uma evidência cada vez maior apoiando o uso dos
diação externa e a quimioterapia podem proporcionar paliação aos
níveis de Tg estimulados pelo TSH um ano após a ablação, sem a
pacientes com doença em fase avançada (Cap. 23).
necessidade de realizar uma cintilografia com iodo radioativo. Se
os níveis estimulados de Tg forem baixos (< 2 ng/mL) e, preferen-
Nódulo solitário ou
com suspeita*
SEÇÃO I
Citopatologia
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
Nódulo “quente”
Figura 4.14 Abordagem ao paciente com um nódulo da tireoide. Ver o texto e as referências para mais detalhes. *Cerca de 33% dos nódulos são císticos ou mistos
(sólido-císticos). US, ultrassonografia; TSH, hormônio tireoestimulante; PAAF, punção aspirativa por agulha fina.
76
CAPÍTULO 5 Os distúrbios do córtex suprarrenal caracterizam-se pela defi-
ciência ou pelo excesso de uma ou mais das três principais classes
Capítulo 5
de corticosteroides. A deficiência hormonal pode ser causada por
distúrbios glandulares ou enzimáticos herdados, ou pela destrui-
Distúrbios do Córtex ção da hipófise ou da glândula suprarrenal por distúrbios autoi-
munes, infecção, infarto ou eventos iatrogênicos, como cirurgia ou
Suprarrenal supressão hormonal. O excesso de hormônio resulta habitualmente
de neoplasia, levando à produção aumentada de hormônio adre-
nocorticoticotrófico (ACTH) pela hipófise ou por células neuro-
Wiebke Arlt
endócrinas (ACTH ectópico) ou à produção aumentada de glico-
corticoides ou mineralocorticoides por nódulos suprarrenais. Os
H3C
H3C
H
CH3
H3C H
H3C
H H
HO
Colesterol
O O O O O O
CH3 HO
CH3 CHO
H3C H3C H3C H3C
HO HO HO
OH OH OH OH
H3C H H3C H H3C H H3C H H3C H H3C H
H H H H H H H H H H H H
O O O
HO POR O ADX O ADX ADX
HSD3B2 CYP21A2 CYP11B2 CYP11B2 CYP11B2
Pregnenolona Progesterona Desoxicorti- Corticos- 18OH-Corti- Aldosterona
costerona CYP11B1 terona costerona
POR POR
CYP17A1 CYP17A1
O O O O O
CH3 CH3
H3C H3C H3C H3C H3C
OH OH OH OH HO OH OH O OH OH
H3C H H3C H H3C H H3C H H3C H
H H H H H H H H H H
HO O O O O
POR ADX H6PDH
17-hidroxi- HSD3B2 17-hidroxi- CYP21A2 11- CYP11B1 HSD11B1
pregnenolona progesterona desoxicortisol Cortisol Cortisona
(17OHP) HSD11B2
POR
CYP17A1
POR Glicocorticoides
O
CYP17A1 O O OH
H3C H3C H3C H3C
H H H H H H H H
HO HSD3B2 O O O
H
HSD17B SRD5A
DHEA Andros- Testosterona 5-Diidrotestosterona
tenediona
PAPSS2
SULT2A1 Precursores Androgênios
androgênicos
O
H3C suprarrenais
H3C H
H H
HO
DHEAS
Figura 5.1 Esteroidogênese suprarrenal. CYP11A1, enzima de clivagem da desidrogenase tipo 2; H6PDH, hexose-6-fosfato desidrogenase; HSD17B,
cadeia lateral; CYP17A1, 17-hidroxilase/17, 20 liase; POR, oxidorredutase P450; 17-hidroxiesteroide desidrogenasse; SRD5A, 5-redutase; SULT2A1, DHEA sulfo-
ADX, adrenodoxina; HSD3B2, 3-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 2; CYP21A2, transferase; DHEA, desidroepiandrosterona; DHEAS, sulfato de desidroepiandroste-
21-hidroxilase; CYP11B1, 11-hidroxilase; CYP11B2, aldosterona sintase; HS- rona; PAPSS2, PAPS sintase tipo 2.
D11B1, 11-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 1; HSD11B2, 11-hidroxiesteroide
77
através da zona fasciculada intermediária, até a zona reticular interna regulador central da síntese de cortisol, com efeitos adicionais de
e, por fim, até a medula suprarrenal. A veia suprarrenal direita drena curto prazo sobre a síntese de mineralocorticoides e de androgênios
diretamente na veia cava, enquanto a veia suprarrenal esquerda dre- suprarrenais. A liberação de CRH e, subsequentemente, de ACTH,
na na veia renal esquerda. ocorre de modo pulsátil, seguindo um ritmo circadiano sob o contro-
SEÇÃO I
Durante o desenvolvimento embrionário inicial, as suprarrenais le do hipotálamo, especificamente de seu núcleo supraquiasmático
originam-se da crista urogenital e, em seguida, separam-se das gô- (NSQ), com regulação adicional por uma complexa rede de genes
nadas e dos rins aproximadamente com seis semanas de gestação. circadianos específicos de células. Refletindo o padrão de secreção
Em conformidade com a época de diferenciação sexual (sete a nove do ACTH, a secreção suprarrenal de cortisol exibe um ritmo circa-
semanas de gestação, ver Cap. 7), o córtex suprarrenal começa a diano distinto, com níveis máximos pela manhã e baixos níveis no
produzir cortisol e o precursor dos esteroides sexuais suprarrenais, final da tarde (Fig. 5.3).
a DHEA. Os receptores nucleares órfãos SF1 (fator esteroidogênico Os testes diagnósticos que avaliam o eixo HHSR utilizam o fato
1) e o DAX1 (gene de reversão sexual sensível a dose 1), entre outros, de que este eixo é regulado por retroalimentação negativa. O excesso
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
desempenham um papel essencial durante esse período de desenvol- de glicocorticoides é diagnosticado pelo teste de supressão da dexa-
vimento, uma vez que eles regulam inúmeros genes suprarrenais en- metasona. A dexametasona, um poderoso glicocorticoide, suprime
volvidos na esteroidogênese. o CRH/ACTH e, portanto, o cortisol endógeno. Várias versões do
teste de supressão da dexametasona são descritas de modo detalhado
■■ CONTROLE REGULADOR DA ESTEROIDOGÊNESE no Cap. 2. Se a produção de cortisol for autônoma (p. ex., nódulo
A produção dos glicocorticoides e dos androgênios suprarrenais suprarrenal), o ACTH já está suprimido, e a dexametasona exerce
encontra-se sob o controle do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal pouco efeito adicional. Se a produção de cortisol for impulsionada
(HHSR), enquanto os mineralocorticoides são regulados pelo siste- por um adenoma hipofisário produtor de ACTH, a supressão pela
ma renina-angiotensina-aldosterona (RAA). dexametasona é ineficaz em baixas doses, porém provoca habitual-
A síntese de glicocorticoides está sob controle inibitório por re- mente supressão em altas doses. Se a produção de cortisol for esti-
troalimentação do hipotálamo e da hipófise (Fig. 5.2). A liberação hi- mulada por uma fonte ectópica de ACTH, os tumores são habitual-
potalâmica do hormônio de liberação da corticotrofina (CRH) ocor- mente resistentes à supressão pela dexametasona. Por conseguinte, o
re em resposta ao estresse endógeno ou exógeno. O CRH estimula a teste de supressão da dexametasona mostra-se útil para estabelecer
clivagem do polipeptídio de 241 aminoácidos, a pró-opiomelanocor- o diagnóstico de síndrome de Cushing e para ajudar no diagnóstico
tina (POMC) pela pró-hormônio convertase específica da hipófise, diferencial do excesso de cortisol.
produzindo o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). O ACTH é Por outro lado, para avaliar a deficiência de glicocorticoides,
liberado pelas células corticotróficas da adeno-hipófise e atua como utiliza-se a estimulação da produção de cortisol pelo ACTH. O pep-
tídio ACTH contém 39 aminoácidos, porém os primeiros 24 são su-
ficientes para induzir uma resposta fisiológica. O teste de estímulo
com ACTH padronizado envolve a administração de cosintropina
Estressores (ACTH 1-24), 0,25 mg por via IM ou IV e a coleta de amostras de
Ritmo (físicos, emocionais, incluindo febre,
circadiano sangue depois de 0, 30 e 60 minutos para determinação do cortisol.
hipoglicemia, hipotensão)
Uma resposta normal é definida por um nível de cortisol > 20 g/dL
ou por um incremento de >10 g/dL acima do valor basal. A versão
desse teste com uma baixa dose (1 g de cosintropina IV) tem sido
recomendada para evitar a estimulação excessiva da glândula suprar-
renal. Alternativamente, pode se utilizar um teste de tolerância à in-
Neurotransmissores
sulina (TTI) para avaliar a insuficiência suprarrenal. Esse teste con-
siste na injeção de insulina para induzir hipoglicemia, que representa
um forte sinal de estresse que desencadeia a liberação hipotalâmica
Hipotálamo de CRH e a ativação de todo o eixo HHSR. O TTI envolve a adminis-
tração de insulina regular, 0,1 U/kg IV (a dose deve ser mais baixa se
houver probabilidade de hipopituitarismo) e a coleta de amostras de
sangue depois de 0, 30, 60 e 120 minutos para determinação da glico-
se, do cortisol e do hormônio do crescimento (GH) se o eixo do GH
– também for avaliado. Administra-se glicose oral ou IV após o apare-
CRH +
cimento de hipoglicemia sintomática no paciente (em geral, nível de
glicose < 40 mg/dL). Uma resposta normal é definida por um nível
de cortisol > 20 g/dL e por um nível de GH > 5,1 g/L. O TTI exi-
ge uma cuidadosa monitoração clínica e determinações sequenciais
da glicose. Sua realização está contraindicada para pacientes com
adeno-
–
doença arterial coronariana, doença vascular cerebral ou distúrbios
hipófise
convulsivos, razão pela qual o teste curto com cosintropina tornou-se
o teste de primeira linha comumente aceito.
A produção de mineralocorticoides é controlada pelo ciclo regu-
lador de RAA, que é iniciado pela liberação de renina pelas células
ACTH + Cortisol justaglomerulares dos rins, resultando em clivagem do angiotensino-
circulante gênio em angiotensina I no fígado (Fig. 5.4). A enzima conversora de
angiotensina (ECA) cliva a angiotensina I em angiotensina II, que se
liga ao receptor de angiotensina II tipo 1 (receptor AT1) e o ativa, re-
sultando em aumento da produção de aldosterona e vasoconstrição.
A aldosterona aumenta a retenção de sódio e a excreção de potássio
e provoca elevação da pressão de perfusão arterial, que, por sua vez,
Córtex suprarrenal regula a liberação de renina. Como a síntese de mineralocorticoides
Figura 5.2 Regulação do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal está principalmente sob o controle do sistema RAA, a lesão hipotalâ-
(HHSR). CRH, hormônio de liberação da corticotrofina, ACTH, hormônio adrenocor- mico-hipofisária não produz impacto significativo na capacidade de
ticotrófico. síntese de aldosterona pela glândula suprarrenal.
78
600 interage com a proteína acessória do MC2R,
a MRAP, e o complexo é então transportado
até a membrana celular adrenocortical, onde
500
se liga ao ACTH (Fig. 5.5). A estimulação
Capítulo 5
Acrofase: 08:30 h
pelo ACTH gera AMP cíclico (cAMP), que
400 suprarregula a via de sinalização da proteino-
Cortisol (nmol/L)
Vasocontrição
Suprarrenal
Células
Liberação de aldosterona justaglomerulares
Angiotensinogênio
Ativação do
receptor de angiotensina II
Tipo 1 (receptor AT1)
Liberação de renina
Angiotensina II
Angiotensina I
Enzima
conversora
de angiotensina (ECA)
Figura 5.4 Regulação do sistema renina-angiotensina-aldosterona (RAA).
79
Célula do córtex suprarrenal
Éster de
colesterol
Membrana celular
ACTH Receptor de
SEÇÃO I
depuração B1
ATP Citosol
CREB StAR
N hormônio
C Mitochondrion
Mitocôndria
C
N
N C Retículo
MRAP N endoplasmático
C Núcleo
P CYP11A1
CREB
CRE Pregnenolona
Transcrição de CYP11A1
e outras enzimas
esteroidogênicas
Figura 5.5 Efeitos do ACTH sobre a esteroidogênese suprarrenal. ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; ATP, trifosfato de adenosina; CRE, elemento de resposta ao cAMP;
CREB, ligação do elemento de resposta ao cAMP; MRAP, proteína acessória do MC2R; StAR, (proteína) reguladora aguda da esteroidogênese.
somais e mitocondriais, respectivamente. Além disso, a desidroge- tículo endoplasmático e converte a glicose-6-fosfato (G6P) em 6-fos-
nase de cadeia curta, a 3-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 2 fogliconato (6PGL), com consequente regeneração do NADP+ em
(3-HSD2), também denominada 4, 5 isomerase, desempenha NADPH, que impulsiona a ativação do cortisol a partir da cortisona
um importante papel na esteroidogênese suprarrenal. pela 11b-HSD1.
A enzima de clivagem da cadeia lateral do colesterol, a CYP11A1, No citosol das células-alvo, o cortisol liga-se ao receptor de gli-
gera pregnenolona. A síntese de glicocorticoides requer a conversão cocorticoides (GR) e o ativa, resultando em dissociação das proteínas
da pregnenolona em progesterona pela 3-HSD2, seguida de conver- de choque térmico (HSP) do receptor e em dimerização subsequen-
são em 17-hidroxiprogesterona pela CYP17A1, hidroxilação adicio- te (Fig. 5.6). Os dímeros de GR ligados ao cortisol são translocados
nal no carbono 21 pela 21-hidroxilase e, por fim, 11-hidroxilação para o núcleo e ativam elementos de resposta aos glicocorticoides
pela CYP11B1 para gerar o cortisol ativo (Fig. 5.1). A síntese de (GRE) na sequência do DNA, aumentando, assim, a transcrição
mineralocorticoides também necessita da progesterona, que é ini- dos genes regulados pelos glicocorticoides (transativação do GR).
cialmente convertida em desoxicorticosterona pela CYP21A2 e, em Entretanto, o GR ligado ao cortisol também pode formar heterodí-
seguida, convertida através da corticosterona e 18-hidroxicorticoste- meros com fatores de transcrição, como AP-1 ou NF-kB, resultando
rona em aldosterona, em três etapas catalisadas pela CYP11B2. Para em transrepressão de genes pró-inflamatórios, um mecanismo de
a síntese de androgênios suprarrenais, a pregnenolona sofre conver- grande importância na ação anti-inflamatória dos glicocorticoides.
são pela CYP17A1, que catalisa exclusivamente duas reações enzi- É importante assinalar que a corticosterona também exerce ativida-
máticas. Por meio de sua atividade de 17-hidroxilase, a CYP17A1 de glicocorticoide, embora muito mais fracamente do que o próprio
converte a pregnenolona em 17-hidroxipregnenolona, seguida de cortisol. Todavia, em roedores, a corticosterona constitui o princi-
geração do precursor universal dos esteroides sexuais, a DHEA, atra- pal glicocorticoide, e, em pacientes com deficiência 17-hidroxilase,
vés da atividade 17,20 liase da CYP17A1. A maior parte da DHEA é a ausência de cortisol pode ser compensada com concentrações mais
secretada pela suprarrenal na forma de seu éster sulfato, o DHEAS, altas de corticosterona, que se acumulam em consequência do blo-
produzido pela DHEA sulfotransferase (SULT2A1). queio enzimático.
Após a sua liberação pela suprarrenal, o cortisol circula na cor- O cortisol é inativado a cortisona pela enzima microssomal
rente sanguínea ligado principalmente à globulina de ligação do 11-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 2 (11-HSD2) (Fig. 5.7),
cortisol (CBG) e, em menor grau, à albumina, com apenas uma pe- principalmente no rim, mas também no colo, nas glândulas saliva-
quena fração do hormônio circulando na forma livre ou não ligada. res e em outros tecidos-alvo. O cortisol e a aldosterona ligam-se ao
Acredita-se que o cortisol livre entre diretamente nas células, sem a receptor de mineralocorticoides (MR) com igual afinidade; entre-
necessidade de transporte ativo. Além disso, em muitos dos tecidos- tanto, o cortisol circula na corrente sanguínea em uma concentração
-alvo periféricos da ação dos glicocorticoides, incluindo o tecido adi- de cerca de mil vezes mais alta. Por conseguinte, apenas a inativação
poso, o fígado, o músculo e o cérebro, o cortisol é gerado a partir da rápida do cortisol em cortisona pela 11b-HSD2 impede a ativação
cortisona inativa dentro da célula pela enzima 11-hidroxiesteroide do MR pelo excesso de cortisol, atuando, assim, como modulador
desidrogenase tipo 1 (11b-HSD1) (Fig. 5.6). Por conseguinte, a tecidual específico da via do MR. Além do cortisol e da aldostero-
11b-HSD1 atua como regulador de pré-receptor tecidual específico na, a desoxicorticosterona (DOC) (Fig. 5.1) tambem exerce ativida-
da ação dos glicocorticoides. Para a conversão da cortisona inativa de mineralocorticoide. O acúmulo de DOC devido à deficiência de
em cortisol ativo, a 11b-HSD1 exige a presença de adenina dinu- 11-hidroxilase ou devido à produção excessiva associada a tumor
cleotídio fosfato (NADPH [forma reduzida]), que é fornecida pela pode resultar em excesso de mineralocorticoides.
enzima hexose-6-fosfato desidrogenase (H6PDH). À semelhança do De maneira análoga à ação do cortisol através do GR, a ligação
domínio catalítico da 11b-HSD1, a H6PDH localiza-se na luz do re- da aldosterona (ou cortisol), ao MR dissocia o complexo HSP-re-
80
Célula-alvo de glicocorticoides
Citosol
Capítulo 5
GR
Cortisona
Cortisol
GR HSP
11-HSD1 Complexo
Retículo coativador
endoplasmático
Transrepressão do GR Transativação do GR
Figura 5.6 Ativação pré-receptor do cortisol e ação do receptor glicocorticoide (GR). GRE, elementos de resposta aos glicocorticoides; HSP, proteínas de choque
térmico; NADPH, fosfato de nicotinamida adenina dinucleotídio (forma reduzida).
ceptor, permitindo a homodimerização do MR e a translocação do e, consequentemente, aumenta o fluxo de ENaC para a superfície ce-
dímero de MR ligado ao hormônio para o núcleo (Fig. 5.7). O MR lular, onde medeia a retenção do sódio.
ativado intensifica a transcrição do canal de sódio epitelial (ENaC)
e da quinase 1 induzível por glicocorticoide sérica (SGK-1). No cito- ■■ SÍNDROME DE CUSHING
sol, a interação do ENaC com Nedd4 impede a expressão do ENaC (Ver também Cap. 2.) A síndrome de Cushing reflete uma conste-
na superfície celular. Entretanto, a SGK-1 fosforila resíduos de serina lação de manifestações clínicas, que resultam da exposição crônica
dentro da proteína Nedd4, diminui a interação entre Nedd4 e ENaC a um excesso de glicocorticoides de qualquer etiologia. O distúrbio
Sangue Luz
(lado basal) (lado apical)
Citosol
Aldosterona
Cortisol
MR HSP
Cortisona MR
11β_HSD2
NAD+ MR
MR
NADH
MR SGK-1
MR
ENaC Na+
Luz do RE Nedd4
Núcleo ENaC Na+
aC
EN
MR MR
HRE
Transcrição Nedd4
de ENaC e
ENaC
SGK-1
81
pode ser dependente de ACTH (p. ex., adenoma corticotrófico hi- A produção ectópica de ACTH é predominantemente causada
pofisário, secreção ectópica de ACTH por tumor não hipofisário) por tumores carcinoides ocultos, mais frequentemente no pulmão,
ou independente do ACTH (por exemplo, adenoma adrenocortical, mas também no timo ou no pâncreas. Em virtude de seu pequeno
carcinoma adrenocortical, hiperplasia suprarrenal nodular), bem tamanho, é muitas vezes difícil localizar esses tumores. O câncer
SEÇÃO I
como iatrogênico (por exemplo, administração de glicocorticoides de pulmão de pequenas células avançado pode causar produção de
exógenos para o tratamento de várias condições inflamatórias). O ACTH ectópico. Em raros casos, foi constatado que a produção ec-
termo doença de Cushing refere-se, especificamente, à síndrome de tópica de ACTH origina-se de carcinoma medular da tireoide ou de
Cushing causada por um adenoma de corticotrofos hipofisários. feocromocitoma, apresentando, este último, uma cossecreção de ca-
tecolaminas e ACTH.
Epidemiologia Os pacientes com excesso de cortisol independente de ACTH são,
A síndrome de Cushing é geralmente considerada uma doença rara. em sua maioria, portadores de adenoma suprarrenal produtor de cor-
A sua incidência é de 1 a 2 por 100.000 indivíduos por ano. Entretan- tisol. Os carcinomas adrenocorticais também podem causar doença
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
to, questiona-se se o excesso leve de cortisol pode ser mais prevalente independente de ACTH e, com frequência, são de grandes dimen-
entre pacientes com várias características da síndrome de Cushing, sões, com produção excessiva de várias classes de corticosteroides.
como obesidade centrípeta, diabetes tipo 2 e fraturas vertebrais os- Uma causa rara, porém notável, de excesso de cortisol suprarrenal é
teoporóticas, tendo em vista o fato de que essas características são a hiperplasia macronodular independente de ACTH (HMAIA), que
relativamente inespecíficas e comuns na população. em geral se caracteriza pela expressão ectópica de receptores que ha-
Na esmagadora maioria dos pacientes, a síndrome de Cushing bitualmente não são encontrados na suprarrenal, incluindo receptores
é causada por um adenoma corticotrófico produtor de ACTH da para o hormônio luteinizante, a vasopressina, a serotonina, a interleu-
hipófise (Quadro 5.1), conforme inicialmente descrito por Harvey cina-1 ou o peptídio inibitório gástrico (GIP), a causa da síndrome de
Cushing, em 1912. A doença de Cushing afeta mais frequentemente Cushing dependente de alimento. A ativação desses receptores resulta
as mulheres, exceto nos casos pré-puberais, quando é mais comum na suprarregulação da sinalização da PKA, como ocorre fisiologi-
em meninos. Em contrapartida, a síndrome de ACTH ectópico é camente com o ACTH, com aumento subsequente na produção de
identificada com mais frequência em homens. Apenas 10% dos pa- cortisol. São encontradas mutações em uma subunidade reguladora
cientes com síndrome de Cushing apresentam uma causa suprarrenal da PKA (PRKAR1A) em pacientes com doença suprarrenal nodular
primária da doença (p. ex., excesso de cortisol autônomo, indepen- pigmentada primária (DSRNPP), como parte do complexo de Carney,
dente de ACTH), e a maioria desses pacientes consiste em mulheres. uma condição de neoplasia múltipla autossômica dominante asso-
De modo global, o uso clínico de glicocorticoides para imunossu- ciada a mixomas cardíacos, hiperlentiginose, tumores de células de
pressão ou para o tratamento de doenças inflamatórias constitui a Sertoli e DSRNPP. A DSRNPP pode ocorrer na forma de hiperplasia
causa mais comum da síndrome de Cushing. micronodular ou macronodular, ou ambas. Outra causa rara de sín-
drome de Cushing independente de ACTH é a síndrome de McCune-
Etiologia -Albright, que também está associada a displasia fibrosa poliostótica,
Em pelo menos 90% dos pacientes com doença de Cushing, o ex- manchas café-com-leite unilaterais e puberdade precoce. A síndrome
cesso de ACTH é causado por um microadenoma corticotrófico de McCune-Albright é causada por mutações ativadoras no GNAS-1
hipofisário, frequentemente com apenas alguns milímetros de diâ- (polipeptídio 1 com atividade estimuladora alfa, proteína ligadora do
metro. Os macroadenomas hipofisários (isto é, tumores com > 1 nucleotídio guanina), e essas mutações também foram encontradas
cm de tamanho) são encontrados em apenas 5 a 10% dos pacientes. na hiperplasia macronodular bilateral sem outras características de
Os adenomas corticotróficos da hipófise ocorrem habitualmente de McCune-Albright (Quadro 5.1; ver também Cap. 29).
modo esporádico; entretanto, muito raramente, podem ser encon-
Manifestações clínicas
trados no contexto da neoplasia endócrina múltipla tipo 1 (NEM1)
(Cap. 23). Os glicocorticoides afetam quase todas as células do corpo, e, em conse-
quência, os sinais de excesso de cortisol têm impacto em múltiplos siste-
mas fisiológicos (Quadro 5.2), com suprarregulação da gliconeogênese,
da lipólise e do catabolismo das proteínas responsável pelas manifesta-
ções mais proeminentes. Além disso, a secreção excessiva de glicocor-
QUADRO 5.1 Causas da síndrome de Cushing ticoides supera a capacidade da 11b-HSD2 de inativar rapidamente o
Relação cortisol a cortisona no rim, exercendo, assim, ações mineralocorticoi-
Causas da síndrome de Cushing Mulher:homem % des, que se manifestam na forma de hipertensão diastólica, hipopotas-
Síndrome de Cushing dependente de 90 semia e edema. Os glicocorticoides em excesso também interferem nos
ACTH sistemas reguladores centrais, levando à supressão das gonadotrofinas,
Doença de Cushing (= adenoma hipofisário 4:1 75 com desenvolvimento subsequente de hipogonadismo e amenorreia, e
produtor de ACTH) supressão do eixo hipotálamo-hipófise-tireoide, resultando em dimi-
nuição da secreção de TSH (hormônio tireoestimulante).
Síndrome de ACTH ectópico 1:1 15
(devido à secreção de ACTH por tumores
Os sinais e sintomas clínicos observados na síndrome de Cushing
carcinoides brônquicos ou pancreáticos, são, em sua maioria, relativamente inespecíficos e consistem em ma-
câncer de pulmão de pequenas nifestações como obesidade, em sua maioria, relativamente inespe-
células, carcinoma medular da tireoide, cíficos e incluem condições como obesidade, diabetes, hipertensão
feocromocitoma e outros) diastólica, hirsutismo e depressão, que são comumente observados
Síndrome de Cushing independente de 4:1 10 em pacientes que não apresentam síndrome de Cushing. Por con-
ACTH seguinte, uma avaliação clínica cuidadosa constitui um importante
aspecto na avaliação dos casos suspeitos. Deve-se considerar o diag-
Adenoma adrenocortical 5‑10
nóstico de síndrome de Cushing quando são observadas várias ma-
Carcinoma adrenocortical 1% nifestações clínicas no mesmo paciente, particularmente quando são
Causas raras: DSRNPP, doença <1% encontradas manifestações mais específicas. Esses achados incluem
suprarrenal nodular pigmentada primária; fragilidade da pele, com equimoses fáceis e estrias cutâneas largas
HMAIA, hiperplasia suprarrenal maciça (> 1 cm) e violáceas (Fig. 5.8), e sinais de miopatia proximal, que se
independente de ACTH; síndrome de torna mais evidente quando o paciente tenta levantar de uma cadeira
McCune‑Albright
sem a ajuda das mãos, ou quando sobe escadas. As manifestações clí-
Nota: ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; HMAIA, hiperplasia macronodular independente de nicas da síndrome de Cushing não diferem significativamente entre
ACTH; DSRNPP, doença suprarrenal nodular pigmentada primária. as diferentes causas. Na síndrome de ACTH ectópico, pode-se obser-
82
tos de clivagem da POMC sobre a produção de pigmento pelos me-
QUADRO 5.2 Sinais e sintomas da síndrome de Cushing lanócitos. Além disso, os pacientes com síndrome de ACTH ectópico
Compartimento e alguns com carcinoma adrenocortical como causa de síndrome de
Cushing podem exibir um início mais vigoroso e progressão mais
Capítulo 5
corporal/sistema Sinais e sintomas
rápida dos sinais e sintomas clínicos.
Gordura corporal Aumento do peso corporal, obesidade central, face Os pacientes com síndrome de Cushing podem correr risco
redonda, coxim adiposo na área interescapular (“giba agudo de trombose venosa profunda, com embolia pulmonar sub-
de búfalo”) sequente, devido a um estado hipercoagulável associado à síndrome.
Pele Pletora facial, pele fina e quebradiça, equimoses A maioria dos pacientes também apresenta sintomas psiquiátricos,
fáceis, estrias largas e purpúricas, acne, hirsutismo em sua maior parte na forma de ansiedade ou depressão; todavia,
Osso Osteopenia, osteoporose (fraturas vertebrais), pode ocorrer também psicose paranoide ou depressiva aguda. Mes-
diminuição do crescimento linear em crianças mo depois da cura, o estado de saúde a longo prazo pode permanecer
83
ALGORITMO PARA AVALIAÇÃO DO PACIENTE COM SUSPEITA DE SÍNDROME DE CUSHING
e osteoporose)
Triagem/confirmação do diagnóstico
• Excreção de cortisol livre na urina de 24 h aumentada acima do normal (3x)
• Teste noturno de dexametasona (Cortisol plasmático > 50 nmol/L às 8-9 h
após a administração de 1 mg de dexametasona às 23 h)
• Cortisol plasmático (ou salivar) da meia-noite > 130 nmol/L
Se uma confirmação adicional for necessária/desejada:
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
• Teste de DEX em baixa dose (Cortisol plasmático > 50 nmol/L após 0,5 mg
de dexametasona a cada 6 h, durante 2 dias)
Negativo
Positivo
Figura 5.9 Avaliação do paciente com suspeita de síndrome de Cushing. CHR, hormônio de liberação da corticotrofina; DEX, dexametasona.
* N. de R.T.: Como há pouca disponibilidade de CRH no Brasil, alternativamente utiliza-se DDAVP (10 g IV). Os critérios laboratoriais para diagnóstico são os mesmos utili-
zados no teste do CRH.
nóstico de síndrome de Cushing. Além disso, os ensaios bioquímicos dente do ACTH, visto que os nódulos da hipófise ou das suprarrenais
empregados podem afetar os resultados dos testes, representando a constituem um achado comum na população geral. Nos pacientes
especificidade um problema comum com os ensaios baseados em an- com excesso independente de ACTH confirmado, indica-se um exa-
ticorpos para a medição do cortisol livre urinário. Esses ensaios foram me de imagem das suprarrenais (Fig. 5.10), de preferência com TC
muito aprimorados com a introdução da espectrometria de massa em sem contraste. Isso permite examinar a morfologia das suprarrenais e
tandem altamente específica. determinar a densidade do tumor em Unidades Hounsfield (UH), o
que ajuda a distinguir entre lesões suprarrenais benignas e malignas.
Diagnóstico diferencial No excesso de cortisol dependente de ACTH (Cap. 2), a RM
A avaliação dos pacientes com síndrome de Cushing confirmada deve da hipófise constitui o exame de escolha, embora possa não revelar
ser realizada por um endocrinologista e começa com o diagnóstico nenhuma anormalidade em até 40% dos casos, visto que os peque-
diferencial do excesso de cortisol dependente de ACTH e indepen- nos tumores estão abaixo da sensibilidade de detecção. Em geral, os
dente de ACTH (Fig. 5.9). Em geral, os níveis plasmáticos de ACTH adenomas corticotróficos hipofisários não apresentam realce após a
estão suprimidos nos casos de excesso de cortisol suprarrenal autôno- administração de gadolínio em imagens de RM ponderadas em T1.
mo, em consequência da retroalimentação negativa aumentada para Em todos os casos de síndrome de Cushing dependente de ACTH
o hipotálamo e a hipófise. Em contrapartida, os pacientes com sín- confirmada, são necessários testes adicionais para o diagnóstico di-
drome de Cushing dependente de ACTH apresentam níveis plasmá- ferencial da doença de Cushing hipofisária e da síndrome do ACTH
ticos normais ou aumentados de ACTH, com níveis muito elevados ectópico. Esses testes exploram o fato de que a maioria dos adenomas
observados em alguns pacientes com síndrome de ACTH ectópico. corticotróficos hipofisários ainda exibe características reguladoras,
É importante assinalar que o exame de imagem só deve ser realizado incluindo supressão residual do ACTH por glicocorticoides em altas
após estabelecer se o excesso de cortisol é dependente ou indepen- doses e responsividade ao CRH. Por outro lado, as fontes ectópicas de
84
Capítulo 5
Distúrbios do Córtex Suprarrenal
A C
B
B
C D
Figura 5.10 Imagem das suprarrenais na síndrome de Cushing. A. TC das ACTH na doença de Cushing. C. TC mostrando um adenoma adrenocortical direito
suprarrenais mostrando a morfologia bilateral normal das glândulas (setas). B. RM (seta) causando síndrome de Cushing. D. RM revelando hiperplasia macronodular
mostrando a hiperplasia suprarrenal bilateral, devido à estimulação excessiva do bilateral causando síndrome de Cushing.
importância assegurar um acompanhamento regular com exames teronismo primário, refletindo a produção excessiva de aldosterona
de imagem para identificação da fonte de ACTH ectópico. pela zona glomerulosa da suprarrenal. A hiperplasia micronodular
Os agentes orais de eficácia estabelecida na síndrome de bilateral é ligeiramente mais comum do que os adenomas suprar-
Cushing são a metirapona e o cetoconazol. A metirapona inibe renais unilaterais (Quadro 5.3). A hiperplasia suprarrenal bilateral
a síntese de cortisol em nível da 11b-hidroxilase (Fig. 5.1), en- é habitualmente micronodular, mas também pode conter nódulos
quanto o antimicótico cetoconazol inibe as etapas iniciais da es- maiores, que podem ser identificados incorretamente como ade-
teroidogênese. As doses iniciais típicas são de 500 mg, três vezes noma unilateral. Em raros casos, o hiperaldosteronismo primário é
ao dia, para a metirapona (dose máxima de 6 g) e de 200 mg, três causado por um carcinoma adrenocortical. Os carcinomas devem ser
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
vezes ao dia, para o cetoconazol (dose máxima de 1.200 mg). O considerados em pacientes mais jovens e naqueles com tumores mais
mitotano, um derivado do inseticida o,p’DDD, é um agente adre- volumosos, visto que os adenomas produtores de aldosterona medem
nolítico, que também é efetivo para reduzir o cortisol. Em virtude habitualmente < 1 cm de diâmetro.
de seu perfil de efeitos colaterais, o mitotano é mais comumente Uma causa rara de excesso de aldosterona é o aldosteronismo
usado no contexto do carcinoma adrenocortical; todavia, o trata- remediável por glicocorticoides (ARG), que é causado por um gene
mento com baixas doses (500 a 1.000 mg ao dia) também tem sido quimérico resultante do crossing-over de sequências do promotor
utilizado na síndrome de Cushing benigna. Nos casos graves de entre os genes CYP11B1 e CYP11B2 que estão envolvidos na síntese
excesso de cortisol, pode-se administrar etomidato para reduzir o de glicocorticoides e de mineralocorticoides, respectivamente (Fig.
cortisol. É administrado por infusão IV contínua em baixas doses 5.1). Esse rearranjo faz a CYP11B2 estar sob o controle da sinalização
não anestésicas. do receptor de ACTH; em consequência, a produção de aldosterona
Após a remoção bem-sucedida de um tumor produtor de é regulada pelo ACTH, mais do que pela renina. A história familiar
ACTH ou de cortisol, o eixo HHSR permanece suprimido. Por pode ser útil, uma vez que pode haver evidências de transmissão
conseguinte, a reposição com hidrocortisona precisa ser iniciada dominante de hipertensão. É importante reconhecer esse distúrbio,
no momento da cirurgia e reduzida lenta e gradualmente após a uma vez que ele pode estar associado à hipertensão de início precoce
recuperação, a fim de permitir uma adaptação fisiológica aos ní- e a acidentes vasculares encefálicos. Além disso, a supressão pelos
veis normais de cortisol. Dependendo do grau e da duração do glicocorticoides pode reduzir a produção de aldosterona.
excesso de cortisol, o eixo HHSR pode necessitar de muitos meses Outras causas raras de excesso de mineralocorticoides estão lis-
ou até mesmo anos para reassumir a sua função normal. tadas no Quadro 5.3. Uma causa importante consiste no excesso de
ligação e ativação do receptor de mineralocorticoides por um este-
roide diferente da aldosterona. O cortisol atua como potente mine-
■■ EXCESSO DE MINERALOCORTICOIDES ralocorticoide quando escapa da inativação eficiente a cortisona pela
11b-HSD2 no rim (Fig. 5.7). Isso pode ser causado por mutações
Epidemiologia inativadoras no gene HSD11B2, resultando na síndrome de exces-
Após a primeira descrição de um paciente com adenoma suprarre- so aparente de mineralocorticoides (EAM), que se manifesta com
nal produtor de aldosterona (síndrome de Conn), acreditou-se que o hipertensão hipopotassêmica grave na infância. Entretanto, muta-
excesso de mineralocorticoides pudesse representar uma causa rara ções mais leves podem causar hipertensão normopotassêmica que se
de hipertensão. Todavia, em estudos que procederam a uma triagem manifesta na vida adulta (EAM Tipo II). A inibição da 11b-HSD2
sistemática de todos os pacientes com hipertensão, foi reconhecida, pela ingestão excessiva de alcaçuz também resulta em hipertensão hi-
hoje, uma prevalência muito maior, que varia de 5 a 12%. A prevalên- popotassêmica, assim como a capacidade de conversão da 11b-HSD2
Nota: DOC, desoxicorticosterona; ENaC, canal de sódio epitelial; RG, receptor de glicocorticoides; RM, receptor de mineralocorticoide.
86
que é sobrepujada pelo excesso de cortisol na síndrome de Cushing. les que apresentam hipertensão associada a resistência a fármacos,
A desoxicorticosterona (DOC) também se liga ao receptor de mi- hipopotassemia, massa suprarrenal ou hipertensão antes dos 40 anos
neralocorticoides e o ativa, podendo causar hipertensão se as suas de idade (Fig. 5.11). O teste de triagem aceito consiste na medição
concentrações circulantes estiverem aumentadas. Isso pode surgir
Capítulo 5
concomitante da renina e da aldosterona no plasma, com cálculo
por meio da secreção autônoma de DOC por um carcinoma adreno- subsequente da razão aldosterona-renina (RAR) (Fig. 5.11); é preci-
cortical, mas também quando a DOC acumula-se em consequência so normalizar o nível sérico de potássio antes da realização do teste.
de um bloqueio enzimático suprarrenal, como aquele observado na A interrupção da medicação anti-hipertensiva pode ser complicada,
hiperplasia suprarrenal congênita devido à deficiência de CYP11B1 particularmente em pacientes com hipertensão grave. Por conse-
(11b-hidroxilase) ou CYP17A1 (17-hidroxilase) (Fig. 5.1). A proges- guinte, para fins práticos, no primeiro caso, o paciente pode manter
terona pode causar hipertensão hipopotassêmica em raros casos de a medicação anti-hipertensiva habitual, exceto que os antagonistas
indivíduos que apresentam uma mutação do receptor de mineralo- do receptor de mineralocorticoides precisam ser interrompidos pelo
corticoides que aumenta a ligação e a ativação pela progesterona; em menos 4 semanas antes da determinação da RAR. Os demais agen-
87
sucessivamente e quanto ao fato de a estimulação com ACTH melho-
QUADRO 5.4 Efeitos dos medicamentos anti‑hipertensivos rar o valor diagnóstico do CVSR.
sobre a razão aldosterona‑renina (RAR) Os pacientes com menos de 40 anos de idade com excesso de mi-
Efeito sobre Efeito sobre a Efeito final neralocorticoides confirmado e lesão unilateral podem ser tratados
SEÇÃO I
Fármaco a renina aldosterona sobre a RAR diretamente com cirurgia, que também está indicada para pacientes
com lateralização confirmada, documentada por um procedimento de
b‑Bloqueadores ↓ ↑ ↑ CVSR válido. A suprarrenalectomia laparoscópica constitui a aborda-
a1‑Bloqueadores → → → gem preferida. Os pacientes que não são candidatos à cirurgia ou aque-
a2‑Simpaticomiméticos → → → les que apresentam evidências de hiperplasia bilateral com base na TC
ou no CVSR devem receber tratamento clínico (Fig. 5.11). O tratamen-
Inibidores da ECA ↑ ↓ ↓ to clínico, que também pode ser considerado antes da cirurgia para
Bloqueadores de AT1R ↑ ↓ ↓ evitar o hipoaldosteronismo pós-cirúrgico, consiste principalmente no
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
Capítulo 5
Prevalência aproximada e mielopoma suprarrenal benigno aumenta com o diâmetro da
Benignas (%) massa suprarrenal. Entretanto, o tamanho por si só tem pouco va-
Adenoma adrenocortical lor preditivo, com sensibilidade de apenas 80% e especificidade de
60% para a diferenciação das massas benignas das malignas quan-
Endócrino inativo 60 a 85
do se utiliza um ponto de corte de 4 cm. A densidade do tumor na
Produtor de cortisol 5 a 10 TC sem contraste tem valor diagnóstico adicional, e os adenomas
Produtor de aldosterona 2a5 adrenocorticais são, em sua maioria, ricos em lipídios e, portan-
Feocromocitoma 5 a 10 to, apresentam baixos valores de atenuação [isto é, densidades de
< 10 Unidades Hounsfield (UH)]. Por outro lado, os carcinomas
Figura 5.12 Conduta no paciente com massa suprarrenal incidentalmente descoberta. Ac, acompanhamento.
em 25% dos casos pediátricos de CAC; a mutação TP53, R337H, é linfadenopatia e metástases. É necessário o uso de meio de contraste
observada em quase todos os casos de CAC pediátrico no Brasil. Ou- intravenoso para obter uma sensibilidade máxima para as metásta-
tras alterações genéticas identificadas no CAC incluem alterações na ses hepáticas. Pode ser difícil estabelecer uma origem suprarrenal na
via Wnt/-catenina no grupamento do fator de crescimento seme- TC axial convencional se os tumores forem volumosos e invasivos,
lhante à insulina 2 (IGF2); ocorre hiperexpressão do IGF2 em 90% porém as reconstruções de TC ou a RM fornecem mais informações
dos CAC. (Fig. 5.13) utilizando múltiplos planos e diferentes sequências. A
Os pacientes com grandes tumores suprarrenais com suspeita de invasão vascular e de órgãos adjacentes é diagnóstica de neoplasia
neoplasia maligna devem ser tratados por uma equipe de especialis- maligna. A tomografia por emissão de pósitrons com 18-fluoro2-de-
tas multidisciplinar, incluindo um endocrinologista, um oncologista, soxi-d-glicose (18-FDG PET) é altamente sensível para a detecção de
um cirurgião, um radiologista e um histopatologista. A AAF não está neoplasia maligna e pode ser usada para a identificação de pequenas
indicada para os casos de suspeita de CAC: em primeiro lugar, tanto
a citologia quanto a histopatologia de uma biópsia central não podem
diferenciar as massas suprarrenais primárias benignas das malignas;
em segundo lugar, a AAF viola a cápsula do tumor e pode até mesmo QUADRO 5.6 Sistemas de classificação para o estagiamento
causar metástases pelo canal da agulha. Mesmo quando se dispõe de do carcinoma adrenocortical
uma amostra de todo o tumor, a diferenciação histopatológica en- Estágio Estágio ENSAT Definições TNM
tre lesões benignas e malignas representa um desafio diagnóstico. A
classificação histopatológica mais comum é o escore de Weiss, que I T1, NO, MO T1, tumor ≤ 5 cm
leva em consideração o alto grau nuclear; a taxa de mitose (> 5/cam- NO, nenhum linfonodo positivo
po de grande aumento); mitoses atípicas; 25% de células claras; ar- MO, nenhuma metástase distante
quitetura difusa; e presença de necrose, invasão venosa e invasão das II T2, NO, MO T2, tumor > 5 cm
estruturas sinusoidais e da cápsula do tumor. A presença de três ou NO, nenhum linfonodo positivo
mais elementos sugere um CAC.
MO, nenhuma metástase distante
Apesar do achado bioquímico de que 60 a 70% dos CAC produ-
zem hormônios em excesso, essa característica não está clinicamente III T1‑T2, N1, MO N1, linfonodo(s) positivo(s)
aparente em muitos pacientes, devido à produção relativamente ine- T3‑T4, NO‑N1, MO MO, nenhuma metástase distante
ficiente de esteroides pelas células do câncer adrenocortical. É mais T3, infiltração do tumor no tecido
comum a produção excessiva de glicocorticoides e de precursores adjacente
dos androgênios suprarrenais. A produção mista e excessiva de vá- T4, invasão do tumor em órgãos
rias classes de corticosteroides por um tumor suprarrenal indica, em adjacentes ou trombo tumoral venoso
geral, neoplasia maligna. na veia cava ou na veia renal
O estagiamento do tumor por ocasião do diagnóstico (Quadro IV T1‑T4, NO‑N1, M1 M1, presença de metástases distantes
5.6) tem implicações prognósticas importantes e requer a avaliação
por imagem do tórax e abdome à procura de invasão local de órgãos, Nota: ENSAT, European Network for the Study of Adrenal Tumors.
90
Capítulo 5
C D
Figura 5.13 Imagens no carcinoma adrenocortical. RM com vistas A. frontal e B. lateral de um carcinoma adrenocortical esquerdo que foi detectado incidentalmente.
TC com vistas C. coronal e D. transversa mostrando um carcinoma adrenocortical do lado direito. Observe a borda irregular e a estrutura não homogênea. TC E. e PET-CT F.,
visualizando uma metástase peritoneal de um carcinoma adrenocortical em estreita proximidade com o rim esquerdo (seta).
metástases ou de recidiva local, que podem não ser evidentes na TC ma Berrutti); as metástases ósseas dolorosas respondem à irradiação.
(Fig. 5.13). Entretanto, a FDG PET não é específica e, portanto, não A taxa de sobrevida global no CAC continua sendo precária, com
pode ser usada para diferenciar as lesões suprarrenais benignas das taxas de sobrevida de 5 anos de 30 a 40%.
malignas. As metástases no CAC ocorrem mais frequentemente para
o fígado e o pulmão.
■■ INSUFICIÊNCIA SUPRARRENAL
O CAC tem prognóstico sombrio, e a cura só pode ser obtida
após remoção cirúrgica completa. A violação da cápsula durante a ci- Epidemiologia
rurgia primária, a presença de metástases por ocasião do diagnóstico A prevalência de insuficiência suprarrenal permanente bem docu-
e o tratamento primário em um centro não especializado constituem mentada é de 5 em 10.000 indivíduos na população geral. A origem
os principais determinantes da baixa sobrevida. Se o tumor primário hipotalâmico-hipofisária da doença é mais frequente, com prevalên-
invadir órgãos adjacentes, deve-se considerar a remoção em bloco cia de 3 em 10.000, enquanto a insuficiência suprarrenal primária
do rim e do baço para reduzir o risco de recidiva. A cirurgia também tem uma prevalência de 2 em 10.000. Cerca de 50% destes últimos
pode ser considerada em um paciente com metástases se houver um casos são adquiridos, em sua maior parte causados pela destruição
excesso pronunciado de hormônios relacionados ao tumor. Essa in- autoimune das glândulas suprarrenais; os outros 50% são genéticos,
dicação precisa ser cuidadosamente ponderada em relação ao risco causados mais comumente por bloqueios enzimáticos distintos na
cirúrgico, incluindo complicações tromboembólicas, e a consequente esteroidogênese suprarrenal, que afetam a síntese dos glicocorticoi-
demora na introdução de outras opções terapêuticas. Os pacientes des (isto é, hiperplasia suprarrenal congênita).
com CAC confirmado e remoção bem-sucedida do tumor primário A insuficiência suprarrenal que se origina da supressão do eixo
devem receber tratamento coadjuvante com mitotano (o,p’DDD), HHSR em consequência do tratamento com glicocorticoides exóge-
particularmente em pacientes com alto risco de recidiva, com base nos é muito mais comum, ocorrendo em 0,5 a 2% da população nos
no tamanho do tumor de > 8 cm, sinais histopatológicos de invasão países desenvolvidos.
vascular, invasão ou violação da cápsula e índice de proliferação Ki67
≥ 10%. O mitotano é habitualmente iniciado em uma dose de 500 Etiologia
mg, quatro vezes ao dia, com aumento das doses em 1.000 mg/dia A insuficiência suprarrenal primária é mais comumente causada
a cada 1 a 2 semanas, conforme tolerado. A dose tolerada máxima é por adrenalite autoimune. A adrenalite autoimune isolada respon-
habitualmente de 8 a 10 g/m2 por dia. O mitotano como tratamento de por 30 a 40% dos casos, enquanto 60 a 70% desenvolvem in-
adjuvante deve ser continuado durante pelo menos 2 anos, se o pa- suficiência suprarrenal como parte das síndromes poliglandulares
ciente conseguir tolerar os efeitos colaterais. A monitoração regular autoimunes (SPA) (Cap. 23) (Quadro 5.7). A SPA1, também de-
dos níveis plasmáticos de mitotano é obrigatória (faixa terapêutica de nominada PEACDE (poliendocrinopatia autoimune-candidíase-
14 a 20 mg/L; complicações neurotóxicas mais frequentes com > 20 -distrofia ectodérmica), constitui a causa subjacente em 10% dos
mg/L), assim como a reposição concomitante de hidrocortisona. Esta pacientes portadores de SPA. A SPA1 é transmitida de modo au-
última deve ser administrada em doses mais altas do que aquelas ha- tossômico recessivo é causada por mutações no gene regulador au-
bitualmente administradas na insuficiência suprarrenal (por exem- toimune AIRE. As condições autoimunes associadas superpõem-se
plo, 20 mg 3x/dia), visto que o mitotano aumenta a inativação dos àquelas observadas na SPA2, mas também podem incluir alopecia
glicocorticoides, devido à indução da atividade da CYP3A4 hepáti- total, hipoparatireoidismo primário e, em raros casos, linfoma.
ca. O mitotano também aumenta a globulina de ligação do cortisol Os pacientes com SPA1 invariavelmente desenvolvem candidíase
circulante, diminuindo, assim, a fração disponível do cortisol livre. mucocutânea crônica, habitualmente manifesta na infância e que
As metástases isoladas podem ser tratadas cirurgicamente ou com precede a insuficiência suprarrenal em vários anos ou décadas. A
ablação por radiofrequência, quando apropriado. Se o tumor sofrer SPA2 muito mais prevalente é de herança poligênica, com associa-
recidiva ou progredir durante o tratamento com mitotano, deve-se ções confirmadas à região do gene HLA-DR3 no complexo princi-
considerar a quimioterapia (p. ex., cisplatina, etoposídeo, doxorrubi- pal de histocompatibilidade e regiões de genes distintas envolvi-
cina mais mitotano continuado, constituindo o denominado esque- das na regulação imune (CTLA-4, PTPN22, CLEC16A). A doença
91
QUADRO 5.7 Causas de insuficiência suprarrenal primária
Diagnóstico Gene Características associadas
Síndrome poliglandular autoimune 1 (SPA1) AIRE Hipoparatireoidismo, candidíase mucocutânea crônica, outros distúrbios
SEÇÃO I
Hiperplasia suprarrenal congênita lipoide StAR, CYP11A1 DDS, 46,XY, insuficiência gonadal (ver também Cap. 7)
(HSRLC)
Hipoplasia congênita suprarrenal (HCSR) NROB1 (DAX‑1), NR5A1 DDS, 46,XY, insuficiência gonadal (ver também Cap. 7)
(SF‑1)
Adrenoleucodistrofia (ALD), X‑ALD Desmielinização do sistema nervoso central (ALD) ou da medula espinal e
adrenomieloneuropatia (AMN) nervos periféricos (AMN)
Deficiência de glicocorticoides familiar Síndromes de insensibilidade ao ACTH devido a mutações no receptor de ACTH
MC2R e sua proteína acessória MRAP, estatura alta
– FGD1 MC2R Alacrimia, acalasia, comprometimento neurológico
– FGD2 MRAP
– FGD3 ?
Síndrome do triplo A AAAS
Síndrome de Smith‑Lemli‑Opitz SLOS Distúrbio na síntese de colesterol associado a deficiência mental,
malformações craniofaciais, retardo do crescimento
Síndrome de Kearns‑Sayre Deleções do DNA Oftalmoplegia externa progressiva, degeneração retiniana pigmentar, defeitos
mitocondrial de condução cardíaca, insuficiência gonadal, hipoparatireoidismo, diabetes tipo
1
Síndrome de IMAGe ? Retardo do crescimento intrauterino, displasia metafisária, anomalias genitais
Infecções suprarrenais Tuberculose, HIV, CMV, criptococose, histoplasmose, coccidioidomicose
Infiltração suprarrenal Metástases, linfomas, sarcoidose, amiloidose, hemocromatose
Hemorragia suprarrenal Sepse meningocócica (síndrome de Waterhouse‑Friderichsen), síndrome do
anticorpo antifosfolipídio primário
Induzida por fármacos Mitotano, aminoglutetimida, arbiraterona, trilostano, etomidato, cetoconazol,
suramina, RU486
Adrenalectomia bilateral Por exemplo, no tratamento da síndrome de Cushing ou após nefrectomia
bilateral
autoimune coincidente consiste mais frequentemente em doença desenvolvimento. As metástases suprarrenais raramente provocam
autoimune da tireoide, vitiligo e insuficiência ovariana prematura. insuficiência suprarrenal, e isso só ocorre nos casos de metástases
Com menos frequência, outras características podem incluir dia- volumosas e bilaterais.
betes tipo 1 e anemia perniciosa causada pela deficiência de vita- As causas inatas de insuficiência suprarrenal primária, com
mina B12. exceção da hiperplasia suprarrenal congênita, são raras, sendo res-
A adrenoleucodistrofia ligada ao X tem uma incidência de ponsáveis por menos de 1% dos casos. Todavia, a sua elucidação
1:20.000 indivíduos do sexo masculino e é causada por mutações no proporciona conhecimentos importantes sobre o desenvolvimento
gene X-ALD, que codifica a proteína transportadora de membrana e a fisiologia das glândulas suprarrenais. As mutações que causam
peroxissomal ABCD1; a sua ruptura leva ao acúmulo de ácidos gra- insuficiência suprarrenal primária (Quadro 5.7) incluem fatores
xos de cadeia muito longa (>24 átomos de carbono). Cerca de 50% que regulam o desenvolvimento e a esteroidogênese das suprar-
dos casos manifestam-se no início da infância com doença da subs- renais (DAX-1, SF-1), síntese, importação e clivagem do colesterol
tância branca rapidamente progressiva (ALD cerebral); 35% manifes- (DHCR7, StAR, CYP11A1) e elementos da via de resposta do ACTH
tam-se durante a adolescência ou no início da vida adulta com carac- suprarrenal (MC2R, MRAP) (Fig. 5.5).
terísticas neurológicas que indicam comprometimento da mielina e A insuficiência suprarrenal secundária representa a conse-
do sistema nervoso periférico (adrenomieloneuropatia, AMN). Nos quência de uma disfunção do componente hipotalâmico-hipofisário
15% remanescentes, a insuficiência suprarrenal constitui a única ma- do eixo HHSR (Quadro 5.8). Com a exceção da supressão iatrogê-
nifestação da doença. É interessante assinalar que mutações distintas nica, a grande maioria dos casos é produzida por tumores hipofisá-
manifestam-se com penetrância variável dentro das famílias afetadas. rios ou hipotalâmicos ou seu tratamento por cirurgia ou irradiação
As causas mais raras de insuficiência suprarrenal envolvem a (Cap. 2). As causas mais raras incluem apoplexia hipofisária, como
destruição das glândulas suprarrenais em consequência de infec- consequência de infarto de adenoma hipofisário ou redução transi-
ção, hemorragia ou infiltração (Quadro 5.7); a adrenalite tubercu- tória do suprimento sanguíneo da hipófise durante uma cirurgia ou
losa continua sendo uma causa frequente de doença nos países em após rápida perda de sangue associada ao parto, também denomina-
92
da síndrome de Sheehan. A deficiência de ACTH isolada é raramente maior atrito ou estresse de cisalhamento e é aumentada pela exposi-
causada por doença autoimune ou por infiltração da hipófise (Qua- ção à luz solar (Fig. 5.14). Em contrapartida, na insuficiência suprar-
dro 5.8). As mutações no precursor do ACTH, a POMC, ou em fa- renal secundária, a pele exibe uma palidez semelhante ao alabastro,
tores que regulam o desenvolvimento da hipófise constituem causas devido à falta de secreção de ACTH.
Capítulo 5
genéticas da deficiência de ACTH (Quadro 5.8). A hiponatremia constitui um achado bioquímico característico
na insuficiência suprarrenal primária e é encontrada em 80% dos
Manifestações clínicas pacientes na apresentação. Verifica-se a presença de hiperpotas-
Em princípio, as manifestações clínicas da insuficiência suprarrenal semia em 40% dos pacientes por ocasião do diagnóstico inicial. A
primária caracterizam-se pela perda da secreção tanto dos glico- hiponatremia é principalmente causada pela deficiência de minera-
corticoides quanto dos mineralocorticoides (Quadro 5.9). Na insu- locorticoides, mas também pode ocorrer na insuficiência suprarre-
ficiência suprarrenal secundária, ocorre apenas deficiência de gli- nal secundária, devido à inibição diminuída do ADH pelo cortisol,
cocorticoides, visto que a própria glândula suprarrenal está intacta resultando em síndrome leve de secreção inapropriada de hormônio
Nota: ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; GH, hormônio do crescimento; LH/FSH, hormônio luteinizante/folículo-estimulante; PRL, prolactina; TSH, hormônio tireoestimulante.
93
Uma vez confirmada a insuficiência suprarrenal, a próxima eta-
QUADRO 5.9 Sinais e sintomas de insuficiência suprarrenal pa consiste na determinação do ACTH plasmático, cujos níveis au-
mentados ou inapropriadamente baixos definem a origem primária
Sinais e sintomas causados por deficiência de glicocorticoides
e secundária da doença, respectivamente (Fig. 5.15). Na insuficiên-
SEÇÃO I
Fadiga, falta de energia cia suprarrenal primária, o aumento dos níveis plasmáticos de reni-
Perda de peso, anorexia na irá confirmar a presença de deficiência de mineralocorticoides.
Na apresentação inicial, os pacientes com insuficiência suprarrenal
Mialgia, dor articular
primária devem ser submetidos a triagem para autoanticorpos es-
Febre teroides como marcadores de adrenalite autoimune. Se esses testes
Anemia, linfocitose, eosinofilia forem negativos, indica-se uma TC das glândulas suprarrenais para
Nível de TSH ligeiramente elevado (devido à perda de inibição da liberação investigar a possível presença de hemorragia, infiltração ou massas.
de TSH por retroalimentação) Em pacientes do sexo masculino com autoanticorpos plasmáticos
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
Hipoglicemia (mais frequente em crianças) negativos, os ácidos graxos de cadeia muito longa devem ser deter-
Pressão arterial baixa, hipotensão postural minados para excluir a possibilidade de X-ALD. Os pacientes com
nível de ACTH inapropriadamente baixo, na presença de deficiên-
Hiponatremia (devido à perda de inibição da liberação de AVP por
retroalimentação)
cia de cortisol confirmada, devem efetuar um exame de imagem
do hipotálamo e hipófise por RM. As manifestações sugestivas de
Sinais e sintomas causados por deficiência de mineralocorticoides apoplexia hipofisária prévia, como cefaleia intensa de início súbito,
(apenas ISR primária) ou uma história pregressa de traumatismo cranioencefálico devem
Dor abdominal, náusea, vômitos ser cuidadosamente investigadas, particularmente em pacientes sem
lesão óbvia na RM.
Tontura, hipotensão postural
Pressão arterial baixa, hipotensão postural
Aumento da creatinina sérica (devido à depleção de volume)
Hiponatremia TRATAMENTO Insuficiência suprarrenal aguda
Hiperpotassemia
A insuficiência suprarrenal aguda exige uma reidratação imedia-
Sinais e sintomas causados por deficiência de androgênios ta, habitualmente com infusão de soro fisiológico em uma velo-
suprarrenais cidade inicial de 1L/h, com monitoração cardíaca contínua. A
Falta de energia reposição de glicocorticoides deve ser iniciada com uma injeção
Pele seca e pruriginosa (em mulheres) intravenosa de 100 mg de hidrocortisona, seguida da administra-
ção de 100 a 200 mg de hidrocortisona durante 24 h, na forma de
Perda da libido (em mulheres)
infusão contínua ou através de várias injeções IV ou IM. A reposi-
Perda dos pelos axilares e púbicos (em mulheres) ção de mineralocorticoides pode ser iniciada após reduzir a dose
Outros sinais e sintomas diária de hidrocortisona para < 50 mg, visto que a hidrocortisona,
em doses mais altas, fornece uma estimulação suficiente dos re-
Hiperpigmentação (apenas ISR primária) (devido ao excesso de peptídios
ceptores de mineralocorticoides.
derivados da proopiomelanocortina [POMC])
A reposição de glicocorticoides para o tratamento da in-
Pele pálida cor de alabastro (apenas ISR secundária) (devido à deficiência suficiência suprarrenal crônica deve ser administrada em uma
de peptídios derivados da POMC)
dose capaz de substituir a produção diária fisiológica de cortisol,
o que é habitualmente obtido pela administração oral de 15 a
25 mg de hidrocortisona, em duas a três doses fracionadas. A
gravidez pode exigir um aumento de 50% na dose de hidrocor-
excelente valor diagnóstico preditivo (Fig. 5.15). O ponto de corte tisona durante o último trimestre. Em todos os pacientes, pelo
para a insuficiência é habitualmente definido com níveis de cortisol menos metade da dose diária deve ser administrada pela manhã.
de < 500 a 550 nmol/L (18 a 20 mg/dL) determinados em amostras As preparações de glicocorticoides atualmente disponíveis não
obtidas 30 a 60 minutos após estimulação com ACTH; o ponto de imitam o ritmo de secreção fisiológico do cortisol (Fig. 5.3). Os
corte exato depende do ensaio disponível no local. Durante a fase glicocorticoides de ação longa, como a prednisolona ou a dexa-
inicial de ruptura do eixo HHSR (por exemplo, dentro de 4 semanas metasona, não são preferidos, visto que resultam em exposição
de insuficiência hipofisária), os pacientes podem ainda responder à aumentada aos glicocorticoides, devido à extensa ativação dos
estimulação com ACTH exógeno. Nessa circunstância, o teste de to- receptores de glicocorticoides em períodos de secreção fisiolo-
lerância à insulina constitui uma escolha alternativa, porém é mais gicamente baixa de cortisol. Não existe nenhuma equivalência
invasivo e só deve ser efetuado com supervisão de um especialista de doses bem estabelecida; entretanto, como orientação, pode-
(ver anteriormente). A indução de hipoglicemia está contraindica- -se admitir uma equipotência para 1 mg de hidrocortisona, 1,6
da para indivíduos com diabetes melito, doença cardiovascular ou mg de acetato de cortisona, 0,2 mg de prednisolona, 0,25 mg de
história de crises convulsivas. As medições aleatórias do nível sérico prednisona e 0,025 de dexametasona.
de cortisol têm valor diagnóstico limitado, visto que os níveis basais A monitoração da reposição de glicocorticoides baseia-se
podem estar coincidentalmente baixos, devido ao ritmo diurno fisio- principalmente na história e no exame à procura de sinais e sinto-
lógico da secreção de cortisol (Fig. 5.3). De forma semelhante, mui- mas sugestivos de reposição excessiva ou insuficiente de glicocor-
tos pacientes com insuficiência suprarrenal secundária apresentam ticoides, incluindo medida do peso corporal e da pressão arterial.
níveis basais de cortisol relativamente normais, porém são incapazes O nível plasmático de ACTH, o cortisol livre na urina de 24 horas
de ter uma resposta apropriada do cortisol ao ACTH, que só pode ou as curvas diárias do cortisol sérico refletem se a hidrocorti-
ser revelada por meio de um teste de estímulo. É importante ressaltar sona foi ou não administrada, porém não fornecem informações
que os testes realizados para estabelecer o diagnóstico de insuficiên- confiáveis acerca da qualidade da reposição. Em pacientes com
cia suprarrenal nunca devem retardar o tratamento. Por conseguinte, insuficiência suprarrenal isolada, a monitoração deve incluir uma
em um paciente com suspeita de crise suprarrenal, é razoável obter os triagem para doença autoimune da tireoide, e as pacientes devem
níveis basais de cortisol, instituir uma terapia de reposição e adiar os ser alertadas quanto à possibilidade de insuficiência ovariana
testes de estímulo formais para uma data posterior.
94
Capítulo 5
Distúrbios do Córtex Suprarrenal
A B
C D
Figura 5.14 Manifestações clínicas da doença de Addison. Observe a hiperpigmentação em áreas de maior atrito, incluindo (A) linhas palmares, (B) parte dorsal do
pé, (C) mamilos e região axilar, e (D) hiperpigmentação irregular da mucosa oral.
prematura. O tratamento com glicocorticoides em níveis suprafi- para detectar uma queda postural indicando a presença de hipo-
siológicos, com doses equivalentes a 30 mg ou mais de hidrocor- volemia. Além disso, os níveis séricos de sódio e potássio e o nível
tisona, irá afetar o metabolismo ósseo, de modo que esses pacien- plasmático de renina devem ser medidos a intervalos regulares.
tes devem ser submetidos a uma avaliação regular da densidade Os níveis de renina devem ser mantidos na faixa de referência
mineral óssea. Todos os pacientes com insuficiência suprarrenal normal superior. As mudanças nas doses de glicocorticoides tam-
precisam ser instruídos sobre a necessidade de ajustes nas doses bém podem ter impacto na reposição de mineralocorticoides,
de glicocorticoides relacionados ao estresse. Em geral, esses ajus- visto que o cortisol liga-se também ao receptor de mineralocor-
tes consistem em duplicar a dose oral de rotina de glicocorticoides ticoides; 40 mg de hidrocortisona equivalem a 100 g de fludro-
em caso de doença intercorrente com febre e repouso ao leito e cortisona. Em pacientes que residem ou que viajam para áreas
necessidade de injeção IV de hidrocortisona, em uma dose diária de clima quente ou tropical, a dose de fludrocortisona deve ser
de 100 mg, em casos de vômitos prolongados, cirurgia ou trau- aumentada em 50-100 g durante o verão. Além disso, pode ser
matismo. Os pacientes que residem ou que viajam para regiões necessário ajustar a dose de mineralocorticoides durante a gravi-
com acesso demorado à assistência de saúde aguda devem dispor dez, devido à atividade antimineralocorticoide da progesterona,
de um kit de emergência de autoinjeção de hidrocortisona, além porém esse ajuste é menos frequentemente necessário do que o
de seus cartões e pulseiras habituais de emergência de esteroides. ajuste na dose de hidrocortisona. A renina plasmática não pode
A reposição de mineralocorticoides na insuficiência suprar- servir como instrumento de monitoração durante a gravidez, de-
renal primária deve ser iniciada em uma dose de 100 a 150 g vido à sua elevação fisiológica durante a gestação.
de fludrocortisona. A suficiência do tratamento pode ser avaliada A reposição de androgênios suprarrenais constitui uma op-
pela aferição da pressão arterial, na posição sentada e ortostática, ção em pacientes com falta de energia, apesar da reposição otimi-
95
ALGORITMO PARA A CONDUTA NO PACIENTE COM SUSPEITA DE INSUFICIÊNCIA SUPRARRENAL
hiperpigmentação, hiponatremia)
Triagem/confirmação do diagnóstico
• Cortisol plasmático, 30 a 60 min após a administração IM ou
IV de 250 g de cosintropina (Cortisol pós-cosintropina < 500 nmol/L)
• Hemograma completo, sódio sérico, potássio, creatinina, ureia, TSH
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
Diagnóstico diferencial
ACTH plasmático, renina plasmática, aldosterona sérica
Reposição de
Reposição de glicocorticoides
glicocorticoides + mineralocorticoides
Positivos Negativos
• Infecção suprarrenal
• Adrenalite autoimune
(tuberculose)
como diagnóstico mais
• Infiltração
provável
(por exemplo, linfoma)
• Nos homens, considerar
• Hemorragia
a adrenoleucodistrofia
• Hiperplasia suprarrenal
(AGCML↑)
congênita (17OHP↑)
Figura 5.15 Conduta no paciente com suspeita de insuficiência suprarrenal. ARP, atividade plasmática de renina.
96
QUADRO 5.10 Variantes da hiperplasia suprarrenal congênita
Marcadores esteroides diagnósticos no soro
Capítulo 5
Variante Gene Impacto sobre a síntese de esteroides (e na urina)
Deficiência de 21‑hidroxilase CYP21A2 Deficiência de glicocorticoides, deficiência de 17‑Hidroxiprogesterona, 21‑desoxicortisol
(21OHD) mineralocorticoides, excesso de androgênios (pregnanetriol, 17‑hidroxipregnanolona,
suprarrenais pregnanetriolona)
Deficiência de 11b‑hidroxilase CYP11B1 Deficiência de glicocorticoides, excesso de 11‑Desoxicortisol, 11‑desoxicorticosterona
(11OHD) mineralocorticoides, excesso de androgênios (tetraidro‑11‑desoxicortisol,
suprarrenais tetraidro‑11‑desoxicorticosterona)
Deficiência de 17a‑hidroxilase CYP17A1 (Deficiência de glicocorticoides), excesso de 11‑Desoxicorticosterona, corticosterona,
97
SEÇÃO I
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
A B
C D
Figura 5.16 Exame de imagem na hiperplasia suprarrenal congênita precário da doença de longa duração. RM com imagens ponderadas em T1 C e em
(HSRC). TC das suprarrenais, mostrando a presença de hiperplasia bilateral homo- T2 D, mostrando tumores de restos suprarrenais testiculares (setas) em um pacien-
gênea em um paciente jovem com HSRC clássica A e hiperplasia bilateral macro- te jovem com hiperplasia suprarrenal congênita perdedora de sal. (Cortesia de N.
nodular B em um paciente de meia-idade portador de HSRC clássica com controle Reisch.)
98
CAPÍTULO 6 cicos extrassuprarrenais. O termo paraganglioma é usado para descrever
tumores produtores de catecolaminas de cabeça e pescoço. Esses tumo-
Capítulo 6
res podem secretar poucas catecolaminas ou nenhuma.
A etiologia dos feocromocitomas e dos paragangliomas esporádi-
Feocromocitoma cos permanece desconhecida. Entretanto, cerca de 25% dos pacientes
apresentam uma condição hereditária, incluindo mutações de linha-
Hartmut P. H. Neumann gem germinativa nos genes RET, VHL, NF1, SDHB, SDHC, SDHD
ou SDHAF2. A inativação de genes bialélicos foi demonstrada para
os genes VHL, NF1 e SDH, enquanto as mutações de RET ativam a
Os feocromocitomas e os paragangliomas são tumores do sistema
atividade de um receptor tirosinoquinase. A SDH é uma enzima do
nervoso simpático ou parassimpático que produzem catecolaminas.
ciclo de Krebs e da cadeia respiratória mitocondrial. A proteína VHL
Feocromocitoma
Esses tumores podem surgir, esporadicamente ou por herança, como
é um componente de uma ubiquitina E3 ligase. As mutações de VHL
elementos da neoplasia endócrina múltipla tipo 2 ou de várias ou-
reduzem a degradação proteica, resultando em suprarregulação dos
tras síndromes associadas aos feocromocitomas. O diagnóstico de
feocromocitomas proporciona uma causa potencialmente corrigível componentes envolvidos na progressão do ciclo celular, no metabo-
de hipertensão e sua remoção pode prevenir crises hipertensivas que lismo da glicose e na percepção do oxigênio.
podem ser letais. A manifestação clínica é variável, oscilando de um
■■ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
incidentaloma suprarrenal a um paciente em crise hipertensiva com
complicações cerebrovasculares ou cardíacas associadas. A apresentação clínica é tão variável que o feocromocitoma foi de-
nominado “o grande mascarado” (Quadro 6.1). Entre os sintomas de
■■ EPIDEMIOLOGIA apresentação, os episódios de palpitações, cefaleias e sudorese profu-
Estima-se que o feocromocitoma ocorra em 2 a 8 pessoas por milhão sa são típicos e constituem uma tríade clássica. A presença de todos
por ano, com cerca de 0,1% dos pacientes hipertensos possuindo um os três sintomas em associação com hipertensão torna o feocromo-
feocromocitoma. As séries de necropsia revelam uma prevalência de citoma um possível diagnóstico. Todavia, um feocromocitoma pode
0,2%. A média etária ao ser feito o diagnóstico é de aproximadamen- permanecer assintomático durante vários anos, e alguns tumores
te 40 anos, embora o tumor possa ocorrer desde o início da segunda crescem até alcançar dimensões consideráveis antes que os pacientes
infância até as fases mais avançadas da vida. A “regra dos dez” para percebam quaisquer sintomas.
os feocromocitomas estabelece que aproximadamente 10% são bila- O sinal dominante é a hipertensão. Classicamente, os pacientes
terais, 10% são extrassuprarrenais e 10% são malignos. No entanto, sofrem de hipertensão episódica, porém a hipertensão sustentada
esses percentuais são mais altos nas síndromes hereditárias. também é comum. As crises induzidas pelas catecolaminas podem
resultar em insuficiência cardíaca, edema pulmonar, arritmias e he-
■■ ETIOLOGIA E PATOGÊNESE morragia intracraniana. Durante os episódios de liberação hormo-
Os feocromocitomas e os paragangliomas são tumores bem vascula- nal, que podem ocorrer a intervalos muito divergentes, os pacientes
rizados que se originam de células derivadas dos paragânglios sim- ficam ansiosos e pálidos e experimentam taquicardia e palpitações.
páticos (por exemplo, medula suprarrenal) ou parassimpáticos (por Em geral, esses paroxismos duram menos de 1 hora e podem ser
exemplo, glomo carótico, glomo vagal) (Fig. 6.1). O termo feocro- precipitados por cirurgia, mudanças de posição, exercício, gravidez,
mocitoma reflete a coloração escura causada pela oxidação cromafim micção (particularmente os feocromocitomas vesicais) e várias medi-
das catecolaminas. cações (p. ex., antidepressivos tricíclicos, opiáceos, metoclopramida).
Embora se tenha utilizado uma variedade de termos para descrever
esses tumores, a maioria dos médicos emprega o termo feocromocitoma ■■ DIAGNÓSTICO
para designar tumores simpáticos produtores de catecolaminas, incluin- O diagnóstico baseia-se na documentação do excesso de catecolami-
do aqueles que se encontram em locais retroperitoneais, pélvicos e torá- nas por exames bioquímicos e na localização do tumor por exames
N. vago N. timpânico
P. jugular
Gânglio
jugular V. jugular P. intravagal
Gânglio
nodoso
N. glossofaríngeo
N. laríngeo
recorrente P. subclávio
P. aórticopulmonar P. pulmonar
P. coronariano
Aorta descendente
Figura 6.1 O sistema paraganglionar e os locais topográficos (em verme- Science, 1996; Parte C, de GG Glenner, PM Grimley, Tumors of the Extra-adrenal Pa-
lho) dos feocromocitomas e paragangliomas. (Partes A, B, de WM Manger, raganglion System [including chemoreceptors], Atlas of Tumor Pathology, 2d Series,
RW Gifford: Clinical and experimental pheochromocytoma. Cambridge, Blackwell Fascicle 9. Washington, DC, AFIP, 1974.)
99
QUADRO 6.1 Características clínicas associadas ao QUADRO 6.2 Métodos bioquímicos e de imagem usados para o
feocromocitoma diagnóstico de feocromocitoma e paraganglioma
Cefaleias Perda de peso Método diagnóstico Sensibilidade Especificidade
SEÇÃO I
100
após o início dos bloqueadores alfa e aumentados, quando neces- ■■ FEOCROMOCITOMA NA GESTAÇÃO
sário se a taquicardia persistir. Outros anti-hipertensivos, como Em certas ocasiões, os feocromocitomas são diagnosticados durante
os bloqueadores dos canais de cálcio ou os inibidores da enzima a gestação. A remoção endoscópica, de preferência entre o quarto e
Capítulo 6
conversora de angiotensina, foram usados quando há dificuldade o sexto mês de gestação, é possível e pode ser acompanhada de parto
de controlar a pressão arterial apenas com fenoxibenzamina. sem incidentes. A triagem regular nas famílias com feocromocitomas
A cirurgia deve ser executada por equipes de anestesiologistas e hereditários proporciona a oportunidade de identificar e remover tu-
cirurgiões com experiência no tratamento dos feocromocitomas. A mores assintomáticos em mulheres em idade reprodutiva.
pressão arterial pode ser lábil durante a cirurgia, particularmente no
início da intubação, ou quando o tumor está sendo manipulado. A ■■ SÍNDROMES ASSOCIADAS AO FEOCROMOCITOMA
infusão de nitroprussiato de sódio é útil para as crises hipertensivas Cerca de 25 a 33% dos pacientes com feocromocitoma ou paragan-
intraoperatórias, e a hipotensão responde habitualmente à infusão glioma apresentam uma síndrome herdada. A idade média por oca-
de volume. Embora a laparotomia tenha sido a abordagem cirúrgi- sião do diagnóstico é cerca de 15 anos a menos nos pacientes com
Feocromocitoma
ca tradicional, a cirurgia endoscópica, que utiliza uma abordagem síndromes hereditárias, em comparação com pacientes portadores de
transperitoneal ou retroperitoneal, está associada a menos complica- tumores esporádicos.
ções, a uma recuperação mais rápida e a resultados estéticos ótimos. A neurofibromatose tipo 1 (NF-1) foi a primeira síndrome des-
A cirurgia endoscópica atraumática tornou-se o método de escolha. crita associada ao feocromocitoma. O gene NF-1 funciona como su-
Pode ser possível preservar o córtex suprarrenal normal, particu- pressor tumoral por meio da regulação da cascata de sinalização Ras.
larmente nos distúrbios hereditários nos quais os feocromocitomas As características clássicas da neurofibromatose incluem neurofibro-
bilaterais são mais prováveis. Os feocromocitomas abdominais ex- mas múltiplos, manchas de café-com-leite, sardas na pele da região
trassuprarrenais, bem como a maioria dos feocromocitomas toráci- axilar e nódulos de Lisch da íris (Fig. 6.2). Os feocromocitomas são
cos, também podem ser removidos por métodos endoscópicos. No observados em apenas cerca de 1% desses pacientes e localizam-se
pós-operatório, deve-se documentar a normalização dos níveis de predominantemente nas suprarrenais. O feocromocitoma maligno
catecolaminas. Deve-se efetuar um teste do hormônio adrenocorti- não é incomum.
cotrófico para excluir a deficiência de cortisol quando se realiza uma A síndrome associada ao feocromocitoma melhor estabelecida
cirurgia com preservação bilateral do córtex suprarrenal. é o distúrbio autossômico dominante conhecido como neoplasia en-
dócrina múltipla tipo 2A e tipo 2B (NEM 2A, NEM 2B) (Cap. 23).
Ambos os tipos de NEM 2 são causados por mutações no RET (RE-
■■ FEOCROMOCITOMA MALIGNO arranjado durante a Transfecção), que codifica uma tirosinoquinase.
Cerca de 5 a 10% dos feocromocitomas e dos paragangliomas são A localização das mutações RET correlaciona-se com a gravidade da
malignos. O diagnóstico de feocromocitoma maligno é problemáti- doença e o tipo de NEM 2 (Cap. 23). A NEM 2A caracteriza-se por
co. Os critérios histológicos típicos de atipia celular, a presença de carcinoma medular da tireoide (CMT), feocromocitoma e hiperpa-
mitoses e a invasão dos vasos ou dos tecidos adjacentes não identi- ratireoidismo; a NEM 2B também inclui CMT e feocromocitoma,
ficam de modo confiável quais são os tumores que possuem a capa- bem como múltiplos neuromas mucosos, constituição marfanoide e
cidade de metastatizar. Por conseguinte, a expressão feocromocitoma outros distúrbios do desenvolvimento, embora não ocorra hiperpara-
maligno é em geral restrita aos tumores com metástases distantes, tireoidismo. O CMT é observado em praticamente todos os pacientes
mais comumente encontradas nos pulmões, nos ossos ou no fígado, com NEM 2, porém o feocromocitoma só ocorre em cerca de 50%
sugerindo uma via vascular de disseminação. Como as síndromes desses indivíduos. Quase todos os feocromocitomas são benignos e
hereditárias estão associadas a locais tumorais multifocais, essas ca- estão localizados nas suprarrenais, sendo frequentemente bilaterais
racterísticas devem ser previstas em
pacientes com mutações de linhagem
germinativa de RET, VHL, SDHD ou
SDHB. Entretanto, ocorrem também
metástases distantes nessas síndro-
mes, particularmente nos portadores
de mutações de SDHB.
O tratamento do feocromocito-
ma ou do paraganglioma maligno é
desafiador. As opções incluem redu-
ção da massa tumoral, bloqueadores
alfa para controlar os sintomas, qui-
mioterapia e radioterapia da medici-
na nuclear. O protocolo de quimiote-
rapia de Averbuch inclui dacarbazina
(600 mg/m2 nos dias 1 e 2), ciclofos-
famida (750 mg/m2 no dia 1) e vin-
cristina (1,4 mg/m2 no dia 1), que é A
repetido a cada 21 dias até três a seis
ciclos. O efeito paliativo (doença está-
vel e retração do tumor) é obtido em
cerca de 50% dos pacientes. Outros
protocolos quimioterápicos ainda
se encontram em fase experimental.
Um tratamento alternativo consiste
em I131-MIBG, utilizando doses de
200-mCi a intervalos mensais, por
três a seis ciclos. O prognóstico do
C D B
feocromocitoma ou do paraganglio-
ma metastático é variável, com uma Figura 6.2 Neurofibromatose. A. RM de feocromocitoma suprarrenal bilateral. B. Neurofibromas cutâneos. C. Nódulos
sobrevida de 5 anos de 30 a 60%. de Lisch da íris. D. Sardas axilares. (Parte A, de HPH Neumann et al.: The Keio J Med 54:15, 2005; com autorização.)
101
(Fig. 6.3). O feocromocitoma pode ser sintomático antes do CMT. A da cadeia transportadora de elétrons mitocondrial. A SDH é formada
tireoidectomia profilática está sendo realizada em muitos portadores de quatro subunidades (A-D). As mutações de SDHB (PGL4), SDHC
de mutações RET; deve-se excluir a presença de feocromocitomas an- (PGL3), SDHD (PGL1) e SDHAF2 (PGL2) predispõem às síndromes
tes de realizar qualquer cirurgia nesses pacientes. de paragangliomas. As mutações de SDHA não predispõem a para-
SEÇÃO I
A síndrome de von Hippel-Lindau (VHL) é um distúrbio autos- gangliomas, porém causam doença de Leigh, que é uma forma de
sômico dominante, que predispõe a hemangioblastomas retinianos e encefalopatia. A transmissão da doença em portadores de mutações
cerebelares, que também ocorrem no tronco encefálico e na medula de linhagem germinativa de SDHB, SDHC e SDHAF2 é autossômi-
espinal (Fig. 6.4). Outras características importantes da síndrome ca dominante. Em contrapartida, nas famílias com SDHD, apenas
VHL são os carcinomas renais de células claras, os tumores de células a progênie dos pais afetados desenvolve tumores quando herdam
das ilhotas pancreáticas, os tumores do saco endolinfático (TSEL) da a mutação. Em um pequeno número de pacientes com feocromo-
orelha interna, os cistadenomas do epidídimo e do ligamento largo e citomas familiar, não foi identificada nenhuma mutação. A PGL1 é
múltiplos cistos pancreáticos ou renais. mais comum, seguida de PGL4, enquanto a PGL2 e a PGL3 são raras.
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
O gene VHL codifica uma E3 ubiquitina ligase, que regula a ex- Os feocromocitomas suprarrenais, abdominais extrassuprarrenais e
pressão do fator induzível por hipoxia-1 (HIF-1), entre outros genes. torácicos, que são componentes da PGL1 e da PGL4, são raros na
A perda do VHL está associada a um aumento na expressão do fator PGL3, porém ausentes na PGL2 (Fig. 6.5). Cerca de 33% dos pacien-
de crescimento do endotélio vascular (VEGF), que induz a angiogê- tes com PGL4 desenvolvem metástases.
nese. Embora o gene VHL possa ser inativado por todos os tipos de O feocromocitoma familiar (FF) tem sido atribuído a tumores he-
mutações, os pacientes portadores de feocromocitoma apresentam reditários exclusivamente suprarrenais em pacientes com mutações
predominantemente mutações de sentido incorreto (missence). Cerca de linhagem germinativa no gene TMEM127.
de 30% dos pacientes com síndrome de VHL apresentam feocromo-
citomas; todavia, em algumas famílias, a incidência pode atingir 90%. ■■ DIRETRIZES PARA A TRIAGEM GENÉTICA DE PACIENTES COM
O reconhecimento do feocromocitoma como uma característica asso- FEOCROMOCITOMA OU PARAGANGLIOMA
ciada à síndrome de VHL proporciona a oportunidade de diagnosticar Além da história familiar, as características gerais que sugerem uma
tumores retinianos, do sistema nervoso central, renais e pancreáticos síndrome hereditária incluem idade jovem, tumores multifocais, tumo-
em um estágio em que o tratamento efetivo ainda pode ser possível. res extrassuprarrenais e tumores malignos (Fig. 6.6). Tendo em vista a
As síndromes de paragangliomas (PGL) foram classificadas por prevalência relativamente alta de síndromes familiares entre pacientes
análises genéticas de famílias com paragangliomas de cabeça e pes- que apresentam feocromocitoma ou paraganglioma, é útil identificar
coço. Os genes de suscetibilidade codificam subunidades da enzima as mutações de linhagem germinativa, até mesmo em pacientes sem
succinato desidrogenase (SDH), um componente do ciclo de Krebs e história familiar conhecida. A primeira etapa consiste em investigar as
características clínicas das síndro-
mes hereditárias e em obter uma
história familiar mais profunda, de
múltiplas gerações. Cada uma des-
sas síndromes apresenta transmis-
são autossômica dominante com
penetrância variável, porém um
caso-índice com mãe portadora
de tumores paraganglionares não
está predisposto a PGL1 (portador
da mutação SDHD). Os neurofi-
bromas cutâneos, as manchas de
café-com-leite e as sardas axilares
sugerem neurofibromatose. Foram
A C relatadas mutações de linhagem
germinativa no NF1 em pacientes
portadores de feocromocitomas
esporádicos. Por conseguinte, não
é necessário realizar um teste para
NF1 na ausência de outras caracte-
rísticas clínicas de neurofibromato-
se. Uma história pessoal ou familiar
de câncer medular da tireoide ou
uma elevação dos níveis séricos de
calcitonina sugerem fortemente a
D NEM 2 e devem levar à realização
de um teste para mutações RET.
Uma história de comprometimento
visual ou de tumores do cerebelo,
do rim, do tronco encefálico ou da
medula espinal sugere a possibili-
dade de VHL. Uma história pessoal
e/ou familiar de paraganglioma de
cabeça e pescoço sugere PGL1 ou
PGL4.
Um único feocromocitoma
B E suprarrenal em um paciente com
Figura 6.3 Neoplasia endócrina múltipla tipo 2. Carcinoma medular multifocal da tireoide mostrado por (A) cintilografia história inespecífica nos demais
com MIBG e (B) amostra cirúrgica. As setas demonstram os tumores; as cabeças de setas mostram a ponte de tecido da aspectos ainda pode estar asso-
amostra cortada. Feocromocitoma suprarrenal bilateral mostrado por (C) cintilografia com MIBG, (D) exame de imagem por TC ciado a mutações de VHL, RET,
e (E) amostras cirúrgicas. (De HPH Neumann et al.: The Keio J Med 54:15, 2005, com autorização.) SDHB ou SDHD (por ordem de-
102
Capítulo 6
Feocromocitoma
A B C D
E F
Figura 6.4 Doença de von Hippel-Lindau. Angioma retiniano (A); hemangio- Nephrol Necker Hosp 27:361, 1997. Copyright Elsevier. Parte B de SH Morgan, J-P
blastomas de cerebelo mostrados por RM no (B) tronco encefálico; (C e D) medula Grunfeld [eds]: Inherited Disorders of the Kidney, Oxford, UK, Oxford University Press,
espinal; (E) feocromocitomas bilaterais e carcinomas renais de células claras bilate- 1998. Parte F, de HPH Neumann et al.: Contrib Nephrol 136:193, 2001. Copyright
rais; e (F) múltiplos cistos pancreáticos. (Partes A e D de HPH Neumann et al.: Adv S. Karger AG, Basel.)
B C
Figura 6.5 Síndrome de paragangliomas. PGL1, um paciente com ressecção lógico do radiofármaco nos rins, no fígado, na vesícula biliar, na pelve renal e na be-
incompleta de um tumor do glomo carotídeo esquerdo e mutação W5X de SDHD. A. xiga. B e C. Angiografia por TC com reconstrução tridimensional. As setas apontam
Tomografia por emissão de pósitrons com F18-dopa, demonstrando a captação do para os tumores paraganglionares. (De S Hoegerle et al.: Eur J Nucl Med Mol Imaging
tumor no glomo jugular direito, glomo carotídeo direito, glomo carotídeo esquerdo, 30:689, 2003, com autorização.)
glomo coronário esquerdo e glândula suprarrenal direita. Observe o acúmulo fisio-
103
Porcentagens de mutações de linhagem germinativa Feocromocitomas múltiplos em %
em genes de suscetibilidade para feocromocitoma
100%
23%
90%
80%
SEÇÃO I
spor
70% RET VHL
60% NF1 SDHB
50% SDHD 45% SDHD
40% SDHB NF1
VHL RET
30%
spor
20%
10% 19%
0%
Distúrbios da Hipófise, Tireoide e Suprarrenal
33%
VHL
VHL
SDHB
SDHB
44% SDHD
SDHD
NF1 NF1
RET RET
23% spor
spor
30%
D 24%
1%
C 1% 7%
Feocromocitomas malignos %
6%
VHL
28%
SDHB
SDHD
60%
NF1
RET
spor
2%
3%
E 1%
Figura 6.6 Distribuição das mutações nos genes RET, VHL, NF1, SDHB, e mais jovens que apresentam feocromocitoma. Mutações de linhagem germinativa de
SDHD. A. Correlação com a idade. As barras representam a frequência das for- acordo com (B) múltiplos feocromocitomas, (C) retroperitoneais extrassuprarrenais,
mas esporádicas ou de várias formas hereditárias de feocromocitoma em diferentes (D) feocromocitomas torácicos e (E) feocromocitomas malignos. (Dados do Freiburg
grupos etários. Os distúrbios hereditários são muito mais comuns entre indivíduos International Pheochromocytoma and Paraganglioma Registry, em 2009.)
104
SEÇÃO II
Endocrinologia Reprodutiva
CAPÍTULO 7 (45,X ou o mosaicismo 45,X/46,XY). Os fetos sem cromossomo X
(45,Y) não são viáveis.
O sexo gonadal refere-se à determinação do tecido gonadal como
testículo ou ovário. A gônada embrionária é bipotencial, podendo
Distúrbios do Desenvolvimento desenvolver-se (a partir de 42 dias de gestação) tanto em um testí-
culo quanto em um ovário, dependendo dos genes que estão sendo
Sexual expressados (Fig. 7.2). O desenvolvimento do testículo é iniciado
pela expressão do gene do cromossomo Y SRY (região determinante
do sexo no cromossomo Y), que codifica um fator de transcrição do
John C. Achermann
HMG boxe. O SRY é expresso transitoriamente nas células destinadas
J. Larry Jameson a se transformar em células de Sertoli e funciona como um comuta-
dor essencial para estabelecer a linhagem testicular. A mutação do
O desenvolvimento sexual começa in utero, porém prossegue até a SRY previne o desenvolvimento dos testículos em homens cromos-
vida adulta com a concretização da maturidade sexual e capacidade sômicos 46,XY, enquanto a translocação de SRY em mulheres 46,XX
SEÇÃO II
reprodutiva. Os principais determinantes do desenvolvimento sexual é suficiente para induzir ao desenvolvimento dos testículos e um
podem ser divididos em três componentes principais: sexo cromos- fenótipo masculino. Outros genes são necessários para prosseguir
sômico, sexo gonadal (determinação sexual) e sexo fenotípico (dife- com o desenvolvimento testicular. O SOX9 (gene 9 do boxe HMG
renciação sexual) (Fig. 7.1). A ocorrência de anormalidades em cada relacionado com o SRY) sofre suprerregulação na gônada masculina
um desses estágios pode resultar em distúrbios do desenvolvimento em desenvolvimento pelo SRY, mas é suprimido na gônada feminina.
sexual (DDS) (Quadro 7.1). Uma criança nascida com genitália am- A expressão transgênica do SOX9 é suficiente para iniciar a formação
bígua necessita de avaliação urgente, visto que algumas causas, como do testículo em camundongos, e as mutações que afetam o SOX9 pre-
a hiperplasia suprarrenal congênita (HSRC), podem estar associadas judicam o desenvolvimento testicular. O WT1 (gene 1 relacionado
Endocrinologia Reprodutiva
a crises suprarrenais que comportam risco de vida. A determinação com o tumor de Wilms) atua precocemente na via genética e regula
precoce do sexo e uma comunicação clara com os pais sobre o diag- a transcrição de vários genes, como o SF1 (oficialmente denomina-
nóstico e as opções de tratamento são essenciais. A participação de do NRSA1), DAX1 (NR0B1) e AMH (que codifica MIS, a substância
uma equipe multidisciplinar experiente é de suma importância para mülleriana inibidora). O SF1 codifica o fator esteroidogênico 1, um
aconselhamento, tratamento clínico e avaliação/intervenção cirúrgi- receptor nuclear que funciona em cooperação com outros fatores de
cas (se houver necessidade). Com frequência, as formas mais sutis de transcrição para regular uma grande série de genes suprarrenais e
disfunção gonadal [p. ex., síndrome de Klinefelter (SK), síndrome de gonadais, incluindo SOX9 e muitos genes envolvidos na esteroidogê-
Turner (ST)] são diagnosticadas posteriormente durante a vida do nese. As mutações heterozigotas do SF1 são responsáveis por cerca de
indivíduo por internistas. Como essas condições estão associadas a 10% dos pacientes XY com disgenesia gonadal e androgenização pre-
uma variedade de consequências psicológicas, reprodutivas e meta-
bólicas, é preciso estabelecer um diálogo franco entre o paciente e os
profissionais de saúde para assegurar a continuidade e a atenção para
WT1
essas questões. Crista urogenital
SF1
Diferenciação
Sexo gonadal Desenvolvimento Regressão
sexual
do folículo mülleriana
masculina
Esteroides gonadais Esteroides e
peptídios gonadais
Figura 7.2 A regulação gênica do desenvolvimento gonadal. WT1, gene
(E2) relacionado ao tumor de Wilms 1; SF1, fator esteroidogênico 1 (também conhecido
(T, DHT, MIS)
como NR5A1); SRY, região determinante do sexo no cromossomo Y; SOX9, gene do
HMG-boxe relacionado ao SRY9 SRY; DHH, ouriço-do-deserto (desert hedgehog);
ATRX, (-talassemia, deficiência mental devido ao X); DAX1, reversão sexual sensível
à dosagem, hipoplasia suprarrenal congênita no cromossomo X, gene 1; DMRT1,2,
Sexo fenotípico fator de transcrição relacionado a MAB3 de duplo sexo 1,2; WNT4, sítio de integra-
ção 4 de MMTV tipo sem asas; FST, folistatina; BMP2 e 15, fatores morfogênicos
Figura 7.1 O desenvolvimento sexual pode ser dividido em três compo- do osso 2 e 15; FOXL2, fator de transcrição de cabeça bifurcada L2; GDF9, fator de
nentes principais: sexo cromossômico, sexo gonadal e sexo fenotípico. T, tes- diferenciação do crescimento 9; AMH, hormônio antimülleriano (substância inibidora
tosterona; DHT, diidrotestosterona; MIS, substância inibidora mülleriana, também mülleriana); DHT, diidrotestosterona; RSPO1, R-espondina 1; MAMLD1, domínio se-
conhecida como hormônio antimülleriano, AMH. melhante a organizador contendo 1.
106
QUADRO 7.1 Classificação dos distúrbios do desenvolvimento sexual (DDS)
Cromossomo sexual DDS DDS, 46,XY DDS 46,XX
47,XXY Distúrbios do desenvolvimento gonadal (testicular) Distúrbios do desenvolvimento gonadal (ovariano)
(síndrome de Klinefelter e Disgenesia gonadal completa ou parcial Disgenesia gonadal
variantes) (p. ex., SRY, SOX9, SF1, WT1, DHH) DDS ovotesticular
45,X Comprometimento da função das células de Leydig fetais
(síndrome de Turner e variantes) DDS testicular (p. ex., SRY+, dup SOX9, RSPO1)
(p. ex., SF1/NR5A1, CXorf6/MAMLD1)
Mosaicismo 45,X/46,XY DDS ovotesticular
(disgenesia gonadal mista)
Regressão testicular
46,XX/46/XY
(quimerismo/mosaicismo) Distúrbios na síntese ou na ação dos androgênios (ver Excesso de androgênios (ver Quadro 7.4)
Quadro 7.3) Fetal
Distúrbios na biossíntese de androgênios
Capítulo 7
3‑Hidroxiesteroide desidrogenase II (HSD32)
Mutações do receptor de LH (LHCGR) 21‑Hidroxilase (CYP21A2)
Síndrome de Smith‑Lemli‑Opitz P450 oxidorredutase (POR)
Proteína reguladora aguda esteroidogênica (STAR) 11‑Hidroxilase (CYP11B1)
Clivagem da cadeia colateral do colesterol (CYP11A1) Mutações do receptor de glicocorticoides
3‑Hidroxiesteroide desidrogenase II (HSD32) Fetoplacentário
17‑Hidroxilase/17,20‑liase (CYP17A1) Deficiência de aromatase (CYP19)
P450 oxidorredutase (POR) Deficiência de oxidorredutase (POR)
judicada, indicando a sensibilidade do testículo à dosagem do gene para o desenvolvimento folicular normal (p. ex., receptor do hormô-
SF1. O padrão de expressão precoce do SF1 na gônada mantém para- nio folículo-estimulante [FSH], GDF9). A esteroidogênese no ovário
lelismo com o de um outro receptor nuclear-órfão, DAX1 (reversão exige o desenvolvimento de folículos que contêm células da granu-
sexual sensível à dosagem, hipoplasia suprarrenal congênita no cro- losa e da teca circundando os ovócitos (Cap. 10). Por conseguinte, a
mossomo X, gene 1). A duplicação de DAX1 prejudica o desenvol- esteroidogênese ovariana é relativamente limitada até a produção de
vimento testicular, enquanto as deleções ou mutações do DAX1 são gonadotrofinas na puberdade.
responsáveis pela formação desordenada dos cordões testiculares, As células germinativas também se desenvolvem de maneira di-
revelando novamente a extraordinária sensibilidade da via determi- mórfica sexual. No ovário em desenvolvimento, as células germina-
nante do sexo masculino aos efeitos da dosagem do gene. Além dos tivas primordiais (CGP) proliferam e entram em meiose, enquanto
genes mencionados anteriormente, estudos das mutações humanas proliferam e, em seguida, sofrem parada mitótica no testículo em de-
e murinas indicam que pelo menos outros 15 genes participam na senvolvimento. A entrada das CGP em meiose é iniciada pelo ácido
diferenciação gonadal, desenvolvimento e posicionamento final da retinoico, que ativa o gene STRA8 (estimulado pelo ácido retinoico 8)
gônada (Fig. 7.2). Esses genes codificam um conjunto de moléculas e outros genes envolvidos na meiose. O testículo em desenvolvimen-
sinalizadoras e fatores de crescimento parácrinos, além dos fatores to produz altos níveis de CYP26B1, uma enzima que degrada o áci-
de transcrição. do retinoico, impedindo a entrada das CGP em meiose. Cerca de 7
Embora o desenvolvimento ovariano tenha sido outrora con- milhões de células germinativas estão presentes no ovário fetal no
siderado como um processo “padrão”, hoje está claro que genes segundo trimestre, e um milhão permanece por ocasião do nasci-
específicos são expressos durante os estágios mais iniciais do de- mento. Apenas 400 sofrem ovulação durante a vida reprodutiva de
senvolvimento ovariano. Alguns desses fatores podem reprimir o de- uma mulher (Cap. 10).
senvolvimento dos testículos (p. ex., WNTA4, R-espondina-1) (Fig. O sexo fenotípico refere-se às estruturas das genitálias externa e
7.2). Uma vez formado o ovário, são necessários genes adicionais interna, bem como às características sexuais secundárias. O fenótipo
107
masculino exige a secreção do hormônio antimülleriano (AMH, tam- ■■ SÍNDROME DE KLINEFELTER (47,XXY)
bém conhecido como substância inibidora mülleriana, MIS) pelas cé-
lulas de Sertoli e da testosterona pelas células de Leydig testiculares. O Fisiopatologia
AMH é um membro da família do fator transformador de crescimento A forma clássica da SK (47,XXY) ocorre após a não disjunção meióti-
(TGF) , que atua por meio de receptores específicos, causando a re- ca dos cromossomos sexuais durante a gametogênese (40% durante a
gressão das estruturas müllerianas (com 60 a 80 dias de gestação). Com espermatogênese, 60% durante a ovogênese). Acredita-se que as for-
60 a 140 dias de gestação, a testosterona sustenta o desenvolvimento mas em mosaico da SK (46,XY/47,XXY) resultam da não disjunção
das estruturas wolffianas, incluindo os epidídimos, ductos deferentes e
mitótica cromossômica dentro do zigoto, ocorrendo em pelo menos
vesículas seminais. A testosterona é o precursor da diidrotestosterona
10% dos indivíduos com essa condição. Foram relatadas outras va-
(DHT), um poderoso androgênio que promove o desenvolvimento da
riantes cromossômicas da SK (p. ex., 48XXYY, 48,XXXY), porém elas
genitália externa, incluindo o pênis e a bolsa escrotal (65 a 100 dias
são menos comuns.
e posteriormente) (Fig. 7.3). O seio urogenital desenvolve-se e forma
a próstata e a uretra prostática no homem, enquanto se transforma
Manifestações clínicas
na uretra e porção inferior da vagina na mulher. O tubérculo genital
torna-se a glande do pênis no homem e o clitóris na mulher. As tu- A SK caracteriza-se por testículos pequenos, infertilidade, gineco-
mastia, proporções “eunucoides” e virilização incompleta em homens
SEÇÃO II
Gônada
Mesonéfron Epidídimo
Ovário Testículo
Ducto mülleriano
Tuba Ducto wolffiano
uterina Ducto
deferente
Útero Seio
urogenital
Vagina Vesícula
seminal
Próstata
Feminino Masculino
A
Tubérculo genital
Saliência (tumefação) genital
Prega e sulco uretrais
Clitóris Glande
do pênis
Corpo do
Lábio menor pênis
B
Feminino Masculino
Figura 7.3 Desenvolvimento sexual. A. Trato urogenital interno. B. Genitália externa. (De E Braunwald et al. [eds.]: Harrison’s Principles of Internal Medicine, 15th ed.,
New York, McGraw-Hill, 2001.)
108
QUADRO 7.2 Características clínicas dos distúrbios cromossômicos do desenvolvimento sexual (DDS)
Genitália
Complemento
Distúrbio cromossômico comum Gônada Externa Interna Desenvolvimento das mamas
Síndrome de Klinefelter 47,XXY ou 46,XY/47,XXY Testículos hialinizados Masculina Masculina Ginecomastia
Características clínicas
Testículos pequenos, azoospermia, diminuição dos pelos faciais e axilares, diminuição da libido, estatura alta e maior comprimento
das pernas, comprimento diminuído do pênis, risco aumentado de tumores da mama, doença tromboembólica, dificuldades de
aprendizagem, obesidade, diabetes melito, veias varicosas
Síndrome de Turner 45,X ou 45,X/46,XX Gônada “em fita” ou ovário Feminina Feminina Feminina imatura
imaturo hipoplásica
Características clínicas
Capítulo 7
Lactância: linfedema, pescoço alado, tórax em escudo, baixa implantação da linha dos cabelos, defeitos cardíacos e coarctação da
aorta, malformações do trato urinário e rim em ferradura
Infância: baixa estatura, cúbito valgo, pescoço curto, quartos metacarpais curtos, unhas hipoplásicas, micrognatia, escoliose, otite
média e perda auditiva sensorineural, ptose e ambliopia, múltiplos nevus e formação de queloides, doença autoimune da tireoide,
dificuldades de aprendizagem visuoespacial
Vida adulta: falência puberal e amenorreia primária, hipertensão, obesidade, dislipidemia, comprometimento da tolerância à
glicose e resistência à insulina, doença autoimune da tireoide, doença cardiovascular, dilatação da croça aórtica, osteoporose,
doença intestinal inflamatória, disfunção hepática crônica, risco aumentado de câncer de colo, perda auditiva
Disgenesia gonadal mista 45,X/46,XY Testículo ou gônada “em Variável Variável Habitualmente masculino
dos pacientes com 47,XXY (90 e 80%, respectivamente), enquanto a ■■ SÍNDROME DE TURNER (DISGENESIA GONADAL; 45,X)
testosterona plasmática está diminuída (50 a 75%), refletindo uma
insuficiência gonadal primária. O estradiol está frequentemente au- Fisiopatologia
mentado, devido à estimulação crônica das células de Leydig pelo LH Cerca da metade dos indivíduos com síndrome de Turner apresenta
e devido à aromatização da androstenediona pelo tecido adiposo; o um cariótipo 45,X, cerca de 20% possuem mosaicismo 45,X/46,XX,
aumento da razão estradiol/testosterona resulta em ginecomastia. Os e o restante exibe anormalidade estruturais do cromossomo X, como
pacientes com formas em mosaico de SK apresentam manifestações fragmentos X, isocromossomos ou anéis. As características clínicas
clínicas menos graves, testículos maiores e, algumas vezes, conse- da ST resultam de uma haploinsuficiência de múltiplos genes do cro-
guem uma fertilidade espontânea. mossomo X (p. ex., homeobox, para baixa estatura, SHOX). Entre-
tanto, os genes impressos também podem ser afetados quando o X
TRATAMENTO Síndrome de Klinefelter herdado tem diferentes origens parentais.
109
40%, 45,X/46,XX), e 2% alcancem a menarca, a grande maioria das ■■ DISGENESIA GONADAL MISTA (45,X/46,XY)
mulheres com ST desenvolve insuficiência ovariana completa. Por
A disgenesia gonadal mista resulta do mosaicismo 45,X/46,XY. O
conseguinte, esse diagnóstico deve ser considerado em todas as mu-
fenótipo dos pacientes com essa condição varia consideravelmente.
lheres que apresentam amenorreia primária ou secundária e níveis
Apesar de alguns pacientes possuírem um fenótipo predominante-
elevados de gonadotrofinas.
mente feminino com características somáticas da ST, gônadas em fita
e estruturas müllerianas, a maioria dos indivíduos com 45,X/46,XY
TRATAMENTO Síndrome de Turner possui um fenótipo masculino e testículos, sendo o diagnóstico feito
acidentalmente após amiocentese ou durante investigação de infer-
O tratamento das meninas e mulheres com ST requer uma abor- tilidade. Na prática, a maioria das crianças encaminhadas para ava-
dagem multidisciplinar, devido ao número de sistemas orgânicos liação possui genitália ambígua e características somáticas variáveis.
potencialmente afetados. Deve-se efetuar uma avaliação cardíaca Com frequência, decide-se criar o paciente como do sexo feminino
e renal detalhada por ocasião do diagnóstico. Os indivíduos com (60%) se houver estruturas uterinas, se as gônadas forem intra-abdo-
defeitos cardíacos congênitos (DCC) (30%) (valva aórtica bi- minais e se o desenvolvimento fálico for precário. Nessas situações,
cúspide; 30 a 50%; coarctação da aorta, 30%; dilatação da croça a gonadectomia é habitualmente realizada para evitar a secreção adi-
aórtica, 5%) exigem acompanhamento de longo prazo por um cional de androgênio e o desenvolvimento de gonadoblastoma (até
SEÇÃO II
cardiologista experiente, profilaxia antibiótica para procedimen- 25%). Os indivíduos criados como homens necessitam de cirurgia
tos odontológicos ou cirúrgicos e exames de imagem seriados das reconstrutiva para hipospadia e remoção das gônadas disgenéticas,
dimensões da croça aórtica, visto que a dilatação progressiva da quando não é possível trazer as gônadas para a bolsa escrotal. Os tes-
croça aórtica está associada a um risco aumentado de dissecção tículos escrotais podem ser preservados, porém exigem um exame
da aorta. Os indivíduos que apresentam malformações congênitas regular à procura do possível desenvolvimento de tumor. Recomen-
renais e do trato urinário (30%) correm risco de infecções do trato da-se a realização de biópsia para carcinoma in situ na adolescên-
urinário, hipertensão e nefrocalcinose. A hipertensão, que pode cia, e pode ser necessária uma suplementação com testosterona para
ocorrer independentemente das malformações cardíacas e renais, sustentar a androgenização na puberdade. O potencial de altura do
Endocrinologia Reprodutiva
deve ser monitorada e tratada como em outros pacientes com indivíduo está habitualmente atenuado.
hipertensão essencial. O aumento do clitóris ou outra evidência
de virilização sugerem a presença de material oculto do cromos- ■■ DDS OVOTESTICULAR
somo Y translocado e estão associados a um risco aumentado de O DDS ovotesticular (anteriormente denominado hermafroditismo
gonadoblastoma, aparentemente em consequência de genes cro- verdadeiro) ocorre quando tanto um ovário quanto um testículo ou
mossômicos Y distintos do SRY. A avaliação regular da função quando um ovoteste são encontrados em um único indivíduo. Por
tireoidiana, do peso, da dentição, audição, fala, visão e questões motivos que ainda não estão esclarecidos, ocorre mais frequente-
educacionais deve ser realizada durante a infância. A otite média mente assimetria gonadal, com um testículo à direita e um ovário à
e a doença da orelha média prevalecem na infância (50 a 85%), e esquerda. A maioria dos indivíduos com esse diagnóstico apresenta
a perda auditiva sensorineural torna-se progressivamente comum um cariótipo 46,XX, particularmente na África Sub-saariana. Um
com a idade (70 a 90%). O hipotireoidismo autoimune (15 a 30%) cariótipo quimérico 46,XX/46,XY é menos comum e apresenta um
pode ocorrer na infância, porém a idade média de seu início é fenótipo variável.
na terceira década. Deve-se fornecer um aconselhamento sobre
o crescimento e a fertilidade a longo prazo. Existem grupos de
apoio para as pacientes ativos no mundo inteiro, que podem de- DISTÚRBIOS DO SEXO GONADAL E FENOTÍPICO
sempenhar um inestimável papel. As características clínicas dos pacientes com distúrbios do sexo gona-
O tratamento da baixa estatura em crianças com ST continua dal e sexo fenotípico são divididas em subandrogenização de homens
sendo um desafio, visto que a altura final sem tratamento rara- 46,XY (DDS 46,XY) e excesso de androgenização de mulheres 46,XX
mente ultrapassa 150 cm na ST 45,X não mosaica. O hormônio (DDS 46,XX) (Quadro 7.1). Esses distúrbios abrangem um espectro
do crescimento recombinante administrado em altas doses esti- de fenótipos, que variam desde “mulheres fenotípicas 46,XY” ou “ho-
mula a taxa de crescimento em crianças com ST e pode ser usado mens 46,XX” até indivíduos com genitália ambígua.
isoladamente ou em combinação com baixas doses do esteroide
anabólico não aromatizável, a oxandrolona (até 0,05 mg/kg/dia) ■■ DDS 46,XY (HOMENS SUBANDROGENIZADOS)
em uma criança de mais idade (mais de 9 anos). Entretanto, os A subandrogenização do feto 46,XY (anteriormente denominada
incrementos finais na altura são frequentemente modestos (5 a 10 pseudo-hermafroditismo masculino) reflete defeitos na produção ou
cm), e a individualização da resposta a esquemas de tratamento na ação dos androgênios. Pode resultar de distúrbios do desenvolvi-
pode ser benéfica. As meninas com evidências de insuficiência mento testicular, defeitos na síntese dos androgênios ou resistência à
gonadal necessitam de reposição estrogênica para induzir o de- testosterona e à DHT (Quadro 7.1).
senvolvimento das mamas e do útero, sustentar o crescimento e
manter a mineralização óssea. Na atualidade, a maioria dos mé- Distúrbios do desenvolvimento do testículo
dicos prefere iniciar a terapia estrogênica em baixas doses (um Disgenesia testicular Os pacientes com disgenesia gonadal pura (ou
décimo a um oitavo da dose de reposição para adultos) para completa) (síndrome de Swyer) apresentam gônadas em fita, estrutu-
induzir a puberdade em um momento apropriado da idade (12 ras müllerianas (devido à secreção insuficiente de AMH/MIS) e au-
anos). As doses de estrogênio são aumentadas de modo gradual sência completa de androgenização. Os níveis séricos de AMH/MIS
para permitir a feminização durante um período de 2 a 4 anos. estão baixos, e a resposta da testosterona à estimulação pela gonado-
Posteriormente, são acrescentadas progestinas para regularizar os trofina coriônica humana (hCG) está comprometida. Os pacientes
sangramentos induzidos por suspensão, e algumas mulheres com com disgenesia gonadal parcial (testículos disgenéticos) podem produ-
ST conseguiram uma gravidez bem-sucedida após doação do ovo zir MIS suficiente para haver regressão do útero e, algumas vezes, tes-
e fertilização in vitro. O acompanhamento de longo prazo de mu- tosterona suficiente para uma androgenização parcial. A disgenesia
lheres com ST envolve uma cuidadosa vigilância da reposição dos gonadal pode resultar de mutações ou deleções dos genes promotores
hormônios sexuais e da função reprodutora, mineralização óssea, testiculares (WT1, SF1, SRY, SOX9, DHH, ATRX, ARX, DMRT) ou da
função cardíaca e dimensões da croça aórtica, pressão arterial, duplicação de loci cromossômicos que contêm genes “antitestículo”
peso e tolerância à glicose, perfis hepático e lipídico, função da (p. ex., WNT4/RSPO1, DAX1) (Quadro 7.3). Entre esses genes, as
tireoide e audição. Esse serviço é oferecido por uma clínica espe- deleções ou mutações do SRY e as mutações heterozigotas do SF-1
cializada em ST em alguns centros. (NR5A1) parecem ser as mais comuns, porém ainda são responsá-
veis, em seu conjunto, por menos de 25% dos casos. Podem existir
110
QUADRO 7.3 Causas genéticas da subandrogenização de homens cariótipos (DDS, 46,XY)
Gene Herança Gônada Útero Genitália externa Características associadas
Capítulo 7
ovoteste ambígua
DHH AR Testículo disgenético + Feminina Neuropatia minifascicular
ATRX X Testículo disgenético – Feminina ou ‑talassemia, retardo desenvolvimental
ambígua
ARX X Testículo disgenético – Masculina ou Deficiência mental; lissencefalia ligada ao X
ambígua
MAMLD1 X Testículo disgenético/ – Hipospadia
disfunção das células de
Nota: AR, autossômica recessiva; AD, autossômica dominante; HSRC, hiperplasia suprarrenal congênita; WT1, gene relacionado ao tumor de Wilms 1; WARGR, tumor de Wilms, aniridia, anomalias
geniturinárias e deficiência mental; SF1, fator esteroidogênico 1; SRY, gene relacionado ao sexo no cromossomo Y; SOX9, gene 9 HMG-boxe relacionado ao SRY; DHH, ouriço-do-deserto; ATRX,
(-talassemia, deficiência mental no X); ARX, homeobox relacionado à ausência de arestas, ligado ao X; DAX1, reversão sexual sensível à dosagem, hipoplasia suprarrenal congênita no cromossomo
X, gene 1; WNT4, sítio de integração do vírus tumoral mamário de camundongo tipo sem asas, 4; LHR, receptor de LH; DHCR7; esterol 7d redutase; StAR, proteína reguladora aguda esteroido-
gênica; CYP11A1, clivagem da cadeia lateral do colesterol P450; HSD32, 3-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 2; CYP17, 17-hidroxilase e 17,20-liase; POR, P450 oxirredutase; HSD173,
17-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 3; SRD5A2, 5-redutase tipo 2.
111
manifestações clínicas associadas, refletindo a existência de papéis feitos na síntese ou na função do receptor de LH impedem a estimu-
funcionais adicionais para esses genes. Por exemplo, ocorre disfunção lação in utero das células de Leydig pela hCG, bem como a estimula-
renal em pacientes com mutações específicas do WT1 (síndromes de ção pelo LH das células de Leydig posteriormente durante a gestação
Denys-Drash e de Fraser), observa-se a ocorrência de insuficiência e o período neonatal. Como resultado, a síntese de testosterona e de
suprarrenal primária em alguns pacientes com mutações de SF-1, e DHT é insuficiente para a androgenização normal da genitália inter-
anormalidades graves da cartilagem (displasia campomélica) cons- na e externa, dando origem a um espectro de fenótipos, que variam
tituem a característica clínica predominante das mutações do SOX9. desde uma subandrogenização completa até um micropênis, depen-
É importante obter uma história familiar de DDS ou de insuficiência dendo da gravidade da mutação.
ovariana prematura (p. ex., SF1/NR5A1). Os testículos disgenéticos
Vias das enzimas esteroidogênicas As mutações na proteína regu-
intra-abdominais devem ser removidos para evitar a ocorrência de
ladora aguda esteroidogênica (StAR) e CYP11A1 afetam a esteroi-
neoplasia maligna, e os estrogênios podem ser usados para induzir
dogênese tanto suprarrenal quanto gonadal (Cap. 5). Os indivíduos
as características sexuais secundárias em indivíduos 46,XY criados
afetados (46,XY) habitualmente têm uma forma grave e de início
como mulheres. A síndrome do testículo ausente (evanescente) (anor-
precoce de insuficiência suprarrenal e apresentam um fenótipo femi-
quia bilateral) reflete a regressão do testículo durante o desenvolvi-
nino, embora se tenha relatado a ocorrência de variantes mais leves
mento. A etiologia é ainda desconhecida, porém a ausência das estru-
de início mais tardio. Os defeitos na 3-hidroxiesteroide desidroge-
SEÇÃO II
Colesterol
ACTH LH
StAR
(suprarrenal) (testículo)
(Enzima para a
CYP11A1 clivagem das cadeias
laterais do colesterol)
Hiperplasia
suprarrenal
Pregnenolona congênita e
subandro-
(3-hidroesteroide
3-HSD32 genização
desidrogenase 2)
masculina
Progesterona
CYP17 (17-hidroxilase)
17-hidroxiprogesterona
CYP21A2 CYP17
(21-hidroxilase) (17,20-liase)
Hiperplasia
suprarrenal
congênita e 11-desoxicortisol Androstenediona Apenas
androgenização subandro-
feminina CYP11B1 17-HSD173 genização
(11-hidroxilase) (17-hidroxiesteroide masculina
desidrogenase 3)
Cortisol Testosterona
Diidrotestosterona
Figura 7.4 Visão global simplificada das vias de síntese dos glicocorticoides e androgênios. Os defeitos em CYP21A2 e CYP11B1 desviam os precursores este-
roides para a via dos androgênios e induzem androgenização das mulheres 46,XX. A testosterona é sintetizada nas células de Leydig testiculares e convertida perifericamente
em diidrotestosterona. Os defeitos nas enzimas envolvidas na síntese dos androgênios resultam em subandrogenização dos homens 46,XY. StAR, proteína reguladora aguda
da esteroidogênese. (De E Braunwald et al. [eds.]: Harrison Internal Medicine, 15th ed., New York, McGraw-Hill, 2001.)
112
dutase (POR) afetam múltiplas enzimas esteroidogênicas, resultando ferentes deve ser evitado. A hipospadia isolada ocorre em cerca de
em comprometimento da androgenização e padrão bioquímico de 1 em 200 homens e é tratada por reparo cirúrgico. A maioria dos
aparente deficiência combinada de 21-hidroxilase e 17-hidroxilase, casos é idiopática, porém a evidência de hipospadia penoescrotal, de-
algumas vezes com anormalidades esqueléticas (craniossinostose de senvolvimento fálico inadequado e/ou criptorquidia bilateral torna
Antley-Bixler). Os defeitos na 17-hidroxiesteroide desidrogenase necessária uma investigação para a identificação de possível distúr-
tipo 3 (HSD173) e na 5-redutase tipo 2 (SRD5A2) interferem na bio subjacente do desenvolvimento sexual (p. ex., disgenesia gonadal
síntese de testosterona e de DHT, respectivamente. Essas condições parcial, defeito leve na ação da testosterona ou até mesmo formas
caracterizam-se por androgenização mínima ou ausente in utero; graves de HSRC 46,XX). A ausência unilateral de descida dos testí-
entretanto, pode ocorrer algum desenvolvimento fálico durante a culos (criptorquidia) afeta mais de 3% dos meninos por ocasião do
adolescência, em virtude da ação de outras isoformas da enzima. Os nascimento. A orquidopexia deve ser considerada quando o testículo
indivíduos com deficiência de 5-redutase tipo 2 possuem estruturas não desceu até 6 a 9 meses de idade. A criptorquidia bilateral ocor-
wolffianas normais e, em geral, não desenvolvem tecido mamário. re com menos frequência e deve levantar a suspeita de deficiência
Na puberdade, o aumento da testosterona induz a formação da massa de gonadotrofinas ou de DDS. Um pequeno subgrupo de pacientes
muscular e outras características virilizantes, apesar da deficiência de com criptorquidia pode apresentar mutações no gene insulino-sími-
DHT. Alguns indivíduos mudam de sexo na puberdade, trocando o le 3 (INSL3) ou em seu receptor LGR8 (também conhecido como
Capítulo 7
sexo feminino pelo masculino. Por conseguinte, a abordagem desse GREAT), que medeia a descida normal dos testículos. O testículo as-
distúrbio representa um desafio. O creme de DHT pode melhorar cendente está sendo reconhecido cada vez mais como condição dis-
o crescimento pré-puberal do pênis em pacientes criados como ho- tinta cujo tratamento ainda não está bem definido. As associações sin-
mens. Nos indivíduos criados como mulheres, podem-se considerar drômicas e o retardo de crescimento intrauterino também ocorrem
a gonadectomia antes da adolescência e a reposição de estrogênio na com frequência relativa em associação ao comprometimento da fun-
puberdade. ção testicular ou responsividade dos tecidos-alvo, porém a etiologia
subjacente de muitas dessas condições continua sendo desconhecida.
Distúrbios da ação dos androgênios
CYP21A2 AR Ovário + Ambígua HSRC, espectro fenotípico desde as formas graves com
perda de sal, associadas à insuficiência suprarrenal, até
as formas virilizantes simples com função suprarrenal
compensada, ↑ 17‑hidroxiprogesterona
POR AR Ovário + Ambígua ou feminina Características mistas da deficiência de 21‑hidroxilase
e 17‑hidroxilase/17,20‑liase, às vezes associada à
craniossinostose de Antley‑Bixler
CYP11B1 AR Ovário + Ambígua HSRC, hipertensão devida a 11‑desoxicortisol e
Endocrinologia Reprodutiva
11‑desoxicorticosterona aumentadas
CYP19 AR Ovário + Ambígua Virilização materna durante a gestação, desenvolvimento
mamário ausente durante a puberdade
Receptor dos AR Ovário + Ambígua ↑ ACTH, 17‑hidroxiprogesterona e cortisol; falha na
glicocorticoides supressão de dexametasona
Nota: DDS, distúrbios do desenvolvimento sexual; AR, autossômica recessiva; SRY, gene relacionado com o sexo no cromossomo Y; SOX9, gene HMG-box 9 relacionado a SRY; HSD32,
3-hidroxiesteroide desidrogenase tipo 2; CYP21A2, 21-hidroxilase; POR, P450 oxirredutase; CYP11B1, 11-hidroxilase; CYP19, aromatase; ACTH, adrenocorticotrofina; RSPO1, R-espondina 1;
HSRC, hiperplasia suprarrenal congênita.
114
sim como a necessidade de consentimento pelo indivíduo. Existe ■■ OUTROS DISTÚRBIOS QUE AFETAM AS MULHERES 46,XX
um limiar muito alto para a realização da cirurgia do clitóris em A ausência congênita da vagina ocorre em associação com a agenesia
alguns centros, visto que a sensibilidade a longo prazo e a capa- ou hipoplasia mülleriana como parte da síndrome de Mayer-Roki-
cidade de alcançar o orgasmo podem ser afetadas; todavia, os tansky-Kuster-Hauser (MRKH) (raramente causada por mutações
resultados de longo prazo das técnicas mais recentes ainda não WNT4). Esse diagnóstico deve ser considerado em mulheres feno-
são conhecidos. Se a cirurgia for realizada na lactância, pode ser tipicamente normais nos demais aspectos, porém com amenorreia
necessária uma revisão cirúrgica ou uma dilatação vaginal regular primária. As características associadas incluem anormalidades renais
na adolescência ou na vida adulta, podendo ser apropriado um (agenesia) e da coluna cervical.
apoio psicológico de longo prazo, bem como aconselhamento
psicossexual. Com frequência, as mulheres com 21-OHD desen- ■■ CONSIDERAÇÕES GLOBAIS
volvem ovários policísticos e apresentam fertilidade reduzida, A abordagem à criança ou ao adolescente com genitália am-
particularmente quando o controle é inadequado. A fecundidade bígua ou outro DDS exige sensibilidade cultural, visto que
é obtida em até 90% das mulheres, porém é frequentemente ne- os conceitos de sexo e gênero variam amplamente. Podem
cessário induzir a ovulação (ou até mesmo a suprarrenalectomia). ocorrer DDS genéticos raros mais frequentemente em populações
Capítulo 7
A dexametasona deve ser evitada durante a gravidez. Os homens específicas (p. ex., 5-redutase tipo 2 na República Dominicana). Di-
com 21-OHD precariamente controlada podem desenvolver res- ferentes formas de HSRC mostram também uma variabilidade étnica
tos suprarrenais testiculares e correm risco de ter uma fertilidade e geográfica. Em muitos países, os testes bioquímicos apropriados
reduzida. O tratamento pré-natal da 21-OHD pela administração poderão não estar prontamente disponíveis, e o acesso às formas ade-
de dexametasona às mães está ainda em fase de avaliação. Toda- quadas de cirurgia ou tratamento ser limitado.
via, o tratamento da mãe e da criança deve ser iniciado preferen-
cialmente antes de 6 a 7 semanas; os efeitos de longo prazo da ex- BIBLIOGRAFIA
posição pré-natal à dexametasona sobre o desenvolvimento fetal
Bojesen A, Gravholt CH: Klinefelter syndrome in clinical practice. Nat
ainda estão sendo avaliados.
115
CAPÍTULO 8 Velocidade de
aumento da altura
Genitália
Shalender Bhasin 2 3 4 5
J. Larry Jameson
Pelos
púbicos 2 3 4 5
O sistema reprodutor masculino regula a diferenciação sexual, a
virilização e as alterações hormonais que acompanham a puberda- Estágios de Tanner
SEÇÃO II
e a virilização da genitália externa. Durante a puberdade, a testos- incluem o eixo da glândula suprarrenal e do hormônio do crescimen-
terona promove o crescimento somático e o desenvolvimento das to (GH) (Fig. 8.1). O desenvolvimento das características sexuais
características sexuais secundárias. Nos adultos, a testosterona é ne- secundárias é iniciado pela adrenarca, que geralmente ocorre entre
cessária para a espermatogênese, a estimulação da libido, a função se- 6 e 8 anos de idade quando a suprarrenal começa a produzir maio-
xual normal e a manutenção da massa muscular e óssea. Este capítulo res quantidades de androgênios a partir da zona reticular, o principal
enfoca a fisiologia dos testículos e os distúrbios associados a menor local de produção de desidroepiandrosterona (DHEA). O processo
produção de androgênio, que pode ser causada por uma deficiência de maturação sexual é acelerado grandemente pela ativação do eixo
de gonadotrofina ou por disfunção testicular primária. Atualmente hipotalâmico-hipofisário e pela produção do GnRH no hipotálamo,
várias formulações de testosterona tornam possível uma reposição que é ativo durante a vida fetal e o início da infância, porém é re-
mais fisiológica do androgênio. A infertilidade ocorre em cerca de primido até os estágios iniciais da puberdade por um freio neuro-
5% dos homens e está sendo tratada com uma frequência cada vez
endócrino imposto pelas ações inibitórias do glutamato, do ácido
maior por reposição hormonal ou por meio de técnicas de transfe-
-aminobutírico (GABA) e do neuropeptídio Y. Embora as vias que
rência de espermatozoides. Para uma discussão mais detalhada sobre
iniciam a reativação do gerador de pulsos do GnRH no início da pu-
disfunção sexual, distúrbios da próstata e câncer testicular, ver Capí-
berdade não tenham sido bem definidas, evidências crescentes sus-
tulos 15 e 9, respectivamente.
tentam a participação do GPR54, um receptor acoplado à proteína
G que se une a um ligante endógeno, denominado kisspeptina. Os
DESENVOLVIMENTO E ESTRUTURA DO TESTÍCULO indivíduos com mutações de GPR54 não conseguem entrar na pu-
O testículo fetal se desenvolve a partir da gônada indiferenciada após berdade, e as experiências realizadas em primatas mostram que a
a expressão de uma cascata genética que é iniciada pelo SRY (gene infusão de kisspeptina é suficiente para induzir puberdade precoce.
relacionado com o sexo no cromossomo Y) (Cap. 7). O SRY induz a A sinalização da kisspeptina desempenha um importante papel na
diferenciação das células de Sertoli, que circundam as células germi- mediação da ação dos esteroides sexuais por retroalimentação na se-
nativas e, juntamente com as células mioides peritubulares, formam creção das gonadotrofinas, bem como na regulação do andamento da
os cordões testiculares que, em seguida, se transformam em túbulos maturação sexual na puberdade. A leptina, um hormônio produzido
seminíferos. As células de Leydig fetais e as células endoteliais migram pelas células adiposas, desempenha um papel permissivo na ressur-
para a gônada a partir do mesonéfron adjacente, mas também podem gência da secreção de GnRH no início da puberdade, uma vez que os
ter origem nas células intersticiais localizadas entre os cordões testi- indivíduos com deficiência de leptina também não conseguem entrar
culares. As células de Leydig produzem testosterona, que estimula o na puberdade (Cap. 16).
crescimento e a diferenciação das estruturas dos ductos de Wolff que Os estágios iniciais da puberdade se caracterizam por oscilações
se transformam em epidídimo, ducto deferente e vesículas seminais. A noturnas de LH e FSH. O crescimento dos testículos geralmente
testosterona é transformada também em DHT (ver adiante), que induz constitui o primeiro sinal de puberdade, refletindo um aumento no
a formação da próstata e da genitália masculina externa, incluindo o volume dos túbulos seminíferos. Níveis cada vez maiores de testos-
pênis, a uretra e a bolsa escrotal. A descida dos testículos pelo canal terona tornam a voz mais grave e aceleram o crescimento muscular.
inguinal é controlada, em parte, pela produção do fator insulino-símile A transformação de testosterona em DTH induz o crescimento da
3 (INSL3) pelas células de Leydig, que atua por meio de um receptor genitália externa e dos pelos púbicos. A DTH estimula também o
denominado LGR8 (receptor acoplado à proteína G contendo repeti- crescimento da próstata e dos pelos faciais e inicia a recessão da
ções ricas em leucina 8, também conhecido como GREAT: receptor linha temporal da implantação dos cabelos. A expansão de cresci-
acoplado à proteína G que afeta a descida do testículo). As células de mento ocorre para um volume testicular de aproximadamente 10
Sertoli produzem a substância inibidora mülleriana (MIS), que acar-
a 12 mL. O GH aumenta no início da puberdade e é estimulado
reta a regressão das estruturas müllerianas, incluindo a tuba uterina, o
em parte pela elevação nos esteroides gonadais. O GH acarreta
útero e o segmento superior da vagina.
elevações no nível do fator do crescimento semelhante à insulina
I (IGF-I), que acelera o crescimento linear dos ossos. A exposição
DESENVOLVIMENTO PUBERAL MASCULINO NORMAL puberal prolongada aos esteroides gonadais (principalmente estra-
Puberdade refere-se comumente à maturação do eixo reprodutor e diol) acaba acarretando o fechamento epifisário e limita qualquer
ao desenvolvimento das características sexuais secundárias, porém crescimento adicional dos ossos.
116
REGULAÇÃO DA FUNÇÃO TESTICULAR ■■ A CÉLULA DE LEYDIG: SÍNTESE DOS ANDROGÊNIOS
O LH une-se a seu receptor de sete domínios transmembrana aco-
■■ REGULAÇÃO DO EIXO HIPOTALÂMICO-HIPOFISÁRIO-TESTICULAR
plado à proteína G para ativar a via do AMP cíclico. A estimulação
NO HOMEM ADULTO do receptor de LH induz a proteína reguladora aguda dos esteroides
O GnRH hipotalâmico regula a produção das gonadotrofinas hipo- (StAR), juntamente com várias enzimas esteroidogênicas que par-
fisárias, LH e FSH (Fig. 8.2). O GnRH é liberado em pulsos distintos ticipam na síntese do androgênio. As mutações no receptor de LH
aproximadamente a cada 2 horas, resultando em pulsos correspon- causam hipoplasia ou agenesia das células de Leydig, o que revela a
dentes de LH e FSH. Esses pulsos hormonais dinâmicos são respon- importância dessa via para o desenvolvimento e a função da célula de
sáveis em parte pelas amplas variações no LH e na testosterona, até Leydig. O processo que limita o ritmo na síntese da testosterona é a
no mesmo indivíduo. O LH atua principalmente sobre a célula de entrega do colesterol pela proteína StAR à membrana mitocondrial
Leydig para estimular a síntese de testosterona. O controle regula- interna. O receptor periférico da benzodiazepina, uma proteína mi-
dor da síntese dos androgênios é mediado por um feedback da tes- tocondrial ligada ao colesterol, também é um regulador agudo da es-
tosterona e do estrogênio atuando sobre o hipotálamo e a hipófise. O teroidogênese da célula de Leydig. As cinco principais etapas enzimá-
FSH atua sobre a célula de Sertoli regulando a espermatogênese e a ticas que a síntese da testosterona envolve estão resumidas na Figura
Capítulo 8
produção dos derivados dessa célula, tais como a inibina B, que atua 8.3. Após o transporte do colesterol para dentro da mitocôndria, a
para suprimir seletivamente o FSH hipofisário. Não obstante essas formação de pregnenolona por CYP11A1 (enzima responsável pela
vias distintas reguladas pelas células de Leydig e de Sertoli, a função clivagem das cadeias laterais) é uma etapa enzimática limitante. As
testicular é integrada em vários níveis: o GnRH regula ambas as go- reações de 17-hidroxilase e 17,20-liase são catalisadas por uma úni-
nadotrofinas; a espermatogênese requer altos níveis de testosterona; ca enzima, CYP17; a modificação pós-translacional (fosforilação)
numerosas interações parácrinas entre as células de Leydig e de Ser- dessa enzima e a presença de cofatores enzimáticos específicos con-
toli são necessárias para a função testicular normal. ferem seletividade para a atividade de 17,20-liase no testículo e na
zona reticular da suprarrenal. A testosterona pode ser transformada
em DHT, mais potente, pela ação da 5-redutase, ou pode ser aroma-
Testosterona LH Colesterol
– Inibina B + FSH (enzima para a clivagem da
DHT CYP11A1
cadeia lateral do colesterol)
Pregnenolona
3β-HSD2 (3β-Hidroxiesteroide
desidrogenase/isomerase 2)
Túbulos Progesterona
Ducto deferente seminíferos CYP17 (17-Hidroxilase)
Epidídimo Túnica albugínea
LH 17-OH-progesterona
CYP17 (17,20-Liase)
FSH +
Androstenediona
+ Células de Leydig
intersticiais 17β-HSD3 (17β-Hidroxiesteroide desidrogenase 3)
(testosterona)
Célula de Sertoli OH
Testículo
(inibina B)
Espermátide
OH
Testosterona
5α-Redutase CYP19 (aromatase)
Testículo e tecidos
OH OH
periféricos
Túbulos
seminíferos
O H HO
Espermatogônia Diidrotestosterona Estradiol
Figura 8.2 Eixo das gonadotrofinas hipofisárias humanas, estrutura do Figura 8.3 A via bioquímica na conversão do esterol colesterol de 27 car-
testículo, túbulo seminífero. E2, 17-estradiol; DHT, diidrotestosterona. bonos em androgênios e estrogênios.
117
Transporte e metabolismo da testosterona danças de conformação, que possibilitam o recrutamento e a monta-
gem de cofatores teciduais específicos e acarreta a sua translocação
Nos homens, 95% da testosterona circulante derivam da produção
para o interior do núcleo, onde se liga ao DNA ou a outros fatores
testicular (3 a 10 mg/dia). A secreção direta da testosterona pela
de transcrição já ligados ao DNA. Assim sendo, o RA é um fator de
suprarrenal e a conversão periférica da androstenediona em testos-
transcrição regulado por um ligante. Alguns efeitos androgênicos
terona são responsáveis, em conjunto, por cerca de 0,5 mg/dia de
podem ser mediados por vias de transdução dos sinais de um RA não
testosterona. Apenas uma pequena quantidade de DHT (70 g/dia)
genômico. A testosterona liga-se ao RA com metade da afinidade da
é secretada diretamente pelo testículo; a maior parte da DHT circu-
DHT. O complexo DHT-RA também tem maior termoestabilidade e
lante deriva da conversão periférica da testosterona. A maior parte
um ritmo de dissociação mais lento que o complexo testosterona RA.
da produção diária de estradiol (aproximadamente 45 g/dia) nos
No entanto, a base molecular para as ações seletivas da testosterona
homens deriva da conversão periférica da testosterona e da androste-
versus DHT ainda não foram totalmente explicadas.
nediona mediada pela aromatase.
A testosterona circulante está ligada a duas proteínas plasmáticas: ■■ OS TÚBULOS SEMINÍFEROS: ESPERMATOGÊNESE
globulina de ligação dos hormônios sexuais (SHBG) e albumina (Fig. Os túbulos seminíferos são alças fechadas convolutas com ambas as
8.4). A SHBG se liga à testosterona com uma afinidade muito maior extremidades desaguando na rede do testículo (rete testis), um sis-
que a albumina. Apenas 0,5 a 3% da testosterona existem em forma tema reticulado de ductos eferentes progressivamente maiores que
SEÇÃO II
livre (não ligada). Em conformidade com a hipótese dos “hormônios acaba formando o epidídimo (Fig. 8.2). Os túbulos seminíferos tota-
livres”, apenas a fração livre (não ligada) é biologicamente ativa; no lizam cerca de 600 m de comprimento e representam cerca de 66% do
entanto, o hormônio ligado à albumina dissocia-se prontamente nos volume testicular. As paredes dos túbulos são formadas por células de
capilares e pode tornar-se biodisponível. As concentrações de SHBG Sertoli polarizadas que entram em aposição com as células mioides
são reduzidas por androgênios, obesidade, diabetes melito, insulina peritubulares. As junções impermeáveis entre as células de Sertoli
e síndrome nefrótica. Inversamente, a administração de estrogênio, criam uma barreira hematotesticular. As células germinativas cons-
o hipertireoidismo, muitas enfermidades inflamatórias crônicas e o tituem a maior parte do epitélio seminífero (cerca de 60%) e estão
envelhecimento estão associados a altas concentrações de SHBG. implantadas profundamente dentro das extensões citoplasmáticas
Endocrinologia Reprodutiva
A testosterona é metabolizada predominantemente no fígado, das células de Sertoli, que funcionam como “células nutrientes”. As
apesar de alguma degradação ocorrer também nos tecidos peri- células germinativas progridem por meio de estágios característicos
féricos, particularmente na próstata e na pele. No fígado, a testos- de divisões mitóticas e meióticas. Um reservatório de espermatogô-
terona é transformada em androsterona, etiocolanolona, DHT e nias tipo A funciona como células-tronco capazes de autorrenova-
3--androstanediol por uma série de etapas enzimáticas que envol- ção. Os espermatócitos primários derivam das espermatogônias tipo
vem as 5 e 5-redutases, as 3 e 3-hidroxiesteroide desidrogena- B e sofrem meiose antes de progredir para espermátides, que sofrem
ses e a 17-hidroxiesteroide desidrogenase. Esses compostos sofrem espermiogênese (um processo de diferenciação que implica conden-
glicuronidação ou sulfatização antes de serem excretados pelos rins. sação da cromatina, aquisição de um acrossomo, alongamento do
citoplasma e formação de uma cauda) e são liberados pelas células
Mecanismo de ação do androgênio de Sertoli como espermatozoides maduros. O processo completo de
O receptor de androgênio (RA) está relacionado estruturalmente aos diferenciação em espermatozoides maduros leva 74 dias. A ação tipo
receptores nucleares para estrogênio, glicocorticoides e progesterona peristáltica executada pelas células mioides peritubulares transporta
(Cap. 1). O RA é codificado por um gene no braço longo do cromos- o esperma para o interior dos ductos eferentes. Os espermatozoides
somo X e tem uma massa molecular de aproximadamente 110 kDa. passam outros 21 dias no epidídimo, onde sofrem maturação e ca-
Uma região polimórfica no aminoterminal do receptor, que contém pacitação adicionais. Os testículos adultos normais produzem > 100
um número variável de repetições da glutamina, modifica a atividade milhões de espermatozoides por dia.
transcricional do receptor. A proteína do RA se distribui tanto no As mutações que ocorrem no gene FSH e no receptor do FSH
citoplasma quanto no núcleo. A ligação do ligante ao RA induz mu- confirmam um papel importante, mas não essencial, para essa via na
espermatogênese. As mulheres que apresentam essas mutações são
hipogonádicas e inférteis, pois os folículos ovarianos não amadure-
METABOLISMO E AÇÃO DOS ANDROGÊNIOS cem. Os homens exibem graus variáveis de espermatogênese redu-
Biodisponíveis zida, presumivelmente por causa da função deteriorada das células
de Sertoli. Já que as células de Sertoli produzem inibina B, que é um
inibidor do FSH, o dano dos túbulos seminíferos (p. ex., por irradia-
Não ligados Albumina SHBG
ção) acarreta um aumento seletivo do FSH. A testosterona alcança
(0,5 a 3,0%) (50 a 70%) (30 a 45%)
altíssimas concentrações localmente no testículo e é essencial para a
Excreção espermatogênese. As ações cooperativas do FSH e da testosterona são
Testosterona (5 mg/dia) (90%) importantes na progressão da meiose e da espermatogênese. O FSH
e a testosterona regulam a sobrevida das células germinativas por
5-redutase Aromatase meio de mecanismos apoptóticos intrínsecos e extrínsecos. O FSH
(6 a 8%) (0,3%) também pode desempenhar um importante papel na sustentação das
espermatogônias. A RNA helicase testicular regulada por gonadotro-
Diidrotestosterona Testosterona Estradiol finas (GRTH/DDX25), uma RNA helicase regulada por androgênio/
(DHT) gonadotrofina específica do testículo, é encontrada nas células ger-
minativas e nas células de Leydig e pode participar na regulação pa-
rácrina do desenvolvimento das células germinativas.
• Genitália externa • Ducto de Wolff • Retroalimentação
• Crescimento • Formação dos hipotalâmica/
Vários modelos murinos de deleção (knockout) exibem deterio-
da próstata ossos hipofisária ração do desenvolvimento das células germinativas ou da esperma-
• Acne • Massa muscular • Reabsorção óssea togênese, o que permite prever a ocorrência de possíveis mutações
• Pelos faciais/ • Espermatogênese • Fechamento epifisário associadas à infertilidade masculina. O cromossomo Y humano con-
corporais • Ginecomastia tém uma pequena região pseudoautossômica que pode recombinar-
• Queda dos cabelos • Alguns efeitos
vasculares e -se com regiões homólogas do cromossomo X. A maior parte do
comportamentais cromossomo Y não se recombina com o cromossomo X e recebe a
designação de região masculina específica do Y (MSY). O MSY con-
Figura 8.4 Metabolismo e ações dos androgênios. SHBG, globulina de liga- tém 156 unidades de transcrição que codificam 26 proteínas, incluin-
ção dos hormônios sexuais. do nove famílias de genes com várias cópias específicos de Y; muitos
118
desses genes específicos de Y são também específicos de testículos ■■ MENSURAÇÕES DAS GONADOTROFINAS E DA INIBINA
e são necessários para a espermatogênese. Microdeleções de vários
LH e FSH são medidos por meio de ensaios imunorradiométricos,
genes do fator de azoospermia (AZF) no cromossomo Y (p. ex., de
imunofluorométricos ou quimioluminescentes em dois locais, que
ligação ao RNA, RBM; deletado na azoospermia, DAZ) estão associa-
têm uma reatividade cruzada muito baixa com outros hormônios gli-
das a oligospermia ou azoospermia.
coproteicos hipofisários e a gonadotrofina coriônica humana (hCG)
e possuem sensibilidade suficiente para conseguirem medir os baixos
níveis presentes nos pacientes com hipogonadismo hipogonadotró-
TRATAMENTO Infertilidade do fator masculino fico. Nos homens com um baixo nível de testosterona, o nível de LH
permite distinguir entre hipogonadismo primário (LH alto) e secun-
As opções terapêuticas para infertilidade devida ao fator mascu-
dário (LH baixo ou inadequadamente normal). Um nível elevado de
lino aumentaram muito nos últimos anos. O hipogonadismo se-
LH indica defeito primário em nível testicular, enquanto um nível
cundário é passível de tratamento com gonadotrofinas (ver adian-
baixo ou inadequadamente normal de LH sugere defeito em nível hi-
te). As tecnologias reprodutivas assistidas, como a fertilização in
potalâmico-hipofisário. Os pulsos de LH ocorrem aproximadamente
vitro (FIV) e a injeção intracitoplasmática de espermatozoides
a cada 1 a 3 horas em homens normais. Assim sendo, os níveis das
(IICE), proporcionaram novas oportunidades para pacientes com
Capítulo 8
gonadotrofinas flutuam e as amostras devem ser acumuladas ou sua
infertilidade devido ao fator masculino apresentando insuficiên-
obtenção repetida quando os resultados são duvidosos. O FSH é me-
cia testicular primária e distúrbios do transporte dos esperma-
nos pulsátil que o LH, pois tem uma meia-vida mais longa. O aumen-
tozoides. A escolha das opções terapêuticas iniciais depende da
to seletivo do FSH sugere dano nos túbulos seminíferos. A inibina
concentração e da motilidade dos espermatozoides. A conduta
B, um produto das células de Sertoli que suprime o FSH, é reduzida
expectante dever ser tentada inicialmente em homens com uma
quando existe algum dano nos túbulos seminíferos. A inibina B é um
ligeira infertilidade devida ao fator masculino (contagem de es-
dímero com subunidades -B e deve ser medida com imunoensaios
permatozoides de 15 a 20 106/mL e motilidade normal). Infer-
realizados em dois locais.
tilidade moderada devida ao fator masculino (10 a 15 106/mL e
tilidade masculina. As amostras são coletadas por masturbação após C. Tumores do SNC e seu tratamento (radioterapia e cirurgia)
um período de abstinência de 2 a 3 dias. Os volumes do sêmen e as D. Causas hipotalâmico‑hipofisárias de falência puberal
concentrações de espermatozoides variam consideravelmente entre os (gonadotrofinas baixas)
homens férteis e poderão ser necessárias várias amostras antes que 1. Distúrbios congênitos (Quadro 8.2)
seja possível concluir que os resultados são anormais. A análise deve
ser realizada dentro de 1 h após a coleta. O volume ejaculado normal a. Síndromes hipotalâmicas (p. ex., Prader‑Willi)
é de 2 a 6 mL e apresenta contagens de espermatozoides > 20 milhões/ b. Hipogonadismo hipogonadotrófico idiopático
mL, com uma motilidade de mais de 50% e uma morfologia normal c. Congênitas
mais de 15%. Não obstante, alguns homens com baixas contagens de d. Mutações de PROP1 e outras mutações que afetam o
espermatozoides são férteis. Vários testes para a função dos esperma- desenvolvimento/a função da hipófise
tozoides podem ser realizados em laboratórios especializados, porém 2. Distúrbios adquiridos
eles acrescentam relativamente pouco às opções de tratamento.
a. Tumores hipofisários
■■ BIÓPSIA TESTICULAR b. Hiperprolactinemia
A biópsia testicular é útil em alguns pacientes com oligospermia E. Causas gonadais de falência puberal (gonadotrofinas elevadas)
ou azoospermia como recurso acessório para se estabelecer o diag- 1. Síndrome de Klinefelter
nóstico e como uma indicação para a exequibilidade do tratamento.
2. Testículos criptorquídicos bilaterais
Utilizando-se anestesia local, realiza-se a biópsia por aspiração com
agulha fina a fim de aspirar tecido para o exame histológico. Como 3. Orquite
alternativa, as biópsias abertas podem ser feitas sob anestesia local ou 4. Quimioterapia ou radioterapia
geral quando é necessário mais tecido. Uma biópsia normal em um 5. Anorquia
homem azoospérmico com um nível normal de FSH sugere obstru- F. Insensibilidade aos androgênios
ção do ducto deferente, que pode ser corrigida cirurgicamente. As
biópsias são usadas também com a finalidade de obter espermatozoi- Nota: SNC, sistema nervoso central; GnRH, hormônio de liberação das gonadotrofinas; hCG,
des para a IICE e para classificar os distúrbios, tais como hiposper- gonadotrofina coriônica humana; LH, hormônio luteinizante.
matogênese (todos os estágios presentes, porém em números reduzi-
dos), a parada de desenvolvimento das células germinativas (em geral ro compatível com o sexo fenotípico e inclui características como de-
no estágio de espermatócito primário) e a síndrome somente células senvolvimento dos pêlos faciais e crescimento fálico. A precocidade
de Sertoli – Sertolli cell-only (células germinativas ausentes) ou hiali- isossexual é dividida em causas de excesso androgênico dependentes
nização (esclerose com ausência de elementos celulares). de gonadotrofina e independentes de gonadotrofina (Quadro 8.1).
Precocidade heterossexual refere-se ao desenvolvimento prematuro
DISTÚRBIOS DA DIFERENCIAÇÃO SEXUAL de características estrogênicas em meninos, como o desenvolvimen-
Ver o Capítulo 7. to mamário.
Puberdade precoce dependente de gonadotrofina
DISTÚRBIOS DA PUBERDADE Este distúrbio, denominado puberdade precoce central (PPC), é me-
O início e a progressão da puberdade variam acentuadamente na nos comum em meninos do que em meninas. É causado pela ativa-
população geral e são afetados por fatores genéticos e ambientais. ção prematura do gerador de pulsos de GnRH, às vezes em virtude
Embora parte da variância no momento de ocorrência da puberda- de lesões do sistema nervoso central (SNC), como hamartomas hi-
de seja explicada por fatores hereditários, os genes envolvidos e suas potalâmicos, porém na maioria das vezes é idiopático. A PPC carac-
relativas contribuições para o momento de início da puberdade não teriza-se por níveis de gonadotrofinas que são inadequadamente ele-
são conhecidos. vados para a idade. Pelo fato de já ter ocorrido a devida preparação
da hipófise, o GnRH induz respostas de LH e FSH típicas daquelas
■■ PUBERDADE PRECOCE observadas na puberdade ou nos adultos. Deve-se realizar a RM para
A puberdade em meninos antes dos 9 anos é considerada precoce. se excluir a presença de uma massa, de um defeito estrutural, de uma
Precocidade isossexual refere-se ao desenvolvimento sexual prematu- infecção ou de um processo inflamatório.
120
nas suprarrenais, na hipófise e na tireoide.
QUADRO 8.2 Causas de hipogonadismo hipogonadotrófico congênito As manchas café-com-leite são lesões cutâ-
Gene Locus Herança Características Associadas neas características que refletem o início
das mutações somáticas nos melanócitos
KAL1 Xp22 Ligada ao X Anosmia, agenesia renal, sincinesia, fenda labial/ durante o desenvolvimento embrionário. A
palatina, defeitos oculomotores/visoespaciais, má displasia fibrosa poliostótica é causada pela
rotações do intestino ativação da via do receptor do paratormônio
NELF 9q34.3 AR Anosmia, hipogonadismo hipogonadotrófico no osso. O tratamento é semelhante àquele
FGFR1 8p11‑p12 AD Anosmia, fenda labial/palatina, sincinesia, sindactilia adotado nos pacientes com mutações ativa-
PROK2 20p13 AR Anosmia, hipogonadismo hipogonadotrófico doras do receptor de LH. Os bifosfonatos fo-
PROKR2 20p12.3 AR Anosmia ram usados para tratar as lesões ósseas.
LEP 7q31 AR Obesidade Hiperplasia suprarrenal congênita Os meni-
LEPR 1p31 AR Obesidade nos com hiperplasia suprarrenal congênita
PC1 5q15‑21 AR Obesidade, diabetes melito, deficiência de ACTH
(HSRC) que não são bem controlados pela
Capítulo 8
supressão com glicocorticoides do hormô-
HESX1 3p21 AR Displasia septo‑óptica, CPHD
nio adrenocorticotrófico (ACTH) podem
AD Insuficiência isolada de GH desenvolver virilização prematura em virtu-
LHX3 9q34 AR CPHD (ACTH preservado), rigidez da coluna cervical de da produção excessiva de androgênio pela
PROP1 5q35 AR CPHD (ACTH habitualmente preservado) suprarrenal (Caps. 5 e 7). O LH é baixo e os
GPR54 19p13 AR Nenhuma testículos são pequenos. Restos suprarrenais
podem desenvolver-se dentro dos testículos
GNRHR 4q21 AR Nenhuma
de pacientes inadequadamente controlados
FSH 11p13 AR ↑ LH com HSRC, devido à estimulação crônica do
121
e ultrassonografia a fim de excluir uma neoplasia de células de bolsas escrotais. Tamanho testicular > 2,5 cm em geral indica que
Leydig. Deve-se aventar a presença de mutações ativadoras do re- a criança entrou na puberdade.
ceptor do LH em crianças com puberdade precoce independente O principal desafio diagnóstico reside em distinguir aqueles
de gonadotrofina nas quais a HSRC, o uso abusivo de androgênio que apresentam um retardo constitucional, que farão sua progres-
e as neoplasias supra-renais e testiculares foram excluídos. são por meio da puberdade em uma idade subsequente, daqueles
que têm um processo patológico subjacente. Deve-se suspeitar de
retardo constitucional quando existe uma história familial e quan-
do se constata uma idade óssea retardada e uma estatura baixa. O
TRATAMENTO Puberdade precoce preparo apropriado da hipófise pelo GnRH pulsátil é necessário
antes de LH e FSH serem sintetizados e secretados normalmente.
Nos pacientes com uma causa conhecida (p. ex., lesão do SNC ou Assim sendo, respostas mais fracas ao GnRH exógeno podem ser
tumor testicular), a terapia deve ser dirigida ao distúrbio subja- observadas nos pacientes com retardo constitucional, deficiência
cente. Nos pacientes com PPC idiopática, podem-se usar análo- de GnRH ou distúrbios hipofisários (ver, “Teste de estimulação
gos do GnRH de ação longa para suprimir as gonadotrofinas e com GnRH”, anteriormente). Em contrapartida, os níveis basais
reduzir os níveis de testosterona, interromper o desenvolvimento baixos a normais de gonadotrofinas ou uma resposta normal ao
SEÇÃO II
puberal precoce, retardar a maturação óssea acelerada e prevenir GnRH exógeno são compatíveis com um estágio precoce da pu-
o fechamento epifisário precoce, aumentando, assim, a altura fi- berdade, que frequentemente é prenunciado por uma secreção no-
nal do indivíduo e reduzindo as consequências psicossociais do turna de GnRH. Assim sendo, o retardo constitucional é um diag-
desenvolvimento puberal precoce. O tratamento é mais eficaz nóstico de exclusão que requer uma avaliação permanente até o
para aumentar a altura final em adultos se for iniciado antes dos início da puberdade e a explosão de crescimento (estirão puberal).
6 anos de idade. A puberdade recomeça após a interrupção do
análogo de GnRH. O aconselhamento constitui um aspecto im-
portante da estratégia terapêutica global.
Endocrinologia Reprodutiva
122
anormalidades variáveis na frequência ou na amplitude dos pulsos de ativação preferencial da liberação de GnRH no início do desenvol-
LH. Nos casos graves, o LH basal é baixo e seus pulsos estão ausentes. vimento, e o seu receptor (TAC3R) foram implicados em algumas
Um subgrupo menor de pacientes possui pulsos LH de baixa ampli- famílias com HHI normósmico. As mutações em mais de um gene
tude ou uma frequência dos pulsos acentuadamente reduzida. Oca- (digenicidade) podem contribuir para a heterogeneidade clinica ob-
sionalmente, ocorrem apenas os pulsos de LH induzidos pelo sono, o servada em pacientes portadores de HHI. Raramente, foram descri-
que representa uma reminiscência do padrão observado nos estágios tas mutações recessivas nos genes LH ou FSH em pacientes com
iniciais da puberdade. O hipogonadismo hipogonadotrófico pode ser deficiências seletivas dessas gonadotrofinas. Em aproximadamente
classificado em distúrbios congênitos e adquiridos. Os distúrbios con- 10% dos homens com HHI, pode ocorrer reversão da deficiência de
gênitos envolvem mais comumente uma deficiência de GnRH, que re- gonadotrofinas na vida adulta. Além disso, uma pequena fração de
sulta em deficiência de gonadotrofinas. Os distúrbios adquiridos são homens com HHI pode apresentar deficiência de androgênios e in-
mais comuns que os distúrbios congênitos e podem resultar de uma fertilidade na vida adulta após ter passado por um desenvolvimento
ampla variedade de lesões expansivas selares ou de doenças infiltrati- puberal aparentemente normal.
vas do hipotálamo ou da hipófise. Diversos fatores de transcrição dos “homeodomínios” partici-
pam no desenvolvimento e na diferenciação das células especializa-
Distúrbios congênitos associados à deficiência de gonadotrofinas das produtoras de hormônios dentro da hipófise (Quadro 8.2). Os
Capítulo 8
A maioria dos casos de hipogonadismo hipogonadotrófico congênito pacientes com mutações de PROP1 têm uma deficiência combinada
é idiopática, não obstante o grande número de testes endócrinos e os dos hormônios hipofisários que inclui GH, prolactina (PRL), hormô-
exames com imagens da região selar. Entre as causas conhecidas, o nio tireoestimulante (TSH), LH e FSH, porém não ACTH. As mu-
hipogonadismo hipogonatrófico familial pode ser transmitido como tações de LHX3 causam uma deficiência combinada de hormônios
um traço ligado ao X (20%), autossômico recessivo (30%), ou autos- hipofisários em associação com rigidez da coluna cervical. As muta-
sômico dominante (50%). Alguns indivíduos com hipogonadismo ções de HESX1 causam displasia septo-óptica e deficiência combina-
hipogonadotrófico idiopático (HHI) têm mutações esporádicas nos da dos hormônios hipofisários.
mesmos genes que causam as formas hereditárias do distúrbio (Qua- A síndrome de Prader-Willi caracteriza-se por obesidade, hipo-
Capítulo 8
Hodgkin e cânceres testiculares e de outros órgãos pode afetar a rária nos níveis de testosterona e podem causar defeitos persistentes
função das células de Leydig e causar infertilidade. O grau de dis- na espermatogênese; alguns pacientes conservam a capacidade de
função gonadal depende do tipo de agente quimioterapêutico e da ereção peniana e de ejaculação.
dose e duração da terapia. Por causa das altas taxas de respostas e
da idade jovem desses homens, a infertilidade e a deficiência de an- ■■ SÍNDROMES DE INSENSIBILIDADE AOS ANDROGÊNIOS
drogênios emergiram como importantes complicações a longo prazo As mutações no RA causam resistência à ação da testosterona e da
da quimioterapia para câncer. A ciclofosfamida e os esquemas com- DHT. Essas mutações ligadas ao X estão associadas a graus variáveis
binados que contêm procarbazina são particularmente tóxicos para de desenvolvimento fenotípico masculino defeituoso e subvirilização
guladores dos genes contíguos, resultando em produção excessiva de antiestrogênios, como tamoxifeno (20 mg/dia), consegue reduzir
estrogênio na gordura assim como em outros tecidos extragonadais. a dor e o tamanho do tecido mamário em mais de metade dos
Os medicamentos podem causar ginecomastia atuando diretamente pacientes. Em ensaios clínicos de pequeno porte, foi relatado que
como substâncias estrogênicas (p. ex., contraceptivos orais, fitoestro- os antagonistas dos receptores de estrogênio, o tamaxifeno e o ra-
gênios, digitálicos), inibindo a síntese dos androgênios (p. ex., ceto- loxifeno, reduzem o tamanho das mamas em homens com gine-
conazol), ou sua ação (p. ex., espironolactona). comastia puberal, embora a regressão completa do aumento das
Levando-se em conta que até 66% dos meninos púberes e metade mamas seja incomum com o uso de antagonistas dos receptores
dos homens hospitalizados têm tecido glandular palpável que é de na- de estrogênio. Os inibidores da aromatase podem ser efetivos na
tureza benigna, uma investigação ou intervenção detalhada não está
Endocrinologia Reprodutiva
Capítulo 8
Provável Deficiência de
hiperlipidemia, relatou um maior número de eventos cardiovasculares deficiência de
T livre baixa T livre
androgênios
T total < 300 ng/dL normal
nos homens randomizados para o braço do estudo com testosterona androgênios excluída
do que naqueles do braço do placebo. A triagem populacional de to-
dos os homens mais velhos para níveis baixos de testosterona não é
recomendada e os testes deverão restringir-se aos homens que relatam LH
sintomas ou que apresentam características físicas que possam ser atri-
buídas à deficiência de androgênios. A terapia com testosterona não é LH elevado LH baixo ou
inapropriadamente normal
recomendada para todos os homens mais velhos com baixos níveis de
testosterona. Em homens mais velhos com sintomas significativos de
127
TRATAMENTO Disfunção reprodutiva relacionada com a idade testosterona aprimora a libido e a atividade sexual de modo geral
e aumenta a energia, a massa muscular magra e a densidade óssea.
GONADOTROFINAS A terapia com gonadotrofinas é usada para se Os benefícios da terapia de reposição da testosterona foram com-
estabelecer ou restaurar a fertilidade em pacientes que apresen- provados apenas em homens que tinham deficiência documenta-
tam deficiência de gonadotrofinas de qualquer causa. Estão dis- da de androgênios, conforme demonstrada por níveis de testos-
poníveis vários preparados de gonadotrofinas. A gonadotrofina terona muito abaixo do limite inferior do normal (< 250 ng/dL).
menopáusica humana (hMG; purificada a partir da urina de mu- A testosterona está disponível em várias formulações com
lheres na pós-menopausa) contém 75 UI de FSH e 75 UI de LH uma farmacocinética distinta (Quadro 8.3). Funciona como um
em cada frasco. A hCG (purificada a partir da urina de mulheres pró-hormônio e é transformada em 17-estradiol pela aromatase
grávidas) tem pouca atividade FSH e é muito semelhante ao LH e em 5-diidrotestosterona pela 5-redutase. Portanto, na avalia-
em sua capacidade de estimular a produção de testosterona pe- ção das formulações de testosterona, é importante levar em conta
las células de Leydig. Dispomos agora de LH recombinante. Por se a formulação que está sendo usada consegue proporcionar con-
causa do alto custo da hMG, o tratamento geralmente é iniciado centrações fisiológicas de estradiol e DHT, além das concentra-
apenas com hCG, sendo a hMG acrescentada em seguida para ções normais de testosterona. As concentrações de testosterona
promover os estágios do desenvolvimento das espermátides que na extremidade inferior da variação masculina normal conse-
SEÇÃO II
dependem do FSH. Está disponível atualmente o FSH humano guem restaurar a função sexual, porém não ficou claro se os níveis
recombinante (hFSH), o qual é indiferenciável do hFSH urinário de testosterona baixos a normais conseguem manter a densidade
purificado em sua atividade biológica e farmacocinética in vitro e mineral óssea e a massa muscular. A recomendação atual consis-
in vivo, apesar de a subunidade madura do hFSH recombinante te em restaurar os níveis de testosterona para a variação média a
possuir menos sete aminoácidos. O hFSH recombinante está dis- normal.
ponível em ampolas que contêm 75 UI (cerca de 7,5 g de FSH),
Derivados orais de testosterona A testosterona é bem-absorvida
que são responsáveis por mais de 99% do conteúdo proteico. De-
após a administração oral, porém é rapidamente degradada du-
pois que a espermatogênese tiver sido restaurada com a utilização
Endocrinologia Reprodutiva
128
QUADRO 8.3 Farmacologia clinica de algumas formulações de testosterona
Formulação Esquema Perfil farmacocinético DHT e E2 Vantagens Desvantagens
Enantato ou 150 a 200 mg IM a Após uma única injeção Os níveis de DHT Corrige os sintomas Exige injeção IM; picos
cipionato de cada 2 semanas ou 75 IM, os níveis séricos de e E2 aumentam de deficiência de e depressões nos níveis
testosterona a 100 mg/semana T aumentam e alcançam proporcionalmente à androgênios; séricos de T
a faixa suprafisiológica, elevação dos níveis de relativamente barato se
em seguida, declinam de T; as razões T:DHT e for autoadministrado;
modo gradual para a faixa T:E2 não se modificam flexibilidade da posologia
hipogonadal no final do
intervalo posológico
Testosterona em Disponível em sachês, Restaura os níveis de T e Os níveis séricos Corrige os sintomas Possibilidade de
gel a 1% tubos e bombas testosterona e de estradiol de DHT estão mais de deficiência de transferência para uma
5 a 10 g de T gel para a faixa masculina elevados e as razões androgênios; proporciona parceira feminina ou
Capítulo 8
contendo 50 a 100 mg fisiológica T:DHT estão mais flexibilidade de posologia, criança por contato direto
de T, 4x/dia baixas em homens facilidade de aplicação; da pele com a pele;
hipogonádicos boa tolerabilidade da pele irritação da pele em uma
tratados com gel de pequena proporção de
T do que nos homens homens tratados; níveis de
eugonádicos sadios DHT moderadamente altos
Adesivo 1 ou 2 adesivos, Restaura(m) os níveis séricos Os níveis T:DHT e T:E2 Facilidade de Os níveis séricos de T
transdérmico de destinados a fornecer de T, DHT, E2 para a faixa estão dentro da faixa aplicação,corrige(m) os em alguns homens com
testosterona nominalmente 5 a 10 masculina fisiológica masculina fisiológica sintomas de deficiência de deficiência de androgênios
* Essas formulações não estão aprovadas para uso clínico nos Estados Unidos, porém estão disponíveis em muitos países. Os médicos nos países onde essas formulações estão disponíveis devem
seguir os esquemas posológicos aprovados..
Nota: DHT, diidrotestosterona; E2, estradiol; T, testosterona.
** N. de R. T.: No Brasil existem formulações disponíveis com o undecanoato de testosterona para uso oral.
129
Testosterona em gel Dois géis de testosterona, o Androgel e o como agonistas integrais no músculo e no osso e que preservam
Testim, quando aplicados topicamente à pele em doses de 5, 7,5 e em vários graus a próstata, encontram-se em estudos clínicos hu-
10 g podem manter as concentrações de testosterona total e livre manos de fase I e de fase II. Os MSRA não esteroides não atuam
na faixa média a alta normal em homens hipogonádicos. As reco- como substratos para a esteroide 5-redutase ou a CYP19 aro-
mendações atuais consistem em começar com uma dose de 50 mg matase. A ligação dos MSRA ao RA induz alterações específicas
e ajustar a posologia com base nos níveis de testosterona. As van- na conformação da proteína RA, que então modula interações
tagens da testosterona em gel incluem a facilidade de aplicação e proteína-proteína entre o RA e seus correguladores, resultando
sua flexibilidade posológica. A principal preocupação é a possí- em regulação da expressão gênica específica de tecido.
vel transferência involuntária do gel para uma parceira sexual ou
crianças que possam entrar em contato íntimo com o paciente. A Indicações farmacológicas dos androgênios Os androgênios e os
relação das concentrações de DHT para testosterona é mais alta MSRA estão sendo avaliados como terapias anabólicas para as
nos homens tratados com testosterona em gel do que em homens limitações funcionais associadas ao envelhecimento e às enfermi-
sadios. Além disso, existe uma considerável variação intrapessoal dades crônicas. A suplementação com testosterona induz aumen-
e interpessoal nos níveis séricos de testosterona em homens trata- tos na massa muscular esquelética, na forma voluntária máxima e
dos com o gel transdérmico. na potência muscular em homens sadios, homens hipogonádicos,
SEÇÃO II
Os efeitos dos alimentos e da escovação dos dentes sobre a absor- ção de que a testosterona deve ser considerada como terapia ad-
ção não foram estudados em detalhes. juvante nos homens infectados pelo HIV que estão sofrendo uma
Os implantes de testosterona cristalina podem ser introduzi- redução ponderal inexplicável e que apresentam baixos níveis de
dos no tecido subcutâneo por meio de um trocarte através de uma testosterona. De modo semelhante, nos homens tratados com
pequena incisão na pele. A testosterona é liberada por erosão su- glicocorticoides, deve-se aventar a terapia com testosterona para
perficial do implante, sendo absorvida e penetrando na circulação preservar a força e massa musculares assim como a densidade mi-
sistêmica. Dois a seis implantes de 200 mg conseguem manter por neral óssea vertebral. Não se sabe se a terapia com testosterona em
até 6 meses a testosterona na variação média para alta a normal. homens idosos com limitações funcionais é segura e efetiva para
Os possíveis inconvenientes são a necessidade de fazer uma inci- melhorar a função física e a qualidade de vida relacionada com
são na pele para a introdução e a remoção, bem como a extrusão a saúde e para reduzir a incapacitação. As preocupações acerca
espontânea e a fibrose no local do implante. dos possíveis efeitos adversos da testosterona sobre a próstata e
Formulações de testosterona que não estão disponíveis nos EUA O as taxas de eventos cardiovasculares estimulam à elaboração de
undecanoato de testosterona, quando administrado por via oral moduladores seletivos dos receptores dos androgênios que sejam
com ácido oleico, é absorvido preferencialmente através dos lin- preferencialmente anabólicos e que poupem a próstata.
fáticos e alcança a circulação sistêmica sem sofrer degradação de A administração de testosterona induz hipertrofia das fibras
primeira passagem no fígado. Geralmente são usadas doses orais dos tipos 1 e 2 e acarreta um aumento no número de células satéli-
de 40 a 80 mg, 2 ou 3 vezes/dia. Entretanto, as respostas clínicas tes (células progenitoras musculares) e mionucleares. Os androgê-
variam e não chegam a ser ideais. As relações entre DHT e tes- nios promovem a diferenciação das células progenitoras mesen-
tosterona são mais altas nos homens hipogonádicos tratados com quimais multipotentes para a linhagem miogênica e inibem sua
undecanoato de testosterona oral, em comparação com homens diferenciação para a linhagem adipogênica. A testosterona pode
eugonádicos. exercer outros efeitos sobre a replicação das células satélites e a
Após essa preparação (priming) inicial, o undecanoato de tes- síntese das proteínas musculares, o que pode contribuir para um
tosterona de ação prolongada misturado em óleo, quando admi- aumento na massa muscular esquelética.
nistrado no músculo a cada 12 semanas, mantém os níveis séricos Outras indicações para a terapia androgênica voltam-se para
de testosterona, estradiol e DHT na variação masculina normal certos pacientes com anemia devida à insuficiência da medula ós-
e corrige os sintomas de deficiência androgênica na maioria dos sea (uma indicação que é suplantada em grande parte pela eritro-
homens tratados. Entretanto, o grande volume da injeção (4 mL) poietina) e para o angioedema hereditário.
representa um inconveniente relativo.
Contracepção hormonal masculina com base na administração com-
Novas formulações de androgênios Inúmeras formulações de binada de testosterona e inibidores das gonadotrofinas As doses
androgênios com uma farmacocinética aprimorada e perfis de suprafisiológicas de testosterona (200 mg de enantato de testoste-
atividade mais seletivos estão sendo desenvolvidos. Dois ésteres rona por semana) suprimem a secreção de LH e de FSH e induzem
de ação prolongada, buciclato de testosterona e um decanoato de azoospermia em 50% dos homens brancos e em mais de 95% dos
testosterona, quando injetados no músculo, conseguem manter as asiáticos. Estudos clínicos de eficácia multicêntricos patrocinados
concentrações circulantes de testosterona na variação masculina pela Organização Mundial da Saúde (OMS) demonstraram que a
por 7 a 12 semanas. Os ensaios clínicos iniciais demonstraram a supressão da espermatogênese com produção de azoospermia ou
exequibilidade de se administrar a testosterona pela via sublin- oligozoospermia pronunciada (< 3 milhões/mL) pela administra-
gual ou bucal. A substância 7-metil-19-nortestosterona é um ção de enantato de testosterona a homens resulta em contracep-
androgênio que não pode ser reduzido para a forma 5; portanto, ção efetiva. Por causa da preocupação acerca dos efeitos adversos
em comparação com a testosterona, exerce uma atividade agonis- a longo prazo das doses suprafisiológicas de testosterona, estão
ta relativamente maior no músculo além da supressão das gona- sendo investigados esquemas que combinam outros inibidores das
dotrofinas, porém exibe uma menor atividade sobre a próstata. gonadotrofinas, como os antagonistas de GnRH e as progestinas
Os moduladores seletivos dos receptores de androgênios com doses de reposição de testosterona. O etonogestrel oral admi-
(MSRA) constituem uma classe de ligantes de receptores de an- nistrado diariamente em combinação com decanoato de testoste-
drogênios, que se ligam ao receptor de androgênio e exercem rona intramuscular a cada 4 a 6 semanas induziu azoospermia ou
ações teciduais seletivas. Vários MSRA não esteroides, que atuam oligozoospermia acentuada (densidade espermática < 1 milhão/
130
mL) em 99% dos homens tratados durante um período de 1 ano. reposição de testosterona. O paciente deve ser indagado também
Esse esquema esteve associado a aumento de peso, volume testi- acerca do desejo e da atividade sexuais, da presença de ereções ma-
cular diminuído e níveis plasmáticos mais baixos de colesterol das tutinas e da capacidade de alcançar e manter ereções adequadas
lipoproteínas de alta densidade (HDL) e a sua segurança a longo para as relações sexuais. Alguns homens hipogonádicos continuam
prazo não foi demonstrada. Os moduladores seletivos dos recep- se queixando de disfunção sexual até mesmo após a instituição da
tores dos androgênios que são inibidores mais possantes das go- reposição de testosterona; esses pacientes podem ser beneficiados
nadotrofinas do que a testosterona e que poupam a próstata são pelo aconselhamento. O crescimento dos pêlos em resposta à repo-
altamente promissores, devido ao seu potencial contraceptivo. sição de androgênios varia e depende da etnia. Os homens hipogo-
nádicos com início pré-puberal da deficiência androgênica que ini-
Esquemas recomendados para reposição de androgênios Os éste-
ciam a terapia com testosterona no final da segunda ou na terceira
res de testosterona são administrados tipicamente em doses de 75
décadas de vida podem achar difícil ajustar-se à sua sexualidade
a 100 mg no músculo por semana ou 150 a 200 mg a cada 2 sema-
recém-encontrada e poderão ser beneficiados pelo aconselhamen-
nas. Um ou dois adesivos não genitais com 5 mg de testosterona
to. Se o paciente tem uma parceira sexual, esta deve ser incluída no
podem ser aplicados diariamente sobre a pele das costas, da coxa
aconselhamento, por causa das mudanças físicas e sexuais radicais
ou do braço longe das áreas de pressão. A testosterona em gel é
Capítulo 8
que ocorrem com o tratamento androgênico.
aplicada sobre uma área coberta da pele na dose de 5 a 10 g diaria-
mente; os pacientes devem lavar as mãos após a aplicação do gel. Contraindicações para a administração de androgênios A adminis-
Os tabletes bucais bioadesivos de testosterona na dose de 30 mg tração de testosterona está contraindicada para homens com his-
geralmente são aplicados 2 vezes/dia na mucosa bucal. tória de câncer da próstata ou da mama (Quadro 8.4). A terapia
com testosterona não deve ser administrada sem avaliação uroló-
Estabelecendo a eficácia da terapia de reposição de testostero-
gica adicional a homens com nódulo prostático palpável ou indu-
na Por não estar disponível um marcador clinicamente útil da
ração ou com antígeno prostático específico > 4 ng/mL ou > 3 ng/
ação dos androgênios, a restauração dos níveis de testosterona
mL a homens com alto risco de câncer de próstata, como negros
para a variação média a normal continua sendo a meta da terapia.
131
QUADRO 8.5 Monitoração de homens que estão recebendo com volume da próstata além daquele esperado para a idade.
testosterona Não existem evidências de que a terapia com testostero-
na cause câncer de próstata. Entretanto, a administração
1. Avaliar o paciente 3 a 6 meses após o início do tratamento e, em seguida, de androgênios pode exacerbar um câncer de próstata
anualmente até estabelecer se os sintomas responderam ao tratamento e se o metastático preexistente. Muitos homens mais velhos
paciente está sofrendo quaisquer efeitos adversos têm na próstata focos microscópicos de câncer. Não sa-
2. Monitorar os níveis de testosterona dentro de 3 a 6 meses após o início da terapia bemos se a administração a longo prazo de testosterona
com testosterona: induzirá o crescimento desses focos microscópicos e sua
•• A terapia deve ter como meta elevar os níveis séricos de testosterona até a faixa transformação em cânceres clinicamente significativos.
média normal Os níveis de antígeno prostático específico (PSA)
•• Enantato ou cipionato de testosterona injetável: Medir os níveis séricos de são mais baixos nos homens com deficiência de testos-
testosterona no período médio entre as injeções. Se a testosterona estiver >
terona e são normalizados após a reposição desse hor-
700 ng/dL (24,5 nmol/L) ou < 400 ng/dL (14,1 nmol/L), ajustar a dose ou a
frequência mônio. Existe considerável variabilidade entre os vários
•• Adesivos transdérmicos: Determinar os níveis de testosterona dentro de 3 testes nas mensurações do PSA. Os aumentos nos ní-
a 12 h após a aplicação do adesivo; ajustar a dose para obter um nível na veis de PSA após a suplementação com testosterona em
SEÇÃO II
porção média da faixa normal homens com deficiência de androgênios em geral são <
•• Tablete de testosterona bucal bioadesivo: Determinar os níveis imediatamente 0,5 ng/mL, e aumentos > 1 ng/mL durante um período
antes e depois da aplicação do sistema de 3 a 6 meses são incomuns. O intervalo de confiança
•• Géis transdérmicos: Determinar o nível de testosterona em qualquer momento de 90% para a mudança nos valores do PSA em homens
após o paciente receber tratamento durante pelo menos 1 semana; ajustar a com hipertrofia prostática benigna, medido com inter-
dose para obter um nível sérico de testosterona dentro da porção média da valo de 3 a 6 meses, é de 1,4 ng/mL. Por esse motivo, o
faixa normal
grupo de especialistas da Endocrine Society sugere que
•• Microesferas de testosterona: Medir os níveis de testosterona no final do
um aumento do PSA >1,4 ng/mL em qualquer ano após
Endocrinologia Reprodutiva
132
Os efeitos adversos do abuso de longo prazo de EAA não estão Alguns usuários de EAA desenvolvem sintomas maníacos
bem elucidados. A maior parte das informações sobre os efeitos durante a exposição a EAA (algumas vezes associados a violência)
adversos dos EAA provém de relatos de casos, estudos não contro- e depressão maior (algumas vezes associada a suicídio) durante a
lados ou ensaios clínicos que usaram doses de reposição de testos- abstinência de EAA. Os usuários também podem engajar-se em
terona. Os dados relativos aos eventos adversos de ensaios clínicos outras formas de uso de drogas ilícitas, que pode ser potencializa-
que usaram doses de reposição fisiológicas de testosterona foram do ou exacerbado pelos EAA.
extrapolados de modo injustificável a usuários de EAA que podem Foram relatados níveis elevados das enzimas hepáticas, icterí-
administrar 10 a 100 vezes as doses de reposição de testosterona ao cia colestática, neoplasias hepáticas e peliose hepática com o uso
longo de muitos anos e que sustentam a alegação de que o uso de de EAA 17-alquilados por via oral. O uso de EAA pode causar
EAA é seguro. Uma fração substancial de usuários de esteroides hipertrofia muscular, sem adaptações compensatórias nos ten-
androgênicos também utiliza outras substâncias, que são perce- dões, ligamentos e articulações, aumentando, assim, o risco de le-
bidas como tendo a capacidade de aumentar a massa muscular ou sões dos tendões e das articulações. O uso de EAA está associado
aprimorar o desempenho, como hormônio do crescimento; IGF-1; a acne e alopecia, bem como a um aumento dos pelos corporais.
insulina; estimulantes como anfetamina, clembuterol, cocaína, efe- Os laboratórios autorizados utilizam cromatografia gasosa-
Capítulo 8
drina e tiroxina; e fármacos percebidos como tendo a capacidade -espectrometria de massa ou cromatografia líquida-espectrome-
de reduzir os efeitos adversos, como hCG, inibidores da aromatase tria de massa para identificar uso abusivo de esteroides anabó-
e antagonistas dos estrogênios. Os homens que fazem uso abusivo licos. Nos últimos anos, a disponibilidade da espectrometria de
de esteroides androgênicos têm mais tendência a engajar-se em massa de alta resolução e da espectrometria de massa em série
outros comportamentos de alto risco do que os não usuários. Os (tandem) aprimorou ainda mais a sensibilidade para a identifi-
eventos adversos associados ao uso de EAA podem ser devidos aos cação de uso abusivo de androgênios. O uso ilícito de testostero-
próprios EAA, ao uso concomitante de outras drogas, a comporta- na em geral é detectado pela aplicação da mensuração da relação
mentos de alto risco e a características do hospedeiro, que podem entre testosterona urinária e epitestosterona e confirmado tam-
tornar esses indivíduos mais suscetíveis ao uso de EAA ou a outros bém pelo uso da razão 13C:12C na testosterona por meio do uso
133
CAPÍTULO 9 mente ocorre dispneia decorrente de metástases pulmonares. Os
pacientes com níveis séricos aumentados de gonadotrofina coriônica
humana (hCG) podem apresentar ginecomastia. Um atraso no diag-
nóstico está associado a um estágio mais avançado e possivelmente
Câncer de Testículo pior sobrevida.
A avaliação do estadiamento do TCG inclui a determinação dos
níveis séricos da a-fetoproteína (AFP), hCG e desidrogenase láctica
Robert J. Motzer
(LDH). Após a orquiectomia, devem-se realizar uma radiografia de
George J. Bosl tórax bem como TC do abdome e pelve. É necessária uma TC de
tórax se houver suspeita de nódulos pulmonares ou doenças medias-
Os tumores de células germinativas (TCG) primários do testículo, tinal ou hilar. A doença no estágio I está limitada ao testículo, ao epi-
surgindo da transformação maligna das células germinativas primor- dídimo ou ao cordão espermático. A doença no estágio II limita-se
diais, constituem 95% de todas as neoplasias testiculares. Raramen- aos linfonodos retroperitoniais (regionais). A doença no estágio III
te, os TCG surgem em locais extragonadais, como o mediastino, o localiza-se fora do retroperitônio, envolvendo as cadeias linfonodais
SEÇÃO II
retroperitônio e muito raramente a glândula pineal. Essa doença é supradiafragmáticas ou vísceras. O estadiamento pode ser “clínico”
notável pela idade jovem dos pacientes acometidos, pela capacidade – definido apenas pelo exame físico, por avaliação com marcadores
totipotente de diferenciação das células tumorais e por sua curabili- sanguíneos e radiografias – ou “histopatológico” – definido por um
dade; cerca de 95% dos pacientes recém-diagnosticados são curados. procedimento cirúrgico.
A experiência no tratamento dos TCG leva a melhores resultados. Os linfonodos que drenam a região dos testículos estão localiza-
dos no retroperitônio, e o suprimento vascular se origina dos gran-
INCIDÊNCIA E EPIDEMIOLOGIA des vasos (para o testículo direito) ou vasos renais (para o testículo
Em 2010, 8.480 casos novos de TCG testicular foram diagnosticados esquerdo). Como resultado, os linfonodos acometidos em primeiro
Endocrinologia Reprodutiva
nos EUA, e 300 pacientes morreram. O tumor ocorre mais frequen- lugar por um tumor testicular direito são os interaortocavos logo
temente em homens entre 20 e 40 anos. Uma massa testicular em abaixo dos vasos renais. No caso de um tumor testicular esquerdo,
homem ≥ 50 anos deve ser considerada um linfoma até prova em os primeiros linfonodos acometidos são os localizados lateralmente à
contrário. O TCG é pelo menos quatro a cinco vezes mais comum aorta (paraórticos) e os abaixo dos vasos renais esquerdos. Em ambos
em homens brancos que nos afrodescendentes, e tem sido observada os casos, a propagação linfonodal é abaixo e contralateral ao hilo re-
incidência mais elevada na Escandinávia e na Nova Zelândia que nos nal, bem como, com menos frequência, acima dele. O acometimento
EUA. linfático pode se estender cranialmente aos linfonodos retrocrurais,
mediastinais posteriores e supraclaviculares. O tratamento é deter-
ETIOLOGIA E GENÉTICA minado pela histologia do tumor (seminoma versus não seminoma)
e pelo estágio clínico (Quadro 9.1).
A criptorquidia está associada a um risco várias vezes mais alto de
TCG. Os testículos criptorquídicos abdominais apresentam um risco
mais elevado que os testículos criptorquídicos inguinais. Se possível, PATOLOGIA
deve-se realizar a orquiopexia antes da puberdade; o procedimento Os TCG são divididos nos subtipos não seminoma e seminoma. Os
precoce reduz o risco de TCG e melhora a capacidade de preservar TCG não seminomatosos são mais frequentes na terceira década da
os testículos. Um testículo criptorquídico abdominal que não pos- vida e podem apresentar o espectro total de diferenciação celular em-
sa ser trazido para a bolsa escrotal deve ser removido. Cerca de 2% brionária e adulta. Esta entidade compreende quatro tipos histológi-
dos homens com TCG em um testículo irão desenvolver um tumor cos: carcinoma embrionário, teratoma, coriocarcinoma e o tumor do
primário no outro testículo. As síndromes de feminização testicular seio endodérmico (saco vitelino). O coriocarcinoma, composto de
elevam o risco de TCG testicular, e a síndrome de Klinefelter está citotrofoblastos e sinciciotrofoblastos, representa uma diferenciação
associada ao TCG mediastinal. trofoblástica maligna, sendo invariavelmente associado à secreção
Um isocromossomo do braço curto do cromossomo 12 (i[12p]) de hCG. O tumor do seio endodérmico é a contraparte maligna do
é patognomônico de todos os tipos histológicos do TCG. O número saco vitelino fetal e está associado à secreção de AFP. O carcinoma
de cópias do 12p em excesso, seja na forma de i(12p), seja como o embrionário puro pode secretar AFP, hCG ou mesmo ambos, pa-
aumento do conteúdo de 12p em cromossomos com bandeamento drão que é uma evidência bioquímica da diferenciação. O teratoma
aberrante, ocorre em quase todos os TCG, mas o(s) gene(s) no compõe-se de tipos de células somáticas derivados de duas ou mais
12p envolvido(s) na patogenia destes tumores ainda não está(ão) camadas germinativas (ectoderma, mesoderma ou endoderma).
definido(s). Cada um desses tipos histológicos pode estar presente isoladamente
ou em combinação com outros. Os TCG não seminomatosos tendem
APRESENTAÇÃO CLÍNICA a enviar metástases precoces para locais como os linfonodos retrope-
ritoniais e o parênquima pulmonar. Cerca de 33% dos pacientes se
Massa testicular indolor é patognomônica de câncer testicular. Mais
apresentam com a doença limitada ao testículo (estágio I), 33% com
comumente, os pacientes apresentam desconforto testicular ou ede-
metástases retroperitoniais (estágio II) e 33% com metástases nodais
ma sugestivos de epididimite e/ou orquite. Em tal circunstância, uma
supradiafragmáticas ou viscerais mais extensas (estágio III).
prova terapêutica com antibióticos é uma medida sensata. Entretan-
O seminoma representa aproximadamente 50% de todos os TCG,
to, se os sintomas persistirem ou uma anormalidade residual perma-
a idade mediana em que ocorre é na quarta década e geralmente segue
necer, indica-se a ultrassonografia testicular.
uma evolução clínica mais indolente. A maioria dos pacientes (70%)
A ultrassonografia do testículo é indicada sempre que se pensa
se apresenta com a doença no estágio I, cerca de 20% com a doença no
na possibilidade de câncer testicular bem como nos casos de edema e
estágio II e 10% com a doença no estágio III; metástases pulmonares
dor testicular. Se a massa testicular for detectada, deve-se realizar uma
ou em outras vísceras são raras. Quando um tumor exibe componen-
orquiectomia radical inguinal. Como o testículo se desenvolve a partir
tes de seminoma e não seminoma, o tratamento do paciente é dirigido
da crista gonadal, seu suprimento sanguíneo e sua drenagem linfática
pelo componente não seminoma, que é mais agressivo.
se originam no abdome e descem com ele em direção à bolsa escrotal.
