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Comunicação
Resumo: Este artigo tem como objetivo principal discutir sugestões para o estudo das
partituras de tuba do repertório orquestral de Richard Wagner (1813-1883), com ênfase no
ciclo O Anel de Nibelungo. Além disso, como objetivo específico buscou-se compreender a
função da tuba na orquestra sinfônica e analisar aspectos técnicos e musicais dos excertos das
óperas de Wagner. Analisa-se a versatilidade da escrita do compositor para esse instrumento
e as dificuldades técnicas de execução que as mesmas apresentam para o tubista, propondo
métodos de trabalho para as ultrapassar. Utilizando uma metodologia de pesquisa
bibliográfica e documental e recorrendo ao meu conhecimento empírico, apresento uma
proposta de planejamento de estudo das partes da tuba, aplicando técnicas base de
execução. Pretende-se, assim, contribuir para melhorar o desempenho do músico na
interpretação do repertório orquestral.
Introdução
Considerando que as oportunidades profissionais de um músico instrumentista
surgem maioritariamente numa orquestra sinfônica, é importante um trabalho profundo de
preparação visando a performance do repertório orquestral. Nesse sentido, o desafio de
ultrapassar várias etapas eliminatórias e conseguir vencer a prova final para tuba solista, numa
orquestra, necessita de um consolidado processo de estudo adequado à exigência dessa
prova.
Diante do exposto este trabalho pretende responder aos seguintes questionamentos:
qual a função da tuba na orquestra sinfônica? como ultrapassar as dificuldades técnicas e
musicais dos excertos orquestrais de tuba das obras de Richard Wagner (1813-1883)?
Sendo assim o objetivo principal é discutir sugestões para o estudo das partituras de
tuba do repertório orquestral de Richard Wagner (1813-1883), com ênfase no ciclo O Anel de
Nibelungo. Além disso, como objetivo específico buscou-se compreender a função da tuba na
orquestra sinfônica e analisar aspectos técnicos e musicais dos excertos das óperas de
Wagner.
Para a resolução deste problema, apresento a hipótese que explora a análise da
partitura de tuba para identificação das maiores dificuldades e sugestão de aplicação de
técnica base.
Durante o meu percurso profissional, em Portugal, como tubista do grupo Remix
Ensemble Casa da Música (Porto), tive a oportunidade de fazer ao longo do ano de 2011 uma
tournée europeia interpretando a totalidade do ciclo O Anel do Nibelungo de Richard Wagner
(1813-1883) numa adaptação de Jonathan Dove e Graham Vick para orquestra reduzida de 18
músicos. Também interpretei excertos desta tetralogia com outras orquestras em Portugal e
no Brasil. Assim, no processo de estudo que proponho, aplico o meu conhecimento empírico,
além de utilizar uma metodologia assente na coleta de dados através de uma pesquisa
bibliográfica realizada em livros, teses e dissertações que abordam o tema, e pesquisa
documental de partituras.
Na estruturação deste artigo apresento, na primeira secção, a integração e a função
da tuba na orquestra sinfônica. Na segunda secção, recorro a vários excertos musicais de
partes de tuba nas óperas de Richard Wagner (1813-1893), nomeadamente da tetralogia de
O Anel do Nibelungo. Demonstro a versatilidade da escrita do compositor para esse
instrumento, explorando a função de suporte harmónico ou o protagonismo de certos solos e
identifico as principais dificuldades na sua execução, propondo um processo de estudo para
melhorar a prestação do músico. Alguns destes excertos são habitualmente exigidos nas
audições para orquestra sinfônica para o lugar de tubista (POKORNY, 1996, pp. 329 – 332).
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For10 years now I have been working with military bands, and have felt, i suppose, most sorely the need of a
tru Wind instrument. None of the bass wind instruments, such as: 1) the English bass horn, 2) the serpemt (both
with an effective compass of at the most two and one half octaves, viz. from treble G down to Contrabass C) and
3) the bass trombone (with a compass of 3 octaves from second octave C to contrabasse C), could fill the place
of the needed contrabass which wind band music demanded.
afinação em Fá e cinco válvulas, no entanto, o seu diâmetro da campânula era menor que a
dos dias de hoje. Três anos mais tarde, Moritz e Wieprecht patentearam a tuba em Mi bemol
(BEVAN, 2000).
