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Química Geral III - Aula 6

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CEDERJ - CENTRO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR A DISTÂNCIA

DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

MATERIAL DIDÁTICO IMPRESSO

CURSO: Licenciatura em Química DISCIPLINA: Química Geral III

CONTEUDISTAS: Alexandre Moura Stumbo

AULA 6

SOLUÇÕES E EQUILÍBRIO DE SOLUBILIDADE

META DA AULA

Aplicar o conceito de equilíbrio em sistemas nos quais estão presentes sólidos pouco
solúveis em meio aquoso.

OBJETIVOS

Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:

1. calcular a solubilidade em água de uma substância, a partir do valor da sua


constante do produto de solubilidade;
2. calcular, a partir da solubilidade em água de uma substância, o valor de sua
constante do produto de solubilidade;
3. prever, a partir das concentrações iniciais das espécies presentes em solução, se
haverá formação de um precipitado;
4. determinar como separar duas espécies em solução por meio de precipitação
seletiva;
5. determinar o efeito da presença de um íon comum sobre a solubilidade de uma
substância;
6. determinar o efeito da formação de um íon complexo sobre a solubilidade de uma
substância.

1
PRÉ-REQUISITOS

Para que você tenha mais facilidade na compreensão desta aula, é importante que tenha
entendido o conceito de constante de equilíbrio de uma reação e o Princípio de Le
Châtelier, e que saiba utilizá-los para calcular a composição do meio reacional no
equilíbrio, a partir das condições iniciais.

INTRODUÇÃO
Em aulas anteriores, apresentamos e desenvolvemos o conceito de equilíbrio envolvendo
reações químicas e suas aplicações em soluções aquosas de ácidos e bases. Nesta aula,
vamos aplicar estes conhecimentos na análise de situações onde se estabelece um equilíbrio
entre um sólido pouco solúvel e as espécies provenientes de sua dissolução parcial em
água, o solvente mais comum e mais importante da natureza.

Solubilidade de sólidos iônicos


A solubilidade de um sólido iônico em água é determinada pelo balanço entre duas
tendências opostas: a atração entre os íons de cargas opostas que formam a estrutura do
composto, que tende a mantê-lo no estado sólido; e a interação entre estes íons e as
moléculas de água, que tende a provocar a dissolução e estabiliza-los em solução.
A água é um bom solvente para sólidos iônicos, pois, apesar de a molécula de água ser
eletricamente neutra, apresenta um dipolo permanente, devido à diferença de
eletronegatividade de seus constituintes: o átomo de O apresenta carga residual negativa,
enquanto que os átomos de H possuem carga residual positiva. Os cátions (íons de carga
positiva) interagem com o lado negativo, enquanto que os ânions (íons de carga negativa)
interagem com o lado positivo das moléculas de água. As espécies que se dissolvem são
rodeadas pelas moléculas do solvente, que têm o efeito de estabilizá-las em solução, pois
evitam que os cátions e ânions se combinem novamente.
É difícil estimar a solubilidade de um composto. No entanto, podemos resumir algumas
observações experimentais para uma série de tipos de compostos iônicos:
- Nitratos (NO32-) → são todos solúveis;
- Cloretos (Cl-) → na maioria solúveis; exceções: AgCl, Hg2Cl2, PbCl2;
- Brometos (Br-) → na maioria solúveis; exceções: AgBr, Hg2Br2, PbBr2;
- Iodetos (I-) → na maioria solúveis; exceções: AgI, Hg2I2, PbI2;
- Sulfatos (SO42-) → na maioria solúveis; exceções: SrSO4, BaSO4, Hg2SO4, PbSO4;
- Carbonatos (CO32-) → na maioria insolúveis; exceções: (NH4)2CO3 e os de cátions de
metais alcalinos (grupo 1A da tabela periódica);
- Hidróxidos (OH-) → na maioria insolúveis; exceções: Ca(OH) 2, Sr(OH)2, Ba(OH)2 e
os de cátions de metais alcalinos (grupo 1A da tabela periódica);

2
- Sulfetos (S2-) → na maioria insolúveis; exceções: (NH4)2S, CaS, SrS, BaS e os de
cátions de metais alcalinos (grupo 1A da tabela periódica);
- Fosfatos (PO42-) → na maioria insolúveis; exceções: (NH4)3PO4 e os de cátions de
metais alcalinos (grupo 1A da tabela periódica).

A constante do produto de solubilidade (K ps)


Quando a solução atinge a saturação, ou seja, foi dissolvido tudo o que era possível nas
condições em que se trabalha, estabelece-se um equilíbrio entre o sólido e as espécies
oriundas de sua dissolução parcial. No caso do carbonato de cálcio, por exemplo, temos o
seguinte equilíbrio numa solução aquosa saturada:

CaCO3 (s)  Ca2+(aq) + CO32-(aq)

A constante de equilíbrio associada a este processo seria:

[Ca 2 ][CO 32 ]


K
[CaCO3(s) ]

Porém, é preciso lembrar-se do que discutimos na Aula 4: a concentração de um sólido é


constante, independente da quantidade de sólido presente, podendo, portanto, ser
incorporada ao valor da constante de equilíbrio. A expressão resultante é conhecida como a
da constante do produto de solubilidade (Kps):

K ps  K  [CaCO3(s) ]  [Ca 2 ][CO 32 ]

Tabela 1 – Constantes do produto de solubilidade de diversas substâncias, a 25°C:

Substância Kps Substância Kps


AgC2H3O2 2,3 × 10-3 Fe(OH)2 2,0 × 10-15
Ag2CO3 8,2 × 10-12 Fe(OH)3 1,1 × 10-36
AgCl 1,7 × 10-10 FeC2O4 2,1 × 10-7
AgBr 5,0 × 10-13 FeS 3,7 × 10-19
AgI 8,5 × 10-17 Hg2Cl2 2,0 × 10-18
Ag2CrO4 1,9 × 10-12 HgS 1,6 × 10-54
AgCN 1,6 × 10-14 Mg(OH)2 1,2 × 10-11
Ag2S 2,0 × 10-49 MgC2O4 8,6 × 10-5
Al(OH)3 2,0 × 10-33 MnS 7,0 × 10-16
BaCO3 8,1 × 10-9 NiS 2,0 × 10-21
BaCrO4 2,4 × 10-10 PbCl2 1,6 × 10-5
BaF2 1,7 × 10-6 PbCrO4 1,8 × 10-14
BaSO4 1,5 × 10-9 PbC2O4 2,7 × 10-11