Deve-se fazer uma abordagem inguinal para evitar a quebra de barrei-
ras anatômicas e ocorrência de vias adicionais de propagação tumoral. MARCADORES TUMORAIS
A dor lombar provocada por metástases retroperitoniais é co- A cuidadosa monitoração dos marcadores tumorais séricos AFP e
mum, devendo ser distinguida da dor musculoesquelética. Rara- hCG é essencial no manejo dos pacientes com TCG, uma vez que es-
134
Opção de tratamento
Quimioterapia,
O tumor invade o cordão espermático, com IIC Linfonodos retroperitoneais de >5 cm Quimioterapia frequentemente
pT3
ou sem invasão vascular/linfática seguida de DLNRP
Metástases distantes
Epidídimo Túnica albugínea
Quimioterapia, fre-
Corpo Os locais comuns incluem linfonodos
Túnica vaginal O tumor invade a bolsa escrotal, com ou sem quentemente seguida
Cabeça pT4 III distantes (ou extra-abdominais), o Quimioterapia
invasão vascular/linfática de cirurgia (biópsia
Cauda Testículo pulmão, o fígado, o osso e o cérebro
ou ressecção)
135
Câncer de Testículo Capítulo 9
ses marcadores são importantes para o diagnóstico, como indicado-
essencial para o sucesso da vigilância. Os pacientes devem ser cui-
res prognósticos, na monitoração da resposta ao tratamento e na de-
dadosamente acompanhados com radiografias periódicas de tó-
tecção da recidiva precoce. Aproximadamente 70% dos pacientes que
rax, exame físico, TC de abdome e dosagens séricas do marcador
se apresentam com TCG não seminomatoso disseminado possuem
tumoral. O tempo mediano até a recidiva é de aproximadamente
concentrações séricas aumentadas de AFP e/ou hCG. Embora as
7 meses, com as recorrências tardias (> 2 anos) sendo raras. Os 70
concentrações de hCG possam estar aumentadas tanto nos pacientes
a 80% dos pacientes que não apresentam recidiva não necessitam
com tumores não seminomatosos quanto seminomatosos, a concen-
de intervenção após a orquiectomia; o tratamento é reservado aos
tração da AFP mostra-se aumentada apenas nos pacientes portado-
que apresentam recorrência. Quando o tumor primário é classi-
res do não seminoma. A presença de um nível de AFP aumentado no
ficado como T2-T4 (extensão além do testículo ou epidídimo, ou
paciente cujo tumor apresente apenas o seminoma indica que existe
identifica-se invasão linfática/vascular), deve-se dar preferência
um componente não seminomatoso oculto e que o paciente deve ser
à DLNRP que poupa os nervos. Cerca de 50% desses pacientes
tratado para o TCG não seminomatoso. Os níveis de LDH são menos
apresentam doença no estágio histopatológico II e irão ter recidi-
específicos que os de AFP ou hCG, mas se mostram aumentados em
va sem a DLNRP.
50 a 60% dos pacientes com não seminoma metastático e em até 80%
dos pacientes com o seminoma avançado. NÃO SEMINOMA NO ESTÁGIO II Os pacientes com adenopatia re-
SEÇÃO II
Os níveis de AFP, hCG e LDH devem ser medidos antes e depois troperitonial ipsolateral limitada (linfonodos geralmente com seu
da orquidectomia. As concentrações séricas aumentadas de AFP e maior diâmetro ≤ 3 cm) e níveis normais de AFP e hCG costumam
hCG diminuem de acordo com a cinética de primeira ordem; a meia- ser submetidos a uma DLNRP bilateral modificada como tratamen-
-vida é de 24 a 36 h para o hCG e 5 a 7 dias para a AFP. A AFP e o to primário. Níveis aumentados de AFP ou hCG, ou ambas, signi-
hCG devem ser analisados periodicamente durante e após o trata- ficam doença metastática fora do retroperitônio; neste contexto,
mento. O reaparecimento do hCG e/ou da AFP ou a não diminuição usa-se quimioterapia. A taxa de recidiva local após uma DLNRP
desses marcadores de acordo com o que é previsto pelas meias-vidas realizada adequadamente é bastante baixa. Conforme a extensão
constitui um indicador de tumor persistente ou recorrente. da doença, as opções de tratamento pós-operatório consistem na
Endocrinologia Reprodutiva
136
quimioterapia. Programas de poliquimioterapia baseados na cis- QUADRO 9.1 Classificação de risco dos tumores das células
platina, nas doses de 100 mg/m2, mais etoposida, nas doses de 500 germinativas avançados segundo IGCCCG
mg/m2 por ciclo, curam 70 a 80% desses pacientes, com ou sem a
bleomicina, de acordo com a estratificação do risco (ver adiante). Risco Não seminoma Seminoma
Uma resposta completa (o desaparecimento total de todas as evi- Bom Local primário gonadal ou Qualquer local primário
dências clínicas do tumor ao exame físico e em radiografias soma- retroperitonial Ausência de metástases
do a níveis séricos normais de AFP e hCG por ≥ 1 mês) ocorre após
Ausência de metástases não pulmonares
a quimioterapia isolada em cerca de 60% dos pacientes, e outros 10 viscerais não pulmonares
a 20% ficam livres da doença por meio da ressecção cirúrgica de Qualquer LDH, hCG
todas as massas residuais que contenham TCG viável. Doses mais AFP < 1.000 ng/mL
baixas de cisplatina resultam em taxas de sobrevida menores. Beta‑hCG < 5.000 mUI/mL
A toxicidade de quatro ciclos do esquema bleomicina, etopo- LDH < 1,5 limite superior
sídeo e cisplatina (BEP) é substancial. Náuseas, vômitos e queda ou normal (LSN)
de cabelos ocorrem na maioria dos pacientes, porém as náuse- Intermediário Local primário gonadal ou Qualquer local primário
Capítulo 9
as e os vômitos diminuem sobremodo com o uso de esquemas retroperitonial Presença de metástases
antieméticos. A mielossupressão é frequente, e a toxicidade pul- Ausência de metástases viscerais não pulmonares
monar sintomática decorrente da bleomicina ocorre em cerca de viscerais não pulmonares Qualquer LDH, hCG
5% dos pacientes. Mortalidade induzida pelo tratamento devido
AFP 1.000 a 10.000 ng/mL
à neutropenia com septicemia ou insuficiência pulmonar induzi-
da pela bleomicina ocorre em 1 a 3% dos pacientes. As reduções Beta‑hCG 5.000 a 50.000
mUI/mL
das doses em virtude da mielossupressão são raramente indica-
das. As toxicidades permanentes a longo prazo incluem nefro- LDH 1,5 a 10 LSN
toxicidade (filtração glomerular diminuída e perda persistente Ruim Local primário mediastinal Nenhum paciente
Câncer de Testículo
de magnésio), ototoxicidade e neuropatia periférica. Quando a Presença de metástases classificado como com
bleomicina é administrada semanalmente pela injeção em bolo, o viscerais não pulmonares prognóstico ruim
fenômeno de Raynaud aparece em 5 a 10% dos pacientes. Outras AFP ≥ 10.000 ng/mL
evidências de lesão de pequenos vasos sanguíneos verificam-se
Beta‑hCG > 50.000 mUI/mL
com menor frequência, como ataques isquêmicos transitórios e
infarto do miocárdio. LDH > 10 LSN
QUIMIOTERAPIA ORIENTADA PELO RISCO Como nem todos os pa- Abreviações: AFP, -fetoproteína; hCG, gonadotrofina coriônica humana; IGCCCG, International
cientes são curados, e o tratamento pode causar toxicidades signi- Germ Cell Consensus Classification Group; LDH, desidrogenase láctica.
ficativas, os pacientes são estratificados em grupos chamados de Fonte: De International Germ Cell Cancer Consensus Group.
“risco baixo” e “risco alto”, de acordo com as características clíni-
cas antes do tratamento. Para os pacientes de baixo risco, o obje-
tivo é conseguir eficácia máxima com toxicidade mínima. Para os devem ser ressecados. A doença retroperitonial residual costuma
pacientes com alto risco, o objetivo é identificar um tratamento requerer uma DLNRP bilateral modificada. A toracotomia (uni
mais eficiente com toxicidade tolerável. ou bilateral) e dissecção do pescoço são menos frequentemente
O “International Germ Cell Cancer Consensus Group” de- necessárias para remover a doença residual do mediastino, do pa-
senvolveu critérios para designar os pacientes em três grupos de rênquima pulmonar ou de linfonodos cervicais. O tumor viável
risco (baixo, intermediário e alto) (Quadro 9.1). Pontos de corte (seminoma, carcinoma embrionário, tumor do saco vitelino ou
dos marcadores foram incorporados ao estadiamento TNM revis- coriocarcinoma) estará presente em 15%, o teratoma maduro em
to (tumor primário, linfonodos regionais, metástases) dos TCG. 40% e os restos necróticos bem como fibrose em 45% dos espéci-
Assim, os grupos de estágios TNM atualmente baseiam-se na mes ressecados. A frequência do teratoma ou da doença viável é
anatomia (local e extensão da doença) e biologia (estado dos mar- mais elevada nos tumores mediastinais residuais. Se houver restos
cadores e histologia). O seminoma tem um risco baixo ou inter- necróticos ou teratoma maduro, não é necessária qualquer qui-
mediário, segundo a ausência ou presença de metástases viscerais mioterapia adicional. Se o tumor viável estiver presente, mas for
não pulmonares. Não existe uma categoria de alto risco para o completamente extirpado, deverão ser instituídos dois ciclos adi-
seminoma. Os níveis dos marcadores não têm qualquer papel na cionais de quimioterapia.
definição do risco do seminoma. Os não seminomas possuem ca- Se a histologia inicial for um seminoma puro, o teratoma ma-
tegorias de risco baixo, intermediário e alto baseadas no local do duro raramente está presente, e o achado mais frequente são os
tumor primário, na presença ou ausência de metástases viscerais restos necróticos. Para a doença retroperitonial residual, DLNRP
não pulmonares e nos níveis dos marcadores. é tecnicamente difícil em razão da extensa fibrose pós-radiote-
Para cerca de 90% dos pacientes com TCG de baixo risco, a rapia. Recomenda-se a observação quando não existe uma anor-
administração de quatro ciclos de etoposida associada à cispla- malidade radiográfica na TC. Os achados positivos em uma to-
tina (EP) ou três ciclos de BEP produz respostas completas du- mografia com emissão de pósitrons (PET) correlacionam-se com
ráveis, com um mínimo de toxicidade aguda e crônica. Não há seminoma viável residual e exigem excisão cirúrgica ou biópsia.
toxicidade pulmonar quando não se usa a bleomicina, sendo rara
QUIMIOTERAPIA DE RESGATE Dos pacientes com TCG avançado,
quando o tratamento é limitado a 9 semanas; a mielossupressão,
20 a 30% não conseguem obter uma resposta completa e durável
juntamente com febre neutropênica, é menos frequente, e a taxa
à quimioterapia de primeira linha. Uma combinação de vimblas-
de mortalidade do tratamento é desprezível. Cerca de 75% dos pa-
tina, ifosfamida e cisplatina (VeIP) pode curar cerca de 25% dos
cientes com risco intermediário e 45% dos pacientes com alto ris-
pacientes, como uma terapia de segunda linha. A substituição
co obtêm remissão completa e durável com quatro ciclos de BEP,
de vimblastina por paclitaxel pode ser mais eficaz neste contex-
e até o momento nenhum outro esquema terapêutico provou ser
to. Os pacientes têm maior probabilidade de obter uma resposta
superior. Há necessidade de um tratamento mais eficiente.
completa e durável se possuírem um tumor primário testicular
CIRURGIA PÓS-QUIMIOTERAPIA A ressecção das metástases resi- e houver recidiva a partir de uma remissão completa anterior à
duais após o término da quimioterapia é parte integrante do trata- quimioterapia de primeira linha que contenha cisplatina. Diferen-
mento. Se a histologia inicial é de não seminoma, e os valores do temente, se o paciente não obtiver uma resposta completa ou se
marcador estão normalizados, todos os locais de doença residual apresentar um não seminoma primário de mediastino, a terapia
137
transformação maligna. O i(12p) tem sido identificado no tipo celu-
de resgate em doses-padrão raramente é benéfica. As opções de
lar transformado, indicando a origem clonal do TCG.
tratamento desses pacientes incluem tratamento com doses inten-
Descreveu-se um grupo de pacientes com tumores pouco dife-
sivas, terapias experimentais e ressecção cirúrgica.
renciados e histogênese desconhecida, de distribuição na linha média
A quimioterapia de dose intensa consistindo de alta dose de
e não associados à secreção de AFP ou hCG; poucos (10 a 20%) são
carboplatina (≥ 1.500 mg/m2) mais etoposida (≥ 1.200 mg/m2),
curados pela quimioterapia-padrão que contenha cisplatina. O i(12p)
com ou sem ciclofosfamida, com o suporte das células-tronco do
está presente em cerca de 25% de tais tumores (as frações que res-
sangue periférico induz uma resposta completa em 25 a 40% dos
pondem à cisplatina), o que confirma sua origem a partir de células
pacientes que progrediram após a quimioterapia de resgate que
germinativas primitivas. Tal achado também é preditivo da resposta à
contenha ifosfamida. Aproximadamente metade das respostas
quimioterapia à base de cisplatina e da consequente sobrevida a lon-
completas será durável. A terapia de doses altas constitui o pa-
go prazo. Tais tumores são heterogêneos; os tumores neuroepiteliais
drão de assistência para essa população de pacientes e foi sugerida
e o linfoma também podem apresentar-se desse modo.
como tratamento de escolha para todos os pacientes que sofrem
recidiva ou com doença refratária. O paclitaxel também se mostra
ativo nos pacientes previamente tratados e promissor nos esque- FERTILIDADE
mas de combinação em altas doses. A cura ainda é possível em A infertilidade é uma consequência importante do tratamento dos
SEÇÃO II
alguns pacientes com recidiva. TCG. Infertilidade preexistente ou fertilidade reduzida são frequen-
tes. A azoospermia e/ou a oligospermia estão presentes na ocasião do
diagnóstico de pelo menos 50% dos pacientes com TCG testicular. A
TCG EXTRAGONADAL E CARCINOMA DA LINHA MÉDIA DE disfunção ejaculatória está associada à DLNRP, e a lesão das células
germinativas pode advir da quimioterapia que contenha cisplatina.
HISTOGÊNESE INCERTA
As técnicas que preservam os nervos simpáticos retroperitoniais tor-
O prognóstico e o tratamento dos pacientes com TCG extragonadal naram a ejaculação retrógrada menos frequente nos subgrupos de
dependem da histologia do tumor e do local de origem. Todos os pacientes candidatos a essa cirurgia. A espermatogênese recupera-
Endocrinologia Reprodutiva
pacientes com um diagnóstico de TCG extragonadal devem ser sub- -se em alguns pacientes após a cirurgia. Entretanto, devido ao risco
metidos a uma ultra-sonografia testicular. Quase todos os pacientes significativo de capacidade reprodutiva prejudicada, devem-se reco-
com seminoma retroperitonial ou mediastinal obtêm uma resposta mendar a análise do sêmen e a criopreservação do esperma, em um
completa e durável às combinações BEP ou EP. As características banco de esperma, a todos os pacientes antes do tratamento.
clínicas dos pacientes portadores de TCG não seminoma primário
do retroperitôneo são semelhantes às dos pacientes portadores de BIBLIOGRAFIA
tumor primário de origem testicular; uma avaliação cuidadosa irá
Bosl GJ et al: Cancer of the testis, in Cancer: Principles and Practice of Onco-
encontrar evidência de um TCG testicular primário em 66% dos ca-
logy, 7th ed, VT DeVita et al (eds). Philadelphia, Lippincott Williams &
sos. Diferentemente, um TCG não seminomatoso mediastinal pri- Wilkins, 2008, pp 1463–1485
mário está associado a um prognóstico reservado; 33% dos pacientes
Ehrlich Y et al: Serum tumor markers in testicular cancer. Urol Oncol 3 Sep
se curam com a terapia-padrão (quatro ciclos de BEP). Os pacientes 2010 [Epub ahead of print]
com o diagnóstico recente de tumor não seminoma mediastinal são Einhorn et al: High-dose chemotherapy and stem-cell rescue for metastatic
considerados portadores de doença de prognóstico desfavorável, germ-cell tumors. N Engl J Med 357:340, 2007
devendo-se pensar na possibilidade de incluí-los em estudos clíni- Feldman DR et al: Medical treatment of advanced testicular cancer. JAMA
cos nos quais são testados esquemas de tratamento com eficácia pos- 299:672, 2008
sivelmente mais elevada. Além disso, o não seminoma mediastinal International Germ Cell Cancer Consensus Group: International
está associado a distúrbios hematológicos, como leucemia mieloide Germ Cell Consensus Classification: A prognostic factor-based staging
aguda, síndrome mielodisplásica e trombocitose essencial sem rela- system for metastatic germ cell cancers. J Clin Oncol 15:594, 1997
ção com a quimioterapia prévia, distúrbios hematológicos bastante Sonpaude G et al: Management of recurrent testicular germ cell tumors. On-
refratários ao tratamento. O não seminoma de qualquer local primá- cologist 12:51, 2007
rio pode se transformar em outros tipos histológicos malignos, como Travis LB et al: Testicular cancer survivorship: Research strategies and re-
rabdomiossarcoma embrionário ou adenocarcinoma, o que se chama commendations. J Natl Cancer Inst 102:1114, 2010
138
CAPÍTULO 10 funções em ciclos mensais repetidos, o ovário sofre algumas das alte-
rações mais dinâmicas de qualquer outro órgão no corpo.
As células germinativas primordiais podem ser identificadas
em torno da terceira semana de gestação, e a sua migração para a
Sistema Reprodutor Feminino: crista genital é completa com 6 semanas de gestação. As células ger-
minativas persistem dentro da crista genital e são então designadas
Infertilidade e Contracepção como ovogônias e são essenciais para a indução do desenvolvimento
ovariano. Embora um cromossomo X sofra inativação X nas célu-
las somáticas, ele é reativado nas ovogônias, e os genes em ambos os
Janet E. Hall
cromossomos X são necessários para o desenvolvimento normal do
ovário. Um ovário em fita contendo apenas células estromais é en-
O sistema reprodutor feminino regula as alterações hormonais res- contrado em pacientes com síndrome de Turner 45,X (Cap. 7).
ponsáveis pela puberdade e função reprodutora. A função reprodu- A população de células germinativas se expande, e, a partir de
CAPÍTULO 10
tora normal nas mulheres requer a integração dinâmica dos sinais cerca de 8 semanas de gestação, as ovogônias começam a entrar na
hormonais provenientes do hipotálamo, da hipófise e do ovário, re- prófase da primeira divisão meiótica e transformam-se em ovócitos
sultando em ciclos repetitivos de desenvolvimento folicular, ovulação primários. Isso permite ao ovócito ser circundado por uma única ca-
e preparação do revestimento endometrial do útero se vier a ocorrer mada de células da granulosa achatadas, formando um folículo pri-
a concepção. mordial (Fig. 10.1). As células da granulosa derivam das células me-
Para uma discussão adicional de tópicos correlatos, ver os se- sonéfricas que invadem o ovário no início de seu desenvolvimento,
guintes capítulos: distúrbios hiperandrogênicos (Cap. 13), distúr- empurrando as células germinativas para a periferia. Embora estudos
bios do ciclo menstrual (Cap. 11), neoplasias malignas ginecológicas recentes tenham reaberto o debate, a maior parte das evidências sus-
(Cap. 14), doenças sexualmente transmitidas, contracepção hormo- tenta fortemente o conceito de que o ovário contém um reservatório
Células germinativas
migratórias
Prófase da primeira
Crista genital divisão meiótica
Ovogônias
Ovócitos 1°
Ovócito Corpo
maduro lúteo Células da
granulosa
Folículos
primordiais
Independente de gonadotrofinas
LH Células da teca
Dependente de gonadotrofinas
Ovulação
Folículos
secundários
Reinício
da meiose
FSH
LH
Folículos
pré-ovulatórios FSH
Folículos antrais
Figura 10.1 Estágios do desenvolvimento ovariano desde a chegada das células germinativas migratórias na crista genital por meio das fases independente e
dependente de gonadotrofinas que resultam finalmente na ovulação de um ovócito maduro. FSH, hormônio folículo-estimulante; LH, hormônio luteinizante.
139
7 x 106 Células germinativas
migratórias
Ovogônias
Ovócitos primários
2 x 106
Folículos primordiais Folículos primários
4 x 105
Gonadotrofinas plasmáticas
FGFR1, PROK2/PROKR2, NELF e CDH7 (Cap. 8) foram implicados
na migração dos neurônios de GnRH até o hipotálamo. Cerca de
7.000 neurônios de GnRH, espalhados por todo o hioptálamo basal
medial, estabelecem contato com capilares do sistema portal hipofi-
FSH LH
sário na eminência mediana. O GnRH é secretado no sistema portal
hipofisário em pulsos distintos para estimular a síntese e a secreção
de LH e de FSH dos gonadotropos hipofisários, que compreendem
cerca de 10% das células na hipófise (Cap. 2). As conexões funcio- Nascimento a 20 meses 10 a 14 anos 50 anos
nais dos neurônios de GnRH com o sistema portal são estabelecidas Infância Lactância Puberdade Anos reprodutivos Menopausa
no final do primeiro trimestre, coincidindo com a produção de go- Figura 10.5 O hormônio folículo-estimulante (FSH) e o hormônio luteini-
nadotrofinas hipofisárias. Por conseguinte, à semelhança do ovário, zante (LH) estão aumentados durante os anos neonatais, porém passam por
os componentes hipotalâmicos e hipofisários do sistema reprodutor um período de quiescência infantil antes de aumentar novamente durante a puber-
estão presentes antes do nascimento. Entretanto, os altos níveis de dade. Os níveis de gonadotrofinas são cíclicos durante os anos reprodutivos e au-
CAPÍTULO 10
estradiol e de progesterona produzidos pela placenta suprimem a mentam drasticamente com a perda da retroalimentação negativa que acompanha
estimulação hipotalâmico-hipofisária da secreção hormonal ovaria- a menopausa.
na no feto.
Após o nascimento e a perda dos esteroides derivados da placen- po, na inibição da secreção de GnRH durante a infância, porém não
ta, ocorre elevação dos níveis de gonadotrofinas. Os níveis de FSH foi definitivamente estabelecida nos seres humanos. Certos sinais
são muito mais altos nas meninas do que nos meninos. Essa elevação metabólicos, como a leptina derivada dos adipócitos, desempenham
do FSH resulta em ativação ovariana (evidenciada na ultrassonogra- um papel permissivo na função reprodutora (Cap. 16). Estudos de
fia) e aumento dos níveis de inibina B e estradiol. Os estudos que pacientes com deficiência isolada de GnRH revelam que a ocorrência
identificaram mutações em TAC3, que codifica a neurocinina B, e de mutações no gene do receptor acoplado à proteína G 54 (GPR54)
corpo lúteo. As células da granulosa luteinizadas constituem a princi- nos folículos antrais, enquanto a inibina A está presente nas células
pal fonte de produção de progesterona, enquanto as células luteínicas tanto da granulosa quanto da teca, sendo secretada pelos folículos
da teca produzem 17-hidroxiprogesterona, um substrato para aroma- dominantes. A inibina A está presente também nas células da gra-
tização a estradiol pelas células da granulosa luteinizadas. O LH é nulosa luteinizadas e representa o principal produto secretório do
essencial para a estrutura e a função normais do corpo lúteo. Como corpo lúteo. A inibina B é secretada constitutivamente pelas célu-
o LH e a gonadotrofina coriônica humana (hCG) ligam-se a um re- las da granulosa e aumenta no soro em associação ao recrutamen-
ceptor comum, o papel do LH na sustentação do corpo lúteo pode ser to do ciclo para o reservatório de folículos em crescimento ativo
substituído pela hCG nas primeiras 10 semanas após a concepção, e sob o controle do FSH. A inibina B tem sido usada clinicamente
a hCG é comumente usada para suporte da fase lútea no tratamento como marcador da reserva ovariana. A inibina B é um importante
da infertilidade. inibidor do FSH, independentemente do estradiol, durante o ciclo
menstrual. Apesar de a ativina também ser secretada pelo ovário, o
Ações dos hormônios esteroides excesso de folistatina no soro, combinado com a sua ligação quase
Tanto o estrogênio quanto a progesterona desempenham papéis irreversível à ativina, torna improvável que a ativina ovariana de-
essenciais na expressão das características sexuais secundárias das sempenhe algum papel endócrino na regulação do FSH. Entretanto,
mulheres (Cap. 1). O estrogênio promove o desenvolvimento de há evidências de que a ativina desempenha um papel autócrino/
ductos na mama, enquanto a progesterona é responsável pelo de- parácrino no ovário, além de seu papel intra-hipofisário na modu-
senvolvimento glandular. No trato reprodutor, os estrogênios criam lação da produção de FSH.
um ambiente receptivo à fertilização bem como apoiam a gestação O AMH (também conhecido como MIS) é importante na biolo-
e parturição por meio de alterações minuciosamente coordenadas gia ovariana, além da função da qual deriva o seu nome (isto é, pro-
no endométrio, do espessamento da mucosa vaginal, da diluição do mover a degeneração do sistema mülleriano durante a embriogênese
muco cervical assim como do crescimento e das contrações do útero. no sexo masculino). O AMH é produzido pelas células da granulosa
A progesterona induz a uma atividade secretória no endométrio pre- e, como a inibina B, constitui um marcador da reserva ovariana. O
parado (escorvado) pelo estrogênio, aumenta a viscosidade do muco AMH também pode inibir o recrutamento dos folículos primordiais
cervical e inibe as contrações uterinas. Os dois esteroides gonadais no reservatório de folículos e parece inibir o efeito do FSH sobre a
desempenham papéis essenciais nos controles por retroalimentação expressão da aromatase.
negativa e positiva da secreção de gonadotrofinas. A progesterona Acredita-se que a relaxina, que é produzida pelas células luteíni-
também eleva a temperatura corporal basal e, por isso, tem sido usa- cas da teca do corpo lúteo, desempenha um papel na decidualização
da na clínica como um marcador da ovulação. do endométrio e na supressão da atividade contrátil do miométrio,
ambas as quais são essenciais para o estabelecimento inicial da ges-
A grande maioria dos estrogênios e androgênios circulantes é
tação.
carreada no sangue ligada às proteínas carreadoras, que restringem
sua difusão livre para o interior das células e prolongam sua depu-
ração, funcionando como um reservatório. As proteínas de ligação INTEGRAÇÃO HORMONAL DO CICLO MENSTRUAL NORMAL
de alta afinidade consistem na globulina de ligação dos hormônios A sequência de mudanças responsáveis pela função reprodutora ma-
sexuais (SHBG), que se liga aos androgênios com uma afinidade bem dura é coordenada por meio de uma série de alças de retroalimen-
maior que os estrogênios, e globulina de ligação dos corticosteroi- tação negativa e positiva, que alteram a secreção pulsátil de GnRH,
des (CBG), que também se liga à progesterona. As modulações nos a resposta hipofisária ao GnRH e a secreção relativa de LH e de FSH
níveis de proteínas de ligação induzidas por insulina, androgênios e do gonadotropo. A frequência e a amplitude da secreção pulsátil de
estrogênios contribuem para os altos níveis de testosterona biodispo- GnRH modulam diferencialmente a síntese e a secreção de LH e
nível na SOP e altos níveis circulantes de estrogênio e progesterona de FSH, em que as frequências lentas favorecem a síntese de FSH,
durante a gestação. enquanto as amplitudes aumentadas favorecem a síntese de LH. A
Os estrogênios atuam principalmente através da ligação aos re- ativina é produzida tanto nos gonadotropos hipofisários quanto nas
ceptores nucleares: os receptores estrogênicos (RE) e . Os coa- células foliculoestreladas e estimula a síntese e a secreção do FSH. As
tivadores da transcrição e correpressores modulam a ação de RE inibinas funcionam como potentes antagonistas das ativinas através
(Cap. 1). Ambos os subtipos de RE estão presentes no hipotálamo, da sequestração dos receptores de ativina. Embora a inibina seja ex-
hipófise, ovário e trato reprodutor. RE e RE exibem alguma redun- pressa na hipófise, a inibina gonadal constitui a principal fonte de
dância funcional, porém existe também alto grau de especificidade, inibição do FSH por retroalimentação.
142
Retroalimentação Retroalimentação
negativa positiva Fase
Fase folicular lútea
- GnRH
FSH
LH
Inibina B
Inibina B Estradiol
Estradiol Inibina A
Inibina A LH
+ FSH
++ E2
Estradiol Prog
Progesterona
CAPÍTULO 10
Endo
Proliferativo Secretório
Figura 10.7 O sistema reprodutor nas mulheres depende criticamente da re- Figura 10.8 Relação entre as gonadotrofinas, o desenvolvimento do
troalimentação negativa dos esteroides gonadais e da inibina para modular a secre- folículo, a secreção gonadal e as alterações endometriais durante o ciclo
ção do hormônio folículo-estimulante (FSH), bem como da retroalimentação positiva menstrual normal. FSH, hormônio folículo-estimulante; LH, hormônio luteinizante; E2,
do estrogênio para gerar o pico pré-ovulatório de hormônio luteinizante (LH). GnRH, estradiol; Prog, progesterona; Endo, endométrio.
hormônio de liberação das gonadotrofinas.
144
QUADRO 10.2 Diagnóstico diferencial da puberdade precoce QUADRO 10.3 Avaliação da puberdade precoce e atrasada
Central (dependente de GnRH) Periférica (independente de GnRH) Precoce Atrasada
CAPÍTULO 10
Traumatismo cranioencefálico TSH, T4 x x
Síndrome de excesso de aromatase
Iatrogênica Hemograma completo x
Irradiação Velocidade de hemossedimentação, proteína x
Quimioterapia C-reativa
Cirúrgica Eletrólitos, função renal x
Malformação do SNC Enzimas hepáticas x
Cistos aracnoideos ou IGF‑1, IGFBP‑3 x
suprasselares Exame de urina x
145
Infertilidade
QUADRO 10.4 Diagnóstico diferencial da puberdade atrasada 14% das mulheres de idade reprodutiva
5 milhões de casais nos EUA
Hipergonadotrófica
Ovariana
Causas femininas Causas masculinas Inexplicadas
Síndrome de Turner 58% 25% 17%
Disgenesia gonadal
Quimioterapia/radioterapia
Hipogonadismo Hipogonadismo Distúrbio no Desco-
Galactosemia primário ( FSH) secundário transporte dos nhecida
Ooforite autoimune 30 a 40% ( FSH, LH) espermatozoides 40 a 50%
2% 10 a 20%
Hiperplasia lipoide congênita
Anormalidades das enzimas esteroidogênicas
Deficiência de 17‑hidroxilase Amenorreia/ Defeito Endometriose Outras
disfunção tubário 9% 7%
SEÇÃO II
Deficiência de aromatase
ovulatória 38%
Mutações da gonadotrofina/receptor 46%
FSH, LHR, FSHR
Síndrome de resistência aos androgênios
Causas Síndrome Insuficiência Distúrbios do trato
Hipogonadotrófica hipotalâmicas/ do ovário ovariana uterino ou do trato
hipofisárias policístico prematura de efluxo
Genética 51% 30% 12% 7%
Síndromes hipotalâmicas
Endocrinologia Reprodutiva
146
Disfunção ovulatória Nas mulheres com história de ciclos mens- tervenções mais invasivas e de risco mais alto somente quando
truais regulares, a evidência de ovulação deve ser pesquisada, con- necessário. Após a determinação de todos os fatores de inferti-
forme descrito anteriormente. A biópsia endometrial para excluir lidade de sua correção, se possível, esta abordagem deve incluir,
uma insuficiência da fase lútea não é mais considerada como par- em ordem crescente de complexidade: (1) conduta expectante;
te habitual da pesquisa de infertilidade. Mesmo na presença de (2) citrato de clomifeno (ver adiante) com ou sem inseminação
ciclos ovulatórios, a avaliação da reserva ovariana é recomendada intrauterina (IIU); (3) gonadotrofinas com ou sem IIU; e (4)
para mulheres com mais de 35 anos de idade. Para esse propósi- fertilização in vitro (FIV). O período utilizado para completar a
to, foram utilizadas determinações do FSH no dia 3 do ciclo (um avaliação, correção e realização do tratamento expectante pode
nível de FSH <10 UI/mL no dia 3 do ciclo indica uma reserva ser mais longo em mulheres com menos de 30 anos de idade,
ovariana adequada de ovócitos) ou em resposta ao clonifeno (que porém este processo tem que avançar rapidamente em mulheres
bloqueia a retroalimentação negativa do estrogênio sobre o FSH), com mais de 35 anos. Em algumas situações, a conduta expectan-
a contagem de folículos antrais e os níveis séricos de inibina B e te não é apropriada.
de AMH.
DISFUNÇÃO OVULATÓRIA O tratamento da disfunção ovulatória
CAPÍTULO 10
Doença tubária A disfunção tubária pode resultar de doença in- deve ser dirigido primeiro à identificação da etiologia do distúr-
flamatória pélvica (DIP), apendicite, endometriose, aderências bio a fim de permitir um tratamento específico quando possível.
pélvicas, cirurgia tubária, uso prévio de dispositivo intrauterino Os agonistas da dopamina, por exemplo, podem ser indicados às
(DIU) e gravidez ectópica prévia. Entretanto, não se identifica pacientes com hiperprolactinemia (Cap. 2); a modificação do es-
nenhuma causa em até 50% das pacientes com infertilidade do- tilo de vida pode ser bem-sucedida nas mulheres com obesidade,
cumentada devido a um fator tubário. Tendo em vista a elevada baixo peso corporal ou história de exercício intensivo.
prevalência de doença tubária, a avaliação da patência tubária por As medicações usadas para a indução da ovulação incluem
histerossalpingografia (HSG) ou laparoscopia deve ser realizada citrato de clomifeno, gonadotrofinas e GnRH pulsátil. O citrato
precocemente na maioria dos casais com infertilidade. As infec- de clomifeno é um antagonista do estrogênio não esteroide que
147
33% dos casais. A interrupção da gravidez é relativamente segura
está associada a taxas de gravidez de 50 e 39%, respectivamente,
quando orientada por profissionais de saúde, porém raramente cons-
em comparação com taxas de 25 e 5% quando se utiliza apenas a
titui a opção de escolha.
conduta expectante. Em algumas pacientes, a FIV pode constituir
Não existe nenhum método contraceptivo isolado ideal, embo-
o tratamento de escolha.
ra todos sejam mais seguros do que levar uma gestação a termo. A
INFERTILIDADE DECORRENTE DO FATOR MASCULINO As opções te- eficiência de determinado método de contracepção não depende
rapêuticas para a infertilidade devida ao fator masculino foram apenas da eficácia do método propriamente dito. As discrepâncias
grandemente ampliadas nos últimos anos (Cap. 8). O hipogona- entre a eficiência teórica e a verdadeira ressaltam a importância da
dismo secundário é altamente passível de tratamento com GnRH educação e adesão das pacientes quando se consideram várias for-
pulsátil ou gonadotrofinas. As técnicas in vitro proporcionaram mas de contracepção (Quadro 10.5). O conhecimento das vantagens
novas oportunidades aos pacientes com falência testicular primá- e desvantagens de cada contraceptivo é essencial para aconselhar um
ria e distúrbios do transporte dos espermatozoides. A escolha das indivíduo acerca dos métodos mais seguros e mais compatíveis com
opções terapêuticas iniciais depende da concentração e motilida- o seu estilo de vida. A Organização Mundial da Saúde (OMS) possui
de dos espermatozoides. A conduta expectante deve ser tentada recursos extensos de planejamento familiar para o médico e o (a) pa-
inicialmente nos homens com infertilidade ligeira devida ao fator ciente, que podem ser acessados online. Recursos semelhantes para
SEÇÃO II
masculino (contagem de espermatozoides de 15 a 20 106/mL determinar a elegibilidade médica estão disponíveis nos Centers for
e motilidade normal). O tratamento da infertilidade moderada Disease Control and Prevention (CDC). As considerações para o uso
devida ao fator masculino (10 a 15 106/mL e motilidade de 20 de contraceptivos em pacientes obesas e após cirurgia bariátrica são
a 40%) deve começar apenas com IIU ou em combinação com o discutidas adiante.
tratamento da parceira feminina com clomifeno ou gonadotrofi-
nas, embora possa ser necessária a FIV com ou sem injeção intra- ■■ MÉTODOS DE BARREIRA
citoplasmática de espermatozoides (ICSI, intracytoplasmic sperm Os contraceptivos de barreira (como preservativos, diafragmas e ca-
injection). Para os homens com um defeito grave (contagem de puzes cervicais) e espermicidas podem ser obtidos facilmente, são
Endocrinologia Reprodutiva
espermatozoides de < 10 106/mL e 10% de motilidade), deve reversíveis e comportam menos efeitos colaterais que os métodos
ser utilizada a FIV com ICSI ou espermatozoide doador. Se a ICSI hormonais. Entretanto, sua eficácia depende muito da adesão e uso
for ser realizada em virtude da azoospermia devida à ausência bi- adequado (Quadro 10.5). A principal vantagem dos contraceptivos
lateral congênita dos ductos deferentes, deverão ser feitos testes de barreira é a proteção proporcionada contra as infecções sexual-
genéticos e ser fornecido o devido aconselhamento por causa do mente transmissíveis (IST). O uso constante está associado a menor
risco de fibrose cística. risco de HIV, gonorreia, uretrite não gonocócica e herpes genital, em
TECNOLOGIAS REPRODUTIVAS ASSISTIDAS O desenvolvimento de parte graças provavelmente ao uso concomitante de espermicidas. Os
tecnologias reprodutivas assistidas (TRA) alterou drasticamente preservativos de membranas naturais podem ser menos efetivos que
o tratamento da infertilidade masculina e o da feminina. A FIV os de látex, e os lubrificantes com base no petrolato podem degra-
está indicada aos pacientes com muitas causas de infertilidade não dar os preservativos bem como reduzir sua eficácia na prevenção da
devidamente solucionada com abordagens mais conservadoras. infecção pelo HIV. Um preservativo feminino altamente eficaz, que
FIV ou ICSI constituem com frequência o tratamento de escolha proporciona também proteção contra as DST, foi aprovado em 1994,
nos casais com um fator masculino significativo ou doença tubá- porém não conseguiu uma utilização generalizada.
ria, enquanto a FIV com a utilização de ovócitos doadores é utili-
zada nas pacientes com falência ovariana prematura e mulheres ■■ ESTERILIZAÇÃO
em idade reprodutiva avançada. As taxas de sucesso dependem da A esterilização é o método de controle de natalidade escolhido mais
idade da mulher e da causa da infertilidade. O número de ciclos frequentemente por homens férteis e mulheres multíparas com mais
cancelados aumenta de aproximadamente 10% em mulheres com de 30 anos de idade (Quadro 10.5). Refere-se a um procedimento
menos de 35 anos de idade até 24% naquelas com mais de 40 anos, que impede a fertilização pela interrupção cirúrgica das tubas ute-
enquanto a taxa de nascimento diminui de cerca de 39% dos ciclos rinas nas mulheres e dos ductos deferentes nos homens. Apesar de a
em que foram transferidos embriões em mulheres de menos de 35 ligadura tubária e vasectomia serem potencialmente reversíveis, esses
anos de idade para 24% em mulheres de 38 a 40 anos e para apenas procedimentos devem ser considerados permanentes, não devendo
10% em mulheres com mais de 40 anos. Apesar de ser frequente- ser empreendidos sem o devido aconselhamento dos pacientes.
mente efetiva, a FIV é dispendiosa e exige uma cuidadosa moni- Foram desenvolvidos vários métodos de ligadura tubária, al-
toração da indução da ovulação e técnicas invasivas, incluindo a tamente efetivos com uma taxa de gravidez cumulativa de 10 anos
aspiração de múltiplos folículos. A FIV está associada a um risco de 1,85 por 100 mulheres. No entanto, quando a gravidez chega a
significativo de gestação múltipla, particularmente em mulheres ocorrer, o risco de gestação ectópica pode ser de até 30%. A taxa de
com menos de 35 anos de idade, nas quais pode atingir até 40%. sucesso da reanastomose tubária depende do método usado, porém
mesmo após uma reversão bem-sucedida, o risco de gestação ectópi-
ca continua alto. Além da prevenção da gravidez, a ligadura tubária
reduz o risco de câncer ovariano, possivelmente por limitar a migra-
ção ascendente de possíveis carcinogênios.
■■ CONTRACEPÇÃO
A vasectomia é um procedimento cirúrgico ambulatorial al-
Apenas 15% dos casais nos Estados Unidos relatam ter tido rela- tamente eficaz que comporta pouquíssimo risco. A instalação da
ções sexuais sem proteção nos últimos 3 meses. Entretanto, apesar azoospermia pode ser retardada em 2 a 6 meses, devendo outras for-
da ampla disponibilidade e do uso disseminado de uma variedade mas de contracepção ser utilizadas até que duas ejaculações isentas
de métodos efetivos de contracepção, aproximadamente metade de de espermatozoides tenham proporcionado uma prova da esterilida-
todos os nascimentos nos Estados Unidos resulta de gravidez não de. A reanastomose pode restaurar a fertilidade em 30 a 50% dos ho-
intencional. As gestações em adolescentes continuam representando mens, porém a taxa de sucesso declina com o passar do tempo após
um sério problema de saúde pública nos Estados Unidos, com mais a vasectomia e pode ser influenciada por fatores, como o surgimento
de 1 milhão de gestações não desejadas a cada ano – uma incidência de anticorpos antiespermatozoides.
significativamente maior que a de outras nações industrializadas.
Entre os métodos contraceptivos disponíveis (Quadro 10.5), ■■ DISPOSITIVOS INTRAUTERINOS (DIU)
uma forma reversível de contracepção é usada por mais de 50% dos Os DIU inibem a gravidez principalmente por meio de efeito esper-
casais, enquanto a esterilização (seja ela masculina ou feminina) tem micida causado por reação inflamatória estéril induzida pela presen-
sido utilizada como forma permanente de contracepção por mais de ça de corpo estranho na cavidade uterina (DIU de cobre) ou libe-
148
QUADRO 10.5 Eficiência das diferentes formas de contracepção
Métodos contraceptivos
Percentual de uso usados por mulheres
a a
Método de contracepção Eficiência teórica (%) Eficiência real (%) contínuo com 1 anob norte‑americanasc
Métodos de barreira
Preservativos 98 88 63 18
Diafragma 94 82 58 2
Capuz cervical 94 82 50 <1
Espermicidas 97 79 43 1
Esterilização
Masculina 99,9 99,9 100 9
CAPÍTULO 10
Feminina 99,8 99,6 100 27
Dispositivo intrauterino 1
De cobre T380 99 97 78
Progestasert 98 97 81
Mirena 99,9 99,8
Contraceptivos hormonais 99,7 92 72 31
Pílula de combinação
Pílula com progestina apenas
ração de progestinas (Progestasert, Mirena). Os DIU proporcionam da diariamente por 3 semanas, seguidas por 1 semana sem qualquer
alto nível de eficácia na ausência de efeitos metabólicos sistêmicos, e medicação, durante a qual em geral ocorre o sangramento menstrual.
a motivação constante não é necessária para garantir a eficácia depois Dois contraceptivos orais de uso extenso foram aprovados para uso
que o dispositivo tiver sido colocado. Entretanto, apenas 1% das mu- nos Estados Unidos; Seasonale é uma preparação para 3 meses com
lheres nos EUA utiliza esse método em comparação com uma taxa 84 dias de medicamento ativo e 7 dias de placebo, e Lybrel é uma
de utilização de 15 a 30% em grande parte da Europa e Canadá, não preparação de uso contínuo contendo 90 g de levonorgestrel e 10
obstante a evidência de que os dispositivos mais recentes não estão g de etinilestradiol. As doses atuais de etinilestradiol variam de 20
associados a maiores taxas de infecção pélvica e infertilidade, como a 50 g. Entretanto, as indicações para a dose de 50 g são raras, e
acontecia com os dispositivos mais antigos. Um DIU não deve ser a maioria das formulações contêm 35 g de etinilestradiol. O con-
usado nas mulheres que correm alto risco de vir a desenvolver uma teúdo reduzido de estrogênio e progestina nas pílulas de segunda e de
DST nem nas mulheres com alto risco de endocardite bacteriana. terceira gerações diminuiu tanto os efeitos colaterais quanto os riscos
Pode não ser efetivo nas mulheres com leiomiomas uterinos, pois es- associados ao uso de contraceptivos orais (Quadro 10.6). Com as do-
tes alteram o tamanho ou formato da cavidade uterina. O uso de DIU ses atualmente utilizadas, as pacientes devem ser alertadas para não
está associado a um aumento do fluxo sanguíneo menstrual, embora omitir as pílulas, devido ao potencial de ovulação. Os efeitos colate-
seja menos pronunciado com o DIU que libera progestina, que está rais, que incluem sangramento por interrupção, amenorreia, hiper-
associada a uma ocorrência de sangramento irregular ou amenorreia. sensibilidade mamária e ganho de peso, respondem frequentemente
a uma mudança da formulação.
■■ MÉTODOS HORMONAIS A minipílula apenas com uma microdose de progestina é me-
Pílulas contraceptivas orais nos eficaz como contraceptivo, comportando a gestação de 2 a 7 por
Por causa da facilidade de utilização e de sua eficácia, as pílulas con- 100 mulheres-ano. No entanto, pode ser apropriada às mulheres com
traceptivas orais representam a forma utilizada mais extensamente de doença cardiovascular ou às que não conseguem tolerar os estrogê-
contracepção hormonal. Atuam suprimindo a ovulação, modificando nios sintéticos.
o muco cervical e alterando o endométrio. As atuais formulações são
feitas de estrogênios e progestinas sintéticos. O componente estrogê- Novos métodos
nico da pílula consiste em etinilestradiol ou mestranol, metabolizado Um adesivo contraceptivo semanal (Ortho Evra) está disponível,
em etinilestradiol. São utilizadas múltiplas progestinas sintéticas. A comportando eficácia semelhante à dos contraceptivos orais, mas
noretindrona e seus derivados são usados em muitas formulações. podendo estar associado a menos sangramento reativo. Cerca de
As pequenas doses de norgestimato e as progestinas desenvolvidas 2% dos adesivos não aderem adequadamente, e um percentual se-
mais recentemente (desogestrel, gestodena, drospirenona) possuem melhante de mulheres sofre de reações cutâneas. A eficácia é mais
um perfil menos androgênico. O levonorgestrel parece ser o mais an- baixa nas mulheres que pesam mais de 90 kg. A quantidade de es-
drogênico das progestinas, devendo ser evitado nas pacientes com trogênio fornecido pode ser comparável à de um contraceptivo oral
sintomas hiperandrogênicos. As três principais formulações de con- com 40 g de etinilestradiol, o que gera a possibilidade de um maior
traceptivos orais são (1) a combinação de estrogênio-progestina com risco de tromboembolismo venoso, a qual deve ser cotejada contra
dose fixa, (2) combinação fásica de estrogênio-progestina e (3) ape- os possíveis benefícios para as mulheres que não conseguem utilizar
nas progestina. Cada uma dessas formulações deve ser administra- com sucesso os outros métodos. Uma injeção contraceptiva mensal
149
pode ser particularmente apropriada em mulheres para as quais um
QUADRO 10.6 Contraceptivos orais, contraindicações e risco contraceptivo contendo estrogênio está contraindicado (p. ex., exa-
de doença cerbação da enxaqueca, anemia falciforme, fibroides).
Contraindicações ■■ CONTRACEPÇÃO PÓS‑COITO
Absolutas Os métodos contraceptivos pós-coito impedem a implantação ou
Evento tromboembólico ou acidente vascular encefálico prévio causam regressão do corpo lúteo e são altamente eficazes se forem
utilizados de modo apropriado. A relação sexual desprotegida sem
História de tumor dependente de estrogênio
qualquer relação com a época do mês está associada a uma incidên-
Doença hepática ativa cia de gravidez de 8%, que pode ser reduzida para 2% com o uso
Gravidez de contraceptivos de emergência dentro de 72 horas após a relação
Sangramento uterino anormal não diagnosticado sexual sem proteção. Um aviso publicado em 1997 pelo U.S. Food
Hipertrigliceridemia and Drug Administration (FDA) indicava que certas pílulas contra-
ceptivas orais poderiam ser usadas dentro de 72 horas após a relação
Mulheres com mais de 35 anos que fumam maciçamente
sexual sem proteção (Ovral [2 comprimidos, com intervalo de 12
Relativas
SEÇÃO II
150
CAPÍTULO 11 pélvica cíclica e a tendência secular a uma idade precoce para a me-
narca, particularmente nas meninas afroamericanas. Assim, deve-se
iniciar uma avaliação para amenorreia aos 15 ou 16 anos de idade,
na presença de crescimento normal e características sexuais secun-
Distúrbios Menstruais dárias; aos 13 anos, na ausência de características sexuais secundá-
rias ou se a altura for menor do que o terceiro percentil; aos 12 ou
e Dor Pélvica 13 anos, na presença de desenvolvimento das mamas e dor pélvica
cíclica; ou nos 2 anos de desenvolvimento das mamas se a menarca,
definida pelo primeiro período menstrual, não ocorrer.
Janet E. Hall
Amenorreia secundária ou oligoamenorreia
A disfunção menstrual pode sinalizar uma anormalidade subja-
A anovulação e os ciclos irregulares são relativamente comuns por até
cente que pode trazer consequências para a saúde a longo prazo.
2 a 4 anos após a menarca e por 1-2 anos antes do período menstrual
Capítulo 11
Embora o sangramento frequente ou prolongado costume induzir
final. Nos anos entre este intervalo, a duração do ciclo menstrual é
a mulher a procurar atendimento médico, o sangramento infre-
de aproximadamente 28 dias, com um intervalo intermenstrual que
quente ou ausente pode parecer menos preocupante e a paciente
normalmente varia entre 25 e 35 dias. A variabilidade ciclo a ciclo
pode não procurar um médico. Assim, concentrar-se na história
em uma mulher que esteja ovulando sistematicamente em geral é de
menstrual é uma parte muito importante de toda consulta femi-
+/– 2 dias. A gravidez é a causa mais comum de amenorreia, devendo
nina. A dor pélvica é uma queixa comum que pode relacionar-se
ser excluída no início de qualquer avaliação de irregularidade mens-
com uma anormalidade dos órgãos reprodutivos, mas pode tam-
trual. Contudo, muitas mulheres algumas vezes não apresentam um
bém ser de origem gastrintestinal, do trato urinário ou musculo-
período menstrual. Três ou mais meses de amenorreia secundária
esquelética. Dependendo da causa, a dor pélvica pode requerer
exigem uma avaliação, assim como uma história de intervalos inter-
Amenorreia primária Figura 11.1 Papel do eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal na etiologia da amenorreia. A secreção do
hormônio de liberação da gonadotrofina a partir do hipotálamo estimula o hormônio folículo-estimulante (FSH) e a
A ausência de menstruação aos 16 anos secreção do hormônio luteinizante (LH) a partir da hipófise para induzir foliculogênese ovariana e esteroidogênese. A
de idade tem sido tradicionalmente usa- secreção ovariana de estradiol e progesterona controla a descamação do endométrio, resultando na menstruação, e,
da para definir amenorreia primária. em combinação com as inibinas, fornece regulação do feedback do hipotálamo e da hipófise para controlar a secreção
Entretanto, devem-se investigar outros de FSH e LH. A prevalência de amenorreia que resulta das anormalidades em cada nível do sistema reprodutivo (hipo-
fatores, como crescimento, característi- tálamo, hipófise, ovário, útero e via de saída) varia conforme a amenorreia seja primária ou secundária. SOP, síndrome
cas sexuais secundárias, presença de dor do ovário policístico.
151
B e inibina A), bem como componentes hipotalâmicos (hormônio lizada devido a complicações da gravidez é responsável por mais de
de liberação de gonadotrofina [GnRH]) e hipofisários (hormônio fo 90% dos casos; a tuberculose genital é uma causa importante nas
lículo-estimulante [FSH] e hormônio luteinizante [LH]) deste siste- regiões endêmicas.
ma (Fig. 11.1).
Os distúrbios da função menstrual podem ser considerados em
duas categorias principais: distúrbios do útero e via de saída e dis-
túrbios de ovulação. Grande parte dos problemas que causam ame- TRATAMENTO Distúrbios uterinos ou da via de saída
norreia primária é congênita, mas não é reconhecida até a época da
puberdade normal (p. ex., anormalidades genéticas, cromossômicas A obstrução da via de saída requer correção cirúrgica. O risco de
e anatômicas). Todas as causas de amenorreia secundária também endometriose é aumentado com esta condição, talvez devido a
podem provocar amenorreia primária. fluxo menstrual retrógrado. A agenesia mulleriana também pode
requerer intervenção cirúrgica, embora a dilatação vaginal seja
Distúrbios uterinos ou da via adequada em alguns pacientes. Como a função ovariana se mos-
de saída tra normal, as técnicas reprodutivas assistidas podem ser usadas
com uma mãe de aluguel. A síndrome de resistência androgênica
As anormalidades uterinas ou da via de saída apresentam-se como
requer gonadectomia porque há risco de gonadoblastoma nas gô-
SEÇÃO II
AMENORREIA / OLIGOMENORREIA
Normal Anormal
Gravidez + βhCG
Síndrome da Agenesia Instrumentação
– insensibilidade mulleriana, uterina
androgênica estenose cervical,
Hiperandrogenismo FSH septo vaginal,
↑ testosterona, hímen imperfurado PRL normal, FSH
hirsutismo, acne Experiência
negativa com
Normal ou diminuído Elevado Encaminhamento estrogênio/
Descartar tumor ao ginecologista progesterona
Descartar deficiência
de 21-hidroxilase PRL Insuficiência
ovariana
Síndrome
de Asherman
Síndrome do ovário
policístico Aumentada Normal
Encaminhamento
ao ginecologista
Descartar fármacos,
↑ TSH Amenorreia Amenorreia secundária
primária, baixa
estatura ou Descartar TSH
RM suspeita clínica aumentado, discutir dieta,
exercício, estresse
Figura 11.2 Algoritmo para a avaliação da amenorreia. hCG, gonadotrofina coriônica humana; FSH, hormônio folículo-estimulante; TSH, hormônio tireoestimulante.
152
Hipogonadismo hipogonadotrófico Níveis baixos de estrogênio, em O hipogonadismo hipergonadotrófico raramente ocorre em
combinação com níveis normais ou baixos de LH e FSH, são obser- outros distúrbios, como mutações nos receptores de FSH ou LH. A
vados nas anormalidades anatômicas, genéticas ou funcionais que deficiência de aromatase e a deficiência de 17-hidroxilase estão as-
interferem na secreção hipotalâmica de GnRH ou na responsividade sociadas a gonadotrofinas elevadas com hiperandrogenismo e hiper-
hipofisária ao GnRH. Embora relativamente incomum, os tumo- tensão, respectivamente. Os tumores que secretam gonadotrofina
res e doenças infiltrativas devem ser considerados no diagnóstico nas mulheres em idade reprodutiva geralmente apresentam-se com
diferencial de hipogonadismo hipogonadotrófico (Cap. 2). Estes níveis altos, e não baixos, de estrogênio, causando hiperestimulação
distúrbios podem apresentar-se com amenorreia primária ou se- ovariana ou sangramento disfuncional.
cundária, podendo ocorrer em associação com outras manifestações
sugestivas de disfunção hipotalâmica ou hipofisária, tais como baixa
estatura, diabetes insípido, galactorreia e cefaleia. O hipogonadismo Causas hipogonadotróficas e
TRATAMENTO
hipogonadotrófico também pode ser observado após radioterapia hipergonadotróficas de amenorreia
craniana. No período pós-parto, pode ser causado por necrose hi-
A amenorreia quase sempre é associada a níveis cronicamen-
pofisária (síndrome de Sheehan) ou hipofisite linfocítica. Como a
te baixos de estrogênio, independente de serem provocados por
Capítulo 11
disfunção reprodutiva é comumente associada a hiperprolactinemia
hipogonadismo hipogonadotrófico ou insuficiência ovariana. O
devido a lesões neuroanatômicas ou medicamentos, a prolactina
desenvolvimento de características sexuais secundárias requer
deve ser medida em todos os pacientes com hipogonadismo hipo-
a titulação gradual de reposição de estradiol com a subsequente
gonadotrófico (Cap. 2).
adição de uma progestina. Os sintomas de hipoestrogenismo po-
O hipogonadismo hipogonadotrófico isolado (HHI) ocorre em
dem ser tratados com terapia de reposição hormonal ou pílulas
mulheres, embora seja mais comum em homens. O HHI geralmente
contraceptivas orais. Os pacientes com hipogonadismo hipogona-
apresenta-se com amenorreia primária e está associado a anosmia
dotrófico interessados em fertilidade requerem tratamento com
em cerca de 50% das mulheres (chamado síndrome de Kallman). As
GnRH pulsátil ou FSH e LH exógenos, enquanto as pacientes com
causas genéticas de HHI foram identificadas em aproximadamente
insuficiência ovariana podem considerar a doação de ovócito, que
153
obstrução das vísceras ocas, distúrbios vasculares e dor que se origi- Um exame sensível de gravidez, hemograma completo com di-
na na parede abdominal. A dor pélvica pode refletir doença pélvica ferencial, exame de urina, exames para infecções por clamídias e
propriamente dita, mas também pode refletir distúrbios extrapélvi- gonococos, bem como ultrassonografia abdominal ajudam a fazer o
cos que referem a dor na pelve. Em até 60% dos casos, a dor pélvica diagnóstico e direcionar o tratamento adicional.
pode ser atribuída a problemas gastrintestinais que incluem apendi-
cite, colecistite, infecções, obstrução intestinal, diverticulite e doença
intestinal inflamatória. O trato urinário e os distúrbios musculoes- TRATAMENTO Dor pélvica aguda
queléticos também são causas comuns de dor pélvica.
O tratamento de dor pélvica aguda depende da etiologia suspei-
ABORDAGEM AO ta, mas pode exigir intervenção cirúrgica ou ginecológica. O tra-
PACIENTE Dor pélvica tamento conservador é uma consideração importante para cistos
ovarianos, caso não haja suspeita de torção, para evitar cirurgia
Uma anamnese abrangente, que inclui o tipo, localização, ra- pélvica desnecessária e risco subsequente de infertilidade causada
diação e estado relacionado com o aumento ou redução da gra- por aderências. A maioria das gravidezes ectópicas sem rompimen-
vidade, pode ajudar a identificar a causa da dor pélvica aguda. to atualmente é tratada com metotrexato, que é efetivo em 84 a 96%
Associações a sangramento vaginal, atividade sexual, defecação,
SEÇÃO II
154
Hall JE: Neuroendocrine control of the menstrual cycle, in Yen and Jaffe’s
mento mais efetivo, fornecendo mais de 80% das taxas contínuas Reproductive Endocrinology, 6th ed, JF Strauss III, RL Barbieri (eds). Phila-
de resposta. O ibuprofeno, naproxeno, cetoprofeno, ácido me- delphia, Elsevier, 2009, pp 139–154
fenâmico e nimesulida são superiores ao placebo. O tratamento Howard FM: Endometriosis and mechanisms of pelvic pain. J Minim Invasi-
deve ser iniciado 1 dia antes da menstruação esperada e em geral ve Gynecol 16:540, 2009
continuado por 2-3 dias. Os contraceptivos orais também redu- Nelson LM: Clinical practice: Primary ovarian insufficiency. N Engl J Med
zem os sintomas de dismenorreia. A falha da resposta aos AINEs 360:606, 2009
e contraceptivos orais é sugestiva de distúrbio pélvico, tal como a Pallais JC et al: Kallmann syndrome, in GeneReviews, RA Pagon et al (eds).
endometriose, devendo a laparoscopia diagnóstica ser considera- Seattle, University of Washington, 1993–2007 [updated April 8, 2010].
da para guiar o tratamento posterior. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/bookshelf/ br.fcgi?book=gene
Sultan C et al: Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser syndrome: Recent clinical
and genetic findings. Gynecol Endocrinol 25:88, 2009
Wittenberger MD et al: The FMR1 premutation and reproduction. Fertil
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Capítulo 11
Gordon CM: Clinical practice: Functional hypothalamic amenorrhea. N contraceptives for pain relief from dysmenorrhea: A review. Contracep-
Engl J Med 33:365, 2010 tion 81:185, 2010
155
CAPÍTULO 12 80 200
LH ou FSH, UI/L
LH (UI/L) 140
Transição da Menopausa
50 120
40 100
e Terapia Hormonal 30
20
Estrona (pg/mL)
80
60
Pós‑Menopausa 10
Estradiol (pg/mL)
40
20
0 0
–6 –4 –2 0 2 4 6 8
JoAnn E. Manson
Menopausa (anos)
Shari S. Bassuk
Figura 12.1 Níveis séricos médios dos hormônios ovarianos e hipofisá-
SEÇÃO II
de quatro anos. O fumo acelera a transição menopáusica em 2 anos. sica pode causar fogachos, suores noturnos, sangramento irregular e
As transições peri e pós-menopausa compartilham muitos sinto- ressecamento vaginal, assim como evidência moderada de que pode
mas, porém a fisiologia e o controle clínico diferem. As pequenas do- causar distúrbios do sono em algumas mulheres. Há evidência in-
ses de contraceptivos orais passaram a constituir o esteio terapêutico conclusiva ou insuficiente de que o envelhecimento ovariano é uma
na perimenopausa, enquanto a terapia hormonal (TH) pós-meno- importante causa de oscilações do humor, depressão, memória ou
pausa tem sido um método comum para o alívio dos sintomas depois concentração alterada, sintomas somáticos, incontinência urinária
que a menstruação cessa. ou disfunção sexual. Em um estudo norte-americano, quase 60% das
mulheres relatavam fogachos nos 2 anos que precediam suas mens-
truações finais. Intensidade, duração, frequência e efeitos dos sinto-
PERIMENOPAUSA mas sobre a qualidade de vida são altamente variáveis.
■■ FISIOLOGIA
A massa ovariana e fertilidade declinam bruscamente após os 35
TRATAMENTO Perimenopausa
anos de idade e ainda mais bruscamente durante a perimenopausa;
a depleção dos folículos primários, um processo que começa antes Para as mulheres com menstruações irregulares ou excessivamen-
do nascimento, ocorre regularmente até a menopausa (Cap. 10). Na te abundantes ou com sintomas relacionados a hormônios que
perimenopausa, observa-se uma redução significativa nos interva- prejudicam a qualidade de vida, os contraceptivos orais, combi-
los intermenstruais (em 3 dias) por causa de uma fase folicular ace- nados em pequenas doses, constituem um esteio da terapia. As
lerada. Os níveis de hormônio folículo-estimulante (FSH) sobem, doses estáticas de estrogênio e progestina (p. ex., 20 g de etinil
em virtude da foliculogênese alterada e menor secreção de inibina. estradiol e 1 mg de acetato de noretindrona diariamente durante
Diferente dos níveis consistentemente altos de FSH e baixos de es- 21 dias a cada mês) podem eliminar os sintomas vasomotores e
tradiol, observados na menopausa, a perimenopausa caracteriza-se restaurar os ciclos regulares. Os contraceptivos orais proporcio-
por níveis hormonais “irregularmente irregulares”. A maior pro- nam outros benefícios, como proteção contra os cânceres ovaria-
pensão para ciclos anovulatórios pode produzir um ambiente hi- nos e endometriais, assim como maior densidade óssea, apesar
perestrogênico e hipoprogestagênico que pode ser responsável pela de não ter ficado claro se o uso durante a perimenopausa reduz
maior incidência de hiperplasia endometrial ou carcinoma, pólipos o risco de fratura nas fases subsequentes da vida. Além disso, o
uterinos e leiomiomas, observada entre as mulheres de idade peri- benefício contraceptivo é importante, tendo em vista que a taxa
menopausa. Os níveis séricos médios de alguns hormônios ovaria- de gestação não intencional entre as mulheres em sua quinta dé-
nos e hipofisários, selecionados durante a transição menopáusica, cada da vida rivaliza com a das adolescentes. As contraindicações
são mostrados na Figura 12.1. Com a transição até a menopausa, ao uso de contraceptivos orais consistem em fumo de cigarros,
os níveis de estradiol caem acentuadamente, enquanto os níveis de doença hepática, história de tromboembolia ou doença cardio-
estronas ficam relativamente preservados, refletindo a aromatiza- vascular, câncer de mama ou sangramento vaginal inexplicável.
ção periférica dos androgênios suprarrenais e ovarianos. Os níveis As formulações que contêm apenas progestina (p. ex., 0,35 mg
de FSH aumentam muito mais que os do hormônio luteinizante de noretindrona diariamente) ou injeções de medroxiprogesto-
(LH), presumivelmente por causa da perda de inibina assim como na (Depo-Provera) (p. ex., 150 mg IM, a cada 3 meses) podem
do feedback estrogênico. proporcionar uma alternativa para o tratamento da menorragia
perimenopausa nas mulheres que fumam ou que possuem fato-
■■ TESTES DIAGNÓSTICOS res de risco cardiovasculares. As progestinas não regularizam os
Por causa de sua enorme variabilidade intraindividual, os níveis do ciclos nem reduzem o número dos dias com sangramento, mas
FSH e estradiol são indicadores diagnósticos imperfeitos da perime- consegue reduzir o volume do fluxo menstrual.
nopausa nas mulheres que continuam menstruando. Entretanto, um As estratégias não hormonais destinadas a reduzir o fluxo
FSH baixo na fase folicular inicial (dias 2 a 5) do ciclo menstrual é menstrual incluem o uso de agentes anti-inflamatórios não este-
incompatível com um diagnóstico de perimenopausa. A mensuração roides, como o ácido mefenâmico (dose inicial de 500 mg no iní-
do FSH também pode ajudar na avaliação da fertilidade; níveis de < cio das menstruações, a seguir 250 mg 4x/dia, durante 2 a 3 dias)
20 mUI/mL, de 20 a < 30 mUI/mL e ≥ 30 mUI/mL medidos no dia 3 ou, quando as abordagens clínicas falham, a ablação endometrial.
do ciclo indicam, respectivamente, uma probabilidade boa, razoável Deve ser assinalado que a menorragia torna necessária uma avalia-
e precária de conseguir engravidar.
156
geniturinários. As abordagens alternativas – incluindo o uso de anti-
ção destinada a excluir a presença de distúrbios uterinos. A ultras-
depressivos (como venlafaxina, 75 a 150 mg/dia), gabapentina (300
sonografia (US) transvaginal com exacerbação por solução salina
a 900 mg/dia), clonidina (0,1 a 0,2 mg/dia) ou vitamina E (400 a 800
é útil para identificar os leiomiomas ou pólipos, enquanto a aspi-
UI/dia), ou o consumo de produtos derivados da soja ou de outros
ração endometrial consegue identificar as alterações hiperplásicas.
fitoestrogênios – também podem eliminar os sintomas vasomotores,
TRANSIÇÃO PARA A MENOPAUSA Para as mulheres sexualmente apesar de serem menos efetivas que a TH. Para os sintomas genituri-
ativas que utilizam hormônios contraceptivos a fim de eliminar os nários, a eficácia do estrogênio vaginal é semelhante à do estrogênio
sintomas da perimenopausa, deve ser individualizada a questão de oral ou do transdérmico.
quando e se convém mudar para a terapia hormonal (TH). As doses
Osteoporose (Ver também o Cap. 28.)
de estrogênio e progestógenio (tanto as progestinas sintéticas quan-
to as formas naturais de progesterona) na TH são mais baixas que Densidade óssea Por reduzir as velocidades de renovação (turnover)
as adotadas nos contraceptivos orais, e não foi possível documentar e reabsorção dos ossos, o estrogênio torna mais lenta a perda óssea
que sejam capazes de prevenir a gravidez. A ausência por 1 ano de relacionada com a idade experimentada pela maioria das mulheres
menstruações espontâneas indica, de forma confiável, a parada da na pós-menopausa. Mais de 50 ensaios randomizados demonstra-
Capítulo 12
ovulação, porém não será possível determinar o padrão menstrual ram que as terapias estrogênicas pós-menopausa, com ou sem um
natural enquanto uma mulher estiver tomando um contraceptivo progestógenio, aumentam rapidamente a densidade mineral óssea na
oral. As mulheres que desejam mudar para um método de barreira coluna vertebral em 4 a 6% e no quadril em 2 a 3%, e mantêm esses
de contracepção devem fazê-lo; se as menstruações ocorrem espon- aumentos durante o tratamento.
taneamente, o contraceptivo oral pode ser reiniciado. A média etá-
ria das menstruações finais entre as parentes pode funcionar como Fraturas Os dados dos estudos baseados em observações indicam um
um guia para o período no qual deve ser iniciado este processo, que risco 50 a 80% mais baixo de fratura vertebral e 25 a 30% mais baixo
pode ser repetido a cada ano até que a menopausa tenha ocorrido. de fraturas de quadril, punho e outros ossos periféricos entre as atuais
usuárias de estrogênio; o acréscimo de um progestógenio não parece
modificar esse benefício. Na WHI, um período de 5 a 7 anos de tera-
Tromboembolismo Aumento definido no risco aumento de 110% no risco E + P: aumento de 106% E + P: 180 casos a mais (350 versus 170)
venoso no risco por 100.000 mulheres‑ano
E: aumento de 32% no E: 80 casos a mais (300 versus 220) por
risco 100.000 mulheres‑ano
Câncer de mama Aumento no risco com o uso E + P: aumento de 63% no E + P: aumento de 24% 10 a 30 casos a mais por 10.000 mulheres
a longo prazo (≥ 5 anos) de risco (≥ 5 anos) no risco utilizando a TH por 5 anos; 30 a 90 casos
estrogênio‑progestina E: aumento de 20% no risco E: nenhum aumento no a mais por 100.000 mulheres após 10
(≥ 5 anos) risco anos de uso; 50 a 200 casos a mais por
10.000 mulheres após 15 anos de uso
(estimativa derivada de dados baseados
em observações e achados E + P de WHI)
Doença na Aumento definido no risco aumento de 110% do risco E + P: aumento de 67% E + P: 180 casos a mais (460 versus 280)
vesícula biliar do risco por 100.000 mulheres‑ano
E: aumento de 93% do E: excesso de 310 casos (650 versus 340)
risco por 100.000 mulheres‑ano
Câncer colorretal Provável redução no risco com Redução de 34% no risco E + P: redução de 37% E + P: menos 70 casos (90 versus 160) por
estrogênio‑progestina no risco 100.000 mulheres‑ano
E: nenhum aumento ou E: nenhuma diferença no risco
redução no risco
Diabetes melito Provável redução no risco Redução de 20% no risco E + P: redução de 21% E + P: menos 150 casos (610 versus 760)
no risco por 100.000 mulheres‑ano
E: redução de 12% no E: menos 140 casos (1.160 versus 1.300)
riscoe por 100.000 mulheres‑anoe
(Continua)
158
QUADRO 12.1 Riscos e benefícios da terapia hormonal (TH) pós‑menopausa nos ambientes de prevenção primáriaa
Benefício ou risco
Relativo Absoluto
b
Estudos baseados em WHI , exceto onde
Resultado Efeito observação assinalado WHIb, exceto onde assinalado
Disfunção Redução não comprovada no Redução de 34% no risco Aumento de 76% no risco 120 a 230 casos a mais de demência por
cognitiva risco (dados inconsistentes para demência com idade 100.000 mulheres‑ano
de estudos baseados em ≥ 65
observações e de ensaios
clínicos randomizados)
a
E, estrogênio apenas; E+P, estrogênio mais progestina. A maioria dos estudos avaliou o estrogênio equino conjugado apenas ou em combinação com acetato de medroxiprogesterona.
b
WHI, Women´s Health Initiative. O braço do estrogênio-mais-progestina da WHI analisou o uso de estrogênio equino conjugado (0,625 mg/dia) mais acetato de medroxiprogesterona (2,5 mg/dia)
Capítulo 12
versus placebo durante 5,6 anos. O braço de estrogênio apenas da WHI avaliou o uso de estrogênio equino conjugado (0,625 mg/dia) versus placebo durante 7,1 anos.
c
Os dados são de ensaios clínicos randomizados. A WHI não foi planejada para avaliar o efeito da TH sobre os sintomas da menopausa.
d
JE Manson, KA Martin: N Engl J Med 345:34, 2001.
e
Não estatisticamente significativo.
um aumento de 2 vezes no risco de tromboembolismo venoso e de pul- entre as mulheres na pós-menopausa. A plausibilidade biológica dessa
monar associado a estrogênio-progestina, bem como um aumento de associação é apoiada por dados de ensaios randomizados que demons-
33% no risco com a terapia apenas estrogênica. O estrogênio transdér- tram que o estrogênio exógeno reduz os níveis plasmáticos de coles-
mico, administrado isoladamente ou com certos progestogênios (pro- terol lipoproteico de baixa densidade (LDL) e eleva os de colesterol
a DCC no grupo do ensaio clínico WHI como um todo, essa terapia esteve associado a um aumento da mortalidade por câncer de pulmão.
esteve associada a uma redução no risco de DCC de 37% entre as par- Mudanças do estado de saúde após a interrupção da terapia hormonal
ticipantes com 50 a 59 anos de idade. Em contrapartida, redução do No grupo da WHI como um todo, os riscos elevados de DCC, aci-
risco de apenas 8% foi observada entre as com 60 a 69 anos de idade e dente vascular encefálico e tromboembolismo venoso associados ao
um aumento do risco de 11% foi constatado entre as com 70 a 79 anos uso ativo de estrogênio-progestina desapareceram dentro de 2,4 anos
de idade. Em virtude do número relativamente pequeno de casos de após a suspensão da terapia, assim como os benefícios, incluindo me-
infarto do miocárdio ou morte coronariana (a definição primária da lhora das ondas de calor e proteção contra fraturas osteoporóticas e
DCC na WHI), especialmente nas mulheres mais jovens, essas dife- câncer colorretal. Um risco ligeiramente elevado de câncer de mama
renças dentro dos e entre os grupos etários não foram estatisticamente
persistiu, e surgiu a sugestão de um risco mais elevado para câncer de
significativas. Contudo, quando a definição de DCC era ampliada de
pulmão, câncer total e mortalidade total. Ainda não se dispõe dos re-
modo a incluir uma cirurgia de bypass coronariano ou intervenções
sultados pós-intervenção estratificados por idade e tempo decorrido
coronarianas percutâneas, a terapia apenas com estrogênio esteve as-
desde o início da menopausa.
sociada a redução significativa de 45% na DCC entre as mulheres no
grupo etário mais jovem. Além disso, o estrogênio esteve associado a
menores níveis de placa calcificada nas artérias coronárias. ABORDAGEM AO
Terapia hormonal pós‑menopausa
Apesar de a idade não ter exercido efeito semelhante no braço PACIENTE
com estrogênio-progestina da WHI, os riscos de DCC aumentam O uso racional da TH pós-menopausa exige um balanceamento
inexoravelmente com o passar dos anos desde a menopausa. A com- dos benefícios e riscos potenciais. A Figura 12.2 proporciona
binação estrogênio-progestina estava associada a redução de 11% no uma abordagem para a tomada de decisões. O clínico deve de-
risco para as mulheres menos de 10 anos além da menopausa, mas terminar primeiro se a paciente apresenta sintomas menopáusi-
estava associada a aumento de 22% no risco para as mulheres 10 a cos moderados a graves, que representam a única indicação para
19 anos depois da menopausa e de 71% no risco para as mulheres 20 iniciar a TH sistêmica (os sintomas urogenitais, na ausência de
anos ou mais depois da menopausa (apenas o último valor era esta- sintomas vasomotores, podem ser tratados com estrogênio va-
tisticamente significativo). No grande Nurses’ Health Study, baseado ginal). Os benefícios e riscos dessa terapia devem ser revistos a
em observações, as mulheres que decidiam iniciar a TH dentro de 4
seguir com a paciente, dando mais ênfase às medidas absolutas
anos após a menopausa experimentavam um menor risco de DCC
que as relativas do efeito, enfatizando as incertezas no conheci-
que as não usuárias, enquanto as que iniciavam a terapia 10 ou mais
mento clínico quando isso for relevante. Sabendo que as taxas
anos após a menopausa pareciam usufruir um benefício coronariano
de doenças crônicas geralmente aumentam com a idade, os ris-
muito pequeno. Levando em conta que os estudos baseados em ob-
cos absolutos tendem a serem maiores nas mulheres mais velhas,
servações incluem alta proporção de mulheres que iniciam a TH 3 a
mesmo quando os riscos relativos continuam sendo semelhantes.
4 anos após a menopausa e que os ensaios clínicos incluem alta pro-
Os efeitos colaterais potenciais – especialmente o sangramento
porção de mulheres inscritas 12 ou mais anos depois da menopausa,
vaginal que pode resultar do uso de formulações combinadas de
esses achados ajudam a reconciliar algumas das aparentes discrepân-
cias entre os dois tipos de estudo. estrogênio-progesterona, recomendadas às mulheres com um
Ainda não está bem elucidado se a idade por ocasião do início da útero intacto – devem ser assinalados. A própria preferência da
TH influencia o risco de acidente vascular encefálico. No WHI and paciente acerca da terapia deve ser explicitada e levada em con-
no Nurses´ Health Study, a TH foi associada a um risco excessivo de ta na decisão. As contraindicações para a TH devem ser avalia-
acidente vascular encefálico em todos os grupos etários. É necessária das sistematicamente, consistindo em um sangramento vaginal
inexplicável, doença hepática ativa, tromboembolismo venoso,
uma pesquisa adicional acerca da idade, período transcorrido des-
história de câncer endometrial (exceto no estágio 1 sem invasão
de a menopausa e outras características clínicas, assim como sobre
profunda) ou de mama, e história de DCC, AVE, ataque isquêmi-
os biomarcadores que permitem prever os aumentos ou reduções no
co transitório ou diabetes. As contraindicações relativas incluem
risco cardiovascular associado à TH exógena. Além disso, ainda não
hipertrigliceridemia (> 400 mg/dL) e doença ativa da vesícula bi-
foi esclarecido se diferentes posologias, formulações ou vias de admi-
liar; nesses casos, o estrogênio transdérmico pode ser uma opção.
nistração da TH poderão produzir diferentes efeitos cardiovasculares.
A prevenção primária da doença cardíaca não deve ser encarada
Câncer colorretal Os estudos baseados em observações sugeriram como um benefício esperado da TH, devendo ser cogitados um
que a TH reduz os riscos de cânceres colônico e retal, apesar de as
160
GRÁFICO PARA IDENTIFICAR AS CANDIDATAS À THa
Não Sim
Não Sim
3. Avaliar o risco de DCC e o número de anos desde o período menstrual final Nenhuma THg
para DCC de Framingham)d
Risco de DCC ao longo de
10 anos (Escore de risco
Capítulo 12
≤5 6 a 10 >10
Muito baixo (< 5%) Passar para Q4 Passar para Q4 Nenhuma TH
Baixo (5 a < 10%) Passar para Q4 Passar para Q4f Nenhuma TH
Moderado (10 a < 20%) Passar para Q4f Nenhuma TH Nenhuma TH
Alto ( 20%) Nenhuma TH Nenhuma TH Nenhuma TH
4. Maior risco de AVE (p. ex., escore do risco de acidente vascular encefálico
Não Sim
5. Escolher a duração do uso de THh com base no tipo de terapia e no risco de câncer de mama Nenhuma TH
Estrogênio mais
Apenas estrogênio
Risco de câncer
progestógeno
de mamai
h
Figura 12.2 Fluxograma para identificar as candidatas apropriadas à te- A TH deve ser continuada somente se persistem os sintomas menopáusicos mode-
rapia hormonal (TH) pós-menopausa. DCC, doença cardíaca coronariana rados a graves. Os pontos de corte recomendados para a duração se baseiam nos
a
Reavaliar cada etapa pelo menos 1 vez a cada 6 a 12 meses (admitindo que a resultados dos ensaios clínicos da Women’s Health Initiative para estrogênio-pro-
paciente continue preferindo a TH). gestina e apenas estrogênio, que duraram 5,6 e 7,1 anos, respectivamente. Para
b
As mulheres que sofrem de ressecamento vaginal sem sintomas vasomotores mo- durações mais longas da TH, é desconhecido o equilíbrio entre benefícios e riscos.
i
derados a graves podem ser candidatas ao estrogênio vaginal. Risco acima da média para o câncer de mama: um ou mais parentes de primeiro
c
Contraindicações tradicionais: sangramento vaginal inexplicável; doença hepática grau com câncer de mama; genes de suscetibilidade, tais como BRCA1 ou BRCA2;
ativa; história de tromboembolismo venoso devido a gravidez, uso de contraceptivos ou história pessoal de biópsia mamária demonstrando atipia.
j
orais, ou etiologia desconhecida; distúrbios da coagulação sanguínea; história de As mulheres com menopausa cirúrgica prematura podem receber TH até a idade
cânceres de mama ou endometrial; história de DCC, AVE, ataque isquêmico transi- média para a menopausa (51 anos nos EUA) e, a seguir, ao obedecer fluxograma
tório ou diabetes. Para outras contraindicações, incluindo triglicerídios altos (> 400 para a tomada de decisões subsequentes.
k
mg/dL); doença ativa da vesícula biliar; e história de tromboembolismo venoso de- Se o progestógenio for tomado diariamente, evitar o prolongamento da duração. Se
vido à imobilidade no passado, cirurgia ou fratura óssea; a TH oral deve ser evitada, o progestógenio for cíclico ou infrequente, evitar o prolongamento da duração em
porém a TH transdérmica pode ser uma opção (ver f adiante). mais de 1 a 2 anos.
d l
O risco de 10 anos de DCC, com base no Framingham Coronary Heart Disease Risk Se os sintomas menopáusicos são acentuados, estrogênio mais progestina podem ser
Score (Expert Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Cholesterol tomados por 2 a 3 anos no máximo e o estrogênio apenas por 4 a 5 anos no máximo.
in Adults: JAMA 285:2486, 2001), conforme modificações feitas por JE Manson com m
Se houver um alto risco de fratura osteoporótica (ver Q6), considerar o bifosfonato,
SS Bassuk: Hot Flashes, Hormones & Your Health. New York, McGraw-Hill, 2007. raloxifeno ou um fármaco alternativo.
e
As mulheres mais de 10 anos após a menopausa não são boas candidatas para n
Maior risco de fratura osteoporótica: osteopenia documentada, história pessoal ou
iniciar (primeira utilização da) a TH. familiar de fratura não traumática, tabagismo atual ou peso inferior a 56,75 kg.
f
Evitar a TH oral. A TH transdérmica pode ser uma opção, pois exerce menor efeito Fonte: Adaptada de JE Manson com SS Bassuk: Hot Flashes, Hormones & Your
adverso sobre os fatores da coagulação, os níveis de triglicerídios e os fatores da Health. New York, McGraw-Hill, 2007.
inflamação que a TH oral.
g
Aventar um inibidor seletivo da recaptação da serotonina ou da serotonina-norepi-
nefrina, gabapentina, clonidina, soja ou alternativas.
161
aumento no número de AVE e um pequeno aumento inicial no Pesquisa adicional acerca dos efeitos desses agentes sobre a DCV,
risco de doença arterial coronariana (DAC). Não obstante, essa tolerância à glicose e câncer de mama será de particular interesse.
terapia pode ser apropriada se os benefícios não coronarianos do Além da TH, o controle dos sintomas e a prevenção da doença
tratamento superam claramente os riscos. Uma mulher que sofre crônica poderão ser conseguidos por meio de escolhas relaciona-
um evento coronariano agudo ou AVE enquanto está recebendo das com o estilo de vida, incluindo abstenção do fumo, atividade
TH deve interromper imediatamente a terapia. física adequada e uma dieta saudável. Um conjunto em expansão
O uso a curto prazo (menos de 5 anos) da TH é apropriado ao de opções farmacológicas (p. ex., bifosfonatos, SERM e outros
alívio dos sintomas menopáusicos entre as mulheres sem contrain- agentes para a osteoporose, assim como agentes anti-hipertensi-
dicações para essa utilização. Entretanto, tal terapia deve ser evitada vos e redutores do colesterol para a DCV) também deveria redu-
entre as mulheres com risco basal elevado de futuros eventos cardio- zir a confiança generalizada no uso de hormônios. Entretanto, a
vasculares. As mulheres que possuem contraindicações, ou que se TH a curto prazo ainda pode beneficiar algumas mulheres.
opõem à TH, podem obter benefícios pelo uso de certos antidepres-
sivos (como a venlafaxina, fluoxetina ou paroxetina), gabapentina,
clonidina, soja ou certas ervas medicinais, e, para os sintomas ge-
niturinários, dos cremes estrogênicos ou dispositivos intravaginais. BIBLIOGRAFIA
SEÇÃO II
162
CAPÍTULO 13 risticamente observado pela primeira vez durante a segunda e a ter-
ceira décadas. Em geral, o crescimento é lento, porém progressivo.
O surgimento súbito e a rápida progressão do hirsutismo sugerem a
possibilidade de neoplasia secretora de androgênios e, nesse caso, é
Hirsutismo e Virilização possível que também haja virilização.
A idade de início dos ciclos menstruais (menarca) e o padrão
David A. Ehrmann do ciclo menstrual devem ser verificados; ciclos irregulares desde a
menarca têm maior probabilidade de serem causados por excesso de
androgênio ovariano e não da suprarrenal. A presença de sintomas
O hirsutismo, definido como crescimento excessivo de pelos depen- associados, tais como galactorreia, deve levar de imediato à inves-
dente de androgênio com distribuição masculina, acomete aproxi- tigação para hiperprolactinemia (Cap. 2) e, possivelmente, para hi-
madamente 10% das mulheres. Na maioria das vezes o hirsutismo é
potireoidismo (Cap. 4). Hipertensão arterial, estrias, equimoses que
idiopático, ou ocorre como consequência de excesso de androgênio
CAPÍTULO 13
surgem com facilidade, ganho ponderal centrípeto e fraqueza suge-
associado à síndrome do ovário policístico (SOP). Menos frequen-
rem hipercortisolismo (síndrome de Cushing; Cap. 5). Os pacientes
temente, pode resultar de produção excessiva de androgênio como
com excesso de hormônio do crescimento (isto é, acromegalia) rara-
ocorre na hiperplasia suprarrenal congênita (HSRC) (Quadro 13.1).
Raramente, é uma manifestação de uma doença subjacente grave. As mente apresentam hirsutismo. O uso de medicamentos, como feni-
manifestações cutâneas comumente associadas ao hirsutismo englo- toína, minoxidil e ciclosporina, pode estar associado a crescimento
bam acne e um padrão masculino de calvície (alopecia androgêni- excessivo de pelos independente de androgênio (isto é, hipertricose).
ca). O termo virilização refere-se a um distúrbio no qual os níveis de Antecedentes familiares de infertilidade e/ou de hirsutismo podem
androgênios são suficientemente altos para provocar outros sinais e indicar distúrbios como hiperplasia suprarrenal congênita (HSRC)
sintomas, como voz mais grave, atrofia da mama, aumento da massa não clássica (Cap. 5).
Hirsutismo e Virilização
muscular, clitoromegalia e libido aumentada; a virilização é um si- O exame físico deve incluir medição de estatura e peso e cálculo
nal nefasto, que sugere a possibilidade de neoplasia ovariana ou da do índice de massa corporal (IMC). Um IMC > 25 kg/m2 é indicativo
suprarrenal. de excesso de peso para a estatura, e valores > 30 kg/m2 são frequen-
temente observados em associação com hirsutismo, provavelmente
■■ CRESCIMENTO E DIFERENCIAÇÃO DO FOLÍCULO PILOSO como resultado do aumento da conversão de precursores de andro-
O pelo pode ser categorizado como velo (fino, macio e não pigmen- gênio em testosterona. Deve-se registrar a pressão arterial, pois as
tado) ou terminal (longo, grosso e pigmentado). O número de folícu-
los pilosos não se modifica durante a vida da pessoa, mas o tamanho
do folículo e o tipo de pelo podem mudar em resposta a inúmeros QUADRO 13.1 Causas de hirsutismo
fatores, principalmente os androgênios. Os androgênios são necessá-
rios para o desenvolvimento do pelo terminal e da glândula sebácea e Hiperandrogenismo gonadal
medeiam a diferenciação de unidades pilossebáceas (UPS), seja para Hiperandrogenismo ovariano
folículo piloso terminal, seja para glândula sebácea. No primeiro caso, Síndrome do ovário policístico/hiperandrogenismo ovariano funcional
os androgênios transformam o cabelo veloso em pelo terminal; no Bloqueios da esteroidogênese ovariana
último, o componente sebáceo se prolifera e o pelo permanece veloso.
Síndromes de resistência extrema à insulina
Existem três fases no ciclo de crescimento dos pelos: (1) anágena
(fase de crescimento), (2) catágena (fase de involução) e (3) telógena Neoplasias ovarianas
(fase de repouso). De acordo com a localização no corpo, a regula- Hiperandrogenismo suprarrenal
ção hormonal pode desempenhar uma função importante no ciclo Adrenarca prematura
de crescimento de pelos. Por exemplo, as sobrancelhas, os cílios e os Hiperandrogenismo suprarrenal funcional
pelos velosos são insensíveis aos androgênios, enquanto as regiões,
Hiperplasia suprarrenal congênita (não clássica e clássica)
axilar e púbica, são sensíveis a níveis baixos de androgênios. O cresci-
mento de pelos em face, tórax, abdome superior e dorso exige níveis Ação/metabolismo anormal do cortisol
mais elevados de androgênios e, em consequência, esse é o padrão de Neoplasias suprarrenais
distribuição típico nos homens. O excesso de androgênios em mu- Outros distúrbios endócrinos
lheres leva a aumento do crescimento de pelos na maioria dos lo- Síndrome de Cushing
cais sensíveis a esses hormônios, exceto na região do couro cabeludo,
Hiperprolactinemia
onde ocorre perda porque os androgênios reduzem o período em que
os pelos do couro cabeludo passam na fase anágena. Acromegalia
Embora o excesso de androgênio esteja por trás da maioria dos Hiperprodução periférica de androgênio
casos de hirsutismo, a correlação entre os níveis de androgênio e o Obesidade
grau de crescimento de pelos é modesta. Isso pode ser explicado pelo Idiopática
fato de o crescimento de pelos a partir dos folículos também depen-
Hiperandrogenismo relacionado com a gestação
der de fatores locais e da variabilidade na sensibilidade do órgão-alvo
(UPS). Fatores genéticos e a origem étnica também influem no cres- Hiperreação luteínica
cimento de pelos. Em geral, as pessoas de cabelo escuro tendem a Tecoma da gravidez
ser mais hirsutas do que as louras ou claras. Os asiáticos e os nativos Fármacos
norte-americanos apresentam relativa escassez de pelos nas regiões Androgênios
sensíveis ao androgênio em níveis elevados, enquanto indivíduos de
Contraceptivos orais contendo progestinas androgênicas
ascendência mediterrânea são mais hirsutos.
Minoxidil
■■ AVALIAÇÃO CLÍNICA Fenitoína
Os elementos relevantes da anamnese para a avaliação do hirsutismo Diazóxido
incluem a idade de início e a velocidade de progressão do crescimen- Ciclosporina
to dos pelos, além dos sinais ou sintomas associados (p. ex., acne). Hermafroditismo verdadeiro
Dependendo da causa, o crescimento excessivo de pelos é caracte-
163
causas suprarrenais podem ser acompanhadas de hipertensão. Entre sexo feminino que se apresente com hirsutismo. Essa avaliação per-
os sinais cutâneos por vezes associados ao excesso de androgênios e à mite a distinção entre hirsutismo e hipertricose e fornece um ponto
resistência à insulina estão acantose nigricante e papilomas cutâneos. de referência basal para se mensurar a resposta ao tratamento. Um
Uma avaliação clínica objetiva da quantidade e da distribuição método simples e comumente utilizado para graduar o crescimento
de pelos é primordial para a investigação de qualquer paciente do dos pelos é a escala modificada de Ferriman e Gallwey (Fig. 13.1),
Acima dos
lábios
1 2 3 4
Queixo
1 2 3 4
SEÇÃO II
Peito
1 2 3 4
Endocrinologia Reprodutiva
Abdome
1 2 3 4
Pelve
1 2 3 4
Região superior
dos braços
1 2 3 4
Coxas
1 2 3 4
Parte superior
das costas
1 2 3 4
Parte inferior
das costas
1 2 3 4
Figura 13.1 Escala de Ferriman e Gallwey para graduação do hirsutis- Considera-se normal um hirsutismo a graduação ≤ 8. (Modificada de DA Ehrmann et
mo. As nove regiões do corpo com sensibilidade aos androgênios são graduadas de al.: Hyperandrogenism, hirsutism, and polycystic ovary syndrome, in LJ DeGroot and
0 (nenhum pelo terminal) a 4 (francamente viril) para que se obtenha o escore final. JL Jameson [eds], Endocrinoly, 5th., Philadelphia, Saunders, 2006; com autorização.)
164
na qual cada um dos nove locais sensíveis aos androgênios é gradu- sexual (SHBG), está biologicamente disponível para conversão em
ado de 0 a 4. Cerca de 95% das mulheres brancas apresentam um DHT e ligação aos receptores de androgênio. A hiperinsulinemia
escore abaixo de 8 nessa escala; assim, é normal que a maioria das e/ou o excesso de androgênio diminuem a produção hepática de
mulheres tenha algum crescimento de pelos nos locais sensíveis aos SHBG, resultando em níveis de testosterona total dentro da faixa
androgênios. Escores acima de 8 sugerem excesso de crescimento normal alta, enquanto a fração livre do hormônio apresenta-se bas-
de pelos mediado por androgênio, achado que deve ser mais bem tante elevada. Embora haja um declínio da síntese de testosterona
pesquisado por meio de avaliação hormonal (ver adiante). Nos gru- após a menopausa, a produção ovariana de estrogênio diminui ainda
pos raciais/étnicos menos propensos a manifestar hirsutismo (p. ex., mais, e a concentração de SHBG é reduzida. Em consequência, há
mulheres asiáticas), devem-se pesquisar outras evidências cutâneas um aumento na proporção relativa de testosterona livre, o que pode
de excesso de androgênio, incluindo acne pustular e adelgaçamento exacerbar o hirsutismo após a menopausa.
dos pelos do escalpo. Um nível plasmático basal de testosterona total > 12 nmol/L
(> 3,5 ng/mL) em geral indica um tumor virilizante, enquanto um
■■ AVALIAÇÃO HORMONAL nível > 7 nmol/L (> 2 ng/mL) é apenas sugestivo. Um nível basal de
Os androgênios são secretados pelos ovários e pelas glândulas su- DHEAS > 18,5 mol/L (> 7.000 g/L) sugere um tumor de suprarre-
CAPÍTULO 13
prarrenais em resposta a seus respectivos hormônios trópicos, o nal. Embora a DHEAS tenha sido proposta como um “marcador” do
hormônio luteinizante (LH) e o hormônio adrenocorticotrófico excesso de androgênios predominantemente originário das suprarre-
(ACTH). Os principais esteroides circulantes envolvidos na etiologia nais, não é raro encontrar elevações modestas na DHEAS entre mu-
do hirsutismo são a testosterona, a androstenediona, a desidroepian- lheres com SOP. Deve-se empregar a tomografia computadorizada
drosterona (DHEA) e sua forma sulfatada (DHEAS). Normalmente, (TC) ou a ressonância magnética (RM) para localizar massa suprar-
os ovários e as glândulas suprarrenais contribuem, de forma apro- renal, sendo que a ultrassonografia será suficiente para identificar
ximadamente idêntica, para a produção de testosterona. Metade da massa ovariana, quando a avaliação clínica e os níveis hormonais
testosterona total origina-se de secreção glandular direta, e o restante sugerirem essas possibilidades.
é derivado da conversão periférica de androstenediona e de DHEA A SOP é a causa mais comum de excesso de androgênio ova-
Hirsutismo e Virilização
(Cap. 8). riano (Cap. 10). Observa-se aumento característico na razão entre
Embora seja o mais importante dos androgênios circulantes, a LH e hormônio folículo-estimulante, de pacientes com SOP cuida-
testosterona é, na verdade, o penúltimo androgênio na mediação dosamente estudadas. Contudo, em razão da natureza pulsátil da
do hirsutismo; ela é convertida em diidrotestosterona (DHT), que é secreção da gonadotrofina este sinal pode ser ausente em até 50%
mais potente, pela enzima 5-redutase, localizada na UPS. A DHT das mulheres portadoras de SOP. Classicamente, a ultrassonografia
apresenta maior afinidade e dissociação mais lenta com o receptor de transvaginal mostra ovários maiores e estroma aumentado em mui-
androgênio. A produção local de DHT faz este ser o mediador primá- tas das mulheres com SOP. Entretanto, ovários policísticos também
rio da ação androgênica no nível da unidade pilossebácea. Existem podem ser encontrados em mulheres sem manifestações clínicas
duas isoenzimas da 5-redutase: o tipo 2 é encontrado na próstata ou laboratoriais de SOP. Ainda que geralmente seja um exame ge-
e nos folículos pilosos, e o tipo 1 é encontrado principalmente nas ralmente restrito ao cenário de pesquisa, é possível realizar testes
glândulas sebáceas. utilizando o agonista do hormônio de liberação das gonadotrofinas
A Figura 13.2 apresenta um método para investigação de hipe- para se fazer um diagnóstico específico de hiperandrogenismo ova-
randrogenemia. Além da medição dos níveis sanguíneos de testoste- riano. Um nível máximo de 17-hidroxiprogesterona ≥ 7,8 nmol/L
rona e de DHEAS, também é importante medir o nível de testostero- (≥ 2,6 g/L) após a administração SC de 100 g de nafarelina (ou
na livre (ou não ligada). A fração da testosterona que não está ligada 10 g/kg de leuprolida) praticamente sela o diagnóstico de hiperan-
à sua proteína transportadora, a globulina de ligação ao hormônio drogenismo ovariano.
Avaliação laboratorial
• Testosteronas total e livre Elevação acentuada
Normal • DHEAS
Testosterona total > 7 nmol/L
(> 2 ng/mL)
Aumentados DHEAS > 18,5 µmol/L (> 7.000 µg/L)
Tratar empiricamente
ou
Considerar exames adicionais
• Supressão por dexametasona → causas suprarrenais vs. ovarianas; afastar Cushing
• Estimulação pelo ACTH → avaliar HSRS não clássica
Diagnóstico final
Figura 13.2 Algoritmo para avaliação e diagnóstico diferencial de hirsutismo. ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; HSRC, hiperplasia suprarrenal congênita;
DHEAS, forma sulfatada da deidroepiandrosterona; SOP, síndrome do ovário policístico.
165
Uma vez que os androgênios suprarrenais são rapidamente su-
drogênios também resultam em aumento da SHBG relacionado
primidos por doses baixas de glicocorticoides, é possível a realiza-
com a dose, reduzindo, desse modo, a fração livre de testosterona
ção do teste de supressão androgênica com a dexametasona para
plasmática. Também se comprovou que a terapia de combinação
distinguir entre sobreprodução de androgênios de origem ovariana
diminui a DHEAS, talvez por reduzir os níveis de ACTH. Os es-
e suprarrenal. Coletam-se amostras de sangue antes e após a admi-
trogênios também exercem um efeito supressor direto, dependen-
nistração de dexametasona (0,5 mg VO a cada 6 h durante 4 dias).
te da dose, no funcionamento da célula sebácea.
A supressão da testosterona livre até a faixa de normalidade sugere
A escolha de um contraceptivo oral específico deve ser fun-
origem suprarrenal. A supressão incompleta sugere que o excesso de
damentada no componente progestacional, já que as progestinas
androgênio tem origem ovariana. O teste de supressão feito com a
variam quanto a seu efeito supressor sobre os níveis de SHBG e
administração de 1 mg de dexametasona na noite anterior e medição
quanto a seu potencial androgênico. O diacetato de etinodiol tem
do cortisol sérico às 8 h é útil nos casos em que houver suspeita de
potencial androgênico relativamente baixo, enquanto as progesti-
síndrome de Cushing (Cap. 5).
nas, como o norgestrel e o levonorgestrel, são particularmente an-
A HSRC não clássica é causada com maior frequência pela de-
drogênicas, a julgar pela atenuação do aumento na SHBG induzida
ficiência de 21-hidroxilase, mas também pode ser provocada por
por estrogênio. O norgestimato é um exemplo de uma nova geração
defeitos autossômicos recessivos em outras enzimas esteroidogêni-
de progestinas que praticamente não tem atividade androgênica. A
SEÇÃO II
166
Também é esperado que a finasterida comprometa a diferenciação BIBLIOGRAFIA
sexual em um feto masculino e, portanto, este medicamento não Ehrmann DA: Polycystic ovary syndrome. N Engl J Med 352:1223, 2005
deve ser usado em mulheres que possam engravidar. Martin KA et al: Evaluation and treatment of hirsutism in premenopausal
O creme de eflornitina foi aprovado como novo tratamento women: An Endocrine Society clinical practice guideline. J Clin Endocri-
para pelos faciais indesejáveis em mulheres, porém sua eficácia nol Metab 93:1105, 2008
a longo prazo ainda não foi estabelecida. Pode causar irritação Pall M et al: The phenotype of hirsute women: A comparison of polycystic
cutânea em circunstâncias de uso exagerado. Por fim, a escolha de ovary syndrome and 21-hydroxylase–deficient nonclassic adrenal hyper-
qualquer agente deve ser adequada às necessidades específicas de plasia. Fertil Steril 94:684, 2010
cada paciente sob tratamento. Conforme já foi dito, os tratamen- Rathnayake D, Sinclair: Innovative use of spironolactone as an antiandro-
tos farmacológicos para o hirsutismo devem ser usados em con- gen in the treatment of female pattern hair loss. Dermatol Clin 28:611,
junto com os recursos não farmacológicos. Também é útil revisar 2010
o padrão feminino de distribuição de pelos na população normal Swiglo BA et al: Antiandrogens for the treatment of hirsutism: A systematic
para se refutarem expectativas irrealistas. review and metaanalyses of randomized controlled trials. J Clin Endocri-
nol Metab 93:1153, 2008
CAPÍTULO 13
Hirsutismo e Virilização
167
CAPÍTULO 14 nos associados ao reparo do córtex ovariano associada à ovulação
e também à supressão de gonadotrofinas. Outros fatores protetores,
como a ligação das trompas de Falópio, parecem proteger o epitélio
ovariano (ou talvez as fímbrias das trompas distais) dos carcinóge-
Cânceres Ginecológicos nos que migram da vagina para as trompas e epitélio da superfície
do ovário (ver adiante).
Michael V. Seiden Fatores genéticos de risco
Uma variedade de síndromes genéticas aumenta substancialmente o
CÂNCER DE OVÁRIO risco de uma mulher desenvolver câncer ovariano. Aproximadamen-
■■ INCIDÊNCIA E PATOLOGIA te 10% das mulheres com câncer ovariano apresentam uma mutação
somática em um de dois genes de reparo do DNA: BRCA1 (cromos-
O câncer ovariano representa a malignidade mais letal de origem gi-
somo 17q12-21) ou BRCA2 (cromossomo 13q12-13). Indivíduos
necológica nos Estados Unidos e em outros países que possuem pro-
que herdam uma cópia única de um alelo mutante apresentam uma
SEÇÃO II
168
ta doença. A disseminação hematogênica e linfática são observadas,
Se houver evidência de doença intra-abdominal maciça, de-
porém não representam a apresentação típica. Os cânceres ovaria-
verá ser feita uma tentativa de citorredução máxima do tumor,
nos são divididos em quatro estágios, sendo o estágio I relacionado
mesmo que envolva a resseção parcial do intestino, esplenectomia
aos tumores confinados ao ovário, as malignidades de estágio II são
e, em certos casos, cirurgia abdominal superior mais extensa. A
confinadas à pelve e o estágio III é confinado à cavidade peritoneal
habilidade de reduzir o câncer ovariano metastático a um nível
(Quadro 14.1). Estes três estágios são subdivididos, sendo a apre-
mínimo de doença visível está associada a um melhor prognósti-
sentação mais comum, estágio IIIc, representada por tumores com
co, quando comparada às mulheres que permanecem com doença
doença intraperitoneal maciça. Aproximadamente 70% das mulheres visível. As pacientes sem doença residual grosseira após a resseção
se apresentam com a doença no estágio IIIc. A doença no estágio IV apresentam uma sobrevida mediana de 39 meses, comparados aos
inclui mulheres com metástases parenquimatosas (fígado, pulmão, 17 meses apresentados por aquelas que persistem com tumores
baço) ou, alternativamente, doença pleural ou da parede abdominal. macroscópicos. Uma vez que os tumores foram removidos cirur-
Os 30% restantes que não apresentam a doença em estágio IIIc estão gicamente, as mulheres são tratadas com um derivado da platina,
grosseiramente distribuídos entre os outros três estágios. e comumente com um taxano. O debate continua a respeito desta
Screening terapia, se deve ser administrada por via intravenosa ou ser alter-
Capítulo 14
nativamente infundida diretamente na cavidade peritoneal via um
O câncer ovariano é a quinta malignidade mais letal em mulheres nos
cateter. Três estudos randomizados demonstraram melhora na so-
Estados Unidos, curável nos estágios iniciais e raramente curável nos
brevida com terapia intraperitoneal, porém esta técnica ainda não
estágios avançados; portanto, o screening é de considerável interesse.
é amplamente aceita devido aos desafios técnicos associados com
Além disso, o ovário é bem visualizado por uma variedade de técnicas essa via de administração e com a toxicidade elevada. Em mulhe-
de imagem, principalmente pela ultrassonografia transvaginal. Os tu- res que apresentam doença maciça, uma estratégia alternativa é o
mores em estágio inicial geralmente produzem proteínas que podem tratamento com platina mais um taxano por vários ciclos (terapia
ser medidas no sangue, como CA-125 e HE-4. De qualquer forma, a neoadjuvante). Subsequentes procedimentos cirúrgicos são mais
incidência de câncer ovariano na população feminina de meia idade eficientes em deixar a paciente sem tumor residual grosseiro e a
é baixa, com apenas aproximadamente uma em cada 2.000 mulhe-
Cânceres Ginecológicos
sobrevida é comparável à cirurgia seguida pela quimioterapia.
res entre as idades de 50 e 60 anos sendo portadora de um tumor as- Com a cirurgia redutora ideal e a quimioterapia baseada na
sintomático não detectado. Assim, as técnicas eficientes de screening platina [geralmente carboplatina em dose de 7,5 de área sob a cur-
devem ser sensíveis e, mais importante, altamente específicas, para va (AUC) mais infusão de paclitaxel 175 mg/m2 por três horas em
minimizar o número de resultados falso-positivos. Mesmo um teste ciclos mensais], 70% das mulheres que apresentam tumores em
com 98% de especificidade e 50% de sensibilidade apresentaria um estágios avançados respondem e 40-50% experimentam remissão
valor preditivo positivo de apenas cerca de 1%. Apesar destas formi- completa com normalização dos seus níveis de CA-125, TCs e exa-
dáveis barreiras, estudos atuais estão avaliando a utilidade de várias me físico. Infelizmente, metade dos respondedores completos per-
estratégias de screening. Entretanto, o screening do câncer ovariano manece em remissão. A doença sofre recorrência em um a quatro
não é recomendado atualmente fora de um ensaio clínico. anos do final da terapia primária em apenas metade dos responde-
dores completos. Os níveis de CA-125 geralmente se elevam como
TRATAMENTO Câncer ovariano primeiro sinal da recidiva; entretanto, os dados não são claros se a
intervenção precoce influencia a sobrevida. A recidiva da doença é
Em mulheres que apresentam uma massa ovariana localizada, a efetivamente controlada, porém não curada, por uma variedade de
principal manobra diagnóstica e terapêutica é determinar se o agentes quimioterapêuticos. Eventualmente todas estas mulheres
tumor é benigno ou maligno e, nesse último caso, se foi origina- desenvolvem doença refratária à quimioterapia, sendo comuns a
do no ovário ou se é um sítio de doença metastática. A doença ascite refratária, fraca motilidade intestinal e obstrução ou pseudo-
metastática do ovário pode se originar de tumores primários do -obstrução devido ao intestino aperistáltico infiltrado pelo tumor.
colo, apêndice, estômago (tumores de Krukenberg) e mama. Em A cirurgia dirigida para aliviar a obstrução intestinal, a radiotera-
geral, as mulheres sofrem uma salpingo-ooforectomia unilateral pia localizada para aliviar a pressão ou a dor devido às massas, ou a
e, caso a patologia revele uma malignidade ovariana primária, o quimioterapia paliativa, podem ser de grande ajuda. Agentes com
procedimento será seguida por uma histerectomia, remoção da taxas de resposta > 15% incluem gemcitabina, topotecano, doxor-
trompa e ovário remanescente, omentectomia, amostragem de rubicina lipossomal e bevacizumabe. Aproximadamente 20% dos
linfonodo pélvico e algumas biópsias randômicas da cavidade pe- cânceres ovarianos são HER2/neu-positivos e o trastuzumabe pode
ritoneal. Esse extenso procedimento cirúrgico é realizado porque induzir respostas nesta subpopulação.
aproximadamente 30% dos tumores que parecem visualmente A sobrevivência de cinco anos se correlaciona com o estágio da
estar confinados ao ovário já se disseminaram para a cavidade pe- doença: estágio I, 90 a 95%; estágio II, 70 a 80%; estágio III, 20 a
ritoneal e/ou linfonodos adjacentes. 50%; estágio IV, 1 a 5% (Quadro 14.1). O prognóstico também é
169
influenciado pelo grau histológico: a sobrevida de 5 anos é de 88% grandes metástases peritoneais também apresentam uma tendên-
para tumores bem diferenciados. 58% para tumores moderadamen- cia à hemorragia, algumas vezes com complicações catastróficas.
te diferenciados e 27% para tumores fracamente diferenciados. O A quimioterapia é ocasionalmente eficiente e as mulheres tendem
tipo histológico tem menor influência sobre o prognóstico. Pacien- a receber esquemas utilizados para tratar tumores de célula ger-
tes com tumores de baixo potencial maligno são tratados com ci- minativa ou epitelial. Estes tumores normalmente produzem altos
rurgia; a quimioterapia e a radioterapia não melhoram a sobrevida. níveis da substância inibidora mülleriana (MIS), a inibina e no
caso dos tumores de Sertoli-Leydig, a -fetoproteína (AFP). Essas
proteínas são detectáveis no soro e podem ser usadas como marca-
■■ TUMORES OVARIANOS ESTROMAIS E DE CORDÃO SEXUAL dores dos tumores para monitorar as mulheres em relação à reci-
diva da doença, já que o aumento e a diminuição dessas proteínas
Epidemiologia, apresentação e síndromes associadas no soro tendem a refletir a alteração da massa do tumor sistêmico.
Aproximadamente 7% das neoplasias ovarianas são estromais ou de
cordão sexual, com aproximadamente 1.800 casos esperados a cada
ano nos Estados Unidos. Os tumores estromais ovarianos ou de Tumores de células germinativas do ovário
cordão sexual são mais comuns em mulheres entre os 50 e 60 anos, Os tumores de célula germinativa, como seus correspondentes nos
SEÇÃO II
porém podem se apresentar nas faixas etárias extremas, incluindo a testículos, são cânceres de células germinativas. Estas células totipo-
população infantil. Estes tumores se originam de componentes me- tentes contêm a programação para diferenciação em essencialmente
senquimatosos do ovário, incluindo células produtoras de esteroides, todos os tipos celulares e, portanto, os tumores de células germinati-
bem como fibroblastos. Essencialmente todos estes tumores possuem vas incluem um conjunto histológico de tumores bizarros, incluindo
baixo potencial maligno e se apresentam como massas sólidas uni- teratomas benignos e uma variedade de tumores malignos, como os
laterais. Três apresentações clínicas são comuns: a detecção de uma teratomas imaturos, disgerminomas, neoplasias do saco vitelino e co-
massa abdominal, dor abdominal devida à torsão ovariana, hemor- riocarcinomas. O teratoma benigno (ou cisto dermoide) é a neopla-
ragia intratumoral ou ruptura e sinais e sintomas devidos à produção sia de célula germinativa mais comum no ovário e, em geral, aparece
Endocrinologia Reprodutiva
hormonal por estes tumores. na mulher jovem. Estes tumores incluem uma mistura complexa de
Os tumores produtores de hormônio mais comuns incluem os tecidos diferenciados incluindo tecidos das três camadas germinati-
tecomas, tumor de célula granulosa ou tumores juvenis da granulosa vas. Em mulheres mais velhas, estes tumores diferenciados podem
em crianças. Estes tumores produtores de estrogênio geralmente se desenvolver transformação maligna, mais comumente carcinomas
apresentam com sensibilidade na mama, bem como pseudo-puberda- de célula escamosa. Os tumores malignos de células germinativas in-
de precoce isossexual em crianças, menometrorragia, oligomenorreia cluem o disgerminoma, o tumor do saco vitelino, teratoma imaturo,
ou amenorreia em mulheres antes da menopausa, ou alternativamen- bem como carcinoma embrionário e coriocarcinoma. Não existem
te como sangramento pós-menopausa em mulheres mais idosas. Em anormalidades genéticas conhecidas que unifiquem estes tumores.
algumas mulheres, malignidades secundárias associadas ao estrogê- Um subgrupo de disgerminomas sofre mutações nos oncogenes c-Kit
nio, tais como câncer de mama ou de endométrio, podem se apre- [como observado nos tumores gastrintestinais estromais (GISTs)],
sentar como malignidades sincrônicas. Alternativamente, o câncer enquanto um subgrupo de tumores de célula germinativa apresenta
de endométrio pode aparecer como primeira malignidade, com uma anormalidades no isocromossomo 12, como nas malignidades testi-
avaliação subsequente identificando uma neoplasia sólida unilateral culares. Além disso, uma subpopulação de disgerminomas está asso-
de ovário, que mostre ser um tumor oculto de células da granulosa. ciada a ovários disgenéticos. A identificação de um disgerminoma
Os tumores de Sertoli-Leydig em geral se apresentam com hirsutismo, originando-se nas gônadas genotípicas XY é importante porque mos-
virilização e, ocasionalmente, síndrome de Cushing devida à produ- tra a necessidade de se identificar e remover a gônada contralateral,
ção aumentada de testosterona, androstenediona ou outros 17-cetoes- devido ao risco de gonadoblastoma.
teroides. Tumores hormonalmente inertes incluem o fibroma, que se
apresenta como uma massa solitária normalmente associada à ascite Apresentação
e, ocasionalmente, ao hidrotórax, também conhecido como síndro- Os tumores de células germinativas se apresentam em todas as ida-
me de Meigs. Um subgrupo destes tumores aparece em indivíduos des, porém o pico de detecção tende a ser em mulheres no final da
com uma variedade de distúrbios hereditários que os predispõem à adolescência ou próximas dos 20 anos de idade. Estes tumores irão
neoplasia mesenquimatosa. Associações incluem tumores juvenis de se tornar grandes massas ovarianas, que eventualmente se apresen-
células da granulosa e, talvez, tumores de Sertoli-Leydig com a doença tam como massas palpáveis na pelve ou no baixo abdome. Como os
de Ollier (encondromatose múltipla) ou síndrome de Maffucci, tumo- tumores de cordão sexual, a torsão ou a hemorragia podem se apre-
res ovarianos de cordão sexual com túbulos anulares com a síndrome sentar como dor abdominal aguda em caráter de urgência ou emer-
de Peutz-Jeghers e fibromas com doença de Gorlin. gência. Alguns destes tumores produzem níveis elevados de gona-
dotrofina coriônica humana (hCG), que podem levar à puberdade
precoce isossexual quando os tumores se apresentam em meninas
TRATAMENTO Tumores de cordão sexual mais jovens. Ao contrário do câncer epitelial ovariano, estes tumo-
res apresentam uma maior tendência à metástases linfonodais ou
O esteio do tratamento dos tumores de cordão sexual é a resseção hematogênicas. Como ocorre com os tumores testiculares, alguns
cirúrgica. A maioria das mulheres se apresenta com tumores con- destes tumores tendem a produzir AFP (tumores do saco vitelino)
finados ao ovário. No caso da pequena subpopulação de mulheres ou hCG (carcinomas embrionários e coriocarcinomas, assim como
que se apresenta com doença metastática ou desenvolve evidências alguns disgerminomas), que são marcadores tumorais confiáveis.
de recorrência tumoral após resseção primária, a sobrevida ainda
é longa, em geral além de uma década. Como estes tumores são de
crescimento lento e relativamente refratários à quimioterapia, as TRATAMENTO Tumores de célula germinativa
mulheres com doença metastática são submetidas à cirurgia re-
dutora da massa tumoral, já que a doença costuma ser baseada no Tumores de células germinativas se apresentam em mulheres que
peritôneo (como o câncer ovariano epitelial). Não existem dados ainda se encontram em período reprodutivo e, como os tumores
definitivos que mostrem que a cirurgia redutora da doença me- bilaterais são raros (exceto o disgerminoma, 10-15%), o tratamen-
tastática ou recorrente prolongue a sobrevida, porém amplos da- to típico é a ooforectomia ou salpingo-ooforectomia unilateral.
dos documentam mulheres que sobreviveram anos ou, em alguns Como as metástases nodais para os linfonodos pélvicos e para-
casos, décadas, após a resseção da doença recorrente. Além disso, -aórticos são comuns e podem afetar as escolhas de tratamento,
170
estes nodos devem ser cuidadosamente inspecionados e, quando ■■ INFECÇÃO PELO HPV E VACINAÇÃO PREVENTIVA
aumentados, deverão ser removidos se possível. Mulheres com O HPV é o evento primário desencadeador da neoplasia na grande
tumores malignos de célula germinativa recebem quimioterapia maioria das mulheres com câncer invasivo de colo uterino. Este vírus
com bleomicina, etoposídeo e cisplatina (BEP). Na maioria das de DNA de cadeia dupla infecta o epitélio adjacente à zona de trans-
mulheres, mesmo naquelas com doença em estágio avançado, a formação do colo do útero. Mais de 60 tipos de HPV são conhecidos,
cura é esperada. O acompanhamento estrito sem terapia adjuvan- sendo que aproximadamente 20 tipos são capazes de gerar displasia e
te de mulheres com tumores em estágio I é racional, se houver de alto grau de malignidade. HPV 16 e 18 são os tipos mais frequente-
total confiança de que a paciente e sua equipe de tratamento estão mente associados à displasia de alto grau e alvos de ambas as vacinas
comprometidos com o acompanhamento compulsivo e cuidado- aprovadas pelo FDA. A grande maioria de adultos sexualmente ativos
so, já que a quimioterapia feita no período de recidiva do tumor é está exposta ao HPV e a maioria das mulheres debela a infecção sem
provavelmente curativa. intervenção específica. O genoma de 8 quilobases do HPV codifica
O disgerminoma é o correspondente ovariano do seminoma sete genes precoces, particularmente E6 e E7, que se ligam à RB e p53,
testicular. A sobrevida livre de doença em 5 anos é de 100% em respectivamente. Tipos de HPV de alto risco codificam moléculas de
pacientes em estágio inicial e de 6% em estágio III da doença. E6 e E7 que são particularmente eficientes na inibição da função de
Capítulo 14
Embora o tumor seja altamente sensível à radiação, esta causa in- verificação dessas proteínas reguladoras nos pontos de checagem do
fertilidade na maioria dos pacientes. A quimioterapia com BEP é ciclo celular normal, levando à imortalização, mas não à transforma-
tão ou mais eficaz, sem causar infertilidade. O uso de BEP após a ção completa do epitélio cervical. Uma minoria de mulheres não irá se
resseção incompleta está associado a uma sobrevida de dois anos livrar da infecção, ocorrendo integração subsequente do HPV ao ge-
livre da doença de 95%. Esta quimioterapia é atualmente o trata- noma hospedeiro. Ao longo de alguns meses ou mais, de alguns anos,
mento de escolha para o disgerminoma. algumas dessas mulheres desenvolverão displasia de alto grau. O tem-
po decorrido entre a displasia e o carcinoma é de anos até mais de uma
década e quase que certamente requer a aquisição de outras mutações
genéticas não esclarecidas pelo epitélio infectado e imortalizado.
Cânceres Ginecológicos
Fatores de risco incluem um alto número de parceiros sexuais, a
CÂNCER DAS TROMPAS DE FALÓPIO idade da primeira relação sexual e a história de doença venérea. O ta-
bagismo é um cofator; fumantes pesados apresentam um alto risco de
O transporte do óvulo para o útero ocorre pela trompa de Falópio,
displasia a partir da infecção por HPV. A infecção por HIV, especial-
com suas extremidades finais compostas de fímbrias que ficam em
mente quando associada a baixas contagens de células T CD4+, é asso-
torno da superfície ovariana e o capturam quando este emerge no
ciada a uma taxa mais elevada de displasia de alto grau e provavelmen-
córtex ovariano. As malignidades da trompa de Falópio apresentam
te a um menor período de latência entre a infecção e a doença invasiva.
o mesmo padrão histológico que as malignidades do ovário, sendo
As vacinas atualmente aprovadas incluem as proteínas recombi-
o mais comum o carcinoma epitelial de histologia serosa. Ensina- nantes e tardias, L1 e L2 dos HPV-16 e 18. A vacinação de mulheres
mentos anteriores classificavam essas malignidades como raras, po- antes do início de sua atividade sexual reduz dramaticamente a taxa
rém um exame histológico mais cuidadoso sugere que muitas “ma- de infecção pelos HPV-16 e 18 e a displasia subsequente. Também
lignidades ovarianas” podem na verdade se originar nas fímbrias existe uma proteção parcial contra outros tipos de HPV, embora as
distais da trompa de Falópio. Dados que suportam esta teoria são mulheres vacinadas ainda sofram risco de infecção pelo vírus e ainda
mais fortes na população de mulheres portadoras de mutações so- precisem realizar o teste padrão do Papanicolaou. Embora não exis-
máticas em BRCA1 ou BRCA2. Essas mulheres costumam se apre- tam dados de nenhum ensaio randomizado demonstrando a utilida-
sentar com massas adnexais e, como ocorre no câncer de ovário, de dos esfregaços do Papanicolaou, a queda dramática na incidência
estes tumores se espalham precocemente pela cavidade peritoneal, e na morte por câncer cervical em países desenvolvidos que utilizam
respondem ao tratamento com platina e taxano e possuem uma o screening em alta escala fornecem fortes evidências de sua eficácia.
história natural que é essencialmente idêntica ao câncer ovariano A incorporação do teste de HPV por reação em cadeia da polimerase
(Quadro 14.1). (PCR) ou outras técnicas moleculares aumenta a sensibilidade de se
detectar a patologia cervical, porém com o custo de menor especifici-
dade, pois identifica muitas mulheres com infecções transitórias que
CÂNCER DE COLO UTERINO não precisariam de intervenção médica específica.
Os tumores cervicais de estágio I são confinados ao colo ute- obesas, mulheres tratadas com estrogênios isolados ou mulheres
rino, enquanto os tumores em estágio II se estendem para a va- com tumores produtores de estrogênio (como os tumores de célula
gina superior ou para os tecidos moles paracervicais (Fig. 14.1). granulosa do ovário) apresentam alto risco de desenvolver câncer
Os tumores em estágio III se estendem à vagina inferior ou às pa- endometrial. Além disso, o tratamento com tamoxifeno, que pos-
redes laterais pélvicas, enquanto os tumores em estágio IV inva- sui efeitos antiestrogênicos no tecido da mama, porém efeitos es-
dem a bexiga ou o reto, ou se apresentam disseminados para sítios trogênicos no epitélio uterino, está associado a um risco maior de
distantes. Tumores cervicais muito pequenos em estágio I podem câncer endometrial. Eventos secundários, como a perda de genes
ser tratados com uma variedade de procedimentos cirúrgicos. Em supressores de tumores Cables ou PTEN, provavelmente funcio-
mulheres jovens que desejam manter a fertilidade, a traquelec-
Endocrinologia Reprodutiva
Estágio 0 I II III IV
Extensão Carcinoma Restrito ao Doença além do Doença na parede Invade o reto, bexiga
do tumor in situ colo uterino colo uterino, mas pélvica ou terço ou apresenta
não para a parede inferior da vagina metástase
pélvica ou terço
inferior da vagina
Parede Corpo
uterina
Orifício interno IIB
Orifício externo Colo IIIB
uterino IIA IIIA
Vagina
Figura 14.1 Apresentação anatômica dos estágios do câncer de colo uterino definida pela localização, extensão do tumor, frequência de apresentação e
sobrevida em cinco anos.
172
■■ PATOLOGIA 1.500 concepções nos países ocidentais desenvolvidos. A incidência
mundial varia amplamente, com regiões do sul da Ásia apresentando
Aproximadamente 75 a 80% dos cânceres endometriais são adenocar-
uma maior incidência de gravidez molar. As regiões com altas taxas
cinomas. O prognóstico depende do estágio, grau histológico e pro-
de gravidez molar estão normalmente associadas às dietas pobres em
fundidade da invasão miometrial. Aproximadamente 10% das pacien-
caroteno e gorduras animais.
tes apresentam tumores com áreas de diferenciação escamosa. Neste
caso, quando o tumor é bem diferenciado, é chamado de adenoacan- ■■ FATORES DE RISCO
toma; quando fracamente diferenciado, carcinoma adenoescamoso. Tumores trofoblásticos resultam do crescimento ou persistência de te-
Histologias menos comuns incluem carcinoma mucinoso (5%) e um cido placentário. Eles se originam mais comumente no útero, porém
tumor seroso papilar (< 10%) que se comporta como câncer ovariano. também podem aparecer em outros locais, como as trompas de Fa-
lópio devido à gravidez ectópica. Os fatores de risco incluem fatores
■■ APRESENTAÇÃO ambientais e alimentares fracamente definidos, bem como concepções
A maioria das mulheres com tumores do corpo uterino apresen- realizadas em idades extremas da faixa etária de reprodução, com a
tam sangramento vaginal pós-menopausa, devido à eliminação do incidência particularmente elevada em mulheres que concebem antes
revestimento endometrial maligno. Mulheres em período de pré- dos 16 anos ou depois dos 50 anos de idade. Em mulheres mais velhas,
Capítulo 14
-menopausa geralmente apresentam sangramento atípico entre os a incidência de gravidez molar pode ser tão alta quanto uma em cada
ciclos menstruais típicos. Estes sinais costumam chamar a atenção três, provavelmente devido ao risco elevado de fertilização anormal do
da mulher para o cuidado médico profissional e, portanto, a maioria óvulo envelhecido. A maioria das neoplasias trofoblásticas está asso-
das mulheres se apresenta com o estágio inicial da doença, no qual o ciada a molas completas, tumor diploide com todo o material gené-
tumor está confinado ao corpo uterino. O diagnóstico é estabelecido tico oriundo do doador paterno (conhecido como disomia parental).
pela biópsia endometrial. Tumores epiteliais podem se espalhar para Acredita-se que este fato ocorra quando um único espermatozoide fer-
os linfonodos pélvicos ou para-aórticos. Metástases pulmonares po- tiliza um óvulo enucleado, que em seguida duplica o DNA paternal. A
dem aparecer mais tarde na história natural da doença, porém são proliferação trofoblástica ocorre com estroma viloso exuberante. Se a
bastante incomuns na apresentação inicial. Tumores serosos tendem pseudo-gravidez se estender além da 12ª semana, o fluido se acumu-
Cânceres Ginecológicos
a apresentar padrões de disseminação muito mais semelhantes ao lará progressivamente no estroma levando às “alterações hidrópicas”.
câncer ovariano, com diversos pacientes apresentando doença omen- Não ocorre desenvolvimento fetal em mola completa.
tal e, algumas vezes, ascite. Algumas mulheres com sarcoma uterino Mola parcial se origina a partir da fertilização de um óvulo por
irão se apresentar com dor pélvica. Metástases linfonodais são raras dois espermatozoides, portanto dois terços do material genético são
no caso de sarcomas, que se apresentam mais provavelmente como paternais nestes tumores triploides. Alterações hidrópicas são menos
doença intra-abdominal ou metástases pulmonares. dramáticas e o desenvolvimento fetal pode em geral ocorrer até o fi-
nal do primeiro trimestre ou início do segundo, quando é comum o
aborto espontâneo. Achados laboratoriais irão incluir níveis excessi-
TRATAMENTO Câncer uterino vamente elevados de hCG e alto de AFP. O risco de doença trofoblás-
tica gestacional persistente após mola parcial é de aproximadamente
A maioria das mulheres com câncer endometrial apresenta doença 5%. Molas completas e parciais podem ser invasivas ou não invasivas.
localizada no útero (75% no estágio I, Quadro 14.1) e o tratamento A invasão miometrial ocorre em não mais do que um em cada seis
definitivo envolve uma histerectomia com remoção dos ovários e molas completas e em uma porção inferior das molas parciais.
das trompas de Falópio. A resseção dos linfonodos não melhora o
prognóstico, porém fornece informações complementares. O en- ■■ APRESENTAÇÃO DE DOENÇA TROFOBLÁSTICA INVASIVA
volvimento nodal define o estágio III da doença, presente em 13% A apresentação clínica da gravidez molar está se alterando nos países
das pacientes. O grau do tumor e a profundidade da invasão são as desenvolvidos devido à detecção precoce da gravidez, por meio dos
duas variáveis prognósticas chaves nos tumores de estágio inicial e kits domésticos e pelo uso muito precoce do Doppler e da ultrassono-
as mulheres com tumores de baixo grau e/ou minimamente inva- grafia para avaliar a viabilidade do feto e a cavidade uterina. Portanto,
sivos são encaminhadas para seguimento clínico após o tratamen- nesses países a maioria das mulheres que apresenta doença trofoblás-
to cirúrgico definitivo. As pacientes com tumores de alto grau ou tica têm a mola detectada precocemente e apresenta sintomas típicos
tumores que são profundamente invasivos (estágio IB, 13%) apre- do início da gravidez incluindo náuseas, amenorreia e sensibilidade
sentam um maior risco para recidiva pélvica ou recidiva no canal nos seios. Com a evacuação uterina de molas parciais e completos
vaginal, que é prevenida pela braquiterapia vaginal. em estágio inicial, a maioria das mulheres experimenta remissão es-
Mulheres com metástases regionais ou doença metastática pontânea da doença, conforme monitorada pelos níveis séricos de
(3% das pacientes) com tumores de baixo grau podem ser tra- hCG. Estas mulheres não precisam de quimioterapia. As pacientes
tadas com progesterona. Tumores fracamente diferenciados são com elevação persistente da hCG e com níveis elevados pós-evacua
resistentes à manipulação hormonal e, portanto, são tratados com ção apresentam doença trofoblástica gestacional persistente ou em
quimioterapia. O papel da quimioterapia no tratamento adjuvan- crescimento ativo e precisarão de terapia. A maioria dos dados sugere
te está atualmente sob investigação. A quimioterapia para doença que entre 15 a 25% das mulheres apresentarão evidências de doença
metastática é utilizada com intenção paliativa. trofoblástica gestacional persistente após a evacuação molar.
A sobrevida de cinco anos é de 89% para a doença em estágio Em mulheres que não têm acesso ao exame pré-natal, os sinto-
I, 73% em estágio II, 52% em estágio III e 17% para o estágio IV mas de apresentação potencialmente fatais, incluindo o desenvolvi-
mento de pré-eclampsia ou mesmo eclampsia. O hipertireoidismo
da doença (Quadro 14.1).
também pode ser observado. A retirada de grandes molas pode estar
associada a complicações fatais incluindo perfuração uterina, perda
de volume sanguíneo, insuficiência cardíaca e síndrome do descon-
TUMORES TROFOBLÁSTICOS GESTACIONAIS forto respiratório agudo (SDRA).
Para mulheres com evidências de hCG em elevação ou confir-
■■ CONSIDERAÇÕES GLOBAIS mação radiológica de doença regional persistente ou metastática, o
As doenças trofoblásticas gestacionais representam um es- prognóstico pode ser estimado por uma variedade de algoritmos que
pectro de neoplasias que vão desde uma mola hidatidiforme identificam aquelas mulheres com risco baixo, intermediário e alto e
benigno até um coriocarcinoma, devido à associação mais requerem quimioterapia com múltiplos agentes. Em geral, mulheres
comum entre doença trofoblástica persistente com gestação molar, com doença não pulmonar amplamente metastática, níveis muito
mas ocasionalmente ocorrendo após gestação normal. As apresen- elevados de hCG e gravidez a termo normal anterior são considera-
tações mais comuns de tumores trofoblásticos são a gravidez molar das de alto risco e necessitam de quimioterapia com múltiplos agen-
parcial e completa. Estas representam aproximadamente uma entre tes para alcançar a cura.
173
TRATAMENTO Doença trofoblástica invasiva BIBLIOGRAFIA
Berkowitz RS, Goldstein DP: Clinical practice. Molar pregnancy. N Engl J
A conduta para um nível crescente e persistente de hCG pós- Med 360:1639, 2009
-retirada de uma concepção molar é a quimioterapia, embora a Clarke-Pearson DL: Clinical practice. Screening for ovarian cancer. N Engl
cirurgia possa desempenhar um papel na doença que permanece J Med 361:170, 2009
isolada no útero (especialmente se a mulher não desejar ter mais Jatoi I, Anderson WF: Management of women who have a genetic predispo-
filhos) ou no controle da hemorragia. Para mulheres que dese- sition for breast cancer. Surg Clin North Am 88:845, 2008
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preferido é a quimioterapia. A quimioterapia é guiada pelo nível plasia. N Engl J Med 361:271, 2009
de hCG, que cai a níveis indetectáveis com a terapia eficaz. O tra- Ledermann JA, Kristeleit RS: Optimal treatment for relapsing ovarian can-
cer. Ann Oncol 21 Suppl 7:vii218, 2010
tamento com agentes isolados como metotrexato ou actinomicina
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motherapy, drug resistance, and the search for new agents. Oncologist
com doença de alto risco (níveis elevados de hCG, apresentação
15:1026, 2010
com quatro meses ou mais após a gravidez, metástases no cére-
bro ou fígado, falha no tratamento com metotrexato) são tratadas
SEÇÃO II
174
CAPÍTULO 15 Simpático (detumescência) Parassimpático (ereção)
Nervo
Nervo
Disfunção Sexual -adrenérgico NANC
NO
colinérgico
Ach
Kevin T. McVary NE
NO
Endotelina
A disfunção sexual masculina afeta 10 a 25% dos homens de meia-
Rho-quinase
-idade e idosos, e a disfunção sexual feminina ocorre com frequência
semelhante. Alterações demográficas, popularidade de tratamentos
recentes e maior conscientização da disfunção sexual pelos pacientes Células musculares lisas
CAPÍTULO 15
e pela sociedade levaram ao aumento do número de diagnósticos e
Junções lacunares
dos gastos com assistência médica associados ao tratamento desse Células endoteliais
distúrbio comum. Como muitos pacientes relutam em iniciar a dis- A
cussão sobre sua vida sexual, o médico, para trazer à tona uma histó-
ria de disfunção sexual, deve abordar esse tópico diretamente. Sildenafila
5-GMP
Vardenafila
Tadalafila
PDE-5
DISFUNÇÃO SEXUAL MASCULINA NOS Relaxamento
L-arginina NO GMP cíclico iCa2+ da mus- Ereção
Disfunção Sexual
■■ FISIOLOGIA DA RESPOSTA SEXUAL MASCULINA culatura lisa
A função sexual masculina normal exige (1) libido intacta; (2) ca- B
pacidade de alcançar e manter a ereção peniana; (3) ejaculação; e
(4) detumescência. A libido relaciona-se com o desejo sexual e é in- Figura 15.1 Vias que controlam a ereção e a detumescência. A. A ereção
fluenciada por vários estímulos visuais, olfatórios, táteis, auditivos, é mediada por vias parassimpáticas colinérgicas e por vias não adrenérgicas não
imaginativos e hormonais. Os esteróides sexuais, em especial a tes- colinérgicas (NANC), que liberam óxido nítrico (NO). As células endoteliais também
tosterona, aumentam a libido, que pode ser diminuída por distúrbios liberam NO que, por sua vez, induz o relaxamento da célula muscular lisa vascu-
hormonais ou psiquiátricos e por medicamentos. lar, possibilitando o aumento do fluxo sanguíneo e levando à ereção. A detumes-
A tumescência peniana que leva à ereção depende de um aumen- cência é mediada por vias simpáticas que liberam norepinefrina e estimulam vias
to do fluxo sanguíneo para a rede lacunar acompanhado de relaxa- -adrenérgicas, levando à contração das células musculares lisas vasculares. A
endotelina, liberada pelas células endoteliais, também induz a contração. A ativação
mento completo das artérias e da musculatura lisa dos corpos. A mi-
da Rho-quinase por meio da atividade da endotelina (entre outras) também contri-
croarquitetura dos corpos compõe-se de uma massa de músculo liso
bui para a detumescência alterando a sinalização do cálcio. B. Vias bioquímicas da
(trabécula) que contém uma rede de vasos revestidos por endotélio síntese e da ação do NO. Sildenafila, vardenafila e tadalafila melhoram a função
(espaços lacunares). A subsequente compressão do músculo liso tra- erétil inibindo a fosfodiesterase tipo 5 (PDE-5) e mantendo, assim, níveis elevados
becular contra a túnica albugínea fibroelástica provoca o fechamen- de 3,5-monofosfato cíclico de guanosina (GMP cíclico). NOS, óxido nítrico-sintase;
to passivo das veias emissárias e o acúmulo de sangue nos corpos. iCa2+, cálcio intracelular.
Quando existem ereção completa e mecanismo valvar competente,
os corpos tornam-se cilindros não compressíveis dos quais o sangue
não escapa.
O sistema nervoso central (SNC) exerce uma influência impor- do GMP cíclico. No entanto, se o óxido nítrico não for produzido
tante ao estimular ou antagonizar as vias espinais que desencadeiam em algum nível, os PDE-5i deixam de ser eficazes, uma vez que tais
a função erétil e a ejaculação. A resposta erétil é mediada por uma fármacos facilitam, mas não desencadeiam, a cascata enzimática
combinação de inervação central (psicogênica) e periférica (reflexo- inicial. Além do óxido nítrico, prostaglandinas vasoativas (PGE1,
gênica). Os nervos sensoriais que se originam de receptores na pele PGF2) são sintetizadas no interior do tecido cavernoso e elevam os
do pênis e da glande convergem, formando o nervo dorsal do pênis, níveis de AMP cíclico, levando também ao relaxamento das células
cujo trajeto alcança os gânglios das raízes dorsais de S2 a S4 via nervo musculares lisas cavernosas.
pudendo. As fibras nervosas parassimpáticas que chegam ao pênis A ejaculação é estimulada pelo sistema nervoso simpático, esti-
emergem de neurônios nas colunas intermediolaterais dos segmen- mulação esta que resulta na contração do epidídimo, do ducto defe-
tos espinais sacros S2 a S4. A inervação simpática origina-se dos seg- rente, das vesículas seminais e da próstata, provocando a entrada do
mentos espinais T11 até L2 e segue ao longo do plexo hipogástrico. líquido seminal na uretra. A emissão do líquido seminal é seguida de
Os impulsos neurais para o tônus da musculatura lisa são fun- contrações rítmicas dos músculos bulbocavernoso e isquiocaverno-
damentais para o início e a manutenção de uma ereção. Também so, provocando a ejaculação. A ejaculação precoce geralmente está
há uma interação complexa entre as células da musculatura lisa dos relacionada com ansiedade ou é um comportamento adquirido, e é
corpos e seu revestimento de células endoteliais sobrejacentes (Fig. sensível à terapia comportamental ou a tratamento com medicamen-
15.1A). O óxido nítrico, que induz relaxamento vascular, promove a tos, como os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS).
ereção e é antagonizado pela endotelina 1 (ET-1) e pela Rho-quinase, Ocorre ejaculação retrógrada quando o esfíncter uretral interno não
que medeiam a contração vascular. se fecha, podendo ocorrer em homens que têm diabetes ou após ci-
O óxido nítrico é sintetizado a partir de l-arginina pela óxido rurgia que envolva o colo da bexiga.
nítrico-sintase e liberado do estoque nervoso autônomo não adre- A detumescência é mediada pela norepinefrina dos nervos simpá-
nérgico não colinérgico (NANC), atuando sobre as células muscula- ticos, pela endotelina oriunda da superfície vascular e pela contração
res lisas com estimulação pós-juncional. O óxido nítrico aumenta a da musculatura lisa induzida pelos receptores -adrenérgicos pós-
produção de 3,5-monofosfato cíclico de guanosina (GMP cíclico), -sinápticos e pela ativação da Rho-quinase. Tais eventos aumentam
que relaxa a musculatura lisa (Fig. 15.1B). O GMP cíclico é degrada- o fluxo de saída venoso e restabelecem o estado flácido. O extravasa-
do gradualmente pela fosfodiesterase tipo 5 (PDE-5). Os inibidores mento venoso pode provocar detumescência prematura e é causado
dessa enzima, tais como os medicamentos orais sildenafila, varde- por relaxamento insuficiente da musculatura lisa dos corpos, e não
nafila e tadalafila, mantêm a ereção pela redução da degradação por um defeito anatômico específico. O termo priapismo refere-se à
175
ereção persistente e dolorosa e pode estar associado à anemia falci- Neurogênica Distúrbios que afetam a medula espinal sacra ou as
forme, aos estados de hipercoagulação, ao traumatismo raquimedu- fibras autonômicas dirigidas ao pênis impedem o relaxamento do
lar ou à injeção de agentes vasodilatadores no pênis. músculo liso peniano pelo sistema nervoso e, dessa forma, provocam
DE. Nos pacientes que sofreram traumatismo raquimedular, o grau
de DE depende da extensão e do nível da lesão. Os pacientes com
■■ DISFUNÇÃO ERÉTIL
lesões ou traumatismos incompletos da parte superior da medula es-
Epidemiologia pinal são mais propensos a manter a habilidade erétil do que aqueles
A disfunção erétil (DE) não é considerada uma parte normal do pro- que apresentam lesões ou traumatismos completos da parte inferior.
cesso de envelhecimento. Não obstante, está associada a determina- Embora 75% dos pacientes que sofreram traumatismo raquimedular
das alterações fisiológicas e psicológicas relacionadas com a idade. apresentem alguma capacidade de ereção, apenas 25% conseguem
No Massachusetts Male Aging Study (MMAS), uma pesquisa de base ereções suficientes para a penetração. Outros distúrbios neurológicos
comunitária envolvendo homens de 40 a 70 anos de idade, 52% dos comumente associados à DE incluem esclerose múltipla e neuropatia
respondentes relataram algum grau de DE. Em 10% dos responden- periférica, esta última quase sempre decorrente de diabetes ou de al-
tes ocorria DE completa, moderada em 25% e mínima em 17%. A coolismo. A cirurgia pélvica pode causar DE em razão de ruptura do
incidência de DE moderada ou grave mais que dobrou entre os 40 e suprimento nervoso autônomo.
SEÇÃO II
os 70 anos de idade. Nos EUA, a pesquisa National Health and Social Endócrina Os androgênios aumentam a libido, mas sua participação
Life Survey (NHSLS), que incluiu uma amostra de homens e mulhe- exata na função erétil permanece incerta. Os indivíduos com níveis
res na faixa de 18 a 59 anos de idade, 10% dos homens relataram se- de testosterona compatíveis com castração podem alcançar ereções
rem incapazes de manter uma ereção (correspondendo à proporção provocadas por estímulos visuais ou sexuais. Não obstante, níveis
de homens no estudo MMAS que relatava DE grave). A incidência normais de testosterona parecem ser importantes para a função eré-
foi mais alta entre os homens na faixa etária de 50 a 59 anos (21%), til, especialmente em homens mais idosos. A terapia de reposição de
naqueles muito pobres (14%), divorciados (14%) e com nível de ins- androgênio pode melhorar a função erétil deprimida quando ela é se-
trução mais baixa (13%). cundária a hipogonadismo; entretanto, não tem utilidade para a DE
Endocrinologia Reprodutiva
A incidência de DE também é mais alta entre homens portadores quando os níveis de testosterona endógena são normais. A prolactina
de certos distúrbios clínicos, tais como diabetes melito, obesidade, aumentada pode diminuir a libido por suprimir o hormônio de libe-
sintomas do trato urinário inferior secundários à hiperplasia benig- ração das gonadotrofinas (GnRH) além de reduzir também os níveis
na da próstata (HBP), cardiopatia, hipertensão arterial e níveis re- de testosterona. O tratamento da hiperprolactinemia com agonistas
duzidos de lipoproteína de alta densidade (HDL). As doenças car- da dopamina pode restabelecer a libido e a testosterona.
diovasculares e a DE compartilham etiologias e fisiopatologia (p. ex.,
disfunção endotelial), e parece que o grau de DE está correlacionado Diabética A DE ocorre em 35 a 75% dos homens com diabetes me-
com a gravidade da doença cardiovascular. Consequentemente, a DE lito. Os mecanismos patológicos estão relacionados principalmente
representa um “sintoma sentinela” para pacientes com doenças car- com as complicações vasculares e neurológicas associadas ao diabe-
diovascular e vascular periférica ocultas. tes. As complicações macrovasculares do diabetes estão relacionadas
O tabagismo também é um fator de risco importante para o de- principalmente com a idade, ao passo que as microvasculares se re-
senvolvimento de DE. Os medicamentos usados no tratamento do lacionam com a duração do diabetes e com o grau de controle gli-
diabetes ou das doenças cardiovasculares são fatores de risco adi- cêmico (Cap. 19). Os indivíduos com diabetes também apresentam
quantidades reduzidas de óxido nítrico-sintase nos tecidos endote-
cionais (ver adiante). Existe uma incidência mais alta de DE entre
liais e neurais.
homens que foram submetidos à radiação ou a cirurgia para tratar
câncer da próstata e naqueles que sofreram lesão na medula espinal Psicogênica Dois mecanismos contribuem para a inibição da ere-
inferior. As causas psicológicas de DE incluem depressão, raiva ou ção na DE psicogênica. Em primeiro lugar, os estímulos psicogênicos
estresse provocados por desemprego e outras causas relacionadas na medula sacra podem inibir respostas reflexogênicas bloqueando,
com estresse. assim, a ativação dos impulsos vasodilatadores para o pênis. Em se-
gundo lugar, a estimulação simpática excessiva no homem ansioso
Fisiopatologia pode aumentar o tônus da musculatura lisa peniana. As causas mais
A DE pode advir de três mecanismos básicos: (1) dificuldade de comuns de DE psicogênica são ansiedade quanto ao desempenho,
iniciação (psicogênica, endócrina ou neurogênica); (2) dificuldade depressão, conflito na relação, perda de atração, inibição sexual, con-
de enchimento (arteriogênica); e (3) dificuldade de manutenção de flitos acerca de preferência sexual, abuso sexual na infância e temor
um volume sanguíneo adequado dentro da rede lacunar (disfunção de gestação ou de doença sexualmente transmissível. Quase todos os
venoclusiva). Essas categorias não se excluem mutuamente, e múlti- pacientes com DE, mesmo quando a disfunção tem base claramente
plos fatores contribuem para DE em muitos pacientes. Por exemplo, orgânica, desenvolvem um componente psicogênico reacional.
a pressão de preenchimento reduzida pode acarretar em extravasa-
Medicamentosa Estima-se que ocorra DE medicamentosa (Quadro
mento venoso secundário. Frequentemente os fatores psicogênicos
coexistem com outros fatores etiológicos e devem ser considerados 15.1) em 25% dos homens atendidos em ambulatórios de medicina
em todos os casos. Causas diabéticas, ateroscleróticas e relacionadas geral. Os efeitos adversos relacionados com terapias farmacológicas
com drogas são responsáveis por mais de 80% dos casos de DE em são aditivos, especialmente em homens idosos. Além do efeito do
homens idosos. próprio medicamento, é provável que a doença sob tratamento con-
tribua para a disfunção sexual. Entre os agentes anti-hipertensivos,
Vasculogênica A causa orgânica mais comum de DE é um distúr- os diuréticos tiazídicos e os -bloqueadores são os implicados com
bio do fluxo sanguíneo de entrada e de saída do pênis. As doenças maior frequência. Os bloqueadores dos canais de cálcio e os inibi-
arteriais, aterosclerótica ou traumática, podem diminuir o fluxo dores da enzima conversora da angiotensina são citados com menor
para os espaços lacunares, resultando em redução da rigidez do frequência. Tais fármacos podem atuar diretamente ao nível dos
pênis e em tempo maior até que a ereção esteja completa. Um flu- corpos (p. ex., bloqueadores dos canais de cálcio) ou indiretamente,
xo de saída em excesso pelas veias, mesmo com influxo adequado, reduzindo a pressão arterial pélvica, que é importante para que acon-
também pode contribuir para DE. Alterações estruturais dos com- teça a rigidez peniana. Os bloqueadores -adrenérgicos são menos
ponentes fibroelásticos dos corpos podem causar perda da compla- propensos a causar DE. Estrogênios, agonistas do GnRH, antagonis-
cência e incapacidade de comprimir as veias da túnica. Tal situação tas de H2 e espironolactona causam DE por suprimirem a produção
pode advir do envelhecimento, do entrecruzamento aumentado das de gonadotrofinas ou por bloquearem a ação do androgênio. Antide-
fibras de colágeno induzido por glicosilação não enzimática, de hi- pressivos e antipsicóticos – em particular neurolépticos, tricíclicos e
poxemia ou de alteração da síntese de colágeno associada à hiper- ISRS – estão associados a dificuldades de ereção, ejaculação, orgasmo
colesterolemia. e desejo sexual.
176
QUADRO 15.1 Fármacos associados à disfunção erétil Tanto o paciente quanto seu parceiro sexual devem ser entrevista-
dos sobre a história sexual. A DE deve ser diferenciada de outros
Classificação Fármacos problemas sexuais, como ejaculação precoce. Fatores comporta-
Diuréticos Tiazídicos mentais, como orientação sexual, o nível de estresse causado pela
DE, ansiedade quanto ao desempenho e detalhes sobre as técnicas
Espironolactona
sexuais devem ser abordados. Há questionários padronizados para
Anti‑hipertensivos Bloqueadores dos canais de cálcio avaliação de DE, incluindo o International Index of Erectile Func-
Metildopa tion (IIEF) e o Sexual Health Inventory for Men (SHIM), mas fácil
Clonidina de ser aplicado, sendo uma versão resumida validada do IIEF.
Reserpina A avaliação inicial da DE se inicia com uma revisão da his-
tória clínica, cirúrgica, sexual e psicossocial do paciente. Na
‑bloqueadores
anamnese deve se assinalar se o paciente sofreu traumatismo,
Guanetidina cirurgia ou irradiação pélvicos. À luz do reconhecimento cres-
Cardíacos/ Digoxina cente da relação entre sintomas do trato urinário inferior e DE,
CAPÍTULO 15
anti‑hiperlipêmicos Genfibrozila é aconselhável investigar a presença de sintomas de obstrução
Clofibrato da via de saída da bexiga. As perguntas devem enfocar o iní-
cio dos sintomas, a presença e a duração de ereções parciais e a
Antidepressivos Inibidores seletivos da recaptação de
progressão da DE. Um relato de ereções noturnas ou matinais é
serotonina
útil para se distinguir DE fisiológica de psicogênica. As ereções
Antidepressivos tricíclicos noturnas ocorrem durante o sono com movimentos oculares
Lítio rápidos (REM) e requerem sistemas neurológico e circulatório
Inibidores da monoaminoxidase íntegros. Causas orgânicas de DE geralmente caracterizam-se
Tranquilizantes Butirofenonas por alteração gradual e persistente na rigidez ou incapacidade de
Disfunção Sexual
manter ereções noturnas, durante o coito ou auto-estimuladas.
Fenotiazínicos
O paciente deve ser perguntado acerca da presença de curvatura
Antagonistas H2 Ranitidina peniana ou de dor durante o coito. É importante enfocar a libido,
Cimetidina pois o impulso sexual diminuído e a DE às vezes são os primeiros
Hormônios Progesterona sinais de anormalidades endócrinas (p. ex., níveis de prolactina
Estrogênios elevados, níveis de testosterona diminuídos). É útil questionar se
o problema ocorre apenas com uma ou também envolve outras
Corticosteroides
parceiras; a DE surge não raramente associada a relações sexuais
Agonistas do GnRH novas ou extraconjugais. A DE circunstancial, diferentemente
Inibidores da 5‑redutase da constante, sugere causas psicogênicas. A ejaculação é afetada
Acetato de ciproterona com frequência muito menor do que a ereção, mas devem ser
Agentes citotóxicos Ciclofosfamida feitas perguntas quanto a ser normal, precoce, tardia ou ausente.
Devem-se identificar fatores de risco relevantes, tais como dia-
Metotrexato
betes melito, doença arterial coronariana (DAC) ou distúrbios
Interferon A neurológicos. A história cirúrgica do paciente deve ser explorada
Anticolinérgicos Disopiramida com ênfase em procedimentos realizados no intestino, na bexi-
Anticonvulsivantes ga, na próstata ou nos vasos sanguíneos. Também é importante
Drogas recreativas Etanol uma anamnese farmacológica completa. Alterações sociais que
podem desencadear DE também são fundamentais para a ava-
Cocaína
liação, incluindo preocupações com a saúde, morte do cônjuge,
Maconha divórcio, dificuldades na relação e preocupações financeiras.
Nota: GnRH, hormônio liberador de gonadotrofina.
Se houver uma associação evidente entre a instituição de um fár- AVALIAÇÃO E TRATAMENTO DO PACIENTE
maco e o início de DE, deve-se considerar a possibilidade de utilizar
medicamentos alternativos. Do contrário, em geral é mais prático Anamnese: clínica, sexual e psicossocial
tratar a DE sem tentar muitas alterações na medicação, já que pode Exame físico
Soro: níveis de testosterona e de prolactina Problema resolvido
ser difícil estabelecer uma relação causal com um fármaco. Controle dos riscos associados ao estilo de vida
Revisão da medicação
Uma boa relação médico-paciente ajuda a revelar possíveis causas Orientação do casal Terapia sexual
Planejamento da terapia voltada por objetivo Exames especiais
de DE, muitas das quais implicam na discussão de assuntos pes-
soais e, às vezes, constrangedores. Por essa razão, com frequência
o ideal é que o médico da atenção primária inicie a investigação. Inibidores da PDE VO Sucesso
terapêutico
Contudo, um porcentual significativo de homens sofrem de DE e
permanecem sem diagnóstico a não ser que sejam questionados Terapia intrauretral ou injetável Sucesso
especificamente acerca do problema. A causa mais comum de sub-
terapêutico
notificação de DE é, de longe, embaraço do paciente. Uma vez que
o tópico seja iniciado pelo médico os pacientes em geral se mos- Dispositivo a vácuo Implante/cirurgia
vascular
tram dispostos a falar sobre sua potência sexual. Deve se proceder a
uma anamnese clínica e sexual completa, na tentativa de avaliar se
a causa da DE é orgânica, psicogênica ou multifatorial (Fig. 15.2). Figura 15.2 Algoritmo para avaliação e tratamento dos pacientes com
DE. PDE, fosfodiesterase.
177
Uma vez que a DE frequentemente envolve diversos fatores AGENTES ORAIS Sildenafila, tadalafila e vardenafila são os únicos
de risco para células endoteliais, os homens que têm tal disfunção agentes orais aprovados e efetivos para o tratamento de DE. Esses
apresentam índices mais elevados de infarto do miocárdio franco três medicamentos melhoraram sobremaneira o tratamento da DE
ou silencioso. Sendo assim, o surgimento de DE em um indivíduo porque são efetivos para uma ampla gama de causas, incluindo a
de resto assintomático implica na possibilidade de outros distúr- psicogênica, a diabética, a vasculogênica, a pós-prostatectomia
bios vasculares, inclusive DAC. radical (procedimentos que preservam nervos) e o traumatismo
O exame físico é um elemento essencial para o diagnóstico raquimedular. Tais fármacos pertencem à classe dos medicamen-
de DE. Sinais de hipertensão, bem como evidências de doenças tos inibidores seletivos e potentes da PDE-5, a isoforma de fos-
tireoidianas, hepáticas, hematológicas, cardiovasculares ou re- fodiesterase predominante no pênis. São administrados em doses
nais, devem ser pesquisados. Os sistemas endócrino e vascular graduais e acentuam a ereção após estimulação sexual. O início da
devem ser examinados, assim como a genitália externa e a prós- ação dá-se em aproximadamente 60 a 120 minutos, dependendo
tata. O pênis deve ser palpado com cuidado ao longo dos corpos do medicamento utilizado e de outros fatores, tais como ingestão
à procura de placas fibróticas. Tamanho testicular diminuído e recente de alimentos. Doses iniciais reduzidas devem ser conside-
perda de características sexuais secundárias sugerem hipogona- radas para os pacientes idosos, para aqueles que estejam tomando
dismo. O exame neurológico deve incluir avaliação do tônus do concomitantemente -bloqueadores, para os que apresentam in-
SEÇÃO II
esfíncter anal, do reflexo bulbocavernoso e pesquisa de neuropa- suficiência renal ou, ainda, para os que estejam tomando medica-
tia periférica. mentos que inibam a via metabólica CYP3A4 no fígado (p. ex., eri-
Embora a hiperprolactinemia seja incomum, deve-se medir o tromicina, cimetidina, cetoconazol e, possivelmente, itraconazol e
nível sérico de prolactina, pois a libido diminuída e/ou a DE po- mibefradil), pois esses fármacos podem aumentar a concentração
dem ser sintomas iniciais de um prolactinoma ou de outras lesões sérica dos PDE-5i (PDE-5i) ou produzir hipotensão.
expansivas da sela (Cap. 2). O nível sérico de testosterona deve Diversos ensaios randomizados demonstraram a eficácia
ser medido e, se estiver baixo, devem-se também dosar as gona- dessa classe de medicamentos. Não há dados convincentes para
dotrofinas para se determinar se o hipogonadismo é de origem apoiar à superioridade de um dos PDE-5i sobre os demais. Alguns
Endocrinologia Reprodutiva
primária (testicular) ou secundária (hipotalâmico-hipofisário) pacientes podem não responder ao tratamento com PDE-5i por
(Cap. 8). Não havendo exames recentes, a bioquímica sérica, o diversos motivos (Quadro 15.2). Alguns não toleram os PDE-5i
hemograma completo e o lipidograma podem ser importantes, em razão de eventos adversos produzidos pela vasodilatação em
pois podem evidenciar anemia, diabetes melito, hiperlipidemia tecidos não penianos que expressam a PDE-5 ou em razão da ini-
ou outras doenças sistêmicas associadas a DE. A dosagem do bição de isoenzimas homólogas não penianas (isto é, PDE-6 en-
antígeno prostático específico (PSA) sérico deve ser realizada de contrada na retina). As alterações visuais atribuídas ao efeito dos
acordo com as diretrizes clínicas recomendadas. PDE-5i sobre a PDE-6 da retina têm curta duração, foram relata-
Raramente há necessidade de outros exames diagnósticos na dos apenas com sildenafila e não se acredita que tenham signifi-
avaliação de DE. Contudo, em alguns pacientes, testes especializa- cância clínica. Mais preocupante é a possibilidade de os PDE-5i
dos podem proporcionar uma visão mais clara sobre os mecanis- causarem neuropatia óptica isquêmica anterior não arterítica; em-
mos patológicos envolvidos e auxiliar na escolha do tratamento. bora os dados que corroboram essa associação sejam limitados, é
Os testes especializados opcionais são: (1) estudos sobre tumes- prudente evitar o uso desses agentes em homens com antecedentes
cência e rigidez peniana noturna; (2) exames vasculares (injeção pessoais de neuropatia óptica isquêmica anterior não arterítica.
no consultório de substâncias vasoativas, ultrassonografia com A suplementação de testosterona associada ao uso de um
Doppler do pênis, angiografia do pênis, cavernosografia/caverno- PDE-5i pode ser benéfica na melhora da função erétil em homens
sometria com infusão dinâmica); (3) exames neurológicos (per- portadores de hipogonadismo e DE que não tenham respondido
cepção vibratória graduada com biotesiometria; potenciais evo- bem ao uso isolado do inibidor de PDE-5i.
cados somatossensoriais); e (4) testes diagnósticos psicológicos. Esses medicamentos não afetam a ejaculação, o orgasmo ou
As informações que podem ser obtidas com esses procedimentos o impulso sexual. Os efeitos colaterais associados aos PDE-5i in-
devem ser ponderadas em função da invasividade e do custo. cluem cefaleia (19%), rubor facial (9%), dispepsia (6%) e conges-
tão nasal (4%). Aproximadamente 7% dos homens que utilizam a
sildenafila experimentam uma alteração transitória da visão colo-
rida (efeito do halo azul), e 6% dos que tomam tadalafila podem
TRATAMENTO Disfunção sexual masculina sentir dor lombar. Os PDE-5i estão contraindicados nos homens
tratados com nitrato para doença cardiovascular, incluindo agen-
tes administrados pelas vias oral, sublingual, transnasal ou tópica.
ORIENTAÇÃO DO PACIENTE A orientação do paciente e dos par-
Tais agentes podem potencializar o efeito hipotensor produzindo
ceiros é fundamental para o tratamento da DE. Na terapia guiada
choque profundo. Da mesma forma, os nitritos voláteis (conhe-
por objetivo, a orientação facilita a compreensão da doença, dos
cidos como poppers) à base de amilbutil podem ter um efeito si-
resultados dos testes e da escolha do tratamento. A discussão das
nérgico fatal sobre a pressão arterial. Os PDE-5i também devem
opções terapêuticas ajuda a esclarecer como o tratamento pode ser
mais eficiente e a estratificar as terapias como de primeira e segun-
da linhas. Os pacientes que apresentem problemas relacionados
com comportamentos de alto risco, tais como obesidade, tabagis-
mo, abuso de álcool ou uso de drogas ilícitas, devem ser informa- QUADRO 15.2 Questões a serem consideradas em pacientes
dos sobre a participação desses fatores no desenvolvimento de DE. que relatam insucesso com o uso de PDE‑5i no tratamento da
Dentre as terapias atualmente empregadas para o tratamento disfunção erétil
da DE estão administração por via oral de inibidores da fosfodies-
terase tipo 5 (os mais usados), terapias com injeção peniana, tera- •• Deve‑se proceder a uma prova terapêutica com duração mínima de
pia com testosterona, dispositivos penianos e terapia psicossocial. seis dias com dose máxima antes de se declarar o paciente como não
Além disso, há dados limitados a sugerir que o tratamento volta- responsivo ao tratamento com PDE‑5i
do para fatores de risco ou comorbidades – por exemplo, perda •• O medicamento está sendo tomado após refeições ricas em gorduras
ponderal, exercícios, redução do estresse e cessação do hábito de •• O paciente não recebe estimulação física e psíquica durante as
fumar – podem melhorar a função erétil. As decisões acerca do preliminares para induzir a liberação de NO endógeno
tratamento devem ser tomadas levando em consideração as prefe- •• Hipogonadismo não diagnosticado
rências e expectativas de pacientes e parceiros.
Nota: NO, óxido nítrico; PDE‑5i, inibidor da fosfodiesterase tipo 5.
178
ser evitados nos pacientes com insuficiência cardíaca congestiva e (estados de hipercoagulabilidade, anemia falciforme). Os efeitos
miocardiopatia em razão do risco de colapso vascular. Como a ati- colaterais incluem eventos adversos locais, ereções prolongadas,
vidade sexual provoca incremento no dispêndio fisiológico (5 a 6 dor e fibrose com o uso crônico. Diversas associações de alprosta-
equivalentes metabólicos [METS]), os médicos têm sido orientados dil, fentolamina e/ou papaverina são usadas ocasionalmente.
a terem cautelas na prescrição de qualquer fármaco para atividade
CIRURGIA Uma forma menos utilizada de terapia para DE é a
sexual em pacientes que apresentem doença arterial coronariana
implantação cirúrgica de uma prótese peniana semirrígida ou
(DAC) ativa, insuficiência cardíaca, hipotensão limítrofe ou hi-
inflável. A escolha do tipo de prótese depende da preferência do
povolemia e naqueles tratados com esquemas anti-hipertensivos
paciente e devem ser levadas em consideração a compleição físi-
complexos.
ca e a destreza manual dos pacientes, que podem afetar a capaci-
Conquanto as diversas formas de PDE-5i tenham um meca-
dade de manipular o dispositivo. Em razão da permanência da
nismo de ação comum, há algumas diferenças a serem ressaltadas
prótese, os pacientes devem ser orientados a considerar primeiro
entre esses três agentes. A tadalafila é única no que diz respeito
as opções menos invasivas. Esses tratamentos cirúrgicos são inva-
à sua meia-vida longa. Todos os três fármacos são efetivos para
sivos, estão associados a complicações potenciais e, em geral, de-
pacientes de todas as idades portadores de DE de quaisquer gra-
CAPÍTULO 15
vem ser reservados para o tratamento da DE refratária. Apesar do
vidade e etiologia. Ainda que haja diferenças farmacocinéticas e
alto custo e da invasividade, as próteses penianas estão associadas
farmacodinâmicas entre esses agentes, não é evidente a existência
a altas taxas de satisfação do paciente e do parceiro.
de diferenças clinicamente relevantes.
TERAPIA SEXUAL Um programa de terapia sexual pode ser útil
TERAPIA COM ANDROGÊNIOS A reposição de testosterona é usada
para abordagem de fatores interpessoais específicos que possam
para tratar o hipogonadismo tanto primário quanto secundário
estar prejudicando a função sexual. Em geral, a terapia sexual
(Cap. 8). A suplementação de androgênios quando a testosterona
consiste em discussões durante a seção e exercícios domiciliares
encontra-se normal raramente é eficaz no tratamento da DE e não
específicos para a pessoa e para a relação. A terapia psicossexu-
é recomendada. Os métodos para reposição de androgênios in-
al envolve técnicas como foco sensorial (massagem não genital),
Disfunção Sexual
cluem géis e adesivos transdérmicos, a administração parenteral
exercícios para despertar a sensibilidade, correção de concepções
de ésteres de testosterona de ação prolongada (enantato e cipio-
equivocadas sobre sexualidade e terapia para dificuldades inter-
nato) e formulações orais (derivados 17 -alquilados) (Cap. 8).
pessoais (p. ex., comunicação franca sobre questões sexuais, pro-
As formulações orais de androgênios apresentam potencial de he-
gramação de intimidade física e intervenção comportamental).
patotoxicidade e devem ser evitadas.
Essas abordagens podem ser úteis em pacientes que tenham com-
Os pacientes do sexo masculino que tratados com testostero-
ponentes psicogênicos ou sociais contribuindo para a DE, embora
na devem ser reavaliados após 1 a 3 meses e no mínimo 1 vez por
os dados de ensaios randomizados sejam limitados e inconsisten-
ano em diante. As avaliações devem incluir níveis de testosterona,
tes. Caso o paciente esteja envolvido em uma relação constante, é
função erétil e efeitos adversos, incluindo ginecomastia, apneia
preferível que a terapia inclua ambos os parceiros.
do sono, desenvolvimento ou agravação de sintomas do trato uri-
nário inferior ou de hiperplasia benigna da próstata, câncer da
próstata, redução do HDL, eritrocitose, alteração nas provas de
função hepática e redução da fertilidade. A reavaliação periódica DISFUNÇÃO SEXUAL FEMININA
deve incluir hemograma completo e dosagem do PSA além de to- A disfunção sexual feminina (DSF) tradicionalmente inclui distúr-
que retal. O tratamento deve ser suspenso nos pacientes que não bios de desejo, excitação, dor e falta de orgasmo. Os fatores de risco
respondam em 3 meses. associados à DSF são semelhantes aos dos homens: doença cardio-
DISPOSITIVOS DE CONSTRIÇÃO A VÁCUO Os dispositivos de cons- vascular, distúrbios endócrinos, hipertensão arterial, distúrbios neu-
trição a vácuo (DCVs) constituem uma terapia não invasiva bem rológicos e tabagismo (Quadro 15.3).
consolidada, sendo uma alternativa de tratamento razoável para
alguns pacientes que não podem tomar sildenafila ou que não de- ■■ EPIDEMIOLOGIA
sejem outras intervenções. Os DCVs direcionam sangue venoso Os dados epidemiológicos são limitados, mas as estimativas existen-
para o pênis e utilizam um anel de constrição para limitar o retor- tes sugerem que até 43% das mulheres tenham pelo menos um pro-
no venoso e manter a tumescência. Os eventos adversos relacio- blema sexual. Apesar do interesse recente pelas causas orgânicas da
nados com o uso dos DCVs incluem dor, dormência, formação DSF, os distúrbios de desejo e da fase de excitação (incluindo queixas
de hematoma e ejaculação alterada. Além disso, muitos pacientes quanto à lubrificação) continuam a ser os problemas mais comuns
queixam-se de que os dispositivos são volumosos e induzem ere- nos inquéritos de base comunitária.
ções com características e sensações não fisiológicas.
■■ FISIOLOGIA DA RESPOSTA SEXUAL FEMININA
ALPROSTADIL INTRAURETRAL Se um paciente não responde bem
A resposta sexual feminina requer a presença de estrogênios. É possí-
a agentes orais, outra opção razoável é a administração intraure-
vel que os androgênios também exerçam um papel, mas isto não está
tral ou por autoinjeção de substâncias vasoativas. A prostaglandi-
bem estabelecido. Os estrogênios e os androgênios atuam sinergica-
na E1 intrauretral (alprostadil), em forma de comprimido semisó-
mente no SNC para aumentar a excitação e a resposta sexual. Vários
lido (doses de 125 a 1.000 g), é administrada com um aplicador.
trabalhos relatam aumento da libido em mulheres durante a fase pré-
Aproximadamente 65% dos homens que utilizam alprostadil in-
-ovulatória do ciclo menstrual, sugerindo que os hormônios envolvi-
trauretral respondem com uma ereção quando testados no con-
sultório, mas apenas 50% conseguem um coito bem-sucedido em dos na ovulação (p. ex., estrogênios) aumentam o desejo.
casa. A inserção intrauretral está associada a uma incidência mui- A motivação sexual é fortemente influenciada pelo contexto, in-
to reduzida de priapismo quando comparada àquela observada cluindo fatores ambientais e relacionados com o parceiro. Uma vez
com a injeção intracavernosa. atingido um desejo sexual suficiente, a excitação é mediada pelo sis-
tema nervoso central e autônomo. Acredita-se que as vias eferentes
AUTOINJEÇÃO INTRACAVERNOSA A injeção de formulações sintéti- simpáticas cerebrais aumentem o desejo enquanto a atividade paras-
cas de alprostadil é eficaz em 70 a 80% dos pacientes com DE, mas simpática periférica produza congestão clitoridiana e secreção vagi-
as taxas de abandono do tratamento são altas em razão da natureza nal (lubrificação).
invasiva da administração. A dose varia de 1 a 40 g. A terapia Os neurotransmissores para o intumescimento do corpo clitori-
injetável está contraindicada nos homens com história de hiper- diano são semelhantes àqueles do sexo masculino, e o controle neural
sensibilidade ao fármaco e naqueles sob alto risco de priapismo da musculatura lisa e o óxido nítrico (NO) liberado pelo endotélio
têm papéis destacados. Uma delicada rede de nervos e arteríolas va-
179
QUADRO 15.3 Fatores de risco para disfunção sexual feminina mentos utilizados pela paciente devem ser revistos, uma vez que
podem afetar a excitação, a libido e o orgasmo. Devem-se identi-
Doença neurológica: acidente‑vascular encefálico, traumatismo ficar fatores de estresse e a necessidade de orientação psicológica.
raquimedular, Parkinsonismo O exame físico deve avaliar a genitália, incluindo o clitóris. Com o
Traumatismo, cirurgia genital, radiação exame do soalho pélvico é possível identificar prolapsos ou outros
Endocrinopatias: diabetes, hiperprolactinemia distúrbios. São necessários exames laboratoriais, especialmente
se houver dúvidas quanto a um eventual estado de menopausa.
Insuficiências hepática e/ou renal
Geralmente são solicitadas as dosagens de estradiol, do hormô-
Doença cardiovascular nio folículo-estimulante (FSH) e do hormônio luteinizante (LH)
Fatores psicológicos e distúrbios do relacionamento interpessoal: abuso e deve-se considerar a possibilidade de dosar a desidroepiandros-
sexual, situações estressantes terona (DHEA), uma vez que seus níveis refletem a secreção de
Medicamentos androgênio pela suprarrenal. Hemograma completo, avaliação da
Antiandrogênios: cimetidina, espironolactona função hepática e do perfil lipídico podem ser úteis. Avaliações
diagnósticas mais complexas, como ultrassonografia com Dop-
Antidepressivos, álcool, hipnóticos, sedativos
pler e biotesiometria do clitóris, requerem equipamentos caros e
SEÇÃO II
Antiestrogênios ou antagonistas do GnRH sua utilidade é discutível. É importante que a paciente identifique
Anti‑histamínicos, aminas simpaticomiméticas os sintomas que lhe causam mais sofrimento.
Anti‑hipertensivos: diuréticos, bloqueadores dos canais de cálcio Antigamente, a investigação dos casos de DSF ocorria so-
Agentes alquilantes bretudo em um contexto psicossocial. No entanto, as incon-
sistências observadas entre as categorias diagnósticas criadas
Anticolinérgicos
com base unicamente em considerações psicossociais e o reco-
Nota: GnRH, hormônio liberador de gonadotrofina. nhecimento de etiologias orgânicas levaram a uma nova clas-
sificação para as DSF. Esse esquema diagnóstico é baseado em
Endocrinologia Reprodutiva
ginais produz um transudato vaginal. Os principais transmissores quatro componentes que não são mutuamente excludentes: (1)
dessa resposta vaginal complexa não foram claramente identificados, desejo sexual hipoativo – ausência persistente ou recorrente de
mas suspeita-se que o NO e o polipeptídio vasointestinal (PVI) te- pensamentos de cunho sexual e/ou de receptividade à atividade
nham papéis relevantes. Os pesquisadores que estudam a resposta sexual, causando sofrimento pessoal. O desejo sexual hipoativo
sexual feminina normal têm posto em dúvida a concepção há muito pode ser causado por insuficiência endócrina ou pode estar as-
mantida de uma relação linear estrita entre desejo inicial, excitação, sociado a distúrbios psicológicos ou emocionais; (2) distúrbio
vasocongestão, lubrificação e, finalmente, orgasmo. Os profissionais da excitação sexual – incapacidade persistente ou recorrente de
de saúde devem pensar na possibilidade de um modelo que admita atingir ou de manter a excitação sexual, causando sofrimento
como resultados emocionais e físicos positivos a ocorrência de um, pessoal; (3) distúrbio orgástico – perda persistente ou recorrente
múltiplos ou nenhum orgasmo. de potencial orgástico após suficientes estimulação e excitação
Ainda que haja diferenças anatômicas e variações na densida- sexuais, causando sofrimento pessoal; (4) distúrbios sexuais do-
de dos leitos vascular e neural entre homens e mulheres, os prin- lorosos – dor genital persistente ou recorrente associada a esti-
cipais efetores da resposta sexual são notavelmente semelhantes. mulação sexual sem penetração, causando sofrimento pessoal.
A integridade sensorial é importante para a excitação. Assim, é Esta nova classificação enfatiza o “sofrimento pessoal” como
mais comum a observação de níveis reduzidos de função sexual uma necessidade para que se defina a disfunção e garante aos
em mulheres que apresentam neuropatias periféricas (p. ex., dia- médicos uma estrutura para avaliação antes ou em conjunto
betes). A lubrificação vaginal é um transudato de soro resultante com os métodos mais tradicionais de aconselhamento.
do aumento do fluxo sanguíneo pélvico associado à excitação. A
insuficiência vascular por diferentes causas pode comprometer
uma lubrificação adequada e causar dispareunia. O relaxamento
da musculatura lisa cavernosa e arteriolar ocorre via aumento da TRATAMENTO Disfunção sexual feminina
atividade da óxido nítrico-sintase (NOS) e provoca ingurgitamento
do clitóris e do vestíbulo circundante. Para que o orgasmo ocorra, GERAL É importante que se faça uma discussão aberta sobre a
é essencial um trato simpático eferente e íntegro; por isso, os dis- questão com a paciente, uma vez que é possível que o casal ne-
túrbios orgásticos são comuns em pacientes que sofreram trauma- cessite de orientações acerca das reações anatômicas e fisiológicas
tismo raquimedular. normais, incluindo o papel do orgasmo nos encontros sexuais.
Devem ser explicadas as alterações fisiológicas associadas ao en-
velhecimento e/ou a doenças. Talvez seja necessário lembrar ao
ABORDAGEM AO
Disfunção sexual feminina casal que a estimulação do clitóris, e não a penetração, pode ser
PACIENTE
mais eficaz.
Muitas mulheres não fornecem voluntariamente informações re- Os primeiros passos devem ser as modificações comporta-
lativas às suas reações sexuais. A formulação de questões abertas mentais e as terapias não farmacológicas. É possível que o acon-
em uma atmosfera acolhedora pode ajudar a iniciar a discussão selhamento do casal melhore a comunicação e desfaça tensões
acerca da adequação sexual em mulheres que se mostrem relu- do relacionamento. Modificações no modo de vida relacionadas
tantes em debater tais questões. Havendo uma queixa, deve-se com fatores de risco conhecidos podem ser importantes para o
realizar uma avaliação ampla, incluindo histórias clínica e psicos- processo de tratamento. É importante enfatizar a importância de
social, exame físico e alguns exames laboratoriais. se buscarem atividades que favoreçam a saúde física e evitar com-
A história deve incluir as usuais informações clínicas, cirúr- portamentos (p. ex., tabagismo, abuso de álcool) e medicamentos
gicas, obstétricas, psicológicas, ginecológicas, sexuais e sociais. que possam produzir DSF (Quadro 15.3). O uso de lubrificantes
Devem-se avaliar ainda as experiências passadas, a existência de tópicos talvez resolva queixas como dispareunia e secura. É possí-
relacionamentos íntimos, os conhecimentos sobre o tema e a dis- vel que seja necessário modificar a prescrição de medicamentos,
ponibilidade de parceiros. Distúrbios clínicos que possam afetar tais como antidepressivos, que possam estar contribuindo para o
a saúde sexual devem ser investigados, incluindo diabetes melito, problema, inclusive com sua substituição por outros que causem
doenças cardiovasculares, problemas ginecológicos, história obs- menor impacto na função sexual, ou com diminuição da dosagem
tétrica, depressão, ansiedade e doenças neurológicas. Os medica- ou, ainda, com sua suspensão temporária.
180
TERAPIA HORMONAL Em mulheres na pós-menopausa, a terapia BIBLIOGRAFIA
de reposição de estrogênio pode ser útil para tratar a atrofia vagi- Araujo AB et al: Changes in sexual function in middle-aged and older men:
nal, diminuir a dor ao coito e aumentar a sensibilidade do clitóris Longitudinal data from the Massachusetts male aging study. J Am Geriatr
(Cap. 12). A reposição de estrogênio em forma de creme local é o Soc 52:1502, 2004
método preferido, uma vez que evita efeitos colaterais sistêmicos. Bhasin S et al: Sexual dysfunction in men and women with endocrine disor-
Os níveis de androgênio diminuem substancialmente nas mulhe- ders. Lancet 369:597, 2007
res antes da menopausa. Contudo, níveis baixos de testosterona Burnett AL: Erectile dysfunction. J Urol 175:S25, 2006
ou de desidroepiandrosterona (DHEA) não são fatores preditivos Cappelleri JC et al: A 5-year review of research and clinical experience. Int J
efetivos de um desfecho terapêutico positivo para a terapia andro- Impot Res 17:307, 2005
gênica. O uso disseminado de androgênios exógenos não encon- Davis SR et al: Endocrine aspects of female sexual dysfunction. J Sex Med
tra apoio na literatura médica, exceto em algumas circunstâncias 1:82, 2004
(insuficiência ovariana prematura ou estados de menopausa) e Doggrell SA: Comparison of clinical trials with sildenafil, vardenafil, and
nos distúrbios secundários da excitação. tadalafil in erectile dysfunction. Expert Opin Pharmacother 6:75, 2005
AGENTES ORAIS A eficácia de PDE-5i na DSF foi muito decep- Esposito K et al: Effect of lifestyle changes on erectile dysfunction in obese
CAPÍTULO 15
cionante, considerando-se o papel proposto da fisiologia depen- men: A randomized controlled trial. JAMA 291:2978, 2004
dente de óxido nítrico na resposta sexual feminina normal. O uso Inman BA et al. A population-based, longitudinal study of erectile dysfunc-
de sildenafila para DSF deve ser desestimulado, uma vez que não tion and future coronary artery disease. Mayo Clin Proc 84:108, 2009
há evidências de que seja efetivo. Pauls RN et al: Female sexual dysfunction: Principles of diagnosis and thera-
py. Obstet Gynecol Surv 60:196, 2005
DISPOSITIVO CLITORIDIANO A VÁCUO Nas pacientes que apresen- Rees PM et al: Sexual function in men and women with neurological disor-
tam dificuldades de excitação e de orgasmo, pode-se optar pelo ders. Lancet 369(9560):512, 2007
emprego do dispositivo clitoridiano a vácuo. Esse dispositivo Thompson IM et al: Erectile dysfunction and subsequent cardiovascular di
manual operado com bateria tem uma pequena abóbada plásti- sease. JAMA 294:2996, 2005
Disfunção Sexual
ca macia que aplica vácuo sobre o clitóris estimulado. Com isto,
ocorrem aumento do fluxo sanguíneo cavernoso, ingurgitamento
e lubrificação vaginal.
181
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SEÇÃO III
Diabetes Melito, Obesidade e
Metabolismo das Lipoproteínas
CAPÍTULO 16 ativa visa confirmar se os adipócitos e as citocinas secretados pelos
adipócitos viscerais desempenham um papel a mais nas complica-
ções sistêmicas da obesidade.
ciá-la a excesso de peso, mas isso nem sempre é correto: indivíduos lação precisa do equilíbrio energético não é facilmente monitorada
magros, porém muito musculosos, podem apresentar excesso de pela contagem calórica com relação à atividade física. Na verdade, a
peso segundo padrões numéricos, mas não têm aumento da massa regulação ou desregulação do peso corporal dependem de uma in-
adiposa. A distribuição do peso corporal na população é contínua, o teração complexa de sinais neurais e hormonais. Alterações no peso
que torna a escolha de uma distinção clinicamente significativa entre normal induzidas por alimentação forçada ou privação de alimentos
magro e obeso um tanto arbitrária. A obesidade é mais bem-definida induzem a mudanças fisiológicas que se opõem a essas perturbações.
pela avaliação de sua ligação com a morbidade e mortalidade. Quando há perda de peso, o apetite aumenta e o dispêndio de energia
Embora não seja medida direta da adiposidade, o método mais diminui. Com excesso de alimentação, o apetite diminui e o dispên-
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
usado para avaliar a obesidade é o índice de massa corporal (IMC), dio de energia aumenta. No entanto, o último mecanismo compensa-
igual ao peso/estatura2 (em kg/m2) (Fig. 16.1). Outras abordagens tório falha com frequência, o que permite o surgimento da obesidade
para a quantificação da obesidade são a antropometria (espessura da quando há alimentos abundantes e pouca atividade física. Um regu-
prega cutânea), densitometria (pesagem sob a água), TC ou RM e a lador importante dessas respostas adaptativas é o hormônio leptina,
impedância elétrica. Segundo os dados das tabelas da Metropolitan produzido pelos adipócitos. Tal substância age através de circuitos
Life, o IMC do ponto médio para todas as estaturas e compleições, cerebrais (sobretudo no hipotálamo) para influenciar o apetite, o dis-
entre homens e mulheres, vai de 19 a 26 kg/m2. As mulheres têm mais pêndio de energia e a função neuroendócrina (ver adiante).
gordura corporal que os homens com determinado IMC. Com base O apetite é influenciado por muitos fatores integrados no cére-
em dados de morbidade substancial, um IMC de 30 é o limiar mais bro, sobretudo no hipotálamo (Fig. 16.2). Os sinais que entram no
usado para a obesidade em ambos os sexos. Estudos epidemiológi- centro hipotalâmico incluem aferentes neurais, hormônios e meta-
cos em grande escala sugerem que a morbidade total por doenças bólitos. Os impulsos vagais são especialmente importantes, pois tra-
metabólicas, câncer e doenças cardiovasculares começa a aumentar zem informações das vísceras, como a distensão dos intestinos. Os
(porém lentamente) quando os IMC são iguais ou superiores a 25, sinalizadores hormonais incluem a leptina, a insulina, o cortisol e
sugerindo que o ponto de corte da obesidade deve ser rebaixado. A os peptídios intestinais. Entre os últimos, estão a grelina, elaborada
maioria das autoridades usa o termo sobrepeso (e não obesidade) no estômago e que estimula a alimentação, o peptídio YY (PYY) e
para descrever os indivíduos com IMC entre 25 e 30, que devem ser a colecistocinina, elaborados no intestino delgado e que sinalizam
considerados clinicamente significativos e dignos de intervenção te- ao cérebro por ação direta nos centros de controle hipotalâmicos e/
rapêutica, principalmente na presença de fatores de risco influencia- ou por intermédio do nervo vago. Os metabólitos, como a glicose,
dos pela adiposidade, como hipertensão e intolerância à glicose. podem influenciar o apetite, visto que a hipoglicemia induz à fome;
A distribuição do tecido adiposo em diferentes espaços anatô- entretanto, a glicose normalmente não é um regulador importante do
micos tem implicações importantes para a morbidade. Especifica- apetite. Esses diversos sinais hormonais, metabólicos e neurais atuam
mente, a gordura intra-abdominal e a subcutânea abdominal são influenciando a expressão e liberação de vários peptídios hipotalâ-
mais importantes que a gordura subcutânea presente nas nádegas e micos (p. ex., neuropeptídio Y [NPY], peptídio relacionado com a
nos membros inferiores. O modo mais fácil de fazer essa distinção proteína aguti [AgRP], hormônio estimulante dos melanócitos
clinicamente é determinando a razão cintura/quadris. Um número [-MSH] e hormônio concentrador da melanina [MCH]), substân-
> 0,9 em mulheres ou > 1 em homens é considerado anormal. Mui- cias integradas às vias sinalizadoras serotoninérgicas, catecolaminér-
tas das complicações importantes da obesidade, como a resistência à gicas, endocanabinoides e opioides (ver adiante). Fatores psicológi-
insulina, diabetes, hipertensão, hiperlipidemia e, em mulheres, o hi- cos e culturais também parecem ter um papel na expressão final do
perandrogenismo, estão mais fortemente associadas à gordura intra- apetite. Com a exceção de raras síndromes genéticas que envolvem a
-abdominal e/ou da parte superior do corpo que à adiposidade total leptina, seu receptor e o sistema da melanocortina, os defeitos especí-
(Cap. 18). O mecanismo subjacente dessa associação é desconhecido, ficos nessa rede complexa de controle do apetite que influenciam os
mas pode estar ligado ao fato de que os adipócitos intra-abdominais casos comuns da obesidade não foram bem-definidos.
têm maior atividade lipolítica do que os dos outros depósitos. A li- O dispêndio de energia envolve os seguintes componentes: (1)
beração dos ácidos graxos livres para a circulação portal tem efeitos taxa metabólica basal ou em repouso; (2) custo energético da me-
metabólicos adversos, sobretudo no fígado. Uma área de investigação tabolização e do armazenamento do alimento; (3) efeito térmico do
184
Peso Estatura
kg lb cm in.
