Manifestacoes Cardiologicas Do HIV
Manifestacoes Cardiologicas Do HIV
Manifestacoes Cardiologicas Do HIV
Update Atualização
Ludhmila Abrahão Hajjar, Daniela Calderaro, Pai Ching Yu, Isabela Giuliano,
Enéas Martins de Oliveira Lima, Giuseppe Barbaro, Bruno Caramelli
Instituto do Coração do Hospital das Clínicas - FMUSP e
Department of Medical Pathophysiology, University La Sapienza, Itália - São Paulo, SP e Roma, Itália
Estima-se atualmente que a infecção pelo vírus da manifestações cardiovasculares são as mais diversas,
imunodeficiência humana (HIV) acometa 42 milhões de conseqüentes à própria infecção pelo HIV, à auto-
pessoas no mundo. No Brasil são 1,2 milhão infectados, imunidade, à reação imunológica diante das infecções
dos quais 257.780 são portadoras da síndrome da virais outras, à inflamação crônica, a neoplasias, à
imunodeficiência adquirida (Sida). A Sida é responsável imunossupressão prolongada, à desnutrição e à
atualmente por 1,41% das mortes notificadas no Brasil, cardiotoxicidade dos medicamentos8,9 .
um número atualmente em queda pela política nacional A instituição da terapia múltipla trouxe modificações
de distribuição de tratamento anti-retroviral, que oferece à qualitativas nas manifestações cardiovasculares.
população acesso amplo à terapêutica disponível. Têm-se observado reduções nas doenças cardíacas
A história da infecção pelo HIV é marcada por dois causadas por agentes oportunistas, por desnutrição e pela
períodos – antes e após 19961. No primeiro período, o imunossupressão prolongada10. É crescente, contudo, o
que se buscava, desde a descoberta da infecção em 1981, número de casos de síndromes coronarianas e eventos
era o diagnóstico precoce e o tratamento das doenças vasculares periféricos, que se relacionam tanto ao
oportunistas. Após 1996, com a introdução da terapêutica aumento da sobrevida da população quanto à toxicidade
anti-retroviral combinada (HAART – Highly Active dos medicamentos11,12.
Antiretroviral Therapy), foram obtidos ganhos significativos Pretendemos discutir as diversas formas de
no combate à infecção, com aumento da sobrevida e manifestação cardíaca em pacientes infectados pelo HIV,
melhora da qualidade de vida dos infectados2. com ampla revisão da literatura, destacando tópicos
A utilização da terapia anti-retroviral combinada, que práticos da avaliação clínica e a nossa experiência
resultou no aumento da expectativa de vida dos pacientes, assistencial aos pacientes da Casa da Aids, no Instituto
associada à redução das infecções oportunistas, propiciou, do Coração em São Paulo.
contudo, a ocorrência, nessa população, de doenças
crônicas e de afecções relacionadas a fatores de risco
comuns à população geral. Em especial, as alterações DOENÇAS DO PERICÁRDIO
cardiovasculares associadas à infecção pelo vírus da O derrame pericárdico era a manifestação cardiológica
imunodeficiência humana e aquelas relacionadas aos mais comum na era pré-HAART13. Sua prevalência é de
efeitos cardiológicos adversos dos anti-retrovirais 21% a 30% nos pacientes HIV+, com uma incidência
aumentaram de importância nos últimos anos3,4. anual de 11%14. Esses dados indicam que, atualmente,
O acometimento cardíaco da infecção pelo HIV foi a investigação de derrame pericárdico deva incluir a
inicialmente descrito em 1983, por Autran e cols.5, que realização da sorologia para o HIV, pois estudos atuais
descreveram um caso de sarcoma de Kaposi miocárdico têm detectado soropositividade na avaliação de derrame
em um paciente com Sida. Desde então, na era pré- pericárdico em 72% dos casos na África, em 33% dos
HAART foram observadas, especialmente em autópsias, casos na Europa e em 7% a 28% dos casos nos Estados
prevalências de 28% a 73% de acometimento cardíaco Unidos13,14. A ocorrência de derrame pericárdico no
no paciente HIV positivo, com envolvimento do contexto da infecção pelo HIV é um marcador de doença
pericárdio, endocárdio, miocárdio e dos vasos6,7. As em estágio avançado, e implica pior prognóstico,
56% dos casos24,25. São encontradas também nos pacientes infectados pelo HIV, os últimos têm sobrevida bastante
HIV positivos as manifestações imunologicamente me- reduzida (risco relativo de morte por insuficiência cardíaca
diadas, como a glomerulonefrite, a presença do fator de 5,86)4. Lipshultz e cols. observaram uma sobrevida
reumatóide, as manchas de Roth e as lesões de Janeway. média de 101 dias em pacientes com disfunção
ventricular, e de 472 dias em pacientes com coração
O diagnóstico, assim como no paciente não-portador
normal no mesmo estágio da infecção pelo HIV27.
