Nhatuve (2013) - 085018
Nhatuve (2013) - 085018
Nhatuve (2013) - 085018
Évora, 2013
UNIVERSIDADE DE ÉVORA
ESCOLA DE CIÊNCIAS Sociais
DEPARTAMENTO DE LINGUÍSTICA E LITERATURA
Évora, 2013
Com palavras me ergo em cada dia!
Com palavras lavo, nas manhãs, o rosto
e saio para a rua.
(…)
Possuímos, das palavras, as mais belas;
as que seivam o amor, a liberdade...
(…)
Com elas eu me deito, me levanto,
e faltam-me palavras para contar...
Aos meus pais, por me criarem e por cuidarem da minha família na minha ausência;
À minha esposa, pelo amor, compreensão, confiança e coragem mesmo nas dificuldades;
À Catarina Costa, pela força, apoio e confiança na hora de decisões sobre a minha vida;
À Claidy e à Giovana, pela amizade e pelas nossas brincadeiras, apesar de lhes fugir
sempre;
Ao Dom Hilário, pela coragem e apoio moral;
Ao Moisés Mafuane, pela amizade e ajuda na realização do inquérito em Maputo;
Ao Isaías Mavota, pela amizade e apoio para a aplicação do inquérito em Tete (Songo);
Ao Amândio Quiolim, pelo apoio moral e financeiro e pelo esforço para inquirir alunos e
professores de Cabo Delgado;
À Onésia Lurdes, pela ajuda na realização do inquérito em Gaza (Xai-xai);
À Universidade de Évora que por intermédio dos seus funcionários me orientou desde a
candidatura até este estágio;
Às Profas. Doutoras Maria do Céu Fonseca, Maria João Marçalo e Ana Alexandra Silva,
por me proporcionarem aprendizagem diversificadas; e às duas primeiras, por me aceitarem
como orientando e pelos diversos e sábios contributos;
Ao IPAD, pela bolsa para a minha estadia em Portugal durante os dois anos do mestrado;
À Doutora Mónica Tavares, por me orientar no período de candidaturas, de pedido de visto
e para conseguir a passagem;
Às direções do distrito e da escola de Quissico, pela generosidade e por me terem facilitado
a recolha de dados de que necessitava para a elaboração do trabalho;
Ao Manuel Macuácua, primeiro amigo na academia, por me facilitar o acesso aos
programas de Português no ensino secundário;
Ao Augusto Almeida, que me recebeu em Évora e me levou para a casa onde me alojei;
Ao Ermelindo Enoque, pela amizade e conversas construtivas;
A todos a quem devo a minha personalidade, o meu Khanimambo1.
1
Muito obrigado
Dedicatória
Às minhas meninas
Irmãs de sangue
Verdadeiras amigas e
Companheiras fiéis
Índice
Agradecimentos
Dedicatória
Resumo ................................................................................................................................................ 1
Abstract ............................................................................................................................................... 2
Ensino-aprendizagem do Vocabulário do Português como L2 em Contextos Multilingues: o caso do
ensino secundário em Moçambique .................................................................................................... 3
Introdução............................................................................................................................................ 3
Capítulo I ............................................................................................................................................. 6
1. Breve historial da língua portuguesa em Moçambique ............................................................... 6
1.1. Localização de Moçambique ............................................................................................... 6
1.2. Expansão da língua portuguesa até chegar a Moçambique ................................................. 8
1.3. Ensino-aprendizagem do Português antes da Independência ............................................ 12
1.3.1. O Século XX e a política de assimilação ................................................................... 15
1.3.2. Ensino da Língua Portuguesa entre 1945 -1975 ........................................................ 18
1.4. Ensino-aprendizagem do Português depois da Independência .......................................... 21
Capítulo II.......................................................................................................................................... 26
2. Trabalho de campo: inquérito linguístico .................................................................................. 26
2.1. Leitura dos dados............................................................................................................... 29
2.2. Apreciação dos atuais programas de ensino ...................................................................... 32
Capítulo III ........................................................................................................................................ 38
3. Ensino-aprendizagem do Português como L2 ........................................................................... 38
3.1. Conceitos de L2 vs LE....................................................................................................... 38
3.2. Algumas abordagens metodológicas do ensino de LP como L2 ....................................... 42
3.2.1. Metodologia tradicional (MT) ................................................................................... 43
3.2.2. Metodologia direta (MD) .......................................................................................... 44
3.2.3. Metodologia áudio-oral (MAO) ................................................................................ 45
3.2.4. Metodologia audiovisual (MAV) .............................................................................. 46
3.2.5. Metodologia comunicativa (MC)/Pedagogia de autonomia ...................................... 47
3.2.5.1. Método de elaboração conjunta (MEC)……………………………….......48
3.3. Vocabulário vs Léxico ....................................................................................................... 50
3.4. Ensino-aprendizagem do vocabulário do Português como L2 .......................................... 53
3.4.1. Aspetos linguísticos do ensino-aprendizagem do vocabulário da LP como L2 ........ 69
3.4.1.1. Aspetos morfológicos………………………………………………………74
3.4.1.1.1. Forma oral e escrita da palavra − fonética e fonologia da palavra……..74
3.4.1.1.2. Estrutura das palavras: radicais e afixos − derivação e composição……81
3.4.1.1.2.1. Algumas particularidades flexionais dos substantivos….…………...94
3.4.1.2. Usos sintáticos da palavra…………………………………………………...97
3.4.1.2.1. Propriedades sintáticas e o comportamento das palavras numa frase........97
3.4.1.2.2. Relações sintagmáticas entre as palavras ……………………………….105
3.4.1.2.3. Propriedades e relações semâticas e pragmáticas das palavras ………...108
Capítulo IV ...................................................................................................................................... 112
4. Propostas de didatização.......................................................................................................... 112
Sugestões ......................................................................................................................................... 126
Conclusão ........................................................................................................................................ 128
Bibliografia...................................................................................................................................... 131
1
Teaching and Learning Vocabulary of Portuguese as a Second Language in Multilingual
Contexts ‒ case of secondary school in Mozambique
Abstract
This dissertation talks about teaching, learning and improvement of vocabulary of
Portuguese in Mozambique. The process is discussed because of the traditional approaches that
focus on grammatical and syntactic structures, at the expense of the vocabulary. So it jeopardizes
the balanced improvement of vocabulary because of the poor quality of the linguistic input that
students have access at school and in their community.
It is essential to focus on vocabulary in secondary school, starting always from a context
in order to motivate the learners. The aspects of vocabulary teaching must be all that can lead
students to their linguistic and vocabulary autonomy. So it seems appropriate to gather the words
into groups of contents and grammatical words. It is recommended an eclectic approach, and to
begin from the basic words and knowledge, and gradually enrich it with words from the lexicon.
The evaluation, finally, should consist of communicative competence.
2
Ensino-aprendizagem do Vocabulário do Português como L2 em Contextos
Multilingues: o caso do ensino secundário em Moçambique
Sem gramática muito pouco se pode exprimir (...).
Sem vocabulário nada se pode exprimir
(Wilkins,1976 apud Nhampule & Morno 2004: 67).
Introdução
A questão do ensino do vocabulário da LP é crucial em vários países e sobretudo nos
considerados multilíngues, como é o caso de Moçambique. A situação torna-se muito crítica pelo
facto de se verificar nesses espaços uma tendência de secundarizar a LP em situações de
comunicação sociocultural. Aliás, este idioma com o estatuto de LO (língua da instrução, da
política, da administração, etc.) é somente tido como “meio de socorro”, ao qual se recorre
quando falha a comunicação em línguas autóctones. Com efeito, a situação põe em causa o
processo de ensino da LP e do seu vocabulário, apesar do prestígio e da função vital que ela tem
no funcionamento da nação.
O atual estado da LP em Moçambique, caracterizado por desvios e variações
relativamente à norma do PE, bem como a sua difusão no território são reflexos de uma longa
história que conduziu à atual situação de idioma falado por cerca de 39,5% da população,
constituindo LM de apenas 6,5% (cf. Gonçalves 2010: 27). É neste contexto que se pretende
fazer um estudo de estratégias linguístico-pedagógicas e comunicativas a nível socioeducativo
para promover o ensino-aprendizagem e o desenvolvimento do vocabulário no ensino secundário
moçambicano, partindo das reais causas que comprometem o uso da LP.
A presente dissertação gravita, desta feita, em torno do ensino e aprendizagem do
vocabulário de Português como L2 em contextos multilingues. Numa perspetiva funcional2, em
que as palavras sejam ensinadas e aprendidas para desempenharem funções na comunicação (cf.
Neves 1997: 3), visa-se com este trabalho um objetivo a dois níveis, nomeadamente: o do
processo de ensino-aprendizagem e o da competência comunicativa. Neste contexto, pretende-se,
de uma forma geral, permitir o desenvolvimento do vocabulário através de uma atividade
sistemática, consciente e coordenada da sociedade, dos professores e de todos, para melhorarem
a performance linguístico-comunicativa dos alunos, ou seja, para que o vocabulário desempenhe
cabalmente a sua função.
2
As palavras constituem os instrumentos que a língua oferece para a arquitetura de enunciados comunicativos. Ora,
a própria língua, na perspetiva martinetiana, existe como tal porque desempenha funções na sociedade, daí o seu
valor funcional.
3
Para a realização destes objetivos gerais importam outros mais específicos, que se
resumem a: (a) identificar os aspetos que dificultam o desenvolvimento do vocabulário; (b)
contribuir por um suplemento teórico-prático que oriente a planificação, execução e avaliação do
ensino-aprendizagem do vocabulário da LP como L2; (c) demonstrar a necessidade e a
possibilidade de ensinar as palavras; (d) sugerir estratégias e/ou metodologias quer aos alunos,
quer aos profissionais de ensino, para estes elevarem o seu empenho no ensino-aprendizagem do
vocabulário; (e) contribuir para a eficácia do processo através de estratégias que tenham em
conta a realidade linguístico-educativa de Moçambique.
Os motivos que estão na origem da escolha do tema exposto, num contexto de Mestrado
em Ciências da Linguagem e da Comunicação (Linguística Portuguesa Aplicada), prendem-se
com o facto de os alunos moçambicanos do ensino secundário (e não só) apresentarem muitas
limitações no uso do vocabulário, desde o desconhecimento das palavras e dos seus significados,
passando pela falta de criatividade até à má seleção e colocação das mesmas durante o ato
comunicativo. Para além disto, a referida escolha deve-se ao facto de tais alunos representarem a
classe média em termos socioeducativos, com responsabilidades acrescidas, portanto, em termos
de domínio da LP. Acrescente-se que, concluído um dos ciclos do nível, os cidadãos podem
ingressar na vida ativa, inclusive no quadro da docência no ensino primário.
Sobre o vocabulário, que o mesmo é dizer conjunto de vocábulos realmente existentes e
usados por uma comunidade linguística num determinado espaço e tempo, Azenha defende a
necessidade de se dar primazia à sua aprendizagem (cf. Azenha 1997: 20-21), embora se debruce
sobre o ensino-aprendizagem de LNM no geral e não especificamente da LP. Não é uma tarefa
fácil, reconhece-se; sobretudo atendendo a que estão em jogo diversas dimensões que intervêm
no sucesso da comunicação: particularidades gramaticais, fonológicas, aspetos de derivação,
significados e usos das palavras, relações de compatibilidade ou combinações sintagmáticas:
Il ne s’agit pas tant d’accumuler sans cesse de nouveaux mots que de découvrir de
nouvelles combinaisons syntagmatiques (de nouveaux emplois) pour les formes déjà
connues partiellement. Connaître un mot, ce n’est pas seulement être capable d’en donner
une définition ni même de pouvoir le situer dans son microsystème de relations
paradigmatiques (synonymes, antonymes, etc.). C’est aussi connaître les propriétés
distributionnelles des mots du point de vue de leur combinatoire sémantique, syntaxique,
discursive (…) (Tréville e Duquette 1996: 15).
5
Capítulo I
1. Breve historial da língua portuguesa em Moçambique
3
Os países anglófonos que fazem fronteira com Moçambique no interior são: Tanzânia, Malawi, Zâmbia,
Zimbabwe, Swazilândia e África do Sul.
4
As atuais províncias de Moçambique são: Cabo Delgado, Gaza, Inhambane, Manica, Maputo Cidade, Maputo
Província, Nampula, Niassa, Sofala, Tete e Zambézia.
5
De entre as várias LB faladas em Moçambique podem-se destacar: Cicopi, Xirhonga, Xichangana, Bitonga,
Citshwa, Cindau, Cisena, Cinyungwe, Citewe, Ciyao, Shimakonde, Emakhuwa, Xwabo, Lomwé, Cinyanja, etc. Esta
ortografia das LB é reconhecida pelo Centro de Estudos de Línguas Moçambicanas da Universidade Eduardo
Mondlane (2008), que preconiza: “O nome da língua escreve[-se] sempre com o seu prefixo. Ex. "Emakhuwa" e não
"Makhuwa"; A ortografia [dá] prioridade às regras de línguas bantas em vez de regras para português [SIC]. Ex.
"Cinyungwe" e não "Nhungue"”.
6
Sobre os conceitos de bilinguismo e diglossia, cf. Casanova 2009 e Tabouret-Keller 1976: 290, respetivamente.
6
domínio do léxico, isto é, das unidades de primeira articulação7 e da prosódia, e provoca, desta
feita, um único sistema de significados em ambas línguas (cf. Tabouret-Killer 1976: 290- 293).
Sendo aprendido e falado pelas populações locais como LNM, o Português está sujeito a
mudanças sobretudo a nível da fonética, da fonologia, do léxico e da sintaxe. A incorporação de
novo vocabulário está relacionada, não só com as realidades para as quais a LP não tem palavras
‒ como por exemplo, a fauna, a flora e aspetos socioculturais especificamente moçambicanos
(Gonçalves 2000: 3) –, como também com a dinâmica social, que resulta do bum dos produtos
científicos e tecnológicos. Esta situação, conjugada com o facto de o uso do Português no país
depender essencialmente da aprendizagem, faz com que, a nível de todos os aspetos
mencionados anteriormente, o Português falado localmente se distancie sobremaneira do PE,
concebido como norma a ser cultivada nas escolas de todo o território.
O distanciamento entre o PE e o PM, por razões de diversa ordem que extravasam o
âmbito exclusivamente linguístico, cria uma situação de ‘desconforto linguístico’ àqueles que
aprendem a LP e a falam marcadamente como moçambicanos. Mesmo assim, parece difícil
contornar as marcas das LM dos alunos, que, de forma quase automática, interferem em qualquer
língua que eles aprendem. O PM enquadra-se, entretanto, nas VNN que tradicionalmente foram
vistas com preconceitos, fruto da incapacidade dos falantes de aprender o considerado “bom
Português”; assim, todo o tipo de desvio constituía motivo de depreciação (Gonçalves 2010: 14).
Embora se tenha como padrão a norma europeia, a LP em Moçambique vai sofrendo
mudanças impostas pela própria realidade social, o que naturalmente vai criando uma estrutura
vocabular, sintática, semântica, fonética e fonológica típica; quer dizer que o idioma está
sofrendo um processo de “nativização”8. Esta mudança gradual
(…) compreende duas dimensões: uma simbólica, com a emergência de novas atitudes e
ideologias sociais face ao uso da língua; e a outra linguística, com o desenvolvimento de
novas formas linguísticas associadas ao seu uso [marcado, sobretudo, pelo surgimento de
novas palavras e novos significados] (Firmino 2008: 8).
7
“Pela primeira articulação da linguagem, as experiências a transmitir, as necessidades que se pretende revelar a
outrem, analisam-se numa série de unidades, cada uma delas possuidora de uma forma vocal e de um sentido. (…)
[trata-se, portanto, do] modo por que se ordena a experiência comum a todos os membros de determinada
comunidade linguística” (Martinet 1985: 18 e 19), isto é, a ordenação canónica das palavras.
8
O termo foi usado por Firmino para designar as mudanças e inovações que o português vai conhecendo no
processo de familiarização entre a língua e os falantes moçambicanos, a partir de 1975.
7
Efetivamente, uma nova mundividência linguística surge no seio dos moçambicanos. O
governo e nos últimos tempos a sociedade concebem e reconhecem a LP como língua nacional
que deve ser aprendida e usada como língua franca de integração social. Recorde-se que só com
o Português os diferentes grupos etnolinguísticos podem comunicar, desencadear a instrução,
fazer e aceder à ciência, condição fundamental para o crescimento e prosperidade de qualquer
sociedade. Entre os dados práticos que ilustram isto tudo, destacam-se a obrigação moral de usar
o Português em locais públicos e a vontade crescente dos moçambicanos de aprendê-lo e usá-lo,
apesar de inúmeras dificuldades que isto implica (cf. Firmino, op. cit.).
Não é menos verdade que a dinâmica da sociedade impõe, em vários contextos, o recurso
às LNM e particularmente ao Português. Foram fatores históricos, políticos, económicos,
diplomáticos e sociais que condicionaram o seu estatuto de LO em todo o território, que lhe foi
conferido quase de forma automática ou impositiva aquando do nascimento da nação
moçambicana, em 1975. No entanto, a LP era falada naquele contexto há sensivelmente cinco
séculos, tendo sido os portugueses9 os primeiros falantes, na sequência do processo de expansão
marítima e de cristianização que culminou com a colonização do povo moçambicano.
9
Como é sabido, os primeiros portugueses chegaram a Moçambique em 1498, chefiados por Vasco da Gama.
8
americanas), por parte dos espanhóis como dos portugueses, não era completamente
desinteressado, uma vez tido como meio propedêutico de aceder à língua europeia. Estabelecer a
comunicação num idioma local mais facilmente permitia a alfabetização em Espanhol ou
Português.
Lopes faz saber que, durante todo o século XVII, o Português foi falado na maior parte
do território da Índia, apesar do encontro de variedades de “gentes e das línguas” (1996: 32 e
34). Pelo mesmo diapasão alinha Fonseca ao considerar que se iniciou uma atividade de
descrição de aspetos gramaticais das línguas da índia e do Brasil, processo que culminou na
produção de gramáticas, dicionários e outros instrumentos pedagogicamente úteis para promover
o uso das línguas locais e assim “supletivamente, alfabetizar [as populações locais] no
Português” (2006: 79). A política linguística não foi a mesma em todos os territórios ocupados;
isto a avaliar pela história de países como Moçambique e Angola, onde, no mesmo período, não
está documentada a descrição das línguas locais nem o ensino de Português. A justificação é
avançada por Fonseca nos seguintes termos (2007: 187):
Un certain échec des missions catholiques, dû à une tradition musulmane déjà bien
enracinée, ainsi que le fait que Mozambique n`ait guère été, au cours de largues année, plus
qu’un point de passage de la route de l’Inde, expliquent ce panorama quelque peu
déconcertant, malgré la richesse linguistique du territoire (..). Il faut cependant noter qu’une
telle diversité linguistique constituait un obstacle à la conversion et, donc, à la fixation
grammaticale.
Barbosa estima em número de uma centena as criança que até 1512, antes mesmo da
publicação da gramática de Fernão de Oliveira ‒ marcante para o ensino da LP ao iniciar a sua
descrição e prescrição ‒ aprendiam Português na Índia (2007: 146). Tal ensino, como referem
Lopes, Barbosa e Fonseca, era ministrado por missionários jesuítas, franciscanos e dominicanos,
que, por determinação superior, estavam obrigados a aprender “as línguas das terras onde pregar;
(…) [a traduzir] compêndios de doutrina cristã em língua da terra; [e a fazer] livros para ensinar”
(Rivara 1986 apud Fonseca 2006: 186).
Ademais, no período medieval, mais uma vez, o latim desempenhou um papel
preponderante na formação histórica da LP. Verificou-se, naquele período, a entrada (in)direta de
elementos linguísticos, tais como o vocabulário e as estruturas sintáticas do latim no Português.
Com o renascimento e com a expansão ultramarina, a LP foi entrando em contacto com diversas
línguas, culturas e mundividências, que em termos linguísticos, contribuíram para o seu
9
desenvolvimento e expansão (cf. Walter 1994: 208-2010 e Câmara Jr. 1979: 18). Veja-se
também Teyssier (1984: 17-18):
[Ao fundo latino da LP adicionaram-se palavras novas: das] línguas dos povos que
habitavam a Península quando da chegada dos Romanos (ex.: barro, manteiga, veiga, sapo,
esquerdo, etc.), (…); de origem germânica (…) [que] haviam penetrado no latim muito
antes da invasão dos Suevos e dos Visigodos (…) (ex.: guerra, guardar, trégua etc.); da
civilização [arábico-islâmica] (…) (ex.: arroz, azeite, azeitona, bolota, açucena, alface,
alfarroba, javali, (…) alfinete, alicate, albarda, alicerce, azulejo, almofada, alfaiate,
almocreve, arrais, alcaide, almoxarife, alfândega, açúcar, alferes, refém, arrabalde,
aldeia, etc.). (…), [enfim], um vocabulário composto basicamente por substantivos.
10
nesse sentido” (Barbosa 1989: 107). Esta é a razão pela qual, regra geral, para todos os destinos
achados, embarcavam em missão de expansão portuguesa quase todos os estratos sociais:
soldados, marinheiros, pessoas simples, nobres, intelectuais, escritores, etc., criando bases
favoráveis para uma utilização da língua, com intervenção de quase todos os estratos sociais.
Sabe-se que antes dos apelos de Oliveira, já em 1498 tinha desembarcado em
Moçambique a primeira expedição portuguesa envolvida no expansionismo. Este grupo
encontrou um terreno fertilíssimo e era ali onde devia, para além de tudo, pôr em ação os apelos
de Oliveira a favor da difusão do Português (ainda que fossem posteriores). Com o mesmo
objetivo, um pouco mais tarde em relação à sua presença no ultramar, os “portugueses criaram
leis favoráveis à difusão do seu idioma (…) Quanto a Moçambique, o problema da língua
portuguesa foi objecto, por exemplo, dos Diplomas Legislativos n° 176 e 168 de Agosto de
1929, do governador-geral (publicado no BO10 n° 31 de 3 de Agosto de 1929), José Cabral, [dos
quais se transcreve o essencial:]
A vida da LP foi desde há muito tempo questão fulcral para os linguistas e autoridades
políticas e sociais pró-política linguística do Português, não só como instrumento de identidade
linguístico-cultural a ser conservado, mas também e sobretudo como sistema de comunicação a
desenvolver, a ensinar e a expandir para vários cantos do mundo. Foi neste contexto que, no
dealbar do passado séc. XX, se começa a trabalhar acerca daquilo que se pode considerar o
segundo aspeto mais importante da evolução da língua desde Oliveira − que marcou avanços
concernentes à morfologia, à flexão verbal, à fonética e à definição de vogais abertas, fechadas e
ditongos − até à contemporaneidade. Trata-se da questão da ortografia da LP.
10
Boletim Oficial.
11
Esforços foram envidados no sentido de unificá-la no seio de todos os lusofalantes, com
vista a facilitar o desenvolvimento e a expansão da língua. Saliente-se que de 190011 até 2010, a
questão da ortografia conheceu cerca de seis tentativas de uniformização ou de reforma,
nomeadamente: a simplificação ortográfica de 1901-1912, quer na ACL, quer na ABL, quer
ainda em conjunto; a reforma ortográfica de 1920; o acordo ortográfico luso-brasileiro de 1931; a
proposta do vocabulário ortográfico da LP e da revisão do acordo anterior em 1940; o acordo
ortográfico luso-brasileiro de 1945; o projeto ortográfico de 1975 e o acordo ortográfico de 1990
(cf. Kemmler 2010: 9- 40).
É fácil notar que esta questão da ortografia do Português foi, durante muito tempo,
abordada com efervescência em dois polos, nomeadamente a margem ocidental e oriental do
Atlântico, ou seja, Brasil e Portugal. Sublinhe-se que, durante as tentativas que foram indicadas
acima, a questão do vocabulário da LP foi tratada numa perspetiva de unificação e simplificação
da ortografia das palavras (cf. Kemmler, op. cit.: 24-26). Isto significa que não foi tratada sob o
ponto de vista do seu ensino como objetivo principal, embora os dicionário e/ou vocabulários
pudessem servir para tal. Este posicionamento ilustra quanto se andou distraído acerca do
desenvolvimento do vocabulário, talvez porque os dois polos tivessem a LP como LM.
Face a tudo o que ficou exposto nos parágrafos anteriores, pode-se entender que o
Português chega a Moçambique no contexto de expansão portuguesa ao Ultramar. Todavia, o
processo oficial e sistemático de ensino, que envolvia missões religiosas, viria a ser objeto de
legislação muito tempo depois da presença portuguesa no território e de convívio com os
moçambicanos. É preciso realçar que a falta de domínio de algum código escrito (por parte dos
indígenas), o sentimento de inferioridade/superioridade e de diferença, o tipo de relações que se
estabeleceu entre os dois povos e a legislação adotada pelos portugueses, sem sombra de dúvidas
tiveram uma certa influência na aprendizagem e uso da LP pelos moçambicanos.
11
10 anos antes da proclamação da República Portuguesa.
12
línguas, sem deixar de ser Português” (Barbosa 1989: 7- 9). A veracidade desta ideia de Barbosa
é incontestável. Contudo, é preciso frisar que o contacto e consequente enriquecimento não
tiveram lugar com muita facilidade e rapidez como se pode imaginar, devido a vários fatores,
podendo destacar-se o conservadorismo que caracterizava os povos irmanados pela língua.
É certo que os portugueses se lançaram ao mar em busca do ultramar conscientes da
necessidade de uma estratégia que possibilitasse a comunicação com as gentes indígenas que iam
encontrando em cada espaço achado. Ou, muito cedo se deram conta de tal necessidade e, como
é óbvio, para se atingir o objetivo de garantir a comunicação, ou os portugueses tinham de
aprender as línguas dos povos, ou estes tinham de aprender o Português. Certamente as LB do
povo moçambicano ainda não se beneficiavam de uma cultura da escola e isto jogava a desfavor
da sua aprendizagem. Desta feita, o mais fácil e viável era que os portugueses impusessem a
aprendizagem do seu idioma.
Todavia, entre 1502 e 1860, de acordo com Dias (apud Arakaki 2006: 52), em termos
linguísticos não havia contacto entre o Português e qualquer LB pois os comerciantes
portugueses não se juntavam à população indígena, devido a vários fatores. Nas entrelinhas do
período anterior, subjaz a ideia de que ainda não se podia falar de ensino de Português aos povos
nativos, ora por falta do comprometimento dos portugueses com o assunto, ora pela resistência
cultural dos povos bantu à dominação portuguesa. Mas, para uma aprendizagem, impunha-se
como condição necessária um convívio minimamente saudável entre os conhecedores do código
e os que o deviam aceitar e se motivar para a sua aprendizagem.
Ensinando a língua de Camões aos moçambicanos, não só se garantia o desenvolvimento
de um instrumento de comunicação com os falantes de várias línguas, como também se cumpria
a missão de difundir a língua e a cultura portuguesas, cuja necessidade fora demonstrada por
Oliveira. Contudo, só depois de 4 séculos da presença portuguesa no país e de todos os
preconceitos se enraizarem é que foram criadas as primeiras instituições de ensino:
“Inicialmente, o ensino da língua portuguesa fazia-se por mercê dos padres e missionários e
entretanto surgiram escolas particulares, até que por vez derradeira é criado o ensino oficial no
ultramar em decreto de 1845” (Ferreira 1991: 11- 12).
A partir da ideia exposta, pode-se avaliar a insuficiência do ensino-aprendizagem da LP ‒
num contexto em que as escolas estavam anexas ao projeto de cristianização, por um lado, e com
13
um caráter particular12, por outro ‒, ora pela insuficiência de instituições, ora pelo caráter
restritivo do ensino, ora ainda pela falta de motivação dos aprendizes e consequente
distanciamento e insucesso na aprendizagem do Português. Neste contexto, a educação era
afetada por transformações sociais, políticas, económicas e ideológicas significativas, como
resultado da imposição de uma ordem social e cultural hegemónica e da negação das estruturas
tradicionalmente existentes (cf. Uaciquete 2010: 11).
