NIEBUHR - Execução Contratual
NIEBUHR - Execução Contratual
NIEBUHR - Execução Contratual
EXECUÇÃO CONTRATUAL
[...] a execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por 1 (um) ou mais fiscais
do contrato, representantes da Administração especialmente designados conforme requisitos
estabelecidos no art. 7º desta Lei, ou pelos respectivos substitutos, permitida a contratação
de terceiros para assisti-los e subsidiá-los com informações pertinentes a essa atribuição.
[...] a execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por 1 (um) ou mais fiscais
do contrato, representantes da Administração especialmente designados conforme requisitos
estabelecidos no art. 7º desta Lei, ou pelos respectivos substitutos, permitida a contratação
de terceiros para assisti-los e subsidiá-los com informações pertinentes a essa atribuição.
746
“O fiscal de contrato, especialmente designado para o acompanhamento da obra, pode ser responsabilizado quando
se omite na adoção de medidas necessárias à manutenção do ritmo de execução normal do empreendimento” (TCU,
Plenário. Acórdão nº 2.296/2019. Rel. Min. André de Carvalho, j. 25.9.2019).
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
940 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
Na mesma linha do parecer técnico, considero que remanesce a irregularidade apurada nos
autos. O responsável, na condição de fiscal do Contrato UT-06-0025/02-00, atestou boletins
de medição contendo serviços em desconformidade com o projeto executivo vigente, ou
seja, atestou serviços não previstos no contrato, caracterizando infração ao disposto no
artigo 60, caput e parágrafo único c/c artigo 61, parágrafo único, da Lei 8666/1993, bem como
nos arts. 62 e 63, §2º, inciso III, da Lei 4320/64. Conforme bem demonstrado na instrução,
as justificativas trazidas aos autos pelo fiscal do contrato não merecem acolhida, cabendo,
assim, a apenação do responsável com a multa prevista no artigo 58, II, da Lei 8.4443/92.748
747
“O fiscal do contrato tem o dever de conhecer os limites e as regras para alterações contratuais definidos na Lei
de Licitações, e, por conseguinte, a obrigação de notificar seus superiores sobre a necessidade de realizar o devido
aditivo contratual, evitando a atestação da execução de itens não previstos no ajuste, sob pena de ser-lhe aplicada
a multa do art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992” (TCU, Plenário. Acórdão nº 43/2015. Rel. Min. Raimundo Carreiro,
j. 21.1.2015).
748
TCU, Plenário. Acórdão nº 2.511/2014. Rel. Min. Raimundo Carreiro, j. 24.9.2014.
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
941
A atividade de fiscalização dos contratos deve ser exercida com redobrada atenção e
cautela, quer pela sua centralidade na consecução dos contratos administrativos, quer pelo
rigor com que os órgãos de controle responsabilizam os gestores e fiscais. É usual que fiscais
sejam designados apenas formalmente, sem que a eles sejam conferidas condições para o
exercício das suas atribuições. É comum que agentes administrativos concentrem atribuições
em excesso e não tenham disponibilidade de tempo para desempenhar suas funções de fiscal
749
STJ, Primeira Seção. AgInt no MS nº 22.900/DF 2016/0276678-6. Rel. Min. Og Fernandes, j. 26.4.2017.
750
TCU, Segunda Câmara. Acórdão nº 382/2014. Rel. Min. Aroldo Cedraz, j. 3.2.2014.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
942 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
ou, noutras oportunidades, não reúnam conhecimento especializado. Tudo isso deve ser
sopesado pelos órgãos de controle diante de faltas cometidas pelos fiscais dos contratos.751
9.2.3. organize a gestão dos contratos de modo que sejam designados, formalmente,
servidores públicos qualificados que serão responsáveis pela execução de atividades e/ou
pela vigilância e garantia da regularidade e adequação dos serviços e produtos elaborados e
aceitos, assim como pela observância do princípio da indisponibilidade do interesse público,
751
“31. No tocante aos pressupostos subjetivos de responsabilização, entendo que há elementos mitigadores da
culpa do recorrente. 32. De fato, as condições materiais de exercício da função pública devem ser consideradas
na avaliação da culpabilidade do gestor e, por conseguinte, na dosimetria das sanções eventualmente aplicadas.
[...] 34. Observo também que, até pouco tempo, a legislação brasileira era omissa a respeito dos parâmetros que
devem ser considerados na mensuração da gravidade da conduta inquinada. Com o advento da Lei 13.655/2018,
foram incluídas na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB disposições sobre segurança
jurídica e eficiência na criação e aplicação do direito público. 35. Passou-se a exigir dolo ou erro grosseiro para a
responsabilização pessoal do agente público nas esferas administrativa, controladora e judicial (art. 28). Ademais,
na interpretação das normas de gestão pública, deverão ser considerados os obstáculos e as dificuldades reais do
gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo (art. 22, caput). 36. Nesse contexto, verifico a existência
de indícios de que as condições de fiscalização da obra eram, de fato, precárias, conforme alegou o recorrente em
várias oportunidades. [...] 41. Ainda que subsistam questionamentos acerca da correta atuação do responsável na
qualidade de fiscal e gestor do Contrato 34/2002, os pressupostos elementares para a sua responsabilização neste
Tribunal (vide, a propósito, os Acórdãos 2.420/2015 e 2.781/2016, ambos de Plenário) não restaram devidamente
configurados. Ademais, as condições de fiscalização mitigam a culpabilidade do recorrente” (TCU, Segunda Câmara.
Acórdão nº 2.973/2019. Rel. Min. Ana Arraes, j. 30.4.2019).
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
943
5.7.7. O servidor designado para exercer o encargo de fiscal não pode oferecer recusa, porquanto não
se trata de ordem ilegal. Entretanto, tem a opção de expor ao superior hierárquico as deficiências e
limitações que possam impedi-lo de cumprir diligentemente suas obrigações. A opção que não se
aceita é uma atuação a esmo (com imprudência, negligência, omissão, ausência de cautela
e de zelo profissional), sob pena de configurar grave infração à norma legal (itens 31/3 do
voto do Acórdão nº 468/2007-P).753
752
TCU, Plenário. Acórdão nº 2.632/2007. Rel. Min. Augusto Nardes, j. 5.12.2007.
753
TCU, Plenário. Acórdão nº 2.971/2010. Rel. Min. Valmir Campelo, j. 3.11.2010.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
944 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
754
STJ, Quinta Turma. AgR no REsp nº 396.704/RS. Rel. Min. Laurita Vaz, j. 7.6.2005.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
946 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
contratos de grande porte, cuja fiscalização é muito difícil de ser realizada por uma pessoa
só, ou em entidades administrativas que não tenham estrutura de pessoal suficiente para
fiscalizar adequadamente os seus contratos, especialmente em relação àqueles cujos objetos
envolvam a prestação de serviços técnicos especializados, como informática e engenharia.
Advirta-se que o supracitado caput do artigo 117 da Lei nº 14.133/2021 não autoriza
a terceirização completa da atividade de fiscalização dos contratos. O dispositivo autoriza
apenas a contratação de alguém que auxilie a fiscalização. O responsável por ela é
obrigatoriamente um representante da Administração, o fiscal do contrato.
Nessas situações, o inciso I do §4º do artigo 117 da Lei nº 14.133/2021 prescreve que
“a empresa ou o profissional contratado assumirá responsabilidade civil objetiva pela
veracidade e pela precisão das informações prestadas, firmará termo de compromisso de
confidencialidade e não poderá exercer atribuição própria e exclusiva de fiscal de contrato”.
Demais disso, o inciso II do mesmo parágrafo esclarece que “a contratação de terceiros não
eximirá de responsabilidade o fiscal do contrato, nos limites das informações recebidas do
terceiro contratado”.
Nesse sentido, deve-se avaliar com ponderação e razoabilidade as decisões do fiscal
tomadas com base em relatórios ou laudos elaborados pelas empresas contratadas para atuar
na fiscalização dos contratos. Os órgãos de controle devem ter sensibilidade para avaliar
a medida da culpabilidade do fiscal, o que depende das peculiaridades de cada contrato.
