Voluntarios Do Martyrio
Voluntarios Do Martyrio
Voluntarios Do Martyrio
B2 852 401
S
VOLUNTARIO DO MARTYRIO
S
PELO
DR . ANGELO DOURADO
Coronel do exercito libertador
1896
TYPOGRAPHIA A VAPOR DA LIVRARIA AMERICANA
PELOTAS
1
7029 J
LOAN STACK
O que ahi vai não é a historia do esforço popular rio-gran-
dense contra o poder esmagador que tentou asphixial-o. E cedo *
ainda para escrever- se essa historia. A tinta em que deve-se mer-
gulhar a penna de fogo para escrevel-a deve ser de justiça, e para
isso é precizo tempo. Preciza-se estudar cada facto nas suas origens,
cada homem nos seus desejos.
Quem escrever essa historia, indagando a genese de todos estas
descalabros, se não conseguir accordar o paiz indicando o declive
rapido que o leva á destruição, conseguirá muito no futuro da hu-
manidade escrevendo a Biblia exacta de um povo que desappareceu
no interesse dos que se apregoavam de Messias da liberdade, da igual-
dade, da fraternidade, da ordem e progresso.
O que escrevo é a impressão da occasi , narrada a quem,
como eu, soffria, a quem teve tanto amor á causa que defendo que
se votou á mizeria, ás privações para não exigir de mim um acto
que me deshonrava , qual seria quietar-me emquanto os companheiros
que eu incitára á lucta morriam e soffriam. Esse acto de resigna-
ção- santificou-a para mim, fel-a martyr voluntaria. Nada modi-
fiquei nas impressões que sentia então e escrevia.
Seria tirar d'estas narrativas, o unico merecimento : a narra-
ção dos factos sob a impressão do momento. Não é portanto um
livro meditado, é um jornal de impressões. O que ahi está será
comprehendido pelos que commigo luctavam e pelos que luctavam
contra nós nos campos de batalha.
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Era um conversar alegre, um estimulo para o progresso, e as
calhandras nos galhos do molhe ou do umbú applaudiam ás garga-
lhadas com uma melodia terna que adormece o espirito nas quen-
tes horas do dia .
Nunca um caçador interrompeu- lhes os cantares.
De repente aquelles homens levantaram-se sobresaltados e su-
miram-se. Não se via na campanha senão grupos que fugiam para
as bandas do sul. Onde iam elles ? porque abandonavam os pagos,
a casa que os vio nascer, ou que elles fizeram para verem nascer
os filhos ? Depois chegaram vultos estranhos.
A alegria e os risos, mudaram- se em silencio e medo. De re-
pente ouviram gritos, lamentos, preces, depois um gemido rouco no
leito do estupro, um gargalhar satanico, mulheres que fugiam , cri-
anças que não comprehendiam o que aquillo era mesmo depois do
horror, e lá um gritava : Viva a legalidade ! Viva Julio de Castilhos !
Não raras vezes o incendio mandou ás nuvens sua torre de
fumo. Por toda parte o mesmo espectaculo, e na terra onde buscava-
se um abrigo para conservar a vida, a lei da neutralidade, servindo de
instrumento ao braço dos verdugos.
Para cumulo de tudo, em todos estes horrores, em todas es-
tas infamias o nome brazileiro arrastado na lama do despudor, des-
honrado, aviltado !
Aquelles que abandonaram os lares, a fortuna e sabiam- n'a
destruida, voltaram para reivindical- a . Aquelles que acima da for-
tuna collocam o nome da Patria, por que o homem que não tem
Patria digna é na vida um estrangeiro que só poderá viver soffren-
do ou fazendo soffrer, voltaram para com o sangue protestarem con-
tra os patricidas...
As aves fugiram, aquelles que ali estavam não eram os que pre-
paravam os campos d'onde as ceáras verdejantes exhalavam perfumes
que embalsamavam os ares, produziam os grãos de que ellas se
alimentavam ; estes deixavam sómente após si cadaveres insepul-
tos que apodreciam o ar.
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E' difficil triumphar uma revolução n'uma patria onde tudo se aquie-
ta. A lucta é desigual entre nós e o governo que se appoia nos
outros Estados.
Eu respondi-lhe : "
Eu não encaro uma revolução como as guerras inter-
nacionaes em que as batalhas decidem num momento o direito do
mais forte. A revolução é um protesto do povo contra seu governo .
Sou medico e medico de pobres, portanto tenho visto mais enfermos
do que os de meu tempo e comparo a nossa terra a um enfermo.
Qual a molestia ? A revolução . Qual a causa ? O Governo.
Pois bem, se a revolução é um conjuncto de simptomas, o me-
dico que quer combatel-o deixará morrer o seu doente por inanição.
A lucta do medico é com a origem da molestia, lucta da vida
com a morte da qual elle é apenas mediador. Se a causa triumpha
o doente morre. Assim é a nação onde o governo que irrita só tem
direito de viver dos restos da destruição.
-
Sabe que lhe estou querendo bem. Você está falando uma
linguagem que eu sinto cá em mim .
Emfim, lhe disse eu , o meu pensamento é este : se esses
homens que assassinam e roubam em nome da republica, persistem
em nos mandar matar, em vez de se levantar a bandeira da sepa-
ração do Rio Grande, como pensam uns poucos que julgam que a nação
é a culpada da perversidade do caracter de uns poucos rio gran-
denses, eu preferiria que se levantasse a bandeira da restauração
da monarchia.
A separação seria isolar do todo uma parte pequeña entre-
gando-a a todos os perigos . Separar-se o Rio Grande, seria consti-
tuir uma congregação de homens que pediriam elementos para a
lucta vendendo a alma ao Diabo. De mais, teriamos contra nós to-
dos os Estados do norte.
O Rio Grande, que muito tem recebido da nação , é por sua
vez o orgulho d'ella porque ; é o Rio Grande o que recebe os pri-
meiros combates do inimigo : é a nossa guerrilha da vanguarda.
Não ha um rio - grandense que viage pelo norte que não conhece
quanto todos os brazileiros amam aos rio - grandenses.
Separal- o será converter esse amor em raiva .
Se a republica continua a ser assassina do Brazil, está com-
mettendo um suicidio ; portanto, para salvar a Patria só teriamos a
restauração da monarchia, ainda que nos viesse um Belzebuth , com
tanto que a unificasse sem sahir da lei .
Qual separação, amigo ! você não sabe o que é um paiz pe-
queno : é o mesmo que viver no meio da campanha cercado de ini-
migos. Vamos luctar pela republica. O Brazil póde ser grande ainda .
-
Sim, lhe respondi, mas para salvar a republica será preci-
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E nós corriamos . Era a perseguição louca do caçador á presa
que lhe foge. Eu não via meu rosto, mas pelo que se passava em
mim, calculo que estaria triste a causar dó.
Alguns se occultavam nas cazas, eu me approximava para
impedir as buscas.
Em uma d'ellas vi toda tremula e chorosa uma pobre moça ;
animci-a e ella chamou- me para dar-me uma chicara de café e
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que eu seguia em busca dos que era preciso fazer vivêr, o mesmo
que horas antes seguiam os meus companheiros em busca dos que
era preciso matar.
Paes de filhos que precisam de educação , esposos que traziam
n'alma o retrato das esposas, filhos unico amparo da decrepitude de
seus paes, irmãos unico sustentaculo do pudor de suas irmãs, que
viam fugir a vida n'esta luta cruel, n'este capricho insano dos par-
venus na desgraça de nossa Patria.
Um dia antes haviam passado por ali , alguns ufanos, sem se
lembrarem que eram instrumento vil dos infames que para lucro e
goso proprio mandam destruir a Patria ; outros obrigados, sentindo
o sopro da morte perto de si e sem coragem para fugirem d'ella. "
Cobardia ! A morte que elles inflingem aos que tentam de-
sertar é igual á que elles iam ter no campo da batalha, mas
ficar-lhes-ia a honra de terem morrido por não terem querido ser-
vir de algozes de sua Paria.
Quando ali passaram iam em festa, sabiam que eramos poucos
e desarmados, e a nossa posição má ; mas o que pódem praticar os
que entram em luta contra os governos que roubam, deshonram e
matam, nem Leonidas seria capaz de imaginar.
Depois, por ali passaram fugitivos, e os que elles pensavam
matar vinham -lhes no encalço tão proximos como um vento de des-
graça que sibilla nos ouvidos ; e os cavallos que cançavam ou mor-
riam deixavam que os cavalleiros fossem colhidos, para seus cada-
veres servirem-me de signal, na busca dos acampamentos.
Que triste cousa é passar-se sósinho á noite, á triste luz do
luar por um campo de batalha ! Que desolação ! que prostração do
espirito que negação d'essa civilisação hypocrita, quando esse cam-
po de batalha é o torrão sagrado da Patria que nossos avós crea-
ram, que nossos paes honra: am, e que nossos irmãos escravisaram !
Ali estão cobertos de sangue os cadaveres das victimas ! Os
olhos amortecidos mal reflectem os raios diffusos da lua. Parecem
almas que morrem , almas criminosas que arrependem-se tardiamente
ante a hediondez do crime que commetteram .
Pobres O que vos trouxe aqui ? - A idéa , dirieis vós.
Que idéas tinheis ? Será idéa que nobilite seguir- se o vilão
ambicioso que vende a dignidade propria a trôco das migalhas do
que hontem o enxotou e a quem chamou de - tres vezes trai-
dor ?
Do miseravel que esquecendo- se do nome heroico de sua ter-
ra , percursora da liberdade brazileira, mata-a como Herodes matara
Baptista, para ser agradavel á sua amante ?
Pobres ! Vossos cadaveres mudos, inertes, regelados , parecem
reviver, e n'esse quadro lugubre que representará esta phase negra
da Patria onde um punhado de martyres procura desfazer a nuvem
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vive lutando porque a vida é sempre uma luta, seja qual for o in-
dividuo, seja qual for o meio onde vegete ; segrega muitas vezes a
fina seda de que os homens se vestem e com que se ostentam . Esse
luxo alheio, esse ostentar de riquezas só é obtido com a morte do
productor que não progredirá , não podendo multiplicar-se ; mas se
não o matam para aproveitar a seda, se a fecundação chega a seu
termo, ella rompe o casulo, desdobra as azas , busca o espaço , vôa,
deixa a semente que tinha em si e myriades de larvas em pouco en-
chem o espaço de bellas borboletas. O homem é como a larva. Conti-
do no casulo elle vegeta, segregando a força de que outros se apro-
veitam e se engrandecem, e n'esse engrandecer esmaga-o ; chega po-
rem a epocha da resistencia, da luta em terreno definido, luta de vida
contra vida, e apparecem homens como os que acabamos de ver ; o envolu-
cro que conservava os outros na timidez, rompe- se. O enthusiasmo da-
The azas, voa, corre, não pensa no perigo. O que poderia ver na
luta ? Uma ameaça á vida ? Mas o que é a vida para o homem que
se eleva acima de si mesmo ? Para a alma cavalheiresca que se
esquece de si para pensar no futuro da Patria, que é o da familia ?
O que é a vida para aquelles em quem viver é ser livre, é
ter vontade, é ter direitos ? E' ver essa vontade respeitada, esse
direito garantido ?
Quando lhes mentem, quando lhes poem tropeço á vontade,
quando lhes roubam o direito, que hão de fazer senão lutar ?
Lutar até que se comprehenda que elles conhecem que lhe
roubam os seus direitos, e os restituam, ou até morrer.
A morte é a liberdade para quem não pode viver escravo.
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Só uma mulher ficou ali e nos dizia : que tinha ficado, porque
preferia nos vêr, a ir morrer de frio no matto e que afinal os outros
é que eram máus porque prendiam, açoitavam e matavam , e que
nós passamos sem nada fazer, sem arrombar uma casa .
Aconselhei-a que fosse ao matto, que não era longe , chamar
aquella pobre gente para suas casas.
Antes de me retirar já elles começavam a apparecer. No ce-
miterio do lugar ha um carneiro feito ha pouco tempo, onde por uni-
co ornamento ostenta-se com todas as suas cores e bem desenhado
o antigo emblema do Brazil com a coroa imperial.
O que ali está, dizem, vendo os horrores que se praticava
em nome da republica, se enfermára e conhecendo que ia morrer,
ordenára que lhe pintassen no tumulo as armas do imperio.
os enredos patrioticos dos dramas que elle compunha para serem re-
citados pelos seus seminaristas e canta-me os hymnos, verso e mu-
sica d'elle, num extremo de patriotismo, onde só se ouve esta palavra
unisona :
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Brazil, Brazil. „
Apesar das idéas que predominam sobre o homem, senão fô-
ra morto esse bom brazileiro, em vista dos seus actos, em vista da
sua boa vontade por nossa terra, em vista dessa hecatombe que
nos vae destruindo , eu iria a esse apostolo sagrado das crenças abs-
tractas, d'esse brazileiro digno , pedir de joelhos que fosse meu amigo.
Tinha dois fins : por ti , minha pobre amiga, seguindo todos os tran-
ses de tuas crenças, tendo por fin chegar ao ultimo ponto de uma
crença consolidada nos representantes das grandes autoridades. Por
mim, como homem , como revolucionario, buscando os representantes
do martyr da humanidade e dizendo -lhe : O esforço d'Elle nada va-
leu, o grande reformador em balde morreu sobre a cruz, porque nós
aqui estamos como os velhos hebreus morrendo n'esse deserto da
justiça que nos anniquilla e que fará desapparecer um por um todos
os que sonham com a igualdade e com a fraternidade humanas.
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Os generaes Salgado e Gomercindo resolveram mandar em-
baixada ao Desterro. Salgado vai mandar o Dr. Carvalho, Gomer-
cindo o Dr. Arthur Maciel.
Gomercindo como sempre, veio à minha barraca de passagem ,
e disse-me o que se tinha resolvido. Sá e Gusmão insistiram para
que elle tomasse um pouco de café, o que acceitou.
Falando-me sobre a embaixada respondi-lhe : que achava incon-
veniente. Que estavamos na fronteira onde não tinhamos outro
remedio senão passar ao Estado de Santa Catharina.
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1º. de Novembro..........