3
CaCO3 9,0 × 10-9 PbSO4 2,0 × 10-8
CaF2 1,7 × 10-10 PbS 7 × 10-27
CaSO4 2,0 × 10-4 Sn(OH)2 5,0 × 10-26
CoS 7,0 × 10-23 SnS 1,0 × 10-26
CuS 8,5 × 10-36 Zn(OH)2 4,5 × 10-17
Cu2S 2,0 × 10-47 ZnS 1,2 × 10-23

Uma das informações mais diretas que o valor da constante do produto de solubilidade
fornece é a possibilidade de calcular a solubilidade em água da substância em questão, na
temperatura considerada (ao longo de toda esta aula, salvo observação em contrário, iremos
considerar que a temperatura é de 25°C). Seja, por exemplo, o sulfeto de prata (Ag2S), cujo
Kps é 2,0  10-49. Se considerarmos que x mol.L-1 do sulfeto se dissolvam para que o
sistema alcance o equilíbrio, serão produzidos 2x mol.L -1 de Ag+ e x mol.L-1 de S2-:

Ag2S (s)  2 Ag+(aq) + S2-(aq) K ps  [Ag  ] 2 [S 2 ]  2,0  10 -49

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Ag+ 0 +2x 2x
S2- 0 +x x

Substituindo estes valores na expressão do Kps, chegamos ao valor da solubilidade (x):

K ps  [Ag  ]2 [S 2 ]  (2x) 2 (x)  4x 3  2,0  10 -49  x = 3,7  10-17 mol.L-1

ATIVIDADE 1 (objetivo 1)
Calcule a solubilidade em água do cromato de prata (Ag 2CrO4), sabendo que seu Kps é
1,9×10-12.

RESPOSTA COMENTADA
Considerando que x mol.L-1 do cromato se dissolvam para que o sistema alcance o
equilíbrio, serão produzidos 2x mol.L-1 de Ag+ e x mol.L-1 de CrO42-:

Ag2CrO4 (s)  2 Ag+(aq) + CrO42-(aq) K ps  [Ag  ]2 [CrO 24 ]  1,9  10 -12

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Ag+ 0 +2x 2x
CrO42- 0 +x x

Substituindo estes valores na expressão do Kps, chegamos ao valor da solubilidade (x):

4
K ps  [Ag  ] 2 [CrO 24- ]  (2x) 2 (x)  4x 3  1,9  10 -12  x = 7,8  10-5 mol.L-1
FIM DA RESPOSTA COMENTADA

Outro tipo de cálculo muito comum é, conhecendo a solubilidade em água de uma


substância, obter o valor de sua constante do produto de solubilidade (Kps). Se a
solubilidade do carbonato de prata (Ag2CO3) é de 1,27  10-4 mol.L-1, como podemos
calcular seu Kps? Basta olhar a reação de dissolução e escrever a expressão de sua
constante de equilíbrio. Para cada x mol.L-1 de sólido que se dissolvem, são produzidos 2x
mol.L-1 de Ag+ e x mol.L-1 de CO32-:

Ag2CO3 (s)  2 Ag+(aq) + CO32-(aq) K ps  [Ag  ] 2 [CO 32 ]

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Ag+ 0 +2x 2x
CO32- 0 +x x

Substituindo estes valores na expressão do Kps, e lembrando que a solubilidade


(representada por “x”) tem o valor numérico de 1,27  10-4 mol.L-1, obtemos o valor desta
constante:

K ps  [Ag  ] 2 [CO 32 ]  (2x) 2 (x)  4x 3  4 (1,27  10 4 ) 3  8,2  10 12

ATIVIDADE 2 (objetivo 2)
A solubilidade do PbSO4 em água, a uma dada temperatura, é de 0,038 g.L-1. Calcule o Kps
deste composto nestas condições:

RESPOSTA COMENTADA
O equilíbrio que se estabelece na solução é dado pela reação a seguir. Se, para alcançar o
equilíbrio, x mol.L-1 de PbSO4 se dissolvem, são produzidos x mol.L -1 de Pb2+ e igual
concentração de SO42-:

PbSO4 (s)  Pb2+(aq) + SO42-(aq) K ps  [Pb 2 ][SO 24 ]  (x)(x)  x 2

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Pb2+ 0 +x x
SO42- 0 +x x

5
Para converter a solubilidade de g.L-1 para mol.L-1 (unidade de x na expressão do Kps) basta
dividi-la pelo peso molecular do PbSO4, que é de 303 g.mol-1:

0,038 g.L1
x 1
 1,25  10  4 mol.L1
303 g.mol

Substituindo este valor na expressão do Kps:

Kps = x2 = (1,25 × 10-4)2 = 1,6 × 10-8


FIM DA RESPOSTA COMENTADA

Outro tipo de informação importante é determinar se, ao misturarmos soluções aquosas de


