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Building the way

HISTÓRIA DOS BRINQUEDOS: CULTURA E PODER

TOYS HISTORY: CULTURE AND POWER

Laís Naiara Gonçalves dos Reis


Doutora em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU)
56 geografalais2013@gmail.com

Danley Rodrigues de Carvalho


Discente do curso de Pedagogia do Instituto Paulo Freire
danleyrodrigues@hotmail.com

Resumo: O estudo da história dos brinquedos revela que eles surgiram no contexto
das guerras. Foram criadas as miniaturas (soldados, cavalos, canhões, etc.) para
serviram de peças de movimentação estratégica em um tabuleiro de guerra, e que
algumas vezes eram manipulados pelas crianças. A apresentação dos brinquedos
para as crianças se dá de forma impositiva (relação de poder), em que os adultos
apresentam os objetos para elas e que somente depois é que vai acontecer a
transformação destes em brinquedos. Quando por meio da imaginação, as crianças
realizam o ato de brincar. Sendo assim, em cada sociedade essa imposição acontece
de forma distinta em detrimento de cada cultura. O universo das crianças é marcado
por alegrias, angústias e realidades, sendo possível compreender o significado
pedagógico dos brinquedos na construção dos indivíduos e nas práticas de
reprodução social. Tanto os brinquedos quanto as brincadeiras podem ser
consideradas suportes de representação que revelam significados e códigos culturais
sobre a formação do indivíduo social. Deve-se destacar que a pedagogia social, que
surgiu na Alemanha no pós-guerra, tem o intuito de ajudar a formar o papel de cada
indivíduo dentro daquela sociedade. Neste sentido, não podemos descartar o caráter
pedagógico que os brinquedos possuem para incutir nas crianças aquilo que a
sociedade espera que elas sejam e que se reconheçam culturalmente no meio em
que nasceram. Uma vez que a cultura é uma dimensão do processo social, ela
mantém proximidade com as relações de poder, cujos interesses dominantes da
sociedade manifestam sua força. Por meio da análise histórica e sócio pedagógica
dos brinquedos, é possível perceber as relações de poder existentes, revelando a
visão que a sociedade tem de suas crianças, e como a indústria dos brinquedos se
apropria destes conceitos, para produção e venda de seus produtos. Este artigo tem
como objetivo apresentar a história dos brinquedos na sociedade e refletir sobre as
relações de poder existentes no ato de brincar, sobretudo com os brinquedos
industrializados.

Palavras-chave: Poder, Pedagogia, Indústria, Brinquedo.

Abstract: The study of the history of toys reveals that they emerged in the context of
wars. Miniatures (soldiers, horses, cannons, etc.) were created to serve as strategic
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move pieces on a warboard, which were sometimes manipulated by children. The
presentation of toys to children takes place in an imposing way (power relationship), in
which adults present the objects to them and only later will their transformation into
toys. When through imagination, children perform the act of playing. Thus, in each
society this imposition happens differently to the detriment of each culture. The
universe of children is marked by joys, anxieties and realities, being possible to
understand the pedagogical meaning of toys in the construction of individuals and
practices of social reproduction. Both toys and games can be considered
representational supports that reveal cultural meanings and codes about the formation
57 of the social individual. It should be noted that social pedagogy, which emerged in
postwar Germany, is intended to help shape the role of each individual within that
society. In this sense, we cannot discard the pedagogical character that toys have to
instill in children what society expects them to be and to recognize themselves
culturally in the environment in which they were born. Since culture is a dimension of
the social process, it maintains proximity to power relations, whose dominant interests
of society manifest their strength. Through the historical and socio-pedagogical
analysis of toys, it is possible to perceive the existing power relations, revealing the
society's view of its children, and how the toy industry appropriates these concepts for
the production and sale of its products. This article aims to present the history of toys
in society and to reflect on the power relations existing in the act of playing, especially
with industrialized toys.

Keywords: Power. Pedagogy. Industry. Toy.