Desde logo surgiram as primeiras críticas positivas, acerca das qualidades deste
instrumento. Berlioz (1855) afirmava que a bass-tuba possuía uma sonoridade e afinação boa,
nada semelhante ao oficleide, passando a considerar a bass-tuba como o verdadeiro baixo na
secção dos metais, modificando nas suas partituras todas as indicações de oficleide para tuba.
De acordo com Bevan (1996), os novos desafios decorrentes desta inovação
mecânica da invenção da válvula possibilitaram que os construtores de instrumentos
explorassem o sistema de válvulas para atingir uma estabilidade tonal com flexibilidade
técnica. Desta forma foi possível abandonar soluções arcaicas como a utilização de certos
dedilhados ou a utilização alternada de chaves para a resolução de problemas decorrentes da
escrita musical.
Dando continuidade ao processo de expansão das possibilidades de volume sonoro
e ampliação do registro grave para a utilização em bandas de sopro, o construtor de
instrumentos Vaclav Frantisek Czerveny criou a contrabass tuba em Dó e Si bemol que foi
inicialmente usada em grupos de sopro e mais tarde inserida na orquestra por Wagner no seu
ciclo de dramas musicais, O Anel do Nibelungo (PHILLIPS; WINKLE, 1992, p.58).
Com um registro grave semelhante ao do contrabaixo e contrafagote, a tuba é o
instrumento que possui o maior volume sonoro. As suas possibilidades dinâmicas, que vão
desde um pianíssimo com um som veludado a um fortíssimo capaz de sustentar uma orquestra
sinfônica de 100 elementos, fazem da tuba um instrumento que realiza a sua função de baixo
em excelência.
2Wagner é também o responsável pela criação da trompa wagneriana, tendo sido inicialmente criado para o ciclo O Anel do
Nibelungo. O compositor pretendia um instrumento com um timbre específico, para retratar certas ambiências das suas
óperas (BAINES,1993, p. 263).
Analiso estas diferentes versatilidades da escrita de Wagner para tuba nos trechos a
seguir apresentados.
A figura 1 apresenta o final da ópera O Crepúsculo dos Deuses em que a tuba realiza
junto com a secção de metais uma importante passagem melódica, mas sempre com a voz
mais grave. Observa-se que, além de acompanhar o desenho da melodia, também sustenta
toda a harmonia no registro grave. Nesta passagem as dinâmicas em piano precisam ser bem
timbradas ou, em alternativa, optar-se por uma dinâmica que permita a audição de todos os
naipes, pois devido à dimensão da orquestra é necessário expandir o som por uma grande
extensão do palco para estes construírem o acorde com uma afinação ajustada.
Para isso é necessário uma boa vocalização e uma grande abertura da cavidade bocal
(MASON, 1977, p.3), que irá produzir um som rico em harmónicos, facilitando assim a
construção do acorde e apoio para os outros naipes (MASON, 1977). É importante a execução
do tubista estar perfeitamente afinada caso contrário com uma base harmônica instável o
acorde irá, com certeza, resultar com problemas de afinação. Recorde-se que a orquestração
de Wagner nas óperas do ciclo O Anel do Nibelungo foi escrita para uma orquestra de grande
dimensão, com mais de cem músicos, constituindo um desafio acrescido para o tubista apoiar
harmonicamente a orquestra quando esta tocava em fortíssimo.
Figura 2: Excerto da partitura de tuba
Na figura 2 há um exemplo do registro mais utilizado por Wagner nas suas óperas,
representativo da função de acompanhamento harmónico da tuba. É bastante grave e recorre
à colocação de linhas suplementares, dificultando assim a leitura e adicionando,
eventualmente, um cansaço extra em óperas de longa duração como as da Tetralogia. Convém
referir que a dificuldade dessa leitura em linhas adicionais pode aumentar quando o tubista
toca numa dinâmica muito forte, pois a cabeça tende a oscilar como resultado da grande
expiração e das vibrações das notas graves.
