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2014. Boletim Anipes - Res

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ISSN 1808-1320

Boletim
Estatísticas Públicas

9/10
Conselho Editorial
Cesar Vaz de Carvalho Jr., José Eustáquio Diniz Alves
José Geraldo dos Reis Santos, José Ribeiro Soares Guimarães,
Nelson de Castro Senra, Paulo Martino Jannuzi,
Paulo Gonzaga Mibielli de Carvalho, Salvatore Santagada

Editores
Cesar Vaz de Carvalho Junior
Edmundo Sá Barreto Figueirôa

Coordenação de Disseminação de Informações


Ana Paula Porto

Editoria-geral
Elisabete Cristina Teixeira Barretto

Revisão de Linguagem
Calixto Sabatini

Editoria de Arte e de Estilo


Ludmila Nagamatsu

Projeto Gráfico
Oficina Editorial

Editoração
Rita de Cássia Assis

Estatísticas Públicas é um boletim técnico-científico voltado à discussão


de questões relacionadas à produção, tratamento metodológico, análise
e disseminação dos dados sociais, demográficos, econômicos, ambientais no Brasil.
Com exceção do Editorial, nenhuma contribuição aqui publicada reflete necessariamente
a posição do Conselho Editorial ou de qualquer de seus membros.

Boletim Estatísticas Públicas, n. 1, (2005- )


Salvador: Anipes, 2014
n. 9/10
Boletim eletrônico (www.anipes.org.br)
ISSN 1808-1320

1. Estatísticas públicas. I. Associação Nacional das


Instituições de Planejamento, Pesquisa e Estatística.

CDU 311.3 (055)


Sumário
B ole t i m E st at íst ic as Públic as • n . 9 /10 • Sa lv a dor, ju l ho 2014

Editorial 04
Artigo 07
Trabalho doméstico: o núcleo duro do déficit de trabalho decente no Brasil....................... 7

IBGE, solidez na tradição como garantia de evoluções prudentes.......................................... 19

Projeções populacionais e políticas públicas: importância e desafios


das novas agendas........................................................................................................................ 41

Mudanças estruturais no território paraense e a dinâmica populacional na


Região de Integraço (RI) Xingu - Pal........................................................................................... 55

A economia do turismo de Pernambuco..................................................................................... 71

Estimativas indiretas da migração para o estado de São Paulo com base


em informações do registro civil................................................................................................ 79

Memória 87
SAGI: Dez anos de informação e conhecimento para aprimoramento
das Políticas de Desenvolvimento Social e Combate à Fome . ............................................... 87

Relatos de Experiências
93
Uso de indicadores sociais georreferenciados no planejamento e
gestão municipal de São Luís – MA........................................................................................... 93

Comunicações de Pesquisas 107


Análise da gestão e da governança metropolitanas das funções
públicas de interesse comum selecionadas............................................................................... 107

Elaboração de diagnósticos para programas sociais: a estratégia multi-métodos para o


Programa Estadual de Qualificação Profissional.................................................................... 113

Projeto de pesquisa: Lendo o Pará................................................................................................ 119

Repercussões dos projetos estruturantes sobre o desenvolvimento


socioeconômico da Bahia.............................................................................................................. 129

Livros e Publicações
139
Editorial
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

A
mais importante missão dos institutos filiados à Associação Nacional das
Instituições de Planejamento, Pesquisa e Estatística (Anipes) é a produção e
disseminação de informação e conhecimento. Estes são fatores sistêmicos
fundamentais ao exercício da cidadania, da competitividade e da ação governamen-
tal. Com base na disponibilidade de informações, grande parte da sociedade civil
organizada passa a ter instrumentos para entender a dinâmica econômica, social,
política e ambiental de um estado, de uma região ou de um país, especialmente em
meio a um ambiente globalizado. No mundo corporativo, as decisões empresariais
tornam-se mais precisas, e no ambiente governamental, a formulação, o monitora-
mento e a avaliação de políticas públicas ficam mais consistentes.

Este boletim, além de cumprir uma parte importante da missão da instituição, tem o
objetivo de disseminar informações e fomentar o debate, constituindo-se em veículo
fundamental no fortalecimento institucional da Anipes no meio social, aumentando
e fortalecendo sua credibilidade e notoriedade técnica e científica junto à sociedade
brasileira e estrangeira – empresários, população em geral, governos, estudantes e
professores, trabalhadores, ONGs e instituições internacionais.

Este número é composto por diversas contribuições, contando com este editorial.
Destas, nove são artigos científicos que discutem desde questões demográficas,
como migrações, mortalidade infantil, projeções e dinâmica populacional, até desen-
volvimento econômico, passando por temas como trabalho doméstico e a questão
do trabalho decente no país, construção de índices, turismo, análise de desempenho
fiscal municipal, entre outros.

Na seção de Comunicação de Pesquisas foram registradas quatro contribuições:


“Análise da gestão e da governança metropolitana das funções públicas de inte-
resse comum selecionadas”; “Elaboração de diagnósticos para programas sociais:
a estratégia multimétodos para o Programa Estadual de Qualificação Profissional”;
“Projeto de pesquisa: lendo o Pará”; e “Repercussões dos projetos estruturantes
sobre o desenvolvimento socioeconômico da Bahia”.

As seções Memória e Relato de Experiência tiveram as seguintes contribuições:


“SAGI: dez anos de informação e conhecimento para aprimoramento das políticas
de desenvolvimento social e combate à fome” e “Uso de indicadores sociais geor-
referenciados no planejamento e gestão municipal de São Luís – Maranhão”.

Maurílio Lima

Presidente Anipes
Anexos
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 8 • Sa lv a dor, outubro 2012

6
Relatos de Experiências
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Trabalho doméstico: o Introdução

núcleo duro do déficit Em 1999, a Organização Internacional do Trabalho

de trabalho decente (OIT) formalizou o conceito de trabalho decente


como uma síntese da sua missão histórica de pro-
no Brasil mover oportunidades para que homens e mulheres
obtenham um trabalho produtivo e de qualidade,
em condições de liberdade, equidade, segurança
José Ribeiro1 e dignidade humana. O trabalho decente é o ponto
de convergência dos quatro objetivos estratégicos
da OIT (o respeito aos direitos no trabalho, a pro-
moção do emprego, a extensão da proteção social
Resumo
e o fortalecimento do diálogo social) e condição
O presente artigo dedica-se a demonstrar que, à luz fundamental para a superação da pobreza, a re-
do conceito de trabalho decente da Organização In- dução das desigualdades sociais, a garantia da
ternacional do Trabalho (OIT), o trabalho doméstico governabilidade democrática e o desenvolvimento
no Brasil, apesar dos avanços recentes, ainda se sustentável. (ABRAMO e GUIMARÃES, 2011).
constitui numa atividade subvalorizada e pouco re-
gulamentada, sendo uma das ocupações com maior O trabalho doméstico é uma importante fonte de
déficit de trabalho decente. Valendo-se de fontes de
dados do Sistema Estatístico Nacional, com ênfase na
ocupação para muitas mulheres e porta de entra-
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) da no mercado de trabalho para as mais pobres.
e na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do É uma atividade importante para o funcionamento
IBGE, e de relatórios recentes divulgados pela OIT, o dos lares e também da economia, na medida em
texto foi estruturado em tópicos que abarcam distin- que oferece suporte e sustentação à esfera produ-
tas e importantes dimensões do trabalho doméstico: tiva, contribuindo, assim, para o bom desempenho
informalidade e desproteção social; níveis de remu-
neração e filiação sindical; conflitos trabalhistas; perfil
econômico dos países.
das despesas das famílias sob responsabilidade de
trabalhadoras/es domésticos; trabalho doméstico e Com base nas estatísticas da OIT referentes ao
a demanda recorrente por medidas de conciliação; trabalho doméstico em 117 países (66,1% do to-
trabalho infantil doméstico; e a Convenção nº 189 so- tal), estimava-se um contingente de 52,6 milhões
bre as Trabalhadoras e os Trabalhadores Domésticos de trabalhadoras e trabalhadores domésticos no
e a importância da Emenda Constitucional Nº 72. As mundo em 2010 – cerca de 83,0% eram mulheres.
análises realizadas ao longo do artigo refletem, de
A região da América Latina e Caribe contava com
forma veemente, a imperiosa necessidade de melhoria
das condições de trabalho, de vida e dignidade das 19,6 milhões de pessoas ocupadas nesta categoria,
trabalhadoras e trabalhadores domésticos, ou seja, o equivalente a mais de um terço (37,0%) do total
de promoção efetiva do trabalho decente. mundial. No Brasil, o contingente era de 6,4 milhões
em 2011.
Palavras-chave: Trabalho doméstico. Trabalho de-
gradante. Trabalho decente. Proteção social. Direitos Apesar de sua contribuição à sociedade, é uma
trabalhistas. atividade subvalorizada e pouco regulamentada,
constituindo-se numa das ocupações com maior
déficit de trabalho decente. Fazendo uso predomi-
nantemente das informações oriundas da Pesquisa
1 Especialista em Estatísticas Laborais da Organização Internacional do
Trabalho (OIT) – Brasília e Genebra. Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e da

7
Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Pesquisa de Orçamentos Familiares (ambas do Apesar de representar apenas 7,5% da categoria,


IBGE) e de diversos relatórios da OIT sobre o tema, a proporção de trabalhadores domésticos do sexo
o objetivo deste artigo é demonstrar que, apesar masculino com carteira assinada (48,4% em 2011)
dos avanços recentes, a ocupação doméstica segue era bem mais elevada em comparação com as tra-
apresentando elevados déficits de trabalho decente balhadoras (30,5%). Entre as domésticas negras,
no Brasil e demanda, portanto, uma efetiva agenda essa proporção era ainda menor (27,4%), sendo
de promoção do trabalho decente para a categoria. cinco pontos percentuais inferior àquela correspon-
dente às brancas (32,3%).

A informalidade e a Em nenhuma das 27 unidades da Federação (UF)


desproteção social o percentual de domésticas com carteira assinada
alcançava 50,0%, sendo que o maior índice era
Segundo os dados da PNAD, o Brasil contava, no observado no Distrito Federal (47,6%), segundo se
ano de 2011, com 6,4 milhões de trabalhadoras e vê no Gráfico 1. No Maranhão, esse percentual era
trabalhadores domésticos com 18 anos e mais de de apenas 10,9%.
idade. Um contingente de 5,9 mi-
lhões de ocupados/as na categoria 50,0 47,6
era do sexo feminino, o correspon- 45,0
39,6
40,0
dente a 92,5% do total. As mulheres 31,8
35,0
negras estavam fortemente presen- 30,0 27,4
tes nesta ocupação, ao representar 25,0
20,0 17,6
60,8% do total de trabalhadoras 17,0
15,0
domésticas. O trabalho doméstico 10,0
11,3
10,9
respondia por 15,5% da ocupação 5,0
0,0
feminina no ano de 2011.
2004 2011

Apesar desta inequívoca importân- Total – Brasil Bahia Maranhão Distrito Federal

cia para um significativo número de


Gráfico 1
pessoas ocupadas, sobretudo para
Percentual de Trabalhadoras e Trabalhadores Domésticos (18 anos e mais de
as mulheres e para a sociedade de
idade) com Carteira de Trabalho Assinada – Brasil, Bahia, Distrito Federal e
um modo geral, o trabalho domés-
Maranhão – 2004-2011
tico ainda é marcado pela preca-
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010) – PNAD.
riedade das condições laborais e
baixa proteção social, constituindo-
-se, portanto, num dos principais núcleos do déficit Seguindo a trajetória geral de aumento da formali-
de trabalho decente no Brasil. zação das relações laborais no país (ainda que num
ritmo mais lento), o percentual de trabalhadoras e
Persistem graves situações de desproteção social trabalhadores domésticos com carteira de trabalho
nessa categoria, marcadas também por significa- assinada aumentou de 27,4% para 31,8% entre 2004
tivas desigualdades de gênero e raça. Com efeito, e 2011. O destaque ficou por conta do Distrito Fede-
no ano de 2011, apenas 31,8%, ou seja, menos de ral, que, além de apresentar a maior proporção do
um terço do total de trabalhadoras e trabalhadores país, conforme já mencionado, experimentou uma
domésticos possuíam carteira de trabalho assinada. evolução de oito pontos percentuais ao passar de