A regra estabelecida na parte final do inciso II do §4º do artigo 117 da Lei nº 14.133/2021
é que o fiscal atue com base nas informações prestadas pelas empresas contratadas e não
deve ser responsabilizado se o defeito provém de tais informações. O fiscal somente deve
ser responsabilizado excepcionalmente se, e somente se, pelas circunstâncias de fato, for
possível aferir com facilidade que as informações repassadas pela empresa contratada são
equivocadas ou contêm falhas e que o fiscal foi extremamente negligente em relação às
tais análises. Reitera-se que os agentes públicos, incluindo os fiscais, somente podem ser
responsabilizados por dolo ou erro grosseiro (culpa grave), em alinho com o artigo 28 da
Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).
Por exemplo, agente administrativo é designado para atuar como fiscal em obra de
grande porte, a construção de uma usina hidrelétrica. A Administração, pelo volume da
obra, contrata empresa especializada para auxiliar o fiscal. Pelo padrão de procedimentos
utilizados pelo órgão ou entidade contratante, percebe-se que a empresa especializada
realiza os trabalhos de campo, acompanhando com equipe multidisciplinar a execução do
contrato e emitindo relatórios e laudos. O fiscal atua com base em tais relatórios e laudos.
Ou seja, naquele contrato, o fiscal não é o responsável por verificar todos os acontecimentos
e ações da empresa contratada, o que, aliás, é materialmente impossível ou muito difícil,
à vista do vulto do empreendimento. Ocorre que determinado relatório, produzido pela
empresa especializada, veicula informação falsa, dando conta que a contratada realizou dada
atividade que, de fato, não foi executada. Em regra, o fiscal não deve ser responsabilizado
porque tomou decisões confiando nas informações que vieram da empresa contratada, até
porque ele não tinha a obrigação de verificar in loco e de modo detalhado todas as atividades
da empresa contratada.
Esse é o teor acertado do artigo 26 do Decreto Federal nº 11.246/2022:
Art. 26. Na hipótese da contratação de terceiros para assistir e para subsidiar os fiscais de
contrato nos termos do disposto neste Decreto, será observado o seguinte:
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
947
38. Concordo com os titulares da unidade técnica, bem como com o MP/TCU, ao entenderem
que o assessoramento técnico de engenheiro previamente ao atesto das notas fiscais não
constitui excludente de responsabilidade do fiscal do contrato, como havia entendido a
Auditora Federal de Controle Externo que instruiu este processo. 39. De acordo com portarias
do órgão, o Sr. [omissis] era o designado para acompanhar e fiscalizar a execução dos con
tratos em tela. O fato de ter obtido ou não assessoramento de engenheiro contratado na
fiscalização das obras não o exime de sua responsabilidade de fiscal, pois o apoio técnico
é subsidiário. [...] 41. Não obstante essa possibilidade, restando evidente que o dever de
fiscalizar diretamente a execução do empreendimento é do preposto da Administração, não
sendo tal tarefa passível de delegação. Nesse sentido são os Acórdãos Plenários 1.001/2017
(rel. Min. Vital do Rego), 1.925/2015 (rel. Min. José Múcio) e 2.987/2015 (de minha relatoria).755
Advirta-se que, ainda que a Administração não conte em seus quadros com pro
fissional habilitado para exercer a função de fiscal de contrato, especialmente em relação
a contratos que envolvam a prestação de serviços técnicos especializados, a fiscalização
permanece de titularidade dela. O terceiro continua, em todo o caso, apenas a auxiliar a
fiscalização. Nesses casos, em que não haja profissional habilitado para exercer a função nos
quadros da entidade administrativa, quem responde pela fiscalização é a própria autoridade
competente que será municiada com as informações técnicas do contratado para assisti-la
em tal atividade. Assim sendo, em princípio, não se deve exigir do fiscal, por não possuir
conhecimento apropriado, que divirja dos relatórios e laudos técnicos da contratada para
auxiliá-lo com a fiscalização, ainda que aos olhos de outro técnico, terceiro, tais relatórios e
laudos pareçam mesmo absurdos.
8 O preposto do contratado
O caput do artigo 118 da Lei nº 14.133/2021 prescreve que “o contratado deverá
manter preposto, aceito pela Administração, no local da obra ou serviço, para representá-
lo na execução do contrato”.
755
TCU, Plenário. Acórdão nº 2.292/2017. Rel. Min. Marcos Bemquerer, j. 11.10.2017.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
948 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
É recomendável que o preposto seja indicado pelo contratado por escrito, até para
que tal fato seja documentado no respectivo processo, inclusive para a aferição dos órgãos
de controle.
Demais disso, como deflui do próprio caput do artigo 118 da Lei nº 14.133/2021, o
preposto indicado pelo contratado deve ser aceito pela Administração. Isso significa, por
dedução cartesiana, que a Administração pode recusá-lo. Evidentemente, a Administração
deve motivar, se for o caso, o ato de recusa, deixando claras as razões pelas quais a pessoa
indicada não está apta ou não é a mais adequada para exercer tal função. As razões apontadas
pela Administração devem ser de ordem objetiva. É inadmissível que a Administração, por
meio de seus agentes, recuse preposto indicado pelo contratado por força de questões de
índole pessoal, antipatias ou coisas do gênero. Enfim, a Administração, conquanto possa
recusar o preposto indicado pelo contratado, não pode fazê-lo de modo arbitrário, sem
justificativas plausíveis e em desobediência aos princípios vetores do direito administrativo,
sobretudo, na espécie, o da impessoalidade.
O preposto indicado pelo contratado pode ser substituído, desde que por profissional
devidamente habilitado. A substituição pode ocorrer no interesse do próprio contratado,
que, por exemplo, pode aproveitá-lo noutra função, ou mesmo a requerimento da
Administração, se não se mostrar qualificado ou apto para exercer tal desiderato.
O preposto indicado pelo contratado é o interlocutor oficial dele com a Administração,
especialmente com o fiscal do contrato. Ele deve acompanhar a execução do contrato,
tomando todas as providências para que os demais empregados da contratada realizem
as suas atividades de modo adequado. Ele também deve tomar ciência de todas as
recomendações e anotações realizadas pelo fiscal, realizando as providências para
corrigir o que fora realizado de modo inadequado, saneando falhas e defeitos. Ele, ainda,
deve interagir constantemente com o fiscal do contrato, indicando problemas técnicos,
necessidade de prorrogações, aditivos e revisões. Enfim, deve enveredar esforços para que
o contrato seja executado a contento, de acordo com as cláusulas nele avençadas.
9 Subcontratação
9.1 Noções gerais
Por regra, o contrato administrativo decorre de licitação pública, processo seletivo
que se realiza por tributo ao princípio da isonomia, dando-se a todos os interessados as
mesmas condições de disputá-lo. No final das contas, o contratado é pessoa que passou
pelo escrutínio da Administração Pública, inclusive em razão de suas condições pessoais de
habilitação. Por conseguinte, o vencedor da licitação e não terceiro é quem faz jus ao direito
de firmar o contrato e executá-lo, o que significa que ele não goza do direito de trespassar
o contrato a terceiro, salvo situações bem delimitadas e sempre parciais.
Pondera-se que, atualmente, em muitos segmentos, é quase improvável que uma
empresa consiga, sozinha e por seus próprios meios, executar inteiramente contrato
administrativo, quer em virtude da complexidade das relações econômicas, quer em
tributo ao avanço do processo de terceirização no setor privado ou quer por força da
especialização das atividades. É muito difícil, por exemplo, que um prédio público mediano
seja inteiramente construído por única empresa. É frequente que a empresa contratada
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
949
subcontrate várias partes da obra, já começando com a própria fundação, que costuma ser
feita por empresa especializada, passando por sistemas elétricos, sistemas de refrigeração,
elevadores e outros.
Enfatiza-se, já de plano, que a subcontratação não pode ser total. Ao contrário, ela
é sempre parcial, relativa a partes previamente autorizadas pela Administração. A sub
contratação total equivaleria à transferência do contrato administrativo, sendo que o
contratado faria as vezes de uma espécie de intermediário. Essa situação é rechaçada pelos
órgãos de controle que, inclusive, apontam a existência de dano ao erário. Confira-se do
Tribunal de Contas da União:
756
TCU, Segunda Câmara. Acórdão nº 3.002/2021. Rel. Min. Marcos Bemquerer, j. 2.3.2021.
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
951
O problema ocorre nas situações em que essas regras são prescritas em pormenor e com
rigidez excessiva, o que acaba, como se disse, engessando a própria Administração e
inviabilizando soluções mais eficientes e adequadas para a execução dos contratos.