Como forma de fomentar o ensino da língua, embora isto só não bastasse, destaque-se o
envio, para as colónias, de várias e volumosas remessas de livros portugueses e docentes para
viabilizarem o ensino da língua aos meninos locais com base em livros de doutrina cristã. A
população local aprendia, então, o Português através das chamadas cartinhas ou cartilhas,
concebidas para o ensino da leitura e da escrita (cf. Barbosa 1989: 108). Ora, apesar de se tratar
de uma língua nova no ultramar, não há registo de alguma estratégia oficialmente adotada para
permitir que, para além da gramática, da leitura e da escrita, os aprendizes aprendessem também
e com rigor o vocabulário.
As chamadas cartinhas ou cartilhas com que se pretendia promover o ensino
privilegiavam “a catequese, o ensino da doutrina cristã, embora o conteúdo [pudesse] ser, porém,
um pouco mais variado, com a inclusão de normas prática para o procedimento em sociedade”
(doutrina da mesa; regra de viver em paz; comportamento ouvindo música, etc.). Eram, com
certeza, de maior teor sociocultural, mas sem pretender, de forma deliberada, sistemática e
explícita, desenvolver o vocabulário, embora fossem, de facto, as palavras e o vocabulário
constantes daqueles livrinhos impregnados de toda a cultura e civilização, modus vivendi e
operandi portugueses (Rosa 2002: 63).
Até à altura da criação das primeiras escolas oficiais em Moçambique, distinguiam-se
dois grupos socialmente diferentes: os indígenas (classe dominada) e os cidadãos brancos (classe
dominante). Com efeito, o sistema de ensino iria também obedecer a esta estratificação social.
Existia um ensino oficial destinado aos filhos dos portugueses e um ensino indígena com
características típicas do regime de dominação, em que o principal meio de motivação e de
viabilização do processo de ensino e de aprendizagem era a autoridade. A legitimidade desta
separação do ensino – separação que constituiu uma falha na estratégia para a rápida
12
O caráter particular do ensino tem a ver com o facto de ser ministrado por entidades não ligadas ao sistema
colonial, como, por exemplo, as missões protestantes.
14
aprendizagem e domínio da língua e do seu vocabulário – constava de documentos oficiais da
administração colonial, que preconizavam, ora a educação de cidadãos, para os primeiros, ora a
civilidade, para os segundos.
Apesar da criação das primeiras escolas, isso não significou a abertura do sistema aos
moçambicanos. Era quase impossível uma aprendizagem bem-sucedida da LP, por razões que já
foram documentadas. Continuavam sem estímulo social, ideológico e cultural para conhecerem,
dominarem e usarem a LP. Na prática, até ao séc. XIX, de uma forma geral, os moçambicanos
ainda não eram falantes da LP, embora o povo luso estivesse presente no território há séculos.
Aliás, ao fim daquele período, “havia uma única escola primária em todo o país” (Gonçalves 2000:
2) e, sendo a escola que catapulta a difusão de uma L2, com a exiguidade de instituições, a baixa
percentagem de lusofalantes moçambicanos era significativa.
15
A nova política portuguesa em Moçambique, entre finais do século XIX e inícios do
século XX, permitiu o surgimento de uma camada social que, ainda assim, era estatutariamente
diferente dos outros moçambicanos. Tinha direitos e deveres previstos na legislação que
vigorava. Essa camada social foi vulgarmente designada por assimilados13. Os primeiros
assimilados eram mestiços, na sua maioria, como resultado do convívio entre brancos e negros.
A igreja (católica sobretudo), através da obra missionária, tendo como atores principais os padres
franciscanos, jesuítas, dominicanos e outros, desempenhou um papel fundamental neste
processo. O seu contributo foi reforçado aquando da união entre o governo português e a Santa
Sé através do acordo missionário que lhe dava vantagens com o banimento das protestantes,
numa colaboração direta entre Vaticano e Lisboa. Porém, não houve muita inovação em matéria
de ensino-aprendizagem e usos linguísticos. Vários diplomas legislativos subsequentes
publicados pelas autoridades portuguesas, apesar de, por um lado, favorecerem o ensino da LP,
por outro, não deixam de fomentar a ideologia colonial e de restrição14 (cf. Barbosa 1989: 108).
A ideologia restritiva é bem evidente na política de assimilação que o sistema adotara
face às necessidades multifacetadas que tinha: a imposição da sua superioridade perante os
indígenas e a necessidade de expandir a língua e cultura portuguesas. Neste contexto, o maior
número dos moçambicanos não tinha acesso à aprendizagem. A minoria que conseguia estudar
tinha muitas restrições em termos de progressão escolar. Esta mesma minoria tinha um objetivo
e uma obrigação simultâneos de passar por uma metamorfose que a recriava como cidadãos
portugueses e, logo, se distanciava da maioria negra. Isto fez com que, apesar de se ter decretado
o ensino de Português, não se verificasse sucesso na sua aprendizagem.
Em meados do século XIX já havia uma imprensa em moldes oficiais, que proporcionou
o aparecimento, em algumas regiões do país, de algumas publicações. De entre essas
publicações, podem-se destacar o Almanach Civil Eclesiástico Histórico Administrativo da
Província de Moçambique (1859), o Jornal o Progresso (1868), o Africano (1877), O Distrito de
Lourenço Marques (1888), etc. (cf. Capela 2010: 149-151). Com a imprensa (que podia facilitar
13
Indivíduos (de raça não branca) que, por terem aprendido o Português e assimilado algum modus vivendi e
operandi dos portugueses, era-lhes reconhecido pelas autoridades portuguesas o direito de cidadania. Entre os
primeiros assimilados moçambicanos podem-se indicar Rui de Noronha, os irmãos Albasini ou a família Estácio
Dias.
14
O caráter restritivo da educação colonial consubstanciava-se em grande medida nas estratégias que eram adotadas
para o processo de ensino e aprendizagem, marcadas pelo uso da férula e dificuldade dos moçambicanos na
progressão nas classes.
16
a impressão, publicação e circulação de jornais, revistas e mesmo livros para a aprendizagem),
num contexto em que se clamava pelo ensino da LP, tendo em conta que a leitura é um excelente
exercício, pode-se dizer que estavam criadas mais algumas das condições necessárias para
aprendizagem da LP, em geral, e do seu vocabulário, em especial.
Todavia e, paradoxalmente, o contributo da imprensa nesta fase não se verificou devido
ao já relatado caráter restritivo do ensino e da própria imprensa. Ou seja, a imprensa não
abrangia as massas populares moçambicanas; daí frustrada a possibilidade de contribuir
positivamente para o desenvolvimento da LP no seio dos indígenas. Aliás, segundo o mesmo
Capela, a imprensa até então produzida era objeto de uma prévia censura, como forma de
garantir que não fossem difundidas informações que pudessem pôr em causa o regime. Para
além disto, ainda não focalizava como sujeitos e objetos os africanos (Capela, op. cit.), e por
isso sem grandes efeitos no respeitante à aprendizagem da LP.
Com o desenrolar dos acontecimentos, no dealbar do século XX nasce em Moçambique
uma imprensa à qual Capela chama de africana. Esta imprensa era produzida por
moçambicanos15, para moçambicanos e tratando de problemas moçambicanos. Por vezes, era
produzida em línguas moçambicanas, fazendo uma “propaganda a favor da instrução” (op. cit.:
146-151) que desempenhou um papel preponderante na sensibilização das massas. Mais ainda,
constituiu uma forte pressão no seio do regime, no sentido de reconhecer a necessidade de
educação dos moçambicanos.
A única entidade privilegiada para proporcionar a educação aos povos locais era o
governo português, que certamente o ia fazer em sua língua. Assim, uma imprensa produzida por
africanos, para africanos e tratando de problemas dos africanos, ainda que fosse, nalguns casos,
em línguas moçambicanas, terá frutificado no que tange a dois pontos: a adesão à instrução em
geral e à aprendizagem da LP, em particular, fornecidas pelos portugueses. Por isso, é legítimo
afirmar que a necessidade de instrução e de aprendizagem da LP foi originalmente inculcada,
com algum sucesso e em larga escala no seio dos falantes das línguas autóctones, pelos
primeiros assimilados, através da imprensa, no passado século XX.
15
Estes moçambicanos que faziam a chamada imprensa africana eram os poucos que tinham beneficiado da
instrução em Português e, nalguns casos, atingido o estatuto de assimilados, embora descontentes.
17
1.3.2. Ensino da Língua Portuguesa entre 1945 -1975
No contexto em que se vivia em Moçambique até à década quarenta do século XX,
fortemente timbrado pela necessidade de imposição linguística, cultural, social e ideológica do
sistema colonial, ainda que em algumas circunstâncias de forma discreta e/ou disfarçada, nos
poucos casos de ensino de LP o processo só podia ser feito por “imersão, sem se partir da língua
materna” (Rodrigues 1991: 19). Apesar de se terem já provadas a importância e as vantagens de
ensino de línguas por imersão, a relação de colonizador vs colonizado que se estabelecia entre as
elites portuguesas e os moçambicanos frustrava todo o processo de aprendizagem da LP com
base na imersão.
A partir dos anos 40, devido a vários fatores, destacando-se as reações da comunidade
internacional e das Nações Unidas, o regime português teve que encontrar mecanismos para
suavizar a sua atuação em Moçambique e em todas as suas colónias. Um dos mecanismos
passava por melhorar a situação do ensino. Segundo José Capela, com a concordata e o acordo
missionário, a igreja arrancaria para uma ação sistemática e determinada na área da imprensa e
do ensino em geral em LP (Capela 2010: 146- 151). O exposto equivale, parcialmente, a dizer
que os dois memorandos sobre o ensino em Moçambique permitiram uma primeira
sistematização16 do ensino, em geral e, em particular, da LP, para os indígenas locais.
Logo nas primeiras tentativas de sistematização, as dificuldades na aprendizagem e no
uso da língua e do seu vocabulário foram notórias, devido ao estilo de ensino referido no
parágrafo anterior. Sabe-se que em vários decretos e diplomas o governo preconizava a exclusão
das LB dos aprendizes de Português. No entanto, “as estratégias de ensino de uma L2 não podem
ignorar a LM em dois níveis: conteúdo e expressão, [aliás], (…) a LM capacita [o aprendiz] para
se orientar e fornece-lhe um conceitual com o qual ele constrói os seus novos pensamentos”
(Gonçalves 1991: 72- 73). Esta situação que marcou o ensino teve, seguramente, o seu contributo
para o (in)sucesso na aprendizagem do Português e do seu vocabulário.
Reitere-se que apesar de vários instrumentos aprovados a favor da instrução em
Português, para um território vastíssimo como o moçambicano as escolas que existiam não eram
suficientes para proporcionar um ensino da LP abrangente. Por isso, os moçambicanos só se
16
Originalmente, a instrução tinha como objetivos cristianizar e civilizar os indígenas até atingirem o estatuto de
cidadão, através da assimilação; daí o seu caráter demasiado restritivo. No entanto, a partir dos anos 40, ainda que
visasse melhor comunicação em todas as incursões coloniais, o ensino não tinha como objetivo somente a
(trans)formação do indígena em português, mas sim a sua educação como cidadão com direito à instrução.
18
comunicavam entre eles em suas línguas e, porque as relações com os portugueses não eram as
melhores, a comunicação em LP era utópica. Apesar dos objetivos de instruir os moçambicanos
“o sistema público de ensino (…) para além de apresentar uma rede escolar insuficiente era
ineficaz e ineficiente [e isto] constitui a causa para a frustração das aspirações dos africanos”
(Uaciquete 2010: 13).
Sendo assim, até aos anos 50, o número de falantes de Português continuava irrisório.
Num universo de cerca de seis milhões de moçambicanos, e com a língua a somar meia dezena
de séculos no território, apenas 4555 eram assimilados (cf. AAVV 1984: 25), ou seja,
comunicavam em LP. Apesar de várias políticas de viabilização da educação dos moçambicanos,
este cenário linguístico estará na origem do fraco desempenho linguístico dos falantes
moçambicanos em Português e, por isso, é relativamente recente o uso consistente e consciente
de LP por parte dos moçambicanos.
Até à data, como já se referiu, a missão de educar o indígena tinha sido confiada às
missões religiosas, cujo objetivo primordial era cristianizar os povos e não tanto educá-los.
Assim, ensinar a LP constituía um objetivo secundário camuflado em sagradas escrituras e
imposto direta17 ou indiretamente pelo governo colonial aos missionários e aos aprendentes.
Neste âmbito, por mais que existissem várias missões religiosas, as católicas detinham o
monopólio do sistema educativo, em detrimento das missões protestantes. No entanto, a igreja
católica, devido aos dois acordos acima mencionados, servia mais os interesses do sistema, sem
pôr em causa os seus projetos, mas relegando para o último plano as verdadeiras necessidades
dos aprendentes.
Por isso, segundo afirma Gonçalves (2010: 21), “devido [a esta] dinâmica social e
política que caracteriza a história da língua portuguesa em Moçambique, até finais dos anos 70,
não existia ainda no país uma comunidade de falantes de Português estabelecida, pelo que até
essa altura, não estava ainda formada uma variante nativizada desta língua”. Isto significa que
ainda eram poucos os moçambicanos falantes de Português e, como consequência, de uma forma
geral, nada se salientava como característica típica do PM; os poucos falantes eram herdeiros
diretos dos portugueses e esforçavam-se por falar como europeus para assegurar o estatuto de
cidadãos, ou somente para atestar publicamente conhecimentos de Português.
17
Vejam-se os diplomas legislativos 167 e 168 de 3 de Agosto de 1929, publicados no Boletim Oficial de
Moçambique nº 31, nos seus artigos 2º e 6º, já citados neste trabalho.
19
A situação viria a conhecer uma mudança decisiva e favorável ao ensino-aprendizagem
da LP com a fundação do principal movimento de luta contra as injustiças coloniais (Frelimo),
que culminou com a independência do país. Embora o maior número dos seus dirigentes fosse
constituído por falantes da língua inglesa, no congresso de fundação da Frelimo (1962) decidiu-
se o uso do Português como LO do movimento para garantir a comunicação e a união entre os
moçambicanos. Sendo LO, devia ser usada por todos para tratar de assuntos de todos, embora
nem todos a falassem.
Assim que nasceu o movimento-mãe a favor dos interesses moçambicanos e adotada a
LP como instrumento privilegiado de comunicação, estavam criadas as bases sólidas para a
aprendizagem do Português pelo povo local. Com efeito, durante a guerra de libertação, a
propaganda política, os textos de esclarecimento e consciencialização, os programas da rádio, a
expressão no seio do exército, da administração, as práticas de escolarização nas zonas libertadas
eram feitos em Português (cf. Ferreira 1987: 251). Com o uso e a auto obrigação de usar o
Português, para tratar de assuntos que lhes diziam respeito, deu-se lugar a uma exposição dos
indivíduos à língua, ainda que insignificante, e com caraterísticas moçambicanas.
Tomada a decisão de usar a LP nos termos expostos, começa-se a enraizar a consciência
da importância que a mesma viria a ter no seio dos moçambicanos, ainda que se continuasse sob
o regime colonial. Durante os 10 anos de luta pela independência, a LP foi desempenhando um
papel preponderante para viabilizar a conquista da soberania do povo, ou seja, com o uso da
língua, os povos podiam fazer ecoar os seus clamores com sucesso. Tratava-se, na altura, da
única língua escolarizada através da qual todas as populações de diferentes etnias se podiam
entender (cf. Ferreira 1987: 252), razão pela qual na hora da Independência não houve dúvidas
na escolha do Português como língua a usar doravante.
Proclamada a Independência e alcançada a soberania, nascia a nação moçambicana e logo
a Frelimo, único representante do povo e das suas aspirações, deliberou a favor do uso da LP
como LO. Assim, o idioma que antes era concebido como língua do colonizador tornava-se num
instrumento imprescindível para o sucesso perante os desafios que se colocavam à Frente e a
todo o povo. Assim se fazia jus às palavras de Amílcar Cabral que afirmara: “o colonialismo não
só tem coisas que não prestam (…), o Português é uma das melhores coisas que os tugas nos
20
deixaram (…)” (op. cit.: 249-250), em plena consciência de que o inimigo era apenas o regime,
tal como dizia Machel18.
A partir de todos os fatores que foram anteriormente arrolados – de que se destacam os
problemas do ensino no período colonial, as dificuldades incomensuráveis na aprendizagem da
LP, a ação da imprensa dita africana, feita sobretudo pelos assimilados, os acordos entre Portugal
e a Santa Sé, as reações de organismos internacionais a favor da descolonização e educação dos
povos colonizados, a fundação da Frelimo e a conceção do Português como sua LO, a
proclamação da Independência e a definição da LP como a LO da nova nação –, pode-se
considerar que o povo moçambicano começa, de forma geral, a identificar-se com o Português a
partir de 1975 (cf. Gonçalves 2010: 27).
Entretanto, o sentimento de pertença da LP é que viria a galvanizar paulatina e
decisivamente o ensino-aprendizagem da língua no seio da população negra moçambicana.
Todavia, ainda não se falava de uma estratégia específica para o ensino, aprendizagem e
desenvolvimento do vocabulário. Aliás, o sistema de ensino nos primeiros anos, só se podia
basear em programas e materiais herdados do sistema colonial então deposto. Por isso, embora
não tivesse havido um “copy past” total, os aspetos linguísticos focalizados não foram muito
diferentes. Perante a nova realidade, tornou-se necessária a definição de programas e políticas
que permitissem a alfabetização dos moçambicanos com recurso à língua que já era de todos.
18
Samora Machel e Amílcar Cabral foram atores principais da luta de libertação nos seus respetivos países de
origem e, por isso, fontes de inspiração dos respetivos povos.
21
Aliás, perpetuando-se as consequências do fraco empenho do sistema colonial em política
linguística favorável (cf. supra Fonseca, 1.2. § 6),
19
De acordo com Santana, o Português aparecerá oficialmente documentado como LO apenas na reformulação do
texto constitucional publicado em 1990.
22
quer a nível de recursos humanos e materiais, quer a nível político e ideológico, baseava-se em
instrumentos orientadores inicialmente usados nas zonas libertadas.
Manuel Ferreira, citando Fernão Ganhão20, justifica a oficialização da LP nos seguintes
moldes:
Teria sido impossível que em 25 de Junho de 1975 se tivesse escolhido uma das várias
línguas moçambicanas, para língua nacional porque as querelas que traziam fariam decerto,
perigar a existência do estado uno, teriam impossibilitado a unidade que criámos no seio do
nosso partido e impedido as vitórias que já alcançámos na edificação das bases materiais e
ideológicas para a construção da sociedade socialista (Ganhão apud Ferreira 1987: 252).
20
Fernão Ganhão era na altura o Reitor da maior instituição de ensino superior em Moçambique (a actual
Universidade Eduardo Mondlane) e que presenciara todo o processo de luta de libertação ao lado da Frelimo.
23
Leite (1987), considerando que “a língua passa a ser nossa a partir do momento em que
falamos e reconhecemo-la” como nossa, postula que o falante moçambicano de Português L2
comete desvios em confronto com a norma do PE, dependendo do elevado ou baixo nível de
escolaridade (Leite 1987: 497-498). Esta posição deixa claro que a proficiência no uso da LP
depende sobremaneira da escolarização. Ou seja, a escola é a principal entidade reconhecida seja
pelo governo, seja pela sociedade, para viabilizar a sua aprendizagem. Ainda nas entrelinhas do
excerto, pode-se entender que a própria realidade linguística moçambicana impõe certas
mudanças na estrutura da LP, como resultado do cruzamento com as várias LB.
A linguista Hildizina Dias, professora do Instituto Superior Pedagógico de Maputo (atual
Universidade Pedagógica de Moçambique), afirma que o Português, em Moçambique, tem sido
influenciado pelas LM dos cidadãos, no que tange à altura, intensidade, entoação, etc.. Sendo
assim, podem-se prever algumas alterações e dificuldades na aquisição do vocabulário. Segundo
a autora, as áreas da sintaxe, da morfologia, da semântica e do léxico são as que têm conhecido
alterações dignas de referência (cf. Dias 1991: 37- 38). No entanto, mesmo com muitas
dificuldades, é também digno de referência o esforço titânico com que os moçambicanos, quer a
nível institucional, quer a nível individual, pretendem aprender e falar o Português.
Assim, ensinar Português em Moçambique implica ensinar todos os aspetos que dizem
respeito à língua. Vários contributos para o processo de ensino das línguas e das LE/L2 em
particular, apontam para o ensino do vocabulário como sendo um dos aspetos imprescindíveis
para o sucesso na aprendizagem e uso eficazes do Português, apesar de não haver grandes
desenvolvimentos em termos de estratégias que privilegiem a aquisição e desenvolvimento do
vocabulário no seio dos aprendentes de L2, como é o caso dos moçambicanos. A falta de tais
estratégias e os procedimentos herdados das várias abordagens metodológicas do ensino da
L2/LE constituem os grandes problemas de aprendizagem.
O ensino-aprendizagem da LP em Moçambique, desde o período colonial até à
contemporaneidade, nunca conheceu estratégias explícitas que permitissem o desenvolvimento
da competência linguístico-comunicativa através do ensino do vocabulário. A realidade
moçambicana também foi basicamente marcada pela deificação dos aspetos gramaticais, típica
da Metodologia Tradicional, em detrimento dos aspetos lexicais. Mesmo com os avanços21 que
21
Recorde-se que desde a Metodologia Tradicional até à Metodologia Comunicativa, o vocabulário nunca conheceu
avanços consistentes para o seu desenvolvimento através do ensino.
24
ao longo do tempo foram sendo alcançados, os mesmos nunca foram concebidos de forma
explícita para valorizar o vocabulário na aprendizagem da L2 e definir métodos capazes de o
desenvolver. Por isso, esta área carece de uma teorização e aplicação de métodos e estratégias
claras para o seu desenvolvimento; ou melhor, é necessária uma planificação a todos os níveis
(sistema, escolas, professores, alunos, etc.), que lhe confira o seu valor na aprendizagem da
língua, pois este défice põe em causa o sucesso da sua aprendizagem, tal como se pode
compreender a partir dos dados que a seguir serão apresentados e analisados.
25
Capítulo II
2. Trabalho de campo: inquérito linguístico
Para a prossecução do presente trabalho, mostrou-se imprescindível a recolha de dados
sobre o ensino-aprendizagem do vocabulário nas camadas profissional e estudantil22 às quais se
fez referência na parte introdutória. O inquérito visava sobretudo colher informação sobre a
opinião dos alunos e professores acerca da importância do vocabulário, das circunstâncias em
que o mesmo é ensinado e aprendido, das estratégias para tal usadas e dos aspetos linguísticos
privilegiados na aprendizagem de uma palavra, cuja pertinência já Varrão (séc. I a. C) atestava
ao considera-la “como uma espécie de átomo da língua, átomo esse que apresenta formas
variáveis” (Marçalo 2009: 55). Por isso, o inquérito foi elaborado tendo em conta todos estes
assuntos que se julgam pertinentes para o conhecimento, desenvolvimento e uso das unidades
lexicais com autonomia e convicção.
O trabalho de campo jogou um papel deveras importante para esta dissertação ao
proporcionar dados de natureza prática fornecidos por fontes primárias (alunos e professores),
verdadeiramente envolvidas no processo de ensino e de aprendizagem do vocabulário. São fontes
que vivem todas as dificuldades e todos os (in)sucessos do processo. Portanto, com o objetivo de
conferir um caráter teórico-prático a este trabalho, os dados fornecidos por estes falantes foram
indispensáveis. No total, foram inquiridos 281 alunos e os respetivos professores, em número de
7. Devido a dificuldades de vária natureza, não foi possível conseguir dados de todas as 11
províncias do país. Assim, pautando pela fidedignidade de fontes e dados, optou-se pela
consideração, estudo e apresentação de informação referente às províncias de Maputo, Maputo
cidade, Gaza, Inhambane, Tete e Cabo Delgado (Mapa I23).
22
O público-alvo para este estudo ‒ ao qual se aplicou o inquérito ‒ é constituído por alunos e professores do ensino
secundário.
23
O Mapa I é referente à distribuição linguística em Moçambique e às províncias onde se aplicou o inquérito.
26
Mapa I: Distribuição linguística em Moçambique e regiões inquiridas
Tete Nampula
Zambézia
Manica
4: Xwabu; Lomwé;
7: Cisena; Cindau;
9: Cicopi; Xichangana;
A ortografia das LB é a reconhecida pelo Centro de Estudos de Línguas Moçambicanas (cf. nota de rodapé no 5).
Zona onde se fala ou comunica em Xichangana Zonas onde se fala ou comunica em Emakhuwa Zonas
onde se fala ou comunica em Cisena Cobertura da língua oficial, a L2 ‒ Português Províncias inquiridas
27
O estudo de dados de 7 professores deveu-se ao facto de se pretender verificar até que
ponto as respostas dos alunos coincidiam com as dos seus docentes; portanto, o número de
turmas coincide com o de professores, tendo sido excluídos dados de outros professores que se
ofereceram para colaborar. Em termos sociolinguísticos, apesar de em cada região serem falados
idiomas diferentes, os mesmos têm muitas semelhanças24, o que permite, na maior parte dos
casos, uma comunicação fácil entre os respetivos falantes. Aliás, algumas línguas (Xichangana,
Emakhuwa e Cisena) são faladas em quase todas as províncias das respetivas região25 (Mapa I).
Vejam-se os dados dos seguintes quadros relativos ao inquérito (vd. Anexo 2).
24
Nas regiões centro e sul, por exemplo, a língua Cinyungwe, Cisena e Citewe têm muitas semelhanças e o mesmo
para o Xirhonga, Xichangana e Cithswa.
25
O Xichangana é quase falado e entendido por habitantes das 4 províncias no sul do país; o Cisena no centro e
Emakhuwa, no norte.
28
Sempre que achar oportuno, porque ninguém se interessa em 70%
ensinar ou aprender vocabulário
3 Nunca, porque o vocabulário não ocupa lugar de relevo nos 20%
programas de ensino
Quando estiver agendado no plano semanal ou quinzenal 20%
Só dentro de uma aula de leitura 70%
4 Quando estiver a preparar um teste 20%
Em qualquer circunstância
Sinónimos e Antónimos 80%
A origem da palavra (radicais, afixos, composição…) 60%
5 Flexão da palavra e a sua combinação com as outras 30%
Outros
27
Atente-se nos Quadros I e II, e nos inquéritos em Anexo 2.
28
Considerado o pai da didática das línguas. João Amós Coménio, natural da Morávia, atual República Checa,
nasceu em 1592 e morreu em 1670 em Amesterdão, tendo deixado várias obras, de que se destaca a Didática
30
demonstra a necessidade de uma abordagem holística no ensino da língua, ao defender o ensino
de tudo “quanto necessário”, para conferir competência ao aprendente duma língua de cobertura
nacional, como a LP (Coménio 1996: 331). Tratando-se do vocabulário, o exposto corresponde a
defender que aquela componente linguística deve ser ensinada também de forma holística para se
atingir o sucesso.
A leitura dos dados permite detetar que há muitas dificuldades no processo de ensino-
aprendizagem do vocabulário nas escolas moçambicanas. Os mesmos dados levam a sublinhar
quatro aspetos que se afiguram como principais óbices ao processo, levando a um insucesso
contagiante na cadeia escola professor aluno sociedade. Esta realidade, que não raras
vezes é interpretada como fenómeno linguístico de variação, constitui antes o cúmulo de uma
claudicação na abordagem do ensino; portanto, é uma insuficiência de aprendizagem e não
variação propriamente dita. Ou, mesmo chegando a sê-lo, é condicionada pelas circunstâncias de
aprendizagem da LP.
Os quatro aspetos destacados são os seguintes:
a) A incongruência entre o sentimento dos alunos e professores sobre a importância do
vocabulário e a realidade do ensino moçambicano.
b) A falta de estratégias predefinidas e de programas que favoreçam explicitamente o
ensino, aprendizagem e desenvolvimento do vocabulário.
c) A dependência da aprendizagem do vocabulário de outras atividades tais como a da
leitura.
d) A limitação da aprendizagem do vocabulário aos aspetos de sinonímia, antonímia e
formação, em detrimento de outros aspetos importantes sobre as palavras.