de HIV, faz-se baseado na clínica, em culturas e
ecocardiografia. O Staphylococcus é o agente mais comum Estudos clinicopatológicos da era pré-HAART mostram
(mais de 70% dos casos), seguido por Streptococcus e prevalência de 30% de cardiomiopatia nos pacientes com
Haemophilus23-26. Também são descritas endocardites por Sida28. Em estudo prospectivo de cinco anos em pacientes
fungos e outras bactérias como a Salmonella, que nesses HIV assintomáticos, a incidência de cardiomiopatia
pacientes têm maior chance de causar bacteremia e dilatada foi de 15,9/1.00029. Em análise ecocardiográfica,
uma disfunção diastólica precoce foi encontrada em até
endocardite. No quadro II estão descritas as causas de
15% dos pacientes com HIV30,31. Com a evolução da
endocardite infecciosa no paciente HIV.
miocardiopatia sobrevêm hipocinesia difusa, dilatação
global das câmaras e disfunção sistólica32. Fração de
Quadro II - Causas de endocardite infecciosa no ejeção reduzida e espessura ventricular aumentada têm
paciente HIV+. Grupo HACEK: Haemophilus sido associadas a maior mortalidade, demonstrada em
parainfluenzae, haemophilus aphrophilus, estudo multicêntrico realizado com crianças infectados
Actinobacillus actinomycetemcomitans, por transmissão vertical.33
Cardiobacterium hominis, Eikenella corrodens A etiopatogênese da cardiopatia dilatada associada
e Kingella kingae. MRSA: S.aureus ao HIV é multifatorial, estando implicados o próprio HIV,
resistente a meticilina outras infecções virais, miocardite, auto-imunidade,
Staphylococcus aureus (75%) inflamação crônica, imunossupressão prolongada,
Streptococcus viridans (20%) disfunção endotelial, arterite, encefalopatia associada ao
Staphylococcus epidermidis HIV, disfunção autonômica, deficiências nutricionais e
Streptococcus pneumoniae de oligoelementos e a cardiotoxicidade por drogas32,34-40.
Haemophilus influenzae
Organismos do grupo HACEK Os estudos com modelos animais que analisaram a
MRSA infecção pelo vírus da imunodeficiência dos simianos (SIV)
Salmonella sp nos macacos rhesus procuraram esclarecer a patogênese
Mycobacterium intracelullare / avium da agressão miocárdica associada com a infecção retroviral.
Candida sp
A infecção crônica com o SIV resulta em depressão da
Cryptococcus neoformans
Aspergillus fumigatus
função sistólica ventricular e uma arteriopatia coronariana
Pseudallescheria boydii extensa sugestiva de lesão mediada por resposta imune
celular25. Aproximadamente dois terços dos primatas
O tratamento da endocardite no paciente portador do infectados que morreram da infecção viral apresentavam
HIV não muda em relação à população geral, persistindo miocardiopatia. Miocardite linfocítica foi encontrada em
indicada a antibioticoterapia prolongada e os mesmos nove dos quinze, e vasculopatia coronariana em nove dos
critérios de terapia cirúrgica: insuficiência cardíaca quinze em estudo de necrópsia. Em alguns primatas foram
refratária, sepse, embolização sistêmica, endocardite visualizadas áreas de oclusão coronariana e recanalização
fúngica e falha terapêutica. relacionadas a regiões de necrose miocárdica, além de
Um outro tipo de endocardite encontrada no paciente um caso de trombo mural ventricular25.
com Sida na era pré-HAART é a endocardite marântica, A infecção pelo HIV e o processo inflamatório miocár-
ou trombótica não-infecciosa23,24. Em casuísticas de dico (miocardite) a ela relacionado são as causas mais
autópsias, era encontrada em 3% a 5% dos pacientes. estudadas de cardiomiopatia nessa população. Virions
Acomete as quatro válvulas, com predomínio da mitral e HIV-1 parecem infectar as células miocárdicas de
aórtica, e se caracteriza pela presença de uma vegetação maneira dispersa, sem que haja associação direta entre
friável, rica em plaquetas sobre uma rede de fibrina, com a presença qualitativa do vírus e a disfunção dos
pouca inflamação e altos índices de embolização sistêmica. miócitos29. A necrose das fibras miocárdias geralmente
Não há relatos de sua ocorrência na era pós-HAART. é mínima, com infiltrados linfocíticos associados. Não
está esclarecido como o HIV-1 entra nos miócitos, uma
vez que estes não apresentam receptores CD425. É
DOENÇAS DO MIOCÁRDIO provável que outras células como as dendríticas
A cardiomiopatia dilatada secundária à infecção pelo desempenhem papel não só de reservatório, como
HIV totaliza 3% a 6% dos casos de cardiopatia também de apresentadoras de antígenos no contexto
dilatada4,11. Quando comparados pacientes portadores do complexo principal de histocompatibilidade e de
de cardiomiopatia dilatada na forma idiopática e na dos ativadoras de dano tissular progressivo mediado por 365
população, como o álcool e a cocaína, são fatores A biópsia endomiocárdica é outro método diagnóstico
agressores miocárdicos implicados na potencialização da de cardiopatia dilatada que visa estabelecer diagnóstico
disfunção ventricular desses pacientes25,32. etiológico e prognóstico, porém sua baixa sensibilidade e
A cardiomiopatia dilatada ocorre tardiamente na riscos associados ao procedimento tornam sua realização
infecção pelo HIV, geralmente associada a níveis reduzidos rotineira mais voltada a centros com experiência acumulada
de CD4. Tem implicação prognóstica por estar associada e protocolos de pesquisa clínica. O grupo italiano assim
a altos índices de mortalidade. O exame anatomopa- como o Instituto do Coração preconizam a biópsia
tológico mostra fibrose endocárdica e trombo mural, endomiocárdica em toda disfunção sistólica associada à
preferencialmente apical, evidência histológica de infecção pelo HIV, o que tem resultado em achados variados
hipertrofia miocárdica e degeneração com aumento do de miocardites virais, reagudização de doença de Chagas
colágeno intersticial e fibrilar endocárdico. Esses achados (fig. 1), infecções fúngicas cardíacas e toxoplasmose, muitas
estão eventualmente associados a evidências de vezes com resposta satisfatória à terapêutica específica.
