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O "Mundo de Aventura" Do Artista:: Silvéria Da Conceição Ramos Miranda

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F AC U L D A D E D E LE T R A S

UNIVERSIDADE DO PORTO

Silvéria da Conceição Ramos Miranda

2º Ciclo de Estudos em Sociologia

O “mundo de aventura” do artista:


entre as autorepresentações artísticas e as heterorepresentações
mediáticas

2012

Orientador: Professora Doutora Natália Maria Azevedo Casqueira

Classificação: Ciclo de estudos:

Dissertação/relatório/Projeto/IPP:

Versão definitiva
«The “Earth” without “art” is just “eh”.»

Autor desconhecido

III
IV
NOTA PRÉVIA

O presente trabalho de investigação foi redigido segundo o Acordo Ortográfico da


Língua Portuguesa, atualmente em vigor. Contudo, todas as citações utilizadas que não foram
escritas em conformidade com o mesmo foram transcritas na sua forma original. O mesmo
acontece com os dados recolhidos e por nós analisados (suplemento Ípsilon e entrevistas via
e-mail), cuja grafia é da inteira responsabilidade dos seus autores.

V
VI
RESUMO

O presente trabalho de investigação, realizado no âmbito do Mestrado em Sociologia


da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, visa analisar as representações das artes e
dos artistas, quer do ponto de vista da imprensa, quer do ponto de vista dos próprios sujeitos
artísticos.
Fatores como a terciarização, a expansão da escolarização e a urbanização têm vindo a
alterar o mundo cultural e a estrutura dos consumos em geral. No caso do consumo cultural,
temos assistido a um maior investimento no setor, o que leva a uma maior aproximação do
cidadão comum às artes, dando lugar à diversificação dos gostos e das escolhas culturais. Por
outro lado, no que diz respeito à informação, estudos revelam que os conteúdos veiculados
pelos meios de comunicação social influenciam o imaginário coletivo. Assim, procuramos
analisar tanto o papel dos media enquanto (re)produtores de representações sobre as artes e os
artistas, como as autorepresentações dos artistas no mesmo sentido.
Para alcançar os objetivos a que nos propusemos, recorremos, no âmbito de um estudo
de caso, às técnicas de análise documental, análise de conteúdo do suplemento Ípsilon (2011)
e entrevistas semidiretivas a estudantes finalistas da Faculdade de Belas Artes da
Universidade do Porto (2011/2012).
Este trabalho mostra que as artes tendem a ser notícia quando é reconhecida a
qualidade da obra e do artista que a criou e que a criação está associada à inspiração, à
experimentação e à criatividade. A obra é o reflexo do artista, que por sua vez é interventivo e
irónico.

Palavras-chave: artes, artista, autorepresentações, comunicação social, heterorepresentações,


representações sociais

VII
ABSTRACT

The present research work, performed under the Master’s Degree in Sociology at
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, seeks to analyze arts and artist representations,
both from the point of view of the press, and from the point of view of the artistic subjects.
Factors such as tertiarization, schooling expansion and urbanization have been
changing the cultural world and the expenditure structure in general. Regarding cultural
expenditure, we have witnessed a larger investment in the sector, which leads to a closer
approach of the common citizen to arts, giving way to a diversification of taste and cultural
choices. On the other hand, on what regards to information, studies reveal that the contents
conveyed by the media influence the collective imaginary. Thus, we seek to characterize the
role of the media as representation propagators about the arts and the artists, as well as self-
representations of the artists in the same direction.
To achieve the goals that we’ve set ourselves, within a case study, we’ve used a few
techniques, such as documental analysis, content analysis of the supplement Ipsilon (2011)
and as semi-directive interview of Faculdade de Belas Artes da Unversidade do Porto’s
finalists in 2011/2012.
This research work shows that arts tend to be news when it’s recognized the quality of
the work of art and the quality of the artist that created it and that the creation process is
associated to inspiration, experimentation and creativity. The work of art is the reflexion of
the artist, who in turn is interventionist and ironic.

Keywords: artist, arts, heterorepresentations, media, self-representations, social


representations

VIII
RÉSUMÉ

Celui-ci est un travail d’investigation, réalisé au contexte du Maîtrise en Sociologie de


la Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Ce travail aspire à analyser des
représentations de l’art et des artistes, du point de vue de la presse, mais aussi do point de vue
des individus artistiques.
Il y a des facteurs comme la tertiairisation, l’expansion de la scolarisation et
l’urbanisation qui ont modifié le monde culturel et l’organisation de la consommation. Dans
le cas de la consommation culturel, nous sommes témoins d’un plus grand investissement
dans le secteur. Cette est une réalité qui permet une meilleur rapprochement au citoyen et qui
mise en place la diversité des goûts et de la choix culturel. En revanche, dans le concernant à
l’information, il y a des études qui révèlent qui les contenus véhiculés par les médias
influencent l’imaginaire collectif. Ainsi, nous avons cherché d’analyser le rôle des médias –
(re)producteurs des représentations – sur les arts et les artistes et des autoreprésentations des
artistes dans la même direction.
Pour atteindre des objectives proposés, nous avons recouru, dans le contexte d'une
étude de cas, à l’analyse documentaire, à l’analyse de contenu du supplément Ípsilon (2011)
et des entrevues demi-directives avec l’étudiants finalistes de la Faculdade de Belas Artes da
Universidade do Porto (2011/2012).
Ce travail montre qui l’art a tendance à être nouvelle quand la qualité de l’œuvre et
d’artiste créateur est reconnue et quand on reconnait que la création s’allie à l’inspiration, à
l’expérimentation et à la créativité. L’œuvre est le reflet de l’artiste qui, en revanche, est
interventif et ironique.

Mots-clés: artistes, autoreprésentations, heteroreprésentations, l’art, médias, représentations


sociaux

IX
X
AGRADECIMENTOS

A vida de uma obra, seja ela de que cariz for, passa por diversas etapas. A ideia que
serviu de mote à realização desta em particular surgiu da vontade de conciliar os
conhecimentos adquiridos no Mestrado em Sociologia da Faculdade de Letras da
Universidade do Porto com os adquiridos anteriormente na Licenciatura em Ciências da
Comunicação (variante Informação e Jornalismo) da Universidade do Minho. Todo o
percurso que me levou até esta criação não teria sido possível sem o apoio dos patrocinadores
incondicionais: os meus pais. A eles agradeço os sacrifícios que sempre fizeram para que
conseguisse alcançar as minhas ambições, seguir as minhas escolhas e viver com as
consequências, boas e más. Ser mãe/pai é isso mesmo, para além de ser uma inesgotável e
incondicional fonte de amor e apoio.
Esta obra também não teria sido possível sem a ajuda, muitas vezes inconsciente, até
mesmo em pequenos pormenores, da minha querida orientadora (no verdadeiro sentido da
palavra!), a Professora Doutora Natália Azevedo, que me transmitiu os ensinamentos
necessários para que esta obra surgisse e crescesse, aquela que mostrou sempre tanto interesse
neste trabalho quanto eu. Agradeço-lhe o tempo e a dedicação que ofereceu a este projeto e o
facto de acreditar nas minhas capacidades. Parte do meu entusiasmo deveu-se a essa
confiança que foi depositando em mim. Agradeço, igualmente, ao Professor Doutor Carlos
Gonçalves, o primeiro a acreditar no meu trabalho e em mim, e agradeço aos meus
professores na Universidade do Minho, que fomentaram em mim o gosto pela investigação
dos media para além deles. Ser professor é uma das mais importantes profissões do mundo,
qui ça a mais importante!
Ao meu Ruben, responsável pela mediação entre os meus desejos e as minhas
possibilidades, um obrigada será sempre pouco para agradecer a atenção e até devoção com
que me acompanhou desde o primeiro minuto. Sem ele, sem as suas questões pertinentes, sem
as suas opiniões contrárias às minhas, sem a sua atenção e paciência, esta obra estaria
certamente mais longe de atingir os seus objetivos. Um sócio na e para a vida, acima de tudo!
Não poderia nunca esquecer os meus verdadeiros companheiros de jornada
sociológica: Andreia Costa, Mafalda Gomes e Rafaela Teixeira, aquelas que lançam as
gargalhadas mais potentes e contagiantes que eu alguma vez (ou)vi, sendo ao mesmo tempo
reativas, racionais e inteligentes; Marcos Ferreira, que me ensinou a rir das nossas próprias
desgraças e que tem uma visão muito característica da sociedade atual e Flávio Fonseca e
Gabriela Teixeira, sempre os elementos estabilizadores do grupo. Dividimos anseios,
XI
preocupações, dúvidas, certezas e opiniões e nunca esquecerei a forma como me acolheram
nesta casa, que passou a ser minha também. Espero que essa partilha se mantenha daqui em
diante, de preferência acompanhada de bons jantares e enormes gargalhadas!
Agradeço também ao Paulo Franco e ao Pedro Barbosa, com quem descobri a FLUP
em finais de 2010.
E como um bom filho nunca abandona a casa-mãe e as suas raízes, um obrigada aos
meus amigos minhotos, em particular à Irmandade, por, embora longe, alimentarem sempre o
meu amor pela comunicação e também a todos os familiares e amigos que sempre se
preocuparam com o meu percurso académico no geral, perguntando “Como vão as coisas?”,
embora não dominem essas “coisas”. São eles os primos Silvério, Sandra, Marco, Mónica,
Marta, Jorge, Filipa e Carla, as tias Maria, Cila, Marcília e Mélia, os sempre amigos Ricardo e
Alberto, a Yolanda, as surpreendentes Patrícia Ramos e Gabriela Phalempin, as afilhadas
Adriana e Joana e todos aqueles que ficam verdadeiramente felizes com as minhas conquistas
e/ou de alguma forma se mostraram interessados pela temática em estudo.
À Letícia, ao Diogo, à Matilde e à Maria, que despertam em mim o meu lado mais
simples e natural graças às suas brincadeiras e cantorias, agradeço com uma beijoca
repenicada na próxima vez que cantarmos o “Atirei o pau ao gato”!
Não posso também esquecer-me de todos aqueles que me ajudaram nos primeiros
contactos com os entrevistados: Gil Silva, Inês Mata e Sérgio Pimenta. Agradeço, ainda, à
Inês Sousa e à Diana Cunha pelos conhecimentos partilhados e à Rita Carneiro e à Marta
Eusébio Barbosa pela ajuda com o francês e pela sincera amizade.
Finalmente, e como não poderia deixar de ser, um obrigado especial às minhas fontes
de inspiração: os artistas. Eles, principalmente aqueles que gentilmente aceitaram ser
entrevistados, serão sempre por mim respeitados e admirados. Embora permaneçam anónimos
nestas páginas, o seu trabalho será sempre por mim acompanhado, não só por uma questão de
gratidão, mas porque o merecem realmente, pela qualidade que demonstram. Aprendi com
todos um pouco, partilhamos saberes e experiências, e a troca de pontos de vista diferentes
atrevo-me a dizer que enriqueceu ambas as partes. Obrigada, sobretudo, pelo interesse que
continuaram a demonstrar por este trabalho até mesmo nos momentos pós-entrevista. Talento,
dedicação, sensibilidade, empenho e muito treino e trabalho fazem parte de todos eles e
fazem-nos ver que todo o ser humano é um conjunto de pequenas coisas que o tornam tão
especial.
Por fim, a todas as pessoas referidas, resta-me dizer que permanecerão comigo ao
longo dos tempos como parte da obra que agora termino.
XII
ÍNDICE

ÍNDICE DE QUADROS ........................................................................................................ XV

ÍNDICE DE FIGURAS ......................................................................................................... XVI

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS .......................................................................... XVII

INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 1

CAPÍTULO I – Entre o campo artístico e o campo mediático: contornos teóricos de uma


relação ....................................................................................................... 5
1.1. As artes e os artistas: definição e contextualização ......................................................... 5
1.1.1. A arte como conceito histórico e sociológico ........................................................... 5
1.1.2. As representações da figura do artista: contexto social e profissional ao longo dos
tempos ............................................................................................................................... 16
1.2. Abordagem sociopsicológica das representações sociais .............................................. 31
1.3. Do discurso mediático à difusão de significados: o caso das artes ............................... 37

CAPÍTULO II – As representações sobre as artes: enquadramento do problema, modelo


analítico e procedimentos metodológicos ............................................................. 47
2.1. As artes enquanto objeto de estudo: problema científico e modelo de análise ............. 47
2.2. Procedimentos metodológicos no estudo das representações do campo artístico ......... 50
2.3. Considerações sobre o percurso da pesquisa: contrariedades encontradas e estratégias
de resolução .......................................................................................................................... 58

CAPÍTULO III – Da criação à receção das obras de arte: entre as autorepresentações dos
estudantes da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e as heterorepresentações
do suplemento Ípsilon .................................................................................... 61
3.1. Critérios de noticiabilidade e características do discurso sobre as artes ....................... 61
3.2. A visibilidade das artes nos media: atores envolvidos e localização dos acontecimentos
noticiados .............................................................................................................................. 64
3.3. Instâncias legitimadoras no campo artístico .................................................................. 70
3.4. Dos processos de criação aos processos de receção das obras de arte .......................... 72
3.5. Auto e heterorepresentações do “mundo de aventura” do artista .................................. 78

XIII
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 91

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 99


Monografias .......................................................................................................................... 99
Artigos e contribuições em monografias ............................................................................ 102
Documentos estatísticos e relatórios científicos e técnicos ................................................ 109
Documentos legislativos e judiciais ................................................................................... 110
Sites oficiais consultados [2011-2012] ............................................................................... 110

ANEXOS ................................................................................................ 111


Anexo 2A. Grelha de análise de conteúdo e respetivo manual .......................................... 113
Anexo 2B. Guião de entrevista ........................................................................................... 119
Anexo 2C. Categorias de análise temática ......................................................................... 123
Anexo 2D. Grelha de análise vertical das entrevistas semidiretivas .................................. 125
Anexo 2E. Grelha de análise horizontal das entrevistas semidiretivas .............................. 171
Anexo 3A. Ípsilon – Localização dos acontecimentos noticiados ..................................... 207
Anexo 3B. Ípsilon – Fontes citadas .................................................................................... 209
Anexo 3C. Ípsilon – Autoria por ramo artístico (ou outro) ................................................ 211
Anexo 3D. As representações da obra no Ípsilon ............................................................... 213
Anexo 3E. As representações do artista no Ípsilon ............................................................ 219

XIV
ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1.1. Cinema, música, dança e variedades, ópera e teatro: sessões e espetadores entre
2000 e 2010 ................................................................................................ 13
Quadro 1.2. Galerias de arte e outros espaços de exposição temporária: número de
equipamentos culturais, visitantes, exposições e obras expostas entre 2000 e 2011 ............ 14
Quadro 1.3. Despesas de consumo final das famílias por tipo de bens e serviços, em
percentagem ............................................................................................... 14
Quadro 1.4. Despesa das Câmaras Municipais em cultura e desporto: total e por domínio
cultural, em euros ......................................................................................... 15
Quadro 1.5. Classificação Portuguesa das Profissões 2010 (profissões artísticas) .............. 23
Quadro 1.6. Alunos inscritos e diplomados no ensino superior, em Portugal, por áreas de
estudo culturais e criativas, em 2010 .................................................................. 25
Quadro 1.7. População empregada nas atividades culturais e criativas, por nível de
escolaridade completo, em 2010 ....................................................................... 25
Quadro 1.8. Escritores e artistas criativos empregados na Europa em 2004 e 2009 e estudantes
do ensino superior em cursos artísticos em 2007/2008 ............................................. 27
Quadro 2.1. Caracterização do corpus de análise (Ípsilon, 2011) ................................. 53
Quadro 2.2. Caracterização dos entrevistados (FBAUP) ........................................... 57
Quadro 3.1. Ípsilon – Ramo artístico (ou outro) representado ..................................... 61
Quadro 3.2. Ípsilon – Valores-notícia ................................................................. 62
Quadro 3.3. Ípsilon: Características do discurso ..................................................... 64
Quadro 3.4. Ípsilon – Dimensão do espaço ocupado ................................................ 65
Quadro 3.5. Ípsilon – Capa de cada edição ........................................................... 66
Quadro 3.6. Ípsilon – Número de imagens por artigo ............................................... 66
Quadro 3.7. Ípsilon – Atores nas imagens ............................................................ 67
Quadro 3.8. Ípsilon – Localização dos acontecimentos noticiados ................................ 68
Quadro 3.9. Ípsilon – Número de fontes por artigo .................................................. 70
Quadro 3.10. Ípsilon – Fontes citadas ................................................................. 71
Quadro 3.11. Ípsilon – As representações da obra de arte .......................................... 73
Quadro 3.12. Ípsilon – As representações do artista ................................................. 79
Quadro 3.13. Ípsilon – Sexo dos artistas representados ............................................. 80

XV
ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 2.1. Modelo de análise .......................................................................... 48


Figura 3.1. Ípsilon – Eventos noticiados ocorridos em Portugal, em 2011....................... 69

XVI
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CPP-1994 – Classificação Portuguesa das Profissões 1994


CPP-2010 – Classificação Portuguesa das Profissões 2010
FBAUP – Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto
INE – Instituto Nacional de Estatística
UE – União Europeia
UE27 – União Europeia constituída por 27 Estados-membros

XVII
O “mundo de aventura” do artista

INTRODUÇÃO

A presente dissertação, intitulada «O “mundo de aventura” do artista: entre as


autorepresentações artísticas e as heterorepresentações mediáticas», insere-se no âmbito do
Mestrado em Sociologia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, sob orientação da
Professora Doutora Natália Azevedo.
O estudo aqui apresentado teve como principais objetivos analisar as representações
sobre as artes e sobre os artistas presentes na comunicação social, mais concretamente no
suplemento Ípsilon, e também recolher os significados sobre o objeto de estudo partilhados
pelos próprios atores artísticos, neste caso os estudantes finalistas da Faculdade de Belas
Artes da Universidade do Porto (FBAUP) em 2011/2012.
Em Portugal, alguns aspetos como a terciarização e a feminização do mundo do
trabalho, a expansão da escolarização e a urbanização contribuíram para as alterações mais
específicas no mundo cultural e na estrutura dos consumos em geral, dando assim lugar a uma
diversificação dos gostos e das escolhas culturais (Santos, 1998). Entre 2000 e 2010
assistimos, por um lado, ao aumento generalizado da oferta cultural (ao nível dos eventos e
das infraestruturas), bem como ao aumento das despesas correntes com cultura e desporto por
parte dos municípios. Por outro lado, durante o mesmo período, verificamos a tendência para
a diminuição do peso do lazer, da recreação e da cultura nos orçamentos das famílias
portuguesas e, em 2011, assistimos à extinção do Ministério da Cultura, passando esta a
Secretaria de Estado, o que foi visto como uma “certidão de óbito” passada ao setor (Carrilho,
2011).
Por outro lado, a comunicação social assume um importante papel enquanto instância
legitimadora no campo artístico: tanto é mediadora entre os artistas e os seus públicos como
difusora e distribuidora de conhecimentos sobre os vários atores do setor. Além de dizerem
sobre o que falar e como falar, os media transformam as informações em linguagem acessível
e, no caso das artes, eles vão mais além, pois dão visibilidade aos artistas, às suas obras e aos
eventos artísticos, cativando a atenção dos seus consumidores para o que se faz na área.
Neste sentido, quais são as representações sobre as artes e os artistas avançadas por
parte dos artistas entrevistados e da imprensa em estudo? Esta é a questão de partida que
organiza todo o presente trabalho de investigação, que visa identificar os vários significados
associados às artes e aos seus criadores.

1
O “mundo de aventura” do artista

A resposta a esta questão passou, sobretudo, por dois intervenientes: o Ípsilon, aqui
representando a comunicação social, e os estudantes finalistas da Faculdade de Belas Artes da
Universidade do Porto, aqui representando os artistas. Assim, do lado do órgão de
comunicação social em análise, procurou-se identificar as áreas artísticas representadas, os
tipos de discurso existentes, os atores presentes nas imagens e nos discursos citados, a
localização dos eventos noticiados, as características e ideias associadas ao artista e às obras
de arte e os valores-notícia que levam à presença das artes nos media. Do lado dos sujeitos
entrevistados, procurou-se conhecer os motivos que os levaram a enveredar por uma carreira
artística e por uma formação especializada na área, os significados que estes partilham sobre
as artes e sobre os artistas e a avaliação que fazem da relação entre as artes e os media. Esta
análise fez-se em quatro dimensões:
- a dimensão Entrada no mundo das artes, que procura averiguar o percurso dos
artistas, desde a sua infância, à relação das famílias com o mundo das artes e os hábitos
culturais das mesmas, passando pela reação das famílias e amigos aquando da escolha das
artes como profissão, bem como a autolegitimação dos entrevistados enquanto artistas;
- a dimensão Escolaridade, formação e profissão, que se centra na avaliação do ensino
artístico em Portugal e da importância da formação artística especializada, não descurando as
expetativas profissionais dos entrevistados;
- a dimensão Auto e heterodefinição de arte e de artista, onde se recolheram as
representações dos entrevistados e as representações que os entrevistados atribuem à
sociedade sobre as obras de arte (da criação à receção), sobre os seus pares e as várias etapas
das suas vidas;
- a dimensão Artes, artistas e media, onde se recolheu as conceções dos entrevistados
sobre a relação artes-media, nomeadamente sobre as suas vantagens e desvantagens, a
visibilidade das artes nacionais, dos artistas e das obras nos meios de comunicação social.
Deste modo, verificando-se as contrariedades que o setor artístico atravessa e o poder
dos media na mediação entre a produção e a receção das obras de arte e enquanto instância
legitimadora das mesmas, este estudo tem como objetivo principal perceber que visão é essa
que os meios de comunicação social, tão importantes na formação do imaginário coletivo, dão
do setor artístico. Temos noção que este é apenas um pequeno contributo para o estudo das
artes, mas procuramos, com este trabalho, chamar a atenção para a necessidade de investigar a
arte em geral e, porque não, ramos artísticos em particular, dando voz aos “alvos” de
representações, os artistas. Estudos semelhantes por nós consultados (Gomes, 2012; Marôpo,
2011) que versam sobre objetos de representações difíceis de alcançar (como as crianças ou
2
O “mundo de aventura” do artista

os doentes), optam apenas pelo estudo das representações apontadas pelos media. No nosso
caso, e já que os nossos objetos de representações são de fácil acesso, optamos por “dar voz”
aos artistas por intermédio dos finalistas da FBAUP.
Estando explicitadas as principais linhas orientadoras do nosso trabalho de
investigação, importa agora descrever a sua estrutura formal.
No capítulo I, procuramos explorar os conceitos teóricos subjacentes ao nosso objeto
de estudo. Para isso, começamos com uma abordagem da arte ao longo dos tempos e suas
definições, definições essas que variam de acordo com a área científica que a pretende
estudar. Também abordamos a evolução do papel social e profissional do artista e os
significados comummente partilhados sobre ele. Não descuidamos, igualmente, a clarificação
do conceito de representação social, nem a importância dos meios de comunicação social
como (re)produtores dessas representações.
O capítulo II tem como finalidade apresentar o nosso objeto de pesquisa e o seu
modelo analítico e clarificar as opções metodológicas por nós tomadas. É aqui que
explicamos as razões que nos levaram a optar pelas técnicas de análise documental, análise de
conteúdo e entrevista e onde apontamos as dificuldades encontradas na sua aplicação, bem
como as estratégias de resolução encontradas.
A apresentação e discussão dos resultados por nós alcançados encontram-se no
capítulo III, que tem como principal objetivo identificar as representações sobre as artes e os
artistas presentes nas edições selecionadas de 2011 do suplemento Ípsilon, bem como os
significados partilhados pelos estudantes finalistas de 2011/2012 da FBAUP. É aqui que
procuramos analisar, em paralelo, as visões dos media e dos artistas sobre um conjunto de
pontos, a saber: a definição de arte e de artista, as instâncias de legitimação no campo
artístico, os critérios de noticiabilidade das artes e a visibilidade das artes e dos seus atores
nos media.
O trajeto de investigação por nós seguido permitiu-nos apresentar as considerações
finais, onde fazemos uma reflexão sobre o percurso percorrido, algumas recomendações e o
lançamento de novas pistas de análise.
Posteriormente, apresentamos as referências bibliográficas por nós consultadas ao
longo de todo o trabalho (monografias, artigos científicos, relatórios técnicos, legislação e
sites) que vão de encontro ao nosso objeto de estudo e aos conceitos a ele subjacentes.
Por fim, encontram-se os anexos que vão sendo devidamente referenciados ao longo
de toda a nossa dissertação.

3
O “mundo de aventura” do artista

4
O “mundo de aventura” do artista

CAPÍTULO I

Entre o campo artístico e o campo mediático: contornos teóricos de uma relação

1.1. As artes e os artistas: definição e contextualização


1.1.1. A arte como conceito histórico e sociológico
Criada pelo Homem, a arte acompanha o seu desenvolvimento e retrata as épocas
históricas, culturais e sociais em que este se insere. Recorrendo a vários materiais e querendo
transmitir diversas mensagens, a arte pode ser estudada segundo as perspetivas da estética, da
história da arte e até mesmo da sociologia da arte. Nesta investigação, que tem como objeto
de estudo as artes e as suas representações1, é indispensável começar por defini-la, sobretudo
na perspetiva das ciências sociais, âmbito em que esta pesquisa se insere. Contudo, é de
referir que não existe uma definição consensual ou neutra deste conceito, uma vez que não há
uma fórmula que permita distinguir claramente os objetos artísticos dos não artísticos (Inglis,
2005, p.12).
Do ponto de vista da estética, Huisman liga a arte ao artificial, embora muitas
definições apontem a arte como o resultado de habilidades manuais (pintura), da manipulação
intelectual (retórica) ou da expressão em público (teatro) (1994). Para o autor, ela possui
como funções adornar, embelezar, ilustrar e registar e provoca êxtase e alegria (Ibidem). Já
para Poussin, estamos perante uma obra de arte quando esta nos causa deleite (cit. por
Friedlander, 2001, p.19).
Segundo Venturi, “compete à estética encontrar o atributo comum que faz com que as
obras da poesia, pintura, escultura, música, etc. devam ser consideradas obras de arte” (1998,
p. 19), efetuando essa procura através da observação ou da introspeção. A imaginação é a
responsável pela produção dessas obras, para além das sensações e sentimentos do criador
(1998). Porém, para Venturi, o artista não pode ficar imerso na sua experiência sentimental,
senão não criará arte. A arte resulta de momentos de inspiração e vários elementos podem
inspirá-lo. Uma obra copiada ou inventada não é arte (Ibidem).

1
Ao longo da História, as artes e os seus criadores foram associados a uma série de representações sociais. Isto
é, desde sempre o campo artístico foi ligado a um conjunto de significados partilhados por um grupo de
indivíduos, significados esses que, além de serem coletivamente produzidos, organizam as relações dentro do
grupo onde foram criados (Ordaz; Vala, 1997, p. 848). Esses significados orientam as condutas dos indivíduos
(Spink, 1993, p.306), influenciam-nos e dependem do contexto histórico, social e cultural em que se inserem
(Moscovici, 2003). Nesta investigação, as representações sociais sobre o nosso objeto de estudo – as artes e os
artistas – percorrem todo o trabalho. A este propósito, ver também 1.2. Abordagem sociopsicológica das
representações sociais, onde o conceito de representações sociais é mais explorado.
5
O “mundo de aventura” do artista

O filósofo Graham aponta três dimensões na definição da arte: arte e prazer, arte e
emoção e arte e compreensão (2001). No primeiro caso, argumenta que o valor da arte está
necessariamente ligado ao prazer, ao deleite e à fruição. Na segunda dimensão, considera que
a emoção é central na arte, tanto a que o artista sente como a que cria junto dos públicos. Por
fim, na última dimensão defende que a arte não tem menor valor que as ciências, pois também
ela é produtora de conhecimento e compreensão, retratando, como defende a sociologia, a
época em que vivemos (Ibidem).
Hauser evidencia a relação entre arte e ciência: a arte também é fonte de conhecimento
e é um complemento do que as ciências exatas descobrem (1973). A arte chega mesmo a
intervir onde a ciência falha, ela alarga o saber dos indivíduos e começa quando a ciência se
afasta (embora não existam tensões entre elas). Porém, se a ciência pode comunicar o que
sabe, o artista nem sempre consegue exprimir totalmente a sua experiência. As formas
artísticas não se contrariam umas às outras, ao contrário de algumas teorias científicas
(Ibidem). As obras de arte não podem ser repetidas nem obedecem a uma certa periodicidade
como os fenómenos naturais, elas são “historicamente singulares” (Ibidem, p.80).
A sociologia da arte teve origem no século XIX, embora não tenha adquirido essa
designação nessa altura por uma questão de pertença epistemológica e de quadros técnicos de
origem (Heinich, 2004). Na sua base estão os contributos de autores como Durkheim (que
referia que a arte está ligada à ciência), Max Weber (que defendia que as diferenças entre
estilos musicais decorrem da racionalização e dos recursos técnicos disponíveis), Simmel (que
se questionou sobre o condicionamento social da arte e os efeitos das visões dos artistas sobre
as obras que produzem), Kris e Kurz (que referiram o dom inato do artista, a sua vocação
precoce, a sua virtuosidade técnica e o seu heroísmo, o que torna a obra mágica, sobrenatural
e bela) e Panofsky (que defendia a interdependência entre a obra de arte e a cultura em que
esta surge) (cit. por Heinich, 2004).
Posteriormente, naquela a que Heinich considera ser a primeira geração da sociologia
da arte (primeira metade do século XX), tornou-se clara a relação entre a disciplina e a
filosofia, a estética e a história da arte da altura (2004). Os discursos produzidos na época
eram especulativos, reflexivos, mas a abordagem adotada centrava-se mais nas obras. Já na
segunda geração (por volta da II Guerra Mundial), a sociologia da arte assumiu uma
componente empírica de caráter mais documental e a abordagem feita centrava-se mais nos
contextos, uma vez que se partia do pressuposto que a arte fazia parte da sociedade. Por fim, a
terceira geração (1950 em diante) procura uma abordagem mais extensiva e valoriza as
abordagens técnicas. Aqui, o processo artístico é entendido como um todo, incluindo
6
O “mundo de aventura” do artista

interlocutores que até agora não eram incluídos: mediadores e públicos, não sendo possível
olhar para eles separadamente. Ou seja, procuram-se regularidades subjacentes às ações, aos
objetos, aos atores, às instituições e às representações do campo artístico (Heinich, 2004).
Embora sendo uma disciplina herdeira da história da arte (que trata as relações entre os
artistas e as obras de arte) e da estética (que trata as relações entre os espetadores e as obras),
“a sociologia da arte sofre com a sua juventude e com a multiplicidade de significados,
reflectindo a diversidade de definições e práticas da sociologia”2 (Heinich, 2004, p.5).
Aproximando-se das abordagens da psicologia social e da sociologia da inquirição, a
sociologia da arte estuda a relação entre a arte e a sociedade e, além de demonstrar alguma
heterogeneidade, visa colmatar as falhas dos ramos do saber que, embora estudem a mesma
relação, estão sujeitos a constrangimentos (Heinich, 2004).
Neste seguimento, surge o conceito de heteronomia que significa que a disciplina em
si privilegia dimensões mais estruturais do funcionamento das sociedades que estão na base
da produção do objeto artístico e que não têm a ver em estrito senso com a criatividade. Isto é,
a sociologia da arte privilegia a causalidade externa da própria arte e estuda a produção,
divulgação, distribuição, legitimação, mediação e receção das obras de arte. Além disso, tem
em conta a polissemia da obra de arte, ou seja, defende que há gostos que mudam e gostos
que permanecem em função da pluralidade de receções possíveis (Ibidem).
A criação artística depende, segundo Goldstein, do contexto histórico e social, mas
também da criatividade e subjetividade do artista (sujeito principal desta etapa) (2008). Já
para Becker, a criação artística é um largo processo que envolve não só a própria elaboração
da mesma, como outros fatores (a compra dos materiais, por exemplo) (1984). Para Abraham,
o criador molda o seu público e este, por sua vez, impõe-lhe os seus gostos e desejos, num
“perpétuo diálogo” e numa relação de duplo sentido (cit. por Bastide, 2006, p.297). A criação
depende da receção, sendo frequentemente coletiva e não individual (Inglis, 2005, p.18).
Relativamente à criação de uma obra de arte, Walter Benjamin defende que, em épocas
anteriores, esta era considerada única e detentora de uma aura própria (1992). Porém,
atualmente, as inovações tecnológicas e a capacidade de criação de infinitas cópias dificultam
essa unicidade, mas lançam novas hipóteses no campo artístico, nomeadamente a
possibilidade de as obras chegarem até mais pessoas, num acesso democrático (o melhor
exemplo é o caso da fotografia, ilimitadamente reprodutível, sem perder as suas

2
Tradução do original: “la sociologia de l'art pâtit à la fois de sa jeunesse et de la multiplicité de ses acceptions,
reflétant la pluralité des définitions et des pratiques de la sociologie” (Heinich, 2004, p.5).
7
O “mundo de aventura” do artista

características originais). Portanto, as obras tornam-se mais próximas, mas mais banais.
Estamos naquilo a que o autor chamou “a era da reprodutibilidade técnica” (Benjamin, 1992).
Já quanto à receção, esta diz respeito à forma como a obra de arte e o trabalho do artista
são apreendidos pelo público, por parte de quem existe reciprocidade e comunicação. O
público é polissémico, mutável e integrável ou não em redes culturais (Santos, 2007, p.281) e
“varia de contexto para contexto, de instituição para instituição, de «mundo da cultura» para
«mundo da cultura»” (Lopes; Aibéo, 2005, p.81). Auto-organização, mobilização cognitiva,
abertura à polémica e interpelação pessoal e impessoal são algumas das características que
Warner aponta como fundamentais da constituição dos públicos (cit. por Lopes; Aibéo, 2005).
Dada a sua heterogeneidade, aliás, faz sentido a designação “públicos” (Santos, 2007). A
formação de públicos nem sempre depende da vontade dos criadores e intermediários
culturais (Lopes; Aibéo, 2005, p. 81). Em suma, fazer parte dos públicos é “ser um certo tipo
de pessoa, habitar um certo tipo de mundo social, ter ao seu dispor certos media e géneros,
estar motivado por um determinado horizonte normativo e falar dentro de uma determinada
linguagem ideológica” (Warner cit. por Lopes; Aibéo, 2005, p.81-82).
Bastide defende que o público reage sobre a obra e impõe os seus gostos ao criador
(2006, p. 297). A obra é apreciada e vivida de maneira diferente de sujeito recetor para sujeito
recetor, algo que é influenciado pelas circunstâncias da vida de cada um (Hauser, 1973). Por
parte dos recetores, existem “comportamentos de avaliação, censura e legitimação do que lhes
é proposto como obras de arte” (Conde, 1984, p.63). A verdade é que “O objecto artístico traz
em si os meios de despertar em nós, em nossas emoções e razão, reações culturalmente ricas,
que aguçam os instrumentos dos quais nos servimos para apreender o mundo que nos rodeia”
(Coli cit. por Goldstein, 2008, p.12).
A receção é, em grande parte, influenciada pelas instâncias de mediação. A mediação
é uma intermediação e tem em conta que “A obra de arte chega então ao público por meio de
uma série de refrações, e são essas refrações mais que a própria obra, que modelam o gosto”
(Bastide, 2006, p. 298). Os mediadores são importantes veículos de “divulgação ou de
promoção e de legitimação” da obra de arte (Freire, 2009, p. 59).
São exemplos de mediadores artísticos, mais ou menos informados, cujas opiniões são
mais ou menos legitimadas, os jornalistas, os críticos, os investigadores e escolas, os editores,
os catálogos e as próprias academias ao distribuírem prémios (Melo, 1994, p.55). Estes
mediadores servem “directa ou indirectamente, formal ou informalmente, como uma instância
de apoio aos agentes que operam na esfera comercial” (Ibidem).

8
O “mundo de aventura” do artista

Os curiosos, cujas opiniões se encontram “ao nível mais elementar” (Melo, 1994, p.
56), os jornalistas, que são mais ou menos especializados e que têm o poder de transformar
em notícia o que se passa no mundo das artes segundo valores-notícia (Ibidem, p. 56-57), e os
investigadores, com conhecimentos a nível superior, fazem parte desta dimensão simbólica, a
par dos críticos (Ibidem, p. 64-65). Estes, por sua vez, “estão sempre, e inevitavelmente, a
exercer ao mesmo tempo um papel cultural e um papel comercial” (Ibidem, p. 58). É neste
contexto que os editores dos órgãos de comunicação social assumem um papel fundamental,
pois são eles que decidem que autores e que obras farão parte dos acontecimentos noticiados
(Ibidem). Essa mediação artística é mais notória em áreas como a música, onde há um
intérprete entre o compositor e o ouvinte (Bastide, 2006, p. 298) e o aparecimento de
fotografias das obras em jornais e catálogos tende, segundo Melo, a aumentar a sua
visibilidade (1994, p. 71-72).
Para a sociologia da arte, a arte não é um valor absoluto por si só, e sim socialmente
construído e interiorizado (Ibidem). A natureza artística de uma obra não é intrínseca à
própria obra de arte, mas sim colocada por algumas partes interessadas em defini-la como arte
(Becker, 1984). Para esta disciplina, o ato de classificar um objeto como artístico nunca é algo
neutro ou involuntário: há sempre um grupo a ganhar ou a perder quando é atribuído esse
rótulo à obra (Wolff, 1974).
Sociologicamente, a arte é vista como uma forma de expressão, mediação e persuasão
(Huisman, 1994). A perspetiva sociológica entende que a arte pode promover a subversão ou
o conformismo social (Ibidem) e não se limita a perceber se um objeto é belo ou não
(Heinich, 2004). Não lhe compete emitir um juízo estético. Contudo, ela pode contribuir para
um juízo estético normativo graças aos trabalhos empíricos por ela levados a cabo (Ibidem).
A arte é “uma das instituições primárias” e a obra de arte pode ser considerada uma
manifestação “da psique colectiva” e ser comparada à religião por contribuir para a resolução,
ainda que simbólica, dos enigmas da vida (Dicionário de Sociologia, 1963, p.33). Ela retrata
uma sociedade numa determinada época histórica, cultural e social e resulta de um constante
diálogo entre criador e recetor (Bastide, 2006), devendo ser explicada no seu todo, indo para
além do seu autor (Hauser, 1973). Assim, uma boa compreensão do campo artístico requer a
sua contextualização (Pais, 1995, p. 67) e o recurso a uma linguagem própria para que a forma
artística perdure (Bastide, 2006, p. 302-303). Essa linguagem deve ser simples e acessível,
mesmo quando pretende “comunicar ideias estranhas e complicadas” (Hauser, 1973, p.25),
para que seja compreendida por muitos. Para Hauser, o artista começa por expressar-se na

9
O “mundo de aventura” do artista

linguagem dos seus antecessores, demorando algum tempo até encontrar uma linguagem
renovada (nunca uma nova) (Hauser, 1973).
Já de acordo com Huyghe, a arte relaciona três aspetos: natureza, meios e artista
(1986, p. 23-24). Se no Paleolítico Superior a arte representava a natureza, atualmente o
público procura uma obra que vá para além da realidade. O artista procura exprimir-se e, para
isso, usa inteligência, sensibilidade e vontade (Ibidem). Já Heinich identifica três critérios
extraestéticos que permitem identificar uma obra de arte: predominância da função estética,
originalidade e ainda o reconhecimento do artista pelas instâncias de legitimação – críticos de
arte, académicos, conservadores de museus, jornalistas, entre outros (1998).
Bourdieu e Darbel defendem que o “amor pela arte” resulta da aprendizagem e da
socialização (1991). Para os autores, os indivíduos com menor capital cultural rececionam a
arte com base na sua materialidade, o que faz com que apreciem as obras de arte em função da
sua representação da realidade. Estes indivíduos estão desprovidos de mecanismos de
perceção que lhes permitam entender as obras enquanto dotadas de sentido (Ibidem). Tal facto
resulta da privação de conhecimento artístico e não da sua recusa (Bourdieu, 1987). Os
sujeitos extraem essa perceção do seu quotidiano e avaliam as obras com base na sua
“experiência existencial” (Ibidem).
Para Bourdieu, o ensino artístico e a relação das famílias com as artes tem um papel
fundamental na construção do juízo estético de cada indivíduo (Ibidem). Aquando da entrada
na escola, embora alguns alunos já possuam um contacto anterior com as artes proporcionado
pelas suas famílias, outros estão desprovidos de qualquer conhecimento artístico. Para o autor,
sob uma aparente neutralidade, a escola é legitimadora de privilégios sociais. Ela atribui as
questões do dom, do talento e da inteligência a alguns alunos, criando hierarquias escolares
que se reproduzem, posteriormente, nas hierarquias sociais, bem como estereótipos em
relação ao sucesso escolar dos alunos. Ou seja, o ensino da arte, mesmo proporcionando o
acesso aos bens culturais e à criação artística, é ele próprio gerador de diferenças e do reforço
do dom como fator de criação de uma obra de arte (Ibidem).
No seu estudo sobre os museus europeus, Bourdieu e Darbel concluíram que os
museus, embora estejam abertos a todos, possuem obras que, de certa forma, estão acessíveis
apenas a um conjunto de pessoas que conseguem delas fruir (Bourdieu; Darbel, 1991). Desde
logo os autores verificaram que a frequência dos museus aumenta à medida que aumenta o
nível de instrução dos indivíduos e que, nos museus por eles estudados, os públicos são
sobretudo jovens e a idade média dos visitantes sobe à medida que as habilitações literárias
aumentam. Contudo, os autores referem que há diferenças várias entre indivíduos com o
10
O “mundo de aventura” do artista

mesmo nível de escolaridade, como o caso dos que pertencem ou aspiram vir a pertencer ao
mundo da arte, que visitam estes espaços mais frequentemente (Bourdieu; Darbel, 1991).
Neste seguimento, Bourdieu defende que a arte pode servir como forma de distinção
social, sendo aquilo a que o autor chama “poder simbólico” (1989). O poder simbólico “é,
com efeito, esse poder invisível o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que
não querem saber que lhe estão sujeitos ou mesmo o exercem” (Ibidem, p.8) e o campo da
produção artística é “o campo do exercício por excelência do poder simbólico” (Conde, 1987,
p.64). A posse de determinadas obras de arte pode ser uma forma de uma família mostrar o
seu poder já que, tal como qualquer mercadoria, a arte possui valor de mercado e faz parte de
um processo económico de produção, circulação e valorização (Melo, 1994, p.13).
Relativamente ao mercado da arte, Moulin distingue a arte classificada da arte
contemporânea (1995). Quanto à primeira, a autora refere que no mercado da arte classificada
“a oferta é teoricamente finita e os valores estéticos são objetivados pelos tempos, pela
história e pelo consenso social resultante de operações múltiplas e sucessivas de seleção e de
ratificação”3 (Ibidem, p.100). A estas obras, é-lhes atribuído o critério de raridade (Moulin,
1995). Ainda assim, novas técnicas permitem verificar a autoria e autenticidade das obras,
levando a alguns riscos e a flutuações no valor das mesmas no mercado consoante as
mudanças de gosto da sociedade e das perspetivas de análise, bem como a importância que a
sociedade dá à arte, que varia de época para época (Melo, 1994, p.15). Segundo Moulin, estas
obras devem circular, uma vez que são consideradas bens raros de consumo público (1995).
Por sua vez, Hauser alerta para o facto de, embora não precisando de recomendação, estas
obras nem sempre serem bem compreendidas devido à diferença de formas de pensar, sentir e
viver entre a época em que estas foram criadas e a época em que são rececionadas (1973).
Se a arte classificada diz respeito às obras de referência (antigas ou modernas clássicas
que fazem parte do património artístico), que já foram sujeitas ao julgamento estético e aos
valores estéticos objetivados pelo tempo, pela história, pelas instituições e pelo consenso
social, a arte contemporânea ainda está sujeita ao julgamento estético pois os valores estéticos
ainda não estão totalmente definidos (Moulin, 1995). O mercado da arte contemporânea é
ilimitado e indefinido e as obras de arte contemporâneas parecem ser frequentemente
rejeitadas por chocarem com os princípios tradicionais que objetivam as obras (Ibidem).
Hauser defende que à medida que surgem novas obras, o número de obras clássicas e os

3
Tradução do original: “l’offre est théoriquement finie e les valeurs esthétiques son objectivées par les temps,
par l’historie e par le consensus social résultant d’operátions multiples et sucessives de sélection et de
ratification” (Moulin, 1995, p.100).
11
O “mundo de aventura” do artista

critérios de qualidade que determinam o que é uma obra clássica alteram-se (1973). Para a
arte de vanguarda, a consagração assume uma grande importância (Conde, 1987).
Além da dimensão económica apontada por Melo já aqui mencionada, o autor refere
ainda as dimensões simbólica e política do sistema da arte contemporânea (1994). A
dimensão simbólica inclui as sensibilidades e os gostos pessoais, os discursos teóricos e a
elaboração e difusão de discursos culturais através dos media, dos críticos, dos especialistas e
dos criadores. As obras de arte são, segundo esta dimensão, objetos de exceção e com valor
simbólico particular. Nesta dimensão, o lucro não é o único motivo que justifica a aquisição
destas obras. Alguns colecionadores apontam o prazer emocional e intelectual que sentem na
sua atividade, a sensação de bem-estar provocada. Neste sentido, é preciso não só ter dinheiro
para investir, como também gosto pessoal e a formação cultural que fomentem tais aquisições
(Melo, 1994).
Ao nível da dimensão política, Melo defende que o que é considerado arte pelo Estado
influencia o apoio (financeiro, por exemplo) que é dado aos agentes culturais (Ibidem). No
entanto, verifica-se, por vezes, a falta de especialização e vocação cultural por parte dos
decisores políticos. Os espaços públicos de exposição são os mais importantes a nível da
consagração social, pelo que é fundamental o apoio do Estado também à arte de vanguarda (o
que se verifica, sobretudo, quando os funcionários de algumas instituições oficiais podem
tomar decisões com alguma autonomia, baseando-se até no próprio gosto individual) e não só
aos gostos da maioria da opinião pública (Ibidem).
Posto isto, consideramos relevante atentar no caso português, onde se verificam três
tendências relativamente ao campo artístico e aos seus intervenientes, apontadas por Santos
(1998):

1. o crescimento das classes médias urbanas, a terciarização e a urbanização


assimétrica contribuíram para o aparecimento de novos públicos, com “razoáveis”
níveis de instrução e rendimento, o que potencia uma procura mais diversificada
por parte destes (Ibidem, p.279);
2. a mistura de diferentes formas de financiamento: setor público, setor privado
lucrativo e setor privado não lucrativo. O apoio público tem privilegiado a cultura
cultivada, mas os governos têm-se preocupado mais com a oferta do que com a
procura (Ibidem, p.280-281);
3. a crescente profissionalização da produção e da difusão cultural e um considerável
aumento das empresas ligadas ao espetáculo (Ibidem, p.280).
12
O “mundo de aventura” do artista

Além disso, assistiu-se à generalização do ensino artístico, o que contribuiu para a


criação de novos públicos, embora essa formação não seja capaz de dar uma “resposta eficaz
aos objectivos programáticos que a preconizam” (Santos, 1998, p.281). O decreto-lei n.º
344/90, de 2 de novembro, estabelece as “bases da formação artística” nas áreas da música,
dança, teatro, cinema e audiovisuais e artes plásticas (decreto-lei n.º 344/90 de 2 de
novembro), mas não tem em conta a educação para os media, nem o incentivo da capacidade
crítica dos consumidores de arte, o que contrasta com a crescente profissionalização do setor
mediático (Santos, 1998, p.282).
Fazendo um retrato dos consumos artísticos em Portugal, entre 2000 e 2010, e
segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), o número de sessões tem aumentado
consideravelmente nas áreas do cinema, música, dança e variedades, ópera e teatro. Contudo,
o número de espetadores no cinema e na ópera diminuiu no mesmo período, ao contrário da
música, dança e variedades e do teatro (quadro 1.1.). Portanto, assistimos a um aumento
generalizado da oferta, mas a uma diminuição da procura em algumas áreas.

Quadro 1.1. Cinema, música, dança e variedades, ópera e teatro: sessões e espetadores
entre 2000 e 2010
MÚSICA, DANÇA E
CINEMA ÓPERA TEATRO
VARIEDADES
ANOS
Espetadores Espetadores Espetadores Espetadores
Sessões Sessões Sessões Sessões
(milhares) (milhares) (milhares) (milhares)
2000 419.695 17.915 2.449 1.149 102 91 4.794 614
2001 450.201 19.471 3.616 1.517 114 135 7.203 970
2002 504.667 19.480 3.781 1.585 111 103 8.422 1.267
2003 569.889 18.722 3.710 1.818 105 67 9.138 1.281
2004 551.850 17.128 7.693 2.798 157 89 11.233 1.706
2005 589.110 15.754 8.038 4.836 105 75 11.804 1.746
2006 591.139 16.367 9.346 4.933 133 81 10.939 1.556
2007 605.717 16.318 10.891 5.208 184 108 12.012 1.762
2008 644.778 15.979 11.935 6.031 189 90 12.703 1.850
2009 651.325 15.705 10.925 5.288 176 96 12.427 1.816
2010 670.315 16.560 11.926 5.702 155 57 12.723 1.620

Fonte: INE

Relativamente às galerias de arte e outros espaços de exposição (quadro 1.2.), e


segundo a mesma fonte, verificamos um aumento, entre 2000 e 2011, em vários aspetos:
equipamentos culturais, visitantes, exposições realizadas e obras expostas. Neste caso,
verificamos um aumento tanto da oferta, como da procura.

13
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 1.2. Galerias de arte e outros espaços de exposição temporária: número de


equipamentos culturais, visitantes, exposições e obras expostas entre 2000 e 2011
Anos Equipamentos culturais Visitantes Exposições realizadas Obras expostas
2000 479 3.786.938 4.255 163.425
2001 556 4.196.013 4.708 188.072
2002 668 4.181.280 5.527 220.836
2003 717 4.917.547 5.880 231.208
2004 732 4.958.487 6.130 224.454
2005 773 5.022.180 6.449 233.512
2006 811 5.544.173 6.463 251.620
2007 804 6.889.625 6.609 259.044
2008 840 8.048.858 6.859 304.850
2009 885 8.624.673 7.235 282.721
2010 881 9.077.521 7.261 279.984
2011 887 8.834.971 7.304 297.836
Fonte: INE

Quanto aos consumos das famílias portuguesas entre 2000 e 2009 (quadro 1.3.),
verificamos que o lazer, a recreação e a cultura têm vindo a ter um peso cada vez menor nos
orçamentos familiares dos últimos anos.

Quadro 1.3. Despesas de consumo final das famílias por tipo de bens e serviços entre
2000 e 2009, em percentagem
Produtos alimentares e

manutenção corrente da
bebidas não alcoólicas

Restaurantes e hotéis
Acessórios para o lar,
outros combustíveis
Vestuário e calçado
tabaco e narcóticos

electricidade, gás e
Bebidas alcoólicas,

Lazer, recreação e
equip. doméstico e
Habitação, água,

Bens e serviços
Comunicações
TOTAL (%)

Transportes

Educação
habitação

diversos
cultura
Saúde

ANOS

2000 91,4 15,2 3,2 5,8 11,9 6,4 4,2 15,0 2,4 7,6 1,0 9,9 8,9
2001 91,2 15,7 3,3 5,7 12,0 6,2 4,2 14,2 2,8 7,4 1,0 10,0 8,8
2002 91,3 15,6 3,3 5,9 12,3 6,3 4,3 13,5 3,0 7,2 1,0 10,1 8,7
2003 90,5 15,7 3,3 5,7 12,8 6,1 4,5 12,6 2,9 6,9 1,0 9,8 9,1
2004 91,4 15,4 3,3 5,7 13,0 5,9 4,6 13,1 3,0 6,9 1,0 10,0 9,3
2005 91,9 15,1 3,2 5,6 13,3 5,9 4,6 13,5 3,0 7,0 1,0 10,1 9,6
2006 93,8 15,4 3,3 5,6 13,4 6,0 4,7 13,5 3,0 7,1 1,1 10,3 10,5
2007 94,6 15,3 2,9 5,5 13,5 6,0 5,0 13,6 2,9 6,9 1,1 10,4 11,5
2008 93,9 15,6 2,7 5,3 13,7 5,8 5,1 13,1 2,8 6,7 1,1 10,0 11,9
2009 89,9 15,2 2,7 5,3 14,0 5,5 5,2 11,4 2,7 6,5 1,2 9,8 10,3
Fonte: INE

Por fim, verificamos a tendência para o aumento das despesas correntes por parte dos
municípios portugueses com a cultura e o desporto, mas verificamos uma diminuição das
14
2010 2009 2008 2007 2006 2005 2004 2003 2002 2001 2000 ANOS

721.091,0 997.703,8 863.808,2 791.078,8 802.857,0 913.810,2 795.736,0 783.887,6 768.090,0 672.343,0 559.911,0 TOTAL (€)

525.805,0 732.767,5 546.019,4 480.430,2 453.239,7 461.760,6 404.221,2 375.401,1 359.813,5 352.223,0 293.842,0 Total

Património
54.794,0 81.934,5 42.668,2 38.637,2 36.947,0 34.609,7 31.603,3 31.929,8 25.058,4 26.561,0 23.898,0
cultural

Fonte: INE
Publicações e
62.744,0 136.035,3 63.247,9 59.500,8 49.835,4 50.884,7 59.406,7 50.646,9 37.421,5 37.675,0 31.095,0
literatura

36.266,0 48.251,7 44.733,2 35.827,2 34.538,8 40.060,6 32.057,5 26.457,6 26.016,3 31.380,0 25.432,0 Música
foram as menos apoiadas.

19.356,0 23.558,3 18.987,4 18.790,6 14.650,3 16.245,5 11.520,3 9.598,6 10.128,0 10.447,0 8.482,0 Artes cénicas

Actividade
61.478,0 79.374,6 76.914,4 62.519,5 59.084,1 69.537,0 57.452,7 60.026,3 52.882,9 50.758,0 47.797,0
socioculturais
Despesas correntes

Recintos
17.914,0 18.520,1 16.230,2 14.913,4 12.891,8 10.988,4 7.568,8 9.023,0 8.159,2 6.867,0 5.222,0
culturais
Jogos e
176.859,0 201.097,0 183.250,8 160.796,0 145.985,9 145.379,6 133.008,0 123.420,4 113.842,0 110.445,0 89.126,0
desportos
Outros e

15
96.394,0 143.996,0 99.987,2 89.445,6 99.306,4 94.055,0 71.604,0 64.298,4 86.305,2 78.090,0 62.790,0
ignorados

195.286,0 264.936,3 317.788,8 310.648,6 349.617,3 452.049,7 391.514,8 408.486,6 408.276,5 320.120,0 266.069,0 Total

Património
30.588,0 37.670,7 53.915,1 56.223,3 48.399,1 48.826,7 55.592,6 39.361,5 44.019,6 49.287,0 45.203,0
cultural

Publicações e
8.461,0 15.723,7 21.428,4 22.034,6 27.404,8 21.479,9 20.041,5 15.793,3 19.309,2 18.495,0 14.804,0
literatura
total e por domínio cultural, em euros

2.994,0 3.141,5 4.529,3 3.539,7 3.115,5 3.698,3 2.669,4 3.421,1 2.895,2 2.585,0 2.764,0 Música

416,0 578,3 1.681,0 1.151,0 617,0 883,8 1.297,8 418,9 704,8 694,0 1.007,0 Artes cénicas

Actividade
8.380,0 12.453,0 11.195,2 8.456,7 10.137,5 11.125,9 13.505,7 8.834,0 12.329,0 15.946,0 11.137,0
socioculturais
Despesas de capital

Recintos
27.639,0 41.460,7 56.796,2 68.738,3 93.845,4 103.587,2 85.468,6 66.192,7 73.326,0 60.337,0 51.731,0
culturais
Jogos e
110.289,0 146.825,0 154.542,1 140.854,0 152.866,2 241.724,9 201.250,9 264.583,5 247.642,1 159.783,0 130.908,0
desportos
Outros e
Quadro 1.4. Despesas das Câmaras Municipais em cultura e desporto entre 2000 e 2010:
despesas de capital na área (quadro 1.4.). Em 2010, as áreas artísticas mais financiadas pelos
municípios portugueses eram as publicações e a literatura, ao contrário das artes cénicas, que
O “mundo de aventura” do artista

6.519,0 7.083,4 13.701,5 9.651,0 13.231,8 20.723,0 11.688,3 18.715,6 8.050,6 12.993,0 8.515,0
ignorados
O “mundo de aventura” do artista

Assim, tal como foi sugerido por Santos, a oferta cultural e artística não acompanha a
procura (1998, p.281). As próprias políticas culturais não têm acompanhado as exigências que
se têm vindo a sentir (Ibidem, p.282) e o Estado, segundo a mesma autora, deve apostar na
“sensibilização da sociedade civil e pela criação de incentivos à sua acção” (Ibidem, p.283).
As associações contribuem para esta situação, evidenciando um esforço sobretudo no norte do
país, onde é visível a tentativa de fazer frente à “supremacia lisboeta” (Ibidem). Contudo, este
é “um país onde, na falta de uma tradição de forte apoio à cultura, há, pelo menos, uma
tradição de forte expectativa quanto a esse apoio” (Santos, 1998, p.265). Essa falta de apoio é
visível, por exemplo, com a extinção do Ministério da Cultura, que passou Secretaria de
Estado, facto considerado por Manuel Maria Carrilho como a “certidão de óbito” passada à
Cultura, fruto de uma “medíocre e incapaz política cultural” (2011).
Assim, verificamos que o campo artístico tem vários agentes envolvidos: os artistas
(responsáveis pela criação), os vendedores (responsáveis pela circulação das obras, em
leilões, galerias ou feiras), os compradores (aqueles que consomem), os comentadores
(responsáveis pela mediação, como é o caso dos curiosos, jornalistas, críticos, investigadores,
escolas, editores e catálogos), os exibidores, o público em geral e os próprios decisores
políticos (Melo, 1994). Este trabalho de investigação centra-se nas representações das artes e
dos artistas (criação), nos media (mediação e legitimação) e nos conteúdos que chegam até
aos públicos (receção), não esquecendo os fatores que levam a essa criação, receção,
legitimação e mediação. Procuramos, ainda, identificar a definição de arte avançada pelos
media, pelos artistas e pela própria sociedade, e procuramos saber se essas definições vão de
encontro às aceções da estética e/ou da sociologia da arte. Além disso, é nosso objetivo tentar
perceber, junto dos próprios criadores e segundo os media, quais os agentes que podem
classificar um objeto como artístico. Tendo-se verificado o aumento generalizado da oferta
artística em Portugal e a diversificação dos gostos culturais, é nossa intenção perceber se os
meios de comunicação social oferecem conteúdos diversificados e que áreas são por eles
consideradas artísticas.

1.1.2. As representações da figura do artista: contexto social e profissional ao longo dos


tempos
A condição social e profissional do artista foi variando ao longo da História. Embora
tenha aparecido há vários séculos, este foi visto de maneira diferente consoante os períodos
históricos em questão. A própria definição da profissão assumiu três aceções diferentes –
16
O “mundo de aventura” do artista

artífice, artesão ou artista – consoante a época vivida, nem sempre sendo clara a distinção
entre elas, nem o limite temporal em que vigoraram. Nesse sentido, neste ponto procuramos
traçar, em linhas gerais, a evolução histórica do estatuto do artista, as auto e
heterorepresentações a ele associadas e o contexto social e profissional do artista em Portugal.
No Antigo Oriente e no Egito Dinástico, era raro encontrar o nome de um artista (Kris;
Kurz, 1988). As obras só começaram a ser assinadas séculos depois, na Grécia Clássica
(Ibidem). Ainda antes de Cristo, o artista tinha um estatuto social privilegiado e era visto
como um imitador (Araujo, 2008; Horn, 2006). A arte era, segundo Platão, o mesmo que
mimesis, pois era uma representação da realidade (cit por Gagnebin, 1993, p.68). Ela era
responsável pela apresentação da beleza ao mundo e, para o autor, ela enganava e iludia os
que não distinguiam o original do retrato ou a história da realidade (Ibidem, p.69). Como
refere o seu discípulo, Aristóteles, é necessário, porém, descobrir a metáfora, isto é, é preciso
perceber as semelhanças entre a obra e a realidade, o que requer atividade intelectual (cit. por
Gagnebin, 1993, p.71). Porém, segundo Kris e Kurz, o facto de as suas obras não serem
melhores que os originais fazia com que os artistas fossem menosprezados pela restante
sociedade (1988). Já na Antiguidade Clássica, o artista era aquele que realizava algo com as
mãos, vivia “uma atividade sem teoria” (Horn, 2006, p.64). O artista era, portanto, um
artificie subordinado (Hauser, 1973).
Já na Idade Média, “a obra fazia sombra ao artista” (Horn, 2006, p.53), artista esse que
estava “ligado à atividade do monge” (Ibidem, p.55) e que era associado à figura divina, pois
só assim era possível ser um criador (Ibidem, p.72). O próprio setor era muito regulamentado:
havia um estágio de aprendizagem, um estágio de acompanhamento e, por fim, a realização da
obra que permitia ao aprendiz consagrar-se como mestre (Ibidem). Assim, da Idade Média até
ao Renascimento, o artista era visto como um artesão, sujeito de uma atividade “puramente
manual, cuja aprendizagem acontecia na transmissão de pessoa para pessoa” (Ibidem, p.44).
Em plena época renascentista, deu-se a “personificação da figura do artista” (Horn,
2006, p.54), sendo este visto como um “herói cultural” (Neumann cit. por Horn, 2006, p.77).
Nesta época, o artista não queria mais ser visto como um artesão, queria antes estar ao lado
dos intelectuais, ser alguém que criava e não um imitador (Kris e Kurz, 1988). No caso da
arquitetura, o edifício criado era visto como um insulto às divindades. Nesse sentido, o artista
tanto era punido por ter tido a coragem de enfrentar os deuses na criação de algo tão
imponente, como essa mesma imponência criava inveja aos seres superiores. Por outro lado,
Kris e Kurz salientaram a ideia de que o artista poderá vir a suicidar-se quando julga que
falhou na concretização da sua obra, algo mais comum entre arquitetos (Ibidem).
17
O “mundo de aventura” do artista

No Renascimento, deu-se, assim, o que Alberti define como a relação “entre o


sensível, o talento e a ciência” (cit. por Horn, 2006, p.55), sendo o artista considerado “um
segundo Deus”, pois continua a tarefa iniciada por ele, transforma e recria a partir da natureza
(Ibidem). Também foi neste período que o artista começou a ser visto como um ser inspirado,
dotado de um dom especial (de origem divina), sendo associado aos heróis (Horn, 2006,
p.72). Nesta altura, o estatuto divino do artista estava, segundo Kris e Kurz, ligado à
astrologia pois, segundo ela, a hora e o local de nascimento de cada um influenciam a sua
personalidade e destino (1988). Com o Humanismo, e o culto da personalidade do artista, este
viu a ascensão do seu estatuto social (Horn, 2006, p.56).
Em Itália, no século XVI, surgem as Academias, que vêm reconhecer o estatuto
profissional entretanto adquirido (Simões, 2006). Estes eram espaços privilegiados de
formação e consagração dos artistas e de reflexão sobre a sua atividade (Ibidem). Segundo
Heinich, a Academia de Luís XIV implementou a ideia do artista como “produtor de
imagens”, um profissional liberal que tinha de obedecer a regras e que seguia uma
deontologia, o que veio reconhecer a atividade enquanto profissão (1998). A criação das
Academias e dos escritos sobre arte foram fatores decisivos para a mudança de estatuto do
artista, cujo ofício até então era considerado mecânico e submetido (Simões, 2006, p.34).
Com o crescimento das Cortes, os artistas foram inseridos em novos cargos, tendo salário fixo
e outros benefícios (Ibidem). Eram vestidos e tratados de maneira diferente dos demais, as
suas obras eram reconhecidas e vangloriadas, chegando o artista a receber títulos que
indicavam uma boa relação com os soberanos (Warnke cit. por Simões, 2006, p.34).
Assim, os artistas chegaram mesmo a ser disputados (Simões, 2006, p.34). Desta
forma, no século XVIII, o termo “artista” começou a ser utilizado. Surgiu a ideia do artista
como um génio que se expressa de forma não convencional, algo que só foi visto como
positivo depois do século XVIII (Adorno, 1993), e os novos profissionais das Artes Liberais,
como foram entretanto chamados (sobretudo os pintores), eram valorizados pelo seu trabalho
intelectual, que requeria um esforço mental e não físico como até agora se classificava o
trabalho artesanal (Simões, 2006, p.34).
Apesar da importância que as Academias tiveram para a valorização do estatuto do
artista, o sujeito criador raramente tinha obras prontas no seu ateliê, à espera de serem
vendidas. Pelo contrário, as obras eram-lhe encomendadas e era especificado o assunto, as
dimensões, os materiais utilizados, entre outros pormenores (Ibidem, p.36).
Em Portugal, as primeiras Academias surgiram nos séculos XVI-XVII, mas eram mais
direcionadas para a produção literária. Durante o século XVIII, os artistas que se destacavam
18
O “mundo de aventura” do artista

em instituições portuguesas ligadas às artes eram enviados para Itália para prosseguirem os
seus estudos (Simões, 2006, p.38). Em 1834, surgiram duas Academias – uma em Lisboa e
outra no Porto –, já ligadas a outros géneros artísticos, servindo, sobretudo, para depósito das
obras religiosas nacionalizadas dois anos antes (Ibidem, p.39). As Academias consideravam
que a pintura tinha uma importância significativa para a formação das novas gerações e para a
emergência de uma consciência histórica. Inicialmente, tinham “funções honoríficas,
pedagógicas e culturais” e foram nelas que surgiram artistas de “grande talento”, apesar de as
suas instalações (“velhos conventos”) e os seus docentes (“antiquados”) serem um “entrave”
(Ibidem, p.37-40).
Na Modernidade, o artista tentou libertar-se das imposições de algumas instituições
como a Igreja e os partidos e deu por si a questionar as características das próprias
manifestações artísticas (Araujo, 2008, p.27). Segundo Lipovetsky, a cultura modernista tem
no seu centro o “eu” (cit. por Araujo, 2008, p.28). O discurso homogéneo assim criado na
modernidade deu lugar a um discurso heterogéneo e multicultural na pós-modernidade
(Araujo, 2008).
É com o Romantismo que, segundo Heinich, surge a imagem do artista tal como é
visto hoje: inovador, original, inspirado, com um dom e uma vocação invulgares,
individualista (cit. por Araujo, 2008, p.43). Esta noção está muito ligada ao conceito de
vanguarda. A “moda das vanguardas”, segundo Rochlitz, fez com que todas as manifestações
que “chocam” possam ser consideradas arte contemporânea, independentemente da qualidade
(cit. por Araujo, 2008, p.46). Quando os critérios que definiam o que era ou não arte eram
claros, era difícil criar algo que respondesse a todos esses critérios, porém, no âmbito da arte
contemporânea, os critérios são difíceis de estabelecer (Ibidem, p.47).
Heinich alerta para o facto de, apesar de os critérios de legitimação da obra de arte não
serem tão rígidos atualmente como no tempo das Academias, existir, hoje em dia, uma grande
concorrência no mercado artístico, dificultando o acesso ao reconhecimento e ao viver
exclusivamente da arte (1998). Neste sentido, Camille Saint-Jacques afirma que a imagem
associada ao artista atual não vai de encontro à realidade, ou seja, este ainda é associado ao
dom e à proximidade com Deus, o que se deve a esta conceção romântica e ao culto da
originalidade e inovação (cit. por Araujo, 2008, p.47).
Também no século XIX, o artista podia seguir, de acordo com Moulin, dois caminhos
possíveis: ou fazia parte dos altos funcionários públicos e, para isso, tinha que apostar na
formação, ou tornava-se independente, com vontade de rutura (2009). Já no século XX, a arte
deixa de estar tão associada apenas à pintura e à escultura (Ibidem). Para Archer, percebeu-se
19
O “mundo de aventura” do artista

que o significado da obra não estava contido necessariamente apenas nela, muitas vezes nasce
do contexto onde esta surge (cit. por Araujo, 2008, p.29). Nesta fase, segundo Kaufmann, a
identidade individual do artista acentua-se, sobretudo porque estes passam a colocar os seus
dilemas pessoais nas obras (2005). O artista deixa de se legitimar apenas com base na sua
criação e os públicos passam a ter em conta as suas ações (Araujo, 2008, p.35).
Desde o seu aparecimento na História que o artista é associado a um conjunto de
representações por parte do senso comum, tanto relacionados com a sua vida, como com o seu
trabalho (Kris; Kurz, 1988). Ao longo da sua obra, Horn enumera alguns desses atributos
associados ao artista: individualista, superior, original, inconformado, diferente, com gestos
arrogantes, como o todo-poderoso, vive em conflito com o mundo, como alguém dotado de
um dom inato que se revela desde a infância e com o domínio de várias técnicas que foi
aprendendo ao longo da carreira artística (2006). Já de acordo com as biografias escritas sobre
vários artistas, estes são frequentemente retratados como autodidatas, como alguém que
ascende socialmente rapidamente, que triunfa sobre os obstáculos, que luta desde muito novo
pela expressão e que foi uma criança-prodígio (Kris; Kurz, 1988). Nestas biografias, o artista
é relatado como um jovem fora do comum, sem grande ligação ao dinheiro e que quer
aproveitar a vida sem as regras impostas por um trabalho regulamentado (Ibidem). Porém,
esta é uma visão irrealista já que alguns artistas não vivem só da fantasia e da aventura
(Araujo, 2008, 53). O que move a atividade dos artistas é, segundo Kris e Kurz, o amor e os
biógrafos partem do princípio que as fraquezas do criador vão estar expostas na obra (1988.).
O artista está, também, associado ao mito do herói (Horn, 2006). Este mito está ligado
a três aspetos: abandono da casa paterna pelo artista e a procura de um pai mais ilustre (no
mundo das artes), ultrapassagem de vários obstáculos pelo artista herói e proteção dos artistas
por parte dos animais. Contudo, após um longo processo de aprendizagem, o artista pode
rejeitar o seu mestre e seguir o seu próprio caminho, criando um estilo próprio (Ibidem). A
rivalidade entre artistas é um dos temas frequentes nas biografias de artistas, mesmo a
rivalidade entre aprendiz e mestre, salientando-se a vontade de os artistas esconderem o seu
segredo, aquilo que torna a sua obra singular (Kris; Kurz, 1988).
O percurso do artista é descrito como o desprendimento da casa paterna, na busca de
uma formação inicial adequada, já que o talento é “inato, precoce, recebido como presente,
pois não há antecedentes relacionados às artes em sua família” (Horn, 2006, p. 66). O artista é
tido como um génio criativo, pois a sua arte está ligada ao sagrado e à vocação divina, ao dom
que possui desde a nascença (Horn, 2006). Não basta aprender a fazer arte, até porque a arte
não se ensina. O artista é um ativista cultural, um herói cultural diferente dos homens comuns.
20
O “mundo de aventura” do artista

Ele luta em prol da arte e tenta levá-la até aos seus apreciadores. Ainda assim, tal como o
herói, nem sempre é aceite por todos e vê o seu trabalho ser criticado (Horn, 2006). Para
Lichtenstein, é através do mito que o artista se constrói e é reconhecido como tal (cit. por
Horn, 2006, p.86). Mesmo na morte, há um discurso mítico em torno da morte e o próprio
criador, ao saber que está perto do fim da vida, traduz esse fim na sua obra, permanecendo
com o seu público após a sua morte através da obra (Horn, 2006, p.90-92).
No caso português, destacam-se dois estudos sobre a forma como os artistas se veem a
si próprios e ao restante grupo profissional. Em primeiro lugar, temos o trabalho de Machado
Pais, Representações da actividade artística, integrado no âmbito de um estudo mais lato –
Inquérito aos artistas jovens portugueses –, aplicado a artistas jovens em Portugal através de
inquéritos por questionário, encomendado pelo Clube Português de Artes e Ideias, cujo
objetivo principal é “ver até que ponto as representações que os artistas têm da produção
artística e da própria arte correspondem às posições que ocupam no mundo artístico” (1995,
p.53). Por outro lado, temos o estudo Em torno da constituição do sujeito artístico, de Teresa
Duarte Marinho, também ele parte integrante de uma investigação mais abrangente: O mundo
da arte jovem (2003). Este trabalho, baseado em entrevistas a jovens artistas, centra-se na
análise de três dimensões principais: “contextos de emergência de vocações; construção social
da identidade social de artista e representações da actividade artística” (Ibidem, p.9).
Segundo o estudo de Machado Pais, a maioria dos artistas considera viver de maneira
diferente da restante sociedade (1995). Eles dão maior importância à liberdade de
pensamento, às emoções e ao mundo sensível, à imagem pessoal, ao lazer e aos tempos livres,
tendo maior espírito de aventura. Por outro lado, importam-se menos com o dinheiro e com
regras e convenções. Para eles, a criação artística depende sobretudo da vocação, da
inspiração e da experiência de vida do artista. Dizem-se originais e capazes de lidar com
várias ideias ao mesmo tempo. Todavia, o valor das obras não se baseia apenas na
criatividade, mas também passou a refletir as condições de produção, como o valor dos
materiais usados. Para atingirem a independência criativa, dizem precisar de apoios do Estado
e dos mecenas, da opinião de críticos e/ou artistas consagrados e de atingirem o público
pretendido (Ibidem).
Música, pintura, teatro, literatura, graffitis, alta-costura, culinária, design, rendas e
bordados, olaria, joalharia, fotografia, cinema, cartoons, arranjos de calçado, decoração de
interiores, artesanato, circo e publicidade são, para eles, arte, já que esta visa transmitir ou
estimular sensações, revelar novos modos de pensar, comunicar ideias e despertar
consciências (Ibidem).
21
O “mundo de aventura” do artista

Já os artistas plásticos entrevistados por Teresa Duarte Marinho dizem ser este um
gosto que os acompanha desde a infância, nomeadamente graças às aulas de Educação Visual
e ao encorajamento de professores e colegas (2003). Originalidade, sensibilidade, rutura e
didatismo são características apontadas pelos próprios como os seus principais atributos.
Querem transmitir as suas ideias, têm pretensão de mudar algo no mundo, de fazer algo
diferente e criar impacto. Contudo, eles próprios têm dificuldade em definir o que é um
artista. Esta designação tem de lhes ser atribuída pelos que são legitimados para tal: um
professor, um colecionador ou outros. Alguns dizem, até, preferir o termo “criador”, pois o
termo “artista” vulgarizou-se. Outros dizem que criar é ser-se idiota com muitas ideias. Além
disso, afirmam serem, muitas vezes, vistos como pretensiosos ou snobs, com alguma coisa de
génios. Porém, para eles, há qualidades essenciais que fazem deles artistas:
determinação/persistência e capacidade de entrega ao trabalho, gostar da sua atividade,
sinceridade/seriedade/honestidade/independência, ser informado e estar atento aos circuitos,
criatividade/ter ideias novas, sensibilidade e domínio das técnicas. Ainda assim, as suas
carreiras podem ser influenciadas por outros fatores e depender de contextos (Ibidem).
Emotivos, inseguros, instáveis, frágeis, originais, sensíveis, diferentes, especiais,
epicuristas, assim são vistos muitas vezes no que diz respeito às suas personalidades. Por sua
vez, a obra de arte é vista pela sociedade em geral, segundo eles, como um meio de expressão
e de comunicação, dependente do contexto, inútil, intemporal, livre, inovadora, rara, reflexo
de um povo e da conjuntura. Porém, os artistas consideram que ela está para além da sua
própria definição, os públicos é que definem esse conceito, a obra tem valor intrínseco. A
divisão entre artes maiores e artes menores não é nada pacífica ou consensual (Ibidem).
Assim, pode dizer-se que contexto, socialização, grupos de referência e redes sociais
influenciam a predisposição do indivíduo para a criação artística (Inglis, 2005). Para Heinich,
“o mito do artista incompreendido” e o da “santificação”/sacrifícios do artista contribuem
para que esse autor atinja a simpatia do público (cit. por Goldstein, 2008, p.4). Cabe então à
sociologia da arte desmistificar estas e outras ideias como a do génio artístico, ideia essa que é
masculinizada (Inglis, 2005, p.17).
Do ponto de vista profissional, no que diz respeito ao caso português, o próprio
tratamento dos dados referentes às profissões ligadas às artes acarreta algumas dificuldades,
pois estes encontram-se desagregados. A mais recente Classificação Portuguesa de Profissões
data de 2010 e surgiu numa tentativa de melhoramento da Classificação de 1994 (CPP-1994)
e da sua correspondência aproximada com a Classificação Internacional Tipo de Profissões
2008 (Ponto Nacional de Referência para as Qualificações).
22
O “mundo de aventura” do artista

Segundo a CPP-2010 (quadro 1.5.), os artistas encontram-se maioritariamente no


grupo 2 – “Especialistas das actividades intelectuais e científicas” – e no sub-grande grupo
26, “Especialistas em assuntos jurídicos, sociais, artísticos e culturais” (Classificação
Portuguesa das Profissões 2010). Este sub-grande grupo diz, assim, respeito aos especialistas
em assuntos ligados ao campo artístico, nomeadamente artistas criativos e das artes do
espetáculo (sub-grupo 265). Logo por aqui se depreende que as profissões artísticas estão
associadas às capacidades intelectuais do indivíduo, sendo o artista um “especialista”. Assim,
as profissões consideradas pela CPP-2010 como ligadas à arte são: escultor, pintor de arte,
caricaturista, outros artistas de artes visuais, compositor, músico, cantor, bailarino,
coreógrafo, realizador (cinema e teatro), produtor (cinema e teatro), produtor e realizador de
televisão e rádio, encenador de teatro, diretor de fotografia e de som, montador e
relacionados, ator, locutor e apresentador de rádio, tv e outros media, disc jockey e outros
artistas e intérpretes criativos das artes do espetáculo (Ibidem).