340
150
320 125
140
300 Índice de massa corporal (IMC) 50
130 (kg/m2)
280 130
120 70
260
110 240 MULHERES 60 HOMENS 135
RISCO RISCO
100 220 55
RELATIVO 50 RELATIVO 140
95
90 200
MUITO ALTO MUITO ALTO 145
85 190 40
180 ALTO ALTO
80
170 150
75
160 MODERADO MODERADO 60
70 30
150 155
65 BAIXO BAIXO
140
160
60 130
MUITO BAIXO MUITO BAIXO
20 165 65
55 120
CAPÍTULO 16
50 110 170
100 175
45
95 70
180
90
40
85
185
80
35 10
75 190 75
Biologia da Obesidade
70 195
30 65
200
60 80
205
25 55
210
85
50
Figura 16.1 Nomograma para determinar o índice de massa corporal. Para usar esse nomograma, coloque uma régua ou outro objeto reto entre o peso corporal
(sem roupas) em quilogramas, localizado na linha à esquerda, e a estatura (sem os sapatos) em centímetros, localizada na linha à direita. O índice de massa corporal é lido a
partir do meio da escala e está em unidades do sistema métrico. (Copyright 1979, George A. Bray, MD, com autorização.)
e a interleucina (IL)-6, fatores complementares, como o fator D composição da dieta na obesidade continue a gerar controvérsia, pa-
(também chamado adipsina), agentes pró-trombóticos, como o rece que as dietas ricas em gorduras podem promover a obesidade,
inibidor da ativação do plasminogênio I, e um componente do sis- quando combinadas com dietas ricas em carboidratos simples, rapi-
tema de regulação da pressão sanguínea, o angiotensinogênio. A damente absorvidos.
adiponectina, uma proteína abundante derivada do tecido adiposo Outros fatores ambientais podem contribuir para o aumento da
cujos níveis ficam reduzidos na obesidade, aumenta a sensibilidade prevalência da obesidade. Tanto correlações epidemiológicas como
à insulina e a oxidação lipídica, além de exercer efeitos protetores dados experimentais sugerem que a privação de sono acarreta o au-
da vasculatura, enquanto a resistina e RBP4, cujos níveis se mos- mento da obesidade. As alterações no microbioma intestinal com
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
tram aumentados na obesidade, podem induzir resistência à insu- capacidade de modificar o equilíbrio energético estão recebendo
lina. Esses fatores, e outros ainda não identificados, participam da suporte experimental de estudos em animais e um possível papel
fisiologia da homeostase dos lipídios, da sensibilidade à insulina, para as infecções virais obesogênicas continua a receber atenção
do controle da pressão arterial, da coagulação e da saúde vascular, esporádica.
bem como provavelmente contribuem para as patologias relacio-
nadas com a obesidade. Síndromes genéticas específicas
Sabe-se há muitos anos que, em roedores, a obesidade é causada por
■■ ETIOLOGIA DA OBESIDADE uma série de mutações distintas distribuída por todo o genoma. A
As vias reguladoras do equilíbrio energético estão começando a ser maioria de tais defeitos gênicos isolados causa hiperfagia e diminui-
desvendadas, mas as causas da obesidade permanecem obscuras, re- ção do dispêndio de energia, o que sugere uma ligação fisiológica en-
fletindo em parte o fato de que a obesidade é um grupo heterogê- tre esses dois parâmetros na homeostase energética. A identificação
neo de doenças. De um lado, a fisiopatologia da obesidade parece da mutação no gene ob em camundongos geneticamente obesos (ob/
simples: um excesso crônico de aporte de nutrientes com relação ao ob) foi um grande avanço no referido campo. O camundongo ob/ob
nível de dispêndio energético. No entanto, devido à complexidade desenvolve obesidade grave, resistência à insulina e hiperfagia, além
dos sistemas neuroendócrinos e metabólicos que regulam a ingestão, de um metabolismo deficiente (ele engorda mesmo quando recebe a
o armazenamento e dispêndio de energia, é difícil quantificar todos mesma quantidade de calorias que os camundongos magros na mes-
os parâmetros relevantes (p. ex., consumo de alimentos e dispêndio ma gaiola). O produto do gene ob é o peptídio leptina, o nome que
de energia) ao longo do tempo em pacientes humanos. deriva do grego leptos, o qual significa magro. A leptina é secretada
pelas células adiposas e atua sobretudo no hipotálamo. O nível de sua
produção serve como índice das reservas adiposas de energia (Fig.
16.4). Níveis altos de leptina diminuem o consumo de alimento e au-
Fatores do complemento Hormônios
mentam o gasto de energia. Outro camundongo mutante, o db/db,
Fator D/adipsina Leptina resistente à leptina, apresenta mutação no receptor desse hormônio
Adiponectina e uma síndrome semelhante. O gene OB está presente em seres hu-
Adipócito Resistina manos onde também é expresso na gordura. Já foram descritas vá-
rias famílias com obesidade mórbida de início precoce causada por
Outros
IAP-1 Citocinas mutações que inativam a leptina ou seu receptor, o que demonstra a
Angiotensinogênio TNF- importância biológica da via da leptina em seres humanos. A obe-
RBP4 IL-6 sidade nesses indivíduos começa logo após o nascimento, é grave e
Enzimas Substratos acompanha-se de anormalidades neuroendócrinas, a mais importan-
Aromatase Ácidos graxos livres te das quais é o hipogonadismo hipogonadotrófico, que a reposição
11-HSD-1 Glicerol de leptina pode reverter no subgrupo deficiente em leptina. No mo-
Figura 16.3 Fatores liberados pelo adipócito que podem afetar os tecidos delo do camundongo, observam-se hipotireoidismo central e atraso
periféricos. IAP, inibidor do ativador do plasminogênio; TNF, fator de necrose tumo- do crescimento, alterações não tão visíveis em seres humanos com
ral; RBP4, proteína de ligação retinal 4. deficiência de leptina. Não se encontraram, até hoje, evidências de
186
Cérebro O -MSH se liga ao receptor da melanocortina do tipo 4 (MC4R),
Hipotálamo um receptor hipotalâmico importante que inibe a alimentação. As
Metabolismo de glicose e lipídios
mutações heterozigotas de perda da função nesse receptor parecem
responder por até 5% dos casos graves de obesidade. Esses cinco de-
Fome/saciedade feitos genéticos definem uma via pela qual a leptina (ao estimular a
POMC e aumentar o -MSH) restringe o consumo de alimentos e
Termogênese/sistema autônomo
limita o peso (Fig. 16.5). Os resultados de estudos de associação em
Função neuroendócrina todo o genoma para identificar loci genéticos responsáveis pela obe-
sidade na população geral até o momento são decepcionantes. Mais
de 10 loci replicados ligados á obesidade foram identificados, mas
Barreira hematencefálica
juntos são responsáveis por menos de 3% da variação interindividual
no IMC. O mais replicado desses é um gene chamado FTO, que tem
Células β
função desconhecida, mas assim como muitos dos outros candidatos
Alvos periféricos Células imunes recentemente descritos, é expressado no cérebro. Como se estima que
Outras a herdabilidade da obesidade seja de 40 a 70%, é provável que muito
mais loci tenham de ser identificados.
Além desses genes humanos de obesidade, estudos em roedo-
Estado alimentado/ res revelaram vários outros candidatos moleculares a mediadores
Leptina
obesidade hipotalâmicos da obesidade ou da magreza em seres humanos. O
gene tub codifica um peptídio hipotalâmico de função desconhe-
Adipócito cida; mutações nesse gene causam obesidade de início tardio. O
gene fat codifica a carboxipeptidase E, uma enzima processadora de
Estado de jejum
Leptina peptídios, acreditando-se que mutações nesse gene também causam
obesidade ao perturbar a produção de um ou mais neuropeptídios.
A AgRP é expressa junto com o NPY em neurônios do núcleo ar-
CAPÍTULO 16
Figura 16.4 Sistema fisiológico regulado pela leptina. Os níveis da leptina queado. A AgRP antagoniza o -MSH nos receptores de MC4, e
em elevação ou queda atuam através do hipotálamo, influenciando o apetite, o gasto sua expressão excessiva induz à obesidade. Já os camundongos com
de energia e a função endócrina, bem como por intermédio de locais periféricos,
deficiência do peptídio MCH, cuja administração induz à alimen-
como o sistema imune
tação, são magros.
Várias síndromes humanas, complexas e de herança definida,
estão associadas à obesidade (Quadro 16.2). Embora ainda genes
que mutações dos genes da leptina ou de seu receptor sejam impor- específicos tenham definição limitada atualmente, sua identificação
tantes nas formas comuns de obesidade. deve melhorar nossa compreensão das formas mais comuns de obe-
Mutações de vários outros genes podem causar obesidade gra- sidade humana. Na síndrome de Prader-Willi, um distúrbio multi-
Biologia da Obesidade
ve em seres humanos (Quadro 16.1); porém, tais síndromes são gênico do neurodesenvolvimento, a obesidade coexiste com baixa
raras. As mutações do gene que codificam a proopiomelanocortina estatura, deficiência mental, hipogonadismo hipogonadotrófico, hi-
(POMC) causam obesidade grave porque não ocorre a síntese de potonia, mãos e pés pequenos, boca em forma de peixe e hiperfagia.
-MSH, um neuropeptídio fundamental que inibe o apetite no hi- A maioria desses pacientes tem uma deleção a região cromossômica
potálamo. A ausência de POMC também causa insuficiência suprar- 15q11-13 e a expressão reduzida da proteína sinalizadora necdina
renal secundária devido à falta do hormônio adrenocorticotrófico pode ser uma causa importante de desenvolvimento neural hipotalâ-
(ACTH) bem como palidez cutânea e cabelos avermelhados pela fal- mico defeituoso. A síndrome de Bardet-Biedl (SBB) é um distúrbio
ta de a-MSH. As mutações da proenzima convertase 1 (PC-1) tam- geneticamente heterogêneo que se caracteriza por obesidade, defi-
bém causam obesidade, acreditando-se que isso se deva à inibição ciência mental, retinite pigmentosa, diabetes, malformações renais e
da síntese de -MSH a partir de seu peptídio precursor, a POMC. cardíacas, polidactilia e hipogonadismo hipogonadotrófico. Foram
187
Enzima processadora PC-1 da síndrome de Cushing (Cap. 5). Apesar disso, é comum que se pen-
se em doença de Cushing. A produção de cortisol e de metabólitos
Expressão da urinários (17OH-esteroides) pode se encontrar aumentada na obe-
Receptor Receptor do
Leptina do sinal
proopiomela-
-MSH sinal de
sidade simples. Contudo, diferentemente da síndrome de Cushing,
nocortina os níveis basais de cortisol no sangue e na urina, bem como após a
de leptina melanocortina 4
(POMC)
injeção do hormônio liberador de corticotrofina (CRH) ou ACTH
são normais; o teste de supressão em 24 horas com 1 mg de dexa-
metasona é normal em 90% dos casos. Os restantes dão resultados
AgRP Diminui normais em um teste-padrão de dexametasona em baixas doses por 2
Mutações o apetite dias. A obesidade pode estar associada à reativação local excessiva do
conhecidas no cortisol na gordura pela 11-hidroxiesteroide desidrogenase 1, enzi-
ser humano
ma que converte a cortisona inativa em cortisol.
Figura 16.5 Uma via central por meio da qual a leptina age para regular o
Hipotireoidismo É uma causa incomum de obesidade, mas deve-se
apetite e o peso corporal. A leptina sinaliza para os neurônios através da proopio-
melanocortina (POMC) no hipotálamo para induzir a aumento da produção do hormô- pensar nessa etiologia. A medição do hormônio tireoestimulante
nio estimulante dos melanócitos (-MSH), requerendo a enzima processadora PC-1 (TSH) permite excluir o hipertireoidismo facilmente. Grande parte
(proenzima convertase 1). O -MSH age como um agonista sobre os receptores de do ganho de peso que ocorre nessa deficiência hormonal se deve ao
melanocortina 4 para inibir o apetite, e o neuropeptídio AgRP (peptídio relacionado mixedema (Cap. 4).
com a proteína aguti) age como antagonista desse receptor. As mutações que cau-
sam obesidade em seres humanos estão indicadas por setas preenchidas verdes. Insulinoma Os pacientes com insulinoma costumam ganhar peso
porque comem excessivamente para evitar os sintomas da hipogli-
cemia (Cap. 20). O aumento do substrato e os altos níveis de in-
sulina fazem com que a energia seja armazenada como gordura, o
identificados pelo menos 12 loci genéticos e a maioria das proteínas que pode ser acentuado em alguns indivíduos, mas é discreto na
codificadas forma dois complexos multiproteína que estão envolvi- maioria dos casos.
dos na função ciliar e transporte intracelular baseado em microtúbu-
los. Evidências recentes sugerem que as mutações podem perturbar Craniofaringioma e outros distúrbios que envolvem o hipotálamo Seja
SEÇÃO III
o tráfego do receptor de leptina nos principais neurônios hipotalâmi- em decorrência de tumores, traumatismo ou inflamação, a disfun-
cos, causando resistência à leptina. ção dos sistemas hipotalâmicos que controlam a saciedade, a fome
e o dispêndio de energia pode resultar em graus variados de obesi-
Outras síndromes específicas associadas à obesidade dade (Cap. 2). É incomum encontrar uma base anatômica distinta
Síndrome de Cushing Os obesos podem ter obesidade central, hiper- para essas alterações. Provavelmente, disfunções sutis do hipotála-
tensão e intolerância à glicose, mas não outros estigmas específicos mo são causas mais comuns de obesidade que se pode demonstrar
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
188
com as técnicas neurorradiológicas disponíveis hoje. O hormônio com a obesidade. Trata-se da termogênese que acompanha outras
do crescimento (GH), que tem atividade lipolítica, mostra-se dimi- atividades físicas que não o exercício voluntário, como tarefas co-
nuído na obesidade e aumentado com a perda de peso. Apesar dos tidianas, movimentos aleatórios, contração muscular espontânea
níveis baixos de GH, a produção do fator de crescimento análogo e manutenção da postura. A NEAT responde por cerca de 66% do
à insulina do tipo I (IGF-I ou somatomedina) é normal, sugerindo aumento do dispêndio diário de energia induzido pelo excesso de
que a supressão do GH seja resposta que compense o aumento da alimentação. A ampla variação no armazenamento de gordura, ob-
oferta nutricional. servada em indivíduos alimentados sem excesso, pode ser prevista
pela intensidade com que a NEAT é induzida. A origem molecular e
Patogenia da obesidade comum a regulação desse fenômeno são desconhecidas.
A obesidade pode ser causada por aumento da ingestão de energia,
diminuição do dispêndio ou uma combinação de ambos. Assim, Leptina na obesidade comum
identificar a etiologia da obesidade exige medições dos dois parâ- A grande maioria dos obesos tem níveis elevados de leptina, mas
metros. Mas é difícil fazer medidas precisas e diretas da ingestão de não apresenta mutações nem na leptina nem em seu receptor. Por
energia em indivíduos em vida livre, e os obesos em particular cos- isso parecem ter uma forma funcional de resistência à leptina. Dados
tumam subestimar sua ingestão. As medições do dispêndio crônico sugerem que alguns desses indivíduos produzem menos leptina por
de energia são possíveis pelo uso de água duplamente marcada ou unidade de massa adiposa que outros, ou têm uma forma relativa de
câmaras e salas metabólicas. Em pacientes com peso e composição deficiência de leptina que predispõe à obesidade, mas isso ainda é
corporal estáveis, a ingestão de energia é igual ao dispêndio. Assim, contraditório e incompleto. O mecanismo de resistência à leptina, e
pode-se concluir que essas técnicas permitem avaliar a ingestão de a possibilidade de revertê-la com a elevação dos níveis desse hormô-
energia em indivíduos em vida livre. Os níveis de dispêndio de ener- nio ou com combinação de leptina e outros tratamentos em um sub-
gia são diferentes em obesos em períodos de ganho ou de perda de grupo de indivíduos obesos, ainda não foi elucidado. Alguns dados
peso, e nos estados pré ou pós-obesidade. Os estudos que não levam sugerem que a leptina pode ser incapaz de atravessar a barreira he-
em conta esses fenômenos são difíceis de interpretar. matencefálica à medida que os níveis sobem. Também há evidências,
O conceito de um ponto de equilíbrio do peso corporal tem sus- a partir de estudos com animais, de que inibidores da sinalização da
citado contínuo interesse. Em favor dessa ideia, existem mecanis- leptina, como SOCS3 e PTP1b, estejam implicados no mecanismo
CAPÍTULO 16
mos fisiológicos em torno de um sistema sensor no tecido adiposo de resistência.
que reflete as reservas de gordura, e um receptor, ou adipostato,
presente nos centros hipotalâmicos. Quando as reservas de gordu- ■■ CONSEQUÊNCIAS PATOLÓGICAS DA OBESIDADE
ra diminuem, o sinal do adipostato cai, e o hipotálamo responde
(Ver também Cap. 17.) A obesidade tem efeitos adversos impor-
estimulando a fome e diminuindo o dispêndio de energia. No en-
tantes sobre a saúde. Está associada a um aumento na mortalidade,
tanto, quando as reservas de gordura são abundantes, o sinal au-
elevação de 50 a 100% no risco de morte por todas as causas em
menta, e o hipotálamo responde diminuindo a fome e aumentando
comparação com os indivíduos de peso normal, principalmente por
o dispêndio de energia. A recente descoberta do gene ob e seu pro-
causas cardiovasculares. Em conjunto, a obesidade e o sobrepeso
duto, a leptina, bem como do gene db, cujo produto é o receptor da
são a segunda causa de morte passível de prevenção nos EUA, sen-
Biologia da Obesidade
lectina, fornece uma base molecular a esse conceito fisiológico (ver
anteriormente). do responsáveis por 300.000 óbitos anuais. As taxas de mortalidade
aumentam com a progressão da obesidade, principalmente quando
Qual a situação da ingestão de alimentos nos obesos? (Os obesos ela está associada a um aumento da gordura intra-abdominal (ver
comem mais que os magros?) anteriormente). A expectativa de vida de um indivíduo com obesi-
dade moderada pode diminuir 2 a 5 anos, e um homem com 20 a
Tal questão suscitou intenso debate, o que se deve em parte às difi-
30 anos de idade e IMC > 45 pode perder 13 anos de vida. Parece
culdades metodológicas inerentes à determinação da ingestão ali-
também que o efeito da obesidade sobre determinados sistemas or-
mentar. Muitos indivíduos obesos consideram que ingerem pou-
ca comida, achado muitas vezes confirmado pelos resultados de gânicos é influenciado por genes de suscetibilidade, os quais variam
questionários sobre a ingestão de alimentos. No entanto, hoje se na população.
sabe que a ingestão média de energia aumenta com a obesidade.
Resistência à insulina e diabetes melito do tipo 2
De acordo com as leis da termodinâmica, os obesos devem comer
mais que os magros em média para manter seu peso mais alto. No A hiperinsulinemia e a resistência à insulina são comuns na obesida-
entanto, é possível que alguns dos indivíduos predispostos à obesi- de. Pioram com o ganho de peso e diminuem com sua perda (Cap.
dade sejam capazes de ficar obesos sem um aumento absoluto no 18). A resistência à insulina está mais relacionada com a gordura
consumo calórico. intra-abdominal que a gordura em outras localizações. A relação
molecular entre a obesidade e a resistência à insulina na gordura,
Qual a situação do dispêndio de energia na obesidade? músculos e fígado tem sido pesquisada há muitos anos. São alguns
O dispêndio total médio diário de energia é maior entre os obesos fatores importantes: (1) a própria insulina, ao induzir à subrregu-
do que entre os magros quando medido no peso estável. No entanto, lação do receptor; (2) os ácidos graxos livres, que ficam elevados e
o dispêndio energético diminui à medida que se perde peso, o que podem bloquear a ação da insulina; (3) o acúmulo intracelular de
se deve em parte à perda de massa corporal magra e diminuição da lipídios; e (4) os vários peptídios circulantes produzidos pelos adipó-
atividade nervosa simpática. Quando atingem um peso próximo do citos, como as citocinas TNF- e IL-6, RBP4 bem como as adipoci-
normal e permanecem assim por algum tempo, (alguns) indivíduos nas adiponectina e resistina, que apresentam expressão alterada nos
obesos gastam menos energia que (alguns) indivíduos magros. Tam- adipócitos dos obesos e podem modificar a ação da insulina. Outros
bém há uma tendência, entre os que se tornaram obesos na infância, mecanismos são inflamação ligada à obesidade, como infiltração de
de ter taxas menores de dispêndio de energia do que os que perma- macrófagos nos tecidos como gordura, e indução de resposta ao es-
necem magros. tresse de retículo endoplasmático, que pode produzir resistência à
A origem fisiológica das taxas variáveis de dispêndio de ener- ação da insulina nas células. Apesar da prevalência da resistência à
gia (mantidos constantes o peso corporal e a ingestão de energia) insulina, a maioria dos obesos não manifesta diabetes, o que sugere
é praticamente desconhecida. Mutação no receptor b3-adrenérgico que o diabetes exige interação entre a resistência à insulina induzida
humano pode estar associada a um risco maior de obesidade e de pela obesidade e outros fatores, como o comprometimento da secre-
resistência à insulina em algumas populações. ção de insulina (Cap. 19). No entanto, a obesidade é um importante
Um componente da termogênese recém-descrito, denominado fator de risco para o diabetes, e até 80% dos pacientes com diabetes
termogênese da atividade fora do exercício (NEAT), foi relacionado melito do tipo 2 são obesos. A perda de peso e o exercício, ainda que
189
modestos, aumentam a sensibilidade à insulina e muitas vezes me- está associada a hipertensão. A perda de peso (10 a 20 kg) pode tra-
lhoram o controle da glicose no diabetes. zer melhora substancial, assim como a perda substancial de peso que
ocorre após cirurgias gástricas restritivas ou bariátricas. A pressão
Distúrbios da reprodução positiva contínua nas vias respiratórias tem sido usada com algum
As doenças do eixo reprodutor estão associadas à obesidade em êxito.
ambos os sexos. O hipogonadismo masculino está associado a um
aumento do tecido adiposo, que muitas vezes se distribui em uma Doença hepatobiliar
conformação mais típica de mulheres. Homens cujo peso é mais de A obesidade frequentemente é associada ao distúrbio comum doença
160% do peso corporal ideal (PCI) têm muitas vezes redução da tes- gordurosa hepática não alcoólica (NAFLD ou DHGNA). Essa in-
tosterona plasmática e da globulina de ligação aos hormônios sexuais filtração gordurosa do fígado de NAFLD ou DHGNA pode evoluir
(SHBG), e níveis de estrogênio (derivados da conversão de andro- em um subgrupo para esteatohepatite não alcoólica inflamatória
gênios suprarrenais no tecido adiposo) aumentados (Cap. 8). Pode (EHNA) e mais raramente para cirrose e carcinoma hepatocelular.
ocorrer ginecomastia, mas na maioria desses indivíduos a masculi- Observou-se que a esteatose melhora após perda de peso, secundária
nização, libido, potência e espermatogênese são normais. A testos- a dieta ou cirurgia bariátrica. O mecanismo para a associação con-
terona livre pode diminuir em homens com obesidade mórbida cujo tinua obscuro. A obesidade pode aumentar a secreção biliar de co-
peso excede 200% do PCI. lesterol, a supersaturação da bile e elevar a incidência de cálculos,
Em mulheres, a obesidade está muito associada a anormalida- sobretudo de colesterol. Em uma pessoa 50% acima do PCI tem uma
des menstruais, principalmente em mulheres com obesidade na incidência seis vezes maior de cálculos biliares sintomáticos. Para-
parte superior do corpo (Cap. 10). Achados comuns são aumento doxalmente, o jejum aumenta a supersaturação da bile ao reduzir o
na produção de androgênios, diminuição da SHBG e aumento da componente fosfolipídico. A colecistite induzida pelo jejum é uma
conversão periférica de androgênios em estrogênios. A maioria das complicação das dietas extremas.
mulheres obesas com oligomenorreia apresenta a síndrome do ová-
rio policístico (SOP), associada a anovulação e hiperandrogenismo Câncer
ovariano; 40% das mulheres com ovário policístico são obesas, e a A obesidade masculina está associada a maior mortalidade por
maioria das mulheres não obesas com ovários policísticos também câncer. Alguns tumores responsáveis são os cânceres de esôfago,
tem resistência à insulina, o que sugere que a resistência à insuli- colo, reto, pâncreas, fígado e próstata. A obesidade feminina eleva
SEÇÃO III
na, a hiperinsulinemia ou ambas podem causar ou contribuir para a mortalidade por câncer da vesícula biliar, dos ductos biliares, das
a fisiopatologia ovariana da SOP em mulheres magras e obesas. Em mamas, do endométrio, do colo uterino e dos ovários. O aumento
mulheres obesas com SOP, a perda de peso ou o tratamento com fár- da taxa de conversão da androstenediona em estrona, que ocorre
macos sensibilizantes à insulina muitas vezes normalizam a mens- no tecido adiposo de obesos, pode causar alguns desses tumores.
truação. O aumento da conversão da androstenediona em estrogê- Outras possíveis ligações mecanicistas são outros hormônios cujos
nio, mais comum em mulheres com obesidade na parte inferior do níveis estão ligados ao estado nutricional, como insulina, leptina,
corpo, pode aumentar a incidência de câncer do útero em mulheres adiponectina e IGF-1. Estimou-se recentemente que, nos EUA, a
obesas na pós-menopausa. obesidade é responsável por 14% dos cânceres em homens e 20%
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
em mulheres.
Distúrbios cardiovasculares
O estudo Framingham revelou que a obesidade foi um fator de ris- Doenças dos ossos, das articulações e da pele
co independente para a incidência durante 26 anos de doenças vas- A obesidade pode aumentar o risco de osteoartrose. Não há duvida
culares em homens e mulheres, como doença arterial coronariana de que isso se deve em parte ao traumatismo devido ao peso extra,
(DAC), acidente vascular encefálico e insuficiência cardíaca conges- mas potencialmente ligados também à ativação de vias inflamató-
tiva (ICC). A razão cintura/quadril pode ser o melhor fator preditivo rias que poderiam promover patologia sinovial. A prevalência de
desses riscos. O impacto da obesidade fica ainda mais evidente quan- gota também pode ser maior. Entre as afecções da pele associadas à
do se consideram os efeitos adicionais da hipertensão e intolerância à obesidade, encontram-se a acantose nigricans, que se manifesta por
glicose associados ao excesso de peso. O efeito da obesidade na mor- escurecimento e espessamento das dobras da pele no pescoço, nos
talidade cardiovascular em mulheres pode ser verificado com IMC de cotovelos e espaços interfalangianos dorsais. A acantose reflete a gra-
apenas 25. A obesidade, sobretudo a abdominal, está associada a um vidade da resistência à insulina subjacente e diminui com a perda de
perfil lipídico aterogênico com aumento no colesterol-lipoproteína peso. A friabilidade da pele também pode aumentar, sobretudo nas
de baixa densidade (LDL), na lipoproteína de muito baixa densidade dobras, o que aumenta o risco de infecções por leveduras e fungos.
e nos triglicerídios, além de diminuição no colesterol-lipoproteína Finalmente, a estase venosa é mais comum no obeso.
de alta densidade e nos níveis da adipocina vascular protetora adipo-
nectina (Cap. 21). A obesidade também está associada à hipertensão. BIBLIOGRAFIA
A medição da pressão arterial em obesos requer um manguito maior
Bochukova EG et al: Large, rare chromosomal deletions associated with se-
para evitar aumentos espúrios da pressão. A hipertensão induzida
vere early-onset obesity. Nature 463:666, 2010
pela obesidade também pode causar elevação da resistência vascular
Cecil JE et al: An obesity-associated FTO gene variant and increased energy
periférica e do débito cardíaco, aumento no tônus do sistema nervoso intake in children. N Engl J Med 359:2558, 2008
simpático, exacerbação da sensibilidade ao sal e retenção de sal me-
Fisher FM et al: Obesity is an FGF21 resistant state. Diabetes 59:2781, 2010
diada pela insulina; com frequência, a hipertensão melhora após uma
Froy O: Metabolism and circadian rhythms—Implications for obesity. Endo-
pequena perda ponderal. cr Rev 31:1, 2010
Misra A, Khurana L: Obesity and the metabolic syndrome in developing
Distúrbios pulmonares countries. J Clin Endocrinol Metab 93:S9, 2008
A obesidade pode estar associada a uma série de anormalidades Morton GJ et al: Central nervous system control of food intake and body
pulmonares, como a diminuição da complacência da parede torá- weight. Nature 443:289, 2006
cica, aumento no trabalho respiratório, aumento do volume-minuto Virtanen KA et al: Functional brown adipose tissue in healthy adults. N Engl
devido à maior atividade metabólica e diminuição da capacidade J Med 360:1518, 2009
pulmonar total, da capacidade residual funcional e do volume expi- Walters RG et al: A new highly penetrant form of obesity due to deletions on
ratório de reserva. A obesidade grave pode estar associada à apneia chromosome 16p11.2. Nature 463:671, 2010
obstrutiva do sono e síndrome de hipoventilação da obesidade, com Zobel DP et al: Variants near MC4R are associated with obesity and influence
respostas ventilatórias hipóxicas e hipercapneicas atenuadas. A ap- obesity-related quantitative traits in a population of middle-aged people:
neia do sono pode ser obstrutiva (mais comum), central ou mista, e Studies of 14,940 Danes. Diabetes 58:757, 2009
190
CAPÍTULO 17 a condição do peso e o risco de doença (Quadros 17.1 e 17.2). O
IMC é usado porque fornece uma estimativa da gordura corporal e
está relacionado com o risco de doença. Foram propostos limiares
baixos de IMC para o sobrepeso e a obesidade para a região asiática
Avaliação e Tratamento do Pacífico, porque esta população de peso corporal baixo parece es-
tar sob risco de apresentar anormalidades da glicose e dos lipídios.
da Obesidade O excesso de gordura abdominal, avaliado pela medida da cir-
cunferência da cintura ou pela proporção entre a cintura e os quadris,
é associado de forma independente a um maior risco de diabetes me-
Robert F. Kushner
lito e doença cardiovascular. A medição da circunferência da cintura
é um substituto do tecido adiposo visceral, devendo ser feita no plano
Mais de 66% dos adultos nos Estados Unidos são categorizados horizontal, acima da crista ilíaca (Quadro 17.3).
como tendo sobrepeso, e a prevalência da obesidade vem aumentan-
do rapidamente na maioria dos países industrializados. Crianças e Aptidão física
adolescentes também estão ficando mais obesos, o que indica que
Vários estudos prospectivos demonstraram que a aptidão física, rela-
as tendências atuais vão se acelerar com o tempo. A obesidade está
tada em questionário ou medida em um teste de esforço máximo em
associada a um maior risco de múltiplos problemas de saúde, como
esteira, é um previsor importante da taxa de mortalidade por qual-
hipertensão, diabetes tipo 2, dislipidemia, doença articular degene-
quer causa, independentemente do IMC e da composição corporal.
rativa e algumas malignidades. Assim, é importante que os médicos
Tais observações esclarecem a importância de se obter uma história
identifiquem, avaliem e tratem os pacientes com obesidade e condi-
de exercício durante o exame, bem como de enfatizar a atividade físi-
ções comórbidas associadas.
ca como uma abordagem terapêutica.
■■ AVALIAÇÃO Condições de morbidade associadas à obesidade
Os médicos deverão proceder a triagem para obesidade de todos os A avaliação das condições mórbidas concomitantes deve basear-se
CAPÍTULO 17
pacientes adultos, bem como oferecer aconselhamento intensivo e na manifestação de sintomas, nos fatores de risco e no índice de sus-
intervenções comportamentais para promover uma perda de peso peita. Deve-se solicitar um painel de lipídios em jejum [colesterol
sustentada. As cinco etapas principais na avaliação da obesidade, total, lipoproteína de baixa densidade (LDL) e lipoproteína de baixa
conforme descrita abaixo são: (1) anamnese voltada para a obesida- densidade (HDL) e níveis de triglicerídeos] de todos os pacientes,
de, (2) exame físico para determinar o grau e o tipo de obesidade, além de medir a glicemia e a pressão sanguínea. Os sintomas e doen-
(3) condições comórbidas, (4) nível de aptidão e (5) disposição do ças direta e indiretamente relacionados com obesidade constam do
paciente em alterar seu estilo de vida. Quadro 17.4. Apesar da variação individual, o número e a gravidade
das condições comórbidas específicas em geral aumentam com ní-
Anamnese voltada para a obesidade
veis maiores de obesidade. Os pacientes sobre risco absoluto muito
157 89 92 94 97 99 102 104 107 109 112 114 116 119 121 124 126 129 131 134
160 92 94 97 100 102 105 108 110 112 115 117 120 122 126 128 130 133 136 138
163 95 98 100 103 105 108 111 113 116 119 121 124 127 129 132 134 137 140 142
165 98 101 103 106 109 112 114 117 120 122 125 128 131 133 136 139 142 144 147
168 101 104 107 109 112 115 118 121 123 126 129 132 135 137 140 143 146 149 152
170 104 107 110 113 116 118 122 124 127 130 133 136 139 142 145 147 150 153 156
173 107 110 113 116 119 122 125 128 131 134 137 140 143 146 149 152 155 158 161
175 110 113 117 119 122 126 129 132 135 138 141 144 147 150 153 156 159 162 166
178 113 117 120 123 126 129 132 136 139 142 145 148 152 155 158 161 164 167 171
180 117 120 123 127 130 133 137 140 143 146 149 153 156 159 162 166 169 172 175
183 120 123 127 130 133 137 140 143 147 150 153 157 160 164 167 170 174 177 180
185 123 127 131 134 137 141 144 147 151 154 158 161 165 168 171 175 178 182 185
188 127 130 134 137 141 145 148 152 155 159 162 166 169 173 176 180 183 187 191
191 130 134 137 141 145 148 152 156 159 163 166 170 174 177 181 185 188 192 196
193 134 138 142 145 149 152 156 160 164 167 171 175 179 182 186 190 193 197 201
tratamento até certo ponto agressivo e que modalidade usar é de- aprender como e quando a energia (alimento) é consumida, como
terminada pelo risco do paciente, por suas expectativas e pelos e quando é gasta (atividade física), e como incorporar essas infor-
recursos disponíveis. O tratamento da obesidade sempre começa mações ao seu cotidiano (terapia comportamental). Mostrou-se
com uma mudança no estilo de vida e pode incluir farmacotera- que a mudança no estilo de vida resultou em perda de peso mo-
pia ou cirurgia, dependendo da categoria de risco do IMC (Qua- desta (em geral, de 3 a 5 kg) em comparação com a ausência de
dro 17.5). Uma perda de peso de 10% em seis meses constitui tratamento ou a conduta habitual.
meta inicial realista.
Tratamento dietético O foco primário da terapia dietética é re-
MODIFICAÇÃO DO ESTILO DE VIDA O tratamento da obesidade duzir o consumo global de calorias. As diretrizes do Instituto
abrange atenção para três elementos essenciais do estilo de vida: Nacional de Coração, Pulmão e Sangue (do inglês, The National
hábitos alimentares, atividade física e modificação do comporta- Heart, Lung and Blood Institute – NHLBI) recomendam iniciar o
mento. Como a obesidade é fundamentalmente uma doença de- tratamento com um déficit de calorias de 500-1.000 kcal/dia em
corrente do desequilíbrio energético, todos os pacientes precisam comparação com a alimentação habitual do paciente. Tal redução
192
QUADRO 17.2 Classificação do peso e risco de doença QUADRO 17.4 Revisão dos sistemas orgânicos relacionados
Classe da com a obesidade
IMC (kg/m2) obesidade Risco de doença
Cardiovascular Respiratório
Subpeso < 18,5 Hipertensão Dispneia
Peso saudável 18,5‑24,9 Insuficiência cardíaca congestiva Apneia do sono obstrutiva
Sobrepeso 25,0‑29,9 Aumentado Cor pulmonale Síndrome hipoventilatória
Obesidade 30,0‑34,9 I Alto Veias varicosas Síndrome de Pickwick
Obesidade 35,0‑39,9 II Muito alto Embolia pulmonar Asma
Obesidade extrema ≥ 40 III Extremamente alto Doença arterial coronariana Gastrintestinal
Fonte: Adaptado de National Institutes of Health, National Heart, Lung, and Blood Institute: Cli- Endócrino Doença do refluxo gastresofágico
nical Guidelines on the Identification, Evaluation, and Treatment of Overweight and Obesity in Síndrome metabólica Doença hepática gordurosa não
Adults. U. S. Department of Health and Human Services, Public Health Service, 1998. alcoólica
Diabetes tipo 2
Dislipidemia Colelitíase
Síndrome do ovário policístico Hérnias
QUADRO 17.3 Valores etno‑específicos para a circunferência
Musculoesquelético Câncer de colo
da cintura
Hiperuricemia e gota Geniturinário
Grupo étnico Circunferência da cintura
Imobilidade Incontinência urinária por estresse
Europeus Glomerulopatia relacionada com a
Osteoartrite (joelhos e quadris)
Homens > 94 cm obesidade
Dor nas costas
Mulheres > 80 cm Hipogonadismo (masculino)
Síndrome do túnel do carpo
Asiáticos do sul e chineses Cânceres de mama e uterino
CAPÍTULO 17
Psicológico
Homens > 90 cm Complicações da gravidez
Depressão/baixa autoestima
Mulheres > 80 cm Neurológico
Distúrbio da imagem corporal
Japoneses Acidente vascular encefálico
Estigmatização social
Homens > 85 cm Hipertensão intracraniana idiopática
Tegumento
Mulheres > 90 cm Meralgia parestética
Estrias
Etnias das Américas do Sul Usar as recomendações para os asiáticos Demência
e Central do sul até que estejam disponíveis dados Estase e pigmentação das pernas
mais específicos Linfedema
Fonte: De KGMM Alberti e col. para o IDF Epidemiology Task Force Consensus Group: Lancet
366:1059, 2005.
é compatível com a meta de perda de aproximadamente 450 g a encontrada no website www.mypyramid.gov. O Dietary Reference
1 kg por semana. Esse déficit calórico pode ser conseguido suge- Intakes for Macronutrients revisto, liberado pelo Instituto de Me-
rindo alimentos substitutos ou alternativos, como, por exemplo, dicina, recomenda 45-65% de calorias de carboidratos, 20-35% de
porções menores, comer mais frutas, legumes e verduras, mais gordura e 10-35% de proteína. As diretrizes também recomendam
cereais integrais, escolher cortes de carne e laticínios com menos um consumo diário de fibra de 38 g (homens) e 25 g (mulheres)
gordura, reduzir frituras bem como o acréscimo de outras gor- para as pessoas com mais de 50 anos de idade e 30 g (homens) e
duras e óleos, além de beber água em vez de bebidas calóricas. É 21 g (mulheres) com menos de 50 anos de idade.
importante que o aconselhamento dietético continue centrado no O controle das porções é uma das estratégias mais difíceis
paciente e as metas sejam práticas, realistas e viáveis. para os pacientes; o uso de produtos preparados previamente,
A composição dos macronutrientes da dieta irá variar de acor- como substitutos de refeições, é uma sugestão simples e conve-
do com a preferência e condição clínica do paciente. As diretrizes niente. São exemplos as entradas congeladas, bebidas enlatadas e
dietéticas de 2005 para os norte-americanos do Departamento de barras de cereais.
Agricultura dos EUA, que enfocam a promoção da saúde e redução O uso de substituições de refeições na alimentação tem leva-
dos riscos, podem ser aplicadas ao tratamento dos pacientes com do a uma perda de peso de 7-8%.
sobrepeso ou obesos. As recomendações indicadas são manter uma Uma área atual de investigação é o uso de dietas pobres em
dieta rica em cereais integrais, frutas, legumes e verduras, além de carboidrato e ricas em proteína para a perda de peso, as quais
fibras; o consumo de duas porções (180 g) de peixe rico em ácidos se baseiam no conceito de que os carboidratos são a causa pri-
graxos ômega 3 por semana; diminuir o sódio para menos de 2.300 mária de obesidade e acarretam resistência à insulina. A maioria
mg/dia; tomar três copos de leite (ou o equivalente em laticínios das dietas pobres em carboidratos (p. ex., South Beach, Zone and
desnatados) por dia; limitar o colesterol a menos de 300 mg/dia Sugar Busters!) encerra um nível de carboidratos de aproxima-
e manter o total de gordura entre 20 e 35% das calorias diárias e damente 40-46% de energia. A dieta Atkins dependendo da fase,
as gorduras saturadas em menos de 10% das calorias diárias. A contém 5-15% de carboidratos. Dietas pobres em carboidratos
aplicação dessas diretrizes a metas calóricas específicas pode ser e com alto teor proteico parecem ser mais eficazes em reduzir o
193
ALGORITMO PARA O TRATAMENTO DA OBESIDADE
Tratamento
Não
Sim
IMC
medido nos
3
últimos 2 anos?
• Medir o peso, a
4 altura e a circunferência
da cintura
• Calcular o IMC
6 IMC 30 OU {[IMC
IMC ≥ 25 OU de 26 a 29,9 OU
5 Sim 7 Sim
circunferência da cintura Avaliar os circunferência da cintura > 88 cm
> 88 cm (M) fatores de risco (M) > 102 cm (H) E dois
> 102 cm (H) ou mais fatores de risco]}
SEÇÃO III
Não
Não
14
Sim
Hist. de IMC ≥ 25? 12 O paciente Sim
quer perder
peso? 8
15 Não 13 O clínico e o paciente estabelecem
Reforço/orientação Avisar para manter metas e a estratégia para a perda de
Não
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
9
Sim Há progresso/metas
16 Verificação periódica do peso
alcançadas?
Não
11 10
Manter o aconselhamento:
Avaliar as razões
• Tratamento dietético
da falha em
• Terapia comportamental
perder peso
• Fisioterapia
Figura 17.1 Algoritmo para o tratamento. Esse algoritmo se aplica à ava- Heart, Lung, and Blood Institute: Clinical guidelines on the identification, evaluation,
liação de sobrepeso e obesidade, bem como às decisões subsequentes sobre tal and treatment of overweight and obesity in adults: The evidence report. Washington,
avaliação. Ele não reflete qualquer avaliação global inicial de outras condições que o DC, US Department of Health and Human Services, 1998.)
médico julgue necessário. IMC, índice de massa corporal; Hist., história. (De National,
Fonte: De National Heart, Lung, and Blood Institute, North American Association for the Study of Obesity (2000).
194
IMC, melhorar os fatores de risco de DAC, incluindo um aumen- de intensidade moderada por semana) é normalmente necessária
to no colesterol HDL e uma queda nos níveis de triglicerídeos e para perder e sustentar a perda de peso. Estas recomendações de
controlar a saciedade a curto prazo, quando comparadas às die- exercícios assustam um pouco a maioria dos pacientes, precisan-
tas com baixo teor de gorduras. Entretanto, após 12 meses, não do ser implementadas gradualmente. A consulta a um fisiologista
houve diferença significativa entre as dietas. Diversos estudos especializado em exercícios ou personal trainer (treinador parti-
demonstraram que a manutenção da adesão à dieta, mais do que cular) pode ser útil.
o seu tipo, parece ser o melhor indicador do prognóstico para a
perda de peso. Terapia comportamental É usada para ajudar a mudança bem
Outra abordagem dietética a ser considerada é o conceito de como reforçar os novos comportamentos alimentares e de ativi-
densidade energética, que se refere ao número de calorias (ener- dade física. As estratégias incluem técnicas de automonitoração
gia) contido em um alimento por unidade de peso. As pessoas (p. ex., um diário, verificação do peso, medição da quantidade de
tendem a ingerir um volume constante de alimento, qualquer que alimento ingerida e da atividade), controle do estresse e dos estí-
seja seu conteúdo calórico ou de macronutrientes. O acréscimo mulos (p. ex., uso de pratos menores, não comer vendo televisão
de água ou fibras a um alimento diminui sua densidade energé- ou no carro), apoio social, solução de problemas e re-estruturação
tica, por aumentar o peso sem afetar o conteúdo calórico. São cognitiva para ajudar os pacientes a desenvolverem ideias mais
exemplos de alimentos com baixa densidade energética as sopas, positivas e realistas sobre si mesmos. Ao recomendar qualquer
frutas, legumes e verduras, farinha de aveia e carnes magras. Os mudança comportamental no estilo de vida, fazer com que o
alimentos secos e os ricos em gordura, como pretzels (biscoito sal- paciente identifique o quê, quando, onde e como a mudança de
gado crocante típico da culinária alemã), queijos, gema de ovo, comportamento será feita. O paciente deve manter um registro da
batatas fritas e carne vermelha, têm alta densidade energética. modificação comportamental esperada, de modo que o progresso
Mostrou-se que as dietas que contêm alimentos com baixa den- possa ser revisto na próxima consulta. Como a implementação
sidade energética controlam a fome e resultam embaixo consumo dessas técnicas demanda tempo, em geral são ensinadas por uma
calórico bem como perda de peso. equipe auxiliar do consultório, como uma enfermeira clínica ou
Ocasionalmente, dietas muito pobres em calorias (DMPC) um nutricionista profissional.
são prescritas como uma forma de terapia dietética agressiva.
CAPÍTULO 17
O objetivo primário de uma DMPC é promover uma perda de FARMACOTERAPIA Os tratamentos farmacológicos adjuvantes
peso rápida e significativa (13-23 kg) a curto prazo em um pe- devem ser considerados no caso dos pacientes com um IMC > 30
ríodo de 3-6 meses. Essas fórmulas comerciais costumam forne- kg/m2 ou um IMC > 27 kg/m2 para aqueles que também possu-
cer 800 kcal ou menos, 50-80 g de proteína e 100% do consumo am doenças concomitantes relacionadas com a obesidade e para
diário recomendado de vitaminas e minerais. De acordo com aqueles cuja terapia dietética e atividade física não tenham tido
uma revisão da National Task Force sobre a prevenção e o tra- êxito. Quando se prescreve um medicamento antiobesidade, os
tamento da obesidade, as indicações para se iniciar uma DMPC pacientes devem estar ativamente engajados em um programa de
incluem indivíduos bem-motivados com obesidade moderada mudança do estilo de vida que forneça as estratégias e habilidades
a grave (IMC > 30), falha das abordagens mais conservadoras necessárias ao uso efetivo do fármaco, pois esse tipo de apoio au-
195
Medicações de ação periférica O orlistat (Xenical) é um deriva- ensaios de fase III e foram submetidos à aprovação pelo FDA.
do hidrogenado sintético de um inibidor da lipase de ocorrência A bupropiona e a naltrexona (Contrave), um inibidor da recap-
natural, lipostatin produzido pelo fungo Streptomyces toxytricini. tação de dopamina e norepinefrina e um antagonista do recep-
Consiste em um inibidor potente, lentamente reversível, das li- tor de opioide, respectivamente, são combinados para reduzir a
pases pancreáticas, gástricas e carboxiléster, bem como da fosfo- motivação/reforço que a comida proporciona (efeito dopamina)
lipase A2, necessárias à hidrólise da gordura dietética em ácidos e o prazer/palatabilidade de se comer (efeito opioide). Outra
graxos e monoacilgliceróis. O fármaco age nos lumens do estô- formulação de bupropiona com zonisamida (Empatic) combi-
mago e intestino delgado, ao formar uma ligação covalente com o na a bupropiona com um anticonvulsivo que possui atividade
local ativo dessas lipases. Tomado na dose terapêutica de 120 mg serotonérgica e dopaminérgica. Por fim, uma formulação de
3 vezes/dia, o orlistate bloqueia a digestão e absorção de aproxi- fentermina e topiramato (Qnexa) combina um liberador de ca-
madamente 30% da gordura dietética. Após a interrupção de sua tecolamina e um anticonvulsivo, respectivamente, que levaram
administração, as concentrações de gordura em geral voltam ao independentemente à perda de peso. O mecanismo responsá-
normal em 48-72 horas. vel pela perda de peso causada pelo topiramato é desconheci-
Vários estudos randomizados duplo-cegos controlados por do, porém acredita-se que seja realizado pela sua modulação de
placebo mostraram que, depois de um ano, o orlistate induz a receptores do ácido gama-aminobutírico (GABA), inibição da
uma perda de peso de cerca de 9-10%, comparada com uma perda anidrase carbônica e antagonismo do glutamato para reduzir
de peso de 4-6% nos grupos tratados com placebo. Como a absor- a ingestão de alimento. Em outubro de 2010, o FDA rejeitou a
ção do orlistate no trato GI é mínima (< 1%), ele não tem efeitos aplicação inicial do Qnexa como um novo fármaco, citando as-
colaterais sistêmicos. A tolerância ao orlistate está relacionada pectos clínicos em relação aos riscos teratogênicos potenciais do
com a má absorção de gordura dietética e a subsequente elimina- topiramato em mulheres de idade reprodutiva. Um fármaco adi-
ção dela nas fezes. Há relatos de efeitos adversos no trato GI em cional em investigação, a lorcaserina, um agonista do receptor
pelo menos 10% dos pacientes tratados com orlistate. Estes efei- 5-HT2C, completou os ensaios de fase III como agente isolado.
tos incluem flatulência com eliminação fecal, urgência fecal, fezes O FDA rejeitou a aplicação inicial da Lorcaserina como novo
gordurosas/oleosas e aumento da defecação. Em geral, tais efeitos fármaco, com a critica clínica de que a eficácia da perda de peso
colaterais são observados precocemente, diminuem à medida que em indivíduos com sobrepeso e obesos sem diabetes do tipo 2
os pacientes controlam o consumo de gordura e poucas vezes fa- seria marginal e com aspectos não clínicos em relação aos ade-
SEÇÃO III
zem com que os pacientes saiam dos ensaios clínicos. O muciloide nocarcinomas mamários em ratos fêmeas.
psyllium é útil no controle dos efeitos colaterais GI induzidos pelo
CIRURGIA Pode-se considerar a cirurgia bariátrica para os pa-
orlistate quando usado junto com o medicamento. As concentra-
cientes com obesidade grave (IMC ≥ 40 kg/m2) ou aqueles com
ções séricas das vitaminas lipossolúveis D e E, bem como do beta-
obesidade moderada (IMC ≥ 35 kg/m2), associadas a uma condi-
caroteno podem ficar reduzidas, sendo recomendáveis suplemen-
ção médica grave. A perda de peso cirúrgica funciona reduzindo
tos vitamínicos para prevenir deficiências potenciais. O orlistate
o consumo de calorias e, dependendo do procedimento, a absor-
foi aprovado para venda sem prescrição em 2007.
ção dos macronutrientes.
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
O sistema endocanabinoide Os receptores canabinoides e seus As cirurgias de perda de peso enquadram-se em uma de duas
ligantes endógenos foram implicados em uma variedade de fun- categorias: restritivas e restritivo-pouco absortivas (Fig. 17.2). As
ções fisiológicas, como a alimentação, a modulação da dor, o com- primeiras limitam a quantidade de alimento que o estômago con-
portamento emocional e o metabolismo periférico dos lipídios. segue manter e tornam o esvaziamento gástrico mais lento. A gas-
A Cannabis e seu principal ingrediente, o Δ9-tetraidrocanabinol troplastia com banda vertical (GVB) é o protótipo dessa categoria,
(THC), são compostos canabinoides exógenos. Dois endocana- sendo, porém, atualmente feita de forma muito limitada devido
binoides foram identificados, a anandamida e o glicerídio 2-ara- à falta de eficácia encontrada em ensaios a longo prazo. A faixa
quidonil. Foram identificados dois receptores canabinoides: o gástrica ajustável de silicone laparoscópica (BGAVL) substituiu a
CB1 (abundante no cérebro) e CB2 (presente nas células imunes). GVB como a cirurgia restritiva feita mais comumente. O primeiro
Acredita-se que o sistema endocanabinoide cerebral controle o dispositivo de faixa, a faixa lap, foi aprovado para uso nos EUA,
consumo de alimentos reforçando a motivação para encontrar e em 2001 e o segundo, a faixa REALIZE, em 2007. Diferentemente
consumir alimentos com alto valor de incentivo e regulação das dos dispositivos anteriores, o diâmetro dessas faixas é ajustável
ações de outros mediadores do apetite. O primeiro canabinoide por meio de uma conexão com um reservatório implantado sob a
seletivo antagonista do receptor CB1, o rimonabant, foi desco- pele. A injeção ou remoção de solução fisiológica no reservatório
berto em 1994. A medicação antagoniza o efeito orexígeno do apertam ou afrouxam o diâmetro interno da faixa, modificando,
THC e suprime o apetite. Vários ensaios prospectivos randomi- assim, o tamanho da abertura gástrica.
zados e controlados de grande porte demonstraram a eficácia Os três procedimentos de bypass restritivo-pouco absortivos
do rimonabant como agente para a perda de peso com melhoras combinam os elementos da restrição gástrica com os da má ab-
concomitantes na circunferência da cintura e nos fatores de risco sorção seletiva e incluem o bypass gástrico em Y de Roux (BGYR)
cardiovasculares. Entretanto, o risco aumentado de efeitos colate- bem como o desvio biliopancreático e o desvio biliopancreático
rais neurológicos e psiquiátricos – ataques, depressão, ansiedade, com derivação duodenal (DBPDO) (Fig. 17.2). O BGYR é o pro-
insônia, agressividade e pensamentos suicidas entre pacientes ex- cedimento de bypass mais comumente executado e aceito, poden-
postos randomicamente ao rimonabant – resultou em uma nor- do ser feito com incisão aberta ou por via laparoscópica.
ma contra a aprovação do fármaco pelo FDA em junho de 2007. Embora nenhum ensaio controlado recente tenha compara-
Embora estivesse disponível em 56 países em todo o mundo em
do a perda de peso após intervenções cirúrgicas e não cirúrgicas,
2008, a permissão foi oficialmente suspensa pela Agência de Me-
dados de metanálises obtidos primordialmente de estudos obser-
dicina Europeia (do inglês, European Medicines Agency – EMEA)
vacionais sugerem que a cirurgia bariátrica seja o tratamento mais
em janeiro de 2009, afirmando que os benefícios do rimonabant
efetivo para que os indivíduos com obesidade clinicamente gra-
não eram maiores que os seus riscos. É necessário o desenvolvi-
ve percam peso. Tais procedimentos costumam resultar em uma
mento de antagonistas de CB1, que não penetram no cérebro e
perda de peso corporal total de 30 a 35%, mantida em quase 60%
escolhem seletivamente o sistema endocanabinoide periférico.
dos pacientes em 5 anos. Em geral, a perda de peso média é maior
Fármacos antiobesidade em desenvolvimento Um tema emer- após procedimentos restritivo-pouco-absortivos combinados do
gente na farmacoterapia para a obesidade é o de atingir diversos que após procedimentos restritivos. Muitos dados confirmam o
pontos nas vias reguladoras que controlem o peso corporal. Vá- impacto positivo da cirurgia bariátrica sobre as condições mór-
rias combinações de tratamentos com fármacos completaram os bidas relacionadas com a obesidade, como diabetes melito, hiper-
196
A mortalidade cirúrgica em decorrência da cirurgia bariátrica
em geral é inferior a 1%, mas varia de acordo com o procedimento,
a idade do paciente e suas condições comórbidas, bem como com
a experiência da equipe cirúrgica. As complicações cirúrgicas mais
comuns consistem em estenose do estômago ou úlceras marginais
(que ocorrem em 5-15% dos pacientes), as quais se manifestam
por náuseas e vômitos prolongados após comer ou impossibilidade
de voltar a consumir uma dieta sólida. Tais complicações são tra-
tadas por dilatação endoscópica com balão e terapia de supressão
ácida, respectivamente. Para os pacientes submetidos à BGAVL,
não há anormalidades na absorção intestinal além da redução
A B
mecânica no tamanho e efluxo gástricos. Por isso, a ocorrência de
deficiências seletivas é incomum, a menos que haja desequilíbrios
nos hábitos alimentares. Em contrapartida, os procedimentos
restritivo-pouco absortivos aumentam o risco de deficiências de
micronutrientes, como a vitamina B12, ferro, folato, cálcio e vita-
mina D, de modo que os pacientes submetidos a eles requerem
suplementação desses micronutrientes pelo resto da vida.
z
x x
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Figura 17.2 Procedimentos de cirurgia bariátrica. Exemplos de intervenções
197
CAPÍTULO 18 mulheres. Na França, uma coorte de 30 a 60 anos de idade mostra
uma prevalência de menos de 10% para cada sexo, embora 17,5%
sejam acometidos na faixa etária entre 60 a 64 anos. Uma maior in-
dustrialização em todo o mundo está associada a taxas crescentes de
Síndrome Metabólica obesidade, que é um prenúncio do aumento drástico da prevalência
da síndrome metabólica, especialmente à medida que a população
envelhece. Além disto, o aumento da prevalência e gravidade da obe-
Robert H. Eckel sidade nas crianças está introduzindo características da síndrome
metabólica em uma população mais jovem.
A síndrome metabólica (síndrome X, síndrome de resistência à in- A distribuição da frequência dos cinco componentes da síndro-
sulina) consiste em um grupo de anormalidades metabólicas que me para a população dos EUA (NHANES III) é resumida na Figura
conferem aumento de risco de doença cardiovascular (DCV) e dia- 18.1. Os aumentos na circunferência abdominal predominam nas
betes melito (DM). Os critérios para a síndrome metabólica têm mulheres, enquanto os triglicerídios de jejum de mais de 150 mg/dL
evoluído desde a definição original feita pela Organização Mundial e hipertensão são mais prováveis nos homens.
de Saúde em 1998, refletindo as crescentes evidências e análise clí-
nicas por uma variedade de conferências de consenso e organiza-
■■ FATORES DE RISCO
ções profissionais. As principais características da síndrome meta-
bólica incluem obesidade central, hipertrigliceridemia, colesterol Sobrepeso/obesidade
da lipoproteína de alta densidade (HDL) baixo, hiperglicemia e Embora a primeira descrição da síndrome metabólica tenha ocorrido
hipertensão (Quadro 18.1). no início do século XX, a epidemia em todo o mundo de sobrepeso/
obesidade tem sido a motivação para o reconhecimento mais recen-
■■ EPIDEMIOLOGIA te da síndrome. A adiposidade central é uma característica essencial
A prevalência da síndrome metabólica varia em todo o da síndrome, que reflete o fato de que a prevalência da síndrome é
mundo, refletindo em parte a idade e etnicidade das po- impulsionada pela forte relação entre a circunferência abdominal
pulações estudadas e os critérios diagnósticos aplicados. e o aumento de adiposidade. Entretanto, apesar da importância da
SEÇÃO III
Em geral, a prevalência da síndrome metabólica aumenta com a ida- obesidade, os pacientes que têm peso normal também podem ser
de. A maior prevalência registrada em todo o mundo é nos norte- insulino-resistentes e ter a síndrome.
-americanos, com aproximadamente 60% de mulheres entre 45 a
49 anos de idade e 45% de homens entre 45 a 49 anos segundo o Estilo de vida sedentário
National Cholesterol Education Program e o Adult Treatment Panel A inatividade física é um preditor de eventos de DCV e taxa de mor-
III (NCEP:ATPIII). Nos EUA, a síndrome metabólica é menos co- talidade relacionada. Muitos componentes da síndrome metabólica
mum nos homens afro-americanos e mais prevalente nas mulheres estão associados a um estilo de vida sedentário, incluindo aumento
mexicano-americanas. Com base em dados da National Health and do tecido adiposo (predominantemente central), colesterol HDL re-
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
Nutrition Examination Survey (NHANES) de 1999 a 2000, a preva- duzido e uma tendência de aumento dos triglicerídios, de pressão
lência ajustada para a idade da síndrome metabólica nos adultos nos arterial elevada e de aumento da glicose naqueles que são genetica-
EUA que não tinham diabetes é de 34% para homens e 30% para mente suscetíveis. Comparados com os indivíduos que assistiram
Obesidade central: circunferência abdominal > 102 cm (H), Homens Mulheres Etnicidade
> 88 cm (M)
≥ 94 cm ≥ 80 cm Povos da Europa, África Subsaariana, Oriente e
Hipertrigliceridemia: triglicerídios ≥ 150 mg/dL ou medicação
Oriente Médio
específica
HDL‑colesterol baixo: < 40 mg/dL e < 50 mg/dL, ≥ 90 cm ≥ 80 cm Sul da Ásia, chineses e povos das Américas do Sul e
respectivamente, ou medicamento específico Central
Hipertensão: pressão arterial > 130 mm sistólica ou ≥ 85 mm
≥ 85 cm ≥ 90 cm Japoneses
diastólica ou medicação específica
Glicemia de jejum ≥ 100 mg/dL ou medicação específica ou Dois ou mais dos seguintes:
diabetes Tipo 2 previamente diagnosticado
Triglicerídios em jejum > 150 mg/dL ou medicação específica
HDL‑colesterol < 40 mg/dL e < 50 mg/dL para os homens e as mulheres, respectivamente,
ou medicação específica
Pressão arterial >130 mm sistólica ou > 85 mm diastólica, ou diagnóstico anterior ou
medicação específica
Glicemia de jejum ≥ 100 mg/dL ou diabetes tipo 2 anteriormente diagnosticado
a
Nesta análise, foram usados os seguintes limites para a circunferência abdominal: homens brancos, ≥ 94 cm; homens afro-americanos, ≥ 94 cm; homens mexicano-americanos, ≥ 90 cm; mulheres
brancas, ≥ 80 cm; mulheres afro-americanas, ≥ 80 cm; mulheres mexicano-americanas, ≥ 80 cm. Para os participantes cuja designação foi “outra raça – incluindo multirracial, foram usados os
limites anteriormente baseados em pontos de corte europeus (≥ 94 cm para os homens e ≥ 80 cm para as mulheres) e em pontos de corte sul-asiáticos (≥ 90 cm para os homens e ≥ 80 cm para as
mulheres). Para os participantes considerados “outros hispânicos”, foram usados os limiares da IDF para povos das Américas do Sul e Central.
Nota: HDL, lipoproteína de alta densidade; IDF, International Diabetes Foundation; NCEP:ATPIII, National Cholesterol Education Program, Adult Treatment Panel III.
198
60 pós-prandial, seguida da hiperinsulinemia de jejum e, finalmente,
hiperglicemia.
Prevalência na população (%) 50 Um grande contribuinte preliminar para o desenvolvimento da
resistência à insulina é uma abundância dos ácidos graxos circulan-
40
tes (Fig. 18.2). Os ácidos graxos livres (AGL) ligados à albumina
30 plasmática, são derivados predominantemente dos estoques e de tri-
glicerídios do tecido adiposo liberados pela lipase das enzimas lipo-
20 líticas. Os ácidos graxos também são produzidos a partir da lipólise
das lipoproteínas ricas em triglicerídios em tecidos por meio da li-
10 poproteína lipase (LPL). A insulina medeia tanto a antilipólise como
a estimulação da LPL no tecido adiposo. É importante salientar que
0
a inibição da lipólise no tecido adiposo é a via mais sensível de ação
Circ abdominal TG150 HDL col PA Glicose
da insulina. Assim, quando se desenvolve resistência à insulina, o
Homens Mulheres aumento da lipólise produz mais ácidos graxos, que reduzem ainda
mais o efeito antilipolítico da insulina. O excesso de ácidos graxos
Figura 18.1 Prevalência dos componentes da síndrome metabólica se-
aumenta a disponibilidade do substrato e cria resistência à insulina,
gundo NHANES III. NHANES, National Health and Nutrition Examination Survey; TG,
modificando a sinalização a jusante. Os ácidos graxos prejudicam
triglicerídios; HDL, lipoproteína de alta densidade; PA, pressão arterial. A prevalência
de glicose elevada inclui indivíduos com diabetes melito conhecido. (Criado a partir a captação de glicose mediada pela insulina e acumulam-se como
de dados da ES Ford et al.: Diabetes Care 27:2444, 2004.) triglicerídios tanto no músculo esquelético quanto no cardíaco, en-
quanto o aumento da produção de glicose e o acúmulo de triglicerí-
dios são observados no fígado.
A hipótese do estresse oxidativo fornece uma teoria unificadora
televisão ou vídeos ou usaram o computador por mais de 1 h/dia, para o envelhecimento e a predisposição à síndrome metabólica. Em
aqueles que realizaram estas mesmas atividades por mais de 4 h/dia estudos realizados em indivíduos resistentes à insulina com obesida-
apresentaram um risco duas vezes maior de síndrome metabólica. de ou diabetes tipo 2, na gênese dos pacientes com diabetes tipo 2 e
Capítulo 18
em idosos, identificou-se um defeito na fosforilação oxidativa mito-
Envelhecimento condrial que levou ao acúmulo de triglicerídios e moléculas lipídicas
A síndrome metabólica acomete 44% da população dos EUA com relacionadas no músculo. O acúmulo de lipídios no músculo está as-
mais de 50 anos de idade. Uma porcentagem maior de mulheres com sociado à resistência à insulina.
mais de 50 anos de idade apresenta a síndrome, comparada com os
homens. Observa-se que a prevalência da síndrome depende da ida- Aumento da circunferência abdominal
de na maioria das populações mundiais.
A circunferência abdominal é um importante componente dos crité-
Diabetes melito rios diagnósticos mais recentes e mais frequentemente aplicados para
a síndrome metabólica. Entretanto, medir a circunferência abdomi-
O DM está incluído nas definições de síndrome metabólica pelo
Síndrome Metabólica
nal não distingue de maneira confiável aumentos do tecido adiposo
NCEP e a International Diabetes Foundation (IDF). Estima-se que a
subcutâneo, e a gordura visceral; esta distinção requer TC ou RM.
grande maioria (aproximadamente 75%) dos pacientes com diabetes
Com aumentos no tecido adiposo visceral, os AGL derivados do teci-
tipo 2 ou com intolerância à glicose (IG) tem síndrome metabólica. A
do adiposo são direcionados para o fígado. Por outro lado, aumentos
presença da síndrome metabólica nestas populações está relacionada
na gordura subcutânea abdominal liberam produtos da lipólise na
com uma prevalência maior de IG comparada com os pacientes com
circulação sistêmica e evitam efeitos mais diretos no metabolismo
diabetes tipo 2 ou IG sem a síndrome.
hepático. Aumentos relativos no tecido adiposo visceral versus sub-
cutâneo, com o aumento da circunferência abdominal nos asiáticos e
Doença arterial coronariana
indiano-asiáticos, podem explicar a maior prevalência da síndrome
A prevalência aproximada da síndrome metabólica em pacientes nestas populações, se comparadas com os homens afro-americanos
com doença arterial coronariana (DAC) é de 50%, com uma pre- nos quais predomina a gordura subcutânea. Também é possível que a
valência de 37% em pacientes com doença da artéria coronária gordura visceral seja um marcador para o excesso de AGL pós-pran-
prematura (com 45 anos de idade ou menos), particularmente nas dial na obesidade, mas não sua origem.
mulheres. Com reabilitação cardíaca apropriada e alterações no es-
tilo de vida (p. ex., nutrição, atividade física, redução do peso e, em
Dislipidemia
alguns casos agentes farmacológicos), a prevalência da síndrome
pode ser reduzida. (Ver também o Cap. 21.) Em geral, o fluxo de AGL para o fígado está
associado a aumento da produção de lipoproteínas de muito baixa
Lipodistrofia densidade (VLDL) ricas em triglicerídios que contêm apoB. O efeito
Os distúrbios de lipodistrofia geralmente estão associados a síndro- da insulina neste processo é complexo, mas a hipertrigliceridemia é
me metabólica. Tanto as formas genéticas (p. ex., lipodistrofia congê- um excelente marcador do distúrbio de resistência à insulina.
nita de Berardinelli-Seip, lipodistrofia parcial familiar de Dunnigan) Outro distúrbio maior da lipoproteína na síndrome metabólica
quanto as adquiridas (p. ex., lipodistrofia relacionada com o HIV em é uma redução do HDL-colesterol. Esta redução é uma consequên-
pacientes tratados com terapia antirretroviral) de lipodistrofia po- cia das modificações na composição e no metabolismo do HDL.
dem dar origem a resistência grave à insulina e muitos dos compo- Em presença de hipertrigliceridemia, a redução no conteúdo de
nentes da síndrome metabólica. HDL-colesterol é uma consequência da redução do conteúdo de
colesteril éster do núcleo da lipoproteína em combinação com al-
■■ ETIOLOGIA terações mediadas pela proteína de transferência do colesteril éster
nos triglicerídios tornando essa partícula menor e mais densa. Esta
Resistência à insulina alteração na composição da lipoproteína também resulta em um
A hipótese mais aceita para descrever a fisiopatologia da síndrome aumento da depuração de HDL da circulação. As relações entre es-
metabólica é a resistência à insulina, que é causada por um defei- tas alterações no HDL e a resistência à insulina são provavelmente
to incompletamente compreendido da ação da insulina (Cap. 19). indiretas, ocorrendo pelas alterações no metabolismo da lipopro-
O início da resistência à insulina é anunciado por hiperinsulinemia teína rica em triglicerídios.
199
Hipertensão
C-II
C-III Colesterol HDL
B100 e
TG
LDL pequena e densa AGL Insulina IL-6 SNS
VLDL
Glicose
TNF-α −
IL-6 Insulina
Proteína
C-reativa −
Glicogênio
−
−
AGL CO2
−
AGL
−
Fibrinogênio
PAI-1 Adiponectina
das lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL). As anormalidades lipídicas/li- insulina e lipólise dos estoques de tecido adiposo em AGL circulante. A IL-6 e outras
poproteicas associadas consistem em reduções do HDL-colesterol e um aumento citocinas também aumentam a produção hepática de glicose, produção de VLDL
da LDL-colesterol. Os AGL também reduzem a sensibilidade à insulina no músculo, pelo fígado e resistência à insulina no músculo. As citocinas e AGL aumentam ainda
inibindo a captação de glicose mediada pela insulina. Os defeitos associados consis- a produção hepática de fibrinogênio e a dos adipócitos do inibidor 1 do ativador do
tem em redução da glicose a partir do glicogênio e aumento do acúmulo de lipídios plasminogênio (PAI-1), resultando em um estado protrombótico. Níveis mais altos de
nos triglicerídios (TG). Aumentos na glicose circulante e, até certa extensão, dos AGL citocinas circulantes também estimulam a produção hepática de proteína C-reativa.
tornam maior a secreção pancreática de insulina, o que resulta em hiperinsulinemia, A produção reduzida da citocina anti-inflamatória e citocina adiponectina sensível à
a qual pode resultar em aumento da reabsorção de sódio e da atividade do siste- insulina também está associada à síndrome metabólica. (Reimpresso de Eckel et al.,
ma nervoso simpático (SNS), bem como contribuir para a hipertensão, ocorrendo o com autorização da Elsevier.)
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
Capítulo 18
Doença cardiovascular O risco relativo para DCV de início recente
em pacientes com a síndrome metabólica, na ausência de diabetes, Exames laboratoriais
fica em média entre 1,5 e 3 vezes. Entretanto, em um acompanha-
O lipidograma e a glicemia de jejum são necessários para determinar
mento de 8 anos de homens e mulheres de meia-idade no Framin-
se há a presença da síndrome metabólica. A mensuração dos biomar-
gham Off-Spring Study (FOS), o risco atribuível à população, para
cadores adicionais associados à resistência à insulina pode ser indivi-
os pacientes com a síndrome metabólica, de desenvolver DCV foi
dualizada. Estes exames podem incluir a apo B, proteína C-reativa de
de 34% nos homens e apenas 16% nas mulheres. No mesmo estudo,
alta sensibilidade, fibrinogênio, ácido úrico, microalbuminúria e exa-
tanto a síndrome metabólica quanto o diabetes foram preditores de
me da função hepática. Deve-se realizar um estudo do sono caso haja
AVE isquêmico com maior risco para os pacientes com a síndrome
a presença de sintomas de AOS. Se houver suspeita de SOP baseada
metabólica do que aqueles com diabetes isoladamente (19 versus
Síndrome Metabólica
nas manifestações clínicas e anovulação, deverão ser medidos a tes-
7%), particularmente nas mulheres (27 versus 5%). Os pacientes com
tosterona, hormônio luteinizante e hormônio folículo-estimulante.
a síndrome metabólica também apresentam maior risco de doença
vascular periférica.
Diabetes Tipo 2 De modo geral, o risco para diabetes tipo 2 em pa- TRATAMENTO Síndrome metabólica
cientes com síndrome metabólica é aumentado 3 a 5 vezes. No acom-
panhamento de 8 anos, do estudo FOS, de homens e mulheres de ESTILO DE VIDA (Ver também o Cap. 17.) A obesidade é o prin-
meia-idade, o risco atribuível à população para o desenvolvimento de cipal elemento da síndrome metabólica. Assim, a redução do
diabetes tipo 2 foi de 62% nos homens e 47% nas mulheres. peso é o objetivo primário. Com a redução do peso, a melhora
na sensibilidade à insulina frequentemente é acompanhada de
Outros distúrbios associados modificações favoráveis em muitos componentes da síndrome
Além das características especificamente associadas à síndrome me- metabólica. Em geral, as recomendações para a perda de peso
tabólica, a resistência à insulina é acompanhada de outras alterações incluem uma combinação de restrição calórica, aumento da ati-
metabólicas, como aumentos na apo B e C III, ácido úrico, fatores vidade física e modificação do comportamento. Para a redução
protrombóticos (fibrinogênio, inibidor 1 do ativador do plasmino- do peso, a restrição calórica é o componente mais importante,
gênio), viscosidade sanguínea, dimetilarginina assimétrica, homo- enquanto os aumentos na atividade física são importantes para a
cisteína, leucograma, citocinas proinflamatórias, proteína C-reativa, manutenção da perda de peso. Algumas das evidências sugerem
microalbuminúria, doença hepática gordurosa não alcoólica (DHG- que a adição da prática de exercícios à restrição calórica pode
NA) e/ou esteato-hepatite não alcoólica (EHNA), síndrome do ová- promover uma perda relativamente maior da gordura visceral. A
rio policístico (SOP) e apneia obstrutiva do sono (AOS).
tendência para readquirir o peso após a redução bem-sucedida
Doença hepática gordurosa não alcoólica O fígado gorduroso é re- do peso enfatiza a necessidade de mudanças comportamentais
lativamente comum. Entretanto, na EHNA tanto o acúmulo de tri- de longa duração.
glicerídios quanto a inflamação coexistem. A EHNA está presente
Dieta Antes de prescrever uma dieta para a perda de peso, é im-
hoje em 2 a 3% da população nos EUA e outros países ocidentais. Na
medida em que a prevalência do sobrepeso/obesidade e da síndrome portante enfatizar ser necessário um longo tempo para um pa-
metabólica aumenta, a EHNA pode tornar-se uma das muitas causas ciente atingir uma expansão da massa corporal; assim, a correção
mais comuns de doença hepática de estágio final e carcinoma hepa- não precisa ocorrer rapidamente. Com base em aproximadamen-
tocelular. te 3.500 kcal = 0,5 kg de gordura, uma restrição de aproximada-
mente 500 kcal diárias equipara-se a uma redução de peso de 0,5
Hiperuricemia A hiperuricemia reflete os defeitos na ação da insu- kg por semana. As dietas com restrição de carboidratos promo-
lina na reabsorção tubular renal do ácido úrico, enquanto o aumen- vem uma perda de peso inicial rápida. Entretanto, após 1 ano
to na dimetilarginina assimétrica, um inibidor endógeno do óxido a quantidade de redução de peso em geral não muda. Assim, a
nítrico sintetase, relaciona-se com a disfunção endotelial. A micro- adesão a uma dieta é mais importante do que a escolha do tipo
albuminúria também pode ser causada por alterações do endotélio de dieta. Além disto, dietas ricas em gordura saturada devem ser
decorrentes de um estado de resistência à insulina.
201
evitadas sobretudo para os pacientes com risco de DCV. Portanto, e/ou miopatia. O inibidor da absorção do colesterol ezetimiba é
a boa qualidade da dieta – isto é, rica em frutas, vegetais, grãos in- bem-tolerado, devendo ser uma segunda escolha. O ezetimiba
tegrais, carnes magras de aves e peixe – deve ser estimulada para reduz o LDL-colesterol em 15 a 20%. Os sequestrantes dos áci-
fornecer o benefício de saúde global máximo. dos biliares e colestipol são mais eficazes do que o ezetimeba,
mas têm de ser usados com cautela em pacientes com a síndrome
Atividade física Antes de recomendar atividade física aos pa-
metabólica, porque podem aumentar os triglicerídios. Em geral,
cientes com a síndrome metabólica, é importante assegurar que
os sequestrantes da bile não devem ser administrados quando os
este aumento de atividade não cause risco. Alguns pacientes de
triglicerídios em jejum forem de mais de 200 mg/dL. Os efeitos
alto risco devem submeter-se a avaliação cardiovascular comple-
colaterais consistem em sintomas gastrintestinais (distúrbios do
ta antes de iniciar um programa de exercícios. Para um partici-
paladar, distensão abdominal, eructação, constipação, irritação
pante inativo, aumentos graduais na atividade física devem ser
anal). O ácido nicotínico tem modesta capacidade de redução do
incentivados, visando aumentar a adesão e evitar lesões. Embora
LDL (menos de 20%). Os fibratos são mais bem-empregados para
os aumentos na atividade física possam levar a modesta redução
reduzir o LDL-colesterol, quando tanto o LDL-colesterol como os
de peso, 60 a 90 minutos diários de atividade são necessários
triglicerídios estão elevados. O fenofibrato pode ser mais eficaz
para atingir este objetivo. Mas, mesmo que um adulto com so-
do que a genfibrozila neste grupo.
brepeso ou obeso seja incapaz de atingir tal nível de atividade,
ainda assim obtêm um benefício de saúde significativo de pelo TRIGLICERÍDIOS O NCEP-ATP III concentrou-se mais no não
menos 30 minutos de atividade diária de intensidade moderada. LDL-colesterol que nos triglicerídios. Entretanto, recomenda-se
O valor calórico de 30 minutos de uma variedade de atividades um valor de triglicerídio em jejum de menos de 150 mg/dL. Em
pode ser encontrado em http://www.americanheart.org/presenter. geral, a resposta dos triglicerídios de jejum relaciona-se com a
jhtml?identifier=3040364. É importante salientar que várias ati- quantidade de redução de peso atingida. Uma redução de peso
vidades rotineiras – como jardinagem, caminhada e limpeza da de mais de 10% é necessária para baixar os triglicerídios de jejum.
casa –, requerem gasto calórico moderado. Assim, a atividade Um fibrato (genfibrozila ou fenofibratos) é o fármaco de es-
física não precisa ser definida somente em termos de exercícios colha para reduzir os triglicerídios de jejum, que atingem uma
formais, como corrida, natação ou tênis. diminuição de 35 a 50%. A administração concomitante com
Obesidade (Ver também o Cap. 17.) Em alguns pacientes com
fármacos metabolizados pelo sistema 3A4 do citocromo P450
SEÇÃO III
síndrome metabólica, as opções de tratamento precisam estender- (incluindo algumas estatinas) aumenta grandemente o risco de
-se além da intervenção no estilo de vida. Fármacos para a perda miopatia. Nestes casos, o fenofibrato pode ser preferível à genfi-
de peso encontram-se em duas classes: inibidores do apetite e ini- brozila. No Veterans Affairs HDL Intervention Trial (VA-HIT), a
bidores da absorção. Os inibidores do apetite aprovados pela U.S. genfibrozila foi administrada em homens com DCV conhecida e
Food and Drug Administration incluem fentermina (apenas para níveis de HDL-colesterol de menos de 40 mg/dL. Um evento de
uso a curto prazo, 3 meses) e sibutramina. O orlistat inibe a ab- doença arterial coronariana e benefício na taxa de mortalidade
sorção de gordura em aproximadamente 30%, sendo moderada- foram experimentados predominantemente em homens com hi-
mente eficaz se comparado com o placebo (aproximadamente 5% perinsulinemia e/ou diabetes, sendo que muitos deles foram iden-
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
de perda de peso). Mostrou reduzir a incidência de diabetes tipo tificados, retrospectivamente, como tendo a síndrome metabóli-
2, um efeito especialmente evidente em pacientes com IG basal. ca. É importante notar que ter reduzido triglicerídios no VA-HIT
A cirurgia bariátrica é uma opção para os pacientes com a não apresentou benefício. Embora os níveis de LDL-colesterol
síndrome metabólica que têm um índice de massa corporal (IMC) não tenham mudado, uma redução no número de partículas LDL
de mais de 40 kg/m2 ou mais de 35 kg/m2 tendo comorbidades. O correlacionou-se com o benefício. Apesar de vários experimentos
bypass gástrico resulta em drástica redução do peso e melhora das clínicos adicionais terem sido realizados, não houve evidências
manifestações da síndrome metabólica. Já foi realizado um estudo claras de que os fibratos reduzem o risco de DCV como conse-
sobre benefício de sobrevida. quência da redução dos triglicerídios.
Outros fármacos que reduzem os triglicerídios são as esta-
LDL-COLESTEROL (Ver também o Cap. 21.) O fundamento do tinas, ácido nicotínico e altas doses de ácidos graxos ômega 3.
NCEP-ATP III para desenvolver critérios para a síndrome me- Quando se escolhe uma estatina com este propósito, a dose tem
tabólica foi o de ir além do LDL-colesterol, visando identificar e de ser alta para as estatinas “menos potentes” (lovastatina, pra-
reduzir o risco de DCV. A hipótese do painel foi de que as metas vastatina, fluvastatina) ou intermediária para as estatinas “mais
para o LDL-colesterol já haviam sido atingidas, e crescentes evi- potentes” (sinvastatina, atorvastatina, rosuvastatina). O efeito do
dências sustentam uma redução linear dos eventos de DCV com ácido nicotínico nos triglicerídios em jejum está relacionado com
a progressiva redução do LDL-colesterol. Para os pacientes com a a dose, sendo menor que o dos fibratos (aproximadamente 20 a
síndrome metabólica e diabetes, o LDL-colesterol deve ser reduzi- 40%). Nos pacientes com a síndrome metabólica e diabetes, o áci-
do para menos de 100 mg/dL e talvez até mais, em pacientes com do nicotínico pode aumentar a glicemia de jejum. As preparações
história de DCV. Para os pacientes com a síndrome metabólica de ácido graxo ômega 3 que incluem altas doses de ácido docosa-
sem diabetes, o escore de risco de Framingham pode prever um exaenoico e ácido eicosapentaenoico (aproximadamente 3,0 a 4,5
risco de 10 anos para DCV que excede 20%. Nestes indivíduos, g/dia) reduzem os triglicerídios de jejum em aproximadamente
o LDL-colesterol deve ser reduzido para menos de 100 mg/dL. 40%. Não ocorre nenhuma interação com os fibratos ou estati-
Contudo, com um risco de 10 anos de menos de 20%, o LDL- nas, sendo o principal efeito colateral a eructação com sabor de
-colesterol desejado é menor que 130 mg/dL. peixe, o que pode ser parcialmente bloqueado pela ingestão do
Dietas com restrição de gorduras saturadas (menos de 7% de nutracêutico após congelamento. Experimentos clínicos do ácido
calorias), gorduras trans (o menos possível) e colesterol (menos nicotínico ou altas doses de ácidos graxos ômega 3 em pacientes
de 200 mg/dia) devem ser aplicadas de maneira agressiva. Se o com a síndrome metabólica não foram relatados.
LDL-colesterol continuar acima da meta, será necessária uma
intervenção farmacológica. As estatinas (inibidores da HMG- HDL-COLESTEROL Além da redução do peso, há muito poucos
-CoA redutase), que produzem uma redução de 20 a 60% de LDL- compostos modificadores de lipídios que aumentam o HDL-
-colesterol, geralmente são a primeira escolha para intervenção -colesterol. As estatinas, fibratos e sequestrantes dos ácidos bi-
medicamentosa. É importante salientar que, para cada duplicação liares apresentam efeitos modestos (5 a 10%) e não há efeito no
da dose da estatina, há apenas uma redução adicional de apro- HDL-colesterol com a ezetimiba ou ácidos graxos ômega 3. O
ximadamente 6% do LDL-colesterol. Os efeitos colaterais são ácido nicotínico é o único fármaco atualmente disponível com
raros, consistindo em um aumento das transaminases hepáticas propriedades de elevação do HDL-colesterol previsíveis. A res-
202
posta está relacionada com a dose e pode aumentar o HDL-co- sensibilidade à insulina. Pelo fato de a resistência à insulina ser o
lesterol em aproximadamente 30% acima da linha de base. Há mecanismo fisiopatológico primário para a síndrome metabólica,
poucas evidências atualmente de que a elevação do HDL tenha os fármacos representativos nestas classes reduzem sua prevalên-
um benefício nos eventos de DCV independente da redução do cia. Tanto a metformina quanto as TZD aumentam a ação da in-
LDL-colesterol, particularmente em pacientes com a síndrome sulina no fígado e suprimem a produção endógena de glicose. As
metabólica. TZD, mas não a metformina, também melhoram a captação de
glicose mediada pela insulina no músculo e tecido adiposo. Os
PRESSÃO ARTERIAL A relação direta entre a pressão arterial e a
benefícios de ambos os fármacos também foram observados em
taxa de mortalidade por todas as causas foi bem-estabelecida, in-
pacientes com DHGNA e SOP, mostrando reduzir os marcadores
cluindo os pacientes com hipertensão (> de 140/90) versus os com
da inflamação e LDL pequena densa.
pré-hipertensão (> de 120/80, porém < de 140/90) versus os indi-
víduos com pressão arterial normal (< de 120/80). Nos pacientes
com a síndrome metabólica sem diabetes, a melhor escolha para
o primeiro anti-hipertensivo geralmente deve ser um inibidor da BIBLIOGRAFIA
enzima de conversão da angiotensina (ECA) ou um bloqueador Alberti KG et al: Harmonizing the metabolic syndrome: A joint interim sta-
do receptor da angiotensina II, pois estas duas classes de fárma- tement of the International Diabetes Federation Task Force on Epidemio-
cos parecem reduzir a incidência de diabetes tipo 2 de início re- logy and Prevention; National Heart, Lung, and Blood Institute; American
cente. Em todos os pacientes com hipertensão, deve-se defender Heart Association; World Heart Federation; International Atherosclerosis
Society; and International Association for the Study of Obesity. Circula-
uma dieta com restrição de sódio, rica em frutas e vegetais e la-
tion 120:1640, 2009
ticínios com baixo teor de gordura. O monitoramento domésti-
Cornier MA et al: The metabolic syndrome. Endocr Rev 29:777, 2008
co da pressão arterial pode ajudar a manter um bom controle da
Eckel RH et al: The metabolic syndrome. Lancet 365:1415, 2005
pressão arterial.
Ford ES: Prevalence of the metabolic syndrome defined by the International
ALTERAÇÃO NA GLICEMIA EM JEJUM (Ver também o Cap. 19.) Em Diabetes Federation among adults in the U.S. Diabetes Care 28:2745, 2005
pacientes com a síndrome metabólica e diabetes tipo 2, o contro- Grundy SM et al: Diagnosis and management of the metabolic syndrome. An
le glicêmico agressivo pode modificar, de maneira favorável, os American Heart Association/National Heart, Lung, and Blood Institute
Capítulo 18
triglicerídios de jejum e/ou HDL-colesterol. Nos pacientes com scientific statement. Circulation 112:2735, 2005
AGJ sem diagnóstico de diabetes, uma intervenção no estilo de ——— : Metabolic syndrome: Connecting and reconciling cardiovascular and
vida que inclua redução do peso, restrição dietética de gordura e diabetes worlds. J Am Coll Cardiol 47:1093, 2006
aumento da atividade física mostra reduzir a incidência de dia- Stewart PM et al: Selective inhibitors of 11beta-hydroxysteroid dehydroge-
betes tipo 2. A metformina também mostra reduzir a incidência nase type 1 for patients with metabolic syndrome: Is the target liver, fat, or
both? Diabetes 58:14, 2009
de diabetes, embora o efeito seja menor do que o observado com
intervenção no estilo de vida. Valle-Gottlieb MG et al: Associations among metabolic syndrome, ische-
mia, inflammatory, oxidatives, and lipids biomarkers. J Clin Endocrinol
RESISTÊNCIA À INSULINA (Ver também o Cap. 19.) Várias classes Metab 95:586, 2010
Síndrome Metabólica
de fármacos [biguanidas, tiazolidinedionas (TZD)] aumentam a Zimmet P et al: The metabolic syndrome: Progress towards one definition
for an epidemic of our time. Nat Clin Pract Endocrinol Metab 4:239, 2008
203
CAPÍTULO 19 Tolerância
Pré-diabetes*
Glicose em jejum
Hiperglicemia
Diabetes melito
Insulina Insulina
comprometida Não necessária necessária
CLASSIFICAÇÃO 2 podem retornar à categoria de tolerância à glicose diminuída, com perda de peso,
no DM gestacional, o diabetes pode reverter para a tolerância à glicose diminuída ou
O DM é classificado tendo como base o processo patogênico que re-
até mesmo para uma tolerância normal à glicose após o parto. A glicose plasmática
sulta em hiperglicemia, em oposição aos critérios precedentes, como em jejum (GPJ), a glicose plasmática (GP) de 2 h após uma carga de glicose e a
a idade por ocasião do início ou o tipo de terapia (Fig. 19.1). As A1C para as diferentes categorias de tolerância à glicose, são mostradas na parte
duas principais categorias de DM são designadas tipo 1 e tipo 2 inferior da figura. Esses valores não se aplicam ao DM gestacional. A Organização
(Quadro 19.1). Ambos os tipos de diabetes são precedidos por uma Mundial da Saúde utiliza uma GPJ de 110-125 mg/dL para a categoria de pré-
fase de homeostasia anormal da glicose à medida que os processos -diabetes. Alguns tipos de DM podem ou não necessitar de insulina para a sobrevida.
patogênicos progridem. O DM tipo 1 representa o resultado de uma *Alguns empregam o termo “risco aumentado de diabetes” (ADA) ou “hiperglicemia
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
deficiência completa ou quase total de insulina. O DM tipo 2 é um intermediária” (OMS) em lugar de “pré-diabetes”. (Adaptada da American Diabetes
grupo heterogêneo de distúrbios caracterizados por graus variáveis Association: Diabetes Care: 30S4, 2007.)
de resistência à insulina, menor secreção de insulina e maior produ-
ção de glicose. Defeitos genéticos e metabólicos distintos na ação e/
ou secreção da insulina dão origem ao fenótipo comum da hipergli-
cemia no DM tipo 2 e comportam importantes implicações terapêu- herança autossômica dominante, início precoce da hiperglicemia
ticas potenciais agora que estão disponíveis agentes farmacológicos (habitualmente, antes dos 25 anos), e deterioração da secreção de
cujos alvos são desarranjos metabólicos específicos. O DM tipo 2 é insulina (abordados adiante). As mutações no receptor da insulina
precedido por um período de homeostasia anormal da glicose clas- causam um grupo de distúrbios raros caracterizados por acentuada
sificado como glicose em jejum alterada (GJA) ou tolerância dimi- resistência à insulina.
nuída à glicose (TDG). O DM pode resultar de doença exócrina pancreática quando a
Duas características da atual classificação do DM divergem das maioria das ilhotas pancreáticas é destruída. É importante conside-
classificações precedentes. Primeiramente, as expressões diabetes rar o DM relacionado à fibrose cística nessa população de pacientes.
melito dependente de insulina (DMID) e diabetes melito não depen- Os hormônios que antagonizam a ação da insulina também podem
dente de insulina (DMNID) tornaram-se obsoletas. Sabendo-se que resultar em DM. Assim sendo, com bastante frequência, o DM é uma
muitos indivíduos com DM tipo 2 eventualmente necessitarão de característica de endocrinopatias como a acromegalia e doença de
um tratamento insulínico para o controle da glicemia, o uso da ex- Cushing. As infecções virais foram implicadas na destruição das
pressão DMNID gerou considerável confusão. Uma segunda dife- ilhotas pancreáticas, mas constituem uma causa extremamente rara
rença é que a idade não é um critério no sistema de classificação. de DM. Uma forma de início agudo do diabetes tipo 1, denominada
Apesar de o DM tipo 1 manifestar-se mais comumente antes dos diabetes fulminante, foi observada no Japão e pode estar relacionada
30 anos de idade, um processo autoimune destrutivo das células com uma infecção viral das ilhotas.
pode instalar-se em qualquer idade. Estima-se que entre 5 e 10%
dos indivíduos que desenvolvem DM após os 30 anos de idade terão ■■ DIABETES MELITO GESTACIONAL (DMG)
DM tipo 1. Embora o DM tipo 2 se instale mais tipicamente em A intolerância à glicose que se desenvolve durante a gestação é clas-
uma idade mais avançada, ele hoje está sendo diagnosticado com sificada como diabetes gestacional. A resistência à insulina está re-
maior frequência em crianças e adultos jovens, particularmente em lacionada com as alterações metabólicas do final da gestação, e as
adolescentes obesos. maiores demandas de insulina podem dar origem a uma TDG ou
diabetes. O DMG ocorre em 7% (faixa de 2 a 10%) das gestações
■■ OUTROS TIPOS DE DM nos EUA; a maioria das mulheres reverte para uma tolerância à gli-
Outras etiologias de DM incluem defeitos genéticos específicos na cose normal depois do parto, porém corre um risco substancial (35
secreção ou ação da insulina, anormalidades metabólicas que preju- a 60%) de vir a desenvolver DM nos próximos 10 a 20 anos. Na
dicam a secreção de insulina, anormalidades mitocondriais e inúme- atualidade, os International Diabetes and Pregnancy Study Groups
ras condições que prejudicam a tolerância à glicose (Quadro 19.1). recomendam que o diabetes diagnosticado na consulta inicial do
O diabetes do jovem com início na maturidade (MODY, de maturity pré-natal seja classificado como diabetes “franco”, e não como dia-
onset diabetes of the young) é um subtipo de DM caracterizado por betes gestacional.
204
dos Árabes Unidos, Arábia Saudita, República de Maurício, Bahrain,
QUADRO 19.1 Classificação etiológica do diabetes melito Reunion, Kuwait, Oman, Tonga, Malásia – por ordem descendente;
Fig. 19.2). Em sua mais recente estimativa para os EUA (2010), os
I. Diabetes tipo 1 (destruição das células beta, dando origem
Centers for Disease Control and Prevention (CDC) estimaram que
habitualmente a uma deficiência absoluta de insulina)
25,8 milhões de pessoas, ou 8,3% da população, tinham diabetes (cer-
A. De mediação imune ca de 27% dos indivíduos com diabetes não haviam sido diagnosti-
B. Idiopático cados). Aproximadamente 1,6 milhão de indivíduos (com mais de 20
II. Diabetes tipo 2 (pode variar predominantemente desde uma anos) haviam sido recém-diagnosticados com diabetes em 2010. O
resistência à insulina com deficiência relativa de insulina até um DM aumenta com a idade. Em 2010, a prevalência de DM nos EUA
defeito predominantemente secretório da insulina com resistência à era estimada como sendo de 0,2% naqueles com menos de 20 anos
insulina) de idade e de 11,3% naqueles com mais de 20 anos de idade. Nos
III. Outros tipos específicos de diabetes indivíduos com mais de 65 anos, a prevalência de DM foi de 26,9%. A
A. Defeitos genéticos da função das células beta caracterizados por prevalência é semelhante em homens e mulheres através de todas as
mutações em: faixas etárias (11,8% e 10,8%, respectivamente, nos indivíduos com
1. Fator de transcrição nuclear dos hepatócitos (HNF) 4 (MODY 1) mais 20 anos de idade). Em âmbito mundial, as estimativas projetam
que, em 2030, o maior número de indivíduos com diabetes terá de 45
2. Glicoquinase (MODY 2)
a 64 anos de idade.
3. HNF‑1 (MODY 3) Existe uma considerável variação geográfica na incidência de
4. Fator promotor da insulina 1 (IPF‑1; MODY 4) DM tanto do tipo 1 quanto do tipo 2. A Escandinávia revela a mais
5. HNF‑1 (MODY 5) alta incidência de DM tipo 1 (p. ex., na Finlândia a incidência é de
57,4/100.000 por ano). A Costa do Pacífico demonstra uma taxa
6. NeuroD1 (MODY 6)
muito mais baixa de DM tipo 1(no Japão e na China, a incidência é
7. DNA mitocondrial de 0,6 a 2,4/100.000 por ano); a Europa do Norte e os EUA têm uma
8. Subunidades do canal de potássio sensível ao ATP taxa intermediária (8 a 20/100.000 por ano). Admite-se que grande
9. Proinsulina ou insulina parte do maior risco de DM tipo 1 reflita a frequência do antígeno
Capítulo 19
B. Defeitos genéticos na ação da insulina leucocitário humano (HLA) de alto risco entre os grupos étnicos de
1. Resistência à insulina tipo A
diferentes localizações geográficas. A prevalência do DM tipo 2 e de
seu precursor, a TDG, é mais alta em certas ilhas do Pacífico e no
2. Leprechaunismo
Oriente Médio e intermediária em países como a Índia e os EUA. É
3. Síndrome de Rabson‑Mendenhall provável que essa variabilidade seja decorrente de fatores genéticos,
4. Síndromes lipodistróficas comportamentais e ambientais. A prevalência de DM também varia
C. Doenças do pâncreas exócrino – pancreatite, pancreatectomia, entre diferentes populações étnicas em um determinado país. Por
neoplasia, fibrose cística, hemocromatose, pancreatopatia exemplo, os CDC estimaram que a prevalência de DM ajustada para
fibrocalculosa, mutações da carboxil éster lipase a idade nos Estados Unidos (idade superior a 20 anos; 2007 a 2009)
era de 7,1% em brancos não hispânicos, de 7,5% em norte-america-
Diabetes Melito
D. Endocrinopatias – acromegalia, síndrome de Cushing,
glucagonoma, feocromocitoma, hipertireoidismo, nos de origem asiática, de 11,8% em hispânicos e 12,6% em negros
somatostatinoma, aldosteronoma não hispânicos. Não se dispõe de estatísticas comparáveis para in-
E. Induzido por fármacos ou substâncias químicas – glicocorticoides, divíduos que pertencem aos grupos étnicos dos índios americanos,
vacor (um rodenticida), pentamidina, ácido nicotínico, diazóxido, nativos do Alasca ou das Ilhas do Pacífico, porém a prevalência pro-
agonistas ‑adrenérgicos, tiazidas, hidantoínas, asparaginase, vavelmente ultrapassa aquela observada em brancos não hispânicos.
‑interferon, inibidores da protease, antipsicóticos (atípicos e O início do DM tipo 2, ocorre, em média, em uma idade mais preco-
outros), epinefrina ce nos outros grupos étnicos diferentes dos brancos não hispânicos.
F. Infecções – rubéola congênita, citomegalovírus, vírus coxsackie Na Ásia, a prevalência do diabetes está aumentando rapidamente, e
G. Formas incomuns de diabetes de mediação imune – síndrome da o fenótipo diabético parece ser diferente daquele dos Estados Unidos
do “homem rígido”, anticorpos antirreceptor de insulina e da Europa – início com um IMC mais baixo e em uma idade mais
precoce, maior adiposidade visceral e redução da capacidade secre-
H. Outras síndromes genéticas ocasionalmente associadas ao
diabetes – síndrome de Wolfram, síndrome de Down, síndrome
tora da insulina.
de Klinefelter, síndrome de Turner, ataxia de Friedreich, coreia O diabetes é a principal causa de mortalidade, porém vários es-
de Huntington, síndrome de Laurence‑Moon‑Biedl, distrofia tudos indicam que essa enfermidade provavelmente é sub-relatada
miotônica, porfiria, síndrome de Prader‑Willi como causa de morte. Nos EUA, o diabetes foi listado como a sétima
IV. Diabetes melito gestacional (DMG) principal causa de morte em 2007; uma estimativa recente sugere que
o diabetes foi a quinta principal causa de morte em todo o mundo e
Nota: MODY, maturity onset of diabetes of the young (diabetes do jovem com início na matu- que foi responsável por quase 4 milhões de mortes em 2010 (6,8% das
ridade). mortes foram atribuídos ao diabetes em âmbito mundial).
Fonte: Adaptado da American Diabetes Association: Diabetes Care: 34:S11, 2011.
DIAGNÓSTICO
EPIDEMIOLOGIA A tolerância à glicose é classificada em três grandes categorias: ho-
A prevalência mundial da DM aumentou drasticamente no meostasia normal da glicose, diabetes melito e comprometimento da
transcorrer das últimas duas décadas, desde aproximada- homeostasia da glicose. A tolerância à glicose pode ser determinada
mente 30 milhões de casos em 1985 para 285 milhões em com o uso da glicose plasmática em jejum (GPJ), com a resposta a
2010. Com base nas tendências atuais, a International Diabetes Fede- uma carga de glicose oral ou a hemoglobina A1C (A1C). Uma GPJ
ration estima que 438 milhões de indivíduos terão diabetes por volta de < 5,6 mmol/L (100 mg/dL), uma glicose plasmática < 140 mg/dL
do ano 2030 (Fig. 19.2). Apesar de a prevalência do DM tanto tipo 1 (11,1 mmol/L) após uma carga de glicose oral e uma A1C < 5,6% são
quanto tipo 2 estar aumentando em todo o mundo, a prevalência do consideradas para definir a tolerancia à glicose normal. O Interna-
DM tipo 2 está subindo muito mais rapidamente, devido, presumi- tional Expert Committee, com membros nomeados pela American
velmente, à obesidade crescente, aos níveis de atividade reduzidos à Diabetes Association, pela European Association for the Study of
medida que os países se tornam mais industrializados e ao envelhe- Diabetes e pela International Diabetes Federation, elaboraram crité-
cimento da população. Em 2010, a prevalência do diabetes variou de rios diagnósticos para o DM (Quadro 19.2) com base nas seguintes
11,6 a 30,9% nos 10 países com a maior prevalência (Naurua, Emira- premissas: (1) a resposta à estimulação com glicose oral (TOTG –
205
Europa tegoria. Os critérios atuais
2010: 50 milhões para o diagnóstico de DM
2030: 66 milhões ressaltam que a A1C ou a
GPJ constituem os testes
América do Norte e Caribe mais confiáveis e conve-
2010: 37 milhões Oriente Médio e África do Norte nientes para identificar o
2030: 53 milhões 2010: 27 milhões
2030: 52 milhões
DM em indivíduos assin-
Pacífico Ocidental tomáticos. O teste de tole-
2010: 77 milhões rância à glicose oral, ape-
Sudeste da Ásia 2030: 113 milhões sar de ainda ser um meio
África 2010: 59 milhões válido para estabelecer o
2010: 12 milhões 2030: 101 milhões
diagnóstico de DM, não
2030: 24 milhões
é frequentemente usado
< 4% como parte da assistência
4-5% América Central e do Sul clínica de rotina.
5-7% 2010: 18 milhões O diagnóstico de
7-9% 2030: 30 milhões
9-12% DM comporta profundas
> 12% implicações para o indi-
Figura 19.2 Prevalência mundial do diabetes melito. Prevalência comparativa (%) das estimativas do diabetes (20-79 aos) 2010.
víduo tanto do ponto de
(Utilizada, com autorização, do IDF Diabetes Atlas, the International Diabetes Federation, 2009.) vista médico quanto do
financeiro. Por conse-
guinte, as anormalidades
nos testes de triagem para
teste oral de tolerância à glicose) e a A1C diferem entre os indivíduos diabetes devem ser repetidas antes de estabelecer um diagnóstico
e (2) o DM é definido como o nível de glicemia no qual ocorrem definitivo de DM, a não ser quando estão presentes distúrbios me-
complicações específicas do diabetes, e não como desvios em relação tabólicos agudos ou uma acentuada elevação da glicose plasmática
SEÇÃO III
a uma média de base populacional. Por exemplo, a prevalência de re- (Quadro 19.2). Esses critérios também permitem que o diagnóstico
tinopatia em nativos americanos (população de índios Pima) começa de DM seja revogado em situações em que a intolerância à glicose se
a aumentar com uma GPJ > 6,4 mmol/L (116 mg/dL) (Fig. 19.3). normaliza.
Uma GPJ ≥ 7 mmol/L (126 mg/dL), uma glicose > 11,1 mmol/L
(200 mg/dL) 2 h após uma carga de glicose oral ou uma A1C ≥ 6,5% ■■ TRIAGEM
justificam o diagnóstico de DM (Quadro 19.2). Uma concentração O uso generalizado da GPJ ou da A1C como teste de triagem para o
plasmática de glicose obtida de modo aleatório de ≥ 11,1 mmol/L DM tipo 2 é recomendado porque: (1) muitos indivíduos que pre-
(200 mg/dL), acompanhada de sintomas clássicos de DM (poliúria, enchem os atuais critérios para DM são assintomáticos e não estão
polidipsia, perda de peso), também é suficiente para o diagnóstico de cientes de que sofrem desse distúrbio, (2) os estudos epidemiológicos
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
DM (Quadro 19.2). sugerem que o DM tipo 2 pode estar presente por até uma década
A homeostasia anormal da glicose (Fig. 19.1) é definida por (1) antes de ser feito o diagnóstico, (3) alguns indivíduos com DM tipo
GJA de 5,6 a 6,9 mmol/L (100 a 125 mg/dL), que é definida como 2 apresentam uma ou mais complicações específicas do diabetes na
GFA (observe que a Organização Mundial da Saúde utiliza uma GPJ época em que é feito seu diagnóstico e, (4) o tratamento do DM tipo
de 6,1 a 6,9 mmol/L (110 a 125 mg/dL); (2) níveis plasmáticos de gli- 2 pode alterar favoravelmente a história natural do DM. A ADA re-
cose entre 7,8 e 11 mmol/L (140 e 199 mg/dL) após uma carga de gli- comenda a triagem em todos os indivíduos acima de 45 anos a cada
cose oral, que é denominada tolerância diminuída à glicose (TDG); 3 anos e a triagem de indivíduos em uma idade mais jovem quando
ou (3) A1C de 5,7 a 6,4%. Uma A1C de 5,7 a 6,4%, GJA e TDG não eles têm sobrepeso [índice de massa corporal (IMC)] > 25 kg/m2] e
identificam os mesmos indivíduos, porém os indivíduos em todos os
três grupos correm maior risco de progredir para o diabetes tipo 2 e
apresentam risco aumentado de doença cardiovascular. A
GPJ
Alguns utilizam o termo “pré-diabetes”, “risco aumentado de dia- 15
betes” (ADA) ou “hiperglicemia intermediária” (OMS) para essa ca- GP de 2 h
A1C
Retinopatia (%)
10
206
litador da glicose (Fig. 19.4). A fosforilação da glicose pela glicoqui-
QUADRO 19.3 Fatores de risco para o diabetes melito tipo 2 nase é a etapa limitante do ritmo que controla a secreção de insulina
regulada pela glicose. O metabolismo adicional de glicose-6-fosfato
História familiar de diabetes (isto é, progenitor ou irmão com diabetes tipo 2)
através da glicólise gera ATP, que inibe a atividade de um canal do
Obesidade (IMC ≥25 kg/m2) +
K sensível ao ATP. Esse canal consiste em duas proteínas separa-
Inatividade física das: uma é o local de fixação para certos hipoglicemiantes orais (p.
Raça/etnicidade (p.ex., afro‑americano, latino, nativo americano, ex., sulfonilureias, meglitinidas); a outra é uma proteína que retifica
+ +
asiático‑americano, nativo das Ilhas do Pacífico) internamente o canal K (Kir6.2). A inibição desse canal K induz
Previamente identificado com GJA, TDG ou A1C de 5,7 a 6,4% a despolarização das membranas das células , o que abre os canais
de cálcio que dependem da voltagem (dando origem a um influxo
História de DMG ou de parto de um lactente com peso de >4 kg
de cálcio) e estimula a secreção de insulina. Os perfis secretórios da
Hipertensão (pressão arterial ≥140/90 mm Hg) insulina revelam um padrão pulsátil de liberação hormonal, com
Nível de HDL‑colesterol <35 mg/dL (0,90 mmol/L) e/ou nível de triglicerídios pequenas explosões secretórias ocorrendo a cada 10 minutos, so-
>250 mg/dL (2,82 mmol/L) brepondo-se às oscilações de maior amplitude de aproximadamente
Síndrome do ovário policístico ou acanthosis nigricans 80-150 minutos. As incretinas são liberadas pelas células neuroen-
História de doença cardiovascular dócrinas do trato gastrintestinal após a ingestão de alimentos e am-
plificam a secreção de insulina estimulada por glicose bem como
Abreviações: IMC, índice de massa corporal; DMG, diabetes melito gestacional; HDL, lipopro- suprimem a secreção de glucagon. O peptídio 1 semelhante ao glu-
teína de alta densidade; GJA, glicose de jejum alterada; TDG, tolerância diminuída à glicose.
cagon (GLP-1), que é a incretina mais potente, é liberado pelas célu-
Fonte: Adaptado da American Diabetes Association, 2011.
las L no intestino delgado e estimula a secreção de insulina somente
quando a glicose sanguínea está acima do nível de jejum. Análogos
das incretinas estão sendo usados para aumentar a secreção endó-
gena de insulina (ver adiante).
se têm um fator de risco adicional para diabetes (Quadro 19.3). Ao
contrário do DM tipo 2, um longo período assintomático de hiper- ■■ AÇÃO
glicemia é raro antes de ser feito o diagnóstico de DM tipo 1. Inú-
Capítulo 19
Depois que a insulina é secretada e lançada no sistema venoso por-
meros marcadores imunológicos para DM tipo 1 estão se tornando
tal, cerca de 50% são removidos e degradados pelo fígado. A insulina
disponíveis (abordados adiante), porém sua utilização sistemática é
que não é extraída penetra na circulação sistêmica, onde se une aos
desaconselhada enquanto se espera pela identificação de interven-
receptores nos locais-alvo. A ligação da insulina ao seu receptor es-
ções clinicamente benéficas para os indivíduos que correm um alto
timula a atividade intrínseca da tirosinoquinase, acarretando a auto-
risco de vir a desenvolver DM tipo 1.
-fosforilação do receptor e o recrutamento das moléculas sinaliza-
doras intracelulares, tais como os substratos do receptor de insulina
BIOSSÍNTESE, SECREÇÃO E AÇÃO DA INSULINA (IRS) (Fig. 19.5). Os IRS e outras proteínas adaptadoras iniciam uma
■■ BIOSSÍNTESE complexa cascata de reações de fosforilação e de desfosforilação, re-
Diabetes Melito
sultando nos efeitos metabólicos e mitogênicos generalizados da in-
A insulina é produzida nas células beta das ilhotas pancreáticas, sen-
sulina. Como exemplo, a ativação da via fosfatidilinositol-3’-quinase
do sintetizada inicialmente como um polipeptídio precursor com
(PI-3-quinase) estimula a translocação de um transportador facili-
uma única cadeia de 86 aminoácidos, a pré-proinsulina. O proces-
samento proteolítico subsequente remove o peptídio do sinal ami-
noterminal, dando origem à proinsulina, a qual está estruturalmente
relacionada com os fatores I e II de crescimento semelhante a insuli-
Canal de Ca2+ dependente
na, que se une fracamente ao receptor da insulina. A clivagem de um
de voltagem Ca2+
fragmento interno com 31 resíduos e sua separação da proinsulina K+
geram o peptídio C e as cadeias A (21 aminoácidos) e B (30 ami- Canal de K+
sensível ao Despolarização
noácidos) da insulina, que estão conectadas por ligações dissulfeto. ATP
SUR Incretinas
A molécula madura de insulina e o peptídio C são armazenados jun-
Ca2+
tos e cossecretados pelos grânulos secretórios das células . Como + cAMP
o peptídio C é depurado mais lentamente que a insulina, constitui ATP/ADP Receptores
um marcador útil de secreção da insulina e torna possível a discri- Mitocôndrias de incretina
minação das fontes endógenas e exógenas de insulina na avaliação da
Fatores de
hipoglicemia (Caps. 20 e 22). As células pancreáticas cossecretam Piruvato
transcrição das +
o peptídio amiloide das ilhotas (IAPP) ou amilina, um polipeptídio ilhotas
Glicose-6-fosfato
com 37 aminoácidos, juntamente com a insulina. O papel do IAPP Glicoquinase
na fisiologia normal não está totalmente definido, porém constitui o Glicose
principal componente das fibrilas amiloides encontradas nas ilhotas Núcleo Insulina
GLUT Grânulos Peptídio C
de pacientes com diabetes tipo 2 e, um análogo é utilizado ocasional- secretórios IAPP
mente no tratamento do DM do tipo 1 e do tipo 2. A insulina huma-
Glicose
na é produzida pela tecnologia do DNA recombinante; as alterações
estruturais em um ou mais resíduos de aminoácidos modificam suas
características físicas e farmacológicas (ver adiante).
Figura 19.4 Mecanismos de secreção de insulina estimulada pela glicose
■■ SECREÇÃO e anormalidades no diabetes. A glicose e outros nutrientes regulam a secreção
de insulina pela célula beta pancreática. A glicose é transportada pelo transportador
A glicose é o principal regulador da secreção de insulina pelas de glicose (GLUT1 nos humanos, GLUT2 em roedores); o metabolismo subsequente
células pancreáticas, porém os aminoácidos, as cetonas, vários da glicose pela célula beta altera a atividade dos canais iônicos, levando à secreção
nutrientes, os peptídios gastrintestinais e os neurotransmissores de insulina. O receptor SUR é o local de ligação de alguns fármacos que atuam como
também influenciam a secreção de insulina. Os níveis de glicose > secretagogos da insulina. As mutações nos eventos ou nas proteínas sublinhados
3,9 mmol/L (70 mg/dL) estimulam a síntese de insulina, principal- constituem uma causa de diabetes juvenil na maturidade (MODY) ou de outras for-
mente por acelerarem a translação e o processamento das proteínas. mas de diabetes. SUR, receptor de sulfonilureia; ATP, trifosfato de adenosina; ADP,
A estimulação da secreção de insulina pela glicose começa com seu difosfato de adenosina; cAMP, monofosfato de adenosina cíclico. IAPP, polipeptídio
transporte para o interior da célula beta por um transportador faci- amiloide das ilhotas ou amilina.
207
Insulina tipo 1 é mostrado esquematicamente
como uma função da massa de células
Glicose
Receptor
na Fig. 19.6. Os indivíduos com uma
Membrana plasmática GLUT4 suscetibilidade genética possuem uma
de insulina
massa normal de células por ocasião
P P do nascimento, mas começam a perder
Cbl Translocação
GLUT4 essas células em virtude da destruição
Glicose
CAP autoimune que ocorre ao longo de me-
Hexoquinase II
P P ses a anos. Admite-se que esse processo
Shc Proteínas IRS
autoimune seja desencadeado por um
Glicose-6-
-fosfato estímulo infeccioso ou ambiental e sus-
p85 tentado por uma molécula específica da
PI-3-quinase
p110
célula . Na maioria dos casos, marca-
Metabolismo/armazenamento
dores imunológicos aparecem depois
do evento desencadeante, porém antes
Crescimento Síntese de Síntese de Transporte
de o diabetes se tornar clinicamente
celular proteínas glicogênio da glicose óbvio. A seguir, a massa de células
começa a diminuir, e a secreção de in-
Figura 19.5 Via de transdução de sinal da insulina no músculo esquelético. O receptor da insulina possui
sulina declina progressivamente, apesar
atividade intrínseca de tirosinoquinase e interage com proteínas dos substratos do receptor de insulina (IRS e Shc).
Várias proteínas “de atracagem” ligam-se a essas proteínas celulares e iniciam as ações metabólicas da insulina [GrB- de ser mantida uma tolerância normal
2, SOS, SHP-2, p110, e fosfatidilinositol-3’-quinase (PI-3-quinase)]. A insulina aumenta o transporte da glicose através à glicose. O ritmo de declínio da massa
da PI-3-quinase e da via Cbl, que promove a translocação das vesículas intracelulares que contêm o transportador de de células varia amplamente entre os
glicose GLUT4 até a membrana plasmática. indivíduos, com alguns pacientes pro-
gredindo rapidamente para diabetes
clínico e outros evoluindo mais len-
tador da glicose (p. ex., GLUT4) para a superfície celular, um evento tamente. As características do diabetes só se tornam evidentes de-
SEÇÃO III
que é de primordial importância para a captação da glicose pelo mús- pois que a maioria das células já foi destruída (70 a 80%). Nesse
culo esquelético e pela gordura. A ativação de outras vias sinalizado- ponto, existem células funcionantes residuais, mas seu número é
ras do receptor de insulina induz a síntese de glicogênio, a síntese de insuficiente para manter a tolerância à glicose. Os eventos que in-
proteínas, a lipogênese e a regulação de vários genes nas células que duzem a transição da intolerância à glicose para o diabetes franco
respondem à insulina. estão associados à frequência a maiores demandas de insulina, como
A homeostasia da glicose reflete um equilíbrio entre a produção poderia ocorrer durante infecções ou na puberdade. Após a manifes-
hepática de glicose e a captação e utilização periférica da glicose. A tação clínica inicial do DM tipo 1, pode seguir-se uma fase de “lua
insulina é o regulador mais importante desse equilíbrio metabólico, de mel” durante a qual o controle glicêmico é conseguido com doses
porém o influxo neural, os sinais metabólicos e outros hormônios
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
100
da liberação de insulina
to dos carboidratos e a síntese de gorduras e proteínas. A maior parte Diabetes franco
da glicose pós-prandial é utilizada pelo músculo esquelético, sendo
um efeito da captação de glicose estimulada pela insulina. Outros
tecidos, mais particularmente o cérebro, utilizam a glicose de uma
maneira que independe da insulina. 50
208
duração produzem uma pequena quantidade de insulina (refletida lula T CD8+. A destruição das ilhotas é mediada por linfócitos T e
pela produção de peptídio C), enquanto outros apresentam células não pelos autoanticorpos insulares, pois esses anticorpos em geral
positivas para insulina no pâncreas à necrópsia. não reagem com a superfície celular das células insulares e não são
capazes de transferir o DM para os animais. A supressão do processo
CONSIDERAÇÕES GENÉTICAS autoimune por ocasião do diagnóstico de diabetes torna mais lento o
A suscetibilidade ao DM tipo 1 envolve múltiplos genes. declínio da destruição das células , porém a segurança dessas inter-
A concordância do DM tipo 1 em gêmeos idênticos va- venções é desconhecida.
ria entre 40 e 60%, indicando que fatores modificadores As moléculas das ilhotas pancreáticas que funcionam como alvo
adicionais provavelmente participam para determinar se para o processo autoimune incluem insulina, ácido glutâmico des-
o diabetes irá instalar-se. O principal gene de suscetibi- carboxilase (GAD, a enzima biossintética para o neurotransmissor
lidade ao DM tipo 1 fica localizado na região HLA no cromossomo GABA), ICA-512/IA-2 (homologia com tirosina fosfatases) e um
6. Os polimorfismos no complexo HLA são responsáveis por 40 a transportador de zinco específico da célula beta (ZnT-8). A maio-
50% do risco genético para o surgimento de DM tipo 1. Essa região ria dos autoantígenos não é específica da célula beta, o que levanta a
contém genes que codificam as moléculas do complexo maior de his- questão de como essas células são seletivamente destruídas. As teo-
tocompatibilidade (MHC) da classe II, que apresentam o antígeno às rias atuais apontam para o início de um processo autoimune dirigido
células T auxiliares e, dessa forma, participam do desencadeamento para uma única molécula da célula , que a seguir se propaga para
da resposta imune. A capacidade das moléculas MHC classe II de outras moléculas das ilhotas à medida que o processo imune destrói
apresentarem o antígeno depende da composição de aminoácidos de as células e cria uma série de autoantígenos secundários. As células
seus locais para a fixação do antígeno. As substituições de aminoáci- dos indivíduos que desenvolvem DM tipo 1 não diferem das célu-
dos podem influenciar a especificidade da resposta imune por alte- las dos indivíduos normais, pois as ilhotas transplantadas de um
rar a afinidade de fixação de diferentes antígenos para as moléculas gêmeo geneticamente idêntico são destruídas por uma recidiva do
classe II. processo autoimune do DM tipo 1.
A maioria dos indivíduos com DM tipo 1 possui o haplótipo
HLA DR3 e/ou DR4. Os aperfeiçoamentos na genotipagem dos Marcadores imunológicos
loci HLA mostraram que os haplótipos DQA1*0301, DQB1*0302 Os autoanticorpos contra as células das ilhotas (ICA) são uma com-
Capítulo 19
e DQB1*0201 estão fortemente associados ao DM tipo 1. Esses ha- binação de diferentes anticorpos dirigidos contra moléculas das ilho-
plótipos estão presentes em 40% das crianças com DM tipo 1, em tas pancreáticas, tais como GAD, insulina, IA-2/ICA-512 e ZnT-8, e
comparação com 2% da população norte-americana normal. No en- funcionam como marcador do processo autoimune do DM tipo 1. Os
tanto, a maioria dos indivíduos com haplótipos predisponentes não ensaios para autoanticorpos dirigidos a GAD-65 estão disponíveis no
desenvolve diabetes. comércio. Os testes para ICA podem ser úteis na classificação do DM
Além das associações do MHC da classe II, estudos de associação tipo 1 como sendo realmente tipo 1 e na identificação dos indivíduos
do genoma identificaram pelo menos 20 loci genéticos diferentes que que não são diabéticos e que correm risco de vir a desenvolver DM
contribuem para a suscetibilidade ao DM tipo 1 (polimorfismos na tipo 1. Os ICA estão presentes na maioria dos indivíduos (superior a
região promotora do gene da insulina, o gene CTLA-4, o receptor 85%) diagnosticados com DM tipo 1 de início recente, em uma mi-
Diabetes Melito
da interleucina 2, CTLA4, e PTPN22, etc.). Existem também genes noria significativa de indivíduos com DM tipo 2 diagnosticado re-
que conferem proteção contra o surgimento da doença. O haplótipo centemente (5 a 10%) e, ocasionalmente, nos indivíduos com DMG
DQA1*0102, DQB1*602 é extremamente raro nos indivíduos com (inferior a 5%). Os ICA estão presentes em 3 a 4% dos parentes de
DM tipo 1 (menos de 1%) e parece proporcionar proteção em relação primeiro grau dos indivíduos com DM tipo 1. Em combinação com
ao DM tipo 1. a secreção prejudicada de insulina após o teste de tolerância à glicose
O risco de vir a desenvolver DM tipo 1 é 10 vezes maior nos pa- IV, eles permitem prever um risco superior a 50% de desenvolver DM
rentes de indivíduos com a doença, porém esse risco é relativamente tipo 1 em 5 anos. Atualmente, a mensuração dos ICA em indivíduos
baixo: 3 a 4% se o progenitor sofre de diabetes tipo 1 e de 5 a 15% em que não são diabéticos constitui um instrumento de pesquisa, pois
um irmão (dependendo de quais haplótipos HLA são compartilha- nenhum tratamento foi aprovado para prevenir a ocorrência ou a
dos). Consequentemente, a maioria dos indivíduos com DM tipo 1 progressão para DM tipo 1. Ensaios clínicos estão testando interven-
não tem um parente de primeiro grau com esse distúrbio. ções para retardar a velocidade de destruição das células beta.
209
alto risco de vir a desenvolver DM tipo 1 não conseguiu prevenir sua
ocorrência.
Nos pacientes com diabetes tipo 1 de início recente, foi demons-
trado que o tratamento com anticorpos monoclonais antiCD3, com 1.000
Secreção de insulina
uma vacina GAD e anticorpo monoclonal antilinfócito B retarda a
velocidade de declínio dos níveis de peptídio C. Trata-se de uma área
(pmol/min)
de intensa pesquisa clínica.
■■ DM TIPO 2 B
A resistência a insulina e a secreção anormal de insulina são essen- TNG
C
ciais para o surgimento do DM tipo 2. Apesar de o defeito primá- 500
TDG A
rio ser controverso, a maioria dos estudos apoia a opinião de que D
a resistência à insulina precede um defeito na secreção de insulina, DM tipo 2
mas que o diabetes se instala somente quando a secreção de insulina 0
torna-se inadequada. O DM tipo 2 tende a abranger uma variedade 0 50 100
de distúrbios com o fenótipo comum de hiperglicemia. A maior parte Sensibilidade à insulina
Valor M (µmol/min/kg)
de nossa compreensão atual (e discussão adiante) da fisiopatologia
e genética baseia-se em estudos de indivíduos de origem europeia. Figura 19.7 Alterações metabólicas durante o desenvolvimento do diabe-
Fica cada vez mais evidente que o DM em outros grupos étnicos tes melito (DM) tipo 2. A secreção de insulina e a sensibilidade à insulina estão
(asiáticos, africanos e latino-americanos) possui uma fisiopatologia relacionadas, e à medida que um indivíduo torna-se mais resistente à insulina (ao
diferente, mas que ainda não foi definida. Nesses grupos, é comum deslocar-se do ponto A para o ponto B), a secreção de insulina aumenta. A incapa-
observar um DM sujeito a cetose (indivíduo frequentemente obeso) cidade de realizar uma compensação pelo aumento da secreção de insulina resulta
inicialmente em tolerância à glicose comprometida (TDG; ponto C) e, finalmente, em
ou resistente à cetose (frequentemente magro).
DM tipo 2 (ponto D). (Adaptada de SE Kahn: J Clin Endocrinol Metab 86:4047, 2001;
RN Bergman, M Ader: Trends Endocrinol Metab 11:351, 2000.) TNG, tolerância nor-
CONSIDERAÇÕES GENÉTICAS
mal à glicose.
O DM tipo 2 tem um poderoso componente genético.
SEÇÃO III
210
sulina (p. ex., aqueles que controlam o crescimento e a diferenciação pode dar origem a uma esteatose hepática não alcoólica e a provas de
celulares utilizando a via da proteinoquinase ativada por mitógenos). função hepáticas anormais. Isto também é responsável pela dislipide-
Consequentemente, a hiperinsulinemia pode exacerbar a ação da in- mia observada no DM tipo 2 (triglicerídios elevados, lipoproteína de
sulina por meio dessas vias, acelerando potencialmente as condições alta densidade [HDL] reduzida e maior número de pequenas partí-
relacionadas com o diabetes, tais como aterosclerose. culas densas de lipoproteína de baixa densidade [LDL]).
A obesidade que acompanha o DM tipo 2, particularmente na
localização central ou visceral é considerada como parte do processo Síndromes de resistência à insulina
patogênico. A maior massa de adipócitos dá origem a maiores níveis A condição de resistência à insulina engloba um amplo espectro de
de ácidos graxos livres circulantes e de outros produtos das células distúrbios, com a hiperglicemia representando um dos aspectos mais
adiposas (Cap. 16). Por exemplo, os adipócitos secretam inúmeros prontamente diagnosticado. A síndrome metabólica, a síndrome de re-
produtos biológicos (ácidos graxos livres não esterificados, proteína sistência à insulina, ou síndrome X são termos usados para descrever
4 fixadora do retinol, leptina, TNF-, resistina e adiponectina). Além uma quantidade de desarranjos metabólicos que inclui resistência à
de regularem o peso corporal, o apetite e o dispêndio de energia, as insulina, hipertensão, dislipidemia (HDL diminuídas e triglicerídios
adipocinas também modulam a sensibilidade à insulina. A maior elevados), obesidade central ou visceral, diabetes tipo 2 ou TDG/
produção de ácidos graxos livres e de algumas adipocinas pode acar- GJA, e doença cardiovascular acelerada. Essa síndrome é abordada
retar resistência à insulina no músculo esquelético e no fígado. Por no Cap. 18.
exemplo, os ácidos graxos livres prejudicam a utilização de glicose no Várias formas relativamente raras de resistência acentuada à in-
músculo esquelético, promovem a produção de glicose pelo fígado sulina incluem aspectos do DM tipo 2 ou TDG (Quadro 19.1). As
e afetam a função da célula . Em contrapartida, a produção pelos mutações no receptor de insulina que interferem na ligação ou na
adipócitos de adiponectina, um peptídio sensibilizador da insulina, é transdução de sinais constituem uma causa rara de resistência à in-
reduzida na obesidade e isso pode contribuir para a resistência hepá- sulina. A acanthosis nigricans e sinais de hiperandrogenismo (hirsu-
tica à insulina. Os produtos dos adipócitos e as adipocinas produzem tismo, acne e oligomenorreia em mulheres) também são caracterís-
também um estado inflamatório e podem explicar por que certos ticas físicas comuns. Duas síndromes distintas de resistência grave à
marcadores da inflamação, tais como a IL-6 e a proteína C-reativa, insulina já foram descritas em adultos: (1) tipo A, que afeta mulheres
estão com frequência elevados no DM tipo 2. Além disso, foram en- jovens e se caracteriza por acentuada hiperinsulinemia, obesidade e
contradas células inflamatórias infiltrando o tecido adiposo. A ini- características de hiperandrogenismo, e (2) tipo B, que afeta mulhe-
Capítulo 19
bição das vias sinalizadoras inflamatórias, tais como a via do fator res de meia-idade e se caracteriza por acentuada hiperinsulinemia,
nuclear B (NFB), parece reduzir a resistência à insulina e melhorar características de hiperandrogenismo e distúrbios autoimunes. Os
a hiperglicemia em modelos animais. indivíduos com a síndrome de resistência à insulina tipo A têm um
defeito ainda não definido na via sinalizadora da insulina; os indiví-
Comprometimento da secreção de insulina A secreção de insulina e duos com a síndrome de resistência à insulina tipo B têm auto-anti-
a sensibilidade à insulina estão interrelacionadas (Fig. 19.7). No DM corpos dirigidos ao receptor da insulina. Esses autoanticorpos recep-
tipo 2, inicialmente a secreção de insulina aumenta em resposta à tores podem bloquear a ligação da insulina ou estimular o receptor
resistência à insulina a fim de manter uma tolerância normal à gli- da insulina, dando origem a uma hipoglicemia intermitente.
cose. Inicialmente, o defeito secretório da insulina é leve e acomete A síndrome do ovário policístico (SOP) é um distúrbio comum
seletivamente a secreção de insulina estimulada pela glicose. A res-
Diabetes Melito
que afeta as mulheres pré-menopáusicas e que se caracteriza por
posta a outros secretagogos diferentes da glicose, como a arginina, anovulação crônica e hiperandrogenismo (Cap. 10). A resistência à
é preservada. As anormalidades no processamento da proinsulina insulina é observada em um subgrupo significativo de mulheres com
refletem-se por um aumento da secreção de proinsulina no diabetes SOP, e o distúrbio eleva substancialmente o risco de DM tipo 2, inde-
tipo 2. Eventualmente, o defeito secretório da insulina progride para pendentemente dos efeitos da obesidade.
um estado de secreção inadequada de insulina.
As razões para o declínio da capacidade secretória de insulina no Prevenção
DM tipo 2 são obscuras. A conjectura é que um segundo defeito gené- O DM tipo 2 é precedido por um período de TDG ou de GJA, e di-
tico – que se sobrepõe à resistência à insulina – resulta em falência das versas modificações no estilo de vida bem como agentes farmacoló-
células beta. A massa de células beta está diminuída em aproximada- gicos previnem ou retardam o início do DM. O Diabetes Prevention
mente 50% nos indivíduos portadores de diabetes tipo 2 de longa du- Program (DPP) demonstrou que mudanças intensivas no estilo de
ração. O polipeptídio amiloide das ilhotas ou amilina é co-secretado vida (dieta e exercício por 30 min/dia, 5x/semana) nos indivíduos
pela célula beta e forma o depósito fibrilar amiloide encontrado nas com TGD preveniam ou retardavam o surgimento de DM tipo 2 em
ilhotas de indivíduos com DM tipo 2 de longa duração. Ainda não 58%, em comparação com o placebo. Esse efeito foi observado em
foi esclarecido se os depósitos amiloides das ilhotas constituem um indivíduos independentemente de idade, sexo ou grupo étnico. No
evento primário ou secundário. O ambiente metabólito do diabetes mesmo estudo, a metformina preveniu ou retardou o diabetes em
também pode exercer um impacto negativo sobre a função das ilho- 31% em comparação com o placebo. O grupo com intervenção no es-
tas. Por exemplo, paradoxalmente a hiperglicemia crônica prejudica a tilo de vida perdeu de 5 a 7% de seu peso corporal durante o período
função das ilhotas (“toxicidade da glicose”) e induz um agravamento de 3 anos do estudo. Estudos realizados em populações finlandesas
da hiperglicemia. Uma melhora do controle glicêmico está frequen- e chinesas observaram uma eficácia semelhante da dieta e do exer-
temente associada a uma função aprimorada das ilhotas. Além disso, cício no sentido de prevenir ou de retardar o DM tipo 2; os inibido-
uma elevação dos níveis de ácidos graxos livres (“lipotoxicidade”) e res da -glicosidase, a metformina, as tiazolidinedionas e o orlistate
a gordura dietética também podem prejudicar a função das ilhotas. previnem ou retardam o DM tipo 2, mas não foram aprovados para
essa finalidade. Os indivíduos com uma significativa história familiar
Aumento na produção hepática de glicose e lipídios No DM tipo 2, a de DM tipo 2 e aqueles com GJA ou TDG devem ser enfaticamen-
resistência à insulina no fígado reflete a incapacidade da hiperinsuli- te encorajados a manter um IMC normal e a se engajarem em uma
nemia de suprimir a gliconeogênese, o que resulta em hiperglicemia atividade física regular. A terapia farmacológica para os indivíduos
de jejum e menor armazenamento de glicogênio pelo fígado no es- com pré-diabetes ainda é controversa, pois seu custo e eficácia bem
tado pós-prandial. A maior produção hepática de glicose ocorre no como seu perfil de segurança são desconhecidos. A ADA sugeriu que
início da evolução do diabetes, porém e provavelmente após o início a metformina seja considerada nos indivíduos com GJA e com TDG
das anormalidades secretórias da insulina e da resistência à insulina que correm um altíssimo risco de progressão para diabetes (idade
2
no músculo esquelético. Como resultado da resistência à insulina no inferior a 60 anos IMC ≥ 35 kg/m , história familiar de diabetes em
tecido adiposo, a lipólise e o fluxo de ácidos graxos livres a partir um parente de primeiro grau, triglicerídios elevados, HDL reduzido,
dos adipócitos aumentam, levando a um aumento da síntese de lipí- hipertensão ou AIC acima de 6,0%). Os indivíduos com GJA, TDG
dios [lipoproteína de densidade muito baixa (VLDL) e triglicerídios] ou A1C de 5,7 a 6,4% devem ser monitorados anualmente para deter-
nos hepatócitos. Esse armazenamento lipídico ou esteatose do fígado minar a presença de critérios diagnósticos do diabetes.
211
FORMAS MONOGÊNICAS GENETICAMENTE DEFINIDAS DE
QUADRO 19.4 Valores laboratoriais na cetoacidose diabética
DIABETES MELITO
(CAD) e no estado hiperosmolar hiperglicêmico (EHH) (faixas
Foram identificadas várias formas monogênicas de DM. Seis va- representativas por ocasião da apresentação)
riantes diferentes de MODY, causadas por mutações nos genes que
codificam os fatores de transcrição enriquecidos por ilhotas ou gli- CAD EHH
coquinase (Fig. 19.4; Quadro 19.1), são transmitidas como distúr- a
Glicose, mmol/L (mg/dL) 13,9‑33,3 33,3‑66,6
bios autossômicos dominantes. MODY 1, MODY 3 e MODY 5 são (250‑600) (600‑1.200)
causados por mutações no fator de transcrição nuclear do hepatócito Sódio, mEq/L 125‑135 135‑145
(HNF) 4, HNF-1 e HNF-1, respectivamente. Como estão implí-
Potássioa,b Normal para ↑ Normal
cito em seus nomes, esses fatores de transcrição se expressam no fíga- a
do, mas também em outros tecidos, incluindo as ilhotas pancreáticas Magnésio Normal Normal
a
e o rim. Esses fatores afetam mais provavelmente o desenvolvimento Cloreto Normal Normal
das ilhotas ou a expressão de genes importantes na secreção de insu- Fosfato
a,b
Normal Normal
lina estimulada por glicose ou na manutenção da massa de células Creatinina Ligeiramente ↑ Moderadamente ↑
beta. Por exemplo, os indivíduos com mutação em HNF-1 (MODY
3) revelam um declínio progressivo no controle glicêmico, mas po- Osmolalidade (mOsm/mL) 300‑320 330‑380
a
dem responder às sulfonilureias. De fato, inicialmente admitia-se Cetonas plasmáticas ++++ +/–
que algum desses pacientes sofriam de DM tipo 1, mas a seguir foi a
Bicarbonato sérico, mEq/L < 15 mEq/L Normal a
demonstrado que respondiam a uma sulfonilureia, e a insulina foi ligeiramente ↓
suspensa. Os indivíduos com mutação em HNF-1 sofrem de dete- pH arterial 6,8‑7,3 > 7,3
rioração progressiva na secreção de insulina, de resistência hepática à
PCO arterial,a mmHg 20‑30 Normal
insulina e necessitam de tratamento com insulina (resposta mínima 2
a
às sulfonilureias). Com frequência, esses indivíduos possuem outras Hiato aniônico [Na – (Cl + ↑ Normal a
anormalidades, tais como cistos renais, ligeira insuficiência exócri- HCO3)] ligeiramente ↑
na pancreática e provas de função hepática anormais. Os indivíduos a
Ocorrem grandes alterações durante o tratamento da CAD.
com MODY 2, como resultado de mutações no gene da glicoquinase, b
Embora os níveis plasmáticos possam estar normais ou elevados por ocasião da apresentação,
SEÇÃO III
têm uma hiperglicemia estável de leve a moderada que não responde existe habitualmente uma depleção das reservas corporais totais.
aos agentes hipoglicemiantes orais. A glicoquinase catalisa a forma-
ção de glicose-6-fosfato a partir da glicose, uma reação que é impor-
tante para a percepção da glicose pelas células beta e para a utilização hiperglicemia, com ou sem cetose. As semelhanças e diferenças me-
da glicose pelo fígado. Como resultado das mutações da glicoquina- tabólicas na CAD e no EHH são realçadas no Quadro 19.4. Ambos
se, são necessários níveis mais altos de glicose para induzir respostas os distúrbios estão associados a complicações potencialmente sérias
secretórias da insulina, alterando dessa maneira o ponto de ajuste se não forem diagnosticados e tratados prontamente.
para a secreção da insulina. MODY 4 é uma variante rara causada por
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
212
tação periférica. A respiração de Kussmaul e um cheiro semelhante Anormalidades laboratoriais e diagnóstico
ao de fruta no hálito do paciente (secundário à acidose metabólica e
O diagnóstico no momento mais oportuno da CAD é crucial e torna
à maior quantidade de acetona) são sinais clássicos desse distúrbio. A
possível a adoção imediata da terapia. A CAD se caracteriza por hiper-
letargia e a depressão do sistema nervoso central podem evoluir para
glicemia, cetose e acidose metabólica (hiato aniônico aumentado) jun-
coma com CAD grave, porém devem induzir-nos a realizar também
tamente com inúmeros desarranjos metabólicos secundários (Quadro
uma avaliação imediata para outras razões de estado mental alterado
19.4). Ocasionalmente, a glicose sérica está apenas minimamente ele-
(infecção, hipoxemia, etc.). O edema cerebral, que é uma complica-
vada. Com frequência, o bicarbonato sérico é < 10 mmol/L, e o pH ar-
ção extremamente grave da CAD, é observado mais frequentemente
terial varia entre 6,8 e 7,3, dependendo da gravidade da acidose. Apesar
em crianças. Os sinais de infecção, que pode desencadear a CAD, de-
de um déficit corporal total de potássio, o potássio sérico por ocasião
vem ser procurados ao exame físico, até mesmo na ausência de febre.
da apresentação pode estar apenas levemente elevado, como fenôme-
A isquemia tecidual (cardíaca, cerebral) também pode ser um fator
no secundário da acidose. As reservas corporais totais de sódio, cloro,
desencadeante. A omissão da insulina devido a um transtorno ali-
fósforo e magnésio também estão reduzidas na CAD, porém não refle-
mentar pode precipitar algumas vezes CAD.
tidas de forma exata por seus níveis no soro por causa da desidratação
Fisiopatologia e da hiperglicemia. A ureia sanguínea elevada e os níveis séricos de
creatinina refletem a depleção do volume intravascular. A interferência
A CAD resulta da deficiência relativa ou absoluta de insulina com-
por parte do acetoacetato pode elevar falsamente a mensuração sérica
binada com excesso dos hormônios contrarreguladores (glucagon,
de creatinina. Leucocitose, hipertrigliceridemia e hiperlipoproteinemia
catecolaminas, cortisol e hormônio do crescimento). Tanto a defi-
também são comumente observadas. A hiperamilasemia pode sugerir
ciência de insulina quanto o excesso de glucagon, em particular, são
um diagnóstico de pancreatite, especialmente quando acompanhada
necessários para a instalação da CAD. A menor relação de insulina
por dor abdominal. Contudo, na CAD a amilase costuma ser de origem
com o glucagon promove a gliconeogênese, a glicogenólise e a forma-
salivar e, assim sendo, não é diagnóstica para pancreatite. A lipase séri-
ção de corpos cetônicos no fígado, assim como aumentos no forne-
ca deve ser obtida quando se suspeita de pancreatite.
cimento de substratos provenientes da gordura e do músculo (ácidos
O sódio sérico medido é reduzido como consequência da hiper-
graxos livres, aminoácidos) ao fígado. Os marcadores da inflamação
glicemia [uma redução de 1,6 mmol/L (1,6 mEq) no sódio sérico para
(citocinas, proteína C-reativa) estão elevados tanto na CAD quanto
cada elevação de 5,6 mmol/L (100 mg/dL) na glicose sérica]. Um sódio
no EHH.
Capítulo 19
sérico normal na vigência da CAD indica um déficit mais acentuado
A combinação de deficiência de insulina e hiperglicemia reduz
de água. Nas unidades “convencionais,” a osmolalidade sérica calcu-
o nível hepático de frutose-2,6-difosfato, o que altera a atividade da
lada [2 (sódio sérico + potássio sérico) + glicose plasmática (mg/
fosfofrutoquinase e de frutose-1,6-bifosfatase. O excesso de glucagon
dL)/18 + ureia sanguínea/2,8] é de leve a moderadamente elevada, po-
reduz a atividade de piruvato quinase, enquanto a deficiência de in-
rém em menor grau do que aquela observada na EHH (ver adiante).
sulina aumenta a atividade de fosfoenolpiruvato carboxiquinase. Es-
sas mudanças desviam o manuseio do piruvato na direção da síntese Na CAD, o corpo cetônico -hidroxibutirato é sintetizado em
de glicose e para longe da glicólise. Os maiores níveis de glucagon e um ritmo 3 vezes maior que o acetoacetato, no entanto, o acetoaceta-
de catecolaminas na vigência de baixos níveis de insulina promovem to é identificado preferencialmente por um reagente de identificação
a glicogenólise. A deficiência de insulina também reduz os níveis do da cetose usado comumente (nitropussiato). As cetonas séricas es-
Diabetes Melito
transportador da glicose GLUT4, o que prejudica a captação da glico- tão presentes em níveis significativos (em geral positivas para uma
se no interior do músculo esquelético e da gordura, além de reduzir o diluição sérica de ≥ 1:8). O comprimido de nitropussiato, ou a fita
metabolismo intracelular da glicose (Fig. 19.5). reagente, são usados com frequência para detectar cetonas na urina;
A cetose resulta de um aumento acentuado na liberação de ácido certas medicações, como o captopril ou a penicilamina, podem cau-
graxos livres pelos adipócitos, com um desvio resultante na direção sar reações falsas positivas. Os ensaios séricos ou plasmáticos para
da síntese de corpos cetônicos no fígado. Os níveis reduzidos de insu- -hidroxibutirato são preferidos, visto que refletem com maior exati-
lina, em combinação com elevações nas catecolaminas e no hormô- dão o verdadeiro nível de corpos cetônicos.
nio do crescimento, aceleram a lipólise e a liberação de ácidos graxos As perturbações metabólicas da CAD existem ao longo de um
livres. Normalmente, esses ácidos graxos livres são transformados espectro, começando com ligeira acidose e hiperglicemia modera-
em triglicerídios ou VLDL no fígado. Contudo, na CAD, a hiperglu- da evoluindo para achados mais graves. O grau de acidose e a hi-
cagonemia altera o metabolismo hepático em favor da formação de perglicemia não evidenciam necessariamente uma correlação mui-
corpos cetônicos por meio da ação da enzima carnitina palmitoil- to íntima, pois vários fatores determinam o nível de hiperglicemia
transferase I. Essa enzima é crucial para a regulação do transporte (ingestão oral, perda urinária de glicose). A cetonemia é um achado
dos ácidos graxos para o interior das mitocôndrias, onde ocorrem a consistente na CAD e a diferencia da hiperglicemia simples. O diag-
oxidação e a transformação em corpos cetônicos. Em um pH fisio- nóstico diferencial de CAD inclui cetose da inanição, cetoacidose al-
lógico, os corpos cetônicos existem em forma de cetoácidos, que são coólica (habitualmente um bicarbonato > 15 mEq/L) e outras formas
neutralizados pelo bicarbonato. À medida que as reservas de bicarbo- de acidose com hiato aniônico aumentado.
nato são depletadas, instala-se um quadro de acidose metabólica. A
maior produção de ácido láctico também contribui para a acidose. As TRATAMENTO Cetoacidose diabética
maiores quantidades de ácidos graxos livres aceleram a produção de
triglicerídios e de VLDL. A depuração de VLDL também é reduzida, O tratamento da CAD é esboçado no Quadro 19.6. Após iniciar
pois a atividade da lipase lipoproteica sensível à insulina no músculo a reposição IV de líquidos e a terapia com insulina, o agente ou o
e na gordura é diminuída. A hipertrigliceridemia pode ser tão inten- evento que desencadeou o episódio de CAD deve ser procurado
sa a ponto de causar pancreatite. e tratado agressivamente. Se o paciente está vomitando ou apre-
A CAD é frequentemente desencadeada por maiores demandas senta um estado mental alterado, uma sonda nasogástrica deve
de insulina, como ocorre durante uma enfermidade concomitante ser introduzida para prevenir a aspiração do conteúdo gástrico.
(Quadro 19.5). Se a terapia com insulina não for aumentada, esse Essenciais para o tratamento bem-sucedido da CAD são o moni-
problema será complicado ainda mais. A omissão completa ou a toramento minucioso e a reavaliação frequente para se ter certeza
administração inadequada de insulina pelo paciente ou pela equipe de que o paciente e os desarranjos metabólicos estão melhorando.
de assistência de saúde (em um paciente hospitalizado com DM tipo Um fluxograma completo deve registrar as alterações cronológi-
1) podem precipitar CAD. Os pacientes que utilizam dispositivos de cas nos sinais vitais, na ingestão e eliminação de líquidos e nos
infusão de insulina com insulina de ação rápida podem desenvolver valores laboratoriais como uma função da insulina administrada.
CAD, visto que até mesmo uma curta interrupção no fornecimento Após o bolus inicial de solução salina normal, a reposição do
de insulina (p. ex., mau funcionamento mecânico) resulta rapida- déficit de sódio e de água livre é realizada no transcorrer das pró-
mente em deficiência de insulina.
213
QUADRO 19.6 Conduta na cetoacidose diabética insulina IV deve ser continuada até a regressão da acidose, e que
o paciente se apresente metabolicamente estável. Com a regressão
1. Confirmar o diagnóstico (glicose plasmática, cetonas séricas positivas, da acidose e da resistência à insulina observada com a CAD, o
acidose metabólica). ritmo de infusão da insulina pode ser reduzido (0,05 a 0,1 uni-
2. Hospitalização; pode ser necessário o ambiente de terapia intensiva dade/kg/h). A insulina de ação prolongada, em combinação com
para monitoração frequente ou se o pH for < 7,00 ou se o paciente a insulina de ação rápida SC, deve ser administrada logo que o
estiver inconsciente. paciente recupere a capacidade de comer, pois isto facilita a transi-
3. Avaliar: ção para um esquema ambulatorial de insulina e reduz o período
Eletrólitos séricos (K+, Na+, Mg2+, Cl–, bicarbonato, fosfato) de permanência hospitalar. É crucial prosseguir com a infusão de
– insulina até serem conseguidos níveis adequados de insulina pela
Equilíbrio ácido‑básico – pH, HCO3 , PCO , ‑hidroxibutirato
2 administração de insulina de ação longa por via SC. Períodos até
Função renal (creatinina, débito urinário) mesmo relativamente curtos de administração inadequada de in-
4. Reposição dos líquidos: 2‑3 L de solução salina a 0,9% durante as sulina nessa fase de transição podem resultar em recidiva da CAD.
primeiras 1 a 3 h (15‑20 mL/kg por hora); subsequentemente, solução A hiperglicemia costuma melhorar com um ritmo de 4,2 a 5,6
salina a 0,45% em 250‑500 mL/h; mudar para glicose a 5% e solução mmol/L (75 a 100 mg/dL) por hora como resultado da eliminação
salina a 0,45% com 150‑250 mL/h quando a glicose plasmática da glicose mediada pela insulina, da liberação hepática reduzida
alcançar 200 mg/dL (11,2 mmol/L). de glicose e da reidratação. Esta última reduz as catecolaminas,
5. Administrar insulina de ação rápida: IV (0,1 unidade/kg); a seguir aumenta as perdas urinárias de glicose e expande o volume intra-
0,1 unidade/kg por hora por infusão IV contínua; aumentar de 2‑3 vascular. O declínio da glicose plasmática durante as primeiras 1
vezes se não houver resposta no transcorrer de 2‑4 h. Se o potássio a 2 h pode ser mais rápido e está relacionado principalmente com
sérico inicial for < 3,3 mmol/L (3,3 mEq/L), não administrar insulina
a expansão volêmica. Quando a glicose plasmática alcança 11,2
até que o potássio esteja corrigido. Se o potássio sérico inicial for >
mmol/L (200 mg/dL), a glicose deve ser acrescentada à infusão de
5,2 mmol/L (5,2 mEq/L), não suplementar com K+ até que o potássio
esteja corrigido. solução salina a 0,45% a fim de manter a glicose plasmática na va-
riação de 8,3 a 13,9 mmol/L (150 a 250 mg/dL), e a infusão de insu-
6. Avaliar o paciente: O que desencadeou o episódio (falta de adesão
lina deve ser continuada. A cetoacidose começa a regredir quando
ao tratamento, infecção, traumatismo, infarto, cocaína)? Iniciar uma
a insulina reduz a lipólise, aumenta a utilização periférica dos cor-
SEÇÃO III
214
(pH arterial < 6,9), a ADA aconselha o bicarbonato [50 mmol/L Anormalidades laboratoriais e diagnostico
(mEq/L) de bicarbonato de sódio em 200 mL de água esterilizada As características laboratoriais do EHH estão resumidas no Quadro
com 10 mEq/L de KCl por hora durante 2 h até atingir um pH > 19.4. Mais impressionantes são a acentuada hiperglicemia [a glicose
7,0]. Hipofosfatemia pode resultar da maior utilização de glicose, plasmática pode ser > 55,5 mmol/L (1000 mg/dL)], a hiperosmo-
porém os ensaios clínicos randomizados não demonstraram que a laridade (> 350 mOsmol/L) e a azotemia pré-renal. O sódio sérico
reposição do fosfato seja benéfica na CAD. Se o fosfato sérico for medido pode ser normal ou ligeiramente baixo, não obstante a hi-
< 0,32 mmol/L (1 mg/dL), então o suplemento de fosfato deve ser perglicemia acentuada. O sódio sérico corrigido em geral está au-
aventado e o cálcio sérico monitorado. A hipomagnesemia pode mentado [acrescentar 1,6 mEq ao sódio medido para cada elevação
manifestar-se durante a terapia da CAD e também pode tornar de 5,6 mmol/L (100 mg/dL) na glicose sérica]. Ao contrário da CAD,
necessária a suplementação. a acidose e a cetonemia estão ausentes ou são apenas leves. Uma aci-
Com uma terapia apropriada, a taxa de mortalidade da CAD dose metabólica com pequeno hiato aniônico pode estar presente em
é baixa (inferior a 1%) e está muito mais relacionada com o evento virtude da maior quantidade de ácido láctico. Uma cetonúria mode-
subjacente ou desencadeante, como uma infecção ou um infarto rada, quando presente, é secundária à inanição.
do miocárdio. A trombose venosa, o sangramento gastrintestinal
superior e a síndrome de angústia respiratória aguda complicam
ocasionalmente a CAD. A principal complicação não metabólica TRATAMENTO Estado hiperosmolar hiperglicêmico
da terapia da CAD é o edema cerebral, que se instala mais frequen-
temente em crianças quando a CAD está regredindo. A etiologia e A depleção volêmica e a hiperglicemia são aspectos proeminen-
a terapia ideal do edema cerebral ainda não foram bem-estabeleci- tes tanto do EHH quanto da CAD. Consequentemente, a terapia
das, porém uma reposição excessiva de água livre deve ser evitada. desses distúrbios compartilha vários elementos (Quadro 19.6).
Após o tratamento, o médico e o paciente deverão rever a se- Em ambos os distúrbios, é crucial o monitoramento minucio-
quência de eventos que resultou na CAD a fim de prevenir recidi- so do estado hídrico do paciente, dos valores laboratoriais e da
vas futuras. De primordial importância é a orientação do paciente velocidade de infusão da insulina. Os problemas subjacentes ou
acerca dos sintomas de CAD, de seus fatores desencadeantes e desencadeantes devem ser procurados e tratados agressivamente.
do tratamento do diabetes durante uma enfermidade concomi- No EHH, as perdas de líquidos e a desidratação em geral são mais
Capítulo 19
tante. Durante uma enfermidade ou quando a ingestão oral está pronunciadas do que na CAD, em virtude da duração mais pro-
comprometida, os pacientes devem: (1) medir com frequência a longada da enfermidade. Habitualmente, o paciente com EHH é
glicose sanguínea capilar; (2) medir as cetonas urinárias quando mais idoso, comporta maior probabilidade de possuir alterações
a glicose sérica for > 16,5 mmol/L (300 mg/dL); (3) beber líqui- no estado mental, assim como um evento desencadeante capaz
dos para manter a hidratação; (4) continuar ou aumentar a dose de ameaçar a vida com comorbidades concomitantes. Até mesmo
de insulina; e (5) procurar assistência médica quando surgirem com um tratamento apropriado, o EHH comporta uma taxa de
desidratação, vômitos persistentes ou uma hiperglicemia descon- mortalidade substancialmente mais alta que a CAD (de até 15%
trolada. Com a utilização dessas estratégias, a CAD em suas fa- em algumas séries clínicas).
ses iniciais pode ser prevenida ou detectada e tratada de maneira A reposição de líquidos deve estabilizar inicialmente o estado
hemodinâmico do paciente (1 a 3 L de solução salina normal a
Diabetes Melito
apropriada em bases ambulatoriais.
0,9% durante as primeiras 2 a 3 h). Levando-se em conta que o
déficit hídrico no EHH se acumulou durante um período de dias
■■ ESTADO HIPEROSMOLAR HIPERGLICÊMICO a semanas, a rapidez da reversão do estado hiperosmolar deverá
balancear a necessidade de repleção de água livre com o risco de
Características clínicas que uma reversão excessivamente rápida possa piorar a função
O paciente prototípico com EHH é um indivíduo idoso com DM tipo neurológica. Se o sódio sérico for > 150 mmol/L (150 mEq/L), de-
2, com uma história de várias semanas de poliúria, perda de peso e verá ser utilizada uma solução salina a 0,45%. Após ter sido con-
ingestão oral reduzida que culmina em confusão mental, letargia ou seguida a estabilidade hemodinâmica, a administração do líquido
coma. O exame físico reflete uma desidratação profunda e hiperos- IV deverá ter como meta a reversão do déficit de água livre utili-
molaridade e revela hipotensão, taquicardia bem como estado men- zando líquidos hipotônicos (solução salina a 0,45% inicialmente
tal alterado. Estão particularmente ausentes os sintomas de náuse- e, a seguir, soro glicosado a 5%). O déficit calculado de água livre
as, vômitos e dor abdominal, assim como a respiração de Kussmaul (que é em média de 9 a 10 L) deve ser corrigido durante os próxi-
característica da CAD. O EHH é desencadeado com frequência por mos 1 a 2 dias (velocidades de infusão de 200 a 300 mL/h de so-
uma enfermidade grave concomitante, como infarto do miocárdio lução hipotônica). A repleção de potássio costuma ser necessária
ou acidente vascular encefálico. Sepse, pneumonia e outras infecções e deve ser determinada por mensurações repetidas do potássio
graves são desencadeantes frequentes e devem ser procuradas. Além sérico. Nos pacientes que tomam diuréticos, o déficit de potássio
disso, uma condição debilitante (acidente vascular encefálico prévio pode ser bastante significativo e acompanhado por deficiência de
ou demência) ou uma situação social que comprometa a ingestão de magnésio. A hipofosfatemia pode ocorrer durante a terapia e ser
água contribuem habitualmente para o surgimento desse distúrbio. melhorada com a utilização de KPO4 e o início da nutrição.
Como acontece na CAD, a reidratação e a expansão volêmica
Fisiopatologia
reduzem inicialmente a glicose plasmática, mas a insulina tam-
A deficiência relativa de insulina e a ingestão inadequada de líquido bém é necessária. Um esquema razoável para o EHH começa com
são as causas subjacentes de EHH. A deficiência de insulina induz um bolus IV de insulina de 0,1 unidade/kg seguido por insulina
um aumento da produção hepática de glicose (através da glicogenóli- IV a um ritmo constante de infusão de 0,1 unidade/kg por hora.
se e da gliconeogênese) e prejudica a utilização de glicose no músculo Se a glicose sérica não cai, duplicar o ritmo de infusão de insulina.
esquelético (ver a discussão da CAD, anteriormente). A hiperglice- Como acontece na CAD, a glicose deve ser acrescentada ao líqui-
mia induz uma diurese osmótica que acarreta depleção do volume do IV quando a glicose plasmática cai para 13,9 a 16,7 mmol/L
intravascular, que será exacerbada por uma reposição inadequada de (250 a 300 mg/dL), e a velocidade de infusão da insulina deve ser
líquidos. A ausência de cetose no EHH não é compreendida. Presu- reduzida para 0,05 a 0,1 unidade/kg/h. A infusão de insulina deve
mivelmente, a deficiência de insulina é apenas relativa e menos acen- ser continuada até que o paciente tenha reiniciado a alimenta-
tuada do que na CAD. Em alguns estudos foram encontrados níveis ção e possa ser transferido para um esquema com insulina SC.
mais baixos de hormônios contrarreguladores e ácidos graxos livres O paciente deverá receber alta hospitalar ainda com prescrição
no EHH do que na CAD. É possível também que o fígado seja menos de insulina, apesar de alguns pacientes poderem adotar a seguir
capaz de sintetizar corpos cetônicos ou que a relação insulina/gluca- agentes orais redutores da glicose.
gon não favoreça a cetogênese.
215
COMPLICAÇÕES CRÔNICAS DO DM ■■ MECANISMOS DAS COMPLICAÇÕES
As complicações crônicas do DM afetam muitos sistemas orgânicos A hiperglicemia crônica é um fator etiológico importante respon-
e são responsáveis pela maior parte da morbidade e da mortalidade sável pelas complicações do DM, porém o mecanismo pelo qual ela
associadas a essa doença. As complicações crônicas podem ser divi- induz uma disfunção celular e orgânica tão diversificada é desconhe-
didas em complicações vasculares e não vasculares (Quadro 19.7). cido. Pelo menos quatro teorias proeminentes, que não são mutua-
As complicações vasculares do DM são subdivididas em microvascu- mente exclusivas, foram propostas para explicar de que maneira a
lares (retinopatia, neuropatia, nefropatia) e macrovasculares [doença hiperglicemia poderia induzir as complicações crônicas do DM. Uma
arterial coronariana (DAC), doença arterial periférica (DAP), doença hipótese emergente sustenta que a hiperglicemia leva a alterações
vascular cerebral]. As complicações não vasculares incluem proble- epigenéticas nas células afetadas.
mas como gastroparesia, infecções e alterações cutâneas. O diabetes Uma teoria estabelece que uma glicose intracelular aumenta-
de longa duração pode estar associado a perda auditiva. Ainda não da resulta na formação de produtos finais da glicosilação avançada
foi esclarecido se o DM tipo 2 em indivíduos idosos está associado a (AGE, de advanced glycosylation end products), que se ligam a um
uma função mental deteriorada. receptor de superfície celular através da glicosilação não enzimá-
O risco de complicações crônicas aumenta como uma função da tica de proteínas intracelulares e extracelulares. A glicosilação não
duração e do grau de hiperglicemia; habitualmente só se tornam evi- enzimática resulta da interação da glicose com grupos amino nas
dentes na segunda década de hiperglicemia. Sabendo-se que o DM proteínas. Foi mostrado que os AGE realizam uma ligação cruzada
tipo 2 comporta com frequência um longo período assintomático de com as proteínas (p. ex., colágeno, proteínas da matriz extracelu-
hiperglicemia, muitos indivíduos com DM tipo 2 já sofrem de com- lar), aceleram a aterosclerose, promovem a disfunção glomerular,
plicações na época em que é feito o diagnóstico. reduzem a síntese de óxido nítrico, induzem a disfunção endotelial
As complicações microvasculares do DM tanto tipo 1 quanto e alteram a composição e a estrutura da matriz extracelular. O ní-
tipo 2 resultam da hiperglicemia crônica. Grandes ensaios clínicos vel sérico dos AGE se correlaciona com o nível de glicemia e esses
randomizados de indivíduos com DM tipo 1 ou tipo 2 demonstra- produtos se acumulam à medida que declina a taxa de filtração glo-
ram de forma conclusiva que uma redução na hiperglicemia crônica merular (TFG).
previne ou retarda a retinopatia, a nefropatia e a neuropatia. Outros Uma segunda teoria baseia-se na observação de que a hipergli-
fatores definidos de forma incompleta podem modular o surgimento cemia acelera o metabolismo da glicose pela via do sorbitol. A glico-
se intracelular é metabolizada predominantemente por fosforilação
SEÇÃO III
Capítulo 19
ensaio (a maioria dos indivíduos era constituída por jovens e com- tecera no DCCT, havia uma relação contínua entre controle glicêmi-
portava um baixo risco de doença cardiovascular). Os resultados do co e surgimento de complicações. O controle glicêmico aprimorado
DCCT permitiam prever que os indivíduos do grupo de tratamento não reduziu de maneira conclusiva (nem agravou) a taxa de mortali-
intensivo do diabetes poderiam ganhar 7,7 anos adicionais de visão, dade cardiovascular durante o período do estudo clínico, porém foi
5,8 anos adicionais livres de DRT e 5,6 anos livres de amputações associado a uma melhora dos perfis de risco das lipoproteínas, como
das extremidades inferiores. Se todas as complicações do DM fos- redução dos triglicerídios e aumento das HDL.
sem combinadas, os indivíduos do grupo de tratamento intensivo do Um dos principais achados do UKPDS foi que o controle rígido
diabetes poderiam usufruir de 15,3 mais anos de vida sem complica-
da pressão arterial reduzia acentuadamente as complicações tanto
ções microvasculares ou neurológicas significativas do DM em com-
macrovasculares quanto microvasculares. De fato, os efeitos benéfi-
Diabetes Melito
paração com os indivíduos que recebiam terapia padronizada. Isto
cos do controle da pressão arterial eram maiores que os efeitos be-
equivale a um período adicional de 5,1 anos de expectativa de vida
néficos do controle glicêmico. Uma queda da pressão arterial para
para os indivíduos do grupo de tratamento intensivo do diabetes.
patamares moderados (144/82 mmHg) reduzia o risco de morte re-
O prognóstico de longo prazo para o diabetes tipo 1 continua me-
lacionada com o DM, acidente vascular encefálico, pontos terminais
lhorando, como mostram os dados de sua incidência em 30 anos no
microvasculares, retinopatia e insuficiência cardíaca (reduções do
grupo de tratamento intensivo do DCCT para a retinopatia (21%), a
risco entre 32 e 56%).
nefropatia (9%) e a doença cardiovascular (9%). Durante esse acom-
Reduções semelhantes nos riscos de retinopatia e de nefropatia
panhamento, menos de 1% do grupo desenvolveu cegueira, perdeu
foram observadas também em um pequeno ensaio de japoneses ma-
um membro por amputação ou necessitou de diálise. O benefício do
controle glicêmico aprimorado durante o DCCT persistiu até mesmo gros com DM tipo 2 randomizados fosse para um controle glicêmi-
depois que o estudo foi concluído e o controle glicêmico piorou. Por co intensivo, fosse para a terapia padronizada com insulina (estudo
exemplo, os indivíduos do grupo de tratamento intensivo do diabe- Kumamoto). Esses resultados demonstram a eficácia do controle
tes por um período médio de 6,5 anos tiveram uma redução de 42 glicêmico aprimorado em indivíduos de diferentes etnias e, presu-
a 57% nos eventos cardiovasculares [infarto do miocárdio (IM) não mivelmente, uma etiologia diferente do DM (isto é, fenotipicamente
fatal, acidente vascular encefálico ou morte decorrente de um evento diferente daqueles do DCCT e do UKPDS).
cardiovascular] com um período médio de acompanhamento de 17 Os achados do DCCT, do UKPDS e do estudo Kumamoto
anos, apesar de seu controle glicêmico subsequente ter sido o mesmo apoiam fortemente a ideia de que a hiperglicemia crônica desempe-
daqueles incluídos no grupo de tratamento convencional do diabetes nha um papel causal na patogenia das complicações microvasculares
de 6,5 a 17 anos (conforme discutido adiante). diabéticas. Esses estudos clássicos comprovam o valor do controle
O benefício de uma melhora do controle glicêmico ocorreu atra- metabólico e enfatizam a importância de (1) controle glicêmico in-
vés de toda a gama de valores de A 1C (Fig. 19.8), sugerindo que, tensivo em todas as formas de DM e (2) diagnóstico precoce bem
para qualquer nível de A 1C, uma melhora do controle glicêmico é como controle rígido da pressão arterial no DM tipo 2. Os alvos
benéfica. A terapia tem como meta conseguir um nível de A 1C o ideais para o controle glicêmico e a pressão arterial não estão total-
mais próximo possível do normal, sem submeter o paciente a um ris- mente definidos (ver adiante).
co excessivo de hipoglicemia.
O United Kingdom Prospective Diabetes Study (UKPDS) estu- ■■ COMPLICAÇÕES OFTALMOLÓGICAS DO DIABETES MELITO
dou a evolução de mais de 5.000 indivíduos com DM tipo 2 por um O DM é a principal causa de cegueira entre os 20 e 74 anos de idade
período superior a 10 anos. Esse estudo utilizou múltiplos esquemas nos EUA. A gravidade desse problema é realçada pelo achado de que
terapêuticos e monitorou o efeito do controle glicêmico intensivo e os indivíduos com DM têm uma probabilidade 25 vezes maior de se
do tratamento dos fatores de risco sobre o surgimento de complica- tornarem legalmente cegos que os indivíduos sem DM. A cegueira
ções diabéticas. Os indivíduos recém-diagnosticados com DM tipo 2 representa principalmente o resultado da retinopatia diabética pro-
foram randomizados para (1) tratamento intensivo utilizando várias gressiva e do edema macular clinicamente significativo. A retinopatia
combinações de insulina, uma sulfonilureia ou metformina; ou (2) diabética é classificada em dois estágios: não proliferativa e prolifera-
terapia convencional utilizando modificação dietética e farmacote- tiva. A retinopatia diabética não proliferativa aparece habitualmente
rapia com o objetivo de prevenir os sintomas. Além disso, os indi- em um período subsequente na primeira década ou precocemente
217
menos retinopatia diabética. Os pacientes com retinopatia conhe-
cida são candidatos à fotocoagulação profilática ao ser iniciada a
terapia intensiva. Quando já está presente uma retinopatia avan-
çada, o controle glicêmico aprimorado confere menos benefício,
apesar de a assistência oftalmológica adequada poder prevenir a
maioria dos casos de cegueira.
Exames oculares abrangentes e regulares são essenciais para
todos os indivíduos com DM. A maior parte da doença ocular dia-
bética pode ser tratada com sucesso se for detectada precocemente.
Os exames oculares de rotina sem dilatação realizados pelo prove-
dor de assistência primária ou pelo especialista em diabetes são ina-
dequados para a identificação da doença ocular diabética, que re-
quer um oftalmologista para o tratamento ótimo desses distúrbios.
A fotocoagulação a laser é muito bem-sucedida na preservação
da visão. A retinopatia proliferativa é tratada habitualmente com
fotocoagulação a laser panrretiniana, enquanto o edema macular
Figura 19.9 A retinopatia diabética resulta em hemorragias dispersas, é tratado com fotocoagulação a laser focal. Não foi possível com-
exsudatos amarelados e neovascularização. Este paciente tem vasos neovas- provar de forma conclusiva que o exercício seja capaz de agravar a
culares que proliferam a partir do disco óptico, tornando necessária uma fotocoagu- retinopatia diabética proliferativa, porém a maioria dos oftalmolo-
lação a laser panrretiniana urgente. gistas aconselha os indivíduos com doença ocular diabética em fase
avançada a limitarem as atividades físicas associadas a manobras de
na segunda década da doença e se caracteriza por microaneurismas Valsalva repetidas. A terapia com ácido acetilsalicílico (650 mg/dia)
vasculares retinianos, exudatos hemorrágicos e manchas algodono- não parece influenciar a história natural da retinopatia diabética.
sas (Fig. 19.9). Uma ligeira retinopatia não proliferativa progride
para uma doença mais extensa, caracterizada por mudanças no ca-
SEÇÃO III
libre dos vasos venosos, anormalidades microvasculares intra-reti- ■■ COMPLICAÇÕES RENAIS DO DIABETES MELITO
nianas e um maior número de microaneurismas e de hemorragias. A nefropatia diabética é a principal causa de DRT nos EUA e uma
Os mecanismos fisiopatológicos envolvidos na retinopatia não proli- das principais causas de morbidade e mortalidade relacionadas com
ferativa incluem desaparecimento dos pericitos retinianos, aumento o DM. Tanto a microalbuminúria quanto a macroalbuminúria dos
da permeabilidade vascular retiniana, alterações no fluxo sanguíneo indivíduos com DM estão associadas a um maior risco de doença
retiniano e microvasculatura retiniana anormal, que resultam em is- cardiovascular. Os indivíduos com nefropatia diabética sofrem co-
quemia retiniana. mumente de retinopatia diabética.
O aparecimento da neovascularização em resposta à hipoxemia Como outras complicações microvasculares, a patogenia da ne-
retiniana constitui o elemento mais característico da retinopatia
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
Capítulo 19
DM se instalam mais comumente em afro-americanos, americanos na-
tivos e indivíduos hispânicos do que em caucasianos com DM tipo 2. saparecimento da microalbuminúria ou até ser alcançada a dose
A acidose tubular renal tipo IV (hipoaldosteronismo hiporre- máxima. Se a utilização de inibidores da ECA ou de BRA não
ninêmico) pode ocorrer no DM tipos 1 ou 2. Esses indivíduos de- for possível, ou a pressão arterial não for controlada, deverão ser
senvolvem uma propensão para a hiperpotassemia que pode ser então usados bloqueadores dos canais de cálcio (classe não dii-
exacerbada pelas medicações [especialmente os inibidores da enzi- dropiridina), os betabloqueadores ou diuréticos. No entanto, sua
ma conversora de angiotensina (ECA) e os bloqueadores do receptor eficácia no sentido de tornar mais lenta a queda da TFG não foi
da angiotensina (BRA)]. Os pacientes com DM estão predispostos comprovada. O controle da pressão arterial com qualquer agente
à nefrotoxicidade induzida por contrastes radiográficos. Os fatores é extremamente importante, porém um benefício específico para
cada medicamento na nefropatia diabética, independentemente
Diabetes Melito
de risco para a nefrotoxicidade induzida por contrastes radiográficos
são representados por nefropatia preexistente e depleção volêmica. do controle da pressão arterial, foi demonstrado apenas para os
Os indivíduos com DM submetidos a procedimentos radiográficos inibidores ECA e para os BRA nos pacientes com DM.
com um corante como contraste devem ser bem hidratados antes e A ADA sugere uma restrição moderada da ingestão de proteí-
após a exposição ao contraste e a creatinina sérica deve ser monitora- nas nos indivíduos diabéticos com microalbuminúria (0,8 a 1,0 g/
da por 24-48 h após o procedimento. kg/dia) ou com macroalbuminúria (< 0,8 g/kg/dia).
O parecer da nefrologia deve ser aventado quando a TFG es-
timada for < 60 mL/min por 1,743 m2. Após a instalação da ma-
TRATAMENTO Nefropatia diabética
219
croalbuminúria, a probabilidade de DRT passa a ser muito alta. Neuropatia autônoma
Em comparação com o que ocorre nos indivíduos que não são Os indivíduos com DM tipos 1 ou 2 de longa duração podem de-
diabéticos, a hemodiálise nos pacientes com DM está associada a senvolver sinais de disfunção autônoma com acometimento dos sis-
complicações mais frequentes, tais como hipotensão (decorrente temas colinérgico, noradrenérgico e peptidérgico (peptídios como o
de neuropatia autônoma ou da perda da taquicardia reflexa), a um polipeptídio pancreático, substância P, etc.). A neuropatia autônoma
acesso vascular mais difícil e a uma progressão acelerada da retino- relacionada com o DM pode acometer múltiplos sistemas, incluindo
patia. A sobrevida após o início da DRT é mais curta na população os sistemas cardiovascular, gastrintestinal, geniturinário, sudomo-
diabética em comparação com não diabéticos com características tor e sistemas metabólicos. As neuropatias autônomas que afetam
clínicas semelhantes. A aterosclerose é a principal causa de morte o sistema cardiovascular induzem uma taquicardia em repouso e
dos indivíduos diabéticos em diálise e a hiperlipidemia deve ser tra- hipotensão ortostática. Os relatos de morte súbita também foram
tada agressivamente. O transplante renal proveniente de um doador atribuídos a uma neuropatia autonômica. A gastroparesia e as anor-
vivo aparentado constitui a terapia preferida, mas torna necessária malidades do esvaziamento vesical são causadas com frequência pela
a imunossupressão crônica. O transplante combinado de pâncreas- neuropatia autonômica observada no DM (abordada adiante). A hi-
-rim oferece a promessa de normoglicemia e de liberdade da diálise. peridrose das extremidades superiores e a anidrose das extremidades
inferiores resultam da disfunção do sistema nervoso simpático. A
anidrose dos pés pode promover uma pele seca com rachaduras, com
■■ NEUROPATIA E DIABETES MELITO maior risco de úlceras do pé. A neuropatia autonômica pode reduzir
a liberação dos hormônios contrarreguladores (particularmente as
A neuropatia diabética ocorre em cerca de 50% dos indivíduos com
catecolaminas), resultando na incapacidade de perceber adequada-
DM tipo 1 e tipo 2 de longa duração. Pode manifestar-se como po-
mente a hipoglicemia (ausência de percepção da hipoglicemia; Cap.
lineuropatia, mononeuropatia e/ou neuropatia autônoma. Como
20), submetendo, assim, o paciente ao risco de hipoglicemia grave e
acontece com outras complicações do DM, o surgimento de neuropa-
complicando os esforços destinados a melhorar o controle glicêmico.
tia correlaciona-se com a duração do diabetes e o controle glicêmico.
Outros fatores de risco são o IMC (quanto maior for o IMC, maior
será o risco de neuropatia) e o tabagismo. A presença de doença car-
TRATAMENTO Neuropatia diabética
diovascular, de triglicerídios elevados e de hipertensão também está
associada à neuropatia periférica diabética. As fibras nervosas tanto
SEÇÃO III
220
■■ DISFUNÇÔES GASTRINTESTINAL E GENITURINÁRIA ■■ MORBIDADE E MORTALIDADE CARDIOVASCULARES
O DM tipo 1 e tipo 2 de longa duração pode afetar a motilidade e A doença cardiovascular aumenta de incidência nos indivíduos com
a função dos sistemas gastrintestinal (GI) e geniturinário. Os sin- DM tipo 1 ou tipo 2. O Framingham Heart Study revelou um acentua-
tomas GI mais proeminentes são o esvaziamento gástrico retarda- do aumento na DAP, ICC, CP, IM e morte súbita (aumento do risco de
do (gastroparesia) e a motilidade alterada dos intestinos delgado e 1 a 5 vezes) no DM. A American Heart Assoaciation designou o DM
grosso (constipação ou diarreia). A gastroparesia pode manifestar- como um “equivalente de risco de CP”. Os pacientes com diabetes tipo
-se com sintomas de anorexia, náuseas, vômitos, saciedade precoce 2 sem um IM prévio correm um risco de terem eventos relacionados
e distensão abdominal. É comum a presença de complicações mi- com a artéria coronária semelhante ao dos indivíduos não diabéticos
crovasculares (retinopatia e neuropatia). A cintilografia da medici- que tiveram um IM prévio. Por causa da prevalência extremamente
na nuclear após a ingestão de uma refeição marcada com uma subs- alta de doença cardiovascular subjacente nos indivíduos com diabetes
tância radioativa pode documentar o esvaziamento gástrico tardio, (especialmente no DM tipo 2), a evidência de doença vascular ateros-
porém pode não evidenciar uma boa correlação com os sintomas clerótica (p. ex., teste com estresse cardíaco) deve ser procurada em
do paciente. Estão sendo desenvolvidos “testes respiratórios” não um indivíduo com diabetes que apresenta sintomas sugestivos de is-
invasivos a serem realizados após a ingestão de uma refeição mar- quemia cardíaca ou doença arterial periférica ou carotídea. A triagem
cada com uma substância radioativa. A disfunção parassimpática para CP nos indivíduos assintomáticos com diabetes é controversa,
secundária à hiperglicemia crônica é importante no surgimento da e estudos recentes não demonstraram qualquer benefício clínico. A
gastroparesia, porém a própria hiperglicemia também prejudica o ausência de dor torácica (“isquemia silenciosa”) é comum nos indiví-
esvaziamento gástrico. A diarreia noturna, alternando com cons- duos com diabetes, razão pela qual uma avaliação cardíaca completa
tipação, constitui uma característica da neuropatia autonômica GI deve ser considerada nos indivíduos que vão ser submetidos a um
relacionada com o DM. No DM tipo 1 esses sintomas devem indu- grande procedimento cirúrgico. O prognóstico para os indivíduos
zir-nos a realizar uma avaliação para a possível presença de doença com diabetes que sofrem de CP ou que tiveram um IM é mais som-
celíaca, por causa de sua maior frequência. A disfunção esofágica brio do que para os não diabéticos. É mais provável que a CP possa
no DM de longa duração também pode ocorrer, mas costuma ser acometer múltiplos vasos nos indivíduos com DM.
assintomática. O aumento das taxas de morbidade e de mortalidade cardiovas-
A neuropatia autonômica diabética pode resultar em disfun- culares parece relacionar-se com o sinergismo entre hiperglicemia e
Capítulo 19
ção geniturinária que inclui cistopatia, disfunção erétil e disfunção outros fatores de risco cardiovasculares. Por exemplo, após realizar o
sexual feminina (desejo sexual reduzido, dispareunia, lubrificação controle para todos os fatores de risco cardiovasculares conhecidos,
vaginal reduzida). Os sintomas de cistopatia diabética começam o DM tipo 2 duplica a taxa de morte cardiovascular em homens e
com a incapacidade de perceber a bexiga cheia e a impossibilidade quadruplica em mulheres. Os fatores de risco para doença macro-
de realizar uma micção completa. À medida que a contratilidade ve- vascular em diabéticos incluem dislipidemia, hipertensão, obesi-
sical piora, a capacidade vesical e o volume residual pós-miccional dade, atividade física reduzida e tabagismo. Outros fatores de risco
aumentam, dando origem a sintomas de irritação urinária, menor mais prevalentes na população diabética incluem microalbuminúria,
frequência miccional, incontinência e infecções recorrentes do tra- macroalbuminúria, uma elevação da creatinina sérica e função pla-
to urinário. A avaliação diagnóstica inclui exames de cistometria e quetária anormal. A resistência à insulina, que se reflete por níveis
Diabetes Melito
urodinâmicos. séricos de insulina elevados, está associada a maior risco de compli-
A disfunção erétil e a ejaculação retrógrada são muito comuns cações cardiovasculares nos indivíduos com e sem DM. Os indiví-
no DM e podem constituir um dos primeiros sinais de neuropatia duos com resistência à insulina e DM tipo 2 têm níveis elevados dos
diabética (Cap. 15). A disfunção erétil, cuja frequência aumenta com inibidores do ativador do plasminogênio (especialmente PAI-1) e de
a idade do paciente e a duração do diabetes, pode ocorrer na ausência fibrinogênio, o que acelera o processo da coagulação e prejudica a
de outros sinais de neuropatia autonômica diabética. fibrinólise, favorecendo assim o desenvolvimento de trombose. O
diabetes também está associado a uma disfunção do endotélio, do
músculo liso vascular e das plaquetas.
A melhora do controle glicêmico, quando iniciada pouco depois
TRATAMENTO Disfunções gastrintestinal e geniturinária do estabelecimento do diagnóstico de diabetes, reduz as complicações
cardiovasculares no DM, porém a meta da glicemia para os indivíduos
Os tratamentos atuais para essas complicações do DM são ina-
com diabetes de longa duração ainda não está bem definida. Tanto
dequados. O controle glicêmico aprimorado deve constituir
no DCCT (diabetes tipo 1) quanto no UKPDS (diabetes tipo 2), os
um objetivo primário, pois alguns aspectos (neuropatia, função
eventos cardiovasculares não foram reduzidos através de tratamento
gástrica) podem melhorar. Refeições menores e mais frequen-
intensivo durante o ensaio clínico, porém foram reduzidos durante o
tes que sejam mais fáceis de digerir (líquidos) ou com um baixo
acompanhamento realizado 10 a 17 anos depois. (Esse efeito foi de-
conteúdo de gorduras e fibras podem minimizar os sintomas da
nominado efeito de legado ou memória metabólica.) Durante o DCCT,
gastroparesia. Os agentes com alguma eficácia incluem os anta-
foi observada uma melhora do perfil lipídico dos indivíduos no grupo
gonistas da dopamina metoclopramida, 5 a 10 mg, e domperi-
de tratamento intensivo (colesterol total e colesterol LDL mais baixos,
dona, 10 a 20 mg, antes de cada refeição. A eritromicina interage
triglicerídios mais baixos) durante o controle intensivo do diabetes.
com o receptor da motilina e pode promover o esvaziamento
Os ensaios clínicos realizados com o objetivo de examinar se os alvos
gástrico. A diarreia diabética na ausência de crescimento bac-
glicêmicos muito agressivos (A1C de quase 6%) reduzem os eventos
teriano excessivo é tratada sintomaticamente com loperamida e
cardiovasculares no diabetes tipo 2 não mostraram um benefício de
pode responder ao octreotida (50 a 75 g, 3x/dia SC). Às vezes
sobrevida com a redução da A1C abaixo de 7% (e, em um ensaio clíni-
é útil o tratamento do crescimento bacteriano excessivo com an-
co, os resultados foram piores). As recomendações atuais não sugerem
tibióticos.
uma redução mais agressiva da glicose nessa população de pacientes.
A cistopatia diabética deve ser tratada com micção cronome-
A possibilidade de potencial aterogênico da insulina é sugerida pelos
trada ou autocaracterização, possivelmente com o acréscimo de
dados obtidos em indivíduos não diabéticos, que mostram níveis sé-
betanecol. Os fármacos que inibem a fosfodiesterase tipo 5 são
ricos mais altos de insulina (indicativos de resistência à insulina) em
efetivos para a disfunção erétil, porém sua eficácia nos indivíduos
associação a um maior risco de morbidade e mortalidade cardiovas-
com DM é ligeiramente menor que na população não diabética
culares. Entretanto, o tratamento com insulina e com as sulfonilureias
(Cap. 15). A disfunção sexual em mulheres pode ser melhorada
não parecia aumentar o risco de doença cardiovascular nos indivíduos
com o uso de lubrificantes vaginais, tratamento das infecções va-
com DM tipo 2, refutando desta maneira as alegações prévias acerca do
ginais e reposição estrogênica sistêmica ou local.
potencial aterogênico desses agentes.
221
Além da CP, a doença vascular cerebral aumenta nos indivíduos maior frequência de dislipidemia nessa forma de diabetes. Os estudos
com DM (aumento de 3 vezes na incidência de acidente vascular en- intervencionais mostraram que os efeitos benéficos da redução do LDL
cefálico). Os indivíduos com DM exibem uma maior incidência de são semelhantes nas populações diabética e não diabética. Os grandes
ICC. A etiologia dessa anormalidade provavelmente é multifatorial ensaios prospectivos de intervenção primária e secundária para CP
e inclui fatores como isquemia do miocárdio secundária à ateroscle- incluíram alguns indivíduos com DM tipo 2, e as análises de subgru-
rose, hipertensão e disfunção das células miocárdicas secundárias à pos constataram sistematicamente que as reduções no LDL reduzem
hiperglicemia crônica. os eventos cardiovasculares e a morbidade nos indivíduos com DM.
Nenhum estudo prospectivo abordou questões semelhantes nos indi-
víduos com DM tipo 1. Sabendo-se que a frequência de doença cardio-
TRATAMENTO Doença cardiovascular vascular é baixa em crianças e adultos jovens com diabetes, a avaliação
do risco CV deve ser incorporada nas diretrizes discutidas adiante.