Considerações iniciais

A análise psicossocial ou pedagógico-social do brinquedo deve ser


compreendida por meio da cultura. E assim, o olhar para este objeto deve se pautar
de modo científico, já que pode ser usado para a construção da infância das crianças,
repassando valores, tradições e também imposições culturais. Destacam-se alguns
pesquisadores nesta temática tais quais: Benjamin (1984), Sutton-Smith (1986), Kline
(1993) e Bougère (1997).
O objeto brinquedo, antes de mais nada, é resultado das características de
uma determinada sociedade. Conforme Benjamin (1984), a apresentação dos
brinquedos para as crianças se dá de forma impositiva, cujos adultos apresentam os
objetos para elas e que somente depois é que vai acontecer a transformação destes
em brinquedos, quando por meio da imaginação, as crianças realizam o ato de brincar.
Nem sempre os brinquedos fizeram parte do universo da criança.
Para Bougère (1997), os brinquedos são dotados de significados e que
podem ser identificados, eles representam elementos reais das sociedades e que
passarão a compor o imaginário das crianças. Para ele, o brinquedo possui um rico

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valor cultural e que por meio da análise do mesmo é possível compreender as relações
culturais das sociedades que o produz.
Com a finalidade de compreender a dimensão histórica e cultural do
brinquedo, entende-se que o brinquedo é uma construção social que é perpassado
para o universo da criança de forma impositiva, que tem como uma das funções fazer
com que as crianças se adaptem às sociedades e se tornem partes executoras e
58 integrantes delas. Desta maneira, este artigo tem como objetivo fazer uma reflexão
teórico-conceitual sobre a dimensão simbólica do brinquedo.

História dos brinquedos

Do século XII até o XVIII aconteceram mudanças históricas que também re


(significaram) o papel das crianças na sociedade. Antes deste recorte histórico-
temporal, a criança era vista dentro de uma visão utilitarista, em que a partir dos sete
anos de idade a mesma já se tornava mão-de-obra e contribuía com a renda do seu
grupo familiar. “No século XVIII passou-se a responsabilizar-se a família pela
educação ou a institucionalização da criança, como, concebiam os filhos como frutos
da possibilidade da ascensão social.” (SANTOS, 2017, p. 44)

A preocupação da família com a educação da criança fez com que


mudanças ocorressem e os pais começassem, então, a encarregar-se
de seus filhos. Houve ainda, a necessidade da imposição de regras e
normas na nova educação e a formação de uma criança melhor
doutrinada, atendendo à nova sociedade que emergia. Tal concepção
de indivíduo que aparece, faz com que a criança seja alvo do controle
familiar ou do grupo social em que ela está inserida (SANTOS, 2017,
p. 44).

É exatamente a mudança de perspectiva de organização de sociedade, que


faz com que a criança seja notada dentro das famílias, e estas passam a ser
responsáveis pela promoção da saúde e educação de seus filhos. Esta nova
sociedade foi fruto de conquistas políticas e econômicas da época moderna. A partir
deste momento, a criança passa a ser vista como indivíduo social, dentro da
coletividade, e a família tem grande preocupação com sua saúde e sua educação.
Tais elementos são fatores imprescindíveis para a mudança de toda a relação social.

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Neste período Rousseau promove uma revolução na pedagogia,
centrando os interesses pedagógicos no aluno e não mais no
professor. Afirma que a criança não é um adulto em miniatura e
destaca ainda que a criança é um ser com características próprias em
suas ideias e interesses. Formulou princípios educacionais que
permanecem até nossos dias, principalmente quando afirmava que a
verdadeira finalidade da educação era ensinar a criança a viver e a
aprender a exercer a liberdade. (SANTOS, 2017, p. 45)

59 Ao se fazer um resgate histórico da origem e evolução do uso dos


brinquedos Von (2001) destacou que há relatos antigos de uso dos mesmos nas
civilizações, “[...] o pião, por exemplo, tem registros cerca de 3 mil anos a.C., na
Babilônia; a bola e o balanço, dentre outros, também estão entre os brinquedos mais
antigos, pois são fáceis de serem produzidos, inclusive pelas próprias crianças” (LIRA,
2009, p. 508). Acredita-se que quando a espécie humana começou a se organizar em
sociedade, os primeiros brinquedos foram criados pelas próprias crianças que
transformaram objetos do cotidiano dos adultos para reproduzirem as relações sociais
dos grupos, tais quais: caça, pesca, e outras atividades ligadas à natureza de uma
forma em geral.
Na sociedade ocidental, por volta do século XI, havia a produção de
miniaturas que eram amuletos para representar familiares falecidos e estes objetos
eram ressignificados pelas crianças que os transformava-os em brinquedos. Na idade
média, a prática de entalhar miniaturas se tornou mais comum, elas eram fabricados
pelos artesãos. É por volta da segunda metade do século XIX que os brinquedos
começam a se desenvolver e incorporam outros materiais, como metais, vidro e
outros. “Com o início do Renascimento, as brincadeiras e brinquedos que serviam
tanto a adultos como crianças, foram se ajustando as especialidades das crianças”
(SANTOS, 2017, p. 46). Sobre as bonecas, a história dos brinquedos revela que:

A boneca de pano, por exemplo, está presente no dia a dia das


crianças e tem origem na pré-história e também no Egito Antigo. Em
Atenas era utilizada como atualmente, um brinquedo, exceto o
simbolismo que a boneca exercia durante o casamento, em que as
mulheres atenienses consagravam suas bonecas à deusa Afrodite. [...]
Para Atzingen (2001), a transição das bonecas de ídolos para
brinquedos provavelmente ocorreu no Egito, há cinco mil anos.
Algumas bonecas tinham braços e pernas articulados e também
cabelo humano. Os meninos romanos se divertiam com bonecos de
cera e argila representando soldados [...] Na Antiguidade Clássica,

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prevalecia o fascínio pelas bonecas. Na Grécia e em Roma, em 500
a.C., as bonecas eram chamadas de outros nomes: nympha e puma,
que significava moça pequena. Já na Idade Média, os estilistas
usavam as bonecas como seus modelos para vesti-las com suas
criações onde as pessoas de posse (rainhas e damas) escolhiam seus
vestidos. (ATZINGEN, 2001) A partir da Idade Contemporânea,
surgiram às primeiras bonecas que falavam mamá e papá foram
produzidas em 1823, aperfeiçoadas em 1880. A Barbie foi criada nos
Estados Unidos em 1959 e revolucionou o conceito de bonecas.
60 (MORAES e ZOMER, 2013)

Havia brinquedos para as crianças do sexo masculino que brincariam no


interior de suas casas, “os soldadinhos de chumbo, pequenas figuras de animais,
blocos em madeira para construção de prédios e pontes, carrinhos, trens, barcos,
todos em miniatura,” (TAVARES RAFFAINI, 2018, [s.p.]). Esses eram construídos de
materiais bem resistentes, como o chumbo, o estanho, vidro, etc. Já Os brinquedos
destinados para as meninas eram feitos de outros materiais, como tecidos, argilas,
cerâmica.
Nem sempre os brinquedos fizeram parte do universo da criança. É
somente por volta do século XVIII, é que a sociedade passa a considerar os
sentimentos da infância. “Tomados como comportamentos naturais da criança, os
jogos e as brincadeiras aos poucos entram nas escolas de educação infantil (como é
o caso do “Jardim da Infância” de Froebel, já no século XIX).” (ALVES, 2009, p. 46)

Brinquedo: Cultura e poder

Na obra “Reflexões: a criança, o brinquedo, a educação” de Walter


Benjamin um pensador do século XX que escreveu sobre o mundo das crianças,
retratou-se como o universo das crianças é marcado por alegrias, angústias e
realidades, e para ele é possível compreender o significado pedagógico dos
brinquedos na construção dos indivíduos e nas práticas de reprodução social. Em
outras palavras, o brinquedo existe por causa do brincar que estimula a compreensão
e reprodução da realidade de uma determinada sociedade. Conforme Benjamin
(1984), a apresentação dos brinquedos para as crianças se dá de forma impositiva:

De uma maneira geral, os brinquedos documentam como o adulto se


coloca com relação ao mundo da criança. Há brinquedos muito
antigos, como bola, roda, roda de penas, papagaio, que

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provavelmente derivam de objetos de culto e que, dessacralizados,
dão margem para a criança desenvolver sua fantasia. E há outros
brinquedos, simplesmente impostos pelos adultos enquanto
expressão de uma nostalgia sentimental e de falta de diálogo. Em
todos os casos, a resposta da criança se dá através do brincar, através
do uso do brinquedo, que pode enveredar para uma correção ou
mudança de função. E a criança também escolhe os seus brinquedos
por conta própria, não raramente entre os objetos que os adultos
jogaram fora. (BENJAMIN, 1984, p. 14)