miocardite. Em um estudo prospectivo de 952 pacientes O tratamento da cardiomiopatia dilatada relacionada ao
HIV assintomáticos, o diagnóstico ecocardiográfico de HIV é semelhante ao da forma idiopática dessa doença.
cardiopatia dilatada foi feito em 76 (8%) com incidência Pela escassez de estudos prospectivos direcionados
anual de 15,9/1.000 29 . Todos os pacientes com especificamente a essa população, o tratamento é baseado
confirmação ecocardiográfica eram submetidos a biópsia nos resultados obtidos nos pacientes HIV negativos,
miocárdica, e a miocardite estava presente em 63 (83%) respeitando-se algumas particularidades. Apesar da
dos pacientes e 36 (57%) tinham hibridização positiva recomendação do uso de inibidores da enzima de conversão
para HIV. Em alguns casos foi observada co-infecção por e de betabloqueadores, podem ocorrer efeitos adversos em
outros vírus – coxsackie, citomegalovírus e Epstein-Barr29. alguns casos de pacientes com resistência vascular sistêmica
O diagnóstico da cardiomiopatia dilatada associada à reduzida por desidratação, diarréia ou infecção. Pacientes
infecção pelo HIV é clínico e ecocardiográfico 27,28. com miocardite apresentam maior sensibilidade à digoxina
Clinicamente o paciente apresenta-se de forma e devem ser monitorizados. O uso de imunossupressores é
semelhante ao não-infectado e em alguns casos o exame controverso nessa população e resultados positivos
ecocardiográfico pode detectar o paciente em fase promissores foram observados em crianças com a
assintomática, geralmente com disfunção diastólica imunoglobulina administrada por via venosa45.
isolada30,31. A indicação do ecocardiograma como exame
de rotina e triagem nos pacientes HIV é duvidosa. Os
benefícios do diagnóstico precoce, na fase inicial da
HIPERTENSÃO PULMONAR
doença, são indiscutíveis, porém não está bem estabe- Hipertensão pulmonar foi encontrada nos pacientes HIV
lecida a relação custo-efetividade do procedimento. De positivos com uma prevalência de 1/200 casos,
maneira geral, como demonstram os estudos, a cardio- contrastando com o achado de 1/200.000 casos na
miopatia dilatada incide em fase avançada da infecção população geral46-50. Sua detecção é muitas vezes associada
pelo HIV; dessa forma o ecocardiograma é bem indicado a infecções pulmonares, uso de drogas intravenosas,
para pacientes com suspeita clínica ou com CD4 abaixo transfusão de fator VIII em hemofílicos, tromboembolismo
de 20025,29,32. venoso, insuficiência cardíaca e à presença do HLA-DR6
Fig. 1 – Ninho de formas amastigotas de T.Cruzi em paciente com reagudização de doença de Chagas. Cedida por The University of Chicago Press.
Sartori AM, Lopes MH, Caramelli B et al. Simultaneous occurrence of acute myocarditis and reactivated Chagas’ disease in a patient with AIDS. Clin
Infect Diseases 1995; 21(5): 1297-9
367
e HLA-DR5246,47. Nos pacientes hospitalizados com Sida, metabólicas secundárias ao tratamento anti-retroviral.
sua ocorrência gira em torno de 0,5%. Assim, não seria surpreendente uma alarmante incidência
Alguns estudos revelam artéria pulmonar pré-capilar de eventos cardiovasculares e cerebrovasculares.
muscular, hipertrofia da média das arteríolas, fibroelastose Entretanto, esse tema ainda é motivo de discussão.
e fibrose intimal excêntrica sem infecção viral direta das
células da artéria pulmonar48,49. Esses achados sugerem Alterações metabólicas
liberação de mediadores de células infectadas e provável
Embora o maior enfoque dado à relação entre Sida e
lesão mediada por citocinas.
alterações metabólicas seja sobre efeitos colaterais da
A patogênese da hipertensão pulmonar primária é terapêutica anti-retroviral, trabalhos da era pré-HAART
pouco conhecida mas parece ser de natureza estabeleceram que a própria infecção pelo HIV determina
multifatorial. Entretanto, em alguns pacientes HIV um perfil lipídico mais desfavorável, caracteristicamente
positivos a hipertensão pulmonar primária é descrita com hipertrigliceridemia e baixo HDL-colesterol 52.