[...] será vedada a subcontratação de pessoa física ou jurídica, se aquela ou os dirigentes desta
mantiverem vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, financeira, trabalhista ou
civil com dirigente do órgão ou entidade contratante ou com agente público que desempenhe
função na licitação ou atue na fiscalização ou na gestão do contrato, ou se deles forem
cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral, ou por afinidade, até o terceiro
grau, devendo essa proibição constar expressamente do edital de licitação.
Os termos usados no §3º do artigo 122 da Lei nº 14.133/2021, bem abertos, podem
causar muitas dúvidas, em prejuízo à segurança jurídica, especialmente em municípios
de médio e pequeno porte. Nesses municípios de médio e pequeno porte, é comum que
o universo de fornecedores seja limitado, ampliando os riscos de se deparar com algumas
das situações mencionadas no dispositivo.
Vínculo trabalhista não atrai dúvida maior, pressupõe relação de emprego. Sobre os
demais vínculos, os de natureza técnica, comercial, econômica, financeira ou civil, não há
definição precisa e objetiva. Por exemplo, imagine-se que se pretenda subcontratar empresa
local especializada em refrigeração, que faz a manutenção eventual dos aparelhos de ar-
condicionado da residência de dirigente do órgão ou entidade. A rigor jurídico, pode-se
dizer que há vínculo comercial, econômico e civil e, por via de consequência, a empresa de
manutenção estaria impedida de ser subcontratada. Isso soa desproporcional.
Propõe-se que os vínculos especiais listados no §3º do artigo 122 da Lei nº 14.133/2021
não se configuram diante de relações que são padronizadas e de préstimos que são
oferecidos de modo geral ao público com condições relativamente uniformes. É que não
se antevê relação pessoal direta nessas situações, o que configuraria o receio de benefício
indevido ou conflito de interesse, o que se busca evitar com o §3º do artigo 122 da Lei
nº 14.133/2021 (intepretação teleológica).
A vedação também atinge, nos termos do §3º do artigo 122 da Lei nº 14.133/2021,
cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral, ou por afinidade, até o terceiro
grau.
De acordo com o artigo 1.591 do Código Civil, “são parentes em linha reta as pessoas
que estão umas para com as outras na relação de ascendentes e descendentes”. O artigo
1.592 do Código Civil considera que “são parentes em linha colateral ou transversal, até o
quarto grau, as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra”.
No que atine aos graus de parentesco, o artigo 1.594 do Código Civil prescreve que “contam-
se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral, também
pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo
até encontrar o outro parente”. Esclareça-se que na ascendência o terceiro grau é o bisavô
e na descendência é o bisneto. Em linha colateral, os parentes de terceiro grau são os tios e
sobrinhos. Primos são parentes de quarto grau, portanto, não estão abrangidos pelo §3º do
artigo 122 da Lei nº 14.133/2021.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
952 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
24. Para assegurar a boa execução do objeto, é exigida do futuro contratado a demonstração
de capacidade financeira e sua capacidade técnico-profissional e técnico-operacional, de
forma a comprovar sua aptidão mediante desempenho de tarefas semelhantes.
25. Tal comprovação de aptidão, obviamente, está relacionada às frações tecnicamente
complexas e financeiramente relevantes do objeto, sob pena de serem absolutamente
descabidas as exigências de habilitação.
26. Assim, não faria sentido admitir que tais parcelas cruciais do objeto, para cuja execução
foi selecionado o licitante mais apto, fossem posteriormente transferidas a terceiro por este
escolhido. Isso tornaria completamente desnecessário o procedimento de habilitação e,
consequentemente, esvaziaria de qualquer significado ou finalidade os dispositivos da lei
que o preconizam, o que não pode ocorrer.
27. Conclui-se, pois, que não é possível a subcontratação das parcelas tecnicamente mais
complexas ou de valor mais significativo do objeto, que motivaram a comprovação de
capacidade financeira ou técnica.757
757
TCU, Plenário. Acórdão nº 3.144/2011. Rel. Min. Aroldo Cedraz, j. 30.11.2011.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
954 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
o edital poderá prever, para aspectos técnicos específicos, que a qualificação técnica seja
demonstrada por meio de atestados relativos a potencial subcontratado, limitado a 25%
(vinte e cinco por cento) do objeto a ser licitado, hipótese em que mais de um licitante poderá
apresentar atestado relativo ao mesmo potencial subcontratado.
758
Inclusive, sob essa perspectiva e diante da Lei nº 8.666/1993, o Tribunal de Contas da União já admitiu: “17. Ainda que
fosse realmente necessária a comprovação de aptidão técnico-operacional para aquela parcela principal do contrato,
seria suficiente que o edital demandasse da contratada demonstração de capacidade técnica da eventual empresa
a ser subcontratada na gestão e execução de obras ou serviços análogos, em atenção ao disposto no art. 78, caput, e
§1º, da Lei das Estatais (13.303/2016) e ao comando expresso no subitem 9.3.3 do Acórdão 2992/2011-TCU-Plenário,
reproduzido anteriormente. 18. Por se tratar de licitação para contratação sob o regime de empreitada integral –
assemelhada à modalidade EPC/Turn Key – que contempla as etapas de engenharia, compra, produção e entrega
do objeto em pleno funcionamento –, é válida a reflexão dos auditores acerca das diferenças dessa modalidade em
relação aos demais regimes de execução, em especial ao regime por preço unitário. A complexidade e a abrangência
desse tipo de contrato requerem flexibilidade nas aquisições e concentração de esforços no gerenciamento do
projeto e na execução das etapas do empreendimento. Nesses casos, dificilmente a contratada detém capacidade
para fornecer todos os insumos e serviços da cadeia produtiva” (TCU, Plenário. Acórdão nº 2.021/2020. Rel. Min.
Ana Arraes, j. 5.8.2020).
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
955
9.3. responder ao consulente que, por falta de amparo legal, os serviços complementares
prestados por empresas subcontratadas por agências de publicidade, que não estejam
prestando serviços de veiculação, não podem ser faturados diretamente em nome do órgão/
entidade da administração pública contratante; [...].761
759
TCU, Segunda Câmara. Acórdão nº 502/2008. Rel. Min. Ubiratan Aguiar, j. 11.3.2008.
760
Em sentido diverso: “9.5.8. atente, nas futuras licitações, para os percentuais aplicados de BDI sobre serviços, materiais
e equipamentos, de forma a corrigir eventual distorção comparativamente aos preços de mercado, avaliando quanto
a este dois últimos (materiais e equipamentos) a possibilidade de a própria Companhia reavaliar as compras de
equipamentos e materiais ou promover a sistemática de pagamento direto aos fornecedores, buscando reduzir os
custos de aquisição” (TCU, Plenário. Acórdão nº 1.595/2006. Rel. Min. Guilherme Palmenira, j. 30.08.2006).
761
TCU, Plenário. Acórdão nº 720/2018. Rel. Min. Marcos Bemquerer, j. 4.4.2018.
762
“Art. 308. O pagamento deve ser feito ao credor ou a quem de direito o represente, sob pena de só valer depois de
por ele ratificado, ou tanto quanto reverter em seu proveito”.
763
ARAGÃO, Alexandre Santos. Possibilidade de faturamento direto entre sociedade de economia mista e empresa
subcontratada sem alteração da responsabilidade da empreiteira principal. Revista de Direito da Procuradoria Geral,
Rio de Janeiro, p. 248-249, 2014.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
956 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
10 Recebimento
A Lei nº 14.133/2021 prescreve regras distintas para o recebimento dos objetos
dos contratos uma vez executados pelos contratados em relação às obras e aos serviços,
e em relação às compras. Num e noutro caso, no entanto, há etapa inicial destinada ao
recebimento provisório, e outra final destinada ao recebimento definitivo.
Com o recebimento provisório a Administração toma posse da coisa, do objeto do
contrato, passando a valer o princípio do res perit domino, isto é, a coisa perece para o dono.
Explicando melhor, a partir do recebimento provisório, a Administração é responsável
pela guarda e conservação do objeto do contrato, afastando qualquer responsabilidade do
contratado. Por exemplo, a Administração recebe provisoriamente uma obra, um prédio
público. Ela, por via de consequência, deve tomar providências para guardá-lo, conservá-
lo. Imagine-se, então, que, depois do recebimento provisório, a Administração deixa o
prédio sem qualquer vigilância e meliantes o invadem, furtando alguns objetos e destruindo
partes da obra. A responsabilidade é exclusivamente da Administração. Ao contratado,
como o objeto foi recebido provisoriamente pela Administração, não é imputável qualquer
responsabilidade.