Como se pode concluir, há muitos outros elementos linguísticos que ficam de fora no
ensino e aprendizagem do vocabulário, isto é, não basta aprender os sinónimos e antónimos das
palavras e a sua formação (cf. Nhampule e Moreno 2004: 68); há que considerar, por exemplo, o
seu uso para a efetivação da função de comunicação, porque se aprendem as palavras e as
línguas com o fim último de comunicar oralmente ou através da escrita29. O uso correto das
palavras implica dominar o seu significado e sentidos, a sua combinação, a sua flexão e a
Magna: Tratado da Arte Universal de Ensinar Tudo a Todos, com que Coménio demonstra claramente o seu
comprometimento na formação do indivíduo.
29
A oralidade e a escrita são as principais formas de usar a língua e de comunicação. A oralidade, em termos
linguísticos, antecede a escrita, sendo por isso importante dominá-la, para se atingir a literacia.
31
capacidade de atualização criativa. Ademais, o conhecimento de todas estas vertentes deve
consistir em aspetos práticos e não teóricos da língua.
30
Pode-se verificar melhor a disposição dos conteúdos programáticos do ESG, nos respetivos programas em anexo
(Anexos 3 e 4).
34
âmbito, os alunos desenvolvem um conhecimento fragmentado e difícil de relacioná-lo sobre as
palavras. Parece ideal que se aprenda tudo sobre a palavra ou um tipo de palavras, numa classe,
sem se vedar que os mesmos aspetos sejam repetidos em outras.
Por exemplo, no que diz respeito à aprendizagem do substantivo, os programas
preconizam basicamente o ensino de aspetos de flexão (inteiramente relacionados com a
gramática). Ademais, os conteúdos programáticos conduzem a uma abordagem muito
fragmentada: na 8ª classe, apenas no ponto 5.2 se orienta o ensino da formação das palavras-
prefixos e sufixos; na 9ª, também no ponto 5.2, a formação de palavras compostas- aglutinação e
justaposição e em 1.2 e 4.2, a flexão de substantivos e adjectivos- regras especiais; na 10ª, no
ponto 2.2, a flexão de palavras compostas e, em 4.2, a flexão do substantivo e adjectivo- regras
especiais. Somente na 11ª e 12ª classes se prevê nos pontos 1.2, o ensino da formação de
palavras- casos de diminutivos eruditos, derivação parassintética e irregular.
Claramente, para além de tratar apenas de um dos aspectos linguísticos dos substantivos,
praticamente, em cada classe se desenvolve uma competência, muito insignificante para o
domínio pleno do substantivo. Quem, por exemplo, não frequentar o segundo ciclo fica vedado
aos conhecimentos sobre diminutivos eruditos e palavras parassintéticas, apesar de precisar
delas, com certeza, no seu dia-a-dia como falante. Aliás, o vocabulário é uma componente básica
da língua, cujo desenvolvimento se consegue com o seu uso e, por isso, tem que ser aprendido de
uma forma integrada. Depois de muito tempo sem usar um determinado vocabulário, ou usá-lo
incorretamente (caso de diminutivos eruditos) fica difícil melhorar com a aprendizagem da
última hora (cf. Programa da 9ª classe, pp. 22- 30)
Em termos de estratégia de abordagem, prevê-se como ponto de partida um determinado
texto para tratar aspetos de funcionamento da língua, o que está bem acertado. Porém, é dentro
deste que são previstas aprendizagens sobre as palavras como subtópicos de outros grandes
temas relacionados com a gramática. O outro constrangimento é o facto de as aprendizagens dos
aspetos vocabulares não serem feitas em aulas próprias, como acontece, por exemplo, com as de
sintaxe (funções sintáticas)31. É verdade que não é possível aprender tudo na mesma aula, mas é
possível focalizar aspetos de vocabulário na aprendizagem da língua, enriquecer o acervo
31
Os professores elaboram planos de aulas típicos para tratar deste aspeto, mas raras vezes para tratar do
vocabulário.
35
vocabular dos alunos e permitir que, ao final de cada ciclo, os alunos não tenham um
conhecimento fragmentado sobre o uso das palavras que aprenderam (saber usar as palavras).
Isto justifica-se pelo facto de, terminado um dos ciclos, o cidadão poder desempenhar
funções que dependam da sua formação académica, sendo fundamental que se garanta que o
aluno tenha acesso a todos os segredos do uso das palavras, isto é, deve-se permitir que ele
consiga identificar e fazer todas as manipulações possíveis de/com as palavras. Mas isto implica
dar mais tempo e espaço ao vocabulário e, acima de tudo, definir as palavras em classes ou
paradigmas32, para evitar que se trabalhe apenas um certo tipo de palavras.
Fazer depender o ensino do vocabulário de exercícios de leitura ou de gramática, em que
se privilegiam outros aspetos, sendo uma abordagem possível, pode conduzir à aprendizagem de
outras realidades linguísticas que não o vocabulário. É que, por exemplo, num texto escrito para
ser lido e entendido, a maioria das palavras menos usadas não farão parte do vocabulário dos
alunos, podendo ser de especialidade.
Habitualmente, quando se fala de funcionamento da língua, entende-se, logo à partida, o
estudo de questões gramaticais. Nestes termos, aliada esta vertente à influência de abordagens
metodológicas de ensino das línguas como a tradicional, que nunca privilegiaram o vocabulário
na aprendizagem de uma L2, consolida-se a subvalorização deste último em favor da gramática
da LP. Neste âmbito, havendo necessidade de destacar aspetos como funcionamento da língua,
conhecimento da literatura, etc., há urgência de se sublinhar, acima de tudo ou ao mesmo nível,
tópicos como desenvolvimento do vocabulário, ou melhor, introduzir-se uma disciplina que trate
especificamente do assunto.
Efetivamente, apesar de se prever o ensino-aprendizagem de saberes relacionados com o
vocabulário, de forma alguma se pode falar de uma orientação explícita para o ensino do mesmo.
Tal como estão apresentados os conteúdos, há maior probabilidade de se ensinar o léxico e/ou as
palavras de especialidade no lugar do vocabulário. No entanto, sublinhe-se neste trabalho a
necessidade de se ensinar o vocabulário e gradualmente ser desenvolvido através de palavras
recenseadas no léxico por mecanismos tipicamente linguísticos. Note-se ainda que o inquérito e
32
Na impossibilidade de ensinar todas as palavras, poder-se-á recorrer a agrupamentos em função das suas
características funcionais. Por exemplo, ter-se-á grupo das palavras de um lugar, de dois, de três; palavras
preposicionadas, etc., que funcionem como ponto de partida, não só para a sua aprendizagem, como também para a
de tantas outras.
36
o programa de ESG só ilustram alguns pontos tratados nas escolas sobre as palavras e silencia a
prescrição clara e a orientação necessárias para o desenvolvimento do vocabulário.
Esta situação, devido à falha na estratégia de ensino-aprendizagem e desenvolvimento do
vocabulário33, é desproporcional ao objetivo de educar o aluno para a cidadania, para o
multiculturalismo, para a tomada de consciência sobre a riqueza linguística que a LP representa,
para o enriquecimento do vocabulário na sua forma oral e escrita, da sintaxe, da fonologia e da
ortografia, para o desenvolvimento da competência discursiva, para a produção de textos
comunicativos e úteis, para a competência sociolinguística e para o conhecimento das regras
sociais necessárias à contextualização e interpretação dos elementos linguísticos e discursivos.
33
Na aprendizagem da L2 ou de qualquer língua, o desenvolvimento dos vários conceitos e conhecimentos
linguísticos dependem essencialmente do conhecimento do vocabulário que é usado na fala. Aliás, aprende-se uma
língua falando, o que é impossível sem o conhecimento das palavras.
37
Capítulo III
3. Ensino-Aprendizagem do Português como L2
3.1. Conceitos de L2 vs LE
É questão atual a definição e diferenciação dos conceitos de LE/L2, embora se saiba que
ambos respeitam a LNM. A dinâmica sociocultural, os fatores económicos, as relações
diplomáticas, comerciais e até militares impuseram, desde longa data, o relacionamento entre
falantes de línguas diferentes. Esta situação conduziu ao ensino, aprendizagem e uso de LNM.
Entretanto, os linguistas viram a necessidade de deixar clara a diferença entre os idiomas que,
não sendo autóctones, têm um estatuto sociopolítico reconhecido num determinado país e
aqueles a que falta tal estatuto. Assim, surgiram os conceitos de L2 e LE.
A LE e a L2 são LNM que o indivíduo aprende depois de ter a sua LM adquirida e
desenvolvida. De acordo com Leiria (2005:1) a L2 pode ser definida como sendo “uma língua
não-nativa dentro de fronteiras territoriais em que ela tem uma função reconhecida”, como é o
caso do Português nos PALOP. Dentro destes territórios, a L2 tem sido a LO usada para vários
fins vitais do Estado. Com efeito, diferentemente da LE aprendida para enriquecer o
conhecimento linguístico, a L2 é aprendida para satisfazer necessidades comunicativas, ou seja,
para garantir a comunicação e a integração com outros indivíduos falantes da língua em questão
(cf. Crane 201134).
Para sintetizar a diferença entre a L2 e LE destaque-se o contributo de Klein (1989: 33),
que o faz nos seguintes termos:
(…) on désigne par langue étrangère, une langue qui est apprise en dehors de son aire
d’usage habituelle (…) et qui n’est pas utilisée en concurrence avec la langue maternelle
pour les communications quotidiennes [enquanto que] la (…) second langue désigne une
langue qui sert, après ou a côté de la langue maternelle, comme second moyen de
communication et qui acquise en générale dans un environnement social où on la parle.
Deste modo, pode-se inferir que a diferença entre a LE e a L2 reside no estatuto que cada uma
detém num território. Enquanto uma é aprendida por opção ou curiosidade, a outra é aprendida
por necessidade social.
34
Artigo sem paginação.
38
Quer a LE, quer a L2 são VNN cujos falantes sentem todas as dificuldades inerentes à
sua aprendizagem, que implica um exercício especialmente ajustado à realidade dos aprendentes,
sejam eles crianças, jovens ou adultos. Em todas as situações, é de vital importância o
envolvimento de alunos e professores. No mesmo diapasão, S. Sridhar e Kamal Sridhar (1986,
1994 apud Gonçalves 2010: 18) sublinham a importância do meio envolvente na aprendizagem
das VNN, realçando o valor “dos objectivos e a motivação dos aprendentes, e ainda a qualidade
do input a que estão expostos”. Outrossim, quanto mais diferenciado for o input, mais qualitativa
poderá ser a aprendizagem. Resta reiterar que, quer LE, quer L2 são objeto de aprendizagem por
indivíduos que já possuem outras competências linguísticas, com outros pressupostos cognitivos
e mentais. Por isso, a sua aprendizagem sofre, direta ou indiretamente, a influência da LM dos
aprendentes. Ora, um dos itens linguísticos a explorar com rigor é o vocabulário. No caso do
Português, o seu tratamento em Moçambique tem de passar pela sala de aula, mas também por
contextos sócio-familiares onde ocorra a aprendizagem.
Nesta ótica, é preciso acreditar na aquisição de uma competência linguístico-
comunicativa dos falantes e não na identidade de uso da língua entre falantes do PM e do PE, o
que nunca será possível: “O que explica a possibilidade de o falante da L2 nunca chegar a atingir
uma competência igual à do falante nativo é o facto de partirem de um estado inicial diferente”
(Leiria 2005: 115). Chegados a este ponto, subentende-se que o processo de ensino de Português
aos moçambicanos deve ter em conta a realidade típica dos aprendentes para que se possa fazer
um trabalho sistemático que minimize o impacto das LM.
Uma LM, entretanto, desenvolve-se através da aquisição, num processo natural35 de
desenvolvimento, sem nenhuma intervenção sistemática, intencional ou formal. Isto é, “On parle
d’acquisition de la première langue lorsque l’apprenant, en générale un enfant, n’vait encore
acquis aucune langue auparavant; (…) l’acquisition de la première langue est rapide et facile”
(Klain 1989: 14-17). Segundo Sim-Sim (1998), para adquirir a LM basta que se esteja exposto a
ela. Isto significa, por um lado, que o vocabulário, a gramática, a fonologia, etc. se desenvolvem
naturalmente e, por outro, que há certa facilidade, a avaliar pela forma como as crianças
desenvolvem a LM, na interação entre a hereditariedade36 e o meio propiciador de experiências.
35
O processo ocorre dentro de período e etapas previsíveis (normalmente entre os 0 aos 7 anos de idade).
36
Hodiernamente, para vários investigadores, professores e estudantes, a teoria inatista tem maior eco. Esta teoria,
cujo defensor foi Chomsky por volta dos anos 50, indica a existência, na informação genética do indivíduo, de um
dispositivo de aquisição da linguagem.
39
Contudo, o mesmo não se dá com a L2. Os indivíduos apropriam-se dela através de uma
aprendizagem que se define como um processo programado, consciente e sistemático, ocorrendo
geralmente no contexto formal da escola e, em condições normais, depois do processo de
aquisição da LM. Por isso, a língua a ser aprendida vai ter inevitavelmente subsídios da língua já
desenvolvida. Ora tais subsídios, dependendo de cada abordagem, podem facilitar ou dificultar o
processo. Para a mesma autora (1998: 28), “a aprendizagem é o processo por meio do qual, e
através da experiência ou da prática, de forma mais ou menos consciente, se instalam
modificações no desempenho do indivíduo”.
Tomando em consideração a ideia de instalação de modificações no desempenho do
indivíduo, pode-se entender que este processo consiste na modificação e/ou adição do
conhecimento linguístico a um outro já existente, a LM. Portanto, os conhecimentos relacionados
com o vocabulário do Português a serem adquiridos pelos alunos do ensino secundário
moçambicano vão-se adicionar aos das LB faladas no território. Deste modo, todos os aspetos
que na LM foram desenvolvidos de forma natural e fácil, serão na L2 desenvolvidos basicamente
graças ao processo de ensino-aprendizagem, mais complexo e menos automático.
A aprendizagem do vocabulário, apesar de se provar que existem fases em que ocorre
com ligeira facilidade e outras em que ocorre com dificuldades enormes, pode ocorrer com
qualquer indivíduo. Crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos podem aprender uma língua,
embora em ritmo diferente, tendendo a ter uma proporcionalidade inversa com a idade. Vários
investigadores preocupam-se em saber que quantidade do VAP e VPR é necessária para se
comunicar com fluência (cf. Leiria 2001: 13). Trata-se de estudos que revelam, por exemplo,
quantas e quais as palavras de que o falante moçambicano precisa para comunicar com fluência
em LP.
Ora, analisando os dados e a realidade sobre o vocabulário dos estudantes do ensino
secundário moçambicanos, o VPR não constitui nem deve constituir preocupação. O objetivo
deste trabalho ‒ contribuir para a aprendizagem e desenvolvimento do vocabulário, para
melhorar a competência linguístico-comunicativa dos alunos ‒ é apostar no VAP. Um trabalho
que o VPR se mostra inútil para as aspirações que norteiam o processo de ensino de Português
no país, podendo mesmo constituir um retrocesso; donde, devam envidar-se esforços no sentido
de transformar o VPR da LP, que os alunos possuem, em VAP; aumentá-lo e desenvolvê-lo
através do ensino.
40
A frequência do uso da LP em Moçambique é residual, pois restringe-se amiúde a
contextos específicos. Por um lado, acontece apenas durante a aprendizagem na sala de aula, não
havendo, neste caso, uma exposição suficiente para o desenvolvimento da língua e do seu
vocabulário. Por outro, mesmo podendo ser a LP usada fora do contexto de sala de aula para
certos casos de comunicação, nem sequer se aproxima à frequência com que se usa uma LM.
Porém, a ideia de Sim-Sim exposta anteriormente permite afirmar que a aprendizagem do
vocabulário da LP como L2 requer experiência e prática; ou seja, é preciso que se ponham os
alunos num contexto de uso da língua para cristalizar o desenvolvimento do seu vocabulário.
Conquanto o vocabulário seja tão importante quanto a gramática ‒ veja-se (a) a
impossibilidade de comunicar verbalmente sem recorrer ao vocabulário, (b) a expressão do
pensamento, explícita ou implicitamente, com base nas palavras, (c) o funcionamento das outras
grandezas linguísticas através do vocabulário ‒, urge assumir-se que deve merecer um
tratamento privilegiado e rigorosamente executado, sobretudo nas escolas. Um trabalho baseado
no vocabulário parece poder permitir a aprendizagem de toda a língua, em todos os seus aspetos,
conferindo maior competência aos alunos.
Sem se pretender ser pessimista, pode-se afirmar que o conhecimento passivo da LP que
caracteriza a maioria dos moçambicanos é resultado da inconsistência do processo de ensino-
aprendizagem do vocabulário, conjugado com a quantidade e qualidade do input que vem da
sociedade. Lembre-se, ademais, que no PM, a qualidade do input “depende da origem social dos
falantes e do contexto, rural ou urbano, em que é adquirido” (Gonçalves 2010: 20). Os alunos
podem, na escrita37, usar adequadamente a palavra (lexis) – que, desde Platão e Aristóteles, é
entendida como uma associação da “voz articulada que pode ser anotada através de letras”, e da
“voz dotada de sentido emitida pelo pensamento” (logos) (Marçalo 2009: 58) ‒; todavia, na
oralidade, ou ficam limitados por não dominarem o significado, não controlarem a posição das
palavras na frase, ou claudicarem na flexão, sem poderem esconder o que já enunciaram38:
(1) *Você foste convidado na festa? [= você foi convidado para a festa?]
(2) *Eu fui nascido em Maputo. [= Eu nasci em Maputo.]
37
Recorde-se que a escrita e a oralidade são formas verbais diferentes. A escrita exige maior rigor que a oralidade; a
escrita corrige-se, enquanto os enunciados orais são ouvidos, interpretados e analisados exatamente como são
produzidos.
38
Isto demonstra que os alunos precisam de ter um ambiente em que ganhem experiência e pratiquem o uso da LP
na comunicação, quer oral, quer escrita.
41
Ora problemas de concordância sintática e uso de preposições em (1); ora usos
inadequados das vozes ativa e passiva em (2). Isto demonstra que há falta de experiência e de
prática no uso da LP e de conhecimentos solidificados acerca do uso das unidades lexicais você,
nascer, em. Assim se faz jus a Azenha (1997), que com razão defende que, no
ensino/aprendizagem da L2 em especial, se dê primazia ao conhecimento do vocabulário ‒ no
que diz respeito ao seu significado e ao seu uso ‒ pois desta forma os aprendentes poderão
comunicar e desenvolver outras competências.
42
dos intervenientes diretos e, não menos importante, os meios disponíveis para tal, de modo a que
se decida melhor sobre a metodologia a usar em cada situação39.
Nestes termos, os métodos/metodologias de ensino ao nível da sala de aula, podem ser
concebidos como meios para alcançar os objetivos gerais e específicos, englobando ações
realizadas pelo professor e pelos alunos na escola e não só. No entanto, alguns métodos de
ensino são mais usados do que os outros ou são empregues em disciplinas e/ou conteúdos
específicos. Isto significa, por exemplo, que existem métodos privilegiados para o ensino de L2
e, até certo ponto, para o do seu vocabulário. Portanto, algumas estratégias são típicas, mas isto
não implica que sejam suficientes por si só. É preciso uma abordagem em que vários métodos se
complementem para o desenvolvimento do Português como L2.
40
Quando os americanos se envolvem na 2.ª grande guerra, o exército sentiu necessidade de ter falantes fluentes em
várias línguas dos diferentes palcos de operações. Por isso, adotou-se uma didática que deu origem à MAO.
41
A análise estrutural da frase requer muitos exercícios de gramática, com base na teoria bloomfieldiana.
42
Este posicionamento alinha-se com a teoria behaviorista de aprendizagem da Língua.
45
não ser um bom procedimento para a aprendizagem da LNM, pois é preciso, nesta situação,
muito esforço, muita concentração e capacidade de sistematização de ambos agentes.
43
Disponível em http://www.hottopos.com.br/videtur6/selma.htm.
44
Diferentemente da MAO, na MAV, a correção é muito valorizada. Acredita-se que a correção é uma forma de
ensinar o que é certo.
45
Para o ensino secundário moçambicano, não há necessidade de uma correção discreta, mas o professor deve
garantir que não desmotiva os seus alunos pelas correções.
46
Esta perspetiva implica o conhecimento e uso das funções de linguagem, sobretudo, a denotativa, fática, emotiva,
etc..
46
No entanto, já na terceira fase, a MAV cria condições para uma relação de negociação do saber
linguístico, entre o professor e o aluno47.
47
Com esta abordagem, o aluno começa a ser visto como sujeito ativo na sua própria aprendizagem.
48
A noção de competência comunicativa foi desenvolvida por Dell Hymes. Na sua perspetiva, saber comunicar
significa saber produzir frases de acordo com as normas gramaticais, associando a este ato o saber sociolinguístico.
49
O professor deixa de ocupar o papel fundamental na aprendizagem dos outros (alunos) e torna-se um orientador.
47
Criar condições favoráveis e orientar os alunos para a aprendizagem é “uma tarefa não
fácil porque o professor tem que imaginar exercícios motivadores e, ao mesmo tempo funcionais,
para além de estar atento aos (in)sucessos de todos e de cada um, para dar apoios e orientações
quanto possível individualizados, no preciso momento em que eles se revelam necessários” (op.
cit.: 8). Como sugestão, pode-se recorrer sistematicamente aos trabalhos em grupo, às interações
entre alunos, aos exercícios de criatividade e de dramatização, podendo até ser privilegiados pelo
facto de permitirem uma expressão livre dos alunos em LNM, sem medo do erro, que deverá ser
visto como fenómeno normal no processo de aprendizagem.
Portanto, esta metodologia proporciona uma aprendizagem que, inquestionavelmente, é
fundamental para o verdadeiro conhecimento das palavras do dia-a-dia, que realmente pode levar
o aluno a desenvolver a competência comunicativa. A mesma permite que o aluno aprenda a usar
o vocabulário e a comunicar a partir da escola com os seus colegas, condição que poderá ser
bastante útil para contextos como o moçambicano em que, fora da escola, raramente se usa a L2.
No entanto, tendo em conta o contexto em que esta metodologia começa a ser usada, marcado
por um desenvolvimento acelerado da tecnologia, em comparação com as MAO e MAV surge
uma crítica pelo fato de não prever o uso das tecnologias (rádio, projetores, computador, etc.).
50
A diferença entre os dois consiste apenas no facto de não se assumir claramente o aluno como foco da
aprendizagem, não havendo, por isso, espaço para a negociação do saber, no MEC.
48
Para terminar esta sessão, diga-se com Azenha (1997) que no ensino de uma LE/L2, a
aula deve ser feita pelos alunos acompanhados pelo professor, o que permite afirmar que o
vocabulário deve ser aprendido pelos alunos, graças à sua atividade, orientados pelo docente.
Tendo em conta que não existem métodos por si só suficientes para viabilizar, com sucesso, uma
aula de vocabulário de L2 e, considerando a essência de cada um dos métodos perfilados, é
deveras importante recordar que uma abordagem flexível e eclética, integrando contributos
diversificados, pode ser uma melhor opção para os profissionais de ensino da LP atingirem a
finalidade de desenvolver o vocabulário dos seus pupilos do ensino secundário em Moçambique.
Com efeito, parece clara a necessidade de resgatar alguns dos aspetos de algumas
metodologias que comummente são consideradas arcaicas, tradicionais e, por isso, desusadas,
para com eles se complementar a MC e o MEC, para se enfrentar com sucesso a batalha para o
desenvolvimento do vocabulário dos alunos do ensino secundário de Moçambique que, como se
viu anteriormente, enfermam de dificuldades enormes e conjunturais. Trata-se do ditado, do uso
do dicionário, da memorização e do uso do texto literário da MT; do uso da L2 para aprender a
L2, do uso de gestos, imagens e simulação, da promoção de diálogos, da compreensão auditiva,
da pronúncia e da escrita de palavras da MD.
Há que se recuperar também, o privilégio da língua falada, o estudo de relações
sintagmáticas e paradigmáticas das palavras, o uso dos meios áudio-orais da MAO. A didática
nocional, funcional e comunicativa, a pragmática utilizando as noções de atos de fala, a relação e
interação professor-aluno, a correção fonética e a memorização da MAV são atividades não
dispensáveis para uma aprendizagem holística do vocabulário dos estudantes moçambicanos.
Reitere-se a necessidade de abordar a LP em todas as vertentes que confiram competência ao
aprendente (leitura, oralidade, etc.), isto é, utilizar de forma mista vários métodos51, tal como
demonstrara Coménio no seu método de ensinar tudo a todos (cf. Coménio 1996: 260 e 336).
51
A utilização de vários métodos numa mesma aula constitui a essência dos métodos ecléticos. Esta ideia é também
referida por Neuner (1991: 23).
49
3.3. Vocabulário vs Léxico
O vocabulário é importante para a comunicação e para o processo de ensino da L2.
Conhecê-lo é a condição sem a qual não se processam nem o ensino-aprendizagem, nem a
comunicação verbal em L2. Contudo, pouca importância se lhe dá no que concerne ao seu ensino
nas escolas. Esta situação é de longa data e, segundo Calçada (1998: 54), o “facto de os
linguistas não terem privilegiado a semântica concorreu para que a aprendizagem do vocabulário
fosse considerada um simples problema de conteúdo”. Em paralelo a esta situação, coloca-se o
facto de o conceito de vocabulário ser confundido com o do léxico52, uma vez que entre ambos,
existe uma relação semântica de hiperónimo/hipónimo:
The term lexicon refers to the overall system of word forms (…), the study of word
information in language. The term is also used to refer to the way forms might be
systematically represented in the brain, that is, the mental lexicon. The term vocabulary
refers to a list or set of words for a particular language or a list or a set of words that
individual speakers of language might use (Hacth & Brown 1995: 1 apud Faria 2001:15).
[Por sua vez, Picoche define o léxico como um] ensemble des mots qui une langue met à la
disposition des lecuteur, et vocabulaire, une ensemble des mots utilisés par un locuteur
donné dans des circunstances données (Picoche apud Eluerd 2000: 8-9).
52
O léxico é, numa perspetiva cognitivo-representativa a codificação de realidades extra linguísticas interiorizadas
no saber de uma dada comunidade linguística. Ou, numa perspetiva comunicativa, o conjunto de palavras por meio
das quais os membros de uma comunidade linguística comunicam entre si ‒ Shered knowlegde ‒ (Vilela 1995a:13).
53
Sobre o conceito de monema, confira-se a conclusão do artigo de Marçalo (2009: 65-67) ou o funcionalista
francês André Martinet (1985: 20).
50
Distingue-se vocabulário do léxico: o vocabulário é uma subdivisão do léxico básico (…),
enquanto o léxico é o conjunto de palavras fundamentais, das palavras ideais; O
vocabulário é o conjunto de vocábulos realmente existentes num determinado tempo e
lugar, no seio de uma comunidade linguística. O léxico é o geral, o essencial e social; o
vocabulário é o particular, o individual e o acessório (Vilela 1995 a: 13).
Em suma, por um lado, existe o léxico que é o conjunto das unidades lexicais que uma
língua oferece aos falantes e, por outro, o vocabulário que é o conjunto de palavras conhecidas
por um indivíduo ou grupo de indivíduos. Paralelamente à distinção dos termos léxico e
vocabulário pode-se distinguir os termos lexema e vocábulo. Os lexemas ‒ palavra cognata de
léxico ‒ são as unidades do léxico de uma língua, ao passo que os vocábulos ‒ cognato de
vocabulário (cf. Casanova: 2009) ‒ consistem em unidades de fala e do discurso, ou seja, aqueles
elementos extraído do universo lexical da língua e armazenados na memória de um indivíduo ou
de um coletivo e que a eles se recorre para comunicar, quer oralmente, quer por escrito.