sem nenhum fator predisponente. Supõe-se que, nesses Constans e cols.53 observaram inclusive implicação
casos, o próprio HIV cause dano endotelial e a liberação prognóstica dessas alterações; quanto mais baixa a
de mediadores vasconstritores, como a endotelina-1, a contagem de linfócitos CD4 maior o nível de triglicérides
interleucina-6 (IL-6) e o fator de necrose tumoral alfa e mais baixos os níveis de HDL-colesterol. A fisiopatologia
(TNF-α) nas artérias pulmonares. O HIV é freqüente- dessa associação não está esclarecida, compreendem-
mente identificado nos macrófagos alveolares em exames se mais as vias pelas quais a terapêutica anti-retroviral,
histológicos47. Esses macrófagos liberam TNF-α, radicais especificamente os inibidores de protease, potencializa
livres e enzimas proteolíticas em resposta à infecção. esse distúrbio lipídico e acarreta outros a ele associados,
As linfocinas também parecem contribuir para a como o aumento da resistência insulínica, diabete melito,
proliferação endotelial vista na hipertensão pulmonar lipodistrofia e obesidade centrípeta.
por promover a adesão leucocitária ao endotélio.
Carr e cols.54 propuseram uma teoria baseada no
Também têm sido implicados na patogênese a ativação
achado de homologia estrutural entre o sítio catalítico da
dos receptores a-1 adrenérgicos e fatores genéticos
protease do HIV e proteínas humanas importantes no
(aumento da freqüência do HLA-DR6 e DR52)47,50.
metabolismo lipídico (CRABP-1: proteína ligadora do
Os sintomas e o prognóstico dos pacientes com disfunção ácido retinóico citoplasmático tipo I e LRP: proteína
ventricular direita por hipertensão pulmonar relacionam-se relacionada ao receptor de LDL), de tal forma que os
à gravidade da hipertensão. O quadro pode ser variável, inibidores da protease inibiriam também etapas
desde ausência de sintomas até insuficiência cardíaca importantes do metabolismo humano. Em última
avançada e cor pulmonale. Segundo o estudo Swiss HIV instância os inibidores de protease determinariam uma
Cohort, o paciente HIV positivo portador de hipertensão interrupção na metabolização do ácido retinóico e menor
pulmonar tem sobrevida reduzida quando comparado ao atividade do PPAR-y (peroxisome-proliferator-activated
paciente não-infectado (1,3 anos x 2,6 anos)51. receptor type gamma), que tem papel fundamental na
O tratamento com o uso de anticoagulantes e diferenciação dos adipócitos e na apoptose dessas células,
vasodilatadores deve considerar as possíveis interações além de melhorar a sensibilidade periférica à insulina. O
medicamentosas, especialmente no caso dos anticoa- resultado final desses efeitos é uma maior liberação de
gulantes. Em relação aos vasodilatadores, não há dados gordura na corrente sangüínea e hipertrigliceridemia.
que justifiquem sua ampla utilização. O epoprostenol é A inibição da LRP, por sua vez, implica menor captação
utilizado apenas nos pacientes mais graves em virtude dos triglicérides pelo fígado e também menor clivagem
do alto custo, necessidade de infusão venosa e risco destes a ácidos graxos e glicerol, que deveria ocorrer por
aumentado de infecção. Com relação ao tratamento da atividade do complexo endotelial da LRP-LPL (lipase
doença de base, não se conhecem, até o momento, os lipoproteica). A hipertrigliceridemia seria a responsável
efeitos da HAART na incidência e evolução clínica da pelo aumento da resistência a insulina que, nos indivíduos
hipertensão pulmonar. suscetíveis, poderia promover o desenvolvimento de
diabete melito tipo II. Contribuiria ainda para essa
INFECÇÃO PELO HIV E discrasia metabólica a inibição da enzima 3A do citocromo
P 450, etapa compartilhada pelos inibidores de protease
ATEROSCLEROSE e o metabolismo do ácido retinóico.