Cumpre enfatizar que o recebimento provisório não importa liberação das obrigações
do contratado, o que somente ocorre com o recebimento definitivo. Logo, a Administra
ção não deve usar nem consumir o objeto do contrato a partir do recebimento provisório
e antes do definitivo. O recebimento definitivo expressa a aceitação da Administração.
O recebimento definitivo é o reconhecimento da Administração de que o contratado adim
pliu suas obrigações.
Evidentemente, o contratado não pode ser compelido a permanecer perpetuamente
à espera do aceite da Administração. É necessário que a Administração expresse sua
concordância ou discordância com o que foi executado pelo contratado. Se, ao analisar
o objeto, a Administração depara-se com falhas e incorreções, o contratado é obrigado a
corrigir ou refazer o objeto do contrato, em obediência ao artigo 119 da Lei nº 14.133/2021.
Portanto, a Administração, se não recebe em definitivo o objeto do contrato, deve
firmar documento ou laudo, indicando os motivos pertinentes, que ensejam a recusa.
O contratado, no exercício do contraditório e da ampla defesa, pode manifestar-se e,
inclusive, requerer que se reexamine o objeto do contrato. Se a Administração mantém
a sua posição de recusa, o contratado deve acatá-la, corrigindo ou refazendo o objeto do
contratado, ou deve procurar a via judicial, reclamando a realização de perícia.
Cumpre registrar que, a teor do §2º do artigo 140 da Lei nº 14.133/2021, “o recebimento
provisório ou definitivo não excluirá a responsabilidade civil pela solidez e pela segurança
da obra ou serviço nem a responsabilidade ético-profissional pela perfeita execução do
contrato, nos limites estabelecidos pela lei ou pelo contrato”. O supracitado dispositivo não
pretende perpetuar a responsabilidade do contratado, deixando-o sempre suscetível aos
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
957
da liquidação da despesa”. Logo, tais prazos são considerados máximos, e não mínimos.
O §2º do mesmo artigo 7º preceitua que, “para as contratações decorrentes de despesas cujos
valores não ultrapassem o limite de que trata o inciso II do art. 75 da Lei nº 14.133, de 2021,
os prazos de que dos incisos I e II do caput serão reduzidos pela metade”.
Chama a atenção que os referidos prazos sejam significativamente mais curtos do
que os consignados na Lei nº 8.666/1993, vigente por décadas. De lembrar que, pela alínea
“a” do inciso I do artigo 73 da Lei nº 8.666/1993, combinado com o seu §3º, o prazo para o
recebimento provisório em obras e serviços era de 15 (quinze) dias, e para o recebimento
definitivo de até 90 (noventa) dias a contar do recebimento provisório. O prazo para
pagamento, consoante a alínea “a” do inciso XIV do caput do artigo 40 da Lei nº 8.666/1993,
não deveria ser superior a 30 (trinta) dias. Esses prazos, preceituados na Lei nº 8.666/1993,
realmente eram muito alongados e não razoáveis, somados atingiam 135 (cento e trinta e
cinco) dias.
Agora, repita-se, diante da Lei nº 14.133/2021, ao menos em âmbito federal, de acordo
com o artigo 7º da Instrução Normativa nº 77/2022, o prazo total para o recebimento foi
limitado a 10 (dez) dias úteis a contar do recebimento da nota fiscal ou instrumento de
cobrança equivalente pela Administração. O novo prazo, indicado na Instrução Normativa,
é mais adequado. No entanto, bem se vê, demandará de órgãos e entidades administrativas
ajustes nas suas rotinas e mesmo que estruturem melhor a gestão dos seus contratos e fluxos
de pagamentos, para que os recebimentos e pagamentos sejam realizados nos prazos mais
curtos da Instrução Normativa.
O §3º do artigo 7º da Instrução Normativa nº 77/2022 admite a prorrogação do prazo,
desde que justificadamente, por igual período, “quando houver necessidade de diligências
para a aferição do atendimento das exigências contratuais”. O §4º, em complemento,
ressalva que “o prazo para a solução, pelo contratado, de inconsistências na execução
do objeto ou de saneamento da nota fiscal ou de instrumento de cobrança equivalente,
verificadas pela Administração durante a análise prévia à liquidação de despesa, não será
computado para os fins de que trata o inciso I do caput e o §2º deste artigo”. Logo, se houver
necessidade de diligência para apurar se o objeto foi de fato executado em conformidade
com o contrato, o prazo para o recebimento pode ser prorrogado. Em acréscimo, se o objeto
não tiver sido executado em conformidade com o contrato e for necessária diligência para
que o contratado promova ajustes ou correções, o prazo para o recebimento é suspenso até
que os ajustes ou correções sejam realizados.
11 Pagamento
A Lei nº 14.133/2021 não predefiniu condições, critérios e prazos para os pagamentos.
Preferiu-se deixar o assunto em aberto, para que a Administração dispusesse sobre ele
de acordo com as peculiaridades de cada contrato. Nem ao menos um prazo referencial
foi indicado. Sem embargo, o legislador impôs à Administração definir as condições de
recebimento e pagamento já na etapa preparatória, o que deve ser expresso no termo de
referência, diante da interpretação conjunta do inciso III do caput do artigo 18 e da alínea
“g” do inciso XXIII do artigo 6º, ambos da Lei nº 14.133/2021. Esses aspectos, definidos na
etapa preparatória, devem ser expressos no edital, como demanda o caput do artigo 25 da
mesma lei, para que os licitantes tenham clareza sobre eles quando da elaboração das suas
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
960 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
propostas – até porque influem e podem ser até mesmo determinantes para as respectivas
propostas. Além da indicação no edital, o inciso VI do artigo 92 da Lei nº 14.133/2021 exige
que constem do contrato “os critérios e a periodicidade da medição, quando for o caso,
e o prazo para liquidação e para pagamento”, cláusulas que lhe são fundamentais. Daí
que a omissão ou a vagueza da Administração sobre condições, critérios e prazos para
os pagamentos constitui ilegalidade, que pode importar na invalidação ou convalidação
dos respectivos atos omissos ou vagos e na responsabilização dos agentes administrativos
faltosos, a depender das peculiaridades do caso.
O pagamento, por regra, depende do anterior cumprimento das obrigações pela
contratada e do recebimento do objeto executado pela Administração, tudo na forma do que
dispõe o contrato. O artigo 62 da Lei nº 4.320/1964 prescreve que “o pagamento da despesa
só será efetuado quando ordenado após sua regular liquidação”. A liquidação, por sua vez,
em acordo com o artigo 63 da Lei nº 4.320/1964, “consiste na verificação do direito adquirido
pelo credor tendo por base os títulos e documentos comprobatórios do respectivo crédito”.
Então, execução do objeto, recebimento (liquidação) e pagamento são atos que se devem
dar de modo sucessivo, sendo que um depende do outro, nesta ordem.
O inciso V do artigo 92 da Lei nº 14.133/2021 determina que o contrato trate de
“critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do
efetivo pagamento”. A atualização monetária é devida mesmo que o pagamento seja
realizado dentro do prazo contratado. Ela consiste apenas na correção monetária, que deve
ser apurada da data da comunicação do contratado à Administração do seu adimplemento,
o que costuma ocorrer com a apresentação de fatura, até a data do efetivo pagamento.
A Administração deve esclarecer no edital como a atualização deve ser realizada, sobre
quais parâmetros. Portanto, a atualização não revela nenhuma espécie de penalidade à
Administração.
O inciso XIV do artigo 92 da Lei nº 14.133/2021 obriga, ainda, o contrato a versar
sobre “os direitos e as responsabilidades das partes, as penalidades cabíveis e os valores
das multas e suas bases de cálculo”. Nesse contexto, o contrato também deve disciplinar
a mora da Administração e os seus efeitos, inclusive dispondo dos encargos que lhe são
decorrentes, como juros e correção monetária.
