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AULA 3 - ADI e ADC

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INTRODUÇÃO AO PROCESSO COLETIVO

CONSTITUCIONAL

Aula 3
Ação direta de inconstitucionalidade e
Ação declaratória de constitucionalidade
Paula Pessoa Pereira
Roberto Dalledone Machado Filho
SUMÁRIO

Introdução..................................................................................................3

1. Legitimidade e acesso à jurisdição constitucional de perfil


abstrato.......................................................................................................8

2. Procedimentos................................................................................... 12

3. Causa de pedir aberta...................................................................... 17

4. Medidas liminares: questões controversas e problemas


procedimentais....................................................................................... 18

5. Técnicas decisórias e a interpretação constitucional............... 23

6. Efeitos da decisão e técnica da modulação................................ 31

Considerações finais............................................................................. 33

Referências.............................................................................................. 35
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

Introdução

Olá! Bem-vinda e bem-vindo à aula sobre Ação Direta


de Inconstitucionalidade (ADI) e Ação Declaratória de
Constitucionalidade (ADC).
Meu nome é Paula Pessoa Pereira, sou doutora e
mestra em Direito das Relações Sociais pela Universidade
Federal do Paraná (2017 e 2013). Fiz especialização em Direito
Processual Civil pela Universidade Federal da Bahia (2009). Sou
pesquisadora visitante no Max Planck Institute for Comparative
Public Law and International Law, membro do Instituto Brasileiro
de Direito Processual, membro da Associação Brasileira de
Direito Processual Constitucional e professora colaboradora
na Universidade de Brasília. Desenvolvi pesquisas no Núcleo de
Direito Processual Civil Comparado vinculado à Pós-graduação
em Direito da UFPR. Atualmente, sou assessora de ministro do
Supremo Tribunal Federal.
Meu nome é Roberto Dalledone Machado Filho, sou
doutor em Direito pela Universidade de Brasília, pesquisador
visitante no Max-Planck-institut für ausländisches öffentliches
Recht und Völkerrecht (Heidelberg) e mestre em Direitos
Humanos e Democracia pela Universidade Federal Paraná com
bolsa da CAPES. Atuo como professor das disciplinas de Direito
Internacional Público e de Direitos Humanos do Instituto
Brasiliense de Direito Público e tenho experiência em Políticas
Públicas e Política Internacional, tendo participado do programa
de estágio das Nações Unidas em Nova Iorque. Atualmente sou
assessor de ministro no Supremo Tribunal Federal.
Nosso objetivo com esta aula é permitir que, ao final dos estudos, você consiga
categorizar as hipóteses de cabimento dessas ações e, para tanto, destacaremos as
principais questões polêmicas relacionadas à temática. Certo?
De início, gostaríamos de salientar que o propósito da ADI e da ADC é servir de
instrumento jurídico-processual de defesa da força normativa da Constituição Federal
frente às situações de inobservância ou violação dessas normas por parte dos poderes
constituídos.
Para ficar mais clara a alocação dessas ações no contexto dos processos
constitucionais necessários à tutela da juridicidade da Constituição, precisamos
esclarecer o significado do constitucionalismo enquanto arranjo democrático. Vamos
juntos?

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 3
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

O constitucionalismo versa uma construção institucional que teme a


democracia como único jogo responsável pela tomada das decisões em sociedades
complexas e heterogêneas. O arranjo institucional da Constituição escrita tem por
objetivo estabelecer limites à autoridade dos poderes constituídos, no campo do
processo político e na estrutura da forma de governo federal, com o estabelecimento
de regras e procedimentos, como o processo legislativo e o sistema de repartição de
competências federativas. Ao lado da enumeração de direitos fundamentais, oponíveis
em face da atuação estatal e mesmo em face dos particulares, ressai aqui a beleza dos
procedimentos dos direitos, sem que a estes se possa atribuir o qualificativo de um
formalismo frívolo.
Nessa dimensão do constitucionalismo, as cortes ou os tribunais constitucionais
assumem função central de tutela da autoridade e da juridicidade da força normativa
da Constituição Federal, razão pela qual há uma expansão, como fenômeno global, de
suas competências.
Para o exercício dessa função é que o desenho institucional da Constituição
previu processos e instrumentos de garantia e defesa da sua juridicidade e exigibilidade
na realidade política e social, por meio da proteção dos procedimentos de arbitramento
da competição e processo político, bem como dos direitos fundamentais, sejam os
individuais ou sociais, de natureza coletiva.
A partir dessa perspectiva, percebemos que a tutela da ordem constitucional
tem uma natureza coletiva, na medida em que os instrumentos e garantias processuais
são vocacionados para a proteção de direito intrinsicamente comunitário, por ser o
fundamento da ordem jurídica.
A ADI e a ADC configuram-se como ações constitucionais estruturantes na
conformação do desenho institucional do controle jurisdicional de constitucionalidade
de perfil abstrato e concentrado. O fundamento normativo dessas ações constitucionais
está na própria Constituição Federal, em seu art. 102, inciso I, alínea a, que assim dispõe:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a


guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I – processar e julgar, originariamente:

a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo


federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei
ou ato normativo federal; (redação dada pela Emenda Constitucional
n. 3, de 1993)

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COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

O objetivo dessas ações, em essência, é permitir que pessoas, cuja legitimidade


foi atribuída pela Constituição Federal, possam questionar, perante o Supremo Tribunal
Federal, a validade dos atos normativos, de origem federal ou estadual, que tenham
sido elaborados de forma contrária ao procedimento formal previsto na arquitetura
constitucional ou aos parâmetros materiais dos direitos fundamentais. Como dito
acima, os poderes constituídos, Legislativo e Executivo, representam a vontade coletiva
de seus representados, mas isso não implica que podem atuar sem limitações de ordem
formal (procedimental) e material. Antes, estão limitados pela ordem constitucional,
que representa o autêntico poder constituinte originário.
Por isso, verificamos na prática da comunidade política a constante tensão
entre a democracia majoritária dos poderes constituídos e o constitucionalismo do
constituinte originário, que impõe limites. Essa tensão é comum nas ditas democracias
constitucionais e a sua resolução passa justamente por esses processos e procedimentos
constitucionais, cujo arbitramento é feito perante instituições não eleitas, sem pré-
compromissos político-partidários, como é o caso do Poder Judiciário e, no Brasil, do
Supremo Tribunal Federal.
Nesse sentido, veja a declaração do Ministro Moreira Alves:

Em nosso sistema jurídico, não se admite declaração de


inconstitucionalidade de lei ou de ato normativo com força de
lei por lei ou por ato normativo com força de leis posteriores. O
controle de constitucionalidade da lei ou dos atos normativos
é da competência exclusiva do Poder Judiciário. Os Poderes
Executivo e Legislativo, por sua chefia – e isso mesmo tem
sido questionado com o alargamento da legitimação ativa
na ação direta de inconstitucionalidade –, podem tão só
determinar aos seus órgãos subordinados que deixem de
aplicar administrativamente as leis ou atos com força de lei que
considerem inconstitucionais. (ADI 221 MC, rel. min. Moreira
Alves, j. 29-3-1990, P, DJ de 22-10-1993).

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COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

Para ilustrar esse argumento da supremacia da Constituição e dos vícios de


inconstitucionalidade de ordem formal e material, transcrevemos duas decisões
tomadas pelo Plenário do STF:

Inconstitucionalidade por vício de Inconstitucionalidade por vício de


ordem formal – procedimental ordem material – quanto
ao conteúdo do ato normativo

Poder constituinte reformador. (...) a temática dos direitos humanos, por


Processo legislativo. EC 19, de 4-6- dizer respeito aos direitos fundamentais,
1998. Art. 39, caput, da CF. Servidores que têm primazia na Constituição, é sempre
públicos. Regime jurídico único. ipso facto materialmente constitucional.
Proposta de implementação, durante E é possível extrair da conjugação dos
a atividade constituinte derivada, da §§ 2º e 3º do art. 5º que o que temos aí
figura do contrato de emprego público. é, pura e simplesmente, uma distinção
Inovação que não obteve a aprovação entre os tratados sem status de emenda
da maioria de três quintos dos constitucional, que são materialmente
membros da Câmara dos Deputados constitucionais, e os do § 3º, que são
quando da apreciação, em primeiro material e formalmente constitucionais.
turno, do destaque para votação em Qual a substância da distinção? A de
separado (DVS) n. 9. Substituição, regimes jurídicos. Com qual consequência?
na elaboração da proposta levada a Com uma única consequência: saber os
segundo turno, da redação original do efeitos ou os requisitos do ato de denúncia
caput do art. 39 pelo texto inicialmente pelo qual o Estado pode desligar-se dos
previsto para o parágrafo 2º do mesmo seus compromissos internacionais. Esta
dispositivo, nos termos do substitutivo é a única relevância na distinção entre as
aprovado. Supressão, do texto hipóteses do § 2º e do § 3º. E acho que o
constitucional, da expressa menção ao Tribunal não deve, com o devido respeito,
sistema de regime jurídico único dos ter receio de perquirir qual a extensão dos
servidores da administração pública. direitos fundamentais, até porque eles
Reconhecimento, pela maioria do são históricos. Ou seja, é preciso que a
plenário do STF, da plausibilidade da Corte, no curso da história, diante de fatos
alegação de vício formal por ofensa ao concretos, vá descobrindo e revelando os
art. 60, § 2º, da CF. (ADI 2.135 MC, rel. direitos humanos que estejam previstos
p/ o ac. min. Ellen Gracie, j. 2-8-2007, P, nos tratados internacionais, enquanto
DJE de 7-3-2008). objeto da nossa interpretação, e lhes
Art. 60, § 2º A proposta será discutida e votada em dispense a necessária tutela jurídico-
cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, constitucional. (RE 466.343, voto do rel.
considerando-se aprovada se obtiver, em ambos,
três quintos dos votos dos respectivos membros. min. Cezar Peluso, j. 3-12-2008, P, DJE de
5-6-2009).