Quadro 1.5. Classificação Portuguesa das Profissões 2010 (profissões artísticas)


Grande Sub-grande Sub- Grupo-
Profissão/Descrição
grupo grupo grupo base
2161 2161.0 – Arquitecto de edifício
2162 2162.0 – Arquitetco paisagista
2163.1 – Designer do produto industrial ou de equipamento
21 216
2163 2163.2 – Designer de têxteis e moda
2163.3 – Designer de interiores, espaços ou de ambientes
2164 2164.0 – Urbanista de cidade e tráfego
264 2641 2641.0 – Autor e escritor
2651.1 – Escultor
2651.2 – Pintor de arte
2651
2651.3 – Caricaturista
2651.4 – Outros artistas de artes visuais
2652.1 – Compositor
2652 2652.2 – Músico
2652.3 – Cantor
2 2653.1 – Bailarino
2653
2653.2 – Coreógrafo
2654.1 - Realizador de cinema e teatro
26 2654.2 - Encenador de teatro
265
2654.3 - Produtor de cinema e teatro
2654
2654.4 - Produtor e realizador, de televisão e rádio
2654.5 - Director de fotografia e de som, montador e
relacionados
2655 2655.0 – Actor
2656.0. Locutor e apresentador, de rádio, de televisão e de
2656
outros meios de comunicação
2659.1 – Disc Jockey
2659.2 – Outros artistas e intérpretes criativos das artes do
2659
espectáculo (mágicos, palhaços, acrobatas e artistas
do trapézio).
5 52 524 5241 5241.0 – Manequins e outros modelos
Fonte: INE (2011)
23
O “mundo de aventura” do artista

Já os autores e escritores fazem parte do sub-grupo 264, “autores, jornalistas e


linguistas”, e serão aqui também considerados artistas devido à sua ligação à literatura, bem
como por poderem escrever guiões, roteiros e afins para teatro, cinema ou televisão
(Classificação Portuguesa das Profissões 2010). Ainda a considerar são os arquitetos de
edifícios, arquitetos paisagistas, designers (de produtos industriais ou de equipamento, de
têxteis e moda e de interiores, espaços ou de ambientes), os urbanistas da cidade e tráfego e os
manequins e outros modelos (Ibidem).
O artista é, segundo esta classificação, alguém que está ligado à atividade intelectual,
salientando-se o recurso a verbos relacionados com a atividade mental: analisar, definir,
escolher, estudar, interpretar, ler, planear, sugerir. Além disso, também é salientada a
componente prática destas profissões. O artista, consoante a sua atividade profissional,
aciona, acompanha, adapta, alinha, apresenta, atua, canta, classifica, coloca, comenta,
compõe, concebe, coreografa, cria, desempenha, distribui, efetua, elabora, ensaia, entrevista,
esboça, escreve, estampa, executa, faz arranjos, fixa, grava, memoriza, modela, molda,
orquestra, participa, pinta, prepara, projeta, realiza, recorta, representa, restaura, reúne,
seleciona, solda, talha, toca, treina. Esta é uma área que exige inspiração, sentido estético e
imaginação e onde é necessário trabalhar em equipa (“colaborar com”). A CPP-2010 não
esquece a vertente económica da arte (“orçamentar”) e a necessidade de organização nestas
profissões (“controlar”, “coordenar”, “orientar”), profissões essas onde são necessários
“materiais e técnicas diversas” (Ibidem).
Para esta Classificação faz sentido distinguir artista de artesão. O artesão – de artigos
de madeira, cestaria e similares, de rendas, bordados e tapeçarias manuais e de artigos de
couro – é descrito como alguém mais ligado a atividades práticas, como traçar, esculpir,
efetuar, fabricar manualmente, enformar, coser, bordar, rematar, colar, entre outros. O mesmo
se pode dizer de outras profissões como joalheiro, filigranista e oleiro, que executam,
fabricam, reparam, criam, cortam e montam, embora não sejam definidos como “artesãos”
(Ibidem).
Outros agentes envolvidos são o diretor de museus, galerias de arte, monumentos
nacionais, o diretor e gerente dos centros desportivos, recreativos e culturais e o curador de
museus. Estas profissões envolvem dirigir, gerir, desenvolver políticas e normas, implementá-
las monitorizá-las, supervisionar, avaliar, controlar despesas, coordenar, elaborar e gerir
orçamentos, organizar, divulgar, catalogar. A CPP-2010 faz também referência à importância
do ensino da arte, através de profissões como professor de música e outros professores de arte
(Ibidem).
24
O “mundo de aventura” do artista

Os últimos censos relativamente aos quais são conhecidos todos os dados (2001)
basearam-se na CPP-1994, o que faz com que as noções de profissão e emprego artístico e
cultural enfrentem problemas de “definição, classificação e contabilização” (Conde; Pinheiro,
2000, p.16), um pouco à semelhança do que acontece sobre a própria Europa (Nico et al.,
2007).
Atentando no caso português, segundo o INE, em 2010, existiam mais de 44 mil
inscritos em áreas culturais e criativas ao nível do Ensino Superior, salientando-se os ramos
da arquitetura e urbanismo, informação e jornalismo e audiovisuais e produção dos media. O
artesanato é aquele que tem menor expressividade, tal como é possível verificar no quadro
abaixo representado.

Quadro 1.6. Alunos inscritos e diplomados no ensino superior, em Portugal, por áreas de
estudo culturais e criativas, em 2010
Áreas de estudo Inscritos Diplomados
Belas artes 3509 642
Artes do espectáculo 4175 733
Audiovisuais e produção dos media 7458 1415
Design 5583 1283
Artesanato 363 100
História e arqueologia 4104 702
Informação e jornalismo 7505 1561
Arquitetura e urbanismo 11318 2475
Total 44015 8911
Fonte: INE

Este interesse dos estudantes portugueses (ou a estudar em Portugal) por cursos
superiores nas áreas culturais e criativas não se reflete, posteriormente, nos dados relativos à
população empregada por nível de escolaridade (quadro 1.7.), uma vez que se verifica uma
maior empregabilidade no setor para pessoas com níveis de escolaridade até ao ensino básico.

Quadro 1.7. População empregada nas atividades culturais e criativas, por nível de
escolaridade completo, em 2010
Nível de escolaridade População empregada (milhares)
Até ao 3º. ciclo do ensino básico 32,4
Ensino Secundário 22,3
Ensino Superior 26,4
Total 81.1
Fonte: INE

25
O “mundo de aventura” do artista

Relativamente à União Europeia constituída por 27 Estados-membros (UE27) (quadro


1.8.), e segundo os dados mais recentes avançados pelo Eurostat, estimava-se, em 2009, a
existência de 1482 milhares de escritores e artistas criativos, o que correspondia a 0,7% do
total de emprego. No caso português, essa percentagem ficava nos 0,4%, o que correspondia a
21 mil empregos na área, estando longe dos resultados islandeses (1,9%). Porém, se Portugal
está abaixo da média da UE27 no que diz respeito ao emprego artístico, o mesmo não se pode
dizer relativamente a cursos no Ensino Superior ligados às artes. De facto, no ano letivo
2007/2008, em Portugal, os estudantes inscritos em cursos superiores artísticos correspondiam
a uma percentagem de 5,2% face ao total, enquanto na Europa se verificavam 3,8% (quadro
1.8.). Portanto, é curioso verificar que Portugal tem um resultado superior à média da
comunidade europeia neste âmbito, embora um considerável número de estudantes inscritos
não corresponda à taxa de empregabilidade que se verifica na área.
Contudo, o emprego no setor artístico tem vindo aumentar um pouco por todos os
Estados-membros da UE, tal como se pode verificar na comparação dos dados disponíveis
sobre 2004 e os dados de 2009 (quadro 1.8.). Em Portugal, o emprego na área aumentou mais
de 50% em cinco anos, segundo o Eurostat. Contudo, é difícil associar a profissão do artista
às profissões convencionais, visto que esta é uma profissão sem horário de trabalho fixo, sem
uma lista de tarefas concretas para cumprir, sem garantias, na maioria dos casos, que aquela
obra será considerada arte e será vendida como tal (Araujo, 2008, p.40). A instabilidade na
profissão leva a que alguns criadores desempenhem outras funções, sobretudo ligadas ao
ensino (Freidson cit. por Cabral; Borges, 2010, p.150), com vista a conseguirem algum
retorno financeiro que lhes permita sobreviver e continuar a criar (Motta cit. por Araujo,
2008).
Para Nathalie Heinich, o facto de a maioria dos artistas não possuírem uma
remuneração estável pode comprometer a qualidade da obra (cit. por Araujo, 2008). Sem
reconhecimento não há remuneração, o que é cada vez mais difícil tendo em conta que o atual
mercado da arte é muito restrito. Por outro lado, as práticas amadoras têm aumentado,
representando o gosto pelas artes, e não a procura da obtenção de lucro. O amador (sobre o
qual não recaem as estatísticas realizadas sobre o campo artístico) não tem a pretensão de ser
reconhecido como artista e é mais polivalente que o artista consagrado, uma vez que não se
concentra na sua atividade única e vitalícia. Por outro lado, os públicos, cada vez mais
numerosos, têm dado eles próprios passos no sentido de decidir o que desejam ou não
consumir enquanto obra de arte (Ibidem).

26
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 1.8. Escritores e artistas criativos empregados na Europa em 2004 e 2009 e


estudantes do ensino superior em cursos artísticos em 2007/2008
Estudantes do ensino
Escritores e artistas criativos4 superior em cursos
artísticos5, 2007/2008
Países 2004 2009 face à % total de
face à % total estudantes no ensino
milhares milhares superior
de emprego
UE27 1166 1 482 0.7 3.8
Alemanha 235.0 328 0.8 3.6
Antiga Rep. Jugoslava
: 2 0.3 1.8
da Macedónia
Áustria 29.7 37 0.9 5.2
Bélgica 27.7 26 0.6 5.1
Bulgária 17.4 18 0.6 2.4
Chipre 2 2 0.4 5.5
Croácia 3.5(u6) 8(u) 0.5 2.6
Dinamarca 21.5 25 0.9 3.6
Eslováquia 6.7 12 0.5 1.7
Eslovénia 6 6 0.6 1.9
Espanha 77.6 102 0.5 4.7
Estónia 6.1(u) 3 0.5 5.1
Finlândia 28.8 36 1.5 5.6
França 150.5 180 0.7 4.2
Grécia 16.2 23 0.5 2.1
Holanda 99.3 108 1.3 4.4
Hungria 23.4 24 0.6 1.7
Irlanda 13.2 17 0.9 6.6
Islândia 1.8 3 1.9 2.9
Itália 118.3 119 0.5 4.0
Letónia 5.4 7 0.7 3.3
Lituânia 4.7(u) 7(u) 0.5 3.2
Luxemburgo 0.6(u) 2 0.7 :
Malta (u) (u) : 2.8
Noruega 9.4 35 1.4 3.0
Polónia 47 69 0.4 1.1
Portugal 13.7 21 0.4 5.2
Reino Unido 140.5 196 0.7 6.8
República Checa 23.4 36 0.7 1.9
Roménia : 13 0.1 1.2
Suécia 51.3 68 1.5 4.4
Suíça 27.9 37 0.9 4.3
Turquia : 37 0.2 1.4
Fonte: Eurostat

4
Inclui escritores e artistas criativos ou performativos (autores, jornalistas, escultores, pintores, compositores,
músicos, cantores, coreógrafos, bailarinos, atores, diretores e outros artistas relacionados).
5
Inclui artes plásticas, artes do espetáculo, música e audiovisuais, técnicas e de produção de media, design e
habilidades artesanais.
6
u = Dados não publicados ou publicados com reduzido grau de confiabilidade devido ao tamanho da amostra.
27
O “mundo de aventura” do artista

Já no período 1970-1981 foi possível verificar o aumento de 27% nas profissões


artísticas em Portugal e assistiu-se, na mesma altura, à entrada da mulher no mercado de
trabalho, fator a que as artes não foram alheias (Nico et al., 2007, p.48; Esquível, 2010,
p.144). Mesmo assim, os homens ainda continuam a ser em maioria na generalidade dos
ramos artísticos, apesar de alguns setores, como a dança, serem altamente feminizados (Nico
et al., 2007, p.49). A taxa de feminização das artes rondava os 16% em 1970, tendo mais que
duplicado em 30 anos (39%) (Ibidem).
Emprego flexível, contratos de trabalho temporários, trabalho independente ou
autoemprego, trabalho a tempo parcial, descontinuidade do trabalho, ausência de vínculos e
falta de proteção social caracterizam a atividade artística portuguesa (Gomes; Marinho, 2009).
Flexibilidade parece ser a característica principal da atividade artística portuguesa. Tal facto
pode trazer vantagens, como o facto de os artistas que estão no início da carreira poderem ter
contacto com um maior número de atividades, e desvantagens, como a ausência de
certificação e acesso regulado ao mercado de trabalho, que pode gerar desigualdade,
precarização e até desqualificação do trabalho. A flexibilidade também atinge setores mais
ligados à administração pública, porque, por um lado, são áreas com falta de autonomia de
gestão por parte dessas entidades e, por outro, porque a regularidade e volume de trabalho
depende dos orçamentos de que os organismos públicos dispõem (Ibidem).
Este é um trabalho incerto e indeterminado, onde se assiste, muitas vezes, à
acumulação de funções, sendo, por isso, o artista chamado de “artista quase firma”, por ter de
possuir competências comunicacionais e de gestão para além das competências artísticas,
essenciais para o trabalho em equipa (Greffe, 2002). Por outro lado, o emprego transnacional
é cada vez mais uma parte importante no setor cultural e artístico (Gomes; Marinho, 2009). A
própria União Europeia (UE) defende a livre circulação dos profissionais, bens e serviços e
existem já projetos e programas que pretendem promover o trabalho articulado de diversos
agentes. Desde os anos 1990 que o Governo português pretende fomentar a promoção da
cultura portuguesa no exterior, mas faltam programas de investimento articulados e
duradouros entre entidades nacionais e internacionais. Além disso, existe ainda o processo de
Bolonha, que visa harmonizar os diferentes cursos superiores das várias universidades da UE,
de forma a evitar discrepâncias e favorecer a mobilidade de estudantes, professores e
investigadores, promovendo a troca de conhecimentos. Aqueles que passaram por uma
experiência fora de Portugal dizem haver uma maior articulação noutros países entre sistema
de ensino e sistema de emprego e existir uma maior interdisciplinaridade (Ibidem).

28
O “mundo de aventura” do artista

Apesar das dificuldades sentidas, o campo artístico tem despertado a atenção dos
vários governos constitucionais, o que se tem traduzido em duas orientações: reforço da
formação/qualificação dos vários envolvidos e definição do estatuto profissional que respeite
as dinâmicas próprias do setor (Gomes; Marinho, 2009). Porém, a legislação que se tem vindo
a produzir ao longo dos anos fica “aquém das intenções explicitadas”, talvez pela sua
complexidade e necessidade de intervenção de várias áreas interligadas (segurança social,
educação, trabalho e cultura) (Ibidem, p.17).
Segundo uma proposta de lei do Partido Comunista Português, do Bloco de Esquerda e
de acordo com a Lei nº. 4/2008 de 7 de fevereiro, os diplomas superiores (que sofreram um
boom nos anos 1990) no setor das artes são fundamentais para habilitar os indivíduos para o
exercício da profissão, para além de ser fundamental desenvolver as atividades artísticas com
caráter regular para se ser um artista (lei n.º 4/2008 de 7 de fevereiro). As instâncias
certificadoras seriam, assim, o Ministério do Trabalho e Solidariedade Social e/ou o
Ministério da Cultura. O registo profissional também parece imperativo. Porém, esta parece
ser uma ideia ainda por concretizar integralmente (Gomes; Marinho, 2009).
Um relatório publicado em 2007, pela Comissão da Cultura e Educação do Parlamento
Europeu, sobre o estatuto social dos artistas concluiu que “a arte deve ser considerada como
um trabalho e uma profissão”, “os artistas são os únicos trabalhadores que não beneficiam de
um estatuto legal” e que “é necessário facilitar o acesso dos artistas à informação respeitante
às suas condições de trabalho, de mobilidade, de desemprego e de saúde e de aposentação”
(cit. por Gomes; Marinho, 2009, p.19). Assim, é possível afirmar que o estatuto profissional
dos artistas preocupa não só os portugueses, como também a comunidade europeia,
traduzindo tal preocupação uma realidade: os artistas enfrentam a precariedade no mercado de
trabalho (Gomes; Marinho, 2009, p.19-20). Neste sentido, o relatório indicou um conjunto de
medidas aos países membros relativas a seis dimensões: situação contratual dos artistas,
proteção do artista, política de vistos, formação ao longo da vida e reconversão, reestruturação
das práticas amadoras e garantia de formação artística e cultural desde a infância (Gomes;
Marinho, 2009, p.19-20).
Face ao exposto, salientamos um estudo levado a cabo por Cabral e Borges, em 2010,
sobre a profissão de arquiteto, e que vem reforçar o que temos vindo a explicitar. Segundo os
autores, os setores artísticos continuam a atrair mais vocações do que o mercado pode
suportar e, no caso dos arquitetos, estes têm de competir pelos mesmos trabalhos com
profissões similares, como a engenharia civil e/ou a construção civil (Cabral; Borges, 2010).
Isto é, tal como o cientista, a carreira do artista é “marcada pela contingência, a inspiração, a
29
O “mundo de aventura” do artista

intuição, a imaginação, a experiência vivida e, por último, incerteza” (Menger cit. por Cabral;
Borges, 2010, p.151). Para Menger, os jovens sentem-se atraídos por estas atividades não
rotineiras e com elevadas gratificações psicológicas e sociais (Ibidem, p.152).
Os arquitetos portugueses são maioritariamente jovens (sobretudo quanto ao sexo
feminino), homens (sobretudo mais velhos), mas tem-se assistido à feminização do setor
(Cabral; Borges, 2010). Os vínculos laborais das mulheres são mais precários que os dos
homens, estando estas mais insatisfeitas com a profissão, mas revelando ser menos exigentes
quanto às condições de exercício da sua atividade profissional. Além da idade (que é
necessária para o desenvolvimento de uma carreira) e do género, outros fatores são decisivos
na arquitetura portuguesa: dedicação exclusiva à profissão (deixando outras ocupações para
segundo plano), ter trabalhado durante a licenciatura (facilita a integração na profissão),
estatuto socioprofissional do pai e estar situado na região sul. De facto, verifica-se a
prevalência dos arquitetos no Porto e em Lisboa e as altas habilitações dos seus pais face à
média nacional. Verifica-se, inclusive, a reprodução interna dentro da profissão, ou seja,
grande parte dos arquitetos são filhos de arquitetos e, quando a influência não se verifica por
parte dos pais, verifica-se através de outros familiares, amigos, colegas ou professores
(Ibidem).
A maioria dos inquiridos neste estudo escolheram este curso por causa da “inclinação
para a arquitectura”, porque sempre tiveram “jeito para o desenho” e porque desde jovens que
se interessam por artes, embora considerem o que aprenderam durante a licenciatura
“insuficiente”. Dizem ter orgulho da profissão que escolheram, apesar da “forma negativa”
como a profissão é vista pela sociedade. Além disso, evidenciam mais hábitos culturais que a
maioria dos indivíduos não ligados às artes, mas, à semelhança destes, procuram a satisfação
material com a profissão que exercem (Ibidem).
Um outro estudo, levado a cabo por Borges e Delicado em 2010, refere que o teatro, a
música e a dança são atividades que refletem um “amor à camisola”, um “apelo”, um
“chamamento”, “uma urgência que implica o corpo e a alma”, uma “vocação” (2010, p.209).
Neste estudo, os artistas são definidos como alguém que possui um talento inato, que segue
uma “paixão” e que se mostra sempre curioso sobre si e sobre o mundo, o que potencia a
aprendizagem (Borges; Delicado, 2010). Eles são autênticos e negam possuir um dom e criar
com base no acaso (Ibidem).
É salientada, nessa investigação, a importância dos antecedentes familiares, da
socialização primária e da exposição precoce às artes, que favorecem a relação dos indivíduos
com as formas artísticas. Os entrevistados encaram a profissão como um desafio, que permite
30
O “mundo de aventura” do artista

alguma liberdade e autonomia. Contudo, esse “amor pela arte” pode surgir tardiamente ou
acidentalmente. Para eles, o gosto pelo que fazem e o reconhecimento que daí advém são as
melhores formas de remuneração, mas é fundamental aprender fazendo, experimentando, ser
autodidata não basta e o diploma assume cada vez maior importância. O artista está em
formação constante e tem um “mestre” como referência (Borges; Delicado, 2010).
Assim, neste trabalho procuramos analisar um conjunto de representações associadas
ao artista a nível pessoal, social e profissional. Para isso, partimos para a recolha das
características atribuídas ao artista por parte do suplemento Ípsilon e dos que por ele foram
referenciados em 2011, e também para a recolha das representações avançadas pelos próprios
sujeitos artísticos (neste caso, os finalistas da FBAUP em 2011/2012) através de entrevistas
semidiretivas. Para isso, tivemos em conta um conjunto de pontos, tais como a infância do
artista, a relação da sua família com as artes e os hábitos culturais das mesmas, a sua
formação profissional, a sua avaliação da relação entre as artes e os media e as definições de
arte e de artista avançadas pelos entrevistados, pelos media e pela sociedade, entre outros
aspetos que abordaremos em maior profundidade no Capítulo III.

1.2. Abordagem sociopsicológica das representações sociais


Diariamente, comunicamos e interagimos com os indivíduos que nos rodeiam,
trocando, assim, ideias, opiniões e até dados que temos como adquiridos. Partindo deste
pressuposto, Durkheim criou o conceito de “representações coletivas” para evidenciar o modo
como as pessoas partilham significados comuns e como transformam a realidade em que
vivem em função desses significados (cit por. Vala, 2004). Contudo, Durkheim incluía neste
conceito qualquer ideia, emoção ou crença, o que gerou dificuldades na compreensão e
definição do conceito (Moscovici, 2003). Para tentar superar esta visão estática das
representações, Moscovici criou o conceito de “representações sociais”, embora admita não
conseguir fazer a distinção entre “social” e “coletivo” (Ibidem).
Uma representação, para ser considerada social, deve respeitar três critérios: critério
quantitativo (tem de ser partilhada por um conjunto de indivíduos), critério genético (tem de
ser coletivamente produzida) e critério de funcionalidade (organiza as relações simbólicas
entre os vários atores do grupo) (Ordaz; Vala, 1997, p.848). Segundo Duveen, na Introdução à
obra de Moscovici, as representações entram para o nosso quotidiano, onde discutimos com
os nossos amigos, e circulam nos media que lemos, ouvimos e vemos (in Moscovici, 2003).
Elas servem para estabelecermos associações através das quais nos ligamos uns aos outros e
31
O “mundo de aventura” do artista

emergem como um modo de compreender quer um objeto particular, quer a forma como um
sujeito adquire uma capacidade de definição (in Moscovici, 2003). As representações estão
presentes não só nas conversas, mas também nos filmes, nas telenovelas, nos telejornais, nos
reality shows, nos desenhos animados, na literatura, nas canções, nos provérbios, nos mitos,
entre outros (Moscovici, 2003).
Moscovici foi o primeiro a considerar como um fenómeno o que inicialmente era
considerado um conceito. Para ele, as representações são históricas e influenciam-nos desde a
infância (Ibidem). É através delas que tornamos o não-familiar, familiar, pois

“as representações que nós fabricamos (…) são sempre o resultado de um esforço constante de
tornar comum e real algo que é incomum (não-familiar) (…). E através delas nós superamos o
problema e o integramos em nosso mundo mental e físico, que é, com isso, enriquecido e
transformado. Depois de uma série de ajustamentos, o que estava longe, parece ao alcance de
nossa mão; o que parecia abstrato, torna-se concreto e quase normal.” (Ibidem, p.58).

As representações possuem três grandes funções: social (orientação das condutas e


comunicações), afetiva (proteção e legitimação das identidades sociais) e cognitiva
(familiarização com a novidade) (Spink, 1993, p.306). Foi sobre esta última que Moscovici se
debruçou mais. Segundo ele, a formação das representações sociais depende de dois processos
sociocognitivos maiores: ancoragem e objetivação (Moscovici, 2003). A ancoragem “tenta
ancorar idéias estranhas, reduzi-las a categorias e a imagens comuns, colocá-las em um
contexto familiar” (Ibidem, p.60-61). Já a objetivação visa “transformar algo abstrato em algo
quase concreto, transferir o que está na mente em algo que exista no mundo físico” (Ibidem,
p.61).
Relativamente à ancoragem, podemos dizer que sempre que uma ideia ou um objeto
são comparados a uma categoria, eles adquirem características dessa categoria, sendo
ajustados a ela se se verificar necessário (Moscovici, 2003). Por vezes, estamos conscientes
da relatividade daí subjacente, mas optamos por garantir o mínimo de coerência entre o que
conhecemos e o que não conhecemos. “Ancorar é, pois, classificar e dar nome a alguma
coisa” (Ibidem, p.61) e a ancoragem refere-se, assim, “ao papel das RS [representações
sociais] enquanto âncoras que apoiam a construção de categorias identitárias, de clivagens
sociais e de posições sociais” (Vala, 1997, p.8). Desta forma, a neutralidade não é permitida,
pois todas as ideias e objetos devem possuir um valor positivo (sendo aceites) ou negativo
(sendo rejeitados) e assumir determinada posição na hierarquia (Moscovici, 2003).

32
O “mundo de aventura” do artista

Além desta generalização, existe a particularização, ou seja, quando mantemos a


distância e continuamos a analisar o objeto, tentando descobrir o que o torna diferente.
Importa referir que tanto uma generalização como uma particularização são atitudes para com
o objeto, e não uma escolha meramente intelectual (Moscovici, 2003).
No seu trabalho, Serge Moscovici criou uma tipologia para melhor evidenciar a
pluralidade das representações sociais (cit. por Vala, 1997). Para ele, as representações podem
ser hegemónicas, emancipadas ou polémicas. As representações hegemónicas “têm o seu
ponto de ancoragem nas crenças e valores largamente difundidos, indiscutíveis, coercivos e
que se referem à natureza do homem e à natureza da ordem social” (cit. por Vala, 1997, p.9).
As representações emancipadas “reflectem as experiências de cooperação entre diferentes
grupos sociais” e as representações sociais polémicas “são por definição geradas no decurso
dos conflitos sociais, e a sua ancoragem faz-se em grupos antagónicos” (Ibidem).
Apesar das considerações que Moscovici tece sobre o processo de ancoragem, na sua
obra são referidas duas consequências deste processo (2003). Primeiro, é assim excluída a
ideia do pensamento sem ancoragem, há a ideia de consenso e de um sistema geral, sem
vieses. Além disso, classificar/nomear não é apenas graduar e rotular objetos (Moscovici
2003).
Quanto à objetivação, esta é, para o autor, mais atuante que a ancoragem, pois “une a
idéia de não-familiaridade com a de realidade” (Ibidem, p. 71). A objetivação consiste na
“forma como se organizam os elementos constituintes da representação e ao percurso através
do qual tais elementos adquirem materialidade e se tornam expressões de uma realidade
pensada como natural” (Vala, 2004, p. 465), envolvendo três etapas: construção seletiva
(construção de um todo coerente, tendo em conta as informações disponíveis, entretanto
selecionadas e descontextualizadas), esquematização (estruturação das noções básicas que
constituem uma representação estruturada) e naturalização (o que era perceção torna-se
natural e adquire materialidade) (Vala, 2004). Desta forma, “Analisar o processo de
objectivação consiste, assim, em identificar os elementos que dão sentido a um objecto, a sua
selecção de um conjunto mais vasto de conceitos, as relações entre esses conceitos
(reconstrução de um esquema), a sua figuração e as modalidades que assume a sua
naturalização” (Ibidem, p. 467-468). A objetivação é, assim, “um processo que resulta
simultaneamente de factores internos ao grupo (autocategorização) e de factores externos ao
grupo (heterocategorização)” (Vala, 1997, p.11)
Materializar uma ideia implica associá-la a um nome ou rosto (personificação), reais
ou prototípicas e também pode implicar a sua metaforização (Ordaz; Vala, 1997). A par da
33
O “mundo de aventura” do artista

personificação e da metaforização, Ordaz e Vala falam-nos também da ontologização, isto é,


da atribuição de características às ideias e às palavras que pertenciam aos seres vivos e às
coisas e da figuração, ou seja, da “tradução de conceitos em imagens” (1997, p.851).
Contudo, nem todas as palavras podem ser ligadas a imagens: ou não há imagens suficientes
fáceis de aceder, ou porque as imagens lembradas são tabus (Moscovici, 2003, p.72).
Portanto, as representações, de acordo com Duveen, são fruto da comunicação, mas é
de salientar que sem representações também não existiria comunicação (in Moscovici, 2003,
p. 22). Uma representação social tem, assim, uma dupla função: se, por um lado, permite aos
indivíduos orientarem-se e controlarem o mundo material e social em que se inserem, por
outro permitem a comunicação entre os vários membros da comunidade, através de um
código comummente partilhado (Moscovici, 2003).
Não existem, portanto, representações sem objeto (Jodelet, 1989, p.5). Contudo, por
vezes, as representações são distorcidas (todos os atributos estão presentes, mas alguns são
acentuados ou minimizados), suplementadas (confere-se ao objeto atributos que ele não
possui) ou desfalcadas (parte dos atributos do objeto são suprimidos) (Ibidem, p.17).
Para Jodelet, as representações sociais são formas de conhecimento que se manifestam
como elementos cognitivos (e não só) e são criadas e partilhadas socialmente como forma de
construir uma realidade comum que permita a comunicação entre os vários indivíduos (1985).
Devem, contudo, ser entendidas como um fenómeno social que deve ser analisado no
contexto em que foi produzido (Ibidem). Elas apresentam como características fundamentais a
representação de um objeto e a posse de um caráter imagético, simbólico, significante,
construtivo, autónomo e criativo (Jodelet, 1989).
As representações sociais, também designadas por “saber do senso comum” ou “saber
ingénuo” (Jodelet, 1985, p.473), guiam-nos em diversos aspetos do nosso dia a dia, ajudam a
interpretar os acontecimentos e a tomar uma posição a respeito deles (Jodelet, 1989, p.1). Elas
são uma forma de conhecimento, socialmente construído e compartilhado (Ibidem, p.4), e a
sua influência é mais visível em comunidades de pequena dimensão, onde a unidade e a
identidade são asseguradas pelas trocas informais entre os membros do grupo (Maget cit. por
Jodelet, 1989, p.13).
Segundo Moscovici, existem dois universos de pensamento nas sociedades
contemporâneas: os reificados (relativos à ciência, onde há o certo e o errado) e os
consensuais (relativos ao senso comum, lugar onde as representações são produzidas, como a
escola, a casa e os media) (Moscovici, 2003). Ciência e senso comum são diferentes, embora
sejam ambos representações da realidade (Ibidem). Porém, a falta de informação e a incerteza
34
O “mundo de aventura” do artista

quanto à ciência favorecem o aparecimento das representações que circulam, formando


“teorias espontâneas”, “carregadas de significações” (Jodelet, 1989, p.4), autênticas “lendas
urbanas” (Brun-vand cit. por Jodelet, 1989, p.13).
Nas “sociedades industriais e pós-industriais, as representações sociais assumem um
caráter móvel, plástico e circulante. (…) Em diversos campos (político, religioso, científico,
entre outros), muitas delas não conseguem sequer se sedimentar, pois o seu tempo de duração
(existência) não as deixa se transformarem em tradições imutáveis” (Morigi, 2004, p.4). Na
atualidade, elas podem mesmo ser equiparadas aos mitos e crenças presentes nas sociedades
ditas primitivas (Moscovici cit. por Horochovski, 2004, p.99).
O fenómeno cognitivo das representações sociais é característico das sociedades
contemporâneas “pensantes”, constituída por “sábios amadores” (Moscovici; Hewstone cit.
por Jodelet, 1989, p.10), onde tudo acontece a um ritmo acelerado e onde não há tempo para
que as representações se tornem uma tradição (Moscovici, 2003). Nestas sociedades, onde há
representações que nos chegam já prontas (Jodelet, 1989, p.14), os indivíduos não são
passivos, mas antes constantes (re)avaliadores dos seus problemas e soluções. As
representações sociais surgem aquando da mudança, gerando novos conteúdos (Moscovici,
2003). Durante esse período, as pessoas tornam-se mais recetivas a manifestações que
anteriormente não lhes eram percetíveis (Ibidem). Segundo Moscovici, não existe nenhuma
representação que não esteja na realidade (cit. por Sêga, 2000, p.132).
Este é um fenómeno que traz consequências (Moscovici, 2003). As representações são
prescritivas, ou seja, elas impõem-se sobre nós de uma forma irresistível, penetrando e
influenciando a mente de cada um, mas sendo repensadas, recitadas e reapresentadas ao longo
de várias gerações. Além disso, elas criam modelos partilhados por várias pessoas e mesmo
que o objeto/pessoa/acontecimento não se enquadre no modelo criado, os indivíduos forçam-
no a entrar em determinada categoria, a ser igual aos outros elementos, sob pena de não vir a
ser compreendido. Por vezes, conseguimos estar conscientes dessas convenções e até escapar
de algumas delas, mas não conseguimos eliminar sempre todos os preconceitos (Ibidem).
As representações sociais são um fenómeno de natureza simbólica que estão
relacionadas com a exclusão social (Menin, 2006). A maioria dos estudos que versam sobre
elas baseiam-se no que é verbalizado pelos sujeitos (em entrevistas ou inquéritos por
questionário), não tendo em conta aquilo que as pessoas pensam mas não dizem, sendo a
chamada “zona muda” (Abric cit. por Menin, 2006, p.43-44). De acordo com Abric, os
elementos que se encontram na zona muda estão ligados a avaliações e valores e são tidos
pelo indivíduo como ilegítimos para o grupo a que pertencem (cit. por Menin, 2006, p.43-44).
35
O “mundo de aventura” do artista

Na recolha das representações, pode ainda pedir-se ao sujeito investigado que faça
associações livremente, porém, segundo Guimelli e Deschamps, as associações nunca são
totalmente livres, até porque as primeiras palavras e expressões citadas nem sempre são as
primeiras que ocorrem aos sujeitos, mas sim as que parecem mais adequadas (cit. por Menin,
2006, p.46).
Do ponto de vista metodológico, é possível apontar os estudos de Moscovici e Jodelet
como os trabalhos de referência na área. Serge Moscovici optou pela técnica da análise de
conteúdo na sua pesquisa sobre as representações acerca da psicanálise e Denise Jodelet optou
por entrevistas e pela etnografia no seu trabalho sobre as representações da sida (cit. Por
Horochovski, 2004). Estes estudos são importantes, “Primeiro, porque se apresentam como
capazes de revelar a maneira à qual os diversos atores assimilam, elaboram e difundem
conhecimentos sobre a realidade e qual o sentido imaginário destes. Segundo, porque (…)
permitem que a sociedade aprenda a se situar no (diante do) mundo, que ela revele o que e
como está significando o mundo” (Oliveira cit. por Horochovski, 2003, p.102).
Em suma, para se definir as representações sociais é preciso ter em conta fatores
sociológicos e psicológicos que ocorrem no quotidiano, bem como uma visão histórica dos
acontecimentos (Moscovici, 2003). Elas são um produto e um processo social, controlam o
hoje a partir do passado, alicerçando-se na memória, e a sua influência é maior quando menos
pensamos nelas e quando menos temos consciência que elas existem. Esta é uma teoria que,
segundo Moscovici, não é vaga, apenas difere da metodologia utilizada na psicologia
tradicional, e que vê o senso comum como conhecimento, embora diferente da ciência e da
ideologia. O senso comum é de elevada importância visto que dá autonomia aos grupos
minoritários, ao que eles pensam, ao que eles são, à forma como comunicam e às implicações
locais e globais de tal comunicação (Ibidem).
Desta feita, este trabalho de investigação procura recolher e analisar os significados
atribuídos às artes e aos artistas. Esses significados, tal como referido anteriormente, são
coletivamente produzidos, organizam as condutas dos indivíduos, legitimam as identidades
sociais e promovem a familiaridade com a novidade. Neste sentido, pretendemos perceber se
as ideias associadas ao nosso objeto de estudo têm uma conotação positiva ou negativa
(generalização), se refletem as experiências dos indivíduos, se decorrem de conflitos e/ou de
crenças e valores, bem como perceber se a arte é personificada, metaforizada ou ontologizada.
Para isso, as técnicas de análise de conteúdo e entrevista figuram-se como adequadas ao
estudo das representações no âmbito em que nos propusemos.

36
O “mundo de aventura” do artista

1.3. Do discurso mediático à difusão de significados: o caso das artes


É difícil encontrar uma linha que separe a sociedade dos media. Os meios de
comunicação social inserem-se na sociedade, dependem dela, embora cada vez mais se assista
ao poder que estes têm de influenciar os indivíduos. Neste sentido, procuramos, neste
momento, explicitar a ligação entre o campo mediático e o campo artístico, atendendo à
relação entre media, sociedade e cultura e aos fatores que fazem das artes notícia.
McQuail defende que o poder dos media se tornou evidente aquando da Segunda
Guerra Mundial, sendo estes utilizados como meio propagandístico, formando opiniões e
influenciando comportamentos, chegando à maioria das pessoas e gerando consenso acerca
das mensagens por eles difundidas (2003). Por outro lado, o mesmo autor aponta alguns
estudos que sugerem que são notórias as ligações entre os media de massas e a
(des)integração social: eles tanto ligam indivíduos separados entre si através de uma
experiência comum, como contribuem de forma negativa para o aumento do crime e da
impessoalidade, gerando pânico em certas situações. Eles são também potenciais educadores,
a par das instituições escolares ou das bibliotecas, disseminando ideias, informações, opiniões
e divertimento e denunciando crimes e imoralidades (Ibidem). Contudo, podem também,
mesmo que involuntariamente, difundir preconceitos (Hall cit. por Curran; Seaton, 1997,
p.337).
Stuart Hall et al. afirmam que os media oferecem interpretações poderosas sobre a
forma de compreender os acontecimentos, uma vez que assentam em pressupostos
frequentemente implícitos sobre o que é a sociedade e sobre a maneira como ela atua (1978).
Esses pressupostos levam-nos a uma visão consensual da sociedade, uma sociedade onde há
equilíbrio de forças, onde o acesso aos media é livre e a justiça é igual para todos. Além disso,
os media assumem que o seu público tem um background cultural semelhante e consensual.
Esta ideia de consenso da sociedade faz com que se acredite que todos temos o mesmo acesso
à informação e o mesmo “mapa de significados”, uma vez que somos todos membros da
mesma sociedade. Há, ainda, a presunção de que todos temos os mesmos interesses e um
equivalente poder na sociedade (Ibidem).
Vários estudos concluíram que as pessoas não mudam necessariamente de ideias
aquando da exposição de um conteúdo nos media, mas sim que o seu interesse por aquele
tema aumenta, bem como o conhecimento acerca do mesmo (sobretudo na política) (Curran;
Seaton, 1997). As pessoas são mais vulneráveis à persuasão mediática acerca de assuntos que
não dominam e tendem a acreditar mais no que é veiculado pela comunicação social que
consideram ser de confiança. A resposta desses indivíduos, o público, é heterogénea (daí que,
37
O “mundo de aventura” do artista

frequentemente, se use a expressão “públicos” para designar essa heterogeneidade) (Curran;


Seaton, 1997). Segundo McQuail et al., os membros dos públicos procuram os media não só
para se manterem informados, mas também para diversão e para confirmarem a sua
identidade pessoal (cit. por Curran; Seaton, 1997, p.374). Os media são, assim, usados pelos
públicos, que se servem dele consoante as suas necessidades e usando as suas mensagens de
maneiras variadas (Ibidem). Ainda assim, convém salientar que a influência dos media sobre
os públicos depende do contexto em causa (Curran; Seaton, 1997).
Também a Escola de Frankfurt se debruçou, desde 1924, sobre o poder da imprensa e
da difusão (cit. por Curran; Seaton, 1997). De acordo com o seu pensamento determinista, os
media fortalecem os hábitos e atitudes que tornam as pessoas suscetíveis a certos argumentos.
Estes filósofos fugiram para os Estados Unidos da América quando Hitler subiu ao poder,
mas viram-se confrontados com uma sociedade consumista a que chamaram
“sociedade/cultura de massas”. Para eles, a cultura americana estava a destruir as tradições
culturais europeias e era essa mesma sociedade de massas que produzia os efeitos de
personalidade que tornavam a sociedade vulnerável a certas influências (Ibidem).
Neste seguimento, Theodor Adorno e Max Horkheimer (da Escola de Frankfurt)
criaram, nos anos 1940, o conceito de “indústria cultural” que retrata a produção em série e
normalizada sentida pela cultura nos últimos tempos, o que, dizem eles, leva à uniformidade
de estilo e conteúdo e tendo como fins principais o entretenimento e a procura do lucro e da
máxima eficácia (cit. por Rieffle, 2003). Segundo este conceito, a obra de arte é uma
mercadoria, sendo o homem visto apenas como potencial cliente, sendo manipulado e sendo-
lhe imposto o gosto dominante (Ibidem). Contudo, esta teoria não se sustenta em pesquisas no
terreno, o imaginário social não depende só de uma imposição da maneira de pensar e o facto
de a produção ser normalizada não obriga a uma homogeneização do gosto (Rieffle, 2003).
Assim, surgiu o conceito no plural, “indústrias culturais”, primeiramente usado por Morin e
Miège (anos 1960/70), para designar a diversidade e complexidade na produção cultural (cit.
por Rieffle, 2003). Esta fusão da cultura e da indústria tornam a cultura redutora, subordinada
às lógicas de mercado, como qualquer outro produto nas sociedades capitalistas. Estes
teóricos distanciam-se da Escola de Frankfurt por terem em conta que a comercialização da
cultura é um processo ambivalente (Rieffle, 2003).
Segundo David Hesmondhalgh, as indústrias culturais são instituições essencialmente
comerciais, mas também de serviço público, e dizem respeito a todas as atividades que visam
a produção de conteúdos, narrativas, discursos e textos para serem distribuídos e consumidos
por determinadas audiências (Hesmondhalgh, 2007). Essas instituições competem entre si
38
O “mundo de aventura” do artista

pelos mesmos recursos, nomeadamente os rendimentos limitados dos potenciais


consumidores e os investimentos limitados por parte da publicidade, a necessidade de mão de
obra especializada e o tempo disponível para o consumo desses produtos culturais
(Hesmondhalgh, 2007). As indústrias culturais estão hoje no centro da atividade económica
de muitos países, os produtos culturais atravessam fronteiras com uma facilidade cada vez
maior e as novas tecnologias de informação e comunicação permitem uma proliferação cada
vez maior de conteúdos. Elas são mais que uma forma de passar o tempo, o que elas
produzem tenta orientar a audiência para novos modos de pensar e tendo em conta as
exigências das audiências, as indústrias culturais dão cada vez mais valor às pesquisas de
mercado (Ibidem).
As artes, que sempre foram pensadas como as maiores formas de criatividade humana,
são aquilo a que Hesmondhalgh chama “criatividade simbólica”, sendo os artistas criadores
de simbologia. Eles são os principais trabalhadores das indústrias culturais e o que eles
produzem (“textos”) apoia-se nos sistemas industriais para a reprodução, distribuição,
marketing e remuneração. Porém, o modo como as indústrias culturais organizam e fazem
circular a criatividade simbólica reflete as desigualdades e injustiças nas sociedades
contemporâneas capitalistas. Em 2000, surgiu o conceito “economia criativa” que
corresponde à ideia de que as sociedades e economias têm vindo a ser construídas na
informação, conhecimento e na cultura. Os próprios académicos argumentam que a
criatividade será a condutora da mudança económico-social muito em breve (Ibidem).
Na sequência do desenvolvimento da Economia Política dos Media e da Teoria da
Dependência (anos 1960/70), surgiu a tese do imperialismo cultural (Mattelart; Mattelart,
1997). Segundo Schiller, o imperialismo cultural é “o conjunto dos processos pelos quais a
sociedade é introduzida no seio do sistema moderno mundial e a maneira como a sua camada
dirigente é levada, pelo fascínio, a pressão, a força ou a corrupção, a modelar as instituições
sociais para que correspondem aos valores e às estruturas do centro dominante (…)” (cit. por
Mattelart; Mattelart, 1997, p.98). Isto é, de acordo com esta tese, a cultura tradicional e local
está a ser destruída devido às grandes quantidades de “lixo” comercial e de produtos
mediáticos produzidos nos Estados Unidos da América (Tunstall, 2008). O poder político e
económico tem vindo a espalhar valores e hábitos de uma determinada cultura em detrimento
das culturas nativas (Tomlinson, 1991). Por outro lado, Tomlinson argumenta que a cultura
não pertence a lugares (Ibidem).
Segundo Hannah Arendt, a sociedade de massas – como veio a ser chamada a
sociedade atual onde a presença dos media é constante e evidente – “não quer a cultura, mas o
39
O “mundo de aventura” do artista

entretenimento (…) e os artigos oferecidos pela indústria de entretenimento são, de facto,


consumidos pela sociedade como todos os objectos de consumo” (cit. por Rieffel, 2003, p.99).
Contudo, a designação de “massas” é desvalorizada por Bourdieu e Passeron, que a
consideram imprecisa (1963). Para eles, nem todos os indivíduos pertencentes à sociedade de
massas possuem as características dessa sociedade. Além disso, falta saber quantas pessoas
são precisas para que um grupo seja considerado uma massa e que conteúdos serão vulgares
ao ponto de pertencerem à cultura de massas (Ibidem).
De uma maneira geral, pode dizer-se que a cultura assume um papel fulcral nas
economias atuais e está cada vez mais disponível a um maior número de pessoas neste mundo
globalizado, situação para que muito contribuem os meios de comunicação social nas suas
mais variadas vertentes (Rieffel, 2003). Os significados, se aceitarmos que são difundidos e
partilhados por muitos indivíduos, estão, também eles, consequentemente, cada vez mais
acessíveis (Ibidem). No entanto, convém ter em conta a posição de Michel de Certeau, que
defende que o público não é passivo ou inerte face às mensagens difundidas pelas media (cit.
por Rieffel, 2003, p.112).
Atentando ao caso das artes, Melo refere a importância dos media enquanto instância
legitimadora e mediadora no setor (1994). Os próprios jornalistas são agentes do campo
artístico na medida em que também eles medeiam a relação entre os produtores de arte e os
seus recetores. São eles que dão voz a outros agentes (como os próprios artistas, os
patrocinadores, os públicos, os comentadores, entre outros), que escolhem o que vai ser falado
e de que forma, ou seja, são eles que traduzem o campo artístico numa linguagem acessível
para o seu público-leitor, mais ou menos familiarizado com a arte (Ibidem).
Porém, esta não é uma relação de onde as artes e os seus agentes envolvidos saem,
necessariamente, em desvantagem (Golin; Cardoso, 2009). Tendo em conta que os meios de
comunicação social são meios de longo alcance e que transformam os conteúdos em
linguagem compreensível, estes são bastante desejados pelos artistas que procuram
visibilidade e até apoios económicos (Ibidem). Embora escolas, universidades, museus e
galerias também contribuam para a maior visibilidade da produção artística, são os media os
responsáveis por “produzir a sedução, criar necessidades desses objetos e sustentar a palavra
dos críticos” (Golin; Cardoso, 2009, p. 7). Ainda assim, convém não esquecer que a cobertura
mediática “incentiva mas não garante a frequência do público a instituições culturais como
museus” (Ibidem) e que um visitante de um museu não comparece numa exposição,
necessariamente, por ter lido sobre ela num jornal ou revista (Golin; Cardoso, 2009). Desta
forma, os significados produzidos e difundidos pelos media podem ser comprovados ou
40
O “mundo de aventura” do artista

refutados pela visita dos consumidores de informação aquando das suas visitas a espaços
artísticos e culturais (Golin; Cardoso, 2009).
Para Golin e Cardoso, a maior ênfase dada à cultura por parte dos media a que temos
vindo a assistir deve-se ao aumento da importância dada ao lazer e ao entretenimento (2009).
A agenda de um periódico, por exemplo, guia os leitores e mostra-lhes o que podem escolher
no meio de uma infinidade de atividades disponíveis. Há uma tendência para falar mais de
artistas e obras notórias e para realçar mais a vida do autor que propriamente as suas obras,
sobretudo quando existem pormenores chocantes na vida do criador capazes de suscitar a
atenção da audiência (Ibidem).
No caso do jornalismo cultural, este também contribui para a formação de públicos e
para a sua aproximação com a obra, sendo um importante mediador (Golin et al., 2008). A par
de outras instituições como os museus, as galerias de arte e as universidades, o jornalismo
confere visibilidade a certos artistas e obras (Ibidem, p. 8). Ele “alicerça e constrói a memória
simbólica” (Ibidem, p.9), contribui para a criação de consenso e revela novos talentos ou
deixa os tradicionais caírem no esquecimento (Golin et al., 2008). Cabe ao jornalista, através
de critérios mais ou menos definidos (valores-notícia), escolher que acontecimentos vão
figurar no espaço disponível nos jornais para os conteúdos culturais. Embora a cultura apareça
como algo pronto nos media impressos, a verdade é que esta presença é reflexo de um longo
processo (Ibidem).
O jornalismo cultural foi fundamental para que as artes se tornassem públicas
(Ribeiro, 2008, p. 28). No atual contexto de modernidade, os media "destacam-se (...) como
entidade detentora de um saber, de uma forma de conhecimento quotidiano, de uma narrativa
que se renova constantemente pelo fluxo inesgotável dos acontecimentos sociais" (Guedes cit.
por Ribeiro, 2008, p. 30). Eles não só documentam a produção cultural como ajudam o
público a interpretar a cultura de determinado local e época (Golin; Cardoso, 2009, p.1).
Refletem alianças, influências, antagonismos, rivalidades, cisões e encontros de gerações de
intelectuais (Abreu cit. por Golin; Cardoso, 2009, p. 4).
Quanto aos géneros jornalísticos, é comum o jornalismo cultural misturá-los, embora o
mais frequenta seja a notícia (Golin et al., 2008). Os textos de opinião, tão importantes na
formação de públicos, aparecem em menor frequência (Golin et al., 2008, p. 13). As imagens
representam cerca de 30% da área impressa (tanto no interior do jornal como na capa) e,
quanto às fontes, estas são em número reduzido e estão, maioritariamente, envolvidas no
acontecimento (Golin et al., 2008, p. 14). Fontes, jornalistas e audiência coexistem no mesmo
sistema, sendo o jornalista quem decide que fontes chegam até aos públicos (Golin et al.,
41
O “mundo de aventura” do artista

2008). Por outro lado, verifica-se a prevalência do próprio autor/artista enquanto fonte,
seguido de veículos como jornais e revistas citados, posteriormente o público, os produtores
culturais, os críticos, os especialistas e só depois os políticos (Golin et al., 2010). Em primeiro
lugar estão, portanto, as fontes ligadas à criação e só depois as ligadas à validação (Ibidem, p.
128).
No seu estágio no Jornal de Notícias, realizado em 2008, Maria de Fátima Ribeiro
verificou que existia a pretensão de ir além da agenda, porém, os jornalistas ficavam
geralmente aquém desse desejo (2008). Os limites de tempo e espaço condicionavam as
escolhas, para além da pressão das assessorias e da falta de jornalistas especializados.
Constatou, ainda, que existe uma grande relação entre os lançamentos e a informação, bem
como a tendência para a cobertura de eventos com grande impacto junto do público (como os
concertos). Segundo a autora, a presença de textos de opinião é mais frequente nos
suplementos semanais, embora sejam superficiais. Os textos diários são mais factuais dada a
falta de disponibilidade do leitor para ler uma maior quantidade de informação (Ibidem).
Para Wolf, quanto menor a experiência, o contacto que o indivíduo tem com
determinado tema, maior a influência dos media sobre ele (cit. por Pavarino, 2003, p.11).
Além disso, variáveis como a tecnologia, o acesso, as diferenças culturais sociais e
económicas influenciam a escolha dos meios de comunicação consultados pelos indivíduos,
variando as representações por estes assimiladas de acordo com o que é disseminado pelo
órgão de comunicação a que mais têm acesso (Pavarino, 2003, p.13).
Nem todos os acontecimentos ou declarações proferidas por fontes primárias ou
fidedignas são passíveis de ser noticiadas (Hall, 1978). Os media seguem uma determinada
linha editorial segundo a qual escolhem as suas fontes, contudo é inegável que “os media não
criam automaticamente as notícias”7 (Ibidem, p. 57). Neste seguimento, três conceitos devem
ser tidos em conta: gatekeeping, agenda-setting e espiral do silêncio.
O gatekeeping (“controlo de entradas”, em português) é o processo pelo qual se fazem
as seleções no trabalho dos media, em especial decisões de admitir ou não que uma dada
notícia passe através das “portas” de um meio noticioso e entre no circuito das notícias”
(McQuail, 2003, p.280). O gate keeper é aquele que define o que vai ser noticiado segundo os
critérios noticiosos (valores-notícia) e segundo a linha editorial do órgão de comunicação. Ele
é o “porteiro” e tem o poder de dar ou retirar acesso a diferentes vozes/fontes na sociedade, o
que nem sempre é aceite de forma pacífica (McQuail, 2003, p.280).

7
Tradução do original: “the media do not themselves autonomously create the news items” (Hal et.al., 1978,
p.57).
42
O “mundo de aventura” do artista

Alguns estudos sugerem que o conteúdo noticioso tende, geralmente, a seguir um certo
padrão e que organizações diferentes se comportam da mesma maneira quando confrontadas
com os mesmos acontecimentos em condições equivalentes (Glasgow Media Group et al. cit.
por McQuail, 2003, p.282). Segundo Tuchman, os acontecimentos mais fáceis de obter são
também os mais noticiados, e não necessariamente os mais importantes (cit. por Curran;
Seaton, 1997, p.328). Outra explicação encontra-se no conceito “valor-notícia”, ou seja, nos
critérios de relevância e interesse dos acontecimentos para o público (Ibidem).
Os valores-notícia são importantes nas três fases da produção jornalística: recolha,
seleção e apresentação da informação. Se para alguns autores tais critérios limitam a atividade
jornalística e dotam-na de uma certa artificialidade, para outros trata-se da regulação e
democratização da atividade, proporcionando até uma maior produtividade (Golin; Cardoso,
2009). Os valores-notícia que pesam mais frequentemente na produção noticiosa sobre cultura
são, segundo Berger: “temporalidade, amplitude, clareza, significância, consonância,
imprevisibilidade, notoriedade dos sujeitos, conflitos e controvérsias, morte, entre outros”
(cit. por Golin; Cardoso, 2009, p. 7). Autores como Mário Wolf falam ainda de importância,
interesse, interesse nacional, proximidade geográfica e psicológica, grande número de
indivíduos envolvidos, atualidade e novidade na produção jornalística em geral (cit. por
Correia, 2000). Já Galtung e Ruge apontam a raridade (do acontecimento), o inesperado, a
violência, a hostilidade (face às elites ou nações), a intensidade e a linearidade (cit. por
Correia, 2000). Por sua vez, Gomes estabeleceu dicotomias: presente/passado,
invulgar/normal, dramático/corrente, simples/complexo, ações/ideias, personalidade/
estruturas e resultados/processos (Ibidem). McQuail refere, ainda, o local onde o órgão de
comunicação está sediado, o lugar onde o poder é exercido e o timing em relação ao ciclo das
notícias (Ibidem). Os aspetos negativos, por tenderem a ser diferentes, chocantes e fora da
norma, são mais "apetecíveis", para além de que "Aquilo que é positivo é mais difícil de
mostrar e leva mais tempo, enquanto o negativo é mais fácil e mais rápido" (Correia, 2000,
p.147).
Alguns estudos sugerem que “é provável que alguns acontecimentos se tornem mais
notícia do que outros porque se prestam mais aos procedimentos de recolha e processamento”
(Mcquail, 2003, p.282) e ainda que alguns eventos surgem dos comunicados de imprensa,
sendo aquilo a que podemos chamar “pseudo-acontecimentos” (Curran; Seaton, 1997). É a
publicidade gratuita, um acontecimento surge como notícia quando, na realidade, a sua
noticiabilidade reflete interesses que chegaram até às redações e, por vezes, a necessidade de
aquele órgão de comunicação social ocupar espaço/tempo que ainda tem livre naquela edição
43
O “mundo de aventura” do artista

(Curran; Seaton, 1997, p.329-330). Outros aspetos fundamentais no tratamento das notícias
são o acesso aos acontecimentos e a presença ou ausência de fatores que o facilitam, como a
localização dos repórteres e do material necessário para a recolha dos dados e ainda os
contactos pessoais que estes possuem com as fontes (McQuail, 2003). No caso da imprensa,
para além dos critérios que utilizam para decidir o que é ou não noticiado, os profissionais a
ela ligados (jornalistas, editores, paginadores, entre outros) são ainda responsáveis pela ordem
das notícias, ou seja, são eles que definem em que local daquela publicação o acontecimento
será noticiado, sendo que algumas páginas têm maior visibilidade junto dos leitores que outras
(Curran; Seaton, 1997, p.333).
Denis McQuail chama a atenção para o facto de os media ocidentais preferirem
acontecimentos que envolvam ações pessoais e para o facto de gostarem de personalizar o
abstrato de forma a tornar-se mais concreto para a audiência (2003). Há também a tendência
para se procurar pessoas conhecidas da opinião pública, à volta de quem as notícias são
construídas. Muitas vezes, as notícias incidem mais sobre o que essas pessoas têm a dizer
sobre certo acontecimento, do que sobre o acontecimento em si (Ibidem). Quanto às fontes,
um estudo de Reese mostrou uma considerável concentração de um relativamente pequeno
número de indivíduos que se relacionam entre si e com o assunto principal que é noticiado,
sendo usados para validar as notícias (cit. por McQuail, 2003). Ao usarem as mesmas fontes
constantemente, os media contribuem, mesmo que inconscientemente, para a construção de
um senso comum convencional e não para uma pluralidade de pontos de vista (Ibidem).
A teoria do agenda-setting, que em português pode ser traduzida por “estabelecimento
da ordem do dia”, foi criada nos anos 1970 por Maxwell McCombs e Daniel Shaw (Mesquita,
2003). Segundo McCombs, “os media nem sempre têm sucesso ao dizer às pessoas o que
devem pensar, mas têm sempre êxito ao dizer-lhes em que assuntos devem pensar” (cit. por
Mesquita, 2003, p80). Ou seja, segundo os autores existe uma relação causal direta entre o
que os media consideram importante noticiar em determinado período e os temas do dia
percecionados pela opinião pública. Os meios de comunicação social confirmam, assim, uma
visão do mundo e permitem aos cidadãos a construção da sua “enciclopédia” através da
seleção de dados feita pelos jornalistas (Ibidem). Assim, de acordo com a agenda-setting, os
media afetam a audiência, mas não diretamente (Curran; Seaton, 1997, p.327).
Quanto à espiral do silêncio, teoria estabelecida pela alemã Elisabeth Noëlle-
Neumann também na década de 70 do século XX, esta relaciona quatro elementos: os media,
a comunicação interpessoal e as relações sociais, as expressões individuais de opinião e as
perceções que os indivíduos têm da opinião que se generalizou no seu ambiente social (cit.
44
O “mundo de aventura” do artista

por McQuail, 2003, p.467). Esta teoria surgiu após a autora constatar que o medo do
isolamento leva as pessoas a manifestarem ou não as suas opiniões (McQuail, 2003). Isto é, os
media e a observação direta são as únicas fontes de informação dos indivíduos e, no caso dos
media, estes fornecem aos indivíduos expressões que eles podem usar para defender as suas
opiniões e posições. Sem estas expressões, eles permaneceriam no silêncio (Ibidem).
Toda a informação recolhida, e posteriormente selecionada, pelo jornalista é tratada e
passa também por um processo de transformação (Hall et al., 1978). Aqui, o jornalista
transforma os discursos aparentemente difíceis de entender pela maioria dos indivíduos numa
linguagem comum, adequada ao público, dando-lhe uma certa conotação de familiaridade.
Com este “idioma público” reproduz-se a visão consensual da sociedade (Ibidem).
No entanto, Stuart Hall et. al. dizem que há um alinhamento entre práticas e ideologias
jornalísticas com as ideologias dominantes (Ibidem). Ou seja, o jornalista tem então de
conjugar pressões práticas com as exigências profissionais de objetividade, neutralidade e
imparcialidade (Gans, 1979). Isto leva a que os jornalistas recorram a fontes de informação
fiáveis (Hall et al., 1978). Nesse caso podemos falar de “definidores primários” que tendem a
tornar-se as principais fontes dos profissionais da informação devido à sua institucionalidade
e representatividade (como deputados ou líderes de sindicatos). Pela garantia de fidedignidade
que conferem à informação dada, estes “definidores primários” são privilegiados em relação
ao resto da população pois influenciam as mensagens que chegam à população, apesar de
estas serem mediadas pelos jornalistas (Ibidem).
Desta forma, conclui-se que os jornalistas têm o “poder” de dizer sobre o que se falar e
como se falar, são eles que dizem ao público o que pensar e como pensar (Pavarino, 2003,
p.9). Os meios de comunicação social influenciam a opinião pública, quer através dos
acontecimentos que decidem trazer ou não para a ordem do dia, quer através dos significados
que veiculam sobre esses mesmos acontecimentos. Eles são vistos como instrumentos
essenciais para a produção de coesão social, bem como para a produção, reprodução e
disseminação de reproduções sociais (Alexandre, 2001, p.116). Se, para Stuart Hall et al. os
media produzem material de qualidade e ajudam a alterar o mundo, não apenas refletindo o
interesse das classes dominantes, mas também contribuindo para uma melhor organização do
entendimento público (1978), por outro lado veem-se sujeitos às lógicas de mercado,
procurando o lucro (Curran; Seaton, 1997). Assim, segundo Bourdieu, o jornalismo “sério”,
tendo em conta estas concessões, dá lugar à lógica de mercado e ao marketing (1994).
Posto isto, e partindo do pressuposto que os media influenciam a opinião pública e
ajudam a formar o imaginário coletivo, nesta investigação baseamo-nos nos conceitos de
45
O “mundo de aventura” do artista

gatekeeping (procuraremos identificar os valores-notícia que, em 2011, regeram a atividade


jornalística do Ípsilon sobre o campo artístico, bem como as fontes por ele citadas), agenda-
setting (procuraremos identificar os assuntos que o Ípsilon, no mesmo período, considera que
devem estar na ordem do dia) e espiral do silêncio (procuraremos identificar a forma como o
Ípsilon considera que se deve falar sobre as artes, nomeadamente através da identificação dos
tipos de discurso por ele utilizados e da recolha e análise das representações sobre as artes e
os artistas presentes no suplemento). Não nos esquecemos que os media, embora sejam uma
forma de publicidade gratuita, fornecem informações, conhecimentos e interpretações sobre a
realidade e estão sujeitos às lógicas de mercado. Nesse sentido, e dado as condicionantes a
que estão expostos, é nossa intenção analisar a visão que os meios de comunicação social dão
das artes e dos seus interlocutores.

