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Marcos Fragomeni Padron

Uma proposta de modelo conceitual para


representação da música popular brasileira

Brasília
2019
Marcos Fragomeni Padron

Uma proposta de modelo conceitual para representação


da música popular brasileira

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós–graduação em Ciência da Informação da
Faculdade de Ciência da Informação da Uni-
versidade de Brasília como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em Ciência
da Informação.

Universidade de Brasília (UnB)


Faculdade de Ciência da Informação (FCI)
Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCInf)
Grupo de Pesquisa em Bibliotecas Digitais

Orientador: Prof. Dr. Fernando William Cruz


Coorientadora: Profa. Dra. Juliana Rocha de Faria Silva

Brasília
2019
Ficha catalográfica elaborada automaticamente,
com os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

Fragomeni Padron, Marcos


Fp Uma proposta de modelo conceitual para representação da
música popular brasileira / Marcos Fragomeni Padron;
orientador Fernando William Cruz; co-orientador Juliana
Rocha de Faria Silva. -- Brasília, 2019.
221 p.

Dissertação (Mestrado - Mestrado em Ciência da Informação)


-- Universidade de Brasília, 2019.

1. Música Popular Brasileira. 2. Modelagem Conceitual.


3. OntoUML. 4. IFLA Library Reference Model (LRM). I.
William Cruz, Fernando, orient. II. Rocha de Faria Silva,
Juliana, co-orient. III. Título.
Agradecimentos

Agradeço imensamente à minha esposa Ana Claudine Santoro, por seu apoio,
paciência e incentivo, sem os quais este trabalho não seria possível. Obrigado, Clau, por
compartilhar comigo seu caminho e me contagiar com sua alegria de viver.
Às minhas filhas Marina e Camila Fragomeni, por compreenderem minhas ausências1
durante a realização desse trabalho e, principalmente, por terem o poder de iluminar a
minha vida com apenas um sorriso.
À minha mãe Ana Helena Fragomeni, por ter me proporcionado todas as condições
e oportunidades para ser quem hoje sou e me orgulhar disso. Também pela ajuda na
revisão dos artigos em inglês.
Ao professor Dr. Fernando William Cruz, pela orientação sempre presente e acessível
durante todo o período do mestrado, pelas longas discussões e constantes provocações, que
se mostraram tão valiosas para o desenvolvimento das ideias presentes nesta dissertação.
À professora Dra. Juliana Rocha de Faria Silva, pelos valiosos ensinamentos sobre
o universo musical, pela participação ativa nesta pesquisa e, sobretudo, pelo primoroso
trabalho realizado em sua tese, na qual se fundamenta o modelo conceitual aqui proposto.
Ao amigo Dr. Lauro César Araujo, por ter me incentivado a realizar este empre-
endimento, pelos ensinamentos de modelagem conceitual, UFO e OntoUML, e por estar
sempre disponível para esclarecer dúvidas e discutir ideias.
Aos colegas Maria de Lourdes Miranda Peixoto, Berkeley Alves Ferreira, João
Holanda, Emmanuel de Figueiredo Caldas e Vládner Lima Barros Leal por compreenderem
e apoiarem um profissional dividido com a academia, em especial à colega e amiga Lurdinha
que me substituiu durante minhas eventuais ausências de maneira impecável.
Ao amigo Dr. João Alberto de Oliveira Lima, que tenho como exemplo profissional
e acadêmico, por ter me apresentado ao mundo da modelagem conceitual e ter impactado
positivamente diversos momentos da minha vida.
Ao professor Dr. Murilo Bastos da Cunha, pelo acolhimento, pela participação na
banca da defesa e pela detalhada revisão da dissertação e do relatório intermediário.
À professora Dra. Fernanda Passini Moreno e ao professor Dr. Cláudio Gottschalg-
Duque, pela participação nas bancas do relatório intermediário e da defesa da dissertação,
respectivamente, fornecendo orientações relevantes ao enriquecimento deste trabalho.

1
Nas palavras da Camila, “o papai é legal, só não interage”.
Resumo
O termo “música popular brasileira” refere-se a um repertório variado de estilos musicais
que possui forte conexão com a cultura local e legitima-se como expressão que ganha caráter
de tradição e promove registros subjetivos da organização social vigente. Ademais, é o estilo
preferido pelos brasileiros, o que acaba motivando a proliferação de fontes de informação
sobre essa música, que variam de sites independentes até centros de documentação. Por
outro lado, as mudanças culturais trazidas pelo amplo acesso à Internet promovem uma
reflexão sobre modelos, práticas e padrões adotados tradicionalmente, fazendo com que os
centros de documentação passem a considerar a possibilidade de estarem integrados ao
contexto da Web Semântica a fim de evitar que se mantenham como silos informacionais.
Nessa dissertação é proposto um modelo conceitual que formaliza as características da
música popular brasileira em um sentido amplo, considerando-se aspectos do contexto
cultural em que se insere, de sua natureza, e de sua concepção, execução e gravação, para
apoiar: (i) a comunicação e análise do domínio da música brasileira; (ii) a publicação e
o intercâmbio de dados musicais bibliográficos e não bibliográficos na Web Semântica; e
(iii) a construção de sistemas que melhor atendam às necessidades informacionais dos
usuários desse tipo de música. Do ponto de vista metodológico, os elementos do modelo
foram obtidos com base na literatura e em pesquisas anteriores. Os resultados permitiram
evidenciar as nuances da música brasileira por meio da identificação dos conceitos e
relacionamentos mais relevantes a esse estilo musical formalizados em um artefato descrito
em linguagem ontológica. Além desse resultado, foi feito um experimento de extensão
do IFLA LRM, a partir do modelo conceitual, para a descrição de músicas brasileiras,
demonstrando a sua utilidade como insumo para a adequação de padrões bibliográficos ao
domínio da música popular brasileira.

Palavras-chave: Música Popular Brasileira. Modelagem Conceitual. OntoUML. IFLA


Library Reference Model (LRM).
Abstract
The term “Brazilian popular music” refers to a varied repertoire of musical styles with
strong connection with local culture, that legitimizes itself as tradition and creates records
of current social organization. Moreover, it is the preferred musical style of Brazilians,
what motivates the proliferation of information sources about this music, ranging from
independent sites to documentation centers. On the other hand, cultural changes, caused
by the wide access to the Internet, demand a revision of traditionally adopted models,
practices and standards, making those documentation centers consider the possibility of
integrating to the Semantic Web in order to prevent them from keeping themselves as
information silos. In this dissertation, it is proposed a conceptual model that formalizes
the characteristics of Brazilian popular music in a broader sense, considering aspects of
the cultural context in which it is inserted, of its nature, and its conception, execution
and recording, in order to support: (i) communication and analysis of Brazilian music
domain; (ii) publication and interchange of bibliographical and non-bibliographical musical
data in the Semantic Web; and (iii) development of systems that best meet informational
needs of users of this kind of music. From a methodological point of view, the modeled
elements were obtained based on the literature and previous researches. The results allowed
to highlight nuances of Brazilian music, through the identification of the most relevant
concepts and relationships to this musical style, formalized on an artifact described in
ontological language. It was also made an experiment, based on the conceptual model, that
extends the IFLA LRM for Brazilian music description. In this experiment, the proposed
model showed its value as input for adapting bibliographic standards to the domain of
Brazilian popular music.

Keywords: Brazilian Popular Music. Conceptual Modeling. OntoUML. IFLA Library


Reference Model (LRM).
Lista de ilustrações

Figura 1 – Exemplo de música popular brasileira escrita. . . . . . . . . . . . . . . 57


Figura 2 – Organização e Representação da Informação e do Conhecimento . . . . 76
Figura 3 – SOCs quanto à estruturação e distanciamento da linguagem natural. . 78
Figura 4 – Triângulo de Ullmann. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
Figura 5 – Relações entre conceitualização, abstração, linguagem de modelagem. . 83
Figura 6 – Linguagem específica de domínio e linguagem independente de domínio. 84
Figura 7 – Interoperabilidade semântica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
Figura 8 – Fragmento da UFO-A: Tipos de universais e indivíduos. . . . . . . . . 92
Figura 9 – Taxonomia revisada de tipos endurantes na UFO. . . . . . . . . . . . . 93
Figura 10 – Exemplos de níveis de linguagens. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
Figura 11 – Perfil da OntoUML 2.0 para endurantes. . . . . . . . . . . . . . . . . . 96
Figura 12 – Modelo em OntoUML para explicação da linguagem. . . . . . . . . . . 97
Figura 13 – Entidades do Grupo 1 do FRBR e seus relacionamentos primários. . . 103
Figura 14 – Família de obras. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104
Figura 15 – Visão geral dos relacionamentos do modelo IFLA LRM. . . . . . . . . . 108
Figura 16 – Modelo geral para agregações no IFLA LRM. . . . . . . . . . . . . . . 110
Figura 17 – Um meta-esquema qualitativo do CIDOC CRM. . . . . . . . . . . . . . 111
Figura 18 – Principais eventos do CIDOC CRM. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112
Figura 19 – Possível registro DUBLIN CORE para o Tratado de Yalta. . . . . . . . 113
Figura 20 – Possível registro DUBLIN CORE para a foto dos líderes aliados em Yalta.113
Figura 21 – Partes do registro TGN para Yalta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114
Figura 22 – Uma arquitetura de integração de informação. . . . . . . . . . . . . . . 115
Figura 23 – Visão estrutural das entidades OEMI no FRBRoo em UML. . . . . . . 117
Figura 24 – Visão do FRBRoo da concepção de uma obra. . . . . . . . . . . . . . . 118
Figura 25 – Relação entre entidades do FRBRer e classes do FRBRoo. . . . . . . . 119
Figura 26 – Agrupamento de registros musicais de acordo com o FRBR. . . . . . . 126
Figura 27 – Modelo de dados do projeto Variations2 . . . . . . . . . . . . . . . . . 128
Figura 28 – Modelagem DOREMUS para várias expressões de uma mesma obra. . . 131
Figura 29 – Esquema sintetizado de uma performance complexa. . . . . . . . . . . 133
Figura 30 – Visão geral da ontologia Event. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137
Figura 31 – Um fluxo de trabalho de produção musical utilizando a Music Ontology. 138
Figura 32 – Relações entre diversas ontologias musicais na visão da Studio Ontology. 140
Figura 33 – Principais conceitos do modelo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149
Figura 34 – Relações de autoria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152
Figura 35 – Versões representativa e original, medley e intérprete proeminente. . . . 154
Figura 36 – Meios de performance. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 156
Figura 37 – Performance musical. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 158
Figura 38 – Gênero musical. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 160
Figura 39 – Gênero musical (continuação). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163
Figura 40 – Expoentes de gêneros musicais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 165
Figura 41 – Alinhamento com o modelo IFLA LRM. . . . . . . . . . . . . . . . . . 167
Figura 42 – Visão geral dos relacionamentos do modelo estendido. . . . . . . . . . . 186
Lista de tabelas

Tabela 1 – Níveis de linguagem Lógico, Epistemológico e Ontológico. . . . . . . . 94


Tabela 2 – Hierarquia de entidades do modelo IFLA LRM. . . . . . . . . . . . . . 106
Tabela 3 – Hierarquia de entidades. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177
Tabela 4 – Novas entidades. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 178
Tabela 5 – Hierarquia de atributos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 180
Tabela 6 – Novos atributos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 181
Tabela 7 – Hierarquia de relacionamentos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 182
Tabela 8 – Novos relacionamentos (parte 1). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 183
Tabela 9 – Novos relacionamentos (parte 2) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 184
Tabela 10 – Novos relacionamentos (parte 3) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 185
Lista de abreviaturas e siglas

AACR Anglo-American Cataloguing Rules

AACR2 Anglo-American Cataloguing Rules, 2a Edição

BRAPCI Base de Dados em Ciência da Informação

BWW Bunge Wand Weber

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CI Ciência da Informação

CIDOC CRM CIDOC Conceptual Reference Model

CIDOC International Committee for Documentation

CMN Common Practice Music Notation

CRM CIDOC Conceptual Reference Model

EER Entidade-Relacionamento Estendido

ER Entidade-Relacionamento

ERM Modelagem Entidade-Relacionamento

FOL Lógica de Primeira Ordem

FRAD Functional Requirements for Authority Data

FRBR Functional Requirements for Bibliographic Records

FRBRer FRBR Entity-Relationship Model

FRBRoo FRBR Object-Oriented Model

FRSAD Functional Requirements for Subject Authority Data

IA Inteligência Artificial

ICOM International Council of Museums

IFLA International Federation of Library Associations and Institutions

IFLA LRM IFLA Library Reference Model


ISBD International Standard Bibliographic Description

ISO International Organization for Standardization

LC Library of Congress

LISA Library and Information Science Abstracts

LRM IFLA Library Reference Model

MARC Machine-Readable Cataloging

MEC Ministério da Educação

MIR Music Information Retrieval

MLA Music Library Association

MLT Multi-Level Conceptual Modelling Theory

MO Music Ontology

MPB Música Popular Brasileira

MPBI Música Popular Brasileira Instrumental

OC Organização do Conhecimento

OCLC Online Computer Library Center

ODCM Ontology-Driven Conceptual Modeling

OE Objetivo Específico

OEMI Obra, Expressão, Manifestação e Item

OI Organização da Informação

OO Orientado(a) a Objetos

OPAC Catálogo Online de Acesso Público

ORM Object-Role Modeling

OWL Web Ontology Language

RC Representação do Conhecimento

RDA Resource Description and Access

RDF Resource Description Framework


RI Representação da Informação

RISM Répertoire Internacional des Sources Musicales

RPM Rotações por Minuto

SOC Sistema de Organização do Conhecimento

TIC Tecnologias de Comunicação e Informação

UFO Unified Foundational Ontology

UML Unified Modeling Language

UNIMARC Universal MARC format

URI Uniform Resource Identifier


Sumário

INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

I PREPARAÇÃO DA PESQUISA 31

1 ELEMENTOS DE PESQUISA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
1.1 Problema de pesquisa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
1.2 Objetivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
1.3 Escopo do modelo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
1.4 Justificativa da pesquisa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
1.5 Metodologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

II REFERENCIAIS TEÓRICOS 45

2 MÚSICA POPULAR BRASILEIRA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47


2.1 Música . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
2.2 Informação musical . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
2.3 Música popular brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
2.3.1 Representações da informação musical popular brasileira . . . . . . . . . . 56
2.3.2 Características da informação musical popular brasileira . . . . . . . . . . . 57
2.3.3 Gêneros da música popular brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
2.3.4 Classificações da música popular brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66
2.3.5 Diretrizes para a organização da informação musical brasileira . . . . . . . 68

3 MODELAGEM CONCEITUAL E ONTOLOGIAS . . . . . . . . . . . 73


3.1 Organização e Representação do Conhecimento e da Informação . . 73
3.1.1 Sistemas de Organização do Conhecimento . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
3.1.2 Representação do Conhecimento para a Representação da Informação . . . 79
3.2 Modelagem Conceitual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80
3.3 Ontologias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
3.4 Unified Foundational Ontology (UFO) . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
3.4.1 UFO-A: Ontologia de Endurantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
3.5 Níveis de linguagem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
3.6 OntoUML . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96
4 MODELOS CONCEITUAIS DA BIBLIOTECONOMIA E MUSEO-
LOGIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
4.1 Família FRBR, incluindo IFLA LRM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
4.2 CIDOC CRM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
4.3 FRBRoo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115
4.4 Discussão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 120

5 APLICAÇÃO DE MODELOS CONCEITUAIS À REPRESENTA-


ÇÃO MUSICAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
5.1 FRBRização de catálogos musicais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
5.2 Variations . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128
5.3 DOREMUS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130
5.4 EthnoMuse . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134
5.5 Music Ontology . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 136
5.6 Discussão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 140

III RESULTADOS 145

6 UMA PROPOSTA DE MODELO CONCEITUAL PARA A REPRE-


SENTAÇÃO DA MÚSICA POPULAR BRASILEIRA . . . . . . . . . 147
6.1 Principais conceitos do modelo, da ideia à performance . . . . . . . 148
6.2 Concepção musical e autoria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 152
6.3 Meios de performance . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 155
6.4 Performance . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157
6.5 Gênero Musical . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159
6.6 Alinhamento com o modelo IFLA LRM . . . . . . . . . . . . . . . . . 166
6.7 Discussão sobre a experiência de uso da linguagem OntoUML . . . 168
6.8 Discussão sobre o modelo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 171

7 APLICAÇÃO DO MODELO IFLA LRM À MÚSICA POPULAR


BRASILEIRA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 175
7.1 Entidades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177
7.2 Atributos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 180
7.3 Relacionamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 181
7.4 Discussão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 186

CONSIDERAÇÕES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 191


REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 195

APÊNDICES 207

APÊNDICE A – DIAGRAMA ONTOUML – IDEIA E PRODUÇÃO


MUSICAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 209

APÊNDICE B – DIAGRAMA ONTOUML – GÊNERO MUSICAL . 211

ANEXOS 213

ANEXO A – ASPECTOS DEMOGRÁFICOS


DOS ENTREVISTADOS POR SILVA (2017) . . . . . 215
25

Introdução

A música acompanha a humanidade desde antes da agricultura e da escrita, exer-


cendo diferentes formatos e funções sociais. Todas as culturas do mundo possuem algo que
reconhecem e definem como música e que serve como uma espécie de trilha sonora para as
suas atividades cotidianas (ILARI, 2007). A música está arraigada nos indivíduos a ponto
de ser apropriada para dar significado às emoções, sentimentos e lembranças (LEVITIN,
2006).
Desde o final do século XIX, o Brasil desenvolveu uma das mais ricas e variadas
tradições de música popular na América Latina. A partir dos anos 1960, várias tendências
e gêneros brasileiros se tornaram parte integral do mercado internacional de world music,
influenciando os Estados Unidos, Portugal e outros países europeus, além de alguns países
Africanos (BÉHAGUE, 2018).
Na prática, a música popular brasileira se apresenta em várias expressões associ-
adas a diferentes classes sociais, regiões e períodos históricos. Essa música tem origem,
principalmente, em elementos europeus, africanos e indígenas, e no decorrer de sua evo-
lução sofreu influências estrangeiras como a do jazz, rock, alguns gêneros de black music
americana e da música caribenha. Conhecida e apreciada internacionalmente e objeto
de intenso estudo especializado no Brasil e no exterior, a música brasileira é uma das
expressões mais importantes da cultura nacional. A força da música na América Latina,
e, consequentemente, no Brasil, como instrumento de valorização do povo e da cultura
nacional é ressaltada por Ilari (2007, p. 42):

A compreensão da música enquanto competência e de nós latino-americanos


como povos dotados de inúmeras competências musicais, nos remove de
uma posição de “desvantagem” em relação aos outros países do mundo,
nos confere poder e nos coloca em grau de igualdade junto a eles.

Gêneros musicais emblemáticos da cultura brasileira, como o Samba e a Bossa Nova,


são consolidados durante o século XX, ao mesmo tempo que o Forró, o Baião e a Música
Sertaneja se fortalecem e atingem todo o território nacional. No início dos anos 1960, são
introduzidos temas políticos, pelas ditas “canções protesto” representantes do engajamento
político contra o regime militar. Compositores e intérpretes famosos da música brasileira
foram revelados, nessa mesma época, por meio dos grandes festivais de música transmitidos
pela TV. A partir dos anos 1950, surgem diversos gêneros e estilos musicais: Bossa Nova,
Jovem Guarda, Tropicália, Música Romântica, Rock Brasileiro, Pagode, Samba-Reggae,
Axé Music, dentre outros.
26 Introdução

A sigla MPB (Música Popular Brasileira), consolidada na década de 1970, é


considerada por Ulhôa (1997) um rótulo dado pela indústria musical para se referir a
um segmento de mercado e não representa toda música popular feita e consumida por
brasileiros, ou seja, música popular brasileira é muito mais que MPB2 .
De fato, a música popular brasileira comporta um repertório variado de estilos
musicais que possui forte conexão com a cultura local. Legitima-se, portanto, como
expressão que ganha caráter de tradição e promove registros subjetivos da organização
social vigente. Mais que em qualquer outra expressão cultural, é na música que se pode
vivenciar a presença das variadas vertentes étnicas que formam o Brasil, seja pelas letras
que falam do cotidiano ou pela origem dos sons e ritmos (variando das músicas regionais
às músicas nacionais que tocam nas rádios) que promove a agregação de pessoas em torno
de determinados estilos musicais.
Mesmo dentro de gêneros aparentemente inconciliáveis da música brasileira, é
possível perceber autores que captam simples expressões populares e sons que remetem às
origens culturais, às produções de saberes locais, valorizando tradições caipiras, regionais,
ao mesmo tempo em que buscam romper com padrões limitadores da criação (ALVES,
2011). Por isso, a música brasileira é vista, ao mesmo tempo, como patrimônio material
e imaterial. Patrimônio material enquanto registrada em documentos, a exemplo dos
manuscritos musicais, e imaterial uma vez que os documentos são registros que dão suporte
às práticas culturais intangíveis (COTTA, 2006).
Essa música, nas suas mais diversas representações, (i) proporciona o acesso à
expressão, ao rosto e à feição de quem fez e faz a fusão cultural brasileira, (ii) é elogiada
por sua qualidade no mundo todo, caracterizando-se como um dos expoentes da cultura
brasileira, e (iii) é a mais abrangente e popular forma de expressão cultural do povo
brasileiro.
As primeiras gravações de discos no Brasil datam do início do século XX, porém
apenas nos anos 1960 que começa a se estabelecer uma estrutura industrial que permitisse
a produção de massa. Mesmo assim, não havia ainda um mercado consumidor grande, que
só veio a se formar nos anos 1980, quando a população urbana atinge 70% da população
brasileira (ULHÔA, 1997). O aumento da produção musical cresce desde então, seguindo o
aumento da população e o desenvolvimento tecnológico, principalmente as mídias digitais,
a Internet, os arquivos MP3 e, mais recentemente, os serviços de streaming de áudio e
vídeo.
No ano de 2013 os novos serviços de streaming, pela primeira vez ultrapassaram em
percentagem de crescimento as vendas físicas e digitais por download no âmbito mundial,
2
Neste trabalho difere-se música popular brasileira de MPB. Entende-se MPB como um rótulo dado
pela indústria musical para se referir a um segmento de mercado, sendo a música popular brasileira
entendida em um sentido mais amplo, tal como descrita na seção 2.3.
Introdução 27

sinalizando uma nova era de rentabilidade na indústria da música com os primeiros sinais
positivos em mais de uma década (NAVES, 2014).
A música é uma das expressões artísticas que mais se beneficiam da evolução
tecnológica. Em outros tipos de expressão artística, como a pintura ou a escultura,
representações digitais podem ser utilizadas para estudar os trabalhos de um determinado
artista, porém nunca para substituir a interação direta com a obra original (ORIO, 2006).
Caminha-se para um estado de Música 3.0 firmado na evolução da Web 3.0 semân-
tica3 e nas novas formas de vivência digital da sociedade em rede (NAVES, 2014). Os
avanços das Tecnologias de Comunicação e Informação (TIC) promoveram melhorias tanto
na manipulação de músicas como na infraestrutura de conexão, possibilitando um maior
interesse do público por recuperação musical, em face dos recursos de softwares musicais e
de bases de conteúdos musicais digitais facilmente acessíveis pela Internet.
O fenômeno do Big Data, caracterizado por um grande volume de informações,
ocorre também com a música popular brasileira que é representada por artefatos (con-
vertidos ou nascidos digitais) que envolvem uma variedade de possibilidades, tais como
músicas impressas com partituras completas ou parciais, músicas em manuscritos feitos
em papel, registros sonoros em formatos variados, libretos ou textos de música impressa
ou manuscrita, coletâneas de arranjos em livros e songbooks e publicações em serviços de
streaming de áudio e vídeo.
Diante do rápido desenvolvimento tecnológico, da explosão informacional e das
mudanças culturais trazidas pelo amplo acesso à Internet, percebe-se uma preocupação
crescente dentro da comunidade da Biblioteconomia em repensar modelos, práticas e
padrões. Coyle (2013, p. 56) observa que “a cada minuto, uma quantidade incalculável
de novos recursos é adicionada à nossa cultura digital e nenhum destes está sob controle
bibliográfico das bibliotecas”. Gonzales (2014) atenta para o fato de que frequentemente o
primeiro lugar em que os usuários buscam informação é a Internet e alerta sobre o perigo
das bibliotecas não estarem adequadamente preparadas para atender às necessidades destes
usuários nos ambientes informacionais que atualmente frequentam.
Muitos pesquisadores acreditam que o Linked Data 4 pode ser uma possibilidade
de libertar as bibliotecas de seus silos informacionais. No mundo do Linked Data, os
relacionamentos entre os dados, não apenas entre os documentos nos quais estão contidos,
3
Web Semântica (Semantic Web ou Web de dados) é um termo cunhado por Berners-Lee, Hendler e
Lassila (2001) para se referir a uma Web de dados legíveis por máquinas. O termo é por vezes usado
como sinônimo de “Web 3.0”. Suportada por padrões mantidos pelo World Wide Web Consortium
(W3C), a Web Semântica é uma extensão da World Wide Web, que provê uma estrutura comum de
compartilhamento e reuso de dados entre aplicações, empresas e comunidades.
4
O Linked Data consiste em um método, ou melhores práticas, para a publicação de dados estruturados
na Web Semântica. Em seu artigo que dita as regras para publicação de Linked Data, Berners-Lee
(2006) comenta que a Web semântica não se trata apenas de publicar dados na Web, nela devem ser
estabelecidas ligações para que pessoas e máquinas possam explorar a Web de dados.
28 Introdução

se tornam explícitos e legíveis tanto por pessoas como por máquinas. Gonzales (2014)
defende que as bibliotecas devem aproveitar os conceitos subjacentes ao Linked Data para
publicar seus recursos na Web, onde poderão ser encontrados pelos usuários, e por sua
vez trazer esses usuários de volta à biblioteca, atraídos por recursos confiáveis e de alta
qualidade e, na visão de Alemu, Stevens, Ross e Chandler (2012), a ligação de dados
bibliográficos na Web permitiria aos usuários navegar facilmente entre bases bibliográficas
distintas e outros provedores de informação, tais como outras bibliotecas e mecanismos de
busca.
A publicação de qualquer conteúdo na Web Semântica requer a utilização de estru-
turas de vocabulário compartilhadas que dão sentido aos dados publicados, possibilitando
a integração entre bases de dados distintas (ANTONIOU; HARMELEN, 2008). Em geral,
essas estruturas são mais complexas que esquemas de metadados aplicáveis a um tipo de
recurso informacional, elas preveem a existência de diversos tipos de recursos, os possíveis
relacionamentos entre esses recursos e os metadados aplicáveis a cada um desses tipos.
A criação dessas estruturas pressupõe a existência de conceitualizações que interpretem
seus vocabulários. Muitas dessas estruturas são derivadas de modelos conceituais, tais
como o FRBR e o CIDOC CRM5 , nos quais se apoiam para uma maior formalização de
seus conceitos. De fato, a publicação de dados na Web Semântica, utilizando estruturas de
vocabulário derivadas de modelos conceituais adequados e bem estabelecidos, resulta em
maiores possibilidades de integração e reuso dos dados em razão de uma maior explicitação
da conceitualização subjacente e redução da ambiguidade na interpretação do vocabulário.
Pretende-se com este trabalho contribuir para um melhor entendimento da música
popular brasileira apresentando um modelo formal para representação desse domínio.
Música popular brasileira, neste trabalho, não se restringe aos objetos informacionais
que a registram na forma de áudio ou notação musical. Busca-se entender, portanto, a
música popular brasileira em um sentido amplo, que abrange aspectos do contexto cultural
em que se insere, de sua natureza, e de sua concepção, execução e gravação. Advoga-
se que um modelo conceitual formal é uma poderosa ferramenta para o entendimento,
comunicação e análise de um domínio do conhecimento, explicitando seus conceitos e
reduzindo a ambiguidade terminológica, e que a existência de um modelo conceitual formal
de representação da música popular brasileira pode apoiar a construção de sistemas que
melhor atendam às necessidades informacionais de usuários especialistas e a integração de
bases de dados bibliográficas e não bibliográficas que lidam com diferentes visões desse
domínio, incluindo a publicação e o intercâmbio de dados bibliográficos musicais na Web
Semântica.
5
Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia, respectivamente, estudados no Capítulo 4.
Introdução 29

Organização do documento
Este documento é estruturado nas três partes descritas a seguir, além da presente
introdução, considerações finais, referências bibliográficas, apêndices e anexos:

a) Parte I (Preparação da pesquisa): a primeira parte da dissertação, que consiste


no Capítulo 1 (Elementos de pesquisa), apresenta o problema de pesquisa,
os objetivos, o escopo do modelo conceitual, a justificativa e a metodologia
científica adotada no trabalho;
b) Parte II (Referenciais teóricos): a segunda parte do trabalho apresenta o refe-
rencial teórico, expondo os achados mais relevantes aos objetivos estabelecidos
no Capítulo 1. Essa parte é distribuída nos seguintes capítulos:

– Capítulo 2 (Música popular brasileira): com o objetivo de identificar as


características do domínio da música popular brasileira a ser representado,
discute-se inicialmente os conceitos de música e informação musical e delimita-
se o recorte de música popular brasileira analisado. Em seguida, é feita uma
análise das principais características dessa música sob diferentes aspectos.
O capítulo se encerra com um resumo das diretrizes para a organização
da informação musical brasileira (SILVA, 2017), que foram utilizadas como
insumo para a construção do modelo conceitual;
– Capítulo 3 (Modelagem conceitual e ontologias): esse capítulo se inicia com
uma revisão sobre os conceitos de organização e representação da informação,
organização e representação do conhecimento e sistemas de organização
do conhecimento. Discute-se como a representação do conhecimento pode
contribuir para a representação da informação. É apresentada, na sequência,
a disciplina de modelagem conceitual, e faz-se uma breve revisão sobre
ontologias e como elas se relacionam com a modelagem conceitual. Finalmente,
são apresentadas a ontologia de fundamentação UFO (Unified Foundational
Ontology)6 e a linguagem OntoUML7 , que embasam o modelo conceitual,
objeto desta dissertação;
– Capítulo 4 (Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia): são apre-
sentados nesse capítulo modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia.
Esses modelos são estudados por tratarem da modelagem de obras abstratas
fruto da criação intelectual ou artística e por servirem de base para a constru-
ção de outros modelos que tratam especificamente de representação musical.
O capítulo termina com uma discussão sobre os modelos apresentados; e
– Capítulo 5 (Aplicação de modelos conceituais à representação musical): nesse
capítulo são apresentadas iniciativas de representação musical suportadas
6
A Unified Foundational Ontology (UFO) é uma ontologia de fundamentação, apresentada na seção 3.4.
7
Linguagem diagramática baseada na ontologia de fundamentação UFO, apresentada na seção 3.6.
30 Introdução

por modelos conceituais. Todas as iniciativas estudadas são fundamentadas,


total ou parcialmente, ou se inspiram nos modelos conceituais estudados no
Capítulo 4. Ao final do capítulo, é feita uma discussão sobre as iniciativas
estudadas;

c) Parte III (Resultados): na terceira e última parte deste trabalho, são apresenta-
dos os resultados obtidos durante a pesquisa. Essa parte é dividida nos seguintes
capítulos:

– Capítulo 6 (Uma proposta de modelo conceitual para a representação da


música popular brasileira): o modelo conceitual construído durante esta
pesquisa é descrito nesse capítulo. Esse modelo é representado na forma
de diagramas OntoUML, nos quais são expostos os conceitos da música
popular brasileira posicionados nas categorias ontológicas da UFO. O modelo
é dividido em diferentes visões, de maneira a facilitar a compreensão do leitor;
e
– Capítulo 7 (Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira):
esse capítulo descreve um experimento de extensão do modelo bibliográfico
IFLA LRM para sua aplicação no domínio da música popular brasileira,
com base nos conceitos formalizados no modelo descrito no Capítulo 6. O
experimento é um exemplo de utilização do modelo do Capítulo 6 como
insumo para a especialização de modelos bibliográficos e também um exemplo
de extensão do modelo IFLA LRM.

O trabalho é complementado por dois apêndices e um anexo. Nos Apêndices A


e Apêndice B são disponibilizados dois diagramas do modelo conceitual proposto, com
visões integradas de vários diagramas explicados no Capítulo 6. Ambos os diagramas
estão divididos em várias folhas tamanho A4, que precisam ser unidas para propiciar uma
visão completa. O diagrama no Apêndice A mostra uma visão integrada da natureza
da ideia musical e da cadeia de produção musical, enquanto o diagrama no Apêndice B
apresenta uma visão integrada dos conceitos relacionados ao gênero musical. No Anexo A
são apresentados dados demográficos dos usuários especialistas entrevistados por Silva
(2017).
Parte I

Preparação da pesquisa
33

1 Elementos de pesquisa

1.1 Problema de pesquisa


Não obstante a importância da música brasileira, várias fontes de informação sobre
esse tipo de música carecem de estratégias voltadas para atender às diferentes necessidades
de informação e quase sempre adotam padrões de catalogação que impedem que esses
objetos musicais sejam identificados, selecionados e efetivamente localizados, tanto por
usuários leigos como por usuários especialistas. Esse fato foi constatado pelo experimento
descrito em Silva, Cruz, Alonso e Ferneda (2016) e Cruz, Silva e Alonso (2017) envolvendo
a busca em catálogos online de bibliotecas brasileiras pela música Garota de Ipanema de
Tom Jobim, uma das mais conhecidas no Brasil e no exterior. Em alguns casos, a música
não foi encontrada quando era parte de uma publicação de partituras ou faixa de um CD.
Em outros, quando encontrada, não havia informações do arranjador ou dos intérpretes
da gravação. Foi percebido que os vários registros musicais dessa obra eram incompletos
ou incompatíveis entre os diferentes acervos pesquisados, dificultando a interoperabilidade
entre as diferentes fontes.
Em sua tese, Silva (2017) apresenta vários problemas de iniciativas dedicadas ao
tratamento da informação musical brasileira, tais como: (i) falta de padronização de
metadados; (ii) utilização de um mesmo critério de organização independente da natureza
do recurso catalogado; (iii) falta de interoperabilidade com outras fontes de informação; e
(iv) uso de padrões internacionais que não contemplam os elementos da cultura brasileira.
Destacam-se dois fatores que podem contribuir para os problemas percebidos. O
primeiro se refere à formação das equipes responsáveis pela organização dos materiais
musicais, em geral são bibliotecários com pouco conhecimento musical ou são músicos
que desconhecem as técnicas de organização da informação (OI). O segundo consiste na
utilização de modelos de representação da informação ou padrões de metadados inadequados
para as características desse tipo de música.
Percebe-se que as iniciativas de organização da informação musical estudadas por
Silva (2017) priorizam a música de tradição ocidental europeia (i. e., a música dita erudita
ou clássica), dando pouca ou nenhuma atenção à música popular e ignorando aspectos
culturais. A autora faz um resumo das limitações dessas iniciativas, conforme identificadas
em sua pesquisa. Na área da Musicologia, bases de dados como a do RISM1 incluem apenas
documentos textuais, o que limita a preservação da música popular cujo registro é feito
primordialmente em gravações de áudio. Os modelos conceituais bibliográficos como o IFLA
1
Répertoire International des Sources Musicales. Disponível em http://www.rism.info
34 Capítulo 1. Elementos de pesquisa

LRM e o FRBRoo2 são genéricos quanto aos tipos de recurso bibliográfico, e quando são
dados exemplos relacionados à informação musical, estes são sempre feitos para a música
clássica. A aplicações desses modelos voltadas à informação musical3 também dão mais
ênfase à música clássica (inclusive os exemplos apresentados em sua documentação) além
de serem restritos quanto à contextualização cultural4 das obras catalogadas. Os padrões
de catalogação como o ISBD, AACR e RDA partem da perspectiva da tradição europeia
e apresentam restrições quanto aos relacionamentos trazidos pelos modelos conceituais.
Ontologias da Web Semântica, como a Music Ontology, lidam com música de uma forma
geral, sem se ocupar de questões culturais (SILVA, 2017, p. 256).
A aplicação de modelos conceituais de alto nível5 a um domínio específico exige
o conhecimento do modelo conceitual, do domínio e de como relacionar os conceitos do
domínio ao modelo conceitual. Por exemplo, o modelo IFLA LRM, de alto nível para
a informação bibliográfica, possui o conceito de obra, porém não possui o conceito de
composição musical. Sua aplicação ao domínio da música exige a identificação dos conceitos
do domínio específico e o entendimento de como estes se relacionam aos conceitos genéricos
do LRM (e. g., uma composição musical é uma obra). Um modelo conceitual de alto
nível por si só dificilmente atenderá às necessidades informacionais de usuários de um
domínio específico sem alguma adaptação, e essa adaptação requer o conhecimento dos
conceitos específicos do domínio a ser atendido. De certa maneira, a utilização de um
modelo conceitual de alto nível requer um trabalho de modelagem conceitual do domínio
específico.
Smiraglia (2001) e Coyle (2016) examinam a informação musical, distinguindo-a
da textual em vários aspectos. Uma obra musical deve primeiro existir no tempo para que
seja assimilada por uma audiência, o que torna a performance sua forma mais precisa de
instanciação. Seu registro escrito, na forma de alguma notação musical, é considerado uma
representação subjetivas do som. Cada performance é vista como uma (re)criação da obra
musical. Algumas performances são interpretações fiéis da música enquanto outras são
distorções criativas da original.
Diferentemente dos livros, ouve-se a mesma música várias vezes, e em diferentes
versões. As notas musicais são lembradas de forma diferente das palavras de um livro, mas
na maioria das vezes, a pergunta sobre o assunto tratado pela música fica sem resposta.
Entretanto, apesar das diferenças entre música e texto, a organização da informação musical,
2
Os modelos IFLA LRM e FRBRoo são discutidos no Capítulo 4 (Modelos conceituais da Biblioteconomia
e Museologia) desta dissertação.
3
Algumas dessas aplicações, tais como o DOREMUS e exemplos de FRBRização de catálogos musicais,
são estudadas no Capítulo 5 (Aplicação de modelos conceituais à representação musical).
4
Entende-se por contextualização cultural o estabelecimento de relações entre estas obras e informações
que as contextualizem dentro da cultura em que foram concebidas.
5
Entende-se por modelo conceitual de alto nível, um modelo que trabalha apenas com conceitos genéricos
abrangentes de um domínio mais amplo e abstrai detalhes de domínios específicos.
1.1. Problema de pesquisa 35

tradicionalmente, provém da adaptação de campos ou metadados criados primariamente


para atender aos documentos textuais (COYLE, 2016). Isso foi também constatado por Silva
(2017) ao estudar iniciativas dedicadas ao tratamento da informação musical brasileira.
Esse problema atinge especialmente a organização da música popular brasileira,
cujo registro é primordialmente feito em gravações de áudio, e cujas performances de uma
mesma obra são mais variadas do que no caso da música clássica.
Os músicos especialistas em música popular brasileira entrevistados por Silva (2017),
afirmam que mecanismos de busca na Web (e. g., Google6 ) e serviços de streaming de
áudio (e. g., Spotify7 e Deezer8 ) e vídeo (e. g., YouTube9 ), são suas principais fonte de
pesquisa musical, entretanto as informações encontradas são frequentemente incompletas
e por vezes incorretas. Tal como apontado por Gonzales (2014), o mesmo ocorre para os
usuários ao procurarem informação de uma forma geral.
O quadro exposto sugere que: (i) a música de tradição ocidental europeia tem sido
priorizada pelas iniciativas de organização da informação musical, em prejuízo da música
popular; (ii) características específicas da música popular brasileira são ignoradas por
essas iniciativas; (iii) a organização da informação musical prescinde da cooperação entre
músicos e profissionais da OI; (iv) os usuários de música não estão sendo bem atendidos
em razão da falta de material confiável e de qualidade na Internet.
Defende-se que a solução dos problemas levantados passa pela compreensão do
domínio da música popular, em especial da música popular brasileira, por parte dos
profissionais de organização da informação e da sistematização do conhecimento sobre o
objeto musical e seu contexto cultural. Defende-se também que modelos conceituais são
ferramentas que sistematizam e facilitam o entendimento, comunicação e análise de um
domínio do conhecimento. Identifica-se então como problema de pesquisa, a inexistência
de um modelo conceitual para o domínio da música popular brasileira10 .
6
https://www.google.com
7
https://www.spotify.com
8
https://www.deezer.com
9
https://www.youtube.com
10
A inexistência de um modelo conceitual similar foi constatada por meio da pesquisa bibliográfica
descrita na seção 1.4 (Justificativa da pesquisa).
36 Capítulo 1. Elementos de pesquisa

1.2 Objetivos
O objetivo geral desta pesquisa é propor um modelo conceitual para representação
formal da música popular brasileira.
Para alcançar esse objetivo geral, são previstos três objetivos específicos (OE):
OE1 – Identificar as características do domínio da música popular brasileira a ser
representado;
OE2 – Examinar iniciativas existentes de representação de música amparadas por
modelos conceituais; e
OE3 – Formalizar os principais conceitos e relacionamentos necessários à represen-
tação da música popular brasileira na forma de uma ontologia de domínio
descrita na linguagem OntoUML.

1.3 Escopo do modelo


Esta dissertação tomou por base o trabalho de Silva (2017), que propõe diretrizes
para a organização da informação musical brasileira. O Capítulo 2 (Música popular
brasileira) caracteriza o domínio do conhecimento a ser modelado, que corresponde ao
recorte da música brasileira popular, elaborada ou de produção restrita, foco das diretrizes
de Silva.

Os resultados dos levantamentos bibliográficos e das entrevistas demons-


traram as especificidades dessa informação apontando um recorte da
música brasileira com características peculiares à sua produção que en-
volve um processo de elaboração de arranjos para fins de registro gravado
(SILVA, 2017, p. vi).

A música brasileira enfatizada nesta pesquisa se enquadra na segunda fase do


nacionalismo no Brasil, aquela “deflagrada pelo movimento da Bossa Nova e radicalizada
pelos Tropicalistas na área da música popular” (ULHÔA, 1997, p. 6).
Entende se música popular brasileira em um sentido mais amplo, que abrange
aspectos do contexto cultural em que se insere, de sua natureza, e de sua concepção,
execução e gravação, não restrito aos objetos informacionais que a registram na forma de
áudio ou notação musical.
São considerados no modelo os aspectos da música popular brasileira relacionados
principalmente aos gêneros musicais, à natureza das obras musicais e situações do mundo
real nas quais essas obras são concebidas, executadas e gravadas ou registradas em forma
escrita.
1.4. Justificativa da pesquisa 37

Por não se tratar de um modelo bibliográfico, não são detalhados conceitos espe-
cíficos à catalogação descritiva de obras musicais, no entanto, é feito um alinhamento
semântico do modelo proposto com o modelo IFLA LRM para facilitar o uso de seus
conceitos em aplicações bibliográficas.

1.4 Justificativa da pesquisa


Este trabalho é fruto de uma investigação conduzida dentro do Grupo de Pesquisa
em Bibliotecas Digitais da Faculdade de Ciência da Informação da Universidade de Brasília
e faz parte de uma série de trabalhos relacionados à informação musical, em especial a
brasileira.
As obras são veículos de cultura, entidades que surgem de uma perspectiva cultural
específica. O papel cultural das obras musicais está no cerne de sua disseminação e
recepção, tornando crítica a sua compreensão para a recuperação da informação musical
(SMIRAGLIA, 2001).
A música brasileira, em particular a popular, é patrimônio cultural intimamente
relacionado com as raízes culturais do povo. Considerando a importância desse patrimô-
nio, Silva (2017) propõe diretrizes para a organização da informação musical brasileira,
respeitando sua natureza cultural específica.
Como apresentado na seção 1.1 (Problema de pesquisa), apesar da importância
da música brasileira, não se encontram estratégias voltadas para atender as diferentes
necessidades de informação desse tipo específico de música. Os padrões utilizados para
o tratamento da informação musical brasileira não contemplam os elementos da cultura
brasileira. Iniciativas de organização da informação musical têm priorizado a música de
tradição ocidental europeia, em prejuízo da música popular. Modelos bibliográficos são
neutros quanto ao tipo de recurso catalogado e genéricos em relação às informações de
assunto, e, por conseguinte, à contextualização cultural das obras.
Nesta pesquisa, pretende-se contribuir para a melhoria dessa situação, propondo
um modelo de representação formal para a música popular brasileira que considere seus
elementos culturais. Esse tipo de modelo facilita a comunicação e a análise do domínio,
explicitando seus conceitos e relacionamentos, contribuindo para a construção de sistemas de
organização e recuperação de informação, e para a elaboração de padrões de representação
da informação mais adequados.
A própria aplicação de modelos conceituais bibliográficos ou museológicos existentes
ao domínio da música popular brasileira poderá se beneficiar de um modelo de representação
como o proposto. A identificação prévia dos conceitos de maneira formal e não ambígua
no modelo de representação reduz o trabalho de extensão do modelo genérico, deixando ao
38 Capítulo 1. Elementos de pesquisa

profissional apenas a tarefa de relacionar esses conceitos aos conceitos do modelo genérico.
Silva (2017, p. 259) propõe, ao final de sua tese, alguns estudos futuros, dentre eles
a elaboração de “uma ontologia a partir das diretrizes traçadas e testá-la em um sistema
de recuperação de informação musical”, motivando a elaboração deste trabalho. O modelo
de representação aqui proposto tem a forma de uma ontologia de domínio, entretanto
não está no seu escopo testá-la no contexto de um sistema de recuperação de informação
musical. Sobre uma visão ontológica do domínio da música popular brasileira, Silva (2017,
p. 257-258) afirma que:

Acredita-se que a visão ontológica da informação [...] mudará a maneira


como os sistemas serão construídos como, por exemplo, atenuará a
perspectiva rígida das classificações, uma vez que ao considerar maior
granularidade, traz um agrupamento não pelas semelhanças (como as
classificações), mas pelas diferenças (como previsto por Bolhman, 2003).
Quer dizer que ao se fazer uma modelagem a partir da construção da
ontologia tendo em vista a arquitetura do objeto informacional, é possível
gerar maiores possibilidades de conjuntos de dados diferenciados para os
objetos. Parte-se do objeto e, na tentativa de descrevê-lo, considera-se
que todas as exceções não sejam mais representadas no campo de notas,
mas no esquema como um todo. Os agrupamentos de músicas poderão
ser feitos tendo em vista atender às necessidades diretas dos usuários, de
modo mais orgânico e aproximado da realidade desses usuários.

Defende-se que a organização da informação (OI) prescinde do conhecimento da


estrutura do domínio a ser organizado, e que as especificidades de diferentes domínios
exigem a utilização de estratégias de OI distintas. A simples aplicação de técnicas de
organização de documentos textuais não seria ideal para a organização de documentos
musicais, e, provavelmente, estratégias genéricas de organização de documentos musicais
não sejam ideais, ou completas, para a organização de música brasileira. Através da
construção de um modelo conceitual que explicite os conceitos e relacionamentos entre
conceitos do domínio abordado é possível o desenvolvimento de modelos de dados e
sistemas de recuperação da informação mais adequados, permitindo a elaboração de
consultas complexas e a descoberta de recursos através da navegação.
O modelo proposto neste trabalho tem a forma de uma ontologia de domínio
descrita em uma linguagem ontológica (GUIZZARDI, 2007). O termo modelo é utilizado
por Guizzardi para se referir a uma abstração do domínio em termos de uma linguagem
de representação. Abstrações são entidades imateriais, que precisam ser representadas
em termos de um artefato concreto para que possam ser documentadas, comunicadas e
analisadas. Isso implica na necessidade de uma linguagem para representá-las de forma
concisa, completa e não ambígua.
Os modelos conceituais propostos pela Biblioteconomia e Museologia e as ontologias
da Web Semântica são representados em linguagens classificadas por Guarino (2009) como
1.4. Justificativa da pesquisa 39

pertencentes ao nível epistemológico. Linguagens epistemológicas, como UML11 , ER12 ,


EER13 e OWL14 , são computacionalmente eficientes, porém carecem de expressividade
quando comparadas a linguagens ontológicas. Buscando uma maior expressividade e
claridade conceitual, foi escolhida a linguagem OntoUML para a representação do modelo
apresentado, uma linguagem ontológica, suportada pela ontologia de fundamentação UFO15
(Unified Foundational Ontology).
Optou-se pela modelagem conceitual baseada em ontologias (ODCM16 ) porque o
uso dessa abordagem restringe a interpretação dos conceitos a categorias ontológicas17 ,
o que proporciona uma especificação mais precisa desses conceitos. Como ontologia de
suporte, foi escolhida a ontologia de fundamentação UFO, que provê categorias ontológicas
universais. Verdonck e Gailly (2016) comparam a evolução do uso das ontologias mais
aplicadas em ODCM: Bunge Wand Weber (BWW) e UFO. Esse estudo constata que
a ontologia BWW foi muito popular entre 2005 e 2009, entretanto, desde a introdução
da UFO em 2005, o uso dessa ontologia por pesquisadores que utilizam ODCM tem
aumentado significativamente, revelando que vários usuários de BWW migraram para a
UFO entre os anos 2010 e 2015.
A linguagem OntoUML é, por excelência, a linguagem de modelagem conceitual
mais adequada à modelagem baseada na UFO. Por ter sido especialmente projetada
para a atividade de ODCM suportada pela UFO, suas primitivas de modelagem refletem
a axiomatização da UFO, restringindo os modelos gramaticalmente válidos a situações
admissíveis segundo a teoria dessa ontologia de fundamentação. Decidiu-se utilizar a
OntoUML 2.0 introduzida por Guizzardi et al. (2018), fundamentada na teoria revisada
de tipos endurantes e estruturas taxonômicas da UFO, dado que essa nova versão facilita
a atividade de modelagem em razão da simplificação axiomática decorrente da revisão da
UFO.
A presente proposta difere-se dos modelos conceituais e iniciativas de representação
musical estudados nos capítulos 4 e 5, principalmente, por ser independente de aplicação18 ,
pela especificidade do domínio tratado19 e pela utilização de uma abordagem de modelagem
11
Unified Modeling Language (OBJECT MANAGEMENT GROUP, 2005).
12
Modelo Entidade-Relacionamento (Entity-Relationship) (CHEN, 1976).
13
Modelo Entidade-Relacionamento Estendido (Enhanced Entity–Relationship) (ELMASRI; NAVATHE,
2011, p. 245-284).
14
Web Ontology Language (ANTONIOU; HARMELEN, 2008, p. 113-156).
15
No Capítulo 3 (Modelagem conceitual e ontologias) são apresentados os níveis de linguagem de
modelagem conceitual, a UFO e a linguagem OntoUML.
16
Acrônimo de Ontology-Driven Conceptual Modeling.
17
Na seção 3.4 (Unified Foundational Ontology (UFO)) são estudadas as categorias ontológicas utilizadas
neste trabalho.
18
O modelo de representação proposto tem como objetivo primário a comunicação e a análise do domínio
entre pessoas, sem viés de utilização em sistemas específicos da Biblioteconomia, Museologia ou outra
área do conhecimento.
19
O modelo de representação proposto trata especificamente de música popular brasileira.
40 Capítulo 1. Elementos de pesquisa

conceitual baseada em ontologias20 .