O controle da morbidade e mortalidade dos pacientes
portadores do HIV já os torna naturalmente expostos a Epidemiologia de eventos
processos crônico-degenerativos como a aterosclerose, cardiovasculares e dos fatores de
que antes não eram manifestos dada a mortalidade
precoce pela doença. Além disso, a predisposição a
risco para aterosclerose
aterosclerose resulta também da própria exposição Inicialmente, a associação entre infecção pelo HIV e
368 cumulativa ao vírus e das importantes alterações doença cardiovascular era inferida a partir de relatos de
casos de pacientes jovens e soropositivos que sofriam infarto Foi ao longo do ano de 2003 que as maiores
agudo do miocárdio, e principalmente de achados casuísticas foram publicadas. Bozzette e cols. analisaram
anatomopatológicos em estudos de necrópsia, com retrospectivamente 36.766 pacientes HIV+ em
evidência de doença obstrutiva em coronárias de pacientes tratamento entre os anos de 1993 e 2001, no que diz
sem fatores de risco habituais para aterosclerose55. Estudos respeito a mortalidade geral, mortalidade específica por
imuno-histoquímicos possibilitaram documentação objetiva eventos cardiovasculares e cerebrovasculares e taxas de
da presença do HIV em artérias coronárias comprometidas internação hospitalar por estes61. As únicas alterações
por inflamação e obstrução aterosclerótica56. Sugeriu-se expressivas ao longo desse período foram a importante
então uma associação direta entre infecção pelo HIV e redução da mortalidade geral e significativo aumento do
presença de arterite coronariana sem afastar a fisiopatologia uso de terapêutica anti-retroviral, notadamente após 1995
clássica aterosclerótica, a despeito da baixa prevalência e 1996. Não houve aumento da incidência de eventos
de fatores de risco nos pacientes estudados. cardiovasculares ou cerebrovasculares concomitante-
Com o advento e o uso cada vez mais difundido da mente à melhora da sobrevida. Embora os autores não
terapêutica anti-retroviral agressiva e seu inquestionável tenham especificado o perfil dos fatores de risco clássicos
impacto sobre os metabolismos lipídico e glicídico, surgiram para aterosclerose nessa população, eles relataram que
estudos com casuísticas progressivamente maiores 23,9% dos pacientes já haviam sido previamente tratados
procurando correlacionar infecção pelo HIV com doença para diabete, hipertensão ou tabagismo, e 6,6% já tinham
cardiovascular, e esta com tratamento anti-retroviral e fatores diagnóstico de doença vascular. Os autores observaram
de risco cardiovascular. Em 2000, Rickerts e cols. analisaram ainda, de maneira interessante, o progressivo aumento
retrospectivamente a incidência de infarto em 4.993 da prescrição de hipolipemiantes, com relato de 140
pacientes portadores de HIV. Verificaram que, embora o pacientes em uso de algum dos medicamentos disponíveis
número absoluto fosse baixo, houve um aumento significativo para controle de dislipidemia em 1995 e de 2.417
da taxa de infarto após a exposição a HAART57(tab. I). Após pacientes em 2001.
dois anos, Holmberg e cols. confirmaram esses mesmos Currier e cols. conduziram um estudo também
achados em população de 5.672 pacientes soropositivos, retrospectivo com inclusão de 28.513 pacientes
evidenciando entre os anos de 1993 e 2002 um significativo portadores do HIV e 3.054.696 não-infectados, com o
aumento da incidência de infarto após 1996, época da objetivo de determinar a incidência específica, por faixas
introdução da HAART58. Entretanto, os autores já chamavam etárias, de doença arterial coronariana em homens e
atenção para a participação de fatores de risco como mulheres HIV+ comparando àquela observada em
tabagismo e dislipidemia. indivíduos não-infectados 62 . O tempo médio de
Foi também em 2002 que Klein e cols. analisaram observação foi 2,5 anos dos pacientes soropositivos e
retrospectivamente 4.159 homens portadores do HIV que 2,64 anos dos pacientes soronegativos. Houve 1.360
ao longo de 5,5 anos de observação apresentaram 72 eventos cardiovasculares no grupo de pacientes
eventos cardiovasculares, dos quais 47 foram infartos do soropositivos e 234.521 no grupo-controle. Quando tais
miocárdio59. Os autores não observaram impacto da eventos eram distribuídos por gênero e idade, a infecção
exposição à terapia anti-retroviral na incidência dos pelo HIV consistiu importante marcador de risco para os
eventos cardiovasculares, porém a incidência destes entre homens com menos de 34 anos e para as mulheres com
os pacientes infectados pelo HIV foi superior àquela menos de 44 anos. Tal associação perdeu força nas faixas
observada entre os 39.877 homens não-infectados do etárias mais avançadas em ambos os sexos, com o curioso
grupo-controle (4,86 x 3,69 por 1.000 pessoas-ano; p achado, em algumas dessas faixas, de menor risco entre
= 0,003). Com relação aos fatores de risco, os pacientes os pacientes HIV+, por exemplo; risco relativo de DAC
soropositivos apresentavam maior prevalência de em homens entre 55 e 64 anos (infectados x não-
dislipidemia e tabagismo, porém menor prevalência de infectados) de 0,60 (0,51-0,71; p < 0,0001).
diabete e hipertensão que os pacientes do grupo-controle. Especificamente entre os pacientes com idade inferior a
33 anos, o uso de terapêutica anti-retroviral foi associado
David e cols. analisaram o perfil de risco de dezesseis
a maior risco de doença coronariana (risco relativo de
pacientes HIV+ (1,7% do total de seus 951 pacientes
2,06; p < 0,001). Os autores observaram um perfil de
infectados) com diagnóstico confirmado de doença arterial
maior risco entre os pacientes soropositivos, com aumento
coronariana e constataram que 81% destes eram
progressivo da prevalência dos fatores de risco
tabagistas, 63% apresentavam hipertensão, 50% tinham
cardiovascular nas faixas etárias mais elevadas.