46
O “mundo de aventura” do artista

CAPÍTULO II

As representações sobre as artes: enquadramento do problema, modelo analítico


e procedimentos metodológicos

2.1. As artes enquanto objeto de estudo: problema científico e modelo de análise


Apresentado o trabalho exploratório que serviu para alargar a nossa perspetiva de
análise e contactar com outras investigações e reflexões, retomamos o nosso objeto de estudo
– as representações das artes por parte do suplemento Ípsilon e dos estudantes finalistas da
Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP) em 2011/2012 – e procuramos
traduzir as perspetivas e conceitos por nós explorados numa estratégia metodológica que nos
permita recolher e tratar os dados essenciais à prossecução dos nossos objetivos.
Tendo vindo a cultura e as artes a representarem uma parte importante dos consumos
das famílias portuguesas (quadro 1.3.) e nos investimentos dos municípios (quadro 1.4.) e
assistindo-se a uma crescente especialização das profissões artísticas (quadro 1.8.), estudos
nesta área mostram-se necessários, nomeadamente através da investigação dos meios de
comunicação social, (re)produtores de conhecimentos sobre a área. Os próprios estudos dos
media “têm estado estreitamente ligados a questões políticas nacionais, constituindo
sobretudo um metadiscurso sobre a definição diária de realidade política” (Schudson cit. por
Ponte, 2002, p.61), sendo necessário inverter esta tendência através de estudos que versem
sobre outras áreas.
Quanto à imprensa, Gabriel Tarde defende que esta “foi um dos fatores que
favoreceram o surgimento e o desenvolvimento da opinião pública”(cit. por Rieffel, 2003,
p.37), sobretudo após a Revolução Francesa, altura em que a imprensa teve grande influência
nas conversas e ideias que circulavam nas sociedades (Rieffel, 2003). Foi nesta altura que
surgiu a noção de “público”, uma nova forma de associação coletiva em expansão devido à
intervenção deste “cimento social”, capaz de unir os indivíduos em prol do bem comum,
dando voz até às minorias. De acordo com Rieffel, no que diz respeito à cultura, antes do
desenvolvimento dos media a sua difusão obedecia a uma lógica: somente os mais
privilegiados, como a nobreza e a alta burguesia, tinham acesso às obras de arte e aos seus
criadores, fomentando a distinção social entre ricos e pobres (Ibidem). Contudo, a partir dos
séculos XIX-XX os media constituíram-se como um mecanismo de democratização cultural,
embora alguns investigadores questionem se essa intervenção não contribuiu para uma

47
O “mundo de aventura” do artista

uniformização da cultura e para um conformismo com a hegemonia da cultura americana


(Rieffel, 2003), algo que procuramos verificar se também acontece no nosso estudo de caso.
Como já referimos, os meios de comunicação social têm o poder de colocar um
acontecimento na ordem do dia ou silenciá-lo, o poder de dar visibilidade a determinado
artista e/ou obra e mostrá-los aos públicos, que veem essa presença nos media como um
indicador de prestígio e qualidade (Ribeiro, 2008). Eles não só sustentam a palavra dos
críticos e outros agentes do campo artístico como criam nos públicos a necessidade de
consumo de bens culturais e artísticos (Golin; Cardoso, 2009). Assim, nesse sentido,
pareceu-nos oportuno analisar a relação entre as formas artísticas e os media, vistos como
capazes de formar e influenciar a opinião pública, influência essa a que as artes não são
imunes. Além disso, tendo em conta que esta é uma relação bilateral, procuramos, ainda,
analisar as representações dos artistas sobre as artes e ainda sobre a relação artes-media.
Neste seguimento, apresenta-se de seguida o modelo de análise do nosso estudo e
respetiva esquematização:

Figura 2.1. Modelo de análise

ARTE

Obra de arte Artista

contexto social
criação autorepresentações

divulgação
heterorepresentações
imprensa
circulação
contexto profissional
mediação
Comunicação
legitimação de massas públicos

receção

Representações sociais

Após a construção e interpretação deste esquema, podemos referir que a arte é o


conceito central da presente dissertação. Assim, e tendo sempre em conta a visão da
sociologia da arte, considerou-se importante analisar a arte sob duas perspetivas: a da obra de
arte e a do artista. Relativamente à primeira, esta está hoje muito ligada ao gosto estético, à
48
O “mundo de aventura” do artista

expressão, às habilidades, sendo associada a funções como o adornar ou o registar algo.


Considerada uma manifestação “da psique colectiva" (Dicionário de Sociologia, 1963, p.33),
a arte retrata uma sociedade num determinado contexto histórico, social e cultural (Bastide,
2006). A aquisição de obras de arte é vista como um mecanismo que permite a distinção,
sendo a arte um poder simbólico que assegura um certo estatuto social (Conde, 2009). Porém,
essa aquisição também implica a detenção de capital económico. Já em 2010 eram evidentes
os cortes na cultura que a crise económica e financeira vivida em Portugal justificou (Rato,
2010), colocando em causa a realização de vários eventos, difíceis de concretizar sem apoios
financeiros suficientes (Coutinho; Carvalho, 2011). Decorrente deste facto, tudo nos leva a
considerar que dada a dependência do financiamento para as várias etapas da vida de uma
obra (Golin; Gruszynski, 2009), o valor económico da mesma e todos os lucros ou prejuízos
em torno dela são frequentemente referidos por parte dos vários atores envolvidos nos seus
processos de criação, divulgação, circulação, legitimação, mediação e receção.
Relativamente às obras de arte, foram consideradas seis dimensões: criação (da
responsabilidade do artista), divulgação, circulação, mediação, legitimação e receção (por
parte do público). A comunicação de massas – mais precisamente a imprensa, onde decidimos
centrar este estudo – é um importante meio de divulgação das obras, mediando a relação entre
os criadores e os seus públicos e constituindo-se como mais uma instância legitimadora do
valor das obras (a par dos críticos, dos investigadores, dos curadores, entre outros),
interferindo, assim, na receção das mesmas.
No que diz respeito aos artistas, centramos a nossa análise nos contextos social e
profissional (entre as autorepresentações artísticas e as heterorepresentações mediáticas) dos
mesmos. Inevitavelmente associados ao dom (Bourdieu, 1987), à criatividade, à originalidade,
à genialidade (Marinho, 2003), à vocação e ao quebrar das regras (Pais, 1995), entre outras
associações, os artistas ocupam hoje uma posição precária na divisão do trabalho (Gomes;
Marinho, 2009), enfrentando dificuldades na legitimação da sua obra. Assim, os media
representam uma instância importante na divulgação das formas artísticas (ou pretendentes a),
divulgação essa que certifica as mesmas como obras de arte, estando entre a criação e a
receção, e dando aos públicos informações que lhes permitam conhecer a obra, o artista e o
processo criativo. No entanto, os meios de comunicação social são difusores de significados,
posteriormente compartilhados pela comunidade, ou seja, também eles são responsáveis pela
partilha e circulação de representações sociais (conceito histórico, psicológico e sociológico
(Moscovici, 2003)), construindo, ou ajudando a construir, a imagem social do artista e da sua
atividade. Desta feita, as nossas interrogações iniciais passam por questionar como é que o
49
O “mundo de aventura” do artista

campo artístico é representado na imprensa portuguesa e até que ponto essa imagem vai de
encontro à imagem que os artistas têm de si próprios.
A partir destas primeiras interrogações, propomo-nos a analisar que obras e eventos
artísticos são chamados a figurar nas páginas dos jornais em análise e são descritos como
fenómenos artísticos, bem como perceber quais os factos artísticos que para estas duas
publicações assumem a relevância necessária para constarem na sua primeira página (a com
maior visibilidade). Outros autores por nós consultados apontam para o predomínio da música
face às outras áreas do campo artístico, o que se deve à sua facilidade de divulgação e ao
consumo por parte de um grande público (Ribeiro, 2008), algo que pretendemos apurar.
Desejamos também identificar as características dos discursos sobre arte e quais os
critérios (valores-notícia) que determinam a inclusão de determinado acontecimento na
agenda mediática. Qual a dimensão que a arte ocupa nos espaços noticiosos e quais as fontes
legitimadas pelos jornalistas para falarem/opinarem sobre arte são outras das questões a que
esta investigação pretende responder, bem como o tentar identificar o perfil-tipo do artista, as
características a ele associadas (idade, nacionalidade, características da sua personalidade,
entre outras que seja possível identificar).
Na prossecução destes objetivos pretende-se, principalmente, tentar perceber se,
enquanto instância de divulgação, legitimação e mediação, o artista (criação) é visto pela
comunicação social como um mero produtor de algo (sendo a obra de arte o seu produto),
dando-se maior ênfase ao seu lado profissional ou se, pelo contrário, é mais valorizado o seu
lado pessoal e social, através do relato da sua personalidade, sendo essa a informação que vai
chegar até aos públicos (receção). Tendo em conta que as notícias são cada vez mais um
produto e que os media obedecem a lógicas de mercado, os meios de comunicação social são
criticados por apresentarem mais detalhes sobre a vida do autor para além do seu trabalho, do
que propriamente sobre a sua obra (Araujo, 2008; Golin; Cardoso, 2009), o que nos leva a
crer que o discurso mediático não vai de encontro às autorepresentações dos artistas, algo que
pretendemos averiguar com esta investigação.

2.2. Procedimentos metodológicos no estudo das representações do campo artístico


Na prossecução dos nossos objetivos de pesquisa, torna-se necessário clarificar o
conjunto de princípios e práticas metodológicas a adotar. Tendo noção que o saber-fazer
sociológico resulta da interação entre teoria e empiria (Silva; Pinto, 1987), é esta interação
que condiciona o trajeto percorrido pelo investigador.
50
O “mundo de aventura” do artista

Sabendo que cabe ao método de investigação escolhido selecionar as técnicas


adequadas para a investigação e controlar a sua utilização (Almeida; Pinto, 1995, p.84), o
nosso primeiro passo foi escolher, de entre os três métodos existentes (experimental, que
procura uma relação causal; de medida, que implica uma análise quantitativa e estudo de
casos), o que seria um melhor “esquema ordenador “(Greenwood, 1963, p.315). Sendo a
nossa pretensão analisar as representações das artes para os sujeitos artísticos e para a
comunicação social, o método de análise intensiva ou estudo de casos configurou-se como o
mais adequado. Este “consiste no exame intensivo, tanto em amplitude como em
profundidade, e utilizando todas as técnicas disponíveis, de uma amostra particular,
seleccionada de acordo com determinado objectivo (…), de um fenómeno social, (…) com a
finalidade última de obter uma ampla compreensão do fenómeno na sua totalidade” (Ibidem,
p.331), ou seja, caracteriza-se como o estudo detalhado de um pequeno número de casos
(Bryman, 1989, p.170).
Posto isto, a nossa investigação situa-se no paradigma qualitativo. A adoção deste
paradigma gera implicações na forma como o próprio desenho de pesquisa é definido. No
âmbito do paradigma qualitativo, valorizam-se os significados e o contexto. O ponto de vista
dos participantes é tido em conta e os dados são recolhidos em forma de texto e/ou imagens
(Biklen, 1994, p.47-51). Descrição, compreensão e explicação são conceitos-chave neste
paradigma, onde o contacto e interação com o objeto de estudo são privilegiados (Pereira,
2010, p.64). Por fim, nesta abordagem tende a analisar-se os dados de forma indutiva, de
“baixo para cima”, ou seja, “as abstrações são construídas à medida que os dados particulares
que foram recolhidos se vão agrupando” (Biklen, 1994, p.50).
A presente investigação tem como base um estudo preliminar realizado em 2011
(Miranda, 2011). Este estudo de casos, aplicado aos cinco jornais diários portugueses
(Correio da Manhã, Diário de Notícias, Jornal de Notícias, jornal i e Público), apoiou-se na
análise de conteúdo de uma semana construída, através da qual foi possível verificar que o
jornal Público, apesar de não ser aquele que tem um maior número de artigos sobre artes, é o
que mais aprofunda os conteúdos artísticos. Assim, não só nos baseamos neste estudo para a
escolha do órgão de comunicação social em estudo, como também nos baseamos nele para a
construção da nossa grelha de análise de conteúdo, técnica que se mostrou essencial para a
recolha e análise das representações sobre o campo artístico avançadas pela imprensa. Graças
a ele, ficou clara a necessidade de ouvir outros interlocutores que não somente os jornalistas e
os seus discursos, bem como a necessidade de proceder à análise de dados relacionados com o
nosso objeto de estudo através de outras fontes documentais.
51
O “mundo de aventura” do artista

A análise de conteúdo, técnica de análise das comunicações, permite, por um lado, a


superação da incerteza – tornar a leitura válida e generalizável – e, por outro, o
enriquecimento da leitura – um olhar atento permite testar as hipóteses levantadas acerca do
conteúdo das mensagens em análise (Bardin, 2004). Neste seguimento, e sendo o objetivo
principal desta dissertação perceber quais os significados ligados às artes, o primeiro passo foi
a seleção do tipo de órgão de comunicação social que iríamos analisar. A escolha recaiu sobre
a imprensa por ser o meio mais antigo, que acompanha a sociedade há mais tempo, e também
por ser o de mais fácil acesso. A imprensa é um importante mediador cultural (Fernandes,
2007, p.1) e uma “poderosa ferramenta na construção de referenciais sociais, e (…) na
construção de um imaginário social.” (Ibidem, p.5). Além disso, é o meio de comunicação
que mais aprofunda os conteúdos noticiados e o que pode ser lido várias vezes, ao contrário
das emissões de rádio ou televisão, que exigem uma maior atenção de imediato.
Tendo em conta que os jornais e revistas especializados têm uma audiência muito
reduzida e que se dirigem a um determinado público, pretendíamos selecionar um
jornal/revista que chegasse, frequentemente, a um grupo diversificado de pessoas,
contribuindo para a construção do imaginário social em torno das artes. Pelas suas
características editoriais e também pelos dados avançados no estudo preliminar que nos serviu
de base, o jornal Público, mais concretamente o suplemento Ípsilon (que o acompanha à
sexta-feira), apresentou-se como a escolha adequada tendo em conta os nossos objetivos, visto
que é um suplemento de tiragem nacional e que, acompanhando um jornal também ele de
cobertura nacional, chega a um maior número de pessoas. O Público foi “concebido como um
diário inovador, de qualidade, projetado para tornar-se o principal jornal de referência do
país” (Horta, 2005, p. 432-433). Os seus leitores pertencem sobretudo às classes média e alta
e é um dos jornais que “mais vezes tem apresentado temas culturais e científicos nas
manchetes de primeira página” (Ibidem, p. 434). Por sua vez, o Ípsilon assume-se como uma
publicação exclusivamente dedicada às artes.
Este suplemento assume sempre a mesma estrutura: contém notícias breves nas duas
primeiras páginas (de texto), seguindo-se a grande reportagem (que figura na capa da edição)
e que dá origem a comentários e outros artigos que melhor exploram o tema, seguindo-se
diversos artigos de maior dimensão que os primeiros, finalizando-se cada edição com a
agenda. Esta última contém pequenas notas que sugerem a visita do leitor a exposições que
vão ser inauguradas ou que estão a decorrer, filmes que estão em exibição, livros que serão
lançados, entre outros.

52
O “mundo de aventura” do artista

Dado este padrão que foi possível estabelecer relativamente ao Ípsilon, procedeu-se à
escolha do ano de 2011 por ser o ano imediatamente anterior à publicação deste trabalho,
prevalecendo desta forma os critérios proximidade e relevância temporal da análise. Na
impossibilidade de analisar todos os artigos de todas as 53 edições referentes ao ano em
análise (o que daria um total aproximado de 1000 a 1100 artigos), selecionou-se uma edição
de cada mês (a primeira sexta-feira de janeiro, a segunda sexta-feira de fevereiro, a terceira
sexta feira de março, e assim por diante), sendo o corpus de análise constituído por 259
artigos, pertencentes a 12 suplementos (quadro 2.1.).

Quadro 2.1. Caracterização do corpus de análise (Ípsilon, 2011)


EDIÇÃO N.º DE ARTIGOS POR EDIÇÃO
N.º
Dia Capa Frequência Percentagem
1 7 de janeiro Objectivo 2011 52 20,08
James Blake, 22 anos. E se ele fosse o som de
2 11 de fevereiro 16 6,18
2011?
O fato de treino das vedetas francesas.
Catherine Deneuve e a sua coiffure imperturbável.
3 18 de março 23 8,88
Isabelle Huppert e a sua entrega física e
psicológica
“48”, mergulho de Susana de Sousa Dias nos
4 22 de abril 17 6,56
arquivos da Pide. Esta história também é nossa
Jonathan Franzen em entrevista. Os dias de
5 6 de maio fúria do “Grande Romancista Americano” 21 8,11
terminaram
Stanley Kubrick, um renovado caso de
popularidade. Cerebral, formalista, dizia-se…
6 10 de junho 22 8,49
Apaixonado pela fraqueza humana e pelas
emoções, diz-se
Arcade Fire. A banda que vimos crescer tornou-
7 15 de julho se gigante. O caminho até à lotação esgotada de 19 7,34
hoje no Meco
8 26 de agosto A rentrée está a chegar 18 6,95
Integral na Cinemateca. Pedro Hestnes, uma
9 2 de setembro 15 5,79
vida de cinema
10 14 de outubro Komba. A nova festa dos Buraka Som Sistema 22 8,49
Carlos Paredes vai partir mundo fora.
11 18 de novembro Reedição internacional de “Guitarra Portuguesa” e 19 7,34
“Movimento Perpétuo” põe jornalistas e editores,
americanos e ingleses, a perguntar: “o que é isto
B Fachada, o artesão que inventou uma
12 23 de dezembro 15 5,79
língua só sua
Total 259 100

Sobre o Ípislon, deparámo-nos com uma realidade que já esperávamos encontrar.


Excetuando a primeira edição analisada (7 de janeiro de 2011), todas as restantes apresentam
entre 15 e 23 artigos, não havendo grandes disparidades na organização interna de cada

53
O “mundo de aventura” do artista

edição. É de salientar que na nossa análise não incluímos as pequenas notas das últimas
páginas de cada edição, uma espécie de agenda intitulada “a semana”.
De um total de 259 artigos, 52 (cerca de 20%) foram recolhidos na primeira edição em
análise (7 de janeiro de 2011). A maior representatividade deste dia deve-se ao facto de esta
edição ter apresentado aos leitores aquelas que considerou serem as revelações para 2011,
fazendo uma antevisão do ano que então se iniciou. No entanto, maior quantidade de artigos
não significa que os conteúdos noticiados tenham sido mais desenvolvidos.
A recolha dos dados foi direcionada para os objetivos da pesquisa, atentando, para
isso, a aspetos como a data da publicação, a página e o título do artigo (para melhor
identificação posterior dos artigos), presença na capa da publicação, ramo artístico
representado (arquitetura, artes circenses, artes plásticas, artes visuais, ao cinema, dança,
design, fotografia, literatura, música e teatro), autoria do artigo, dimensão do artigo (pequena,
média ou grande), características do discurso (explicativo, informativo, interrogativo e/ou
opinativo), atores presentes nas imagens utilizadas (artista, obra ou outro artista do ramo, por
exemplo), fontes citadas (artistas, produtores, críticos, académicos, comunicados de imprensa,
entre outros), local onde decorre o acontecimento noticiado (tanto em Portugal, como no
estrangeiro), valores-notícia (proximidade temporal e geográfica, por exemplo) e
características associadas ao sujeito artístico (género, idade, nacionalidade, características
pessoais, entre outros aspetos). Em todas as categorias de análise foram atribuídos códigos
aos diversos itens presentes, o que se encontra devidamente assinalado e explicitado no
respetivo manual de codificação8.
Para além do recurso à análise de conteúdo, optou-se pela aplicação de entrevistas.
Estudos sobre representações mediáticas ligadas a outros objetos de estudo têm optado pela
realização de entrevistas aos difusores das mesmas, quer porque os objetos de representação
são difíceis de alcançar (como é o caso das crianças), quer por uma opção metodológica por
parte dos investigadores. Neste trabalho, escolheu-se entrevistar os objetos de representação,
os artistas, uma vez que além de nos estarem acessíveis, consideramos relevante analisar as
diferenças entre as autorepresentações e as representações sobre as artes e os artistas
(re)produzidas pelos media. Posto isto, optou-se pela realização de entrevistas a estudantes
finalistas da FBAUP.
O critério de escolha baseou-se, sobretudo, no facto de estes estudantes estarem
ligados às artes pelo menos há quatro anos, através da formação na área, tendo, por isso, uma

8
A este propósito, ver Anexo 2A. Grelha de análise de conteúdo e respetivo manual.
54
O “mundo de aventura” do artista

visão do setor própria de quem entrou recentemente ou se prepara para entrar no mercado
artístico. Além disso, na FBAUP são ministradas duas licenciaturas: Artes Plásticas (que se
divide em três variantes: Pintura, Escultura e Multimédia) e Design de Comunicação. Os
alunos, apesar dos cursos/variantes em que estão inscritos, podem frequentar unidades
curriculares que não pertencem originalmente ao seu plano de estudos, tendo assim uma visão
mais ampla do mundo artístico.
Neste âmbito, optou-se pela entrevista semidirectiva onde, embora existam questões
guia e embora caiba ao entrevistador conduzir o discurso do entrevistado para os objetivos da
pesquisa, é permitido ao entrevistado seguir o seu raciocínio de forma natural (Boni;
Quaresma, 2005). A condução da entrevista deve ter um sentido lógico para o entrevistado,
podendo ser necessário recorrer à memória do inquirido para uma conversa fluente (Ibidem, p.
72). Esta é uma técnica de investigação onde está presente um enorme interesse no indivíduo
e na sua forma de ver o mundo, bem como nas suas crenças e intenções (Albarello et al.,
1997, p.84).
Quanto às representações, a entrevista é, de acordo com Albarello et al., o melhor
instrumento para análise das mesmas, motivo pelo qual optamos pelo recurso a esta técnica
(1997). Contudo, é preciso ter em atenção os elementos manifestos ou latentes
(metalinguagem) evidenciados pelo sujeito entrevistado (Ibidem).
Dada a indisponibilidade de alguns entrevistados e a preferência de outros pelas
respostas escritas, as entrevistas foram realizadas de duas formas: umas pessoalmente, em
locais sugeridos pelos próprios entrevistados, e outras por e-mail, contornando assim a falta
de disponibilidade para uma conversa presencial.
Posto isto, o guião de entrevista utilizado9, que teve em conta os dados recolhidos
primeiramente através da análise de conteúdo e entretanto analisados, é constituído pelos
tópicos fundamentais a abordar durante a entrevista, bem como questões possíveis dentro de
cada um dos tópicos, mas a conversa com cada entrevistado decorreu de acordo com o seu
pensamento, sendo o entrevistador uma espécie de guia para que o entrevistado não se perca
no seu raciocínio. Foram abordados tópicos como a entrada no mundo das artes, as suas
opções escolares, formativas e expectativas futuras, as auto e heterodefinições do campo
artístico e a relação entre as artes e os media. Os sentimentos e emoções dos próprios artistas
também foram aprofundados, recorrendo a exemplos sempre que possível. Ao longo do
processo, foi-lhes dada total liberdade para que se expressassem de acordo com a fluidez do

9
A este propósito, ver Anexo 2B. Guião de entrevista.
55
O “mundo de aventura” do artista

seu pensamento, nunca lhes sendo cortado o raciocínio. Ao entrevistador coube apenas dar
sinais de encorajamento e esperar a finalização do raciocínio do entrevistado antes de partir
para um novo tópico a abordar (no caso das entrevistas presenciais) e clarificar as questões
aos entrevistados via e-mail, sem induzir qualquer tipo de resposta e respeitando os tempos de
cada um. Procuramos sempre tratar todos os entrevistados de igual forma, independentemente
do meio de comunicação.
Ao todo, foram realizadas 10 entrevistas (três presencialmente e sete por e-mail),
durante julho e agosto de 2012, procurando-se a abrangência e a diversidade mais do que a
representatividade (quadro 2.2.). Metade dos entrevistados são do sexo masculino e metade
do sexo feminino. Com idades compreendidas entre os 21 e os 56 anos, todos são
portugueses. A maioria é natural do distrito do Porto, bem como possui residência no mesmo
distrito. Regra geral, frequentaram o curso de Artes no ensino secundário tradicional ou outro
curso ligado às artes. Quanto à condição perante o trabalho, existe alguma confusão, uma vez
que os estudantes tinham acabado de terminar ou estavam a terminar a licenciatura no
momento da entrevista. Embora alguns desejassem prosseguir os estudos, outros pretendiam
ingressar rapidamente na vida profissional, motivo pelo qual não sabem se ainda se
consideram estudantes ou desempregados.
Convém salientar que as amostras escolhidas (suplemento Ípsilon e alunos da FBAUP)
pretendem representar social e teoricamente os acontecimentos, e não propriamente alcançar
uma representatividade estatística, uma vez que as técnicas utilizadas requerem o contacto
com um número pequeno de sujeitos, para além dos temas tratados em entrevista (infância,
percurso académico, relação das famílias com as artes, visões do setor artístico, expetativas
profissionais, entre outros), que são do foro íntimo dos envolvidos (Biklen, 1994; Lessard-
Hébert; Goyette; Boutin, 1994). Os dados foram recolhidos no seu “ambiente natural” e o
investigador teve o papel principal enquanto sujeito que recolhe esses dados (Godoy, 1995).
Contudo, o investigador procurou abandonar o senso comum, as crenças e alguns pré-
conceitos subjacentes à realidade em estudo, oriundos de uma possível aproximação com o
objeto, para que estes não influenciem a pesquisa (Goldenberg, 2004).

56
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 2.2. Caracterização dos entrevistados (FBAUP)


Condições de
Área de Condição perante o
N.º Curso10 Sexo11 Idade Nacionalidade Naturalidade Formação artística anterior realização da
residência trabalho
entrevista
Curso de Artes Visuais no
1 AP (Pintura) M 22 Portuguesa Paredes Porto Estudante Presencial
ensino secundário tradicional
Curso de Artes Visuais no
2 AP (Pintura) F 24 Portuguesa Porto Gondomar Estudante E-mail
ensino secundário tradicional
Curso de Artes Visuais no
3 AP (Pintura) M 43 Portuguesa Maputo Sabrosa Trabalhador-estudante Presencial
ensino secundário tradicional
Curso de Artes Visuais no
4 AP (Pintura) F 22 Portuguesa Porto Porto Estudante E-mail
ensino secundário tradicional
Vila Pouca de Curso de Representação
5 AP (Pintura) F 56 Portuguesa Gondomar Estudante e reformada E-mail
Aguiar Plástica do Espetáculo
Curso de Design de
6 AP (Escultura) F 28 Portuguesa Porto Porto Estudante E-mail
Comunicação
Curso de Artes Visuais no
7 AP (Escultura) F 22 Portuguesa Vila Real Gondomar Estudante E-mail
ensino secundário tradicional
Curso de Tecnologia e
8 AP (Multimédia) M 21 Portuguesa Porto Gondomar Estudante Presencial
Produção Gráfica
Curso de Artes Visuais no
9 DC M 21 Portuguesa Porto Matosinhos Trabalhador-estudante E-mail
ensino secundário tradicional
Curso de Artes e Indústrias
10 DC M 23 Portuguesa Porto Porto Estudante E-mail
Gráficas

10
AP = Artes Plásticas; DC = Design de Comunicação
11
M = Masculino; F = Feminino
57
O “mundo de aventura” do artista

Ao longo de todo este processo, as questões éticas foram constantemente uma


prioridade. O propósito da pesquisa foi sempre por nós explicitado à população a estudar e a
todos aqueles que precisamos de contactar para o efeito. Paralelamente, garantimos sempre o
anonimato dos sujeitos e elucidamos os mesmos quanto à voluntariedade das informações
recolhidas e a finalidade das mesmas. Aquando da realização das entrevistas presenciais, que
respeitaram a disponibilidade dos intervenientes, estas foram gravadas com o devido
consentimento para que pudessem, posteriormente, ser transcritas na íntegra. As entrevistas
realizadas por e-mail foram também usadas textualmente. Posteriormente, todas as entrevistas
foram analisadas através de grelhas de análise categorial12.
Quanto à análise documental, também por nós utilizada e já mencionada, esta pode ser
definida como “uma operação ou um conjunto de operações visando representar o conteúdo
de um documento sob uma forma diferente da original, a fim de facilitar num estado ulterior a
sua consulta ou referenciação” (Chaumier cit. por Bardin, 2004, p.40), ou seja, a análise
documental pretende transformar a informação de forma a que o observador “obtenha o
máximo de informação (aspecto quantitativo), com o máximo de pertinência (aspecto
qualitativo)” (Bardin, 2004, p.40). A informação é, assim, condensada e armazenada para
posterior consulta (Ibidem, p.41). Neste caso, a nossa análise documental passou pela consulta
e tratamento de dados estatísticos referentes ao nosso objeto de estudo, bem como de dados
referentes ao Ípsilon e aos estudantes finalistas da FBAUP.
Neste sentido, a combinação das três técnicas mostrou-se vantajosa, visto que estas se
adaptam à complexidade do objeto de estudo e nos permitem responder às interrogações
colocadas.

2.3. Considerações sobre o percurso da pesquisa: contrariedades encontradas e


estratégias de resolução
A trajetória de um trabalho de investigação é suscetível de passar por algumas
dificuldades, contrariedades e obstáculos de vária ordem que precisam de ser contornados,
algo a que este trabalho não foi exceção.
Ao nível teórico, desde logo nos deparámos com a abundância de bibliografia
referente ao nosso objeto de estudo, sendo difícil chegar a uma definição do nosso conceito
principal, a arte, sobretudo sem nos deixarmos levar por um caminho mais ligado à estética ou
12
A este propósito, ver Anexo 2C. Categorias de análise temática, Anexo 2D. Grelha de análise vertical das
entrevistas semidiretivas e Anexo 2E. Grelha de análise horizontal das entrevistas semidiretivas.
58
O “mundo de aventura” do artista

à história da arte. Também a maioria das estatísticas a que recorremos se referem


principalmente à cultura e não exclusivamente às artes, dificultando a definição do nosso
objeto de estudo.
Ao nível prático, salientamos a morosidade da pré-análise do Ípsilon, essencial para a
definição dos critérios que levaram à seleção da nossa amostra, o que só se tornou possível
após um profundo conhecimento da organização do mesmo e do próprio espaço onde
consultamos as várias edições da publicação (Biblioteca Pública Municipal do Porto).
Por outro lado, as entrevistas aos estudantes finalistas da FBAUP obrigaram-nos a
lidar com as preferências e com a disponibilidade dos entrevistados. Desde logo o momento
da realização das mesmas coincidiu com o final do ano letivo, momento em que muitos dos
recém-licenciados da FBAUP se encontravam a expor (ou se preparavam para) os seus
trabalhos, estando, por isso, com pouco tempo livre e/ou sem horários que pudessem, com
antecedência e certeza, disponibilizar para um encontro presencial.
As primeiras três entrevistas por nós realizadas foram feitas presencialmente e ficou
clara a dificuldade dos entrevistados em responderem concretamente ao que lhes era pedido,
perdendo-se estes, muitas vezes, em exemplos e explicações. Este facto tornou as entrevistas
bastante demoradas, embora os sujeitos tenham afirmado que tal não era um problema. Tendo
em conta esta dificuldade na condução de um discurso verbal e presencial, procurando
também lidar com a falta de disponibilidade de outros entrevistados e da sugestão de outros
que afirmaram expressarem-se melhor por escrito, optamos pela realização de entrevistas por
e-mail, nunca sendo esta a única opção apresentada ou imposta, antes sim a escolhida pelos
restantes finalistas da FBAUP aquando da apresentação dos objetivos da pesquisa e da
importância das suas participações.
As entrevistas feitas via e-mail foram facilmente conduzidas, sendo enviado o guião
de entrevista aos recém-licenciados de Artes Plásticas e Design de Comunicação, guião esse a
que, regra geral, responderam sem grandes dificuldades. Esta tornou-se uma opção muito
vantajosa, pois fez com que os entrevistados estruturassem melhor as suas ideias e
organizassem as suas agendas conforme as suas preferências.
Embora já fosse por nós esperado, outra dificuldade encontrada foi o facto de o
discurso dos entrevistados estar constantemente relacionado ao longo das entrevistas
(presenciais ou por e-mail), dificultando a análise de conteúdo das mesmas e originando
alguns espaços em branco na grelha de análise das mesmas. Embora todas as questões tenham
sido respondidas por todos os entrevistados, em alguns casos verificamos que ao responder a

59
O “mundo de aventura” do artista

uma determinada pergunta, o sujeito entrevistado encontrava-se a responder também a uma


outra questão que pretendíamos colocar posteriormente, situação que variou de entrevistado
para entrevistado.
Além disso, podemos mesmo dizer que o investigador foi visto como um não-artista, a
quem os entrevistados, presencialmente ou por escrito, sentiram necessidade de mostrar o
mais possível os seus gostos e preferências, as suas inquietações e reclamações, o meio que os
rodeia. Estes aspetos, embora não fizessem parte dos nossos objetivos e, por isso, não
pudessem ser enquadrados nesta pesquisa (o que foi esclarecido aos entrevistados), serviram
para enriquecimento pessoal do investigador. Falamos, por exemplo, de trabalhos académicos
realizados pelos estudantes e que estes sentiram necessidade de partilhar connosco, tal como
os próprios portefólios. Não vimos nessa situação uma contrariedade, pois já prevíamos que a
própria proximidade entre o investigador e os entrevistados (na idade e na situação
académica) devia ser gerida ao longo de todo este caminho.
Vimos como inconveniente nas entrevistas via e-mail a demora nas respostas dos
entrevistados (ao contrário das entrevistas presenciais, de resposta direta e imediata) o que, se
podia adiar a conclusão do estudo por um lado, por outro evitou-nos a transcrição de parte das
entrevistas, não atrasando assim o término do nosso estudo.
Assim, e ultrapassados os obstáculos com que nos fomos deparando, espera-se que o
presente trabalho de investigação seja útil para a análise das representações das artes em duas
frentes: as autorepresentações artísticas e as heterorepresentações mediáticas.

60
O “mundo de aventura” do artista

CAPÍTULO III

Da criação à receção das obras de arte: entre as autorepresentações dos estudantes


da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e as
heterorepresentações do suplemento Ípsilon

3.1. Critérios de noticiabilidade e características do discurso sobre as artes


Um dos objetivos a que esta investigação pretende responder prende-se com a
identificação dos acontecimentos que a imprensa encara como artísticos e que decide trazer
para a ordem do dia. Assim, e tendo em conta que o Ípsilon se assume como um suplemento
dedicado às artes, partimos para a identificação dos ramos artísticos nele representados
(quadro 3.1.). Foi possível verificar que o Ípsilon noticia acontecimentos ligados à
Arquitetura, às Artes circenses, às Artes plásticas, às Artes visuais, ao Cinema, à Dança, ao
Design, à Fotografia, à Literatura, à Música e ao Teatro. Três áreas surgem esporadicamente:
Arqueologia, História da arte e Jornalismo. Estas últimas, que representam uma pequena parte
da totalidade da amostra (1,93%), não são por nós consideradas artísticas por se referirem a
acontecimentos relativos a outras áreas do saber (achados arqueológicos relativos a um
filósofo já falecido, por exemplo), nunca tidas como artísticas na nossa problemática teórica
de referência.

Quadro 3.1. Ípsilon – Ramo artístico (ou outro) representado


Ramo artístico (ou outro) Frequência Percentagem (%)
Arqueologia 2 0,77
Arquitetura 5 1,93
Artes circenses 1 0,39
Artes plásticas 11 4,25
Artes visuais 2 0,77
Cinema 51 19,69
Dança 12 4,63
Design 2 0,77
Fotografia 8 3,09
História da arte 2 0,77
Jornalismo 1 0,39
Literatura 39 15,06
Música 82 31,66
Teatro 23 8,88
Vários 18 6,95
Total 259 100
61
O “mundo de aventura” do artista

Constatamos que o género artístico mais frequente nos artigos em análise é a Música
(31,66%), seguindo-se o Cinema (19,69%) e a Literatura (15,06%). Por outro lado, áreas
como a Arquitetura (1,93%), Artes circenses (0,39%), Artes visuais (0,77%) e Design
(0,77%), apesar de serem consideradas artísticas pela publicação, têm pouca expressividade.
No que diz respeito aos valores-notícia utilizados, desde logo se destaca a atualidade
(42,81%) como o critério noticioso mais frequente (presente, aliás, em todos os artigos em
análise), seguindo-se o fator novidade (39,17%) e a proximidade geográfica (13,06%):

Quadro 3.2. Ípsilon – Valores-notícia


Valores-notícia Frequência Percentagem
Aniversário do artista 1 0,17
Aniversário do artista (carreira) 1 0,17
Atribuição de prémio 4 0,66
Descoberta arqueológica 2 0,33
Expetativa em torno de nova obra 6 0,99
Homenagem 5 0,83
Lançamento póstumo 3 0,50
Novidade 237 39,17
Polémica 2 0,33
Proximidade geográfica
79 13,06
(Portugal)13
Proximidade temporal14 259 42,81
Revelação do ano 6 0,99
Total 605 100

Assim, de acordo com o quadro 3.2., podemos concluir que o Ípsilon privilegia os
acontecimentos ocorridos num passado recente ou num futuro próximo. Tendo em conta que
se trata de uma publicação semanal (nas bancas à sexta feira), não são frequentes o “hoje” ou
o “amanhã”, mas antes um chamar de atenção para eventos a ocorrer alguns dias depois.
Apesar de, na maioria dos casos, os estudantes por nós entrevistados não terem tido
uma experiência pessoal com os meios de comunicação social, na generalidade admitem que a
relação artes-media pode trazer vantagens e desvantagens para ambas as partes, motivo pelo
qual as artes devem ser notícia. Ainda assim, além da “pouca divulgação” do campo artístico
nos diferentes media, assumem a importância da comunicação social para a divulgação das
obras, dos artistas, sua legitimação e influência da opinião pública.

13
Considerou-se “Proximidade geográfica” como valor-notícia em todos os artigos relacionados com eventos
ocorridos em Portugal (Continental e Ilhas).
14
Considerou-se “Proximidade temporal” como valor-notícia em todos os artigos relacionados com
acontecimentos ocorridos entre 12 meses antes da publicação da edição em causa e 12 meses depois.
62
O “mundo de aventura” do artista

Acho que há pouca divulgação da prática artística portuguesa. As poucas revistas que existem são
caras (…). Mas a comunicação social comum não tem uma mostra relevante da arte portuguesa.
As vantagens seriam para ambos, embora a procura seja apenas das pessoas interessadas. (…)
(Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

Certo é que são os media que “fazem” o artista. O artista só ganha destaque, nome e valor quando
é falado nos meios de comunicação ou é referido por algum curador, galerista ou crítico de arte
importantes. Há artistas que são enlameados no início da sua carreira e jamais ou a muito custo
têm sucesso porque tiveram uma crítica má do crítico x ou y. (Sexo feminino, 22 anos, Escultura)

Os media conseguem influenciar qualquer tema e qualquer população, agora se dão o devido valor
á arte? Não. Apenas futebol e mais futebol. Mas é Portugal! (Sexo masculino, 21 anos, Design de
Comunicação)

Os estudantes entrevistados falam também da tendência para a noticiabilidade dos


acontecimentos artísticos quando estes ou os seus criadores geram polémica ou quando
recebem prémios, sobretudo a nível internacional. Os artistas são ainda associados a certos
estereótipos, passando-se uma ideia errada do artista.

(…) hoje em dia, a comunicação social vai buscar esses temas da provocação. (…) E se calhar hoje
em dia o artista sabe essa situação e então “Vamos criar polémica!”.
“(…) O artista pode ser uma pessoa normal como outra qualquer. Pode passar despercebida. Mas
como há esse estereótipo de dizer que o artista é assim, é claro que o artista tem de ir muito ao
encontro disso. (Sexo masculino, 43 anos, Pintura)

Não. Daí é que o tempo que dedicam à arte ser tão pouco. Se realmente se se interessassem pelo
nosso meio, e se nos dessem o devido valor, a visão das outras pessoas iria ser diferente. Os únicos
acontecimentos, ao nível da arte, que dão a conhecer ao público é quando um artista ganha um
prémio no estrangeiro. E porquê? Porque aí já é alguém com valor. (…) (Sexo feminino, 22 anos,
Pintura)

(…) É inevitável, a linguagem dos medias cria realidades diferentes da realidade directa. Não acho
errado, apenas considero que é uma forma diferente de ver o mundo: o que torna os media
decadentes em relação às práticas artísticas é o facto de retirarem substância aos seus conteúdos.
Mas existe uma imprensa que leva com seriedade o mundo da arte (…). (Sexo feminino, 28 anos,
Escultura)

De facto, o discurso utilizado pelos media quando falam sobre as artes é variado.
Desde logo constatamos que era impossível atribuir um género jornalístico (notícia,
entrevista, reportagem, crónica, entre outros) ao artigo em análise, dado que os tipos de
discurso se misturam. É, aliás, possível identificar mais que um tipo de discurso no mesmo
artigo, tal como evidencia o quadro abaixo representado.

63
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 3.3. Ípsilon: Características do discurso


Característica do discurso Frequência Percentagem
Explicativo 170 43,70
Informativo 71 18,25
Interrogativo 15 3,86
Opinativo 133 34,19
Total 389 100

O Ípsilon utiliza mais frequentemente o discurso do tipo explicativo (43,70%) para


tratar os factos artísticos, seguindo-se o género opinativo (34,19%). Quanto ao discurso do
tipo explicativo, de facto, além de procurar informar os seus leitores sobre a data e o local de
determinado evento artístico, o Ípsilon procura explorar o assunto, deixando claro o percurso
do artista (profissional e pessoal), as obras que este já criou, bem como o que se espera do
artista no futuro.
Além da prevalência do discurso explicativo, verificamos a tendência deste
suplemento para a identificação dos artistas por ele considerados como uma “revelação do
ano”, embora este discurso do tipo opinativo não seja assumido enquanto tal.
Seguem-se os discursos do tipo informativo (18,25%) e interrogativo (3,86%). O
discurso informativo, tal como o próprio nome indica, fornece dados ao leitor, tais como a
data, o local e o(s) artista(s) envolvido(s) no evento/na obra em causa. Nestes artigos, o
jornalista não vai ao fundo das temáticas noticiadas, embora, como averiguamos, recorra
frequentemente ao uso da opinião ao mesmo tempo que fornece informações e/ou
explicações. Já o discurso do tipo interrogativo mostra-se como um discurso do tipo pergunta-
resposta, é o menos frequente e também o que menos surge ligado à opinião.

3.2. A visibilidade das artes nos media: atores envolvidos e localização dos
acontecimentos noticiados
Para além do que é arte para os media, quando e como, procuramos analisar a
visibilidade que o suplemento em estudo dá às artes, ou seja, partimos, em primeiro lugar,
para a análise do espaço ocupado pelos artigos em cada edição e tendo em conta o ramo
artístico representado.

64
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 3.4. Ípsilon – Dimensão do espaço ocupado

História da Arte
Artes Circenses
Artes Plásticas

(percentagem)
Artes Visuais
Arqueologia

(frequência)
Arquitetura

Jornalismo
Fotografia

Literatura
Cinema

Música
Teatro
Design

Vários
Dança

Total

Total
Dimensão do
espaço ocupado

Pequena dimensão 2 4 1 8 2 35 11 1 4 1 0 23 60 18 15 185 71,43

Média dimensão 0 1 0 3 0 13 1 1 4 1 1 14 18 5 3 65 25,10


Grande dimensão 0 0 0 0 0 3 0 0 0 0 0 2 4 0 0 9 3,47
Total 2 5 1 11 2 51 12 2 8 2 1 39 82 23 18 259 100

Atentando no quadro supra representado, verificamos a prevalência de artigos de


pequena dimensão (71,43%), ou seja, com menos de uma página, sobretudo no que diz
respeito à Música, ao Cinema e à Literatura. O mesmo acontece nos artigos de média (entre
mais de uma página e três páginas, inclusive) e grande dimensão (superiores a três páginas),
que representam, respetivamente, 25,10% e 3,47% do total. Quanto às áreas artísticas menos
representadas (Arqueologia, Artes Circenses, Artes Visuais e Design), verificamos que estas
são pouco exploradas.
A capa de cada edição é outro dos indicadores da visibilidade das artes nos media,
uma vez que são as páginas com destaque imediato e com maior aposta gráfica.

Quadro 3.5. Ípsilon – Capa de cada edição


Área artística Idade do(s) Nacionalidade
Edição Sexo do(s) artista(s) Imagens
representada artista(s) do(s) artista(s)
1 Várias Vários Várias Várias Obra
2 Música M 22 Inglesa Artista
3 Cinema F 67 e 58 Francesa Artista
4 Cinema F 49 Portuguesa Obra
5 Literatura M 51 Norte-americana Artista
6 Cinema M Já falecido (70 anos) Norte-americana Obra
7 Música FeM Entre 28 e 33 Canadiana Artista
8 Várias Vários Várias Várias Obra
9 Cinema M Já falecido (49 anos) Portuguesa Artista
10 Música FeM Desconhecidas Portuguesa Artista
11 Música M Já falecido (79 anos) Portuguesa Artista
12 Música M 27 Portuguesa Artista

No que diz respeito às capas do Ípsilon, prevalecem, mais uma vez, a Música, o
Cinema e a Literatura. Os artistas representados são sobretudo portugueses do sexo

65
O “mundo de aventura” do artista

masculino, mas também é dado destaque a artistas norte-americanos, canadianos, franceses e


ingleses. Relativamente à idade dos artistas, nota-se algum equilíbrio entre os artistas jovens
(até aos 33 anos, neste caso), os artistas com idades compreendidas entre os 49 e os 67 anos e
artistas já falecidos. Em termos de imagens, o artista prevalece face à obra, tal como podemos
verificar no quadro 3.5.
De facto, verificamos que o Ípsilon recorre frequentemente à imagem para ilustrar os
seus artigos. Predomina o recurso a uma só imagem (62,25%) e praticamente não existem
artigos sem ilustrações (1,54%) (quadro 3.6.).

Quadro 3.6. Ípsilon – Número de imagens por artigo


N.º de imagens Frequência Percentagem
0 4 1,54
1 169 65,25
2 38 14,67
3 21 8,11
4 10 3,86
5 5 1,93
6 2 0,77
7 1 0,39
8 4 1,54
9 2 0,77
10 1 0,39
12 1 0,39
13 1 0,39
Total 259 100

Apesar da propensão para o recurso a uma só imagem na ilustração dos textos,


salientamos que, ainda assim, podem existir até 13 imagens (0,39%) referentes ao mesmo
acontecimento.
Verificamos, tal como aconteceu com a análise das capas do Ípsilon, que o artista é a
figura mais representada nas páginas do suplemento (55,35%). Denota-se, ainda, a recorrência
à exposição da obra (37,53%) e, em menor grau, do público (3,35%). Outras instâncias
legitimadoras, como os curadores (0,21%) e os editores (0,21%), têm pouca
representatividade neste sentido.

66
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 3.7. Ípsilon – Atores nas imagens


Atores nas imagens Frequência Percentagem
Artista 264 55,35
Artista e obra 1 0,21
Casa do artista 1 0,21
Curador 1 0,21
Editor 1 0,21
Espaço 2 0,42
Espaço e público 1 0,21
Instrumento musical 1 0,21
Motivo de inspiração 1 0,21
Obra 179 37,53
Outros artistas do ramo 6 1,26
Presidente do evento 1 0,21
Público 16 3,35
Recortes de imprensa 2 0,42
Total 477 100

Esta tendência para a valorização do artista (como mostra o quadro 3.7.) face à obra
também nos foi avançada pelos entrevistados, que referem que os meios de comunicação
social privilegiam mais o criador do que a obra criada, sobretudo quando o artista é célebre
e/ou cria polémicas. O valor comercial passa a residir no artista, no seu nome – que se torna
uma marca –, e não na obra.

Penso que privilegiam o artista célebre, a obra vem em segundo lugar. (Sexo feminino, 56 anos,
Pintura)

Apesar de ele ser reconhecido a partir da obra que é exposta ao público, quem fica para a
posteridade da divulgação e futuras notícias é o artista. (…) um dia mais tarde, o artista pode vir a
vender obras apenas porque são assinadas por ele, e o valor cultural e comercial passa a estar
implícito no seu nome, como uma marca, independentemente de ter realmente valor artístico ou
não. (…) Portanto, o artista pode assinar folhas de papel em branco que o papel ganha
automaticamente um valor insólito. (…) (Sexo feminino, 22 anos, Escultura)

Sem dúvida, que se for um artista de renome, é o artista. Se for uma exposição coletiva, não há
assim nenhum destaque. Mas se for um artista polémico, aí são cinco ou seis páginas só para isso.
O artista pop, estrela, cria a obra mesmo para isso. O artista quer sempre chegar ao momento alto.
E quando chega tem medo de cair. (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)

Outro aspeto ressalvado pelos entrevistados é o facto de haver uma valorização da arte
internacional face à nacional e a predominância de artigos noticiosos sobre o que acontece em
Lisboa. Dizem sentir que o melhor parece estar “lá fora”, tendo de recorrer à internet como
forma de divulgação dos seus trabalhos.

67
O “mundo de aventura” do artista

Sem dúvida a internacional. Eu vejo o programa Câmara Clara e as informações que eles dão
sobre artistas têm de ser sempre artistas estrangeiros porque soa bem dizer aqueles nomes em
inglês. (Sexo masculino, 43 anos, Pintura)

Acho que não (…). Felizmente, a RTP2, não sei durante quanto tempo, tem programas
interessantes sobre arte, mas principalmente direcionada para a capital. As bienais que têm
acontecido, um pouco por todo o país, que espaço têm na comunicação social? (Sexo feminino, 56
anos, Pintura)

Falam dos artistas portugueses de uma forma discreta, à excepção dos internacionalizados que têm
destaque (Paula Rego ou Joana Vasconcelos). O desenvolvimento da internet permitiu criar meios
para divulgar as produções de arte e interagir com a comunidade artística. O meio virtual passou a
ser uma arena para fornecer serviços e mostrar, de uma forma dinâmica, o que aparece de novo na
arte. A informação é acessível, difícil é gerir toda essa informação. Obviamente há coisas que não
se podem substituir, como a experiência a três dimensões. (Sexo feminino, 28 anos, Escultura)

Internacionais. O melhor está sempre lá fora. (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)

Esta ideia avançada pelos entrevistados é contrariada pela análise do suplemento


Ípsilon, onde os dados nos permitem concluir que, embora uma grande parte dos artigos não
possa ser localizada geograficamente (46,98%), os eventos mais noticiados são os ocorridos
no continente europeu (48,40%), sobretudo em Portugal (37,37%), representando os eventos
ocorridos no estrangeiro 15,65% do total (quadro 3.8.).

Quadro 3.8. Ípsilon – Localização dos acontecimentos noticiados15


Localização dos acontecimentos Frequência Percentagem
Não especificada 132 46,98
Europa 136 48,40
Alemanha 2 0,71
Bélgica 1 0,36
Espanha 3 1,07
Estónia 1 0,36
Finlândia 1 0,36
França 9 3,20
Itália 2 0,71
Polónia 1 0,36
Portugal 105 37,37
Reino Unido 9 3,20
República Checa 1 0,36
Europa (digressão) 1 0,36
África 5 1,78
Angola 5 1,78
América do Norte 8 2,85
Estados Unidos da América 7 2,49
México 1 0,36
Total 281 100

15
Com a “localização dos acontecimento noticiados” referimo-nos ao espaço físico onde decorrem concertos,
peças de teatro, lançamentos de álbuns ou livros, entre outros.
68
O “mundo de aventura” do artista

Para além de Portugal, seguem-se os eventos ocorridos em França (3,20%), Reino


Unido (3,20%) e Estados Unidos da América (2,49%), embora em proporções muito inferiores.
Relativamente a Portugal, e como pode ser verificado na figura 3.1., os eventos mais
noticiados ocorridos em território nacional acontecem em Lisboa, seguidamente do Porto16, algo que já
tinha sido avançado pelos entrevistados.

Figura 3.1. Ípsilon – Eventos noticiados ocorridos em Portugal, em 2011

Assim, verificamos a tendência para o noticiar de eventos ocorridos no litoral do país,


sobretudo na capital e no Porto. A terceira cidade portuguesa mais noticiada é Guimarães,
havendo um equilíbrio entre as cidades restantes, sem grande destaque.

16
A este propósito, ver Anexo 3A. Localização dos acontecimentos noticiados.
69
O “mundo de aventura” do artista

3.3. Instâncias legitimadoras no campo artístico


Para além dos artistas, responsáveis pela criação das obras de arte, e do público,
recetor das mesmas, existem diversos atores que intervêm e que medeiam a relação entre a
produção e a receção. São eles, como já mencionamos, críticos, curadores, professores,
jornalistas, historiadores da arte, entre outros. No caso dos meios de comunicação social, já
em si agentes responsáveis pela mediação, estes ainda dão voz a outros atores que fazem parte
do campo artístico, sendo aquilo a que chamam fontes, ou seja, são aqueles que, direta ou
indiretamente, são citados pelos jornalistas. Estas fontes são tidas como legitimadas para
falarem sobre arte e, por sua vez, como fontes legitimadoras no campo artístico.
No caso do Ípsilon, tal como é possível verificar no quadro 3.9., cerca de 30% dos
artigos não fazem referência a dados recolhidos a partir de outras fontes que não o próprio
conhecimento adquirido pelo jornalista, embora a maioria dos artigos recorra a pelo menos
uma, duas ou três fontes (64,86%).

Quadro 3.9. Ípsilon – Número de fontes por artigo

N.º de fontes Frequência Percentagem


0 78 30,12
1 107 41,31
2 41 15,83
3 20 7,72
4 6 2,32
5 3 1,16
8 2 0,77
9 1 0,39
11 1 0,39
Total 259 100

As fontes maioritariamente escolhidas pelos jornalistas para falarem sobre o campo


artístico (quadro 3.10.) são os próprios artistas envolvidos no acontecimento/na obra em
notícia (55,22%), seguindo-se outros artistas do mesmo ramo (8,06%), a comunicação social
(5,37%) e a própria obra (5,07%). Além dessas fontes, são ainda citados académicos,
historiadores e investigadores (3,28%), comissários (1,79%), críticos (3,28%), curadores
(1,49%) diretores (2,09%), editores (1,19%), familiares do artista (0,90%), produtores
(0,90%), público (2,09%), redes sociais (1,49%), entre outros (7,76%).

70
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 3.10. Ípsilon – Fontes citadas


Fonte Frequência Percentagem
Académicos/historiadores/investigadores 11 3,28
Artista 185 55,22
Comissário 6 1,79
Comunicação social 18 5,37
Crítico 11 3,28
Curador 5 1,49
Diretor 7 2,09
Editor 4 1,19
Familiares do artista 3 0,90
Obra 17 5,07
Outros artistas do ramo 27 8,06
Produtor 3 0,90
Público 7 2,09
Redes sociais 5 1,49
Outras fontes 2617 7,76
Total 33518 100

Quando questionados sobre as instâncias legitimadoras na sua área de atividade, os


artistas apontaram os próprios artistas e os seus pares como principais fontes de legitimação.
Embora comunicação social, críticos, curadores, galerias de arte, historiadores,
investigadores, museus e professores possam intervir nesse julgamento, para os entrevistados
são os próprios criadores, que dominam a teoria e a técnica, que podem considerar algo como
obra de arte ou alguém como artista, e não os que são apenas detentores de conhecimentos
teóricos. Contudo, apontam a necessidade de muitos criadores quererem “agradar” esse
mercado da arte para conseguirem manter-se e afirmar-se enquanto artistas.

A principal pessoa para te considerar artista és tu. (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

(…) a meu ver, apenas os artistas devem realmente ter este peso quanto ao que é ou não uma obra
de arte, porque todos podem pensar nestas questões mas são apenas teóricos (…). (Sexo feminino,
24 anos, Pintura)

Em termos de curadores, de galerias de arte e tudo, eles é que estão a mandar nesses termos, e
críticos da arte. (…) eu vejo pelos meus colegas, há aquela preocupação de a pessoa ser aceite no
mercado (…) A faculdade também faz parte desse sistema, a faculdade está a preparar artistas
(…). (Sexo masculino, 43 anos, Pintura)

Quem julga a arte é quem vive no mundo da arte, ou quem vive do mundo da arte. (…) refiro-me
às instituições, como galerias, críticos, curadores, museus, quem promove concursos onde os
artistas são avaliados e, principalmente, as pessoas que investem em arte. (…) A comunicação
social tem um papel relevante nesse julgamento ao promover, noticiando, as obras dos artistas.
(Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

17
A este propósito, ver Anexo 3B. Ípsilon – Fontes citadas.
18
11 das fontes referidas tinham dois cargos em simultâneo (exemplo: responsável pelo evento e crítico de arte).
71
O “mundo de aventura” do artista

O papel da comunicação social foi referido várias vezes pelos entrevistados, que
apontam a necessidade de um discurso imparcial e especializado por parte dos jornalistas.

Os media direccionados para as artes não descoram o valor do artista e da própria obra. Creio que,
por vezes, são influenciados pelos curadores e críticos e aí é que se torna perigoso para o artista
esta relação. Mas a visão dos media que não são influenciados é normalmente uma visão
imparcial, que vê e deve ver as obras como elas são e analisar artista a artista, para que não se
cometam erros (…) (Sexo feminino, 24 anos, Pintura)

Acho que umas coisas vão de encontro, outras não. (…) O jornalista que escreve pode ter uma
visão diferente da tua. E eu fico chateado se alguém que não conhece o meu trabalho começa a
mandar palpites, mas depois, no final, até acho piada porque isso enriquece o meu argumento. Há
o treinador de bancada. O futebol e a arte podem ser comparados! (Sexo masculino, 21 anos,
Multimédia)

De facto, aquando da análise de conteúdo por nós levada a cabo, pudemos verificar
que, no caso do Ípsilon, os jornalistas que mais escrevem no suplemento, escrevem sobretudo
sobre uma área específica19. É o caso de Isabel Coutinho na Literatura e de Gonçalo Frota,
João Bonifácio, Mário Lopes e Vítor Belanciano na Música. Outros casos chamam também a
nossa atenção: Jorge Mourinha e Luís Miguel Oliveira escreveram somente artigos ligados ao
Cinema e Tiago Bartolomeu Costa trabalha as questões ligadas à Dança e ao Teatro. Assim,
embora não tenhamos dados que nos permitam verificar se os redatores do Ípsilon possuem
alguma especialização na área sobre a qual escrevem, é possível verificar que existe uma
ligação entre determinados jornalistas e os assuntos noticiados.

3.4. Dos processos de criação aos processos de receção das obras de arte
Ao analisarmos os 259 artigos do Ípsilon, verificamos que as representações sobre arte
são diversificadas, passando pelos processos de criação, divulgação, difusão, receção, bem
como passando pela atribuição de características à obra nos mais diversos sentidos: sua
relação com o dinheiro, com a espiritualidade, com os sentimentos e/ou com a criatividade, a
sua influência na sociedade e as suas consequências, entre outros aspetos 20 que se encontram
no quadro 3.11.

19
A este propósito, ver Anexo 3C. Ípsilon – Autoria por ramo artístico (ou outro).
20
A este propósito, ver Anexo 3D. As representações da obra no Ípsilon.
72
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 3.11. Ípsilon – As representações da obra de arte


Total
As representações da obra no Ípsilon
Fi %
Dimensão sociográfica da obra 75 8,61
Ano de iniciação, criação, conclusão e/ou acesso ao público 62 7,12
Locais de acesso ao público e/ou lançamento 2 0,23
Nacionalidade da obra 11 1,26
Processo e condições de criação da obra de arte 119 13,66
Inspiração e referências 26 2,99
Obra como espelho do autor 15 1,72
Obra retrata a realidade 13 1,49
Outros 65 7,46
Dimensão estética da obra 13 1,49
Dimensão temporal da obra 22 2,53
Dimensão espiritual da obra 8 0,92
Dimensão económica da obra 18 2,07
Preço/valor 13 1,49
Vendas 5 0,57
Processo e condições de distribuição e divulgação da obra 5 0,57
Distribuição 3 0,34
Divulgação 2 0,23
Processo e condições de receção da obra (críticos e públicos) 24 2,76
Bem recebida 16 1,84
Mal recebida 8 0,92
Relação da obra com os públicos 18 2,07
Apreensão da obra 12 1,38
Reconhecimento e fama da obra 81 9,30
Relação obra-qualidade 84 9,64
Obra com qualidade 74 8,50
Obra sem qualidade 10 1,15
Consequências da obra 25 2,87
Raridade e singularidade da obra 17 1,95
Poder/influência da obra junto da sociedade 39 4,48
Necessidade de criação da obra 9 1,03
Obra e riscos 9 1,03
Intencionalidade da obra 8 0,92
Ironia na obra 9 1,03
Atratividade da obra 12 1,38
Delicadeza da obra 13 1,49
Independência da obra 9 1,03
Simplicidade da obra 7 0,80
Obra associada à criatividade 25 2,87
Obra associada ao sentimento 14 1,61
Obra associada à tristeza 33 3,79
Características da obra (de tempo, de espaço e técnicas) 21 2,41
Tempo 7 0,80
Espaço 7 0,80
Técnicas 7 0,80
Outras características da obra 142 16,30
Total 871 100

73
O “mundo de aventura” do artista

Para além das características inerentes à obra de arte (ano de iniciação, criação,
conclusão e/ou acesso ao público, locais de lançamento e de acesso ao público e
nacionalidade da obra), que representam 8,61% do total das características atribuídas à obra,
duas etapas da vida da obra de arte chamam a nossa atenção no conjunto destas
representações: a criação da obra e a sua receção.
Para o Ípsilon, a obra de arte é, sobretudo, o reflexo do seu criador (1,72%), o retrato
da realidade (1,49%) e o fruto da inspiração e das referências do artista (2,99%). Para além
disso, o processo de criação da obra é associado a outros aspetos (7,46%) como o improviso,
o formalismo e a experimentação. Já de acordo com os estudantes da FBAUP por nós
entrevistados, o processo de criação é diferente de artista para artista, uma vez que as
vivências de cada um, as pessoas com as quais contactam, os locais onde estudam e outros
fatores relacionados com o artista e que influenciam as obras por eles criadas, variam
consoante as experiências que foram tendo. Esse facto faz com que cada obra, que parte de
um desejo de o artista de exprimir algo, seja única. A inspiração faz parte do processo de
criação, mas este é um processo que exige não só um pensamento, como também muita
experimentação e a coordenação de vários prós e contras, como as condições técnicas e
económicas na altura da criação da peça.

Não depende só do artista (…). As vivências de cada um vão ser diferentes, senão estávamos todos
a fazer coisas iguais. (…) o estudares no Porto ou estudares em Lisboa é completamente diferente
também. Os professores vão influenciar-te, os amigos vão influenciar-te, o facto de trabalhares
sozinho ou não vai influenciar-te. (…) (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

Normalmente há muita especulação durante a execução. (…) Depende muito do meio artístico a
ser utilizado, depende muito das metodologias de trabalho do artista em questão. (…) Há todo um
processo de racionalização e reflexão constantes. Há que ter muita consciência do que se quer
dizer e da forma como se vai dizer. Há que ter muitos conhecimentos aos mais variados níveis
(…). Há que saber o que se quer ou pelo menos, o que não se quer. É preciso muita pesquisa,
dedicação, dores de cabeça, pausas de dias ou semanas para afastar o olhar da obra em construção
e tentar olhar para ela com olhos “novos”. É preciso tempo. A ideia de que o artista pega numas
matérias e começa a mexer com elas quando sente, de repente, que a “inspiração” está a vir, é
absolutamente mítica. Não há inspiração, há, antes (…) um impulso da criação artística. (Sexo
feminino, 22 anos, Escultura)

Infelizmente ainda acham que a criação é sempre algo repentino. As peças, mesmo que tenham
uma perspectiva pessoal, (…) têm sempre um grande trabalho conceptual por trás, e muitas vezes
isso não é lido pelo público. (Sexo masculino, 23 anos, Design de Comunicação)

Outro aspeto sobre a obra de arte muito focado pelo Ípsilon é a receção da obra por
parte dos públicos, a sua relação com estes e com a crítica, a apreensão da obra e das
mensagens que esta transmite e ainda o reconhecimento e fama de que esta usufrui (o que
representa um total de 15,61%). Podemos verificar que a obra de arte é notícia sobretudo

74
O “mundo de aventura” do artista

quando é bem recebida pelos críticos e pelos públicos (1,84%). Ao mesmo tempo, tende a ser
noticiada quando é famosa (“célebre”, “mediática”) e quando é reconhecida a marca que
deixa em quem contacta com ela e a sua importância (“importante”; “marcante”, “clássico”,
“êxito”, “sucesso”), nomeadamente através de prémios que lhe são atribuídos (9,30%).
Relativamente à apreensão do seu conteúdo (1,38%), quando é descrita neste sentido, a obra é
sempre tida como “complexa” ou “difícil de apreender”, não sendo evidente o seu
significado/mensagem. Ainda assim, a sua relação com o público (2,07%), segundo o
suplemento em estudo, pressupõe interatividade.
Os sujeitos entrevistados demonstram preocupação com os públicos aquando da
criação da obra pois, para eles, uma obra só o é quando exposta ao público, público esse que
deve ser o mais diversificado possível, significando que a obra é heterogénea.