Pretende-se que o modelo conceitual proposto possa contribuir para a comunicação
e a análise do domínio da música popular brasileira respeitando a cultura e as tradições do
País. Outros possíveis usos podem incluir: (i) a avaliação da adequabilidade de iniciativas
de organização da informação musical a este domínio; (ii) suportar o desenvolvimento de
ontologias de aplicação, modelos de representação da informação e perfis de metadados;
(iii) servir de conceitualização compartilhada para a integração semântica de fontes de
dados heterogêneas; (iv) apoio à pesquisa e ao ensino de música popular brasileira; e (v)
divulgação da abordagem de modelagem conceitual baseada em ontologia de fundamentação
nas áreas de organização e representação da informação e do conhecimento.
É proposta a construção de um modelo conceitual para a música popular brasileira
e não para o domínio mais amplo da música popular em razão de sua motivação ter surgido
a partir da identificação de deficiências no tratamento desse tipo de música em bases
bibliográficas nacionais e internacionais, além de partir de uma pesquisa da literatura
sobre música popular brasileira e da opinião de especialistas nessa música. O olhar sobre a
música popular brasileira sugere que os resultados obtidos sejam válidos para este domínio,
e não necessariamente válidos para toda música popular. A avaliação da adequabilidade
do modelo a outros tipos de música poderá ser objeto de trabalhos futuros.
Outra contribuição deste trabalho é a inovação na utilização da segunda versão da
linguagem de modelagem conceitual OntoUML, podendo servir de exemplo de uso dessa
nova versão da linguagem.
Intenciona-se, também, contribuir com a divulgação da disciplina de modelagem
conceitual, aproximando-a da organização da informação e da organização do conhecimento.
Pesquisas feitas em bases de dados científicas nacionais e internacionais sugerem a
inexistência de trabalho similar que proponha um modelo conceitual para representação
de música brasileira.
Foram realizadas pesquisas no idioma português, nas quais foram utilizadas combi-
nações da palavra “música” (e sua variação “musical”) com as palavras “modelo conceitual”,
“modelagem conceitual”, “representação” e “ontologia”, com os seguintes resultados:

a) Pesquisas na Base de Dados Referenciais de Artigos de Periódicos em Ciência


da Informação21,22 (BRAPCI). Pesquisa efetuada em todos os campos, incluindo
título, palavras-chave, resumo e referências:
20
Abordagem baseada na ontologia de fundamentação UFO, proposta por Guizzardi (2005).
21
Base de dados de periódicos em Ciência da Informação publicados no Brasil desde 1972, cujo objetivo é
subsidiar estudos e propostas na área de Ciência da Informação, disponível em http://www.brapci.inf.br,
acesso de 17.mai.2018.
22
A BRAPCI traz resultados que apresentam todas as palavras da pesquisa (i. e., utiliza o operador
booleano “E”) e considera apenas o início das palavras (e. g., uma pesquisa por “model musica” traz
também os resultados da pesquisa por “modelagem musical”)
1.4. Justificativa da pesquisa 41

– a pesquisa por “musica model conceitual” retornou apenas 1 resultado;


– a pesquisa por “musica representacao” retornou 12 registros; e
– a pesquisa por “musica ontologia” trouxe 1 registro.

b) Pesquisas no Portal de Periódicos da CAPES/MEC23,24 . Buscas por assunto,


com filtro pelo idioma português e tópico “Library & Information Science”:

– a pesquisa por ‘musica* AND (“modelo conceitual” OR “modelagem concei-


tual” OR representacao OR ontologia*)’ retornou 22 registros.

As pesquisas resultaram em um total de 33 documentos trabalhos diferentes.


Dentre esses, 26 tratavam de temática distinta ou de representação do conhecimento ou da
informação de uma maneira geral. Entre os sete trabalhos restantes foram encontrados: a
proposta de um modelo para mapeamento de necessidades de usos de informação musical;
um levantamento bibliográfico internacional sobre ontologias musicais; duas propostas
de metadados para representação da informação musical; dois estudos de iniciativas de
organização da informação musical; e um estudo sobre a contribuição da análise semiótica
da informação musical para a organização do conhecimento.
Foram também feitas pesquisas no idioma inglês em duas bases de dados inter-
nacionais combinando-se a palavra “music” (e sua variação “musical”) com “brazil” (e
sua variação “brazilian”) com as palavras “conceptual model”, “conceptual modeling”,
“representation” e “ontology”. Seguem os resultados:

a) Pesquisas no Library & Information Science Abstracts (LISA)25,26 . Busca no


título, resumo e palavras-chave:

– a pesquisa “AB,TI,IF (music* AND brazil* AND conceptual* AND model*)”


não retornou resultados;
– a pesquisa “AB,TI,IF (music* AND brazil* AND representation)” retornou
apenas 1 resultado; e
– a pesquisa “AB,TI,IF (music* AND brazil* AND ontolog*)” também não
retornou resultados.
23
http://www.periodicos.capes.gov.br
24
A pesquisa por prefixo no portal da CAPES exige a utilização do caractere ‘*’ no final da palavra.
As palavras podem ser agrupadas entre aspas para pesquisas exatas (e. g., “modelo conceitual”, que
considera as duas palavras exatas em sequência) e combinadas utilizando os operadores booleanos
AND e OR.
25
O Library & Information Science Abstracts (LISA) é uma ferramenta internacional de indexação
projetada para profissionais de Biblioteconomia e outros especialistas em informação. Acesso realizado
através do Portal de Periódicos da CAPES.
26
A pesquisa na LISA foi feita com uma expressão que restringe os campos pesquisados e utiliza o
caractere ‘*’ para indicar prefixo.
42 Capítulo 1. Elementos de pesquisa

b) Pesquisas na Scopus27,28 . Busca no título, resumo e palavras-chave:

– a pesquisa “TITLE-ABS-KEY (music* AND brazil* AND conceptual* AND


model*)” retornou 2 resultados;
– a pesquisa “TITLE-ABS-KEY (music* AND brazil* AND representation)”
limitando pelas áreas “Social Sciences” e “Computer Science” retornou 35
resultados; e
– a pesquisa “TITLE-ABS-KEY (music* AND brazil* AND ontolog*)” retornou
5 resultados.

Combinados, os resultados em inglês somaram 41 trabalhos após a exclusão dos


repetidos. Nenhum dos resultados tratava de representação de música brasileira. Os resul-
tados encontrados nas bases de dados nacionais e internacionais sugeriram a inexistência
de trabalhos similares.
27
De acordo com o próprio sítio Web da base de dados, o Scopus é a maior base de dados de resumos e
citações de literatura revisada por pares: periódicos científicos, livros e anais de conferências. Acesso
realizado através do Portal de Periódicos da CAPES.
28
A pesquisa na Scopus foi feita com uma expressão que restringe os campos pesquisados e utiliza o
caractere ‘*’ para indicar prefixo.
1.5. Metodologia 43

1.5 Metodologia
Esta pesquisa segue uma abordagem qualitativa e pode ser classificada com base
em seus objetivos como exploratória. Para Gil (2002, p. 41) uma pesquisa exploratória
visa “proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais
explícito” e tem como principal objetivo o aprimoramento de ideias. A construção de um
modelo conceitual para a representação da música popular brasileira explicita os conceitos
deste domínio e consequentemente contribui para uma melhor identificação dos requisitos
necessários a qualquer aplicação que venha a lidar com esse tipo de música.
O campo de investigação é transdisciplinar, envolvendo pelo menos três grandes
áreas do conhecimento: Ciência da Informação, Música e Ciência da Computação. Bicalho
e Borges (2015) defendem o uso da abordagem transdisciplinar pela CI como forma de
melhor trabalhar seu objeto de pesquisa, com metodologias que se adéquam à sua natureza
interdisciplinar e à sua necessidade de novos procedimentos de pesquisa, que vão além das
abordagens tradicionais da ciência. Para Litto (2000, p. 7), a visão transdisciplinar tem
demonstrado “sua validade e sua importância no processo de levar quem estuda qualquer
assunto a conseguir maior profundidade na sua compreensão do assunto”.
A modelagem conceitual e a engenharia de ontologias foram utilizadas como base
teórica para a construção do modelo, enquanto a base empírica é concentrada no recorte
da música popular brasileira cujas características são discutidas no Capítulo 2 (Música
popular brasileira).
O procedimento técnico adotado na Parte II (Referenciais teóricos) é o levantamento
bibliográfico exploratório, elaborado a partir de material já publicado, constituído de livros,
artigos de periódicos, de revistas e de anais de eventos, dissertações e teses além de padrões
e especificações técnicas relacionados aos temas pesquisados.
A identificação das características do domínio da música popular brasileira a ser
representado, objeto do OE1 , foi feita primordialmente a partir do trabalho realizado
por Silva (2017), recorrendo-se ocasionalmente a textos complementares. Por esse motivo,
no decorrer da dissertação aparecem diversas referências aos músicos entrevistados na
pesquisa de Silva. Evita-se repetir em excesso referências a essa pesquisa. Em função
disso, todas as menções sem referência bibliográfica aos “músicos entrevistados”, “especi-
alistas entrevistados”, ou simplesmente aos “entrevistados”, dizem respeito aos músicos
entrevistados por Silva.
O OE2 prevê o exame de iniciativas existentes de representação de música suportadas
por modelos conceituais. Foram selecionados para esse fim o DOREMUS, o EthnoMuse,
a Music Ontology, além de outras iniciativas baseadas ou inspiradas no modelo FRBR.
Todas as iniciativas estudadas são fundamentadas, total ou parcialmente, ou se inspiram
em modelos conceituais da Biblioteconomia e da Museologia (i. e., modelos da família
44 Capítulo 1. Elementos de pesquisa

FRBR, CIDOC CRM e FRBRoo), exigindo o estudo desses modelos. O estudo de modelos
de representação da criação intelectual e de outras iniciativas de representação musical
foi feito com o objetivo de enriquecer o modelo proposto por meio do contraste entre as
diferentes visões e pela identificação de conceitos comuns.
Foi feito também um estudo sobre modelagem conceitual com base em ontologia
de fundamentação, mais especificamente a Unified Foundational Ontology (UFO) e a
linguagem OntoUML, para embasar a construção do modelo prevista no OE3 .
Para a construção do modelo partiu-se das características da música popular
brasileira descritas no Capítulo 2 (Música popular brasileira). Foram identificados e
definidos os conceitos relacionados aos gêneros musicais e à cadeia produtiva das obras
musicais, buscando seus posicionamentos dentro das categorias da UFO e incorporando-os
a diagramas OntoUML.
Parte II

Referenciais teóricos
47

2 Música popular brasileira

Esta seção é dedicada à descrição do domínio da música popular brasileira tratado


nesta pesquisa. Discorre-se inicialmente sobre a música como um evento amplo e sobre a
informação musical para, em seguida, serem identificadas as características do domínio da
música popular brasileira a ser representado.

2.1 Música
Diferentes sociedades, subculturas, períodos históricos e músicos podem ter ideias
bem diferentes sobre o que constitui a música e sobre sua essência, características, signifi-
cância, função e significado. O conceito de música é algo sempre aberto a questionamento.
Sobre a (in)definição do conceito Bohlman (2010, p. 17) escreveu:

Música pode ser o que pensamos que ela é, ou pode não ser. Música
pode ser sentimento ou sensualidade, mas pode não ter nada a ver com
emoções ou sensações físicas. Música pode ser aquilo para alguém dançar,
rezar ou fazer amor, mas não é necessariamente isso.

O aspecto cultural é determinante em como uma sociedade entende esse conceito.


De acordo com Nettl (2014), existem ao menos três abordagens para determinar as
definições de uma sociedade para os seus componentes culturais: (i) buscar declarações
de autoridades amplamente reconhecidas, tais como dicionários, livros de referência, e
talvez textos sagrados ou sábios anciões (em sociedades menores); (ii) perguntar para os
membros de uma população; e (iii) construir formulações do sistema de ideias sobre um
conceito ou mesmo uma palavra por meio da observação de comportamentos relevantes.
A partir de definições em dicionários na língua inglesa e em outras linguagens
europeias, Nettl (2014) conclui que, em sua maioria, as definições da palavra música se
dividem em duas categorias: (i) definições que salientam características da música, porém
utilizam como modelo a música ocidental na tradição das belas artes, vendo a música
principalmente como uma série de sons e um grupo de composições, e a atividade musical
consistindo principalmente da composição, expressa como uma combinação de sons; ou
(ii) a própria definição da palavra “música” é dada como já conhecida, e a definição é feita
em termos de explicações, etimologia e classificação.
Seguem alguns trechos de definições encontradas em Nettl (2014):

a) Oxford English Dictionary: Uma das belas artes que se interessa pela combinação
de sons com uma visão de beleza de forma e de experiência emocional ou a
48 Capítulo 2. Música popular brasileira

ciência das leis ou princípios (da melodia, harmonia, ritmo, etc.) pela qual essa
arte é regulada;
b) Webster’s Third International Dictionary (Nova York, 1981): Ciência ou arte
de incorporar combinações prazerosas, expressivas ou inteligíveis de sons vocais
ou instrumentais em uma composição com estrutura definida e continuidade;
c) Brockhaus-Wallring deutsches Wörterbuch (Wiesbaden, 1982): A arte de combi-
nar sons em uma forma esteticamente satisfatória em sucessão e simultanea-
mente, organizando-os ritmicamente e os integrando em uma obra completa;
d) Grande dizionario della lingua italiana (ed. S. Battaglia, Turim, 1981): A arte
de combinar sons e coordená-los no tempo e espaço, produzidos por meio da
voz ou por instrumentos e organizados de várias maneiras de acordo com sua
altura, duração, intensidade e timbre. Ciência do som subdividida em melodia,
harmonia e ritmo;
e) Littré’s Dictionnaire de la language française (Paris, 1873): Ciência de usar
sons derivados racionalmente, ou seja, aqueles baseados em escalas.

Considerando que os principais dicionários refletem as crenças sobre a linguagem


geralmente utilizada e seus usos comuns, para a população letrada da Europa Ocidental,
a palavra “música”: (i) se refere primeiramente à composição; (ii) é arte e ciência; (iii)
envolve a combinação satisfatória de seus componentes (principalmente a melodia); e (iv)
tem como objetivo ser bonita, expressiva ou (não necessariamente) inteligível. As definições
sugerem que a música possui funções estéticas e de comunicação. A combinação de notas
musicais1 é a principal função do artista musical (NETTL, 2014).
No Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (HOUAISS, 2004) foram encontradas
as seguintes definições da palavra “música”: (i) combinação harmoniosa e expressiva de
sons; (ii) a arte de se exprimir por meio de sons, seguindo regras variáveis conforme a
época, a civilização etc.; (iii) interpretação de obra musical; (iv) acompanhamento musical;
e (v) sons vocais, instrumentais ou mecânicos com ritmo, harmonia e melodia.
De acordo com Cruz (2008, p. 12-13), a música é essencialmente formada por uma
combinação de tempo e som. O som é a sensação produzida pelas vibrações de corpos
elásticos no ouvido. Essa vibração põe em movimento o ar na forma de ondas sonoras que
se propagam em todas as direções simultaneamente. As ondas que atingem a membrana
do tímpano fazem-na vibrar e essas vibrações, transformadas em impulsos nervosos, são
transmitidas ao cérebro que as identifica como tipos diferentes de sons. Portanto, o som só
é decodificado no cérebro.
A vibração regular produz sons de altura definida entendidos como sons ou notas
musicais. Por outro lado, a vibração irregular produz sons de altura indefinida, os quais são
1
Nettl usou o termo tone no idioma inglês, se referindo a um som, de uma altura específica.
2.1. Música 49

identificados como ruído. A Música utiliza tanto os sons regulares como os sons irregulares.
Do ponto de vista da Física, Med (1996, p. 11-12) relaciona as seguintes caracterís-
ticas da música decorrentes das propriedades acústicas do som:

a) Altura ou pitch 2 : Propriedade física do som intimamente relacionada à frequência


das vibrações das ondas associadas ao som caracterizando a sua tonalidade.
Pode-se inferir, portanto, que quanto maior a frequência do som, maior será o
pitch e mais agudo será o som. Em contraposição, quanto menor for o pitch,
mais grave é o som. No entanto, pesquisas recentes apontam para uma revisão
dessa definição como algo que está associado a outras dimensões;
b) Duração: Extensão de um som, caracterizada pelo tempo de emissão das vibra-
ções sonoras;
c) Intensidade: Amplitude das ondas ou harmônicos que compõem o som. É
determinada pela força ou pelo volume do agente que as produz; e
d) Timbre: Identidade sonora de uma voz ou instrumento musical e que permite
identificar um violão ou uma flauta. Um timbre também pode ser determinado
pelo número e intensidade relativa dos harmônicos que o compõe.

Cruz (2008, p. 14-15) analisa a música sob o ponto de vista de três dimensões
estruturais: o ritmo, a melodia e a harmonia.
O ritmo é a dimensão que se relaciona mais diretamente com o tempo (ou duração)
e com a intensidade (propriedade do som). Ritmo, neste sentido, são os sons e silêncios
que se sucedem temporalmente, cada um deles com uma duração e uma intensidade3 .
A percepção do ritmo ocorre pelo contraste entre som e silêncio, podendo ser periódico
(obedecer a uma pulsação definida ou uma estrutura métrica) ou não. Pode ser visto
também como a ordem e proporção em que estão dispostos os sons que constituem a
melodia e a harmonia.
A melodia é uma sucessão de sons de alturas distintas e não tocados ao mesmo
tempo ao longo do tempo. Por outro lado, as melodias também são caracterizadas pela
duração e intensidade dos sons emitidos e eventuais pausas entre os sons. Percebe-se,
portanto, também na melodia, a existência de uma dimensão temporal relacionada à
duração das notas e às pausas, o que deixa evidente a impossibilidade de desassociação
das estruturas melódica e rítmica da música na experiência musical.
2
O termo pitch é traduzido como “altura” nos livros de teoria musical em língua brasileira.
3
A intensidade no ritmo é o que possibilita reconhecer um determinado gênero musical, é o swing da
música, o modo como deve ser interpretado. Para Silva (2017), swing é a maneira de interpretar um
determinado estilo mais próximo do seu original (região ou grupo que executa aquele estilo dento
de sua cultura), o que inclui as acentuações. É quando a performance pode ser reconhecida como
pertencente a determinado estilo por um ouvinte com algum grau de qualificação para aquele estilo.
50 Capítulo 2. Música popular brasileira

A harmonia é a dimensão que apresenta um conjunto de sons dispostos em ordem


e simultaneamente. Temporalmente é a execução simultânea de vários ritmos e melodias
que se sobrepõem e se misturam para compor um som muito mais complexo, como
se cada melodia fosse uma camada e a harmonia fosse a sobreposição de todas essas
camadas. Uma harmonia é considerada consonante se o resultado harmônico é agradável ao
ouvido e dissonante se o som não é tão agradável, entretanto essa classificação é subjetiva
por depender da percepção do ouvinte e da estética musical vigente. A harmonia é
caracterizada pela música polifônica, quando duas ou mais linhas melódicas são executadas
simultaneamente, em contraste com a música monofônica, constituída por uma única linha
melódica.
Bennett (1986) classifica a música, quanto à sua textura, em:

a) monofônica: constituída por uma única linha melódica, destituída de qualquer


espécie de harmonia;
b) polifônica: duas ou mais linhas melódicas entretecidas ao mesmo tempo (às
vezes, também chamada contrapontística); ou
c) homofônica: uma única linha melódica é ouvida contra um acompanhamento de
acordes. Basicamente, é uma música com um mesmo ritmo em todas as vozes.

As dimensões estruturais em geral não estão presentes igualmente em todas as


músicas. Diferentes estilos musicais são identificados pela predominância de uma dimensão
estrutural mais do que outra. Por exemplo, o ritmo bem marcado e fortemente periódico
tem a primazia na música tradicional dos povos africanos, enquanto que em algumas
culturas orientais, bem como na música tradicional e popular do Ocidente, é a melodia que
representa o valor mais destacado. A harmonia, por sua vez, é mais presente na música
erudita ocidental.

2.2 Informação musical


Na literatura específica de Ciência da Informação, uma das primeiras iniciativas de
conceituar a música foi feita por Mclane (1996). O autor discute problemas que envolvem
a representação e recuperação da informação contidas nos documentos musicais e examina
os aspectos básicos e significativos da música – sua notação e seus sons. O texto, registro
escrito da música, e o áudio, resultado de uma performance musical, são os aspectos básicos
da informação musical.
Smiraglia (2001) define as obras musicais como entidades para recuperação da
informação. Uma obra musical é vista existencialmente como um conceito abstrato no
tempo em vez de uma entidade física no espaço. Partituras, performances (e gravações)
representam instâncias da obra, e nenhuma delas pode ser totalmente igualada à própria
2.2. Informação musical 51

obra. Para este autor, a variabilidade no tempo é um aspecto inato do conjunto de todas
as instanciações de uma obra musical, trazendo complexidade ao domínio da recuperação
da informação.

Uma obra musical é uma concepção intelectual sonora. Obras musicais


tomam forma documental em uma variedade de instanciações (i. e., o
seu som como em uma performance ou sua representação impressa como
em uma partitura). (SMIRAGLIA, 2001, p. 3)

No entendimento de Smiraglia (2001), Smiraglia (2002) e Mclane (1996), a instancia-


ção mais precisa de uma obra musical é provavelmente sua performance. Cada performance
é uma recriação da obra. Uma performance é uma obra musical, e por extensão, uma
gravação delineada pelo fator tempo de sua execução para uma audiência que a recebeu.
De acordo com Mclane (1996), a música, enquanto arte temporal, enfrenta o
problema de deixar de existir quando a sua performance é concluída. Torna-se, portanto,
necessário providenciar instruções para suas futuras recriações que, na sociedade letrada,
tem historicamente tomado a forma de registros escritos. Uma linguagem artificial é,
portanto, necessária para a transmissão na forma escrita das características dos sons com
suas relações no tempo.
A Common Practice Music Notation (CMN)4 é a notação musical mais conhecida
na literatura internacional. Mclane (1996) cita as seguintes características da CMN:

a) padronizada para os músicos;


b) serve para o compositor instruir e orientar a execução da sua obra musical;
c) concebida para servir de registro ou para prescrever/descrever as ações tomadas
pelos músicos a fim de produzir sons;
d) não foi criada para ser um relato completo de tudo que foi ouvido em uma
performance musical;
e) sua principal limitação é a ausência de qualquer notação para as qualidades dos
sons (o timbre) ou de instruções verbais colocadas diretamente na partitura;
f) possui algumas exceções para alguns instrumentos musicais que têm notações
próprias (tablaturas) que proveem uma exibição visual única para seu método
de produzir notas e não fazem sentido para outros instrumentos;
g) sua elaboração algumas vezes não é feita por compositores para fins de execução
musical, mas por transcritores como um meio de preservar a música que foi
executada; e
h) tem características que a tornam tanto um documento gráfico como um texto,
pois possui características icônicas que também são simbólicas.
4
A CMN também é chamada de notação tradicional ou notação padrão.
52 Capítulo 2. Música popular brasileira

Desde o final do século XIX, o conceito de preservação musical adquiriu outras


dimensões advindas das tecnologias da gravação do som, tais como a armazenagem da
partitura e da performance gravada e a possibilidade da produção eletrônica da música.
Além das representações musicais na forma de áudio e de notação musical, Byrd e
Crawford (2002) propõem a notação baseada em eventos temporais. Esse tipo de notação
contém instruções compreensíveis por sintetizadores para produção artificial de sons
relativos ao objeto musical.
Três visões de uma obra musical são consideradas por Mclane (1996) para o efeito
de representação: subjetiva; objetiva; e interpretativa.
A visão subjetiva é realizada por meio da notação musical, que é baseada na ideia
de alguém sobre a obra. Essa visão perde a estrutura acústica mais completa da obra e
exige que o usuário tenha um conhecimento básico de leitura musical.
A visão por meio do registro audível é considerada objetiva. O contato direto do
usuário com o áudio permite a exploração das características timbrísticas de um trabalho
musical e uma identificação mais exata das instruções para a performance relacionadas à
qualidade dos sons. Essa visão não exige uma especialização do usuário.
Uma visão interpretativa junta as visões subjetiva e objetiva oferecendo uma
análise musical que identifica os elementos de uma obra com sua estrutura e significado.
Produz representações extraídas de elementos não contínuos da obra, em oposição às
visões anteriores que representam a obra apenas de forma linear. A visão interpretativa
requer grande expertise do usuário e permite classificar a obra musical de acordo com sua
organização estrutural.
Downie (2003), ao analisar o domínio da recuperação da informação musical,
identifica sete facetas desse tipo de informação. O autor afirma que, devido às dificuldades
relacionadas à representação da informação musical, sua análise não pode ser considerada
uma análise facetada no senso estrito considerando que essas facetas não são mutuamente
exclusivas. As sete facetas são as seguintes:

a) Altura ou pitch: é a qualidade percebida de um som em função de sua frequência


fundamental em um número de oscilações por segundo. O quão agudo ou grave
é o som. É representado graficamente pela posição vertical das notas musicais
em uma partitura. A diferença entre duas ’alturas’ (ou pitches) é chamada de
intervalo. A noção de tonalidade é considerada uma sub-faceta da altura. As
melodias podem ser consideradas conjuntos de ’alturas’ ou intervalos percebidos
ordenados sequencialmente no tempo;
b) Temporal: informação relacionada à duração dos eventos musicais. Inclui a
indicação de tempo, métrica, duração da altura, duração harmônica e acentos.
Esses cinco elementos formam o componente rítmico da obra musical. As pausas
2.2. Informação musical 53

podem ser consideradas também indicadores da duração dos eventos musicais


que não contém informação de altura;
c) Harmônica: uma simultaneidade ou harmonia ocorre quando duas ou mais
alturas soam ao mesmo tempo. Isso caracteriza a polifonia, em contraste com a
monofonia, que ocorre quando somente uma altura soa no tempo. A interação
entre as facetas altura e temporal para criar a polifonia é uma característica
central da música ocidental. A harmonia é representada por várias alturas que
se alinham verticalmente em uma partitura;
d) Timbre: compreende todos os aspectos da “cor” do som. Distingue-se pelo ouvir
os instrumentos musicais e inclui as informações de orquestração, ou seja, a
designação de instrumentos específicos para executar toda ou parte de uma
obra musical;
e) Editorial: são instruções para a performance musical e inclui dedilhados, or-
namentação, instruções dinâmicas, articulações, staccati, inclinação do arco e
outros. A dificuldade relacionada a essa informação é a sua tipologia de represen-
tação que pode ser por meio de ícones, texto ou ambos. Inclui o baixo contínuo
e as cadências que originalmente eram destinadas por muitos compositores para
ser improvisadas, mas atualmente são realizadas pelo editor;
f) Textual: são as letras de canções, árias, corais, hinos, sinfonias e outros, além
dos libretos, que são textos de óperas; e
g) Bibliográfica: pode ser o título de uma obra, a identificação do compositor, do
arranjador, do editor, do autor da letra (ou da melodia), da editora, da edição,
do número de catálogo, da data de publicação, da discografia, do performer,
entre outros.

Para Mclane (1996), a informação bibliográfica em si só não é suficiente para


identificar uma obra musical. As análises das obras musicais feitas por musicólogos,
teóricos, linguistas, cientistas cognitivistas e outros pesquisadores apontam necessidades
diversas para a automatização da recuperação de informação de música. Essas análises
mais convencionais relacionadas à estrutura e ao estilo musicais ou as mais recentes, que
exploram a gramática musical e a inteligência artificial, envolvendo a percepção musical,
podem abranger as necessidades de extração de padrões melódicos, harmônicos e rítmicos;
a classificação de diferentes tipos de contornos melódicos; ou ainda a coleta de dados
estatísticos relacionados ao registro tímbrico, textura ou a densidade rítmica, por exemplo.
A necessidade de gerenciar coleções de música em formato digital impulsionou
a evolução da área de Recuperação de Informação Musical (MIR5 ), principalmente o
crescimento explosivo na criação, uso e comercialização de arquivos de áudio MP3. Essa é
5
Acrônimo de Music Information Retrieval.
54 Capítulo 2. Música popular brasileira

uma área transdisciplinar que envolve pesquisadores da Ciência da Computação e Recupe-


ração de Informação, Musicologia e Teoria Musical, Engenharia de Áudio e Processamento
de Sinal Digital, Ciência Cognitiva, Biblioteconomia, Publicação/Editoração e o Direito
(DOWNIE, 2003).
Para Downie (2003), o surgimento de sistemas MIR criaria um significativo va-
lor para os enormes conjuntos de música atualmente subutilizados e armazenados em
bibliotecas do mundo e faria todo o corpus de música acessível.

2.3 Música popular brasileira


A cultura, entendida como elemento que distingue as músicas próprias de cada
país, pode ser definida a partir do nacionalismo – que se constitui como uma ponte que
estabelece a relação entre música e cultura. O nacionalismo na música permitiu a expansão
das músicas regionais ou “de raiz” e o estabelecimento dos repertórios consagrados de
canções populares ao invés de eleger e apoiar a produção de uma música “de elite” por
meio de níveis sociais que considera a arte do letrado como superior à do não letrado
(BOHLMAN, 2003; MIDDLETON, 2003).
No Brasil, os primeiros estudos sobre a música identificam uma expressão nacional
a partir das origens étnicas da música, ou seja, as contribuições culturais vindas princi-
palmente dos ameríndios, africanos e portugueses. Uma primeira geração de intelectuais
ligados ao Instituto Histórico Geográfico Brasileiro elaborou uma primeira formulação
sobre a questão étnica brasileira (ULHÔA, 2014).
Para a geração de 1870, as ideias sobre música brasileira se concentraram em torno
do folclore, entendido como cantos e contos tradicionais das camadas rurais e iletradas da
sociedade. A identidade brasileira é discutida, neste período, principalmente do ponto de
vista racial, documental e das ciências naturais. A próxima geração de intelectuais para
lidar com a música popular – mais rural do que urbana – pela perspectiva da mestiçagem
pertence ao modernismo paulista. De fato, a geração ao redor de Mário de Andrade
(1893-1945) – o mentor do modernismo musical nacionalista – trouxe para a musicologia
brasileira a rejeição das ideias de superioridade e inferioridade racial por parte de diversos
intelectuais brasileiros, desde as primeiras décadas do século XX. Esta avaliação positiva
da miscigenação por parte dos músicos está muito presente na produção sobre a música
popular por meio de um viés folclorista, entre 1890 e 1920 (ULHÔA, 2014).
Uma primeira fase do nacionalismo na música brasileira está pautada na música
erudita, começando com a Semana de 1922 e se fortalecendo com os modernistas em torno
de Mário de Andrade (ULHÔA, 1997). Nessa fase, o termo música brasileira é empregado
pelos profissionais ligados à música de concerto, ou música erudita, alguns deles ligados
à Academia Brasileira de Música, fundada por Heitor Villa Lobos, em 1945, tendo por
2.3. Música popular brasileira 55

meta reunir as principais personalidades da vida musical do país e trabalhar “em prol da
música brasileira”6 .
Uma segunda fase nacionalista foi deflagrada pelo movimento da Bossa Nova e
radicalizada pelos Tropicalistas na área da música popular (ULHÔA, 1997). Neste contexto,
música brasileira é considerada por aqueles relacionados com a música popular mediatizada,
desde que ligados à linhagem de música comprometida com a “tradição” que inclui Samba,
Choro, MPB, Música Regional – nordestina, mineira, gaúcha – Bossa Nova, Tropicália,
Rock Brasileiro, Vanguarda Paulista e nova MPB.
A música tratada nesta pesquisa abarca o recorte utilizado por Silva (2017), que se
situa na segunda fase do nacionalismo na música brasileira e é definido pelas características
da produção musical dos músicos brasileiros entrevistados pela autora, a saber:

a) aproximam do repertório reconhecido como pertencente ao universo das músicas


populares;
b) envolvem um processo de elaboração de arranjos de composições originais para
registrar a performance gravada;
c) incluem melodias lídio-dominantes que se desenrolam quase sempre no contra-
tempo e que, quando cantadas, são quase que declamadas;
d) englobam ritmos sincopados conectados aos regionalismos que refletem os
sotaques próprios de cada região brasileira;
e) incorporam uma harmonização elaborada, a exemplo daquela que é feita pelos
bossa-novistas;
f) integram improvisações aos arranjos que ocorrem em seções específicas e também
permeiam a performance de toda a música;
g) abarcam timbres que muitas vezes são adaptados dos instrumentos musicais
regionais e são tocados lembrando os aspectos originais desses instrumentos no
âmbito de cada estilo musical;
h) abrangem canções, composições e arranjos instrumentais dessas canções; e
i) contêm letras poéticas com temas variados e do cotidiano que revelam situações
vividas relacionadas à natureza e aos aspectos geográficos, raciais, sociais e
políticos locais.

Este conjunto de repertório foi identificado pelos músicos e na literatura como a


música popular mais sofisticada e elaborada que reflete uma prática e concepção popular
de produção restrita.
Foi percebido, no decorrer desta pesquisa, que a maioria dos conceitos aplicáveis a
esse repertório são acomodados por um espectro mais amplo da música popular brasileira,
6
Mais informações no site da Academia Brasileira de Música: http://abmusica.org.br.
56 Capítulo 2. Música popular brasileira

ainda conectado à música mediatizada, porém sem necessariamente se comprometer


com a “tradição” ou apresentar as mesmas características de produção musical. Dentre
essas músicas, encontram-se, por exemplo, a Jovem Guarda, o Rock Nacional, o Choro
improvisado, o Pagode, o Forró e a Música Sertaneja.
O restante desta seção é basicamente um resumo dos resultados de Silva (2017), que
refletem principalmente a opinião dos 22 músicos por ela entrevistados, cuja demografia
consta do Anexo A. Evita-se realizar repetidas citações ao trabalho da autora, que pode
ser consultado na seção 5 (Análise de Dados) de sua tese.

2.3.1 Representações da informação musical popular brasileira


As representações básicas da informação musical7 incluem o áudio e a notação.
Para os entrevistados, a música brasileira que faz parte de suas carreiras profissionais foi
aprendida por meio do áudio. Às vezes de maneira autodidata, tirando “de ouvido”. Para
vários deles essas gravações fazem parte da herança musical transmitida principalmente
pela família.
A execução da música popular brasileira apresenta sutilezas que só podem ser
percebidas pela audição. O uso de partituras não é enfatizado pelos professores brasileiros
de música popular. Considerando que os músicos brasileiros não repetem uma execução
exatamente como foi tocada antes, se torna impossível escrever todas as variações de sua
execução. Nesse contexto, se torna mais relevante a divulgação das músicas através do
áudio, em detrimento do uso de partituras. A partitura tem, portanto, um papel quase que
acessório, sendo considerada um meio para tirar as dúvidas quando o músico está tentando
copiar uma música “de ouvido” ou um recurso para o aprendizado inicial de uma música.
De acordo com os entrevistados, as partituras apresentam melodias em notação
convencional, com letras e cifras8 . Ocorre também de as letras com cifras serem escritas
separadamente da partitura, contendo também a divisão dos compassos indicando a
métrica da música. A Figura 1 apresenta um exemplo de registro escrito de música popular
brasileira, contendo tablaturas, letra, cifras (sobre a letra e sobre a partitura) e partitura
(com melodia, armadura de clave e compasso). Para as gravações, as partituras podem
variar desde uma melodia com a cifra até uma partitura com as partes instrumentais ou a
escrita do ritmo, dependendo do perfil dos músicos. O maior detalhamento da partitura é
requerido quando os músicos não estão familiarizados com o estilo da música popular que
vão executar, ou seja, são músicos com fluência na leitura de partituras e na execução e
7
Representação da informação musical, como tratada nesta seção, difere da proposta de representação de
música popular brasileira, objeto desta dissertação, por esta se tratar de um modelo de representação
do conhecimento. Discute-se na seção 3.1 a relação entre as áreas de Representação da Informação e
Representação do Conhecimento.
8
A cifra é uma espécie de notação musical que representa acordes ou a harmonia que acompanha uma
linha melódica.
2.3.2. Características da informação musical popular brasileira 57

Figura 1 – Exemplo de música popular brasileira escrita.

Fonte: Chediak (2009).

interpretação da música clássica.


O que se percebe na catalogação de materiais musicais, principalmente no Brasil,
é uma ênfase nas partituras impressas, tendência oposta à realidade da música popular
brasileira cuja principal forma de registro é o áudio.

2.3.2 Características da informação musical popular brasileira


A partir da visão dos músicos entrevistados por Silva (2017), foram identificadas
características de alguns elementos da música popular brasileira que podem diferenciá-la
das músicas estrangeiras. Esses elementos foram classificados em: melodia, ritmo, harmonia,
timbre, edição, texto e elementos bibliográficos.

Melodia

A melodia na música popular brasileira é lembrada principalmente pelas músicas


nordestinas próximas de um regionalismo, possui contratempos e é declamada (i. e., tem sua
interpretação próxima da fala). A letra, em alguns momentos, é utilizada para transmitir
58 Capítulo 2. Música popular brasileira

uma informação relevante e a melodia passa a ter menor importância, como no caso da
Tropicália e do Rap.
Um dos entrevistados que atua profissionalmente como compositor sugere que
pudesse existir um banco de dados de melodias de músicas brasileiras que possibilitasse
comparar uma composição inédita com as existentes como forma de evitar um possível
plágio involuntário.

Ritmo

O ritmo, na opinião dos entrevistados, é o elemento é o elemento essencial que


pode distinguir a música popular brasileira das demais. Sua interpretação – o balanço, a
sutileza – está associada principalmente às síncopes9 .
Alguns entrevistados mencionaram a palavra swing como algo que caracteriza com
naturalidade o ritmo brasileiro. Entende-se que o swing também seja um dos elementos da
informação do timbre, devido à modificação de acentuações, ou seja, uma pressão sobre
determinadas notas para dar o “gingado” do ritmo brasileiro. Foi mencionada também a
palavra “malemolência” com essa mesma interpretação.
Foi utilizada também a palavra “sotaque” para representar o cruzamento do ritmo
com um contexto cultural, isto é, interpretá-lo de maneira mais específica de uma região
ou grupo que executa aquele ritmo dentro de sua cultura.

Harmonia

A harmonia é estabelecida, pelos entrevistados, no contexto de estilos como a Bossa


Nova e o Samba, este último aparentemente é entendido sob a releitura dos bossa-novistas.
Para um dos entrevistados, parte da música popular brasileira sofre influências
do Jazz norte-americano no que diz respeito às suas harmonias como é caso dos diversos
estilos cultivados no movimento da Bossa Nova.

Timbre

A maneira de alguém tocar um instrumento musical, a sonoridade produzida pela


batida de um ritmo em um instrumento e a dinâmica resultante do movimento corporal
do músico são fatores que diferenciam o timbre na música popular brasileira.
Um músico comenta que, na música erudita, os professores de violão dificilmente
deixam a o aluno tocar com o polegar apoiado enquanto no Choro só se toca dessa maneira.
“Então, às vezes vem um cara da música erudita tocar Choro, muito limpinho, não soa do
jeito que a gente gosta de ouvir” (SILVA, 2017, p. 177).
9
Síncope é definida por Med (1996) como “um som articulado sobre tempo fraco ou parte fraca do
tempo e prolongado até o tempo forte ou parte forte do tempo”.
2.3.2. Características da informação musical popular brasileira 59

Outro entrevistado observa que a voz brasileira também tem características distintas,
apesar das referências norte-americanas serem muito fortes.
Os instrumentos musicais próprios da cultura brasileira também estão intimamente
relacionados à informação do timbre. Estilos musicais tradicionais ou regionalistas são
caracterizados por seus instrumentos. Conhecer esses timbres “originais” pode revelar a
influência externa de outras sonoridades e clarear os efeitos da globalização na música
popular brasileira. Como exemplo, foram citados: o cavaco, pandeiro e tantam, utilizados
no Pagode do Rio de Janeiro; a sanfona, o triângulo e a zabumba, para o Forró; e os
tambores e o canto do Axé baiano.

Edição

A informação mais difícil de se conseguir, na opinião de um dos músicos entrevista-


dos, é a da interpretação. As partituras não oferecem a riqueza de detalhes necessárias de
que ele precisa, e nem teriam como, porque os músicos populares não tocam sempre da
mesma forma e não seria possível escrever instruções em uma partitura de algo que não se
repete. Para ele, não há um material que substitua a audição, principalmente na música
popular. Nesse tipo de música, as variações são valorizadas, não a replicação do som.

Texto

As letras das canções podem identificar a música popular brasileira por traduzirem
os temas cotidianos de diferentes épocas e situações vividas pelos brasileiros. De acordo
com os entrevistados, além de histórias do dia a dia, nossas letras falam da ave, da floresta,
praia, mar, nossa raça, negritude, preconceito, chão, nordeste, etc.
Foram citados também alguns aspectos relacionados à maneira como a melodia se
articula com a letra. Existe uma maestria em juntar música com a letra ou a música e a
letra já juntas, comenta um dos entrevistados. Outro identifica uma necessidade comum
da música favorecer o texto. Um terceiro conta que na música popular brasileira o texto é
entregue com clareza, muitas vezes falado.

Elementos bibliográficos

Nos relatos, foram levantadas algumas demandas por informação dos músicos
profissionais em relação a este tipo de informação que envolvem:

a) encontrar o nome do compositor de uma obra musical quando ela é conhecida


por uma gravação de um intérprete proeminente;
b) achar uma versão completa com a letra correta em materiais confiáveis;
c) atribuir, acertadamente, os papéis de cada agente que participa da gravação;
60 Capítulo 2. Música popular brasileira

d) local da gravação e equipe técnica responsável pela gravação; e


e) breve histórico sobre um arranjo a partir da ideia da sua concepção.

A dificuldade em se obter informações bibliográficas de música popular brasileira


é uma queixa comum entre os entrevistados. Como disse um dos músicos, “Quando eu
preciso de alguma informação da música, eu tenho que ir atrás lá na Internet, vasculhar”.
Os aplicativos que oferecem os serviços de streaming de áudio (e. g., iTunes10 , Spotify11
e Deezer12 ) distanciaram-se dos encartes dos discos ou dos CDs ao oferecer nenhuma ou
pouca informação técnica que pode ter relevância para quem é do ramo. Em geral as
informações são buscadas em sites de cifras, sites que publicam capas e encartes de LPs e
CDs e sites de streaming de vídeo (e. g., YouTube13 e Vevo14 ).
Muitas vezes a informação encontrada se encontra incompleta ou mesmo incorreta.
O compositor, muitas vezes, não é mencionado nas informações que aparecem junto a
uma gravação, principalmente no contexto da Web. Também se percebe nas consultas aos
catálogos online das bibliotecas atribuições equivocadas de papéis.
Alguns problemas foram levantados por alguns entrevistados, como o da música
cantada pelos cantores das famosas rádios a partir da década de 1920. Naquela época: (i)
o registro na gravação era o nome do intérprete que tinha certa relevância no meio musical;
(ii) o nome do compositor era muitas vezes esquecido; (iii) os arranjadores, que depois até
se tornaram proeminentes no cenário musical brasileiro, como Tom Jobim, também não
possuíam os seus nomes nos arranjos.
Dentre os entrevistados foram identificados ao menos quatro papéis de agentes
(pessoas) desempenhados nas atividades que envolviam a performance da música popular
brasileira: compositor; arranjador; intérprete; e produtor.
O compositor pode também assumir a função de arranjador, mas não necessaria-
mente. As composições, neste universo musical, nascem a partir de uma melodia e uma
sequência harmônica que, em geral, é escrita sob a forma de cifras acima da melodia
grafada em um pentagrama.
Aparentemente existe uma maior valorização do intérprete em relação ao compositor,
que comumente não é mencionado nas informações bibliográficas (principalmente no
contexto Web) nem nas performances. Percebe-se que este talvez não seja o caso de músicas
da tradição europeia ocidental em que são conhecidos os vários intérpretes que gravaram a
música de um determinado compositor “já imortalizado”.
O arranjador é um agente que possui muita ênfase nesta música popular brasileira
10
https://www.apple.com/lae/itunes
11
https://www.spotify.com
12
https://www.deezer.com
13
https://www.youtube.com
14
https://www.vevo.com
2.3.2. Características da informação musical popular brasileira 61

de tradição mais oral. O papel que desempenha inclui a realização de trabalhos por
encomendas de músicas específicas por cantores, maestros ou grupos musicais por exemplo.
Em geral, quando a encomenda envolve a gravação da música, esse trabalho é escrito ou
melhor esquematizado de maneira a agilizar a execução no estúdio de gravação. É comum
o arranjador também acumular o papel de produtor musical quando este tem experiência
no campo da produção.
A principal função desse agente é enriquecer a obra original de um compositor
que, a princípio, se reduz a uma melodia e um instrumento harmônico. As competências
profissionais incluem a capacidade de prever auditivamente a combinação das partes
instrumentais separadamente, além de desenvolver-se com maior maestria em estilos
específicos de música popular brasileira.
Este profissional é, muitas vezes, ignorado pelos sistemas que têm se proposto
a organizar a informação musical popular brasileira. Um possível motivo para isso é o
desconhecimento do seu papel nas gravações de música popular brasileira.
O intérprete, em geral, acompanha outros artistas e atende a eventos. Um dos
entrevistados diferencia o instrumentista do músico, ambos intérpretes. O instrumentista se
restringe a explorar questões técnicas de um instrumento musical ou repertórios específicos,
enquanto o músico atua de maneira mais diversificada, como acompanhante, arranjador
ou toca em diversas formações.
A imersão na cultura é um dos fatores que leva um intérprete a identificar-se como
um “porta-voz” dessa cultura. O intérprete desenvolve sua prática por meio da vivência
em locais que cultivam diferentes estilos da música popular brasileira.
O produtor musical atua na escolha das músicas que farão parte de um álbum,
colabora no arranjo que será gravado exercendo, por vezes, as duas funções – arranjador e
produtor – principalmente na gravação de uma música que envolve pouco recurso, gerencia
a execução do arranjo, conduz os ensaios, gerencia a performance dos músicos, supervisiona
a execução de uma gravação ou de um show e acompanha o processo de gravação – mixagem
e masterização.
Há também o produtor fonográfico que possui mais uma visão de mercado tecendo
estratégias de marketing e de venda. Nesta perspectiva, decide sobre o álbum a partir de
uma estilística e de uma linguagem voltada para um público-alvo, escolhe os arranjadores
que imprimirão nas músicas o estilo adequado a esse público. Além disso, atua, por vezes,
como o arregimentador na escolha dos intérpretes mais especialistas naquele determinado
estilo desejado.
Além destes agentes, alguns outros foram mencionados por alguns entrevistados
como o técnico de áudio que realiza a mixagem ou a masterização e o hitmaker que é
alguém que lança hits, ou seja, músicas muito populares que fazem sucesso.
62 Capítulo 2. Música popular brasileira

2.3.3 Gêneros da música popular brasileira


Para os entrevistados por Silva (2017), parece que a informação contida sob os rótu-
los “estilo” ou “gênero” pode ser pouco clara para exprimir exatamente o enquadramento
de uma música popular brasileira como pertencente a um conjunto específico de repertório.
No entanto, grande parte das definições de música popular brasileira partiram de estilos
atribuindo-lhes algum legado de tradição cultural. Na música de tradição europeia culta
aparecem os termos “estilo” e “forma”.
Em um cenário da música popular internacional, o estudo de Santini (2013) mostra
a realidade da classificação por gêneros musicais feita pela indústria musical. Para ela, há
uma distância muito grande dos rótulos de gêneros em relação àqueles sugeridos pelos
usuários – por exemplo, apenas 10,5% dos artistas são classificados por esses usuários
como a indústria musical o faz.
Em um dos relatos, percebe-se o quanto a identificação de gêneros musicais pode
ser difícil mesmo do ponto de vista de um músico especialista, demonstrando a relevância
de considerar a música em seus diferentes contextos geográficos e históricos e valorizar as
classificações colaborativas por usuários.
Os entrevistados falam da música popular brasileira com destaque para alguns
estilos ou gêneros musicais, a saber: (i) Choro; (ii) Samba; (iii) Bossa nova; (iv) MPB; (v)
MPBI; e (vi) Música Regional.

Choro

O termo Choro aparece dede 1808 quando era definido como uma reunião de
músicos. Seu uso no sentido de gênero musical ocorre a partir de 1870 com o grupo
instrumental criado pelo carioca Joaquim Antônio da Silva Callado Júnior (1848-1880),
considerado “pai dos chorões”.
O violão, o piano, a flauta, o cavaquinho e o bandolim são instrumentos emblemá-
ticos do gênero.
A partir dos relatos, pode-se identificar algumas distinções para o Choro:

a) Tradicional: é a maneira como os intérpretes gravam retirando a improvisação


que é feita nas rodas de Choro;
b) Clássico: aparentemente é o empregado por Villa-Lobos e por outros composi-
tores contemporâneos (e “eruditos”), como Oscar Lorenzo Fernandez, Luciano
Gallet e Francisco Mignone. É possível comparar o Choro mais clássico com
aqueles que estão registrados nas partituras e possuem uma interpretação igual
ou bastante próxima deste registro escrito; e
2.3.3. Gêneros da música popular brasileira 63

c) Moderno: a maneira como o Choro é executado pelos músicos da música popular


instrumental brasileira (MPBI) ou Jazz Brasileiro.

“Costuma-se observar que o Choro primitivo se aproxima da música clássica, ao


passo que o Choro mais recente apresenta analogias com o Jazz, principalmente quanto ao
seu potencial para a improvisação”. A afirmação de Kittsteiner (2005, p. 62), aparentemente
se refere ao Choro clássico e ao Choro moderno.
Uma prática musical coletiva característica do Choro é a Roda de Choro. Realizada,
em geral, no formato de roda, nela, “cada instrumentista tem um papel pré-definido, e
a soma dos sons dos instrumentos caracteriza a formação do grupo regional de Choro”
(FIORUSSI, 2012, p. 47). Muito do que é tocado na Roda de Choro ocorre por improviso
e nem sempre todos os músicos sabem tocar todas as músicas da roda (FIORUSSI, 2012,
p. 75).

Samba

O Samba tem sido considerado como uma expressão musical mais tipicamente
brasileira, nasceu simultaneamente no Rio e na Bahia onde a maioria dos africanos viviam.
No que diz respeito ao Samba Carioca, nos anos de 1910 e 1920, as pessoas ligadas
a este gênero eram de comunidades de negros mestiços emigrados da Bahia e que se
instalaram nos bairros próximos ao cais do porto, à Saúde, à Praça Onze e à Cidade Nova.
Além de chamarem suas festas de “samba”, o termo era empregado para designar uma
modalidade musical-coreográfica. Muitas baianas descendentes de escravos alojaram-se
nesses bairros, sendo conhecidas como as Tias Baianas. Tia Ciata, Aciata ou Asseata –
Hilária Batista – foi uma das responsáveis pela sedimentação do Samba Carioca.
A gravação, “Pelo telefone”, em 1917, pelo Donga (filho de baiana) é a primeira
designada como “Samba” no sentido de gênero musical, dada pelo próprio compositor.
Depois dele, Sinhô, nos anos de 1920, alcança sucesso com composições como “Jura”.
Alguns subgêneros do Samba foram citados pelos entrevistados, dentre eles: Samba
de Roda, Samba de Breque, Samba Enredo, Samba Canção, Samba Choro, Samba Funk e
Sambaião.