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COLETIVO CONSTITUCIONAL
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Ação Declaratória de Constitucionalidade
Na presente aula, portanto, vamos nos dedicar a estudar tópicos relevantes
e controversos das ações direta de inconstitucionalidade e declaratória de
constitucionalidade, a partir da análise da sua legitimidade, do procedimento, dos
efeitos das medidas liminares, dos efeitos das decisões e das técnicas decisórias
necessárias à formulação de respostas jurisdicionais racionais e efetivas.
Antes de adentrarmos essas discussões, esperamos que você entenda bem o
significado e o alcance da função do controle jurisdicional de constitucionalidade dos
atos normativos do poder público e, por conseguinte, do próprio papel e centralidade
do Poder Judiciário e de seu órgão de cúpula, vocacionado à tutela e à guarda precípua
da Constituição Federal.
Assim, temos duas sugestões de vídeos sobre a temática. Confira:

VALE A PENA
CONFERIR

Trailer do filme “O povo contra Larry Flynt” (trata da liberdade de expressão


e da liberdade de imprensa). Veja o trailer.
“Reversing Roe” (2018, produção Netflix): é muito interessante para a
compreensão do papel dos tribunais, em especial da Suprema Corte, na defesa
dos direitos fundamentais dos indivíduos como limites à atuação dos poderes
públicos constituídos. Nesse documentário, em essência, foi abordada a questão
da decisão sobre a descriminalização da prática do aborto nos Estados Unidos, por
decisão da Suprema Corte americana, cujos fundamentos de decidir concentram-
se na proteção dos direitos à privacidade e à autodeterminação da mulher.
Para ter acesso a outros filmes que demonstram o papel do Poder Judiciário
no exercício do controle de constitucionalidade dos atos legislativos e normativos
primários em geral, ou seja, no desempenho da sua função de garantidor da
juridicidade dos direitos fundamentais frente aos atos estatais, recomendamos a
lista elaborada pelo Professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Cassio
Casagrande. Acesse a lista.

Consolidados esses conhecimentos introdutórios, analisaremos a partir de


agora assuntos relevantes para a compreensão da ADI e ADC. Vamos continuar?

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1. Legitimidade e acesso à jurisdição constitucional de


perfil abstrato

Sabemos que o acesso à jurisdição constitucional de perfil concentrado e


abstrato é limitado aos legitimados instituídos no texto constitucional (art. 103), rol
esse que foi replicado na Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999 (art. 2º).
A lógica subjacente à restrição dos legitimados ativos reside na função peculiar
do controle de constitucionalidade abstrato, voltado para a verificação da validade
constitucional dos atos normativos infraconstitucionais, federais e estaduais, em uma
dimensão abstrata, desvinculada de casos concretos e de seus efeitos na incidência e
interação com os fatos. Todavia, não obstante seja um rol exaustivo o dos legitimados
ativos, é certo que possui uma ampla abrangência, a demonstrar o reforço institucional
dado pela ordem constitucional de 1988 ao sistema de defesa e tutela da Constituição
Federal ao lado do sistema de perfil difuso e concreto.
De acordo, portanto, com o art. 103 da Constituição Federal dispõem de
legitimidade para propor ação direta de (in)constitucionalidade:

Artigo 103 da CF

I - o Presidente da República;
I - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
possuem capacidade
postulatória plena IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

A capacidade postulatória dos legitimados previstos nos incisos I a VII do art.


103 da Constituição é plena, conforme jurisprudência do STF que definiu interpretação
jurídica no sentido de que essa capacidade postulatória tem fundamento na própria
norma constitucional, sendo prescindível a representação de advogados na prática dos
atos processuais.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 8
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade
Por outro lado, os partidos políticos com representação no Congresso Nacional
e as confederações ou entidades de classe de âmbito nacional (inciso IX) não possuem
capacidade postulatória primária, devendo estar representados por advogados
no processo. Com relação à capacidade postulatória, cabe destacar a necessidade
de outorga de poderes especiais, com a indicação específica na procuração do ato
normativo a ser impugnado. Não é admissível, sob pena de indeferimento da petição
inicial, a procuração com outorga de poderes genéricos.
Questão controversa na jurisprudência do STF, no contexto da legitimidade
ativa para o ajuizamento das ações constitucionais diretas, centra-se no controle da
representação adequada das confederações ou entidades de classe de âmbito nacional.
Por versar hipótese aberta, que permitiria um amplo acesso da jurisdição constitucional
de perfil concentrado, o Tribunal, por meio de seus precedentes, estabeleceu critérios
de verificação da representação dessas entidades. Nesse sentido, três foram os
requisitos a serem observados pelas confederações e entidades de classe:

abrangência nacional;
Requisitos para representação
representação, no mínimo, em nove estados; e
confederações e entidades de
classe composição homogênea das categorias
profissionais e econômicas representadas.

Conquanto essa limitação, a partir da observância desses critérios, tenha sido


o resultado de uma postura de defesa da viabilidade institucional da própria Corte
no desempenho de suas funções, é possível verificar uma atenuação (maleabilidade)
da exigência desses requisitos na jurisprudência recente, mais especificamente o
requisito da homogeneidade na representação de categorias tão somente profissionais
e econômicas.

DICA DE LEITURA

Sugerimos a leitura do artigo “A voz da sociedade civil no controle concentrado


de constitucionalidade”, por Matheus George Gouvêa da Nóbrega.
Vale a pena conferir também o artigo “Controle de Constitucionalidade e
acesso à jurisdição constitucional”, por Dirley da Cunha Júnior.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 9
COLETIVO CONSTITUCIONAL
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Essa solução normativa vai ao encontro da configuração de uma jurisdição


constitucional mais democrática e plural, mais aberta aos atores sociais, ou seja, uma
autêntica sociedade aberta dos intérpretes. Paradigmáticas dessa recente posição são
as decisões tomadas na ADPF nº 527, rel. Min. Roberto Barroso, decisão monocrática,
e na ADPF nº 262, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 8.3.2019.

CURIOSIDADE

Grandes advogados já sustentaram questões constitucionais perante


Supremas Cortes ou Cortes Constitucionais do mundo. Um deles foi Thurgood
Marshall, primeiro juiz afrodescendente da Suprema Corte Americana, que
inspirou o filme “Marshall: igualdade e justiça”, lançado em 2017 (observação: caso
necessário, utilize o tradutor para a leitura do artigo).
Veja o trailer do filme:

Fonte: Marshall: igualdade e justiça

Outro exemplo é o da atual justice da Suprema Corte Americana Ruth Bader


Ginsburg, que atuou, nas décadas de setenta e oitenta, como advogada e defensora
dos direitos das mulheres e de gênero. Essa história está contada no filme “Suprema
(On the basis of sex)”, de 2018 e no documentário “A Juíza” (RBG: Hero. Icon. Dissenter),
de 2019. Veja o trailer do documentário.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 10
COLETIVO CONSTITUCIONAL
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VÍDEO

Fonte: A Juíza

Fonte: Suprema

Ruth Bader Ginsburg foi Associada de Justiça da


Suprema Corte dos Estados Unidos até seu falecimento em 18
de setembro de 2020. Ginsburg foi indicada para o cargo pelo
Presidente Bill Clinton e foi empossada em 10 de agosto de
1993. Depois de Sandra Day O’Connor, foi a segunda mulher
a ser confirmada pelo Senado para servir na Suprema Corte.
Após a aposentadoria de O’Connor em 2006, e antes de a Juíza
Sonia Sotomayor se juntar ao tribunal em 2009, Ginsburg era a
única mulher a atuar como Associada de Justiça.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 11
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Recomendamos que, quando tiver um tempinho, assista aos filmes em sua


integralidade. Você perceberá como a atuação de brilhantes advogados perante
as cortes supremas ou cortes constitucionais amplia a visibilidade da qualificação
técnica e jurídica desses profissionais, de modo a influenciar na condução da
carreira para o contexto de atuação como juiz constitucional nessas cortes.