8
Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

39,6% em 2004 para 47,6% em 2011 (vide Gráfico (36,3%). A proporção de contribuintes era maior
1). Em sentido contrário, durante o mesmo perío- entre as mulheres brancas (37,2%) em relação às
do, o Maranhão e a Bahia apresentaram declínio negras (31,8%) no ano de 2011.
desse dado.
Bastante condicionado pela maior proporção com
Em função da baixa proporção de trabalhadoras e carteira de trabalho assinada, o Distrito Federal
trabalhadores domésticos com carteira de trabalho também apresentava o maior percentual de con-
assinada, também é bastante baixo o percentual tribuintes da previdência (53,6%) e mostrou uma
da categoria com acesso à previdência social. En- significativa evolução comparativamente ao ano de
tre 2004 e 2011, a proporção do pessoal ocupado 2004 (41,9%), conforme se observa no Gráfico 2. No
nesta categoria que contribuía para a previdência Maranhão, o referido percentual evoluiu de 11,3%
social aumentou de 29,8% para 37,5%, como mos- para 12,6% entre 2004 e 2011.
tra o Gráfico 2. Vale ressaltar que esse percentual
de contribuintes é mais elevado do que aquele
correspondente ao trabalho com carteira assinada
Níveis de remuneração e
pelo fato, sobretudo, de um contingente de traba- filiação sindical
lhadoras e trabalhadores domésticos contribuir de
forma autônoma, a exemplo daqueles/as que atuam Tratando-se dos níveis de remuneração do trabalho
como diaristas. doméstico, o rendimento médio da categoria era de
apenas R$ 522,40 em setembro de 2011 e corres-
A proporção de contribuintes da categoria aumen- pondia a 96,0% do valor do salário mínimo vigente
tou indistintamente entre homens e mulheres entre na época (R$ 545,00). Ademais, cerca de 22,0%
2004 e 2011, mas no início desta década era muito das trabalhadoras e trabalhadores domésticos
mais elevada entre os trabalhadores do sexo mascu- recebiam até meio salário mínimo mensal. O valor
lino (53,4%) em comparação com as trabalhadoras do rendimento médio e a elevada proporção de pes-
soas que não recebiam sequer o
55,0 53,6
salário mínimo eram bastante con-
50,0
45,0 41,9
dicionados pelo baixo percentual
40,0 37,5 de trabalhadoras e trabalhadores
35,0 29,8 domésticos que possuíam carteira
30,0
25,0 19,6
de trabalho assinada, conforme foi
19,6
20,0 demonstrado anteriormente.
15,0 12,6
11,3
10,0 Os maiores níveis de rendimento
5,0
0,0
eram observados em São Paulo
2004 2011 (R$ 652,66) e no Distrito Federal
Total – Brasil Bahia Maranhão Distrito Federal
(R$ 651,23) e giravam em torno
de 1,2 salário mínimo, conforme a
Gráfico 2 Tabela 1. Já no Piauí (R$ 274,04),
Percentual de Trabalhadoras e Trabalhadores Domésticos (18 anos e mais de Maranhão (R$ 305,18) e na Paraíba
idade) que contribuem para a previdência social – Brasil, Bahia, Distrito Federal (R$ 310,16) a remuneração média
e Maranhão – 2004-2011 ficava em torno de meio salário
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010) – PNAD. mínimo mensal.

9
Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Maranhão (16,1%) e no Piauí (10,5%). Em São Paulo,


Tabela 1
Rendimento médio real no trabalho principal das traba- que abrigava o maior contingente de trabalhadores/
lhadoras e trabalhadores domésticos Brasil e unidades as da categoria (1,55 milhão), apenas 2,0% eram
da federação selecionadas – 2011 filiados a sindicato.
Valor
Área geográfica
(Em R$) Em SM Conflitos trabalhistas
Brasil 522,40 0,96
São Paulo 652,66 1,20
Distrito Federal 651,23 1,19 No ano de 2009, o IBGE realizou um levantamento
Santa Catarina 620,54 1,14 suplementar da PNAD sobre acesso à Justiça 2, em
Rio de Janeiro 620,02 1,14 parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Bahia 333,32 0,61 Uma das dimensões investigadas foi o envolvimento
Paraíba 310,16 0,57 da população com 18 anos ou mais de idade em
Maranhão 305,18 0,56 “[...] situação de conflito, que corresponde a toda
Piauí 274,04 0,50 situação problemática que pode envolver violência
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010) – PNAD.
ou não, decorrente das relações entre indivíduos ou

Tabela 2
Número e percentual de trabalhadoras e trabalhadores domésticos de 18 anos ou mais de idade filiados a sindicato
Brasil e unidades da federação selecionadas – 2004-2011
2004 2011
Área geográfica
Número de filiados Número de filiados
Sim Não (%) Sim Não (%)
Brasil 96.839 5.951.796 1,6 176.387 6.218.860 2,8
Bahia X 328.495 X 15.426 429.679 3,5
Ceará 11.129 220.326 4,8 17.538 218.304 7,4
Goiás 4.515 248.827 1,8 5.820 244.511 2,3
Maranhão X 138.607 X 20.685 107.847 16,1
Minas Gerais 9.424 741.820 1,3 16.834 733.227 2,2
Piauí X 71.976 X 9.051 76.913 10,5
Rio Grande do Sul 7.764 301.451 2,5 14.531 365.303 3,8
São Paulo X 1.439.964 X 31.409 1.522.604 2,0
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010). Microdados da PNAD.
Escritório da OIT no Brasil.
X – Corresponde a dados restritos devido ao pequeno número de observações na amostra.

entre indivíduos e instituições públicas ou privadas.


Mesmo diante do importante trabalho realizado pela Algum ramo do direito é responsável pelos bens ju-
Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas rídicos (liberdade, igualdade, expressão, patrimônio
(Fenatrad) e pelos diversos sindicatos de emprega- etc.) ofendidos ou ameaçados nestas situações”
das e trabalhadoras domésticas espalhadas pelo
país, apenas 2,8% do pessoal ocupado na categoria
era filiado a sindicato no ano de 2011, sendo que em 2 Segundo a concepção adotada pela PNAD, entende-se acesso à Jus-
2004 a proporção era de 1,6% (Tabela 2). tiça em sentido amplo, ou seja, está incluída a formulação de políticas
públicas destinadas a garantir os direitos fundamentais e a prevenir
conflitos. Trata-se, portanto, de inclusão social e não apenas do aces-
Entre as unidades federativas, os maiores percentu- so ao serviço prestado pelo Poder Judiciário, compreendendo outras
esferas de poder, seja ele público, privado, do terceiro setor ou da so-
ais de filiação sindical em 2011 eram observados no ciedade civil.

10
Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

(INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ES- No caso da categoria de trabalhadoras e trabalhado-


TATÍSTICA, 2010). res domésticos, o principal conflito em 2009 era na
área da família e respondia por 42,9% – proporção
O suplemento da PNAD levantou que um contingente mais do que duas vezes superior ao correspondente
de 12,6 milhões de pessoas de 18 anos ou mais de ida- ao conjunto da população (22,0%), conforme o Grá-
de esteve envolvido em situações de conflito nos cinco fico 3. Já os conflitos de natureza trabalhista corres-
anos anteriores à data da entrevista3, o correspondente pondiam a 15,4% para os ocupados e ocupadas no
a 9,4% do total populacional desta faixa etária. trabalho doméstico, enquanto era de 23,3% entre a
população brasileira.
No concernente as áreas investi-
gadas4 pela PNAD que representa- 50,0
vam os maiores problemas para a 45,0 42,9

população brasileira envolvida em 40,0


situações de conflito, a área traba- 35,0
30,0
lhista alcançava o maior percentual 23,3 23,8
25,0 22,0
(23,3%), seguida pela de família5 20,0 15,4 16,4
(22,0%), criminal (12,6%), serviços 15,0 12,6
9,8 9,7
de água, luz ou telefone6 (9,7%) e 10,0 7,1
8,6 8,4

de benefícios do INSS ou previdên- 5,0


0,0
cia7 (8,6%), conforme o Gráfico 3. Previdência Serv. água, luz
Trabalhista Família Criminal Outras
social e telefone

Os conflitos trabalhistas abarcam Trabalhador/a Doméstico População


as dificuldades relacionadas a
Gráfico 3
emprego, salário e condições de
Distribuição percentual da população de 18 anos ou mais de idade e de traba-
trabalho. Em geral, envolvem tanto
lhadoras/es domésticos que tiveram situação de conflito durante o período de
trabalhadores quanto empregado-
referência de cinco anos, por área de situação do conflito – Brasil – 2009
res quando são discutidas férias,
Fonte:IBGE–Microdados da PNAD (Suplemento de Vitimização e Justiça).
vantagens, licenças, auxílios (mora- Elaboração: Escritório da OIT no Brasil.

dia/alimentação/insalubridade/peri-
culosidade), greves e demissões.
Tratando-se dos conflitos trabalhistas, dentre as
3 Entre 27 de setembro de 2004 e 26 de setembro de 2009. trabalhadoras e trabalhadores domésticos que bus-
4 Trabalhista, criminal, família, terra/moradias, serviços de água, luz e te- caram solução (90,0% do total), 79,3% procuraram
lefone, impostos/tributação, benefícios do INSS/previdência, bancos/
instituições financeiras e outros. a Justiça – no caso, foi movida uma ação judicial
formal. Em seguida, 10,1% procuraram o Juizado
5 Problemas relativos a separações conjugais, investigações de paterni-
dade e divisão de bens e direitos, tais como herança, pensões alimen- Especial (antigo Juizado de Pequenas Causas). Até
tícias e guarda de filhos.
a época da pesquisa, mais da metade (54,0%) dos
6 Falta, interrupção ou qualquer outro problema no fornecimento des-
ses serviços, cobranças excessivas ou incidentes, como queima de
conflitos ainda não tinham obtido solução. Dentre
aparelhos eletrodomésticos e inclusão de nomes em bancos de dados aqueles que tiveram, 50,6% foram solucionados
de inadimplentes (SPC e Serasa). Geralmente são valores baixos (as
antigas “pequenas causas”) e as reclamações são encaminhadas aos em até um ano. Acerca dos principais responsáveis
juizados especiais.
pela solução do conflito figuravam: Justiça (65,8%),
7 Relativos à previdência social, como aposentadorias, licenças, auxílios Juizado Especial (11,4%) e advogado particular/
em caso de gestação, de acidentes de trabalho, benefícios decorrentes
de incapacidade para o trabalho, entre outros. Defensoria Pública (12,5%).

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Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Perfil das despesas das gastos naquelas modalidades mais diretamente


famílias sob responsabilidade atreladas à sobrevivência, as famílias nas quais a
pessoa de referência era trabalhadora ou trabalha-
de trabalhadoras/es dor doméstico alocavam cerca de 59,0% de sua
domésticas/os despesa média com os grupos alimentação (23,3%)
e habitação (35,5%).
Com base nas informações provenientes da Pesqui-
sa de Orçamentos Familiares (POF) 2008-2009 do As despesas com transporte representavam cerca
IBGE, é possível traçar um breve perfil das despesas de 12,0% do gasto total das famílias de trabalha-
das famílias sob responsabilidade de trabalhadoras/ doras e trabalhadores domésticos. Vale ressaltar
es domésticas/os. que nos grandes centros urbanos as dificuldades
de locomoção assumem maior magnitude e afetam
Segundo as informações dispostas no Gráfico 4, as de forma mais contundente os trabalhadores de
famílias que possuíam trabalhadora ou trabalhador baixa renda (a exemplo das/dos domésticas/os),
doméstico como pessoa de referência apresenta- que costumam residir em áreas periféricas, comu-
vam despesa média mensal familiar de apenas R$ mente distantes das regiões de maior dinamismo
1.248,09 (cerca de três salários mínimos da época) econômico e oferta de emprego, trabalho e renda.
– valor bastante abaixo comparativamente às despe- Esses trabalhadores necessitam, muitas vezes,
sas efetuadas pelas famílias sob responsabilidade utilizar diferentes linhas ou modalidades de trans-
de empregador (R$ 6.373,62), empregado público porte (ônibus e metrô ou trem, por exemplo), o que
(R$ 4.327,08), empregado privado (R$ 2.497,14) e também impacta o orçamento doméstico.
trabalhador por conta própria (R$ 2.377,61).

