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DPD, O LETRAMENTO - TEORIA E PRÁTICA

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MAGALHÃES, I. (Org.).

Discurso e Práticas de Letramento: Pesquisa Etnográfica e


formação de professores. Campinas, SP: Mercado das Letras, 2012, 336p.

O LETRAMENTO: TEORIA E PRÁTICA

Tamiris Marques Eng Wang ∗


tetmw_mei@hotmail.com

A obra Discurso e Práticas de Letramento: Pesquisa Etnográfica e formação de


professores organizada por Izabel Magalhães é composta por artigos de autores conceituados
que auxiliam na compreensão das práticas de ensino tanto da língua portuguesa quanto da
estrangeira, esclarecendo termos como Letramento, intertextualidade, prática e dialética que
são discutidos num prisma relevante no espaço escolar. Outra importância do livro é mostrar
as práticas em públicos diferenciados como alunos especiais, universitários e na educação de
jovens e adultos.
O livro está divido em três partes e para que haja uma compreensão do leitor, a
primeira parte intitulada Sociedade e Letramento, define o significado de letramento,
mostrando a diferença entre letramento e alfabetização e as práticas. Izabel Magalhães, além
de ser organizadora do livro, também apresenta artigos, um deles é o Letramento,
intertextualidade prática social crítica; e Eventos de letramento e práticas de letramento:
teoria e prática nos Novos Estudos de Letramento e Norman Fairclough com A dialética do
discurso.
No primeiro momento da obra são apresentadas definições que nos auxiliam para uma
compreensão ampla e concreta do ensino. Em especial, quando se trata da educação de jovens
e adultos, um modelo de ensino diferenciado, que visa aos docentes, segundo as orientações
curriculares de educação básica, “produzir linguagem e trabalhar com valores, conceitos,
noções e comportamentos que os justificam e que são comuns aos interlocutores ou do seu
conhecimento.” (BRASIL, 2012, p. 65).
Nesta perspectiva, Magalhães relaciona pontos fundamentais como letramento,
intertextualidade à prática na modalidade de ensino da EJA. Assim, Rios (2009) aponta que o
letramento constitui-se dos “atos socioculturais concretos que são atribuídas as seguintes
atividades: escrita, leitura e conversa relacionada ao texto escrito. E a intertextualidade refere-


Bolsista voluntária no Centro de Educação de Jovens e Adulto Benedito Santana da Silva Freire.
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se ao recorte de diversos textos, pois se derivam de discursos heterogêneos coexistentes no
contexto educacional brasileiro.
Quando refletimos no espaço escolar verificamos existência de algumas falhas, como
carga horária reduzida, profissionais com dificuldades em ministrar as aulas por falta de
habilidade, espaços inadequados para os alunos e docentes, enfim vários discursos aparecem
para justificar a “falha” do ensino.
Estes discursos são tradicionais como aponta Street (1984) que estão enraizados no
sistema cultural educacional, que denomina como Modelo Autônomo de Letramento e refere-
se ao ensino “descontextualizado”, que muitas vezes faz parte da formação acadêmica do
profissional, apresentado e denominado pelos currículos e a pedagogia dos cursos.
Street faz críticas pertinentes sobre algumas matrizes curriculares dos cursos de Letras,
uma por trabalharem com textos abstraídos de suas práticas, porém não valorizam uma
abordagem de leitura em forma de debate e crítica, como se a existência dos textos fossem
independentes de suas práticas. E a outra, direciona-se às produções escritas acadêmicas que
são cobradas pelo conhecimento gramatical das línguas, diagnosticando a estrutura sistêmica
da língua, que para Street esse método de ensino seria “um grande equívoco”, pois é
necessário levar em consideração a “leitura e a escrita” de forma contextualizada, da realidade
do indivíduo, para que possa entender na prática suas funções.
Já o modelo Ideológico, está relacionado com as ideologias presentes no espaço
escolar, apresentado nas práticas de leitura e escrita, e quando interpretadas não são negadas,
e sim respeitadas, através de práticas linguísticas em que o ensino de línguas passa a ser
comprometido com a educação, desta forma o uso da linguagem é visto como fonte de
conhecimento entre letrados e iletrados.
Sendo assim as trocas de conhecimentos ideológicos, de conteúdo, de experiências são
expostas pela intertextualidade e interdiscursividade, estabelecendo uma relação na concepção
da Linguística Textual, em que as “Vozes” dos discursos “estão associadas às identidades”.
Enquanto os discursos “são formas de representação de acordo com um ponto de vista
particular”. Logo, entende-se que somos constituídos de diversos textos/vozes que nos
contextualizam ao espaço que estamos inseridos, atribuindo valores e representações que nos
identifiquem. Então, a intertextualidade é a polifonia nos textos, ou seja, quando se encontram
vozes que estão apropriadas para exatos contextos.
Para contextualizar o espaço social ao escolar, através das práticas de letramento, na
inclusão nos programas de ensino de línguas, uma das propostas de Magalhães está na