Bossa nova

A palavra “bossa” significa um jeito especial de fazer algo de maneira natural ou


orgânica e também qualquer coisa nova e diferente. Curia (1997 apud SILVA, 2017, p. 252)
explica que “quando dizemos “alguém tem bossa”, queremos dizer que “ele sabe como
fazer”. Para o músico, este gênero é visto mais como um movimento musical que iniciou
por volta de 1960 a partir de reuniões em clubes, apartamentos ou residências, conhecidas
64 Capítulo 2. Música popular brasileira

como “Samba Sessions” frequentadas por instrumentistas, cantores e compositores com a


intenção de “dar uma concepção mais moderna às composições tradicionais”.
Sobre a origem da Bossa Nova, Miranda (2015, p. 48) escreveu:

Oficialmente a Bossa Nova começou num dia de agosto de 1958 quando


chegou nas lojas de discos brasileiras o 78 rotações de número 14.360 do
selo Odeon do cantor João Gilberto com as músicas Chega de Saudade
(Tom Jobim e Vinicius de Moraes) e Bim Bom (do próprio cantor).

João Gilberto é reconhecido como fundador deste gênero musical. Para alguns
entrevistados, Tom Jobim deveria ser uma categoria à parte de música brasileira, pois
suas composições ultrapassam o que se poderia considerar apenas o estilo Bossa Nova,
possui uma certa erudição na sua obra.

MPB

Para Ulhôa (1997, p. 1-2), o termo MPB é visto como “uma rubrica incorporada
pela indústria cultura para se referir a um segmento do mercado”. A junção de música
“popular” e música “brasileira” em uma única expressão “música popular brasileira (MPB)”
significa um rótulo dado pela indústria da música para se referir a um segmento do mercado,
o qual reflete uma prática e uma concepção de popular, mas não comercial15 , mesmo sendo
produzida e distribuída como bem de consumo e próxima às raízes rústicas regionais, mais
sofisticada e elaborada.
Nas entrevistas, algumas vezes, há a percepção de que utilizam MPB como sinônimo
de uma classificação mais geral de toda a “música popular brasileira” e, em outras, como
estabelecendo um rótulo para um conjunto de repertório mais específico.
Chico Buarque, Ivan Lins, Djavan, Mônica Salmaso, Joice e Gal Costa são citados
como referências desse tipo de música. Aparentemente, alguns artistas como aqueles
pertencentes ao Clube da Esquina, por não serem reconhecidamente pertencentes ao grupo
da Bossa Nova, estão no grupo da MPB.
Nos relatos percebe-se algumas tendências para a compreensão do que é MPB: (i)
ao envolver artistas ou grupos que não fazem parte de nenhuma outra classificação de
estilo; (ii) ao considerar regravações de músicas de outros estilos por artistas mais recentes
como é o caso da regravação de “Carinhoso” por Marisa Monte; e (iii) a partir de um
certo deslocamento temporal do rótulo, ou seja, a MPB não compreende apenas a música
das décadas de 1960 e 1970, mas se estende para agregar outros artistas do tempo presente
como é o caso da cantora Maria Gadú.
15
Entende-se por “música popular não comercial” uma música popular de produção restrita em contraste
à música popular de grande produção.
2.3.3. Gêneros da música popular brasileira 65

MPBI

Também chamada de Jazz Brasileiro, a música popular instrumental brasileira


(MPBI) é tocada por instrumentos musicais, podendo incluir a voz, porém sem as letras.
A voz, nesse estilo, é utilizada como um instrumento. Nesse estilo, a voz aparece como
mais um instrumento, na mesma hierarquia dos demais, diferente da MPB, onde existe
uma distinção clara entre o cantor e os instrumentos (BASTOS; PIEDADE, 2006).
César Camargo Mariano e Hermeto Pascoal foram mencionados por alguns dos
entrevistados como representantes desse tipo de música brasileira.

Música Regional

A música folclórica brasileira reflete suas diversas origens étnicas e culturais. A base
da música folclórica brasileira é a música folclórica luso-hispânica devido à colonização
portuguesa. Ainda são encontradas melodias portuguesas, especialmente nas canções
infantis. Outras heranças luso-hispânicas que permanecem são a polifonia popular ibérica,
o sistema harmônico que prevalece na maioria dos gêneros folclóricos e populares e uma
rica variedade de instrumentos, particularmente instrumentos de cordas.
Ritmos africanos, como a hemíola, constituem a base de muitas complexidades
rítmicas dessa música folclórica. A maioria das canções e danças afro-brasileiras mostram
uma clara origem bantu, com exceção de certos ciclos de canções que funcionam em algumas
religiões afro-brasileiras. Foram herdados dos africanos, ainda, o canto responsorial, o
estilo vocal e instrumentos específicos.
Não há muito conhecimento sobre a música indígena e suas influências em nossa
música folclórica. Alguns tipos de instrumento (e. g., chocalhos do tipo maraca), certos
gêneros coreográficos e características de performance podem revelar um pouco da influência
desse grupo étnico na música folclórica brasileira.
Seguimos o entendimento de Silva (2017) de música folclórica brasileira como
Música Regional. Nos relatos, os entrevistados conectam a Música Regional à cultura
brasileira e, por meio desse tipo de música, delimitam a música brasileira.
Um dos músicos entrevistados, por exemplo, afirma que a “música brasileira é uma
música contida nela elementos da cultura brasileira” e que, de uma forma mais ampla,
pode-se chamar a Música Regional de música brasileira.
O fenômeno da influência de uma cultura em outra é observado por outro entrevis-
tado. De acordo com o músico, a partir dos anos 1960, “quando uma música queria deixar
de ser regional, para ganhar números maiores, ela mudava alguns aspectos”, tais como a
linguagem, a letra e os instrumentos. “Para uma música ser popular, ela tem que ter uma
banda por detrás [...] tem que ter pelo menos um acompanhamento de um quinteto, baixo,
bateria, guitarra e teclado ou piano, mais um instrumento melódico”. Conclui que foram
66 Capítulo 2. Música popular brasileira

os instrumentos que mais se globalizaram. Dessa maneira a música folclórica se torna


música popular. Por exemplo, quando um ritmo folclórico como o maracatu é utilizado por
artistas da atualidade, como o Chico Science, a música passa a ser considerada como uma
música brasileira popular e de produção restrita, perdendo o seu caráter mais regionalista.

2.3.4 Classificações da música popular brasileira


A visão da classificação musical pelos músicos especialistas entrevistados leva em
conta não apenas aspectos estilísticos, mas também outros mais amplos, como questões
sociais, modos de transmissão e registro, compositores, intérpretes, indústria da música,
globalização, entre outros.
Ao comparar música popular com erudita, um dos entrevistados de Silva (2017)
afirma que músicas populares elaboradas podem exigir do profissional um alto nível de
conhecimento e técnica. A música popular pode ser “complicadíssima”. Para o entrevistado,
a música popular em termos de erudição pode ser tão difícil quanto a música dita erudita.
Outro músico inclusive critica a utilização do termo “popular” em música popular brasileira.
É percebido nas entrevistas que o conhecimento musical formal já não é carac-
terística apenas dos músicos eruditos, fazendo com que a prática musical “erudita” se
confunda com a “popular”, uma vez que sua concepção ou execução podem atingir níveis
de complexidade semelhantes.
A diferenciação entre música popular e erudita não parece fazer muito sentido para
os entrevistados, porém os relatos sugerem algumas possíveis classificações dicotômicas: (i)
músicas que são os “clássicos” e as “pop”; (ii) música elaborada e comercial; (iii) música
instrumental e canções; e (iv) músicas com ou sem improviso.

Músicas que são os “clássicos” e as “pop”

As músicas consideradas como “clássicos” ultrapassam a época em que foram


compostas e são ouvidas ou regravadas até os dias atuais. Em contraste, as músicas “pop”
aparecem e rapidamente são as mais ouvidas por um tempo determinado, mas desaparecem
rapidamente.
O envelhecimento das músicas e sua inclusão na memória longa conquistam posições
de prestígio. “Sambas que nos anos 30 eram rotulados como ‘popularescos’, tornam-se
‘clássicos’ nos anos 60 ao serem valorizados [...] em nome de uma busca de autenticidade”
(ULHÔA, 1997, p. 7). Uma música que hoje é “pop” pode vir a se tornar um “clássico”.

Música elaborada e comercial

A música elaborada também entendida como a música elitizada que tem algum
registro escrito, de melodia com cifra ou parciais de arranjos, é aquela feita para um
2.3.4. Classificações da música popular brasileira 67

público de “iniciados”, ou seja, são músicos ou intelectuais ou ainda jovens influenciados


pelas preferências musicais de seus pais. A música comercial ou chamada de mais “simples”
são aquelas que, em geral, os únicos registros são as gravações ou algumas letras com cifras
providas por sites de músicas na Internet e têm um apelo para o público mais leigo.
Algumas características que distinguem a música elaborada daquela mais comercial
e de entretenimento podem ser percebidas principalmente no seu arranjo, quando (i)
a harmonia caminha junto com as notas da melodia, apresentando linhas melódicas
distribuídas; (ii) os acordes são rebuscados, ou seja, incluem mais dissonâncias como
sétima ou nona; (iii) alguns estilos são mais representativos; e (iv) os músicos possuem
mais conhecimento formal, ou seja, sabem escrever e ler partituras.
Conforme os relatos, estilos como a Música Sertaneja, o Axé e o Pagode mesmo
tendo alguma conexão com as músicas “de raiz” em algum momento se popularizaram e
tiveram um apelo mais comercial ou de entretenimento. A Bossa Nova, o Choro, o Frevo
ou o Xaxado são estilos menos “popularizados” e feitos para um público menor e não
possuem um apelo tão comercial.

Música instrumental e canções

Uma canção é uma peça musical para uma ou mais vozes e que pode ou não ser
acompanhada por instrumentos ou, também, o ato ou arte de cantar (CHEW; MATHIESEN;
PAYNE; FALLOWS, 2001). As canções incluem as músicas com letras em que a elaboração
dos arranjos deve privilegiar o texto.
As músicas instrumentais podem ser essencialmente instrumentais ou terem vozes
que fazem o papel de um instrumento musical, ou seja, compõem a textura musical
emitindo palavras isoladas ou até frases, no entanto, não deve haver um protagonismo do
texto. Nesta classificação estão também as orquestrações para grupos grandes ou pequenos,
populares ou eruditos.
As canções predominam sobre a música instrumental no campo da música popular
brasileira, com exceção de alguns gêneros como o a MPBI e o Choro moderno com influência
do Jazz, que favorecem a música instrumental.

Músicas com ou sem improviso

A música sem improviso é aquela interpretada totalmente a partir do registro. As


músicas mais próximas às “eruditas” e que possuem o registro escrito da melodia, da
levada ou dos baixos, por exemplo, podem ser tocadas dessa maneira.
É principalmente no momento da improvisação que o intérprete expressa seu estilo
pessoal. Na opinião de um dos músicos entrevistados por Silva (2017, p. 187), durante a
68 Capítulo 2. Música popular brasileira

improvisação o músico demonstra “se tem sotaque brasileiro ou não”. Sobre o improviso
no Choro, Lara Filho, Silva e Freire (2011, p. 159) comentam:

No improviso, o músico se despe das preparações prévias à performance, e


mostra o seu real domínio e conhecimento da linguagem do Choro. Além
disso, traz a possibilidade de se expressar individual e pessoalmente.

A música popular mais elaborada dá aos músicos uma maior liberdade de improvi-
sação, prevendo seções de improviso. Por outro lado, a música mais comercial costuma
restringir a improvisação às “passagens de estrofe e coro para uma ponte ou na repetição
da estrofe” Silva (2017, p. 207).
O grau de liberdade de improvisação pode variar dependendo da composição ou do
arranjo. Músicas escritas com cifras também favorecem a improvisação.

2.3.5 Diretrizes para a organização da informação musical brasileira


Nesta seção são apresentados os principais conceitos destacados por Silva (2017)
em suas diretrizes para a organização da informação musical brasileira. Esses conceitos
refletem primordialmente a percepção da música popular brasileira por parte dos músicos
entrevistados pela autora.

Composição e arranjo musical

Para Silva (2017), uma obra musical pode ser tanto uma composição original como
um arranjo musical. Alguns participantes de sua pesquisa utilizaram também o termo
música autoral ao se referirem à composição.
No universo da música estudada pela autora, o processo de composição se parece
muito com aquele que é feito na tradição da música ocidental europeia, porém seu registro
é quase sempre uma gravação de áudio. Neste registro de áudio, o compositor geralmente
é o próprio intérprete, individualmente ou como membro de um grupo musical. Quando
existe um registro escrito, este, em geral, é feito na forma de partitura com melodia e
harmonia, podendo apresentar também uma letra, para fins de direitos autorais.
O conceito de arranjo é central para o entendimento do processo produtivo do
recorte da música popular brasileira estudado. O arranjo é considerado uma “roupagem” a
uma composição. Pode também ser visto como uma obra derivada de uma composição ou
de outro arranjo. Entretanto, o esforço artístico e intelectual do arranjador é reconhecido
pela autora e pelos músicos entrevistados.
Alguns músicos entrevistados comentaram sobre a busca de um “original” para
realização do arranjo. Esse “original” seria uma versão da obra musical considerada
representante mais fiel à ideia do compositor, quando comparada a outras versões da
2.3.5. Diretrizes para a organização da informação musical brasileira 69

mesma obra. São consideradas “referências” as gravações ou partituras que influenciam


o arranjador. Estas podem ser de gravações da mesma música ou ideias musicais que
emergem a partir de suas experiências auditivas de outras músicas.
A elaboração de um arranjo pode ser feita por um arranjador, a partir de uma
encomenda de um cliente, ou por vários arranjadores, que em muitos casos são os instru-
mentistas que realizam a gravação. Este arranjo coletivo acontece pouco antes da gravação,
quando são feitas as combinações de como vai acontecer. É comum a existência de um
líder deste processo.
A principal forma de registro do arranjo é a gravação, sendo considerado seu registro
na forma escrita como exceção. Quando existe uma partitura no contexto de uma gravação,
esta atua apenas como um “guia”, geralmente composta de uma estrutura com introdução,
partes, pontes, indicação dos momentos em que ocorrem as improvisações, coda, melodia,
cifras e convenções rítmicas em que todos devem executar ao mesmo tempo. Em geral, a
partitura não possui partes separadas para cada um dos instrumentistas. Existem casos
em que o arranjador escreve melodias alternativas à melodia principal, como sugestões
para a gravação.
Podem também existir partituras nos casos em que o arranjo: (i) foi feito por
encomenda para conjuntos musicais grandes ou que envolvem músicos “de fora” do contexto
da música popular (inclui-se aqueles que não possuem a habilidade do improviso ou que
não tocam por meio de cifras, por exemplo); ou (ii) foi feito com fins pedagógicos, ou
seja, quando são registradas para o ensino de instrumentos musicais no campo da música
popular.
Um mesmo arranjo pode ser gravado várias vezes, constituindo várias versões. Cada
performance de música popular brasileira é única, diferindo-se das outras principalmente
no momento da improvisação. Outras configurações de grupos musicais ou outro intérprete
podem gerar um novo arranjo baseado em um arranjo anterior.
Entende-se que música popular brasileira descrita pelos entrevistados tenha proximi-
dade com as definições de música popular encontradas na literatura. De acordo com Kanai
(2015), o arranjo na música popular difere do arranjo na música clássica pelas seguintes
características da música popular: (i) é frequente a participação do arranjador na criação
da música original; (ii) a flexibilidade de interpretação é maior; (iii) é comum que outro
artista faça covers de uma música utilizando uma arranjo diferente do original; e (iv) não
é feita a distinção dos arranjos por não serem significativos para os usuários. Observa-se,
entretanto, que os usuários especialistas entrevistados atribuem grande valor ao arranjo, o
que representa uma visão oposta à do item (iv). Por outro lado, compreende-se a visão de
Kanai (2015) devido à comum ausência de metadados relacionados ao arranjo nos itens
bibliográficos de música popular.
70 Capítulo 2. Música popular brasileira

Silva (2017) identificou as seguintes características dos arranjos na música estudada


a partir dos relatos de seus entrevistados: (i) um arranjo envolve a maneira como o
arranjador decide organizar os elementos musicais; (ii) é realizado por meio da junção de
melodia e harmonia; (iii) envolve organizar os elementos originais providos pelo compositor
para serem divulgados a uma plateia; (iv) considera as características da música original
composta por outra pessoa; (v) envolve a pesquisa por originais; (vi) pode excluir um
trabalho que é realizado a partir de outro arranjo; e (vii) pode ser concebido de maneira
coletiva.

Performances e versões

As performances de música popular são executadas a partir dos arranjos, não das
composições diretamente. Cada performance é única, diferenciando-se em seu aspecto
interpretativo e de improvisação que refletem o estilo pessoal de cada artista. Essa
característica da música popular se opõe à da música clássica, cujas diferentes performances
de uma mesma obra buscam repetir exatamente as mesmas notas, ritmos, harmonias,
estrutura e até mesmo o estilo do “original”.
A música popular brasileira, na visão dos músicos entrevistados, tem uma comple-
xidade ainda maior que a internacional quando o assunto são as versões. No Brasil, há uma
cultura de gravar a mesma música várias vezes, até pelo próprio compositor, dificultando a
identificação da obra original. Muitas expressões modificam o original de modo a torná-lo
quase que irreconhecível se comparado às versões. Isso tem uma implicação direta no
trabalho dos músicos porque as várias versões servem como apoio para a interpretação. O
intérprete as ouve para decidir como tocar a partir do seu próprio arranjo.

Influência

O conceito de “influência”, identificado a partir dos relatos dos entrevistados pela


autora, aparentemente pode ser empregado como sinônimo de “cultura” tal como utilizado
pela Music Library Association (MLA)16 em sua proposta de metadados17 . O atributo
“cultura” proposto pela MLA consiste em uma declaração se referindo a um grupo de
pessoas às quais uma obra musical está associada, por quem ela é influenciada e para
quem ela foi criada.
A influência também está relacionada às pessoas que influenciam na interpretação
do artista. O artista cria o seu estilo próprio a partir da observação de outros artistas.
16
A Music Library Association (MLA) é a associação profissional de bibliotecários e bibliotecas de
música nos Estados Unidos. Fundada em 1931, tem uma participação internacional de bibliotecários,
músicos, estudiosos, educadores, livreiros e comerciantes de materiais de música. Mais informações em:
https://www.musiclibraryassoc.org.
17
O grupo de trabalho de metadados do Comitê de Controle Bibliográfico da MLA elaborou um documento
em fevereiro de 2008 propondo quatorze atributos para materiais musicais. Mais informações podem
ser obtidas em Silva (2017, p. 278-287).
2.3.5. Diretrizes para a organização da informação musical brasileira 71

Uma prática comum entre os músicos iniciantes ou semiprofissionais é o cover, i. e., a cópia
da performance de outros artistas exatamente como foram originalmente gravadas.
Foi também identificado o conceito de “influência” nos sentidos de: (i) algo que
extrapola o estilo de um determinado artista ou grupo; (ii) música regional estrangeira,
sem especificá-la; ou (iii) tradição, modernidade ou aspectos relacionados à indústria
cultural.

Gênero musical

O gênero musical talvez seja o elemento que melhor expõe os aspectos culturais
da música popular brasileira em discussão. O conceito de gênero musical pode ser ex-
tremamente ambíguo. Análises puramente cognitivas dos elementos musicais podem ser
insuficientes para a delimitação clara de um gênero musical. Isso porque o próprio con-
ceito de gênero na música popular muda com o tempo, sofrendo transformações externas
relacionadas à época, local, experiência musical e mercado fonográfico.
Silva (2017) sugere que o gênero musical pode ser compreendido a partir de outros
conceitos a ele relacionados, tais como época, local, movimentos culturais, grupos ou
indivíduos, influências estrangeiras, ritmos (e variações), outros gêneros e subgêneros,
origem, função, instrumentação, “inventores”, primeira gravação e tradição.
A origem de um gênero musical pode ser identificada a partir de um marco principal,
como uma primeira gravação ou um evento musical. Alguns gêneros da música popular
brasileira têm sua origem marcada pela mistura de uma música regional a influências
estrangeiras.
Para alguns gêneros, são identificados um ou mais artistas que são considerados seus
criadores ou “inventores”. Esses são os primeiros a gravar músicas daquele gênero ou são
os responsáveis pela divulgação do gênero fora da sua região de origem. Os instrumentos
musicais utilizados pelos criadores, o local e a época em que foi divulgado também são
elementos importantes na caracterização de um gênero musical. A expressão da vida
cotidiana de seus criadores e demandas da indústria da música podem identificar uma
função para gênero.
Um gênero musical evolui a partir da adaptação de estilos a influências estranhas à
sua origem, feita por indivíduos em diferentes épocas e locais. À medida que seus limites
se suavizam, os gêneros se tornam híbridos, surgindo denominações como Samba Reggae,
Samba Choro e Samba Jazz.
Nomes de gêneros musicais brasileiros podem ter um sentido amplo e significar um
movimento com pretensões de resgaste da cultura popular, como ocorreu no Tropicalismo,
ou, ainda, uma maneira de interpretação de vários ritmos brasileiros, como é o caso da
Bossa Nova.
72 Capítulo 2. Música popular brasileira

Referência

Outro termo recorrente nos relatos dos músicos entrevistados por Silva (2017) é
a “referência”, relacionado a algo utilizado pelos artistas como base ou inspiração para
seu trabalho, porém com diferentes significados: (i) uma gravação de áudio ou vídeo,
considerada “original” ou representativa de um ritmo tradicional ou de ritmos tradicionais
combinado a outros ritmos, por vezes divulgada por um artista conhecido; (ii) uma
gravação específica de um artista ou de um grupo musical; (iii) o estilo de interpretação
de outros músicos; (iii) algo que pode ser encontrado em qualquer música e obtido de
diversas fontes; (iv) música “erudita”, manifestações culturais, estilos musicais e cantores
ou grupos musicais específicos; (v) repertórios ou artistas que são característicos de um
estilo musical; (vi) muitos estilos musicais; ou (vii) artistas do mesmo instrumento musical
que se quer aprender.

Estilo

O termo “estilo” é empregado como: (i) sinônimo de gênero musical; (ii) forma
de caracterizar a maneira particular de atuação incorporada por artistas a partir de suas
influências musicais; ou (iii) quase que como um sinônimo de “referência”.

Linguagem

Os músicos entrevistados utilizaram o termo “linguagem” para se referira à forma


de interpretar (tocar) um estilo musical, respeitando os elementos estilísticos intrínsecos
necessários ao seu reconhecimento dentro da época que foi produzido.

Autenticidade

O conceito de “autenticidade” é outro que aparece diversas vezes na discussão


sobre o que pode ser considerado como música popular brasileira. Elementos musicais
inseridos em uma cultura específica podem ser indicadores de autenticidade, sendo o
ritmo o elemento considerado como o que mais distingue a música popular brasileira. Nos
relatos, esses ritmos são aproximados com a cultura, com um local de origem ou com um
compositor brasileiro.
73

3 Modelagem conceitual e ontologias

No início deste capítulo é feita uma pequena revisão sobre organização e represen-
tação da informação e organização e representação do conhecimento, o posicionamento
das ontologias como sistemas de organização do conhecimento e discute-se a contribuição
da representação do conhecimento para a representação da informação. É apresentada
a disciplina, de modelagem conceitual e, em seguida, é feita uma pequena revisão sobre
ontologias e como elas se relacionam com a modelagem conceitual. Finalmente, são apre-
sentadas a ontologia de fundamentação UFO e a linguagem OntoUML, que embasam o
modelo conceitual apresentado nesta dissertação.

3.1 Organização e Representação do Conhecimento


e da Informação
Nesta sessão são apresentados os conceitos de Organização da Informação (OI),
Organização do Conhecimento (OC), Representação da Informação (RI) e Representação do
Conhecimento (RC) como entendidos neste trabalho. Essa visão se alinha com a proposta
de Bräscher e Café (2008). Faz-se necessário, primeiramente, diferenciar e relacionar os
conceitos de informação e conhecimento.
Para Fogl (1979 apud BRÄSCHER; CAFÉ, 2008) a informação é composta de três
elementos: (i) conhecimento (conteúdo da informação); (ii) linguagem (um instrumento
de expressão de itens de informação); e (iii) suporte (objetos materiais ou energia). De
acordo com o autor, a única fonte de origem da informação é o conhecimento, a consciência
humana, não o próprio objeto que está sendo conhecido, avaliado ou transformado.
Ainda na visão de Fogl, pelo exame de sua estrutura cognitiva, a informação
não pode ser vista como um objeto concreto contábil, mas sim como algo subjetivo,
relativo e dependente da interpretação do receptor. A informação é vislumbrada como
uma possibilidade de transformar estruturas do conhecimento e, portanto, o conhecimento
pode ser visto como algo provisório e em permanente revisão.
Farradane (1980) define conhecimento como “um registro relembrável de um
processo no cérebro, algo presente apenas na mente” e informação como “uma alternativa
física para o conhecimento [...] usada para comunicação”.
Informação e conhecimento são conceitos que se inter-relacionam fortemente, entre-
tanto possuem características distintas que podem ser utilizadas para distinguir os termos
Organização da Informação e Organização do Conhecimento.
74 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

Para Bräscher e Café (2008) a organização da informação pode ser vista como um
processo que tem por objetivo possibilitar o acesso ao conhecimento contido na informação.
Para ser organizada, a informação precisa ser descrita e uma descrição é um enunciado
de propriedades de um objeto ou das relações desse objeto com outros que o identificam
(SVENONIUS, 2000, p. 54). Esse objeto constitui a unidade de informação organizável
(i. e., informação registrada na forma de textos, imagem, registros sonoros, entre outros),
denominada de “pacote informacional” ou “objeto informacional”.
Buckland (1991) propõe três significados de informação: (i) informação-como-
processo; (ii) informação-como-conhecimento; e (iii) informação-como-coisa. De acordo
com o autor, “Qualquer que seja o sistema de armazenamento e recuperação da informação
necessita da informação-como-coisa”. O objeto informacional de Svenonius, corresponde ao
entendimento de Buckland de informação-como-coisa.
A organização da informação requer dois tipos de descrição dos objetos informacio-
nais: (i) a descrição física do objeto; e (ii) a descrição do seu conteúdo. A descrição física é
direcionada ao suporte enquanto a descrição de conteúdo tem foco no conhecimento contido
na informação. Para Bräscher e Café (2008) o produto da Organização da Informação é a
Representação da Informação, “um conjunto de elementos descritivos que representam os
atributos de um objeto informacional específico”.
Dahlberg (1993 apud BRÄSCHER; CARLAN, 2010, p. 149) define Organização
do Conhecimento como “a ciência que estrutura e organiza sistematicamente unidades
do conhecimento (conceitos) segundo seus elementos de conhecimento (características)
inerentes e a aplicação desses conceitos e classes de conceitos ordenados a objetos/assuntos.”
A organização do conhecimento visa à construção de modelos de mundo que se
constituem em abstrações da realidade. A representação do conhecimento é produto
do processo de organização do conhecimento. Davis, Hall, Heath, Hill e Wilkins (1992
apud CAMPOS, 2004) veem a representação do conhecimento como “estruturas que são
utilizadas para construir ou representar o mundo, de maneira que o conhecimento possa
ser usado em diferentes aplicações”.
A OI e a RI tratam do objeto informacional, dos registros de informação, dos
objetos físicos. O objeto da OC e da RC, por sua vez, se encontra no mundo das ideias,
cuja unidade elementar é o conceito. Entende-se que o conceito, objeto da OC e da RC, é
primariamente o conceito geral de Dahlberg.
Dahlberg (1978), em sua Teoria do Conceito, define conceito como a reunião e
compilação de enunciados verdadeiros a respeito de determinado objeto, fixada por um
símbolo linguístico. Objeto, por sua vez, é tudo aquilo que circunda o ser-humano e que
é por ele designado. Diferenciam-se conceitos individuais de conceitos gerais. Conceitos
individuais expressam objetos individuais. Um objeto individual é “um objeto único,
3.1. Organização e Representação do Conhecimento e da Informação 75

distinto dos demais constituindo uma unidade inconfundível (coisas, fenômenos, processos,
acontecimentos, atributos, etc.)”, caracterizado pela “presença das formas do tempo e
espaço” (e. g., esta casa, esta mesa, esta partida de futebol). Conceitos gerais representam
objetos gerais, que são “objetos situados fora do tempo e do espaço”. São exemplos de
conceitos gerais: casa, mesa, partida de futebol, etc.
De acordo com essa teoria, um conceito possui atributos ou características referen-
ciadas em cada um dos seus enunciados constituindo os elementos do conceito, obtidos
através da análise do conceito e síntese das características (método analítico-sintético). A
intensão de um conceito consiste na soma de suas características e a extensão do conceito é
a soma total dos conceitos mais específicos que possui. A intensão é utilizada para definição
do conceito, entendida como uma forma de delimitação ou fixação de seu conteúdo.

No caso da representação do conhecimento, a representação construída


não se restringe ao conhecimento expresso por um autor, ela é fruto de
um processo de análise de domínio e procura refletir uma visão consen-
sual sobre a realidade que se pretende representar. A representação do
conhecimento reflete um modelo de abstração do mundo real, construído
para determinada finalidade. (BRÄSCHER; CAFÉ, 2008, p. 6)

Essa afirmação diferencia a representação do conhecimento da representação da


informação quando esta lida com a descrição de conteúdos de objetos informacionais.
Para as autoras, a descrição do conteúdo de um objeto informacional (e. g., elaboração
de resumos, classificação e indexação) funciona como uma “atribuição de etiquetas que
representam os conceitos expressos pelo autor”. Nessa visão, o processo de OI se aplica às
ocorrências individuais de objetos informacionais enquanto o processo de OC se aplica a
conceitos.
Dahlberg (2006 apud BRÄSCHER; CARLAN, 2010, p. 149) distingue duas aplica-
ções para a organização do conhecimento: (i) a construção de sistemas conceituais; e (ii) a
correlação ou mapeamento de unidades desse sistema conceitual com objetos da realidade.
Na visão de Bräscher e Café (2008), com a qual concordamos, a primeira aplicação
sugerida por Dahlberg se refere à organização do conhecimento e a segunda aplicação está
no campo da organização da informação.
A Figura 2 demonstra como se relacionam a organização do conhecimento a
organização da informação e suas representações. A OI trata dos objetos (ou pacotes)
informacionais, tais como um documento ou uma fotografia. A RI, vista como um produto
da OI, descreve os objetos informacionais por meio da atribuição de metadados relacionados
tanto ao seu suporte como ao seu conteúdo. A OC, por sua vez, lida com conceitos (no
exemplo, o conceito de cadeira). A RC, produto da OC, utiliza sistemas de organização do
conhecimento (SOC) para organizar os conceitos, sem se referir a nenhum indivíduo em
particular. É ainda demonstrado na figura um relacionamento entre a OC e a OI, onde
76 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

Figura 2 – Organização e Representação da Informação e do Conhecimento

OC/RC OI/RI
- Características - Conceito Individual
- Conceitos - Individualização de um
- Classificação Pacote Informacional
- Relacionamentos

Organização do Organização da
Conhecimento (OC) Informação (OI)

Representação do Representação da
Conhecimento (RC) SOC Informação (RI)

| móvel | - Autor: Silva, J.


- Título: Fabricação de cadeiras
é um - Local: Brasília
| cadeira | é feita de | madeira | - Editor:
serve para - Data:
- Assunto: cadeira, fabricação
| sentar |

Fonte: Bräscher e Café (2008).

o conceito (de cadeira) posicionado em uma RC (elaborada na estrutura de um SOC) é


utilizado como assunto na RI exemplificada.

3.1.1 Sistemas de Organização do Conhecimento


Como afirma Vickery (2008), organizar o conhecimento é reunir o que conhecemos
em uma estrutura sistematicamente organizada, mostrar suas partes e relacionamentos. O
produto da organização do conhecimento é a representação do conhecimento, implementada
por meio de sistemas de organização do conhecimento (SOC).

A representação do conhecimento é feita por meio de diferentes tipos de


sistemas de organização do conhecimento (SOC) que são sistemas concei-
tuais que representam determinado domínio por meio da sistematização
dos conceitos e das relações semânticas que se estabelecem entre eles.
(BRÄSCHER; CAFÉ, 2008, p. 8)
3.1.1. Sistemas de Organização do Conhecimento 77

Para Bräscher e Carlan (2010, p. 150) os SOCs são “tipos de sistemas conceituais,
ou [...] tipos de representações do conhecimento, frutos do processo de organização do
conhecimento”. Em SOCs, “[...] o principal objeto de trabalho são os conceitos e não a
expressão usada para se referir a eles (os termos, códigos, fórmulas ou outros símbolos que
os representam)” (BRÄSCHER; CARLAN, 2010, p. 155).
Segundo as autoras, os SOCs:

a) são frutos dos processos de organização do conhecimento;


b) são utilizados como instrumentos em processos de classificação e indexação;
c) caracterizam-se pela relação entre os conceitos;
d) são sistemas de representações semânticas; e
e) são compostos de conceitos.

Na visão de Hjørland (2008 apud BRÄSCHER; CARLAN, 2010) os SOCs são


“ferramentas que apresentam a interpretação organizada de estruturas do conhecimento,
também chamadas de ferramentas semânticas”.
Hodge (2000) agrupa os SOCs em três categorias:

a) Listas de termos: englobam listas de termos geralmente acompanhados de suas


definições. Compreendem:

– Lista de autoridades: listas de termos que controlam as variações de nomes


para entidades, como nomes de países, indivíduos ou instituições.
– Glossários: lista de termos com definições, geralmente de um assunto ou
domínio específico.
– Dicionários: lista alfabética de palavras e suas definições. Seu escopo é mais
geral que o dos glossários.
– Gazetteers: dicionário de nomes de lugares e acidentes geográficos, tais como
cidades, rios, vulcões. Quando georreferenciados, os gazetteers apresentam as
coordenadas para a localização de lugares na superfície da Terra.

b) Classificações e categorias: reúnem SOCs que enfatizam a criação de classes de


assuntos. São eles:

– Cabeçalhos de assunto: conjunto de termos controlados que representam os


assuntos de uma coleção.
– Esquemas de classificação, taxonomias e esquemas de categorização: esquemas
utilizados para agrupar entidades em classes mais gerais. Os esquemas de
categorização são geralmente usados para reunir os termos de tesauros em
tópicos. As taxonomias são usadas em modelos orientados a objeto e em
78 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

Figura 3 – SOCs quanto à estruturação e distanciamento da linguagem natural.

Fonte: Zeng e Salaba (2005).

sistemas de gestão do conhecimento, para indicar grupos de objetos baseados


em características particulares.

c) Listas de relacionamentos: agrupam SOCs que privilegiam a conexão entre


termos e conceitos. Englobam:

– Tesauros: conjunto de termos que representam conceitos e as relações de


equivalência, hierárquicas e associativas que se estabelecem entre eles.
– Redes semânticas: estrutura de conceitos e termos em forma de rede ou teia,
os conceitos são nós e os relacionamentos expandem-se a partir dos nós.
– Ontologia: estrutura de conceitos e representação dos relacionamentos com-
plexos entre eles, incluindo regras de inferência e axiomas.

O gráfico da Figura 3, apresentado por Zeng e Salaba (2005), sintetiza a classificação


proposta por Hodge (2000), posicionando os diversos SOCs em um plano que varia em
termos de complexidade de sua estrutura e de distância em relação à linguagem natural.
Observa-se a posição das ontologias como o SOC de estrutura mais complexa e maior
formalismo.
Quanto aos objetivos dos SOC, Soergel (1999) enumera:

a) prover um mapa semântico para domínios individuais e para os relacionamentos


3.1.2. Representação do Conhecimento para a Representação da Informação 79

entre domínios, fornecendo orientação e servindo como um instrumento de


referência;
b) melhorar a comunicação e o ensino;
c) prover uma base conceitual para a boa execução da pesquisa e implementação;
d) prover classificação para a ação, isto é, o uso prático dos SOC em diferentes
atividades profissionais, tais como a classificação de doenças para diagnósticos
médicos e de mercadorias para o comércio;
e) apoiar a recuperação da informação; e
f) prover uma base conceitual para sistemas baseados em conhecimento e para
a definição de elementos de dados e hierarquias de objetos na engenharia de
software, servir como um dicionário mono, bi ou multilíngue para uso pelo
homem ou por sistemas automáticos de processamento da linguagem natural.

3.1.2 Representação do Conhecimento para a Representação da Informação


Como visto, a representação do conhecimento (RC) é realizada através de sistemas
de organização do conhecimento (SOC) e um dos objetivos dos SOCs é apoiar a recuperação
da informação. Para Bräscher e Carlan (2010, p. 149) os SOCs “cumprem importante papel
de padronização da terminologia adotada para organização e recuperação de informações,
ao delimitar o uso de termos e definir conceitos e relações de alguma área do conhecimento,
de forma compartilhada e consensual.”
O uso mais comum de SOCs para OI é na descrição de conteúdo, onde “cumprem
a função de padronizar a representação da informação, no que concerne à identificação
do assunto do documento” (BRÄSCHER; CAFÉ, 2008, p. 8). A descrição de conteúdo é
comumente feita por meio do uso de ontologias e taxonomias.
A OI e a OC se inter-relacionam, mas são processos distintos. A OC produz
representações de conhecimento utilizadas na OI para padronizar as representações de
informação. Bräscher e Carlan (2010) enfatizam duas funções dos SOCs no âmbito da OI:
representar e recuperar a informação.

Os SOC são aplicados para mapear objetos informacionais, ou seja, para


representar os assuntos dos documentos num sistema de informação.
Nesse contexto, os SOC são instrumentos usados nos processos de classi-
ficação e indexação. A qualidade obtida na recuperação da informação
dependerá substancialmente desses instrumentos. Portanto, os padrões
de organização devem ser definidos desde a concepção do sistema para
permitir que a informação seja encontrada posteriormente. (BRÄSCHER;
CARLAN, 2010, p. 150)

Vignoli, Souto e Cervantes (2013) afirmam que os SOCs possuem como principal
atributo fomentar a organização e a representação da informação. Para as autoras, os
80 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

SOCs são utilizados para organizar e representar o conhecimento por meio de suas bases
conceituais, para que seja possível representar a informação.

Diante disso, os SOCs atendem tanto a OI e a RI, quanto a OC e a


RC, e isso sempre ocorrerá quando o conhecimento for representado em
informação, num devir incessante. Dessa forma, os SOCs são sistemas de
organização do conhecimento que são úteis para organizar, padronizar
e possibilitar a recuperação da informação e do conhecimento, ou vice-
versa, por meio de sistemas como a ontologia e a taxonomia. (VIGNOLI;
SOUTO; CERVANTES, 2013, p. 62)

Mas não é apenas para a descrição de conteúdo que os SOCs podem contribuir para
a OI. A construção de esquemas de metadados e regras de catalogação pode se beneficiar
do estudo prévio dos conceitos relacionados ao domínio da informação a ser representada.
O trabalho feito pela IFLA com a elaboração e evolução dos modelos conceituais
da família FRBR desde os anos 1990, consolidados no modelo LRM em 2017, demonstra a
força dessa ideia dentro da área da biblioteconomia.
O IFLA LRM objetiva “tornar explícitos os princípios gerais que governam a
estrutura lógica da informação bibliográfica” e se propõe a servir como “guia ou base para
formulação de regras de catalogação e implementação de sistemas bibliográficos” (RIVA;
LE BOEUF; ŽUMER, 2017, p. 9-10). O LRM é, portanto, um modelo de representação
do conhecimento para o domínio bibliográfico que visa contribuir para uma melhor
representação da informação.
O modelo de representação de música popular brasileira proposto neste trabalho,
diferentemente do IFLA LRM, não é feito especificamente para o domínio bibliográfico,
todavia, os conceitos nele representados podem ser úteis para a identificação de metadados
bibliográficos, além da descrição de conteúdo. A modelagem de gênero considera aspectos
relacionados ao conteúdo e a outros aspectos culturais ligados à origem e à percepção das
obras musicais, enquanto a modelagem da cadeia produtiva das obras musicais trata do
conteúdo e também de conceitos de interesse bibliográfico.

3.2 Modelagem Conceitual


Com o aumento da complexidade dos sistemas de informação tornou-se necessário
o desenvolvimento de modelos que facilitassem o entendimento do usuário em relação aos
sistemas sem expor informações mais técnicas de implementação. Esses modelos buscam
espelhar com maior fidelidade a complexidade semântica do mundo real da informação
(SAYÃO, 2001). Os modelos conceituais buscam um entendimento compartilhado do
domínio de interesse ou do universo do discurso. A comunidade de usuários envolvida no
domínio passa a ter uma linguagem comum através da qual o seu conhecimento possa ser
3.2. Modelagem Conceitual 81

expresso, facilitando a comunicação entre esta comunidade e o sistema (SIVA; SOUZA,


2016).
Mylopoulos (1992) define modelagem conceitual como “a atividade de descrever
formalmente alguns aspectos do mundo físico e social, com o propósito de entendimento e
comunicação”. Os modelos conceituais, produtos da atividade de modelagem conceitual,
são feitos para serem usados por humanos, não por máquinas. A adequabilidade de um
modelo conceitual está em sua contribuição para a construção de modelos da realidade
que promovam um entendimento comum dessa realidade entre seus usuários humanos.
Para Guizzardi (2005), modelos conceituais suportam também a atividade de solução de
problemas, além do entendimento e comunicação.
Nas esferas da Organização e Representação do Conhecimento (OC e RC), a
estruturação de conceitos é embasada pela Teoria do Conceito de Dahlberg (1978). O
conceito é a unidade elementar desenvolvida tanto pela OC como pela modelagem conceitual.
Tal como visto na seção 3.1, a OC visa à construção de modelos de mundo que se constituem
em abstrações da realidade, e o produto da OC é a RC. O entendimento de Davis, Hall,
Heath, Hill e Wilkins (1992 apud CAMPOS, 2004) da RC como “estruturas que são
utilizadas para construir ou representar o mundo, de maneira que o conhecimento possa ser
usado em diferentes aplicações” implica na necessidade de organização dessas estruturas
com base nos conceitos envolvidos. Existe, portanto, a necessidade de uma estrutura
ontológica para a representação do conhecimento epistemológico.
A RC é produto da OC, da mesma maneira que modelos conceituais são produto
da modelagem conceitual e, assim como a implementação da RC é suportada por Sistemas
de Organização do Conhecimento (SOC), a implementação de modelos conceituais se
suporta em técnicas e linguagens de modelagem conceitual, tais como a modelagem
Entidade-Relacionamento (ERM)1 e Unified Modeling Language (UML)2 e a OntoUML3 .
Entende-se que modelos conceituais podem apoiar a construção de representações
do conhecimento, provendo a formalização conceitual necessária a um melhor entendimento
do domínio do conhecimento e comunicação entre projetistas e usuários de modelos de
representação do conhecimento. Ontologias como SOCs4 se apoiam em modelos semelhantes
aos modelos de dados5 utilizados pela Engenharia de Software, e linguagens de representação
do conhecimento, tais como RDF e OWL, são utilizadas para representar tanto a estrutura
dos dados como os dados em si. Percebe-se que é na construção de ontologias que a
modelagem conceitual pode contribuir mais com a OC, por necessitar de uma estrutura
1
Chen (1976).
2
Object Management Group (2005)
3
Guizzardi (2007), Guizzardi e Wagner (2010), Guizzardi et al. (2018)
4
O conceito de ontologias, como entendido neste trabalho, é discutido na seção 3.3 e difere do entendi-
mento de ontologias como SOCs.
5
Um modelo de dados, tal como definido por Elmasri e Navathe (2011, p. 30) é uma coleção de conceitos
que podem ser utilizados para descrever a estrutura de uma base de dados.
82 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

mais elaborada e complexa que os demais SOCs.


Para Sayão (2001), a natureza ampla e interdisciplinar da Ciência da Informação a
permite adotar paradigmas e modelos de outras áreas. Um exemplo dessa aplicação de
paradigmas e modelos externos é a utilização de linguagens de modelagem conceitual, tais
como o modelo entidade-relacionamento e a modelagem orientada a objetos, oriundas da
Ciência da Computação nos modelos da família FRBR e no CIDOC CRM.
De acordo com Taniguchi (2002), é percebido na área da Biblioteconomia um
empenho no desenvolvimento de modelos para catalogação no nível conceitual com o
objetivo de reexaminar a estrutura atual dos registros e bases de dados bibliográficas e das
práticas correntes baseadas nessa estrutura e assim propor uma estrutura alternativa. O
autor justifica a adoção da modelagem conceitual por considerar que sua utilização pode
trazer resultados benéficos por exigir um reexame dos conceitos envolvidos em um nível
mais fundamental. Espera-se que a modelagem conceitual possa contribuir com a redução
dos custos e esforços de catalogação e a adoção de códigos e práticas de catalogação
mais adequados a ambientes digitais, reconhecendo os problemas enfrentados em um nível
conceitual, tentando em seguida encontrar uma maneira de resolvê-los nesse nível, para
finalmente tentar implementar soluções práticas.
Dois elementos-chave da modelagem conceitual são os conceitos de modelo e
conceitualização. Uma conceitualização pode ser definida, de uma forma geral, como
“um conjunto de conceitos que articulam abstrações de um dado estado das coisas em
um domínio da realidade” (GUIZZARDI, 2007). Dá-se o nome de “referentes” às coisas
do domínio, também chamadas de truth makers da conceitualização. Símbolos de uma
linguagem são então utilizados para se referir às coisas do domínio indiretamente por meio
dos conceitos. Esse mapeamento indireto entre símbolo e referente é definido como uma
função de interpretação. A Figura 4 mostra o triângulo de Ullmann, que apresenta as
relações entre algo na realidade, sua conceitualização e uma representação simbólica dessa
conceitualização (ULLMANN, 1972).

Figura 4 – Triângulo de Ullmann.

Fonte: Albuquerque (2013, p. 9).


3.2. Modelagem Conceitual 83

De acordo com Guizzardi (2007), conceitualizações e abstrações são elementos


essenciais para a criação de modelos. Entretanto, ambas são entidades imateriais que
existem apenas na mente do usuário ou de uma comunidade de usuários de uma linguagem.
Para serem documentadas, comunicadas e analisadas, as conceitualizações e abstrações
devem ser representadas em termos de um artefato. Uma linguagem torna-se então
necessária para representá-las de uma forma concisa, completa e não ambígua. Esses
artefatos são conhecidos como modelos, e para serem criados são necessários elementos
conhecidos como primitivas de modelagem. As primitivas de modelagem são usadas para
representar os conceitos de uma conceitualização. O conjunto das primitivas de modelagem
compõe uma linguagem de modelagem, que é fundamentada na conceitualização. As relações
entre conceitualização, abstração, linguagem de modelagem e modelo são apresentadas na
Figura 5.

Figura 5 – Relações entre conceitualização, abstração, linguagem de modelagem.

Fonte: Guizzardi (2007, p. 3).

Guizzardi (2007) diferencia linguagens sentenciais de linguagens diagramáticas em


termos de sua sintaxe:

O conjunto de símbolos que compõem uma linguagem e as regras para


a combinação válida desses símbolos constituem sua sintaxe. No caso
de linguagens sentenciais, a sintaxe é primeiramente definida em ter-
mos de um alfabeto (conjunto de caracteres) que podem ser agrupados
em sequências válidas, formando palavras. Essa é a camada léxica [...]
Palavras podem ser agrupadas em sentenças, de acordo com regras preci-
samente definidas [...] Finalmente, essas sentenças são restringidas por
condições contextuais.
Em linguagens diagramáticas (gráficas), a sintaxe não é definida em ter-
mos de uma sequência linear de caracteres, mas em termos de símbolos
gráficos. O conjunto de primitivas gráficas de modelagem formam a ca-
mada léxica e a sintaxe abstrata da linguagem é tipicamente definida por
um metamodelo. Finalmente, o metamodelo é enriquecido por condições
contextuais...
84 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

Linguagens de modelagem podem, ainda, representar conceitos específicos de


domínios do conhecimento (e. g., música, biblioteconomia, direito, anatomia, etc.) ou
representar conceitos genéricos, que independem particularmente de um domínio. Diferem-
se portanto, linguagens específicas de domínio das linguagens independentes de domínio.
Utiliza-se a Figura 6 para exemplificar os conceitos de linguagem de modelagem,
primitivas de modelagem, modelo, linguagem específica de domínio, linguagem indepen-
dente de domínio e metamodelo. Os diagramas nos quadrantes (a) e (b) apresentam
respectivamente as primitivas de modelagem de uma linguagem de modelagem (L1) es-
pecífica de domínio e de uma linguagem de modelagem (L2) independente de domínio, e
nos quadrantes (c) e (d) são apresentados dois exemplos de modelos que instanciam essas
linguagens.

Figura 6 – Linguagem específica de domínio e linguagem independente de domínio.


Linguagem específica de domínio (L1) Linguagem independente de domínio (L2)
de Modelagem
Primitivas

(a) (b)

(c) (d)
Modelo

Analisa-se inicialmente o exemplo da linguagem L1, específica para um domínio


simples: existem pessoas e cachorros, e pessoas podem ou não possuir cachorros. Existe
ainda a restrição de que um cachorro não pode ter mais de um dono. A existência dessas
entidades (i. e., pessoas e cachorros), relacionamentos e restrições é a conceitualização
representada pela linguagem L1.
Essa linguagem possui três primitivas de modelagem (a), que permitem a represen-
tação de instâncias de pessoas, de cachorros e de relacionamentos entre pessoas e cachorros,
que indicam a posse de um cachorro por uma pessoa. O quadrante (c) apresenta um
modelo que instancia a linguagem L1, utilizado suas primitivas de modelagem. Sobre a
abstração representada por esse modelo, pode-se afirmar que: existem duas pessoas, Maria
e João; existem dois cachorros, Rex e Hulk; Maria possui Rex; Maria possui Hulk; e João
não possui cachorro algum.
A conceitualização representada pela linguagem L2, que é independente de domínio,
considera a existência de classes (i. e., tipos de coisas) e tipos de relacionamentos entre
3.3. Ontologias 85

instâncias dessas classes. Nota-se que essa conceitualização não se restringe a um domínio
específico do conhecimento.
As primitivas de modelagem da linguagem L2 aparecem no quadrante (b). Observa-
se que além do nome do tipo de relacionamento, pode ser indicada a direção de leitura e as
cardinalidades (ou multiplicidades) do relacionamento. Uma cardinalidade indica quantas
instâncias da classe do seu lado podem ser associadas a uma instância da classe do lado
oposto. As letras ‘m’ e ‘n’ representam a cardinalidade mínima e máxima respectivamente.
O limite máximo pode ser representado por um ‘*’, que indica a não restrição de um
limite máximo, e, um limite mínimo de 0 (zero) indica a opcionalidade do relacionamento.
Por exemplo: a cardinalidade ‘0..*’ representa um relacionamento opcional e sem limite
máximo de instanciações.
No quadrante (d) é apresentado um modelo que instancia a linguagem L2. A
abstração representada por esse modelo é a seguinte: existem pessoas e cachorros; uma
pessoa pode possuir zero ou mais cachorros (cardinalidade ‘0..*’); e um cachorro pode ou
não (cardinalidade ‘0..1’) pertencer a uma pessoa.
O modelo em (d), acompanhado de enunciados que definam os conceitos envolvidos,
pode ser considerado um modelo conceitual caso tenha sido feito com o propósito de
formalizar sua abstração para o entendimento e comunicação entre pessoas, não por
máquinas.
Observa-se que o modelo em (d) utiliza uma linguagem independente de domínio
para representar conceitos específicos de domínio, e que sua abstração corresponde à
conceitualização da linguagem L1. Nesse exemplo, a camada léxica da linguagem L1
consiste nas primitivas do quadrante (a) e sua sintaxe abstrata é representada pelo modelo
em (d). O modelo em (d) é o metamodelo da linguagem L1.