Em geral, o tratamento da doença coronariana não é diferente Com base nas diretrizes proporcionadas pela ADA e pela
no diabético. Os procedimentos de revascularização para CP, in- American Heart Association, as prioridades no tratamento da dis-
cluindo intervenções coronarianas percutâneas (ICP) e enxerto lipidemia são as seguintes: (1) reduzir o colesterol LDL, (2) elevar
bypass de artérias coronárias (EBAC), poderão ser menos efica- o colesterol HDL, e (3) reduzir os triglicerídios. A estratégia tera-
zes no indivíduo diabético. As taxas de sucesso inicial dos ICP em pêutica depende do padrão das anormalidades das lipoproteínas. A
diabéticos são semelhantes àquelas observadas na população não terapia inicial para todas as formas de dislipidemia deveria incluir
diabética, porém os pacientes diabéticos exibem taxas mais altas alterações dietéticas, assim como as mesmas modificações no esti-
de reestenose, assim como taxas mais baixas de patência a longo lo de vida recomendadas na população não diabética (abandono do
prazo e de sobrevida nos estudos mais antigos. Mais recentemente, tabaco, controle da pressão arterial, perda de peso, aumento da ati-
o uso de stents farmacológicos (que liberam medicamentos) e de vidade física). As recomendações dietéticas para os indivíduos com
um inibidor plaquetário GPIIb/IIIa aprimorou os resultados nos DM são semelhantes àquelas defendidas pelo National Cholesterol
pacientes diabéticos, porém não ficou claro se existe alguma di- Education Program (Cap. 21) e incluem maiores quantidades de gor-
ferença na eficácia dos ICP em indivíduos diabéticos. Apesar de o dura monoinsaturada e de carboidratos e quantidades reduzidas de
enxerto bypass de artérias coronárias (EBAC) poder ser preferido gorduras saturadas e de colesterol. Apesar de ser considerada como
à ICP nos diabéticos com doença arterial coronariana de múltiplos sendo importante, a resposta às alterações dietéticas costumam ser
SEÇÃO III
vasos ou que tiveram um infarto recente com onda Q, a ICP é pre- moderadas (redução inferior a 10% no LDL). O aprimoramento do
ferida nos pacientes com doença arterial coronariana de um único controle glicêmico conseguirá reduzir os triglicerídios e exerce um
vaso ou com doença de dois vasos (sem acometimento da artéria efeito benéfico moderado por elevar o HDL. Os inibidores de HMG
coronária descendente anterior esquerda). CoA redutase são os agentes de escolha para reduzir o LDL. Em con-
A ADA enfatizou a importância do controle glicêmico e da mo- formidade com as diretrizes da ADA e da American Heart Associa-
dificação agressiva dos riscos cardiovasculares em todos os indiví- tion, os valores-alvo dos lipídios em diabéticos (idade superior a 40
duos com DM (ver adiante). O antigo temor acerca da utilização de anos) sem doença cardiovascular deveriam ser os seguintes: LDL <
betabloqueadores nos indivíduos que sofrem de diabetes não deveria 2,6 mmol/L (100 mg/dL); HDL > 1 mmol/L (40 mg/dL) em homens e
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
impedir a utilização desses agentes, pois eles beneficiam claramente > 1,3 mmol/L (50 mg/dL) em mulheres; e triglicerídios < 1,7 mmol/L
os pacientes diabéticos após IM. Os inibidores ECA (ou os BRA) (150 mg/dL). Nos pacientes com mais de 40 anos, a ADA recomenda
também podem ser particularmente benéficos e deverão ser aven- o acréscimo de uma estatina, independentemente do nível das LDL,
tados nos indivíduos com DM tipo 2 e outros fatores de risco (ta- em pacientes com CP e naqueles sem CP, mas que apresentam fatores
bagismo, dislipidemia, história de doença cardiovascular, microal- de risco para CP.
buminúria). Os pacientes com dor torácica atípica ou com um ECG Quando se sabe que o paciente apresenta CP, a ADA recomenda
em repouso anormal devem ser considerados para triagem para CP. uma meta das LDL de < 1,8 mmol/L (70 mg/dL) como “opção” [em
A terapia antiplaquetária reduz os eventos cardiovasculares conformidade com a evidência de que essa meta é benéfica nos indi-
nos indivíduos com DM que sofrem de CP. As recomendações víduos não diabéticos com CP (Cap. 21)]. Estudos anteriores realiza-
atuais elaboradas pela ADA incluem o uso de ácido acetilsalicílico dos com fibratos indicaram a sua eficácia, porém os ensaios clínicos
para a prevenção secundária de episódios coronarianos e a consi- recentes não demonstraram qualquer benefício dessa classe de agen-
deração do uso de ácido acetilsalicílico em indivíduos diabéticos tes. A terapia combinada com um inibidor de HMG CoA redutase
com risco cardiovascular aumentado (baseado na estratificação e um fibrato ou outro agente redutor dos lipídios (ezetimibe, niaci-
de risco utilizando fatores de risco como hipertensão, tabagismo, na) pode ser considerada para alcançar as metas das LDL, porém as
história familiar, albuminúria ou dislipidemia). Não existem da- combinações de estatina/fibrato aumentam a possibilidade de efeitos
dos demonstrando a eficácia do ácido acetilsalicílico na prevenção colaterais, como a miosite. O ácido nicotínico eleva efetivamente as
primária de eventos coronarianos em indivíduos com DM e baixo HDL e pode ser usado nos pacientes com diabetes, porém as altas
risco de CP. A dose de ácido acetilsalicílico (75 a 162 mg) é a mes- doses (> 2 g/dia) podem prejudicar o controle glicêmico e aumentar
ma adotada nos indivíduos não diabéticos. A terapia com ácido a resistência à insulina. As resinas fixadoras de ácidos biliares não
acetilsalicílico não exerce efeitos deletérios sobre a função renal ou devem ser usadas na presença de hipertrigliceridemia.
a hipertensão, nem influencia a evolução da retinopatia diabética.
Hipertensão A hipertensão pode acelerar outras complicações do
DM, particularmente doença cardiovascular e nefropatia. Ao ter como
meta um alvo de PA < 130/80 mmHg, a terapia deveria enfatizar pri-
Fatores de risco cardiovasculares meiro as modificações no estilo de vida, tais como perda de peso, exer-
Dislipidemia Os indivíduos com DM podem ter várias formas de dis- cício, controle do estresse e restrição de sódio. Reconhecendo-se que
lipidemia (Cap. 21). Por causa do risco cardiovascular aditivo da hi- em geral será necessário mais de um agente para alcançar a meta da
perglicemia e da hiperlipidemia, as anormalidades lipídicas devem ser pressão arterial, a ADA recomenda que todos os pacientes com diabe-
avaliadas agressivamente e tratadas como parte da assistência abran- tes e hipertensão devem ser tratados com um inibidor de ECA ou um
gente do diabetes. O padrão mais comum de dislipidemia é a hipertri- BRA. Subsequentemente, os agentes que reduzem o risco cardiovascu-
gliceridemia e níveis de colesterol HDL reduzidos. Por si só o DM não lar (betabloqueadores, diuréticos tiazídicos e bloqueadores dos canais
eleva os níveis de LDL, porém as pequenas partículas densas de LDL de cálcio) devem ser incorporados nesse esquema. Apesar de os inibi-
encontradas no DM tipo 2 são mais aterogênicas, pois elas são glica- dores da ECA e os BRA serem provavelmente equivalentes na maioria
das (glicosiladas) mais facilmente e se tornam suscetíveis à oxidação. dos pacientes com diabetes e doença renal, a ADA assinala que: (1) nos
Quase todos os estudos sobre o tratamento da dislipidemia dia- pacientes com diabetes tipo 1, hipertensão e microalbuminúria ou ma-
bética foram realizados em indivíduos com DM tipo 2 por causa da croalbuminúria, um inibidor da ECA reduziu a progressão da nefropa-
222
tia; (2) um inibidor da ECA ou um BRA diminuíram a velocidade de
tes de alto risco devem ser identificados durante o exame sistemá-
progressão para macroalbuminúria em pacientes com diabetes tipo 2;
tico do pé realizado em todos os pacientes com DM (ver “Aspec-
e (3) os BRA reduziram o declínio da TFG em pacientes com diabetes
tos contínuos da assistência abrangente do diabetes”, adiante). A
tipo 2, hipertensão, macroalbuminúria e insuficiência renal. Outros
orientação do paciente deveria enfatizar: (1) a escolha cuidadosa
pontos a serem enfatizados incluem os seguintes:
do calçado, (2) a inspeção diária dos pés para identificar os sinais
1. Os inibidores da ECA são neutros para a glicose e os lipídios precoces de uma adaptação inadequada do calçado ou de peque-
ou são benéficos para essas mesmas substâncias e, assim sendo, nos traumatismos, (3) higiene diária dos pés a fim de manter a
exercem um impacto positivo sobre o perfil de risco cardio- pele limpa e úmida, (4) evitar o autotratamento das anormalida-
vascular. Os bloqueadores dos canais de cálcio, os antagonistas des do pé, assim como qualquer comportamento de alto risco (p.
adrenérgicos centrais e os vasodilatadores são neutros para os ex., andar descalço) e (5) consulta imediata com um provedor de
lipídios e a glicose. assistência de saúde quando surge alguma anormalidade. Os pa-
2. Os beta-bloqueadores e os diuréticos tiazídicos podem au- cientes com um alto risco de ulceração ou amputação podem ser
mentar a resistência à insulina e exercer um impacto negativo beneficiados pela avaliação feita por um especialista em cuidados
sobre o perfil lipídico; os betabloqueadores podem aumentar do pé. As intervenções orientadas para a modificação dos fatores
ligeiramente o risco de instalação do DM tipo 2. Os beta-blo- de risco incluem calçados e dispositivos ortóticos, tratamento das
queadores são seguros em pacientes com diabetes e reduzem os calosidades, cuidados com as unhas e medidas profiláticas para
eventos cardiovasculares. reduzir o aumento de pressão sobre a pele produzido por uma ar-
3. Os inibidores simpáticos e os bloqueadores -adrenérgicos po- quitetura óssea anormal. A atenção a outros fatores de risco para
dem agravar a hipotensão ortostática no diabético com neuro- doença vascular (tabagismo, dislipidemia, hipertensão) e o con-
patia autonômica. trole glicêmico aprimorado também são importantes.
4. Uma redução equivalente na pressão arterial induzida por dife- Apesar das medidas preventivas, a ulceração e a infecção do pé
rentes classes de agentes pode não se traduzir em uma proteção são comuns e representam um problema sério. Por causa da pato-
equivalente em relação aos pontos terminais cardiovasculares genia multifatorial das úlceras da extremidade inferior, o controle
e renais. Tiazídicos, beta-bloqueadores, inibidores da ECA e dessas lesões é multidisciplinar e, com frequência, exige a perícia
BRA exercem um impacto positivo sobre os pontos terminais em ortopedia, cirurgia vascular, endocrinologia, podiatria e doen-
Capítulo 19
cardiovasculares (IM ou acidente vascular encefálico). ças infecciosas. A superfície plantar do pé é o local mais comum de
5. O potássio sérico e a função renal devem ser monitorados. ulceração. As úlceras podem ser principalmente neuropáticas (sem
Por causa da alta prevalência de doença aterosclerótica nos indiví- infecção concomitante) ou podem possuir uma celulite circundan-
duos com DM tipo 2, a possibilidade de hipertensão renovascular deve te ou osteomielite. A celulite sem ulceração também é frequente e
ser aventada quando a pressão arterial não é prontamente controlada. deve ser tratada com antibióticos que proporcionam uma cobertu-
ra de amplo espectro, incluindo os anaeróbios (ver adiante).
■■ COMPLICAÇÕES NOS MEMBROS INFERIORES A úlcera infectada é um diagnóstico clínico, pois a cultura
O DM é a principal causa de amputação não traumática dos membros superficial de qualquer ulceração encontrará provavelmente múl-
inferiores nos EUA. Úlceras e infecções no pé também constituem tiplas espécies possíveis de bactérias. A infecção ao redor de uma
Diabetes Melito
uma importante fonte de morbidade nos indivíduos com DM. As ra- úlcera do pé representa com frequência o resultado de múltiplos
zões para a maior incidência desses distúrbios no DM envolvem a inte- organismos (organismos Gram-positivos e Gram-negativos, as-
ração de vários fatores patogênicos: neuropatia, biomecânica anormal sim como anaeróbios) e a gangrena gasosa pode instalar-se na au-
do pé, DAP e cicatrização precária das feridas. A neuropatia sensorial sência de infecção clostrídica. As culturas do material obtido da
periférica interfere com os mecanismos protetores normais e permite superfície da úlcera não são úteis; uma cultura do material obtido
ao paciente suportar traumatismos significativos ou menores, porém da base da úlcera desbridada ou da secreção purulenta ou da as-
repetidos que acometem o pé, na maioria das vezes sem tomarem co- piração da ferida é a mais útil. A profundidade da ferida deve ser
nhecimento da lesão. A propriocepção desordenada acarreta um apoio determinada pela inspeção e realizando-se uma sondagem com
anormal do peso ao caminhar e a subsequente formação de uma calo- um instrumento esterilizado de ponta romba. Radiografias sim-
sidade ou ulceração. A neuropatia motora e sensorial é responsável por ples do pé devem ser obtidas para determinar a possibilidade de
uma mecânica muscular anormal do pé e por alterações estruturais no osteomielite nas úlceras crônicas que não responderam à terapia.
pé (dedo em martelo, deformidade com dedo do pé em garra, cabeças A cintilografia óssea pode ser útil, porém e com muita frequên-
dos metatarsos proeminentes, articulação de Charcot). A neuropatia cia será difícil diferenciar a infecção subcutânea suprajacente de
autonômica resulta em anidrose e fluxo sanguíneo superficial alterado uma osteomielite. Os exames com linfócitos marcados com índio
no pé, o que promove o ressecamento da pele e a formação de fissuras. são mais úteis para determinar se a infecção acomete as estruturas
A DAP e uma cicatrização precária das feridas dificultam a resolução ósseas ou apenas os tecidos moles, apesar de serem tecnicamente
de pequenas soluções de continuidade na pele, permitindo-lhes que complexos. A RM do pé pode ser a modalidade mais específica,
aumentem de tamanho e que se tornem infectadas. apesar de ser difícil distinguir a destruição óssea decorrente de os-
Cerca de 15% dos indivíduos com DM tipo 2 desenvolvem úlce- teomielite da destruição secundária a uma artropatia de Charcot.
ra do pé (o grande artelho ou as áreas MTF são mais comuns), e um Se for necessário o desbridamento cirúrgico, a biópsia e a cultura
subgrupo significativo acabará sendo submetido a uma amputação do osso poderão proporcionar a resposta.
(risco de 14 a 24% com essa úlcera ou uma ulceração subsequente). Os A osteomielite deve ser tratada preferencialmente por uma
fatores de risco para úlceras ou amputação do pé incluem: sexo mascu- combinação de antibióticos prolongados (IV e, a seguir, orais), e,
lino, diabetes com mais de 10 anos de duração, neuropatia periférica, possivelmente, pelo desbridamento do osso infectado. A possível
estrutura anormal do pé (anormalidades ósseas, calosidades, unhas es- contribuição da insuficiência vascular deve ser aventada em todos
pessadas), doença arterial periférica, tabagismo, história de úlcera ou os pacientes. Com bastante frequência, os exames não invasivos
de amputação prévia e controle glicêmico precário. Com frequência, as do fluxo sanguíneo não são confiáveis no DM e poderá ser neces-
grandes calosidades são precursoras de ou se sobrepõem às ulcerações. sária uma angiografia, reconhecendo-se, porém o risco da nefro-
toxicidade induzida pelo contraste. Os procedimentos periféricos
de bypass arterial costumam ser efetivos no sentido de promover
TRATAMENTO Complicações nos membros inferiores a cicatrização das feridas e de reduzir a necessidade de amputação
do membro isquêmico.
A terapia ideal para úlceras e amputações do pé é a prevenção pela Existe um número crescente de possíveis tratamentos para
identificação dos pacientes de alto risco, orientação do paciente e o pé diabético, mas que ainda não evidenciaram uma eficácia
adoção de medidas destinadas a prevenir a ulceração. Os pacien- incontestável nos ensaios prospectivos controlados. Uma decla-
223
Pneumonia, infecções do trato urinário e infecções da pele e dos
ração de consenso da ADA identificou seis intervenções com
tecidos moles são todas mais comuns na população diabética. Em ge-
eficácia demonstrada nas feridas do pé diabético: (1) eliminação
ral, os organismos que causam infecções pulmonares são semelhantes
das sobrecargas, (2) desbridamento, (3) curativos das feridas, (4)
àqueles encontrados na população não diabética; entretanto, os orga-
uso apropriado de antibióticos, (5) revascularização e (6) ampu-
nismos Gram-negativos, S. aureus e Mycobacterium tuberculosis são
tação limitada. A eliminação da carga consiste em evitar comple-
os patógenos mais frequentes. As infecções do trato urinário (tanto do
tamente o apoio do peso corporal sobre a úlcera, o que elimina
trato urinário inferior quanto a pielonefrite) representam o resultado
o traumatismo mecânico que retarda a cicatrização da ferida. O
de agentes bacterianos comuns, tais como Escherichia coli, apesar de
repouso no leito e uma ampla variedade de dispositivos ortóticos
várias espécies de fungos (Candida e Torulopsis glabrata) serem ob-
ou de imobilizadores de contato limitam o apoio do peso corporal
servadas comumente. As complicações das infecções do trato urinário
sobre as feridas ou os pontos de maior pressão. O desbridamen-
incluem pielonefrite enfisematosa e cistite enfisematosa. A bacteriúria
to cirúrgico é importante e eficaz, porém faltam evidências para
ocorre frequentemente nos indivíduos com cistopatia diabética. Ob-
uma eficácia incontestável de outras modalidades utilizadas para
serva-se um aumento da suscetibilidade à furunculose, das infecções
a limpeza das feridas (enzimas, impregnação com líquidos, turbi-
superficiais por Candida e da vulvovaginite. O controle glicêmico pre-
lhões). Certos curativos, como aqueles de hidrocoloide, promo-
cário é um denominador comum nos indivíduos com essas infecções.
vem a cicatrização das feridas por criarem um ambiente úmido e
Os indivíduos diabéticos evidenciam uma maior taxa de colonização
protegerem a ferida. Os agentes antissépticos devem ser evitados.
por S. aureus nas pregas cutâneas e nas narinas. Os diabéticos também
Os antibióticos tópicos comportam um valor limitado. O encami-
correm maior risco de infecções pós-operatórias das feridas. O contro-
nhamento para a fisioterapia, a avaliação ortótica e a reabilitação
le glicêmico rígido reduz as infecções pós-operatórias nos diabéticos
devem ser realizados após o controle da infecção.
submetidos a um enxerto bypass de artérias coronárias (EBAC) e de-
As infecções mais leves ou que não ameaçam o membro po-
veria ser a meta em todos os pacientes diabéticos com uma infecção.
dem ser tratadas com antibióticos orais (cefalosporina, clindami-
cina, amoxicilina/clavulanato e fluoroquinolonas), desbridamento ■■ MANIFESTAÇÕES DERMATOLÓGICAS
cirúrgico do tecido necrótico, cuidados locais da ferida (evitando-
As manifestações cutâneas mais comuns do DM são a cicatrização re-
-se o apoio do peso corporal sobre a úlcera) e vigilância atenta à
tardada das feridas e as ulcerações cutâneas. A dermopatia diabética,
possível progressão da infecção. As úlceras mais graves podem exi-
às vezes denominada pápulas pré-tibiais pigmentadas, ou “manchas
gir antibióticos IV. assim como repouso no leito e cuidados locais
SEÇÃO III
Capítulo 19
e locais das injeções de insulina. Uma pressão arterial > 130/80
mmHg é considerada como hipertensão nos indivíduos com dia- uma triagem para CP assintomática através de um teste apropria-
betes. O exame minucioso das extremidades inferiores deve pro- do de estresse cardíaco, quando indicado.
curar evidências de doença arterial periférica (pulsos pediosos), A classificação do tipo de DM pode ser facilitada por avalia-
neuropatia periférica, calosidades, infecções fúngicas superficiais, ções laboratoriais. As mensurações séricas de insulina ou do pep-
doença ungueal, reflexos do tornozelo e deformidades do pé (tais tídio C nem sempre permitem distinguir o DM tipo 1 do tipo 2,
como dedo em martelo ou em garra e pé de Charcot) a fim de porém um baixo nível de peptídio C confirma que esse paciente
identificar os locais de possível ulceração cutânea. A sensação vi- necessita de insulina. Muitos indivíduos com DM tipo 1 de início
bratória (um diapasão de 128 MHz colocado na base do grande recente conservam alguma produção do peptídio C. A mensura-
artelho), a capacidade de perceber o toque com um monofila- ção dos anticorpos para as células insulares na época do início do
Diabetes Melito
mento (monofilamento 5,07, de 10 g), a sensação gerada por uma diabetes pode ser útil se o tipo de DM não tiver sido esclarecido
alfinetada, o teste para reflexo do tornozelo e o limiar de percep- com base nas características descritas anteriormente.
ção vibratória (com o uso de um biotesiômetro) são úteis para
detectar uma neuropatia diabética moderadamente avançada.
Sabendo-se que a doença periodontal é mais frequente no DM, os TRATAMENTO A LONGO PRAZO
dentes e as gengivas também devem ser examinados.
■■ PRINCÍPIOS GERAIS
CLASSIFICAÇÃO DO DM DE UM DETERMINADO PACIENTE A etiologia As metas da terapia para o DM tipo 1 ou tipo 2 consistem em: (1)
do diabetes em um indivíduo com doença de início recente em eliminar os sintomas relacionados com a hiperglicemia, (2) reduzir
geral pode ser imputada com base em critérios clínicos. Os indi- ou eliminar as complicações microvasculares e macrovasculares a
víduos com DM tipo 1 tendem a ter as seguintes características: longo prazo do DM e (3) permitir que o paciente possa levar o estilo
(1) início da doença antes dos 30 anos; (2) constituição corporal de vida mais normal possível. Para concretizar essas metas, o médico
magra; (3) necessidade de insulina como terapia inicial; (4) pro- deve identificar o nível alvo de controle glicêmico para cada paciente,
pensão para desenvolver cetoacidose; e (5) maior risco de outros proporcionar ao paciente os recursos de orientação e farmacológicos
distúrbios autoimunes como doença tireóidea autoimune, insufi- necessários para que possa alcançar esse nível e monitorar/tratar as
ciência suprarrenal, anemia perniciosa, doença celíaca e vitiligo. complicações relacionadas com o DM. Os sintomas de diabetes costu-
Em contrapartida, os indivíduos com DM tipo 2 exibem com mam regredir quando a glicose plasmática é < 11,1 mmol/L (200 mg/
frequência as seguintes características: (1) desenvolvem diabetes dL) e, assim sendo, a maior parte do tratamento do DM se concentra
após os 30 anos; (2) em geral são obesos (80% são obesos, porém na concretização do segundo e do terceiro objetivos. As metas do tra-
os indivíduos idosos podem ser magros); (3) inicialmente podem tamento dos pacientes com diabetes são resumidas no Quadro 19.8.
não necessitar de terapia insulínica; e (4) podem ter condições O atendimento de um indivíduo com DM tanto tipo 1 quanto
associadas, tais como resistência à insulina, hipertensão, doença
tipo 2 requer uma equipe multiprofissional. De primordial impor-
cardiovascular, dislipidemia ou SOP. No DM tipo 2, a resistência
tância para o sucesso dessa equipe são a participação, o influxo e o
à insulina está associada frequentemente à obesidade abdominal
entusiasmo do paciente, que são todos essenciais para um contro-
(em oposição a obesidade no quadril e nas coxas) e a hipertriglice-
le ideal do diabetes. Os membros da equipe de assistência de saúde
ridemia. A maioria dos indivíduos diagnosticados com DM tipo 2
incluem o provedor de assistência primária e/ou o endocrinologista
é constituída por idosos, porém a idade ao ser feito o diagnóstico
ou diabetologista, um educador graduado em diabetes e um nutri-
está declinando e observa-se um grande aumento entre crianças
cionista. Além disso, quando surgem complicações do DM, alguns
e adolescentes com sobrepeso. Alguns indivíduos com DM fe-
notípico tipo 2 se apresentam com cetoacidose diabética (CAD), especialistas (incluindo neurologistas, nefrologistas, cirurgiões vas-
porém carecem de marcadores autoimunes e a seguir poderão ser culares, cardiologistas, oftalmologistas e podiatras) com experiência
tratados com agentes orais redutores da glicose em vez de insu- nas complicações relacionadas com o DM são essenciais.
lina (esse quadro clínico é algumas vezes denominado DM tipo Várias designações são algumas vezes aplicadas às diferentes
2 com propensão para cetose). Por outro lado, alguns indivíduos abordagens do atendimento ao diabetes, tais como terapia insulínica
(5 a 10%) com o aspecto fenotípico de DM tipo 2 não possuem intensiva, controle glicêmico intensivo e “controle rígido.” Este capítu-
lo e outras fontes utilizam o termo assistência abrangente do diabetes
225
cluem o auto-monitoramento da glicose sanguínea, o monitoramen-
QUADRO 19.8 Metas do tratamento para adultos com to das cetonas urinárias (DM tipo 1); a administração de insulina; as
diabetesa diretrizes para o controle do diabetes durante as enfermidades; a pre-
Índice Meta venção e o controle da hipoglicemia (Cap. 20); os cuidados com os
pés e a pele; o controle do diabetes antes, durante e após o exercício; e
b
Controle da glicemia as atividades capazes de modificar os fatores de risco.
A1C < 7,0%c
Glicose plasmática capilar 3,9 a 7,2 mmol/L (70 a 130 mg/dL) Nutrição
pré‑prandial Terapia nutricional médica (TNM) é um termo usado pela ADA para
Pico de glicose plasmática < 10,0 < 1,7 mmol/L (< 180 mg/dL) descrever a coordenação ótima da ingesta calórica com outros aspec-
capilar pós‑prandiald tos da terapia para diabetes (insulina, exercício, perda de peso). As
medidas de prevenção primária da TNM destinam-se a prevenir ou
Pressão arterial < 130/80
retardar o início do DM tipo 2 nos indivíduos de alto risco (obesos
Lipídiose ou com pré-diabetes) através da promoção de uma redução ponderal.
Lipoproteína de baixa densidade < 2,6 mmol/L (< 100 mg/dL) O tratamento médico da obesidade é uma área em rápida evolução e
Lipoproteína de alta densidade > 1 mmol/L (> 40 mg/dL) nos será abordado no Cap. 17. As medidas de prevenção secundária da
homens TNM têm por finalidade prevenir ou retardar as complicações relacio-
> 1,3 mmol/L (> 50 mg/dL) nas nadas com o diabetes nos indivíduos diabéticos pelo aprimoramento
mulheres do controle glicêmico. As medidas de prevenção terciária da TNM têm
Triglicerídios < 1,7 mmol/L (150 mg/dL) por finalidade controlar as complicações relacionadas com o diabe-
a
tes (doença cardiovascular, nefropatia) nos indivíduos diabéticos. Por
De acordo com as recomendações da ADA; as metas devem ser individualizadas para cada exemplo, nos indivíduos com diabetes e doença renal crônica, a inges-
paciente (ver o texto). As metas podem ser diferentes para certas populações de pacientes.
b tão de proteínas deveria ser limitada a 0,8 g/kg de peso corporal por
A A1C constitui a principal meta.
c dia. A TNM nos pacientes com diabetes e doença cardiovascular de-
Faixa normal para A1C: 4,0 a 0,6% (ensaio baseado no DCCT).
d veria incorporar os princípios dietéticos utilizados nos pacientes sem
Uma a duas após iniciar uma refeição.
e
Por ordem decrescente de prioridade.
diabetes com doença cardiovascular. Apesar de as recomendações para
SEÇÃO III
226
com DM tipo 2. O índice glicêmico é uma estimativa da elevação pós- exercício se a glicose sanguínea for > 14 mmol/L (250 mg/dL) as-
-prandial na glicose sanguínea quando é consumida uma determi- sim como na presença de cetonas; (3) se a glicose sanguínea for < 5,6
nada quantidade desse alimento. O consumo de alimentos com um mmol/L (100 mg/dL), ingerir carboidratos antes de exercitar-se; (4)
baixo índice glicêmico parece reduzir as excursões pós-prandiais da monitorar a glicose durante o exercício e ingerir carboidratos para
glicose e aprimorar o controle glicêmico. As calorias reduzidas e os prevenir a hipoglicemia; (5) reduzir as doses de insulina (com base
adoçantes não nutritivos são úteis. Atualmente, a evidência não apoia na experiência precedente) antes do exercício e injetar insulina em
a suplementação da dieta com vitaminas, antioxidantes (vitaminas C uma área que não está sendo exercitada; bem como (6) ensinar aos
e E), ou micronutrientes (cromo) nos pacientes com diabetes. indivíduos as respostas da glicose aos diferentes tipos de exercício
O objetivo da TNM no indivíduo com DM tipo 1 consiste em e aumentar a ingestão de alimentos por até 24 h após um exercício,
coordenar e equilibrar a ingestão calórica, em termos tanto tempo- dependendo da intensidade e da duração desse exercício. Nos indi-
rais quanto quantitativos, com a quantidade apropriada de insulina. víduos com DM tipo 2, a hipoglicemia relacionada com o exercício é
A TNM no DM tipo 1 e o automonitoramento da glicose sanguínea menos comum, mas pode ocorrer nos indivíduos que estão receben-
devem ser integrados de forma a definir o esquema ótimo de insuli- do insulina ou secretagogos da insulina.
na. A ADA encoraja os pacientes e os provedores a utilizarem as con- Levando-se em conta que a doença cardiovascular assintomática
tagens de carboidratos ou os sistemas de permuta a fim de estimar aparece em uma idade mais jovem no DM tanto tipo 1 quanto tipo
o conteúdo em nutrientes de uma refeição ou de um lanche. Com 2, o teste formal de tolerância ao exercício pode ser justificado nos
base na estimativa feita pelo paciente do conteúdo em carboidratos indivíduos diabéticos com qualquer um dos seguintes elementos:
de uma refeição, uma relação de insulina-para-carboidratos determi- idade acima de 35 anos, duração do diabetes mais de 15 anos (DM
na a dose de insulina necessária para uma refeição ou um lanche. A tipo 1) ou mais de 10 anos (DM tipo 2); complicações microvascula-
TNM deve ser suficientemente flexível para permitir a realização do res do DM (retinopatia, microalbuminúria ou nefropatia), DAP, ou-
exercício e o esquema de insulina deve tornar possível a realização de tros fatores de risco de CP, ou neuropatia autonômica. A retinopatia
desvios na ingestão calórica. Um componente importante da TNM proliferativa não tratada é uma contraindicação relativa ao exercício
no DM tipo 1 consiste em minimizar o aumento de peso com fre- vigoroso, pois poderia resultar em hemorragia do vítreo ou em des-
quência associado ao controle intensivo do diabetes. colamento da retina.
Os objetivos da TNM no DM tipo 2 devem concentrar-se na per-
da de peso e considerar a prevalência acentuadamente aumentada ■■ MONITORAMENTO DO NÍVEL DE CONTROLE GLICÊMICO
Capítulo 19
dos fatores de risco cardiovasculares (hipertensão, dislipidemia, obe- O monitoramento ótimo do controle glicêmico envolve as mensura-
sidade) e de doença nessa população. A maioria desses indivíduos é ções da glicose plasmática pelo paciente e uma avaliação do controle
obesa e a perda de peso é enfaticamente encorajada, e deve continuar a longo prazo pelo médico (mensuração da hemoglobina A1C e revi-
sendo um objetivo importante. As dietas hipocalóricas e a redução são das automensurações da glicose plasmáticas feitas pelo paciente).
moderada do peso (5 a 7%) resultam com frequência em uma que- Essas mensurações são complementares: as mensurações do paciente
da rápida e dramática da glicose nos indivíduos com DM tipo 2 de proporcionam um quadro do controle glicêmico a curto prazo, en-
início recente. Não obstante, inúmeros estudos documentam que a quanto a A 1C reflete o controle glicêmico médio ao longo dos 2 a 3
perda de peso a longo prazo é incomum. A TNM para o DM tipo 2 meses precedentes.
deveria enfatizar uma redução calórica moderada (com baixo teor
Diabetes Melito
de carboidratos e de gordura), uma ingestão reduzida de gordura e Automonitoramento da glicose sanguínea
maior atividade física. O maior consumo de fibras dietéticas solúveis O automonitoramento da glicose sanguínea (AMGS) é o padrão de
pode aprimorar o controle glicêmico nos indivíduos com DM tipo assistência no controle do diabetes e permite ao paciente monitorar
2. A perda de peso e o exercício melhoram a resistência à insulina. a qualquer momento sua glicose sanguínea. Com a AMGS, uma pe-
quena gota de sangue e uma reação enzimática facilmente detectável
Exercício físico permitem fazer a mensuração da glicose plasmática capilar. Muitos
O exercício comporta múltiplos benefícios positivos, incluindo redu- monitores da glicose conseguem medir a glicose com rapidez e exa-
ção do risco cardiovascular, queda da pressão arterial, manutenção tidão (sendo calibrados de modo a proporcionar o valor da glicose
da massa muscular, redução da gordura corporal e perda de peso. plasmática apesar de estar sendo medida a glicose sanguínea) em pe-
Para os indivíduos com DM tipo 1 ou tipo 2, é útil também para quenas quantidades de sangue (3 a 10 L) obtidas da ponta digital;
baixar a glicose plasmática (durante e após o exercício) e aumentar os locais alternativos para os testes (p. ex., o antebraço) são menos
a sensibilidade à insulina. Nos pacientes com diabetes, a ADA re- confiáveis, especialmente quando a glicose sanguínea está se modifi-
comenda 150 min/semana (distribuídos ao longo de pelo menos 3 cando rapidamente (no período pós-prandial). Estão disponíveis inú-
dias) de atividade física aeróbia moderada. O programa de exercício meros monitores da glicose sanguínea e o educador diplomado em
também deveria incluir o treinamento de resistência. diabetes é de primordial importância no sentido de ajudar o paciente
Apesar de seus benefícios, o exercício gera desafios para os indi- a escolher o dispositivo ideal e aprender a usá-lo corretamente. Ao
víduos com DM, pois eles carecem dos mecanismos glicorregulado- combinar as mensurações da glicose com a história dietética, as mu-
res normais (normalmente, a insulina cai e o glucagon sobe durante o danças de medicações e a história do exercício, a equipe de tratamento
exercício). O músculo esquelético é o principal local para o consumo do diabetes e o paciente podem melhorar o programa de tratamento.
de combustível metabólico no estado de repouso e a atividade muscu- A frequência das mensurações do AMGS deve ser individualizada
lar aumentada durante o exercício aeróbio vigoroso induz um grande e adaptada de maneira a atender as metas da assistência do diabetes.
aumento das necessidades de combustível. Os indivíduos com DM tipo Os indivíduos com DM tipo 1 ou aqueles com DM tipo 2 que estão
1 são propensos à hiperglicemia ou hipoglicemia durante o exercício, recebendo múltiplas injeções diárias de insulina devem medir siste-
dependendo da glicose plasmática pré-exercício, do nível de insulina maticamente sua glicose plasmática 3 ou mais vezes/dia para estimar
circulante e do nível de catecolaminas induzidas pelo exercício. Se o ní- e selecionar os bolus de insulina de ação rápida na hora da refeição,
vel de insulina for excessivamente baixo, a elevação nas catecolaminas assim como para modificar as doses de insulina de ação prolongada.
pode acarretar um aumento excessivo da glicose plasmática, promover A maioria dos indivíduos com DM tipo 2 necessita de um monitora-
a formação de corpos cetônicos e, possivelmente, resultar em cetoaci- mento menos frequente, porém a frequência ótima do AMGS ainda
dose. Inversamente, se o nível de insulina circulante for excessivo, essa não foi definida claramente. Os indivíduos com DM tipo 2 que estão
hiperinsulinemia relativa pode reduzir a produção hepática de glicose utilizando insulina deveriam utilizar o AMGS com maior frequência
(diminuição da glicogenólise e da gliconeogênese) e aumentar a entra- do que aqueles que estão recebendo agentes orais. Os indivíduos com
da de glicose no músculo, resultando em hipoglicemia. DM tipo 2 que estão sendo controlados com medicações orais deve-
Para evitar a hiperglicemia ou hipoglicemia relacionadas com riam utilizar o AMGS como um meio de determinar a eficácia de sua
o exercício, os indivíduos com DM tipo 1 deveriam: (1) monitorar medicação e o impacto da dieta. Sabendo-se que os níveis plasmáticos
a glicose sanguínea antes, durante e após o exercício; (2) protelar o de glicose flutuam menos nesses indivíduos, uma a duas mensurações
227
do AMGS por dia (ou até menos nos pacientes que estão recebendo mico no transcorrer das 2 semanas precedentes. Ensaios alternativos
agentes orais ou que estão sendo controlados pela dieta) podem ser de controle glicêmico (incluindo o ensaio de 1,5 anidroglucitol) não
suficientes. A maioria das mensurações nos indivíduos com DM tipo devem ser utilizados como rotina, pois faltam estudos demonstrando
1 ou tipo 2 deveria ser realizada antes de uma refeição e suplementada que eles possam prever com exatidão as complicações do DM.
com mensurações pós-prandiais para ajudar a alcançar os alvos pós-
-prandiais da glicose (Quadro 19.8).
Os dispositivos para o monitoramento contínuo da glicose san- TRATAMENTO Diabetes melito tipo 1 e tipo 2
guínea (MCG) foram aprovados pelo FDA, e outros encontram-se
em vários estágios de desenvolvimento. Esses dispositivos não elimi- ESTABELECIMENTO DO NÍVEL-ALVO DE CONTROLE GLICÊMICO Como
nam a necessidade das mensurações tradicionais da glicose. Essa tec- as complicações do DM estão relacionadas com o controle glicê-
nologia em rápida evolução requer uma perícia substancial por parte mico, a normoglicemia ou quase-normoglicemia é a meta deseja-
da equipe de controle do diabetes e do próprio paciente. Os atuais da, porém com frequência ilusória, para a maioria dos pacientes.
sistemas de monitoramento contínuo da glicose medem a glicose no Contudo, a normalização da glicose plasmática por longos períodos
líquido intersticial que está em equilíbrio com a glicose sanguínea. é extremamente difícil, conforme demonstrado pelo DCCT. Inde-
Esses dispositivos fornecem uma informação de curto prazo útil so- pendentemente do nível de hiperglicemia, uma melhora do controle
bre os padrões de mudanças da glicose, assim como maior capacida- glicêmico reduzirá o risco das complicações do diabetes (Fig. 19.8).
de de detectar os episódios hipoglicêmicos. Os alarmes notificam o O alvo para o controle glicêmico (conforme refletido pela
paciente quando o nível de glicemia cai para a faixa hipoglicêmica. A1C) deve ser individualizado e as metas da terapia devem ser
A experiência clínica com esses dispositivos está rapidamente cres- elaboradas em uma conversa com o paciente após levar em conta
cendo, e eles têm maior utilidade para indivíduos com ausência de inúmeros problemas médicos, sociais e relacionados com o estilo
percepção da hipoglicemia, hipoglicemia frequente ou naqueles que de vida. Alguns fatores importantes a serem levados em conta in-
não alcançaram os alvos glicêmicos, apesar de grandes esforços. A cluem a idade do paciente, a capacidade de compreender e imple-
utilidade do MCG no contexto da UTI ainda não foi estabelecida. mentar um esquema terapêutico complexo, a presença e a gravi-
As cetonas são um indicador de cetoacidose diabética precoce e dade de complicações do diabetes, a capacidade de reconhecer os
devem ser medidas nos indivíduos com DM tipo 1 quando a glicose sintomas hipoglicêmicos, a presença de outras condições médicas
plasmática é consistentemente > 16,7 mmol/L (300 mg/dL); duran- ou tratamentos que possam alterar a resposta à terapia, o estilo de
te uma enfermidade concomitante; ou com sintomas como náuseas, vida e a ocupação (p. ex., possíveis consequências de sofrer um
SEÇÃO III
vômitos ou dor abdominal. A mensuração de -hidroxibutirato no episódio de hipoglicemia no trabalho) e nível de apoio disponível
sangue é preferida aos testes urinários com ensaios baseados no ni- por parte da família e dos amigos.
tropussiato que medem apenas o acetoacetato e a acetona. A ADA sugere que o objetivo glicêmico consiste em alcançar
uma A1C o mais próximo possível do normal sem hipoglicemia
Avaliação do controle glicêmico a longo prazo significativa. Em geral, a A1C-alvo deveria ser abaixo de 7% (Qua-
A mensuração da hemoglobina glicosilada (glicada) é o método pa- dro 19.8) com um alvo mais rígido para alguns pacientes. Uma
dronizado para avaliar o controle glicêmico a longo prazo. Quando a meta mais alta da A1C pode ser apropriada para o indivíduo mui-
glicose plasmática apresenta-se consistentemente elevada, ocorre um to jovem ou idoso, assim como naqueles com expectativa de vida
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
aumento na glicação não enzimática da hemoglobina; essa alteração limitada ou condições comórbidas. A principal ponderação é a
reflete a história glicêmica ao longo dos 2 a 3 meses precedentes, pois frequência e a gravidade da hipoglicemia, pois esta se torna mais
a duração média da vida dos eritrócitos é de 120 dias (o nível glicêmi- comum com uma meta mais rígida da A1C. O controle mais rigo-
co no mês precedente contribui com cerca de 50% para o valor de A roso da glicemia (A1C de 6% ou menos) não é benéfico e pode ser
1C). Existem numerosos métodos laboratoriais para medir as várias prejudicial no DM tipo 2 e constituir um alto risco de doença CV.
formas de hemoglobina glicada, e esses comportam variações signifi-
DIABETES MELITO TIPO 1
cativas entre os diferentes ensaios; os ensaios calibrados em relação ao
ensaio para A1C do DCCT são essenciais. Dependendo da metodolo- Aspectos gerais As recomendações da ADA para os objetivos
gia do ensaio, as hemoglobinopatias, anemias, reticulocitose, transfu- glicêmicos de jejum e da hora de deitar-se e para os alvos da A1C
sões e uremia podem interferir no resultado da A1C. A mensuração são resumidos no Quadro 19.8. A meta consiste em planejar e
da A1C no “ponto de assistência” proporciona uma retroalimentação implementar esquemas de insulina que simulem a secreção fisio-
mais rápida e, portanto, pode ajudar a realizar os ajustes na terapia. lógica dessa substância. Levando-se em conta que os indivíduos
A hemoglobina glicada ou A1C deve ser medida em todos os in- com DM tipo 1 carecem parcial ou completamente de produção
divíduos com DM durante sua avaliação inicial e como parte de sua endógena de insulina, a administração de insulina basal é essen-
assistência abrangente do diabetes. Por ser o preditor primário das cial para regular o fracionamento do glicogênio, a gliconeogênese,
complicações a longo prazo do DM, a A1C deveria espelhar, até certo a lipólise e a cetogênese. Do mesmo modo, a reposição de insulina
ponto, as mensurações a curto prazo da AMGS. Essas duas mensura- para as refeições deve ser apropriada à ingestão de carboidratos
ções são complementares, pois as enfermidades intercorrentes recen- e promover a utilização e o armazenamento normais da glicose.
tes podem exercer algum impacto sobre as mensurações da AMGS, Controle intensivo O controle intensivo do diabetes tem como
porém não sobre a A1C. Outrossim, a hiperglicemia pós-prandial e objetivo conseguir a euglicemia ou uma glicemia quase normal.
noturna pode não ser detectada pelo AMGS da glicose plasmática ca- Essa abordagem requer múltiplos recursos, incluindo uma orien-
pilar em jejum e pré-prandial, mas será refletida na A1C. Nos ensaios tação completa e contínua do paciente, registros minuciosos das
padronizados, a A1C aproxima-se dos seguintes valores plasmáticos mensurações da glicose plasmática e da ingesta nutricional por
médios da glicose: uma A1C de 6% equivale a 7,5 mmol/L (135 mg/ parte do paciente e um esquema variável de insulina que seja
dL), de 7% a 9,5 mmol/L (170 mg/dL), de 8% a 11,5 mmol/L (205 mg/ comparável à ingestão de glicose e à dose de insulina. Os esque-
dL) etc. [Uma elevação de 1% na A1C corresponde a um aumento de mas de insulina incluem habitualmente múltiplos componentes,
2,0 mmol/L (35 mg/dL) na glicose média.] Nos pacientes que alcan- múltiplas injeções diárias (MID) ou dispositivos de infusão de
çam seu objetivo glicêmico, a ADA recomenda a mensuração da A1C insulina (cada um deles será abordado adiante).
pelo menos 2 vezes por ano. Testes mais frequentes (a cada 3 meses) Os benefícios do controle intensivo do diabetes e do contro-
justificam-se quando o controle glicêmico é inadequado, quando a le glicêmico aprimorado incluem uma redução das complicações
terapia foi modificada ou na maioria dos pacientes com DM tipo 1. microvasculares do DM assim como das complicações macro-
O grau de glicação de outras proteínas, como a albumina, pode ser vasculares do DM que persista após um período de quase nor-
usado como um indicador alternativo do controle glicêmico quando moglicemia. Do ponto de vista psicológico, o paciente consegue
a A1C é inexata (anemia hemolítica, hemoglobinopatias), o ensaio da maior controle sobre seu diabetes e, com frequência, constata
frutosamina (medindo-se a albumina glicada) reflete o estado glicê-
228
uma maior sensação de bem-estar, uma maior flexibilidade nos cêmicos, principalmente porque o declínio da ação da insulina
horários e no conteúdo das refeições e a capacidade de alterar a corresponde ao declínio na glicose plasmática após uma refeição.
posologia da insulina com a realização de um exercício. Assim sendo, as insulinas aspart, lispro ou glulisina são preferidas
Além disso, o controle intensivo do diabetes antes e durante a à insulina regular para a cobertura prandial. A insulina glargina é
gestação reduz o risco de malformações e morbidade fetais. O con- uma insulina humana biossintética de ação prolongada que difere
trole intensivo do diabetes é enfaticamente encorajado nos pacien- da insulina normal pelo fato de a asparagina ser substituída pela
tes recém-diagnosticados com DM tipo 1, pois poderá prolongar o glicina no nível do aminoácido 21, e de dois resíduos da arginina
período de produção do peptídio C, que pode resultar em melhor serem acrescentados ao C-terminal da cadeia B. Em comparação
controle glicêmico e em risco reduzido de hipoglicemia grave. com a insulina NPH, o início de ação da insulina glargina é mais
O controle intensivo confere benefícios impressionantes, mas tardio, a duração da ação é mais longa (24 h) e existe um pico
é acompanhado também de custos pessoais e financeiros signi- menos pronunciado. Uma menor incidência de hipoglicemia,
ficativos e, portanto, não é apropriado para todos os indivíduos. especialmente à noite, foi relatada com a insulina glargina quan-
do comparada com a insulina NPH. A possível associação entre
Preparados de insulina Os atuais preparados de insulina são
a glargina e o risco aumentado de câncer está sendo investigada
gerados pela tecnologia do DNA recombinante e consistem na
(revisão pelo FDA em andamento) e é controversa. A insulina de-
sequência de aminoácidos da insulina humana ou de suas varia-
temir possui uma cadeia lateral de ácidos graxos que prolonga sua
ções. Nos EUA, a maioria dos preparados de insulina é formulada
ação por tornar mais lenta a absorção e o catabolismo. As injeções
como U-100 (100 unidades/mL). A insulina regular formulada
de glargina ou detemir duas vezes ao dia são algumas vezes neces-
como U-500 (500 unidades/mL) está disponível e é algumas ve-
zes útil para pacientes com grave resistência à insulina. A insu- sárias para proporcionar uma cobertura de 24 h. As insulinas re-
lina humana foi formulada com uma farmacocinética distintiva gular e NPH têm a sequência nativa de aminoácidos da insulina.
ou geneticamente modificada para que haja uma reprodução As demandas basais de insulina são atendidas pelas formu-
mais aproximada da secreção fisiológica de insulina. A insulina lações de insulina de ação prolongada (insulina NPH, insulina
pode ser classificada como de ação rápida ou de ação prolonga- glargina, ou insulina detemir). Em geral estas são prescritas com
da (Quadro 19.10). Por exemplo, uma formulação de insulina de uma insulina de ação rápida na tentativa de reproduzir a liberação
ação rápida, a insulina lispro, um análogo da insulina no qual o fisiológica da insulina com as refeições. A mistura das formula-
Capítulo 19
28o e o 29o aminoácidos (lisina e prolina) da cadeia B da insulina ções de insulina NPH e de ação rápida constitui uma prática co-
foram invertidos pela tecnologia do DNA recombinante. A insu- mum, mas essa mistura pode alterar o perfil de absorção da insu-
lina asparte e a insulina glulisina são outros análogos da insulina lina (especialmente das insulinas de ação rápida). Por exemplo, a
modificados geneticamente com propriedades semelhantes às absorção de lispro é retardada pela mistura com NPH. A alteração
do tipo lispro. Esses análogos da insulina exercem uma atividade na absorção da insulina quando o paciente mistura diferentes for-
biológica plena, porém com uma menor tendência para a auto- mulações de insulina não deve desencorajar as misturas de insuli-
-agregação, resultando em absorção e início de ação mais rápidos nas. Entretanto, devem ser obedecidas as seguintes diretrizes: (1)
e em uma duração do efeito mais curta. Essas características são misturar as diferentes formulações de insulina na seringa imedia-
particularmente vantajosas por permitirem o emparelhamento tamente antes da injeção (injetar 2 min após fazer a mistura); (2)
Diabetes Melito
da injeção e ação da insulina aos níveis em elevação da glicose não guardar a insulina como uma mistura; (3) adotar a mesma
plasmática após as refeições. A menor duração da ação também rotina em termos de mistura e administração das insulinas a fim
parece estar associada ao menor número de episódios hipogli- de padronizar a resposta fisiológica à insulina injetada; e (4) não
misturar a insulina glargina ou detemir com outras insulinas. A
miscibilidade das insulinas humanas regular e NPH torna possí-
vel a produção de combinações de insulinas que contém 70% de
QUADRO 19.10 Propriedades das preparações de insulina NPH e 30% de regular (70/30); ou misturas iguais de NPH e regu-
Tempo de ação lar (50/50). Outras formulações de insulinas são a insulina asparte
Duração (70/30) e a insulina lispro (75/25 e 50/50). Ao incluir o análogo da
Preparação Início, h Pico, h efetiva, h insulina misturado com protamina, essas combinações adquirem
um perfil de ação rápida e ação prolongada (Quadro 19.10). Ape-
De ação rápida
sar de serem mais convenientes para o paciente (apenas duas in-
Asparte <0,25 0,5 a 1,5 3a4 jeções/dia) as formulações com insulinas combinadas não permi-
Glulisina < 0,25 0,5 a 1,5 3a4 tem fazer um ajuste independente da atividade de ação rápida e de
Lispro < 0,25 0,5 a 1,5 3a4 ação prolongada. Estão disponíveis várias formulações de insuli-
Regular 0,5 a 1,0 2a3 4a6 na na forma de insulina “pens,” que podem ser mais convenientes
para alguns pacientes. A administração de insulina por inalação
De ação longa
a
não está mais disponível, porém continua sendo pesquisada.
Detemir 1a4 — Até 24
Glargina 1a4 —
a
Até 24
Esquemas de insulina As representações dos vários esquemas de
insulina que podem ser utilizados no DM tipo 1 são ilustradas na
NPH 1a4 6 a 10 10 a 16 Figura 19.12. Apesar de os perfis da insulina serem representados
Combinações de insulina como curvas simétricas “regulares,” existe uma considerável va-
75/25 – 75% de protamina < 0,25 1,5 h Até 10 a 16 riação de um paciente para outro no pico e na duração. Em todos
lispro, 25% de lispro os esquemas, a insulina de ação prolongada (NPH, glargina ou
70/30 – 70% de protamina < 0,25 1,5 h Até 10 a 16 detemir) proporciona a insulina basal, enquanto o tipo regular,
asparte, 30% asparte a insulina asparte, glulisina ou a insulina lispro proporcionam a
50/50 – 50% de protamina < 0,25 1,5 h Até 10 a 16 insulina prandial. Os análogos da insulina de ação rápida devem
lispro, 50% de lispro ser injetados imediatamente antes (menos de 20 min) ou imedia-
70/30 – 70% de NPH, 30% de 0,5 a 1 Duplob 10 a 16
tamente após uma refeição; a insulina regular é administrada de
insulina regular 30 a 45 minutos antes de uma refeição.
Um inconveniente dos atuais esquemas de insulina é que a
insulina injetada penetra imediatamente na circulação sistêmica,
a
A glargina e a determir apresentam um pico de atividade mínimo.
b
Duplo: dois picos – um dentro de 2 a 3 h, e o segundo, várias horas mais tarde. enquanto a insulina endógena é secretada e lançada no sistema
Fonte: Adaptado de JS Skyler, Therapy for Diabetes Mellitus and Related Disorders, American venoso portal.
Diabetes Association, Alexandria, VA, 2004.
229
Manhã Tarde Anoitecer Noite
Análogo Análogo Análogo Manhã Tarde Anoitecer Noite Manhã Tarde Anoitecer Noite
Efeito da insulina
Efeito da insulina
Efeito da insulina
da da da Análogo Análogo
insulina* insulina* insulina* da insulina* da insulina* Bolus Bolus Bolus
Regular Regular
Insulina de Infusão basal
NPH
ação longa^ NPH
D A J HD D D A J HD D D A J HD D
Figura 19.12 Esquemas representativos de insulina para o tratamento do fornecer uma cobertura glicêmica em cada refeição. B. A injeção de duas doses de
diabetes. Para cada painel, o eixo y mostra a quantidade do efeito da insulina, e insulina de ação longa (NPH) e de insulina de ação curta [glulisina, lispro, insulina
o eixo x mostra a hora do dia. D, desjejum; A, almoço; J, jantar; HD, hora de deitar; asparte (linha vermelha contínua) ou regular (linha verde tracejada)]. Apenas uma
ISCI, infusão subcutânea contínua de insulina. *Podem ser utilizadas as insulina lis- formulação de insulina de ação curta é utilizada. C. A administração de insulina
pro, glulisina ou insulina asparte. A hora da injeção de insulina é mostrada por uma com dispositivo de infusão de insulina é mostrada com a insulina basal e injeção de
seta vertical. O tipo de insulina é assinalado acima de cada curva de insulina. A. Um bolus em cada refeição. A taxa basal de insulina diminui durante a tarde e aumenta
esquema de insulina de múltiplos componentes, consistindo em insulinaA de ação ligeiramente antes do paciente acordar pela manhã. A glulisina, a lispro ou a insulina
longa, glargina ou detemir, pode ser necessário diariamente para proporcionar uma asparte são utilizadas na bomba de insulina. (Adaptada de H Lebovitz [ed.]: Therapy
cobertura basal de insulina e três doses de glulisina, lispro ou insulina asparte para for Diabetes Mellitus. American Diabetes Association, Alexandria, VA, 2004.)
Assim sendo, a administração de insulina exógena expõe o insulina de ação rápida). A desvantagem desse esquema é que ele
fígado a níveis subfisiológicos de insulina. Nenhum esquema de impõe ao paciente um esquema rígido em termos de atividade
insulina reproduz o padrão secretório preciso da insulina da ilho- diária assim, como do conteúdo e do escalonamento das refeições.
ta pancreática. No entanto, os esquemas mais fisiológicos exigem Apesar de ser simples e eficaz no sentido de evitar uma hipergli-
injeções mais frequentes de insulina, maior dependência da insu- cemia intensa, ele não proporciona um controle glicêmico quase
SEÇÃO III
lina de ação rápida e mensurações mais frequentes da glicose plas- normal em indivíduos com DM tipo 1. Além disso, se o padrão e o
mática capilar. Em geral, os indivíduos com DM tipo 1 necessitam conteúdo das refeições do paciente variam ou se a atividade física
de 0,5 a 1 U/kg/dia de insulina dividida em múltiplas doses, com aumenta, o resultado poderá ser uma hiperglicemia ou hipoglice-
cerca de 50% da insulina sendo administrada como insulina basal. mia. A mudança da insulina de ação prolongada da refeição notur-
Esquemas de insulina com múltiplos componentes referem- na para a hora de deitar permite evitar a hipoglicemia noturna e
-se à combinação de insulina basal e insulina na forma de um bo- proporcionar mais insulina quando os níveis de glicose sobem no
lus (insulina de ação rápida pré-prandial). A hora e a dose da in- início da manhã (o denominado fenômeno do amanhecer). Nesses
sulina pré-prandial de ação rápida são alteradas para se ajustarem esquemas, a dose de insulina deve ser ajustada com base nos resul-
aos resultados do AMGS, a ingestão prevista de alimento e à ati- tados do AMGS com as seguintes suposições gerais: (1) a glicose
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
vidade física. Esses esquemas proporcionam ao paciente com dia- em jejum é determinada principalmente pela insulina de ação pro-
betes tipo 1 uma maior flexibilidade em termos de estilo de vida e longada da noite precedente; (2) a glicose pré-almoço é uma função
da melhor probabilidade de alcançar a quase-normoglicemia. Um da insulina de ação rápida da manhã; (3) a glicose pré-jantar é uma
desses esquemas, mostrado na Figura 19.12B, consiste em insuli- função da insulina de ação prolongada da manhã; e (4) a glicose da
na basal com glargina ou detemir e lispro, glulisina ou insulina as- hora de deitar é uma função da insulina de ação rápida pré-jantar.
parte pré-prandial. A dose de insulina asparte, glulisina ou lispro Esse não é um esquema ideal para os pacientes com DM tipo 1, po-
baseia-se em algoritmos individualizados que integram a glicose rém é usado ocasionalmente para os pacientes com diabetes tipo 2.
pré-prandial e a ingestão prevista de carboidratos. Para determi- A infusão SC contínua de insulina (ISCI) é um esquema
nar o componente de refeição da dose de insulina pré-prandial, muito eficaz de administração da insulina para o paciente com
o paciente utiliza uma relação insulina:carboidrato (uma relação diabetes tipo 1 (Fig. 19.12C). Para a infusão de insulina basal,
comum para o DM tipo 1 é de 1 a 1,5 unidade/10 g de carboidrato, uma insulina pré-prandial (bolus) é aplicada pelo dispositivo de
porém esta deverá ser determinada para cada indivíduo). A essa infusão de insulina com base nas instruções proporcionadas pelo
dose de insulina é acrescentada a insulina suplementar ou cor- paciente, que utiliza um algoritmo individualizado que incorpora
retiva com base na glicose sanguínea pré-prandial [uma fórmula a glicose plasmática pré-prandial e a ingestão prevista de carboi-
utiliza uma unidade de insulina para cada 2,7 mmol/L (50 mg/ dratos (ver anteriormente). Esses dispositivos sofisticados de in-
dL) acima do alvo da glicose pré-prandial; outra fórmula utiliza fusão de insulina conseguem proporcionar com exatidão peque-
(peso corporal em kg) (glicose sanguínea – glicose desejada em nas doses de insulina (microlitros por hora) e comportam várias
mg/dL)/1.700]. Um esquema insulínico alternativo com múltiplos vantagens: (1) múltiplas velocidades de infusão basal podem ser
componentes consiste em insulina NPH na hora de deitar, uma programadas para atender a demanda de insulina basal noturna
pequena dose de insulina NPH no desjejum (20 a 30% da dose versus diurna, (2) as velocidades de infusão basal podem ser al-
utilizada na hora de deitar) e insulina de ação rápida pré-prandial. teradas durante os períodos de exercício, (3) diferentes formatos
Estão sendo utilizadas outras variações desse esquema, porém de onda da infusão de insulina com o bolus relacionado com as
elas comportam a desvantagem de que a NPH tem um pico signi- refeições permitem melhor equivalência da insulina, dependendo
ficativo, o que torna a hipoglicemia mais comum. O AMGS fre- da composição da refeição e (4) algoritmos programados levam
quente (mais de 3x/dia) é absolutamente essencial para todos os em conta a administração prévia de insulina e os valores da gli-
tipos de esquemas de insulina. cose sanguínea para calcular a dose de insulina. Esses dispositi-
Um esquema comumente usado consiste em injeções 2x/dia de vos exigem instrução por um profissional da área de saúde com
NPH misturada com uma insulina de ação rápida antes das refei- considerável experiência nos dispositivos de infusão de insulina e
ções matinal e noturna (Fig. 19.12A). Esses esquemas prescrevem interações muito frequentes do paciente com a equipe de controle
habitualmente 66% da dose diária total de insulina pela manhã do diabetes. Os dispositivos de infusão de insulina criam desafios
(com cerca de 66% sendo administrados como insulina de ação ímpares, tais como infecção no local da infusão, hiperglicemia
prolongada e 33% como insulina de ação rápida) e 33% antes da inexplicável porque o conjunto de infusão ficou obstruído, ou ce-
refeição noturna (com aproximadamente a metade sendo adminis- toacidose diabética se houver desconexão da bomba. Levando-se
trada como insulina de ação prolongada e a outra metade como em conta que a maioria dos médicos utilizam lispro, glulisina ou
230
insulina asparte na ISCI, a meia-vida extremamente curta dessas principal causa de mortalidade nesses indivíduos. Os esforços des-
insulinas acarreta rapidamente uma deficiência de insulina se o tinados a alcançar os objetivos relacionados com a pressão arterial
sistema de fornecimento for interrompido. Essencial para o uso e o perfil lipídico (Quadro 19.8) devem começar juntamente com
seguro dos dispositivos de infusão é uma orientação completa do as intervenções para a redução dos níveis de glicose.
paciente acerca do funcionamento da bomba e o AMGS frequen- O tratamento do diabetes tipo 2 deve começar com a TNM
te. Continuam os esforços destinados a criar um sistema em alça (abordada anteriormente). Deve ser instituído também um es-
fechada no qual os dados da mensuração contínua da glicose irão quema de exercícios capaz de aumentar a sensibilidade à insulina
regular a velocidade de infusão da insulina. e de promover a perda de peso. As abordagens farmacológicas ao
tratamento do DM tipo 2 incluem os agentes orais redutores da
Outros agentes que aprimoram o controle da glicose Ainda não foi
glicose, a insulina e outros agentes que aprimoram o controle da
esclarecido o papel da amilina, um peptídio com 37 aminoácidos
glicose; a maioria dos médicos e dos pacientes prefere os agen-
cossecretado com a insulina pelas células beta pancreáticas na ho-
tes orais redutores da glicose como a escolha inicial (abordados
meostasia normal da glicose. No entanto, com base na análise ló-
adiante após uma revisão de várias medicações). Qualquer terapia
gica de que os pacientes com deficiência de insulina também são
capaz de melhorar o controle glicêmico reduz a “toxicidade da gli-
deficientes em amilina, foi criado um análogo da amilina (pran-
cose” para as células das ilhotas e aumenta a secreção endógena
lintida) que se revelou capaz de reduzir as excursões glicêmicas
de insulina. No entanto, o DM tipo 2 é um distúrbio progressivo
pós-prandiais nos pacientes diabéticos tipo 1 e tipo 2 que tomam
e, basicamente, requer múltiplos agentes terapêuticos e, com fre-
insulina. A pranlintida injetada imediatamente antes de uma re-
quência, a administração de insulina.
feição torna mais lento o esvaziamento gástrico e suprime o glu-
cagon, porém sem alterar os níveis de insulina. As pranlintida foi Agentes redutores da glicose Os avanços na terapia do DM tipo
aprovada para os pacientes tratados com insulina e com DM tipos 2 geraram agentes orais redutores da glicose que possuem como
1 e 2. O acréscimo de pranlintida produz uma redução modera- alvos os diferentes processos fisiopatológicos que atuam no DM
da na A1C e parece reduzir as excursões da glicose relacionadas tipo 2. Com base em seus mecanismos de ação, os agentes reduto-
com as refeições. No diabetes tipo 1, a pranlintida é iniciada como res da glicose são subdivididos naqueles que aumentam a secreção
uma injeção SC de 15 g antes de cada refeição e será titulada até de insulina, que reduzem a produção de glicose, que aumentam a
sensibilidade à insulina e que exacerbam a ação de GLP-1 (Qua-
Capítulo 19
um máximo de 30 a 60 g, conforme tolerada. No DM tipo 2, a
pranlintida é iniciada como uma injeção SC de 60 g antes de dro 19.11). Os agentes redutores da glicose além da insulina (com
cada refeição e pode ser titulada até um máximo de 120 g. Os exceção do análogo da amilina e dos inibidores de -glicosidase)
principais efeitos colaterais são náuseas e vômitos e os aumentos são ineficazes no DM tipo 1 e não devem ser usados para o con-
nas doses devem ser lentos para limitá-los. Por retardar o esvazia- trole da glicose nos indivíduos gravemente enfermos com DM
mento gástrico, a pranlintida pode influenciar a absorção de ou- tipo 2. Às vezes a insulina constitui o agente inicial utilizado para
tras medicações e não deve ser usada em combinação com outros reduzir os níveis da glicose no diabetes tipo 2.
fármacos que reduzem a motilidade GI. Inicialmente, a insulina
Biguanidas A metformina, o representante dessa classe de agen-
de ação rápida administrada antes da refeição deve ser reduzida
tes, reduz a produção hepática de glicose e melhora ligeiramente a
a fim de evitar a hipoglicemia e, a seguir, deve ser titulada quan-
Diabetes Melito
utilização periférica da glicose (Quadro 19.11). A metformina ativa
do os efeitos da pranlintida se tornam evidentes. Os inibidores de
a proteinoquinase dependente de AMP e penetra nas células atra-
-glicosidase constituem outro tipo de agente que algumas vezes
vés de transportadores de cátions orgânicos (cujos polimorfismos
podem ser usados em associação nos pacientes com DM tipo 1.
podem influenciar a resposta à metformina). A metformina reduz
os níveis plasmáticos de glicose e de insulina em jejum, melhora
DIABETES MELITO TIPO 2
o perfil lipídico e promove uma redução modesta de peso. A dose
Aspectos gerais Os objetivos da terapia para o DM tipo 2 são se- inicial de 500 mg, 1 ou 2 vezes por dia, pode ser aumentada para
melhantes aos do tipo 1. Apesar de o controle glicêmico dominar 1.000 mg, duas vezes ao dia. Dispõe-se de uma forma de liberação
o tratamento do DM tipo 1, a assistência dos indivíduos com DM prolongada, que pode apresentar menos efeitos colaterais gastrin-
tipo 2 deve incluir também a devida atenção ao tratamento das testinais (diarreia, anorexia, náusea, gosto metálico). Em virtude de
condições associadas ao DM tipo 2 (obesidade, hipertensão, disli- seu início de ação relativamente lento e dos sintomas gastrintesti-
pidemia, doença cardiovascular) e a identificação e o tratamento nais observados com doses mais altas, a dose deve ser incremen-
das complicações relacionadas com o DM (Fig. 19.13). As compli- tada a cada 2 a 3 semanas, com base nas medições do AMGS. A
cações específicas do DM podem estar presentes em até 20 a 50% metformina mostra-se efetiva como monoterapia e pode ser usada
dos indivíduos com DM tipo 2 recém-diagnosticado. A redução em combinação com outros agentes orais ou com insulina. A prin-
do risco cardiovascular é de primordial importância, pois essa é a cipal toxicidade da metformina, a acidose láctica, é muito rara e
pode ser evitada através de seleção cuidadosa dos pacientes. Os ní-
veis de vitamina B12 são 30% mais baixos durante o tratamento com
metformina. A metformina não deve ser usada em pacientes com
Conduta no
insuficiência renal [TFG < 60 mL/min], qualquer forma de acido-
diabetes tipo 2 se, ICC, doença hepática ou hipoxemia grave. A metformina deve
ser suspensa nos pacientes gravemente enfermos, naqueles que não
podem ingerir nada por via oral e naqueles que estão recebendo
algum meio de contraste radiográfico. A insulina deve ser usada até
Controle glicêmico Tratar as condições Triagem para/tratamento que a metformina possa ser reiniciada.
• Dieta/estilo associadas das complicações
de vida • Dislipidemia do diabetes Secretagogos da insulina – agentes que afetam o canal de K+ sensí-
• Exercício • Hipertensão • Retinopatia vel ao ATP Os secretagogos da insulina estimulam sua secreção
• Medicação • Obesidade • Doença
cardiovascular por interagirem com o canal de potássio sensível ao ATP na cé-
• Coronariopatia
• Nefropatia lula beta (Fig. 19.4). Esses fármacos são mais efetivos nos indiví-
• Neuropatia duos com DM tipo 2 de início relativamente recente (menos de
• Outras complicações 5 anos), que ainda exibem uma produção endógena residual de
insulina. As sulfonilureias de primeira geração (clorpropamida,
tolazamida, tolbutamida; não listadas no Quadro 19.12) exibem
Figura 19.13 Elementos essenciais no tratamento abrangente do diabetes
uma meia-vida mais longa, uma incidência mais alta de hipogli-
tipo 2.
231
QUADRO 19.11 Agentes usados para o tratamento do diabetes tipo 1 e tipo 2
Redução Vantagens
da A1C específicas do Desvantagens
Mecanismo de ação Exemplos (%)a agente específicas do agente Contraindicações
Orais
Biguanidasb ↓ Produção de glicose Metformina 1a2 Neutras quanto Diarreia, náusea, Creatinina sérica > 1,5
hepática ao peso, acidose láctica mg/dL (homens) > 1,4
Não causam mg/dL (mulheres), ICC,
hipoglicemia, de exames radiográficos
baixo custo contrastados,
pacientes gravemente
enfermos, acidose
Inibidores de ↓ Absorção da glicose Acarbose, Miglitol 0,5 a 0,8 Reduzem Flatulência GI, provas de Doença renal/hepática
‑glicosidase GI a glicemia função hepática
pós‑prandial
Inibidores Prolongam a ação do Saxagliptina, 0,5 a 0,8 Não causam Reduzir a dose na
da dipeptidil GLP‑1 endógeno Sitagliptina, hipoglicemia presença de doença
peptidase IVb Vildagliptina renal
Secretagogos da ↑ Secreção de insulina Ver o texto e o 1a2 De baixo custo Hipoglicemia, ganho Doença renal/hepática
insulina: Quadro 19.12 de peso
Sulfonilureiasb
Secretagogos da ↑ Secreção de insulina Ver o texto e o 1a2 Início rápido de Hipoglicemia Doença renal/hepática
insulina: Quadro 19.12 ação, reduzem
Não sulfonilureiasb a glicose
pós‑prandial
SEÇÃO III
Tiazolidinedionasb ↓ Resistência à insulina Rosiglitazona, 0,5 a 1,4 Reduzem as Edema periférico, ICC, ICC, doença hepática;
↑ Utilização de glicose Pioglitazona necessidades ganho de peso, fraturas, ver o texto sobre
de insulina edema macular; a rosiglitazona
rosiglitazona pode
aumentar o risco
cardiovascular
Sequestradores de Ligam‑se aos ácidos Colesevelam 0,5 Constipação, dispepsia, Triglicerídios
ácidos biliares biliares; mecanismo dor abdominal, náusea, plasmáticos elevados
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
cemia, interações medicamentosas mais frequentes e, hoje em dia, dose diária (Quadro 19.12). As sulfonilureias reduzem os níveis de
são raramente usadas. As sulfonilureias de segunda geração têm glicose tanto em jejum quanto pós-prandiais e devem ser iniciadas
um início mais rápido de ação e melhor cobertura da elevação em pequenas doses, que serão aumentadas a intervalos de 1 a 2 se-
pós-prandial da glicose, porém a meia-vida mais curta de alguns manas tendo como base o AMGS. Em geral, as sulfonilureias ele-
agentes pode exigir um esquema posológico com mais de uma vam rapidamente os níveis de insulina e, assim sendo, devem ser
232
QUADRO 19.12 Popriedades dos secretagogos da insulina natureza dependente de glicose da secreção de insulina estimulada
pelas incretinas (a não ser que haja uso concomitante de um agente
Dose Diária, Duração de capaz de induzir hipoglicemia – sulfonilureias, etc.). A exenatida,
Classe/Nome Genérico mg Ação, h uma versão sintética de um peptídio inicialmente identificado na
Sulfonilureias saliva do monstro Gila (exendina-4), é um análogo do GLP-1. Dife-
Glimepirida 1a8 24
rentemente do GLP-1 nativo, que possui uma meia-vida inferior a 5
minutos, as diferenças na sequência de aminoácidos da exenatida a
Glipizida 5 a 40 12 a 18
tornam resistente à enzima que degrada o GLP-1 (dipeptidil pepti-
Glipizida (liberação prolongada) 5 a 20 24 dase-IV ou DPP-IV). Por conseguinte, a exenatida possui uma ação
Gliburida 1,25 a 20 12 a 24 prolongada semelhante ao GLP-1 e liga-se aos receptores de GLP-
Gliburida (micronizada) 0,75 a 12 12 a 24 1 encontrados nas ilhotas, no trato gastrintestinal e no cérebro. A
Não sulfonilureias (Meglitinidas)
liraglutida, outro agonista do receptor de GLP-1, é quase idêntica
ao GLP-1 nativo, com exceção de uma substituição de aminoácido
Repaglinida 0,5 a 16 2a6
e adição de um grupo de ácido graxo (acoplado a um espaçador de
Nateglinida 180 a 360 2a4 ácido -glutâmico), que promovem a ligação à albumina e às pro-
Agonistas do GLP‑1 teínas plasmáticas e que prolongam a sua meia-vida. Os agonistas
Exenatida 0,01 a 0,02 4a6 do receptor de GLP-1 aumentam a secreção de insulina estimula-
Liraglutida 0,6 a 1,8 12 a 24 da pela glicose, suprimem o glucagon e retardam o esvaziamento
gástrico. Esses agentes não promovem qualquer aumento de peso;
Inibidores da Dipeptil Peptidase
na verdade, a maioria dos pacientes exibe uma redução ponderal
Saxagliptina 2,5 a 5 12 a 16 moderada e supressão do apetite. O tratamento com esses agentes
Sitagliptina 100 12 a 16 deve ser iniciado em uma dose baixa para minimizar os efeitos co-
Vildagliptina 50 a 100 12 a 24 laterais iniciais (sendo a náusea o fator limitante). A exenatida está
aprovada como monoterapia e para uso como terapia de combi-
Nota: GLP-1, peptídio semelhante ao glucagon 1. nação com metformina, sulfonilureias e tiazolidinedionas. Alguns
Capítulo 19
pacientes que tomam secretagogos da insulina podem necessitar
de uma redução na dose desses agentes para evitar a hipoglicemia.
tomadas imediatamente antes de uma refeição; com a terapia crô- Os agonistas dos receptores de GLP-1 não devem ser administra-
nica, porém, a liberação de insulina é mais uniforme. Glimepirida dos a pacientes em uso de insulina. Os principais efeitos colaterais
e glipizida podem ser administradas em uma única dose diária e consistem em náusea, vômitos e diarreia; foi relatada a ocorrência
são preferidas à gliburida. Repaglinida e nateglinida não são sulfo- de pancreatite e redução da função renal em dados de vigilância
nilureias, mas também interagem com o canal do potássio sensível com a exenatida. A liraglutida tem uma tarja preta de advertência
ao ATP. Por causa de sua meia-vida muito curta, esses agentes são do FDA, devido a um risco aumentado de tumores de células C da
administrados com cada refeição ou imediatamente antes a fim de tireoide em roedores e está contraindicada em indivíduos com car-
Diabetes Melito
reduzir as excursões glicêmicas relacionadas com as refeições. cinoma medular da tireoide e neoplasia endócrina múltipla. Como
Esses secretagogos da insulina em geral são bem tolerados. os agonistas do receptor de GLP-1 reduzem o esvaziamento gástri-
Esses agentes, particularmente os de ação mais longa, comportam co, eles podem influenciar a absorção de outros fármacos. Não se
o potencial de acarretar uma hipoglicemia profunda e persistente, sabe se os agonistas do receptor de GLP-1 aumentam a sobrevida
especialmente nos indivíduos idosos. A hipoglicemia está habi- das células beta, promovem a sua proliferação ou alteram a história
tualmente relacionada com refeições retardadas, atividade física natural do DM tipo 2. Estão sendo desenvolvidos outros agonistas
aumentada, ingestão de álcool ou insuficiência renal. Os indiví- do receptor de GLP-1 e formulações.
duos que ingerem uma dose excessiva (overdose) de alguns agen- Os inibidores da DPP-IV inibem a degradação do GLP-1 na-
tes desenvolvem uma hipoglicemia prolongada grave e deverão tivo e, portanto, intensificam o efeito das incretinas. A DPP-IV,
ser monitorados atentamente no hospital (Cap. 20). A maioria que está amplamente expressa na superfície celular das células
das sulfonilureias é metabolizada no fígado para compostos (al- endoteliais e alguns linfócitos, degrada uma ampla variedade de
guns dos quais são ativos) que são depurados (eliminados) pelo peptídios (não específica do GLP-1). Os inibidores da DPP-IV
rim. Assim sendo, sua utilização em indivíduos com disfunções promovem a secreção de insulina na ausência de hipoglicemia
hepática ou renal significativas não é aconselhável. O aumento de ou de aumento de peso e parecem exercer um efeito preferencial
peso, um efeito colateral comum da terapia com sulfonilureias, sobre a glicemia pós-prandial. Os inibidores da DDP-IV são utili-
resulta dos maiores níveis de insulina e do aprimoramento do zados isoladamente ou em combinação com outros agentes orais
controle glicêmico. Algumas sulfonilureias realizam interações em adultos com DM tipo 2. Deve-se administrar doses reduzidas
medicamentosas significativas com o álcool e com algumas ou- a pacientes com insuficiência renal. Esses agentes possuem relati-
tras medicações, incluindo a varfarina, ácido acetilsalicílico, ce- vamente poucos efeitos colaterais.
toconazol, inibidores de -glicosidase e fluconazol. Uma isofor-
ma afim dos canais do potássio sensíveis ao ATP está presente Inibidores de -glicosidase Os inibidores de -glicosidase (acar-
no miocárdio e no cérebro. Todos esses agentes, com exceção de bose e miglitol) reduzem a hiperglicemia pós-prandial por retar-
gliburida, possuem baixa afinidade para essa isoforma. darem a absorção da glicose; eles não afetam a utilização da glicose
Não obstante as preocupações de que esse agente possa afe- nem a secreção de insulina (Quadro 19.11). A hiperglicemia pós-
tar a resposta do miocárdio à isquemia e os estudos baseados em -prandial, secundária a uma deterioração da utilização hepática e
observações sugerindo que as sulfonilureias aumentam o risco periférica da glicose, contribui acentuadamente para o estado hi-
cardiovascular, os estudos realizados não demonstraram um au- perglicêmico no DM tipo 2. Esses medicamentos, tomados imedia-
mento da mortalidade cardíaca com a gliburida. tamente antes de cada refeição, reduzem a absorção de glicose por
inibirem a enzima responsável pela clivagem dos oligossacarídios
Secretagogos da insulina – agentes que intensificam a sinalização do e sua transformação em açúcares simples no lúmen intestinal. A
receptor de GLP-1 As “incretinas” amplificam a secreção de insuli- terapia deve ser iniciada com uma pequena dose (25 mg de acar-
na estimulada pela glicose (Fig. 19.4). Os agentes que atuam como bose ou de miglitol) com a refeição noturna e pode ser aumentada
agonista do GLP-1 ou que aumentam a atividade do GLP-1 endóge- até uma posologia máxima ao longo de semanas a meses (50 a 100
no foram aprovados para o tratamento do diabetes tipo 2 (Quadro mg para acarbose ou 50 mg para miglitol com cada refeição). Os
19.12). Os agentes dessa classe não causam hipoglicemia, devido à principais efeitos colaterais (diarreia, flatulência, distensão abdo-
233
minal) estão relacionados com o maior fornecimento de oligossa- de mitigação” e devem ser apenas feitas para pacientes com diabetes
carídios ao intestino grosso e podem ser reduzidos até certo ponto que não conseguem ser controlados com outras medicações. A Eu-
pela titulação ascendente gradual da posologia. Os inibidores de ropean Medicines Agency (2010) aconselhou a retirada da rosiglita-
-glicosidase podem elevar os níveis de sulfonilureias e aumentar a zona e das formulações contendo rosiglitazona do mercado europeu.
incidência de hipoglicemia. O tratamento simultâneo com resinas Como resultado dessas decisões, a rosiglitazona estará disponível de
de ácidos biliares e antiácidos deve ser evitado. Esses agentes não modo limitado nos Estados Unidos, mas não na Europa.
devem ser utilizados nos indivíduos com doença intestinal infla-
Outras terapias para o diabetes tipo 2
matória, gastroparesia ou uma creatinina sérica > 177 mol/L (2
mg/dL). Esta classe de agentes não é tão possante quanto os outros Resinas de ligação de ácidos biliares O metabolismo dos ácidos
agentes orais no sentido de reduzir a A 1C, porém é ímpar porque biliares apresenta-se anormal no diabetes tipo 2. O colesevelam,
reduz a elevação pós-prandial de glicose até mesmo nos indivíduos uma resina sequestradora de ácidos biliares, foi aprovado para o
com DM tipo 1. Se a hipoglicemia decorrente de outros tratamen- tratamento do diabetes tipo 2 (já aprovado para o tratamento da
tos do diabetes ocorre enquanto estão sendo administrados esses hipercolesterolemia). Evidências emergentes indicam que os ácidos
agentes, o paciente terá que consumir glicose, pois a degradação e a biliares, através de sua sinalização nos receptores nucleares, podem
absorção dos carboidratos complexos serão retardadas. desempenhar um papel no metabolismo. Tendo em vista a absorção
mínima das resinas sequestradoras de ácidos biliares na circulação
Tiazolidinedionas As tiazolidinedionas reduzem a resistência sistêmica, não se sabe como esses agentes podem reduzir o nível de
à insulina através de sua ligaçaão ao receptor nuclear PPAR- glicemia. O colesevelam (disponível em pó para solução oral e em
(receptor ativado pelo proliferador de peroxissomo) (que for- comprimidos de 625 mg) é prescrito na dose de 3 a 6 comprimidos
ma um heterodímero com o receptor X retinoide). O receptor antes das refeições. Os efeitos colaterais mais comuns são gastrintes-
PPAR- é encontrado em níveis mais altos nos adipócitos, porém tinais (constipação, dor abdominal e náusea). As resinas sequestra-
se expressa em níveis mais baixos em muitos outros tecidos. Os doras de ácidos biliares podem aumentar os níveis plasmáticos de
agonistas desse receptor regulam um grande número de genes, triglicerídios e devem ser utilizadas com cautela em pacientes com
promovem a diferenciação dos adipócitos, reduzem o acúmulo tendência à hipertrigliceridemia. O papel dessa classe de fármacos
hepático das gorduras e promovem o armazenamento dos áci- no tratamento do diabetes tipo 2 ainda não foi definido.
dos graxos (Quadro 19.11). As tiazolidinedionas promovem uma
Bromocriptina. Uma formulação do agonista do receptor de do-
SEÇÃO III
234
tipo 2 por causa da maior conveniência, porém não permitem fazer Pacientes com diabetes tipo 2
um ajuste independente da dose de insulina de ação rápida e de
ação prolongada e, com frequência, não alcançam o mesmo grau
de controle glicêmico dos esquemas basais/ em bolus. Em pacientes
Terapia nutricional clínica,
selecionados com DM tipo 2 (em geral, com deficiência de insulina aumento da atividade
conforme definida pelo nível de peptídio C), podem ser aventados física, perda de
os dispositivos de infusão de insulina. peso
+
Escolha do agente inicial redutor da glicose O nível de hipergli- metformina
cemia deve influenciar a escolha inicial da terapia. Admitindo-se
que tenha sido constatado um benefício máximo da TNM e uma
Reavaliar a A1C
atividade física aumentada, os pacientes com hiperglicemia leve
ou moderada [GPJ < 11,1 a 13,9 mmol/L (200 a 250 mg/dL)] cos-
tumam responder muito bem a um único agente oral redutor da
Terapia de combinação -
glicose. Os pacientes com hiperglicemia mais acentuada [GPJ >
metformina + segundo agente
13,9 mmol/L (250 mg/dL)] podem evidenciar apenas uma resposta
parcial, porém é improvável que consigam a normoglicemia com
a monoterapia oral. Pode ser utilizada uma abordagem por etapas Reavaliar a A1C
que começa com um único agente e acrescenta um segundo agente
para conseguir o alvo glicêmico (ver “Terapia combinada”, adiante).
A insulina pode ser usada como terapia inicial nos indivíduos com Terapia de combinação
hiperglicemia acentuada [GPJ > 13,9 a 16,7 mmol/L (250 a 300 mg/ - metformina + dois Insulina + metformina
dL)] ou naqueles que apresentam sintomas de hiperglicemia. Essa outros agentes Reavaliar a A1C
abordagem baseia-se na lógica de que o controle glicêmico mais
rápido reduzirá a “toxicidade da glicose” para as células das ilhotas,
Capítulo 19
aprimorará a secreção endógena de insulina e, possivelmente, per- Figura 19.14 Controle glicêmico do diabetes tipo 2. Ver o texto para uma
mitirá que os agentes orais redutores da glicose sejam mais efetivos. discussão do tratamento da hiperglicemia grave ou da hiperglicemia sintomática. Os
Quando isto ocorre, a insulina pode ser suspensa. agentes que podem ser combinados com metformina incluem secretagogos da insu-
Os secretagogos da insulina, as biguanidas, os inibidores de lina, tiazolidinedionas, inibidores de -glicosidase, inibidores de DPP-IV e agonistas
-glicosidase, as tiazolidinedionas, os agonistas do receptor de do receptor de GLP-1. A1C, hemoglobina A1C.
GLP-1, os inibidores da DPP-IV e a insulina foram aprovados
para a monoterapia do DM tipo 2. Apesar de cada classe de agen-
tes orais redutores da glicose comportar vantagens e desvanta-
eficácia, do perfil conhecido de efeitos colaterais e do custo rela-
gens específicas, podem ser feitas algumas generalizações: (1) os
tivamente baixo (Fig. 19.14). A metformina tem a vantagem de
secretagogos da insulina, as biguanidas, os agonistas do receptor
Diabetes Melito
promover uma ligeira perda de peso, de baixar os níveis de insu-
de GLP-1 e as tiazolidinedionas melhoram o controle glicêmico
lina e de melhorar ligeiramente o perfil lipídico. Com base nos
em um grau semelhante (redução de 1 a 2% na A 1C) e são mais
resultados do AMGS e na A 1C, a dose de metformina deve ser
efetivos que os inibidores de -glicosidase e os inibidores da DPP-
aumentada até que o alvo glicêmico tenha sido conseguido ou que
-IV; (2) admitindo-se um grau semelhante de aprimoramento
tenha sido alcançada uma dose máxima.
glicêmico, nenhuma vantagem clínica para uma única classe de
medicamentos foi demonstrada e qualquer terapia que melhore o Terapia combinada com agentes redutores da glicose Diver-
controle glicêmico comporta a probabilidade de ser benéfica; (3) sas combinações de agentes terapêuticos são bem-sucedidas no
os secretagogos da insulina, os agonistas do receptor de GLP-1, os DM tipo 2, e a posologia dos agentes usados em combinação é
inibidores da DPP-IV e os inibidores da -glicosidase começam a mesma adotada quando os agentes são usados isoladamente.
a baixar imediatamente a glicose plasmática, enquanto os efeitos Levando-se em conta que os mecanismos de ação do primeiro e
redutores da glicose das biguanidas e as tiazolidinedionas são re- do segundo agentes usados são diferentes, o efeito sobre o contro-
tardados em várias semanas; (4) nem todos os agentes são efetivos le glicêmico costuma ser aditivo. Estão disponíveis várias combi-
em todos os indivíduos com DM tipo 2 (falência primária); (5) as nações posológicas fixas de agentes orais, porém falta qualquer
biguanidas, os inibidores de -glicosidase, os agonistas do recep- evidência de que eles sejam superiores à titulação de um único
tor de GLP-1, os inibidores da DPP-IV e as tiazolidinedionas não agente até ser alcançada uma dose máxima e, a seguir, realizando-
causam hipoglicemia diretamente; e (6) a maioria dos indivíduos -se o acréscimo de um segundo agente. Se um controle adequado
acabará necessitando de um tratamento com mais de uma única não for conseguido com a combinação de dois agentes (com base
classe de agentes orais redutores de glicose ou de insulina, o que na reavaliação da A 1C a cada 3 meses), deve-se acrescentar um
reflete a natureza progressiva do DM tipo 2; (7) a durabilidade terceiro agente oral ou a insulina basal (Fig. 19.14).
do controle glicêmico é ligeiramente menor para a gliburida em O tratamento com insulina torna-se necessário quando o DM
comparação com a metformina ou a rosiglitazona. tipo 2 entra na fase de deficiência relativa de insulina (como teste-
Existe considerável experiência clínica com a metformina e as munhada no DM de longa duração) e é assinalado por um controle
sulfonilureias, desde que estão disponíveis há várias décadas. Ad- glicêmico inadequado com um ou dois agentes orais redutores da
mite-se que os inibidores de -glicosidase, os agonistas do GLP-1, glicose. A insulina isoladamente ou em combinação deve ser usa-
os inibidores da DPP-IV e as tiazolidinedionas, que são classes da nos pacientes que não alcançam o alvo glicêmico. Por exemplo,
mais recentes de agentes orais redutores da glicose, reduzirão as uma única dose de insulina de ação prolongada ao deitar é eficaz
complicações relacionadas com o DM por melhorarem o controle em combinação com metformina. Quando a produção endógena
glicêmico, apesar de ainda não se dispor de dados a longo prazo. de insulina cai ainda mais, múltiplas injeções de uma insulina de
As tiazolidinedionas são teoricamente atraentes, pois possuem ação prolongada e de ação rápida serão necessárias para controlar
como alvo uma anormalidade fundamental no DM tipo 2, ou seja as excursões pós-prandiais da glicose. Os esquemas de insulina são
maior resistência à insulina. Entretanto, todos esses agentes atual- idênticos aos esquemas combinados de ação prolongada e de ação
mente são mais caros que a metformina e as sulfonilureias. rápida abordados acima para o DM tipo 1. Levando-se em conta
Um algoritmo terapêutico razoável para o tratamento ini- que a hiperglicemia do DM tipo 2 tende a ser mais “estável,” esses
cial utiliza a metformina como terapia inicial em virtude de sua esquemas podem ser aumentados por acréscimos de 10% a cada 2 a
235
riam acarretar um aumento do risco de doença cardiovascular. Como
3 dias utilizando os resultados da GPJ. A dose diária de insulina ne-
abordado anteriormente, a piora transitória da retinopatia ou neuro-
cessária pode vir a ser muito alta (1 a 2 unidades/kg/dia) à medida
patia diabética às vezes acompanha um controle glicêmico aprimora-
que a produção endógena de insulina cai e que a resistência à insu-
do. Em consequência de controvérsias recentes sobre a meta glicêmi-
lina persiste. Os indivíduos que necessitam de mais de 1 unidade/
ca ideal e preocupações de segurança, o FDA exige atualmente uma
kg/dia de insulina de ação prolongada devem ser aventados para
informação sobre o perfil de segurança cardiovascular como parte de
uma possível terapia combinada com metformina ou uma tiazoli-
sua nova avaliação para tratamento do diabetes tipo 2.
dinediona. O acréscimo de metformina ou de uma tiazolidinedio-
na pode reduzir as necessidades de insulina em alguns indivíduos
com DM tipo 2, ao mesmo tempo em que se consegue manter ou ASPECTOS CONTÍNUOS DA ASSISTÊNCIA ABRANGENTE
até mesmo aprimorar o controle glicêmico. A insulina mais uma AO DIABETES
tiazolidinediona promove aumento de peso e está associada a ede- As taxas de morbidade e de mortalidade das complicações relacio-
ma periférico. O acréscimo de uma tiazolidinediona ao esquema de nadas com o DM podem ser grandemente reduzidas por procedi-
insulina de um determinado paciente pode tornar necessária uma mentos de vigilância oportunos e consistentes (Quadro 19.13). Esses
redução na dose de insulina para evitar a hipoglicemia. procedimentos de triagem estão indicados para todos os indivíduos
com DM, porém muitos indivíduos com diabetes não recebe uma
TERAPIAS EMERGENTES O transplante total de pâncreas (reali-
assistência abrangente do diabetes. A triagem para dislipidemia e
zado concomitantemente com um transplante renal) pode nor-
hipertensão deve ser realizada anualmente. Além da manutenção
malizar a tolerância à glicose e constitui uma importante opção
de saúde habitual, os indivíduos com diabetes também devem rece-
terapêutica no DM tipo 1 com DRT, apesar de exigir um nível
ber as vacinas antipneumocócica e antitetânica (com os intervalos
substancial de perícia e de estar associado aos efeitos colaterais da
recomendados) e a vacina antigripal (anualmente). Como discutido
imunossupressão. O transplante de ilhotas pancreáticas foi preju-
anteriormente, a terapia com ácido acetilsalicílico deve ser aventada
dicado pelas limitações no suprimento das ilhotas pancreáticas e
em muitos pacientes com diabetes (prevenção primária em homens
na sobrevida do enxerto e continua sendo uma área de investiga-
de mais de 50 anos de idade ou mulheres de mais de 60 anos com DM
ção clínica. Muitos indivíduos com DM tipo 1 de longa duração
tipo 1 ou tipo 2 com um fator de risco de doença CV), porém o seu
produzem quantidades muito pequenas de insulina ou possuem
papel na prevenção primária em indivíduos de baixo risco não está
células insulino-positivas dentro do pâncreas. Isto sugere que
bem definido, e o seu uso não é recomendado.
SEÇÃO III
236
DM tipo 2. Essa triagem inclui um exame para perda da sensibilida- paciente hospitalizado ainda não estão totalmente definidas. Em vá-
de protetora (PDSP) utilizando o teste do monofilamento mais um rios estudos de corte transversal de pacientes com diabetes, um maior
dos seguintes testes: vibração, picada com alfinete, reflexo aquileu ou grau de hiperglicemia foi associado a resultados cardíacos, neurológi-
limiar de percepção vibratória (utilizando um biotesiômetro). Se o cos e infecciosos mais graves. Em alguns estudos, os pacientes que não
teste do monofilamento ou um dos outros testes estiverem anormais, apresentam diabetes preexistente, mas que desenvolvem elevações
o paciente é diagnosticado com PDSP e recebe aconselhamento apro- moderadas do nível de glicemia durante a hospitalização parecem ser
priado. As calosidades e as deformidades ungueais devem ser trata- beneficiados quando se consegue atingir uma quase normoglicemia
das por um podiatra; o paciente deve ser desencorajado de realizar com a utilização do tratamento insulínico. Entretanto, um ensaio clí-
a autoassistência de problemas podálicos até mesmo insignificantes, nico randomizado de grande porte (NICE-SUGAR) de pacientes na
porém deve ser enfaticamente encorajado a verificar seus pés diaria- unidade de terapia intensiva (cuja maioria estava sob ventilação me-
mente quanto a quaisquer lesões em fase inicial. Os médicos devem cânica) constatou uma taxa de mortalidade aumentada e um maior
considerar uma triagem para doença arterial periférica assintomática número de episódios de hipoglicemia grave com um controle glicê-
usando o índice tornozelo-braquial em indivíduos de alto risco. mico muito estrito [GS-alvo de 4,5 a 6 mmol/L ou 81 a 108 mg/dL]
Uma mensuração anual da microalbuminúria (relação albumina- em comparação com indivíduos com meta glicêmica mais moderada
-creatinina em uma amostra de urina) é aconselhável nos indivíduos (glicemia média de 8 mmol/L ou 144 mg/dL). Na atualidade, a maio-
com DM tipo 1 e tipo 2 (Fig. 19.10). A mensuração da proteína uri- ria dos dados sugere que o controle muito estrito da glicemia em pa-
nária em um exame de urina de rotina não detecta esses baixos níveis cientes agudamente enfermos tende a agravar os resultados e aumenta
de excreção de albumina (microalbuminúria). A triagem para micro- a frequência de hipoglicemia. A ADA sugere essas metas glicêmicas
albuminúria deve começar 5 anos após o início do DM tipo 1, assim para pacientes hospitalizados: (1) em pacientes gravemente enfermos:
como ao ser feito o diagnóstico de DM tipo 2. Independentemente glicose de 7,8 a 10,0 mmol/L ou 140 a 180 mg/dL; (2) pacientes que
dos resultados para a excreção de proteína, a TFG deve ser estimada não estão em estado crítico: glicose pré-prandial < 7,8 mmol/L (140
utilizando a creatinina séria em todos os pacientes em bases anuais. mg/dL) e GS em outros momentos < 10 mmol/L (180 mg/dL).
O médico que cuida de um indivíduo com diabetes no período pe-
CONSIDERAÇÕES ESPECIAS NO DIABETES MELITO rioperatório, durante episódios de infecção ou de enfermidade física
grave, ou simplesmente quando o paciente está em jejum para algum
■■ ASPECTOS PSICOSSOCIAIS
Capítulo 19
procedimento diagnóstico deve monitorar com muito cuidado a glicose
Como o indivíduo com DM pode enfrentar uma série de desafios que plasmática, ajustar o esquema de tratamento do diabetes e administrar
afetam muitos aspectos da vida diária, a avaliação psicossocial e o tra- uma infusão de glicose, se necessário. A hipoglicemia é frequente nos
tamento constituem uma parte essencial da assistência abrangente ao pacientes hospitalizados, e muitos desses episódios podem ser evitados.
diabetes. O indivíduo com DM terá que aceitar que poderá vir a de- As medidas para reduzir ou prevenir a hipoglicemia incluem frequen-
senvolver complicações relacionadas com o DM. Até mesmo com um te monitoração da glicose e antecipação das modificações potenciais
esforço considerável, a normoglicemia poderá ser uma meta ilusória da administração de insulina/glicose devido a mudanças na situação
e as soluções para o controle glicêmico em deterioração podem não clínica ou tratamento (redução gradual dos glicocorticoides, etc.) ou
ser identificadas com facilidade. O paciente deve encarar-se como um interrupção de infusões enterais ou parenterais ou ingestão VO.
membro essencial da equipe de assistência do diabetes e não apenas Dependendo da gravidade da enfermidade do paciente e do am-
Diabetes Melito
como alguém que está sendo cuidado pela equipe especializada no biente hospitalar, o médico pode utilizar uma infusão de insulina ou
controle do diabetes. O estresse emocional pode provocar uma mu- insulina SC. As infusões de insulina são preferidas na UTI ou em um
dança no comportamento, fazendo com que os indivíduos deixem de contexto clinicamente instável. A absorção da insulina SC pode ser
obedecer o esquema dietético, de exercícios ou terapêutico. Isto pode variável nessas situações. As infusões de insulina também podem con-
resultar no aparecimento de hiperglicemia ou de hipoglicemia. Os trolar efetivamente a glicose plasmática no período perioperatório e
transtornos alimentares, incluindo a ingestão indiscriminada de ali- quando o paciente for incapaz de qualquer ingestão oral. A insulina
mentos e bebidas, a bulimia ou a anorexia nervosa, parecem ocorrer regular é preferida aos análogos da insulina para a infusão de insulina
mais frequentemente em indivíduos com DM tipo 1 ou tipo 2. IV, visto que é menos dispendiosa e igualmente efetiva. O médico deve
considerar cuidadosamente o contexto clínico no qual será utilizada
■■ TRATAMENTO DO PACIENTE HOSPITALIZADO uma infusão de insulina, incluindo a disponibilidade de pessoal auxi-
Praticamente todas as especialidades médicas e cirúrgicas partici- liar adequado para monitorar com frequência a glicose plasmática, e se
pam da assistência dos pacientes hospitalizados com diabetes. A hi- esse pessoal é capaz de ajustar a velocidade de infusão da insulina para
perglicemia, tanto em paciente com diabetes conhecido quanto em manter a glicose plasmática dentro da faixa ideal. Os algoritmos para
alguém sem diabetes conhecido, parece ser um prognosticador de infusão de insulina devem integrar a sensibilidade do paciente à insu-
um resultado precário nos pacientes hospitalizados. Anestesia geral, lina, a monitoração frequente da glicemia e a tendência a alterações do
cirurgia, infecção ou enfermidade concomitante elevam os níveis dos nível de glicemia para determinar a velocidade de infusão da insulina.
hormônios contra-reguladores (cortisol, hormônio do crescimento, São aconselhados algoritmos para infusão de insulina desenvolvidos e
catecolaminas e glucagon) e das citocinas que podem resultar em re- implementados conjuntamente pela equipe de enfermagem e médicos.
sistência transitória à insulina, assim como em hiperglicemia. Esses Devido à meia-vida curta da insulina regular IV, é necessário adminis-
fatores elevam as demandas de insulina por aumentarem a produção trar insulina de ação longa antes de interromper a infusão de insulina
de glicose e prejudicarem sua utilização e, assim sendo, podem agra- (2 a 4 h) para evitar um período de deficiência de insulina.
var o controle glicêmico. A enfermidade ou procedimento cirúrgico Em pacientes que não estão em estado crítico ou que não se en-
concomitante pode dar origem a uma absorção variável da insulina e contram na UTI, a insulina basal ou “programada” é administrada por
impedir também que o paciente com DM possa comer normalmen- via SC, a insulina de ação longa é suplementada por insulina prandial
te, razão pela qual pode promover um quadro de hipoglicemia. O e/ou “corretiva” utilizando uma insulina de ação curta (são preferidos
controle glicêmico deve ser avaliado (usando a A1C na admissão). os análogos da insulina). O uso de insulina de ação rápida em “esca-
Devem ser determinados também os eletrólitos, a função renal e o la móvel” isoladamente, em que nenhuma insulina é administrada, a
estado volêmico intravascular. A alta prevalência de doença cardio- não ser que o nível de glicemia esteja elevado, é inadequado para o
vascular nos indivíduos com DM (especialmente no DM tipo 2) pode controle da glicose nos pacientes internados e não deve ser adotado.
tornar necessária uma avaliação cardiovascular pré-operatória. A dose de insulina pré-prandial de ação rápida deve incluir a cober-
As metas do tratamento do diabetes durante a hospitalização con- tura para o consumo de alimentos (com base na ingestão prevista de
sistem em quase normoglicemia, prevenção da hipoglicemia e tran- carboidratos) mais uma insulina corretiva ou suplementar com base
sição de volta ao esquema de tratamento ambulatorial do diabetes. na sensibilidade do paciente à insulina e na glicose sanguínea. Por
O controle glicêmico parece melhorar os resultados clínicos em uma exemplo, se o paciente for magro (e, provavelmente, sensível à insu-
variedade de circunstâncias, porém as metas glicêmicas ideais para o lina), um suplemento de insulina corretiva poderia constar de uma
237
unidade para cada 2,7 mmol/L (50 mg/dL) acima da glicose almejada. mina) podem ser suficientes para reduzir a hiperglicemia. Se a GPJ
Se o paciente for obeso e resistente à insulina, então o suplemento de for > 11,1 mmol/L (200 mg/dL), em geral os agentes orais não são
insulina poderia constar de duas unidades para cada 2,7 mmol/L (50 eficazes e torna-se necessária a insulinoterapia. A insulina de ação
mg/dL) acima da glicose almejada. É de suma importância individua- rápida poderá ser necessária para suplementar a insulina de ação
lizar o esquema e ajustar com frequência a dose de insulina basal ou prolongada a fim de controlar as excursões pós-prandiais da glicose.
“programada”, tendo como base a insulina corretiva necessária. Um
“plano consistente de refeição com carboidratos para diabetes” para Tópicos sobre reprodução
pacientes hospitalizados fornece uma quantidade previsível de carboi- A capacidade reprodutiva tanto dos homens quanto das mulheres
dratos em determinada refeição a cada dia (mas não necessariamente com DM parece ser normal. Os ciclos menstruais podem estar as-
a mesma quantidade no desjejum, almoço e jantar). A dieta hospita- sociados a alterações no controle glicêmico nas mulheres com DM.
lar deve ser estabelecida por um nutricionista; termos como dieta da A gravidez está associada a uma resistência à insulina significativa;
ADA ou dieta pobre em açúcar não são mais empregados. as maiores demandas de insulina costumam desencadear um quadro
Os indivíduos com DM tipo 1 que estão sendo submetidos a uma de DM e permitiram o diagnóstico de DMG. A glicose, que em al-
anestesia geral e a uma cirurgia, ou que estão gravemente enfermos, tos níveis é um teratógeno para o feto em desenvolvimento, atravessa
devem receber insulina contínua, seja através de uma infusão IV de prontamente a placenta, porém a insulina não consegue fazê-lo. As-
insulina, seja pela administração subcutânea de uma dose reduzida sim sendo, a hiperglicemia da circulação materna pode estimular a
de uma insulina de ação prolongada. Apenas a insulina de ação rápi- secreção de insulina no feto. Os efeitos anabólicos e de crescimento
da é insuficiente. O prolongamento de um procedimento cirúrgico da insulina podem resultar em macrossomia. O DMG complica cerca
ou uma demora na sala de recuperação não é incomum e pode resul- de 7% das gestações nos EUA. A incidência de DMG é grandemente
tar em períodos de deficiência de insulina que evolui para uma ceto- aumentada em certos grupos étnicos, incluindo os afro-americanos
acidose diabética (CAD). A infusão de insulina é o método preferido e latinos, o que é consistente com um aumento semelhante no risco
para controlar os pacientes com DM tipo 1 no período perioperató- de DM tipo 2. As recomendações atuais aconselham a triagem para
rio ou quando existe uma enfermidade concomitante grave (0,5 a 1,0 intolerância à glicose entre as semanas 24 e 28 de gestação das mu-
unidade/h de insulina regular). Se o procedimento diagnóstico ou lheres com risco aumentado para DMG (25 anos ou mais; obesidade;
cirúrgico for de curta duração e estiver sendo realizado sob anestesia história familiar de DM, membro de um grupo étnico como latino,
local ou regional, uma dose reduzida de insulina subcutânea de ação nativo americano, asiático americano, afro-americano ou das ilhas
rápida pode ser suficiente (redução de 30 a 50%, com a insulina de do Pacífico). A terapia para o DMG é semelhante àquela adotada
SEÇÃO III
ação rápida sendo suspensa ou reduzida). Essa abordagem facilita a para as pessoas com diabetes associado à gravidez e envolve TNM
transição de volta para a insulina de ação prolongada após o proce- e insulina se a hiperglicemia persiste. Os agentes orais redutores da
dimento. A glicose pode ser infundida para prevenir a hipoglicemia. glicose não foram aprovados para uso durante a gestação, porém os
A glicose sanguínea deve ser monitorada com frequência durante a estudos que usaram a metformina ou a gliburida demonstraram a
enfermidade ou no período perioperatório. sua eficácia e não encontraram nenhuma toxicidade. Entretanto, a
Os indivíduos com DM tipo 2 podem ser tratados com uma in- maioria dos médicos utiliza insulina para tratar o DMG. Com as prá-
fusão de insulina ou com insulina SC de ação prolongada (redução ticas atuais, a morbidez e a mortalidade da mãe com DMG e do feto
de 25 a 50%, dependendo da situação clínica) mais uma insulina pré- não são diferentes daquelas observadas na população sem diabetes.
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
-prandial de ação rápida. Os agentes orais redutores da glicose devem As pessoas que desenvolvem DMG correm um risco muito maior de
ser suspensos após a admissão e não são úteis para regular a glicose vir a desenvolver DM tipo 2 no futuro e devem ser submetidas a uma
plasmática nas situações clínicas em que as necessidades de insulina e triagem periódica para DM. A maioria das pessoas com DMG rever-
a ingestão de glicose estão se modificando rapidamente. Além disso, te para uma tolerância normal à glicose após o parto, porém algumas
esses agentes orais podem ser perigosos se o paciente estiver jejuando continuarão tendo um diabetes franco ou uma deterioração na tole-
(p. ex., hipoglicemia com as sulfonilureias). A metformina deve ser rância à glicose depois do parto. Além disso, os filhos de mulheres
suspensa quando vão ser administrados meios de contraste radio- com DMG parecem correr um alto risco de obesidade e intolerân-
gráficos ou se estiver presente uma ICC grave, uma acidose ou uma cia à glicose e detêm maior risco de diabetes com início nos estágios
função renal em declínio. mais avançados da adolescência.
A gravidez nas pessoas com DM conhecido torna necessário um
Nutrição parenteral total planejamento meticuloso e a devida adesão a esquemas terapêuticos
A nutrição parenteral total (NPT) acarreta um grande aumento nas ne- rígidos. O controle intensivo do diabetes e a normalização da A1C
cessidades de insulina. Além disso, os indivíduos cujo DM não era co- são essenciais para as pessoas com DM preexistente que estão plane-
nhecido previamente podem tornar-se hiperglicêmicos durante a NPT jando uma gravidez. O período mais crucial do controle glicêmico
e necessitar de tratamento insulínico. A infusão IV de insulina constitui é logo após a fertilização. O risco de malformações fetais aumenta
o tratamento preferido para a hiperglicemia e a titulação rápida até ser de 4 a 10 vezes nas pessoas com DM descontrolado por ocasião da
alcançada a dose necessária de insulina é realizada mais eficientemente concepção e a glicose plasmática normal durante o período pré-con-
ao utilizar uma infusão em separado de insulina. Após ter sido determi- cepção e ao longo dos períodos de desenvolvimento dos órgãos do
nada a dose total de insulina, esta pode ser acrescentada diretamente na feto deve constituir a meta almejada.
infusão para NPT ou, de preferência, administrada como uma infusão
em separado. Com muita frequência, os pacientes que estão recebendo ■■ DM LIPODISTRÓFICO
NPT ou nutrição enteral recebem suas cargas calóricas continuamente A lipodistrofia, ou perda do tecido adiposo subcutâneo, pode ser ge-
e não nas “horas das refeições”; consequentemente, os esquemas de in- neralizada em certas condições genéticas, como o leprechaunismo. A
sulina SC devem ser ajustados. lipodistrofia generalizada está associada a uma acentuada resistência
à insulina e é acompanhada com frequência por acanthosis nigricans
Glicocorticoides e dislipidemia. A lipodistrofia localizada associada às injeções de in-
Os glicocorticoides aumentam a resistência à insulina, reduzem a sulina foi consideravelmente reduzida pelo uso de insulina humana.
utilização de glicose, aceleram a produção hepática de glicose e re-
tardam a secreção de insulina. Essas alterações resultam em piora do Inibidores da protease e lipodistrofia
controle glicêmico nos indivíduos com DM e podem desencadear o Os inibidores da protease usados no tratamento da doença pelo HIV
diabetes em outros indivíduos (“diabetes induzido por esteroides”). estiveram associados a um acúmulo centrípeto de gordura (área vis-
Os efeitos dos glicocorticoides sobre a homeostasia da glicose estão ceral e abdominal), um acúmulo de gordura na região dorsocervical,
relacionados com a dose, em geral são reversíveis e são mais pronun- a perda de gordura nas extremidades, uma menor sensibilidade à in-
ciados no período pós-prandial. Se a GPJ estiver próxima da variação sulina (elevações no nível de insulina em jejum e tolerância reduzida
normal, os agentes orais para diabetes (p. ex., sulfonilureias, metfor- à glicose nos testes de tolerância à glicose IV) e dislipidemia. Apesar
238
de muitos elementos do aspecto físico desses indivíduos serem seme- Grant RW et al: Genetic architecture of type 2 diabetes: Recent progress and
lhantes a uma síndrome de Cushing, os níveis de cortisol aumentados clinical implications. Diabetes Care 32:1107, 2009
não são responsáveis por esse aspecto. Continua sendo válida a pos- Holman RR et al: 10-year follow-up of intensive glucose control in type 2
sibilidade de que isso esteja relacionado com uma infecção pelo HIV diabetes. N Engl J Med 359:1577, 2008
por algum mecanismo ainda não definido, pois algumas caracterís- Kahn SE et al: Glycemic durability of rosiglitazone, metformin, or glyburide
monotherapy. N Engl J Med 355:2427, 2006
ticas da síndrome são observadas antes da introdução dos inibidores
da protease. A terapia para a lipodistrofia relacionada com o HIV Kitabchi AE et al: Hyperglycemic crises in adult patients with diabetes. Dia-
betes Care 32:1335, 2009
ainda não foi bem estabelecida.
Nathan DM et al: Modern-day clinical course of type 1 diabetes mellitus after
30 years’ duration: The diabetes control and complications trial/epidemio-
logy of diabetes interventions and complications and Pittsburgh epide-
BIBLIOGRAFIA
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Diabetes Care 34:S11, 2011 Vaxillaire M, Froguel P: Monogenic diabetes in the young, pharmacoge-
Chan JC et al: Diabetes in Asia: Epidemiology, risk factors, and pathophy- netics and relevance to multifactorial forms of type 2 diabetes. Endocr Rev
siology. JAMA 301:2129, 2009 29:254, 2008
Capítulo 19
Diabetes Melito
239
CAPÍTULO 20 QUADRO 20.1 Causas de hipoglicemia em adultos
Indivíduo enfermo ou medicado
1. Drogas
Hipoglicemia Insulina ou secretagogo da insulina
Álcool
Philip E. Cryer Outras substâncias
Stephen N. Davis 2. Doença crítica
Insuficiência hepática, renal ou cardíaca
A hipoglicemia é causada mais comumente por fármacos usados no
tratamento do diabetes melito ou pela exposição a outras drogas, in- Sepse
cluindo o álcool. Entretanto, vários outros distúrbios, incluindo fa- Inanição
lência de órgãos críticos, sepse e inanição, deficiências hormonais, 3. Deficiência hormonal
tumores de células não beta, insulinoma e cirurgia gástrica prévia, Cortisol
podem causar hipoglicemia (Quadro 20.1). A hipoglicemia é docu-
Glucagon e epinefrina (no diabetes com deficiência de insulina)
mentada de maneira mais convincente pela tríade de Whipple: (1)
sintomas compatíveis com hipoglicemia, (2) baixa concentração 4. Tumor não de células das ilhotas
plasmática de glicose medida por um método preciso (e não com Aparentemente bem individualizado
monitor de glicose) e (3) alívio desses sintomas após elevação do ní- 5. Hiperinsulinismo endógeno
vel plasmático de glicose. Normalmente, o limite inferior da concen- Insulinoma
tração plasmática de glicose em jejum é de aproximadamente 70 mg/
Distúrbios funcionais das células beta (nesiodioblastose)
dL – todavia, em condições normais, ocorrem níveis substancialmen-
te mais baixos de glicose no sangue venoso dentro de algumas horas Hipoglicemia pancreatogênica não insulinoma
após uma refeição. Os níveis de glicose < 55 mg/dL – com sintomas Hipoglicemia pós‑derivação gástrica
SEÇÃO III
que são aliviados prontamente após elevação do nível de glicose do- Hipoglicemia autoimune para a insulina
cumentam uma hipoglicemia. A hipoglicemia pode causar morbi- Anticorpo contra a insulina
dade significativa; se for grave e prolongada, pode ser fatal. A sua
Anticorpo contra o receptor de insulina
presença deve ser considerada em qualquer paciente com episódios
de confusão, nível alterado de consciência ou crise convulsiva. Secretagogo da insulina
Outro
6. Hipoglicemia acidental, subrreptícia ou mal‑intencionada
EQUILÍBRIO DA GLICOSE SISTÊMICA E CONTRARREGULAÇÃO DA
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
Fonte: De PE Cryer et al: J Clin Endocrinol Metab 94:709, 2009 © The Endocrine Society, 2009.
GLICOSE
A glicose é um combustível metabólico obrigatório para o cérebro
em condições fisiológicas. O cérebro é incapaz de sintetizar a glicose O equilíbrio sistêmico da glicose – manutenção da concentra-
ou de armazenar um suprimento na forma de glicogênio por mais ção plasmática normal de glicose – é obtido por meio de uma rede
de alguns minutos e, por conseguinte, necessita de um suprimento de hormônios, sinais neurais e efeitos dos substratos que regulam
contínuo de glicose a partir da circulação arterial. Quando a concen- a produção endógena de glicose e a sua utilização por tecidos além
tração plasmática de glicose no sangue arterial cai abaixo da faixa do cérebro (Cap. 19). Entre os fatores reguladores, a insulina de-
fisiológica, o transporte de glicose do sangue para o cérebro torna-se sempenha um papel dominante (Quadro 20.2; Fig. 20.1). Quando
insuficiente para sustentar o metabolismo energético e a função do os níveis plasmáticos de glicose declinam dentro da faixa fisiológi-
cérebro. Entretanto, mecanismos contrarreguladores redundantes ca no estado de jejum, a secreção de insulina pelas células beta do
da glicose normalmente impedem ou corrigem rapidamente a hi- pâncreas diminui, aumentando, assim, a glicogenólise hepática e a
poglicemia. gliconeogênese hepática (e renal). Os baixos níveis de insulina tam-
As concentrações plasmáticas de glicose são normalmente man- bém reduzem a utilização da glicose nos tecidos periféricos, indu-
tidas dentro de uma faixa relativamente estreita, de aproximadamente zindo lipólise e proteólise, com consequente liberação de precurso-
70 a 110 mg/dL no estado de jejum, com excursões transitórias mais res gliconeogênicos. Por conseguinte, uma diminuição da secreção
altas depois de uma refeição, apesar das amplas variações no forne- de insulina constitui a primeira defesa contra a hipoglicemia.
cimento exógeno de glicose a partir das refeições e na utilização da Quando os níveis plasmáticos de glicose declinam imediata-
glicose endógena por parte dos músculos em atividade, por exemplo. mente abaixo da faixa fisiológica, ocorre liberação dos hormônios
Entre as refeições e durante o jejum, os níveis plasmáticos de glicose contrarreguladores da glicose (que elevam os níveis plasmáticos de
são mantidos pela produção endógena de glicose, pela glicogenólise glicose (Quadro 20.2; Fig. 20.1). Entre esses hormônios, o glucagon
hepática e pela gliconeogênese hepática (e renal) (Fig. 20.1). Embora das células do pâncreas, que estimula a glicogenólise hepática, de-
as reservas hepáticas de glicogênio sejam habitualmente suficientes sempenha um papel primário. O glucagon constitui a segunda defesa
para manter os níveis plasmáticos de glicose por aproximadamente contra a hipoglicemia.
8 h, esse período de tempo pode ser mais curto se houver aumento A epinefrina adrenomedular, que estimula a glicogenólise e a gli-
da demanda de oxigênio pelo exercício ou se ocorrer depleção das coneogênese hepáticas (e a gliconeogênese renal), normalmente não
reservas de glicogênio por doença ou inanição. é crítica. Todavia, torna-se essencial quando o glucagon está defi-
A gliconeogênese normalmente exige baixos níveis de insulina ciente. A epinefrina constitui a terceira defesa contra a hipoglicemia.
e presença de hormônios anti-insulina (contrarreguladores), junta- Quando a hipoglicemia prolonga-se por mais de cerca de 4 horas, o
mente com um suprimento coordenado de precursores do músculo cortisol e o hormônio do crescimento também sustentam a produção
e do tecido adiposo para o fígado (e os rins). O músculo fornece lac- de glicose e limitam a sua utilização, embora com apenas cerca de
tato, piruvato, alanina, glutamina e outros aminoácidos. Os triglice- 20% da intensidade da epinefrina.
rídios no tecido adiposo são degradados em ácidos graxos e glicerol, À medida que os níveis plasmáticos de glicose caem para va-
que é um precursor gliconeogênico. Os ácidos graxos proporcionam lores mais baixos, os sintomas acionam a defesa comportamental
um combustível oxidativo alternativo para outros tecidos diferentes contra a hipoglicemia, incluindo a ingestão de alimento (Quadro
do cérebro (que necessita de glicose). 20.2; Fig. 20.1).
240
Glicose arterial
Fígado
Pâncreas
Insulina
Cérebro
Glucagon Produção
Rins
de glicose
Efluxo
simpáticoadrenal Glicose
Hipófise arterial
Músculo Gordura
Medula
suprarrenal
Precursor
Hormônio Epinefrina gliconeogênico (lactato,
do aminoácidos, glicerol)
(ACTH) crescimento Neurônios
pós-ganglionares Depuração
simpáticos da glicose
Córtex (Ingestão)
Norepinefrina
suprarrenal
Sintomas
Acetilcolina
Cortisol
Capítulo 20
Figura 20.1 Fisiologia da contrarregulação da glicose – os mecanismos que normalmente impedem ou corrigem rapidamente a hipoglicemia. No diabetes
com deficiência de insulina, as respostas contrarreguladoras essenciais – supressão da insulina e aumento do glucagon – são perdidas, e a estimulação do efluxo simpati-
coadrenal é atenuada.
Os limiares glicêmicos normais para essas respostas à diminui- lógicas causadas pela descarga simpaticoadrenal mediada pelo SNC
ção das concentrações plasmáticas de glicose são mostrados no Qua- e desencadeada pela hipoglicemia. Incluem sintomas adrenérgicos
dro 20.2. Entretanto, esses limiares são dinâmicos. Desviam-se para (mediados, em grande parte, pela norepinefrina liberada pelos neu-
níveis de glicose acima do normal em indivíduos com diabetes mal rônios pós-ganglionares simpáticos, mas talvez também pela epine-
controlado, que podem apresentar sintomas de hipoglicemia quando frina liberada pela medula suprarrenal), como palpitações, tremor
Hipoglicemia
os níveis de glicose declinam para a faixa normal. Por outro lado, des- e ansiedade. Incluem também sintomas colinérgicos (mediados
viam-se para níveis de glicose abaixo do normal em indivíduos com pela acetilcolina liberada dos neurônios pós-ganglionares simpá-
hipoglicemia recorrente, como, por exemplo, aqueles com diabetes ticos), como sudorese, fome e parestesias. Evidentemente, trata-se
tratado agressivamente ou com insulinoma. Esses pacientes apresen- de sintomas inespecíficos. A sua atribuição à hipoglicemia exige a
tam sintomas com níveis de glicose abaixo daqueles que produzem presença de uma concentração plasmática baixa correspondente de
sintomas nos indivíduos sadios. glicose e a sua resolução após a elevação dos níveis de glicose (tríade
de Whipple).
■■ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Os sinais comuns de hipoglicemia consistem em diaforese e pali-
Os sintomas neuroglicopênicos de hipoglicemia constituem o re- dez. A frequência cardíaca e a pressão arterial sistólica estão aumen-
sultado direto da privação de glicose do sistema nervoso central tadas, porém podem não estar elevadas em um indivíduo que sofreu
(SNC). Incluem alterações do comportamento, confusão, fadiga, episódios recentes e repetidos de hipoglicemia. Com frequência,
crises convulsivas, perda da consciência e, se a hipoglicemia for podem-se observar manifestações neuroglicopênicas. Em certas oca-
intensa e prolongada, morte. Os sintomas neurogênicos (ou autô- siões, ocorrem déficits neurológicos focais transitórios. Os déficits
nomos) da hipoglicemia resultam da percepção das alterações fisio- neurológicos permanentes são raros.
Nota: Ra, velocidade de aparecimento da glicose, de produção da glicose pelo fígado e pelos rins; Rc, velocidade de depuração da glicose, de utilização da glicose em relação às concentrações plas-
máticas de glicose no ambiente; Rd, velocidade de desaparecimento da glicose, de utilização da glicose pelo cérebro (que não é alterada pelos hormônios glicorreguladores) e pelos tecidos sensíveis
à insulina, como o músculo esquelético (que é regulado pela insulina, epinefrina, cortisol e hormônio do crescimento).
Fonte: De PE Cryer: Hypoglycemia em Williams Textbook of Endocrinology, 11th ed. HM Kronenberg et al. (eds). Philadelphia, Saunders, 2008.
241
■■ ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA hipoglicemia compromete a defesa comportamental (ingestão de
carboidratos).
A hipoglicemia representa mais comumente o resultado do trata-
mento do diabetes. Por conseguinte, esse tópico é abordado antes de Contrarregulação defeituosa da glicose No contexto de uma defi-
serem consideradas outras causas de hipoglicemia. ciência absoluta de insulina endógena, os níveis de insulina não di-
minuem quando os níveis plasmáticos de glicose caem; a primeira
■■ HIPOGLICEMIA NO DIABETES defesa contra a hipoglicemia é perdida. Além disso, provavelmente
pelo fato de que a redução da insulina dentro das ilhotas constitui
Impacto e frequência
normalmente um sinal para estimular a secreção de glucagon, os
A hipoglicemia constitui o fator limitante do controle glicêmico do níveis de glucagon não aumentam quando os níveis plasmáticos de
diabetes. Em primeiro lugar, causa morbidade recorrente na maio- glicose caem ainda mais; a segunda defesa contra a hipoglicemia
ria dos indivíduos com diabetes tipo 1 (DMT1) e em muitos com também é perdida. Por fim, o aumento dos níveis de epinefrina, a
diabetes tipo 2 (DMT2) avançado, sendo algumas vezes fatal. Em terceira defesa contra a hipoglicemia, em resposta a um determinado
segundo lugar, impede a manutenção da euglicemia durante a vida nível de hipoglicemia está atenuado. O limiar glicêmico para a res-
do paciente diabético, e, portanto, e obtenção total dos benefícios posta simpaticoadrenal (epinefrina adrenomedular e norepinefrina
vasculares bem estabelecidos do controle glicêmico. Em terceiro lu- neural simpática) é desviada para concentrações plasmáticas de gli-
gar, provoca um ciclo vicioso de hipoglicemia recorrente ao produzir cose mais baixas. Isso resulta de uma hipoglicemia iatrogênica ante-
falência autônoma associada à hipoglicemia – as síndromes clínicas cedente e recente. No contexto da ausência de redução da insulina e
de contrarregulação defeituosa da glicose e de perda da percepção da ausência de aumento do glucagon, a elevação atenuada da epinefrina
hipoglicemia. leva à síndrome clínica de contrarregulação defeituosa da glicose. Os
A hipoglicemia é um fato real da vida para os indivíduos com pacientes afetados correm risco 25 vezes maior ou até mais alto de
DMT1. Esses pacientes sofrem, em média, dois episódios de hipo- hipoglicemia iatrogênica grave durante a terapia glicêmica agressiva
glicemia sintomática por semana e pelo menos um episódio de hi- do diabetes, em comparação com aqueles que apresentam respostas
poglicemia grave e, pelo menos temporariamente, incapacitante a normais à epinefrina. Esse distúrbio funcional e reversível é distinto
cada ano. Estima-se que 6 a 10% dos indivíduos com DMT1 morrem da neuropatia autônoma diabética clássica, que é um distúrbio estru-
como resultado da hipoglicemia. A hipoglicemia ocorre com menos tural e irreversível.
frequência no DMT2. Entretanto, a sua prevalência no DMT2 que
SEÇÃO III
Episódios de Hipoglicemia
Exercício Sono
Respostas simpaticoadrenais
atenuados à hipoglicemia
(FAAH)
Capítulo 20
Contrarregulação Perda da percepção
defeituosa da glicose da hipoglicemia
Hipoglicemia
recorrente
Figura 20.2 Falência autônoma associada à hipoglicemia no diabetes com deficiência de insulina.
Hipoglicemia
VANCE, ACCORD e VADT também relataram uma incidência sig- O uso de monitoração contínua da glicose parece ser promissor
nificativa de hipoglicemia grave em indivíduos portadores de DMT2. como método de reduzir a hipoglicemia, enquanto melhora o nível
De modo um tanto surpreendente, todos os três estudos constataram de HbA1C. Outras intervenções para estimular as respostas con-
que o controle intensivo da glicose tem pouco ou nenhum benefí- trarreguladoras, como terbutalina, fluoxetina, tiazolidinedionas ou
cio na redução dos eventos macrovasculares no DMT2. De fato, o frutose, continuam sendo experimentais e não foram submetidas a
estudo ACCORD foi concluído precocemente, devido a um aumen- estudos clínicos de grande escala.
to da mortalidade no braço de controle intensivo da glicose. Não se Por conseguinte, a terapia glicêmica intensiva (Cap. 19) precisa
sabe se a hipoglicemia iatrogênica constituiu a causa do aumento de ser aplicada em combinação com orientação e capacitação do pa-
mortalidade. Tendo em vista esses achados, foram formulados novos ciente; automonitoração frequente da glicemia; esquemas flexíveis de
paradigmas e recomendações. Enquanto existe pouca controvérsia insulina (e de outros fármacos), incluindo o uso de análogos da in-
sobre a necessidade de reduzir a hiperglicemia em pacientes hospi- sulina (tanto de ação curta quanto de ação mais longa); metas glicê-
talizados, as metas para a manutenção da glicemia foram modifica- micas individualizadas; orientação e apoio profissionais constantes;
das, caindo entre 140 e 180 mg/dL. Por conseguinte, os benefícios e análise tanto dos fatores de risco convencionais quanto daqueles
da insulinoterapia e da redução da hiperglicemia podem ser obtidos indicativos de comprometimento da contrarregulação da glicose.
enquanto se diminui a prevalência da hipoglicemia. Tendo em vista uma história de perda da percepção da hipoglicemia,
De forma semelhante, há evidências de que o controle intensivo indica-se um período de 2 a 3 semanas durante o qual é preciso evitar
da glicose pode reduzir a prevalência de doença microvascular tanto escrupulosamente a hipoglicemia.
no DMT1 quanto no DMT2. Esses benefícios precisam ser avalia-
dos em relação à prevalência aumentada de hipoglicemia. O nível ■■ HIPOGLICEMIA SEM DIABETES
de controle da glicose (HbA1C) deve ser determinado para cada pa- Existem muitas causas de hipoglicemia (Quadro 20.1). Como a hipo-
ciente. Ensaios clínicos multicêntricos demonstraram que pacientes glicemia é comum no diabetes tratado com insulina ou com secreta-
com diagnóstico recente de DMT1 ou DMT2 podem obter um me- gogos da insulina, é frequentemente razoável supor que um episódio
lhor controle glicêmico com menos hipoglicemia. Além disso, ainda clinicamente suspeito foi o resultado de hipoglicemia. Por outro lado,
existe um benefício de longo prazo na redução dos níveis mais altos como a hipoglicemia é rara na ausência de diabetes tratado com fár-
de HbA1C para valores mais baixos, embora ainda acima dos níveis macos, é razoável concluir que a presença de distúrbio hipoglicêmico
recomendados. Talvez uma meta terapêutica razoável seja o menor só é observada em pacientes nos quais é possível demonstrar a tríade
nível de HbA1C que não irá causar hipoglicemia grave e que irá pre- de Whipple.
servar a percepção da hipoglicemia. Nos pacientes enfermos ou medicados, em particular, as consi-
O transplante de pâncreas (tanto o órgão inteiro quanto células derações diagnósticas iniciais devem focalizar o uso de medicações
das ilhotas) tem sido usado como opção de tratamento para a hi- e, em seguida, doenças críticas, deficiências hormonais ou hipogli-
poglicemia grave recorrente. Em geral, as taxas de hipoglicemia di- cemia causada por tumores de células não beta. Na ausência de qual-
minuem após o transplante. Isso parece ser devido a respostas mais quer uma dessas causas e no indivíduo aparentemente em boa saúde,
fisiológicas da insulina e do glucagon durante a hipoglicemia após o foco deve ser orientado para as possibilidades de hiperinsulinismo
transplante de órgão e resolução da modulação da insulina após endógeno ou hipoglicemia acidental, subrreptícia ou até mesmo mal-
transplante de células das ilhotas. -intencionada.
243
Medicamentos outros sistemas glicorreguladores estão intactos. As deficiências
combinadas de glucagon e de epinefrina desempenham um papel
A insulina e os secretagogos da insulina suprimem a produção de
essencial na patogenia da hipoglicemia iatrogênica em indivíduos
glicose e estimulam a sua utilização. O etanol bloqueia a gliconeogê-
com diabetes com deficiência de insulina, conforme discutido an-
nese, mas não a glicogenólise. Por conseguinte, a hipoglicemia indu-
teriormente. De outro modo, as deficiências desses hormônios não
zida pelo álcool ocorre depois de um abuso de etanol de vários dias,
são habitualmente consideradas no diagnóstico diferencial de um
durante o qual o indivíduo ingere pouco alimento, causando, assim,
distúrbio hipoglicêmico.
depleção de glicogênio. O etanol é habitualmente mensurável no san-
gue por ocasião da apresentação, porém seus níveis exibem pouca Tumores de células não beta
correlação com as concentrações plasmáticas de glicose. Como a gli-
A hipoglicemia de jejum, frequentemente denominada hipoglicemia
coneogênese passa a constituir a via predominante de produção de
do tumor de células não insulares, ocorre ocasionalmente em pacien-
glicose durante a hipoglicemia prolongada, o álcool pode contribuir
tes com grandes tumores mesenquimais ou epiteliais (p. ex., hepato-
para a progressão da hipoglicemia em pacientes diabéticos tratados
mas, carcinomas adrenocorticais, carcinoides). Os padrões cinéticos
com insulina.
de glicose assemelham-se aos do hiperinsulinismo (ver adiante), po-
Numerosos outros fármacos foram associados à hipoglicemia,
rém a secreção de insulina é suprimida apropriadamente durante a
incluindo medicamentos usados comumente, como inibidores da hipoglicemia. Na maioria dos casos, a hipoglicemia deve-se à produ-
enzima conversora de angiotensina e antagonistas dos receptores de ção excessiva de uma forma incompletamente processada do fator de
angiotensina, antagonistas dos receptores -adrenérgicos, quinolo- crescimento insulino-símile II (“IGF-II grande”), que normalmente
nas, indometacina, quinina e sulfonamidas, entre muitos outros. não forma complexos com as proteínas de ligação circulantes e que,
portanto, consegue acesso mais prontamente aos tecidos-alvo. Em
Enfermidade crítica
geral, os tumores são clinicamente evidentes, a razão entre IGF-II e
Entre os pacientes hospitalizados, as doenças graves, como insufi- IGF-I no plasma está elevada, e os níveis de IGF-II livre [e os níveis
ciência renal, hepática ou cardíaca, sepse e inanição, ocupam o se- de pró-IGF-II (E1-21)] estão aumentados. A cirurgia curativa rara-
gundo lugar após os fármacos como causas de hipoglicemia. mente é possível, porém a redução do volume do tumor pode melho-
A destruição hepática rápida e extensa (p. ex., hepatite tóxica) rar a hipoglicemia. Foi também relatado que a terapia com glicocor-
provoca hipoglicemia de jejum, visto que o fígado constitui o prin- ticoides, hormônio do crescimento ou ambos alivia a hipoglicemia.
SEÇÃO III
cipal local de produção endógena de glicose. O mecanismo da hi- A hipoglicemia atribuída à produção ectópica de IGF-I foi relatada,
poglicemia nos pacientes com insuficiência cardíaca é desconhecido. porém a sua ocorrência é rara.
Pode envolver congestão hepática e hipoxia. Embora os rins consti-
tuam uma fonte de produção de glicose, a hipoglicemia em pacientes Hiperinsulinismo endógeno
com insuficiência renal também é causada pela depuração reduzida A hipoglicemia devida ao hiperinsulinismo endógeno pode ser cau-
da insulina e menor mobilização dos precursores gliconeogênicos na sada por (1) um distúrbio primário das células beta, um tumor de
insuficiência renal. células beta (insulinoma), algumas vezes múltiplos insulinomas ou
A sepse constitui uma causa relativamente comum de hipoglice- um distúrbio funcional das células beta com hipertrofia ou hiper-
mia. O aumento da utilização de glicose é induzido pela produção de
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
244
sempre, causam hipoglicemia de jejum, pode ocorrer um episódio somatostatina, o octreotide, podem ser usados para tratar a hipogli-
diagnóstico após um jejum ambulatorial relativamente curto. A ob- cemia em pacientes com tumores não ressecáveis; o everolimo, um
tenção de amostras seriadas durante um jejum diagnóstico de até inibidor do mTOR (alvo da rapamicina de mamíferos), é promissor.
72 h com o paciente internado ou após uma refeição mista é mais
problemática. Uma alternativa consiste em fornecer ao paciente uma ■■ HIPOGLICEMIA ACIDENTAL, SUB‑REPTÍCIA OU
lista detalhada das medições necessárias e solicitar que procure um MAL‑INTENCIONADA
serviço de emergência com a lista durante um episódio sintomático. Podem ocorrer acidentalmente a ingestão de um secretagogo da
Naturalmente, uma concentração plasmática normal de glicose du- insulina (p. ex., resultado de erro de farmácia ou erro médico) ou
rante um episódio sintomático indica que os sintomas não resultam administração de insulina. A hipoglicemia factícia, causada pela
de hipoglicemia. administração sub-reptícia ou até mesmo mal-intencionada de in-
Um insulinoma, um tumor de células beta das ilhotas pan- sulina ou de um secretagogo da insulina, compartilha muitas carac-
creáticas secretor de insulina, constitui o protótipo da causa de terísticas clínicas e laboratoriais com o insulinoma. É mais comum
hiperinsulinismo endógeno, de modo que a sua presença deve
entre profissionais de saúde, pacientes com diabetes ou seus paren-
ser investigada em pacientes com a síndrome clínica. Entretan-
tes e indivíduos com história de outras doenças factícias. Entre-
to, o insulinoma não constitui a única causa de hiperinsulinismo
tanto, deve ser considerado em todos os pacientes que estão sendo
endógeno. Alguns pacientes com hipoglicemia hiperinsulinêmica
avaliados para hipoglicemia de causa obscura. A ingestão de um
endógena de jejum apresentam comprometimento difuso das ilho-
secretagogo da insulina provoca hipoglicemia com aumento dos ní-
tas com hipertrofia e, algumas vezes, hiperplasia das células beta.
veis de peptídio C, enquanto a insulina exógena causa hipoglicemia
Esse padrão é comumente designado como nesidioblastose, embora
com baixos níveis de peptídio C, refletindo a supressão da secreção
nem sempre se verifique a presença de brotamento de células beta
dos ductos. Outros pacientes apresentam um padrão das ilhotas de insulina.
semelhante, porém com hipoglicemia pós-prandial, um distúrbio O erro analítico na determinação das concentrações plasmáticas
denominado hipoglicemia pancreatogênica não insulinoma. A hi- de glicose é raro. Por outro lado, os monitores de glicose empregados
poglicemia pós-prandial pós-derivação gástrica também envolve o para orientar o tratamento do diabetes não são instrumentos quan-
comprometimento difuso das ilhotas e a presença de hiperinsuli- titativos, particularmente na presença de baixos níveis de glicose, e
eles não deveriam ser usados para o diagnóstico definitivo de hipo-
Capítulo 20
nismo endógeno. Com mais frequência, desenvolve-se após bypass
gástrico em Y de Roux. Algumas autoridades sugeriram que as glicemia. Até mesmo com um método quantitativo, as baixas con-
respostas exageradas de GLP-1 a refeições podem causar hiperin- centrações de glicose medidas podem ser artificiais, por exemplo, o
sulinemia e hipoglicemia, porém a patogenia envolvida ainda não resultado do metabolismo contínuo da glicose pelos elementos figu-
foi claramente estabelecida. Se o tratamento farmacológico, como rados do sangue ex vivo, particularmente na presença de leucocitose,
inibidor da -glicosidase ou octreotida, falhar, pode ser necessá- eritrocitose ou trombocitose, ou se houver demora a separar o soro
ria uma pancreatectomia parcial. As hipoglicemias autoimunes dos elementos figurados (pseudo-hipoglicemia).
incluem aquelas causadas por anticorpo anti-insulina, que gradual-
mente se disassocia, levando à hipoglicemia pós-prandial tardia. ABORDAGEM AO
Hipoglicemia
Hipoglicemia
Alternativamente, um anticorpo dirigido contra o receptor de in- PACIENTE
sulina pode atuar como agonista. A presença de um secretagogo da
insulina, como uma sulfonilureia ou glinida, resulta em um padrão Além do reconhecimento e da documentação da hipoglicemia e,
clínico e bioquímico que se assemelha àquele de um insulinoma, com frequência, no tratamento urgente, o diagnóstico do meca-
mas que pode ser diferenciado pela presença de secretagogo circu- nismo hipoglicêmico é fundamental para escolher um tratamento
lante. Por fim, fenômenos muito raros incluem a secreção ectópica capaz de evitar ou, pelo menos, de minimizar a hipoglicemia re-
de insulina, uma mutação do receptor de insulina com ganho de corrente.
função e hiperinsulinemia induzida pelo exercício. RECONHECIMENTO E DOCUMENTAÇÃO Deve se suspeitar de hi-
Os insulinomas são incomuns – a incidência anual é estimada poglicemia em pacientes com sintomas típicos; na presença de
em 1 em 250.000 – entretanto, como mais de 90% são benignos, confusão, de alteração do nível de consciência ou de uma crise
eles constituem uma causa tratável de hipoglicemia potencialmente convulsiva; ou em um contexto clínico no qual se sabe que a hi-
fatal. A idade mediana por ocasião da apresentação é de 50 anos poglicemia ocorre. Sempre que possível, deve-se obter uma amos-
nos casos esporádicos, porém manifesta-se habitualmente na ter- tra de sangue antes da administração de glicose para permitir a
ceira década, quando existe um componente de neoplasia endócri- documentação de uma baixa concentração plasmática de glicose.
na múltipla tipo 1 (Cap. 23). Mais de 99% dos insulinomas estão A documentação convincente da hipoglicemia exige o preenchi-
localizados dentro da substância do pâncreas e são habitualmente mento da tríade de Whipple. Por conseguinte, o momento ideal
pequenos (90% têm < 2,0 cm). Por conseguinte, chama a atenção do para medir o nível plasmático de glicose é durante um episódio
clínico devido à hipoglicemia, mais do que aos efeitos expansivos. sintomático. A obtenção de um nível normal de glicose exclui a
A TC ou a RM detectam aproximadamente 70 a 80% dos insulino- possibilidade de hipoglicemia como causa dos sintomas. Um bai-
mas. Esses métodos identificam metástases em cerca de 10% dos xo nível de glicose confirma que a hipoglicemia constitui a causa
pacientes com insulinoma maligno. A ultrassonografia transabdo- dos sintomas, contanto que estes desapareçam após a elevação do
minal frequentemente identifica os insulinomas, e a ultrassonogra- nível de glicose. Quando a causa do episódio hipoglicêmico é obs-
fia endoscópica tem uma sensibilidade de cerca de 90%. Acredita- cura, as medições adicionais enquanto o nível de glicose está bai-
-se que a cintilografia dos receptores de somatostatina detecta os xo e antes do tratamento devem incluir os níveis plasmáticos de
insulinomas em cerca de 50% dos pacientes. As injeções seletivas insulina, peptídio C, pró-insulina -hidroxibutirato, bem como
de cálcio na artéria pancreática, tendo como ponto terminal um triagem para os agentes hipoglicemiantes orais circulantes, e os
aumento acentuado dos níveis de insulina na veia hepática, regio- sintomas devem ser avaliados durante e após a elevação das con-
nalizam os insulinomas com alta sensibilidade; todavia, esse proce- centrações plasmáticas de glicose.
dimento invasivo raramente é necessário, exceto para confirmar o Quando a história sugere hipoglicemia prévia, e não se iden-
hiperinsulinismo endógeno nos distúrbios difusos das ilhotas. A ul- tifica um possível mecanismo aparente, a estratégia diagnóstica
trassonografia pancreática intraoperatória quase sempre localiza os consiste em medir esses valores e avaliar a tríade de Whipple du-
insulinomas que não são prontamente palpáveis pelo cirurgião. A rante e após um episódio de hipoglicemia. Por outro lado, em-
ressecção cirúrgica de um insulinoma solitário é geralmente cura- bora não possa ser ignorada, uma concentração plasmática de
tiva. O diazóxido, que inibe a secreção de insulina, ou o análogo da
245
glicose nitidamente baixa, medida em um paciente sem sintomas as suas doses reduzidas. A hipoglicemia causada por uma sulfo-
correspondentes, levanta a possibilidade de um artefato (pseudo- nilureia pode persistir por várias horas ou até mesmo dias. Com
-hipoglicemia). frequência, as doenças críticas subjacentes podem ser tratadas.
Pode-se proceder à reposição de cortisol e de hormônio do cresci-
DIAGNÓSTICO DO MECANISMO HIPOGLICÊMICO Em um paciente
mento se estes estiverem deficientes. A redução cirúrgica, radiote-
com hipoglicemia documentada, um mecanismo hipoglicêmico
rapêutica ou quimioterápica de um tumor de células não insulares
plausível frequentemente pode ser deduzido a partir da anam-
pode aliviar a hipoglicemia, mesmo quando o tumor não pode ser
nese, do exame físico e dos dados laboratoriais disponíveis (Qua-
curado; a administração de glicocorticoide ou de hormônio do
dro 20.1). Os fármacos, particularmente aqueles usados para
crescimento também pode reduzir os episódios hipoglicêmicos
tratar o diabetes ou o álcool devem ser os primeiros a serem con-
nesses pacientes. A ressecção cirúrgica de um insulinoma é cura-
siderados, mesmo na ausência de uso conhecido de um fármaco
tiva; a terapia clínica com diazóxido ou octreotide pode ser utili-
relevante, devido à possibilidade de administração subrreptícia,
zada se a ressecção não for possível, bem como em pacientes com
acidental ou mal-intencionada de fármacos. Outras considera-
distúrbio de células beta não tumoral. A pancreatectomia parcial
ções incluem evidências de doença crítica relevante, menos co-
pode ser necessária nesses últimos pacientes. O tratamento da
mumente deficiências hormonais e, raramente, tumor de células
hipoglicemia autoimune (p. ex., com um glicocorticoide ou com
não beta, cujo diagnóstico pode ser pesquisado. Na ausência de
agentes imunossupressores) é problemático, porém os distúrbios
um desses mecanismos, em um indivíduo aparentemente saudá-
são, algumas vezes, autolimitados. Se esses tratamentos falharem,
vel nos demais aspectos, deve-se considerar a possibilidade de hi-
podem ser necessárias refeições frequentes, bem como evitar os
perinsulinismo endógeno e deve-se prosseguir com as medições
períodos de jejum. A administração de amido de milho cru ao
e a avaliação dos sintomas durante a hipoglicemia espontânea ou
deitar ou até mesmo uma infusão intragástrica noturna de glicose
em condições passíveis de induzir hipoglicemia.
podem ser necessárias em alguns pacientes.
TRATAMENTO DE URGÊNCIA O tratamento oral com comprimidos
de glicose ou com líquidos contendo glicose, doce ou alimento é
apropriado se o paciente for capaz e demonstrar vontade de inge-
ri-los. Uma dose inicial razoável é de 20 g de glicose. Se o paciente BIBLIOGRAFIA
for incapaz ou relutar, devido à neuroglicopenia, em ingerir car-
SEÇÃO III
poglicemia induzida por álcool). Ele também estimula a secreção Melmed et al (eds). Philadelphia, Saunders, in press
de insulina e, portanto, é menos útil no DMT2. Esses tratamentos Davis SN: Diabetes: Hypoglycemia—A new approach to an old problem.
elevam as concentrações plasmáticas de glicose apenas de modo Nat Rev Endocrinol 5:243, 2009
transitório, e, portanto, os pacientes devem ser incentivados a co- ——— et al: Effects of intensive therapy and antecedent hypoglycemia on
mer logo que isso for prático para obter a repleção das reservas counterregulatory responses to hypoglycemia in type 2 diabetes. Dia-
de glicogênio. betes 58:701, 2009
PREVENÇÃO DA HIPOGLICEMIA RECORRENTE A prevenção da hi- Murad MH et al: Drug-induced hypoglycemia: A systematic review. J Clin
poglicemia recorrente exige uma compreensão do mecanismo Endocrinol Metab 94:741, 2009
hipoglicêmico. Os fármacos agressores podem ser suspensos, ou The Nice-Sugar Study Investigators: Intensive versus conventional
glucose control in critically ill patients. N Engl J Med 360:1283, 2009
246
CAPÍTULO 21 0,95
VLDL
1,006
Distúrbios do Metabolismo IDL
Densidade, g/mL
Remanescentes
das Lipoproteínas 1,02
LDL
de quilomicrons
Quilomícron
Daniel J. Rader 1,06
Helen H. Hobbs 1,10 HDL
1,20
As lipoproteínas são complexos de lipídios e proteínas e são essen-
ciais ao transporte de colesterol, triglicerídios e vitaminas liposso- 5 10 20 40 60 80 1.000
lúveis. Anteriormente, os distúrbios das lipoproteínas eram da alça- Diâmetro, nm
da de lipidologistas especializados, porém a demonstração de que o Figura 21.1 A distribuição das principais classes de partículas de lipopro-
tratamento hipolipêmico reduz significativamente as complicações teínas de acordo com sua densidade e tamanho. As lipoproteínas são classifica-
clínicas da doença cardiovascular aterosclerótica (DCVAS) trouxe o das de acordo com a sua densidade e tamanho, que são inversamente relacionados.
diagnóstico e o tratamento desses distúrbios para o domínio do in- VLDL, lipoproteína de densidade muito baixa; IDL, lipoproteína de densidade inter-
ternista. O número de indivíduos candidatos ao tratamento hipolipê- mediária; LDL, lipoproteína de baixa densidade; HDL, lipoproteína de alta densidade.
mico continuou aumentando. O desenvolvimento de agentes farma-
cológicos seguros, efetivos e bem tolerados expandiu enormemente ApoB é a principal proteína estrutural dos quilomícrons, das VLDL,
o arsenal terapêutico disponível para o médico no tratamento dos IDL e LDL; em cada partícula de lipoproteína, existe uma molécula
distúrbios do metabolismo dos lipídios. Por conseguinte, o diagnós- de ApoB, na forma de ApoB-48 (quilomícron) ou ApoB-100 (VLDL,
CAPÍTULO 21
tico e o manejo apropriados dos distúrbios dos lipídios são de suma IDL ou LDL). O fígado humano sintetiza a ApoB-100, enquanto o
importância na prática da medicina. Este capítulo revê a fisiologia intestino produz a ApoB-48, que deriva do mesmo gene por edição do
normal das lipoproteínas, a fisiopatologia dos distúrbios primários mRNA. A ApoE é encontrada em múltiplas cópias nos quilomícrons,
(hereditários) do metabolismo das lipoproteínas, as doenças e os fa- nas VLDL e IDL e desempenha um papel fundamental no metabo-
tores ambientais que causam distúrbios secundários desse metabo- lismo e na depuração de partículas ricas em triglicerídios. Três apo-
lismo e as abordagens práticas para o seu diagnóstico e tratamento. lipoproteínas da série C (ApoC-I, ApoC-II e ApoC-III) também par-
ticipam no metabolismo das lipoproteínas ricas em triglicerídios. A
METABOLISMO DAS LIPOPROTEÍNAS ApoB é a única apolipoproteína principal que não é transferida entre
partículas de lipoproteínas. Algumas das apolipoproteínas de menor
circulação pelo fígado por meio de um processo que requer a ApoE múltiplas cópias de ApoE e de apolipoproteínas da série C por meio de
como ligante para receptores no fígado. Em consequência, poucos transferência das HDL. A exemplo dos quilomícrons, os triglicerídios
quilomícrons ou até mesmo nenhum remanescentes de quilomícrons das VLDL são hidrolisados pela LPL, particularmente no músculo, no
estão presentes no sangue depois de um jejum de 12 horas, exceto em coração e no tecido adiposo. Após a sua dissociação da LPL, os rema-
SEÇÃO III
indivíduos com distúrbios do metabolismo dos quilomícrons. nescentes de VLDL são designados como IDL, que contêm quantida-
des aproximadamente semelhantes de colesterol e de triglicerídios. O
■■ TRANSPORTE DOS LIPÍDIOS HEPÁTICOS (VIA ENDÓGENA) fígado remove cerca de 40 a 60% de IDL por endocitose mediada pelo
A via endógena do metabolismo das lipoproteínas refere-se à secreção receptor de LDL através de sua ligação à ApoE. O restante da IDL é
de lipoproteínas contendo apoB pelo fígado e ao metabolismo dessas remodelado pela lipase hepática (HL), formando LDL. Durante esse
partículas ricas em triglicerídios nos tecidos periféricos (Fig. 21.2). processo, a maior parte do triglicerídio na partícula sofre hidrólise, e
As partículas de VLDL assemelham-se aos quilomícrons quanto à sua todas as apolipoproteínas, exceto a ApoB-100, são transferidas para
composição proteica, mas contêm ApoB-100, em lugar de ApoB-48, e outras lipoproteínas. O colesterol nas LDL responde por mais de 50%
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
apresentam uma maior relação entre colesterol e triglicerídios (cerca do colesterol plasmático na maioria dos indivíduos. Cerca de 70% das
de 1 mg de colesterol para cada 5 mg de triglicerídios). Os triglicerí- LDL circulantes são depurados por meio de endocitose mediada pelo
dios das VLDL derivam predominantemente da esterificação de ácidos receptor de LDL no fígado. A lipoproteína(a) [Lp(a)] é uma lipopro-
graxos de cadeia longa no fígado. O acondicionamento dos triglicerí- teína semelhante à LDL na sua composição de lipídios e proteínas,
dios hepáticos com os outros componentes principais da partícula de mas contém uma proteína adicional, denominada apolipoproteína(a)
VLDL nascente (ApoB-100, ésteres de colesteril, fosfolipídios e vitami- [Apo(a)]. A Apo(a) é sintetizada no fígado e fixada à ApoB-100 por
na E) exige a ação da enzima proteína de transferência de triglicerídios uma ligação de dissulfeto. O principal local de depuração da Lp(a) é o
microssômica (MTP). Após a sua secreção no plasma, a VLDL adquire fígado, porém a sua via de captação não é conhecida.
Nota: HDL, lipoproteína de alta densidade; IDL, lipoproteína de densidade intermediária; LCAT, lectina-colesterol-aciltransferase; LDL, lipoproteína de baixa densidade; Lp(a), lipoproteína A; LPL, lipase
lipoproteica; VLDL, lipoproteína de densidade muito baixa.
248
Exógena Endógena
Lipídios da dieta
Ácidos biliares
+
colesterol LDL
LDLR
Intestino Fígado
delgado HL Tecidos
periféricos
Remanescente
Quilomícron VLDL IDL
de quilomícrons
Capilares Capilares
LPL LPL
CAPÍTULO 21
AGL AGL
Distúrbios dos lipídios associados a níveis elevados de LDL‑C e Deve-se obter uma cuidadosa história familiar, e os níveis plasmá-
triglicerídios normais ticos de lipídios devem ser determinados em ambos os pais, bem como
Hipercolesterolemia familiar (HF) A HF é um distúrbio autossômico co- em outros parentes de primeiro grau dos pacientes com HF homozi-
dominante, caracterizado por níveis plasmáticos elevados de LDL-C, gota. A doença tem uma penetrância de mais de 90%, de modo que
com níveis normais de triglicerídios, xantomas tendíneos e ateroscle- os pais de homozigotos com HF geralmente apresentam hipercoles-
rose coronariana prematura. A HF é causada por um grande número terolemia. O diagnóstico da HF homozigota pode ser confirmado por
Nota: HAD, hipercolesterolemia autossômica dominante; Apo, apolipoproteína; HAR, hipercolesterolemia autossômica recessiva; HLCF, hiperlipidemia combinada familiar; SQF, síndrome de quilomi-
cronemia familiar; DFB, defeito familiar da ApoB; DBLF, disbetalipoproteinemia familiar; HF, hipercolesterolemia familiar; HTGF, hipertrigliceridemia familiar; LPL, lipase lipoproteica; LDLRAP, proteína
associada ao receptor de LDL; GPIHBP1, proteína de ligação da lipoproteína de alta densidade ancorada por glicosilfosfatidilinositol 1; N, normal.
250
QUADRO 21.4 Hiperlipoproteinemias primárias causadas por mutações conhecidas de um único gene
Transmissão Incidência
Distúrbio genético Defeito genético Lipoproteínas elevadas Achados clínicos genética estimada
Deficiência de lipase LPL (LPL) Quilomícrons Xantomas eruptivos, AR 1/1.000.000
lipoproteica hepatoesplenomegalia, pancreatite
Deficiência familiar de ApoC‑II (APOC2) Quilomícrons Xantomas eruptivos, AR < 1/1.000.000
apolipoproteína C‑II hepatoesplenomegalia, pancreatite
Deficiência de ApoA‑V ApoA‑V (APOA5) Quilomícrons, VLDL Xantomas eruptivos, AD < 1/1.000.000
hepatoesplenomegalia, pancreatite
Deficiência de GPIHBP1 GPIHBP1 Quilomícrons Xantomas eruptivos, pancreatite AD < 1/1.000.000
Deficiência familiar da lipase Lipase hepática Remanescentes de VLDL Pancreatite, DAC AR < 1/1.000.000
hepática (LIPC)
Disbetalipoproteinemia ApoE (APOE) Remanescentes de Xantomas palmares e AR 1/10.000
familiar quilomícrons e de VLDL tuberoeruptivos, DAC, DVP AD
Hipercolesterolemia familiar Receptor de LDL LDL Xantomas tendíneos, DAC AD 1/500
(LDLR)
Deficiência familiar de ApoB‑100 (APOB) LDL Xantomas tendíneos, DAC AD < 1/1.000
ApoB‑100
Hipercolesterolemia PCSK9 (PCSK9) LDL Xantomas tendíneos, DAC AD < 1/1.000.000
autossômica dominante
Hipercolesterolemia LDLRAP LDL Xantomas tendíneos, DAC AR < 1/1.000.000
autossômica recessiva
CAPÍTULO 21
Sitosterolemia ABCG5 ou ABCG8 LDL Xantomas tendíneos, DAC AR < 1/1.000.000
Nota: AD, autossômica dominante; AR, autossômica recessiva; HAR, hipercolesterolemia autossômica recessiva; DAC, doença arterial coronariana; LDL, lipoproteína de baixa densidade; LPL, lipase
lipoproteica; DVP, doença vascular periférica; VLDL, lipoproteína de densidade muito baixa.
meio da obtenção de biópsia cutânea e determinação da atividade dos volvimento de DCVAS sintomática. Como a doença é de herança
receptores de LDL em cultura de fibroblastos cutâneos, ou por meio codominante, um dos pais e cerca de 50% dos irmãos do paciente
da quantificação do número de receptores de LDL nas superfícies dos habitualmente apresentam também hipercolesterolemia. Com fre-
linfócitos, utilizando a tecnologia de separação celular. Dispõe-se tam- quência, a história familiar é positiva para DCVAS prematura em
receptor, a LDL é internalizada juntamente com o receptor. No pH primeiro grau de pacientes com hipercolesterolemia poligênica têm
baixo do endossomo, a LDL dissocia-se do receptor e este retorna à hipercolesterolemia. O tratamento da hipercolesterolemia poligênica
superfície celular. A LDL é liberada no lisossomo. Quando a PCSK9 é idêntico ao das outras formas de hipercolesterolemia.
liga-se ao receptor, o complexo é internalizado, e o receptor é redire-
cionado para o lisossomo, em lugar de retornar à superfície celular. Níveis plasmáticos elevados de lipoproteína (a)
As mutações de sentido incorreto na PCSK9 que causam hipercoles- Diferentemente das outras classes principais de lipoproteínas, que
terolemia aumentam a atividade da PCSK9. Em consequência, ocorre possuem uma distribuição normal na população, os níveis plasmá-
uma redução do número de receptores hepáticos de LDL. Os pacien- ticos de LP(a) exibem uma distribuição altamente distorcida, com
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
tes com HAD-PCSK9 são clinicamente indistinguíveis daqueles com níveis que variam dentro de uma faixa de 1000 vezes. Os níveis são
HF. É interessante observar que as mutações com perda de função da fortemente influenciados por fatores genéticos, e os indivíduos de
PCSK9 causam baixos níveis de LDL-C (ver adiante). origem africana e do Sul da Ásia apresentam níveis mais elevados
Hipercolesterolemia autossômica recessiva (HAR) A HAR é um distúrbio do que os de origem europeia. Embora já esteja bem documentado
raro (exceto na Sardenha, Itália), devido a mutações em uma proteína que os níveis elevados de LP(a) estão associados a um aumento da
(HAR, também denominada proteína adaptadora LDLR, LDLRAP) en- DCVAS, não foi demonstrado que a redução dos níveis plasmáticos
volvida na endocitose mediada pelos receptores de LDL no fígado. Na de LP(a) diminui o risco cardiovascular.
ausência de LDLRAP, a LDL liga-se ao receptor de LDL, porém o com-
plexo lipoproteína-receptor não é internalizado. A HAR, à semelhança Distúrbios dos lipídios associados a triglicerídios elevados
da HF homozigota, caracteriza-se por hipercolesterolemia, xantomas Síndrome de quilomicronemia familiar (hiperlipoproteinemia tipo I; de-
tendíneos e doença arterial coronária (DAC) prematura. Os níveis plas- ficiência de lipase lipoproteica e de ApoC-II) Conforme assinalado
máticos de LDL-C tendem a ser intermediários entre os níveis observa- anteriormente, a LPL é necessária para a hidrólise dos triglicerídios
dos em homozigotos e em heterozigotos para a HF, e a DAC habitual- nos quilomícrons e nas VLDL, enquanto a ApoC-II é um cofator da
mente não é sintomática até pelo menos a terceira década de vida. A LPL (Fig. 21.2). A deficiência genética ou a inatividade de uma des-
função dos receptores de LDL em cultura de fibroblastos está normal ou sas proteínas resulta em comprometimento da lipólise e em elevações
apenas moderadamente reduzida na HAR, enquanto a função dos re- pronunciadas dos níveis plasmáticos de quilomícrons. Esses pacien-
ceptores de LDL nos linfócitos e no fígado é insignificante. Ao contrário tes também podem apresentar elevações dos níveis plasmáticos de
dos homozigotos para a HF, a hiperlipidemia responde parcialmente ao VLDL, porém a quilomicronemia predomina. O plasma em jejum é
o
tratamento com inibidores da HMG-CoA redutase, porém esses pacien- turvo, e, quando permanece em repouso a 4°C (39,2 F) durante al-
tes habitualmente necessitam de aférese das LDL para reduzir os níveis gumas horas, os quilomícrons flutuam na superfície, formando um
plasmáticos de LDL-C para os valores recomendados. sobrenadante cremoso. Nesses distúrbios, denominados síndromes
de quilomicronemia familiar, os níveis de triglicerídios em jejum es-
Sitosterolemia A sitosterolemia é outra doença autossômica reces- tão quase sempre > 1.000 mg/dL. Os níveis de colesterol em jejum
siva rara, que pode resultar em hipercolesterolemia grave, xantomas também estão elevados, porém em menor grau.
tendíneos e DCVAS prematura. A sitosterolemia é causada por muta- A deficiência de LPL é de herança autossômica recessiva e apre-
ções em um de dois membros da família do transportador de metade senta uma frequência na população de aproximadamente 1 em 1 mi-
do cassete de ligação do ATP (ABC), ABCG5 e ABCG8. Esses genes lhão. A deficiência de ApoC-II também exibe um padrão recessivo
são expressos nos enterócitos e nos hepatócitos. As proteínas sofrem de herança e é ainda menos comum que a deficiência de LPL. Essas
heterodimerização para formar um complexo funcional, que bom- doenças são causadas por múltiplas mutações diferentes nos genes da
beia esterois vegetais, como o sitosterol e o campesterol, bem como LPL e da ApoC-II. Os heterozigotos obrigatórios para LPL apresen-
esterois animais, predominantemente colesterol, na luz intestinal e tam níveis normais ou elevações leves a moderadas dos triglicerídios
na bile. Nos indivíduos normais, menos de 5% dos esterois vegetais plasmáticos, ao passo que os heterozigotos para a mutação da ApoC-
da dieta são absorvidos pela parte proximal do intestino delgado e -II não exibem hipertrigliceridemia.
transportados até o fígado. Os esterois vegetais absorvidos são secre- Em geral, tanto a deficiência de LPL quanto a deficiência de
tados preferencialmente na bile e são mantidos em níveis muito bai- apoC-II manifestam-se na infância com episódios recorrentes de dor
xos. Na sitosterolemia, a absorção intestinal de esterois está aumen- abdominal intensa causada por pancreatite aguda. Na fundoscopia,
252
os vasos sanguíneos da retina apresentam-se opalescentes (lipidemia acúmulo de partículas de lipoproteínas remanescentes. A ApoE, pre-
retiniana ou lipemia retinalis). Os xantomas eruptivos, que consistem sente em múltiplas cópias nos remanescentes de quilomícrons e de
em pequenas pápulas branco-amareladas, aparecem frequentemente VLDL, medeia a sua remoção por meio dos receptores de lipoproteí-
em grupos nas costas, nas nádegas e nas faces extensoras dos braços nas hepáticos (Fig. 21.2). A DBLF é decorrente de variações genéticas
e das pernas. Essas lesões cutâneas indolores podem tornar-se pruri- da ApoE que interferem na sua capacidade de ligação aos receptores
ginosas. A hepatoesplenomegalia resulta na captação de quilomícrons de lipoproteína. O gene APOE apresenta uma sequência polimórfi-
circulantes pelas células reticuloendoteliais do fígado e do baço. Por ca, resultando na expressão de três isoformas comuns: a ApoE3, que
motivos desconhecidos, alguns pacientes com quilomicronemia per- é a mais comum; e a ApoE2 e ApoE4, que diferem da ApoE3 por
sistente e pronunciada nunca apresentam pancreatite, xantomas erup- um único aminoácido. Embora esteja associado a níveis ligeiramente
tivos ou hepatoesplenomegalia. A DAC prematura não é geralmente mais altos de LDL-C e a um risco aumentado de DAC, o alelo ApoE4
uma característica das síndromes de quilomicronemia familiar. não está associado à DBLF. Os pacientes com ApoE4 apresentam
O diagnóstico das deficiências de LPL e de ApoC-II é estabele- incidência aumentada de doença de Alzheimer de início tardio. A
cido enzimaticamente em laboratórios especializados pelo ensaio da ApoE2 possui menor afinidade pelo receptor de LDL; por conseguin-
atividade de lipólise dos triglicerídios no plasma após a administra- te, os remanescentes de quilomícrons e de VLDL que contêm ApoE2
ção de heparina. Obtém-se uma amostra de sangue após a injeção de são removidos mais lentamente do plasma. Os indivíduos homozigo-
heparina IV para liberar a LPL ligada ao endotélio. A atividade da tos para o alelo E2 (genótipo E2/E2) representam o subgrupo mais
LPL está profundamente reduzida em ambas as deficiências de LPL comum de pacientes com DBLF.
e de ApoC-II; em pacientes com deficiência de ApoC-II, a adição de Cerca de 0,5% da população geral consiste em homozigotos
plasma normal (que proporciona uma fonte de ApoC-II) normaliza a ApoE2/E2, porém apenas uma pequena minoria desses indivíduos
atividade da LPL. Pode-se utilizar a determinação da sequência mo- desenvolve DBLF. Na maioria dos casos, o desenvolvimento da hiper-
lecular dos genes para confirmar o diagnóstico. lipoproteinemia é precipitado por um fator adicional identificável. Os
A principal intervenção terapêutica nas síndromes de quilomi- fatores precipitantes mais comuns consistem em dieta rica em gordu-
cronemia familiar consiste em restrição da gordura na dieta (para ra, diabetes melito, obesidade, hipotireoidismo, doença renal, infecção
apenas 15 g/dia), com suplemento de vitaminas lipossolúveis. É es- pelo HIV, deficiência de estrogênio, consumo de álcool ou uso de cer-
sencial ter uma consulta com um nutricionista familiarizado com tos fármacos. A ocorrência de outras mutações na ApoE pode causar
uma forma dominante de DBLF, em que a hiperlipidemia manifesta-se
CAPÍTULO 21
esse distúrbio. A suplementação calórica com triglicerídios de cadeia
média, que sofrem absorção direta na circulação portal pode ser útil, totalmente no estado heterozigoto; todavia, essas mutações são raras.
mas pode estar associada ao desenvolvimento de fibrose hepática se Os pacientes com DBLF manifestam habitualmente a doença na
for utilizada por um longo período de tempo. Se a restrição nutri- idade adulta com hiperlipidemia incidental, xantomas, coronariopatia
cional de lipídios como uma única conduta não tiver sucesso na re- prematura ou doença vascular periférica. A doença raramente acome-
gressão da quilomicronemia, o uso de óleos de peixe tem sido efetivo te mulheres antes da menopausa. São observados dois tipos distintos
em alguns pacientes. Em indivíduos com deficiência de ApoC-II, a de xantomas nos pacientes com DBLF: os xantomas tuberoeruptivos
ApoC-II pode ser fornecida por meio da infusão de plasma fresco e os palmares. Os xantomas tuberoeruptivos surgem como grupos de
congelado para resolução da quilomicronemia na condição aguda. O pequenas pápulas nos cotovelos, nos joelhos ou nas nádegas e podem
crescer até o tamanho de pequenos cachos de uvas. Os xantomas pal-
de vida. Nos pacientes com níveis plasmáticos de triglicerídios > 500 mo que tem sido utilizado para descrever o estado dos níveis plasmá-
mg/dL após uma prova terapêutica de dieta e exercício físico, deve- ticos elevados de ApoB com níveis plasmáticos normais de LDL-C, re-
-se considerar a terapia farmacológica para evitar o desenvolvimen- presenta, provavelmente, uma forma de HLCF. Em geral, os indivíduos
to de quilomicronemia e pancreatite. Os fibratos e os óleos de peixe com HLCF compartilham o mesmo defeito metabólico, que consiste
(ácidos graxos ômega 3) constituem abordagens de primeira linha na produção excessiva de VLDL pelo fígado. A etiologia molecular das
razoáveis para a HTGF, e a niacina também pode ser considerada HLCF ainda está pouco elucidada, e é provável que o fenótipo da HLCF
nesse distúrbio. Na presença de elevações mais moderadas dos níveis possa ser causado por defeitos em vários genes diferentes.
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
Nota: DM, diabetes melito; HDL, lipoproteína de alta densidade; IDL, lipoproteína de densidade intermediária; LDL, lipoproteína de baixa densidade; Lp(a), lipoproteína A; VLDL, lipoproteína de densi-
dade muito baixa.
254
O diagnóstico de HLCF é fortemente sugerido pela presença de cos de colesterol e de triglicerídios estão extremamente baixos nesse
dislipidemia mista (níveis plasmáticos de triglicerídios entre 200 e distúrbio, e os quilomícrons, as VLDL, as LDL e a ApoB são inde-
800 mg/dL e níveis de colesterol total entre 200 e 400 mg/dL, habi- tectáveis no plasma. Os pais de pacientes com abetalipoproteinemia
tualmente com níveis de HDL-C < 40 mg/dL nos homens e < 50 mg/ (heterozigotos obrigatórios) apresentam níveis plasmáticos normais
dL nas mulheres) e por uma história familiar de hiperlipidemia e/ou de lipídios e de ApoB. Em geral, a abetalipoproteinemia manifesta-se
DAC prematura. no início da infância com diarreia e atraso do crescimento, devido
Os indivíduos com HLCF devem ser tratados de modo agressivo, à má absorção de gordura. As manifestações neurológicas iniciais
devido a um risco significativamente aumentado de DAC prematura. A consistem em perda dos reflexos tendíneos profundos, seguida de
redução da ingestão dietética de gordura saturada e carboidratos sim- diminuição da sensação proprioceptiva e vibratória na parte distal
ples, a prática de exercício aeróbio e a perda de peso possuem efeitos dos membros inferiores, dismetria, ataxia e aparecimento de marcha
benéficos sobre o perfil dos lipídios. Os pacientes com diabetes devem espástica, frequentemente na terceira ou na quarta décadas de vida.
ser tratados agressivamente para manter um bom controle da glicose. A Os pacientes com abetalipoproteinemia também desenvolvem uma
maioria dos pacientes com HLCF necessita de tratamento com agentes retinopatia pigmentada progressiva, que se manifesta na forma de re-
hipolipêmicos para reduzir os níveis de lipoproteínas dentro da faixa dução da visão noturna e para cores, seguida de redução da acuidade
recomendada e diminuir o alto risco de DCVAS. As estatinas mostram- visual diurna e, por fim, evolução para quase cegueira. A presença
-se efetivas nessa afecção, porém muitos pacientes irão necessitar de um de degeneração espinocerebelar e de retinopatia pigmentada nessa
segundo fármaco (inibidor da absorção do colesterol, niacina, fibrato doença levou ao diagnóstico incorreto de ataxia de Friedreich em al-
ou óleos de peixe) para o controle ótimo dos níveis de lipoproteínas. guns pacientes com abetalipoproteinemia.
A maioria das manifestações clínicas da abetalipoproteinemia re-
■■ CAUSAS HEREDITÁRIAS DE BAIXOS NÍVEIS DE LIPOPROTEÍNAS sulta de defeitos na absorção e no transporte de vitaminas lipossolú-
CONTENDO APOB veis. A vitamina E e os ésteres de retinil são normalmente transporta-
dos dos enterócitos para o fígado pelos quilomícrons, e a vitamina E
Hipobetalipoproteinemia familiar (HBF)
depende das VLDL para o seu transporte do fígado para a circulação.
A presença de baixos níveis plasmáticos de LDL-C (a Em consequência de sua incapacidade de secretar partículas conten-
“-lipoproteína”) com base genética ou hereditária é designada, do ApoB, os pacientes com abetalipoproteinemia apresentam uma
genericamente, como hipobetalipoproteinemia familiar. Tradicional- acentuada deficiência de vitamina E e também exibem deficiência
CAPÍTULO 21
mente, esse termo tem sido utilizado para referir-se à condição de leve a moderada das vitaminas A e K. Os pacientes com abetalipo-
baixos níveis de colesterol total e de LDL-C, devido a mutações na proteinemia devem ser encaminhados a centros especializados para
apoB, representando a forma hereditária mais comum de hipoco- confirmação do diagnóstico e tratamento apropriado. O tratamento
lesterolemia. A maioria das mutações que causam HBF interfere na consiste em uma dieta pobre em gordura, rica em calorias e enrique-
produção de apoB, resultando em diminuição da secreção e/ou cata- cida com vitaminas, acompanhada de altas doses suplementares de
bolismo acelerado da proteína. Os indivíduos heterozigotos para es- vitamina E. É imperativo que o tratamento seja instituído o mais rá-
sas mutações geralmente apresentam níveis de LDL-C < 80 mg/dL e pido possível para ajudar a evitar o desenvolvimento de sequelas neu-
podem obter uma proteção contra a DCVAS, embora isso não tenha rológicas, que podem progredir mesmo com tratamento apropriado.
sido rigorosamente demonstrado. Alguns heterozigotos apresentam São necessários novos tratamentos para essa doença grave.
que pode atenuar o risco aterosclerótico. Os heterozigotos obrigatórios fora do Japão. A relação entre a deficiência de CETP e a DCVAS ain-
para mutações do ABCA1 exibem uma redução moderada dos níveis da não foi resolvida. Os heterozigotos para a deficiência de CETP
plasmáticos de HDL-C (15 a 30 mg/dL), porém o risco de DAC prema- apresentam elevações apenas modestas dos níveis de HDL-C. Com
tura permanece incerto. As mutações do ABCA1 parecem constituir base no fenótipo de níveis elevados de HDL-C na deficiência de
a causa dos baixos níveis de HDL-C em uma minoria de indivíduos. CETP, a inibição farmacológica da CETP está em fase de desenvolvi-
mento como nova abordagem terapêutica tanto para a elevação dos
Deficiência de LCAT níveis de HDL-C quanto para a redução dos níveis de LDL-C, porém
Esse distúrbio autossômico recessivo muito raro é causado por mu- ainda não foi estabelecido se irá reduzir o risco de DCVAS.
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
CAPÍTULO 21
A lipodistrofia está associada a uma acentuada resistência à constituinte de uma partícula lamelar denominada LP-X. Essas partí-
insulina e a níveis plasmáticos elevados de VLDL e quilomicrons, culas podem depositar-se em pregas cutâneas, produzindo lesões que
cujo controle pode ser particularmente difícil. Os pacientes com se assemelham àquelas observadas em pacientes com DBLF (xanto-
lipodistrofia generalizada congênita caracterizam-se pela ausência mas estriados palmares). Além disso, podem-se observar xantomas
de gordura subcutânea associada a hipertrofia muscular e esteatose planares e eruptivos em pacientes com colestase.
hepática; alguns desses pacientes foram tratados com sucesso com
leptina. A lipodistrofia parcial pode apresentar-se com dislipidemia, Álcool
e deve-se considerar o diagnóstico em pacientes com variações na O consumo regular de álcool possui um efeito variável sobre os ní-
distribuição da gordura corporal, particularmente aumento da gor- veis plasmáticos de lipídios. O efeito mais comum do álcool consiste
CAPÍTULO 21
apresentavam DCVAS estabelecida ou que corriam alto risco de principais. Em cada um desses estudos, o subgrupo com níveis ba-
desenvolvimento de DAC (primariamente diabetes); o único cri- sais elevados de triglicerídios sugeriu algum benefício.
tério de entrada referente aos lipídios foi um nível plasmático de Embora a niacina seja, no momento atual, o fármaco disponí-
colesterol total > 135 mg/dL. O tratamento com sinvastatina por vel mais efetivo para elevação das HDL, ela não foi testada quanto
um período médio de 5 anos resultou em uma redução de 24% à sua capacidade de reduzir o risco cardiovascular em indivíduos
dos eventos coronarianos principais e uma diminuição altamente com baixos níveis plasmáticos de HDL-C. Os estudos clínicos
significativa de 13% na taxa de mortalidade de todas as causas. É AIM-HIGH e HPS2-THRIVE são estudos em andamento sobre
importante assinalar que o benefício relativo do tratamento com o efeito do acréscimo de niacina ao tratamento basal com esta-
estatinas foi semelhante nos tercis dos valores basais de LDL-C, e tinas em pacientes com DAC e baixos níveis de HDL-C. Por fim,
em uma variedade de alimentos, como pastas, molhos para saladas risco de 10 anos quanto do risco vitalício. Embora seja desejável
e refeições leves. Esses esterois e ésteres de esterois vegetais inter- evitar o tratamento farmacológico em pacientes com pouca pro-
ferem na absorção do colesterol e reduzem o nível plasmático de babilidade de desenvolver DAC, uma proporção muito elevada
LDL-C em cerca de 10% quando ingeridos 3 vezes/dia. O acrésci- de pacientes que acabam desenvolvendo DAC apresentam níveis
mo de Psyllium, proteína de soja ou arroz fermentado chinês (que plasmáticos de LDL-C situados dentro dessa faixa. A presença de
contém lovastatina) à dieta pode ter um efeito modesto sobre a outros fatores de risco, como baixos níveis plasmáticos de HDL-C
redução do colesterol. Ainda não foram realizados estudos contro- (< 40 mg/dL), ou o diagnóstico da síndrome metabólica fornecem
lados com uma combinação de várias dessas opções não farmaco- um argumento a favor da terapia farmacológica (Cap. 18). Outros
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
lógicas para estabelecer seus efeitos aditivos ou sinérgicos. exames laboratoriais, como elevação dos níveis plasmáticos de
Perda de peso e atividade física O tratamento da obesidade, apoB, LP(a) ou da proteína C-reativa de alta sensibilidade, podem
quando presente, pode ter impacto favorável sobre os níveis plas- ajudar na identificação de indivíduos de alto risco que devem ser
máticos de lipídios e deve ser ativamente incentivado. Os níveis considerados para tratamento farmacológico quando o nível de
plasmáticos de triglicerídios e de LDL-C tendem a cair, enquanto LDL-C encontra-se em uma “zona neutra”.
os níveis de HDL-C tendem a aumentar nos indivíduos obesos O tratamento farmacológico também está indicado para pa-
após redução do peso. O exercício físico aeróbico regular também cientes com níveis de triglicerídios > 500 mg/dL, que foram sub-
pode ter um efeito positivo sobre os lipídios, devido, em grande metidos a triagem e tratados para causas secundárias de hipertrigli-
parte, à redução associada do peso corporal. O exercício aeróbio ceridemia. A meta é reduzir o nível plasmático de triglicerídios em
possui um efeito muito modesto na elevação dos níveis plasmáti- jejum para menos de 500 mg/dL, a fim de evitar o risco de pancrea-
cos de HDL-C na maioria dos indivíduos, mas também apresenta tite aguda. Quando os níveis de triglicerídios encontram-se na faixa
benefícios cardiovasculares que se estendem além dos efeitos so- de 200 a 500 mg/dL, a decisão quanto ao uso de tratamento farma-
bre os níveis plasmáticos de lipídios. cológico depende do risco do paciente de desenvolver quilomicro-
nemia e da avaliação do risco cardiovascular. A maioria dos estudos
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO A decisão quanto ao uso do trata- clínicos de parâmetros finais com estatinas excluiu os indivíduos
mento farmacológico irá depender do risco cardiovascular. O tra- com níveis de triglicerídios > 350 a 450 mg/dL; por conseguinte,
tamento farmacológico da hipercolesterolemia em pacientes com existem poucos dados relativos à eficiência das estatinas na redução
DAC estabelecida é sustentado pelos dados dos estudos clínicos do risco cardiovascular em indivíduos com hipertrigliceridemia.
conduzidos, conforme descrito anteriormente. Mesmo pacientes São necessários mais dados sobre a eficiência relativa das estatinas,
com DAC ou fatores de risco que apresentam níveis “médios” de dos fibratos, da niacina e dos óleos de peixe na redução do risco
LDL-C beneficiam-se do tratamento. O tratamento farmacológico cardiovascular nesse contexto. Com frequência, a terapia de com-
para reduzir os níveis de LDL-C em pacientes com DAC também binação é necessária para um controle ideal da dislipidemia mista.
apresenta uma relação custo-benefício alta. Os pacientes com dia-
betes melito na ausência de DAC conhecida apresentam um risco Inibidores da HMG-CoA redutase (estatinas) A HMG-CoA redutase
cardiovascular semelhante àqueles que não apresentam diabetes, é uma enzima-chave na biossíntese do colesterol, e a inibição dessa
mas que possuem DAC preexistente. As diretrizes do NCEP AT- enzima diminui a síntese de colesterol. Ao inibir a biossíntese de
PIII recomendaram a estimativa do risco absoluto de determina- colesterol, as estatinas resultam em aumento da atividade do re-
do evento cardiovascular no decorrer de um período de 10 anos, ceptor de LDL hepático como mecanismo contrarregulador e, por
utilizando um sistema de pontuação baseado no banco de dados conseguinte, em depuração acelerada das LDL circulantes, com
do Framingham Heart Study. Os pacientes com risco absoluto de consequente redução dos níveis plasmáticos de LDL-C dependen-
DAC dentro de 10 anos de > 20% são considerados como “equi- te da dose. A magnitude da redução das LDL associada ao trata-
valentes de risco de DAC”, sendo tratados de modo tão agressi- mento com estatinas varia amplamente entre os indivíduos; entre-
vo quanto aqueles com DAC já existentes. As diretrizes atuais do tanto, uma vez iniciada a medicação, a administração do dobro da
NCEP ATP III indicam a necessidade de tratamento farmacoló- dose de estatina produz uma redução adicional de cerca de 6% nos
gico para reduzir os níveis de LDL-C para < 100 mg/dL em pa- níveis plasmáticos de LDL-C. As estatinas atualmente disponíveis
260
QUADRO 21.6 Resumo dos principais fármacos utilizados no tratamento da hiperlipidemia
Fármaco Principais indicações Dose inicial Dose máxima Mecanismo Efeitos colaterais comuns
Inibidores da HMG‑CoA Elevação do LDL‑C ↓ Síntese de colesterol, Mialgias, artralgias,
redutase (estatinas) ↑ Receptores de LDL elevação das transaminases,
Lovastatina 20 mg/dia 80 mg/dia hepáticos ↓ Produção dispepsia
de VLDL
Pravastatina 40 mg à noite 80 mg à noite
Sinvastatina 20 mg à noite 80 mg à noite
Fluvastatina 20 mg à noite 80 mg à noite
Atorvastatina 10 mg à noite 80 mg à noite
Rosuvastatina 10 mg à noite 40 mg à noite
Inibidores da absorção do ↓ Absorção intestinal do Elevação das transaminases
colesterol colesterol
Ezetimiba Elevação do LDL‑C 10 mg/dia 10 mg/dia Receptores de LDL
Agentes sequestradores Elevação do LDL‑C ↑ Excreção de ácidos Distensão, constipação,
de ácidos biliares biliares e ↑ receptores níveis elevados de
Colestiramina 4 g/dia 32 g/dia de LDL triglicerídios
Colestipol 5 g/dia 40 g/dia
Colesevelam 3.750 mg/dia 4.375 mg/dia
Ácido nicotínico Níveis elevados de LDL‑C, ↓ Produção de VLDL Rubor cutâneo, desconforto
baixos níveis de HDL‑C, GI, elevação da glicose, do
níveis elevados de TG ácido úrico e das provas de
CAPÍTULO 21
De liberação imediata 100 mg 3x/dia 1 g 3x/dia função hepática
De liberação 250 mg 2x/dia 1,5 g 2x/dia
prolongada
De liberação extensa 500 mg à noite 2 g à noite
Derivados do ácido fíbrico Níveis elevados de TG e ↑ LPL, ↓ síntese de VLDL Dispepsia, mialgia, cálculos
de remanescentes biliares, elevação das
Genfibrozila 600 mg 2x/dia 600 mg 2x/dia transaminases
Fenofibrato 145 mg/dia 145 mg/dia
Nota: GI, gastrintestinal; HDL-C, HDL-colesterol; LDL, lipoproteína de baixa densidade; LDL-C, LDL-colesterol; LPL, lipase lipoproteica; TG, triglicerídio; VLDL, lipoproteína de densidade muito baixa.
diferem na sua potência de redução do LDL-C (Quadro 21.6). Na A elevação das transaminases hepáticas [alanina (ALT) e as-
atualidade, não há evidências convincentes de que qualquer uma partato (AST)] representa outra consequência do tratamento com
das estatinas diferentes possa conferir uma vantagem indepen- estatinas. As transaminases hepáticas devem ser avaliadas antes
dente de seu efeito sobre o LDL-C. As estatinas também reduzem de iniciar o tratamento, dentro de 2 a 3 meses e, a seguir, anual-
os níveis plasmáticos de triglicerídios de modo independente da mente. É relativamente raro observar uma elevação considerável
dose, que é aproximadamente proporcional a seu efeito de redução (mais de três vezes o limite superior do normal) das transamina-
dos níveis de LDL-C (se os níveis de triglicerídios forem < 400 mg/ ses, e as elevações leves a moderadas (1 a 3 vezes o normal) dessas
dL). As estatinas exercem um efeito moderado sobre a elevação enzimas na ausência de sintomas não indica uma necessidade de
das HDL (5 a 10%), que geralmente não depende da dose. interromper a medicação. A hepatite clínica grave associada às es-
As estatinas são bem toleradas e podem ser tomadas na forma tatinas é extremamente rara, e a tendência é proceder a uma mo-
de comprimidos, 1 vez/dia. Os efeitos colaterais potenciais con- nitoração menos frequente das transaminases nos pacientes tra-
sistem em dispepsia, cefaleia, fadiga e dor muscular ou articular. tados com estatinas. A elevação das enzimas hepáticas associada
Raramente, ocorrem miopatia grave e até mesmo rabdomiólise ao uso de estatinas desaparece após a interrupção da medicação.
em pacientes que recebem tratamento com estatinas. O risco de As estatinas parecem ser notavelmente seguras. Metanálises
miopatia associada às estatinas aumenta com a idade avançada, de estudos clínicos controlados e randomizados de grande porte
a presença de fraqueza, insuficiência renal e coadministração de com estatinas não sugerem um aumento na incidência de qual-
fármacos que interferem no metabolismo das estatinas, como a eri- quer doença não cardíaca importante. As estatinas constituem a
tromicina e antibióticos relacionados, agentes antifúngicos, agentes classe de fármacos de escolha para redução dos níveis de LDL-C e
imunossupressores e derivados do ácido fíbrico (particularmente constituem, sem dúvida alguma, a classe mais amplamente utili-
genfibrozila). Em geral, a miopatia grave pode ser evitada com uma zada de fármacos hipolipêmicos.
seleção cuidadosa dos pacientes, evitando o uso de fármacos que
Inibidores da absorção do colesterol O colesterol que se encontra
interagem e orientando o paciente sobre a necessidade de entrar
no lúmen do intestino delgado deriva da dieta (cerca de 33%) e
imediatamente em contato com o médico caso apareça qualquer
da bile (cerca de 66%) e sofre absorção ativa pelo enterócito, por
dor muscular inexplicada. Na presença de sintomas musculares,
meio de um processo que envolve a proteína NPC1 L1. A ezetimi-
devem-se determinar os níveis plasmáticos de creatinoquinase
ba (Quadro 21.6) é um inibidor da absorção do colesterol, que se
(CK) para documentar a miopatia. Os níveis séricos de CK não
liga diretamente à NCP1 L1, inibindo-a e bloqueando a absorção
precisam ser monitorados em uma base rotineira nos pacientes em
intestinal do colesterol. A ezetimiba (10 mg) inibe a absorção do
uso de estatinas, visto que a elevação da CK na ausência de sinto-
colesterol em quase 60%, resultando em uma redução do aporte
mas não indica a possibilidade de desenvolvimento de miopatia e
de esterois dietéticos no fígado e em aumento da expressão do re-
tampouco sugere a necessidade de suspender o fármaco.