Como está triste o dia ! Uma chuva miùda, que apenas nos
molha a barba e as botas, e torna lamacento o terreno, no estreito trilho
que temos de percorrer flanqueando os serros, em busca das barracas
onde se abrigam os enfermos . Parece-me que o dia de hoje foi de-
signado pela fatalidade para representar o estado de nossas almas.
Tú, em terra estranha, longe de mim, longe dos teus, tendo em torno
de ti nossos filhinhos, unicos objectos de nossas esperanças e de nos-
sas apprehensões, julgando-os, talvez orphãos sem o arrimo do pae,
que os idolatra, e que para elles hoje só conta com a tua santa
guarda !
Que luta para ti, o pensar que esses thesouros, unicos que
te dei, n'esta epocha em que vivemos em meio de todas as corrup ·
ções, de todo despudor, do anniquilamento do caracter de um povo
que tende a desapparecer forçosamente, se n'um acto de desespero
não se votar a um sacrificio ingente, a um martyrio inaudito, porem.
transitorio, para fugir do martyrio lento, longo, anniquilador !
Como elles te beijarão hoje e tu como estarás triste !
Tu és a imagem d'esta Patria a quem cada affecto de um filho ,
cada prova de amor, cada affago, faz correr torrentes de lagrimas
dos que pertencem a esses devotados ! No dia de teus annos ver
correr sangue irmão ! Vêr abrir o templo dos sacrificios para o holo-
causto em honra da tyrannia !
Vêr um irmão, como o escravo matando ao seu irmão por or-
dem de um senhor ! Ver um irmão que luta, que morre, para, li-
bertando a patria, libertar da ignominia até aquelles que lhe vêm
trazer a morte ! Ver encharcar os campos de sangue, formado com
a seiva da patria , impellido por corações
corações formados
formados no seio de
uma mãe commum !
Que fazer ! Quando um povo cahe do seu pedestal, quando
a lei, a justiça, é o interesse de alguns sobre o direito de todos, as
festas nos lares só podem ser como a tua hoje ; o orvalho dos cam-
pos só pode ser como o que em pouco talvez derramaremos.
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A
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Ora Elle tem trinta e tres annos, Elle é bom, faz milagres como
propheta nenhum nunca fez ; quem poderá negar que Elle seja o Mes-
sias ? Como Elle defendeu a adultera ? Ali estava ella sentada na
porta, segue-o por toda parte, parece que renasceu para a vida . Elle
disse se é lei que ella seja apedrejada, que se cumpra a lei, mas
que atire a primeira pedra o que nunca tiver peccado .
E ninguem atirou, e todos recolheram-se em si, e reconheceram
que todos temos culpas que é preciso corrigir ; que é preciso implo-
rar o perdão e perdoar.
Quem entre os rabbinos daria esta sentença ? Salomão não
daria igual , porque, se nenhuma daquellas mulheres , que disputavam
a criança, era mãe d'ella como poderia succeder, porque a criança era
roubada, certamente morreria e Salomão não lhe daria a vida ainda
mesmo que matasse as duas mulheres. Elle diz :
Não faças a outrem o que não queres que te façam a ti dá
a cada qual o que é seu . Maria sae do interior com José de Arima-
théa, fala de Jesus n'uma exaltação adorativa : " E' Elle, é o Salva-
dor ! Nunca vio expressão tão divina, nem tanta sabedoria, e tanta
modestia, mas Elle veio cedo de mais, já que não podia ter vindo antes.
A corrupção do povo hebreu, seus crimes, seus vicios, sua pusilla-
nimidade, sua doblez ante os potentados e este por sua vez diante
de Antipas que é escravo dos romanos. Como levantal-o ?
Quando um povo torna-se obsecado é surdo a toda palavra
pelo bem, é cego a todo o acto que seja util á communhão. Cada
qual procura para si, procurando destruir os fracos, vendendo- se aos
poderosos , que afinal fazem d'elle seus instrumentos para o anniqui-
lamento dos que lhe poderiam servir de obstaculo ; e ás vezes tam-
bem morrem ás mãos dos que ensinaram a matar, dos que, varridas
as consciencias pelo crime constante para poderem gosar, levam esse
goso até fazerem crer que o crime é uma virtude.
Tal é a historia d'essa Roma até Cezar que os opprime e
cuja sorte será tambem a de seus antecessores.
Si os decuriões sérvem-se dos soldados para matarem os Impe-
radores a fim de elegerem um que lhes seja propicio, ou accla-
mar um d'elles mesmo Imperador, os soldados por sua vez matarão
os decuriões para substituil-os tambem, e assim a força que se tor-
nou absoluta se anniquilará pela sua divisibilidade, pela ambição, pela
indisciplina, pelo crime.
Os povos bestialisados têm o mesmo fim. A traição e a cobiça
é que os dominam.
Hoje um denuncia a Antipas o seu proprio irmão para man-
dal-o matar. Amanhã um outro denuncial - o-á e elle terá a mesma
sorte.
E' d'isso que nasce a tyrannia sobre os povos ; é d'isso que
por sua vez nasce a sujeição dos tyraunos aos seus auxiliares; 9
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II
No portico de Bethsaida. O povo agglomerado pelas ruas atropella
para vel o passar. Grupos narram seus feitos, sua bondade. Em cada
grupo um velho procura nas prophecias a predição dos seus actos.
Um velho levou-lhe um burro para montar ; era a sua unica fortuna.
Elle bondoso como é, acceitou . Que lhe importa montar em um ani-
mal sem estar ajaezado, se com isso causa prazer áquelle pobre bo-
mem, que se exulta, por ter Elle, tão sabio, tão milagroso, baixado sobre
elle os seus olhos.
Não é isso, responde um outro ; Elle acceitou para que se
cumpra o que estava escripto. Outros narram como Elle multiplicou
o alimento e todos sahiam satisfeitos, porque o espirito d'elles se
confortava com a esperança de uma proxima redempção. Alguns
scribas procuram fazer desmerecer seus actos E' um charlatão,
um embusteiro, um prestidigitador.
--
Qual o seu lucro ; quanto ganha para isso ? perguntam-lhe.
Pode- se julgar mal de quem tudo faz em proveito dos outros, sem
descanço, sem lucros ?
Charlatães sois vós. Charlatães são os que se dizem executores
da lei, vendendo -a.
São os que dizem defendel-a encarcerando, matando aquelles
que clamam por justiça; estes sim, são charlatães, são embusteiros ,
só. veem o interesse pessoal e dos seus.
Exturquem ao povo o que é preciso para pagarem aos que
protegem os seus negocios.
Os que praticam o bem por abnegação, por amor á justiça ,
pelo desejo de que o homem deixe de ser opprimido, só têem um
fimé a salvação da familia. Loucos os chamareis vós, martyres os
chamaremos nós.
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III
hontem o ouvio, que lhe beijava as mãos, que o adorava, não o arre-
bata das mãos dos scribas?
-- Oh! o povo, diz Maria, o povo é sempre o mesmo no sof-
frimento. Arrancam-lhe tudo , suas crenças, sua garantia, sua paz,
o seu ouro, e elle bestialisado cala-se ou applaude e só quando o
latego do senhor cabe-lhe sobre os lombos, quando a dôr fustiga-o ,
elle se levanta . Muitas vezes heroico, altivo, elle sabe repellir
a affronta, sabe impor-se como a força nascida das grandes massas,
mas este heroismo, essa altivez , não salvam a victima, a punição
não attinge aos algozes, vai cahir sobre terceiros, muitas ve
zes tambem victimas inconscientes dos algozes mercenarios,
se o povo perde toda esperança de reparação, torna se cruel , inconve-
niente, capaz de tudo destruir para encontrar um só dos que o
fizeram soffrer. Oh muito fez e pediu, rogou, procurou levantar-lhe
o espirito, todos se quietavam .
Afinal, alguns empunharam as espadas, mas Elle appareceu e
mandou embainhal- as " Não derrameis sangue por mim, " disse.
Esses soldados são romanos, são pagos para obedecer, não é jus-
to que morram quando cumprem com o seu dever Elles não de-
vem pagar os crimes dos outros .
Buscais-me? perguntou. Eis-me aqui . Cumpra-se o que está
escripto.
Claudia retira-se sentindo aproximar- se Pilatos .
Es tù, bella hebrea, que vens á minha Casa ! Sinto que es-
te ambiente se perfuma como se aqui houvesse um jardim mais flo-
rido do que o de Semiramis.
E ' que tu encerras em ti o perfume de todas as flores .
Em Roma terias sido a rainha de Capua , aqui eu serei teu sør-
vo. Diz o que tu queres e eu o farei, se fores minha .
Na tua raça as mulheres são bellas , mas são tristes .
Alegra-te pois , joven e formosa ; todo o brilho do mundo se-
--
rá para te illuminar. Diz pois , Maria, que não continuas a ser
esquiva, que tua mocidade não se evaporará inutil , como o fumo
do incenso nas pyras de teus templos. Que a tua belleza não se
fanará sem fructo como a flôr do lothus .
Poncio, diz Maria, eu não vim aqui para te ouvir. Bem
sabes, que eu nunca te quiz ouvir em outras occasiões em que a
alma se abre ás lisonjas, por mais casta que ella seja, quanto mais
hoje que a minha se debate n'uma agonia mortal.
Vão sacrificar um justo, vão fazer desapparecer o primeiro que
teve coragem para com seus actos arrostar os crimes de um povo
vil e dissoluto . Este povo é o men, mas elle é filho d'esse povo.
Tu não és judeo, tu não tens direito a ter odios, porque nin-
guem te offende . A vida d'elle está em tuas mãos . Quererás tu
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IV
No Golgotha.
Maria junto ao sepulchro agradece a José de Arimathea o
ter por seu pedido obtido o Corpo de Christo para dar-lhe sepul-
tura. Josè responde- lhe que elle tambem o amava. Que nunca
mais sahirão do seu pensamento sua doutrina e seus conselhos . Os
discipulos vão apparecendo receiosos ; junto ao sepulchro ajoelham
e beijam a terra.
Vão-se dispersar, por que é preciso para não serem persegui-
dos, mas todos elles serão eternamente unidos pelo martyrio do Mes-
tre. Maria diz-lhe que agora é que sua obra começa, que a elles
compete propagal - a indo por toda parte, levando seus conselhos,
o seu exemplo. O que soffrerdes nada será em vista do que elle
soffreu. O martyrio vos santificará.
Os criminozos, os cobardes, os tyrannos inartyrisam , mas o sa-
crificio dos dignos abre os olhos aos bons adormecidos, que não po-
dem acceitar para si aquelles crimes, aquellas infamias, sanccionando-
as com o silencio . Comprehenderão a final que esse martyriologio
sò tem um fimo luxo, a riqueza, o dominio dos algozes. Deixa-
me gozar ou morres, dizem elles , porque nós somos os represen-
tantes da lei, que fizemos para nós, e por tanto devemos ser obede-
cidos. Porque não protestastes então? Tinheis medo ? Logo, sois
cobardes, e os cobardes são escravos. Porque clamais ?
Porventura não se vos deixa viver desde que só cuidais em
cultivar a terra sem levantardes os olhos sobre nós ? Que mais
quereis da nossa magnanimidade, se, tendo força para vos matar,
vos consentimos viver?
Se, podendo vs obrigar a trabalhar sò para nós, na nossa be-
nevolencia consentimos que tenhais um pouco do producto do vosso
trabalho? Querieis que nós tambem trabalhassemos? Quem cuida-
ria da vossa felicidade? Mal agradecidos ! Tendo a fortuna publi-
ca, que nos fornece instrumentos para vossa ruina, as multidões que
nos applaudem em cada acto da nossa energia, não vos destruimos
no corpo, e vós vindes perturbar o nosso socego ; por tanto sereis
punidos. Não vos importeis, irmãos, diz Maria, dirigindo- se aos
discipulos ; quando a alma é forte e animada pelo bem e pela ver-
dade o corpo não sente o martyrio. Quem morre n'essa luta morre
immortal. Hoje são poucos, suas palavras, porem, germinarão em
todas as almas boas e o triumpho será certo amanhã ; ide. Se
nas portas dos palacios os mastins vos mostrarem os dentes,
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sempre irreparavel por mais delicada que seja a soldadura, que lhe
queiram dar.
Um povo que não está educado, para dirigir-se por si mesmo,
precisa de guias , directores, que sejam bons e honestos, como os
menores precisam de um tutor, para que, quando cheguem à maio-
ridade, nem só tenham tido uma educação capaz para se dirigirem ,
como encontrarão a fortuna augmentada e com intelligencia e tra-
balho poderão fazel-a crescer.
Se é máo o tutor, o orphão serà abandonado a todos os seus
instinctos e na maioridade, nada encontrando, seguirá o caminho, que,
fatalmente, leva- o ao presidio.
Assim é o povo ; dão-lhe tutores máos, que roubam, que o
maltratam . Afinal elle reluta. Vencedor, é horrivel o que acontecerá
depois , mas é preciso vencer, se não quizer transformar-se em besta.
O mais forte, ou o mais hypocrita será o seu chefe.
Tome-se um homem ignorante, porém forte, habituado a fazer-
se respeitar pela força; tome- se um cacique valent-, feroz, insensi-
vel às dores alheias, adornando - se com os dentes e os cabellos dos
inimigos ; tome-se um antigo senhor de escravos , calculando o tem-
po de vida dos seus escravisados emquanto baste, o que lhes darão
no trabalho, o lucro e os juros correspondentes ao capital empregado
e diga-se a qualquer d'elles :
„ Este povo é ignoraute e docil, fazei d'elle o que quizerdes ,
governai porque sois o mais forte ,, O primeiro governal -o -á a pau ,
o cacique á faca e o economico fazendeiro mandará os feitores que
o exterminem, comtanto que o trabalho d'elle dê para si e
seus amigos.
Dando-se mesmo o caso de que o homem que tenha de governar
este povo, segundo seu modo de pensar e não segundo as necessi-
dades que o habito e costumes d'elle exigem, esse homem ainda
mesmo que seja bom, intelligente e illustrado, nada conseguirá. Será
como o inglez a educar africanos explicando-lhes os deveres n'uma
lingua que elles nunca ouviram. O resultado de tudo isto é sempre
negativo.