3.3 Ontologias
O termo ontologia é entendido diferentemente pela Filosofia e pela comunidade de
Inteligência Artificial (IA). No contexto filosófico, uma ontologia é um sistema particular de
categorias que considera uma certa visão de mundo, em oposição à visão da IA de ontologia
como um artefato de engenharia, constituído de um vocabulário específico utilizado
para descrever uma certa realidade e de um conjunto de pressupostos explícitos sobre o
significado pretendido das palavras do vocabulário. O mesmo entendimento da IA é, de uma
forma geral, compartilhado por toda a comunidade da Ciência da Computação (GUARINO,
1998). Ontologia com “O” maiúsculo é uma disciplina filosófica. Etimologicamente, esse
termo pode ser traduzido como o estudo do ser (GUIZZARDI, 2007).
De acordo com o Gruber (2009), uma ontologia, no contexto das áreas da Ciência da
86 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

Informação e da Ciência da Computação, define um conjunto de primitivas de representação


utilizadas para modelar um domínio do conhecimento ou do discurso. Essas primitivas
tipicamente consistem em classes, atributos e relacionamentos, e suas definições incluem
informações sobre seu significado e restrições para sua aplicação logicamente consistente.
Uma ontologia, nesse sentido, corresponde a um modelo semântico representado em
determinada linguagem. Em sistemas de bancos de dados, uma ontologia funciona como
uma abstração do modelos de dados que representa o conhecimento sobre indivíduos, seus
atributos e seus relacionamentos com outros indivíduos. Devido à sua independência de
aspectos mais técnicos do armazenamento de dados, as ontologias são utilizadas para
integrar bases de dados heterogêneas, de modo a habilitar a interoperabilidade entre
diferentes sistemas. Ontologias, nesse sentido, desempenham um papel central no universo
da Web Semântica, como artefato utilizado para registro e exposição da estrutura de
publicação de dados na Web.

Figura 7 – Interoperabilidade semântica.

A Figura 7 exemplifica uma ontologia, como definida por Gruber (2009), e sua
utilidade para a interoperabilidade entre sistemas. No exemplo, a ontologia (a), represen-
tada na linguagem UML, provê um alinhamento semântico entre duas bases de dados
heterogêneas: uma base de dados de arquivos texto (BD1); e uma base de dados que utiliza
um banco de dados relacional (BD2).
3.3. Ontologias 87

As duas bases armazenam dados com nomes de pessoas e de cachorros e rela-


cionamentos entre pessoas e cachorros, porém de maneiras distintas. O modelo em (b)
representa como são armazenados os dados na base BD1: linhas com o nome do dono
e do cachorro separados por uma vírgula ‘,’. Um exemplo de arquivo nesse formato é
apresentado em (d). A base BD2, armazena dados em tabelas de um banco de dados
relacional. Seu modelo de dados é apresentado em (c): uma tabela de pessoas com colunas
para um identificador único e o nome de cada pessoa; e uma tabela de cachorros com
colunas para um identificador único do cachorro, o nome do cachorro e o identificador do
dono. Em (e) são exemplificadas duas tabelas com dados estruturados de acordo com esse
modelo. Observa-se em (d) e (e) dados que representam Maria e seus dois cachorros, Rex
e Hulk.
Um exemplo de integração entre as duas bases de dados seria a transferência de
dados da BD1 para a BD2. Mas, antes de decidir como transferir os dados de uma base
para outra, é necessário entender como os dados de uma base se relacionam com os dados
da outra base, ou seja, é necessário prover um alinhamento semântico entre seus modelos
de dados. Uma forma de se fazer isso é através da construção de uma conceitualização
comum aos dois modelos. A ontologia em (a) provê essa conceitualização. No exemplo, as
setas entre os modelos de dados (b) e (c) e a ontologia (a) representam esse alinhamento
semântico, realizado, indiretamente, por intermédio da ontologia. Verifica-se que “DONO”
em (b) e “PESSOA” em (c) correspondem ao mesmo conceito “Pessoa” em (a) e que a
ligação entre “DONO” e “CACHORRO” em uma única linha, separados por “,” em (b)
e a ligação entre as linhas das tabelas “CACHORRO” E “PESSOA” através da coluna
“id_cachorro” em (c) correspondem ao relacionamento “possui” em (a). Após resolvida a
interoperabilidade semântica, podem ser decididos detalhes tecnológicos para a integração
entre as bases.
A integração intermediada por uma conceitualização comum é mais efetiva que
a integração direta entre os modelos de dados porque reduz a possibilidade de erros
decorrentes de ambiguidades terminológicas. Outra vantagem dessa abordagem é decorrente
do reuso de ontologias. Seria possível utilizar uma ontologia já existente, considerada
adequada às duas aplicações, reduzindo o trabalho de modelagem. A ontologia (a), por
exemplo, também poderia servir para integração com outras bases de dados que lidassem
com o mesmo domínio do conhecimento. E, caso sua conceitualização fosse interessante para
um domínio mais amplo ou mais específico, ou se essa conceitualização fosse complementar
a um outro domínio, a ontologia poderia ser (re)utilizada por outras6 .
No universo da Web Semântica e dos Dados Abertos Ligados, as ontologias são
representadas em linguagens como RDF, RDF Schema e OWL. Esse tipo de ontologia
6
Na seção 5.5 (Music Ontology) são apresentados exemplos de reutilização de ontologias no contexto da
Web Semântica.
88 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

consiste em um modelo de dados para a publicação de dados no formato RDF, legível por
máquina, cuja conceitualização subjacente é também utilizada para interoperabilidade
semântica entre bases de dados heterogêneas. Por ser um modelo para publicação de dados,
também resolve aspectos tecnológicos necessários à interoperabilidade dessas bases. No
exemplo da Figura 7, a ontologia (a) seria também um terceiro modelo de dados.
No trecho a seguir, Guizzardi, Almeida, Guizzardi, Barcellos e Falbo (2011, p. 1-2)
explicam como é entendido o conceito de ontologia em diferentes disciplinas, introduzem
os conceitos de ontologia de fundamentação e ontologia de domínio, e justificam o uso de
ontologias de fundamentação como base para a construção de linguagens de modelagem
conceitual:

Em modelagem conceitual e áreas afins (ex. modelagem organizacional),


o termo é usado de acordo com sua definição original em filosofia, a saber,
como uma referência a um sistema formal e filosoficamente bem funda-
mentado de categorias que pode ser usado para articular conceituações
e modelos em domínios específicos do conhecimento. Em contraste, nas
outras áreas supracitadas, o termo ontologia tem sido usado como: (i)
artefato concreto de engenharia, projetado com um propósito específico e
sem prestar nenhuma ou quase nenhuma atenção a aspectos teóricos de
fundamentação; (ii) modelo de um domínio específico do conhecimento
(ex., biologia molecular, finanças, logística, doenças infecciosas) expresso
em uma linguagem de representação do conhecimento (ex., RDF, OWL,
F-Logic) ou modelagem conceitual (ex., UML, EER, ORM).
Ontologias, no sentido filosófico, têm sido desenvolvidas em filosofia desde
Aristóteles com sua teoria de Substância e Acidentes e, mais recente-
mente, várias dessas teorias têm sido propostas sob o nome de Ontologias
de Fundamentação (Foundational Ontologies). Desde o fim da década
de oitenta, observa-se um crescente interesse no uso dessas ontologias de
fundamentação no processo de avaliação e (re)engenharia de linguagens
de modelagem conceitual. A hipótese inicial, e que foi posteriormente
confirmada por várias evidências empíricas, pode ser explicada através da
seguinte argumentação: (i) modelos conceituais são artefatos produzidos
com o objetivo de representar uma determinada porção da realidade
segundo uma determinada conceituação; (ii) Ontologias de Fundamen-
tação descrevem as categorias que são usadas para a construção dessas
conceituações. Podemos, portanto, concluir que uma linguagem adequada
de modelagem conceitual deveria possuir primitivas de modelagem que
refletissem as categorias conceituais definidas em uma Ontologia de Fun-
damentação.
Uma ontologia de domínio, no sentido usado pelas demais comunidades
em computação, é um tipo particular de modelo conceitual. Em particu-
lar, é um modelo conceitual que deve satisfazer o requisito adicional de
servir como uma representação de consenso (ou modelo de referência) de
uma conceituação compartilhada por uma determinada comunidade. Por-
tanto, se uma ontologia de domínio é, antes de qualquer coisa, um modelo
conceitual, uma linguagem adequada para representação de ontologias de
domínio deve satisfazer os requisitos gerais de uma linguagem adequada
para modelagem conceitual, ou seja, deve ter como teoria subjacente
uma ontologia de fundamentação. Em outras palavras, ontologias (no
sentido adotado em filosofia e em modelagem conceitual) representam
ferramentas conceituais de importância fundamental para a criação de
ontologias de domínio de qualidade (no sentido adotado nas demais
áreas).
3.4. Unified Foundational Ontology (UFO) 89

No início do século XX, o filósofo Edmund Husserl definiu Ontologia Formal como
uma subárea da Ontologia como disciplina filosófica que trata de estruturas ontológicas
formais, ou seja, aspectos formais dos objetos que independem de sua natureza particular.
São exemplos dessas estruturas: relações todo-parte, tipos e instanciação, identidade,
dependência e singularidade (ZAMBORLINI, 2011; GUIZZARDI, 2005). Ontologias for-
mais utilizam teorias desenvolvidas pela Ontologia Formal em um sistema de categorias
independente de domínio (conceitos como parte, todo, papel, evento, etc.), que podem
ser usados para a construção de outros tipos de ontologias, tais como as ontologias de
domínio.
Reforça-se o entendimento, neste trabalho, de ontologia de domínio como um tipo
particular de modelo conceitual que deve satisfazer o requisito adicional de servir como uma
representação de consenso, ou modelo de referência, de uma conceituação compartilhada
por uma determinada comunidade.

3.4 Unified Foundational Ontology (UFO)


A ontologia de fundamentação UFO (Unified Foundational Ontology), proposta por
Guizzardi (2005), é baseada em meta-propriedades ontológicas e define, entre outras coisas,
termos relacionados a aspectos estruturais, tais como, conceitos gerais de objetos, suas
propriedades intrínsecas e relacionais, os tipos que instanciam e os papéis que representam.
Esta ontologia tem sido desenvolvida baseada em um número de teorias das áreas de
Ontologias Formais, Lógica Filosófica, Filosofia da Linguagem, Linguística e Psicologia
Cognitiva. A UFO é dividida em três partes: (i) UFO-A (Ontologia de Endurantes),
que define o núcleo dessa ontologia, sistematizando conceitos como, tipos taxonômicos
e estruturas, relacionamentos todo-parte, propriedades intrínsecas e espaços de valores
de atributos, papéis e propriedades relacionais; (ii) UFO-B (Ontologia de Eventos), que
objetiva sistematizar conceitos como estados, processos, eventos, relações temporais, entre
outros; e (iii) UFO-C (Ontologia de Entidades Sociais e Intencionais), construída sobre
as partes anteriores, objetiva a sistematização de conceitos que incluem agentes, ações,
estados intencionais, delegação, compromissos, reivindicações sociais, entre outros. Um
glossário da UFO pode ser consultado em Araujo (2015).
Na sequência são apresentados alguns aspectos de cada fragmento da UFO e a
linguagem de modelagem OntoUML, utilizada para a representação de modelos conceituais
fundamentados na UFO. Para cada fragmento da UFO, são descritas algumas categorias
ontológicas mais relevantes para este trabalho e um diagrama UML.
Mas, antes, faz-se necessário diferenciar os conceitos de endurantes e perdurantes.
A UFO, tal como outras ontologias de fundamentação, faz uma distinção fundamental
entre indivíduos endurantes e perdurantes, também chamados de eventos. Essa distinção
90 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

pode ser entendida nos termos do seu comportamento em relação ao tempo. Endurantes
são indivíduos que estão inteiramente presentes durante sua existência, ou seja, eles “são
no tempo”. Exemplos de endurantes são: uma casa, uma pessoa, a lua, um punhado de
areia. É possível fazer referência à mesma casa em diversos momentos no tempo e, mesmo
que uma de suas propriedades mude (e. g., a cor das paredes), ela continua sendo a mesma
casa.
Eventos (ou perdurantes) são indivíduos compostos por partes temporais, eles
“acontecem no tempo”. São exemplos de eventos: uma conversa, uma partida de futebol,
um casamento, uma festa de aniversário. Eventos se estendem no tempo, acumulando
partes temporais.

3.4.1 UFO-A: Ontologia de Endurantes


A UFO-A é o fragmento da UFO composto por entidades estruturais, que compre-
endem os conceitos considerados como o núcleo da UFO, tais como conceitos gerais de
objetos, suas propriedades intrínsecas e relacionais, os tipos que eles instanciam, os papéis
que eles desempenham, etc.7
As principais categorias da UFO-A utilizadas nesta pesquisa são conceitos e rela-
ções binárias, que correspondem respectivamente a propriedades unárias e binárias em
Representação do Conhecimento (ver seção 3.1). Tais propriedades apresentam diferentes
meta-propriedades formais conforme apresentado a seguir.

Meta-propriedades unárias

São meta-propriedades de propriedades unárias a identidade, a rigidez e a


dependência.
A identidade é a característica que alguns conceitos têm de prover um critério ou
princípio de identidade para seus indivíduos que permita distingui-los ou contá-los. Por
exemplo, o conceito de maçã provê um critério de identidade que permite a distinção
de uma maçã de outra e também contar quantas maçãs há em uma cesta. O conceito de
vermelho não apresenta essa meta-propriedade. Não faz sentido contar quantos vermelhos
há naquela cesta de maçãs.
A rigidez se refere à necessidade de aplicação do conceito a seus indivíduos durante
sua existência. Quanto à rigidez, um conceito pode ser considerado rígido, anti-rígido
ou semirrígido.
Um conceito rígido é necessariamente aplicável a todos seus indivíduos enquanto
eles existirem. Por exemplo, o conceito de pessoa é rígido se indivíduos classificados
7
Para um conhecimento introdutório mais completo da UFO-A, recomenda-se a leitura de Zamborlini
(2011) e Albuquerque (2013).
3.4.1. UFO-A: Ontologia de Endurantes 91

como pessoa não puderem deixar de ser pessoas enquanto existirem.


Conceitos anti-rígidos têm a característica de serem aplicáveis a seus indivíduos
de maneira contingente. Por exemplo, o conceito estudante é anti-rígido se uma pessoa
puder não ser estudante e passar a ser estudante, ou deixar de ser estudante no decorrer
de sua existência.
Um conceito é considerado semirrígido quando é eventualmente aplicável a alguns
de seus indivíduos, e necessariamente aplicáveis a outros. O conceito de sentável é o
exemplo clássico de conceito semirrígido. Se alguns dos indivíduos forem considerados
necessariamente sentáveis, e. g., uma cadeira, e outros eventualmente sentáveis, e. g., um
caixote, o conceito de sentável é semirrígido.
Outra meta-propriedade unária é a dependência. Diz-se que um conceito C1 é
dependente de outro C2 se para instanciar C1 os indivíduos precisam participar de uma
determinada relação com instâncias de C2 . A dependência pode ser genérica, específica
ou existencial.
A dependência genérica se caracteriza quando a dependência pode mudar.
Por exemplo, considerando-se a possibilidade de transplante, o conceito de coração é
genericamente dependente do conceito de pessoa se ele deve sempre instanciar a relação
parte de com um indivíduo pessoa, que pode mudar.
Uma dependência específica se caracteriza quando a dependência não pode
mudar. Por exemplo, não considerando a possibilidade de transplante, o conceito de
cérebro é especificamente dependente do conceito de pessoa se ele deve sempre instanciar
a relação parte de com um indivíduo pessoa, que não pode mudar.
A dependência existencial é um tipo de dependência específica que ocorre
quando o indivíduo dependente existe somente se o outro indivíduo do qual aquele depende
também existir. Considerando ainda o exemplo citado sobre o cérebro, se o mesmo, para
existir, devesse sempre instanciar a relação com pessoa. Não haveria dependência existencial,
caso o cérebro pudesse continuar existindo fora da pessoa.

Meta-propriedades binárias

Meta-propriedades de propriedades binárias dizem respeito a relações entre indiví-


duos. Essas relações podem ser relações formais ou relações materiais.
Relações formais não dependem de uma entidade mediadora, ou seja, valem pela
simples existência dos indivíduos relacionados. Podem ser classificadas como internas ou
externas.
As Relações formais internas implicam em dependência existencial entre os
indivíduos relacionados. Recorre-se novamente ao exemplo da dependência existencial
92 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

entre o cérebro e a pessoa. Se o cérebro for considerado uma parte essencial de uma pessoa
esta relação vale enquanto o cérebro existir.
Relações formais externas existem pela comparação entre propriedades dos
indivíduos relacionados e valem sempre que os indivíduos e as referidas propriedades
existirem. Como exemplo temos a relação mais pesado que entre duas pessoas, que
existe enquanto os dois indivíduos existirem e o peso do primeiro indivíduo for maior que
o do segundo.
São consideradas relações materiais aquelas que dependem de uma entidade
mediadora para valer. Considera-se, por exemplo, a relação casado com entre duas pessoas
enquanto existir um indivíduo casamento.

Categorias ontológicas estruturais

As categorias ontológicas da UFO-A são consideradas estruturais por se referirem


a conceitos necessários à descrição da estrutura estática de indivíduos endurantes, ou
seja, estes conceitos são utilizados para descrever o estado das coisas em um determinado
momento no tempo, em oposição a conceitos dinâmicos, tais como eventos e outros conceitos
relacionados.

Figura 8 – Fragmento da UFO-A: Tipos de universais e indivíduos.

Fonte: Zamborlini (2011, p. 30).

A UFO pode ser vista como uma teoria sobre categorias de universais (Universal)
e individuais (Individual). Esta diferenciação corresponde à mesma feita por Dahlberg
(1978) entre conceitos gerais e conceitos individuais. No contexto da modelagem concei-
tual, os universais são conhecidos, em geral, como conceito/classe ou relação/associação,
enquanto as instâncias destes representam os indivíduos. Universais são ainda classificados
em monádicos (Monadic) e de relação (Relation). O tipo monádico se aplica aos pa-
drões aplicados a indivíduos singulares (correspondente a conceito/classe em modelagem
conceitual), enquanto o tipo de relação se aplica às relações, ou seja, padrões aplicados a
grupos de dois ou mais indivíduos (correspondente a relação/associação em modelagem
3.5. Níveis de linguagem 93

conceitual). O diagrama da Figura 8 representa essas categorias a partir da categoria fun-


damental, chamada entidade ou coisa (Thing), que representa qualquer coisa referenciada
no universo do discurso.
Utiliza-se como exemplo a descrição do seguinte enunciado “Maria tem um cachorro
chamado Rex”. O conceito cachorro é um universal monádico, a relação tem um é um
universal de relação, e Maria, Rex e a relação Maria tem Rex são individuais.
O modelo proposto neste trabalho utiliza a linguagem OntoUML 2.0, fundamentada
na nova versão da teoria de tipos endurantes e estruturas taxonômicas da UFO apresentada
por Guizzardi et al. (2018).

Figura 9 – Taxonomia revisada de tipos endurantes na UFO.

Fonte: Guizzardi et al. (2018, p. 9).

O diagrama na Figura 9 apresenta a nova taxonomia de tipos endurantes na


UFO. Essas categorias são fundamentadas nas meta-propriedades formais apresentadas
anteriormente nesta seção. As categorias ontológicas Kind, Subkind, Role, Category,
Mixin, RoleMixin, Mode Type e Relator Type são utilizadas no modelo conceitual
proposto neste trabalho por meio de estereótipos da linguagem OntoUML e são explicadas
na seção 3.6 junto à explicação da linguagem.

3.5 Níveis de linguagem


Guizzardi (2007) defende a utilização de duas classes complementares de lingua-
gens de representação na Engenharia de Ontologias8 : (i) Linguagens filosoficamente bem
fundamentadas, focadas na expressividade e na claridade conceitual; (ii) e linguagens com
foco na computabilidade. Linguagens ontológicas representam a primeira classe, enquanto
as linguagens epistemológicas se encaixam na segunda.
8
De acordo com Gómez-Pérez, Fernández-López e Corcho (2004), a Engenharia de Ontologias se refere
ao conjunto de atividades que lidam com o processo de desenvolvimento de ontologias, ciclo de vida
de ontologias, métodos e metodologias para a construção de ontologias e o conjunto de ferramentas e
linguagens que suportam essas atividades.
94 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

De acordo com a classificação proposta por Guarino (1994), a linguagem OntoUML9


se posiciona no nível ontológico. Guarino propõe a classificação de linguagens de acordo
com os níveis apresentados na Tabela 1, revisitando a classificação de Brachman (1979).

Tabela 1 – Níveis de linguagem Lógico, Epistemológico e Ontológico.

Níveis Construtos primitivos Principais características Interpretação


ontológica
Lógico Predicados Formalização Arbitrária
Epistemológico Relações Estruturais (con- Estrutura Arbitrária
ceitos e papéis)
Ontológico Relações Estruturais (sa- Significado Restrita
tisfazem postulados de sig-
nificado)

Fonte: Zamborlini (2011, p. 43)

Como explicado por Guizzardi (2007), o nível lógico se ocupa dos predicados
necessários para representar os conceitos do domínio e com a avaliação da validade des-
ses predicados para certos indivíduos. As primitivas básicas são proposições, predicados,
funções e operadores lógicos, que são extremamente gerais e ontologicamente neutros. Lin-
guagens do nível lógico são neutras em relação a compromissos ontológicos, e é exatamente
esta neutralidade que as tornam interessantes para serem usadas no desenvolvimento de
teorias científicas.
Epistemologia é o ramo da filosofia que estuda a natureza e as fontes de conheci-
mento. Brachman e vários outros estudiosos da tradição lógica em IA interpretam que esse
conhecimento é composto de proposições, cuja estrutura formal é fonte de novo conheci-
mento. O raciocínio por trás do projeto de linguagens epistemológicas é: (i) as linguagens
devem ser projetadas para capturar inter-relações entre pedaços de conhecimento que não
podem ser facilmente capturadas em linguagens lógica; (ii) devem oferecer mecanismos de
estruturação que facilitem o entendimento e a manutenção, devem permitir uma economia
na representação, e prover maior eficiência computacional em relação às linguagens lógicas;
e (iii) as primitivas de modelagem devem representar conexões estruturais do conhecimento
necessárias para justificar inferências conceituais que independam do significado dos con-
ceitos. Linguagens epistemológicas favorecem a formalização do raciocínio em detrimento
da formalização da representação. Alguns exemplos de linguagens de nível epistemológico
são EER10 , OWL11 e UML12 .
9
A linguagem OntoUML é utilizada no modelo conceitual proposto neste trabalho e estudada na
seção 3.6 (OntoUML).
10
Modelo Entidade-Relacionamento Estendido (Enhanced Entity–Relationship) (ELMASRI; NAVATHE,
2011, p. 245-284).
11
Web Ontology Language (ANTONIOU; HARMELEN, 2008, p. 113-156).
12
Unified Modeling Language (OBJECT MANAGEMENT GROUP, 2005).
3.5. Níveis de linguagem 95

Linguagens no nível ontológico permitem explicitar compromissos ontológicos por


meio de suas primitivas de modelagem. Em contrapartida, em linguagens nos níveis lógico
e epistemológico, o significado pretendido de um predicado depende do entendimento do
seu nome em linguagem natural.

Figura 10 – Exemplos de níveis de linguagens.

Na Figura 10 são apresentados exemplos de linguagens nos níveis lógico, epistemoló-


gico e ontológico. Os três exemplos buscam representar a mesma conceitualização: existem
cachorros, que podem ser exclusivamente macho ou fêmea e que não podem mudar de sexo.
No primeiro exemplo, a linguagem no nível lógico (Lógica Clássica de Primeira Ordem),
formaliza a conceitualização por meio dos predicados C(x), F(x) e M(x), representando
os conceitos de cachorro, cachorro macho e cachorro fêmea, respectivamente13 . Há uma
forte formalização, entretanto não há expressividade ontológica, ou seja, os predicados
utilizados na linguagem não explicitam compromisso ontológico algum.
No exemplo da linguagem de nível epistemológico (Entidade-Relacionamento), fica
clara a estrutura da entidade que representa o cachorro e o atributo que representa o
sexo do cachorro. Essa estrutura simples favorece sua implementação em sistemas de
computação, tal como bancos de dados relacionais, porém também não explicita nenhum
compromisso ontológico.
No terceiro exemplo, escrito na linguagem do nível ontológico (OntoUML), as
primitivas da linguagem restringem o entendimento ontológico dos conceitos representados,
por exemplo: o estereótipo kind indica que o conceito cachorro provê um critério de
identidade, é rígido, e que sua existência não depende da existência de outras entidades; e
o estereótipo subkind indica que o conceito de cachorro fêmea (e de cachorro macho) herda
seu critério de identidade, não depende de outros conceitos, e é rígido, ou seja, um cachorro
fêmea será sempre um cachorro fêmea durante sua existência. É importante notar que as
meta-propriedades de identidade, rigidez e dependência só puderam ser representadas na
13
Faz-se a leitura das declarações lógicas da seguinte forma: para todo x tal que x seja um cachorro
então x é um cachorro fêmea ou x é um cachorro macho; para todo x tal que x seja um cachorro fêmea,
então x é um cachorro e não é um cachorro macho; e para todo x tal que x seja um cachorro macho,
então x é um cachorro e não é um cachorro fêmea.
96 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

linguagem de nível ontológico, e que ao oferecer uma maior expressividade, esta linguagem
se torna de mais complexa em termos computacionais.

3.6 OntoUML
A OntoUML é um perfil para a UML (Unified Modeling Language) construído
como uma linguagem diagramática para modelagem conceitual baseada na UFO. Esse
perfil é composto por um conjunto de estereótipos14 que representam distinções ontológicas
propostas pela teoria da UFO e restrições que governam as relações entre esses elementos,
que representam os postulados da teoria (GUIZZARDI; WAGNER, 2010). Na Figura 11
são apresentados os estereótipos utilizados para a representação de classes endurantes na
OntoUML 2.0.

Figura 11 – Perfil da OntoUML 2.0 para endurantes.

Fonte: Guizzardi et al. (2018, p. 10).

A OntoUML utiliza estereótipos para representar as categorias ontológicas dos


tipos de universais da UFO-A e estabelecer restrições formais que refletem a axiomatização
da UFO de tal modo que se restringe o conjunto de modelos gramaticalmente válidos
em OntoUML àqueles que representam situações admissíveis segundo a teoria da UFO
(GUIZZARDI, 2007).
Faz-se uso do diagrama da Figura 12 para explicar o uso da linguagem OntoUML.
Esse diagrama demonstra a aplicação de um sistema de categorias ontológicas em primitivas
14
Estereótipos são mecanismos de extensão da linguagem UML, que permitem a criação de novas primi-
tivas de modelagem a partir de primitivas já existentes, adicionando (meta)propriedades relacionadas a
um domínio específico ou a outra forma especializada de uso da linguagem. Graficamente os estereótipos
são apresentados entre guillemets (« ») e posicionados sobre o nome do elemento.
3.6. OntoUML 97

de modelagem com o objetivo de tornar precisa e explícita uma semântica de mundo real
dos termos utilizados na representação de um domínio. Nesse diagrama são apresentadas
as primitivas mais utilizadas no modelo proposto no Capítulo 6.

Figura 12 – Modelo em OntoUML para explicação da linguagem.

Algumas primitivas de modelagem da linguagem UML já foram apresentados no


exemplo da linguagem independente de domínio na Figura 6. Classes são representadas por
retângulos, com seu em destaque abaixo de um estereótipo, identificável pelos guillemets
(« »), e. g., classe Cachorro com estereótipo kind.
Relacionamentos taxonômicos do tipo “é um” são representados por setas com
ponta triangular branca, e. g., Cachorro com Dono é um Cachorro. Diz-se que Ca-
chorro com Dono é uma subclasse de Cachorro e que Cachorro é uma superclasse de
Cachorro com Dono. As subclasses são também referenciadas como especializações da
superclasse e a superclasse uma generalização das subclasses.
Classes abstratas, representadas no diagrama pelo nome em itálico (e. g., classe
Cachorro), não podem ser instanciadas diretamente, sendo obrigatória a instanciação de
ao menos uma de suas subclasses. No exemplo, um Cachorro não pode ser, simplesmente,
um Cachorro sem ser Cachorro Macho ou Cachorro Fêmea.
Mais de uma relação taxonômica unidas em uma mesma terminação triangular
caracterizam um conjunto de generalizações (generalization set). Um conjunto de generali-
zações agrupa relações de generalização feitas sob um mesmo critério, e. g., Cachorro
Macho e Cachorro Fêmea generalizados pela classe Cachorro sob o critério do sexo
do animal. Um conjunto de generalizações pode apresentar restrições relacionadas à sua
completude ou à possibilidade de instanciação simultânea das subclasses pelo mesmo
indivíduo. Quanto à completude, o conjunto de generalizações pode ser completo (com-
plete) ou incompleto (incomplete). Um conjunto completo apresenta no diagrama todas as
possibilidades de especialização de uma classe de acordo com o critério de especialização.
Por exemplo, na especialização da classe Cachorro de acordo com o critério do sexo do
animal, não é possível existir outra especialização que não Cachorro Macho ou Ca-
chorro Fêmea. Um conjunto incompleto, por sua vez, informa que não foram previstas
98 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

no diagrama todas as possíveis opções de especialização segundo o critério estabelecido.


Quanto à possibilidade de instanciação simultânea, um conjunto de generalizações pode
ser disjunto (disjoint) ou com sobreposição (overlapping). Conjuntos disjuntos informam
que um indivíduo pode ser instancia de apenas uma das subclasses ao mesmo tempo,
enquanto conjuntos com sobreposição permitem a um indivíduo instanciar mais de uma
das subclasses concomitantemente. No exemplo da especialização da classe Cachorro pelo
critério do sexo, o conjunto de generalizações é disjunto, ou seja, um Cachorro pode ser
exclusivamente Cachorro Macho ou Cachorro Fêmea, não os dois ao mesmo tempo.
Associações (ou relacionamentos) em UML são representadas por uma linha que
une duas classes. Uma associação pode ter nome e estereótipo, e. g., a associação da
classe Cachorro com ela mesma com nome é maior que e estereótipo formal. Em cada
extremidade de uma associação pode ser representada uma cardinalidade, ou seja, a
quantidade instanciações que este relacionamento pode ter. Lê-se sempre a cardinalidade
oposta à direção da leitura do relacionamento, por exemplo, para a associação entre
Posse de Cachorro e Dono de Cachorro, lê-se “para cada Posse de Cachorro, há
apenas um Dono de Cachorro (cardinalidade ‘1’) e, no sentido oposto, lê-se “para cada
Dono de Cachorro, há uma ou mais (cardinalidade ‘1..*’) Posse de Cachorro”. A
cardinalidade zero indica um relacionamento opcional e considera-se cardinalidade um
quando a cardinalidade é omitida.
Até o momento foram explicadas primitivas de modelagem da linguagem UML,
que também são utilizadas na OntoUML. As especificidades da OntoUML estão nos
estereótipos aplicados às classes e associações.
O entendimento do conceito da categoria ontológica sortal é essencial para o
entendimento dos estereótipos apresentados. Guizzardi (2014, p. 6) explica a distinção
entre sortais e não sortais:

Um sortal é um tipo cujas instâncias obedecem a um princípio uniforme


de identidade. Um princípio de identidade, por sua vez, é um princípio
com o qual podemos julgar se dois indivíduos são o mesmo ou, como caso
especial, quais mudanças um indivíduo pode sofrer e ainda permanecer o
mesmo.

Um kind e subkinds são sortais rígidos, ou seja, são sortais cujos conceitos se aplicam
necessariamente a todos os seus indivíduos enquanto existirem. Kinds são independentes
relacionalmente de outros indivíduos e proveem um critério de identidade próprio, enquanto
subkinds herdam seu critério de identidade. No exemplo, o conceito de Cachorro é um kind
e o conceito de Cachorro Fêmea é um subkind. Um Cachorro, para existir, independe
da existência de outros indivíduos, e é possível diferenciar um cachorro de outro. Esse
critério de identidade é herdado pelo conceito Cachorro Fêmea, ou seja, o mesmo critério
usado para diferenciar cachorros é utilizado para diferenciar um cachorro fêmea de outros
3.6. OntoUML 99

indivíduos. Subkinds são sempre especializações de outro subkind ou de um sortal rígido


que provê um critério próprio de identidade (i. e., um ultimateSortal).
Como visto na subseção 3.4.1, existem relações formais e materiais. Relações
formais dependem da simples existência dos indivíduos relacionados, não precisando de
uma entidade mediadora. Um exemplo de relação formal é o autorrelacionamento é maior
que da entidade Cachorro caracterizado pelo estereótipo formal. A constatação de que
um cachorro é maior que outro depende apenas de características intrínsecas dos indivíduos
relacionados.
Um exemplo de relação material é a relação entre Dono de Cachorro e Cachorro
com Dono, mediada pela classe Posse de Cachorro. Não é possível saber se uma pessoa
é dona de um cachorro apenas por meio das características dos dois indivíduos, sendo
necessário, portanto, algo externo aos indivíduos que valide essa relação. O relatorKind é
o intermediário em uma relação material. No mundo real, a Posse de Cachorro pode
ser apenas um reconhecimento social de que essa posse existe, amparado ou não em
um documento legal. Associações entre o relatorKind e as classes relacionadas usam o
estereótipo mediation. De acordo com as cardinalidades das relações do tipo mediation no
exemplo, cada Posse de Cachorro intermedia a relação entre um Dono de Cachorro e
um Cachorro com Dono, cada Dono de Cachorro pode estar associado a uma ou mais
Posses de Cachorro, e cada Cachorro com Dono está associado a uma Posse de
Cachorro. Pode-se imaginar o conceito Posse de Cachorro como um documento legal
que atribui a posse de apenas um cachorro a um dono. De acordo com essa conceitualização,
um Dono de Cachorro pode possuir vários desses documentos, mas um cachorro só
pode aparecer em um documento válido em um mesmo momento no tempo.
Roles são sortais anti-rígidos relacionalmente dependentes. Conceitos anti-rígidos
são aplicáveis a seus indivíduos de maneira contingente. O conceito Cachorro com Dono
é anti-rígido, considerando que nem todos os cachorros têm dono e um mesmo cachorro
pode ou não ter dono em diferentes momentos de sua vida. É também um conceito
dependente de uma relação com um Dono de Cachorro, ou seja, não existe Cachorro
com Dono sem existir um Dono de Cachorro a ele relacionado. Por fim, esse conceito
é também um sortal, cujo princípio de identidade é herdado de Cachorro. Um Cachorro
com Dono é, dessa forma, um role. Um role pode ser visto como um papel de um indivíduo
de um tipo específico (i. e., um ultimateSortal) em uma relação que não seja obrigatória
para todos os indivíduos daquele mesmo tipo.
O estereótipo category, aplicado à classe Ser Vivo, representa conceitos não-sortais
rígidos. Esses são conceitos aplicáveis a indivíduos de diferentes naturezas (i. e., indiví-
duos com princípios de identidade distintos), que instanciam esse conceito durante toda
sua existência. No exemplo, Pessoas Físicas e Cachorros são Seres Vivos. Pessoas
Físicas e Cachorros têm princípios de identidade distintos e todas suas instâncias são
100 Capítulo 3. Modelagem conceitual e ontologias

sempre Seres Vivos.


Um modeKind representa uma categoria de elementos existencialmente dependentes
de outros. ModeKinds são inerentes a outros indivíduos e não são diretamente relacionados
a estruturas de qualidade. Podem ser vistos como qualidades que não podem ser objetiva-
mente medidas. No exemplo, o Estado de Saúde é inerente a um Ser Vivo. Caso o Ser
Vivo deixe de existir, seu Estado de Saúde também deixa de existir. Não é possível, no
entanto, medir, de maneira objetiva, o Estado de Saúde de um Ser Vivo. A relação
de um modeKind com o conceito do qual ele depende apresenta sempre o estereótipo
characterization.
Foi utilizado, ainda, o estereótipo roleMixin para o conceito Dono de Cachorro.
Um roleMixin é um não-sortal anti-rígido relacionalmente dependente, portanto, um
conceito aplicável de maneira contingente às suas instâncias e aplicável a instâncias de
diferentes naturezas quando em uma relação. No exemplo, um Dono de Cachorro pode
ser tanto uma Pessoa Física como uma Pessoa Jurídica e esse conceito é aplicável
contingentemente a esses indivíduos, apenas quando associados a um Cachorro com
Dono.
Linguagens epistemológicas como a UML e a OWL não têm expressividade sufici-
ente para explicitar essas distinções ontológicas. Por exemplo, um diagrama UML com a
estrutura do diagrama da Figura 12, mas sem os estereótipos adicionados pela OntoUML,
permitiria interpretações indesejadas pela conceitualização pretendida, tais como a pos-
sibilidade de um cachorro mudar de sexo ou uma pessoa e um cachorro apresentarem o
mesmo estado de saúde.
101

4 Modelos conceituais da Biblioteconomia e


Museologia

Este capítulo apresenta modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia


utilizados como base para a maioria das iniciativas de representação de música discutidas
no Capítulo 5 (Aplicação de modelos conceituais à representação musical).

4.1 Família FRBR, incluindo IFLA LRM


Desde os mais antigos catálogos bibliográficos até os tempos modernos, as ferra-
mentas de organização bibliográfica têm buscado prover aos seus usuários acesso ao acervo
e o agrupamento de materiais relacionados. Desde a década de 1950, foram desenvolvidas
teorias para diferenciar uma obra do item ou itens físicos que a contém. A distinção entre
obra e item foi, pela primeira vez, formalmente apresentada à comunidade de catalogação
durante a Conferência Internacional de Paris sobre Princípios Catalográficos de 1961,
todavia a publicação das regras de catalogação AACR2 em 1988 continuou a demonstrar
confusão em relação à natureza das obras (DICKEY, 2008).
O impulso para a definição dos requisitos funcionais para registros bibliográficos
surgiu no Seminário de Catalogação de Estocolmo em 1990 patrocinado pela IFLA. De
1992 a 1997 o Grupo de Estudos da IFLA sobre Requisitos Funcionais para Registros
Bibliográficos (FRBR1 ) desenvolveu um modelo entidade-relacionamento representando
uma visão geral do universo bibliográfico, com o objetivo de ser independente do código
de catalogação ou de detalhes de implementação. O relatório final do FRBR (IFLA Study
Group on the FRBR, 1998) foi aprovado em 1997 e publicado em 1998. O documento
contém: (i) a especificação do modelo conceitual (entidades, relacionamentos e atributos);
(ii) tarefas de usuário relacionadas a recursos bibliográficos descritos em catálogos ou
outras ferramentas bibliográficas; e (iii) uma proposta de registro bibliográfico de nível
nacional para todos os tipos de materiais.
A família de modelos FRBR também inclui o modelo Requisitos Funcionais para
Dados de Autoridade (FRAD2 ), aprovado e publicado em 2009, e o modelo Requisitos
Funcionais para Dados de Autoridade de Assunto (FRSAD3 ), aprovado em 2010 e publicado
em 2011.
Em IFLA (2013) é apresentado o modelo conceitual FRAD para entidades descritas
1
Acrônimo de Functional Requirements for Bibliographic Records
2
Acrônimo de Functional Requirements for Authority Data
3
Acrônimo de Functional Requirements for Subject Authority Data
102 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

em registros de autoridade, continuando o trabalho iniciado pelo FRBR. O principal


objetivo do modelo FRAD é prover uma estrutura para a análise de requisitos funcionais
para o tipo de dados de autoridade requerido para suportar a tarefa de controle de
autoridades e para o compartilhamento internacional de dados de autoridade. O modelo
tem foco nos dados, independentemente de como são agrupados (e. g., em registros de
autoridade) (IFLA, 2013, p. 1).
O modelo conceitual FRSAD, como apresentado em IFLA (2010), endereça questões
relacionadas a dados de autoridade de assunto. Seu principal propósito é prover uma
estrutura para o entendimento compartilhado e explícito sobre o que dados, registros e
arquivos de autoridade de assunto objetivam prover de informação, e a expectativa do que
esses dados devem representar em termos de atendimento às necessidades dos usuários
(IFLA, 2010, p. 9).
Os três modelos adotaram diferentes pontos de vista e propuseram diferentes
soluções para questões comuns entre eles, ainda que os três tenham sido desenvolvidos
utilizando a mesma estrutura de modelagem entidade-relacionamento. A tentativa de
adotar os três modelos em um mesmo sistema requereria a solução de questões complexas
e de forma ad hoc. Ficou claro que seria necessário combinar ou consolidar a família FRBR
em um modelo único e coerente para esclarecer o entendimento do modelo geral e remover
as barreiras à sua adoção (RIVA; LE BOEUF; ŽUMER, 2017, p. 5).
O contexto de utilização dos modelos evoluiu desde a publicação do modelo FRBR
em 1998. Os dados ligados se tornaram parte do panorama bibliográfico, requerendo maior
estruturação e claridade dos modelos para que se pudesse aproveitar as técnicas da Web
Semântica para navegação nos dados bibliográficos (RIVA, 2016b).
Em agosto de 2017 foi aprovado pelo comitê de padrões da IFLA o relatório final
do Modelo de Referência para Dados Bibliográficos da IFLA (IFLA LRM4 ). Para Riva
(2016b), o LRM se propõe a ser um modelo conceitual único, apoiado em uma estrutura
entidade-relacionamento de alto nível que cobre todos os aspectos do universo bibliográfico
unindo os modelos FRBR, FRAD e FRSAD.
Nesta subseção apresenta-se como é modelada pelo FRBR a distinção entre os itens
bibliográficos e as obras neles contidas e seus relacionamentos – provavelmente a maior
inovação trazida pelo modelo FRBR – e em seguida é apresentada uma visão geral do
modelo LRM.
O modelo FRBR possui dez entidades divididas em três grupos: (i) o grupo 1
compreende os produtos intelectuais ou artísticos (obra, expressão, manifestação e item);
(ii) o grupo 2 compreende as entidades responsáveis pelo conteúdo intelectual ou artístico,
pela produção física e disseminação, ou pela guarda das entidades do primeiro grupo
4
Acrônimo de Library Reference Model
4.1. Família FRBR, incluindo IFLA LRM 103

(pessoa e entidade coletiva); e (iii) o terceiro grupo, que compreende um conjunto adicional
de entidade que servem como assunto de obras (conceito, objeto, evento e lugar).
As entidades do grupo 1 são conhecidas pela sigla OEMI5 (acrônimo de Obra,
Expressão, Manifestação e Item). De acordo com Tillett (2003) o FRBR trouxe uma nova
perspectiva sobre a estrutura e relacionamentos dos registros bibliográficos e de autoridade,
além de estabelecer um vocabulário mais preciso para as regras de catalogação. Antes do
FRBR as regras de catalogação utilizavam palavras como “obra”, “edição” e “item” de
maneira não muito clara.
No dia a dia, utiliza-se a palavra “livro” com vários significados, como por exemplo:
(i) um objeto físico com páginas, encadernação, possíveis anotações, etc. Chamado de
“item” no FRBR; (ii) uma publicação no sentido usado quando se deseja comprar um
livro, sem se interessar por um exemplar específico. Chamado de “manifestação” pelo
FRBR; (iii) uma versão específica do texto, com em “quem traduziu a aquele livro”. Nesse
caso o usuário tem em mente um texto e um idioma em particular. Para o FRBR esse
texto representa uma “manifestação”; e (iv) o conteúdo do livro sem importar qual é a
versão, idioma ou qualquer característica física ou de publicação, como em “quem é o
autor daquele livro”. Nesse sentido o FRBR utiliza a palavra “obra” (TILLETT, 2003).

Figura 13 – Entidades do Grupo 1 do FRBR e seus relacionamentos primários.

Fonte: IFLA Study Group on the FRBR (1998, p. 14).

De uma maneira simplificada, o FRBR define as entidades OEMI como:

a) Obra: Uma criação intelectual ou artística de natureza distinta.


b) Expressão: A realização intelectual ou artística de uma obra na forma de
notação alfanumérica, musical ou coreográfica, som, imagem, objeto, movimento,
etc., ou qualquer combinação dessas formas.
c) Manifestação: A materialização de uma expressão de uma obra.
d) Item: Um exemplar de uma manifestação.
5
Em inglês WEMI (acrônimo de Work, Expression, Manifestation e Item).
104 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

O diagrama na Figura 13 apresenta as entidades do grupo 1 e seus relacionamentos


primários. Uma obra é realizada por meio de uma ou várias expressões. Uma expressão é
materializada em uma ou mais manifestações. E uma manifestação é exemplificada por
um ou mais itens. Esta leitura, de cima para baixo, se alinha a uma visão de usuário.
Uma leitura no sentido inverso se adéqua mais à visão do catalogador. Observa-se que
o único relacionamento primário com cardinalidade múltipla nos dois sentidos ocorre
entre as entidades Expressão e Manifestação. Uma manifestação pode conter mais de uma
expressão.

Figura 14 – Família de obras.

Fonte: Tillett (2001, p. 23).

Tillett (2003) enfatiza a importância de outros relacionamentos entre as entidades


do grupo 1, além dos relacionamentos primários apresentados anteriormente. Esses rela-
cionamentos também permitem o agrupamento de itens relacionados e a navegação em
uma rede, por vezes complexa, do universo bibliográfico. A autora utiliza a Figura 14 para
descrever os relacionamentos de conteúdo como sendo um contínuo de obras, expressões,
manifestações e itens. O eixo horizontal indica o quanto o conteúdo de uma obra relacio-
nada (ou derivada) se diferencia do conteúdo da obra original. O FRBR, assim como o
LRM, não especifica regras para a delimitação de fronteiras entre as obras, deixando essa
responsabilidade para as regras de catalogação. O diagrama apresenta uma linha de corte
tracejada que representa uma possível fronteira. De acordo com essa visão, uma edição
4.1. Família FRBR, incluindo IFLA LRM 105

resumida ainda seria considerada a mesma obra, ao passo que uma adaptação já seria
considerada uma nova obra derivada.
Relacionamentos do tipo todo-parte e parte-parte também são endereçados pelo
FRBR. Para Tillett (2003), relacionamentos do tipo todo-parte têm especial importância
para o controle bibliográfico de recursos digitais, citando o exemplo de um sítio Web
que pode ser visto como um “todo” composto de seus componentes, tratados como
“partes”. Como exemplos de relacionamento parte-parte pode-se citar os relacionamentos
de “sequência”, “suplemento” e “apêndice”. O nível de granularidade para a catalogação
desses recursos deve ser feito pelo catalogador, com base em políticas locais que reflitam
as necessidades de seus usuários.
As entidades OEMI e seus relacionamentos primários foram mantidos no modelo
IFLA LRM e permanecem sendo o núcleo do modelo, entretanto ao prover um nível comum
de conhecimento dos três modelos, o LRM apresenta um maior nível de abstração. O LRM
é um modelo lógico com foco na organização estrutural e, por essa razão, está mais longe
da prática que os outros modelos. Ao mesmo tempo, ele se adianta ao adotar a forma
necessária para sua utilização em aplicações de dados abertos ligados (Linked Open Data)
(RODRÍGUEZ; ALONSO-LIFANTE; MOLERO; RANDAZZO, 2017).
O LRM objetiva tornar explícitos os princípios gerais que governam a estrutura
lógica da informação bibliográfica sem fazer pressuposições sobre como os dados devem
ser armazenados em uma aplicação em particular. Os dados bibliográficos são tratados
pelo LRM de uma maneira ampla, sem distinção entre dados armazenados em registros
bibliográficos, de acervo e dados armazenados em registros de autoridades. Para seu
propósito, todos esses dados são tratados genericamente como informação bibliográfica
(RIVA; LE BOEUF; ŽUMER, 2017, p. 9).
O escopo do modelo é restrito às tarefas de usuário (encontrar, identificar, selecionar,
obter e explorar), definidas do ponto de vista do usuário final e suas necessidades, portanto
metadados administrativos estão fora do escopo e metadados relacionados aos direitos
de uso só estão no escopo caso estejam relacionados diretamente à tarefa de obtenção do
recurso pelo usuário.
É utilizada para a confecção do modelo uma estrutura de modelagem entidade-
relacionamento estendida (EER6 ), que difere da estrutura entidade-relacionamento usada
pelos modelos anteriores principalmente pela introdução conceito de especialização7 de clas-
ses, de relacionamentos e de atributos. Esse conceito pode ser visto como um relacionamento
6
Acrônimo de Enhanced Entity-Relationship
7
A especialização ocorre na forma de um relacionamento do tipo “é um” entre dois elementos do
modelo, estabelecendo uma hierarquia entre estes elementos. Quando um elemento X (chamado de
Subclasse) especializa (ou “é um”) elemento Y (chamado de Superclasse, o elemento X “herda” todas
as características do elemento Y, podendo atuar da mesma forma que o elemento Y atua em qualquer
contexto.
106 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

do tipo gênero-espécie, muito comum no âmbito dos estudos sobre classificação.


O LRM não se atém a nenhum tipo de recurso especificamente, procurando assim
revelar as similaridades e a estrutura subjacente aos recursos bibliográficos. São utilizados,
portanto, termos e definições aplicáveis de maneira genérica a todos os tipos de recurso.
Ainda assim, são apresentados no modelo alguns atributos relacionados a tipos de recursos
específicos a título de exemplo.
Definido na forma de um modelo conceitual de alto-nível, o IFLA LRM deve
ser utilizado como guia ou base para a formulação de regras de catalogação e para a
implementação de sistemas bibliográficos. Qualquer aplicação prática terá que determinar o
nível requerido de precisão, podendo expandir o contexto do modelo ou até omitir alguns de
seus elementos. Exige-se, entretanto, que a aplicação respeite ao menos os relacionamentos
essenciais entre as entidades OEMI, consideradas como o núcleo do modelo, para que
ainda seja considerado uma implementação do IFLA LRM (RIVA; LE BOEUF; ŽUMER,
2017, p. 10).
O modelo prevê vários mecanismos de extensão que provavelmente serão necessários
em qualquer implementação. A definição do atributo LRM-E1-A1 Categoria da entidade
Res permite às implementações criarem subclasses que acharem úteis a qualquer entidade.
Atributos especializados podem ser adicionados a todas as entidades. Várias das entidades
são definidas em um nível geral, novamente com a intenção de serem especializadas durante
a implementação (RIVA; LE BOEUF; ŽUMER, 2017, p. 10).

Tabela 2 – Hierarquia de entidades do modelo IFLA LRM.