dois ou mais sais, haverá precipitação de algum composto insolúvel. Inicialmente, é
preciso determinar todas as possibilidades de formação de compostos a partir das espécies
presentes, identificando quais são as pouco solúveis, segundo os critérios discutidos
anteriormente nesta aula (seção intitulada “Solubilidade de sólidos iônicos”). Para cada um
destes compostos, calcula-se então o produto iônico (Q), cujo valor é obtido substituindo-se
as concentrações iniciais das espécies presentes na solução na expressão da constante do
produto de solubilidade (Kps) da espécie insolúvel que pode vir a se formar.
Se o valor de Q for maior que o do Kps, temos uma solução supersaturada, ou seja, uma
solução na qual o número de espécies provenientes da dissolução de um determinado
composto está acima do permitido pela termodinâmica do sistema. Para que o equilíbrio de
dissolução seja respeitado, será preciso diminuir o número de espécies em solução, o que se
dá por meio da formação de precipitado. A formação deste sólido insolúvel prossegue até
que a concentração das espécies em solução caia o suficiente para que o produto iônico se
iguale ao Kps.
Se o valor de Q for igual ao do Kps, temos uma solução saturada, ou seja, a concentração
das espécies em solução é exatamente igual ao máximo que o sistema permite. Neste caso,
como o equilíbrio de solubilidade está sendo respeitado, não há formação de precipitado. A
tentativa de aumentar a concentração de qualquer uma das espécies envolvidas no
equilíbrio provocará precipitação.
Se o valor de Q for menor que o do Kps, temos uma solução que não atingiu a saturação, ou
seja, onde ainda é possível dissolver uma quantidade adicional limitada da substância
pouco solúvel. As concentrações das espécies resultantes desta dissolução só podem
aumentar até o ponto em que o valor de Q se igualar ao do Kps, indicando que a saturação
foi finalmente alcançada.
Se misturarmos 500 mL de uma solução 0,1 mol.L -1 de BaCl2 com igual volume de solução
0,2 mol.L-1 de K2SO4, como podemos avaliar se haverá formação de precipitado? As
observações experimentais relatadas na seção “Solubilidade de sólidos iônicos” indicam
que o cloreto de bário e o sulfato de potássio são ambos compostos muito solúveis, estando
portanto completamente dissociados em solução aquosa, formando as seguintes espécies:

2  
BaCl 2 H

2O
 Ba (aq)  2 Cl (aq) e K 2 SO 4 H

2O
 2 K (aq)  SO 24(aq)

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Analisando as recombinações possíveis entre as espécies em solução, poderíamos observar
a formação de KCl e BaSO4. O primeiro é um sal muito solúvel, mas o segundo é um dos
poucos sulfatos de solubilidade muito limitada (Kps = 1,5 × 10-9), sendo, portanto, possível
que este composto precipite. Para confirmar ou não esta hipótese, é preciso calcular o
produto iônico nesta situação. Para isto, inicialmente temos que determinar as
concentrações iniciais do Ba2+ e do SO42-, levando em conta a diluição que ocorre quando
as duas soluções são misturadas. Como o volume original é dobrado (estamos misturando
0,5 L de uma solução com igual volume de outra), as concentrações originais caem à
metade:

0,1 mol.L1  0,5 L 0,2 mol.L1  0,5 L


(Ba 2 )   0,05 mol.L1 ; (SO24- )   0,1 mol.L1
0,5 L  0,5 L 0,5 L  0,5 L

Substituindo estes valores na expressão do produto iônico (Q) e comparando o valor obtido
ao do Kps:

Q  (Ba 2 )(SO 24 )  (0,05)(0,1 )  5,0  10 -3  1,5  10 9  K ps  Q > Kps

Observamos que o valor do produto iônico é muito superior ao do Kps, indicando que a
solução está supersaturada e que, portanto, haverá formação de precipitado.

BOXE DE ATENÇÃO
Vamos resumir as observações que permitem prever se haverá ou não formação de
precipitado. Seja Q o produto iônico, calculado substituindo-se as concentrações das
espécies presentes na solução na expressão do Kps de uma substância insolúvel passível de
ser formada a partir destas espécies:
Q > Kps  ocorre precipitação;
Q = Kps  não há precipitação (não é possível dissolver quantidades adicionais da
substância considerada, pois a solução está saturada);
Q < Kps  não há precipitação (ainda é possível dissolver quantidades limitadas da
substância considerada, pois a solução ainda não está saturada).
FIM DO BOXE DE ATENÇÃO

ATIVIDADE 3 (objetivo 3)
Determine se há formação de precipitado quando são misturados 100 mL de solução 0,25
mol.L-1 de NaF e 400 mL de solução 0,015 mol.L -1 de Ba(NO3)2.

RESPOSTA COMENTADA
O fluoreto de sódio e o nitrato de bário são ambos sais muito solúveis, estando, portanto,
completamente dissociados em solução aquosa, formando Na+, F-, Ba2+ e NO32-. As

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recombinações possíveis são: Na(NO3)2, que também é muito solúvel, e BaF2, que tem
baixa solubilidade (Kps = 1,7 × 10-6), podendo vir a precipitar. Para determinar se há
formação de sólido, é preciso calcular as concentrações iniciais das espécies envolvidas,
levando em conta a diluição que ocorre quando as soluções são misturadas:

0,015 mol.L1  0,4 L 0,25 mol.L1  0,1 L


(Ba 2 )   0,012 mol.L1 ; (F - )   0,050 mol.L1
0,4 L  0,1 L 0,1 L  0,4 L

Substituindo estes valores na expressão do produto iônico (Q) e comparando o valor obtido
ao do Kps:

Q  (Ba 2 )(F - ) 2  (0,012) (0,050) 2  3,0  10 -5  1,7  10 6  K ps  Q > Kps

Como o valor do produto iônico é superior ao do K ps, concluímos que haverá formação de
precipitado.
FIM DA RESPOSTA COMENTADA

Separação de íons por precipitação seletiva


Podemos usar as diferenças de solubilidade entre certas substâncias para separar íons que
estejam presentes na mesma solução.
Tal separação é extremamente simples e direta se apenas uma das espécies formar um
composto insolúvel: ao adicionarmos íons cloreto (Cl-) a uma solução contendo os cátions
Ag+ e Na+, apenas a prata irá formar uma substância insolúvel, precipitando quase toda na
forma de AgCl (s) (Kps = 1,7 × 10-10), deixando todo o Na+ em solução, uma vez que o NaCl
é um sal muito solúvel.
Se misturarmos 50 mL de uma solução 0,020 mol.L -1 de Ag+ e 0,10 mol.L-1 de Na+ com
50 mL de solução 0,10 mol.L-1 de HCl, qual será a concentração de Ag+ que permanece em
solução? Neste caso, o sólido insolúvel que pode se formar é o AgCl (Kps = 1,7 × 10-10).
Calculando as concentrações iniciais das espécies presentes, levando em conta a diluição
causada pela mistura das soluções:

0,020 mol.L1  0,05 L


(Ag  )   0,010 mol.L1 ;
0,05 L  0,05 L
0,10 mol.L1  0,05 L
(Cl ) 
-
 0,050 mol.L1
0,05 L  0,05 L