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elaboração de projetos extracurriculares, um ensino que inclui a multimodalidade, ou seja,
renovar os métodos de ensino na utilização de imagens, sons, jogos lúdicos que auxiliam na
associação dos conteúdos.
Nesta direção, Norman Fairclough aponta que “toda prática é uma articulação de
diversos elementos sociais em uma configuração relativamente estável, sempre incluindo o
discurso”. E no discurso que se inclui alguns elementos tais como: as atividades, os sujeitos e
suas relações sociais, os instrumentos/ objetos, determinado por um tempo e lugar, forma de
consciência, valores e discurso.
Estes estão relacionados dialeticamente (Harvey 1996), ou seja, envolve-se na Análise
do Discurso Crítico, estudo que centra nas relações dialéticas entre o discurso, incluindo não
somente a linguagem, como também formas de semiose, que são formas de linguagens
corporais e visuais. Assim o discurso, para Fairclough apresenta-se em três maneiras: A
primeira condiz com “atividade social de uma prática”, quando usa-se a “língua de modo
particular”; a segunda forma corresponde às representações das práticas sociais, entende-se
que “é um processo de construção social de prática, inclusive a autoconstrução reflexiva”; e, o
terceiro que está constituído na identidade, no exemplo a ser seguido, pelo modo exemplar de
ser, de representar.
Mediando as formas dos discursos com as práticas educacionais, refletimos que é no
espaço escolar, onde encontramos diversos discursos que remetem o espaço social dos
falantes, incluímos direção, docentes e alunos. É através delas que podemos ressignificar o
conhecimento do indivíduo, na tentativa de aprimorá-lo tanto nos aspectos estruturais como
no intelectual.
Nesta perspectiva, a segunda parte do livro titulada de Letramento e pesquisa
etnográfica analisa as práticas de letramento, centrando-se nos corpus das pesquisas, através
de questionários, experiências e formas diferenciadas de ensino. Neste momento evidencia-se
ao leitor alguns aportes instrumentais que auxiliam nas pesquisas de cunho etnográfico.
Primeiramente a pesquisa etnográfica, insere o pesquisador ao espaço dos
participantes da pesquisa, no intuito de observar as experiências, os costumes, os momentos
que consolidam suas práticas, para que no segundo momento da pesquisa possa refletir e
descrever a relevância da pesquisa. A utilização de diários, proporciona registros reais do
espaço e tempo, demonstrando a rotina da comunidade ou dos pesquisados estudados, os
costumes, os hábitos, etc.