O público contribui para a realização da obra por intermédio de uma narrativa (…). Se arte é
expor, expomos para quem? Para um público, que quanto mais diversificado, mais bem-sucedida a
obra é, porque significa que essa obra abrange uma enorme quantidade de audiências sem excluir
outras. (Sexo feminino, 28 anos, Escultura)

Quantas mais pessoas gostarem da obra, penso que mais será um motivo de satisfação para o
artista. É sempre bom ver que o nosso trabalho causa algum impacto… bom ou mau. (Sexo
masculino, 21 anos, Design de Comunicação)

Para eles, o artista trabalha para ser reconhecido, o que é uma “forma de
remuneração”. Numa altura em que existem tantos profissionais ligados às artes, o facto de o
trabalho de um artista ser reconhecido pelas diversas instâncias competentes faz com que o
artista se distinga dos demais, o que contribuirá para a existência de condições favoráveis à
continuidade da sua atividade criativa, uma vez que favorece, entre outros aspetos, as
condições económicas do artista. Admitem “gostar” quando uma das suas obras é elogiada,
embora, muitas vezes, esse reconhecimento só ocorra após a morte do artista.

É fundamental. Depois de o artista ser reconhecido tudo acontece, as obras passam a valer
fortunas, e o artista fica na história. (Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

(…) Se um artista não trabalha para receber dinheiro, o artista trabalha para ser reconhecido pelos
seus pares e para ser reconhecido como artista. É outra forma de remuneração. (…) Mas se
chegarem à minha beira e me disseram que adoraram a minha peça, fico contente. (…) (Sexo
masculino, 21 anos, Multimédia)

É sempre bom ser reconhecido, mas neste ramo a maior parte dos artistas só atinge a fama no final
da vida ou mesmo depois dela. (Sexo masculino, 21 anos, Design de Comunicação)

Verificamos também, aquando da nossa análise ao Ípsilon, que as obras são


geralmente noticiadas quando são consideradas de qualidade (8,50%): “magnífica”, “grande”,

75
O “mundo de aventura” do artista

“obra-prima”, “perfeita”. É visível o reconhecimento da sua importância junto dos públicos e


do poder que exerce sobre eles (4,48%): “política”, “influente”, “poderosa”, “revolucionária”.
Ela traz, inclusive, consequências (2,87%): “causa impacto”, “escandalosa”, “polémica”.
Além disso, a obra é associada à tristeza e a outros sentimentos relacionados (3,79%),
à criatividade/originalidade (2,87%), à raridade/singularidade (1,95%), ao sentimento
(1,61%), à delicadeza (1,49%), à atratividade (1,38%), à independência/autonomia (1,03%), à
ironia/sarcasmo (1,03%) e à simplicidade (0,80%). A obra é necessária (1,03%) e intencional
(0,92%), embora corra riscos (1,03%). Parte destas representações são partilhadas pelos
entrevistados, que encaram a obra de arte como um meio de transmissão de uma mensagem,
política ou social, sendo um meio poderoso de expressão do pensamento do artista e de
divulgação das suas críticas e denúncias.

Também [como instrumento político], mas não como instrumento manipulador. Ao longo da
História, a arte foi direccionada, pela religião, pelo poder político. (…) Hoje continuam a haver
artistas que utilizam a sua arte para delatar as acções menos correctas dos seus governos (…).
(Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

Sim, para manifestar e criticar a sociedade, para documentar acções. Enquanto manifestação e
crítica, pode ser uma ferramenta muito poderosa. (Sexo masculino, 23 anos, Design de
Comunicação)

Além das características atribuídas à obra no Ípsilon por nós já mencionadas, são ainda
referidos a localização da obra no tempo (2,53%) – “contemporânea”, “nova”, “fresca” –,
aspetos temporais, espaciais e técnicos da obra (2,41%) – duração das mesmas, o espaço que
ocupam –, aspetos económicos (2,07%) – preço da obra ou o número de vendas da mesma –,
aspetos estéticos (1,49%), espirituais (0,92%) e, em menor grau, os processos de divulgação e
distribuição da obra (0,57%).
Relativamente à dimensão económica da obra, esta é uma questão que preocupa os
estudantes entrevistados, uma vez que o número de visitantes de uma exposição acaba por
levar ao reconhecimento do artista e à sua divulgação.

O mais importante é expores o teu trabalho. Ele não pode ficar guardado em casa. Claro que
quantos mais visitantes houver numa exposição, melhor. Começam a conhecer-te, a associar o teu
nome aos trabalhos que viram, como também pode aumentar o número de vendas. (Sexo feminino,
22 anos, Pintura)

Os números estão relacionados com o reconhecimento e com a fama, é a ambição de qualquer


artista, mesmo que o negue. (Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

76
O “mundo de aventura” do artista

Outras características (16,30%) são ainda associadas à arte, das quais destacamos,
dentro de um leque variado, a sensualidade presente na obra de arte, o secretismo à sua volta,
o seu caráter estranho, frio, duro, enjoativo e irritante.
O que é, então, a arte? Para os estudantes entrevistados, a definição deste conceito não
é unânime nem definitiva, “nem os artistas sabem”. A obra de arte ultrapassa a normalidade,
tem uma mensagem a transmitir e é a visão pessoal do artista, a sua alma. Ela fascina, prende
o olhar do espetador e causa-lhe emoções e sensações. Apesar de ser original e invulgar, ela
deve respeitar os limites morais e éticos e, além disso, levantar questões.

Arte para mim é a alma do artista. Quando um trabalho espelha a sua alma, a sua paixão, a sua
dedicação, isso para mim é arte. Agora quando uma obra tenta apenas entreter o público, quando o
seu interior é vazio (…) então mais vale estar-se quieto. (Sexo feminino, 22 anos, Pintura)

Para mim, a arte é algo que causa emoções. Uma obra de arte deve prender o olhar do espectador,
ser original, ser invulgar. (…) a arte deve ter limites morais e éticos, embora se faça de
transgressões. (…) Vejo a arte como um processo de comunicação (…). Acho que a arte não deve
ser utilitária, mas sim participativa. (Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

(...) Não há definição concreta e existem tantas respostas quantas pessoas a quem fizeres a
pergunta. Para mim, arte é algo que requer a componente material (…) e que proporciona ao outro
emoções, sensações e reflexões (…). A fronteira entre ser arte e não ser é muito ténue e é, até,
subjectiva. (…) Arte não é ciência (…). Essa questão da consideração do que é arte e do que não é,
normalmente é feita pelos críticos de arte e galeristas. (…) (Sexo feminino, 22 anos, Escultura)

Segundo os estudantes da FBAUP, a definição de arte por parte da sociedade é


diferente da deles, pois o cidadão comum tende a preferir um objeto belo, que “combina com
os sofás”, e a arte nem sempre “tem que ser bonita”. Além deste privilegiar do gosto estético,
o cidadão comum tende a reconhecer como arte a obra que ele não se sente capaz de fazer,
embora não se interesse pelo processo de criação da obra. A formação de cada um, segundo
os entrevistados, influencia a relação que estes têm com a arte, a sua “cultura visual” e o
procurar descortinar o pensamento do artista que levou à criação de determinada obra. Ainda
assim, as obras que foram vendidas por um preço considerado alto ou obras que foram criadas
por artistas mediáticos, como a artista plástica Joana Vasconcelos.

(…) Como as coisas são feitas não interessa (…). E interessa o preço, mas só (…) se for alto. (…)
Para já passa por não passar por “eu também faço isso”, “o meu filho faz isso”. (…) A sociedade
em geral considera arte as coisas bonitas. Se é bonito, é arte.
(…) são coisas para combinar com os sofás, para combinar com os cortinados. (…) (Sexo
masculino, 22 anos, Pintura)

(…) quando olham para uma determinada obra de arte, entendem que ali (…) não houve trabalho.
Portanto, às vezes, nem sempre as obras falam por si. (…) (Sexo masculino, 43 anos, Pintura)

(…) Joana Vasconcelos! (…) falas com o cidadão comum e ele adora o trabalho dela, tens a
cultura visual. É uma coisa que é bonita e a arte, muitas vezes, não tem que ser bonita. (…) Ela
tornou-se uma figura pública. (…) As pessoas têm um vício, que é a televisão, e esse vício fornece
o que elas querem ver. (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)
77
O “mundo de aventura” do artista

Assim, a arte não tem uma função prática, visto não ser uma ferramenta. Aquilo que
ela pretende atingir vai depender de quem a cria, mas ela visa, sobretudo, intervir na
sociedade, mexer com as mentalidades, levar os seus públicos a questionarem-se e comunicar
algo.

(…) ela pode pensar sobre si própria, questionar a si própria. Enquanto outras vão ter uma função
social, de intervenção. (…) a arte não tem uma função, os artistas é que vão ter alguma função
consoante o que eles querem. (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

Para mim, tem a função de intervir na sociedade, ser participativa, mais que ser contemplada.
(Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

(…) o diálogo, o factor comunicante. O sentido da arte é expor, mostrar-se. Humanizar. (Sexo
feminino, 28 anos, Escultura)

(…) na sua essência, a obra não deve ter uma função prática activa, senão não é obra de arte, é
uma ferramenta. (Sexo masculino, 23 anos, Design de Comunicação)

Desta forma, podemos constatar que a arte é retratada nos media sobretudo no que diz
respeito aos seus processos de criação (associada à inspiração, à realidade e à vida do artista
como fontes dessa mesma inspiração e improviso) e receção (sobretudo quando a obra é tida
como uma obra de qualidade e reconhecida pelos diferentes públicos).

3.5. Auto e heterorepresentações do “mundo de aventura” do artista


Relativamente ao artista, constatamos, no nosso enquadramento teórico, que este é
associado a um conjunto de representações provenientes do senso comum, tanto no que diz
respeito ao seu lado profissional enquanto criador, quer no que diz respeito à sua
personalidade, estilo de vida e opções que foi tomando nos mais diversos campos. No caso do
Ípsilon, este é descrito em vários sentidos21, desde as suas características sociográficas até aos
seus métodos de criação da obra de arte, passando pela sua vida pessoal (hobbies,
relacionamento com os outros, sexualidade, espiritualidade, entre outros), tal como mostra o
quadro 3.12. Nesse seguimento, procuramos também saber se essas representações são
partilhadas pelos próprios artistas entrevistados.

21
A este propósito, ver Anexo 3E. As representações dos artistas no Ípsilon.
78
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 3.12. Ípsilon – As representações do artista


Total
As representações do artista no Ípsilon
fi %
Dados biográficos 359 25,35
Nome 11 0,78
Nascimento 91 6,43
Morte 41 2,90
Idade 30 2,12
Morada 32 2,26
Nacionalidade: 153 10,81
Etnia 1 0,07
Infância 5 0,35
Relação da família com as artes 9 0,64
Entrada no mundo das artes 11 0,78
Educação, formação e profissão 55 3,88
Formação na área em que trabalha 14 0,99
Formação noutra área 9 0,64
Outras profissões que já teve/tem 32 2,26
Hobbies 19 1,34
Artísticos, mas noutro ramo 10 0,71
Não artísticos 9 0,64
Características físicas e indumentária 73 5,16
Relação com o álcool e com as drogas 3 0,21
Sexualidade 4 0,28
Processo de criação 110 7,77
Aprendizagem e influências 20 1,41
Dom e talento 14 0,99
Relação com a crítica e com os públicos 36 2,54
Reconhecimento e fama 179 12,64
Mediatismo 34 2,40
Qualidade do artista 26 1,84
Artista de qualidade 24 1,69
Artista sem qualidade 2 0,14
Orientações e tendências artísticas 16 1,13
Forma de encarar a profissão 19 1,34
Carreira 11 0,78
Objetivos e ambições 12 0,85
Relação com a política 4 0,28
Papel interventivo do artista 33 2,33
Relacionamento com os outros 4 0,28
Relação com o dinheiro 6 0,42
Relação com a obra 6 0,42
Raridade e singularidade do artista 7 0,49
Artista e sentimento 10 0,71
Artista e ironia 16 1,13
Artista e criatividade 23 1,62
Artista e espiritualidade 11 0,78
Artista e conhecimento 7 0,49
Artista e timidez 14 0,99
Artista e fragilidade emocional 20 1,41
Artista e alegria 20 1,41
Artista e afectuosidade 9 0,64
Relação do artista com o tempo 13 0,92
Outras características do artista 197 13,91
Total 1416 100

79
O “mundo de aventura” do artista

Após a análise dos resultados apresentados no quadro supra representado, podemos


verificar que, quando o artista é notícia, são referidos, principalmente, os seus dados
biográficos (25,35%), tal como data de nascimento e de falecimento, idade atual,
nacionalidade e locais onde reside ou residiu. No que diz respeito à idade, em 50% dos casos
o artista tem entre 20 e 40 anos, o que mostra alguma tendência para o privilegiar de artistas
jovens. Os entrevistados consideram que a idade é importante porque, à partida, traz
experiência, mas que um artista jovem não tem menos valor pela idade. Contudo, associam o
artista jovem a ações, em quem os investidores no mundo da arte apostam. Enquanto os
artistas com mais idade são as referências, os mais novos são vistos como alguém que possui
um “olhar mais fresco”.

(…) És artista jovem? Vamos apostar nele, é tipo ações. (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

A sociedade vai sempre considerar a arte jovem como algo muito infantil ou sem valor. Olham
para a arte produzida pelos mais velhos e, sendo estes mais velhos, assumem que são mais sábios e
daí darem mais valor ao que eles produzem. (…) (Sexo feminino, 24 anos, Pintura)

A idade do artista, geralmente, é sempre um ponto a favor do seu trabalho. Com a experiência e a
cultura visual que se vai ganhando, o trabalho, normalmente, será melhor. (Sexo feminino, 22
anos, Pintura)

Nada vem do nada. Os artistas mais velhos são as nossas referências e os jovens dão continuidade
e frescura às produções de arte. No entanto, quanto maior a experiência, mais perto de atingir uma
sensibilidade aquém dos “meros mortais”. (Sexo feminino, 28 anos, Escultura)

Ambos são vistos de formas distintas: o mais novo como tendo um olhar mais fresco, o mais velho
como tendo um olhar mais experiente. (Sexo masculino, 23 anos, Design de Comunicação)

Relativamente ao sexo dos artistas, e embora esse dado não fosse imediatamente
evidente ou descrito pelo suplemento, pudemos verificar, tal como mostra o quadro 3.13., que
os artistas do sexo masculino estão em maioria, quer na totalidade dos artigos jornalísticos,
quer por área artística, exceto na Dança.

Quadro 3.13. Ípsilon – Sexo dos artistas representados


História da Arte
Artes Circenses
Artes Plásticas

(percentagem)
Artes Visuais
Arqueologia

(frequência)
Arquitetura

Jornalismo
Fotografia

Literatura
Cinema

Música
Teatro
Design

Vários
Dança

Total

Total

Sexo dos artistas


representados

Feminino 0 0 0 2 1 13 6 1 2 0 0 7 15 6 5 58 22,39
Masculino 2 3 1 5 1 33 4 0 5 2 1 31 54 12 8 162 62,55
Feminino e masculino 0 0 0 1 0 3 2 0 0 0 0 0 13 5 3 27 10,42
Não especificado 0 2 0 3 0 2 0 1 1 0 0 1 0 0 2 12 4,63
Total 2 5 1 11 2 51 12 2 8 2 1 39 82 23 18 259 100
80
O “mundo de aventura” do artista

Quanto à nacionalidade, tal como acontecia com a obra, o Ípsilon dá destaque


sobretudo a artistas europeus, sendo a nacionalidade que mais se destaca a portuguesa.
Contudo, tendo em conta o total de nacionalidades citadas, Portugal representa apenas
14,38%, ao contrário dos artistas internacionais que representam 85,62%. Este facto é
confirmado pelos entrevistados, tal como já tínhamos referido, que defendem que “O melhor
está sempre lá fora”. Por outro lado, tal como nos mostra o quadro 3.8., são noticiados
(geograficamente) acontecimentos ocorridos sobretudo em Portugal.
Depois das características biográficas, o artista é noticiado sobretudo quando é
reconhecido e/ou famoso (12,64%), tendo sido premiado ou proposto para um prémio, e
sendo descrito como um “nome de referência” na área, “marcante”, “estrela”, “importante”,
“sucesso”, “mestre”, “génio”, “herói”. Em terceiro lugar (7,77%), o processo de criação é
outro motivo pelo qual o artista é falado no suplemento em análise, sendo mencionado como
“inspirado”, “experimentalista”, como alguém que “tira partido das novas tecnologias” e
como detentor de “liberdade criativa”. Tal como já tínhamos visto em relação à obra, o artista
é, também ele, associado à inspiração e à experimentação.
O quarto aspeto mais frequentemente utilizado para definir o artista (5,16%) refere-se
ao seu aspeto físico e à sua indumentária, tidos como irreverentes. Para os entrevistados, os
artistas não se vestem de maneira diferente da restante sociedade por serem artistas. Os que o
fazem, fazem-no porque gostam de se expressar através da roupa e/ou porque o contacto com
diversos materiais os incentiva a não usar “roupa bonita” que se pode danificar. Além disso,
afirmam que os seus pares não se preocupam com o que os outros pensam, nem com as
modas.

Não se vestem diferente. (…) O que acontece é que as pessoas talvez não sejam tão preocupadas
com a imagem. As raparigas da minha turma não vão calçar um salto-alto e trabalhar numa oficina
de metais, não dá jeito. Não vão com roupa toda bonita, porque ela vai estragar-se. As pessoas vão
para trabalhar, e trabalhar no campo das artes significa, como um meu professor dizia “pores a
mão na porcaria”. (…) Mas se fores ver os estudantes de Design, já não tem nada a ver. (Sexo
masculino, 22 anos, Pintura)

Eu acho que os meus colegas de faculdade vestem-se de maneira diferente das outras pessoas, mas
isso acho que se deve ao facto de eles não se importarem com o que está na moda, nem quererem
copiar o vizinho. Nisto acho que somos diferentes. Vestimos o que queremos e não nos
importamos se os outros gostam ou não, ou se estamos démodé. (Sexo feminino, 22 anos, Pintura)

De seguida, o Ípsilon dá também importância à educação e formação do artista


(3,88%). De facto, dados recentes confirmam que se tem dado a profissionalização da
atividade artística e os autores por nós consultados indicam que a infância do artista, a relação

81
O “mundo de aventura” do artista

da sua família com as artes e os hábitos culturais adquiridos desde cedo potenciam o interesse
pela atividade. Embora no Ípsilon não seja dada grande ênfase à infância do artista (0,35%), a
maioria dos entrevistados afirmam que o seu interesse pelas artes surgiu na infância, onde
desde logo demonstraram gosto pelo desenho, pelas atividades manuais e pela costura,
ouvindo frequentemente comentários como “desenha tão bem”, como se fossem detentores de
um dom inato. Em alguns casos, foi importante o contacto com as artes adquirido na escola.

A minha infância foi pautada pelo desenho, pelos trabalhos manuais, bordados, costura, etc. (…)
(Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

Lembro-me que em miúda pintava e desenhava imenso, adorava legos e cores, já tinha um sentido
para a criatividade e era muito curiosa em relação ao mundo. (…) (Sexo feminino, 28 anos,
Escultura)

(…) Desenhava muito, lembro-me que quando era miúdo vendia desenhos a cem escudos. (…) As
pessoas sempre disseram: «Ai que este menino desenha tão bem!» (…) (Sexo masculino, 21 anos,
Multimédia)

O interesse surgiu no ensino básico, com a disciplina de EVT. (Sexo masculino, 23 anos, Design
de Comunicação)

Para os entrevistados, todas as etapas da vida, da qual a infância faz parte, influenciam
o artista e a sua atividade artística.

O que é o artista? O artista és tu. A tua infância faz parte de ti, a tua vida vai acabar por se refletir
na obra. (…) (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

A infância ao artista, na minha opinião, pode ser perfeitamente idêntica à infância de uma pessoa
não-artista. (…) Creio que é na infância que se desenvolve a propensão para um dia se tornar
artista (…). Penso que se tem ideia de que os artistas foram, em geral, crianças tristes ou
problemáticas. (…) (Sexo feminino, 22 anos, Escultura)

Para este gosto pelas artes contribuíram diversas pessoas: nuns casos foram membros da
família (pais, irmãos, tios), noutros foram os professores.

(…) uma professora do Secundário foi uma grande influência, pois era extremamente competente,
não só pelo facto de fazer muitos exercícios técnicos, mas também porque nos levava todos os
anos ao Porto e ao festival de animação em Espinho. (…) (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

O meu irmão era mais velho que eu quatro anos e é mesmo aquela coisa de uma pessoa seguir o
mais velho. (…) (Sexo masculino, 43 anos, Pintura)

A minha mãe tinha mão para o desenho e muita criatividade. (…) (Sexo feminino, 56 anos,
Pintura)

Talvez o meu tio, pois era o único ligado às artes, e o único que me incentivava a desenhar e a
colorir os habituais “livros de pintar”. (Sexo masculino, 21 anos, Design de Comunicação)

82
O “mundo de aventura” do artista

A maioria dos entrevistados afirma que os seus familiares próximos não têm ligação às
artes. Os que tiveram (irmãos, filhos), abandonaram-na ou passaram-na para segundo plano,
uma vez que procuravam a estabilidade financeira que o ramo artístico não lhes podia dar.

Tenho dois irmãos mais velhos que eu, ambos estiveram ligados às artes no Ensino Secundário.
(…) (Sexo feminino, 24 anos, Pintura)

Não tenho nenhum artista na família, mas isso até me dá mais vontade de ser a primeira. (Sexo
feminino, 22 anos, Pintura)

Tenho uma irmã, mais velha (…), com bastante jeito para o desenho e trabalhos manuais (…).
Tenho outro irmão quando jovem ainda pensou fazer Belas Artes, mas acabou por fazer
Engenharia Civil. O meu filho também tem jeito para o desenho, chegou a frequentar, por
iniciativa própria, a Escola Soares dos Reis, mas desistiu. Desde sempre teve gosto pela música,
tem uma banda onde canta, escreve as letras e compõe musicalmente, paralelamente tem uma vida
profissional para lhe garantir independência monetária. (Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

Relacionada com a fraca relação dos familiares mais próximos dos entrevistados com
as artes, está a fraca adesão das famílias a eventos culturais e artísticos.

Raramente, os meus familiares visitaram esta última exposição em que participei, mas nada mais.
(Sexo feminino, 24 anos, Pintura)

Por acaso, no meu caso, não. Sempre fui uma pessoa que os meus museus foram dos livros (…).
(Sexo masculino, 43 anos, Pintura)

Só costumam frequentar as festas tradicionais e populares. (Sexo feminino, 28 anos, Escultura)

Quando era miúdo praticava muito desporto e posso dizer que só no meu 9.º ou 10.º ano é que
entrei pela primeira vez num museu. (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)

Ainda assim, na maioria dos casos, a reação dos familiares e dos amigos aquando da
decisão destes estudantes de enveredarem por uma formação especializada em artes foi
“tranquila” ou “desinteressada”. Os pais destes estudantes mostraram-se, regra geral,
preocupados com o futuro profissional dos filhos, uma vez que as profissões ligadas às artes
acarretam instabilidade financeira e a outros níveis (como a proteção social), estando longe de
agradar tanto aos pais como a profissão de médico, por exemplo.

Foi algo muito desinteressado, apenas informei que queria tirar este curso e que já sabia que não
era em termos profissionais o que desejavam, então os meus familiares apenas disseram “Ok!”
(…). Actualmente, ligam mais, uns gostam de me ver a expor. Outros familiares apenas acham que
é um incómodo imenso que coloco sobre os meus pais, pois preciso do meu pai para levar as obras
aos locais… (Sexo feminino, 24 anos, Pintura)

Sim, foi uma decisão tranquila para eles. No entanto, no início estavam com um bocado de receio
por causa das saídas profissionais. (…) (Sexo feminino, 22 anos, Pintura)

Nenhum dos meus pais apoiou esta minha decisão. Tornou-se uma barreira na relação entre mim e
eles (…). A minha mãe queria que eu fosse médico. Mas não é para ganhar rios de dinheiro que eu
quero estudar. (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)
83
O “mundo de aventura” do artista

Dado o fraco contacto com as artes dentro do seio familiar, a necessidade de


especialização e a importância dada aos diplomas na atualidade, os entrevistados decidiram
enveredar pela licenciatura em Artes Plásticas ou Design de Comunicação. Consideram
importante adquirir os conhecimentos teóricos e técnicos necessários ao exercer da profissão
que pretendem seguir, embora admitam que existem autodidatas de sucesso.

(…) porque não tinha família na área, nem amigos nem nada e portanto a única maneira de me
inserir no mundo da arte era seguir a licenciatura e aprender mais alguma coisa. (Sexo masculino,
22 anos, Pintura)

(…) Houve duas exposições que (…) foram buscar artistas do norte com curso. Os artistas do
norte que não tinham curso não são artistas. (…) eu comecei a ver que aquilo que eu estava a fazer,
o meu trabalho, não estava a ser reconhecido por causa de um canudo (…). (Sexo masculino, 43
anos, Pintura)

Pessoalmente foi importante, senão fundamental, para a minha formação como artista, tanto em
conhecimentos teóricos como na aprendizagem técnica. (…) Ao mesmo tempo os conhecimentos
são certificados. Na nossa sociedade são muito importantes os diplomas. (…) Não só se é levado
mais a sério, como poderá ser a única forma de se poder entrar no “mundo da arte” reconhecido.
Embora existam casos de autodidactas bem-sucedidos. (Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

Para obter conhecimentos teórico/práticos que correspondessem às minhas ambições: desde o


reconhecimento, interacção social e o factor económico. (Sexo feminino, 28 anos, Escultura)

Quando questionados sobre o ensino artístico em Portugal, consideram que esta devia
iniciar-se desde cedo, à semelhança do que acontece em Espanha, pois a ligação às artes é tão
importante quanto o adquirir de conhecimentos em áreas como a matemática e o português.
Ainda assim, referem que é preciso saber qual o “momento certo” para esse contacto.

Creio que falta Portugal ter atenção ao valor das artes desde cedo. Em Espanha, e não só, os
meninos vão desde a pré escola ver exposições, e está cientificamente provado que todos o que o
fazem acabam por se tornar, não mais inteligentes, mas com capacidades diferentes e mais
avançadas que os que não o fazem. (Sexo feminino, 24 anos, Pintura)

(…) nós começamos a ver que aquilo que tem havido até agora (…) não foi pensado. (…) estamos
a ter cérebros a mais. (Sexo masculino, 43 anos, Pintura)

O que dificulta o nível de formação dos alunos em Portugal são as más condições das escolas e das
faculdades. As escolas não têm espaço nem equipamento necessário para as necessidades dos
alunos. Nas faculdades isso também acontece, o que leva a que optemos por projectos mais
pequenos e que exijam poucos recursos. (Sexo feminino, 22 anos, Pintura)

A tendência é direccionar os jovens para letras ou ciências. O português e a matemática são


importantes para a vida prática, mas o indivíduo é composto, também, por “alma”. (…) (Sexo
feminino, 56 anos, Pintura)

(…) Não é a formação que é má, o momento é que nem sempre é o certo. (…) (Sexo masculino,
21 anos, Multimédia)

84
O “mundo de aventura” do artista

Para além das questões da infância, da educação e da formação, o artista é notícia no


Ípsilon quando é mediático (2,54%) e/ou quando o suplemento aborda a sua relação com a
critica e com os públicos (2,40%). No primeiro caso, verificamos que o artista aparece nas
páginas do suplemento quando “dá que falar” e é “polémico”. No segundo caso, embora as
representações neste caso sejam diversificadas, verificamos que o artista é notícia quando é
bem recebido, ou seja, quando é “elogiado”, “celebrado”, visto como um “ídolo”. O artista
considerado de qualidade (1,69%) prevalece face ao considerado sem qualidade (0,14%).
Em termos profissionais, e apesar de representar uma pequena parte dos dados, o
artista é visto como alguém que encara a profissão (1,34%) com coragem e determinação:
“veio para ficar”, “autocrítico”, “em permanente evolução”, “não tem medo do ridículo”. A
sua obra evidencia as suas tendências (1,13%): não é “mainstream”, “controlador” ou a favor
do progresso. Já a sua carreira (0,78%) chega a ser referida como “breve” ou “rápida”. Ainda
assim, é uma pessoa de ideias firmes ambições (0,85%), pois “não pretende agradar às
massas”, mas tem “vontade de mudar”.
O artista tem um papel interventivo (2,33%), pois além de ser um “provocador”, é
“influente” e é “de armas”. Este facto já tinha sido avançado pelos entrevistados, que
defendem que as artes devem “intervir na sociedade”.
Relativamente ao seu caráter, se por um lado o artista é associado à instabilidade
emocional (“frágil”, “frustrado”, “vulnerável”) (1,41%), por outro é associado a sentimentos
mais positivos, como a energia e/ou a alegria (1,41%). Ele possui ironia e sentido de humor
(1,13%), podendo também ser tímido (0,99%). Está associado à criatividade (1,62%), à
espiritualidade (0,85%), ao sentimento (0,71%) e é afetuoso (0,64%). A par da infância, a
espiritualidade é apontada como outra das influências do artista no momento da criação, quer
porque o artista é religioso, quer precisamente pelo contrário. Associada durante muito tempo
à religião, a própria obra confunde-se com um objeto sacro, no qual não se pode tocar.

A espiritualidade está na base de muita criação artística, no sentido em que é uma coisa que vem
de dentro. O próprio objeto de arte pode confundir-se com um objeto sacro. É um objeto mas, ao
mesmo tempo, “Não toques!”. (…) (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

Influencia bastante, definindo muitos dos caminhos e opções temáticas do artista. Muitos artistas
são religiosos e só abordam esse tema. Outros são contra e tentam criticar a espiritualidade. (Sexo
masculino, 23 anos, Design de Comunicação)

Tal como a obra, o artista é, ainda, descrito como uma “espécie rara” e “singular”
(0,49%). Ele “permanece através da obra”. A sua relação com o dinheiro (0,42%) é pouco
explorada, embora seja tido como milionário/rico e como “vendido” e não como pobre. Por
85
O “mundo de aventura” do artista

parte dos entrevistados, estes garantem não ter o dinheiro como uma prioridade, reconhecendo
mesmo que são vistos pela sociedade com “uns pobres”, que trabalham com o lixo. Contudo,
o dinheiro é essencial para a compra dos materiais de que a obra é feita e, consequentemente,
sem criar o artista deixa de ser artista.

Somos uns pobres! Tu não trabalhas para ter dinheiro, trabalhas para estar bem contigo próprio e,
o mais gratificante de tudo, o tal subir na carreira. O subir na carreira é igual a dinheiro, portanto,
tu sobes na carreira para teres dinheiro e para teres o reconhecimento (…). O único facto que faz
com que os artistas precisem de dinheiro é para criar. (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

(…) Todo o artista, antes de ser artista, antes de pensar no dinheiro, já é artista. É claro que sem
dinheiro não se faz nada, não é? Quer dizer, hoje em dia, com esta história dos materiais e essas
coisas dos conceitos, uma pessoa pode pegar até em lixo e fazer obras de arte. (…) Mas tem que se
comer, tem que se vestir, tem que se pagar as contas… (Sexo masculino, 43 anos, Pintura)

(…) Mas que a maioria dos artistas não é nada rico, é verdade. As obras podem valer milhões, mas
quem os ganha são as galerias e coleccionadores de arte e outras instituições artísticas, não são os
próprios. (…) Há pessoas consideradas artistas, mas que são simplesmente empresárias, como
considero o caso da Joana Vasconcelos. Ou que seja artista, mas é artista pimba. Como temos o
Emanuel e o Quim barreiros, que têm o seu valor, mas dentro da música pimba. (Sexo feminino,
22 anos, Escultura)

Os resultados sobre o relacionamento do artista com os outros e as suas tendências


políticas não são claros, mas podemos constatar a tendência para associar o artista ao
mistério/secretismo e à ponderação/serenidade.
Quando contactamos com os autores de referência na área, apuramos que o artista é
associado ao dom e ao talento inatos, algo que o Ípsilon também refere (0,99%). Os
entrevistados afirmam que o dom é importante, mas que uma obra de arte resulta também da
aprendizagem e de muito treino. Também associam a atividade artística à criatividade.

Um pouco de tudo. A genialidade desenvolve-se com trabalho e experiência. Existem coisas que
por mais que insistamos não conseguimos fazer, mas compensa-se com aquilo que sabemos fazer
melhor. (…) nascemos com determinadas características que vão ser desenvolvidas a partir de uma
dialéctica entre o mundo exterior e mundo interior. Quem me diz que eu não podia ter sido
arqueóloga? A criatividade, factor importante para definir um artista, pode servir para outras
profissões além de produzir arte. (Sexo feminino, 28 anos, Escultura)

Não é uma vocação. Há técnicas. Tu aprendes a pintar. Isso do dom é mito. A pessoa nasce com
qualidade, mas essa qualidade tem de ser praticada. (…) (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)

Resulta do talento/dom e da aprendizagem. Acho que esta dupla de palavras anda sempre de mão
dada. Há que gostar daquilo que se faz (talento/dom) e de saber como se faz (aprendizagem).
(Sexo masculino, 23 anos, Design de Comunicação)

Quando questionados sobre se se consideram ou não artistas, os recém-licenciados em


Artes Plásticas afirmam serem artistas em amadurecimento, com um longo caminho a
percorrer. Uma licenciatura na área não os faz ser, per si, artistas, é apenas uma etapa que

86
O “mundo de aventura” do artista

consideraram necessária. O artista precisa de tempo e a sua carreira vai afirmar-se ao longo do
seu percurso. Já os recém-licenciados em Design de Comunicação não se consideram artistas,
uma vez que respondem a um problema, a uma encomenda.

Sim! Vá, sou um jovem artista, porque já estou dentro de alguma coisa, mas considerar-me
“aquele artista” ainda não. Precisas de muita maturidade (…). (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

Não é por estar licenciada em artes plásticas (…) que sou uma artista. Ainda estou no primeiro
degrau, para chegar ao último é preciso muita experiência, muito amadurecimento. (…) (Sexo
feminino, 22 anos, Pintura)

Considero-me aspirante a artista. Artista serei se continuar o meu percurso, trabalhando nesse
sentido e conquistando obra, seja dentro das artes plásticas ou da música. Licenciar-se em Artes
Plásticas não nos torna artistas, de forma alguma. (...) (Sexo feminino, 22 anos, Escultura)
Normalmente não digo que sou artista, por isso nunca recebi comentários. (…) Mas uma vez, um
curador brasileiro (Fernando Cocchiarale) perguntou-me se era artista e eu disse que sim, mas que
ainda tinha muito que crescer. Ele ficou impressionado com a minha determinação e disse que
crescer é preciso sempre e que era bom eu ter essa consciência.(Sexo feminino, 22 anos, Escultura)

(…) como designer não me posso intitular artista, pois respondo a um problema como outra pessoa
qualquer, apesar de criar uma obra também. (Sexo masculino, 21 anos, Design de Comunicação)

Relativamente às expetativas profissionais, os recém-licenciados em Design de


Comunicação são mais positivos, considerando que é possível, para eles, viver da sua
atividade. Os recém-licenciados em Artes Plásticas admitem que, para viver, é preciso
dinheiro, e dificilmente conseguirão com as suas criações atingir o montante necessário não
só indispensável para uma “vida estável”, como para a criação de novas obras, que requerem
material. Este é um “mundo de aventura”, onde quem quer fazer aquilo de que gosta precisa
de correr riscos.

(…) viver da arte, pode-se viver. Agora depende da maneira como tu queres viver. Se tu queres ter
uma vida estável, (…) não podes viver só da arte. Tens de ter um vencimento que pague essas
despesas. Tu da arte podes vender muito hoje e amanha não vendes nada. Agora, tudo é um risco,
é uma opção. Eu conheço muitos artistas que tiveram de sair de Portugal. Não quer dizer que
também não se possa viver da arte aqui em Portugal! Vive-se, mas não é para toda a gente. (Sexo
masculino, 43 anos, Pintura)

Não quero levar isto como uma profissão, quero levar isto como um estilo de vida. (…) E depende
da cabeça que tiveres. (…) Há uma quantidade estúpida de pessoas que o querem [ser artistas],
mas essa quantidade não revela qualidade, não revela vontade, dom, talento, o que queiras chamar
de mito, porque é mito! (…) (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)

Se eu me for a questionar todos os dias sobre isso, o mais certo é daqui a um mês já estar no
manicómio! Eu sei que as coisas se pagam, mas eu não consigo viver assim. (…) Eu não me
consigo imaginar a fazer outra coisa. (…) precisas de cunhas, às vezes. E ser bom não é achares
que és o melhor, tens de ser bom mesmo. (…) Nem que tenha de arranjar qualquer coisa (…) e
vou fazendo o meu trabalho na área. Se tudo correr bem pode ser que tenha uma boa oportunidade.
Isto é um mundo de aventura! (…) (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)

Como designer, sim. (Sexo masculino, 21 anos, Design de Comunicação)


87
O “mundo de aventura” do artista

O que é, então, um artista? Para começar, é diferente do artesão. Enquanto o artesão se


preocupa, segundo os artistas entrevistados, com o fazer técnico de algo bonito, cuja
finalidade é a decoração, o artista pensa a obra, tem “sensibilidade estética” e procura dar aos
recetores da obra motivos para pensarem também. A obra de arte é “comunicante” e
inovadora.

Artista não é aquele que apenas sabe como produzir através da técnica, é aquele que vai para além
disso, sabe a técnica e sabe utilizar todos os meios a seu favor, tem uma certa bagagem de
conhecimentos que permitem validar tudo o que produz, não só em termos técnicos como também
em termos teóricos e conceptuais. Artesão limita-se a produzir coisas que viu em técnicas que
conhece. Artista tem sempre algo de inovador naquilo que produz. (…) (Sexo feminino, 24 anos,
Pintura)

Um artista é alguém que pensa e é capaz de transportar para o mundo material pedaços da sua
existência. O artesão é alguém que faz, o artista é alguém que pensa, podendo fazer ou não. O
artista tem sensibilidade estética e oferece motivos aos fruidores para pensar, sentir e imaginar. O
artesão produz materialmente, desprovido de emoção universal, concentrando-se no acto do fazer,
não deixando espaço na “obra” para o outro se sentir. A arte é comunicante. O artesanato é,
maioritariamente, um veículo para o adorno e a decoração. (Sexo feminino, 22 anos, Escultura)

Contudo, para o cidadão comum, o artista ainda é alguém que aparentemente cria
peças belas espontaneamente, sendo um romântico, homossexual ou um apaixonado pelo sexo
oposto. Ele só é artista quando é reconhecido e promovido pelos media e quando a sociedade
lhe reconhece “aptidões técnicas e estéticas”.

As pessoas têm um bocado a ideia do artista romântico, aquele do devaneio, ou o muito romântico
no sentido de as coisas aparecem na cabeça e faz, não quer saber de regras, não precisa de
dinheiro, é drogado e relaciona-se com muitas raparigas. É o Don Juan… ou então é gay! (Sexo
masculino, 22 anos, Pintura)

Quando um nome é ligado a várias obras e reconhecido pelas instituições e pela própria sociedade.
(…) acho que os media têm uma grande responsabilidade na promoção de um artista, quando o
artista é manchete. (Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

A sociedade aceita/considera alguém como artista quando este tem as aptidões técnicas e estéticas
para produzir peças apelativas (…). (Sexo masculino, 23 anos, Design de Comunicação)

Além disso, falar-se da dissemelhança entre um artista profissional e um artista


amador faz, para os entrevistados, sentido. O artista profissional é aquele que já se estabeleceu
no mercado e que consegue viver do seu trabalho artístico, já o amador tem de se “adaptar” e
ir criando o que vende, para poder continuar a sustentar-se. Porém, se já é esperado um certo
tipo de trabalho do artista dito profissional, o amador já não tem que responder a tantas
expectativas. Ainda assim, não consideram o artista amador inferior ao artista profissional.

88
O “mundo de aventura” do artista

(…) O amador tem de se adaptar muito às necessidades do mercado. O profissional já tem uma
liberdade maior, por um ponto de vista. Por outros pontos de vista, há pessoas que já esperam
desse profissional determinado trabalho, isso também o prende. Já criam expectativas. (Sexo
masculino, 43 anos, Pintura)

(…) É o desenvolver de uma prática com empenhamento, com base em conhecimentos teóricos e
práticos, o que é igual a uma boa formação; ser bem sucedido e reconhecido, o que é igual a
conseguir viver da arte. (Sexo feminino, 56 anos, Pintura)

Para mim um trabalho de um amador é tão legítimo como o de alguém que tem um mestrado.
(…) O artista é artista quando é aceite pelos seus pares. Não é amador nem profissional, não há um
escalão, isto não é a Primeira Liga do futebol! (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)

Por fim, deixam um conjunto de outras representações sobre o(s) artista(s) que dizem
ouvir por parte da sociedade, tais como: “fechados de mais”, “bêbado”, “drogado”, “não quer
fazer nada da vida”, “arrogantes”, “faz o que lhe dá na gana”, “mente mais aberta” (E1), “ser
que vagueia pelo mundo”, “não se integra em parte alguma”, “loucos” (E2), não é levado “a
sério”, “mais sensível”, “vê o mundo de maneira diferente”, “irreverente”, “anormal”, “veste-
se de uma maneira descabida”, “tolinho” (E4), “gay”, “maluco que passa fome” (E9),
“excêntrico”, “temperamental”, “acções mais espontâneas” (Sexo masculino, 23 anos, Design
de Comunicação).
Os artistas entrevistados veem os seus pares como pessoas que extravasam as regras,
que provocam, e que não conseguem fazer os públicos entenderem essa provocação. A obra é,
neste sentido, um meio de o artista se expressar, e a associação do artista à loucura faz com
que este aproveite essa fama de “despreocupado” para fazer o que vai contra as convenções.

Há artistas que extravasam o que às vezes é considerado civilizado. Para quem vê de fora, quando
tu extravasas as regras, é provocação. O ideal é que faças as pessoas entenderem que as regras não
são tudo, devemos pensar para além delas. (Sexo masculino, 22 anos, Pintura)

Todos temos os nossos momentos de loucura, momentos menos sãos. Se calhar um artista tem
mais à vontade para demonstrar isso do que uma pessoa que está sentada num escritório, com uma
pressão para atingir certos objetivos. Mas essas pessoas, quando se «passam», «passam-se» de
formas muito mais agressivas do que nós. (…) Um artista já tem uma imagem tão despreocupada e
as pessoas já lhe dão tão pouco crédito que nós podemos ter o à vontade e a liberdade que é assim,
podemos chegar à faculdade e deitarmo-nos no chão. Sentar na relva dá má imagem? Mas quem é
que estabelece essas coisas? (Sexo masculino, 21 anos, Multimédia)

O artista é, assim, “naturalmente diferente”, é detentor de uma mentalidade também


ela “completamente diferente”, sendo menos materialista e não pensando “segundo as
massas”. Ele faz por ser diferente, pensa e expressa-se de maneira diferente, tem “uma visão
mais ampla do mundo”, é “mais receptivo às diferenças”, mas a própria sociedade também o
vê “com um olhar diferente”22.

22
A este propósito, ver Anexo 3E - As representações dos artistas no Ípsilon.
89
O “mundo de aventura” do artista

90
O “mundo de aventura” do artista

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a apresentação dos pressupostos teóricos por nós explorados e dos dados
empíricos recolhidos, pretende-se, neste momento, apresentar os principais resultados que
advieram da investigação realizada, não deixando de salientar que tais dados dizem respeito a
interlocutores e a um período temporal específicos (suplemento Ípsilon durante o ano de 2011
e finalistas da FBAUP em 2011/2012) e procuram o cruzamento entre as autorepresentações
artísticas e as heterorepresentações mediáticas. Além disso, procuramos sugerir novas pistas
de investigação e apontar outras pistas metodológicas que poderiam ter sido por nós seguidas.
O primeiro aspeto que salientamos nesta investigação é o facto de, para o suplemento
em estudo, as áreas artísticas mais relevantes serem a música, o cinema e a literatura, o que
confirma a hipótese por nós levantada anteriormente. Estas áreas, tal como já tinha sido
avançado por Ribeiro, são as mais fáceis de divulgar e de mais fácil acesso às massas (2008).
A portabilidade do CD, do DVD e do livro (em papel ou em formato digital) podem explicar
as grandes audiências destes três ramos, que por sua vez se traduzem num maior interesse por
parte dos media. Os concertos, no caso da música, também são eventos que juntam multidões,
pelo que a sua noticiabilidade tem maior probabilidade de interessar a um maior número de
leitores do Ípsilon. Por outro lado, ao contrário do referido pelos inquiridos por Machado
Pais, as áreas da alta-costura, graffitis, culinária, rendas e bordados, olaria, joalharia,
cartoons, arranjos de calçado, decoração de interiores, artesanato e publicidade não são
consideradas arte na imprensa em questão (1995).
Os eventos artísticos noticiados, tal como sugere Wolf, são atuais (cit. por Correia,
2000) e ocorrem, sobretudo, no litoral de Portugal, embora os artistas em destaque nos media
sejam, maioritariamente, internacionais. Não se verifica, ao contrário da hipótese por nós
levantada e do que defendem os autores por nós consultados (Rieffel, 2003; Tunstall, 2008;
Escola de Frankfurt, cit. por Curran; Seaton, 1997), a hegemonia das artes de origem norte-
americana. Neste seguimento, os artistas entrevistados criticam não só a falta de visibilidade
das artes nos diferentes meios de comunicação social, como criticam a falta de atenção que é
dada aos artistas e às obras portuguesas. Para eles, as artes só são notícia quando o artista ou a
obra são polémicos – o que Araujo (2008) e Golin e Cardoso (2009) já tinham defendido – e a
visão que os media dão do campo artístico não corresponde ao que se passa no setor. Ainda
assim, reconhecem a importância dos media como meios de divulgação dos seus trabalhos e
como importantes na construção da opinião pública, algo já apontado por Tarde (cit. por
91
O “mundo de aventura” do artista

Rieffel, 2003, p.37), McQuail (2003), Curran e Seaton (1997) e Wolf (cit. por Pavarino, 2003,
p.11). No caso do Ípsilon, o fator polémica não contribui significativamente para o noticiar
dos acontecimentos artísticos, contrariando a visão geral que os entrevistados têm dos meios
de comunicação social portugueses.
O artista tem maior visibilidade no suplemento em análise que a obra, algo já apontado
por Golin e Cardoso (2009). Ele não só é aquele que é mais representado visualmente, como é
a fonte a que os jornalistas mais recorrem como instância de legitimação (seguindo-se os
outros artistas do mesmo ramo em notícia, os meios de comunicação social e a própria obra).
Golin et al. já apontavam para a prevalência do próprio artista enquanto fonte citada pelos
jornalistas (2010). Contudo, os artigos jornalísticos sobre as artes são, na maioria dos casos,
de pequena dimensão e os jornalistas do Ípsilon, que usam principalmente um discurso do
tipo explicativo e/ou opinativo para falarem sobre as artes, tendem a escrever sobre
acontecimentos relativos à mesma área artística. Estes dados contrariam o que foi avançado
por Golin et al., que salientaram a fraca ocorrência de artigos de opinião no jornalismo
cultural (2008). Além disso, Ribeiro alerta para a falta de especialização dos jornalistas da
área, algo que não foi possível verificar nesta investigação (2008).
Quanto à obra de arte, são vários os autores que defendem que esta é fruto da
inspiração. De facto, desde o Renascimento que o artista começa a ser visto como um ser
inspirado (Horn, 2006), consolidando-se esta ideia com o Romantismo (Heinich cit. por
Araujo, 2008, p.43), algo que se verifica até hoje, quer através da mais recente Classificação
Portuguesa das Profissões (2010), quer através de estudos aplicados a artistas (Pais, 1995).
Contudo, os nossos entrevistados referem que a inspiração é importante, mas não é o único
fator decisivo na criação, uma vez que a execução de uma obra requer muito treino e
conhecimento.
No caso do Ípsilon, constatamos que a obra é descrita sobretudo no que diz respeito
aos seus processos de criação e receção. No primeiro caso, ela é descrita como formal e
experimental, fruto da já referida inspiração e das vivências do artista, sendo também uma
representação da realidade. Efetivamente, os próprios estudantes da FBAUP referem que as
suas vivências (nomeadamente a infância e a sua relação com a religião) interferem no
processo de criação da obra, uma vez que esta resulta do percurso do artista. Simmel já tinha
mostrado que as visões dos artistas se refletem nas obras (cit. por Heinich, 2004) e, com
efeito, tanto o Ípsilon, como os finalistas da FBAUP apontam as vivências do artista como
fulcrais no momento da criação.

92
O “mundo de aventura” do artista

Os entrevistados assumem que o seu gosto pelo desenho foi evidente desde os
primeiros anos de vida e que algumas figuras (como os pais, irmãos e tios) foram importantes
na sua ligação às artes, mas defendem que o talento, hipoteticamente inato, por si só, não cria
uma obra. Estas ideias vão de encontro ao defendido por Menger, que apontava a “experiência
vivida” como um dos fatores responsáveis pela criação (cit. por Cabral; Borges, 2010, p.151).
Além disso, as influências dos familiares, colegas, amigos e/ou professores nas suas escolhas
profissionais referidas pelos entrevistados já tinham sido apontadas no estudo de Teresa
Marinho (2003), aplicado a artistas plásticos portugueses jovens, e no estudo de Cabral e
Borges (2010), aplicado a arquitetos portugueses.
O conhecimento de que os artistas necessitam e por estes referidos é, em parte,
adquirido nas escolas, principal motivo pelo qual optaram por seguir uma formação artística
especializada. Além disso, o facto de os seus familiares e amigos próximos não estarem muito
ligados às artes e não serem frequentadores assíduos de eventos artísticos faz com que a
frequência de um curso superior se apresente como um meio de aproximação entre estes
estudantes e o campo artístico. Os entrevistados também salientam a importância da aquisição
de diplomas na atualidade, não deixando de criticar a falta de condições nas escolas e
universidades, bem como o contacto tardio dos estudantes portugueses com as artes. Como
pudemos constatar neste trabalho, tem-se verificado, em Portugal, um aumento dos estudantes
do ensino superior em cursos ligados às áreas culturais e criativas face à média da UE27,
embora a taxa de empregabilidade do setor neste país seja inferior à média da comunidade
europeia (Eurostat, INE).
Não obstante a baixa empregabilidade do setor artístico, esta necessidade de
profissionalização sentida pelos nossos entrevistados foi bem aceite pela generalidade das
famílias, embora demonstrem algum receio quanto à instabilidade profissional e financeira
característica do setor. Todavia, os artistas afirmam que, embora precisem de pagar contas
como qualquer pessoa e precisem de dinheiro para continuarem a criar, não trabalham pelas
recompensas monetárias, mas sim pelo reconhecimento, a melhor “forma de remuneração”.
Nos primórdios da sociologia da arte, Max Weber defendia que os constrangimentos
económicos influenciam as diferenças entre estilos musicais (cit. por Heinich, 2004). De
facto, os artistas plásticos entrevistados salientaram que o dinheiro é fundamental para a
aquisição de materiais que permitem a criação e que, não existindo recursos financeiros
suficientes, terão de fazer escolhas que alterarão todo o sentido da obra. A própria
instabilidade nas profissões artísticas já tinha sido apontada por Freidson, que referia a

93
O “mundo de aventura” do artista

necessidade de os artistas desenvolverem outras atividades como forma de sustento (Freidson


cit. por Cabral; Borges, 2010, p.150), uma vez que esta é uma profissão, regra geral, sem
horário ou salário fixos, sem garantias que as obras vão ser vendidas, sem contratos de
trabalho (Heinich, cit. por Araujo, 2008). Viver da arte é, assim, de acordo com os
entrevistados, viver num “mundo de aventura”.
Quanto à receção da obra, constatamos que esta é notícia quando é bem recebida pelos
diferentes públicos e pela crítica, bem como quando é considerada de qualidade. O seu
mediatismo, os prémios recebidos e a importância que lhe é atribuída são outros dos fatores
que contribuem para a sua noticiabilidade. A sua relação com o público pressupõe
interatividade, apesar de a obra ser tida como “complexa” e “difícil de apreender”. No
entanto, os artistas entrevistados assumem pensar nos públicos aquando da concretização de
uma obra, uma vez que a obra só o é efetivamente quando exposta. De facto, os públicos são
polissémicos, auto-organizam-se e mobilizam-se coletivamente (Lopes; Aibéo, 2005),
fazendo parte do grupo de consumidores das obras de arte e, por isso, os artistas não descuram
a importância destes.
A obra é, também, descrita como triste, criativa, rara, sensível, delicada, atrativa,
autónoma, irónica, simples, necessária, arriscada e intencional. Ela é um forte meio de
expressão do pensamento artístico, das suas críticas e denúncias, o que Huisman já tinha
evidenciado (1994).
Relativamente ao artista, podemos constatar que este, de acordo com o suplemento
Ípsilon, é geralmente homem, jovem e não é português. Apenas na dança se destaca a
prevalência das mulheres, tal como avançado por Nico et al., embora se tenha vindo a assistir
à feminização do campo artístico (2007). Para os entrevistados, a aposta em artistas jovens
por parte dos investidores no mercado das artes é “tipo ações" (como refere um dos
entrevistados), mas reconhecem que um artista não se faz só através da idade e que a
juventude não lhe retira valor (algo que é referido, inclusivamente, pelos entrevistados mais
velhos, com 43 e 56 anos).
Tal como acontece com a obra, o artista é noticiado quando é reconhecido e/ou
famoso, quando é premiado e quando a sua importância na área em que exerce é reconhecida.
Ele cria livremente a partir da inspiração e da experimentação e sabe aproveitar as novas
tecnologias. O seu aspeto físico e a sua maneira de vestir chamam a atenção por fugirem do
que é considerado moda, mas os entrevistados afirmam que não se vestem de maneira
diferente por serem artistas, e sim porque a indumentária reflete um estado de espírito e, mais

94
O “mundo de aventura” do artista

que isso, porque não se preocupam com tendências estilísticas ou com o que os outros possam
pensar sobre eles. A criação de uma obra também envolve o contacto com materiais que
podem danificar as roupas, motivo pelo qual os artistas parecem vestir-se de forma mais
descontraída.
Para os artistas entrevistados, a obra é o espelho do seu criador e tem uma mensagem a
transmitir. Tal como Graham já tinha defendido, ela causa sensações e emoções nos seus
públicos (2001) e fascina, mexe, é invulgar e original (este último aspeto já tinha sido
apontado como essencial por Heinich na sua obra de 1998). Contudo, dizem não existir uma
definição clara do que é ou não é arte, tanto que, para a sociedade em geral, a obra tem de ser
bonita e “combinar com os sofás”. O processo de criação não é relevante para o cidadão
comum, que considera como obras de arte objetos que ele próprio não consegue criar e que,
além de mediáticos, possuem um preço elevado. Contudo, ressalvamos que no Ípsilon a
relevância dada à dimensão económica das obras não tem grande expressividade.
Para o Ípsilon, o artista é descrito como singular, sensível, irónico, criativo, tímido,
afetuoso, emocionalmente frágil e como alguém que atinge a sua imortalidade através da obra.
Horn, aliás, já tinha mencionado que o artista permanece com os seus públicos através das
obras que criou, mesmo após a sua morte (2006). Já para os artistas plásticos entrevistados, o
artista conjuga teoria e técnica no (longo) momento de criação, preocupando-se com
conceitos, e não com o produzir de objetos belos. A arte, aliás, “não tem que ser bonita” e o
artista é “naturalmente diferente”.
Quando questionados, os entrevistados afirmaram considerar-se artistas em fase de
amadurecimento, tendo, ainda, um longo caminho a percorrer. Apesar da importância
atribuída aos diplomas na atualidade, consideram que uma licenciatura não faz de um
indivíduo um artista, embora faça o artista ser “levado mais a sério”. Desta forma, os artistas
amadores não são considerados, por parte dos finalistas da FBAUP, inferiores aos artistas
especializados e, embora tenham de produzir objetos que vão mais de encontro aos gostos das
massas (como caricaturas) para sobreviverem, são polivalentes, não tendo que responder a
tantas expetativas quanto o artista que já tem uma carreira consolidada ou, pelo menos,
(re)conhecida. Quanto aos artesãos, se na Idade Média eles eram considerados seres
superiores por terem aprendido um ofício (Araujo, 2008), para os artistas entrevistados, na
atualidade, estes apenas se preocupam com o “fazer técnico de coisas bonitas”, tratando-se de
uma atividade “puramente manual”, como era descrita na altura do Renascimento (Araujo,
2008). Não são, portanto, artistas.

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O “mundo de aventura” do artista

Assim, podemos concluir que, no caso do Ípsilon, é privilegiado o lado profissional do


artista, dando-se relevância ao processo de criação e receção da obra. A visão do campo
artístico neste suplemento parece ir de encontro àquela que os artistas entrevistados atribuem
aos media em geral, já que consideram que os meios de comunicação social portugueses não
têm “uma mostra relevante da arte portuguesa” e que só dão visibilidade a um artista quando
este é premiado. Para eles, “é inevitável, a linguagem dos media cria realidades diferentes da
realidade directa”.
Quanto aos entrevistados, salientamos a tendência destes para referirem o caso da
artista plástica portuguesa Joana Vasconcelos23. Para eles, o trabalho desta artista beneficia da
relação que esta possui com as artes desde cedo e da relação que tem com os media. O facto
de ter recebido vários prémios e de ser (re)conhecida além-fronteiras faz com que o público
esteja atento à artista e ao seu trabalho, trabalho esse que, para os entrevistados, vai de
encontro ao que as massas procuram (objetos bonitos e que fazem lembrar algo real).
Contudo, não deixamos de relembrar que os artistas entrevistados estudam, sobretudo, Artes
Plásticas, área profissional onde Joana Vasconcelos exerce. Além disso, o trabalho desta
artista tem sido bastante mediatizado em 2012, ano de realização das entrevistas, devido à sua
exposição no Palácio de Versalhes, motivo pelo qual está “a bombar nos olhos de muita
gente” (segundo um dos estudantes), o que poderá chamar a atenção dos entrevistados para o
seu trabalho, que veem nela a personificação das artes plásticas. Além do conceito de
personificação, também a metaforização (conceitos avançados por Ordaz e Vala (1997)) foi
passível de identificar nas entrevistas realizadas, já que alguns entrevistados usam o futebol
como metáfora para explicar os seus pontos de vista relativamente às artes. Tanto estes
estudantes da FBAUP como os resultados obtidos através da análise de conteúdo apontam
para a tendência de associar o artista a características negativas, como a instabilidade
emocional, as drogas e a tristeza.
Para além das etapas de produção e receção, a sociologia da arte debruça-se sobre as
etapas de divulgação, distribuição, legitimação e mediação. Se as obras de arte e os seus
criadores são divulgados e legitimados pelos media, e se estes exercem o seu papel mediador
entre a criação e a receção, o mesmo não se pode dizer da distribuição, que praticamente não é
referida pelo suplemento em estudo.

23
Joana Vasconcelos é uma artista plástica de nacionalidade portuguesa que nasceu em Paris, em 1971.
Atualmente vive e trabalha em Lisboa e o seu trabalho “assenta na apropriação, descontextualização e subversão
de objetos pré-existentes e realidades do quotidiano” (Joana Vasconcelos, 2012). Foi também a primeira mulher
e a mais jovem artista plástica a expor o seu trabalho no Palácio de Versalhes (Godinho, 2012). O seu pai, Luís
Vasconcelos, é repórter fotográfico e fez parte da equipa fundadora do jornal Público (Ribeiro, 2012).
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O “mundo de aventura” do artista

Relativamente à questão do dom e do talento, apontados pelo Ípsilon mas tidos como
um mito por parte dos artistas entrevistados, esta é uma questão que atravessa a sociologia da
arte desde a sua essência. Kris e Kurz apontavam o dom inato do artista e a sua vocação
precoce (cit. por Heinich, 2004). Porém, os finalistas da FBAUP frisam que o “jeito para o
desenho”, apesar de ter sido evidente em todos eles desde a infância, não cria, por si só, uma
obra de arte, pois sem treino o eventual dom que possam possuir não age sozinho. No que diz
respeito ao juízo estético dos indivíduos, Bourdieu defende que as famílias têm um papel
importante na sua construção (1987). Todavia, as famílias dos entrevistados não possuem
fortes ligações ao mundo das artes, o que, como já referimos, contribuiu para o ingresso dos
entrevistados no ensino superior artístico.
Chegando ao final do nosso percurso, torna-se possível fazer um balanço do trabalho
até então realizado. Desde logo salientamos que, aquando das entrevistas, nos apercebemos
que a visão dos estudantes de Design de Comunicação era diferente da dos estudantes de
Artes Plásticas, embora ambos os cursos sejam ministrados na FBAUP. Os primeiros não só
não se consideram artistas, como sentiram menor necessidade de desenvolver as questões por
nós colocadas, ao contrário dos segundos, que manifestaram uma constante vontade de
exemplificar as suas ideias, defender os seus pontos de vista e de mostrar ao entrevistador,
que veem como alguém fora do mundo das artes, como é que o seu meio funciona. Mesmo
assim, incluímos as entrevistas aos estudantes de Design de Comunicação neste trabalho, uma
vez que eles representam um meio-termo entre as representações das artes avançadas por
parte dos alunos de Artes Plásticas (autorepresentações) e as representações avançadas pelos
media e/ou pela sociedade em geral (heterorepresentações).
Quanto a futuras investigações, e agora que temos uma visão geral das representações
das artes nos media, sugerimos o estudo de um ramo artístico específico e, possivelmente, o
estudo de outros meios de comunicação social. Além da análise de conteúdo do(s) meio(s) de
comunicação em análise e das entrevistas aos artistas do ramo, propomos, igualmente, a
aplicação de entrevistas aos jornalistas e o alargamento do período temporal em observação,
uma vez que consideramos relevante estudar a evolução das representações das artes ao longo
dos tempos.

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O “mundo de aventura” do artista

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O “mundo de aventura” do artista

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2011). Edição Porto.
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 ÍPSILON (2011e) – A rentrée está a chegar (26 de agosto de 2011). Edição Porto.
 ÍPSILON (2011f) – Arcade Fire. A banda que vimos crescer tornou-se gigante. O
caminho até à lotaºão esgotada de hoje no Meco (15 de julho de 2011). Edição Porto.
 ÍPSILON (2011g) – Stanley Kubrick, um renovado caso de popularidade. Cerebral,
formalista, dizia-se… Apaixonado pela fraqueza humanas e pelas emoções, diz-se (10 de
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 ÍPSILON (2011h) – Jonathan Franzen em entrevista. Os dias de fúria do “Grande
Romancista Americano” terminaram (6 de maio de 2011). Edição Porto.
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história também é nossa (22 de abril de 2011). Edição Porto.
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coiffure imperturbável. Isabelle Huppert e a sua entrega física e psicológica (18 de
março de 2011). Edição Porto.
 ÍPSILON (2011k) – James Blake, 22 anos. E se ele fosse o som de 2011? (11 de fevereiro
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O “mundo de aventura” do artista

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 VALA, Jorge (2004) – Representações sociais e psicologia social do conhecimento
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social. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. ISBN 972-31-0845-3. p. 457-502.
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Análise Social, vol. XXXII, nº140 (1997), p. 7-29. [Consultado a 15 de agosto de 2012]
Disponível em
http://analisesocial.ics.ul.pt/documentos/1221840494M6zFQ7xv9Rd55BV5.pdf.

Documentos estatísticos e relatórios científicos e técnicos


 GOMES, Rui Telmo; MARINHO, Teresa Duarte (2009) – Trabalho e qualificação nas
actividades culturais. Um panorama em vários domínios. [Em linha] Lisboa:
Observatório das Actividades Culturais. [Consultado a 2 de fevereiro de 2012]
Disponível em http://www.oac.pt/pdfs/OBS_Pesquisas14_ecran.pdf.

109
O “mundo de aventura” do artista

 INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA (2011) – Classificação nacional das


profissões 2010. [Em linha] [Consultado a 13 de outubro de 2011] Disponível em
http://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_publicacoes&PUBLICACOESp
ub_boui=107961853&PUBLICACOESmodo=2.

 NICO, Magda et al. (2007) – Licença para criar. Imigrantes nas artes em Portugal. [Em
linha] Lisboa: Alto-Comissariado para a imigração e minorias étnicas. ISBN 978-989-
8000-38-5. [Consultado a 5 de fevereiro de 2012] Disponível em
http://www.oi.acidi.gov.pt/docs/Estudos%20OI/Estudo_OI_23.pdf.

Documentos legislativos e judiciais


 DECRETO-LEI n.º344/90 de 2 de novembro. Diário da República. Série I. [Em linha]
[Consultado a 15 de agosto de 2012] Disponível em http://www.educacao-
artistica.gov.pt/documentos/legisla%C3%A7%C3%A3o/344-1990.pdf. Estabelece as
bases gerais da organização da educação artística pré-escolar, escolar e extra-escolar.
 LEI nº 4/2008 de 7 de Fevereiro. Diário da República. Série 1. [Em linha] [Consultado a
15 de agosto de 2012] Disponível em
http://www.secomunidades.pt/vistos/images/docs/Lei%204.2008%20regula%20trabalho
%20espectaculos.pdf. Aprova o regime dos contratos de trabalho dos profissionais de
espectáculos.

Sites oficiais consultados [2011-2012]


 Eurostat. http://epp.eurostat.ec.europa.eu/portal/page/portal/eurostat/home/
 Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto.
http://sigarra.up.pt/fbaup/web_page.inicial
 Instituto Nacional de Estatística. http://www.ine.pt/
 Ípsilon. http://ipsilon.publico.pt/
 Joana Vasconcelos. http://www.joanavasconcelos.com/index.aspx
 Ponto Nacional de Referência para as Qualificações. http://portal.iefp.pt/pnrq/index.html
 Pordata. http://www.pordata.pt/

110
O “mundo de aventura” do artista

ANEXOS

111
O “mundo de aventura” do artista

112
O “mundo de aventura” do artista

Anexo 2A. Grelha de análise de conteúdo e respetivo manual

Grelha de análise de conteúdo

Figura 1. Grelha de análise de conteúdo

Ramo artística representado

Característica do discurso

Representações do artista
Representações da obra
N.º de fontes utilizadas

Geografia (do evento)


Atores nas ilustrações
Dimensão do artigo

N.º de ilustrações
Autoria do artigo

Fontes utilizadas

Valores.-notícia
Título do artigo
Página

Capa
Data
N.º

1
2
3

Manual da análise de conteúdo

Além das categorias mencionadas, foram ainda tidos em conta, por uma questão de
organização, itens como a página em que o artigo se encontrava na mesma e título do artigo em causa.
O primeiro item a ser codificado foi a data da publicação em estudo.

Quadro 1. Ípsilon (manual de codificação) – Data de publicação dos artigos


DATA
Código Notas
1 7 de janeiro
2 11 de fevereiro
3 18 de março
4 22 de abril
5 6 de maio
6 10 de junho A cada um dos dias em análise foi
7 15 de julho fornecido um código distinto.
8 26 de agosto
9 2 de setembro
10 14 de outubro
11 18 de novembro
12 23 de dezembro

113
O “mundo de aventura” do artista

Seguidamente, analisamos a presença ou ausência do artigo em análise na capa do


suplemento Ípsilon.

Quadro 2. Ípsilon (manual de codificação) – Presença dos artigos na capa da publicação


PRESENÇA NA CAPA
Código Notas
1 Sim A cada um dos dias em análise foi fornecido um código distinto:
2 Não 1 para a presença e 2 para a ausência.

Quanto ao ramo artístico representado, foram 15 os identificados ao longo da


aplicação desta técnica.

Quadro 3. Ípsilon (manual de codificação) – Ramos artísticos representados


RAMOS ARTÍSTICOS REPRESENTADOS
Código Notas
Como Arqueologia consideraram-se todos os artigos relativos a achados
1 Arqueologia
arqueológicos e todos os vestígios materiais considerados relevantes.
Como Arquitetura consideraram-se todos os artigos relativos a edifícios e
2 Arquitetura
espaços habitados/usados pelo ser humano.
Como Artes circenses consideraram-se todos os artigos relacionados com
3 Artes circenses companhias itinerantes constituídas por palhaços, malabaristas, ilusionistas,
equilibristas, entre outros.
Como Artes plásticas consideraram-se todos os artigos relacionados com
4 Artes plásticas pintura e escultura e com todos os materiais necessários à execução de formas
e imagens.
Como Artes visuais consideraram-se todos os artigos relativos à representação
5 Artes visuais
visual, incluindo cinema, teatro, pintura, escultura, fotografia, entre outros.
Como Cinema consideraram-se todos os artigos relacionados com imagens em
6 Cinema
movimento que constituem uma narrativa.
Como Dança consideraram-se todos os artigos relacionados com o uso do
7 Dança corpo em movimentos previamente estabelecidos (coreografia) ou
improvisados.
Como Design consideram-se todos os artigos relativos aos desenhos
8 Design
industriais e à conceção dos mesmos.
Como Fotografia consideraram-se todos os artigos relacionados com imagens
9 Fotografia
estáticas criadas por meio da exposição luminosa.
Como História da arte consideraram-se todos os artigos relacionados com a
10 História da arte
evolução das formas e expressões artísticas.
Como Jornalismo consideraram-se todos os artigos relativos à recolha,
11 Jornalismo
redação, edição e divulgação de factos verídicos.
Como Literatura consideraram-se todos os artigos relacionados com a
12 Literatura
(re)criação de textos eloquentes.
Como Música consideraram-se todos os artigos relacionados com a
13 Música
combinação de sons e silêncios ao longo de um período temporal.
Como Teatro consideraram-se todos os artigos relacionados com a
14 Teatro interpretação de uma determinada história, num determinado lugar, por parte
de um conjunto de indivíduos. Aqui incluímos, também, a ópera.
Como Vários consideraram-se todos os artigos que englobavam mais do que
15 Vários
um dos itens supra mencionados, geralmente dizendo respeito a exposições.