261
ceptor de LDL hepático. A redução média dos níveis plasmáticos elevações discretas das transaminases em até 15% dos pacientes
de LDL-C com a administração de ezetimiba (10 mg) é de 18%, tratados com qualquer forma de niacina, e, em certas ocasiões,
e o efeito é aditivo quando o fármaco é utilizado em combina- essas elevações podem exigir a interrupção do medicamento. A
ção com uma estatina. Os efeitos sobre os níveis de triglicerídios niacina potencializa o efeito da varfarina, de modo que esses dois
e de HDL-C são insignificantes, e não foram relatados dados de fármacos devem ser prescritos juntos com cautela. A acanthosis
desfecho cardiovascular. Quando utilizado em combinação com nigricans, uma lesão cutânea grosseira de coloração escura, e a
uma estatina, recomenda-se a monitoração das transaminases maculopatia constituem efeitos colaterais infrequentes da niacina.
hepáticas. O único papel da ezetimiba na monoterapia consiste A niacina está contraindicada para pacientes com doença ulcero-
em seu uso em pacientes que não toleram as estatinas; o fármaco sa péptica e pode exacerbar os sintomas do refluxo esofágico. A
é frequentemente acrescentado a uma estatina em pacientes que niacina também pode elevar os níveis plasmáticos de ácido úrico
necessitam de redução adicional do LDL-C. e precipitar episódios de gota em pacientes suscetíveis.
A niacina pode elevar os níveis plasmáticos de glicose em
Sequestradores de ácidos biliares (resinas) Os sequestradores ou
jejum. Em um estudo de indivíduos com diabetes tipo 2, foi ob-
quelantes de ácidos biliares ligam-se aos ácidos biliares presentes
servado apenas um aumento discreto da glicose em jejum, e não
no intestino, promovendo a sua excreção, em lugar de sua reab-
houve alteração significativa do nível de HbA1c com o tratamento
sorção no íleo. Para manter o tamanho do reservatório de ácidos
com niacina. A niacina em baixas doses pode ser usada efetiva-
biliares, o fígado desvia o colesterol para a síntese de ácidos bi-
liares. A redução do conteúdo hepático intracelular de colesterol mente para reduzir os níveis plasmáticos de triglicerídios e au-
resulta em suprarregulação dos receptores de LDL e intensifica mentar o HDL-C, sem qualquer impacto adverso sobre o controle
a depuração das LDL do plasma. Os agentes sequestradores de da glicemia. Por conseguinte, a niacina pode ser utilizada em pa-
ácidos biliares, incluindo a colestiramina, o colestipol e o cole- cientes diabéticos, porém todos os esforços devem ser envidados
sevelam (Quadro 21.6), reduzem primariamente os níveis plas- para otimizar o manejo do diabetes antes de iniciar o tratamento
máticos de LDL-C, mas podem causar um aumento nos níveis com niacina. A glicose deve ser cuidadosamente monitorada em
plasmáticos de triglicerídios. Por conseguinte, os pacientes com pacientes não diabéticos com comprometimento da glicose em
hipertrigliceridemia não devem ser tratados com resinas seques- jejum após o início do tratamento com niacina.
tradoras de ácidos biliares. A colestiramina e o colestipol são re- O tratamento bem-sucedido com niacina exige uma orienta-
SEÇÃO III
sinas insolúveis, que precisam ser misturadas com líquidos. O ção cuidadosa e motivação do paciente. Suas vantagens incluem
colesevelam está disponível em comprimidos; todavia, em geral, o seu baixo custo e segurança a longo prazo. Trata-se do fármaco
são necessários até 6 a 7 comprimidos por dia para uma redu- mais efetivo atualmente disponível para elevar os níveis de HDL-
ção efetiva dos níveis de LDL-C. Os efeitos colaterais das resinas -C. Mostra-se particularmente útil em pacientes com hiperlipi-
limitam-se, em sua maior parte, ao trato gastrintestinal e consiste demia combinada e baixos níveis plasmáticos de HDL-C, sendo
em distensão e constipação. Como os agentes sequestradores de efetiva quando utilizada em combinação com estatinas. Os dados
ácidos biliares não sofrem absorção sistêmica, são muito seguros sobre os resultados são um tanto limitados com a niacina; entre-
e constituem o fármaco de escolha para reduzir o colesterol em tanto, dois estudos clínicos estão atualmente em andamento para
avaliar os benefícios do acréscimo da niacina a uma estatina em
Diabetes Melito, Obesidade e Metabolismo das Lipoproteínas
CAPÍTULO 21
culares em pacientes que apresentam DAC, sendo utilizada por dos a perder peso, os indivíduos sedentários devem ser estimula-
alguns médicos para esse propósito. dos a praticar exercício físico, e deve-se obter um controle ótimo
do diabetes. Quando possível, os medicamentos associados a uma
Terapia de combinação A terapia farmacológica de combinação redução dos níveis plasmáticos de HDL-C devem ser interrompi-
é frequentemente utilizada nas seguintes situações: (1) pacientes dos. A presença de um baixo nível plasmático isolado de HDL-C
incapazes de atingir as metas de LDL-C e não HDL-C por meio de em um paciente com nível plasmático limítrofe de LDL-C deve
monoterapia com estatina, (2) pacientes com níveis elevados de indicar a consideração de tratamento com agentes redutores das
LDL-C e anormalidades combinadas do eixo TG-HDL, e (3) pa- LDL em indivíduos de alto risco. As estatinas aumentam apenas
cientes com hipertrigliceridemia grave que não alcançam a meta moderadamente os níveis plasmáticos de HDL-C (cerca de 5 a
264
SEÇÃO IV
Distúrbios que Afetam Múltiplos
Sistemas Endócrinos
CAPÍTULO 22 os carcinoides serão discutidas em conjunto, enquanto as áreas onde
existem diferenças importantes serão consideradas separadamente.
SEÇÃO IV
CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS TUMORES NEUROENDÓCRINOS ção pela prata, e os tumores eram classificados pela demonstração
GASTRINTESTINAIS (GI) de uma reação argentafim quando captavam e reduziam a prata, ou
Os tumores neuroendócrinos gastrintestinais (TNE) são tumores de- pela sua natureza argirofílica, quando não a reduziam. Mais recen-
rivados do sistema neuroendócrino difuso do trato GI; esse sistema temente, utiliza-se a localização imuno-histoquímica das cromogra-
é constituído por células produtoras de aminas e de ácidos com dife- ninas (A, B, C), da enolase específica de neurônio e da sinaptofisina,
rentes perfis hormonais, dependendo do local de origem. Historica- que são todos marcadores de células neuroendócrinas (Quadro 22.1).
mente, os tumores são divididos em tumores carcinoides e tumores Hoje, a cromogranina A é o marcador mais usado.
endócrinos pancreáticos (TEP), embora as classificações patológicas Em nível ultraestrutural, esses tumores possuem grânulos neu-
recentes tenham proposto que todos sejam classificados como TNE rossecretores elétron-densos e, com frequência, contêm vesículas cla-
gastrintestinais. Neste capítulo, o termo tumor carcinoide é mantido ras, que correspondem às vesículas sinápticas dos neurônios. Os TNE
por ser largamente utilizado. Esses tumores eram originalmente clas- sintetizam numerosos peptídios, fatores de crescimento e aminas
sificados como APUDomas (de amine precursor uptake e decarbo- bioativas, que podem ser secretados de modo ectópico, dando ori-
xylation, captação e descarboxilação de precursores amínicos), assim gem a uma síndrome clínica específica (Quadro 22.2). O diagnóstico
como os feocromocitomas, os melanomas e os carcinomas medulares da síndrome específica exige a presença das manifestações clínicas
da tireoide, visto que eles compartilham determinadas características da doença (Quadro 22.2) e não pode ser estabelecido baseando-se
citoquímicas, bem como várias características patológicas, biológi- apenas nos resultados da imuno-histoquímica. A presença ou a au-
cas e moleculares (Quadro 22.1). Foi proposto originalmente que os sência de uma síndrome clínica específica também não podem ser
APUDomas tinham uma origem embrionária semelhante a partir previstas baseando-se exclusivamente na imuno-histoquímica (Qua-
das células da crista neural; todavia, hoje, sabe-se que as células secre- dro 22.1). Além disso, os patologistas não conseguem diferenciar os
toras de peptídios não são de origem neuroectodérmica. Entretanto, TNE benignos dos malignos, a não ser na presença de metástases ou
o conceito de APUDomas é útil, visto que os tumores dessas células de invasão.
possuem importantes semelhanças, assim como algumas diferenças Os tumores carcinoides frequentemente são classificados de
(Quadro 22.1). Nesta seção, as áreas de semelhança entre os TEP e acordo com a sua região anatômica de origem (isto é, intestino ante-
QUADRO 22.1 Características gerais dos tumores neuroendócrinos gastrintestinais (carcinoides, tumores endócrinos
pancreáticos [TEP])
A. Compartilham marcadores de células neuroendócrinas gerais (identificação usada para diagnóstico)
1. As cromograninas (A, B, C) são proteínas solúveis monoméricas ácidas encontradas nos grânulos secretores grandes. A cromogranina A é a mais
utilizada.
2. A enolase neurônio específica (NSE) é o dímero ‑ da enzima enolase e constitui um marcador citosólico da diferenciação neuroendócrina.
3. A sinaptofisina é uma glicoproteína integral de membrana com peso molecular de 38.000, encontrada em pequenas vesículas de neurônios e tumores
neuroendócrinos.
B. Semelhanças patológicas
1. Todos são APUDomas que exibem captação e descarboxilação de precursores amínicos (amine precursor uptake and decarboxylation).
2. Em nível ultraestrutural, possuem grânulos secretores de centro denso (> 80 nm).
3. Histologicamente exibem aspecto geralmente semelhante, com poucas mitoses e núcleos uniformes.
4. Com frequência, sintetizam múltiplos peptídios/aminas, que podem ser detectados por exame imuno-histoquímico, mas que podem não ser secretados.
5. A presença ou ausência de síndrome clínica ou do tipo não podem ser previstas pelos estudos imuno-histoquímico.
6. As classificações histológicas são cada vez mais preditivas do comportamento biológico. Apenas a invasão ou as metástases estabelecem a natureza
maligna.
C. Semelhanças do comportamento biológico
1. Em geral, crescimento lento, porém uma proporção é agressiva.
2. Secretam peptídios/aminas biologicamente ativos, que podem causar sintomas clínicos.
3. Em geral, apresentam altas densidades de receptores de somatostatina, que são usados tanto para localização quanto para tratamento.
D. Semelhanças/diferenças nas anormalidades moleculares
1. Semelhanças
a. Incomuns – alterações nos oncogenes comuns (ras, jun, fos, etc.).
b. Incomuns – alterações nos genes supressores tumorais comuns (p53, retinoblastoma).
c. Ocorrem alterações no locus NEM‑1 (11q13) e p16INK4a (9p21) em uma proporção (10 a 45%).
d. Ocorre metilação de vários genes em 40 a 87% (família do domínio associado a ras I, p14, p16, O6 metil guanosina metiltransferases, receptor do
ácido retinoico).
2. Diferenças
a. TEP – perda de 1p (21%), 3p (8 a 47%), 3q (8 a 41%), 11q (21 a 62%), 6q (18 a 68%). Ganhos em 17q (10 a 55%), 7q (16 a 68%), 4q (33%)
b. Carcinoides – perda de 18q (38 a 67%) > 18 p (33 a 43%) > 9p, 16q21 (21 a 23%). Ganhos em 17q, 19p (57%), 4q (33%), 14q (20%).
266
QUADRO 22.2 Síndrome de tumor neuroendócrino gastrintestinal
Incidência
Capítulo 22
Peptídio(s) (Novos
biologicamente casos/106 da Associado(a) Principais sinais/
Nome ativo(s) secretado(s) população/ano) Localização do tumor Maligno (%) a NEM1 (%) sintomas
I. Síndrome funcional específica estabelecida
A.Tumor carcinoide
Síndrome carcinoide Serotonina, 0,5 a 2 Intestino médio (75 a 87%) 95 a 100 Raramente Diarreia (32 a 84%)
possivelmente Intestino anterior (2 a 33%) Rubor (63 a 75%)
taquicininas, Intestino posterior (1 a 8%) Dor (10 a 34%)
Nota: ACTH, hormônio adrenocorticotrófico; GRFoma, tumor endócrino pancreático secretor de fator de liberação do hormônio do crescimento; IF-II, fator de crescimento semelhante à insulina 2;
NEM, neoplasia endócrina múltipla; TEP, tumor endócrino pancreático; PPoma, tumor secretor de polipeptídio pancreático; PTHrP, peptídio relacionado ao paratormônio; VIPoma, tumor secretor de
peptídio intestinal vasoativo; WDHA, síndrome de diarreia aquosa, hipopotassemia e acloridria.
267
rior, intestino médio, intestino posterior), visto que os tumores com Célula tumoral carcinoide
áreas similares de origem compartilham manifestações funcionais,
Triptofano
histoquímicas e produtos secretórios (Quadro 22.3). Em geral, os
tumores do intestino anterior apresentam baixo conteúdo de seroto- Triptofano hidroxilase
SEÇÃO IV
QUADRO 22.3 Localização dos tumores carcinoides, tilidade e constipação. Cada uma das síndromes funcionais listadas
frequência das metástases e associação à síndrome carcinoide no Quadro 22.2 está associada a sintomas causados pelo hormônio
Incidência específico liberado. Em contrapartida, os TEP não funcionais não li-
Localização Incidência de da síndrome beram produtos responsáveis por uma síndrome clínica específica. O
(% do total) metástases carcinoide termo “não funcional” é incorreto no sentido estrito, visto que esses
tumores com frequência secretam ectopicamente vários peptídios
Intestino anterior
[polipeptídio pancreático (PP), cromogranina A, grelina, neuroten-
Esôfago < 0,1 — — sina, subunidades da gonadotrofina coriônica humana, enolase
Estômago 4,6 10 9,5 neurônio específica]; todavia, não produzem uma síndrome clínica
Duodeno 2,0 — 3,4 específica. Os sintomas causados por TEP não funcionais são total-
Pâncreas 0,7 71,9 20 mente devidos ao próprio tumor.
Vesícula biliar 0,3 17,8 5 Podem ocorrer tumores carcinoides em praticamente qualquer
Brônquio, pulmão, 27,9 5,7 13 tecido GI (Quadro 22.3); todavia, na atualidade, a maioria (70%) tem
traqueia origem em um de três locais: brônquio, jejunoíleo ou colo/reto. No
passado, os tumores carcinoides eram relatados com mais frequên-
Intestino médio cia no apêndice (isto é, 40%); entretanto, o brônquio/pulmão, o reto
Jejuno 1,8 {58,4 9 e o intestino delgado são, agora, os locais mais comuns. De modo
Íleo 14,9 9 global, o trato GI constitui o local mais comum desses tumores, re-
Divertículo de Meckel 0,5 — 13 presentando 64%, enquanto o trato respiratório ocupa um segundo
Apêndice 4,8 38,8 <1 lugar distante com 28%. Tanto a raça quanto o sexo podem afetar
Colo 8,6 51 5 a frequência, bem como a distribuição dos tumores carcinoides. Os
Fígado 0,4 32,2 — afro-americanos exibem uma alta incidência de carcinoides, sendo os
Ovário 1,0 32 50 carcinoides retais os mais comuns. As mulheres têm uma incidência
Testículo < 0,1 — 50 mais baixa de carcinoides do intestino delgado e pancreáticos.
O termo tumor endócrino pancreático, apesar de ser largamente
Intestino posterior
utilizado e, por isso, mantido aqui, também é uma designação in-
Reto 13,6 3,9 — correta no sentido exato da palavra, visto que esses tumores podem
ocorrer quase inteiramente no pâncreas (insulinomas, glucagono-
Fonte: A localização é obtida a partir dos dados de PAN-SEER (1973-1999), e a incidência das
metástases, a partir dos dados de SEER (1992-1999), relatados por IM Modlin et al.: Cancer
mas, TEP não funcionais, TEP que causam hipercalcemia) ou tanto
97:934, 2003. A incidência da síndrome carcinoide é de 4349 casos estudados no período de no pâncreas quanto em locais extrapancreáticos (gastrinomas, VI-
1950-1971, relatados por JD Godwin, Cancer 36:560, 1975. Pomas [peptídio intestinal vasoativo], somatostatinomas, GRFomas
268
[fator de liberação do hormônio do crescimento]). Os TEP também enquanto são relatados carcinoides malignos na necropsia em 21 a
são denominados tumores de células das ilhotas; entretanto, não se 84 casos/milhão da população por ano. Nos Estados Unidos, a inci-
incentiva o uso desse termo, visto que ainda não foi estabelecido se dência de TNE GI é de aproximadamente 25 a 50 casos por milhão,
Capítulo 22
eles se originam a partir das ilhotas, e muitos deles podem ocorrer tornando-os menos comuns do que os adenocarcinomas do trato
em locais extrapancreáticos. GI. Entretanto, a sua incidência aumentou seis vezes nos últimos 30
Vários sistemas novos de classificação foram propostos para os anos. Os TEP clinicamente significativos têm uma prevalência de 10
carcinoides e os TEP. Na classificação da Organização Mundial da casos/milhão da população, enquanto os insulinomas, os gastrino-
Saúde (OMS), foi proposto que todos esses tumores sejam classi- mas e os TEP não funcionais apresentam uma incidência de 0,5 a 2
ficados como tumores neuroendócrinos GI (incluindo carcinoides casos/milhão da população por ano (Quadro 22.2). Os VIPomas são
e TEP), o que os divide em três categorias gerais: (1a) TNE bem duas a oito vezes menos comuns, os glucagonomas são 17 a 30 vezes
diferenciados, (1b) carcinomas neuroendócrinos bem diferencia- menos comuns, e os somatostatinomas são os menos comuns. Em es-
dos que apresentam baixo grau de malignidade, e (2) carcinomas tudos de necropsia, 0,5 a 1,5% de todos os casos apresentam um TEP;
Nota: 5-HIAA, ácido 5-hidroxiindolacético; chr, cromossomo; EGF, fator de crescimento epidérmico; Ki-67, antígeno nuclear associado à proliferação reconhecido pelo anticorpo monoclonal Ki-67;
PDH, perda da heterozigose; NEM, neoplasia endócrina múltipla; TNE, tumores neuroendócrinos; PCNA, antígeno nuclear de células em proliferação; TEP, tumor endócrino pancreático; TGF-, fator
transformador do crescimento ; TNM, tumor, linfonodo, metástase; VEGF, fator de crescimento endotelial vascular; OMS, Organização Mundial da Saúde.
269
QUADRO 22.5 Síndromes genéticas associadas a uma incidência aumentada de tumores neuroendócrinos (TNE) (carcinoides ou
tumores endócrinos pancreáticos [TEP])
80 a 100% desenvolvem TEP (microscópicos), 20 a 80%
SEÇÃO IV
Síndrome Localização da mutação gênica e do produto gênico (clínicos): (não funcional > gastrinoma > insulinoma)
Neoplasia endócrina múltipla tipo 11q13 (codifica uma proteína de 610 aminoácidos, Carcinoides: gástricos (13 a 30%), brônquicos/tímicos (8%)
1 (NEM 1) menin)
Doença de von Hippel‑Lindau 3q25 (codifica uma proteína de 230 aminoácidos) 12 a 17% desenvolvem TEP (quase sempre não funcionais)
Doença de von Recklinghausen 17q11.2 (codifica uma proteína de 2.485 aminoácidos, 0 a 10% desenvolvem TEP, principalmente somatostatinomas
[neurofibromatose 1 (NF‑1)] a neurofibromina) duodenais (habitualmente não funcionais)
Raramente, insulinoma, gastrinoma
Distúrbios que Afetam Múltiplos Sistemas Endócrinos
Esclerose tuberosa 9q34 (TSCI) (codifica uma proteína de 1.164 Raramente há desenvolvimento de TEP [não funcionais e
aminoácidos, a hamartina) funcionais (insulinoma, gastrinoma)]
16p13 (TSC2) (codifica uma proteína de 1.807
aminoácidos, a tuberina)
noides quanto para os TEP. No desenvolvimento de metástases hepá- 18%, insulinomas, 3%, glucagonomas, 3%, VIPomas e < 1%, GRFo-
ticas, o tamanho do tumor primário é particularmente importante. mas ou somatostatinomas. A NEM 1 está presente em 20 a 25% de
Por exemplo, com os carcinoides do intestino delgado, que consti- todos os pacientes com síndrome de Zollinger-Ellison, em 4% dos
tuem a causa mais comum da síndrome carcinoide devido à doença pacientes com insulinomas e em uma baixa porcentagem (< 5%) dos
metastática no fígado (Quadro 22.2), ocorrem metástases em 15 a pacientes com outros TEP.
25% se o diâmetro do tumor for < 1 cm, em 58 a 80% se o diâmetro Três facomatoses estão associadas aos tumores neuroendócri-
for de 1 a 2 cm, e em > 75%, se o diâmetro for > 2 cm. Existem dados nos: a doença de von Hippel-Lindau (VHL), a doença de von Re-
semelhantes para os gastrinomas e outros TEP, nos quais o tamanho cklinghausen (neurofibromatose tipo 1 [NF-1]), e esclerose tubero-
do tumor primário constitui um preditor independente do desen- sa (doença de Bourneville) (Quadro 22.5). A doença de VHL é um
volvimento de metástases hepáticas. A presença de metástases para distúrbio autossômico dominante, devido a defeitos no cromossomo
os linfonodos, a profundidade da invasão, a velocidade rápida de 3p25, que codifica uma proteína de 213 aminoácidos que interage
crescimento, várias características histológicas (diferenciação, taxas com a família elongina de proteínas como regulador da transcrição
mitóticas, índices de crescimento, densidade vascular, fator de cres- (Caps. 6, 23). Além dos hemangioblastomas cerebelares, do câncer
cimento do endotélio vascular [VEGF] e expressão da metaloprotei- renal e dos feocromocitomas, 10 a 17% desenvolvem TEP. A maior
nase CD10), a ocorrência de necrose, a presença de citoqueratina, os parte consiste em tumores não funcionais, embora se tenha relata-
níveis séricos elevados de fosfatase alcalina, a idade mais avançada, do a ocorrência de insulinomas e VIPomas. Os pacientes com NF-1
os estágios avançados nos sistemas de classificação da OMS, TNM (doença de von Recklinghausen) apresentam defeitos em um gene
ou graduação e os resultados da citometria de fluxo, como a pre- no cromossomo 17q11.2, que codifica uma proteína de 2.845 ami-
sença de aneuploidia, constituem, todos eles, fatores prognósticos noácidos, a neurofibromina, que atua nas células normais como
importantes para o desenvolvimento de doença metastática (Quadro supressor da cascata de sinalização ras. Até 10% desses pacientes
22.4). Para os pacientes com tumores carcinoides, outras associações desenvolvem um tumor carcinoide do trato GI superior, na região
a um prognóstico mais sombrio incluem o desenvolvimento da sín- periampular (54%). Muitos são classificados como somatostatino-
drome carcinoide (particularmente o desenvolvimento de cardiopa- mas, visto que contêm somatostatina ao exame imuno-histoquími-
tia carcinoide), o sexo masculino, a presença de tumor sintomático co; entretanto, eles raramente secretam somatostatina e produzem
ou aumentos mais acentuados de vários marcadores tumorais [ácido uma síndrome clínica de somatostatinoma. A NF-1 raramente tem
5-hidroxiindolacético (5-HIAA), neuropeptídio K, cromogranina sido associada a insulinomas e à síndrome de Zollinger-Ellison. A
A] e presença de várias características moleculares. Com os TEP ou NF-1 responde por 48% de todos os somatostatinomas duodenais e
os gastrinomas, que têm sido o TEP mais bem estudado a longo pra- por 23% de todos os tumores carcinoides ampulares. A esclerose tu-
zo, um prognóstico mais sombrio está associado ao sexo feminino, berosa é causada por mutações que alteram a proteína de 1164 ami-
hiperexpressão do oncogene Ha-ras ou p53, ausência de neoplasia noácidos, a hamartina (TSC1), ou a proteína de 1807 aminoácidos,
endócrina múltipla tipo 1 (NEM-1), níveis mais elevados de vários a tuberina (TSC2). Tanto a hamartina quanto a tuberina interagem
marcadores tumorais (isto é, cromogranina A, gastrina) e várias ca- em uma via relacionada à fosfatidil inositol 3-quinases e a cascatas
racterísticas moleculares (Quadro 22.4). de sinalização mTor. Alguns casos, incluindo TEP não funcionais e
Diversas doenças devido a vários distúrbios genéticos estão as- funcionais (insulinomas e gastrinomas) foram relatados nesses pa-
sociadas a uma incidência aumentada de tumores neuroendócrinos cientes (Quadro 22.5).
(Quadro 22.5). Cada uma delas é causada pela perda de um possível Ao contrário dos tumores não endócrinos mais comuns, como o
gene supressor tumoral. A mais importante é a NEM 1, que é um dis- carcinoma de mama, colo, pulmão ou estômago, nem os TEP nem os
túrbio autossômico recessivo, devido a um defeito em um gene de 10 tumores carcinoides apresentam alterações nos oncogenes comuns
exons no 11q13, que codifica uma proteína nuclear de 610 aminoá- (ras, myc, fos, src, jun) ou nos genes supressores tumorais comuns
cidos, menin (Cap. 23). Os pacientes portadores de NEM 1 desen- (p53, gene de suscetibilidade ao retinoblastoma) que tenham sido
volvem hiperparatireoidismo, devido à hiperplasia das paratireoides consideradas geralmente importantes em sua patogênese mole-
em 95 a 100% dos casos, TEP em 80 a 100%, adenomas hipofisários cular (Quadro 22.1). As alterações que podem ser importantes em
em 54 a 80%, adenomas suprarrenais em 27 a 36%, carcinoides brôn- sua patogênese incluem alterações no gene NEM 1, no gene supres-
quicos em 8%, carcinoides tímicos em 8%, carcinoides gástricos em sor tumoral p16/MTS1 e no gene DPC 4/Smad 4; amplificação do
13 a 30% dos pacientes com síndrome de Zollinger-Ellison, tumores proto-oncogene HER-2/neu, alterações dos fatores de transcrição
cutâneos (angiofibromas [88%], colagenomas [72%]), tumores do [Hoxc6 (carcinoides GI)], dos fatores de crescimento e expressão
sistema nervoso central (SNC) (meningiomas [< 8%]) e tumores do de seus receptores; metilação de diversos genes que provavelmente
músculo liso (leiomiomas, leiomiossarcomas [1 a 7%]). Entre os pa- resulta em sua inativação; e deleções de genes supressores tumorais
cientes portadores de NEM 1, 80 a 100% desenvolvem TEP não fun- desconhecidos, bem como ganhos em outros genes desconhecidos
cionais (cuja maioria é microscópica, enquanto 0 a 13% são grandes/ (Quadro 22.1). A hibridização genômica comparativa, os estudos de
sintomáticos), ocorrem TEP funcionais em 20 a 80% em diferentes alelo tipagem genômica global e as análises de polimorfismos de um
séries, e 54%, em média, desenvolvem síndrome de Zollinger-Ellison, nucleotídio do genoma mostraram que as perdas e os ganhos cro-
270
mossômicos são comuns nos TEP e nos carcinoides, porém diferem
entre esses dois TNE e alguns apresentam significado prognóstico QUADRO 22.6 Características clínicas em pacientes com
(Quadro 22.4). As mutações no gene NEM 1 são, provavelmente, de síndrome carcinoide
Capítulo 22
importância particular. Ocorre perda da heterozigose no locus NEM Durante a
1 no cromossomo 11q13 em 93% dos casos de TEP esporádicos (isto evolução da
é, em pacientes sem NEM 1) e em 26 a 75% dos tumores carcinoides Na apresentação doença
esporádicos. São relatadas mutações no gene NEM 1 em 31 a 34%
Sinais/sintomas
dos gastrinomas esporádicos. A presença de várias dessas alterações
Diarreia 32 a 73% 68 a 84%
moleculares (TEP ou carcinoide) correlaciona-se com o crescimento
Rubor 23 a 65% 63 a 74%
e o tamanho do tumor e a extensão ou natureza invasiva da lesão,
Dor 10% 34%
podendo ter significado prognóstico.
Asma/sibilos 4 a 8% 3 a 18%
Pelagra 2% 5%
Carcinoides do intestino delgado pequenas células (KC-III). Outra classificação proposta inclui três
Os carcinoides do intestino delgado são responsáveis por aproxima- categorias de TNE pulmonares: benigno ou maligno de baixo grau
damente 33% de todos os tumores do intestino delgado em várias (carcinoide típico), maligno de baixo grau (carcinoide atípico) e
séries cirúrgicas. Com frequência, são múltiplos; 70 a 80% ocorrem maligno de alto grau (carcinoma pouco diferenciado do tipo com
no íleo, e 70% a uma distância de 6 cm da valva ileocecal. Quarenta grandes células ou pequenas células). A classificação da OMS inclui
por cento apresentam < 1 cm de diâmetro, 32% têm 1 a 2 cm, e 29%, quatro categorias gerais: carcinoide típico, carcinoide atípico, carci-
> 2 cm. Entre 35 e 70% estão associados a metástases (Quadro 22.3). noma neuroendócrino de grandes células e carcinomas de pequenas
Causam uma acentuada reação fibrótica, que pode levar à obstrução células. Essas diferentes categorias de TNE pulmonares apresentam
intestinal. Ocorrem metástases distantes para o fígado em 36 a 60%, prognósticos diferentes, variando de excelente para o carcinoide tí-
para o osso em 3% e para o pulmão em 4%. Conforme discutido an- pico a sombrio para os carcinomas neuroendócrinos de pequenas
teriormente, o tamanho do tumor representa uma importante variá- células. A ocorrência de carcinoides pulmonares de grandes células
vel na frequência das metástases. Entretanto, até mesmo uma propor- e de pequenas células, mas não carcinoides pulmonares típicos ou
ção de pequenos tumores carcinoides pequenos do intestino delgado atípicos, está relacionada ao tabagismo.
(< 1 cm) apresentam metástases em 15 a 25% dos casos, enquanto
essa proporção aumentada para 58 a 100% nos tumores com 1 a 2 cm Carcinoides gástricos
de diâmetro. Os carcinoides também ocorrem no duodeno, e 31% Os carcinoides gástricos respondem por 3 em cada 1.000 neoplasias
sofrem metástases. Em duas séries, nenhum tumor duodenal com < gástricas. Foi proposta a ocorrência de três subtipos diferentes de
1 cm metastatizou, enquanto 33% daqueles com > 2 cm tiveram me- carcinoides gástricos. Cada um deles origina-se a partir de células
tástases. Os carcinoides do intestino delgado constituem a causa mais gástricas de tipo enterocromafim (células ECL), um dos seis tipos
comum (60 a 87%) da síndrome carcinoide e são discutidos em uma de células neuroendócrinas gástricas, na mucosa gástrica. Dois sub-
seção posterior (Quadro 22.6). tipos estão associados a estados de hipergastrinemia, seja a gastrite
atrófica crônica (tipo I) (80% de todos os carcinoides gástricos) ou
Carcinoides retais a síndrome de Zollinger-Ellison, que quase sempre constitui parte
Os carcinoides retais representam 1 a 2% de todos os tumores retais. da síndrome de NEM 1 (tipo II) (6% de todos os casos). Em geral,
São encontrados em aproximadamente 1 em cada 2.500 proctosco- esses tumores seguem uma evolução benigna, e o tipo I raramente
pias. Quase todos ocorrem entre 4 e 13 cm acima da linha denteada. (< 10%) está associado a metástases, enquanto os tumores tipo II são
Os carcinoides retais são, em sua maioria, pequenos, com < 1 cm de um pouco mais agressivos, com 10 a 30% associados a metástases.
diâmetro em 66 a 80% dos casos, e raramente metastatizam (5%). Os Em geral, são múltiplos e pequenos e infiltram-se apenas até a sub-
tumores entre 1 e 2 cm podem metastatizar em 5 a 30%, e aqueles mucosa. O terceiro subtipo de carcinoide gástrico (tipo III) (esporá-
com > 2 cm, que são incomuns, em mais de 70%. dico) ocorre sem hipergastrinemia (14 a 25% de todos os carcinoides
gástricos) e segue uma evolução agressiva, com desenvolvimento de
Carcinoides brônquicos metástases em 54 a 66% dos casos. Os carcinoides esporádicos são
Os carcinoides brônquicos respondem por 1 a 2% dos tumores habitualmente tumores isolados e volumosos; 50% exibem histologia
pulmonares primários. A frequência dos carcinoides brônquicos atípica, e eles podem constituir uma causa da síndrome carcinoide.
aumentou mais de cinco vezes nesses últimos 30 anos. Foram pro- Os carcinoides gástricos, como percentual de todos os carcinoides,
postas diversas classificações diferentes dos tumores carcinoides estão aumentando de frequência (1,96% [1969 a 1971], 3,6% [1973 a
brônquicos. Em alguns estudos, os TNE pulmonares são classifica- 1991], 5,8% [1991 a 1999]).
dos em quatro categorias: carcinoide típico (também denominado
tumor carcinoide brônquico, carcinoma de células de Kulchitsky I ■■ TUMORES CARCINOIDES SEM SÍNDROME CARCINOIDE
[KCC]), carcinoide atípico (também denominado carcinoma neu- A idade dos pacientes por ocasião do diagnóstico varia de 10 a 93
roendócrino bem diferenciado [KC-II]), carcinoma neuroendócri- anos, com média de 63 anos para o intestino delgado e 66 anos para
no de pequenas células intermediário, e neuroendocarcinoma de o reto. A apresentação é variável e está relacionada ao local de ori-
271
gem e à extensão da disseminação maligna. No apêndice, os tumo- carcinoides brônquicos, o rubor frequentemente é prolongado, com
res carcinoides são habitualmente encontrados de modo incidental várias horas a dias de duração, de coloração avermelhada e associado
durante uma cirurgia para suspeita de apendicite. Os carcinoides do à salivação, lacrimejamento, diaforese, diarreia e hipotensão. O rubor
intestino delgado no jejunoíleo manifestam-se com dor abdominal associado aos carcinoides gástricos também pode ser de coloração
SEÇÃO IV
periódica (51%), obstrução intestinal com íleo/invaginação (31%), avermelhada, porém com distribuição salpicada na face e no pescoço,
tumor abdominal (17%) ou sangramento GI (11%). Devido à nature- embora o rubor clássico observado nos carcinoides do intestino mé-
za imprecisa dos sintomas, o diagnóstico é habitualmente retardado dio também possa ocorrer nos carcinoides gástricos. Pode ser provo-
em cerca de 2 anos a partir do início dos sintomas, com uma faixa de cado por alimentos e ser acompanhado de prurido.
até 20 anos. Os carcinoides duodenais, gástricos e retais são detec- Ocorre diarreia em 32 a 73% dos casos no início e em 68 a 84%
tados mais frequentemente por acaso durante uma endoscopia. Os em algum momento durante a evolução da doença. A diarreia ocor-
sintomas mais comuns dos carcinoides retais consistem em melena/ re habitualmente com rubor (85% dos casos). A diarreia é habitual-
sangramento (39%), constipação (17%) e diarreia (12%). Com fre- mente descrita como aquosa, e 60% dos pacientes apresentam menos
Distúrbios que Afetam Múltiplos Sistemas Endócrinos
quência, os carcinoides brônquicos são descobertos como uma lesão de 1 L/dia de diarreia. Ocorre esteatorreia em 67%, e, em 46% dos
em uma radiografia de tórax, e 31% dos pacientes são assintomáticos. casos, contém mais de 15 g/dia (normal < 7 g). Pode haver dor abdo-
Os carcinoides tímicos manifestam-se como massas no mediastino minal com a diarreia ou independentemente em 10 a 34% dos casos.
anterior, habitualmente em uma radiografia ou TC de tórax. Os car- As manifestações cardíacas são observadas inicialmente em 11 a
cinoides ovarianos e testiculares manifestam-se habitualmente como 20% dos pacientes com síndrome carcinoide e em 17 a 56% (média:
massas, que são descobertas ao exame físico ou em uma ultrassono- 40%) em algum momento durante a evolução da doença. A doença
grafia. O tumor carcinoide metastático no fígado manifesta-se fre- cardíaca é devida à formação de placas fibróticas (compostas de célu-
quentemente na forma de hepatomegalia em um paciente que pode las musculares lisas, miofibroblastos e tecido elástico) envolvendo o
apresentar sintomas mínimos ou resultados pouco alterados das pro- endocárdio, principalmente no lado direito, embora também possam
vas de função hepática. ocorrer lesões no lado esquerdo em certas ocasiões, particularmen-
te na presença de forame oval patente. Os depósitos fibrosos densos
■■ TUMORES CARCINOIDES COM SINTOMAS SISTÊMICOS DEVIDO A localizam-se mais comumente na superfície ventricular da valva tri-
PRODUTOS SECRETADOS cúspide e, com menos frequência, nas cúspides da valva pulmonar.
No exame imuno-histoquímico, os tumores carcinoides podem con- Podem resultar em constrição das valvas, e a estenose pulmonar é
ter numerosos peptídios GI: gastrina, insulina, somatostatina, mo- habitualmente predominante, enquanto a valva tricúspide frequen-
tilina, neurotensina, taquicininas (substância K, substância P, neu- temente exibe abertura fixa, resultando em predomínio da regurgita-
ropeptídio K), glucagon, peptídio de liberação da gastrina, peptídio ção. De modo global, nos pacientes com cardiopatia carcinoide, 97%
intestinal vasoativo (VIP), polipeptídio pancreático (PP), grelina, apresentam insuficiência tricúspide, 59% estenose tricúspide, 50%
outros peptídios biologicamente ativos (ACTH, calcitonina, hormô- insuficiência pulmonar, 25% estenose pulmonar e 11% (0 a 25%)
nio do crescimento), prostaglandinas e aminas bioativas (serotoni- lesões do lado esquerdo. Até 80% dos pacientes com lesões cardía-
na). Essas substâncias podem ou não ser liberadas em quantidades cas desenvolvem insuficiência cardíaca. As lesões situadas no lado
suficientes para causar sintomas. Em vários estudos de pacientes com esquerdo são muito menos extensas, são observadas em 30% das ne-
tumores carcinoides, foram encontrados níveis séricos elevados de cropsias e, com mais frequência, afetam a valva mitral.
PP em 43%, de motilina em 14%, de gastrina em 15% e de VIP em Outras manifestações clínicas incluem sibilos ou sintomas seme-
6%. Os carcinoides do intestino anterior tem mais tendência a pro- lhantes à asma (8 a 18%) e lesões cutâneas semelhantes à pelagra (2
duzir vários peptídios GI do que os carcinoides do intestino médio. A a 25%). Foram relatados diversos problemas não cardíacos, devido
produção ectópica de ACTH que provoca síndrome de Cushing está ao aumento do tecido fibroso, incluindo fibrose retroperitoneal cau-
sendo cada vez mais observada nos carcinoides do intestino anterior sando obstrução uretral, doença de Peyronie do pênis, fibrose intra-
(principalmente do trato respiratório) e, em algumas séries, tem sido -abdominal e oclusão das artérias ou veias mesentéricas.
a causa mais comum da síndrome de ACTH ectópico, sendo respon-
sável por 64% de todos os casos. A acromegalia em consequência da Biopatologia
liberação do fator de liberação do hormônio do crescimento ocor- Em diferentes estudos, a síndrome carcinoide ocorreu em 8% de
re nos carcinoides do intestino anterior, assim como a síndrome do 8876 pacientes com tumores carcinoides, com uma taxa de 1,4 a
somatostatinoma, porém é raramente observada com os carcinoides 18,4%. Ocorre apenas quando concentrações suficientes dos pro-
duodenais. A síndrome sistêmica mais comum com os tumores car- dutos secretados pelo tumor alcançam a circulação sistêmica. Em
cinoides é a síndrome carcinoide, que é discutida detalhadamente na 91% dos casos, isso ocorre após o aparecimento de metástases para
seção seguinte. o fígado. Raramente, os carcinoides primários do intestino com me-
tástases nodais e invasão retroperitoneal extensa, os carcinoides pan-
■■ SÍNDROME CARCINOIDE
creáticos com linfonodos retroperitoneais ou os carcinoides do pul-
Características clínicas mão ou do ovário com acesso direto à circulação sistêmica podem
As principais características observadas em diversas séries por oca- causar a síndrome carcinoide sem metástases hepáticas. Nem todos
sião da apresentação, bem como durante a evolução da doença, são os tumores carcinoides exibem a mesma propensão a metastatizar e
apresentadas no Quadro 22.6. O rubor e a diarreia constituem os dois a causar a síndrome carcinoide (Quadro 22.3). Os carcinoides do in-
sintomas mais comuns, que ocorrem em até 73% inicialmente e em testino médio são responsáveis por 60 a 67% dos casos de síndrome
até 89% durante a evolução da doença. O rubor característico é de carcinoide, os tumores do intestino anterior, por 2 a 33%, os do intes-
início súbito; trata-se de um eritema vermelho intenso ou violáceo tino posterior, por 1 a 8%, e os de localização primária desconhecida,
da parte superior do corpo, particularmente do pescoço e da face, por 2 a 15%.
frequentemente associado a uma sensação de calor e, em certas oca- Um dos principais produtos secretórios dos tumores carcinoides
siões, associado a prurido, lacrimejamento, diarreia ou edema facial. envolvidos na síndrome carcinoide é a serotonina (5-hidroxitriptami-
O rubor pode ser precipitado por estresse, álcool, exercício, certos na [5-HT]) (Fig. 22.1), que é sintetizada a partir do triptofano. Até
alimentos como queijo ou determinados agentes, como catecolami- 50% do triptofano dietético podem ser utilizados nessa via de síntese
nas, pentagastrina e inibidores da recaptação de serotonina. Os epi- pelas células tumorais, e isso pode resultar em suprimentos inade-
sódios de rubor podem ser breves, de 2 a 5 minutos de duração, par- quados para conversão em niacina; por conseguinte, alguns pacientes
ticularmente no início, ou podem durar várias horas, especialmente (2,5%) desenvolvem lesões semelhantes à pelagra. A serotonina exer-
numa fase mais tardia da evolução da doença. O rubor está habi- ce numerosos efeitos biológicos, que incluem a estimulação da secre-
tualmente associado a carcinoides metastáticos do intestino médio, ção intestinal com inibição da absorção, a estimulação de aumentos
mas também pode ocorrer nos carcinoides do intestino anterior. Nos na motilidade intestinal e a estimulação da fibrogênese. Em vários
272
estudos, 56 a 88% de todos os tumores carcinoides foram associados à produzida caracteristicamente por um tumor carcinoide do intestino
produção excessiva de serotonina; entretanto, 12 a 26% dos pacientes médio, a conversão do triptofano em 5-HTP constitui a etapa limi-
não apresentaram síndrome carcinoide. Em um estudo, a serotonina tadora de velocidade (Fig. 22.1). Uma vez formada a 5-HTP, ela é
Capítulo 22
plaquetária exibiu uma elevação em 96% dos pacientes com carcinoi- rapidamente convertida em 5-HT e armazenada em grânulos secre-
des do intestino médio, em 43% daqueles com tumores do intestino tórios do tumor ou nas plaquetas. Uma pequena quantidade perma-
anterior e em 0% dos pacientes com tumores do intestino posterior. nece no plasma e é convertida em 5-HIAA, que aparece na urina em
Em 90 a 100% dos pacientes com a síndrome carcinoide, há evidências grandes quantidades. Esses pacientes apresentam um reservatório
de superprodução de serotonina. Acredita-se que a serotonina seja de serotonina aumentado, níveis elevados de serotonina no sangue
predominantemente responsável pela diarreia, devido a seus efeitos e nas plaquetas e aumento do ácido 5-hidroxiindolacético (5-HIAA)
sobre a motilidade e a secreção intestinais, principalmente por meio urinário. Alguns tumores carcinoides provocam uma síndrome car-
dos receptores 5-HT3 e, em menor grau, 5-HT4. Os antagonistas dos cinoide atípica, que se acredita seja causada por uma deficiência da
receptores da serotonina (particularmente os antagonistas 5-HT3) ali- enzima dopa descarboxilase; por conseguinte, a 5-HTP não pode ser
LYS
elevados em pacientes com TEP e outros tumores neuroendócrinos.
Os níveis plasmáticos de enolase neurônio específica também são CYS SER THR PHE THR
usados como marcador de tumores carcinoides; todavia, são menos
sensíveis do que a cromogranina A e estão aumentados em apenas 17 D-
βNAL CYS TYR
a 47% dos pacientes. D-
S TRP
Lanreotide
S LYS
Síndrome carcinoide e tumores THR CYS VAL
TRATAMENTO
Distúrbios que Afetam Múltiplos Sistemas Endócrinos
274
Foi relatado ser o interferon efetivo no controle dos sinto- A ressecção de metástases hepáticas isoladas ou limitadas
mas da síndrome carcinoide, isoladamente ou em combinação pode ser benéfica e será discutida em uma seção posterior sobre o
com embolização da artéria hepática. Com interferon- isolada- tratamento da doença avançada.
Capítulo 22
mente, a taxa de resposta é de 42%, ao passo que, com o uso de
interferon- e embolização da artéria hepática, a diarreia foi con-
trolada por 1 ano em 43%, e o rubor, em 86% dos casos. TUMORES ENDÓCRINOS PANCREÁTICOS
A embolização da artéria hepática, isoladamente ou com
quimioterapia (quimioembolização) tem sido usada para con- Em geral, os TEP funcionais manifestam-se, clinicamente, com sin-
trolar os sintomas da síndrome carcinoide. Foi relatado que a tomas causados por um estado de excesso hormonal. Somente numa
embolização apenas controla os sintomas em até 76% dos pa- fase tardia da evolução da doença é que o próprio tumor provoca
cientes, e a quimioembolização (5-fluoruracil, doxorrubicina, sintomas proeminentes, como dor abdominal. Em contrapartida, to-
cisplatina, mitomicina), em 60 a 75% dos pacientes. A emboliza- dos os sintomas decorrentes de TEP não funcionais são devidos ao
metástases hepáticas.
B12; por esse motivo, os níveis dessa vitamina devem ser avaliados
Diagnóstico durante o acompanhamento.
Com a maior capacidade de controlar a hipersecreção ácida,
O diagnóstico de SZE requer a demonstração de hipergastrinemia em
mais de 50% dos pacientes que não são curados (> 60% dos pa-
jejum inapropriada, habitualmente pela demonstração de hipergas-
cientes) morrem de causas relacionadas ao tumor. Por ocasião da
trinemia que ocorre com aumento do débito de ácido gástrico basal
apresentação, a realização cuidadosa de exames de imagem é es-
(DAB) (hipercloridria). Mais de 98% dos pacientes com gastrinomas
sencial para localizar a extensão do tumor. Cerca de 33% dos pa-
apresentam hipergastrinemia de jejum, embora, em 40 a 60%, o nível
cientes apresentam metástases hepáticas, e, em < 15% dos pacien-
possa estar elevado menos de 10 vezes. Por conseguinte, quando há
tes, a doença é limitada, de modo que a ressecção cirúrgica pode
suspeita do diagnóstico, deve-se determinar em primeiro lugar o nível
ser possível. A cura cirúrgica a curto prazo é possível em 60% de
de gastrina em jejum. É importante lembrar que os potentes fármacos
todos os pacientes sem NEM 1 ou metástases hepáticas (40% de
supressores de ácido gástrico, como os inibidores da bomba de pró-
todos os pacientes) e em 30% dos pacientes a longo prazo. Naque-
tons (omeprazol, esomeprazol, pantoprazol, lansoprazol, rabeprazol)
les que apresentam NEM 1, a cura cirúrgica de longo prazo é rara,
podem suprimir a secreção ácida o suficiente para causar hipergas-
visto que os tumores são múltiplos, frequentemente com metás-
trinemia. Devido à sua duração de ação prolongada, esses fármacos
tases para os linfonodos. Por conseguinte, todos os pacientes com
devem ser interrompidos por uma semana antes da determinação da
gastrinomas sem NEM 1 ou alguma condição clínica capaz de li-
gastrina. A retirada dos inibidores da bomba de prótons (IBP) deve
mitar a expectativa de vida devem ser submetidos à cirurgia por
ser efetuada com cuidado e, de preferência, com apoio de serviço de
um cirurgião experiente para o tratamento desses distúrbios.
gastroenterologia com experiência nessa área. O uso disseminado dos
IBP pode dificultar o diagnóstico de SZE, sugerindo um diagnóstico
falso-positivo, uma vez que esses fármacos causam hipergastrinemia
em pacientes tratados com doença péptica idiopática (sem SZE). Le- ■■ INSULINOMAS
vam a um diagnóstico falso-negativo, visto que, nas doses habituais O insulinoma é um tumor endócrino do pâncreas, que se acredita
empregadas para o tratamento de pacientes com doença péptica idio- seja derivado das células beta que secretam ectopicamente insulina,
pática, os IBP controlam os sintomas da maioria dos pacientes por- resultando em hipoglicemia. A idade média de ocorrência é de 40 a
tadores de SZE e, dessa maneira, ocultam o diagnóstico. Se houver 50 anos. Os sintomas clínicos mais comuns são devidos ao efeito da
suspeita de SZE, e o nível de gastrina estiver elevado, é importante hipoglicemia sobre o SNC (sintomas neuroglicêmicos) e consistem
mostrar que ele está aumentando quando o pH é ≤ 2,0, visto que a em confusão, cefaleia, desorientação, dificuldades visuais, compor-
hipergastrinemia fisiológica secundária à acloridria (gastrite atrófica, tamento irracional e até mesmo coma. Além disso, a maioria dos
anemia perniciosa) constitui uma das causas mais comuns de hiper- pacientes apresenta sintomas devido à liberação excessiva de cateco-
gastrinemia. Quase todos os pacientes com gastrinoma apresentam laminas secundária à hipoglicemia, incluindo sudorese, tremores e
um pH em jejum ≤ 2 quando não estão recebendo agentes antisse- palpitações. Esses ataques estão associados ao jejum.
cretórios. Se a gastrina em jejum for > 1.000 pg/mL (aumento de 10 Em geral, os insulinomas são pequenos (> 90% têm < 2 cm) e
vezes), e o pH for ≤ 2,0, o que ocorre em 40 a 60% dos pacientes com habitualmente não são múltiplos (90%); apenas 5 a 15% são malignos
gastrinoma, o diagnóstico de SZE é estabelecido após excluir a possi- e quase invariavelmente só ocorrem no pâncreas, com distribuição
bilidade de síndrome do antro retido pela anamnese. Nos pacientes igual pela cabeça, corpo e cauda do pâncreas. Deve-se suspeitar da
que apresentam hipergastrinemia com gastrina em jejum < 1.000 pg/ presença de insulinoma em todos os pacientes com hipoglicemia,
mL e pH gástrico ≤ 2,0, outras condições, como infecções por H. pylo- particularmente quando existe uma história sugerindo ataques pro-
ri, hiperplasia/hiperfunção das células G do antro, obstrução da saída vocados pelo jejum, ou quando se obtém uma história familiar de
gástrica e, raramente, insuficiência renal, podem simular uma SZE. NEM 1. A insulina é sintetizada na forma de pró-insulina, que con-
Para estabelecer o diagnóstico nesse grupo, devem-se efetuar uma siste em uma cadeia de 21 aminoácidos e uma cadeia de 30 ami-
determinação do DAB e um teste provocativo com secretina. Nos noácidos conectados por um peptídio de conexão de 33 aminoácidos
pacientes com SZE sem cirurgia redutora prévia de ácido gástrico, o (peptídio C). Nos insulinomas, além dos níveis plasmáticos elevados
DAB está habitualmente (> 90%) elevado (isto é, > 15 mEq/h). O teste de insulina, são encontrados níveis plasmáticos elevados de pró-in-
provocativo com secretina é habitualmente positivo, sendo as maiores sulina, e os níveis de peptídio C podem estar aumentados.
sensibilidade (94%) e especificidade (100%) alcançadas com o critério
de um aumento de > 120 pg/mL acima do nível basal. Diagnóstico
O diagnóstico de insulinoma requer a demonstração de um nível plas-
mático elevado de insulina por ocasião da hipoglicemia. Várias outras
TRATAMENTO Gastrinomas condições podem causar hipoglicemia de jejum, como o uso inadver-
tido ou subrreptício de insulina ou de agentes hipoglicemiantes orais,
A hipersecreção de ácido gástrico em pacientes com gastrinomas doença hepática grave, alcoolismo, nutrição precária e outros tumores
pode ser controlada, em quase todos os casos, por medicamentos extrapancreáticos. Além disso, a hipoglicemia pós-prandial pode ser
antissecretórios gástricos orais. Em virtude de sua longa duração causada por diversas condições que confundem o diagnóstico de in-
de ação e potência, o que possibilita a administração de uma dose, sulinoma. Neste contexto, é particularmente importante a ocorrência
1 ou 2 vezes ao dia, os IBP (inibidores da H+,K+-ATPase) consti- aumentada de hipoglicemia após cirurgia de derivação gástrica para
tuem os fármacos de escolha. Os antagonistas do receptor H2 de obesidade, que é, hoje, amplamente realizada. O exame mais confiável
para estabelecer o diagnóstico de insulinoma consiste em um jejum
276
de até 72 horas com determinação dos níveis séricos de glicose, pep- ■■ GLUCAGONOMAS
tídio C, pró-insulina e insulina a cada 4 a 8 horas. Se em qualquer
O glucagonoma é um tumor endócrino do pâncreas que secreta
momento o paciente se tornar sintomático, ou se os níveis de glicose
quantidades excessivas de glucagon, causando uma síndrome dis-
Capítulo 22
estiverem persistentemente abaixo de 2,2 mmol/L (40 mg/dL), o teste
deve ser encerrado, e devem ser obtidas amostras para repetição dos tinta caracterizada por dermatite, intolerância à glicose ou diabetes
exames já mencionados antes da administração de glicose. Cerca de e perda de peso. Os glucagonomas ocorrem principalmente entre
70 a 80% dos pacientes irão desenvolver hipoglicemia durante as pri- 45 e 70 anos de idade. O tumor é clinicamente anunciado por uma
meiras 24 horas, e 98%, dentro de 48 horas. Nos indivíduos normais dermatite característica (eritema necrolítico migratório) (67 a 90%),
não obesos, os níveis séricos de insulina devem diminuir < 43 pmol/L acompanhada de intolerância à glicose (40 a 90%), perda de peso (66
(< 6 U/mL) quando o nível de glicemia cai para < 2,2 mmol/L (< 40 a 96%) anemia (33 a 85%), diarreia (15 a 29%) e tromboembolia (11 a
mg/dL), e a razão entre insulina e glicose é < 0,3 (em mg/dL). Além de 24%). O exantema característico começa habitualmente na forma de
ter um nível de insulina > 6 U/mL quando a glicemia é < 40 mg/dL, eritema anular nas áreas intertriginosas e ao redor dos orifícios, par-
alguns pesquisadores também exigem níveis séricos elevados de pep- ticularmente na virilha ou nas nádegas. Subsequentemente, torna-se
nos somatostatinomas pancreáticos do que nos intestinais: diabetes ações conhecidas consistem em estimulação da secreção de cloreto
melito (95 vs. 21%), doença da vesícula biliar (94 vs. 43%), diarreia pelo intestino delgado, bem como efeitos sobre a contratilidade do
(92 vs. 38%), esteatorreia (83 vs. 12%), hipocloridria (86% vs. 12%) e músculo liso, inibição da secreção ácida e efeitos vasodilatadores, que
perda de peso (90 vs. 69%). A síndrome do somatostatinoma ocorre explicam a maioria das características da síndrome clínica.
em 30 a 90% dos somatostatinomas pancreáticos e em 0 a 5% dos Nos adultos, 80 a 90% dos VIPomas são de localização pancreá-
somatostatinomas do intestino delgado. Em várias séries, 43% de tica, enquanto o restante é devido a feocromocitomas secretores de
todos os TNE duodenais contêm somatostatina; todavia, verifica- VIP, carcinoides intestinais e, raramente, ganglioneuromas. Em geral,
-se raramente a presença (< 2%) da síndrome. Os somatostatinomas esses tumores são solitários, 50 a 75% estão localizados na cauda do
Distúrbios que Afetam Múltiplos Sistemas Endócrinos
ocorrem no pâncreas em 56 a 74% dos casos, sendo a cabeça do pân- pâncreas e 37 a 68% apresentam metástases hepáticas por ocasião do
creas a localização primária. Os tumores são habitualmente solitários diagnóstico. Em crianças com < 10 anos de idade, a síndrome é ha-
(90%) e volumosos (tamanho médio de 4,5 cm). As metástases hepá- bitualmente causada por ganglioneuromas ou ganglioblastomas e é
ticas são comuns, sendo observadas em 69 a 84% dos pacientes. Os menos frequentemente maligna (10%).
somatostatinomas são raros em pacientes com NEM 1 e ocorrem em
apenas 0,65% dos casos. Diagnóstico
A somatostatina é um tetradecapeptídio de amplamente distri- O diagnóstico exige a demonstração de um nível plasmático elevado
buído no SNC e no trato GI, onde atua como neurotransmissor ou de VIP e a presença de diarreia de grande volume. Foi sugerido um vo-
exerce ações parácrinas e autócrinas. Trata-se de um poderoso ini- lume de fezes de < 700 mL/dia para excluir o diagnóstico de VIPoma.
bidor de muitos processos, incluindo a liberação de quase todos os Quando o paciente faz jejum, é possível excluir diversas doenças que
hormônios, secreção ácida, secreções intestinal e pancreática e ab- podem causar diarreia acentuada. Outras doenças que podem produ-
sorção intestinal. As manifestações clínicas estão, em sua maioria, zir diarreia secretória de grande volume incluem gastrinomas, abuso
diretamente relacionadas a essas ações inibitórias. crônico de laxativos, síndrome carcinoide, mastocitose sistêmica, ra-
ramente câncer medular da tireoide, diarreia diabética, espru e Aids.
Diagnóstico Entre essas condições, apenas os VIPomas causam um acentuado au-
Na maioria dos casos, os somatostatinomas foram encontrados aci- mento dos níveis plasmáticos de VIP. Pode ser particularmente difícil
dentalmente, por ocasião de uma colecistectomia ou durante uma detectar clinicamente o uso subrreptício crônico de laxativos/diuréti-
endoscopia. A presença de corpúsculos de psamoma em um tumor cos. Por conseguinte, em um paciente com diarreia crônica inexplica-
duodenal deve, em particular, levantar suspeita. Os tumores duo- da, deve-se efetuar uma triagem para laxativos, que irá detectar mui-
denais que contêm somatostatina estão cada vez mais associados à tos, mas nem todos, os indivíduos que fazem abuso de laxativos.
doença de von Recklinghausen. A maioria desses tumores (> 98%)
não provoca a síndrome do somatostatinoma. O diagnóstico da sín-
drome do somatostatinoma exige a demonstração de níveis plasmáti- TRATAMENTO Peptidomas intestinais vasoativos
cos elevados de somatostatina.
O tratamento inicial mais importante nesses pacientes consiste
em corrigir a desidratação, a hipopotassemia e as perdas eletrolí-
TRATAMENTO Somatostatinomas ticas com reposição hidreletrolítica. Esses pacientes podem neces-
sitar de 5 L/dia de líquidos e > 350 mEq/dia de potássio. Tendo em
Os tumores pancreáticos são frequentemente metastáticos (70 a vista que 37 a 68% dos adultos com VIPomas apresentam doença
92%) por ocasião de sua apresentação, enquanto 30 a 69% dos metastática no fígado por ocasião da apresentação, não é possível
somatostatinomas do intestino delgado possuem metástases. A curar cirurgicamente um número significativo de pacientes. Nes-
cirurgia constitui o tratamento de escolha para aqueles que não ses pacientes, os análogos da somatostatina de ação longa, como
apresentam metástases hepáticas disseminadas. Os sintomas em o octreotide e o lanreotide, constituem os fármacos de escolha.
pacientes com a síndrome do somatostatinoma também são me- O octreotide e o lanreotide controlam a diarreia em curto e
lhorados pelo tratamento com octreotide. longo prazo em 75 a 100% dos pacientes. Naqueles que não res-
pondem, a combinação de glicocorticoides e octreotide/lanreo-
tide demonstrou ser útil em um pequeno número de pacientes.
■■ VIPomas Outros fármacos cuja utilidade foi relatada em pequeno número
de pacientes incluem a prednisona (60 a 100 mg/dia),a clonidina,
Os VIPomas são tumores endócrinos que secretam quantidades ex-
indometacina, fenotiazinas, loperamida, lidamidina, lítio, propra-
cessivas do peptídio intestinal vasoativo, provocando uma síndrome
nolol e metoclopramida. O tratamento da doença avançada com
distinta caracterizada por diarreia de grande volume, hipopotasse-
embolização, quimioembolização, quimioterapia, radioterapia,
mia e desidratação. Essa síndrome é também denominada síndro-
ablação com radiofrequência e radioterapia com receptor peptí-
me de Verner-Morrison, cólera pancreática e síndrome WDHA para
dico pode ser útil (ver adiante).
diarreia aquosa (watery diarrhea), hipopotassemia e acloridria, que
alguns pacientes desenvolvem. A idade média dos indivíduos com
essa síndrome é de 49 anos; entretanto, pode ocorrer em crianças,
e, neste caso, é habitualmente causada por um ganglioneuroma ou
ganglioneuroblastoma. ■■ TUMORES ENDÓCRINOS PANCREÁTICOS NÃO FUNCIONAIS
Os principais sintomas consistem em diarreia de grande volume (TEP‑NF)
(100%), grave o suficiente para causar hipopotassemia (80 a 100%), Os TEP-NF são tumores endócrinos que se originam no pâncreas
desidratação (83%), hipocloridria (54 a 76%) e rubor (20%). A diar- e que secretam ou não produtos não causam uma síndrome clínica
reia é de natureza secretória, persiste durante o jejum e é quase sem- específica. Os sintomas são produzidos inteiramente pelo próprio
pre > 1 L/dia e, em 70% dos casos, >3 L/dia. Em vários estudos, a tumor. Os TEP-NF secretam cromogranina A (90 a 100%), cromo-
diarreia foi inicialmente intermitente em até 50% dos pacientes. granina B (90 a 100%), PP (58%), -HCG (gonadotrofina coriônica
A maioria dos pacientes não apresenta esteatorreia concomitante humana) (40%) e -HCG (20%). Como os sintomas são devidos à
(16%), e o volume aumentado de fezes é devido à excreção aumen- massa tumoral, os pacientes com TEP-NF habitualmente procuram
tada de sódio e de potássio que, juntamente com os ânions, é res- assistência médica tardiamente durante a evolução da doença com
278
tumores invasivos e metástases hepáticas (64 a 92%), e os tumores mor abdominal, paciente com NEM 1 apresentando acromegalia ou
são habitualmente volumosos (72% com > 5 cm). Em geral, os TEP- paciente sem adenoma hipofisário com acromegalia ou associado a
-NF são solitários, exceto em pacientes com NEM 1, quando são hiperprolactinemia, que ocorre em 70% dos GRFomas. Os GRFomas
Capítulo 22
múltiplos. Ocorrem principalmente na cabeça do pâncreas. Embo- constituem uma causa incomum de acromegalia. Ocorrem GRFomas
ra esses tumores não produzam uma síndrome funcional, os estu- em < 1% dos pacientes com NEM 1. O diagnóstico é estabelecido
dos imuno-histoquímicos mostram que eles sintetizam numerosos por ensaios plasmáticos para o GRF e o hormônio do crescimento.
peptídios e não podem ser diferenciados dos tumores funcionais por A maioria dos GRFomas apresenta níveis plasmáticos de GRF > 300
imuno-histoquímica. Na NEM 1, 80 a 100% dos pacientes apresen- pg/mL (normal < 5 pg/mL para os homens, < 10 pg/mL para as mu-
tam TEP-NF microscópicos, que se tornam volumosos ou sintomáti- lheres). Os pacientes com GRFomas também apresentam níveis plas-
cos em apenas uma minoria dos casos (0 a 13%). Na doença de VHL, máticos elevados do fator de crescimento semelhante à insulina tipo
12 a 17% dos pacientes desenvolvem TEP-NF, e, em 4%, os tumores I (IGF-I) semelhantes àqueles observados na acromegalia clássica. A
têm ≥3 cm de diâmetro. cirurgia constitui o tratamento de escolha se não houver metástases
tros quatro subtipos de sst. A interação com esses receptores pode ser rurgia foi adiada. A USE com avaliação citológica também é utilizada
usada para localizar os TNE, utilizando o [In111-DTPAd-Phe1] octre- com frequência para diferenciar um TEP-NF de um adenocarcinoma
otide e cintilografia com radionuclídeo (SRS), bem como para o tra- pancreático ou outro tumor pancreático não endócrino.
tamento do estado de excesso hormonal com octreotide e lanreotide, Os insulinomas hiperexpressam receptores para GLP-1; um
conforme discutido anteriormente. Em virtude de sua sensibilidade análogo de GLP-1 radiomarcado pode detectar insulinomas ocul-
e capacidade de localizar o tumor em todo o corpo, a SRS constitui a tos que não são localizados por outras modalidades de imagem. Na
modalidade de imagem inicial de escolha para a localização dos TNE atualidade, a localização funcional pela determinação dos gradien-
tanto primários quanto metastáticos. A SRS localiza o tumor em 73 tes hormonais é raramente usada para os gastrinomas (após injeções
Distúrbios que Afetam Múltiplos Sistemas Endócrinos
a 89% dos pacientes com carcinoides e em 56 a 100% daqueles com intra-arteriais de secretina), porém continua sendo utilizada com
TEP, exceto os insulinomas. Em geral, os insulinomas são pequenos frequência em pacientes com insulinoma, nos quais outros exames
e apresentam uma baixa densidade de receptores sst, de modo que de imagem são negativos (avaliação das concentrações de insulina
a SRS é positiva em apenas 12 a 50% dos pacientes com insulino- na veia hepática após injeções intra-arteriais de cálcio). O teste do
mas. A Figura 22.3 mostra um exemplo da sensibilidade aumentada cálcio intra-arterial também pode permitir diferenciar a causa da hi-
da SRS em um paciente com tumor carcinoide. A TC mostrou uma poglicemia e indicar se é devida a um insulinoma ou a uma nesidio-
única metástase hepática, enquanto a SRS demonstrou três metásta- blastose. Esta última entidade está se tornando cada vez mais impor-
ses no fígado em múltiplas localizações. Podem ser obtidas respos- tante, devido à frequência crescente de hipoglicemia após cirurgia
tas falso-positivas ocasionais com a SRS (12% em um estudo), visto de derivação gástrica para a obesidade, e é principalmente devida à
que numerosos outros tecidos normais, bem como doenças, podem nesidioblastose, embora possa ser causada, em certas ocasiões, por
apresentar altas densidades dos receptores sst, incluindo granulomas um insulinoma.
(sarcoide, tuberculose, etc.), doenças da tireoide (bócio, tireoidite) Se as metástases hepáticas forem identificadas por SRS, para pla-
e linfócitos ativados (linfomas, infecções de feridas). Para os TEP nejar o tratamento apropriado, recomenda-se uma TC ou uma RM
no pâncreas, a USE mostra-se altamente sensível, localizando 77 a para estabelecer o tamanho e a localização exata das metástases, visto
100% dos insulinomas, que ocorrem quase exclusivamente dentro que a SRS não fornece informações acerca do tamanho do tumor. A
do pâncreas. A ultrassonografia endoscópica é menos sensível para localização funcional por meio da medição dos gradientes hormo-
os tumores extrapancreáticos. Está sendo cada vez mais usada em nais após injeções intra-arteriais de cálcio nos insulinomas (insulina)
ou dos gradientes de gastrina após injeções de secretina no gastrino-
ma constitui um método sensível, que é positivo em 80 a 100% dos
pacientes. Entretanto, esse método fornece apenas a localização re-
TC
gional e, por isso, é reservado para casos em que outras modalidades
de imagem são negativas.
D E
Duas modalidades mais recentes de imagem (tomografia por
emissão de pósitrons e uso de scanners híbridos, como TC e SRS)
podem ter sensibilidade aumentada. A tomografia por emissão de
pósitrons com F18-fluoro-DOPA em pacientes portadores de carci-
noides ou com C11-5-HTP ou análogos da somatostatina marcados
com gálio58 em pacientes portadores de TEP ou carcinoides possui
maior sensibilidade do que os exames de imagem convencionais ou a
SRS e, provavelmente, será utilizada com frequência cada vez maior
no futuro. A tomografia por emissão de pósitrons para TNE GI não
está atualmente aprovada nos Estados Unidos.
280
100 Sem metástases hepáticas (n = 158) dade à TMZ (taxa de resposta de 34%), e TMZ mais capecitabina
90 (taxa de resposta de 59 a 71%, estudos retrospectivos).
Os análogos da somatostatina de ação prolongada, como o
Capítulo 22
80
p < 0,028 octreotide, o lanreotide e o interferon-, raramente reduzem o ta-
70 manho do tumor (isto é, 0 a 17%); todavia, esses fármacos exer-
60 cem efeitos tumoristáticos, interrompendo qualquer crescimento
Metástases em um
50 único lobo hepático adicional em 26 a 95% dos pacientes com TNE. Um estudo clínico
(n = 14) duplo-cego randomizado em pacientes com carcinoides do intes-
40 tino médio metastáticos demonstrou um acentuado aumento do
p = 0,0004
30 tempo de progressão (14,3 versus 6 meses, p = 0,000072) com o uso
de octreotide-LAR. Essa melhora foi observada em pacientes com
Probabilidade de sobrevida, %
20
Metástases hepáticas difusas comprometimento hepático limitado. Ainda não foi provado se
281
Metz DC et al: Gastrointestinal neuroendocrine tumors: Pancreatic endo-
BIBLIOGRAFIA
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and management of neuroendocrine tumors: Welldifferentiated neuro- of gastroenteropancreatic neuroendocrine (carcinoid) tumours. Ali-
endocrine tumors of the jejunum, ileum, appendix, and cecum. Pancre-
SEÇÃO IV
282
CAPÍTULO 23 nitor afetado tem uma probabilidade de 50% de herdar esse gene. A
penetrância variável dos vários componentes neoplásicos pode fazer
Capítulo 23
tanto o diagnóstico diferencial quanto o tratamento sejam extrema-
mente desafiadores.
Distúrbios que Afetam Múltiplos
Manifestações clínicas
Sistemas Endócrinos O hiperparatireoidismo primário é a manifestação mais comum de
NEM 1, com uma penetrância estimada de 95 a 100%. A hiper-
Camilo Jimenez Vasquez calcemia pode instalar-se durante a adolescência e a maioria dos
Robert F. Gagel indivíduos terá sido afetada por volta dos 40 anos (Fig. 23.1). O
QUADRO 23.1 Associações de doenças nas síndromes de neoplasia endócrina múltipla (NEM)
NEM 1 NEM 2 Síndromes mistas
Hiperplasia ou adenoma das paratireoides NEM 2A Síndrome de von Hippel‑Lindau
Hiperplasia de células das ilhotas, adenoma ou CMT Feocromocitoma
carcinoma Feocromocitoma Tumor de células das ilhotas
Hiperplasia ou adenoma da hipófise Hiperplasia ou adenoma das paratireoides Carcinoma de células renais
Outras manifestações menos comuns: carcinoide NEM 2A com amiloidose liquenoide cutânea Hemangioblastoma do sistema nervoso central
do intestino anterior, feocromocitoma, lipomas
subcutâneos ou viscerais NEM 2A com doença de Hirschsprung Angiomas retinianos
CMT familiar Neurofibromatose com características de NEM
NEM 2B 1 ou 2
CMT Complexo de Carney
Feocromocitoma Mixomas do coração, da pele e da mama
Neuromas mucosos e gastrintestinais Pigmentação cutânea salpicada
Características marfanoides Tumores testiculares, suprarrenais e hipofisários
produtores de GH
Schwanomas dos nervos periféricos
Tumores hipofisários familiares produtores de
hormônio do crescimento ou prolactina
283
Os tumores enteropancreáticos constituem a segunda manifesta- NEM 1. A hipoglicemia causada pelos insulinomas é observada em
ção mais comum de NEM 1, com uma penetrância estimada de 50%. cerca de 33% dos pacientes com NEM 1 com tumores de células das
Estes tendem a ocorrer em paralelo com o hiperparatireoidismo (Fig. ilhotas pancreáticas (Fig. 23.1). Os tumores podem ser benignos ou
23.1); 30% são malignos. A maioria desses tumores secreta hormô- malignos (25%). O diagnóstico pode ser sugerido ao documentar a
SEÇÃO IV
nios peptídicos que causam síndromes clínicas específicas. No entan- hipoglicemia durante um jejum de curta duração, com elevação ina-
to, essas síndromes podem ter um início insidioso e uma progressão propriada simultânea dos níveis séricos de insulina e do peptídio C.
lenta, o que torna seu diagnóstico difícil e, em muitos casos, retar- Mais comumente, é necessário submeter o paciente a um jejum su-
dado. Alguns tumores enteropancreáticos não secretam hormônios. pervisionado de 12-72 h para induzir a hipoglicemia (Cap. 20). Os
Esses tumores “silenciosos” são habitualmente encontrados durante grandes insulinomas podem ser identificados pela TC ou RM; os
uma triagem radiográfica. Em cerca de 33% dos pacientes, ocorre tumores pequenos que não são detectados pelas técnicas radiográ-
metástase, mais comumente para o fígado. ficas convencionais podem ser localizados por ultrassonografia en-
Os gastrinomas são os tumores enteropancreáticos mais comuns doscópica ou pela injeção arteriográfica seletiva de cálcio dentro de
Distúrbios que Afetam Múltiplos Sistemas Endócrinos
observados nos pacientes com NEM 1 e resultam na síndrome de cada uma das artérias que irrigam o pâncreas e obtendo amostras de
Zollinger-Ellison (SZE), a qual é causada pela produção excessiva sangue da veia hepática para insulina a fim de determinar a região
de gastrina e ocorre em mais de 50% dos pacientes acometidos por anatômica que contém o tumor. A ultrassonografia intraoperatória
NEM 1 com pequenos tumores semelhantes a carcinoides na pa- é utilizada com frequência para localizar esses tumores. A tendência
rede duodenal ou, menos frequentemente, por tumores de células a estabelecer um diagnóstico mais precoce dos tumores que, conse-
das ilhotas pancreáticas. Pode haver mais de um tumor produtor de quentemente, são menores, reduziu a utilidade da cintilografia com
gastrina, o que torna difícil a localização. A abundante produção de octreotide, que é positiva em uma pequena minoria desses pacientes.
ácido pode causar esofagite, úlceras em todo o duodeno, úlceras que O glucagonoma, que é observado ocasionalmente na NEM 1,
acometem o jejuno proximal e diarreia. A diátese ulcerosa é comu- causa síndrome de hiperglicemia, erupção cutânea (eritema migra-
mente refratária à terapia conservadora, como os antiácidos. O diag- tório necrolítico), anorexia, glossite, anemia, depressão, diarreia e
nóstico é feito pelo achado de maior secreção ácida gástrica, níveis trombose venosa. Em cerca de 50% desses pacientes o nível plas-
basais elevados de gastrina no soro [em geral > 115 pmol/L (200 pg/ mático de glucagon é alto, o que resultou em sua designação como a
mL)] e uma resposta exagerada da gastrina sérica tanto à secretina síndrome do glucagonoma, apesar de a elevação do nível plasmático
quanto ao cálcio. Outras causas de níveis séricos elevados de gastrina, de glucagon nos pacientes com NEM 1 não estar necessariamente
tais como acloridria, tratamento com antagonistas do receptor H2 ou associada a esses sintomas. Alguns pacientes com essa síndrome
inibidores da bomba de prótons, antro gástrico retido, ressecção do possuem também níveis plasmáticos elevados de grelina. A síndro-
intestino delgado, obstrução da saída gástrica e hipercalcemia, de- me do glucagonoma pode representar uma interação complexa en-
vem ser excluídas (Fig. 23.1). A TC de alta resolução em sua fase ini- tre a superprodução de glucagon e de grelina e o estado nutricional
cial, a RM abdominal com contraste, a cintilografia com octreotide e/ do paciente.
ou a ultrassonografia endoscópica constituem as melhores técnicas A síndrome de Verner-Morrison, ou de diarreia aquosa, consiste
pré-operatórias para a identificação do gastrinoma primário e metas- em diarreia aquosa, hipopotassemia, hipocloridria e acidose metabó-
tático. A ultrassonografia intra-operatória é o método mais sensível lica. A diarreia pode ser volumosa e é observada quase sempre em as-
para a detecção de tumores pequenos. Cerca de 25% de todos os ca- sociação a um tumor de células das ilhotas no contexto da NEM 1, o
sos de SZE ocorrem no contexto da NEM 1. que deu origem ao termo cólera pancreática. No entanto, quando não
Os insulinomas representam o segundo tumor enteropancreáti- associada à NEM 1, a síndrome fora da NEM 1 não se restringe a tu-
co mais comum nos pacientes que apresentam NEM 1. Diferente- mores das ilhotas pancreáticas e tem sido observada com carcinoides
mente dos gastrinomas, a maioria dos insulinomas tem origem no e outros tumores. Admite-se que essa síndrome seja decorrente da
leito pancreático, tornando-se o tumor pancreático mais comum na superprodução do peptídio intestinal vasoativo (PIV), embora os ní-
veis plasmáticos de PIV possam não estar elevados. A hipercalcemia
pode ser induzida pelos efeitos do PIV no sentido de estimular a re-
absorção óssea osteoclástica, assim como pelo hiperparatireoidismo.
45
Outros distúrbios que devem ser aventados no diagnóstico diferen-
40 cial da diarreia crônica incluem doenças infecciosas ou parasitárias,
Tumor das doença intestinal inflamatória, espru e outras causas endócrinas, tais
35 paratireoides como SZE, carcinoide e carcinoma medular da tireoide.
As neoplasias pancreáticas diferem dos outros componentes da
Pacientes com tumor, n
30 Gastrinoma
Insulinoma NEM 1, pois cerca de 33% dos tumores exibem características malig-
25 Prolactinoma nas, incluindo metástases hepáticas. As neoplasias pancreáticas tam-
bém podem ser usadas para realçar outra característica da NEM 1: o
20 impacto específico de um hormônio produzido por um componente
15
da NEM 1 sobre outro componente neoplásico dessa síndrome. Os
exemplos específicos incluem os efeitos da produção seja do hormô-
10 nio de liberação da corticotrofina (CRH), seja do hormônio de libe-
ração do hormônio do crescimento (GHRH) pelo tumor das células
5 das ilhotas, de modo a causar uma síndrome de produção excessiva
0
de adrenocorticotrofina (ACTH) (doença de Cushing) ou de GH
≤15 16 a 20 21 a 30 31 a 40 41 a 50 51 a 60 61 a 70 (acromegalia) pela hipófise. Essas interações secundárias conferem
Idade, anos uma complexidade ainda maior ao diagnóstico e tratamento dessas
síndromes tumorais. Os tumores de células das ilhotas pancreáticas
Figura 23.1 Idade por ocasião do início da expressão dos tumores endó-
são diagnosticados pela identificação de uma síndrome clínica carac-
crinos na neoplasia endócrina múltipla tipo 1 (NEM 1). Dados derivados da
análise retrospectiva da hiperfunção de cada órgão endócrino em 130 casos de NEM
terística, com ensaios hormonais com ou sem estímulos provocati-
1. A idade do início é aquela por ocasião do primeiro sintoma ou, para os tumores vos, ou por técnicas radiográficas. Uma abordagem envolve a triagem
que não causam sintomas, a idade por ocasião do primeiro achado anormal em um anual dos indivíduos que correm risco realizando-se a mensuração
teste de triagem. A taxa de diagnóstico de hiperparatireoidismo aumentou brusca- dos níveis basais e estimulados por uma refeição do polipeptídio
mente entre os 16 e 20 anos de idade. (Reimpressa, com autorização, de S Marx et pancreático a fim de identificar os tumores, o mais precocemente
al.: Ann Intern Med 129:484, 1998.) possível; a base lógica para essa estratégia de triagem reside no con-
284
ceito de que a remoção cirúrgica dos tumores de células das ilhotas CONSIDERAÇÕES GENÉTICAS
em um estágio mais precoce poderá ser curativo. Outras abordagens
Mutações do gene NEM 1 são encontradas em mais de
para a realização da triagem incluem a mensuração dos níveis séri-
90% das famílias com a síndrome (Fig. 23.2). Os testes
Capítulo 23
cos de gastrina e do polipeptídio pancreático a cada 2-3 anos, com a
justificativa de que as neoplasias pancreáticas serão detectadas em genéticos podem ser realizados nos indivíduos que cor-
um estágio mais avançado, mas podendo ser tratadas clinicamente, rem o risco de desenvolver a síndrome de NEM 1 e es-
se possível, ou pela cirurgia. A TC de alta resolução em fase inicial ou tão disponíveis comercialmente nos EUA e na Europa. O
a ultrassonografia endoscópica constituem a melhor técnica pré-ope- principal valor do teste genético em uma família com uma mutação
ratória para identificação desses tumores; a ultrassonografia intra- identificável é a confirmação ou a exclusão do estado de portador
-operatória é o método mais sensível para a identificação dos tumo- do gene. Naqueles que são identificados como portadores do gene
res pequenos. Apesar de a tomografia por emissão de pósitrons com mutante, a triagem de rotina para as manifestações individuais da
fluorodesoxiglicose (FDG-PET) detectar 50% dos tumores de células NEM 1 deve ser realizada como esboçado anteriormente. Aqueles
285
teriormente, o tecido paratireoideo transplantado pode ser res- curativos. Há evidências crescentes de que o everolimus, um ini-
secado do antebraço com exérese tecidual de modo a reduzir o bidor de mTor (alvo mamífero da rapamicina), provoca regressão
paratormônio (PTH) intacto para menos de 50% do valor basal. do tamanho do tumor; 2 de 13 carcinomas de células das ilhotas
Outra abordagem consiste em remover 3-3,5 glândulas pa- e 2 de 12 tumores carcinoides tiveram uma redução de > 30% de
SEÇÃO IV
ratireoides do pescoço (deixando cerca de 50 mg de tecido pa- seu tamanho, e > 60% tinham doença estável.
ratireoideo), demarcando com extremo cuidado a localização do
TUMORES HIPOFISÁRIOS O tratamento dos prolactinomas com
tecido residual para que o tecido restante possa ser localizado fa-
agonistas dopaminérgicos (bromocriptina, cabergolina ou quina-
cilmente durante uma cirurgia subsequente. Se essa abordagem
golida) em geral consegue normalizar o nível sérico de prolactina
for usada, deverão ser feitas mensurações intraoperatórias do
e previne qualquer crescimento adicional do tumor (Cap. 2). A
PTH a fim de monitorar a adequação do tecido paratireoideo com
ressecção cirúrgica de um prolactinoma só raramente é curativa,
o objetivo de reduzir o PTH intacto sérico pós-operatório para ≤
mas pode aliviar os efeitos de massa. A ressecção transesfenoidal
50% dos valores basais.
Distúrbios que Afetam Múltiplos Sistemas Endócrinos
286
é estabelecido pelo achado de hipercalcemia, hipofosfatemia, hiper- CONSIDERAÇÕES GENÉTICAS
calciúria e de um nível sérico excessivamente alto de PTH intacto. A
Mutações do protooncogene RET foram identificadas na maioria
hiperplasia de múltiplas glândulas paratireoides é o achado histológi-
dos pacientes com NEM 2 (Fig. 23.3). RET codifica um receptor
Capítulo 23
co mais comum, porém com a doença de longa duração as alterações
tirosinoquinase que, em combinação com um correceptor, GFR,
adenomatosas podem sobrepor-se à hiperplasia.
é normalmente ativado pelo fator neurotrófico derivado das células
A subvariante mais comum de NEM 2A é o CMT familiar, uma
gliais (GDNF) ou por outros membros dessa família de peptídios
síndrome autossômica dominante na qual o CMT é a única mani-
semelhantes ao fator, incluindo artemina, persefina e neurturina.
festação (Quadro 23.1). O diagnóstico clínico de CMTF é estabele-
Na célula C existe evidência de que a persefina ativa normalmente
cido pela identificação do CMT em múltiplas gerações sem um fe-
o complexo RET/receptor de GRF-4 e é responsável em parte pela
ocromocitoma. Sabendo-se que a penetrância do feocromocitoma
migração de células C para dentro da tireoide, enquanto no siste-
é de 50% na NEM 2A, é possível que esta última possa disfarçar-se
ma neuronal em desenvolvimento do trato gastrintestinal, o GDNF
como CMTF em famílias pequenas. É importante levar em conta essa
ativa o complexo RET/GFR-1. As mutações de RET induzem a
Figura 23.3 Diagrama esquemático do protooncogene RET mostrando as da linhagem germinativa. As mutações dos códons 630, 768, 883 e 918 foram
mutações encontradas na NEM tipo 2 e no carcinoma medular da tireoide identificadas como mutações somáticas (que não afetam a linhagem germinativa)
(CMT) esporádico. O protooncogene RET fica localizado no braço proximal do cro- que ocorrem em uma única célula parafolicular ou C dentro da tireoide no CMT
mossomo 10q (10q11.2). Foram identificadas mutações ativadoras de dois domínios esporádico. Uma mutação no códon 918 é a mutação somática mais comum. NEM
funcionais do receptor de tirosinoquinase RET. O primeiro afeta uma região rica em 2, neoplasia endócrina múltipla tipo 2; ALC, amiloidose liquenoide cutânea; CMTF,
cisteína (Cys-Rich) na porção extracelular do receptor. Cada mutação na linhagem carcinoma medular da tireoide familiar; Sinal, o peptídio sinalizador; Caderina, uma
germinativa troca uma cisteína nos códons 609, 611, 618, 620 ou 634 por outro região semelhante à caderina no domínio extracelular; TM, domínio transmembrana;
aminoácido. A segunda região é o domínio intracelular da tirosinoquinase (TK). As TK, domínio da tirosinoquinase.
mutações no códon 634 são responsáveis por cerca de 80% de todas as mutações
287
Mutações incomuns (< 5% do total) incluem aquelas dos códons
tras famílias existem exemplos de doença metastática que ocorre
533 (éxon 8), 666, 768, 777, 790, 791, 804, 891 e 912. As mutações
no início da vida. Por exemplo, a doença metastática antes dos 6
associadas apenas ao CMTF incluem os códons 533, 768 e 912. Com
anos de idade já foi descrita com mutações nos códons 609 e 804
maior experiência, as mutações que antigamente estavam associadas
e antes dos 14 anos em um paciente com uma mutação no códon
SEÇÃO IV
Capítulo 23
pode ser útil para diferenciar VHL de NEM 1 (as características de su-
pescoço, a irradiação externa pode prevenir a recidiva local ou
perposição incluem o tumor de células das ilhotas e feocromocitoma
reduzir a massa tumoral, porém não é curativa. A quimioterapia
raro), ou NEM 2 (a característica de superposição é o feocromocito-
com combinações de adriamicina, vincristina, ciclofosfamida e
ma) é que o hiperparatireoidismo ocorre apenas raramente na VHL.
dacarbazina pode proporcionar paliação. Os ensaios clínicos com
O defeito molecular na neurofibromatose tipo I inativa a neu-
pequenos compostos (inibidores da tirosinoquinase), que intera-
rofibromina, uma proteína associada à membrana celular que, nor-
gem com a bolsa de ligação do ATP do RET, do receptor endote-
malmente, ativa uma GTPase. A inativação dessa proteína prejudica
lial vascular e dos receptores do fator de crescimento epidérmico
a GTPase e induz a ativação contínua de Ras p21 e sua descida pela
e tipo 2, e que impedem a fosforilação mostraram-se promissores
via da tirosinoquinase. Os tumores endócrinos são formados também
para o tratamento do CMT hereditário e esporádico. Um ensaio
Capítulo 23
Ocorrem síndromes raras de resistência à insulina nos pacientes que Síndrome de Crow-Fukase
desenvolvem anticorpos que bloqueiam a ligação da insulina com o As características desta síndrome são realçadas por um acrônimo
seu receptor. Inversamente, outras classes de anticorpos para os re- que enfatiza seus aspectos mais importantes: polineuropatia, or-
ceptores anti-insulina podem ativar o receptor e causar hipoglicemia; ganomegalia, endocrinopatia, proteínas-M e alterações cutâneas
este distúrbio deve ser aventado no diagnóstico diferencial da hipo- (skin) (POEMS). O aspecto mais importante é uma polineuropatia
glicemia em jejum (Cap. 20). sensorimotora progressiva grave associada à discrasia de plasmóci-
Os pacientes com anticorpos contra o receptor da insulina e tos. Acúmulos localizados de plasmócitos (plasmacitomas) podem
acanthosis nigricans costumam ser mulheres de meia-idade que ad- causar lesões ósseas escleróticas e produzir as proteínas IgG ou IgA
quirem resistência à insulina em associação com outros distúrbios monoclonais. As manifestações endócrinas em homens ou mulheres
291
CAPÍTULO 24 lular provavelmente está por trás da maioria dos casos de produção
hormonal ectópica. Muitos tipos de câncer são pouco diferenciados,
e certos produtos tumorais, como gonadotrofina coriônica humana
SEÇÃO IV
Além da invasão tecidual local e da ocorrência de metástases, as célu- que determinam a diferenciação celular.
las neoplásicas podem produzir diversas substâncias que estimulam No CPPC, a via de diferenciação foi relativamente bem definida.
reações hormonais, hematológicas, dermatológicas e neurológicas. O fenótipo neuroendócrino é ditado em parte pelo fator de trans-
Síndromes paraneoplásicas é o termo utilizado para indicar distúrbios crição basic-helix-loop-helix (bHLH), homólogo humano de achaete-
que acompanham tumores benignos ou malignos, mas que não estão -scute 1 (hASH-1), expresso em níveis anormalmente altos no CPPC
relacionados diretamente com o efeito de massa ou com a invasão associado ao ACTH ectópico. A atividade do hASH-1 é inibida pelo
do tumor primário. Os tumores de origem neuroendócrina, como o hairy enhancer of split 1 (HES-1) e pelas proteínas Notch, que tam-
carcinoma pulmonar de pequenas células (CPPC) e os tumores car- bém são capazes de induzir a interrupção do crescimento. Portanto,
cinoides, produzem uma ampla variedade de hormônios peptídios e a expressão anormal desses fatores de transcrição relacionados com
são causas comuns de síndromes paraneoplásicas. Entretanto, quase o desenvolvimento parece fornecer um elo entre proliferação e dife-
todos os tipos tumor têm potencial para produção de hormônios ou renciação celulares.
citocinas ou para induzir respostas imunológicas. Estudos criteriosos Se não resultasse em manifestações clínicas, a produção hor-
sobre a prevalência das síndromes paraneoplásicas indicaram que monal ectópica seria apenas um epifenômeno associado ao câncer.
elas são mais comuns do que se supunha. Os sinais e sintomas bem A produção excessiva e desregulada de hormônios, como ACTH,
como as alterações metabólicas associados aos distúrbios paraneo- PTHrP ou vasopressina, pode gerar morbidade substancial e compli-
plásicos podem passar despercebidos no contexto de um câncer e seu car o plano de tratamento oncológico. Além disso, as endocrinopa-
tratamento. Consequentemente, manifestações clínicas atípicas em tias paraneoplásicas às vezes são a manifestação de apresentação do
pacientes com câncer devem levantar suspeitas sobre uma possível câncer subjacente, podendo levar à investigação de um tumor oculto.
síndrome paraneoplásica. As síndromes endocrinológicas e hemato- Um grande número de síndromes endócrinas paraneoplásicas foi
lógicas mais comuns associadas a neoplasias subjacentes serão discu- descrito, associando a produção excessiva de hormônios específicos a
tidas neste capítulo. determinados tipos de tumores. Entretanto, certas síndromes recor-
rentes surgem a partir desse grupo (Quadro 24.1). Entre as síndro-
SÍNDROMES PARANEOPLÁSICAS ENDÓCRINAS mes endócrinas paraneoplásicas mais comuns, estão a hipercalcemia
por produção excessiva de PTHrP e outros fatores, a hiponatremia
■■ ETIOLOGIA em razão do excesso de vasopressina e a síndrome de Cushing causa-
Os hormônios podem ser produzidos por fontes eutópicas ou ec- da pela produção ectópica de ACTH.
tópicas. O termo eutópico refere-se à expressão de um hormônio a
partir de seu tecido normal de origem, enquanto ectópico refere-se ■■ HIPERCALCEMIA CAUSADA PELA PRODUÇÃO ECTÓPICA DE
à produção de hormônio a partir de uma fonte tecidual atípica. PTHRP
Por exemplo, o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) é expres- (Ver também o Capítulo 27.)
so eutopicamente pelas células corticotróficas da adenoipófise,
mas pode ser expresso ectopicamente no CPPC. Muitos hormô- Etiologia
nios são produzidos em baixos níveis a partir de uma ampla varie- A hipercalcemia humoral do câncer (HHC) ocorre em até 20% dos
dade de tecidos, além de suas fontes endócrinas clássicas. Assim, pacientes portadores da doença, sendo mais comum nos cânceres
a expressão ectópica refere-se, com frequência, a uma alteração de pulmão, cabeça e pescoço, pele, esôfago, mama e trato genituri-
quantitativa e não a uma alteração absoluta na expressão tecidual. nário bem como no mieloma múltiplo e nos linfomas. Embora haja
Entretanto, o termo expressão ectópica está firmemente arraigado diversas causas humorais distintas de HHC, o fenômeno está mais
e expressa uma fisiologia anormal associada à produção de hor- frequentemente associado à produção excessiva de PTHrP. Além de
mônios por células neoplásicas. Além dos altos níveis de hormô- atuar como fator humoral circulante, muitas metástases ósseas (p.
nio, a expressão ectópica caracteriza-se pela regulação anormal da ex., metástases do câncer de mama, mieloma múltiplo) podem pro-
produção hormonal (p. ex., defeito do controle por feedback) e do duzir PTHrP, ocasionando osteólise local e hipercalcemia.
processamento de peptídios (resultando em precursores grandes O PTHrP está estruturalmente relacionado com o PTH e liga-se
e não processados). ao seu receptor, o que explica as características bioquímicas seme-
Uma ampla variedade de mecanismos moleculares foi suge- lhantes entre a HHC e o hiperparatireoidismo. O PTHrP desempe-
rida como causa da produção hormonal ectópica. Em casos raros, nha um papel fundamental no desenvolvimento ósseo além de regu-
rearranjos genéticos explicam a expressão hormonal aberrante. Por lar a proliferação e a diferenciação celulares em outros tecidos, como
exemplo, a translocação do gene do paratormônio (PTH) pode resul- pele, medula óssea, mama e folículos pilosos. O mecanismo de indu-
tar em níveis elevados de expressão de PTH em outros tecidos além ção do PTHrP no câncer não está completamente compreendido; en-
da glândula paratireoide, aparentemente porque o rearranjo genético tretanto, os tecidos tumorais comumente associados à HHC normal-
coloca o gene do PTH sob controle de elementos reguladores atípi- mente produzem PTHrP durante o desenvolvimento ou a renovação
cos. Há um fenômeno relacionado bem documentado ocorrendo celular. A expressão de PTHrP é estimulada pelas vias de sinalização
em várias formas de leucemia e linfoma em que rearranjos genéticos hedgehog e por fatores de transcrição Gli que são ativos em muitos
somáticos produzem vantagem no crescimento e alteram a diferen- cânceres. O fator de crescimento transformador beta (FTC-), pro-
ciação e a função celulares. Embora rearranjos genéticos possam pro- duzido por muitos tumores, também estimula o PTHrP, em parte
duzir alguns casos de produção hormonal ectópica, esse mecanismo ao ativar a via de transcrição Gli. Mutações em determinados on-
é provavelmente raro, uma vez que muitos tumores estão associados cogenes, como o Ras, também podem ativar a expressão do PTHrP.
à produção excessiva de diversos peptídios. A desdiferenciação ce- No linfoma de células T em adultos, a proteína Tax transativadora
292
QUADRO 24.1 Síndromes paraneoplásicas causadas pela produção ectópica de hormônios
Síndrome paraneoplásica Hormônio ectópico Tipos tumorais característicosa
CAPÍTULO 24
Comuns
Hipercalcemia do câncer Proteína relacionada com o paratormônio (PTHrP) Células escamosas (cabeça e pescoço, pulmão e pele),
mama, geniturinário, gastrintestinal
1,25 diidroxivitamina D Linfomas
Paratormônio (PTH) (raro) Pulmão, ovário
Prostaglandina E2 (PGE2) (raro) Renal, pulmão
Síndrome da secreção inapropriada de Vasopressina Pulmão (células escamosas, pequenas células),
produzida pelo vírus linfotrópico II de células T humanas (HTLV-I) de rotina. Com menor frequência, a hipercalcemia é o sinal inicial
estimula a atividade do promotor do PTHrP. As lesões ósseas me- de apresentação do câncer. Em especial quando os níveis de cálcio se
tastáticas são mais propensas a produzir PTHrP do que as metásta- mostram acentuadamente aumentados (> 3,5 mmol/L [> 14 mg/dL]),
ses para outros tecidos, sugerindo que o osso produza fatores (p. ex., os pacientes podem apresentar fadiga, alterações do estado mental,
FCT-) que aumentam a produção de PTHrP, ou que as metástases desidratação ou sintomas de nefrolitíase.
produtoras de PTHrP possuam uma vantagem de crescimento seleti-
vo no osso. Portanto, a produção de PTHrP pode ser estimulada por Diagnóstico
mutações nos oncogenes, expressão alterada dos fatores de transcri- Entre as características que reforçam a hipótese de HHC, em opo-
ção virais ou celulares e fatores de crescimento locais. sição ao hiperparatireoidismo primário, estão câncer diagnosticado,
Outra causa relativamente comum de HHC é a produção excessi- hipercalcemia de início recente e níveis séricos de cálcio muito eleva-
va de 1,25-diidroxivitamina D. Assim como os distúrbios granuloma- dos. Assim como no hiperparatireoidismo, a hipercalcemia causada
tosos associados à hipercalcemia, os linfomas podem produzir uma pelo PTHrP é acompanhada por hipercalciúria e hipofosfatemia. Os
enzima que converte a 25‑hidroxivitamina D na forma mais ativa, pacientes com HHC caracteristicamente apresentam alcalose meta-
1,25-diidroxivitamina D, aumentando a absorção gastrintestinal de bólica e não a acidose hiperclorêmica encontrada no hiperparatireoi-
cálcio. Outras causas de HHC são a produção de citocinas osteolíti- dismo. A medição do PTH é útil para excluir o hiperparatireoidismo
cas e mediadores inflamatórios mediada pelo tumor. primário; o nível de PTH deve se encontrar suprimido na HHC. Um
nível elevado de PTHrP confirma o diagnóstico, tendo sido consta-
Manifestações clínicas tado aumento em cerca de 80% dos pacientes hipercalcêmicos com
A apresentação típica da HHC é a de um paciente com diagnóstico de câncer. Os níveis de 1,25-diidroxivitamina D podem estar aumenta-
câncer em que a hipercalcemia é um achado em exames laboratoriais dos nos pacientes com linfoma.
293
TRATAMENTO Hipercalcemia humoral dos cânceres Diagnóstico
As características diagnósticas da produção ectópica de vasopressina
O tratamento da HHC se inicia com a retirada do excesso de são as mesmas que as de outras causas de SIADH (Cap. 3). Ocor-
cálcio da dieta, dos medicamentos ou das soluções intravenosas. rem hiponatremia e diminuição da osmolalidade sérica quando a
SEÇÃO IV
Deve-se administrar fósforo por via oral (p. ex., Neutra-Phos 250 osmolalidade urinária se encontra inapropriadamente normal ou
mg 3 a 4 vezes/dia) até que o seu nível sérico esteja > 1 mmol/L aumentada. A excreção urinária de sódio está normal ou aumentada
(> 3 mg/dL). A reidratação com solução salina é utilizada para a menos que haja depleção de volume. Devem ser afastadas outras
diluir o cálcio sérico e promover a calciurese. O incentivo à diu- causas de hiponatremia, como as disfunções renal, suprarrenal ou ti-
rese com furosemida ou outros diuréticos de alça pode aumentar reóidea. As fontes fisiológicas de estimulação da vasopressina (lesões
a excreção de cálcio, mas tem relativamente pouco valor, exceto do SNC, doença pulmonar, náuseas) e os mecanismos circulatórios
na hipercalcemia que ameace a vida. Os diuréticos de alça devem adaptativos (hipotensão, insuficiência cardíaca, cirrose hepática),
ser administrados apenas após reidratação completa e com mo- assim como fármacos, incluindo vários agentes quimioterápicos,
Distúrbios que Afetam Múltiplos Sistemas Endócrinos
nitoração cuidadosa do equilíbrio hídrico. Os bifosfonatos, como também devem ser considerados causas possíveis de hiponatremia.
o pamidronato (60 a 90 mg IV), o zoledronato (4 a 8 mg IV) e o A dosagem da vasopressina geralmente é desnecessária para definir
etidronato (7,5 mg/kg/dia VO durante 3 a 7 dias consecutivos), o diagnóstico.
podem reduzir o cálcio sérico em 1 a 2 dias e suprimir a liberação
de cálcio por várias semanas. Infusões de bifosfonatos podem ser
repetidas, ou bifosfonatos orais usados no tratamento crônico. A Vasopressina ectópica: SIADH associada
TRATAMENTO
possibilidade de diálise deve ser considerada nos casos com hi- a tumor
percalcemia grave quando a hidratação com solução salina e os
A maioria dos pacientes com produção ectópica de vasopressina
tratamentos com bifosfonatos não forem possíveis ou tenham
desenvolve hiponatremia ao longo de algumas semanas ou meses.
resultados muito lentos. Os agentes usados antigamente, como
O distúrbio deve ser corrigido gradualmente, a não ser que o esta-
a calcitonina e a mitramicina, têm pouca utilidade atualmente
do mental se encontre alterado ou que haja risco de convulsões. O
após a introdução dos bifosfonatos. A calcitonina (2 a 8 U/kg SC
tratamento do câncer subjacente pode reduzir a produção ectópica
a cada 6 a 12 h) deve ser considerada quando for necessária cor-
de vasopressina, mas essa resposta, caso ocorra, é lenta. A restri-
reção rápida de hipercalcemia grave. A hipercalcemia associada a
ção hídrica para um volume inferior ao débito urinário, somado
linfomas, mieloma múltiplo ou leucemia pode responder ao tra-
às perdas insensíveis, costuma ser suficiente para corrigir a hipo-
tamento com glicocorticoides (p. ex., 40 a 100 mg de prednisona
natremia parcialmente. Entretanto, é necessário monitoramento
VO fracionados em 4 doses).
rígido da quantidade e da qualidade dos líquidos consumidos ou
administrados por via intravenosa para que a restrição hídrica seja
eficaz. Comprimidos de sal e solução salina não são úteis, a não ser
■■ VASOPRESSINA ECTÓPICA: SIADH ASSOCIADA A TUMOR que haja depleção de volume. A demeclociclina (150 a 300 mg VO,
3 a 4 vezes/dia) pode ser usada para inibir a ação da vasopressina
Etiologia no túbulo distal renal, mas o início de ação é relativamente lento
A vasopressina é um hormônio antidiurético normalmente produ- (1 a 2 semanas). A conivaptana, um antagonista do receptor não
zido pela neuroipófise. A produção ectópica de vasopressina por tu- peptídio V2, pode ser administrado pelas vias oral (20 a 120 mg
mores é uma causa comum da síndrome de secreção inapropriada de 2 vezes/dia) ou intravenosa (10 a 40 mg) e é particularmente efe-
hormônio antidiurético (SIADH), ocorrendo em pelo menos metade tivo quando usado em combinação com restrição hídrica na hipo-
dos pacientes com CPPC. A SIADH também pode ser causada por natremia euvolêmica. A hiponatremia grave (Na < 115 mEq/L) ou
diversas doenças não neoplásicas, incluindo traumatismo do sistema os casos com alterações do estado mental podem exigir tratamen-
nervoso central (SNC), infecções e medicamentos (Cap. 3). As res- to com solução salina hipertônica (a 3%) ou solução salina normal
postas compensatórias à SIADH, como diminuição da sede, podem juntamente com furosemida para aumentar a depuração de água
minorar o aparecimento de hiponatremia. Contudo, com a produção livre. A taxa de correção de sódio deve ser lenta (0,5 a 1 mEq/L por
prolongada da vasopressina em excesso, é possível que o sensor de hora) para evitar alterações hídricas rápidas e a possível ocorrência
osmolalidade (osmostat) controlador da sede e secreção de vasopres- de mielinólise central da ponte.
sina hipotalâmica sejam zerados. Além disso, é possível que a inges-
tão de água livre, por via oral ou intravenosa, rapidamente agrave a
hiponatremia em razão da redução da diurese renal. ■■ SÍNDROME DE CUSHING CAUSADA PELA PRODUÇÃO ECTÓPICA
Os tumores com características neuroendócrinas, como o CPPC DE ACTH
e os tumores carcinoides, são as fontes mais comuns de produção (Ver também o Capítulo 5.)
ectópica de vasopressina, mas também ocorrem em outras formas
de câncer de pulmão e nas lesões do SNC, nos cânceres de cabeça Etiologia
e pescoço, bem como nos cânceres geniturinários, gastrintestinais e A produção ectópica de ACTH representa 10 a 20% dos casos de sín-
ovarianos. O mecanismo de ativação do gene da vasopressina em tais drome de Cushing. A síndrome é particularmente comum nos tu-
tumores é desconhecido, mas frequentemente envolve a expressão mores neuroendócrinos. O CPPC (> 50%) é a fonte mais comum de
concomitante do gene da ocitocina adjacente, sugerindo a desrepres- ACTH ectópico, seguido pelo tumor carcinoide do timo (15%), pelos
são desse locus. tumores de células da ilhota (10%), carcinoide brônquico (10%), ou-
tros tumores carcinoides (5%) e feocromocitomas (2%). A produção
Manifestações clínicas ectópica de ACTH é causada por aumento da expressão do gene da
A maioria dos pacientes com secreção ectópica de vasopressina é as- proopiomelanocortina (POMC), que codifica o ACTH, juntamente
sintomática e identificada em razão da presença de hiponatremia nos com hormônio estimulante de melanócitos (MSH), betalipotropina e
testes bioquímicos de rotina. Os sintomas podem incluir fraqueza, vários outros peptídios. Em diversos tumores, há expressão abundan-
letargia, náuseas, confusão, depressão do estado mental e convulsões. te, porém aberrante do gene POMC a partir de um promotor interno,
A gravidade dos sintomas reflete a rapidez da instalação assim como proximal ao terceiro éxon, que codifica o ACTH. Entretanto, como
a extensão da hiponatremia. A hiponatremia geralmente se desenvol- esse produto não possui a sequência de sinalização necessária ao pro-
ve lentamente, mas pode ser exacerbada por hidratação intravenosa cessamento da proteína, não é secretado. Já o aumento da produção
ou pela instituição de novos medicamentos. de ACTH acontece com a expressão menos abundante, mas não re-
294
gulada, de POMC a partir do mesmo sítio promotor usado na hipó- exceções comprovadas para essas diretrizes gerais, uma vez que tais
fise. Entretanto, como os tumores não possuem várias das enzimas fontes ectópicas de ACTH podem apresentar regulação do tipo feed-
necessárias para processar o polipeptídio POMC, este é normalmente back indistinguível da observada nos adenomas hipofisários, como
CAPÍTULO 24
liberado como múltiplos fragmentos grandes e biologicamente inati- a supressão por altas doses de dexametasona e a resposta do ACTH
vos juntamente com quantidades relativamente pequenas de ACTH ao bloqueio suprarrenal com metirapona. Se necessário, o cateteris-
ativo e totalmente processado. mo do seio petroso pode ser usado para investigar um paciente com
Raramente, o hormônio de liberação de corticotrofina (CRH) é síndrome de Cushing dependente de ACTH quando a origem do
produzido por tumores das células das ilhotas pancreáticas, CPPC, ACTH não for evidente. Após estimulação com CRH, uma relação
câncer medular da tireoide, tumores carcinoides ou carcinoma de 3:1 entre o ACTH no seio petroso e o na periferia é altamente su-
da próstata. Quando seus níveis são suficientemente altos, o CRH gestiva de uma fonte hipofisária de ACTH. Os exames radiológicos
pode causar hiperplasia da hipófise pela corticotrofina e síndrome também são úteis na avaliação de lesões carcinoides suspeitas, per-
de Cushing. Os tumores produtores de CRH algumas vezes também mitindo a biópsia e a caracterização da produção hormonal usando
295
maior acesso aos tecidos alvo da insulina. Por esse motivo, o nível fósforo acentuadamente reduzidos e perda renal de fosfato, resultan-
circulante de IGF-II pode não estar muito elevado e, ainda assim, do em fraqueza muscular, dor óssea e osteomalacia. Os níveis séri-
causar hipoglicemia. Além da hipoglicemia mediada por IGF-II, os cos de cálcio e PTH são normais, e o de 1,25-diidroxivitamina D é
tumores podem ocupar uma porção do fígado suficiente para cau- baixo. A osteomalacia oncogênica geralmente é causada por tumores
SEÇÃO IV
são do mRNA do IGF-II. As medicações que possam estar associadas como fator do crescimento de fibroblastos 23 (FGF23). Os níveis de
à hipoglicemia devem ser eliminadas. Quando possível, o tratamento FGF23 mostram-se aumentados em alguns pacientes com osteoma-
da neoplasia maligna subjacente pode reduzir a predisposição à hipo- lacia osteogênica. O distúrbio apresenta características bioquímicas
glicemia. Refeições frequentes e a administração de glicose IV, espe- semelhantes às presentes nas mutações inativadoras do gene PHEX,
cialmente durante o sono ou o jejum, frequentemente são necessárias a causa da hipofosfatemia hereditária ligada ao X. O gene PHEX co-
para prevenir hipoglicemia. Glucagon e glicocorticoides também fo- difica uma protease que inativa o FGF23. O tratamento envolve re-
ram utilizados para aumentar a produção de glicose. moção do tumor, se possível, e suplementação com fosfato e vitamina
D. O tratamento com octreotida reduz a perda de fosfato em alguns
■■ GONADOTROFINA CORIÔNICA HUMANA (HCG) pacientes com tumores que expressam o subtipo 2 do receptor de
A hCG é composta das subunidades e , podendo ser produzida somatostatina. As cintilografias com octreotida também podem ser
como hormônio completo e biologicamente ativo, ou como subuni- úteis para detectar esses tumores.
dades não combinadas biologicamente inertes. A produção ectópi-
ca de hCG completa ocorre mais frequentemente em associação a Agradecimentos
tumores embrionários de testículo, tumores de células germinativas, Os autores agradecem as contribuições de Bruce E. Johnson às versões anteriores
germinomas extragonadais, câncer de pulmão, hepatoma e tumores desse capítulo.
das ilhotas pancreáticas. A produção eutópica de hCG ocorre nas
neoplasias malignas trofoblásticas. A produção da subunidade do BIBLIOGRAFIA
hCG é particularmente comum no câncer pulmonar e no câncer das
AL-Tourah AJ et al: Paraneoplastic erythropoietin-induced polycythemia
ilhotas pancreáticas. Nos homens, níveis elevados de hCG estimulam associated with small lymphocytic lymphoma. J Clin Oncol 24:2388, 2006
a esteroidogênese e a atividade da aromatase nas células testiculares Gosden RG, Feinberg AP: Genetics and epigenetics—nature’s pen-and-pen-
de Leydig, resultando em aumento da produção de estrogênio e de- cil set. N Engl J Med 356:731, 2007
senvolvimento de ginecomastia. A puberdade precoce em meninos Mundy GR, Edwards JR: PTH-related peptide (PTHrP) in hypercalcemia. J
ou a ginecomastia em homens devem levar à medição do hCG e à Am Soc Nephrol 19:672, 2008
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fonte de produção ectópica de hCG. A maioria das mulheres é assin- sis and treatment. Mayo Clin Proc 85:838, 2010
tomática. A hCG é facilmente dosada. O tratamento deve ser direcio- Rikhof B ET AL: The insulin-like growth factor system and sarcomas. J Pa-
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■■ OSTEOMALACIA ONCOGÊNICA and other novel mediators. Pediatr Nephrol 23:1203, 2008
A osteomalacia oncogênica hipofosfatêmica, também denominada Stewart AF: Clinical practice: Hypercalcemia associated with cancer. N Engl
osteomalacia induzida por tumor (OIT), caracteriza-se por níveis de J Med 352:373, 2005
296
SEÇÃO V
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo
do Cálcio
CAPÍTULO 25 nalicular, atuando, assim, como principais reguladores da formação
e reabsorção ósseas. Notavelmente, os osteócitos também secretam
o fator de crescimento dos fibroblastos 2 (FGF23), um importante
regulador do metabolismo do fosfato (ver adiante). A mineralização
Osso e Metabolismo Mineral da matriz, tanto no osso trabecular quanto nos ósteons (osteônios)
do osso cortical compacto (sistemas de Havers), começa logo depois
na Saúde e na Doença que a matriz é secretada (mineralização primária), porém só será
completada várias semanas depois ou após períodos ainda mais
longos (mineralização secundária). Embora essa mineralização tire
F. Richard Bringhurst
vantagem da alta concentração de cálcio e fosfato já próximos da
Marie B. Demay saturação no soro, a mineralização é um processo minuciosamente
Stephen M. Krane regulado, que depende da atividade da fosfatase alcalina derivada
Henry M. Kronenberg dos osteoblastos, que funciona provavelmente hidrolisando os inibi-
dores da mineralização.
SEÇÃO V
298
BMPs PMO PTH, Vit D, IGF,
PMO, Wnts
CAPÍTULO 25
M-CSF Ligante do RANK M-CSF Ligante do RANK
Ligante do RANK IL-1
IL-1,IL-6
Figura 25.1 Vias que regulam o desenvolvimento (A) dos osteoblastos e insulina; Runx2, fator de transcrição relacionado a Runt 2; M-CSF, fator estimulador
(B) dos osteoclastos. Hormônios, citocinas e fatores do crescimento que contro- de colônias de macrófagos; PU-1, fator de transcrição da família ets específico para
lam a proliferação e a diferenciação das células são mostrados acima das setas. Os monócitos e linfócitos B; NFB, fator nuclear B; TRAF, fatores associados ao re-
fatores de transcrição e outros marcadores específicos para vários estágios do de- ceptor do fator de necrose tumoral; ligante do RANK, ativador do receptor do ligante
senvolvimento são representados abaixo das setas. PMO, proteínas morfogênicas do NFB; IL-1, interleucina 1; IL 6, interleucina 6. (Modificada de T Suda et al.: Endocr
osso; wnts, local de integração do vírus do tumor mamário murino tipo “sem asas” Rev 20:345, 1999, com autorização.)
(wingless); PTH, paratormônio; Vit D; vitamina D; IGF, fator de crescimento similar à
Vários fatores de crescimento e citocinas (incluindo as interleucinas Esse programa é regulado tanto por fatores locais, como IGF-I e IGF-
1, 6 e 11, o TNF e o interferon ) modulam a diferenciação e a função -II, ihh, peptídio relacionado ao paratormônio (PTHrP) e FGF, quan-
dos osteoclastos. A maioria dos hormônios que influenciam a função to por hormônios sistêmicos, tais como hormônio do crescimento,
dos osteoclastos não se dirige diretamente para essas células, porém glicocorticoides e estrogênio.
influencia a sinalização de M-CSF e do ligante do RANK pelos os- O osso novo, independentemente de ter sido formado em lacten-
teoblastos. Tanto o PTH quanto a 1,25(OH)2D induzem aumentos no tes ou em adultos durante o reparo, possui uma relação relativamente
número e na atividade dos osteoclastos, enquanto o estrogênio reduz alta de células para matriz e se caracteriza por feixes de fibras gros-
o número e a atividade dos osteoclastos por esse mecanismo indireto. seiras de colágeno que se entrelaçam e se dispersam aleatoriamente
Em contrapartida, a calcitonina se une ao seu receptor sobre a superfí- (osso reticulado). Nos adultos, o osso mais maduro é organizado com
cie basal dos osteoclastos e inibe diretamente sua função. feixes de fibras distribuídos regularmente em lâminas paralelas ou
A reabsorção do osso mediada pelos osteoclastos se processa em concêntricas (osso lamelar). Nos ossos longos, a deposição de osso
espaços bem delineados (lacunas de Howship), onde os osteoclastos lamelar em uma organização concêntrica ao redor dos vasos san-
se unem através de uma integrina específica v3 aos componentes guíneos forma os sistemas de Havers. O crescimento dos ossos em
da matriz óssea, como a osteopontina. O osteoclasto forma uma ve- comprimento depende da proliferação das células da cartilagem e da
dação impermeável para a matriz subjacente e secreta prótons, clo- sequência endocondral no nível da placa de crescimento. O cresci-
reto e proteinases para o interior de um espaço confinado, que foi mento em largura e espessura é empreendido pela formação de osso
comparado a um lisossomo extracelular. A superfície dos osteoclas- na superfície periosteal e pela reabsorção na superfície endosteal,
tos ativos forma uma borda enrugada que contém uma ATPase espe- com a velocidade de formação ultrapassando a de reabsorção. Em
cializada da bomba de prótons, que secreta ácido e solubiliza a fase adultos, após o fechamento das placas de crescimento, o crescimento
mineral. A anidrase carbônica (isoenzima tipo II) dentro do osteo- em comprimento e a formação de osso endocondral cessam, exceto
clasto gera os prótons necessários. A matriz óssea é reabsorvida no para alguma atividade nas células da cartilagem debaixo da superfí-
ambiente ácido adjacente à borda enrugada por proteases que atuam cie articular. Até mesmo em adultos, porém, o remodelamento ósseo
em um pH baixo, como a catepsina K. (dentro dos sistemas de Havers, assim como ao longo das superfícies
No embrião e na criança em crescimento, o osso se desenvolve do osso trabecular) prossegue ao longo da vida. Em adultos, cerca de
por remodelamento e substituição da cartilagem previamente calci- 4% da superfície do osso trabecular (como a crista ilíaca) participam
ficada (formação óssea endocondral), ou é formado sem uma matriz na reabsorção ativa, enquanto 10 a 15% das superfícies trabeculares
cartilaginosa (formação óssea intramembranosa). Durante a forma- são cobertas com osteoide, o novo osso não mineralizado formado
ção do osso endocondral, os condrócitos proliferam, secretam e mi- pelos osteoblastos. Os estudos com radioisótopos indicam que até
neralizam uma matriz, aumentam de tamanho (hipertrofia) e, a se- 18% do cálcio total do esqueleto são depositados e removidos a cada
guir, morrem, aumentando as dimensões do osso e proporcionando ano. Assim sendo, o osso é um tecido com metabolismo ativo que
a matriz e os fatores que estimulam a formação óssea endocondral. requer um suprimento sanguíneo intacto. O ciclo de reabsorção e
299
Precursor do
osteoclasto Precursores dos
osteoblastos Unidade de
Osteoclasto Osteoclasto ativo Osteoblasto remodelamento
Células de ósseo
revestimento
Superfície
Osteoide
óssea em Linha de
repouso Reabsorção
cimento
Ativação Reversão Formação do osso Mineralização
Osteócito
cerca de 3 semanas cerca de 3 meses
Figura 25.2 Representação esquemática do remodelamento ósseo. O ciclo de remodelamento ósseo é executado pela unidade multicelular básica (UMB), forma-
da por um grupo de osteoclastos e osteoblastos. No osso cortical, as UMB formam túneis através do tecido, enquanto no osso esponjoso elas se movimentam através da
superfície trabecular. O processo de remodelamento ósseo é iniciado pela contração das células de revestimento e pelo recrutamento dos precursores osteoclásticos. Esses
SEÇÃO V
precursores fundem-se para formar osteoclastos ativos multinucleados que medeiam a reabsorção óssea. Os osteoclastos aderem ao osso e, subsequentemente, o removem
por acidificação e digestão proteolítica. À medida que as UMB avançam, os osteoclastos deixam o local de reabsorção, e os osteoblastos penetram para cobrir a área escavada
e iniciar o processo de formação de osso novo pela secreção de osteoide, que acaba sendo mineralizado e transformado em osso novo. Após a mineralização do osteoide, os
osteoblastos se achatam e formam uma camada de células de revestimento sobre o osso novo.
formação de osso é um processo altamente coordenado, executado vatório que se torna necessário ocasionalmente para preservar a
pela unidade multicelular básica, que é constituída por um grupo de concentração de cálcio no líquido extracelular (LEC) (Fig. 25.3).
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
osteoclastos e osteoblastos (Fig. 25.2). O acréscimo de cálcio esquelético se torna significativo pela pri-
A resposta do osso a fraturas, infecção e interrupção do supri- meira vez durante o terceiro trimestre da vida fetal, é acelerado ao
mento sanguíneo, assim como a lesões expansivas, é relativamente longo de toda a infância e a adolescência, alcança um pico no início
limitada. O osso morto deve ser reabsorvido e o osso novo deve ser da vida adulta e, gradualmente, declina daí em diante com ritmos
formado, processo executado em associação ao crescimento de no- que só raramente ultrapassam 1 a 2% ao ano. Essas alterações lentas
vos vasos sanguíneos que penetram na área envolvida. Nas lesões no conteúdo total de cálcio esquelético contrastam com as veloci-
que destroem a organização do tecido, como uma fratura na qual a dades diárias relativamente altas dos fluxos muito semelhantes de
aposição dos fragmentos é precária ou quando existe algum movi- cálcio para dentro e para fora do osso (cerca de 250 a 500 mg cada),
mento na área da fratura, as células estromais progenitoras recapitu- processo esse mediado pela atividade acoplada osteoblástica e os-
lam a formação do osso endocondral do desenvolvimento inicial e teoclástica. Uma quantidade adicional de 0,5 a 1% de cálcio esque-
produzem cartilagem, que é substituída por osso e, de modo variá- lético é permutada livremente (p. ex., em equilíbrio químico) com
vel, por tecido fibroso. Quando existe uma boa aposição com fixa- aquele existente no LEC.
ção e pouca movimentação no local da fratura, o reparo se processa A concentração de cálcio ionizado no LEC deve ser mantida den-
predominantemente pela formação de osso novo sem outro tecido tro de uma variação estreita, por causa do papel extremamente im-
mediador. portante que desempenha em uma ampla gama de funções celulares,
O remodelamento ósseo ocorre ao longo de linhas de força ge- especialmente aquelas envolvidas na atividade neuromuscular, na se-
radas pelo estresse mecânico. Os sinais provenientes desses estresses creção e na transdução dos sinais. Os níveis de cálcio livre citosólico
mecânicos são percebidos pelos osteócitos, que transmitem os sinais intracelular são de cerca de 100 nmol/L e 10.000 vezes mais baixos
aos osteoclastos e aos osteoblastos, ou a seus precursores. Um des-
ses sinais é a esclerostina, um inibidor da sinalização wnt. As forças
mecânicas suprimem a produção de esclerostina e, dessa maneira, 0,4-1,5 g
aumentam a formação óssea pelos osteoblastos. As lesões ósseas ex-
pansivas, como os tumores, induzem a reabsorção na superfície em
contato com o tumor, pela produção de ligantes, como o PTHrP, que
estimulam a diferenciação e a função dos osteoclastos. Até mesmo 0,25-0,5 g
LEC
0,25-0,5 g
em um distúrbio com destruição da arquitetura tão extensa quanto 1a2g
1000-2000 g
0,1-0,2 g 0,25-0,5 g
na doença de Paget, o remodelamento é determinado por forças me-
cânicas. Assim sendo, a plasticidade do osso reflete as interações de
células entre si e com o meio ambiente. 8-10 g 7,9-9,7 g
A mensuração dos produtos da atividade osteoblástica e osteo-
Intestino Osso
clástica pode ajudar no diagnóstico e no tratamento das doenças do
osso. A atividade osteoblástica pode ser avaliada medindo-se a fos-
fatase alcalina sérica osso-específica. De maneira semelhante, a os- 0,3-1 g
teocalcina, uma proteína secretada pelos osteoblastos, é produzida
quase exclusivamente pelos osteoblastos. A atividade osteoclástica
pode ser avaliada medindo-se os produtos da degradação do colá-
geno. As moléculas de colágeno estão ligadas covalentemente en- Rim
tre si na matriz extracelular pela formação de ligações cruzadas de
hidroxipiridínio. Após digestão pelos osteoclastos, esses peptídios
0,15-3 g
com ligações cruzadas podem ser medidos tanto na urina quanto
no sangue. Figura 25.3 Homeostase do cálcio. Ilustração esquemática do conteúdo de
cálcio do líquido extracelular (LEC) e do osso, bem como da dieta e das fezes; a mag-
nitude do fluxo de cálcio por dia conforme calculada por vários métodos é mostrada
METABOLISMO DO CÁLCIO
nos locais de transporte no intestino, no rim e no osso. As faixas dos valores mos-
Mais de 99% dos 1 a 2 kg de cálcio presentes normalmente no corpo trados são aproximadas e foram escolhidas para ilustrar certos pontos discutidos no
humano adulto estão localizados no esqueleto, onde esse mineral texto. Em condições de equilíbrio do cálcio, as velocidades de liberação do cálcio e
proporciona estabilidade mecânica e funciona como um reser- de sua captação no osso são iguais.
300
que a concentração de cálcio ionizado no sangue e no LEC (1,1 a A regulação hormonal controlada por retroalimentação da efi-
1,3 mmol/L). O cálcio citosólico não desempenha o papel estrutu- ciência absortiva intestinal resulta em uma absorção diária global de
ral desempenhado pelo cálcio extracelular; na verdade, ele tem uma cálcio relativamente constante de cerca de 5 a 7,5 mmol/dia (200 a
função de sinalização. O acentuado gradiente químico do cálcio de 400 mg/dia), não obstante as grandes mudanças na ingestão dietéti-
fora para dentro da célula promove o influxo rápido de cálcio através ca diária de cálcio. Essa carga diária de cálcio absorvido é excretada
de vários canais do cálcio da membrana que podem ser ativados por pelos rins de maneira também regulada rigidamente pela concentra-
hormônios, metabólitos ou neurotransmissores, modificando rapi- ção do cálcio ionizado no sangue. Cerca de 8 a 10 g/dia de cálcio
damente a função celular. No sangue, a concentração total de cálcio são filtrados pelos glomérulos, dos quais apenas 2 a 3% aparecem
normalmente é de 2,2 a 2,6 mM (8,5 a 10,5 mg/dL), dos quais cerca na urina. A maior parte do cálcio filtrado (65%) é reabsorvida nos
de 50% são ionizados. O restante se une por processos iônicos às pro- túbulos proximais, por uma via paracelular passiva que é acoplada
teínas com carga negativa (predominantemente albumina e imuno- com a reabsorção concomitante de NaCl e não é especificamente re-
globulinas) ou se combina fracamente com fosfato, citrato, sulfato e gulada. O ramo ascendente cortical espesso da alça de Henle (cTAL)
outros ânions. As alterações nas concentrações séricas das proteínas reabsorve aproximadamente outros 20% do cálcio filtrado, também
afetam diretamente a concentração sanguínea total de cálcio, até por um mecanismo paracelular. A reabsorção do cálcio no cTAL re-
CAPÍTULO 25
mesmo quando a concentração de cálcio ionizado continua normal. quer uma proteína das junções impermeáveis denominada parace-
Um algoritmo destinado a corrigir as alterações proteicas ajusta o lina 1 e é inibida pelas maiores concentrações sanguíneas de cálcio
cálcio sérico total (em mg/dL) para cima em 0,8 vez o déficit na albu- ou de magnésio, agindo através dos CaSR, que está muito expressa
mina sérica (g/dL) ou em 0,5 vez o déficit na imunoglobulina sérica na membrana basolateral nesse segmento do néfron. A intervenção
(em g/dL). No entanto, essas correções proporcionam aproximações dos CaSR renais proporciona um mecanismo, independente daqueles
apenas imperfeitas das concentrações reais de cálcio livre e podem engajados diretamente pelo PTH ou 1,25(OH)2D, por meio do qual o
ser enganosas, em particular durante uma enfermidade aguda. A aci- cálcio sérico ionizado consegue controlar a reabsorção renal de cál-
dose também altera o cálcio ionizado por reduzir sua associação às cio. Finalmente, cerca de 10% do cálcio filtrado são reabsorvidos nos
proteínas. A melhor conduta consiste em medir o cálcio sanguíneo túbulos contornados distais (TCD) por um mecanismo transcelular.
CAPÍTULO 25
4. Hipercalcemia hipocalciúrica familiar f. Cisplatina, ifosfamida, foscarnet, rapamicina
B. Independente de PTH/PTHrP II. Comprometimento da absorção intestinal de fosfato
1. Excesso de FGF23 ou outras “fosfatoninas” A. Antiácidos contendo alumínio
a. Raquitismo hipofosfatêmico ligado ao X (RHLX) B. Sevelâmer
b. Hipofosfatemia autossômica recessiva (HFAR) III. Desvios do fosfato extracelular para dentro das células
c. Raquitismo hipofosfatêmico autossômico dominante (RHAD) A. Glicose intravenosa
d. Síndrome de osteomalacia induzida por tumor (OIT) B. Insulinoterapia para hiperglicemia prolongada ou cetoacidose diabética
e. Síndrome de McCune‑Albright (displasia fibrosa)
A doença de Dent é um distúrbio recessivo ligado ao X causado da doença de Paget lítica. Isso costuma ser mais proeminente nos pa-
por mutações inativadoras em CLCN5, um transportador do clo- cientes que possuíam evidência pré-operatória de alto remodelamen-
reto que se expressa nos endossomos dos túbulos proximais as ca- to ósseo (p. ex., altos níveis séricos de fosfatase alcalina). Metástases
racterísticas incluem hipercalciúria, hipofosfatemia e cálculos renais osteoblásticas também podem dar origem a essa síndrome.
recorrentes. A perda renal de fosfato é comum entre os pacientes
diabéticos mal controlados e etilistas, que correm portanto alto ris- Achados clínicos e laboratoriais
co de hipofosfatemia iatrogênica quando tratados com insulina ou As manifestações clínicas de hipofosfatemia grave refletem um de-
glicose IV, respectivamente. Os diuréticos e outros medicamentos e feito generalizado no metabolismo energético celular em virtude
toxinas podem causar reabsorção tubular renal anormal do fosfato da depleção de ATP, de um desvio da fosforilação oxidativa para a
(Quadro 25.1). glicólise e da disfunção tecidual ou orgânica associada. A hipofosfa-
Nos pacientes hospitalizados, a hipofosfatemia pode ser atri- temia aguda grave ocorre exclusiva ou principalmente em pacientes
buída com frequência a uma redistribuição maciça do fosfato do LEC hospitalizados com enfermidades clínicas ou cirúrgicas graves sub-
para dentro das células. A insulinoterapia para a cetoacidose diabéti- jacentes e depleção preexistente de fosfato devida a perdas urinárias
ca constitui um paradigma para esse fenômeno, no qual a gravidade excessivas, má absorção acentuada ou desnutrição. A hipofosfatemia
da hipofosfatemia está relacionada com o grau de depleção preceden- crônica tende a ser menos grave, com manifestação clínica dominada
te de fosfato e outros eletrólitos (Cap. 19). A hipofosfatemia em geral por queixas musculoesqueléticas, tais como dor óssea, osteomalacia,
é maior em algum momento muitas horas após o início da insulino- pseudofraturas e fraqueza muscular proximal ou, em crianças, raqui-
terapia e é difícil prever com base nas mensurações basais do fosfato tismo e baixa estatura.
sérico feitas por ocasião da apresentação quando uma azotemia pré- As manifestações neuromusculares da hipofosfatemia grave são
-renal pode obscurecer uma depleção significativa de fosfato. Outros variáveis, mas podem incluir fraqueza muscular, letargia, confusão,
fatores que podem contribuir para essa hipofosfatemia redistributiva desorientação, alucinações, disartria, disfagia, paralisias oculomoto-
aguda incluem inanição ou desnutrição precedentes, administração ras, anisocoria, nistagmo, ataxia, tremor cerebelar, balismo, hiporre-
de glicose IV sem outros nutrientes, catecolaminas sanguíneas ele- flexia, falta de controle esfincteriano, déficits sensoriais distais, pares-
vadas (endógenas ou exógenas), alcalose respiratória e recuperação tesia, hipoestesia, paralisia ascendente generalizada ou semelhante à
após acidose metabólica. síndrome de Guillain Barré, crises convulsivas, coma e até mesmo
A hipofosfatemia também pode ocorrer transitoriamente (por morte. Sequelas sérias, como paralisia, confusão e crises convulsivas,
semanas a meses) durante a fase de formação efetiva acelerada do são prováveis somente com concentrações de fosfato < 0,25 mmol/L
osso após uma paratireoidectomia para hiperparatireoidismo primá- (< 0,8 mg/dL). A rabdomiólise pode manifestar-se durante uma hi-
rio grave ou durante o tratamento da deficiência da vitamina D ou pofosfatemia rapidamente progressiva. O diagnóstico de rabdomió-
303
lise induzida por hipofosfatemia pode passar despercebido, pois até
30% dos pacientes com hipofosfatemia aguda (< 0,7 mM) exibem QUADRO 25.2 Terapia intravenosa da hipofosfatemia
elevações de creatinofosfoquinase que alcançam um pico um a dois
Considerar
dias depois do nadir no fosfato sérico, quando a liberação de fosfato
pelos miócitos lesionados pode ter acarretado uma quase normaliza- Provável gravidade da depleção subjacente de fosfato
ção dos níveis circulantes de fosfato. Administração concomitante de glicose parenteral
A insuficiência respiratória e a disfunção cardíaca, que são re-
Presença de complicações neuromusculares, cardiopulmonares ou
versíveis pelo tratamento com fosfato, podem ocorrer com níveis hematológicas da hipofosfatemia
séricos de fosfato de 0,5 a 0,8 mmol/L (1,5 a 2,5 mg/dL). Os de-
Função renal (reduzir a dose em 50% se a creatinina sérica for >
feitos tubulares renais, incluindo acidose tubular, glicosúria e re-
220 mol/L [> 2,5 mg/dL])
absorção alterada de sódio e cálcio, também podem ocorrer. As
anormalidades hematológicas se correlacionam com reduções no Nível sérico de cálcio (corrigir em primeiro lugar a hipocalcemia; reduzir a
ATP e no 2,3-difosfoglicerato intracelulares e podem incluir micro- dose em 50% na hipercalcemia)
esferocitose e hemólise dos eritrócitos; dissociação da hemoglobina Diretrizes
comprometida; quimiotaxia, fagocitose e destruição bacteriana dos Total
SEÇÃO V
leucócitos defeituosa; e disfunção plaquetária com hemorragia gas- Fósforo sérico, mM Velocidade administrado,
trintestinal espontânea. (mg/dL) de infusão Duração, h mmol
< 0,8 (< 2,5) 2 6 12
< 0,5 (< 1,5) 4 6 24
TRATAMENTO Hipofosfatemia
< 0,3 (< 1,0) 8 6 48
A hipofosfatemia grave (< 0,75 mmol/L [< 2 mg/dL]), particu- As velocidades de infusão mostradas são calculadas para um indivíduo de 70 kg; os níveis séri-
larmente na vigência de uma depleção subjacente de fosfato, cos de cálcio e de fósforo devem ser medidos a cada 6 a 12 horas durante a terapia; as infusões
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
constitui uma anormalidade eletrolítica perigosa que deve ser podem ser repetidas para obter níveis séricos estáveis de fósforo > 0,8 mmol/L (> 2,5 mg/dL);
a maioria das formulações disponíveis nos Estados Unidos proporciona 3 mmol/mL de fosfato
corrigida de imediato. Lamentavelmente, o déficit cumulativo no
de sódio ou potássio.
fosfato corporal não pode ser previsto com facilidade a partir do
conhecimento do nível circulante de fosfato e a terapia deverá ser
abordada de forma empírica. O limiar para a terapia com fosfato ■■ HIPERFOSFATEMIA
IV e a dose administrada deve refletir uma análise da função re-
nal, da provável gravidade e da duração da depleção subjacente Causas
de fosfato, e da presença e intensidade dos sintomas consistentes Quando a carga filtrada de fosfato e a taxa de filtração glomerular
com aqueles de hipofosfatemia. Em adultos, o fosfato pode ser (TFG) são normais, o controle dos níveis séricos de fosfato é conse-
administrado com segurança por via IV como misturas neutras guido ajustando-se a velocidade com que o fosfato é reabsorvido pe-
de sais de fosfato de sódio e potássio nas doses iniciais de 0,2 a los cotransportadores tubulares proximais NaPi-2. Os principais re-
0,8 mmol/kg de fósforo elementar durante 6 horas (p. ex., 10 a 50 guladores hormonais da atividade de NaPi-2 são o PTH e o FGF23. A
mmol durante 6 horas), com doses > 20 mmol/6 h ficando reser- hiperfosfatemia, definida em adultos como uma concentração sérica
vadas para aqueles com níveis séricos < 0,5 mmol/L (1,5 mg/dL) em jejum de fosfato > 1,8 mmol/L (5,5 mg/dL), resulta habitualmente
e função renal normal. Uma abordagem sugerida é apresentada de uma filtração glomerular reduzida, hipoparatireoidismo, aporte
no Quadro 25.2. Os níveis séricos de fosfato e cálcio devem ser excessivo de fosfato para o LEC (a partir do osso, intestino ou por
monitorados atentamente (a cada 6 a 12 horas) ao longo de todo o terapia parenteral com fosfato), ou uma combinação desses fatores
tratamento. É necessário evitar um produto cálcio-fósforo sérico (Quadro 25.3). O limite superior das concentrações séricas normais
> 50 para reduzir o risco de calcificação heterotópica. A hipocal- de fosfato é mais alto em crianças e recém-nascidos [2,4 mmol/L (7
cemia, quando presente, deve ser corrigida antes de administrar o mg/dL)]. Seria útil distinguir a hiperfosfatemia causada por uma ex-
fosfato IV. Uma hipofosfatemia menos acentuada, na variação de creção renal reduzida de fosfato daquela que resulta do aporte exces-
0,5 a 0,8 mmol/L (1,5 a 2,5 mg/dL), em geral pode ser tratada com sivo de fosfato para o LEC (Quadro 25.3).
fosfato oral em doses fracionadas de 750 a 2.000 mg/dia, na forma Na insuficiência renal crônica, uma TFG reduzida resulta em
de fósforo elementar; as doses mais altas podem causar distensão retenção de fosfato. Por sua vez, a hiperfosfatemia prejudica ainda
abdominal e diarreia. mais a síntese renal de 1,25(OH)2D e estimula a secreção de PTH
O tratamento da hipofosfatemia crônica depende do conheci- e a hipertrofia, tanto direta quanto indiretamente (reduzindo os ní-
mento da(s) causa(s) do distúrbio. A hipofosfatemia relacionada veis sanguíneos de cálcio ionizado). Assim sendo, a hiperfosfatemia
com o hiperparatireoidismo secundário à deficiência de vitamina é uma das principais causas de hiperparatireoidismo secundário da
D costuma responder ao tratamento apenas com vitamina D e cál- insuficiência renal e deve ser corrigida precocemente durante a evo-
cio. RHLX, RHAD, OIT e distúrbios tubulares renais correlatos em lução da doença (Cap. 27).
geral são tratados com doses orais fracionadas de fosfato, na maio- O hipoparatireoidismo resulta em hiperfosfatemia em virtude da
ria das vezes com suplementos de cálcio e de 1,25(OH)2D, para maior expressão dos cotransportadores NaPi-2 no túbulo proximal.
contornar o bloqueio na síntese renal de 1,25(OH)2D e prevenir o O hipoparatireoidismo, ou supressão das paratireoides, comporta
hiperparatireoidismo secundário causado pela supressão dos ní- múltiplas causas potenciais, que incluem doença autoimune; ausên-
veis de cálcio no LEC. Diuréticos tiazídicos podem ser usados para cia de desenvolvimento, cirúrgica ou induzida por irradiação do te-
prevenir a nefrocalcinose nos pacientes tratados dessa maneira. A cido paratireóideo funcional; intoxicação pela vitamina D ou outras
normalização completa da hipofosfatemia em geral não é possível causas de hipercalcemia independente do PTH; resistência celular ao
nessas condições. O tratamento ideal da OIT é a exérese do tumor PTH (pseudo-hipoparatireoidismo ou hipomagnesemia); distúrbios
responsável, que pode ser localizado pelo levantamento esque- infiltrativos, como doença de Wilson e hemocromatose; e secreção
lético radiográfico ou por uma cintilografia óssea (muitos estão comprometida de PTH causada por hipermagnesemia, hipomagne-
localizados no osso) ou por uma cintilografia com radionuclídios semia grave ou mutações ativadoras no CaSR. A hipocalcemia pode
utilizando sestamibi ou octreotídeo marcado. O tratamento bem- contribuir também diretamente para uma depuração comprometida
-sucedido da hipofostatemia induzida por OIT com octreotídeo do fosfato, pois a infusão de cálcio pode induzir hiperfosfatúria nos
foi relatado em um pequeno número de pacientes. indivíduos hipoparatireóideos. A maior reabsorção tubular de fosfato
também ocorre na acromegalia, durante a administração de heparina
304
ciência renal, hiperpotassemia, hiperuricemia e acidose metabólica)
QUADRO 25.3 Causas de hiperfosfatemia e calcificações pulmonares ou cardíacas (incluindo a ocorrência de
bloqueio cardíaco agudo). A gravidade dessas complicações está re-
I. Comprometimento da excreção renal de fosfato
lacionada com a elevação dos níveis séricos de fosfato, que pode al-
A. Insuficiência renal cançar concentrações de até 7 mmol/L (20 mg/dL) nos casos de lesão
B. Hipoparatireoidismo maciça dos tecidos moles ou da síndrome de lise tumoral.
1. Do desenvolvimento
2. Autoimune
3. Após cirurgia ou radiação do pescoço TRATAMENTO Hiperfosfatemia
4. Mutações ativadoras do receptor sensor ao cálcio As opções terapêuticas para o tratamento da hiperfosfatemia gra-
C. Supressão das paratireoides ve são limitadas. A expansão volêmica pode acelerar a depuração
1. Hipercalcemia independente das paratireoides renal de fosfato. Os antiácidos que contêm hidróxido de alumínio
a. Intoxicação por vitamina D ou por vitamina A ou o sevalamer podem ser úteis como elementos de quelação e
CAPÍTULO 25
b. Sarcoidose, outras doenças granulomatosas
por limitarem a absorção dos sais de fosfato presentes no intesti-
no. A hemodiálise é a estratégia terapêutica mais efetiva e deve ser
c. Imobilização, metástases osteolíticas aventada precocemente durante a evolução da hiperfosfastemia
d. Síndrome leite‑álcali grave, em especial na vigência de insuficiência renal e hipocalce-
2. Hipermagnesemia ou hipomagnesemia grave mia sintomática.
D. Pseudo‑hipoparatireoidismo
E. Acromegalia
F. Calcinose tumoral METABOLISMO DO MAGNÉSIO
305
LEC para dentro das células, do osso ou do terceiro espaço (Qua- magnésio é agravada pela acidose metabólica, que acarreta também
dro 25.4). A deficiência dietética de magnésio é improvável, exceto perdas intracelulares.
possivelmente na vigência de alcoolismo. Foi descrito um distúrbio A hipomagnesemia devida aos desvios rápidos de magnésio do
genético raro que causa má absorção intestinal seletiva de magnésio LEC para o compartimento intracelular pode ocorrer durante a re-
(hipomagnesemia infantil primária). Outro distúrbio hereditário cuperação da cetoacidose diabética, inanição ou acidose respiratória.
raro (hipomagnesemia com hipocalcemia secundária) é causado Desvios menos agudos podem ser observados durante a formação
por mutações no gene que codifica a TRPM6, uma proteína que, rápida de osso após paratireoidectomia, com o tratamento da defi-
juntamente com a TRPM7, forma um canal importante para o ciência de vitamina D, ou com metástases osteoblásticas. Grandes
transporte tanto intestinal quanto renal do magnésio. Os estados quantidades de magnésio podem ser perdidas nos casos de pancrea-
de má absorção, acompanhados frequentemente por deficiência tite aguda, queimaduras extensas, transpiração prolongada e intensa
de vitamina D, podem limitar de forma acentuada a absorção de e durante a gestação e a lactação.
magnésio e causar hipomagnesemia, não obstante os efeitos com-
pensatórios do hiperparatireoidismo secundário e da hipocalcemia Achados clínicos e laboratoriais
e da hipomagnesemia que aceleram a reabsorção do magnésio pelo A hipomagnesemia pode causar alterações generalizadas na função
cTAL. A diarreia ou o líquido de uma drenagem cirúrgica podem
neuromuscular, incluindo tetania, tremores, crises convulsivas, fra-
SEÇÃO V
autossômica dominante com hipocalciúria) e um gene do DNA mi- eletrocardiográficas podem incluir intervalos PR ou QT prolonga-
tocondrial que codifica um tRNA mitocondrial. A expansão do LEC, dos, achatamento ou inversão da onda T e retificação de ST. A sensi-
a hipercalcemia e a depleção grave de fosfato podem prejudicar a bilidade para a toxicidade digitálica pode ser exacerbada.
reabsorção de magnésio, o mesmo podendo ocorrer com várias for- Outras anormalidades eletrolíticas observadas frequentemente
mas de lesão renal, incluindo aquelas causadas por medicamentos, com a hipomagnesemia, incluindo hipocalcemia (com hipocalciúria)
tais como cisplatina, ciclosporina, aminoglicosídios e pentamidina, e hipopotassemia, podem não ser corrigidas facilmente se não for
bem como o anticorpo inibidor do receptor de EGF, o cetuximab realizada também a administração concomitante de magnésio. A hi-
(Quadro 25.4). Uma concentração sanguínea em elevação de etanol pocalcemia pode ser o resultado de uma deficiência concomitante de
prejudica diretamente a reabsorção tubular de magnésio, e a glicosú- vitamina D, embora a hipomagnesemia possa causar menor síntese
ria persistente com diurese osmótica resulta em perda de magnésio de 1,25(OH)2D, resistência celular ao PTH e, com um magnésio séri-
e provavelmente contribui para a alta frequência de hipomagnese- co muito baixo (< 0,4 mmol/L [< 0,8 mEq/L; < 1 mg/dL]), um defeito
mia em pacientes diabéticos sob controle precário. A depleção de na secreção de PTH; tais anormalidades são reversíveis com a terapia.
306
TRATAMENTO Hipomagnesemia QUADRO 25.5 Causas de hipermagnesemia
A hipomagnesemia assintomática leve pode ser tratada com a ad- I. Aporte de magnésio excessivo
ministração oral de sais de magnésio [MgCl2, MgO, Mg(OH)2] A. Catárticos, irrigantes urológicos
em doses fracionadas até um total de 20 a 30 mmol/dia (40 a 60 B. Administração parenteral de magnésio
mEq/dia). A diarreia pode ocorrer com doses mais altas. Uma
II. Mobilização rápida dos tecidos moles
hipomagnesemia mais acentuada deve ser tratada pela via paren-
teral, de preferência com MgCl2 IV, que pode ser administrado A. Traumatismo, choque, sepse
com segurança como uma infusão contínua de 50 mmol/dia (100 B. Parada cardíaca
mEq de Mg2+/dia) se a função renal for normal. Se houver uma C. Queimaduras
redução da TFG, a velocidade da infusão deve ser reduzida em 50 III. Comprometimento da excreção de magnésio
a 75%. O uso de MgSO4 IM deve ser desencorajado; as injeções
A. Insuficiência renal
são extremamente dolorosas e proporcionam uma quantidade re-
lativamente pequena de magnésio (2 mL de MgSO4 a 50% fornece B. Hipercalcemia hipocalciúrica familiar
CAPÍTULO 25
apenas 4 mmol). O MgSO4 pode ser administrado na veia para IV. Outras
substituir o MgCl2, apesar de os ânions sulfato poderem ligar-se A. Insuficiência suprarrenal
ao cálcio no soro e na urina e agravar a hipocalcemia. O magnésio B. Hipotireoidismo
sérico deve ser monitorado a intervalos de 12 a 24 horas durante a
C. Hipotermia
terapia, que poderá prosseguir por vários dias em virtude da con-
servação renal comprometida do magnésio (apenas 50 a 70% da V. Aporte excessivo de magnésio
dose diária IV de magnésio são retidos) e da repleção retardada A. Catárticos, irrigantes urológicos
dos déficits intracelulares, que podem ser de até 1 a 1,5 mmol/kg B. Administração parenteral de magnésio
(2 a 3 mEq/kg).
■■ HIPERMAGNESEMIA
Causas bloqueio cardíaco; e, com níveis séricos de magnésio que se aproxi-
mem de 10 mmol/L, assistolia.
A hipermagnesemia é raramente observada na ausência de insu-
A hipermagnesemia, agindo através do CaSR, causa hipocalce-
ficiência renal, pois os rins normais conseguem excretar grandes
mia e hipercalciúria em virtude tanto da supressão das paratireoides
quantidades (250 mmol/dia) de magnésio. A hipermagnesemia leve
quanto da menor reabsorção de cálcio pelo cTAL.
devida à absorção excessiva no cTAL ocorre com mutações nos re-
ceptores sensíveis ao cálcio na hipercalcemia hipocalciúrica familiar
e foi descrita em alguns pacientes com insuficiência suprarrenal,
VITAMINA D
hipotireoidismo ou hipotermia. A exposição maciça ao magnésio ■■ SÍNTESE E METABOLISMO
exógeno, habitualmente pelo trato gastrintestinal, podem sobrepu- A 1,25-diidroxivitamina D [1,25(OH)2D] é o principal hormônio es-
jar a capacidade de excreção renal e causar uma hipermagnesemia teroide envolvido na regulação da homeostase mineral. A vitamina
ameaçadora (Quadro 25.5). Um exemplo notável disso é a retenção D e seus metabólitos são mais hormônios e precursores hormonais
prolongada de quantidades até mesmo normais de catárticos que que vitaminas, pois no ambiente biológico apropriado podem ser
contêm magnésio nos pacientes com íleo intestinal, obstrução ou sintetizados por mecanismos endógenos (Fig. 25.4). Em resposta à
perfuração. A lesão ou necrose extensa dos tecidos moles também radiação ultravioleta da pele, uma clivagem fotoquímica resulta na
pode lançar grandes quantidades de magnésio no LEC em pacientes formação de vitamina D a partir de 7-dehidrocolesterol. A produção
que sofreram traumatismo, choque, sepse, parada cardíaca ou quei- cutânea de vitamina D é reduzida pela melanina e pelos altos blo-
maduras extensas. queios solares produzidos por fatores de proteção, que dificultam efe-
tivamente a penetração da pele pela luz ultravioleta. A maior utiliza-
Achados clínicos e laboratoriais ção de bloqueios solares na América do Norte e na Europa Ocidental,
As manifestações clínicas mais proeminentes da hipermagnesemia e uma redução na magnitude da exposição solar por parte da popula-
são vasodilatação e bloqueio neuromuscular, que podem aparecer ção geral durante as últimas décadas resultaram em maior dependên-
com concentrações séricas de magnésio > 2 mmol/L (> 4 mEq/L; cia das fontes dietéticas de vitamina D. Nos EUA e no Canadá, essas
> 4,8 mg/dL). A hipotensão, que é refratária aos vasopressores ou fontes consistem essencialmente em cereais e produtos lácteos enri-
à expansão volêmica, pode ser um sinal precoce. Náuseas, letargia quecidos, além de óleos de peixe e gemas de ovo. A vitamina D pro-
e fraqueza podem progredir para insuficiência respiratória, parali- veniente de fontes vegetais existe na forma de vitamina D2, enquanto
sia e coma, com reflexos tendinosos hipoativos e níveis séricos de aquela proveniente de fontes animais existe como vitamina D3. Es-
magnésio > 4 mmol/L. Outros achados podem incluir hipomobili- sas duas formas possuem uma atividade biológica equivalente e são
dade gastrintestinal ou íleo paralítico; rubor facial; dilatação pupilar, ativadas igualmente bem pelas hidroxilases da vitamina D em seres
bradicardia paradoxal; prolongamento dos intervalos PR, QRS e QT; humanos. A vitamina D penetra na circulação, independentemente
307
teína carreadora da vitamina D são reduzidos, como pode ocorrer
TRATAMENTO Hipermagnesemia com as maiores perdas urinárias na síndrome nefrótica.
A segunda hidroxilação, necessária para a formação do hormô-
O tratamento bem-sucedido da hipermagnesemia em geral envol- nio maduro, ocorre no rim (Fig. 25.5). A 25-hidroxivitamina-D-1-
ve a identificação e a interrupção da fonte de magnésio e a utiliza- hidroxilase é uma oxidase de função mista semelhante ao citocromo
ção de medidas destinadas a aumentar a depuração do magnésio P450 rigidamente regulada que se expressa nas células do túbulo con-
a partir do LEC. A utilização de catárticos ou enemas isentos de torcido proximal do rim. O PTH e a hipofosfatemia são os principais
magnésio pode ajudar a eliminar do trato gastrintestinal o mag- indutores dessa enzima microssomal, enquanto o cálcio, o FGF23 e o
nésio ingerido. A hidratação IV vigorosa deve ser tentada, se for produto da enzima, 1,25(OH)2D, a reprimem. A 25-hidroxivitamina
apropriada. A hemodiálise é efetiva e poderá ser necessária nos
D-1-hidroxilase está presente também nos queratinócitos epidér-
pacientes com insuficiência renal significativa. O cálcio, adminis-
micos, porém a produção de 1,25(OH)2D pelos queratinócitos não
trado por via IV em doses de 100 a 200 mg durante 1 a 2 horas,
é considerada contribuinte para os níveis circulantes desse hormô-
se revelou capaz de proporcionar melhora temporária nos sinais e
nio. Além de estar presente na camada trofoblástica da placenta, a
sintomas de hipermagnesemia.
1-hidroxilase é produzida pelos macrófagos associados a granulo-
mas e linfomas. Nestes estados patológicos, a atividade da enzima é
SEÇÃO V
AÇÕES DA 1,25(OH)2D
A 1,25(OH)2D medeia seus efeitos biológicos ligando-se a um mem-
bro da superfamília de receptores nucleares, o receptor da vitamina
D (VDR). Este receptor pertence à subfamília que inclui os receptores
dos hormônios tireoidianos, os receptores retinoides e os receptores
Pele Intestino ativados pelo proliferador de peroxissomo; no entanto, ao contrá-
7-Desidrocolesterol rio dos outros membros dessa subfamília, apenas uma isoforma do
VDR foi isolada. O VDR se liga às sequências alvo do DNA como
um heterodímero com o receptor X retinoide, recrutando uma série
Vitamina D de coativadores que modificam a cromatina e aproximam o VDR do
aparelho transcricional basal, resultando na indução da expressão do
gene-alvo. O mecanismo da repressão transcricional pelo VDR va-
ria com os diferentes genes-alvo, mas mostrou-se que envolve seja a
interferência com a ação de fatores ativadores da transcrição, seja o
recrutamento de novas proteínas para o complexo VDR, resultando
Fígado
em repressão transcricional.
A afinidade do VDR por 1,25(OH)2D é aproximadamente três
25(OH)D
ordens de magnitude mais alta que aquela para outros metabólitos
da vitamina D. Em circunstâncias fisiológicas normais, esses outros
metabólitos não são considerados capazes de estimular as ações que
dependem do receptor. Entretanto, nos estados de toxicidade da vita-
mina D, níveis extremamente elevados de 25(OH)D podem resultar
em hipercalcemia por interagirem diretamente com o VDR e deslo-
carem a 1,25(OH)2D da proteína carreadora da vitamina D, resultan-
Rim do em maior biodisponibilidade do hormônio ativo.
O VDR se expressa em uma ampla variedade de células e teci-
dos. As ações moleculares da 1,25(OH)2D foram estudadas mais ex-
tensamente nos tecidos que participam na regulação da homeostase
1,25(OH)2D
mineral. Esse hormônio é o principal indutor de calbindina 9K, uma
Figura 25.4 Síntese e ativação da vitamina D. A vitamina D é sintetizada na proteína ligadora do cálcio que se expressa no intestino, e considera-
pele em resposta à radiação ultravioleta e também é absorvida a partir da dieta. da como desempenhando um papel importante no transporte ativo
A seguir, é transportada até o fígado, onde sofre 25-hidroxilação. Esse metabólito do cálcio através do enterócito. Os dois principais transportadores de
constitui a principal forma circulante de vitamina D. A etapa final na ativação do cálcio expressos pelo epitélio intestinal, TRPV5 e TRPV6 (vaniloide
hormônio, a 1-hidroxilação, ocorre no rim. com potencial de receptor transitório), também respondem à vitami-
308
Vitamina D3 importante da base lógica para as atuais terapias destinadas a preve-
nir e tratar o hiperparatireoidismo associado à insuficiência renal.
O VDR se expressa também em tecidos e órgãos que não desem-
Vitamina D- penham qualquer papel na homeostase iônica mineral. A esse res-
25 hidroxilase peito é digna de nota a observação de que a 1,25(OH)2D exerce um
efeito antiproliferativo sobre vários tipos de células, incluindo quera-
tinócitos, células do câncer de mama e células do câncer de prósta-
ta. Os efeitos de 1,25(OH)2D e do VDR sobre os queratinócitos são
particularmente intrigantes. A alopecia é observada em seres huma-
– nos e camundongos com VDR mutantes, porém não constitui uma
Fígado
característica da deficiência de vitamina D; assim sendo, os efeitos do
25(OH)D3
VDR sobre o folículo piloso independem do ligante.
DEFICIÊNCIA DE VITAMINA D
CAPÍTULO 25
25(OH)D-
Pi e A preocupação crescente acerca da relação entre exposição solar e o
1α-hidroxilase
outros fatores desenvolvimento de câncer da pele deu origem a uma dependência
maior das fontes dietéticas de vitamina D. A prevalência de deficiên-
Rim – cia de vitamina D varia, porém o terceiro National Health and Nutri-
–/+
tion Examination Survey (NHANES III) revelou que a deficiência de
vitamina D é prevalente em todo o território dos EUA. A síndrome
D3 1,25(OH)2D3 clínica de deficiência da vitamina D pode ser o resultado de uma pro-
H)
2
5(O
-H
PO
lci
2
–
aç
o PO
4
função mista do citocromo P450 hepático, como barbitúricos, feni-
ã
2+ -H
Ca toína e rifampicina. A 25-hidroxilação inadequada, associada a uma
Cálcio doença hepática grave ou à administração de isoniazida, constitui
sanguíneo
uma causa incomum de deficiência de vitamina D. Foi identificada
Figura 25.5 Representação esquemática da alça de controle hormonal uma mutação no gene responsável pela 25-hidroxilação em uma fa-
para o metabolismo e a função da vitamina D. Uma redução no cálcio sérico mília. A 1-hidroxilação prejudicada é prevalente na população com
abaixo de cerca de 2,2 mmol/L (8,8 mg/dL) leva a um aumento proporcional na disfunção renal profunda, em virtude de um aumento nos níveis cir-
secreção do paratormônio (PTH) e, dessa forma, mobiliza uma quantidade adicional culantes de FGF23 e redução na massa renal funcional. Assim sendo,
de cálcio a partir do osso. O PTH promove a síntese de 1,25(OH)2D no rim, o que, por as intervenções terapêuticas devem ser aventadas nos pacientes cuja
sua vez, estimula a mobilização do cálcio do osso e do intestino e regula a síntese de depuração da creatinina for < 0,5 mL/s (30 mL/min). As mutações
PTH por retroalimentação negativa. na 1-hidroxilase renal constituem a base para o distúrbio genéti-
co, o raquitismo pseudo-deficiente em vitamina D. Esse distúrbio
autossômico recessivo se manifesta com a síndrome de deficiência
na D. Por induzir a expressão desses e de outros genes no intestino de vitamina D no primeiro ano de vida. Os pacientes se apresentam
delgado, a 1,25(OH)2D aumenta a eficiência da absorção intestinal com atraso do crescimento, raquitismo e convulsões hipocalcêmicas.
do cálcio, e foi também constatado que ela exerce várias ações impor- Os níveis séricos de 1,25(OH)2D são baixos, apesar de níveis normais
tantes no esqueleto. O VDR se expressa nos osteoblastos e regula a de 25(OH)D e elevados de PTH. O tratamento com metabólitos da
expressão de vários genes nessa célula. Esses genes incluem as proteí- vitamina D que não exigem 1-hidroxilação resulta em remissão da
nas da matriz óssea, osteocalcina e osteopontina, que sofrem uma re- doença, embora seja necessária uma terapia vitalícia. Um segundo
gulação ascendente por parte de 1,25(OH)2D, além do colágeno tipo distúrbio autossômico recessivo, o raquitismo hereditário resistente à
I, que sofre uma repressão transcricional por parte de 1,25(OH)2D. vitamina D, uma consequência de mutações no receptor da vitamina
Tanto a 1,25(OH)2D quanto o PTH induzem a expressão do ligante D, constitui um maior desafio terapêutico. Esses pacientes se apre-
do RANK, que promove a diferenciação dos osteoclastos e aumenta sentam de maneira semelhante durante o primeiro ano de vida, po-
sua atividade, por se ligar ao RANK nos progenitores dos osteoclas- rém a alopecia acompanha com frequência esse distúrbio, demons-
tos, assim como nas formas maduras dessas células. Esse é o meca- trando um papel funcional do VDR na regeneração pós-natal dos
nismo pelo qual 1,25(OH)2D induz a reabsorção óssea. Entretanto, cabelos (pelos). Os níveis séricos de 1,25(OH)2D estão drasticamente
as características esqueléticas associadas a os camundongos VDR- elevados nesses indivíduos, tanto em virtude de uma produção maior
-knockout (raquitismo, osteomalacia) são essencialmente corrigidas devida ao estímulo da atividade de 1a-hidroxilase quanto como con-
ao aumentar a ingestão de cálcio e de fósforo, o que realça a impor- sequência do hiperparatireoidismo secundário e por causa da inati-
tância da ação da vitamina D no intestino. vação prejudicada, pois a indução da 24-hidroxilase por 1,25(OH)2D
O VDR se expressa na paratireoide e mostrou-se que a requer um VDR intacto. Levando-se em conta que a mutação do re-
1,25(OH)2D exerce efeitos antiproliferativos sobre as células para- ceptor resulta em resistência ao hormônio, infusões diárias de cálcio
tireóideas e suprime a transcrição do gene do paratormônio. Esses e fósforo poderão ser necessárias para contornar o defeito na absor-
efeitos da 1,25(OH)2D sobre a paratireoide representam uma parte ção intestinal de íons minerais.
309
Mostrou-se que a suplementação com vitamina D e cálcio reduz a
QUADRO 25.6 Causas do comprometimento da ação da incidência de fraturas do quadril entre os residentes das clínicas de
vitamina D repouso na França que deambulam, sugerindo que a mineralização
inadequada do osso contribui de maneira significativa para a mor-
Deficiência de vitamina D Comprometimento da 1‑hidroxilação bidade nos idosos. A miopatia proximal é uma característica mar-
Comprometimento da Hipoparatireoidismo cante da deficiência grave de vitamina D, tanto em crianças quanto
produção cutânea em adultos. A resolução rápida da miopatia é observada após o trata-
Ausência dietética Insuficiência renal mento com vitamina D.
Má absorção Cetoconazol A deficiência de vitamina D é a causa mais comum de raquitismo
Perda acelerada de vitamina D Mutação da 1‑hidroxilase e osteomalacia, porém muitos distúrbios podem resultar em minera-
lização inadequada da placa de crescimento e do osso. A deficiência
Aumento do metabolismo Osteomalacia oncogênica
(barbitúricos, fenitoína, de cálcio sem deficiência de vitamina D, os distúrbios do metabolis-
Raquitismo hipofosfatêmico ligado
rifampicina) mo da vitamina D abordados previamente e a hipofosfatemia podem
ao X
todos resultar em mineralização ineficiente. Até mesmo na presença
Comprometimento da Resistência dos órgãos‑alvo
circulação êntero‑hepática de níveis normais de cálcio e fosfato, a acidose crônica e medica-
SEÇÃO V
vitamina D representam essencialmente uma consequência da me- na vigência de níveis normais de cálcio e de fosfato.
nor absorção intestinal de cálcio. Uma deficiência leve a moderada
de vitamina D é assintomática, enquanto uma deficiência mais pro- Diagnóstico de deficiência de vitamina D, raquitismo
longada dessa vitamina resulta em hipocalcemia acompanhada por e osteomalacia
hiperparatireoidismo secundário, mineralização óssea prejudicada O teste de triagem mais específico para detectar deficiência de vita-
(osteopenia no exame radiográfico ou densidade mineral óssea re- mina D em indivíduos sadios nos demais aspectos é o nível sérico
duzida), e miopatia proximal. Foi também constatada a associação de 25(OH)D. Apesar de uma variação das faixas normais, níveis de
da deficiência de vitamina D a um aumento nas taxas globais de 25(OH)D < 37 nmol/L (< 15 ng/mL) estão associados a níveis cada
mortalidade, incluindo por causas cardiovasculares. Na ausência de vez mais altos de PTH e a uma densidade óssea mais baixa. Os níveis
uma enfermidade intercorrente, a hipocalcemia associada a uma de- ideais de vitamina D são > 80 nmol/L (> 32 ng/mL).
ficiência prolongada de vitamina D só raramente se manifesta com A deficiência de vitamina D é responsável por menor absorção
sintomas agudos de hipocalcemia, como dormência, formigamentos intestinal de cálcio, resultando em reduções nos valores séricos de
e crises convulsivas. Entretanto, o desenvolvimento concomitante de cálcio total e ionizado. Essa hipocalcemia resulta em hiperparatireoi-
hipomagnesemia, que afeta a função das paratireoides, ou a adminis- dismo secundário, uma resposta homeostática que inicialmente serve
tração de bisfosfonatos potentes, que retardam a reabsorção óssea, para manter os níveis séricos de cálcio a expensas do esqueleto. Por
pode dar origem a uma hipocalcemia sintomática aguda nos indiví- causa do aumento do remodelamento ósseo induzido pelo PTH, os
duos com deficiência de vitamina D. níveis de fosfatase alcalina aumentam com bastante frequência. Além
de aumentar a reabsorção óssea, o PTH reduz a excreção urinária de
Raquitismo e osteomalacia cálcio, ao mesmo tempo que promove a fosfatúria, resultando em hi-
Nas crianças, antes da fusão epifisária, a deficiência de vitamina D pofosfatemia, que exacerba o defeito de mineralização no esqueleto.
resulta em atraso do crescimento associado a uma expansão da placa Com a deficiência prolongada de vitamina D resultando em osteo-
de crescimento conhecida como raquitismo. Três camadas de con- malacia, as reservas de cálcio no esqueleto tornam-se relativamente
drócitos estão presentes na placa de crescimento normal: a zona de inacessíveis, pois os osteoclastos não conseguem reabsorver o osteoi-
reserva, a zona de proliferação e a zona hipertrófica. O raquitismo de não mineralizado e instala-se uma hipocalcemia franca. Sabendo-
associado a uma ação deficiente da vitamina D caracteriza-se por ex- -se que o PTH constitui o principal estímulo para a 1-hidroxilase
pansão da camada de condrócitos hipertróficos. A proliferação e a da 25(OH)D renal, observa-se maior síntese do hormônio ativo,
diferenciação dos condrócitos na placa de crescimento raquítica são 1,25(OH)2D. Paradoxalmente, os níveis desse hormônio são normais
normais, e a expansão da placa de crescimento constitui uma con- com bastante frequência na deficiência grave de vitamina D. Portan-
sequência da apoptose comprometida dos condrócitos hipertróficos to, as mensurações de 1,25(OH)2D não constituem reflexos exatos
tardios, evento que precede a substituição dessas células por osteo- das reservas de vitamina D e não devem ser usados para diagnosticar
blastos durante a formação de osso endocondral. As pesquisas rea- a deficiência dessa vitamina nos pacientes com função renal normal.
lizadas em modelos murinos demonstram que a hipofosfatemia, que As características radiológicas da deficiência de vitamina D em
na deficiência de vitamina D representa uma consequência do hi- crianças incluem uma placa de crescimento alargada e dilatada, típi-
perparatireoidismo secundário, é um fator etiológico primordial no ca do raquitismo. Esses achados não apenas são evidentes nos ossos
desenvolvimento da placa de crescimento raquítica. longos, mas também estão presentes na junção costocondral, onde a
A hipocalcemia e a hipofosfatemia que acompanham a defi- expansão da placa de crescimento dá origem a uma tumefação co-
ciência de vitamina D resultam em mineralização prejudicada das nhecida como “rosário raquítico.” A deterioração da mineralização
proteínas da matriz óssea, condição conhecida como osteomalacia. A do osso intramembranoso induz um atraso na fusão das suturas dos
osteomalacia também é uma característica clínica da hipofosfatemia ossos da calota craniana, assim como redução da radiopacidade do
de longa duração, que pode ser uma consequência da perda renal de osso cortical nos ossos longos. Se a deficiência de vitamina D ocor-
fosfato ou do uso crônico de etidronato ou de antiácidos que fixam rer após a fusão epifisária, o principal achado radiológico será uma
o fosfato. Essa matriz hipomineralizada é biomecanicamente infe- diminuição na espessura cortical e na radiotransparência relativa do
rior ao osso normal. Como resultado, os pacientes com deficiência esqueleto. Uma característica radiológica específica da osteomalacia
de vitamina D estão propensos ao arqueamento dos membros res- que pode estar associada ao desgaste do fosfato ou a uma deficiên-
ponsáveis pela sustentação do peso corporal e a fraturas esqueléticas. cia de vitamina D, é representada pelas pseudofraturas, ou zonas de
310
Looser. Essas linhas radiotransparentes que ocorrem onde as grandes
12 semanas), seguida por terapia de manutenção (800 UI diaria-
artérias estão em contato com os elementos esqueléticos subjacentes;
mente). As doses farmacológicas poderão ser necessárias para a
admite-se que as pulsações arteriais dão origem a essas radiotrans-
terapia de manutenção nos pacientes que estejam tomando certas
parências. Como resultado, em geral essas pseudofraturas possuem medicações, como barbitúricos ou fenitoína, que aceleram o meta-
poucos milímetros de largura, têm vários centímetros de compri- bolismo de 1,25(OH)2D ou causam resistência a ela. A suplemen-
mento e são observadas particularmente na escápula, na pelve e no tação com cálcio deveria incluir 1,5 a 2 g/dia de cálcio elementar.
colo do fêmur. A normocalcemia é observada habitualmente até uma semana
após a instituição da terapia, apesar de os aumentos nos níveis de
PTH e de fosfatase alcalina poderem persistir por três a seis meses.
TRATAMENTO Deficiência de vitamina D Os métodos mais eficazes para monitorar o tratamento e a reso-
lução da deficiência de vitamina D são as mensurações séricas e
A ingestão diária de um polivitamínico (400 UI) costuma ser su- urinárias de cálcio. Nos pacientes cuja vitamina D já foi reposta e
ficiente para prevenir a deficiência de vitamina D. Com base na estejam tomando suplementação adequada de cálcio, a excreção
observação de que 800 UI de vitamina D, além da suplementação urinária de cálcio durante 24 horas deve ficar na faixa de 100 a 250
CAPÍTULO 25
com cálcio, reduzem o risco de fraturas do quadril em mulheres mg/24 horas. Níveis mais baixos sugerem problemas com a adesão
idosas, passou-se a admitir que essa dose mais alta constitui uma ao esquema de tratamento ou com a absorção dos suplementos de
ingestão diária apropriada para a prevenção da deficiência de vi- cálcio ou de vitamina D. Níveis > 250 mg/24 horas predispõem a
tamina D em adultos. A margem de segurança para vitamina D é nefrolitíase e devem induzir-nos a realizar uma redução na poso-
grande, e a toxicidade da vitamina D costuma ser observada ape- logia da vitamina D e/ou na suplementação de cálcio.
nas nos pacientes que tomam doses na variação de 40.000 UI dia-
riamente. O tratamento da deficiência de vitamina D deveria ser
dirigido ao distúrbio subjacente, se possível, e ajustado também à
gravidade dessa condição. A vitamina D deve ser sempre admi- BIBLIOGRAFIA
311
CAPÍTULO 26 HIPERCALCEMIA
■■ ETIOLOGIA
As causas da hipercalcemia podem ser entendidas e classificadas com
Hipercalcemia e base nos desequilíbrios dos mecanismos de retroalimentação normais
que regulam o cálcio sérico (Quadro 26.1). A produção excessiva de
Hipocalcemia PTH, que não é apropriadamente suprimido pela elevação das con-
centrações do cálcio sérico, ocorre em distúrbios neoplásicos primá-
rios das glândulas paratireoides (adenoma, hiperplasia ou, raramente,
Sundeep Khosla carcinoma das paratireoides), que estão associados a um aumento da
massa das células paratireoides e comprometimento da inibição pelo
O íon cálcio desempenha um papel fundamental na função e sinali- cálcio por meio de retroalimentação. A secreção inadequada do PTH,
zação celulares normais, regulando diversos processos fisiológicos, com relação ao nível vigente de cálcio sérico, também ocorre na pre-
como a transmissão neuromuscular, a contratilidade cardíaca, a se- sença de mutações inativadoras heterozigotas do receptor sensor de
SEÇÃO V
creção hormonal e a coagulação sanguínea. Por essa razão, as con- cálcio (CaSR), que dificultam a detecção do cálcio extracelular pe-
centrações do cálcio extracelular são mantidas dentro de uma faixa las glândulas paratireoides e pelos rins, resultando em hipercalcemia
extremamente estreita por meio de uma série de mecanismos de re- hipocalciúrica familiar (HHF). Embora a secreção do PTH por tu-
troalimentação que envolvem o paratormônio (PTH) e o metabólito mores seja extremamente rara, muitos tumores sólidos secretam um
ativo da vitamina D, conhecido como 1,25-diidroxivitamina D [1,25 peptídio relacionado com o PTH (PTHrP), que compartilha uma ho-
(OH)2D]. Esses mecanismos de retroalimentação são coordenados mologia com o PTH em seus primeiros 13 aminoácidos e que se liga
por meio de sinais integrativos entre as glândulas paratireoides, os ao receptor do PTH, reproduzindo, assim, os efeitos deste hormônio
rins, o intestino e os ossos (Fig. 26.1; Cap. 25). nos ossos e rins. Na hipercalcemia mediada pelo PTHrP associada a
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
Os distúrbios da concentração sérica do cálcio são relativa- neoplasias malignas, os níveis do PTH são suprimidos pelos níveis
mente comuns e, em geral, constituem indícios de alguma doença séricos elevados do cálcio. A hipercalcemia associada à doença granu-
subjacente. Este capítulo apresenta um resumo da avaliação dos pa- lomatosa (p. ex., sarcoidose) ou aos linfomas é causada pelo aumento
cientes com alterações do cálcio sérico. Ver descrição detalhada no da conversão da 25 (OH)D em seu derivado potente 1,25 (OH)2D.
Capítulo 27. Nesses distúrbios, a 1,25 (OH)2D aumenta a absorção intestinal do
cálcio, resultando em hipercalcemia e supressão do PTH. Os distúr-
bios que aumentam diretamente a mobilização do cálcio ósseo, como
o hipertireoidismo e as metástases osteolíticas, também causam hi-
percalcemia com secreção suprimida do PTH, do mesmo modo que
a sobrecarga de cálcio exógeno (p. ex., síndrome do leite-álcali) ou
a nutrição parenteral total com suplementação exagerada de cálcio.
312
■■ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS TRATAMENTO Hipercalcemia
Em geral, a hipercalcemia branda (até 11 a 11,5 mg/dL) é assinto-
mática, sendo detectada apenas pelas dosagens rotineiras do cálcio. A hipercalcemia branda assintomática não exige tratamento ime-
Alguns pacientes podem apresentar sintomas neuropsiquiátricos diato, devendo a abordagem terapêutica ser voltada para o diag-
mal definidos, inclusive dificuldade de concentração, alterações da nóstico subjacente. Por outro lado, a hipercalcemia significativa
personalidade ou depressão. Outros sinais e sintomas por ocasião da sintomática geralmente requer intervenção terapêutica indepen-
apresentação podem ser atribuídos à doença ulcerosa péptica ou ne- dentemente da causa da elevação do cálcio sérico. O tratamento
frolitíase, e o risco de fratura também pode ser maior. A hipercalce- inicial da hipercalcemia significativa começa com a expansão de
mia mais grave (> 12 a 13 mg/dL), principalmente se tiver progressão volume, visto que a hipercalcemia sempre leva à desidratação; nas
rápida, pode causar letargia, estupor ou coma, além de sinais e sinto- primeiras 24 h, podem ser necessários 4 a 6 L de soro fisiológico
mas gastrintestinais (náuseas, anorexia, constiplação ou pancreatite). intravenoso, tendo em mente que as comorbidades associadas (p.
A hipercalcemia reduz a capacidade de concentração renal e pode ex., insuficiência cardíaca congestiva) podem exigir a utilização
causar poliúria bem como polidipsia. No hiperparatireoidismo crô- de diuréticos de alça para aumentar a excreção de sódio e cálcio.
nico, os pacientes podem ter dor óssea ou fraturas patológicas. Por Entretanto, os diuréticos de alça não devem ser iniciados antes
Capítulo 26
fim, a hipercalcemia pode causar anormalidades eletrocardiográficas que o volume tenha sido normalizado. Se houver a mobilização
significativas, inclusive bradicardia, bloqueio AV e redução do inter- aumentada do cálcio ósseo (como ocorre no câncer ou no hiper-
valo QT; as alterações do cálcio sérico podem ser monitoradas pelo paratireoidismo grave), os fármacos que inibem a reabsorção ós-
acompanhamento do intervalo QT. sea deverão ser considerados. O ácido zoledrônico (p. ex., 4 mg
IV em ~30 min), pamidronato (p. ex., 60-90 mg IV em 2 a 4 h) e
■■ ABORDAGEM DIAGNÓSTICA etidronato (p. ex., 7,5 mg/kg/dia durante 3-7 dias consecutivos)
A primeira etapa da abordagem diagnóstica da hiper ou hipocalce- foram aprovados pelo U.S. Food and Drug Administration para o
mia é confirmar que a alteração dos níveis séricos do cálcio não é tratamento da hipercalcemia associada às neoplasias malignas do
secundária às concentrações anormais de albumina. Cerca de 50% adulto. O início da ação ocorre em 1-3 dias, e 60-90% dos pacien-
Hipercalcemia e Hipocalcemia
do cálcio total estão ionizados, e o restante encontra-se ligado à al- tes normalizam os níveis séricos de cálcio. As infusões de bifosfo-
bumina. Embora as determinações diretas do cálcio ionizado sejam natos poderão precisar ser repetidas se a hipercalcemia recidivar.
exeqüíveis, são facilmente influenciadas pelos métodos de coleta e Em vista de sua eficácia, os bifosfonatos substituíram a calcitoni-
na ou plicamicina, raramente utilizadas na prática corrente para o
por outros artefatos; por esta razão, geralmente é preferível dosar o
tratamento da hipercalcemia. Em casos raros, pode ser necessário
cálcio total e a albumina para “corrigir” o cálcio sérico. Quando as
fazer diálise. Por fim, embora o fosfato intravenoso faça a quela-
concentrações séricas de albumina estão reduzidas, o nível corrigido
ção do cálcio e diminua seus níveis séricos, este tratamento pode
do cálcio deve ser calculado somando 0,2 mM (0,8 mg/dL) ao valor
ser tóxico porque os complexos cálcio-fosfato podem depositar-se
do cálcio total para cada decréscimo de 1,0 g/dL na albumina sérica
nos tecidos e causar lesões graves nos órgãos.
abaixo do valor de referência 4,1 g/dL da albumina, ou em sentido
Nos pacientes com hipercalcemia mediada pela 1,25 (OH)2D,
inverso se houver a elevação do nível sérico da albumina.
os glicocorticoides são a opção terapêutica preferida porque dimi-
A história detalhada pode fornecer indícios importantes quanto
nuem a síntese desta vitamina. O fármaco utilizado mais comu-
à etiologia da hipercalcemia (Quadro 26.1). Na maioria dos casos, a mente é a hidrocortisona intravenosa (100-300 mg/dia) ou pred-
hipercalcemia crônica é causada pelo hiperparatireoidismo primá- nisona oral (40-60 mg/dia) durante 3 a 7 dias. Outros fármacos,
rio, enquanto a segunda causa mais comum é uma neoplasia maligna como o cetoconazol, cloroquina e hidroxicloroquina, também
subjacente. A anamnese deve incluir os fármacos utilizados, história podem reduzir a síntese da 1,25 (OH)2D, sendo utilizados oca-
de cirurgia do pescoço assim como sinais e sintomas sistêmicos su- sionalmente.
gestivos de sarcoidose ou linfoma.
Uma vez estabelecida a presença de hipercalcemia verdadeira, o
segundo exame laboratorial mais importante para a investigação diag-
nóstica é a dosagem do PTH por um two-site assay para o hormô- clínica combinada com os exames laboratoriais geralmente estabelece
nio completo. Em geral, as elevações do PTH são acompanhadas de o diagnóstico dos vários distúrbios relacionados no Quadro 26.1.
hipofosfatemia. Além disso, a creatinina sérica deve ser dosada para
avaliar a função renal, porque a hipercalcemia pode comprometer a HIPOCALCEMIA
função renal, e a depuração renal do PTH pode se mostrar alterada,
dependendo dos fragmentos detectados pelo ensaio. Se o nível do ■■ ETIOLOGIA
PTH estiver elevado (ou “inapropriadamente normal”) em um pa- As causas da hipocalcemia podem ser diferenciadas com base na pre-
ciente com cálcio elevado e fósforo baixo, o diagnóstico quase sempre sença de níveis séricos baixos (hipoparatireoidismo) ou altos (hiper-
será de hiperparatireoidismo primário. Como os pacientes com hiper- paratireoidismo secundário) do PTH. Embora existam muitas causas
calcemia hipocalciúrica familiar (HHF) também podem apresentar possíveis da hipocalcemia, a síntese reduzida do PTH ou a da vitami-
elevações discretas do PTH e hipercalcemia, esse diagnóstico deve ser na D são as etiologias mais comuns (Quadro 26.2) (Cap. 27). Como
considerado e excluído porque a cirurgia das paratireoides é ineficaz o PTH é a principal defesa contra a hipocalcemia, os distúrbios asso-
nesta condição. A taxa de depuração do cálcio/creatinina (calculada ciados à síntese ou secreção deficiente deste hormônio podem ser as-
pela relação entre cálcio urinário/sérico dividida pela razão creatinina sociados à hipocalcemia grave e potencialmente fatal. Nos adultos, o
urinária/sérica) < 0,01 sugere HHF, particularmente quando existe hipoparatireoidismo é causado mais comumente pela lesão acidental
uma história familiar de hipercalcemia branda assintomática. Além das quatro glândulas durante uma cirurgia da tireoide ou das parati-
disso, diversos laboratórios estão oferecendo atualmente uma análise reoides. O hipoparatireoidismo é uma das principais manifestações
de sequência do gene CaSR para estabelecer o diagnóstico definitivo das endocrinopatias autoimunes (Cap. 23); em casos raros, esse dis-
de HHF. A secreção ectópica do PTH é extremamente rara. túrbio pode estar associado a doenças infiltrativas, como a sarcoido-
Níveis suprimidos de PTH napresença de hipercalcemia são com- se. A secreção reduzida do PTH pode ser secundária à deficiência de
patíveis com hipercalcemia não mediada pelo paratormônio que, na magnésio ou às mutações ativadoras do CaSR, que suprimem o PTH
maioria dos casos, é causada por neoplasia maligna subjacente. Em- e produzem efeitos contrários aos observados na HHF.
bora o tumor responsável pela hipercalcemia geralmente seja eviden- A deficiência de vitamina D, a síntese reduzida de 1,25 (OH)2D
te, pode ser necessário dosar o nível de PTHrP para confirmar o diag- (principalmente quando é secundária à insuficiência renal) ou, ra-
nóstico de hipercalcemia maligna. Os níveis séricos da 1,25 (OH)2D ramente, a resistência à vitamina D também causam hipocalcemia.
mostram-se aumentados nas doenças granulomatosas, e a avaliação Contudo, a gravidade da hipocalcemia associada a esses distúrbios
313
convulsões, espasmo carpopodálico, broncospasmo, laringospasmo e
QUADRO 26.2 Causas de hipocalcemia prolongamento do intervalo QT.