Dado que a lexia vocabulário está estreitamente ligada com a lexia léxico de uma língua
e da LP em particular, dando lugar aos habituais equívocos, é essencial que se sublinhe a
diferença entre os dois elementos, de modo a permitir um ensino adequado do vocabulário nas
escolas moçambicanas e nos PALOP em geral. O erro que pode advir da confusão sobre os dois
conceitos pode parecer simples, uma vez que quer numa, quer noutra situação, se trata de
palavras da língua. Mas, pode ser grave mais do que se imagina. Uma claudicação desta natureza
pode fazer com que os alunos conheçam muitas palavras, mas continuem com problemas na
comunicação, como resultado de conhecerem palavras que não fazem parte do repertório
vocabular imediato e corrente do coletivo.
Seja o léxico, seja o vocabulário, cada um é constituído por elementos linguísticos
comummente denominados palavras que, à luz de Meillet (1921), são resultado de associação de
um determinado sentido a um conjunto de determinados sons que podem ser empregues numa
estrutura gramatical (cf. Eluerd 2000: 35). Este posicionamento chama atenção para o facto de,
linguisticamente, as palavras que constituem o léxico não serem unidades simples como podem
parecer. Na verdade, trata-se de elementos complexos, constituídos por um significado e um
conjunto de sons que se solidificam num único. Assim, num trabalho sobre o vocabulário, por
exemplo, há que ter em consideração estas propriedades das palavras. Tal como dizem Fromkin
e Rodman, embora seja apenas uma parte do conhecimento de um idioma, o conhecimento dos
51
sons e as suas sequências possíveis para constituir uma unidade à qual se pode associar um
significado, não deixa de ser importante (cf. Fronkin e Rodman 1993: 4-5):
54
In order to use the word it is necessary to know what part of speech and what grammatical patterns it can fit into
(Long & Richard 2001: 55).
52
numa estreita relação entre elas e a gramática55, típicos de uma determinada língua (cf. Saussure
1985: 170).
O Português tem uma história bastante rica de miscigenação de culturas, hábitos e povos.
Isto é, a LP desempenhou e tem desempenhado um papel fundamental no encontro e junção de
vários indivíduos em diferentes cantos do mundo. Desde a sua origem, passando pela sua
expansão até às atuais relações diplomáticas e socioculturais entre os povos do mundo, o
Português, cumprindo o que lhe cabia fazer ‒ permitir a comunicação entre os indivíduos ‒ foi
ganhando, na área do léxico, algumas características formais que lhe são, nos dias de hoje,
típicas (cf. Walter 1994: 198- 220). Segundo Porzig, todas as palavras adquirem um significado
em virtude do seu uso, mas cada uma tem um uso e um significado que lhe são peculiares (Lyons
1977: 213).
Portanto, o vocabulário Português procede de três fontes, a saber: “a continuidade, a
importação estrangeira e a formação vernácula” (Melo 1981: 149), ou seja, o léxico da LP é
constituído de acordo com determinados modelos e processos tidos como tradicionais, tais como:
(a) o modelo greco-latino, no qual intervêm elementos de origem grega e latina; (b) os modelos
híbridos com elementos de proveniência grega e/ou latina e de outras línguas atuais tais como o
Inglês e outras tantas do espaço ultramarino outrora sob controlo de Portugal 56 (cf. Vilela 1995a:
17). Devido ao vertiginoso crescimento técnico científico, pode-se achar, (c) palavras de fundo
estrangeiro (sobretudo Inglês) importadas total ou parcialmente.
A LP é ensinada e falada como L2 nos PALOP e em Timor Leste, em virtude de, nestes
países, o Português ter sido escolhido como LO, quando se tornaram independentes. Assim, o
55
O léxico e a gramática são domínios muito relacionados. O que diferencia os dois é que o léxico é um sistema
aberto enquanto a gramática é um sistema fechado: as estruturas fonológicas, morfológicas (morfemas, artigos,
conjunções, preposições, sufixos, desinências nominais e verbais) e estruturas sintáticas (modelos de construção),
fazem parte de um conjunto finito (Vilela 1995 a: 15).
56
Para (b) e (c) são exemplos todos os neologismos e empréstimos que se enquadraram com ou sem modificações
(deletar, marketing do Inglês; khenhar (mentir; derrubar o outro num jogo e futebol), mafurra (fruta da mafurreira
típica a zona sul de Moçambique), wuswa (massa de farinha de milho), das LB moçambicanas; etc.).
53
idioma tem nestas sociedades um estatuto reconhecido por todos, sendo usado para vários fins
sociais. Para além disto, convive com as línguas locais; no entanto, em muitos casos, não é a LM
da maioria dos cidadãos. O português, naqueles contextos, constitui a “Língua materna de uma
comunidade [portuguesa] que, sobretudo por razões de imigração ou de multilinguismo, é
aprendida por outros falantes de uma outra comunidade [PALOP] a um nível secundário em
relação à sua primeira língua” (Dicionário Terminológico de Linguística: 12).
Falando sobre o ensino de Português como L2 em Moçambique, Mariza Mendoça57,
docente da Faculdade de Línguas da Universidade Pedagógica de Maputo, salienta que
(…) o ensino do Português (…) é uma área de muita responsabilidade. Primeiro, pelo
estatuto que o Português tem. O Português é uma língua oficial, mas é falada pela minoria
dos moçambicanos. Só por isso, o ensino do Português já tem por si uma responsabilidade
muito grande. A par disso, quando nós moçambicanos falamos da língua portuguesa
identificamo-la, desde logo, como a língua da unidade nacional.
57
Até 2007, altura da entrevista e publicação do artigo em http://www.instituto-camoes.pt/encarte/encarte102c.htm,
Mariza Mendonça estava em Portugal para fazer o balanço do programa de formação contínua de professores, após
seis meses de implementação.
54
A eficácia da aprendizagem do vocabulário da LP em contextos multilingues depende
muito de mecanismos formais que viabilizem o processo, desde a disponibilização de recursos
até à monitorização e avaliação. Isto significa que é fundamental a disponibilidade de uma
entidade humana (professor ou outro elemento equivalente) qualificada que oriente o processo de
ensino-aprendizagem, a existência dos curricula eficazes tendo em conta a realidade do grupo-
alvo, a existência de um espaço físico devidamente preparado para o desenvolvimento da
atividade, a produção e disponibilização de material de qualidade, a motivação dos aprendentes,
o recurso a metodologias e estratégias eficazes para cada situação de ensino, etc.
Em conformidade com Azenha, para uma boa aprendizagem de uma LNM e sobretudo de
uma L2, os alunos precisam de se munir de bons materiais. O professor deve intervir na seleção
cuidadosa dos manuais e materiais complementares (cf. Azenha 1997: 7). Reitere-se, Azenha
sublinha ainda a necessidade de se privilegiar a aquisição do vocabulário; necessidade que se
justifica pelo facto de se recorrer a este elemento em qualquer ato comunicativo verbal, bem
como da ponderação de que a aula de uma língua se particulariza pelo facto de nela decorrerem
dois processos, o da aprendizagem e o do uso da língua (aprende-se a língua recorrendo à própria
língua). Pode-se compreender e exprimir sem um conhecimento profundo de regras gramaticais,
mas não sem conhecimentos lexicais (cf. op. cit.: 20).
Colom (2004: 73) por sua vez, alerta para o fato de “a educação [ter] como desafios, a
formação de um Homem autossuficiente e livre que não necessite dos mitos da razão para poder
sobreviver”. Com esta visão compreende-se que a educação, particularmente na área de
aprendizagem do Português, deve permitir que os alunos consigam por si próprios enfrentar a
vida. No que tange ao ensino da língua, fica claro que se deve viabilizar o seu uso de maneira
suficientemente adequada, de modo que se possa ganhar todos os benefícios de saber falar
Português no seio dos PALOP e dos moçambicanos em particular. Portanto, para que isto seja
possível a escola deve apostar no ensino e desenvolvimento do vocabulário dos seus alunos.
A autossuficiência e a liberdade na aprendizagem e desenvolvimento do vocabulário
devem-se manifestar no uso. Porém, é preciso que se paute por metodologias favoráveis para que
isso aconteça. Vieira (1998) aponta para a Autonomia58 na Aprendizagem da LE/L2 como sendo
58
O conceito de autonomia na aprendizagem é bastante antigo, todavia, só a partir dos finais da 2ª guerra mundial é
que começa a ser aplicado, tornando-se sistemático na área de educação devido aos movimentos de emancipação dos
grupos minoritários (cujos valor e objetivos acabaram tendo reflexos na área da educação); aos movimentos de
55
um aspeto a não ignorar para o sucesso das atividades. Saliente-se, antes de mais, que a
autonomia dos indivíduos é um ingrediente fundamental para o sucesso quer individual, quer
coletivo. A atual realidade dos povos exige altos graus de autonomia (no seu sentido literal), para
uma prestação cada vez mais correspondente à demanda social, no ensino e aprendizagem da
LE/L2, em territórios multilingues como Moçambique (cf. Vieira 1998: 21-22).
No que toca ao ensino-aprendizagem do vocabulário, a autonomia do aluno requer a
centralização de todo o processo nele mesmo, a valorização do seu trabalho e, mais do que isto, a
tomada de uma atitude positiva e ativa. Este aluno, até ao nível do ensino secundário, é quem
conhece e sente melhor as dificuldades que tem, sendo, por isso mesmo, importante o seu
comprometimento com sua aprendizagem, para melhorar o sua performance linguística. Por se
falar nisto, é digno de referência que “o papel ativo do sujeito na construção do seu próprio
conhecimento implica, na sala de aula, um enfoque prioritário no aluno, e a redefinição do papel
do professor como facilitador do desenvolvimento humano” (op. cit.: 24).
É preciso que os alunos desenvolvam capacidades científicas que os ajudem a apreender
o vocabulário da L2, como também a usá-lo eficazmente. Tais capacidades podem ser: (a) o
espírito de abertura (para questionarem o que não sabem acerca de uma palavra); (b) de
curiosidade (para procurarem saber cada vez mais coisas relacionadas com as palavras); (c) de
crítica e de criatividade (para fazerem uso consciente e diversificado das palavras); (d) a
colaboração, a autoconfiança e o rigor; (e) a honestidade intelectual, a consistência, a
racionalidade e a eficiência; (f) a formulação das hipóteses, a conceção, a planificação e a
execução de experiências; e (g) a manipulação, a comunicação, a previsão, entre outras.
Tais capacidades deverão proporcionar o conhecimento da LP na ótica de Fromkin,
Rodman e Hyams, traduzindo-se na destreza em combinar sons em unidades linguisticamente
hierárquicas e organizadas de acordo com normas da LP. Refere-se a um conhecimento que
permita a associação de sons ou fonemas para a formação de unidades lexicais ou palavras;
destas para formar estruturas sintagmáticas (imediatamente a seguir ao lexema); de sintagmas,
para dar origem à frase que também são associadas para resultar numa unidade
reação à psicologia behaviorista; ao desenvolvimento da educação de adultos; aos avanços tecnológicos associados à
criação de recursos; ao acesso cada vez maior da população à educação; e, no ensino/aprendizagem das línguas, ao
aumento da procura e à crescente comercialização de recursos de aprendizagem. Isto tudo condicionou a redefinição
do papel do aluno e de esquemas alternativos ao tradicional. No centro das novas abordagens, figura o conceito de
autonomia (autodeterminação) (cf. Vieira 1998).
56
comunicativamente maior, o texto59 (cf. Fromkim, Rodman e Hyams (2011: 8). Este
conhecimento, numa L2, deve ser desenvolvido de uma forma sistemática nas escolas e não só.
A “autonomia representa um valor instrumental e intrínseco, conduzindo a uma vida
melhor e constituindo, em si mesma, fonte de satisfação e de autoestima (autodeterminação e
capacidade de resposta face aos contextos)” (Dworkin apud Vieira 1998: 21-22). Nesta
perspetiva, num trabalho sobre o vocabulário, o aluno de LP como L2 sai beneficiado, pois
consegue desenvolver uma visão dinâmica sobre as palavras, cujos componentes possíveis são,
segundo Schlescher, de dois tipos: um radical e um elemento gramatical (afixo) (cf. Ducrot 1996:
24); desempenha um papel ativo e não passivo na produção e uso do conhecimento, desenvolve
uma motivação intrínseca, aumenta e reforça a organização do conhecimento, elabora e utiliza
diversificadamente os recursos de aprendizagem e faz uma autoavaliação.
Numa PD, a autoridade máxima do professor na tomada de decisões incapacita o aluno
na aquisição do vocabulário, uma vez que é uma realidade humana com as suas insuficiências,
preconceitos, estratégias, objetivos, etc. e, com a obscuridade dos programas de ensino no que
diz respeito ao vocabulário, todo o processo fica comprometido60. No entanto, a PA orienta-se
para a responsabilidade do aprendente, para gerir a sua própria aprendizagem, mantendo relações
de interdependência com o professor. Com isto assume-se que “uma [PA] pode ser uma mais
valia no processo de ensino-aprendizagem [do vocabulário] de uma LE/L2” (Vieira 2003: 34).
Um dos grandes desafios que se colocam ao professor de L2 e do Português, em
Moçambique particularmente, é de garantir que durante a comunicação na sala de aula, haja uma
intercompreensão entre os alunos e entre estes e o professor. Para tal, precisa de desenhar bem as
modalidades de comunicação (orientar a comunicação na sala de aula), e estar atento para
desempenhar um papel de reparador linguístico quando for necessário, pôr os alunos a falar e a
sentir vontade de falar61, conduzir e fazer corresponder todas as intervenções ao grande objetivo
da aula, de uma forma interativa. Agindo deste modo, com o intuito de desenvolver o
vocabulário dos alunos, maior será a probabilidade de ver recompensado o seu esforço.
59
When you know a language, you know the sounds, the words, and the rules for their combination (cf. Fromkim,
Rodman e Hyams 2011: 11).
60
Que isto não seja entendido de modo algum como forma de subvalorizar a figura do professor. Pelo contrário,
deve ser entendido na perspetiva da complexidade do processo de ensino-aprendizagem que ele consegue enfrentar.
61
O professor deve pôr os alunos a produzirem enunciados, através de questionário em função das suas intervenções
(este esquema indica o grau de cooperação entre os participantes).
57
Está muito claro que ensinar e aprender o vocabulário de uma L2 no geral e de Português,
em particular, requer um trabalho abnegado quer do professor, quer do aluno. A razão desta ideia
resume-se, entre outros aspetos, ao facto de ser o vocabulário que viabiliza todas as
manifestações linguísticas de uma determinada sociedade, quer ao nível intralinguístico, quer ao
nível sociolinguístico. Entretanto, numa aula de Português como L2 deve-se privilegiar uma
conceção comunicativa multidimensional (formal, pragmática, cultural e social, etc.) e a tarefa
do aluno como elemento central e como falante criativo, agente ativo e coprodutor do saber.
Deste modo, o programa passa a ser uma base de negociação62 entre os professores e os alunos.
As manifestações de índole gramatical, sintática, semântica, morfofonológica, etc.
materializam-se no uso da língua, através das palavras que constituem o vocabulário, explícita ou
implicitamente. Para falar, ler, escrever, compreender qualquer tipo de informação é necessário o
conhecimento do vocabulário na língua específica a que os interlocutores recorrem para tal ato
comunicativo. Para Tréville e Duquette (1996: 12) “Le vocabulaire d’une langue est un sous-
ensemble du lexique de cette langue. Il est composé de toutes les unités sémantiques,
graphiquement simples et composées, et locutions indécomposables qui s’actualisent dans le
discours et que l’on appelle ‘vocable’ ou plus communément ‘mots’”.
Tréville e Duquette asseguram a existência de pelo menos 3 aspetos fundamentais no
ensino e aprendizagem do vocabulário. Indicam questões semânticas, gráficas (formas escritas) e
estruturais (unidades simples ou complexas). O seu contributo remete para a ideia de o
vocabulário ser constituído por todo o tipo de lexemas, ou seja, (a) palavras lexemáticas
(lexemas) (as que configuram e representam a realidade extra linguística ‒ carro, mar, rio,
pessoa, etc.); (b) palavras categoremáticas (categoremas) (as que representam a forma de
configuração da realidade ‒ este, aquele, esse, etc.); e (c) palavras morfemáticas (morfemas) (as
que não representam a realidade, estabelecendo relações entre unidades de língua ‒ ou, e, sim,
com, etc.)63 (cf. Vilela 1979: 11).
Sendo a finalidade do ensino-aprendizagem do vocabulário de uma L2 em geral e do
Português em Moçambique em particular o melhoramento da performance comunicativa ou
competência comunicativa dos aprendentes, Tréville e Duquette (1996: 14) afirmam que em
“l´actuelle orientation sociale de la linguistique, la didactique des langues (…) vise à engager
62
No que tange à aprendizagem do vocabulário, a negociação ‒ no sentido de privilegiar as necessidades do aluno
sem pôr em causa o objetivos e as metas ‒ constitui um procedimento fundamental e, por isso, imprescindível.
63
Palavras lexicais e gramaticais, na linguagem de Sivers (1996: 279).
58
l’apprenant dans un processus spontané d’utilisation de la langue dans des situations de
communication naturelle”. A abordagem deste género mostra-se fundamental para o propósito
ora apresentado. Um processo espontâneo num contexto de comunicação real, associado à
intenção de desenvolver o vocabulário, viabilizado por uma PA poderá frutificar com facilidade.
No entanto, em Moçambique os contextos naturais de comunicação são escassos e/ou
muito artificiais; só uma reforma macro estrutural e social poderá conduzir a esses contextos
naturais de uso da LP. Portanto, esta estratégia é ideal, todavia, em termos práticos, a realidade
apresenta inconveniências na sua implementação. Para provar a inconveniência de uma
abordagem que tome por base aquela estratégia, basta recordar que no país, a LP, apesar de ter o
privilégio de unir linguisticamente os diversos grupos etnolinguísticos, nas famílias e na
sociedade, sobretudo fora dos maiores centros urbanos, não é usada na comunicação corrente.
Isto não significa que deva ser dispensada; pelo contrário, deve ser desenvolvida.
Os mesmos linguistas, sobre o ensino e aprendizagem do vocabulário, advogam que a
primeira atividade (ensino) não se deve limitar a identificar a palavra como simples, derivada ou
composta, sendo que cada ato deve ser acompanhado por mecanismos que levem ao
conhecimento das respetivas propriedades combinatórias, enquanto a segunda (aprendizagem)
deverá consistir na interiorização (memorização) de todos os aspetos relacionados com a palavra
e o seu uso (cf. op.cit.: 15, 53). Destaque-se que o ensino-aprendizagem do vocabulário deve ser
um processo basicamente teórico e prático no qual a atividade e a capacidade mental do
aprendente são fundamentais, pois é preciso apreender e memorizar todos os aspetos das
palavras.
Não basta conhecer o significado da palavra. É fundamental ter o conhecimento de outros
aspetos linguísticos relacionados com ela. Trata-se de saber com que outras palavras
normalmente se associa; as suas propriedades gramaticais; a sua pronúncia, soletração e sílabas;
as palavras com que se relaciona (família de palavras); e as características seletivas de cada
unidade em uso (cf. MCCarthy, O’dell e Shaw 1997: 2- 8). Mais uma vez, reitera-se a
necessidade de ensinar e aprender cada palavra de uma forma holística. Esta é uma abordagem
que não deve ser menosprezada no contexto moçambicano, no qual, tal como se verificou, o
vocabulário clama por um tratamento rigoroso, para ser conhecido e usado satisfatoriamente.
Mais ainda, ensinar, aprender e conhecer o vocabulário não se esgota na identificação dos
seus sinónimos e antónimos, com 42. 7% e 80% nas estatísticas do inquérito (Quadros I e II).
59
Todavia, até a camada docente se limita a tratar somente destes assuntos, em detrimento de muita
informação relacionada com as palavras. Isto pode ser resultado da falta de preparação específica
para tratar do vocabulário, ou do défice na estrutura dos próprios programas64. Ensinar, aprender
e conhecer uma palavra é também o enfoque nas suas propriedades combinatória, semântica,
sintática, discursiva, sem portanto ignorar a existência contextual de unidades que mobilizam
outras e interferem em termos significativos (cf. Tréville e Duquette 1996: 15). No caso do
Português, como aliás acontece em outras línguas, recordem-se fenómenos de regência
preposicional (no que toca a verbos, adjetivos, substantivos):
A ideia acima aflora dois aspetos a não ignorar. O primeiro tem que ver com o caráter
típico das palavras como entidades significativas (semântica) e que funcionam com base nas
normas sintáticas; e o segundo dá conta de se realizarem em situações do discurso. Claramente,
vê-se a relação quase natural entre as palavras (vocabulário), sintaxe (normas) e o discurso, que,
segundo Fávero e Koch, é uma unidade observável, aquela que se entende, interpreta, quando se
vê ou se ouve uma enunciação (cf. Fávero e Koch 2000: 22-25). Esta conjuntura que sobressai
em relação ao vocabulário deve ser vista com atenção para se garantir o sucesso da competência
comunicativa que tanto se almeja.
Acerca da relação entre vocabulário e discurso, Linda Taylor apresenta itens tais como a
entoação, a acentuação e as pausas na emissão de uma determinada palavra como sendo
importantes para sinalizar o início e o término de um determinado discurso. O conhecimento do
vocabulário envolve, pois, as capacidades de selecionar, articular, sequenciar e decifrar os
significados das palavras (cf. Taylor 1992: 5). Estas habilidades remetem para conhecimentos
sintático-semânticos que devem ser criteriosamente ensinados, aprendidos, praticados e
desenvolvidos. São, portanto, outras tarefas a serem privilegiadas pelos professores da LP como
L2 nos PALOP, sob pena de não se atingirem as finalidades relacionada com o vocabulário.
64
Uma análise minuciosa dos programas permitiu detetar a falta de clareza e/ou abrangência no que diz respeito ao
ensino das palavras.
60
Aos professores da L2, uma sapiente instrução é-lhes dirigida por Taylor nos seguintes
termos: “it is important for teachers to atend to the relationship of sound and spelling (…). When
[students] encouter a new word [they] pay more attention to the way it sounds than to what it
means” (op. cit.: 3). Pronunciamentos deste género dão, inequivocamente, ênfase à questão da
forma sonora e gráfica da palavras como indispensáveis conhecimentos que os aprendentes
devem adquirir e, posteriormente, vem o seu significado e sua interpretação. No entanto, no
contexto moçambicano, a questão da forma sonora das palavras de Português está seriamente
comprometida devido à interferência de traços fonéticos das LB.
A propósito das interferência entre a LP e as LB, um dos aspetos mais salientes e dignos
de menção é a influência fonética/fonológica dos idiomas africanos na língua europeia (cf.
Gonçalves 2000: 3). Se o “estar-já-aí da primeira língua [LM] é um dado ineludível”, e se essa
língua é “tão omnipresente na vida do sujeito, que se tem o sentimento de jamais tê-la
aprendido” (Revuz apud Pereira 2001: 59), exerce, por isso, direta ou indiretamente a sua
influência sobre a L2, sendo previsível o rol das dificuldades de pronúncia que professores e
alunos do ensino secundário moçambicano enfrentam no tratamento das formas sonoras das
palavras. O facto deve, portanto, merecer a maior atenção, enquanto continuar a ser usada a
norma europeia. Confrontem-se as seguintes pronúncias do PE vs PM (cf. Nunga s/d: 10 e
Gonçalves 2010: 41- 41):
PE PM
(10) Amarei [αmα’rej] /αmα’Rej/ [ama’Rej] /ama’Rej/
(11) Colher [ku’λer] /ku’λeR/ [ku’λher] /ku’λheR/
(12) Filhinho [fi’λiηu] /fi’λiηu/ [fi’λhiηu] /fi’λhiηu/
(13) Feminino [fəmə’ninu] /fəmə’ninu/ [feme’nino] /feme’nino/
65
Esta ideia é também defendida por autores como Candlin e Winddowson (1996).
66
Formas sonoras das palavras e a sua escrita.
62
objetivo”. Este corpus deverá ser de âmbito nacional, sem ignorar eventuais necessidades
vocabulares locais, em contextos multilingues. Para além disto deverá ser suficientemente
diversificado e pertinente. Os dois propõem e demonstram no seu estudo67 a necessidade de
corpora vocabulares a serem trabalhados com alunos durante o processo de ensino-
aprendizagem, em função dos objetivos e perspetivas determinados.
Sobre o ponto de vista de Long e Richards, pode-se entender erradamente que na
planificação os resultados a médio e longo prazo é que interessam68. Mas não se pode subestimar
os resultados imediatos, pois o sucesso naqueles níveis depende do sucesso de dia-a-dia, de
semana a semana, etc.. Considerar apenas os resultados a longo ou médio prazo pode conduzir a
equívocos ou pode não permitir correções em casos de falhas. É imperioso que, no país, a nível
macroestrutural, o tratamento do vocabulário beneficie de uma reforma, no sentido de se tornar
clara a necessidade de o ensinar, especificando todos os itens a ter em conta, a quantidade69
média das palavras a aprender e preparar rigorosamente os professores70.
Como sugestão, pode-se basear na ideia de que “the high-frequence words of the
language are cleary so important that considerable time should be spent on them by teachers and
learners” (Long e Richards 2001:16). Para o desenvolvimento do vocabulário dos alunos
moçambicanos de L2, que fique claro que a intenção não deve ser de ensinar palavras difíceis ou
novas, deve ser basicamente o ensino das palavras que se mostram frequentes e pontuais no uso.
Só depois de se ter o seu domínio, é que se pode e deve partir para as novas, difíceis e pouco
frequentes unidades lexicais. A necessidade de se despender mais tempo no trabalho com as
high-frequent words justifica-se por serem estas as palavras do dia-a-dia dos falantes.
Numa visão basicamente comunicativa, dirigindo-se essencialmente aos alunos,
MCCarthy, O’dell e Shaw postulam que uma forma bastante fiável e rápida para a aprendizagem
e desenvolvimento do vocabulário, em contextos multilingues, deve passar pela leitura e audição,
quantas vezes for possível, em L2 (cf. MCCarthy, O’dell e Shaw 1997: 3). Com efeito, fica
dilucidada a dúvida sobre a importância ou não da leitura, da audição e da expressão em
67
Trata-se de um estudo sobre o Vocabulário básico de Português referente ao espaço, tempo e quantidade.
68
Isto pode ser interpretado como se não houvesse necessidade de avaliação a curto prazo.
69
Não é vergonhoso nem descabido estimar e apresentar uma listagem de palavras que constituam o vocabulário
básico a ser aprendido incondicionalmente, por estudantes de uma certa classe. Pelo contrário, é fundamental saber-
se: que palavras é que o aluno precisa de conhecer na plenitude para se comunicar sem restrições?
70
Mas fique claro que o objetivo desta planificação nunca deve ser de conhecer todas as palavras da língua, pois tal
não é possível.
63
Português, para se atingir a proficiência em Português como L2. Assim, aos moçambicanos
estudantes do ensino secundário, deve-se-lhes proporcionar oportunidades de leitura, escrita,
audição, análise de enunciados, enfim, de usar a língua para crescerem linguisticamente.
Ademais, estas atividades requerem o apetrechamento das bibliotecas com livros
interessantes que cativem os alunos a lê-los ‒ aliás, Azenha (1997) já se referira à necessidade de
disponibilizar material de qualidade que cative os estudantes ‒ e mais do que isso, disponibilizar
os meios que permitam ao aluno conhecer as palavras com facilidade, como por exemplo,
dicionários de língua, de sinónimos, de regências, etc., em formatos diversificados. No entanto,
nas condições reais do ensino secundário em Moçambique, a atividade de leitura dos alunos é
posta em causa devido à falta de material, pelo que é fundamental que redobrados esforços sejam
envidados no sentido de inverter a situação, pois periga a realização de diversos objetivos.