114
O “mundo de aventura” do artista

No que diz respeito aos jornalistas autores dos artigos em análise foram 41 os
identificados.

Quadro 4. Ípsilon (manual de codificação) – Autoria dos artigos analisados


AUTORIA
Código Notas
Alexandre
1 15 José Marmeleira 29 Rodrigo Amado
Prado Coelho
Ana Dias José Riço
2 16 30 Rogério Casanova
Cordeiro Direitinho
Cristina
3 17 Lucinda Canelas 31 Rui Lagartinho
Fernandes
Francisco Luís de Freitas
4 18 32 Sara Dias Oliveira
Valente Branco
Luís Miguel
5 Gonçalo Frota 19 33 Sérgio B. Gomes
Oliveira
Luís Miguel
6 Gonçalo Mira 20 34 Sérgio C. Andrade
Queirós
Luísa Soares de Susana Moreira
7 Helen Barlow 21 35 A cada um dos dias em
Oliveira Marques
análise foi fornecido
Helena Margarida Tiago Bartolomeu
8 22 36 um código distinto.
Vasconcelos Medeiros Costa
Hugo
9 Morgadinho 23 Mário Lopes 37 Vasco Câmara
Pereira
10 Inês Nadais 24 Miguel Gaspar 38 Vera Esteves
Isabel
11 25 Nuno Crespo 39 Vítor Belanciano
Coutinho
Vítor Bruno
Joana Amaral
12 26 Nuno Pacheco 40 Pereira
Cardoso
13 João Bonifácio 27 Óscar Faria 41 Não identificado
Jorge
14 28 Pedro Rios
Mourinha

A dimensão dos artigos foi classificada como pequena, média ou grande, de acordo com o
espaço que cada artigo ocupa na publicação.

Quadro 5. Ípsilon (manual de codificação) – Dimensão dos artigos analisados


DIMENSÃO DOS ARTIGOS
Código Notas
1 Pequena Artigos com dimensão igual ou inferior a uma página.
2 Média Artigos com dimensão compreendida entre uma e três páginas (inclusive).
3 Grande Artigos com dimensão superior a três páginas.

115
O “mundo de aventura” do artista

Os artigos possuíam um discurso assente em quatro tipos: explicativo, informativo,


interrogativo e/ou opinativo. Frequentemente, assistimos ao recurso a mais do que um tipo de discurso
no mesmo artigo.

Quadro 6. Ípsilon (manual de codificação) – Características do discurso


CARACTERÍSTICAS DO DISCURSO
Código Notas
Como discurso do tipo explicativo entenderam-se todos os artigos cujo discurso
procurava elucidar os leitores acerca dos processos de criação e receção da obra, entre
outros aspetos. São artigos que não se limitam a dizer o que vai acontecer, quando,
onde e com quem, mas que dão ao leitor mais dados para além disso.
1 Explicativo Exemplo 1: “E o jogo proposto pelo actor é determinado a priori pelo próprio autor
que dizia estar em todas as personagens, assumindo-se também como marionetista das
vidas dessas personagens e dos actores que as interpretavam. Ele sabia onde os queria
levar, mesmo que pudesse ser surpreendido pelo resultado. (…)”
Ípsilon, 11 de fevereiro de 2011, p.68
Como discurso do tipo informativo identificamos todos os artigos cujo discurso
procurava dar as informações essenciais para que o leitor percebesse o evento
noticiado.
2 Informativo
Exemplo 2: “A digressão comemorativa de “Doolite”, o mítico álbum que os Pixies
lançaram em 1989, terminou ontem no Canadá. 8(…)”
Ípsilon, 6 de maio de 2011, p.3
Como discurso do tipo interrogativo consideramos todos os artigos do género
entrevista, constituídos por pergunta-resposta.
3 Interrogativo
Exemplo 3: “Foi buscar as referências ao “verdadeiro” poeta Rubert Brooke?”
Ípsilon, 18 de novembro de 2011, p.17
Como discurso do tipo opinativo consideramos todos os artigos em que o artista fazia
juízos de valor sobre o artista e/ou sobre a obra.
4 Opinativo Exemplo 4: “As fotografias de Edgar Martins são invulgarmente frias e este projecto
não escapa a essa estética implacável. (…)”
Ípsilon, 14 de outubro de 2011, p.27

Relativamente às ilustrações, além do número de ilustrações por artigo, tiveram-se


em conta os atores presentes nessas ilustrações.

Quadro 7. Ípsilon (manual de codificação) – Atores presentes nas ilustrações


ATORES PRESENTES NAS ILUSTRAÇÕES
Código Notas
1 Artista 8 Instrumento musical
2 Artista e obra 9 Motivo de inspiração
3 Casa do artista 10 Obra
A cada um dos dias em análise
4 Curador 11 Outros artistas do ramo
Editor Presidente do evento
foi fornecido um código distinto.
5 12
6 Espaço 13 Público
7 Espaço e público 14 Recortes de imprensa

116
O “mundo de aventura” do artista

Relativamente às fontes, além do número de fontes citadas por artigo, tiveram-se


em conta que fontes eram essas.

Quadro 8. Ípsilon (manual de codificação) – Fontes utilizadas


FONTES PRESENTES
Código Notas
Académicos/historiadores/ 20
1 Engenheiro de som
investigadores
2 Advogado 21 Ex-curador
3 Agente 22 Ex-diretor do evento
4 Artista 23 Familiares do artista
5 Autor do texto de apresentação 24 Membro de instituição
6 Bíblia 25 Obra
7 Biografia do artista 26 Oprah Winfrey
8 Carta 27 Outros artistas do ramo
A cada um dos dias em
9 Colega na editora 28 Presidente do evento análise foi fornecido um
10 Comissário 29 Primeiro editor do artista código distinto.
11 Comunicação social 30 Produtor
12 Convite para o evento 31 Professor do artista
13 Crítico 32 Programa do evento
14 Curador 33 Promotor de imprensa
15 Diretor 34 Psicólogo do artista
16 Diretor da editora 35 Público
17 Diretor de associação 36 Redes sociais
18 Editor 37 Responsável pelo evento
19 Editor de outra revista 38 Texto de apresentação da obra

Foram 12 os valores-notícia encontrados, tal como mostra o quadro abaixo


representado.

117
O “mundo de aventura” do artista

Quadro 9. Ípsilon (manual de codificação) – Valores-notícia utilizados


VALORES-NOTÍCIA
Código Notas
Aniversário do Como Aniversário do artista entenderam-se todos os artigos relativos à comemoração
1
artista do aniversário do artista.
Aniversário do Como Aniversário do artista (carreira) entenderam-se todos os artigos relativos à
2
artista (carreira) comemoração do aniversário de carreira do artista.
Atribuição de Como Atribuição de prémio entenderam-se todos os artigos relativos à atribuição de
3
prémio prémios ao artista
Descoberta Como descoberta arqueológica entenderam-se todos os artigos relativos a achados
4
arqueológica arqueológicos e a todos os vestígios materiais considerados relevantes.
Expectativa em
Como Expetativa em torno da obra consideraram-se todos os artigos relativos à
5 torno de nova
ansiedade e expetativas em torno das obras de arte.
obra
Como Homenagem consideraram-se todos os artigos relativos a homenagens feitas
6 Homenagem
aos artistas.
Lançamento Como Lançamento póstumo entenderam-se todos os artigos relacionados com
7
póstumo publicações e lançamentos de obras após a morte dos seus criadores.
Como Novidade entenderam-se todos os artigos referentes a lançamentos de álbuns,
8 Novidade
filmes, livros, estreias de peças de teatro, entre outros.
Como Polémica entenderam-se todos os artigos que tinham como base uma polémica
9 Polémica
relacionada com o artista e/ou com a(s) sua(s) obra(s).
Proximidade
Como Proximidade geográfica (Portugal) entenderam-se todos os artigos
10 geográfica
relacionados com eventos ocorridos em Portugal (Continental e Ilhas)
(Portugal)
Como Proximidade temporal entenderam-se todos os artigos relacionados com
Proximidade
11 acontecimentos ocorridos entre 12 meses antes da publicação da edição em causa e
temporal
12 meses depois
Como Revelação do ano entenderam-se todos os artigos relativos aos artistas que
Revelação do
12 foram considerados pelos autores dos mesmos artigos como revelações do ano e
ano
como alguém a seguir com atenção.

Por fim, procedemos à recolha das representações atribuídas às obras de arte e aos
artistas. Nestes itens, dada a enorme diversidade dos significados recolhidos, partimos para a
recolha de todos eles e, posteriormente, para a sua categorização e agrupamento, tal como
evidenciam os quadros 3.11. e 3.12.

118
O “mundo de aventura” do artista

Anexo 2B. Guião de entrevista

Guião de entrevista

I. Caracterização sociográfica do estudante entrevistado


1. Sexo
2. Idade
3. Nacionalidade
4. Naturalidade (concelho)
5. Área de residência (concelho)
6. Formação artística anterior
7. Condição perante o trabalho

II. Entrada no mundo das artes *


1. Descreva-me o momento em que o seu interesse pelas artes despertou.
2. Existiu alguma figura na sua vida que tenha sido importante na sua ligação às artes?
Quem? Porquê?
3. Tem artistas na família? Que influência teve a sua (in)existência nas suas escolhas
académicas e/ou profissionais?
4. Em família, costumavam frequentar concertos, museus, exposições?
5. Foi uma decisão pacífica para os seus familiares e amigos? Qual a opinião destes?
6. Considera-se artista? A partir de que momento passou a reconhecer-se como tal?

III. Escolaridade e formação *


1. Como vê a oferta formativa em Portugal a nível das artes?
2. O que o levou a investir numa formação artística especializada? Qual a importância da
sua formação artística na sua área de atividade? Criou-lhe oportunidades ou, pelo
contrário, não teve qualquer importância no acesso à vida profissional?
3. Consegue viver exclusivamente da arte? Se não, considera que algum dia conseguirá?

119
O “mundo de aventura” do artista

IV. Auto e heterodefinição de arte e de artista


1. O que é, para si, arte? Qual a fronteira entre o que pode ser considerado arte ou não?
2. Na sua opinião, o que a generalidade da sociedade considera ou não arte? Com base
em que critérios?
3. O que é, para si, um artista? Qual a fronteira entre o artista e o artesão?
4. Na sua opinião, quando é que a generalidade da sociedade considera que alguém é um
artista? Com base em que critérios?
5. Na sua opinião, o que faz de um artista um artista profissional?
6. Quem pode dizer o que é arte e o que é um artista?
7. Relativamente ao artista, gostaria de saber a sua opinião e a opinião que julga que a
sociedade tem sobre:
 infância do artista
 aspeto físico do artista e indumentária
 relação do artista com a sociedade em geral e com as regras estabelecidas
 relação do artista com o dinheiro
 artista e espiritualidade
 importância da idade do artista (arte jovem diferente da arte dos artistas mais
velhos?)
 importância do reconhecimento e da fama para a obra e para o artista
 artista: diferente ou igual à restante sociedade?
 outras características associadas

8. Relativamente à (obra de) arte, gostaria de saber a sua opinião e a opinião que julga
que a sociedade tem sobre:
 processo de criação da obra de arte (fatores envolvidos)
 funções da arte
 obra de arte resulta do talento e/ou da aprendizagem?
 obra de arte como liberdade de expressão?
 obra de arte como instrumento político?
 importância dos números (de vendas, de visitantes, entre outros) no mundo das
artes
 importância do público na realização da obra

120
O “mundo de aventura” do artista

V. Arte, artistas e media


1. No seu entender, como é a relação dos artistas com os meios de comunicação social?
(vantagens e desvantagens, se as houver)
2. Considera que a visão dos media sobre a arte e os seus criadores vai de encontro à
realidade do setor?
3. Considera que os media portugueses privilegiam mais o artista ou a obra? Porquê?
4. Relativamente à arte portuguesa, considera que esta tem o destaque suficiente nos
media nacionais?
5. Já alguma vez foi notícia nos media? Se sim, fale-nos dessa experiência.

* tópicos elaborados com base na investigação apresentada em SANTOS, Maria de Lourdes Lima dos (coord.)
(2003) – Anexo 1 - Guião de entrevista a jovens criadores. In SANTOS, Maria de Lourdes Lima dos (coord.) –
O mundo da arte jovem: protagonistas, lugares e lógicas de acção. Oeiras, Celta Editora. ISBN 972-774-167-3.
p.257-263.

121
O “mundo de aventura” do artista

122
O “mundo de aventura” do artista

Anexo 2C. Categorias de análise temática

Categorias de análise temática das entrevistas aos estudantes finalistas de


2011/2012 da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (E1 a E10)

CATEGORIAS SUB-CATEGORIAS CÓDIGO


Despertar do interesse pelas artes A1
mundo das artes

Influências A2
Entrada no

Relação da família com as artes A3


Hábitos culturais e artísticos na infância/juventude A4
Reação de familiares e amigos A5
Autolegitimação enquanto artista A6
Avaliação do ensino artístico em Portugal B1
Escolarid

formação

profissão

Avaliação da importância de uma formação artística


ade,

B2
e

especializada
Expectativas profissionais B3
Auto definição de arte C1
Heterodefinição de arte C2
Diferença entre artista e artesão C3
Heterodefinição de artista C4
Diferença entre artista profissional e artista amador C5
Instâncias legitimadoras C6
Auto e heterodefinição de arte e de artista

Auto e heteroperceção sobre o artista C7


infância C7.1
aspeto físico e indumentária C7.2
relação com a sociedade e as regras estabelecidas C7.3
relação com o dinheiro C7.4
relação com a espiritualidade C7.5
importância da idade C7.6
importância da fama e/ou do reconhecimento C7.7
outras características associadas C7.8
ser diferente C7.9
Auto e heteroperceção sobre a arte C8
processo de criação da obra de arte C8.1
funções da obra de arte C8.2
obra de arte: talento ou aprendizagem C8.3
obra de arte como liberdade de expressão e/ou C8.4
instrumento político
importância dos números (de vendas, visitantes, entre C8.5
outros)
importância do público C8.6

123
O “mundo de aventura” do artista

vantagens e desvantagens D1

artistas e
visão do setor D2

media
Artes,
artista ou obra D3
arte nacional e arte internacional D4
experiência com os media D5

124
O “mundo de aventura” do artista

Anexo 2D. Grelha de análise vertical das entrevistas semidiretivas

Grelhas de análise vertical das entrevistas semidiretivas

Entrevista n.º 1
Idade: 22 anos
Caracterização sociográfica
Sexo: masculino
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Paredes
Área de residência: Porto
Formação artística anterior: Curso de Artes Visuais no Ensino Secundário tradicional
Estatuto: estudante
Licenciatura em: Artes Plásticas (Pintura)

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “A primeira lembrança que eu tenho é da escola primária. Dizia: “Quero ser desenhador!”.”
A2. Influências “Familiar não, mas uma professora do Secundário foi uma grande influência, pois era extremamente competente, não só
pelo facto de fazer muitos exercícios técnicos, mas também porque nos levava todos os anos ao Porto e ao festival de
animação em Espinho. Portanto, não era uma pessoa que ficava sentada na cadeira a dar aulas, percebia o que era
necessário para ser artista e nesse facto foi das pessoas que mais ia minha entrada nesta Faculdade.”
A3. Relação da família com as artes “Os meus pais não são ligados à arte”.
A4. Hábitos culturais e artísticos na “De pequenino? Não, nada! Nada, nada, nada. Gostava de desenhar, só isso. (…) A partir do décimo ano é que comecei a
ir visitar museus no Porto, teatros…”
125
O “mundo de aventura” do artista

infância/juventude
A5. Reação de familiares e amigos “Os meus pais concluíram o 4º ano e nunca me obrigaram a ser médico ou seguir o que eles queriam, portanto,
provavelmente não era a área preferida deles, mas conseguem compreender o que eu estou a fazer, e deram sempre
apoio.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Sim! Vá, sou um jovem artista, porque já estou dentro de alguma coisa, mas considerar-me “aquele artista” ainda não.
Precisas de muita maturidade, muito tempo para conseguires estabelecer um grupo de trabalho, um portefólio, vá lá, em
que diga “Isto sou eu!”. Quando existir esse “eu” existe o artista. Mas agora não o deixo de ser.”
Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “Eu acho que o Ensino Secundário está muito mal feito porque quando vais para Artes tu não sabes que vais para Artes,
Portugal ou melhor, tu não sabes o que é arte, tu gostas é de desenhar. (…) Mas nós só temos real noção da arte quando chegamos à
Faculdade. (…) No Secundário, a arte contemporânea tu dás num trimestre…é ridículo. A não ser que tenhas um bom
professor de desenho, que é a disciplina principal, e que te leve a exposições. Só assim vais tendo algum acesso às coisas,
mas é muito vago.”

“Quando nós vamos para lá não aprendemos nada relacionado com Arquitetura nem com as futuras saídas. De design não
aprendes nada, nem sequer vem no programa curricular.”
B2. Avaliação da importância de uma “Como a minha professora estudou cá no Porto, sempre ouvimos falar mil maravilhas da escola do Porto. Além disso, na
formação artística especializada altura não tinha a maturidade, não tinha o background de cultura da arte porque não tinha família na área, nem amigos
nem nada e portanto a única maneira de me inserir no mundo da arte era seguir a licenciatura e aprender mais alguma
coisa.”

“Era hipócrita se dissesse que [o curso superior] não me ajudou.”


B3. Expetativas profissionais “É o meu sonho. E o meu sonho passa logo por sair de Portugal. Esquece, Portugal não. Não consegues. Ou tornas-te
Joana Vasconcelos, tens já dinheiro ou esquece, não dá. (…) Ou então tens já de conhecer as pessoas certas e inserires-te
em círculos, ires para Lisboa, não podes ficar no Porto, de todo não podes ficar no Porto. Para seres um artista profissional
precisas de trabalhar muito, seres convicto e seres bom. E seres bom não é só pintares bem.”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “Nós vivemos uma crise de conceitos, os próprios artistas põem em causa os conceitos todos. Eu acho que arte não é
assim tão ampla quanto isso. (…) Por um lado é o facto de te fascinares e por outro lado é inserires-te num contexto onde
as coisas partem de um pensamento, em que ele se modifica e em que chega às pessoas de um facto que não é normal, é a
visão pessoal de alguma coisa e tu queres que ela chegue a alguém. Portanto, o facto de eu fazer uma peça bonita não é
visão nenhuma, não é? Ou seja, é o artesanato. Para ser, atualmente, arte não é só ser algo técnico, tem de haver conceito.
(…)

“Não podemos estar sempre a pôr em causa a história da arte, estávamos desgraçados!”

126
O “mundo de aventura” do artista

“Mas é muito difícil justificar o que é a arte, nem os artistas sabem.”

“Há áreas que toda a gente sabe que são arte: a música, o cinema, a dança, as artes plásticas…Mas até que ponto é que a
arquitetura, por exemplo, é arte? Tem de haver um grau de exigência…”

“Há design que é arte e outro que não é arte. Quando é que ele é arte? Quando passa o grau de normalidade, acho eu. Está
tão bem feito, que é arte. Não é artes plásticas, é outro tipo de arte.”
C2. Heterodefinição de arte “É a atual mentalidade contemporânea, de massas até. Como as coisas são feitas não interessa a ninguém. (…) E interessa
o preço, mas só interessa se for alto. Costumamos brincar e dizer que vendemos mais depressa uma peça por 60 mil euros
do que uma peça por 600. As pessoas são também um bocado iludidas. E a venda de quadros, actualmente, é o que mexe o
mercado da arte. Sei que há pessoas e associações que compram peças de arte e nem sequer as tiram do pacote. É
complicado para os artistas. (…)”

“Para já passa por não passar por “eu também faço isso”, “o meu filho faz isso”. (…) A sociedade em geral considera arte
as coisas bonitas. Se é bonito, é arte.”

“Mas lá está, são coisas para combinar com os sofás, para combinar com os cortinados. Tudo o que é tinta numa tela é
arte, desenhos bonitos é arte, retratos das pessoas na rua é arte, portanto…. curtas metragens para as pessoas não é arte,
não é? Cinco minutos de filme? Isso é porcaria…Não tem sentido nenhum. Cinema de animação é para crianças.”
C3. Diferença entre artista e artesão “O artista trabalha sobre o que está à volta dele, tenta perceber como é que a sociedade funciona. E eu não dispenso, de
todo, diversão. Para mim, seria surreal. Eu não consigo fechar-me dentro de um sítio a trabalhar 24 horas, para mim não
faz sentido nenhum. É preciso haver uma parte de contacto exterior, de contacto com as pessoas, é esse contacto que me
vai fazer conhecer enquanto artista e não é dentro de quatro paredes que vou aprender as coisas. Não é só na Faculdade
que eu vou aprender. As experiências cá fora, o falar com as pessoas.”

“O artesão prende-se com o fazer técnico de coisas bonitas, o fazer técnico de coisas dentro da cultura popular, bem feitas.
E o artista…é complicadíssimo, mas há muito mais para além da técnica, há uma ideia, há um conceito, há um inserir num
contexto cultural contemporâneo, enquanto um artesão não tem qualquer noção de arte (…)”
C4. Heterodefinição de artista “As pessoas têm um bocado a ideia do artista romântico, aquele do devaneio, ou o muito romântico no sentido de as
coisas aparecem na cabeça e faz, não quer saber de regras, não precisa de dinheiro, é drogado e relaciona-se com muitas
raparigas. É o Don Juan… ou então é gay!”
C5. Diferença entre artista profissional e “Para mim, os profissionais são aqueles que vivem diretamente da arte e são um em mil, ou mais. (…) Ou melhor, se
artista amador calhar não existem artistas profissionais. Podemos considerar artistas profissionais aqueles cuja ocupação é ser artistas,
porque há muito poucos cuja profissão é ser artistas, apenas.”
C6. Instâncias legitimadoras “Para já, quem estudou e quem vem de um contexto inicial ligado à área…”

“A principal pessoa para te considerar artista és tu. Portanto, o facto de te considerares artista é o que te vai manter vivo.

127
O “mundo de aventura” do artista

Os professores não, quer dizer, podem. Podem ser eles porque vão ter alguma influência em ti, mas é complicado…o que
te vai considerar artista vai ser o feedback que tu vais ter. (…) “

“Perceber de arte é não é perceber de técnica, é tu interessares-te e leres e veres. (…) Portanto, quem percebe de arte são
os que se interessam sobre arte, tens de perceber, tens que ir aos sítios, tens que pesquisar, não chega passar ao sábado de
cada mês e passear pelo Miguel Bombarda e beber um copo de vinho. (…) Não é só frequentar.”
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “(…) tens sempre recalcamentos, (…) enquanto as outras pessoas se tornam quase psicopatas e por aí fora, os artistas
passam isso para a arte.”

“O que é o artista? O artista és tu. A tua infância faz parte de ti, a tu vida vai acabar por se refletir na obra. (…) Uma
pessoa que esteve extremamente ligada na infância à natureza vai trabalhar provavelmente com madeiras. (…)”
C7.2. aspeto físico e indumentária “Não se vestem diferente. (…) O que acontece é que as pessoas talvez não sejam tão preocupadas com a imagem. As
raparigas da minha turma não vão calçar um salto-alto e trabalhar numa oficina de metais, não dá jeito. Não vão com
roupa toda bonita, porque ela vai estragar-se. As pessoas vão para trabalhar, e trabalhar no campo das artes significa,
como um meu professor dizia “pores a mão na porcaria”. É preciso sujares-te. Mas se fores ver os estudantes de Design, já
não tem nada a ver.”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Há artistas que extravasam o que às vezes é considerado civilizado. Para quem vê de fora, quando tu extravasas as regras,
estabelecidas é provocação. O ideal é que faças as pessoas entenderem que as regras não são tudo, devemos pensar para além delas.”
C7.4. relação com o dinheiro “Somos uns pobres! Tu não trabalhas para ter dinheiro, trabalhas para estar bem contigo próprio e, o mais gratificante de
tudo, o tal subir na carreira. O subir na carreira é igual a dinheiro, portanto, tu sobes na carreira para teres dinheiro e para
teres o reconhecimento, para seres ainda mais artista. O único facto que faz com que os artistas precisem de dinheiro é
para criar.”

“O luxo, ao artista, em geral, quase não diz nada. O luxo para eles é poder viajar, por exemplo, e conhecer, poder
informar-se, poder cultivar-se.”
C7.5. relação com a espiritualidade “A espiritualidade está na base de muita criação artística, no sentido em que é uma coisa que vem de dentro. O próprio
objeto de arte pode confundir-se com um objeto sacro. É um objeto mas, ao mesmo tempo, “Não toques!”. Tu vais a um
museu e tens a linha que não podes transpor. (…) Parece estar ligado a uma peça católica, ao santinho que está lá em cima
do altar e que o altar é aquele local que não podes tocar.”
C7.6. importância da idade “É extremamente importante. És artista jovem? Vamos apostar nele, é tipo ações.”
C7.7. importância da fama e/ou do “Reconhecimento, vai ser aquele que te vai dar alento. Quanto à fama, já entras na Joana Vasconcelos, entras no star
reconhecimento system. Quando é que o artista é extremamente artista? Quando passa o reconhecimento para além da área da arte, é
aquele que é falado nos meios de comunicação social, que aparece em público. O star system é além arte. (…) É muito
promíscuo mas, o teu nome vai ser mais valorizado no campo da arte quando apareceres noutros meios.”

128
O “mundo de aventura” do artista

“Atualmente, tu tens milhares de artistas e o facto de eles serem reconhecidos passa por inovarem.”
C7.8. outras características associadas “As pessoas são muito preconceituosas e os artistas são um bocado fechados de mais.”

“Há muito a ideia do estudante de belas artes bêbado, drogado e que não quer fazer nada da vida. É completamente o
oposto. Tanto que, atualmente, os artistas portugueses vão lá para fora e têm sucesso.”

“Dizem que são arrogantes, a questão de superioridade, e é a verdade. Muitas vezes são mesmo. Dentro da arte, o público
em geral não te consegue chegar. A arrogância é estúpida, o facto de alguém não te conseguir compreender e tu não
fazeres o esforço por teres um contacto com essa pessoa, é muito mau.”

“O artista faz o que lhe dá na gana, muitas vezes. Isso é verdade. Mas acho que não chateia ninguém e ao mesmo tempo
não é um drogado. São pessoas com uma mente mais aberta, sem dúvida alguma. Aí está um virtuosismo, mente aberta.
Defeito, facilmente caem nessa mente aberta.”
C7.9. ser diferente “Eu acho, sinceramente, que as pessoas de arte são diferentes. (…) Acho que a mentalidade é completamente diferente.
Não somos pessoas materialistas. Não vamos nas cantigas da cultura pop. Somos minados para não pensar segundo as
massas.”

“Eu acho que é naturalmente diferente. (…) Os artistas não fazem por ser diferentes, pensam de uma maneira diferente e
expressam-se de uma forma diferente.”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “Há aqueles artistas mais loucos que têm uma criança dentro deles e qualquer coisa serve para brincar e criam uma peça
de arte, mas que fascina. Tens aqueles que põem todos os recalcamentos da vida íntima na arte… É muito complicado.
Quais são os fatores? Não faço ideia, mas investiga-os!”

“Não depende só do artista, todos nós somos diferentes. As vivências de cada um vão ser diferentes, senão estávamos
todos a fazer coisas iguais. Sei lá, tu podes ter um acidente e isso vai ser um fator que vai equacionar toda a tua vida
artística, o estudares no Porto ou estudares em Lisboa é completamente diferente também. Os professores vão influenciar-
te, os amigos vão influenciar-te, o facto de trabalhares sozinho ou não vai influenciar-te. A melhor coisa que podes fazer é
não estares sozinho, ouvires críticas.”
C8.2. funções da obra de arte “No mundo da arte, atualmente, ela pode pensar sobre si própria, questionar a si própria. Enquanto outras vão ter uma
função social, de intervenção. Portanto, a função da arte… a arte não tem uma função, os artistas é que vão ter alguma
função consoante o que eles querem.”
C8.3. obra de arte: talento ou “Não precisas de ter talento. O talento que tu precisas de ter não é técnico. É em termos de pensamento. Pensares sobre as
aprendizagem coisas e conseguires a ideia sobre o que tu tens e haver uma metamorfose do pensamento para o objeto e como é que isso
funciona. (…) Tu podes ter muitas ideias, podes ser um criativo, mas não te chega isso. Tens de estar dentro de um
contexto e perceber de arte, perceber como as coisas resultam, ter uma cultura visual, porque há muitos artistas que são
autodidatas, que nunca passaram pelas escolas, e são bons artistas.”

129
O “mundo de aventura” do artista

C8.4. obra de arte como liberdade de “Sim, completamente. Se tu não tens liberdade, não és artista. Isso não impede que tenhas encomendas. (…) Tu tens a tua
expressão e/ou instrumento político liberdade, que é a liberdade de pensamento. Felizmente, ainda vamos tendo isso.”

“Há casos muito específicos de arte e politica em que, para os artistas, fazer arte passa por intervir, falar sobre. (…) Tu
não fazes arte por acaso, fazes porque pretendes trabalhar com questões sociais, por exemplo.”
C8.5. importância dos números (de “O número de visitantes é mais importante para os museus, coisas desse género. Mas é muito importante o
vendas, visitantes, entre outros) reconhecimento para o artista.”
C8.6. importância do público “Ser artista, para mim, passa por transmitir alguma coisa, nem que seja o facto da cor, não precisa de ter mensagem,
necessita de público. Para ser artista é necessário ter público. Portanto, se tu não expões, não vais ser artista.
Automaticamente precisas de exposições, nem que não sejam apelativas para seres artista. (…) Agora, só és artista quando
expões? (…) Não é assim…Acho que somos sempre artistas, mas o reconhecimento é fundamental. Também se não
tiveres reconhecimento, mais tarde ou mais cedo, vais deixar de trabalhar, portanto vais deixar de ser artista. (…)”
Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “Só é vantajosa, lá está, se a tua intenção for ser como a Joana Vasconcelos e a comunicação social falar muito de ti, isso
permite-te chegar a outras coisas. Mas, sinceramente, tenho um colega meu que costuma dizer que só o facto de falarem
em ti já é ótimo. O problema está em que, às vezes, quem está a falar não percebe nada daquilo. E o que se fala não é
suficiente. Media e arte não combinam. É um casamento que nem chegou a ser casamento, não há ligação.”
D2. visão do setor “Portanto, é muito complicado falar dos media e da arte porque eu quase nem sequer vejo arte nos media. A única coisa
que eu vejo ou leio é sobre a Joana Vasconcelos.”

“A visão dos media de massas não vai de encontro ao setor. Nem sequer fazem um esforço. Não lhes interessa. A única
coisa que existe é a Agenda, eventualmente o Câmara Clara da RTP2. Apesar de tudo, a RTP2 tem discussão pública,
opinião pública e por aí fora…”
D3. artista ou obra “O que interessa é a pessoa, não o que ele faz.”
D4. arte nacional e arte internacional “Mais os portugueses, por uma questão de agenda e porque em Portugal não recebem quase nada do lado de fora. Na
cultura portuguesa, o que é de fora é que é bom. Estratégia de muitos artistas passa por ir lá fora fazer exposições para ter
valor em Portugal.”
D5. experiência com os media “O meu nome foi referido aqui e ali, fiz um documentário que passou no Fantasporto. Mas não o suficiente para eu me
gabar.”

130
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 2
Sexo: feminino
Idade: 24 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Porto
Área de residência: Gondomar
Formação artística anterior: Curso de Artes Visuais no Ensino Secundário tradicional
Estatuto: estudante
Licenciatura em: Artes Plásticas (Pintura)

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “O despertar pelas artes foi tardio, tomei este caminho por uma mera “aposta” com um professor de Educação Visual, em
que lhe disse se ele me desse nota cinco no final do período, eu seguiria Artes, caso contrário ia para Humanidades.
Quando cheguei ao Secundário, questionaram-nos sobre o que queríamos fazer da vida, se íamos para a Faculdade e, se
sim, que curso. Naquela altura eu queria acabar o 12º ano e pronto, ir trabalhar. Mas à medida que o décimo ano passou e
o 11º ano também, comecei a sentir interesse em explorar coisas que aprendi ali, então no 12º ano decidi que afinal queria
ir para a Faculdade e que de todos os cursos que existiam, Pintura era o que mais me interessava. Nunca fui pra Faculdade
com a ideia de arranjar emprego bom depois dela, apenas quis aprender, desenvolver, mais tudo o que já tinha dado no
secundário em termos de técnicas. Nunca me interessou fazer carreira como pintora até ao ano lectivo anterior, pois aí
desenvolvi projecto pessoal e comecei a ver-me como artista plástica.”
A2. Influências “Inicialmente o tal professor de Educação Visual que me direccionou para as artes, mas no Secundário tive a professora de
Geometria que tirou Pintura na ESBAP (actualmente FBAUP) e que me colocou em contacto com artistas impressionantes
e técnicas fabulosas.”
A3. Relação da família com as artes “Tenho dois irmãos mais velhos que eu, ambos estiveram ligados às artes no Ensino Secundário. Mas não me
influenciaram em quase nada. Um deles teve ligação às artes gráficas e ajuda-me nesses assuntos mais ligados ao design,
mas apenas quando lhe peço uma opinião.”
A4. Hábitos culturais e artísticos na “Raramente, os meus familiares visitaram esta última exposição em que participei, mas nada mais.”
infância/juventude
131
O “mundo de aventura” do artista

A5. Reação de familiares e amigos “Foi algo muito desinteressado, apenas informei que queria tirar este curso e que já sabia que não era em termos
profissionais o que desejavam, então os meus familiares apenas disseram “Ok!” e não ligaram muito. Actualmente, ligam
mais, uns gostam de me ver a expor. Outros familiares apenas acham que é um incómodo imenso que coloco sobre os
meus pais, pois preciso do meu pai para levar as obras aos locais…”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Ainda me sinto como estudante e não uma artista completa, mas já me vejo como artista, mais do que via quando iniciei o
curso.”
Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “Creio que falta Portugal ter atenção ao valor das artes desde cedo. Em Espanha, e não só, os meninos vão desde a pré
Portugal escola ver exposições, e está cientificamente provado que todos o que o fazem acabam por se tornar, não mais inteligentes,
mas com capacidades diferentes e mais avançadas que os que não o fazem.”
B2. Avaliação da importância de uma “Creio que um artista não se pode medir pela formação académica que tem, apenas só esta formação não dignifica um
formação artística especializada artista, ou não faz um artista ser melhor que outro, creio que desde que o trabalho tenha qualidade e se mantenha
contemporâneo o artista amador tem tantas chances de expor numa galeria como um artista profissional.”
B3. Expetativas profissionais “Para já não. Espero conseguir um dia!”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “Há quem diga que tudo é arte. Na minha opinião, tem que haver mais do que a técnica, tem sempre que haver a
conjugação do que é a técnica com o que é a conceptualização. As obras não surgem porque não há nada que dizer, a
mensagem que foi e ainda é descorada das obras de arte, existe e permanece em tudo que é obra de arte. Esta mensagem
que revela um pedaço do autor/artista e que torna as obras de arte não objectos que possam ser feitos por meros artesãos,
mas conceptualizados por verdadeiros artistas.”
C2. Heterodefinição de arte “A generalidade da sociedade não entende muito, revela que apenas o gosto estético está patente nas suas sugestões de
obras de arte, então para realmente “validar” as obras de arte, temos sempre que cair no circulo da elite, uma elite que
percebe, estuda e aprecia a arte, não porque ficaria bem na sua sala de jantar ao cimo da lareira, mas porque vê as
potencialidades da obras no seu todo e num contexto global.”
C3. Diferença entre artista e artesão “Artista não é aquele que apenas sabe como produzir através da técnica, é aquele que vai para além disso, sabe a técnica e
sabe utilizar todos os meios a seu favor, tem uma certa bagagem de conhecimentos que permitem validar tudo o que
produz, não só em termos técnicos como também em termos teóricos e conceptuais. Artesão limita-se a produzir coisas
que viu em técnicas que conhece. Artista tem sempre algo de inovador naquilo que produz. Creio que este julgamento não
será difícil de todos observarem e constatarem.”
C4. Heterodefinição de artista “Na generalidade, a sociedade considera artista todos aqueles que produzem algo que eles próprios não conseguem
produzir. Mas creio que cada vez mais se poderá ver que as pessoas ficam mais atentas a estas questões quanto mais
lidarem e entrarem no mundo artístico.”
C5. Diferença entre artista profissional e “Um profissional aprende que não se deve colocar tudo na obra para que ela funcione. Um amador tem a tendência de
artista amador colocar tudo o que aprendeu para mostrar virtuosismo.”
C6. Instâncias legitimadoras “Creio que os professores possam reconhecê-lo, não sei se o fazem. (…) Existem muitas opiniões sobre este respeito, a

132
O “mundo de aventura” do artista

meu ver, apenas os artistas devem realmente ter este peso quanto ao que é ou não uma obra de arte, porque todos podem
pensar nestas questões mas são apenas teóricos e ou nem sequer têm formação para falar do assunto, o artista tem
formação e conhece a técnica. Muitos curadores, etc, irão pensar que o papel é deles, mas a meu ver é dos artistas. Na arte
contemporânea fica imensamente difícil dizer o que é ou deixa de ser obra de arte, então quando se falar em obra de arte
deve ter-se em conta toda uma historicidade passada e as novas premissas da arte.”
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “Acho que a sociedade nem sequer pensa nesta etapa da vida do artista. Para mim, a história do artista, o seu percurso, têm
sempre relação com tudo aquilo que ele faz, mas isto aplica-se a todas as áreas. A meu ver, o percurso das pessoas
influencia todo o modo de pensar e executar seja que atividade for.”
C7.2. aspeto físico e indumentária “As pessoas, praticamente, veem-nos como uns porcos, sujos e mal cheirosos. Quando olham para um designer nunca
expressam este tipo de comentário. Muitos artistas plásticos vestem-se como arquitetos ou designers, apenas a diferença é
que um artista plástico suja demasiada roupa porque realmente trabalha no duro, não brinca com os computadores apenas.
(…)”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “A sociedade vê-nos como transgressores, uns malucos que aqui andam e que na sua maioria só fazem asneiras.”
estabelecidas
C7.4. relação com o dinheiro “A sociedade acha que somos um bando de pobres que até lixo usamos para produzir. Creio que há de tudo no mundo da
arte. (…) Óbvio que todos os artistas gostariam de vender, porque se ninguém vender como poderá continuar a produzir?
Mesmo fazendo reutilização de materiais há sempre qualquer coisa que temos que comprar e, como bem sabemos, a vida
não está fácil para recebermos esmolas seja por que motivo for.”
C7.5. relação com a espiritualidade “A sociedade vê-nos como a ateus completos. As pessoas acham que não pertencemos a nada e que não acreditamos em
nada. Para mim, o percurso do artista enquanto ser humano tem sempre relação com o modo de pensar e executar obras,
então a relação espiritual está sempre presente.”
C7.6. importância da idade “A sociedade vai sempre considerar a arte jovem como algo muito infantil ou sem valor. Olham para a arte produzida
pelos mais velhos e, sendo estes mais velhos, assumem que são mais sábios e daí darem mais valor ao que eles produzem.
(…)”
C7.7. importância da fama e/ou do “A sociedade não quer saber disto. Mas claro que toda a gente quer ver as suas obras reconhecidas e o seu nome associado
reconhecimento a coisas que valham a pena. Se bem que alguns artistas não trabalham em função disto, apenas gostam de ter o
reconhecimento.”
C7.8. outras características associadas “O artista é sempre visto como um ser que vagueia pelo mundo e que não se integra em parte alguma, daí a apologia de
que somos uns loucos. Alguns são, mas uma certa medida contida de loucura é que permite a exploração artística ao seu
máximo.”
C7.9. ser diferente “No entanto, eu creio que toda a gente é louca, pois sem a loucura nada iria funcionar, a vida seria demasiado aborrecida
(…).”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “Todo dizem algo tipo: “Aquilo também eu fazia!”, mas a verdade é que sem passar pelo que o artista passou, nenhuma
obra sairia do mesmo jeito.”
133
O “mundo de aventura” do artista

C8.2. funções da obra de arte “Para a sociedade, a obra de arte não tem função, apenas serve para decorar a casa. A obra de arte, no meu ponto de vista,
é algo tão pessoal do artista, de quem a produz, algo tão comprometedor, que por vezes custa até vender ou expor. O
artista apenas revela o que produz porque acha que aquilo que produz deve ser visto por outros, e aqui entra novamente a
relação entre obra e mensagem da obra, pois o desejo de dar a conhecer aquela visão à sociedade é tão grande que o artista
expõe as suas obras.”
C8.3. obra de arte: talento ou “Muitos falam do dom, mas eu creio que seja um conjunto dos dois factores [talento e aprendizagem].”
aprendizagem
C8.4. obra de arte como liberdade de “A liberdade de expressão existe para tudo, então porque não para a arte? Existem artistas que tomam posições políticas e
expressão e/ou instrumento político as revelam através da arte e, não têm que ser apenas posições políticas, qualquer tipo de informação que queiram difundir
através das suas obras. Já a sociedade não vê este ponto.”
C8.5. importância dos números (de “A sociedade acha sempre que os preços são demasiado elevados e que certas obras nem se vendem. Para nós, interessa
vendas, visitantes, entre outros) saber o número de visitantes, porque quanto mais visitantes tiver, mais probabilidade temos de algum turista apreciador de
arte nos propor algum negócio e nos arranjar exposições noutros locais. Além de que quanto mais gente vir as nossas
obras, mais reconhecimento teremos (teoricamente).”
C8.6. importância do público “Creio que todo o artista pensa imenso no público quando realiza a sua obra. Creio também que a sociedade não tem esta
noção!”
Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “(…) é uma relação estável, os artistas tiram o melhor proveito que podem, pois a publicidade às obras e ao artista é o que
possibilita a comercialização da obra e até do artista. Creio que a comunicação social também tira partido desta relação,
sempre tem histórias para contar e por vezes polémicas bem caricatas para mostrar.”
D2. visão do setor “Os media direccionados para as artes não descoram o valor do artista e da própria obra. Creio que, por vezes, são
influenciados pelos curadores e críticos e aí é que se torna perigoso para o artista esta relação. Mas a visão dos media que
não são influenciados é normalmente uma visão imparcial, que vê e deve ver as obras como elas são e analisar artista a
artista, para que não se cometam erros (…)”
D3. artista ou obra “Privilegiam mais o artista, mas só quando este é conhecido. Caso contrário, nenhum.”
D4. arte nacional e arte internacional “Não, creio que [a arte nacional] deveria ser mais observada e destacada pelos nossos, para que pudesse ter relevância lá
fora também.”
D5. experiência com os media “Não.”

134
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 3
Sexo: masculino
Idade: 43 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Maputo (Moçambique)
Área de residência: Sabrosa
Formação artística anterior: Curso de Artes Visuais no Ensino Secundário tradicional
Estatuto: trabalhador-estudante
Licenciatura em: Artes Plásticas (Pintura)

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “Não há um momento. Isto é, começa-se a fazer é por brincadeira, depois é por gosto, depois talvez seja mais aquilo de
nos pôr sempre à prova, de estar a testar-nos, a querer fazer mais e acabamos por, até mesmo no meu caso, foram as
pessoas que começaram a dizer “Olha! Porque é que não fazes isto?”, e eu comecei a ver que afinal aquilo dava dinheiro.”
A2. Influências “O meu irmão era mais velho que eu quatro anos e é mesmo aquela coisa de uma pessoa seguir o mais velho. Ele
desenhava muito bem e até na altura pintava com tintas de esmalte, não tínhamos acesso às tintas de óleo, e uma pessoa
praticamente pouco conhecia. Ele, a certa altura da vida dele, deixou de desenhar e de pintar e agora, neste momento, já
não sabe fazê-lo.”
A3. Relação da família com as artes “Não, não. Não tenho artistas na família.”
A4. Hábitos culturais e artísticos na “Por acaso, no meu caso, não. Sempre fui uma pessoa que os meus museus foram dos livros, apesar que não é a melhor
infância/juventude disciplina que uma pessoa deve ter, porque as imagens escondem muita coisa, põem as coisas muito planas, a pessoa vê as
coisas muito na superfície e o ir ao museu é importante porque nós vemos a textura.”
A5. Reação de familiares e amigos “No meu caso, foi uma coisa tão natural que eu acabei por arranjar emprego logo aos 17, 18 anos e consegui conciliar a
vida artística com a vida, se é que se possa chamar assim, profissional. Consegui ter um emprego mais estável e isso deu-
me…não houve essa tal situação de conflito, não é? Foi uma coisa que consegui conciliar. Portanto, trabalhava das 9h as
17h30, depois das 17h30 tinha sábados e domingos e podia fazer o que quisesse nesse horário.”

“Estabilidade financeira, sim. Mas é o que estou a dizer, depois há coisas que às vezes não dá…há determinados conflitos,
135
O “mundo de aventura” do artista

porquê? Por causa daquilo que eu estava a falar, não podemos viver só do dom e do talento. E esse tempo, se nos
ocupamos com trabalho e depois com outro trabalho a nível artístico, que é a pintura, começamos a ver que acabamos por
ficar com pouco tempo. Pouco tempo a nível pessoal, isso às vezes gera aí um bocadinho de conflitos. Mas…quer
dizer…é muito complicado. Ou uma pessoa se entrega ou não se entrega. É uma questão de opção.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “É assim, eu considero-me artista, porque ninguém faz um curso de artes plásticas se não se considera artista. Agora há a
questão se me considero um grande artista ou se me considero um fraco artista. Agora, considero que sou um artista que
ainda tenho um grande caminho para percorrer, só isso.”
Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “Eu acho que, é assim, nós começamos a ver que aquilo que tem havido até agora com as consequências que estamos a
Portugal ter, acho que não foi pensado, nem foi pensado a maneira de fazer as coisas, porque começamos a ver que estamos a ter
excedentes em tudo. Estamos a ter excedentes em cérebros, estamos a ter cérebros a mais.”
B2. Avaliação da importância de uma “Vamos cá ver…Essa situação da aceitação tem muito a ver com a ideia de quem tem curso é porque é bom (…) Isso é
formação artística especializada muito importante porque há esses tais determinados grupos que “Ai! Tu não és doutor, não és artista!”.”

“Abre, abre [portas]. (…) Houve duas exposições que foram escolher artistas do norte, mas eles não foram buscar artistas
do norte, foram buscar artistas do norte com curso. Os artistas do norte que não tinham curso não são artistas. Portanto, eu
comecei a ver que aquilo que eu estava a fazer, o meu trabalho, não estava a ser reconhecido por causa de um canudo de
doutor. Por amor de Deus, quer dizer, toda a vida vou trabalhar e vou estar sempre com este estigma em cima a dizer que
o meu trabalho vai estar sempre ali e uma coisa a dizer “Olha! Não… Não tem curso, não é bom trabalho.””

“Ninguém pode dizer que vem para uma faculdade, por exemplo aqui a de Belas Artes no Porto, e que tenha entrado e
tenha saído de igual maneira. Não, não! Muita coisa em mim mudou, aprendi muitas coisas. Ganha-se uma confiança
maior naquilo que estamos a fazer.”
B3. Expetativas profissionais “Não sei. Olha, a questão é esta: viver da arte, pode-se viver. Agora depende da maneira como tu queres viver. Se tu
queres ter uma vida estável, se queres ter um carro, uma casa, quer dizer, não podes viver só da arte. Tens de ter um
vencimento que pague essas despesas. Tu da arte podes vender muito hoje e amanha não vendes nada. Agora, tudo é um
risco, é uma opção. Eu conheço muitos artistas que tiveram de sair de Portugal. Não quer dizer que também não se possa
viver da arte aqui em Portugal! Vive-se, mas não é para toda a gente.”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Auto definição de arte “Para mim, uma obra de arte é aquilo que, naquele momento em que eu esteja a fazer uma obra, eu considere arte, para
mim, tudo o que eu fizer será sempre arte. Agora, o que é a arte? A arte, haverá muitas respostas em relação a isso. Arte,
acho que não tem uma definição certa. (…)Eu posso algo considerar arte conforme a educação, a formação, o espaço onde
estou inserido, é aquilo que nos vai fazendo a nossa maneira de pensar, a nossa personalidade e aquilo que nós somos, o
meu “eu”, não é? O que eu sou e tudo isso que fui adquirindo é que posso considerar o que é arte para mim e o que não é
arte. Mas também há conhecimento geral, em que esse conhecimento geral que é comum a toda a gente e isso também
define. Há determinadas regras que estão estabelecidas. Há coisas que não se pode fugir, não é? E que não se pode
136
O “mundo de aventura” do artista

ultrapassar. Mas há outras coisas que são próprias do nosso “ser” e que faz com que eu goste, se calhar, de uma música
pimba, goste de uma música clássica, goste de outro tipo de música.”
C2. Heterodefinição de arte “As pessoas consideram algo arte consoante a formação que vão tendo. Há pessoas que dizem que só consideram arte
quando é uma coisa que eles veem e que reconhecem. Quando veem uma coisa que são gatafunhos, que eles dizem que
são gatafunhos, isso para eles não é arte. Há outros que veem nos gatafunhos arte…”

“Às vezes, acaba-se por eles [cidadãos comuns] não terem essa informação suficiente, quando olham para uma
determinada obra de arte, entendem que ali não houve esforço, não houve trabalho. Portanto, às vezes, nem sempre as
obras falam por si. Ou não dizem tudo que houve por trás da obra e às vezes acontece essa situação. Ou as pessoas não
têm informação suficiente para definir ou distinguir se essa obra teve trabalho ou não.”
C3. Diferença entre artista e artesão “Pode dizer-se que a primeira vez que uma pessoa se considera artista é quando uma pessoa se expõe ao público. É
quando uma pessoa se expõe à crítica do público. É aceite ou não é aceite. (…) E uma pessoa é artista quando faz o
primeiro quadro, não quer dizer que o venda, mas quando expõe uma pessoa passa a ser artista.”

“Eu acho que é assim: um artista não deve passar pela ideia de ser todo formatado da mesma maneira. Isso é o que faz,
define, o que é uma obra: uma obra é única. Se essa obra é única, o artista também tem de ser único. Não podem ser todos
a pensar da mesma maneira e todos a agir da mesma maneira. E até é bom uma pessoa não ter contactos com a arte e
maneiras de pensar a arte antes de entrar para as faculdades, que é para não entrarmos na cena do formatado.”
C4. Heterodefinição de artista “Agora, há o público, há muitos tipos diferentes de público e de pessoas que compram arte. Há pessoas que compram
porque gostam. Há pessoas que compram porque ficam bem com as cortinas. Há pessoas que compram porque houve
alguém, foram-se informar, alguém que percebe em termos de arte e disse “Afinal aquela pessoa foi aconselhada, vale a
pena investir!”.”
C5. Diferença entre artista profissional e “Nós temos, na história da arte, muitas pessoas que foram amadores, olha o Amadeu Sousa Cardoso. O Amadeu Sousa
artista amador Cardoso era autodidata, foi para França…”

“Um artista amador é um artista que ficou ali pelo chão.”

“(…) Não quer dizer que o artista profissional queira agradar a alguém. E se calhar o artista amador não faz aquilo que lhe
apetece, ele está ali a fazer o retrato da senhora do lado que o encomendou, faz o desenho para a Queima das Fitas, as
caricaturas e não sei quê e ele não está a fazer aquilo que lhe apetece. Ele está a trabalhar para determinado tipo de
pessoas. E está ali, se calhar, mais constrangido que outros artistas profissionais que estão a trabalhar para eles. O amador
tem de se adaptar muito às necessidades do mercado. O profissional já tem uma liberdade maior, por um ponto de vista.
Por outros pontos de vista, há pessoas que já esperam desse profissional determinado trabalho, isso também o prende. Já
criam expectativas.”
C6. Instâncias legitimadoras “Em termos de curadores, de galerias de arte e tudo, eles é que estão a mandar nesses termos, e críticos da arte, esses é que
estão a mandar quem é artista e quem não é artista. E está a haver aí um certo controlo em termos de mercado, não é? Eu
acho que é o tal sistema, o próprio sistema é que dita as leis, é que diz “Ah! Este é artista! Este não é artista! Estes é

137
O “mundo de aventura” do artista

aceite! Este não é aceite!”. É por isso que a maior parte, eu vejo pelos meus colegas, há aquela preocupação de a pessoa
ser aceite no mercado, nesse próprio mercado da arte. (…) E há muito essa preocupação de dizer “ Expus ali numa galeria,
é uma boa galeria e não sei quê! Pronto, tive que dar 50% dos lucros mas é uma boa galeria!”. A pessoa está com aquela
necessidade de ser aceite, mas são eles que ditam as leis do mercado. É natural, hoje em dia é assim. (…) Os professores
também não deixam de fazer parte desse sistema. A faculdade também faz parte desse sistema, a faculdade está a preparar
artistas. Mas a questão é se que esses artistas vão ser aceites ou não vão ser aceites pela própria comunidade, pela própria
sociedade. Isso aí talvez seja a dificuldade maior e tudo tem a ver com as influências.”

“É uma marca, por exemplo, de iogurtes, também quer atingir um determinado público-alvo. Então faz uma determinada
campanha publicitária para que esse público seja manipulado e que compre esse determinado produto. Falando em termos
de arte, continua a ser a mesma coisa, são essas galerias, esses artistas, esses críticos, que comandam e que ditam quais
são as regras que neste momento se deve considerar o que é arte e o que não é arte.”
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “Não há um padrão, porque senão todos vivíamos a mesma vida.”
C7.2. aspeto físico e indumentária
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Eu, por exemplo, sou um artista que tenho que me conter em muitas situações porque eu tenho um trabalho, tenho uma
estabelecidas profissão e claro que há maneiras de estar, que há determinados padrões que fazem com que uma pessoa tenha de estar
inserida na sociedade.”
C7.4. relação com o dinheiro “O padrão “cunha” é bom. Mas isso acontece em qualquer lado. Mas acho que há um fator sorte, há um fator “cunha”, há
um fator de influências, sei lá…há tantos, tantos, tantos fatores que condicionam a entrada de um artista para o mundo das
artes. Mas também há uma parte, que é a principal, que é o fator económico (…) Todo o artista, antes de ser artista, antes
de pensar no dinheiro, já é artista. É claro que sem dinheiro não se faz nada, não é? Quer dizer, hoje em dia, com esta
história dos materiais e essas coisas dos conceitos, uma pessoa pode pegar até em lixo e fazer obras de arte. (…) Mas tem
que se comer, tem que se vestir, tem que se pagar as contas…”
C7.5. relação com a espiritualidade “Claro que influencia. Tudo aquilo que vamos aprendendo, toda essa aprendizagem e formação que vamos tendo ao longo
da vida, vai-nos condicionando em muitas coisas e a religião, se calhar… temos sempre que levantar questões.”
C7.6. importância da idade “A tendência desta indústria de massas é criar certos focos que naquele momento vão atrair massas, vai ser uma produção
muito fácil, muito rápida, em que se ganha muito dinheiro mas, também que se vai extinguir rapidamente. Isto da ideia do
artista ser considerado grande artista em termos de quando tiver mais idade, é uma questão de percurso. É como tudo na
vida, tem que se passar por elas, tem que se passar esse tempo, esses anos. É como tudo, é como qualquer outra profissão
e eu considero que um grande artista será um artista sempre com o passar do tempo e ele vai sendo grande artista nas fases
que vai tendo.”
C7.7. importância da fama e/ou do
reconhecimento
C7.8. outras características associadas “Isso depende dos estados de espírito, das alturas...eu tenho alturas em que se calhar sou triste e outras alturas em que sou
muito alegre. Toda a gente passa por esses estados de espírito. Só que se calhar esses estados de espírito não são marcados
138
O “mundo de aventura” do artista

como no artista, o artista marca-os porque está a produzir uma obra.”


C7.9. ser diferente “Mas a sociedade aceita muito bem quando o artista é diferente: “Ah! É maluco, é artista!”. É por isso que, às vezes, os
artistas têm a tendência para criar um boneco, uma imagem e quanto mais essa imagem for extravagante e diferente
daquilo que se possa dizer os conceitos e das maneiras de estar na sociedade, talvez seja muito mais aceite.”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “Quando se faz algum trabalho, parte-se sempre de uma ideia, de uma vontade de fazer, de uma vontade de expor a ideia
que nós temos ou do sentimento que nós temos, mas tudo tem um início. Ou alguma coisa que se viu, que se olhou…
porque o artista, isso é uma coisa que nos aprendemos, estarmos atentos ao mundo que nos rodeia.”
C8.2. funções da obra de arte “A obra de arte tem muitas funções e se calhar as funções dela têm muito a ver com o que já falamos: porquê que as
pessoas compram obras de arte? E se as pessoas compram é porque tem uma função para elas. Uma função para admirar,
uma função para decorar, uma função para colecionar, uma função para rentabilizar.”
C8.3. obra de arte: talento ou
aprendizagem
C8.4. obra de arte como liberdade de
expressão e/ou instrumento político
C8.5. importância dos números (de “Há pessoas que avaliam muito a qualidade das obras e das exposições em função das vendas.”
vendas, visitantes, entre outros)
C8.6. importância do público “Isto há sempre aquela ideia que as exposições e as obras só são boas quando são vendidas ao público.”
Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “Traz sempre vantagens para todos. É aquela coisa do artista querer criar imagens ou temas que sejam agressivos.
Provocar. E, hoje em dia, a comunicação social vai buscar esses temas da provocação. Tudo o que crie polémicas. A
comunicação social, hoje em dia, não anda atrás de boas notícias, anda atrás de más notícias. E se calhar hoje em dia o
artista sabe essa situação e então “Vamos criar polémica!”.”
D2. visão do setor “Não, não. Não vai, não [de encontro à realidade do setor]. O artista pode ser uma pessoa normal como outra qualquer.
Pode passar despercebida. Mas como há esse estereótipo de dizer que o artista é assim, é claro que o artista tem de ir
muito ao encontro disso.”
D3. artista ou obra “O artista está sempre em primeiro lugar mas, hoje em dia, é a pessoa que fala em relação à obra.”
D4. arte nacional e arte internacional “Sem dúvida a internacional. Eu vejo o programa Câmara Clara e as informações que eles dão sobre artistas têm de ser
sempre artistas estrangeiros porque soa bem dizer aqueles nomes em inglês.”
D5. experiência com os media “Já. Apareceu em muitos jornais locais, apareceu no Jornal de Notícias…”

139
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 4
Sexo: feminino
Idade: 22 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Porto
Área de residência: Porto
Formação artística anterior: Curso de Artes Visuais no Ensino Secundário tradicional
Estatuto: estudante
Licenciatura em: Artes Plásticas (Pintura)

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “Desde pequena que sempre gostei muito de desenhar e pintar. Aos nove anos tirei um curso de pintura e desenho na
Filantrópica (Póvoa de Varzim). Entretanto, já quando estava no meu oitavo ano, deixei de parte a ideia de seguir pelo
caminho das artes, e achava que queria ser bióloga ou jornalista. Andava muito confusa porque tudo me interessava. Após
concluir o nono ano, fiz uns testes psicotécnicos, cujo resultado foi Artes em primeiro lugar e em segundo Ciências.
Inscrevi-me, então, na turma de Artes (…), mas sinceramente não sabia o que havia de ser dentro deste ramo. Como a
maior parte dos meus colegas queriam ser arquitectos, eu fui tentando procurar o que dentro da arquitectura me poderia
interessar. (…) A pintura sempre me fascinou e esteve sempre presente na minha vida, mas como tive receio em relação
ao meu futuro isso fez-me procurar outras saídas e tentar esquecer a minha veia artística”
A2. Influências “Não houve nenhuma figura em particular. Alguns professores de desenho incentivaram-me a seguir este caminho, porque
sempre gostaram do meu trabalho, e claro que isso foi importante.”
A3. Relação da família com as artes “Não tenho nenhum artista na família, mas isso até me dá mais vontade de ser a primeira.”
A4. Hábitos culturais e artísticos na “Costumava ir mais com os meus amigos.”
infância/juventude
A5. Reação de familiares e amigos “Sim, foi uma decisão tranquila para eles. No entanto, no início estavam com um bocado de receio por causa das saídas
profissionais. No nosso país, ao nível das artes, tudo se complica muito.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Não é por estar licenciada em artes plásticas, mais propriamente em Pintura, que sou uma artista. Ainda estou no
primeiro degrau, para chegar ao último é preciso muita experiência, muito amadurecimento. Por isso é que, na minha
140
O “mundo de aventura” do artista

opinião, não é qualquer um que é um artista.”


Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “O que dificulta o nível de formação dos alunos em Portugal são as más condições das escolas e das faculdades. As
Portugal escolas não têm espaço nem equipamento necessário para as necessidades dos alunos. Nas faculdades isso também
acontece, o que leva a que optemos por projectos mais pequenos e que exijam poucos recursos.”
B2. Avaliação da importância de uma “A partir do momento em que encaro o meio artístico como algo sério e que me irá acompanhar a vida toda, penso que é
formação artística especializada necessário especializar-me. Nenhum de nós nasce ensinado e é importante conviver com pessoas que já estão neste meio
há muito tempo. É uma experiência que só traz bons frutos.”
B3. Expetativas profissionais “Hoje é muito difícil viver-se só da arte. Não sei se algum dia vou conseguir.”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “Arte para mim é a alma do artista. Quando um trabalho espelha a sua alma, a sua paixão, a sua dedicação, isso para mim
é arte. Agora quando uma obra tenta apenas entreter o público, quando o seu interior é vazio (como os quadros que vemos
nos chineses, por exemplo) então mais vale estar-se quieto.”
C2. Heterodefinição de arte “Eu penso que maior parte das pessoas, e agora falando de pintura, considera arte aquilo que tem “bom” aspecto. Isto é,
para essas pessoas, os quadros que estejam bem pintados ou com uma paleta de cores que combina com a sala (por
exemplo), são arte. É estupendo, maravilhoso e é um quadro muito giro (palavra que, na minha opinião, devia ser banida).
Isto é o que a grande massa pensa. Agora com as minorias já é diferente e é esse público que eu procuro. Eles procuram
descobrir o que está para lá do quadro: todo o pensamento e preocupações do artista. Avaliam o exterior e o interior para
considerarem o que é arte ou não.”
C3. Diferença entre artista e artesão “Um artista é uma pessoa que vive no limiar da felicidade extrema e do esgotamento. Vive num turbilhão de ideias e
procura encontrar maneira de expressá-las. Cada vez mais o artista aproxima-se do artesão porque sente a necessidade de
ser ele próprio a construir aquilo que idealizou. No final, o artista acaba por ter um conhecimento sobre todos os meios
artesanais.”
C4. Heterodefinição de artista “Eu penso que a generalidade das pessoas considera este ou aquele artistas consoante se o trabalho deles “enche os olhos”
ou não. A maioria das pessoas não procura perceber o que levou o artista a criar algo desta maneira ou daquela maneira.
(…) o que importa é o exterior. Tem que ser bonito, parecer minimamente real, e o tema tem que ser fácil (se forem
naturezas mortas, melhor). Se fizeres isto, então és um artista.”
C5. Diferença entre artista profissional e “A sua formação académica, a sua experiência, a sua cultura visual, o seu pensamento.”
artista amador
C6. Instâncias legitimadoras “O reconhecimento acho que passa por todos, desde os professores até aos críticos, curadores, negociantes.”
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “A maior parte das pessoas pensa que um artista teve uma infância problemática, daí ter um comportamento estranho e ter
ido para Artes. Eu própria gozo com isto. Isto é ridículo. Eu desenhava as figuras da Disney, fazia desenhos com o meu
nome, dançava, cantava, etc. Tive uma infância completamente normal. Apenas penso que desde pequena sempre tive
141
O “mundo de aventura” do artista

uma forte ligação com o mundo das artes.”


C7.2. aspeto físico e indumentária “Eu acho que os meus colegas de faculdade vestem-se de maneira diferente das outras pessoas, mas isso acho que se deve
ao facto de eles não se importarem com o que está na moda, nem quererem copiar o vizinho. Nisto acho que somos
diferentes. Vestimos o que queremos e não nos importamos se os outros gostam ou não, ou se estamos démodé.”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Para a sociedade em geral, o artista é alguém que não cumpre as regras, é alguém que não é normal, porque veste-se de
estabelecidas maneira diferente, é maluco, provavelmente também é um drogado e enfim, não vai ter qualquer tipo de futuro.”
C7.4. relação com o dinheiro “Eu procuro enriquecer com as minhas obras. Faço (pinto) o que quero. Sei que não agrado a toda a gente, mas a alguns
consigo agradar e vendo as minhas obras. Se eu conseguisse viver só da pintura, era perfeito.”
C7.5. relação com a espiritualidade “Sim. Mas acho que isso influencia a vida de qualquer pessoa.”
C7.6. importância da idade “A idade do artista, geralmente, é sempre um ponto a favor do seu trabalho. Com a experiência e a cultura visual que se
vai ganhando, o trabalho, normalmente, será melhor.”
C7.7. importância da fama e/ou do “Claro que se formos alguém já com algum nome no mundo artístico, a nossa obra é logo valorizada.”
reconhecimento
C7.8. outras características associadas “Basta dizer que estudei na faculdade de Belas Artes para as pessoas não me levarem a sério. Ou perguntam-me para o
que é que isto dá, ou então riem-se.”

“Já ouvi alguns comentários de que um artista é mais sensível, que vê o mundo de maneira diferente (por exemplo: as
cores do céu), que é irreverente. No entanto, comentários negativos são mais frequentes. Ele é um “anormal”, porque
veste-se de uma maneira descabida, é um tolinho, um drogado, não faz nada de jeito na vida.”
C7.9. ser diferente “É diferente ao nível do pensamento. A nossa maneira de encarar a vida e de vivê-la é diferente da das outras pessoas.”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “O factor económico influencia muito. O próprio espaço de trabalho também acaba por influenciar as nossas escolhas.”
C8.2. funções da obra de arte “Eu penso que a obra de arte pode ter qualquer função. Isso depende da intenção do artista e também da visão do
espectador (que por vezes difere da do artista). A obra de arte é sempre uma forma de exprimir o que o artista sente.”
C8.3. obra de arte: talento ou “As duas coisas. Por mais que tenhamos muito talento, com a aprendizagem adquirida ao longo dos anos vamos
aprendizagem aprendendo a usar melhor esse talento.”
C8.4. obra de arte como liberdade de “Eu penso que a obra de arte é sempre uma forma de o artista se exprimir e penso que ele se sente mais livre, por haver
expressão e/ou instrumento político tantas maneiras de o fazer. Ele é que define o que pretende mostrar e como.”

“Claro que sim, mas isso depende da intenção do artista. A sua obra pode ser um reflexo da sociedade e com isso estar a
criticá-la (e a tentar provocar a agitação no público), como também pode estar a elevar outros aspectos. Basicamente, tu
fazes o que queres, como queres e quando queres.”
C8.5. importância dos números (de “O mais importante é expores o teu trabalho. Ele não pode ficar guardado em casa. Claro que quantos mais visitantes
vendas, visitantes, entre outros) houver numa exposição, melhor. Começam a conhecer-te, a associar o teu nome aos trabalhos que viram, como também
pode aumentar o número de vendas.”
C8.6. importância do público “Ao realizarmos um trabalho, pensamos sempre no público, no espectador, na visão que ele poderá ter da nossa obra. Isso
142
O “mundo de aventura” do artista

por vezes até leva a que haja modificações no trabalho.”


Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “Eu penso que em Portugal, não há uma “relação” entre artistas e os media. A televisão portuguesa é um bom exemplo
disso. Apenas a RTP2 promove um pouco da arte em Portugal, mas mesmo assim é escasso. A SIC e a TVI são o reflexo
da sociedade portuguesa: ignorante. Nos vários noticiários ao longo do dia, são raras as notícias sobre os trabalhos deste
ou daquele artista, das exposições aqui ou acolá. As pessoas não querem saber. Quanto aos jornais, também pouco dizem
e as boas revistas de arte são quase todas importadas.”
D2. visão do setor “Não. Daí é que o tempo que dedicam à arte ser tão pouco. Se realmente se se interessassem pelo nosso meio, e se nos
dessem o devido valor, a visão das outras pessoas iria ser diferente. Os únicos acontecimentos, ao nível da arte, que dão a
conhecer ao público é quando um artista ganha um prémio no estrangeiro. E porquê? Porque aí já é alguém com valor.
Então já merece aparecer na televisão e nos jornais.”
D3. artista ou obra “Eu penso que dão mais atenção à obra, porque sabem que a imagem é algo que ressalta à vista do espectador. O nome do
artista já acaba por ser secundário.”
D4. arte nacional e arte internacional “Como já referi anteriormente, acho que não. Ainda há um mês recebi uma menção honrosa (…) e um amigo meu recebeu
o prémio. (…) e o director do Galeria de Arte fez questão de comunicar aos jornais (…) o sucedido. Um dos jornais,
entrou em contacto com o meu colega e entrevistou-o. O meu colega perguntou-lhes se me iam contactar, e eles disseram
que sim. Mas não ligaram. Nessa edição do jornal aparecia a entrevista, a foto do meu colega, mas nem sequer fizeram
referência ao meu nome. Mesmo assim a noticia era um terço da pagina. Isto só mostra o valor que dão.”
D5. experiência com os media “Sim já fui. Já apareceram fotos minhas (…) quando recebi o diploma por ter entrado duas vezes no quadro de excelência
na escola (…). Apareceu outra de quando participei num dos espectáculos de dança da academia que frequento e quando
recebi a menção honrosa (…) um dos jornais, que o director contactou, fez referência ao meu trabalho. Também, por
causa do mesmo acontecimento, fui notícia no Facebook da Póvoa, e noutros jornais online.”