Primeiro Nível Segundo Nível Terceiro Nível


LRM-E1 Res
-- LRM-E2 Obra
-- LRM-E3 Expressão
-- LRM-E4 Manifestação
-- LRM-E5 Item
-- LRM-E6 Agente
-- -- LRM-E7 Pessoa
-- -- LRM-E8 Agente Coletivo
-- LRM-E9 Nomen
-- LRM-E10 Lugar
-- LRM-E11 Intervalo de Tempo

Fonte: Riva, Le Boeuf e Žumer (2017, p. 19)

O modelo conceitual é composto por 11 entidades, 37 atributos e 36 relacionamentos.


Cada elemento do modelo recebe uma identificação única para uma referenciação não am-
bígua. É utilizado para essa identificação o prefixo “LRM-” seguido de uma letra indicativa
do tipo do elemento (‘E’ para entidades, ‘A’ para atributos e ‘R’ para relacionamentos) e
de um número sequencial (e. g., LRM-E2 e LRM-R12). No caso de atributos, é utilizado
4.1. Família FRBR, incluindo IFLA LRM 107

como prefixo o identificador da entidade, antes da letra ‘A’, e a sequência numérica é


reiniciada para cada entidade (e. g., LRM-E2-A1). Cada elemento também recebe um
nome curto, porém o significado de cada elemento é definido nas notas de escopo. Para
cada elemento é apresentado um quadro com seu: identificador, nome, definição, notas de
escopo e exemplos. Para classes, são apresentadas também algumas restrições. Para os
atributos, é identificada a classe à qual pertence. Para cada relacionamento, são definidos
ainda as classes do domínio e da imagem (origem e destino), sua cardinalidade e o nome
no sentido inverso.
A Tabela 2 apresenta a estrutura hierárquica das 11 entidades do modelo, cujas
descrições são apresentadas abaixo8 :

a) LRM-E1 Res: Qualquer entidade no universo do discurso.


b) LRM-E2 Obra (Work): O conteúdo artístico ou intelectual de uma criação
distinta.
c) LRM-E3 Expressão (Expression): Uma combinação distinta de sinais que
transmite conteúdo artístico ou intelectual.
d) LRM-E4 Manifestação (Manifestation): Um conjunto de todos os su-
portes para os quais se assume que compartilhem as mesmas características
relacionadas a conteúdos artísticos ou intelectuais e aspectos de forma física.
Esse conjunto é definido tanto pelo conteúdo global como pelo plano de produção
do(s) seu(s) suporte(s).
e) LRM-E5 Item: Um objeto ou objetos que contêm símbolos com o objetivo de
transmitir um conteúdo intelectual ou artístico.
f) LRM-E6 Agente (Agent): Uma entidade capaz de ações intencionais, de
receber direitos e de ser responsabilizada por suas ações.
g) LRM-E7 Pessoa (Person): Um ser-humano em particular.
h) LRM-8 Agente Coletivo (Collective Agent): Um grupo ou organização
de pessoas identificado por um nome distinto e capaz de agir como uma unidade.
i) LRM-E9 Nomen: Uma associação entre uma entidade e uma denominação
que se refere a ela.
j) LRM-E10 Lugar (Place): Uma área delimitada no espaço.
k) LRM-E11 Intervalo de Tempo (Time-span): Uma dimensão temporal
com início, fim e duração.

No FRBR, as entidades Expressão, Manifestação e Item são definidas utilizando


outras entidades do grupo 1 em suas definições, de modo que as definições das quatro
8
Para um melhor entendimento do significado de cada entidade é necessário recorrer às notas de escopo
e aos exemplos constantes em Riva, Le Boeuf e Žumer (2017).
108 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

entidades dependem de cada uma das outras. No LRM a definição de cada uma dessas
três entidades busca permanecer independente das demais, sem referenciar uma a outra
(RIVA, 2016b).
Ainda de acordo com Riva (2016b), a função da entidade Obra é ser um ponto
de agrupamento daquelas expressões e manifestações relacionadas que, aparentemente,
deveriam estar juntas para a sua recuperação. Uma obra não existe independentemente de
suas expressões, e só poderá vir a existir quando sua primeira expressão é criada.

Figura 15 – Visão geral dos relacionamentos do modelo IFLA LRM.

Fonte: Riva, Le Boeuf e Žumer (2017, p. 86)

Uma visão geral das classes e relacionamentos do modelo IFLA LRM é apresentada
na Figura 15. Os relacionamentos de especialização entre a entidade Res e as demais é
omitido para uma melhor visualização do diagrama. O mesmo ocorre para os relaciona-
mentos de especialização entre o relacionamento Res é associado a Res e os demais
relacionamentos. Não são apresentados também os relacionamentos no sentido inverso,
nem suas cardinalidades.
A entidade Res redefine a entidade Thema do modelo FRAD. Foi adicionada
a entidade Agente como superclasse de Pessoa e Agente Coletivo, que, por sua vez,
representa as entidades Entidade Coletiva e Família do FRBR. A entidade Nomen
é uma fusão das entidades Nomen do FRSAD, Nome do FRAD e de ponto de acesso
controlado. Foi adicionada ainda a entidade Intervalo de Tempo, inexistente nos modelos
anteriores (BIANCHINI, 2017).
4.1. Família FRBR, incluindo IFLA LRM 109

As entidades Lugar e Intervalo de Tempo podem ser associadas a qualquer


outra entidade, seguindo a lógica da Web Semântica. Atributos do tipo “local de ...” ou
“data de ...” foram generalizados nos relacionamentos entre Res e estas entidades, reduzindo
de forma drástica a quantidade de atributos do novo modelo (37 no total).
A maioria dos atributos de uma manifestação FRBR consiste em declarações
transcritas de um exemplar representativo de toda a manifestação. Todos esses atributos
previstos no FRBR são representados no LRM pelo atributo, LRM-E4-A4 declaração
de manifestação, que deve ser normalmente implementado como uma série de atributos
especializados, de acordo com as regras relevantes de catalogação. O Padrão Internacional
para Descrição Bibliográfica (ISBD9 ) detalha o consenso internacional sobre as declarações
mais relevantes que devem ser incluídas na descrição de recursos. Ao tratar essas declarações
de manifestação de uma forma genérica, o LRM evita tomar o lugar do ISBD ou de regras
especializadas de catalogação, ao mesmo tempo que provê uma posição de extensão do
modelo (BIANCHINI, 2017; RIVA, 2016b).
A definição de alguns elementos-chave do IFLA LRM tem a intenção de facilitar
sua operacionalização por meio de uma variedade de códigos de catalogação. Um desses
casos é o atributo LRM-E2-A2 atributo da expressão representativa da entidade
Obra, que registra os valores desses atributos de expressão considerados essenciais para
a caracterização da obra, sem predeterminar o critério a ser usado por um código de
catalogação em particular (RIVA; LE BOEUF; ŽUMER, 2017, p. 10).
Diferentemente da visão original do FRBR, no qual identificadores, nomes e termos
eram modelados como atributos das entidades, o LRM adota a visão do modelo FRSAD,
uma entidade Nomen única para associar as entidades às suas denominações. Qualquer
entidade referenciada no universo do discurso é nomeada por meio de pelo menos um
Nomen. O modelo LRM define vários atributos para a entidade Nomen, tais como script,
conversão de script e esquema, que são básicos para a utilização de um Nomen na função
de ponto de acesso controlado (RIVA, 2016a). Há uma grande diferença entre a entidade
Nomen e o atributo string do Nomen. Essa entidade é muito mais que uma simples string,
trata-se de uma distinção que se aplica quotidianamente no âmbito bibliográfico quando
se desenvolve a atividade de controle de autoridades (BIANCHINI, 2017).
O objetivo do novo modelo lógico, de acordo com Bianchini (2017), é reforçar
a estrutura de relacionamentos dos dados bibliográficos, tornando-a mais adaptada à
estrutura dos grafos no RDF e favorecer a integração de dados bibliográficos na Web
Semântica. A escolha do nome Res, por exemplo, se relaciona ao termo Thing em inglês,
que representa qualquer entidade definida na Web Semântica.
O LRM prevê duas modalidades de representação de um atributo: uma sequência
9
International Standard Bibliographic Description
https://www.ifla.org/publications/international-standard-bibliographic-description
110 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

de símbolos ou um Uniform Resource Identifier (URI)10 . Sendo preferido o estabelecimento


de um relacionamento entre entidades, sempre que um atributo possa ser representado
como um URI que referencia um recurso externo. Essa abordagem deriva diretamente da
Web Semântica e dos Dados Ligados.

Figura 16 – Modelo geral para agregações no IFLA LRM.

Fonte: Riva, Le Boeuf e Žumer (2017, p. 94)

O diagrama na Figura 16 representa o modelo geral de agregações no IFLA LRM.


Agregações são definidas como manifestações que incorporam múltiplas expressões. São
previstos três tipos distintos de agregações: (i) agregações com coleções de expressões; (ii)
agregações resultantes de ampliação; e (iii) agregações de expressões paralelas. Agregações
com coleções de expressões são de especial interesse no domínio da informação musical por
serem muito usuais (e. g., coleções de gravações em CDs e LPs e coleções de partituras em
songbooks). O processo de agregação das expressões é considerado um esforço intelectual
ou artístico e, portanto, atende ao critério para ser considerado uma Obra, representada
no diagrama como Obra Agregadora. As expressões das diversas obras agregadas são
incorporadas em uma mesma manifestação, o que justifica o relacionamento muitos para
muitos entre as entidades Expressão e Manifestação. As obras e expressões são tratadas da
mesma maneira independentemente da sua forma de publicação ou da manifestação física
na qual são incorporadas. Uma expressão pode ser publicada sozinha ou ser incorporada
em uma manifestação junto a outras expressões.
10
O URI é o padrão para identificação de recursos na Web Semântica.
4.2. CIDOC CRM 111

4.2 CIDOC CRM


O modelo CIDOC CRM (Conceptual Reference Model) representa uma ontologia
para a informação de memória cultural, ou seja, ele descreve em uma linguagem formal
os conceitos implícitos e explícitos relevantes à documentação da memória cultural. Sua
principal função é servir como base para a mediação da informação histórica e desta forma
prover a “cola semântica” necessária para a integração entre diferentes fontes de informação
de memória cultural, tais como as publicadas em museus, bibliotecas e arquivos (CIDOC
CRM SIG, 2016).
O CRM surgiu a partir do Grupo de Documentação do Comitê Internacional de
Documentação (CIDOC) do Conselho Internacional de Museus (ICOM) visando alcançar
a interoperabilidade semântica de dados museológicos. Em setembro de 2006 o CRM foi
aceito como norma ISO 21127 e em dezembro de 2015 foi publicada a nova versão ISO
21127:2014.
Doerr (2003) caracteriza o CRM como uma ontologia de alto nível para habilitar a
integração de informação para dados de memória cultural e sua correlação com a informação
bibliotecária e arquivística. Em seguida explica que o modelo analisa os conceitos comuns
por trás das estruturas de dados e metadados para suportar a transformação, mediação e
mesclagem de dados.
Com o aumento crescente da disponibilização de informação, existe uma demanda
cada vez maior por pesquisas globais, estudos comparativos, transferência de dados e
migração de dados entre fontes heterogêneas de conteúdo cultural. “Isso requer interopera-
bilidade não apenas no nível de codificação [...] mas também em um nível semântico mais
complexo, onde se encontram as características do domínio” (DOERR, 2003, p. 75).

Figura 17 – Um meta-esquema qualitativo do CIDOC CRM.

Fonte: Doerr (2003).


112 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

Segundo Lima (2008), uma das inovações do CRM é a estruturação das informações
em torno dos eventos temporais, em oposição à maioria dos modelos de metadados que têm
o recurso como objeto central de interesse. Nesta abordagem, os eventos são definidos como
entidades que agregam atores, fatos e objetos (físicos e abstratos), localidades e duração
de intervalo de tempo. Múltiplos nomes, identificadores e tipos podem ser atribuídos a
todas as entidades do modelo.
Em sua versão 5.0.4 o CIDOC CRM contém 86 classes e 137 propriedades únicas
(CIDOC CRM SIG, 2011). Essas propriedades puseram as entidades temporais, e com isso,
os eventos em uma posição central, como apresentado na Figura 17. Entidades temporais,
atores, objetos conceituais, objetos físicos, locais e intervalos temporais são organizados
em uma hierarquia de tipos, bem como os relacionamentos entre eles, representados por
propriedades binárias. Tanto as classes como as propriedades são identificadas por um ou
mais nomes.

Figura 18 – Principais eventos do CIDOC CRM.

Fonte: CIDOC CRM SIG (2016).

A Figura 18 apresenta uma representação gráfica das classes e propriedades que


modelam os principais eventos do modelo. As classes são identificadas por um código
iniciado pela letra “E” seguida de seu número e nome em inglês enquanto as propriedades
são identificadas por um código iniciado pela letra “P” seguido de seu número, nome
e nome para leitura no sentido inverso entre parênteses. As propriedades representam
relacionamentos binários entre classes. No diagrama da Figura 18 pode-se observar que a
criação de um objeto conceitual, por exemplo a pintura de um quadro ou uma música,
é modelada como um evento de criação (E65 Creation), que é uma atividade (E7
4.2. CIDOC CRM 113

Activity), que foi realizada por (P14 carried out by) atores (E39 Actor), podendo
ter sido influenciado por (P15 was influenced by) qualquer outra entidade do modelo
(E1 CRM Entity), e assim por diante.
Doerr (2003) exemplifica como o CIDOC CRM pode ser utilizado para atingir seu
objetivo primário de habilitar a troca de informações e integração entre fontes heterogêneas
de informação de memória cultural. A conferência de Yalta, que ocorreu em fevereiro de
1945, é o evento que registra oficialmente o fim da segunda guerra mundial. Durante esse
evento foi assinado um tratado de divisão pós-guerra da Europa e do Japão e foi tirada
uma foto dos líderes aliados, Winston Churchill, Franklin Delano Roosevelt e Josef Stalin.

Figura 19 – Possível registro DUBLIN CORE para o Tratado de Yalta.

Type: Text
Title: Protocol of Proceedings of Crimea Conference
Title.Subtitle: II. Declaration of Liberated Europe
Date: February 11, 1945.
Creator: The Premier of the Union of Soviet Socialist Republics
The Prime Minister of the United Kingdom
The President of the United States of America
Publisher: State Department
Subject: Postwar Division of Europe and Japan

Fonte: Doerr (2003, p. 78)

A Figura 19 representa um possível registro DUBLIN CORE de uma cópia do


Tratado de Yalta no Departamento de Estado dos Estados Unidos e a Figura 20 apresenta
um registro semelhante para a fotografia exposta no Bettmann Archive em Nova York.

Figura 20 – Possível registro DUBLIN CORE para a foto dos líderes aliados em Yalta.

Type: Image
Title: Allied Leaders at Yalta
Date: 1945
Publisher: United Press International (UPI)
Source: The Bettmann Archive
Copyright: Corbis
References: Churchill, Roosevelt, Stalin

Fonte: Doerr (2003, p. 79)


114 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

Os dois registros de metadados não têm nada em comum a não ser a data de 1945,
um atributo que praticamente não caracteriza os documentos. A Figura 21, apresenta
um registro do Thesaurus of Geographic Names (TGN), que poderia servir como peça de
integração entre os dois documentos.

Figura 21 – Partes do registro TGN para Yalta.

TGN Id: 7012124


Names: Yalta (C, V), Jalta (C, V)
Types: inhabited place(C), city (C)
Position: Lat: 44 30 N, Long: 034 10 E
Hierarchy: Europe (continent) <– Ukrayina (nation)
<– Krym (autonomous republic)
Note: Located on the south shore of the Crimean Peninsula,
site of the conference between Allied powers during
World War II in 1945. It is a vacation resort noted
for pleasant climate and coastal and mountain
scenery; it produces wine, canned fruit, and tobacco
products.
Source: Thesaurus of Geographic Names.

Fonte: Doerr (2003, p. 79)

Surgem então os problemas de relacionar “Crimea” com “Krym” e então com


“Yalta”, relacionar o “Premier of the Union of Soviet Socialist Republics” com “Joseph
Stalin”, e assim por diante. Os artefatos sozinhos não são suficientes para responder à
questão sobre a conferência de Yalta. O problema fundamental é que, para recuperar
informação relacionada a um assunto específico, é necessária a integração de diversas
fontes de informação. A unificação de vocabulário e de estruturas de dados somente não é
suficiente para resolver o problema.
Na Figura 22 é apresentada uma possível arquitetura que integra o CIDOC CRM,
como ontologia de alto nível que provê a semântica para as propriedades dos sistemas
terminológicos subordinados, e uma camada de conhecimento factual construída a partir
de fontes de dados, metadados e conhecimento existente, como o Thesaurus of Geographic
Names e outras autoridades (DOERR, 2003).
A descrição de problemas semânticos em linguagem natural é passível de erro,
imprecisão e certo grau de ambiguidade apesar do esforço empenhado na precisão da
argumentação (SANTOS, 2016). O CRM é uma ontologia formal11 , que acaba com a
ambiguidade e imprecisão na comunicação dos conceitos. Dessa forma o modelo conceitual
11
Em CIDOC CRM SIG (2011, p. i) o CRM é caracterizado como uma ontologia formal, no entanto não
se encaixa na definição de ontologia formal de Husserl (ver seção 3.3). Acredita-se que o termo formal
foi utilizado para ressaltar a importância da formalização dos conceitos representados.
4.3. FRBRoo 115

permite o entendimento unificado dos conceitos do domínio entre os cientistas da compu-


tação, implementadores de sistemas, especialistas e profissionais da memória cultural e
usuários.

Figura 22 – Uma arquitetura de integração de informação.

Fonte: Adaptado de Doerr (2003, p. 81)

Além da interoperabilidade semântica, o CRM pode ser utilizado também como


ontologia para modelagem de aplicações e para o processamento de consultas complexas
que necessitam de inferências (SANTOS, 2016).

4.3 FRBRoo
O FRBRoo é um modelo conceitual que expressa os conceitos do FRBR utilizando
a metodologia e estrutura orientada a objetos do CIDOC CRM. Deve ser visto como
uma visão alternativa sobre a conceitualização bibliográfica e não como substituição ao
FRBR. O modelo oferece uma visão comum da documentação bibliográfica e museológica,
necessária ao desenvolvimento de sistemas integrados de informação desses dois domínios.
Seu desenvolvimento é fruto de um esforço conjunto entre a IFLA e o ICOM, por meio
do International FRBR/CIDOC CRM Harmonization Group, formado em 2003 (RIVA;
DOERR; ŽUMER, 2008).
O objetivo do FRBRoo é capturar e representar a semântica da informação biblio-
gráfica e facilitar a integração de intercâmbio de informações bibliográficas e museológicas
(CHOFFÉ; LERESCHE, 2016).
116 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

De acordo com Riva, Doerr e Žumer (2008), o trabalho de harmonização dos


modelos se tornou uma oportunidade de enriquecimento dos modelos FRBR e CIDOC
CRM, como por exemplo: (i) adição ao FRBR da modelagem de tempo e eventos; (ii)
esclarecimento da entidade Manifestação; (iii) modelagem explícita de performances e
gravações no FRBR; (iv) adição da entidade Obra ao CRM; e (v) adição do processo de
atribuição de identificadores ao CRM.
Enquanto o FRBR modela os resultados de processos (e. g., criação, realização e
planejamento), mas não lida com esses processos, o FRBRoo é focado em processos. Os
criadores do FRBRoo modelaram todos os conceitos implícitos do FRBRer12 necessários
para justificar a existência de certos atributos no FRBRer. O documento do FRBRoo
dedica uma seção ao mapeamento entre o FRBRer e o FRBRoo, que explica como esses
conceitos foram endereçados.
As classes e propriedades do FRBRoo recebem um nome e um identificador cons-
truídos de acordo com as convenções do CIDOC CRM. O identificador das classes é
formado pela letra “F” seguida de um número sequencial. No caso das propriedades, o
identificador é formado pela letra “R” seguida de um número sequencial. Os identificado-
res de propriedades recebem um sufixo “i” quando a propriedade é referenciada em seu
sentido reverso. Algumas propriedades, ditas Propriedades de Classe (Class Properties),
são identificadas pelo prefixo “CLP” seguido de um número sequencial. Estas são proprie-
dades que têm como domínio a classe F3 Manifestation Product Type e indicam que
todos os exemplares de uma determinada publicação devem apresentar (ou espera-se que
apresentem) as características da publicação à qual eles pertencem (IFLA, 2015, p. 35).
Os nomes das classes e das propriedades são apenas um indicativo do seu significado.
O conjunto do identificador seguido do nome existe para identificar unicamente estes
elementos na documentação. O significado real de uma classe ou propriedade é dado em
sua nota de escopo.
No FRBRoo, as entidades Obra, Expressão e Manifestação foram divididas em
várias classes, cada uma com suas propriedades específicas. A classe Obra (F1 Work)
é especializada em Obra Individual (F14 Individual Work), Obra Complexa (F15
Complex Work), Obra Contêiner (F16 Container Work), Obra Agregadora (F17
Aggregation Work), Obra Serial (F18 Serial Work), Obra de Publicação (F19 Publi-
cation Work), Obra de Performance (F20 Performance Work) e Obra de Gravação
(F21 Recording Work). A classe Expressão (F2 Expression), por sua vez, é espe-
cializada nas subclasses Expressão Autocontida (F22 Self-Contained Expression),
Fragmento de Expressão (F23 Expression Fragment), Expressão de Publicação (F24
Publication Expression), Plano de Performance (F25 Performance Plan) e Grava-
12
É utilizada a sigla FRBRer para diferenciar o modelo FRBR original, que segue a abordagem ER
(Entidade-Relacionamento), do FRBRoo, que segue a abordagem OO (Orientada a Objetos).
4.3. FRBRoo 117

ção (F26 Recording). Em relação às manifestações, o FRBRoo trata separadamente as


Manifestações Tipo de Produto (F3 Manifestation Product Type) que são produtos de
um processo de publicação, das Manifestações Originais (F4 Manifestation Singleton)
produzidas como objetos únicos. Para Choffé e Leresche (2016), a Obra Complexa é a classe
que melhor representa o conceito de obra do FRBRer. Na Figura 23 é apresentado um
diagrama na linguagem UML13 com as relações hierárquicas e os principais relacionamentos
entre as entidades OEMI no FRBRoo.

Figura 23 – Visão estrutural das entidades OEMI no FRBRoo em UML.

13
As primitivas de modelagem da linguagem UML utilizadas nesse diagrama são as mesmas descritas na
seção 3.2 (Modelagem Conceitual) na explicação sobre linguagens independentes de domínio ilustrada
pela Figura 6, adicionadas da relação de especialização, representada por uma seta triangular de
ponta oca (e. g. F17 Aggregation Work é uma especialização de F14 Individual Work), e da relação de
agregação, representada por uma terminação em forma de losango (e. g. F2 Expression pode agregar
várias F22 Self-Contained Expression).
118 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

A Figura 24 exemplifica o papel central exercido pelas entidades temporais no


FRBRoo. As classes Concepção de Obra (F27 Work Conception) e Criação de Expressão
(F28 Expression Creation) são atividades, exercidas por um ou mais agentes (E39
Actor) e que ocorrem em um intervalo de tempo (E52 Time-Span) e em um lugar
(E53 Place). Inicialmente surge uma ideia durante a concepção da obra, seguida de
um processo de criação de expressão, que produz simultaneamente uma expressão e sua
primeira manifestação, uma manifestação original (e. g., manuscrito do autor), ambos
realizando a obra.

Figura 24 – Visão do FRBRoo da concepção de uma obra.

Fonte: IFLA (2015, p. 17)

O FRBRoo torna explícita a contribuição intelectual do editor, não modelada


no FRBRer. A Figura 25 demonstra como é entendida a relação entre a obra do autor
(F1 Work) e a obra do editor (F19 Publication Work). A manifestação tipo de
produto (F3 Manifestation Product Type) contém uma expressão de publicação (F24
Publication Expression), que, por sua vez compreende a expressão autocontida (F22
Self-Contained Expression) do autor e realiza a obra do editor.
4.3. FRBRoo 119

Figura 25 – Relação entre entidades do FRBRer e classes do FRBRoo.

Fonte: IFLA (2015, p. 19)

Apesar de reconhecer performances gravadas como novas expressões de obras, o


FRBR não apresenta relacionamentos entre a performance e o material utilizado como fonte
para a performance. Na visão do FRBRoo, intérpretes, ao participarem de uma performance
(F31 Performance) seguindo um plano de performance (F25 Performance Plan),
criam uma expressão, que pode ser materializada em uma gravação (F26 Recording)
durante um evento de gravação (F29 Recording Event) (RIVA; DOERR; ŽUMER,
2008).
A análise de processos bibliográficos no FRBRoo, trouxe diversos refinamentos
ao modelo CRM que beneficiam a comunidade da Museologia, tais como: (i) um melhor
entendimento da produção em série de objetos (e. g., impressão de gravuras); (ii) o
estabelecimento de relações entre o conteúdo imaterial de criações e seu suporte físico; e
(iii) a introdução de um modelo básico de concepção intelectual e derivação aplicável a
todos os tipos de arte.
É apresentado em um apêndice do FRBRoo um processo de atribuição de iden-
tificadores que pode ser aplicado de uma forma geral. A atribuição de identificadores
inclui a construção de pontos de acesso controlados com base nos nomes associados a
entidades específicas, por meio da aplicação de regras específicas de uma agência. Nesse
processo, deve-se ressaltar a importância da identificação de uma manifestação que seja
considerada “representativa” de uma expressão e de uma expressão “representativa” de
uma obra. Características das manifestações ou expressões representativas podem ser
abstraídas para a expressão ou obra e serem utilizadas na criação de identificadores.
120 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

4.4 Discussão
Entende-se como sendo a grande contribuição do modelo FRBR a introdução das
entidades OEMI ao tratamento da informação bibliográfica. A divisão de conceitos mais
físicos (i. e., relacionados à publicação e exemplares de recursos bibliográficos) de conceitos
abstratos (i. e., relativos à criação intelectual e suas expressões), além do reconhecimento da
importância entre os relacionamentos existentes entre objetos culturais teve grande impacto,
não só nas regras de catalogação, mas também em outras aplicações não bibliográficas.
Coyle (2016, p. 157) declara que o “FRBR representa um grande salto na evolução
da teoria de descrição bibliográfica”, e abre uma “nova era de regras de catalogação
bibliográfica”. Coyle, entretanto, considera surpreendente a distância entre os objetivos
desenvolvidos na reunião de Estocolmo e o resultado da análise feita pelo Grupo de Estudos
do FRBR. O conjunto de requisitos funcionais definidos pelo FRBR (i. e., encontrar,
identificar, selecionar e obter) é considerado pequeno e discutido apenas superficialmente.
É importante ressaltar o pioneirismo do FRBR ao utilizar a modelagem Entidade-
Relacionamento para a informação bibliográfica em um trabalho iniciado em 1992, quase
uma década antes do início da Web Semântica. A publicação de dados estruturados no
contexto da Web Semântica e do Linked Data depende do reconhecimento da existência
de entidades relacionadas, algo não contemplado pela prática tradicional da catalogação
AACR2 em registros MARC. Foram criados, inclusive, vocabulários RDF para a representa-
ção das entidades FRBR na Web Semântica, como por exemplo o FRBR core (NEWMAN,
2005) utilizado pela Music Ontology 14 . Baker, Coyle e Petiya (2014, p. 562) comentam
sobre a mudança de paradigma de uma catalogação dita “plana”, ou single-entity, para
uma nova visão multi-entity, que se iniciou com o modelo FRBR:

A maioria dos metadados na Web, tais como dados descrevendo um livro,


artigo, ou imagem, seguem o modelo implícito de entidade única (um
“recurso”) com atributos (propriedades) [...] No decorrer das últimas duas
décadas, entretanto, o mundo bibliográfico tem desenvolvido modelos
mais diferenciados de recursos bibliográficos. Esses modelos não veem
um livro como apenas um livro, mas como um conjunto de entidades
variadas que refletem o significado, expressão e aspectos físicos de um
recurso.

O modelo IFLA LRM, sucessor do FRBR, já nasce com o objetivo de facilitar a


publicação de dados bibliográficos na Web de dados. Além de compatibilizar os modelos
anteriores da família FRBR, o LRM simplificou os modelos e empregou um maior nível
de generalidade/abstração. O novo modelo manteve as entidades OEMI e suas relações
e removeu as delimitações entre os grupos de entidades, tratando recurso, assunto e
autoridades como dados bibliográficos de uma forma geral.
14
Ontologia da Web Semântica para música, estudada na seção 5.5 (Music Ontology)
4.4. Discussão 121

Em termos de metodologia de modelagem, a principal diferença em relação aos


modelos anteriores está na utilização das relações de especialização, presentes no modelo
entidade-relacionamento estendido. Entidades, atributos e relacionamentos são estruturados
em hierarquias que refletem relações taxonômicas entre esses elementos. A utilização desse
tipo de relação permitiu (i) a simplificação do modelo em termos de redução de elementos,
(ii) a aplicação de um maior nível de abstração, (iii) melhor entendimento do relacionamento
entre as entidades e (iv) maior facilidade na extensão do modelo.
O modelo IFLA LRM é um modelo conceitual, mas também pode ser considerado
uma ontologia de domínio, tal como definida por Guizzardi, Almeida, Guizzardi, Barcellos
e Falbo (2011, p. 2), para o domínio da informação bibliográfica:

Uma ontologia de domínio, no sentido usado pelas demais comunidades


em computação, é um tipo particular de modelo conceitual. Em particular,
é um modelo conceitual que deve satisfazer o requisito adicional de servir
como uma representação de consenso (ou modelo de referência) de uma
conceituação compartilhada por uma determinada comunidade.

Mais genérico que seus predecessores, o LRM deixa claro no seu documento que
“qualquer aplicação prática necessitará determinar o nível apropriado de precisão”, reque-
rendo expansões ou omissões do modelo (RIVA; LE BOEUF; ŽUMER, 2017, p 10). Esse
nível de generalidade é bem-vindo em se tratando de um modelo conceitual de alto-nível.
Modelos mais genéricos facilitam a integração entre modelos derivados e atendem a uma
gama maior de aplicações. Em contrapartida, se posicionam mais longe da implementação,
exigindo que o implementador tome mais decisões em relação ao domínio da aplicação.
Por exemplo, o relacionamento LRM-R6 EXPRESSÃO foi criada por AGENTE
é genérico suficiente para compreender extensões como A1-R1 livro traduzido por
agente ou A2-R1 livro ilustrado por agente em uma aplicação A1 de catálogo de
livros e A2-R2 música interpretada por agente em uma aplicação A2 de catálogo
de música. Um nível mais alto de abstração permitiu que o modelo atendesse a domínios
distintos, além de servir como uma ontologia para o alinhamento semântico (ver seção 3.3)
entre as aplicações A1 e A2 até o seu nível de abstração, ou seja, até o nível de abstração
que as duas aplicações têm em comum, i. e., o relacionamento LRM-R6. Um portal,
que publicasse dados das duas aplicações não distinguiria os relacionamentos A1-R1,
A2-R1 e A2-R2, tratando todos como LRM-R6. Percebe-se, portanto, que é necessária
padronização de extensões do LRM para tipos específicos de recursos informacionais,
semelhante à extensão apresentada no Capítulo 7, para que haja uma interoperabilidade
semântica mais completa entre aplicações que lidam com esses tipos de recurso.
Utilizando ainda o exemplo do parágrafo anterior, ressalta-se que a identificação dos
relacionamentos A1-R1, A2-R1 e A2-R2, necessários para acomodar tipos específicos
de recursos informacionais, é uma atividade de modelagem conceitual, na qual se estende o
122 Capítulo 4. Modelos conceituais da Biblioteconomia e Museologia

modelo LRM (ver exemplo no Capítulo 7). Os conceitos necessários à extensão do modelo
podem ser identificados, dentre outras fontes, a partir do estudo de modelos conceituais
preexistentes específicos de domínio, tal como o modelo proposto no Capítulo 6.
Para Coyle (2016, p. 158), “a força do FRBR como modelo conceitual é poder
suportar uma variedade de interpretações”. Essa variedade de interpretações pode facilitar
sua adoção em uma maior quantidade de aplicações, mas, por outro lado, pode dificultar a
interoperabilidade entre aplicações. A delimitação da fronteira entre obras e expressões é
um exemplo (ver Figura 14). Deixar essa responsabilidade para a aplicação (ou para a regra
de catalogação) cria problemas de interoperabilidade entre as aplicações que entendem
essas fronteiras de forma diferente. O que para uma aplicação é considerada uma obra,
pode ser uma expressão em outra aplicação.
Ainda sobre a falta de clareza na delimitação de fronteiras entre obra e expressão,
característica comum aos três modelos estudados que trabalham com essas entidades (i.
e., FRBR, IFLA LRM e FRBRoo), acredita-se que, ao se proporem a atender a todos os
tipos de recursos bibliográficos, esses modelos não poderiam definir critérios fixos para o
estabelecimento dessas fronteiras sem se especializarem nos diferentes tipos de recursos
informacionais, e, por isso, deixam a responsabilidade para as aplicações e regras de
catalogação.
Fazem-se algumas comparações entre os modelos IFLA LRM e CIDOC CRM.
Quanto ao domínio modelado, o IFLA LRM atende ao domínio bibliográfico, enquanto o
CIDOC CRM considera dados de memória cultural e sua correlação com a informação
bibliotecária e arquivística.
O IFLA LRM objetiva servir como guia ou base para a formulação de regras de
catalogação e para a implementação de sistemas bibliográficos, mas também visa facilitar
a publicação de dados bibliográficos na Web Semântica. Por sua vez, o CIDOC CRM foi
originalmente idealizado visando a interoperabilidade semântica de dados museológicos.
Apesar de esses serem os principais objetivos de uso declarados em seus documentos oficiais,
ambos os modelos podem ser utilizados tanto para a interoperabilidade semântica de dados
em seus respectivos domínios, quanto como base conceitual para a implementação de
aplicações. Quanto à publicação de dados na Web Semântica, existem vocabulários RDF e
OWL para publicação de dados na estrutura do modelo CIDOC CRM15 , entretanto, até o
momento, não foram publicados vocabulários desse tipo para o modelo IFLA LRM16 .
A formalização orientada a objeto, utilizada pelo CRM possui maior poder de
expressão que a modelagem EER, usada pelo LRM. Observa-se que todas as primitivas de
15
Alguns exemplos são: Erlangen CRM / OWL, disponível em http://erlangen-crm.org; e o arquivo RDF
para o CRM CORE, disponível em http://www.cidoc-crm.org/Resources/rdf-file-for-crm-core.
16
De acordo com pesquisas por assunto feitas pelo autor no mês de fevereiro de 2019 no Portal de
Periódicos da CAPES (http://www.periodicos.capes.gov.br) nos idiomas inglês e português sobre o
modelo IFLA LRM, sem restrição de periódicos ou bases de dados.
4.4. Discussão 123

modelagem utilizadas no modelo LRM encontram correspondentes nas primitivas utili-


zadas pelo CRM, ou seja, o LRM poderia ser representado com o uso das primitivas da
modelagem orientada a objeto, sem prejuízo de formalização, porém, o contrário não é
verdadeiro. No CRM são declaradas classes, propriedades e relações de especialização, e
no LRM, são declaradas entidades, relacionamentos, atributos e relações de especialização.
Entidades poderiam ser representadas como classes, relacionamentos, representados como
propriedades, e atributos, representados por propriedades cuja imagem fosse uma espe-
cialização de E59 Valor Primitivo. Conceitos de modelagem, como herança múltipla
e a diferenciação entre entidades endurantes e perdurantes, usadas pelo CRM, não são
utilizadas pelo LRM.
A estruturação das informações em torno de eventos temporais é outra característica
que diferencia o CRM de modelos que têm como principal interesse o recurso informacional,
como o LRM. Essa característica é herdada pelo modelo FRBRoo, que o estende para
atender ao domínio da informação bibliográfica.
O FRBRoo é um modelo consideravelmente maior e mais complexo que o IFLA LRM.
Se, por um lado, esse modelo descreve com mais detalhes e maior formalismo as diferenças
entre diversos tipos de obra, expressão e manifestação, por outro, essa complexidade pode
levar a uma menor adoção, em razão de aumentar a curva de aprendizagem. O investimento
necessário para se aprender a trabalhar com o IFLA LRM é muito menor do que com o
FRBRoo.
Aparentemente, o FRBRoo representa uma conceitualização mais próxima da
natureza das coisas, enquanto o LRM procura atender a necessidades mais práticas de
regras de catalogação e aplicações bibliográficas. Um exemplo é como os dois modelos
tratam a expressão representativa: no FRBRoo é modelada a expressão representativa de
uma obra (reconhecida através da propriedade R40 has representative expression) e
o LRM propõe o atributo LRM-E2-A2 atributo da expressão representativa, usado
para caracterização da obra. Apesar de ser reconhecida a existência de uma expressão
representativa em ambos os modelos, percebe-se a preocupação prática dos autores do
LRM com a aplicação do modelo em contextos nos quais a expressão representativa possa
não constar do catálogo.
Embora o FRBRoo seja mais completo que o LRM, ainda busca um nível de
abstração suficiente para atender a todos os tipos de recursos informacionais, o que resulta
na necessidade de adaptação do modelo a contextos específicos. Uma dessas adaptações é
exemplificada na seção 5.3 (DOREMUS).
125

5 Aplicação de modelos conceituais à repre-


sentação musical

São apresentadas neste capítulo algumas iniciativas de representação musical


suportadas por modelos conceituais, que serviram de referência para a elaboração do
modelo conceitual proposto neste trabalho.

5.1 FRBRização de catálogos musicais


O principal objetivo de por em prática o modelo FRBR é permitir a pesquisa
e apresentação de resultados de acordo com as entidades do grupo 1. Esse processo é
chamado de FRBRização de catálogos.
Existem estudos que demonstram a preferência dos usuários por interfaces de
busca que agrupam os resultados seguindo a hierarquia das entidades do grupo 1 do
FRBR quando comparadas às listas redundantes de edições apresentadas pelos catálogos
tradicionais (COYLE, 2016, p. 109). Um desses estudos foi feito para a validação da
segunda versão do projeto Variations, apresentado na seção 5.2.
Os benefícios de uma visualização FRBRizada são frequentemente utilizados como
argumento para a utilização de modelos baseados no FRBR nas bases de catalogação.
Na verdade, as visualizações FRBRizadas que têm sido testadas foram, em sua maioria,
construídas a partir de dados bibliográficos não catalogados de acordo com os princípios
do FRBR ou armazenados digitalmente na forma de entidades FRBR. Uma visualização
FRBRizada feita a partir de dados modelados de acordo com os princípios do FRBR pode
ser superior, mas devem existir meios de se beneficiar de alguns dos conceitos do FRBR
sem a necessidade de refazer inteiramente os sistemas de biblioteca (COYLE, 2016, p.
112).
Coyle (2016, p. 112) afirma que é aparentemente óbvio que, a partir da introdução
dos relacionamentos bibliográficos, uma das principais funções do FRBR seja resgatar
a função de agrupamento (collocation) que foi perdida para o catálogo online, quando
a descoberta por meio da ordem sequencial em catálogos físicos foi substituída pela
recuperação de registros bibliográficos individuais a partir de bancos de dados.
De acordo com Dickey (2008), o estabelecimento de relacionamentos entre os itens
em uma biblioteca musical é essencial para atender às necessidades de seus usuários. Há
uma grande diversidade de formatos de recursos informacionais relacionados à música,
tais como partituras (ou outros formatos de notação musical), gravações (de áudio e
126 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

ocasionalmente de vídeos), livros e periódicos. Outra característica desse tipo de biblioteca


é a existência de várias obras contidas em um mesmo item do catálogo e os usuários
frequentemente pesquisarem por partes dos itens (e. g., uma faixa de um CD ou uma
partitura em um livro).

Figura 26 – Agrupamento de registros musicais de acordo com o FRBR.

Obra La Bohéme de Puccini


Expressão A partitura completa do compositor (1896)
Manifestação Edição da partitura impressa pela Ricordi em 1897
Expressão Uma versão no idioma inglês para piano e vozes
Expressão Uma performance por Mirella Freni, Luciano Pavarotti
e Orquestra Filarmônica de Berlim (Outubro de 1972)
Manifestação Uma gravação em áudio dessa performance em discos
de 33 1/3 RPM lançada em 1972 pela London Records
Manifestação Um relançamento da mesma performance em CD em 1987
pela London Records
Item A cópia do CD mantida na Columbus Metropolitan Library
Item A cópia do CD mantida na Universidade de Cincinnati

Fonte: Dickey (2008, p. 25)

A Figura 26 apresenta o exemplo e agrupamento hierárquico de registros musicais


segundo o grupo 1 do FRBR. A obra La Bohéme de Puccini agrupa expressões de diferentes
formatos, duas partituras (em dois idiomas) e uma gravação em áudio. A gravação de
áudio foi publicada mais de uma vez, em dois tipos distintos de mídia, resultando em
duas manifestações. A publicação do áudio em CD pode ser encontrada em itens físicos
localizados em duas bibliotecas.
Para Dickey (2008), a obra é o ponto de acesso utilizado por vários usuários em suas
pesquisas, entretanto, eles desejam descobrir, identificar e obter manifestações específicas
da obra pesquisada. O agrupamento apresentado na Figura 26 simplifica a navegação
desses usuários entre a obra pesquisada e a manifestação desejada.
Um dos métodos utilizados para a FRBRização de catálogos musicais é a aplicação
do modelo FRBR a registros já existentes por meio da identificação automática de obras e
expressões para os registros de mídia, que estão no nível das manifestações. Em geral, a
maioria das pesquisas nesta área se concentram na identificação de obras, como o algoritmo
FRBR Work-Set 1 da Online Computer Library Center (OCLC)2 e o FRBR Display Tool 3
da Biblioteca do Congresso (LC)4 . A identificação de expressões recebe tipicamente menos
1
https://www.oclc.org/research/activities/frbralgorithm.html
2
https://www.oclc.org
3
http://www.loc.gov/marc/marc-functional-analysis/tool.html
4
https://www.loc.gov
5.1. FRBRização de catálogos musicais 127

importância que a de obras em razão dos registros MARC possuírem poucos campos
relacionados a expressões (KANAI, 2015).
Kanai (2015) realizou um experimento de identificação manual de obras e expressões
em dados musicais no formato MARC com o objetivo de explorar possibilidades de
identificação automática dessas entidades para a FRBRização de OPAC (catálogo online
de acesso público). O experimento foi conduzido sobre o Toccata MARC5 , um arquivo
MARC da empresa japonesa Toccata Corporation especializada em materiais musicais
lançados no Japão.
Durante esse experimento, o autor encontrou diversas diferenças entre forma de
descrição de música clássica e de Jazz/música popular. Afirma que enfrentou dificuldades
na identificação de obras e expressões nos registros de Jazz/música popular devido à forma
de descrição desse tipo de música.
A declaração de responsabilidade nos registros de Jazz/música popular normalmente
apresentava o nome do intérprete e não o nome do compositor. Foi comum encontrar
registros sem campos de anotação sobre os intérpretes. No caso da música popular, vários
registros não apresentavam a informação de data e hora da performance. A falta dessas
informações resultou em uma maior dificuldade na identificação de obras e expressões nos
registros de Jazz/música popular. A não utilização de controle de autoridade na maior
parte dos registros de Jazz/música popular do Toccata MARC foi outro fator limitante.
Foi necessário recorrer a outras informações para a identificação de obras e expres-
sões nesse tipo de registro, tais como: duração da performance, descrição da performance,
informação de direitos autorais e até o conteúdo do áudio.
A análise das obras e expressões identificadas levou o autor a algumas conclusões
interessantes que diferenciam os registros de música clássica dos de Jazz/música popular
no universo pesquisado: (i) raramente ocorre a gravação separada de partes de obras de
Jazz/música popular; (ii) o agrupamento por obra para o Jazz/música popular não é tão
importante quanto é para a música clássica; (iii) a recorrência da falta de informação sobre
o compositor nos registros de Jazz/música popular em oposição à existência comum de
informações sobre o intérprete o leva à conclusão que o intérprete é muito mais importante
que o compositor nesse universo; e (iv) o significado da informação sobre a performance
de Jazz/música popular é diferente da música clássica levando a diferenças nas descrições
de performance para Jazz/música popular.
5
http://www.toccata.co.jp
128 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

5.2 Variations
As Bibliotecas digitais de conteúdo musical costumam recorrer às práticas comuns
de biblioteca, armazenando um registro para cada item da coleção (e. g., CD, LP, partitura),
sem explicitar os relacionamentos entre itens. Essa abordagem apresenta limitações no
tratamento da informação musical, que apresenta uma estrutura significativamente diferente.
Scherle e Byrd (2004) apresentam o projeto Variations2, um sistema de biblioteca digital
de músicas desenvolvido pelo programa de bibliotecas digitais da Universidade de Indiana,
que permite aos usuários pesquisarem músicas utilizando termos e relacionamentos mais
familiares.
Em sua versão original, o sistema Variations provia acesso online à mídia digital
a partir do catálogo online da biblioteca, apresentando todos os problemas decorrentes
do tratamento da informação musical de forma similar a outros recursos bibliográficos. O
projeto Variations2 busca resolver o problema da falta de relacionamentos na catalogação
de itens musicais com a utilização de um modelo de dados baseado na obra musical. Seu
modelo tem como inspiração o modelo FRBR e o trabalho de Smiraglia (2001).
O Variations2 utiliza um modelo baseado em obra, para suportar a busca e a
navegação. O modelo agrupa todas as versões de uma obra no resultado das buscas,
independentemente de sua instrumentação ou idioma. São providos links entre a obra
e suas partes, e buscas por partes de uma obra permitem ao usuário o acesso à obra
completa.

Figura 27 – Modelo de dados do projeto Variations2

Fonte: Scherle e Byrd (2004, p. 4)

O modelo de dados, apresentado na Figura 27, permite a representação dos relaciona-


5.2. Variations 129

mentos entre obras, criadores, intérpretes e performances com um mínimo de redundância.


Similar ao modelo FRBR, o modelo de dados do Variations2 inclui cinco tipos de registro:
(i) Obra (Work): representa o conceito abstrato de uma peça musical ou de um conjunto
de peças musicais; (ii) Instanciação (Instantiation): representa a manifestação de uma
obra, como performance gravada ou partitura; (iii) Contêiner (Container): um item físico
(ou conjunto de itens) onde as instanciações podem ser encontradas; (iv) Objeto de Mídia
(Media Object): uma peça de conteúdo de mídia digital, tal como um arquivo de som
ou uma imagem de partitura; e (v) Contribuinte (Contributor): representa uma pessoa
ou grupo que contribuiu para a criação de uma música.
Os contribuidores são ainda especializados em três tipos, de acordo com a natureza
de sua contribuição: (i) Criador (Creator): Um contribuinte associado a uma obra. Uma
pessoa ou grupo que contribuiu diretamente na criação de uma peça musical, normalmente
um compositor ou letrista; (ii) Intérprete (Performer): Um contribuinte associado a uma
instanciação. Uma pessoa ou grupo que contribuiu com a criação de uma performance ou
publicação de uma obra. Corresponde normalmente à definição tradicional de intérprete,
porém pode abranger papéis como maestro ou editor de partitura; e (iii) Outro Contribuinte
(Other Contributor): Um contribuinte associado a um contêiner. Uma pessoa ou grupo
que contribuiu com a criação de um álbum ou um grupo de partituras.
Uma estrutura interessante no modelo do Variations2 é a Ligação (Binding).
Uma ligação conecta uma instanciação, uma obra e um objeto de mídia. Esse metadado
estrutural permite a identificação de uma obra em um momento específico dentro de um
objeto de mídia, por exemplo, a instanciação da performance dos Beatles de “Blue Suede
Shoes” dentro de um objeto de mídia de um medley.
Scherle e Byrd (2004) declaram que o sistema Variations2 tem sido avaliado por
testes de usabilidade e pelo seu uso real na biblioteca, que os usuários tiveram pouca
dificuldade em entender o processo de busca e que gostaram da organização dos dados
e da interface de busca. Concluem ainda que o sistema Variations2 exige um esforço de
catalogação maior do que o tipicamente necessário à catalogação de itens no formato
MARC.
Em outubro de 2005, foi lançado o projeto Variations36 com o objetivo de disponi-
bilizar o sistema Variations para outras bibliotecas de instituições de ensino superior. Em
2009 o sistema Variations foi publicado na forma de software livre.
O sistema Variations foi substituído na Universidade de Indiana pelo sistema
Avalon7 , considerado uma evolução ou continuidade do projeto Variations. O Avalon Media
System endereça a necessidade de administrar várias coleções de áudio e vídeo em um
sistema de bibliotecas ou em uma grande instituição. A utilização do sistema Variations
6
http://www.dlib.indiana.edu/projects/variations3
7
http://www.avalonmediasystem.org
130 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

pela Universidade de Indiana foi encerrada no início de 2017 após todo seu conteúdo ter
sido migrado para o sistema Avalon.

5.3 DOREMUS
O DOREMUS é um projeto baseado em tecnologias da Web Semântica, que
objetiva prover modelos compartilhados de conhecimento e vocabulários multi-idioma
compartilhados para instituições culturais, editores, distribuidores e usuários no domínio
musical. O foco do projeto é a descrição de obras de música clássica e tradicional, assim
como de suas interpretações, e tem como principais objetivos: (i) publicar e ligar dados
musicais na Web de dados; (ii) desenvolver ferramentas de auxílio à seleção de peças
musicais; e (iii) construir e validar ferramentas educacionais que habilitem a implantação
de padrões, vocabulários e das tecnologias de Web Semântica subjacentes em instituições
culturais na França e no mundo (ACHICHI et al., 2015).
O projeto é gerido por um consórcio composto por três grandes instituições culturais
– Radio France 8 , Biblioteca Nacional da França (BnF)9 e Filarmônica de Paris10 –, três
instituições acadêmicas e duas empresas privadas (DOREMUS, 2018).
De acordo com Achichi et al. (2015), as obras musicais são objetos complexos,
cuja compreensão exige a descrição de suas manifestações físicas (gravações e partituras)
e dos eventos que as definem (criação, publicação e performance). O primeiro aspecto
é relativamente bem resolvido em catálogos bibliográficos e na indústria da música. O
segundo aspecto é bastante novo, apesar de haver uma necessidade e interesse crescentes
pela utilização de modelos baseados em eventos.
Nesse tipo de modelo, as obras não existem por si só, elas são resultado de uma
atividade. Eventos e atividades se tornam, então, cruciais para cada etapa do processo
de modelagem, permitindo a descrição das coisas como elas são (i. e., resultados de um
processo). Apesar dessa abordagem parecer mais complexa que a dos modelos estáticos,
ela torna o processo de modelagem mais natural, mais fluido e mais fácil (CHOFFÉ;
LERESCHE, 2016).
Uma das dificuldades com obras musicais é que apesar de suas expressões poderem se
diferenciar significativamente, elas ainda são vistas como uma mesma obra. Sua modelagem
requer a expressão da singularidade da obra, das especificidades de suas expressões, e da
demonstração de como os eventos são conectados a essas expressões. Achichi et al. (2015)
ainda comentam que um arranjo pode ser considerado tanto uma expressão como uma
nova obra, dependendo do produtor dos dados. O projeto também permite a especificação
8
https://www.radiofrance.fr
9
https://www.bnf.fr
10
https://philharmoniedeparis.fr
5.3. DOREMUS 131

Figura 28 – Modelagem DOREMUS para várias expressões de uma mesma obra.