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O brinquedo é um objeto marcado pela dimensão simbólica em que o
mesmo assume como função principal. Cabe aqui definir o conceito de brinquedo
adotado por Bougère (1997), “[...] é um objeto distinto e específico com imagem
projetada em três dimensões, cuja função parece vaga. Com certeza podemos dizer
que a função do brinquedo é a brincadeira” (BOUGÈRE, 1997, p. 13). Em outras
palavras, é um objeto em que as crianças manipulam segundo a vontade e modo
delas. O brinquedo é um objeto destinado exclusivamente para a criança.
Ao se refletir sobre a dimensão simbólica dos brinquedos é que pode-se
questionar como que estas representações podem ser manipuladas tanto na sua
forma quanto em seu conteúdo para se tornarem brinquedos, mas que não
necessariamente não deixam de transmitir para o imaginário da crianças as
mensagens culturais da sociedade, retomando aqui o caráter impositivo destacado
por Benjamin (1984).

Numa primeira abordagem, isso parece muito evidente ao olhar a


Barbie e a Suzy, duas bonecas-manequins e também, as bonecas-
bebê e seu ambiente infantil, reconhecemos certos aspectos de nossa
realidade cotidiana. Do mesmo modo, sociedades diferentes,
sociedades passadas podem ser reconhecidas através das bonecas,
de suas roupas, suas casinhas. (BOUGÈRE, 2010, P. 34)

A pedagogia social destaca o papel do brinquedo e do brincar, como sendo


elementos característicos de uma sociedade e que eles podem variar ao longo do
tempo e espaço, sendo consequências históricas e culturais que acabam colocando
para as crianças os símbolos do mundo real para que as mesmas já possam os re
(significar) em seus imaginários e formam sua cidadania, fazendo com que os mesmos
se adaptem, enquadrem em uma determinada organização social. “Através do brincar
e o jogar, a criança desenvolvem a linguagem, o pensamento, a socialização, a

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iniciativa e a autoestima, preparando-se para ser um cidadão capaz de enfrentar
desafios e participar na construção de um mundo melhor” (SANTOS, 2017, p. 43).
Para os autores Rocha, Almeida e Braga (2016, p. 1), “[...] o brincar, o
brinquedo e os jogos como produtos sociais e históricos, temos que considerar que
estes últimos revelam traços importantes da cultura que determinam o povo em um
dado momento histórico.”
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Sendo assim, a criança não brinca numa ilha. Como o adulto, ela não
se satisfaz apenas com a realidade, ela necessita relacionar com o
imaginário. Esse imaginário é fruto de um banco de dados (as
representações, as imagens, os símbolos ou os significados) disposto
pela cultura. Portanto, a criança brinca com as substâncias materiais
e imateriais que lhe são acessíveis (ROCHA, ALMEDIA E BRAGA,
apud BROUGERE, 2001, p.1).

Ainda é preciso destacar que mesmo no universo lúdico, onde há uma certa
liberdade, há uma interdependência da cultura global. Assim, como as culturas globais
acabam influenciando e homogeneizando culturas regionais ou até mesmo locais, o
mesmo acontece com os brinquedos e o ato de brincar, deve se destacar o papel das
indústrias dos brinquedos que atuam de forma incisiva com o objetivo principal o de
atingir a sua finalidade, o lucro. E como consequência deste processo globalizatório,
“[...] na modernidade os objetos são elementos muito importantes na constituição da
cultura lúdica e esta limitação da posse pode restringir a criação, a imaginação.”
(LIRA, 2009, p. 517)
É neste processo histórico-cultural que o brinquedo deve ser analisado
enquanto instrumento de poder, que estão impregnados de valor simbólico e que
mesmo incorporados ao universo lúdico eles transmitem os esquemas de
comportamento e organização social. Nesta ótica, destaca-se uma relação de poder
que pode ser entendida também como objeto da pedagogia social para na construção
dos indivíduos, por meio de “[...] possibilidades de esquadrinhar os modos como o
poder se exerce sobre os sujeitos infantis e as verdades que estão implicadas nessas
estratégias que funcionam como meios para manter e colocar em operação os
dispositivos de governamento” (BUJES, 2005, p.196 apud LIRA, 2009, p. 513)

Esta racionalidade instrumental intensifica a produção e fabricação de


brinquedos para ensinar gestos, comportamentos e valores sociais.