Justifica-se o esforço em apetrechar as escolas com dicionários da língua, pois, mais do
que ajudarem o aluno a conhecer e desenvolver a língua, fomentam a sua autonomia como
sujeito do processo. Com o dicionário, a maior parte dos aspetos linguísticos da palavra que
podiam ser aprendidos com o professor são descobertos pelo aluno, o que facilita a sua
apreensão. Em virtude da importância do dicionário, Alvares Ezquerra defende que se trata de
um instrumento com o qual os alunos se devem identificar e familiarizar, uma vez que os
acompanha ou deve acompanhá-los desde que começam a aprender e refletir sobre a língua. O
dicionário poderá acelerar a aprendizagem e o uso adequado das palavras (cf. Alvares Ezquerra:
2009: 7-11).
Para que haja consistência nas aprendizagens do vocabulário, quer conseguidas através
do ensino na escola, quer através de outros processos, é deveras importante revê-lo e fazer
exercícios quantas vezes forem necessárias para dominar cada palavra. As estratégias de revisão
poderão consistir em: (a) sublinhar as palavras em estudo, (b) recorrer aos dicionários,
professores ou falantes proficientes na LP, para descobrir o significado e os respetivos usos; (c)
procurar decompor a palavra para encontrar o radical, os afixos e as possíveis derivadas71; (d)
usá-las em diversos contextos, e sobretudo praticar a pronúncia e a escrita para evitar os
equívocos de situações de homofonia e de homografia, como:
71
Este é um aspeto que é essencialmente morfológico e já é de senso comum que a decomposição das palavras é um
mecanismo importante para se chegar ao seu significado.
64
(14) colher (subst.) vs colher (verb.)
(15) cela (subst.) vs sela (verb.)
Para capitalizar mais uma vez a questão da pronúncia (forma sonora) das palavras na sua
aprendizagem, saliente-se a título exemplificativo a sua pertinência na identificação e distinção
das palavras em (14). É que só a fonética das duas palavras permite a sua diferenciação. Uma das
dificuldades com que se defrontam os alunos do ensino secundário moçambicano é, na verdade,
a pronúncia de palavras semelhantes às do exemplo (14). Já em (15), ilustra-se quão importante é
o conhecimento da grafia para a aprendizagem e distinção de palavras idênticas.
Perante unidades como as de (15), vale apenas recordar a relação entre os sons e os
significados das palavras. De acordo com Saussure (1985: 100-101) a relação entre as duas
realidades linguísticas (som e significado), como já se referiu anteriormente, é arbitrária.
Entretanto, devido a tal arbitrariedade, nas línguas naturais podem ser encontradas unidades
lexicais foneticamente iguais, mas completamente diferentes a nível semântico, e palavras
foneticamente diferentes, porém semelhantes no que toca à sua semântica. Esta relação prova,
por um lado, a separação das duas subáreas da linguística (a pronúncia e a significação), mas, por
outro, a indispensabilidade da forma e do significado prova a sua coexistência e importância em
todas as línguas.
Nisto tudo, a organização do vocabulário aprendido é fundamental e este ato pode seguir
vários critérios para facilitar a memorização de cada palavra aprendida e a sua ativação no ato de
comunicação (cf. Fromkin e Rodman 1993: 77); dentre esses critérios merecem destaque os
seguintes72:
a) Ordenar as palavras com base no significado e sentido, começando, por exemplo, pela
palavra-base ou até mesmo pelo radical e fazendo-se-lhe seguir todas as outras (cf.
(16)). Esta organização pode ou não coincidir com a baseada na formação das
palavras, quer pela derivação, quer pela composição, mas isto não significa que não
haja diferença entre os processos. Enquanto numa interessa o significado das palavras,
noutra o que é importante é o processo de formação.
72
As sugestões de organização a serem apresentadas baseiam-se nas propostas de MCCarthy, O’dell e Shawn
(1997).
65
(16) Amig-
(17)
Uma organização nestes moldes permite conhecer vários aspetos relacionados com o
vocabulário aprendido. Trata-se, por exemplo, das classes possíveis no conjunto das palavras da
mesma família e dos afixos a usar na formação de certas palavras e a sua função. Tendo em
73
O gerúndio é uma forma que pode funcionar como modificador do verbo, desempenhando papel de um verdadeiro
advérbio.
66
conta o exemplo (17), poder-se-á saber que os sufixos -mento, -dor e -ura são usados, regra
geral, para formar substantivos e, para além disso, têm o sentido de ação feita/praticada;
praticante/profissão/quem faz; e ação feita/o que se sente ou sofre, respetivamente. Refira-se que
a organização ou não das palavras em ordem alfabética, poderá depender do aluno, caso ache que
isso lhe poderá facilitar a sua apreensão.
c) Agrupar as palavras tendo como foco as relações semânticas: nesta abordagem, deve-
se transpor os tradicionais limites a que se reduzem as relações semânticas das
palavras74. É preciso, para uma aprendizagem completa e bem sucedida das palavras,
incluir no esquema, as relações de sinonímia, antonímia, hiponímia, hiperonímia,
homonímia, polissemia, etc. (cf. Casanova 2009). O aprofundamento dos sentidos e as
relações das palavras são alguns dos principais ganhos que podem resultar desta
organização. A mesma pode ser através de quadros, ramificações, ou diagramas que
elucidem cada palavra e a sua relação com a outra:
(18) Campo
74
Tradicionalmente, sobretudo em Moçambique, no contexto escolar, as relações entre as palavras reduzem-se a
sinonímia e antonímia.
67
d) Listagem das palavras por ordem alfabética: esta estratégia consiste na disposição das
palavras de A-Z, tal como é feito num dicionário75 de língua. Todavia, a desvantagem
tem que ver com o caráter complexo e pouca clareza do corpus. Em termos de
estratégias pedagógicas para a compreensão do vocabulário, esta complexidade e falta
de clareza ficam a dever-se ao facto de não ser fácil agrupar as palavras nem em
função da sua formação, nem do seu significado, etc.. A maior parte dos aspetos não é
tratada sob ponto de vista de disposição das entradas, mas sim como informação
acessória. Para o exemplo, pode-se observar um dicionário de língua.
e) Agrupar as unidades lexicais tendo em conta os campos semânticos: para Lopes e Rio-
Torto, um campo semântico é constituído por um conjunto de palavras ligadas por
laços semântico, num universo extensional delimitável (cf. op. cit.: 85). Portanto, esta
estratégia consiste na criação de redes semânticas entre palavras que se solicitam
mutuamente em virtude da existência de traços de significados comuns. Esta é uma
das estratégias a recomendar, pois, para além de conhecer os significados e sentidos, o
aluno avança para o conhecimento de questões relacionais e colocacionais das
palavras76:
75
Nos dicionários de língua, número considerável de alunos, sobretudo do ensino primário e secundário, enfrenta
algumas dificuldades na decifração da informação dos verbetes e, para além disso, consulta-o para resolver um
problema imediato, sem, por isso, se preocupar em, por exemplo, descobrir que outras palavras estão direta ou
indiretamente relacionadas (um substantivo derivado de um verbo; ou um substantivo derivado de um adjetivo, etc.).
76
As palavras dispostas em campos semânticos permitem a aprendizagem de vários aspetos relacionados com o uso
das palavras, tais como a interação semântica; e a cristalização dos sentidos das palavras, como resultado do
completamento que se estabelece por meio das redes semânticas que este agrupamento permite. Aliás, os campos
semânticos podem ser constituídos pelas palavras da mesma família ‒ tendo em conta os processos de formação das
palavras, ‒ e pelas palavras que estabelecem entre si certas relações de sentido, etc..
68
sucesso da aprendizagem, significar a interiorização do seu significado, das suas propriedades e,
sobretudo, do contexto em que ocorrem. Finalmente, é preciso que se considere tudo o que se
achar pertinente para o desenvolvimento do vocabulário e, a partir disto, melhorar-se a
competência linguístico-comunicativa. Neste âmbito, os professores deverão ajudar os seus
pupilos a aprenderem e a organizarem melhor o seu conhecimento vocabular.
O ensino, aprendizagem e organização do vocabulário são as principais formas para o seu
conhecimento pleno e ativo pelos aprendentes e falantes da L2 nos PALOP. Há que se
reconhecer que para as classes de palavras consideradas fechadas e invariáveis, de evolução
muito lenta, o seu ensino e aprendizagem pode ser feito e substanciado sob ponto de vista do seu
sentido (significado), quer no tratamento, quer na sua organização e interiorização. Sobre as
características das classes fechadas e abertas, variáveis e invariáveis das palavras, consulte-se os
capítulos VIII, IX, X, XI, XII, XIII, XIV, XV, XVI, XVII e XVIII de Cunha e Cintra (1984: 177-
589); ou Vilela (1995b: 61- 211).
69
(Leiria 2001: 14). Contudo, neste trabalho, embora se use a norma do PE em Moçambique, não
se pretende que os alunos moçambicanos falem como portugueses, porque, na atual realidade, é
absolutamente impossível. Deve-se lutar, sim, pelo uso correto das palavras; aliás, já se disse que
o falante da L2 nunca poderá fazer o mesmo uso que um nativo, porque os dois se apropriam da
língua, tendo como bases realidades linguístico-sociais diferentes.
Uma palavra na sua totalidade contém, como signo, uma face formal e uma semântica,
ambas fundamentais para o seu funcionamento. Assim, ao ensiná-la e aprendê-la, há que
observar com rigor as duas faces. Há ainda a observar a sua construção e o seu uso na
comunicação (Tréville & Duquette 1996; 21). Só assim é que se pode permitir o conhecimento
de qualquer palavra através do ensino nas escolas. Mas isto só não basta. Sabido o que se deve
ensinar, é necessária a criação de condições favoráveis para que o sucesso se sobreponha ao
insucesso até ao mais alto nível desejado. Há que capacitar todos os agentes de modo a que toda
a ação educativa seja feita num campo fértil em que possa frutificar.
Falando acerca da aprendizagem da palavra, importa referir que entram em jogo as
capacidades do aprendente, as circunstâncias de aprendizagem e as características da palavra.
Portanto, pode-se verificar uma proporcionalidade direta entre a alta capacidade de memorização
do vocabulário e a facilidade na sua apreensão. No entanto, o mesmo já não se verifica em
relação àquela última e a complexidade da palavra. Para além disto, se a forma de um item
lexical não se fixar na memória, a fixação do seu conteúdo tornar-se-á dificílima. Com efeito,
havendo associação da forma e do conteúdo na memória do aprendente, a aprendizagem é quase
automática e menos onerosa no que tange à sintaxe e pragmática linguísticas.
Mais ainda, “Words are an important part of linguistic knowledge and constitute a
component of our mental grammars (…) without words we would be unable to convey our
thoughts through language or understand the thoughts of others” (Fromkin, Rodman e Hyams
2011: 76). Assim, o enfoque sobre as palavras, na perspetiva dos três autores, assegura
conhecimentos lexicais e constitui uma alavanca e um condimento para o desenvolvimento da
consciência sobre a combinatória das unidades. É justo concluir que a mente humana está
preparada para desenvolver a língua partindo do conhecimento de palavras, a avaliar pelo
processo da aquisição em que a criança as adquire e só posteriormente é que desenvolve outros
aspetos, sobre uma base lexical. Recorde-se, a criança adquire primeiro uma certa quantidade de
palavras e mais tarde as regras de combinação e uso.
70
A focalização da forma e do conteúdo, os exercícios mnemónicos bem executados e o
uso das palavras, facilitam sobremaneira a aprendizagem. Com eles, as novas palavras poderão
ser relacionadas com as outras já conhecidas. Todavia, apesar de a memorização ser
indispensável, isso não significa que o processo se deva basear nela, pois, imposta aos alunos,
poderá pôr em causa o desenvolvimento da competência vocabular e comunicativa desejada.
Deverão, portanto, ser preferidos outros exercícios que permitam a memorização e o
desenvolvimento da capacidade de uso em comunicação real que, como se sabe, é bastante
condicionada pelo contexto, na sua forma oral.
Para Leiria, são palavras conhecidas as que:
(…) têm conexões com o léxico do sujeito, [embora] o número das conexões [possa] variar.
Certas palavras têm poucas conexões. O sujeito tem delas um conhecimento pobre; outras
têm muitas conexões e, por isso, são bem conhecidas, (…) [ao passo que] palavras
desconhecidas são aquelas que não fazem parte de nenhum dos sistemas de representação;
que não têm qualquer conexão com o léxico do sujeito (Leiria 2005: 15).
Assim sendo, as palavras do vocabulário, no caso dos estudantes moçambicanos, são conhecidas,
mas não suficientemente. Afinal, o que é que os alunos moçambicanos do ensino secundário
precisam de aprender para conhecerem melhor o vocabulário da LP?
A questão das conexões entre o léxico e as palavras remete para o conceito de
consciência metalinguística. Entretanto, o ensino do vocabulário tem forte relação com a
consciência metalinguística como sendo a habilidade de os falantes usarem a linguagem para
pensar e falar. Esta capacidade, portanto, envolve conhecimentos semânticos, fonológicos,
morfológicos, sintáticos, pragmáticos e textuais. Como ela é relevante na aprendizagem das
palavras, aos aprendentes da LP em Moçambique, deve ser ‘provocada’, para que os domínios
afetivo, social, o de poder, o cognitivo e o do desempenho que a caracterizam, possam catapultar
o ensino-aprendizagem do vocabulário nas escolas (cf. Osório e Antunes 2009: 93, 94 e 105).
Sobre a questão de o que aprender acerca do vocabulário de qualquer língua, e de
Português em particular, por falantes não nativos, cuja proficiência depende da aprendizagem
escolar, de maneira implícita, explicita ou mista, em função da realidade de cada contexto, e do
tipo de abordagem que se adotar, Long e Richards (2001: 81-82) afirmam, em Learning
Vocabulary in Another Language, que “There are numerous things to know about a word: (…)
its form: spoken, written and components affixes and stress; (…) its meaning: concept,
71
association; (…) its uses: collocation, grammatical pattern and constraints on its use.” Portanto,
abarcando estes conhecimentos, os alunos poderão conhecer e usar proficientemente a sua L2.
No que toca à forma, deverá ser sublinhado o seu papel imprescindível para o sucesso de
toda a aprendizagem do vocabulário. É dominando-a que se poderá fazer o uso da palavra em
comunicação do dia-a-dia. Isto não deverá significar, como pode parecer, a sua superioridade em
relação aos outros aspetos como, por exemplo, o sentido. Trata-se apenas de demonstrar a sua
importância. A forma das palavras, quer oral, quer escrita, diz respeito à representação física,
como a palavra se apresenta quando é enunciada. Sendo assim, o aprendente deverá, para
conhecê-la, identificar os elementos que a compõem ‒ consoantes e vogais: fonemas definidos
por Trubetzkoy como elementos de “oposição fonologicamente distintiva” (Marçalo 1992: 206),
sílabas, acento, radical, afixos, e classes gramaticais ‒ e saber articulá-los, executá-los e
pronunciá-los na oralidade.
O aluno aprendente de Português L2 deverá saber diferenciar, no uso, por exemplo, as
vogais abertas, fechadas e semifechadas do Português. Aliás, um dos problemas que se verificam
na aprendizagem e uso das palavras de Português no contexto moçambicano tem que ver com a
dificuldade na diferenciação da abertura de vogais nas palavras (contraste-se o uso do PM e do
PE nos exemplos (10) - (13) e nos seguintes). Parece não se reconhecer devidamente o valor
distintivo da abertura ou não de algumas vogais, perturbando, certas vezes, o ato comunicativo.
Por causa disto, na oralidade, o PM apresenta variações dignas de referência em relação ao PE:
PM PE
(29) Pessoa [pεsowa] [pəssowa]
Ainda na esteira deste assunto, as semivogais ([j] e [w]), os ditongos orais e nasais são
elementos que deverão ser dominados para a aquisição do vocabulário. É também fundamental
saber a relação biunívoca e unívoca entre o som e a grafia. Igualmente, não é pouco relevante
72
conhecer quais são as consoantes sonoras e quais as surdas da LP. Outra das dificuldades dos
estudantes, sobretudo do norte do país, por exemplo, tem a ver com a diferenciação, em termos
de vozeamento, das bilabiais oclusivas [p] e [b], as linguodentais oclusivas [d] e [t]. A tendência
é de usar as formas não vozeadas como (bebida [pepita]; dente [tentə]). Portanto, um trabalho
para os alunos conhecerem as características fonéticas e fonológicas da LP mostra-se necessário.
Reitere-se que o objetivo no ensino secundário moçambicano não deverá ser o de dotar os
alunos de conhecimentos teóricos sobre estes pontos, mas sim práticos para favorecer a
aprendizagem do vocabulário. A acentuação das palavras é também um dos aspetos a não
negligenciar. Portanto, são vários aspetos sobre a forma das palavras que devem ser aprendidos
pelos alunos para facilitar-lhes o desenvolvimento e uso das unidades lexicais.
De acordo com Leiria, nos estudos sobre L2 procura-se saber quais os fatores de natureza
formal que afetam a aquisição de uma palavra: a `pronunciabilidade´, a ortografia, a extensão, a
morfologia, a semelhança com outros itens lexicais; ou de natureza semântica: o fato de serem
concretas ou abstratas, o grau de especificidade, registo e idiomaticidade (Leiria 2001: 16). Em
consonância, Long e Richards e Leiria demonstram não ser suficiente uma parte dos aspetos de
uma palavra, sendo necessária a sua aprendizagem total. Pelo que, para além da forma há que
trabalhar no significado, sentido e usos ‒ basicamente a sua semântica e pragmática ‒ e, enfim a
sua colocação e/ou combinatória77, na formação de estruturas supra palavra ‒ sintaxe.
Aliás, sobre este último assunto, Long e Richards (2001: 23) afirmam que “words are not
isolated units of language, but fits into many interlocking system and levels. Because of this,
there are many things to know about any particular word and there are many degrees of
knowing”. Isto reforça, mais uma vez, a ideia de que é preciso aprender tudo sobre as palavras
para melhor as conhecer e usar, devendo haver uma planificação adequada e flexível. Mais
ainda, fica esclarecido o facto de as palavras, numa determinada língua, não funcionarem
isoladamente. É com diversas relações entre elas, através de normas próprias ‒ sintaxe,
pragmática ‒ que se edificam os diversos discursos.
Leiria (2005), MCCarthy, O’dell e Shaw (1997), Long e Richards (2001) e Alvares
Ezquerra (2009) apresentam claramente os aspetos linguísticos que devem ser tratados na
aprendizagem das palavras. Ora, não se verifica nenhuma divergência entre as suas propostas,
77
O estudo do vocabulário pode ter sucesso se se apostar na sua estrutura actancial que comporta uma palavra base
(operador) e os seus actantes que são todas as palavras e/ou elementos necessários para que se produza um sentido
completo (cf. Treville & Duquette 1996: 15-17).
73
senão as diferenças, tão naturais em ciência, de abordagem dos mesmos assuntos. Entretanto,
sem ignorar as outras propostas, por ter sido produzido num contexto de estudos linguísticos
sobre a aquisição do léxico de PLNM, em que se inclui o Português aprendido e falado em
Moçambique, basear-se-á, este trabalho, no contributo de Leiria (2005: 130-131) citando Batia
Laufer (1997: 141) que considera os seguintes aspetos para ensinar e aprender eficientemente
uma palavra:
São basicamente estes seis aspetos referentes ao ensino-aprendizagem das palavras que se
pretende ver tratados na totalidade até ao nível do ensino secundário moçambicano, para o
sucesso na aquisição, desenvolvimento e uso do vocabulário da LP. Por isso, são os mesmos
que, em seguida, serão descritos, dilucidados e analisados, tendo em conta os dados obtidos
através do inquérito e da análise dos programas de ensino de Português em Moçambique e que
foram apresentados em capítulos anteriores. A descrição dos referidos aspetos irá privilegiar os
conteúdos que se mostram essências e aqueles que, por várias razões, constituem dificuldades
para o caso específico dos estudantes do ensino secundário do país.
O termo morfologia remete, logo à partida, para a forma das entidades linguísticas,
geralmente não de nível superior à palavra, ou por outras palavras, “trata do estudo da estrutura
interna das palavras”. De facto, disto trata a morfologia; todavia, mais do que isto, preocupa-se
com o significado e com a função de cada entidade que compõe a palavra, com as suas relações
com outras “entidades mínimas” com que ocorre e com os princípios que regulam a ligação entre
74
essas entidades. Esses elementos linguísticos que compõem as palavras, “distribuem-se em duas
grandes áreas: significação gramatical/flexional e a significação lexical, podendo haver a
conjugação das duas áreas (…)” (Rio-Torto 1998: 47).
Optando por uma abordagem comunicativa para o ensino-aprendizagem do vocabulário,
conforme se recomenda na atual didática das L2, colocando o aprendente numa situação de
comunicação real ou quase real, em que o conhecimento é negociável para a sua compreensão e
apreensão (cf. Tréville & Duquette 1996: 95), é fundamental que ele conheça a forma (a parte
externa da palavra). Ou seja, precisa de conhecer as formas de algumas palavras para negociar,
com o professor, o conhecimento de outras. Conhecer a forma oral e escrita constitui, portanto, a
primeira etapa da aprendizagem de qualquer palavra. É a partir desta forma física (oral ou
escrita) que serão aprendidos outros pontos inerentes a todo o processo.
Falando acerca da forma da palavra, importa referir que tem a ver com vários aspetos
conjugados. Na verdade, mobiliza o conhecimento de cada grafema, de cada sílaba, do radical,
dos afixos, do acento gráfico ou não que compõem a palavra e da sua correta sequenciação, quer
na oralidade, quer na escrita. Sublinhe-se, isto deve implicar o conhecimento, não da teoria da
fonética e da fonologia, mas sim o da prática relacionada com elas. É preciso saber quais os
grafemas e a sua função a combinar para constituírem determinadas sílabas que, por sua vez,
serão estruturadas com uma certa lógica de uma língua para originarem uma determinada
unidade que, associada a um significado constituirá uma palavra. Ademais, estas formas é que
estarão na superfície de cada ato comunicativo em que se recorra à linguagem verbal, isto porque
elas se enquadram dentro de um universo científico designado morfologia e que mantém relações
quase naturais e inevitáveis com a fonética, fonologia, semântica, etc. (Rio-Torto 1998: 47- 50).
Assim, no conhecimento da forma de qualquer unidade lexical, entram em cena, ainda
que de forma meramente básica para fins imediatos, conhecimentos de índole fonético-
fonológica. Se por um lado, a fonologia estuda os sistemas de sons de línguas particulares para
explicar o seu funcionamento (cf. Mateus 1996: 172), ‒ os sons e a pertinência de cada grafema e
de cada sílaba que compõem a palavra aprendida ou a ser aprendida numa L2,‒ por outro, a
fonética se preocupa com o estudo científico dos sons da fala humana, desde a sua produção até à
sua perceção (cf. Andrade e Viana 1996: 115). Nas entrelinhas, subentende-se que o
conhecimento fonológico é sobre o particular, ao passo que o fonético, é sobre o geral.
75
A consciência fonológica é a capacidade que os estudantes/falantes têm ou devem ter
para reconhecerem os sons ‒ onde começam e terminam. É preciso desenvolver no seio dos
falantes moçambicanos esta habilidade, que é importante para a aprendizagem do vocabulário.
Ao desenvolvê-la dá-se, em simultâneo, grande parte dos conteúdos inerentes à aprendizagem de
uma unidade lexical. Desta feita os alunos poderão emitir, ouvir, ver, escrever, e ler, sem
dificuldade as palavras, um passo gigantesco para a competência vocabular. Sobre a escrita, no
contexto das estratégias de ensinar e aprender as palavras, está certificado que ela proporciona o
desenvolvimento da capacidade de criatividade vocabular (cf. Candlin e widdowson 1996: 7).
Sobre a sílaba, Gardes-Temine (1998:11) apela para o facto de dever ser vista como “une
unité fondamenale, et c’est en particulier dans son quadre que l’on definira l’accent. (…)”.
Resume-se assim a importância do conhecimento da sílaba, para a apreensão adequada de
qualquer palavra. Efetivamente, é em determinada sílaba que reside o acento de cada lexema.
Como se sabe, apenas uma vogal78 acomoda o acento de toda a unidade silábica. Por seu turno,
Said Ali demonstra que a sílaba é um elemento imprescindível na estrutura das palavras da LP,
podendo existir sílabas constituídas apenas por vogais79 (cf. Said Ali 1975: 22). Os alunos
moçambicanos, em certas palavras modificam sons, ou omitem total ou parcialmente certos sons,
ou ainda acrescentam sílabas:
78
Le centre de toute la syllabe est constitué par une voyelle (Gardes-Temine 1998:11).
79
Recorde-se que as sílabas do Português podem respeitar a ordem consoante-vogal (CV): pa-to; vogal-consoante
(VC): al-to; vogal (V): é, a-tar; vogal-semivogal: ou-tro, oi-tenta; consoante-vogal-consoante (CVC): par; mal-ta;
consoante-consoante-vogal (CCV): pró-prio; tra-ba-lho; consoante-consoante-vogal-consoante (CCVC): plás-tico,
fren-te; consoante-consoante-vogal-consoante-consoante (CCVCC): trans-mitir, cen-trais; consoante-consoante-
vogal-consoante-consoante-consoante (CCVCCC): trens, pa-trões; consoante-vogal-consoante-consoante (CVCC):
sais, pais, tam-bém, vogal-consoante-consoante (VCC): eis (Barbosa 1994: 137).
76
Nos dois últimos casos do mesmo número, o problema consiste na mudança da vogal de uma
determinada sílaba, como resultado do não domínio das vogais, cuja relação com os sons não é
unívoca. Já em (31) ocorre a omissão de certas sílabas das palavras, casos de aférese.
Entretanto, estas dificuldades que põem em causa a gramaticalidade daquelas unidades
lexicais poderão ser facilmente ultrapassadas com um trabalho minucioso acerca da estrutura
silábica das palavras, para viabilizar a aprendizagem do vocabulário. Com aqueles exemplos,
pode-se afirmar que, os indivíduos que os pronunciam daquela maneira, não têm a consciência
fonológica no que diz respeito àquelas unidades lexicais. Desta feita, prova-se que a sílaba,
definida como segmento pronunciado numa só emissão de voz e constituída por vogal, ditongo
ou vogal e ditongo combinados com consoante(s), constitui um elemento fulcral para a apreensão
de uma palavra.
A “aquisição de uma língua não materna implica utilização dos órgãos do aparelho
fonador e de processos psicológicos formatados para o uso na produção de sons e outras
estruturas da língua materna” (Ngunga 2012: 8), entretanto, “cada língua possui os seus sons”
(Martinet 1985: 17). Deste feita, algumas formas sonoras do Português são afetadas pela
fonologia bantu, dando lugar a vários desvios que se detetam no PM, salientando-se erros na
pronúncia dos fonemas /r/; /λ/; /a/, /α/; /e/, /ε/, /o/ e /Ɔ/, representados graficamente pelos
grafemas “r”; “lh”; “a”; “e” e “o”, respetivamente. Verificam-se também tendências para a
universalização da sequência silábica consoante-vogal; a abertura das vogais átonas e o
ensurdecimento de algumas consoantes sonoras do PE, sobretudo na oralidade (cf. Gonçalves
2010: 41-42).
No Sul de Moçambique, os falantes têm dificuldades na diferenciação dos fonemas /r/ e
/R/ ((32)), na pronúncia do /λ/ ((33)), e na marcação da abertura das vogais de acordo com o PE
((34). Um dado importante é que nas línguas autóctones, LM dos falantes da região sul,
sobretudo Xichangana, Cicopi, Bitonga e Xirhonga, não se estabelece diferença entre /r/ e /R/.
Aliás, uma escuta estratégica nos falantes das LB permitiu detetar a ausência do fone [r], o
caráter não distintivo da abertura ou não de uma certa vogal e a aspiração do fone [λ], só para
exemplificar. Estas características das LB afiguram-se como umas das principais causas das
dificuldades de índole fonológica dos falantes (cf. op. cit. e Ngunga: 2012: 8- 13).
77
(32) Parágrafo: *[pa’Ragrafu] /pa’Ragrafu/
(33) Folha: *[‘foλha] /’foλha/
(34) Feminino: *[feme’nino] /feme’nino/ (id.)