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Compreendendo brevemente o significado de uma pesquisa etnográfica, Izabel
Magalhães, no viés da Linguística Aplicada, no artigo “Letramentos e identidades no Ensino
Especial” aborda sobre as práticas de letramento, elencando termos como discurso, letramento
e identidade, dos docentes para um público especial, na perspectiva de uma integração social
do indivíduo deficiente.
A inserção dos alunos surdos ou com alguma deficiência tanto mental, quanto física
nas escolas, requer práticas de ensino diferenciadas para que possa proporcionar possíveis
interações sociais. Desta forma, Magalhães abrange sua pesquisa para esse público, numa
perspectiva da Linguística Aplicada em que aborda e relaciona os conceitos com as práticas
de discurso, letramento e identidade, investigando, os discursos e as práticas de letramento
que envolvem leitura e escrita.
Logo, discorrer sobre as práticas de letramento é estar inserido nos modos
socioculturais que produzem significados sobre as atividades de leitura e de escrita,
demandando a análise do poder “a seleção das práticas que são ensinadas e o modo de
transmiti-las dependem da natureza de formação social”.
É de suma importância ressaltar a diferença entre alfabetização e letramento. Segundo
Soares (1998) alfabetização consiste na “ação de ensinar/aprender a ler e a escrever”, já o
letramento “é o estado ou a condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e
exerce as práticas sociais que usam a escrita.” Já para Street, segundo Magalhães, a concepção
de letramento está associada à leitura e a escrita às práticas sociais, que são
multidimensionais, incluindo o sujeito e suas identidades, discursos e situações de poder
relacionadas às ações, interações e aos espaços e tempo diversos.
Contudo, conhecer o letramento e entender suas práticas inseridas na sociedade, é
reconhecer uma diversidade de linguagens, de culturas, de identidades, de valores éticos que
precisam ser compartilhados e trabalhados, no intuito de interagir com a sala, sem
menosprezar suas diferenças.
Dessa forma, a pesquisa apresentada pela autora são análises das narrativas realizadas
pelos alunos. Verificou-se que as práticas de letramento para o público especial,
especificamente, precisam ser planejadas com atenção, pois requerem um cuidado não só nas
escolhas dos materiais utilizados para as atividades, como também adaptações das atividades
para a determinada deficiência, trabalhando com imagens e textos contextualizados ao espaço
do aluno, para facilitar o ensino.

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Rios, em seu artigo, também apresenta outra prática de letramento que aborda a
descrição e análise dos usos, valores e aprendizagem da leitura e da escrita. Diferentemente de
Magalhães, que utiliza o espaço escolar como o local da pesquisa, esse concentra-se em duas
localidades no Distrito Federal. O objetivo de Rios é evidenciar as diversas formas de práticas
de leitura e de escrita que estão inseridas no espaço social das pessoas, através de textos
diários nas rotinas dos grupos observados como: folhetos publicitários, painéis e letreiros
expostos nas ruas e avenidas, jornais, agendas, revistas e etc. Podemos dizer que esses
diversos gêneros que rodeiam a sociedade apresentam uma funcionalidade na vida das
pessoas, não importando a classe social que pertence.
Notou-se, nesta pesquisa que os temas discutidos foram os textos dispostos no
cotidiano das pessoas, os cursos de capacitação profissional e empregos. Percebeu-se que
muitas vezes, a profissão do indivíduo no mercado de emprego, não condiz com o curso de
capacitação realizada pelo mesmo. Averiguou-se que muitos fizeram cursos
profissionalizantes em habilidades específicas para ser incluídos no mercado de trabalho e que
nenhum dos pesquisados estava na carreira estudada, porém almejavam uma colocação, uma
oferta gratificante.
Outra observação notória está na obtenção de valores de letramento, além da
aprendizagem informal da leitura e escrita que contrastou a realidade das duas localidades
estudadas. Percebeu-se que o fator determinante das atitudes e rotinas dos indivíduos estão
associados aos espaços inseridos na sociedade, determinado pela sua classe e posição social,
que somam-se nas identidades e nos perfis.
Christine Carvalho apresenta outra prática de letramento, de extrema importância que
associa as tecnologias nas aulas de português, com o objetivo de entender como a linguagem
está dinamizada à diferentes modos semióticos anexos à tecnologia da informática e
multimídia, podendo contribuir para uma transformação habitual no cotidiano das pessoas.
Street chama essa geração tecnológica de “nova ordem da comunicação”, as práticas de
letramento tecnológico de informação, e no reconhecimento da leitura e da escrita
relacionados ao conjunto de combinações entre signos, símbolos, imagens, palavras e sons.
Carvalho aponta que a prática de letramento, como uso da tecnologia em sala de aula,
proporciona ao aluno, que no caso pesquisado foram os universitários, uma conexão ao
espaço cibernético, oportunizando-os para um contato com os aparelhos, na compreensão das
funcionalidades dos programas em seus manuseios, tornando-os membros virtuais da
comunidade digital. Tal fato oportuniza o ensino básico para aqueles que não tiveram o