Fonte: Choffé e Leresche (2016, p. 7)

de relações entre obras (e. g., uma obra derivada de outra).


O modelo conceitual utilizado pelo DOREMUS é baseado no modelo FRBRoo.
Este último é estendido por novas classes e propriedades consideradas importantes para
a descrição de obras musicais. Os identificadores das classes definidas pelo DOREMUS
apresentam o prefixo “M” enquanto os identificadores das propriedades apresentam o
prefixo “U”.
Choffé e Leresche (2016) explicam que o modelo é em sua essência composto pelos
elementos: obra, expressão, evento, tipo, apelação, ator e algumas propriedades básicas.
O padrão de relacionamentos entre atividade, obra e expressão, como apresentado na
Figura 28, é recorrente em todo o modelo. Ele descreve uma atividade (F28 Expression
Creation) representando a criação de uma expressão (F22 Self-Contained Expression)
que realiza uma obra (F14 Individual Work).
A Figura 28 também apresenta a modelagem para várias expressões de uma mesma
obra. A abordagem tomada é o agrupamento de várias obras individuais (F14 Individual
Works) dentro de uma mesma obra complexa (F15 Complex Work). Considerando
que qualquer obra musical pode ser utilizada para a realização de outra obra, qualquer
obra individual também é um membro de uma obra complexa, mesmo que seja o seu
único membro. O que delimita as fronteiras de uma obra complexa é a dominância de um
conceito. No modelo DOREMUS, múltiplas versões de uma mesma obra, de um mesmo
compositor, são claramente agrupadas dentro de uma mesma obra complexa e arranjos
dessa obra por outros compositores podem também ser membros dessa obra complexa,
contanto que o conceito inicial permaneça dominante. A simples citação de uma obra
132 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

por outra não faz desta membro da mesma obra complexa da primeira porque o conceito
inicial não é o dominante.
O DOREMUS faz extenso uso das expressões do FRBRoo agrupadas em obras
complexas por meio de suas obras associadas. Considerando que uma obra individual
(F14 Individual Work) corresponde a uma, e apenas uma, expressão autocontida (F22
Self-Contained Expression), é possível descrever uma obra no nível da obra ou da
expressão. O DOREMUS opta pela descrição no nível da expressão. Considera a expressão
como um objeto informacional, que pode ser agregado a outras expressões, como no caso
de performances e publicações.
Foram criadas várias classes e propriedades dedicadas à descrição de obras musicais
em suas expressões autocontidas: (i) títulos diferenciados por propriedades específicas
(e. g., tem título original, tem apelido, tem título traduzido, tem título transliterado); (ii)
números opus e números de catálogo; (iii) número de ordem, tonalidade, gênero, meio de
performance, andamento, estilo, formação do grupo musical, modo, escala. Várias dessas
classes se referem a vocabulários controlados: gênero, tonalidade, modo musical, meio de
performance e nome do catálogo.
No DOREMUS é possível descrever obras complexas formadas pela união de várias
outras obras utilizando a propriedade contém (P165 incorporates) entre suas expressões
autocontidas. Choffé e Leresche (2016) exemplificam esse caso com a ópera Cosi Fan Tutte,
que contém o libreto de Da Ponte e a música de Mozart.
Outro relacionamento comum entre obras musicais é a derivação, para o qual é
utilizada a propriedade é derivada de (R2 is derivative of ) entre obras complexas e
entre obras individuais. Essa propriedade é “tipada”, ou seja, ela possui um tipo que
informa qual forma de derivação está sendo modelada (e. g., orquestração, transcrição).
Os tipos de derivação são listados em um vocabulário controlado multi-idioma.
A descrição de performances no DOREMUS segue o esquema geral de modelagem
de performances no FRBRoo: Uma F31 Performance executa um F25 Performance
Plan (plano de performance), que contém uma ou mais expressões. O plano de performance
permite descrever intenções ou colaborações que levaram à performance, tais como uma
coreografia ou uma organização de palco.
O DOREMUS introduz a classe M28 Individual Performance (performance
individual) para representar a complexidade de uma performance. A decomposição de
performances em outras performances em performances individuais permite a descrição da
atuação de grupos ou indivíduos em uma performance, indicando suas funções, responsabi-
lidades, meios de performance utilizados, personagens interpretados, etc. Uma performance
pode ser parte de uma E7 Activity (atividade), um festival, por exemplo.
5.3. DOREMUS 133

Figura 29 – Esquema sintetizado de uma performance complexa.

Fonte: Choffé e Leresche (2016, p. 13)

A Figura 29 exemplifica a representação de uma performance complexa no DORE-


MUS. A performance apresentada ocorreu no contexto de um festival (Festival de Lucerne)
e implementa um plano de performance que contém uma ou mais expressões (e. g., a obra
musical que foi interpretada). Observa-se pela leitura dos elementos M28 Individual
Performance na parte de baixo, a indicação de que a performance foi conduzida pelo
maestro H. v. Karajan e teve a participação do solista soprano E. Scharzkpof no papel
"The Marschallin", de J. Schmidt no Cello e M. Müller no violino solo, os dois últimos
representando a Berliner Philharmoniker 11 .
Gravações são modeladas a partir de um evento de gravação (F29 Recording
Event), a partir do qual é criada uma obra de gravação (F21 Recording Work) e uma
gravação (F26 Recording). Em um evento de gravação é gravada uma performance. O
DOREMUS trabalha com o conceito de gravação sem identificar como este foi executado,
por exemplo, quantas sessões de gravação foram necessárias ou quantos microfones foram
utilizados. Uma atividade de edição (M29 Edição) representa o trabalho envolvido na
conversão da gravação em faixas (M24 Track).
O DOREMUS ainda estende a modelagem de publicações (F14 Publication
Work do FRBRoo, para representar a publicação de itens bibliográficos relacionados à
informação musical, como um CD. Um CD (no nível de expressão FRBR) é representado
como uma expressão de publicação (F24 Publication Expression), que contém várias
faixas e outras expressões de publicação, como o encarte, por exemplo.
11
https://www.berliner-philharmoniker.de/en
134 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

Como complemento do modelo, o DOREMUS define uma série de vocabulários


12
RDF . Quando possível, são utilizados vocabulários já existentes, podendo estes serem
completados com valores de vocabulários dos parceiros do projeto. Quando identificados
mais de um vocabulário para o mesmo tema, são feitos alinhamentos. São feitos, inclusive,
alinhamentos com vocabulários populares, como MuzicBrainz13 , Wikidata14 e DBPedia15 .
Alguns vocabulários utilizados são: ISNI, para pessoas e entidades coletivas; RAMEAU,
para grupos étnicos, gêneros musicais e meios de performance; UNIMARC e RDA para
funções; IAML para gêneros musicais e meios de performance; e MIMO para meios de
performance. Outros vocabulários foram criados no âmbito do projeto DOREMUS, como no
caso de tons, modos, tipos de derivação e tipos de responsabilidade. Todos os vocabulários
são disponibilizados ao menos em inglês e francês, sendo alguns multilíngues, a exemplo
do vocabulário de tons.
Além do modelo conceitual e dos vocabulários controlados, o projeto DOREMUS
disponibiliza ferramentas e metodologias para o tratamento de dados utilizando tecnologias
de Web Semântica.

5.4 EthnoMuse
O Instituto de Etnomusicologia do Centro de Pesquisas Científicas da Academia
Eslovena de Ciências e Artes (SRC SASA)16 tem como uma de suas principais atribuições
realizar uma compilação de uma coleção, o mais completa possível, do folclore musical
esloveno. Uma parte importante da sua atividade de pesquisa consiste na coleta, preservação,
pesquisa e publicação de canções, músicas e danças do folclore esloveno e desenvolvimento
da biblioteca digital EthnoMuse17 .
A biblioteca EthnoMuse abrange todo o acervo do instituto, composto por apro-
ximadamente 25.000 manuscritos de canções folclóricas com transcrições, por volta de
30.000 gravações em fitas magnéticas e mídia digital de canções e melodias folclóricas,
gravações em cilindros de cera e documentação visual, incluindo fotografias e vídeos. Essa
biblioteca consiste em um conjunto de ferramentas e técnicas que auxiliam na digitalização
das coleções do instituto, suporta os processos contínuos de produção e pós-produção
12
Os vocabulários utilizados no projeto DOREMUS são referenciados em sua documentação como
controlled vocabularies no idioma inglês, entretanto, evitou-se a tradução literal por “vocabulários
controlados” para não remeter à atividade bibliográfica de controle de vocabulário. Esses vocabulários de
diferentes naturezas (e. g., registros de autoridade, taxonomias e listas de termos) são disponibilizados
na Web Semântica no formato RDF, por isso a tradução como “vocabulários RDF” ou, simplesmente,
“vocabulários”.
13
https://musicbrainz.org
14
https://www.wikidata.org
15
https://wiki.dbpedia.org
16
https://gni.zrc-sazu.si/en
17
http://www.etnomuza.si
5.4. EthnoMuse 135

relacionados às gravações feitas em campo e documentação de canções, músicas e danças


do folclore esloveno e habilita a manipulação e pesquisa nos conteúdos do acervo.
Strle e Marolt (2012) apresentam como foi desenvolvido para essa biblioteca um
modelo de dados flexível fundamentado nos modelos FRBRoo e CIDOC CRM.
É da natureza das canções folclóricas serem interpretadas e mediadas segundo uma
tradição oral. Registros em áudio são a fonte científica primária para as pesquisas sobre o
folclore. Não havendo um documento, a representação de uma canção folclórica em uma
gravação de uma de suas variações se torna a única representação de suas características
físicas. Seria a documentação da canção por meio do evento de alguém cantando, não a
documentação da própria performance. Em razão dessa forte interdependência, o conceito
de evento é central para o projeto do modelo de dados proposto.
O modelo de dados da EthnoMuse é suportado pelos modelos conceituais FRBRoo
e CIDOC CRM, e seu desenvolvimento ocorreu na mesma época do modelo FRBRoo. Em
uma primeira versão, foram utilizados os conceitos do CIDOC CRM, úteis para a descrição
dos eventos de gravação das canções, mas não suficientes para relacionar as canções às suas
variações gravadas. Uma segunda versão do modelo foi feita combinando-se os modelos
CIDOC CRM e FRBRer com o objetivo de (i) representar entidades e relacionamentos para
descrição de canções e músicas folclóricas, com base nas entidades do grupo 1 do FRBRer;
e (ii) representar os processos de produção e pós-produção com base no conceito de evento
do CRM. Em uma terceira versão do modelo, buscou-se um mapeamento de conceitos com
o modelo FRBRoo. Foram necessárias mudanças para a adequação à nova interpretação
da entidade Manifestação pelo FRBRoo. Passam, então, a serem consideradas as entidades
F3 Manifestation Product Type e F4 Manifestation Singleton.
Um registro em áudio representa a documentação mais autêntica de uma variação,
enquanto as demais formas de representação da variação, tais como a transcrição de textos
e melodia, são consideradas como realizações parciais da variação.
A classe Tipo Variante (Variant Type) representando uma obra complexa que
conecta todas as variantes da canção folclórica baseadas no primeiro verso. Cada variante
é representada por uma obra complexa, que conecta obras individuais ou outras obras
complexas com diferentes formas de realização. Uma variação é representada por uma
gravação de áudio (F26 Recording) enquanto as transcrições de melodia e texto são
representadas por expressões autocontidas (F22 Self-contained Expression).
Destacam-se alguns relacionamentos como: (i) o relacionamento que indica o
registro de áudio como expressão representativa da variação (R40 has representative
expression); (ii) a indicação de um segmento de gravação como a manifestação original
representativa de uma gravação (R42B has representative manifestation singleton);
(iii) e o relacionamento explicitando que as transcrições de melodia e texto são derivações
136 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

da variação (R2 is derivative of ).


O modelo de dados da EthnoMuse suporta um conjunto de ferramentas para os
usuários dessa biblioteca. Primeiramente foi desenvolvido o EthnoMuse Librarian, uma
aplicação desktop que integra ferramentas para armazenamento, anotação e manipulação de
conteúdo digital e metadados, para uso dos pesquisadores do instituto. Para a navegação e
pesquisa no acervo, foi desenvolvido o EthnoMuse Explorer, uma aplicação Web disponível
para uso geral na Internet. A navegação pode ser feita através da seleção de uma combinação
de gêneros, tipos de conteúdo, tipos de variação, intérpretes, datas e regiões. A interface
de pesquisa permite a combinação de consultas booleanas e textuais sobre os atributos e
de pesquisas baseadas na melodia.

5.5 Music Ontology


A Music Ontology (MO), apresentada por Raimond, Abdallah, Sandler e Giasson
(2007), é uma estrutura (framework) formal para o tratamento de informações relacionada
à música na Web Semântica. Teve como foco inicial a descrição do fluxo de trabalho que
se inicia com a criação de uma obra musical, indo até o seu lançamento em uma gravação
em particular.
Esta ontologia tem sido usada extensivamente em projetos como o DBTune18
e o sítio Web de música da BBC19 , tanto como um modelo genérico para o domínio
musical como um meio de publicação de dados relacionados a música na Web (RAIMOND;
SANDLER, 2012).
O termo ontologia, nesta seção, é compreendido como um artefato de engenharia,
de acordo com a visão da comunidade de Inteligência Artificial (GUARINO, 1998), mais
especificamente um artefato representado na linguagem OWL a ser utilizado no contexto
da Web Semântica.
A flexibilidade está entre as principais características da MO, que permite a
publicação desde dados editoriais até anotações temporais de sinais de áudio. Para atender
a representação em vários níveis de granularidade, esta é dividida em três níveis de
expressividade:

a) o primeiro nível trata apenas de informações editoriais, tais como trilha, álbum,
compilação e artista;
b) o segundo nível introduz o conceito de eventos, para descrição de fluxos de
trabalho envolvendo a composição, arranjos, performances e outros; e
18
http://dbtune.org
19
https://www.bbc.co.uk/music
5.5. Music Ontology 137

c) no terceiro nível, é introduzido o conceito de decomposição de eventos, permi-


tindo o registro de eventos internos a outros eventos, como a performance de
um pianista em um concerto, ou até o registro de que uma tecla específica foi
tocada por qual músico em certo momento.

A MO reutiliza várias ontologias da Web Semântica para endereçar alguns con-


ceitos mais genéricos, dentre as quais se destacam as ontologias Timeline (RAIMOND;
ABDALLAH, 2007b) e a Event (RAIMOND; ABDALLAH, 2007a).
A ontologia Timeline é utilizada para a descrição de informação temporal. Com
essa ontologia é possível o registro de intervalos temporais e instantes (momentos pontuais)
em uma linha do tempo (TimeLine), que representa o suporte para o endereçamento
de informações temporais. Pode ainda relacionar duas linhas do tempo por meio de
mapeamentos entre estas (TimeLineMaps). São considerados na MO dois tipos de linhas
do tempo: física e relativas (tal como uma linha do tempo de uma trilha musical).

Figura 30 – Visão geral da ontologia Event.

Fonte: Raimond e Abdallah (2007a, p. 3)

De acordo com Raimond, Abdallah, Sandler e Giasson (2007), o processo de


produção musical envolve eventos físicos que ocorrem em um certo tempo e lugar e que
podem envolver a participação de vários objetos físicos animados ou inanimados, como,
por exemplo, performances envolvendo intérpretes e seus instrumentos. A representação
de eventos é feita com a utilização da ontologia Event (ver Figura 30).
O conceito de evento, para a MO, é amplo, incluindo sons (como um campo acústico
definido sobre uma região espaço-tempo), performances, composições, gravações entre
outros. Um evento abrange um número de fatores, agentes e produtos, podendo ser ligado
um lugar e a um registro de tempo. É considerada também a existência de subeventos para
138 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

a representação de eventos complexos de forma estruturada e não ambígua. Um evento


complexo, que possa envolver vários agentes e fatores, pode ser subdividido em eventos
mais simples, cada um carregando parte da informação do evento complexo.
Outra ontologia utilizada pela MO é a FRBR core (NEWMAN, 2005), um vo-
cabulário RDF com os principais conceitos do FRBR. A MO utiliza principalmente os
conceitos Obra, Manifestação e Item, entretanto não utiliza diretamente o conceito de
Expressão por considerar que sua utilização não permitiria a modelagem de fluxos de
trabalho complexos durante o processo de produção, que envolvesse, por exemplo, um
arranjo, uma performance, uma gravação e uma masterização.
A entidade MusicalWork (Obra Musical) é definida como uma especialização da
entidade Obra do FRBR. Analogamente são definidas as entidades MusicManifestation
(Manifestação Musical) e MusicalItem (Item Musical) como especializações das entidades
Manifestação e Item.
É utilizada ainda a ontologia Friend-of-a-friend (FOAF) (BRICKLEY; MILLER,
2014) para a especialização dos conceitos de Pessoa e Grupo em MusicalArtist (Artista
Musical) e MusicalGroup (Grupo Musical) respectivamente.

Figura 31 – Um fluxo de trabalho de produção musical utilizando a Music Ontology.

Fonte: Raimond, Abdallah, Sandler e Giasson (2007, p. 3)


5.5. Music Ontology 139

Vários conceitos relacionados ao fluxo de trabalho de criação musical são definidos


a partir da ontologia Event. Uma Composition (Composição) trata da criação de um
MusicalWork. Um Arrangement trata da elaboração de um arranjo de um Musi-
calWork, que pode ter como um fator outro MusicalWork, como agente um Arranger
(Arranjador) e como produto um Score (Partitura). Uma Performance pode ter como
fatores um MusicalWork, um Score, vários instrumentos musicais e equipamentos e,
como agentes, vários intérpretes, engenheiros de som, maestros, ouvintes, entre outros.
O resultado de uma Performance pode ser outro evento, um Sound (som), que, por
sua vez pode ser fator de um Recording (gravação). Um Recording pode produzir um
Signal (sinal), que poderá ser publicado na forma de uma MusicalManifestation. A
Figura 31 apresenta um exemplo de fluxo de trabalho semelhante ao recém explicado.
As diferentes subclasses de Event (e. g., Composition, Performance e Recor-
ding) funcionam como pontos de extensão, que permitem a ligação da MO com ontologias
e taxonomias específicas de domínio.
Algumas dessas ontologias e taxonomias lidam com conceitos que podem ser
utilizados como fatores de Performances ou outros eventos, tais como a Key ontology 20 ,
para descrição de tons musicais, a OMRAS2 Chord ontology 21 , para descrição de acordes e
a Instrument taxonomy 22 , taxonomia de instrumentos musicais.
A utilização da ontologia FOAF permite a expressão de gostos musicais de consu-
midores e relacionamentos entre eles, o que provê uma base para aplicações colaborativas
de filtragem.
A Features Onotology 23 estende a MO com o objetivo de criar uma estrutura genérica
para expressão de características (features) de sinais de áudio (e. g., Mel Frequency Cepstral
Coefficients, chromagram e onsets).
Outra extensão da MO é a Studio Ontology, que pode ser utilizada para a descrição
e compartilhamento de informações detalhadas sobre a produção musical em um estúdio de
gravação. A Figura 32 apresenta um diagrama, na visão da Studio Ontology, das relações
entre a Music Ontology, as ontologias nas quais ela se baseia e algumas ontologias que a
estendem.
20
https://github.com/motools/keysontology
21
http://motools.sourceforge.net/chord/draft1/index.html
22
http://purl.org/ontology/mo/mit
23
http://motools.sourceforge.net/doc/audio_features.html
140 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

Figura 32 – Relações entre diversas ontologias musicais na visão da Studio Ontology.

Fonte: C4DM (2011)

5.6 Discussão
As iniciativas de representação musical estudadas aplicam modelos conceituais à
representação de diferentes tipos de música (e. g., música clássica, popular e folclórica), e
atendem a diferentes tipos de aplicação (e. g., integração e publicação de dados na Web
Semântica, visualização de catálogos, modelagem de dados em bibliotecas digitais, pesquisa
e preservação de memória cultural, dentre outros).
Percebe-se, em todas as iniciativas estudadas, que a utilização de modelos con-
ceituais aplicados à representação da informação musical favorece o agrupamento e a
navegação entre obras, expressões e manifestações bibliográficas. Foram encontrados vários
exemplos de agrupamentos de entidades OEMI, que são de interesse dos usuários desse
tipo de informação. Dickey (2008) exemplifica o agrupamento de partituras em diferentes
idiomas e a performance de uma obra. O modelo Variations2 agrupa manifestações de uma
obra e permite a navegação entre expressões individuais (peças musicais) e manifestações
agregadoras (e. g., CD, DVD, etc.). O projeto DOREMUS utiliza a obra complexa do
FRBRoo para agrupar diferentes versões de uma obra de um mesmo autor e arranjos da
mesma obra feitos por outros autores, permite a navegação entre obras originais e derivadas,
e possibilita a composição de obras complexas por meio da junção de obras individuais de
naturezas diferentes (e. g., uma ópera, composta pela música e pelo libreto). Na biblioteca
EthnoMuse são agrupadas as variações de cada música folclórica documentada e, para
5.6. Discussão 141

cada variação são associadas as transcrições de letra e melodia à versão gravada. Com
suporte do FRBR, a Music Ontology também possibilita agrupamentos entre entidades
OEMI.
Vários desses agrupamentos e associações se mostram úteis no domínio da música
popular brasileira. O agrupamento de áudio, música escrita e letra, feito na biblioteca
EtnhoMuse é um dos exemplos. Assim como na música folclórica eslovena, a canção tem um
papel preponderante na música popular brasileira, o que implica em uma maior importância
da letra da música para seus usuários. O agrupamento da versão original de uma música
com seus arranjos, como apresentado no projeto DOREMUS para a música clássica, é
outro exemplo. Esse agrupamento é interessante no domínio da música popular, onde é
comum uma mesma música ter várias versões. A possibilidade de navegação no projeto
Variations entre expressões individuais as manifestações agregadoras que as publicam é
mais um exemplo.
Em seu experimento com o catálogo Toccata, Kanai (2015) constata algumas
diferenças entre a música clássica e a música popular, que também foram identificadas por
Silva (2017), tais como, a maior importância dada a um intérprete proeminente do que ao
compositor de música popular e a falta de informações sobre o próprio compositor e os
demais intérpretes. Entretanto, a conclusão de Kanai (2015) de que o agrupamento por
obra para o Jazz/música popular não é tão importante quanto é para a música clássica
pode não ser válida para a música popular brasileira, um universo musical no qual há uma
cultura de gravar a mesma música várias vezes, até pelo próprio compositor.
O medley, usado como exemplo de utilização da estrutura de ligação (Binding) do
modelo Variations2, também ocorre na música popular brasileira. Medley (ou pot-pourri)
é uma peça musical formada por partes de outras peças musicais existentes, normalmente
tocadas em sequência, mas podendo ser sobrepostas.
Essa estrutura de ligação do Variations2, que permite a identificação de uma obra
em um momento específico dentro de um objeto de mídia, poderia ser usada para a
identificação de músicas em momentos específicos da gravação de um show, por exemplo.
Usuários de música popular brasileira poderiam se beneficiar do agrupamento de obras
de naturezas distintas, porém derivadas de uma mesma obra original, tais como versões
musicais escritas ou em áudio, músicas em shows gravados em vídeo, videoclipes, letras
escritas, etc. Esse tipo de agrupamento remete ao conceito de superobra24 , tal como
definida por Svenonius (2000, p. 38):
24
Os termos família bibliográfica, rede de identidade textual e rede de instanciações também são usados
na literatura para se referir ao mesmo conceito de superobra (SMIRAGLIA; VAN DEN HEUVEL,
2013, p. 373).
142 Capítulo 5. Aplicação de modelos conceituais à representação musical

Uma superobra pode conter, como subconjuntos, qualquer número de


obras, cujos membros, mesmo que não compartilhem essencialmente o
mesmo conteúdo informacional, são ainda similares por serem derivados
de uma mesma obra original.

No projeto DOREMUS, é exemplificado o problema do estabelecimento de fronteiras


entre as entidades obra e expressão. No contexto desse projeto, Choffé e Leresche (2016)
afirmam que arranjos de uma obra feitos por outros compositores podem também ser
membros dessa obra complexa, contanto que o conceito inicial permaneça dominante. Esse
parece ser um critério razoável para delimitação da fronteira entre obra e expressão, porém,
ainda em relação ao DOREMUS, Achichi et al. (2015) comentam que, dependendo do
produtor dos dados, um arranjo pode ser considerado tanto uma expressão como uma
nova obra. Apesar de existir um critério, diferentes bases de dados tratam essa fronteira
de maneira distinta.
Observa-se o critério de distinção entre obras na biblioteca EthnoMuse como sendo
o primeiro verso da canção. Esse é um critério simples e objetivo, no entanto, aplicável
em um contexto específico: música folclórica eslovena catalogada em uma única biblioteca
digital. O projeto DOREMUS, por sua vez, mesmo definindo um critério de fronteira entre
obra e expressão, trabalha com a integração de dados de diversas fontes heterogêneas
e depende da interpretação desse critério por grupos distintos, o que dificulta que essa
fronteira seja sempre respeitada.
Ao justificarem o uso do FRBRoo como base para o modelo do projeto DOREMUS,
Choffé e Leresche (2016, p. 3) fazem a seguinte crítica à Music Ontology:

Já existem várias ontologias musicais, sendo a Music Ontology, parcial-


mente baseada no FRBRer, a mais sofisticada. No entanto, essa ontologia
é limitada em várias maneiras e não permite uma representação completa
de obras musicais. Ela não possui a expressividade necessária à publicação
de catálogos de instituições de preservação de memória cultural.

Apesar da crítica, os mesmos autores reconhecem a importância da Music Ontology


ao afirmarem que a ontologia musical proposta pelo projeto DOREMUS deve permitir
alinhamentos com a Music Ontology.
A Music Ontology diferencia-se das demais iniciativas por atender o domínio musical
de uma forma genérica, sem se restringir a uma aplicação ou tradição musical específica.
Essa ontologia procura atender a um espectro mais amplo do domínio musical, que vai
além da representação da informação musical. Percebe-se que, ao tentar atender a todos os
tipos de música, lhe falta o detalhamento necessário para atender a necessidades específicas,
tal como constatado por Choffé e Leresche (2016).
Outra diferença da Music Ontology em relação às demais iniciativas estudadas é
a sua capacidade de representação em vários níveis de granularidade. Em seu terceiro
5.6. Discussão 143

nível de expressividade é possível a decomposição de eventos ao ponto de identificar o


momento em que uma tecla de piano é tocada. Apesar do DOREMUS também trabalhar
com decomposição de eventos, este recurso é limitado à identificação da participação de
grupos ou indivíduos em performances.
Identificam-se quatro formas distintas de uso dos modelos conceituais FRBR,
CIDOC CRM e FRBRoo pelas iniciativas estudadas, listadas em ordem de maior aderência
ao modelo: (i) uso sem adaptação; (ii) extensão do modelo; (ii) fundamentação parcial; e
(iii) inspiração para modelagem. A FRBRização de catálogos musicais, tal como apresentada
neste capítulo, proporciona a navegação em catálogos musicais de acordo com a estrutura
do FRBR, sem alterar ou adicionar elementos a essa estrutura. As ontologias DOREMUS
e Music Ontology estendem vocabulários OWL e RDF dos modelos FRBRoo e FRBR,
respectivamente. O projeto EthnoMuse fundamenta os conceitos utilizados no seu modelo
de dados nos modelos CIDOC CRM e FRBRoo, sem, necessariamente, manter uma
compatibilidade com esses modelos. E o projeto Variations2, por sua vez, apenas se inspira
no modelo FRBR. Quando maior a aderência ao modelo, maior serão os benefícios em
termos de interoperabilidade semântica e possibilidade de uso de aplicações, ferramentas
de software e protocolos padronizados.
A utilização de modelos conceituais pelas iniciativas de representação musical
estudadas demonstra como esse tipo de modelo pode proporcionar aos usuários de música
interfaces com melhor agrupamento de recursos e uma navegação mais flexível, de modo
que suas necessidades informacionais sejam mais bem atendidas.
Parte III

Resultados
147

6 Uma proposta de modelo conceitual para a


representação da música popular brasileira

Neste capítulo é descrito o modelo conceitual elaborado durante esta pesquisa. O


modelo é apresentado na forma de diagramas OntoUML, onde aparecem os conceitos do
recorte estudado do domínio da música popular brasileira posicionados nas categorias
ontológicas da UFO. A conceitualização representada é discutida no decorrer do texto.
Para facilitar o entendimento, o modelo é dividido em diferentes visões.
O desenvolvimento do modelo partiu de uma rede semântica1 relacionando os
principais conceitos extraídos das características do domínio a ser representado constantes
no Capítulo 2 (Música popular brasileira), foco do OE1 . Essa rede semântica serviu de
insumo para os diagramas OntoUML, onde a natureza de cada conceito e relacionamento
foi identificada em termos de categorias da UFO. Novos conceitos e relacionamentos
apareceram durante a análise do domínio e do estudo de outros modelos de representação
musical.
Referências ao “modelo” de forma genérica correspondem ao modelo conceitual
descrito neste capítulo. Foram utilizadas algumas convenções durante a descrição do modelo:
(i) nomes de classes em negrito, com primeira letra maiúscula em cada palavra (e. g., Ideia
Musical); (ii) nomes de relacionamentos e atributos em negrito e em letras minúsculas
(e. g., tem melodia); e (iii) estereótipos são escritos em itálico (e. g., role e formal).
Para reduzir o número de elementos e facilitar a visualização dos diagramas, não são
apresentados os estereótipos de relações do tipo mediation e formal. Relacionamentos não
estereotipados ligados a classes do tipo relatorKind e suas especializações são mediations,
sendo os demais relacionamentos não estereotipados do tipo formal. As principais classes
de cada diagrama aparecem com fundo cinza para facilitar sua localização no diagrama
durante a leitura do texto. Para maior fluidez do texto, nomes de classes que são no
singular podem aparecer no texto no plural (e. g., Arranjos Escritos se referindo à classe
Arranjo Escrito).
Com o objetivo de facilitar a descrição do modelo, são apresentados, no decorrer
deste capítulo, diversos diagramas OntoUML que apoiam a discussão dos conceitos do
modelo sob diferentes pontos de vista. A mesma classe pode aparecer em diversos diagramas
e, em vários casos, não aparecem todos os seus relacionamentos no mesmo diagrama. São
1
De acordo com Sowa (1992), uma rede semântica é uma estrutura em grafo para representar conheci-
mento em padrões de nós e arcos interconectados. A rede semântica elaborada no início desta pesquisa
era um diagrama simples, onde os nós eram conceitos da música popular brasileira e os arcos eram
linhas ligando esses conceitos.
148 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

disponibilizados, como apêndices deste trabalho, dois diagramas que proveem visões mais
completas e integradas dos diagramas deste capítulo: o diagrama do Apêndice A (Diagrama
OntoUML – Ideia e produção musical) integra os diagramas das sessões 6.1 a 6.4; e o
Apêndice B (Diagrama OntoUML – Gênero musical) integra os diagramas da seção 6.5.
O arquivo do modelo completo no formato .asta2 se encontra embutido neste documento
PDF.

6.1 Principais conceitos do modelo, da ideia à performance


Apresenta-se primeiramente uma visão do modelo com foco na criação intelectual
musical e seu desenvolvimento até a performance. No diagrama da Figura 33 são apre-
sentados os conceitos que podem ser considerados os mais importantes do modelo e seus
principais relacionamentos.
No topo do diagrama, aparece o conceito Ideia Musical, especializado nos conceitos
Ideia Musical Original e Versão de Ideia Musical. Uma Ideia Musical é um som
musical não expressado, como se alguém pudesse imaginá-lo ou executá-lo internamente
em sua mente. Uma Ideia Musical Original é uma ideia musical considerada original,
ou autoral, do ponto de vista dos usuários, enquanto uma Versão de Ideia Musical é
uma ideia musical que desenvolve uma ou mais ideias musicais originais para que sejam
expressas na forma de som ou de qualquer forma de notação musical.
É a Ideia Musical Original que permite a identificação de diferentes versões
como instâncias de uma mesma “música”. Existem dois tipos de Ideia Musical Original,
o Tema Melódico e a Canção. O Tema Melódico é caracterizado por uma Melodia e
por um Ritmo que estão presentes em todas as suas versões. De fato, a Melodia e o Ritmo
das versões podem ser variações do tema melódico sem, no entanto, descaracterizarem o
Tema Melódico desenvolvido. A Canção, por sua vez, existe a partir da junção de um
Tema Melódico a uma Expressão Textual, no papel de Letra de música. Destaca-se
que várias letras podem ser escritas para uma mesma canção.
Faz-se um paralelo entre os conceitos Ideia Musical Original e Versão de Ideia
Musical com os conceitos F15 Complex Work (obra complexa) e F14 Individual
Work (obra individual) do FRBRoo tal como utilizados no projeto DOREMUS (ver 5.3).
O DOREMUS agrupa várias obras individuais dentro de uma mesma obra complexa,
e sempre existe ao menos uma obra individual membro de uma obra complexa. O que
delimita as fronteiras de uma obra complexa no DOREMUS é a dominância de um conceito.
As diversas versões e arranjos de uma mesma obra são agrupadas em uma mesma obra
complexa contanto que o conceito inicial permaneça dominante. De maneira similar, na
2
O arquivo OntoMPB.asta foi elaborado no editor Astah UML versão 8.1, disponível em http://www.
astah.net
6.1. Principais conceitos do modelo, da ideia à performance 149

Figura 33 – Principais conceitos do modelo.

música popular brasileira, ideias musicais originais agrupam as versões que a desenvolvem,
sendo que o conceito dominante para a seleção das versões é representado pelo tema
melódico, podendo também incluir a letra, no caso de canções. Percebe-se, no entanto, uma
diferença em relação ao DOREMUS: uma versão de ideia musical pode desenvolver mais
de uma ideia musical original, enquanto, no DOREMUS, uma obra individual pertence a
apenas uma obra complexa.
Ainda no projeto DOREMUS, é reconhecida a possibilidade da citação de uma
obra por outra, sendo a citação insuficiente para tornar a obra que a utiliza membro
da mesma obra complexa da obra citada quando o conceito inicial não é o dominante.
A citação ocorre quando uma música faz apenas uma referência a outra música. Esse
150 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

fenômeno também ocorre na música popular brasileira e está representado no modelo pelo
relacionamento cita ideia original entre Versão de Ideia Musical e Ideia Musical
Original.
Para exemplificação de alguns conceitos apresentados utiliza-se as músicas Garota
de Ipanema, de Tom Jobim e Para um Amor no Recife, de Paulinho da Viola. O Tema
Melódico de Garota de Ipanema, unido à Letra de Vinícius de Moraes forma uma
Canção. Para esta canção, foram escritas outras letras em diferentes idiomas, como a
letra em inglês, escrita por Norman Gimbel. Versões instrumentais (representadas pelo
conceito Versão Instrumental) dessa música podem ser identificadas apenas pelo Tema
Melódico, como, por exemplo, sua versão instrumental interpretada pelo grupo Zimbo Trio
para o álbum Zimbo Trio (1964). Podem existir, ainda, versões de canção (representadas
pelo conceito Versão Cantada) que utilizam mais de uma letra, como, por exemplo, a
versão Girl from Ipanema para o álbum Getz/Gilberto (1964) com a letra em português de
Vinícius de Moraes e a letra em inglês de Norman Gimbel na mesma versão. A utilização
da letra em uma versão é representada pelo relacionamento usa letra, entre Versão
Cantada e Letra. Versões de canções podem também ser identificadas pelo uso da Letra,
quando a melodia e ritmo forem muito modificados. Um exemplo é a versão da canção
Para um Amor no Recife de Paulinho da Viola gravada por Marina Lima para o álbum
Registros à Meia-Voz (1996), cuja melodia e ritmo foram significativamente modificados,
apesar de ainda serem uma variação do tema melódico da versão original de 1971, deixando
a versão mais reconhecível pela letra do que pelo tema melódico.
Como antecipado, uma Letra é o papel exercido por uma Expressão Textual em
uma Canção. O conceito Expressão Textual é uma especialização da entidade LRM-
E3 Expressão do LRM e pode ser definido como uma combinação distinta de símbolos
textuais que carrega conteúdo artístico ou intelectual. Esse conceito foi modelado como
uma category com o objetivo de abstrair uma possível taxonomia de expressões textuais,
considerada desnecessária a esta conceitualização. Considerou-se a letra como sendo o texto
a ser cantado, não a ideia do texto, que remeteria à entidade LRM-E2 Obra. Geralmente
a letra é escrita especificamente para a canção, mas é comum o caso de poemas serem
musicados, ou o oposto, quando é escrita uma letra para um tema melódico já conhecido.
Um bom exemplo de poema musicado é a canção Canteiros na qual Fagner compôs uma
música para o poema homônimo de Cecília Meireles. É importante notar que, para uma
música ser considerada uma canção, o texto deve ser privilegiado. Músicas instrumentais
podem utilizar a voz humana no mesmo nível de outros instrumentos musicais para compor
a textura musical, mesmo emitindo frases ou palavras isoladas e, ainda assim, não serem
consideradas canções.
Ideias musicais originais são expressas por intermédio das suas versões (Versão
de Ideia Musical). A versão é uma ideia musical mais completa por conter todos os
6.1. Principais conceitos do modelo, da ideia à performance 151

componentes musicais necessários à sua execução. No caso de versões cantadas, estas


também incluem a letra utilizada. Enquanto um Tema Melódico é caracterizado apenas
por Melodia e Ritmo, uma versão é caracterizada por vários Componentes Musicais
e Sonoros, i. e., Melodia, Harmonia, Ritmo e Timbre. Versões monofônicas não
possuem harmonia, considerando que a harmonia é característica da música polifônica
(ver seção 2.1). É possível também que uma versão não possua timbre, no caso de arranjo
escrito sem anotações sobre a qualidade dos sons.
Uma Versão de Ideia Musical pode ser um Arranjo ou uma Expressão de
Performance. Um Arranjo é uma ideia musical criada com a intenção de ser represen-
tada em um dado contexto ou de uma certa forma. Esse contexto ou forma podem ser tão
diversos quanto a gravação de um álbum de um grupo musical, um show, a elaboração de
um conjunto de partituras para uma instrumentação específica, ou para a trilha sonora de
um filme. Uma Expressão de Performance, por sua vez, é a ideia musical transmitida
pelo som produzido durante uma Performance. Enquanto o Arranjo é uma ideia a ser
executada, a Expressão de Performance é uma ideia executada. Cada Performance
é única e, consequentemente, cada Expressão de Performance também é única. Mesmo
que os músicos tentem repetir uma performance anterior, o resultado não será comple-
tamente o mesmo. Isso é especialmente válido para a música popular brasileira onde as
performances diferem principalmente no momento da improvisação (ver subseção 2.3.5).
A principal forma de registro dos arranjos de música popular brasileira é a gravação,
sendo considerado seu registro na forma escrita uma exceção (ver subseção 2.3.5). Isso
implica na existência de Arranjos Escritos e Arranjos não Escritos. O registro
escrito de um arranjo exige a utilização de uma ou várias notações musicais (Notação
Musical) e, para seu registro gravado, é necessária a existência de uma Performance de
Arranjo. Observa-se que, para cada execução do arranjo, é criada uma nova Expressão de
Performance e que apenas esta é efetivamente registrada. Arranjos não Escritos são
comuns no contexto de uma sessão de gravação em estúdio, onde o arranjador e os músicos
interagem de maneira informal para sua elaboração. Existem ainda Performances sem
Arranjo, caracterizadas por serem executadas de maneira improvisada, sem seguir um
arranjo escrito nem haver combinação prévia dos detalhes de execução entre os músicos.
Performances sem Arranjo são comuns em eventos musicais informais, como rodas
de Choro e reuniões de fundo de quintal (ver subseção 2.3.3).
Finalmente, versões de ideias musicais podem ser classificadas por gêneros musicais,
como representado pela relação entre Gênero Musical e o role Música Classificada
por Gênero. Observa-se que uma mesma versão de ideia musical pode ser classificada
por mais de um gênero musical. O conceito Gênero Musical e seu relacionamento com
Versão de Ideia Musical são explorados na seção 6.5.
152 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

6.2 Concepção musical e autoria


O diagrama na Figura 34 apresenta as relações de autoria (ao centro em destaque),
os papéis das pessoas relacionados à concepção musical (à esquerda, associados ao conceito
Pessoa) e os produtos criados. O conceito Pessoa representa um ser-humano individual
e corresponde aos conceitos LRM-E7 Pessoa do IFLA LRM e E21 Pessoa do CIDOC
CRM. Uma mesma pessoa pode desempenhar simultaneamente diferentes papéis relacio-
nados à concepção musical, e. g., uma pessoa pode ser ao mesmo tempo Compositor,
Letrista, Arranjador e Intérprete. Percebe-se que à cada relação de autoria podem
ser associadas mais de uma pessoa e apenas um produto. Além disso, cada pessoa pode
participar de diversas relações de autoria e a cada produto é associada apenas uma relação
de autoria.
Na sequência, são discutidas as relações, na Figura 34, na ordem que aparecem no
diagrama (i. e., de cima para baixo).

Figura 34 – Relações de autoria.

As composições, neste universo musical, nascem a partir de uma melodia e uma


sequência harmônica, diferente da música clássica, onde uma composição já nasce como
6.2. Concepção musical e autoria 153

uma peça completa, escrita para um ou mais instrumentos, geralmente destinada a ser
interpretada da maneira que foi escrita, refletindo a intenção do compositor. Apesar da
composição nascer com uma sequência harmônica, suas versões são identificáveis pelo
Tema Melódico, ou melodia principal. Por esse motivo, considera-se que o papel do
Compositor está relacionado à Autoria de Tema Melódico, que dá origem a um
Tema Melódico. Utilizou-se o nome tema melódico no lugar de composição por ser mais
específico em relação ao que diferencia o trabalho do compositor do trabalho desempenhado
pelos demais atores envolvidos na concepção musical.
A relação Autoria de Letra associa um ou mais Letristas à cada Letra de
canção, indicando a responsabilidade das pessoas envolvidas na criação das Expressões
Textuais utilizada como letra de música. Devido à predominância das canções nesse
universo, os temas melódicos, em geral, já nascem com uma letra, formando uma canção,
entretanto não existe relação de dependência histórica entre o tema melódico e a expressão
textual da letra. A maioria das expressões textuais de letra já é elaborada para ser utilizada
como letra de música, porém, ocasionalmente, a expressão textual já existe antes da canção.
Nesta conceitualização, só é representado o Letrista, papel desempenhado pelo autor da
expressão textual quando esta é utilizada em uma canção e, por esse motivo, a Autoria
de Letra se relaciona diretamente à Letra, e não à Expressão Textual.
Arranjador é o papel desempenhado pelo autor de um Arranjo Novo. Essa
relação é representada pelo conceito Autoria de Arranjo. Esse arranjo pode ser elaborado
por um arranjador, ou por vários arranjadores, caso em que se caracteriza um arranjo
coletivo. Os arranjos elaborados para registro da performance gravada se encontram nessa
categoria.
O conceito Arranjo Novo se opõe ao conceito Arranjo Transcrito. O primeiro
é fruto do esforço do arranjador na concepção de um novo trabalho, enquanto, o segundo, é
fruto de um trabalho de Transcrição, no qual o Transcritor busca registrar por escrito
a ideia musical criada em uma performance. A relação Transcrição associa, por inter-
médio do role Fonte de Transcrição, o Transcritor à Expressão de Performance
registrada e ao Arranjo Transcrito resultante.
A relação Performance, cujo conceito é melhor explorado na seção 6.4, representa
a execução musical por parte dos músicos. Uma Performance associa os Intérpretes
que nela atuam à Expressão de Performance concebida durante a performance. O
papel de Intérprete pode ser exercido por pessoas (Intérprete Individua) ou por
grupos musicais (Intérprete Grupo Musical). Um Grupo Musical reúne pessoas no
papel de Membro de Grupo Musical e, em última análise, a interpretação é sempre
feita por pessoas, membros ou não de um grupo musical. A uma performance, também
pode estar associado o Produtor Musical que a gerencia.
O Produtor Musical exerce um papel complexo, podendo gerenciar a Perfor-
154 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

mance, participar da escolha das músicas de um Álbum e supervisionar e acompanhar


o processo de Gravação. Constata-se, portanto, suas associações com os conceitos Per-
formance, Gravação e Produção de Álbum. Lembra-se que o produtor musical pode
exercer também a função de arranjador, caso em que uma mesma Pessoa exerce os papéis
de Produtor Musical e Arranjador. Outras atribuições do produtor musical, tais como
a supervisão da execução de um show e acompanhamento dos processos de mixagem
e masterização não estão contemplados pelo modelo e poderão ser objeto de trabalhos
futuros.
A Gravação representa o registro sonoro de uma Performance, no papel de
Performance Gravada, resultando em um Sinal. Os conceitos Gravação e Sinal cor-
respondem às classes Recording e Signal da Music Ontology (MO), e seu relacionamento
corresponde à propriedade prouced_signal da classe Recording. Nota-se, também, que
a relação formal representa expressão entre Sinal e Expressão de Performance
corresponde à propriedade records da classe Signal da MO.
Por fim, a Produção de Álbum relaciona os atores envolvidos no processo de
produção de um Álbum com o álbum produzido. Devido às suas diversas responsabilidades
no processo de produção de um álbum, o role Produtor Fonográfico é dependente dessa
relação.
Constata-se que os processos envolvidos na produção de um álbum e na gravação,
mixagem e masterização e as diferentes responsabilidades dos atores envolvidos nesses
processos foram pouco estudados neste trabalho, tornando o modelo ainda incompleto em
relação a esses aspectos. Melhorias poderão ser feitas em trabalhos futuros.

Figura 35 – Versões representativa e original, medley e intérprete proeminente.

No diagrama da Figura 35 aparecem outros conceitos relacionados à concepção


musical e à percepção dos usuários sobre aspectos de autoria. Esses conceitos são discutidos
6.3. Meios de performance 155

em seguida.
A maioria das versões é feita para uma única ideia musical original (Versão de
Ideia Musical Única), enquanto algumas outras concatenam mais de uma dessas ideias
em uma mesma versão (Medley). Estas são chamadas de medley ou pot-pourri.
A primeira versão por meio da qual uma ideia musical original ficou conhecida é uma
versão original (Versão Original). Demais versões da mesma ideia musical original são
considerados versões derivadas (Versão Derivada). Nem sempre a versão original é a mais
conhecida ou é a mais lembrada pelos usuários. O conceito Versão Representativa remete
à versão que, na percepção dos usuários, melhor representa a ideia musical original. A versão
representativa pode ser a própria versão original. Observa-se, ainda, que podem existir
mais de uma versão considerada representativa da ideia original. Toma-se como exemplo
desses conceitos a canção Como Nossos Pais de Belchior. A canção foi primeiramente
gravada no álbum Alucinação (1976) do próprio autor, onde ele mesmo a interpretava,
contudo, a canção fez mais sucesso na voz da cantora Elis Regina, que a gravou ainda no
mesmo ano, no álbum Falso Brilhante (1976). Nesse exemplo, a versão de Belchior é a
versão original, sendo a versão de Elis Regina uma versão derivada e também uma versão
representativa.
Esses conceitos ainda se relacionam da seguinte maneira: versões originais e versões
representativas são versões de ideia musical única, enquanto versões do tipo medley são
versões derivadas.
Nota-se que o modelo LRM, com seu atributo LRM-E2-A2 atributo da ex-
pressão representativa, e o modelo FRBRoo, com sua propriedade R40 has represen-
tative expression, reconhecem a existência de versões mais significativas de uma obra
na percepção dos usuários, assim como ocorre neste modelo através do conceito Versão
Representativa.
Neste universo musical, ocorre uma maior valorização do intérprete em relação
ao compositor. Usuários desse tipo de música costumam associar a música ao intérprete
e, muitas vezes, desconhecem o compositor. O reconhecimento desse intérprete através
do qual uma ideia musical original é mais conhecida é modelado pelo role Intérprete
Proeminente. No caso do exemplo anterior, Elis Regina pode ser considerada a intérprete
proeminente da canção Como Nossos Pais de Belchior.

6.3 Meios de performance


Considera-se um Meio de Performance qualquer meio utilizado por um músico
para expressar som em uma performance musical. Normalmente, é um instrumento musical
ou a própria voz do cantor, mas pode ser qualquer coisa que produza sons, como no caso
156 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

de Hermeto Pascoal tocar seu próprio batimento cardíaco ou o apito de uma chaleira. A
Figura 36 apresenta um diagrama com os conceitos Meio de Performance e Tipo de
Meio de Performance além de conceitos correlatos. Nesse diagrama aparece à direita
a relação Performance Individual que representa a execução musical por parte de um
intérprete utilizando um ou mais meios de performance.

Figura 36 – Meios de performance.

Um arranjo especifica uma Instrumentação, que consiste em um conjunto de


tipos de meios de performance a serem utilizados e a quantidade de cada um (e. g., voz,
dois violões e um piano). O powerType Tipo de Meio de Performance representa
todos os possíveis tipos de meio de performance. Esse conceito é importante para que a
orquestração possa indicar tipos de meio de performance em vez de instâncias de meio de
performance. De fato, um arranjo é feito para qualquer piano, não para uma instância
específica de piano. Esse powerType é referenciado pelo Tipo Planejado de Meio de
Performance na instrumentação. O atributo quantidade indica o número de instâncias
de meios de performance daquele tipo que deverão ser usadas na execução do arranjo. A
relação entre Tipo de Meio de Performance e Meio de Performance, estereotipada
como instantiation, segue a notação UML proposta por Carvalho, Almeida e Guizzardi
(2016) para representar o caso de um powerType particionando um tipo base, de acordo
com sua teoria de modelagem conceitual multinível (MLT3 ).
O modelo busca representar a realidade com o objetivo de ser mais expressivo
e servir a um espectro maior de aplicações. Um exemplo dessa expressividade é o uso
de Powertypes para diferenciar as instâncias dos instrumentos tocados e os tipos dessas
instâncias. Uma aplicação, por exemplo, poderia se interessar pela instância do violão
tocado por João Gilberto no Carnegie Hall em 1962, ao passo que para outra aplicação,
a identificação do tipo de instrumento tocado é suficiente. Aplicações museológicas se
3
Acrônimo de Multi-Level Conceptual Modeling Theory.
6.4. Performance 157

interessam em instâncias de objetos, enquanto que aplicações bibliográficas ignoram essa


informação.
Ainda no diagrama da Figura 36, aparece à esquerda o role Membro de Grupo
Musical associado a Tipo de Meio de Performance. Essa relação indica por quais
tipos de meio de performance o membro do grupo musical é responsável e permite
representar a formação de um grupo musical como em: o grupo musical Zimbo Trio é
formado por Luiz Chaves no contrabaixo, Rubens Barsotti na bateria e Amilton Godói no
piano4 .