Haverá realmente formação de precipitado, pois o produto iônico é superior ao Kps:

Q  (Ag  )(Cl - )  (0,010) (0,050)  5,0  10 -4  1,7  10 10  K ps

O AgCl precipitará até que as concentrações de Ag+ e Cl- se reduzam a valores que

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multiplicados se igualem ao Kps. Como o cloreto está presente em grande excesso,
podemos considerar que a prata é quase completamente consumida. Para que apenas x
mol.L-1 de Ag+ permaneçam em solução, o consumo deverá ser de (0,010 - x) mol.L-1.
Como a reação se dá na proporção molar de 1:1, para cada mol de Ag + consumido, a
mesma quantidade de cloreto reage. A quantidade de Ag+ que permanece em solução (x)
deverá ser muito pequena, podendo ser considerada desprezível em relação ao cloreto
remanescente:

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Ag+ 0,010 - (0,010 - x) x
Cl- 0,050 - (0,010 - x) 0,040 + x  0,040

Substituindo os valores das concentrações no equilíbrio na expressão do Kps, podemos


calcular a concentração final do íon Ag+:

Kps = [Ag+][Cl-] = (x)(0,040) = 1,7 × 10-10  x = [Ag+] = 4,3 × 10-9 mol.L-1

O valor obtido é realmente desprezível em relação a 0,040, confirmando a hipótese adotada.


A concentração do Ag+ que permanece em solução é extremamente reduzida, o que
significa que um alto grau de separação foi alcançado.

ATIVIDADE 4 (objetivo 4)
Qual é concentração de Pb2+ que permanece em solução ao adicionar-se 150 mL de solução
0,500 mol.L-1 de NaCl a 50 mL de solução 0,0500 mol.L-1 de Pb(NO3)2?

RESPOSTA COMENTADA
O cloreto de sódio e o nitrato de chumbo são ambos sais muito solúveis, que se dissociam
completamente em solução aquosa. O composto insolúvel que pode se formar é o cloreto
de chumbo:

PbCl2 (s)  Pb2+(aq) + 2 Cl-(aq) K ps  [Pb 2 ][Cl  ]2  1,6 10 -5

Calculando as concentrações iniciais das espécies envolvidas na formação do precipitado:

2 0,0500 mol.L1  0,05 L


(Pb )   0,0125 mol.L1 ;
0,05 L  0,15 L
0,500 mol.L1  0,15 L
(Cl ) 
-
 0,375 mol.L1
0,05 L  0,15 L

Verificando que há formação de precipitado, pois o produto iônico é maior que o Kps:

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Q  (Pb 2 )(Cl - ) 2  (0,0125) (0,375) 2  1,76 10 -3  1,6 10 5  K ps

Como o cloreto está presente em grande excesso, podemos considerar que o chumbo é
quase completamente consumido. Para que apenas x mol.L-1 de Pb2+ permaneçam em
solução, o consumo deverá ser de (0,0125 - x) mol.L-1. Para cada mol de Pb2+ consumido,
dois moles de cloreto reagem. A quantidade de Pb2+ que permanece em solução (x) deverá
ser muito pequena, podendo ser considerada desprezível em relação ao cloreto
remanescente:

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Pb2+ 0,0125 - (0,0125 - x) x
Cl- 0,375 -2(0,0125 - x) 0,350 + 2x  0,350

Substituindo os valores das concentrações no equilíbrio na expressão do Kps, podemos


calcular a concentração final do íon Pb2+:

K ps  [Pb 2 ][Cl  ]2  (x)(0,350) 2  1,6  10 -5  x = [Pb2+] = 1,31 × 10-4 mol.L-1

O valor de 2x (2,6210-4) é realmente desprezível em relação a 0,350, confirmando a


hipótese adotada.
FIM DA RESPOSTA COMENTADA

Mesmo quando há mais de uma espécie que forma compostos insolúveis, é possível
alcançar um alto grau de separação, quando a diferença de solubilidade entre as substâncias
formadas for elevada. Para isto, é preciso ajustar cuidadosamente a concentração da
espécie que leva à precipitação dos compostos insolúveis.
Tomemos como exemplo uma solução contendo 0,10 mol.L -1 de Pb2+ e igual concentração
de Ag+. A adição de cloreto pode levar à formação de PbCl2 (s) (Kps = 1,6 × 10-5) e AgCl (s)
(Kps = 1,7 × 10-10). Se aumentarmos gradativamente a concentração de Cl-, qual dos
compostos precipitará primeiro? No caso do AgCl, a concentração mínima de cloreto para
provocar precipitação será:

1,7  10 10 1,7  10 10


Kps = [Ag+][Cl-] = 1,7 × 10-10  [Cl  ]  
  1,7  10 9 mol.L1
[Ag ] 0,10

No caso do PbCl2, a concentração mínima de cloreto para provocar precipitação é dada por:

1,6  10 5 1,6  10 5
Kps = [Pb2+][Cl-]2 = 1,6 × 10-5  [Cl  ]  2
  1,3  10 3 mol.L1
[Pb ] 0,10

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Podemos concluir que qualquer concentração de cloreto acima de 1,7 × 10 -9 mol.L-1 irá
provocar a formação de AgCl. Se esta concentração for mantida abaixo de
1,3 × 10-3 mol.L-1, não haverá precipitação de PbCl2.
Qual será a concentração de Ag+ remanescente na solução quando o chumbo começar a
precipitar? Para fazer este cálculo, basta substituir, na expressão do Kps do AgCl, a
concentração de cloreto necessária para a formação do PbCl2:

1,7  10 10 1,7  10 10


Kps = [Ag+][Cl-] = 1,7 × 10-10  [Ag  ]  
  1,3  10 7 mol.L1
[Cl ] 1,3  10 -3

Podemos, assim, constatar que a concentração de Ag+ remanescente na solução quando o


Pb2+ ainda vai começar a precipitar é realmente diminuta, indicando que, neste caso, o grau
de separação alcançado foi elevado.