A propósito, é permitido ao edital, inclusive, prescrever multa contra a Administração,
como penalidade à mora.764 Veja-se que o inciso XIV do artigo 92 da Lei nº 14.133/2021 refere-
se às “partes”, Administração e contratada, consignando que pode haver penalidades para
ambas, inclusive, expressamente, multas. Essa medida é conveniente porque demonstra aos
interessados em participar da licitação que a Administração pretende realmente honrar os
seus compromissos em dia, tanto que ela mesma se compromete a arcar com multa se não
o fizer. Isso confere credibilidade e serve como incentivo para que os licitantes reduzam
os seus preços.
764
O Tribunal de Conas da União, antes da Lei nº 14.133/2021, editou a Súmula nº 226, cujo teor é o seguinte: “É indevida
a despesa decorrente de multas moratórias aplicadas entre órgãos integrantes da Administração Pública e entidades
a ela vinculadas, pertencentes à União, aos Estados, ao Distrito Federal ou aos Municípios, quando inexistir norma
legal autorizativa”. Não se deve interpretar tal súmula no sentido de que é proibido estabelecer multa em desfavor
da Administração em contratos administrativos. A multa vedada pela referida súmula é aquela estipulada entre
dois órgãos ou entidades da Administração Pública, logo de efeito interno. A súmula não se opõe à multa entre a
Administração e o contratado, terceiro que não se confunde com órgão ou entidade da Administração Pública.
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
961
deverá ser liberada no prazo previsto para pagamento”. Havendo dissenso sobre o que foi
executado pelo contratado, a parte controversa não deve ser paga e a parte incontroversa
deve ser paga. Ocorre que, muitas vezes, parcelas de pagamentos são retidas em razão de
dissenso parcial e de menor monta, o que gera prejuízos aos contratados.
Pondera-se que a regra do artigo 143 da Lei nº 14.133/2021 deve ser obtemperada
diante das particularidades de cada contrato e não tem lugar naqueles em que o objeto
somente tem utilidade na sua integridade, não cabendo dividi-lo em partes. Nesses casos,
a Administração não deve realizar qualquer pagamento, porque não há utilidade em pagar
por algo que não lhe será útil até que o todo seja executado.
765
“Art. 64. A ordem de pagamento é o despacho exarado por autoridade competente, determinando que a despesa
seja paga”.
766
“Art. 38. Não será permitido o pagamento antecipado de fornecimento de materiais, execução de obra, ou prestação
de serviço, inclusive de utilidade pública, admitindo-se, todavia, mediante as indispensáveis cautelas ou garantias,
o pagamento de parcela contratual na vigência do respectivo contrato, convênio, acordo ou ajuste, segundo a forma
de pagamento nele estabelecida, prevista no edital de licitação ou nos instrumentos formais de adjudicação direta”.
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
963
Ou seja, é legal alterar a forma de pagamento, porém, não para prever o pagamento
antecipado. Repita-se que, nos termos da Lei nº 14.133/2021, o pagamento antecipado é
excepcional, faz parte do contrato original, ele não surge no transcurso da relação contratual.
Os riscos do pagamento antecipado são altíssimos. Pura e simplesmente, pode
acontecer de a Administração Pública pagar e não receber o objeto que foi contratado ou
ainda receber com inadequações que impossibilitem, no todo ou em parte, sua fruição.
Sob essa perspectiva, não se pode jamais perder de vista que o pagamento antecipado
é exceção e, sendo assim, deve ser amplamente justificado, como exige o §1º do artigo 145 da
Lei nº 14.133/2021. Aliás, a justificativa deve ser amparada em duas hipóteses alternativas,
tudo conforme o dispositivo supracitado. Ou o pagamento antecipado propicia sensível
economia de recursos ou ele é condição indispensável para a obtenção do bem ou prestação
do serviço.
Se o pagamento antecipado não for “condição indispensável”, conforme o §1º do
artigo 145 da Lei nº 14.133/2021, é obrigatório demonstrar que ele propicia economia
de recursos, que seja vantajoso sob a ótica econômica. É bem complicado demonstrar a
economia de recursos em razão do pagamento antecipado, o que pode ser entrave para a
sua aplicação, dado que depende de muitas variáveis, algumas delas até mesmo subjetivas.
É difícil que essas variáveis sejam identificadas de forma precisa na etapa preparatória da
licitação, momento em que se deve definir, se for o caso, pelo pagamento antecipado.
Ganha destaque que, consoante o §2º do artigo 145 da Lei nº 14.133/2021, o pagamento
antecipado pode ser autorizado sem a prestação de garantias por parte dos contratados,
o que é fator de maior amplificação de riscos. O dispositivo mencionado preceitua que
“a Administração poderá exigir a prestação de garantia adicional como condição para o
pagamento antecipado”. O legislador, claramente, faculta a exigência da garantia adicional,
não a obriga.
É de frisar que, sob a ótica anterior à Lei nº 14.133/2021, os órgãos de controle têm
admitido o pagamento antecipado em condições excepcionais, devidamente justificadas
e sob a prestação de garantia do contratado. Inclusive, são frequentes os casos de agentes
administrativos responsabilizados pelos órgãos de controle porque não justificaram
adequadamente o pagamento antecipado ou não exigiram garantias, o que vem sendo
qualificado como erro grosseiro, com fundamento no artigo 28 da Lei de Introdução
às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).767 Insista-se que o §2º do artigo 145 da Lei
nº 14.133/2021, alterando esse quadro, não obriga a exigência de garantia.
767
Para fins de responsabilização perante o TCU, pode ser tipificada como erro grosseiro (art. 28 do Decreto-Lei
nº 4.657/1942 – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) a realização de pagamento antecipado sem
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
964 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
justificativa do interesse público na sua adoção e sem as devidas garantias que assegurem o pleno cumprimento
do objeto pactuado (TCU, Plenário. Acórdão nº 185/2019. Rel. Min. Benjamin Zymler, j. 6.2.2019).
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
965
768
NIEBUHR, Joel de Menezes; PIRONTI, Rodrigo Aguirre de Castro. Gestão de riscos de pagamentos antecipados.
Zênite Fácil, 23 jun. 2020. Disponível em: http://www.zenitefacil.com.br. Acesso em: 15 set. 2021.
769
TCU, Plenário. Decisão nº 705/1994. Rel. Min. Paulo Affonso Martins de Oliveira, j. 23.11.1994.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
966 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
770
STJ, Segunda Turma. MS nº 53.467/SE. Rel. Min. Herman Benjamin, j. 27.6.2017.
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
967
Sem embargo, pondera-se que a rescisão não deve ser considerada consequência
automática e inevitável diante de situação de irregularidade perante a seguridade social
ou qualquer outra entidade fiscal. Sucede que a rescisão produz efeitos drásticos e muitas
vezes prejudiciais à Administração. Portanto, antes de partir para a rescisão do contrato, é
aconselhável que a Administração oportunize ao contratado a regularização da situação,
dando-lhe prazo adequado para tal desiderato, que deve ser avaliado diante de cada caso
concreto.
A rescisão não deve ser açodada. Isso não quer dizer, no entanto, que a Administração
deva ser leniente com contratados inadimplentes, que não mantêm as suas condições
de habilitação, entre as quais a regularidade fiscal. Se for o caso, se a situação não for
regularizada, a rescisão unilateral do contrato, por falta do contratado, é medida que se
impõe.
Outrossim, a rescisão permite à Administração executar a garantia contratual, para
ressarcimento dos prejuízos, bem como os valores das multas e das indenizações, conforme
o inciso III do caput do artigo 139 da Lei nº 14.133/2021, e, ainda, reter pagamentos devidos
ao contratado até o limite dos prejuízos causados, dessa feita com amparo no inciso IV do
mesmo artigo.
Trocando-se em miúdos, a rescisão do contrato por culpa do contratado confere à
Administração o direito de executar garantia e reter os pagamentos devidos ao contratado
para fazer frente aos prejuízos por ele causados. Portanto, se o contratado não mantém
situação de regularidade com a seguridade social ou qualquer outra de ordem fiscal, à
Administração, no final das contas, ao rescindir o contrato administrativo, é permitido
reter os pagamentos. No entanto, ela só pode fazê-lo na medida dos prejuízos que lhe são
causados. A ela não é permitido reter, de cambulhada, os valores devidos ao contratado
em sua totalidade, sem parâmetros, em montante superior aos prejuízos a ela causados.