Certo? Continuemos os estudos!

2. Procedimentos

Como visto nos tópicos antecedentes, a ADI e a ADC configuram-se como ações
constitucionais estruturantes na conformação do desenho institucional do controle
jurisdicional de constitucionalidade de perfil abstrato e concentrado. O fundamento
normativo dessas ações constitucionais está na própria Constituição Federal, no art.
102, inciso I, alínea a.
A disciplina processual das ações foi implementada no ordenamento jurídico
brasileiro uma década depois de sua previsão constitucional, com a introdução da Lei
nº 9.868 em 1999, que tem por objeto regular o processamento e julgamento das ações
constitucionais de perfil abstrato, dentre elas a ação direta de inconstitucionalidade e a
ação declaratória de constitucionalidade.
O regramento procedimental dessas ações constitucionais, portanto, tem seu
fundamento de validade na própria ordem normativa constitucional, bem como na Lei
nº 9.868/1999, com a complementação subsidiária do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal que igualmente dispõe sobre a matéria.
Conversaremos, em especial, acerca da Lei nº 9.868/1999, que nos arts. 6º, 8º,
10 e 12 prescreve três ritos procedimentais para o processamento das ações diretas
de (in) constitucionalidade.
O primeiro procedimento é ordinário, padrão para o processamento das
referidas ações nas hipóteses em que não há pedido de medida liminar, ou seja, centra-
se nos pedidos principais de análise da validade constitucional das normas impugnadas.
Nesse rito, o relator pedirá informações aos órgãos e autoridades responsáveis pelos
atos normativos, as quais deverão ser juntadas no prazo de 30 dias (art. 6º). Momento
sucessivo, o relator encaminhará o processo para a oitiva das manifestações da
Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República, no prazo de 15 dias,
nos termos do art. 8º.

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Por sua vez, o segundo procedimento, previsto no art. 10, trata da hipótese
de ações que veiculam pedidos de medida cautelar. Em razão das alegações de
probabilidade do direito afirmado e do perigo de demora na prestação jurisdicional, o
legislador dispôs procedimento fundado em cognição sumária, com prazos abreviados.
As informações a serem prestadas pelas autoridades devem observar o prazo de 5 dias
(art.10, caput). A Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da República, por
sua vez, a juízo do relator, serão instadas a se manifestar no prazo de 3 dias (art. 10,
§1º).
O terceiro procedimento igualmente incide nas ações formuladas com pedido
de medida cautelar. Todavia, de acordo com o art. 12, nessas situações, o relator, na
análise do problema jurídico-constitucional posto, pode entender que a relevância da
matéria e o especial significado que assume para a ordem social e a segurança jurídica
justificam a adoção de procedimento abreviado, fundado em cognição exauriente e
solucionado por decisão definitiva. O prazo para as informações será de 10 dias e para
as manifestações da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República
será de 5 dias.
Como forma de ilustrar a comparação entre os procedimentos, elaboramos um
quadro-síntese com as principais informações:

Cognição Prazo para


Rito Decisão Efeitos decisórios
jurídica manifestação

Ordinário (Art. 6) Definitiva Ex-tunc (derivados Definitiva Órgãos e autoridades


da nulidade do responsáveis pelo ato
ato declarado normativo: 30 dias
inconstitucional) PGR e AGU: 15 dias
a decisão tem efeito retroativo,
valendo também para o passado.
decisão não tem efeito retroativo,
vale do momento em que foi proferida em diante.
Medida liminar Provisória Ex-nunc (salvo Sumária Órgãos e autoridades
(Art. 10) deliberação responsáveis pelo ato
em sentido normativo: 5 dias
diverso feita pelo
PGR e AGU: 3 dias
Colegiado)

Abreviado em Definitiva Ex-tunc (derivados Definitiva Órgãos e autoridades


razão da relevância da nulidade do responsáveis pelo ato
e segurança ato declarado normativo: 10 dias
jurídica (Art. 12) inconstitucional PGR e AGU: 5 dias
a decisão tem efeito retroativo,
valendo também para o passado.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 13
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Com esse resumo, ficaram mais evidentes os detalhes dos três ritos
procedimentais da ADI e ADC?
Ainda, em termos de procedimento, cumpre destacar, por se tratar de técnica
processual importante para o incremento das perspectivas argumentativas e da
contestação pública das informações apresentadas no processo, principalmente
aquelas relacionadas com matérias ou circunstâncias de fato, a possibilidade de o
relator requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos
para que emita parecer sobre questão de fato, ou designar audiência pública. Nesse
sentido, o art. 9º, § 1º da Lei nº 9.868/1999 assim dispõe:

Em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância


de fato ou de notória insuficiência das informações existentes nos
autos, poderá o relator requisitar informações adicionais, designar
perito ou comissão de peritos para que emita parecer sobre a questão,
ou fixar data para, em audiência pública, ouvir depoimentos de pessoas
com experiência e autoridade na matéria.

A ferramenta é relevante e imprescindível para uma adequada instrução do


processo, notadamente na fase pré-decisória, para que todos os dados, perspectivas
argumentativas, informações de natureza técnica e reflexos em realidades complexas,
do ponto de vista fático, sejam coletadas e submetidas à contestação pública de todos
os sujeitos do processo e da própria deliberação e decisão do Tribunal.
Quanto ao ponto, cumpre sublinhar que, em momento anterior compreendido
até meados da década de 2000, a jurisprudência do Tribunal compartilhava
compreensão normativa muito restritiva acerca do papel da atividade interpretativa,
de cunho meramente declaratório e cuja operação bastava-se na comparação analítica
das normas infraconstitucionais frente ao bloco de constitucionalidade integrado
pela ordem constitucional, de hierarquia superior. Nesse cenário, o Supremo Tribunal
firmou entendimento de que fatos controvertidos que ensejassem apuração probatória
não poderiam ser deliberados (ADI nº 1.372, rel. Min. Celso de Mello, despacho, DJ
17.11.1995).
Entretanto, em outro sentido, é a nova compreensão do papel e alcance da
interpretação constitucional, a qual exige adequada análise e depuração de questões
fáticas controversas, principalmente, de natureza técnica, que demanda abordagens
de ordem especializada não jurídica. Nesse quadro normativo contemporâneo,
tornou-se lugar comum o uso das técnicas processuais de convocação de audiência
pública, de perito ou comissão de perito, bem como de solicitação de manifestação
de instituições e órgãos técnicos como métodos de incremento do material fático
subjacente ao processo de interpretação da Corte. Quanto ao ponto, sugerimos que
confira a decisão de convocação de audiência pública proferida na ADPF nº 442, rel.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 14
COLETIVO CONSTITUCIONAL
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Ação Declaratória de Constitucionalidade
Min. Rosa Weber, DJe 2.4.2018, bem como a decisão de convocação conjunta dada
na ADPF nº 403, rel. Min. Edson Fachin, e na ADI nº 5.527, rel. Min. Rosa Weber, DJe
31.5.2017.
Soma-se a esse contexto de formação adequada da fase pré-decisória a
possibilidade de intervenção de amigos da corte, os denominados amicus curiae, cuja
admissão fica a cargo do juízo do relator (art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/1999). Os amigos
da corte, que não se confundem com a noção clássica de intervenção de terceiros
no processo, fornecem ao Tribunal informações de caráter técnico e especializado,
considerada a relevância da matéria e a representatividades dos postulantes.

Amicus curiae na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

O art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/1999 autoriza a admissão da manifestação


de órgãos ou entidades investidas de representatividade adequada
nos processos de controle abstrato de constitucionalidade que versem
sobre matérias de grande relevância. (...) o telos precípuo da intervenção
do amicus curiae consiste na pluralização do debate constitucional,
com vistas a municiar a Suprema Corte dos elementos informativos
necessários ou mesmo trazer novos argumentos para o deslinde da
controvérsia. Assim, a habilitação de entidades representativas se
legitima sempre que restar efetivamente demonstrado o nexo de
pertinência entre as finalidades institucionais da entidade e o objeto
da ação direta. (ADI 5.875, rel. min. Luiz Fux, j. 26-11-2018, dec.
monocrática, DJe de 28-11-2018).