ATIVIDADE 5 (objetivo 4)
Quem irá precipitar primeiro quando Na2CrO4 (s) for adicionado gradativamente a uma
solução contendo 0,010 mol.L-1 de Pb2+ e 0,010 mol.L-1 de Ba2+? Qual será a concentração
remanescente desta espécie que precipita primeiro quando o segundo precipitado começar a
se formar?

RESPOSTA COMENTADA
O cromato de sódio é um sal muito solúvel, que se dissocia completamente. Duas espécies
insolúveis podem se formar:

PbCrO4 (s)  Pb2+(aq) + CrO42-(aq) Kps = [Pb2+][CrO42-] = 1,8 × 10-14

BaCrO4 (s)  Pb2+(aq) + CrO42-(aq) Kps = [Ba2+][CrO42-] = 2,4 × 10-10

Para determinar quem precipita primeiro, basta calcular a concentração mínima do íon
cromato necessária para formar uma solução saturada, através da expressão do Kps:

K ps 1,8  10 14
[CrO ] 
2-
4 2
  1,8  10 12 mol.L1
[Pb ] 0,010

K ps 2,4  10 10
[CrO ] 
2-
4 2
  2,4  10 8 mol.L1
[Ba ] 0,010

Podemos concluir que o PbCrO4 precipita primeiro, pois necessita de uma concentração
bem menor de ânions cromato para começar a se formar.
O segundo sólido a se formar, BaCrO4, só começa a precipitar quando a concentração de
cromato atingir o valor de 2,4 × 10-8 mol.L-1. Neste momento, a concentração de Pb2+ que
ainda está em solução é dada por:

11
1,8  10 14
K ps
[Pb 2 ]   7,5  10 7 mol.L1

[CrO 4 ] 2,4  10
2- -8

FIM DA RESPOSTA COMENTADA

Uma técnica muito comum para separação de íons metálicos em solução é a precipitação
seletiva na forma de sulfetos, pois estes sais são em sua maioria pouco solúveis (vide
Tabela 1). Além disso, a concentração do ânion sulfeto (S2-), que é proveniente de um
ácido fraco, o H2S, pode ser facilmente controlada pelo ajuste do pH da solução.
Qual seria o pH necessário para separar, na forma de sulfeto, Fe 2+ e Zn2+ presentes em uma
solução aquosa, ambos em concentrações iniciais de 0,10 mol.L-1? O que se faz é
borbulhar H2S (g) através da solução, até que esta fique saturada com esta espécie, o que
significa, a 25°C, atingir a concentração de 0,10 mol.L -1. Os seguintes equilíbrios podem
se estabelecer:

FeS (s)  Fe2+(aq) + S2-(aq) Kps = [Fe2+][S2-] = 3,7 × 10-19

ZnS (s)  Zn2+(aq) + S2-(aq) Kps = [Zn2+][S2-] = 1,2 × 10-23

Devemos ajustar a concentração do íon sulfeto para que apenas um dos metais precipite.
Em cada caso, a concentração mínima desta espécie para haver precipitação é dada por:

K ps 3,7  10 19
FeS: [S 2 ]    3,7  10 18 mol.L1
[Fe 2 ] 0,10

K ps 1,2  10 23
ZnS: [S 2 ]    1,2  10  22 mol.L1
[Zn 2 ] 0,10

Podemos concluir que, se a concentração de sulfeto for maior que 1,2 × 10 -22 mol.L-1, mas
menor ou igual a 3,7 × 10-18 mol.L-1, haverá precipitação de ZnS, sem que haja formação de
FeS. Para alcançar o grau máximo de separação possível, deveremos trabalhar com a maior
concentração possível de sulfeto que precipita o ZnS, sem provocar a formação de FeS, ou
seja, 3,7 × 10-18 mol.L-1.
Para o cálculo do pH, temos que levar em conta o equilíbrio de dissociação do H2S:

[H  ][HS  ]
H2S  H + HS + -
K a1   1,1  10 7
[H 2 S]
[H  ][S 2 ]
HS  H + S
- + 2-
K a2  -
 1,0  10 14
[HS ]

Quando conhecemos as concentrações de duas das três seguintes espécies, H 2S, H+ e S2-,

12
como é o caso que estamos analisando ([H2S] = 0,10 mol.L-1 e [S2-] = 3,7 × 10-18 mol.L-1),
podemos trabalhar de forma mais simples, combinando as equações das duas etapas:

[H  ] 2 [S 2 ]
H2S  2 H+ + S2- K  K a1  K a2   1,1  10  21
[H 2 S]

Calculando a concentração de H+ e o pH:

1/2 1/2
 K [H 2S]   (1,1 10 21 ) (0,10) 

[H ]   2
     5,5  10 3 mol.L1  pH = 2,3
 [S ]   3,7  10 -18

Concentrações menos elevadas de H+, ou seja, valores de pH superiores a 2,3, provocarão a


precipitação do FeS.

ATIVIDADE 6 (objetivos 3 e 4)
Considere uma solução 0,022 mol.L-1 de HCl, contendo 0,0010 mol.L-1 de Cd2+ e igual
concentração de Fe2+, saturada com H2S. Determine se algum dos metais presentes
precipita na forma de sulfeto. Caso algum deles precipite, qual será a concentração que
permanece em solução?

RESPOSTA COMENTADA
Os seguintes equilíbrios podem se estabelecer:

FeS (s)  Fe2+(aq) + S2-(aq) Kps = [Fe2+][S2-] = 3,7 × 10-19


CdS (s)  Cd2+(aq) + S2-(aq) Kps = [Cd2+][S2-] = 3,6 × 10-29

A concentração de H+ é determinada pelo ácido forte (HCl) presente: [H+] = 0,022 mol.L-1.
A do H2S corresponde à concentração de saturação: [H2S] = 0,10 mol.L-1. Como
conhecemos as concentrações destas duas espécies, podemos calcular a do sulfeto de forma
simplificada:

2 K [H 2 S] (1,1  10 21 ) (0,10)


[S ]   2
 2
 2,3  10 19 mol.L1
[H ] (0,022)

Verificando se há formação de precipitado:

FeS: Q = (Fe2+) ( S2-) = (0,0010) (2,3 × 10-19) = 2,3 × 10-22 < Kps  não há precipitação
CdS: Q = (Cd2+) ( S2-) = (0,0010) (2,3 × 10-19) = 2,3 × 10-22 > Kps  há precipitação

Apenas o CdS precipita. A concentração do Cd2+ que permanece em solução é dada por:

13
3,6  10 29
K ps
[Cd 2 ]    1,6  10 10 mol.L1
[S 2 ] 2,3  10 19
FIM DA RESPOSTA COMENTADA

Efeito de um íon comum na solubilidade


Quando dissolvemos um sólido pouco solúvel numa solução que já contém algum dos íons
que serão formados, ou seja, numa solução contendo um íon comum, observamos que a
quantidade de sólido solubilizada é inferior àquela que seria dissolvida em água pura.
O efeito do íon comum pode ser explicado pelo Princípio de Le Châtelier, que discutimos
anteriormente (“Quando um sistema em equilíbrio sofre uma perturbação, reage de forma
a contrabalançar parcialmente o efeito desta perturbação”). A presença do íon comum
tem o efeito da adição de um excesso de produto, ou seja, desloca o equilíbrio na direção da
formação do sólido.
Em um exemplo anterior, calculamos a solubilidade em água pura do Ag 2S, que é de
3,7  10-17 mol.L-1. Qual seria a solubilidade desta substância numa solução 0,010 mol.L -1
de Na2S? Como o sulfeto de sódio é muito solúvel, a solução, antes de qualquer dissolução
de Ag2S, já irá conter 0,010 mol.L-1 do ânion sulfeto, íon que ambas as substâncias têm em
comum. A forma que o sistema tem de tentar compensar o excesso de S 2- é deslocar o
equilíbrio de dissolução na direção da formação do Ag2S (s).

Ag2S (s)  2 Ag+(aq) + S2-(aq) K ps  [Ag  ] 2 [S 2 ]  2,0  10 -49

Consideramos que x mol.L-1 de Ag2S se dissolvem para que o sistema atinja o equilíbrio,
gerando 2x mol.L-1 de Ag+ e x mol.L-1 de S2-. Como a solubilidade do sólido é reduzida (o
valor do Kps é muito baixo), podemos provavelmente considerar que x é desprezível em
relação à concentração do sulfeto proveniente do Na2S (0,010 mol.L-1).

Espécies em solução Conc. iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Ag+ 0 +2x 2x
S2- 0,010 +x 0,010 + x  0,010

Substituindo estes valores na expressão do Kps:

K ps  [Ag  ]2 [S 2 ]  (2x) 2 (0,010)  2,0 10 -49  x = 2,2 × 10-24 mol.L-1

O valor de x é realmente desprezível em relação a 0,010, confirmando a validade da


hipótese. A solubilidade do Ag2S é de 2,2 × 10 -24 mol.L-1, inferior ao valor obtido em água
pura (3,7  10-17 mol.L-1), como esperado, devido ao efeito do íon comum.

ATIVIDADE 7 (objetivo 5)

14
Determine a massa de PbI2 (Kps = 1,4 × 10-8) que se dissolve em: (a) 1,0 L de água pura; (b)
1,0 L de solução contendo 9,93 g de Pb(NO3)2.

RESPOSTA COMENTADA
Na dissolução do PbI2, estabelece-se o seguinte equilíbrio:

PbI2 (s)  Pb2+(aq) + 2 I-(aq) K ps  [Pb 2 ][I  ]2  1,4  10 -8

(a) Na dissolução em água pura, não há espécies previamente em solução. Se x mol.L -1 de


sólido se dissolvem para o sistema atingir o equilíbrio, são formados x mol.L -1 de Pb2+ e x
mol.L-1 de I-:

Espécies em solução Conc. iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Pb2+ 0 +x x
I- 0 +2x 2x

Substituindo estes valores na expressão do Kps:

K ps  [Pb 2 ][I  ]2  (x)(2x) 2  1,4 10 -8  4x3 = 1,4 × 10-8  x = 1,5 × 10-3 mol.L-1

Para calcular a massa, basta multiplicar a concentração pelo volume, para determinar o
número de moles, e multiplicar o resultado pelo peso molecular do PbI 2:

Massa = 1,5 × 10-3 mol.L-1 × 1,0 L × 461 g.mol-1 = 0,69 g

(b) Dissolução em solução de Pb(NO3)2, que já apresenta uma certa quantidade de íons
Pb2+. Para calcular a concentração inicial desta espécie, dividimos a massa de nitrato por
seu peso molecular e pelo volume de solução:

9,93 g
(Pb 2 )   3,00 10 2 mol.L1
331 g.mol 1 1,0 L

Se x mol.L-1 de PbI2 se dissolvem para o sistema atingir o equilíbrio, são formados x


mol.L-1 de Pb2+ e x mol.L-1 de I-. O Pb2+ proveniente da dissolução do sólido pode
provavelmente ser considerado desprezível em relação ao que já está em solução:

Espécies em solução Conc. iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Pb2+ 3,00 × 10-2 +x 3,00 × 10-2 + x  x
I- 0 +2x 2x

15
Substituindo estes valores na expressão do Kps:

K ps  [Pb 2 ][I  ]2  (3,0  10 -2 )(2x) 2  1,4  10 -8  x = 3,4 × 10-4 mol.L-1

O valor de x é cerca de 1,1% do valor da concentração inicial de Pb2+, podendo, portanto,


ser realmente desprezado. Calculando a massa de PbI 2 dissolvido:

Massa = 3,4 × 10-4 mol.L-1 × 1,0 L × 461 g.mol-1 = 0,16 g

A massa dissolvida neste caso é menor do que na água pura, devido ao efeito do íon
comum, que diminuiu a solubilidade do PbI2.
FIM DA RESPOSTA COMENTADA