A título ilustrativo, imagine-se que o contratado recolheu os encargos relativos ao
sistema de seguridade social, bem como todos os encargos trabalhistas e outros legais
771
TCU, Plenário. Acórdão nº 964/2012. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, j. 25.4.2012.
772
STJ, Segunda Turma. Agravo de Instrumento nº 1.030.498/RO. Rel. Min. Castro Meira, j. 9.9.2008.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
968 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
prestados ao argumento de que a contratada está em situação irregular perante o SICAF, por ausência
de previsão legal e por configurar enriquecimento ilícito da Administração Pública. Precedente:
(AG 2003.01.00.035327-7/DF - TRF 1ª Região - Quinta Turma - Rel. Desem. Federal Selene
Maria de Almeida - DJ 08.03.2004, p. 106) 2. Remessa oficial a que se nega provimento.773
773
TRF-1, Sexta Turma. REOMS nº 0018595-86.2008.4.01.3400. Rel. Des. Kassio Nunes Marques, j. 13.12.2013.
774
O Enunciado nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho foi revisto em face da decisão prolatada pelo Supremo
Tribunal Federal, nos autos da Ação Direta de Constitucionalidade nº 16, em 24.11.2010. O enunciado é o seguinte:
“I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o
tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). II - A contratação irregular
de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração
pública direta, indireta ou fundacional (artigo 37, II, da CF/1988). III - Não forma vínculo de emprego com o
tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem
como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e
a subordinação direta. IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a
responsabilidade subsidiária do tomador de serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da
relação processual e conste também do título executivo judicial. V - Os entes integrantes da administração pública
direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta
culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 14.133/2021, especialmente na fiscalização do cumprimento
das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não
decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI - A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação
referentes ao período da prestação laboral”.
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
971
Nesse mesmo sentido, noutro precedente, o Supremo Tribunal Federal ressalvou que
a responsabilidade da Administração depende da comprovação de comportamento dela
sistematicamente negligente e que ela não tem a obrigação de acompanhar pagamento por
pagamento da empresa prestadora dos serviços. Leia-se:
O Supremo Tribunal Federal fixou, na ADC 16, que a mera inadimplência não pode
converter a Administração Pública em responsável por verbas trabalhistas, decidindo
que não é todo e qualquer episódio de atraso na quitação de verbas trabalhistas que
pode ser imputado subsidiariamente ao Poder Público, mas só aqueles que tenham se
reiterado com a conivência comissiva ou omissiva do Estado. Não me parece que seja
automaticamente dedutível, da conclusão deste julgamento, um dever estatal de fiscalização
do pagamento de toda e qualquer parcela, rubrica por rubrica, verba por verba, devida aos
trabalhadores. O que pode induzir à responsabilização do Poder Público é a comprovação
de um comportamento sistematicamente negligente em relação aos terceirizados; ou seja,
a necessidade de prova do nexo de causalidade entre a conduta comissiva ou omissiva do
Poder Público e o dano sofrido pelo trabalhador. Se não houver essa fixação expressa, clara
e taxativa por esta Corte, estaremos possibilitando, novamente, outras interpretações que
acabem por afastar o entendimento definitivo sobre a responsabilização da Administração
Pública nas terceirizações, com a possibilidade de novas condenações do Estado por mero
inadimplemento e, consequentemente a manutenção do desrespeito à decisão desta Corte
na ADC 16.776
775
STF, Plenário. RE nº 760.931/DF. Rel. p/ acórdão Min. Luiz Fux, j. 26.4.2017.
776
STF. Rcl nº 45.550/SP. Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 27.1.2021.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
972 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
[...] nas contratações de serviços com regime de dedicação exclusiva de mão de obra, o
contratado deverá apresentar, quando solicitado pela Administração, sob pena de multa,
comprovação do cumprimento das obrigações trabalhistas e com o Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço (FGTS) em relação aos empregados diretamente envolvidos na execução
do contrato, em especial quanto ao:
I - registro de ponto;
II - recibo de pagamento de salários, adicionais, horas extras, repouso semanal remunerado
e décimo terceiro salário;
III - comprovante de depósito do FGTS;
IV - recibo de concessão e pagamento de férias e do respectivo adicional;
V - recibo de quitação de obrigações trabalhistas e previdenciárias dos empregados
dispensados até a data da extinção do contrato;
VI - recibo de pagamento de vale-transporte e vale-alimentação, na forma prevista em
norma coletiva.
No caso dos autos, trata-se de exigência dupla: regularidade fiscal e trabalhista. Assim,
diante da distinção das situações acolhidas pela jurisprudência desta Corte, cumpre negar
provimento ao agravo interno, mas esclarecer que a retenção somente pode incidir sobre
os encargos trabalhistas subsidiariamente garantidos pela administração, no limite de suas
respectivas parcelas, e não do valor global dos pagamentos devidos pelos serviços prestados
ou em relação aos débitos fiscais.777
777
STJ, Segunda Turma. AgInt no AgInt no REsp nº 1.690.994/DF 2017/0192424-0. Rel. Min. Og Fernandes, j. 5.3.2020.
778
“A única crítica inteiramente despida de fundamento, conforme a unanimidade de posições dos órgãos que atuaram
no feito, consiste naquela endereçada à previsão de retenção de pagamentos em caso de não ser comprovada, pela
contratada, durante a execução da avença, o cumprimento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e para com o
Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). 1. Ao menos em análise abstrata, nota-se aderência a parâmetros
de razoabilidade. De fato, a retenção é proporcional ao inadimplemento e permite que a contratada regularize
a situação, em até 15 (quinze) dias. Apenas em caso de não demonstração da conformidade das obrigações, no
referido prazo, procederá a Administração ao pagamento direto em favor dos empregados vinculados ao contrato,
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
975
com a notificação do sindicato pertinente para acompanhar o procedimento. Além disso, verifica-se que a cautela
da Administração encontra amparo no artigo 55, inciso XIII, da Lei Federal nº 8.666/93, que explicita o dever de
manutenção, durante toda a consecução do contrato, das condições de habilitação demandadas na licitação, entre
as quais se insere a regularidade em relação aos encargos previdenciários e de FGTS” (TCE-SP, Tribunal Pleno.
TC-018208.989.20-2. Rel. Cons. Cristiana de Castro Moraes, j. 2.2.2020).
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
976 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
Art. 5º A ordem cronológica de exigibilidade terá como marco inicial, para efeito de inclusão
do crédito na sequência de pagamentos, a liquidação de despesa. [...]
§2º Nos contratos de prestação de serviços com regime de dedicação exclusiva de mão de
obra, a situação de irregularidade no pagamento das verbas trabalhistas, previdenciárias ou
referentes ao FGTS não afeta o ingresso do pagamento na ordem cronológica de exigibilidade,
podendo, nesse caso, a unidade administrativa contratante deduzir parte do pagamento
devido à contratada, limitada a dedução ao valor inadimplido.
§3º Na hipótese de que trata o §2º, a Administração, mediante disposição em edital ou
contrato, pode condicionar a inclusão do crédito na sequência de pagamentos à comprovação
de quitação das obrigações trabalhistas vencidas.
Veja-se que os dispositivos são mais focados na questão da ordem cronológica para
os pagamentos do que na proteção da Administração em face do inadimplemento do
contratado. De toda forma, extrai-se da interpretação conjunta dos supracitados parágrafos
que a situação de irregularidade trabalhista e previdenciária pode ensejar o desconto parcial
dos valores correspondentes no pagamento, sem afetar sua posição na ordem cronológica
(§2º). Ou, desde que previsto em edital ou contrato, a irregularidade pode obstar a inclusão
do crédito na ordem cronológica e, por via de consequência, obstar o pagamento (§3º).
São alternativas que se abrem à Administração. Ambas as alternativas foram postas na
Instrução Normativa como faculdades da Administração, e não como obrigação. Pondera-
se, no entanto, em acordo com os comentários já deduzidos acima em face do inciso II do
§3º do artigo 121 da Lei nº 14.133/2021, que, nos casos de inadimplemento das obrigações
trabalhistas – por consequência, também previdenciárias – diretamente decorrentes do
contrato, a Administração não deve realizar os respectivos pagamentos. Repita-se, nos
casos de inadimplemento das obrigações por parte do contratado e não mera situação de
irregularidade, deve-se considerar que o contratado não cumpriu a sua obrigação, o que
não gera a obrigação da Administração de realizar o pagamento. Não se trata, insista-se, de
retenção ou medida do gênero. Trata-se da não verificação da condição que gera a obrigação
da Administração de pagar. Essas questões, insista-se, devem estar dispostas no edital ou
no contrato, como exige o §3º do artigo 121 da Lei nº 14.133/2021.