143
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 5
Sexo: feminino
Idade: 56 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Vila Pouca de Aguiar
Área de residência: Gondomar
Formação artística anterior: Curso de Representação Plástica do Espetáculo em Escola Artística
Estatuto: reformada
Licenciatura em: Artes Plásticas (Pintura)

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “A minha infância foi pautada pelo desenho, pelos trabalhos manuais, bordados, costura, etc. Na escola primária o gosto
pelo desenho continuou a ser desenvolvido. Os meus estudos tiveram continuação na Escola Industrial Aurélia de Sousa.
Esta escola leccionava o Curso de Formação Feminina, tendo sido referenciada como escola modelo. Este curso, além das
disciplinas teóricas normais dos cursos secundários, leccionava as disciplinas de História de Arte, Estilismo, Modelismo e
Costura, Desenho Artístico, Bordados Regionais e Tecelagem (…). O curso tinha a duração de seis anos (mais tarde
passou para cinco anos). A Especialização deste Curso, mais dois anos lectivos, dava a possibilidade de leccionar a
disciplina de Trabalhos Oficinais. Embora tivesse feito a Especialização nunca leccionei, enveredei por uma carreira
profissional ligada à indústria têxtil (…). A carreira profissional e o projecto familiar ocuparam a minha vida. Mas a
apetência pelas artes não morreu…e o sonho venceu!”
A2. Influências “A minha mãe tinha mão para o desenho e muita criatividade. Ela (e demais seis irmãos) tinha mãos de “fada”, era
modista desde a roupa comum aos vestidos noiva, fazia peças lindas de lã, sem qualquer informação (na altura não
existiam revistas ou a televisão) ou formação, criava modelos, bordava motivos que ela própria desenhava.”
A3. Relação da família com as artes “Tenho uma irmã, mais velha dois anos, com bastante jeito para o desenho e trabalhos manuais, que frequentou, também,
a Escola Aurélia de Sousa. Tenho outro irmão quando jovem ainda pensou fazer Belas Artes, mas acabou por fazer
Engenharia Civil. O meu filho também tem jeito para o desenho, chegou a frequentar, por iniciativa própria, a Escola
Soares dos Reis, mas desistiu. Desde sempre teve gosto pela música, tem uma banda onde canta, escreve as letras e
compõe musicalmente, paralelamente tem uma vida profissional para lhe garantir independência monetária.”

144
O “mundo de aventura” do artista

A4. Hábitos culturais e artísticos na “[mais nova] somente por iniciativa própria. (…) Quando os meus filhos eram crianças (…) visitávamos museus de várias
infância/juventude temáticas para conhecer outras civilizações, costumes e a História. Actualmente, continuo a visitar qualquer tipo de
museu, mas a minha preferência são as exposições de arte em geral, principalmente de pintura.”
A5. Reação de familiares e amigos “Foi uma decisão com muito apoio familiar, marido e filhos.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Ainda não me habituei à ideia de ser uma artista, mas acho que os professores foram os primeiros a reconhecê-lo. Espero
vir a ser reconhecida no mundo da arte.”
Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “Achei a escola profissional onde andei com um nível muito bom, tanto na formação dos alunos para o ensino superior
Portugal (Belas Artes), como para saídas profissionais. Relativamente à FBAUP, tem uma boa oferta formativa, a nível das
disciplinas leccionadas, assim como bons professores.”

“A tendência é direccionar os jovens para letras ou ciências. O português e a matemática são importantes para a vida
prática, mas o indivíduo é composto, também, por “alma”. As artes (de qualquer expressão: plástica, musical) e o desporto
são fundamentais para cativar o interesse dos jovens pelas outras práticas escolares, para o seu desenvolvimento físico e
intelectual e pela promoção de valores e do seu relacionamento em sociedade. O desenho obriga a saber olhar/observar, e
a forma como uma criança interpreta o que vê pode ser primordial para entendermos a sua forma de ser, o seu intelecto. A
música educa e promove a sensibilidade. O desporto é essencial para um desenvolvimento físico e emocional saudável. A
Escola é a cúpula da educação da sociedade, o seu descuramento reflecte-se numa sociedade pobre em valores, em
cultura, em saúde…É ao que estamos a assistir, infelizmente.”
B2. Avaliação da importância de uma “Pessoalmente foi importante, senão fundamental, para a minha formação como artista, tanto em conhecimentos teóricos
formação artística especializada como na aprendizagem técnica. Na faculdade, deram-me os instrumentos para começar a criar. Ao mesmo tempo os
conhecimentos são certificados. Na nossa sociedade são muito importantes os diplomas. Tive um professor na FBAUP
que me disse: “uma pessoa pode saber muito, mas se não tiver o certificado desse conhecimento, de nada lhe vale”. Tive
essa experiência na minha vida profissional. (…) Acho que a formação académica é importante em qualquer actividade. É
a formação que certifica um artista. Não só se é levado mais a sério, como poderá ser a única forma de se poder entrar no
“mundo da arte” reconhecido. Embora existam casos de autodidactas bem-sucedidos.”
B3. Expetativas profissionais “Ainda é cedo para fazer essa avaliação. No entanto, devido à situação económica que vivemos e ao país que somos
(pouco dado a uma cultura artística), acho difícil viver exclusivamente da arte.”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “Para mim, a arte é algo que causa emoções. Uma obra de arte deve prender o olhar do espectador, ser original, ser
invulgar. A fronteira entre o que pode ser considerado arte ou não vê-se quando a arte ultrapassa a linha do absurdo. Acho
que a arte deve ter limites morais e éticos, embora se faça de transgressões. (…) Vejo a arte como um processo de
comunicação: permitir à vida intervir na arte e a arte intervir na vida. Acho que a arte não deve ser utilitária, mas sim
participativa.”
C2. Heterodefinição de arte “Acho que o cidadão comum considera arte quando uma obra o fascina... É difícil para o cidadão comum entender o que
se passa na arte contemporânea. Ver um cão a morrer numa galeria de arte, mesmo que o conceito seja válido, é difícil de
145
O “mundo de aventura” do artista

entender onde está a arte. (…) O belo é muito relativo. O fascinante pode estar em algo inesperado. O caso da Joana
Vasconcelos é um bom exemplo, fascinou-me com os seus primeiros trabalhos: o lustre feito com tampões, o sapato feito
com tachos, e outras obras relacionadas com a mulher. Actualmente, as suas obras já não me surpreendem. Acho que a
sociedade, em geral, vai atrás do mediático.”
C3. Diferença entre artista e artesão “O artista pensa a arte. Criar arte é diferente de produzir objectos mecanicamente (não desvalorizando a criatividade de
muitos artesãos).”

“São e foram as instituições de arte que intercederam nesta separação de arte e artesanato. Primeiro houve a categorização
das peças de arte, consideradas arte de luxo, que tinham entrada nos museus, entradas essas que eram decretadas pelas
instituições de arte. Este formalismo foi desafiado por Marcel Duchamp, na década de 1950, com os seus readymades, o
prenúncio da arte conceptual dos anos 60. Esta perspectiva de arte concebe a ideia como o aspecto mais importante da
obra. Mudou a forma de fazer e de pensar arte, mas quem intervém? Quem continua a decidir o que é arte? Continuam a
ser os mesmos – as instituições, a critica, os coleccionadores, os curadores…
C4. Heterodefinição de artista “Quando um nome é ligado a várias obras e reconhecido pelas instituições e pela própria sociedade. Os critérios poderão
ser vários, mas acho que os media têm uma grande responsabilidade na promoção de um artista, quando o artista é
manchete.”
C5. Diferença entre artista profissional e “O mesmo das outras profissões, como o futebol, o teatro, ou a música. É o desenvolver de uma prática com
artista amador empenhamento, com base em conhecimentos teóricos e práticos, o que é igual a uma boa formação; ser bem sucedido e
reconhecido, o que é igual a conseguir viver da arte.”
C6. Instâncias legitimadoras “Quem julga a arte é quem vive no mundo da arte, ou quem vive do mundo da arte. Eu posso gostar muita de uma obra,
mas se não é reconhecida pelas instituições, pode ser considerada arte? Quando faço referência ao mundo da arte, refiro-
me às instituições, como galerias, críticos, curadores, museus, quem promove concursos onde os artistas são avaliados e,
principalmente, as pessoas que investem em arte. (…) Com o cinema e a música, é igual. A comunicação social tem um
papel relevante nesse julgamento ao promover, noticiando, as obras dos artistas.”
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “Alguns artistas poderão usá-la, por isso digo que a infância pode influenciar a obra de um artista. Acho que depende da
vida de cada um, da fase de vida que foi mais marcante. Mas a infância, ou a vida do artista, é apenas um aspecto entre
muitos e muitos outros. A expressão de um artista pode ser constituída por um conjunto de factores internos e externos ao
artista.”
C7.2. aspeto físico e indumentária “Há artistas que sim, marcam pela diferença. Mas não acho que seja uma regra, se fosse havia muitas excepções.”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Acho que o artista é entendido como radical porque rejeita ver a sociedade segundo as regras estabelecidas. A própria
estabelecidas criação rejeita as regras.”
C7.4. relação com o dinheiro “Penso criar pelo mesmo incentivo com que cheguei à arte: realização pessoal e dar um sentido à minha arte. Acho que
depende dos artistas, há artistas fiéis à sua arte, não se importam com o dinheiro, mas há outros artistas que se dão muito
bem no mercado…”

146
O “mundo de aventura” do artista

C7.5. relação com a espiritualidade “A minha espiritualidade está na emoção com que executo a minha arte. Não tenho qualquer tipo de crença a não ser a
utopia de viver numa sociedade mais justa; mais nobre em valores e com menos oportunismo; com mais solidariedade,
enfim que os direitos humanos sejam para todos: Homens e mulheres de todo o mundo. É neste sentido que a minha arte é
influenciada. (…) Há casos em que é evidente que o artista é influenciado pela sua vida. Mas um artista não é,
obrigatoriamente, influenciado pela sua vida ou problemas pessoais. O meio ambiente em que o artista vive, a própria
sociedade, pode estar presente numa obra. Uma obra de arte numa galeria é autónoma, vale pela obra que é, como objecto
artístico e não pelo que representa. Acho que a arte surge de um mundo muito diverso.”
C7.6. importância da idade “A maturidade pode influenciar a arte, mas não é obrigatoriamente diferente.”

“No meu caso [agora com 56 anos] foi uma opção que tem mais a ver com a realização pessoal, a concretização de um
sonho que, por alguma razão, não foi realizado, do que para seguir uma carreira profissional. Embora, actualmente, o
problema seja comum a outros cursos, acho que as artes vivem mais de ideais…não são uma necessidade prática. Eu
também dou os parabéns aos jovens que fazem opções por convicção, para a realização dos seus sonhos.”
C7.7. importância da fama e/ou do “É fundamental. Depois de o artista ser reconhecido tudo acontece, as obras passam a valer fortunas, e o artista fica na
reconhecimento história.”
C7.8. outras características associadas
C7.9. ser diferente “Não acho que o artista tenha um perfil diferente, acho que é a sociedade que vê o artista com um olhar diferente. (…) O
artista é uma pessoa comum, talvez com uma visão mais ampla do mundo, mais receptivo às diferenças.”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “A inspiração é um factor primordial, mas não chega, é preciso pensar a arte para que uma obra resulte num objecto
artístico. Uma obra de arte é como um alvo, tem que se saber o que se pretende para depois atingir esse mesmo objectivo.”
C8.2. funções da obra de arte “Para mim, tem a função de intervir na sociedade, ser participativa, mais que ser contemplada. “
C8.3. obra de arte: talento ou “Do talento, da aprendizagem e do conhecimento.”
aprendizagem
C8.4. obra de arte como liberdade de “[como liberdade de expressão] Sempre! Quando a arte deixa de ser produzida sem liberdade de expressão, deixa de ser
expressão e/ou instrumento político arte! O artista tem que pôr alma na sua obra, gostar do que faz e não produzir para ir de encontro às necessidades do
mercado…ou a modas. É a expressão de um artista que o define, que caracteriza.”

“Também [como instrumento político], mas não como instrumento manipulador. Ao longo da História, a arte foi
direccionada, pela religião, pelo poder político. Mais recentemente, artistas como o Picasso com a obra “Guernica”,
utilizaram a sua arte para denunciar actos políticos selváticos. Hoje continuam a haver artistas que utilizam a sua arte para
delatar as acções menos correctas dos seus governos, como é o exemplo do artista chinês Ai Weiwei, tendo sido raptado
pelas forças policias chinesas estando detido em lugar desconhecido.”
C8.5. importância dos números (de “Os números estão relacionados com o reconhecimento e com a fama, é a ambição de qualquer artista, mesmo que o
vendas, visitantes, entre outros) negue.”
C8.6. importância do público “É o público que compra, é o público que visita. Uma obra de arte só o é quando em contacto com o observador

147
O “mundo de aventura” do artista

(público).”
Artes, artistas e media
D1. Vantagens e desvantagens “Acho que há pouca divulgação da prática artística portuguesa. As poucas revistas que existem são caras, eu pessoalmente
procuro na internet, a Ípsilon é uma boa referência. Mas a comunicação social comum não tem uma mostra relevante da
arte portuguesa. As vantagens seriam para ambos, embora a procura seja apenas das pessoas interessadas. Talvez por isso
a revista L+arte tenha deixado de ser publicada.”
D2. visão do setor “Acho que há um afastamento dos media relativamente à arte e por consequência um desconhecimento, para o cidadão
comum, da realidade do sector. A arte está muito restrita ao seu mundo, aos que já estão inseridos e que vivem da arte.”
D3. artista ou obra “Penso que privilegiam o artista célebre, a obra vem em segundo lugar.”
D4. arte nacional e arte internacional “Acho que não [suficiente visibilidade das artes nacionais], principalmente na TV que é o meio mais popular. Felizmente,
a RTP2, não sei durante quanto tempo, tem programas interessantes sobre arte, mas principalmente direcionada para a
capital. As bienais que têm acontecido, um pouco por todo o país, que espaço têm na comunicação social? “
D5. experiência com os media “Não”

148
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 6
Sexo: feminino
Idade: 28 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Porto
Área de residência: Porto
Formação artística anterior: Curso Design de Comunicação em Escola Artística
Estatuto: estudante
Licenciatura em: Artes Plásticas (Escultura)

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “Lembro-me que em miúda pintava e desenhava imenso, adorava legos e cores, já tinha um sentido para a criatividade e
era muito curiosa em relação ao mundo. Era a mais jovem de uma família de nove pessoas, o facto de haver uma diferença
de idades para com os mais velhos reduziu a minha participação nos acontecimentos familiares e restou-me observar
comportamento dos outros. Tornei-me uma observadora atenta que desenvolveu capacidades sensíveis quanto ao
comportamento humano. Por outro lado, tornei-me inibida e incapaz de manter um diálogo por intermédio das palavras. A
minha expressão artística era a única forma de dialogar.”
A2. Influências “Venho de uma família de trabalhadores operários pobres, em jovem nunca tive contacto com as artes a não ser por meio
dos mass media (TV, rádio, aparelhagem de som, revistas, livros) ligados a conteúdos mainstream. Mas o meu irmão mais
velho, que tinha começado a trabalhar, oferecia-me brinquedos, livros e música, o que reforçou a minha tendência criativa.
Passei a pedir esse tipo de coisas sem sequer saber da existência da arte. A escola foi fundamental e foi a minha ligação
directa com o mundo da arte. No geral, fui uma aluna exemplar, mas o meu entusiasmo era maior nas práticas artísticas. O
meu interesse pelas artes resultou da comunidade que me educou. (família, amigos, professores, colegas, media...)”
A3. Relação da família com as artes “Só costumam frequentar as festas tradicionais e populares.”
A4. Hábitos culturais e artísticos na “Não tínhamos o hábito de frequentar museus ou qualquer tipo de eventos artísticos. Mais tarde, em adolescente, passei a
infância/juventude explorar fora do ambiente em que tinha crescido em garota. Conheci gente interessante e com visões completamente
diferentes da minha.”
A5. Reação de familiares e amigos “Ninguém se opôs. O facto de ter sido a única da família a acabar o Secundário e ter conseguido entrar para a Faculdade
149
O “mundo de aventura” do artista

foi um marco.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Prefiro pensar que sim, pelo menos sinto que o sou. A faculdade desenvolveu a minha artisticidade, no sentido de ter
refinado a minha sensibilidade e de me ter dado conhecimentos que não teria se não fosse por intermédio do ensino
institucional. Pode ser-se didáctico e conseguir ser tão bom como um académico, mas para um didáctico seguir sozinho
arrisca-se a ser ignorado.”
Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “É preciso ter fé. As artes continuam a ser amadas por uma minoria e desprezadas no geral pelas entidades que governam
Portugal o país (cortes nos orçamentos, nos subsídios, encerramento de estabelecimentos culturais, etc.). As artes continuam a ser
consideradas inúteis porque não se compreende a importância que tem para a sublimação mental e sensorial do ser
humano. As artes humanizam, não corrompem, revelam aspectos que incomodam o nosso comportamento. No entanto,
numa aldeia global como se vive actualmente, o que não se consegue de um lado procura-se no outro.”
B2. Avaliação da importância de uma “[optou por seguir o ensino artístico] Para obter conhecimentos teórico/práticos que correspondessem às minhas
formação artística especializada ambições: desde o reconhecimento, interacção social e o factor económico.”
B3. Expetativas profissionais “Não, mas ambiciono viver daquilo que faço.”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “Existem autores que teorizam tudo isso. Essa parte não me compete a mim, não tenho uma fórmula para produzir arte.
Acontece por resultado de uma emergência interior que quer existir cá fora. Seja intuitivo ou intelectual, nada acontece
por acidente. O meu objectivo é partilhar, interagir a partir de aspectos sensoriais que causem impacto nos outros. Parte do
íntimo para o público.”
C2. Heterodefinição de arte “As reacções e as críticas são diversificadas. No geral, as audiências não têm “instrumentos” para compreender todo o
processo em volta das práticas artísticas. Quando não entendem, surgem comentários deste género: “O meu filho de cinco
anos fazia igual!”, ou “Isto não se parece com nada”, ou então “Não tinha uma coisa destas na minha casa”. No entanto,
actualmente, faz-se muita arte efémera em que não existe um objecto que fique para a perenidade como, por exemplo,
algo que seja comestível. O que fica deste tipo de prática artística é a marca da experiência no momento que acontece.
Persiste a tendência para confundir a obra de arte com o artista. No geral o público, tem dificuldade em separar a produção
do produtor. Apesar de ser um comportamento errático, compreendo essa ligação que fazem com a obra e o autor, esse
comportamento revela o poder sensorial e imediato das obras de arte, são tomadas como parte do mundo real e têm uma
força dialogante que pode provocar transtorno e, quando isso acontece, o autor é o primeiro alvo. Por vezes, o ser humano
projecta os seus defeitos e qualidades no outro, quando se faz um julgamento de uma obra de arte estamos meramente a
olhar no espelho, porque todas as interpretações são individuais. O próprio artista torna-se ele mesmo o espectador do seu
trabalho. A apreciação das obras de arte provém das elites da arte capazes de compreender o que se encontra por detrás da
superfície das produções.”
C3. Diferença entre artista e artesão “O artista reinventa e transforma. O artesão segue o mesmo padrão repetidamente de forma automatizada.”
C4. Heterodefinição de artista “Dizem que fazemos coisas estranhas. Mas acho que apreciam isso, acontece-me muitas vezes reagirem de forma
desconfiada, mas a partir de momento que revelamos que somos artistas ficam à vontade.”

150
O “mundo de aventura” do artista

C5. Diferença entre artista profissional e “O método de trabalho e o respeito com quem se trabalha, disciplina, responsabilidade, cumprimento de horários de
artista amador trabalho, fazer bem o seu trabalho, levar isto com seriedade, ser generoso com o seu trabalho, isto faz de alguém um
profissional.”
C6. Instâncias legitimadoras “Uma inteira comunidade ligada à arte, desde as academias, instituições... Parte do artista, a priori, definir-se-á si mesmo
como artista e apresentar-se-á como tal. O que distingue um artista é o seu sentido de oportunidade, ele sabe sempre o
momento ideal para transgredir, nada é inocente na acção do artista. A sua atitude é intencional, trata-se de assumir a sua
posição na sociedade e de revelar o quão é importante a sua profissão como artista. O que quero dizer é que parte do
artista levar os outros a reconhecer a seriedade da sua produção. Ser artista é uma profissão tão importante como outra
qualquer.”
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “Não é muito diferente das outras crianças. Fui uma criança feliz e livre. Brincava descalça e os meus pais nunca me
proibiram de fazer brincadeiras que eram consideradas de rapazes. Normal e curiosa como qualquer criança e por vezes
um pouco esquisita. (…)”
C7.2. aspeto físico e indumentária “Sem dúvida que alguém que seja tendencialmente criativo o projecta na indumentária. Aquilo que usamos adapta-se ao
nosso espaço de trabalho e vida. Se vou trabalhar para as oficinas utilizo roupa adequada: uma t-shirt, calças desbotadas,
etc. Uso sempre o que me faz sentir confortável sem ter de seguir as regras da moda. Na Faculdade, não temos praxe nem
usamos traje porque defendemos a liberdade de expressão individual, no sentido em que abdicamos do traje igual para nos
expressarmos no nosso próprio estilo. Para nós, faz sentido assim. Os estereótipos são um fiasco!”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Um artista sabe sempre quando deve transgredir, não o faz aleatoriamente, mas sim quando acha que algo precisa de ser
estabelecidas mudado nos standards das convenções e instituições de arte. Não se trata de agredir, trata-se de cooperar com esses meios,
pois são esses meios que suportam os artistas.”
C7.4. relação com o dinheiro “Não basta ter vontade de trabalhar e produzir, o investimento económico influencia também a produção artística. Se eu
quero uma peça em ouro e não tenho meios económicos para tal, pinto em tinta dourada, mas estou a ser desonesta com o
meu trabalho. O trabalho fica arruinado. Mas se consigo a peça em ouro e não a consigo vender fico sem meios
económicos para investir numa produção seguinte. Os meios económicos facilitam determinadas produções. Obviamente
não é o mais importante, mas não se pode ignorar o mercado económico das artes. Arte é um negócio. Fazer arte por
paixão é maravilhoso, mas um artista também paga contas.”

“No geral, os artistas não fazem dinheiro. Podem ter imenso trabalho, mas não recebem muito por isso. Por vezes, nem
chega para pagar as contas. Os bem pagos são uma minoria. Não me queixo, sabia que era assim. É mesmo por amor a
isto. Mas contudo, se conseguir viver do que faço, é juntar o útil ao agradável.”

“O curso de Belas Artes é um curso extremamente caro, um estudante pobre sem apoio financeiro não tem possibilidades
para concluir uma licenciatura. Quem quer entrar no mundo das artes ou trabalha, ou tem dinheiro. Não basta querer. O
fator económico também influencia as escolhas. É preciso ter coragem para entrar no mundo das artes como pobre e sem
feedback artístico na família, como eu, por exemplo.”
151
O “mundo de aventura” do artista

C7.5. relação com a espiritualidade “Influencia sim, tenho colegas que são movidos pela força espiritual e a transportam para as suas produções. Não o meu
caso, pelo menos não de forma consciente, mas admito que a minha educação católica interferiu nos meus trabalhos. (…)”
C7.6. importância da idade “Nada vem do nada. Os artistas mais velhos são as nossas referências e os jovens dão continuidade e frescura às
produções de arte. No entanto, quanto maior a experiência, mais perto de atingir uma sensibilidade aquém dos “meros
mortais”.”
C7.7. importância da fama e/ou do “O que não é a vida senão as relações que estabelecemos uns com os outros? O reconhecimento traz satisfação pessoal e
reconhecimento sentido de existência.”
C7.8. outras características associadas “Dizem que somos loucos e degenerados. Ser artista desculpa a insanidade, apesar de não achar que somos loucos. De
qualquer maneira, num mundo como este, há que ser louco de vez em quando!”
C7.9. ser diferente “Todo o ser humano tem um comportamento similar com algumas características que nos distinguem dos outros. No
entanto, somos mais parecidos que diferentes. A forma como levamos a vida, o modo como a representamos é que faz a
diferença.”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “Há trabalhos que demoram anos a fazer. Isso da inspiração é um fiasco. O processo de uma obra de arte pode ser muito
penoso e árduo, exige muita força mental e física.”
C8.2. funções da obra de arte “(…) o diálogo, o factor comunicante. O sentido da arte é expor, mostrar-se. Humanizar.”
C8.3. obra de arte: talento ou “Um pouco de tudo. A genialidade desenvolve-se com trabalho e experiência. Existem coisas que por mais que insistamos
aprendizagem não conseguimos fazer, mas compensa-se com aquilo que sabemos fazer melhor. Não acredito que nascemos tal como
uma folha branca como foi referido (penso que pelo Rousseau), nascemos com determinadas características que vão ser
desenvolvidas a partir de uma dialéctica entre o mundo exterior e mundo interior. Quem me diz que eu não podia ter sido
arqueóloga? A criatividade, factor importante para definir um artista, pode servir para outras profissões além de produzir
arte.”
C8.4. obra de arte como liberdade de “Porque não? Na minha última produção, fiz uso do corpo como escultura e expressão feminina. As artistas mulheres
expressão e/ou instrumento político fazem uso do seu corpo, não só como arte, mas como um campo de intervenção, um modo de contar histórias. O corpo da
mulher sempre foi alvo de barbaridades e de censura, o corpo revela os tabus impostos sobre a mulher e sem ter a intenção
de politizar, o conteúdo político aparece automaticamente nas minhas produções, porque se vives num ambiente
politizado acaba por afectar-nos de forma política.”
C8.5. importância dos números (de
vendas, visitantes, entre outros)
C8.6. importância do público “O público contribui para a realização da obra por intermédio de uma narrativa, de uma história que começa com o artista
a produzir até ao contacto com o público e outros intervenientes. Se arte é expor, expomos para quem? Para um público,
que quanto mais diversificado, mais bem-sucedida a obra é, porque significa que essa obra abrange uma enorme
quantidade de audiências sem excluir outras.”
Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “Os media são um reforço para o reconhecimento do artista. O artista é o seu primeiro crítico em relação ao seu trabalho.
As entrevistas, os textos escritos, os documentários em que o artista fala do seu trabalho, são essenciais para se perceber

152
O “mundo de aventura” do artista

em primeira mão como se comporta o mundo da arte por dentro. São essenciais para “amantes” da arte, especialmente
estudantes que os usam como referências. (…) A falta de apoio de alguns media, falando em Portugal, faz o artista
procurar outros meio alternativos para o fazer. Quanto a canais portugueses, a RTP 2 continua a fornecer uma boa
programação com alguns programas interessantes, mas ironicamente é a que tem menos audiências. As pessoas não têm
formação para compreender a elite da arte e de outras áreas que exigem um certo nível de eruditismo.”
D2. visão do setor “(…) É inevitável, a linguagem dos medias cria realidades diferentes da realidade directa. Não acho errado, apenas
considero que é uma forma diferente de ver o mundo: o que torna os media decadentes em relação às práticas artísticas é o
facto de retirarem substância aos seus conteúdos. Mas existe uma imprensa que leva com seriedade o mundo da arte:
revistas, jornais...”
D3. artista ou obra “Depende do contexto, há artistas que são eles mesmos obras de arte (Yayoi Kusama). Há obras de arte que falam pelo
artista morto e são avaliadas sem a presença do mesmo. (…) Também se fala, muitas vezes, mais do artista do que do seu
trabalho (caso da Tracey Emin, que pertenceu ao grupo YBA, foi envolvida em grande mediatismo pelo seu
comportamento provocador). Por outro lado, temos ambas as partes (Marina Abramovic e as sua performances fabulosas).
O que acontece é que se o trabalho do artista é auto-referencial, assumidamente sobre si, está mais próximo de se conectar
à obra de arte (…).”
D4. arte nacional e arte internacional “Falam dos artistas portugueses de uma forma discreta, à excepção dos internacionalizados que têm destaque (Paula Rego
ou Joana Vasconcelos). O desenvolvimento da internet permitiu criar meios para divulgar as produções de arte e interagir
com a comunidade artística. O meio virtual passou a ser uma arena para fornecer serviços e mostrar, de uma forma
dinâmica, o que aparece de novo na arte. A informação é acessível, difícil é gerir toda essa informação. Obviamente há
coisas que não se podem substituir, como a experiência a três dimensões.”
D5. experiência com os media “Não, que eu saiba.”

153
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 7
Sexo: feminino
Idade: 22 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Vila Real
Área de residência: Valongo
Formação artística anterior: Curso de Artes Visuais no Ensino Secundário tradicional
Estatuto: estudante
Licenciatura em: Artes Plásticas (Escultura)

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “Não tenho consciência disso porque sempre manifestei interesse desde pequena e quando passei para o Secundário, não
considerei sequer qualquer um dos outros cursos. (…) Desde que me lembro de mim que gosto de “fazer”. As mais
variadas coisas, com as mais variadas matérias. Sempre polivalente.”
A2. Influências “Não e sim. Ninguém em específico, mas desde nova que passei a admirar, principalmente, músicos.”
A3. Relação da família com as artes “Não tenho artistas na família.”
A4. Hábitos culturais e artísticos na “Nem por isso. Em família só começamos a frequentar esses locais por influência minha e mais recentemente.”
infância/juventude
A5. Reação de familiares e amigos “Sim, os meus amigos nunca se opuseram, nem mesmo a minha família. Sempre me apoiaram porque sempre viram que,
de facto, era o que mais me completava e me dava prazer. Nunca vieram com a história do “isso não dá nada, não serve
para nada, porque não dá dinheiro”. Claro que tenho que lutar porque não tenho pais ricos, mas a realização, para eles, e
para mim, está acima de tudo.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Considero-me aspirante a artista. Artista serei se continuar o meu percurso, trabalhando nesse sentido e conquistando
obra, seja dentro das artes plásticas ou da música. Licenciar-se em Artes Plásticas não nos torna artistas, de forma alguma.
Há pessoas que são reconhecidas enquanto artistas sem o serem e pessoas que são postas na valeta tendo muito valor
enquanto artista.”

“Normalmente não digo que sou artista, por isso nunca recebi comentários. (…) Mas uma vez, um curador brasileiro
154
O “mundo de aventura” do artista

(Fernando Cocchiarale) perguntou-me se era artista e eu disse que sim, mas que ainda tinha muito que crescer. Ele ficou
impressionado com a minha determinação e disse que crescer é preciso sempre e que era bom eu ter essa consciência.”
Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “Acho a oferta formativa muito precária até ao 10º ano de escolaridade. Considero que tive sorte com os professores de
Portugal Secundário durante o meu percurso no curso de Artes, por isso, também não sei bem como será a normalidade, mas nos
anos anteriores, pelo que vejo também por familiares, amigos e conhecidos mais jovens, acho que devia ser dado um
apoio à formação do estudante muito maior no campo das artes em geral. A cultura geral artística de quem não frequentou
cursos de artes é assustadora e eu própria me deparei com essa questão quando era mais nova.”

“E depois as pessoas vêm o quadrado preto sobre fundo branco do Malevich e riem-se dizendo que isso também elas são
capazes de fazer, não se apercebendo da sua própria ignorância e besteirice. Acho que tudo devia começar desde cedo. A
sociedade tornava-se melhor. Estudar arte na sua base como cultura geral de qualquer cidadão, tal como se estuda
matemática ou inglês. Agora os putos aprendem a falar inglês antes de saberem escrever bem português. Não entendo.
(…)”
B2. Avaliação da importância de uma “No meu caso, a minha formação artística despoletou as minhas capacidades artísticas e provavelmente nunca teria
formação artística especializada chegado ao mesmo ponto de formação se tivesse sido autodidacta. Ainda que o seja com a música. Mas nas artes plásticas
considero o meu percurso académico ter sido fundamental, principalmente porque me permitiu encontrar colegas e
professores, ainda que poucos, que me fizeram crescer em todos os sentidos na minha vida profissional e não só. Criou-me
oportunidades, ainda, sim.”
B3. Expetativas profissionais “Para já não consigo [viver da arte], minimamente, mas espero conseguir, sim.”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “A resposta a esta questão, já tu bem o sabes, é das perguntas com resposta mais incerta de todo o sempre. Não há
definição concreta e existem tantas respostas quantas pessoas a quem fizeres a pergunta. Para mim, arte é algo que requer
a componente material (recorra à componente digital ou não, há sempre matéria) e que proporciona ao outro emoções,
sensações e reflexões, sob um certo grau de poética. A fronteira entre ser arte e não ser é muito ténue e é, até, subjectiva.
Existem alguns parâmetros, não são, contudo, absolutos. Arte não é ciência, nunca foi nem há-de ser. Essa questão da
consideração do que é arte e do que não é, normalmente é feita pelos críticos de arte e galeristas. Certo ou errado, é
assim.”
C2. Heterodefinição de arte “A generalidade da sociedade considera arte a arte do renascimento até ao modernismo e trabalhos actuais realizados por
artistas-ou-não contemporâneos, cuja aparência se assemelha à arte da época passada. Normalmente, são pessoas mais
velhas ou com uma fraca ou inexistente ligação ao meio da arte que consideram o que acabei de falar. Depois também há
quem considere o fim do modernismo, os Picassos, os Dalis, e esses ícones mais influentes. E agora também temos a
Joana Vasconcelos a bombar nos olhos de muita gente. De qualquer forma, existem várias pessoas, não a generalidade
populacional, claro está, que consideram arte também o que existiu no século XX a partir dos anos 40/50 e o que existe
agora no século XXI: a arte contemporânea. A questão é que a maior parte das pessoas ficou na era moderna. Em termos
artísticos e não só.”
155
O “mundo de aventura” do artista

C3. Diferença entre artista e artesão “Um artista é alguém que pensa e é capaz de transportar para o mundo material pedaços da sua existência. O artesão é
alguém que faz, o artista é alguém que pensa, podendo fazer ou não. O artista tem sensibilidade estética e oferece motivos
aos fruidores para pensar, sentir e imaginar. O artesão produz materialmente, desprovido de emoção universal,
concentrando-se no acto do fazer, não deixando espaço na “obra” para o outro se sentir. A arte é comunicante. O
artesanato é, maioritariamente, um veículo para o adorno e a decoração.”
C4. Heterodefinição de artista “Quando aparece na televisão e nos jornais.”
C5. Diferença entre artista profissional e “Não há artistas profissionais nem artistas amadores. Há artistas e todas as outras pessoas. Artesãos, tocadores de guitarra,
artista amador críticos, professores, historiadores, etc. (…) Um músico é um artista (como um actor, bailarino, coreógrafo, realizador de
cinema, poeta, artista plástico, etc), mas qualquer pessoa que toque música não é necessariamente músico. Pode ser apenas
um intérprete. Um tocador e não músico. Porque pode não ser criador. Um artista é um ser que cria, pala além de ser
criativo (palavra que agora anda muito na moda), por isso, pensa a sua composição, estrutura e ainda toca. Ou não. Como,
por exemplo, um maestro.”
C6. Instâncias legitimadoras “Os professores, por norma, não se referem a esse tipo de questões porque não lhes compete julgar os estudantes por esses
termos. Não têm que considerar mais um aluno por ser artista ou não. Têm que avaliar se é um bom estudante, não se é
um bom artista. Há óptimos alunos que não são artistas e vice-versa. Críticos e curadores, são eles que acabam por
proporcionar o sucesso dos “artistas” ou destruir a sua imagem. Não me interesso muito por essas questões, sinceramente.
Importo-me com aquilo que faço e em fazer bem. Claro que ser reconhecido traz os seus lucros, mas não é isso que anseio
mais que tudo.”
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “A infância ao artista, na minha opinião, pode ser perfeitamente idêntica à infância de uma pessoa não-artista. Mais feliz
ou mais triste. Com aspectos mais marcantes, naturalmente. Creio que é na infância que se desenvolve a propensão para
um dia se tornar artista, no entanto, não creio que haja acontecimentos específicos que determinem tal coisa. Afinal é na
infância que construímos a maior parte da nossa identidade e durante a qual manifestamos grande parte da nossa
personalidade. Essa característica da artisticidade pode já estar implícita ou não. Penso que se tem ideia de que os artistas
foram, em geral, crianças tristes ou problemáticas. Não sei se considero esta falácia parte do meu pensamento, mas eu,
sem motivos aparentes para ser triste, sempre o fui, um bocado, e inexplicavelmente.”
C7.2. aspeto físico e indumentária “Essa ideia tanto é válida como não. Há artistas de todos os tipos. Podes olhar para uma pessoa e achar que é artista, como
olhas para outra e achas que é gay. Nem todos os artistas têm altos estilos, nem todos os artistas têm aspectos retro, ou
futuristas ou desmazelados. Há artistas que passam perfeitamente despercebidos fisicamente no meio da sociedade. Há
artistas que têm vestes próprias para ocasiões especiais e há outros que vestem precisamente o mesmo que vestem num dia
de trabalho (por exemplo, Joseph Beuys – andava com a mesma roupa, tanto a trabalhar, como na inauguração da
exposição). É tudo muito variado. Há pessoas com mais “cara de artista” que outras, mas isso é como em tudo.”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “A relação do artista com a sociedade em geral é muito variada. Tal como há mil e uma formas e meios de se fazer arte, a
estabelecidas relação entre as duas partes também é variada. A ideia antiga de que os artistas são uns pobres bêbados, malucos, com
ideias maradas, incompreendidos e anti-regras não é mais assim. Certamente que continuam a existir artistas assim, tal
como existem pessoas assim e não são artistas. Mas existem artistas com formas de pensar muito diferentes e formas de se
156
O “mundo de aventura” do artista

movimentarem no mundo e a sociedade muito distintas, por isso não posso considerar que haja maioritariamente um tipo
de relação a destacar. Existem artistas extremamente elitistas, existem artistas que falam com as pessoas do povo, existem
artistas que só fazem obras monumentais de preços exorbitantes, há artistas que se envolvem com as populações e cujas
obras são para ser levadas pelos próprios fruidores (por exemplo, Félix Gonzalez-Torres). Há artistas contestatários, que
manifestam questões sociais, institucionais e políticas (por exemplo, Joseph Beuys). Há artistas que abordam questões
auto-referenciais a sua vida toda (por exemplo, Louise Bourgeois, que olha, a questão da infância. Esta artista tem muito a
dizer sobre isso).”
C7.4. relação com o dinheiro “Lá está, há artistas que ligam a isso, há artistas que não ligam a isso. Há artistas que não ligam e têm obras de arte com
valores altíssimos. Mas que a maioria dos artistas não é nada rico, é verdade. As obras podem valer milhões, mas quem os
ganha são as galerias e coleccionadores de arte e outras instituições artísticas, não são os próprios. Ainda que haja casos
em que é revertida uma percentagem ao artista de cada vez que a obra é vendida, isso não chega para podermos dizer que
os artistas são ricos. Há artistas ricos e a maior parte dos artistas são pobres ou aguentam-se. Há pessoas consideradas
artistas, mas que são simplesmente empresárias, como considero o caso da Joana Vasconcelos. Ou que seja artista, mas é
artista pimba. Como temos o Emanuel e o Quim barreiros, que têm o seu valor, mas dentro da música pimba.”
C7.5. relação com a espiritualidade “Sim, tanto quanto me dou conta, influenciam o seu trabalho como influenciam a sua vida e forma de ver o mundo.”
C7.6. importância da idade “A importância da idade agora está a começar a ter um impacto diferente. Grande parte de concursos, selecções para
exposições e etc. têm limite de idade. Costuma-se ver “jovens artistas (até aos 35 anos)”, por exemplo. Em Portugal, no
resto do mundo não sei. Mas relativamente ao tipo de obras realizadas por jovens ou artistas mais velhos, não noto que
haja grande especificidade nuns e noutros. Depende do tipo de pessoa.”
C7.7. importância da fama e/ou do “Infelizmente, ao longo dos tempos tem-se praticamente vindo a reconhecer os artistas e dar valor às suas obras depois da
reconhecimento sua morte, mas nota-se algum avanço nesse sentido nos últimos anos e espera-se que continue esse avanço no sentido de
dar o devido valor às devidas pessoas no devido tempo de vida. “
C7.8. outras características associadas “O artista é louco, drogado, gay.”
C7.9. ser diferente “Acho que já te fui respondendo a isso!”.
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “Normalmente há muita especulação durante a execução. Muitos pensamentos a correr, muitas preocupações ainda que
subconscientes e, muitas vezes, a suposta obra acaba no monte de experiências, ou no monte de lixo, ou no monte de
materiais a reciclar. Depende muito do meio artístico a ser utilizado, depende muito das metodologias de trabalho do
artista em questão. Há artistas que não produzem as suas obras (por exemplo, Anish Kapoor tem uma equipa de trabalho),
mas pensam-nas, repensam-nas, desmistificam-nas, simplificam-nas. Há todo um processo de racionalização e reflexão
constantes. Há que ter muita consciência do que se quer dizer e da forma como se vai dizer. Há que ter muitos
conhecimentos aos mais variados níveis, sejam filosóficos, espirituais, técnicos, de desenho, de estruturação das matérias,
da preservação das matérias, etc. Há que saber o que se quer ou pelo menos, o que não se quer. É preciso muita pesquisa,
dedicação, dores de cabeça, pausas de dias ou semanas para afastar o olhar da obra em construção e tentar olhar para ela
com olhos “novos”. É preciso tempo. A ideia de que o artista pega numas matérias e começa a mexer com elas quando
sente, de repente, que a “inspiração” está a vir, é absolutamente mítica. Não há inspiração, há, antes, e como defende
também uma professora que tive e muito me prezo em ter tido, um impulso da criação artística.”
157
O “mundo de aventura” do artista

C8.2. funções da obra de arte “A obra de arte distingue-se precisamente dos restantes objectos, sejam eles de design ou de artesanato, por não ter
função. Não é um objecto funcional. Não serve a propósitos decorativos nem funcionais. É comunicante, é para sentir, é
para intelectualizar. Não tem nenhuma função específica a não ser comunicar. Contudo, o artista tem o dever de tentar
“mudar o mundo”, alertando os restantes cidadãos da sociedade em que vivemos.”
C8.3. obra de arte: talento ou “Como já disse, há alunos de Belas Artes que não são nem nunca serão artistas, tal como há artistas que não acabaram
aprendizagem sequer o ensino secundário (por exemplo, Isaque Pinheiro) e são, portanto, autodidactas. A aprendizagem é, sem dúvida
importante, mas tem que haver já de trás um impulso, uma vontade, uma necessidade. Normalmente, quem tem esse
desejo tem o que se costuma chamar de “dom”, que pode ser descoberto no momento de aprendizagem e inter-relação
com o ambiente artístico ou pode ter já sido descoberto anteriormente. Mas a obra de arte não resulta do talento ou dom.
Daí pode resultar o trabalho de um artesão.”
C8.4. obra de arte como liberdade de “Acho que um artista tem necessidade de se expressar por via da arte. É uma necessidade vital. Não sei o que as outras
expressão e/ou instrumento político pessoas acham que faz um artista querer sê-lo.”
C8.5. importância dos números (de “Números são o que fazem o mundo, os negócios. Tudo que tem números, no sentido em que estás a falar, é negócio e
vendas, visitantes, entre outros) isso, para mim, não vale verdadeiramente nada. A arte não devia ser um negócio, mas é-o, inevitavelmente, neste mundo.”
C8.6. importância do público “O público é o único alvo da obra de arte depois de consumada. Tem toda a importância. Os artistas normalmente fazem
as obras para si, mas na verdade são para o outro, na medida em que são comunicantes.”
Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “Certo é que são os media que “fazem” o artista. O artista só ganha destaque, nome e valor quando é falado nos meios de
comunicação ou é referido por algum curador, galerista ou crítico de arte importantes. Há artistas que são enlameados no
início da sua carreira e jamais ou a muito custo têm sucesso porque tiveram uma crítica má do crítico x ou y.”
D2. visão do setor “Aquilo que ela passa muitas vezes não é a realidade, muitas vezes as palavras do artista são transformadas e é dado um
ponto de vista sobre as obras que não é o que o artista afirmou. Por vezes, para o bem e, por vezes, para o mal.”
D3. artista ou obra “Apesar de ele ser reconhecido a partir da obra que é exposta ao público, quem fica para a posteridade da divulgação e
futuras notícias é o artista. É o seu nome que fica conhecido. E se um dia o artista ficou conhecido pela sua obra x ou y, à
qual foi atribuída um grande valor artístico, cultural e etc., um dia mais tarde, o artista pode vir a vender obras apenas
porque são assinadas por ele, e o valor cultural e comercial passa a estar implícito no seu nome, como uma marca,
independentemente de ter realmente valor artístico ou não. Passa a ter porque a obra nasce sob o nome que já está com o
lugar garantido no "livro das artes". Portanto, o artista pode assinar folhas de papel em branco que o papel ganha
automaticamente um valor insólito. Parece muito estranho, mas creio que há situações destas, ainda que bem caricatas.”
D4. arte nacional e arte internacional “Acho que está a começar a ganhar algum impacto, mas ainda assim não há divulgação suficiente de muita coisa que anda
a acontecer por aí. No Porto, ouvimos falar de Serralves, Teatro Nacional São João e Casa da Música e o resto é nevoeiro
para o público em geral... E ainda assim, a aderência a qualquer um destes espaços não é assim tão grande. Não há assim
tanta cultura na generalidade da população, nem há sequer quase predisposição para a arte. E acho que tudo começa em
criança, quando não se aprende a olhar a arte, mas sim apenas a fazer umas paneleirices numas folhas de papel cavalinho,
sem haver fundamentação teórica nenhuma por parte de grande parte dos professores do ensino básico.”
D5. experiência com os media “Ainda não tenho a experiência de ter lidado com os meios de comunicação social.”

158
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 8
Sexo: masculino
Idade: 21 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Porto
Área de residência: Gondomar
Formação artística anterior: Curso de Tecnologia e Produção Gráfica em Escola Profissional
Estatuto: estudante
Licenciatura em: Artes Plásticas (Multimédia)

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “Eu acho que ele sempre existiu, mas nunca existiu, se calhar, da forma mais correta. (…) Se calhar ia reformular a
questão e perguntar quando é que eu tive noção que estava a querer entrar nesse mundo… que foi no meu terceiro ano na
faculdade! (…) Desenhava muito, lembro-me que quando era miúdo vendia desenhos a cem escudos. (…) As pessoas
sempre disseram: «Ai que este menino desenha tão bem!» e quando chegas ao final do 12º ano e tens de escolher um
curso, olhei para tudo e era para artes que eu queria ir.”
A2. Influências “O meu pai é decorador e sempre tive aquela coisa com as artes, «porque não?». De certa forma isso influenciou-me
indiretamente, embora a decoração, pelo menos hoje em dia, não seja propriamente arte.”
A3. Relação da família com as artes “Há uma grande distância entre o que ele [pai, decorador] faz e o que eu faço. Mas talvez a minha cultura visual tenha
surgido aí.”
A4. Hábitos culturais e artísticos na “Quando era miúdo praticava muito desporto e posso dizer que só no meu 9.º ou 10.º ano é que entrei pela primeira vez
infância/juventude num museu.”
A5. Reação de familiares e amigos “Nenhum dos meus pais apoiou esta minha decisão. Tornou-se uma barreira na relação entre mim e eles, de certa forma.
(…) A minha mãe queria que eu fosse médico. Mas não é para ganhar rios de dinheiro que eu quero estudar. (…) Sempre
gostei de street art e talvez aí já se visse a minha necessidade de afirmação.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Se me perguntares se o que eu faço é arte, eu quero acreditar que sim. Claro que se eu acredito que é – e se calhar aqui
estou a contradizer-me –, não é por chegar aqui outro artista e dizer que a minha obra não é arte que ela deixa de o ser.
Mas claro que isso levanta questões.”
159
O “mundo de aventura” do artista

Escolaridade, formação e profissão


B1. Avaliação do ensino artístico em “Mesmo que em pequeno te levassem a museus, tu ias questionar-te? Ias para casa pensar sobre isso? Não me parece. Ias
Portugal para casa brincar ou falar no MSN com os teus amigos. Não é a formação que é má, o momento é que nem sempre é o
certo. Aos 17 anos era o momento certo para eu entrar na faculdade? Não.”
B2. Avaliação da importância de uma “Gosto muito da ideia do autodidata. Sou muito apologista disso, adoro sê-lo. Mas há coisas que tu não aprendes sozinho.
formação artística especializada Tens de cultivar-te a ti próprio e não conseguirias isso sozinho. (…) E hoje em dia, um curso dá-te outro estatuto lá fora.
Uma licenciatura nem tanto, mas um mestrado. Mas isso é só uma fachada. Eu não estudo pelo título, mas pela
aprendizagem. (…) Mas também não é isso que te vai fazer ser mais exposto que um amador, vai também do teu portfólio.
Faz diferença teres um curso superior, mas numa galeria de um município qualquer só têm lá exposições porque fica bem
culturalmente.”
B3. Expetativas profissionais “Não quero levar isto como uma profissão, quero levar isto como um estilo de vida.(…) E depende da cabeça que tiveres.
(…) Há uma quantidade estúpida de pessoas que o querem [ser artistas], mas essa quantidade não revela qualidade, não
revela vontade, dom, talento, o que queiras chamar de mito, porque é mito! Eu não sou a pessoa que desenha melhor aqui
dentro, mas ser artista não é só desenhar.”

“Se eu me for a questionar todos os dias sobre isso, o mais certo é daqui a um mês já estar no manicómio! Eu sei que as
coisas se pagam, mas eu não consigo viver assim. (…) Eu não me consigo imaginar a fazer outra coisa. Não vou estar com
tretas como «Se te esforçares muito, tu consegues.» Não, precisas de cunhas, às vezes. E ser bom não é achares que és o
melhor, tens de ser bom mesmo. (…) Nem que tenha de arranjar qualquer coisa dentro da área e vou fazendo o meu
trabalho na área. Se tudo correr bem pode ser que tenha uma boa oportunidade. Isto é um mundo de aventura! Mas neste
momento não tenho noção como vai ser essa aventura. Foi para isso que eu me candidatei a este curso. É isto que eu quero
e não me vejo a fazer outra coisa.”
Auto e héterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “A arte, para mim, é o que procura algo. Pode ser um objeto, um pensamento, um desenho, uma escultura, uma instalação,
uma faixa, o que tu quiseres. Mas tem que ser algo que transmita um certo sentimento ao espectador, bom ou mau. É
difícil explicar porque depois temos aquelas pessoas que acreditam mais numa arte conceptual, outros numa arte sensorial,
outros numa arte pela arte, e não é assim. A arte não é arte por entrar no museu. (…) A arte é aquele momento em que tu
assumes um compromisso com a peça que estás a fazer, e essa peça – num momento expositivo, ou não – consegue
transmitir esse compromisso ao espectador. (…) A culinária é uma experiência sensorial.”

“Para mim, uma boa obra de arte é uma obra que levanta questões, que mexe, não pode ser uma obra insossa.”

“Aquilo que eu posso dizer é que, para mim, a arte é um levantar de questões, é uma expressão. Não tem de ser
comunicativa. Não é um spot publicitário. Mas é algo que está ali.”
C2. Heterodefinição de arte “A minha resposta vai desiludir-te tanto… Joana Vasconcelos! É só isto que eu tenho a dizer! Para mim, falas com o
cidadão comum e ele adora o trabalho dela, tens a cultura visual. É uma coisa que é bonita e a arte, muitas vezes, não tem
160
O “mundo de aventura” do artista

que ser bonita. Se houvesse tópicos para a definição de arte para o cidadão comum, seriam: Mona Lisa, Joana
Vasconcelos e Cristiana Ronaldo. Toda a gente já ouviu falar da Mona Lisa e leu o livro do Dan Brown, “O Código da
Vinci”, o Cristiano Ronaldo é uma obra de arte viva e a Joana Vasconcelos é tipo o top português. (…) Chamar “arte” a
alguma coisa é muito complicado e aborrece-me quando as pessoas chamam arte a tudo. Não estou a dizer que o que ela
faz não é arte, mas é arte que o povo gosta. Ela tornou-se uma figura pública. (…) As pessoas têm um vício, que é a
televisão, e esse vício fornece o que elas querem ver.”
C3. Diferença entre artista e artesão “Eu tento sempre ser eu a fazer tudo. Mas não te vou dizer que não existe gente, até artistas de renome, que têm os seus
ateliês e as pessoas a trabalharem lá. (…) Um arquiteto não é trolha, não é? E há logo uma coisa positiva aí, é que cria
trabalho. (…) Mas e porque não considerar um artista um artesão e vice-versa?”

“Entrar nas artes é um ato de rebeldia, de afirmação. Depois há os que têm uma aptidão nata, pessoas curiosas,
revolucionárias, que questionam, é por aí. Há sempre um bichinho qualquer.”
C4. Heterodefinição de artista “As pessoas normalmente pensam que os artistas são excêntricos. Alguns até são bem calados, ficam na sua vidinha e até
trabalham melhor sozinhos! Há peças que mostram que os artistas são pessoas muito plásticas, há outros muito certinhos e
muito rigorosos…”
C5. Diferença entre artista profissional e “Para mim um trabalho de um amador é tão legítimo como o de alguém que tem um mestrado.”
artista amador
“Não há uma diferença. O artista é artista quando é aceite pelos seus pares. Não é amador nem profissional, não há um
escalão, isto não é a Primeira Liga do futebol!”
C6. Instâncias legitimadoras “Um artista é artista quando é aceite pelos seus pares.”
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “A infância é o momento mais verdadeiro que temos na nossa vida. (…) Mas a infância pode definir o trabalho do artista.
Há muita gente que trabalha com essas memórias. Ou até com memórias do que pensa que viveu.”
C7.2. aspeto físico e indumentária “É mito. Hoje em dia, as pessoas querem ser diferentes. E então isso é mais fácil pela forma de vestir e pelo penteado. Se
calhar, a própria vida também conduz as pessoas nesse sentido. (…) As pessoas de artes vestem-se à vontade e de uma
forma que transmite a sua personalidade e as pessoas acham mesmo que entram na FBAUP e só vão ver pessoas nuas e
orgias nos jardins. Há pessoas normais, há pessoas extravagantes, aqui há de tudo.”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Todos temos os nossos momentos de loucura, momentos menos sãos. Se calhar um artista tem mais à vontade para
estabelecidas demonstrar isso do que uma pessoa que está sentada num escritório, com uma pressão para atingir certos objetivos. Mas
essas pessoas, quando se «passam», «passam-se» de formas muito mais agressivas do que nós. (…) Se agora me
apetecesse mandar um grito, mandava. Sou livre para o fazer! (…) Um artista já tem uma imagem tão despreocupada e as
pessoas já lhe dão tão pouco crédito que nós podemos ter o à vontade e a liberdade que é assim, podemos chegar à
faculdade e deitarmo-nos no chão. Sentar na relva dá má imagem? Mas quem é que estabelece essas coisas?”
C7.4. relação com o dinheiro “Tens que meter uma coisa na cabeça: não podes entrar no mundo das artes a pensar que vais ganhar rios de dinheiro e
que vai correr tudo bem, que não vais ter obstáculos e que vais vender peças por dez ou 15 mil euros. Isso é uma ilusão.”

161
O “mundo de aventura” do artista

“O povo não está habilitado para ter noção disso [valor da obra], o povo não se abre a isso nem nós – e há um certo
elitismo à volta desta questão – abrimos isso ao povo. (…) Aqui em Portugal falta interesse, talvez porque os próprios
artistas, os galeristas, os comissários assim o querem… ou não!”

“O verdadeiro artista não é aquele que vive sem dinheiro. Isso é outro mito. E há muita gente que pensa que vai entrar em
artes e ganhar milhões. Isso é mentira.”
C7.5. relação com a espiritualidade “Eu não ligo uma coisa à outra, mas eu renego-me a trabalhar a religião porque andei numa escola salesiana vários anos.
(…) Mas há muitos autores que trabalham a imagem religiosa.”
C7.6. importância da idade “No outro dia estávamos na trollice e estávamos a dizer que se queres que a tua arte seja mesmo boa, tens de morrer aos
2724! Caso contrário, terás que te aplicar muito! Agora sem brincadeiras, acho que hoje em dia já nem passa tanto pelo ser
jovem ou ser velho, passa mais pela aceitação. Até já falamos nisso numa disciplina… porquê que eu não posso citar um
colega meu? Nem é a idade, é o nome.”
C7.7. importância da fama e/ou do “É muito importante. Se um artista não trabalha para receber dinheiro, o artista trabalha para ser reconhecido pelos seus
reconhecimento pares e para ser reconhecido como artista. É outra forma de remuneração. Mas há artistas que não querem saber disso.
Mas se chegarem à minha beira e me disseram que adoraram a minha peça, fico contente. Eu procuro o reconhecimento
das minhas peças como sendo obras de arte.”
C7.8. outras características associadas “Não, acho que o artista é uma pessoa e todas as pessoas têm qualidades e defeitos diferentes e isso reflete-se na sua
maneira de ser. Vimos todos de culturas diferentes. Não dá pra dizer que todos os artistas têm as mesmas características.”
C7.9. ser diferente “Acho que, às vezes, as pessoas enganam-se um bocado. Skaters, por exemplo, as pessoas dizem que são artistas. Isso
agora está na moda. Mas eu sinto-me uma pessoa normal, mas com vantagens porque não consigo ter aquele tipo de vida
de fazer o jantar, ver a telenovela e no dia seguinte ir trabalhar. Sinto-me privilegiado porque a minha própria vida, a
minha personalidade, me permitirem ser assim como sou. Eu não sou mais nem menos, mas fico contente por ser assim!”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “Envolve tudo. É cozido à portuguesa! A carne não fica boa se não tiver a cenoura!”
C8.2. funções da obra de arte “Passa por tentar manter a sanidade. A arte serve para a expressão, é cultura, é desenvolvimento, é necessária. A arte é um
mundo, como o futebol é um mundo.”
C8.3. obra de arte: talento ou “Não é uma vocação. Há técnicas. Tu aprendes a pintar. Isso do dom é mito. A pessoa nasce com qualidade, mas essa
aprendizagem qualidade tem de ser praticada. (…) Não te vou dizer que não pode aparecer aí alguém que a desenhar é mesmo de topo,
mas vais a ver e é alguém que tem 50 diários gráficos em casa, está sempre a desenhar em todo o lado. Não é alguém que
nunca pegou num desenho. Tem algum cuidado, algum interesse.”
C8.4. obra de arte como liberdade de “Se não for, as pessoas não estão a perceber bem o conceito.”
expressão e/ou instrumento político
“A mim dizem-me que o meu trabalho é muito político, mas depois também me pergunto se eu critico. Não, eu questiono.
É esse o intuito. O intuito de dar a perceber aos outros. O meu trabalho é a minha forma de expressão.”
C8.5. importância dos números (de “O número de visitantes da exposição é importante mesmo para a cultura geral do país. (…) Para mim, os museus deviam

24
Referência a artistas que faleceram com 27 anos de idade. Exemplos: Amy WInehouse, Janis Joplin, Kurt Kobain e Jim Morrison.
162
O “mundo de aventura” do artista

vendas, visitantes, entre outros) ter entrada gratuita e as pessoas deviam ir ver as obras, ter acesso. Percebo que depois há ali um mundo à volta que tem de
ser gerido e tem de ir buscar rendimentos, mas a criação de uma barreira monetária para ires ver um museu, que é algo
que as pessoas já não vão ver de bom grado mesmo quando é gratuito, se for a pagar, ainda pior.”
C8.6. importância do público “Fazes a obra para ser vista pelo espectador, não para ser vista por ti. Mas não a faço para agradar, nunca penso nisso.”
Artes, artistas e media
D1. Vantagens e desvantagens “Certas coisas que aparecem nos media, tu vais lá e tiras para os teus trabalhos. Através dos media tu divulgas. Claro que
depois há coisas bem ou mal divulgadas, há críticas boas e críticas más. A relação não tem que ser saudável nem deixar de
ser saudável. Tem que haver sempre a relação.”
D2. visão do setor “Acho que umas coisas vão de encontro, outras não. (…) O jornalista que escreve pode ter uma visão diferente da tua. E
eu fico chateado se alguém que não conhece o meu trabalho começa a mandar palpites, mas depois, no final, até acho
piada porque isso enriquece o meu argumento. Há o treinador de bancada. O futebol e a arte podem ser comparados!”
D3. artista ou obra “Sem dúvida, que se for um artista de renome, é o artista. Se for uma exposição coletiva, não há assim nenhum destaque.
Mas se for um artista polémico, aí são cinco ou seis páginas só para isso. O artista pop, estrela, cria a obra mesmo para
isso. O artista quer sempre chegar ao momento alto. E quando chega tem medo de cair.”
D4. arte nacional e arte internacional “Internacionais. O melhor está sempre lá fora.”
D5. experiência com os media “Já devo ter sido mencionado em algumas coisas, mas nem ligo a isso.”

163
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 9
Sexo: masculino
Idade: 21 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Porto
Área de residência: Matosinhos
Formação artística anterior: Curso de Artes Visuais no Ensino Secundário tradicional
Estatuto: trabalhador-estudante
Licenciatura em: Design de Comunicação

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “Desde pequeno tive vontade e aptidão para o desenho, e esse gosto acompanhou-me sempre até aos dias de hoje.”
A2. Influências “Talvez o meu tio, pois era o único ligado às artes, e o único que me incentivava a desenhar e a colorir os habituais “livros
de pintar”.”
A3. Relação da família com as artes “Apenas o meu tio que pintava esporadicamente, penso que foi a única ligação, pois não tenho mais ninguém na família
com essa orientação.”
A4. Hábitos culturais e artísticos na “Raramente frequentava.”
infância/juventude
A5. Reação de familiares e amigos “Sim, foi pacífico. Posso dizer que tenho pais bastante liberais.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Essa definição ainda hoje está envolta em perguntas, mas como designer não me posso intitular artista, pois respondo a
um problema como outra pessoa qualquer, apesar de criar uma obra também. Mas respondendo à questão, na minha
opinião, artista é aquele que cria uma obra, tanto uma pintura como o carpinteiro uma cadeira. Tudo depende da dedicação
e do espírito com que se faz a peça.”
Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “A minha experiencia pessoal foi boa, mas acredito que poderia ter sido melhor, ou pelo menos podia ter tido um
Portugal acompanhamento desde mais cedo, para desenvolver aptidões nesse ramos muito mais direccionadas do que apenas livre
vontade.”

164
O “mundo de aventura” do artista

B2. Avaliação da importância de uma “A minha área profissional está dividida entre o desporto e o design, mas falando do design, essa é a base do meu
formação artística especializada trabalho. Sou freelancer e faço exactamente o que estudei. (…) As fracas opções que temos sem especialização levaram-
me a investir nesta formação.”
B3. Expetativas profissionais “Como designer, sim.”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “Esta pergunta nunca foi respondida durante séculos e certamente não vou ser eu a respondê-la. Mas, para mim, arte é
uma obra que foi criada com espirito criativo, originalidade e determinação e não algo que seja produzido em série.”
C2. Heterodefinição de arte “Gosto pessoal apenas. É uma educação que pelo menos cá não existe.”
C3. Diferença entre artista e artesão “Artesão é aquele que cria como forma de sustento, produz em série.”
C4. Heterodefinição de artista “O gosto pessoal. Isto se a pessoa gostar do quadro ou reconhecer alguma técnica. Caso contrário é mais uma vez a frase
“até eu fazia isto”.”
C6. Diferença entre artista profissional e “O profissional é aquele que vive das suas obras.”
artista amador
C6. Instâncias legitimadoras
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “A infância potencia apenas o gosto.”
C7.2. aspeto físico e indumentária “Eu sou bastante normal! (…) Acho que os artistas são pessoas normais, apenas com um exterior mais elaborado.”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Os artistas tendem sempre a fugir das regras para serem considerados artistas, eu não percebo!”
estabelecidas
C7.4. relação com o dinheiro “Eu faço projectos pessoais por gosto (mas que me podem projectar como designer) e faço trabalhos pagos.”
C7.5. relação com a espiritualidade “Penso que não [tem relação]. Pelo menos comigo não.”
C7.6. importância da idade “Como qualquer profissão sem ser as fisicamente exigentes, quanto mais experiência, melhor o trabalho.”
C7.7. importância da fama e/ou do “É sempre bom ser reconhecido, mas neste ramo a maior parte dos artistas só atinge a fama no final da vida ou mesmo
reconhecimento depois dela.”
C7.8. outras características associadas “Acredito que, para muita gente, ser artista é igual a ser um maluco que passa fome. “
C7.9. ser diferente “Podem ser facilmente identificados.”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “Há obras pensadas e há obras que aparecem em momentos mais relaxados, mas esse é o segredo de todas as coisas. Toda
a evolução do homem provém de trabalho e de inspiração que provêm de locais fora do trabalho. Mas parte tudo de um
problema. Pois qualquer obra é uma solução a algo.”
C8.2. funções da obra de arte “É um bom meio de se expressar e de camuflar sentimentos ressentidos.”
C8.3. obra de arte: talento ou “Dos dois. Um bom artista é aquele que tem técnica e consegue ter visão para produzir algo nunca feito.”

165
O “mundo de aventura” do artista

aprendizagem
C8.4. obra de arte como liberdade de “Depende dos países, nuns é mais eficaz, noutros ninguém liga.”
expressão e/ou instrumento político
C8.5. importância dos números (de “Funciona como uma mercearia.”
vendas, visitantes, entre outros)
C8.6. importância do público “Quantas mais pessoas gostarem da obra, penso que mais será um motivo de satisfação para o artista. É sempre bom ver
que o nosso trabalho causa algum impacto… bom ou mau.”
Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “Os media conseguem influenciar qualquer tema e qualquer população, agora se dão o devido valor á arte? Não. Apenas
futebol e mais futebol. Mas é Portugal!”
D2. visão do setor “Penso que agora existem jornais e revistas bastante qualificados e adaptados mas, como digo, a atenção a esses assuntos
não é a que deveria ser, ao fim de contas estamos a falar da cultura de um povo.”
D3. artista ou obra “Pergunta difícil, não sei. Eu pessoalmente valorizo mais o artista, pois se for bom é alguém que mantem um padrão de
qualidade e uma identidade fixa e única.”
D4. arte nacional e arte internacional “Não, infelizmente conheço um caso que é flagrante. O artista de rua, Alexandre Farto, só chegou até mim através de uma
plataforma online não nacional.”
D5. experiência com os media “Apenas enquanto desportista.”