A intervenção de terceiros no processo da ação direta de


inconstitucionalidade é regra excepcional prevista no art. 7º, § 2º, da Lei
9.868/1999 que visa a permitir “que terceiros – desde que investidos
de representatividade adequada – possam ser admitidos na relação
processual, para efeito de manifestação sobre a questão de direito
subjacente à própria controvérsia constitucional. A admissão de
terceiro, na condição de amicus curiae, no processo objetivo de controle
normativo abstrato, qualifica-se como fator de legitimação social
das decisões da Suprema Corte, enquanto Tribunal Constitucional,
pois viabiliza, em obséquio ao postulado democrático, a abertura
do processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade, em
ordem a permitir que nele se realize, sempre sob uma perspectiva
eminentemente pluralística, a possibilidade de participação formal
de entidades e de instituições que efetivamente representem os
interesses gerais da coletividade ou que expressem os valores
essenciais e relevantes de grupos, classes ou estratos sociais. Em suma:
a regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei n. 9.868/99 – que contém a base
normativa legitimadora da intervenção processual do amicus curiae –

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 15
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Ação Declaratória de Constitucionalidade

tem por precípua finalidade pluralizar o debate constitucional.” (ADI


2.130 MC, rel. min. Celso de Mello, DJe de 2-2-2001). Vê-se, portanto,
que a admissão de terceiros na qualidade de amicus curiae traz ínsita
a necessidade de que o interessado pluralize o debate constitucional,
apresentando informações, documentos ou quaisquer elementos
importantes para o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade.
(ADI 3.921, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 24-10-2007, dec. monocrática,
DJ de 31-10-2007, e ADI 4.010, rel. min. Rosa Weber, j. 26-6-2012, dec.
monocrática, DJE de 2-8-2012).

Entendo (...) perfeitamente possível a aplicação analógica do


referido art. 7º, § 2º, da Lei 9.868/1999 às ações declaratórias de
constitucionalidade, cuja natureza tanto se assemelha com a que
possui a ação direta de inconstitucionalidade. Nesse mesmo sentido,
asseverou o eminente ministro Menezes Direito, em decisão proferida
na ADC 18 (DJ de 22-11-2007), que não houve, com os vetos do
presidente da República [aos § § 1º e 2º do art. 18 da Lei 9.868/1999],
qualquer repúdio, sob qualquer fundamento, ao ingresso de amicus
curiae em ação declaratória de constitucionalidade. Neste caso, atento
ao fato de que esta ação integra o sistema de controle concentrado
de constitucionalidade, não há razão lógico jurídica, plausível, para
deixar de aplicar o § 2º do art. 7º da Lei 9.868/1999, específico das
ações diretas de inconstitucionalidade, às ações declaratórias de
constitucionalidade. (ADC 14, rel. min. Ellen Gracie, j. 16-12-2008,
dec. monocrática, DJE de 3-2-2009, e ADC 24, rel. min. Cármen Lúcia,
j. 17-3-2010, dec. monocrática, DJE de 24-3-2010).

DICA DE LEITURA

Antes de prosseguir, gostaríamos de indicar a leitura de um artigo sobre a


sociedade aberta dos intérpretes e o papel criativo da atividade interpretativa dos
juízes constitucionais: As ideias de Peter Häberle e a abertura da interpretação
constitucional no direito brasileiro, de Inocêncio Mártires Coelho.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 16
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

3. Causa de pedir aberta

Agora que compreendemos os diferentes


ritos enunciados na Lei nº 9.868/1999, ressaltamos
Inepta é a petição que não
que, proposta a ação direta e decidido o rito aponta o dispositivo impugnado,
procedimental pelo qual ela deve tramitar, o os fundamentos jurídicos ou o
relator poderá, monocraticamente, rejeitar a pedido com suas especificações.
ação nos casos em que a petição inicial for inepta,
conforme o art. 4º, caput: “A petição inepta, não
fundamentada e a manifestamente improcedente
serão liminarmente indeferida pelo relator”.
Na experiência do Tribunal, já foram rejeitadas, por inépcia, ações que:
não traziam fundamentação suficiente ou apontavam ato normativo que não
estava sujeito ao controle abstrato (ADI nº 4.819, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJ
20.10.2018);
apresentavam fundamentação genérica (ADI nº 5.118, Rel. Min. Alexandre de
Moraes, DJ 17.5.2018 ); ou
não traziam dissídio jurisprudencial relevante em ADC (ADC nº 23, Rel. Min.
Edson Fachin, DJ 1.2.2016).
A fundamentação suficiente é uma exigência formal. Ela visa a apenas afastar
alegações genéricas, seja para não sobrecarregar a jurisdição constitucional (ADI nº
1.775, Rel. Min. Maurício Correa, DJ 18.5.2001), seja para que o Tribunal respeite a
presunção de constitucionalidade das leis (ADI nº 514, Rel. Min. Celso de Mello, DJ
1.7.1991).
O Tribunal, no entanto, ao decidir as ações de controle concentrado não se
vincula às razões argumentativas das partes, isto é, pode ele decidir com base em
fundamento não suscitado por elas. Isso porque, de acordo com a jurisprudência da
Corte, há nas ações do controle concentrado a abertura da causa de pedir, ou seja, o
Tribunal pode escolher fundamentos que rejeitem ou acolham a inconstitucionalidade
suscitada da inicial por fundamentos diversos daqueles apontados pelas partes, uma
vez que o que está em jogo, na essência, é a afirmação da supremacia da Constituição
Federal frente aos atos normativos emanados pelos poderes públicos constituídos.
A abertura da causa de pedir decorre também da irrecorribilidade das decisões
(art. 26 da Lei nº 9.868/1999). Isso significa que julgada improcedente a ação direta não
há mais a possibilidade de se novamente suscitar a inconstitucionalidade da mesma
norma, ainda que por fundamento diverso. Noutras palavras, o julgamento conclusivo
de improcedência importará sempre o reconhecimento da constitucionalidade da

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 17
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

lei (RE nº 343.818, Rel. Min. Moreira Alves), ainda que fundamentos diversos dos
contemplados no acórdão possam ser suscitados.
O reconhecimento da abertura da causa de pedir apresenta ainda curiosas
consequências. Para ilustrar o argumento, citamos o exemplo em que a mesma parte
não pode propor nova ação direta contra o mesmo dispositivo do ato normativo apenas
para agregar novos fundamentos. É causa de litispendência a propositura de nova ação
direta que apresente apenas fundamentos diferentes, mas que guarde idênticas partes
e pedido (ADI nº 5.749, Rel. Min. Alexandre de Moraes). Além disso, a conexão de ações
ocorre apenas na hipótese de identidade de objetos entre as ações (ADPF nº 139, Rel.
Min. Cezar Peluso, DJ 8.5.2008).

No mesmo sentido, a ADI nº 4.351, decisão do Pres. Min. Gilmar Mendes, em


3.12.2009:

A presente ação direta de inconstitucionalidade contesta a Lei 16.239,


de 29.9.2009, do Estado do Paraná (...). 2. Para que se estabeleça a
prevenção de competência nos processos de controle concentrado de
constitucionalidade é preciso que dois ou mais feitos possuam, total
ou parcialmente, um mesmo objeto, isto é, um mesmo ato normativo
(RISTF, art. 77-B). A presente ADI 4.351 e a 4.249 não possuem o mesmo
objeto, pois contestam leis de diferentes Estados da Federação. (...) 3.
Assim sendo, nos termos do art. 13, VII, do Regimento Interno, submeto
a presente questão expressamente suscitada pela requerente (fl. 3) ao
Excelentíssimo Senhor Presidente desta suprema Corte, o eminente
Ministro Gilmar Mendes, a quem encaminho os autos com a proposta
de que seja mantida a livre distribuição do presente processo.

Tudo bem até aqui? Está conseguindo acompanhar nossa explanação?


Podemos continuar os estudos?

4. Medidas liminares: questões controversas e problemas


procedimentais

Como vimos em tópico anterior, se a petição inicial preencher os requisitos do


art. 3º da Lei 9.868/1999 e se a ação tiver sido proposta por quem detenha legitimidade
(art. 103 da Constituição Federal), cabe ao relator – e somente a ele – decidir, nos casos
em que há pedido de liminar, o rito da ação direta, ou seja, se a ação tramitará pelo
disposto no art. 10 ou no art. 12, como vimos no tópico 3.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 18
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

É no âmbito da decisão liminar que as


diferenças entre esses ritos mais se destacam. Art. 3 da Lei 9.868/99
Isso porque a própria lei atribui consequências A petição indicará:
diferentes para as decisões que são tomadas com
I - o dispositivo da lei ou do ato
base no rito procedimental do art. 10 e a que é normativo impugnado e os
tomada com base no rito procedimental do art. fundamentos juríd icos do pedido em
12. Enquanto neste a decisão é definitiva, isto é, relação a cada uma das impugnações;
a declaração de inconstitucionalidade importa a
nulidade do ato normativo com efeitos ex tunc;
II - o pedido, com suas especificações.
naquele, a decisão é provisória e, nos termos
do art. 11, § 1º, tem apenas efeitos ex nunc Parágrafo único. A petição inicial,
acompanhada de instrumento de
(salvo deliberação em sentido diverso feita pelo
procuração, quando subscrita por
colegiado). advogado, será apresentada em duas
vias, devendo conter cópias da lei ou
Note que o pressuposto da lei não é o de
do ato normativo impugnado e dos
que a decisão liminar é aquela individualmente documentos necessários para
tomada pelo ministro relator. A lei pressupõe que, comprovar a impugnação.
tanto na medida cautelar quanto no julgamento
do mérito da ação, a decisão sempre observará
a reserva do Plenário (art. 97 da Constituição
Federal), tal como sempre previu o Regimento
Interno do STF (art. 22).