Em função dos baixos níveis de rendimento e, con- Trabalho doméstico e


sequentemente, da necessidade de concentrar os a demanda recorrente
por medidas de
(R$)
conciliação
7.000,00
6.373,62

6.000,00
A cadeia do cuidado está atual-
5.000,00
4.327,08 mente baseada quase inteiramente
4.000,00
sobre o trabalho das mulheres.
2.732,85
3.000,00 2.497,14 2.377,61 2.473,02 Neste contexto, as trabalhadoras
2.000,00 domésticas desempenham um
1.248,09
1.000,00
936,44 papel de suma importância, pois
0,00 amortecem, no âmbito das famí-
Empregado Empregado Trabalhador
Total privado público
Trabalhador
doméstico
Empregador Conta própria para o próprio Outras (1) lias e principalmente para outras
consumo ou uso
mulheres trabalhadoras, a pressão
Gráfico 4 gerada pela necessidade de com-
Valor da despesa total por posição na ocupação principal da pessoa de referência patibilizar a inserção no mercado
da família – Brasil – 2008-2009 de trabalho com as responsabilida-
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa de Orçamentos Familiares
2008-2009. des familiares, em um cenário de
Nota: O termo família está sendo utilizado para indicar a unidade de investigação da pesquisa ‘’Unidade de Consumo’’.
(1) Aprendiz e trabalhador em ajuda a membro da família. importantes lacunas em termos de

12
Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

políticas púbicas nessa área (GUIMARÃES, 2012). A dupla jornada de trabalho é ainda mais extensiva
Por outro lado, são as trabalhadoras domésticas que e estafante para o conjunto de trabalhadores/as
mais fortemente sofrem esta pressão, em razão dos domésticos/as que já dedicam mais de 45 horas
baixos rendimentos que impedem a contratação de ao mercado laboral. Conforme a Tabela 3, ao con-
serviços que apoiem o trabalho reprodutivo, confor- jugarem-se as informações relativas às 20,3 horas
me evidenciado anteriormente nos
tópicos que abordaram os níveis de 35,0
32,0
rendimento e o perfil das despesas 31,4 31,8

da categoria. 30,0
25,3
25,0
A jornada de trabalho é bastante
extensa. Conforme o Gráfico 5, em 20,0
17,0
2011, mais de um quarto (25,6%) 15,0 13,5 13,5
12,8
12,1
da categoria de trabalhadoras e 10,7

trabalhadores domésticos no país 10,0

possuía jornada semanal de traba- 5,0


lho superior a 45 horas, sendo que,
0,0
para o conjunto da população ocu- Até 14 horas De 15 a 39 horas De 40 a 44 horas De 45 a 48 horas Mais de 48 horas

pada, tal percentual era de %. Em Bahia Brasil

algumas unidades federativas, a


Gráfico 5
exemplo da Bahia, o percentual de
Distribuição percentual das trabalhadoras e trabalhadores domésticos por
domésticos/as com jornada laboral grupos de horas trabalhadas – Brasil e Bahia – 2011
superior a 45 horas por semana era Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010) – PNAD.
ainda maior (30,5%) (Gráfico 5).
de trabalho semanal dedicadas aos afazeres do-
A esmagadora maioria da categoria, sobretudo as
mésticos e de cuidado em seus próprios domicílios
mulheres, ainda dedica diversas horas diárias aos
(reprodução social9) com as 52,6 horas referentes à
afazeres domésticos8 em suas próprias moradias.
jornada exercida no mercado de trabalho (produção
Os baixos níveis de rendimento dificultam a aqui-
econômica) em lares de terceiros, constata-se que
sição de bens e serviços que apoiem a execução
a jornada semanal total da categoria de trabalhado-
das atividades domésticas e de cuidado – a título
res/as domésticos/as (com jornada semanal acima
de exemplo, em 2011, mais da metade (58,3%) dos
de 45 horas e que realizava afazeres domésticos)
domicílios brasileiros chefiados por trabalhadoras
era de aproximadamente 73 horas semanais no
domésticas não possuía máquina de lavar roupa,
ano de 2011. Em termos absolutos, correspondia
sendo que, na Região Nordeste, tal proporção alcan-
a cerca de 1,3 milhão de trabalhadores/as (21,7%
çava 85,0%. Ademais, as trabalhadoras costumam
do total), significando que, em média, um em cada
residir em locais com precariedade de oferta de
cinco ocupados/as no trabalho doméstico possuía
serviços públicos nesta área, a exemplo de creches.
jornada dupla de 73 horas por semana.

8 Afazeres domésticos englobam a realização, no domicílio de residência,


de tarefas não econômicas (ou seja, que não atendem às condições 9 Entende-se o trabalho de reprodução social como aquele necessário
estabelecidas no conceito de trabalho) de arrumar ou limpar a moradia, à reprodução da sociedade, mas que não se realiza para o mercado e
cozinhar, lavar roupa, cuidar de filhos ou de menores de idade, orientar cujo valor econômico não é reconhecido. Para uma abordagem mais
ou dirigir trabalhadores domésticos etc. profunda sobre o tema, ver Dedecca, 2008.

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Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Tabela 3
Trabalhadoras/es domésticos de 18 anos ou mais de idade que realizam afazeres domésticos, por sexo, com jornada
superior a 45 horas por semana, segundo a média de horas semanais dedicadas ao mercado de trabalho e aos afazeres
domésticos – Brasil – 2011
Média de horas semanais Média de horas semanais Jornada semanal
Área geográfica no mercado de trabalho gastas c/ afazeres domésticos total
(A) (B) (A + B)

Brasil 52,6 20,3 72,9


Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010). Microdados da PNAD.
Elaboração: Escritório da OIT no Brasil.

TRABALHADORAS/ES DOMÉSTICOS doméstico sem carteira assinada (6,7%) e também


DE 18 ANOS OU MAIS DE IDADE entre as trabalhadoras domésticas (6,8%).

QUE REALIZAM
Tabela 4
Percentual de população ocupada com depressão
Ademais, se trata de uma ocupação na qual a não Segundo a posição na ocupação – Brasil – 2008
observância dos direitos humanos e dos direitos % de
Posição na ocupação trabalhadores/as
fundamentais no trabalho é marcante. Comu-
com depressão
mente, as/os trabalhadoras/es domésticas/os têm Empregado com carteira assinada 2,9
seus direitos trabalhistas violados e são vítimas Funcionário público estatutário 6,0
de diversas formas de discriminação e de assédio Empregados sem carteira 2,8
moral e sexual. Trabalhador doméstico 6,5
Trabalhador doméstico com carteira assinada 5,7
Guimarães (2012) enfatiza que este ambiente e o en- Trabalhador doméstico sem carteira assinada 6,7
torno de trabalho precário são um notório exemplo Conta própria 4,7
da tensão e sobrecarga psíquica exercida entre as Empregador 4,1
mulheres no âmbito das dificuldades de conciliação Trabalhador na produção para o próprio consumo 6,0
entre trabalho e família. Segundo o Suplemento de Trabalhador na construção para o próprio uso 5,9

Saúde da PNAD de 2008, a incidência de depres- Não remunerado 4,3

são10 entre as trabalhadoras e trabalhadores dos Total 3,9


Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2010) – Microdados da PNAD.
serviços domésticos alcançava 6,5%, situando-se Elaboração: Escritório da OIT no Brasil.

bastante acima da média correspondente ao con-


junto da população ocupada (3,9%), além de ser a
Em termos absolutos, cerca de 430 mil trabalha-
mais elevada dentre todas as categorias de posição
doras e trabalhadores domésticos apresentavam
na ocupação, conforme a Tabela 4. Vale a pena
transtorno depressivo, o equivalente a 5,5% do
chamar a atenção para o fato de que a incidência
total de pessoas com depressão no país, além de
de depressão era ainda maior entre o trabalho
ser a categoria ocupacional com maior contingente
absoluto com esse transtorno.
10 As informações se referem às pessoas com depressão diagnosticada
e de forma autorreferida. Objetivando assegurar a qualidade da infor-
mação, o IBGE considerou a existência de doença crônica, no caso a A inclusão das trabalhadoras domésticas em to-
depressão, quando a pessoa entrevistada declarou que a enfermidade
foi diagnosticada por médico ou profissional de saúde. Considerou-se
das as dimensões da proteção social, inclusive na
como depressão: problema de diminuição da atividade por causa de proteção à maternidade e também nos cuidados
estado emocional, apatia, abatimento moral com letargia, falta de cora-
gem ou ânimo para enfrentar a vida. com a primeira infância, é medida indispensável de

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Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

conciliação entre trabalho e família para garantir a mil em 2004 para 257 mil em 2011 (uma redução
estas trabalhadoras e a suas filhas e filhos direitos de 146 mil pessoas em sete anos). No ano de 2011,
essenciais como cidadãs e cidadãos. 93,7% deste contingente era composto por meninas,
sendo que 62,4% correspondiam a meninas negras.
No ano de 2011, sete unidades da Federação res-
O trabalho infantil doméstico pondiam por mais da metade (150 mil ou 58,3%)
do total de menores envolvidos nesta situação de
Apesar de proibido para menores de 18 anos, o trabalho proibida por lei:
trabalho doméstico em casa de terceiros ainda é
• Minas Gerais (31,3 mil – 12,2% do total nacio-
uma realidade na vida de crianças e adolescentes nal)
brasileiros/as. Trata-se de um “trabalho invisível”,
• Bahia (26,6 mil – 10,3%)
na medida em que é realizado no interior de resi-
dências que não são as suas, sem nenhum sistema • Maranhão (20,7 mil – 8,0%)
de controle e longe de suas famílias. Predominan- • São Paulo (20,4 mil – 7,9%)
temente são meninas, que levam prematuramente
uma vida de adulto, trabalhando muitas horas • Pará (19,3 mil – 7,5%)
diárias em condições prejudiciais à sua saúde e • Ceará (17,0 mil – 6,6%)
desenvolvimento, por um salário baixo ou em troca
de habitação e educação. • Paraná (15,0 mil – 5,8%)

A desinformação e a crença popular de que o tra- Por outro lado, em nove unidades federativas o
balho infantil doméstico não traz perigo e que se contingente era tão reduzido que não assumia
trata, inclusive, de uma atividade “desejável” são o significância estatística. Tais informações permitem
maior entrave para a proteção de crianças e ado- concentrar esforços em espaços geográficos espe-
lescentes imersos nesta atividade. Os riscos fazem cíficos do país em prol da erradicação do trabalho
com que diversos países o classifiquem entre os infantil doméstico.
trabalhos perigosos, proibidos para menores de 18
anos, conforme o Artigo 3º da Convenção nº 182
A Convenção nº 189 sobre
da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de
1999, sobre as piores formas de trabalho infantil. No
as Trabalhadoras e os
Brasil, o Decreto nº 6.481, de 12 de junho de 2008, Trabalhadores Domésticos
regulamenta os artigos 3º, Alínea “d”, e 4º da referida e a importância da Emenda
convenção. Dentre os principais riscos, destacam- Constitucional Nº 72
-se longa jornada laboral; trabalho físico pesado e
de risco à saúde; abuso físico, emocional e sexual;
A Conferência Internacional do Trabalho da OIT
inexistência de oportunidades educativas; baixa
adotou, em 16 de junho de 2011, a Convenção sobre
remuneração ou trabalho somente por moradia e ali-
Trabalhadoras e Trabalhadores Domésticos, 2011
mentação; além da ausência de oportunidades para
(nº 189) e a Recomendação11 nº 201 sobre Trabalha-
o desenvolvimento emocional e social (OIT, 2011).
doras e Trabalhadores Domésticos, que estabelece
No Brasil, o contingente de crianças e adolescentes
de 10 a 17 anos de idade em situação de trabalho 11 A recomendação complementa a convenção, com diretrizes e suges-
tões de políticas para avançar na implementação dos direitos e princí-
infantil doméstico declinou 36,0% ao diminuir de 403 pios anunciados na convenção.

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Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

direitos e princípios básicos para esta categoria trabalhadores, incluindo a proteção à materni-
e orienta os estados no sentido de tomarem uma dade (Artigo 14).
série de medidas com a finalidade tornar o trabalho
decente uma realidade para as trabalhadoras e os • Normas relativas ao trabalho doméstico infantil:
obrigação de fixar uma idade mínima. Não se
trabalhadores domésticos.
devem privar os trabalhadores e as trabalhadoras
As normas mínimas estabelecidas pela Convenção adolescentes da educação obrigatória (Artigo 4).
Nº 189 são:
• Trabalhadores e trabalhadoras que dormem
no trabalho: condições de vida digna, que res-
• Direitos básicos das trabalhadoras e dos traba-
peitem a privacidade. Liberdade para decidir
lhadores domésticos: respeito e proteção com se reside ou não no domicílio onde trabalham
relação aos princípios e direitos fundamentais (artigos 6, 9 e 10).
no trabalho. Isso significa proteção com rela-
ção ao trabalho infantil, a todas as formas de • Trabalhadores e trabalhadoras migrantes: um
trabalho forçado ou obrigatório, a todas as contrato por escrito no país de emprego, ou
formas de discriminação e a garantia do direito uma oferta de trabalho escrita, antes de sair de
de associação e de negociação coletiva. Pro- seu país (artigos 8 e 15).
teção efetiva contra todas as formas de abuso,
• Agências privadas de emprego: regulamen-
assédio e violência (artigos 3, 4, 5 e 11). tação da operação das agências privadas de
emprego (Artigo 15).
• Informação sobre os termos e condições de
emprego: informação disponível e facilmente • Solução de conflitos e queixas: acesso efetivo
compreensível, de preferência por meio de aos tribunais ou outros mecanismos de solução
contrato escrito (Artigo 7). de conflitos, incluindo mecanismos de denúncia
acessíveis (Artigo 17).
• Horas de trabalho: medidas destinadas a
garantir a igualdade de tratamento entre as Até o final de julho de 2013, oito países tinham rati-
trabalhadoras e trabalhadores domésticos e os ficado a Convenção nº 189:
trabalhadores em geral. Período de descanso
• Uruguai (14 de junho de 2012)
semanal de pelo menos 24 horas consecutivas
(Artigo 10). • Filipinas (5 de setembro de 2012)

• Maurício (13 de setembro de 2012)