O que é certo , porém, é que o povo perde seus antigos
costumes e o governo o seu programma apregoado.
Tornado incerto o exito, a surpresa, muitas vezes assombrosa,
é o resultado.
Chateaubriand nas suas viagens na America, diz ter encontrado
um francez que ensinava a dansar : En avant, mrs. les sauvages ,
maintenant vous, mes dames les sauvagesses ; e tocava flauta e os
selvagens dansavam.
Chateaubriand, sempre delicado no seu estylo , não nos diz
como eram executadas aquellas dansas.
Mas, se a graça da dansa de salão é o movimento das roupas,
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plantado, por mares nunca d'antes navegados " voavam como ousadas
gaivotas em busca de portos em terras ignotas, onde o nome luzita-
no tornaram sublimado.
Na praia a que aportavam erguiam um solar e em breve uma
familia ali edificavam ; viviam para a guerra, mas ali no lar, as sãs
ideias, a honra somente fecundavam. Portugal, ó grande creador,
se o tempo tudo gasta, tudo destroe e consome , na vasta zona que
aquece o sol do Equador, os seculos não poderão destruir nem tua
raça , nem teu nome.
Eu amo teu povo ingente, como emblema do passado , d'essas
raças nobres, heroicas de força e honra formadas. Tua historia é
um poema, que devia ser cantado na agonia torpe das raças desna-
turadas. Emquanto a minha Patria guardava a tradição das tuas leis,
dos teus costumes , gosavam meus irmãos de paz . Na hora da afflic-
ção de uns, todos se erguiam, como provou-se um dia em que os
filhos do sul viram seus lares invadidos pelo estrangeiro e os filhos
do norte bradaram o insulto é feito ao povo brazileiro.
Um outro canta os versos de Tasso e Dante, lembrando -se da
patria, então humilhada ; mas o brio, a vontade, o batalhar constante,
libertou-a dos tyrannos, tornou- a respeitada.
Mazzini, Garibaldi, o rei cavalheiro, deixando o amor proprio,
que a politica gerou, unidos como um homem, como um só guerreiro,
que as armas empunhando, a Italia unificou.
Ali vae o hespanhol ardente e folgasão, tangendo a guitarra,
bailando sobre a vaga, quer sopre briza fagueira, quer agite o oce-
ano o raiveso tufão, sorri pensando da patria, nas meigas plagas.
Os hollandezes meticulosos , pensam na terra creada pelo esfor-
ço herculeo dos avòs. Filhos do mar, nasceram como a alga e como
os diques, que fizeram, elles lá vivem sós .
O' mar, quando eu te vejo, ora calmo e suave, como o desli-
sar da infancia , lembro-me do povo que docil e tranquillo dei-
xa-se dominar. Quando eu te vejo agitado, raivoso, lembro- me
d'esse povo de quem se abusára um dia, que ergue- se furioso para
vingar, affronta por affionta, insulto por insulto, os que na sua loucu-
ra julgaram que quem é docil e bom, é digno de ser escravo.
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7 de Dezembro.
Hoje o meu passeio foi mais prolongado á barra. Atei o meu
cavallo á cerca de uma casa de banhista, deshabitada e passei
longo tempo na area endurecida pela maré vasante.
A revolução ausentou d'aqui ate os navios mercantes ; nem
uma vela branqueia ao longe.
Que triste deserto é este mar ! Deserto como a minha pessoa
dos teus carinhos e dos de nossos filhos, hoje, e dentro em mim, o
espirito move-se, como estas aguas, e o pensamento agita-se, corren-
do ora para vós, ora para a Patria, como estas ondas que vêm, que
banham as areias da praia e recuam, para de novo voltarem. Ellas
serão eternas , e nòs ... Talvez este corpo que hoje produz a alma ,
que te dirige estas linhas , que prefere o soffrimento á quietação
condicional dos seres subordinados ás vontades alheias, amanhã já
não exista e nem ao menos meus filhos poderão saber o lugar em
que a bala fratricida privou -me da vida.
Ao entrar em casa encontrei reunida e alegre a familia de
Fonseca ; eu porém, não podia accompanhal-os, como sempre, n'a-
quella alegria intima das familias modestas e de limitadas ambições.
Dirigi-me para o gabinete d'elle e ali conservei-me.
Fonseca, além de sua bondade incomparavel, é um poeta que
sabe comprehender as dores alheias, como os que soffrem ; sabe sen-
tir, por isso deixa-me só, entregue ao meu pensamento, que agora
fecha os olhos ao presente, foge de pensar no futuro, mergulha- se
todo no passado, n'esse passado em que foste a parte integrante do
meu ser, a protogonista da minha existencia , a fonte unica dos
meus sonhos de futuro....
O mundo é isto .
O homem chega a um ponto em que é obrigado a pensar
I seriamente no futuro. Amanhã tem que entrar na vida real do tra-
balho , com responsabilidades e resultados immediatos ; sonhador, en-
cara- o e vê diante de si um horizonte vasto , sem limites , onde o
trabalho ha de dignifical-o, onde o esforço e a coragem, nas lutas in-
cruentas , lhe darà um dos primeiros lugares entre os seus confrades.
Parece que tudo está disposto ; mãos á obra e o resto ao futuro.
Mas elle sente que alguma cousa lhe falta . Marchar só, não é justo,
porque, para esse futuro, essa fortuna que tem ou que pensa ad-
quirir, para quem deixar? esse nome, que ambiciona , a quem o ha de
legar ? Pensa na próle, mas para isso precisa de uma companheira.
Procura com cautella ; pela primeira vez na vida, com calculo ;
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encontra afinal no seio de uma familia um ser que lhe agrada, por-
que reune em si os predicados que buscava. Amam-se, unem-se.
Leva- a consigo . Se a primeira noite que passa fóra do tecto paterno
vê-a chorar no sonho e desperta-a, tendo remorsos de leval-a para
longe, a ella tão criança, tão meiga , tão querida dos seus, resolve
a contrariar- se, a deixar de ser dos primeiros , onde pensa viver,
para şer dos segundos , onde ella vivia. Desperta-a e pergunta- lhe :
queres voltar ?
-- Não.
― Porque choravas, então ?
-Eu sonhava que via minha mãe enferma e por isso chorava.
E cercando-lhe a cabeça com os braços diz- lhe ao ouvido : -Eu sou
tua, eu te seguirei para onde quizeres . E elle sente- se orgulhoso
'd'esse amor, d'essa dedicação .
Ser amado por uma alma de anjo, que mais pode desejar o
homem ?
Vêm depois os filhos, fortes, robustos, bellos, sadios .
Para fazel - os felizes não precisa mais do que educal - os e
mostrar-lhes o caminho extenso a percorer n'uma patria de direitos
garantidos . Já os vê no futuro, n'essa luta do progresso, sem saltos ,
sem commoções -- Progredior.
De repente, sente que o horizonte da patria se obscurece ; não
imperará mais n'ella o trabalho, o esforço, o merito ; o que vae do-
minar é a força, é a surpresa, é a intriga, é a cilada, é a traição .
E essas calamidades são como os entozoarios - pullulam na
reproducção .
O que será, portanto, dos filhos por quem tanto sonhára ? o
que lhes esperará na patria, se ella não for digna, para que os
movimentos d'elles sejam voluntarios e methodicos ?
Tudo perdido ! A esposa embala nos joelhos o mais novo d'elles ,
tem oito dias de nascido apenas ; o esposo aconselha- lhe dar- lhe
o nome de Telemaco, ella sabe a lenda de Fenelon e por isso olha- o
surpresa. Os outros dormem, elle beija- os todos como de costume.
---- Onde vaes ? pergunta. Uma pequena viagem, voltarei breve ;
adeus.
Onde vae elle ? leva uma arma occulta, lagrimas nos olhos,
mas um raio de energica vontade no olhar. Vae aplanar o cami-
nho para os filhos, vae lutar pela Patria ; e luta, e soffre e não
sente o cansaço , nem as dores; mas á noite, quando todos dormem ,
o espirito toma azas e vôa. Para onde ? não sabe.
A esposa e os filhos dos proscriptos , dos que lutam contra a
tyrannia, não têem morada certa ; quem os ampara ? Talvez ninguem ,
talvez uma alma boa entre os extranhos, mas seja onde fôr que
estejam, a alma chega ali, vê- os, beija-os, consola-os, enche-os de
esperanças ....
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nosso lado, mas querer desde já criar partido official, é não vêr que
quem luta contra o Sr. Castilhos, appoiado pelo Sr. Floriano, lutará
contra quem quer que seja que queira se oppor ou desviar a sua
vontade.
Alvaro ficou satisfeito e eu recommendei ainda que se esforce
para não envolverem o nome de seu pae nas discussões.
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que trabalha para falar bem a lingua da sua patria, do que milha
.
res d'esses philosophos que mandam matar em nome da religião
da humanidade.
O Itajahy, onde chegamos cêdo, estava abandonado ; apenas
avistamos nas ruas alguns individuos de calças com listas vermelhas,
que fugiram com a nossa approximação.
Disseram-me serem desertores de Pinheiro Machado. As for-
ças d'esse caudilho da legalidade que se achavam na margem, ha-
viam fugido em caminho de Blumenau acossadas pela artilheria do
brave commandante Moraes Ancora que, aproveitando-se da cres-
cente do rio, subio até o ponto em que ellas acampavam, não se
lembrando que uma vasante rapida poderia conservar seu navio ali
encalhado e que n'este caso a sua pequena tripulação seria victima
d'aquellas numerosas forças.
Moraes Ancora saltou no Itajahy e indo fazer um reconheci-
mento, encontrou cento e tantos cadaveres das forças inimigas que
ali ficaram insepultos, producto da batalha com Guerreiro.
Accompanhei Costa Mendes a uma chacara onde uma familia
nos offereceu café, e onde vi uma creança que haviam posto o nome
de Urano, para commemorar a bravura de seus tripulantes n'aquelle
feito sem par na historia.
Logo depois seguimos para S. Francisco, pequena cidade,
antigo emporio colonial. Ali reside o Dr. Abdon Baptista , filho da
Bahia, que, por seu caracter, intelligencia e trabalho, adquirio fortuna,
tornando-se um dos primeiros homens do Estado, tendo já sido
por mais de uma vez, no Imperio, sua primeira autoridade e è
idolatrado pela colonia allemã.
Ali acha-se tambem o Dr. João Gualberto, meu condiscipulo,
um dos mais dignos filhos da Escola de Medicina da Bahia.
Abdon é nosso companheiro ; Gualberto, nosso adversario, mas
a politica aqui é moderada, não leva a luta até o exterminio dos
contrarios.
A' bordo de um vapor encontrei o Dr. Gomes com a mulher
e filhos, todos da Bahia, que não quizeram ficar em Itajahy depois
da retirada das nossas forças. Declarou-me querer accompanhar-nos.
Perguntando eu á Sra. d'elle se annuia a isso, ella, com a
dignidade da esposa e mãe que sabe comprehender a situação de
nossa patria , respondeu-me que -— sim.
Falei a Abdon que providenciou sobre casa para accommo-
dal-o , e logo que essa accommodação seja concluida, Gomes seguirá
para junto de mim .
Ali ficou o general Laurentino com a sua brigada e eu segui
para Joinville n'uma pequena lancha por estar ali o quartel general
de Gomercindo, que se achava no cáes á nossa espera no acam-
pamento do velho Fulião.
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xe-me, ella mesma, um pouco de café com leite, com pão de centeio,
e crême de leite. Era domingo e ella havia vestido uma roupa me-
lhor, penteado os bastos cabellos castanhos ; parecia assim mais uma
senhora de cidade do que uma pobre colona . Fritz tinha ido
a mandado de Emiliano procurar o que lhe era preciso para seu
desempenho de cosinheiro que se preza e que queria que quando
viesse o Jaques Ourique ou outro, onde eu estava, encontrasse um
jantar digno de ser elogiado. Orgulho e ambição, unico de cozinheiro .
Tivemos de demorar aqui alguns dias á espera da exploração
da vanguarda.
A chuva continúa. Fritz cuida de suas vaccas e Maria, tal-
1 vez com receio de que lhe roubemos a cama ou o armario, conserva-
se em casa. Alguns companheiros vem ver- me e jogamos o solo.
Emiliano visita , os acampamentos e eu quando estou sò , leio ou
escrevo. Maria ensina- me algumas palavras allemas, e ri- se como
uma creança, ouvindo minha pronuncia, e repete-me muitas vezes até
que eu pronuncie bem . A'noite, depois de jantarmos, senta-se na
porta que sahe para a cozinha e com Fritz somma o que já devo .
A lousa ja está cheia de um lado e outro . Até a lenha está ali ,
mas só attinge a seis mil reis. Para não dar- lhes pezadelo de tan-
ta somma, dei- lhe vinte mil reis para pagar o que jà se devia e
para ir pagando o que se fosse gastando .
―
Sim senhor, disse ella . Deus permitta que fique aqui mui-
tos dias até gastar tudo ; e foi guardar os vinte mil reis n'uma cai-
xa que collocava no armario. À' noite chegou um emissario que tra-
zia noticia de que o inimigo estava na frente, entrincheirando -se.
Tivemos de marchar pela manhã. Emiliano dirigiu-se a Maria,
reclamando o troco.
-Não comprehendo, disse ella.
-O troco dos vinte mil reis que sô coronel deu hontem para
tirar os seis mil reis. Não comprehendo.
O dinheiro, o dinheiro, gritava elle no ouvido d'ella , e ao mes-
mo tempo fazia signal com os dedos . Não comprehendo .
Eu ria-me, vendo o esforço de Emiliano para se fazer compre-
hender e a impassibilidade d'ella em não querer comprehender.
Bem, disse eu, já estão marchando, vamos, toca a marchar, é
justo que elles cobrem o aluguel da casa.
Ouvio ? disse elle apertando -lhe a mão com physionomia sau-
dosa. O coronel disse que é o aluguel da casa .
Sim, sim ja ouvi, disse ella.
E despedindo- se de Fritz , este riu- se alegre e o Emiliano dis-
se com gravidade : E o ladrão ainda ri.
Ao despedir-me de Maria ella desejou- me felicidade na expedi-
ção, e que quando voltasse demorasse ali muitos dias .