dislipidemia e 31% história familiar positiva para doenças
cardiovasculares 60 . Os autores compararam as Em novembro de 2003 foram publicados dados do
características desses pacientes às de 32 indivíduos estudo DAD (Data Collection on Adverse Events of Anti-
HIV+, porém sem evidência de doença arterial HIV Drugs) com evidência de correlação positiva entre a
coronariana (DAC), e demonstraram que a prevalência duração da exposição à terapêutica anti-retroviral e o risco
dos fatores de risco era significativamente maior naqueles de infarto do miocárdio 63. Prospectivamente foram
com evidência de DAC, sem demonstrar associação entre observados 23.468 pacientes portadores do HIV, com
a exposição a inibidores de protease e maior risco. tempo médio de seguimento inferior a dois anos e registro 369
de 126 casos de infarto do miocárdio, dos quais apenas nos pacientes HIV+. Nessa amostra, 58% dos pacientes
55% preenchiam os critérios definitivos para esse HIV+ eram tabagistas, 58% apresentavam dislipidemia,
diagnóstico de acordo com as normas do projeto MONICA64. 50% tinham história familiar de DAC precoce, 29%
A taxa absoluta de eventos foi baixa, correspondente a hipertensão e 12% diabete. Além disso, os autores
3,5 eventos por mil pessoas/ano. Entretanto, cada ano de analisaram comparativamente a morbidade e mortalidade
exposição à terapia antiretroviral combinada determinou a curto e médio prazos, demonstrando que os pacientes
um aumento de 26% do risco relativo de infarto do soropositivos apresentavam evolução intra-hospitalar
miocárdio durante os primeiros quatro a seis anos de benigna, porém com maior morbidade após a alta, com
exposição. Nessa mesma coorte de pacientes, a prevalência mais reinfarto (20% x 4%; p = 0,07) e maior recorrência
dos fatores de risco tradicionais para doença coronariana de sintomas (45% x 11%; p = 0,007) sem contudo
foi alta; 56,2% de tabagismo, 45,9% de dislipidemia, apresentar maior mortalidade (0 x 4%; p > 0,99). Com
7,2% de hipertensão e 2,8% de diabetes. Foram preditores relação ao comprometimento das artérias coronarianas,
independentes de infarto do miocárdio idade avançada, não foi observada diferença entre as características
história de tabagismo, sexo masculino e diagnóstico prévio angiográficas dos grupos.
de doença cardiovascular63. Finalmente, Hsue e cols. avaliaram retrospectivamente
Varriale e cols. analisaram prospectivamente 690 os fatores de risco e a evolução clínica de 68 pacientes
pacientes HIV+ submetidos a internação hospitalar portadores do HIV internados entre os anos de 1993 e
durante três anos de observação65. Detectaram 29 casos 2003 por angina instável ou infarto do miocárdio, e
de infarto do miocárdio, constatando uma incidência de compararam as características dessa população a um
1/100 pacientes-ano de observação, semelhante àquela grupo controle de 68 indivíduos com diagnóstico de DAC
observada na população geral norte-americana. No que aguda, porém soronegativos67. A prevalência de tabagismo
diz respeito ao perfil de risco cardiovascular desses (46% x 28%; p = 0,003) e baixo HDL-colesterol (35 ±
pacientes, 55% eram tabagistas, 21% dislipidêmicos, 12 x 41 ± 9; p = 0,005) era maior entre os pacientes
14% hipertensos, 14% apresentavam histórico familiar soropositivos e sua faixa etária era menor (50 + 8 x 61
de DAC precoce e apenas 21% não apresentavam ± 11 anos; p < 0,001). Entretanto, a prevalência de
nenhum fator de risco. A idade média dos pacientes diabete e dislipidemia foi maior no grupo-controle e o
infartados foi de 46 anos (±10 a.), 66% recebiam inibidor compito geral do risco, avaliado pelo escore de TIMI68,69,
de protease e, embora 79% deles apresentasse pelo também foi maior no grupo-controle, que apresentou à
menos algum fator de risco para aterosclerose, a maioria angiografia maior extensão da doença coronariana.
apresentava baixa associação deles. Contudo, a taxa de reestenose clinicamente manifesta
No estudo de Matetzky e cols., 24 pacientes HIV+ foi maior nos pacientes soropositivos do que nos controles
internados com o diagnóstico de infarto do miocárdio entre que foram submetidos a angioplastia com o uso de stent
os anos de 1998 e 2000 foram prospectivamente avaliados (50% x 18%; p = 0,078). Ao todo, foram realizadas 29
por um tempo médio de quinze meses e comparados a angioplastias nos pacientes soropositivos, com uso de
um grupo-controle de 48 pacientes com infarto, porém stents em 22 desses procedimentos. No grupo-controle
soronegativos66. Os autores não mostraram diferenças foram realizadas onze angioplastias com stents e dez
significativas entre as prevalências de diabete, hipertensão, exclusivamente com cateter-balão.