Formação de íons complexos e solubilidade


Diversos íons metálicos, notadamente aqueles provenientes de metais de transição, que se
comportam como ácidos de Lewis (ou seja, receptores de elétrons), são capazes de se
combinar com uma ou mais moléculas, ou outros íons, que se comportem como bases de
Lewis (ou seja, doadores de elétrons), produzindo espécies chamadas de íons complexos
(ou, simplesmente, complexos). As espécies que se combinam com os íons metálicos são
denominadas ligantes. Os ligantes podem ser: (i) moléculas neutras, como H2O ou NH3;
(ii) ânions monoatômicos, tais como Cl- ou Br-; e (iii) ânions poliatômicos, como CN -,
SCN-, OH-, ou C2O42-.
A formação de um complexo envolve um equilíbrio, que pode ser representado de duas
formas: escrevendo a reação de formação, a partir do íon metálico e dos ligantes, ou através
da reação de decomposição do complexo em seus constituintes. No primeiro caso, a
constante de equilíbrio associada à reação é chamada de constante de formação (Kf). Por
exemplo, quando a amônia interage com íons Ag+:

[Ag(NH 3 ) 2 ]
Ag +
(aq) + 2 NH3 (aq)  Ag(NH3)2+(aq) Kf 
[Ag  ][NH 3 ] 2

Quanto maior o valor de Kf, mais estável é o complexo, ou seja, maior é a tendência de o
íon metálico e os ligantes interagirem. No caso do Ag(NH3)2+, o valor desta constante é de
1,7 × 107, indicando que este complexo é bem estável. Isto ocorre porque as moléculas de
NH3 são capazes de interagir mais fortemente com o íon metálico do que as moléculas de
água responsáveis por sua solvatação. A Tabela 2 indica os valores das constantes de
formação de diversos complexos.

Tabela 2 – Constantes de formação (Kf), a 25°C, de diversos íons complexos:

Íon complexo Kf Íon complexo Kf

16
Ag(CN)2 - 5,3 × 1018 Cr(OH)4- 8,0 × 1029
Ag(NH3)2+ 1,7 × 107 Cu(CN)2- 1,0 × 1016
Ag(S2O3)23- 2,9 × 1013 Cu(NH3)42+ 4,8 × 1012
AlF63- 6,7 × 1019 Fe(CN)63- 9,1 × 1041
Cd(Br)42- 5,0 × 103 Fe(CN)64- 1,0 × 1035
Cd(CN)42- 7,7 × 1016 Ni(NH3)42+ 9,1 × 107
Co(NH3)62+ 7,7 × 104 Ni(NH3)62+ 5,0 × 108
Co(NH3)63+ 5,0 × 1033 Zn(CN)42- 5,0 × 1016
Co(SCN)42- 1,0 × 103 Zn(OH)42- 2,8 × 1015

Se representarmos o equilíbrio ligado ao complexo através da reação de decomposição


deste em seus constituintes, a constante de equilíbrio associada à reação é chamada de
constante de instabilidade (Kinst). Usando o mesmo exemplo:

[Ag  ][NH 3 ] 2
Ag(NH3)2+(aq)  Ag+(aq) + 2 NH3 (aq) K inst 
[Ag(NH 3 ) 2 ]

Quanto maior o valor de Kinst, mais instável é o íon complexo, ou seja, menor será a
tendência de formar esta espécie. As constantes de formação e de instabilidade
correlacionam-se de uma forma simples:

1
Kf 
K inst

A formação de íons complexos pode afetar a solubilidade de compostos pouco solúveis.


Como parte dos íons metálicos em solução são consumidos para formar o complexo, mais
sólido deve se dissolver, para aumentar a concentração do íon metálico a um valor em que
o Kps volte a ser respeitado. Portanto, a solubilidade de um composto pouco solúvel tende a
aumentar quando se observa a formação de um íon complexo.
No caso da adição de amônia a uma solução em que os íons Ag + estavam em equilíbrio
com um sólido insolúvel como o AgCl, a formação do complexo Ag(NH3)2+ consome parte
dos íons Ag+ que estavam em solução, interferindo com o equilíbrio de dissolução do AgCl.
Para que o valor da constante do produto de solubilidade volte a ser respeitado, é preciso
que parte do AgCl sólido se dissolva, o que desloca o equilíbrio original para a direita, ou
seja, na direção da formação das espécies em solução. O processo global pode ser
representado como a soma destas duas reações:

Ag+(aq) + 2 NH3 (aq)  Ag(NH3)2+(aq)


AgCl (s)  Ag+(aq) + Cl-(aq)
AgCl (s) + 2 NH3 (aq)  Ag(NH3)2+(aq) + Cl-(aq)

Sendo esta reação a soma de duas outras, sua constante de equilíbrio é dada pelo produto

17
das constantes de equilíbrio destas reações:

[Ag(NH 3 ) 2 ][Cl  ]
Kc   K ps  K f  (1,7  10 -10 )  (1,7  10 7 )  2,9  10 3
[NH 3 ] 2

Como seria afetada a solubilidade do AgCl em uma solução contendo 0,5 mol.L -1 de NH3?
Na ausência de amônia, já vimos como calcular a solubilidade; considerando que x mol.L-1
do sólido se dissolvem para atingir o equilíbrio:

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
Ag+ 0 +x x
Cl- 0 +x x

Kps = [Ag+][Cl-] = (x)(x) = 1,7 × 10-10  x = 1,3 × 10-5 mol.L-1

Agora, considerando a adição de amônia, que leva à formação do complexo:

AgCl (s) + 2 NH3 (aq)  Ag(NH3)2+(aq) + Cl-(aq)

Se x mol.L-1 de AgCl se dissolvem para alcançar o novo equilíbrio:

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
NH3 0,5 -2x 0,5 - 2x
Cl- 1,3 × 10-5 +x 1,3 × 10-5 + x  x
Ag(NH3)2+ 0 +x x

Fazendo a aproximação de que a quantidade inicial de cloreto é desprezível em relação à


formada pela interação do sólido com a amônia e substituindo os valores na expressão do
Kc desta reação:

[Ag(NH 3 ) 2 ][Cl  ] (x)(x)


Kc    2,9  10 3  x = 2,4 × 10-2 mol.L-1
[NH 3 ] 2
(0,5  2x) 2

Observamos que a concentração inicial do cloreto é realmente desprezível em relação a x,


confirmando a hipótese adotada. A solubilidade do AgCl aumentou consideravelmente
devido à formação do íon complexo.