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passando por cima, se é que seus destroços já não iam longe. Abri-
guei-me n'uma casa abandonada onde haviam outros revolucionarios
e nada havia para comer. Emiliano estava ali com uma cara de diabos.
Nada achara para comprar e o coronel nada comeria, tendo
almoçado mal .
O Emiliano pensava mais em si do que em mim, mas lamen-
tando por mim, mostrava dedicação. Que bom politico seria o Emi-
liano...
Dormi n'uma canoa velha e felizmente o pé não me encommodou.
A agua fria tirando o calor deu -lhe uma especie de insensibilidade.
Ao amanhecer soube que em uma pequena casa, tambem des-
habitada, achavam-se o general Jacques Ourique e o tenente- coronel
Gentil . Fui vel-os . Apezar de tudo , de toda esta vida que levamos ,
a minha natureza não se modifica, continúo a ser 0 homem que
procura ser amigo dos que lhe causam boa impressão. As desillusões
desde a infancia não me poderam destruir esta natureza, aqui neste
grande scenario de sacrificios ella se accentuou, por isso tomei por
Jacques Ourique uma verdadeira affeição, quasi que diria a elle
como o poeta .
Te voglio bene.
*
**
do. Mais de uma vez ouvi falar-se a seu respeito com insinuações
de cobardia . Tenho protestado contra isso. Argollo é brasileiro,
Argollo é bahiano. Argollo tem um nome heroico, a defender a pro
pagar, a idéa de cobardia é um absurdo.
Ha uma certa injustiça nos grupos das guerras civis , contra
os adversarios. Fugiram, dispararam ! Não se lembram que n'essas
forças ha irmãos que lutam contra irmãos e que a perversidade che-
gou ao ponto de que os prisioneiros não têm direito de vida ?
Não ha o abraço fraternal dos vencedores e vencidos ; não
ha as forcas caudinas que humilham officialmente, mas abraçam depo-
is. Ha esta lei dos que para viver precisam do deserto em torno
de si . Mata , dizem elles e o revolucionario triumphante busca
pôr em pratica a lei que elles decretam ! Vergonha de uma raça
que se anniquilla. Argollo é apenas o brasileiro que guarda o seu
sangue para as lutas nobres em defeza da Patria contra o estrangei-
ro, como o seu grande parente.
Sabia que iamos brigar, e isto não lhe agradava. Afinal marchei,
deixando a ambulancia ao cuidado de Emiliano. Ao chegarmos ao
ponto de onde se avistava o inimigo ficamos surpresos. As trinchei-
ras estavam abandonadas...
O terreno onde nos achavamos, muito ondulado, a pouco tempo
começara a ser desbravado. A estrada serpenteia, acompanhando os
declives . Uma roçada nova cheia de madeiras que o fogo não des-
truiu é o que temos diante de nós, terminando- se no matto ; alem, no
outro declive, está a villa de Tijucas. O caminho é um só, é a estra-
da de rodagem que elles estavam fazendo. Fugiram, diziam as forças
que vinham chegando emquanto os exploradores marchavam. Fugiu a
bahianada, sentiu a nossa catinga . La nos pagos amigos, no churrasco e
chimarrão o homem ganha almiscar que se sente longe... Me doia ver
que homens da mesma raça, da mesma familia se gloriavam ante provas
apparentes de cobardia de seus irmãos. Vamos a Villa tomar café,
e nada arranjaremos, nem um ponche, nem uma carabina , é preciso
dar- lhes caça .. vão levando nosso soldo.
Não pensem assim, dizia-lhes eu , esperem um pouco e tenham
cautela. A nossa exploração seguia pela estrada tortuosa como quem
vai a uma caçada ou a ceifa, entrava na bocca da mata cortada pela
estrada , justamente quando eu terminava a minha phrase ; esperem.
Na mata produzio -se um ruido igual á queda de uma arvore
gigantesca que vai levando comsigo as arvores menos fortes, presas
pelos sarmentos e esmagando as outras que lhe são subpostas , e afi-
nal ouvindo o som abafadiço da arvore quando se despedaça ao esten-
der- se no solo, eu disse: Que monstruoso pinheiro cahio ! mas os movi-
mentos dos nossos, os tiroteios das guerrilhas, e o sibilo das balas
que já passavam por nós, modificou a minha phrase: Estão brigando: ahi
estão os bahianos; cuidado e para diante: Tudo isto passou- se no cur-
to espaço de segundos.
No outro dia pela manhã foram operar outros em uma casa immun-
da. Eu não podia prival- o, porque, operado Grevy, ou todos tinham
de ficar ali, ou algum ficar sem medico. Meditei e vi que meus po-
bres companheiros não tinham cul, a do que se passava ; abandoral-os
seria peior para elles, e entre tantos sacrificios que mais era aquelle ?
uma gotta mais na taça da amargura... que devia tragar. Dirigi-me
para a casa onde operavam, e assumi o meu papel de medico de
.revolucionarios.
Os feridos precisavam assistencia . Parte das forças seguia
para Tijucas, outra para Lapa e ali, aquelle Kilometro 62 da Es-
trada D. Francisca, tornou- se o centro de todo movimento revolucio-
nario. Era d'ali que se devia registrar as marchas progressivas
das nossas columnas. Grevy parecia satisfeito, eu porem não o es-
tava. Conversava commigo o meu pobre amigo. Falou-me bem dos
medicos que o operaram, sentindo, porem, que não tivesse sido
eu o seu operador. Recommendava-me para não deixar perder o
seu pé, que não sabia onde o tinham enterrado. Queria leval- o
depois a sua mãezinha. E' o melhor presente que pode dar á uma
mãe rio grandense, um filho revolucionario , dizia elle. Depois ria-
se, lembrando-se do seu futuro emprego. Um invalido de muletas
vendendo pelas ruas : O Rio Grande, o seu jornal .
Estas impressões sobre o futuro doiam-me, porque só um acaso
poderia salval-o. O Major Nunes, commandante da infauteria, tam-
bem ali estava, e nos ajudava o capitão Roberto Silva que tinha
por Grevy a maior dedicação . Escrevi ao Dr. Abdon , em Joinville,
pedindo roupas e alimentos para os feridos . Devendo este pedido.
ser demorado, fui eu mesmo a S. Bento, a ex-capital provisoria do
general Argollo, procurar esses recursos. Infelizmente nada achei de
medicamentos . A casa do medico do lugar tinha sido aberta ę ti-
nham levantado todos os medicamentos e instrumentos . Encontrei so-
mente ali uma preparação para combater o veneno ophidico, e o nu-
mero de vidros cheios indicava ser bom o remedio.
Durante tres dias ouvimos os canhões fratricidas no seu rouco-
gemido em Tijucas. Nossas forças atacavam com energia, sobresa-
hindo-se como sempre os valentes marinheiros. O inimigo res stia com
bravura e tenacidade taes, que causava dó ver como n'esta luta sem
nome, sem interesse geral, se anniquillam vidas de que tanto a patria
precisa. Chamar- se de inimigos a irmãos que deviam juntos mar-
char para diante, ou pelo progresso moral da patria, ou para defen-
del- a, e aqui se destroem, se insultam, enfraquecendo a nação ,
deshonrando-a !
Emquanto em Tijucas morria o bravo capitão Mineiro, cortado
ao meio por uma bala de canhão, sobre o canhão a seu cargo . junto
de mim, morriam os dois officiaes operados e no outro dia, dia da
rendição do Tijucas, morria o infeliz Grevy, todos de septicemia . Tal é
-- 157
vantar ferro por isso não fui. Já em marcha, Emiliano veio dizer- me
que não tinha podido levar nem a cesta, nem os pratos e guardanapos
do João Gualberto. Roubaste, não ? Emiliano riu- se como quem dizia :
é um meio de termos estas cousas sem comprar.
Pela manhã começamos a ver esse esplendido panorama que
apresenta a serra do mar nas costas do Sul ; é a serra dos orgãos
por toda parte , sempre cobertas de nuvens brancas, brilhantes, sem-
pre azues, as gigantescas pyramides.
As oito da manhã chegamos em frente ao porto de Paranaguá
onde ha uma guarnição . Tendo de ir ali um official levar communi-
cações , eu fui tambem. Ali vi peças de bronze ainda com dragões
esculturados .
Vi tambem a casa da polvora e o reducto feitos na base do roche-
do , onde uma granada chocando-se, não deixarà de explodir .
Quando fizeram aquelle forte, não se lembraram que a arte de
matar chegaria ao ponto de descobrir as balas explozivas .
Ao meio dia chegamos a Paranaguá. Demoramos o dia quasi
todo , a espera de trem para nos transportar á Curitiba, e a final á
tarde marchamos. A estrada de ferro de Paranaguá á Curitiba, di-
zem, é uma maravilha da arte, mas nada pude ver porque os pon-
tos de obras notaveis foram transpostos á noite.
Chegamos á Curitiba á uma hora da manhã. Não sei se pela
hora ou se pelo cansaço , a cidade não me causou impresão agradavel.
Ia commigo o coronel Severino Brasil, adoentado. Procuramos o
hotel mais proximo a estação . Nem um conhecido apparecia para nos
guiar.
Estavam em um baile em casa do Dr. Doria, governador. Sa-
bendo que tarde, da noite chegaria um trem com revolucionarios
que não conheciam a cidade, e por parte do governo , ou da guar-
nição, não apparecesse na estação uma unica pessoa para ensinar- lhes
o caminho do lugar, onde se deviam alojar, causou- me pessima impressão.
Julgam talvez que tudo está terminado , que podem entrar na vida nor-
mal, e eu julgo que nada está feito ainda, e se estivesse terminado
essa terminação seria contra nòs .
O dono do hotel, Agostinho Leandro, deu-me um bom commodo.
Pertence ao partido adverso, mas parece-me um bom homem e estou
resolvido a não sahir de sua casa , emquanto aqui estiver.
Pela manhã tive a visita de Doria,que me veio dizer que tinha em
casa d'elle um lugar para mim , e que exige que eu acceite. Disse-lhe
que não é possivel. Que, de mais, sei que Laurentino Pinto lá está
hospedado com todo seu estado maior. Disse - me que junto aos apo-
sentos de sua familia ha um commodo occupado por seus filhos e
que ali pretende collocar-me. Respondi francamente, que não .
Que tinha pecessidade de trabalhar, que sou toda hora pro-
curado pelos companheiros, e demais uma familia separada do che-
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**
*
*
quando uma granada veio cahir a algumas braças de nós, fazendo ex-
plosão e os projectis passaram assobiando sobre nossas cabeças . Logo
depois outra que passou subindo por cima de nós e outra e outra.
A pontaria era certeira, corremos para diante, mas ao aproximarmo-
nos de um passo, uma chuva de balas ; ao passarmos por uma rua,
outra.
Felizmente nenhum de nós soffreu. Percorri o acampamento ,
vi os innumeros feridos dos bravos companheiros de Torquato . Vol-
tamos á noite e nos perdemos, e com receio de sahirmos nas posi-
ções inimigas, nos affastavamos e mais nos perdiamos . Depois avis.
tamos uma luz exquisita, como um pharol de muitas côres.
Approximamo- nos com cautela e afinal reconhecemos que estava-
mos no meio dos nossos, e um companheiro que havia retirado de
uma casa a tal lanterna de côres estava ali chiamando a attenção
dos sitiados para ver se elles teriam uma pontaria tão boa que que-
brasse a lanterna com uma bala de canhão ; esquecia- se que onde
elle estava a bala que quebrasse a lanterna ou mesmo que não
a quebrasse, matalo-hia. Cheguei ao meu acampamento á 1 hora da
manhã e achei o meu quarto fechado e um official que eu não co-
nhecia dormindo em minha cama.
Tive de dormir ao relento.
*
**
tenho escripto nos dois jornaes da terra ; n'um delles escrevi uma
especie de lenda sobre as desgraças da India, devidas á divisão do
seu povo por causa de ambições ; divisão que obrigou - a á ser domi-
nada por um punhado de estrangeiros . Creio, porem, que elles lêem
os meus contos indús, julgam ser uma historia para passar o tempo e
não se compenetram de que o que eu digo ter-se passado ha muitos
annos na India é o que se está passando entre nós, e que o resultado
será a nossa desgraça.
።
* *
Uma vez pordi-me nas mattas do Orobó. Veio a noite, sem que
eu podesse sahir na estrada . Era uma noite chuvosa e escura . Quanto
mais exforçava-me para encontrar o caminho, mais me perdia. Ouvia
sons que indicavam o movimento das atafonas, onde ralam a mandioca,
procurava aquella direcção e tudo silenciava ! eram as cantilenas dos
sapos que eu ouvia e elles se calavam com a minha approximação.
Voltava buscando orientar-me de novo, via uma clareira, luzes que
pareciam sahir pelas janellas de uma casa. Corria para lá e cahia
n'uma charneca enterraudo-me na lama até o pescoço. As luzes
que vira eram dos pyrilampos, a clareira a charneca. Afinal, exte-
nuado, pouco importando-me que os queixadas e os tigres que lhes
seguem sempre, me viessem sorprehender, adormeci recostado a
uma arvore. Pela manhã os meus rapazes encontraram-me . Me ha-
viam buscado toda noite, mas eu não os ouvia e elles não me viam .
Entretanto mais de uma vez eu tinha passado pela estrada que busca-
va, sem reconhecel- a porque a noite não me deixava ver a trilha
feita no solo pelos pés dos transeuntes, unica cousa que indica a
direcção que deve seguir o caminhante. Assim estamos nós. Mais de
uma vez tivemos em nossas mãos a victoria, sem nos aproveitarmos
d'ella. Mais de uma vez tomamos as apparencias pela realidade,
afinal tivemos que resignarmo-nos á nossa sorte, sem nos importar
com o triumpho .
Mas se os tigres e os queixadas me pouparam n'aquella noi-
te tormentosa, os homens da legalidade não pouparão os que , des-
apercebidos, cheguem ao alcance delles. Mas morrerão lutando . Ou-
tros morreram n'um afago, n'um abraço com um punhal nas costas
como em Piratiny depois que confiamos nas palavras do Sr. Arthur
Oscar, em Bagè .