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contato com a informática, ensinando as funcionalidades dos teclados, como abrir arquivos e
enviá-los, escrever e enviar uma carta simples ou um e-mail de boas-vindas, ou seja,
atividades com estrutura e funções gramaticais específicas.
Após algumas práticas de letramento, refletimos com Carvalho ao apontar que “língua
escrita é um mecanismo mediador na construção social da identidade”. Assim, precisamos nos
adaptar e valorizar as mudanças sociais e culturais como forma positiva no sistema
educacional da sociedade.
A terceira parte da obra é nomeada de “Formação de professores”, neste momento
voltam-se os holofotes da atenção para a reflexão do ensino, observando as compreensões e as
práticas dos docentes no requisito letramento.
Inês Signorini, preocupada com as práticas docentes, aponta que estamos
contextualizados numa sociedade heterogênea e contemporânea em que a todo momento
somos apresentados para um “novo” na área da tecnologia, com materiais didáticos, com
reformas ortográficas e até mesmo com maneiras diferentes de ensinar. Desta forma, adequar
o ensino para os novos gêneros que surgem, dispostos na sociedade e conciliar com as
tipologias textuais tradicionais como narração, descrição e dissertação é uma grande tarefa
para o docente, em suas práticas de letramento, em especial para a educação de jovens e
adultos, que requer uma atenção diferenciada.
Logo, Silviane Barbato aborda sobre “A alfabetização de Jovens e Adultos: princípios
do ensino dialógico para a formação de cidadãos e cidadãs críticos”, em que aponta o
letramento na junção de concepções direcionadas ao ensino regular, com os conceitos e as
aplicações de materiais para o ensino, numa perspectiva sócio-histórica de Vygotsky,
somando-se com a vertente de Bakthin, no que refere-se à interação social. Porém,
direcionada e uma organização de processos de ensino de práticas de participação de ensino/
alfabetização para jovens e adultos.
Neste direcionamento, entende-se que o domínio da leitura e da escrita amplia as
possibilidades de comunicação do sujeito, de sua inserção na cultura. Na medida em que
domina as competências, passa a ter uma vida ativa em outros acessos de comunicações, em
diferentes formas como: jornais, TV, livros, etc.
A linguagem é repensada como o instrumento simbólico mais importante para a
transformação individual. Torna-se necessário compreender e criar oportunidades para a
construção de significados pelos participantes. Além de desenvolver leitura e escrita
relacionando às funções e os usos nas comunidades que pertencem. E a prática ideológica, por

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proporcionar mudanças sociais e na expectativa de vida dos alunos, objetivando na construção
da prática contextualizada da cultura letrada.
O livro Discurso e práticas de letramento: pesquisa etnográfica e formação de
professores, torna-se essencial para a formação dos docentes pela variedade de textos
apresentados de autores da área do letramento que, além de conceituar termos atuais e
importantes para uma reflexão sobre a prática dos docentes, também compartilham novas
visões de práticas de letramento com alunos, que muitas vezes estão marginalizados pela
sociedade ou excluídos.
As propostas dos pesquisadores visam um ensino contextualizado, valorizando as
identidades culturais dos alunos, elaborando atividades interativas, através de materiais
didáticos ou midiáticos, com a utilização de aportes tecnológicos que auxiliam na
aprendizagem. Trazer o “novo” para as práticas requer cuidados, pois o sistema educacional,
infelizmente está atrelado à educação tradicional, e a vinda do “novo”, muitas vezes pode ser
entendida como forma de ameaça aos profissionais veteranos. É preciso que haja reflexões
coletivas sobre essa nova concepção de “práticas de letramento”, para que o trabalho seja
funcional no cotidiano do aluno.

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