16 Remuneração variável
O artigo 144 da Lei nº 14.133/2021 autoriza a previsão no edital e no contrato de
remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões
de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega.
A experiência com remuneração variável na Administração Pública nacional
vem ganhando força especialmente nas contratações de tecnologia da informação e na
terceirização de serviços, áreas em que é corriqueira a previsão do denominado “acordo
de níveis de serviço”, cujo propósito é disciplinar contratualmente a remuneração variável.
O artigo 144 da Lei nº 14.133/2021 autoriza a remuneração variável, que pode ser
formalizada por meio de acordo de níveis de serviço ou não, para todos os contratos,
inclusive obras e serviços de engenharia. A Administração não é obrigada a utilizar a
sistemática de remuneração variável em todos os seus contratos. Ela deve avaliar em quais
contratos a remuneração variável é cabível e pode ser proveitosa.
A remuneração variável somente faz sentido se o nível de satisfação e de utilidade
para o interesse público também puder ser variável. Se não puder, se o interesse público
puder ser atendido de uma maneira apenas, então a Administração não deve prever
remuneração variável. Ou o contrato atende ou não atende, é adimplente ou inadimplente.
Em síntese, a remuneração variável pressupõe que a prestação ao cargo do contratado
também possa ser razoavelmente variável e a variação da prestação impactar o interesse
público.
779
“Quando da prolação do Acórdão 1.214/2013-Plenário, foi levantada questão no sentido de que o procedimento
possa se constituir em prática excessivamente onerosa em confronto com outras formas de fiscalização, tendo em
vista dificuldades para operacionalizar o controle da conta vinculada, especialmente dificuldades no cálculo de
valores a serem liberados, e ações judiciais relativas a outros contratos que bloqueiam os recursos depositados.
Todavia, não houve a formulação de providência específica sobre o assunto. 54. Neste trabalho, a equipe retomou
a questão para argumentar que esse mecanismo deveria ser submetido a avaliação de risco e de custo-benefício
em face de indícios de onerosidade em sua aplicação. Consequentemente, foi proposto recomendar à SLTI que
reavaliasse a obrigação da utilização da conta vinculada, levando em consideração o custo do procedimento e outras
alternativas de fiscalização suscitadas pelo Acórdão 1.214/2013-Plenário (combinação de controles, amostragem,
supervisão, etc.). 55. Em sua manifestação, a SLTI informou que está em processo de revisão o normativo que trata
da contratação dos serviços terceirizados, com avaliação da possibilidade de definir as situações passíveis, ou
não, de adoção da referida conta, em conjunto com a inclusão de requisitos mais rigorosos na qualificação técnica
e econômico-financeira. 56. Segundo avalio, a questão da utilização realmente precisa ser estudada com maior
profundidade. De fato, há indícios de que, em determinadas situações, o procedimento possa se afigurar oneroso.
Todavia, há que se admitir que podem ocorrer outras situações em que o procedimento seja o mais apropriado,
considerando os recursos humanos disponíveis e as condições específicas de cada contratação. De todo modo, não
se pode esquecer que a conta vinculada oferece ao gestor segurança no gerenciamento do contrato, assegurando
que ele não será responsabilizado e a Administração não será onerada, caso a empresa contratada não honre com
suas obrigações trabalhistas. 57. Em vista da intenção da SLTI de revisar as normas a respeito do tema, penso que
se possa alterar a proposta da equipe no sentido de formular recomendação para que a unidade jurisdicionada
elabore estudo de avaliação de custo-benefício e de riscos relacionados à utilização da conta vinculada e, com base
nos resultados obtidos, verifique as possibilidades de manter, ou não, o procedimento e de prever a adoção de
outras formas de controle, como, por exemplo, aquelas suscitadas no Acórdão 1.214/2013-Plenário” (TCU, Plenário.
Acórdão nº 2.328/2015. Rel. Min. Subst. Augusto Sherman Cavalcanti, j. 16.9.2015).
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
978 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
no dever de pagamento pela Administração, será observada a ordem cronológica para cada
fonte diferenciada de recursos, subdividida nas seguintes categorias de contratos:
I - fornecimento de bens;
II - locações;
III - prestação de serviços;
IV - realização de obras.
a Administração deve pagar os contratados de acordo com a ordem cronológica dos seus
créditos, por dedução lógica, noutro lado, os contratados dispõem do direito de que os
pagamentos assim sejam feitos.
Cumpre ressalvar que, de conformidade com o §1º do artigo 141 da Lei nº 14.133/2021,
somente seria permitido à Administração quebrar a ordem cronológica em situações bem
excepcionais:
Seguindo essa exegese, a quebra da ordem cronológica deve ser a única medida capaz de
evitar a lesão ao interesse público. Se outras medidas puderem ser adotadas para evitar
tal lesão, tal quebra já não se justificará. Se outras medidas não forem suficientes, a quebra
deve ser direcionada para favorecer exclusivamente aqueles contratos indispensáveis e não
à generalidade dos contratos da Administração. Ou seja, apenas os contratos essenciais
passariam à frente, não todos os contratos gerais da Administração.
O §2º do artigo 141 adverte que “a inobservância imotivada da ordem cronológica
referida no caput deste artigo ensejará a apuração de responsabilidade do agente responsável,
cabendo aos órgãos de controle a sua fiscalização”. O agente responsável, como está claro
no §1º do artigo 141, é a autoridade competente. O legislador foi intencionalmente enfático
na direção de que o descumprimento não deve ser tolerado pelos órgãos de controle. Diante
dele os órgãos de controle não devem se contentar com meras recomendações. A autoridade
deve ser punida. A conduta é especialmente qualificada, tanto que é tipificada como crime
pelo artigo 337-H do Código Penal.
Acresça-se que a quebra ocorre sempre que o pagamento de crédito posterior precede
o de crédito anterior. Cada pagamento fora da ordem representa uma quebra da ordem
cronológica e demanda o atendimento dos requisitos formais e substanciais estabelecidos
no §1º do artigo 141 da Lei nº 14.133/2021. Ou seja, cada pagamento fora da ordem demanda
uma justificativa específica da autoridade competente e uma comunicação específica ao
controle interno e ao tribunal de contas competente.
Sendo assim, a ocorrência de uma quebra não justifica nem autoriza que a fatura
preterida seja sempre preterida. A fatura preterida mantém o seu lugar na ordem
cronológica e o pagamento de qualquer outra fatura mais antiga do que ela representa nova
quebra da ordem cronológica.
A Lei nº 14.133/2021 não prevê qualquer tipo de condicionante temporal para a
formação da ordem cronológica, mesmo em relação a faturas em aberto de exercícios
anteriores. Se a obrigação do contratado foi liquidada, tendo a Administração reconhecido
o adimplemento dele, a fatura por ele apresentada ingressa na ordem cronológica e o
inadimplemento da Administração prolongado no tempo não a desfaz nem a prejudica,
desde que não se configure decadência ou prescrição. Solução diversa seria contrária à
máxima de que ninguém deve se beneficiar da própria torpeza (nemo auditur propriam
turpitudinem allegans), dado que o inadimplemento prolongado da Administração não pode
ser premiado.
De nada serviria o comando estatuído no caput do artigo 5º da Lei nº 14.133/2021 se
a Administração pudesse subverter a ordem cronológica dos pagamentos sob quaisquer
alegações, impertinentes ou irrelevantes. A quebra da ordem cronológica é medida
extremamente excepcional, em razão do que deve ser fitada de modo restritivo, para
albergar situações fáticas realmente anômalas, inevitáveis, alheias à vontade dos agentes
administrativos, potencialmente causadoras de relevantes prejuízos ao interesse público.