• Remuneração: direito ao salário mínimo esta-
belecido, pago diretamente à trabalhadora ou • Nicarágua (10 de janeiro de 2013)
trabalhador doméstico, em intervalos regulares
• Itália (22 de janeiro de 2013)
de não mais de 30 dias. Pagamento in natura é
permitido apenas em certas condições (artigos • Bolívia (15 de abril de 2013)
11, 12 e 15).
• Paraguai (7 de maio de 2013)
• Segurança e saúde: direito a um trabalho seguro • África do Sul (20 de junho de 2013)
e a um ambiente laboral saudável (Artigo 13).
A adoção da Convenção 189 no âmbito da OIT
• Seguridade social: condições que não sejam estabelece um importante marco em termos do
menos favoráveis que as aplicáveis aos demais estabelecimento de patamares mínimos de direitos

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Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

para uma categoria que é frequentemente vítima de abaixo do salário mínimo. A representatividade e
violação dos direitos humanos e dos direitos fun- a atuação sindical em prol da melhoria das condi-
damentais no trabalho (trabalho forçado, trabalho ções de trabalho também enfrentam obstáculos na
infantil e discriminação). medida em que apenas 2,8% das trabalhadoras e
trabalhadores estavam associados/as a sindicato. A
No dia 2 de abril de 2013, o Congresso Nacional dupla e extensiva jornada de trabalho e as severas
promulgou a Emenda Constitucional Nº 72, que dificuldades de conciliação entre trabalho e família
estabeleceu a igualdade de direitos trabalhistas en- submetem cerca de 22,0% das trabalhadoras e tra-
tre os/as trabalhadores/as domésticos e os demais
balhadores a uma jornada semanal total (exercida
trabalhadores. Antes da emenda, era assegurada à
no mercado laboral e em seus próprios lares) em
categoria apenas parte dos direitos garantidos pela
torno de 73 horas.
Constituição aos demais trabalhadores. Entre os
novos direitos, figuram o controle da jornada de tra- Tal precariedade laboral e as péssimas condições de
balho, limitada a 44 horas semanais e não superior vida exercem uma sobrecarga física e psíquica que
a oito horas diárias; o pagamento de horas extras tornam o trabalho doméstico a posição na ocupação
(remuneradas com valor pelo menos 50% superior com maior incidência de transtorno depressivo.
ao normal) e o Fundo de Garantia do Tempo de Ser-
viço (FGTS), cujo valor a ser recolhido mensalmente O conjunto destas informações e as diversas outras
(pago pelo/a empregador/a) corresponde a 8,0% análises realizadas ao longo do artigo refletem, de
do salário estipulado em contrato. A proposta da forma veemente, a imperiosa necessidade de me-
referida emenda surgiu no contexto pós-aprovação lhoria das condições de trabalho, de vida e dignida-
da Convenção nº 189 da OIT. de das trabalhadoras e trabalhadores domésticos,
ou seja, de promoção efetiva do trabalho decente.
Considerações finais A reparação dessa dívida histórica (que remonta à
época da escravidão) deve ser uma meta incansa-
velmente perseguida pelo conjunto da sociedade
No Brasil, o trabalho doméstico é uma categoria
e demanda uma maior conscientização em prol da
predominantemente composta por mulheres (92,5%
valorização do trabalho doméstico e do fiel cumpri-
do total) e negras (cerca de 61,0% do total) e res-
mento dos seus dispositivos legais.
ponde por 15,5% da ocupação feminina no país.
Se, por um lado, o trabalho doméstico figura na
ponta da cadeia de cuidado, por outro, representa Referências
o elo mais fraco nessa cadeia, pois essa ocupação
ABRAMO, Laís; GUIMARÃES, José Ribeiro
carece de proteção social e condições de trabalho
Soares. Trabalho decente, combate à pobreza e
adequadas, ou seja, é marcada por significativos desenvolvimento. No Mérito, Rio de Janeiro, v. 16, n.
déficits de trabalho decente. Com efeito, menos de 45, p. 10-11, dez. 2011.
um terço (31,8%) das/os trabalhadoras/es domés-
ticas/os possuía carteira de trabalho assinada e o DEDECCA, Claudio Salvadori. Regimes de trabalho,
percentual de contribuintes da previdência era de uso do tempo e desigualdade entre homens e
apenas 37,5% no ano de 2011. mulheres. In: COSTA, Albertina de Oliveira et al.
(Org.). Mercado de trabalho e gênero: comparações
Em função, sobretudo, da informalidade, o ren- Internacionais. Rio de Janeiro: FGV, 2008. v. 1, p.
dimento médio mensal da categoria se situava 279-298.

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GUIMARÃES, José Ribeiro Soares. Perfil do trabalho ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO.


decente no Brasi: um olhar sobre as Unidades Salários dignos para as trabalhadoras domésticas
da Federação. Brasília: OIT, 2012. Disponível em: remuneradas. [S.I.]: OIT, 2011b. (Série O Trabalho
<http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/ doméstico remunerado na América Latina, n. 2).
gender/pub/relatorio_trabalho_decente_880.pdf>. Disponível em: <http://www.oit.org.br/sites/default/
Acesso em: 2 jul. 2013. files/topic/gender/pub/notas_oit_2_558_732.pdf>.
Acesso em: 27 jun. 2013.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA. Pesquisa de Orçamentos Familiares ______. Promoção da igualdade de gênero e políticas
2008-2009: perfil das despesas no Brasil: indicadores de conciliação entre o trabalho e a família. [Brasília]:
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no Brasil: 2009. Rio de Janeiro: IBGE, 2010.
ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO.
INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION - ILO. Um trabalho decente para as trabalhadoras
Domestic work is not just a “domestic issue”. World of domésticas remuneradas no continente. [S.I.]: OIT,
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2011. América Latina, n. 1). Disponível em: <http://www.
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ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO.
oit_1_557_730.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2013.
Erradicar o trabalho infantil doméstico. [S.I.]: OIT,
2011a. (Série O Trabalho doméstico remunerado na
América Latina, n. 3). Disponível em: <http://www.
oit.org.br/sites/default/files/topic/gender/pub/notas_
oit_3_559_733.pdf>. Acesso em: 27 jun. 2013.

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Artigo
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IBGE, solidez na inúmeras dificuldades, ao lado de homens notáveis,


com realce a Bulhões Carvalho, a quem dizia seu
tradição como mestre. Em Minas Gerais, ensaiou soluções, matu-
rou caminhos alternativos. E quando surgiram as
garantia de evoluções condições sociopolíticas, fez uma inflexão positiva

prudentes na atividade estatística brasileira.

Isso é bem expresso em magnífico necrológio que


o poeta Carlos Drummond de Andrade, seu antigo
Nelson de Castro Senra1 colega no Ministério da Educação, publicou no ve-
lho Correio da Manhã, em 25 de fevereiro de 1956,
Além [da] preocupação de harmonia e equi- pranteando seu falecimento (três dias antes, a 22).
líbrio para os seus esquemas, hão de ter Era capaz de sonhar, mas também de realizar, e era
– os estatísticos e os geógrafos – o apego à incansável. Intelectual excepcional, soube pensar
tradição, procurando a renovação antes em o Brasil e o fez pelas estatísticas, viu seu presente
diretrizes evolutivas e de prudente avanço, do e maturou seu futuro.
que em sugestões de radicais transformações.
E porque é assim, posso assegurar que as Antes dele, nossa estatística era um serviço
soluções e os alvitres já sedimentados no co- à espera de uma fórmula, e essa fórmula foi
mum assentimento dos nossos observadores ele quem a cunhou e fez aplicar: cooperação
formam um conjunto impressionantemente
interadministrativa. Não teríamos nunca esta-
homogêneo, um verdadeiro sistema a que, em
tística brasileira por um esforço federal isolado,
nossos círculos íntimos, aludimos, em expres-
maciço que fosse; era necessário, transpondo
siva síntese, como sendo o “Ideário Cívico dos
montanhas de inibições, interessar no assunto
Ibgeanos”. (FREITAS, 1943, p. 527).
todas as unidades políticas, chegar até o mu-
nicípio, criar um sistema. O sistema está em
Introdução pleno funcionamento, malgrado os golpes que
a política lhe vibra. E se hoje nos conhecemos
mais a nós mesmos, se é possível elaborar
Tradição, sempre ampla, em esquema sistêmico,
planos de governo com base em dados po-
sem sectarismo. Sólida o bastante para conseguir
sitivos, se a iniciativa particular na promoção
assimilar ou mesmo praticar evoluções, rejeitando
de riquezas dispõe de elementos essenciais
revoluções. Essa a terra fértil em que foi plantada a
para conhecimento do meio social e econô-
credibilidade e a legitimidade institucionais.
mico, tudo isso se deve a Teixeira de Freitas.
E o espírito desta tradição emergiu da paciente Teve antecessores ilustres e colaboradores
de grande porte, mas a ideia, repito, é dele,
catequese de Teixeira de Freitas, em não menos
como também a prática, e dele a maior glória.
paciente animação diuturna. À época, vivenciou
(O FALECIMENTO..., 1956, p. 63).

1 Doutor em Ciência da Informação – Universidade Federal do Rio de De fato, arregimentou colaboradores e, mais ainda,
Janeiro (UFRJ) e Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tec-
nologia (IBICT); pesquisador aposentado do Instituto Brasileiro de Ge- formou gerações de irresolutos seguidores. Moldou
ografia e Estatística (IBGE); professor do Programa de Mestrado em uma tradição, uma “mística ibgeana” pela qual seus
Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ci-
ências Estatísticas (ENCE/IBGE); sócio efetivo do Instituto Histórico e quadros, em todos os tempos, e até hoje, têm forte
Geográfico do Rio de Janeiro; sócio fundador da Associação das Amé-
ricas para a História da Estatística e do Cálculo de Probabilidades. sentimento de pertencimento, partilhando valores

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e crenças, seguindo um “ideário cívico” que ele es- A razão de existir o IBGE
creveu e ofereceu à nação via IBGE. Seus quadros,
onde estivessem, em gabinete ou em campo, todos
No contexto da reforma do governo Getúlio Vargas,
se sabiam (e se sabem) retratando a população
brasileira de per se, bem assim, conformada em ao final de 1930, após a queda da Primeira Repúbli-
segmentos na sociedade (o idoso, o jovem, o do- ca, foi instituído o Ministério do Trabalho, Indústria e
ente, o estudante etc., com suas posses, com suas Comércio2. Na estrutura desse ministério, foi incorpo-
carências etc.), e em suas relações econômicas, rado o Departamento Nacional de Estatística, criado
no território nacional, e disso sempre se orgulham. pela junção da antiga Diretoria-Geral de Estatística
(até então, afeta ao extinto Ministério da Agricultura,
Pois este texto pretende dissertar tanto sobre a ori- Indústria e Comércio) e da Diretoria de Estatística
gem desta tradição, focando a atuação de Teixeira Comercial (do Ministério da Fazenda)3, cujo diretor,
de Freitas, para revelar sua concepção da atividade Leo de Affonseca, assumiria o novo órgão. Já Bulhões
estatística brasileira, quanto registrar, em breves Carvalho, que comandou a Diretoria-Geral de Estatís-
traços, os dois momentos históricos de evoluções tica por quase 20 anos, se retirou do serviço público.
havidos. Não haverá incursão exaustiva sobre mu- Na opinião de Teixeira de Freitas, esta medida,
danças metodológica, mas apenas menções. Seu
foco será a formação laboriosa da tradição. Não [...] embora aparentemente racionalizadora,
uma tradição estática, avessa à mudança, ao con- era, de fato, desaconselhável, senão mesmo
trário, uma tradição aberta ao novo, quando tornado errada, tanto administrativa e como tecnica-
imperativo. Uma tradição tão sólida que protege mente. Mantinha-se a imprópria subordinação
a instituição dos modismos, das aventuras, das da estatística geral, como um todo – tanto vale
dizer, como função eminentemente política
eventuais nefastas influências. Uma tradição que
do Estado, – a um Ministério que não o dos
conformou e consolidou a reconhecida credibilida-
negócios políticos. E isso ao mesmo tempo
de institucional, sustentação de sua legitimidade.
que se retirava um grande setor estatístico, da
Para seguir, então, é preciso primeiro lembrar o
dependência ministerial que lhe era mais pro-
estado das artes.
pícia em todos os sentidos, para colocá-lo em
um Ministério que só lhe dedicaria interesse
Antes, porém, uma justificativa para escrever este
secundário e nem tinha sequer os meios para
texto e o intentar divulgar numa publicação da as-
favorecer seu desenvolvimento. Por outro lado,
sociação que congrega instituições de estatística
deixava-se esquecida a lição da experiência
estaduais. A razão é simples. A nosso juízo, refletir universal, que já tornara claro não ser mais
essa narração poderá acordar nessas instituições a possível, a um Estado moderno, gerir os seus
importância de cristalizar em seus cotidianos uma negócios mantendo os diferenciados apare-
tradição, estimulando e valorizando uma continui- lhos do governo e da administração alheios à
dade sócio-histórica. Os anos zero são sempre função estatística, a fim de entregar este es-
nefastos e, mesmo que decorram de mudanças de sencial objetivo governamental aos cuidados
governo, não raro vêm apenas de meras vaidades. de um órgão único. (FREITAS, 1943, p. 519).
Assim, será sempre educativo, mutatis mutandis, ter
como referências as atitudes de alguns notáveis,
tais como Teixeira de Freitas, Macedo Soares, Isaac 2 Criado pelo Decreto nº 19.433, de 26 de novembro de 1930 (BRASIL,
1930).
Kerstenezky, Simon Schwartzman, para nomear,
aqui e agora, apenas os grandes, mas sem olvidar 3 Criado pelo Decreto nº 19.669, de 4 de fevereiro de 1931, mas só seria
regulamentado um ano depois, através do Decreto nº 21.047, de 18 de
jamais muitos outros. fevereiro de 1932 9BRASIL, 1931, 1932).