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14
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radores, seguindo uma vida mais regular do que tiveram, tendo cada
dia uma licção da experiencia paterna, vivendo porem sem sobre-
saltos, nem apprehensões, porque a lei do paiz é que os governa, por-
que essa lei é a arma de todos, é a fortaleza onde se abrigam, e
não é como hoje a arma com que matam a uns para que os outros
se possam perpetuar. Lei para o bem dos scelerados, dos assassi-
nos, que para gozarem matam aos que os chamam de vendilhões
da patria, que assassinam para roubar. Esse paiz chama-se o futu-
}
ro. E se esse toque de alvorada annuncia que apenas as nuvens
se mostrem no espaço, coradas pelos raios que o sol de longe lhes
envia, cono flores que a atmosphera cria nos jardins do ceo , a
luta começará, talvez a vida vai chegar ao termo, o toque de al-
vorada é ainda um estimalo para os que lutam pelo dever de ci-
dadãos contra os que lutam pela obediencia aos senhores.
O toque de silencio , porem, n'um acampamento é lugubre. Do
quartel general é que elle parte como uma ordem absoluta para
que cesse o rumor, a agitação ; nos corpos, se repote a ordem, o
mais proximo ouvio primeiro e primeiro responde ; depois outro, outro
até o ultimo, o que està mais longe. As notas d'essa muzica, gra-
ves , prolongadas, imitam o som difuso do vento que passa pelas
grutas, ou se perdem nas folhagens das florestas virgens, gemebun-
das nas vibrações produzidas pelo contacto com os troncos annosos.
E se esse silencio é ordenado por esse toque melancholico a
um punhado de homens que hontem cheios de esperanças, ardendo
no desejo da luta pela causa santa, só pensavam na victoria, e hoje
já sem contar com as victorias brilhantes, só pensam na luta pela
defeza da vida, só pensam na vida para poderem lutar até o fim.
Se o toque de silencio sôa no meio dos pinheiraes, onde esses
valentes repousam como sombras que o luar limpido, magestoso que
a lua no seu trajecto, por um espaço sem nuvens, projecta filtran-
do sua luz por entre os galhos dos pinheiros, esse toque tem melancho-
lias que não se pode comprehender ; produz sensações que pare .
cem fugir a perceptibilidade dos sentidos. O corpo repousa ; mas
o espirito que parece querer evolar-se, não vai mais longe do que
onde termina a zona em que as ultimas notas se perdem. E a ul-
tima nota de um clarim, prolongada pela ultima do mais proximo ,
esta pela do vizinho e assim consecutivamente até á ultima vibra-
ção mais longinqua, assemelha - se a alguma cousa que a arte não
pode exprimir, mas que a nossa imaginação figura aquelles sons
continuos com que os pagés accordavam o espirito dos seus para
a luta, fazendo com que os ventos passassem pelos canaes subterra-
neos que era a voz de Tupán ordenando a Guerra, com que os
gaulezes accordavam nas florestas druidicas o animo dos seus em
nome de Theutatés. Mas ai ! essa luta foi improficua. Os selvicolas
desappareceram em nome da civilisação e a civllisação só teve para
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fabricam não chegou para a gente que passára antes, de modo que
tivemos de mandar distante comprar algumas garrafas. A mulher
do telegraphista de Palma, que é tambem telegraphista e se com-
promettera em nosso favor, fugiu e veio esconder- se aqui onde en-
controu-se com o marido que estava em Ponta Grossa e veio com-
nosco.
Não a vi ; ella porem escreveu me e mandou- me alguns biscoitos
e mel. A' tarde fomos pescar em um poço fundo ; uma bomba de dy-
namite nos fez recolher oitenta e dois peixes que poucos aprecia-
ram, mas que o Emiliano preparou um de modo que offereceu-
me magnifica ceia, o que foi providencial porque aqui não tivemos
carne .
Pela manhã seguimos chegando á tarde n'uma pequena aldeia
de fabricantes de erva mate.
Aqui começam os dominios de um celebre monge que tem per-
corrido toda a região missioneira, plantando cruzes em frente das
casas, designando arvores, que diz serem sagradas onde os crentes
habitantes d'estas regiões vão em certas noites rezar, levando cada
qual um rolo de cera que accendem ali.
Quem não conhece as tradicções d'esse monge, assusta-se ven-
do alta noite no meio do matto aquella porção de luzes em redor
de uma arvore e aquelles vultos silenciosos prostrados e immoveis
ali. Criminam muitos estas praticas grosseiras ; ellas porem são uteis
para os povos poucos educados ; são um correctivo para seus actos.
Que differença poderá haver entre as pessoas crentes de uma gran-
de cidade ajoelhados ante a estatua de um santo, no meio de luzes
profusas onde o brilho do ouro, o fumo do incenso, a figura do
Sacerdote parecem leval- as a esse paiz mystico que chamam Ceu, e
esses pobres ignorantes que acreditam que em certo dia á certa
hora, Deus repousa n'aquella arvo e que lhes indicaram, e elles ali
vão e oram, na simplicidade da linguagem quasi rudimentar crendo
que Dens os ouve, os vê, os protege, os perdoa ?
Esses pobres crentes não dissolverão sociedades, não anniquilla-
rão costumes tradicionaes de familias, não comprehenderão o que seja
ordem e progresso, senão no trabalho de cada qual para viver e no
respeito mutuo porque o que faltar a esse respeito será punido .
O monge è um typo especial que convem ser conhecido. Ca-
minha só por esses sertões, nada conduz, nada pede. Se chega á
uma casa, dão-lhe que comer, elle só acceita o que é mais fru-
gal e em pequena quantidade ; não dorme dentro das casas , a não
ser nas noites de chuva torrencial. Conversa com os moradores sem
ostentação, sem impostura, sua conversa é calma , como quem fala
para si só, porem todos o ouvem, todos lhe obedecem ; sua figura é
humilde, porem todos o respeitam e estimam. Nunca diz para onde
vai, nem quando. Anoutece, e não amanhece ; raramente porem, passa
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por um lugar mais de uma vez . Quer chova, quer os rios estejam
transbordando vai-se. Não ha canoas e elle passa , ninguem sabe
dizer como passou . Alguns garantem que não se molha quando pas-
sa os rios, outros que passa por elles caminhando, em pé sem se
afundar. Uma reminiscencia talvez da lenda de Christo sobre as on-
das em Cafarnaum .
Os que passam a vida nos gozos, ainda mesmo que esses go-
zos sejam empregnados de sangue e lagrimas de seus proprios ir-
mãos, os que julgam que a pureza da mulher só consiste na inte-
gridade anatomica, porque só d'esta a estupida lei dos tartufos se
procura defender, e vão aos bailes, em toda parte desvirginar a al-
ma das creanças, plantando-lhe pelos ouvidos a arvore da dissolução,
da hypocrizia, da mentira, da traição, preparando-as portanto para
todas as desgraças da vida, como um Mephistofeles toldando tudo
que é limpo, como uma abelha venenosa fazendo emmurchecer a flor
mais bella apenas com o seu contacto, dirão que esse pobre monge,
esse authomato é um embusteiro, um charlatão, um velhaco, porque
prega mentiras que em vez de matar ensinam a viver, ensinam a
respeitarem-se, ensinam a ser modestos e honestos, ensinam que n'u-
ma arvore do bosque ha um olho de justiça suprema indefectivel
que não se compra por alguns contos de reis annuaes, ainda mesmo.
que esses contos sejam tantos quanto os trinta dinheiros porque tra-
hio ao seu mestre o Judas Escariotis, que não foge diante das es-
padas de Holofernes, que os observa, que os punirá, que os premiará.
E tudo isso elle faz sem paga, sem ser para se mostrar agra-
davel a quem quer que seja. E' humilde, ignorante talvez. Não edi-
ficará um templo á humanidade, a tanto por cabeça mas seu nome
será lembrado eternamente no meio d'esse povo que não comprehende
senão as cousas simples, naturaes ; e as gerações que se succederem
sem conhecerem a ordem e progresso, se lembrarão sempre d'elle ,
como uma lenda do justo, que passava consolando, animando , ensi-
nando a ter fé, dizendo que a esperança no que é possivel é sem-
pre realisavel, e assim seu rasto se perpetuará, sem sangue, sem
crimes, sem lagrimas , sem odios. E se elle é um louco, sua loucura
é absolutamente opposta a do Sr Julio de Castilhos que faz tudo ao
contrario d'elle, que alem de tudo tem exercito, tem dinheiro para
mandar matar a quem diga que é assim que se cumpre a ordem e
progresso, porque é d'essa ordem e d'esse progresso que os louva-
minheiros se locupletam.
E elle, o louco , é absolutamente mais feliz do que o seu con-
genere que, vivendo n'um palacio, tendo algozes para executar suas
sentenças não goza um unico momento de descanço, porque só o
teria nos banhos continuos de sangue, e o sangue que lhes poderia
fornecer evapora- se na campanha e nas casas distantes de seu palacio.
*
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220
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- 228
Falta- nos até o sal e a herva mate. Nestas matas não encon
tramos pinhão ; ha porem um sarmento espinhozo que dá fructos
doces como a uva, em pequenos cachos, amoras ; de que os europeus
que vem comnosco são vorazes.
Mas a colheita d'isto demora a marcha, e a nutrição é nulla ,
porque uma vez que me tinha adiantado muito , parei durante duas
horas á espera de minha gente, e todo este tempo empreguei em
comer essa frutilha, abundantissima alli, e depois de muito comer,
sentia a mesma fome.
Lembrava-me porem , que quando podessemos viver tranquillos
em uma chacara, trataria de cultivar essa planta , porque as frutilhas
com creme de leite darão uma excellente sobre-meza . Pensando
n'isso lembrava- me que se estivesse te falando a respeito, tu te
ririas, e me repetirias aquella historia da cafeteira .
Uma vez, eu tinha conseguido comprar um pouco de feijão e
carne de porco a um companheiro que tinha sahido ao campo e de
là trouxera aquillo para negocio, porque no exercito , se negocia
muito com pequenas cousas ; preparava o Emiliano o nosso feijão , quan
do chegaram ao acampamento dois soldados que foram da nossa extin-
cta artilharia, conduzindo em páu uma pesada barraca, por ser gran .
de e estar molhada, porque n'estas matas chove todo dia. Senta-
ram-se perto, e na occasião da comida mandei o Emiliano que os
chamasse, porque deviam estar com fome.
Depois Emiliano veio dizer- me que um d'elles è da Bahia , e
que me conhece de lá. Chamei-o , perguntando - lhe quem era e disse
ser Franklim de Almeida Lima, irmão de meus dois collegas e
amigos, Benjamim e Virgilio Franklim de Almeida Lima, o primeiro
ja finado. Que uma vez que fora á capital com o pae, que queren-
do me conhecer fora á minha casa e levara- o tambem. Estava eu
no 2º anno de medicina e o pae d'elle que era negociante em Santo
Amaro, lá fora realmente à minha casa e levara- o . Muito viva cre-
ança e muito travessa.
Lembro-me que o sentei nos meus joelhos e mandei o creado,
ao Lourenço Devoto, comprar doces para dar-lhe. Morto o pae , sen-
tára praça como cadete, mas a republica que fez generalissimo , que
promoveu, por serviços relevantes, a todos os parentes e amigos, dos
factores, que fez a fortuna de milhares á custa da fortuna dos outros,
que deu commissões honrosas e lucrativas no estrangeiro, a individuos
que só
só nos cafés e nos theatros de moralidade duvidosa poderiam
ter representação ; para o pobre soldado, para essa massa anonyma
que sabe dar a vida pela patria sem pensar no quanto lhe pagarão
para isso , e que serve de instrumento para a fortuna dos espertos ,
nada teve senão ò castigo corporal, infligido diariamente, e as or-
dens de marcharem para fazerem calar os irmãos que, assasinados
lentamente por ordem do governo, entenderam não se deixarem mais
230
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Fiz-lhe sentir que aquella commenda não sendo d'elle, era um ador-
no de pouco valor.
O homem sahio ás pressas e voltou trazendo - me sua fé de
officio . Lutára no Paraguay até o ponto de ser condecorado com aquel-
la alta commenda , sem saber ler e ali vivia da pesca como um outro
que nas mesmas con lições vendia lenha . Depois de ler a fé de offi-
cio apertei a mão d'aquelle sertanejo . Terminado o passeio civico
voltei para casa e ali encontrei um lauto banquete que as familias
do lugar tiveram a idéa de levar á minha casa, na minha ausencia.
Sentavamos à mesa, e ali se achava á minha espera toda a fidal-
guia da terra, predominando em numero os parentes do B. de Cote-
gipe, quando chegou o meu commandante do batalhão de homens
do rio. Fil-o sentar- se a meu lado, o que elle não queria acceitar ,
e o que parecia contrariar aos generosos cavalheiros que me ti-
nham preparado o banquete e me honravam ali na minha casa
de forasteiro .
Obriguei o meu homem a sentar- se e tomando um copo brin-
dei-o, narrando todos os seus actos de brazileiro, a honra da terra,
que elle salientára. Seus sacrificios pessoaes, sua abnegação ante o
altar da Patria . Meu brinde produziu o effeito desejado e todos
aquelles grandes homens da terra julgavam- se honrados ao lado do
pobre pescador. D'ahi em diante vinha-me peixe de que não se re-
cebia paga, e isto porem, não o prejudicou . ,,
Esta minha narrativa faz nascer o animo nos filhos do norte
que nos acompanham e elles commentam esses factos heroicos dos
tempos passados e dizem comsigo : Vale mais isso do que se ganhar
soldo hoje e amanhã estar sem dinheiro e precisando trabalhar para
viver.
Aos italianos eu narro a historia de Garibaldi, vindo à Ame-
rica lutar, pela liberdde , sem ambições, sem lucro. Cantando no violão
modinhas brasileiras, vencendo depois as maiores difficuldades.
Tido como salteador , bandido , depois indo ajudar a unificação
da Itatlia, esquecendo- se para salval-a , de que era republicano, mas
que só uma dynastia poderia salval- a.
Velho , já rheumatico, fugio de Caprera para ir nos Alpes lu-
tar pela França que se libertára do trahidor de Dezembro, do
negociador de Sedan.