166
O “mundo de aventura” do artista

Entrevista n.º 10
Sexo: masculino
Idade: 23 anos
Nacionalidade: portuguesa
Naturalidade: Porto
Área de residência: Porto
Formação artística anterior: Curso de Artes e Indústrias Gráficas em Escola Artística
Estatuto: estudante
Licenciatura em: Design de Comunicação

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “O interesse surgiu no ensino básico, com a disciplina de EVT.”
A2. Influências “Família e professores. Interessava-me pelos livros que lia sobre o assunto.”
A3. Relação da família com as artes Não, não tenho artistas na família.”
A4. Hábitos culturais e artísticos na “Não.”
infância/juventude
A5. Reação de familiares e amigos “Sim, foi uma decisão pacífica. Apoiaram-me.”
A6. Autolegitimação enquanto artista “Não, não me considero artista.”
Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “[A oferta formativa em Portugal é] interessante, pelos vários cursos que envolvem cada vez mais áreas para além das
Portugal artes e promovem a actividade interdisciplinar”
B2. Avaliação da importância de uma “Ainda agora comecei a entrar no mercado de trabalho, por isso ainda não sei responder bem a esta pergunta.”
formação artística especializada
B3. Expetativas profissionais “Ainda não consigo responder com precisão, mas acho que conseguirei.”
Auto e heterodefinição de arte e de
artista

167
O “mundo de aventura” do artista

C1. Autodefinição de arte “Não sei se é possível definir Arte. A arte acho que é a manifestação de uma acção, de uma emoção. Afinal, a força de
vontade é aquilo que nos move. Hoje em dia tudo pode ser considerado arte. Aquilo que é mais importante é a perspectiva
pessoal do artista, e nesse aspecto ninguém pode intervir directamente.”
C2. Heterodefinição de arte “A sociedade ainda é bastante académica, de certa forma. A arte passa por ser uma peça tecnicamente bem trabalhada, e
esteticamente apelativa.”
C3. Diferença entre artista e artesão “Acho que nem eu sei dizer o que é um artista. Já li sobre artistas autodidactas, sem formação académica e praticaram
peças interessantes. Também não sei bem qual a fronteira entre as duas actividades. Muitos artistas vão buscar ao
artesanato a inspiração estética e a técnica para as suas peças e vice-versa. Os papéis estão interligados.”
C4. Heterodefinição de artista “A sociedade aceita/considera alguém como artista quando este tem as aptidões técnicas e estéticas para produzir peças
apelativas (mesmo que seja para um público reduzido).”
C6. Diferença entre artista profissional e “A diferença está na experiência que teve ao longo do tempo, e acima de tudo como é que agarra nessas experiências e
artista amador continua a inovar e a criar.”
C6. Instâncias legitimadoras
C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “Julgam sempre que um artista teve um passado próspero.”
C7.2. aspeto físico e indumentária “O artista, por ser visto como um excêntrico, acham que se veste de forma pouco convencional. Hoje em dia, temos
artistas com um aspecto regular, um par de jeans e uma camisola branca. Acho que a diferença que marca nas pessoas é
com a sua personalidade.”
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Em geral o artista deve, dependendo do público, dar uma boa experiência ao público. Muitas vezes, e quando as regras
estabelecidas não são cumpridas, a relação não sai bem vista.”
C7.4. relação com o dinheiro “A sociedade ainda acha que é uma actividade barata, com recursos baratos, e por isso o artista não recebe muito. A
realidade não é assim.”
C7.5. relação com a espiritualidade “Influencia bastante, definindo muitos dos caminhos e opções temáticas do artista. Muitos artistas são religiosos e só
abordam esse tema. Outros são contra e tentam criticar a espiritualidade.”
C7.6. importância da idade “Ambos são vistos de formas distintas: o mais novo como tendo um olhar mais fresco, o mais velho como tendo um olhar
mais experiente.”
C7.7. importância da fama e/ou do “Muitas vezes isso significa, de certa maneira, prosperidade. Conheço muitos artistas que trabalham por sua própria conta
reconhecimento e que se mantêm na sombra. E temos o caso da Joana Vasconcelos, que tem um trabalho mais internacional e exposto.
Nesse aspecto também depende se o artista quer ser exposto desta maneira.”
C7.8. outras características associadas “A sociedade criou a imagem de uma artista louco, excêntrico e temperamental. Muitos artistas, no passado, tinham
acções mais espontâneas e ainda hoje alguns as têm. Mas um artista é um indivíduo que tem a sua própria personalidade.
Não sei se ainda existe efectivamente esse estereótipo.”
C7.9. ser diferente “Ambos: é igual porque participa na sociedade; é diferente porque o artista tem um olhar mais atento sobre as coisas e isso
permite-lhe reflectir sobre o que se passa.”
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
168
O “mundo de aventura” do artista

C8.1. processo de criação da obra de arte “Infelizmente ainda acham que a criação é sempre algo repentino. As peças, mesmo que tenham uma perspectiva pessoal,
que reflecte emoções, têm sempre um grande trabalho conceptual por trás, e muitas vezes isso não é lido pelo público.”
C8.2. funções da obra de arte “Não sei responder bem a esta pergunta porque ainda hoje a definição de obra de arte está a ser reescrita. Mas na sua
essência, a obra não deve ter uma função prática activa, senão não é obra de arte, é uma ferramenta.”
C8.3. obra de arte: talento ou “Resulta do talento/dom e da aprendizagem. Acho que esta dupla de palavras anda sempre de mão dada. Há que gostar
aprendizagem daquilo que se faz (talento/dom) e de saber como se faz (aprendizagem).”
C8.4. obra de arte como liberdade de “Sim, para manifestar e criticar a sociedade, para documentar acções. Enquanto manifestação e crítica, pode ser uma
expressão e/ou instrumento político ferramenta muito poderosa.”
C8.5. importância dos números (de “Um artista que queira mais exposição quer ter mais números [de vendas, de visitantes na exposição] do que aquele que
vendas, visitantes, entre outros) prefere algo mais independente.”
C8.6. importância do público “A obra pode ter dois tipos de fim: uma exposição individual, onde a peça reflecte sobre as acções do artista e onde o
público apenas aprecia; ou pode ter um público específico para ser apreciado.”
Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “Esta relação depende da vontade da exposição do artista. E nesse aspecto pode ser benéfica para ambas as partes a
publicação de artigos.”
D2. visão do setor “Costumo ler com alguma regularidade e acho que hoje temos críticas cada vez mais isentas. Ainda que devamos pôr
claro as opções pessoais de cada crítico.”
D3. artista ou obra “Ambos. Todos os elementos são importantes e os media em Portugal dão importância a todas as partes.”
D4. arte nacional e arte internacional “O destaque [da arte portuguesa] nos media nacionais está a crescer cada vez mais.”
D5. experiência com os media “Não, não fui.”

169
O “mundo de aventura” do artista

170
O “mundo de aventura” do artista

Anexo 2E. Grelha de análise horizontal das entrevistas semidiretivas

Grelhas de análise vertical das entrevistas semidiretivas

CATEGORIA TRANSCRIÇÃO
Entrada no mundo das artes
A1. Despertar do interesse pelas artes “A primeira lembrança que eu tenho é da escola primária. Dizia: “Quero ser desenhador!”.” (E1)

“O despertar pelas artes foi tardio, tomei este caminho por uma mera “aposta” com um professor de Educação Visual, em
que lhe disse se ele me desse nota cinco no final do período, eu seguiria Artes, caso contrário ia para Humanidades. (…)”
(E2)

“Não há um momento. Isto é, começa-se a fazer é por brincadeira, depois é por gosto, depois talvez seja mais aquilo de
nos pôr sempre à prova, de estar a testar-nos, a querer fazer mais (…).” (E3)

“Desde pequena que sempre gostei muito de desenhar e pintar. (…)” (E4)

“A minha infância foi pautada pelo desenho, pelos trabalhos manuais, bordados, costura, etc. (…)” (E5)

“Lembro-me que em miúda pintava e desenhava imenso, adorava legos e cores, já tinha um sentido para a criatividade e
era muito curiosa em relação ao mundo. (…) ”(E6)

“(…) sempre manifestei interesse desde pequena (…) Desde que me lembro de mim que gosto de “fazer”(…)” (E7)

“(…) Desenhava muito, lembro-me que quando era miúdo vendia desenhos a cem escudos. (…) As pessoas sempre
disseram: «Ai que este menino desenha tão bem!» (…)” (E8)

“Desde pequeno tive vontade e aptidão para o desenho, e esse gosto acompanhou-me sempre até aos dias de hoje.” (E9)

“O interesse surgiu no ensino básico, com a disciplina de EVT.” (E10)


A2. Influências “(…) uma professora do Secundário foi uma grande influência, pois era extremamente competente, não só pelo facto de
fazer muitos exercícios técnicos, mas também porque nos levava todos os anos ao Porto e ao festival de animação em
Espinho. (…)” (E1)
171
O “mundo de aventura” do artista

“Inicialmente o tal professor de Educação Visual que me direccionou para as artes, mas no Secundário tive a professora de
Geometria que tirou Pintura na ESBAP (actualmente FBAUP) e que me colocou em contacto com artistas impressionantes
e técnicas fabulosas.” (E2)

“O meu irmão era mais velho que eu quatro anos e é mesmo aquela coisa de uma pessoa seguir o mais velho. (…)” (E3)

“Não houve nenhuma figura em particular. Alguns professores de desenho incentivaram-me a seguir este caminho, porque
sempre gostaram do meu trabalho, e claro que isso foi importante.” (E4)

“A minha mãe tinha mão para o desenho e muita criatividade. (…)” (E5)

“(…) o meu irmão mais velho (…) oferecia-me brinquedos, livros e música, o que reforçou a minha tendência criativa.
(…)” (E6)

“Ninguém em específico, mas desde nova que passei a admirar, principalmente, músicos.” (E7)

“O meu pai é decorador e sempre tive aquela coisa com as artes (…).” (E8)

“Talvez o meu tio, pois era o único ligado às artes, e o único que me incentivava a desenhar e a colorir os habituais “livros
de pintar”.” (E9)

“Família e professores. Interessava-me pelos livros que lia sobre o assunto.” (E10)
A3. Relação da família com as artes “Os meus pais não são ligados à arte” (E1).

“Tenho dois irmãos mais velhos que eu, ambos estiveram ligados às artes no Ensino Secundário. (…) Um deles teve
ligação às artes gráficas (…).” (E2)

“Não, não. Não tenho artistas na família.” (E3)

“Não tenho nenhum artista na família, mas isso até me dá mais vontade de ser a primeira.” (E4)

“Tenho uma irmã, mais velha dois anos, com bastante jeito para o desenho e trabalhos manuais, que frequentou, também,
a Escola Aurélia de Sousa. Tenho outro irmão quando jovem ainda pensou fazer Belas Artes, mas acabou por fazer
Engenharia Civil. O meu filho também tem jeito para o desenho, chegou a frequentar, por iniciativa própria, a Escola
Soares dos Reis, mas desistiu. Desde sempre teve gosto pela música, tem uma banda onde canta, escreve as letras e
compõe musicalmente, paralelamente tem uma vida profissional para lhe garantir independência monetária.” (E5)

172
O “mundo de aventura” do artista

“Só costumam frequentar as festas tradicionais e populares.” (E6)

“Não tenho artistas na família.” (E7)

“Há uma grande distância entre o que ele [pai, decorador] faz e o que eu faço. Mas talvez a minha cultura visual tenha
surgido aí.” (E8)

“Apenas o meu tio que pintava esporadicamente, penso que foi a única ligação, pois não tenho mais ninguém na família
com essa orientação.” (E9)

“Não, não tenho artistas na família.” (E10)


A4. Hábitos culturais e artísticos na “De pequenino? Não, nada! (…) A partir do décimo ano é que comecei a ir visitar museus no Porto, teatros…” (E1)
infância/juventude
Raramente, os meus familiares visitaram esta última exposição em que participei, mas nada mais.” (E2)

“Por acaso, no meu caso, não. Sempre fui uma pessoa que os meus museus foram dos livros (…).” (E3)

“Costumava ir mais com os meus amigos.” (E4)

“[mais nova] somente por iniciativa própria. (…)” (E5)

“Não tínhamos o hábito de frequentar museus ou qualquer tipo de eventos artísticos. Mais tarde, em adolescente, passei a
explorar fora do ambiente em que tinha crescido em garota. (…)” (E6)

“Nem por isso. Em família só começamos a frequentar esses locais por influência minha e mais recentemente.” (E7)

“Quando era miúdo praticava muito desporto e posso dizer que só no meu 9.º ou 10.º ano é que entrei pela primeira vez
num museu.” (E8)

“Raramente frequentava.” (E9)

“Não.” (E10)
A5. Reação de familiares e amigos “Os meus pais concluíram o 4º ano e nunca me obrigaram a ser médico ou seguir o que eles queriam, portanto,
provavelmente não era a área preferida deles, mas conseguem compreender o que eu estou a fazer, e deram sempre
apoio.” (E1)

173
O “mundo de aventura” do artista

“Foi algo muito desinteressado, apenas informei que queria tirar este curso e que já sabia que não era em termos
profissionais o que desejavam, então os meus familiares apenas disseram “Ok!” e não ligaram muito. Actualmente, ligam
mais, uns gostam de me ver a expor. Outros familiares apenas acham que é um incómodo imenso que coloco sobre os
meus pais, pois preciso do meu pai para levar as obras aos locais…” (E2)

“No meu caso, foi uma coisa tão natural que eu acabei por arranjar emprego logo aos 17, 18 anos e consegui conciliar a
vida artística com a vida, se é que se possa chamar assim, profissional. (…) não houve essa tal situação de conflito (…).”
(E3)

“Sim, foi uma decisão tranquila para eles. No entanto, no início estavam com um bocado de receio por causa das saídas
profissionais. (…)” (E4)

“Foi uma decisão com muito apoio familiar, marido e filhos.” (E5)

“Ninguém se opôs. O facto de ter sido a única da família a acabar o Secundário e ter conseguido entrar para a Faculdade
foi um marco.” (E6)

“Sim, os meus amigos nunca se opuseram, nem mesmo a minha família. Sempre me apoiaram porque sempre viram que,
de facto, era o que mais me completava e me dava prazer. Nunca vieram com a história do “isso não dá nada, não serve
para nada, porque não dá dinheiro”. Claro que tenho que lutar porque não tenho pais ricos, mas a realização, para eles, e
para mim, está acima de tudo.”(E7)

“Nenhum dos meus pais apoiou esta minha decisão. Tornou-se uma barreira na relação entre mim e eles (…). A minha
mãe queria que eu fosse médico. Mas não é para ganhar rios de dinheiro que eu quero estudar.” (E8)

“Sim, foi pacífico. Posso dizer que tenho pais bastante liberais.” (E9)

“Sim, foi uma decisão pacífica. Apoiaram-me.” (E10)


A6. Autolegitimação enquanto artista “Sim! Vá, sou um jovem artista, porque já estou dentro de alguma coisa, mas considerar-me “aquele artista” ainda não.
Precisas de muita maturidade (…).” (E1)

“Ainda me sinto como estudante e não uma artista completa, mas já me vejo como artista, mais do que via quando iniciei
o curso.”(E2)

“É assim, eu considero-me artista, porque ninguém faz um curso de artes plásticas se não se considera artista. Agora há a
questão se me considero um grande artista ou se me considero um fraco artista. Agora, considero que sou um artista que
ainda tenho um grande caminho para percorrer, só isso.”(E3)

174
O “mundo de aventura” do artista

“Não é por estar licenciada em artes plásticas (…) que sou uma artista. Ainda estou no primeiro degrau, para chegar ao
último é preciso muita experiência, muito amadurecimento. (…)” (E4)

“Ainda não me habituei à ideia de ser uma artista (…).” (E5)

“Prefiro pensar que sim, pelo menos sinto que o sou. (…)” (E6)

“Considero-me aspirante a artista. Artista serei se continuar o meu percurso, trabalhando nesse sentido e conquistando
obra, seja dentro das artes plásticas ou da música. Licenciar-se em Artes Plásticas não nos torna artistas, de forma alguma.
(...)” (E7)
“Normalmente não digo que sou artista, por isso nunca recebi comentários. (…) Mas uma vez, um curador brasileiro
(Fernando Cocchiarale) perguntou-me se era artista e eu disse que sim, mas que ainda tinha muito que crescer. Ele ficou
impressionado com a minha determinação e disse que crescer é preciso sempre e que era bom eu ter essa
consciência.”(E7)

“Se me perguntares se o que eu faço é arte, eu quero acreditar que sim. (…)” (E8)

“(…) como designer não me posso intitular artista, pois respondo a um problema como outra pessoa qualquer, apesar de
criar uma obra também.” (E9)

“Não, não me considero artista.”(E10)


Escolaridade, formação e profissão
B1. Avaliação do ensino artístico em “Eu acho que o Ensino Secundário está muito mal feito porque quando vais para Artes tu não sabes que vais para Artes,
Portugal ou melhor, tu não sabes o que é arte, tu gostas é de desenhar. (…) Mas nós só temos real noção da arte quando chegamos à
Faculdade. (…)” (E1)

“Creio que falta Portugal ter atenção ao valor das artes desde cedo. Em Espanha, e não só, os meninos vão desde a pré
escola ver exposições, e está cientificamente provado que todos o que o fazem acabam por se tornar, não mais
inteligentes, mas com capacidades diferentes e mais avançadas que os que não o fazem.” (E2)

“(…) nós começamos a ver que aquilo que tem havido até agora (…) não foi pensado. (…) estamos a ter cérebros a mais.”
(E3)

“O que dificulta o nível de formação dos alunos em Portugal são as más condições das escolas e das faculdades. As
escolas não têm espaço nem equipamento necessário para as necessidades dos alunos. Nas faculdades isso também
acontece, o que leva a que optemos por projectos mais pequenos e que exijam poucos recursos.” (E4)

175
O “mundo de aventura” do artista

“Achei a escola profissional onde andei com um nível muito bom (…). Relativamente à FBAUP, tem uma boa oferta
formativa, (…) assim como bons professores.” (E5)
“A tendência é direccionar os jovens para letras ou ciências. O português e a matemática são importantes para a vida
prática, mas o indivíduo é composto, também, por “alma”. (…)” (E5)

“É preciso ter fé. As artes continuam a ser amadas por uma minoria e desprezadas no geral pelas entidades que governam
o país (cortes nos orçamentos, nos subsídios, encerramento de estabelecimentos culturais, etc.). As artes continuam a ser
consideradas inúteis porque não se compreende a importância que tem para a sublimação mental e sensorial do ser
humano. (…)” (E6)

“Acho a oferta formativa muito precária até ao 10º ano de escolaridade. (…) acho que devia ser dado um apoio à
formação do estudante muito maior no campo das artes em geral. A cultura geral artística de quem não frequentou cursos
de artes é assustadora (…).” (E7)

“(…) Acho que tudo devia começar desde cedo. A sociedade tornava-se melhor. Estudar arte na sua base como cultura
geral de qualquer cidadão, tal como se estuda matemática ou inglês. (…)” (E7)

“Mesmo que em pequeno te levassem a museus, tu ias questionar-te? Ias para casa pensar sobre isso? Não me parece. (…)
Não é a formação que é má, o momento é que nem sempre é o certo. (…)”(E8)

“A minha experiencia pessoal foi boa, mas acredito que poderia ter sido melhor, ou pelo menos podia ter tido um
acompanhamento desde mais cedo, para desenvolver aptidões nesse ramos muito mais direccionadas do que apenas livre
vontade.” (E9)

“[A oferta formativa em Portugal é] interessante, pelos vários cursos que envolvem cada vez mais áreas para além das
artes e promovem a actividade interdisciplinar”(E10)
B2. Avaliação da importância de uma “(…) porque não tinha família na área, nem amigos nem nada e portanto a única maneira de me inserir no mundo da arte
formação artística especializada era seguir a licenciatura e aprender mais alguma coisa.” (E1)

“Creio que um artista não se pode medir pela formação académica que tem, apenas só esta formação não dignifica um
artista, ou não faz um artista ser melhor que outro (…).” (E2)

“(…) Houve duas exposições que (…) foram buscar artistas do norte com curso. Os artistas do norte que não tinham curso
não são artistas. Portanto, eu comecei a ver que aquilo que eu estava a fazer, o meu trabalho, não estava a ser reconhecido
por causa de um canudo de doutor. (…)” (E3)
“Ninguém pode dizer que vem para uma faculdade (…) e que tenha entrado e tenha saído de igual maneira. (…) aprendi

176
O “mundo de aventura” do artista

muitas coisas. Ganha-se uma confiança maior naquilo que estamos a fazer.” (E3)

“A partir do momento em que encaro o meio artístico como algo sério e que me irá acompanhar a vida toda, penso que é
necessário especializar-me. (…) e é importante conviver com pessoas que já estão neste meio há muito tempo. (…)” (E4)

“Pessoalmente foi importante, senão fundamental, para a minha formação como artista, tanto em conhecimentos teóricos
como na aprendizagem técnica. (…) Ao mesmo tempo os conhecimentos são certificados. Na nossa sociedade são muito
importantes os diplomas. (…) Não só se é levado mais a sério, como poderá ser a única forma de se poder entrar no
“mundo da arte” reconhecido. Embora existam casos de autodidactas bem-sucedidos.” (E5)

“[optou por seguir o ensino artístico] Para obter conhecimentos teórico/práticos que correspondessem às minhas
ambições: desde o reconhecimento, interacção social e o factor económico.” (E6)

“No meu caso, a minha formação artística despoletou as minhas capacidades artísticas e provavelmente nunca teria
chegado ao mesmo ponto de formação se tivesse sido autodidacta. Ainda que o seja com a música. Mas nas artes plásticas
considero o meu percurso académico ter sido fundamental, principalmente porque me permitiu encontrar colegas e
professores, ainda que poucos, que me fizeram crescer em todos os sentidos na minha vida profissional e não só. Criou-me
oportunidades, ainda, sim.”(E7)

“Gosto muito da ideia do autodidata. Sou muito apologista disso, adoro sê-lo. Mas há coisas que tu não aprendes sozinho.
(…) E hoje em dia, um curso dá-te outro estatuto lá fora. (…) Mas também não é isso que te vai fazer ser mais exposto
que um amador, vai também do teu portfólio. (…)” (E8)

“A minha área profissional está dividida entre o desporto e o design, mas falando do design, essa é a base do meu
trabalho. Sou freelancer e faço exactamente o que estudei. (…) As fracas opções que temos sem especialização levaram-
me a investir nesta formação.”(E9)

“(…) ainda não sei responder bem a esta pergunta.” (E10)


B3. Expetativas profissionais “(…) o meu sonho passa logo por sair de Portugal. Esquece, Portugal não. Não consegues. Ou tornas-te Joana
Vasconcelos, tens já dinheiro ou esquece, não dá. (…) Ou então tens já de conhecer as pessoas certas e inserires-te em
círculos, ires para Lisboa, (…) de todo não podes ficar no Porto. Para seres um artista profissional precisas de trabalhar
muito, seres convicto e seres bom. E seres bom não é só pintares bem.” (E1)

Para já não. Espero conseguir um dia!” (E2)

“(…) viver da arte, pode-se viver. Agora depende da maneira como tu queres viver. Se tu queres ter uma vida estável, se
queres ter um carro, uma casa, quer dizer, não podes viver só da arte. Tens de ter um vencimento que pague essas

177
O “mundo de aventura” do artista

despesas. Tu da arte podes vender muito hoje e amanha não vendes nada. Agora, tudo é um risco, é uma opção. Eu
conheço muitos artistas que tiveram de sair de Portugal. Não quer dizer que também não se possa viver da arte aqui em
Portugal! Vive-se, mas não é para toda a gente.” (E3)

“Hoje é muito difícil viver-se só da arte. Não sei se algum dia vou conseguir.” (E4)

“Ainda é cedo para fazer essa avaliação. No entanto, devido à situação económica que vivemos e ao país que somos (…),
acho difícil viver exclusivamente da arte.” (E5)

“Não, mas ambiciono viver daquilo que faço.” (E6)

“Para já não consigo [viver da arte], minimamente, mas espero conseguir, sim.” (E7)

“Não quero levar isto como uma profissão, quero levar isto como um estilo de vida. (…) E depende da cabeça que tiveres.
(…) Há uma quantidade estúpida de pessoas que o querem [ser artistas], mas essa quantidade não revela qualidade, não
revela vontade, dom, talento, o que queiras chamar de mito, porque é mito! Eu não sou a pessoa que desenha melhor aqui
dentro, mas ser artista não é só desenhar.” (E8)
“Se eu me for a questionar todos os dias sobre isso, o mais certo é daqui a um mês já estar no manicómio! Eu sei que as
coisas se pagam, mas eu não consigo viver assim. (…) Eu não me consigo imaginar a fazer outra coisa. (…) precisas de
cunhas, às vezes. E ser bom não é achares que és o melhor, tens de ser bom mesmo. (…) Nem que tenha de arranjar
qualquer coisa dentro da área e vou fazendo o meu trabalho na área. Se tudo correr bem pode ser que tenha uma boa
oportunidade. Isto é um mundo de aventura! (…) (E8)

“Como designer, sim.” (E9)

“Ainda não consigo responder com precisão, mas acho que conseguirei.” (E10)
Auto e heterodefinição de arte e de
artista
C1. Autodefinição de arte “ (…) Por um lado é o facto de te fascinares e por outro lado é inserires-te num contexto onde as coisas partem de um
pensamento, (…) é a visão pessoal de alguma coisa e tu queres que ela chegue a alguém. Portanto, o facto de eu fazer uma
peça bonita não é visão nenhuma, não é? Ou seja, é o artesanato. Para ser, atualmente, arte não é só ser algo técnico, tem
de haver conceito. (…)” (E1)
“Mas é muito difícil justificar o que é a arte, nem os artistas sabem.” (E1)
“Há áreas que toda a gente sabe que são arte: a música, o cinema, a dança, as artes plásticas…Mas até que ponto é que a
arquitetura, por exemplo, é arte? Tem de haver um grau de exigência…” (E1)
“Há design que é arte e outro que não é arte. Quando é que ele é arte? Quando passa o grau de normalidade, acho eu. Está
tão bem feito, que é arte. Não é artes plásticas, é outro tipo de arte.” (E1)

178
O “mundo de aventura” do artista

“(…) Na minha opinião, tem que haver mais do que a técnica, tem sempre que haver a conjugação do que é a técnica com
o que é a conceptualização. (…) a mensagem (…) existe e permanece em tudo que é obra de arte. Esta mensagem que
revela um pedaço do autor/artista (…).” (E2)

“Para mim, uma obra de arte é aquilo que, naquele momento em que eu esteja a fazer uma obra, eu considere arte. (…)
Arte, acho que não tem uma definição certa. (…) Eu posso algo considerar arte conforme a educação, a formação, o
espaço onde estou inserido, é (…) o meu “eu” (…). Mas também há conhecimento geral (…) Há determinadas regras que
estão estabelecidas. (…)” (E3)

“Arte para mim é a alma do artista. Quando um trabalho espelha a sua alma, a sua paixão, a sua dedicação, isso para mim
é arte. Agora quando uma obra tenta apenas entreter o público, quando o seu interior é vazio (…) então mais vale estar-se
quieto.” (E4)

“Para mim, a arte é algo que causa emoções. Uma obra de arte deve prender o olhar do espectador, ser original, ser
invulgar. A fronteira entre o que pode ser considerado arte ou não vê-se quando a arte ultrapassa a linha do absurdo. Acho
que a arte deve ter limites morais e éticos, embora se faça de transgressões. (…) Vejo a arte como um processo de
comunicação: permitir à vida intervir na arte e a arte intervir na vida. Acho que a arte não deve ser utilitária, mas sim
participativa.” (E5)

“(…) não tenho uma fórmula para produzir arte. Acontece por resultado de uma emergência interior que quer existir cá
fora. Seja intuitivo ou intelectual, nada acontece por acidente. O meu objectivo é partilhar, interagir a partir de aspectos
sensoriais que causem impacto nos outros. Parte do íntimo para o público.” (E6)

“(...) Não há definição concreta e existem tantas respostas quantas pessoas a quem fizeres a pergunta. Para mim, arte é
algo que requer a componente material (…) e que proporciona ao outro emoções, sensações e reflexões, sob um certo grau
de poética. A fronteira entre ser arte e não ser é muito ténue e é, até, subjectiva. (…) Arte não é ciência, nunca foi nem há-
de ser. Essa questão da consideração do que é arte e do que não é, normalmente é feita pelos críticos de arte e galeristas.
(…)” (E7)

“A arte, para mim, é o que procura algo. (…) tem que ser algo que transmita um certo sentimento ao espectador, bom ou
mau. (…) A arte não é arte por entrar no museu. (…) A arte é aquele momento em que tu assumes um compromisso com a
peça que estás a fazer, e essa peça – num momento expositivo, ou não – consegue transmitir esse compromisso ao
espectador. (…) A culinária é uma experiência sensorial.” (E8)
“Para mim, uma boa obra de arte é uma obra que levanta questões, que mexe, não pode ser uma obra insossa.” (E8)

“(…) para mim, arte é uma obra que foi criada com espirito criativo, originalidade e determinação e não algo que seja
produzido em série.” (E9)
179
O “mundo de aventura” do artista

“(…) acho que é a manifestação de uma acção, de uma emoção. Afinal, a força de vontade é aquilo que nos move. Hoje
em dia tudo pode ser considerado arte. Aquilo que é mais importante é a perspectiva pessoal do artista, e nesse aspecto
ninguém pode intervir directamente.” (E10)
C2. Heterodefinição de arte “(…) Como as coisas são feitas não interessa a ninguém. (…) E interessa o preço, mas só interessa se for alto. (…) E a
venda de quadros, actualmente, é o que mexe o mercado da arte. Sei que há pessoas e associações que compram peças de
arte e nem sequer as tiram do pacote. É complicado para os artistas. (…)” (E1)
“Para já passa por não passar por “eu também faço isso”, “o meu filho faz isso”. (…) A sociedade em geral considera arte
as coisas bonitas. Se é bonito, é arte.” (E1)
“(…) são coisas para combinar com os sofás, para combinar com os cortinados. (…)” (E1)

“A generalidade da sociedade não entende muito, revela que apenas o gosto estético está patente nas suas sugestões de
obras de arte, então para realmente “validar” as obras de arte, temos sempre que cair no circulo da elite, uma elite que
percebe, estuda e aprecia a arte, não porque ficaria bem na sua sala de jantar ao cimo da lareira, mas porque vê as
potencialidades da obras no seu todo e num contexto global.” (E2)

“As pessoas consideram algo arte consoante a formação que vão tendo. (…) Quando veem uma coisa que (…) eles dizem
que são gatafunhos, isso para eles não é arte. Há outros que veem nos gatafunhos arte…” (E3)
“(…) quando olham para uma determinada obra de arte, entendem que ali não houve esforço, não houve trabalho.
Portanto, às vezes, nem sempre as obras falam por si. (…)” (E3)

“Eu penso que maior parte das pessoas (…) considera arte aquilo que tem “bom” aspecto. (…) para essas pessoas, os
quadros que estejam bem pintados ou com uma paleta de cores que combina com a sala (…) são arte. (…) Isto é o que a
grande massa pensa. Agora com as minorias (…). Eles procuram descobrir o que está para lá do quadro: todo o
pensamento e preocupações do artista. Avaliam o exterior e o interior para considerarem o que é arte ou não.” (E4)

“Acho que o cidadão comum considera arte quando uma obra o fascina... É difícil para o cidadão comum entender o que
se passa na arte contemporânea. Ver um cão a morrer numa galeria de arte, mesmo que o conceito seja válido, é difícil de
entender onde está a arte. (…) O belo é muito relativo. (…) Acho que a sociedade, em geral, vai atrás do mediático.” (E5)

“(…) No geral, as audiências não têm “instrumentos” para compreender todo o processo em volta das práticas artísticas.
Quando não entendem, surgem comentários deste género: “O meu filho de cinco anos fazia igual!”, ou “Isto não se parece
com nada”, ou então “Não tinha uma coisa destas na minha casa”. No entanto, actualmente, faz-se muita arte efémera em
que não existe um objecto que fique para a perenidade como, por exemplo, algo que seja comestível. O que fica deste tipo
de prática artística é a marca da experiência no momento que acontece. Persiste a tendência para confundir a obra de arte
com o artista. No geral o público, tem dificuldade em separar a produção do produtor. Apesar de ser um comportamento
errático, compreendo essa ligação que fazem com a obra e o autor, esse comportamento revela o poder sensorial e

180
O “mundo de aventura” do artista

imediato das obras de arte, são tomadas como parte do mundo real e têm uma força dialogante que pode provocar
transtorno e, quando isso acontece, o autor é o primeiro alvo. (…) todas as interpretações são individuais. O próprio artista
torna-se ele mesmo o espectador do seu trabalho. A apreciação das obras de arte provém das elites da arte capazes de
compreender o que se encontra por detrás da superfície das produções.” (E6)

“A generalidade da sociedade considera arte a arte do renascimento até ao modernismo e trabalhos actuais realizados por
artistas-ou-não contemporâneos, cuja aparência se assemelha à arte da época passada. Normalmente, são pessoas mais
velhas ou com uma fraca ou inexistente ligação ao meio da arte que consideram o que acabei de falar. Depois também há
quem considere o fim do modernismo, os Picassos, os Dalis, e esses ícones mais influentes. E agora também temos a
Joana Vasconcelos a bombar nos olhos de muita gente. De qualquer forma, existem várias pessoas, não a generalidade
populacional, claro está, que consideram arte também o que existiu no século XX a partir dos anos 40/50 e o que existe
agora no século XXI: a arte contemporânea. A questão é que a maior parte das pessoas ficou na era moderna. Em termos
artísticos e não só.” (E7)

“A minha resposta vai desiludir-te tanto… Joana Vasconcelos! (…) falas com o cidadão comum e ele adora o trabalho
dela, tens a cultura visual. É uma coisa que é bonita e a arte, muitas vezes, não tem que ser bonita. Se houvesse tópicos
para a definição de arte para o cidadão comum, seriam: Mona Lisa, Joana Vasconcelos e Cristiana Ronaldo. Toda a gente
já ouviu falar da Mona Lisa e leu o livro do Dan Brown, “O Código da Vinci”, o Cristiano Ronaldo é uma obra de arte
viva e a Joana Vasconcelos é tipo o top português. (…) Chamar “arte” a alguma coisa é muito complicado e aborrece-me
quando as pessoas chamam arte a tudo. Não estou a dizer que o que ela faz não é arte, mas é arte que o povo gosta. Ela
tornou-se uma figura pública. (…) As pessoas têm um vício, que é a televisão, e esse vício fornece o que elas querem
ver.” (E8)

“Gosto pessoal apenas. É uma educação que pelo menos cá não existe.” (E9)

“A sociedade ainda é bastante académica, de certa forma. A arte passa por ser uma peça tecnicamente bem trabalhada, e
esteticamente apelativa.” (E10)
C3. Diferença entre artista e artesão “O artista trabalha sobre o que está à volta dele, tenta perceber como é que a sociedade funciona. (…)” (E1)
“O artesão prende-se com o fazer técnico de coisas bonitas, o fazer técnico de coisas dentro da cultura popular, bem feitas.
E o artista…(…) há uma ideia, há um conceito, há um inserir num contexto cultural contemporâneo, enquanto um artesão
não tem qualquer noção de arte (…)” (E1)

“Artista não é aquele que apenas sabe como produzir através da técnica, é aquele que vai para além disso, sabe a técnica e
sabe utilizar todos os meios a seu favor, tem uma certa bagagem de conhecimentos que permitem validar tudo o que
produz, não só em termos técnicos como também em termos teóricos e conceptuais. Artesão limita-se a produzir coisas
que viu em técnicas que conhece. Artista tem sempre algo de inovador naquilo que produz. (…)” (E2)

181
O “mundo de aventura” do artista

“Pode dizer-se que a primeira vez que uma pessoa se considera artista é quando uma pessoa se expõe ao público. É
quando uma pessoa se expõe à crítica do público. É aceite ou não é aceite. (…)” (E3)
“(…) uma obra é única. Se essa obra é única, o artista também tem de ser único. Não podem ser todos a pensar da mesma
maneira (…). E até é bom uma pessoa não ter contactos com a arte (…) antes de entrar para as faculdades, que é para não
entrarmos na cena do formatado.” (E3)

“Um artista é uma pessoa que vive no limiar da felicidade extrema e do esgotamento. Vive num turbilhão de ideias e
procura encontrar maneira de expressá-las. Cada vez mais o artista aproxima-se do artesão porque sente a necessidade de
ser ele próprio a construir aquilo que idealizou. No final, o artista acaba por ter um conhecimento sobre todos os meios
artesanais.” (E4)

“O artista pensa a arte. Criar arte é diferente de produzir objectos mecanicamente (…).” (E5)
“São e foram as instituições de arte que intercederam nesta separação de arte e artesanato. (…)” (E5)

“O artista reinventa e transforma. O artesão segue o mesmo padrão repetidamente de forma automatizada.”(E6)

“Um artista é alguém que pensa e é capaz de transportar para o mundo material pedaços da sua existência. O artesão é
alguém que faz, o artista é alguém que pensa, podendo fazer ou não. O artista tem sensibilidade estética e oferece motivos
aos fruidores para pensar, sentir e imaginar. O artesão produz materialmente, desprovido de emoção universal,
concentrando-se no acto do fazer, não deixando espaço na “obra” para o outro se sentir. A arte é comunicante. O
artesanato é, maioritariamente, um veículo para o adorno e a decoração.” (E7)

“Eu tento sempre ser eu a fazer tudo. Mas não te vou dizer que não existe gente, até artistas de renome, que têm os seus
ateliês e as pessoas a trabalharem lá. (…) Mas e porque não considerar um artista um artesão e vice-versa?” (E8)

“Artesão é aquele que cria como forma de sustento, produz em série.” (E9)

“Acho que nem eu sei dizer o que é um artista. Já li sobre artistas autodidactas, sem formação académica e praticaram
peças interessantes. Também não sei bem qual a fronteira entre as duas actividades. Muitos artistas vão buscar ao
artesanato a inspiração estética e a técnica para as suas peças e vice-versa. Os papéis estão interligados.” (E10)
C4. Heterodefinição de artista “As pessoas têm um bocado a ideia do artista romântico, aquele do devaneio, ou o muito romântico no sentido de as
coisas aparecem na cabeça e faz, não quer saber de regras, não precisa de dinheiro, é drogado e relaciona-se com muitas
raparigas. É o Don Juan… ou então é gay!” (E1)

“Na generalidade, a sociedade considera artista todos aqueles que produzem algo que eles próprios não conseguem
produzir. Mas creio que cada vez mais se poderá ver que as pessoas ficam mais atentas a estas questões quanto mais
lidarem e entrarem no mundo artístico.” (E2)

182
O “mundo de aventura” do artista

“(…) há muitos tipos diferentes de público e de pessoas que compram arte. Há pessoas que compram porque gostam. Há
pessoas que compram porque ficam bem com as cortinas. Há pessoas que compram porque houve alguém, foram-se
informar, alguém que percebe em termos de arte e disse “Afinal aquela pessoa foi aconselhada, vale a pena investir!”.”
(E3)

“Eu penso que a generalidade das pessoas considera este ou aquele artistas consoante se o trabalho deles “enche os olhos”
ou não. A maioria das pessoas não procura perceber o que levou o artista a criar algo desta maneira ou daquela maneira.
(…) o que importa é o exterior. Tem que ser bonito, parecer minimamente real, e o tema tem que ser fácil (se forem
naturezas mortas, melhor). Se fizeres isto, então és um artista.” (E4)

“Quando um nome é ligado a várias obras e reconhecido pelas instituições e pela própria sociedade. (…) acho que os
media têm uma grande responsabilidade na promoção de um artista, quando o artista é manchete.” (E5)

“Dizem que fazemos coisas estranhas. Mas acho que apreciam isso, acontece-me muitas vezes reagirem de forma
desconfiada, mas a partir de momento que revelamos que somos artistas ficam à vontade.” (E6)

“Quando aparece na televisão e nos jornais.” (E7)

“As pessoas normalmente pensam que os artistas são excêntricos. Alguns até são bem calados, ficam na sua vidinha e até
trabalham melhor sozinhos! Há peças que mostram que os artistas são pessoas muito plásticas, há outros muito certinhos e
muito rigorosos…” (E8)

“O gosto pessoal. Isto se a pessoa gostar do quadro ou reconhecer alguma técnica. Caso contrário é mais uma vez a frase
“até eu fazia isto”.” (E9)

“A sociedade aceita/considera alguém como artista quando este tem as aptidões técnicas e estéticas para produzir peças
apelativas (…).” (E10)
C5. Diferença entre artista profissional e “(…) Podemos considerar artistas profissionais aqueles cuja ocupação é ser artistas, porque há muito poucos cuja
artista amador profissão é ser artistas, apenas.” (E1)

“Um profissional aprende que não se deve colocar tudo na obra para que ela funcione. Um amador tem a tendência de
colocar tudo o que aprendeu para mostrar virtuosismo.” (E2)

“Nós temos, na história da arte, muitas pessoas que foram amadores (…).” (E3)
“Um artista amador é um artista que ficou ali pelo chão.” (E3)
“(…) O amador tem de se adaptar muito às necessidades do mercado. O profissional já tem uma liberdade maior, por um

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O “mundo de aventura” do artista

ponto de vista. Por outros pontos de vista, há pessoas que já esperam desse profissional determinado trabalho, isso
também o prende. Já criam expectativas.” (E3)

“A sua formação académica, a sua experiência, a sua cultura visual, o seu pensamento.” (E4)

“(…) É o desenvolver de uma prática com empenhamento, com base em conhecimentos teóricos e práticos, o que é igual a
uma boa formação; ser bem sucedido e reconhecido, o que é igual a conseguir viver da arte.” (E5)

“O método de trabalho e o respeito com quem se trabalha, disciplina, responsabilidade, cumprimento de horários de
trabalho, fazer bem o seu trabalho, levar isto com seriedade, ser generoso com o seu trabalho, isto faz de alguém um
profissional.” (E6)

“Não há artistas profissionais nem artistas amadores. Há artistas e todas as outras pessoas. Artesãos, tocadores de guitarra,
críticos, professores, historiadores, etc.” (E7)

“Para mim um trabalho de um amador é tão legítimo como o de alguém que tem um mestrado.” (E8)
“Não há uma diferença. O artista é artista quando é aceite pelos seus pares. Não é amador nem profissional, não há um
escalão, isto não é a Primeira Liga do futebol!” (E8)

“O profissional é aquele que vive das suas obras.” (E9)

“A diferença está na experiência que teve ao longo do tempo, e acima de tudo como é que agarra nessas experiências e
continua a inovar e a criar.” (E10)
C6. Instâncias legitimadoras “Para já, quem estudou e quem vem de um contexto inicial ligado à área…” (E1)
“A principal pessoa para te considerar artista és tu. Portanto, o facto de te considerares artista é o que te vai manter vivo.
Os professores não, quer dizer, podem. Podem ser eles porque vão ter alguma influência em ti. (…) o que te vai considerar
artista vai ser o feedback que tu vais ter. (…)” (E1)
“ (…) Portanto, quem percebe de arte são os que se interessam sobre arte (…).” (E1)

“Creio que os professores possam reconhecê-lo, não sei se o fazem. “(…) a meu ver, apenas os artistas devem realmente
ter este peso quanto ao que é ou não uma obra de arte, porque todos podem pensar nestas questões mas são apenas
teóricos e ou nem sequer têm formação para falar do assunto, o artista tem formação e conhece a técnica. Muitos
curadores, etc, irão pensar que o papel é deles, mas a meu ver é dos artistas. (…)” (E2)

“Em termos de curadores, de galerias de arte e tudo, eles é que estão a mandar nesses termos, e críticos da arte (…).Eu
acho que é o tal sistema, o próprio sistema é que dita as leis .(….) eu vejo pelos meus colegas, há aquela preocupação de a
pessoa ser aceite no mercado (…) Os professores também não deixam de fazer parte desse sistema. A faculdade também

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O “mundo de aventura” do artista

faz parte desse sistema, a faculdade está a preparar artistas (…).” (E3)

“O reconhecimento acho que passa por todos, desde os professores até aos críticos, curadores, negociantes.” (E4)

“Quem julga a arte é quem vive no mundo da arte, ou quem vive do mundo da arte. (…) Quando faço referência ao
mundo da arte, refiro-me às instituições, como galerias, críticos, curadores, museus, quem promove concursos onde os
artistas são avaliados e, principalmente, as pessoas que investem em arte. (…) A comunicação social tem um papel
relevante nesse julgamento ao promover, noticiando, as obras dos artistas.” (E5)

“Uma inteira comunidade ligada à arte, desde as academias, instituições... Parte do artista, a priori, definir-se-á si mesmo
como artista e apresentar-se-á como tal. (…)” (E6)

“Os professores, por norma, não se referem a esse tipo de questões porque não lhes compete julgar os estudantes por esses
termos. (…) Têm que avaliar se é um bom estudante, não se é um bom artista. (…) Críticos e curadores, são eles que
acabam por proporcionar o sucesso dos “artistas” ou destruir a sua imagem. (…)” (E7)

“Um artista é artista quando é aceite pelos seus pares.” (E8)


C7. Auto e heteroperceção sobre o
artista:
C7.1. infância “(…) tens sempre recalcamentos, (…) enquanto as outras pessoas se tornam quase psicopatas e por aí fora, os artistas
passam isso para a arte.” (E1)
“O que é o artista? O artista és tu. A tua infância faz parte de ti, a tua vida vai acabar por se refletir na obra. (…)” (E1)

“Acho que a sociedade nem sequer pensa nesta etapa da vida do artista. Para mim, a história do artista, o seu percurso, têm
sempre relação com tudo aquilo que ele faz (…).” (E2)

“Não há um padrão, porque senão todos vivíamos a mesma vida.” (E3)

“A maior parte das pessoas pensa que um artista teve uma infância problemática, daí ter um comportamento estranho e ter
ido para Artes. (…) Eu desenhava as figuras da Disney, fazia desenhos com o meu nome, dançava, cantava, etc. Tive uma
infância completamente normal. Apenas penso que desde pequena sempre tive uma forte ligação com o mundo das artes.”
(E4)

“Alguns artistas poderão usá-la, por isso digo que a infância pode influenciar a obra de um artista. Acho que depende da
vida de cada um, da fase de vida que foi mais marcante. Mas a infância, ou a vida do artista, é apenas um aspecto entre
muitos e muitos outros. (…)” (E5)

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O “mundo de aventura” do artista

“Não é muito diferente das outras crianças. Fui uma criança feliz e livre. (…)” (E6)

“A infância ao artista, na minha opinião, pode ser perfeitamente idêntica à infância de uma pessoa não-artista. (…) Creio
que é na infância que se desenvolve a propensão para um dia se tornar artista (…). Penso que se tem ideia de que os
artistas foram, em geral, crianças tristes ou problemáticas. (…)” (E7)

“A infância é o momento mais verdadeiro que temos na nossa vida. (…) Mas a infância pode definir o trabalho do artista.
Há muita gente que trabalha com essas memórias. Ou até com memórias do que pensa que viveu.” (E8)

“A infância potencia apenas o gosto.” (E9)

“Julgam sempre que um artista teve um passado próspero.” (E10)


C7.2. aspeto físico e indumentária “Não se vestem diferente. (…) O que acontece é que as pessoas talvez não sejam tão preocupadas com a imagem. As
raparigas da minha turma não vão calçar um salto-alto e trabalhar numa oficina de metais, não dá jeito. Não vão com
roupa toda bonita, porque ela vai estragar-se. As pessoas vão para trabalhar, e trabalhar no campo das artes significa,
como um meu professor dizia “pores a mão na porcaria”. É preciso sujares-te. Mas se fores ver os estudantes de Design, já
não tem nada a ver.” (E1)

“As pessoas, praticamente, veem-nos como uns porcos, sujos e mal cheirosos. Quando olham para um designer nunca
expressam este tipo de comentário. Muitos artistas plásticos vestem-se como arquitetos ou designers, apenas a diferença é
que um artista plástico suja demasiada roupa porque realmente trabalha no duro, não brinca com os computadores apenas.
(…)” (E2)

“Eu acho que os meus colegas de faculdade vestem-se de maneira diferente das outras pessoas, mas isso acho que se deve
ao facto de eles não se importarem com o que está na moda, nem quererem copiar o vizinho. Nisto acho que somos
diferentes. Vestimos o que queremos e não nos importamos se os outros gostam ou não, ou se estamos démodé.” (E4)

“Há artistas que sim, marcam pela diferença. Mas não acho que seja uma regra, se fosse havia muitas excepções.” (E5)

“Sem dúvida que alguém que seja tendencialmente criativo o projecta na indumentária. Aquilo que usamos adapta-se ao
nosso espaço de trabalho e vida. Se vou trabalhar para as oficinas utilizo roupa adequada: uma t-shirt, calças desbotadas,
etc. Uso sempre o que me faz sentir confortável sem ter de seguir as regras da moda. Na Faculdade, não temos praxe nem
usamos traje porque defendemos a liberdade de expressão individual, no sentido em que abdicamos do traje igual para nos
expressarmos no nosso próprio estilo. Para nós, faz sentido assim. Os estereótipos são um fiasco!” (E6)

“Essa ideia tanto é válida como não. Há artistas de todos os tipos. Podes olhar para uma pessoa e achar que é artista, como
olhas para outra e achas que é gay. Nem todos os artistas têm altos estilos, nem todos os artistas têm aspectos retro, ou

186
O “mundo de aventura” do artista

futuristas ou desmazelados. Há artistas que passam perfeitamente despercebidos fisicamente no meio da sociedade. Há
artistas que têm vestes próprias para ocasiões especiais e há outros que vestem precisamente o mesmo que vestem num dia
de trabalho (…). É tudo muito variado. Há pessoas com mais “cara de artista” que outras, mas isso é como em tudo.” (E7)

“É mito. Hoje em dia, as pessoas querem ser diferentes. E então isso é mais fácil pela forma de vestir e pelo penteado. Se
calhar, a própria vida também conduz as pessoas nesse sentido. (…) As pessoas de artes vestem-se à vontade e de uma
forma que transmite a sua personalidade e as pessoas acham mesmo que entram na FBAUP e só vão ver pessoas nuas e
orgias nos jardins. Há pessoas normais, há pessoas extravagantes, aqui há de tudo.” (E8)

“Eu sou bastante normal! (…) Acho que os artistas são pessoas normais, apenas com um exterior mais elaborado.” (E9)

“O artista, por ser visto como um excêntrico, acham que se veste de forma pouco convencional. Hoje em dia, temos
artistas com um aspecto regular, um par de jeans e uma camisola branca. Acho que a diferença que marca nas pessoas é
com a sua personalidade.” (E10)
C7.3. relação com a sociedade e as regras “Há artistas que extravasam o que às vezes é considerado civilizado. Para quem vê de fora, quando tu extravasas as regras,
estabelecidas é provocação. O ideal é que faças as pessoas entenderem que as regras não são tudo, devemos pensar para além delas.”
(E1)

“A sociedade vê-nos como transgressores, uns malucos que aqui andam e que na sua maioria só fazem asneiras.” (E2)

“Eu, por exemplo, sou um artista que tenho que me conter em muitas situações porque eu tenho um trabalho, tenho uma
profissão e claro que há maneiras de estar, que há determinados padrões que fazem com que uma pessoa tenha de estar
inserida na sociedade.” (E3)

“Para a sociedade em geral, o artista é alguém que não cumpre as regras, é alguém que não é normal, porque veste-se de
maneira diferente, é maluco, provavelmente também é um drogado e enfim, não vai ter qualquer tipo de futuro.” (E4)

“Acho que o artista é entendido como radical porque rejeita ver a sociedade segundo as regras estabelecidas. A própria
criação rejeita as regras.” (E5)

“Um artista sabe sempre quando deve transgredir, não o faz aleatoriamente, mas sim quando acha que algo precisa de ser
mudado nos standards das convenções e instituições de arte. Não se trata de agredir, trata-se de cooperar com esses meios,
pois são esses meios que suportam os artistas.” (E6)

“A relação do artista com a sociedade em geral é muito variada. Tal como há mil e uma formas e meios de se fazer arte, a
relação entre as duas partes também é variada. A ideia antiga de que os artistas são uns pobres bêbados, malucos, com
ideias maradas, incompreendidos e anti-regras não é mais assim. Certamente que continuam a existir artistas assim, tal

187
O “mundo de aventura” do artista

como existem pessoas assim e não são artistas. Mas existem artistas com formas de pensar muito diferentes e formas de se
movimentarem no mundo e a sociedade muito distintas, por isso não posso considerar que haja maioritariamente um tipo
de relação a destacar. Existem artistas extremamente elitistas, existem artistas que falam com as pessoas do povo, existem
artistas que só fazem obras monumentais de preços exorbitantes, há artistas que se envolvem com as populações e cujas
obras são para ser levadas pelos próprios fruidores (por exemplo, Félix Gonzalez-Torres). Há artistas contestatários, que
manifestam questões sociais, institucionais e políticas (por exemplo, Joseph Beuys). Há artistas que abordam questões
auto-referenciais a sua vida toda (por exemplo, Louise Bourgeois, que olha, a questão da infância. Esta artista tem muito a
dizer sobre isso).” (E7)

“Todos temos os nossos momentos de loucura, momentos menos sãos. Se calhar um artista tem mais à vontade para
demonstrar isso do que uma pessoa que está sentada num escritório, com uma pressão para atingir certos objetivos. Mas
essas pessoas, quando se «passam», «passam-se» de formas muito mais agressivas do que nós. (…) Um artista já tem uma
imagem tão despreocupada e as pessoas já lhe dão tão pouco crédito que nós podemos ter o à vontade e a liberdade que é
assim, podemos chegar à faculdade e deitarmo-nos no chão. Sentar na relva dá má imagem? Mas quem é que estabelece
essas coisas?” (E8)

“Os artistas tendem sempre a fugir das regras para serem considerados artistas, eu não percebo!” (E9)

“Em geral o artista deve, dependendo do público, dar uma boa experiência ao público. Muitas vezes, e quando as regras
não são cumpridas, a relação não sai bem vista.” (E10)
C7.4. relação com o dinheiro “Somos uns pobres! Tu não trabalhas para ter dinheiro, trabalhas para estar bem contigo próprio e, o mais gratificante de
tudo, o tal subir na carreira. O subir na carreira é igual a dinheiro, portanto, tu sobes na carreira para teres dinheiro e para
teres o reconhecimento, para seres ainda mais artista. O único facto que faz com que os artistas precisem de dinheiro é
para criar.” (E1)
“O luxo, ao artista, em geral, quase não diz nada. O luxo para eles é poder viajar, por exemplo, e conhecer, poder
informar-se, poder cultivar-se.” (E1)

“A sociedade acha que somos um bando de pobres que até lixo usamos para produzir. Creio que há de tudo no mundo da
arte. (…) Óbvio que todos os artistas gostariam de vender, porque se ninguém vender como poderá continuar a produzir?
Mesmo fazendo reutilização de materiais há sempre qualquer coisa que temos que comprar e, como bem sabemos, a vida
não está fácil para recebermos esmolas seja por que motivo for.” (E2)

“(…) acho que há um fator sorte, há um fator “cunha”, há um fator de influências, sei lá…há tantos, tantos, tantos fatores
que condicionam a entrada de um artista para o mundo das artes. Mas também há uma parte, que é a principal, que é o
fator económico (…) Todo o artista, antes de ser artista, antes de pensar no dinheiro, já é artista. É claro que sem dinheiro
não se faz nada, não é? Quer dizer, hoje em dia, com esta história dos materiais e essas coisas dos conceitos, uma pessoa
pode pegar até em lixo e fazer obras de arte. (…) Mas tem que se comer, tem que se vestir, tem que se pagar as contas…”

188
O “mundo de aventura” do artista

(E3)

“Eu procuro enriquecer com as minhas obras. Faço (pinto) o que quero. Sei que não agrado a toda a gente, mas a alguns
consigo agradar e vendo as minhas obras. Se eu conseguisse viver só da pintura, era perfeito.” (E4)

“Penso criar pelo mesmo incentivo com que cheguei à arte: realização pessoal e dar um sentido à minha arte. Acho que
depende dos artistas, há artistas fiéis à sua arte, não se importam com o dinheiro, mas há outros artistas que se dão muito
bem no mercado…” (E5)

“Não basta ter vontade de trabalhar e produzir, o investimento económico influencia também a produção artística. Se eu
quero uma peça em ouro e não tenho meios económicos para tal, pinto em tinta dourada, mas estou a ser desonesta com o
meu trabalho. O trabalho fica arruinado. Mas se consigo a peça em ouro e não a consigo vender fico sem meios
económicos para investir numa produção seguinte. Os meios económicos facilitam determinadas produções. Obviamente
não é o mais importante, mas não se pode ignorar o mercado económico das artes. Arte é um negócio. Fazer arte por
paixão é maravilhoso, mas um artista também paga contas.” (E6)
“No geral, os artistas não fazem dinheiro. Podem ter imenso trabalho, mas não recebem muito por isso. Por vezes, nem
chega para pagar as contas. Os bem pagos são uma minoria. Não me queixo, sabia que era assim. É mesmo por amor a
isto. Mas contudo, se conseguir viver do que faço, é juntar o útil ao agradável.” (E6)
“O curso de Belas Artes é um curso extremamente caro, um estudante pobre sem apoio financeiro não tem possibilidades
para concluir uma licenciatura. Quem quer entrar no mundo das artes ou trabalha, ou tem dinheiro. Não basta querer. O
fator económico também influencia as escolhas. É preciso ter coragem para entrar no mundo das artes como pobre e sem
feedback artístico na família (…).” (E6)

“Lá está, há artistas que ligam a isso, há artistas que não ligam a isso. (…) Mas que a maioria dos artistas não é nada rico,
é verdade. As obras podem valer milhões, mas quem os ganha são as galerias e coleccionadores de arte e outras
instituições artísticas, não são os próprios. (…) Há pessoas consideradas artistas, mas que são simplesmente empresárias,
como considero o caso da Joana Vasconcelos. Ou que seja artista, mas é artista pimba. Como temos o Emanuel e o Quim
barreiros, que têm o seu valor, mas dentro da música pimba.” (E7)

“Tens que meter uma coisa na cabeça: não podes entrar no mundo das artes a pensar que vais ganhar rios de dinheiro e
que vai correr tudo bem, que não vais ter obstáculos e que vais vender peças por dez ou 15 mil euros. Isso é uma ilusão.”
(E8)
“O povo não está habilitado para ter noção disso [valor da obra], o povo não se abre a isso nem nós (…) isso ao povo. (…)
Aqui em Portugal falta interesse, talvez porque os próprios artistas, os galeristas, os comissários assim o querem… ou
não!” (E8)
“O verdadeiro artista não é aquele que vive sem dinheiro. Isso é outro mito. E há muita gente que pensa que vai entrar em
artes e ganhar milhões. Isso é mentira.” (E8)

189
O “mundo de aventura” do artista

“Eu faço projectos pessoais por gosto (mas que me podem projectar como designer) e faço trabalhos pagos.” (E9)

“A sociedade ainda acha que é uma actividade barata, com recursos baratos, e por isso o artista não recebe muito. A
realidade não é assim.” (E10)
C7.5. relação com a espiritualidade “A espiritualidade está na base de muita criação artística, no sentido em que é uma coisa que vem de dentro. O próprio
objeto de arte pode confundir-se com um objeto sacro. É um objeto mas, ao mesmo tempo, “Não toques!”. (…)” (E1)

“A sociedade vê-nos como a ateus completos. As pessoas acham que não pertencemos a nada e que não acreditamos em
nada. Para mim, o percurso do artista enquanto ser humano tem sempre relação com o modo de pensar e executar obras,
então a relação espiritual está sempre presente.” (E2)

“Claro que influencia. Tudo aquilo que vamos aprendendo, toda essa aprendizagem e formação que vamos tendo ao longo
da vida, vai-nos condicionando em muitas coisas e a religião, se calhar… temos sempre que levantar questões.” (E3)

“Sim. Mas acho que isso influencia a vida de qualquer pessoa.” (E4)

“(…) Há casos em que é evidente que o artista é influenciado pela sua vida. Mas um artista não é, obrigatoriamente,
influenciado pela sua vida ou problemas pessoais. (…)” (E5)

“Influencia sim, tenho colegas que são movidos pela força espiritual e a transportam para as suas produções. Não o meu
caso, pelo menos não de forma consciente, mas admito que a minha educação católica interferiu nos meus trabalhos. (…)”
(E6)

“Sim, tanto quanto me dou conta, influenciam o seu trabalho como influenciam a sua vida e forma de ver o mundo.” (E7)

“Eu não ligo uma coisa à outra (…). Mas há muitos autores que trabalham a imagem religiosa.” (E8)

“Penso que não [tem relação]. Pelo menos comigo não.” (E9)

“Influencia bastante, definindo muitos dos caminhos e opções temáticas do artista. Muitos artistas são religiosos e só
abordam esse tema. Outros são contra e tentam criticar a espiritualidade.” (E10)
C7.6. importância da idade “É extremamente importante. És artista jovem? Vamos apostar nele, é tipo ações.” (E1)

“A sociedade vai sempre considerar a arte jovem como algo muito infantil ou sem valor. Olham para a arte produzida
pelos mais velhos e, sendo estes mais velhos, assumem que são mais sábios e daí darem mais valor ao que eles produzem.
(…)” (E2)

190
O “mundo de aventura” do artista

“A tendência desta indústria de massas é criar certos focos que naquele momento vão atrair massas, vai ser uma produção
muito fácil, muito rápida, em que se ganha muito dinheiro mas, também que se vai extinguir rapidamente. Isto da ideia do
artista ser considerado grande artista em termos de quando tiver mais idade, é uma questão de percurso. É como tudo na
vida, tem que se passar por elas, tem que se passar esse tempo, esses anos. É como tudo, é como qualquer outra profissão
e eu considero que um grande artista será um artista sempre com o passar do tempo e ele vai sendo grande artista nas fases
que vai tendo.” (E3)

“A idade do artista, geralmente, é sempre um ponto a favor do seu trabalho. Com a experiência e a cultura visual que se
vai ganhando, o trabalho, normalmente, será melhor.” (E4)

“A maturidade pode influenciar a arte, mas não é obrigatoriamente diferente.” (E5)

“No meu caso [agora com 56 anos] foi uma opção que tem mais a ver com a realização pessoal, a concretização de um
sonho que, por alguma razão, não foi realizado, do que para seguir uma carreira profissional. Embora, actualmente, o
problema seja comum a outros cursos, acho que as artes vivem mais de ideais…não são uma necessidade prática. Eu
também dou os parabéns aos jovens que fazem opções por convicção, para a realização dos seus sonhos.” (E5)

“Nada vem do nada. Os artistas mais velhos são as nossas referências e os jovens dão continuidade e frescura às
produções de arte. No entanto, quanto maior a experiência, mais perto de atingir uma sensibilidade aquém dos “meros
mortais”.” (E6)

“A importância da idade agora está a começar a ter um impacto diferente. Grande parte de concursos, selecções para
exposições e etc. têm limite de idade. Costuma-se ver “jovens artistas (até aos 35 anos)”, por exemplo. Em Portugal, no
resto do mundo não sei. Mas relativamente ao tipo de obras realizadas por jovens ou artistas mais velhos, não noto que
haja grande especificidade nuns e noutros. Depende do tipo de pessoa.” (E7)

“No outro dia estávamos na trollice e estávamos a dizer que se queres que a tua arte seja mesmo boa, tens de morrer aos
2725! Caso contrário, terás que te aplicar muito! Agora sem brincadeiras, acho que hoje em dia já nem passa tanto pelo ser
jovem ou ser velho, passa mais pela aceitação. Até já falamos nisso numa disciplina… porquê que eu não posso citar um
colega meu? Nem é a idade, é o nome.” (E8)

“Como qualquer profissão sem ser as fisicamente exigentes, quanto mais experiência, melhor o trabalho.” (E9)

“Ambos são vistos de formas distintas: o mais novo como tendo um olhar mais fresco, o mais velho como tendo um olhar
mais experiente.” (E10)

25
Referência a artistas que faleceram com 27 anos de idade. Exemplos: Amy WInehouse, Janis Joplin, Kurt Kobain e Jim Morrison.
191
O “mundo de aventura” do artista

C7.7. importância da fama e/ou do “Reconhecimento, vai ser aquele que te vai dar alento. Quanto à fama, já entras na Joana Vasconcelos, entras no star
reconhecimento system. Quando é que o artista é extremamente artista? Quando passa o reconhecimento para além da área da arte, é
aquele que é falado nos meios de comunicação social, que aparece em público. O star system é além arte. (…) É muito
promíscuo mas, o teu nome vai ser mais valorizado no campo da arte quando apareceres noutros meios.” (E1)
“Atualmente, tu tens milhares de artistas e o facto de eles serem reconhecidos passa por inovarem.” (E1)

“(…) Mas claro que toda a gente quer ver as suas obras reconhecidas e o seu nome associado a coisas que valham a pena.
Se bem que alguns artistas não trabalham em função disto, apenas gostam de ter o reconhecimento.” (E2)

“Claro que se formos alguém já com algum nome no mundo artístico, a nossa obra é logo valorizada.” (E4)

“É fundamental. Depois de o artista ser reconhecido tudo acontece, as obras passam a valer fortunas, e o artista fica na
história.” (E5)

“O que não é a vida senão as relações que estabelecemos uns com os outros? O reconhecimento traz satisfação pessoal e
sentido de existência.” (E6)

“Infelizmente, ao longo dos tempos tem-se praticamente vindo a reconhecer os artistas e dar valor às suas obras depois da
sua morte, mas nota-se algum avanço nesse sentido nos últimos anos e espera-se que continue esse avanço no sentido de
dar o devido valor às devidas pessoas no devido tempo de vida.” (E7)

“(…) Se um artista não trabalha para receber dinheiro, o artista trabalha para ser reconhecido pelos seus pares e para ser
reconhecido como artista. É outra forma de remuneração. Mas há artistas que não querem saber disso. Mas se chegarem à
minha beira e me disseram que adoraram a minha peça, fico contente. Eu procuro o reconhecimento das minhas peças
como sendo obras de arte.” (E8)

“É sempre bom ser reconhecido, mas neste ramo a maior parte dos artistas só atinge a fama no final da vida ou mesmo
depois dela.” (E9)

“Muitas vezes isso significa, de certa maneira, prosperidade. Conheço muitos artistas que trabalham por sua própria conta
e que se mantêm na sombra. E temos o caso da Joana Vasconcelos, que tem um trabalho mais internacional e exposto.
Nesse aspecto também depende se o artista quer ser exposto desta maneira.” (E10)
C7.8. outras características associadas “As pessoas são muito preconceituosas e os artistas são um bocado fechados de mais.” (E1)
“Há muito a ideia do estudante de belas artes bêbado, drogado e que não quer fazer nada da vida. É completamente o
oposto. Tanto que, atualmente, os artistas portugueses vão lá para fora e têm sucesso.” (E1)
“Dizem que são arrogantes, a questão de superioridade, e é a verdade. Muitas vezes são mesmo. Dentro da arte, o público
em geral não te consegue chegar. (…)” (E1)

192
O “mundo de aventura” do artista

“O artista faz o que lhe dá na gana, muitas vezes. Isso é verdade. Mas acho que não chateia ninguém e ao mesmo tempo
não é um drogado. São pessoas com uma mente mais aberta, sem dúvida alguma. Aí está um virtuosismo, mente aberta.
Defeito, facilmente caem nessa mente aberta.” (E1)

“O artista é sempre visto como um ser que vagueia pelo mundo e que não se integra em parte alguma, daí a apologia de
que somos uns loucos. Alguns são, mas uma certa medida contida de loucura é que permite a exploração artística ao seu
máximo.” (E2)
“Isso depende dos estados de espírito, das alturas...eu tenho alturas em que se calhar sou triste e outras alturas em que sou
muito alegre. Toda a gente passa por esses estados de espírito. Só que se calhar esses estados de espírito não são marcados
como no artista, o artista marca-os porque está a produzir uma obra.” (E3)

“Basta dizer que estudei na faculdade de Belas Artes para as pessoas não me levarem a sério. Ou perguntam-me para o
que é que isto dá, ou então riem-se.” (E4)

“Já ouvi alguns comentários de que um artista é mais sensível, que vê o mundo de maneira diferente (…), que é
irreverente. No entanto, comentários negativos são mais frequentes. Ele é um “anormal”, porque veste-se de uma maneira
descabida, é um tolinho, um drogado, não faz nada de jeito na vida.” (E4)

“Dizem que somos loucos e degenerados. Ser artista desculpa a insanidade, apesar de não achar que somos loucos. De
qualquer maneira, num mundo como este, há que ser louco de vez em quando!” (E6)

“O artista é louco, drogado, gay.” (E7)

“Não, acho que o artista é uma pessoa e todas as pessoas têm qualidades e defeitos diferentes e isso reflete-se na sua
maneira de ser. Vimos todos de culturas diferentes. Não dá pra dizer que todos os artistas têm as mesmas características.”
(E8)

“Acredito que, para muita gente, ser artista é igual a ser um maluco que passa fome. “ (E9)

“A sociedade criou a imagem de uma artista louco, excêntrico e temperamental. Muitos artistas, no passado, tinham
acções mais espontâneas e ainda hoje alguns as têm. Mas um artista é um indivíduo que tem a sua própria personalidade.
Não sei se ainda existe efectivamente esse estereótipo.” (E10)
C7.9. ser diferente “Eu acho, sinceramente, que as pessoas de arte são diferentes. (…) Acho que a mentalidade é completamente diferente.
Não somos pessoas materialistas. Não vamos nas cantigas da cultura pop. Somos minados para não pensar segundo as
massas.” (E1)
“Eu acho que é naturalmente diferente. (…) Os artistas não fazem por ser diferentes, pensam de uma maneira diferente e
expressam-se de uma forma diferente.” (E1)

193
O “mundo de aventura” do artista

“No entanto, eu creio que toda a gente é louca, pois sem a loucura nada iria funcionar, a vida seria demasiado aborrecida
(…).” (E2)

“Mas a sociedade aceita muito bem quando o artista é diferente: “Ah! É maluco, é artista!”. É por isso que, às vezes, os
artistas têm a tendência para criar um boneco, uma imagem e quanto mais essa imagem for extravagante e diferente
daquilo que se possa dizer os conceitos e das maneiras de estar na sociedade, talvez seja muito mais aceite.” (E3)

“É diferente ao nível do pensamento. A nossa maneira de encarar a vida e de vivê-la é diferente da das outras pessoas.”
(E4)