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Pois Leo de Affonseca, conhecendo a situação, Brasileira de Educação, dava-se um fato no âmbito
cuidou de evitar o desastre, “[...] mantendo sob sua da repartição de estatística do ministério, com in-
única autoridade, mas em simples justaposição, as críveis desdobramentos. Em maio de 1931, Alvim
duas diretorias que o Departamento se destinara a Pessoa, antigo chefe de seção na extinta DGE, e
unificar [...]”. Por demais, ao tempo que evitava o na época trabalhando com Teixeira de Freitas, em
desastre, soube, como logo será visto, apoiar o “[...] ofício interno, sugeriu haver uma “lei de estatística”,
movimento que visava dar ao Brasil a verdadeira com ênfase na questão da obrigação da prestação
solução para o problema da estatística nacional: a de informações por parte dos “donos” das fontes
unidade, que lhe é essencial, não na unicidade de de dados. Sim, a obrigação na prestação de infor-
órgão, mas na organicidade de um diferenciado e mações à repartição de estatísticas era imperativa
adequado sistema” (FREITAS, 1943). e segue sendo: as estatísticas são agregações de
informações individuais. Pois há tempos alcançar
Entrementes, enquanto se intentava (e, de fato, se
os registros administrativos para deles extrair as
evitava) a junção dessas repartições de estatísticas,
informações individuais vinha sendo uma luta
ao se constituir o Ministério da Educação e Saúde
contra seus “donos”, que, lhes tendo ciúmes, não
Pública, nele seria criada a Diretoria de Informações,
os abriam e nem queriam eles próprios coletar as
Estatística e Divulgação. Para chefiá-la, o ministro
informações necessárias. Bulhões Carvalho tentara
Francisco Campos convidou Teixeira de Freitas,
soluções através de decretos, de acordos estaduais
que vivera os anos 1920 em Minas Gerais, década
bilaterais, de conselhos, mas sem sucesso. Agora,
em que afiaria régua e compasso, ao organizar a
no novo tempo político, isso se poderia configurar
atividade estatística mineira, num ensaio da sempre
mediante legislação abrangente, e tal fato dava ra-
desejada cooperação interadministrativa (com as
três esferas políticas: federal, estadual e municipal). zão a Alvim Pessoa. Mas havia outros pontos que
Ao trazer sua ciência, sua vivência e sua experiência ele não via.
à esfera nacional, ainda que sobre uma temática
Por talvez simples atenção, em ofício de julho de
específica – a educação e a saúde pública –, de
1931, Teixeira de Freitas levou a sugestão a Francis-
novo triunfaria. Foi quando, em dezembro de 1931,
co Campos, que a apoiou. Mas Teixeira de Freitas,
promoveu a realização do “[...] convênio entre a
tendo em conta sua visão de mundo, pensava maior
União, os estados, o Distrito Federal e o território do
e, em lugar de uma simples minuta de lei, prepa-
Acre, para o aperfeiçoamento e uniformização das
rou uma avaliação minuciosa do estado das artes,
estatísticas educacionais”4. Ampliava a cooperação
fazendo sugestões expansivas (fevereiro de 1932).
interadministrativa5.
Em sua análise, mostrou o caráter federativo dos
Enquanto esse convênio era pensado, e depois registros administrativos, algo que devia ser respei-
levado, debatido e aprovado no contexto da IV tado, ou seja, a simples imposição da obrigação
Conferência Nacional de Educação, na Associação não resolveria o imbróglio reinante desde longo
tempo. Os “donos” dos registros deviam fazer, eles
próprios, com seus recursos, sapiências e compe-
4 Por decisão da Assembleia Geral do Conselho Nacional de Estatística, tências, suas estatísticas temáticas, mas seguindo
foi posto nos anais do IBGE como anexo à Resolução nº 115, de 14 de
julho de 1939. princípios uniformes. Antes que haver um órgão
5 “Sem sombra de dúvidas, Minas fora o campo de experimentação onde
central produtor, deveria haver um órgão central
o grande mestre da estatística nacional ensaiara as suas ideias, veri- coordenador. Seu relatório é detalhado e revela sua
ficara as reações do meio, retificara os erros e pudera conceber um
plano exequível para o Brasil” (CARVALHO, , 1950, p. 555). vivência em Minas Gerais.

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Para além de mostrar problemas, Teixeira de Frei- jeto de criação do Instituto Nacional de Estatística.
tas propôs como solução a criação do Instituto A ideia seguiu rumos burocráticos e correu riscos
Nacional de Estatística e Cartografia, um órgão de fracassar ao receber pareceres contrários de
com uma direção colegiada, fortemente parlamen- diversos ministros. Juarez Távora os refutou e levou,
tar. A cartografia, também chamada “cartografia por fim, o projeto a Getúlio Vargas, que o aprovou.
geográfica”, era vista como a chave da elaboração Foi assinado o Decreto nº 24.609 (BRASIL, 1934),
controlada das estatísticas. A essa base territorial antes da aprovação da Constituição da República,
se juntariam os necessários cadastros (prediais que se daria no dia 16 de julho8. Se não saísse antes,
e domiciliares, entre outros). A ideia não vingou6. a ideia teria que ir à discussão no Congresso, com
Contudo, Teixeira de Freitas seguiu atento, com delongas e desgastes.
olhos e ouvidos despertos, à espera de momento
adequado. E um fato novo viria com Juarez Távora, Para começar a funcionar, devia realizar-se uma
que em dezembro de 1932, ao assumir o Ministério convenção nacional de estatística, na qual as
da Agricultura, sentiu falta de estatísticas e pediu várias partes envolvidas e interessadas (nas três
ajuda a Teixeira de Freitas, já um homem de renome esferas políticas: federal, estadual e municipal) se
em matéria de atividade estatística (afora que tinham acordariam, assumindo direitos e deveres. E só
algum convívio, por exemplo, na recém-fundada seu presidente teria competência para fazer essa
Sociedade dos Amigos de Alberto Torres). Teixeira convocação. A escolha desse nome e sua ulterior
de Freitas estruturou naquele ministério uma repar- nomeação foram postergadas porque, diante de
tição especializada e sugeriu Rafael Xavier como uma pressão de credores externos, o governo se
diretor (o que Juarez Távora endossou, trazendo-o viu envolto no atropelo de promover a uniformiza-
de Pernambuco). ção das estatísticas comerciais brasileiras, o que
resultou numa intensa atividade no Palácio do
Então Juarez Távora pediu ajuda para sua proposta Itamaraty, no final de 1934 e início de 1935, sob
de solução da atividade estatística brasileira7 e a o comando do chanceler Macedo Soares. Vários
mostrou a Getúlio Vargas, que apoiou a ideia. Távora homens públicos foram chamados à discussão da
foi por ele autorizado a constituir uma comissão de matéria, entre os quais Teixeira de Freitas, que se
trabalho para debater a matéria (em junho de 1933), valeu da ocasião para insistir na instalação definitiva
com representantes dos ministérios. Ela foi instalada do Instituto Nacional de Estatística. Ele procurou
na antessala de seu gabinete no Ministério da Agri- mostrar que, com o sistema estatístico funcionando
cultura. Leo de Affonseca a coordenou, tendo como organicamente, as estatísticas brasileiras teriam
secretário executivo Teixeira de Freitas. O ponto forma contínua e sistemática, e crises como aquela
de partida foi, naturalmente, a proposta anterior de estariam afastadas. Ele foi o mais atuante, inclusive
Teixeira de Freitas. Então, feitos os debates e os idealizando uma publicação pertinente. Por certo,
ajustes, em outubro de 1933, dispunha-se do pro- Macedo Soares se impressionou positivamente e
deve ter comentado com o presidente da República,
6 A ideia não vingou por reação contrária da Academia Brasileira de Ci- Getúlio Vargas.
ência, tendo à frente Alberto José Sampaio, que queria criar um órgão
nacional de geografia. A proposta de Teixeira de Freitas poria obstáculo
a essa pretensão, que, contudo, acabaria não se concretizando, por
falta de recursos financeiros. Isso abriria campo para novas investidas
de Teixeira de Freitas em futuro próximo, com a forte atuação de Ma-
cedo Soares. 8 A Constituinte e a Constituição vieram na esteira da Revolução Cons-
titucionalista (julho de 1933). Os paulistas, que haviam perdido nos
7 Com Francisco Campos ausente do ministério, primeiro licenciado, de- campos de batalha, ganharam no campo político. Contudo, seria pas-
pois em outra função, seus substitutos não sustentaram o esforço de sageira a Constituição de 1934, logo vindo o golpe de 1937 e, com ele,
Teixeira de Freitas. a Constituição elaborada por Francisco Campos.

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Entrementes, Teixeira de Freitas, sem esmorecer, tivéssemos a consciência disso, poderíamos


catequizava: sugeria nomes e os justificava. E Luís afirmá-lo, em confiança à inteligência e ao
Simões Lopes, à frente do Departamento Adminis- extraordinário senso profissional de Bulhões
Carvalho, que com a autoridade eminentíssima
trativo do Serviço Público (DASP), por ordem de
de criador da estatística geral brasileira, de
Getúlio Vargas, convidou Juarez Távora, que tanto realizador do grande censo geral de 1920, de
lutara por sua criação, para assumir a presidência tratadista consagrado na matéria e de técnico
do Instituto Nacional de Estatística. Mas tendo es- de reputação mundial como membro vitalício
colhido priorizar sua carreira militar, ele declinou do que é do Instituto Internacional de Estatística,
convite. O nome seguinte, por razões óbvias (talvez), preconizou e ensaiou todas as realizações que
o plano do nosso Instituto sistematizou.
surgiu na figura de Macedo Soares. Getúlio Vargas o
convidou, e ele recusou, mas foi nomeado à revelia Os acordos intergovernamentais; o Conselho
(no dia 19 de julho de 1935). Não se sabe a real razão de Estatística; as delegações regionais e locais
desta decisão “descortês” daquela “raposa política”, para inquéritos diretos; a especial franquia
o presidente Getúlio Vargas. Macedo Soares, talvez postal-telegráfica para os serviços estatísticos;
irritado, talvez esperando uma alternativa de carreira a organização do Anuário Estatístico Brasileiro;
o preparo das publicações especializadas de
política, relutou em assumir, fazendo sucessivos
estatística e ainda das que são preparatórias ou
adiamentos, para, finalmente, em 29 de maio de complementares daquelas; a cartografia esta-
1936, tomar posse no Palácio do Catete. tística; a colaboração dos serviços estatísticos
na cartografia geográfica, na obra de vulgari-
zação científica ou educativa e na publicidade
IBGE, uma promessa venturosa informativa; as exposições de estatística; as
conferências de estatística; a organização e o
amparo da Associação Brasileira de Estatística;
Naquela solenidade, no Palácio do Catete, diante do
a criação da Revista Brasileira de Estatística;
presidente Getúlio Vargas, depois da posse formal a colaboração do Brasil nas iniciativas inter-
de Macedo Soares, todos ouviram um discurso nacionais ligadas à estatística; – tudo isto que
alentado de Teixeira de Freitas. A seu juízo, naque- é o principal no plano de organização ou de
le momento, o novo rumo da atividade estatística operação do Instituto, tudo também foi objeto
brasileira, renovada, faria um novo Brasil, melhor de iniciativas, de realizações, de ensaios, de
demonstrações, de apelos de Bulhões Carva-
informado e conhecido. Essa certeza da potência
lho. Logo, tal a força demonstrativa que os êxi-
da estatística ficaria marcada numa frase forte, seu tos da exemplar e fecunda carreira de 30 anos
lema: “Faça o Brasil a estatística que deve ter, e a de vida pública desse grande brasileiro dão a
estatística fará o Brasil como deve ser”.9 Entre outros estas diretivas por ele praticadas ou lembradas,
pontos, para dizer que havia um passado naquele podemos bem ter como certo que o Instituto é
instante, exaltou Bulhões Carvalho, seu mestre precisamente o grande sistema que deve ser
e não poderá falhar à sua missão. Esta é a fé
querido, a quem tomou como inspirador e a quem
inabalável dos estatísticos brasileiros, que ve-
nunca deixará de reverenciar: mos em Bulhões Carvalho, mestre querido de
todos nós, nosso modelo, nosso guia, nosso
E nós outros que o vamos movimentar, temos,
oráculo. (FREITAS, 1937, p. 158-165).10
pela nossa experiência, a convicção de que ele
corresponderá aos seus fins. E quando não

10 Mário Augusto Teixeira de Freitas. Instituto Nacional de Estatística, dis-


curso proferido no ato de instalação do instituto, em 29 de maio de
9 E só não exaltou a cartografia porque ela não passara como propusera. 1936. Posto em anexo à Resolução nº 135, da Assembleia Geral do
Já a noção de geografia só viria adiante. Conselho Nacional de Estatística, em 21 de julho de 1937.