Níveis baixos de paratormônio (hipoparatireoidismo) ■■ ABORDAGEM DIAGNÓSTICA
Agenesia das paratireoides Além de dosar o cálcio sérico, é útil determinar os níveis de albumi-
Isolada na, fósforo e magnésio. Como no caso da avaliação da hipercalcemia,
a dosagem do nível do PTH é fundamental à avaliação da hipocalce-
Síndrome de DiGeorge
mia. Um nível suprimido (ou “inapropriadamente baixo”) na presen-
Destruição das paratireoides ça de hipocalcemia confirma a redução ou ausência de secreção do
Cirúrgica PTH (hipoparatireoidismo) como causa da hipocalcemia. Os outros
Por radiação elementos da história clínica geralmente definem a causa subjacente
Infiltração por metástases ou doenças sistêmicas (isto é, agenesia versus destruição das paratireoides). Por outro lado,
os níveis altos de PTH (hiperparatireoidismo secundário) devem
Autoimune
dirigir a atenção para a homeostasia da vitamina D como causa da
Função reduzida das paratireoides hipocalcemia. A deficiência nutricional dessa vitamina é mais bem-
SEÇÃO V
314
CAPÍTULO 27 mentando, dessa maneira, o fluxo de cálcio do osso para o sangue;
(2) reduz a depuração renal de cálcio, devolvendo a maior parte do
cálcio filtrado ao nível do glomérulo para o LEC; e (3) aumenta a efi-
ciência da absorção do cálcio no intestino por estimular a produção
Doenças das Glândulas de 1,25(OH)2D. O controle imediato do cálcio no sangue se deve aos
efeitos do PTH sobre o osso e, em menor grau, sobre a depuração
Paratireoides e Homeostasia renal de cálcio. Por outro lado, a manutenção de um equilíbrio do
cálcio em estado estável (equilíbrio dinâmico) resulta provavelmente
do Cálcio dos efeitos da 1,25(OH)2D sobre a absorção do cálcio (Cap. 25). As
ações renais do hormônio são exercidas em múltiplos locais e consis-
John T. Potts, Jr. tem na inibição do transporte do fosfato (túbulo proximal), aumen-
to da reabsorção de cálcio (túbulo distal) e estimulação da 25(OH)
Harald Jüppner D-1-hidroxilase renal. Até 12 mmol (500 mg) de cálcio são transfe-
CAPÍTULO 27
ridos diariamente entre o LEC e o osso (quantidade considerável em
As quatro glândulas paratireoides, localizadas atrás da tireoide, pro- relação ao reservatório total de cálcio no LEC), desempenhando o
duzem o paratormônio (PTH), o regulador primário da fisiologia do PTH um efeito muito significativo sobre essa transferência. O papel
cálcio. O PTH atua diretamente sobre o osso, onde induz a reabsor- homeostático do hormônio pode preservar a concentração do cálcio
ção do cálcio, e sobre o rim, onde intensifica a reabsorção do cálcio, no sangue a expensas da desmineralização óssea.
bem como a síntese da 1,25-diidroxivitamina D [1,25(OH)2D], um O PTH exerce múltiplas ações sobre o osso, algumas diretas e
hormônio que aumenta a absorção gastrintestinal do cálcio. Os níveis outras indiretas. As modificações mediadas pelo PTH na liberação
séricos de PTH são rigorosamente regulados por uma alça de feed- de cálcio pelo osso podem ser observadas em poucos minutos. Os
back negativo. O cálcio, agindo através do receptor sensor de cálcio, e efeitos crônicos do PTH consistem em aumentar o número de células
suprafisiológicos de 1,25(OH)2D3 ou de análogos desse metabólito hormônio removido; o PTH (7-84) foi identificado como um impor-
ativo pode suprimir drasticamente a superprodução de PTH, cujo tante componente desses fragmentos com aminoterminal truncado.
controle às vezes é difícil por causa do PTH secundário grave. A Existem evidências crescentes sugerindo que o PTH (7-84) (e, prova-
regulação da destruição proteolítica do hormônio pré-formado (re- velmente, os fragmentos com aminoterminal truncado relacionados)
gulação pós-translacional da produção do hormônio) constitui um podem atuar, através de mecanismos que ainda não foram definidos,
importante mecanismo para mediar as rápidas alterações (minutos) como inibidor da ação do PTH podendo ter um significado clínico,
na disponibilidade hormonal. O cálcio alto aumenta e o cálcio baixo particularmente na insuficiência renal. Nesse grupo de pacientes, os
inibe a destruição proteolítica das reservas hormonais. esforços para prevenir o HPT secundário através de uma variedade
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
hPTH hPTHrP
1 30 84 1 30 84 144
Resíduos de aminoácidos Resíduos de aminoácidos
Figura 27.1 Diagrama esquemático para ilustrar as semelhanças e as apenas 84 resíduos de comprimento; depois do resíduo 30, existe pouca homolo-
diferenças na estrutura do paratormônio (PTH) humano e o peptídio hu- gia estrutural entre os dois. As linhas tracejadas na sequência do PTHrP indicam
mano relacionado com o PTH (PTHrP). Existe uma estreita homologia estrutural identidade; os resíduos sublinhados, apesar de diferentes daqueles do PTH, ainda
(e funcional) entre os primeiros 30 aminoácidos do hPTH e do hPTHrP. A sequência representam alterações conservadoras (carga ou polaridade preservadas). Dez ami-
CAPÍTULO 27
do PTHrP pode ter ≥144 resíduos de aminoácidos de comprimento. O PTH possui noácidos são idênticos, e um total de 20 de 30 são homólogos.
truído localmente dentro dos tecidos. Nos adultos, o PTHrP parece bioquímicos resultam em resposta hormonal integrada na renovação
exercer pouca influência sobre a homeostasia do cálcio, exceto nos óssea e homeostasia do cálcio. O PTH ativa também os trocadores de
estados patológicos, quando grandes tumores, especialmente do tipo Na+/Ca2+ nos locais dos túbulos renais distais e estimula a transloca-
de células escamosas, bem como carcinomas de células renais, resul- ção dos canais pré-formados do transporte do cálcio, transferindo-os
tam em superprodução maciça do hormônio e hipercalcemia. do interior para a superfície apical a fim de aumentar a captação tu-
317
antagonista do PTH. Parece comportar um significado fisiológico Sempre que a hipercalcemia é confirmada, deve ser estabelecido
limitado nos seres humanos, pelo menos no que concerne à home- um diagnóstico definitivo. Apesar de o hiperparatireoidismo, uma
ostasia do cálcio. Possui significado médico por causa de seu papel causa frequente da hipercalcemia assintomática, ser um distúrbio
como um marcador tumoral nos casos esporádicos e hereditários de crônico no qual as manifestações, se vierem a ocorrer, podem ser ex-
carcinoma medular, e de sua utilização médica como tratamento co- pressadas apenas após meses ou anos, a hipercalcemia pode ser tam-
adjuvante na hipercalcemia grave e doença de Paget do osso. bém a manifestação mais precoce de malignidade, a segunda causa
A atividade hipocalcêmica da calcitonina é explicada principal- mais comum da hipercalcemia no adulto. As causas da hipercalcemia
mente pela inibição da reabsorção óssea mediada por osteoclastos e são inúmeras (Quadro 27.1), porém o hiperparatireoidismo e câncer
secundariamente pela estimulação da depuração renal do cálcio. Es- são responsáveis por 90% de todos os casos.
ses efeitos são mediados por receptores existentes nos osteoclastos e Antes de empreender uma pesquisa diagnóstica, é essencial
nas células dos túbulos renais. A calcitonina exerce efeitos adicionais certificar-se de que existe uma hipercalcemia verdadeira, e não um
através de receptores presentes no cérebro, no trato gastrintestinal e teste de laboratório falso positivo. Um diagnóstico falso positivo
sistema imune. O hormônio, por exemplo, exerce efeitos analgésicos de hipercalcemia representa habitualmente o resultado de hemo-
diretamente sobre as células no hipotálamo e nas estruturas correla- concentração inadvertida durante a coleta de sangue ou elevação
tas, possivelmente por interagir com receptores dos hormônios pep- nas proteínas séricas, como a albumina. A hipercalcemia é um pro-
SEÇÃO V
tídicos correlatos, como o peptídio relacionado com o gene da calci- blema crônico, constituindo conduta custo-efetiva realizar várias
tonina (CGRP) ou a amilina. Os últimos ligantes possuem receptores mensurações do cálcio sérico, testes que não precisam ser feitos no
específicos de alta afinidade, podendo também unir-se e acionar os estado de jejum.
receptores da calcitonina. O receptor da calcitonina compartilha uma As características clínicas são úteis para fazer o diagnóstico
semelhança estrutural com o PTH1R. diferencial. A hipercalcemia em adulto assintomático é decorrente
A tireoide é a principal fonte do hormônio, e as células envol- habitualmente do hiperparatireoidismo primário. Na hipercalcemia
vidas na síntese da calcitonina têm origem no tecido da crista neu- associada a malignidade, a doença não costuma ser oculta; pelo con-
ral. Durante a embriogênese, essas células migram e penetram no trário, os sintomas da malignidade trazem o paciente até o médico, e
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
corpúsculo ultimobranquial, que deriva da última bolsa branquial. a hipercalcemia é descoberta durante a avaliação. Nesses pacientes, o
Nos vertebrados que precederam os mamíferos na escala zoológica, o intervalo entre a identificação da hipercalcemia e a morte, especial-
corpúsculo ultimobranquial constitui um órgão distinto, anatomica- mente se não for adotado um tratamento vigoroso, costuma ser in-
mente separado da tireoide; nos mamíferos, a glândula ultimobran- ferior a 6 meses. Consequentemente, se um indivíduo assintomático
quial se funde com e acaba sendo incorporada à tireoide. teve hipercalcemia ou alguma manifestação de hipercalcemia, como
As calcitoninas de ocorrência natural consistem em uma cadeia cálculos renais, por mais de 1 ou 2 anos, é improvável que a causa
peptídica de 32 aminoácidos. Existe considerável variabilidade de se- seja malignidade. Não obstante, às vezes pode ser difícil diferenciar
quências entre as espécies. A calcitonina do salmão, utilizada com o hiperparatireoidismo primário de malignidade oculta, o que tor-
finalidades terapêuticas, é 10 a 100 vezes mais potente que as formas na necessária uma avaliação minuciosa, particularmente quando a
dos mamíferos para reduzir o cálcio sérico. duração da hipercalcemia é desconhecida. A hipercalcemia não de-
Existem dois genes para a calcitonina, e ; o controle trans-
cricional desses genes é complexo. Duas moléculas diferentes de
mRNA são transcritas a partir do gene ; uma é transladada no pre-
cursor para a calcitonina, e a outra mensagem é transladada para QUADRO 27.1 Classificação das causas da hipercalcemia
um produto alternativo, o CGRP, sintetizado sempre que o mRNA
I. Relacionada com as paratireoides
da calcitonina se expressa, por exemplo, no carcinoma medular de
tireoide. O gene , ou CGRP-2, é transcrito no mRNA do CGRP A. Hiperparatireoidismo primário
no sistema nervoso central (SNC); entretanto, esse gene não produz 1. Adenoma(s)
calcitonina. O CGRP exerce ações cardiovasculares, podendo fun- 2. Neoplasia endócrina múltipla
cionar como neurotransmissor ou desempenhar um papel desenvol- 3. Carcinoma
vimental no SNC.
B. Terapia com lítio
O nível circulante de calcitonina nos seres humanos é mais baixo
que o de muitas outras espécies. Nos seres humanos, mesmo varia- C. Hipercalcemia hipocalciúrica familiar
ções extremas na produção de calcitonina não modificam o meta- II. Relacionada com neoplasia maligna
bolismo do cálcio e o do fosfato; não existem efeitos específicos que A. Tumor sólido com metástases (mama)
possam ser atribuídos a uma deficiência de calcitonina (pacientes B. Tumor sólido com mediação humoral de hipercalcemia (pulmão,
submetidos à tireoidectomia total e que recebem apenas tiroxina de rim)
reposição) nem ao seu excesso (pacientes com carcinoma medular de C. Neoplasias malignas hematológicas (mieloma múltiplo, linfoma,
tireoide, um tumor secretor de calcitonina) (Cap. 23). A calcitonina leucemia)
tem sido um agente farmacológico útil para suprimir a reabsorção
III. Relacionada com a vitamina D
óssea na doença de Paget (Cap. 29) e osteoporose (Cap. 28), assim
como no tratamento da hipercalcemia da malignidade (ver adiante). A. Intoxicação por vitamina D
Contudo, o papel fisiológico da calcitonina nos seres humanos, se B. ↑ 1,25(OH)2D; sarcoidose e outras doenças granulomatosas
houver algum, não foi esclarecido. Por outro lado, uma ablação (kno- C. Hipercalcemia idiopática da infância
ckout) do gene da calcitonina em camundongos resulta em redução IV. Associada a alta renovação óssea
da densidade mineral óssea, sugerindo que seu papel biológico nos
A. Hipertireoidismo
mamíferos ainda não foi plenamente compreendido.
B. Imobilização
HIPERCALCEMIA C. Tiazidas
D. Intoxicação por vitamina A
(Ver também o Cap. 26.) A hipercalcemia pode ser manifestação
de enfermidade grave, como malignidade, ou ser detectada coinci- V. Associada a insuficiência renal
dentemente por testes de laboratório em paciente sem enfermidade A. Hiperparatireoidismo secundário grave
óbvia. O número de pacientes reconhecidos com hipercalcemia as- B. Intoxicação pelo alumínio
sintomática, em geral hiperparatireoidismo, aumentou no final do C. Síndrome do leite‑álcali
século XX.
318
corrente de hiperparatireoidismo nem de malignidade pode resultar Adenomas solitários Uma única glândula anormal é a causa em cer-
da ação excessiva da vitamina D, de alta renovação óssea secundária ca de 80% dos pacientes; a anormalidade na glândula geralmente é
a qualquer uma de várias causas, ou de insuficiência renal (Quadro uma neoplasia benigna ou um adenoma, e raramente um carcinoma
27.1). A história dietética e história de ingestão de vitaminas ou dro- de paratireoides. Alguns cirurgiões e patologistas relatam que o au-
gas são úteis, com bastante frequência, para diagnosticar algumas mento de volume de múltiplas glândulas é comum; já foram relatados
das causas menos frequentes. Os ensaios imunométricos para o PTH adenomas duplos; em cerca de 15% dos pacientes, todas as glândulas
funcionam como o principal teste de laboratório para estabelecer o são hiperfuncionantes; a hiperplasia das células principais das parati-
diagnóstico. reoides em geral é hereditária e está associada frequentemente a ou-
A hipercalcemia de qualquer causa pode resultar em fadiga, de- tras anormalidades endócrinas.
pressão, confusão mental, anorexia, náuseas, vômitos, constipação,
Síndromes hereditárias e tumores múltiplos das paratireoides O hi-
defeitos tubulares renais reversíveis, micção mais frequente, intervalo
perparatireoidismo hereditário pode ocorrer sem outras anorma-
QT curto no eletrocardiograma e, em alguns pacientes, arritmias car-
lidades endócrinas, porém geralmente faz parte de uma síndrome
díacas. Existe uma relação variável de um paciente para outro entre
de neoplasia endócrina múltipla (Cap. 23). A NEM 1 (síndrome de
a gravidade da hipercalcemia e os sintomas. Em geral, os sintomas
Wermer) consiste em hiperparatireoidismo e tumores da hipófise e
CAPÍTULO 27
são mais comuns com níveis de cálcio > 2,9 a 3 mmol/L (11,5 a 12,0
do pâncreas, associada frequentemente a hipersecreção gástrica e
mg/dL), porém alguns pacientes, mesmo com esse nível, continuam
doença ulcerosa péptica (síndrome de Zollinger-Ellison). A NEM
assintomáticos. Quando o nível de cálcio é > 3,2 mmol/L (13 mg/
2A se caracteriza por feocromocitoma e carcinoma medular de
dL), ocorrem calcificações nos rins, pele, vasos sanguíneos, pulmões,
tireoide, assim como hiperparatireoidismo; a NEM 2B possui ca-
coração e estômago, podendo instalar-se um quadro de insuficiência
racterísticas associadas adicionais, como múltiplos neuromas, mas
renal, particularmente quando os níveis sanguíneos de fosfato são
carece habitualmente de hiperparatireoidismo. Cada uma destas
normais ou estão elevados em virtude da função renal comprome-
síndromes NEM é transmitida em conformidade com um padrão
tida. Hipercalcemia significativa, definida habitualmente como 3,7
autossômico dominante aparente, porém e como assinalado ante-
a 4,5 mmol/L (15 a 18 mg/dL), pode ser uma emergência médica,
riormente, a base genética da NEM 1 envolve a perda bialélica de
caracteriza habitualmente por um defeito na linha germinativa (to- tumor mandibular). Várias mutações inativadoras foram identifica-
das as células) e deleção/mutação somática adicional no tumor (Fig. das no HRPT2 (localizado no cromossomo 1q21-31), que codifica
27.3). uma proteína de 531 aminoácidos denominada parafibromina. As
As mutações no locus do gene NEM1, que codifica a proteína mutações genéticas responsáveis no HRPT2 parecem ser necessárias,
MENIN, sobre o cromossomo 11q13 são responsáveis por causar a porém não suficientes, para o câncer das paratireoides.
NEM 1; o alelo normal desse gene se encaixa na definição de um gene Em geral, a identificação de defeitos genéticos adicionais nestas
supressor tumoral. A herança de um único alelo que sofreu muta- síndromes relacionadas com tumores das paratireoides e a variação
ção nesta síndrome hereditária, seguida por perda do outro alelo por observada na expressão/penetrância fenotípica indicam a multipli-
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
mutação das células somáticas, resulta em expansão monoclonal e cidade de fatores genéticos responsáveis. Não obstante, a capacidade
desenvolvimento de um tumor. Além disso, em cerca de 15 a 20% dos de detectar a presença dos principais elementos genéticos que contri-
adenomas esporádicos das paratireoides, ambos os alelos do locus buem facilitou grandemente um controle mais apropriado dos mem-
NEM 1 no cromossomo 11 sofrem deleção somática, o que implica bros da família de pacientes identificados com as síndromes heredi-
que o mesmo defeito responsável pela NEM 1 pode causar também tárias, tais como NEM 1, NEM 2 e HPT-TM.
a doença esporádica (Fig. 27.3A). Em conformidade com a hipótese Uma contribuição importante, por parte dos estudos sobre a ori-
de Knudson para a neoplasia em duas etapas em certas síndromes gem genética do carcinoma de paratireoides, foi o reconhecimento
de câncer hereditário, o início mais precoce do hiperparatireoidismo de que as mutações envolvem uma via diferente da envolvida nos
nas síndromes hereditárias reflete a necessidade de ocorrer apenas aumentos benignos da glândula. Diferentemente da patogenia das
um único evento mutacional para desencadear o crescimento (a ex- alterações genéticas observadas no câncer de colo, em que as lesões
crescência) monoclonal. Nos adenomas esporádicos, que ocorrem evoluem de adenomas benignos para doença maligna por altera-
Deleção/mutação Tumor
somática do alelo benigno
Cópia Cópia normal restante
normal mutante
Figura 27.3 A. Diagrama esquemático que indica os eventos moleculares Um locus genético diferente que também envolve a perda de um gene supressor
na suscetibilidade tumoral. O paciente com a anormalidade hereditária (neo- tumoral, denominado HRPT2, participa na patogenia do carcinoma de paratireoides.
plasia endócrina múltipla ou NEM) é encarado como possuindo um gene defeituoso (De A Arnold: J Clin Endocrine Metab 77(5):1108, 1993. Copyright 1993, The En-
herdado do progenitor acometido no cromossomo 11, porém uma cópia do gene docrine Society.) B. Ilustração esquemática do mecanismo e consequências
normal está presente e provém do outro progenitor. No tumor monoclonal (tumor do rearranjo gênico bem como da expressão excessiva do proto-oncogene PRAD
benigno), um evento somático, aqui representado por uma deleção cromossômica 1 (inversão pericentromérica do cromossomo 11) nos adenomas das paratireoides.
parcial, remove da célula o gene normal restante. Nos tumores não hereditários, A expressão excessiva de PRAD 1 (uma proteína que controla o ciclo celular, ciclina
terão de ocorrer duas mutações somáticas sucessivas, processo mais demorado. D1) pelo promotor altamente ativo do gene do PTH na célula paratireoidiana contribui
Por qualquer uma das vias, a célula, privada da influência reguladora do crescimento para o excesso de proliferação celular. (De J Habener et al., em L DeGroot, JL Jame-
por esse gene, sofre um crescimento desregulado e transforma-se em um tumor. son [eds.]: Endocrinology, 4th ed., Philadelphia, Saunders, 2001, com autorização.)
320
ções genéticas progressivas, as alterações observadas comumente na sição de cálcio no parênquima, ou por uma nefrolitíase recorren-
maioria dos cânceres de paratireoides (mutações HRPT2) são verifi- te, estava presente em 60 a 70% dos pacientes antes de 1970. Com
cadas raramente nos adenomas esporádicos de paratireoides. uma identificação mais precoce, as complicações renais ocorrem em
As anormalidades no gene Rb foram as primeiras a serem ob- menos de 20% dos pacientes em muitas grandes séries. Os cálculos
servadas no câncer de paratireoides. O gene Rb, um gene supressor renais são formados habitualmente por oxalato de cálcio ou fosfato
tumoral localizado no cromossomo 13q14, esteve associado inicial- de cálcio. Em alguns pacientes, os episódios repetidos de nefrolitíase
mente ao neuroblastoma – porém, desde então, passou a ser impli- ou a formação de grandes cálculos podem resultar em obstrução do
cado em outras neoplasias, incluindo o carcinoma de paratireoides. trato urinário, infecção e perda da função renal. A nefrocalcinose
Os primeiros estudos implicavam as deleções alélicas do gene Rb pode ser responsável também pela redução da função renal e pela
em muitos carcinomas de paratireoides e na expressão reduzida ou retenção de fosfato.
ausente da proteína Rb. No entanto, por existirem, com frequência, A manifestação óssea distintiva do hiperparatireoidismo é a
grandes deleções no cromossomo 13 que incluem muitos genes além osteíte fibrosa cística, que ocorria em 10 a 25% dos pacientes nas
do locus Rb (com achados semelhantes em alguns carcinomas hipo- séries relatadas 50 anos atrás. Ao exame histológico, as caracterís-
fisários), continua sendo possível que outros genes supressores tu- ticas patognomônicas são um aumento no número de osteoclastos
CAPÍTULO 27
morais no cromossomo 13 estejam desempenhando algum papel no multinucleados gigantes em algumas áreas sobre a superfície do
carcinoma de paratireoides. osso (lacunas de Howship) bem como a substituição dos elemen-
O estudo dos cânceres de paratireoides identificados em alguns tos celulares e medulares normais por tecido fibroso. As alterações
pacientes com a síndrome de HPT-TM resultou na identificação de radiográficas consistem em reabsorção dos tufos das falanges e
um papel muito mais significativo para as mutações no gene HRPT2 substituição do contorno cortical habitualmente nítido do osso nos
na maioria dos carcinomas de paratireoides, incluindo os que se ma- dígitos por um contorno irregular (reabsorção subperiosteal). Nos
nifestam esporadicamente, sem qualquer associação aparente com últimos anos, a osteíte fibrosa cística tem sido rara no hiperparati-
a síndrome de HPT-TM. Mutações na região codificadora foram reoidismo primário, provavelmente por causa da identificação mais
identificadas em 75 a 80% dos cânceres de paratireoides analisados, precoce da doença.
permitindo tirar a conclusão de que, com o acréscimo de hipotéticas
321
reoidismo está associado a um aumento dos sintomas neuropsiquiá-
QUADRO 27.2 Diretrizes para a cirurgia no tricos, de modo que esse problema continua sendo um fator signifi-
hiperparatireoidismo primário assintomáticoa cativo nas decisões relacionadas ao impacto da cirurgia nessa doença.
Parâmetro Diretrizes
■■ DIAGNÓSTICO
Cálcio sérico (acima do normal) > 1 mg/dL O diagnóstico é feito ao detectar um nível elevado de PTH imunor-
Ca urinário de 24 h Nenhuma indicação -reativo em paciente com hipercalcemia assintomática (ver “Diag-
Depuração da creatinina (calculada) Se < 60 mL/min nóstico diferencial: testes especiais”, adiante). O fosfato sérico costu-
ma ser baixo, mas pode se mostrar normal, especialmente quando já
Densidade óssea Escore T < –2,5 em
b
se instalou um quadro de insuficiência renal.
Em qualquer de 3 lugares Foram introduzidas várias modificações nos ensaios do PTH em
Idade < 50 um esforço de melhorar a sua utilidade à luz das informações sobre
a o metabolismo do PTH (conforme discutido anteriormente). Os en-
Bilezikian et al.
b
Coluna, parte distal do rádio, quadril.
saios de primeira geração eram baseados no deslocamento do PTH
radiomarcado de anticorpos que reagem com o PTH (também fre-
SEÇÃO V
322
1.000 Hiperparatireoidismo de confirmar uma queda rápida (mais de 50%) para níveis nor-
Hipercalcemia da malignidade
Hipoparatireoidismo
mais de PTH. Em vários centros, uma combinação de imagens
800
600 pré-operatórias com sestamíbi, anestesia por bloqueio cervical,
500 incisão cirúrgica mínima e mensurações intraoperatórias do
PTH tornou possível a conduta cirúrgica bem-sucedida na con-
dição de pacientes externos com um benefício incontestável em
termos de custo em comparação com a anestesia geral e uma ci-
400 rurgia no pescoço mais extensa. O uso dessas abordagens mini-
mamente invasivas depende do tirocínio clínico para selecionar
os pacientes com pouquíssima probabilidade de terem doença
Paratormônio 1-84 (pg/mL)
CAPÍTULO 27
Em geral, a gravidade da hipercalcemia proporciona um in-
200 dício pré-operatório para o carcinoma das paratireoides. Nesses
casos, quando se realiza uma exploração cervical, o tecido deve
ser amplamente excisado. Deve-se evitar a ruptura da cápsula a
fim de prevenir a semeadura local das células tumorais.
100 A hiperplasia de múltiplas glândulas, como pode ser prevista
nos casos familiares, gera questões mais difíceis para a conduta ci-
rúrgica. Estabelecido o diagnóstico de hiperplasia, todas as glân-
20 dulas devem ser identificadas. Foram propostos dois esquemas
323
Os pacientes com hiperparatireoidismo possuem uma absor- dade na quantidade de coletas de urina. Apesar da utilidade das
ção intestinal de cálcio eficiente em virtude dos maiores níveis diretrizes, a importância da decisão de cada paciente e do médico
de 1,25(OH)2D estimulados pelo excesso de PTH. Sabendo que e as suas preferências são evidentes em todas as recomendações.
a hipocalcemia significa que a cirurgia foi bem-sucedida, os pa- Quando não se opta pela cirurgia, ou quando esta não é clini-
cientes podem passar a adotar uma alta ingestão de cálcio ou re- camente viável, há interesse no valor potencial de terapias clínicas
ceber suplementos orais de cálcio. Apesar de uma hipocalcemia específicas. Não existe nenhuma experiência de longo prazo com
leve, a maioria dos pacientes não necessita de terapia parenteral. relação a resultados clínicos específicos como prevenção de fratu-
Se o cálcio sérico cai para < 2 mmol/L (8 mg/dL), e se o nível de ras, porém já está bem estabelecido que os bifosfonatos aumen-
fosfato sobe simultaneamente, deve ser aventada a possibilidade de tam significativamente a densidade mineral óssea, sem modificar
que a cirurgia tenha causado hipoparatireoidismo. Com uma hi- o nível sérico de cálcio (como ocorre com os estrogênios, porém
pocalcemia inesperada, deve ser aventada uma hipomagnesemia estes últimos não são preferidos, devido aos efeitos adversos rela-
coexistente, pois isso interfere na secreção de PTH e causa hipo- tados em outros sistemas orgânicos). Os calcimiméticos que re-
paratireoidismo funcional (Cap. 25). duzem a secreção de PTH diminuem os níveis de cálcio, porém
Os sinais de hipocalcemia consistem em espasmos muscula- não afetam a densidade mineral óssea (DMO).
res, sensação geral de ansiedade e sinais positivos de Chvostek e
SEÇÃO V
apenas por poucos dias. Se os sintomas pioram ou se o cálcio pa- lítio, regredindo e recidivando quando é suspenso e reiniciado. Os
renteral é necessário por mais de 2 a 3 dias, deve ser iniciada a te- adenomas das paratireoides relatados em alguns pacientes hiper-
rapia com um análogo da vitamina D e/ou cálcio oral (2 a 4 g/dia) calcêmicos que estão sendo submetidos à terapia com lítio podem
(ver adiante). O uso de calcitriol é custo-efetivo (nas doses de 0,5 a refletir a presença de um tumor paratireoidiano de ocorrência inde-
1 g/dia), por causa da rapidez do início do efeito e da interrupção pendente; não é necessário implicar um efeito permanente do lítio
imediata da ação quando o medicamento é suspenso, em compa- sobre o crescimento das paratireoides, pois a maioria dos pacien-
ração com outras formas de vitamina D. Uma elevação dos níveis tes consegue a reversão completa da hipercalcemia quando o lítio
sanguíneos de cálcio após vários meses de reposição de vitamina é suspenso. Entretanto, a estimulação prolongada da replicação das
D pode indicar restauração e normalização da função paratireoi- células paratireoidianas pelo lítio pode predispor ao surgimento de
dea. É apropriado também monitorar os níveis séricos seriados de adenomas (como documentado no hiperparatireoidismo secundá-
PTH a fim de estimar a função glandular nesses pacientes. rio e insuficiência renal).
Se uma deficiência de magnésio estava presente, ela pode Com os níveis alcançados no sangue em pacientes tratados, po-
complicar a evolução pós-operatória, visto que a deficiência de de-se mostrar in vitro que o lítio desloca a curva de secreção de PTH
magnésio dificulta a secreção de PTH A hipomagnesemia deve para a direita em resposta ao cálcio; isto é, são necessários níveis mais
ser corrigida sempre que for identificada. A reposição de mag- altos de cálcio para reduzir a secreção de PTH, agindo provavelmen-
nésio pode ser efetiva por via oral (p. ex., MgCl2, MgOH2), po- te ao nível do sensor do cálcio (ver adiante). Esse efeito que pode
rém a reposição parenteral é habitual para garantir a recuperação induzir níveis elevados de PTH e consequente hipercalcemia em
pós-operatória, se a deficiência de magnésio for suspeitada em indivíduos no restante normais. Felizmente, existem habitualmente
virtude dos baixos níveis sanguíneos de magnésio. Sabendo-se medicações alternativas para a enfermidade psiquiátrica subjacente.
que o efeito depressivo do magnésio sobre as funções do sistema A cirurgia das paratireoides não deve ser recomendada a menos que
nervoso central e dos nervos periféricos não ocorre com níveis a hipercalcemia e os níveis elevados de PTH persistam após a sus-
< 2 mmol/L (variação normal de 0,8 a 1,2 mmol/L), a reposição pensão do lítio.
parenteral pode ser realizada rapidamente. Uma dose cumulativa
de até 0,5 a 1 mmol/kg de peso corporal pode ser administrada ■■ DISTÚRBIOS GENÉTICOS QUE CAUSAM SÍNDROMES
se houver uma hipomagnesemia significativa; com bastante fre- SEMELHANTES AO HIPERPARATIREOIDISMO
quência, porém, são suficientes as doses totais de 20 a 40 mmol. Hipercalcemia hipocalciúrica familiar
TRATAMENTO CLÍNICO As diretrizes para a recomendação de A HHF (também denominada hipercalcemia benigna familiar) é her-
intervenção cirúrgica, quando viável (Quadro 27.2), bem como dada como um traço autossômico dominante. Os indivíduos afetados
para monitoração dos pacientes com hiperparatireoidismo assin- são descobertos em virtude de hipercalcemia assintomática. A HHF,
tomático que decidem não efetuar a paratireoidectomia (Quadro que é causada por uma mutação inativadora em um único alelo do
27.3), refletem as mudanças ocorridas desde a primeira conferên- receptor sensor de cálcio (ver adiante), envolve a secreção inapro-
cia sobre esse assunto, realizada em 1990. A monitoração clínica priadamente normal ou até mesmo aumentada de PTH, enquanto
em lugar da cirurgia corretiva continua sendo aceitável, porém é outro distúrbio hipercalcêmico, a doença de Jansen extremamente
evidente que a intervenção cirúrgica constitui a opção mais fre- rara, é causado por um receptor de PTH/PTHrP constitutivamente
quentemente recomendada pelos motivos citados anteriormente. ativo nos tecidos-alvo. Entretanto, nem a HHF nem a doença de Jan-
As diretrizes rigorosas que favorecem a cirurgia incluem redução sen constituem um distúrbio de crescimento das paratireoides.
do nível recomendado de elevação do cálcio sérico, atenção mais A fisiopatologia da HHF já foi compreendida. O defeito primá-
cuidadosa para a integridade óssea por meio de referência com a rio é a percepção anormal do cálcio sanguíneo pela paratireoide e
massa óssea máxima em condições basais (escores T), em lugar pelo túbulo renal, acarretando a secreção inapropriada de PTH e
da densidade óssea ajustada para a idade (escores Z), bem como a reabsorção renal excessiva de cálcio. O receptor sensor de cálcio é
presença de qualquer fratura por fragilidade. As outras alterações um membro da terceira família de GPCR (tipo C ou III). O receptor
assinaladas nas duas diretrizes (Quadros 27.2 e 27.3) refletem a responde à concentração aumentada de cálcio no LEC, suprimindo
experiência acumulada e considerações práticas, como dificul- a secreção de PTH através da sinalização de segundos mensageiros,
proporcionando desse modo uma regulação por retroalimentação
324
negativa da secreção de PTH. Muitas mutações inativadoras diferen- ticas do distúrbio humano. A Figura 27.5 ilustra algumas das mu-
tes no receptor do sensor de cálcio foram identificadas nos pacientes tações genéticas nas glândulas paratireoides ou nas células-alvo do
2+
com HHF, reduzindo a capacidade do sensor de se ligar ao cálcio, e PTH que afetam o metabolismo do Ca .
os receptores mutantes funcionam como se os níveis sanguíneos de
cálcio fossem baixos; a secreção excessiva de PTH ocorre a partir de ■■ HIPERCALCEMIA RELACIONADA COM NEOPLASIA MALIGNA
uma glândula normal. Cerca de 66% dos pacientes com HHF pos-
Síndromes clínicas e mecanismos da hipercalcemia
suem mutações na região de codificação das proteínas do gene. Os
A hipercalcemia causada por neoplasia maligna é comum (ocorren-
33% restantes das famílias podem ter mutações no promotor do gene
ou envolver mecanismos ainda desconhecidos em outras regiões do do em até 20% dos pacientes com câncer, especialmente com certos
genoma identificadas graças aos estudos de mapeamento (p. ex., cro- tipos de tumor, tais como o carcinoma de pulmão), na maioria das
mossomo 19p e 19q). vezes grave e difícil de controlar e, em raras ocasiões, difícil de distin-
Mesmo antes da elucidação da fisiopatologia da HHF, uma gran- guir do hiperparatireoidismo primário. Apesar de a neoplasia malig-
de quantidade de evidência clínica serviu para distinguir o distúrbio na ser clinicamente óbvia com bastante frequência ou prontamente
do hiperparatireoidismo primário, sendo essas características clíni- identificável pela história médica, ocasionalmente a hipercalcemia
pode ser causada por um tumor oculto. Antigamente, a hipercalce-
CAPÍTULO 27
cas ainda úteis no diagnóstico diferencial. Os pacientes com hiperpa-
ratireoidismo primário realizam menos de 99% da reabsorção renal mia associada à neoplasia maligna era considerada como provocada
do cálcio, enquanto a maioria dos pacientes com HHF realiza mais por invasão local e destruição do osso pelas células tumorais; agora,
de 99% de reabsorção. A hipercalcemia na HHF pode ser identificada são conhecidos muitos casos que resultam da elaboração, pelas célu-
com frequência nos membros afetados das famílias durante a primei- las malignas, de mediadores humorais da hipercalcemia. O PTHrP
ra década da vida, enquanto a hipercalcemia raramente ocorre nos é o agente humoral responsável na maioria dos tumores sólidos que
pacientes com hiperparatireoidismo primário ou com as síndromes causam hipercalcemia.
NEM que têm menos de 10 anos de idade. O PTH pode ficar elevado Na previsão da hipercalcemia, a natureza histológica do tumor é
na HHF, porém os valores em geral são normais ou mais baixos para mais importante que a extensão das metástases esqueléticas. O car-
cinoma de pequenas células (célula em grão de aveia – oat cell) e o
325
Perda de função HHBF, Condrodisplasia letal Pseudo-
HPTNG de Blomstrand -hipoparatireoidismo
Ca2+
CaSR
AC
Gs
Receptor de cAMP
ATP
Proto-oncogenes e genes PTH/PTHrP
supressores tumorais
SEÇÃO V
PTH
Fatores de transcrição, p.ex.,
GATA3, GCMB, AIRE PIP2
PTHrP Gq
IP3 + DAG
PLC
Figura 27.5 Ilustração de algumas mutações genéticas que alteram o me- homozigóticas (mutação de ambos os alelos), hiperparatireoidismo neonatal grave
tabolismo do cálcio através de seus efeitos sobre a célula das paratireoides ou as (HPTNG); a mutação com ganho de função heterozigótica causa hipocalcemia hi-
células-alvo da ação do PTH. As alterações na produção de PTH pela célula das percalciúrica autossômica dominante (HHAD). Outros defeitos na função das células
paratireoides podem ser causadas por mudanças na resposta ao cálcio do líquido das paratireoides que ocorrem em nível da regulação gênica (oncogenes ou genes
extracelular (Ca2+), que são detectadas pelo receptor sensor de cálcio (CaSR). Além supressores tumorais) ou fatores de transcrição são discutidos no texto. A condrodis-
disso, o PTH (ou PTHrP) pode apresentar eficácia alterada nas células-alvo, como plasia letal de Blomstrand é causada por mutações com perda de função homozigó-
nas células tubulares proximais, através da alteração na função de seu receptor ticas ou heterozigóticas compostas no receptor de PTH/PTHrP um distúrbio letal no
(receptor de PTH/PTHrP) ou proteínas de transdução de sinais, proteínas G, como a período neonatal, enquanto o pseudo-hipoparatireoidismo envolve a inativação em
Gs, que está ligada à adenilato ciclase (AC), a enzima responsável pela produção nível das proteínas G, especificamente mutações que eliminam ou que reduzem a
de AMP cíclico (cAMP) [está também ilustrada a Gq, que ativa uma via alternativa atividade da Gs no rim (ver o texto para mais detalhes). A condrodisplasia metafi-
da transmissão de sinais do receptor, envolvendo a geração de trifosfato de inositol sária de Jansen e a síndrome de McCune-Albright representam mutações ganho de
IP3 ou diacilglicerol (DAG)]. As mutações com perda de função heterozigóticas no função no receptor de PTH/PTHrP ou na proteína Gs, respectivamente.
CaSR causam hipercalcemia hipocalciúrica benigna familiar (HHBF), e as mutações
CAPÍTULO 27
neoplasia maligna. e a sarcoidose podem coexistir em alguns pacientes.
O tratamento da hipercalcemia pode ser empreendido com fre-
quência evitando a exposição excessiva à luz solar bem como limitan-
■■ HIPERCALCEMIA RELACIONADA COM A VITAMINA D do a ingestão de vitamina D e cálcio. No entanto, pode-se presumir
que a sensibilidade anormal à vitamina D e a regulação anormal da
A hipercalcemia causada pela vitamina D pode ser decorrente da in-
síntese da 1,25(OH)2D persistirão enquanto a doença for ativa. Como
gestão excessiva ou do metabolismo anormal da vitamina. O metabo-
alternativa, os glicocorticoides na posologia equivalente de 100 mg/
lismo anormal da vitamina é adquirido habitualmente em associação
dia de hidrocortisona ou doses equivalentes de glicocorticoides po-
com um distúrbio granulomatoso generalizado. O metabolismo da
dem ajudar a controlar a hipercalcemia. Parece que os glicocorticoi-
vitamina D é regulado de forma meticulosa, particularmente a ati-
tubular proximal de sódio e cálcio em resposta à depleção de sódio. pode manifestar-se na insuficiência renal crônica de longa duração
Parte desse efeito renal é decorrente da intensificação da ação do tratada de maneira inadequada [p. ex., hiperparatireoidismo terci-
PTH, sendo mais pronunciado nos indivíduos com secreção intacta ário (3o); ver adiante].
de PTH. Entretanto, as tiazidas causam hipocalciúria nos pacientes Os pacientes com hiperparatireoidismo secundário podem de-
hipoparatireoidianos que estão recebendo altas doses de vitamina senvolver dor óssea, calcificação ectópica e prurido. A doença óssea
D e reposição oral de cálcio quando a ingestão de sódio é restrita. observada nos pacientes com hiperparatireoidismo secundário e
Esse achado representa a base lógica para o uso das tiazidas como doença renal crônica é denominada osteodistrofia renal e afeta prin-
um adjuvante da terapia nos pacientes hipoparatireoidianos, como
cipalmente a renovação óssea. Entretanto, a osteomalacia também é
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
CAPÍTULO 27
de 90% dos pacientes com hiperparatireoidismo primário sofrerão de
Esta intoxicação (e, com frequência, a hipercalcemia como compli- hipercalcemia assintomática; em geral, os sintomas de malignidade es-
cação do tratamento clínico) era observada no passado nos pacientes tão presentes na hipercalcemia associada ao câncer. Outros distúrbios
em diálise crônica; as manifestações consistiam em demência agu- do hiperparatireoidismo e da malignidade causam menos de 10% dos
da e osteomalacia refratária e grave. Ocorrem dor óssea, múltiplas casos de hipercalcemia, e algumas das causas não paratireoidianas es-
fraturas que não consolidam, particularmente das costelas e pelve, tão associadas a manifestações claras, como insuficiência renal.
além de miopatia proximal. A hipercalcemia se instala quando esses O hiperparatireoidismo é o provável diagnóstico nos pacientes
pacientes são tratados com vitamina D ou calcitriol por causa da res- com hipercalcemia crônica. Se a hipercalcemia se manifestou por mais
ponsividade esquelética comprometida. O alumínio está presente no de 1 ano, geralmente a malignidade pode ser excluída como causa.
local da mineralização osteoide, a atividade osteoblástica é mínima, Um aspecto impressionante da hipercalcemia associada à malignida-
329
não são identificáveis ou se encontram baixas na hipercalcemia rela- nidade, incluindo radiografia de tórax, TC de tórax e abdome, bem
cionada com a malignidade, e não são identificáveis ou se mostram como cintilografia óssea. Os imunoensaios para o PTHrP podem ser
normais nas causas da hipercalcemia relacionadas com a vitamina particularmente úteis nessas situações. Convém dar também a devi-
D e com alta renovação óssea. Em vista da especificidade do imuno- da atenção aos indícios indicativos de possíveis distúrbios hemato-
ensaio para o PTH e da alta frequência de hiperparatireoidismo nos lógicos subjacentes, como anemia, globulina plasmática aumentada
pacientes hipercalcêmicos, constitui conduta custo-efetiva medir o e imunoeletroforese sérica anormal; as cintilografias ósseas podem
nível de PTH em todos os pacientes hipercalcêmicos, a menos que ser negativas em alguns pacientes com metástases, como acontece no
malignidade, ou doença não paratireoidiana específica sejam óbvias. mieloma múltiplo. Finalmente, se um paciente com hipercalcemia
Os resultados falsos positivos do ensaio para o PTH são raros. Os crônica está assintomático e, portanto, malignidade parece imprová-
imunoensaios para o PTHrP são úteis, ajudando a fazer o diagnóstico vel em bases clínicas, mas os valores do PTH não estão elevados, é
de certos tipos de hipercalcemia associada à malignidade. Apesar de útil procurar outras causas crônicas da hipercalcemia, como sarcoi-
a HHF estar relacionada com as paratireoides, a doença deve ser tra- dose oculta. Uso de suplementos dietéticos e de medicamentos pode
tada de maneira diferente do hiperparatireoidismo. As características sugerir intoxicação por vitaminas D ou A, ou a utilização de tiazidas.
clínicas e a baixa excreção urinária de cálcio podem ajudar a fazer
essa distinção. Sabendo que a malignidade e o hiperparatireoidismo
SEÇÃO V
aumentam de incidência com a idade, podem coexistir como duas TRATAMENTO Estados hipercalcêmicos
causas independentes da hipercalcemia.
Os níveis de 1,25(OH)2D mostram-se elevados em muitos dos A abordagem ao tratamento clínico da hipercalcemia varia de
pacientes com hiperparatireoidismo primário. Em outros distúrbios acordo com sua gravidade (Quadro 27.4). Uma hipercalcemia
associados à hipercalcemia, as concentrações de 1,25(OH)2D ficam leve, < 3 mmol/L (12 mg/dL), pode ser controlada com hidrata-
baixas ou, quando muito, se mostram normais. Entretanto, esse teste ção. Uma hipercalcemia mais grave [níveis de 3,2 a 3,7 mmol/L
comporta baixa especificidade e não é custo-efetivo, pois nem todos (13 a 15 mg/dL)] deve ser enfrentada agressivamente; acima desse
os pacientes com hiperparatireoidismo possuem níveis elevados de nível, a hipercalcemia pode ameaçar a vida, tornando necessária
1,25(OH)2D e nem todos os pacientes hipercalcêmicos não parati-
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
330
calcemia nos pacientes com malignidade deve-se principalmente QUADRO 27.5 Classificação funcional da hipocalcemia
à liberação excessiva de cálcio esquelético, por isso consegue-se (excluindo as condições neonatais)
melhora apenas mínima pela restrição de cálcio dietético. Por ou-
tro lado, os pacientes com hipersensibilidade à vitamina D ou in- PTH ausente
toxicação pela vitamina D exibem excessiva absorção intestinal de
Hipoparatireoidismo hereditário Hipomagnesemia
cálcio, e a restrição de cálcio dietético é benéfica. Função renal di-
minuída ou depleção do LEC reduzem a excreção urinária de cál- Hipoparatireoidismo adquirido
cio. Nestas situações, a reidratação consegue reduzir rapidamente PTH ineficaz
ou reverter a hipercalcemia, apesar de a maior reabsorção óssea
persistir. Como esboçado adiante, quanto mais intensa for a hi- Insuficiência renal crônica Vitamina D ativa ineficaz
percalcemia, maior será o número de terapias combinadas a serem Ausência da vitamina D ativa Má absorção intestinal
utilizadas. As abordagens de ação rápida (horas) – reidratação, ↓ Ingestão dietética ou da luz solar Raquitismo tipo II dependente de
diurese forçada e calcitonina – podem ser usadas com os agentes vitamina D
antirreabsortivos mais eficazes, como os bifosfonatos (pois a hi-
CAPÍTULO 27
Metabolismo defeituoso: Pseudo‑hipoparatireoidismo
percalcemia grave costuma envolver excessiva reabsorção óssea).
Terapia anticonvulsivante
HIDRATAÇÃO, MAIOR INGESTÃO DE SAL, DIURESE LIGEIRA E FORÇA- Raquitismo tipo I dependente de
DA O primeiro princípio do tratamento consiste em restaurar a vitamina D
hidratação normal. Muitos pacientes hipercalcêmicos ficam desi-
PTH sobrepujado
dratados por causa dos vômitos, inanição e/ou defeitos induzidos
pela hipercalcemia na capacidade de concentração urinária. A Hiperfosfatemia aguda grave Osteíte fibrosa após
queda resultante na taxa de filtração glomerular é acompanha- paratireoidectomia
da por redução adicional na depuração tubular renal de sódio e Lise tumoral
331
OUTRAS TERAPIAS A plicamicina (anteriormente, mitramicina), pela hidratação. Uma hipercalcemia acentuada (≤ 3,7 mmol/L [15
que inibe a reabsorção óssea, tem sido um agente terapêutico útil, mg/dL]) torna necessária uma rápida correção. A calcitonina deve
sendo, porém, agora usado raramente por causa de sua toxicida- ser administrada por causa de seu rápido bloqueio, embora de
de assim como da eficácia dos bifosfonatos. A plicamicina deve curta duração, da reabsorção óssea, e o pamidronato ou zolendro-
ser administrada na veia, como bolus ou por infusão lenta; a dose nato IV também devem ser administrados, apesar de o início de
habitual é de 25 g/kg do peso corporal. O nitrato de gálio exerce sua ação ser retardado por 1 a 2 dias. Além disso, durante as pri-
ação hipocalcêmica por inibir a reabsorção óssea e alterar a estru- meiras 24 a 48 horas, deve ser induzida uma diurese agressiva de
tura dos cristais do osso. Atualmente, não está sendo usado com sódio-cálcio com solução salina intravenosa e, após a reidratação,
frequência por causa das alternativas superiores. devem-se administrar altas doses de furosemida ou de ácido eta-
Os glicocorticoides são úteis, especialmente na hipercalcemia crínico, porém somente quando se dispõe de um monitoramen-
que complica certas malignidades; eles aumentam a excreção uri- to apropriado e se as funções cardíaca e renal forem adequadas.
nária de cálcio e reduzem a absorção intestinal desse metal quan- Caso contrário, poderá ser necessário recorrer à diálise. Os graus
do administrados em doses farmacológicas, porém causam tam- intermediários de hipercalcemia entre 3,0 e 3,7 mmol/L (12 e 15
bém um equilíbrio negativo do cálcio esquelético. Nos indivíduos mg/dL) devem ser abordados com hidratação vigorosa, e, a seguir,
normais e pacientes com hiperparatireoidismo primário, os glico- feita a escolha mais apropriada para o paciente, entre as combina-
SEÇÃO V
corticoides não aumentam nem reduzem a concentração sérica de ções usadas, com hipercalcemia grave.
cálcio. Porém, nos pacientes com hipercalcemia decorente de cer-
tas malignidades osteolíticas, os glicocorticoides podem ser efica-
zes em virtude de seus efeitos antitumorais. As malignidades nas
quais a hipercalcemia responde aos glicocorticoides consistem no HIPOCALCEMIA
mieloma múltiplo, leucemia, doença de Hodgkin, outros linfomas
(Ver também o Cap. 26.)
e o carcinoma de mama, pelo menos no início da evolução dessa
doença. Os glicocorticoides são efetivos também no tratamento ■■ FISIOPATOLOGIA DA HIPOCALCEMIA: CLASSIFICAÇÃO BASEADA
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
CAPÍTULO 27
pocalcemia não tratada são compartilhados por ambos os tipos de 22 é denominado agora DSG1; mais recentemente, foi reconhecido
hipoparatireoidismo, porém o início do hipoparatireoidismo he- também um defeito no cromossomo 10p – atualmente denominado
reditário é mais gradual e, com frequência, está associado a outros DSG2. Os fenótipos parecem semelhantes. Os estudos sobre o defeito
defeitos desenvolvimentais. A calcificação dos gânglios basais e as do cromossomo 22 evidenciaram um fator de transcrição TBX1. As
síndromes extrapiramidais são mais comuns e de início mais preco- deleções do gene murino ortólogo mostram um fenótipo semelhante
ce no hipoparatireoidismo hereditário. Nas décadas precedentes, o ao da síndrome humana.
hipoparatireoidismo adquirido secundário a uma cirurgia no pesco- Outro defeito desenvolvimental autossômico dominante, carac-
ço era mais comum que o hipoparatireoidismo hereditário, porém terizado por hipoparatireoidismo, surdez e displasia renal (HDR),
a frequência da falência das paratireoides induzida cirurgicamente foi estudado ao nível genético. As anormalidades citogenéticas em
333
cursor do PTH, porém requer ambos os alelos para causar o hipopa- poparatireoidismo, a função normal das paratireoides pode resultar
ratireoidismo. A terceira envolve uma única mudança nas bases de graças à hiperplasia ou recuperação do tecido restante. Ocasional-
nucleotídios que resulta em defeito com junção dos éxons; o éxon mente, a recuperação ocorre meses após a cirurgia.
perdido contém o promotor – consequentemente o gene é silenciado.
Uma forma recessiva ligada ao X de hipoparatireoidismo foi descrita
em homens, e o defeito localizado no cromossomo Xq26-q27, envol- TRATAMENTO Hipoparatireoidismo adquirido e hereditário
vendo talvez o gene SOX3.
Anormalidades no receptor sensor do cálcio (CaSR) são detec- O tratamento envolve a reposição com vitamina D ou
tadas em três distúrbios hipocalcêmicos distintos. Todos são raros, 1,25(OH)2D3 (calcitriol), combinada com alta ingestão oral de
porém mais de 10 mutações diferentes com ganho de função foram cálcio. Na maioria dos pacientes, os níveis de cálcio e fosfato no
encontradas em uma forma de hipocalcemia denominada hipercalci- sangue são regulados satisfatoriamente, porém alguns pacientes
úria hipocalcêmica autossômica dominante (HHAD). O receptor per- mostram resistência e certa fragilidade, com tendência a alter-
cebe o nível de cálcio no ambiente como excessivo e suprime a secre- nâncias entre hipocalcemia e hipercalcemia. Para muitos pacien-
ção de PTH, resultando em hipocalcemia. A hipocalcemia é agravada tes, a vitamina D, nas doses de 40.000 a 120.000 U/dia (1 a 3 mg/
pela atividade constitutiva do receptor no túbulo renal, causando ex- dia), combinada com ≥ 1 g de cálcio elementar, é satisfatória. A
SEÇÃO V
creção de quantidades inapropriadas de cálcio. O reconhecimento da enorme variedade posológica reflete a variação observada de um
síndrome é importante, pois os esforços envidados para tratar a hipo- paciente para outro, o que torna necessária uma regulação precisa
calcemia com análogos da vitamina D e maior ingestão de cálcio oral em cada paciente. Em comparação com as necessidades diárias
exacerbam a excreção urinária de cálcio já excessiva (vários gramas típicas em pacientes euparatireoidianos de 200 U/dia (ou, em pa-
ou mais por 24 horas), dando origem a dano renal irreversível em cientes mais velhos, de até 800 U/dia), a alta dose de vitamina D
virtude dos cálculos e calcificações ectópicas. (até 100 vezes mais alta) reflete a conversão reduzida de vitamina
Outras causas de hipoparatireoidismo isolado incluem muta- D em 1,25(OH)2D. Atualmente, muitos médicos utilizam 0,5 a 1
ções inativadoras homozigóticas do fator de transcrição específico g de calcitriol no tratamento desses pacientes, especialmente
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
das paratireoides, GCMB, que levam a uma forma autossômica re- quando seu controle é difícil. Por causa de seu armazenamento
cessiva da doença, ou mutações pontuais heterozigóticas do GCMB, na gordura, quando a vitamina D é suspensa, precisam transcor-
que possuem um efeito negativo dominante sobre a proteína de tipo rer algumas semanas para observar o desaparecimento dos efeitos
selvagem, levando, assim, a uma forma autossômica dominante de biológicos, em comparação com uns poucos dias para o calcitriol,
hipoparatireoidismo. que possui rápida renovação.
A síndrome de Bartter é um grupo de distúrbios associados a Cálcio e vitamina D orais restauram o equilíbrio global de cál-
perturbações no equilíbrio eletrolítico e no ácido/básico, às vezes cio-fosfato, porém não revertem a reduzida reabsorção urinária de
com nefrocalcinose e outras características. Estão envolvidos vários cálcio típica do hipoparatireoidismo. Por isso, deve-se tomar cuida-
tipos de canais iônicos ou de transportadores. Curiosamente, a sín- do para evitar a excreção urinária excessiva de cálcio após a terapia
drome de Bartter tipo V exibe as perturbações eletrolíticas e do pH de reposição da vitamina D e cálcio; caso contrário, haverá a for-
observadas em outras síndromes, mas parece decorrente de ganho mação de cálculos renais. Os diuréticos tiazídicos reduzem o cálcio
de função no CaSR. O defeito pode ser mais grave que na HHAD e na urina em até 100 mg/dia nos pacientes hipoparatireoidianos que
explica as características adicionais observadas além da hipocalce- estão recebendo vitamina D, desde que sejam mantidos em uma
mia e hipercalciúria. dieta pobre em sódio. O uso de tiazidas parece benéfico por miti-
Como acontece com os distúrbios autoimunes que bloqueiam gar a hipercalciúria e facilitar o controle diário desses pacientes. Na
o CaSR (abordados anteriormente em condições hipercalcêmicas), atualidade, existem ensaios clínicos do PTH administrado por via
existem autoanticorpos que pelo menos transitoriamente ativam o parenteral [PTH (1-34) ou PTH (1-84)] em pacientes com hipopa-
CaSR, resultando em secreção suprimida de PTH e hipocalcemia. ratireoidismo, que proporcionam maior facilidade de manutenção
Esse distúrbio, cuja intensidade pode oscilar, pode ser classificado dos níveis séricos de cálcio e redução da excreção urinária de cálcio
como uma forma adquirida de hipoparatireoidismo, porém é listado (desejável para proteger o indivíduo contra qualquer lesão renal).
aqui com os outros distúrbios que envolvem o CaSR. Todavia, a terapia com PTH ainda não está aprovada.
Hipoparatireoidismo adquirido
O hipoparatireoidismo crônico adquirido representa habitualmente
o resultado da remoção cirúrgica inadvertida de todas as glândulas Hipomagnesemia
paratireoides; em alguns casos, nem todo o tecido é removido, porém A hipomagnesemia grave (< 0,4 mmol/L; < 0,8 mEq/L) está associa-
a parte restante sofre um comprometimento do suprimento vascular da a hipocalcemia (Cap. 25). A restauração do déficit corporal total
secundário às alterações fibróticas no pescoço que ocorrem após a de magnésio induz a uma rápida reversão da hipocalcemia. Existem
cirurgia. No passado, a causa mais frequente de hipoparatireoidismo pelo menos duas causas da hipocalcemia – secreção comprometida
adquirido era a cirurgia para o hipertireoidismo; agora, o hipopara- do PTH e responsividade reduzida ao PTH. Para uma discussão adi-
tireoidismo ocorre habitualmente após uma cirurgia para o hiper- cional sobre as causas e o tratamento da hipomagnesemia, ver Capí-
paratireoidismo quando o cirurgião, ao se deparar com o dilema de tulo 25.
remover pouquíssimo tecido e, dessa forma, não curar o hiperparati- Os efeitos do magnésio sobre a secreção de PTH são semelhan-
reoidismo, acaba removendo quantidade excessiva do tecido. A fun- tes aos do cálcio; a hipermagnesemia suprime e a hipomagnesemia
ção paratireoidiana pode não estar totalmente ausente em todos os estimula a secreção de PTH. Contudo, normalmente os efeitos do
pacientes com hipoparatireoidismo pós-operatório. magnésio sobre a secreção de PTH comportam pouco significado,
As causas ainda mais raras do hipoparatireoidismo crônico ad- pois os efeitos do cálcio predominam. É necessária maior mudan-
quirido consistem no dano actínico subsequente à terapia com iodo ça no magnésio que no cálcio para poder influenciar a secreção de
radioativo do hipertireoidismo e dano glandular observado nos hormônio. Não obstante, poderia esperar-se que a hipomagnesemia
pacientes com hemocromatose ou hemossiderose após repetidas viesse a aumentar a secreção de hormônio. Por isso, é surpreendente
transfusões de sangue. A infecção pode acometer uma ou mais das constatar que a hipomagnesemia grave está associada a menor secre-
paratireoides, porém não costuma causar hipoparatireoidismo, pois ção de PTH. A explicação para esse paradoxo é que a hipomagne-
raramente são afetadas as quatro glândulas. semia crônica grave acarreta deficiência de magnésio intracelular, o
O hipoparatireoidismo transitório é frequente após uma cirurgia que interfere na secreção e nas respostas periféricas ao PTH. O meca-
para o hiperparatireoidismo. Depois de um período variável de hi- nismo das anormalidades celulares causadas pela hipomagnesemia é
334
desconhecido, mas foram propostos efeitos sobre a adenilato ciclase dades suprafisiológicas de vitamina D ou calcitriol corrige a absorção
(da qual o magnésio é um cofator). de cálcio comprometida. Como são observados níveis elevados de
Os níveis de PTH não são identificáveis ou se mostram inapro- FGF23 até mesmo nos estágios iniciais da insuficiência renal em al-
priadamente baixos na hipomagnesemia grave não obstante o estí- guns pacientes, e foi relatado que esses níveis estão correlacionados
mulo da hipocalcemia acentuada, e a repleção aguda do magnésio a uma taxa aumentada de mortalidade, existe um interesse atual por
induz a um rápido aumento no nível de PTH. Com frequência, os métodos (reduzindo a absorção do fosfato) para diminuir os níveis
níveis séricos de fosfato não se mostram elevados, o que se diferen- de FGF23, bem como uma preocupação quanto ao fato de a suple-
cia da situação observada no hipoparatireoidismo adquirido ou no mentação de vitamina D (que fisiologicamente aumenta o FGF23)
idiopático, provavelmente porque a deficiência de fosfato é frequen- aumentar o FGF23 na DRC.
temente observada na hipomagnesemia. A hiperfosfatemia na insuficiência renal reduz os níveis de cálcio
A menor responsividade periférica ao PTH ocorre também em no sangue por vários mecanismos, como a deposição extra-óssea de
alguns pacientes, conforme documentado por resposta subnormal cálcio e fosfato, ação de reabsorção óssea do PTH comprometida e
no fósforo urinário e na excreção urinária de AMP cíclico após a redução na produção de 1,25(OH)2D pelo tecido renal restante.
administração de PTH exógeno aos pacientes hipocalcêmicos e hi-
CAPÍTULO 27
pomagnesêmicos. Tanto a menor secreção de PTH quanto a falta
de resposta renal ao PTH administrado podem ocorrer no mesmo
paciente. Quando é empreendida a repleção aguda do magnésio, a TRATAMENTO Insuficiência renal crônica
restauração dos níveis de PTH para valores normais ou supranormais
pode preceder a restauração do cálcio sérico normal em vários dias. A terapia da insuficiência renal crônica envolve o controle apro-
priado dos pacientes antes da diálise e o ajuste dos esquemas
depois que a diálise tiver sido iniciada. Deve ser dada a devida
atenção a restrição do fosfato na dieta; evitar os antiácidos fixa-
TRATAMENTO Hipomagnesemia dores de fosfato que contêm alumínio para prevenir o problema
da intoxicação pelo alumínio; promover uma ingestão oral de
grave dos idosos, porém a deficiência D deve ser aventada no diag- associação a defeitos esqueléticos e desenvolvimentais distintos. A
nóstico diferencial de hipocalcemia leve. hipocalcemia é devida a uma resposta deficiente ao PTH, que prova-
SEÇÃO V
Hipocalcemia leve, hiperparatireoidismo secundário, hipofosfa- velmente se restringe aos túbulos renais proximais. A hiperplasia das
temia acentuada e uma grande variedade de deficiências nutricionais paratireoides, que representa uma resposta à hipocalcemia resistente
ocorrem com as doenças gastrintestinais. A disfunção hepatocelular a hormônio, causa elevação dos níveis de PTH. Estudos tanto clíni-
pode acarretar redução nos níveis de 25(OH)D, como ocorre na cir- cos quanto básicos esclareceram alguns aspectos desses distúrbios,
rose hepática portal ou na biliar, e a má absorção de vitamina D e incluindo o espectro clínico variável, a fisiopatologia, os defeitos ge-
de seus metabólitos, incluindo 1,25(OH)2D, pode ocorrer em várias néticos e seu modo de herança.
doenças intestinais, hereditárias ou adquiridas. A própria hipocalce- Uma classificação funcional das várias formas de PHP é apre-
mia pode resultar em esteatorreia devido à deficiente produção de sentada no Quadro 27.6. O esquema de classificação se baseia nos
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
enzimas pancreáticas e sais biliares. Dependendo do distúrbio, a vita- sinais de ação ineficaz do PTH (cálcio baixo e fosfato alto), resposta
mina D ou seus metabólitos podem ser administrados por via paren- do AMP cíclico urinário ao PTH exógeno, presença ou ausência da
teral, garantindo níveis sanguíneos adequados de metabólitos ativos. osteodistrofia hereditária de Albright (OHA), e ensaios para medir a
concentração da subunidade Gs da enzima adenilato ciclase. Com a
Metabolismo defeituoso da vitamina D utilização desses critérios, identificam-se quatro tipos: PHP tipos Ia
Terapia anticonvulsivante A terapia anticonvulsivante com qualquer e Ib; pseudopseudo-hipoparatireoidismo (PPHP) e o distúrbio rela-
um de vários agentes induz a uma deficiência adquirida de vitamina cionado POH, e PHP-II.
D por aumentar a conversão da vitamina D em compostos inativos
PHP-Ia e PHP-Ib Os indivíduos com PHP-I, o mais comum dos distúr-
e/ou por causar resistência à sua ação. Quanto mais precária for a in-
bios, mostram uma resposta do AMP cíclico urinário deficiente após
gestão de vitamina D na dieta, maior será a probabilidade de a terapia
a administração do PTH exógeno. Os pacientes com PHP-I são dividi-
anticonvulsivante resultar em metabolismo mineral e ósseo anormal.
dos em tipo Ia e tipo Ib. Os pacientes com PHP-Ia exibem evidências
Raquitismo tipo I dependente de vitamina D O raquitismo pode ser de OHA e quantidades reduzidas de proteína/atividade Gs em tecidos
causado por resistência à ação da vitamina D assim como por uma facilmente acessíveis, como os eritrócitos, os linfócitos e os fibroblas-
deficiência de vitamina D. O raquitismo tipo I dependente de vita- tos. Os pacientes com PHP-Ib carecem de evidências de OHA e exi-
mina D, antes denominado pseudorraquitismo resistente à vitamina bem atividade de Gs normal. O PHP-Ic, algumas listado como uma
D, difere do raquitismo verdadeiro resistente à vitamina D (raqui- terceira forma de PHP, é, na realidade, uma variante do PHP-Ia, visto
tismo tipo II dependente de vitamina D, ver adiante) por ser menos que a Gs mutante exibe atividade normal em certos ensaios in vitro.
grave e as anormalidades bioquímicas e radiográficas poderem ser A maioria dos pacientes que apresentam PHP-Ia revela elemen-
revertidas com doses apropriadas do metabólito ativo da vitami- tos característicos de OHA, consistindo em estatura baixa, face ar-
na, 1,25(OH)2D3. As quantidades fisiológicas de calcitriol curam a redondada, anomalias esqueléticas (braquidactilia) e/ou calcificação
doença (Cap. 25), achado compatível com a fisiopatologia do distúr- heterotópica. Os pacientes possuem níveis de cálcio baixos e de fos-
bio, autossômico recessivo, e sabe-se agora que é causado por mu- fato altos, como acontece com o hipoparatireoidismo verdadeiro. No
tações no gene que codifica a 25(OH)D-1a-hidroxilase. Ambos os entanto, os níveis de PTH se mostram elevados, refletindo resistência
alelos são inativados em todos os pacientes, e os compostos heterozi- à ação do hormônio.
gotos, que contêm mutações distintas, são comuns. Depósitos amorfos de cálcio e fosfato são encontrados nos gân-
As características clínicas consistem em hipocalcemia, na maio- glios basais em cerca de 50% dos pacientes. Os defeitos nos ossos
ria das vezes com tetania ou convulsões, hipofosfatemia, hiper- metacarpais e metatarsais às vezes são acompanhados também por
paratireoidismo secundário e osteomalacia, associada frequente- falanges curtas, o que reflete possivelmente o fechamento prema-
mente a deformidades esqueléticas e maior quantidade de fosfatase turo das epífises. Os achados típicos são os quarto e quinto meta-
carpais, bem como os metatarsais curtos. Em geral, os defeitos são
alcalina. O tratamento consiste em doses fisiológicas de reposição de
bilaterais. As exostoses e o rádio curvo são frequentes. Deficiências
1,25(OH)2D3 (Cap. 25).
na olfação e no paladar, assim como anormalidades nos dermatogli-
Raquitismo tipo II dependente de vitamina D O raquitismo depen- fos já foram relatadas.
dente de vitamina D tipo II resulta da resistência dos órgãos-alvo ao
metabolismo ativo 1,25 (OH)2 D3. As manifestações clínicas asseme- Herança e padrões genéticos
lham-se às da doença tipo I e incluem hipocalcemia, hipofosfatemia, Já foram identificados múltiplos defeitos no locus GNAS em pacien-
hiperparatireoidismo secundário e raquitismo, bem como alopecia tes com PHP-Ia, PHP-Ib e PPHP. Esse gene, localizado no cromos-
parcial ou total. Os níveis plasmáticos de 1,25 (OH)2 D estão ele- somo 20q13.3, codifica a subunidade da proteína G estimuladora
vados, refletindo a refratariedade dos órgãos-alvo. Esse distúrbio é (Gs), entre outros produtos (ver adiante). As mutações incluem
causado por mutações do gene que codifica o receptor de vitamina D; anormalidades nas junções de união associadas à produção deficien-
o tratamento é difícil e exige infusões de cálcio regulares e habitual- te de mRNA, mutações pontuais, inserções e/ou deleções, que resul-
mente noturnas (Cap. 25). tam, todas elas, em uma proteína com função defeituosa, isto é, uma
redução de 50% na atividade de Gs nos eritrócitos ou outras células.
Pseudo-hipoparatireoidismo As análises detalhadas da transmissão da doença em famílias afe-
O PHP refere-se a um grupo de distúrbios hereditários distintos. Os tadas esclareceram muitos aspectos de PHP-Ia, PPHP e PHP-Ib (Fig.
pacientes caracterizam-se por sinais e sintomas de hipocalcemia em 27.7). As duas primeiras entidades, rastreadas por meio de múltiplas
336
perda da metilação do DNA em um ou vários loci do alelo mater-
no (Quadro 27.6). Essas anormalidades na metilação silenciam a ex-
pressão do gene. No córtex renal – onde a Gs parece ser expressa
exclusivamente a partir do alelo materno –, isso leva à resistência ao
PTH. Em outros tecidos, a expressão da Gs não é impressa; dessa
maneira, os eritrócitos apresentam níveis normais de Gs. O PHP-Ib,
que carece do fenótipo OHA na maioria dos casos, compartilha com
o PHP-Ia a hipocalcemia e a hiperfosfatemia causadas pela resistência
ao PTH e, portanto, a resposta urinária atenuada do AMP cíclico ao
PTH administrado, um teste padronizado para determinar a presen-
ça ou a ausência de resistência hormonal (Quadro 27.6). Além disso,
essas anormalidades endócrinas só se tornam evidentes se a mutação
causadora da doença for herdada da mãe. A responsividade do osso
pode ser excessiva em vez de atenuada em pacientes com PHP-Ib (e
CAPÍTULO 27
PHP-Ia PHPP PHP-Ia), com base em relatos de casos que enfatizaram um padrão
AMP cíclico/
fosfato
PTH (+ OHA) PTH (+ OHA) semelhante ao da osteíte fibrosa em vários pacientes com PHP-Ib.
urinário PHP-II refere-se aos pacientes com hipocalcemia e hiperfosfate-
mia que apresentam uma resposta urinária normal do AMP cíclico
ao PTH, porém com resposta fosfatúrica comprometida ao hormô-
Figura 27.7 Impressão paterna da resistência renal ao paratormônio nio. Admite-se que estes pacientes possuem um defeito na resposta
(PTH) (GNAS-1, gene para a subunidade Gs) no pseudo-hipoparatireoidismo (PH-
ao PTH em um locus distal à produção de AMP cíclico. Ainda não foi
PIa). Menor excreção de AMP cíclico e fosfato urinários é observada nos pacientes
com PHP. No córtex renal, existe o silenciamento seletivo do mRNA do gene Gs
estabelecido por que a resistência ao PTH em alguns pacientes, desig-
paterno. A doença se manifesta apenas nos pacientes que herdam o gene defeituoso nada como PHP-II, pode ser tratada com suplementos de vitamina D.
nistração de antiácidos fixadores do fosfato ou recorrendo à diálise, como acontece no hipoparatireoidismo. A insuficiência renal crônica
que se torna necessária com frequência para o controle da insufi- está associada frequentemente à hipocalcemia e hiperfosfatemia, não
ciência renal. A reposição do cálcio poderá ser necessária quando
obstante o hiperparatireoidismo secundário.
a hipocalcemia for intensa e sintomática, porém a administração
O diagnóstico é estabelecido habitualmente pela aplicação dos
de cálcio durante o período hiperfosfatêmico tende a aumentar a
imunoensaios para PTH, testes para os metabólitos da vitamina D e
deposição extraóssea de cálcio e agravar o dano tecidual. Os níveis
mensurações da resposta do AMP cíclico urinário ao PTH exógeno.
de 1,25(OH)2D podem ser baixos durante a fase hiperfosfatêmica e
No hiperparatireoidismo hereditário e no adquirido, bem como na
retornar ao normal durante a fase oligúrica da recuperação.
hipomagnesemia grave, o PTH pode não ser identificável ou estar na
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
338
no hipoparatireoidismo, pois o defeito reside na hidroxilação pela BIBLIOGRAFIA
25(OH)D-1-hidroxilase. O calcitriol é usado também nos dis- Bastepe M, Jüppner H: Pseudohypoparathyroidism, Albright’s hereditary
túrbios da 25(OH)D-1-hidroxilase; os defeitos no receptor da osteodystrophy, and progressive osseous heteroplasia: Disorders caused by
vitamina D são muito mais difíceis de tratar. inactivating GNAS mutations, in Endocrinology, 6th ed, in Endocrinology,
Os pacientes com hipoparatireoidismo devem receber 2 a 3 g JL Jameson, LJ DeGroot (eds), Philadelphia, W.B. Saunders Company,
de cálcio elementar VO a cada dia. Os dois agentes, vitamina D ou 2011
calcitriol e cálcio oral, podem ser modificados independentemen- Bilezikian JP et al: Guidelines for the management of asymptomatic primary
te um do outro. A excreção urinária de cálcio precisa ser cuida- hyperparathyroidism: Summary statement from the third international
dosamente monitorada. Se a hipocalcemia alterna com episódios workshop. J Clin Endocrinol Metab 94:335, 2009
de hipercalcemia em pacientes altamente frágeis com hipoparati- Thakker RV et al: Genetic disorders of calcium homeostasis caused by ab-
reoidismo, a administração de calcitrol e o uso de tiazidas, como normal regulation of parathyroid hormone secretion or responsiveness,
abordado anteriormente, pode facilitar a conduta terapêutica. in Endocrinology, 6th ed, in Endocrinology, JL Jameson, LJ DeGroot (eds),
Philadelphia, W.B. Saunders Company, 2011
CAPÍTULO 27
Doenças das Glândulas Paratireoides e Homeostasia do Cálcio
339
CAPÍTULO 28 3.000
Mulheres
Quadril
Osteoporose
Incidência/100.000 pessoas-ano
Robert Lindsay 2.000
Vertebras
Felicia Cosman
340
QUADRO 28.1 Fatores de risco para fratura por osteoporose
Não modificáveis Deficiência de estrogênio
História pessoal de fratura na Menopausa precoce (< 45 anos)
idade adulta ou oofarectomia bilateral
História de fratura em um Amenorreia pré‑menstrual
parente de primeiro grau prolongada (> 1 ano)
Sexo feminino Baixa ingestão de cálcio
Idade avançada Alcoolismo
Raça branca Comprometimento da visão, a
Demência despeito da correção adequada
Potencialmente modificáveis Quedas recorrentes
Tabagismo atual Atividade física inadequada
Capítulo 28
Baixo peso corporal (< 58 kg) Saúde precária/fragilidade
Osteoporose
ção esquelética, que alcança massa e densidade máximas no início
da vida adulta. É por volta da puberdade que o dimorfismo sexual
algumas outras culturas, possivelmente em virtude da genética, do
no tamanho esquelético torna-se óbvio, porém a densidade óssea
nível de atividade física ou da dieta.
verdadeira continua sendo semelhante entre os sexos. A nutrição
As próprias fraturas representam fatores de risco para a ocor-
e o estilo de vida também desempenham um papel importante no
rência de futuras fraturas (Quadro 28.1). As fraturas vertebrais au-
crescimento, porém os fatores genéticos são os principais determi-
mentam o risco de outras fraturas vertebrais, assim como de fratu-
nantes da massa e da densidade esqueléticas máximas. Numerosos
ras do esqueleto periférico, como quadril e punho. As fraturas do
genes controlam o crescimento esquelético, o pico da massa óssea
punho também elevam o risco de fraturas vertebrais e do quadril.
e as dimensões corporais, assim como a estrutura e a densidade es-
Consequentemente, entre os indivíduos com mais de 50 anos de
queléticas. Estimativas de hereditariedade de 50 a 80% para a densi-
idade, qualquer fratura deve ser considerada como estando relacio-
dade e o tamanho dos ossos foram obtidas tendo como base estudos
nada potencialmente com a osteoporose, independentemente das
realizados em gêmeos. Apesar de o pico de massa óssea ser mais
circunstâncias da fratura. A fratura do osso osteoporótico é mais
baixo com bastante frequência entre os indivíduos com anteceden-
provável que aquela do osso normal para qualquer nível de trau-
tes familiares de osteoporose, os estudos de associação dos genes
matismo, e uma fratura em alguém com mais de 50 anos de idade
candidatos (o receptor da vitamina D; colágeno tipo I, o receptor de
torna necessária uma avaliação para detectar a possível presença de
estrogênio (ER) e a interleucina [IL] 6; e o fator de crescimento se-
osteoporose.
melhante à insulina I [IGF-I]) com a massa óssea, o remodelamento
ósseo e a prevalência de fraturas foram inconsistentes. Os estudos
FISIOPATOLOGIA de ligação sugerem que um locus genético no cromossomo 11 está
associado a alta massa óssea. Mostrou-se que as famílias com alta
■■ REMODELAMENTO ÓSSEO
massa óssea e sem muita perda óssea aparente relacionada com a
A osteoporose resulta da perda óssea devida a modificações rela- idade possuem uma mutação pontual em LRP5, uma proteína rela-
cionadas com a idade no remodelamento ósseo, assim como de fa- cionada com o receptor da lipoproteína de baixa densidade. O pa-
tores extrínsecos e intrínsecos que exageram esse processo. Essas pel desse gene na população geral não é claro, porém uma mutação
modificações podem se sobrepor a um baixo pico de massa óssea. não funcional resulta em síndrome de osteoporose pseudoglioma,
Consequentemente, uma boa compreensão do processo de remo- e a sinalização de LRP5 parece ser importante no controle da for-
delamento ósseo é fundamental para poder entender a fisiopatolo- mação óssea.
gia da osteoporose (Cap. 25). Durante o crescimento, o esqueleto Nos adultos, é o remodelamento ósseo, e não a modelagem, que
aumenta de tamanho por crescimento linear e por aposição de um representa o processo esquelético metabólico principal. O remode-
lamento ósseo desempenha duas funções primárias: (1) reparar as
microlesões dentro do esqueleto para manter a resistência esquelética
FATORES QUE LEVAM A FRATURAS e (2) suprir cálcio a partir do esqueleto para manter o cálcio sérico.
Envelhe- Outros fatores
O remodelamento pode ser ativado por microlesões do osso como
cimento
Menopausa
de risco resultado de um estresse excessivo ou acumulado. As demandas agu-
das de cálcio envolvem a reabsorção mediada pelos osteoclastos e o
transporte do cálcio pelos osteócitos. As demandas crônicas de cálcio
Aumento da Baixo pico de resultam em hiperparatireoidismo secundário, remodelamento ósseo
perda óssea massa óssea
Baixa densidade
aumentado e perda global de tecido ósseo.
óssea O remodelamento ósseo também é regulado por vários hormô-
nios circulantes, incluindo estrogênios, androgênios, vitamina D e
Propensão Má-qualidade paratormônio (PTH), assim como por fatores do crescimento pro-
a quedas do osso
duzidos localmente, como o IGF-I e o hormônio do crescimento
Fraturas imunorreativo II (IGH-II), o fator de crescimento de transformador
(TGF ), o peptídio relacionado ao paratormônio (PTHrP), inter-
Figura 28.3 Fatores que levam a fraturas osteoporóticas. leucinas (IL), prostaglandinas e membros da superfamília do fator
341
Pré-osteoclasto RANK pelo RANKL é uma via comum final no desenvolvimento e na
ativação dos osteoclastos. Um atrativo humoral para RANKL, tam-
bém secretado pelos osteoblastos, é denominado de osteoprotegerina
(Fig. 28.5). A modulação do recrutamento e da atividade dos oste-
oclastos parece relacionada com a interação entre esses três fatores.
UMB Influências adicionais incluem nutrição (particularmente a ingestão
A de cálcio) e nível de atividade física.
Pré-osteoblasto Em adultos jovens, o osso reabsorvido é substituído por uma
quantidade igual de tecido ósseo novo. Assim sendo, a massa do
esqueleto se mantém constante depois que é alcançado um pico de
massa óssea na vida adulta. Entretanto, após os 30 a 45 anos de idade,
os processos de reabsorção e de formação sofrem um desequilíbrio e
a reabsorção supera a formação. Esse desequilíbrio pode começar em
Osteoclasto idades diferentes e varia em diferentes locais esqueléticos, tornando-
B
-se exagerado nas mulheres após a menopausa. A perda óssea exces-
SEÇÃO V
342
A CFU-GM B
OPG
Linfócitos T Fibroblastos
RANKL
ativados sinoviais M-CSF M-CSF
RANK ativados
Pré-osteoclasto
Células
dendríticas
ativadas
T T
Osteoclasto
multinucleado
Capítulo 28
Osteoblastos ou células Osso
estromais da medula óssea Osteoclato Osteoclasto
ativado apoptótico
Fatores pró-reabsortivos 1,25(OH)2 vitamina D3. PTH, PTHrP, PGE2, IL-1, IL-6, Fatores anabólicos Estrogênios, calcitonina, BMP 2/4, TGF- , TPO, IL-17,
Osteoporose
e calciotrópicos TNF, prolactina, corticosteroides, oncostatina M, LIF ou antirreabsortivos PDGF, cálcio
Figura 28.5 Controle hormonal da reabsorção óssea. A. Fatores pró-rea- nuição da sobrevida dos osteoclastos preexistentes. CFU-GM, unidades formadoras
bsortivos e calciotrópicos. B. Fatores anabólicos e antiosteoclásticos. A expressão de colônias, de granulócitos macrófagos; M-CSF, fator de estimulação de colônias
de RANKL é induzida nos osteoblastos, células T ativadas, fibroblastos sinoviais e de macrófagos; RANKL, receptor ativador do fator nuclear NFB; PTH, paratormônio;
células estromais da medula óssea. Liga-se ao receptor RANK ligado à membra- PGE2, prostaglandina E2; TNF, fator de necrose tumoral; LIF, fator inibidor da leu-
na para promover a diferenciação, a ativação e a sobrevida dos osteoclastos. Em cemia; TPO, trombospondina; PDGF, fator de crescimento derivado das plaquetas;
contrapartida, a expressão da osteoprotegerina (OPG) é induzida por fatores que OPG-L, osteoprotegerina-ligante; IL, interleucina; TGF-, fator de crescimento trans-
bloqueiam o catabolismo ósseo e que promovem efeitos anabólicos. A OPG liga-se formador . (De WJ Boyle et al.: Nature 423:337, 2003.)
ao RANKL e o neutraliza, resultando em bloqueio na osteoclastogênese e em dimi-
vitamina D pode ser mais prevalente que se pensava previamente, ■■ ESTADO ESTROGÊNICO
em particular entre os indivíduos que correm maior risco, como os
A deficiência estrogênica provavelmente causa perda óssea por dois
idosos; aqueles que vivem em latitudes mais ao norte; e indivíduos
mecanismos distintos, porém inter-relacionados: (1) ativação de no-
com nutrição precária, má absorção ou doença hepática ou renal
vos locais de remodelamento ósseo e (2) exagero do desequilíbrio
crônica. Os indivíduos de pele escura também correm alto risco de
entre formação e reabsorção ósseas. A mudança na frequência de
deficiência de vitamina D. Um consenso de especialistas sugeriu
ativação causa uma perda óssea transitória até que tenha sido alcan-
que os níveis séricos aceitos para 25-hidroxivitamina D [25(OH)D] çado um novo estado estável (de equilíbrio dinâmico) entre reab-
foram estabelecidos em um padrão excessivamente baixo e que os sorção e formação. Entretanto, o desequilíbrio no remodelamento
alvos ideais para 25(OH)D sérica são > 75 nmol/L (30 ng/mL). Para resulta em uma redução permanente na massa. Além disso, a pró-
conseguir esse nível na maioria dos adultos, é necessário um aporte pria presença de mais locais de remodelamento no esqueleto eleva a
de 800 a 1.000 unidades/dia, em particular no caso de indivíduos probabilidade de que as trabéculas serão penetradas, eliminando o
que evitam exposição solar ou utilizam sistematicamente proteto- molde sobre o qual poderá ser formado o osso novo e acelerando a
res solares. A insuficiência de vitamina D resulta em hiperparati- perda de tecido ósseo.
reoidismo secundário compensatório e constitui um fator de risco O estado mais comum de deficiência de estrogênio é a inter-
importante para a osteoporose e as fraturas. Alguns estudos mos- rupção da função ovariana por ocasião da menopausa, que ocorre
traram que mais de 50% dos pacientes internados em um serviço de em média aos 51 anos de idade (Cap. 12). Assim sendo, com a atual
clínica geral exibem características bioquímicas de deficiência de expectativa de vida, uma mulher comum passará cerca de 30 anos
vitamina D, incluindo maiores níveis de PTH e de fosfatase alcalina sem um aporte ovariano de estrogênio. O mecanismo pelo qual a
e níveis mais baixos de cálcio ionizado. Nas mulheres que vivem deficiência de estrogênio causa perda óssea está resumido na Figu-
em latitudes ao norte, os níveis de vitamina D diminuem durante ra 28.5. As células da medula óssea (macrófagos, monócitos, pre-
os meses de inverno. Isso está associado à perda óssea sazonal, re- cursores dos osteoclastos, mastócitos), assim como as células ósseas
fletindo maior renovação (turnover) do osso. Até mesmo entre os (osteoblastos, osteócitos, osteoclastos), expressam os receptores es-
indivíduos sadios que deambulam a prevalência de leve deficiên- trogênicos (ER) e . A perda de estrogênio faz aumentar a pro-
cia de vitamina D está aumentando. O tratamento com vitamina dução de RANKL e pode reduzir a produção de osteoprotegerina,
D pode normalizar os níveis (> 75 mol/L [30 ng/mL]) e prevenir aumentando o recrutamento de osteoclastos. O estrogênio também
o aumento associado no remodelamento ósseo, a perda óssea e as pode desempenhar um papel importante por determinar o período
fraturas. Taxas reduzidas de fraturas também foram documentadas de vida das células ósseas, controlando o ritmo de apoptose. Assim
entre indivíduos nas latitudes ao norte que ingerem maiores quan- sendo, nas situações de privação de estrogênio, a sobrevida dos os-
tidades de vitamina D e possuem níveis mais altos de 25(OH)D (ver teoblastos pode ser reduzida, enquanto a longevidade e a atividade
adiante). A suficiência da vitamina D também pode afetar o risco e/ dos osteoclastos aumentam.
ou a gravidade de outras doenças, incluindo cânceres (colorretal, de Uma vez que o remodelamento é iniciado na superfície do osso,
próstata e mama), doenças autoimunes e diabetes. conclui-se que o osso trabecular – que possui uma área superficial
343
consideravelmente maior (80% do total) do que o osso cortical – será
afetado preferencialmente pela deficiência estrogênica. As fratu- QUADRO 28.2 Doenças associadas a um risco aumentado de
ras ocorrem mais precocemente nos locais em que o osso trabecu- osteoporose generalizada em adultos
lar contribui mais para a resistência do osso; consequentemente, as
fraturas vertebrais são a consequência mais precoce da deficiência Estados hipogonádicos Distúrbios/neoplasias malignas
Síndrome de Turner hematológicas
estrogênica.
Síndrome de Klinefelter Mieloma múltiplo
■■ ATIVIDADE FÍSICA Anorexia nervosa Linfoma e leucemia
A inatividade, como o repouso prolongado no leito ou uma paralisia, Amenorreia hipotalâmica Produção de paratormônio
resulta em perda óssea significativa. Consequentemente, os atletas (PTHrP) associada a neoplasia
Hiperprolactinemia maligna
possuem massa óssea mais alta que a população geral. Essas altera-
Outros estados hipogonádicos
ções na massa esquelética são mais acentuadas quando o estímulo Mastocitose
primários ou secundários
começa durante o crescimento e antes da idade da puberdade. Os Hemofilia
adultos são menos capazes que as crianças de aumentar a massa ós- Distúrbios endócrinos
Talassemia
sea após a restauração da atividade física. Os dados epidemiológicos Síndrome de Cushing
SEÇÃO V
Distúrbios hereditários
confirmam os efeitos benéficos dos altos níveis crônicos de atividade Hiperparatireoidismo selecionados
física sobre o esqueleto. O risco de fratura é menor nas comunidades Tireotoxicose
rurais e nos países em que a atividade física é mantida até uma ida- Osteogênese imperfecta
Diabetes melito tipo 1 Síndrome de Marfan
de mais avançada. Contudo, quando o exercício é iniciado durante a
vida adulta, os efeitos de um exercício moderado sobre o esqueleto Acromegalia Hemocromatose
são modestos, com um aumento da massa óssea de 1 a 2% nos estu- Insuficiência suprarrenal Hipofosfatasia
dos a curto prazo com menos de 2 anos de duração. Argumenta-se Distúrbios nutricionais e Doenças do estoque do
que os indivíduos mais ativos comportam menor probabilidade de gastrintestinais glicogênio
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
sofrer quedas e são mais capazes de se proteger durante as mesmas, Desnutrição Homocistinúria
reduzindo assim o risco de fratura. Nutrição parenteral Síndrome de Ehlers‑Danlos
Síndromes de má absorção Porfiria
■■ DOENÇA CRÔNICA
Gastrectomia Síndrome de Menkes
Várias doenças genéticas e adquiridas estão associadas a um au-
mento no risco de osteoporose (Quadro 28.2). Os mecanismos Doença hepática grave, Epidermólise bolhosa
particularmente cirrose biliar
que contribuem para a perda óssea são ímpares para cada doença e Outros distúrbios
resultam de múltiplos fatores, incluindo nutrição, níveis reduzidos Anemia perniciosa
Imobilização
de atividade física e fatores que afetam as taxas de remodelamento Distúrbios reumatológicos
ósseo. Na maioria das circunstâncias, porém não em todas, o diag- Doença pulmonar obstrutiva
Artrite rematoide crônica
nóstico primário é feito antes de a osteoporose manifestar-se clini-
Espondilite anquilosante Gestação e lactação
camente.
Escoliose
■■ MEDICAÇÕES Esclerose múltipla
Um grande número de medicações usadas na prática clínica com- Sarcoidose
porta efeitos potencialmente deletérios sobre o esqueleto (Quadro Amiloidose
28.3). Os glicocorticoides são a causa mais comum de osteoporose
induzida por medicação. Com demasiada frequência não é possível
determinar o grau em que a osteoporose está relacionada ao glico-
corticoide ou a outros fatores, pois o tratamento se sobrepõe aos ■■ TABAGISMO
efeitos da doença primária, que por si só pode estar associada à per-
O uso de cigarros durante um longo período comporta efeitos dele-
da óssea (p. ex., artrite reumatoide). As doses excessivas de hormô-
térios sobre a massa óssea. Esses efeitos podem ser mediados direta-
nio tireoidiano podem acelerar o remodelamento ósseo e resultar
mente, por efeitos tóxicos sobre os osteoblastos, ou indiretamente,
em perda óssea.
modificando o metabolismo do estrogênio. Em média, as tabagistas
Outras medicações exercem efeitos menos prejudiciais sobre o
alcançam a menopausa 1 a 2 anos antes que a população geral. O
esqueleto que as doses farmacológicas de glicocorticoides. Admite-
fumo de cigarros exerce também efeitos secundários que podem
-se que os anticonvulsivantes aumentam o risco de osteoporose,
porém muitos indivíduos acometidos possuem uma insuficiência modular o estado esquelético, incluindo enfermidades respiratórias
concomitante de 1,25(OH)2D, pois alguns anticonvulsivantes in- e de outra natureza intercorrente, fragilidade, quantidade reduzida
duzem o sistema do citocromo P450 e o metabolismo da vitamina de exercício, nutrição precária e a necessidade de utilizar medicações
D. Os pacientes submetidos a um transplante correm alto risco de adicionais (p. ex., glicocorticoides para a doença pulmonar).
perda óssea rápida e de fratura, não apenas em virtude dos glico-
corticoides, mas também do tratamento com outros imunossupres-
sores, tais como ciclosporina e tacrolimus (FK506). Além disso, QUADRO 28.3 Substâncias e fármacos associados a um risco
com bastante frequência esses pacientes sofrem de anormalidades aumentado de osteoporose generalizada em adulto
metabólicas subjacentes, como insuficiência hepática ou renal, que
Glicocorticoides Tiroxina excessiva
predispõem à perda óssea.
Os inibidores da aromatase, que bloqueiam significativamente a Ciclosporina Alumínio
enzima aromatase que transforma os androgênios e outros precur- Agentes citotóxicos Agonistas do hormônio de liberação das
sores suprarrenais em estrogênio, reduzem drasticamente os níveis gonadotrofinas
circulantes de estrogênio pós-menopausa. Mostrou-se que esses Anticonvulsivantes Heparina
agentes, que são usados em vários estágios do tratamento do câncer Álcool em excesso Lítio
de mama, também exercem um efeito prejudicial sobre a densidade Inibidores da aromatase
óssea e elevam o risco de fratura.
344
MENSURAÇÃO DA MASSA ÓSSEA A US é usada para medir a massa óssea calculando a atenuação
do sinal quando passa através do osso ou a velocidade com que atra-
Dispõe-se de várias técnicas não invasivas para estimar a massa ou vessa o osso. Ainda não foi esclarecido se a US consegue avaliar ou-
densidade esquelética. Elas incluem densitometria óssea por meio de tras propriedades do osso além da massa (p. ex., qualidade), porém
absorciometria de raios X de dupla energia (DEXA), absorciometria essa é uma vantagem potencial da técnica. Por causa de seu custo
de raios X de energia única (SXA), TC quantitativa e ultra-sonogra- relativamente baixo e da mobilidade, a US pode ser utilizada como
fia (US). um procedimento de triagem.
A DEXA é uma técnica radiográfica altamente precisa que se tor- Todas essas técnicas para medir a DMO foram aprovadas pela
nou o padrão para medir a densidade óssea na maioria dos centros. U.S. Food and Drug Administration (FDA) com base em sua capa-
Embora possa ser usada para as mensurações de qualquer área es- cidade de prever o risco de fratura. O quadril é o local preferido da
quelética, as determinações clínicas são habitualmente feitas para a mensuração na maioria dos indivíduos, pois permite prever o risco
coluna lombar e o quadril. Foram desenvolvidos aparelhos portáteis de sua fratura, que é a consequência mais importante da osteoporose,
de DEXA que medem o calcanhar (calcâneo), o antebraço (rádio e melhor do que qualquer outro local de mensuração da densidade ós-
ulna) ou os dedos (falanges). A DEXA também pode ser usada para sea. Quando as mensurações do quadril são realizadas pela DEXA, a
medir a composição corporal. Na técnica com DEXA são usadas duas
Capítulo 28
coluna vertebral pode ser medida ao mesmo tempo. Nos indivíduos
energias de raios X para estimar a área de tecido mineralizado, e o mais jovens, como as mulheres na perimenopausa ou no início da
conteúdo mineral é dividido pela área, o que corrige em parte as dife- pós-menopausa, as mensurações da coluna podem ser o indicador
renças devidas ao tamanho corporal. Entretanto, essa correção é ape- mais sensível de perda óssea.
nas parcial, pois a DEXA é uma técnica de cintilografia bidimensional
que não pode estimar a profundidade nem o comprimento póstero-
■■ QUANDO MEDIR A MASSA ÓSSEA
-anterior do osso. Assim sendo, as pessoas pequenas costumam ter
uma densidade mineral óssea (DMO) abaixo da média. Os esporões Foram desenvolvidas diretrizes clínicas para a utilização da densi-
ósseos, que são comuns na osteoartrite, tendem a aumentar falsamen- tometria óssea na prática clínica. As diretrizes originais da National
te a densidade óssea da coluna vertebral e representam um proble- Osteoporosis Foundation recomendam as mensurações da massa
Osteoporose
ma específico na mensuração da coluna em indivíduos mais velhos. óssea em mulheres na pós-menopausa, admitindo que elas tenham
Levando-se em conta que a instrumentação para DEXA é proporcio- um ou mais fatores de risco para osteoporose além de idade, sexo
nada por vários fabricantes diferentes, o rendimento varia em termos e deficiência estrogênica. As diretrizes também recomendam que a
absolutos. Consequentemente, passou a ser uma prática padronizada mensuração da massa óssea deve ser aventada em todas as mulhe-
relacionar os resultados com valores “normais” utilizando os escores res por volta dos 65 anos de idade, posição essa que foi ratificada
T, que comparam os resultados individuais aos obtidos em uma popu- pela U.S. Preventive Health Services Task Force. Os critérios apro-
lação jovem com equivalência de raça e sexo. Os escores Z comparam vados para reembolso pelo Medicare da DMO estão resumidos no
os resultados individuais àqueles de uma população de idade equi- Quadro 28.4.
valente que demonstra também equivalência para raça e sexo. Assim
sendo, uma mulher de 60 anos com um escore Z de –1 (1 DP abaixo ■■ QUANDO TRATAR COM BASE NOS RESULTADOS DA
da média para a idade) possui um escore T de –2,5 (2,5 DP abaixo da MASSA ÓSSEA
média para um grupo controle jovem) (Fig. 28.6). Um escore T abai- A maioria das diretrizes sugere que os pacientes devem ser conside-
xo de –2,5 na coluna lombar, no colo do fêmur ou no quadril como rados para tratamento quando a DMO é > 2,5 DP abaixo do valor
um todo é interpretado como um diagnóstico de osteoporose. médio para adultos jovens (escore T > –2,5), um nível consistente
A TC é usada principalmente para medir a coluna vertebral e, com o diagnóstico de osteoporose. O tratamento também deve ser
mais recentemente, o quadril. O exame TC periférico é usado para aventado nas mulheres na pós-menopausa com fatores de risco, até
medir o osso no antebraço ou na tíbia. Os resultados obtidos pela TC mesmo quando a DMO não se enquadra na faixa para osteoporose.
são diferentes de todos os outros atualmente disponíveis, pois essa Os fatores de risco (idade, fratura prévia, história familiar de fratura
técnica é tridimensional e pode proporcionar uma densidade verda- do quadril, peso corporal baixo, consumo de cigarros, uso excessivo
deira (massa de tecido ósseo por unidade de volume). A TC também de álcool, uso de esteroides e artrite rematoide) podem ser combina-
pode analisar específica e separadamente o conteúdo de osso trabe- dos com a DMO para determinar a probabilidade de uma fratura ao
cular e de osso cortical e o volume. No entanto, o exame TC continua longo de um período de 5 ou 10 anos. Os limiares para o tratamento
sendo extremamente caro, envolve uma exposição maior à radiação, dependem das análises de custo-eficácia, porém provavelmente serão
além de ser menos reprodutível que a DEXA. Uma nova técnica que cerca de 1% por ano de risco nos EUA.
utiliza a TC de alta resolução (denominada TC Xtreme) pode pro-
porcionar também informação acerca da arquitetura esquelética, in-
cluindo a conectividade esponjosa.
Figura 28.6 Relação entre os escores Z e T em uma mulher de 60 anos de *Critérios adaptados do Bone Mass Measurement Act, 1998
idade. DMO, densidade mineral óssea; DP, desvio-padrão. Nota: DMO, densidade mineral óssea; FDA, U.S. Food and Drug Administration.
345
ABORDAGEM AO O mieloma pode disfarçar-se como osteoporose generaliza-
PACIENTE Osteoporose
da, porém manifesta-se mais comumente com dor óssea e lesões
A transição perimenopausa é uma boa oportunidade para iniciar características “entalhadas” na radiografia. A eletroforese sérica e
uma discussão acerca dos fatores de risco para osteoporose e uma urinária e a avaliação para as cadeias leves na urina são necessá-
análise das indicações para um teste de DMO. Uma anamnese mi- rias para excluir esse diagnóstico. Uma biópsia da medula óssea
nuciosa e um bom exame físico devem ser realizados para iden- poderá ser necessária para excluir o mieloma (nos pacientes com
tificar os fatores de risco para osteoporose. Um escore Z baixo resultados eletroforéticos duvidosos) e pode ser usada também
aumenta a suspeita de uma doença secundária. Uma redução da para excluir mastocitose, leucemia e outros distúrbios infiltrativos
altura > 2,5 a 3,8 cm constitui indicação para solicitar uma ra- da medula óssea, como a doença de Gaucher.
diografia ou realizar uma avaliação para possível fratura vertebral
BIÓPSIA ÓSSEA A marcação óssea com tetraciclina permite de-
pela DEXA, a fim de excluir as fraturas vertebrais assintomáticas,
terminar a velocidade de remodelamento, assim como a avaliação
o mesmo ocorrendo com a presença de uma cifose significativa
para detectar outras doenças ósseas metabólicas. O uso atual dos
ou de dor nas costas, em particular se teve início após a menopau-
testes da DMO, em combinação com a avaliação hormonal e os
sa. Nos pacientes que se apresentam com fraturas, é importante
marcadores bioquímicos de remodelamento ósseo, substituiu em
certificar-se de que as mesmas não são causadas por uma malig-
SEÇÃO V
346
TRATAMENTO Osteoporose necer em ambientes fechados e ao início do isolamento social.
Algumas vezes, esses sintomas podem ser aliviados pelo apoio da
CONDUTA NAS FRATURAS OSTEOPORÓTICAS O tratamento de um família e/ou psicoterapia. As medicações poderão ser necessárias
paciente com osteoporose envolve com frequência o controle das quando houver características depressivas.
fraturas agudas, assim como o tratamento da doença subjacente. CONTROLE DA DOENÇA SUBJACENTE
As fraturas de quadril tornam necessário quase sempre o reparo
cirúrgico para que o paciente possa voltar a deambular. Depen- Redução dos fatores de risco O estabelecimento do risco de fraturas
dendo da localização e da gravidade da fratura, da condição da pode ser estimado pelo uso de calculadores FRAX que estão dispo-
articulação adjacente e do estado geral do paciente, os procedi- níveis online (http://www.shef.ac.uk/FRAX/tool.jsp?locationValue=9)
mentos podem incluir redução aberta e fixação interna com pinos (Fig. 28.7). Os pacientes deverão receber uma educação abrangente
e placas, hemiartroplastias e artroplastias totais, procedimentos que lhes permita reduzir o impacto dos fatores de risco modificá-
cirúrgicos seguidos por reabilitação intensa na tentativa de de- veis associados à perda óssea e às quedas. As medicações devem ser
volver aos pacientes seu nível funcional pré-fratura. As fraturas revistas para certificar-se de que todas são necessárias. Os glicocor-
Capítulo 28
dos ossos longos exigem com frequência uma fixação externa ou ticoides se estiverem sendo utilizados, devem ser avaliados a fim
interna. Outras fraturas (p. ex., vertebrais, das costelas e pélvicas) de determinar se estão verdadeiramente indicados e se estão sendo
são tratadas habitualmente com tratamento de suporte, dispen- administrados nas menores doses possíveis. Para os que recebem re-
sando qualquer tratamento ortopédico específico. posição do hormônio da tireoide, os testes do TSH devem ser feitos
Apenas cerca de 25 a 30% das fraturas vertebrais por com- para determinar se não está sendo utilizada uma dose excessiva, pois
pressão se manifestam com dor nas costas de início súbito. Para a tireotoxicose pode estar associada a aumento da perda óssea. Nos
as fraturas agudamente sintomáticas, o tratamento com analgé- pacientes que fumam, devem ser feitos todos os esforços capazes de
sicos é necessário, incluindo anti-inflamatórios não esteroidais facilitar o abandono do fumo. A redução dos fatores de risco para a
e/ou acetaminofeno, às vezes com o acréscimo de um agente ocorrência de quedas também inclui o tratamento do abuso de ál-
apioide (codeína ou oxicodona). Uns poucos e pequenos ensaios
Osteoporose
cool e uma revisão do esquema terapêutico para quaisquer medica-
clínicos randomizados sugerem que a calcitonina pode reduzir a mentos que possam estar associados à hipotensão ortostática e/ou
dor relacionada com a fratura vertebral aguda por compressão. sedação, incluindo hipnóticos e ansiolíticos. Se houver nictúria, a
Uma técnica desenvolvida recentemente envolve a injeção percu- frequência deve ser reduzida, se possível (p. ex., diminuindo ou mo-
tânea de um cimento artificial (polimetilmetacrilato) dentro do dificando o uso de diuréticos), pois a necessidade de levantar-se no
corpo vertebral (vertebroplastia ou cifoplastia); isso proporciona meio da noite constitui um fator desencadeante comum de queda.
alívio imediato e significativo da dor na maioria dos pacientes. Os pacientes devem ser instruídos acerca da segurança ambiental no
Os efeitos a longo prazo são desconhecidos e as conclusões se ba- que concerne à eliminação de fios elétricos expostos, a cordéis para
seiam em estudos de observação em pacientes com dor intensa cortinas, capachos escorregadiços e mesas móveis. Evitar o apoio
e persistente nas costas, secundária a fraturas vertebrais agudas dos pés descalços sobre assoalhos de madeira, checar as condições
ou subagudas. Ainda não foram realizados ensaios controlados dos tapetes (em particular nas escadas) e proporcionar boa ilumi-
e randomizados a longo prazo para a vertebroplastia ou a cifo- nação nos trajetos para os banheiros e para fora da casa são medidas
plastia. Períodos curtos de repouso no leito podem ser úteis para preventivas importantes. Recomenda-se o tratamento para uma vi-
o controle da dor; no entanto, em geral a mobilização precoce é são inadequada, que representa um problema particularmente com
recomendada porque ajuda a prevenir a perda óssea adicional a percepção da profundidade, que está associado principalmente a
associada à imobilização. Ocasionalmente, o uso de uma órtese maior risco de quedas. Os pacientes idosos com deficiências neu-
elástica macia pode facilitar a mobilização mais precoce. Os es- rológicas (p. ex., acidente vascular encefálico, doença de Parkinson,
pasmos musculares ocorrem com frequência nas fraturas agudas
doença de Alzheimer) correm um risco particularmente alto de cair
por compressão e podem ser tratados com relaxantes musculares
e necessitam de supervisão e assistência especializadas.
e calor local.
A dor intensa habitualmente regride em 6 a 10 semanas. A Recomendações nutricionais
dor crônica provavelmente não é de origem óssea; pelo contrário,
Cálcio Uma grande quantidade de dados indica que a ingestão
está relacionada com uma sobrecarga anormal que age sobre os
músculos, ligamentos e tendões, assim como a uma artrite secun- ideal de cálcio reduz a perda óssea e suprime o remodelamento ós-
dária das articulações facetárias associada a alterações no formato seo. As ingestões recomendadas pelo relatório de um Instituto de
torácico e/ou abdominal. O tratamento efetivo da dor crônica é Medicina são mostradas no Quadro 28.6. Os National Health and
difícil e pode exigir analgésicos, às vezes incluindo opioides. O Nutritional Evaluation Studies (NHANES) documentaram con-
repouso frequente e intermitente em uma posição supina ou se- sistentemente que a ingestão média de cálcio é consideravelmente
mirreclinada costuma ser necessário para permitir o relaxamento menor do que essas recomendações. A fonte preferida de cálcio
dos tecidos moles, que estão sob tensão. Os exercícios de forta- é representada pelos produtos lácteos e outros alimentos, porém
lecimento da musculatura paravertebral podem ser benéficos. O muitos pacientes necessitam de suplementação de cálcio. As fontes
calor local ajuda a relaxar os músculos e a reduzir o componente alimentares de cálcio são os produtos lácteos (leite, iogurte e quei-
muscular do desconforto. Várias modalidades físicas, como a US jo) e os alimentos enriquecidos, como certos cereais, panquecas,
e a estimulação neural transcutânea, podem ser benéficas em al- lanches, sucos e biscoitos. Alguns desses alimentos enriquecidos
guns pacientes. A dor também ocorre na região do pescoço, não contêm a mesma quantidade de cálcio do leite por porção.
como resultado das fraturas por compressão (que quase nunca Se for necessário um suplemento de cálcio, deverá ser forne-
ocorrem na coluna cervical como resultado da osteoporose), mas cido em doses ≤ 600 mg de cada vez, pois a fração de absorção
em virtude da sobrecarga crônica associada às tentativas de elevar do cálcio diminui nas doses mais altas. Os suplementos de cálcio
a cabeça em uma pessoa com cifose torácica acentuada. devem ser calculados com base no conteúdo de cálcio elementar
As fraturas vertebrais múltiplas estão frequentemente asso- do suplemento, e não no peso do sal de cálcio (Quadro 28.7). Os
ciadas a sintomas psicológicos; essa situação nem sempre é re- suplementos de cálcio que contêm carbonato devem ser tomados
conhecida. As mudanças na configuração corporal e a dor nas preferencialmente com os alimentos, pois necessitam de ácido
costas podem dar origem a uma enorme perda da autoimagem e para sua solubilidade. Os suplementos de citrato de cálcio podem
depressão secundária. O equilíbrio alterado, induzido pela cifose ser tomados a qualquer hora. Para confirmar a biodisponibili-
e pelo deslocamento anterior do centro da gravidade do corpo, dade, os suplementos de cálcio podem ser colocados em vinagre
gera o temor de cair, com uma tendência consequente a perma- destilado e deverão ser dissolvidos em 30 min.
347
SEÇÃO V
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
Figura 28.7 Instrumento de cálculo FRAX. Quando as respostas às perguntas ac.uk/FRAX/tool.jsp?locationValue=9) também pode ajustar o risco para vários gru-
indicadas são preenchidas, a calculadora pode ser usada para avaliar a probabili- pos étnicos.
dade de fratura em 10 anos. A calculadora (disponível online em http://www.shef.
Vários ensaios clínicos controlados de cálcio mais vitamina D Embora os efeitos colaterais do cálcio suplementar sejam mí-
confirmaram a ocorrência de reduções nas fraturas clínicas, incluin- nimos (eructação e constipação, principalmente com sais de car-
do as do quadril (redução do risco de cerca de 20 a 30%). Todos os bonato), nos indivíduos com história de cálculos renais deve-se
estudos recentes de agentes farmacológicos foram empreendidos no fazer uma determinação do cálcio urinário de 24 horas antes de
contexto de reposição do cálcio (± vitamina D). Assim sendo, cons- recomendar maior ingestão de cálcio, para evitar uma hipercalci-
titui uma prática padronizada garantir a ingestão adequada de cálcio úria significativa.
e vitamina D nos pacientes com osteoporose, independentemente de
estarem ou não recebendo terapia farmacológica adicional. Uma re- Vitamina D A vitamina D é sintetizada na pele sob a influência do
visão sistemática confirmou uma resposta maior da DMO à terapia calor e da luz ultravioleta (Cap. 25). No entanto, grandes segmentos
anti-reabsortiva quando a ingestão de cálcio era adequada. da população não obtêm uma quantidade suficiente de vitamina D
QUADRO 28.6 Ingestão adequada de cálcio QUADRO 28.7 Conteúdo de cálcio elementar de vários
Estimativa da ingestão diária preparados de cálcio orais
Grupo por estágio de vida adequada de cálcio, mg/dia Preparado de cálcio Conteúdo de cálcio elementar
Crianças pequenas (1 a 3 anos) 500 Citrato de cálcio 60 mg/300 mg
Crianças de mais idade (4 a 8 anos) 800 Lactato de cálcio 80 mg/600 mg
Adolescentes e adultos jovens (9 a 18 1.300 Gliconato de cálcio 40 mg/500 mg
anos)
Carbonato de cálcio 400 mg/g
Homens e mulheres (19 a 50 anos) 1.000
Carbonato de cálcio + 5 g de vitamina 250 mg/comprimido
Homens e mulheres (51 anos e de mais 1.200 D2 (OsCal 250)
idade)
Carbonato de cálcio (Tums 500) 500 mg/comprimido
Nota: As necessidades durante a gravidez e a lactação são as mesmas das mulheres não grá-
Fonte: Adaptado de SM Krane, MF Holick, Cap. 355, in Harrison’s Principles of Internal Medicine,
vidas (p. ex., 1.300 mg/dia para adolescentes/adultos jovens e 1.000 mg/dia para ≥19 anos).
14th ed.,1998.
Fonte: Adaptado do Standing Committee on the Scientific Evaluation of Dietary Reference Intakes.
Food and Nutrition Board. Institute of Medicine. Washington, DC, 1997, National Academy Press.
348
que lhes permita manter o que é considerado agora um suprimento mais amplos. A disponibilidade desses fármacos permite ajustar a
adequado [25(OH)D sérico consistentemente > 75 mol/L (30 ng/ terapia às necessidades de cada paciente.
mL)]. Sabendo-se que a suplementação com vitamina D nas doses
Estrogênios Uma grande quantidade de dados proporcionados por
que poderiam proporcionar esses níveis séricos é segura e barata, o
ensaios clínicos indica que vários tipos de estrogênios (estrogênios
instituto de medicina recomenda ingestões diárias de 200 UI para
equinos conjugados, estradiol, estrona, estrogênios esterificados,
adultos com menos de 50 anos de idade, 400 UI para aqueles com
etinil estradiol e mestranol) reduzem a renovação óssea, previnem
50 a 70 anos e 600 UI para aqueles com mais de 70 anos. Os com-
a perda óssea e induzem pequenos aumentos na massa óssea da co-
primidos com múltiplas vitaminas contêm habitualmente 400 UI e
luna vertebral, do quadril e do corpo como um todo. Os efeitos do
muitos suplementos de cálcio também contêm vitamina D. Alguns
estrogênio são observados em mulheres com menopausa natural ou
dados sugerem que doses mais altas (≥ 1.000 UI) poderão ser ne-
cirúrgica assim como em mulheres na pós-menopausa com ou sem
cessárias em idosos e indivíduos com doenças crônicas.
osteoporose estabelecida. Os estrogênios são eficazes quando admi-
Outros nutrientes Outros nutrientes, como sal, altas ingestões de nistrados pela VO ou transdérmica. Para as vias de administração
proteína animal e cafeína, podem exercer efeitos moderados so- tanto oral quanto transdérmica, os preparados combinados de estro-
Capítulo 28
bre a excreção ou a absorção do cálcio. O estado adequado da vi- gênio/progestogênio estão disponíveis agora em muitos países, elimi-
tamina K é necessário para a carboxilação adequada da osteocal- nando o problema de ter que tomar dois comprimidos ou de utilizar
cina. Os estados em que a nutrição ou o metabolismo da vitamina um adesivo (patch) e progestogênio oral. Um grande estudo, deno-
K é prejudicado, como acontece com a terapia prolongada com minado PEPI (Postmenopausal Estrogen/Progestin Intervention
varfarina, estiveram associados a massa óssea reduzida. A pesqui- Trial), indicou que apenas os progestogênios C-21 não aumentam
sa acerca da ingestão de refrigerantes a base de cola é controversa, o efeito das doses padronizadas de estrogênio sobre a massa óssea.
porém sugere uma possível associação a massa óssea reduzida por
Dose de estrogênio Para os estrogênios orais, as doses convencio-
meio de fatores que independem da cafeína.
O magnésio é abundante nos alimentos e sua deficiência é nais recomendadas foram de 0,3 mg/dia para os estrogênios este-
rificados, 0,625 mg/dia para os estrogênios equinos conjugados e 5
Osteoporose
bastante rara na ausência de uma doença crônica grave. A suple-
mentação de magnésio pode estar justificada nos pacientes com g/dia para etinil estradiol. Para o estrogênio transdérmico, a dose
doença inflamatória intestinal, doença celíaca, quimioterapia, usada comumente fornece 50 g de estradiol ao dia, apesar de uma
diarreia intensa, desnutrição ou alcoolismo. Os fitoestrogênios dose menor poder ser apropriada em algumas pacientes. Os dados
dietéticos, que derivam principalmente dos produtos com soja e de dose-resposta para os estrogênios equinos conjugados indicam
dos legumes (p. ex., alguns tipos de feijão, grão-de-bico e lenti- que as doses mais baixas (0,3 e 0,45 mg/dia) são efetivas. Doses ain-
lha), exercem alguma atividade estrogênica, mas são insuficien- da menores estiveram associadas a uma proteção da massa óssea.
temente potentes para justificar sua utilização no lugar de um Dados acerca das fraturas Os bancos de dados epidemiológicos
agente farmacológico no tratamento da osteoporose. indicam que as mulheres que realizam reposição estrogênica com-
Os pacientes com fraturas do quadril costumam ser frágeis portam uma redução de 50%, em média, nas fraturas osteoporóticas,
e relativamente desnutridos. Alguns dados sugerem um melhor incluindo as de quadril. O efeito benéfico do estrogênio é maior en-
resultado nesses pacientes quando se lhes fornece uma suplemen- tre aquelas que iniciam a reposição precocemente e continuam reali-
tação calórica e proteica. A ingestão excessiva de proteína pode zando o tratamento; o benefício declina após a interrupção, de forma
aumentar a excreção renal de cálcio, porém isso pode ser corrigi- a não existir um efeito protetor residual contra as fraturas 10 anos
do por uma ingestão adequada de cálcio. após essa interrupção. O primeiro ensaio clínico destinado a avaliar
Exercício Nos indivíduos jovens, o exercício aumenta a probabi- as fraturas como consequências secundárias, o Heart and Estrogen-
lidade de que venham a alcançar o pico máximo de massa óssea -Progestin Replacement Study (HERS), não mostrou efeito algum
determinado geneticamente. As metanálises de estudos realiza- da terapia hormonal sobre as fraturas do quadril ou outras fraturas
dos em mulheres na pós-menopausa indicam que o exercício com clínicas em mulheres com coronariopatia já estabelecida. Esses da-
carga previne a perda óssea, mas não parece resultar em qualquer dos tornaram extremamente importantes os resultados da Women’s
ganho substancial de massa óssea. Esse efeito benéfico desaparece Health Initiative (WHI) (Cap. 12). O braço com estrogênio-proges-
quando o exercício é interrompido. A maioria dos estudos é de togênio da WHI em mais de 16.000 mulheres na pós-menopausa sa-
dias indicou que a terapia hormonal reduz o risco de fratura do qua-
curta duração e um efeito mais substancial sobre a massa óssea é
dril e vertebral clínica em 34% e todas as fraturas clínicas em 24%.
provável quando o exercício continua por um período mais longo.
Uns poucos ensaios clínicos menores avaliaram a ocorrência de
O exercício também exerce efeitos benéficos sobre a função neu-
fraturas vertebrais como uma consequência observada com a tera-
romuscular e aprimora a coordenação, o equilíbrio e a resistência,
pia estrogênica. Eles mostraram consistentemente que o tratamento
reduzindo assim o risco de quedas. Um programa de caminhadas
estrogênico reduz a incidência de fratura vertebral por compressão.
constitui forma prática de começar. Outras atividades, como dan-
A WHI já proporcionou uma enorme quantidade de dados
ça, esportes com raquete, esqui cross-country e o uso do equipa-
sobre os efeitos multissistêmicos da terapia hormonal. Os estudos
mento dos ginásios, também são recomendadas, dependendo da
precedentes com base em observação sugeriram que a reposição
preferência pessoal e da condição geral do paciente. Até mesmo as
estrogênica poderia reduzir a doença cardíaca, porém a WHI
mulheres que não conseguem caminhar são beneficiadas pela na-
mostrou que o tratamento combinado com estrogênio-progesto-
tação ou pelos exercícios aquáticos, nem tanto pelos efeitos sobre
gênio aumentava o risco de infarto do miocárdio fatal e não fatal
o osso, que são relativamente pequenos, mas em virtude dos efei-
em cerca de 29%, confirmando os dados do estudo HERS. Outros
tos sobre o músculo. Os hábitos relacionados com o exercício de-
riscos relativos importantes incluíram um aumento de 40% no
vem ser consistentes, de preferência pelo menos 3 vezes/semana.
acidente vascular encefálico, de 100% na doença tromboembólica
TERAPIAS FARMACOLÓGICAS Até bem recentemente, o tratamen- venosa e de 26% no risco de câncer de mama. As análises sub-
to estrogênico, tanto isoladamente quanto em combinação com sequentes confirmaram o maior risco de acidente vascular ence-
um progestogênio, era a conduta terapêutica primária para a pre- fálico e evidenciaram um aumento de duas vezes na incidência
venção ou o tratamento da osteoporose. No entanto, apareceram de demência. Outros benefícios, além das reduções na incidência
vários medicamentos novos e muitos mais estão sendo esperados de fraturas assinaladas, incluíram uma redução de 37% no risco
em um futuro próximo. Alguns são agentes que tratam especifi- de câncer de colo. Esses riscos relativos devem ser interpretados
camente a osteoporose (bisfosfonato, calcitonina, PTH); outros, levando na devida conta o risco absoluto (Fig. 28.8). Por exem-
como os moduladores seletivos da resposta ao estrogênio (MSRE/ plo, de um total de 10.000 mulheres tratadas com estrogênio-
SERM, de selective estrogen response modulators), exercem efeitos -progestogênio durante 1 ano, haverá um excesso de 8 infartos, 8
349
Riscos Benefícios Neutro
60
drona pode exercer um benefício adicional. No tecido mamário, os
progestogênios podem aumentar o risco de câncer de mama.
50 Eventos adicionais
SERM Dois SERM são usados atualmente nas mulheres pós-me-
Número de casos em
10.000 mulheres/ano
40
7 8 8 18 nopausa: o raloxifeno, aprovado para a prevenção e o tratamento
Eventos da osteoporose, e o tamoxifeno, aprovado para a prevenção e o
30 reduzidos tratamento do câncer de mama.
O tamoxifeno reduz a renovação óssea e a perda de osso em
20 6 5 mulheres na pós-menopausa, em comparação com os grupos que
receberam placebo. Esses achados confirmam o conceito de que o ta-
10 moxifeno atua como um agente estrogênico no osso. Existem dados
limitados acerca do efeito do tamoxifeno sobre o risco de fraturas,
0
DCC Acidente Câncer ETV Câncer Fratura Câncer Mortes
porém o estudo Breast Cancer Prevention indicou uma possível re-
vascular de colorretal de endometrial dução nas fraturas clínicas vertebrais, do quadril e de Colles. O prin-
encefálico mama quadril cipal benefício do tamoxifeno é observado na ocorrência do câncer
SEÇÃO V
Figura 28.8 Efeitos da terapia hormonal sobre as taxas de eventos: verde, de mama. O ensaio sobre prevenção do câncer de mama indicou que
placebo; púrpura, estrogênio e progestogênio. DCC, doença cardíaca coroná- a administração de tamoxifeno durante 4 a 5 anos reduzia a incidên-
ria; ETV, eventos tromboembólicos venosos. (Adaptada de Women’s Health Initiative. cia de um novo câncer invasivo e não invasivo de mama em cerca
WHI HRT Update. Disponível em http://nhlbi.nih.gov/health/women/upd2002.htm.) de 45% nas mulheres sob maior risco de terem essa malignidade. A
incidência de cânceres da mama ER-positivos era reduzida em 65%.
O tamoxifeno aumenta o risco de câncer uterino em mulheres na
cânceres de mama, 18 eventos tromboembólicos venosos, menos pós-menopausa, limitando sua utilização para a prevenção do câncer
5 fraturas do quadril, menos 44 fraturas clínicas e menos 6 cânce- de mama em mulheres sob risco baixo ou moderado.
res colorretais. Esses números devem ser multiplicados pelos anos O raloxifeno (60 mg/dia) exerce efeitos sobre a renovação óssea
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
de tratamento hormonal. Não foi constatado efeito do tratamento e a massa óssea muito semelhantes aos observados com o tamoxi-
hormonal sobre o risco de câncer uterino ou de mortalidade total. feno, indicando que esse agente também é estrogênico sobre o es-
É importante assinalar que esses achados da WHI se aplicam es- queleto. O efeito de raloxifeno sobre a densidade óssea (+1,4 a 2,8%
pecificamente ao tratamento hormonal na forma de estrogênio equi- versus placebo na coluna vertebral, no quadril e no corpo como um
no conjugado mais acetato de medroxiprogesterona. Os benefícios e todo) é algo menor do que o observado com doses padronizadas de
riscos relativos do estrogênio sem qualquer oposição nas mulheres estrogênios. O raloxifeno reduz a ocorrência de fratura vertebral
submetidas a histerectomia variam bastante. Ainda se observam be- em 30 a 50%, dependendo da população; no entanto, não existem
nefícios contra a ocorrência de fraturas, assim como um maior risco dados confirmando que o raloxifeno possa reduzir o risco de fra-
de trombose venosa e acidente vascular encefálico, de magnitude turas não vertebrais durante um período de 8 anos de observação.
semelhante aos riscos da terapia hormonal combinada. Em contra- O raloxifeno, como o tamoxifeno e o estrogênio, exerce efeitos
partida, porém, o braço apenas com estrogênio da WHI não indi- em outros sistemas orgânicos. O efeito mais benéfico parece ser uma
cou aumento do risco de infarto nem de câncer de mama. Os dados redução na ocorrência de câncer de mama invasivo (principalmente
sugerem que pelo menos alguns dos efeitos prejudiciais da terapia uma redução no tipo ER-positivo) de cerca de 65% nas mulheres que
combinada estão relacionados com o componente progestogênio. tomam raloxifeno em comparação com placebo. Em um estudo mais
abrangente, o raloxifeno foi tão eficaz quanto o tamoxifeno na pre-
Mecanismo de ação Dois subtipos de ER (receptores estrogê-
venção do câncer de mama em mulheres de alto risco, porém em um
nicos), e , foram identificados no osso e em outros tecidos. estudo em separado não exerceu efeito algum sobre a doença car-
As células de linhagem monocítica expressam tanto ER quanto díaca em mulheres sob maior risco para esse evento. Ao contrário do
ER, o mesmo ocorrendo com os osteoblastos. Os efeitos media- tamoxifeno, o raloxifeno não está associado a um aumento no risco
dos pelo estrogênio variam de acordo com o tipo de receptor. Ao de câncer uterino nem de doença uterina benigna. O raloxifeno au-
utilizar modelos de camundongos depletados (knockout) de ER, menta a ocorrência de fogachos mas reduz o colesterol lipoproteico
a eliminação do ER produz uma redução moderada na massa sérico total e de baixa densidade, a lipoproteína(a) e o fibrinogênio.
óssea, enquanto uma mutação de ER exerce menor efeito sobre
o osso. Um paciente do sexo masculino com uma mutação homo- Mecanismos de ação dos SERM Todos os SERM se unem ao ER,
zigota de ER apresentou uma densidade óssea extremamente porém cada agente produz uma conformação ímpar receptor-
reduzida, assim como anormalidades no fechamento das epífises, -medicamento. Consequentemente, as proteínas coativadoras ou
confirmando o importante papel de ER na biologia do osso. O correpressoras específicas estarão ligadas ao receptor (Cap. 1),
mecanismo da ação do estrogênio no osso é uma área de investi- resultando em efeitos diferenciais sobre a transcrição gênica, que
gação ativa (Fig. 28.5). Apesar de os dados serem conflitantes, os variam na dependência dos outros fatores de transcrição presen-
estrogênios podem inibir diretamente os osteoclastos. No entan- tes na célula. Outro aspecto da seletividade é a afinidade de cada
to, a maioria dos efeitos do estrogênio (e do androgênio) sobre a SERM para os diferentes subtipos de ERa e ERb, que se expres-
reabsorção óssea é mediada indiretamente por fatores parácrinos sam diferentemente em vários tecidos. Esses efeitos teciduais sele-
produzidos pelos osteoblastos. Tais ações incluem: (1) aumentos tivos dos SERM proporcionam a possibilidade de ajustar a terapia
de IGF-I e TGF- e (2) supressão de IL-1 ( e ), IL-6, TNF- e estrogênica de forma a satisfazer melhor as necessidades e o perfil
da síntese da osteocalcina. As ações indiretas do estrogênio redu- dos fatores de risco de determinado paciente.
zem essencialmente a reabsorção óssea.
Bifosfonatos O alendronato, o risedronato e o ibandronato fo-
Progestogênio Nas mulheres com o útero, o progestogênio diário ram aprovados para a prevenção e o tratamento da osteoporose
ou o progestogênio cíclico pelo menos 12 dias por mês é prescrito pós-menopausa. O risedronato e o alendronato foram aprovados
em combinação com os estrogênios, com a finalidade de reduzir para o tratamento da osteoporose induzida por glicocorticoides e
o risco de câncer uterino. O acetato de medroxiprogesterona e o o risedronato também foi aprovado para a prevenção da osteopo-
acetato de noretindrona enfraquecem a resposta da lipoproteína de rose induzida por glicocorticoides. O alendronato e o risedronato
alta densidade ao estrogênio, porém isso não ocorre com a proges- foram aprovados para o tratamento da osteoporose em homens.
terona micronizada. Acetato de medroxiprogesterona e progestero- Mostrou-se que o alendronato reduz a renovação óssea e au-
na micronizada não parecem exercer um efeito independente sobre menta a massa óssea na coluna vertebral em até 8% versus um
o osso; com doses mais baixas de estrogênio, o acetato de noretin- placebo e em 6% versus um placebo no quadril. Múltiplos ensaios
350
avaliaram seu efeito sobre a ocorrência de fraturas. O Fracture In- óssea do que 2,5 mg/dia. Os pacientes devem tomar o ibandro-
tervention Trial forneceu evidência em mais de 2.000 mulheres nato oral da mesma forma dos outros bisfosfonatos, porém com
com fraturas vertebrais prevalentes de que o tratamento diário com um período de 1 hora antes de tomar qualquer outro alimento ou
alendronato (5 mg/dia durante 2 anos e 10 mg/dia durante 9 meses bebida, além da água potável.
daí em diante) reduz o risco de fraturas vertebrais em cerca de 50%, O ácido zoledrônico é um poderoso bisfosfonato com esque-
fraturas vertebrais múltiplas em até 90% e fraturas do quadril em mas ímpares de administração (1 vez ao ano pela via IV). Apesar
até 50%. Vários ensaios clínicos subsequentes confirmaram esses de ainda não ter sido aprovado para ser usado na osteoporose,
achados (Figs. 28.9 e 28.10). Por exemplo, em um estudo com mais os dados sugerem que ele é altamente eficaz na redução do risco
de 1.900 mulheres com baixa massa óssea tratadas com alendrona- de fratura. Em um estudo com mais de 7.000 mulheres acompa-
to (10 mg/dia) versus placebo, a incidência de todas as fraturas não nhadas por 3 anos, o ácido zoledrônico (5 mg como uma única
vertebrais foi reduzida em cerca de 47% após apenas 1 ano. infusão IV a cada ano) reduziu o risco de fraturas vertebrais em
Os ensaios clínicos destinados a comparar o alendronato admi- 70%, de fraturas não vertebrais em 25% e de fraturas do quadril
nistrado uma única vez por semana, na posologia de 70 mg, com em 40%. Esses resultados estiveram associados a menor perda de
uma posologia diária de 10 mg, mostraram equivalência no que con- altura e incapacidade. Na população tratada, houve maior risco de
Capítulo 28
cerne às respostas da massa óssea e da renovação óssea. Consequen- fibrilação atrial (2%) e de artralgia e um risco de 15% de febre, em
temente, a terapia realizada uma única vez por semana em geral é comparação com o placebo.
preferida, por causa da baixa incidência de efeitos colaterais gastrin-
Mecanismo de ação Os bisfosfonatos são estruturalmente aparen-
testinais e da facilidade de administração. O alendronato deve ser
tados com os pirofosfatos, compostos que são incorporados den-
administrado com um copo cheio de água antes do desjejum, pois os
tro da matriz óssea. Os bisfosfonatos prejudicam especificamente
bifosfonatos são precariamente absorvidos. Por causa do potencial
a função dos osteoclastos e reduzem o número dessas células, em
de irritação esofágica, o alendronato está contraindicado nos pa-
parte ao induzir apoptose. Evidências recentes sugerem que os
cientes com estreitamento ou esvaziamento inadequado do esôfago.
bifosfonatos que contêm nitrogênio inibem também a prenilação
Recomenda-se que os pacientes permaneçam na posição ereta por
Osteoporose
proteica, um dos produtos finais na via do ácido mevalônico, ao
pelo menos 30 minutos após tomarem a medicação, a fim de evitar
inibir a enzima farnesil pirofosfato sintase. Esse efeito altera a mo-
irritação esofágica. Foram descritos casos de esofagite, úlcera esofá-
vimentação intracelular das proteínas e pode levar finalmente à
gica e estreitamento esofágico, porém a incidência parece ser baixa.
apoptose. Alguns bisfosfonatos são retidos por longos períodos no
Nos ensaios clínicos, a sintomatologia gastrintestinal global não foi
esqueleto e podem exercer efeitos a longo prazo. As consequências
diferente com alendronato em relação ao placebo. O alendronato
disso, se houver alguma, são desconhecidas. Um fenômeno que
está disponível também em um preparado que contém vitamina D*.
foi denominado osteonecrose da mandíbula (ONM) foi descrito
O risedronato também reduz a renovação óssea e aumenta a
principalmente nos pacientes com câncer que vinham recebendo
massa óssea. Ensaios clínicos controlados demonstraram uma re-
altas doses de ácido zoledrônico ou de pamidronato. Poucos casos
dução de 40 a 50% no risco de fraturas vertebrais durante 3 anos,
foram descritos em pacientes com osteoporose tratados com bis-
acompanhada por uma redução de 40% nas fraturas clínicas não fosfonatos orais. A incidência global de ONM nessa população é
vertebrais. O único ensaio elaborado especificamente para avaliar desconhecida, e, assim sendo, o risco atribuível aos bisfosfonatos
o resultado em termos de fratura do quadril (HIP) indicou que o não foi esclarecido, embora pareça ser relativamente baixo.
risedronato reduzia em 40% o risco de fratura do quadril em mu-
lheres na oitava década de vida com osteoporose confirmada. Em Calcitonina A calcitonina é um hormônio polipeptídico produ-
contrapartida, o risedronato não era eficaz para reduzir a ocor- zido pela tireoide (Cap. 27). Seu papel fisiológico não é claro, pois
rência de fraturas do quadril em mulheres mais velhas (com mais nenhuma doença esquelética foi descrita em associação à defi-
de 80 anos) sem osteoporose comprovada. Os estudos mostraram ciência ou ao excesso de calcitonina. Os preparados de calcitonina
que 35 mg de risedronato administrados uma única vez por se- foram aprovados pelo FDA para doença de Paget, hipercalcemia e
mana é terapeuticamente equivalente a 5 mg/dia. Os pacientes osteoporose em mulheres com mais de 5 anos após a menopausa.
devem tomar o risedronato com um copo cheio de água potável, A calcitonina injetável produz pequenos aumentos na massa
para facilitar sua chegada ao estômago, e não deverão deitar-se óssea da coluna lombar. Contudo, a dificuldade de administração
por 30 minutos após terem tomado o medicamento. A incidência e as reações frequentes, incluindo náuseas e rubor facial, limitam
de efeitos colaterais gastrintestinais nos ensaios com risedronato sua utilização generalizada. Um spray nasal que contém calcitoni-
foi semelhante à observada com um placebo. na (200 UI/dia) está disponível para o tratamento da osteoporose
O etidronato foi o primeiro bifosfonato a ser aprovado, ini- em mulheres na pós-menopausa. Um estudo sugere que a calcito-
cialmente para ser usado na doença de Paget e na hipercalcemia. nina nasal produz pequenos aumentos na massa óssea e pequena
Esse agente também foi utilizado em ensaios de osteoporose de redução no número de novas fraturas vertebrais nos pacientes tra-
menor magnitude do que aqueles realizados com o alendronato tados com calcitonina versus aqueles que recebem apenas cálcio.
e o risedronato, porém ainda não foi aprovado pelo FDA para o Não houve eficácia comprovada contra as fraturas não vertebrais.
tratamento da osteoporose. O etidronato comporta provavelmen- Um preparado oral de calcitonina recentemente foi aprovado para
te alguma eficácia contra a fratura vertebral quando administra- ser utilizado na osteoporose.
do na forma de um esquema cíclico intermitente (2 semanas de A calcitonina não está indicada para a prevenção da osteopo-
tratamento, 2,5 meses sem tratamento). A sua eficácia contra as rose e não é suficientemente potente para prevenir a perda óssea
fraturas não vertebrais não foi estudada. em mulheres na pós-menopausa inicial. A calcitonina poderia
O ibandronato é o terceiro aminobisfosfonato aprovado nos exercer um efeito analgésico sobre a dor óssea, tanto na forma
EUA. Mostrou-se em ensaios clínicos que o ibandronato (2,5 mg/ subcutânea quanto possivelmente na forma nasal.
dia) reduz o risco de fratura vertebral em cerca de 40%, porém Mecanismo de ação A calcitonina suprime a atividade osteoclás-
sem nenhum efeito global sobre as fraturas não vertebrais. Em tica pela ação direta sobre o receptor da calcitonina nos osteoclas-
uma análise pós-hoc de indivíduos com um escore T de –3 ou tos. Os osteoclastos expostos à calcitonina não conseguem manter
ainda mais baixo para o colo do fêmur, o ibandronato reduziu o sua borda pregueada ativa, que mantém normalmente um íntimo
risco de fraturas não vertebrais em cerca de 60%. Em ensaios clí- contato com o osso subjacente.
nicos, doses de ibandronato de 150 mg/mês VO ou de 3 mg a cada
3 meses IV exerceram maiores efeitos sobre a renovação e a massa Denosumabe Foi constatado que um novo agente, que foi adminis-
trado duas vezes por ano por via SC em um estudo clínico controlado
* N. de R. T.: Não disponível no Brasil a formulação com vitamina D. randomizado de mulheres pós-menopausa com osteoporose, aumen-
351
Fraturas vertebrais
3 3
4 2
45%↓*
49↓*
2 2
* 77%↓*
2 1
* 69%↓*
1 * 1
*
SEÇÃO V
* ?
*
0 0 0 0
0 12 24 36 0 6 12 0 12 24 36 0 12 24 36
A Meses Meses Meses Meses
Alendronato misturado, análise pós-hoc Risedronato misturado, análise pós-hoc Ácido zoledrônico pré-planejado
15 15 15
PLB PLB PLB
27%↓*
Porcentagem de pacientes
10 10 10
*
25%↓*
*
59%↓*
?
5 5 5
*
* *
* *
*
* * *
*
0 0 0
0 12 24 36 0 12 24 36 0 12 24 36
B Meses Meses Meses
Fraturas de quadril
2 RRR
Placebo (n = 3.861) 41%
Ácido zoledrônico (n = 3.875)
0
0 3 6 9 12 15 18 21 24 27 30 33 36
C Tempo decorrido até a primeira fratura de quadril (meses)
Figura 28.9 Efeitos de vários bisfosfonatos sobre fraturas vertebrais clínicas. Roux et al: Curr Med Res Opin 4:433, 2004; CH Chesnut et al: J Boné Miner Res
(A) Fraturas não vertebrais (B) e fraturas de quadril (C) Plb, placebo; RRR, redução 19:1241, 2004; DM Black et al: N Engl J Med 356:1809, 2007; JT Harrington et al:
de risco relativo. (De DM Black et al.: J Clin Endocrinol Metab 85:4118, 2000; C Calcif Tissue Int 74:129, 2003.)
352
25 RR, 0,5 (IC de 95%, 0,4 a 0,6)
% de pacientes com fratura vertebral incidental
Placebo A Nova fratura vertebral
60 mg/dia de raloxifeno RR, 0,7 (IC de 95%, 0,6 a 0,9) Placebo Denosumabe
20 120 mg/dia de raloxifeno
RR, 0,32 RR, 0,39 RR, 0,22 RR, 0,35
8 P < 0,001 P < 0,001 P < 0,001 P < 0,001
7
0 0
Capítulo 28
Ausência de fraturas preexistentes Fraturas preexistentes 0-36 0-12 >12-24 >12-36
Mês
Figura 28.10 Efeitos de duas doses de raloxifeno sobre fraturas vertebrais
incidentais no estudo clínico MORE. (De B. Ettinger et al: JAMA:282:637, 1999.) B Tempo decorrido até a primeira fratura não vertebral
9
8 Placebo
Osteoporose
4
pós-menopausa com baixa massa óssea (acima da faixa osteoporó-
tica) e em mulheres pós-menopausa com câncer de mama tratadas 3
com agentes hormonais. Além disso, um estudo realizado em homens 2
com câncer de próstata tratados com agonista do hormônio de libe- 1
ração das gonadotrofinas (GnRH) indicou a capacidade do denosu- 0
mabe de melhorar a massa óssea e reduzir a ocorrência de fraturas 0 6 12 18 24 30 36
vertebrais. O denosumabe foi aprovado pelo FDA, em 2010, para o Mês
tratamento de mulheres pós-menopausa que correm alto risco de fra- N° com risco
Placebo 3.906 3.750 3.578 3.410 3.264 3.121 3.009
turas osteoporóticas, incluindo aquelas com história de fraturas ou Denosumabe 3.902 3.759 3.594 3.453 3.337 3.228 3.130
múltiplos fatores de risco para fraturas e aquelas que não responde-
ram ou que são intolerantes a outros tratamentos para a osteoporose. C Tempo decorrido até a primeira fratura de quadril
1,4
Mecanismo de ação O denosumabe é um anticorpo monoclonal
1,2 Placebo
Incidência cumulativa (%)
353
Número de mulheres com uma ou
mais novas fraturas vertebrais
70 15
risco de novas fraturas vertebrais
Efeito da teriparatida sobre o
60 14
Redução do risco
12
50
% de mulheres
Relativa: Relativa:
10
40 65% 69%
Absoluta: Absoluta: 8
30 9,3% 9,9%
6
20 4
A B
10 2
64 22 19 Figura 28.13 Efeito do tratamento com paratormônio (PTH) sobre a micro-
0 0 arquitetura óssea. Duas amostras de biópsia de uma mulher de 64 anos de idade
Placebo TPTD20 TPTD40
A (n = 448) (n = 444) (n = 434) antes (A) e depois (B) do tratamento com PTH. (De DW Dempster et al.: J Bone
SEÇÃO V
Redução do risco
por fragilidade não vertebrais
20 Absoluta: Absoluta:
2,9% 3,0% com resultados conflitantes, em parte devido ao uso de dose e
3
15 preparados variáveis. Não obstante os acréscimos na massa óssea
2 de até 10%, não existem efeitos consistentes do fluoreto sobre a
10 fratura vertebral ou não vertebral. Em verdade, esta última pode
5 1 até mesmo aumentar quando são usadas altas doses de fluoreto.
30 14 14 Este fármaco continua sendo um agente experimental, apesar de
0 0 sua longa história e múltiplos estudos.
Placebo TPTD20 TPTD40
B (n = 544) (n = 541) (n = 552) Ranelato de estrôncio O ranelato de estrôncio foi aprovado em
vários países europeus para o tratamento da osteoporose, indu-
Efeito da teriparatida sobre o risco de fraturas por zindo aumentos na massa óssea em todo o esqueleto; nos ensaios
fragilidade não vertebrais (tempo decorrido até a primeira fratura) clínicos, o medicamento reduziu o risco de fraturas vertebrais em
8 37% e o das fraturas não vertebrais em 14%. Parece ser moderada-
7 mente antirreabsortivo, porém e ao mesmo tempo sem acarretar
6 muita redução na formação óssea (medida bioquimicamente). O
% de mulheres**
354
de cálcio, provavelmente por um efeito que independe da vitamina
A cifoplastia e a vertebroplastia também são abordagens não
D; (4) aumento na perda urinária de cálcio e talvez indução de um
farmacológicas úteis para o tratamento das fraturas vertebrais do-
certo grau de hiperparatireoidismo secundário; (5) redução dos an-
lorosas. No entanto, ainda não se dispõe de dados a longo prazo.
drogênios suprarrenais e supressão da secreção ovariana e testicular
MONITORAÇÃO DO TRATAMENTO Ainda não existe diretrizes bem- de estrogênios e androgênios; e (6) indução da miopatia devida aos
-aceitas para monitorar o tratamento da osteoporose. Sabendo-se glicocorticoides; que pode exacerbar os efeitos sobre o esqueleto e a
que a maioria dos tratamentos para osteoporose produzem em mé- homeostase do cálcio, além de aumentar o risco de quedas.
dia aumentos pequenos ou moderados da massa óssea, seria razoá-
vel considerar a DMO como um instrumento de monitoramento. As ■■ AVALIAÇÃO DO PACIENTE
mudanças deverão ser superiores a cerca de 4% na coluna vertebral Por causa da prevalência da perda óssea induzida por glicocorticoi-
e 6% no quadril para serem consideradas significativas em qualquer des, é importante avaliar o estado do esqueleto em todos os pacientes
indivíduo. O quadril é o local preferido, por causa da área superficial que irão iniciar ou já estejam sob terapia com glicocorticoide a longo
mais extensa e da maior reprodutibilidade. Os aumentos induzidos prazo. Os fatores de risco modificáveis devem ser identificados, in-
pela medicação podem levar vários anos para produzir mudanças cluindo aqueles relacionados com as quedas. O exame deve incluir a
Capítulo 28
dessa magnitude (se é que realmente ocorrem). Consequentemente, determinação da altura e da força muscular. A avaliação laboratorial
pode-se argumentar que a DMO deveria ser repetida a intervalos > 2 deve incluir uma determinação do cálcio urinário de 24 horas. Todos
anos. Apenas as reduções significativas da DMO deveriam induzir- os pacientes que estão recebendo glicocorticoides a longo prazo (mais
-nos a realizar uma mudança no esquema médico, pois espera-se de 3 meses) devem ter sua massa óssea medida tanto na coluna verte-
que muitos indivíduos não evidenciarão respostas maiores do que os bral quanto no quadril utilizando DEXA. Se puder ser medido apenas
limites de identificação das atuais técnicas de mensuração. uma única área esquelética, é preferível avaliar a coluna nos indivíduos
Os marcadores bioquímicos da renovação óssea poderão com menos de 60 anos e o quadril para aqueles com mais de 60 anos.
revelar-se úteis para monitorar o tratamento, porém existe pou-
quíssima evidência concreta apoiando atualmente esse conceito; ■■ PREVENÇÃO
Osteoporose
falta esclarecer que objetivo seria mais útil. Se forem utilizados os A perda óssea causada pelos glicocorticoides pode ser prevenida e
marcadores da renovação óssea, deverá ser feita uma determina- pode-se conseguir uma redução significativa no risco de fratura. As
ção antes de começar a terapia e que será repetida 4 meses depois estratégias devem incluir o uso da menor dose de glicocorticoide que
de iniciada. Em geral, uma mudança nos marcadores da renova- seja adequada para o controle da doença. As vias de administração
ção óssea deve ser 30 a 40% mais baixa que a medida basal para tópica e inalada são preferidas, quando apropriadas. A redução dos
ser significativa, por causa da variabilidade biológica e da técnica fatores de risco é importante, incluindo o abandono do fumo, a limi-
inerente a esses testes. Uma mudança positiva nos marcadores tação no consumo de álcool e a participação em exercícios com carga,
bioquímicos e/ou na densidade óssea pode ser útil para ajudar os quando apropriado. Todos os pacientes deverão receber uma quanti-
pacientes a aderir aos esquemas de tratamento. dade adequada de cálcio e de vitamina D na alimentação ou em su-
plementos.
355
CAPÍTULO 29 Célula mesenquimal
M-CSF
acometimento ósseo (dor óssea, artrite secundária, fraturas) ou se- e a função dos osteoclastos e osteoblastos e o papel da via RANK. As células
cundariamente da expansão do osso, causando compressão do teci- estromais da medula óssea (mesenquimais) e os osteoblastos diferenciados produ-
do neural circundante. zem múltiplos fatores de crescimento e citocinas, incluindo o fator de estimulação das
colônias de macrófagos (M-CSF), para modular a osteoclastogênese. RANKL (ativa-
Epidemiologia dor do receptor do ligante NFB) é produzido pelos progenitores dos osteoblastos e
Existe uma enorme variação geográfica na frequência da osteoblastos maduros e pode ligar-se a um receptor “chamariz” solúvel, conhecido
como OPG (osteoprotegerina) para inibir a ação do RANKL. Como alternativa, uma
doença de Paget, com alta prevalência na Europa Ocidental
interação célula-célula entre os progenitores dos osteoblastos e dos osteoclastos per-
(Grã-Bretanha, França e Alemanha, excluindo, porém Suíça e Es- mite ao RANKL ligar-se ao seu receptor acoplado à membrana, RANK, estimulando
candinávia) e entre aqueles que imigraram para a Austrália, a Nova desse modo a diferenciação e a função dos osteoclastos. O RANK liga-se a proteínas
Zelândia, a África do Sul e as Américas do Norte e do Sul. A doença intracelulares denominadas TRAF (fatores associados ao receptor do fator de necrose
é rara nas populações nativas das Américas, da África, da Ásia e do tumoral), que medeiam a sinalização do receptor por meio de fatores de transcrição,
Oriente Médio; quando ela ocorre, os indivíduos acometidos têm ha- como NFB. O M-CSF une-se ao seu receptor, c-fms, que é o homólogo celular do
bitualmente uma ancestralidade europeia, confirmando a teoria da oncogene do fms. Ver no texto o papel potencial dessas vias nos distúrbios da função
migração. Por motivos que ainda não foram esclarecidos, a prevalên- dos osteoclastos, como a doença de Paget e a osteopetrose.
cia e a gravidade da doença de Paget estão diminuindo, enquanto a
idade por ocasião do diagnóstico está aumentando.
A prevalência é maior em homens e aumenta com a idade. As no gene da proteína contendo valosina provocam uma síndrome rara
séries de necropsia revelam a presença de doença de Paget em cerca com herança autossômica dominante e penetrância variável, conhe-
de 3% daqueles com mais de 40 anos de idade. A prevalência de ra- cida como miopatia por corpúsculo de inclusão com doença de Paget e
diografias esqueléticas positivas nos pacientes com mais de 55 anos demência frontotemporal (MCIDPDF). O papel dos fatores genéticos
de idade é de 2,5% para homens e de 1,6% para mulheres. Os níveis está menos esclarecido na forma mais comum de doença de Paget de
elevados de fosfatase alcalina (ALP) nos pacientes assintomáticos início tardio. Embora tenham sido descritas algumas famílias com
evidenciam uma incidência ajustada à idade de 12,7 e 7 por 100.000 mutações no gene que codifica o RANK, as mutações mais comuns
pessoas-ano em homens e mulheres, respectivamente. identificadas nos casos familiares e esporádicos de doença de Paget
têm sido no gene SQSTM1 (sequestassomo 1 ou proteína p62) no
Etiologia domínio de fixação da ubiquitina C terminal. A proteína p62 está
A etiologia da doença de Paget do osso continua sendo desconheci- envolvida na sinalização NF-kB e regula a diferenciação osteoclásti-
da, porém a evidência apoia etiologias tanto genéticas quanto virais. ca. A variabilidade fenotípica nos pacientes com mutações SQSTM1
Uma história familiar positiva é encontrada em 15 a 25% dos pacien- sugere que fatores adicionais, como outras influências genéticas ou
tes e, quando presente, eleva 7 a 10 vezes a prevalência da doença infecções virais, podem influenciar a expressão clínica da doença.
entre os parentes de primeiro grau. Várias linhas de evidência sugerem que uma infecção viral pode
Não foi estabelecida uma base genética clara para vários distúr- contribuir para as manifestações clínicas da doença de Paget, incluin-
bios ósseos familiares raros que se assemelham clinica e radiologica- do (1) a presença de inclusões citoplasmáticas e nucleares semelhan-
mente à doença de Paget, mas que têm uma apresentação mais grave tes aos paramixovírus (vírus do sarampo e sincicial respiratório) nos
e início mais precoce. Uma deleção homozigota do gene TNFRSF11B, osteoclastos pagéticos e (2) RNAm viral nos osteoclastos precursores
que codifica a osteoprotegrina (Fig. 29.1), causa a doença de Paget e maduros. A etiologia viral é apoiada também pela conversão dos
juvenil, também conhecida como hipofosfatasia idiopática familiar, precursores dos osteoclastos para osteoclastos semelhantes aos pagé-
um distúrbio que se caracteriza por diferenciação e reabsorção oste- ticos por vetores que contêm o nucleocapsídio do vírus do sarampo
oclásticas descontroladas. Os padrões familiares da doença em várias ou genes da matriz. Entretanto, a etiologia viral foi questionada pela
grandes famílias são compatíveis com um padrão de herança autos- impossibilidade de se cultivar um vírus vivo a partir do osso pagético
sômica dominante com penetrância variável. A osteólise expansível e de clonar genes virais inteiros a partir do material obtido de pacien-
familiar, a hiperfosfatasia esquelética expansível e a doença de Paget tes com a doença de Paget.
de início precoce estão associadas a mutações no gene TNFRSF11A,
que codifica o RANK (receptor ativador do fator nuclear B), um Fisiopatologia
membro da superfamília do fator de necrose tumoral, que é essencial A principal anormalidade na doença de Paget é o aumento no nú-
para a diferenciação dos osteoclastos (Fig. 29.1). Por fim, as mutações mero e na atividade dos osteoclastos. Os osteoclastos pagéticos são
356
grandes, seu número aumenta 10 a 100 vezes e também possuem um As fraturas são complicações sérias da doença de Paget e ocor-
número maior de núcleos (até 100, em comparação com 3 a 5 núcleos rem habitualmente nos ossos longos em áreas de lesões líticas ativas
no osteoclasto normal). Os osteoclastos hiperativos podem gerar um ou expansivas. Os locais comuns de fraturas são a diáfise femoral e
aumento de 7 vezes nas superfícies reabsortivas e uma velocidade de as regiões subtrocantéricas. As neoplasias com origem no osso pa-
erosão de 9 g/dia (o normal é de 1 g/dia). Foram identificadas vá- gético são raras. A incidência de sarcoma parece estar diminuindo,
rias causas para o aumento do número e da atividade dos osteoclas- possivelmente por causa do tratamento mais efetivo e mais precoce
tos pagéticos: (1) os precursores osteoclásticos são hipersensíveis à com os poderosos agentes antirreabsortivos. A maioria dos tumo-
1,25(OH)2D3; (2) os osteoclastos são hiper-responsivos ao ligante do res é representada por osteossarcomas, que se manifestam habitual-
RANK (RANKL), o fator estimulador dos osteoclastos que medeia mente com dor recente em uma lesão pagética de longa duração. Os
os efeitos da maioria dos fatores osteotrópicos sobre a formação dos tumores de células gigantes benignos ricos em osteoclastos podem
osteoclastos; (3) as células estromais da medula óssea das lesões pa- ter origem em áreas adjacentes ao osso pagético e respondem à tera-
géticas exibem maior expressão de RANKL; (4) o recrutamento dos pia com glicocorticoides.
precursores dos osteoclastos é aumentado pela interleucina (IL) 6, As complicações cardiovasculares podem ocorrer nos pacientes
cujos níveis sanguíneos são mais altos nos pacientes com doença de com acometimento de grandes porções (15 a 35%) do esqueleto e alto
CAPÍTULO 29
Paget ativa e cuja expressão é mais acentuada nos osteoclastos pagé- grau de atividade da doença (ALP 4 vezes acima do valor normal). A
ticos; (5) a expressão do proto-oncogene c-fos, que acelera a atividade extensa derivação arteriovenosa (shunts) e os grandes aumentos no
osteoclástica, é aumentada; e (6) o oncogene antiapoptótico Bcl-2 no fluxo sanguíneo através do osso pagético vascularizado dão origem
osso pagético exibe uma expressão mais acentuada. Numerosos os- a um estado de alto débito e aumento de volume do coração. En-
teoblastos são recrutados para os locais de reabsorção ativa e produ- tretanto, a insuficiência cardíaca de alto débito é relativamente rara
zem grandes quantidades de matriz de osso novo. Como resultado, a e, em geral, se instala nos pacientes com alguma patologia cardíaca
renovação óssea é alta e a massa óssea é normal ou aumentada, em concomitante. Além disso, estenose aórtica calcificada e calcificações
vez de reduzida, a não ser que exista deficiência concomitante de cál- vasculares difusas já foram associadas à doença de Paget.
cio e/ou de vitamina D.
Figura 29.2 Uma mulher de 48 anos com doença de Paget do crânio. À ral do crânio, mostrando a captação difusa do isótopo pelos ossos frontal, parietal,
esquerda. Radiografia lateral mostrando áreas de reabsorção e esclerose do osso. occipital e petroso.
À direita. Cintilografia óssea com Tc99m HDP com vistas anterior, posterior e late-
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
dade da doença. Os pacientes com a elevação mais alta de ALP (10 a realizar uma busca de outra causa de hipercalcemia. Em contrapar-
vezes o limite superior do normal) exibem acometimento do crânio tida, a hipocalcemia ou um ligeiro hiperparatireoidismo secundário
e de pelo menos outra área esquelética. Valores mais baixos sugerem pode manifestar-se nos pacientes com doença de Paget e formação
acometimento menos extenso ou uma fase quiescente da doença. óssea muito ativa e ingestão insuficiente de cálcio dietético, particu-
Para a maioria dos pacientes, a ALP sérica total continua sendo o laarmente durante a terapia com bisfosfonatos quando a reabsorção
teste de escolha tanto para o diagnóstico quanto para determinar a óssea é suprimida rapidamente e a formação ativa do osso prossegue.
resposta ao tratamento. Ocasionalmente, um paciente sintomático Por conseguinte, a ingestão adequada de cálcio e de vitamina D deve
com evidência de progressão em um único local pode ter um nível ser instituída antes da administração de bisfosfonatos.
total normal de ALP, porém um aumento na ALP específica do osso.
Por motivos que ainda não estão esclarecidos, a osteocalcina sérica,
outro marcador de formação óssea, nem sempre está elevada, razão TRATAMENTO Doença de Paget do osso
pela qual sua utilização não é recomendada para o diagnóstico e o
tratamento da doença de Paget. Os marcadores da reabsorção óssea O desenvolvimento de agentes farmacológicos efetivos e possan-
(N-telopeptídio ou C-telopeptídio séricos ou urinários medidos no tes (Quadro 29.1) mudou a filosofia terapêutica do tratamento
sangue ou na urina) também estão elevados na doença de Paget ativa apenas dos pacientes sintomáticos para o tratamento dos pacien-
e diminuem mais rapidamente em resposta à terapia do que a ALP. tes assintomáticos que correm risco de complicações. A terapia
Os níveis séricos de cálcio e de fosfato são normais na doença farmacológica está indicada nas seguintes circunstâncias: para
de Paget. A imobilização de um paciente com doença de Paget ati- controlar os sintomas causados pela doença de Paget metaboli-
va pode, embora raramente, causar hipercalcemia e hipercalciúria e camente ativa, como dor óssea, fratura, cefaleia, dor da radiculo-
aumentar o risco de nefrolitíase. Entretanto, a descoberta de hiper- patia ou artropatia pagética, ou complicações neurológicas; para
calcemia, até mesmo na presença de imobilização, deve induzir-nos reduzir o fluxo sanguíneo local e minimizar a perda sanguínea
operatória nos pacientes que precisam submeter-se a uma cirur-
gia em uma área pagética ativa; reduzir a hipercalciúria que pode
ocorrer durante a hospitalização; e minorar o risco de complica-
ções quando a atividade da doença é alta (ALP elevada) e o local
de acometimento envolve ossos que participam na sustentação
do peso corporal, áreas adjacentes às grandes articulações, cor-
pos vertebrais e o crânio. Ainda não foi determinado se a tera-
pia precoce previne as complicações subsequentes. Um estudo
randomizado recente de mais de 1.200 pacientes do Reino Uni-
do mostrou não haver nenhuma diferença na dor óssea, taxa de
fraturas, qualidade de vida e perda auditiva entre pacientes que
receberam terapia farmacológica para controlar os sintomas (dor
óssea) e aqueles que receberam bisfosfonatos para normalizar os
níveis séricos de ALP. Entretanto, o agente mais potente (ácido
zoledrônico) não foi usado, e a duração da observação (em média,
3 anos, com faixa de 2 a 5 anos) pode não ser longa o suficiente
para avaliar o impacto do tratamento sobre os resultados de longo
prazo. Parece provável que a restauração da arquitetura normal
do osso após a supressão da atividade pagética irá prevenir a ocor-
rência de deformidades e complicações adicionais.
Os agentes aprovados para o tratamento da doença de Paget
Figura 29.3 Radiografia de um homem de 73 anos com doença de Paget suprimem os ritmos muito altos de reabsorção óssea e, secun-
do fêmur proximal direito. Observar a natureza grosseira do padrão trabecular, dariamente, reduzem as altas taxas de formação óssea (Quadro
com acentuado espessamento cortical e estreitamento do espaço articular compatí- 29.1). Como resultado da menor renovação do osso, os padrões
vel com osteoartrite secundária à deformidade pagética do fêmur direito.
358
QUADRO 29.1 Agentes farmacológicos aprovados para o tratamento da doença de Paget
Nome (comercial) Dose e forma de administração Normalização da ALP
Ácido Zoledrômico (Zometa) 5 mg IV durante 15 min 90% dos pacientes em 6 meses
Pamidronato (Aredia) 30 mg IV durante 4 h em 3 dias Cerca de 50% dos pacientes
Risedronato (Actonel) 30 mg VO/dia durante 2 meses 73% dos pacientes
Alendronato (Fosamax) 40 mg VO durante 6 meses 63% dos pacientes
Tiludronato* (Skelid) 800 mg VO/dia durante 3 meses 35% dos pacientes
Etidronato* (Didronel) 200 a 400 mg VO/dia por 6 meses 15% dos pacientes
Calcitonina (Miacalcin) 100 U SC diariamente durante 6 a 18 meses (pode ser (Redução da ALP em 50%)
reduzida para 50 U 3x/semana)
CAPÍTULO 29
estruturais pagéticos, incluindo as áreas de osso reticulado preca- de calcitonina foi aprovado para a osteoporose na dose de 200 U/
riamente mineralizado, são substituídos por um osso esponjoso dia; no entanto, a eficácia dessa dose na doença de Paget ainda não
ou lamelar mais normal. A renovação óssea reduzida pode ser do- foi devidamente estudada. A dose inicial habitual de calcitonina
cumentada por um declínio da ALP sérica e dos marcadores uri- injetável (100 U/dia) reduz a ALP em 50% e pode eliminar os sin-
nários ou séricos da reabsorção (N-telopeptídio, C-telopeptídio). tomas esqueléticos. A dose pode ser reduzida para 50 U/dia, 3x/se-
O primeiro agente clinicamente útil, o etidronato, é hoje rara- mana após uma resposta favorável inicial à posologia diária de 100
359
II prejudica a reabsorção óssea osteoclástica. Em outras formas de ■■ PICNODISOSTOSE
doença humana há defeitos genéticos menos claros. Cerca de 50%
É uma forma autossômica recessiva de osteosclerose considerada
dos pacientes com osteopetrose infantil maligna possuem uma mu-
como tendo afetado o pintor impressionista francês Henri de Toulou-
tação no gene TCIRG1 que codifica a subunidade específica do oste-
se-Lautrec. A base molecular envolve mutações no gene que codifica
oclasto da bomba protônica vacuolar, que medeia a acidificação da
a catepsina K, uma metaloproteinase lisossômica altamente expressa-
interface entre o mineral ósseo e a borda enrugada do osteoclasto. As
da nos osteoclastos e importante para a degradação da matriz óssea.
mutações no gene para o canal do cloreto CICN7 causam osteopetro-
Os osteoclastos estão presentes, porém não funcionam normalmente.
se autossômica dominante tipo II.
A picnodisostose é uma forma de nanismo com membros curtos que
Manifestações clínicas se manifesta com fraturas frequentes, porém em geral com duração
normal da vida do indivíduo. As características clínicas incluem
A incidência de osteopetrose grave (maligna) autossômica recessiva
baixa estatura; cifoescoliose e deformidades do tórax; palato alto e
oscila de 1 em 200.000 a 1 em 500.000 nascimentos vivos. Se houver
arqueado; proptose, escleróticas azuladas; características dismórficas
falha no remodelamento ósseo e da cartilagem, poderá ocorrer parali-
que incluem face e queixo pequenos, proeminência frontoccipital,
sia de um ou mais nervos cranianos, em virtude do estreitamento dos
nariz afilado e bicudo, crânio volumoso e ângulo mandibular obtuso;
forames cranianos. A falha da modelagem esquelética resulta também
e mãos pequenas e quadradas com unhas hipoplásicas. As radiogra-
SEÇÃO V
CAPÍTULO 29
gem ou tecido ósseo, e alterações cutâneas sobre o osso envolvido, (que na verdade são áreas hipomineralizadas da calota craniana),
que consistem em áreas semelhantes à esclerodermia e hipertricose. pressão intracraniana elevada e tórax instável, além de predisposição
A doença não progride em adultos, porém a dor e a rigidez podem à pneumonia. Hipercalcemia e hipercalciúria são comuns. Essa for-
persistir. Os exames laboratoriais nada revelam de significativo e ma comporta uma taxa de mortalidade de aproximadamente 50% e o
não há etiologia nem tratamento específico. Na maioria das vezes, as prognóstico parece melhorar para as crianças que conseguem sobre-
intervenções cirúrgicas destinadas a corrigir as contraturas não são viver até além da primeira infância (lactância). A hiposfatasia infan-
bem-sucedidas. til comporta uma apresentação clínica variável. A perda prematura
dos dentes decíduos (antes dos 5 anos de idade) constitui o elemento
■■ OSTEOPOIQUILOSE mais característico da doença. O raquitismo é responsável pela de-
CAPÍTULO 29
mária exibe uma superfície periosteal irregular.
Não existem exames de sangue ou de urina que sejam diagnósti- CALCIFICAÇÃO E OSSIFICAÇÃO EXTRA-ESQUELÉTICAS
cos. O líquido sinovial não possui um perfil inflamatório. Não há tra- (ECTÓPICAS)
tamento específico, porém uma experiência limitada com colchicina A deposição de cristais de fosfato de cálcio (calcificação) ou a forma-
sugere algum benefício no controle das artralgias. ção de osso verdadeiro (ossificação) em tecidos moles não ósseos po-
dem ocorrer por um de três mecanismos: (1) calcificação metastática
■■ OSTEOCONDRODISPLASIAS decorrente de um produto supranormal da concentração de cálcio
Incluem várias centenas de distúrbios hereditários do tecido co- fosfato no líquido extracelular; (2) calcificação distrófica decorrente
nectivo. Essas anormalidades primárias da cartilagem se manifes- de deposição mineral dentro de um tecido metabolicamente dete-
associada também a uma anormalidade com expressão variável da lógica é denominada miosite ossificante. O osso formado é organiza-
dentição que se caracteriza pela presença de raízes bulbosas curtas, do como estrutura lamelar ou trabecular, com osteoblastos e osteo-
calcificação da polpa e dentina radicular depositada nas espirais. clastos normais conduzindo um remodelamento ativo. Podem estar
O defeito primário responsável pela calcificação metastática parece presentes sistemas de Havers bem desenvolvidos e elementos medu-
ser a hiperfosfatemia que resulta da maior capacidade do túbulo lares. Uma segunda causa de formação óssea ectópica ocorre no dis-
renal de reabsorver o fosfato filtrado. A calcificação espontânea dos túrbio hereditário denominado fibrodisplasia ossificante progressiva.
tecidos moles está relacionada com o fosfato sérico elevado, que
juntamente com o cálcio sérico normal ultrapassa o produto da ■■ FIBRODISPLASIA OSSIFICANTE PROGRESSIVA
Distúrbios dos Ossos e do Metabolismo do Cálcio
364
rais. Sempre que possível, os valores de referência fornecidos pelo
APÊNDICE laboratório que realizou o exame devem ser utilizados na interpreta-
ção dos dados laboratoriais. Os valores apresentados nesse Apêndice
refletem as faixas de referência típicas para adultos. As faixas de refe-
Valores Laboratoriais de rência pediátricas podem variar significativamente dos valores para
adultos.
Importância Clínica Ao preparar o Apêndice, os autores levaram em consideração
o fato de que o sistema de unidades internacionais (SI, système in-
ternational d’unités) é utilizado na maioria dos países e em algumas
Alexander Kratz
publicações médicas. Entretanto, os laboratórios de análise clínica
Michael A. Pesce podem continuar a relatar os valores nas unidades “tradicionais”
Robert C. Basner ou convencionais. Em função disso, os dois sistemas são fornecidos
Andrew J. Einstein no Apêndice. O sistema duplo também é utilizado no texto, exceto
para (1) aqueles casos em que os números permanecem os mesmos,
havendo apenas modificação da terminologia (mmol/L para mEq/L
Este Apêndice contém quadros de valores de referência para exames ou UI/L para mUI/mL), quando são fornecidas apenas as unidades
laboratoriais, itens especiais analisados e provas de função especiais. do SI; e (2) a maioria das medições de pressão (p. ex., pressão arte-
Inúmeros fatores podem influenciar os valores de referência. Tais va- rial e pressão do líquido cerebrospinal), quando as unidades tradi-
riáveis incluem a população estudada, a duração e os meios de trans- cionais (mmHg, mmH2O) são utilizadas. Em todos os outros casos
porte das amostras, os métodos laboratoriais, a instrumentação e até no texto, a unidade do SI é seguida da unidade tradicional entre
mesmo o tipo de recipiente utilizado para a coleta da amostra. Por parênteses.
conseguinte, as faixas de referência ou faixas “normais” fornecidas
nesse apêndice podem não ser apropriadas para todos os laborató-
rios, e esses valores devem ser utilizados apenas como diretrizes ge- VALORES DE REFERÊNCIA PARA EXAMES LABORATORIAIS
Apêndice
QUADRO 1 Hematologia e coagulação
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Tempo de coagulação ativado ST 70 a 180 s 70 a 180 s
365
QUADRO 1 Hematologia e coagulação (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Dímero D P 220 a 740 ng/mL FEU 220 a 740 ng/mL FEU
Contagem sanguínea diferencial ST
Contagens relativas:
Neutrófilos 0,40 a 0,70 40 a 70%
Bastões 0,0 a 0,05 0 a 5%
Linfócitos 0,20 a 0,50 20 a 50%
Monócitos 0,04 a 0,08 4 a 8%
Eosinófilos 0,0 a 0,6 0 a 6%
Basófilos 0,0 a 0,02 0 a 2%
Contagens absolutas:
9
Neutrófilos 1,42 a 6,34 x 10 /L 1.420 a 6.340/mm3
9
Bastões 0 a 0,45 x 10 /L 0 a 450/mm3
9
Linfócitos 0,71 a 4,53 x 10 /L 710 a 4.530/mm3
9
Monócitos 0,14 a 0,72 x 10 /L 140 a 720/mm3
Eosinófilos 0 a 0,54 x 109/L 0 a 540/mm3
9
Basófilos 0 a 0,18 x 10 /L 0 a 180/mm3
Contagem de eritrócitos ST
12
Homens adultos 4,30 a 5,60 x 10 /L 4,30 a 5,60 x 106/mm3
12
Mulheres adultas 4,00 a 5,20 x 10 /L 4,00 a 5,20 x 106/mm3
Apêndice
366
QUADRO 1 Hematologia e coagulação (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Mulheres adultas 120 a 158 g/L 12,0 a 15,8 g/dL
Eletroforese da hemoglobina ST
Hemoglobina A 0,95 a 0,98 95 a 98%
Hemoglobina A2 0,015 a 0,031 1,5 a 3,1%
Hemoglobina F 0 a 0,02 0 a 2,0%
Outras hemoglobinas diferentes de A, A2 ou F Ausentes Ausentes
Anticorpo contra a trombocitopenia induzida por heparina P Negativo Negativo
Fração plaquetária imatura (FPI) ST 0,011 a 0,061 1,1 a 6,1%
Cristais do líquido articular LA Não aplicável Nenhum cristal observado
Mucina do líquido articular LA Não aplicável Presente apenas mucina tipo I
Leucócitos
Fosfatase alcalina (LAP) ST 0,2 a 1,6 mkat/L 13 a 100 m/L
9
Contagem ST 3,54 a 9,06 x 10 /L 3,54 a 9,06 x 103/mm3
Hemoglobina corpuscular média (HCM) ST 26,7 a 31,9 pg/célula 26,7 a 31,9 pg/célula
Concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) ST 323 a 359 g/L 32,3 a 35,9 g/dL
Hemoglobina corpuscular média dos reticulócitos (HC) ST 24 a 36 pg 24 a 36 pg
3
Volume corpuscular médio (VCM) ST 79 a 93,3 fL 79 a 93,3 mm
Volume plaquetário médio (VPM) ST 9,00 a 12,95 fL 9,00 a 12,95
Fragilidade osmótica dos eritrócitos ST
Apêndice
Direta 0,0035 a 0,0045 0,35 a 0,45%
Indireta 0,0030 a 0,0065 0,30 a 0,65%
Tempo de tromboplastina parcial, ativada P 26,3 a 39,4 s 26,3 a 39,4 s
Plasminogênio P
Antígeno 84 a 140 mg/L 8,4 a 14,0 mg/dL
Funcional 0,70 a 1,30 70 a 130%
Inibidor do ativador do plasminogênio 1 P 4 a 43 mg/L 4 a 43 ng/mL
367
QUADRO 1 Hematologia e coagulação (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Tempo de reptilase P 16 a 23,6 s 16 a 23,6 s
Contagem de reticulócitos ST
Homens adultos 0,008 a 0,023 eritrócitos 0,8 a 2,3% eritrócitos
Mulheres adultas 0,0008 a 0,020 eritrócitos 0,8 a 2,0% eritrócitos
Conteúdo de hemoglobina dos reticulócitos ST >26 pg/célula >26 pg/célula
Cofator de ristocetina (fator de von Willebrand) P
Grupo sanguíneo O 0,75 média do normal 75% média do normal
Grupo sanguíneo A 1,05 média do normal 105% média do normal
Grupo sanguíneo B 1,15 média do normal 115% média do normal
Grupo sanguíneo AB 1,25 média do normal 125% média do normal
Ensaio de liberação de serotonina S <0,2 de liberação <20% de liberação
Teste de falcização ST Negativo Negativo
Hemólise em sacarose ST <0,1 <10% de hemólise
Tempo de trombina P 15,3 a 18,5 s 15,3 a 18,5 s
6
Eosinófilos totais ST 150 a 300 x 10 /L 150 a 300/mm3
Receptor de transferrina S, P 9,6 a 29,6 nmol/L 9,6 a 29,6 nmol/L
Viscosidade
Plasma P 1,7 a 2,1 1,7 a 2,1
Soro S 1,4 a 1,8 1,4 a 1,8
Apêndice
Abreviações: LA, líquido articular; P, plasma; PRP, plasma rico em plaquetas; S, soro; ST, soro total.
Valores Laboratoriais de Importância Clínica
368
QUADRO 2 Química clínica e imunologia (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Androstenediona (adulto) S
Homens 0,81 a 3,1 nmol/L 23 a 89 ng/dL
Mulheres
Pré‑menopausa 0,91 a 7,5 nmol/L 26 a 214 ng/dL
Pós‑menopausa 0,46 a 2,9 nmol/L 13 a 82 ng/dL
Enzima conversora de angiotensina (ECA) S 0,15 a 1,1 kat/L 9 a 67 U/L
Hiato aniônico S 7 a 16 mmol/L 7 a 16 mmol/L
Apolipoproteína A‑1 S
Homem 0,94 a 1,78 g/L 94 a 178 mg/dL
Mulher 1,01 a 1,99 g/L 101 a 199 mg/dL
Apolipoproteína B S
Homem 0,55 a 1,40 g/L 55 a 140 mg/dL
Mulher 0,55 a 1,25 g/L 55 a 125 mg/dL
Gasometria arterial ST
–
[HCO3 ] 22 a 30 mmol/L 22 a 30 mEq/L
Pco2 4,3 a 6,0 kPa 32 a 45 mmHg
pH 7,35 a 7,45 7,35 a 7,45
Po2 9,6 a 13,8 kPa 72 a 104 mmHg
Aspartato aminotransferase (AST, SGOT) S 0,20 a 0,65 kat/L 12 a 38 U/L
Apêndice
Autoanticorpos S
Anticorpo IgG anticentrômero ≤ 29 AU/mL ≤ 29 AU/mL
Anti‑DNA de fita dupla (nativo) < 25 UI/L < 25 UI/L
Anticorpos antimembrana basal glomerular
IgG, IgA qualitativas Negativo Negativo
Anticorpo IgG quantitativo ≤ 19 AU/mL ≤ 19 AU/mL
Anticorpos anti‑histona < 1,0 U < 1,0 U
(Continua)
369
QUADRO 2 Química clínica e imunologia (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Bilirrubina S
Total 5,1 a 22 mol/L 0,3 a 1,3 mg/dL
Direta 1,7 a 6,8 mol/L 0,1 a 0,4 mg/dL
Indireta 3,4 a 15,2 mol/L 0,2 a 0,9 mg/dL
Peptídio C S 0,27 a 1,19 nmol/L 0,8 a 3,5 ng/mL
Proteína inibidora da C1‑esterase S 210 a 390 mg/L 21 a 39 mg/dL
CA 125 S < 35 kU/L < 35 U/mL
CA 19‑9 S < 37 kU/L < 37 U/mL
CA 15‑3 S < 33 kU/L < 33 U/mL
CA 27‑29 S 0 a 40 kU/L 0 a 40 U/mL
Calcitonina S
Homens 0 a 7,5 ng/L 0 a 7,5 pg/mL
Mulheres 0 a 5,1 ng/L 0 a 5,1 pg/mL
Cálcio S 2,2 a 2,6 mmol/L 8,7 a 10,2 mg/dL
Cálcio, ionizado ST 1,12 a 1,32 mmol/L 4,5 a 5,3 mg/dL
Conteúdo de dióxido de carbono (TCO2) P (nível do mar) 22 a 30 mmol/L 22 a 30 mEq/L
Carboxiemoglobina (conteúdo de monóxido de carbono) ST
Não fumantes 0,0 a 0,015 0 a 1,5%
Fumantes 0,04 a 0,09 4 a 9%
Apêndice
(Continua)
370
QUADRO 2 Química clínica e imunologia (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Creatinoquinase‑MB S
Massa 0,0 a 5,5 g/L 0,0 a 5,5 ng/mL
Fração da atividade total (por eletroforese) 0 a 0,04 0 a 4,0%
Creatinina S
Mulheres 44 a 80 mol/L 0,5 a 0,9 mg/dL
Homens 53 a 106 mol/L 0,6 a 1,2 mg/dL
Crioglobulinas S Não aplicável Nenhuma detectada
Cistatina C S 0,5 a 1,0 mg/L 0,5 a 1,0 mg/L
Desidroepiandrosterona (DHEA) (adulto)
Homens S 6,2 a 43,4 nmol/L 180 a 1250 ng/dL
Mulheres 4,5 a 34,0 nmol/L 130 a 980 ng/dL
Sulfato de desidroepiandrosterona (DHEA) S
Homens (adultos) 100 a 6190 g/dL 10 a 619 g/dL
Mulheres (adultas, pré‑menopausa) 120 a 5350 g/L 12 a 535 g/dL
Mulheres (adultas, pós‑menopausa) 300 a 2600 g/dL 30 a 260 g/dL
11‑Desoxicortisol (adulto) (composto S) S 0,34 a 4,56 nmol/L 12 a 158 ng/dL
Diidrotestosterona
Homens S, P 1,03 a 2,92 nmol/L 30 a 85 ng/dL
Apêndice
Mulheres 0,14 a 0,76 nmol/L 4 a 22 ng/dL
Dopamina P 0 a 130 pmol/L 0 a 20 pg/mL
Epinefrina P
Em decúbito (30 min) < 273 pmol/L < 50 pg/mL
Em posição sentada < 328 pmol/L < 60 pg/mL
Em posição ortostática (30 min) < 491 pmol/L < 90 pg/mL
Eritropoietina S 4 a 27 U/L 4 a 27 U/L
(Continua)
371
QUADRO 2 Química clínica e imunologia (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Hormônio folículo estimulante (FSH) S, P
Mulheres
Durante a menstruação 3,0 a 20,0 UI/L 3,0 a 20,0 mUI/mL
Fase folicular 9,0 a 26,0 UI/L 9,0 a 26,0 mUI/mL
Fase ovulatória 1,0 a 12,0 UI/L 1,0 a 12,0 mUI/L
Fase lútea 18,0 a 153,0 UI/L 18,0 a 153,0 mUI/mL
Pós‑menopausa
Homens 1,0 a 12,0 UI/L 1,0 a 12,0 mUI/mL
Frutosamina S < 285 mol/L < 285 mo/L
Gama glutamiltransferase S 0,15 a 0,99 kat/L 9 a 58 U/L
Gastrina S < 100 ng/L < 100 pg/mL
Glucágon P 40 a 130 ng/L 40 a 130 pg/mL
Glicose ST 3,6 a 5,3 mmol/L 65 a 95 mg/dL
Glicose (jejum) P
Normal 4,2 a 5,6 mmol/L 75 a 100 mg/dL
Risco aumentado de diabetes 5,6 a 6,9 mmol/L 100 a 125 mg/dL
Diabetes melito Jejum ≥ 7,0 mmol/L Jejum ≥ 126 mg/dL
Nível de ≥ 11,1 mmol/L dentro Nível de ≥ 200 mg/dL dentro
de 2 horas durante um teste de de 2 horas durante um teste de
Apêndice
(Continua)
372
QUADRO 2 Química clínica e imunologia (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
17‑Hidroxiprogesterona (adulto) S
Homens < 4,17 nmol/L < 139 ng/dL
Mulheres
Fase folicular 0,45 a 2,1 nmol/L 15 a 70 ng/dL
Fase lútea 1,05 a 8,7 nmol/L 35 a 290 ng/dL
Imunofixação S Não aplicável Nenhuma faixa detectada
Imunoglobulina, quantificação (adulto)
IgA S 0,70 a 3,50 g/L 70 a 350 mg/dL
IgD S 0 a 140 mg/L 0 a 14 mg/dL
IgE S 1 a 87 KUI/L 1 a 87 UI/mL
IgG S 7,0 a 17,0 g/L 700 a 1.700 mg/dL
IgG1 S 2,7 a 17,4 g/L 270 a 1.740 mg/dL
IgG2 S 0,3 a 6,3 g/L 30 a 630 mg/dL
IgG3 S 0,13 a 3,2 g/L 13 a 320 mg/dL
IgG4 S 0,11 a 6,2 g/L 11 a 620 mg/dL
IgM S 0,50 a 3,0 g/L 50 a 300 mg/dL
Insulina S, P 14,35 a 143,5 pmol/L 2 a 20 U/mL
Ferro S 7 a 25 mol/L 41 a 141 g/dL
Capacidade de ligação do ferro S 45 a 73 mol/L 251 a 406 g/dL
Apêndice
Saturação da capacidade de ligação do ferro S 0,16 a 0,35 16 a 35%
Albumina modificada por isquemia S < 85 KU/L < 85 U/mL
Cristais do líquido articular LA Não aplicável Nenhum cristal detectado
Mucina do líquido articular LA Não aplicável Presença apenas de mucina tipo I
Cetona (acetona) S Negativa Negativa
Lactato P, arterial 0,5 a 1,6 mmol/L 4,5 a 14,4 mg/dL
P, venoso 0,5 a 2,2 mmol/L 4,5 a 19,8 mg/dL
Norepinefrina P
(Continua)
373
QUADRO 2 Química clínica e imunologia (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Em decúbito (30 min) 650 a 2.423 pmol/L 110 a 410 pg/mL
Em posição sentada 709 a 4.019 pmol/L 120 a 680 pg/mL
Em posição ortostática (30 min) 739 a 4.137 pmol/L 125 a 700 pg/mL
N‑telopeptídio (ligação cruzada), NTx S
Mulheres, pré‑menopausa 6,2 a 19,0 nmol BCE 6,2 a 19,0 nmol BCE
Homens 5,5 a 24,2 nmol BCE 5,4 a 24,2 nmol BCE
BCE = equivalente de colágeno ósseo
NT‑Pro BNP S, P < 125 ng/L até 75 anos < 125 pg/mL até 75 anos
<450 ng/L >75 anos < 450 pg/mL > 75 anos
5’‑Nucleotidase S 0,00 a 0,19 kat/L 0 a 11 U/L
Osmolalidade P 275 a 295 mOsmol/kg de água 275 a 295 mOsmol/kg de água
sérica sérica
Osteocalcina S 11 a 50 g/L 11 a 50 ng/mL
Conteúdo de oxigênio ST
Arterial (nível do mar) 17 a 21 17 a 21 vol%
Venoso (nível do mar) 10 a 16 10 a 16 vol%
Saturação de oxigênio (nível do mar) ST Fração: Porcentagem:
Arterial 0,94 a 1,0 94 a 100%
Venoso, braço 0,60 a 0,85 60 a 85%
Apêndice
374
QUADRO 2 Química clínica e imunologia (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
Piruvato P 40 a 130 mol/L 0,35 a 1,14 mg/dL
Fator reumatoide S < 15 kUI/L < 15 UI/mL
Serotonina ST 0,28 a 1,14 mol/L 50 a 200 ng/mL
Eletroforese das proteínas séricas S Não aplicável Padrão normal
Globulina de ligação dos hormônios sexuais (adulto) S
Homens 11 a 80 nmol/L 11 a 80 nmol/L
Mulheres 30 a 135 nmol/L 30 a 135 nmol/L
Sódio S 136 a 146 mmol/L 136 a 146 mEq/L
Somatomedina C (IGF‑1) (adulto) S
16 anos 226 a 903 g/L 226 a 903 ng/mL
17 anos 193 a 731 g/L 193 a 731 ng/mL
18 anos 163 a 584 g/L 163 a 584 ng/mL
19 anos 141 a 483 g/L 141 a 483 ng/mL
20 anos 127 a 424 g/L 127 a 424 ng/mL
21 a 25 anos 116 a 358 g/L 116 a 358 ng/mL
26 a 30 anos 117 a 329 g/L 117 a 329 ng/mL
31 a 35 anos 115 a 307 g/L 115 a 307 ng/mL
36 a 40 anos 119 a 204 g/L 119 a 204 ng/mL
Apêndice
41 a 45 anos 101 a 267 g/L 101 a 267 ng/mL
46 a 50 anos 94 a 252 g/L 94 a 252 ng/mL
51 a 55 anos 87 a 238 g/L 87 a 238 ng/mL
56 a 60 anos 81 a 225 g/L 81 a 225 ng/mL
61 a 65 anos 75 a 212 g/L 75 a 212 ng/mL
66 a 70 anos 69 a 200 g/L 69 a 200 ng/mL
71 a 75 anos 64 a 188 g/L 64 a 188 ng/mL
375
QUADRO 2 Química clínica e imunologia (Continuação)
Item analisado Amostra Unidades SI Unidades convencionais
População saudável, percentil 99 0 a 0,01 g/L 0 a 0,01 ng/mL
Ureia nitrogenada S 2,5 a 7,1 mmol/L 7 a 20 mg/dL
Ácido úrico S
Mulheres 0,15 a 0,33 mmol/L 2,5 a 5,6 mg/dL
Homens 0,18 a 0,41 mmol/L 3,1 a 7,0 mg/dL
Polipeptídio intestinal vasoativo P 0 a 60 ng/L 0 a 60 pg/mL
Protoporfirina zinco ST 0 a 400 g/L 0 a 40 g/dL
Razão protopofirina zinco (ZPP)‑heme ST 0 a 60 mol ZPP/mol de heme 0 a 69 mol/L ZPP/mol de heme
Paracetamol (acetaminofeno) 66 a 199 mol/L 10 a 30 g/mL > 1.320 mol/L > 200 g/mL
Amicacina
Pico 34 a 51 mol/L 20 a 30 g/mL > 60 mol/L > 35 g/mL
Mínimo 0 a 17 mol/L 0 a 10 g/mL > 17 mol/L > 10 g/mL
Amitriptilina/nortriptilina 430 a 900 nmol/L 120 a 250 ng/mL > 1.800 nmol/L > 500 ng/mL
(fármaco total)
Anfetamina 150 a 220 nmol/L 20 a 30 ng/mL > 1.500 nmol/L > 200 ng/mL
Valores Laboratoriais de Importância Clínica
Brometo 9,4 a 18,7 mmol/L 75 a 150 mg/dL > 18,8 mmol/L > 150 mg/dL
Toxicidade leve 6,4 a 18,8 mmol/L 51 a 150 mg/dL
Toxicidade grave > 18,8 mmol/L > 150 mg/dL
Letal > 37,5 mmol/L > 300 mg/dL
Cafeína 25,8 a 103 mol/L 5 a 20 g/mL > 206 mol/L > 40 g/mL
Carbamazepina 17 a 42 mol/L 4 a 10 g/mL > 85 mol/L > 20 g/mL
Cloranfenicol
Pico 31 a 62 mol/L 10 a 20 g/mL > 77 mol/L > 25 g/mL
Mínimo 15 a 31 mol/L 5 a 10 g/mL > 46 mol/L > 15 g/mL
Clordiazepóxido 1,7 a 10 mol/L 0,5 a 3,0 g/mL > 17 mol/L > 5,0 g/mL
Clonazepam 32 a 240 nmol/L 10 a 75 ng/mL > 320 nmol/L > 100 ng/mL
Clozapina 0,6 a 2,1 mol/L 200 a 700 ng/mL > 3,7 mol/L > 1.200 ng/mL
Cocaína > 3,3 mol/L > 1,0 g/mL
Codeína 43 a 100 nmol/L 13 a 33 ng/mL > 3.700 nmol/mL > 1.100 ng/mL (letal)
Ciclosporina
Transplante renal
0 a 6 meses 208 a 312 nmol/L 250 a 375 ng/mL > 312 nmol/L > 375 ng/mL
6 a 12 meses após o 166 a 250 nmol/L 200 a 300 ng/mL > 250 nmol/L > 300 ng/mL
transplante
> 12 meses 83 a 125 nmol/L 100 a 150 ng/mL > 125 nmol/L > 150 ng/mL
Transplante cardíaco
0 a 6 meses 208 a 291 nmol/L 250 a 350 ng/mL > 291 nmol/L > 350 ng/mL
6 a 12 meses após o 125 a 208 nmol/L 150 a 250 ng/mL > 208 nmol/L > 250 ng/mL
transplante
> 12 meses 83 a 125 nmol/L 100 a 150 ng/mL > 125 nmol/L 150 ng/mL
(Continua)
376
QUADRO 3 Toxicologia e monitoração terapêutica de fármacos e substâncias (Continuação)
Faixa terapêutica Nível tóxico
Agente Unidades SI Unidades convencionais Unidades SI Unidades convencionais
Ciclosporina (Continuação)
Transplante de pulmão
0 a 6 meses 250 a 374 nmol/L 300 a 450 ng/mL > 374 nmol/L > 450 ng/mL
Transplante de fígado
Iniciação 208 a 291 nmol/L 250 a 350 ng/mL > 291 nmol/L > 350 ng/mL
Manutenção 83 a 166 nmol/L 100 a 200 ng/mL > 166 nmol/L > 200 ng/mL
Desipramina 375 a 1.130 nmol/L 100 a 300 ng/mL > 1.880 nmol/L > 500 ng/mL
Diazepam (e metabólito)
Diazepam 0,7 a 3,5 mol/L 0,2 a 1,0 g/mL > 7,0 mol/L > 2,0 g/mL
Nordiazepam 0,4 a 6,6 mol/L 0,1 a 1,8 g/mL > 9,2 mol/L > 2,5 g/mL
Digoxina 0,64 a 2,6 nmol/L 0,5 a 2,0 ng/mL > 5,0 nmol/L > 3,9 ng/mL
Disopiramida 5,3 a 14,7 mol/L 2 a 5 g/mL > 20,6 mol/L > 7 g/mL
Doxepina e nordoxepina
Doxepina 0,36 a 0,98 mol/L 101 a 274 ng/mL > 1,8 mol/L > 503 ng/mL
Nordoxepina 0,38 a 1,04 mol/L 106 a 291 ng/mL > 1,9 mol/L > 531 ng/mL
Etanol
Alterações comportamentais > 4,3 mmol/L > 20 mg/dL
Limite legal ≥ 17 mmol/L ≥ 80 mg/dL
Apêndice
Crítico com exposição aguda > 54 mmol/L > 250 mg/dL
Etilenoglicol
Tóxico > 2 mmol/L > 12 mg/dL
Letal > 20 mmol/L > 120 mg/dL
Etossuximida 280 a 700 mol/L 40 a 100 g/mL > 700 mol/L > 100 g/mL
Everolimo 3,13 a 8,35 nmol/L 3 a 8 ng/mL > 12,5 nmol/L > 12 ng/mL
Flecainida 0,5 a 2,4 mol/L 0,2 a 1,0 g/mL > 3,6 mol/L > 1,5 g/mL
(Continua)
377
QUADRO 3 Toxicologia e monitoração terapêutica de fármacos e substâncias (Continuação)
Faixa terapêutica Nível tóxico
Agente Unidades SI Unidades convencionais Unidades SI Unidades convencionais
Morfina 232 a 286 mol/L 65 a 80 ng/mL > 720 mol/L > 200 ng/mL
Ácido micofenólico 3,1 a 10,9 mol/L 1,0 a 3,5 ng/mL > 37 mol/L > 12 ng/mL
Nitropussiato (como tiocianato) 103 a 499 mol/L 6 a 29 g/mL 860 mol/L > 50 g/mL
Nortriptilina 190 a 569 nmol/L 50 a 150 ng/mL > 1.900 nmol/L > 500 ng/mL
Fenobarbital 65 a 172 mol/L 15 a 40 g/mL > 258 mol/L > 60 g/mL
Fenitoína 40 a 79 mol/L 10 a 20 g/mL > 158 mol/L > 40 g/mL
Fenitoína, livre 4,0 a 7,9 g/mL 1 a 2 g/mL > 13,9 g/mL > 3,5 g/mL
% Livre 0,08 a 0,14 8 a 14%
Primidona e metabólito
Primidona 23 a 55 mol/L 5 a 12 g/mL > 69 mol/L > 15 g/mL
Fenobarbital 65 a 172 mol/L 15 a 40 g/mL > 215 mol/L > 50 g/mL
Procainamida
Procainamida 17 a 42 mol/L 4 a 10 g/mL > 43 mol/L > 10 g/mL
NAPA (N‑acetilprocainamida) 22 a 72 mol/L 6 a 20 g/mL > 126 mol/L > 35 g/mL
Quinidina 6,2 a 15,4 mol/L 2,0 a 5,0 g/mL > 19 mol/L > 6 g/mL
Salicilatos 145 a 2.100 mol/L 2 a 29 mg/dL > 2.900 mol/L > 40 mg/dL
Sirolimo (nível mínimo)
Apêndice
Transplante renal 4,4 a 15,4 nmol/L 4 a 14 ng/mL > 16 nmol/L > 15 ng/mL
Tacrolimo (FK506) (minimo)
Rim e fígado 12 a 19 nmol/L 10 a 15 ng/mL > 25 nmol/L > 20 ng/mL
Iniciação
Manutenção 6 a 12 nmol/L 5 a 10 ng/mL > 25 nmol/L > 20 ng/mL
Coração
Iniciação 19 a 25 nmol/L 15 a 20 ng/mL
Valores Laboratoriais de Importância Clínica
378
QUADRO 4 Vitaminas e oligoelementos selecionados
Faixa de referência
Amostra Item analisado Unidades SI Unidades convencionais
Ácido fólico H 340 a 1.020 nmol/L células 150 a 450 ng/mL células
Ácido fólico S 12,2 a 40,8 nmol/L 5,4 a 18,0 ng/mL
Alumínio S < 0,2 mol/mL < 5,41 g/L
Arsênico ST 0,03 a 0,31 mol/L 2 a 23 g/L
U, 24 h 0,07 a 0,67 mol/dia 5 a 50 g/dia
‑caroteno S 0,07 a 1,43 mol/L 4 a 77 g/dL
Cádmio ST < 44,5 nmol/L < 5,0 g/L
Chumbo (adulto) S < 0,5 mol/L < 10 g/dL
Cobre S 11 a 22 mol/L 70 a 140 g/dL
Coenzima Q10 (ubiquinona) P 433 a 1.532 g/L 433 a 1.532 g/L
Mercúrio ST 3,0 a 294 nmol/L 0,6 a 59 g/L
Selênio S 0,8 a 2,0 mol/L 63 a 160 g/L
Vitamina A S 0,7 a 3,5 mol/L 20 a 100 g/dL
Vitamina B1 (tiamina) S 0 a 75 nmol/L 0 a 2 g/dL
Vitamina B12 S 206 a 735 pmol/L 279 a 996 pg/mL
Vitamina B2 (riboflavina) S 106 a 638 nmol/L 4 a 24 g/dL
Vitamina B6 P 20 a 121 nmol/L 5 a 30 ng/mL
Apêndice
Vitamina C (ácido ascórbico) S 23 a 57 mol/L 0,4 a 1,0 mg/dL
Vitamina D3, 1,25 diidroxi, total S, P 36 a 180 pmol/L 15 a 75 pg/mL
Vitamina D3, 25‑hidroxi, total P 75 a 250 nmol/L 30 a 100 nmol/L
Vitamina E S 12 a 42 mol/L 5 a 18 g/mL
Vitamina K S 0,29 a 2,64 nmol/L 0,13 a 1,19 ng/mL
Zinco S 11,5 a 18,4 mol/L 75 a 120 mol/dL
379
VALORES DE REFERÊNCIA PARA ITENS ESPECÍFICOS
QUADRO 5 Classificação do colesterol LDL, total e HDL
Colesterol LDL
< 70 mg/dL Opção terapêutica para pacientes QUADRO 6 Líquido cerebrospinala
de risco muito alto
Faixa de referência
< 100 mg/dL Ideal
Unidades
100 a 129 mg/dL Quase ideal/acima do ideal Componente Unidades SI convencionais
130 a 159 mg/dL Limítrofe alto
Amônia 15 a 47 mol/L 25 a 80 g/dL
160 a 189 mg/dL Alto
Creatinina 44 a 168 mol/L 0,5 a 1,9 mg/dL
> 190 mg/dL Muito alto
Eletrólitos
Colesterol total
Cálcio 1,0 a 1,5 mmol/L 2,1 a 3,0 mEq/L
< 200 mg/dL Desejável
Cloreto 116 a 122 mmol/L 116 a 122 mEq/L
200 a 239 mg/dL Limítrofe alto
Conteúdo de CO2 20 a 24 mmol/L 20 a 24 mEq/L
> 240 mg/dL Alto
Magnésio 1,0 a 1,2 mmol/L 2,0 a 2,5 mEq/L
Colesterol HDL
Potássio 2,7 a 3,9 mmol/L 2,7 a 3,9 mEq/L
< 40 mg/dL Baixo
Sódio 137 a 145 mmol/L 137 a 145 mEq/L
≥ 60 mg/dL Alto
Glicose 2,22 a 3,89 mmol/L 40 a 70 mg/dL
Nota: LDL, lipoproteína de baixa densidade; HDL, lipoproteína de alta densidade. Hemácias 0 0
Fonte: Resumo executivo do terceiro relatório do grupo de especialistas do National Choles-
terol Education Program (NCEP) sobre detecção, avaliação e tratamento dos níveis sanguíneos Lactato 1 a 2 mmol/L 10 a 20 mg/dL
elevados de colesterol em adultos (painel de tratamento de adultos III). JAMA 2001; 285:2486- Proteína total:
97. Implicações dos estudos clínicos recentes do National Cholesterol Education Program Adult
Treatment Panel III Guidelines: SM Grundy et al. for the Coordinating Committee of the National
Albumina 0,066 a 0,442 g/L 6,6 a 44,2 mg/dL
Apêndice
Cholesterol Education Program. Circulation 110:227, 2004. Faixas oligoclonais < 2 faixas ausentes
na amostra de soro
equivalente
Cisternal 0,15 a 0,25 g/L 15 a 25 mg/dL
IgG 0,009 a 0,057 g/L 0,9 a 5,7 mg/dL
Índice de IgGb 0,29 a 0,59
Lombar 0,15 a 0,5 g/L 15 a 50 mg/dL
Ventricular 0,06 a 0,15 g/L 6 a 15 mg/dL
Valores Laboratoriais de Importância Clínica
Leucócitos
Diferencial
Linfócitos 60 a 70%
Monócitos 30 a 50%
Neutrófilos Nenhum
Total 0 a 5 células
mononucleares por L
Osmolaridade 292 a 297 mmol/kg 292 a 297
de água mOsmol/L
PCO 6 a 7 kPa 45 a 49 mmHg
2
pH 7,31 a 7,34
Pressão do LCS 50 a 180 mmH2O
Proteína básica da mielina < 4 g/L
Volume do LCS (adulto) Cerca de 150 mL
a
Como as concentrações do líquido cerebrospinal são valores de equilíbrio, são aconselháveis
mensurações dos mesmos parâmetros no plasma sanguíneo obtido na mesma hora. Todavia, há
um lapso de tempo para se alcançar o equilíbrio, e os níveis cerebrospinais dos componentes
plasmáticos que podem oscilar rapidamente (como, por exemplo, a glicose plasmática) podem
não atingir valores estáveis antes de um intervalo de tempo significativo.
b
Índice de IgG = IgG do LCS (mg/dL) albumina sérica (g/dL)/IgG sérica (g/dL) albumina do
LCS (mg/dL).