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Ou seja, materializa-se o projeto do adulto para com as crianças,
mostrando como se estabeleceram e se estabelecem as relações com
elas (VOLPATO, 2002). Assim, verifica-se que na era moderna a
reprodução dos comportamentos dos adultos, tão desejada, se
constrói desde a infância, inclusive por meio dos jogos e brinquedos.
É desde pequenas que as crianças se apropriam da cultura, dos
comportamentos, dos modos de ser e, embora muitas vezes
subvertam tal ordem, na maioria das situações reproduzem
estereótipos. (LYRA, 2009, p. 513)

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Na relação objeto e criança, a infância é marcada pelo simbolismo e
representações dos brinquedos. Pode-se dizer, também, que há uma tradição cultural
que por meio dos brinquedos se distingue masculino e do feminino. Porém, deve-se
destacar que estas imposições não fazem sentido na psique lúdica, pois, brinquedos
não possuem gênero. Os brinquedos impostos para as meninas privilegiam a casa em
detrimento do ambiente externo, como trabalhos, por exemplo (BOUGÈRE, 1997).
Os brinquedos não são uma representação fidedigna do real, pois as
crianças por meio de seu imaginário modificam as funções e até mesmo o simbolismo
deles. Porém, a imagem cultural é apreendida, por isto, é preciso destacar que antes
de mais nada, eles são objetos culturais. “Portanto manipular brinquedo, remete entre
outras coisas, a manipular significações culturais originadas numa determinada
sociedade.” (BOUGÉRE, 1997, p. 43)

Na sua brincadeira, criança não se contenta em desenvolver


comportamentos, mas manipula as imagens, significa ações
simbólicas que constitui a partir da impregnação cultural na qual está
submetida. Como consequência, ela tem acesso a um repertório
cultural próprio de uma parcela da civilização. Contudo, o brinquedo
deve ser considerado na sua especificidade: a criança, na maior parte
das vezes, não se contenta em contemplar o registrar imagens: elas
manipulam na brincadeira e, ao fazê-lo, transforma as vias das novas
significações. (BOUGÈRE, 1997, p.47)

Em consonância com BOUGÈRE (1997), acredita-se que apesar do


brinquedo estar impregnado por conteúdo e imagens simbólicas. Este processo
representa uma relação de cultura e poder em que a apropriação destas mensagens
é ativa por parte das crianças, que não são apenas receptoras, mas retrabalham as
informações e serão os adultos da sociedade do amanhã. “Trata-se duma
representação humana [...] é sempre classificado numa determinada ordem social. [...]
a boneca apresenta-nos seres situados no tempo, a tal ponto que esse reflexo do

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passado e do presente nos fascina.” (BOUGÈRE, 2010, p. 34). Bougère (2010) usa a
metáfora do espelho para mostrar que os brinquedos são significados das sociedades,
porém eles não são a reprodução do mundo real. Pois, não se pode menos prezar a
cultura lúdica, em que a criança por meio de transformações imaginárias irá destorcer
ainda mais a representação do mundo real, porém o autor não descarta que antes de
mais nada, manipular os brinquedos, trata-se de manipular objetos culturais de uma
64 determinada sociedade.

Análise do brinquedo Soldadinho de Chumbo e da Literatura infantil:


mensagem de poder

Para Bougère (1997), a explicação para o significado dos brinquedos é


porque eles apresentam forma que pode estar ligada a função ou não. O material é
um significante a medida em que ele pode representar diversas características
(robustez, fragilidade, etc.), a cor também representa códigos sociais (guerra, paz,
feminino, masculino, etc.). O autor aponta elementos de análise dos brinquedos que
se subdividem em dois blocos: aspecto do material e significações. O quadro 1 mostra
a análise feita do brinquedo soldadinho de chumbo.

Quadro 1 - Análise do brinquedo Soldadinho de Chumbo feita por Bougère (1997)

Aspecto do material Significações


Material: Chumbo pintado Representação de uma realidade: Soldado
de uma determinada época
Forma/Desenho: Forma bastante Modificações induzidas nessa realidade:
parecida com um ser humano Única modificação: o tamanho da
representação
Cor: Cores realistas e diversas Universo imaginário representado:
Universo realista
Aspecto Tátil: Frieza do metal Representação isolada: Logica originada
do real: o exército como universo
Aspecto odorífico: Vazio Impacto da dimensão funcional: vazio
Ruído: Ruído de metal
Fonte: Bougère (1997). Org. os autores.