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O INE, logo IBGE, iria figurar um sistema estatístico Pois outra coisa ele não pretende ser. E consin-
em suas vertentes organizacional e informacional tam os fados amigos que isso rigorosamente
e o devia coordenar atentamente, em cooperação ele possa ser.
livremente consentida. Teria autonomia e autoridade
“Obra de relojoaria” na multiplicação conve-
dadas pelas partes, em ação voluntária de cessão
niente das peças, no primoroso acabamento
de direitos e de assunção de deveres. Atuaria,
de cada uma e de todas, no seu ajustamento
promovendo harmonias, nas três esferas políti- integral, no engrenamento harmonioso do
cas: federal, estadual e municipal. Seria um órgão seu mecanismo, na sua perfeita obediência
nacional, não federal, ficando vinculado não a um às molas de propulsão.
ministério, mas à própria Presidência da República,
única entidade com legitimidade de ação em todas “Obra de relojoaria”, sim, seja ele com as suas
as esferas políticas. Seria sempre referido como um cento e tantas peças de hoje e as duas mil que
“órgão sui generis”, ou uma “federação de reparti- terá amanhã – mas obra de alta precisão – para
ções” ou um “consórcio federativo”. efetuar todas as medidas de extensão, de
profundidade e de peso, e a determinação de
Voltando ao discurso, Teixeira de Freitas anteviu todos os tensores, da complexa realidade de
o futuro do instituto, expressando expectativas constituição, de vida e de ambiente em que se
move a Nação. Esta “obra de relojoaria” ele há
grandiosas. Com seu espírito cristão, não deixaria
de ser, sem a qual o Brasil não terá consciência
relevar a família, mas nessa família agora entraria o
do que é, do que vale, do que deve fazer, para
instituto, e por ele, pelo conhecimento decorrente
caminhar de olhos abertos, corações ao alto e
das informações estatísticas, também estaria o
espírito alerta, ao encontro dos seus definitivos
Brasil, ao qual lançaria olhares de utopia (no seu destinos. (FREITAS, 1937, p. 158-165)12.
melhor sentido semântico). Lutas viriam, e seriam
muitas. Teixeira de Freitas combateria o bom com- Ato contínuo, Macedo Soares daria posse a uma
bate e venceria os inimigos invencíveis. Ao final junta executiva provisória, sendo integrada, nos
dessa oração, com maestria, inverteu a favor de si termos da legislação, pelos diretores federais te-
as ironias de um crítico anônimo: máticos de estatística, ou seja, além de Teixeira de
Freitas (Ministério da Educação e Saúde Pública),
Um crítico anônimo11, em documento de
Leo de Affonseca (Ministério da Fazenda), Joaquim
um arquivo guardado neste palácio, atacou
Licínio de Souza e Almeida (Ministério da Viação e
severamente, certa vez, a administração bra-
Obras Públicas), Heitor Bracet (Ministério da Justiça
sileira e as suas diretivas. Também o Instituto
lhe foi objeto de acrimoniosas referências. E
e Negócios Interiores), Rafael Xavier (Ministério da
condenando-o, disse dele, exatamente, por Agricultura) e Oswaldo Costa Miranda (Ministério
uma deformação curiosa de visão, o que mais das Relações Exteriores). Na ocasião, Teixeira de
o poderia elevar no apreço da Nação como Freitas foi escolhido secretário-geral. Terminada a
aparelho de observação e medida, que se primeira reunião da junta, Macedo Soares propôs
destina a ser. uma visita a Simões Lopes, em seu gabinete no
palácio, para agradecer-lhe as contribuições:
“Obra de relojoaria”... apostrofou o crítico.

12 Discurso proferido no ato de instalação do Instituto, em 29 de maio


11 Quem terá sido? A história não revelou seu nome, infelizmente. Talvez de 1936. Posto em anexo à Resolução n. 135, da Assembleia Geral do
ainda esteja em algum arquivo, a espera de venturosa descoberta. Conselho Nacional de Estatística, em 21 de julho de 1937.

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Por fim, o Sr. Presidente propôs que os pre- A “convenção” fez nascer um
sentes o acompanhassem ao gabinete de
sistema estatístico
trabalho do Dr. Luiz Simões Lopes, afim de sig-
nificar a este o apreço da Diretoria do Instituto
e a gratidão da estatística brasileira pelo valor, O sistema estatístico criado na ocasião terá sido,
tenacidade e patriotismo com que advogou a salvo melhores pesquisas, o primeiro sistema de
causa do Instituto e obteve o triunfo deseja- informações devidamente constituído no Brasil.
do, conseguindo, ou melhor, promovendo a Era bastante complexo e poderia fracassar, se não
integração do mesmo, depois de ter atuado tivesse no comando Teixeira de Freitas.
decisivamente em benefício da sua criação.
Sendo por todos aplaudida a proposta do Sr. Em seu topo estava o Conselho Nacional de Estatís-
Presidente, determinou este que o registro da tica, que era o “órgão de orientação e coordenação
ocorrência fosse reproduzido em documento geral”. Ele era formado por diversos órgãos, como
autêntico e enviado com ofício ao homena- a assembleia geral (AG), a junta executiva central
geado. Em seguida, se dirigiram em bloco ao (JEC) e as juntas executivas regionais (JER), uma
gabinete do Dr. Luiz Simões Lopes, a quem para cada unidade da Federação (UF).
comunicaram, calorosamente, o desígnio
daquela visita coletiva. (DOCUMENTAÇÃO..., A JEC era formada pelos diretores federais temá-
1968, p. 41-42). ticos de estatística, oriundos dos ministérios, bem
como dos departamentos administrativos especia-
Daí então, a junta trataria de organizar a Conven- lizados e dos institutos temáticos oficiais. Um dos
ção Nacional de Estatística. E já em 7 de julho de seus membros era escolhido secretário-geral, que
1936, ela foi convocada pelo Decreto nº 946 e teve acumulava a secretaria-geral do instituto. Eis então
lugar no Palácio do Itamaraty, junto ao gabinete seu “órgão administrativo” e seu “quadro executivo”.
de Macedo Soares, no período de 27 de julho a 9 Cada JER tinha, caso a caso, conforme a estrutura
de agosto. No dia 11 de agosto, pelo Decreto nº organizacional da UF correspondente, uma compo-
1.022, foi aprovada pelo governo federal.13 Surgia sição assemelhada (algo do tipo ministério temático
a chamada “Carta Magna” da estatística brasilei- x, secretária temática x).
ra, ou sua “pedra angular”. Logo adiante, em 17
de novembro, pelo Decreto nº 1.200, o Conselho O dirigente máximo de cada JER, bem como todos
Nacional de Estatística, derivado da convenção, os membros da JEC, integrava a AG e dela também
foi regulado e já no mês seguinte seria instalado poderia participar algum convidado. Ela se reunia,
numa assembleia geral. Ele seria a peça-chave do em geral, em junho ou julho. A AG deliberava sobre
instituto e de todo o sistema. Enfim, graças à prá- princípios, normas, padrões e definia as campanhas
estatísticas: o quê, como e quando a coleta seria
tica de Teixeira de Freitas e ao seu dinamismo, em
realizada. Poderia promover homenagens, oferecer
sete meses, o instituto estaria pronto para operar
louvores, decidir pela incorporação de documentos
a pleno vapor.
à memória do instituto etc. A JEC poderia deliberar
sobre todo tema ad referendum da AG que logo
ocorresse.

O conselho integrava ainda os “órgãos opinati-


vos”, agrupados em comissões técnicas, e havia
as permanentes e também as especiais, e/ou um
13 Ver Senra (2008, p. 119-140). corpo de consultores técnicos. Esses órgãos, ao

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fim e ao cabo, agrupavam estudiosos, professores foi o hábil e insubstituível recurso por meio
e pesquisadores, oriundos de ambientes universi- do qual se tornou possível articular entre si,
tários ou de centros de estudos e pesquisas, bem submeter a uma disciplina comum e orientar
como figuras notáveis, os chamados pensadores segundo objetivos convergentes e normas téc-
do Brasil. Envolvia-os sem maiores custos, ape- nicas uniformes um numerosíssimo conjunto
de repartições e serviços, tanto federais e es-
lando ao nacionalismo, invocando a relevância da
taduais, como também municipais, estes, em
atividade estatística para a revelação do Brasil. À
número, atualmente, de nada menos de 1.668.
época ainda não havia usuários das estatísticas,
como os atuais, e essas pessoas não tinham uma Assim, a autonomia administrativa, no que se
expertise de utilização minuciosa, mas antes uma refere aos conselhos do instituto e aos órgãos
visão ampla de retrato das realidades que as esta- destes diretamente dependentes, assume ca-
tísticas proporcionavam. De fato, grandes estudos racterísticas especiais, decorrentes do pacto
de época se valeram das estatísticas, mas não as intergovernamental – a Convenção Nacional
apresentam, o que soa como paradoxo, mas não é. de Estatística –, que teve exatamente a missão
de investi-lo naquele solene mandato político,
A coleta, no contexto das chamadas “campanhas apto a fazer funcionar extensas e mútuas de-
estatísticas” – não por acaso assim chamadas, legações de autoridade no próprio plano dos
porquanto integravam a percepção da época de poderes governamentais autônomos.
“entradas civilizadoras”, como as da saúde ou as
Em virtude dessa ampla fórmula de coor-
técnicas (como a expansão do telégrafo e a integra-
denação de serviços, o instituto não é uma
ção dos índios) –, ocorria nas agências municipais
“repartição”, nem mesmo um “conjunto de
de estatística, como “organização local”.14 repartições”, dependente de um só governo.
Pois, em verdade, é um largo sistema de
Entre os órgãos subordinados diretamente à
órgãos técnico-administrativos, de variadas
Presidência da República, ocupa o Instituto
categorias, tipos e finalidades específicas,
Brasileiro de Geografia e Estatística situação
que a um só tempo se originam e dependem
à parte, uma vez que os demais são “organi-
– no exercício, todavia, de uma conveniente
zações federais”. Isto é, estão vinculados ex-
autonomia – de todos os governos que ime-
clusivamente à órbita administrativa da União,
diata ou mediatamente aceitaram as normas
enquanto o instituto assume posição especial,
fundamentais da Convenção Nacional de
que se pode dizer mesmo “sui generis”, resul-
Estatística.15
tante do caráter político de que houve mister
revesti-lo, como fundamento do seu destino
Duas mudanças ainda ocorreriam. Em 24 de mar-
técnico-administrativo.
ço de 1937, pelo Decreto nº 1.527, seria criado o
Esse “caráter político”, que teve por objetivo Conselho Brasileiro de Geografia, logo associado
dotar a instituição de ampla autonomia, ema- ao Instituto Nacional de Estatística. Viriam várias
nada de simultâneos mandatos políticos, em discussões em assembleias gerais, resultando na
condições de permitir-lhe atuar por delegação proposta firmada no Decreto-lei nº 218, de 26 de
conjunta e solidária de todas as três órbitas de janeiro de 1938, em que o Conselho Brasileiro de
governo do regime constitucional brasileiro,

15 Exposição apresentada pelo Dr. M. A. Teixeira de Freitas, secretário-


-geral do IBGE, ao Dr. Heitor Bracet, presidente em exercício da enti-
14 O sistema geográfico teria basicamente a mesma estrutura, com eventuais dade. Posto em anexo à Resolução nº 325, de 29 de julho de 1946, da
mudanças de terminologia. Assembleia Geral do Conselho Nacional de Estatística.