Aqui perto está o Campo do meio onde com os seus , elle pas-
sou 9 mezes, e onde comeu até as caronas dos arreios.
Aos hespanhoes eu falo de Cid e narro-lhes o que li nas
tragedias e elles dizem ; tudo é verdade. Quasi chegam a dizer que
assistiram. Mas são valentes esses diabos dançadores.
O capitão Molina do 9. ° batalhão, era soldado do Carneiro na
Lapa.
Desertou e foi agarrado.
16
242
que tornou-se classico na historia. E'a retirada dos dez mil . Mas
estes dez mil erão homens que abandonavam a Patria como merce-
narios, e batidos voltaram a ella .
A alegria d'elles ao avistar o mar da Patria, devia ser egua!
á nossa avistando o campo, mas elles tiveram apenas a retirada,
sem que o inimigo os perseguisse por muito tempo, vindo para
onde os seus os esperavam, offerecendo-lhes repouso. O illustre Tau-
ney, carra, uma pagina brilhante do antigo exercito brazileiro, sa-
hindo de Matto Grosso e indo ter á Laguna. Se aquelles abnegados
romperam as difficuldades do terreno, com tudo, o inimigo não os
perseguia e elles vinham para o seio da Patria, onde tudo lhes sor-
ria, onde todos se desvaneciam em ser-lhes agradaveis. Nós sahimos
da fronteira de S. Paulo, cercados de inimigos, chegamos ao Rio
Grande do Sul . Não viemos para nossas casas. Nenhum de nós sabe
o que é feito dos seus, quantos ainda vivem, quantos morreram ,
quantos foram assassinados e apenas chegamos onde deveriamos respi-
rar, sò ouvimos a voz de Preparem- se para brigar.
--- Sim, me disse elle, talvez amanhã mesmo tenhamos de
brigar. Mas aqui é campo, aqui podemos ver o que se passa em
torno de nós, aqui poderemos lutar até o triumpho.
-
Sim, disse- lhe eu, e esse triumpho, o tornará o primeiro
heroe da America do Sul, se essa retirada , quando for escripta , não
bastasse para sagral- o heroe !
E tu has de descrevel-a, Dourado !
Sim, se não morrer.
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decia-lhe . Elle respondeu-me que não era por nós, mas pela justiça, e
Deus manda que se soffra com os que soffrem.
Quando proclamaram a republica elle annunciava por onde
passava grandes calamidades, e que para preservarem-se d'ella plan-
tassem cruzes nas portas. Que haviam de matar e roubar, porque
todos estes teriam em si o diabo. Depois, esses crimes trariam uma
guerra cruel, sem quartel. Que os animados pelo diabo teriam for-
ças e dinheiro, mas que os outros venceriam, mesmo sem armas.
Ora, tudo isso deu-se e o pobre visionario tornou - se propheta
para aquella gente que vive sempre animada na esperança de ven-
cer, porque elle disse que Deus assim o quer.
As cruzes porem, em muitas casas, não privaram a entrada
dos possuidos do diabo, porque, lá estão ellas em pè onde as casas
são ruinas e onde os esqueletos mostram que os assassinados não
tiveram quem ao menos os sepultassem ali junto d'aquella cruz , em-
blema do triumpho do homem sobre os crimes, antes da moderna
civilisação.
Um outro homem, que me chamou a attenção tambem, foi um
allemão das colonias de Santa Cruz, o coronel Altinoble. Tinha vin-
do encontrar-se comnosco no Passo Fundo com o fim de obter mu-
nições para suas lutas na , Estrella, onde mais de uma vez tinha
tido combates renhidos .
Esteve na batalha do Passo Fundo,, conservando-se sempre
onde o fogo era mais vivo, com a calma de quem observa. Ouvia
falar como brigava a gente de Gomercindo, não acreditava e por
isso foi ver, ficando convencido , disse elle, que o que se dizia nada
era em vista do que elle viu . Não podendo obter munições man-
dou reunir todos as capsulas de cartuchos inutilisados para ir pre-
parar novas para brigar por lá.
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Orgulho humano ,
que tudo exprimia. Foi a ultima vez que se viram aquelles dois
heroes que se amavam mais do que á vida .
Quando me approximei já ali estava o Major dr . Fritz, tendo
os primeiros curativos sido feitos pelo dr. Hungria, medico da ar
mada . O dr. Fritz tiuha preparado uma injecção de ergotina para pri-
var a hemorrhagia interna, porem elle não consentiu que fizessem
sem eu chegar , e falando me Fritz , elle me disse : Amigo , não deixe me
darem nada para dormir, tu sabes que eu não devo dormir.
Não é para dormir, disse-lhe eu .
Então pode fazer o que você quer... e entregou o braço.
-
Onde é o ferimento ? perguntei eu . Elle mesmo levantou a
camisa ensanguentada e mostrou- me.
Um pequeno orificio entre a 6. e 7. costella esquerdas, pro-
ximo do externo, por onde sahia o ar na expiração ; portanto fora
interessado o bordo do pulmão. A pallidez da face indicava que não
havia asphyxia, e a respiração era pausada. Seu nariz aquilino esta-
va fino como uma lamina. Tomei-lhe o pulso ; era mizeravel quazi im-
perceptive!, portanto, pensei, a bala penetrou no pericardo, e tal-
vez mesmo na parede do coração , e a assystolia em pouco o matará.
Perguntou por seus arreios ; estavam ali. Não deixem os bi-
chos leval- os ,,, disse.
Movendo-se soltou um gemido. Lembra-se, disse eu, que
quando Apparicio foi ferido e gemia você me disse que todos vocês
são fracos para a dor ?
Não amigo , não é a dôr , eu estou perdido , me disse.
Não é nada , vamos marchar. Eu vou buscar um apparelho
para applicar-lhe e em pouco estará bem .
Sim, me disse, não é nada, deem - me agua, tenho sede,
agua fria, muita agua fria.
Quando viu que ia sahir disse-me : „ Dourado, que organizem
a marcha já. Torquato que faça a retaguarda, e Apparicio que te
nha muito cuidado com o flanco esquerdo . ,,
Montei a cavallo para ir procurar os companheiros que com-
mandavam, em quanto se preparava a padiola para transportal- o.
Quando transportaram- n'o para a padiola elle disse aos meninos
Garcia, netos do famigerado Candido Garcia, de Bagé, seus ajudan-
tes de ordens, e inseparaveis companheiros, e a Hilario Montiel :
,,Ah ! meus filhos, vocês estão sem mim, elles me mataram . ,,
Muito custou-me n'aquella mistura de corpos, alguns desconhe-
cidos, encontrar alguns, os amigos com quem queria falar. O fogo no
campo occupava uma extensão de mais de legua , e os que estavam
ali não viam nada alem, pela escuridão que tornava-se mais pro-
nunciada para os que estavam perto do fogo.
Encontrando- me com Fabio Azambuja que até ao escurecer
275
produzida pela queda das aguas nas cascatas. Era justo. Se o gra-
nizo tinha vindo sobre nós com a furia da lei no Rio Grande do Sul
no fim do seculo XIX, era justo que a euxurrada celebrasse seu
triumpho cantando nos funeraes.
287
podessePavir oscartu
ata
ssam - nos
do ali.
que não podia brigar, pelo pequeno po-
voado , que està situado entre dois arroios, e parou essa vanguarda
inutil, de mutilados e feridos , no cimo da cochilha .
Apparicio e Torquato esperaram o inimigo , sendo preciso que
formassem linha , muitos que já não tinham armas e outros munições ;
mas era preciso apparentar que as posições estavam guardadas .
O inimigo vinha resoluto , porem sempre em quadrado , e sus-
tentou comnosco um fogo renhido , sem nunca desfazer o quadrado ,
o que esperavamos ; por isso Torquato se conservou occulto n'uma
canhada para fazer- lhe carga apenas se desdobrasse o quadrado .
A principio pareceu -me que o inimigo pretendia passar o arroio
a cima, para nos tomar a frente ; creio porem que vendo em cima
da cochilha todos os inuteis , julgou ser aquillo o corpo de exercito
que poderia esmagal - o , e desviou - se, marchando em direcção ao logar
a ci
nhri
Tipa
onde Ap o
locua
Torq
sidoe col ravam .
to os espeha
ada uma lin de atiradores por detraz de
um matto ; elles presen tir am isso e despediram pelotões , a marche
marche , pelas canhadas , que, penetrando no matto desalojaram os
nossos , que ali apenas apparentavam resistencia .
Eu estava no topo da cochilha , via-lhes todos os movimentos ,
gritava para os nossos , mas elles não ouviam-me ; em compensação
as balas cahiam ali, onde me achava , sem a menor ceremonia .
Augusto Amaral que se achava em marcha para a picada
voltára e seguia costeando o arroio para guardar um passo que mo:
mentos antes me parecera que o inimigo buscava .
N'esta occasião a cavalhada e parte d'elles voltaram ás car-
reiras , o que fez com que os nossos se alegrassem julgando que
alguma manobra os tivesse posto em perigo , ou alguma carga tivesse
291
292
lando a noticia de que uma columna tinha, por uma picada, penetra-
do no matto, para tomar-lhes a retirada, espalhou-se o panico, e
abandonaram os chefes .
Estava ferido, no pulmão, um sargento de Garcia. Um alferes,
que por doente, andava de vagar, fora pegado por elles e degol-
lado. O sargento pedia a Augusto e Garcia que seguissem, que
o deixassem ; os dois valentes companheiros porem não o abandonaram ,
e a tiro de revolver respondiam ao inimigo, mas sempre em retirada .
Entrega-te, gritava o commandante da força .
- Ja viste um rio -grandense se entregar ? respondia Garcia dis-
parando-lhe o revolver.
Felizmente Apparicio estava perto , e os fugitivos encontran-
do-o, e vendo elle correr para junto dos dois bravos companhei-
ros, calcularam a figura feia que haviam feito e recobrando o brio,
voltaram com elle para fazer face ao inimigo .
Chegaram a tempo porque ja não tinham munições , e não
podiam correr por causa do ferido. A luta se travou ali. Os lan-
ceiros ameaçavam carregar, as guerrilhas emboscadas faziam retro-
ceder os mais afoitos , afinal a explozão de uma bomba de dynami-
te mettida n'um monte de pedras, que um companheiro teve
coragem de accender, sacrificando a vida, fel - os parar.
Na manhã do dia seguinte Apparicio estava do outro lado
com todos os companheiros. Só no 3º . dia elles entraram na colonia
tocando Diana nos clarins.
Nós já nos achavamos do lado opposto, ha mais de 24 horas,
os ultimos , e elles tocavam arias que executam os vencedores, quan-
do os vencedores eramos nós que sahimos do Paraná, lutando com
os elementos, com os terrenos e com os homens.
A' 10 de Agosto perdiamos o nosso chefe, e cercados por
todos os lados , tendo em cada ponto uma columna inimiga para
substituir a que já vinha cançada, na nossa perseguição.
No dia 5 de Setembro sahiamos do Brazil onde só póde vi-
ver quem tem armas para lutar ou quem já se resignou o abdicar
de si os predicados do homem livre.
De 10 de Agosto a 5 de Setembro , 25 dias, caminhamos 120
leguas, ora lutando, ora esperando debalde que elles quizessem lutar
onde nos convinha, pelos peiores caminhos, estropeados, muitas
vezes famintos.
Esta marcha para o homem que foge hoje para poder amanhã
voltar para a luta até que a Patria seja livre ou desappareça, é
maior victoria do que as que se obtem nos combates onde ella é
rapida e muitas vezes inesperada .
como sonhara Dante , com a differença porem, de que temos por Harpia a
fome e o cançaço, e se ter brio é ser violento, cabe- nos em tudo a alegoria.
Acompanha-me como sombra uma figura sinistra. E' a de um
polaco snjo, cadaverico, tremulo, de olhar sinistro.
297 w w
**
* *
de mim. Diz aos outros que não tem coragem de ver-me Doe-lhe
separar- se de quem elle acompanhou em todos os perigos, quem foi o seu
companheiro de martyrios sem nunca desanimar, sem nunca lamentar.
No porto do embarque porem, estava elle. Levava-me um pão e
duas rapaduras. Deu- m'os sem proferir palavra, com os olhos humi-
dos, depois atirou-se a meus braços em prantos, num longo pranto ,
depois abraçou- se ás minhas pernas, depois apoderou-se de minhas
mãos, beijou-as comprimindo n'ellas os seus labios, molhando- as de
pranto, e sem olhar para mim retirou- se lento, sombrio pela estrada.
Eu o olhei por muito tempo.
Era talvez a derradeira vez que o olhava. Quantos dos nossos
separam-se assim dos seus !
Esta republica começou por uma d'estas separações, sem sangu9,
sem morte, depois vieram as pelo sangue e pela morte, o que será
amanhã ?
Apparicio veio despedir-se de nós e ao abraçar-lhe perguntei :
Até quando ?
Se você for dos primeiros que voltem ao Rio Grande ou vol-
tarà commigo ou lá me encontrará !
Respondi a esta phrase com um abraço longo, expressivo.
Enganam-se os que julgam, que a crueldade, a selvajaria , podem
fazer desapparecer o estimulo para a luta, quando isto o tonnifica. Enga-
nam-se os que obrigam ao exilio, ao softrimento em terra estranha, á mi-
zeria e á esmola, o que mais doe, que cobrindo as fronteiras com
os assalariados possam viver tranquillos.
Aquelles que abandonam a patria por sua vontade adoptam
a terra em que vivem, porque é n'ella que encontram o que lhes
faltava lá . Nem por isso porem, deixam de ter saudades porque o
proprio soffrimento no passado deixa uma sombra de prazer na alma,
porque n'este soffrimento ha uma esperança, e a esperança è sem-
pre doce, é um noivado da noite martyrio, com a aurora do ama-
nhã ; victoria e a terra onde se soffreu e se esperou torna-se um leito
nupcial d'essa approximação das dores que se soffre e da esperança
de allivio .
Mas, quando essa terra é um refugio, quando é em azylo da
vida, mizerenta, humilhada, só uma idea predomina : voltar. Morrer
talvez, mas morrer matando os que lhe privam, ou por interesses
individuaes ou por obediencia tudo que um homem pode mais desejar :
ter um lar, e n'elle viver tranquillo. Não, elles não se enganam.