Art. 97 da CF Artigo 22 do RISTF

Somente pelo voto da maioria O Relator submeterá o feito ao


absoluta de seus membros ou dos julgamento do Plenário, quando
membros do respectivo órgão especial houver relevante arguição de
poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade ainda não
inconstitucionalidade de lei ou ato decidida.
normativo do poder público. Parágrafo único. Poderá o Relator
proceder na forma deste artigo:
a) quando houver matérias em que
divirjam as Turmas entre si ou alguma
delas em relação ao Plenário;
b) quando, em razão da relevância da
questão jurídica ou da necessidade de
prevenir divergência entre as Turmas,
convier pronunciamento do Plenário.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 19
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

Vale dizer, apenas por maioria de seus membros o Tribunal pode se pronunciar
sobre a constitucionalidade de um ato normativo. Há súmula vinculante editada nesse
sentindo, a Súmula Vinculante 10: “viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo
97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente
a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência,
no todo ou em parte”. Observe, no entanto, que nas medidas cautelares em ações diretas
julgadas pelos tribunais de justiça, a inobservância do quórum de maioria absoluta
não constitui ofensa a essa súmula, mas apenas ao art. 10 da Lei nº 9.868/1999 (Rcl nº
10.114, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 19.02.2014).
Você consegue imaginar situações em que a urgência e a impossibilidade de
reunião do colegiado possam até mesmo trazer prejuízo para a medida reclamada?
Vamos pensar, por exemplo, em atos que sejam editados durante o recesso forense
ou que, por serem de aplicação imediata, já esgotem todos os efeitos antes mesmo da
realização da reunião do Plenário. Nesses casos, não seria possível admitir a atuação
monocrática do relator? Qual é o seu entendimento?
A resposta dada pela própria legislação está no caput do art. 10 mencionado:
a atuação monocrática, de competência do Presidente do Tribunal (art. 13, VIII, do
RISTF), pode ser feita durante o recesso, ad referendum do Plenário (ADI nº 3.929, Rel.
Min. Ellen Gracie, DJ 11.10.2007). Além disso, em diversos precedentes, os ministros
do Supremo Tribunal Federal têm admitido a possibilidade de atuação monocrática dos
relatores, veja-se, por exemplo, a ADI 4.307, Rel. Ministra Cármen Lúcia. No mesmo
sentido: Rcl 11.768, Rel. Ministra Rosa Weber, DJe 23.02.2016, dada a complexidade e
urgência que caracterizam o problema constitucional posto para deliberação.
Os requisitos para a concessão da medida cautelar, consistentes na probabilidade
do direito (fumus boni iuris) e no perigo da demora na prestação jurisdicional (periculum
in mora), foram desenvolvidos pela jurisprudência do STF e coincidem com os que são
utilizados para o exercício do poder geral cautelar pelo Poder Judiciário.
O efeito da decisão liminar é, como regra, vinculante e erga omnes, mas ex nunc,
nos termos do art. 11, § 1º, da Lei. Além disso e também como regra, a liminar torna
aplicável a legislação anterior acaso existente, nos termos do art. 11, § 2º, da Lei, são
os chamados efeitos repristinatórios. Diz-se “como regra” porque o Tribunal pode, por
deliberação expressa, atribuir excepcionalmente efeitos ex tunc à decisão liminar, assim
como, por meio do arrastamento, impedir a aplicação da legislação anterior. Exemplo
de excepcional atribuição de efeitos ex tunc à decisão liminar é a ADI nº 4.307, Rel.
Ministra Cármen Lúcia, DJ 5.3.2010.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 20
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

A decisão liminar começa a surtir efeitos com a publicação no Diário de Justiça


da ata de sessão de julgamento e é a partir desse momento que os efeitos vinculantes
e erga omnes estão presentes. É, pois, a partir daqui que se admite o ajuizamento de
reclamações que visam precisamente garantir a observância dos julgados do Supremo
Tribunal Federal (Rcl 2.576, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 20.8.2004).

Mas atenção: só são cabíveis as reclamações quando houver suspensão do ato


normativo impugnado. Não cabe reclamação que invoque como paradigma decisão do
Tribunal que nega o pedido de cautela, pois a decisão que indefere a liminar limita-se
a afastar o perigo na demora e a fumaça do bom direito, nada dizendo sobre o mérito
da alegação de inconstitucionalidade. Confira-se nesse sentido a Rcl nº 2.585, Rel.
Min. Marco Aurélio, DJ 22.04.2005. Além disso, também não autoriza a propositura
de reclamação as decisões que sequer conhecem da ação direta (Rcl nº 15.423, Rel.
Min. Dias Toffoli, DJ 24.09.2013). Tanto no caso do indeferimento do pedido de medida
cautelar, quanto no caso de não conhecimento ficam os juízes liberados para realizar o
controle difuso de constitucionalidade.

Com a quantidade de processos no acervo do Tribunal, talvez você tenha se


perguntando se não poderia o Plenário, quando fosse julgar o pedido de cautelar,
converter o julgamento da cautelar em mérito. A resposta é afirmativa. Desde que feitas
todas as providências de instrução, isto é, desde que ouvidas todas as autoridades de
quem emanou o ato, assim como o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da
República, é possível a conversão do julgamento da cautelar no mérito da ação direta
(ADI 4.163, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe 01.03.2013).
Apesar do caráter dúplice ou ambivalente entre as ações de inconstitucionalidade
e a declaratória de constitucionalidade, há uma diferença relevante no âmbito da jurisdição
cautelar: nos termos do art. 21 da Lei nº 9.868/1999, a medida cautelar pode consistir
na ordem de suspensão dos processos que envolvam a aplicação do ato normativo
impugnado até o julgamento definitivo da ação. Note que o descumprimento da ordem
de suspensão abre às partes a possibilidade de ajuizarem reclamação para o Supremo
Tribunal Federal (Rcl 32.177, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 17.10.2018).
O preocupante efeito multiplicador de uma decisão nesse sentido é mitigado
pela exigência legal de que o mérito da ação seja julgado em até 180 dias após a
publicação da ata de julgamento da medida cautelar. O Tribunal, no entanto, tem
entendimento no sentido de que o não julgamento no prazo legal não tem como
consequência a perda de eficácia da medida acauteladora (Rcl 5.758, Min. Cármen
Lúcia, DJe 07.08.2009).

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 21
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

PARA REFLETIR

Como você deve imaginar, há muitos casos de concessão de medidas


cautelares monocráticas no STF. Diferentes doutrinadores e professores, assim
como profissionais do direito, questionam se tais medidas afetam a legitimidade
do processo decisório do Tribunal, na medida em que a sua atuação deve ocorrer
na forma e em nome do colegiado.
O que você pensa a esse respeito?

Para auxiliar na formação de seu entendimento, deixamos aqui o link de um


podcast em que essa atuação monocrática foi bastante discutida, a partir da perspectiva
do diálogo institucional entre os Poderes da Federação:
Podcast “Sem Precedentes: há base jurídica na suspensão da nomeação de
Ramagem para a PF?”
Ainda, queremos indicar editoriais de jornais e artigos curtos que colocaram
o problema em pauta, e, assim, demonstraram a centralidade da questão para uma
adequada compreensão do funcionamento do Estado constitucional e da democracia.
Observação: reputamos o conteúdo profícuo para as nossas discussões, em que pese o
teor de alguns títulos.
O STF inventou o ministro contramajoritário, que joga contra a maioria da corte.
Com excesso de decisões monocráticas, STF favorece subjetivismo jurídico.
STF bate recorde de monocráticas em ações constitucionais em 2018.
‘Canetadas’ como a de Marco Aurélio representam maioria dos julgamentos do
STF.
Decisões monocráticas - Comparação dos processos decisórios do STF e o da
Suprema Corte dos EUA.
Como os Supremos Tribunais de EUA e Europa tomam decisões - e lidam com
questões espinhosas.
MINISTROCRACIA: O Supremo Tribunal individual e o processo democrático
brasileiro.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 22
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

5. Técnicas decisórias e a interpretação constitucional

No âmbito da jurisdição constitucional é longa a controvérsia sobre os efeitos da


decisão que declara a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo. Pense-
se, por exemplo, na célebre expressão de que “uma lei inconstitucional não é uma lei”,
dita por Westel W. Willoughby, um dos autores preferidos pela primeira geração dos
publicistas da República norte-americana. Traduzindo o debate para o direito nacional,
Lúcio Bittencourt (1997) defendia que a declaração de inconstitucionalidade implica
reconhecer que a lei jamais poderia ter produzido efeitos, não podendo sequer ser
invocada em uma relação jurídica. A mera declaração de inconstitucionalidade era o
suficiente para que a lei deixasse de ser aplicada.
No Brasil, as consequências do reconhecimento de uma inconstitucionalidade
acabaram por se desdobrar em duas outras questões centrais no direito constitucional,
especificamente na jurisdição constitucional. A primeira diz respeito à diferença entre
o controle concentrado e o controle difuso; a segunda, sobre o alcance da vinculação
da decisão proferida pelo Tribunal.
O texto constitucional oferece resposta a ambas as questões. No art. 52, X, da
Constituição da República, está a previsão de que compete privativamente ao Senado
suspender a execução de lei que tenha sido declarada inconstitucional por decisão
definitiva do Supremo Tribunal Federal. Ademais, o art. 102, § 2º, prevê que

decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal


Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações
declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra
todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder
Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas
federal, estadual e municipal.