tabagismo, dislipidemia ou história familiar de DAC quando Um recente estudo procurou estabelecer de forma
compararam os grupos, sugerindo assim implicação direta objetiva a relação de risco de doença cardiovascular e
da infecção retroviral na doença. Entretanto, a não- uso de terapia antiretroviral70. Foram estudados 721
inferioridade do perfil de risco reforça a importância dos indivíduos divididos em três grupos pareados por idade e
fatores tradicionais na etiopatogenia da doença coronariana sexo; 219 pacientes eram HIV+ em uso de HAART, 64
pacientes HIV+ sem uso de HAART, e 438 indivíduos não for iniciado inibidor de protease, repetir a avaliação a
controles (HIV-). A estimativa de risco cardiovascular foi cada dois anos. Se vier alterado, iniciar tratamento e repetir
realizada utilizando o escore de risco de Framingham e em um mês e posteriormente de três em três meses. Quanto
evidenciou que a prevalência de risco coronariano ao tratamento, a dislipidemia nos pacientes infectados pelo
estimado > 20% em dez anos foi duas vezes maior nos HIV deve considerar as mesmas metas recomendadas para
pacientes tratados com HAART que no grupo-controle a população geral, após análise global dos demais fatores
(11,9% x 5,3% , p = 0,004). O grupo de pacientes de risco. Sempre se devem iniciar medidas não-
HIV+ que não receberam tratamento com HAART teve farmacológicas e, na persistência da dislipidemia, iniciar
um risco estimado > 20% em dez anos de 6,3%, sem farmacoterapia, com extrema cautela73,74.
diferença significativa quando comparada ao grupo HIV+ A prescrição dos hipolipemiantes, entretanto, pode
em uso de HAART (p = 0,25) ou comparada ao grupo trazer complicações aos complexos esquemas
controle (p = 0,76). Entre os fatores de risco observados, antiretrovirais75. Algumas alternativas ao tratamento
a prevalência de tabagismo foi maior no grupo de farmacológico da dislipidemia foram aventadas, tais como
pacientes HIV+ que nos controles (54,5% x 30,1%), alterar o esquema de tratamento anti-retroviral
assim como níveis mais elevados de colesterol total e substituindo o inibidor de protease por um outro, ou para
reduzidos de HDL-colesterol. um inibidor da transcriptase reversa não-nucleosídeo.
Na prática global de prevenção primária e secundária Porém, essas alternativas, teoricamente favoráveis, não
de doença cardiovascular inicialmente levava-se em conta têm resultado em benefícios consideráveis nos estudos
apenas a exposição aos fatores de risco, porém a clínicos, além da possibilidade de ocorrência de
necessidade de discriminação mais precisa das modificações nas características do processo infeccioso
populações de risco se traduziu na implementação de viral crônico como resistência e sorotipagem76,77.
exames de rastreamento para identificação de Os medicamentos mais utilizados no tratamento da
aterosclerose antes de sua repercussão clínica, a chamada dislipidemia desses pacientes são os mesmos da população
aterosclerose subclínica, comprovadamente relacionada geral: estatinas, fibratos e niacina. As recomendações do
à maior incidência de eventos futuros. Entre esses exames grupo de estudos da Sida referem-se ao NCEP Panel III
destacam-se o ultra-som de carótidas e femorais para para o manejo da dislipidemia74. As diretrizes baseiam-se
detecção de espessamento do complexo íntima-média na análise do risco global do paciente e se baseiam nos
dessas artérias, as provas de função endotelial e, mais níveis de LDL-colesterol em jejum.
recentemente, a detecção de cálcio em coronárias. No
Estatinas: com exceção da pravastatina e da
contexto específico de infecção pelo HIV, já foi
rosuvastatina, a maioria das estatinas é metabolizada
demonstrada prevalência elevada de disfunção endotelial,
pela isoenzima 3A4 do citocromo P450, que é inibida
principalmente entre aqueles pacientes em uso de
pelos inibidores de protease atuais. Portanto, a
inibidores de protease, bem como maior prevalência de
administração das estatinas com os inibidores de protease
espessamento do complexo íntima-média de carótidas71.
pode resultar em elevação dos níveis da estatina no sangue
Recentemente, além de se verificar maior espessura do
a níveis perigosos, possivelmente causando toxicidade
complexo médio-intimal de carótidas de pacientes
soropositivos quando comparados a controles, foi muscular esquelética e outros efeitos adversos73-77. Pelas
observada maior velocidade da progressão desse potenciais interações, as estatinas devem ser dadas
espessamento no intervalo de um ano72. inicialmente em baixas doses com monitoração freqüente.
Na prática clínica, alguns autores utilizaram atorvastatina
com segurança nessa população, fato também observado
Manuseio da dislipidemia nos em nossa experiência 76,77 . Assim, as estatinas
pacientes portadores de HIV teoricamente mais seguras para uso em associação aos
O estudo Framingham demonstrou que o controle da inibidores de protease são pravastatina, atorvastatina e
dislipidemia reduz o risco de doenças cardiovasculares no rosuvastatina. São as drogas de escolha no tratamento
contexto tanto de prevenção primária quanto secundária. da hipercolesterolemia, além de serem eficazes também
Especificamente na população de pacientes portadores na terapia da hipertrigliceridemia, especialmente a
de HIV não há estudos epidemiológicos que permitam atorvastatina e rosuvastatina.
conclusões sobre essa questão. Entretanto, a maior Fibratos: os fibratos são a primeira escolha no tratamento
sobrevida desses pacientes implica a adoção de medidas da dislipidemia mista dos pacientes infectados pelo HIV, a
para redução de seu real risco cardiovascular. A Sociedade mais freqüente alteração observada nessa população74,77.