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Geografia passa a Nacional e o Instituto Nacional “Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística”,


de Estatística passa a Brasileiro e também de Geo- ou seja, o nosso “IBGE”, hoje tão familiar aos
grafia (sucedâneo da Cartografia). E se completava brasileiros de todos os quadrantes. (DÉCIMO-
a proposta original de Teixeira de Freitas de criação -QUINTO..., 1951, p. 256-257).
do Instituto Nacional de Estatística e Cartografia.
A última mudança, completando o idealismo de
Há um ponto curioso, pouco sabido. Quando sua Teixeira de Freitas, recompensando sua tenacidade,
proposta não passou, Teixeira de Freitas cuidou de persistência, compreensão, transigência (quando
“camuflar” (como um setor) a cartografia na repar- imperativa), virtudes que possuía, ocorreria em
tição de estatística do Ministério da Agricultura. É 1942, quando, no contexto do esforço de guerra, o
claro que Juarez Távora, tão afeito à geopolítica e já IBGE ganharia o direito ao Fundo Estatístico (o
temas afins, estava ciente e de acordo, se não foi que também estivera na proposta originária), com
mesmo o mentor da ideia. O fato então é que, ao recursos suficientes para fazer avançar as agên-
ocorrer a mudança agora da geografia, só se fez cias municipais de estatística, base do sistema.
mesmo explicitar a proposta original de Teixeira de Elas ainda não estavam instaladas em todos os
Freitas, razão porque é legítimo tomar-se ainda 29 municípios, por falta de recursos nos orçamentos
de maio de 1936 como data de criação do IBGE, municipais. Por elas, o IBGE se fazia, então, o único
não a substituindo por 26 de janeiro de 1938. órgão federal com atuação proativa nos municípios
brasileiros. Por elas, braços civilizadores, os municí-
Esse dia, dedicado entre nós a aviventar a nos- pios avançariam. Ao dizer de Teixeira de Freitas, os
sa consciência cívica e profissional, a afervorar agentes da estatística (e da geografia), por saberem
os nossos sentimentos de zelo pelo bem pú- pelos números, sabiam melhor, e por isso poderiam
blico, a fortalecer o nosso “espírito de corpo”, contribuir na transformação dos municípios. 18
esse dia outro nome não poderia ter senão
este: “Dia dos Geógrafos e Estatísticos”16. Pois Até aquele momento, o IBGE atuava apenas como
solidários labutam, no Brasil, os que fazem a orientador técnico-processual das agências, não
Geografia e a Estatística. E em cada carreira raro de apenas um agente alocado em espaço da
do Sol sob os signos do zodíaco, a jornada
prefeitura, mas seu vínculo funcional era a munici-
preferida para simbolizar a nossa fraternidade,
palidade. Daquele momento de emergência, e sem
a serviço da Pátria e da Humanidade, não ha-
retorno, as agências entrariam na estrutura do IBGE,
veria de ser outro, também, senão o histórico
dia 29 de maio. Porque foi este o dia em que não de pronto, mas pouco a pouco. E para geri-las
se instalou em 1936, a instituição criada pelo surgiram as inspetorias regionais, logo estaduais,
Presidente Vargas dois anos antes, o então embrião das antigas delegacias e atuais unidades
“Instituto Nacional de Estatística”, o qual, des- estaduais do IBGE. Hoje já não estão em todos os
de 193717, posta em prática, em sua plenitude, municípios, dadas as facilidades de comunicação,
a ideia que o havia inspirado se transformou no física e eletrônica, mas àquele tempo a força do
sistema é que estivessem.

16 O Dia do Estatístico foi instituído pela Resolução nº 190, de 22 de julho Ao passar do tempo, estava claríssimo, o instituto
de 1941, da Assembleia Geral do Conselho Nacional de Estatística. O
Dia do Geógrafo o foi pela Resolução nº 133, de 7 de julho de 1945, pela triunfara. A ideia fora bela, e acertada, mas fora
Assembleia Geral do Conselho Nacional de Geografia. Hoje é, sobre-
modo, considerado o Dia do Ibgeano. nova, e, como costuma acontecer, assustara e por
17 Na verdade, formalmente, desde janeiro de 1938, Teixeira de Freitas,
ao se referir a 1937, realçava as tratativas da formação do Conselho de
Geografia. 18 Ver Senra (2008).

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bom tempo seguiria assustando, envolvendo sua Rafael Xavier, que substituíra Teixeira de Freitas
beleza em brumas. E bem ao caso, Alvim Pessoa, na secretaria-geral, em seu afastamento voluntário
em franqueza incomum – ele que, oito anos antes, em 1948, dava seus retratos numéricos, valendo-
propusera a legislação que, a seu juízo, mudaria -se dos resultados do censo de 1940. Mostrava
a atividade estatística brasileira, e tivera sua ideia, suas potências e suas carências. Por essa via, lhes
como visto antes, ampliada por Teixeira de Freitas, mostrava a importância de se manterem ligados ao
resultando no IBGE –, dizia, passados quase 15 IBGE, devendo continuar a prestigiá-lo, de modo a
anos, que então duvidara da proposta aprovada. se preservar a formatação censitária no território das
Dizia e fazia autocrítica: pesquisas. Para essa nova investida nos municípios,
surgiu ainda a Revista Brasileira dos Municípios, que
Figurando no número dos misoneístas19 que, o IBGE editaria por 20 anos (1948-1968), e desse
na aurora do novo regime, duvidaram, com os
contexto emergeria primeiro a Associação Brasileira
olhos na experiência do passado, do êxito pro-
dos Municípios e, logo depois, o Instituto Brasileiro
pugnado pelos idealistas de ação, o signatário
de Administração Municipal (IBAM) (SENRA, 2008).
deste artigo se desvanece em reconhecer o
próprio erro com a satisfação de ver desmen-
Essa nova revista se somava à Revista Brasileira de
tidos os prognósticos sombrios que inspirava
Estatística e à Revista Brasileira de Geografia, bem
o futuro desenvolvimento da campanha hoje
como aos boletins de estatística e de geografia, sem
vitoriosa aos que a supunham condenada ao
malogro por exceder, na grandiosidade dos olvidar o Anuário Estatístico do Brasil, regularmente
seus objetivos, à capacidade, mal julgada, elaborado e editado. Paralelamente, havia uma
dos homens públicos do Brasil. (PESSOA, formação e capacitação continuadas, por cursos,
1940, p. 99). palestras, conferências, consultorias. Livros de geo-
grafia e de estatística foram traduzidos e publicados
Com a volta da democracia, vindo a Constituição pelo IBGE. E a geografia, bem mais que a estatís-
de 1946, a situação se complicou. Pouco a pou- tica, daria cursos de formação de professores.20 E
co, perdeu o fundo, sempre objeto de polêmica. logo viriam o Laboratório de Estatística, com Giogio
Então a chamada autonomia dos municípios foi Mortara, entre outros, e adiante, em 1953, a Escola
entendida sendo violada, e eles queriam também Brasileira de Estatística, logo Escola Nacional de
esta receita. Pouco a pouco, também seu quadro Ciências Estatísticas (ENCE).
de pessoal cresceu, ora para gerir os recursos do
fundo, ora para defender sua cobrança, ora para Os censos de 1940 e de 1950 seriam feitos ainda na
executar funções técnicas, deixadas em descaso gestão do embaixador Macedo Soares e teriam su-
pelos ministérios. Seu quadro de pessoal ganhou cesso. O de 1940 traria como volume de introdução
o status de “servidores públicos”, com todas as o magistral estudo A Cultura Brasileira, de Fernando
amarras daí decorrentes. Como manter aquela en- de Azevedo, que ganharia depois edições indepen-
grenagem? Como seguir presente nos municípios, dentes, inclusive fora do IBGE. Em 1945, seria feito
tidos como peça-chave da concepção da atividade um “projeto de Brasil”, o chamado Problemas de
estatística? A solução estará na promoção de uma Base do Brasil, um plano como se fazia na época,
campanha municipalista. De cidade em cidade, trazendo intenções, tentando provocar motivações,
ou seja, tinha a tradicional formatação de mobiliza-
ção psicológica. Sairia sem autoria, como obra do
19 Aversão a tudo quanto é novo – ideias, costumes, formas de arte etc. –,
não por motivo bem fundado, mas tão-só porque não corresponde ao
estabelecido, conforme mestre Aurélio. 20 Ver Senra, (2008, p. 231-254).

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IBGE, e seria muito elogiado, tendo cinco edições, todos vós, meus Amigos, tendes um grande
até 1956. Sua autoria, contudo, seria reconhecia a crédito. Eu o reconheço em nome do Governo,
Teixeira de Freitas após sua morte. Era um plano que represento, e em nome do nosso IBGE,
para fora e um plano para dentro, posto como o formulando os cordiais agradecimentos que
vos são devidos pela vossa dedicação, zelo e
“ideário cívico” do IBGE: tudo que se fazia na casa
espírito público, no desempenho das tarefas
se fazia para um novo Brasil, o que devia ser motivo
que vos estão confiadas.
de orgulho. E ali estava a unidade das inúmeras
atividades institucionais (CAMARGO, 2008). Vou mais longe, porém. Quero igualmente con-
vidar-vos a um propósito solidário e generoso,
no sentido de aperfeiçoardes sem descanso
Teixeira de Freitas e a os vossos recursos profissionais, quer pelo
catequese da grandeza autodidatismo, quer por outros meios já ao
vosso alcance. Porque é altamente desejável
que as vossas atividades se aprimorem cons-
A tradição estava formada, é verdade, mas Teixeira
tantemente na orientação técnico-científica,
de Freitas jamais descansou na laboriosa inocula- ou mesmo apenas técnico-administrativa, e
ção do sentimento de pertença e de grandeza do vos habiliteis a elevar o nível – e assim, a me-
já feito e do em curso. Nada será estático, nunca. É lhorar o rendimento – dos vossos trabalhos,
preciso maturar uma filosofia institucional, ou uma tão prestimosos, tão fundamentais mesmo, na
estratégia de existência, e ele o sabe e faz. Não difícil fase de reconstrução nacional em que
cansa de discursar, de catequisar. vamos entrar.

Portanto, vós, estatísticos e geógrafos do Bra- E desejo, por fim, convidar-vos a focalizar em
sil, vós a quem – na gradação feliz que tenho vossas inteligências – dando-lhes guarida
visto lembrada – incumbe a tarefa de “referir” também em vossos corações – os grandes
todas as condições da vida nacional; de lhes problemas humanos que estão assumindo
cotejar e “conferir” os resultados; de interrogar uma significação aguda nesta gravíssima
as configurações e tendências dos fenômenos hora histórica que a humanidade vai viver.
sociais, para lhes “inferir”, já as condicionan- Problemas a que o Brasil não mais poderá fugir
tes, já os prováveis desenvolvimentos ou muta- agora – como infelizmente o fez até o presente
–, porque será forçado a acompanhar o mundo
ções; e, também, de lhes “transferir” os valores
na procura obstinada e ansiosa daquele dis-
sinaléticos, das diretrizes governamentais par
tante e quase inatingível “velocino de ouro”,
a realidade social, ou, ao invés, da realidade
que é a felicidade coletiva do gênero humano.
para os planos de reforma, projetando, orçan-
do, controlando: – vós todos que vos dedicais Por isso batalhareis, por certo, como todos
àquelas tarefas primárias como estatígrafos, os brasileiros hão de batalhar. Mas a vós vai
ou estatísticos observadores, recenseando, caber o trabalho silencioso das colmeias, no
apurando e expondo, ou que, como mate- preparo diligente e probidoso [sic] do material
máticos, fazeis a estatística interpretativa e estatístico-geográfico sem o qual todas as
inferencial, ou como estatistas, participais reformas político-sociais serão saltos no es-
da tarefa dos homens de Estado, fundamen- curo, ou paraquedismo político, de resultados
tando o orientando a política construtiva dos que, se às vezes acertam por acaso, também
governos, e com isto fazendo de certo modo poderão conduzir a erros e fracassos tremen-
uma “estatística histórica”, porque é a estatís- dos, verdadeiras catástrofes para os destinos
tica dirigindo a história que a Nação vai viver; da Pátria.