Outro aspeto que pode dificultar a leitura é a notação destas notas ser pouco clara ou
a partitura estar desgastada. Assim recomendo uma análise prévia da parte.
Este trecho contém 27 compassos maioritariamente de notas longas, em Moderato,
um poco sostenuto, no registro grave, e apenas uma pausa de semínima durante toda esta
passagem. Para uma boa performance deste longo trecho, é importante uma mínima
condição física, para que assim se possa tocar estas notas continuas, que despendem tantos
litros de ar. Caberá ao tubista decidir quando interromper a nota para respirar nos oito
compassos ligados na nota sol.
A nível dinâmico o fortíssimo do compasso 116 representa um desafio, pois o tubista
toca durante 18 compassos seguidos, sem pausas. Assim sendo, o cansaço físico provocado
pela expiração do volume de ar exigido nesse registro, como já referido, aliado à tensão que
a embocadura está realizando durante todo este trecho para manter a mandibula avançada
que é exigida para alcançar este registro (MASON, 1977, p.31), vai dificultar a predisposição
para o fortíssimo do compasso 116. Para uma boa resistência exigida nestas óperas de
Wagner, sugiro estudar os métodos 70 Estudos para Tuba de Vladislav Blazhevich (1942) e 24
Estudos Melodiosos para Tuba de S. Vasiliev (1955) que abordam o registro grave, com poucos
momentos de pausas, e que se assemelham um pouco à escrita de Wagner. Estes estudos
também são importantes para as bases técnicas do tubista no que diz respeito a construção
do som, a capacidade de tocar tenuto e sustentado, o que também é exigido num tubista de
orquestra.
Cabe destacar que este excerto é um ótimo exemplo da função da tuba na escrita de
Wagner: a arte de tocar grave e sustentado.
A figura 6 expõe um dos mais requisitados solos das audições de orquestra. Nesta
partitura, Wagner (1813-1883) colocou bass tuba na partitura dos Mestres Cantores de
Nuremberg, ao contrário da escrita habitual utilizada nas suas obras e óperas da tetralogia,
em que indica a especificação de contrabass tuba. Provavelmente, esta indicação ocorre por
este solo se situar num registro médio/agudo da tuba, em uníssono com os violoncelos,
interpretando uma bonita melodia. Neste excerto o tubista pode demonstrar a sua
musicalidade e competências técnicas, não só na incursão pelo registro agudo, mas também
pelo trilo do compasso 172. Desde já referir que é raro a utilização deste ornamento nas partes
orquestrais de tuba.
Para alcançar o registro agudo, devemos apoiar a coluna de ar com o diafragma,
tornando a saída do ar mais veloz e de menor volume progressivamente na incursão para o
registro agudo. Esta técnica irá ajudar o tubista a alcançar estas notas agudas com precisão de
articulação e afinação.
Para a execução do trilo proponho o estudo com metrônomo em diversas velocidades
e uma adequada escolha da digitação em função da tonalidade, marca e modelo de tuba.
Também a diferença da mecânica de rotores e pistões terá influência na execução do solo,
desejando-se que estes sejam velozes para realizá-lo. Um exercício que ajuda é o de realizar
o trilo com posições fixas, apenas usando a embocadura para a troca de notas, e depois usar
a digitação em simultâneo com a embocadura para que este trilo resulte com melhor
execução e definição.
Este solo inicia-se com uma articulação em molto marcato e na segunda parte
(compasso 173) em molto legato. É importante que esta diferença seja clara tanto na
performance na orquestra, assim como a execução em uma prova para a vaga de tubista onde
o júri avaliará esta diferença de articulação e estilo.
Figura 7: Excerto da partitura de tuba
BAINES, Anthony. Brass Instruments. Their History and Development. Dover Publications, New
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VASILIEV, S. 24 Melodious Etudes for Tuba. Alphonse Leduc, Paris, 1955. ( 1st edition)
Trechos de partitura