Brasileira de Cardiologia foi a primeira a incluir nas Os efeitos a longo prazo de sua administração com os
Diretrizes Brasileiras sobre Dislipidemias e Diretriz de inibidores da protease são desconhecidos. O gemfibrozil é
Prevenção de Aterosclerose, em 2001, um tópico bem tolerado e tem perfil de interação aceitável para
específico para conduta em pacientes soropositivos. utilização. Em estudo que utilizou atorvastatina com
Recomenda que seja feita dosagem do perfil lipídico no gemfibrozil em pacientes soropositivos houve redução de
início do acompanhamento; se o mesmo vier normal e 30% no colesterol total e 60% nos triglicerídeos77. As 371
recomendações são em favor da utilização do gemfibrozil como diabetes ou dieta. A maior importância dos outros
ou fenofibrato nessa população73,74. fatores de risco em relação à dislipidemia para essa
Niacina: a niacina reduz os níveis de LDL-colesterol, população específica aliada às limitações dos estudos
aumenta os níveis de HDL-colesterol e reduz os disponíveis mantém ainda indefinido, em nossa opinião,
triglicerídeos. Entretanto, efeitos colaterais como flushing, a existência de um regime anti-retroviral que deva ser
prurido, hiperglicemia e principalmente a hepatotoxi- escolhido em busca de um menor risco cardiovascular.
cidade, não a recomendam como agente de primeira Em conclusão, dadas as características do perfil de
escolha no portador de HIV. risco cardiovascular dessa população, as intervenções
Outros agentes: a colestiramina e o colestipol não são não-farmacológicas parecem ter o efeito mais importante
recomendados por interferirem com a biodisponibilidade no tratamento preventivo do paciente infectado pelo HIV.
dos inibidores de protease e por aumentarem os níveis Os pacientes devem ser aconselhados a controlar os
de triglicerídeos77. As glitazonas, ativadores do receptor fatores de risco seguindo as orientações de estilo de vida,
PPAR-g, não se demonstraram úteis no tratamento da como parar de fumar, seguir dieta, realizar exercício físico,
dislipidemia nesses pacientes. Entretanto, a metformina controlar hipertensão arterial e diabete74.
mostrou eficácia na redução dos triglicerídeos, mas com
um efeito potencial de acidose láctica, especialmente na
presença de uso contínuo de inibidores da transcriptase
SIDA EM CRIANÇAS
reversa77. Os ácidos graxos w3 são úteis no tratamento
da hipertrigliceridemia nos pacientes soropositivos, porém Epidemiologia
não foram avaliados em pacientes que receberam
Apesar de todos os esforços de prevenção da
inibidores da protease77. Outra fronteira a ser explorada transmissão vertical do vírus HIV no Brasil, a
é a busca por inibidores de protease com menor perfil contaminação materno-fetal continua sendo freqüente.
aterogênico e com menos interações com os hipoli- Aliado a isso, os avanços no controle da doença e de
pemiantes. O atazanavir é um inibidor de protease potente suas complicações têm determinado a diminuição
e eficaz recentemente aprovado, para o qual foi sugerida progressiva da sua letalidade na infância. Isso determina
menor incidência de efeitos colaterais metabólicos em um aumento significativo do número de crianças
pacientes tratados por 108 semanas77. infectadas, as quais necessitam de controle de possíveis
Em pacientes nos quais foi feita a troca de nelfinavir complicações em longo prazo78 (gráfico 1).
para atazanavir, houve retorno dos níveis lipídios para os Dados internacionais têm demonstrado também uma
valores encontrados antes do tratamento com nelfinavir. diminuição significativa da letalidade da Sida na infância
Entretanto, uma análise cuidadosa revela que esses e aumento da sobrevida dessas crianças. Apesar disso,
estudos têm deficiências metodológicas semelhantes, enquanto há a diminuição dos óbitos por causas
incluindo tamanho amostral inadequado, não-observação infecciosas, há uma tendência secular de aumento discreto,
de jejum ou abstinência de álcool para coleta de perfil mas progressivo, da mortalidade proporcional por causas
lipídico e não-correção para potenciais fatores de confusão cardíacas nas crianças acometidas pela Sida79,80.
Gráfico 1 – Número de casos novos e de óbitos pela Sida em crianças e adolescentes do Brasil,
no período de 1981 a 2003. Fonte: Datasus
1800
n 1600
1400
1200
1000 ó b it o s
800 c as os n o v os
600
400
200
0
81 83 85 87 89 91 93 95 97 99 01 03
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372
70 0
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6 4 0,4 8 p<0,0001
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20 0
10 0 1 0 6 ,6 p=0,009
9 7 ,4 8
P ré-BZ F P ó s-BZ F
374
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