Noutras palavras, enquanto a declaração de inconstitucionalidade nas ações


diretas de controle concentrado produz efeitos imediatos e para todos, com eficácia
vinculante, no controle difuso, a extensão dos efeitos da declaração, para além do
contexto do caso concreto, depende da manifestação do Senado Federal.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 23
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

ADI ADC Recurso Extraordinário


Controle concentrado Controle concentrado Controle difuso

Efeitos inter partes para o


Efeitos para todos Efeitos para todos
caso concreto.

Eficácia vinculante Eficácia vinculante Eficácia subjetiva

A resposta dada ao texto constitucional, portanto, solucionava o antigo dilema


por que passou a doutrina ao longo de quase um século de experiência republicana:
o efeito contra todos da declaração de inconstitucionalidade estava adstrito ao
procedimento das ações de controle concentrado, não havendo que se falar desse
efeito no âmbito do controle difuso, vocacionado que era ao julgamento de casos
concretos e relações jurídicas subjetivas.

PARA REFLETIR

Nada obstante essa primeira resposta de separação autônoma entre os


efeitos das decisões proferidas em cada modalidade de controle, seja concentrado
ou difuso, é certo que, com o desenvolvimento da jurisprudência do Tribunal
somado às necessidades e complexidades dos problemas constitucionais criados
em razão da convivência desses dois modelos de controle de constitucionalidade,
outra resposta foi dada como solução normativa mais adequada.
No julgamento da Rcl. 4.335, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 22.10.2014, foi
debatida a questão da convergência e da aproximação dos efeitos das decisões
tomadas em sede de controle jurisdicional de constitucionalidade, seja no perfil
concentrado ou difuso. O Tribunal nesse julgamento consolidou a premissa da
convergência entre os modelos e da equivalência dos efeitos das decisões tomadas
em ambos contextos. Veja:

O STF, por maioria, julgou improcedentes pedidos formulados


em ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas contra a

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 24
COLETIVO CONSTITUCIONAL
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Ação Declaratória de Constitucionalidade

Lei 3.579/2001 do estado do Rio de Janeiro. O referido diploma


legal proíbe a extração do asbesto/amianto em todo o território
daquela unidade da Federação e prevê a substituição progressiva
da produção e da comercialização de produtos que o contenham.
A Corte declarou, também por maioria e incidentalmente, a
inconstitucionalidade do art. 2º da Lei federal 9.055/1995, com
efeito vinculante e erga omnes. O dispositivo já havia sido declarado
inconstitucional, incidentalmente, no julgamento da ADI 3.937/
SP (rel. orig. min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. min. Dias Toffoli,
julgamento em 24-8-2017). A partir da manifestação do ministro
Gilmar Mendes, o Colegiado entendeu ser necessário, a fim de
evitar anomias e fragmentação da unidade, equalizar a decisão
que se toma tanto em sede de controle abstrato quanto em sede
de controle incidental. O ministro Gilmar Mendes observou que
o art. 535 do CPC reforça esse entendimento. Asseverou se estar
fazendo uma releitura do disposto no art. 52, X, da CF, no sentido
de que a Corte comunica ao Senado a decisão de declaração de
inconstitucionalidade, para que ele faça a publicação, intensifique
a publicidade. O ministro Celso de Mello considerou se estar diante
de verdadeira mutação constitucional que expande os poderes do
STF em tema de jurisdição constitucional. Para ele, o que se propõe
é uma interpretação que confira ao Senado Federal a possibilidade
de simplesmente, mediante publicação, divulgar a decisão do
STF. Mas a eficácia vinculante resulta da decisão da Corte. Daí se
estaria a reconhecer a inconstitucionalidade da própria matéria
que foi objeto deste processo de controle abstrato, prevalecendo
o entendimento de que a utilização do amianto, tipo crisotila e
outro, ofende postulados constitucionais e, por isso, não pode
ser objeto de normas autorizativas. A ministra Cármen Lúcia, na
mesma linha, afirmou que a Corte está caminhando para uma
inovação da jurisprudência no sentido de não ser mais declarado
inconstitucional cada ato normativo, mas a própria matéria que nele
se contém. O ministro Edson Fachin concluiu que a declaração de
inconstitucionalidade, ainda que incidental, opera uma preclusão
consumativa da matéria. Isso evita que se caia numa dimensão
semicircular progressiva e sem fim. E essa afirmação não incide em
contradição no sentido de reconhecer a constitucionalidade da lei
estadual que também é proibitiva, o que significa, por uma simetria,
que todas as legislações que são permissivas – dada a preclusão
consumativa da matéria, reconhecida a inconstitucionalidade do
art. 2º da lei federal – são também inconstitucionais.
[ADI 3.406 e ADI 3.470, rel. min. Rosa Weber, j. 29-11-2017, P,
Informativo 886.]

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 25
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

Ainda assim remanescia a dúvida sobre como manejar os efeitos da declaração.


Afinal, se a competência do Tribunal se limita a uma providência declaratória, como o
próprio nome sugere, ou a lei é inconstitucional, e dela não surge efeito algum, ou ela é
constitucional, mantendo-se plenamente em vigor. Não é difícil imaginar hipóteses em
que o Tribunal teria que se deparar com questões difíceis à luz das consequências que
a declaração de inconstitucionalidade poderia gerar.
Foi precisamente por essa razão que o legislador incluiu na Lei nº 9.868/1999 a
possibilidade de decisões intermediárias de inconstitucionalidade. Isso permitiu que
os tribunais evitassem declarar a constitucionalidade de leis que eram nitidamente
inconstitucionais apenas para impedir os efeitos da inconstitucionalidade enquanto
nulidade.
A partir da possibilidade de modulação, ao invés apenas da declaração de
nulidade total, têm agora os tribunais a possibilidade de proferirem declarações
parciais de nulidade, seja reduzindo ou não o texto, seja reconhecendo uma ação ou
omissão (caso de omissão parcial).

DICA DE LEITURA

Para aprofundar seus conhecimentos a respeito do tema, sugerimos a leitura


da obra:
MENDES, Gilmar; BRANCO, Paulo Gonet. Curso de direito constitucional. 14ª ed.
rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2019.

Importante salientar que a perfeita discriminação de cada uma das modalidades


das técnicas de decisão é objeto de divergências na doutrina constitucional. Um dos
primeiros autores a trabalhar a temática é o Ministro Gilmar Mendes. As considerações
feitas por ele, seja nos livros e artigos publicados, seja no trabalho no âmbito do
Ministério da Justiça para a redação do projeto de lei que resultou na Lei nº 9.868/99,
são fundamentais.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 26
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

DICA DE LEITURA

Nessa linha, existem ainda os trabalhos formulados pelos professores:


Luiz Guilherme Marinoni:
MARINONI, Luiz Guilherme; SARLET, Ingo Wolfgang; MITIDIERO, Daniel. Curso de
direito constitucional. 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017.
Lênio Streck e Virgílio Afonso da Silva:
SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação conforme à Constituição: entre a trivialidade
e a centralização judicial. Revista Direito GV. vol. 2, n. 1, p. 191-210, jan./jun. 2006.
Bernardo Fernandes Gonçalves:
GONÇALVES, Bernardo Fernandes. Curso de Direito Constitucional. 9ª ed. Salvador:
Juspodiuvm, 2019.

Boas leituras!