No norte do país, por seu turno, os fenómenos que se podem salientar são diferentes dos
que foram apresentados para o sul. Nesta região, há uma generalização do ensurdecimento das
consoantes oclusivas do Português. Os fonemas /g/, /d/ e /b/, tendem a ser pronunciados como
[k], [t] e [p] ((35)-(37)), respetivamente. Para além destes, observa-se a ‘desvibração’ das
vibrantes simples /r/ e múltipla /R/ ((38)) (cf. Ngunga 2012: 12- 13). Isto deve-se ao facto de não
existirem nas línguas da região, sobretudo o Emakhuwa, aquelas consoantes vozeadas (Sitoe e
Ngunga 2000 apud Gonçalves 2010: 42). Portanto, estas e outras questões da fonologia precisam
de ser dominados pelo professor, para poder abordá-las melhor.
Como se pode entender, em todas estas palavras (embora as de (39) não estejam graficamente
acentuadas), existe uma sílaba que contém uma vogal hospedeira do acento tónico, ou seja,
aquela que é pronunciada com maior intensidade de voz. São basicamente três os acentos
gráficos existentes na LP ‒ grave, agudo e circunflexo ‒ cujo uso é, como se sabe, regulado por
regras gramaticais. Isto prova mais uma vez que a colocação do acento numa vogal inadequada, a
não colocação, ou qualquer procedimento à margem da prescrição gramatical levam à
agramaticalidade da unidade lexical e a todas as inconveniências que isso pode causar, como se
pode contrastar os exemplos a seguir.
80
(41) * Rúbrica (Subst.) vs Rubrica (Subst.)
(42) *Estrategias (Subst.) vs Estratégias (Subst.)
(43) *Periodo (Subst.) vs Período (Subst.)
84
Em (44) pode-se incluir palavras como amanhecer, amável, entardecer, expectável, acrescentar, etc., enquanto em
(45), vinagre, passatempo, etc..
85
Excetuam-se casos particulares de palavras compostas cujo significado do composto não é a associação dos
significados dos componentes, como por exemplo, a palavra amor-perfeito.
86
Quanto à sua estrutura interna.
87
Todas têm pelo menos um radical ou uma base.
82
complexas, encontram-se um radical e um afixo ‒ se forem derivadas,‒ ou duas palavras ‒ se
forem compostas88‒ ((47)) (cf. Tréville e Duquette 1996: 21- 22).
Quanto aos afixos há que salientar que são sempre morfemas presos que ocorrem com
radicais e/ou bases, modificando-lhes o significado. Estes morfemas, em função da posição em
que ocorrem junto do radical, podem ser sufixos ‒ quando pospostos ao radical, ‒ prefixos ‒
quando antepostos - ((44)) e infixos90 - quando introduzidos no meio da palavra (cf. op. cit.: 22-
23). Os prefixos apenas modificam a palavra a nível semântico, enquanto os sufixos podem
modificar o significado e a classe gramatical. Nas palavras do Português, é possível que ao
mesmo radical se atrelem dois ou mais afixos ((44)) derivacionais apenas ou combinados com os
flexionais (Rio-Torto 1998: 50- 63).
Resumidamente, a prefixação caracteriza-se pela anteposição de um morfema preso a
uma palavra, resultando numa unidade cuja semântica está relacionada com a base. Neste
sentido, o prefixo subordina-se total ou parcialmente ao seu hospedeiro. Na sufixação, por seu
turno, verificando-se um fenómeno de subordinação total do sufixo ‒ que funciona como um
complemento morfológico e modificador semântico do radical – a característica principal, a nível
da forma é a posposição. Quer os prefixos, quer os sufixos são monemas fixos91 que a língua
disponibiliza como instrumentos úteis na (re)criação lexical (cf. Basílio 1991: 29-32; Alves
1991: 42- 45).
90
Os infixos, na língua portuguesa, de uma forma geral, não intervém muito na constituição de palavras, por isso,
não será apresentado nenhum exemplo. Existem alguns autores que consideram caso de infixação na língua
portuguesa, o processo de colocação do clítico numa forma verbal do futuro (lavar-me-ei). Todavia esta ponderação
é muito discutível, por isso, não se tratará dela neste trabalho.
91
Um prefixo nunca pode ocorrer na posição de sufixo, nem de infixo. Estes, por sua vez nunca poderão ocorrer na
posição do primeiro.
84
A divisão dos afixos em derivacionais e flexionais, com impacto diferente na
classificação e semântica da palavra, como se referiu anteriormente, fundamenta-se nos seguintes
fatores: a capacidade criativa e recreativa dos processos derivacionais (uso de afixos
derivacionais), a sua ação na mudança da categoria gramatical e do valor semântico da unidade
lexical, em oposição aos processos flexionais (uso de afixos flexionais) que originam diversas
formas da mesma palavra, servindo sobremaneira a sintaxe e atuando na periferia da palavra, ou
seja, sem interferir na sua estrutura morfológica e semântica de base (cf. Varela Ortega: 1992:
69-71). Resumindo, os afixos derivacionais modificam o sentido de base, mas os flexionais, não.
Os dois processos (derivacional e flexional), afetando de maneira diferente a estrutura das
palavras, vão condicionar também de maneira diferente o uso dessas unidades. Enquanto a
derivação (sobretudo sufixal) pode implicar a mudança da estrutura argumental e/ou
colocacional, a flexão significa apenas a variação da mesma unidade em número, género, pessoa,
aspeto, tempo, voz, grau, etc. em função de cada caso. Assim, como consequência dos dois
processos, as relações das palavras com as outras em enunciados vão ser diferentes. Por
exemplo, adicionar sufixos derivacionais a um verbo como comer resulta em propriedades
diferentes em relação à adição de sufixos flexionais, sobretudo no contexto de uma frase ((49)-
(50)).
(49) [SN O [Subst. come- [derivação dor]] de bananas] é o João.
(50) O João [SV [Verb. com- [flexão eu]] banana]; Eles [SV [Verb. com[flexão eram]] bananas].
92
Despedir não tem nenhum prefixo, enquanto em ilegal, o verdadeiro prefixo é in-.
85
palavras que origina. Os derivacionais são os que se juntam aos radicais para modificá-los,
originando uma unidade relativamente independente da sua base sob ponto de vista semântico
((51)). Por seu turno, os flexionais distinguem-se por não modificarem a base à qual se ligam
((52)) (Gardes-Termine 1998: 55). Estes últimos morfemas acrescentam à palavra, informação
de índole sintático gramatical fundamental para estabelecer relações entre as unidades lexicais e
entre estas e a realidade objeto da comunicação. Diferentemente dos derivacionais, os flexionais
podem indicar num só monema, várias categorias flexionais (amálgama) de tempo, modo,
aspeto, pessoa e número – é o caso do monema -o numa forma verbal de um verbo da 1ª
conjugação, no presente do indicativo, 1ª pessoa do singular falo ‒ (cf. Vilalva 2000: 187).
(prefixo) afixo derivacional com sentido (sufixo) afixo derivacional com sentido de
de negação. Quem faz/profissão…
93
Não pode ser substituído por des- (*desfeliz).
94
Não pode ser substituído por -ante (*carregante).
95
Saliente-se que a enumeração não é exaustiva, é apenas exemplificativa.
86
c) Sufixo que formam substantivos a partir de adjetivos: -eza, -ez, -ice, -idão, -tude, -ura;
-dade, etc.: (moleza; pequenez; chatice; lentidão; completude; formosura;
cumplicidade);
d) Sufixos que formam substantivos a partir de verbos: -mento, -ção, -dor, -dura, -tório,
-ante, -ança, etc. (juramento; oração; investigador; investidura; interrogatório;
ambulante; cobrança;);
e) Sufixos que formam adjetivos a partir de substantivos: -eiro, -oso, -udo, -ano, -ento,
-ático; ico, etc. (aventureiro; famoso; sortudo; moçambicano; bolorento;
emblemático; anatómico; etc.);
f) Sufixos que formam adjetivos a partir de radicais verbais: -ável, -ivo, -iço, etc.
(amável; curativo; reboliço; etc.);
g) Sufixos que formam advérbios a partir de adjetivos: -mente (alegremente;
pacientemente; et.);
h) Sufixos que formam verbos: -ar, -ir, -izar, -ficar, -ear, -itar, etc. (amar; curtir;
pontapear; palpitar; etc.).
Já no que tange aos prefixos, que como se sabe, apenas intervêm na semântica da palavra,
importa, ainda que de forma sumária e menos abrangente, destacar alguns prefixos menos
simples, podendo até ser confundidos com algumas palavras. De acordo com Rio-Torto, existem
prefixos monossilábicos que se podem juntar a várias palavras e os dissilábicos caracterizados
por uma certa força semântica que nunca fica despercebida, como o acontece com os
monossilábicos. Os prefixos, segundo a autora, caracterizam-se de uma forma geral pela
polivalência e ambiguidade, ou seja, um mesmo morfema pode veicular mais de um sentido
funcional (anormal vs anoitecer;) e o mesmo sentido, por vários prefixos (negação: a-; in-; des-;)
(cf. Rio-Torto 1987: 96- 97).
Dentre vários, pode-se indicar os seguintes:
a) des- (desinformar, desinibido, desinteresse, desgraçar, desmembrar, etc.);
b) pre- (previver, prepotência, predestino, prever, predizer, preanunciar, prefixo, etc.);
c) re- (rever, reviver, reagrupar, reaparecer, reestruturar, renovar; reabrir, etc.);
d) a- (anormal; amovível, agramatical etc.);
e) arqui- (arquidiocese, arquifonema, arquibancada, arquimilionário, etc.);
87
f) extra- (extraterreno, extracurricular, extraordinário, extraprograma, etc.);
g) híper- (hipersensível, hiperativo, hipertenso, etc.);
h) sobre- (sobrenatural, sobrepor, sobrecarregar, sobrevoar, sobremesa, etc.);
i) super- (super-homem, supermercado, superordenar, superdotado, etc.);
j) contra- (contradizer, contrafeito, contramão, contrapor, contração, etc.)
k) ante- (antever, antepassado, etc.) (cf. Rio-Torto 1987: 96- 100).
96
Acerca dos prefixos, importa recordar que nunca alteram a categoria gramatical da palavra a que se atrelam,
aspeto fundamental que os diferencia dos sufixos, para além da posição em que ocorrem.
97
Palavra que se usa no PM. Trata-se de um neologismo derivado de bip.
98
Não se deve confundir a derivação por prefixação e sufixação com a parassintética.
99
Significa mercado informal e resulta da justaposição de dumba (confiar) + nengue (perna/pé)).
100
Organização da Mulher Moçambicana.
101
Frente de Libertação de Moçambique.
102
“Existem morfemas prefixais que assumem rigidamente a função prefixal, mas existem alguns que extrapolam
essa função” (Alves 1991: 47).
88
Na composição, “se unen o se combinan dos o más formas librés (…) para constituir una
forma compleja la cual, desde el punto de vista significativo, fónico y funcional, representa una
unidad léxica [nueva]” (Varela Ortega 1992: 97). Existem compostos em que as palavras se
ligam em plena e simples coordenação dos seus componentes (compostos copulativos: amor-
perfeito; fura-olho) e aqueles cujos elementos desencadeiam uma relação de dependência
(compostos subordinativos: professor-fantasma; navio-escola) – um dos componentes é
determinante do outro (cf. Sandman 1991: 50). A criação de palavras compostas pode obedecer a
uma das combinações:
a) Substantivo + substantivo: pai-natal; fanta-uva, couve-flor, etc.
b) Substantivo + Preposição + substantivo: fim-de-semana; cota de família103, etc.
c) Substantivo + Adjetivo: pátria amada, matéria-prima, campo pequeno, etc.
d) Adjetivo + adjetivo: luso-moçambicano, azul-escuro; indo-europeu, etc.
e) Verbo + substantivo: ganha-pão, fura-olho, vira-latas, saca-rolhas, guarda-redes, etc.
(cf. Said Ali 1975: 118-119).
Neste contexto, para além da derivação, importa que os alunos moçambicanos dominem
o processo de composição que consiste na combinação de palavras autónomas entre si, ou de
radicais. Tais compostos podem ser morfológicos (malmequer, vinagre…) e sintáticos (guarda-
redes, saca-rolhas…) (Vilalva 2000). Ademais, nos dias que correm, é urgente que os
aprendentes de L2, moçambicanos em particular, aprendam cada palavra nova (neologismo) e
estejam em altura de enquadrá-la melhor no seu vocabulário. Ora, este enquadramento não pode
ocorrer com sucesso se não tiverem conhecimentos suficientes sobre a formação das palavras na
LP. É certo que a nomeação de novas realidades é feita através da criação de novas palavras ou
atribuição de novos significados às palavras já existentes, resultando, em todos os casos, em
neologismos (cf. Carvalho 1998).
É de referir que na composição, a questão da ortografia não é fundamental para definir tal
processo. Não raras vezes, consideram-se palavras compostas aquelas cuja estrutura resulta da
combinação de unidades através do hífen. No entanto, isto é um engano. Os componentes dos
compostos podem-se articular por meio de um hífen, através de um espaço entre eles, ou mesmo
sem qualquer separação (cf. Fromkin e Rodman 1993: 136). Portanto, a formação de palavras
consiste em processos morfossintáticos e semântico que permitem a (re)criação de unidades
103
Neologismo que significa, em Moçambique, pessoa responsável.
89
novas. Os derivados e os compostos têm de diferente o facto de, na sua formação, intervirem
elementos linguisticamente diferentes. Há que, na derivação prefixal, se prestar atenção aos
morfemas que se parecem com palavras, (entre-: entrecortar; contra-: contrafazer; sobre-:
sobrepor), para não se confundir com compostos (Gonçalves 2004: 68-70).
Uma palavra nova, neste contexto, legitima-se no seio da língua através do uso e da sua
inclusão num dicionário. Esta legitimação deve ser resultado da adaptação à estrutura da língua
em questão. O neologismo, para se integrar, no vocabulário dos alunos falantes do PM, deve, de
acordo com Alves (1996: 56), ser fruto da necessidades de nomeação de certa realidade, adequar-
se à estrutura morfossintática da LP, apresentar uma estrutura compatível à formação de
derivados, estar em circulação no seio dos falantes, entre outros. E, para o aluno conseguir fazer
reunir todos estes requisitos, tem de conhecer as estruturas internas típicas das palavras da LP.
Hodiernamente, a realidade socioeconómica, as relações interpessoais e os costumes
mudam rapidamente e, como consequência disto tudo, impõem-se o uso de novos itens lexicais,
oriundos da língua de especialidade como reflexo do desenvolvimento da ciência e da técnica.
Por sua vez, a globalização propicia a entrada, na LP, de termos estrangeiros (cf. Carvalho 1998).
Isto implica que, no ensino do vocabulário aos estudantes secundários em Moçambique, se deve
proporcionar conhecimentos básico sobre os neologismos e a sua formação, empréstimos e
outros mecanismos de criação, recriação e renovação lexical, o que lhes conferirá a capacidade
de se enquadrarem num mudo dinâmico e globalizado dos dias de hoje.
É preciso consciencializar os aprendentes sobre o facto de existirem quatro tipos de
neologia lexical, a saber: (a) a neologia fonológica ou formal, que resulta de um novo recorte
cultural, com expressão e conteúdo inéditos e uma função semiótica. O neologismo fonológico
pode ser específico (quando resulta da combinação inédita de fonemas) ou complementar
(quando resulta da combinação de morfemas:) ((53)); (b) a neologia semântica104 que resulta de
uma palavra já existente, conservando-se a sua base e atribuindo-se-lhe um novo conteúdo,
correspondente ao novo recorte cultural. Os novos conteúdos podem prevalecer com os antigos
ou neutralizá-los ((54)) (cf. Biderman 1998: 38).
Existe ainda (c) a neologia sintagmática que resulta da derivação e da composição. Os
derivados decorrem da combinatória lexicalizada de signos mínimos que assumem o conteúdo e
104
As conotações, a transposição de uma palavra de um universo discursivo para o outro, o emprego com desfoque
semântico de um lexema, a conversão categorial, geralmente, originam este tipo de neologismo.
90
as funções de segmentos que sintetizam e representam e, os compostos, da combinatória
lexicalizada de vocábulos ((55)); e (d) a neologia alogenética que consiste em unidades novas
emprestadas de outro sistema linguístico e sociocultural. As novas palavras passam por
adaptações no plano fonético-fonológico ou semântico-sintático (estrangeirismo/peregrinismo)
((56)). Todos estes tipos vão respeitar processos vernáculos de formação de palavras, ou estas
terão de reunir as condições enumeradas.
É possível que a mesma palavra pertença a mais de uma das divisões apresentadas.
Portanto, a neologia é um dos aspetos que, nem os alunos, nem os professores devem deixar de
lado. O Quadro III, resume os processos de formação de palavras e a situação da neologia em
Moçambique cujo conhecimento sobre os mesmos, de prejudicial nada tem, pelo contrário,
alarga o horizonte dos alunos sobre o vocabulário do seu dia-a-dia. A apresentação do referido
quadro, em nenhum momento deve ser entendido como a delimitação das palavras a focalizar no
ensino do vocabulário em Moçambique, pois, quanto a isso, já se referiu bastante que todas as
palavras que constituem necessidades dos alunos para se comunicarem devem ser ensinadas.
105
Derrubar o outro com recurso aos pés, num jogo de futebol, ou estar a mentir (PM).
106
Emancipar a mulher, habilitá-la a assumir cargos superiores da vida política e económica, em igualdade com os
homens, no PM.
107
Equivalente a não conseguir no PE.
108
Prato típico da gastronomia do sul de Moçambique.
109
Equivalente a namorada do PE.
110
Meio de transporte coletivo.
111
Organização Nacional dos Professores, em Moçambique.
112
Mercado informal, cf. Nota 98.
113
Intrometer-se num convívio sem convite.
91
Quadro III: Resumo dos processos e tipos de neologia de Moçambique
Neologismo Alogenético
Neologismo Neologismos Neologismo Moçambicanismos
Fonológicos Semânticos Sintagmático “verdadeiros” Outros
92
Lobolar Mothiana Horera
Minhar Mufana
Phatlar Mukume
Printar Mukherista
Sograria Mulungo
Tchovar Muzungo
Thayar Ngalanga
Thonar Njinga
Ventar Saguate
Vunar Sathanhoco
Winar Suca
Zenhar Tchova
Compo Arroz-fogado Tchova-xitaduma
sição Bula-bula Tchungamoio
Deixa-andar Thonthontho
Tihove
T.Sem Timbila
Trun. Tintlolo
F.Sint Txopela
Sig, Wukanhi
Wuswa
Acr.
Xicadju
Xiconhoca
Xidjumba
Xigovia
Xiguiana
Xiguinha
XiKwembu
Xindere
Xingomana
Xingombela
Xipefu
Xitende
Xitique
Zotho
T. sem. = Transferência semântica; Trun. = Truncação; F. Sin. = Formação sintagmática; Sig. = siglação; Acr. = acronímia.
NB:
1. As palavras sinalizadas por um asterisco (*) apenas gozam de estatuto de neologismos semânticos, não sendo resultado
de derivação.
2. Apesar de algumas formas já estarem dicionarizadas serão apresentadas em anexo 6 informação mais detalhada relativa
aos neologismos do PM (cf. Anexo 6).
93
3.4.1.1.2.1. Algumas particularidades flexionais dos substantivos
Antes de tudo, importa deixar claro que a escolha do substantivo para demonstrar a
abrangência que deve caracterizar o ensino do vocabulário tem que ver com o facto de o
substantivo ser uma das classes com maior número de unidades lexicais, apresentar muitos
aspetos salientes na sua flexão e por ser uma classe da qual dependem muitas outras, tais como
adjetivos, artigos, pronomes, numerais, e até certo ponto, verbos. Falando concretamente do
substantivo, é preciso que se esclareça que para a sua derivação, existem alguns morfemas
(sufixos), que são especializados, para a partir de certas unidade, dar-lhes origem, ou seja, não é
qualquer sufixo que se junta a qualquer elemento e resultar num nome aceitável.
Os substantivos, na sua variação em grau, podem formar o aumentativo a partir de
morfemas tais como -ão que dependendo de cada palavra pode tomar as seguintes formas: -
arrão, -zarrão, -eirão, -gão, -arão, -aço, -az, etc. ((57)). O diminutivo, por sua vez, na LP, pode
ser expresso por sufixos como -inho/a, -zinho/a, -ito/a, -zito/a, -ote, -ola, -ucho, -eta114, etc.
((58)) (cf. Said Ali 1975: 32). Note-se que, apesar de serem estes os sufixos aumentativos e
diminutivos, não funcionam da mesma maneira em todas as palavras. Por exemplo, os sufixos -
inho/a e -ito/a não se ligam às bases, mas sim, aos radicais, enquanto, -zinho/a e –zito/a ligam-se
sempre à elas ((59)). Ou melhor, nos dizeres de Vilalava, a variação do substantivo em grau
realiza-se através de sufixos avaliativos e z-avaliativos, existindo, de uma forma geral, “sufixos
que se associam aos radicais, outros que se relacionam com as bases e outros que se associam a
palavras” (Vilalva 2000: 135).
114
Os sufixo -ote, -ola, -ucho; -eta não são aplicáveis a todos os substantivos.
94
importante que se capacite os alunos no sentido de descodificarem o valor de cada uso do
diminutivo no seu dia-a-dia, para distinguirem o seu valor ofensivo e afetivo ((60)-(61)):
Relativamente ao género, interessa que se trate dos casos pouco comuns de passagem do
masculino para o feminino. Para os substantivos terminados em ‘-o’, sabe-se que na sua maioria
passam para o feminino com a troca daquele morfema por ‘-a’115. Porém, existem casos
complexos como o de nomes que passam para o feminino através de sufixos como -ina; -inha; -
essa, etc. ((62)); daqueles cujo feminino é uma outra palavra (com o seu radical) ((63)); dos que
terminam em ‘-ão’ que passam para o feminino de 3 formas: (a) trocando -ão por -ã ((64)); (b)
substituindo -ão por -oa ((65)); e (c) substituindo a forma do masculino por -ona ((66)):
(62) [masc. Galo]- [fem. galinha]; [masc. conde]-[fem. condessa]; [masc. príncipe]-[fem. princesa];
(63) [masc. homem]- [fem. mulher]; [masc. boi]- [fem. vaca]; [masc. genro]- [fem. nora];
(64) [masc. cidadão ]- [fem. cidadã]; [masc. vilão]- [fem. vilã ]; [masc. escrivão]- [fem. escrivã];
(65) [masc. leão]- [fem. leoa]; [masc. patrão]- [fem. patroa]; [masc. leitão]- [fem. leitoa];
(66) [masc. comilão]- [fem. comilona]; [masc. brincalhão]- [fem. brincalhona]; [masc. esfregão]-
[fem. esfregona]
Para além destes casos existem palavras terminadas por ‘-or’ no masculino e que formam
o feminino através de: (a) acréscimo do morfema de feminino ‘-a’ ((67)); ou (b) substituição do
morfema do masculino -or pelo morfema -triz ((68)). Existem ainda (c) os substantivos que na
mesma forma servem para seres dos dois género ‒ substantivos epicenos ‒ ((69)); e (d) aqueles
que fazem a variação de género, pela anteposição do artigo ‒ substantivos comuns de dois (Said
Ali 1975: 33-42) ‒ ((70)). Embora estes substantivos, por si sós constituam meras
particularidades, não devem ser esquecidos/ignorados no ensino, pelo contrário devem merecer
uma atenção especial.
115
As palavras que passam para o feminino por meio deste processo não constituem grandes dificuldades para os
falantes de PM.
95
(67) [masc. Administrador] ‒ [fem. administradora]; [masc. escritor] ‒ [fem. escritora];
(68) [masc. embaixador] ‒ [fem. embaixatriz]; [masc. ator] ‒ [fem. atriz];
(69) [masc. fem. criança]; [masc. fem. pássaro]; [masc. fem. pessoa]; [masc. fem. bebé116];
(70) [masc. o jornalista] ‒ [fem. a jornalista]; [masc. o artista] ‒ [fem. a artista];
Ainda sobre o substantivo, há que tratar da sua flexão em número (plural e singular),
sendo que, na LP, o morfema -s é que é típico do plural, podendo-se apresentar em forma de -es,
dependendo da estrutura da palavra. Todavia, existem as que fazem o plural recorrendo a outros
mecanismos e afixos, como nos seguintes casos: (a) nomes terminados em -m que passam para o
plural substituindo-se o -m por -ns ((71)); (b) os que no singular terminam em -l, acrescentando-
se-lhes -es ((72)); (c) aqueles em que se omite -l final, substituindo-o por -is ((73)). Por sua vez,
os que terminam em -ão, dependendo da origem: (d) mudam para -ões ((74)); ou (e) para -ãos
((75)):
Outros casos, não menos importantes, são os dos nomes que alteram a tonalidade da
vogal tónica118 no plural ((76)); e de palavras compostas por dois substantivos ou por substantivo
e um modificador aglutinados, em que se coloca a desinência do plural, como se fosse uma
palavra simples ((77)); ou por verbo e um nome em que apenas o nome passa para o plural
((78)); etc. Estes e os anteriores são os aspetos que poderão constituir uma mais valia para os
aprendentes do vocabulário da LP como L2 em Moçambique. Assim, a partir de conhecimentos
referentes ao vocabulário, terão acesso a outros conhecimentos sobre a sua flexão gramatical e
sintática (cf. Elson e Picket 1978: 33- 38).
116
Na norma do PE.
117
Exemplos tirados de Said Ali.
118
De vogais fechadas ou médias, passam para vogais abertas.
96
(76) [Sing. poço] ‒ [Plur. poços]; [Sing. ovo] ‒ [Plur. ovos]; [Sing. povo] ‒ [Plur. povos]
(77) [Sing. vinagre] ‒ [Plur. vinagres]; [Sing. moçambola119] ‒ [Plur. moçambolas]
(78)[Sing. guarda-chuva]‒ [Plur. guarda-chuvas]; [Sing. quebra-cabeça] ‒ [Plur. quebra-cabeças]
119
Neologismo moçambicano que designa a maior competição futebolística do país.
97
regras sintáticas de colocação, ordenação e relacionamento das palavras que se veiculam ideias
coerentes e saturadas de significação”120 (Liles 1975: 42- 43).
A aprendizagem da estrutura sintática cujos elementos são as palavras da LP no país, a
nível metalinguístico, encontra-se distribuída entre a dificuldade e a facilidade. Há uma ligeira
facilidade nos aspetos em que há uma coincidência entre a estrutura das LB e do PE, como é o
caso da estrutura sintática básica SVO ((79)). Mas não há coincidência em tudo ((80)) e então, o
processo torna-se mais difícil. Long e Richards (200: 24) afirmam que “word in the first
language with roughly the same meaning, fit into roughly simillary grammatical patterns as in
the first language and has a similary collocation and constraints, then the learning burden will be
very light and the word will not be difficult to learn”:
(79) PE: [Suj. A Claidy] [Verb. estuda] [Obj. Cicopi]; LB: [Suj. Claidy [Verb. agondha] [Obj.
Cicopi].
(80) PE: Claidy nasceu em Chidenguele. LB: *Claidy avelekile Cidengele.
Em termos da estrutura e da sequência das palavras as duas frases em cada exemplo são
equivalentes. Todavia, o enunciado da LB (Cicopi) é agramatical em (80). A sua
agramaticalidade deve-se ao facto de as propriedades sintáticas do verbo kuveleka (nascer) na
LB não coincidirem com as do verbo equivalente em Português. Devido à discrepância entre as
propriedades sintáticas, semânticas e pragmáticas entre os dois equivalentes nas duas línguas, os
alunos são vulneráveis ao erro. Portanto, é preciso que, na aprendizagem do vocabulário, eles
não só saibam a que classe pertence uma determinada palavra, como também é necessário e
fundamental que saibam como é que se comporta num dado contexto sintático.
Todos os seres falantes são dotados de uma certa capacidade geralmente adquirida no
processo natural de aquisição da linguagem e que se desenvolve paralelamente com o
crescimento linguístico do indivíduo. Tal capacidade é constituída por conhecimentos lexicais
latentes e ativos que ambos se ativam com um input para a aprendizagem de novas palavras.