Elles sabem de tudo isso. Elles calculam medem, pesam toda
essa ignominia e a somma total é o lucro pessoal .
Que lhes importa que morram brazileiros ? que lhes importa
que a nação se anniquille , que lhes importa que amanhã outras
nações venham tirar uma desforra do Brazil por ter elle durante
algum tempo querido ser digno n'este continente ? O patriotismo
314 —
Os Jesuitas! ....
Por muito tempo, ou desde que comecei a pensar,
esta expressão produzia em mim uma irritação , uma especie de
revolta . Eu via sempre, homens negros opprimindo , matando, des-
truindo tudo , familia , honestidade , honra.
Mesmo lendo esse poema que em poucas palavras narra a
grandeza, de Anchieta e Nobrega, essa epopéa que teve por cal-
vario os insondaveis sertões brazileiros, eu duvidava que aquella
abnegação, aquelle devotamento tivesse outro fim que não fosse o
dominio.
Preserva nossos filhos da leitura dos romances creados pela
imaginação .
Ensina-os a ler no livro diario dos soffrimentos actuantes,
das glorias e martyrios dos tempos em que viverem. Tudo que vem
do passado é duvidoso, a não ser o producto dos actos que se per-
petuam anniquillando ou elevando as familias e as nações.
Commodo e Nero deviam de ter tido adoradores.
Lucrecia Borgia foi chamada anjo de bondade por Metastazio ,
se me não falha a memoria. Cromwell foi divinizado por Milton,
o sonhador do Pradize Lost. O Sr. Deodoro foi cognominado Washing-
ton depois de apresentar o Brazil no encilhamento , o Sr. Floriano
Peixoto foi denominado pelo Sr. Julio de Castilhos , trez vezes tra-
hidor, e hoje é o seu maior amigo, porque manda- lhe dinheiro, e ho-
mens do norte para morrerem, creio que com o fim de obrigar
o Sr. Julio de Castilhos a dizer o contrario do que disse d'elle.
Deixar portanto as creanças se apoderarem d'essas narrativas
é um perigo.
Ŏ Sr. Floriano se alguma vez leu historia devia de ser as de
Nero e Luiz XI.
- 315
nando o throno que havia creado, os que por tres vezes elegeram
a José Bonifacio no desterro, como um protesto á tyrannia que o
exilava, ao passo que hoje curva-se á tyrannia que mata, louva- se a
quem arruina sua patria, deshonra sua nacionalidade, por capricho,
sem lhes commoverem as lagrimas de muitas mães. E hoje
por interesses muitos, inconscientes quasi todos, prestam-se a por
em pratica os planos tenebrosos de alguns para exterminarem a
seus proprios irmãos, cuja tranquillidade e futuro elles destruiram
para sempre, e nem ao menos têm coragem para pouparem o soffri-
mento alheio, poupando o proprio, dignificando a sua obra, fazendo
amar o que elles tem tornado odiento.
A'S ARMAS !
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326
*
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nas nascido, e hoje volto sem nada ter encontrado, sen de nenhum
saber se é vivo, e com o soffrimento, o desejo da luta se enraizou ;
e é d'aqui que vamos outra vez entrar n'essa luta que parece só
terminarà quando o sangue do ultimo revolucionario pelo direito e
pela liberdade satisfizor a sede felina dos fazedores d'essa republica
que matam, que roubam, que infamam !
um logar para escondel- as. Alguns dos homens d'ellas , porem vieram
para junto das de Bento Xavier.
Eu tive de ficar junto ao tenente Dominguez, para cural- o .
Não deixava de ser perigosa para mim aquella posição.
Sabiam que eu ali estava e uma partida d'elles que viesse
até aquelle lugar, segundo diziam, João Francisco premedita-
va, nos destroçaria porque a força de policia era apenas de 12 ho
mens ; mas seria mostrar-me cobarde abandonar um ferido por es-
tar proximo da linha divizoria do Rio Grande do Sul.
Afinal o estado do tenente deixou de ter gravidade e as
forças castilhistas desappareceram da fronteira, mas outros perigos
nos ameaçam,
Por ordem do Governo veio percorrer o logar não só o chefe
politico do departamento, como o proprio ministro da guerra, e por
isso tivemos de nos occultar ainda mais. Dias e dias passamos
occultos nas grutas, sem fazer fogo, sem ao menos fallar-se alto para
não sermos descobertos, até que se foram chefe politico e ministro.
Raphael Cabeda veio tambem para junto de nós ; e Apparicio
Saraiva com os companheiros vem se approximando.
Um dia recebi recado de Raphael Cabeda que fosse com ur-
gencia ao seu acampamento.
Pensei que se tratava de doença, e ao chegar là encontrei
Saldanha da Gama.
E' incançavel esse homen. Em poucos dias percorreu,
a cavallo , toda fronteira do Rio Grande d'esde S. Thomé,
na Republica Argentina, até Aceguá proximo a Jaguarão .
Se tivesse feito isso ha mais tempo, me disse elle, tudo teria
accommodado ou remediado, e não teriamos perdido tanto tempo.
Guerreiro internou-se no Rio Grande e esta só. O adver-
sario....
O inimigo disse eu ...
Não, o adversario, eu não considero inimigo os que nas-
ceram na mesma terra que nós...
Tambem eu não os considerava, e hoje considero.
Quem fez e faz o que elles têm feito ainda que tivesse sido
gerado por minha mãe, eu dizia que minha mãe nada tinha com
elles.
Tem soffrido muito, eu sei, em corpo e em espirito, mas
amanhã será o primeiro a esquecer.
Mas, a posição de Guerreiro é melindrosa, é preciso irmos em
soccorro d'elle.
Apparicio já tem cavallos e abi vem, portanto devemos apressar.
Tivemos de almoçar. Um assistente de Raphael " estendeu um
sacco de aniagem já sujo no chão , e collocou sobre elle um prato
343
cara a tristeza que vai n'alma, e eu estou triste por vel- os seguir
sem mim.
Não , não é por isso , disse-lhe eu, é porque vê a abnegação
d'esses brazileiros que sahiram hontem do sacrificio e hoje alegres
buscam outros, e a sua alma brazileira comprehende que o que esta
morrendo não são os homens que em qualquer parte morrem, é a Patria.
Abraçamo- nos, e elle quiz ir ver desfilar a columna.
Ao passar ella onde estavamos eu ergui- lhe vivas, á patria
e acs deffensores de sua honra.
Quando desfilavamos eu ainda agitei o lenço em despedida,
para elle.
{
Tivemos noticia, vinda de Rivera pelo telegrapho, que
o coronel Sampaio havia sahido de Sant' Anna á frente de oitocentos
homens de linha, pertencentes ás forças da União , das tres armas,
em direcção ao Umbú."
Sabia-se por ali que estavamos prestes a invadir, portanto a
vinda do coronel Sampaio devia obedecer a um plano para , toman-
do-nos a sahida no Caverá, dar tempo a que as forças de Hyppolito
Ribeiro nos tomassem a retirada e assim ficariamos esmagados nos
banhados da Serra, porque no Rozario, por onde poderiamos sahir,
havia forças inimigas .
Acampamos à tarde, seguindo o velho coronel Maneco Macha-.
do, commandante da columna de Cabeda, para o Caverá onde esta-
vam companheiros nossos, que era preciso reunir para dar- se com
bate a Sampaio .
De madrugada marchamos.
Foi n'essa marcha que vi muitos companheiros que julgava
mortos, e outros que julgava que nos haviam abandonado ; mas para
os revolucionarios convictos, familiarisados com o soffrimento , parar
quando os outros marcham para a luta, tendo armas, è deshonra e
nenhum quer ser deshonrado.
Eu caminhava flanqueando a columna , queria vel - os todos, os
que ja havia visto, os que chegavam. Ali tivemos a distribuição de
divisas.
Quando invadimos a primeira vez não tivemos divisas unifor-
mes. Alguns tinham uma divisa branca, outros azul, outros verme-
lha, colorada, como se diz em castelhano.
Deves te lembrar que por tuas proprias mãos fizeste divisas
em que sobre fita branca passavas uma fita vermella . Foste tù tam-
bem que bordaste o emblema da Cruz Vermelha para os medicos.
Era o nosso distinctivo.
Sabia eu que no Brazil actual, ser trabalhador para restituir a
vida é um crime. O brazileiro não tem direito de viver a não ser
na escravidão. Era um luxo meu, e a bandeira que me fizeste
1 de se-
da branca com a cruz vermelha, ainda vem commigo.
349
**
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-- 357
rada e d'onde fizeram forte tiroteio que nos matou dois companhei-
ros, um d'elles o major Placido rapaz de 20 annos, de bravura
desmedida e feriu-nos muitos.
Os nossos perseguiram até repassarem a restinga matando alguns
e tomando varios cavallos ensilhados.
Ficou guardando o campo o tenente coronel Juca Rodrigues
e nós seguimos em busca do Cunhatay para d'ali irmos a S. Luiz ,
onde devia ser recebida a cavalhada que pretendiamos tomar.
Tivemos dez feridos, entre elles mortalmente, Armando Sam-
paio Ribeiro um rapaz valente e digno.
Depois de fazermos os curativos de todos, marchamos :
A lua que nos clareava o caminho obscureceu-se em pouco por
eclipse total. Acampamos ao sahir a lua da sombra.
Apparicio voltou com um ajudanto para verificar a posição do
inimigo.
Depois de extrahir duas balas e fazer os curativos dos
feridos fui á uma casa de negocio onde mandei preparar almoço .
Levei commigo o meu prisioneiro que ali encontrou parentes que
lhe traziam roupa, dinheiro, doces e queijos.
Uma velha madrinha e tia d'elle mandou -me um magnifico
queijo.
A' tarde Apparicio ainda não tinha voltado , o que jà nos es-
tava encommodando . Falei a Torquato para mandar um piquéte em
sua procura e o piquete já se preparava para sahir quando elle che
gou.
Fora até proximo ao logar do tiroteio da vespera e nada vira.
Ao anoitecer marchamos. O terreno onde nos achamos é todo
de serias de modo que difficilmente se poderia ver o inimigo se
elle não quizesse ser visto.
E' plano de Apparicio passar entre o Santa Maria e Bagé, em
busca da Carpintaria e ali esperar que recebam a cavalhada para
tomal -a no caminho por isso temos de marchar de noite para não
saberem o nosso destino, e acamparmos durante o dia em logares
onde não sejamos vistos de longe.
Apenas começamos a marcha vieram dizer- me que um dos fe-
ridos da vespera acabara de agonisar. Pouco depois vieram chamar-
me em nome de Armando Sampaio Ribeiro.
Entreguei o sargento prisioneiro a um capitão para fazer- lhe
companhia. Deixal- o só sem uma protecção quando os nossos com-
panheiros morrem, ainda mesmo que elles saibam que elle está sob
minha protecção, é um perigo, e entre tantos que tem soffrido, tan-
tos que tem vinganças tremendas no pensamento, de noite ninguem
saberia de onde partira o golpe que o ferisse.
Armando estava no chão recostado em um amigo.
Eu sabia que elle não poderia durar muito. Uma ferida pene-
- 362
muita cautella, porque até as nossas divizas elles usam, algumas vezes ,
para chamar victimas.
Apenas cheguei ao acampamento, appareceu a columna com-
mandada por Guerreiro. Fui abraçar o velho amigo e companhei-
ro e ver todos aquelles valentes de quem me tinha separado em
Santa Catharina, que me criam morto, e outros de quem não tinha
noticias ha mais de dois annos. Guerreiro disse me que na retaguarda
vinha o inimigo tiroteando desde cedo. Os nossos, montados em ca-
vallos cançados e elles bem montados, mas a sorte dos nossos era
que a cavallaria inimiga não se desprendia da infantaria. Alem do
mensageiro que Guerreiro mandára a Apparicio eu tinha feito seguir
para lá, a toda pressa, um assistente de Cabeda que ali estava, para
avisal- o do que havia.
Quando acabava de conversar com Guerreiro já os piquetes
da retaguarda assomavam na coxilha tiroteando a vanguarda inimiga.
Corri á casa para buscar o que era meu e marchar com Guerreiro .
Quando cheguei ali já as guerrilhas tiroteavam em frente e
as balas cahiam no telhado.
Fazia a retaguarda de Guerreiro, o valente Juca Anastacio e
a vanguarda do coronel Telles, Zeca Pinto.
Eu seguia pela banda oriental buscando logar para encorpo-
rar- me as forças e vi os nossos retirando apressados sendo perse-
guidos encarniçadamente pelo inimigo. Comquanto longe, eu grita-
va para elles : Não sejam tolos, voltem para junto dos bahia-
nos, a Serrilhada é ahi adiante, o que fazia rir alguns orientaes que
por ali observavam as guerrilhas.
Estava chovendo e em pouco tudo desappareceu, os tiros se
confundindo com o trovão longinquo.
Perdida a esperança de poder alcançar a minha gente, dirigi-me
ao posto do B. de S. Luiz onde estava doente o alferes Salgado,
afim de providenciar sobre elle, e d'ali tomei o caminho da casa de
Carlos Alberto, onde devia pernoitar.
Carlos Alberto é um desses homens de alma boa, tão raros
hoje. Adversario político nosso , elle tornou- se excepção conservan-
do-se bom como outros seus companheiros politicos, infelizmente em
numero muito limitado.
Emquanto muitos castilhistas que eram pobres se enriquecem,
elle que é rico se empobrece, não pelo flagello da guerra civil, mas
porque sua casa nunca se fechou a nenhum de seus patricios exilados
sem se encommodar nem indagar qual a parcialidade a que està filia-
do ; nunca sua bolsa deixou de abrir- se para attender os necessitados .
Sua casa durante estes tres annos tornou-se asylo de muitos ,
de familias inteiras, fugitivas de Bagé, desalojando dos seus com-
modos a sua propria familia.
Estando tão proximo de um brazileiro que ainda conserva
24
370
cida junto aos marcos, os nossos não dispararam um tiro contra elles,
porque ali estavam policias orientaes que era preciso respeitar.