As posições dos autores que indicamos não são necessariamente convergentes,


como também não o é a análise feita, sobretudo pela doutrina portuguesa, sobre as
modalidades de sentenças da corte constitucional. Por isso, nesta aula, a referência
mais importante serão as técnicas efetivamente empregadas pelo Tribunal em seus
precedentes.
Feita a ressalva, dentro do espectro de técnicas decisórias que vai da declaração
de inconstitucionalidade total até a declaração de constitucionalidade total, existem
cinco figuras intermediárias a respeito das quais teceremos considerações a partir de
agora.
1. Na
Nadeclaração
declaração de
de nulidade
nulidade dede parte
parte do
do texto,
texto o Tribunal limita-se a reconhecer
apenas os dispositivos da lei, inclusive as expressões ou mesmo palavras contidas neles,
que são incompatíveis com a Constituição. Exemplos dessa orientação são:
a declaração de inconstitucionalidade da expressão “ou do Tribunal de Contas
do Estado” (ADI 3.029, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 15.4.2020) e
da expressão “do Distrito Federal” (ADI 4.868, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ
15.4.2020).
Note que em ambas as ações, o Tribunal julgou inteiramente procedente a ação
direta, tal como formulado nas petições iniciais, a indicar que a Corte tem baseado o
juízo de procedência da ação a partir do pedido e não do conteúdo da declaração.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 27
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

Essa orientação marca sensível mudança em relação ao dispositivo legal


constante do art. 24 da Lei nº 9.868/1999 (“proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á
improcedente a ação direta ou procedente eventual ação declaratória; e, proclamada a
inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual
ação declaratória”), assim como da jurisprudência antiga da Corte que previa limites
para essa declaração, a fim de evitar que o Tribunal distorcesse a vontade expressa do
legislador (como exemplo dessa antiga interpretação, a Rp 1.379, Rel. Min. Moreira
Alves, DJ 11.09.1987).
2. A declaração de nulidade parcial sem redução do texto reconhece, na plurissemia
das normas jurídicas, que um dos sentidos da norma é inconstitucional. Daí a feliz
expressão de Bernardo Gonçalves (2019) de que essa declaração se limita a apontar as
hipóteses de incidência da norma que deverão ser afastadas por serem inconstitucionais,
isto é, a norma é inconstitucional “se” e “quando” empregada em determinada direção.
Poucas ações no Tribunal foram julgadas por meio da referida declaração. Exemplo do
emprego dessa técnica é a ADI nº 5.044, de Relatoria do Min. Alexandre de Moraes, DJ
27.6.2019, julgada parcialmente procedente para excluir da exigência de capacidade
física para ingresso no quadro de oficias bombeiros os capelães e os médicos.
3. A interpretação conforme, por sua vez, é uma técnica de decisão que
também leva em conta a multiplicidade de sentidos de uma mesma norma jurídica.
Diferentemente da declaração de nulidade parcial, que dos vários sentidos da norma
reconhece apenas um como sendo inconstitucional, a interpretação conforme fixa a
única orientação constitucional possível. Vale dizer, a norma impugnada somente será
compatível com a Constituição se interpretada de determinada maneira. Também aqui
o Tribunal tem julgado procedente a ação se a declaração for objeto do pedido. Vários
autores têm apontado a proximidade das técnicas da nulidade parcial sem redução de
texto e da interpretação conforme. A interpretação conforme é mais simples e mais
empregada porque há apenas um sentido para a norma e é o Tribunal quem o fixa. Os
demais sentidos da norma são reconhecidos como sendo inconstitucionais.
Mas o que acontece precisamente na declaração de nulidade parcial? Os demais
sentidos são tidos por constitucional?
Essa questão foi bem colocada em um precedente debatido em sede de
repercussão geral, o RE nº 601.580, Rel. Min. Edson Fachin, DJ 20.2.2020. Nele, o
Tribunal precisou revisitar a decisão proferida na ADI nº 3.324, Rel. Min. Marco Aurélio,
DJ 5.8.2005, na qual o STF reconheceu a inconstitucionalidade do sentido da norma
federal que permitia que servidores públicos fizessem a transferência de instituições
de ensino nos casos de remoção. A declaração foi no seguinte sentido:

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 28
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Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
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a constitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 9.536/97, viabilizador


da transferência de alunos, pressupõe a observância da natureza
jurídica do estabelecimento educacional de origem, a congeneridade
das instituições envolvidas - de privada para privada, de pública para
pública -, mostrando-se inconstitucional interpretação que resulte na
mesclagem - de privada para pública.

Anos depois, em sede de repercussão geral, a questão novamente foi colocada


perante o Tribunal, agora para saber o que fazer no caso de ausência de congeneridade.
Havia, portanto, um terceiro sentido na norma, aparentemente não contemplado na
declaração original. Ao julgar a repercussão geral, o Tribunal acabou por reconhecer que
a declaração de nulidade parcial importava o reconhecimento da constitucionalidade
dos demais sentidos da norma, sob pena de se atribuir efeito rescisório à declaração
que, como veremos mais à frente, é final (art. 26 da Lei nº 9.868/99).
4. Na declaração de constitucionalidade de norma “ainda constitucional”, cuida o
Tribunal de reconhecer, pelas circunstâncias fáticas, a possibilidade de se empregar
a norma impugnadas até que, finalmente, sejam garantidas as circunstâncias fáticas
que a tornem inconstitucionais. São raros os exemplos de emprego dessa técnica na
experiência jurisdicional do STF. O mais notório foi o de reconhecer que, enquanto não
plenamente instaladas as Defensorias, teriam elas o direito ao prazo processual em
dobro (HC nº 70.514, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ 27.6.1997).
Outro precedente importante, embora sem ter feito menção expressa à
técnica, é o da ADI nº 4.029, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 27.6.2012, no qual se reconheceu
que a disciplina feita pelo Congresso para a tramitação de medidas provisórias era
inconstitucional, mas ela continuaria sendo aplicada, ante a postergação dos efeitos da
decisão, até que todas as medidas em tramitação tivessem sido apreciadas. A solução
nessa ADI, embora houvesse declaração de inconstitucionalidade, foi de julgá-la
improcedente.
Mais recentemente, a Corte se deparou com questão semelhante, quando
julgou a ADI nº 4.717, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJ 27.9.2019. O Tribunal julgou que
seria inconstitucional editar medida provisória para restringir espaços de proteção
ambiental, mas, em vista das consequências jurídicas da decisão e tendo em conta
diversos empreendimentos já realizados nessas áreas, optou por julgar procedente
a ação, sem pronúncia de nulidade, para declarar a inconstitucionalidade da norma
impugnada. No mesmo sentido dessa orientação estão as seguintes decisões: ADI nº
5.287, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 12.9.2016 e ADI nº 429, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 30.10.2014.
O que essa orientação parece indicar é que a declaração de inconstitucionalidade
sem pronúncia de nulidade foi utilizada como forma de sinalizar a orientação do Supremo
para casos futuros. Ainda não se pode, porém, concluir que seja essa a técnica por meio

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Ação Declaratória de Constitucionalidade

da qual o Tribunal tem apontado caminhos para o futuro. Em outra oportunidade,


quando do julgamento da ADI nº 5.127, Rel. Min. Edson Fachin, DJ 23.9.2016, a solução
foi julgar improcedente a ação, mas reconhecendo a inconstitucionalidade do acréscimo
de emendas parlamentares às medidas provisórias, sem que haja pertinência temática.
5. A utilização da técnica de declaração de inconstitucionalidade sem pronúncia
de nulidade era antes restrita às hipóteses em que o Tribunal reconhecia uma omissão
parcial da norma e, por isso, reconhecia ser ela inconstitucional, no que deixou de dispor
sobre tema que deveria ter sido contemplado. A declaração de inconstitucionalidade
recaía, assim, não propriamente sobre a ação do legislador, mas em sua omissão. A
técnica é bastante útil para colmatar lacunas legais que atentem contra o direito à
igualdade, tanto que o exemplo paradigmático do emprego dessa técnica é a decisão do
Plenário do Tribunal no caso do benefício assistencial da – Lei Orgânica da Assistência
Social LOAS (RE nº 567.985, Rel. Min. Gilmar Mendes).

DICA DE LEITURA

Que tal aprofundar seus conhecimentos a respeito da técnica da declaração


de inconstitucionalidade sem pronúncia de nulidade nos acasos e omissão parcial?
Para tanto, indicamos que leia o artigo do professor e ministro Gilmar
Mendes: A declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade da lei:
“Unvereinbarkister Klarung” – na jurisprudência da Corte Constitucional alemã.
(Revista de Informação Legislativa. Brasília, n. 118, abr./jun. 1993, pp. 63-84.)

Estamos quase finalizando! Respire fundo e acompanhe-nos no próximo tópico.

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COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

6. Efeitos da decisão e técnica da modulação

Iniciamos este último tópico de conteúdo com uma questão: quando a declaração
de inconstitucionalidade opera efeitos vinculantes e contra todos (erga omnes)?

A resposta é simples: desde a publicação da ata de julgamento no Diário


Oficial da União. É a partir desse momento, portanto, que se admite o ajuizamento
de reclamações que contestem as decisões judiciais ou administrativas que tenham
violado a autoridade da decisão proferida em sede de controle de constitucionalidade.

Esses efeitos são declaratórios. A decisão do Tribunal não constitui, nem


desconstitui nada, de acordo com a jurisprudência formada sobre o tema. Trata-se
de mero reconhecimento de que a norma, desde a origem, era incompatível com a
Constituição e, por isso, como regra não produz efeitos no mundo jurídico.