“Não acho que o artista tenha um perfil diferente, acho que é a sociedade que vê o artista com um olhar diferente. (…) O
artista é uma pessoa comum, talvez com uma visão mais ampla do mundo, mais receptivo às diferenças.” (E5)

“Todo o ser humano tem um comportamento similar com algumas características que nos distinguem dos outros. No
entanto, somos mais parecidos que diferentes. A forma como levamos a vida, o modo como a representamos é que faz a
diferença.” (E6)

“Acho que já te fui respondendo a isso!”. (E7)

“Acho que, às vezes, as pessoas enganam-se um bocado. Skaters, por exemplo, as pessoas dizem que são artistas. Isso
agora está na moda. Mas eu sinto-me uma pessoa normal, mas com vantagens porque não consigo ter aquele tipo de vida
de fazer o jantar, ver a telenovela e no dia seguinte ir trabalhar. Sinto-me privilegiado porque a minha própria vida, a
minha personalidade, me permitirem ser assim como sou. Eu não sou mais nem menos, mas fico contente por ser assim!”
(E8)

“Podem ser facilmente identificados.” (E9)

“Ambos: é igual porque participa na sociedade; é diferente porque o artista tem um olhar mais atento sobre as coisas e isso
permite-lhe reflectir sobre o que se passa.” (E10)
C8. Auto e heteroperceção sobre a arte:
C8.1. processo de criação da obra de arte “Há aqueles artistas mais loucos que têm uma criança dentro deles e qualquer coisa serve para brincar e criam uma peça
de arte, mas que fascina. Tens aqueles que põem todos os recalcamentos da vida íntima na arte… É muito complicado.
(…)” (E1)
“Não depende só do artista, todos nós somos diferentes. As vivências de cada um vão ser diferentes, senão estávamos
todos a fazer coisas iguais. (…) o estudares no Porto ou estudares em Lisboa é completamente diferente também. Os
professores vão influenciar-te, os amigos vão influenciar-te, o facto de trabalhares sozinho ou não vai influenciar-te. A

194
O “mundo de aventura” do artista

melhor coisa que podes fazer é não estares sozinho, ouvires críticas.” (E1)

“Todo dizem algo tipo: “Aquilo também eu fazia!”, mas a verdade é que sem passar pelo que o artista passou, nenhuma
obra sairia do mesmo jeito.” (E2)

“Quando se faz algum trabalho, parte-se sempre de uma ideia, de uma vontade de fazer, de uma vontade de expor a ideia
que nós temos ou do sentimento que nós temos, mas tudo tem um início. Ou alguma coisa que se viu, que se olhou… (…)
estarmos atentos ao mundo que nos rodeia.” (E3)

“O factor económico influencia muito. O próprio espaço de trabalho também acaba por influenciar as nossas escolhas.”
(E4)

“A inspiração é um factor primordial, mas não chega, é preciso pensar a arte para que uma obra resulte num objecto
artístico. (…)” (E5)

“Há trabalhos que demoram anos a fazer. Isso da inspiração é um fiasco. O processo de uma obra de arte pode ser muito
penoso e árduo, exige muita força mental e física.” (E6)

“Normalmente há muita especulação durante a execução. Muitos pensamentos a correr, muitas preocupações ainda que
subconscientes e, muitas vezes, a suposta obra acaba no monte de experiências, ou no monte de lixo, ou no monte de
materiais a reciclar. Depende muito do meio artístico a ser utilizado, depende muito das metodologias de trabalho do
artista em questão. Há artistas que não produzem as suas obras (…), mas pensam-nas, repensam-nas, desmistificam-nas,
simplificam-nas. Há todo um processo de racionalização e reflexão constantes. Há que ter muita consciência do que se
quer dizer e da forma como se vai dizer. Há que ter muitos conhecimentos aos mais variados níveis (…). Há que saber o
que se quer ou pelo menos, o que não se quer. É preciso muita pesquisa, dedicação, dores de cabeça, pausas de dias ou
semanas para afastar o olhar da obra em construção e tentar olhar para ela com olhos “novos”. É preciso tempo. A ideia de
que o artista pega numas matérias e começa a mexer com elas quando sente, de repente, que a “inspiração” está a vir, é
absolutamente mítica. Não há inspiração, há, antes (…) um impulso da criação artística.” (E7)

“Envolve tudo. É cozido à portuguesa! A carne não fica boa se não tiver a cenoura!” (E8)

“Há obras pensadas e há obras que aparecem em momentos mais relaxados, mas esse é o segredo de todas as coisas. Toda
a evolução do homem provém de trabalho e de inspiração que provêm de locais fora do trabalho. Mas parte tudo de um
problema. Pois qualquer obra é uma solução a algo.” (E9)

“Infelizmente ainda acham que a criação é sempre algo repentino. As peças, mesmo que tenham uma perspectiva pessoal,
que reflecte emoções, têm sempre um grande trabalho conceptual por trás, e muitas vezes isso não é lido pelo público.”
(E10)
195
O “mundo de aventura” do artista

C8.2. funções da obra de arte “No mundo da arte, atualmente, ela pode pensar sobre si própria, questionar a si própria. Enquanto outras vão ter uma
função social, de intervenção. Portanto, (…) a arte não tem uma função, os artistas é que vão ter alguma função consoante
o que eles querem.” (E1)

“Para a sociedade, a obra de arte não tem função, apenas serve para decorar a casa. A obra de arte, no meu ponto de vista,
é algo tão pessoal do artista, de quem a produz, algo tão comprometedor, que por vezes custa até vender ou expor. O
artista apenas revela o que produz porque acha que aquilo que produz deve ser visto por outros, e aqui entra novamente a
relação entre obra e mensagem da obra, pois o desejo de dar a conhecer aquela visão à sociedade é tão grande que o artista
expõe as suas obras.” (E2)

“A obra de arte tem muitas funções e se calhar as funções dela têm muito a ver com o que já falamos: porquê que as
pessoas compram obras de arte? E se as pessoas compram é porque tem uma função para elas. Uma função para admirar,
uma função para decorar, uma função para colecionar, uma função para rentabilizar.” (E3)

“Eu penso que a obra de arte pode ter qualquer função. Isso depende da intenção do artista e também da visão do
espectador (que por vezes difere da do artista). A obra de arte é sempre uma forma de exprimir o que o artista sente.” (E4)

“Para mim, tem a função de intervir na sociedade, ser participativa, mais que ser contemplada. “ (E5)

“(…) o diálogo, o factor comunicante. O sentido da arte é expor, mostrar-se. Humanizar.” (E6)

“A obra de arte distingue-se precisamente dos restantes objectos, sejam eles de design ou de artesanato, por não ter
função. Não é um objecto funcional. Não serve a propósitos decorativos nem funcionais. É comunicante, é para sentir, é
para intelectualizar. Não tem nenhuma função específica a não ser comunicar. Contudo, o artista tem o dever de tentar
“mudar o mundo”, alertando os restantes cidadãos da sociedade em que vivemos.” (E7)

“Passa por tentar manter a sanidade. A arte serve para a expressão, é cultura, é desenvolvimento, é necessária. A arte é um
mundo, como o futebol é um mundo.” (E8)

“É um bom meio de se expressar e de camuflar sentimentos ressentidos.” (E9)

“(…) na sua essência, a obra não deve ter uma função prática activa, senão não é obra de arte, é uma ferramenta.” (E10)
C8.3. obra de arte: talento ou “Não precisas de ter talento. O talento que tu precisas de ter não é técnico. É em termos de pensamento. Pensares sobre as
aprendizagem coisas e conseguires a ideia sobre o que tu tens e haver uma metamorfose do pensamento para o objeto e como é que isso
funciona. (…) Tu podes ter muitas ideias, podes ser um criativo, mas não te chega isso. Tens de estar dentro de um
contexto e perceber de arte, perceber como as coisas resultam, ter uma cultura visual, porque há muitos artistas que são
autodidatas, que nunca passaram pelas escolas, e são bons artistas.” (E1)

196
O “mundo de aventura” do artista

“Muitos falam do dom, mas eu creio que seja um conjunto dos dois factores [talento e aprendizagem].” (E2)

“As duas coisas. Por mais que tenhamos muito talento, com a aprendizagem adquirida ao longo dos anos vamos
aprendendo a usar melhor esse talento.” (E4)

“Do talento, da aprendizagem e do conhecimento.” (E5)

“Um pouco de tudo. A genialidade desenvolve-se com trabalho e experiência. Existem coisas que por mais que insistamos
não conseguimos fazer, mas compensa-se com aquilo que sabemos fazer melhor. (…) nascemos com determinadas
características que vão ser desenvolvidas a partir de uma dialéctica entre o mundo exterior e mundo interior. Quem me diz
que eu não podia ter sido arqueóloga? A criatividade, factor importante para definir um artista, pode servir para outras
profissões além de produzir arte.” (E6)

“(…) há alunos de Belas Artes que não são nem nunca serão artistas, tal como há artistas que não acabaram sequer o
ensino secundário (…) e são, portanto, autodidactas. A aprendizagem é, sem dúvida importante, mas tem que haver já de
trás um impulso, uma vontade, uma necessidade. Normalmente, quem tem esse desejo tem o que se costuma chamar de
“dom”, que pode ser descoberto no momento de aprendizagem e inter-relação com o ambiente artístico ou pode ter já sido
descoberto anteriormente. Mas a obra de arte não resulta do talento ou dom. Daí pode resultar o trabalho de um artesão.”
(E7)

“Não é uma vocação. Há técnicas. Tu aprendes a pintar. Isso do dom é mito. A pessoa nasce com qualidade, mas essa
qualidade tem de ser praticada. (…)” (E8)

“Dos dois. Um bom artista é aquele que tem técnica e consegue ter visão para produzir algo nunca feito.” (E9)

“Resulta do talento/dom e da aprendizagem. Acho que esta dupla de palavras anda sempre de mão dada. Há que gostar
daquilo que se faz (talento/dom) e de saber como se faz (aprendizagem).” (E10)
C8.4. obra de arte como liberdade de “(…) Se tu não tens liberdade, não és artista. Isso não impede que tenhas encomendas. (…) Tu tens a tua liberdade, que é
expressão e/ou instrumento político a liberdade de pensamento. Felizmente, ainda vamos tendo isso.” (E1)
“Há casos muito específicos de arte e politica em que, para os artistas, fazer arte passa por intervir, falar sobre. (…) Tu
não fazes arte por acaso, fazes porque pretendes trabalhar com questões sociais, por exemplo.” (E1)

“A liberdade de expressão existe para tudo, então porque não para a arte? Existem artistas que tomam posições políticas e
as revelam através da arte e, não têm que ser apenas posições políticas, qualquer tipo de informação que queiram difundir
através das suas obras. Já a sociedade não vê este ponto.” (E2)

197
O “mundo de aventura” do artista

“Eu penso que a obra de arte é sempre uma forma de o artista se exprimir e penso que ele se sente mais livre, por haver
tantas maneiras de o fazer. Ele é que define o que pretende mostrar e como.” (E4)

“Claro que sim, mas isso depende da intenção do artista. A sua obra pode ser um reflexo da sociedade e com isso estar a
criticá-la (e a tentar provocar a agitação no público), como também pode estar a elevar outros aspectos. Basicamente, tu
fazes o que queres, como queres e quando queres.” (E4)

“[como liberdade de expressão] Sempre! Quando a arte deixa de ser produzida sem liberdade de expressão, deixa de ser
arte! O artista tem que pôr alma na sua obra, gostar do que faz e não produzir para ir de encontro às necessidades do
mercado…ou a modas. É a expressão de um artista que o define, que caracteriza.” (E5)

“Também [como instrumento político], mas não como instrumento manipulador. Ao longo da História, a arte foi
direccionada, pela religião, pelo poder político. (…) Hoje continuam a haver artistas que utilizam a sua arte para delatar as
acções menos correctas dos seus governos (…).” (E5)

“Porque não? Na minha última produção, fiz uso do corpo como escultura e expressão feminina. As artistas mulheres
fazem uso do seu corpo, não só como arte, mas como um campo de intervenção, um modo de contar histórias. O corpo da
mulher sempre foi alvo de barbaridades e de censura, o corpo revela os tabus impostos sobre a mulher e sem ter a intenção
de politizar, o conteúdo político aparece automaticamente nas minhas produções, porque se vives num ambiente
politizado acaba por afectar-nos de forma política.” (E6)

“Acho que um artista tem necessidade de se expressar por via da arte. É uma necessidade vital. (…)” (E7)

“Se não for, as pessoas não estão a perceber bem o conceito.” (E8)
“A mim dizem-me que o meu trabalho é muito político, mas depois também me pergunto se eu critico. Não, eu questiono.
É esse o intuito. O intuito de dar a perceber aos outros. O meu trabalho é a minha forma de expressão.” (E8)

“Depende dos países, nuns é mais eficaz, noutros ninguém liga.” (E9)

“Sim, para manifestar e criticar a sociedade, para documentar acções. Enquanto manifestação e crítica, pode ser uma
ferramenta muito poderosa.” (E10)
C8.5. importância dos números (de “O número de visitantes é mais importante para os museus, coisas desse género. Mas é muito importante o
vendas, visitantes, entre outros) reconhecimento para o artista.” (E1)

“A sociedade acha sempre que os preços são demasiado elevados e que certas obras nem se vendem. Para nós, interessa
saber o número de visitantes, porque quanto mais visitantes tiver, mais probabilidade temos de algum turista apreciador de
arte nos propor algum negócio e nos arranjar exposições noutros locais. Além de que quanto mais gente vir as nossas

198
O “mundo de aventura” do artista

obras, mais reconhecimento teremos (teoricamente).” (E2)

“Há pessoas que avaliam muito a qualidade das obras e das exposições em função das vendas.” (E3)

“O mais importante é expores o teu trabalho. Ele não pode ficar guardado em casa. Claro que quantos mais visitantes
houver numa exposição, melhor. Começam a conhecer-te, a associar o teu nome aos trabalhos que viram, como também
pode aumentar o número de vendas.” (E4)

“Os números estão relacionados com o reconhecimento e com a fama, é a ambição de qualquer artista, mesmo que o
negue.” (E5)

“Números são o que fazem o mundo, os negócios. Tudo que tem números, no sentido em que estás a falar, é negócio e
isso, para mim, não vale verdadeiramente nada. A arte não devia ser um negócio, mas é-o, inevitavelmente, neste mundo.”
(E7)

“O número de visitantes da exposição é importante mesmo para a cultura geral do país. (…) Para mim, os museus deviam
ter entrada gratuita e as pessoas deviam ir ver as obras, ter acesso. Percebo que depois há ali um mundo à volta que tem de
ser gerido e tem de ir buscar rendimentos, mas a criação de uma barreira monetária para ires ver um museu, que é algo
que as pessoas já não vão ver de bom grado mesmo quando é gratuito, se for a pagar, ainda pior.” (E8)

“Funciona como uma mercearia.” (E9)

“Um artista que queira mais exposição quer ter mais números [de vendas, de visitantes na exposição] do que aquele que
prefere algo mais independente.” (E10)
C8.6. importância do público “Ser artista, para mim, passa por transmitir alguma coisa, (…) necessita de público. (...) Portanto, se tu não expões, não
vais ser artista. (…) Agora, só és artista quando expões? (…) Não é assim…Acho que somos sempre artistas, mas o
reconhecimento é fundamental. Também se não tiveres reconhecimento, mais tarde ou mais cedo, vais deixar de trabalhar,
portanto vais deixar de ser artista. (…)” (E1)

“Creio que todo o artista pensa imenso no público quando realiza a sua obra. Creio também que a sociedade não tem esta
noção!” (E2)

“Isto há sempre aquela ideia que as exposições e as obras só são boas quando são vendidas ao público.” (E3)

“Ao realizarmos um trabalho, pensamos sempre no público, no espectador, na visão que ele poderá ter da nossa obra. Isso
por vezes até leva a que haja modificações no trabalho.” (E4)

199
O “mundo de aventura” do artista

“É o público que compra, é o público que visita. Uma obra de arte só o é quando em contacto com o observador
(público).” (E5)

“O público contribui para a realização da obra por intermédio de uma narrativa, de uma história que começa com o artista
a produzir até ao contacto com o público e outros intervenientes. Se arte é expor, expomos para quem? Para um público,
que quanto mais diversificado, mais bem-sucedida a obra é, porque significa que essa obra abrange uma enorme
quantidade de audiências sem excluir outras.” (E6)

“O público é o único alvo da obra de arte depois de consumada. Tem toda a importância. Os artistas normalmente fazem
as obras para si, mas na verdade são para o outro, na medida em que são comunicantes.” (E7)

“Fazes a obra para ser vista pelo espectador, não para ser vista por ti. Mas não a faço para agradar, nunca penso nisso.”
(E8)

“Quantas mais pessoas gostarem da obra, penso que mais será um motivo de satisfação para o artista. É sempre bom ver
que o nosso trabalho causa algum impacto… bom ou mau.” (E9)

“A obra pode ter dois tipos de fim: uma exposição individual, onde a peça reflecte sobre as acções do artista e onde o
público apenas aprecia; ou pode ter um público específico para ser apreciado.” (E10)
Artes, artistas e media
D1. vantagens e desvantagens “Só é vantajosa, lá está, se a tua intenção for ser como a Joana Vasconcelos e a comunicação social falar muito de ti, isso
permite-te chegar a outras coisas. Mas, sinceramente, tenho um colega meu que costuma dizer que só o facto de falarem
em ti já é ótimo. O problema está em que, às vezes, quem está a falar não percebe nada daquilo. E o que se fala não é
suficiente. Media e arte não combinam. É um casamento que nem chegou a ser casamento, não há ligação.” (E1)

“Eu creio que é uma relação estável, os artistas tiram o melhor proveito que podem, pois a publicidade às obras e ao artista
é o que possibilita a comercialização da obra e até do artista. Creio que a comunicação social também tira partido desta
relação, sempre tem histórias para contar e por vezes polémicas bem caricatas para mostrar.” (E2)

“(…) hoje em dia, a comunicação social vai buscar esses temas da provocação. Tudo o que crie polémicas. A
comunicação social, hoje em dia, não anda atrás de boas notícias, anda atrás de más notícias. E se calhar hoje em dia o
artista sabe essa situação e então “Vamos criar polémica!”.” (E3)

“Eu penso que em Portugal, não há uma “relação” entre artistas e os media. A televisão portuguesa é um bom exemplo
disso. Apenas a RTP2 promove um pouco da arte em Portugal, mas mesmo assim é escasso. A SIC e a TVI são o reflexo
da sociedade portuguesa: ignorante. Nos vários noticiários ao longo do dia, são raras as notícias sobre os trabalhos deste
ou daquele artista, das exposições aqui ou acolá. As pessoas não querem saber. Quanto aos jornais, também pouco dizem

200
O “mundo de aventura” do artista

e as boas revistas de arte são quase todas importadas.” (E4)

“Acho que há pouca divulgação da prática artística portuguesa. As poucas revistas que existem são caras, eu pessoalmente
procuro na internet, a Ípsilon é uma boa referência. Mas a comunicação social comum não tem uma mostra relevante da
arte portuguesa. As vantagens seriam para ambos, embora a procura seja apenas das pessoas interessadas. Talvez por isso
a revista L+arte tenha deixado de ser publicada.” (E5)

“Os media são um reforço para o reconhecimento do artista. O artista é o seu primeiro crítico em relação ao seu trabalho.
As entrevistas, os textos escritos, os documentários em que o artista fala do seu trabalho, são essenciais para se perceber
em primeira mão como se comporta o mundo da arte por dentro. São essenciais para “amantes” da arte, especialmente
estudantes que os usam como referências. (…) A falta de apoio de alguns media, falando em Portugal, faz o artista
procurar outros meio alternativos para o fazer. Quanto a canais portugueses, a RTP 2 continua a fornecer uma boa
programação com alguns programas interessantes, mas ironicamente é a que tem menos audiências. As pessoas não têm
formação para compreender a elite da arte e de outras áreas que exigem um certo nível de eruditismo.” (E6)

“Certo é que são os media que “fazem” o artista. O artista só ganha destaque, nome e valor quando é falado nos meios de
comunicação ou é referido por algum curador, galerista ou crítico de arte importantes. Há artistas que são enlameados no
início da sua carreira e jamais ou a muito custo têm sucesso porque tiveram uma crítica má do crítico x ou y.” (E7)

“Certas coisas que aparecem nos media, tu vais lá e tiras para os teus trabalhos. Através dos media tu divulgas. Claro que
depois há coisas bem ou mal divulgadas, há críticas boas e críticas más. A relação não tem que ser saudável nem deixar de
ser saudável. Tem que haver sempre a relação.” (E8)

“Os media conseguem influenciar qualquer tema e qualquer população, agora se dão o devido valor á arte? Não. Apenas
futebol e mais futebol. Mas é Portugal!” (E9)

“Esta relação depende da vontade da exposição do artista. E nesse aspecto pode ser benéfica para ambas as partes (…).”
(E10)
D2. visão do setor “Portanto, é muito complicado falar dos media e da arte porque eu quase nem sequer vejo arte nos media. A única coisa
que eu vejo ou leio é sobre a Joana Vasconcelos.”
“A visão dos media de massas não vai de encontro ao setor. Nem sequer fazem um esforço. Não lhes interessa. A única
coisa que existe é a Agenda, eventualmente o Câmara Clara da RTP2. Apesar de tudo, a RTP2 tem discussão pública,
opinião pública e por aí fora…” (E1)

“Os media direccionados para as artes não descoram o valor do artista e da própria obra. Creio que, por vezes, são
influenciados pelos curadores e críticos e aí é que se torna perigoso para o artista esta relação. Mas a visão dos media que
não são influenciados é normalmente uma visão imparcial, que vê e deve ver as obras como elas são e analisar artista a

201
O “mundo de aventura” do artista

artista, para que não se cometam erros (…)” (E2)

“(…) Não vai, não [de encontro à realidade do setor]. O artista pode ser uma pessoa normal como outra qualquer. Pode
passar despercebida. Mas como há esse estereótipo de dizer que o artista é assim, é claro que o artista tem de ir muito ao
encontro disso.” (E3)

“Não. Daí é que o tempo que dedicam à arte ser tão pouco. Se realmente se se interessassem pelo nosso meio, e se nos
dessem o devido valor, a visão das outras pessoas iria ser diferente. Os únicos acontecimentos, ao nível da arte, que dão a
conhecer ao público é quando um artista ganha um prémio no estrangeiro. E porquê? Porque aí já é alguém com valor.
Então já merece aparecer na televisão e nos jornais.” (E4)

“Acho que há um afastamento dos media relativamente à arte e por consequência um desconhecimento, para o cidadão
comum, da realidade do sector. A arte está muito restrita ao seu mundo, aos que já estão inseridos e que vivem da arte.”
(E5)

“(…) É inevitável, a linguagem dos medias cria realidades diferentes da realidade directa. Não acho errado, apenas
considero que é uma forma diferente de ver o mundo: o que torna os media decadentes em relação às práticas artísticas é o
facto de retirarem substância aos seus conteúdos. Mas existe uma imprensa que leva com seriedade o mundo da arte (…).”
(E6)

“Aquilo que ela passa muitas vezes não é a realidade, muitas vezes as palavras do artista são transformadas e é dado um
ponto de vista sobre as obras que não é o que o artista afirmou. Por vezes, para o bem e, por vezes, para o mal.” (E7)

“Acho que umas coisas vão de encontro, outras não. (…) O jornalista que escreve pode ter uma visão diferente da tua. E
eu fico chateado se alguém que não conhece o meu trabalho começa a mandar palpites, mas depois, no final, até acho
piada porque isso enriquece o meu argumento. Há o treinador de bancada. O futebol e a arte podem ser comparados!” (E8)

“Penso que agora existem jornais e revistas bastante qualificados e adaptados mas, como digo, a atenção a esses assuntos
não é a que deveria ser, ao fim de contas estamos a falar da cultura de um povo.” (E9)

“Costumo ler com alguma regularidade e acho que hoje temos críticas cada vez mais isentas. Ainda que devamos pôr
claro as opções pessoais de cada crítico.” (E10)
D3. artista ou obra “O que interessa é a pessoa, não o que ele faz.” (E1)

“Privilegiam mais o artista, mas só quando este é conhecido. Caso contrário, nenhum.” (E2)

“O artista está sempre em primeiro lugar mas, hoje em dia, é a pessoa que fala em relação à obra.” (E3)

202
O “mundo de aventura” do artista

“Eu penso que dão mais atenção à obra, porque sabem que a imagem é algo que ressalta à vista do espectador. O nome do
artista já acaba por ser secundário.” (E4)

“Penso que privilegiam o artista célebre, a obra vem em segundo lugar.” (E5)

“Depende do contexto, há artistas que são eles mesmos obras de arte (…). Há obras de arte que falam pelo artista morto e
são avaliadas sem a presença do mesmo. (…) Também se fala, muitas vezes, mais do artista do que do seu trabalho (…).
Por outro lado, temos ambas as partes (…). O que acontece é que se o trabalho do artista é auto-referencial,
assumidamente sobre si, está mais próximo de se conectar à obra de arte (…).” (E6)

“Apesar de ele ser reconhecido a partir da obra que é exposta ao público, quem fica para a posteridade da divulgação e
futuras notícias é o artista. (…) um dia mais tarde, o artista pode vir a vender obras apenas porque são assinadas por ele, e
o valor cultural e comercial passa a estar implícito no seu nome, como uma marca, independentemente de ter realmente
valor artístico ou não. (…) Portanto, o artista pode assinar folhas de papel em branco que o papel ganha automaticamente
um valor insólito. (…)” (E7)

“Sem dúvida, que se for um artista de renome, é o artista. Se for uma exposição coletiva, não há assim nenhum destaque.
Mas se for um artista polémico, aí são cinco ou seis páginas só para isso. O artista pop, estrela, cria a obra mesmo para
isso. O artista quer sempre chegar ao momento alto. E quando chega tem medo de cair.” (E8)

“Pergunta difícil, não sei. Eu pessoalmente valorizo mais o artista, pois se for bom é alguém que mantem um padrão de
qualidade e uma identidade fixa e única.” (E9)

“Ambos. Todos os elementos são importantes e os media em Portugal dão importância a todas as partes.” (E10)
D4. arte nacional e arte internacional “Mais os portugueses, por uma questão de agenda e porque em Portugal não recebem quase nada do lado de fora. Na
cultura portuguesa, o que é de fora é que é bom. Estratégia de muitos artistas passa por ir lá fora fazer exposições para ter
valor em Portugal.” (E1)

“Não, creio que [a arte nacional] deveria ser mais observada e destacada pelos nossos, para que pudesse ter relevância lá
fora também.” (E2)

“Sem dúvida a internacional. Eu vejo o programa Câmara Clara e as informações que eles dão sobre artistas têm de ser
sempre artistas estrangeiros porque soa bem dizer aqueles nomes em inglês.” (E3)

“Como já referi anteriormente, acho que não. Ainda há um mês recebi uma menção honrosa (…) e um amigo meu recebeu
o prémio. (…) e o director do Galeria de Arte fez questão de comunicar aos jornais (…) o sucedido. Um dos jornais,

203
O “mundo de aventura” do artista

entrou em contacto com o meu colega e entrevistou-o. O meu colega perguntou-lhes se me iam contactar, e eles disseram
que sim. Mas não ligaram. Nessa edição do jornal aparecia a entrevista, a foto do meu colega, mas nem sequer fizeram
referência ao meu nome. Mesmo assim a noticia era um terço da pagina. Isto só mostra o valor que dão.” (E4)

“Acho que não (…), principalmente na TV que é o meio mais popular. Felizmente, a RTP2, não sei durante quanto tempo,
tem programas interessantes sobre arte, mas principalmente direcionada para a capital. As bienais que têm acontecido, um
pouco por todo o país, que espaço têm na comunicação social? “ (E5)

“Falam dos artistas portugueses de uma forma discreta, à excepção dos internacionalizados que têm destaque (Paula Rego
ou Joana Vasconcelos). O desenvolvimento da internet permitiu criar meios para divulgar as produções de arte e interagir
com a comunidade artística. O meio virtual passou a ser uma arena para fornecer serviços e mostrar, de uma forma
dinâmica, o que aparece de novo na arte. A informação é acessível, difícil é gerir toda essa informação. Obviamente há
coisas que não se podem substituir, como a experiência a três dimensões.” (E6)

“Acho que está a começar a ganhar algum impacto, mas ainda assim não há divulgação suficiente de muita coisa que anda
a acontecer por aí. No Porto, ouvimos falar de Serralves, Teatro Nacional São João e Casa da Música e o resto é nevoeiro
para o público em geral... E ainda assim, a aderência a qualquer um destes espaços não é assim tão grande. Não há assim
tanta cultura na generalidade da população, nem há sequer quase predisposição para a arte. E acho que tudo começa em
criança, quando não se aprende a olhar a arte, mas sim apenas a fazer umas paneleirices numas folhas de papel cavalinho,
sem haver fundamentação teórica nenhuma por parte de grande parte dos professores do ensino básico.” (E7)

“Internacionais. O melhor está sempre lá fora.” (E8)

“Não, infelizmente conheço um caso que é flagrante. O artista de rua, Alexandre Farto, só chegou até mim através de uma
plataforma online não nacional.” (E9)

“O destaque [da arte portuguesa] nos media nacionais está a crescer cada vez mais.” (E10)
D5. experiência com os media “O meu nome foi referido aqui e ali, fiz um documentário que passou no Fantasporto. Mas não o suficiente para eu me
gabar.” (E1)

“Não.” (E2)

“Já. Apareceu em muitos jornais locais, apareceu no Jornal de Notícias…” (E3)

“Sim já fui. (…) Apareceu outra de quando participei num dos espectáculos de dança da academia que frequento e quando
recebi a menção honrosa (…) um dos jornais, que o director contactou, fez referência ao meu trabalho. Também, por
causa do mesmo acontecimento, fui notícia no Facebook da Póvoa, e noutros jornais online.” (E4)

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O “mundo de aventura” do artista

“Não” (E5)

“Não, que eu saiba.” (E6)

“Ainda não tenho a experiência de ter lidado com os meios de comunicação social.” (E7)

“Já devo ter sido mencionado em algumas coisas, mas nem ligo a isso.” (E8)

“Apenas enquanto desportista.” (E9)

“Não, não fui.” (E10)

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O “mundo de aventura” do artista

206
O “mundo de aventura” do artista

Anexo 3A. Ípsilon – Localização dos acontecimentos noticiados

LOCALIZAÇÃO DOS ACONTECIMENTOS NOTICIADOS


Geografia Frequência Percentagem
Não especificada 132 46,98
Portugal 105 37,37
Aveiro 1 0,36
Barcelos 1 0,36
Cascais 2 0,71
Coimbra 3 1,07
Estarreja 1 0,36
Guarda 1 0,36
Guimarães 4 1,42
Lagoa 1 0,36
Leiria 1 0,36
Lisboa 56 19,93
Loulé 1 0,36
Porto 23 8,19
Santa Maria da Feira 1 0,36
Sesimbra 2 0,71
Viseu 2 0,71
Portugal (digressão) 5 1,78
Outros países europeus 31 11,03
Alemanha 2 0,71
Bélgica 1 0,36
Espanha 3 1,07
Estónia 1 0,36
Finlândia 1 0,36
França 9 3,20
Itália 2 0,71
Polónia 1 0,36
Reino Unido 9 3,20
República Checa 1 0,36
Europa (digressão) 1 0,36
África 5 1,78
Angola 5 1,78
América do Norte 8 2,85
Estados Unidos da América 7 2,49
México 1 0,36
Total 281 100

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O “mundo de aventura” do artista

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O “mundo de aventura” do artista

Anexo 3B. Ípsilon – Fontes citadas

FONTES CITADAS
Fonte Frequência Percentagem
Académicos/historiadores/investigadores 11 3,28
Advogado 1 0,30
Agente 1 0,30
Artista 185 55,22
Autor do texto de apresentação 1 0,30
Bíblia 1 0,30
Biografia do artista 1 0,30
Carta 1 0,30
Colega na editora 1 0,30
Comissário 6 1,79
Comunicação social 18 5,37
Convite para o evento 1 0,30
Crítico 11 3,28
Curador 5 1,49
Diretor 7 2,09
Diretor da editora 1 0,30
Diretor de associação 1 0,30
Editor 4 1,19
Editor de outra revista 1 0,30
Engenheiro de som 1 0,30
Ex-curador 1 0,30
Ex-diretor do evento 1 0,30
Familiares do artista 3 0,90
Membro de instituição 1 0,30
Obra 17 5,07
Oprah Winfrey 1 0,30
Outros artistas do ramo 27 8,06
Presidente do evento 1 0,30
Primeiro editor do artista 1 0,30
Produtor 3 0,90
Professor do artista 1 0,30
Programa do evento 2 0,60
Promotor de imprensa 1 0,30
Psicólogo do artista 1 0,30
Público 7 2,09
Redes sociais 5 1,49
Responsável pelo evento 1 0,30
Texto de apresentação da obra 2 0,60
Total 33526 100

26
11 das fontes referidas tinham dois cargos em simultâneo (exemplo: responsável pelo evento e crítico de arte).
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O “mundo de aventura” do artista

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O “mundo de aventura” do artista

Anexo 3C. Ípsilon – Autoria por ramo artístico (ou outro)

AUTORIA POR RAMO ARTÍSTICO (OU OUTRO)

Total (percentagem)
Total (frequência)
História da Arte
Artes Plásticas
Ramo artístico

Arte Circense
Artes Visuais
Arqueologia

Arquitetura

Jornalismo
Fotografia

Literatura
Cinema

Música
Design

Teatro

Vários
Dança
Autoria
Alexandre Prado Coelho 0 1 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 2 0,77
Ana Dias Cordeiro 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 2 0,77
Cristina Fernandes 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 3 2 0 5 1,93
Francisco Valente 0 0 0 0 8 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 9 3,47
Gonçalo Frota 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 13 0 0 14 5,41
Gonçalo Mira 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 1 0,39
Helen Barlow 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0,39
Helena Vasconcelos 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 1 0,39
Hugo Morgadinho Pereira 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0,39
Inês Nadais 0 0 0 2 0 0 2 0 0 0 0 2 1 4 1 12 4,63
Isabel Coutinho 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 14 0 0 0 14 5,41
Joana Amaral Cardoso 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1 0,39
João Bonifácio 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 11 0 0 13 5,02
Jorge Mourinha 0 0 0 0 8 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 8 3,09
José Marmeleira 0 0 4 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 1 6 12 4,63
José Riço Direitinho 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 5 0 0 0 5 1,93

211
O “mundo de aventura” do artista

Lucinda Canelas 1 0 0 0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 1 4 1,54


Luís de Freitas Branco 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 1 0,39
Luís Miguel Oliveira 0 0 0 0 6 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 6 2,32
Luís Miguel Queirós 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0,39
Luísa Soares de Oliveira 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0,39
Margarida Medeiros 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 0 2 0,77
Mário Lopes 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 19 0 0 20 7,72
Miguel Gaspar 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 0 0 0 2 0,77
Nuno Crespo 0 0 3 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 2 6 2,32
Nuno Pacheco 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 2 0,77
Óscar Faria 0 0 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0,77
Pedro Rios 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 8 0 0 8 3,09
Rodrigo Amado 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 3 0 0 3 1,16
Rogério Casanova 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 3 0 0 0 3 1,16
Rui Lagartinho 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 2 0 0 0 2 0,77
Sara Dias Oliveira 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 1 0,39
Sérgio B. Gomes 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 0,39
Sérgio C. Andrade 0 1 0 0 3 0 0 0 1 0 0 0 1 0 0 6 2,32
Susana Moreira Marques 0 0 0 0 3 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 3 1,16
Tiago Bartolomeu Costa 0 0 0 0 0 0 6 0 0 0 0 1 0 7 2 16 6,18
Vasco Câmara 0 0 0 0 6 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 7 2,70
Vera Esteves 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0,39
Vítor Belanciano 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 14 0 0 14 5,41
Vítor Bruno Pereira 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1 0 0 1 0,39
Não identificado 1 2 1 0 12 1 3 0 1 0 0 8 6 5 5 45 17,37
Total (frequência) 2 5 11 2 51 1 12 2 8 2 1 39 82 23 18 259 100
Total (percentagem) 0,77 1,93 4,25 0,77 19,69 0,39 4,63 0,77 3,09 0,77 0,39 15,06 31,66 8,88 6,95 100

212
O “mundo de aventura” do artista

Anexo 3D. As representações da obra no Ípsilon

Total
AS REPRESENTAÇÕES DA OBRA NO ÍPSILON
fi %
Dimensão sociográfica da obra 75 8,61
Ano de iniciação, criação, conclusão e/ou acesso ao público 62 7,12
ano de acesso ao público (10), ano de criação (49), ano de conclusão (1), ano de
iniciação (2)
Locais de acesso ao público e/ou lançamento 2 0,23
local de acesso ao público (1) , local de lançamento (1)
Nacionalidade da obra 11 1,26
brasileira (1), europeia (1), inglesa (3), norte-americana (2), portuguesa (3), russa
(1)
Processo e condições de criação da obra de arte 119 13,66
Inspiração e referências 26 2,99
associada a… (3), baseada em… (3), imitação (1), inspirada em… (12), marcada
pelas referências do seu criador (2), remete para… (1), trabalho feito a partir
de… (3), trabalho herdeiro do trabalho de… (1)
Obra como espelho do autor 15 1,72
autobiográfica (5), capricho adolescente do autor (1), espelha o seu criador (1),
forma de o autor tentar fazer as pazes com a morte (1), introspetiva (1), não
biográfica (2), pessoal (2), pode ser a morte do artista ou salvá-lo (1), um sinal de
fuga do autor (1)
Obra retrata a realidade 13 1,49
pretende projectar o poder de um país (1), promove uma visão errada do mundo
(1), realista (2), representa a realidade (7), sintetiza um período (1), testemunha a
euforia dos anos 20 (1)
Outros 65 7,46
acabada à pressa (1), acabada (1), académica (1), acidental, (1), ambiente em
que foi criada (1), artesanal (1), caseira (1), composta na estrada (1), conseguida
(1), construída (1), contida (1), criada de raiz (1), criada para responder a um
problema (1), criada de forma fragmentada (1), cuidadosamente construída (1),
deficientes condições técnicas (1), em constante mutação (1), espontânea (1),
experimentação (4), facilmente manuseada (1), feita à mão (1), feita de propósito
para a exposição (1), feita depressa (1), o criador definiu o que era pretendido (1),
formal (4), improvisada (7), inacabada (1), incompleta (1), meticulosa (2),
metódica (1), não se guiava por pautas (1), não se resume a uma técnica ou
vocabulário (1), não segue as formas clássicas (1), obedece a certas
especificidades (1), pensada (2), precário (1), racional (2), reflectida (1),
reproduzida de forma industrial (1), resulta de uma ideia simples (1), resultou de
um convite (1), rudimentar (1), tempo que demorou a criar (1), terminada (1),
trabalhada (3), tudo nela encaixa (1), uma mistura de… (1), uso recorrente do
abjecto (1)
Dimensão estética da obra 13 1,49
bela (2), bonita (1), cintilante (1), colorida (1), de contrastes (1), de sombras (1), estilosa (1),
luminosa (2), não-estética (1), pictórica (1), radiosa (1)

213
O “mundo de aventura” do artista

Dimensão temporal da obra 22 2,53


actual (1), adiada (1), antiquada (1), contemporânea (3), fixada historicamente (1), fresca (3),
histórica (1), não segue a moda (1), não histórica (1), nova (3), perdida no tempo (1), póstuma
(2), recente (1), tardia (1), velha (1)
Dimensão espiritual da obra 8 0,92
epifania (2), espiritual (1), mística (2), profética (1), religiosa (1), transcendente (1)
Dimensão económica da obra 18 2,07
Preço/valor 13 1,49
baixo custo (1), financiamento (1), orçamento (5), preço da obra (5) valiosa (1)
Vendas 5 0,57
muito vendida (1), número de vendas (3), poucas vendas (1)
Processo e condições de divulgação e distribuição da obra 5 0,57
Divulgação 2 0,23
períodos de maior e menor exposição (1), promovê-la foi difícil (1)
Distribuição 3 0,34
difusão na internet (1), distribuída para todo o mundo (1), viral (1)
Processo e condições de receção da obra (críticos e públicos) 24 2,76
Bem recebida 16 1,84
aceite (1), acessível (1), apreciação positiva(1), bem recebida pela critica (3),
bem recebida(1) ,elogiada (1), expectativas em torno dela (2), faz os espectadores
descobrirem o sentido da vida (1), público revê-se na obra (1), recomendada (1)
,resistente às criticas (1), tem escapado ao público, academias e mercado (1),
unânime (1).
Mal recebida 8 0,92
alvo de escárnio do público (1), censurada (3), divide a crítica (1), divide o
público (1), divide posições (1), faz-nos sentir um sentimento de deslocação
física (1)
Relação da obra com os públicos 18 2,07
à disposição de todos (1), aberta à participação (1), das massas (1), de culto (1), deixa o público
KO (1), desperta curiosidade (1), exige uma tomada de posição do público (1), familiar (1),
impossível escapar-lhe (1), não facilita vida dos fãs (1), não faz tremer os joelhos a ninguém (1),
para um público minoritário (2), põe o público em perigo (1), preservá-la é serviço público (2),
questiona o público (1), sobre ela recaem todas as atenções (1)
Apreensão da obra 12 1,38
ambígua (1), apenas ouvidos testados perceberão (1), complexa (3), complicada (1), difícil de
apreender (3), indefinível (2), inteligível (1)
Reconhecimento e fama da obra 81 9,30
aclamada (1), aplaudida (1), apoteótica (1), celebrada (1), célebre (3), clássico (7), conhecida (1),
desconhecida (2), é tema de conversa (1), épica (1), êxito (5), famosa (2), faz história (1),
fenómeno (3), importante (9), marcante (7), mediática (2), memorável (2), mítica (3),
monumental (4), nos tops (2), ocupa lugar de destaque (1), passa despercebida (1), popular (1),
premiada (5), sucesso (11), tem vindo a ser recuperada pelo Estado (1), teve muita atenção (1),
tocante (1)

214
O “mundo de aventura” do artista

Relação obra-qualidade 84 9,64


Obra com qualidade 74 8,50
boa (2), brilhante (3), deixa a fasquia bem alta (1), eficaz (1), eleva a fasquia para
os outros sucessores (1), espantosa (1), espectacular (1), excelente (1), exímia (1),
extraordinária (2), fantástica (1), fixe (1), genial (2), gloriosa (1), grande (5),
grandiosa (1), impressionante (2), magnífica (8), maravilhosa (3), notável (1),
obra-chave (2), obra-farol (1), obra-mestre (1), obra-prima (4), obra-sensação (1),
óptima (1), passada de geração em geração (1), perfeita (4), preciosa (1),
proeminente (1), promissora (1), requintada (1), sublime (1), tornou-se emblema
de uma geração (1), uma das melhores (13), vale a pena(1)
Obra sem qualidade 10 1,15
falhada (3), fracasso (1), hedionda (1), imperfeita (2), má (2), péssima (1)
Consequências da obra 25 2,87
abrasiva (1), arrasadora (1), caótica (1), catastrófica (2), causa debate (1), causa impacto (3),
causa sensações (1), chocante (1), controversa (1), dá que falar (1), desarmante (1), didáctica (1),
escandalosa (3), esmagadora (1), hipnótica (1), pedagógica (1), polémica (2), suspende os
sentidos (1), tumultuosa (1).
Raridade e singularidade da obra 17 1,95
atípica (2), especial (3), inigualável (1), insólita (1), invulgar (2), já não se faz (1), rara (1),
relíquia (1), peculiar (1), singular (3), única (1)
Poder/influência da obra junto da sociedade 39 4,48
anti-autoridade (1), anti-política (1), consciente (1), contra-revolucionária (1), democrática (1),
denunciadora (1), desviante (1), difamatória (1), fracturante (1), fragmentária (1), gritando
revolta (1), hino libertário (1), influente (3), inspiradora (1), libertadora (1), manipuladora (1),
move montanhas (1), não deixa pedra sobre pedra (1), não é política (1), não vai revolucionar
nada (1), poderosa (3), põe o público a pensar (1), política (5), pouco impacto na consciência
nacional (1), propagandística (1), provocadora (1), revolucionária (2), subversão das relações de
poder (1), transformadora (1), transgressora (1)
Necessidade de criação da obra 9 1,03
aguardada (5), esperada (1), fundamental (1), necessária (1), urgente (1)
Obra e riscos 9 1,03
arriscada (2), arrojada (1), audaz (1), aventureira (1), desafio (3), não arrojada (1)
Intencionalidade da obra 8 0,92
ambiciosa (2), homenagem a… (2), ideia de celebrar a existência (1), mostra o que é certo e
errado (1), não intencional (1), propõe experiência física e sensorial (1)
Ironia na obra 9 1,03
cínica (1), irónica (4), sarcástica (2), satírica (2)
Atratividade da obra 12 1,38
agradável (1), atractiva (1), cativante (2), deliciosa (1), entusiasmante (3), não cativa (1),
vibrante (3)
Delicadeza da obra 13 1,49
amansada (1), aveludada (1), delicada (2),elegante (5), graciosa (2), untuosa (1), vaporosa (1)
Independência da obra 9 1,03
autónoma (1), independente (3), livre (4), solta (1)
Simplicidade da obra 7 0,80
minimal (2), simples (5)

215
O “mundo de aventura” do artista

Obra associada à criatividade 25 2,87


criativa (1), de outro planeta (1), distingue-se (1), fantasiosa (1), futurista (1), imaginativa (2),
olhar peculiar (1), original (2), pouco convencional (1), radical (1), sonhadora (2), surpreendente
(5), um passo à frente (1), vanguardista (4), versátil (1)
Obra associada ao sentimento 14 1,61
com alma (1), comovente (1), emotiva (5), experiência sensorial (1), nostálgica (1), romântica
(1), sensível (2), sentida (1), visceral (1)
Obra associada à tristeza 33 3,79
abandonada (1), amargurada (1), assombra (1), assombrada (1), assustadora (2), claustrofóbica
(1), de luto (1), desnorteada (1), dominada por um clima de desespero (1), dramática (1), febril
(1), louca (1), melancólica (2), negra (1), obscura (2), paranóica (1), perturbada (1), pessimista
(1), sinistra (1), só (1), solitária (1), sufocante (1), suicidária (1), suspirando desespero (1), teatral
(1), tempestuosa (1), tétrica (1), tonta (1), traumática (1), triste (1)
Características da obra (de tempo, de espaço e técnicas) 21 2,41
Tempo
7 0,80
demorada (1), duração da obra (4), rápida (2)
Espaço
7 0,80
espaçosa (1), grande dimensão (3), longa (2), pequena dimensão (1)
Técnicas
barulhenta (1), melódica (1), rítmica (1), ruidosa (1), silenciosa (1), sonante (1), 7 0,80
sonoridade convulsa e frenética (1)
Outras características da obra 142 16,30
a sério (1), séria (1), verdadeira( 1) 3 0,34
atarraxada (1) 1 0,11
caleidoscópica (1), reinventa-se (1) 2 0,23
cândida (1), catártica (1), etérea (1), imaculada (1) 4 0,46
cerimonial (1) 1 0,11
certeira (1) 1 0,11
cheia (1) 1 0,11
com cabeça, tronco e membros (1), disforme(1), não encaixa (1) 3 0,34
com humor (2), paródica (1) 3 0,34
comunicativa (1), inexpressiva (1), pouco comunicativa (1) 3 0,34
conceptual (4) 4 0,46
conta uma história (1) 1 0,11
crua (1), dura (2), fria (2) 5 0,57
degradada (1) 1 0,11
densa (2), vasta (1) 3 0,34
desconexa (1) 1 0,11
desprotegida (1) 1 0,11
desumana (1) 1 0,11
dinâmica (1) 1 0,11
discreta (1), subtil (2), tímida (1) 4 0,46
distópica (1) 1 0,11
diversificada (3) 3 0,34
empoeirada (1) 1 0,11
enérgica (1) 1 0,11
enjoativa (1), fustigante (1), irritante (1), sinuosa (1), xaroposa (1) 5 0,57
equilibrada (1), fluída (1), harmoniosa (1) 3 0,34
erótica (2), insinuante (1), picante (1), sedutora (1), sensual (1) 6 0,69
esquelética (2) 2 0,23

216
O “mundo de aventura” do artista

estranha (4), macabra (1) 5 0,57


excessiva (1) 1 0,11
feminina (1) 1 0,11
forte (2) 2 0,23
fracturada (1), fragmentada (1) 2 0,23
frágil (2), vulnerável (2) 4 0,46
generosa (2) 2 0,23
híbrida (2) 2 0,23
hilariante (1), jovial (1) 2 0,23
icónica (1) 1 0,11
idílica (1) 1 0,11
impenetrável (1), inatacável(1) 2 0,23
implacável (1) 1 0,11
imprevisível (2) 2 0,23
insaciável (1) 1 0,11
insular (1) 1 0,11
inteligente (1) 1 0,11
intensa (4) 4 0,46
interessante (2) 2 0,23
intimista (4) 4 0,46
labiríntica (1) 1 0,11
lacónica (1) 1 0,11
mágica(1) 1 0,11
maldita (1) 1 0,11
menos abstracta (1) 1 0,11
menos datada (1) 1 0,11
menos perecível (1) 1 0,11
menos ruminante (1) 1 0,11
metafórica (1), simbólica (1) 2 0,23
milagrosa (1) 1 0,11
misógina (1) 1 0,11
misteriosa (4), secretismo à sua volta (1) 5 0,57
não cede (1), inesgotável (1) 2 0,23
não conforta (1) 1 0,11
não é “limpa” (1) 1 0,11
não é essencial (1) 1 0,11
não é estritamente espacial (1) 1 0,11
não é óbvia (1) 1 0,11
não é uma abstracção (1) 1 0,11
nómada (1), transportável (1) 2 0,23
obediente (1) 1 0,11
orgânica (2) 2 0,23
parada (1), viva (3) 4 0,46
preocupada (1) 1 0,11
redonda (1) 1 0,11
ritualista (1) 1 0,11
serena (1),selvagem (1) 2 0,23
sobrenatural (1) 1 0,11
TOTAL 871 100

217
O “mundo de aventura” do artista

218
O “mundo de aventura” do artista

Anexo 3E. As representações do artista no Ípsilon

Total
AS REPRESENTAÇÕES DO ARTISTA NO ÍPSILON
fi %
Dados biográficos 359 25,35
Nome 11 0,78
nome artístico anterior (1), nome estranho (1), nome verdadeiro (6), onde surgiu o
seu nome artístico (1), onde surgiu o seu nome verdadeiro (1), significado do seu
nome (1)
Nascimento 91 6,43
data nascimento (51), local de nascimento (40)
Morte 41 2,90
causa da morte (7), data da morte (32), local da morte (1), morte precoce (1)
Idade 30 2,12
21 (2), 22 (2), entre os 19 e os 22 (1), 26 (1), 27 (1), 28 (1), 30 (1), 31 (1), 35 (2), 37
(1), 38 (1), 39 (1), 42 (1), 46 (2), 51 (1), 60 (1), 62 (1), 64 (1), 65 (1), 66 (1), 69 (2),
Sexagenário (1), 80 (2), 82 (1)
Morada 32 2,26
local de residência actual (17), local onde já viveu (15)
Nacionalidade 153 10,81
Africana (4): congo (1), etíope (1), malaio/maliano (2); Americana (41): anglo-
brasileiro (1), argentino (2), brasileiro (7), canadiano (4), chileno (1), colombiano (1),
cubano (1), jamaicano (1), mexicano (2), norte-americano (19), peruano (1),
venezuelano (1); Asiática (6): chinês (3), israelita (1), nigeriano (1), paquistanês (1);
Europeia (95): alemão (3), austríaco (1), basco (1), belga (4), bielorrusso (1),
britânico (9), catalão (1), checo (1), dinamarquês (7), escocês (1), esloveno (1),
espanhol (2), finlandês (2), francês (10), holandês (2), inglês (10), irlandês: (2),
islandês (1), macedónio (1), norueguês (2), polaco (1), português (22), romano (1),
romeno (1), sérvio (1), sueco (5), ucraniano (1), vienense (1), Oceânica (1):
australiano (1), Outras (6): ascendência russa e japonesa (1), russo (5)
Etnia 1 0,07
judeu (1)
Infância 5 0,35
em pequeno, queria ser actor e cantor (1), em pequeno, queria ser médico (1), pobre em criança (2),
violentado pelo tio (1)
Relação da família com as artes 9 0,64
família ligada às artes (8), família não ligada às artes (1)
Entrada no mundo das artes 11 0,78
idade que tinha quando surgiu no panorama artístico (10), percurso doloroso (1)
Educação, formação e profissão 55 3,88
Formação na área em que trabalha 14 0,99
arquitectura (1), artística (não especificada) (4), audiovisual (1), canto lírico (1),
cinema (1), escultura (1), formação clássica (1), formação convencional (1),
fotografia (1), lições de canto (1), pintura (1)
Formação noutra área 9 0,64
administração (1), engenharia (2), filosofia (1), física (1), letras (1), matemática (1),
medicina (1), publicidade (1)

219
O “mundo de aventura” do artista

Outras profissões que já teve/tem 32 2,26


Ligada às artes (8): arquitecto (1), bailarino (1), cantor lírico (1), crítico de arte (1),
escritor (2), físico (1), fotógrafo (1)
Não ligada às artes (24): delegado de informação médica (1), engenheiro civil (1),
engenheiro militar (1), historiador (1), jornalista (4), médico (2), merceeiro (1),
monge (1), não especificado (1), presidente da federação espírita (1), professor (7),
seminarista (1), tradutor (1), vendedor em loja de discos (1)
Hobbies 19 1,34
Artísticos, mas noutro ramo 10 0,71
BD(1), cinema (1), desenho (1), história do pop (1), literatura (4), pintura (1),
folclore (1)
Não artísticos 9 0,64
agricultura (1), ciência (1), colecionadorismo (1), ficção científica (1), investigação
(1), linguística (2), mobiliário (1), teorias cósmicas (1)
Características físicas e indumentária 73 5,16
ágil (1), charmoso (1), elegante (2), falar lento (1), grande (11), jovem (12), novo (1), parece mais
velho (1), parece uma criança (3), patinho feio (1), referência ao aspecto físico (23), referência ao
modo de vestir (14), transpira (1), velho (1)
Relação com o álcool e com as drogas 3 0,21
alimentava-se a champanhe (1), relação com as drogas (1), viciado em drogas (1)
Sexualidade 4 0,28
ambiguidade sexual (1), fetiches doentios (1), homossexualidade (1), não é maricas (1)
Processo de criação 110 7,77
aberto a tudo (1), amante de paradoxos (1), baseia-se na realidade (1), cabeça cheia de ideias (1),
coloca os seus dilemas na obra (1), conceptual (1), conciso (1), dinâmico (3), disciplinado (1),
entrega-se a 100% (2), envolvimento controlado (1), esporádico (1), experimentalista (6), explora
e/ou ultrapassa limites (3), facilidade de criar (1), formalista (1), cerebral (2), gosta de desafios (1),
gosta de se localizar em terrenos incertos (1), imaginativo (1), imitação de (1), improvisa (2),
influências à flor da pele (1), inspirado (11), interdisciplinar (1), joga com o que sabe (1), liberdade
criativa (5), linguagem própria (2), meticuloso (1), metódico (3), minucioso (1), multidisciplinar
(1), multi-instrumentalista (1), multimédia (1), não brinca em serviço (1), não confia na inspiração
e sim na repetição dos gesto (1), não está disposto a tudo (1), não faz concessões (1), não faz
planos (1), não se limita a criar (1), não tem medo de arriscar (2), não tenta esconder as falhas da
obra (1), obcecado por obter o máximo de informação (1), opera num território híbrido (1),
perfeccionista (3), pesquisador (1), planeador (2), prefere meios analógicos (1), preguiçoso (1),
preocupado com cada obra e não com a originalidade (1), preparado (1), procura reflectir a
realidade na obra (1), radical (2), recolhe impulsos de várias áreas (1), relação mística com o
trabalho (1), sabe o que quer (1), sacrifica-se pela obra (2), segue as indicações (1), segue as
tendências (1), sem cedências estéticas (1), técnica extraordinária (1), tem o seu género (1), tira
partido das novas tecnologias (5), trabalhador (1), trabalhava na obra até ao último segundo (1),
transversal (1), viciado no trabalho (4), ziguezagues estilísticos (1)
Aprendizagem e influências 20 1,41
aprendeu com os heróis e mentores (1), aprendeu com os monges (1), autodidacta (2), comparado
com outro artista do ramo (8), influenciado por... (8)
Dom e talento 14 0,99
dom (2), talentoso (12)

220
O “mundo de aventura” do artista

Relação com a crítica e com os públicos 34 2,40


abana multidões (1), aclamado (1), adoptado pelas massas (1), aplaudido de pé (1), assustado com
os fãs (1), bajulado (1), causa sensação (1), celebrado (3), confia no público e o público nele (1),
conquistou a crítica (2), conquistou o público (1), coqueluche (1), deixa o público de fora das suas
escolhas (1), detestado (1), elogiado (3), familiar (1), ídolo (2), irrita (1), mal-visto (1), muitos fãs
(1), não agrada a generalidade do público (1), popular (2), reúne consenso (1), seguido pelos fãs
(1), sobrevivente (às críticas e biografias) (2), vaiado (1)
Reconhecimento e fama 179 12,64
admirado (1), agitou o panorama artístico (1), ainda ninguém o igualou (1), artista de “primeira
linha” (1), atingiu o auge (1), célebre (1), celebridade (2), chama a atenção por ser mulher (1),
conhecido (3), determinante (na área) (1), dispensa apresentações (1), emblemático (1), estatuto
privilegiado no ramo (1), estrela (9), excelente (2), expoente máximo (1), extraordinário (2),
famoso (2), fascinante (3), favorito (2), fenómeno (6), figura de culto (2), figura incontornável (1),
galardoado (1), génio (6), herói (5), ícone (3), importante (9), inconfundível (1), individualidade
(1), inigualável (3), inspirador (1), lenda-viva (2), marcante (11), messias da área (1), mestre (8),
mito (4), não é reconhecido (2), nome de referência (15), notável (2), perdeu relevância (1), prémio
(possibilidade) (9), prémio recebido (25), prestigiado (1), protagonista (2), provocou o nascimento
de outros artistas (1), regresso aguardado (1), responsável por um movimento (2), símbolo (1),
solicitado (1), sucesso (9), tem vindo a definir o futuro do ramo (2), um “caso” (1), uma bênção
(1), vulto (1)
Mediatismo 36 2,54
amado pelos media (1), aparece frequentemente (1), aparece raramente (1), carismático (1), dá nas
vistas (1), dá que falar (8), é notícia (1), evitava os media (1), expõe-se (1), exuberante (2), lança
fait-divers (1), não é amado pelos media (1), não lê o que escrevem sobre ele (1), o mundo está de
olhos nele (1), os holofotes pousam sobre ele (1), passou despercebido (1), polémico (8), prefere o
anonimato (1), saiu do radar mediático (1), tudo que faz é notícia (1), vedeta (1)
Qualidade do artista 26 1,84
Artista de qualidade 24 1,69
bom (1), brilhante (8), colosso (1), de qualidade (1), diamante (1), maduro
(artisticamente) (1), magnífico (1), maior (1), majestoso (1), maravilhoso (1),
monstro (de qualidade) (4), óptimo (1), perfeito (1), promissor (1)
Artista sem qualidade 2 0,14
artisticamente morto (1), pouco estimulante (1)
Orientações e tendências artísticas 16 1,13
anti nostalgia (1), anti-progresso (1), contra a mitificação da obra (1), discurso feminista
radicalizado (1), não mainstream (2), não-controlador (1), não-estratégico (1), oscila entre géneros
(1), pós-moderno (1), pouco adepto de conceitos (1), progressivo (1), puxa pelos fracos (1),
surrealista (1), tradicional (2)
Forma de encarar a profissão 19 1,34
acha que a actividade artística deve ter horário fixo (1), ama o que faz (1), autocrítico (1),
ambicioso (1), auto-depreciativo (1), em permanente evolução (1), encontrou o seu espaço (1),
ético (1), foi descuidando a veia criativa (1), gere os seus próprios escândalos (1), não facilita (1),
não se cansa do seu trabalho (1), não tem medo do ridículo (1), tem construído o seu caminho (1),
tornou-se o tipo de artista que não queria ser (1), vê a arte como um trabalho igual a qualquer outro
(1), veio para ficar (2), vivia para lá da obra (1)
Carreira 11 0,78
agenda apertada (1), carreira breve (2), entrou depressa numa redoma (1), está no estilhaço do
mapa musical (1), está por todo o lado (1), internacional (1), percorre o mundo (1), surgiu de
repente (1), tudo lhe está a acontecer muito depressa (1), viajador (1)

221
O “mundo de aventura” do artista

Objetivos e ambições 12 0,85


não poupa nem dizima ninguém (1), não pretende agradar às massas (2), não se importa com os
prémios (1), procura a catarse (1), procura a palavra certa (1), procura desviar-se do
sentimentalismo (1), procura redenção na obra (1), procura uma vida simples (1), procurava o
prazer de se cultivar (1), vontade de mudar (2)
Relação com a política 4 0,28
como um cientista político louco (1), consciência política (1), político (1), socialista (1)
Papel interventivo do artista 33 2,33
agitador (1), alerta (1), consciencioso (2), critico (1), de armas (2), desbocado (1), expansivo (1),
expressivo (1), faz ultimatos (1), general (1), influente (8), inquieto (1), insatisfeito (1),
interventivo (1), líder (1), lutador (1), manipulador (1), provocador (4), questionador (1), rebelde
(1), revolucionário (1)
Relacionamento com os outros 4 0,28
amigo de outros vultos da área (1), amigos no mundo inteiro (1), dificuldade em relacionar-se com
o sexo oposto (1), dificuldade em relacionar-se com os outros (1)
Relação com o dinheiro 6 0,42
aumento da sua conotação no mercado (1), mais vendido (1), milionário (1),rejeita os luxos (1),
rico (1), vendido (1)
Relação com a obra 6 0,42
cada vez acredita menos na obra (1), ele e a obra são um só (1), permanece através da obra (4)
Raridade e singularidade do artista 7 0,49
diferente (1), especial (1), espécie rara (1), excepcional (1), singular (2), único (1)
Artista e sentimento 10 0,71
emotivo (2), esbanja amor (1), romântico (2), sensível (5)
Artista e ironia 16 1,13
irónico (7), sarcástico (1), sentido de humor (8)
Artista e criatividade 23 1,62
excêntrico (1), futurista (1), inovador (2), original (2), pioneiro (11), progressista (1), surpreendente
(2), vanguardista (3)
Artista e espiritualidade 12 0,85
convoca o Diabo (1), epifanias (1), espiritual (2), heterodoxo (2), místico (3), mundano (1), não
religioso (1), pecador (1)
Artista e conhecimento 7 0,49
conhecedor (1), culto (1), intelectual (1), inteligente (2), sábio (2)
Artista e timidez 14 0,99
de poucas palavras (1), discreto (1), isolado (1), recatado (1), reservado (4), retraído (1), tímido (5)
Artista e fragilidade emocional 20 1,41
amargurado (1), assombrado (1), atordoado (1), atormentado (1), bateu no fundo (1), desajustado
(1), frágil (6), frustrado (2), inadaptado (1), magoado (1), melancólico (1), ressabiado (1),
vulnerável (2)
Artista e alegria 20 1,41
alegre (2), descontraído (2), divertido (1), enérgico (5), entusiasmado (4), extrovertido (2), feliz (3),
radiante (1)

222
O “mundo de aventura” do artista

Artista e afetuosidade 9 0,64


afável (1), afectuoso (1), doce (3), encantador (1), enternecedor (1), gracioso (1), terno (1)
Relação do artista com o tempo 13 0,92
à antiga (1), contemporâneo (4), do seu tempo (1), fiel ao seu tempo (1), histórico (2), intemporal
(1), moderno (2), nem sempre compreendido no seu tempo (1)
Outras características do artista 197 13,91
a sério (1) 1 0,07
absoluto (1) 1 0,07
acutilante (1), incisivo (1) 2 0,14
ADN de artista (1), aura artística (2), é artista e não há nada a fazer para mudar isso (1) 4 0,28
aforista (1), minimalista (2), simplista (1) 4 0,28
analisado pela psicologia americana (1) 1 0,07
anormal (1) 1 0,07
apagado (1) 1 0,07
arrogante (1), snobe (1), soberbo (1) 3 0,21
áspero (1), duro (1), frio (1), impessoal (1), impiedoso (1) 5 0,35
atitude de celebração da existência (1) 1 0,07
atrevido (1) 1 0,07
autónomo (1), independente (2) 3 0,21
avaliador (1), julgador (1) 2 0,14
aventureiro (1), corajoso (1), destemido (1) 3 0,21
avisado (1) 1 0,07
bom coração (1) 1 0,07
bom parceiro (1) 1 0,07
bomba (1) 1 0,07
camaleão (1), moldável (1), transfigurável (1), versátil (1) 4 0,28
cândido (1), puro (2) 3 0,21
capaz (1) 1 0,07
com classe (1) 1 0,07
complexos de inferioridade (1) 1 0,07
compulsivo (1) 1 0,07
conquistador (1) 1 0,07
constante (1) 1 0,07
contemplativo (1), observador (1), ponderado (1), reflexivo (1), sereno (1), tranquilo (1) 6 0,42
contraditório (1) 1 0,07
controlador (2), manda-chuva (1) 3 0,21
credível (1), gerava desconfiança (1),transmite confiança (1) 3 0,21
cria expectativas (2) 2 0,14
criador (1), fundador (1) 2 0,14
criou nova tradição (1), destreinado (1), parou algum tempo (2) 4 0,28
curioso (1) 1 0,07
deixa-nos perplexos (1) 1 0,07

223
O “mundo de aventura” do artista

descomplexado (1) 1 0,07


desesperado (1) 1 0,07
desestabilizador (1) 1 0,07
desiludido com o rumo do seu país (1) 1 0,07
domado (1) 1 0,07
egocêntrico (1) 1 0,07
elitista (2) 2 0,14
empolgante (1), entusiasmante (1) 2 0,14
enigmático (1), labiríntico (1), misterioso (5), secreto (2) 9 0,64
esperançoso (1) 1 0,07
espontâneo (1) 1 0,07
estranho (2) 2 0,14
estreante (1), não é novato (1), novato (1) 3 0,21
exasperante (1) 1 0,07
excêntrico (1) 1 0,07
excessivo (1) 1 0,07
falso humilde (1), humilde (2), modesto (3) 6 0,42
fantasma (1) 1 0,07
fascinado (2), sonhador (1) 3 0,21
faz sentido (1) 1 0,07
faz-nos duvidar da realidade (1) 1 0,07
fiel a si próprio (2) 2 0,14
figura a seguir com atenção (1), revelação (2) 3 0,21
freak (1) 1 0,07
frívolo (1) 1 0,07
generoso (1) 1 0,07
honesto (1), virtuoso (1) 2 0,14
imenso (1) 1 0,07
infatigável (1), imparável (1) 2 0,14
impetuoso (1), violento (1) 2 0,14
impulsivo (1) 1 0,07
inocente (1) 1 0,07
insinuante (1), maroto (1), perverso (1) 3 0,21
interesseiro (1) 1 0,07
intimista (2) 2 0,14
introspectivo (1) 1 0,07
intuitivo (4) 4 0,28
irrequieto (2) 2 0,14
juvenil (2) 2 0,14
liberto (1), livre (2) 3 0,21
ligado à sua cidade natal (2) 2 0,14
maniento (1), ticoso (1) 2 0,14
megalómano (2) 2 0,14
224
O “mundo de aventura” do artista

meloso (1) 1 0,07


mimado (1) 1 0,07
moralista (1) 1 0,07
mulher fatal (2) 2 0,14
mulher-bibelô (1) 1 0,07
nómada (1) 1 0,07
nunca teve paz (1) 1 0,07
obscuro (1) 1 0,07
obsessivo (2), paranóico (1) 3 0,21
odiava outro artista (1), vive no ódio (1) 2 0,14
optimista (1) 1 0,07
ovelha negra (1) 1 0,07
ovni (1) 1 0,07
patamar superior (1) 1 0,07
pavão (1) 1 0,07
persona non grata (1) 1 0,07
pertence às ruas (1) 1 0,07
poderoso (1) 1 0,07
pressionado (2), resiste às pressões (1) 3 0,21
pungente (1) 1 0,07
rancoroso (1), raiva para com o mundo (1) 2 0,14
receptivo (1) 1 0,07
relação com a natureza (2) 2 0,14
seguro (2), transmite segurança (1) 3 0,21
simpático (1) 1 0,07
teimoso (1) 1 0,07
totó (1) 1 0,07
transparente (1), verdadeiro (1) 2 0,14
uma incógnita (1) 1 0,07
veterano (1) 1 0,07
vivacidade (1) 1 0,07
Total 1416 100

225

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