6.4 Performance
Conceitos relacionados à Performance musical são apresentados no diagrama da
Figura 37. Considera-se uma performance musical a atividade de execução musical por
uma ou mais pessoas que utilizam meios de performance para expressar uma ideia musical
na forma de som. Uma performance pode ser individual (Performance Individual),
quando executada por apenas um músico, ou coletiva (Performance Coletiva), quando
há mais de um músico tocando. Uma performance coletiva é composta por duas ou mais
performances individuais.
A performance é executada por intérpretes (Intérprete), que podem ser indivíduos
no papel de Intérprete Individual ou grupos musicais no papel de Intérprete Grupo
Musical. Uma Pessoa desempenha o papel de Intérprete Individual ao tocar um ou
mais meios de performance em uma performance individual. Percebe-se que a participação
de um Grupo Musical em uma performance é na realidade o crédito dado ao grupo
musical pela participação de seus membros nas performances individuais que compõem a
performance coletiva quando estes representam o grupo musical. Isso quer dizer que os
mesmos intérpretes ora podem estar representando o grupo musical em uma performance,
ora podem representar outro grupo, ou, mesmo, podem tocar juntos sem representar grupo
musical algum.
Um Grupo Musical é formado por dois ou mais membros (Membro de Grupo
Musical) que podem mudar com o tempo, ou seja, sua identidade não depende da variação
na composição de seus membros. É importante notar que uma mesma pessoa pode ser
simultaneamente membro de mais de um grupo musical.
É muito comum a existência de um ou mais intérpretes principais (Intérprete
Principal) em uma performance. Em uma performance individual, o intérprete principal
não pode ser outro que seu único intérprete, entretanto, em performances coletivas, muitas
vezes existem intérpretes que estão em mais evidência e que são mais valorizados pelo
público. Esses intérpretes principais são os que recebem os créditos pela performance,
4
Formação do grupo Zimbo Trio entre os anos de 1964 e 2007.
158 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

Figura 37 – Performance musical.

enquanto os demais são vistos como coadjuvantes e, muitas vezes, não são nem citados nas
publicações de registros gravados. Na música popular, o intérprete principal quase sempre
é a cantora, o cantor ou o grupo musical.
Faz-se um comparativo entre os conceitos Intérprete Principal e Intérprete
Proeminente. O intérprete proeminente é o intérprete pelo qual uma ideia musical
original é mais conhecida enquanto o intérprete principal é o que se destaca em uma
performance específica. Voltando ao exemplo da canção Como Nossos Pais, Belchior é
o intérprete principal da versão original e Elis Regina é a intérprete principal da versão
representativa. Constata-se, ainda, que o intérprete proeminente é o intérprete principal
da versão representativa.
A performance ocorre em um Evento Musical, que pode reunir várias perfor-
mances em um mesmo local (um Lugar no papel de Local de Evento) em um mesmo
6.5. Gênero Musical 159

período de tempo5 . Nesta conceitualização, até uma única performance informal de um


músico para amigos em sua casa é considerada um evento musical. Alguns exemplos de
eventos musicais são show, festival de música, sessão de gravação e Roda de Choro.
Uma performance pode ser uma Performance de Arranjo ou uma Perfor-
mance sem Arranjo. Em uma performance de arranjo é executado um arranjo, no
papel de Arranjo Executado, que pode ser escrito ou não escrito, como no caso dos
arranjos feitos de maneira informal entre arranjador e músicos no contexto de uma sessão
de gravação. Uma performance sem arranjo ocorre quando uma ideia musical original é
desenvolvida pelos intérpretes sem recorrer a um arranjo, situação comum em eventos
como reuniões de fundo de quintal e rodas de Choro.
Em toda performance é criada uma, e apenas uma, Expressão de Performance.
Esse conceito representa a versão de ideia musical transmitida pelo som musical produzido
durante a performance. Essa ideia pode ser captada por meio do processo de Gravação,
do qual resulta um Sinal que a representa.
A expressão de performance pode conter ou não improvisos, o que diferencia os
conceitos de Versão com Improviso e Versão sem Improviso. Versões sem improviso
são executadas totalmente a partir do registro, o que se configura uma situação menos
comum no universo da música popular brasileira. Os intérpretes são, nesse universo,
encorajados a se expressarem mais livremente e são valorizados por sua capacidade de
improvisar. Uma versão com improviso não é necessariamente uma versão sem arranjo. Em
arranjos não escritos há uma tal confiança na experiência e na habilidade dos músicos ao
ponto de não ser necessário um registro detalhado para execução da performance. Arranjos
escritos na forma de cifras e melodia também dão muita liberdade de improvisação aos
músicos. Alguns arranjos, inclusive, preveem trechos de improvisação.

6.5 Gênero Musical


Nesta seção discutem-se conceitos relacionados ao Gênero Musical no contexto
da música popular brasileira, considerando aspectos socioculturais envolvidos na percepção
do gênero musical por parte do público e dos artistas que os produzem e interpretam, extra-
polando sua função de classificação de repertórios musicais. Na Figura 38 são apresentados
os principais conceitos relacionados ao gênero musical.
O gênero musical é utilizado como critério de classificação para a organização e
recuperação da informação musical. A relação entre Gênero Musical e Música Clas-
sificada por Gênero declara a possibilidade de uma mesma música representar mais
de um gênero musical. Observa-se que o gênero musical classifica uma Versão de Ideia
5
A dimensão temporal não é modelada nos diagramas OntoUML, que se ocupam apenas de aspectos
estruturais dos conceitos (ver seção 3.6).
160 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

Figura 38 – Gênero musical.

Musical (no papel de Música Classificada por Gênero) e não uma Ideia Musical
Original, isso em razão de uma mesma ideia musical original poder ser interpretada na
forma de diferentes gêneros musicais com base em decisões criativas do arranjador ou do
intérprete. Nada impede, entretanto, a utilização do gênero para classificação de ideias
musicais originais utilizando-se como referência o gênero da sua versão representativa.
Gêneros musicais têm origem em regiões geográficas. O Samba, por exemplo, é
originário da Bahia e do Rio de Janeiro. Essa origem geográfica do gênero é representada no
modelo pelo relacionamento entre Gênero Musical e Lugar de Origem do Gênero.
6.5. Gênero Musical 161

Letras das músicas de um gênero musical podem ter características em comum


(Característica de Texto). As letras das músicas da Bossa Nova, por exemplo, abordam
temas leves e descompromissados, baseados na literatura e na vida cotidiana do Rio de
Janeiro. Por outro lado, as letras do Tropicalismo buscavam uma inovação linguística,
misturando cultura popular e erudita.
Um gênero musical, como estudado no contexto da música popular brasileira, pode
ser exclusivamente um Gênero Musical Puro ou um Rótulo Musical. Entende-se
por gênero musical puro um gênero musical identificável pelas características musicais e
sonoras das músicas, ou seja, músicas desse gênero podem ser reconhecidas auditivamente
por pessoas familiarizadas com o gênero. Exemplos de gêneros musicais puros são Samba,
Choro e Bossa Nova. Um rótulo musical, por sua vez, delimita um repertório de músicas
por critérios não relacionados às características musicais e sonoras das músicas. Essas
músicas podem até ter alguma similaridade entre si, contudo essa similaridade não é
suficiente para a identificação das músicas como representantes do mesmo gênero. São
exemplos de rótulos musicais o Tropicalismo, a MPB e a MPBI.
Como antecipado, um gênero musical puro é identificável por suas Característi-
cas Musicais e Sonoras. Essas características envolvem características de performance
(Característica de Performance), de melodia (Característica Melódica), de har-
monia (Característica Harmônica), de ritmo (Característica Rítmica) e de timbre
(Característica de Timbre). A possibilidade de uma ideia musical original ter versões
de diferentes gêneros ocorre quando essas versões apresentam as características musicais e
sonoras atribuídas aos referidos gêneros.
As Características Musicais e Sonoras do gênero musical são características
de Componentes Musicais e Sonoros da versão de ideia musical, e. g., o Ritmo de
uma versão pode apresentar ou não a Característica Rítmica de um gênero específico.
Uma característica rítmica de um gênero musical, por exemplo, seria o ritmo calmo e
suave da Bossa Nova, enquanto o ritmo de uma versão representante desse gênero é o
ritmo efetivamente empregado nessa versão, ou seja, a sequência de sons e silêncios que
se sucedem temporalmente com sua duração e uma intensidade, tal como empregados na
versão.
Silva (2017) cita algumas dessas características ao descrever a produção dos músicos
por ela entrevistados: melodias lídio-dominantes que se desenrolam quase sempre no
contratempo; ritmos sincopados conectados aos regionalismos que refletem os sotaques
próprios de cada região brasileira; harmonização elaborada, a exemplo daquela que é feita
pelos bossa-novistas; e timbres que muitas vezes são adaptados dos instrumentos musicais
regionais e são tocados lembrando os aspectos originais desses instrumentos no âmbito de
cada estilo musical.
A Característica de Performance diz respeito à maneira com que os músicos
162 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

executam a performance, ou seja, o modo de tocar ou cantar. Esse conceito inclui os


movimentos corporais relativos aos efeitos sonoros produzidos pelos instrumentos musicais e
pelas vozes. Os músicos entrevistados por Silva (2017) utilizam termos como suingue, levada,
sotaque e malemolência para se referirem a esse tipo de característica. A característica
de performance é modelada como modeKind das características musicais e sonoras por
influenciar diretamente no som das performances. A Bossa Nova, por exemplo, tem como
característica de performance uma “batida” de violão original desse gênero e um estilo de
cantar coloquial, baixo e calmo.
Rótulos musicais, em contraste com os gêneros musicais puros, não são caracte-
rizados por características musicais e sonoras, mas por critérios diversos (Critério de
Seleção de Repertório) de seleção do seu repertório musical. Por exemplo, a MPB como
rótulo musical seleciona um repertório de músicas populares mais sofisticadas e elaboradas,
que não necessariamente possuem características musicais e sonoras semelhantes. O mesmo
ocorre no caso do Tropicalismo, que restringe seu repertório à produção musical do grupo
de artistas participantes desse movimento musical durante um período de tempo.
Gêneros musicais são influenciados por outros gêneros musicais, como representado
pelo relacionamento entre as classes Gênero Musical e Gênero Musical Influente.
Gêneros musicais puros nascem e evoluem de uma maneira orgânica, dando origem a novos
gêneros e subgêneros (Subgênero Musical). Subgêneros são gêneros musicais puros que
surgem a partir de variações das características musicais e sonoras de outro gênero ou pelo
fenômeno do hibridismo (i. e., a mistura de gêneros musicais), entretanto não se distanciam
o suficiente do gênero ou dos gêneros originais para serem percebidos pelo público como
novos gêneros. Esse forte relacionamento com o gênero de origem fica explícito no nome do
subgênero quando este carrega o nome do gênero de origem como, por exemplo, em alguns
subgêneros do Samba: Sambaião, Samba de Breque, Samba Rock e Samba Choro. No
entanto isso não é uma regra, como no caso do Pagode. Subgêneros derivados de apenas um
gênero são representados no modelo pelo conceito Subgênero não Híbrido e subgêneros
derivados de dois gêneros são representados pelo conceito Subgênero Híbrido. Sambaião
e Samba de Breque são exemplos de subgêneros não híbridos e Samba Rock e Samba
Choro são exemplos de subgêneros híbridos. Observa-se que, nesta pesquisa, não foram
identificados subgêneros musicais brasileiros derivados de rótulos musicais e, por esse
motivo, o conceito de Subgênero Musical foi modelado como especialização de Gênero
Musical Puro. Não foram também identificados subgêneros de mais de dois gêneros.
É importante notar que a relação entre um gênero musical e seus subgêneros (relação
entre Supergênero Musical e Subgênero Musical) não é uma relação taxonômica, ou
seja, o subgênero musical não é uma espécie do gênero musical. Assim sendo, não é válida
a afirmação de que o que vale para o gênero vale para o subgênero. Por exemplo, o lugar
de origem do subgênero não é necessariamente o mesmo do gênero musical de origem e
6.5. Gênero Musical 163

suas características musicais e sonoras não são as mesmas.


Alguns gêneros musicais são também movimentos musicais (Movimento Musical).
Esses gêneros têm em sua origem uma intencionalidade declarada por parte de seus
primeiros expoentes de, através de sua produção musical, contribuir com mudanças em
alguma área. Essa proposta de mudança é representada no modelo pela classe Proposta
de Movimento Musical. O Tropicalismo é um exemplo de movimento musical que
propõe o resgate da cultura popular incorporando elementos da cultura jovem mundial,
como o Rock, a psicodelia e a guitarra elétrica. Outro exemplo de movimento musical
são as canções de protesto contra o regime militar. Ambos os exemplos são também
rótulos musicais, por não apresentarem características musicais e sonoras suficientemente
diferenciadas para identificação auditiva do seu repertório.

Figura 39 – Gênero musical (continuação).

O diagrama na Figura 39 apresenta mais alguns conceitos envolvidos na caracteri-


zação de gêneros musicais, como pessoas, músicas, álbuns e eventos de referência do gênero
e tipos de meios de performance, grupos e eventos musicais tradicionais do gênero musical.
Todos esses conceitos se relacionam à história do gênero musical e servem como referência
para um melhor conhecimento e compreensão do mesmo.
Todo gênero possui expoentes (Expoente) e músicas emblemáticas (Música
Emblemática). Expoentes são pessoas ou grupos de pessoas reconhecidos como inventores
do gênero ou cujo trabalho é referência dentro do gênero musical. O conceito de expoente
é melhor desenvolvido no final desta seção. Músicas emblemáticas são as ideias musicais
originais mais lembradas como representantes do gênero musical. É possível dizer que, no
caso de gêneros musicais puros, essas músicas são arquétipos do gênero musical. Alguns
164 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

exemplos de música emblemática são: Chega de Saudade e Garota de Ipanema, de Tom


Jobim e Vinicius de Moraes, na Bossa Nova; Alegria, Alegria, de Caetano Veloso, e Domingo
no Parque, de Gilberto Gil, no Tropicalismo; e Pelo Telefone, de Ernesto dos Santos (o
Donga) e Mauro de Almeida, para o Samba. Observa-se que a música emblemática é uma
ideia musical original em vez de uma versão de ideia musical por considerar-se que, em geral,
a ideia original (tema melódico ou canção) é mais lembrada como música emblemática
do gênero do que uma versão específica. Sendo o gênero musical, nesta conceitualização,
relacionado diretamente à versão de ideia musical e não da ideia musical original, o gênero
da música emblemática coincide com o gênero da versão original ou da versão representativa
da ideia original.
Alguns gêneros musicais também possuem álbuns emblemáticos (Álbum Emble-
mático), como o Tropicalismo, com o álbum Tropicália ou Panis et Circencis (1968), e o
Pagode, com o álbum De pé no chão (1978) de Beth Carvalho.
Existem também eventos musicais que marcam a criação, consolidação ou evolução
de um gênero musical (Evento Musical Emblemático). Alguns exemplos são: o 3o
Festival de Música Popular Brasileira (1967), que marcou o início do Tropicalismo; e a
Bienal do Samba (1968 e 1971), que inseriu novos talentos na cena musical do Samba
junto a grandes sambistas da velha guarda.
Gêneros musicais, principalmente gêneros musicais puros, podem ter tipos de meios
de performance considerados tradicionais do gênero (Meio de Performance Tradici-
onal). Esses são tipos de meio de performance mais utilizados nas suas performances.
Não existe uma obrigatoriedade de uso desses instrumentos na performance de versões
desse gênero, entretanto a utilização desses instrumentos tende a caracterizar mais a
versão como representante do gênero resultando em um timbre mais compatível com a
característica de timbre do gênero, no caso de gêneros musicais puros. São exemplos de
meios de performance tradicionais de gênero: violão, piano, flauta, cavaquinho o bandolim
no Choro; guitarra elétrica no Tropicalismo; cavaquinho, violão e vários instrumentos de
percussão (como pandeiro, surdo e tamborim) no Samba.
Existem alguns tipos de evento musical que são característicos de um gênero musical
(Tipo de Evento Musical Característico), tais como a Roda de Choro, característica
do Choro, as Samba Sessions do início da Bossa Nova e as reuniões dos fundos de quintal
para uma plateia de vizinhos, comum entre os pagodeiros.
Alguns gêneros musicais podem ter tipos de grupo musical tradicionais (Tipo
de Grupo Musical Tradicional), como é o caso das duplas sertanejas, para a Música
Sertaneja.
Como visto previamente, expoentes (Expoentes) são pessoas ou grupos de pessoas
que reconhecidos como inventores do gênero ou cujo trabalho é referência dentro do gênero
6.5. Gênero Musical 165

musical. O diagrama na Figura 40 apresenta os vários tipos de expoentes identificados na


música popular brasileira.

Figura 40 – Expoentes de gêneros musicais.

Expoentes individuais (Expoente Individual) são indivíduos que marcaram a his-


tória do gênero musical como intérprete (Intérprete Individual Expoente), compositor
(Compositor Expoente) ou letrista (Letrista Expoente). Um intérprete individual
expoente é conhecido também pelo tipo de meio de performance por ele utilizado. Pode-se
citar como exemplos de expoentes individuais: o Saxofonista Pixinguinha como intérprete
flautista e saxofonista e compositor de Choro; Vinicius de Moraes, letrista da Bossa
Nova; Elis Regina, cantora da MPB; Caetano Veloso, cantor, compositor e letrista do
Tropicalismo; e Hermeto Paschoal, multi-instrumentista e compositor de MPBI.
As parcerias de compositores com letristas (Parcerias) marcaram a Bossa Nova
e a MPB, como nos casos das parcerias entre: João Bosco e Aldir Blanc; Tom Jobim e
Vinicius de Moraes; e Ivan Lins e Victor Martins.
Grupos musicais também são lembrados como expoentes de gêneros musicais
(Grupo Musical Expoente). São exemplos desses grupos musicais: o Zimbo Trio e o
166 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

Quarteto em Cy na Bossa Nova; os Mutantes no Tropicalismo; e o Raça Negra e Só pra


contrariar no Samba Pop.
Existem também alguns grupos culturais que marcaram a história de alguns gêneros
musicais (Grupo Cultural Expoente), como é o caso das tias baianas e a turma do
Estácio nas origens do Samba, e dos próprios tropicalistas.

6.6 Alinhamento com o modelo IFLA LRM


Com o objetivo de facilitar a utilização dos conceitos deste modelo conceitual em
aplicações bibliográficas, faz-se um alinhamento deste com o modelo bibliográfico IFLA
LRM6 . Considera-se como principal benefício deste alinhamento o posicionamento dos
conceitos da música popular brasileira em relação às entidades OEMI, tornando claras as
fronteiras entre essas entidades7 . O experimento apresentado no Capítulo 7 (Aplicação do
modelo IFLA LRM à música popular brasileira) exemplifica a utilidade do alinhamento
apresentado nesta seção.
A Figura 41 apresenta em seu diagrama o alinhamento entre este modelo conceitual
e o modelo IFLA LRM. Para esse alinhamento, foram adicionadas ao modelo as entida-
des LRM-E1 Res, LRM-E2 Obra, LRM-E3 Expressão, LRM-E4 Manifestação,
LRM-E5 Item, LRM-E6 Agente e LRM-E8 Agente Coletivo na forma de classes
OntoUML com o estereótipo category, e a entidade LRM-E9 Nomen com o estereótipo
kind. As entidades LRM-E7 Pessoa e LRM-E10 Lugar são equivalentes aos conceitos
Pessoa e Lugar já apresentados anteriormente.
A entidade LRM-E11 Intervalo de Tempo não é contemplada no modelo
em razão deste ser escrito em OntoUML, uma linguagem suportada pela ontologia de
fundamentação UFO-A que endereça apenas conceitos endurantes8 . O tempo é uma
dimensão ortogonal à estrutura representada pelo modelo, ou seja, o modelo representa
como pode ser um estado das coisas em recortes temporais. Instâncias do modelo podem
surgir ou serem modificadas no tempo e os intervalos temporais de interesse de usuários
de uma aplicação bibliográficas poderão ser registrados associados a qualquer entidade no
caso da derivação de um modelo bibliográfico a partir destes conceitos.
Todos os sortais do modelo (i. e., classes com estereótipos kind, relatorKind e
collective) especializam a classe LRM-E1 Res e, consequentemente, podem ter diversas
denominações por meio do relacionamento com a classe LRM-E2 Nomen. As relações de
especialização entre LRM-E1 Res e os diversos sortais não é apresentada nos diagramas
6
O modelo IFLA LRM é apresentado na seção 4.1 (Família FRBR, incluindo IFLA LRM).
7
O problema de delimitação de fronteiras entre as entidades Obra e Expressão é discutido nas seções
4.4 e 5.6.
8
A ontologia de fundamentação UFO e a linguagem OntoUML são apresentadas nas seções 3.4 e 3.6
respectivamente.
6.6. Alinhamento com o modelo IFLA LRM 167

Figura 41 – Alinhamento com o modelo IFLA LRM.

com o objetivo de reduzir a quantidade de elementos e melhorar a visualização.


À esquerda, em baixo, é apresentada a hierarquia a partir de LRM-E6 Agente, que
se especializa em Pessoa ou LRM-E8 Agente Coletivo, que, por sua vez se especializa
em Grupo Musical, Grupo Cultural ou Parceria.
À direita aparecem as classes correspondentes às entidades OEMI. Seguindo o
modelo geral de agregações do LRM (RIVA; LE BOEUF; ŽUMER, 2017, p. 93-94), são
previstas obras individuais e agregadoras (Obra Individual e Obra Agregadora), ex-
pressões individuais e agregadoras (Expressão Individual e Expressão Agregadora)
e manifestações individuais e agregadas (Manifestação Individual e Manifestação
Agregada). Uma manifestação agregada incorpora uma expressão agregadora e várias
expressões individuais. Para exemplificar o conceito de expressão agregadora, são apresen-
tados os conceitos Álbum e Songbook como agregações de expressões de performance
de arranjos escritos respectivamente.
Ideias musicais originais e obras textuais (Obra Textual) são classificadas como
obras individuais. Nota-se que as obras textuais aparecem no modelo por serem realizadas
pelas expressões textuais utilizadas como letras de música. Expressões textuais, arranjos
168 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

escritos e expressões de performance são classificadas como expressões individuais. Destaca-


se no modelo as relações especializadas de LRM-R2 é realizada por entre os tipos
específicos de obra individual e expressão individual: Uma obra textual pode ser realizada
por várias expressões textuais; e uma ideia musical original pode ser realizada por vários
arranjos escritos e ou várias expressões de performance.
Não foi feito um trabalho exaustivo de alinhamento entre os modelos que consi-
derasse todos os relacionamentos previstos no IFLA LRM. Contudo, mesmo não sendo
completo, foram endereçados os principais conceitos em ambos os modelos e esse alinha-
mento pode servir de guia para aplicações do modelo IFLA LRM ao domínio da música
popular brasileira, tal como exemplificado no experimento descrito no Capítulo 7.

6.7 Discussão sobre a experiência de uso da linguagem OntoUML


A linguagem OntoUML 2.0 se mostrou útil durante o processo de modelagem
conceitual. A aplicação de suas primitivas de modelagem, suportadas pela ontologia de
fundamentação UFO, exigiu do modelador uma análise muito mais profunda sobre a
natureza de cada conceito e relacionamento modelado se comparado ao uso de linguagens
do nível epistemológico. Essa análise, necessária à aplicação de categorias ontológicas à cada
elemento do modelo, facilitou a explicitação de detalhes que normalmente não apareceriam
com o uso de linguagens de modelagem mais tradicionais como EER e UML, e que, mesmo
se fossem identificados, poderiam não ser representáveis por falta de expressividade destas
linguagens.
Quanto maior a necessidade de formalização, mais elementos devem ser adicionados
ao modelo, no entanto, o excesso de elementos muitas vezes dificulta a sua leitura. Por
esse motivo, alguns conceitos considerados de menor importância foram omitidos. Relacio-
namentos com cardinalidade 0 (zero) escondem alguns desses conceitos. Por exemplo, no
relacionamento em que uma Versão de Ideia Musical cita zero ou mais (i. e., cardinali-
dade 0..*) Ideia Musical Original (ver Figura 33), estão implícitos os conceitos Versão
com Citação e Versão sem Citação, entretanto esses conceitos não foram considerados
importantes o suficiente para serem explicitados e a cardinalidade zero foi considerada
suficiente para representar a conceitualização.
Os relacionamentos com estereótipo material indicam relações intermediadas,
ou seja, relações que dependem da existência de um terceiro elemento para que sejam
estabelecidas. Este terceiro elemento, na linguagem OntoUML 2.0 é representado por
uma classe com estereótipo relatorKind. No modelo aparecem quatro relacionamentos
sem explicitação do relatorKind. Os relacionamentos entre Ideia Musical Original e
Versão Representativa e entre Ideia Musical Original e Intérprete Proeminente
(ver Figura 35) dependem de um reconhecimento, por parte de uma comunidade de
6.7. Discussão sobre a experiência de uso da linguagem OntoUML 169

usuários, de que existe uma versão representativa e de que pode existir um intérprete
proeminente para aquela ideia musical original. No entanto, foi considerado ser suficiente
a indicação de que essas são relações materiais. O mesmo ocorre para os relacionamentos
entre Grupo Musical e Membro de Grupo Musical (ver Figuras 34 e 37) e entre
Grupo Cultural e Membro de Grupo Cultural (ver Figura 40), para os quais não
foi considerado ser importante a explicitação de um conceito que relacionasse os membros
aos grupos, tal como um contrato ou apenas um acordo entre esses membros.
Apesar de possuir um grande poder de expressividade, percebeu-se que a linguagem
OntoUML é menos popular que a maioria das outras linguagens utilizadas para modelagem
conceitual como UML e EER, o que implica em existirem menos recursos de suporte
online e uma menor oferta de ferramentas para edição e validação dos diagramas. Não
existe uma documentação oficial completa da linguagem, o que dificulta seu aprendizado.
Os dois softwares de edição e validação de diagramas UML9 se demonstraram instáveis
ao ponto de impossibilitar seu uso. Isso levou a comunidade de usuários da linguagem
à prática do uso de outras ferramentas de edição de diagramas de classe UML para a
criação dos modelos OntoUML e a posterior importação desses modelos para validação
nas ferramentas de edição especializadas em OntoUML. Um problema desta prática é o
suporte incompleto à edição de diagramas OntoUML por parte das ferramentas de edição
UML. O estabelecimento de relações de especialização e derivação entre relacionamentos,
por exemplo, não é suportado por essas ferramentas.
Alguns possíveis motivos para essa menor popularidade da linguagem OntoUML
comparada a outras linguagens utilizadas para modelagem conceitual são: a disciplina de
modelagem conceitual ainda não é tão difundida quanto a modelagem de dados e estas
outras linguagens são muito utilizadas para a modelagem de dados e, consequentemente,
mais conhecidas; sua curva de aprendizagem tende a ser mais longa devido à necessidade
de compreensão das categorias e meta-propriedades ontológicas sobre as quais a linguagem
foi construída.
A versão 2.0 da linguagem OntoUML, utilizada neste trabalho, por ser muito
10
recente , carece mais ainda de suporte. As ferramentas de validação ainda não foram
desenvolvidas e não existem exemplos de uso em modelos mais extensos.
Devido à natureza temporal e social da música, diversos conceitos do modelo
remetem a categorias ontológicas da UFO-B e UFO-C, tais como eventos, atividades,
agentes e recursos. Uma performance, por exemplo, é um universal de atividade11 , da
9
Os softwares Menthor (disponível em http://www.menthor.net) e OLED (OntoUML Lightweight Editor,
disponível em https://nemo.inf.ufes.br/projects/oled) são as ferramentas de referência para edição e
validação de diagramas OntoUML.
10
A linguagem OntoUML 2.0 é fundamenta da nova teoria de tipos endurantes e estruturas taxonômicas
da UFO proposta por Guizzardi et al. (2018).
11
Atividades, na UFO-C, são eventos intencionais que instanciam um plano com o propósito de satisfazer
alguma intenção (GUIZZARDI; FALBO; GUIZZARDI, 2008).
170 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

qual participam agentes e recursos. Intérpretes individuais são agentes que participam
intencionalmente em performances, meios de performance são recursos utilizados por
esses agentes e expressões de performance são recursos criados durante a performance. A
linguagem OntoUML, todavia, em sua versão atual, representa apenas modelos conceituais
estruturais, expressando apenas aspectos endurantes da realidade, ou seja, seu metamodelo
é fundamentado apenas na UFO-A. Por este motivo, foi utilizada uma abordagem de
modelagem estrutural para representação dos universais de perdurantes, representando-os
com o estereótipo relatorKind, que indica a existência de uma relação material entre os
atores e recursos envolvidos. Esta abordagem não é o ideal por não representar a real
natureza ontológica desses conceitos.
Esta limitação da linguagem OntoUML é reconhecida por Guizzardi, Wagner,
Almeida e Guizzardi (2015), ao comentarem que “subversões sistemáticas da linguagem”
devem ser estudadas com o objetivo de evoluir a UFO e a própria OntoUML. Um
dos exemplos dados é o uso de perdurantes e relações perdurantes como primitivas de
modelagem.
Outro problema enfrentado durante a modelagem também se relaciona à natureza
estritamente estrutural dos modelos em OntoUML. O tempo é uma dimensão ortogonal à
estrutura representada, ou seja, um modelo OntoUML representa como pode ser um estado
das coisas em um recorte temporal. Isso dificulta, e por vezes impede, a representação
de conceitos relacionados a essa dimensão nesse tipo de modelo, como o posicionamento
de instâncias no tempo e a indicação da possibilidade de mudanças no estado das coisas.
Por exemplo, ao representar uma canção como um relatorKind entre um tema melódico
e uma ou mais letras, não fica claro se podem ou não serem feitas novas letras para a
canção. Em um recorte temporal, a canção Garota de Ipanema pode ter uma letra em
português e outra em inglês e, em um momento posterior, pode ser feita uma nova letra
para a mesma canção em um outro idioma. Isso não é explícito no modelo. Diferentemente,
uma performance representa algo que já ocorreu e que não pode ser alterado, uma situação
que também não é formalizada no modelo. Optou-se nesta versão do modelo, por uma
modelagem estritamente estrutural, sem referências à dimensão temporal.
A única subversão12 feita à linguagem foi o uso do estereótipo powerType para a
representação de modelagem multinível, inexistente na linguagem OntoUML. Os conceitos
Tipo de Meio de Performance, Tipo de Evento Musical e Tipo de Conjunto
Musical não poderiam ser representados sem esta estratégia.
12
Foi utilizado o termo subversão, tal como utilizado por Guizzardi, Wagner, Almeida e Guizzardi
(2015), com o sentido de uso incorreto da linguagem. No caso concreto foi utilizada uma primitiva de
modelagem inexistente na linguagem OntoUML 2.0.
6.8. Discussão sobre o modelo 171

6.8 Discussão sobre o modelo


Diversos aspectos da música popular brasileira são contemplados pelo modelo
conceitual de representação recém descrito. Foram discutidos conceitos relacionados à
natureza das criações musicais da ideia à performance, concepção musical, meios de
performance, gênero musical e aspectos bibliográficos, com o intuito de formalizar a
percepção dessa tradição musical pelos músicos especialistas entrevistados por Silva (2017)
complementada pela revisão bibliográfica apresentada no Capítulo 2.
Buscou-se, no início desta pesquisa, representar apenas o recorte da música popular
brasileira estudada por Silva (2017). Entretanto, com a evolução do modelo, percebeu-se que
este se adéqua a um espectro mais amplo da música popular brasileira. A conceitualização
representada, também, permite a representação de músicas não pertencentes ao recorte
originalmente estabelecido, tais como músicas sem arranjo (e. g., improvisações em rodas
de Choro), com melodias mais simples (e. g., Pagode, Música Sertaneja e Rock Nacional)
e algumas músicas não associadas à segunda fase nacionalista ou anteriores a ela (e. g.,
Jovem Guarda e primeiros Sambas). Apesar de atender a grande parte da música popular
urbana ouvida atualmente, alguns gêneros musicais precisam ser melhor avaliados. Por
exemplo, seria necessário pesquisar o quanto o tema melódico pode ser considerado uma
ideia musical original em gêneros como o Funk Carioca e o Rap Brasileiro.
Aparentemente, o modelo também poderia suportar a representação da música
folclórica brasileira, todavia seria necessário um complementá-lo com conceitos relacionados
à cultura regional, tais como danças, rituais, grupos étnicos, etc.
É importante lembrar que uma Ideia Musical Original surge junto com sua
primeira Versão de Ideia Musical, em razão de não existir uma ideia musical original
sem existir ao menos uma versão desta por meio da qual ela possa ser expressa na
forma escrita ou de som, independentemente de existir um registro da performance. Esse
entendimento se alinha com a visão do FRBRoo da concepção de uma obra (ver Figura 24
na seção 4.3), que considera a criação de uma expressão simultaneamente à concepção da
obra.
A questão cultural é mais percebida na parte do modelo referente ao Gênero
Musical. O entendimento do que é um gênero musical, considerando sua natureza e
história, remete a diversos elementos culturais como, por exemplo: pessoas e grupos
sociais; evolução do gênero musical, considerando influência e mistura com outros gêneros;
origem geográfica; característica de texto e características musicais e sonoras dos gêneros
puros; propostas de movimentos musicais; meios de performance e tipos de grupo musical
tradicionais; e tipos de evento musical característicos. Esses aspectos culturais ficarão mais
claros quando forem identificados os indivíduos que instanciam os conceitos do modelo.
Por exemplo, um pesquisador da área de música, ao utilizar esse modelo para representar
172 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

gêneros musicais brasileiros, identificará diversos conceitos individuais relacionados à


cultura brasileira, tais como: as tias baianas e a turma do Estácio; a Roda de Choro;
o cavaquinho e o tamborim; a dupla sertaneja; a origem baiana e carioca do Samba; a
influência do Samba na Bossa Nova; o hibridismo do Samba Reggae; e a proposta do
Tropicalismo de resgate da cultura popular incorporando elementos da cultura jovem
mundial.
O modelo ora apresentado difere significativamente de sua versão preliminar pu-
blicada em Padron, Cruz e Silva (2018), que não contemplava gênero musical, nem o
alinhamento com o modelo IFLA LRM. De fato, durante a pesquisa o modelo de repre-
sentação sofreu várias revisões, e os conceitos de Canção e Arranjo foram os que mais
demoraram a ser estabelecidos.
Em um primeiro momento uma Canção foi entendida como a simples junção de
uma letra a um tema melódico. Isso implica em considerar distintas a canção Garota de
Ipanema com sua letra em português e a canção The Girl from Ipanema que utiliza uma
letra em inglês com o mesmo tema melódico. Essa visão se mostrou equivocada após ser
analisado o caso da performance de The Girl from Ipanema para o disco Getz/Gilberto
(1964) com a letra em português a letra em inglês na mesma versão. Nesse caso concreto,
para atender à conceitualização original, ou a versão não representaria uma canção ou
seria necessário considerar uma terceira letra, composta pela mesclagem das duas letras
originais, sendo ambas as opções insatisfatórias. Em uma versão seguinte do modelo,
considerou-se que a canção era algo circunstancial, relacionado à opção do arranjador ou
do intérprete de utilizar ou não uma ou mais letras ao interpretar (ou escrever) uma versão
de ideia musical, sendo o conceito de canção removido do modelo e substituído apenas pelo
conceito de Versão Cantada. Devido à predominância das canções no universo da música
popular brasileira, o modelo foi revisto e o conceito de canção voltou a ser considerado
uma ideia musical original, com a diferença de uma mesma canção poder ter mais de uma
letra, ou seja, no momento que um tema melódico é unido a uma letra, surge uma canção,
que pode receber novas letras sem que sejam consideradas novas canções. Nesta última
conceitualização, o exemplo do disco Getz/Gilberto (1964) é considerado uma Versão
Cantada que desenvolve a Canção Garota de Ipanema e utiliza duas letras feitas para
essa canção.
Quanto ao Arranjo, as primeiras versões do modelo consideravam sempre a
existência de um arranjo para que uma ideia musical original fosse expressa, mesmo por
meio de uma performance informal. Esse entendimento foi influenciado pelo recorte da
música popular brasileira que foi mais estudado e que considera o processo de elaboração
de arranjos para efeito do registro gravado. O conceito de arranjo era equivalente ao
conceito Versão de Ideia Musical desta versão mais recente do modelo. Percebeu-se,
portanto, ao analisar gêneros com muito improviso, como o Choro, e eventos musicais
6.8. Discussão sobre o modelo 173

informais, como reuniões de fundo de quintal, a importância de diferenciar performances


com e sem arranjo e diferenciar versões de ideia musical que são “planos de execução” de
versões que são fruto da execução musical, representadas respectivamente pelos conceitos
Arranjo e Expressão de Performance. Esse entendimento, se alinha com o ponto de
vista de Smiraglia (2001), que considera as obras musicais como conjuntos de instanciações
variadas de criações abstratas. Essas instanciações na forma sonora são expressões de
performance e na forma escrita são arranjos escritos, e as criações abstratas são arranjos
ou apenas ideias musicais originais, quando desenvolvidas durante a própria performance
sem recorrer a um arranjo.
A questão terminológica também influenciou a existência de diversas versões
do modelo. A utilização de nomes mais próximos à realidade dos usuários facilita o
entendimento e a validação do modelo junto a este público. Porém, vários conceitos que
foram identificados durante a elaboração do modelo ainda não tinham nome e alguns nomes
que poderiam facilitar o entendimento do modelo remetem a significados ambíguos quando
apreciados pela comunidade da Ciência da Informação (e. g., “obra” e “expressão”). Alguns
exemplos de mudança terminológica durante a evolução do modelo são: “obra musical”
foi alterada para “ideia musical”; “orquestração” foi alterada para “instrumentação”; e
“composição musical” foi alterada para “tema melódico”. Espera-se que, em uma futura
validação do modelo junto a uma comunidade de usuários especializados, os nomes dos
conceitos possam ser revistos de modo a torná-los mais próximos à realidade desses
usuários.
Apesar de ser relativamente extenso, com 127 classes, ainda existem muitos pontos
a serem desenvolvidos e questões a serem discutidas, que não puderam ser resolvidos no
âmbito desta pesquisa de mestrado.
Poderiam ser adicionados axiomas e restrições13 entre relacionamentos, que permi-
tiriam uma maior formalização dos conceitos apresentados, por exemplo: um Intérprete
Grupo Musical só poderia participar de uma Performance Coletiva caso ao menos
dois de seus membros estivessem atuando em Performances Individuais que formassem
esta Performance Coletiva; e o relacionamento entre Subgênero Musical e Super-
gênero Musical é derivado dos relacionamentos de suas subclasses e Supergênero
Musical.
13
A linguagem OntoUML, por ser uma extensão da linguagem UML, permite a definição de restrições
(constraints). De acordo com Object Management Group (2005), existem restrições definidas pelo
usuário e restrições predefinidas na UML. Restrições definidas pelo usuário são escritas na forma
de texto em linguagem natural, em linguagem formal (e.g., Object Constraint Language OCL https:
//www.omg.org/spec/OCL/About-OCL) ou em uma linguagem de programação (e.g., Java https:
//www.java.com/pt_BR).
174 Capítulo 6. Uma proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira

Possíveis gradações de proximidade entre gêneros musicais puros14 e entre versões


de ideia musical15 poderiam ser representadas em alguma versão futura do modelo.
Outra evolução do modelo poderia contemplar a representação de fases de um
gênero musical. Antes disso, porém, é necessário discutir se essas fases seriam apenas
diferentes estados de um mesmo gênero no tempo ou se estas poderiam ser consideradas
outros gêneros ou subgêneros deste. De qualquer forma, deve ser endereçada pelo modelo
a constatação de que a “percepção dos gêneros pode mudar com o tempo” (SILVA, 2017,
p. 50).
A parte do modelo relacionada à produção de publicações musicais e que envolve
gravação, mixagem, masterização e os papéis de produtor musical, fonográfico, técnico
de áudio e hitmaker também precisa ser desenvolvida. Esses conceitos foram apenas
parcialmente formalizados, refletindo o trabalho de Silva (2017), que não se aprofundou
nesses aspectos.
As classificações musicais “clássicos” e “pop” e música elaborada e comercial
discutidas na subseção 2.3.4 também não foram endereçadas pela versão atual do mo-
delo. Percebeu-se que a formalização dessas classificações exigiria uma discussão mais
aprofundada junto aos especialistas, o que não foi possível realizar no contexto dessa
pesquisa.
O endereçamento de questões relacionadas à dimensão temporal também poderá
ser futuramente discutido para evolução do modelo. Algumas possibilidades de mudança
poderiam envolver a reificação de intervalos de tempo para posicionamento de instâncias
no tempo, tal como o uso da entidade LRM-E11 Intervalo de tempo no modelo IFLA
LRM, e a adição de categorias representantes de conceitos perdurantes, como no caso das
entidades E5 Event e E7 Activity do modelo CIDOC CRM.
Por fim, destaca-se a importância da necessidade de validação deste modelo junto
a uma comunidade de usuários especializados com o intuito de construir uma ontologia de
domínio para a representação da música popular brasileira que realmente formalize uma
conceitualização compartilhada entre esses usuários.

14
Por exemplo, aparentemente o Samba se aproxima mais da Bossa Nova do que o Choro.
15
Duas versões de uma mesma ideia musical podem ser muito parecidas, tal como duas interpretações
da mesma canção por um mesmo intérprete com a mesma instrumentação ou um cover, mas serem
consideravelmente diferentes de uma outra versão feita para uma instrumentação totalmente diferente
ou com outro ritmo.
175

7 Aplicação do modelo IFLA LRM à música


popular brasileira

Neste capítulo é apresentado um experimento de extensão do modelo bibliográfico


IFLA LRM para sua aplicação no domínio da música popular brasileira, com base nos
conceitos formalizados no modelo descrito no Capítulo 6. Este experimento é um exemplo
de utilização do modelo conceitual de representação como insumo para a adequação de
modelos bibliográficos ao domínio da música popular brasileira e também um exemplo de
extensão do modelo IFLA LRM para atender à uma aplicação bibliográfica especializada.
A extensão do modelo IFLA LRM visa a implementação de um protótipo de
biblioteca digital especializada em música popular brasileira cuja navegação atenda às
necessidades de usuários especialistas com perfil similar ao dos músicos entrevistados
por Silva (2017). Essa aplicação deverá publicar (i) arquivos de áudio com gravações
de performances e (ii) arquivos de texto e de imagem com letras de música e música
escrita (i. e., na forma de partituras, cifras, etc.). Para efeitos deste experimento, não são
consideradas buscas em recursos bibliográficos que agrupam músicas, tais como CD, DVD,
songbook, etc.
Algumas consultas previstas a serem suportadas pelo modelo são:

a) obter todas as letras de uma música;


b) encontrar as versões representativas de uma música;
c) obter todas as gravações de uma música para um gênero específico;
d) encontrar partituras de uma música para um dado conjunto de instrumentos
musicais;
e) listar os músicos e meios de performance utilizados por cada um em uma
gravação;
f) selecionar gravações de performances de um grupo musical que ocorreram em
um dado intervalo de tempo; e
g) listar as performances ocorridas em um evento musical.

A premissa estabelecida é que o trabalho de extensão do modelo IFLA LRM para


seu uso em uma aplicação bibliográfica especializada é beneficiado pelo conhecimento
prévio da arquitetura dos seus objetos informacionais, principalmente se houver uma
consulta prévia aos usuários. Para o caso em discussão, considera-se que os desejos dos
usuários e sua forma de ver a música popular brasileira foram materializados no modelo
de representação de música popular brasileira descrito no Capítulo 6. No restante deste
176 Capítulo 7. Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira

capítulo, o modelo IFLA LRM estendido é referenciado como “modelo estendido” e o


modelo descrito no Capítulo 6 é referenciado como “modelo específico”.
Ao invés de utilizar as entidades genéricas do IFLA LRM diretamente, o processo de
especialização do IFLA LRM consistiu no mapeamento de conceitos do modelo específico
em conceitos do modelo IFLA LRM, na extensão de relacionamentos e atributos, na
criação de novas entidades, atributos e relacionamentos específicos do domínio e no
descarte de elementos do modelo IFLA LRM considerados irrelevantes para o contexto
da biblioteca digital. Foram também mantidos ou estendidos alguns elementos do IFLA
LRM relacionados ao domínio bibliográfico, que não aparecem no modelo específico. Por
ser estritamente estrutural, o modelo específico não explicita os relacionamentos entre
os conceitos e intervalos de tempo. Foram, portanto, adicionados alguns relacionamentos
com a entidade LRM-E11 Intervalo de Tempo, inexistentes no modelo específico, mas que
podem ser de interesse dos usuários.
Optou-se por utilizar os atributos category (LRM-E2-A1 e LRM-E3-A1 ) para a
especialização de entidades obra e expressão com o objetivo de reduzir a quantidade de
entidades do modelo estendido, sabendo-se que criação de subclasses também seria uma
alternativa válida. Esta decisão de projeto gerou a necessidade do estabelecimento de
restrições ao uso de alguns atributos e relacionamentos que só são aplicáveis a instâncias
de categorias específicas.
A definição do modelo estendido segue convenções de nomenclatura e formato
análogos aos utilizados no documento de especificação do modelo IFLA LRM. Cada
elemento do modelo é numerado para referência não ambígua. Entidades e atributos
recebem um nome curto, que facilita seu reconhecimento, porém não é suficiente para a
especificação do elemento. Para isso, são providas definições e notas de escopo para cada
novo elemento do modelo. Nas referências aos relacionamentos, são apresentadas, além
do nome curto, o nome das entidades de domínio e imagem. Para evitar ambiguidade,
referências a elementos do modelo específico são escritas em negrito (e. g., Ideia Musical
Original) e referências a elementos do modelo estendido em itálico (e. g., Obra).
Elementos adicionados pelo modelo estendido adotam uma numeração única com
prefixo ‘MPB-’ para diferenciá-los dos elementos originais do modelo IFLA LRM. Novas
entidades são numeradas adicionando-se a letra ‘E’ e uma numeração sequencial ao
prefixo padrão (e. g., MPB-E1 Gênero Musical) sendo a mesma regra aplicada aos novos
relacionamentos, porém com a utilização da letra ‘R’ (e. g., MPB-R1 OBRA foi composta
por PESSOA). Novos atributos recebem em sua numeração, além do prefixo padrão, a
referência à entidade que o contém seguida da letra ‘A’ e um número sequencial. Quando
aplicados a entidades originais do modelo IFLA LRM, a referência à entidade mantém o
prefixo ‘LRM’ (e. g., o atributo MPB-LRM-E2-A1 Idioma é o primeiro atributo adicionado
à entidade LRM-E2 Obra). Para restringir referências a instâncias de categorias específicas
7.1. Entidades 177

Tabela 3 – Hierarquia de entidades.


Primeiro Nível Segundo Nível Terceiro Nível
LRM-E1 Res
– LRM-E2 Obra
– LRM-E3 Expressão
– LRM-E4 Manifestação
– LRM-E5 Item
– LRM-E6 Agente
– – LRM-E7 Pessoa
– – LRM-E8 Agente Coletivo
– LRM-E9 Nomen
– LRM-E10 Lugar
– LRM-E11 Intervalo de Tempo
– MPB-E1 Gênero Musical
– MPB-E2 Notação Musical
– MPB-E3 Performance Individual
– MPB-E4 Membro de Grupo Musical
– MPB-E5 Evento Musical

de uma entidade, são listadas as categorias após o nome da entidade entre colchetes (e. g.,
Obra [música] referencia instâncias de Obra da categoria música).
Para a aplicação bibliográfica, fazem-se algumas simplificações terminológicas e
abstraem-se alguns conceitos da formalização do modelo específico visando facilitar a
navegação na aplicação bibliográfica.
Prossegue-se com a definição dos elementos do modelo estendido. Todos os elementos
do modelo IFLA LRM utilizados nesta especialização constam das tabelas 3, 5 e 7,
que apresentam a hierarquia entre os elementos, porém não constam das tabelas de
detalhamento, podendo ser consultados no documento de referência do modelo IFLA LRM.

7.1 Entidades
A Tabela 3 apresenta a hierarquia de entidades do modelo estendido e na Tabela 4
são detalhadas as novas entidades do modelo estendido. Foram adicionadas apenas as
entidades MPB-E1 Gênero Musical, MPB-E2 Notação Musical, MPB-E3 Performance
Individual, MPB-E4 Membro de Grupo Musical e MPB-E5 Evento Musical.
Foi utilizado o alinhamento descrito na seção 6.6 para identificação das principais
entidades do modelo estendido. Considerando que a aplicação não publicará recursos
agrupadores, não foram utilizadas, para o mapeamento de conceitos, as classes Obra
Agregadora, Expressão Agregadora e Manifestação Agregadora.
De acordo com o modelo específico, são consideradas obras, as classes Ideia
Musical Original e Obra Textual. Uma ideia musical original é um Tema Melódico
ou uma Canção, e a obra textual, no contexto deste experimento, só é considerada quando
178 Capítulo 7. Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira

Tabela 4 – Novas entidades.