A possibilidade de produção de efeitos, a Artigo 27 da Lei 9.868/99


despeito da regra da nulidade da lei inconstitucional,
Ao declarar a
depende, nos termos do art. 27 da Lei n. 9.868/99, da inconstitucionalidade de lei
manifestação de um quórum específico de aprovação ou ato normativo, e tendo
de modulação dos efeitos. em vista razões de
segurança jurídica ou de
Noutras palavras, a legislação sobre o processo excepcional interesse social,
poderá o Supremo Tribunal
e julgamento das ações de controle concentrado
Federal, por maioria de dois
admite que os atos que são nulos, porque realizados terços de seus membros,
com base em lei inconstitucional, possam ter restringir os efeitos daquela
produzido efeitos, comum porém: esses efeitos declaração ou decidir que
ela só tenha eficácia a partir
não decorrem da constitucionalidade da norma,
de seu trânsito em julgado
mas de razões imperativas de segurança jurídica ou ou de outro momento que
excepcional interesse público. venha a ser fixado.

Note-se, portanto, que há uma diferença fundamental entre a declaração sobre


a validade do ato normativo, que opera efeitos ex tunc desde a edição da norma, e os
efeitos normativos vinculantes, que legitimam o cabimento da reclamação e têm início
com a publicação da decisão no Diário Oficial.
Essa diferença é fundamental para que se compreenda que a decisão do STF não
produz efeitos rescisórios, conforme tese fixada no tema 733 da Repercussão Geral:
a decisão do Supremo Tribunal Federal declarando a constitucionalidade
ou a inconstitucionalidade de preceito normativo não produz a
automática reforma ou rescisão das decisões anteriores que tenham
adotado entendimento diferente. Para que tal ocorra, será indispensável

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 31
COLETIVO CONSTITUCIONAL
Aula 3 - Ação Direta de Inconstitucionalidade e
Ação Declaratória de Constitucionalidade

a interposição de recurso próprio ou, se for o caso, a propositura de


ação rescisória própria, nos termos do art. 485 do CPC, observado o
respectivo prazo decadencial (CPC, art. 495).

No que tange à técnica da modulação de efeitos, o Tribunal tem reconhecido


que o disposto no art. 27 da Lei nº 9.868/1999 acaba por conceder-lhe a possibilidade
de utilizar parâmetros mais amplos para avaliar as consequências de sua decisão,
no juízo de ponderação entre a supremacia da Constituição e razões de segurança
jurídica e excepcional interesse público e social. Por essa razão, tem sido adotada a
praxe de se deixar a questão relativa à modulação de efeitos para eventuais embargos
de declaração, único recurso cabível das decisões que julgam o mérito das ações de
controle concentrado, a fim de permitir que as partes tragam mais subsídios para a
tomada de decisão acerca da modulação. Registre-se, contudo, que a modulação de
efeitos não depende da oposição dos embargos, porquanto, como já decidiu o Tribunal,
ela pode ser concedida até mesmo de ofício (ADI nº 5.617-ED, Rel. Min. Edson Fachin,
DJ 08.3.2019).
Finalmente, o quórum para deferir a modulação é de 2/3 dos ministros, isto
é, 8 dos 11 Ministros devem necessariamente ter se manifestado favoravelmente
à modulação. Observe-se que esse é o requisito legal, previsto no art. 27 da Lei nº
9.868/1999, e não um requisito constitucional. É por essa razão que, no âmbito do
controle difuso, a modulação de efeitos da decisão tomada em recurso extraordinário
em repercussão geral não exige o quórum qualificado. Basta, para tanto, a maioria
absoluta dos membros. Todavia, excepciona-se da regra de maioria absoluta de decisão
tomada em recurso extraordinário com repercussão geral, quando o objeto versa
questão de inconstitucionalidade (RE nº 638.115, oitavos eds, Rel. Min. Gilmar Mendes,
DJ 11.5.2020).

DICA DE LEITURA

Vamos aprofundar as reflexões sobre o tema? Sugerimos a leitura da tese


de Paula Pessoa Pereira (2017):
Supermaioria como regra de decisão na jurisdição constitucional do Supremo
Tribunal Federal

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 32
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SAIBA MAIS

Deseja entender melhor a técnica da modulação de efeitos da decisão que


declara a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo?
Recomendamos, então, o interessante julgamento do RE nº 197.917, Rel.
Min. Maurício Corrêa, DJ 7.5.2004, que versou sobre a questão da composição
da Câmara de Vereadores do Município de Mira Estrela, no Estado de São Paulo,
oportunidade em que se debateu a necessidade de se resguardar, com fundamento
da segurança jurídica, a situação consolidada no referido Município.

Outro caso expressivo foi o julgamento da ADI nº 2.240, Rel. Min. Eros Grau, DJ
03.8.2007, que tratou da validade da criação do Município de Luís Eduardo Magalhães,
no Estado da Bahia, sem observância da regra do art. 18, §4º, da Constituição Federal.

Considerações finais

Chegamos ao final desta aula!


Nosso propósito foi apresentar a você dois instrumentos processuais essenciais
para a defesa da Constituição Federal, quais sejam, a ação direta de inconstitucionalidade
(ADI) e a ação declaratória de constitucionalidade (ADC), a partir da análise da sua
função, do seu procedimento e das questões controversas que orbitam o contexto dos
efeitos das decisões e das técnicas decisórias necessárias para a compatibilização da
teoria constitucional com a complexidade do mundo fático.
No percurso traçado, evidenciamos a força normativa da ordem constitucional
realizada na Constituição Federal, que consiste na sua autoridade jurídica, ou seja,
na sua exigibilidade frente aos atos normativos emanados pelos Poderes públicos
constituídos, bem como em face de atos praticados por particulares, em razão da
eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Para a defesa normativa da Constituição,
sua adequada tutela, o constituinte predispôs um desenho institucional sofisticado de
processos constitucionais e garantias fundamentais dos cidadãos.

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 33
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Ação Declaratória de Constitucionalidade

Importante salientar que o tema da jurisdição constitucional e dos processos


e garantias necessários à efetiva tutela da Constituição Federal está em permanente
desenvolvimento, considerada a complexidade das relações sociais, políticas,
institucionais e da própria atividade interpretativa de aplicação do Direito. Essa
dimensão ficou clara a partir do estudo da jurisprudência acima delineado, notadamente
no ponto da legitimidade, dos efeitos das decisões e das técnicas decisórias. Portanto,
recomendamos que fique atento no sentido de acompanhar essa faceta dinâmica do
desenvolvimento da jurisdição constitucional.
Esperamos que os estudos tenham contribuído para o seu aprendizado!
Antes de encerrarmos, cabe registrar que a próxima aula será dedicada à
abordagem da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão e do Mandado
de Injunção Coletivo.
Até mais! Bons estudos!

INTRODUÇÃO AO PROCESSO 34
COLETIVO CONSTITUCIONAL
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Ação Declaratória de Constitucionalidade

Referências

AVILA, Humberto. Constituição, liberdade e interpretação. São Paulo: Malheiros


Editores, 2019.
BITTENCOURT, Carlos Alberto Lúcio. O controle jurisdicional da
constitucionalidade das leis. Brasília: Ministério da Justiça, 1997.
CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial da constitucionalidade das leis no direito
comparado. Tradução de Aroldo Plínio Gonçalves. 2. ed. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris, 1992.
CLÈVE, Clèmerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no Direito
brasileiro. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.
GONÇALVES, Bernardo Fernandes. Curso de Direito Constitucional. 9ª ed. Salvador:
Juspodiuvm, 2019.
GRIMM, Dieter. Jurisdição Constitucional e Democracia. Revista de Direito de
Estado, Rio de Janeiro, a. 1, nº 4, pp. 3-22, out.-dez. 2006.
MARINONI, Luiz Guilherme; SARLET, Ingo (coord.). Processo Constitucional. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.
MARINONI, Luiz Guilherme; SARLET, Ingo Wolfgang; MITIDIERO, Daniel. Curso de
direito constitucional. 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 2017.
MENDES, Gilmar Ferreira. A declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia
da nulidade da lei: “Unvereinbarkister Klarung” na jurisprudência da Corte
Constitucional alemã. Revista de Informação Legislativa. Brasília, nº 118, p. 63-84,
abr./jun. 1993.
MENDES, Gilmar; BRANCO, Paulo Gonet. Curso de direito constitucional. 14ª ed.
rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2019.
PEREIRA, Paula Pessoa. Qual regra de decisão para a jurisdição constitucional:
maiorias ou supermaiorias? Uma velha discussão não tão conhecida na história
constitucional. In: MARINONI, Luiz Guilherme; SARLET, Ingo (coord.) Processo
Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, p. 399-441.
SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação conforme a constituição: entre a trivialidade
e a centralização judicial. Revista Direito GV, vol. 2, n. 1, p. 191-210, jan./jun. 2006.

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COLETIVO CONSTITUCIONAL

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