380
QUADRO 7A Contagens diferenciais de células nucleadas no QUADRO 8 Exame de fezes
aspirado de medula ósseaa Faixa de referência
Faixa Unidades
observada Faixa de Média Unidades SI convencionais
(%) 95% (%) (%)
Alfa‑1‑antitripsina ≤ 540 mg/L ≤ 54 mg/dL
Células blásticas 0 a 3,2 0 a 3,0 1,4
Volume 0,1 a 0,2 kg/dia 100 a 200 g/24 h
Promielócitos 3,6 a 13,2 3,2 a 12,4 7,8
Coproporfirina 611 a 1.832 nmol/dia 400 a 1.200 g/24 h
Mielócitos neutrofílicos 4 a 21,4 3,7 a 10,0 7,6
Gordura
Mielócitos eosinofílicos 0 a 5,0 0 a 2,8 1,3
Adulto < 7 g/dia
Metamielócitos 1 a 7,0 2,3 a 5,9 4,1
Adulto com dieta < 4 g/dia
Neutrófilos sem gorduras
Homens 21,0 a 45,6 21,9 a 42,3 32,1 Ácidos graxos 0 a 21 mmol/dia 0 a 6 g/24 h
Mulheres 29,6 a 46,6 28,8 a 45,9 37,4 Leucócitos Ausentes Ausentes
Eosinófilos 0,4 a 4,2 0,3 a 4,2 2,2 Nitrogênio < 178 mmol/dia < 2,5 g/24 h
Eosinófilos mais mielócitos 0,9 a 7,4 0,7 a 6,3 3,5 pH 7,0 a 7,5
eosinofílicos
Potássio 14 a 102 mmol/L 14 a 102 mmol/L
Basófilos 0 a 0,8 0 a 0,4 0,1
Sangue oculto Negativo Negativo
Eritroblastos
Osmolalidade 280 a 325 mOsm 280 a 325 mOsm
Homens 18,0 a 39,4 16,2 a 40,1 28,1
Sódio 7 a 72 mmol/L 7 a 72 mmol/L
Mulheres 14,0 a 31,8 13,0 a 32,0 22,5
Tripsina 20 a 95 U/g
Linfócitos 4,6 a 22,6 6,0 a 20,0 13,1
Urobilinogênio 85 a 510 mol/dia 50 a 300 mg/24 h
Apêndice
Plasmócitos 0 a 1,4 0 a 1,2 0,6
Uroporfirinas 12 a 48 nmol/dia 10 a 40 g/24 h
Monócitos 0 a 3,2 0 a 2,6 1,3
Água < 0,75 < 75%
Macrófagos 0 a 1,8 0 a 1,3 0,4
Razão M:E Fonte: Modificado de FT Fishbach, MB Dunning III: A Manual of Laboratory nad Diagnostic Tests,
7th. ed. Philadelphia, Lippincott Williams & Wilkins, 2004.
Homens 1,1 a 4,0 1,1 a 4,1 2,1
Mulheres 1,6 a 5,4 1,6 a 5,2 2,8
a
Com base no aspirado de medula óssea de 50 voluntários sadios (30 homens, 20 mulheres).
381
QUADRO 9 Exame de urina e provas de função renal
Faixa de referência
Unidades SI Unidades convencionais
Acidez, titulável 20 a 40 nmol/dia 20 a 40 mEq/dia
Aldosterona Dieta normal: 6 a 25 g/dia Dieta normal: 6 a 25 g/dia
Dieta com baixo teor de sal: 17 a 44 g/dia Dieta com baixo teor de sal: 17 a 44 g/dia
Dieta com alto teor de sal: 0 a 6 g/dia Dieta com alto teor de sal: 0 a 6 g/dia
Alumínio 0,19 a 1,11 mol/L 5 a 30 g/L
Amônia 30 a 50 mmol/dia 30 a 50 mEq/dia
Amilase 4 a 400 U/L
Razão amilase/depuração da creatinina [(Clam/ClCr) x 100] 1a5 1a5
Arsênico 0,07 a 0,67 mol/dia 5 a 50 g/dia
Proteína de Bence Jones, urina, qualitativa Não aplicável Nenhuma detectada
Proteína de Bence Jones, urina, quantitativa
Kappa livre 1,4 a 24,2 mg/L 0,14 a 2,42 mg/dL
Lambda livre 0,2 a 6,7 mg/L 0,02 a 0,67 mg/dL
Razão K/L 2,04 a 10,37 2,04 a 10,37
Cálcio (10 mEq/dia ou 200 mg/dia de cálcio dietético) < 7,5 mmol/dia < 300 mg/dia
Cloreto 140 a 250 mmol/dia 140 a 250 mmol/dia
Citrato 320 a 1.240 mg/dia 320 a 1.240 mg/dia
Apêndice
(Continua)
382
QUADRO 9 Exame de urina e provas de função renal (Continuação)
Faixa de referência
Unidades SI Unidades convencionais
Microalbumina
Normal 0,0 a 0,03 g/dia 0 a 30 mg/dia
Microalbuminúria 0,03 a 0,30 g/dia 30 a 300 mg/dia
Albuminúria crítica > 0,3 g/dia > 300 mg/dia
Razão microalbumina/creatinina
Normal 0 a 3,4 g/mol de creatinina 0 a 30 g/mL de creatinina
Microalbuminúria 3,4 a 34 g/mol de creatinina 30 a 300 g/mg de creatinina
Albuminúria clínica > 34 g/mol de creatinina > 300 g/mg de creatinina
2‑Microglobulina 0 a 160 g/L 0 a 160 g/L
Norepinefrina 89 a 473 nmol/dia 15 a 80 g/dia
N‑telopeptídio (ligação cruzada), NTx
Mulheres, pré‑menopausa 17 a 94 nmol BCE/mmol de creatinina 17 a 94 nmol BCE/mmol de creatinina
Mulheres, pós‑menopausa 26 a 124 nmol BCE/mmol de creatinina 26 a 124 nmol BCE/mmol de creatinina
Homens 21 a 83 nmol BCE/mmol de creatinina 21 a 83 nmol BCE/mmol de creatinina
BCE = equivalente de colágeno ósseo
Osmolalidade 500 a 800 mOsmol/kg de água 500 a 800 mOsmol/kg de água
Oxalato
Apêndice
Homens 80 a 500 mol/dia 7 a 44 mg/dia
Mulheres 45 a 350 mol/dia 4 a 31 mg/dia
pH 5,0 a 9,0 5,0 a 9,0
Fosfato (fósforo) (varia com a ingestão) 12,9 a 42,0 mmol/dia 400 a 1.300 mg/dia
Porfobilinogênio Ausente Ausente
Potássio (varia com a ingestão) 25 a 100 mmol/dia 25 a 100 mEq/dia
Proteína < 0,15 g/dia < 150 mg/dia
Fonte: Modificado de FT Fishbach, MB Dunning III: A Manual of Laboratory and Diagnostic Tests, 7th ed., Lippincott Williams & Wilkins, Philadelphia, 2004
383
PROVAS DE FUNÇÃO ESPECIAIS
Ventrículo esquerdo
Sistólica máxima 130 90 a 140
Diastólica final 8,7 5 a 12
Artéria braquial
Média 85 70 a 105
Sistólica máxima 130 90 a 140
Diastólica final 70 60 a 90
Fonte: Reproduzido de MJ Kern The Cardiac Catheterization Handbook, 4th ed., Philadelphia, Mosby, 2003.
384
QUADRO 11 Provas de função circulatória
Resultados: faixa de referência
Teste Unidade SI (faixa) Unidades convencionais (faixa)
Diferença arteriovenosa de oxigênio 30 a 50 mL/L 30 a 50 mL/L
Débito cardíaco (Fick) 2,5 a 3,6 L/m2 de área de superfície 2,5 a 3,6 L/m2 de área de superfície
corporal por min corporal por min
Índices de contratilidade
pd/td ventricular esquerda máxima (pd/td) 220 kPa/s (176 a 250 kPa/s) 1.650 mmHg/s (1.320 a 1.880 mmHg/s)
PD quando PD = 5,3 kPa (37,6 ± 12,2)/s (37,6 ± 12,2)/s
(40 mmHg) (PD, pressão VE desenvolvida) 3,32 ± 0,84 volumes diastólicos finais por 3,32 ± 0,84 volumes diastólicos finais por
segundo segundo
Taxa de ejeção sistólica normalizada média (angiografia) 1,83 ± 0,56 circunferências por segundo 1,83 ± 0,56 circunferências por segundo
Velocidade média de encurtamento das fibras circunferenciais
(angiografia)
Fração de ejeção: volume sistólico/volume diastólico final (VS/VDF) 0,67 ± 0,08 (0,55 a 0,78) 0,67 ± 0,08 (0,55 a 0,78)
Volume diastólico final 70 ± 20,0 mL/m2 (60 a 88 mL/m2) 70 ± 20,0 mL/m2 (60 a 88 mL/m2)
2 2
Volume sistólico final 25 ± 5,0 mL/m (20 a 33 mL/m ) 25 ± 5,0 mL/m2 (20 a 33 mL/m2)
Trabalho ventricular esquerdo
2
Índice de trabalho sistólico 50 ± 20,0 (g.m)/m (30 a 110) 50 ± 20,0 (g.m)/m2 (30 a 110)
2
Índice de trabalho por minuto ventricular esquerdo 1,8 a 6,6 [(kg.m)/m ]/min 1,8 a 6,6 [(kg.m)/m2]/min
Índice de consumo de oxigênio 110 a 150 mL 110 a 150 mL
Apêndice
Captação máxima de oxigênio 35 mL/min (20 a 60 mL/min) 35 mL/min (20 a 60 mL/min)
5
Resistência vascular pulmonar 2 a 12 (kPa.s)/L 20 a 130 (dyn.s)/cm
Resistência vascular sistêmica 77 a 150 (kPa.s)/L 770 a 1.600 (dyn.s)/cm5
Fonte: E Braunwald et al.: Heart Disease, 6a. ed. Philadelphia, W.B. Saunders Co., 2001.
(Continua)
385
QUADRO 12 Limites de referência e valores de partição normais de ecocardiografia em adultos (Continuação)
Valores de Valores de
referência referência
nas Levemente Moderadamente Gravemente nos Levemente Moderadamente Gravemente
mulheres anormais anormais anormais homens anormais anormais anormais
Comprimento base‑ápice 7,1 a 7,9 8,0 a 8,5 8,6 a 9,1 ≥ 9,2 7,1 a 7,9 8,0 a 8,5 8,6 a 9,1 ≥ 9,2
Diâmetro do TSVD acima da valva 2,5 a 2,9 3,0 a 3,2 3,3 a 3,5 ≥ 3,6 2,5 a 2,9 3,0 a 3,2 3,3 a 3,5 ≥ 3,6
aórtica
Diâmetro do TSVD acima da valva 1,7 a 2,3 2,4 a 2,7 2,8 a 3,1 ≥ 3,2 1,7 a 2,3 2,4 a 2,7 2,8 a 3,1 ≥ 3,2
pulmonar
Diâmetro da artéria pulmonar abaixo 1,5 a 2,1 2,2 a 2,5 2,6 a 2,9 ≥ 3,0 1,5 a 2,1 2,2 a 2,5 2,6 a 2,9 ≥ 3,0
da valva pulmonar
Tamanho e função do ventrículo direito
na visualização de 4 câmaras
Área diastólica, cm2 11 a 28 29 a 32 33 a 37 ≥ 38 11 a 28 29 a 32 33 a 37 ≥ 38
2
Área sistólica, cm 7,5 a 16 17 a 19 20 a 22 ≥ 23 7,5 a 16 17 a 19 20 a 22 ≥ 23
Alteração da área fracional, % 32 a 60 25 a 31 18 a 24 ≤ 17 32 a 60 25 a 31 18 a 24 ≤ 17
Dimensões atriais
Diâmetro do AE, cm 2,7 a 3,8 3,9 a 4,2 4,3 a 4,6 ≥ 4,7 3,0 a 4,0 4,1 a 4,6 4,7 a 5,2 ≥ 5,3
2
Diâmetro do AE/ASC, cm/m 1,5 a 2,3 2,4 a 2,6 2,7 a 2,9 ≥ 3,0 1,5 a 2,3 2,4 a 2,6 2,7 a 2,9 ≥ 3,0
Eixomenor do AD, cm 2,9 a 4,5 4,6 a 4,9 5,0 a 5,4 ≥ 5,5 2,9 a 4,5 4,6 a 4,9 5,0 a 5,4 ≥ 5,5
2
Eixo menor do AD/ASC, cm/m 1,7 a 2,5 2,6 a 2,8 2,9 a 3,1 ≥ 3,2 1,7 a 2,5 2,6 a 2,8 2,9 a 3,1 ≥ 3,2
Apêndice
2
Área do AE, cm < 20 20 a 30 30 a 40 ≥ 41 < 20 20 a 30 30 a 40 ≥ 41
Volume AE, mL 22 a 52 53 a 62 63 a 72 ≥ 73 18 a 58 59 a 68 69 a 78 ≥ 79
2
Volume AE/ASC, mL/m 16 a 28 29 a 33 34 a 39 ≥ 40 16 a 28 29 a 33 34 a 39 ≥ 40
Estenose aórtica, classificação da
gravidade
Velocidade do jato aórtico, m/s 2,6 a 2,9 3,0 a 4,0 > 4,0 2,6 a 2,9 3,0 a 4,0 > 4,0
Gradiente médio, mmHg < 20 20 a 40 > 40 < 20 40 > 40
2
Valores Laboratoriais de Importância Clínica
Aérea valvar, cm > 1,5 1,0 a 1,5 < 1,0 > 1,5 1,0 a 1,5 < 1,0
2 2
Índice de área valvar, cm /m >0,85 0,60 a 0,85 < 0,6 > 0,85 0,60 a 0,85 < 0,6
Razão de velocidade > 0,50 0,25 a 0,50 < 0,25 0,50 0,25 a 0,50 < 0,25
Estenose mitral, classificação da
gravidade
Área valvar, cm2 > 1,5 1,0 a 1,5 < 1,0 > 1,5 1,0 a 1,5 < 1,0
Gradiente médio, mmHg <5 5 a 10 > 10 <5 5 a 10 > 10
Pressão da artéria pulmonar, mmHg < 30 30 a 50 > 50 <0 30 a 50 > 50
Insuficiência aórtica, índices de
gravidade
Largura da vena contracta, cm < 0,30 0,30 a 0,60 0,60 < 0,30 0,30 a 0,60 ≥ 0,60
Largura do jato/largura do TSVE, % < 25 25 a 64 ≥ 65 < 25 25 a 64 ≥ 65
ACT do jato/ACT do TSVE, % <5 5 a 59 ≥ 60 <5 5 a 59 ≥ 60
Volume regurgitante, mL/batimento < 30 30 a 59 60 < 30 30 a 59 ≥ 60
Fração regurgitante, % < 30 30 a 49 ≥ 50 < 30 30 a 49 ≥ 50
Orifício efetivo de regurgitação, cm2 < 0,10 0,10 a 0,29 ≥ 0,30 < 0,10 0,10 a 0,29 ≥ 0,30
Insuficiência mitral, índice de gravidade
Largura da vena contracta, cm < 0,30 0,30 a 0,69 ≥ 0,70 < 0,30 0,30 a 0,69 ≥ 0,70
Volume regurgitante, mL/batimento < 30 30 a 59 60 < 30 30 a 59 ≥ 60
Fração regurgitante, % < 30 30 a 49 50 < 30 30 a 49 ≥ 50
Área do orifício efetivo de < 0,20 0,20 a 0,39 ≥ 0,40 < 0,20 0,20 a 0,39 ≥ 0,40
regurgitação, cm2
Nota: ASC, área de superfície corporal; ACT, área de corte transversal; AE, átrio esquerdo; TSVE, via de saída do ventrículo esquerdo; AD, átrio direito; TSVD, via de saída do ventrículo direito; 2D,
bidimensional.
Fonte: Valores adaptados da: American Society of Echocardiography, Guidelines and Standards. http://www.asecho.org/i4a/pages/index.cfm?pageid-3317. Acessado em 23 de fevereiro, 2010.
386
QUADRO 13 Resumo dos valores úteis em fisiologia pulmonar
Valores típicos
Homem de 40 anos, 75 kg, Mulher de 40 anos, 60 kg,
Símbolo estatura de 175 cm estatura de 160 cm
Mecânica pulmonar
Espirometria – curvas de volume‑tempo
Capacidade vital forçada CVF 5,0 L 3,4 L
Volume expiratório forçado em 1 s VEF1 4,0 L 2,8 L
VEF1/CVF VEF1% 80% 78%
Fluxo máximo no meio da expiração FMME (FEF 25 a 75) 4,1 L/s 3,2 L/s
Taxa de fluxo expiratório máximo TFEM (FEF 200 a 1.200) 9,0 L/s 6,1 L/s
Espirometria – curvas de fluxo‑volume
Fluxo expiratório máximo em 50% da capacidade vital Vmáx. 50 (FEF 50%) 5,0 L/s 4,0 L/s
expirada
Fluxo expiratório máximo em 75% da capacidade vital Vmáx. 75 (FEF 75%) 2,1 L/s 2,0 L/s
expirada
Resistência ao fluxo de ar
Resistência pulmonar RP (Rp) < 0,3 (cmH2O/s)/L
Resistência das vias respiratórias Rvr < 2,5 (cmH2O/s)/L
Condutância específica CEvr > 0,13 cmH2O/s
Complacência pulmonar
Apêndice
Pressão de retração estática na capacidade pulmonar total Pest CPP 25 ± 5 cmH2O
Complacência dos pulmões (estática) CP 0,2 L cmH2O
Complacência dos pulmões e do tórax C(P+T) 0,1 L cmH2O
Complacência dinâmica de 20 incursões por minuto C din 20 0,25 ± 0,05 L/cmH2O
Pressões respiratórias estáticas máximas
Pressão inspiratória máxima PIM > 110 cmH2O > 70 cmH2O
Pressão expiratória máxima PEM > 200 cmH2O > 140 cmH2O
Fonte: Baseado em: AH Morris et al.: Clinical Pulmonary Function Testing. A Manual of Umiform Laboratory Procedures, 2nd. ed. Salt Lake City, Utah, Intermountain Thoracic Society, 1984.
387
QUADRO 14 Provas gastrintestinais
Resultados
Exame Unidades SI Unidades convencionais
Gastrina, soro 0 a 200 g/L 0 a 200 pg/mL
Provas de absorção
d‑xilose: após
uma noite de jejum, administração de 25 g de xilose em
solução aquosa oral
Soro, 2 h após a dose 2,0 a 3,5 mmol/L 30 a 52 mg/dL
Urina, coletada durante as 5 h seguintes 25% da dose ingerida 25% da dose ingerida
Vitamina A: obtém‑se uma amostra de sangue em jejum e são O nível sérico deve aumentar duas O nível sérico deve aumentar duas
administradas 200.000 unidades VO de vitamina A em óleo vezes em relação ao nível de jejum em vezes em relação ao nível de jejum em
3a5h 3a5h
Suco gástrico
Produção de ácido
Basal
Homens (média ± 1 DP) 0,8 ± 0,6 mol/s 3,0 ± 2,0 mEq/h
Mulheres (média ± 1 DP) 0,6 ± 0,5 mol/s 2,0 ± 1,8 mEq/h
Máxima (após fosfato ácido de histamina por via SC, 0,004 mg/kg de peso
corporal, e precedida de 50 mg de prometazina, ou após betazol, 1,7 mg/
kg de peso corporal, ou pentagastrina, 6 g/kg de peso corporal)
Homens (média ± 1 DP) 6,4 ± 1,4 mol/s 23 ± 5 mEq/h
Apêndice
388
DIVERSAS
Apêndice
Mulheres 65 mL por kg de peso corporal
389
Agradecimentos Kratz A et al: Case records of the Massachusetts General Hospital. We-
Agradecemos imensamente as contribuições dos Drs. Daniel J. Fink, Patrick M. ekly clinicopathological exercises. Laboratory reference values. N Engl
Sluss, Dr. James L. Januzzi e Dr. Kent B. Lewandrowski por suas contribuições J Med 351:1548, 2004
para este capítulo nas edições anteriores. Expressamos também nossa profunda Lehman HP, Henry JB: SI Units, in Henry’s Clinical Diagnosis and Manage-
gratidão aos Drs. Amudha Palanisamy e Scott Fink pela sua cuidadosa revisão ment by Laboratory Methods, 21st ed, RC McPherson, MR Pincus (eds).
dos quadros e sugestões úteis. Philadelphia, Elsevier Saunders, 2007, pp 1404–1418
Pesce MA: Reference ranges for laboratory tests and procedures, in Nelson’s
BIBLIOGRAFIA Textbook of Pediatrics, 18th ed, RM Klegman et al (eds). Philadelphia,
Hickman PE, Koerbin G: Methods in Clinical Chemistry. An accessory Elsevier Saunders, 2007, pp 2943–2949
work to the fifth edition of Kaplan and Pesce’s: Clinical Chemistry: The- Roberts WL et al: Reference information of the clinical laboratory, in Tietz
ory, Analysis, Correlation, 5th ed, LA Kaplan, AJ Pesce (eds). Philadel- Textbook of Clinical Chemistry and Molecular Diagnostics, 4th ed, CA
phia, Elsevier Mosby, 2009 Burtis et al (eds). Philadelphia, Elsevier Saunders, 2006, pp 2251–2318
Apêndice
Valores Laboratoriais de Importância Clínica
390
5. Todos os seguintes hormônios são produzidos pela adeno-hi-
Questões de Preparação pófise, EXCETO:
QUESTÕES
A. Hormônio adrenocorticotrófico
para Provas e Concursos B. Hormônio do crescimento
C. Ocitocina
Charles Wiener D. Prolactina
Cynthia D. Brown E. Hormônio tireoestimulante
Anna R. Hemnes
6. Uma mulher de 22 anos de idade, hígida, dá à luz a um lactente
a termo por parto vaginal normal. No dia seguinte, queixa-se
QUESTÕES de alterações visuais e de cefaleia intensa. Duas horas após se
INSTRUÇÕES: Escolha a resposta mais adequada para cada questão: queixar, é encontrada com deterioração da consciência e hipo-
tensão profunda. É intubada e colocada sob ventilação mecâni-
1. Todos os itens a seguir representam exemplos de feedback nega- ca. A pressão arterial é de 68/28 mmHg, a frequência cardíaca
tivo hipotalâmico-hipofisário, EXCETO: é regular, de 148 bpm e a saturação de oxigênio é de 95% com
A. Cortisol sobre o eixo CRH-ACTH FIO2 de 0,40. O exame físico é inespecífico. Os resultados labo-
B. Esteroides gonadais sobre o eixo GnRH-LH/FSH ratoriais são notáveis pelo nível de glicose de 49 mg/dL e hema-
C. IGF-1 sobre o eixo hormônio de liberação do hormônio do tócrito e contagem de leucócitos normais. Qual das seguintes
crescimento (GHRH)-GH. alternativas mais provavelmente irá reverter a hipotensão dessa
D. Eixo renina-angiotensina-aldosterona paciente?
E. Hormônios tireoidianos sobre o eixo TRH-TSH A. Alfadrotrecogina ativada
B. Hidrocortisona
2. A disfunção endócrina pode ser dividida em hiperfunção glan- C. Piperacilina/tazobactam
dular, hipofunção glandular ou resistência hormonal. Qual das D. T4
seguintes doenças é causada por resistência hormonal? E. Transfusão de concentrados de hemácias
A. Doença de Graves
B. Tireoidite de Hashimoto 7. Um homem de 45 anos de idade relata a seu médico que a
C. Feocromocitoma esposa percebeu que seus traços faciais estavam se tornando
D. Síndrome de Sheehan grosseiros no decorrer de vários anos. Além disso, queixa-se
E. Diabetes melito tipo 2 de baixa libido e diminuição da energia. O exame físico revela
bossas frontais e maior tamanho das mãos. A RM confirma a
3. A secreção de hormônio de liberação das gonadotrofinas existência de uma massa hipofisária. Qual dos seguintes exa-
(GnRH) normalmente estimula a liberação do hormônio lu- mes de rastreamento deve ser solicitado para diagnosticar a
teinizante (LH) e do hormônio folículo-estimulante (FSH), causa da massa?
os quais promovem a produção e a liberação de testosterona e A. Cortisol livre na urina de 24 horas
de estrogênio. Qual dos seguintes mecanismos explica melhor B. Ensaio do ACTH
como os agonistas de liberação prolongada do hormônio de C. Nível sérico do hormônio do crescimento
liberação das gonadotrofinas (p. ex., leuprolide) diminuem os D. Nível sérico de IGF-1
níveis de testosterona no tratamento do câncer de próstata? E. Nível sérico de prolactina
A. Os agonistas do GnRH também promovem a produção de
globulina de ligação dos hormônios sexuais, que diminuem 8. Todas as seguintes condições representam causas potenciais de
a disponibilidade de testosterona. hiperprolactinemia, EXCETO:
B. Alça de feedback (feedback loop) negativo entre o GnRH e o A. Cirrose
LH/FSH. B. Hirsutismo
C. Sensibilidade do LH e do FSH à frequência de pulsos do C. Estimulação dos mamilos
GnRH. D. Abuso de opiáceos
D. Translocação do receptor nuclear citoplasmática para o nú- E. Cisto de Rathke
cleo, com ativação constitutiva do GnRH.
9. Uma mulher de 28 anos de idade chega ao consultório de seu
4. O receptor de mineralocorticoides no túbulo renal é responsá- médico com amenorreia que já dura um ano. Queixa-se de
vel pela retenção de sódio e pela perda de potássio que são ob- galactorreia leve e cefaleias. Embora seja sexualmente ativa, o
servadas em estados de excesso de mineralocorticoides, como teste de gravidez pela urina é negativo. Os níveis séricos de pro-
os tumores secretores de aldosterona. Entretanto, os estados de lactina estão elevados, e a paciente é subsequentemente diag-
excesso de glicocorticoides (p. ex., síndrome de Cushing), tam- nosticada com microprolactinoma. Qual das seguintes alterna-
bém podem apresentar retenção de sódio e hipopotassemia. tivas representa o principal objetivo do tratamento da condição
Qual característica das vias de mineralocorticoides-glicocorti- dessa paciente com bromocriptina?
coides explica este achado? A. Controle da hiperprolactinemia
A. Maior afinidade do receptor de mineralocorticoides pelos B. Redução do tamanho do tumor
glicocorticoides. C. Resolução da galactorreia
B. Saturação excessiva da via de degradação de glicocorticoi- D. Restauração das menstruações e da fertilidade
des no estado de excesso de glicocorticoides. E. Todas as alternativas anteriores
C. Locais de ligação de DNA semelhantes, porém distintos,
que produzem o mesmo efeito metabólico. 10. Um homem de 50 anos de idade sofre um grave traumatismo
D. Suprarregulação da proteína de ligação de mineralocorti- cranioencefálico e desenvolve insuficiência hipofisária. Após
coides nos estados de excesso de glicocorticoides. sua recuperação, recebe tratamento com hormônio tireoidiano,
* Questões e respostas retiradas de Wiener C et al (Eds.): Medicina interna de Harrison: preparação para provas e concursos, 18a ed. Porto Alegre: AMGH, 2014.
391
testosterona, glicocorticoides e vasopressina. Em uma visita de A. Estabelecer o diagnóstico de pan-hipopituitarismo subclí-
rotina, ele pergunta ao médico sobre a possibilidade de defi- nico e iniciar reposição hormonal com baixas doses.
ciência do hormônio de crescimento. Todos os seguintes itens B. Tranquilizar a paciente e acompanhar rigorosamente os re-
são sinais ou sintomas potenciais de deficiência de hormônio sultados.
QUESTÕES
QUESTÕES
C. Síndrome do eutireóideo doente dicações devido a dificuldades financeiras. Não há evidências
D. Hipertiroxinemia disalbuminêmica familiar de infecção no exame, na microscopia de urina ou na radiogra-
E. Excesso familiar de globulina de ligação dos hormônios ti- fia do tórax. A bioquímica sérica é notável pela hiponatremia
reoidianos. discreta e glicose a 48. O nível de TSH está acima de 100 mU/L.
Todas as seguintes afirmativas sobre essa condição são verda-
20. Qual das seguintes condições constitui a causa mais comum de deiras, EXCETO:
hipotireoidismo no mundo? A. O aquecimento externo é um aspecto crítico do tratamento
A. Doença de Graves de pacientes com temperatura acima de 34°C.
B. Tireoidite de Hashimoto B. Deve-se evitar o uso de soluções intravenosas hipotônicas.
C. Hipotireoidismo iatrogênico C. Deve-se administrar levotiroxina IV com glicocorticoides
D. Deficiência de iodo IV.
E. Exposição à radiação D. Deve-se evitar a sedação, se possível.
E. Essa condição ocorre quase exclusivamente no idoso e,
21. Uma mulher de 75 anos de idade é diagnosticada com hipoti- com frequência, é precipitada por uma doença clínica não
reoidismo. Apresenta doença arterial coronariana de longa du- relacionada.
ração e quer saber sobre as potenciais consequências para seu
sistema cardiovascular. Qual das seguintes alternativas é ver- 25. Uma mulher de 29 anos de idade é avaliada devido à ocorrência
dadeira acerca da interação do hipotireoidismo com o sistema de ansiedade, palpitações e diarreia, e verifica-se que ela apre-
cardiovascular? senta doença de Graves. Antes de iniciar o tratamento para essa
A. A contratilidade miocárdica está aumentada no hipotireoi- doença da tireoide, ela tem um episódio de dor torácica aguda e
dismo. procura o atendimento de emergência. Apesar da prescrição de
B. Ocorre redução do volume sistólico no hipotireoidismo. angiotomografia, o radiologista entra em contato com o médi-
C. Os derrames pericárdicos constituem uma rara manifesta- co da paciente para notificar que esse exame é potencialmente
ção do hipotireoidismo. perigoso. Qual das seguintes alternativas melhor explica a reco-
D. Ocorre redução da resistência periférica no hipotireoidis- mendação do radiologista?
mo, a qual pode ser acompanhada de hipotensão. A. A exposição ao meio de contraste iodado em pacientes com
E. O fluxo sanguíneo é desviado para a pele no hipotireoi- doença de Graves pode exacerbar o hipertireoidismo.
dismo. B. A embolia pulmonar é extremamente rara na doença de
Graves.
22. Uma mulher de 38 anos de idade e com três filhos procura seu C. A exposição à radiação em pacientes com hipertireoidismo
médico com queixas de fadiga. Percebe que seu nível de energia está associada a um risco aumentado de neoplasia maligna
tem sido baixo nos últimos três meses. Estava anteriormente subsequente.
saudável e não fazia uso de nenhuma medicação. Ela também D. A taquicardia com doença de Graves limita a qualidade da
relata que teve um aumento de peso de cerca de 5 kg e apresen- imagem da angiotomografia e não possibilitará uma avalia-
ta constipação intestinal grave, para a qual tem tomado vários ção precisa da embolia pulmonar.
laxativos. O nível de TSH está elevado, em 25 mU/L. A T4 livre E. O radiologista estava equivocado: a angiotomografia é se-
está baixa. Ela quer saber por que está com hipotireoidismo. gura na doença de Graves.
Qual dos seguintes testes tem mais probabilidade de diagnosti-
car a etiologia? 26. Que porcentagem de pacientes com hipertireoidismo e fibrila-
A. Anticorpo antitireoglobulina ção atrial reverte para o ritmo sinusal após o tratamento apenas
B. Anticorpo antitireoperoxidase do estado da tireoide?
C. Cintilografia de captação com iodo radioativo A. 20%
D. Nível sérico de tireoglobulina B. 30%
E. Ultrassonografia da tireoide C. 50%
D. 70%
23. Uma mulher de 54 anos de idade com hipotireoidismo de longa E. 90%
duração é examinada no consultório de seu médico para ava-
liação de rotina. Queixa-se de fadiga e de ligeira constipação in- 27. Qual das seguintes afirmativas melhor descreve a oftalmopatia
testinal. Desde a última consulta, as outras condições clínicas, de Graves?
que incluem hipercolesterolemia e hipertensão sistêmica, per- A. Apesar de ser um problema estético, a oftalmopatia de
maneceram estáveis. Foi diagnosticada com fibroides uterinos Graves raramente está associada a complicações oculares
e recentemente começou a tomar ferro. As outras medicações importantes.
incluem levotiroxina, atorvastatina e hidroclorotiazida. O ní- B. Pode ocorrer diplopia devido ao edema periorbitário.
vel de TSH é determinado e apresenta-se elevado em 15 mU/L. C. Nunca ocorre sem hipertireoidismo concomitante.
Qual das seguintes alternativas representa o motivo mais pro- D. A complicação mais grave consiste em abrasão da córnea.
vável para a elevação do TSH? E. Não ocorre doença unilateral.
A. Doença celíaca
B. Câncer de colo 28. Qual das seguintes alternativas é o mecanismo de ação mais
C. Não adesão à medicação importante da propiltiouracila no tratamento da doença de
D. Diminuição/Má absorção da levotiroxina devido ao sulfato Graves?
ferroso A. Comprometimento da produção de transtiretina
E. Adenoma hipofisário secretor de TSH B. Inibição da produção de imunoglobulinas tireoestimulantes
C. Inibição da função da tireoperoxidase
24. Uma mulher de 87 anos de idade é internada na unidade de D. Conversão periférica reduzida da T4 em T3
terapia intensiva com nível deprimido de consciência, hipo- E. Reversão da organificação do iodo
393
29. Um homem de 44 anos de idade é vítima de colisão com ve- apresenta-se baixo. Qual é o próximo passo na avaliação desse
ículo motorizado. Sofre múltiplas lesões no rosto, no tórax e paciente?
na pelve. Está com nível de consciência alterado no local do A. Acompanhamento rigoroso e determinação dos níveis de
acidente e é intubado para proteção da via respiratória. Obtém- TSH em seis meses
QUESTÕES
-se um acesso intravenoso. O paciente é internado na unidade B. Aspiração com agulha fina
de terapia intensiva (UTI) com múltiplas lesões ortopédicas. C. Reposição com hormônio tireoidiano em baixa dose
É estabilizado clinicamente e, no segundo dia de internação, é D. Tomografia por emissão de pósitrons seguida de cirurgia
submetido à redução aberta bem-sucedida e à fixação interna E. Cintilografia da tireoide com radionuclídeo
do fêmur e úmero direitos. Após o retorno do paciente à UTI,
você faz uma revisão dos valores laboratoriais. O nível de TSH 34. Um paciente deve ser submetido à neurocirurgia para tumor
é de 0,3 mU/L e o nível de T4 total está normal. O nível de T3 é hipofisário que exige ressecção da glândula. Qual das seguintes
de 0,6 ����������������������������������������������������
µ���������������������������������������������������
g/dL. Qual o próximo passo mais apropriado no mane- funções das glândulas suprarrenais será preservada nesse pa-
jo desse paciente? ciente no pós-operatório imediato?
A. Início da levotiroxina A. Pico matinal dos níveis plasmáticos de cortisol
B. Início da prednisona B. Liberação de cortisol em resposta ao estresse
C. Observação C. Retenção de sódio em resposta à hipovolemia
D. Cintilografia com captação de iodo radioativo D. Nenhuma das alternativas anteriores
E. Ultrassonografia da tireoide
35. Qual das seguintes condições representa a causa mais comum
30. Uma mulher de 29 anos de idade chega à sua clínica queixan- da síndrome de Cushing?
do-se de dificuldade na deglutição, faringite e edema hiper-
sensível no pescoço. Ela também observou a ocorrência de A. Adenoma hipofisário produtor de ACTH
febre intermitente nesta última semana. Várias semanas antes B. Adenoma adrenocortical
do aparecimento dos sintomas atuais, a paciente teve sintoma C. Carcinoma adrenocortical
de infecção das vias respiratórias superiores. Não tem história D. Secreção ectópica de ACTH
clínica pregressa. Ao exame físico, verifica-se a presença de E. Síndrome de McCune-Albright
um pequeno bócio, que é doloroso à apalpação. A orofaringe
está clara. Os exames de laboratório revelam uma contagem de 36. Todos os seguintes itens são manifestações da síndrome de
leucócitos de 14.100 células/��������������������������������
µ�������������������������������
L com contagem diferencial nor- Conn, EXCETO:
mal, velocidade de hemossedimentação (VHS) de 53 mm/h e A. Alcalose
nível de hormônio tireoestimulante (TSH) de 21 µUI/mL. Os B. Hiperpotassemia
anticorpos antitireoidianos são negativos. Qual é o diagnóstico C. Cãibras musculares
mais provável? D. Nível sérico de sódio normal
A. Hipotireoidismo autoimune E. Hipertensão sistêmica grave
B. Doença da arranhadura do gato
C. Doença de Graves 37. Todas as seguintes afirmativas sobre massas suprarrenais assin-
D. Angina de Ludwig tomáticas (incidentalomas) são verdadeiras, EXCETO:
E. Tireoidite subaguda A. Todos os pacientes com incidentalomas devem ser subme-
tidos ao rastreamento para feocromocitoma.
31. Qual o tratamento mais apropriado para o paciente descrito na B. Aspiração com agulha fina pode diferenciar tumores su-
Questão 30? prarrenais primários benignos de malignos.
A. Ablação da tireoide com iodo C. Em pacientes com história de neoplasia maligna, a proba-
B. Altas doses de ácido acetilsalicílico bilidade de que a massa seja uma metástase é de aproxima-
C. Radioterapia local damente 50%.
D. Não há necessidade de tratamento D. Os incidentalomas suprarrenais são, em sua maioria, não
E. Propiltiouracila secretores.
E. A grande maioria dos incidentalomas suprarrenais é de na-
32. Qual dos seguintes casos é compatível com um diagnóstico de tureza benigna.
tireoidite subaguda?
A. Mulher de 38 anos de idade com história de duas semanas 38. Um homem de 43 anos de idade com hipertensão episódica
de duração de tireoide dolorida, níveis elevados de T4 e T3, grave é encaminhado para avaliação de possíveis causas se-
baixo nível de TSH e captação elevada de iodo radioativo. cundárias de hipertensão. Diz que geralmente sente-se bem,
B. Homem de 42 anos de idade com história de tireoide dolo- com exceção de episódios de ansiedade, palpitações e taquicar-
rida de quatro meses de duração, fadiga, mal-estar, baixos dia, com elevação da pressão arterial durante esses episódios.
níveis de T4 livre e T3 e nível elevado de TSH. Com frequência, o exercício físico desencadeia esses eventos.
C. Mulher de 31 anos de idade com tireoide aumentada e in- O paciente também tem depressão leve e, no momento, utili-
dolor, baixo nível de TSH, níveis elevados de T4 e de T4 livre za sertralina, labetalol, anlodipino e lisinopril para controlar a
e captação aumentada de iodo radioativo. pressão arterial. As metanefrinas totais na urina de 24 horas
D. Homem de 50 anos de idade com tireoide dolorida, ligeira são determinadas e revelam uma elevação de 1,5 vezes acima
elevação da T4, nível normal de TSH e ultrassonografia re- do limite superior de referência. Qual das seguintes opções é a
velando a presença de massa. conduta mais adequada?
A. Suspender o labetalol durante uma semana e repetir o teste.
33. Um homem de 53 anos de idade e saudável chega a seu consul- B. Suspender a sertralina durante uma semana e repetir o
tório para exame físico anual. Não tem queixas nem história teste.
clínica significativa. Está tomando um polivitamínico de venda C. Encaminhar imediatamente para avaliação cirúrgica.
livre, sem nenhuma outra medicação. Ao exame físico, consta- D. Medir o nível de ácido vanililmandélico na urina de 24
ta-se a presença de um nódulo da tireoide não hipersensível. horas.
O nível do hormônio tireoestimulante (TSH) é determinado e E. Encaminhar para RM do abdome.
394
39. Um homem de 45 anos de idade é diagnosticado com feocro- 44. Uma mulher de 27 anos de idade com obesidade leve é exami-
mocitoma após apresentar confusão, hipertensão pronunciada nada no consultório de seu médico devido a um aumento da
de 250/140 mmHg, taquicardia, cefaleias e rubor. As metane- sede e poliúria; suspeita-se de diabetes melito, e uma concen-
frinas fracionadas plasmáticas revelam um nível de normeta- tração plasmática aleatória de glicose de 211 mg/dia confirma
QUESTÕES
nefrina de 560 pg/mL e um nível de metanefrina de 198 pg/ o diagnóstico. Qual dos seguintes testes indicará fortemente a
mL (valores normais: normetanefrina: 18 a 111 pg/mL; meta- presença de diabetes melito tipo 1?
nefrina: 12 a 60 pg/mL). A TC do abdome com contraste IV A. Anticorpo anti-GAD-65
revela uma massa de 3 cm na glândula suprarrenal direita. A B. Teste para polimorfismos do receptor γ-2 ativado por pro-
RM do cérebro com gadolínio mostra a presença de edema da liferador peroxissomal
substância branca próximo à junção parietoccipital compatível C. Nível plasmático de insulina
com leucoencefalopatia posterior reversível. Você é consultado D. Teste para HLA-DR3
acerca da conduta. Qual das seguintes afirmativas é verdadeira E. Não existe nenhum exame laboratorial que indique diabe-
sobre o manejo do feocromocitoma nesse indivíduo? tes melito tipo 1
A. O betabloqueio está absolutamente contraindicado para a
taquicardia, mesmo após a obtenção de um alfabloqueio 45. Em pacientes com comprometimento da glicose em jejum, to-
adequado. das as intervenções abaixo demonstraram diminuir a incidên-
B. A remoção cirúrgica imediata da massa está indicada, visto que cia/desenvolvimento do diabetes tipo 2, EXCETO:
o paciente apresentou crise hipertensiva com encefalopatia. A. Modificação da dieta
C. O aporte de sal e de líquido deve ser restrito para evitar B. Exercício
uma exacerbação posterior da hipertensão do paciente. C. Gliburida*
D. O tratamento com fenoxibenzamina deve ser iniciado em D. Metformina
alta dose (20 a 30 mg três vezes ao dia) para controlar ra-
pidamente a pressão arterial, e deve-se efetuar a cirurgia 46. Um paciente é avaliado no atendimento de emergência devido
dentro de 24 a 48 horas. a complicações do diabetes melito, com episódio de estressores
E. O tratamento com fentolamina IV está indicado para o tra- da vida. Todos os seguintes exames laboratoriais são compatí-
tamento da crise hipertensiva. A fenoxibenzamina deve ser veis com o diagnóstico de cetoacidose diabética, EXCETO:
iniciada em dose baixa e titulada para a dose máxima tole-
A. pH arterial de 7,1
rada no decorrer de 2 a 3 semanas. A cirurgia não deve ser
B. Glicose 550 mg/dL
planejada até que a pressão arterial esteja consistentemente
C. Cetonas plasmáticas acentuadamente positivas
abaixo de 160/100 mmHg.
D. Nível sérico normal de potássio
40. Qual das seguintes populações étnicas nos EUA corre maior E. Osmolalidade plasmática de 380 mOsm/mL
risco de desenvolver diabetes melito?
47. Todos os seguintes achados são compatíveis com retinopatia
A. Norte-americanos de origem asiática diabética não proliferativa, EXCETO:
B. Hispânicos
C. Negros não hispânicos A. Hemorragias dispersas
D. Brancos não hispânicos B. Exsudatos algodonosos
C. Neovascularização
41. Qual dos seguintes itens define uma tolerância à glicose normal? D. Ocorre na primeira ou segunda década de diabetes melito.
E. Microaneurismas vasculares retinianos
A. Glicose plasmática em jejum inferior a 100 mg/dL.
B. Glicose plasmática em jejum inferior a 126 mg/dL após
48. Um homem de 68 anos de idade com diabetes melito tipo 2
uma teste oral de tolerância a glicose (TOTG).
inadequadamente controlado é internado com úlcera na face
C. Hemoglobina A1C abaixo de 5,6% e glicose plasmática em
lateral do membro inferior direito, que tem sido dolorosa e
jejum inferior de 140 mg/dL.
aparece purulenta. Teve três dias de febre. Todas as seguintes
D. Hemoglobina A1C abaixo de 6,0%.
intervenções são recomendadas para melhorar a cicatrização
E. Glicose plasmática em jejum inferior a 100 mg/dL, glicose
de feridas em um paciente com ferida diabética, EXCETO:
plasmática abaixo de 140 mg/dL após teste oral de tolerân-
cia a glicose (TOTG), e hemoglobina A1C abaixo de 5,6%. A. Uso apropriado de antibióticos
B. Desbridamento
42. Uma mulher de 37 anos de idade com obesidade chega à clínica C. Oxigênio hiperbárico
para avaliação de rotina de sua saúde. Relata que, nesse último D. Eliminação das sobrecargas
ano, teve duas infecções fúngicas tratadas com medicamentos E. Revascularização
de venda livre e que ela frequentemente sente sede. Ela tam-
bém relata que acorda à noite para urinar. Qual dos seguintes 49. Escolha a combinação correta de início de ação e duração de
exames é o primeiro teste mais adequado na avaliação dessa ação para as seguintes insulinas:
paciente para diabetes melito? A. Asparte: 1 hora, 6 horas
A. Hemoglobina A1C B. Detemir: 2 horas, 12 horas
B. Teste oral de tolerância à glicose C. Lispro: 0,5 horas, 2 horas
C. Nível plasmático de peptídeo C D. NPH: 2 horas, 14 horas
D. Nível plasmático de insulina E. Regular: 0,25 horas, 6 horas
E. Nível plasmático aleatório de glicose
50. Uma mulher de 55 anos de idade é diagnosticada com diabetes
43. Todos os seguintes itens constituem fatores de risco para o dia- melito tipo 2 após um acompanhamento de rotina por com-
betes melito tipo 2, EXCETO: prometimento da glicose em jejum, que mostrou um nível de
A. IMC acima de 25 kg/m2 hemoglobina A1C de 7,6%. Tentou perder peso e fazer exercí-
B. Parto de um lactente com peso acima de 3,5 kg cio físico, sem nenhuma melhora da hemoglobina A1C, e, nes-
C. Nível de HDL inferior a 35 mg/dL te momento, recomenda-se a terapia farmacológica. A paciente
D. Hemoglobina A1C de 5,7 a 6,4%
E. Hipertensão sistêmica *N. de R.T. No Brasil, este medicamento é conhecido como glibenclamida.
395
apresenta hipertensão sistêmica leve, que é bem controlada e 56. Uma mulher de 25 anos de idade, profissional da área de saúde,
não tem outras condições clínicas. Qual dos seguintes fármacos é examinada devido à hipoglicemia recorrente. Teve vários epi-
constitui o tratamento de primeira linha mais adequado? sódios no trabalho no decorrer deste último ano; nesses episó-
A. Acarbose dios, sente-se trêmula e ansiosa; além disso, apresenta sudorese
QUESTÕES
QUESTÕES
64. Um homem de 30 anos de idade, pai de três filhos, teve um au-
trual
mento progressivo das mamas nesses últimos 10 meses. Ele não
C. Aumento da temperatura corporal basal em mais de 0,3°C
faz uso de nenhum fármaco ou droga. A avaliação laboratorial
na segunda metade do ciclo menstrual
revela baixos níveis de LH e de testosterona. Qual dos seguintes
D. Presença de mittelschmerz
exames deve ser incluído na avaliação adicional desse paciente?
E. Nível de progesterona acima de 5 ng/mL sete dias antes da
menstruação esperada A. Coleta de urina de 24 horas para determinação dos 17-ce-
tosteroides
61. Um casal casado há cinco anos tentou conceber um filho nos B. Amostra de sangue para níveis séricos de aspartato amino-
últimos 12 meses. Apesar de relações sexuais regulares, não transaminase, fosfatase alcalina e bilirrubina
houve gravidez. Ambos têm 32 anos de idade e nenhum pro- C. Biópsia de mama
blema clínico. Nenhum deles utiliza qualquer medicamento. D. Análise do cariótipo para excluir a síndrome de Klinefelter
Qual das seguintes alternativas é a causa mais provável para a E. Medição dos níveis de estradiol e gonadotrofina coriônica
infertilidade? humana (hCG)
A. Endometriose
65. O estudo Women’s Health Initiative investigou a terapia hor-
B. Causas masculinas
monal em mulheres na pós-menopausa. O estudo foi interrom-
C. Disfunção ovulatória
pido precocemente, devido ao risco aumentado de qual das
D. Defeito tubário
seguintes doenças no braço com estrogênio apenas?
E. Infertilidade inexplicada
A. Trombose venosa profunda
62. Um casal procura aconselhamento devido à infertilidade. A B. Câncer endometrial
mulher tem 35 anos de idade. Nunca engravidou e tomou con- C. Infarto do miocárdio
traceptivos orais dos 20 até os 34 anos. Interrompeu o uso de D. Osteoporose
contraceptivos orais há 16 meses. Está tendo ciclos menstruais E. Acidente vascular encefálico
aproximadamente uma vez a cada 35 dias; todavia, em certas
ocasiões, o ciclo estende-se por até 60 dias. Na maioria dos 66. Um homem de 37 anos de idade é avaliado para infertilidade.
meses, apresenta hipersensibilidade das mamas cerca de 2 a 3 Ele e sua esposa tentaram conceber uma criança nesses últimos
semanas após o início do ciclo menstrual. Quando estava na dois anos, porém sem sucesso. Inicialmente, procurou um es-
universidade, foi tratada para a infecção por Neisseria gonor- pecialista em infertilidade e foi encaminhado a um endocrino-
rheae, para a qual foi diagnosticada quando procurou o centro logista quando a análise do sêmen revelou a ausência de esper-
de saúde estudantil com febre e dor pélvica. Nos demais aspec- matozoides. É saudável nos demais aspectos e toma apenas um
tos, não tem nenhuma história clínica. Trabalha cerca de 60 ho- polivitamínico. Ao exame físico, os sinais vitais estão normais.
ras semanais como advogada e pratica exercícios diariamente. É um homem alto, com testículos pequenos, ginecomastia e pe-
Bebe café todos os dias e consome álcool apenas em ocasiões los faciais e axilares mínimos. A análise cromossômica confir-
sociais. O seu índice de massa corporal (IMC) é de 19,8 kg/ ma a síndrome de Klinefelter. Qual das seguintes afirmativas é
2
m . O marido, de 39 anos de idade, veio acompanhá-la nessa verdadeira?
avaliação. Ele também nunca teve filhos. Teve um primeiro ca- A. A suplementação androgênica é de pouca utilidade nessa
samento dos 24 aos 28 anos. A sua ex-esposa tentou conceber condição.
durante cerca de 15 meses, porém não teve sucesso. Naquela B. O paciente não corre risco aumentado de tumor mamário.
época, fumava maconha todos os dias e atribuiu a falta de su- C. As concentrações plasmáticas de estrogênio estão elevadas.
cesso ao uso da droga. Está totalmente livre de drogas há nove D. Os casos são diagnosticados, em sua maioria, na pré-pu-
anos. Tem hipertensão e é tratado com 10 mg de lisinopril ao berdade.
dia. Não é obeso (IMC de 23,7 kg/m²). O casal solicita uma E. As concentrações plasmáticas de FSH e de LH estão dimi-
avaliação de sua infertilidade e ajuda para concepção. Qual das nuídas nessa condição.
seguintes afirmativas é verdadeira acerca de sua infertilidade e
probabilidade de sucesso de concepção? 67. Uma jovem de 17 anos de idade é avaliada em seu consultó-
A. A determinação da ovulação não é necessária na mulher, rio devido à amenorreia primária. Sente como se não tivesse
visto que a maioria dos ciclos menstruais é regular, e ela entrado na puberdade, visto que ela nunca teve um período
apresenta hipersensibilidade das mamas na metade do ci- menstrual e apresenta crescimento escasso dos pelos axilares
clo, indicando a presença de ovulação. e púbicos. Ao exame, tem 1,50 cm de altura. Tem uma linha de
B. O lisinopril deve ser interrompido imediatamente, devido implantação dos cabelos baixa e uma ligeira prega no pesco-
ao risco de defeitos congênitos associado a seu uso. ço. O nível do hormônio folículo-estimulante é de 175 mUI/
C. A mulher deve ser avaliada para desobstrução tubária por mL, o do hormônio luteinizante é de 20 mUI/mL e o nível de
histerossalpingografia. Se houver cicatrizes significativas, a estradiol é de 2 pg/mL. Você suspeita de síndrome de Turner.
fertilização in vitro deve ser fortemente considerada para Todos os seguintes exames estão indicados para essa paciente,
diminuir o risco de gravidez ectópica. EXCETO:
D. O uso prolongado de contraceptivos orais por mais de 10 A. Esfregaço bucal para heterocromatina nuclear (corpúsculo
anos aumentou o risco de anovulação e infertilidade. de Barr)
E. O uso de maconha pelo parceiro é diretamente tóxico para B. Ecocardiograma
a motilidade dos espermatozoides, e provavelmente esta é a C. Análise do cariótipo
causa da infertilidade. D. Ultrassonografia dos rins
E. Hormônio tireoestimulante (TSH)
63. Qual das seguintes formas de contracepção tem uma eficácia
teórica de mais de 90%? 68. Um homem de 35 anos de idade é examinado no serviço de
A. Preservativo emergência para avaliação de dor epigástrica, diarreia e reflu-
B. Dispositivos intrauterinos xo. Relata a ocorrência frequente de episódios semelhantes e
397
foi submetido a várias endoscopias. Em cada caso, foi dito que diagnósticos tem maior probabilidade de estabelecer o diag-
ele tem uma úlcera duodenal. Ficou muito frustrado, visto que nóstico correto?
disseram que as úlceras são habitualmente causadas por uma A. Cortisol sérico
bactéria que pode ser tratada; entretanto, não foi detectada a B. TSH sérico
QUESTÕES
QUESTÕES
3
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L, com 70% de células polimorfonucleares e 6% de bas- contraste confirma a presença de um calculo renal do lado di-
tões. O nível de ureia é de 171 mg/dL, e a creatinina, de 3,1 mg/ reito, que está atualmente localizado na parte distal do ureter.
dL. O nível plasmático de glicose é de 425 mg/dL. São adminis- Tem uma história clínica pregressa de sarcoidose pulmonar,
trados antibióticos de amplo espectro, líquidos intravenosos, que atualmente não está sendo tratada. Foi diagnosticado por
omeprazol e insulina endovenosa. Uma sonda nasogástrica é meio de biópsia broncoscópica, que revelou granulomas não
inserida, e inicia-se a alimentação por sonda. No segundo dia caseosos. A radiografia de tórax revela adenopatia hilar bilate-
de internação, o nível de creatinina diminui para 1,6 mg/dL. ral. O nível sérico de cálcio é de 12,6 mg/dL. Qual é o mecanis-
Entretanto, os níveis plasmáticos de fosfato são de 1,0 mg/dL mo de hipercalcemia nesse paciente?
(0,3 mmol/L) e de cálcio de 8,8 mg/dL. Todos os seguintes itens A. Ativação aumentada da 25-hidroxivitamina D em 1,25-hi-
são causas de hipofosfatemia nesse paciente, EXCETO: droxivitamina D por macrófagos no interior dos granulo-
A. Alcoolismo mas.
B. Insulina B. Ativação aumentada da 25-hidroxivitamina D em 1,25-hi-
C. Desnutrição droxivitamina D pelos rins.
D. Insuficiência renal C. Ativação aumentada de vitamina D em 25-hidroxivitamina
E. Sepse D por macrófagos dentro dos granulomas.
D. Diagnóstico omitido de linfoma com invasão subsequente
75. No paciente da Questão 74, qual é a abordagem mais adequada da medula óssea e reabsorção óssea por meio de destruição
para corrigir a hipofosfatemia? local.
A. Administrar gluconato de cálcio IV, 1 g, seguido de infusão E. Produção de peptídeo relacionado ao paratormônio por
de fosfato IV em uma velocidade de 8 mmol/h durante 6 macrófagos dentro dos granulomas.
horas.
B. Administrar fosfato IV apenas, em uma velocidade de 79. Um homem de 52 anos de idade apresenta doença renal termi-
2 mmol/h durante 6 horas. nal em consequência de hipertensão de longa duração e diabe-
C. Administrar fosfato IV apenas em uma velocidade de tes melito. Tem sido tratado com hemodiálise nesses últimos
8 mmol/h durante 6 horas. oito anos. Durante esse período, a adesão aos medicamentos e à
D. Manter uma observação rigorosa, visto que se espera que hemodiálise tem sido precária, omitindo frequentemente uma
a redistribuição do fosfato normalize nas próximas 24 a 48 sessão por semana. Nesse momento, queixa-se de dor óssea e
horas. dispneia. A saturação de oxigênio é de 92% no ar ambiente e
E. Iniciar a reposição de fosfato oral em uma dose de 1.500 uma radiografia do tórax revela infiltrados bilaterais pouco de-
mg/dia. finidos. A TC do tórax mostra infiltrados bilaterais em vidro
fosco. Os dados laboratoriais incluem cálcio de 12,3 mg/dL,
76. Uma mulher de 35 anos de idade é internada com 37 sema- fosfato de 8,1 mg/dL e paratormônio de 110 pg/mL. Qual das
nas de gestação após sofrer uma crise convulsiva associada à seguintes condutas seria a melhor abordagem para o tratamen-
pressão arterial elevada de 190/96 mmHg. Recebe tratamen- to da atual condição clínica do paciente?
to agudo com sulfato de magnésio por via intravenosa para A. Calcitriol, 0,5 µg por via intravenosa por hemodiálise, com
eclâmpsia. Inicia-se uma infusão contínua de sulfato de mag- sevelâmer três vezes ao dia
nésio 1 g/hora, que deverá ser mantida por 24 horas após a crise B. Calcitriol, 0,5 µg por via oral ao dia, com sevelâmer 1.600
convulsiva. Planeja-se uma cesariana de emergência. Os níveis mg ao dia
séricos de magnésio serão examinados a cada 6 horas. Qual se- C. Hemodiálise mais agressiva para obter um equilíbrio hi-
ria o nível de magnésio preocupante para o desenvolvimento de droeletrolítico ótimo.
depressão do sistema nervoso central, paralisia dos músculos D. Paratireoidectomia
respiratórios e arritmias cardíacas? E. Sevelâmer, 1.600 mg três vezes ao dia
A. 0,5 mmol/L
B. 1,0 mmol/L 80. Uma mulher de 54 anos de idade é submetida à tireoidecto-
C. 2,5 mmol/L mia total para carcinoma folicular da tireoide. Cerca de 6 horas
D. 3,0 mmol/L após a cirurgia, a paciente queixa-se de formigamento ao redor
E. 5,0 mmol/L da boca. Subsequentemente, apresenta uma sensação de alfi-
netada nos dedos das mãos e dos pés. O enfermeiro chama o
77. Você está cuidando de um homem de 72 anos de idade que re- médico para avaliar a paciente após ter tido cãibras intensas das
sidiu em uma clínica geriátrica nos últimos três anos. Ele apre- mãos quando a pressão arterial é medida. Durante a avaliação,
senta doença pulmonar obstrutiva crônica grave e necessita de a paciente ainda se queixa de câimbras intermitentes nas mãos.
oxigênio contínuo, 3 L/min. Além disso, sofreu anteriormente Desde a cirurgia, recebeu sulfato de morfina, 2 mg, para alívio
um acidente vascular encefálico, que o deixou com hemipare- da dor, e compazine, 5 mg para as náuseas. Não teve nenhuma
sia direita. As medicações atuais incluem ácido acetilsalicílico, alteração dos sinais vitais e não apresenta febre. A percussão
losartana, hidroclorotiazida, fluticasona/salmeterol, tiotrópio e sobre a porção inferior do arco zigomático, 2 cm anteriormente
2
salbutamol. O índice de massa corporal é de 18,5 kg/m . Você à orelha, produz contração no canto da boca. O eletrocardio-
suspeita que ele possa ter deficiência de vitamina D. Qual dos grama (ECG) revela intervalo QT de 575 milissegundos. Qual é
seguintes itens é o melhor teste para determinar a presença de o próximo passo na avaliação e no tratamento dessa paciente?
deficiência de vitamina D? A. Administração de benztropina, 2 mg IV
A. 1,25-hidroxivitamina D B. Administração de gluconato de cálcio, 2 g IV
B. 25 hidroxivitamina D C. Administração de sulfato de magnésio, 4g IV
C. Fosfatase alcalina D. Determinação dos níveis de cálcio, magnésio, fosfato e po-
D. Paratormônio tássio
E. Níveis séricos de cálcio total e ionizado E. Determinação da capacidade total forçada
399
81. Uma mulher de 68 anos de idade com carcinoma de células 85. Uma mulher de 50 anos de idade chega a seu consultório que-
escamosas do pulmão de estádio IIIB é internada, devido à al- rendo saber sobre o risco de fratura relacionado com a osteo-
teração do estado mental e à desidratação. Ao ser internada, porose. Ela tem uma história familiar positiva de osteoporose
verifica-se que o nível de cálcio é de 19,6 mg/dL, e o de fosfato, na mãe, embora esta nunca tenha sofrido qualquer fratura
QUESTÕES
de 1,8 mg/dL. A determinação concomitante do paratormônio vertebral ou de quadril. A própria paciente também não sofreu
é de 0,1 pg/mL (faixa normal de 10 a 65 pg/mL), e o rastrea- nenhuma fratura. É branca e tem história de tabagismo por 20
mento para o peptídeo relacionado ao paratormônio é positiva. anos, tendo abandonado o fumo há 10 anos. Aos 37 anos, foi
Nas primeiras 24 horas, a paciente recebe 4 L de solução sali- submetida a uma histerectomia total com salpingo-ooforecto-
na normal com furosemida para diurese. Na manhã seguinte, mia bilateral para endometriose. Apresenta intolerância à lac-
o nível de cálcio da paciente é de 17,6 mg/dL, o de fosfato de tose e não consome produtos derivados do leite. Atualmente,
2,2 mg/dL. Ela continua apresentando delírio. Qual é a melhor toma 500 mg de carbonato de cálcio por dia. Pesa 52 kg. Todos
abordagem para o tratamento continuado da hipercalcemia os seguintes itens são fatores de risco para uma fratura osteopo-
dessa paciente? rótica nesta mulher, EXCETO:
A. Continuar o tratamento com a administração de líquidos A. Menopausa precoce
em grande volume e diurese forçada com furosemida. B. Sexo feminino
B. Continuar o tratamento com a administração de líquidos C. História de tabagismo
em grande volume, porém interromper a furosemida e tra- D. Baixo peso corporal
tar com hidroclorotiazida. E. Baixa ingestão de cálcio
C. Iniciar o tratamento apenas com calcitonina.
D. Iniciar o tratamento apenas com pamidronato. 86. Todas as seguintes doenças estão associadas a um risco aumen-
E. Iniciar o tratamento com calcitonina e pamidronato tado de osteoporose, EXCETO:
A. Anorexia nervosa
82. Uma mulher de 60 anos de idade é encaminhada a seu con- B. Doença pulmonar obstrutiva crônica
sultório para avaliação de hipercalcemia de 12,9 mg/dL. A hi- C. Insuficiência cardíaca congestiva
percalcemia foi descoberta de modo incidental em um painel D. Síndrome da má-absorção
bioquímico obtido durante sua hospitalização para espondilose E. Hiperparatireoidismo
cervical. Apesar da administração de líquidos no hospital, o ní-
vel sérico de cálcio por ocasião de sua alta foi de 11,8 mg/dL. A 87. Uma mulher de 54 anos de idade é encaminhada a uma clí-
paciente é assintomática. Nos demais aspectos, tem boa saúde e nica de endocrinologia para avaliação de osteoporose depois
efetuou um rastreamento para câncer apropriada para a idade. que um exame recente realizado para dor lombar revelou uma
Nega ter constipação intestinal ou dor óssea, e, neste momento, fratura por compressão do corpo vertebral T4. Ela está na pe-
faz oito semanas que realizou a cirurgia de coluna. O nível de rimenopausa, com períodos menstruais irregulares e ondas de
sérico e cálcio é atualmente de 12,4 mg/dL, e o fosfato, de 2,3 calor frequentes. Não fuma. Nos demais aspectos, a paciente
mg/dL. O hematócrito e todos os exames de bioquímica, in- está saudável. Pesa 70 kg e mede 1,68 cm. Perdeu 5 cm de sua
cluindo a creatinina, estão normais. Qual é o diagnóstico mais altura máxima. A densitometria óssea revela um escore T de
provável? -3,5 DP e um escore Z de -2,5 DP. Todos os seguintes testes
estão indicados para a avaliação da osteoporose nessa paciente,
A. Câncer de mama EXCETO:
B. Hiperparatireoidismo
C. Hipertireoidismo A. Cálcio urinário de 24 horas
D. Mieloma múltiplo B. Níveis de hormônio folículo-estimulante e hormônio lutei-
E. Intoxicação por vitamina D nizante
C. Cálcio sérico
D. Hormônio tireoestimulante
83. Todos os seguintes itens constituem ações do paratormônio,
E. Níveis de vitamina D (25-hidroxivitamina D)
EXCETO:
A. Estimulação direta dos osteoblastos para aumentar a for- 88. Uma mulher de 45 anos de idade procura aconselhamento de
mação óssea. seu médico sobre o risco de osteoporose e a necessidade de me-
B. Estimulação direta dos osteoclastos para aumentar a reab- dição da densidade óssea. Ela não é fumante e só consome ál-
sorção óssea. cool socialmente. Tem uma história de asma persistente mode-
C. Reabsorção aumentada de cálcio pelo túbulo distal do rim. rada desde os 12 anos. No momento, faz uso de fluticazona, 44
D. Inibição da reabsorção de fosfato no túbulo proximal do mg/aplicação, duas vezes ao dia, com um bom controle. Neces-
rim. sitou de tratamento com prednisona oral há cerca de seis me-
E. Estimulação da 1-α-hidroxilase renal para produzir ses, quando teve influenza complicada por uma crise de asma.
1,25-hidroxicolecalciferol. Tomou prednisona durante 14 dias. Teve três gestações e dois
nascimentos vivos aos 39 e 41 anos. Atualmente, tem menstru-
84. Qual das seguintes afirmativas sobre a epidemiologia da osteo- ações irregulares, as quais ocorrem aproximadamente a cada 42
porose e das fraturas ósseas é correta? dias. O nível de hormônio folículo estimulante é de 25 mUI/L
o
A. Para cada período de cinco anos após os 70 anos de idade, e o nível de 17β-estradiol é de 15 pg/mL no 12 dia de seu ciclo
a incidência de fraturas de quadril aumenta em 25%. menstrual. A mãe e a tia materna foram diagnosticadas com
B. As fraturas do rádio distal aumentam em frequência antes osteoporose. A mãe também tem artrite reumatoide e necessita
dos 50 anos e alcançam um platô por volta dos 60 anos, de tratamento com prednisona, 5 mg ao dia. A mãe sofreu uma
com um aumento relacionado com a idade apenas mode- fratura da coluna lombar por compressão aos 68 anos. Ao exa-
rado. me físico, a paciente tem boa aparência e está saudável. A altura
C. A maioria das mulheres preenche os critérios diagnósticos é de 1,68 cm e o peso de 66,4 kg. Os exames torácico, cardíaco,
para osteoporose entre 60 e 70 anos de idade. abdominal, muscular e neurológico são normais. O que você
D. O risco de fratura de quadril é igual quando as mulheres explica a essa paciente sobre a necessidade de medição da den-
brancas são comparadas a mulheres negras. sidade óssea?
E. As mulheres com osteoporose são mais numerosas do que A. Como atualmente ela está na perimenopausa, deve efetuar
os homens, em uma razão aproximada de 10 para 1. uma medição da densidade óssea a cada dois anos até com-
400
pletar a menopausa e, em seguida, repetir a densitometria e γ-glutamil transferase de 20 U/L. Qual é o diagnóstico mais
óssea uma vez por ano. provável desse paciente?
B. Tendo em vista sua história familiar, deve começar a efetu- A. Reação adversa à rosuvastatina
ar a medição da densidade óssea a cada ano. B. Doença de Paget
QUESTÕES
C. A densitometria óssea não é recomendada até completar a C. Cirrose biliar primária
menopausa. D. Calculo retido no ducto colédoco
D. A gestação tardia até a quarta e quinta décadas diminui o E. Osteomielite vertebral
risco de desenvolver osteoporose, de modo que a densito-
metria óssea não é recomendada. 92. Qual dos seguintes exames tem mais probabilidade de estabele-
E. O uso de glicocorticoides inalados em baixa dose aumenta cer o diagnóstico do paciente da Questão 91?
em três vezes o risco de osteoporose, de modo que ela deve
A. Colangiopancreatografia com ressonância magnética
efetuar uma medição anual da densidade óssea.
B. Ressonância magnética da coluna lombossacra
89. Qual é a definição da osteoporose por absorciometria de raios C. Radiografia simples da coluna lombossacra
X de dupla energia (densitometria óssea)? D. Ultrassonografia do quadrante superior direito
E. Nível sérico de osteocalcina
A. Paciente com densidade óssea abaixo da media para con-
troles de idade, raça e sexo equivalentes. 93. Qual dos seguintes exames bioquímicos tem mais probabilida-
B. Paciente com densidade óssea de menos de 1,0 desvio-pa- de de estar dentro da faixa normal em um individuo ativo e
drão (DP) abaixo da média de controles da mesma raça e saudável com doença de Paget?
sexo.
C. Paciente com densidade óssea com menos de 1,0 DP abaixo A. Nível sérico de fosfatase alcalina
da média de controles da mesma idade, raça e sexo. B. Nível sérico de C-telopeptídeo
D. Paciente com densidade óssea de menos de 2,5 DP abaixo C. Nível sérico de cálcio
da média de controles da mesma raça e sexo. D. Nível sérico de N-telopeptídeo
E. Paciente com densidade óssea de menos de 2,5 DP abaixo E. Nível sérico de osteocalcina
da média de controles da mesma idade, raça e sexo
94. Uma mulher de 67 anos de idade chega à clínica depois de
90. Uma mulher asiática de 66 anos de idade procura tratamento uma queda sobre o gelo ocorrida há uma semana. Procurou o
para osteoporose. Caiu e fraturou o quadril direito, exigindo in- atendimento de emergência local imediatamente após a queda,
tervenção cirúrgica há três meses. Enquanto estava internada, onde foram realizadas radiografias de quadril, negativas para
disseram-lhe que tinha osteoporose, mas que ela não tinha sido fraturas ou luxação. Revelaram fusão das articulações sacroilía-
anteriormente avaliada para isso. Durante a hospitalização, so- cas e trabeculações grosseiras no ílio, compatíveis com a doença
freu trombose venosa profunda (TVP) com embolia pulmonar, de Paget. Foi também solicitado um painel metabólico abran-
para a qual está atualmente utilizando varfarina. Completou a gente, cujos resultados são consideráveis pela fosfatase alcalina
menopausa aos 52 anos. É uma ex-fumante, tendo abandona- de 257 U/L, com níveis séricos normais de cálcio e fosfato. Teve
do o fumo há cerca de seis anos. Sempre foi magra, e seu atual alta com analgésicos e a aconselharam a ser acompanhada pelo
2
índice de massa corporal (IMC) é de 19,2 kg/m . Os exames seu médico para avaliação subsequente dos achados radiográ-
laboratoriais revelam: cálcio de 8,7 mg/dL, fosfato de 3 mg/dL, ficos. Ela está se recuperando da queda e nega qualquer dor
creatinina de 0,8 mg/dL e 25-hidroxivitamina D de 18 ng/mL prolongada ou imobilidade do quadril. Declara que o pai sofria
(normal > 30 ng/mL). A determinação da densidade mineral de uma doença óssea que causava cefaleia e provocou perda da
óssea por absorciometria de raios X de dupla energia revela um audição no final da vida. Está muito preocupada com as radio-
escore T de -3,0. Qual é o melhor tratamento inicial para essa grafias e quer saber o que elas significam. Qual das seguintes
paciente? condutas é a melhor estratégia de tratamento neste momento?
A. Calcitonina, 200 UI ao dia por via intranasal A. Iniciar fisioterapia e exercícios sem sustentação de pesos
B. Carbonato de cálcio, 1.200 mg, e vitamina D, 400 UI ao dia para fortalecer o quadril.
C. Etinilestradiol, 5 mg e acetato de medroxiprogesterona, 625 B. Iniciar o tratamento com vitamina D e cálcio.
mg, diariamente C. Iniciar o tratamento com bifosfonato oral.
D. Raloxifeno, 60 mg ao dia D. Iniciar o tratamento com prednisona, 1 mg/kg, com redu-
E. Risedronato, 35 mg uma vez por semana, e carbonato de ção gradual da dose no decorrer de seis meses.
cálcio, 1.200 mg, e vitamina D, 400 UI, ao dia E. Não há necessidade de tratamento, visto que a paciente é
assintomática.
91. Um homem de 52 anos de idade apresenta níveis elevados de
fosfatase alcalina durante um exame de rotina da bioquímica 95. Um homem de 32 anos de idade é avaliado em uma visita de
do sangue para seguro de vida após mudança de emprego. Tem rotina à clínica para fatores de risco coronarianos. É saudável
história de hipertensão e hiperlipidemia. Anteriormente, foi e nega tabagismo. A pressão arterial sistêmica é normal e o
submetido à colecistectomia por litíase biliar. As medicações paciente não tem diabetes. A história familiar merece atenção
atuais incluem losartana, 25 mg ao dia, hidroclorotiazida, 25 pelo colesterol alto da mãe e dos avôs maternos. O exame físi-
mg ao dia e rosuvastatina, 20 mg ao dia. Pratica atividade físi- co revela xantomas tendíneos. O nível de colesterol em jejum
2
ca e tem um índice de massa corporal de 25,2 kg/m . A única é notável pelo colesterol de lipoproteína de baixa densidade
queixa é uma dor lombar que recentemente tornou-se mais in- (LDL-C) de 387 mg/dL. Qual das seguintes condições é mais
tensa. Não fez nenhuma avaliação adicional para a dor lombar. provavelmente o distúrbio genético que afeta esse indivíduo?
O exame físico é normal, o fígado tem 10 cm à percussão. É A. Hipercolesterolemia autossômica dominante
palpável, com inspiração profunda no rebordo costal direito, B. Deficiência familiar de apoB-100
e é macio. O sinal de Murphy é negativo. Não há calor nem C. Deficiência familiar de lipase hepática
hipersensibilidade à palpação nos corpos vertebrais da coluna D. Hipercolesterolemia familiar
lombossacra. Os exames laboratoriais revelam nível de fosfatase E. Deficiência de lipoproteína lipase
alcalina de 468 U/L, nível de alanina aminotransferase de 22
U/L, nível de aminotransferase aspartato de 32 U/L, bilirrubina 96. Todas as seguintes alternativas constituem causas potenciais de
total de 1,0 mg/dL e cálcio de 9,4 mg/dL, fosfato de 3,2 mg/dL elevação das LDL, EXCETO:
401
A. Anorexia nervosa 400 ng/mL. A β-hCG está normal, assim como a desidrogenase
B. Cirrose láctica (LDH). Você encaminha o paciente para orquiectomia.
C. Hipotireoidismo A patologia identifica um seminoma limitado ao testículo. O
D. Síndrome nefrótica nível de AFP normaliza-se dentro de um intervalo de tempo
QUESTÕES
RESPOSTAS
la comercial.
QUESTÕES
B. Encaminhar para cirurgia bariátrica. te incluem injeções intramusculares periódicas de goserelina.
C. Meta de alcançar o seu peso prévio a gravidez dentro de 6 Ao exame, o paciente é afebril. A pressão arterial é de 110/50
meses. mmHg, e a frequência do pulso, de 110 bpm. Está letárgico e
D. Iniciar um plano de exercícios de 150 minutos de atividade com resposta mínima à estimulação do esterno. Apresenta
física de intensidade moderada semanalmente, sem modi- atrofia bitemporal, e as mucosas estão secas. Ao exame neuro-
ficar os hábitos alimentares. lógico, constata-se que o paciente está obnubilado. O paciente
E. Diminuir o consumo de calorias em 500 a 1.000 kcal/dia tem reflexo do vômito intacto e se retrai à dor em todos os qua-
para obter uma perda de peso de 0,5 a 1 kg por semana. tro membros. O tônus retal está normal. Os resultados labora-
toriais são significativos, com creatinina de 4,2 mg/dL, cálcio
106. Uma mulher de 44 anos procura assistência para avaliação de de 14,4 mEq/L e albumina de 2,6 g/dL. Todas as seguintes eta-
cirurgia bariátrica. Tentou uma variedade de dietas no passado, pas iniciais de manejo são apropriadas, EXCETO:
porém não conseguiu manter a perda de peso. Está sendo tra- A. Solução salina normal
tada para hipertensão e hipercolesterolemia, e está preocupada B. Pamidronato
quanto à possibilidade de desenvolver diabetes melito se ela C. Furosemida, quando o paciente estiver euvolêmico
não perder peso. Sua altura é de 1,65 m e pesa 122 kg (IMC de D. Calcitonina
44,6 kg/m2). Que conselho você lhe daria a respeito dos benefí- E. Dexametasona
cios e dos riscos da cirurgia bariátrica?
A. Uma cirurgia restritiva é tão efetiva quanto uma cirurgia 108. Obtém-se um nível sérico de cálcio de 13,0 mg/dL em um ho-
restritiva e disabsortiva. mem de 55 anos de idade que procurou a clínica com queixa de
B. A gastroplastia com banda vertical constitui o procedimen- fadiga e sede durante esse último mês. A radiografia de tórax
to cirúrgico restritivo mais efetivo. revela uma massa de 4 cm no lobo inferior direito. Qual dos se-
C. Todos os tipos de cirurgia bariátrica estão associadas a de- guintes testes séricos tem mais probabilidade de revelar a causa
ficiências de micronutrientes, exigindo suplementação du- da hipercalcemia?
rante toda a vida. A. Hormônio adrenocorticotrófico (ACTH)
D. A perda de peso média após cirurgia bariátrica é de 30 a B. Hormônio antidiurético (ADH)
35%, e 60% dos indivíduos são capazes de manter a perda C. Fator de crescimento semelhante à insulina
de peso durante 6 anos. D. Paratormônio (PTH)
E. A taxa de mortalidade associada à cirurgia bariátrica é de E. Proteína relacionada ao paratormônio (PTH-rp)
cerca de 2%.
RESPOSTAS
1. A resposta é D. (Cap. 1) O controle por feedback pode ser po- causa a secreção de LH e de FSH. A translocação do receptor
sitivo ou negativo. O principal meio de controle hormonal no do citoplasma para o núcleo ocorre com certos hormônios (p.
sistema endócrino é o feedback negativo. Por exemplo, quando ex., glicocorticoides); todavia, esse fenômeno relacionado aos
o nível de hormônio esteroide é reconhecido como baixo pelo receptores não é específico de nenhum mecanismo regulador.
hipotálamo, um hormônio de liberação é liberado, o qual induz O GnRH não promove a produção de globulina de ligação
a liberação de um hormônio estimulador da hipófise; a seguir, a dos hormônios sexuais. Além disso, embora as globulinas de
glândula-alvo secreta o hormônio esteroide, com consequente ligação possam diminuir a quantidade de hormônio ligado
elevação dos níveis plasmáticos. Então, o hipotálamo reconhe- medido no soro, a presença de níveis anormais de globulinas
ce essa elevação e diminui a liberação do hormônio liberador. de ligação não tem habitualmente nenhum significado clínico,
Esse processo é utilizado pelo sistema endócrino para controlar visto que os níveis de hormônio livre geralmente aumentam.
os níveis do hormônio tireoidiano, cortisol, esteroides gonadais
e hormônio do crescimento. O eixo renina-angiotensina-aldos- 4. A resposta é B. (Cap. 1) Com poucas exceções, a ligação dos
terona é independente da hipófise e do hipotálamo e envolve o hormônios é altamente específica de um único tipo de receptor
fígado, os pulmões e os rins. nuclear. Os hormônios mineralocorticoides-glicocorticoides
representam uma considerável exceção, visto que o receptor
2. A resposta é E. (Cap. 1) A resistência hormonal pode ser de mineralocorticoides também apresenta uma alta afinidade,
causada por mutações nos receptores ou mutações nas vias de porém não maior, pelos glicocorticoides. Uma enzima (11 b-
sinalização ou, mais comumente, por alterações pós-receptor. -hidroxiesteroide desidrogenase) localizada nos túbulos renais
O diabetes melito tipo 2 e a resistência à leptina são exemplos inativa os glicocorticoides, possibilitando uma resposta seletiva
de alterações pós-receptor que resultam em resistência hormo- aos mineralocorticoides. Quando há um excesso de glicocorti-
nal. O feocromocitoma e a doença de Graves são exemplos de coides, a enzima torna-se supersaturada, e os glicocorticoides
hiperfunção orgânica, enquanto a tireoidite de Hashimoto e a podem exibir efeitos mineralocorticoides. Esse efeito difere do
síndrome se Sheehan são doenças de hipofunção orgânica. No receptor de estrogênio, onde diferentes compostos proporcio-
caso da Síndrome de Sheehan, o órgão acometido é a hipófise. nam um mecanismo de transcrição único. Os hormônios mi-
neralocorticoides não apresentam proteínas de ligação no soro.
3. A resposta é C. (Cap. 1). São necessários pulsos intermitentes Exemplos de hormônios que circulam com proteínas de ligação
de GnRH para manter a sensibilidade da hipófise ao hormônio. no soro são a T4, a T3, o cortisol, os estrogênios e o hormônio
A exposição contínua ao GnRH provoca dessensibilização dos do crescimento. A maioria das anormalidades das proteínas
gonadotrofos da hipófise, levando finalmente a níveis dimi- de ligação tem pouca consequência clínica, visto que as con-
nuídos de testosterona. A relação entre o GnRH e o LH/FSH centrações dos hormônios livres frequentemente permanecem
consiste em uma alça de feedback positivo, em que o GnRH normais.
403
5. A resposta é C. (Cap. 2) Os hormônios produzidos pela também estão elevados após convulsões generalizadas, o que
adeno-hipófise incluem o hormônio adrenocorticotrófico, o pode ser útil na avaliação de pseudoconvulsões. A hipersecre-
hormônio tireoestimulante, hormônio luteinizante, hormônio ção induzida por fármaco está associada aos bloqueadores dos
folículo-estimulante, prolactina e hormônio do crescimento. A receptores de dopamina, inibidores da síntese de dopamina,
RESPOSTAS
QUESTÕES
neuro-hipófise produz vasopressina e ocitocina. A adeno-hipó- opiáceos, antagonistas H2, imipraminas, inibidores seletivos
fise e a neuro-hipófise possuem um suprimento vascular sepa- da recaptação de serotonina e bloqueadores dos canais de cál-
rado, e a neuro-hipófise é diretamente inervada por neurônios cio. A lesão do hipotálamo pedículo-hipofisário também pode
hipotalâmicos por meio do pedículo hipofisário, tornando-a causar hiperprolactinemia. Os cistos da bolsa de Rathke, que
suscetível à disfunção associada ao estresse de cisalhamento. O consistem em lesões intrasselares benignas, podem provocar
controle hipotalâmico da função adeno-hipofisária é efetuado anormalidades endocrinológicas semelhantes aos adenomas
por meio dos hormônios secretados; por conseguinte, é menos hipofisários.
suscetível à lesão traumática.
9. A resposta é E. (Cap. 2) Os tumores que se originam dos lacto-
6. A resposta é B. (Cap. 2) A paciente apresenta evidências de trofos da hipófise são responsáveis por metade de todos os tu-
síndrome de Sheehan pós-parto. Nessa síndrome, a hipófise mores hipofisários funcionantes e acometem mais comumen-
hiperplásica pós-parto corre risco aumentado de hemorragia te as mulheres. As apresentações mais comuns consistem em
e/ou infarto. Isso causa alterações visuais bilaterais, cefaleia e amenorreia, infertilidade e/ou galactorreia. Os microadenomas
sinais meníngeos. Pode ocorrer oftalmoplegia. Nos casos gra- raramente evoluem, transformando-se em macroadenomas.
ves, podem-se observar colapso cardiovascular e níveis altera- Para a doença sintomática, os principais objetivos do tratamen-
dos de consciência. A avaliação laboratorial revela comumente to consistem em controle da hiperprolactinemia, redução do
hipoglicemia. A TC ou a RM da hipófise podem revelar sinais tamanho do tumor, restauração das menstruações e da ferti-
de hemorragia selar, quando presente. Pode ocorrer compro- lidade e resolução da galactorreia. Para esse propósito, são ha-
metimento de todos os hormônios hipofisários, embora o bitualmente utilizados agonistas orais da dopamina, como a
achado mais agudo frequentemente consista em hipoglicemia e cabergolina e a bromocriptina.
hipotensão, devido à falha do hormônio adrenocorticotrófico.
A hipoglicemia e a hipotensão presentes no caso dessa mulher 10. A resposta é C. (Cap. 2) A deficiência do hormônio de cres-
sugerem insuficiência do sistema glicocorticoide; por conse- cimento em adultos é habitualmente causada por lesão hipo-
guinte, indica o tratamento com um corticosteroide. Não há talâmica ou hipofisária. Como o hormônio do crescimento
evidências de sepse, de modo que os antibióticos ou a alfadro- não é mais importante para alcançar a estatura, a apresenta-
trecogina não estão indicados. Com um hematócrito normal e ção difere daquela da deficiência do hormônio de crescimen-
a ausência de evidências de hemorragia maciça, a transfusão to em crianças. Embora o hormônio do crescimento tenha
de concentrados de hemácia provavelmente não tem nenhuma efeitos teciduais diretos, ele atua principalmente ao aumentar
utilidade. Embora a produção de hormônio tireoestimulante a secreção de IGF-1, que, por sua vez, estimula a lipólise, au-
esteja, sem dúvida alguma, baixa nessa paciente, a preocupação menta os ácidos graxos circulantes, reduz a massa de gordura
mais imediata é a reposição de glicocorticoides. omental e aumenta a massa corporal magra. Por conseguinte,
a deficiência do hormônio de crescimento provoca os efeitos
7. A resposta é D. (Cap. 2) As apresentações do adenoma hipo- opostos. Além disso, podem ocorrer hipertensão, disfunção
fisário funcional incluem acromegalia, como no caso deste pa- ventricular esquerda e aumento dos níveis plasmáticos do fi-
ciente, prolactinomas e síndrome de Cushing. Essa síndrome brinogênio na presença de deficiência de hormônio do cres-
está associada à hipersecreção de hormônio do crescimento em cimento. Pode-se observar também uma redução, e não um
pacientes com massas hipofisárias, embora se tenha relatado aumento, da densidade mineral óssea em adultos com defi-
a produção ectópica de hormônio do crescimento, particular- ciência de hormônio do crescimento.
mente por tumores. Como o hormônio do crescimento é secre-
tado de modo altamente pulsátil, a obtenção aleatória de níveis 11. A resposta é E. (Cap. 2) O paciente tem uma apresentação
séricos não é confiável. Por conseguinte, o mediador dos efeitos clínica com a síndrome de Cushing. Embora muitos casos de
sistêmicos do hormônio do crescimento, o IGF-1 é determina- elevação inapropriada dos níveis de ACTH devam-se a tumores
do para o rastreamento do excesso do hormônio do crescimen- hipofisários, uma proporção substancial é causada pela secre-
to. O IGF-1 é produzido pelo fígado em resposta à estimulação ção ectópica de ACTH. Os indícios desse diagnóstico incluem
do hormônio do crescimento. Um teste de tolerância à glicose início rápido de manifestações de hipercortisolismo associadas
oral, com determinação do nível de hormônio do crescimento à hiperpigmentação da pele e à miopatia grave. Além disso, a
aos 0, 30 e 60 minutos também pode ser usado no rastreamento hipertensão, a alcalose metabólica hipopotassêmica, a intole-
da acromegalia, visto que, nos indivíduos normais, ocorre su- rância à glicose e o edema são mais proeminentes na secreção
pressão do hormônio do crescimento em resposta a esse estí- ectópica de ACTH do que nos tumores hipofisários. Ocorrem
mulo. Os níveis séricos de prolactina são úteis para triagem dos níveis séricos de potássio abaixo de 3,3 mmol/L em 70% dos
prolactinomas; o cortisol livre na urina de 24 horas e o ensaio casos de secreção ectópica de ACTH, porém em menos de 10%
do ACTH são úteis para o rastreamento da doença de Cushing. dos casos de síndrome de Cushing dependente da hipófise. Os
níveis de ACTH estarão elevados, visto que esta é a causa subja-
8. A resposta é B. (Cap. 2) A hiperprolactinemia é a síndrome cente de ambos os tipos de síndrome de Cushing. O hormônio
de hipersecreção do hormônio hipofisário mais comum tanto de liberação da corticotrofina raramente constitui a causa da
em homens quanto em mulheres. Embora o adenoma hipofi- síndrome de Cushing. Infelizmente, a RM da hipófise não vi-
sário constitua uma causa frequente, existem várias etiologias sualiza as lesões com menos de 2 mm; por esse motivo, é neces-
fisiológicas, relacionadas com medicamentos e potencialmente sário realizar ocasionalmente o cateterismo das veias petrosas
reversíveis. A prolactina normalmente está elevada durante a inferiores, porém esse exame não está indicado para este caso
gravidez e a lactação, embora os níveis diminuam para valores na ocasião da avaliação.
normais dentro de seis meses após a interdição da amamen-
tação. A estimulação dos mamilos, o sono e o estresse podem 12. A resposta é C. (Cap. 2) A paciente apresenta pan-hipopitui-
aumentar os níveis de prolactina. Distúrbios sistêmicos, como tarismo e é incapaz de sintetizar o TSH; por conseguinte, os
insuficiência renal crônica e cirrose, também podem elevar níveis plasmáticos de TSH estarão sempre baixos, independen-
os níveis de prolactina. Normalmente, os níveis de prolactina temente da adequação da reposição de T4. O nível de T4 livre
404
possibilita determinar se os níveis plasmáticos do hormônio firmar uma elevação consiste da osmolaridade urinária, o dia-
tireoidiano estão dentro da faixa normal. Essa determinação, betes insípido grave é mais uma vez confirmado. Nesse estágio,
juntamente com seus sintomas, ajudará a definir a dose ade- pode-se administrar desmopressina, e, se os eletrólitos e as va-
quada de levotiroxina. Não há nenhuma evidência clínica de riáveis urinárias e clínicas forem corrigidas, a doença central é
RESPOSTAS
QUESTÕES
doença recorrente, de modo que a RM não é útil. A paciente confirmada. No diabetes insípido nefrogênico, verifica-se uma
provavelmente não apresenta doença primária da tireoide, resposta mínima ao ADH, visto que o defeito primário reside
e o nível de T4 atualmente não é conhecido, de modo que a nos rins. A RM do cérebro não é útil até que a doença central
cintilografia de captação da tireoide não está indicada nesse seja confirmada.
momento.
16. A resposta é B. (Cap. 3) Esse paciente apresenta diabetes in-
13. A resposta é A. (Cap. 2) O diagnóstico da síndrome de sípido (DI) central no contexto da LMMA. A RM mais prova-
Cushing baseia-se na documentação de hipercortisolismo velmente demonstrará a presença de cloroma (tumor mieloide
endógeno. Entre as opções da lista, o teste de melhor relação frequentemente observado na LMMA) na neuro-hipófise, par-
custo-benefício e mais preciso é a determinação do cortisol ticularmente tendo em vista a história de outros nódulos tu-
livre urinário de 24 horas. A incapacidade de suprimir o cor- morais extramedulares. A urina é diluída, devido à deficiência
tisol plasmático pela manhã após um teste de supressão no- de ADH, resultando em hipernatremia. A alteração do estado
turna com 1 mg de dexametasona constitui uma alternativa. A mental resulta provavelmente da hipernatremia, que normal-
maioria dos adenomas hipofisários secretores de ACTH tem mente se desenvolve no DI central quando o aporte de água
menos de 5 mm de diâmetro, e aproximadamente 50% não são não consegue acompanhar o debito urinário, que pode ul-
detectados, até mesmo com RM sensível. Além disso, como os trapassar 5 L/dia. A reposição imediata de ADH na forma de
microadenomas incidentais são comuns na hipófise, a presença desmopressina irá confirmar o diagnóstico de DI central se o
de uma pequena anormalidade hipofisária na RM pode não es- débito urinário cair e irá proporcionar alívio sintomático. A
tabelecer a fonte de produção de ACTH. Os níveis plasmáticos desmopressina pode ser administrada por via nasal ou intrave-
basais de ACTH são utilizados para distinguir entre as fontes nosa, com rápido início de ação. A hidroclorotiazida é utilizada
de hipercortisolismo independente de ACTH (glicocorticoides no DI nefrogênico para aumentar a reabsorção proximal de só-
suprarrenais ou exógenos) e dependente de ACTH (ACTH hi- dio e de água. O ATRA é utilizado no tratamento da leucemia
pofisário, ectópico). Os níveis basais médios de ACTH estão promielocítica aguda, e não da LMMA. A hidrocortisona seria
mais elevados em pacientes com secreção ectópica de ACTH do o tratamento de escolha para a crise addisoniana aguda, e não
que naqueles com adenomas hipofisários secretores de ACTH. para o DI central. O lítio constitui uma causa bem conhecida de
Entretanto, existe uma superposição significativa nos níveis de DI nefrogênico.
ACTH, e esse teste não deve ser utilizado como exame comple-
mentar inicial. Raramente, os pacientes apresentam síndrome 17. A resposta é B. (Cap. 4) As deficiências de iodo nutricional
de Cushing e níveis elevados de ACTH devido à presença de e materna são comuns em muitos países em desenvolvimento
um tumor secretor de CRH. Neste caso, os níveis de CRH es- e, quando graves, podem resultar em cretinismo. O cretinismo
tão elevados. O cateterismo dos seios petrosos inferiores pode caracteriza-se por retardo mental e do crescimento, porém
ser usado para identificar uma fonte hipofisária de secreção de é passível de prevenção com a administração de iodo e/
ACTH quando as modalidades de imagem não revelam a fonte. ou hormônio tireoidiano no início da vida. A deficiência
concomitante de selênio pode contribuir para as manifestações
14. A resposta é B. (Cap. 2) A identificação de uma sela va- neurológicas. A suplementação do pão, do sal e de outros
zia constitui, com frequência, um achado incidental na RM. alimentos com iodo diminuiu acentuadamente as taxas dessa
Normalmente, esses pacientes apresentam função hipofisária doença. O beribéri é uma doença do sistema nervoso causada
normal e devem ser tranquilizados. É provável que a margem pela deficiência de tiamina na alimentação. O escorbuto é
circundante de tecido hipofisário esteja funcionando normal- devido à deficiência de vitamina C. A deficiência de folato
mente. Uma sela vazia pode indicar o início insidioso de hi- em mulheres grávidas está associada ao risco aumentado
popituitarismo, e os resultados laboratoriais devem ser acom- de trabalho de parto prematuro e diversas malformações
panhados rigorosamente. A não ser que haja uma mudança na congênitas, que acometem mais notavelmente o tubo neural.
situação clínica dessa paciente, não há indicação para repetir a A suplementação de folato pode reduzir o risco de espinha
RM. Não existe probabilidade de neoplasia endócrina, e a ci- bífida, anencefalia, cardiopatia congênita, lábio leporino
rurgia não faz parte do tratamento de uma sela vazia. e deformidades dos membros. A deficiência de vitamina
A constitui uma causa comum de cegueira nos países em
15. A resposta é A. (Cap. 3) A paciente tem uma apresentação desenvolvimento.
clássica de diabetes insípido idiopático com frequência uri-
nária, sede, enurese e nictúria de longa duração. Os pacientes 18. A resposta é E. (Cap. 4) A T4 é secretada pela glândula tireoide
também podem apresentar ligeira fadiga em consequência das em uma quantidade aproximadamente 20 vezes maior que a T3.
frequentes interrupções do sono. O diabetes insípido pode ser Ambos os hormônios estão ligados às proteínas plasmáticas,
nefrogênico ou central, embora este caso não seja específico incluindo albumina, transtiretina e proteína de ligação da tiro-
quanto à etiologia. O diabetes insípido é confirmado pela me- xina. A proteína de ligação da tiroxina tem alta afinidade pela
dição do volume de urina de 24 horas, que é de mais de 50 mg/ T4; por conseguinte, apesar de sua baixa concentração, trans-
kg por dia (5.500 mL em um homem de 70 kg) e osmolaridade porta 80% do hormônio plasmático. É seguida pela albumina e
urinária superior a 300 mOsmol/L. Para diferenciar o diabetes pela transtiretina. As mulheres grávidas podem ser eutireóide-
insípido central do nefrogênico, a anamnese pode ser útil para as, com níveis totais elevados de T4, devido ao aumento da glo-
verificar a ocorrência de traumatismo cranioencefálico prévio, bulina de ligação dos hormônios tireoidianos. A T3 está menos
neurocirurgia ou doença granulomatosa – que podem lesionar ligada às proteínas do que a T4. Acredita-se que o hormônio
a neuro-hipófise –, ou pode sugerir o uso de uma medicação, não ligado esteja biologicamente disponível para os tecidos, e
como lítio, que comprovadamente causa diabetes insípido ne- a normalização da fração não ligada constitui a principal meta
frogênico. O teste de restrição hídrica, em que o paciente é pri- dos mecanismos homeostáticos. A determinação da T4 livre é
vado de líquido, mede, a cada hora, o débito urinário, o peso biologicamente mais relevante do que a T4 total. A tireoperoxi-
corporal, a osmolaridade plasmática e/ou a concentração de dase é uma enzima encontrada na glândula tireoide, envolvida
sódio e da osmolaridade da urina. Se a restrição hídrica con- na organificação do iodo.
405
19. A resposta é C. (Cap. 4) Existem diversas condições associa- comprimidos de uma vez no dia em que lembram para tentar
das à hipertiroxinemia, com função normal da tireoide, embo- alcançar a dose-alvo semanal; essa prática é segura, em razão
ra algumas dessas condições estejam associadas ao hipertireoi- da meia-vida longa do fármaco. Outras causas de aumento das
dismo clínico, muitas simplesmente apresentam níveis elevados necessidades de tiroxina incluem má-absorção, como doença
RESPOSTAS
QUESTÕES
de T4 total e conversão normal de T3, sendo, portanto, clinica- celíaca ou cirurgia do intestino delgado, terapia com estrogênio
mente normais. Qualquer fator capaz de aumentar a produção e fármacos que interferem na absorção de T4 (p. ex., sulfato fer-
hepática de globulina de ligação dos hormônios tireoidianos roso e colestiramina) ou na sua depuração, como lovastatina,
produzirá níveis elevados de T4 total e níveis normais de T4 livre amiodarona, carbamazepina e fenitoína.
e T3. Nessa categoria estão incluídos a gravidez, os contracep-
tivos orais contendo estrogênio, a cirrose e a produção familiar 24. A resposta é A. (Cap. 4) A paciente tem coma mixedematoso.
excessiva de globulina de ligação dos hormônios tireoidianos. Essa condição de hipotireoidismo profundo ocorre mais co-
A hipertiroxinemia disalbuminêmica familiar resulta de uma mumente no idoso, e, com frequência, pode-se identificar uma
mutação da albumina e produz níveis aumentados de T4, com condição precipitante, como infarto do miocárdio ou infecção.
níveis normais de T4 livre e T3. A síndrome do eutireóideo As manifestações clínicas incluem nível alterado de consciência,
doente ocorre durante uma enfermidade clínica aguda e trans- bradicardia e hipotermia. O tratamento inclui repleção de hor-
torno psiquiátrico. Nessa síndrome, ocorrem elevação transi- mônio tireoidiano com levotiroxina IV, bem como suplementa-
tória da T4 livre e níveis diminuídos de TSH. A T4 total e a T3 ção de glicocorticoides, devido ao comprometimento da reserva
podem estar diminuídas, particularmente em um estágio mais suprarrenal no hipotireoidismo grave. É preciso ter cuidado com
avançado da evolução da doença. o reaquecimento, visto que pode precipitar colapso cardiovas-
cular. Por conseguinte, o aquecimento externo está indicado so-
20. A resposta é D. (Cap. 4) A deficiência de iodo continua sen- mente quando a temperatura é inferior a 30°C. A solução salina
do a causa mais comum de hipotireoidismo no mundo intei- hipertônica e a glicose podem ser utilizadas se a hiponatremia
ro. Ocorre em uma taxa relativamente alta mesmo nos países ou a hipoglicemia forem graves; entretanto, deve-se evitar o uso
desenvolvidos, incluindo a Europa. Em áreas com suficiência de soluções hipotônicas, visto que elas podem agravar a retenção
de iodo, as causas mais comuns incluem doença autoimune hídrica. Como o metabolismo de muitas substâncias está acen-
(tireoidite de Hashimoto) e hipotireoidismo iatrogênico (trata- tuadamente reduzido, a sedação deve ser evitada ou reduzida ao
mento do hipertireoidismo). mínimo. De modo semelhante, os níveis sanguíneos dos fárma-
cos devem ser monitorados, quando disponível.
21. A resposta é B. (Cap. 4) O hormônio tireoidiano (ou sua au-
sência) exerce vários efeitos importantes sobre o sistema car- 25. A resposta é A. (Cap. 4) Os pacientes com doença de Graves
diovascular. Nesse aspecto importante, o hipotireoidismo está produzem imunoglobulinas tireoestimulantes. Subsequente-
associado à ocorrência de bradicardia e redução da contratili- mente, produzem níveis mais elevados de T4 em comparação
dade miocárdica e, portanto, a uma redução do volume sistóli- com a população normal. Em consequência, muitos pacientes
co. O aumento da resistência periférica pode ser acompanhado com doença de Graves apresentam deficiência leve de iodo, e
de hipertensão sistêmica, particularmente hipertensão diastóli- a produção de T4 está um tanto limitada pela disponibilidade
ca no hipotireoidismo. São observados derrames pericárdicos de iodo. Por conseguinte, a exposição a meios de contraste io-
em até 30% dos pacientes com hipotireoidismo, embora rara- dados reverte a deficiência de iodo e pode resultar em agrava-
mente provoquem diminuição da função cardíaca. Por fim, em mento do hipertireoidismo. Além disso, em virtude da reversão
pacientes com hipotireoidismo, o fluxo sanguíneo é afastado da da deficiência leve de iodo, o tratamento com para a doença de
pele, produzindo, assim, membros frios. Graves pode ser menos bem-sucedido, visto que a captação de
iodo pela tireoide é reduzida no estado de repleção de iodo.
22. A resposta é B. (Cap. 4) A causa mais comum de hipotireoi-
dismo nos EUA é a tireoidite autoimune, visto que é uma área 26. A resposta é C. (Cap. 4) O hipertireoidismo está associado a
que não apresenta deficiência de iodo. Embora a cintilografia diversas complicações cardiovasculares, incluindo taquicardia,
com captação de iodo radioativo em um estágio mais inicial palpitações, alto débito cardíaco com pulso intenso, pressão de
da doença possa demonstrar uma captação difusamente au- pulso alargada e sopro sistólico aórtico. Isso pode resultar em
mentada pela infiltração linfocítica, nesse estágio da doença da agravamento da angina em pacientes predispostos. A fibrila-
paciente, quando o infiltrado está “exaurido”, provavelmente ção atrial é mais comum em pacientes com mais de 50 anos
haverá poucos achados na cintilografia. De modo semelhante, a de idade, e o tratamento do estado da tireoide isolado leva à
ultrassonografia da tireoide só seria útil para suspeita de bócio reversão da fibrilação atrial em 50% dos pacientes, sugerindo
multinodular. Os anticorpos antitireoperoxidase são comumente a existência de um distúrbio cardíaco subjacente nos pacientes
encontrados em pacientes com tireoidite autoimune, enquanto remanescentes que não apresentam reversão.
os anticorpos antitireoglobulina estão presentes com menos fre-
quência. Os anticorpos antitireoglobulina também são encon- 27. A resposta é B. (Cap. 4) Embora a retração palpebral possa
trados em outras doenças da tireoide (doença de Graves, tireo- ocorrer em qualquer tipo de hipertireoidismo, a doença de
toxicose) bem como em doenças autoimunes sistêmicas (LES). Graves está associada a sinais oculares específicos, que acre-
Ocorre liberação de tireoglobulina da tireoide em todos os tipos dita-se serem devidos à interação de autoanticorpos com os
de tireotoxicose à exceção da doença factícia. Todavia, essa pa- músculos periorbitários. O início da oftalmopatia de Graves
ciente tinha hipotireoidismo, de modo que os níveis séricos de pode ocorrer antes ou depois do hipertireoidismo e raramente
tireoglobulina provavelmente não seriam úteis. pode não estar associada ao hipertireoidismo, representando
tão somente os efeitos da presença de autoanticorpos sobre os
23. A resposta é D. (Cap. 4) Uma elevação do TSH em um pa- músculos periorbitários. As manifestações sutis consistem em
ciente com hipotireoidismo que previamente estava estável arenosidade nos olhos, desconforto ocular e lacrimejamento
durante muitos anos sugere uma não adesão à medicação, di- excessivo. Ocorre proptose em um terço dos pacientes, poden-
ficuldade de absorção em decorrência de doença intestinal ou do resultar em abrasão da córnea se não for possível fechar as
interação medicamentosa que afeta a depuração. Pacientes com pálpebras, particularmente durante o sono. A manifestação
peso corporal normal em uso de mais de 200 µg de levotiroxina mais grave é a compressão do nervo óptico no ápice da orbita,
por dia que apresentam níveis elevados de TSH sugerem má podendo resultar em papiledema e perda permanente da visão
adesão. Esses pacientes devem ser incentivados a tomar dois se não for tratada.
406
28. A resposta é C. (Cap. 4) Os principais agentes antitireoidianos 32. A resposta é B. (Cap. 4) A tireoidite subaguda, também co-
usados no tratamento da doença de Graves são o propiltiou- nhecida como tireoidite de De Quervain, tireoidite granulo-
racil, o carbimazol e o metabólito ativo do carbimazol, o me- matosa e tireoidite viral, caracteriza-se clinicamente, por febre,
timazol*. Todos atuam ao inibir a função da tireoperoxidase. sintomas constitucionais, e tireoide dolorida e aumentada.
RESPOSTAS
QUESTÕES
Embora o propiltiouracil reduza a conversão periférica de T4 Acredita-se que a etiologia seja uma infecção viral. O pico de
para T3, este não é o seu principal mecanismo de ação e não é incidência é observado entre 30 e 50 anos de idade, e as mu-
responsável pela maior parte da utilidade do fármaco no trata- lheres são afetadas mais frequentemente do que os homens. Os
mento da doença de Graves. sintomas dependem da fase da doença. Durante a fase inicial
de destruição folicular, ocorre liberação de tireoglobulina e dos
29. A resposta é C. (Cap. 4) A síndrome do eutireóideo doente hormônios tireoidianos. Em consequência, ocorrem níveis cir-
pode ocorrer no contexto de qualquer doença aguda grave. culantes aumentados de T4 e T3, com supressão concomitante
Acredita-se que as anormalidades nos níveis circulantes de do TSH. Os sintomas de tireotoxicose predominam nessa fase.
TSH e de hormônio tireoidiano resultem da liberação de cito- A captação de iodo radioativo está baixa ou indetectável. De-
cinas em resposta ao estresse grave. Podem ocorrer múltiplas pois de várias semanas, ocorre depleção de hormônio tireoidia-
anormalidades. O padrão hormonal mais comum consiste em no, e sobrevém uma fase de hipotireoidismo, com baixos níveis
diminuição dos níveis de T3 total e T3 livre, devido ao compro- de T4 livre e elevação moderada do TSH. A captação de iodo
metimento da conversão periférica de T4 em T3. Do ponto de radioativo retorna ao normal. Por fim, depois de 4 a 6 meses,
vista teleológico, acredita-se que o declínio dos níveis de T3, os níveis de hormônios tireoidianos e de TSH normalizam-se à
o hormônio tireoidiano mais ativo, limite o catabolismo no medida que a doença regride. A paciente A é compatível com
paciente com inanição ou enfermo. Os níveis de TSH podem a fase tireotóxica da tireoidite subaguda, exceto pela captação
variar acentuadamente, de 0,1 a mais de 20 mU/L, dependen- aumentada de iodo radioativo. A paciente C é mais compatível
do do momento em que são medidos durante a evolução da com doença de Graves com supressão do TSH, captação ele-
doença. Os pacientes muito enfermos podem apresentar uma vada e níveis elevados de hormônios tireoidianos, em conse-
redução dos níveis de T4. O paciente descrito neste caso sem quência da imunoglobulina tireoestimulante. O paciente D é
dúvida alguma apresenta anormalidades nas provas de função compatível com uma neoplasia.
da tireoide em consequência das lesões sofridas no acidente de
veiculo motorizado. Não há nenhuma indicação para a obten- 33. A resposta é E. (Cap. 4) São encontrados nódulos da tireoide
ção de outros exames de imagem neste caso. Os esteroides não em 5% dos pacientes.** Os nódulos são mais comuns com au-
desempenham nenhum papel. O manejo mais adequado con- mento da idade, em mulheres e em áreas com deficiência de
siste em simples observação. No decorrer de várias semanas a iodo. Tendo em vista sua prevalência, o custo do rastreamento
meses, com a recuperação do paciente, a função da tireoide irá e a evolução geralmente benigna da maioria dos nódulos, a es-
se normalizar. colha e a sequência dos exames de rastreamento têm sido muito
controversas. Entretanto, uma pequena porcentagem de nódu-
los descobertos de modo incidental representa câncer de tireoi-
30 e 31. As respostas são E e B, respectivamente. (Cap. 4) A ti-
de. A determinação do nível de TSH deve ser o primeiro exame
reoidite subaguda, também conhecida como tireoidite de De
a ser realizado após a detecção de um nódulo da tireoide. A
Quervain, tireoidite granulomatosa ou tireoidite viral, é uma
maioria dos pacientes apresenta provas de função da tireoide
doença de múltiplas fases, que afeta as mulheres com uma
normais. No caso de um nível normal de TSH, o próximo pas-
frequência três vezes maior do que os homens. Muitos vírus
so pode consistir em aspiração com agulha fina. Se o nível de
já foram implicados, porém nenhum foi definitivamente iden-
TSH estiver baixo, deve-se efetuar uma cintilografia com ra-
tificado como agente deflagrador da tireoidite subaguda. O
dionuclídeos para estabelecer se o nódulo constitui a fonte da
diagnóstico pode passar despercebido, visto que os sintomas
hiperfunção tireoidiana (nódulo “quente”). Neste caso, esta é
simulam uma faringite, e, com frequência, também apresenta
a melhor conduta. Os nódulos “quentes” podem ser tratados
uma evolução benigna. Nesta paciente, a doença de Graves é
clinicamente, ressecados ou eliminados com iodo radioativo.
improvável, tendo em vista o nível elevado de TSH e o painel
Os nódulos “frios” devem ser avaliados posteriormente com
de anticorpos negativo. Deve-se considerar o hipotireoidismo
aspiração por agulha fina. Quatro por cento dos nódulos sub-
autoimune; todavia, a evolução de sua doença, a hipersensibili-
metidos à biópsia são malignos, 10% são suspeitos de neoplasia
dade da glândula tireoide ao exame e a doença viral precedente
maligna, e 86% são indeterminados ou benignos.
tornam esse diagnóstico menos provável. A angina de Ludwig
é uma infecção bacteriana potencialmente fatal dos espaços
retrofaríngeo e submandibular, que frequentemente é causada 34. A resposta é C. (Cap. 5) A glândula suprarrenal desempenha
por infecção dentária precedente. A doença da arranhadura do três funções importantes: síntese de glicocorticoides, síntese
gato é uma doença habitualmente benigna, que se manifesta de aldosterona e síntese de precursores androgênios. A sínte-
com linfadenopatia, febre e mal-estar. É causada por Bartonella se de glicocorticoides é controlada pela secreção hipofisária de
henselae e é frequentemente transmitida por arranhaduras ACTH. O principal estímulo para a síntese de aldosterona é o
de gato que penetram na epiderme. Não provoca elevação do sistema renina-angiotensina-aldosterona que é independente
TSH. A tireoidite subaguda pode ocorrer com hipotireoidismo, da hipófise. Por conseguinte, a secreção matinal de cortisol e
tireotoxicose ou nenhum dos dois. Na primeira fase da doença, a liberação de hormônio em resposta ao estresse são reguladas
a inflamação da tireoide leva à destruição dos folículos e libe- pela hipófise, enquanto a regulação da retenção de sódio e ex-
ração de hormônio tireoidiano. Em consequência, ocorre tireo- creção de potássio pela aldosterona é independente da hipófise
toxicose. Na segunda fase, ocorre depleção de hormônio da ti- e deve estar preservada nesse paciente.
reoide, resultando em hipotireoidismo. Segue-se normalmente
uma fase de recuperação, em que a diminuição da inflamação 35. A resposta é A. (Cap. 5) A síndrome de Cushing representa
possibilita a cicatrização dos folículos e a regeneração dos hor- uma constelação de manifestações, que resultam da exposição
mônios. crônica a níveis elevados de cortisol de qualquer etiologia. Em-
bora a etiologia mais comum seja o adenoma hipofisário pro-
dutor de ACTH, que responde por 75% dos casos de síndrome
* N. de R.T. No Brasil, estão disponíveis o propiltiouracil e o metimazol, mas não ** N. de R.T. Esta taxa refere-se ao encontrado em exame físico. Quando os pacientes
o carbinazol. são avaliados por ecografia esta taxa pode chegar a 60%.
407
de Cushing, 15% são devidos a síndromes de ACTH ectópico, feocromocitoma. As elevações limítrofes, como no caso deste
como tumores brônquicos ou pancreáticos, câncer de pulmão paciente, são provavelmente resultados falso-positivos. O pró-
de pequenas células e outros. A síndrome de Cushing indepen- ximo passo mais adequado consiste em remover, se possível, as
dente de ACTH é muito mais rara. O adenoma adrenocortical exposições a alimentos ou fármacos passíveis de causar con-
RESPOSTAS
QUESTÕES
está envolvido em 5 a 10% dos casos, enquanto o carcinoma fusão e em repetir o teste. Os prováveis fármacos envolvidos
adrenocortical é encontrado em 1% dos casos de síndrome de incluem levodopa, simpaticomiméticos, diuréticos, antidepres-
Cushing. A síndrome de McCune-Albright é uma causa gené- sivos tricíclicos e alfa e betabloqueadores (neste caso, o labeta-
tica de anormalidades ósseas, lesões cutâneas (café com leite) e lol). A sertralina é um antidepressivo da classe dos ISRS, e não
puberdade prematura, particularmente em meninas. É interes- um agente tricíclico. Como alternativa, pode-se realizar um
sante assinalar que a síndrome é causada por uma mutação in teste de supressão com clonidina.
utero esporádica, e não representa um distúrbio hereditário, de
modo que não é transmitido para a progênie. 39. A resposta é E. (Cap. 6) A remoção completa do feocromo-
citoma constitui o único tratamento que leva a uma cura de
36. A resposta é B. (Cap. 5) A síndrome de Conn refere-se a um longo prazo, embora 90% dos tumores sejam benignos. Entre-
adenoma suprarrenal produtor de aldosterona. Embora seja tanto, o controle pré-operatório da hipertensão é necessário
responsável por 40% dos estados de hiperaldosteronismo, a para evitar complicações cirúrgicas e diminuir a mortalidade.
hiperplasia suprarrenal micronodular bilateral é mais comum. Esse paciente apresenta encefalopatia com crise hipertensiva. A
Outras causas de hiperaldosteronismo são significativamente hipertensão deve ser inicialmente controlada com medicações
mais raras, respondendo por menos de 1% da doença. A ca- IV para reduzir a pressão arterial média em aproximadamente
racterística fundamental da síndrome de Conn é a hipertensão 20% no período inicial de 24 horas. Os medicamentos que po-
com hipopotassemia. Como a aldosterona estimula a reten- dem ser utilizados para a crise hipertensiva no feocromocitoma
ção de sódio e a excreção de potássio, todos os pacientes de- incluem o nitroprussiato, nicardipino e fentolamina. Após re-
vem apresentar hipopotassemia no início*. O nível sérico de solução da crise hipertensiva aguda, indica-se a transição para
sódio está habitualmente normal, devido à retenção hídrica bloqueadores α-adrenérgicos orais. A fenoxibenzaina é o fár-
concomitante. A hipopotassemia pode estar associada à fra- maco mais comumente utilizado; é iniciada em doses baixas (5
queza muscular, miopatia proximal ou até mesmo paralisia. A a 10 mg, 3 vezes ao dia), e titulada para a dose máxima tolerada
hipopotassemia pode ser exacerbada por diuréticos tiazídicos. (habitualmente 20 a 30 mg ao dia). Uma vez iniciados os blo-
Outras manifestações incluem a alcalose metabólica, que pode queadores alfa, o bloqueio beta pode ser utilizado com segu-
contribuir para as cãibras musculares e a tetania. rança e está particularmente indicado para a taquicardia con-
tínua. O aporte liberal de sal e de líquidos ajuda a expandir o
volume plasmático e a tratar a hipotensão ortostática. Uma vez
37. A resposta é B. (Cap. 5) As massas suprarrenais incidentais mantida a pressão arterial abaixo de 160/100 mmHg, com hi-
são frequentemente descobertas durante um exame de imagem potensão ortostática moderada, é seguro realizar a cirurgia. Se
para outra condição e são encontradas em aproximadamente a pressão arterial permanece elevada a despeito do tratamento
6% dos adultos na necropsia. Cinquenta por cento dos pa- com bloqueio alfa, deve-se considerar a adição de bloqueadores
cientes com história de neoplasia maligna e massa suprarrenal dos canais de cálcio, bloqueadores do receptor de angiotensina
recentemente descoberta apresentam, na realidade, uma me- ou inibidores da enzima conversora de angiotensina. Deve-se
tástase suprarrenal. A aspiração com agulha fina de uma neo- evitar o uso de diuréticos, visto que irão exacerbar a hipotensão
plasia metastática suspeita é frequentemente diagnóstica. Na ortostática.
ausência de suspeita de neoplasia maligna não suprarrenal, os
incidentalomas suprarrenais são, em sua maioria, benignos. As 40. A resposta é C. (Cap. 19) O risco de diabetes melito tanto do
neoplasias malignas suprarrenais primárias são raras (< 0,01%) tipo 1 quanto do tipo 2 está aumentando em todas as popula-
e a aspiração com agulha fina não é útil para distinguir entre ções, porém o risco de diabetes tipo 2 está subindo em uma
tumores suprarrenais primários benignos e malignos. Embo- taxa substancialmente mais rápida. Nos EUA, a prevalência do
ra 90% dessas massas não sejam secretoras, os pacientes com diabetes melito ajustada para a idade é de 7,1% em brancos não
incidentalomas devem ser submetidos ao rastreamento para hispânicos, de 7,5% em norte-americanos em origem asiática,
feocromocitoma e hipercortisolismo, com determinação das de 11,8% em hispânicos e de 12,6% em negros não hispânicos.
metanefrinas livres plasmáticas** e teste de supressão noturna Não se dispõe de dados comparáveis para indivíduos que per-
com dexametasona, respectivamente. Quando um exame de tencem aos grupos dos índios norte-americanos, nativos do
imagem sugere uma neoplasia benigna (< 3 cm), deve-se re- Alasca ou das Ilhas do pacífico, porém acredita-se que a pre-
petir o exame em 3 a 6 meses. Quando as massas detectadas valência seja ainda mais alta do que na população negra não
têm mais de 6 cm, opta-se pela remoção cirúrgica (se for mais hispânica.
provavelmente uma neoplasia suprarrenal primária) ou aspira-
ção com agulha fina (se for mais provavelmente uma neoplasia
41. A resposta é E. (Cap. 19). A tolerância à glicose é classificada
maligna metastática). em três categorias: tolerância normal à glicose, comprometi-
mento da homeostasia da glicose e diabetes melito. A tolerân-
38. A resposta é A. (Cap. 6) Quando se considera o diagnósti- cia normal à glicose é definida pelo seguinte: glicose plasmática
co de feocromocitoma, a primeira etapa consiste na medição em jejum inferior a 100 mg/dL, glicose plasmática abaixo de
dos níveis de catecolaminas e/ou metamefrinas. Isso pode ser 140 mg/dL após uma carga de glicose oral e hemoglobina A1c
feito com testes urinários com ácido vanililmandélico, cateco- inferior a 5,6%. A homeostasia anormal da glicose é definida
laminas, metanefrinas fracionadas ou metanefrinas totais. As por glicose plasmática em jejum de 100 a 125 mg/dL ou glicose
metanefrinas totais exibem alta sensibilidade e, portanto, são plasmática de 140 a 199 após um teste oral de tolerância à gli-
utilizadas com frequência. A obtenção de um valor três vezes cose ou hemoglobina A1c de 5,7 a 6,4%. O diabetes melito é de-
acima do limite superior do normal é altamente sugestiva de finido por uma glicose plasmática em jejum acima de 126 mg/
dL, glicose de 200 mg/dL após um teste de tolerância à glicose
* N. de R.T. Estudos de pacientes com hiperaldosteronismo observam que atual- oral ou hemoglobina A1c de 6,5% ou mais.
mente cerca de 40-50% dos pacientes não apresentam hipocalemia.
** N. de R.T. É discutível se o melhor teste de rastreamento deve ser medida plas-
mática ou urinária. No Brasil, o teste mais disponível é a medida em urina de 42. A resposta é E. (Cap. 19) Como essa paciente apresenta sinto-
24 horas. mas, ela não está sendo submetida ao rastreamento para dia-
408
betes melito. Para rastreamento, recomenda-se a glicose plas- 46. A resposta é E. (Cap. 19) A cetoacidose diabética e o estado
mática em jejum ou a hemoglobina A1c. Como essa paciente hiperosmolar hiperglicêmico existem em um espectro, sendo a
apresenta sintomas, uma concentração plasmática aleatória cetoacidose diabética mais comum em pacientes com diabetes
de glicose acima de 200 mg/dL é adequada para estabelecer o melito tipo 1, embora ocorra com certa frequência em pacien-
RESPOSTAS
QUESTÕES
diagnóstico de diabetes melito. Outros critérios incluem glicose tes com diabetes melito tipo 2. Ambas as condições caracteri-
plasmática em jejum acima de 126 mg/dL ou hemoglobina A1c zam-se por hiperglicemia, desidratação, deficiência de insulina
superior a 6,4% ou glicose plasmática após duas horas acima absoluta ou relativa e anormalidades acidobásicas. A cetose é
de 200 durante um teste de tolerância à glicose oral. O peptí- mais comum na cetoacidose diabética. Na cetoacidose diabéti-
deo C constitui um instrumento útil para determinar se está ca, a glicose normalmente varia de 250 a 600 mg/dL, enquanto
ocorrendo clivagem normal da insulina de seu precursor. Um os níveis frequentemente alcançam 600 a 1.200 mg/dL no es-
nível normal de peptídeo C com hipoglicemia sugere uso sub- tado hiperosmolar hiperglicêmico. Com frequência, o nível de
-reptício de insulina, enquanto um baixo nível de peptídeo C sódio está ligeiramente diminuído na cetoacidose, enquanto é
com hiperglicemia indica insuficiência pancreática. preservado no estado hiperosmolar. O potássio está normal a
elevado na cetoacidose diabética, porém normal em pacientes
com estado hiperosmolar hiperglicêmico. Os níveis de magné-
43. A resposta é B. (Cap. 19) Os fatores de risco para o diabetes sio, cloreto e fosfato estão normais em ambas as condições. A
melito tipo 2 incluem história familiar de diabetes melito, in- creatinina pode estar discretamente elevada na cetoacidose dia-
cluindo os pais ou irmãos, IMC acima de 25 kg/m2, inatividade bética, porém exibe uma elevação frequentemente moderada
física, raça/etnicidade, comprometimento da glicose em jejum no estado hiperosmolar hiperglicêmico. As cetonas plasmáti-
ou hemoglobina A1c de 5,7 a 6,4% previamente identificados, cas podem ser ligeiramente positivas em pacientes com esta-
hipertensão sistêmica, história de diabetes gestacional ou de do hiperosmolar, porém estão sempre fortemente positivas na
parto de um lactente com peso acima de 4 kg, nível de HDL in- cetoacidose diabética. Como a hiperosmolaridade constitui a
ferior a 35 mg/dL e/ou nível de triglicerídios acima de 250 mg/ característica essencial nos pacientes com estado hiperosmolar
dL, doença ovariana policística ou acantose nigricans e história hiperglicêmico, eles apresentam uma osmolaridade de 330 a
de doença cardiovascular. 380 mOsm/mL, enquanto os pacientes com cetoacidose diabé-
tica têm uma osmolaridade plasmática que varia de 300 a 320
44. A resposta é A. (Cap. 19) O diabetes melito tipo 1 geralmente mOsm/mL. O nível sérico de bicarbonato está acentuadamente
tem uma apresentação mais grave com cetoacidose diabética e, deprimido na cetoacidose diabética, enquanto está normal ou
com frequência, ocorre em indivíduos mais jovens em compa- levemente diminuído no estado hiperosmolar. O pH arterial
ração com o diabetes tipo 2; entretanto, existem alguns casos está diminuído para menos de 7,3 na cetoacidose enquanto é
em que a distinção entre tipo 1 e tipo 2 não é direta. Existem superior a 7,3 no estado hiperosmolar. Por fim, o hiato aniôni-
preferências de localização do HLA-DR3 para o diabetes tipo co mostra-se amplo na cetoacidose diabética, porém normal a
1; existem vários haplótipos em 40% das crianças com diabetes ligeiramente elevado no estado hiperosmolar hiperglicêmico.
melito tipo 1, porém isso ainda representa a minoria. A des-
truição imunológica das células beta constitui a principal causa 47. A resposta é C. (Cap. 19) A retinopatia diabética constitui
da doença no diabetes tipo 1, e é comum a presença de anti- a principal causa de cegueira em adultos de 20 a 74 anos de
corpos dirigidos contra células das ilhotas. A GAD, a insuli- idade nos EUA. A cegueira representa o resultado de edema
na, a IA/ICA-512 e o ZnT-8 constituem os alvos mais comuns. macular e retinopatia progressiva, que pode ser classificada em
Dispõem-se amplamente de ensaios no comercio para autoan- retinopatia não proliferativa e proliferativa. A retinopatia não
ticorpos anti-GAD-65, que podem demonstrar a presença de proliferativa tende a ocorrer na primeira década e no início da
anticorpos em mais de 85% dos indivíduos com diabetes melito segunda década após o diagnóstico da doença e caracteriza-se
tipo 1 de início recente. Esses não estão frequentemente pre- por microaneurismas vasculares retinianos, hemorragias dis-
sentes no diabetes melito tipo 2, sendo detectados em 5 a 10% persas e exsudatos algodonosos. A neovascularização constitui
dos casos. Pode-se observar alguma insulina residual no plas- o elemento característico da retinopatia proliferativa e ocorre
ma de pacientes com diabetes melito tipo 1 no estágio inicial; em resposta à hipoxemia retiniana. Ocorrem vasos recém-
por conseguinte, isso não distinguirá os dois tipos de modo -formados na retina que, por serem frágeis, sofrem ruptura
confiável. Foram descritos polimorfismos do receptor γ-2 ati- facilmente, causando hemorragia do vítreo, fibrose e, por fim,
vado por proliferador peroxissômico no diabetes melito tipo 2; descolamento da retina.
entretanto, eles não podem distinguir as duas condições.
48. A resposta é C. (Cap. 19) As úlceras diabéticas representam
45. A resposta é C. (Cap. 19) O diabetes melito tipo 2 é prece- uma importante fonte de morbidade e até mesmo de mortali-
dido por um período de comprometimento da glicose em je- dade em pacientes com diabetes melito. Embora tenham sido
jum e tolerância à glicose comprometida, e diversos agentes feitas diversas tentativas de intervenções, apenas seis são reco-
e intervenções foram estudados nesse período para prevenir mendadas pela American Diabetes Association com eficácia
a evolução para o diabetes melito franco. O Diabetes Preven- demonstradas no tratamento de feridas no pé diabético: (1) eli-
tion Program demonstrou que mudanças intensivas no estilo minação das sobrecargas, (2) desbridamento, (3) curativos das
de vida, incluindo dieta e exercício, preveniam ou retardavam feridas, (4) uso apropriado de antibióticos, (5) revascularização
o desenvolvimento de diabetes melito em 58%, em compa- e (6) amputação limitada. O tratamento com oxigênio hiper-
ração com o placebo. A metformina foi utilizada no mesmo bárico já foi utilizado e é amplamente divulgado por meio de
estudo e preveniu o desenvolvimento de diabetes em 31%. propaganda, porém falta uma prova rigorosa de sua eficácia.
Outras terapias farmacológicas foram estudadas e mostraram
retardar a progressão, incluindo inibidores da alfa-glicosida- 49. A resposta é D. (Cap. 19) As preparações de insulina podem
se, tiazolidinedionas e orlistate, embora nenhum desses fár- ser divididas em insulinas de ação rápida e de ação longa. As
macos tenha sido aprovado para essa finalidade, e a American insulinas de ação rápida incluem a insulina regular e novas pre-
Diabetes Association recomenda apenas a metformina para parações: asparte, glulisina e lispro. A insulina regular tem um
tratamento no comprometimento na tolerância à glicose. As início de ação de 0,5 a 1 hora e se mostra efetiva por 4 a 6 horas.
sulfonilureias, como a gliburida, estimulam a secreção de gli- As outras três insulinas de ação rápida têm início de ação em
cose e não demonstraram retardar a progressão para o diabe- menos de 0,25 hora e são efetivas por 3 a 4 horas. As insulinas
tes melito tipo 2. de ação longa incluem as insulinas detemir, glargina e NPH. A
409
detemir e a glargina têm um início de ação de 1 a 6 horas e a tia, retinopatia, microalbuminúria e nefropatia em indivíduos
sua duração é de até 24 horas, enquanto a NPH tem início de com controle glicêmico rigoroso. É interessante assinalar que o
ação de 1 a 4 horas e é efetiva por 10 a 16 horas. Essas insulinas controle glicêmico não teve nenhum efeito sobre os desfechos
estão disponíveis em várias preparações de combinações que macrovasculares. Na verdade, foi o controle da pressão arterial
RESPOSTAS
QUESTÕES
aproveitam as diferentes durações de início e de ação para obter para valores-alvo pelo menos moderados (142/88 mmHg) no
uma eficácia ótima e a adesão do paciente ao tratamento. UKPDS que resultou em incidência diminuído de desfechos
macrovasculares, isto é, morte relacionada com o DM, aciden-
50. A resposta é D. (Cap. 19) O tratamento oral de primeira linha te vascular encefálico e insuficiência cardíaca. A melhora do
para pacientes com diabetes melito tipo 2 é a metformina. Está controle da pressão arterial também resultou em melhora dos
contraindicada para pacientes com TFG inferior a 60 mL/min*, desfechos microvasculares.
qualquer forma de acidose, insuficiência cardíaca congestiva,
doença hepática ou hipoxemia grave, porém é bem tolerada na 53. A resposta é A. (Cap. 19) A cetoacidose diabética é uma com-
maioria dos indivíduos. Os secretagogos da insulina, as bigua- plicação aguda do diabetes melito. Resulta de uma deficiência
nidas, os inibidores da alfa-glicosidase, as tiazolidinedionas, relativa ou absoluta de insulina combinada a um excesso dos
os agonistas de GLP-1, os inibidores de DPP-IV e a insulina hormônios contrarreguladores. Em particular, uma diminui-
foram todos aprovados como monoterapia para o diabetes ção da razão entre insulina e glucagon promove gliconeogê-
melito tipo 2. Em virtude da extensa experiência clínica com nese, glicogenólise e formação de corpos cetônicos no fígado.
a metformina, seu perfil favorável de efeitos colaterais e cus- A cetose resulta de um aumento da liberação de ácidos graxos
to relativamente baixo, ela constitui o agente de primeira linha livres pelos adipócitos, com consequente desvio na direção da
recomendado. A metformina tem os benefícios adicionais de síntese de corpos cetônicos no fígado. Isso é mediado pela rela-
promover uma ligeira perda de peso, reduzir os níveis de in- ção entre a insulina e a enzima carnitina palmitoil transferase
sulina e produzir uma discreta melhora no perfil lipídico. As 1. Em pH fisiológico, os corpos cetônicos existem na forma de
sulfonilureias, como a gliburida, os agonistas do GLP-1, como cetoácidos que são neutralizados pelo bicarbonato. À medida
a exenatida, e os inibidores da dipeptidil peptidase 4 como a que ocorre depleção das reservas de bicarbonato, surge a acido-
sitagliptina, podem ser apropriados como terapia de combina- se. Clinicamente, esses pacientes apresentam náusea, vômitos e
ção, porém não são considerados como tratamento de primeira dor abdominal. São desidratados e podem ser hipotensos. Po-
linha para a maioria dos pacientes. dem ocorrer letargia e grave depressão do sistema nervoso cen-
tral. O tratamento visa à reposição da insulina do corpo, que irá
resultar na interrupção da formação de cetoácidos e melhora
51. A resposta é A. (Cap. 19) O Diabetes Control e Complications do estado acidótico. A avaliação do nível de acidose pode ser
Trial (DCCT) proporcionou uma prova definitiva de que a re- efetuada com gasometria arterial. Esses pacientes apresentam
dução da hiperglicemia crônica pode prevenir muitas das com- acidose com hiato aniônico e, com frequência, alcalose meta-
plicações do diabetes melito (DM) tipo 1. Esse estudo clínico bólica concomitante em decorrência da depleção de volume. A
randomizado multicêntrico recrutou mais de 1.400 pacientes reposição de volume com líquidos intravenosos é critica. Po-
com DM tipo 1 para tratamento intensivo ou convencional do dem ocorrer muitas anormalidades eletrolíticas. Os pacientes
diabetes e avaliou prospectivamente o desenvolvimento de re- apresentam depleção corporal total de sódio, potássio e magné-
tinopatia, nefropatia e neuropatia. Os indivíduos do grupo de sio. Em consequência da acidose, o potássio intracelular pode
tratamento intensivo receberam múltiplas administrações de sair das células e resultar em nível de potássio normal ou até
insulina ao dia, juntamente com educação e aconselhamento mesmo elevado. Todavia, com a melhora da acidose, o nível sé-
psicológico. Os indivíduos do grupo de tratamento intensivo rico de potássio cai rapidamente. Por conseguinte, a reposição
obtiveram um nível médio de hemoglobina A1c de 7,3% ver- de potássio é crítica, apesar da presença de um nível “normal”.
sus 9,1% no grupo de tratamento convencional. A melhora do Devido aos efeitos osmolares da glicose, o líquido é deslocado
controle glicêmico levou a uma redução da retinopatia de 47%, para o espaço intravascular. Isso resulta em queda do nível sé-
a uma redução da nefropatia de 54% e a uma redução da neuro- rico de sódio. Ocorre uma queda de 1,6 mEq/L do sódio sérico
patia de 60%. Houve uma tendência, embora não significativa, para cada elevação de 100 mg/dL da glicose sérica. No caso des-
a uma melhora das complicações macrovasculares. Os resulta- ta paciente, o nível sérico de sódio irá melhorar com hidratação
dos do DCCT mostraram que os indivíduos no grupo do trata- apenas. O uso de solução salina a 3% não está indicado, visto
mento intensivo conseguiriam ganhar mais de sete anos adicio- que a paciente não tem nenhum déficit neurológico, e a expec-
nais de visão intacta e até cinco anos adicionais sem amputação tativa é de rápida resolução apenas com líquidos IV.
dos membros inferiores. Posteriormente, o United Kingdom
Prospective Diabetes Study (UKPDS) estudou mais de 5.000 54. A resposta é E. (Cap. 19; Nathan, N Engl J Med 328:1676-
indivíduos com DM tipo 2. Os indivíduos que foram submeti- 1685, 1993) A nefropatia constitui uma das principais causas
dos a um controle intensivo da glicemia tiveram uma redução de morte em pacientes diabéticos. A nefropatia diabética pode
dos eventos microvasculares, porém nenhuma alteração signi- permanecer funcionalmente silenciosa durante 10 a 15 anos. A
ficativa nas complicações macrovasculares. Esses dois estudos nefropatia clinicamente detectável começa com o desenvolvi-
clínicos foram fundamentais para mostrar o benefício do con- mento de microalbuminúria (30 a 300 mg de albumina em 24
trole glicêmico na redução das complicações microvasculares horas). A taxa de filtração glomerular pode na verdade estar
nos pacientes com DM tipo 1 e tipo 2, respectivamente. Outro elevada nesse estágio. Somente com o passar do tempo é que a
resultado do UKPDS foi que o controle estrito da pressão arte- proteinúria se manifestará o suficiente (0,5 g/L) para ser detec-
rial resultou em melhora das complicações macrovasculares. tável nas tiras reagentes padrões para urina. A microalbuminú-
ria precede a nefropatia em pacientes com diabetes melito tanto
52. A resposta é D. (Cap. 19) No Diabetes Control and Complica- insulinodependente quanto não insulinodependente. O estágio
tions Trial (DCCT), em pacientes com diabetes melito tipo 1 e de hiperfiltração inicial também pode ser acompanhado de um
no United Kingdom Prospective Diabetes Study (UKPDS), em aumento no tamanho dos rins. Quando a proteinúria torna-se
pacientes com diabetes tipo 2, foi constatado que o controle gli- significativa o suficiente para ser detectada por tiras reagentes,
cêmico rigoroso com uma hemoglobina A1c de 7% ou menos ocorre um declínio uniforme da função renal, com queda da
causou uma melhora da doença microvascular. De modo consi- taxa de filtração glomerular de 1 mL/min por mês, em média.
derável, foi observada uma redução na incidência de neuropa- Por conseguinte, a azotemia surge cerca de 12 anos após o diag-
nóstico de diabetes. A hipertensão constitui claramente um fa-
* N. de R.T.: A recomendação atual é não usar com TFG < 30 mL/min. tor de exacerbação para a nefropatia diabética.
410
55. A resposta é D. (Cap. 20) A manutenção da euglicemia envol- 58. A resposta é D. (Cap. 8) A ginecomastia é uma queixa relativa-
ve diversos sistemas para reduzir os níveis elevados de glicemia, mente comum nos homens e pode ser causada por obesidade,
mas também para restaurar os níveis normais quando a hipo- com expansão do tecido adiposo na mama, ou por um aumento
glicemia está iminente ou presente. A diminuição da secreção da razão estrogênio/androgênio, em que ocorre um verdadeiro
RESPOSTAS
QUESTÕES
de insulina constitui o principal fator regulador da glicose, e aumento glandular, como no caso deste paciente. Se houver au-
sua secreção é inibida com níveis plasmáticos de glicose de 80 mento unilateral da mama, ou se ela for de consistência dura ou
a 85 mg/dL. A secreção de glucagon é a segunda defesa contra fixada ao tecido subjacente, indica-se a mamografia. De modo
a hipoglicemia, e o hormônio é secretado na presença de níveis alternativo, se houver cirrose ou algum fármaco como fator
de glicose de 65 a 70 mg/dL. A epinefrina e o cortisol são os etiológico, ambos podem fornecer uma explicação adequada,
terceiros a serem secretados e são liberados com um nível de particularmente quando a ginecomastia surge numa fase avan-
glicose de 65 a 70 mg/dL. Por fim, surgem sintomas com um çada da vida em homens previamente férteis. Se o tecido ma-
nível de glicose de 50 a 55 mg/dL que leva o paciente a buscar mário tiver mais de 4 cm, ou houver evidências de testículos
alguma fonte de alimento, e ocorre diminuição da cognição muito pequenos e nenhum fármaco como agente etiológico ou
com níveis de glicose inferiores a 50 mg/dL. doença hepática, deve-se efetuar uma investigação à procura de
alterações nos níveis séricos de testosterona, LH, FSH, estradiol
56. A resposta é D. (Cap. 20) A paciente apresenta episódios re- e hCG. Pode haver deficiência de androgênio ou uma síndrome
correntes de hipoglicemia que preenchem a tríade de Whipple: de resistência, ou pode-se detectar a presença de tumor secre-
sintomas, baixo nível de glicose documentado por ocasião dos tor de hCG. No caso deste paciente, a espironolactona é prova-
sintomas e alívio dos sintomas com a administração de glicose. velmente a causa e pode ser interrompida ou substituída por
O diagnóstico diferencial começa com a determinação dos ní- eplerenona, com reavaliação da ginecomastia.
veis de insulina durante a hipoglicemia. Os níveis precisam ser
obtidos durante um episódio para serem interpretados. Quando 59. A resposta é C. (Cap. 8) Muitos fármacos podem interferir
elevados, os níveis de insulina sugerem hiperprodução endóge- na função testicular por meio de uma variedade de mecanis-
na por tumor secretor de insulina ou administração exógena, mos. A ciclofosfamida provoca lesão dos túbulos seminíferos
causando hipoglicemia factícia. Como o peptídeo C é clivado de modo dependente da dose e do tempo e causa azoosper-
da proinsulina nativa para formar o produto secretado, seu ní- mia dentro de poucas semanas após seu início. Esse efeito é
vel estará elevado no caso de hiperinsulinemia endógena e bai- reversível em aproximadamente metade dos pacientes. O ce-
xo durante o episódio de hipoglicemia factícia. A ingestão sub- toconazol inibe a síntese de testosterona. A espironolactona
-reptícia de sulfonilureia pode causar hipoglicemia, juntamente provoca bloqueio da ação androgênica, o que também pode
com níveis elevados de insulina e de peptídeo C, visto que esses causar ginecomastia. Os glicocorticoides levam ao hipogo-
fármacos estimulam a secreção pancreática de insulina. No caso nadismo predominantemente por meio da inibição da fun-
desta paciente, um rastreamento para sulfonilureias estaria indi- ção hipotalâmico-hipofisária. A disfunção sexual foi descrita
cada. Os indícios neste caso que apontam para o uso sub-reptício como efeito colateral do tratamento com betabloqueadores.
de insulina incluem o trabalho da paciente como profissional da Entretanto, não há evidências de algum efeito sobre a função
área de saúde e a presença de sintomas apenas no local de traba- testicular. Os relatos de disfunção sexual têm sido, em sua
lho. Outro grupo em que isso é comum é constituído por paren- maioria, de pacientes que utilizaram betabloqueadores mais
tes de pacientes com diabetes e pacientes com história de outros antigos, como o propranolol e o timolol.
distúrbios factícios. É possível que essa paciente tenha um tumor
de células beta secretor de insulina, porém isso é muito menos
provável, e haveria sintomas durante as horas fora de trabalho. 60. A resposta é B. (Cap. 10) As mulheres que apresentam ciclos
A avaliação deve ter por objetivo demonstrar a supressão da menstruais mensalmente regulares, que não variam em mais
secreção pancreática de insulina durante um episódio de hipo- de quatro dias, geralmente têm ciclos ovulatórios, porém vá-
glicemia. Embora uma falha dos hormônios contrarreguladores rios outros indicadores sugerem a probabilidade de ovulação.
possa produzir hipoglicemia, trata-se de uma causa muito rara Incluem a presença de mittelschmerz, que é descrita como des-
de hipoglicemia, e a avaliação só deve considerar essa possibili- conforto pélvico na metade do ciclo, que se acredita ser cau-
dade após excluir o uso sub-reptício. sado pela rápida expansão do folículo dominante pela ocasião
da ovulação ou sintomas pré-menstruais, como hipersensibili-
dade ou distensão das mamas, e desejo compulsivo por certos
57. A resposta é E. (Cap. 20) A causa mais comum de hipogli- alimentos. Outros parâmetros objetivos sugerem a presença de
cemia está relacionada com o tratamento do diabetes melito. ovulação, incluindo nível de progesterona superior a 5 ng/mL,
Os indivíduos com diabetes melito tipo 1 (DM1) apresentam
sete dias antes da menstruação esperada, elevação da tempera-
hipoglicemia mais sintomática do que os pacientes com dia-
tura corporal basal superior a 0,3°C na segunda metade do ci-
betes melito tipo 2 (DM2). Em média, pacientes com DM1
clo menstrual e detecção de aumento urinário de LH. Os níveis
apresentam dois episódios de hipoglicemia sintomática se-
de estrogênio estão elevados por ocasião da ovulação e durante
manalmente e pelo menos uma vez por ano os pacientes com
a fase secretora do ciclo menstrual, porém não são úteis para
DM1 irão apresentar episódio grave de hipoglicemia que é pelo
detectar a ovulação.
menos temporariamente incapacitante. Estima-se que 2 a 4%
dos indivíduos com DM1 morrem como resultado da hipogli-
cemia. Além disso, os episódios recorrentes de hipoglicemia 61. A resposta é C. (Cap. 10) A infertilidade, definida como a in-
no DM1 contribuem para o desenvolvimento de falência au- capacidade de conceber após 12 meses de relações sexuais sem
tônoma associada à hipoglicemia. Clinicamente, manifesta-se proteção, representa um problema comum nos EUA, com uma
como perda da percepção da hipoglicemia e contrarregulação estimativa de 15% de casais afetados. A avaliação inicial deve
defeituosa da glicose, com ausência de secreção de glucagon e incluir uma análise da história menstrual atual, aconselhamen-
de epinefrina com a queda dos níveis de glicose. Os indivíduos to sobre o momento apropriado da relação sexual e educação
com DM2 têm menos probabilidade de desenvolver hipoglice- acerca dos fatores de risco modificáveis, como uso de drogas,
mia. Os medicamentos que estão associados à hipoglicemia no consumo de álcool, tabagismo, cafeína e obesidade. Os fatores
DM2 incluem a insulina e os secretagogos da insulina, como as masculinos são responsáveis por aproximadamente 25% dos
sulfonilureias. A metformina, as tiazolidinedionas, os inibido- casos de infertilidade, a infertilidade é inexplicada em 17%
res da alfa-glicosidase, os agonistas do receptor de peptídeo 1 dos casos, e as causas femininas respondem por 58% dos ca-
semelhante ao glucagon e os inibidores da dipeptidil peptidase sos de infertilidade. Entre as causas femininas, a mais comum
IV não causam hipoglicemia. é a amenorreia/disfunção ovulatória, que está presente em 43%
411
dos casos. Resulta mais frequentemente de distúrbios hipotalâ- 65. A resposta é E. (Cap. 12) O Women’s Health Initiative foi o
micos ou hipofisários ou da síndrome de ovários policísticos. maior estudo sobre terapia hormonal realizado até hoje, que
Os defeitos tubários e a endometriose são menos comuns. examinou 27.000 mulheres na pós-menopausa com 50 a 79
anos de idade, por um período médio de 5 a 7 anos. O estudo
RESPOSTAS
QUESTÕES
62. A resposta é C. (Cap. 10) A avaliação da infertilidade deve in- foi interrompido precocemente devido a uma relação risco-
cluir uma análise dos fatores masculinos e femininos comuns -benefício desfavorável no braço com estrogênio-progestina e
que podem estar contribuindo. As anormalidades da função risco aumentado de acidente vascular encefálico, que não foi
menstrual constituem a causa mais comum de infertilidade fe- contrabalançado por um menor risco de doença cardíaca co-
ronariana no braço com estrogênio apenas. O risco de câncer
minina, e a avaliação inicial da infertilidade deve incluir uma
endometrial foi maior em pacientes com estrogênio apenas e
avaliação da ovulação e da potência tubária e uterina. A mu-
útero. O uso de progesterona elimina esse risco. O estrogênio
lher relata um episodio de infecção gonocócica com sintomas
sem oposição foi associado a um risco aumentado de acidente
de doença inflamatória pélvica, o que pode aumentar o risco
vascular encefálico que ultrapassou de longe o risco diminuído
de infertilidade, devido à cicatriz e oclusão/obstrução tubá-
de doença cardíaca coronariana. A combinação de estrogênio-
rias. Indica-se histerossalpingografia. Se houver evidências de
-progestina foi associada a um risco aumentado de doença car-
anormalidades tubárias, muitos especialistas recomendam a
díaca coronariana. O risco de osteoporose diminuiu em ambos
fertilização in vitro para a concepção, visto que essas mulheres
os grupos com estrogênio e estrogênio-progestina. O risco de
correm risco aumentado de gravidez ectópica em caso de con-
tromboembolismo venoso também foi maior em ambos os
cepção. Neste caso, a mulher relata a ocorrência de alguma ir-
grupos de tratamento. Esses tratamentos reduzem os principais
regularidade nas suas menstruações, sugerindo ciclos anovula-
sintomas da menopausa, como ondas de calor e ressecamento
tórios; por conseguinte, devem-se obter evidências de ovulação
da vagina. Esse estudo seminal levou a uma profunda reavalia-
pela determinação dos níveis hormonais. Não há evidências de
ção do uso de estrogênio/progesterona em mulheres na pós-
que o uso prolongado de contraceptivos orais possa afetar ad-
-menopausa para reduzir o risco cardiovascular.
versamente a fertilidade (A Farrow, et al: Hum Reprod 17: 2754,
2002). Os inibidores da enzima conversora de angiotensina,
incluindo o lisinopril, são teratógenos conhecidos quando to- 66. A resposta é C. (Cap. 7) A síndrome de Klinefelter é um dis-
mados por mulheres, porém não exercem nenhum efeito sobre túrbio cromossômico com 47,XXY. Como a principal carac-
as anormalidades cromossômicas em homens. O uso recente terística desse distúrbio consiste em insuficiência gonadal, os
de maconha pode estar associado a um risco aumentado de níveis de testosterona estão baixos, e, portanto, ocorre aumento
infertilidade, e estudos in vitro de espermatozoides humanos na produção de LH e de FSH na tentativa de aumentar a produ-
expostos a um derivado canabinoide mostraram uma redução ção de testosterona na alça de feedback dos hormônios sexuais.
da motilidade (LB Whan, et al: Fertil Steril 85: 653, 2006). En- A produção de estrogênio está frequentemente aumentada, de-
tretanto, nenhum estudo demonstrou uma diminuição da fer- vido à estimulação crônica das células de Leydig pelo LH e de-
tilidade de longo prazo em homens que fizeram uso prévio de vido à aromatização da androstenediona pelo tecido adiposo. A
maconha. razão testosterona:estrogênio mais baixa resulta em leve femi-
nização com ginecomastia. As manifestações dos baixos níveis
de testosterona consistem em testículos pequenos e proporções
63. A resposta é E. (Cap. 10) Todas as opções têm uma eficácia “eunucoides” com pernas longas e virilização incompleta. A
teórica de mais de 90% na prevenção da gravidez. Entretanto, biópsia dos testículos, embora seja raramente realizada, revela
a eficiência real pode variar amplamente. Os espermicidas são hialinização dos túbulos seminíferos e azoospermia. Embora
os que apresentam a maior taxa de falha de 21%. Os métodos casos graves sejam diagnosticados no período pré-puberal com
de barreira/preservativos, (capuz cervical, diafragma) tem uma pequenos testículos e androgenização deficiente, cerca de 75%
eficácia real entre 82 e 88%. Os contraceptivos orais e os dispo- dos casos não são diagnosticados, e a frequência na população
sitivos intrauterinos têm uma eficácia semelhante, com sucesso geral é de 1 para 1.000. Os pacientes com síndrome de Kline-
de 97% na prevenção da gravidez na prática clínica. felter correm risco aumentado de tumores mamários, doença
tromboembólica, dificuldades de aprendizagem, obesidade,
64. A resposta é E. (Cap. 10) Ocorre ginecomastia patológica diabetes melito e veias varicosas.
quando a razão efetiva entre testosterona e estrogênio apresen-
ta-se diminuída, devido à produção diminuída de testosterona 67. A resposta é A. (Cap. 7) A síndrome de Turner resulta mais
(como na insuficiência testicular primária) ou à produção au- frequentemente de um cariótipo 45,X, porém o mosaicismo
mentada de estrogênio. Esta última pode resultar da secreção também resulta nesse distúrbio. Clinicamente, a síndrome de
direta de estradiol por um testículo estimulado pelo LH ou pelo Turner se manifesta por baixa estatura e amenorreia primária
hCG, ou de um aumento da aromatização periférica dos este- quando se apresenta em adultas. Além disso, outras caracterís-
roides precursores, mais notavelmente androstenediona. Os ticas comuns incluem linfedema crônico das mãos e dos pés,
níveis elevados de androstenediona podem resultar de secreção pregas nucais, linha baixa de implantação dos cabelos e palato
aumentada por um tumor suprarrenal (levando a níveis eleva- arqueado alto. Para estabelecer o diagnóstico de síndrome de
dos de 17 cetosteroides urinários) ou diminuição da depuração Turner, deve-se efetuar uma análise do cariótipo. O corpúsculo
hepática em pacientes com doença hepática crônica. Diversas de Barr resulta na inativação de um dos cromossomos X em
substâncias, incluindo dietilestilbestrol, heroína, digitálicos, mulheres e não é observado nos homens. Na síndrome de Tur-
espironolactona, cimetidina, isoniazida e antidepressivos tricí- ner o corpúsculo de Barr deve estar ausente, porém apenas 50%
clicos, também podem causar ginecomastia. Nesse paciente, a dos indivíduos com síndrome de Turner apresentam o carió-
história de paternidade e o exame físico normal sob os demais tipo 45,X. Por conseguinte, o diagnóstico poderia ser omitido
aspectos indicam que não há necessidade de análise do carió- em indivíduos com mosaicismo ou outras anormalidades es-
tipo, e o aumento bilateral das mamas exclui essencialmente a truturais do cromossomo X.
presença de carcinoma e, portanto, a necessidade de biópsia. A São encontradas diversas condições comórbidas nos indi-
presença de altos níveis de LH e de testosterona sugere a pro- víduos com síndrome de Turner, e recomenda-se um rastrea-
dução de estrogênio ou de hCG. Devido ao exame normal dos mento apropriado. Defeitos cardíacos congênitos afetam 30%
testículos, não há suspeita de tumor testicular primário. O car- das mulheres com síndrome de Turner, incluindo valva aórtica
cinoma de pulmão e os tumores de células germinativas podem bicúspide, coarctação da aorta e dilatação da raiz da aorta. De-
produzir hCG, causando ginecomastia. ve-se efetuar um ecocardiograma, e o individuo deve ser avalia-
412
do para pressão arterial nos braços e nas pernas. A hipertensão cientes desenvolvem sintomas típicos, bem como sintomas sis-
também pode estar associada a anormalidades estruturais dos têmicos, como hipotensão e hipertensão com taquicardia. Os
rins e do trato urinário, mais comumente do rim em ferradura. análogos sintéticos da somatostatina (octreotida, lanreotida)
Recomenda-se também uma ultrassonografia dos dois rins. A constituem o tratamento de escolha para a crise carcinoide. Es-
RESPOSTAS
QUESTÕES
doença tireoidiana autoimune acomete 15 a 30% das mulheres ses fármacos também são efetivos para prevenir crises quando
com síndrome de Turner e deve ser avaliada mediante a do- administrados antes de um evento desencadeante conhecido. A
sagem do TSH. Outras comorbidades que podem ocorrer in- octreotida, em uma dose de 150 a 250 mg por via subcutânea,
cluem perda da audição neurossensorial, elevação das enzimas a cada 6 a 8 horas, deve ser iniciada, 14 a 48 horas antes de um
hepáticas, osteoporose e doença celíaca. procedimento passível de precipitar de uma crise carcinoide.
68. A resposta é B. (Cap. 22) Esse paciente apresenta úlceras 71. A resposta é C. (Cap. 22) Este paciente apresenta os achados
pépticas recorrentes sem qualquer evidência de infecção por clássicos de VIPoma, incluindo diarreia aquosa de grande vo-
H. pylori. Deve-se estabelecer o diagnóstico de síndrome se lume, hipopotassemia, desidratação e hipocloridria (síndrome
Zollinger-Ellison. Outras características que sugerem uma WDHA ou de Verner-Morrison). A dor abdominal é incomum.
doença ulcerosa idiopática não clássica incluem a presença de A presença de diarreia secretora é confirmada por um hiato
diarreia que é observada na síndrome de Zollinger-Ellison, mas osmolal das fezes [2(Na fecal + K fecal) – (osmolalidade das
não nas úlceras idiopáticas. O diagnóstico costuma ser esta- fezes)] abaixo de 35 e persistência durante o jejum. Na diarreia
belecido pela dosagem dos níveis plasmáticos de gastrina, que osmótica ou induzida por laxativos, o hiato osmolal das fezes
devem estar acentuadamente elevados. Todavia, o uso comum é superior a 100. Em adultos, mais de 80% dos VIPomas são
de inibidores da bomba de prótons (IBP) que suprimem acen- massas pancreáticas solitárias, que habitualmente têm mais de
tuadamente a secreção de ácido gástrico altera essa determina- 3 cm por ocasião do diagnóstico. As metástases para o fígado
ção. Como o uso de IBP suprime a produção de ácido gástrico, são comuns e impossibilitam uma ressecção cirúrgica curativa.
ocorrem elevação da gastrina. Por esse motivo, o uso de IBP O diagnóstico diferencial inclui gastrinoma, abuso de laxativos,
deve ser interrompido por uma semana antes da determinação síndrome carcinoide e mastocitose sistêmica. O diagnóstico
da gastrina no plasma. Com frequência, essa retirada exige a exige a demonstração de diarreia secretora de grande volume
colaboração de um gastrenterologista para garantir a seguran- (> 700 mL/dia) e nível sérico elevado de VIP. A TC do abdome
ça e oferecer um tratamento farmacológico alternativo durante frequentemente demonstra a presença de massa pancreática e
esse período de tempo. Uma vez confirmada a hipergastrine- metástases hepáticas.
mia, a presença de um baixo pH gástrico também precisa ser
confirmada, visto que a causa mais comum de elevação da 72. A resposta é B. (Cap. 23) A síndrome de neoplasia endócrina
gastrina é a acloridria devido à anemia perniciosa. O exame múltipla é definida como um distúrbio com neoplasias, as quais
de imagem do abdome está indicado após da demonstração da acometem dois ou mais tecidos hormonais em vários membros
hipergastrinemia. Por fim, embora a síndrome de Zollinger- de uma família. A mais comum dessas síndromes é a NEM 1,
Ellison possa estar associada à neoplasia endócrina múltipla que é causada pelo gene que codifica uma proteína nuclear de-
tipo 1, que frequentemente apresenta hiperplasia ou adenoma nominada Menina. A NEM 1 está associada a tumores ou hi-
das paratireoides, essa condição é menos provável do que a perplasia das paratireoides, do pâncreas, da hipófise, do córtex
síndrome de Zollinger-Ellison isolada. suprarrenal e do intestino anterior e/ou a lipomas subcutâne-
os ou viscerais. A manifestação mais comum e mais precoce
69 e 70. Ambas as respostas são E. (Cap. 22) Em pacientes com é o hiperparatireoidismo com hipercalcemia sintomática. Essa
tumores carcinoides não metastáticos, a cirurgia constitui o manifestação ocorre mais comumente no final da adolescên-
único tratamento potencialmente curativo. A extensão da res- cia, e 93 a 100% dos portadores da mutação desenvolvem essa
secção cirúrgica depende do tamanho do tumor primário, visto complicação. Os gastrinomas, os insulinomas e os prolactino-
que o risco de metástases está relacionado com o tamanho do mas são menos comuns e tendem a ocorrer em pacientes nas
tumor. O tratamento sintomático tem por objetivo diminuir a décadas de 20, 30 e 40 anos de idade. O feocromocitoma pode
quantidade e os efeitos das substâncias circulantes. Os fármacos ocorrer na NEM 1, porém é mais comumente encontrado na
que inibem os receptores de serotonina 5-HT1 e 5-HT2 (meti- NEM 2A ou síndrome de von Hippel-Lindau.
sergida, cipro-heptadina, cetanserina) podem controlar a diar-
reia, mas não o rubor. Os antagonistas dos receptores 5-HT3 73. A resposta é A. (Cap. 23) O quadro clínico desse paciente é
(ondansetrona, tropisetrona, alosetrona) controlam a náusea e mais compatível com NEM 1 ou “3P”: paratireoides, pituitá-
a diarreia em até 100% dos pacientes e podem aliviar rubor. ria (hipófise) e pâncreas. A NEM 1 é uma síndrome genética
Uma combinação dos agonistas dos receptores H1 e H2 da his- autossômica dominante, caracterizada por neoplasias das glân-
tamina pode controlar o rubor, particularmente em pacientes dulas paratireoides, hipófise e células das ilhotas dos pâncreas.
com tumores carcinoides do intestino anterior. Os análogos da O hiperparatireoidismo constitui a manifestação mais comum
somatostatina (octreotida, lanreotida) constituem os agentes da NEM 1. As alterações neoplásicas afetam várias glândulas
que são mais efetivos e amplamente utilizados para controlar paratireoides, tornando difícil o tratamento cirúrgico. A neo-
os sintomas da síndrome carcinoide, diminuindo a excreção plasia de células das ilhotas do pâncreas é a segunda manifes-
urinária de 5-HIAA e os sintomas em 70 e 80% dos pacientes. tação mais comum da NEM 1. Os hormônios das células das
O interferon-α, isoladamente ou combinado com embolização ilhotas pancreáticas que estão aumentados incluem polipeptí-
da artéria hepática, controla o rubor e a diarreia em 40 a 85% deo pancreático, gastrina, insulina, peptídeo intestinal vasoati-
desses pacientes. A fenoxibenzamina é um bloqueador dos re- vo, glucagon e somatostatina. Os tumores pancreáticos podem
ceptores α1-adrenérgica, que é usada no tratamento do feocro- ser multicêntricos, e até 30% são malignos, sendo o fígado o
mocitoma. principal local de metástases. Os sintomas dependem do tipo
A crise carcinoide é uma complicação da síndrome carcinoi- de hormônio secretado. A síndrome de Zollinger-Ellison (SZE)
de que comporta risco de vida. É mais comum em pacientes provoca elevação da gastrina, resultando em diátese ulcerosa.
que apresentam sintomas intensos de tumores do intestino an- O tratamento conservador frequentemente não tem sucesso. O
terior ou níveis urinários acentuadamente elevados de 5-HIAA. insulinoma resulta em hipoglicemia documentada, com níveis
A crise pode ser provocada por cirurgia, estresse, anestesia, elevados de insulina e de peptídeo C. O glucagonoma resulta
quimioterapia ou traumatismo físico do tumor (biópsia ou, em hiperglicemia, exantema cutâneo, anorexia, glossite e diar-
neste caso, compressão física das lesões hepáticas). Esses pa- reia. As elevações do peptídeo intestinal vasoativo resultam em
413
diarreia aquosa profusa. Ocorrem tumores hipofisários em até de sulfato de magnésio, em uma dose de aproximadamente 4g,
50% dos pacientes com NEM 1. Os prolactinomas são os mais seguida de infusão contínua, 1 g/hora. Embora o tratamento
comuns. Em virtude de sua multicentricidade, a ressecção dos definitivo da eclâmpsia seja o parto do lactente, recomenda-se
tumores é difícil. Os tumores secretores de hormônio do cres- o tratamento continuado com sulfato de magnésio por 24 horas
RESPOSTAS
QUESTÕES
cimento são os próximos tumores mais comuns, enquanto os após a última crise convulsiva. As pacientes devem ser moni-
tumores secretores de ACTH e de hormônio de liberação da toradas durante a infusão para sinais de hipermagnesemia e os
corticotrofina (CRH) são mais raros. Os tumores carcinoides níveis devem ser determinados pelo menos a cada 6 horas. A
também podem ocorrer no timo, nos pulmões, no estômago e concentração habitual de magnésio é de 0,7 a 1 mmoL (1,5 a 2
o duodeno. mEq/L), e o nível desejado para tratamento da pré-eclâmpsia
é habitualmente de 1,7 a 3,5 mmol/L, embora possam surgir
74 e 75. As respostas são D e C, respectivamente. (Cap. 25) A sinais e sintomas de hipermagnesemia com níveis de 2 mmol/L.
hipofosfatemia resulta em um de três mecanismos: absorção Os sinais iniciais de hipermagnesemia incluem prolongamento
intestinal inadequada de fosfato, excreção renal excessiva de do complexo QRS, depressão dos reflexos tendíneos profundos
fosfato e redistribuição rápida do fosfato do espaço extracelular e hipotensão, que é refratária aos vasopressores. Com concen-
para dentro do osso ou dos tecidos moles. A absorção intes- trações acima de 4 mmol/L, podem aparecer náusea, letargia
tinal inadequada é rara, visto que os antiácidos contendo hi- e fraqueza, progredindo para a paralisia e insuficiência respi-
dróxido de alumínio deixaram de ser comumente prescritos. ratória. Os sintomas tornam-se cada vez mais graves e ocorre
A desnutrição em consequência de jejum ou inanição pode assistolia quando os níveis aproximam-se de 10 mmol/L.
resultar em depleção do fosfato. Essa situação também é obser-
vada comumente no alcoolismo. Em pacientes hospitalizados, 77. A resposta é B. (Cap. 25) A deficiência de vitamina D é alta-
a redistribuição constitui a principal causa. A insulina promove mente prevalente nos EUA e é mais comum em idosos hospita-
a entrada de fosfato dentro das células, juntamente com a glico- lizados ou em clínicas geriátricas. A deficiência de vitamina D
se. Quando se inicia a nutrição, a realimentação aumenta ain- pode ocorrer em consequência de aporte dietético inadequado,
da mais a redistribuição do fosfato para dentro das células e é produção diminuída na pele, absorção intestinal diminuída,
mais pronunciada quando a glicose IV é usada isoladamente. A perdas aceleradas ou comprometimento da ativação da vitami-
sepse pode causar destruição das células e acidose metabólica, na D no fígado ou no rim. Clinicamente, a deficiência D em in-
resultando em desvio efetivo do fosfato do espaço extracelular divíduos idosos é mais frequentemente silenciosa. Os médicos
para dentro das células. A insuficiência renal está associada à muitas vezes deixam de considerar a possibilidade de deficiên-
hiperfosfatemia e não à hipofosfatemia, e a azotemia pré-renal cia de vitamina D até que um paciente seja diagnosticado com
inicial, conforme observado neste caso, pode obscurecer a de- osteoporose ou tenha sofrido uma fratura. Entretanto, alguns
pleção subjacente de fosfato. indivíduos podem apresentar dor muscular e é óssea difusa.
A abordagem do tratamento da hipofosfatemia pode consi- Para a avaliação dos níveis de vitamina D, o teste apropriado
derar diversos fatores, incluindo a probabilidade e a magnitude, consiste nos níveis de 25-hidroxivitamina D [25(OH)D]. Os
da depleção subjacente de fosfato, a função renal, os níveis sé- níveis ideais de 25(OH)D são superiores a 80 nmol/L (32 ng/
ricos de cálcio e a administração concomitante de glicose pa- mL)*; entretanto, um indivíduo não é considerado deficiente,
renteral. Além disso, o médico deve avaliar o paciente quanto a não ser que o nível sejaconsiderado inferior a 37 nmol/L (15
à ocorrência de complicações da hipofosfatemia, que podem ng/mL)**. Quando o nível de 25(OH)D cai abaixo desse valor, o
incluir fraqueza neuromuscular, disfunção cardíaca, hemó- paratormônio (PTH) pode aumentar, e isso também está asso-
lise e disfunção plaquetária. Em geral, ocorre hipofosfatemia ciado a uma menor densidade óssea. A deficiência de vitamina
grave quando a concentração sérica cai abaixo de 2 mg/dL (< D resulta em diminuição da absorção intestinal de cálcio, com
0,75 mmol/L). Essa situação torna-se particularmente perigosa consequente hipocalcemia e hiperparatireoidismo secundário.
quando há depleção crônica subjacente de fosfato. Todavia, não Em resposta a isso, ocorre maior renovação óssea, que pode
existe nenhuma fórmula simples para determinar as necessi- estar associada a um aumento dos níveis de fosfatase alcalina.
dades corporais de fosfato a partir da determinação dos seus Além disso, os níveis elevados de PTH estimulam a conver-
níveis séricos, visto que a maior parte do fosfato é intracelular. são renal 25-hidroxivitamina D em 1,25-hidroxivitamina D, a
Em geral, recomenda-se a reposição com fosfato oral quando forma ativada da vitamina D. Por conseguinte, mesmo na pre-
os níveis séricos de fosfato são superiores a 1,5 a 2,5 mg/dL (0,5 sença de deficiência grave, os níveis de 1,25(OH)D podem ser
a 0,8 mmol/L). A dose de fosfato oral é de 750 a 2.000 mg ao dia normais e não refletem acuradamente as reservas da vitamina.
de fosfato elementar, em doses fracionadas. A hipofosfatemia Por conseguinte, o nível de 1,25(OH)D não deve ser usado para
mais grave, como aquela do caso descrito, exige uma reposição estabelecer um diagnóstico de deficiência de vitamina D. Em-
intravenosa. A reposição intravenosa de fosfato é efetuada com bora a deficiência de vitamina D possa estar associada a anor-
misturas neutras de sais de fosfato de sódio e potássio, em do- malidades nos níveis de PTH, fosfatase alcalina e cálcio, estas
ses de 0,2 a 0,8 mmol/kg durante 6 horas. O Quadro 25-2 for- anormalidades bioquímicas podem ser observadas em muitas
nece a dose total e a velocidade recomendada de infusão para outras doenças e nenhuma dessas determinações é sensível ou
uma faixa de níveis de fosfato. Neste paciente com um nível de específica para o diagnóstico de deficiência de vitamina D.
1,0 mg/dL, a velocidade de infusão recomendada é de 8 mmol/
hora durante 6 horas, para uma dose total de 48 mmol. Até que 78. A resposta é A. (Cap. 27) Os distúrbios granulomatosos, in-
a hipofosfatemia subjacente seja corrigida, os níveis séricos de cluindo sarcoidose, tuberculose e infecções fúngicas, podem
fosfato e de cálcio devem ser monitorados a cada 6 horas. A estar associados à síntese aumentada de 1,25-hidroxivitamina
infusão deve ser interrompida se o produto cálcio-fosfato au- D por macrófagos nos granulomas, causando hipercalcemia.
mentar para mais de 50, a fim de reduzir o risco de calcificação Esse processo escapa dos mecanismos normais de feedback, e
heterotópica. De modo alternativo, se for constatada a presença podem ser observados níveis elevados de 25-hidroxi e 1,25-hi-
concomitante de hipocalcemia com a hipofosfatemia, é impor- droxivitamina D. Isso não ocorre normalmente, visto que os
tante corrigir o cálcio antes de administrar o fosfato. níveis de 1,25-hidroxivitamina D são, em condições normais,
414
rigorosamente controlados por meios de mecanismos de feed- doença na miastenia gravis ou na síndrome de Guillain-Barré.
back da 1-hidroxilase renal, a enzima que produz a vitamina D A fraqueza muscular é uma característica de apresentação típi-
ativada em circunstâncias normais. Além disso, o mecanismo ca, mas não as parestesias.
de feedback normal proporcionado pela concentração de para-
RESPOSTAS
QUESTÕES
tormônio também é contornado, e o nível de PTH pode estar 81. A resposta é E. (Cap. 27) A neoplasia maligna pode causar
baixo. hipercalcemia por vários mecanismos diferentes, incluindo
metástase para o osso, estimulação da renovação óssea por ci-
79. A resposta é D. (Cap. 27) Esse paciente apresenta evidências tocinas e produção de uma proteína estruturalmente semelhan-
de hiperparatireoidismo terciário, com elevações inapropriadas te ao paratormônio pelo tumor. Essa proteína é denominada
do paratormônio, apesar dos aumentos nos níveis de cálcio e peptídeo relacionado com o paratormônio (PTHrp) e atua nos
fosfato. Além disso, o paciente está exibindo evidências clini- mesmos receptores do paratormônio (PTH). O carcinoma de
cas da doença, incluindo dor óssea e calcificação ectópica. O células escamosas do pulmão constitui o tumor mais comum
hiperparatireoidismo terciário desenvolve-se mais comumente associado à produção de PTHrp. Os níveis séricos de cálcio tor-
em indivíduos com insuficiência renal de longa duração que nam-se acentuadamente levados na neoplasia maligna, devido
não têm aderido ao tratamento. No caso deste paciente, a hipo- à produção desregulada de PTHrp, que está fora do controle
xemia e os infiltrados em vidro fosco na TC do tórax represen- por feedback negativo que normalmente resulta no contexto da
tam calcificações ectópicas dos pulmões. Isso pode ser difícil hipercalcemia. Os níveis de PTH devem estar muito baixos ou
de identificar com as imagens típicas, e uma cintilografia ós- indetectáveis nesse contexto. Quando a hipercalcemia é grave
sea com tecnécio 99m mostrará uma captação aumentada nos (> 15 mg/dL), os sintomas frequentemente incluem desidra-
pulmões. O tratamento do hiperparatireoidismo terciário com tação e alteração do estado mental. O eletrocardiograma pode
manifestações clínicas graves exige paratireoidectomia. revelar encurtamento do intervalo QTc. O tratamento inicial
inclui a administração de líquidos em grande volume para re-
80. A resposta é B. (Cap. 27) A hipocalcemia pode ser uma con- verter a desidratação que resulta da hipercalciúria. Além disso,
sequência potencialmente fatal da tireoidectomia, quando as acrescenta-se furosemida para promover uma maior calciúria.
glândulas paratireoides são removidas inadvertidamente du- Se o cálcio permanecer elevado, como no caso dessa pacien-
rante a cirurgia, visto que as quatro glândulas paratireoides te, outras medidas devem ser implementadas para diminuir o
localizam-se posteriormente à glândula tireoide. Na atuali- cálcio sérico. A calcitonina tem rápido início de ação, com di-
dade, trata-se de um evento infrequente, visto que as glândulas minuição dos níveis séricos de cálcio dentro de poucas horas.
paratireoides podem ser mais bem identificadas tanto antes Todavia, verifica-se o desenvolvimento de taquifilaxia, e a du-
quanto durante a cirurgia. Entretanto, pode ocorrer hipopa- ração do benefício é limitada. O pamidronato é um bifosfonato
ratireoidismo, mesmo se as glândulas paratireoides não forem útil para a hipercalcemia da neoplasia maligna. O pamidronato
removidas na tireoidectomia, devido à desvascularização ou ao diminui o nível sérico de cálcio ao impedir a reabsorção óssea
traumatismo das glândulas. A hipocalcemia após a remoção e a liberação de cálcio do osso. Após administração IV, o início
das glândulas paratireoides pode surgir a qualquer momento de ação do pamidronato é observado em 1 a 2 dias, com du-
nas primeiras 24 a 72 horas, e recomenda-se a monitoração dos ração de ação de pelo menos duas semanas. Por conseguinte,
níveis seriados de cálcio nas primeiras 72 horas. Os primeiros nessa paciente com hipercalcemia sintomática grave persisten-
sintomas de hipocalcemia normalmente consistem em pares- te, o melhor tratamento consiste na adição de calcitonina e pa-
tesias periorais e parestesias com sensação de alfinetada nos midronato. A paciente deve continuar recebendo líquidos IV e
dedos das mãos e dos pés. O desenvolvimento de espasmos car- furosemida. A adição de um diurético tiazídico está contraindi-
pais com a insuflação do manguito de pressão arterial constitui cada, visto que os tiazídicos provocam aumento da reabsorção
um sinal clássico de hipocalcemia e é conhecido como sinal de de cálcio no rim, o que agravaria a hipercalcemia.