ID Entidade Definição Restrições
MPB-E1 Gênero Musical Uma categorização que identifica peças musicais Superclasse: res
como pertencentes a uma mesma tradição ou
que possuem elementos em comum.
Notas Corresponde ao conceito de mesmo nome no modelo específico.
Exemplos Bossa Nova / Samba
MPB-E2 Notação Musical Uma linguagem para escrita musical. Superclasse: res
Notas Corresponde ao conceito de mesmo nome no modelo específico.
Exemplos Notação tradicional / Cifra
MPB-E3 Performance Atividade executada por um músico ao produ- Superclasse: res
Individual zir som musical utilizando um meio de perfor-
mance.
Notas Corresponde ao conceito de mesmo nome no modelo específico.
Exemplos Performance de Pery Ribeiro como cantor na primeira gravação comercial de Garota
de Ipanema em 1962. / Performance de Amilton Godoy tocando piano na gravação de
Garota de Ipanema para o álbum Zimbo Trio (1964).
MPB-E4 Membro de Papel desempenhado por um músico ao partici- Superclasse: res
Grupo Musical par de um grupo musical, possivelmente limi-
tado a um intervalo de tempo e associado ao
meio de performance utilizado.
Notas Corresponde ao conceito de mesmo nome no modelo específico.
Exemplos Corina como membro do grupo musical Quarteto em Cy desde 2016. / Amilton Godoy
como pianista do grupo musical Zimbo Trio.
MPB-E5 Evento Musical Evento social que reúne uma ou mais perfor- Superclasse: res
mances em um mesmo local e em um mesmo
período de tempo.
Notas Corresponde ao conceito de mesmo nome no modelo específico.
Exemplos Concerto no Carnegie Hall em Nova York ocorrido em 1962, que lançou bossa nova
nos EUA. / Terceira edição do Festival de Música Popular Brasileira organizado pela
TV Record, que aconteceu entre 30 de setembro e 21 de outubro de 1967 no Teatro
Record Centro, em São Paulo.

realizada por uma expressão textual utilizada como Letra de uma canção. São modelados,
portanto, dois tipos de obra, representados pelas categorias música e letra da entidade
Obra. Uma Obra [música] representa um tema melódico que compõe ou não uma canção e
uma Obra [letra] representa uma Obra Textual relacionada a uma Letra. Cita-se como
exemplo de Obra [música] a música Garota de Ipanema, composta por Tom Jobim e como
exemplo de Obra [letra] a letra em português de Garota de Ipanema escrita por Vinicius
de Moraes.
Não foi identificado, dentre as iniciativas estudadas nos referenciais teóricos (ver
Capítulo 5) que utilizam as entidades OEMI para representação de música popular, o
posicionamento da letra de música como obra. Provavelmente o entendimento mais comum
seja considerar a letra um componente de uma obra assim como a ilustração de um livro.
Esse entendimento, entretanto, não reflete a importância dada à letra pelos usuários de
música popular. Um dos tipos de objetos informacionais a serem publicados nesta biblioteca
digital são arquivos digitais apenas com a letra da música, podendo a mesma letra ser
7.1. Entidades 179

publicada em mais de um formato de arquivo digital. Optou-se, então, por considerar a


letra como obra.
No modelo específico, as classes Expressão Textual, Arranjo Escrito e Expres-
são de Performance são expressões. Correspondentes a esses conceitos, foram criadas
no modelo estendido as categorias letra escrita, música escrita e áudio para a entidade
Expressão. Por exemplo: a primeira gravação comercial de Garota de Ipanema por Pery
Ribeiro em 1962 é um exemplo de Expressão [áudio], o arranjo escrito de Garota de
Ipanema para quinteto de cordas em Fá Maior de Manoel F. Jaez é um exemplo de
Expressão [música escrita] e o texto da letra The Girl From Ipanema de Norman Gimbel
um exemplo de Expressão [letra escrita].
Uma letra pode ser publicada sozinha ou acompanhada da música, quando publicada
em uma Expressão [música escrita]. Esta poderia corresponder a uma manifestação
agregada, tal como no padrão descrito em Riva, Le Boeuf e Žumer (2017, p. 94), ou seja,
uma manifestação de registro escrito de música com letra incorpora as expressões do
arranjo escrito e da letra. Entretanto, a adição do relacionamento MPB-R14 EXPRESSÃO
usa letra OBRA, atende à necessidade de navegação a partir da letra para expressões
de música escrita, ou mesmo expressões de áudio, que a utilizam, sem a necessidade de
utilização do padrão de manifestações agregadas.
Observa-se que é possível existir nesta biblioteca digital uma instância de Obra
[letra] sem que exista uma Expressão [letra escrita]. Desta maneira é possível registrar a
existência de letra (além de informar o idioma e autor da letra) mesmo que não exista o
texto da letra no acervo. Esse comportamento é perfeitamente aceito pelo IFLA LRM, que
cita como exemplo similar a existência de uma obra sem itens em um catálogo, apenas
porque a biblioteca possui cópias de estudos sobre aquela obra.
Apesar da entidade Manifestação do modelo estendido corresponder ao conceito de
mesmo nome do modelo específico, são utilizadas apenas manifestações correspondentes
ao conceito Manifestação Individual do modelo específico, em razão da não publicação
de manifestações agregadas nesta aplicação.
As entidades Res, Item, Agente, Pessoa, Agente Coletivo, Lugar e Nomen corres-
pondem aos conceitos homônimos do modelo específico. Manteve-se o uso da entidade
Intervalo de Tempo para representar questões temporais, não endereçadas pelo modelo
específico.
A inexistência de outros tipos de agentes coletivos no modelo específico permitiu o
mapeamento de Grupo Musical em Agente Coletivo sem a necessidade de especialização
ou categorização de agentes coletivos.
A nova entidade Membro de Grupo Musical, correspondente ao conceito de mesmo
nome no modelo específico, surge para registrar o período de tempo da participação de
180 Capítulo 7. Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira

Tabela 5 – Hierarquia de atributos.


Entidades Atributos
LRM-E1 Res LRM-E1-A1 Categoria
– LRM-E2 Obra – LRM-E2-A1 Categoria
– LRM-E3 Expressão – LRM-E3-A1 Categoria
LRM-E1 Res LRM-E1-A2 Nota
– LRM-E2 Obra LRM-E2-A2 Atributo da expressão representativa
– LRM-E2 Obra – MPB-LRM-E2-A1 Idioma
– LRM-E3 Expressão LRM-E3-A6 Idioma
– LRM-E3 Expressão LRM-E3-A7 Tom musical
– LRM-E3 Expressão LRM-E3-A8 Meio de performance
– LRM-E4 Manifestação LRM-E4-A4 Declaração da manifestação
– LRM-E4 Manifestação – MPB-LRM-E4-A1 Formato
– LRM-E5 Item LRM-E5-A1 Localização
– LRM-E9 Nomen LRM-E9-A2 String do nomen
– LRM-E9 Nomen LRM-E9-A7 Idioma
– LRM-E11 Intervalo de Tempo LRM-E11-A1 Início
– LRM-E11 Intervalo de Tempo LRM-E11-A2 Fim
– MPB-E3 Performance Individual MPB-E3-A1 Meio de performance
– MPB-E4 Membro de Grupo Musical MPB-E4-A1 Meio de performance

um músico em uma banda e os meios de performance por ele utilizados. De maneira


semelhante, a nova entidade Performance Individual corresponde ao conceito homônimo no
modelo específico e registra a participação de um músico em uma performance (Expressão
[áudio]) e os meios de performance por ele utilizados.

7.2 Atributos
Os atributos do modelo estendido são apresentados na Tabela 5, e a Tabela 6
detalha os novos atributos. Foram adicionados apenas quatro atributos: MPB-LRM-E2-A1
Idioma; MPB-LRM-E4-A1 Formato; MPB-E3-A1 Meio de performance; e MPB-E4-A1
Meio de performance.
Foram utilizados os atributos LRM-E2-A1 Categoria e LRM-E3-A1 Categoria para
as entidades Obra e Expressão, entretanto não foi necessário o uso do atributo LRM-E4-A1
Categoria do suporte da entidade Manifestação em razão da aplicação trabalhar apenas
com itens digitais.
A classe Tipo de Meio de Performance do modelo específico poderia ser
contemplada no modelo estendido na forma de uma nova entidade, todavia foi escolhida
a utilização do atributo LRM-E3-A8 Meio de performance existente no IFLA LRM
com o objetivo de reduzir as modificações no modelo IFLA LRM. Para manter uma
consistência dentro do modelo, os meios de performance utilizados por um intérprete em
uma performance ou em uma banda também foram modelados na forma de atributos (i.
e., MPB-E3-A1 Meio de performance e MPB-E4-A1 Meio de performance).
7.3. Relacionamentos 181

Tabela 6 – Novos atributos.


ID Entidade Atributo Definição
MPB-LRM-E2-A1 OBRA Idioma O idioma utilizado pela versão representa-
tiva da obra.
Notas de escopo Idioma da letra usada pela versão representativa, quando aplicado a Obra [música],
ou idioma da letra, quando aplicado a Obra [letra].
Exemplos Português / Inglês
MPB-LRM-E4-A1 MANIFESTAÇÃO Formato Formato de arquivo digital.
Notas de escopo Formato de codificação de arquivo digital de áudio, texto ou imagem.
Exemplos PDF / HTML
MPB-E3-A1 PERFORMANCE Meio de Uma combinação de meios de performance
INDIVIDUAL performance que foram efetivamente utilizados por um
intérprete durante uma performance.
Notas de escopo Uma lista de meios de performance. Difere do atributo LRM-E3-A8 Meio de
performance que pode especificar quantidades para cada meio de performance.
Exemplos Voz e violão / Piano
MPB-E4-A1 MEMBRO DE Meio de Uma combinação de meios de performance
GRUPO MUSICAL performance normalmente utilizada por um intérprete
enquanto membro de um grupo musical.
Notas de escopo Uma lista de meios de performance que um músico costuma tocar quando participa
de um grupo musical.
Exemplos Voz e violão / Piano

O novo atributo MPB-LRM-E2-A1 Idioma exemplifica o uso do atributo LRM-E2-


A2 Atributo da expressão representativa. No caso de Obra [letra], esse atributo informa
o idioma em que a letra foi escrita e, para Obra [música], o atributo informa o idioma
utilizado pela letra de seu arranjo original. Nota-se que seria uma grande exceção a
existência de um arranjo original de uma música popular brasileira utilizar uma letra em
outro idioma que não o português.

7.3 Relacionamentos
A Tabela 7 apresenta a hierarquia de relacionamentos do modelo estendido. Diversos
novos relacionamentos, detalhados nas Tabelas 8, 9 e 10, foram adicionados para atender
às necessidades informacionais ditadas pelo modelo específico.
Os novos relacionamentos MPB-R1 a MPB-R5 e MPB-R20 modelam diferentes
responsabilidade de agentes na criação de obras e de expressões. O caso do relacionamento
MPB-R20 PESSOA interpretou em PERFORMANCE INDIVIDUAL se difere dos demais
por referenciar indiretamente o músico responsável pela interpretação da expressão por meio
do relacionamento MPB-R21 EXPRESSÃO foi interpretada por PERFORMANCE INDI-
VIDUAL. Essa indireção existe devido à necessidade de indicação do meio de performance
utilizado pelo intérprete, representado pelo atributo MPB-E3-A1 Meio de performance.
Apesar da modelagem Entidade Relacionamento (EER) permitir a existência de atributos
de relacionamentos (ELMASRI; NAVATHE, 2011, p. 2018), tornando possível a alternativa
182 Capítulo 7. Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira

Tabela 7 – Hierarquia de relacionamentos.

LRM-R1 RES é associado a RES


– LRM-R2 OBRA é realizada por EXPRESSÃO
– LRM-R3 EXPRESSÃO é incorporada em MANIFESTAÇÃO
– LRM-R4 MANIFESTAÇÃO é exemplificada por ITEM
– LRM-R5 OBRA foi criada por AGENTE
– – MPB-R1 OBRA foi composta por PESSOA
– – MPB-R2 OBRA foi escrita por PESSOA
– LRM-R6 EXPRESSÃO foi criada por AGENTE
– – MPB-R3 EXPRESSÃO foi composta por PESSOA
– – MPB-R4 EXPRESSÃO foi interpretada por AGENTE COLETIVO
– – MPB-R5 EXPRESSÃO foi transcrita por PESSOA
– LRM-R13 RES tem denominação NOMEN
– LRM-R33 RES tem associação com LUGAR
– – MPB-R6 EVENTO MUSICAL ocorreu em LUGAR
– LRM-R35 RES tem associação com INTERVALO DE TEMPO
– – MPB-R7 OBRA foi composta em INTERVALO DE TEMPO
– – MPB-R8 OBRA foi escrita em INTERVALO DE TEMPO
– – MPB-R9 EXPRESSÃO ocorreu em INTERVALO DE TEMPO
– – MPB-R10 MANIFESTAÇÃO foi publicada em INTERVALO DE TEMPO
– – MPB-R11 MEMBRO DE GRUPO MUSICAL participou durante INTERVALO DE TEMPO
– – MPB-R12 EVENTO MUSICAL ocorreu em INTERVALO DE TEMPO
– MPB-R13 OBRA tem letra OBRA
– MPB-R14 EXPRESSÃO usa letra OBRA
– MPB-R15 OBRA representa GÊNERO MUSICAL
– MPB-R16 EXPRESSÃO representa GÊNERO MUSICAL
– MPB-R17 EXPRESSÃO é escrita em NOTAÇÃO MUSICAL
– MPB-R18 OBRA tem versão original EXPRESSÃO
– MPB-R19 OBRA tem versão representativa EXPRESSÃO
– MPB-R20 PESSOA interpretou em PERFORMANCE INDIVIDUAL
– MPB-R21 EXPRESSÃO foi interpretada por PERFORMANCE INDIVIDUAL
– MPB-R22 PESSOA desempenha papel de MEMBRO DE GRUPO MUSICAL
– MPB-R23 MEMBRO DE GRUPO MUSICAL constitui AGENTE COLETIVO
– MPB-R24 EXPRESSÃO ocorreu em EVENTO MUSICAL

de adicionar um atributo Meio de performance a um relacionamento EXPRESSÃO foi


interpretada por PESSOA, decidiu-se pela manutenção da forma de uso da modelagem
EER pelo modelo IFLA LRM original, que não usa atributos de relacionamentos.
É importante notar que o relacionamento MPB-R3 EXPRESSÃO foi composta
por PESSOA, que indica o arranjador de uma expressão, pode ser aplicado tanto a
Expressão [áudio] como a Expressão [música escrita]. No caso de Expressão [música escrita],
que corresponde ao conceito Arranjo Escrito do modelo específico, a identificação do
arranjador é direta, correspondendo ao Arranjador que elaborou um Arranjo Novo,
no entanto, para Expressão [áudio], essa relação não é tão óbvia. O arranjador associado
a uma Expressão [áudio], que corresponde ao conceito Expressão de Performance, é
o Arranjador que compôs o arranjo executado por uma Performance de Arranjo,
quando esta Expressão de Performance resulta de uma Performance de Arranjo.
Observa-se que o gênero musical associado a Obra [música] por meio do relaci-
onamento MPB-R15 OBRA representa GÊNERO MUSICAL é o gênero de sua versão
7.3. Relacionamentos 183

Tabela 8 – Novos relacionamentos (parte 1).


ID Domínio Nome Nome inverso Imagem Cardin.
MPB-R1 Obra foi composta por compôs Pessoa M-M
Definição Este relacionamento liga uma música ao seu compositor.
Notas Domínio restrito a Obra [música].
Exemplos A música Garota de Ipanema foi composta por Tom Jobim.
MPB-R2 Obra foi escrita por escreveu Pessoa M-M
Definição Este relacionamento liga uma letra ao seu autor.
Notas Domínio restrito a Obra [letra].
Exemplos A letra Garota de Ipanema em português foi escrita por Vinicius de Moraes.
MPB-R3 Expressão foi composta por compôs Pessoa M-M
Definição Este relacionamento liga uma Expressão [áudio, música escrita] ao seu arranjador.
Notas Domínio restrito a Expressão [áudio, música escrita].
Exemplos O arranjo escrito de Garota de Ipanema para quinteto de cordas em Fá maior de Manoel
F. Jaez foi composto por Manoel F. Jaez.
MPB-R4 Expressão foi interpretada por interpretou Agente M-M
Coletivo
Definição Este relacionamento liga uma Expressão [áudio] ao grupo musical que participou em sua
performance.
Notas Domínio restrito a Expressão [áudio].
Exemplos A gravação de Garota de Ipanema para o álbum Zimbo Trio (1964) foi interpretada pelo
grupo musical Zimbo Trio.
MPB-R5 Expressão foi transcrita por transcreveu Pessoa M-M
Definição Este relacionamento liga uma Expressão [música escrita] à pessoa que a transcreveu.
Notas A pessoa referenciada é responsável pela transcrição de um áudio, ou seja, por escrever
a música a partir do áudio. Não é o compositor do arranjo. Corresponde à relação
Transcrição do modelo específico.
Exemplos Elenice Maranesi, é responsável pela transcrição do arranjo Garota de Ipanema para piano
solo, publicado no livro “Brazilian Piano - vol. 1”.
MPB-R6 Evento ocorreu em é local de Lugar M-1
Musical
Definição Este relacionamento liga um evento musical ao lugar onde o evento ocorreu.
Notas Corresponde ao relacionamento entre Evento Musical e Local de Evento do modelo
específico.
Exemplos A terceira edição do Festival de Música Popular Brasileira organizado pela TV Record
ocorreu no Teatro Record Centro, em São Paulo.
MPB-R7 Obra foi composta em indica quando foi com- Intervalo M-1
posta a de Tempo
Definição Este relacionamento registra quando uma música foi composta.
Notas Domínio restrito a Obra [música].
Exemplos A música Garota de Ipanema foi composta em 1962.
MPB-R8 Obra foi escrita em indica quando foi es- Intervalo M-1
crita a de Tempo
Definição Este relacionamento registra quando uma letra foi escrita.
Notas Domínio restrito a Obra [letra].
Exemplos A letra Garota de Ipanema em português foi escrita em 1962.
MPB-R9 Expressão ocorreu em indica quando foi exe- Intervalo M-1
cutada de Tempo
Definição Este relacionamento registra quando uma performance gravada ocorreu.
Notas Domínio restrito a Expressão [áudio].
Exemplos A gravação de The Girl from Ipanema para o álbum Getz/Gilberto ocorreu em março de
1963.
184 Capítulo 7. Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira

Tabela 9 – Novos relacionamentos (parte 2)


ID Domínio Nome Nome inverso Imagem Cardin.
MPB-R10 Manifestação foi publicada em indica quando foi pu- Intervalo M-1
blicada de Tempo
Definição Este relacionamento registra quando uma gravação ou música escrita foi publicada.
Notas A aplicação conterá arquivos digitais que, em sua maioria, são conversões de suportes
antigos para formatos digitais (e.g., uma faixa de um LP convertido para MP3 ou a
digitalização de uma partitura). Este relacionamento registra a data da publicação do
suporte original, não quando o arquivo digital foi disponibilizado na aplicação.
Exemplos A faixa The Girl from Ipanema do álbum Getz/Gilberto foi publicada em março de 1964.
MPB-R11 Membro participou durante indica período de par- Intervalo M-1
de Grupo ticipação de de Tempo
Musical
Definição Este relacionamento registra o período de tempo durante o qual uma pessoa foi membro
de um grupo musical.
Notas Durante sua existência, um grupo musical pode ter diferentes formações. Este relaciona-
mento permite a identificação dos membros de um grupo musical em períodos específicos.
Exemplos A cantora Corina na participou do grupo musical Quarteto em Cy a partir de 2016.
MPB-R12 Evento ocorreu em indica quando ocorreu Intervalo M-1
Musical de Tempo
Definição Este relacionamento registra quando ocorreu um evento musical.
Notas —
Exemplos A terceira edição do Festival de Música Popular Brasileira organizado pela TV Record
ocorreu entre 30 de setembro e 21 de outubro de 1967.
MPB-R13 Obra tem letra é letra de Obra M-M
Definição Este relacionamento liga a música a sua letra.
Notas Domínio restrito a Obra [música] e imagem restrita a Obra [letra].
Exemplos A música Garota de Ipanema tem a letra The Girl from Ipanema de Norman Gimbel.
MPB-R14 Expressão usa letra é usada pela Obra M-M
Definição Este relacionamento liga uma Expressão [áudio, música escrita] à letra utilizada.
Notas Domínio restrito a Expressão [áudio, música escrita] e imagem restrita a Obra [letra].
Exemplos A gravação da música Garota de Ipanema para o álbum Getz/Gilberto usa a letra The
Girl from Ipanema de Norman Gimbel.
MPB-R15 Obra representa é representado por Gênero M-M
Musical
Definição Este relacionamento liga uma música ao gênero musical de sua versão representativa.
Notas Domínio restrito a Obra [música].
Exemplos A música Garota de Ipanema representa o gênero bossa nova.
MPB-R16 Expressão representa é representado por Gênero M-M
Musical
Definição Este relacionamento liga uma Expressão [áudio, música escrita] ao gênero que ela repre-
senta.
Notas Domínio restrito a Expressão [áudio, música escrita].
Exemplos A primeira gravação comercial de Garota de Ipanema representa o gênero bossa nova.
MPB-R17 Expressão é escrita em é usada em Notação M-M
Musical
Definição Este relacionamento liga a música escrita à notação musical utilizada.
Notas Domínio restrito a Expressão [música escrita].
Exemplos O arranjo escrito de Garota de Ipanema para quinteto de cordas em Fá maior de Manoel
F. Jaez é escrito em notação tradicional.
7.3. Relacionamentos 185

Tabela 10 – Novos relacionamentos (parte 3)


ID Domínio Nome Nome inverso Imagem Cardin.
MPB-R18 Obra tem versão original é versão original de Expressão 1-1
Definição Este relacionamento liga uma música à sua versão original.
Notas Domínio restrito a Obra [música] e imagem restrita a Expressão [áudio, música escrita].
Exemplos A música Garota de Ipanema tem como versão original sua primeira gravação comercial
pelo cantor Pery Ribeiro em 1962.
MPB-R19 Obra tem versão representa- é versão representa- Expressão 1-M
tiva tiva de
Definição Este relacionamento liga uma música à sua versão representativa.
Notas Domínio restrito a Obra [música] e imagem restrita a Expressão [áudio, música escrita].
Exemplos A música Garota de Ipanema tem como versão representativa sua gravação por Tom
Jobim para o álbum Antônio Carlos Jobim (1963).
MPB-R20 Pessoa interpretou em foi interpretada por Performance 1 - M
Individual
Definição Este relacionamento liga um músico a sua performance individual.
Notas —
Exemplos Pery Ribeiro interpretou na primeira gravação comercial de Garota de Ipanema.
MPB-R21 Expressão foi interpretada por interpretou Performance 1 - M
Individual
Definição Este relacionamento liga uma expressão de áudio à performance de um intérprete.
Notas —
Exemplos A primeira gravação comercial de Garota de Ipanema foi interpretada por Pery Ribeiro
como cantor.
MPB-R22 Pessoa desempenha papel de é papel de Membro 1-M
de Grupo
Musical
Definição Este relacionamento liga uma pessoa à sua participação em um grupo musical.
Notas —
Exemplos Corina desempenha o papel de membro de grupo musical no grupo Quarteto em Cy.
MPB-R23 Membro constitui é constituído por Agente M-1
de Grupo Coletivo
Musical
Definição Este relacionamento liga um grupo musical a seus membros.
Notas —
Exemplos Corina, como participante de grupo musical, constitui o grupo musical Quarteto em Cy.
MPB-R24 Expressão ocorreu em contém Evento M-1
Musical
Definição Este relacionamento liga uma performance ao evento no qual ela ocorreu.
Notas Domínio restrito a Expressão [áudio]
Exemplos A performance de Domingo no Parque por Gilberto Gil ocorreu na terceira edição do
Festival de Música Popular Brasileira organizado pela TV Record.
186 Capítulo 7. Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira

Figura 42 – Visão geral dos relacionamentos do modelo estendido.

representativa, que pode ser visto como a expressão representativa ou canônica da obra.
Dessa forma, a associação do gênero musical à obra é análoga à extensão do LRM-E2-A2
Atributo da expressão representativa como forma de melhor descrever e identificar a obra.
De fato, seria também válida a modelagem do gênero musical como um atributo especiali-
zado de LRM-E2-A2. A técnica de modelagem EER permite pensar em relacionamentos
como atributos e vice-versa (ELMASRI; NAVATHE, 2011, p. 210,211,2014). O próprio
IFLA LRM comenta sobre a alternativa de modelagem de atributos na forma de relacio-
namentos ao orientar que atributos que possam ser representados na forma de Uniform
Resource Identifier (URI) apontando para alguma fonte externa poderiam ser modelados
na forma de relacionamento (RIVA; LE BOEUF; ŽUMER, 2017, p. 11).
A exemplo da visão geral dos relacionamentos do modelo IFLA LRM1 (RIVA; LE
BOEUF; ŽUMER, 2017, p. 86), a Figura 42 apresenta uma visão geral dos relacionamentos
do modelo estendido. Para melhor visualização, não foram apresentados os relacionamentos
de especialização com a entidade Res e os relacionamentos do IFLA LRM que foram
especializados pelo modelo específico.

7.4 Discussão
O método empregado nesse experimento consistiu: (i) na construção de um modelo
conceitual que reflete a percepção dos usuários; (ii) no alinhamento desse modelo conceitual
1
A visão geral dos relacionamentos do modelo IFLA LRM é apresentada na Figura 15
7.4. Discussão 187

com o modelo IFLA LRM; (iii) na identificação dos conceitos possíveis e desejáveis à
aplicação; e, por fim, (iv) no posicionamento desses conceitos na estrutura do IFLA LRM.
Percebe-se que esse método pode ser utilizado para extensão do IFLA LRM em outras
aplicações e para outros tipos de conteúdo e que a existência desse modelo conceitual
facilita também a extensão do IFLA LRM para outras aplicações dentro do mesmo domínio.
A estratégia de partir de um modelo conceitual que reflete a percepção de usuários
especializados no domínio da música popular brasileira para, em seguida, estender o modelo
IFLA LRM, se mostrou interessante em alguns aspectos: (i) no estabelecimento de limites
entre obra e expressão; (ii) na identificação de conceitos importantes para os usuários; e
(iii) no enriquecimento de metadados.
Uma crítica comum ao grupo 1 do modelo FRBR, que também é aplicável ao IFLA
LRM, é a falta de definição de limites claros entre obras e expressões. De fato, o FRBR,
assim como o IFLA LRM, não especifica regras para a delimitação de fronteiras entre as
obras, deixando essa responsabilidade para as regras de catalogação. Acredita-se que o IFLA
LRM ao prover um modelo genérico que atenda a todos os tipos de recursos bibliográficos
não poderia definir critérios fixos para o estabelecimento de fronteiras entre as entidades
Obra e Expressão sem se especializar nos diferentes tipos de recursos informacionais, e,
por esse motivo, deixa a responsabilidade para as aplicações e regras de catalogação.
No caso deste experimento, a formalização dos conceitos relacionados à natureza das
obras musicais no universo da música popular brasileira, permitiu o estabelecimento
claro dessas fronteiras. Observa-se que o posicionamento da letra como obra, e não como
uma criação acessória ou parte de uma composição, é uma decisão prática que visa
atender às necessidades informacionais dos usuários desta biblioteca digital, melhorando o
agrupamento e a navegabilidade entre composições, letras e seus objetos digitais.
Estender o modelo IFLA LRM é um trabalho de modelagem conceitual que envolve
a identificação e definição de conceitos específicos do domínio da aplicação, a aplicabilidade
de conceitos bibliográficos preexistentes e como os esses dois tipos de conceitos se relacionam.
A identificação dos conceitos específicos do domínio fica mais natural quando o modelador
tem uma maior liberdade de ação, por este não precisar se adequar a uma estrutura
preexistente que trata de um domínio distinto. A elaboração de um modelo com apenas
conceitos do domínio melhora a comunicação com os usuários e permite o estabelecimento
de uma conceitualização compartilhada entre usuários e o modelador. Acredita-se, portanto,
que a estratégia de usar um modelo específico como insumo para a tarefa de extensão do
IFLA LRM tende a gerar resultados mais adequados às necessidades dos usuários.
Observa-se que o modelo estendido prevê metadados que não podem ser transcritos
a partir de exemplares, tornando importante a participação de especialistas em música no
processo de catalogação dos recursos informacionais desta biblioteca digital. Os especialistas,
por exemplo, têm condições de preencher metadados como gênero musical e tom de uma
188 Capítulo 7. Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira

música por meio da análise do conteúdo musical. Esse enriquecimento dos metadados
permite a realização de consultas complexas envolvendo conceitos musicais.
De fato, o maior benefício da extensão do IFLA LRM para atender a um domínio
específico é a oferta de melhores consultas e melhor navegação no catálogo, além da
navegação entre as entidades OEMI, já provida originalmente pelo modelo IFLA LRM,
tais como as consultas e navegações previstas no início deste capítulo:

a) obter todas as letras de uma música (MPB-R13 OBRA [música] tem letra
OBRA [letra]);
b) encontrar as gravações das versões representativas de uma música (LRM-
R19 OBRA [música] tem versão representativa EXPRESSÃO [áudio], LRM-
R3 EXPRESSÃO [áudio] é incorporada em MANIFESTAÇÃO e LRM-R4
MANIFESTAÇÃO é exemplificada por ITEM );
c) obter todas as gravações de uma música para um gênero específico (LRM-R2
OBRA [música] é realizada por EXPRESSÃO [áudio], MPB-R16 EXPRESSÃO
[áudio] representa GÊNERO MUSICAL, LRM-R3 EXPRESSÃO [áudio] é in-
corporada em MANIFESTAÇÃO e LRM-R4 MANIFESTAÇÃO é exemplificada
por ITEM );
d) encontrar partituras de uma música para um conjunto de instrumentos musi-
cais (LRM-R2 OBRA [música] é realizada por EXPRESSÃO [música escrita],
LRM-E3-A8 Meio de performance, LRM-R3 EXPRESSÃO [música escrita] é in-
corporada em MANIFESTAÇÃO e LRM-R4 MANIFESTAÇÃO é exemplificada
por ITEM );
e) listar os músicos e meios de performance utilizados por cada um em uma grava-
ção (MPB-R21 EXPRESSÃO [áudio] foi interpretada por PERFORMANCE
INDIVIDUAL, MPB-R20 PESSOA interpretou em PERFORMANCE INDIVI-
DUAL e MPB-E3-A1 Meio de performance);
f) selecionar gravações de performances de um grupo musical que ocorreram em
um dado intervalo de tempo (MPB-R4 EXPRESSÃO [áudio] foi interpretada
por AGENTE COLETIVO, MPB-R9 EXPRESSÃO [áudio] ocorreu em IN-
TERVALO DE TEMPO, LRM-R3 EXPRESSÃO [áudio] é incorporada em
MANIFESTAÇÃO e LRM-R4 MANIFESTAÇÃO é exemplificada por ITEM ); e
g) listar as performances ocorridas em um evento musical (MPB-R24 EXPRESSÃO
ocorreu em EVENTO MUSICAL).

Outras consultas complexas, não previstas originalmente, também foram atendidas


pelo modelo, por exemplo:
7.4. Discussão 189

a) apresentar a formação de uma banda no momento em que uma de suas per-


formances ocorreu (MPB-R23 MEMBRO DE GRUPO MUSICAL constitui
AGENTE COLETIVO, MPB-R22 PESSOA desempenha papel de MEMBRO
DE GRUPO MUSICAL, MPB-R11 MEMBRO DE GRUPO MUSICAL par-
ticipou durante INTERVALO DE TEMPO, MPB-R4 EXPRESSÃO [áudio]
foi interpretada por AGENTE COLETIVO e MPB-R9 EXPRESSÃO [áudio]
ocorreu em INTERVALO DE TEMPO); e
b) obter a letra de uma música partindo de uma versão instrumental (LRM-
R2 OBRA [música] é realizada por EXPRESSÃO [áudio, música escrita] e
MPB-R13 OBRA [música] tem letra OBRA [letra]).

Uma dificuldade enfrentada durante este experimento decorre da falta de expres-


sividade do subconjunto da linguagem EER utilizada pelo IFLA LRM, que não prevê a
existência de atributos de relacionamentos e de relacionamentos entre mais de duas entida-
des. Na notação tradicional de modelos EER, estes relacionamentos são representados na
forma de um losango (ELMASRI; NAVATHE, 2011, p. 223). Observa-se que as entidades
Performance Individual e Membro de Grupo Musical são, na verdade, relacionamentos.
Performance Individual é um relacionamento binário com o atributo LRM-E3-A1 Meio de
performance e a entidade Membro de Grupo Musical um relacionamento ternário com o
atributo LRM-E4-A1 Meio de performance. Caso o IFLA LRM utilizasse uma linguagem
mais expressiva, esses dois relacionamentos seriam candidatos a especializações dos rela-
cionamentos LRM-R6 EXPRESSÃO foi criada por AGENTE e LRM-R30 AGENTE é
membro de AGENTE COLETIVO respectivamente.
A partir da necessidade de restringir a atuação de um músico em uma banda
percebeu-se que o relacionamento LRM-R30 AGENTE é membro de AGENTE COLETIVO
nem sempre é definitivo. Diversos tipos de agentes coletivos (e. g., organizações sociais
em geral) não possuem os mesmos membros durante sua existência. Em vista disso, seria
interessante que, em uma possível evolução do IFLA LRM, esse relacionamento pudesse
se limitar a um Intervalo de Tempo. Entretanto, são previstos no IFLA LRM apenas
relacionamentos binários (i. e., entre apenas duas entidades), e caso dos atributos LRM-
E3-A1 Meio de performance e LRM-E4-A1 Meio de performance demonstra também a
necessidade de modelagem de atributos de relacionamentos. Sendo assim, uma futura
versão do IFLA LRM seria beneficiada pela possibilidade utilização de relacionamentos
entre mais de duas entidades e de atributos de relacionamentos.
Mesmo com algumas restrições relacionadas à expressividade da linguagem de
modelagem utilizada, o IFLA LRM foi capaz de acomodar conceitos específicos do domínio
da música popular brasileira e atender melhor às necessidades dos usuários, permitindo
uma navegação mais adequada e respondendo a consultas complexas. Bibliotecas digitais de
música brasileira suportadas pelo IFLA LRM parecem ser mais aderentes às necessidades
190 Capítulo 7. Aplicação do modelo IFLA LRM à música popular brasileira

dos usuários do que as estratégias convencionais que vem sendo utilizadas.


Neste experimento foi também demonstrada a utilidade do modelo conceitual de
representação como insumo para a adequação de modelos bibliográficos ao domínio da
música popular brasileira, ao prover uma formalização da percepção dos usuários em
relação ao conteúdo dos objetos informacionais.
191

Considerações Finais

Constata-se que o objetivo geral desta pesquisa de propor um modelo conceitual para
representação formal da música popular brasileira foi atingido por meio do cumprimento dos
objetivos específicos (OE). A música popular brasileira, objeto do modelo de representação,
foi caracterizada e estudada no Capítulo 2 (Música popular brasileira), atendendo ao
objetivo OE1 de identificar as características do domínio da música popular brasileira a ser
representado. No Capítulo 5 (Aplicação de modelos conceituais à representação musical),
foram estudadas e discutidas diversas iniciativas de representação de música amparadas
por modelos conceituais, assim como previsto no OE2 , e foi descrito no Capítulo 6 (Uma
proposta de modelo conceitual para a representação da música popular brasileira) o modelo
conceitual para a representação da música popular brasileira em linguagem OntoUML,
que satisfaz ao OE3 , terceiro e último objetivo específico.
Na Parte II (Referenciais teóricos), foram fornecidas diversas contribuições para a
área da Ciência da Informação, dentre as quais destacam-se:

a) os exemplos didáticos, no Capítulo 3 (Modelagem conceitual e ontologias),


elaborados pelo autor para explicar os temas: (i) linguagem específica de
domínio e linguagem independente de domínio; (ii) uso de ontologias para
interoperabilidade semântica entre bases de dados heterogêneas; (iii) níveis de
linguagem; e (iv) a linguagem OntoUML 2.0;
b) a discussão ao final do Capítulo 4 (Modelos conceituais da Biblioteconomia e
Museologia), onde: (i) foram feitas comparações entre os modelos LRM, CIDOC
CRM e FRBRoo; (ii) foram avaliadas vantagens e desvantagens atribuídas ao
nível de abstração apresentado por esses modelos, em especial pelo modelo
IFLA LRM; e (iii) discutiu-se o problema da delimitação de fronteiras entre as
entidades Obra e Expressão e sua consequência para a interoperabilidade entre
bases de dados;
c) a visão integrada, no Capítulo 5 (Aplicação de modelos conceituais à represen-
tação musical), de iniciativas que são exemplos práticos de uso dos modelos
conceituais FRBR, CIDOC CRM e FRBRoo, de diferentes maneiras e para
atender a tipos diversos de aplicações; e
d) na discussão ao final do Capítulo 5, a exemplificação do problema da delimi-
tação de fronteiras entre Obra e Expressão, percebido no contexto do projeto
DOREMUS.
192 Considerações Finais

Considera-se o modelo proposto como uma primeira versão de modelo conceitual


para representação formal da música popular brasileira, que deve ser validada junto a uma
comunidade de usuários especializados. Por ser um modelo conceitual, sua função primária
é o entendimento e a comunicação entre pessoas. Durante a investigação, foi percebido
por integrantes do grupo de pesquisa em bibliotecas digitais da Faculdade de Ciência da
Informação da Universidade de Brasília que o uso desse modelo para a análise do domínio
abordado facilita a identificação mais precisa dos seus conceitos.
Além de contribuir para a comunicação e a análise do domínio da música popular
brasileira, prevê-se outros possíveis usos para o modelo, tais como: (i) servir como base
conceitual para a aplicação de modelos conceituais bibliográficos ou museológicos existentes
ao domínio da música popular brasileira; (ii) a avaliação da adequabilidade de iniciativas
de organização da informação musical a este domínio; (iii) suportar o desenvolvimento de
ontologias de aplicação, modelos de representação da informação e perfis de metadados;
(iv) servir de conceitualização compartilhada para a integração semântica de fontes de
dados heterogêneas; (v) apoio à pesquisa e ao ensino de música popular brasileira; e (vi)
divulgação da abordagem de modelagem conceitual baseada em ontologia de fundamentação
nas áreas de organização e representação da informação e do conhecimento.
O uso do modelo como base conceitual para a aplicação de modelos conceituais
bibliográficos foi exemplificado no experimento descrito no Capítulo 7 (Aplicação do modelo
IFLA LRM à música popular brasileira). Além de exemplificar o uso do modelo conceitual
proposto, esse experimento é também um exemplo de extensão do modelo IFLA LRM.
Considera-se esse exemplo uma contribuição significante à área da Biblioteconomia, visto
que o modelo IFLA LRM é recente e não foi encontrado na literatura2 um experimento
semelhante. O método empregado nesse experimento também pode ser utilizado para
extensão do IFLA LRM em outras aplicações e outros domínios.
Ao final do Capítulo 7 foi feita uma discussão sobre o experimento na qual são
destacadas vantagens do uso do modelo conceitual, a saber: (i) o estabelecimento claro de
fronteiras entre obra e expressão no domínio abordado; (ii) maior facilidade na identificação
de conceitos importantes para os usuários; e (iii) o enriquecimento de metadados do modelo
IFLA LRM estendido, permitindo uma gama maior de consultas e melhor navegação
entre as entidades. Foram, ainda, relatadas algumas dificuldades enfrentadas durante o
experimento relacionadas à expressividade da modelagem EER, tal como utilizada pelo
modelo IFLA LRM, e sugeridas possíveis melhorias a futuras versões daquele modelo.
2
De acordo com pesquisas feitas pelo autor no mês de fevereiro de 2019 no Portal de Periódicos da
CAPES (http://www.periodicos.capes.gov.br) nos idiomas inglês e português sobre o modelo IFLA
LRM, sem restrição ao domínio musical. Foram feitas pesquisas por assunto, sem restrição de periódicos
ou bases de dados.
Considerações Finais 193

O modelo conceitual proposto foi elaborado com um olhar para a música popular
brasileira, no entanto vários conceitos identificados aparentam ser comuns a outras tradições
musicais. A adequação deste modelo a outros contextos musicais pode vir a ser objeto de
estudos futuros.
Dentre potenciais trabalhos futuros, o mais importante é a validação do modelo
junto a uma comunidade de músicos especialistas em música popular brasileira. Outros
trabalhos futuros, alguns já comentados na seção 6.8 (Discussão sobre o modelo), são: (i)
verificar adequação a outros gêneros de música popular brasileira, como o Funk Carioca e o
Rap Brasileiro; (ii) conferir se o modelo se adéqua à música folclórica brasileira e adicionar
conceitos concernentes a essa música, como danças, rituais, grupos étnicos, dentre outros;
(iii) implementar diversas melhorias no modelo, tais como a consideração de gradações de
proximidade entre gêneros musicais puros e entre versões de ideia musical, a verificação
da necessidade de modelagem de fases de um gênero musical, evolução da modelagem
relacionada à produção de publicações musicais e o endereçamento de questões relacionadas
à dimensão temporal; (iv) desenvolver um vocabulário RDF ou OWL para publicação
de dados na Web Semântica com base neste modelo conceitual; (v) fazer o alinhamento
com outros modelos, tais como o FRBRoo e a Music Ontology; e (vi) evoluir o estudo
sobre a natureza dos componentes musicais e sonoros das versões de ideia musical e das
características musicais e sonoras dos gêneros musicais puros.
Constatou-se que a questão cultural é mais percebida na parte do modelo referente
ao gênero musical. A exemplificação do uso da conceitualização do modelo para a repre-
sentação de um gênero musical poderia contribuir para o uso do modelo na pesquisa e
ensino de música.
Espera-se que o modelo proposto contribua para a melhoria da comunicação e
análise do domínio da música popular brasileira, considerando e respeitando nossa cultura
e tradições.
195

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Apêndices
209

APÊNDICE A – Diagrama OntoUML –


Ideia e produção musical
211

APÊNDICE B – Diagrama OntoUML –


Gênero musical
Anexos
215

ANEXO A – Aspectos demográficos


dos entrevistados por Silva (2017)
ANEXO A. Aspectos demográficos
216 dos entrevistados por Silva (2017)

ASPECTOS DEMOGRÁFICOS

Além das entrevistas, foram elaboradas fichas-síntese contendo o ID do participante,


idade, sumário do perfil e da experiência profissional, estilos preferenciais de músicas
brasileiras, conceito de música brasileira, identificação de quem faz a música brasileira,
classificação, metadados (atributos) das músicas que interpretaram, compuseram ou fizeram o
arranjo. Todo os conteúdos relevantes providos pelas entrevistas que não eram aproveitados
nessas fichas-síntese foram organizados em um documento de texto e classificados em
correspondência com o objetivo geral e específico desta pesquisa. Apresenta-se o cabeçalho das
fichas síntese contendo uma descrição do perfil de cada participante.

PARTICIPANTE 1 (P1)
Idade: 36
Sexo: masculino
Atuação profissional: pianista, tecladista
Experiência profissional: bandas de baile e de música gospel; acompanhamento de dupla sertaneja
Formação: curso técnico de Piano Popular; licenciatura em Música
Estilos preferenciais: Choro, Samba (exceto o Pagode), Forró (de Jacó do Bandolim e Luiz Gonzaga),
Bossa Nova, Música Popular Brasileira Instrumental (MPBI)

PARTICIPANTE 2 (P2)
Idade: 37
Sexo: masculino
Atuação profissional: pianista, professor
Experiência profissional: bandas de baile
Formação: curso técnico de Piano Popular
Estilos preferenciais: Música popular brasileira, Bossa Nova, MPBI

PARTICIPANTE 3 (P3)
Idade: 46
Sexo: masculino
Atuação profissional (atual): pianista, tecladista, arranjador, compositor, professor
Experiência profissional: banda de baile e de rock, gravações (CDs e trilhas sonoras), execução de
outros instrumentos (violão/ guitarra), shows
Formação: curso técnico de Piano Popular, cursos de verão, licenciatura e mestrado em Música
Estilos preferenciais: Samba, Bossa Nova, Baião, Música mineira.

PARTICIPANTE 4 (P4)
Idade: 43
Sexo: masculino
Atuação profissional: baterista/ percussionista, compositor, arranjador, produtor
Experiência profissional: bandas de baile e trios de forró, acompanhamento de relevantes artistas
(Dominguinhos; João Donato; Boca livre; Daniel Gonzaga [filho do Gonzaguinha]; Max Viana [filho
do Djavan]; e outros)
217

Formação: carteira profissional da Ordem dos Músicos


Estilo preferencial: Bossa Nova, Samba, Jazz Brasileiro

PARTICIPANTE 5 (P5)
Idade: 32
Sexo: masculino
Atuação profissional: pianista, compositor, arranjador, pesquisador
Experiência profissional: gravações (show, musicais, CDs autorais e outros), shows
Formação: aulas de piano popular, bacharel e mestrado em Música
Estilo preferencial: música popular brasileira

PARTICIPANTE 6 (P6)
Idade: 7x
Sexo: feminino
Atuação profissional: pianista, arranjadora, compositora, professora
Experiência profissional: apresentações públicas na infância (festas na escola) e em rádios, bandas de
baile, shows, gravações (CDs autorais e outros)
Formação: cursos de verão, bacharel e mestrado em Música
Estilo preferencial: Bossa Nova (Tom Jobim)

PARTICIPANTE 7 (P7)
Idade: 38
Sexo: masculino
Atuação profissional: guitarrista, violonista, cantor, regente, arranjador, compositor
Experiência profissional: bandas de baile, regência de coro infantil, guitarrista acompanhador, músico
atuante de MPB, gravações (CD), show (violão e voz)
Formação: especialização em Regência
Estilo preferencial: Música mineira (Clube da Esquina; Milton Nascimento; Lô Borges; Beto Guedes;
Toninho Horta etc.)

PARTICIPANTE 8 (P8)
Idade: 32
Sexo: masculino
Atuação profissional: Violonista, guitarrista, arranjador, compositor, produtor
Experiência profissional: bandas de baile, gestor de empresa de músicos para eventos
Formação: curso técnico de Violão Popular, licenciatura e mestrado em Música
Estilo preferencial: música brasileira com improvisação – Bossa Nova e Samba

PARTICIPANTE 9 (P9)
Idade: 30
Sexo: masculino
Atuação profissional: compositor, professor
Experiência profissional: bandas de rock, rodas de choro, aulas e shows no Brasil e em outros países,
vice-diretor de escola de choro
Formação: licenciatura em Música
Estilo preferencial: Choro

PARTICIPANTE 10 (P10)
Idade: 32
Sexo: masculino: masculino
Atuação profissional: violonista, cantor, compositor
ANEXO A. Aspectos demográficos
218 dos entrevistados por Silva (2017)
Experiência profissional: bandas diversas e de música gospel, participação em festivais nacionais de
música; Cursos avulsos
Formação: revistas de MPB e songbooks, licenciatura e mestrado em Música, cursos avulsos
Estilo preferencial: música instrumental brasileira, canções de Caetano Veloso (até na fase dos anos
de 1980), Djavan, Lenine, Chico César, Gilberto Gil – músicas com muita síncope, letra poética e
violão percussivo

PARTICIPANTE 11 (P11)
Idade: 31
Sexo: feminino
Atuação profissional: pianista; compositora; arranjadora; produtora
Experiência profissional: participação em grupos com composições próprias, shows, atendimento a
encomendas de arranjos
Formação: curso técnico de Piano Popular, cursos de verão, licenciatura em Música (Brasil) e mestrado
em Composição e Arranjo (EUA)
Estilo preferencial: MPBI

PARTICIPANTE 12 (P12)
Idade: 42
Sexo: masculino
Atuação profissional: violonista, arranjador, produtor, professor
Experiência profissional: membro de vários grupos musicais, gravações (aprox. 300), dono de escola
de música e de estúdio de gravação, diretor de música em igrejas
Formação: --- (não informou)
Estilo preferencial: Jazz brasileiro, Bossa Nova

PARTICIPANTE 13 (P13)
Idade: 39
Sexo: masculino
Atuação profissional: pianista, compositor, professor
Experiência profissional: bandas de baile, apresentações em rádios, participações em gravações de
outros artistas
Formação: bacharel em Composição, mestrado em Música
Estilo preferencial: música popular brasileira com temas e improvisos

PARTICIPANTE 14 (P14)
Idade: 54
Sexo: feminino
Atuação profissional: cantora popular
Experiência profissional: grupos musicais, shows, bandas de baile e eventos
Formação: licenciatura e mestrado em Música
Estilo preferencial: MPB e Bossa Nova, músicas folclóricas e regionais

PARTICIPANTE 15 (P15)
Idade: 46
Sexo: masculino
Atuação profissional: baterista, produtor
Experiência profissional: bandas de fanfarra e de bailes, participação na gravação de mais de 100
CDs
Formação: conservatório de música, prática informal de MB (sem aprendizado formal)
219

Estilo preferencial: Samba, Frevo, Maracatu e outros

PARTICIPANTE 16 (P16)
Idade: 47
Sexo: masculino
Atuação profissional: contrabaixista, compositor, arranjador, produtor, professor
Experiência profissional: bandas de baile, big bands, shows, músico de estúdio, gravação de CDs
autorais e de outros artistas
Formação: licenciatura em Música (Brasil) e mestrado em Composição (EUA)
Estilo preferencial: Bossa Nova, Baião, Rock e outros

PARTICIPANTE 17 (P17)
Idade: 40
Sexo: masculino
Atuação profissional: gaitista, compositor, professor
Experiência profissional: gravações autorais e de outros artistas, rodas de choro, turnês internacionais,
shows, festivais nacionais de música brasileira, músico de estúdio
Formação: cursos de verão
Estilo preferencial: música instrumental brasileira

PARTICIPANTE 18 (P18)
Idade: 60
Sexo: masculino
Atuação profissional: violonista, arranjador, produtor, professor
Experiência profissional: produção de trilhas sonoras e sonorização para TV, composição de jingles,
acompanhamento de artistas relevantes (Martinho da Vila e outros), gravações autorais e de outros
artistas, músico de estúdio, direção musical
Formação: licenciatura em Música (Brasil), mestrado em Composição (EUA)
Estilo preferencial: MPB jazzístico

PARTICIPANTE 19 (P19)
Idade: 55
Sexo: masculino
Atuação profissional: contrabaixista, compositor, arranjador, letrista
Experiência profissional: bandas de baile, Rock, Choro, Samba e outras, gravações autorais
Formação: curso técnico de Violão Popular e Contrabaixo
Estilo preferencial: MPB (Djavan, Caetano Veloso, Gilberto Gil), música nordestina (Frevo, Baião)

PARTICIPANTE 20 (P20)
Idade: 50
Sexo: masculino
Atuação profissional: cantor, compositor, produtor, letrista
Experiência profissional: participação em festivais regionais (Nordeste), gravação coletâneas e
autorais, bandas de baile, participação em shows de outros artistas (abertura ou convidado especial)
Formação: --- (não informou)
Estilo preferencial: música popular brasileira (C. Buarque; C. Veloso), música mineira (M.
Nascimento; F. Venturini; Lô Borges), música popular maranhense, música popular antiga (Noel Rosa)

PARTICIPANTE 21 (P21)
Idade: 39
Sexo: masculino
ANEXO A. Aspectos demográficos
220 dos entrevistados por Silva (2017)
Atuação profissional: flautista, arranjador, produtor, professor
Experiência profissional: rodas de choro, shows, bandas de baile, participação em grupos de música
popular
Formação: bacharel em Música
Estilo preferencial: Choro

PARTICIPANTE 22 (P22)
Idade: 36
Sexo: feminino
Atuação profissional: cantora, compositora
Experiência profissional: gravações autorais e de outros artistas, participação em festivais nacionais de
música brasileira
Formação: curso técnico de Canto Lírico e de Violão Popular
Estilo preferencial: MPB
Fonte: Elaboração pela autora (2017)

Os vinte e dois especialistas selecionados por meio da amostragem “bola de neve”


possuem o seguinte perfil: (i) 18 participantes do sexo masculino e quatro do sexo feminino;
(ii) sete participantes são pianistas, seis são violonistas, três são cantores, dois são
contrabaixistas, dois são bateristas, um é flautista e um é gaitista. Destes, dois participantes são
pianistas e do sexo feminino e duas são cantoras. Além de todos serem intérpretes
(instrumentistas e cantores), vários são também compositores e arranjadores, alguns são
produtores musicais e outros já atuam como produtores fonográficos.
Algumas atividades detalham o perfil profissional, que são comuns ao universo da
pesquisa, no que diz respeito à trajetória:
(i) Participação em programas de rádio e televisão;
(ii) Inserção em bandas para atender aos bailes, às casas noturnas, aos restaurantes, aos hotéis
e aos eventos, como casamentos e aniversários;
(iii) Atuação como músico de estúdio, ou seja, são conhecidos no meio profissional pela
execução de um estilo (ou vários), e são convidados para gravar com vários músicos
locais, de outros estados e internacionais;
(iv) Participações em gravações de CDs ou trilhas sonoras de filmes com compositor,
arranjador ou intérprete;
(v) Gravações autorais nas quais assumem o papel de compositor e produtor musical;
(vi) Realização de arranjos por encomenda e também para seus trabalhos autorais;
(vii) Direção de shows de música brasileira;
(viii) Participação de festivais de música brasileira com composições próprias e com
premiação;
221

(ix) Participação como músico de bandas de artistas renomados e conhecidos nacional e


internacionalmente, de duplas sertanejas com certo prestígio, de música gospel, de
bandas de forró, rodas de choro, entre outras;
(x) Reconhecimento de prestígio com contemporâneos na linhagem de grandes
instrumentistas de música brasileira;
(xi) Donos de escolas de música e de estúdio de gravação;
(xii) Formação técnica no campo da música popular, especialização e mestrado internacionais
em música popular, dissertações concluídas em temas sobre a música popular brasileira
nas áreas de Musicologia e Educação Musical;
(xiii) Multinstrumentistas.

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