Trata-se de léxico mental; entretanto, “each word in [our] mental lexicon includes other
information as well, such as whether it is a noun, a pronoun, a verb, an adjective, an adverb, a
120
Tradução nossa.
98
preposition, or a conjunction. That is, the mental lexicon also specifies the grammatical
category or syntactic class of the word” (Fromkin, Rodman e Hyams 2011: 77).
É claro que as palavras conhecidas afetam aquelas que se aprendem. Ou seja, factores
interlexicais, tais como a distância entre a L1 e a L2, intralexicais tais como a dimensão e o
grau de organização do léxico da L2 e a frequência com que a palavra ocorre no input,
determinam certamente a aprendizagem de outras palavras121 (…): a forma falada e escrita
da palavra, a extensão, a estrutura morfológica, a classe gramatical, e as propriedades
semântico-sintáticas (Leiria 2001: 131).
Esta é a razão por que para a maior parte dos falantes do PM, é normal emitir um enunciado
como *A Claidy foi nascida em Chidenguele, equivalente a Claidy a velekilwe Cidengele da LB.
É conhecida a dificuldade milenar de definir cabalmente a palavra, bem como a
diversidades dos critérios que têm sido ponderados por diversos autores para tal efeito. Esta
dificuldade que se arrasta desde a antiguidade até a contemporaneidade, tem-se refletido na
distribuição das palavras em classe. Só para exemplificar, Dionísio (a.C.) estabeleceu oito
categorias de palavras; Varrão, posteriormente, considerou duas, três ou quatro, e já na época
moderna e na contemporaneidade, oscila-se entre nove e dez classes de palavras (cf. Marçalo
2009: 59-60). Neste contexto, sendo inoportuno desencadear uma discussão sobre o assunto, para
os propósitos deste trabalhos, limitar-se-á a considerar as dez que atualmente e para o público
geral são reconhecidas, pelo que o aluno deve, de acordo com Vilela (1995b), saber que:
121
Para a aprendizagem da sintaxe e da estrutura interna das palavras, é importante que saibam que existem palavras
variáveis e invariáveis e classes abertas e fechadas.
99
Sob ponto de vista da gramática de valência122, o verbo constitui o elemento central de
todo o ato de construção e emissão de enunciados. Isto é, em função do verbo, são definidos
outros elementos necessários para completar a sua significação. Sendo “o verbo a categoria
sintáctica mais indicada para desempenhar a função predicativa na frase, (…) [assumindo] uma
função central (…) e [determinando] a estrutura frásica de base, quer sob o ponto de vista
sintáctico, quer semântico” (Busse e Vilela 1986: 17), uma aprendizagem do vocabulário que se
oriente por estes princípios, pode ser útil e vantajosa na medida em que a palavra é tratada em
função do seu comportamento na frase, mediante as outras com que se deve relacionar.
O significado de alguns verbos não é saturado. Ficam, portanto, lugares vazios para os
chamados actantes, que podem ser nominais que completam o seu sentido e que têm a sua função
semântica, assim como certos traços semânticos determinados pelo mesmo verbo (Gärtner 1996:
27). Nesta área, é importante que se esteja consciente de que no PM, há “tendências de
estabelecer um par transitivo para verbos que, em PE, são intransitivos (…) e os complementos
de verbos agentivos tendem a ser substituídos por SN” (Gonçalves 2010: 47). Assim, no ensino
do vocabulário, particularmente dos verbos, deverão ser criteriosamente destacadas as suas
propriedades, de modo a evitar os aspetos acabados de enumerar.
Em (81) os núcleos dos SN são um verbo, um adjetivo e uma preposição, mas devido à
força do artigo que se lhes antepõe, tomam estatuto de um nome e encabeçam o respetivo SN. Já
em (82) está-se perante um SN e uma oração, ambos com um elemento fonética e graficamente
semelhante, o o. Todavia, o primeiro é um artigo e o segundo, pronome átono. Quanto ao uso,
sobretudo quando os artigos são correferentes, o definido usa-se depois do indefinido, por
questões de coesão ((83)). Usa-se o indefinido para um referente não especificado, enquanto o
definido, não. Na pragmática, a colocação do artigo definido em nomes próprios de altas
individualidades tem conotação algo pejorativa ((84)):
(83) ?[Texto O João comprou o carro. Um carro que ele comprou é branco]
vs [Texto O João comprou um carro. O carro que ele comprou é branco].
(84) ?O Obama; ?
O Mandela ?
O Cavaco Silva; ?O Armando Guebuza
Segundo Silva, o advérbio é uma das classes mais complexas no que tange à sua
estrutura, à sua função e às unidades com que se relaciona. Geralmente, indica
circunstâncias e, por isso, ocorre na periferia, podendo, sem comprometer a
gramaticalidade dos enunciados, ser movimentado de uma posição para a outra, ou
mesmo ser suprimido. Embora a supressão possa reduzir a informação, não põe em
102
causa o valor comunicativo do enunciado. Esta classe depende dos verbos,
substantivos, adjetivos, sendo a eles que determina. Quanto à sua formação, pode ser
uma palavra simples ou derivada com -mente. (op. cit.: 252, 255 e 300).
i) Um numeral indica a ordem numérica das coisas ou da sua sucessão. Pode ser
cardinal, quando pode funcionar como determinante ((90)); ordinal, que funciona
como adjetivo que indica uma determinada ordem ((91)); fracionário, expressando
parte de um todo (um quarto, dois terços…); multiplicativo, quando indica o número
de vezes que uma unidade é repetida (duplo, triplo, quádruplo, quíntuplo, sêxtuplo;
séptuplo…); e numeral coletivo para indicar um conjunto (dezena, centena,
125
Aliás, um dos problemas dos alunos do ensino secundário moçambicano, no que tange ao uso dos verbos, tem
que ver com a regência dos verbos com preposições.
103
milhar…). É uma classe cuja variação em género e número apresenta muitas
restrições.126
(90) [Numer. Det. Masc. Um] livro; [Numer. Det. Masc. dois] livros; [Numer. Det. Fem. uma] cadeira
(91) [Espec. quarto] elemento; a [Espec. quinta] pessoa…
j) Uma interjeição127 é uma palavra que serve para indicar sentimentos, vontades ou
intenções espontâneas e emocionais. No entanto, a mesma interjeição pode ter valores
diferentes, dependendo de circunstâncias e da entoação. Assim, é o contexto e a
entoação que facilitam a descodificação do seu sentido. Embora não desempenhe
nenhuma função sintática na frase, ela tem um valor semântico, isto é, tem um
significado, como por exemplo, o de alegria, o de aplauso, o de dor, o de
chamamento, o de desejo, etc. (cf. Vilela: 1995b: 210- 211). Esta classe é uma das que
não apresentam o seu radical (pronomes, artigos e preposições…).
Cada palavra tem, como ficou claro, as suas particularidades como unidade e tem aquelas
que a permitem ligar-se às outras para edificar enunciados comunicativos, e satisfazer a
necessidade humana e social de comunicar com recurso a um “sistema complexo de signos que
permita descrever de maneira interindividual objectos, qualidades e processos”(Metzeltin e
Candeias 1982: 25-26). Tais signos que são associados para comunicar são as palavras. Portanto,
para além da própria divisão das palavras, são todos os aspetos inerentes a elas que interessa
aprender. Assim, desenvolver-se-ão conhecimentos sobre a sintaxe e o comportamento das
palavras, no que tange à sua estrutura actancial, às suas propriedades de c-seleção, etc..
Tréville e Duquette defendem que o ensino-aprendizagem do vocabulário pode ter
sucesso se se apostar na estrutura actancial das palavras. Esta perspetiva, que se enquadra na
gramática de valência, pode de facto frutificar. Porém, devem os profissionais de ensino fazer
uma abordagem minuciosa e prudente para não claudicarem e transformar a aula de vocabulário,
numa de linguística ou de gramática. Na verdade, tendo em conta esta estrutura, considerar-se-á
como núcleo da ação comunicativa, uma palavra ‒ o verbo, por exemplo ‒ e a partir dela, tratar-
126
Existem alguns numerais que podem variar em número e género: uma, duas, vigésimo, quinquagésima, quartos,
quintos, primeiros, segundas…
127
Olá, psiu, ah, oh, viva, bis, eh, ei, bolas, hem, mau, ui, ai, oxalá, etc.
104
se-á das outras que constituem os seus argumentos (cf. Tréville e Duquette 1996: 15- 17). Mas é
preciso que não se parta sempre e somente do verbo para aprender o vocabulário128.
(92) [SN O João]; [SN o novo livro do João]; [SV comeu bananas]
(93) [[Det. o] João] vs *[João [?o]]
(94) [[Det. o] livro [Mod. novo] [Esp. do João]] vs *[[?do João] livro [?novo] [?o]]
132
Com este conhecimento, pode-se antecipar ao nível do discurso as possíveis palavras seguintes e os seus
significados.
107
secundário (8ª a 12ª), sejam abordados suficientemente todos aqueles aspectos (pelo menos até
ao final de cada ciclo), de modo que, ao terminar o nível, os alunos tenham competência
vocabular desejada133.
133
Isto deverá ser conseguido com uma planificação eficaz e eficiente de todo o sistema.
108
significado e sentido pode ocorrer numa variedade de situações, tais como durante o ensino
formal, com a ajuda do professor, dos colegas e, sobretudo, de um dicionário134; através do
contexto135 em que a palavra se encontra inserida, da leitura, etc. (cf. Long e Richards 200: 81).
As palavras, que funcionam inter-relacionadas entre elas no discurso, estabelecem sempre
determinadas relações semânticas entre si e pragmáticas com o mundo real. Isoladamente têm
significados, mas quando relacionadas, num dado contexto comunicativo, têm também um
sentido que é o cerne da comunicação. É visto que esta relação entre as palavras e os seus
significados, entre os seus sentidos e o mundo são úteis na construção do discurso (cf. Sivers
1976: 281). Outrossim, os lexemas, para poderem comunicar, devem estar coesas e, esta coesão,
que se realiza basicamente através das palavras, é a condição fundamental para a construção de
um texto/discurso136. Com isto se justifica a associação da semântica e da pragmática na
aprendizagem do vocabulário.
O mesmo fenómeno, que condiciona a textualidade de um conjunto de palavras, consiste
essencialmente na (inter)dependência semântica, e falando da semântica entre as palavras, na
construção do discurso, subentende-se, direta ou indiretamente, a pragmática textual, através das
palavras (cf. Fonseca, J. 1992: 11- 12). Desta feita, impõe-se a necessidade de se ensinar e
aprender os significados, as relações semânticas, os sentidos e as relações entre as palavras e o
mundo real. É que hoje em dia e, em particular, em contextos multilingues, é urgente que se aja a
favor, não só de conhecimentos sobre a forma, mas também e, sobretudo, da exploração e
domínio do uso das palavras de L2 em situações de comunicação (cf. Fonseca e Fonseca 1990:
32).
A este propósito, vale recordar que na LP, certas palavras137 e expressões veiculam um
determinado sentido em função da situação comunicativa e das relações entre os interlocutores.
Tais palavras podem até veicular sentidos opostos, dependendo do uso que delas for feito num
determinado contexto. Com efeito, para a compreensão do sentido destas unidades, é
indispensável o contributo do contexto, ou seja, é preciso atender sobretudo a aspetos extra
134
O uso de dicionário, no contexto moçambicano, é inviabilizado por falta de material, mas é preciso esforços para
que os alunos tenham acesso ao dicionário, sobretudo para a aprendizagem do vocabulário.
135
Uma palavra, mesmo tendo autonomia semântica e podendo ser aprendida isoladamente, funciona dentro de um
contexto. A semântica (significado e sentido) da palavra é condicionada, não raras vezes, pelo contexto (cf. Treville
e Duquette 1996: 34).
136
Saliente-se que o texto/discurso é uma unidade dependente de aspetos semânticos e pragmáticos.
137
Ex.: este, aquilo, onde, agora, ontem, etc.
109
linguísticos que marcam os usos das palavras, conhecimento que ultrapassa a simples
competência linguística; associa-se, antes, ao domínio das relações socioculturais que envolvem
aspetos pragmáticos e de deixis (cf. Fromkin, Rodman e Hyams 2011: 210).
Sem se conhecer o significado, sem se ter acesso ao sentido das unidades lexicais e sem
se estar consciente das relações das palavras entre si e entre elas e o mundo, jamais se
conseguiria a competência vocabular, linguística e comunicativa, porque dificilmente se
produziria enunciados coesos, ou seja, jamais se conseguiria dar vulto a um texto, na perspetiva
da linguística discursiva. Entretanto, a coesão “(…) occur where the ‘interpretation’ of some
elements in the discurs is dependent on that of another (Halliday e Hasan 1976: 4). Isto é, as
palavras estão sempre em relacionamento dentro do discurso, podendo ser de semelhança, de
oposição, de hierarquia, de generalização, etc. (cf. Tréville e Duquette 1996: 27).
Existem várias relações semânticas entre palavras dentre as quais se destacam:
a) Sinonímia (relação de equivalência): quando duas ou mais palavras são
semanticamente equivalentes (casa, habitação, residência, moradia, lar; matar,
assassinar)138;
b) Antonímia (relação de oposição): quando duas ou mais palavras têm significados
opostos (frio, quente, morno; nascer, viver, morrer; fazer, desfazer; jovem; velho;)139;
c) Hiperonímia/hiponímia (relação de hierarquia): quando uma palavra representa o
sentido geral ‒ hiperónimo ‒ e a(s) outra(s), o significado mais restrito ‒ hipónimo ‒
(animal, mamífero, pessoa, mulher, Joana;);
d) Polissemia140 e a ambiguidade das palavras: quando uma mesma unidade lexical
tem mais de um significado, permitindo mais de uma interpretação ‒ a ambiguidade é
causada pela polissemia da palavra ‒ (banco; ordem; campo; peça;); Para mais
esclarecimentos sobre os conceitos indicados, recomenda-se a consulta do Dicionário
Terminológico de Isabel Casanova (2009), no qual aqueles conceitos são apresentados
de forma muito concisa.
138
É importante que se deixe claro que o facto de serem sinónimos não significa que se podem substituir em todos
os casos, como acontece com os sinónimos matar e assassinar.
139
É necessário que se sublinhe em aulas de vocabulário que os antónimos podem ser graduáveis e não graduáveis e
que não só são palavras com sentidos/significados diferentes, mas também e, sobretudo, com sentido oposto.
140
A polissemia poucas vezes constitui um obstáculo. As palavras ficam monossémicas quando integradas num
contexto (enunciado ou num sintagma).
110
e) Ainda que não façam parte das relações semânticas entre as palavras, enquadrando-se
mais nas relações de pragmática, é necessário que se aposte também no ensino dos
fenómenos de conotação e de denotação. Trata-se do sentido subjetivo, forjado em
função do contexto ‒ figurado ‒ e do sentido literal ‒ verdadeiro sentido ‒das palavras.
Aliás, o conhecimento destes aspetos constitui a condição básica para se chegar às
relações entre as palavras, das quais se debruçou, brevemente nos pontos anteriores.
Maior número de palavras em maior parte dos casos é usado no seu valor conotativo.
Assim, a incapacidade de as descodificar pode revelar insuficiências vocabulares.
111
Capítulo IV
4. Propostas de didatização
A partir das palavras pode-se ensinar tudo sobre a
língua (gramática, morfologia, semântica, etc.).
O ensino de idiomas de outros povos conheceu, durante a sua história, várias teorias,
metodologias e/ou abordagens. No entanto, dentre as metodologias conhecidas ‒ desde a
Metodologia tradicional até à metodologia/abordagem que se recomenda atualmente ‒, nenhuma
focaliza, explicitamente, o ensino do vocabulário para o desenvolvimento das competências
vocabular e comunicativa em L2. Esta situação deveu-se ao facto de a linguística e os linguistas
terem deificado conhecimentos gramaticais em detrimento de outros aspetos linguísticos para a
aprendizagem da L2, esquecendo-se ou ignorando, por exemplo, o facto de que os aprendentes
precisam primeiro de palavras para aprenderem tal gramática.
Assim, o autor mostra-se a favor de uma atividade sincronizada com a realidade do aluno, seja
em termos de metodologias a usar, seja em termos do estatuto da língua em aprendizagem. Uma
aula de L2, não é necessariamente igual à de LM.
Parafraseando Ribeiro, sendo o vocabulário um domínio básico na aprendizagem de L2,
então, no ensino secundário, deve-se fazer corresponder este valor à atenção e à frequência ou
intensidade do ensino do vocabulário. Há necessidade de os alunos compreenderem primeiro
uma determinada palavra, para a partir dela, aprenderem, compreenderem e apreenderem o resto
sobre o seu funcionamento. Na perspetiva cognitivista, valoriza-se o ensino do léxico, tendo em
conta que os aprendentes conseguem comunicar-se quando conhecem as palavras básicas e, só
141
Destaque-se que este autor também defende a primazia do vocabulário e do seu ensino explícito, tal como o
fazem Azenha, Treville e Duquette e outros autores.
112
posteriormente adquirem as estruturas morfossintáticas. Aliás, “no se enseña la lengua
analizando su estrutura, sino através de su vocabulário” (Martín Vegas 2009: 144).
De acordo com Gaspar (1991: 45) uma estratégia consiste em ações pedagógicas
concretas, tendo em conta a realidade sociolinguística dos alunos, com vista a viabilizar o ensino
e a aprendizagem. Cada estratégia deverá ser coerente com os objetivos, com o currículo e com a
sociedade, por isso, deverá ser fundamentada pela realidade local. Por sua vez, o método consiste
na forma de atuação e comportamento do docente. Tem a ver com a sua função e contributo
perante os alunos e as matérias de aprendizagem que tenciona promover. No entanto, o mesmo
método pode ser usado para várias matérias por indivíduos diferentes (é universal), mas as
estratégias são particulares, sendo concretizadas com recurso aos métodos de ensino.
A compreensão e aprendizagem são dois fenómenos cognitivos distintos mas
interdependentes, correspondentes a dois níveis de conhecimentos, em que o primeiro é
consequência do segundo, sobretudo quando se trata de uma L2 (cf. Tréville e Duquette 1996:
54). A primeira é importante para o desenvolvimento do vocabulário dos alunos. Tal capacidade
e a competência vocabular estão diretamente relacionadas com o pensamento que, para Piaget, é
a base em que se assenta a aprendizagem, embora não se deva subestimar, para o contexto
moçambicano, o contributo do behaviorismo de Skiner que olha para o comportamento e a
aprendizagem como fruto de estímulos ambientais (cf. Bordenave e Pereira 1989: 28- 31).
Está comprovado que quanto maior forem as semelhanças entre o vocabulário da L2 e o
da LM, maior será a facilidade na aprendizagem. Há uma interação entre o aprendido e o acervo
lexical armazenado na memória. Isto remete ao conceito de léxico mental e à sua importância.
142
A planificação nunca pode ser dispensada de qualquer instituição, ou sistema. É a atividade específica do ser
humano, consistindo em pensar antes de agir, organizar a ação e adequar os meios aos fins (Libâneo 1994).
114
situação [real da sociedade]” (Martinez e Lahore (1977) apud Padilha 2006: 31). Esta avaliação
deverá permitir que na planificação sejam selecionados e organizados o vocabulário e os aspetos
a serem explorados; apresentados os objetivos a atingir; sugeridos os métodos, as estratégias e as
atividades143 que permitam o desenvolvimento vocabular dos alunos (Ribeiro, 1999:123-130).
A planificação do ensino do vocabulário, ao nível da ação pedagógica do professor, deve
consistir na escolha das palavras, dos aspetos a abordar sobre as mesmas, dos métodos e
estratégias, do processo de revisão e avaliação. Isto tudo para permitir que os aprendentes do
vocabulário adquiram conhecimentos sobre a pronúncia, escrita, derivações, origem, significado
das palavras e analisá-las tendo em conta o contexto, usando o dicionário, etc. (cf. Long e
Richards 2001: 218). Deve ser nesta planificação que se deve identificar as palavras de alta
frequência nos usos gerais da LP e aquelas que as devem complementar, para tornar as
aprendizagens mais ricas e pertinentes (cf. Carvalho 1992: 53). Em suma, é preciso garantir que
sejam aprendidos conhecimentos declarativos que compreendem a capacidade de definir a
palavra, reconhecer as suas regras gramaticais e conhecimentos processuais que correspondem à
capacidade de uso.
No uso do dicionário para aprender o vocabulário, o professor é chamado a munir os seus
alunos de conhecimentos que lhes permitam manusear a obra corretamente, uma vez que o uso
inadequado da mesma pode desmotivar ou levar os alunos ao ócio, por um lado, por não
conseguirem encontrar a informação de que necessitam e, por outro, por acharem que tem tudo
no dicionário. O professor deve selecionar bons dicionários para a aprendizagem da L2 (não
havendo, para o caso de Moçambique, necessidade de ser um bilingue) e indicar os aspetos que
os alunos devem procurar na obra lexicográfica. Segundo Alvares Ezquerra, para a aprendizagem
da L2, o dicionário deve possuir informações tais como: a divisão silábica, a pronúncia, as
palavras usuais (na oralidade e na escrita), definições claras, exemplos elucidativos, os usos das
palavras, família de palavras, etc. (Alvares Ezquerra 2009: 104-105). Todavia, não são todos os
dicionários que têm toda esta informação, por isso, é essencial que o professor ajude a escolher
os dicionários a serem comprados, disponibilizados e usados para o ensino da LP.
143
Este processo de planificação não deve ser visto como sendo apenas do professor, mas sim, de todo o sistema,
cada entidade, ao seu nível de atividade.
115
Capitalizando a ideia de não se comunicar com palavras isoladas, o uso de um texto144
para aprender o vocabulário é deveras importante.
[O texto] enquanto produto, analisável em si, (…) permite entender as ocorrências tão
variadas como: a selecção do artigo nos processos de determinação; a construção de cadeias
anafóricas e mecanismos de co-referência; os fenómenos de pronominalização; a ordem dos
sintagmas nos enunciado e a marcação de tópico; (…) os critérios de selecção lexical
(propriedades referenciais dos nomes; e o uso de meta-operadores e de certos advérbios
transfrásicos.) (Amor 1991: 127).
O texto a ser explorado sob o ponto de vista de aprendizagem das palavras deve ser rico145 e
atrativo.
Fromkim, Rodman e Hyams (2011: 78-79) referem que entre as unidades lexicais que são
usadas na comunicação, e na aprendizagem do vocabulário da L2, é deveras importante
distinguir dois tipos de palavras
(…) content words and function words. Nouns, verbs, adjectives, and adverbs (…) denote
concepts such as objects, actions, attributes, and ideas that we can think about like children,
anarchism, soar, and purple. (…) other classes of words do not have clear lexical meanings
or obvious concepts associated with them, including conjunctions such as and, or, and but;
prepositions such as in and of; the articles the and a/an, and pronouns such as it [ ‒ ] (…)
function words because they specify grammatical relations (…).
144
Texto, latu sensus, é toda a unidade linguística e socialmente comunicativa.
145
A riqueza do texto oral ou escrito, neste contexto, traduz-se na abundância e diversidade de aspetos a tratar sobre
o vocabulário.
116
grandes dificuldade aos alunos, exceto casos isolados de alguns numerais e conjunções devem
ser sobretudo de índole semântico, sintático e funcional. Ou seja, devem-se cingir muito mais
sobre a sua vertente prática147, diferentemente das classes abertas em que há mais aspetos
linguísticos que devem ser tratados, tal como se tem vindo a tentar demonstrar. Em todo caso, é
preciso planificar cada aula, cada atividade para ensinar o vocabulário, norteado pelos objetivos
do aluno, do sistema, da escola, e do professor (Long e Richards 2001: 60).
No que tange às estratégias de ensino-aprendizagem do vocabulário, é preciso que o
professor e o aluno se conheçam mutuamente em termos profissionais, para que se possam
decidir sobre as estratégias a tomar para atingir os seus objetivos. Para Tréville e Duquette
(1996: 92-93) as estratégias de ensino do vocabulário podem ser (a) diretas quando dizem
respeito a estratégias mnemónicas (interiorização), cognitivas (manipulação e transformação da
informação) e compensatória (armazenamento e recuperação na comunicação); e (b) indiretas
que envolvem as estratégias metacognitivas (coordenar processos de aprendizagem em função do
que se sabe), afetivas (emoção e motivação), e sociais (usar aspetos sociais para saber).
No entanto, para o contexto moçambicano, em que o Português é L2, não de preferência
na comunicação sociofamiliar e, devendo ensinar uma palavra significar conhecer a sua forma,
significado e uso (cf. Hisguerra Garcia 2008), a diferenciação de estratégias não deve constituir
separação e possibilidade de preferência para o ensino do vocabulário. Deve sim, constituir
oportunidade para a diversificação do processo de aprendizagem, em que uma complemente a
outra. A mesma relação deve ser extensiva até para o caráter intencional ou espontâneo 148 do
ensino do vocabulário. Apesar de se reconhecer que, em Moçambique, é e/ou deve ser
intencional, não se pode ignorar a aprendizagem espontânea num meio de comunicação real.
Se no ensino intencional (explicito), há um trabalho deliberadamente virado à aquisição
do vocabulário, com estratégias próprias que permitam e facilitem o aluno a interiorizar a
palavra, apreendendo-lhe a forma, o significado e as propriedades de uso, com apoio de manuais,
dicionários, professores, etc. e, na hipótese implícita, o processo é quase inconsciente, resultante
146
As interjeições são uma classe não de fácil decisão sobre a sua pertença ou não às classes fechadas, uma vez que
dado ao seu caráter (de representar emoções ou sentimento), novas palavras, mesmo não sendo de Português,
intrometem-se.
147
Com esta perspetiva não se pretende subvalorizar outros aspetos que caracterizam estas palavras, tais como,
pronúncia e escrita, mas sim pretende-se focalizar o que na verdade constitui dificuldade para os aprendentes de
Português em Moçambique.
148
Uma aprendizagem espontânea do vocabulário, sobretudo em contextos sócio familiares tem apenas a
desvantagem de ser lenta e não permitir uma aprendizagem imediata dos aspetos morfossintáticos, semânticos, etc.
117
da exposição à língua, sem ter como foco o vocabulário (podendo ser a compreensão de um
texto, ou outra situação), ambas são importantes e complementam-se; vale a pena tirar proveito
dos dois149, uma vez que, o primeiro (explícito) pode se viabilizar melhor na sala de aula e o
segundo (implícito) fora dela150 (Nhampule e Moreno 2004: 73- 76).
Como se tem vindo a defender, no processo de ensino-aprendizagem do vocabulário
deve-se facultar aos aprendentes o conhecimento ativo sobre a língua. Meara (1990) apud Long e
Richards (2001: 25) defende que “active vocabulary can be activeted by ather words because it
has many incoming and autgoing links with other words”. Esta perspetiva valoriza o
conhecimento que os alunos têm sobre o Português e outras línguas, para o desenvolvimento da
sua competência vocabular. Sendo assim, é preciso que seja ativado o chamado conhecimento
prévio e/ou potencial, para que se possa proceder a aprendizagem de novas unidades, pois as
palavras se armazenam na mente conectadas umas com as outras (cf. Martín Vegas 2009: 143).
Para um conhecimento ativo ideal, é também necessário que o processo não seja
concebido como simples tratamento de palavra. Há que considerar que as palavras, a nível
sociocultural, estão impregnadas de uma cultura de um povo. Sendo assim, como diz Romero
Gualda (1996: 392) “la enseñanza del léxico permite al estudiante extranjero conocer mejor la
cultura y la vida de un pueblo; que ese conocimiento llegue a través del discurso del profesor o
de otra fórmula didáctica habrá que decidirlo de acuerdo a los fines del curso, al tipo de alumno
o incluso a la duración del periodo lectivo”. Porém, os termos poderão não representar a tal
cultura já que são palavras novas criadas para satisfazer necessidades duma área específica.