Fossem elles os victoriosos não olhariam divisas ; matariam
aquelles poucos fugitivos e até o major Cabrera , ainda mesmo que
fosse preciso atravessar um rio como o Quarahy , como fez João
Francisco.
CHRISTO
7
387
Somente os que tem olhos para enchergar essa pallida luz que
se espalha n'um pateo cheio de hervas maninhas, onde outr'ora se
ostentavam os jardins viçosos de um palacio ou de antigo solar ; que
buscam em cada pedra, solta , desarticulada, reorganisar o pavimento ,
a pyramide que concorrera para organisar, que vêm n'esses sulcos
aprofundados pela torrente formada pelas chuvas, de leitos desiguaes,
ca!háos e quartzos, a descoberto, cortantes, movediços ; limos , de-
tritos accumulados, de superficie igual, de base falsa, promptos
a desfazerem á primeira pressão ; o antigo leito de aguas crystali-
nas que deslisavam placidas, regando os canteiros de relva flo-
rida , as arvores de fructos saborosos, e, depois , pela incuria ou pela
luta, entre os successores dos habitantes, cahiram n'aquelle abando-
no, onde só os lagartos buscam o calor do sol , onde só as viboras
são senhoras, onde só as abelhas volitantes sugam o nectar tempo-
rario e fugaz como o perfume das flores que os produzem; e olhan-
do para as ruinas calculam a riqueza e a força dos que ali viveram
e progrediram e avaliam a decadencia d'elles pelos destroços que
389 -
uma velhice precoce, uma morte prematura, não foi o destino, nem
a vontade de Deus que a decretou , foi o vicio, foi a concupicencia
que o victimou como o ma hado do lenhador victima a arvore, dan-
do-lhe um golpe nas raizes .
Como o homem os povos estão sugeitos á mesma sorte . Um
povo que tem leis, que se rege por ellas, que respeita o direito de
cada qual, que tem por norma a justiça, que garante o producto
do esforço individual, nunca terá revoluções , como as nações que pro-
cedem do mesmo modo , nunca terão guerra.
Mas se os governos não são mais do que protectores de par-
tidarios seus, de seus adeptos , se a justiça é apenas a punição dos
fracos, do adversario , se mesmo os que promettem governar ás cla-
ras nada mais fazem do que fazer a fortuna dos amigos, dos irmãos
em Clotilde, concedendo previlegios que lhes fariam a fortuna não
pela exploração de uma industria que fosse util á communhão , mas
de meras phantasias, e o povo vê na sua miseria, na sua pobreza in-
dividuos, pobres hontem, ricos hoje, sem ter o direito de inquerir
como o producto do seu trabalho foi passar aquellas mãos, e aquelle
enriquecido julga- se no caso de se considerar salvador da republi-
ca como acontece n'esta infeliz patria, então o povo julga- se com o
direito de protestar, e protesta contra o modo pelo qual desperdiçam
o seu trabalho mas em vez de moderarem ou modificarem esse modo de
viver ás claras, mandam matal-o e para isso é ainda o seu traba-
lho do passado e todo o trabalho de sua geração, no futuro , que
ha de pagar com munificencia os que se encarregaram de assassinal- o .
E' d'ahi que vem a guerra civil ; é d'ahi que vem a queda
das instituições, é d'ahi que vem o anniquilamento de povos, a ex-
tincção de nacionalidades.
Nem se diga que se não fôra a guerra e as calamidades, o
mundo não comportaria os seus habitantes .
Não. O mundo é ainda um deserto e o homem para viver adapta-
se a todos os climas e a todos os trabalhos . A morte na epoca
propria bastaria para compensar os nascimentos.
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seria a loucura dos que sabendo que haviam de morrer pela faca
da legalidade preferiam morrer matando.
Quando elles marcharam toda a noite para nos sorprehender
ali, de certo nos consideraram n'um sepulchro de vivos ; esqueceram-
se porem que, quando o revolucionario luta pelo direito, resurge sem-
pre, aqui ou ali , hoje ou amanhã, mudando de armas e de program-
mas, mas sempre tenaz ; ora violento como a febre combustora, ora
lento como a ferida atonica depauperando o organismo. Em balde
a tyrannia estende seus tentaculos , em balde transforma o erario
publico em instrumento de destruição, em balde arroja-se aos pés
dos fortes, elogia- lhes os crimes e da- lhes honras por cada crime, em
balde opprime os fracos, mata os fracos e doentes para fazer- se
temida, para ser obedecida na sua marcha destruidora ; o revolu-
cinario surge diante d'ella como um pesadelo, como a lenda fatal que
annuncia-lhe o fim proximo no meio das orgias do poder de que dispõe.
A tyrannia não dorme. A coberto do perigo, fingindo - se de
victima do seu amor á honra, á patria, ás instituições, transforma
o suor do povo em meio de comprar instrumentos que lhe derramem
o sangue. O revolucionario não tem descanço, não tem gozos , luta
porque prefere a morte rapida dos combates, á morte lenta que
ella lhe prepara, e ella, a tyrannia, accusa-o por não se deixar
matar lentamente.
As vezes julga-o fraco , e expede as legiões de janizaros para
destruil-o .
Conta os dias, as horas ; cada chamada do telegrapho julga
ser a noticia da victoria... A noticia chega, mas não foi a revolu-
ção quem perdeu ; foram os seus. A epilepsia larvada que lhe orde-
na os actos, chega a manifestar- se n'uma gagueira persistente. As
commissuras labiaes branquejam de espuma, e não achando em quem
cevar seu odio, rasga as carnes com as unhas, as fronhas dos tra-
vesseiros com os dentes ...
E emquanto compra novos elementos e medita n'um plano,
n'um circulo de ferro donde não escapará um só dos bandidos que
não se deixam matar impune, pausada e calculadamente ,
como o tigre que lambe as ventas ao sentir cheiro de sangue, an-
tegosta as alegrias da proxima hecatombe que prepara, os revolu
cionarios nus, percorrem a campanha, ora fugindo como a pomba
perseguida pelo gavião, ora baixando rapidos como o falcão sobre
a presa, quando ha necessidade absoluta de lutar, vão contando
dias e as noites que passam longe do lar, cantando suas canções
que recordam tempos felizes, lembrando -se dos companheiros, dos ami-
gos, dos irmãos, dos paes, dos filhos que a morte privou de con-
tinuar na luta, rindo -se dos sustos dos companheiros, e dos proprios ,
na hora do perigo , alegres pelo perigo já passado, sem se encom-
modarem com o perigo futuro .
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A PAZ
Estará ella feita, esta paz tão desejada pela Nação que via
correr o sangue de seus filhos sem que podesse dizer aos que a
reduziram ao papel de mãe desolada, que fizessem cessar taes hor-
rores ? Esta paz tão desejada por todos os espiritos sãos em qual-
quer ponto do universo onde chegava a noticia dessa nevrose sui
generis que apoderou-se dos dominadores do Brazil quando só a ra-
zão devia ser arbitro entre os contendores ? Estará feita esta paz
tão necessaria á vida e conservação da nacionalidade ?
O acto do general Galvão não será sómente um armisticio por
tempo mais ou menos limitado ?
As leis que serviram de instrumento de oppressão foram abo-
lidas ou modificadas ? Esse direito de viver por si, livre , sem peias
aos seus actos sociaes, sonho de todo homem que sente e que com-
prehende o que sente, que o aspira sob o nome de liberdade, será
garantido, será mesmo tolerado ?
Essa devastação que arruinou a fortuna de innumeros homens.
então abastados, ricos hontem, pobres hoje, de qualquer das par-
cialidades , porque os ricos adversarios não exigiam à guerra, não
fizeram parte dos corpos provizorios porque não queriam enriquecer
por esse meio, não precisavam dos fornecimentos nem das commissões ,
foram indennizados ? Foram ou serão punidos esses que exigiam
a vida de seus irmãos para não reclamarem no futuro os bens que
devastaram, que espoliaram ou para poderem, a coberto da
fiscalização, apossarem-se dos dinheiros que a nação inteira forne-
cia, ou pagará, dados como por magnanimidade de amante decrepito
a jovens concubinas que chamam belleza a hediondez d'elles,
aos gargantuas de sangue e ouro, desde as republicas do Prata
até nas regiões do Mississipe ?
E esses pobres , esses valentes abnegados , o que tiveram ?
A paga d'elles será somente o sacrificio, o arriscar a vida sem des-
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mens estranhos a esta luta não aclarar certos factos, que em sua
generalidade são veridicos, e tirar assim ao exercito brazileiro a
responsabilidade dos actos dos patriotas do Sr. Castilhos, em pouco
o romance, a comedia, a tragedia aproveitarão esses horrores e o
exercito brazileiro já não terá meios para se libertar dos apodos'
porque os que podem servir de testemunhas já não existirão.
Conta-se que Cortes fora ferido em renhido combate e que com o
filho, o valente menino capitão Cortes, e um capitão ajudante , noivo
de sua filha occultara-se na casa de um parente. Ameaçaram que
arrazariam a casa onde elle se occultava se não o entregassem, e
que nada lhe fariam se o entregassem. Em vista disso o parente
entregou- os. Foram separados, o filho do pae. O commandante da
força convidou o filho a fazer parte das forças sob seu commando ,
este negou-se. Deixaram-o preso muitos dias sem comer. No fim de alguns
dias trouxeram -lhe costellas assadas que elle comeu com voracidade.
De que são estas costellas, perguntaram. De carneiro
respondeu o rapaz. Venha ver o carneiro... e mostraram-lhe o
cadaver do pae do qual tinham tirado as costellas. Perto estava o
cadaver do que havia de ser seu cunhado. O rapazinho enfurecido
apoderou-se de uma espada e sozinho enfrentou a todos os que o
cercavam até cahir aos golpes que lhe desferiam. 99
Aqui em Santa Tecla fui visitar uma senhora que tinha na
revolução um filho commigo e ella narrou-me que lá foram para
degollal-a. Não o fizeram, mas passaram-lhe a facca pela garganta
muitas vezes, como quem ia praticar o acto promettido. A pobre
senhora via tudo azul e amarello. Afinal viu-os se irem em garga-
lhadas. Desde então enfermou- se. E' uma cardiaca que em pouco
deixará de existir.
Pag. 287 No Carovi segundo me informaram entre os papeis
tomados havia um ordem do dia do Sr. Santos Filho que fora nosso
prisioneiro, promettendo punir severamente a qualquer dos seus que
fizesse um prisioneiro.
Pag. 294. O official encarregado de dirigir o serviço da dynamite
nos diversos pontos da picada foi o Dr. Fabio Azambuja que o de-
sempenhou cabalmente com os maiores riscos de vida.
Pag. 295. Quem prestou serviços aos feridos na descida do
Uruguay, foi o coronel José Gomes que eu ali deixara com elles.
Pag. 304. onde se lê : sua companheira de folguedos www.com mos-
tra sempre, - leia-se, mestra sempre.
Meu avô materno Joaquim de Sant'Anna Galvão, filho do
senhor do engenho Santa Cruz, em Pernambuco, hoje em Alagoas,
foi chefe revolucionario ali, d'onde fugiu com seu primo Guedes,
bisavô do Dr. Flavio Araujo, hoje deputado federal . Conquistaram
a Pedra Branca onde ficou o Guedes e elle seguiu para o sertão
onde se cazou com minha avó. Em pequeno meu avô paterno quando
-― 430 -
bendo do estado dos meus, mandou buscal- os para sua Estancia onde
estiveram tres mezes. Serviu-lhe então o dinheiro da Cruz vermelha,
que acabava de lhe chegar ás mãos. Não me referiria a isso, senão
para deixar aqui escripto o nome do meu generoso amigo Boaventura
Silva para quem contrahi uma divida que nunca se acabará de pagar.
A cruz vermelha, durante sete mezes mandou cincoenta libras
mensaes á minha familia. Eu estive em campanha dois annos, tive
prejuizos maiores com a minha ida do que o que recebeu- se, em di-
nheiro. Deixei de ganhar talvez uma fortuna porque marchei para
a campanha justamente quando depois de curativos e operações
importantes em Melo meu nome começou a ser espalhado cercado
de grande fama.
Não posso ser portanto considerado medico da cruz vermelha,
tendo como tal ido para a guerra . Isto não implica censura a ninguem,
apenas justifica- me.
Pag. 354. O capitão Baptista tinha no dedo um annel com
um magnifico brilhante. O companheiro que o tirou do cadaver
engeitou por elle, creio que 500$.
Na pacificação , quando o corone! Telles foi receber nossas
armas em D. Pedrito o possuidor do annel, sabendo que a familia
desejava-o, entregou- o ao coronel Telles para lhe ser entregue . Esse
maragato estava tão pobre que o coronel Telles deu-lhe dez mil
reis para comprar alguma couza.
Pag. 365. O coronel Sampaio diz ter morto o que lhe feriu. Nos
só perdemos ali o Alferes Cyriaco portanto o que os dois compa-
nheiros de Cyriaco mataram julgando ter sido o matador de Cyriaco,
foi um outro.
Pag. 364 Cunhatay.
Vi depois de longe esse serro. Representa perfeitamente uma
mulher no decubito dorsal, e o pico de Cunhatahy um seio intumescido .
Pag. 374. bahiano... esta denominação é dada na campanha a
todo nortista , e tambem a todos que não sabem montar a cavallo ;
aos corpos de infantaria.
Muito teriam de se admirar os gaúchos se fossem aos sertões
do norte e ali vissem como os bahianos da Bahia, de Pernambuco ,
Ceará, Piauhy, Goyaz etc etc sabem montar e domar os potros.
Pag. 375. Nesse encontro, o Dr Nabuco de Araujo que viera
como medicò da Cruz vermelha, mas que apezar de extincta esta
quiz continuar a prestar seus serviços , foi ferido .
Pag. 380. Onde se lê degrada pela senda leia- se , degrede .
Pag 389 Onde se lê : dão a vida ao homem substitua-se o
ponto por virgula ; onde se lê : compradores a venderem-se aos com-
pradores, leia-se aos comprados.
Pag. 395. Onde se lê : crepusculo nocturnal mude - se o ponto
em ponto e virgula.
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Lenda Arabe
Adaptada á politica brazileira