Para facilitar o controle sobre a ordem cronológica, o §3º do artigo 141 preceitua que
“o órgão ou entidade deverá disponibilizar, mensalmente, em seção específica de acesso à
informação em seu sítio na internet, a ordem cronológica de seus pagamentos, bem como
as justificativas que fundamentarem a eventual alteração dessa ordem”. Quer dizer que
cada órgão ou entidade precisa elaborar e dar publicidade, literalmente, a uma lista com a
ordem cronológica para pagamentos em acordo com as categorias de contratos indicadas
no caput do artigo 141. A medida é em prol da transparência e faz com que eventual quebra
de ordem seja identificada de forma objetiva pelos interessados e pelos órgãos de controle.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
982 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
incorrer no tipo penal do artigo 337-H do Código Penal, como adverte o §7º do mesmo
artigo 5º. Para facilitar o controle, o artigo 10 da Instrução Normativa exige que os órgãos e
as entidades administrativas disponibilizem, mensalmente, em seus sites a ordem cronoló
gica de pagamentos e as justificativas para eventuais alterações da ordem. Esses aspectos
apenas reproduzem o que já está contido nos §2º e 3º do artigo 141 da Lei nº 14.133/2021.
A propósito, a ordem cronológica pode ser alterada diante dos casos previstos no
§1º do artigo 141 da Lei nº 14.133/2021, reproduzidos no artigo 9º da Instrução Normativa
nº 77/2022. O parágrafo único prescreve que o prazo para a comunicação ao controle sobre
a alteração da ordem cronológica é de 30 (trinta) dias contados da ocorrência do evento que
motivou a alteração da ordem cronológica de pagamento.
Concordo plenamente com o autor citado quando afirma que qualquer procedimento
administrativo que objetive burlar, protelar, diferir ou escamotear a aplicação do artigo 5º da
Lei nº 14.133/2021 constitui válido motivo para que o interessado recorra ao Judiciário, para
fazer valer o seu direito à ordem cronológica de pagamentos, assegurada pelos princípios
constitucionais da igualdade e da imparcialidade (artigos 5º, II, e 37 da Constituição Federal
e Emenda Constitucional 30/00).780
780
MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas licitações e contratos: licitação, pregão, contratos, concessões, impactos da
Lei de Responsabilidade Fiscal: legislação, doutrina e jurisprudência atualizadas. 9. ed. Belo Horizonte: Del Rey,
2002. p. 128.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
984 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
Com efeito, a questão que se coloca – e que o artigo 5º da Lei nº 14.133/2021 visa assegurar
– é a de ter o contratante um direito público subjetivo de não ser imotivadamente preterido
pelo seu contratante, o Poder Público, no momento de receber aquilo a que faz jus em razão
de um determinado contrato.
Tal direito do contratante decorre, à evidência, dos princípios constitucionais insertos no caput
do artigo 37 da Constituição Federal, em especial o da impessoalidade e o da moralidade,
que, precipuamente, respaldam o direito dos contratantes particulares, impondo ao agente
público o dever de não favorecer quem quer que seja na efetivação dos pagamentos.781
781
MOURÃO, Laís de Almeida. Os contratos administrativos e a observância da ordem cronológica de pagamentos.
Boletim de Licitações e Contratos, v. 14, n. 10, out. 2001. p. 614.
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
985
Dentre os direitos dos credores está o de cobrar a dívida em juízo, quando provado que o
ente público não cumpriu as suas obrigações, pretendendo justificar a sua inadimplência
de forma burocrática.
Observe-se que, no pedido, a empresa não requer o recebimento do seu crédito. Pede apenas
para que seja obedecida a ordem legal de pagamento e que, quando a sua vez chegar, venha
a receber o que lhe é devido.
O acórdão recorrido decidiu a querela pelo comando inserto no artigo 5º da Lei 14.133/2021,
assim redigida:
Artigo 5º Todos os valores, preços e custos utilizados nas licitações terão como expressão
monetária a moeda corrente nacional, ressalvado o disposto no artigo 42 desta Lei, devendo
cada unidade da Administração, no pagamento das obrigações relativas ao fornecimento
de bens, locações, realização de obras e prestação de serviços, obedecer, para cada fonte
diferenciada de recursos, a estrita ordem cronológica das datas de suas exigibilidades, salvo
quando presentes relevantes razões de interesse público e mediante prévia justificativa da
autoridade competente, devidamente publicada.
À luz desse dispositivo, constato que o acórdão recorrido deve ser mantido, porque a
impetrante, por ter a Agravante direito líquido e certo em ver cumprida a ordem de
pagamento estabelecida em lei. Nesse contexto, não pode o credor, titular de dívida mais
recente recebê-lo, preterindo o titular de crédito mais antigo e da mesma natureza.782
782
STJ, Segunda Turma. REsp nº 1.095.777/MG. Rel. Min. Eliana Calmon, j. 1º.9.2009.
783
STF, Plenário. RE nº 573.872. Rel. Min. Edson Fachin, j. 24.5.2017.
JOEL DE MENEZES NIEBUHR
986 LICITAÇÃO PÚBLICA E CONTRATO ADMINISTRATIVO
O ponto é que tais medidas judiciais que se opõem à quebra da ordem cronológica
acabam, de maneira indireta, ainda que não visem à cobrança ou execução, por inibir o
inadimplemento da Administração. Ocorre que, se o crédito de determinado contratado for
o primeiro da fila e se ele obtiver decisão que impeça a Administração de quebrar a ordem
cronológica, ela inevitavelmente, se não conseguir reverter a situação, acabará pagando
o que lhe é devido. Isso porque, em caso contrário, não poderá pagar nenhum outro
contratado, colocando, daí, deliberadamente, em perigo a continuidade de suas atividades
e dos serviços públicos acaso prestados por ela.
Portanto, sob esse enfoque, o reconhecimento de que os contratados têm direito
subjetivo a que os pagamentos sejam realizados na ordem cronológica de suas exigibilidades
revela-se como valioso instrumento para garantir o adimplemento da Administração,
conferindo certa margem de segurança jurídica, benéfica a todas as partes envolvidas na
relação contratual e, especialmente, ao interesse público.
Agregue-se que os pedidos formulados por contratados de que se proíba à
Administração realizar pagamentos fora da ordem cronológica de exigibilidade de seus
créditos não causam qualquer sorte de prejuízo ao interesse público. Se houver prejuízo,
ele será causado pela inadimplência da Administração, não pelos direitos dos contratados.
A desídia da Administração, o pouco caso dela com o Estado de Direito e a arbitrariedade
de muitos gestores públicos é que poderão causar prejuízo.
Outrossim, como destacado no tópico antecedente, a Administração somente
está autorizada a realizar pagamentos em desacordo com a ordem cronológica de suas
exigibilidades em situações verdadeiramente excepcionais, fartamente amparadas no
interesse público e desde que providencie a publicação das justificativas pertinentes antes
de efetuar o pagamento.
Em vista disso, a defesa da Administração em ações que visem a obrigá-la a não fazer
pagamentos fora da ordem cronológica de exigibilidade dos créditos é bastante limitada.
Vislumbram-se somente duas linhas de defesa. Por ordem, a seguir.
A primeira consiste em comprovar que os pagamentos não foram realizados na
ordem cronológica de exigibilidade dos créditos em decorrência de razão de interesse
público, devidamente justificado, consoante prevê o §1º do artigo 141 da Lei nº 14.133/2021.
Por óbvio, a justificativa deve ser anterior à data do pagamento que quebrou ou quebra a
ordem cronológica de exigibilidade dos créditos.
A segunda linha de defesa consubstancia-se na alegação de que o crédito pleiteado
pelo contratado-autor não é exigível. Ou seja, que ele não adimpliu a sua obrigação, em
virtude do que não poderia exigir que a Administração tivesse adimplido a sua, com base
na exceção do contrato não cumprido.
No entanto, pondera-se que, se o objeto do contrato foi liquidado pela Administração,
então não cabe a ela apoiar-se em tal alegação, que, de pronto, se desenhará temerária.
Ora, se a Administração recebeu os objetos contratados e não providenciou a devolução
imediata ou a notificação dos contratados para retirarem suas mercadorias ou desfazerem
os serviços prestados, é porque eles cumpriram com as suas obrigações e, por via de
consequência, o crédito é, a rigor, exigível.
Repita-se que o direito subjetivo dos contratados de que os pagamentos sejam feitos
na ordem cronológica perdura para além do exercício orçamentário. Isto é, o direito subjetivo
perdura, ainda que eventualmente o crédito de dado contratado não tenha sido quitado
até o final do exercício correspondente. Dessa sorte, os contratados pela Administração que
CAPÍTULO 19
EXECUÇÃO CONTRATUAL
987