ATIVIDADE 8 (objetivo 6)
Qual é a solubilidade do AgBr em uma solução 0,40 mol.L-1 de NH3? Considere que
Ag(NH3)2+ é o único complexo formado:

18
RESPOSTA COMENTADA
A reação global pode ser representada como:

AgBr (s)  Ag+(aq) + Br-(aq)


Ag+(aq) + 2 NH3 (aq)  Ag(NH3)2+(aq)
AgBr (s) + 2 NH3 (aq)  Ag(NH3)2+(aq) + Br-(aq)

Sua constante de equilíbrio é o produto do Kps do AgBr e da constante de formação do


complexo:

[Ag(NH 3 ) 2 ][Br  ]
Kc   K ps  K f  (5,0  10 -13 )  (1,7  10 7 )  8,5  10 6
[NH 3 ] 2

Se x mol.L-1 de AgBr se dissolvem para alcançar o novo equilíbrio:

Espécies em solução Conc. Iniciais Variação da conc. Conc. no equilíbrio


(mol.L-1) (mol.L-1) (mol.L-1)
NH3 0,40 -2x 0,40 - 2x
Br- 0 +x x
Ag(NH3)2+ 0 +x x

Substituindo estes valores na expressão do Kc:

[Ag(NH 3 ) 2 ][Br  ] (x)(x)


Kc    8,5  10 6  x = 1,2 × 10-3 mol.L-1
[NH 3 ] 2
(0,40  2x) 2

FIM DA RESPOSTA COMENTADA

ATIVIDADE FINAL

Calcule as solubilidades do AgSCN (Kps = 1,1 × 10-12) e do AgBr (Kps = 5,0 × 10-13) em
água, a 25°C, quando ambos estão presentes simultaneamente na solução:

RESPOSTA COMENTADA
As solubilidades não são independentes, pois há um íon comum, o Ag+. As solubilidades
dos compostos isolados são muito próximas, pois ambos são eletrólitos 1:1 (para cada
cátion gerado na dissolução, é formado um ânion de mesma carga) e os valores dos Kps são
da mesma ordem de grandeza. Os dois equilíbrios devem ser resolvidos simultaneamente:

19
[Ag+][SCN-] = 1,1 × 10-12
[Ag+][Br-] = 5,0 × 10-13

[SCN  ] 1,1  10 12


Dividindo uma equação pela outra:   2,2
[Br  ] 5,0  10 13

Temos três incógnitas ([Ag+], [SCN-] e [Br-]) e apenas duas equações independentes. Para
chegar a uma solução, precisamos de mais uma equação. Considerando que deve haver
uma balanço entre as cargas negativas e positivas no sistema:

[Ag+] = [SCN-] + [Br-]

[Ag  ] [SCN  ]
Dividindo por [Br-]:   1  2,2  1  3,2  [Ag+] = 3,2 [Br-]
[Br  ] [Br  ]

Substituindo na expressão do Kps do AgBr: 3,2 [Br-]2 = 5,0 × 10-13


Assim: [Br-] = 4,0 × 10-7 mol.L-1
As demais concentrações são obtidas facilmente:
[Ag+] = 1,2 × 10-6 mol.L-1 e [SCN-] = 9,0 × 10-7 mol.L-1

As solubilidades são, portanto:


AgBr: 4,0 × 10-7 mol.L-1 e AgSCN: 9,0 × 10-7 mol.L-1

RESUMO

A solubilidade em água de um sólido iônico é determinada pelo balanço entre a atração


entre os íons de cargas opostas, que tende a mantê-lo como sólido, e a interação entre estes
íons e as moléculas de água, que tende a provocar a dissolução.
No caso de sólidos pouco solúveis, estabelece-se um equilíbrio entre o sólido e as espécies
provenientes de sua dissolução parcial, cuja constante de equilíbrio é denominada constante
do produto de solubilidade (Kps). A partir do valor desta constante, é possível calcular a
solubilidade em água da substância, e vice-versa. Também podemos prever, conhecendo as
concentrações iniciais das espécies em solução, se haverá precipitação de um sólido
insolúvel. Se o valor obtido substituindo os valores destas concentrações na expressão do
Kps for maior que o valor desta constante, haverá precipitação. Se for menor ou igual, não

20
há formação de sólido.
As diferenças de solubilidade entre substâncias podem ser usadas para separar íons que
estejam presentes na mesma solução. A separação, denominada de precipitação seletiva, é
feita adicionando-se um reagente que forme um precipitado com um ou poucos dos íons
presentes na solução. É muito comum o uso do íon sulfeto na separação de íons metálicos,
pois sua concentração é facilmente controlada pelo ajuste do pH e porque há grandes
diferenças de solubilidade entre os sulfetos.
Quando dissolvemos um sólido pouco solúvel numa solução que já contém algum dos íons
que serão formados, ou seja, numa solução contendo um íon comum, observamos que a
quantidade de sólido solubilizada é inferior àquela que seria dissolvida em água pura, o que
é explicado pelo Princípio de Le Châtelier. A presença do íon comum tem o mesmo efeito
de um excesso de produto, ou seja, desloca o equilíbrio na direção da formação do sólido.
Ions metálicos que se comportam como ácidos de Lewis são capazes de se combinar com
uma ou mais moléculas, ou outros íons, que se comportem como bases de Lewis,
produzindo espécies chamadas de íons complexos. Como parte dos íons metálicos em
solução são consumidos para formar o complexo, mais sólido deve se dissolver, para que o
valor do Kps volte a ser respeitado, aumentando, portanto, a solubilidade do composto
pouco solúvel.

INFORMAÇÕES SOBRE A PRÓXIMA AULA

Na próxima aula, discutiremos as propriedades e usos dos metais alcalinos e alcalino-


terrosos.

REFERÊNCIAS

BRADY, James E. e HUMISTON, Gerard E. Química Geral, vol. 1. 2ª Edição. Rio de


Janeiro: Livros Técnicos e Científicos Editora, 1986. 410 pg.

BROWN, Theodore L., LE MAY JR., H. Eugene e BURSTEN, Bruce E. Química, a Ciência

21
Central. 9ª Edição. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005. 972 pg.

22

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