À luz da ideia de Romero, é preciso que se associe ao ensino do vocabulário a
componente cultural. No entanto, como se sabe, o Português em Moçambique é uma L2, e assim,
não se pode ignorar nem a cultura de origem da LP, nem a de origem dos aprendentes. Aliás, a
LP, com a aprendizagem, passa a ser parte da cultura dos aprendentes, ou seja, passa a veicular
também esta cultura. Portanto, para efeitos de desenvolvimento do vocabulário, mostra-se
vantajoso optar pela fusão dos aspetos culturais dos dois contextos. Isto permitirá, por exemplo,
que o aluno saiba que na cultura portuguesa, as pessoas nascem enquanto na moçambicana, são
nascidas e, daí conseguir compreender o funcionamento do vocábulo nascer em Português.
149
Como estratégias de aprendizagem implícita pode-se orientar o uso de estratégias individuais para descobrir a
palavra e o seu significado através do contexto e de associação de palavras e ideias, numa situação de exposição ou
de leitura de textos. Para a aprendizagem explícita, as atividades podem consistir em associações de palavras,
famílias de palavras, jogos de vocabulário, campos lexicais, relações semânticas, etc.
150
Isto não significa que um e outro não possam funcionar num e noutro contexto.
118
Já no que diz respeito às línguas diferentes151 de Português, na desnecessidade e
impossibilidade de excluí-las completamente do contexto de aprendizagem do vocabulário, é
preciso que haja rigor para evitar a sua influência negativa sobre a LP, proporcionada pelo seu
encontro. Deve-se trabalhar no sentido de tirar o benefício que a LM pode dar para a
aprendizagem do vocabulário da L2. Recorde-se que, por um lado, é em função da LM que se
formata todo o outro conhecimento posterior à sua aquisição e, por outro, a aquisição do
vocabulário torna-se mais difícil quando a LE/L2 em aprendizagem for estruturalmente diferente
da LM do aprendente (Meara apud Anderman e Rogers 1996: 33).
Para o contexto moçambicano em que o uso do Português se defronta com as preferências
das comunidades linguísticas em termos de línguas de comunicação corrente, dificultando-se
dessa maneira, o desenvolvimento da LP até a um nível satisfatório dos falantes, quer em termos
de domínio das estruturas comunicativas, quer em termos de capacidade de ativar o
conhecimento linguístico para servir a comunicação, justifica-se um ensino-aprendizagem do
vocabulário numa perspetiva de uma espiral crescente em que se comece sempre do vocabulário
básico e, paulatinamente, se desenvolva e enriqueça por novas palavras do léxico da língua. Ou
seja, cada conhecimento novo deve-se assentar sobre o básico já cristalizado no seio dos alunos;
a estratégia deve consistir em começar do básico, do concreto e do mais funcional para o
específico, o abstrato e o menos funcional (button-up) (Neves 1997: 79-80).
Assim, o estudo do vocabulário não deve nem pode ser radicalmente separado do estudo
do léxico, pois ambos se conjugam para o desenvolvimento da competência lexical e, cada
unidade que constitua o vocabulário de cada indivíduo faz parte de um grande conjunto que se
chama léxico. Desta feita, o estudo do vocabulário não se deve limitar às palavras, enquanto
unidades discretas, nem mesmo levar a um contínuo acúmulo delas ou simplesmente descobrir-
lhes novas combinações sintagmáticas, quando já conhecidas (Martín Vegas 2009: 145), pois a
competência vocabular consiste no domínio das palavras de uso, mas também no conhecimento
diversificado das palavras da língua.
Brown e Palincsar (apud Vivanco 2001: 178- 179) apresentam as seguintes estratégias152:
151
Línguas bantu, línguas maternas dos alunos moçambicanos, na sua maioria.
152
Estas estratégias enquadram-se numa perspetiva cognitiva de aprendizagem do vocabulário de uma L2
119
información recibida, con una autoavaluación posterior; estrategias cognitivas, que se
hallan directamente relacionadas con la capacidad mental individual; manipulan la
información organizándola y procesándola en la memória a corto y largo plazo; [e]
estrategias socioafectivas, que reflejan el grado de aprecio del estudiante por el objeto de
estudio; éstas se muestran claramente en la comprensión lectora o en las prácticas orales
basadas en un tema de interés para los alumnus.
A atual didática, a dinâmica social, os intercâmbios entre os povos e a cada vez mais
sublinhada função comunicativa das palavras e das línguas impõem processos educativos que
capacitem os alunos para usarem a língua e enquadrarem-se numa sociedade, satisfazendo com
ela as necessidades sociais. A recém-desenvolvida MC mostra-se ideal e, para o ensino do
vocabulário, um trabalho baseado nesta abordagem justifica-se porque difunde conhecimentos
que o aprendente sozinho não chegaria a descobrir, e porque o vocabulário é uma porta aberta
para a descoberta da gramática, ao nível da frase e ao nível do discurso, o que não se pode
conseguir sem tratar da língua num ambiente comunicativo (Tréville e Duquette 1996: 97).
Numa abordagem comunicativa, como se deve saber, e num ensino sistemático do
vocabulário é imprescindível uma preparação e criação de atividades pertinentes de comunicação
a serem propostas em sala de aula. Os conhecimentos formal, funcional e pragmático da palavra
devem ser desenvolvidos juntos de maneira abrangente e eficaz. Sendo colocado o aluno numa
situação de comunicação real em que o conhecimento é negociável (para a compreensão do
vocabulário), é indispensável que ele tome uma atitude ativa, como elemento central de todo o
processo. Assim, ao professor cabe a responsabilidade de orientá-lo, ajudá-lo, disponibilizar-lhe
alguns materiais, de modo a alcançar a sua autonomia vocabular.
Recomenda-se, deste modo, o ensino do vocabulário partindo de um contexto153 real154,
aliás, “most vocabulary is learned from context” (Sternberg 1987 apud Ellis 1995: 3) e nunca de
forma isolada155. É partindo de um texto156 que se deve anunciar e propor as palavras para a
aprendizagem ponderando: as necessidades dos alunos, programas de ensino, características das
palavras, função sintática, etc. (Tréville e Duquette 1996: 100- 103). A didática atual tende a
prescindir de abordagens desligadas do discurso, pois é nele que se realizam todas as
153
Estudantes que procuram o sentido/significado da palavra pelo contexto e aqueles que leem um texto e em
seguida procuram o significado no dicionário, têm sucesso em relação àqueles que leem e recebem os sinónimos das
palavras (cf. Laufer e Hulstijn 2001: 11).
154
Texto, discurso, frases, etc.
155
Lista de palavras isoladas para serem tratadas.
156
O texto pode ser oral ou escrito e, se for de autoria do aluno, melhor ainda, desde que ofereça situações
importante para o desenvolvimento do vocabulário.
120
propriedades de todos os lexemas. Portanto, a partir do discurso, pode-se aprender melhor e tudo
sobre o vocabulário. Os sentidos, as propriedades e as combinatórias possíveis são detetáveis
num dado enunciado.
A preferência pela metodologia comunicativa não deve implicar a subvalorização dos
outros. Há sempre alguns aspetos que só podem ser conseguidos através de um conjunto de
métodos e estratégias, pois não existem métodos suficientes, por si só157. É vantajoso que se
recorra a cada aspeto dos diferentes métodos o qual se mostre ideal para efetivar os objetivos
traçados. No caso de Moçambique, pode-se recuperar da MT o uso do texto158, do dicionário e da
memorização, para auxiliar a aprendizagem das palavras; e, da MD, a exposição à língua alvo e a
preocupação em desenvolver as capacidades de ouvir, falar, ler, escrever e compreender, para
fortalecer a aprendizagem do seu vocabulário, só para dar exemplos (cf. Frias 1992: 16- 21).
Já dos MAV e MAO, tendo em conta a perspetiva de exposição dos falantes à L2, pode-
se recuperar o uso dos meios áudio orais e/ou audiovisuais159, para viabilizar o processo. A
correção fonética, os aspetos estruturais e pragmáticos, podem com certeza ajudar a desenvolver
competências relacionadas com a pronúncia das palavras, com a sua organização em estruturas
sintagmáticas e com o seu uso, respetivamente. Deste modo, fica claro que cada método tem algo
de positivo e que pode ser útil quando usado dentro de uma determinada perspetiva pedagógica.
O material para o ensino do vocabulário deve ser adequado e interessante, para que o aluno possa
ativar as suas estratégias de aprendizagem (cf. Tréville e Duquette 1996: 106).
Tratando-se de uma L2 muito diferente da LM, o estudo sistemático e contrastivo,
sempre que for necessário, pode ajudar a remediar os (de)efeitos da influência da última sobre a
primeira. Com vista a conferir competência vocabular desejada, com certa facilidade, quatro
procedimentos mostram-se viáveis para o contexto moçambicano. São procedimentos
cientificamente experimentados e aprovados, no âmbito do ensino de uma L2. Trata-se de um
ensino-aprendizagem do vocabulário a partir dos campos léxico-semânticos, de família de
palavras, da leitura e escrita e das relações entre palavras. Ora, partindo destes aspetos, deve-se
ensinar e aprender tudo o que for necessário, explorando todas as pistas de saber que aparecerem:
157
Por isso, é preciso fazer o uso eclético dos métodos.
158
Deve se entender por texto, uma unidade comunicativa (discurso), independentemente do seu tipo.
159
É preciso que as escolas secundárias sejam equipadas por materiais áudio-orais e audiovisuais para que esta
estratégia possa surtir efeitos.
121
a) O campo léxico-semântico160: pode ser definido como sendo o conjunto das
unidades lexicais que se relacionam entre si através do seu conteúdo semântico, ou
seja, partindo do significado de uma, prevê-se várias outras palavras ((95)). Para os
falantes nativos, a articulação dos itens lexicais em função dos seus campos
semânticos durante a comunicação é quase automática que não experimentam
nenhuma dificuldade. Todavia os aprendentes de LE/L2, devido às dificuldades
próprias do fenómeno de aprendizagem, não conseguem ter acesso automático àquela
relação, para fazer escolhas com facilidade.
Lewis (1993 apud Ferreira 2009: 41), postula que:
Como se deve saber, o sentido das palavras e/ou estruturas que as têm como
componentes é basicamente dependente da relação que cada elemento mantém com os
outros. Assim, um campo semântico que congregue exaustivamente as palavras que se
relacionem em termos de conteúdo, e tendo em conta o uso dessas unidades, pode
proporcionar um vasto leque de aspetos a aprender. Começando, por exemplo, por
orientar a elaboração de frases a partir de cada uma das palavras, pode-se tratar vários
aspetos linguísticos relacionados com elas. Esta situação pode justificar a
conveniência de se basear nos campos semânticos para aprendizagem do vocabulário.
160
Opta-se pelo nome ‘campo léxico-semântico, porque se considera o léxico a materialidade do domínio semântico
e, de fato, não é possível pensar e conceber um campo semântico sem o suporte do léxico’ (Ferreira 2009: 39).
122
b) A família de palavras: é entendida como sendo o conjunto das palavras que, regra
geral, têm o mesmo radical, ou seja, são ligadas pelo mesmo núcleo significativo
((96)). A partir deste núcleo ou palavra, recorrendo à sua análise dentro do contexto,
deve-se aprender o essencial sobre a unidade. Este critério de agrupamento, que reúne
apenas palavras que têm a mesma origem (verbos, substantivos, advérbios, adjetivos),
ajudará os alunos na coesão textual por meio da continuidade temática. Mas, do
agrupamento, ficam de fora outras classes, pelo que o professor deverá estar
consciente disso, para agir e compensar o défice.
estudioso
(96)
estudo estudar estudante
estudando
123
de histórias, identificação do assunto do texto, etc. com o intuito de desenvolver o
vocabulário, sendo que é imprescindível o envolvimento ativo do aluno.
Em conformidade com Sim-Sim (1998: 235), dominar a escrita da língua significa ser
capaz de ler e de escrever. Ler é o processo que permite extrair a informação de
material escrito (reconstruir o significado da mensagem que alguém codificou em
sinais gráficos) enquanto a escrita é a representação gráfica do oral, o que implica
que, para extrair e produzir a informação escrita, é necessário dominar a vertente oral.
Assim, quanto mais exercícios de escrita e leitura audível o aluno fizer, concentrando
as suas atenções para questões de aquisição das palavras, sob orientação cuidadosa do
docente, mais chances terá de aprender com facilidade.
As atividades em todo o processo devem ser feitas pelos alunos acompanhados pelo seu
professor. Moreno Ramos (2009: 164) e Perez Daza (2010: 3-7) propõem várias atividades sobre
o vocabulário na sala de aula, merecendo destaque, para o contexto de Moçambique, as que
apelidam de convencionais e lúdicas. As atividades convencionais segundo os autores podem
consistir em: (a) pronunciar as palavras em aprendizagem; (b) classificá-las segundo as
categorias de palavras ou partes da oração; (c) relacioná-las entre elas e entre o seu significado;
(d) estabelecer derivações; (e) indicar outros vocábulos equivalentes, opostos, inclusos e os
campos semânticos; (f) escrever frases usando as palavras; (g) explicar o seu sentido etc..
Por seu turno, as atividades lúdicas consistem em exercícios engraçados tais como: (h)
sopa de palavras num contexto de intercâmbio entre colegas; (i) palavras cruzadas; (j) recriar as
unidades ou formar outras com as letras duma; (k) procurar adivinhar as palavras ocultas, etc..
Estas atividades todas deverão ser feitas em simultâneo com o uso das unidades, ou seja, o
professor tem de proporcionar circunstâncias de os alunos falarem. Durante os exercícios, tem
que prestar atenção para que as brincadeiras entre alunos e palavras não extravasem do contexto
de aprendizagem. É preciso que os alunos brinquem com as palavras, reconstruam-nas,
aprendam-nas, usem-nas e tornem-se amigos delas (cf. Martins e Duarte 1993: 9).
Às vezes, torna-se difícil recordar-se das palavras mesmo que se as tenha armazenado na
sua memória. Perante esta dificuldade, como estratégia de recordação, ativação e uso do
vocabulário, aconselha-se: (a) a identificar o contexto em que se encontrava usada a palavra; (b)
procurar recordar-se das outras com que estava relacionada e identificar-lhes o sentido; (c)
124
recordar-se da primeira impressão que teve com a palavra, etc. (cf. Vivanco 2001: 180), pelo que
o professor deve proporcionar circunstâncias, durante a aula do vocabulário, que permitam ao
aluno usar estas estratégias, dando-lhe atividades de ativação do léxico recetivo e produtivo, de
consolidação, de revisão e de reciclagem do conhecimento (cf. Vidilela Andreu 2012: 32).
É certo que só com uma atividade de repetição/revisão da matéria sobre o vocabulário é
que se pode dominá-lo161. Na ótica de Long e Richards (2001: 75- 76) a repetição “(…) is
essential for vocabulary learning because there is so much to know about word that one meeting
with it is not suficient to gain this information”. Outrossim, a repetição a que se refere não é
momentânea ou numa mesma aula, mas sim uma repetição sistemática, programada para a
aprendizagem de todos os aspetos inerentes à palavra162. O uso do dicionário, durante a
aprendizagem e/ou revisão é fundamental, pois facilita a autocorreção, o acesso ao conhecimento
e fomenta o desenvolvimento da autonomia na aquisição do saber (cf. Martín Vegas 2009: 146).
Para terminar, importa referir, por um lado, que tratando-se de uma atividade planificada,
é importante que seja alvo de avaliação163 rigorosa e, esta avaliação sobre a competência
vocabular dos aprendentes de LP como L2 no ensino deve-se basear na competência
comunicativa dos alunos (Tréville e Duquette 1996: 132), uma vez que a meta a atingir é o uso
do Português pelos alunos, com autonomia. Por outro, frisar que “una palabra forma parte del
vocabulário de un hablante cuando cononce su significado, sus valores conotativos, sus
acepciones, los modismos y frases hechas em la que aparece, y cuando en qué contextos se
utiliza, en qué registo se usa y con qué palabras suele aparecer en la cadena sintáctica ” (Martín
Vegas 2009: 144).
161
Um só contacto com a palavra não é bastante para conhecê-la perfeitamente.
162
A repetição pode ser dentro de uma semana, um semestre, um ano, etc.
163
A função mais relevante da avaliação é de diagnosticar as dificuldades sentidas pelos alunos, diferentes nuns e
noutros casos, possibilitando a seleção e diversificação de estratégias adequadas à resolução dos problemas
identificados. (…) No ensino da língua, a avaliação deverá incidir sobre: a compreensão da linguagem oral; a
compreensão da linguagem escrita; a expressão oral; e a expressão escrita (Ribeiro 1991: 57- 58).
125
Sugestões
Numa realidade marcada pelo convívio da LP com várias LB que, como se sabe, têm
estruturas vocabulares diferentes, no que toca à morfologia, e pela tradicional supervalorização
de aspetos gramaticais no ensino da LP, havendo com certeza a necessidade de proporcionar uma
competência comunicativa aos níveis desejados, um trabalho renhido com enfoque ao
vocabulário mostra-se necessário. No entanto, apesar de se poder falar teoricamente de ensino
das palavras nas escolas moçambicana, o processo está muito aquém do verdadeiro trabalho
deliberado para desenvolver o vocabulário dos aprendentes de Português como L2. Neste
contexto, importa deixar as seguintes propostas de procedimentos, políticas e atividades:
a) Tendo em conta que se comunica com as palavras e, com a sua aprendizagem eficiente
se pode aprender tudo sobre a língua (gramática, sintaxe, etc.), propõe-se uma
mudança de abordagem a partir da primeira classe do ensino secundário (8ª). Tal
mudança deverá consistir na focalização do vocabulário ao invés da gramática. Isto é,
na sala de aula, o estudo de qualquer aspeto linguístico (leitura, gramática,
vocabulário, frase, escrita, etc.) deve partir de um determinado aspeto relacionado com
o vocabulário164, ou desaguar nele; Afinal, este elemento marca a sua presença em
todos os atos comunicativos verbais;
b) É urgente que se faça um estudo exaustivo que permita determinar: quantas e quais
são as palavras que, até ao fim do ensino secundário, devem os alunos saber e mostrar
competência comunicativa desejável; quais os aspetos linguísticos do vocabulário que
devem os alunos aprender em cada classe do nível, até à 12ª; quais as estratégias a que
pode recorrer quer o professor, quer o aprendente com vista a alcançar-se o sucesso
deste último;
c) Pode-se também optar por dividir o sistema em função das aprendizagens em que o
primeiro nível (Ensino primário) e o último (Ensino superior) focalizem quer a
gramática, quer o vocabulário, podendo-se variar as metodologias em função das
164
Esta perspetiva parte do princípio de que na escola primária, os alunos terão tido oportunidade de aprender de
uma forma indistinta o vocabulário e a gramática da língua que permitam articular razoavelmente os elementos
linguísticos.
126
características de cada nível, e reservar-se para o ensino secundário, o estudo da língua
partindo do vocabulário165;
d) Na disciplina de Português, em Moçambique, tem de se ensinar tudo sobre a língua,
tarefa não fácil para os professores e também para os alunos, os quais acabam não
sabendo em que é que devem concentrar as suas atenções, o que pode estar na origem
de se focalizar aspetos menos importantes em detrimentos dos que são
imprescindíveis. Portanto, a criação de uma disciplina que trate do vocabulário
(Vocabulário da Língua Portuguesa) neste nível e, pô-la a correr em paralelo com a de
Português que incida sobre aspetos gramaticais, tal como acontece atualmente, pode
ser uma preferência que frutifique;
e) Esta reforma deverá ser acompanhada pela formação e/ou capacitação de docentes de
modo a fazerem frente a esta missão não menos difícil nem complexa, mas possível;
f) Há urgência de se incentivar o uso do dicionário nas aulas de vocabulário (sobretudo)
e de todos os aspetos linguísticos. Para isto, é preciso que se garanta que os alunos das
escolas secundárias tenham acesso fácil aos dicionários, cabendo ao professor ensinar-
lhes a usá-los inteligentemente para desenvolverem o vocabulário e a língua;
g) É preciso que, ao nível sócio-educativo, sejam criadas as condições para os alunos
usarem a LP e, sentirem-se à vontade e com vontade de usá-la166;
165
Com esta ideia não se pretende dizer, de modo algum, que no ensino secundário só se deve tratar do vocabulário.
Pretende-se sim que se lhe incidam as atenções na aprendizagem da língua.
166
Isto poderá galvanizar o desenvolvimento linguístico, uma vez que o aluno, para além do tempo da aula, na
escola, terá mais tempo de contacto com a língua com os seus amigos e/ou familiar.
127
Conclusão
O estudo sobre o ensino do vocabulário no ensino secundário moçambicano, não só,
como também em diversos contextos em que a LP se mistura com várias outras línguas nas
sociedades, é de vital importância pois traz à superfície vária informação de índole sociocultural,
histórica, linguística e pedagógica que direta ou indiretamente condicionam a aprendizagem do
Português e do seu vocabulário. A informação que se pode desvendar com tal estudo é
fundamental para nortear a tomada de decisões sobre o processo de ensino-aprendizagem quer do
vocabulário, quer da própria língua. Aliás, aprender o vocabulário é no fundo aprender a língua,
pois tudo sobre a língua se materializa por meio de unidades lexicais, durante o uso.
Devido a várias situações, a aprendizagem pelo contacto durante muito tempo, não surtiu
efeito favorável ao desenvolvimento de habilidades linguístico-comunicativas em Português, aos
moçambicanos (cf. Gonçalves 2010). Neste contexto, a única saída que se podia seguir era de
recorrer ao ensino da LP. Porém, só nos meados do século XX é que finalmente é desenhada e
implementada uma política educacional e linguística no país. Mesmo assim, uma comunidade de
falantes de Português moçambicano continuaria quase inexistente até à Independência.
Naturalmente, como acontecia um pouco por toda a parte, em Moçambique foram
privilegiados aspetos de índole gramatical em detrimento do vocabulário, apesar de este se impor
sempre que for necessário aprender qualquer aspeto linguístico. Esta tendência, infelizmente,
arrastou-se com todas as suas inconveniências até à atualidade. Embora tenha havido algumas
reformas no setor de ensino desde a Independência até hoje, as mesmas ainda não consistiram em
capitalizar a importância do vocabulário, através do seu ensino nas escolas.
Portanto, sendo a LP falada no país, graças ao ensino, é óbvio que se sintam as
dificuldades proporcionadas pela situação exposta. Até ao ensino secundário, os alunos ainda
apresentam dificuldades no uso das palavras, dificuldades essas que consistem num acervo
reduzido de palavras ativas, limitações de caráter semântico, colocacional, fonológico e sintático,
e na falta de criatividade lexical etc.. As mesmas constituem, por um lado, o cúmulo da
ineficácia da abordagem escolhida para o ensino-aprendizagem da LP. Por outro, demonstram a
necessidade urgente de uma reforma no/do ensino da LP. Tal reforma não deverá negligenciar
nenhum aspeto linguístico, mas sim, fomentar o ensino da LP a partir do seu vocabulário167.
167
Aprender o vocabulário é aprender a própria língua
128
Os dados colhidos a partir do inquérito e da análise dos programas de ensino de
Português da 8ª a 12ª classe permitiram destacar os seguintes aspetos que causam o insucesso
dos alunos: (a) a incongruência entre o sentimento dos alunos e professores sobre a importância
do vocabulário e a realidade do ensino moçambicano; (b) a falta de estratégias predefinidas e de
programas que favoreçam explicitamente o ensino, aprendizagem e desenvolvimento do
vocabulário; (c) a dependência da aprendizagem do vocabulário de outras, tais como a de leitura;
(d) a limitação da aprendizagem do vocabulário aos aspetos de sinonímia, antonímia e formação,
em detrimento de outros aspetos importantes sobre o vocabulário. No entanto, é indiscutível que
a evolução social, académica, profissional, deve ser acompanhada pelo desenvolvimento
linguístico168.
O conceito de vocabulário é amiúde confundido com o do léxico e, com certeza, algumas
das falhas no ensino daquele têm que ver com esta confusão. Na verdade, ensinar uma palavra,
não é ensinar o vocabulário e este não é ensinar o léxico. A sua diferença reside, obviamente, na
conceção e objetivo do processo, mas isto não significa que não haja nenhuma relação. A palavra
pode ser do vocabulário do indivíduo, pode ser do léxico da língua. Enquanto o vocabulário
consiste em palavras correntes, do dia-a-dia do indivíduo e no que é particular; o léxico é o
conjunto de todas as unidades lexicais da língua, o tesouro comum, palavras frequentemente
usadas e não usadas, é o geral. Por isso, aquele faz parte deste.
As diferenças entre o vocabulário e o léxico são fundamentais na tomada de decisão
sobre o ensino do vocabulário. É que não raras vezes, se recorre a palavras difíceis para se
considerar ensino do vocabulário. Mas o difícil não é que constitui o vocabulário, aliás, é
improcedente aprender palavras difíceis, sem ter o domínio do que é básico, o vocabulário.
Tratando-se de um processo de ensino, é indispensável que seja objeto de uma planificação
criteriosa de modo a que se orientem sabiamente o professor e os alunos sobre as palavras que
devem ser aprendidas em cada aula, semana, semestre, ano, classe ou ciclo. Só assim o sucesso
se poderá sobrepor ao insucesso, rumo à competência comunicativa dos alunos.
A propósito dos aspetos linguísticos que devem ser tratados no ensino-aprendizagem do
vocabulário de uma língua, sublinhe-se ser tudo o que poderá proporcionar competência aos
aprendentes, ou seja, uma abordagem holística, tal como defendeu Coménio. É preciso que sejam
desenvolvidos aos alunos conhecimentos sobre (a) a forma oral e escrita das palavras; (b) a sua
168
“The more complex our activities and ideas are, the more extensive our vocabulary need to be” (Liles 1975: 41).
129
estrutura interna (derivações, flexão, composição); (c) as propriedades sintáticas, seletivas,
referenciais, etc.; (d) a sua semântica e pragmática, (propriedades, denotações, conotações,
relações) e (e) as suas combinatórias e relações sintagmáticas. Estes aspetos e outros que forem
achados pertinentes deverão ser objeto de prescrição, num documento orientador.
No processo de ensino-aprendizagem do vocabulário, deve ser privilegiada uma
pedagogia de autonomia, entendida como sendo a capacidade de o aluno gerir pessoalmente a
sua aprendizagem. Deste modo, é preciso que se lhes desenvolva a capacidade de abertura,
curiosidade, procura, análise, conclusão e avaliação, tornando-se autossuficiente. O professor
deve-se libertar das práticas tradicionais e, com base numa abordagem comunicativa, orientar os
seus alunos, negociando com eles o conhecimento, pondo-os a trabalhar e a comunicar, para
desenvolver o vocabulário e a língua. A abordagem deverá ser em forma de espiral crescente,
em que se parta das palavras (aspetos) de base e gradualmente se enriqueça com as do léxico.
Nunca se deverá ensinar o vocabulário tratando palavras isoladas. Dos possíveis corpora
de palavras a ensinar, estas devem passar por uma contextualização para poderem ser exploradas
na sala. Ensinar o vocabulário, partindo de textos e/ou discursos é de vital importância, pois é
neles que cada palavra desoculta as suas idiossincrasias. As classes de palavras, os campos
semânticos, a família de palavras, as relações semânticas, a leitura e a escrita, são estratégicos
pontos de partida para ensinar o vocabulário. Desta feita, todo o processo deverá ser alvo de uma
avaliação pelo aluno, professor e sistema no geral. Ora, tal avaliação deverá ter como indicadores
a competência linguística e comunicativa dos alunos.
Portanto, o ensino-aprendizagem do vocabulário deve ser o ponto de partida do da língua.
Para isto é preciso que haja uma preparação ao nível da camada docente (para estar em altura de
aceitar a mudança e enfrentar o desafio com valentia), dos alunos (para que a mudança e/ou nova
abordagem não lhes desmotive), de materiais169 (para que o processo não seja frustrado pela
exiguidade de meios), e da sociedade (para que possa contribuir positivamente na aprendizagem
do vocabulário e da língua). Recorde-se que, no processo de ensino, quando uma abordagem não
satisfaz as expectativas da maioria deve ser mudada ou melhorada. Ora, não se ensina a língua
pela estrutura, mas sim pelas palavras (Martín Vegas 2009).
169
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