Trousseau. O sinal de Chvostek é outro sinal clássico de hipo-
calcemia, que é produzido pela percussão do nervo facial na 82. A resposta é B. (Cap. 27) O hiperparatireoidismo constitui a
área pré-auricular, causando espasmo dos músculos faciais. O causa mais comum de hipercalcemia e é a causa mais provável
prolongamento do intervalo QT no ECG sugere hipocalcemia em um adulto assintomático. O câncer é a segunda causa mais
potencialmente fatal, que pode progredir para arritmia fatal, e comum de hipercalcemia, porém está habitualmente associa-
o tratamento não deve ser adiado para a realização de testes do à hipercalcemia sintomática. Além disso, frequentemente
séricos em um paciente com causa conhecida de hipocalcemia. existem sintomas da própria neoplasia maligna que dominam
Deve-se iniciar o tratamento imediato com cálcio IV. A tera- o quadro clínico. O hiperparatireoidismo primário resulta da
pia de manutenção com calcitriol e cálcio é necessária para o secreção autônoma de paratormônio (PTH) que não é mais
tratamento continuado do hipoparatireoidismo adquirido. De regulada pelos níveis séricos de cálcio. Habitualmente relacio-
modo alternativo, o cirurgião pode implantar tecido paratire- nada ao desenvolvimento de adenomas das paratireoides. Os
óideo no tecido subcutâneo do antebraço se for considerada pacientes são, em sua maioria, assintomáticos ou apresentam
a possibilidade de remoção das glândulas paratireoides. A hi- sintomas mínimos por ocasião do diagnóstico. Quando presen-
pomagnesemia pode causar hipocalcemia ao suprimir a libe- te, os sintomas incluem nefrolitíase recorrente, úlceras pépti-
ração de paratormônio, apesar da presença de hipocalcemia. cas, desidratação, constipação e alteração do estado mental. Os
Entretanto, nesta paciente, não há suspeita de hipomagnesemia exames laboratoriais revelam níveis séricos elevados de cálcio e
após a tireoidectomia, e a administração de magnésio não está diminuição do nível sérico de fosfato. O diagnóstico pode ser
indicada. A benztropina é um anticolinérgico de ação central, confirmado pela determinação dos níveis de paratormônio.
utilizado no tratamento de reações distônicas que podem ocor- A remoção cirúrgica dos adenomas autônomos é geralmente
rer após o uso de medicações antieméticas de ação central com curativa, porém nem todos os pacientes necessitam de trata-
atividades dopaminérgicas, como a metoclopramida ou a Com- mento cirúrgico. Recomenda-se que os indivíduos com menos
pazine. As reações distônicas envolvem espasmos focais da de 50 anos de idade sejam submetidos à ressecção cirúrgica
face, pescoço e membros. Embora essa paciente tenha tomado primária. Todavia, em pacientes com mais de 50 anos, frequen-
uma medicação (morfina) que pode causar uma reação distô- temente utiliza-se uma abordagem cautelosa com monitoração
nica, os espasmos que está apresentando são mais compatíveis laboratorial frequente. Então, a cirurgia pode ser realizada se
com contrações tetânicas da hipocalcemia do que com reações o paciente se tornar sintomático ou se houver agravamento da
distônicas. Por fim, a determinação da capacidade vital força- hipercalcemia ou complicações, como osteopenia. O câncer
da é mais comumente efetuada como medida da gravidade da de mama representa uma causa frequente de hipercalcemia,
415
devido à doença metastática para o osso. Nesta paciente que tam até os 50 anos de idade e alcançam um platô por volta dos
foi submetida à mamografia de rotina como parte do rastrea- 60 anos, com um aumento do risco apenas moderado daí em
mento de câncer apropriada para a idade e que é assintomática, diante. Isso contrasta com o risco de fraturas de quadril. As ta-
o câncer de mama seria pouco provável. O mieloma múltiplo é xas de incidência para fraturas de quadril duplicam a cada cin-
RESPOSTAS
QUESTÕES
outra neoplasia maligna frequentemente associada à hipercal- co anos depois dos 70 anos de idade. Essa alteração no padrão
cemia, que se acredita seja causada pela produção de citocinas de fraturas não se deve totalmente à osteoporose, mas também
e mediadores humorais do tumor. O mieloma múltiplo não está relacionada com o fato de que o menor número de que-
deve estar presente com hipercalcemia isolada e está associado das no idoso ocorre sobre o braço hiperestendido e tem mais
à anemia e a elevações da creatinina. probabilidade de ocorrer diretamente sobre o quadril. As mu-
Cerca de 20% dos indivíduos com hipertireoidismo desen- lheres negras sofrem fraturas de quadril em uma taxa de apro-
volvem hipercalcemia relacionada com aumento da renovação ximadamente metade daquela das mulheres brancas. A taxa de
óssea. Essa paciente não exibe sinais nem sintomas de hiperti- mortalidade no ano subsequente a uma fratura de quadril é de
reoidismo, tornando esse diagnóstico improvável. A intoxica- 5 a 20%. As fraturas vertebrais também constituem manifesta-
ção pela vitamina D constitui uma rara causa de hipercalcemia. ções comuns da osteoporose, embora a maioria seja encontrada
Um indivíduo precisa ingerir 40 a 100 vezes a quantidade diária incidentalmente em uma radiografia de tórax, os casos graves
recomendada para desenvolver hipercalcemia. Como a vita- podem resultar em perda da altura, restrição pulmonar e mor-
mina D atua aumentando a absorção intestinal tanto do cálcio bidade respiratória.
quanto do fosfato, os níveis séricos de ambos os minerais esta-
riam elevados, o que não ocorre neste caso. 85. A resposta é C. (Cap. 28) Existem múltiplos riscos para as fra-
turas ósseas por osteoporose, que podem ser modificáveis ou
83. A resposta é B. (Cap. 27) O paratormônio (PTH) é produzido não. Esses fatores de risco estão resumidos no Quadro 28-1. Os
pelas quatro glândulas paratireoides, localizadas posteriormen- fatores de risco não modificáveis incluem história pregressa de
te à glândula tireoide. Trata-se do principal hormônio respon- fratura quando adulto, sexo feminino, raça branca, demência,
sável pela regulação do equilíbrio do cálcio e do fosfato séricos. idade avançada e história de fratura (mas não de osteoporose)
A secreção de PTH é rigorosamente regulada por feedback ne- em parente de primeiro grau. Os fatores de risco que são po-
gativo pelos níveis séricos de cálcio e de vitamina D. O PTH tencialmente modificáveis incluem peso corporal abaixo de 58
afeta principalmente os níveis séricos de cálcio e de fosfato por kg, baixa ingestão de cálcio, alcoolismo, comprometimento da
meio de sua ação sobre o osso e o rim. No osso, o PTH aumenta visão, quedas recorrentes, atividade física inadequada, saúde
a remodelagem óssea por meio de suas ações sobre os osteo- precária e deficiência de estrogênio, incluindo menopausa an-
blastos e osteoclastos. O PTH estimula diretamente os osteo- tes dos 45 anos ou amenorreia pré-menstrual prolongada. O
blastos a aumentar a formação óssea, e essa ação do hormônio tabagismo atual constitui um fator de risco para fratura relacio-
tem sido utilizada no tratamento da osteoporose. Entretanto, nada à osteoporose, mas não uma história pregressa de fumo de
sua ação sobre os osteoclasto é indireta e provavelmente é me- cigarros.
diada pelas suas ações sobre os osteoblastos. O osteoclasto não
tem nenhum receptor para o PTH. Foi aventada a hipótese de 86. A resposta é C. (Cap. 28) Diversas doenças no adulto aumentam
que as citocinas produzidas pelos osteoblastos são responsáveis o risco de osteoporose. Em primeiro lugar, as doenças que levam
pela atividade osteoclástica aumentada que é observada após a uma deficiência de estrogênio ou hipogonadismo podem re-
a administração de PTH, visto que o hormônio não consegue sultar em osteoporose. Esse grupo inclui a síndrome de Turner,
exercer um efeito sobre os osteoclastos na ausência de osteo- a síndrome de Klinefelter e a hiperprolactinemia, entre outras.
blastos. O efeito final do PTH sobre o osso consiste em aumen- Uma ampla diversidade de distúrbios endócrinos também pode
tar a remodelagem óssea. Por fim, isso leva a um aumento dos levar a um metabolismo anormal do osso, particularmente hi-
níveis séricos de cálcio, um efeito que pode ser observado den- perparatireoidismo e tireotoxicose. A desnutrição e os distúrbios
tro de horas após a administração do fármaco. No rim, o PTH gastrintestinais aumentam a probabilidade de desenvolvimento
atua aumentando a reabsorção de cálcio, enquanto aumenta a de osteoporose. A anorexia nervosa causa tanto hipogonadis-
excreção de fosfato. No túbulo proximal, o PTH atua ao dimi- mo quanto um estado nutricional precário. As síndromes de má
nuir o transporte de fosfato, facilitando, assim, a sua excreção. absorção levam a um aporte diminuído de cálcio e vitamina D
A reabsorção de cálcio é aumentada pela ação do PTH sobre o que são essenciais para a boa saúde do osso. A doença pulmonar
túbulo distal. Uma ação final do PTH no rim consiste em au- obstrutiva crônica também apresenta uma alta incidência de os-
mentar a produção de 1,25-hidroxicolecalciferol, a forma ativa- teoporose, que pode estar relacionada com um estado inflamató-
da da vitamina D, por meio da estimulação da 1-α-hidroxilase. rio crônico com alta renovação óssea, que é exacerbada pelo uso
A seguir, a vitamina D ativada ajuda a aumentar os níveis de frequente de corticosteroides, deficiência frequente de vitamina
cálcio, aumentando a absorção intestinal tanto do cálcio quanto D e baixo estado de atividade. Outras categorias amplas de doen-
do fosfato. ças que podem levar à osteoporose incluem distúrbios reumato-
lógicos, neoplasias malignas hematológicas e alguns distúrbios
84. A resposta é B. (Cap. 28) A osteoporose refere-se a uma con- hereditários como osteogênese imperfeita, síndrome de Marfan
dição crônica caracterizada por diminuição da resistência do e porfiria, entre muitos outros. É bem conhecido o fato de que
osso e, com frequência, manifesta-se na forma de fraturas ver- a imobilização, a gravidez e a lactação também podem levar ao
tebrais e de quadril. Nos EUA, cerca de 8 milhões de mulhe- desenvolvimento de osteoporose.
res apresentam osteoporose, em comparação com cerca de 2
milhões de homens, com razão entre homens e mulheres de 4 87. A resposta é B. (Cap. 28) A osteoporose é uma doença comum
para 1. Estima-se que outros 18 milhões de indivíduos apresen- que acomete 8 milhões de mulheres e 2 milhões de homens nos
tam osteopenia. O risco de osteoporose aumenta com a idade e EUA. É mais comum em mulheres na pós-menopausa, porém
agrava-se rapidamente depois da menopausa nas mulheres. A a incidência também está aumentando nos homens. A perda
maioria das mulheres preenche os critérios para o diagnóstico de estrogênio provavelmente causa perda óssea por meio da
de osteoporose entre 70 e 80 anos de idade. As mulheres bran- ativação de locais de remodelagem óssea e exagero do dese-
cas correm risco aumentado de osteoporose, em comparação quilíbrio entre formação e reabsorção ósseas. A osteoporose é
com as mulheres afro-americanas. diagnosticada pela medida da densidade mineral óssea. A ab-
A epidemiologia das fraturas ósseas acompanha a da osteo- sorciometria de raios X de dupla energia (DEXA) é o exame
porose. As fraturas do radio distal (fratura de Colles) aumen- mais acurado para medir a densidade mineral óssea. As deter-
416
minações clínicas da densidade óssea são mais comumente efe- essa paciente. O risedronato pertence a uma família de fárma-
tuadas na coluna lombar e no quadril. Na técnica de DEXA, são cos denominados bifosfonatos. Os bifosfonatos atuam ao inibir
usadas duas energias de raios X para medir a área dos tecidos a atividade dos osteoclastos, diminuindo a reabsorção óssea e
mineralizados e comparadas com valores normativos para sexo aumentando a massa óssea. O alendronato, o risedronato e o
RESPOSTAS
QUESTÕES
e raça. O escore T compara os resultados individuais aos resul- ibandronato foram aprovados para o tratamento da osteopo-
tados de uma população jovem, enquanto o escore Z compara rose pós-menopausa, e o alendronato e risedronato também
os resultados individuais com os de uma população de idade foram aprovados para o tratamento da osteoporose induzida
equivalente. A osteoporose é diagnosticada quando o escore T é por esteroides e osteoporose em homens. Nos ensaios clínicos
de -2,5 DP na coluna lombar, colo do fêmur e quadril. Deve-se realizados, o risedronato diminui em cerca de 40% o risco de
considerar uma avaliação para as causas secundárias de osteo- fratura de quadril e fraturas vertebrais em mulheres com os-
porose em indivíduos que sofrem fraturas osteoporóticas em teoporose, durante um período de três anos. Entretanto, o ri-
uma idade jovem e naqueles que apresentam escores Z muito sedronato não é efetivo para diminuir as fraturas de quadril
baixos. A avaliação inicial deve incluir níveis de cálcio sérico em mulheres com mais de 80 anos de idade sem osteoporose
e urinário de 24 horas, provas de função renal e de função he- comprovada. O principal efeito colateral dos bifosfonatos por
pática, nível sérico de fósforo e níveis de vitamina D. Outras via oral é a esofagite. Esses fármacos devem ser tomados com
anormalidades endócrinas, incluindo hipoparatireoidismo e um copo de água, e o paciente deve permanecer em pé por 30
hiperparatireoidismo devem ser avaliadas, e os níveis urinários minutos após tomar o medicamento. Existe também alguma
de cortisol devem ser verificados, se houver suspeita clínica de preocupação acerca de um aumento do risco de osteonecrose
síndrome de Cushing. Os níveis de hormônio folículo estimu- da mandíbula em indivíduos tratados com altas doses de bi-
lante e de hormônio luteinizante devem estar elevados, porém fosfonatos IV ou com tratamento oral por períodos prolonga-
não são úteis nesta paciente, visto que ela se encontra em um dos de tempo; todavia, nessa paciente com osteoporose grave e
estado perimenopáusico. fratura recente, os benefícios superam os riscos potenciais. Os
estrogênios também são efetivos na prevenção e no tratamento
88. A resposta é C. (Cap. 28) A determinação do momento em da osteoporose. Dados epidemiológicos indicam que as mulhe-
que deve ser iniciada o rastreamento para osteoporose com res em uso de estrogênio tem uma redução de 50% no risco de
densitometria óssea pode ser complicada por múltiplos fato- fraturas de quadril. O raloxifeno é um modulador seletivo dos
res. Em geral, a maioria das mulheres não necessita de rastrea- receptores de estrogênio (SERM). O efeito do raloxifeno sobre
mento para osteoporose até completar a menopausa, a não ser a densidade óssea é ligeiramente menor que o do estrogênio,
que tenham sofrido fraturas inexplicadas ou que outros fatores porém o fármaco diminui o risco de fraturas vertebrais em 30
de risco estejam sugerindo osteoporose. Não existe nenhum a 50%. Todavia, ambos os fármacos estão contraindicados para
benefício em iniciar o rastreamento para a osteoporose no pe- essa paciente, devido à ocorrência recente de doença trombo-
ríodo perimenopáusico. Com efeito, a maioria das recomenda- embólica venosa. Tanto o estrogênio quanto os SERM aumen-
ções de especialistas não indica o rastreamento de rotina para a tam em várias vezes o risco de TVP e embolia pulmonar. Se
osteoporose até os 65 anos de idade ou mais, a não ser que exis- houver necessidade de estrogênio, ele deve ser usado em asso-
tam fatores de risco. Os fatores de risco para osteoporose in- ciação com uma progestina em mulheres com o útero intacto,
cluem idade avançada, tabagismo recente, baixo peso corporal com o objetivo de diminuir o risco de câncer uterino associado
(< 57,7 kg), história familiar de fratura de quadril e uso prolon- à estimulação estrogênica sem oposição. Tanto a suplementa-
gado de glicocorticoide. Os glicocorticoides inalados podem ção de cálcio quanto a de vitamina D são recomendadas como
causar perda aumentada da densidade óssea. Todavia, como terapia suplementar; entretanto, tendo em vista o grau de oste-
essa paciente está fazendo uso de uma baixa dose de fluticasona oporose dessa paciente, ambas são inadequadas isoladamente.
inalada e não apresenta deficiência de estrogênio, não se pode A calcitonina está disponível como spray intranasal e produz
recomendar a densitometria óssea nesse momento. O risco de pequenos aumentos da densidade óssea, porém não tem efici-
osteoporose relacionada a glicocorticoides inalados não está ência comprovada na prevenção de fraturas.
bem definido, porém a maioria dos estudos sugere que o risco é
relativamente baixo. Uma gestação na quarta e quinta décadas 91 e 92. As respostas são B e C, respectivamente. (Cap. 29) O
de vida aumenta o risco de osteoporose, mas não induz o iní- diagnóstico mais provável nesse caso é a doença de Paget. O
cio precoce de osteoporose antes de completar a menopausa. A nível normal de γ-glutamil transferase, localiza a causa dos
história familiar de menopausa da paciente tampouco exige um níveis elevados de fosfatase alcalina no osso. Por conseguinte,
rastreamento precoce para osteoporose. são excluídas as doenças do fígado e da árvore biliar. Embora
tanto a osteomielite vertebral quanto a doença de Paget possam
89. A resposta é D. (Cap. 28) A osteoporose é definida como uma causar elevação da fosfatase alcalina, o paciente não tem sinto-
redução da massa ou da densidade óssea ou presença de fra- mas de doença sistêmica que possa ser normalmente esperada
tura por fragilidade. A Organização Mundial da Saúde (OMS) com a osteomielite vertebral. A doença de Paget é uma displa-
fornece uma definição operacional da osteoporose como uma sia comum do osso associada à remodelagem óssea localizada,
densidade óssea de mais de 2,5 DP abaixo da média para adul- que pode afetar numerosas áreas distintas do esqueleto. Esse
tos jovens sadios da mesma raça e sexo. A absorciometria de distúrbio é relativamente comum. Em séries de necropsias, as
raios X de dupla energia (DEXA) é o exame mais amplamente lesões de Paget podem ser mostradas em cerca de 3% dos indi-
usado para determinar a densidade óssea. A densidade óssea víduos com mais de 40 anos de idade, embora as manifestações
é expressa como escore T, isto é, o DP abaixo da media para clínicas da doença sejam muito menos comuns. Com mais fre-
adultos jovens da mesma raça e do mesmo sexo. Um escore T quência, o diagnóstico é estabelecido em indivíduos com eleva-
acima de 2,5 caracteriza a osteoporose, enquanto um escore T ções assintomáticas da fosfatase alcalina ou em indivíduos com
inferior a 1 identifica pacientes com risco de osteoporose. O alterações radiográficas características, que efetuaram exames
escore Z compara os indivíduos com aqueles de uma população bioquímicos ou radiografias por outros motivos. Nos indivídu-
de idade, raça e sexo equivalentes. os sintomáticos, observa-se mais comumente a ocorrência de
dor localizada. Os ossos mais frequentemente acometidos são
90. A resposta é E. (Cap. 28) Dispõem-se de várias escolhas para o fêmur, o crânio, a pelve, os corpos vertebrais e a tíbia. Os sin-
tratamento na prevenção de fraturas e reversão da perda óssea tomas específicos dependem da localização da lesão de Paget.
na osteoporose, e o perfil de efeitos colaterais deve ser cuida- Quando os corpos vertebrais são acometidos, pode ocorrer dor
dosamente analisado para efetuar uma escolha adequada para lombar devido às vértebras aumentadas, às fraturas da coluna
417
por compressão e à estenose vertebral. Em casos raros, pode normalmente são necessários 3 a 6 meses para observar o início
ocorrer compressão da medula espinal. Nesse contexto, é possí- da normalização da fosfatase alcalina. O zoledronato e o pami-
vel que a dor lombar do paciente seja devida à doença de Paget dronato por via intravenosa são alternativas adequadas para os
não diagnosticada. Normalmente, o diagnóstico é estabelecido bifosfonatos orais. Enquanto sua administração IV evita o risco
RESPOSTAS
QUESTÕES
com base nos achados típicos em radiografias e exames bioquí- de refluxo, existe o potencial de desenvolver uma síndrome de
micos. As radiografias podem mostrar aumento ou expansão tipo gripal dentro de 24 horas de uso. A presença desse efeito
de todo o osso, espessamento cortical, espessamento das mar- colateral não exige a suspensão do fármaco. Pode-se esperar o
cas trabeculares e alterações tanto líticas quanto escleróticas. mesmo tempo para obter uma resposta a esses agentes.
Os achados característicos nas vértebras incluem espessamento
cortical das placas terminais superior e inferior, criando uma 95. A resposta é D. (Cap. 21) A mutação do receptor de LDL re-
vértebra em “moldura”. Se uma vértebra estiver difusamente sulta em hipercolesterolemia. Essa mutação, que pode ser ho-
aumentada, a radiodensidade criada é designada como “vér- mozigota ou heterozigota, ocorre em aproximadamente um
tebra de marfim”. A elevação da fosfatase alcalina constitui o entre 500 indivíduos em sua forma heterozigota. A doença
achado clássico na doença de Paget e o exame de escolha para homozigota é mais grave, com desenvolvimento de aterosclero-
o diagnóstico e para avaliar a resposta ao tratamento. O nível se coronariana sintomática na infância, enquanto os pacientes
sérico de osteocalcina, um marcador da formação óssea, nem heterozigotos apresentam hipercolesterolemia desde o nasci-
sempre está elevado na doença de Paget por razões desconhe- mento, e o diagnóstico da doença habitualmente só é estabe-
cidas, e sua determinação não é recomendada para diagnós- lecido na idade adulta, quando o paciente apresenta xantomas
tico ou resposta ao tratamento. Os níveis séricos ou urinários tendíneos ou doença arterial coronariana. Nos pacientes com
de N-telopeptídeo ou C-telopeptídeo também são marcadores doença heterozigota, geralmente obtém-se uma história fami-
da reabsorção óssea e estão elevados na doença de Paget ativa. liar em pelo menos um lado da família. Na hipercolesterole-
Esses marcadores diminuem mais rapidamente em resposta ao mia familiar, ocorre elevação de LDL-C entre 200 e 400 mg/
tratamento do que a fosfatase alcalina. Os níveis séricos de fós- dL, sem qualquer alteração dos quilomícrons ou das VLDL. A
foro e de potássio estão normais na doença de Paget, a não ser deficiência familiar de apoB-100 tem uma apresentação seme-
que o paciente fique imobilizado. lhante, porém menos comum (1/1.000). Pode haver uma histó-
ria autossômica dominante nessa família, sugerindo hiperco-
93. A resposta é C. (Cap. 29) A doença de Paget do osso está as- lesterolemia autossômica dominante; todavia, essa condição é
sociada à displasia óssea localizada, que pode ocorrer em nu- muito rara (< 1/1.000.000), e, portanto, muito menos provável.
merosas áreas distintas do osso. Do ponto de vista patológico, a A deficiência familiar de lipase hepática e a deficiência de lipo-
doença é iniciada por uma atividade excessiva dos osteoclastos, proteína lipase estão associadas ao aumento dos quilomícrons,
que leva a uma elevada renovação óssea e aumento subsequen- e não do LDL-C, e manifestam-se com xantomas eruptivos, he-
te da atividade osteoblástica, resultando em lesões ósseas tanto patoesplenomegalia e pancreatite. Essas condições raramente
líticas quanto escleróticas. Do ponto de vista bioquímico, há ocorrem (< 1/1.000.000).
normalmente evidências do aumento da renovação óssea, e a
elevação dos níveis de fosfatase alcalina constitui a principal 96. A resposta é B. (Cap. 21) Existem muitas formas secundárias
anormalidade bioquímica usada tanto para o diagnóstico de de elevação das LDL que exigem consideração em um paciente
doença de Paget quanto para a resposta ao tratamento. Outros com níveis anormais de LDL. Incluem: hipotireoidismo, sín-
marcadores da reabsorção óssea aumentada incluem o C-telo- drome nefrótica, colestase, porfiria intermitente aguda, ano-
peptídeo e o N-telopeptídeo, que normalmente estão elevados rexia nervosa, hepatoma e fármacos, como tiazídicos, ciclos-
tanto no soro quanto na urina. Essas proteínas declinam mais porina e Tegretol. A cirrose está associada a níveis reduzidos
rapidamente do que a fosfatase alcalina em resposta ao trata- de LDL, devido à sua produção inadequada. A má-absorção, a
mento. O nível sérico de osteocalcina também é um marcador desnutrição, a doença de Gaucher, a doença crônica infecciosa,
da elevada renovação óssea, e seus níveis podem estar elevados o hipertireoidismo e a toxicidade da niacina também estão as-
ou normais em pacientes com doença de Paget. Todavia, o nível sociados a níveis reduzidos de LDL.
sérico de cálcio é sempre normal em pacientes com doença de
Paget, a não ser que o indivíduo fique imobilizado. 97. A resposta é D. (Cap. 21) Esse paciente apresenta sinais e sin-
tomas de hipercolesterolemia familiar (HF) com níveis plasmá-
94. A resposta é C. (Cap. 29) Apesar da ausência de sintomas, ticos elevados de LDL, triglicerídeos normais, xantomas ten-
essa paciente apresenta evidências suficientes para estabele- díneos e doença arterial coronariana prematura. A HF é um
cer o diagnóstico de doença de Paget. As radiografias revelam distúrbio das lipoproteínas autossômico codominante, que é a
alterações características da doença ativa na pelve, que é uma mais comum dessas síndromes causadas pelo distúrbio de um
das áreas mais comuns acometidas na doença de Paget. O nível único gene. Tem maior prevalência em africâneres, libaneses
elevado de fosfatase alcalina fornece uma evidência adicional cristãos e franco-canadenses. Não existe nenhum exame com-
do remodelamento ósseo ativo. Os níveis séricos normais de plementar definitivo para o diagnóstico da HF. A HF pode ser
cálcio e de fosfato são característicos da doença de Paget. O diagnosticada por meio da obtenção de biópsia cutânea, que re-
tratamento da doença de Paget assintomática mudou desde a vela uma redução da atividade dos receptores de LDL em cultu-
disponibilidade dos tratamentos efetivos. O tratamento deve ra de fibroblastos (embora haja considerável superposição com
ser iniciado em todos os pacientes sintomáticos e em pacientes indivíduos normais). A HF é predominantemente um diagnós-
assintomáticos que apresentam sinais de doença ativa (valo- tico clínico, embora ensaios moleculares para diagnóstico este-
res elevados da fosfatase alcalina ou da hidroxiprolina uriná- jam sendo desenvolvidos. A hemólise não é uma característica
ria) ou doença adjacente a estruturas de sustentação de pesos, da HF. A sitosterolemia distingue-se da HF pela ocorrência de
vértebras ou crânio. Os bifosfonatos orais de segunda geração episódios de hemólise. Trata-se de um distúrbio autossômico
como o tiludronato, o alendronato e o risedronato, constituem recessivo raro que causa acentuado aumento da absorção die-
escolhas excelentes, em virtude de sua capacidade de diminuir tética de esterois vegetais. A hemólise deve-se à incorporação
o remodelamento ósseo. O principal efeito colateral desses fár- de esterois vegetais na membrana eritrocitária. A sitosterole-
macos consiste em ulceração esofágica e refluxo. Devem ser to- mia é confirmada pela demonstração de níveis plasmáticos
mados pela manhã com o estômago vazio, com a permanência aumentados de sitosterol por meio de cromatografia gasosa. A
do paciente sentado em postura ereta para minimizar o risco de TC do fígado não diferencia suficientemente as hiperlipopro-
refluxo. A duração do tratamento depende da resposta clínica; teinemias. Muitas das lipoproteinemias primárias, incluindo a
418
sitosterolemia, são herdadas como caráter autossômico recessi- bolsa escrotal, a vigilância não está indicada. Ambas as abor-
vo, de modo que a análise de um heredograma provavelmente dagens devem levar à cura em mais de 95% dos pacientes. A
não isolaria o distúrbio. radioterapia constitui a escolha adequada para o seminoma dos
estádios I e II. Por outro lado, não desempenha nenhum papel
RESPOSTAS
QUESTÕES
98. A resposta é C. (Cap. 21) Esse paciente apresenta síndrome nas lesões não seminomatosas. A quimioterapia adjuvante não
nefrotica, provavelmente em consequência de mieloma múlti- está indicada para o câncer de testículo de estádio inicial. A te-
plo. A hiperlipidemia da síndrome nefrótica parece resultar de rapia hormonal mostra-se efetiva para o câncer de próstata e o
uma combinação do aumento da produção hepática e redução câncer de mama com receptores positivos, porém não desem-
da depuração das lipoproteínas de densidade muito baixa, com penha nenhum papel no câncer de testículo. A tomografia por
aumento da produção das LDL. É habitualmente mista, mas emissão de pósitrons pode ser utilizada para localizar resíduos
pode se manifestar na forma de hipercolesterolemia e hipertri- viáveis de um seminoma, exigindo excisão cirúrgica ou biópsia.
gliceridemia. O tratamento efetivo da doença renal subjacente
normaliza o perfil dos lipídeos. Entre as escolhas apresentadas, 101. A resposta é A. (Cap. 14) Cerca de 10% das mulheres com
os inibidores da HMG-CoA redutase seriam os mais efetivos câncer de ovário apresentam uma mutação somática em um
para reduzir as LDL desse paciente. O manejo dietético cons- dos dois genes de reparo do DNA, BRCA1 (cromossomo
titui um importante componente da modificação do estilo de 17q12-21) ou BRCA2 (cromossomo 13q12-13). As pessoas que
vida, porém raramente resulta em uma queda de mais de 10% herdam uma única cópia de um alelo mutante têm uma inci-
nas LDL. A niacina e os fibratos estariam indicados se os tri- dência muito alta de câncer de mama e de ovário. A maioria
glicerídeos estivessem mais elevados, porém a LDL constitui a dessas mulheres apresenta uma história familiar notável por
anormalidade mais importante dos lipídeos a ser considerada múltiplos casos de câncer de mama ou de ovário (ou de ambos
nesse paciente. A aférese de lipídeos é reservada para pacien- os tipos de câncer), embora a herança nos membros da famí-
tes que não conseguem tolerar os fármacos hipolipêmicos ou lia do sexo masculino possa camuflar esse genótipo através de
que apresentam distúrbio genético dos lipídeos refratário aos várias gerações. Nessas mulheres, a neoplasia maligna mais co-
fármacos. Foi constatado que os inibidores da proteína de mum é o carcinoma de mama, embora mulheres que apresen-
transferência de ésteres de colesterol aumentam os níveis de tam mutações BRCA1 de linhagem germinativa corram acen-
lipoproteína de alta densidade, e seu papel no tratamento das tuado aumento no risco de desenvolver neoplasias de ovário
lipoproteínas ainda está em fase de investigação. na quarta ou na quinta décadas de vida, com risco de 30 a 50%
ao longo da vida de desenvolver câncer de ovário. As mulheres
99. A resposta é C. (Cap. 9) Noventa por cento dos indivíduos que apresentam uma mutação em BRCA2 têm uma menor pe-
com tumores de células germinativas não seminomatosos pro- netrância de câncer de ovário, com probabilidade talvez de 20
duzem α-fetoproteína (AFP) ou betagonadotrofina coriônica a 40% de desenvolver essa neoplasia maligna, cujo início costu-
humana (�����������������������������������������������
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-hCG); por outro lado, os indivíduos com semi- ma ser observado na quinta ou sexta décadas de vida. As mu-
nomas puros habitualmente não produzem esses marcadores. lheres com mutação BRCA2 também correm risco ligeiramente
Esses marcadores tumorais estão presentes por algum tempo aumentado de câncer de pâncreas. Estudos de rastreamento
depois da cirurgia; se os níveis pré-operatórios estiverem ele- nessa população selecionada sugerem que as técnicas atuais de
vados, podem ser necessários 30 dias ou mais para a obtenção rastreamento, incluindo avaliação seriada do marcador tumo-
de níveis pós-operatórios significativos. As meias-vidas da AFP ral CA-125 e ultrassonografia, não são suficientes para detectar
e da β-hCG são de seis dias e um dia, respectivamente. Após a doença de estádio inicial e curável, de modo que as mulheres
o tratamento, pode haver uma redução desigual da β-hCG e com essas mutações de linhagem germinativa são aconselha-
da AFP, sugerindo que os dois marcadores são sintetizados das a se submeter à remoção profilática dos ovários e das tubas
por clones heterogêneos de células dentro do tumor; por con- uterinas após ter tido filhos e, idealmente, antes dos 30 a 40
seguinte, é necessário acompanhar ambos os marcadores. A anos. O ooforectomia profilática precoce também protege essas
β-hCG é semelhante ao hormônio luteinizante, exceto pela sua mulheres de câncer de mama subsequente, com uma redução
subunidade beta distinta. de aproximadamente 50% no risco.
100. A resposta é D. (Cap. 9) O câncer de testículo ocorre mais co- 102. A resposta é C. (Cap. 14) O carcinoma endometrial constitui
mumente em homem na segunda e terceira décadas de vida. a neoplasia ginecológica mais comum nos EUA, consistindo a
O tratamento depende da patologia subjacente e do estádio maioria em adenocarcinomas. O desenvolvimento desses tu-
da doença. Os tumores de células germinativas são divididos mores é um processo em múltiplas etapas, em que o estrogê-
nos subtipos não inseminoma e inseminoma. Embora a pato- nio desempenha um papel inicial importante na estimulação
logia do tumor desse paciente fosse de seminoma, a presença da proliferação das glândulas endometriais. A hiperexposição
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-fetoproteína (AFP) é sugestiva de componentes não se- relativa a essa classe de hormônios constitui um fator de risco
minomatosos ocultos. Se houver qualquer componente não para o desenvolvimento subsequente de tumores endometriais.
seminomatoso, o tratamento segue o de um tumor de células Em contrapartida, as progestinas impulsionam a maturação
germinativas não seminomatoso. Por conseguinte, esse pacien- glandular e são protetoras. Por conseguinte, as mulheres com
te apresenta tumor de células germinativas não seminomatoso alta exposição endógena ou farmacológica aos estrogênios, par-
de estádio clínico I. Como o nível de AFP se normalizou após ticularmente quando não compensada pela progesterona, cor-
a orquiectomia, não existe nenhuma doença oculta óbvia. En- rem alto risco de câncer endometrial. As mulheres obesas, as
tretanto, 20 a 50% desses pacientes irão apresentar doença nos tratadas com estrogênios sem oposição e aquelas com tumores
linfonodos retroperitoneais. Numerosos estudos clínicos não produtores de estrogênio (p. ex., tumores de células da granulo-
indicaram qualquer diferença de sobrevida global nessa coor- sa do ovário) correm maior risco de câncer endometrial. Além
te entre observação e dissecção de linfonodos retroperitoneais disso, o tratamento com tamoxifeno, que exerce efeitos anties-
(DLNRP). Devido aos efeitos colaterais potenciais da DLNRP, trogênicos no tecido mamário, porém efeitos estrogênicos no
a escolha de vigilância ou DLNRP baseia-se na patologia do epitélio uterino, está associado a um risco aumentado de câncer
tumor primário. Se o tumor primário não exibir qualquer evi- endometrial. A maioria das mulheres com tumores do corpo
dência de invasão linfática ou vascular e for limitado ao tes- do útero apresenta sangramento vaginal pós-menopausa, cau-
tículo, qualquer uma das opções é razoável. Entretanto, se for sado pela descamação do revestimento endometrial maligno.
constatada a ocorrência de invasão linfática ou vascular, ou se As mulheres na pré-menopausa frequentemente apresentam
o tumor se estender na túnica, no cordão espermático ou na sangramento atípico entre ciclos menstruais típicos. Esses si-
419
nais fazem com que uma mulher procure a assistência de um a ser uma meta e prazo razoáveis para a perda. O alvo inicial
profissional de saúde, de modo que a maioria das mulheres para perda de peso deve ser de cerca de 10% dentro de 6 me-
apresenta doença no estádio inicial, com tumor confinado ses. Nessa paciente, isso corresponde aproximadamente a uma
ao corpo do útero. Para pacientes com doença confinada perda de 10,8 a 11,5 kg no decorrer de 6 meses. Ela não seria
RESPOSTAS
QUESTÕES
ao útero, a histerectomia com remoção das tubas uterinas e capaz de alcançar o seu peso de 70 kg antes da gravidez dentro
ovários resulta em uma sobrevida de cinco anos de aproxi- de um prazo de pelo menos 18 a 24 meses. Muitos indivíduos
madamente 90%. têm dificuldade em manter uma dieta por um período exten-
so de tempo, particularmente quando se prescreve uma dieta
103. A resposta é C. (Cap. 16) De 2007 a 2008, os National Health específica e limitada. É mais importante que o indivíduo pen-
and Nutrition Examination Surveys (NHANES) verificaram se nas mudanças dietéticas que ocorrem junto com a perda de
que 68% da população adulta dos EUA estavam com sobrepe- peso como uma mudança em seu estilo de vida. Para obter uma
2
so ou com obesidade (IMC > 25 kg/m ). A compreensão do perda de peso de 0,5 a 1 kg semanalmente, o consumo de calo-
agravamento da obesidade nos EUA requer um entendimento rias precisa diminuir para cerca de 500 a 1.000 kcal por dia. A
dos fatores genéticos e ambientais que contribuem para o de- intervenção dietética específica depende de fatores pessoais. Os
senvolvimento da obesidade. É evidente que o rápido aumen- estudos realizados mostraram que as dietas pobres em carboi-
to na incidência de obesidade no país é muito maior do que dratos e ricas em proteínas (Atkins, South Beach, etc.) levam
o atribuído a mudanças na genética. Entretanto, determinados a uma maior perda de peso, melhor saciedade e diminuição
fatores genéticos certamente aumentam o risco de obesidade. dos fatores de risco de doença arterial coronariana em curto
Em geral, a obesidade é herdada como padrão não mendeliano, prazo; todavia, depois de 12 meses, não se observa nenhuma
semelhante à altura. Crianças adotadas apresentam IMC mais diferença entre as dietas. As dietas muito pobres em calorias (≥
relacionados com os de seus pais biológicos do que com os de 800 kcal/dia) constituem uma forma de terapia dietética mui-
seus pais adotivos. De modo semelhante, gêmeos monozigó- to agressiva, que utiliza fórmulas comerciais. Essas dietas têm
ticos têm IMC mais semelhantes do que os de gêmeos dizigó- por objetivo obter uma perda de peso de 13 a 23 kg no decor-
ticos. Alguns dos genes identificados que desempenham um rer de um período de 3 a 6 meses e só devem ser usadas por
papel no desenvolvimento da obesidade incluem os genes da indivíduos com obesidade e comorbidades clínicas, nos quais
leptina, pró-opiomelanocortina (POMC), hormônio de con- as abordagens conservadoras falharam. Em associação com as
centração de melanina, entre outros. A leptina é um hormônio modificações dietéticas, é também necessário recomendar ao
importante na obesidade, pois é produzido pelos adipócitos, e indivíduo iniciar um programa de exercícios. Embora o exercí-
atua no hipotálamo para diminuir o apetite e aumentar o gasto cio isolado possa levar a alguma perda de peso, ele não deve ser
energético. Nos seres humanos, mutações do gene ob levam a a única estratégia para perder peso. A quantidade recomendada
uma redução na produção de leptina, enquanto mutações do de atividade física é de 150 minutos de atividade de intensidade
gene db causam resistência à leptina. O resultado dessas mu- moderada ou 75 minutos de atividade de alta intensidade por
tações pode consistir em diminuição da produção da leptina semana. Pode-se considerar a farmacoterapia para a obesidade
2
ou resistência à leptina, de modo que o cérebro não é capaz de em indivíduos com IMC superior a 30 kg/m . Entretanto, as
reconhecer o estado de saciedade. Essas mutações geralmente opções para a farmacoterapia são atualmente limitadas. Muitos
estão associadas à obesidade grave que começa pouco depois dos novos medicamentos estão sendo objeto de ensaios clínicos
do nascimento. e poderão desempenhar um papel no futuro para a perda de
peso. A cirurgia bariátrica não deve ser considerada, a não ser
104. A resposta é A. (Cap. 16) Foram reconhecidas várias síndro- que as estratégias conservadoras para a perda de peso tenham
mes associadas ao desenvolvimento da obesidade. A síndrome fracassado.
de Prader-Willi encontra-se em uma categoria de síndromes de
obesidade associadas a retardo mental. Os indivíduos com sín- 106. A resposta é D. (Cap. 17) A cirurgia bariátrica deve ser con-
drome de Prader-Willi são de baixa estatura, com mãos e pés 2
siderada para indivíduos com IMC de 40 kg/m ou mais, ou
pequenos. Apresentam hiperfagia, obesidade e retardo do neu- 2
para aqueles com IMC de 35 kg/m ou mais se tiverem comor-
rodesenvolvimento em associação com hipogonadismo hipo- bidades clínicas graves, incluindo diabetes melito, hipertensão
gonadotrófico. Anormalidades endócrinas ou do hipotálamo ou hipercolesterolemia. O tratamento cirúrgico produz perda
também costumam estar associadas à obesidade. Os pacientes de peso por meio da redução da capacidade de ingestão ca-
com síndrome de Cushing têm obesidade central, hipertensão lórica e também pode causar má absorção, dependendo do
e intolerância à glicose. O hipotireoidismo está associado à procedimento escolhido. Existem duas amplas categorias de
obesidade, devido a diminuições da taxa metabólica; todavia, procedimentos para perda de peso: restritiva e restritiva disa-
trata-se de uma causa rara de obesidade. Os indivíduos com bsortiva. As cirurgias restritivas diminuem o tamanho do es-
insulinoma frequentemente são obesos, visto que aumentam o tômago para produzir uma sensação de saciedade precoce. O
seu consumo calórico tentando evitar episódios de hipoglice- procedimento original foi a gastroplastia com banda vertical,
mia. Por fim, pacientes com disfunção hipotalâmica devido à porém esse procedimento foi abandonado, em virtude da falta
presença de craniofaringioma ou outros distúrbios carecem da de eficácia encontrada em ensaios clínicos de longo prazo. Foi
capacidade de responder a sinais hormonais típicos que indi- substituída pela banda gástrica ajustável de silicone laparoscó-
cam saciedade e, portanto, desenvolvem obesidade. A acrome- pica (BGASL). Com esse tipo de cirurgia bariátrica, existe um
galia não está associada à obesidade. reservatório subcutâneo no qual a injeção ou a remoção de soro
fisiológico modificam o tamanho da abertura gástrica. Os pro-
105. A resposta é E. (Cap. 17) Com mais de 60% da população cedimentos restritivo-disabsortivos incluem o bypass gástrico
norte-americana acima do peso ou com obesidade, o médico em Y de Roux, o desvio biliopancreático e o desvio biliopan-
deve monitorar o peso e o IMC a cada consulta e fazer reco- creático com derivação duodenal. O procedimento em Y de
mendações sobre a perda de peso para evitar as complicações Roux constitui o procedimento de bypass mais comum. A per-
de longo prazo, como hipertensão, hipercolesterolemia e diabe- da média de peso após cirurgia bariátrica é de 30 a 35% do peso
tes melito. Apesar do conceito muito simples, segundo o qual corporal total, e 60% dos pacientes conseguem mantê-la por
o débito de energia precisa ser maior do que o aporte calórico 5 anos. Os procedimentos restritivos disabsortivos conseguem
é muito difícil para o indivíduo perder peso e mantê-lo. Um uma maior perda de peso do que os procedimentos restritivos.
fator inicial que predispõe o indivíduo a tentativas fracassadas Além disso, os procedimentos bariátricos levam a uma melho-
de perder peso é a incapacidade de compreender o que vem ra das condições comórbidas relacionadas com a obesidade.
420
A taxa de mortalidade global da cirurgia bariátrica é inferior advento dos bifosfonatos, a calcitonina só é utilizada nos ca-
a 1%, porém aumenta com a idade e a presença de condições sos graves de hipercalcemia, em virtude de seu rápido efeito.
comórbidas. Cerca de 5 a 15% dos indivíduos desenvolvem es- Os glicocorticoides podem ser úteis em pacientes com neo-
tenose do estoma ou úlceras marginais após a cirurgia, que se plasias malignas linfoides, visto que o mecanismo da hiper-
RESPOSTAS
QUESTÕES
manifestam na forma de náusea e vômitos prolongados. Não calcemia nessas condições frequentemente está relacionado
ocorre má absorção após os procedimentos restritivos. Os in- com a hidroxilação excessiva da vitamina D. Todavia, nesse
divíduos submetidos a procedimentos restritivos disabsortivos paciente com câncer de próstata, a dexametasona terá pouco
correm risco aumentado de deficiência de micronutrientes, efeito sobre o nível de cálcio e poderá exacerbar a alteração
como vitamina B12, ferro, folato, cálcio e vitamina D. É necessá- do estado mental.
ria uma suplementação dessas substâncias pelo resto da vida.
108. A resposta é E. (Cap. 24) Diversos hormônios são produzidos
107. A resposta é E. (Cap. 24) A hipercalcemia representa uma ectopicamente por tumores que podem causar doença sinto-
complicação oncológica comum do câncer metastático. Os mática. A produção eutópica de paratormônio (PTH) pelas
sintomas consistem em confusão, letargia, alteração do esta- glândulas paratireoides representa a causa mais comum de hi-
do mental, fadiga, poliúria e constipação intestinal. Indepen- percalcemia. Raramente a hipercalcemia pode ser causada por
dentemente da doença subjacente, o tratamento é semelhante. produção hiperparatireóidea ectópica, porém é mais frequen-
Esses pacientes frequentemente estão desidratados, visto que temente provocada pela produção da proteína relacionada com
a hipercalcemia pode causar diabetes insípido nefrogênico e, o paratormônio (PTH-rp) por tumores de células escamosas
com frequência, são incapazes de tomar líquidos por via oral. (cabeça e pescoço, pulmão e pele), de mama, geniturinários e
Por conseguinte, o principal manejo consiste em restabelecer a gastrintestinais. Essa proteína pode ser medida como ensaio
euvolemia. Com frequência, a hipercalcemia regride com hi- sérico. O hormônio antidiurético (ADH), que causa hiponatre-
dratação apenas. Os pacientes devem ser monitorados para hi- mia, é comumente produzido por tumores de pulmão (células
pofosfatemia. Na atualidade, os bifosfonatos constituem a base escamosas, pequenas células), gastrintestinais, geniturinários e
do tratamento, visto que eles estabilizam a reabsorção de cálcio de ovário. O hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), que cau-
do osso pelos osteoclastos. Entretanto, seus efeitos podem levar sa síndrome de Cushing, é comumente produzido por tumores
um a dois dias para se manifestarem. É preciso ter cuidado nos de pulmão (pequenas células, carcinoide brônquico, adenocar-
casos de insuficiência renal, visto que a administração rápida cinoma, células escamosas), timo e ilhotas pancreáticas e carci-
de pamidronato pode exacerbá-la. Uma vez obtida a euvole- noma medular da tireoide. O fator de crescimento semelhante à
mia, pode-se administrar furosemida para aumentar a calciure- insulina, que é secretado por tumores mesenquimais, sarcomas
se. A calcitonina por via nasal ou subcutânea ajuda ainda mais e tumores suprarrenais, hepáticos, gastrintestinais, renais ou de
a deslocar o cálcio para fora do espaço intravascular. Desde o próstata, pode causar hipoglicemia sintomática.
421
ÍNDICE
Os números de páginas em negrito indicam o início da discussão principal sobre o assunto. Os números de página seguidos das letras “f ” e “q” referem‑se, respectivamente, a
figuras e quadros.
A cérvice, 171 Alprostadil, para disfunção erétil, 179 Antagonistas do receptor de histamina
A1C. Ver Hemoglobina A1C endometrial, 172 Amenorreia H2, 177q
Abetalipoproteinemia, 255 Adeno-hipófise. Ver também Glândula diagnóstico de, 152, 152f Antagonistas do receptor de hormônio
Ablação com radiofrequência, para hipófise eixo hipotálamo-hipófise-gônadas na, do crescimento (GH), para
metástases hepáticas de tumor distúrbios da 152, 151f acromegalia, 32
neuroendócrino, 281 insuficiência. Ver Hipopituitarismo em distúrbios do útero ou trato de Antagonistas α-adrenérgicos, efeitos
ÍNDICE
Absorciometria com raios X de energia tumores. Ver Tumores de hipófise saída, 152 sobre a razão aldosterona-
dupla (DEXA) (adenomas) nos distúrbios de ovulação, 153 renina dos, 88q
na medida da massa óssea, 341, 398, expressão e regulação hormonal na, primária, 151 Antagonistas β-adrenérgicos
414 12, 12q secundária, 151 (β-bloqueadores)
no hiperparatireoidismo, 321 Adenoma, hipófise. Ver Tumores de Amil/butil nitrato, 178 efeitos adversos de, 176, 177q
Abuso de androgênio, 132–133 hipófise (adenomas) Amilina, no controle da glicose, 231 efeitos sobre a razão aldosterona-
Abuso ou dependência de álcool Adenoma de hipófise secretor de Amilorida renina do, 88q
(alcoolismo) hormônio tireoestimulante para excesso de mineralocorticoide, para feocromocitoma, 100
disfunção erétil no, 176 (TSH), 64 88 Antiandrogênios, para hirsutismo,
efeitos adversos do, 125, 177q, 179q Adenoma tóxico, 69–70, 70f para síndrome de Liddle, 88 166–167
hipoglicemia no, 244 Adenomas secretores de hormônio Aminoglutetimida, para síndrome de Anticolinérgicos, efeitos adversos de
Abuso sexual, disfunção sexual na fase estimulador da tireoide (TSH), Cushing, 35 disfunção erétil, 177q
adulta subsequente ao, 176, 38 Amiodarona, efeitos adversos da, 67 disfunção sexual feminina, 179q
179q Adenomiose, 154 Amostra venosa suprarrenal, 88, 87f Anticoncepcionais orais, 149
Acanthosis nigricans Adipócitos, 186, 186f Amostragem da veia petrosa inferior, características da, 148–150
na obesidade, 190 Adiponectina, 186, 201 na síndrome de Cushing, 34, 85 contraindicações para, 150, 150q, 166
na síndrome metabólica, 201 Adipostat, 189 Anágeno, 163 efeitos adversos de, 150, 150q
no diabetes melito, 224 Adipsina, 186 Análise de sêmen, 120, 147 na perimenopausa, 157
Acarbose, para diabetes melito, 232q, Adrenalectomia Análogos da somatostatina para amenorreia, 153
233 para excesso de mineralocorticoide, efeitos adversos de, 32 para dismenorreia, 154
Acetato de ciproterona 88, 87f para acromegalia, 31–32, 31f para hirsutismo, 166
efeitos adversos do, 166–167, 177q para síndrome de ACTH ectópica, 295 para adenomas secretores de para síndrome do ovário policístico,
para hirsutismo, 166 para síndrome de Cushing, 35, 85 TSH, 38 153
Acetato de noretindrona, na Adrenalectomia laparoscópica, 88, 87f Anandamida, 196 Anticorpo(s), resistência à insulina
perimenopausa, 157 Adrenoleucodistrofia, 92q, 92 Androgênio(s) por, 291
Acidente vascular encefálico, prevenção ADTs. Ver Antidepressivos tricíclicos abuso de, 132–133 Anticorpo(s) antifosfolipídio, avaliação
do, 158q, 160 (ADTs) ação de laboratorial de, 365q
Ácido acetilsalicílico, para tireoidite Aférese de lipoproteína de baixa distúrbios de, 112–114, 143q Anticorpos antitireoide,
subaguda, 65 densidade (LDL), 263 na regulação da função testicular, hipertireoidismo e, 291
Ácido graxos ômega-3 Agênese mülleriana, 114, 152 118, 118f Antidepressivos tricíclicos (ADTs)
efeitos adversos de, 261q Agentes alquilantes, efeitos adversos deficiência de efeitos adversos de
para distúrbios lipoproteicos, 202, de, 179q abordagem ao paciente, 127, 127f disfunção erétil, 176, 177q
261q, 262 Agonistas da dopamina fisiopatologia da, 126–127 obesidade, 191
Ácido mefenêmico efeitos adversos de, 26 ginecomastia por, 124 para neuropatia diabética, 220
para dismenorreia, 154 para acromegalia, 32 excesso de, 97, 163 Antígeno prostático específico (PSA)
para menorragia, 156 para disfunção ovulatória, 147 metabolismo de, 118, 118f terapia com testosterona e, 132
Ácido nicotínico para prolactinoma, 25–26 na esteroidogênese suprarrenal, 77f valores de referência, 374q
efeitos adversos do, 261q, 262 Agonistas do hormônio liberador de no crescimento e diferenciação de Anti-histamínicos, efeitos adversos de,
para distúrbios lipoproteicos, 202, gonadotrofina (GnRH), 35, pelo, 163 179q
262, 261q 392, 403 síntese de Antropométricos, 184, 191
Ácido ursodesoxicólico, 195 hipotalâmico, 12, 13f, 35 distúrbios de, 112, 143q Apetite, 187, 187f
Ácido(s) graxo(s), livre, na resistência à mutações no receptor, 124 na regulação da função testicular, Apneia do sono obstrutiva
insulina, 199 na regulação da função ovariana, 117, 117f na síndrome metabólica, 201
Áclase diafisária, 363 140–141, 141f vias para, 112f obesidade e, 190
Acne, 114 para hipogonadismo, 36 suprarrenal, para insuficiência Apolipoproteína B
Acondrodisplasia, 363 síntese defeituosa de. Ver Síndrome de suprarrenal, 94 ApoB-100, defeituosa familiar, 251q,
Acromegalia, 29 Kallmann usos farmacológicos de, 127 252
avaliação laboratorial da, 31 teste com agonista, 165 Andropausa, 127 níveis baixos de, 255
diagnóstico de, 30, 391, 404 teste de estimulação, 119 Androstenediona, no hirsutismo, 165 níveis elevados de, 250–253, 251q,
etiologia da, 30, 30q AIRE (regulador autoimune), 92q, 333 Anel vaginal, mensalmente, 149q, 149 254q
familiar, 18 Albumina, na hipercalcemia, 313 Anorexígenos Apolipoproteína E, 248q
hirsutismo na, 163 Aldosterona para perda de peso, 195 Apolipoproteína(s), 248, 248q
manifestações clínicas da, 30, 30f excesso de, remediável com para síndrome metabólica, 201 Apoplexia da hipófise, 15, 93q
paraneoplásica, 293q glicocorticoide, 86, 88 Anormalidades/distúrbios Aquaporinas, 40f, 42
testes de triagem para, 21q na esteroidogênese suprarrenal, 80, cromossômicos 2-Araquidonil glicerídeo, 196
tratamento de, 31–32, 31f 81f em cromossomos sexuais, 107q, 108, ARG (aldosteronismo remediável por
Acropaquia da tireoide, 61f, 62 Aldosteronismo remediável por 106f glicocorticoide), 86, 88
ACTH. Ver Hormônio glicocorticoide (ARG), 86, 88 Anovulação, 151 Arginina-vasopressina (AVP), 39
adrenocorticotrófico Alendronato Ansiedade ação da, 39, 40f
(ACTH) efeitos adversos do, 350 disfunção erétil e, 176 deficiência de, 18q. Ver também
ACTHoma, 267q no tratamento/prevenção da disfunção sexual feminina e, 180 Hipernatremia adipsíca;
Acupuntura, para dismenorreia, 154 osteoporose, 350, 352f, 355 Antagonistas de receptor de Diabetes insípido (DI)
ADAMTS 13, 365q para doença óssea de Paget, 359q canabinoide, para perda de estrutura da, 30f
Adenocarcinoma Alopécia, andrógenética, 163 peso, 196 metabolismo da, 40
422
na sede, 40 Bupropiona, 196 tipo II, 168 em pacientes com nódulo tireóideo,
produção ectópica de. Ver Síndrome Bypass gástrico em y de Roux, 196, 197f, Câncer de endométrio, 172 71, 71q
de antidiurese inapropriada 420–421 epidemiologia do, 172 fatores de risco para, 71, 71q
(SIAD) estadiamento do, 169q, 173 fatores genéticos no, 71–73, 72q
secreção de, 39 fatores de risco para, 172, 403, 420 folicular, 70q, 71q, 73, 73f
secreção excessiva e ação da, 45 C fatores genéticos no, 172 incidência de, 71, 71f
síntese da, 39 CA-125, no câncer de ovário, 168 manifestações clínicas do, 173 medular
Ascite, no câncer de ovário, 168 Cabergolina patologia do, 171 em NEM 2, 75, 287, 287f, 288–289
Aspectos psicossociais, no diabetes efeitos adversos da, 26 prognóstico do, 169q, 173 estadiamento do, 71q
melito, 237 para acromegalia, 32 terapia hormonal pós-menopausa e, familiar, 75
Atividade física, energia requerida para prolactinoma, 25–26 157, 158q prevalência do, 70q
para, 184 Calcificação tratamento de, 173, 420 síndromes paraneoplásicas no, 293q
Atleta(s), abuso de androgênio em, distrófica, 363q tumor de células da granulosa e, 170 papilares, 70q, 71q, 73, 73f
132–133 extraesquelética, 55q, 363–364 Câncer de mama patogenia do, 71–73
Atorvastatina, para hiperlipidemia, 261q metastática, 363, 363q síndromes paraneoplásicas no, 293q taxas de sobrevida, 73, 73f
Atrofia muscular espinobulbar, 125 Calcinose tumoral, 363–364 terapia hormonal pós-menopausa e, tratamento de
Ausência congênita da vagina, 115 Calcinose circunscrita, 364 157, 158q, 157 cirurgia, 73–74
AVP. Ver Arginina-vasopressina (AVP) Calcinose universal, 364 Câncer de ovário, 168 inibidores de quinase, 75
Cálcio, 312 epidemiologia do, 168 terapia com iodo radioativo, 75
ÍNDICE
deficiência de. Ver Hipocalcemia epitelial, 168 terapia supressora de TSH, 74
B excesso de. Ver Hipercalcemia estadiamento do, 169, 169q triagem e avaliação de, 10q
Baixa estatura extracelular, 312, 312f etiologia do, 15 Câncer de trompa de Falópio, 171
diagnóstico de, 29 homeostasia do, 300, 300f fatores de risco para, 168 Câncer pancreático, síndromes
etiologia da, 28 ingesta de, 301 fatores genéticos no, 168 paraneoplásicas no, 293q
manifestações clínicas de, 29 ingesta recomendada de, 347, 348q, fatores protetores para, 168 Câncer renal, síndromes
na síndrome de Turner, 110 349 incidência de, 168 paraneoplásicas no, 293q
nutricional, 29 metabolismo do, 300, 300f manifestações clínicas do, 168 Câncer tímico, síndromes
psicossocial, 29 suplementos marcadores tumorais no, 168 paraneoplásicas no, 293q
tratamento de, 29 para hipocalcemia, 314 patologia do, 168 Captação de iodo radioativo, na
Baixa estatura nutricional, 29 para tratamento/prevenção da prognóstico do, 169q, 170 avaliação da disfunção de
Baixa estatura psicossocial, 29 osteoporose, 347–349, 348q recorrente, 169–170 tireoide, 54–55
Balanço energético, regulação fisiológica preparações orais, conteúdo de, síndrome do câncer de mama/ovário, Carbamazepina, efeitos adversos da, 191
do, 184, 187f 348q 168 Carbimazol
Banco de sêmen, 138 Calcitonina, 317 síndromes paraneoplásicas no, 293q efeitos adversos do, 63
Banda gástrica ajustada de silicone por ações de, 317, 351 terapia hormonal pós-menopausa e, para doença de Graves, 62
laparoscopia, 196, 197f, 420 atividade hipocalcêmica da, 318 158q, 160 Carboplatina
deficiência de, 256 fontes de, 318 tratamento de, 169–170 para câncer de ovário, 169
Barreiras anticoncepcionais, 149q, 148 níveis circulantes de, 318 triagem para, 168 para câncer de testículo, 137, 138
Benzfetamina, para perda de peso, 195 no tratamento/prevenção da tumores de células germinativas, 170 Carboxipeptidase E, 187q, 187
Bevacizumabe, para câncer de ovário, 169 osteoporose, 351 tumores medulares sexuais, 170 Carcinoides bronquiais, 268q, 271
bFGF (fator de crescimento de para doença óssea de Paget, 358–359, Câncer de pele, síndromes Carcinoides de apêndice, 268q, 270, 275
fibroblasto básico), 17 359q paraneoplásicas no, 293q Carcinoides gástricos, 268q, 271, 275
Biguanidas para hipercalcemia, 294, 330q, 331, Câncer de próstata Carcinoides retais, 268q, 271, 275
ação da, 232q 415 disfunção erétil após o tratamento de, Carcinoma adrenocortical, 88, 89–90,
contraindicações às, 232q produção ectópica de, 293q 176 90q, 91f
efeitos adversos da, 231, 232q Calcitriol síndromes paraneoplásicas no, 293q Carcinoma de célula escamosa,
para diabetes melito tipo 2, 231, 232q para hiperparatireoidismo secundário, terapia com testosterona e, 132 endométrio, 173
para resistência à insulina, 203 328 Câncer de pulmão, síndromes Carcinoma de linha média de
Bisfosfonatos para hipocalcemia, 314, 338 paraneoplásicas no, 292, 293q histogênese indeterminada, 138
ação do, 350 Calculadoras FRAX, na avaliação do Câncer de testículo, 134 Carcinoma embrionário
para doença óssea de Paget, 358, risco de fratura, 347, 348f classificação do risco no, 137, 137q ovariano, 170
359q, 418 Cálculo biliar(s) epidemiologia do, 134 paraselar, 20
para hipercalcemia, 294, 314, obesidade e, 190 estadiamento do, 134, 136f testicular, 134
331, 330q prevenção com ácido etiologia do, 134 Carcinoma hepatocelular, síndromes
para tratamento/prevenção da ursodesoxicólico, 195 fatores genéticos no, 134 paraneoplásicas no, 293q
osteoporose, 350–351, 352f, 355, Canabinoide(s), 196 incidência de, 134 Cardiopatia congênita (CC), na
417 Câncer. Ver também Sítios e tipos manifestações clínicas do, 134 síndrome de Turner, 110
Bleomicina específicos marcadores tumorais em, 134, Catágeno, 163
efeitos adversos da, 137 obesidade e, 190 402, 419 Caxumba, orquite na, 124
para câncer de testículo, 137 síndromes paraneoplásicas, 292, 293q não seminoma, 134, 137q CCK (colecistocinina), 185
para doença trofoblástica Câncer cervical, 171 patologia do, 134, 136f Célula de Leydig
gestacional, 173 considerações globais, 171 seminoma, 134, 137q na regulação da função testicular, 117,
para tumores de célula germinativa epidemiologia do, 171 síndromes paraneoplásicas no, 293q 117f
ovariana, 171 estadiamento do, 169q, 172, 172f tratamento de na síntese de androgênio, 117
Bloqueadores de canal de cálcio etiologia do, 171 cirurgia pós-quimioterapia, 137 Célula(s) germinativa(s)
efeitos adversos do, 176 fatores de risco para, 171 infertilidade após, 138 ovariana, 140, 140f
disfunção erétil, 177q fatores genéticos no, 171 não seminoma em estágio I, 134, primordial, 139, 140f
disfunção sexual feminina, 179q HPV no, 171 136f, 137, 402, 419 Cetanserina, para diarreia na síndrome
edema periférico, 191 incidência de, 171 não seminoma em estágio II, 136f, carcinoide, 274
efeitos sobre a razão aldosterona- manifestações clínicas do, 171 137 Cetoacidose diabética (CAD), 212
renina do, 88q prevenção do, 171 não seminoma em estágios I e II, dados de mortalidade, 214–215
Bloqueadores do receptor de prognóstico do, 169q 136f, 137 diagnóstico de, 212q, 213, 395, 409
angiotensina síndromes paraneoplásicas no, 293q quimioterapia de salvamento, 138 fisiopatologia da, 213, 410
efeitos na razão aldosterona-renina tratamento de, 172 quimioterapia orientada pelo risco, manifestações clínicas da, 212–213,
dos, 88q triagem para, 171 137, 137q 212q, 396, 410
para hipertensão na síndrome Câncer colorretal, prevenção do, 158q, quimioterapia para doença tratamento de, 213–215, 214q, 410
metabólica, 203 160 avançada, 137 Cetoconazol
para nefropatia diabética, 219 Câncer de cabeça e pescoço, síndromes Câncer de tireoide, 71 efeitos adversos do, 35
Bromocriptina paraneoplásicas no, 293q anaplásica, 71q, 75 interações farmacológicas de, 178
efeitos adversos da, 26 Câncer de colo hereditário não poliposo avaliação laboratorial de, 71 para hipercalcemia, 313
para acromegalia, 32 (HNPCC) bem diferenciado, 70q, 71q, 73 para síndrome de ACTH ectópica, 295
para diabetes melito tipo 2, 232q, 234 câncer de endométrio no, 172 classificação do, 71, 70q, 71q para síndrome de Cushing, 35, 85
para prolactinoma, 26 câncer de ovário no, 168 cuidados de seguimento, 75, 74f Cetoprofeno, para dismenorreia, 154
423
CETP (proteína de transferência de efeitos adversos de, 232q, 234, 261q DCHH (deficiência combinada de Deprivação do sono, 186
ésteres de colesteril), 249f para diabetes melito tipo 2, 232q, 234 hormônios hipofisários), 93q Derivados do ácido fíbrico
deficiência de, 257 para hiperlipidemia, 261q DDAVP. Ver Desmopressina (DDAVP) efeitos adversos do, 261q, 262
Ciclo circadiano, 7 Colesterol, transporte reverso de, Deficiência combinada de hormônios para distúrbios lipoproteicos, 261q,
Ciclo menstrual 248–249, 249f hipofisários (DCHH), 93q 262
duração do, 6, 7 Colestipol Deficiência de 17α-hidroxilase para síndrome metabólica, 202
fase folicular do, 143, 143f efeitos adversos de, 261q hipogonadismo hipergonadotrófico Dermatofibrose lenticular disseminada,
fase lútea do, 143 para hiperlipidemia, 261q na, 163 361
integração hormonal do, 142, 143f para síndrome metabólica, 202 manifestações clínicas da, 97q, 112, Dermopatia da tireoide, 61, 61f, 64
relações entre gonadotrofinas, Colestiramina 143q Desalogenase 1, 49q
desenvolvimento do folículo, efeitos adversos da, 261q marcadores diagnósticos de, 97q Desejo sexual hipoativo, feminino, 180
secreção gonadal e alterações para hiperlipidemia, 261q Deficiência de 21-hidroxilase clássica. Desenvolvimento do sexo
endometriais durante, 143, 143f para síndrome metabólica, 202 Ver Hiperplasia suprarrenal componentes do, 106–108, 106f
Ciclofosfamida Coma do mixedema, 60, 393, 406 congênita (HSRC) distúrbios do, 107q, 108
efeitos adversos da, 177q, 397, 411 Condrodisplasia de Blomstrand letal, diagnóstico de, 166 normal, 106, 108f
para câncer de testículo, 138 326f manifestações clínicas da, 97q, 113, regulação genética do, 106f
para doença trofoblástica gestacional, Conivaptana, para SIAD, 47, 295 114q Desenvolvimento gonadal, 106–107,
173 Contracepção, 148 marcadores diagnósticos da, 97q 106f
para feocromocitoma maligno, 101 DIUs, 149q, 148 perdedora de sal, 113 Desidroepiandrosterona (DHEA)
ÍNDICE
Ciclosporina efeitos da obesidade na, 150 virilizante simples clássica, 113 no hirsutismo, 165
efeitos adversos da, 163 efetividade da, 149q, 148–150, 397, Deficiência de 3β-hidroxiesteroide para insuficiência suprarrenal, 96
monitoração terapêutica da, 376q 412 desidrogenase, 97q, 111, 143q Desmopressina (DDAVP)
Cifoplastia, 355 esterilização, 149q, 148 Deficiência de 5α-redutase de tipo estrutura da, 39f
Cimetidina métodos com barreira, 149q, 148 2, 111 para diabetes insípido, 43–44, 43f
efeitos adversos da métodos hormonais, 149q, 148–150, Deficiência de ABCA1 (doença de para hipernatremia adipsíca, 44
disfunção erétil, 177q 149q Tangier), 256 Desnutrição, deficiência de
disfunção sexual feminina, 179q adesivos semanais, 149q, 149 Deficiência de apolipoproteína A-V, gonadotrofina por, 123
interações farmacológicas da, 178 de longa duração, 149q, 148 251q, 253 Desoxicorticosterona (DOC), 77f, 80, 86
Cipro-heptadina, para síndrome de masculina, 131 Deficiência de apolipoproteína C-II Desvio biliopancreático, 196, 197f
Cushing, 35 métodos novos, 149q, 148 fatores genéticos na, 251q, 252 Detumescência, 176f, 175
Circunferência da cintura, 191, 193q pós-coito, 148–150 manifestações clínicas da, 251q, 252 DEXA. Ver Absorciometria com raios X
na síndrome metabólica, 198q, 200 Contracepção de emergência, 150 Deficiência de apolipoproteína(a)-I, 256 de energia dupla (DEXA)
Cirrose Controle glicêmico Deficiência de aromatase, 153 Dexametasona, para HSRC, 97, 166
atrofia testicular na, 124 de longa duração, avaliação do, 228 Deficiência de glicose-6-fosfato Diabetes do jovem com início na
ginecomastia na, 124 na síndrome metabólica, 203 desidrogenase (G6PD), 366q maturidade (MODY),
Cirurgia bariátrica nefropatia diabética e, 219 contrarregulação, 240, 241f, 241q 204, 205q
banda gástrica ajustável, 196, 197f no diabetes melito, 217, 227–228 homeostasia, 204, 204f, 207–08 fatores genéticos no, 212
complicações da, 197 retinopatia diabética e, 217, 217f secreção de insulina e, 207, 207f manifestações clínicas do, 212
para obesidade, 194q, 196–197, 197f, Controle por retroalimentação tolerância Diabetes insípido (DI), 40
403, 420 positivo, 6 comprometida, 200 diagnóstico diferencial de, 42–43, 42f,
para síndrome metabólica, 202 na regulação hormonal, 6–7, 6f normal, 394, 409 392
Cirurgia transesfenoidal negativo, 6–7, 392, 403 Deficiência de GPIHP1, 251q, 253 dipsogênico, 40
para acromegalia, 32 Cordoma, 19 Deficiência de hormônio do etiologia do, 40–42, 41q
para síndrome de Cushing, 34, 85 Cordomas em sela, 19 crescimento (GH) fisiopatologia do, 42
para tumores de hipófise, 21–22, 22f, Coriocarcinoma. Ver também Doença em adultos hipófise (central, neuro-hipofisária),
37 trofoblástica gestacional diagnóstico de, 29, 28q 40–42, 41q
Cisplatina cromossômica sexual, 106, 106f manifestações clínicas da, 29, 28q, manifestações clínicas do, 40, 392, 405
efeitos adversos da, 137 ovariano, 170 391, 404 nefrogênico, 41q, 42, 405
para câncer cervical, 172 parasselar, 19 tratamento de, 18q, 29, 29f tratamento de, 43–44, 43f, 392, 405
para câncer de testículo, 137, 138 síndromes paraneoplásicas no, 293q em crianças Diabetes melito (DM), 204
para doença trofoblástica gestacional, testicular, 134 avaliação laboratorial de, 29 abordagem ao paciente, 225
173 Córtex suprarrenal fisiopatologia da, 28 aspectos psicossociais do, 237
para tumores de célula germinativa distúrbios da, 77 manifestações clínicas da, 29 aspectos reprodutivos no, 238
ovariana, 171 hormônios produzidos pelo, 77 tratamento de, 18q, 29 avaliação laboratorial do, 206, 232q
Cisto de Rathke, 19 Corticosteroides. Ver idiopática, 28 biossíntese, secreção e ação da
Cisto ovariano, tratamento de, 154 Glicocorticoide(s) Deficiência de hormônio do insulina no, 207–209, 207f
Cistopatia, diabética, 221 Corticotropo, 12q, 18q crescimento do adulto. Ver CAD por. Ver Cetoacidose diabética
Cistos araquinoides, 19 Cortisol Deficiência de hormônio do (CAD)
Cistos da tireoide, 71 na esteroidogênese suprarrenal, 80, crescimento (GH), em adultos classificação do, 204, 205q, 205q
Cistos dermoides, 170 81f, 81f Deficiência de lipase hepática familiar, complicações do
Citocina(s) avaliação laboratorial de, 78, 94 251q, 253 aguda, 212
na síndrome metabólica, 200–201 deficiência, hipoglicemia na, 244 Deficiência de lipoproteína lipase (LPL), controle glicêmico e, 217, 217f
na síntese de hormônio da tireoide, 51 Creatinoquinase, MB, valores de 251q, 252 crônica, 216, 216q
Citrato de clomifeno referência, 370q Deficiência de P450 oxidorredutase, 97q mecanismos do, 216
para disfunção ovulatória, 147 Creme de eflornitina, para hirsutismo, Deficiência de PCSK9, 255 membro inferior, 222–223, 236, 395,
para síndrome do ovário policístico, 167 Deficiência de11β-hidroxilase 410
153 Crescimento manifestações clínicas da, 97q renal. Ver Nefropatia diabética
Classificação de Frederickson, das distúrbios do, 28 marcadores diagnósticos da, 97q retinopatia. Ver Retinopatia
hiperlipoproteinemias, 250, hormônios no, 5 Deficiência idiopática de hormônio do diabética
250q somático, maturação esquelética e, 2 crescimento (IGHD), 28 considerações globais, 205, 206f
Clonidina Crescimento folicular, 140, 139f Deiodinase(s), 48f, 52 definição de, 204
efeitos adversos da, 177q Cretinismo, 50, 392, 406 Demeclociclina, para SIAD, 47, 295 diagnóstico de, 205, 206f, 206q, 395,
para sintomas menopáusicos, 157 Crianças, doença de Graves em, 63 Demência, prevenção da, 158q, 160 408–409
Cloranfenicol, monitoração terapêutica Criptorquidismo, 124 Denosumabe disfunção erétil na, 176, 176, 221
do, 376q Crise carcinoide, 398, 413 ação do, 351–353 disfunção sexual feminina na, 180
Cloroquina, para hipercalcemia, 313 para tratamento/prevenção da dislipidemia na, 222
Cobalamina (vitamina B12), faixa de osteoporose, 351–353, 353f distúrbios lipoproteicos no, 257
referência para, 379q D Densidade energética, do alimento, 195 doença cardiovascular no
Cobre, valores de referência, 379q DAC. Ver Doença arterial coronariana Densitometria, 184 dados de morbidade e mortalidade,
Cocaína, efeitos adversos da, 177q (DAC) Depilatório, 166 221
Colecistite, induzida por jejum, 190 Dacarbazina, para feocromocitoma Depressão/transtornos depressivos, fatores de risco para, 222
Colecistocinina (CCK), 185 maligno, 101 disfunção sexual em, 176, 180 doença gastrintestinal no, 220–221
Colesevelam DAX1, 78 tireoidite de Quervain, 65, 394, 407 doença geniturinária no, 220–221
424
EHH por. Ver Estado hiperosmolar triagem e avaliação do, 10q fisiologia da, 179–180 fisiopatologia de, 7
hiperglicêmico (EHH) tipo(s) de, 204, 205q tratamento de, 180–181 paraneoplásico, 292, 293q
ejaculação retrógrada no, 221 tratamento de, 225 Disgênese gonadal, 110, 143q tipos de, 7, 8q
em paciente internados, 237 aspectos atuais do, 236, 236q Disgênese gonadal mista, 109q, 110 triagem e avaliação de, 9, 10q
epidemiologia da, 205, 395, complicações do, 236 Disgerminoma Distúrbios lipoproteicos, 250
408–409 controle glicêmico no, 227–228 encéfalo, 20 classificação de Frederickson de, 250,
etiologia da, 205q cuidados abrangentes no, 225 ovariano, 170 250q
exame físico no, 225 durante a terapia nutricional Dislipidemia. Ver Distúrbios com ApoB baixa
fatores genéticos no, 211 parenteral, 238 lipoproteicos deficiência de PCSK9, 255
fulminante, 204 educação do paciente no, 226 Dismenorreia, 154 hipobetalipoproteinemia familiar,
gestacional, 204, 238 em pacientes internados, 237 Disopiramida, efeitos adversos da, 177q 255
hipertensão e, 222 equipe multidisciplinar no, 225 Dispareunia, 180 com HDL-C baixa
hipoglicemia no. Ver Hipoglicemia, exercício no, 227 Displasia(s) deficiência de LCAT, 256
no diabetes melito metas para, 225, 226q cleidocraniana, 298 deficiência genética de apoA-I, 256
história no, 225 monitoração da glicemia no, de osso doença de Tangier, 256
homeostasia da glicose do, 204, 204f 227–228 fibrosa. Ver Displasia fibrosa hipoalfalipoproteinemia primária,
incidência de, 205, 206f princípios de, 225 osteocondrodisplasias, 362–363 257
infecções no, 224 terapia com glicocorticoide e, 238 paquidermoperiostose, 362–363 com HDL-C elevada
lipodistrófico, 238 terapia nutricional médica em, 227, síndrome de McCune-Albright. Ver com LDL-C elevada e triglicerídeos
ÍNDICE
manifestações cutâneas de, 224 226q Síndrome de McCune-Albright normais, 250q, 250–253
nutrição parenteral no paciente com, terapias emergentes, 236 diafisária progressiva, 360 ApoB-100 defeituosa familiar, 252
238 triagem para, 207 hipófise, 14 autossômica dominante
prevalência do, 206f Diabetes melito dependente de insulina. Displasia cleidocraniana, 298 hipercolesterolemia autossômica
resistente à insulina, 291 Ver Diabetes melito, tipo 1 Displasia diafisária progressiva, 360 recessiva, 252
síndrome metabólica e, 199, 201 Diabetes melito não dependente Displasia fibrosa hipercolesterolemia familiar,
tipo 1 insulina. Ver Diabetes melito, avaliação laboratorial de, 362–363 250–252
fatores ambientais no, 208f, 209 tipo 2 fatores genéticos na, 362 hipercolesterolemia poligênica, 252
fatores genéticos no, 208–209 Diacetato de etinodiol, para hirsutismo, manifestações clínicas da, 362 hipercolesterolemia por mutações
fisiopatologia do, 208, 208f 166 radiografia de, 362, 362f em PCSK9, 252
hipertensão no, 219 Diálise peritoneal tratamento de, 362 sitosterolemia, 252
marcadores imunológicos no, 209, para hipercalcemia, 332 Displasia septo-óptica, 14 com lipoproteína(a) elevada, 252
395, 409 Diarreia, paraneoplásica, 293q Dispositivo clitoridiano à vácuo, 181 com triglicerídeos elevados, 250q, 253
prevenção do, 209 Dieta Dispositivo de constrição a vácuo, para deficiência de ApoA-V, 253
tratamento de, 228 densidade energética da, 195 disfunção erétil, 179 deficiência de GPIHBP1, 253
agentes de controle glicêmico para distúrbios lipoproteicos, 260 Dispositivos intrauterinos (DIUs), deficiência de lipase hepática, 253
para, 231 Dieta Atkins, 193 149q, 148 disbetalipoproteinemia familiar, 253
amilina para, 231 Dieta da zona, 193 Dissecção de linfonodo retroperitoneal, hiperlipidemia combinada familiar,
aspectos gerais do, 226q, 228 Dieta de baixíssima caloria, 195 para câncer de testículo, 136, 254–255
nível de controle glicêmico-alvo, Dieta de South Beach, 193 137 hipertrigliceridemia familiar,
228 Dieta de Sugar Busters, 193 Dissomia parental, 173 253–254
pramlintida para, 231 Dieta pobre em carboidrato, 193 Distúrbio de dor sexual, 180 na síndrome metabólica, 200, 202
preparações de insulina, 229, 229q Dietilpropiona, para perda de peso, 195 Distúrbio de excitação sexual, feminino, síndrome da quilomicronemia
regimes de insulina, 229–230, Diidrotestosterona, 165 180 familiar, 252
230q 1,25-Diidroxivitamina D. Ver também Distúrbios 44, XI, 110–114, 143q, 112f deficiência de CETP, 257
tratamento intensivo, 228, Vitamina D Distúrbios 46, XX, 113, 114q, 114 diagnóstico de, 258
395, 410 ação da 308f, 309, 309f, 312, 312f Distúrbios da coagulação, avaliação disfunção erétil em, 176
tipo 2 superprodução de, 293, 293q, 312, laboratorial de, 365–368q formas secundária, 254q
anormalidades metabólicas no, 210, 313q, 313 Distúrbios da hipófise associada a fármaco, 254q, 257
210f Dilatação vaginal, 152 anterior consumo de álcool e, 257
fatores de risco para, 207, 207q, DIP (doença inflamatória pélvica), 154, insuficiência. Ver Hipopituitarismo diabetes melito e, 257
395, 409 154q tumores. Ver Tumores da hipófise distúrbios hepáticos e, 257
fatores genéticos no, 210 Disbetalipoproteinemia familiar (adenomas) distúrbios renais e, 257, 401, 419
fisiopatologia do, 210, 210f (doença do β amplo), 251q, 253 posterior doença da tireoide e, 257
hipertensão no, 219 Discondroplasia, 363 diabetes insípido. Ver Diabetes doenças de armazenamento
inibidores de α-glicosidase, 232q, Disfunção erétil, 176 insípido (DI) lisossomal e, 257
233 abordagem ao paciente, 10q, 177–178, hipernatremia adípsica. Ver estrogênio e, 257
agentes redutores de glicose, 177f Hipernatremia, adípsica na obesidade, 257
231–234, 232q, 233q, 235f endocrinológica, 176 Distúrbios da tireoide, 53 na síndrome de Cushing, 257
biguanidas, 231, 232q epidemiologia da, 176 câncer. Ver Câncer de tireoide hiperalfalipoproteinemia familiar, 257
bromocriptina, 232q, 234 exame físico na, 178 distúrbios lipoproteicos em, 257 no diabetes melito, 222. Ver também
resinas de ligação de ácido biliar, fármacorrelacionada, 176–177, 177q exames laboratoriais de Síndrome metabólica
232q, 234 fisiopatologia da, 176 anticorpos TPO, 54 prevalência de, 10q
secretagogos de insulina, 231–233, história na, 177–178 captação de iodo radioativo e tratamento de, 259
232q, 233q neurogênica, 176 varredura da tireoide, 54–55 abordagem clínica de, 259
seleção dos agentes iniciais, 235, no diabetes melito, 176, 176, 221 medida do hormônio da tireoide, ácido graxos ômega-3, 261q, 262
235f prevalência da, 10q 53–54 ácido nicotínico, 262, 261q
terapia com insulina, 232q, 234 psicogênica, 176 níveis de Tg, 54 aférese de LDL, 263
terapia combinada, 235 tratamento de, 178, 178q ultrassonografia, 55 alimentos e aditivos dietéticos, 260
tiazolidinedionas, 232q, 234 agentes orais, 178 hipertireoidismo. Ver derivados do ácido fíbrico, 261q,
músculo e metabolismo de gordura alprostadil, 179 Hipertireoidismo 262
no, 210 dispositivos de constrição a vácuo, hipertireoidismo. Ver estatinas, 261, 261q
obesidade e, 189–190 179 Hipertireoidismo inibidores da absorção de colesterol,
prevalência do, 10q educação do paciente, 178 nodular. Ver Nódulo tireóideo 261, 261q
prevenção do, 158q, 160, 211, 395, prótese peniana, 179 Distúrbios de reprodução feminina modificação da dieta, 260
409 terapia com androgênio, 178 insuficiência ovariana primária, 153 modificações do estilo de
produção de glicose hepática no, terapia sexual, 179 Distúrbios do desenvolvimento sexual, vida, 260
211 vasculogênica, 176 108. Ver também Distúrbios na síndrome metabólica, 202
produção de lipídeos no, 211 Disfunção ovulatória, 147, 153 específicos para diminuição do risco C, 258
secreção de insulina comprometida Disfunção sexual, 175 considerações globais, 115 sequestradores de ácido biliar,
no, 210, 210f Disfunção sexual feminina, 179 ovotesticular, 109q, 110 261–262, 261q
síndromes de resistência à insulina abordagem à paciente, 180 Distúrbios endócrinos terapia farmacológica combinada,
no, 211 epidemiologia da, 179 abordagem ao paciente, 8–9, 10q 263
tratamento de, 231, 231f, 395, 410 fatores de risco para, 179q etiologia de, 8q tratamento da HDL–C baixa, 263
425
tratamento da lipoproteína(a) dados de morbidade e mortalidade, complicações da, 357 Efeito do halo azul, 178
elevada, 263 221 diagnóstico da, 357, 358f, 358f, 401, Efeito Jod-Basedow, 67, 69
triagem para fatores de risco para, 222 417–418 Efeito Wolff-Chaikoff, 51, 64, 67
classificação dos resultados, 380q tratamento de, 222 doença cardiovascular e, 357 EHH (estado hiperosmolar
recomendações, 10q, 257 obesidade e, 190 doenças associadas com, 357 hiperglicêmico). Ver Estado
Distúrbios menstruais, 151 síndrome metabólica e, 201 epidemiologia da, 356 hiperosmolar hiperglicêmico
definição de, 151 terapia com testosterona e, 132 etiologia da, 356, 356f (EHH)
diagnóstico de, 152, 152f Doença da paratireoide, 315 fatores genéticos na, 356 EHNA. Ver Esteato-hepatite não
dismenorreia, 154 hipercalcemia na, 312 fisiopatologia da, 356f alcoólica (EHNA)
epidemiologia de, 151 Doença da vesícula biliar, terapia fraturas e, 357 Eixo hipotálamo-hipófise-gônadas, 151f
obesidade e, 190 hormonal pós-menopausa e, juvenil, 356 Eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal,
Distúrbios ovotesticulares do 158q, 159 manifestações clínicas da, 357, 417–418 78, 78f, 392, 403
desenvolvimento sexual, Doença de Addison. Ver Insuficiência tratamento de, 358–359, 359q, Eixo hipotálamo-hipófise-testículos,
109q, 110 suprarrenal 401–402, 418 117, 117f
Distúrbios reprodutivos masculinos, Doença de Albers-Schonberg, 359 Doença óssea Eixos hipofisários, 13f
119 Doença de Bourneville. Ver Esclerose doença de Paget. Ver Doença óssea de Ejaculação, 176
avaliação de tuberosa Paget esclerosante, 358 precoce, 176
análise de sêmen, 120 Doença de Camurati-Engelmann, 360 associada à infecção por HCV, 361 retrógrada, 175, 221
biópsia testicular, 120 Doença de Cushing displasia diafisária progressiva, 360 Elementos de resposta da tireoide,
ÍNDICE
ensaios de testosterona, 120 definição de, 81–82 hiperostose cortical generalizada, 52, 53f
história e exame físico, 119 testes de triagem para, 21q 360 Eletrólise, para remoção de pelo, 166
infertilidade, 119, 147 tratamento de, 85 melorreostose, 360–361 Embolia arterial hepática, para
medidas de gonadotrofina e inibina, vs. síndrome de Cushing, 81–82 osteopetrose. Ver Osteopetrose síndrome carcinoide, 275, 281
119 Doença de Dent osteopoiquilose, 361 Encondromatose, 363
na fase adulta, 123 fatores genéticos na, 303 picnodisostose, 360 Endocanabinoides, 196
ginecomastia. Ver Ginecomastia manifestações clínicas da, 303 marmórea, 359 Endocrinologia, princípios de, 1
hipogonadismo hipogonadotrófico. Doença de Graves, 60 Doença pulmonar, obesidade e, 190 Endometriose
Ver Hipogonadismo avaliação laboratorial de, 61, 62f, 393, Doença renal crônica (DRC) definição de, 147
hipogonadotrófico 407 distúrbios do metabolismo do cálcio e dismenorreia na, 154
hipogonadismo. Ver crise tireotóxica na, 63 fosfato no etiologia da, 154
Hipogonadismo curso clínico da, 61–62 hiperparatireoidismo secundário, infertilidade por, 147
síndrome da insensibilidade a diagnóstico diferencial da, 61 328 manifestações clínicas da, 154
androgênios. Ver Síndrome da em crianças, 63 tratamento de, 336 tratamento de, 147
insensibilidade a androgênios epidemiologia da, 60 distúrbios hidreletrolíticos e ácido- Endometrite, dor pélvica in, 154
relacionado ao envelhecimento, 126 hipertireoidismo da, 62–63 básicos na Endotelina(s)
abordagem ao paciente, 127, 127f manifestações clínicas da, 60–61, 60q, hipercalcemia, 328 na função da tireoide, 51
fisiopatologia do, 126–127 61f, 68 hiperfosfatemia, 335 na função sexual masculina, 175, 176f
tratamento de patogenia da, 60 hipocalcemia, 335 Envelhecimento, síndrome metabólica
gonadotrofinas para, 128 prevalência da, 10q tratamento de, 335 e, 199
testosterona para. Ver Terapia com taxas de remissão, 62, 63 distúrbios lipoproteicos na, 257 Epilatório, 166
testosterona tratamento da no diabetes melito. Ver Nefropatia Epitélio mülleriano, 168
Distúrbios respiratórios, obesidade fármacos antitireoide, 63, 394, 407 diabética Eplerenona, para excesso de
e, 190 iodo radioativo, 63 Doença renal terminal (DRT). Ver mineralocorticoide, 88
Diurese na gravidez, 63 Doença renal crônica (DRC) Ereção, 175, 176f
água, 40, 40f propranolol, 63 Doença suprarrenal nodular Eritrocitose, terapia com testosterona
para hipercalcemia, 331, 330q tireoidectomia, 62–63 pigmentada primária e, 131
Diuréticos de alça, para hipercalcemia triagem e avaliação de, 10q (DSRNPP), 82 Eritromicina
da malignidade, 294 Doença de Hand-Schüller-Christian, 19 Doença trofoblástica gestacional, 173 interações farmacológicas de, 178
Diuréticos tiazida Doença de Jansen, 325, 326f considerações globais, 173 para disfunção gastrintestinal no
efeitos adversos de, 176 Doença de Ollier, 170, 363 fatores de risco para, 173 diabetes melito, 221
disfunção erétil, 177q Doença de Paget juvenil, 356 manifestações clínicas da, 173 Escala de Ferriman e Gallwey para
hipercalcemia, 328 Doença de Tangier (deficiência de síndromes paraneoplásicas na, 293q hirsutismo, 164, 164f
para diabetes insípido nefrogênico, 44 ABCA1), 256 tratamento de, 174 Escleredema, diabético, 224
Diuréticos Doença de van Buchem, 360 Doença tubária, 147 Esclerose múltipla (EM), disfunção
efeitos adversos de Doença de von Hippel-Lindau Doença/insuficiência hepática erétil na, 176
disfunção erétil, 177q fatores genéticos na, 102–104, 270q, distúrbios lipoproteicos na, 257 Esclerose tuberosa, 270q, 270
disfunção sexual feminina, 179q 270, 289 obesidade e, 190 Esclerosteose, 360
efeitos sobre a razão aldosterona- feocromocitoma na, 102, 102–104, Doença/insuficiência renal. Ver Doença Escores T, 340, 345, 345f
renina de, 88q 103f, 289 renal crônica (DRC) Escores Z, 345, 345f
DM. Ver Diabetes melito (DM) manifestações clínicas da, 102, 102, Doença/lesão medular espinal, Esfregaço de Pap, para triagem de
DOC (desoxicorticosterona), 77f, 103f, 283q disfunção erétil na, 176 câncer cervical, 171
80, 86 tumores pancreáticos endócrinos na, Doença/síndrome de Meige, 170 Espermatogênese, 116f, 118–119
Doença arterial coronariana (DAC). Ver 270q, 270 Doenças de armazenamento lisossomal, Espessura da prega cutânea, 184
também Doença cardiovascular vs. NEM 1 ou NEM 2, 289 distúrbios lipoproteicos em, 257 Espironolactona
obesidade e, 191 Doença de von Recklinghausen. Ver Domperidona, para disfunção efeitos adversos da
prevenção da Neurofibromatose tipo 1 (NF1) gastrintestinal no diabetes disfunção erétil, 176, 177q
terapia hormonal pós-menopausa Doença do olho de peixe, 257 melito, 221 disfunção sexual feminina, 179q
na, 158q, 159–160 Doença gastrintestinal, no diabetes Dor pélvica hipercalemia, 166
tratamento de dislipidemia na, 258 melito, 220–221 aguda, 154, 154q hipotensão, 166
síndrome metabólica e, 199 Doença hematológica, valores de crônica, 154 para excesso de mineralocorticoide, 88
Doença β ampla referência, 365–368q no câncer cervical, 171 para hirsutismo, 166
(disbetalipoproteinemia Doença hipotalâmica Doxorrubicina, para câncer de ovário, 169 para síndrome do ovário policístico,
familiar), 251q, 253 efeitos metabólicos da, 20 DRC. Ver Doença renal crônica (DRC) 153
Doença cardíaca. Ver Doença glioma, 19 Drospirenona, para hirsutismo, 166 Esporões ósseos, 345
cardiovascular hamartoma, 19 DSRNPP (doença suprarrenal nodular Estado hiperosmolar hiperglicêmico
Doença cardiovascular. Ver também hipopituitarismo por, 14, 15. Ver pigmentada primária), 82 (EHH)
Doença arterial coronariana também Hipopituitarismo Duloxetina, para neuropatia diabética, avaliação laboratorial de, 212q, 215,
(DAC) obesidade na, 187, 191 220 409
disfunção erétil na, 176 Doença inflamatória pélvica (DIP), fisiopatologia do, 215
hipertireoidismo e, 393, 407 154, 154q manifestações clínicas do, 215
hipotireoidismo e, 393, 406 Doença neuroléptica, disfunção E tratamento de, 215
na doença óssea de Paget, 358 testicular por, 125 EAM (síndrome de excesso aparente de Estase venosa, obesidade e, 190
no diabetes melito Doença óssea de Paget, 356 mineralocorticoides), 86 Estatinas
426
efeitos adversos de, 261, 261q acoplados à proteína G nas síndromes NEM, 101, 102f, 287, Gangliocitomas, 19
para distúrbios lipoproteicos, 202, (GPCRs) 289 Ganho de peso, fisiologia do, 184
261, 261q Famílias de receptor de membrana, 2, 2q patogenia do, 99, 99f Gases arteriais, valores de referência,
Esteato hepatite não alcoólica (EHNA) Fármaco(s), monitoração terapêutica, síndromes paraneoplásicas no, 295 369q
na síndrome metabólica, 201 376–378q sítios topográficos, 99, 99f Gasto energético, 186, 189
obesidade e, 190 Fármacos antiepiléticos, efeitos adversos testes bioquímicos no, 100q Gastrinoma. Ver também Síndrome de
Estenose cervical, 154 de tratamento de, 100–101, 394, 408 Zollinger-Ellison (SZE)
Esterilização (controle de natalidade), disfunção erétil, 177q triagem genética para, 102, 102, 104f diagnóstico de, 276
149q, 148 osteoporose, 344 Fertilização in vitro (IVF), 147–148 em NEM 1, 276, 284, 284f
Esteroide(s), ovariano(s), 141–142, 142f. Fármacos anti-inflamatórios não α-fetoproteína, 134, 292 manifestações clínicas do, 275
Ver também Estrogênio(s) esteroides (AINEs), para Fibrodisplasia ossificante progressiva, tratamento de, 276
Esteroidogênese dismenorreia, 154 364 Gastroparesia, no diabetes melito,
controle regulatório da, 78–79, 78f Fármacos antitireoide Fibrogênese óssea imperfeita, 362 220–221
modelo de duas células para, 141, 142f ações de, 394, 406 Fibroides, uterinos, 154 Gastroplastia, vertical em faixa, 196
Esteroidogênese suprarrenal, 77, 77f efeitos adversos de, 63 Fibroma Gemcitabina, para câncer de ovário, 169
controle regulatório da, 77–78, 78f para doença de Grave, 62–63 ovariano, 170 Gemfibrozil
efeitos do ACTH na, 77–78, 78f Fator de crescimento de fibroblasto síndromes paraneoplásicas no, 293q efeitos adversos do 261q
estimulação por ACTH na, 79–80, 80f básico (bFGF), 17 Fibrose, osteíte, 337 para hiperlipidemia, 261q
síntese, metabolismo e ação na, 79–81, Fator de crescimento endotelial Finasterida, para hirsutismo, 166 para síndrome metabólica, 202
ÍNDICE
80f, 81f vascular (VEGF), na retinopatia Fludrocortisona Gene APC, no câncer de tireoide, 72q
sistema de regulação RAA na, 78, 79f diabética, 216 para insuficiência suprarrenal, 96 Gene CIP11B1, 112f, 114q
Estresse, deficiência de gonadotrofina Fator de crescimento epidérmico (EGF), para SIAD, 47 Gene CIP19, 114q, 115, 126
por, 123 na síntese de hormônio da Fluoreto, para tratamento/prevenção da Gene CIP21A2, na HSRC, 96, 97q, 112f,
Estrogênio(s) tireoide, 51 osteoporose, 354 114q
deficiência de, 343–344, 343f Fator de crescimento semelhante a Flutamida, para hirsutismo, 166 Gene da calcitonina, 318
efeitos no metabolismo de insulina I (IGF-I) Fluvastatina, para hiperlipidemia, 261q Gene do fator de crescimento
lipoproteína de, 257 efeitos adversos do, 28 Folato, valores de referência, 379q insulina-símile II, 295
efeitos ósseos do, 349 estrutura do, 2 Folículo(s) Gene E6, 171
excesso de, 125 na síntese de hormônio da tireoide, 51 de Graaf, 140f Gene E7, 171
na perimenopausa, 156 para síndromes resistentes ao GH, 28 maduro, 140, 139f Gene fat, 187q, 187
produção de, 141–142, 142f secreção de, 27 ovariano, 140, 140f Gene FEX, 296
Estroma ovariano, 65, 293q via transdutora de sinal para, 2q Fome, 186 Gene GNAS, 82, 337, 337f
Etidronato Fator de crescimento crescimento Fosfato/fósforo Gene GnRH1, 123
para doença óssea de Paget, 358, 359q semelhante a insulina II definição de, 302 Gene HESX1, 14, 93q
para hipercalcemia, 313 (IGF-II), 293q, 295 metabolismo de, 302 Gene HRPT2, 317, 317f
para tratamento/prevenção da Fator de transcrição nuclear do para hipercalcemia, 294, 330q, 332 Gene KAL, 14
osteoporose, 351 hepatócito (HNF), 212 Fosfatonina, produção ectópica de, Gene NEM1. Ver Neoplasia endócrina
Etinil estradiol Fator transformador do crescimento-β 293q, 296 múltipla tipo 1 (NEM 1)
em anticoncepcionais orais, 148–150 (TGF-β), na síntese de Fratura de Colles, 340f Gene MET, no câncer de tireoide, 72q
para hirsutismo, 166 hormônio da tireoide, 51 Fratura de punho 340 Gene NF1, 101, 102, 104f, 289
Etomidato, para síndrome de Cushing, Fator V, ensaios de triagem, 366q Fratura do quadril, 340, 340f Gene NIS, 50
35, 86 Fator VII, ensaios de triagem, 366q Fratura(s). Ver também Tipos específicos Gene ob, 186
Etoposídeo Fator VIII, ensaios de triagem, 366q e sítios osteoporóticos. Ver Gene p16, no câncer de tireoide, 72q
efeitos adversos do, 137 Fatores ambientais Osteoporose, fraturas associadas Gene p21/WAF, no câncer de tireoide,
para câncer de testículo, 137, 138 disfunção testicular por, 124 com 72q
para tumores de célula germinativa na obesidade, 186 doença óssea de Paget e, 358 Gene p53, no câncer de tireoide, 72q
ovariana, 171 no diabetes melito tipo 1, 208f, 209 Fraturas vertebrais Gene POMC, 93q
Excesso de mineralocorticoide, 86 Fecundabilidade, 145 bisfosfonatos para prevenção de, Gene RAS, no câncer de tireoide, 72q, 73
diagnóstico de, 87, 87f, 88q Feminilização masculina, 350–353, 352f Gene Rb, no carcinoma da paratireoide,
diagnóstico diferencial de, 87–88, 87f paraneoplásica, 293q denosumabe para prevenção de, 353, 321
epidemiologia do, 86 Fendimetrazina, para perda de peso, 195 353f Gene RET
etiologia do, 86–87, 86q, 392, 403 Fenitoína epidemiologia da, 340f, 340 análise do, 287
manifestações clínicas de, 87 efeitos adversos da, 163 fratura por esmagamento, 340, 341f em NEM 2, 75, 101, 287, 287f, 321
tratamento de, 88, 87f monitoração terapêutica da, 378 raloxifeno para prevenção de, 350, no câncer de tireoide, 72–73, 72q
Excesso de peso, 184, 193q Fenofibrato 353f no feocromocitoma, 104, 104f
Exenatida, para diabetes melito, 233, para hiperlipidemia, 261q teriparatida para prevenção de, 353, Gene RSPO1, 114q
232q, 233, 233q para síndrome metabólica, 202 354f Gene SDHB, 102, 104, 104f
Exercício Fenômeno de Raynaud, relacionado à Fumar cigarro. Ver Tabagismo Gene SDHD, 102, 104, 104f
deficiência de gonadotrofina quimioterapia, 137 Função cognitiva, terapia hormonal Gene SF1, 78, 110, 143q
por, 123 Fenotiazinas, efeitos adversos de, 177q pós-menopausa e, 158q, 160 Gene SOX3, 93q
para diabetes melito, 227 Fenoxibenzamina, para Função ovariana Gene SOX9, 110, 143q, 114q
para dismenorreia, 154 feocromocitoma, 100 avaliação clínica de, 143 Gene SRI, 110, 143q, 114q
para distúrbios lipoproteicos, 260 Fentermina regulação da, 141 Gene TNFRSF11A, 356
para perda de peso, 194q, 195 para perda de peso, 195, 196 esteroides ovarianos na, 141–142, Gene TNFRSF11B, 356
para síndrome metabólica, 201 para síndrome metabólica, 202 142f Gene TP53, 89
para tratamento/prevenção da Feocromocitoma, 99 peptídeos ovarianos na, 142 Gene TrkB, 187q
osteoporose, 349 definição de, 99 secreção da hipófise na, 140–141, Gene Tub, 187q, 187
Exócrino, 1 diagnóstico diferencial de, 100, 394, 408 141f Gene VHL, 102, 104f, 289
Exostose múltipla, 363 diagnóstico do, 99, 100q secreção hipotalâmica na, 140–141, Gene WNT1, 114q
Exposição/intoxicação por arsênico, exames bioquímicos no, 99–100 141f Gene WT1, 143q
379q imagem no, 100 Furosemida Genes supressores tumorais, no câncer
Exposição/intoxicação por cádmio, 379q durante a gravidez, 101 para hipercalcemia da malignidade, de tireoide, 71–73, 72q
Exposição/intoxicação por mercúrio, epidemiologia do, 99 294 Germinoma
379q etiologia do, 99 para SIAD, 294 paraselar, 20
Ezetimibe imagem no, 100q síndromes paraneoplásicas no, 293q
efeitos adversos do, 261q maligno, 101 GH. Ver Hormônio do crescimento
para hiperlipidemia, 261q manifestações clínicas do, 99, 100q G (GH)
para síndrome metabólica, 202 na neurofibromatose, 101, 101f Gabapentina GHRH (hormônio liberador de
na síndrome de von Hippel-Lindau, efeitos adversos da, 191 hormônio do crescimento), 26
102, 102, 103f. Ver também para sintomas da menopausa, 157 Ginecomastia, 125
F Doença de von Hippel-Lindau Galactorreia, 24 avaliação de, 10q, 125, 126f, 397, 412
Família GPCR que atravessam sete vezes na síndrome do paraganglioma, 102, Galactosemia, insuficiência ovariana etiologia da, 125, 397, 412
a membrana. Ver Receptores 103f primária na, 153 na cirrose, 124
427
na síndrome de Klinefelter, 108, 124 na função reprodutiva masculina, 119 Heparina, tratamento de monitoração Hipercalciúria hipocalcêmica
obesidade e, 190 para disfunção ovulatória, 147 com, 366q autossômica dominante, 334
patológica, 125, 126f para disfunção reprodutiva associada Hermafroditismo. Ver Distúrbios Hipercolesterolemia. Ver também
prevalência da, 10q, 125 à idade, 128 ovotesticulares do Distúrbios lipoproteicos
tratamento de, 109, 127 produção por tumor de hipófise de, 36 desenvolvimento sexual autossômica dominante, 251q, 252
Glândula hipófise síntese de, 35 Hexose-6-fosfato desidrogenase autossômica recessiva, 251q, 252
anatomia da, 12–13, 13f Gonadotrofina coriônica humana (H6PDH), 80 familiar, 250–251, 251q, 401, 418, 419
anterior. Ver Adeno-hipófise (hCG) Hidrocortisona poligênica, 252
avaliação laboratorial da, 17q em tumores de célula germinativa, 171 para coma do mixedema, 60 Hiperêmese gravídica, 68
desenvolvimento da, 12q, 13 na doença trofoblástica gestacional, para deficiência de ACTH, 33 Hiperfosfatemia, 305
fator de crescimento de fibroblasto 173 para hipercalcemia, 313 aguda grave, 337
básico na, 17 no câncer de testículo, 136 para HSRC, 97, 114 etiologia da, 305, 305q
hormônios produzidos pela, 12, 13f, produção ectópica de, 292, 293q, 296 para insuficiência suprarrenal, 94–95 hipocalcemia e, 337
392, 403 teste de estimulação, 119 Hidroxicloroquina, para hipercalcemia, manifestações clínicas da, 305
insuficiência da. Ver Hipopituitarismo valores de referência, 372q 313 na doença renal crônica, 433
posterior. Ver Neuro-hipófise Gonadotrofina menopáusica humana 11β-Hidroxiesteroide desidrogenase-2, tratamento de, 305
“Glândula mestra,” 12 (hMG), para deficiência de 80, 295 Hiperinsulinemia
Glândula suprarrenal, 77, 395, 407 gonadotrofina, 128 11β-Hidroxilase, 80 no hirsutismo, 165
Glândula tireoide, 48 Gonadotrofo, 12q, 18q 17-Hidroxiprogesterona, na HSRC, 97 obesidade e, 189–190
ÍNDICE
anatomia da, 48 Gordura corporal Hímen, imperfurado, 152 resistência à insulina e, 211
desenvolvimento da, 48 distribuição da, 184, 191 Hiperaldosteronismo Hiperinsulinismo, endógeno, 240q, 245
dor na, diagnóstico diferencial de, 65 intra-abdominal, 189 excesso de mineralocorticoide no. Ver Hiperlipidemia. Ver Distúrbios
exame físico de, 53 medida da, 184, 191 Excesso de mineralocorticoide lipoproteicos
função da, 67 parte superior do corpo, 184 remediável por glicocorticoide, Hiperlipoproteinemia. Ver Distúrbios
hormônios da. Ver Hormônio(s) da subcutânea abdominal, 184, 189 86, 88 lipoproteicos
tireoide Gordura(s), metabolismo no diabetes Hiperalfalipoproteinemia, familiar, 257 Hipermagnesemia, 308
regulação da, 48 melito tipo 2, 210 Hiperandrogenismo, ovariano, 165 achados laboratoriais na, 308
Glândulas endócrinas, 1 Gota, 68 Hiperapobetalipoproteinemia, 255 etiologia da, 308
Gliburida, para diabetes melito, 233q coloide, 68 Hipercalcemia, 292, 313 manifestações clínicas da, 308
Glicocorticoide(s) esporádica, 68 assintomática, 329 tratamento de, 308
ações de, 77 juvenil, 68 associada à malignidade, 292, 293q, Hipernatremia, adipsíca, 44, 44–46, 44f
efeitos adversos do, 177q não tóxica difusa (simples) 318q diagnóstico diferencial de, 44–45
equipotência, 96 etiologia da, 68 diagnóstico de, 292, 326 etiologia da, 44
osteoporose induzida por, 344, 343q, manifestações clínicas da, 68 etiologia da, 292, 415 fisiopatologia da, 44, 44f
355 não tóxica multinodular, 68–69 manifestações clínicas da, 292 manifestações clínicas da, 44
para deficiência ACTH, 33 substernal, 68 mecanismos da, 326 tratamento de, 44–45
para hipercalcemia da malignidade, multinodular tóxica, 69 síndromes clínicas relacionadas à, Hiperostose cortical generalizada, 360
294 obesidade e, 191 325 Hiperparatireoidismo
para hipercalcemia, 313, 330q, 332 tratamento de, 68 tratamento de, 294, 326, 399, 403, assintomático, 319, 320
para HSRC, 97, 166 Granuloma anular, 224 415, 421 hereditária, 319
para insuficiência suprarrenal, Gravidez associada à renovação óssea, 328 osteíte fibrosa cística no, 320–321
94–95, 96f doença de Graves na, 63 benigna familiar, 324 prevalência do, 10q
para oftalmopatia de Graves, 63 eclâmpsia na, 399, 414 crônica, 329, 329f primário, 319
para síndrome de ACTH ectópica, 295 feocromocitoma na, 101 diagnóstico de, 313, 319, 329, 329f adenomas solitários e, 319
síntese de, 78, 77f, 112f função da tireoide durante, 68 diagnóstico diferencial de, 319, 329, deficiência de magnésio no, 324
tratamento do diabetes melito e, 238 hipertireoidismo na, 59 329f diagnóstico de, 321q, 322, 323f,
Gliconato de cálcio, para hipocalcemia, prolactinoma na, 26 etiologia de, 312, 313q, 319, 318q, 330, 329f, 400, 415
314 Gravidez ectópica, 154 403, 421 etiologia de, 318q, 319, 415
Glicose Grelina, 26, 184 hiperparatireoidismo primário e. Ver fatores genéticos no, 320–321, 320f
balanço, 240, 241f, 241q GRFomas (tumores de fator liberador Hiperparatireoidismo, primário história natural de, 319
sangue, monitoração de, 227–228. Ver de hormônio do crescimento), hipertireoidismo e, 328 incidência de, 319
também Controle glicêmico 267q, 279 hipocalciúrica familiar, 312, 324 manifestações clínicas de, 320–321,
Glimepirida, para diabetes melito, 233, Grupos étnicos, valores de idiopática, da infância, 327 415
233q circunferência da cintura em, imobilização e, 328 nas síndromes NEM, 284, 287, 289,
Glioma 193q intoxicação por alumínio e, 329 319
hipotalâmico, 19 Guanetidina, efeitos adversos intoxicação por vitamina A e, 328 níveis de PTH no, 322, 323f
óptico, 19 da, 177q lítio e, 324 patologia do, 319
Glipizídios, para diabetes melito, 231, Guia alimentar MyPyramid, 193 manifestações clínicas da, 313, 319 tratamento de
233q na doença óssea de Paget, 358 cirúrgico, 321q, 323
Globulina de ligação de hormônio na doença renal crônica, 328 médico, 324
sexual, 166 H na sarcoidose, 327 monitoração no, 321q
Globulina ligadora de tiroxina (TBG), H6PDH (hexose-6-fosfato relacionada à vitamina D, 327 nas síndromes NEM, 285–286, 289
52q, 54 desidrogenase), 80 síndrome do leite álcali e, 329 secundário
Glucagonoma, 277 Hamartoma, hipotalâmico, 19 tiazidas e, 328 etiologia do, 314q
diagnóstico de, 277 hCG. Ver Gonadotrofina coriônica tratamento de, 313, 319, 330, 330q hipocalcemia e, 314q
em NEM 1, 285 humana (hCG) bisfosfonatos, 313, 331 manifestações clínicas de, 328
manifestações clínicas do, 267q, 277 HDF (hipertiroxinemia calcitonina, 331 na doença renal crônica, 328
tratamento de, 277 disalbuminêmica familiar), diálise, 332 patogenia do, 329
GMP cíclico, na função sexual 52, 52q diurese, 331 tratamento de, 329
masculina, 175, 176f HDL. Ver Lipoproteína de alta glicocorticoides, 313, 331 terciário, 329, 400, 415
GnRH. Ver Hormônio liberador de densidade (HDL) hidratação, 313, 331 triagem e avaliação de, 10q
gonadotrofina (GnRH) Hemangiopericitoma, 293q ingesta de sal aumentada, 331 Hiperpigmentação, na insuficiência
Gonadectomia, 152 Hematócrito, normal, 366q nitrato de gálio, 331 suprarrenal, 93, 95f
Gonadotrofina, 35. Ver também Hemocromatose, hipogonadismo e, 124 plicamicina, 331 Hiperplasia suprarrenal
Hormônio folículo-estimulante Hemodiálise terapia com fosfato, 332 congênita. Ver Hiperplasia suprarrenal
(FSH); Hormônio luteinizante para hipercalcemia, 330q, 332 Hipercalcemia da infância idiopática, congênita (HSRC)
(LH) da malignidade, 294 327 macronodular, 293q
ação da, 35 para hipermagnesemia, 308 Hipercalcemia da malignidade humoral, macronodular independente de
deficiência de, 35–36 Hemoglobina 326. Ver também Hipercalcemia, ACTH (HMAIA ), 82
causas adquiridas de, 124–125 normal, 366q associada à malignidade Hiperplasia suprarrenal congênita
distúrbios congênitos associados terapia com testosterona e, 131 Hipercalciúria (HSRC), 96
com, 121f, 123 Hemoglobina A1C, no diabetes melito, hipocalcêmica, 334 androgênios e, 114, 114q
tratamento de, 36 225, 226q, 228 na doença óssea de Paget, 358 etiologia da, 96–97, 114
428
fatores genéticos na, 96, 97q, 114, padrões genéticos na, 337, 337f deficiência de vitamina D e, 307 secundário, 58
114q pancreatite e, 332 etiologia do, 305–306, 306q subclínico, 55
hirsutismo na, 163, 165 transiente, 332 manifestações clínicas do, 305 tratamento de, 58–59
imagem na, 97, 98f tratamento de, 314, 324, 338–339 tratamento de, 305–306, 335 Hipoventilação, na obesidade, 190
manifestações clínicas da, 97, 114 vitamina D deficiência e, 336 Hiponatremia, 45 Hirsutismo, 163
masculina, 121 Hipocalemia considerações globais, 47 abordagem ao paciente, 10q, 163, 165f
tratamento de, 97, 114–115, 166 na CAD, 215 diagnóstico diferencial de, 46q, 46–47 após a menopausa, 165
variantes da, 97, 97q, 114 no excesso de mineralocorticoide, 87 etiologia da, 45–46, 45q avaliação hormonal no, 163
Hiperplasia suprarrenal congênita Hipofisite, 15, 153 fisiopatologia da, 46 escala de escores de Ferriman e
lipoide (HSRLC), 92q Hipofisite linfocítica, 15 manifestações clínicas da, 45 Gallwey, 164, 164f
Hiperprolactinemia, 23 Hipofosfatasia, 356, 361 na insuficiência suprarrenal, 93 etiologia do, 163q
avaliação laboratorial da, 24 Hipofosfatemia, 302 paraneoplásica, 292 induzido por fármaco, 163, 163q
diagnóstico da, 24, 24, 178 achados laboratoriais na, 303–304 tratamento de, 47 na deficiência de 21-hidroxilase, 113
disfunção erétil na, 176 crônica, 302 VLEC avaliação e, 46, 46q prevalência de, 10q
etiologia da, 23, 23q, 391, 404 etiologia da, 302, 302q, 399, 414 Hipoparatireoidismo tratamento de, 166–167
galactorreia e, 24 manifestações clínicas da, 303–304, adquirido, 333–334 Histerectomia
hipogonadismo hipogonadotrófico e, 399 crônico, 334 para câncer de endométrio, 173
124 mecanismos da, 302 etiologia do, 314q para câncer de ovário, 169
hirsutismo na, 163 osteomalácia e, 310 fatores genéticos no, 333 Histiocitose X, 15, 19
ÍNDICE
manifestações clínicas de, 24 tratamento de, 304, 304q, 414 hiperfosfatemia por, 305, 305q HNF (fator de transcrição nuclear do
prevalência da, 10q Hipoglicemia, 240 hipocalcemia e, 313–314, 314q, hepatócito), 212
tratamento de, 24 abordagem ao paciente, 245–246 332–333 Homeostasia, 6
triagem e avaliação de, 10q ação hormonal na, 6 manifestações clínicas do, 333 Hormônio adrenocorticotrófico
Hipertensão acidental, 245 PTH ausente, 331q, 333–334 (ACTH), 32
disfunção erétil e, 176 com tumores de células não β, 244 PTH dominado, 331q, 338 ação do, 3, 33
hipocalêmica, 87 deficiências hormonais e, 240q, 243 PTH inefetivo, 331q, 335, 337f avaliação laboratorial do, 17q
na síndrome metabólica, 200, 202 diagnóstico de, 246, 397, 411 transiente, 333–334 deficiência de, 18q, 33
no diabetes melito, 219, 222 etiologia da, 240, 240q Hipopituitarismo, 13 no controle da esteroidogênese
obesidade e, 190 factícia, 246 causas adquiridas de, 14q, 15 suprarrenal, 78–79, 78f
paraneoplásica, 293q fisiopatologia da, 242, 241q, 397, 411 apoplexia hipofisária, 15 produção ectópica de, 34q, 292, 293q,
Hipertireoidismo autoimune, 55 hiperinsulinismo endógeno e, 240q, distúrbios infiltrativos 295
avaliação laboratorial do, 58 245 hipotalâmicos, 15 diagnóstico de, 295
classificação do, 55 induzida por fármaco, 240q, 243 hipofisite linfocítica, 15 etiologia de, 295
diagnóstico diferencial do, 58 induzida por tumor, 293q, 295 irradiação craniana, 15 manifestações clínicas do, 295
manifestações clínicas do, 56q, 56–57, manifestações clínicas da, 241 lesões inflamatórias, 15 tratamento de, 295
57f na doença grave, 240q, 243 sela vazia, 16, 392, 405 secreção de, 32–33
patogenia do, 56 na síndrome da insulina autoimune, causas associadas ao desenvolvimento síntese do, 32
prevalência do, 56 291 e genética do, 14q Hormônio concentrador de melatonina,
tratamento do, 58–59 não diabética, 240q, 244 disfunção hipotalâmica associada ao 184
Hipertireoidismo no diabetes melito desenvolvimento, 14 Hormônio do crescimento (GH), 26
avaliação de, 62f contrarregulação defeituosa de displasia da hipófise, 14 ação do, 26
complicações cardiovasculares do, glicose e, 236, 242 mutações em fator avaliação laboratorial de, 17q
393, 407 falência autônoma associada com, tecido-específico, 15 insensibilidade ao, 28
congênito, 48, 49q, 55 242, 242f Síndrome de Prader-Willi. Ver no tratamento/prevenção da
definição de, 60 fatores de risco para, 242, 243, 397, Síndrome de Prader-Willi osteoporose, 355
distúrbios lipoproteicos no, 257 411 diagnóstico de, 16, 17q, 392, 405 produção ectópica de, 293q
hipercalcemia e, 328 impacto e frequência da, 241, 411 manifestações clínicas do, 16 secreção de, 26
na doença trofoblástica gestacional, perda da percepção da, 243 tratamento de, 16, 18q síntese de, 26–27
173 prevenção da, 243 Hipoplasia suprarrenal congênita, via transdutora de sinal para, 2q
paraneoplásico, 293q reconhecimento e documentação da, 92q, 123 Hormônio estimulante de
primário, 59q 246 Hipospadia, isolada, 113 melanócito-α (MSH)
secundário, 59q recorrente, prevenção da, 245 Hipotálamo controle do apetite e, 187, 187, 187q,
tireotoxicose sem, 59q tratamento de, 245–246 disfunção associada ao 188f
Hipertireoxinemia Hipogonadismo, hipergonadotrófico, desenvolvimento do, 14 produção de ATCH ectópica e, 295
disalbuminêmica familiar, 52, 52q 153 na regulação da função ovariana, Hormônio folículo-estimulante
eutireoide, 52, 52q Hipogonadismo, hipogonadotrófico, 140–141, 141f (FSH), 35
Hipertricose, 164 123 vasculatura do, 13f ação do, 35
Hipertrigliceridemia familiar (HTGF), adquirido, 123 Hipótese do estresse oxidativo, 199 avaliação laboratorial de, 17q, 36–37
253–254 amenorreia no, 153 Hipotireoidismo, 48, 55 deficiência de, 18q
Hipertrigliceridemia combinada congênito, 121f, 123, 146q anticorpos antitiroxina e, 291 durante o período neonatal, 141, 141f
familiar (HLCF), 254–255 diagnóstico de, 36 autoimune, 55 recombinante, 128, 147
Hiperuricemia etiologia do, 146q avaliação laboratorial do, 58, 393, secreção de, 35
síndrome metabólica e, 201 fisiopatologia do, 123 406 síntese de, 35
Hipoalfalipoproteinemia, 257 hemocromatose e, 124 classificação do, 55 valores de referência, 372q
Hipobetalipoproteinemia, familiar, 255 hiperprolactinemia no, 124 manifestações clínicas do, 56q, Hormônio liberador de corticotrofina,
Hipocalcemia, 332 isolado, 35, 153 56–57, 57f produção ectópica de, 293q, 295
anormalidades genéticas e, 333 lesões expansivas selares e, 124 patogenia do, 56 Hormônio liberador de hormônio do
classificação da, 331q, 332–333 manifestações clínicas do, 36 prevalência do, 56 crescimento (GHRH), 26, 293q
crônica, 332–333 obesidade no, 124, 187 avaliação de, 10q agonistas, 176, 177q, 179q
diagnóstico da, 314 tratamento de, 36 congênito, 48, 49q, 55 mutações no receptor, 28
diagnóstico diferencial de, 338 Hipogonadismo diagnóstico de, 58, 57f Hormônio liberador de tireotrofina
etiologia da, 313–314, 314q, 332–333 avaliação de, 127, 127f diagnóstico diferencial de, 58 (TRH), 23, 31
fisiopatologia da, 332–333 causas testiculares de, 124–125 distúrbios lipoproteicos no, 257 Hormônio luteinizante (LH), 35
hiperfosfatemia e, 337 criptorquidismo e, 124 doenças associadas com, 58 ação do, 3, 35
hipomagnesemia e, 335 disfunção erétil no, 176 efeitos cardiovasculares do, 393, 406 avaliação laboratorial de, 17q
hipoparatireoidismo e, 324, 331q, hipergonadotrófico, 153 etiologia do, 55q, 58 deficiência de, 18q
399, 415. Ver também hipogonadotrófico. Ver franco, 55 durante o período neonatal, 141, 141f
Hipoparatireoidismo Hipogonadismo hirsutismo no, 163 produção ectópica de, 293q
manifestações clínicas da, 314, 324, hipogonadotrófico iatrogênico, 58 secreção de, 35
399, 415 obesidade e, 190 na gravidez, 59, 68 síntese de, 35
na doença renal crônica, 335 síndrome de Klinefelter e, 124 obesidade no, 187, 191 valores de referência, 373q
na PHP, 336 Hipomagnesemia, 305, 335 patogenia do, 56 Hormônio tireoestimulante (TSH), 37
osteoporose associada com, 342 achados laboratoriais na, 305–306 prevalência do, 10q, 56 ação do, 37
429
avaliação do, 7 Imunoglobulinas tireoestimulantes Insuficiência ovariana, primária, 153 Lecitina-colesterol-aciltransferase
avaliação laboratorial de, 17q, 53 (TSI) Insuficiência ovariana precoce. (LCAT), 249f
câncer de tireoide por, 71 na doença de Graves, 54 Ver Insuficiência ovariana Leptina
deficiência de, 18q, 37 na gravidez, 54 primária ações de, 186, 187f
elevado, 393, 406 Incidentaloma. Ver Massa suprarrenal, Insuficiência suprarrenal, 90 deficiência de, 15
na função da glândula tireoide, 51 descoberta incidentalmente aguda, 93 genética da, 186, 187q
produção ectópica de, 293q Incretinas, para diabetes melito tipo 2, crônica, 93 mutações, hipopituitarismo por, 15
secreção de, 37 231–233 diagnóstico de, 93–94, 96f na obesidade, 187q, 189
síntese de, 37 Índice de massa corporal (IMC), 184, epidemiologia da, 91 no hipogonadismo hipogonadotrófico,
terapia supressora, 74 185f, 191, 192q etiologia da, 91, 92q, 93q 153
Hormônio(s). Ver também Hormônios e Índice de T3 livre, 54 hipoglicemia na, 244 para acromegalia, 31–32
tipos específicos Índice de T4 livre, 54 manifestações clínicas da, 93, 94q para síndrome carcinoide, 274
classes de, 2 Indometacina, para diabetes insípido primária, 91, 92q Lesões em massa selares, 18–19, 20q,
deficiência de, 8 nefrogênico, 44 secundária, 92–93, 93q 124. Ver também Tumores de
degradação de, 3–4 Infarto do miocárdio (IM), disfunção tratamento de, 94–95, 96f hipófise (adenomas)
funções do, 5–6 erétil e, 178 Insuficiência/doença renal. Ver Doença Leucemia/linfoma de célula T do adulto,
medidas de, 9 Infecção pelo vírus da hepatite C renal crônica (DRC) síndromes paraneoplásicas
meia-vida do, 3 (HCV), osteosclerose e, 361 Insulina asparte, 229, 229q na, 292
natureza do, 2 Infecção por HIV, lipodistrofia na, 199 Insulina detemir, 229, 229q, 395, 410 Leucovorina, para doença trofoblástica
ÍNDICE
padrões rítmicos de, 7 Infecções do trato urinário (ITUs), no Insulina glargina, 229, 229q, 395, 410 gestacional, 174
papel do, 2 diabetes melito, 224 Insulina glulisina, 229, 229q Levonorgestrel
produção ectópica de, 292, 293q Infecções por Candida spp., no diabetes Insulina lispro, 229, 229q em anticoncepcionais orais, 149
produção eutópica de, 292 melito, 224 Insulina na contracepção emergencial, 150
regulação autócrina de, 7 Infecções por Staphyloccocus aureus, no ação da, 207–208 para hirsutismo, 166
regulação parácrina de, 7 diabetes melito, 224 biossíntese da, 207 Levotiroxina
resistência ao, 8, 392, 403 Infecções sexualmente transmissíveis, efeitos adversos da, 191 efeitos adversos da, 58
secreção do 4 câncer cervical e, 170 estrutura da, 2 para gota não tóxica difusa, 69
síntese e processamento de, 2–3 Infertilidade, 145 para CAD, 215 para hipertireoidismo, 58–59
sistemas de regulação por abordagem ao paciente, 145–146 para diabetes melito tipo 1 para tireoidite subaguda, 65
retroalimentação, 8–7, 6f após o câncer de testículo, 138 infusão subcutânea contínua, LH. Ver Hormônio luteinizante (LH)
teste endócrino relacionado ao, 9 aspectos psicológicos da, 147 230–231, 230f Libido
transporte de, 3–4 avaliação de, 10q, 145–146, 397, 412 injeções duas vezes ao dia, 230, 230f feminina, 179
Hormônio(s) da tireoide definição de, 145 preparações, 229, 229q, 395, 410 masculina, 175, 178
ação do, 52–53, 53f etiologia da, 145, 146f, 397, 412 regimes com múltiplos Ligação das trompas, 149q, 148
avaliação laboratorial do, 53–54 feminina, 145 componentes, 230, 230f Linfoma de tireoide, 75
estrutura do, 48f hiperprolactinemia e, 24 para diabetes melito tipo 2, 232q, 234 Liotironina, 58, 59
não ligado, 54 masculina, 119, 147, 147 produção ectópica de, 293q Lipase endotelial, 250
resistência ao, 52q, 53 na HSRC, 97 secreção da, 207, 207f, 210, 210f Lipídio(s)
síntese de, 50 prevalência da, 10q, 145 via transdutora de sinal para, 2q, dietético, transporte de, 247–248, 249f
ação do TSH na, 51 tratamento de, 148 207–208, 208f hepático, transporte de, 248, 249f
fatores influenciadores, 51 Ingesta de alimentos, na obesidade, 189 Insulinoma, 277 produção de, 211
metabolismo e transporte de iodo Inibidores da enzima conversora de definição de, 277 Lipoatrofia
na, 50 angiotensina (ECA) diagnóstico de, 245, 277 diabética, 224
organificação, acoplamento, efeitos adversos de, 176 em NEM 1, 284f, 285 na síndrome metabólica, 201
armazenamento, liberação, 50–51 para hipertensão na síndrome epidemiologia do, 245 Lipodistrofia congênita de Berardinelli-
regulação da, 48–49, 49f metabólica, 203 hiperinsulinismo endógeno por, 245 Seip, 199
transporte e metabolismo de para nefropatia diabética, 219 incidência de, 245, 267q Lipodistrofia de Dunnigan parcial
deiodinases no, 52 Inibidores da fosfodiesterase tipo 5 manifestações clínicas do, 267q, 278 familiar, 199
proteínas de ligação no, 52 ação dos 175, 176f obesidade no, 187 Lipodistrofia
proteínas de ligação séricas no, efeitos adversos dos, 178 tratamento de, 245, 277 diabetes melito associado com, 238
51–52, 51q interação com nitratos, 178 Interferon-α (IFN-α), para síndrome distúrbios lipoproteicos e, 257
Hormônios da hipófise para disfunção erétil, 178 carcinoide, 275 inibidores de protease e, 238
expressão e regulação de, 6f para disfunção sexual feminina, 180 Intervalo QT, prolongado, 314, 415 na infecção por HIV, 199
na regulação da função ovariana, Inibidores de 5α-redutase, efeitos Intestino delgado, tumores carcinoides síndrome metabólica e, 199
140–141, 141f adversos de, 177q de, 268q, 271, 271q Lipo-hipertrofia, diabética, 224
secreção de, 13f Inibidores de absorção de colesterol, Intoxicação por chumbo, 379q Lipoproteína(s)
Hormônios esteroides. Ver também 261, 261q Intoxicação/overdose de fármaco, classificação de, 247–248, 247f, 248q
hormônios específicos Inibidores de aromatase 376–378q composição da, 247–248, 248q
ações de, 142 efeitos adversos de, 344 Intumescimento do clitóris, 180 metabolismo de
efeitos adversos de, 191 para disfunção ovulatória, 147 Iodo HDL e transporte reverso do
síntese, metabolismo e ação de, 79–81, Inibidores de dipeptidil peptidase-4, deficiência de colesterol, 248–249, 249f
80f, 81f para diabetes melito, 232q, 233, considerações globais, 50, 50f, 393, via endógena (lipídeos hepáticos),
Hormônios glicoproteicos, 2 233q 406 248, 249f
HSRC. Ver Hiperplasia suprarrenal Inibidores de ECA. Ver Inibidores gota e, 68 via exógena (lipídeos dietéticos),
congênita (HSRC) da enzima conversora de hipertireoidismo e, 58 247–248, 249f
HSRLC Ver Hiperplasia suprarrenal angiotensina (ECA) manifestações clínicas da, 51 níveis elevados de, 253, 254q, 263
lipoide congênita (HSRLC) Inibidores de HMG-CoA redutase. prevenção da, 58 proteínas associadas com, 248–249
Ver Estatinas ingesta excessiva de, 58 Lipoproteína de alta densidade (HDL)
Inibidores de monoaminaoxidase, ingesta recomendada de, 51 composição da, 247, 247f
I efeitos adversos de metabolismo e transporte de, 50 metabolismo de, 248–249, 249f
Ibandronato, para tratamento/prevenção disfunção erétil, 177q Ioga, 154 na síndrome metabólica, 200
da osteoporose, 352f, 351 obesidade, 191 Itraconazol, interações farmacológicas níveis altos de, 254q, 257
Ibuprofeno, para dismenorreia, 154 Inibidores de quinase, para câncer de de, 178 níveis baixos de, 254q, 256.
IDLs (lipoproteínas de densidade tireoide, 75 Ver também Distúrbios
intermediária), 247, 247f, 248q, Inibidores de α-glicosidase, para lipoproteicos
254q diabetes melito tipo 2, 232q, 233 L terapia para aumentar os níveis de,
Idosos, deficiência de vitamina D em, Inibidores seletivos da recaptação Lactato desidrogenase, no câncer de 202, 263
309 de serotonina (ISRS), efeitos testículo, 134 Lipoproteína de baixa densidade (LDL)
Ifosfamida, para câncer de testículo, 138 adversos de, 176, 177q Lactotropo, 12q, 18q composição da, 247, 247f
IGF. Ver Fator de crescimento Inibina, na função reprodutiva Lacunas de Howship, 299, 321 elevada
semelhante a insulina (IGF) masculina, 119 Lanreotide causas secundárias de, 254q, 401, 418
Imunoglobulina(s), valores de Insuficiência autônoma, associada à LDL. Ver Lipoproteína de baixa distúrbios associados com, 251q,
referência, 373q hipoglicemia, 242, 242f densidade (LDL) 253–255
430
estimativa de, 257 triagem e avaliação de, 10q Mutações em PCSK9, 251q, 252, 255 tratamento de, 288–289
metas para, no diabetes melito, 202, Menopausa precoce. Ver Insuficiência Mutações no gene BRCA triagem para, 287
222 ovariana primária no câncer de ovário, 168, 402, 419 Neurofibromatose tipo 1 (NF-1)
na síndrome metabólica, 200 Menorragia, 156 no câncer de trompa de Falópio, 171 fatores genéticos na, 102, 270q, 270,
redução dos níveis de. Ver Distúrbios Metformina 289
lipoproteicos, tratamento de para diabetes melito tipo 2, 231, 232q, feocromocitoma na, 101, 101f
Lipoproteína lipase (LPL), 199, 247 235, 395, 410 N manifestações clínicas da, 101, 101f
deficiência de, 252 para pré-diabetes, 211 Naltrexona, 196 manifestações cutâneas da, 101, 101f
Lipoproteínas de densidade para síndrome do ovário policístico, Não seminoma, mediastínico, 138 tumores carcinoides na, 270q, 270
intermediária (IDL), 247, 247f, 153 Naproxeno, para dismenorreia, 154 Neuro-hipófise
248q, 254q para síndrome metabólica, 203 Nateglinida, para diabetes melito, 233, distúrbios da
Lipoproteínas de densidade muito baixa α-metildopa, efeitos adversos da, 177q 233q diabetes insípido. Ver Diabetes
(VLDL) Metilprednisolona, para Graves, Necrobiose lipídica diabética, 224 insípido (DI)
características da, 247, 247f, 248q oftalmopatia, 64 Nefropatia diabética, 218 hipernatremia adipsíca. Ver
níveis elevados de, 251q, 253, 254q Metimazol avaliação laboratorial de, 396, 410 Hipernatremia adipsíca
vias metabólicas da, 249f, 248 efeitos adversos do, 63 controle glicêmico e, 217, 217f hormônios produzidos por
Liraglutida, para diabetes melito, 232q, para doença de Graves, 62 história natural de, 218–219, 219f ocitocina, 39f, 40
233, 233q Metirapona microalbuminúria na, 219–220, 219f vasopressina. Ver Arginina-
Lítio, efeitos adversos do para síndrome de ACTH ectópica, 295 no diabetes melito tipo 1 vs. tipo 2, vasopressina (AVP)
ÍNDICE
disfunção erétil, 177q para síndrome de Cushing, 35, 85 219 Neurolépticos, efeitos adversos de, 176
hipercalcemia, 324–325 Metoclopramida, para disfunção patogenia da, 218, 410 Neuropatia diabética, 219
obesidade, 191 gastrintestinal no diabetes tratamento de, 219–220 autônoma, 220
Locaserina, 196 melito, 221 Neoglicogênese, 240 fatores de risco para, 219
Lovastatina Metotrexato Neonato(s) mononeuropatia, 220
efeitos adversos da, 261q disfunção erétil, 177q diabetes em, 212 polineuropatia, 219–220
para hiperlipidemia, 261q monitoração terapêutica de, 377q níveis de FSH em, 141, 141f prevalência de, 219
Luz solar, deficiência de vitamina D por para doença trofoblástica gestacional, níveis de LH em, 141, 141f tratamento de, 220
falta de, 336 174 Neoplasia endócrina múltipla tipo 1 Neuropeptídio Y, 184
para gravidez ectópica, 154 (NEM 1), 283 NF-1. Ver Neurofibromatose tipo 1
Mibefradil, interações farmacológicas doenças associadas com, 283q (NF-1)
M de, 178 epidemiologia da, 284 Nimesulide, para dismenorreia, 154
Magnésio Microalbuminúria, na nefropatia fatores genéticos na, 102, 270q, 284, Nitrato de gálio, para hipercalcemia, 332
deficiência de, 324 diabética, 219–220, 219f 285, 285f, 320, 320f Nitratos, interação com inibidores de
metabolismo de, 305 Mieloma múltiplo feocromocitoma na, 102f fosfodiesterase tipo 5, 178
para tratamento/prevenção da hipercalcemia no, 292 gastrinomas na, 284, 284f Nitroprussiato, monitoração terapêutica
osteoporose, 349 hiperlipidemia no, 402, 419 glucagonomas na, 285 do, 378q
MAIA (hiperplasia macronodular síndromes paraneoplásicas no, 292 hiperparatireoidismo na, 284, Nódulo tireóideo
independente de ACTH), 82 Miglitol, para diabetes melito, 232q, 233 285–286, 319 abordagem ao paciente, 75–76, 76f
Malignidades linfoides Mineral(is), faixas de referência para, idade no início da expressão do tumor benigno, 71, 70q
na tireoide, 75 379q endócrino na, 284, 284f câncer de tireoide em pacientes com,
síndromes paraneoplásicas em, 292, Mineralização, defeituosa, 361 insulinomas na, 284f, 285 71, 71q
293q Mineralocorticoide(s) manifestações clínicas da, 18q, 283q, prevalência de, 10q, 68
“Manchas cutâneas diabéticas,” 224 ações de, 77 284, 284f, 398, 413–414 solitário, hiperfuncional, 70, 70f
Mandíbula, osteonecrose da, 351 para insuficiência suprarrenal, 96f, 96 manifestações incomuns de, 285 triagem e avaliação de, 10q, 394, 407
Manifestações clínicas de produção de, 77f, 78, 79f patogenia da, 7–8 Norgestimato, para hirsutismo, 166
craniofaringioma, 19 Minoxidil, efeitos adversos de, 163 prevalência da, 284 Norgestrel, para hirsutismo, 166
obesidade nas, 187 Miosite ossificante, 364 síndrome de Verner-Morrison Nutrição parenteral
tratamento de, 19 Miosite ossificante progressiva, 364 (diarreia aquosa) na, 285 tratamento do diabetes melito e, 312
Marcadores tumorais Mirtazapina, efeitos adversos da, 191 SZE e, 276
no câncer de ovário, 168 Mitotano, para síndrome de ACTH tratamento de, 285–286
no câncer de testículo, 134 ectópica, 295 tumores carcinoides na, 270q, 285 O
Massa anexial, 169, 171 Mitotano, para síndrome de Cushing, tumores corticais de suprarrenal na, Obesidade
Massa suprarrenal, incidentalmente 35, 86 285 adiposidade central na, 198
descoberta Mittelschmerz, 143, 154 tumores de hipófise na, 18, 18q, 278, apneia do sono e, 190
diagnóstico diferencial de, 88–89, 90f, Mixedema 283q, 286 avaliação da, 184, 191
394, 408 características do, 56 tumores enteropancreáticos na, 284 cálculos biliares e, 190
epidemiologia da, 88 no hipertireoidismo, 56, 188 tumores pancreáticos na, 270q, 285, câncer e, 190
etiologia da, 88, 89q Mnemônica “NO SPECS”, na doença de 286 comorbidades, 191, 193q
tratamento de, 89 Graves, 61 Neoplasia endócrina múltipla tipo 2 condicionamento físico e, 191
Massa testicular, 134 Modelo de duas células para (NEM 2), 286 definição de, 184
Massa/força óssea, medida da, 345, esteroidogênese, 141, 142f carcinoma de tireoide medular na, diabetes melito e, 189–190, 193q
345f, 345q Modificação comportamental/ 101, 102f, 288–289 disfunção erétil na, 176
Maturação esquelética, crescimento terapia comportamental, para doenças associadas com, 283q distúrbios gastrintestinais e, 193q
somático e, 28 disfunção sexual feminina, fatores genéticos na, 102, 287, 287f distúrbios geniturinários e, 193q
Mazindol, para perda de peso, 195 180–181 feocromocitoma na, 289 distúrbios lipoproteicos na, 257
MCIDPDF (miopatia por corpúsculo de Modificações do estilo de vida hiperparatireoidismo na, 289 distúrbios neurológicos e, 193q
inclusão com doença de Paget e para obesidade, 191 manifestações clínicas da, 283q, 286 distúrbios ósseos e articulares e, 190,
demência frontotemporal), 356 para síndrome metabólica, 201 patogenia da, 8 193q
Medroxiprogesterona Moduladores seletivos da resposta aos tipo 2A distúrbios reprodutivos e, 147, 190
para contracepção, 150 estrogênios (SERM) fatores genéticos na, 286, 287f distúrbios respiratórios e, 190, 193q
para menorragia, 156 ação do, 349 feocromocitoma na, 101, 102, 286, doença cardiovascular e, 190, 193q
para síndrome do ovário policístico, no tratamento/prevenção da 289 doença hepática e, 190
153 osteoporose, 350, 417 hiperparatireoidismo na, 319 etiologia da, 186–187
Megalina, 4 MODY. Ver Diabetes do jovem com manifestações clínicas da, 283q, craniofaringioma na, 187
Meia-vida, hormônio circulante, 3 início na maturidade (MODY) 286, 319 distúrbios hipotalâmicos na, 20, 187
Melorreostose, 361 Monitoração da glicemia, 227–228. triagem para, 287 gasto energético na, 189
Menarca, idade na, 144, 144q, 151 Ver também Controle tipo 2B genética vs. fatores ambientais na,
Meningioma, selar, 19 glicêmico fatores genéticos na, 287, 287f 186
Menopausa, 156 Mononeuropatia, diabética, 219–220 feocromocitoma na, 101 hipertireoidismo na, 188
alívio de sintoma na, 157 RM. Ver Ressonância magnética hiperparatireoidismo na, 319 hipogonadismo hipogonadotrófico
da perimenopausa à, 157 (RM) manifestações clínicas da, 283q, 287, na, 124
função ovariana durante, 343–344 MSH. Ver Hormônio estimulante de 319 ingesta de alimentos na, 189
pós-hirsutismo, 165 melanócito (MSH) triagem para, 287 insulinoma na, 188
431
leptina na, 188f, 189 deficiência de vitamina D e, 310 doença metastática para, 169 Peptídeo inibidor gástrico, produção
síndrome de Cushing na, 188 diagnóstico de, 310 produção de estrogênio no, 141–142, ectópica de, 293q, 295
síndromes genéticas, 186–189, 187q, hiperparatireoidismo secundário e, 142f Peptídeo intestinal vasoativo (VIP), 23,
188q, 402, 420 328 teratoma de, 170 278, 293q
hipertensão e, 190, 193q hipofosfatemia e, 310 tumores medulares sexuais do, 170 Peptídeo relacionado ao PTH, 312
história enfocada na, 191 oncogênica (induzida por tumor), Ovogônia, 139, 139f Peptídeo relacionado com o
induzida por fármaco, 191 293q, 296 Ovulação, 397, 412 paratormônio (PTHrP), 2
manifestações cutâneas da, 190, 193q Osteomielite, tratamento de, 223 Óxido nítrico Peptídeos ovarianos, 142
métodos anticoncepcionais e, 150 Osteonecrose da mandíbula, 351 na ereção, 175, 176f Peptídio C, 245
na síndrome metabólica, 198q, 198, 201 Osteopenia, 341f no ingurgitamento do clítoris, 180 Peptídio YY, 184
prevalência da, 10q, 184 Osteopetrose Peptidomas intestinais vasoativos
tratamento de, 191, 402, 420 achados laboratoriais na, 359 (VIPomas). Ver VIPomas
cirurgia bariátrica, 196–197, 197f, etiologia da, 359 P (peptidomas intestinais
420 fatores genéticos na, 359 Paciente gravemente enfermo, vasoativos)
disposição do paciente para mudar manifestações clínicas da, 359 hipoglicemia em, 240q, 244 Perda de osso, prevenção da, 347. Ver
e, 191 radiografia de, 359 Paciente queimado, hipocalcemia em, também
farmacoterapia, 195 tipos de, 359 314 Osteoporose, tratamento da
meta do, 191 tratamento de, 359–360 Paclitaxel Perda de peso
programa de exercício, 195 Osteopoiquilose, 361 para câncer de ovário, 169 para distúrbios lipoproteicos, 260
ÍNDICE
seleção de, 194f, 194q Osteoporose, 340 para câncer de testículo, 138 para síndrome metabólica, 201
terapia comportamental, 195 abordagem ao paciente, 346, 346f Pamidronato Perda visual, em tumores de hipófise, 20
terapia dietética, 191–195 avaliação laboratorial da, 346, 400, 416 para doença óssea de Paget, 358, 359q Perimenopausa, 156
tratamento baseado no estilo de biópsia de osso na, 346 para hipercalcemia, 294, 313, 330q, definição de, 156
vida, 191 definição de, 340, 401, 417 331 diagnóstico da, 156
triagem e avaliação da, 10q doenças associadas com, 344, 343q, Pancreatite aguda, hipocalcemia na, fisiologia da, 156, 156f
Ocitocina, 39f, 40 400, 416 314, 332 manifestações clínicas da, 156
Octreotida epidemiologia da, 10q, 340, 400, 416 Papilomavírus humano (HPV), 171 transição para menopausa, 157
para acromegalia, 31–32 fisiopatologia da, 341 infecções tratamento de, 156
para diarreia diabética, 221 atividade física na, 344 câncer cervical e, 171 Período pós-parto, tireoidite no, 66
para glucagonoma, 277 deficiência de vitamina D na, considerações globais, 171 Pesagem sob a água, 184
para osteomalácia oncogênica, 296 342–343 vacina, 171 Peso
para síndrome carcinoide, 274 doença crônica na, 344, 343q Pápulas pré-tibiais pigmentadas, no ponto de ajuste do, 189
para VIPoma, 278 estado do estrogênio na, 343–344, diabetes melito, 224 regulação do, 184
Oftalmopatia de Graves, 61, 61f, 63, 343f Paquidermoperiostose, 362–363 risco de doença e, 193q
394, 407 medicações na, 344–345, 343q Paraclorofenilanina, para síndrome PHP. Ver Pseudo-hipoparatireoidismo
Oligomenorreia, 114, 151. Ver também nutrição do cálcio na, 343 carcinoide, 275 (PHP)
Amenorreia remodelamento ósseo na, 341–342, Paraganglioma Picnodisostose, 360
Omentectomia, no câncer de ovário, 169 342f definição de, 99 Pioglitazona, para diabetes melito,
Oncogene(s), no câncer de tireoide, tabagismo na, 345 feocromocitoma e, 102, 103f 232q, 234
72–73, 72q fraturas associadas com. Ver também imagem no, 103f Pirâmide alimentar, 192
Oncogene BRAF, 72q, 73 Fraturas e sítios específicos sítios topográficos, 99, 99f Piridoxina (vitamina B6), faixa de
Oncogene c-MYC, 72q epidemiologia da, 340, 340f, 400, triagem genética para, 102, 102, 104f referência
Ooforectomia, para tumores de célula 416 Paratireoidectomia, 285–287, 324, 338, para, 379q
germinativa ovariana, 171 fatores de risco para, 340f, 340, 399, 415 Pit-1, 14, 49q
Orgasmo 341q, 400, 416 Paratormônio (PTH), 315 Placa de crescimento, mineralização
distúrbio orgásmico feminino, 180 prevenção da ações de, 310, 312, 312f, 315, 353, inadequada da, 310
Orlistate, 196, 201 terapia hormonal pós-menopausa 354f, 399, 416 Plaqueta(s), valores de referência para,
Orquiectomia, para câncer de testículo, na, 157, 158q, 349, 350f avaliação de, 7 367q
134, 137 tratamento/ prevenção da deficiência de, 313–314 Platibasia, 357
Orquite viral, 124 osteoporose para, 347, 417 estrutura do, 310, 316, 317f Plicamicina, para hipercalcemia, 332
Osmorregulação, 39, 44f induzida por glicocorticoide, 355 excesso de, 312 PLTP (proteína de transferência de
Osmorreceptores, 39 marcadores bioquímicos na, 345, 346f fisiologia do, 310 fosfolipídeo), 250
Ossificação medida da massa óssea na, 345, 345f, imunorreativo, no Pneumonia por Pneumocistis (PcP),
ectópica, 363q, 364 345q, 416 hiperparatireoidismo primário, ectópica
extraesquelética, 55q, 363 prevenção da, 157, 158q 322, 323f Polidipsia
Osso tratamento de, 347, 401, 417 metabolismo de, 317 iatrogênica, 42, 44
componentes extracelular do, 298 bisfosfonatos, 350–351, 352f na hipercalcemia, 329–330 primária, 41, 44
estrutura do, 298 calcitonina, 351 no metabolismo cálcio, 6, 326f psicogênica, 41–42, 44
fase mineral do, 298 denosumabe, 353, 353f no tratamento/prevenção da Polineuropatia, diabética, 219–220
lamelar, 299 estrogênios, 349, 350f osteoporose, 353–354, 354f Polipeptídeo vasointestinal, na resposta
metabolismo do, 298 exercício, 349 produção ectópica de, 292, 293q, 313, sexual feminina, 180
mineralização inadequada do, 310 fluoreto, 350–353 420, 421 Polirradiculopatia diabética, 219–220
novo, 299 GH, 355 PTHrP ação e, 317, 317f POMC. Ver Pró-opiomelanocortina
osteoblastos no, 298, 299f, 300f magnésio, 349 secreção de, 316 (POMC)
osteoclastos no, 299, 299f, 300f monitoração de, 355 síntese de, 316 PPHP (pseudo-pseudo-
reabsorção do, 341–342, 343f não farmacológico, 355 via transdutora de sinal para, 2q, 2 hipoparatireoidismo), 336, 336q
remodelamento do, 299, 300f, progestinas, 350 Paroxetina, efeitos adversos da, 191 PRAD 1, 320f, 321
341–342, 342f PTH, 351, 354f Patologia anexial, dor pélvica na, 154 Pramlintide, para diabetes melito, 231,
renovação do, 328 ranelato de estrôncio, 355 PAX-8, 48, 49q 232q
reticulado, 299 recomendações nutricionais, Pé diabético, 222–223 Pravastatina, para hiperlipidemia, 261q
Osteíte fibrosa cística, 320–321, 338 347–349, 348q Pedômetro, 195 Precocidade
Osteoartrite, obesidade e, 190 redução de fator de risco, 347, 348f Pegvisomant, para acromegalia, 32, 286 heterossexual, 120, 121, 144
Osteoblasto(s), 298, 299f, 300f, 357 SERM, 349, 353f Pelo isossexual, 120
Osteoblastoma, 293q suplementação de cálcio, 347–349, ciclo de crescimento do, 163 Prednisona
Osteócito(s), 298 348q remoção, 166 para deficiência de ACTH, 33
Osteoclasto(s), 299f, 299, 300f, 357 tratamento de fratura, 347 terminal, 163 para hipercalcemia da malignidade,
Osteocondrodisplasias, 363 vitamina D, 349 velo, 163 294
Osteocondromatose, 363 vitamina K, 349 Pendrina, 49q, 50 para hipercalcemia, 313
Osteodistrofia hereditária de Albright, triagem para, 10q, 400, 417–418 Peptídeo relacionado com a proteína para HSRC, 166
336 Osteoprotegerina, 342, 343f aguti (AgRP), 185, 187q, 187, para oftalmopatia de Graves, 64
Osteodistrofia renal, 328 Osteosclerose, 361 188f para tireoidite subaguda, 65
Osteomalácia Ovário. Ver também Câncer de ovário Peptídeo infundibular tubular de 39 Pré-eclâmpsia, na doença trofoblástica
axial, 362 desenvolvimento de, 139, 139f, 140f resíduos (TIP39), 317 gestacional, 173
432
Pregabalina, para neuropatia diabética, Pseudopseudo-hipoparatireoidismo Receptor(s) ativado(s) pelo proliferador efeitos adversos do, 351
228 (PPHP), 336, 336q peroxissômico, 184 no tratamento/prevenção da
Pregnenolona, 77f, 80 Pseudotumor cerebral, 59 Receptores acoplados à proteína G osteoporose, 352f, 351, 355, 417
Pré-hipertensão, 202 Psyllium mucilloid, com orlistate, 196 (GPCRs), 1, 2q, 4–5 para doença óssea de Paget, 359q
Priapismo, 176 PTH. Ver Paratormônio (PTH) Receptores de citocina, 2q, 4f, 5 Roferon-A, 177q
Produção de ACTH e, 295 Puberdade Receptores de hormônio da tireoide, Ritmicidade circadiana, cortisol na, 79f
Produtos finais de glicosilação avançada definição de, 116 52–53, 53f Ritmo circadiano do cortisol, 79f
(AGEs), 217 estágios de, 116, 116f Receptores de hormônio Rosário raquítico, 310
Progesterona normal caracterização de, 1–2 Rosiglitazona, para diabetes melito,
ações da, 142 durante o desenvolvimento famílias de, 1–2, 2q 232q, 234
efeitos adversos da, 177q feminino, 144, 144q receptores de membrana, 4–5, 4f Rosuvastatina, para hiperlipidemia,
Progestinas masculina, 116, 116f receptores nucleares, 5, 5f 261q
em anticoncepcionais orais, 149 precoce Receptores de leptina, 186–187, 187q, rT3 (T3 reverso), 48f
na perimenopausa, 157 feminina, 144, 145q 188f RTH (resistência ao hormônio da
no tratamento/prevenção da masculina. Ver Puberdade precoce, Receptores nucleares de hormônio da tireoide), 52q, 53
osteoporose, 350 masculina tireoide, 52–53, 53f Runx2, 298
para síndrome do ovário policístico, tardia Receptores sensíveis ao cálcio, 312
153 feminina, 144–145, 145q, 146q Receptores serinoquinase, 2q, 5
Pró-hormônio convertase 1, 187q masculina, 120q, 122 Receptores tirosinoquinase, 2q, 4f, 5 S
ÍNDICE
Prolactina, 22 Puberdade precoce 5α-redutase, 165 Salina normal, para SIAD, 294
ação da, 23 feminina, 144, 144q Regime BEP Salpingo-ooforectomia, bilateral
avaliação laboratorial da, 17q masculina para câncer testicular, 137 no câncer de endométrio, 173
secreção de, 23 abordagem ao paciente, 122 para tumores de célula germinativa para câncer de ovário, 169
síntese de, 23 central, 120 ovariana, 171 para tumores de célula germinativa
Prolactinoma, 24 dependente de gonadotrofina, 120 Regime VeIP, para câncer de testículo, ovariana, 171
diagnóstico de, 24–25 etiologia da, 120q, 121f 138 Sandostatin-LAR, para acromegalia, 32
durante a gravidez, 26 independente de gonadotrofina, 120 Regulação autócrina, 7 Sangramento uterino disfuncional, 151
etiologia do, 24 masculina-restrita familiar, 120 Regulação parácrina, 7 Sangue, avaliação laboratorial de,
manifestações clínicas do, 24 tratamento de, 122 Regulator autoimune (AIRE), 92q, 333 365–368q
prevalência do, 24 tumores de célula germinativa Remodelamento ósseo, 341–342, 342f Sarcoidose
testes de triagem para, 21q ovariana e, 170 Renina, produção ectópica de, 293q hipercalcemia na, 313, 327
tratamento de, 25–26, 25f Repaglinida, para diabetes melito, 233, hipocalcemia na, 313
Prométrio, para síndrome do ovário 233q hipopituitarismo na, 15
policístico, 153 Q Reserpina, efeitos adversos da 177q Sarcoma
Pró-opiomelanocortina (POMC) Quilomícron(s) Reserva ovariana, 147 síndromes paraneoplásicas no, 293q
deficiência, 93q características de, 248q Resistência à insulina uterino, 172, 173
na obesidade, 187, 187q, 188f elevados, 252, 254q ácidos graxos livres no, 199 Saúde global
produção de ATCH ectópica e, 295 Quimioterapia do câncer anticorpos e, 291 câncer cervical, 171
PROP-1, 14, 49q, 93q complicações reprodutivas/endócrinas autoimune, 291 diabetes melito, 205, 206f
Propiltiouracil, para doença de Graves, da, 124 distúrbios lipoproteicos e, 257 distúrbios sexuais do
62 intraperitoneal, 169 fisiopatologia da, 211 desenvolvimento, 114
Proporções eunucoides, 119 na síndrome metabólica. Ver hiponatremia, 61
Propranolol Síndrome metabólica Saxagliptina, para diabetes melito, 232q,
para doença de Grave, 63 R obesidade e, 186, 189–190 233q
para feocromocitoma, 100 Rabdomiólise, hipocalcemia na, 314 síndromes de, 211 Secretagogos da insulina
Prostaglandina E2, produção ectópica Radiografia tratamento de, 203 efeitos adversos do, 233
de, 293q na displasia fibrosa, 362, 362f Resistência à síndrome da insulina. Ver para diabetes melito tipo 2, 231–233,
Prostaglandina(s), na dismenorreia, 154 na doença óssea de Paget, 357, 358f, Síndrome metabólica 232q, 233q
Proteína(s) 358f Resistência ao hormônio tireoidiano propriedades do, 231–233, 233q
associada à lipoproteína, 248–249 na osteopetrose, 360 (RTH), 52q, 53 Sedativo-hipnóticos, efeitos adversos
de ligação do hormônio da tireoide, 52 na síndrome de Mcune-Albright, 362 Resistência ao paratormônio, 337, 337f de, 179q
de ligação sérica, 51–52 Radioterapia Respirações de Kussmaul, 213 Sede
relacionada ao PTH, 317 efeitos adversos da Resposta imune/sistema imune, valores defeitos na, 44
Proteína C, valores de referência, 367q câncer de tireoide, 71 de referência, 368–376q mecanismo da, 40
Proteína C-reativa, valores de referência, disfunção testicular, 124 Resposta sexual, fisiologia da Sela vazia, 16, 392, 405
370q hipófise, 15, 22, 93q feminina, 179–180 Selênio, faixa de referência para, 379q
Proteína de desacoplamento para acromegalia, 32 masculina, 175–176, 176f Sepse, hipoglicemia na, 244
mitocondrial, 185 para câncer de testículo, 137 Ressonância magnética (RM) Septo vaginal, 152
Proteína de transferência de ésteres de para tumores de hipófise, 22 em tumores de hipófise, 21, 20f Sequestradores de ácido biliar
colesteril (CETP), 249f Raloxifeno em tumores pancreáticos endócrinos, efeitos adversos de, 202, 232q, 234, 262
deficiência de, 257 para ginecomastia, 127 279–280 para diabetes melito tipo 2, 232q, 234
Proteína de transferência de fosfolipídeo para prevenção e tratamento na HSRC, 98f para distúrbios lipoproteicos, 261–
(PLTP), 250 osteoporose, 350, 353f, 417 na síndrome de Cushing, 85, 85f 262, 261q
Proteína G, 4f, 5 Ranelato de estrôncio, para osteoporose, no carcinoma adrenocortical, 91f para síndrome metabólica, 202
Proteína relacionada com o 355 Retardo do crescimento intrauterino, Serotonina (5-HT)
paratormônio (PTHrP), 317 Ranitidina, efeitos adversos da, 177q distúrbios testiculares e, 113 na síndrome carcinoide, 273
ações de, 317, 317f RANK (ativador de receptor de NFκB), Retinopatia diabética síntese, secreção e metabolismo da,
estrutura da, 317–318, 317f 342, 343f, 356, 356f controle glicêmico e, 217, 217f 266–268, 268f
produção ectópica de, 292, 293q RANKL, 342, 343f incidência de, 217 Sexo
PTH e, 317, 317f Razão aldosterona-renina (RAR), 87, manifestações clínicas da, 217–218, cromossômico, 106, 106f
Proteína S, valores de referência, 367q 88q 218f, 395, 409 fenotípico, 108, 108f
Proteínas de ligação de hormônio da Razão cintura-quadril, 190, 191 tratamento de, 218 gonadal, 106–107, 106f
tireoide, anormalidades de, 51–52 Receptor de paratormônio (PTH)/ Rho-quinase, 175 Sexo fenotípico
Proteinoquinase A, 79 PTHrP, 317, 317f Riboflavina (vitamina B2),faixa de definição de, 108
Proteinoquinase C, 216 Receptor do hormônio tireoestimulante referência para, 379q distúrbios de, 110
Pseudo-hermafroditismo (TSH-R), 48, 49q, 70, 70f, 72q Rimonabanto, 196 SIA. Ver Síndrome da insensibilidade a
familiar, 113, 114q Receptor do hormônio luteinizante Riquétsias androgênios (SIA)
Pseudo-hipoparatireoidismo (PHP) (LH), distúrbios de, 110, 143q deficiência de vitamina D e, 310 SIAD. Ver Síndrome de antidiurese
classificação do, 336, 336q Receptor(es) de canabinoide, 196 dependente de vitamina D inapropriada (SIAD)
fatores genéticos no, 326f, 337, 337f Receptor(es) de membrana, 4, 4f tipo I, 336 Sibutramina, 195, 202
hipocalcemia e, 336 Receptor(es) nuclear(es), 5, 5f tipo II, 336 Sildenafil
tipos de, 337 ação hormonal via, 4 diagnóstico de, 310 ação do, 175, 176f
tratamento de, 337 sinalização, 5, 5f Risedronato efeitos adversos do, 178
433
para disfunção erétil, 178 causada por produção ectópica de Síndrome de Smith-Lemli-Opitz, 92q Síndromes poliglandulares autoimunes
Simpatomiméticos, efeitos RAR de, 88q ACTH, 293q, 295 Síndrome de Swyer, 110, 143q (SPA)
Simvastatina diagnóstico de, 295 Síndrome de Turner, 108 diagnóstico da, 291
efeitos adversos da, 261q etiologia da, 295, 394, 407–408 fisiopatologia da, 108 disfunção testicular por, 124
para hiperlipidemia, 261q manifestações clínicas da, 295 insuficiência ovariana primária na, efeitos em órgãos endócrinos
Sinal de Chvostek, 314, 415 tratamento de, 295 153 múltiplos da, 289, 290q
Sinal de Pemberton, 68 diagnóstico da, 33–34, 34q, 83, 84f, manifestações clínicas da, 108, 109q, manifestações clínicas da, 289, 290q
Sinal de Trousseau, 314, 415 85f, 391, 404, 405 397, 413 tipo I, 289, 290q, 336
Síndrome APECED (poliendocrinopatia diagnóstico diferencial de, 85–86 prevalência da, 10q tipo II, 290, 290q
autoimune-candidíase-displasia distúrbios lipoproteicos na, 257 tratamento de, 110 tratamento de, 291
ectodérmica), 91, 289, 290q epidemiologia da, 82 triagem e avaliação da, 10q, 397, 413 Síndromes de neoplasia endócrina
Síndrome carcinoide, 272 etiologia da, 33, 82q, 81, 394, 407–408 Síndrome de Verner-Morrison, múltipla (NEM)
atípica, 274 hirsutismo na, 165, 166 285, 413 definição de, 283
diagnóstico da, 274 manifestações clínicas da, 33–34, 33q, Síndrome de Williams, 327 síndromes mistas, 283q. Ver
incidência de, 267q 81–82, 83f, 83q, 391, 404 Síndrome de Zollinger-Ellison (SZE), também síndrome de Carney;
localizações tumorais na, 267q obesidade/gordura abdominal na, 187, 275 Neurofibromatose tipo 1 (NF1);
manifestações clínicas da, 267q, 271q, 191 diagnóstico da, 276, 397–398, 413 doença de von Hippel-Lindau
272, 398, 413 prevalência da, 33 distribuição tumoral na, 267q tipo 1. Ver Neoplasia endócrina
patobiologia da, 267q, 268f, 273 tratamento de, 34–35, 35f, 84f epidemiologia da, 267q múltipla tipo 1 (NEM 1)
ÍNDICE
tratamento de, 274, 274f, 413 tumores pancreáticos endócrinos e, fisiopatologia da, 267q tipo 2. Ver Neoplasia endócrina
tumores carcinoides associados com, 279 manifestações clínicas da, 267q, 275, múltipla tipo 2 (NEM 2)
266–268, 268q, 271 vs. doença de Cushing, 81–82 397–398, 413 Síndromes de resistência hormonal, 8
Síndrome da diarreia aquosa, 285 Síndrome de DiGeorge, 333 NEM 1 e, 276 Síndromes do tipo
Síndrome da feminilização testicular. Síndrome de excesso aparente de tratamento de, 276, 286 hiperparatireoidismo, 325
Ver Síndrome da insensibilidade mineralocorticoides (EAM), 86 Síndrome do carpinteiro, 188q Síndromes paraneoplásicas
a androgênios (SIA) Síndrome de Gorlin (síndrome do Síndrome do ducto mülleriano definição de, 292
Síndrome da hipotermia periódica, 20 carcinoide de célula basal persistente, 113 endocrinológicas, 292, 293q
Síndrome da hipoventilação da nevoide), 170 Síndrome do glucagonoma, 285 Sirolimo, monitoração terapêutica
obesidade, 190 Síndrome de Kallmann Síndrome do leite álcali, 312, 329 do, 378
Síndrome da insensibilidade a etiologia da, 14 Síndrome do ovário policístico (SOP) na Sistema paraganglial, 99, 99f
androgênios (SIA) fatores genéticos na, 14, 123 HSRC, 114–115 Sistema renina-angiotensina-
amenorreia na, 152 manifestações clínicas da, 14 distúrbios menstruais na, 153 aldosterona (RAA), regulação
completa, 113 Síndrome de Kearns-Sayre hirsutismo na, 163, 164 do, 78, 79f
disfunção testicular por, 125 fatores genéticos na, 92q infertilidade na, 147 Sistemas harvesianos, 298, 299
fatores genéticos na, 113 hipocalcemia e, 333 na síndrome metabólica, 201 Sitagliptina, para diabetes melito, 232q,
ginecomastia por, 125 manifestações clínicas da, 92q, 333 obesidade e, 190 233q
manifestações clínicas da, 143q, 113 Síndrome de Kenney-Caffey, 333 prevalência da, 10q Sitosterolemia, 251q, 252, 419
parcial, 113 Síndrome de Klinefelter, 108 resistência à insulina na, 211 Somatostatina
Síndrome da insulina autoimune, com fatores genéticos na, 124 tratamento de, 153 estrutura da, 274, 274f
hipoglicemia, 291 fisiopatologia da, 108 triagem e avaliação da, 10q síntese de, 27
Síndrome da lise tumoral, hipocalcemia ginecomastia na, 109, 124 Síndrome do testículo ausente Somatostatinoma, 277
na, 314 hipogonadismo por, 124 (desparecido), 110 diagnóstico de, 278
Síndrome da miopatia mitocondrial, manifestações clínicas da, 108–109, Síndrome do X frágil, 153 etiologia do, 277
encefalopatia, acidose láctica 109q, 124, 397, 413 Síndrome IMAGe, 92q localização tumoral no, 267q
e acidente vascular encefálico prevalência da, 10q Síndrome MELAS (miopatia manifestações clínicas do, 267q, 277
(MELAS), 333 tratamento de, 109 mitocondrial, encefalopatia, tratamento de, 278
Síndrome da quilomicronemia familiar, triagem e avaliação da, 10q acidose láctica e acidente Somatotropo, 12q, 18q
252 Síndrome de Laron, 29 vascular encefálico), 333 Sorafenibe, para câncer de tireoide, 75
Síndrome de Ahlstrom, 188q Síndrome de Laurence-Moon-Biedl, Síndrome metabólica, 198 SOP. Ver Síndrome do ovário
Síndrome de antidiurese inapropriada 123, 188q adiponectina na, 201 policístico (SOP)
(SIAD) Síndrome de Liddle, 88 apneia do sono e, 201 SPA (síndrome poliglandular
associada a tumor, 294 Síndrome de Lynch. Ver Câncer de colo circunferência da cintura e, 200 autoimune), 91–92, 92q, 153
diagnóstico de, 294 hereditário não poliposo citocinas na, 200–201 StAR (proteína de regulação aguda
etiologia da, 294 Síndrome de Maffuci, 170, 362 diabetes melito e, 198, 201, 203, 211 esteroidogênica), 112, 143q
manifestações clínicas da, 294 Síndrome de Mayer-Rokitansky-Kuster- diagnóstico de, 198q, 201 Subandrogenização de feto 46,XI,
tratamento de, 294 Hauser, 115, 152 dislipidemia na, 200 110–114
diagnóstico diferencial de, 46q, Síndrome de McCune-Albright doença cardiovascular e, 198, 201 Subpeso, 193q
46–47 achados laboratoriais na, 362 epidemiologia da, 198, 199f Substância inibitória mülleriana, 170
disfunção osmorregulatória na, 44f achados radiográficos na, 362, 362f esteatose hepática e, 201 Sulfato de magnésio, para eclâmpsia
etiologia da, 45–46, 45q fatores genéticos na, 83, 121, 326f, 362 estilo de vida sedentário e, 198 na gravidez, 399, 414
fisiopatologia da, 46 manifestações clínicas da, 18, 83, 121, fatores de risco para, 199 Sulfonilureias
tratamento de, 47 362 fisiopatologia da, 199–201, 200f efeitos adversos das, 191, 231
Síndrome de Asherman, 152 síndrome de Cushing na, 83 hipertensão na, 200, 202 interações farmacológicas de, 231
Síndrome de Bardet-Biedl, 14, 187 tratamento de, 362 hiperuricemia/cálculos de ácido úrico propriedades das, 233q
Síndrome de Bartter, 334 tumores de hipófise na, 18 na, 201 Superalimentação, 184
Síndrome de Burnett, 329 Síndrome de Nelson, 35 idade e, 198 Suplementos de óleo de peixe, para
Síndrome de Buschke-Ollendorff, 361 Síndrome de Pallister-Hall, 19 intolerância à glicose na, 200 distúrbios lipoproteicos,
Síndrome de Carney Síndrome de Pendred, 50 lipodistrofia e, 199 261q, 263
doença suprarrenal nodular na, 81 Síndrome de Peutz-Jeghers, 170 manifestações clínicas de, 201 Suporte/terapia nutricional
fatores genéticos na, 289 Síndrome de poliendocrinopatia obesidade e, 201 para diabetes melito, 227, 226q
manifestações clínicas da, 18q, 289 autoimune-candidíase-displasia resistência à insulina na, 199, 203 para distúrbios lipoproteicos, 260
tumores de hipófise na, 18, 18q ectodérmica (APECED), 91, síndrome do ovário policístico e, 201 para obesidade, 192, 194f, 194q
Síndrome de Cohen, 188q 289, 290q tratamento de, 201–203 para síndrome metabólica, 201
Síndrome de Conn, 85, 394, 408. Síndrome de Prader-Willi Síndrome perdedora de magnésio, 305,
Ver também Excesso de fatores genéticos na, 15, 123, 187 306q
mineralocorticoide hipopituitarismo por, 15 Síndrome POEMS (síndrome de T
Síndrome de Crow-Fukase (síndrome manifestações clínicas da, 15, 123, Crow-Fukase), 291 T3. Ver Tri-iodotironina (T3)
POEMS), 291 187, 188q, 420 Síndrome poliglandular autoimune T3 reverso (rT3), 48f
Síndrome de Cushing, 33, 81 obesidade na, 187, 188q (SPA), 91–92, 92q, 153 T4. Ver Tiroxina (T4)
ACTH-dependente vs. ACTH- Síndrome de Reifensten, 113 Síndrome velocardiofacial, hipocalcemia Tabagismo
independente, 34, 34q Síndrome de Sanjad-Sakati, 333 e, 333 câncer cervical e, 171
amostragem da veia petrosa inferior Síndrome de Sheehan, 15, 153, Síndrome X. Ver Síndrome disfunção erétil e, 176
na, 34 392, 404 metabólica osteoporose e, 344
434
Tacrolimo, monitoração terapêutica testosterona em gel, 129q, 130 TEV (tromboembolia venosa), terapia TPO. Ver Tireoperoxidase (TPO)
do, 378q usos farmacológicos de, 130 hormonal pós-menopausa e, Tranquilizantes, efeitos adversos de,
Tadalafil Terapia de reposição hormonal 157, 158q 177q
ação do, 175, 176f para hipopituitarismo, 16, 18q Tg. Ver Tireoglobulina (Tg) Transformação maligna, 138
efeitos adversos do, 178 pós-menopausa. Ver Terapia Tiamina (vitamina B1) Transplante de células-tronco
para disfunção erétil, 178 hormonal pós-menopausa faixa de referência para, 379q hematopoiéticas, para
Tamoxifeno Terapia hídrica para dismenorreia, 154 osteopetrose, 359
efeitos adversos de, 172 para CAD, 213–215 Tiazolidinedionas Transplante de fígado, para TNEs
para ginecomastia, 126 para EHH, 215 ação de, 232q, 234 metastáticas, 281
para prevenção e tratamento da para hipercalcemia, 313 efeitos adversos de, 191, 232q Transtirretina (TTR), eutireoide
osteoporose, 350 Terapia hormonal pós-menopausa, 157 para diabetes melito tipo 2, 232q, 234 hipertireoxinemia e, 52q
Taxa metabólica em repouso (basal), 184 abordagem à paciente, 160–161, 161f para resistência à insulina na Trastuzumabe, para câncer de ovário,
Taxanos, para câncer de ovário, 169 benefícios da, 157, 158q síndrome metabólica, 203 170
TBG (globulina de ligação de tiroxina), câncer de endométrio e, 16 Tiludronato, para doença óssea de TRH (hormônio liberador de
52q, 54 candidatas para, 160, 161f Paget, 359q tireotrofina), 23, 37
TC. Ver Tomografia computadorizada descontinuação da, alterações do Tionamidas, para doença de Grave, 62 Tríade de Whipple, 240, 397, 411
(TC) estado de saúde subsequentes à, TIP39 (peptídeo infundibular tubular de Triglicerídeos
Tecido adiposo, 186 160 39 resíduos), 317 de VLDLs, 250
Tecido adiposo marrom, 185 para prevenção de fratura Tireoglobulina (Tg) elevados, distúrbios lipídicos
ÍNDICE
Tecnologias de reprodução assistida, 148 osteoporótica, 350, 350f na tireotoxicose, 54 associados com, 253–255, 254q
Tecoma, do ovário, 170 riscos associados com, 157–160, 158q, no hipertireoidismo congênito, 48, normal, LDL–C elevada e, 250q,
Telarca, 144 397, 413 49q 250–253
Telógeno, 163 riscos e benefícios prováveis ou no seguimento do câncer de tireoide redução do nível de, 202
Tempestade tireóidea (crise tireotóxica), incertos da, 158–159q, 159–160 follow-up, 54, 75 Tri-iodotironina (T3)
64 Terapia imunossupressora, efeitos Tireoidectomia avaliação laboratorial de, 53–54
Teofilina, monitoração terapêutica da, adversos da, 345 hipocalcemia subsequente, 399, 415 características da, 51q
379q Terapia modificadora de lipídeo. Ver para doença de Grave, 62–63 estrutura da, 48f
Terapia a laser Distúrbios lipoproteicos, para gota não tóxica difusa, 68 livre, 54
para remoção de pelo, 166 tratamento de Tireoidite, 64 Trilostano para síndrome de
Terapia cognitivo-comportamental Terapia sexual, 179 aguda, 64, 65q Cushing, 35
(TCC), para obesidade, 196 Teratoma atrófica, 55 Troglitazona, 234
Terapia com androgênio. Ver também ovariano, 170 crônica, 64, 66 Tromboembolia venosa (TEV), terapia
Terapia com testosterona paraselar, 20 de Hashimoto, 55 hormonal pós-menopausa e,
contraindicações à, 131, 131q testicular, 134, 138 de Quervain, 65, 394, 407 157, 158q
efeitos adversos da, 131, 132q Teriparatida, para prevenção e de Riedel, 66 TSH. Ver Hormônio tireoestimulante
novas formulações de, 130 tratamento da osteoporose, destrutiva, 64 (TSH)
para disfunção sexual feminina, 180 353, 354f etiologia da, 65q TSH-R (receptor do hormônio
regimes recomendados, 131 Termogênese, 185, 189 gotosa, 55 tireoestimulante), 70, 70f, 72q
usos farmacológicos da, 130 Termogênese da atividade fora do granulomatosa, 65 TSI. Ver Imunoglobulinas
Terapia com bicarbonato, para CAD, exercício, 189 induzida por fármaco, 66 tireoestimulantes (TSI)
215 Teste da carga de sódio, 88 pós-parto, 66 TTF-1, 48, 49q
Terapia com calor, para dismenorreia, Teste da infusão de salina, 88 silenciosa (indolor), 66, 394, 407 TTF-2, 48, 49q
154 Teste da resina de captação de T3, 54 subaguda, 65, 65q, 65f Túbulos seminíferos, 117f, 118–119
Terapia com estrogênio. Ver também Teste de supressão com dexametasona, viral, 65 Tumescência peniana, 175
Terapia hormonal pós- 166, 188 Tireoperoxidase (TPO) Tumor de Brenner, 168
menopausa Teste de supressão com fludrocortisona, no desenvolvimento tireoide, 48, 49q Tumor de célula germinativa
câncer de endométrio e, 16 88 no hipertireoidismo autoimune, 54 extragonadal, 138
efeitos adversos da, 176, 177q Teste de tolerância à insulina, 78 Tireotoxicose, 48, 59. Ver também ovariano, 170
para amenorreia, 153 Testes laboratoriais clínicos, valores de Doença de Grave Tumor de célula gigante, síndromes
para contracepção, 148–150 referência apática, 60 paraneoplásicas no, 293q
para disfunção sexual feminina, 180 bioquímica clínica e imunologia, definição de, 59 Tumor de células da granulosa, do
para hirsutismo, 166 368–376q etiologia da, 59q, 64 ovário, 170
para síndrome de Turner, 110 colesterol, 380q factícia, 54, 65 Tumor de Krukenberg, 168
Terapia com iodo radioativo hematologia e coagulação, 365–368q hipertireoidismo primário e, 59q Tumor de saco vitelino, do ovário, 170
para câncer de tireoide, 74 toxicologia e monitoração induzida por amiodarona, 67 Tumor de Sertoli-Leydig, 170
para doença de Graves, 63 farmacológica terapêutica, manifestações clínicas da, 60–61, 60q, Tumor embrionário, síndromes
para feocromocitoma maligno, 101 376–378q 61f paraneoplásicas em, 293q
para gota multinodular tóxica, 69 vitaminas e oligominerais, 379q sem hipertireoidismo, 59q Tumor mesenquimal, síndromes
para nódulo de tireoide solitário Testículo/testículos, 116 subclínica, 69 paraneoplásicas no, 293q
hiperfuncional, 69–70 atrofia de, na doença sistêmica, 125 Tireotrofo, 6q Tumor sinusal endodérmico, testicular,
Terapia com testosterona biópsia de, 120 Tiroxina (T4) 134
abuso de, 132–133 defeitos adquiridos de, 125 avaliação laboratorial de, 53–54, 393, Tumores carcinoides, 271
adesivo bucal de testosterona, 129q, desenvolvimento de, 37 406 bronquiais, 268q, 271
130 disgênese de, 110, 143q características da, 51q, 393, 406 características de, 266q
adesivo transdérmico, 129q, 130, disgenética, 110, 143q estrutura da, 48f características gerais do, 271
129q, 179 distúrbios de, 119 livre, 54 classificação do, 266–268, 269
contracepção hormonal masculina e, estrutura do, 37 Tomografia computadorizada (TC) com síndrome carcinoide, 266–268,
131 regulação da função de em tumores pancreáticos endócrinos, 268q, 271
contraindicações para, 131, 132q eixo hipotálamo-hipófise-testículo 280, 280f com sintomas sistêmicos por produtos
derivados orais, 129q, 130 na, 117, 117f na HSRC, 98f secretados, 272
efeitos adversos da, 131, 131q espermatogênese e, 117f, 118–119 na medida da massa óssea, 345 de apêndice, 268q, 271
farmacologia da, 129q síntese de androgênio em, 117, 117f na NEM 1, 286 de intestino delgado, 268q, 271, 271q
formas injetáveis de, 130, 129q Testosterona na síndrome de Cushing, 85f, 85 diagnóstico do, 275, 280, 280f
formulações indisponíveis nos EUA, biodisponível, 120 no excesso de mineralocorticoide, 87 em NEM 1, 285
130 ensaios de, 120 Tomografia computadorizada Xtreme, fatores prognósticos no, 269q
monitoração de, 131, 131q não ligada, medida da, 120 na medida da massa óssea, 345 gástrico, 268q, 271
novas formulações de androgênio, 130 no hirsutismo, 165 Topiramato, 196 incidência de, 269
para disfunção erétil, 178 total, testes de, 120 Topotecano, para câncer de ovário, 169 metastático
para disfunção reprodutiva transporte e metabolismo da, 118, Torsão do ovário, 154 prevalência de, 268q
relacionada à idade, 126–127, 118f Torsão testicular, disfunção testicular tratamento de, 280–281, 281f
128 Testosterona adesiva bucal, 129q, 130 por, 125 não metastático, tratamento de, 275
para hipogonadismo, 36 Testosterona em gel, 129q, 130 Toxicidade do alumínio, hipercalcemia retal, 268q, 271
regimes para, 131 Testotoxicose, 121 por, 328 sem síndrome carcinoide, 271–272
435
síndromes genéticas associadas com, síndromes genéticas associadas com, V Vitamina B12 (cobalamina), faixa de
270, 270q 270, 270q Vagina referência para, 379q
síndromes paraneoplásicas no, 293q, tratamento de, 61f, 280–281 ausência congênita da, 115 Vitamina B2 (riboflavina), faixa de
295 Tumores neuroendócrinos cega, 152 referência para, 379q
sítios de, 268, 268q gastrintestinais, 266, 266q, Valproato/ácido valproico Vitamina B6 (piridoxina), faixa de
Tumores da hipófise (adenomas), 16 267q. Ver também Tumores efeitos adversos de, 191 referência para, 379q
secretores de ACTH, 34, 34q. Ver carcinoides; Tumores monitoração terapêutica de, 379q Vitamina C, faixa de referência para,
também Síndrome de Cushing pancreáticos endócrinos Vancomicina, monitoração terapêutica 379q
diagnóstico de, 20 Tumores pancreáticos endócrinos, da, 379q Vitamina D, 307
avaliação histológica em, 21 275. Ver também Gastrinoma; Vardenafil, 175, 176f, 178 ativação de, 308, 308f
avaliação oftalmológica em, 21 VIPomas (peptidomas Variações em c-kit, em tumores deficiência de
efeitos em massa locais, 19–20, 20q intestinais vasoativos) de célula germinativa anticonvulsivos e, 336
exames laboratoriais em, 21–22, características gerais de, 266q ovariana, 170 diagnóstico de, 310, 314
21q, 391, 404 classificação de, 268, 267q, 269 Varredura da tireoide, 55 dieta e/ou exposição à luz solar
RM em, 21, 20f fatores prognósticos no, 269q Varredura da tireoide de corpo inteiro, inadequada e, 336
produtor de gonadotrofina, 36 glucagonoma. Ver Glucagonoma para seguimento do câncer de doença ileal terminal e, 309
síndromes de excesso de hormônio GRFomas, 279 tireoide, 75 em idosos, 309, 399, 414
por, 12 insulinoma. Ver Insulinoma Varredura óssea, na doença óssea de etiologia de, 309, 310q
efeitos em massa locais, 19–20, 20q localização do, 279–280 Paget, 358 hipocalcemia e, 313
ÍNDICE
na síndrome de Mccune-Albright, 18 manifestações clínicas de, 267q, 275 Varreduras/cintilografia com hipomagnesemia e, 308
efeitos metabólicos de, 20 misnômero de, 269 radionuclídeo manifestações clínicas da, 310
metastático, 19 na NEM 1, 285, 286 em tumores pancreáticos endócrinos, osteomalácia por, 310
não funcional, 37, 37f não funcional, 279 279–280 osteoporose associada com,
patogenia de, 16 definição de, 279 no tumor carcinoide, 280f 342–343
prevalência do, 16 diagnóstico de, 279 Vasculatura hipotalâmica-hipofisária, 13f prevalência da, 10q, 309
insuficiência suprarrenal secundária e, manifestações clínicas de, 279 Vasectomia, 149q, 148 riquétsias por, 310
92–93, 93q tratamento de, 279 Vasopressina. Ver também Arginina- tratamento de, 308, 311, 314
lesões em massa selares, 18–19, 20q, 124 prevalência do, 267q, 269 vasopressina (AVP) triagem e avaliação de, 10q, 415
tratamento de síndrome de Cushing e, 279 produção ectópica de. Ver Síndrome faixa de referência para, 379q
cirúrgico, 21–22, 22f síndromes genéticas associadas com, de antidiurese inapropriada metabolismo de, 308, 308f, 309f
médico, 23, 391, 404 270, 270q (SIAD) metabolismo defeituoso de, 336,
radioterapia, 22 síndromes paraneoplásicas Venlafaxina, para sintomas da 399, 415
secretor de TSH, 37 no, 293q menopausa, 157 no tratamento/prevenção da
tireotoxicose por, 65 síndromes raras, 279 “Vértebra de marfim,” 357, 418 osteoporose, 349
classificação de, 16, 18q somatostatinoma. Ver Vertebroplastia, 355 para hipocalcemia, 338–339
na síndrome de Carney, 18, 18q Somatostatinoma Via transdutora de sinais, famílias para hipoparatireoidismo, 336
na acromegalia familiar, 18, 18q tratamento de, 275, 281 de receptor de membrana resistência à, 313, 336
em NEM 1, 17, 18q, 283q, 285, 286 Tumores suprarrenais testiculares em e, 2q síntese de, 308, 308f, 309f
Tumores de célula germinativa repouso, 97, 98f Vias enzimáticas esteroidogênicas, suplementos, para hipocalcemia, 314
cerebrais, 20 distúrbios de, 112, 143q, 113 toxicidade de, 327
Tumores de células de ilhota, em NEM Vildagliptina, para diabetes melito, Vitamina E
1, 286 U 232q, 233q faixa de referência para, 379q
Tumores de fator liberador de hormônio UDCA (ácido ursodesoxicólico), 195 Vinblastina suplementos
do crescimento (GRFomas), Úlceras do pé, no diabetes melito, 223, para câncer de testículo, 138 para dismenorreia, 154
267q, 279 395, 410 para doença trofoblástica gestacional, para sintomas da menopausa, 157
Tumores endócrinos Ultrassonografia endoscópica (USE), 174 Vitamina K
do pâncreas. Ver Tumores em tumores pancreáticos Vincristina faixa de referência para, 379q
pancreáticos endócrinos endócrinos, 279 para doença trofoblástica gestacional, para tratamento/prevenção da
gastrintestinal, 266, 266q. Ver também Ultrassonografia transvaginal, no câncer 174 osteoporose, 349
Tumores carcinoides de ovário, 168 para feocromocitoma maligno, 101 Vitamina(s), faixas de referência
Tumores estromais, ovarianos, 170 Ultrassonografia VIP (peptídeo intestinal vasoativo), 23, para, 379q
Tumores medulares sexuais, ovarianos, na avaliação da disfunção da 278, 293q VLDLs. Ver Lipoproteínas de densidade
170 tireoide, 55 VIPomas (peptidomas intestinais muito baixa (VLDLs)
Tumores neuroendócrinos (TNEs). Ver na medida da massa óssea, 345 vasoativos), 278
também Tumores carcinoides Unidade pilossebácea, 163 diagnóstico de, 278, 413
bem diferenciado, 269 Uso de álcool localizações tumorais no, 267q Z
biologia de, 266–268, 266q disfunção testicular por, 125 manifestações clínicas de, 267q, 278, Zoledronato (ácido zoledrônico)
classificação de, 266–268, 266q metabolismo de lipoproteína e, 257 398, 413 para doença óssea de Paget, 358,
fatores prognósticos no, 269q Uso de tabaco. Ver Tabagismo tratamento de, 278 359q
gastrinomas. Ver Gastrinoma Uso/abuso de maconha, 177q Virilização, 163 para hipercalcemia, 294, 313, 330q,
gastrintestinal, 266, 266q Útero, distúrbios do Vitamina A 332
metastático, 280–281 amenorreia no, 152, 152f faixa de referência para, 379q para tratamento/prevenção da
pancreático. Ver Tumores pancreáticos câncer. Ver Câncer de endométrio toxicidade da, 328 osteoporose, 352f, 351
endócrinos dor pélvica no, 154 Vitamina B1. Ver Tiamina Zonas de Looser, 310–311
patologia de, 266–268, 266q tratamento de, 153 (vitamina B1) Zonisamida, 196
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