Martinelli 1
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RESUMO: Trato, neste artigo, das relações entre o Serviço Social e o seu projeto ético-
político. Partindo de uma concepção sócio-histórica, analiso a profissão e o projeto
como construções sociais em contextos históricos determinados. Situo os alicerces
do projeto e explicito suas relações com os projetos societários, bem como ressalto a
importância da qualificação e empenho dos profissionais no sentido da consolidação
do projeto ético-político.
PALAVRAS-CHAVE: Serviço Social, Projeto Ético-Político, Construção Coletiva.
Introdução
1
Palestra promovida pelo Departamento de Serviço Social da Universidade Estadual de Ponta
Grossa, PR, em 10/11/2005. Transcrição de Jussara Ayres Bourguignon, em março de 2006.
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Doutora em Serviço Social, Docente e Pesquisadora do Programa de Estudos Pós-Graduados em
Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Coordenadora do Núcleo de
Estudos e Pesquisa sobre Identidade da mesma Universidade.
Martinelli, Maria Lúcia. Reflexões sobre o Serviço Social e o projeto ético-político profissional
3
Indico na bibliografia algumas de minhas produções sobre esta temática, com vistas ao
aprofundamento da análise.
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Uma importante análise, e indispensável leitura, sobre o uso da expressão prática profissional,
encontra-se em Iamamoto, 998, especialmente às páginas 93 a 96. No caso do presente artigo
utilizo-a para expressar o trabalho profissional que o assistente social realiza no contexto das
relações sociais.
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da própria sociedade. A filósofa Marilena Chauí (1999 - 2000) nos seus
estudos sobre a sociedade contemporânea, afirma que nas últimas dé-
cadas do século passado assistimos a um verdadeiro desmonte da so-
ciedade, a uma verdadeira implosão de direitos sociais conquistados há
mais de duzentos anos, com duras lutas, desde a Revolução Francesa
em 1789.
O trabalho socialmente protegido, uma legislação trabalhista
consistente, acesso aos bens e serviços socialmente produzidos, direi-
tos consagrados em Cartas Constitucionais e em legislação pertinente,
ruíram diante de nossos olhos. Com o avanço do processo de globalização
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e com os ajustes neoliberais caíram por terra todos estes direitos.
A edificação com a qual convivemos durante décadas sumiu
de nosso horizonte. Que edificação era esta, que sociedade era esta?
Uma sociedade que se organizava através do trabalho e a partir do tra-
balho contava com a proteção trabalhista, com a proteção social.
O trabalho é expressão do humano, é constitutivo da práxis
humana. (MARX, 1986, p. 201 a 209). Porém, da década de setenta do
século passado para cá, começa a ocorrer um descentramento do tra-
balho como modo de organização da vida em sociedade.
No modelo até então vigente, trabalho, emprego e proteção
social compunham uma tríade organicamente articulada. Ao perdermos
o trabalho como instância organizativa da vida social, perdemos muito
de tudo aquilo que significa proteção legal ao trabalho, proteção social
ao cidadão.
Torna-se bastante claro que no âmbito das políticas neoliberais,
somos considerados cidadãos, trabalhadores enquanto estamos à dis-
posição do capital. Ao deixar o mercado formal de trabalho, rapidamente
o trabalhador perde a sua inserção de classe e os seus direitos traba-
lhistas e sociais.
Os estudiosos franceses deste tema, e entre eles especial-
mente Robert Castel (1998), consideram que todas estas perdas o le-
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A autora trabalha esta temática em vários estudos, porém para efeito deste artigo utilizei especi-
almente a Ideologia Neoliberal no livro “Os sentidos da democracia” (1999, p. 27 a 54) e “O que
comemorar?” na Revista Projeto História nº 20, p. 35 a 62, publicada pela EDUC, São Paulo, 2000.
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Sobre esta temática há uma vasta literatura. Para efeito deste artigo destaco Castel (1998),
Antunes (2001), Dupas (1999), Chauí (1999).
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Para aprofundamento de estudo sobre a categoria hegemonia e sobre direção social, consultar a
obra de Antonio Gramsci, de ampla circulação no Brasil e com profunda repercussão na literatura do
Serviço Social brasileiro, onde há nomes destacados como o de Ivete Simionatto e Marina Maciel.
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Para aprofundamento desta análise ver Netto, obra citada (1999, p. 93-109).
Creio ter deixado claro, e reafirmo aqui apenas por uma ques-
tão de ênfase, que estas reflexões estão pautadas em uma concepção
sócio-histórica de profissão, na qual o Serviço Social é visualizado como
especialização do trabalho coletivo e sua prática como concretização
de um processo de trabalho que tem como objetivo o enfrentamento das
inúmeras expressões da questão social. Isto lhe dá um caráter eminen-
temente dinâmico, permitindo-nos pensar o Serviço Social como uma
profissão histórica, instituinte, uma verdadeira construção social, uma
vez que a profissão se transforma ao se transformarem as condições
em que se deu o seu engendramento histórico. Nesta perspectiva, o
sentido e a direcionalidade da ação profissional demandam um perma-
nente movimento de construção/reconstrução crítica, pois projetos éti-
co-políticos e práticas profissionais devem pulsar com o tempo e com o
movimento. Ambos são atos políticos, são produtos de sujeitos coleti-
vos em contextos históricos determinados.
Hoje, diante das profundas transformações societárias e de
suas repercussões sobre as profissões, temos identidades inteiramen-
te dinâmicas, que se expressam de múltiplas formas.
Se este é o século do conhecimento, é também o século da
intervenção, da materialização do conhecimento.
Nós, como assistentes sociais, estamos iniciando este milê-
nio com renovadas possibilidades de prática profissional. A rigor, desde
a Constituição de 1988 até a aprovação da Política Nacional de Assis-
tência Social, em 15 de outubro de 2004, inúmeras foram as transforma-
ções que ocorreram na área do Serviço Social.
ABSTRACT: I treat, in this article, about the relations between the Social Work and its
project ethical-political. Beginning from a social-historical conception, I analyze the
profession and the project like social buildings in determined historical contexts. I place
the foundations of the project and explain its relations with the societary projects, as
well as I point out the importance of the professionals’ qualification and determination
on direction of the consolidation of the ethical-political project.
KEYWORDS: Social Work, Ethical-Political Project, Collective Building.
Referências