A literatura infantil apresenta para o universo das crianças o conto de fadas


do Dinamarquês Hans Christian Andersen, “O soldadinho de chumbo”. Para Araújo e
Toffoli (2009), o conto apresenta diferenças culturais, identidade e aceitação, pelo fato
do personagem principal não possuir uma perna. “O soldadinho vestia-se de

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vermelho, cor da vida, do amor, também da guerra do poder destruidor do fogo e de
azul, cor do céu, da água, da verdade e da fidelidade, todos esses conceitos se
misturam ao longo da história, bem contra o mal, vida ou mote.”
Para Tavares Raffaini (2018), os soldadinhos de chumbo foram fabricados
inicialmente em cidades alemãs, tendo como auge da popularidade no século inicial
XX, em função do conflito franco-prussiano (primeira guerra mundial). E esse contexto
65 histórico foi repassado para as crianças em forma de brinquedo, tendo como estrela
o soldadinho de chumbo.

Como já foi dito, os brinquedos feitos para meninos possuíam outras


características, eram feitos em madeira, metal, vidro, concebidos para
brincadeiras de movimento e competição como bolinhas de gude,
piões, pipas, arcos de girar. Mas havia também brinquedos para
meninos quietos, para ambientes domésticos, que remetem mais ao
jogo na concepção de Walter Benjamin, como cubos ou tijolinhos de
montar, trenzinhos e outros veículos e as miniaturas, pequenos
personagens, homens ou animais que povoavam a imaginação das
crianças e dentro dessa categoria os soldadinhos de chumbo. Em sua
maioria esses brinquedos remetiam a atividades associadas ao
universo masculino, como construções de ferrovias, de edifícios e
também atividades militares. (TAVARES RAFFAINI, 2018, sp.)

Ao se analisar o brinquedo soldadinhos de chumbo dentro de um contexto


histórico em que os mesmos surgiram, a análise irá perpassar por mensagens que
permitam incutir nos indivíduos da sociedade e de suas crianças sentimentos e
valores que contribuam para com o nacionalismo a fim de consolidar os estados-
nacionais.

Os soldadinhos de chumbo uniformizados e pintados com as cores de


cada país poderiam servir como formas de reafirmar e consolidar as
nacionalidades. Além disso, traziam embutidos em si valores
desejáveis aos meninos: coragem, bravura, heroísmo. Valores esses
que aparecem na narrativa de Andersen. A materialidade desses
soldadinhos: o chumbo, o estanho, o metal, remetem a dureza e frieza
necessária para participar de um conflito, as cores exuberantes com
que são pintados revelam a glória, o heroísmo advindo da vitória.
(TAVARES RAFFAINI, 2018, [s.p.])

A manipulação de brinquedos é antes de mais nada, manusear objetos


culturais que carregam símbolos e significados de uma determinada sociedade. Por
isso, eles não são objetos neutros, sem forma de representação. Desta maneira,

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pode-se dizer que funcionam como espelhos, só que devido a ludicidade não é
qualquer espelho e sim um espelho mágico, como disse Bougère (2010).

Considerações Finais

Os brinquedos certamente são escolhidos a princípio pelos adultos que


66 oferecem os objetos para as crianças, muitas vezes, eles despertam neles
sentimentos saudosos da infância. Alguns dos objetos quando apropriados pela
indústria dos brinquedos tentam passar características da nossa sociedade para
incutir nas crianças sentimentos da sociedade capitalista, como: felicidade material, e
para isto as mídias oferecem um suporte de propagandas.
Este artigo teve como finalidade discutir o papel cultural do objeto
brinquedo e como eles podem influenciar na formação simbólica de representação
das sociedades nas crianças. O universo dos brinquedos é um fazer imaginário da e
para as crianças e confecção destes objetos pode ser entendido como os adultos de
uma determinada sociedade entendem o papel das crianças. Conclui-se
demonstrando assim, a relação de cultura e poder por detrás dos brinquedos.
Destaca-se a importância deste objeto dentro da Pedagogia Social como forma de
governamento e formação sócio cultural das crianças, em conformidade com que cada
sociedade espera delas quando elas se tornarem os adultos do amanhã.

Referências

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Chumbo de Anderson. Disponível em:<
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