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Conscientes dessas vossas grandes respon- Valorizava, em toda ocasião possível, os estatísticos
sabilidades, – que são também as responsa- e os geógrafos ibgeanos, como o faria ao tomar
bilidades do Instituto –, dai à vossa técnica, posse, em 1953, como membro da Sociedade Bra-
dai à vossa família profissional, dai ao vosso sileira de Geografia, um ano depois de se aposentar
IBGE, neste instante simbolizado lindamente do serviço público federal.21 Então, desde 1948, já
pela sua nova casa, que hoje passamos a
deixara a Secretaria-Geral do IBGE. Exaltou com
ocupar sob os auspícios e as bênçãos do cre-
ênfase e convenceu:
do religioso do nosso povo –, dai de vós, em
pensardes em vós, todas as forças do ideal, A Nação talvez ainda não tenha feito ideia jus-
todas as energias de vontade. Daí à vossa ta, do labor penoso, difícil, cheio de tropeços
tenda de trabalho e aos companheiros, toda a quase intransponíveis – que tantos sacrifícios
nobreza dos corações que se compreendem exige e é tão mal recompensado, – por ela atri-
e estimam, e sabem que, nessa compreensão buído aos seus Estatísticos e Geógrafos, das
e solidariedade, têm o poder de “remover mais modestas às mais elevadas categorias.
montanhas”. (ANIVERSÁRIO..., 1945, p. 299). [...] Eu sei, – e sei-o de experiência própria –
o que custa aos Estatísticos e Geógrafos a
Por essa ação, tornam-se próximos e presentes
dura tarefa que lhes é confiada. [...] Posso,
mundos que são distantes e ausentes (mundos pois, devo e quero dizer-vos, alto e bom som:
nos cotidianos das sociedades e dos governos e os Geógrafos e Estatísticos são na realidade,
nos nossos próprios cotidianos). Então, tornados sob o mais lídimo julgamento, beneméritos
conhecidos, esses mundos se fazem pensáveis, servidores da Pátria, seu merecimento cresce
podendo ser mudados. Nas palavras de Teixeira na razão direta da obscuridade e anonimato
de Freitas (antecipando sociologias futuras), pela das labutas diárias, onde não falta o sacrifício
ação conjunta da estatística e da geografia, seria ignorado, e que orfanam e desgraçam, não
possível conhecer para prever e, daí, poder prover. raro e sem remédio, inúmeros lares. Eles é
Isso, a seu juízo, era um simples truísmo, ou, como que têm feito em verdade tudo que o Brasil
gostava de afiançar, era um “imperativo categórico” possui como conhecimento do que é e do
que vale, através das observações, pesquisas,
para os homens e as nações. E mais dizia, com
estudos e levantamentos a que procedem. (M.
firmeza e convicção:
A. TEIXEIRA..., 1956, p. 206).
O Brasil, infelizmente, tardou muito a com-
E completando suas exaltações aos ibgeanos,
preender, em toda extensão e força, essa
grave e eloquente verdade. O conhecimento Teixeira de Freitas jamais deixava de reverenciar, a
das suas realidades existenciais não teve, até cada ocasião que surgia, aqueles que estavam na
bem pouco, a precedência que deveria ter base da pirâmide. Na base não num sentido inferior.
entre as preocupações dos nossos estadistas. Muito ao contrário, na base porque sustentação das
Não é que não viéssemos de longos anos atividades estatística e geográfica, ao serem aque-
procurando obter o conhecimento da nossa les que “adquiriam” as informações individuais (pri-
“terra” e da nossa “gente”. Mas os esforços meiras, ou primárias), que, depois das sucessivas
que a isso dedicávamos, além de insuficientes, agregações, permitiam a elaboração, caso a caso,
sem continuidade e sem espírito de sistema, –
eram malbaratados pela inconformidade deles
com as determinantes que lhe impunham as 21 Estavam presentes à solenidade, bem fixando seu prestígio intelectual,
condições físicas, sociais e políticas do país. entre outras autoridades, o desembargador Florêncio de Abreu, pre-
sidente do IBGE, o general Cândido Rondon e o almirante português
(FREITAS, 1940, 100-1001). Gago Coutinho (em visita ao Brasil).

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das estatísticas e dos mapas nacionais. Eram eles utopia pensar-se em construir, com a lógica
que, realizando entrevistas, em ações ainda mais e a técnica necessárias, os destinos do Bra-
anônimas, nos rincões mais distantes do território, sil, que não pode permanecer apenas como
permitiam (e permitem) aos estatísticos e aos ge- um “País grande”, mas deve, quanto antes,
ógrafos pesquisar, revelar, clarear as condições e transformar-se, de fato, em um “grande País”,
as evoluções de vida do país. graças à força criadora do seu povo. (DECIMO-
-QUINTO..., 1951, p. 258-259).
Os Agentes Municipais são, sem dúvida,
os observadores diretos da realidade que a Para fechar o circulo estavam os chamados utili-
Geografia e a Estatística precisam conhecer, zadores das informações estatísticas e geográfi-
analisar e investigar. Operam na verdadeira cas, mas estes eram, à época, eles próprios, os
intimidade, no plano mais profundo da vida estatísticos e os geógrafos, os autodenominados
nacional, agindo sincronizadamente e em “estatistas”, um misto de estadistas e estatísticos22.
perfeita solidariedade de objetivos e de es- E embora o estatístico aí estivesse explicitado, a ex-
forços, em todas as células municipais do pressão, mutatis mutandis, valeria também para os
organismo pátrio. Põem os Agentes de Es- geógrafos, enquanto utilizadores das informações
tatística em obra uma paciência inesgotável, produzidas. E esses “estatistas” estavam sempre
a par daquela prudência exemplar, que não atentos, prontos para explicar as realidades e para
deve ser esquecida um só momento. Colocam-
formular políticas públicas ou as sugerir. Eram ho-
-se em plano superior às lutas locais, sem
mens de Estado e foram os técnicos valiosos do
jamais tomar partido, porque precisam obter
Estado de Vargas.
de todos – como bons amigos e não como
adversários ou indiferentes, a quem se deva
Mais que posta, a tradição entrava na genética e,
temer ou repelir, as informações minudentes
embora tenha nomes vários hoje, segue presente.
que é de seu dever colher com veracidade
Foi ela que norteou a salvação nos momentos da
e rapidez. Corteses, infatigáveis, discretos,
maturidade, com suas crises, e as duas grandes
zelosos, agindo com método e pertinácia, do
seu labor admirável é que se há de conseguir a evoluções que seguiram por imperativos dos mo-
matéria-prima, como informação de base, para mentos sociopolíticos. O nome IBGE tem valor,
todas as elaborações da Estatística Política e impõe respeito, provoca reverência.
da Geografia Humana, através das quais se
configuram e interpretam os diferentes aspec-
tos dos agrupamentos sociais. Sem eles, sem
As dores da maturidade
os Agentes Municipais, o Brasil não teve, até
faz pouco, senão grosseiras e atrasadas men- Pouco a pouco, o modelo original se esgotaria. A
surações da sua própria ambiência telúrica e autonomia financeira e de gerência do quadro de
social. Com eles, graças ao seu concurso, os pessoal caiu nas amarras da burocracia. O fundo
estudos estatísticos e geográficos, tanto os de estatística foi sofrendo contestação no Judiciário
de sentido nacional, como os de significação e não tardou a minguar, sacrificando a manutenção
regional ou local, lograram um surto admirável, (e as criações eventuais) das agências municipais
e vão-se multiplicando dia a dia, e assumem
de estatística.
aquele caráter de verdadeiras contribuições
técnicas, umas, já inferidas cientificamente,
outras, perfeitamente utilizáveis pela análise 22 Por “estatísticos” entendam-se os profissionais envolvidos na produ-
ção das estatísticas, independentemente de suas formações, sendo
científica; contribuições sem as quais seria inclusive, mas não apenas, os estatísticos.

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Os serviços federais de estatística, em algumas ções e dizendo: “Quero passar o resto de minha
situações, se achavam em condições de não com- vida na cadeia se o IBGE não merecer crédito”.
partilhar e não cooperar, agindo sozinhos e, logo, Getúlio Vargas reagiu e nomeou uma comissão de
perdendo qualidade. Em diversas situações, várias avaliação, comandada por Themistocles Cavalcanti
dessas produções sofreram perigosas delongas e (procurador-geral da República e futuro ministro
mesmo inaceitáveis interrupções, não na coleta, do STF) e integrada por Lourenço Filho (criador do
que seguia sendo feita pelas agências, mas sim INEP), Jessé Montelo (estatístico e atuário e futuro
na apuração e na divulgação, levando o IBGE a presidente do IBGE) e Lyra Madeira (que formaliza-
assumi-las. Teve, assim, que formar quadros e ad- ria a demografia brasileira na sequência de Giorgio
quirir máquinas. Seus titulares perderam qualidade, Mortara). Apresentado o relatório, Polli Coelho foi
esvaziando as decisões da JEC e da AG. exonerado, sendo sucedido pelo desembargador
Florêncio de Abreu, que saiu com a morte de Ge-
Nas UFs a situação seria ainda mais grave. Mais o túlio Vargas. Seguiu-se Elmano Cardim, que logo
IBGE lhes oferecia estatísticas de qualidade, mais sairia, por amizade ao presidente da República Café
elas achavam (erradamente) que poderiam “econo- Filho (vice de Vargas). Voltou, então, o embaixador
mizar” eliminando suas repartições de estatística (e Macedo Soares e, com ele, Waldemar Lopes, na
de geografia). E quando não as extinguiam, as dimi- função de secretário-geral, desenvolvendo progra-
nuíam de nível. Seus dirigentes também perderam ma inovador de atenção às mídias (SENRA, 2008).
qualidade, esvaziando a potência das JERs e da AG.
A nova gestão do embaixador foi curta, logo passan-
Em suma, o incrível esquema de cooperação intera-
do a presidência a Jurandir Pires Ferreira, também
dministrativa, matriz do sistema, sua força (bastante
ele um homem da geografia. Em sua gestão se fez
complexo, sem dúvida, mas eficiente), caía pouco
o censo de 1960, aos trancos e barrancos, em boa
a pouco no vazio.
medida por conta das introduções do “cérebro
eletrônico”, o primeiro computador de grande porte
O ano de 1951 seria nevrálgico. O embaixador
usado em pesquisa no Brasil, bem como da técnica
Macedo Soares passou a presidência ao general
de amostragem, em si importante e necessária,
Polli Coelho, egresso da geografia, conhecido ao
mas de adoção perigosa numa operação censitária,
participar ativamente da delimitação do sítio da
nova capital federal, mas por demais vaidoso e sem prévio aprendizado. Fez a famosa Enciclopé-
sem a habilidade diplomática do embaixador. Mal dia Brasileira dos Municípios, em muitos volumes,
assumiu, tropeçou nas páginas dos jornais ao dizer em que ampliou a antiga prática das monografias
numa entrevista que as estatísticas feitas pelo IBGE municipais, existente desde o início do IBGE. Foi o
eram caras, sempre estavam atrasadas e, pior de tempo de JK na presidência da República. Ao tem-
tudo, eram de precisão duvidosa. Fora aceso um po de Jânio Quadros, seu sucessor, Rafael Xavier
estopim, e ele explodiria, ameaçando a instituição. foi o presidente, também ele por pouco tempo. Ao
Suas chefias, as mais e as menos graduadas, se tempo de João Goulart, viriam Sá Freire Alvim (an-
exoneraram. Uma polêmica na imprensa foi mantida tigo prefeito do Distrito Federal) e Bandeira Accioli
por meses, pelas mãos fortes de Waldemar Lopes, (diretor do Colégio Pedro II). Com os militares, ain-
um homem de imprensa. da antes das mudanças estruturais, veio o general
Senna Campos, com missão de “varredura”, mas
Teixeira de Freitas dirigirá carta aberta ao presidente logo se encantou com a instituição, valorizando-
da República, Getúlio Vargas, refutando as acusa- -a e defendendo-a. Ocorreu então uma sucessão

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de administrações, sem a tranquila presença do Freitas) e ligado à OEA. Em 1966, veio uma crítica
embaixador e sem a atuação, presente ou distante síntese, englobando as demais, em relatório elabo-
(quando já afastado da secretaria-geral) de Teixeira rado por Henrique Flanzer, ligado ao IPEA (SENRA,
de Freitas (ele morreu em 1956, e em seu velório 2008). Essas críticas sempre somavam, uma lendo
marcou presença o presidente da República, Jus- a anterior e a seguindo, com acréscimos, quando
celino Kubitschek). necessários, mas jamais as ignorando, e isso era
um reflexo indireto da tradição, ou seja, até nesses
Nos finais dos anos 1960 e já nos anos 1970, o Es- pontos os feitos contavam.
tado nacional – que, dos planos simples, somente
de mobilização psicológica, não mais que fazendo Então, em 1967, na lógica da reforma administra-
indicações de mudanças, passou aos planos mais tiva (coordenada por Hélio Beltrão, no segundo
objetivos e precisos, com propostas de mudanças governo militar), o IBGE se tornou uma fundação
mensuradas, numa clara atuação de governo – pública de direito privado e pela primeira vez teve
enfim fez avançar as técnicas de planejamento. As um presidente ibgeano, Sebastião Aguiar Ayres. A
estatísticas econômicas ganharam relevo, e era reforma, no primeiro momento, foi um equívoco, e
preciso introduzi-las intensamente. Era preciso utili- os problemas estruturais se agravaram, logo fican-
zar as técnicas de amostragem. Mas como atender do evidente que não daria em nada do esperado.
à demanda assim crescente diante do estado de A reforma, então, seria reformada, pelas mãos de
exaustão acima descrito? Por demais, a tendência Isaac Kerstenezty, egresso da FGV e já familiar ao
censitária e municipal do programa estatístico, tudo instituto (membro que fora da JEC). De fato, ao fim
tendo a mesma prioridade, já que feito por diferentes e ao cabo, o sistema estatístico seria centralizado
repartições, não abria espaço para se introduzirem e federal, sem atenção à Federação. Os municípios
novidades. Ademais, a prioridade era inexistente. e os estados perderam foco.
Melhor dizendo, era igual, e era certo que fosse
assim, ou seja, em cada órgão produtor, suas esta-
tísticas eram, naturalmente, importantes e prioritá-
Duas evoluções marcantes:
rias. Tudo bem se os recursos fossem abundantes, c1966 e c1996
mas se não fossem, ficava sempre difícil expandir o
programa. E era o que ocorreria quando se tornou Em 13 de fevereiro de 1967, o Decreto-lei nº 161
imperativo produzir as estatísticas econômicas, as mudou seu estatuto jurídico, tornando-o uma funda-
derivadas, e utilizar as pesquisas por amostragem. ção pública de direito privado. A ideia era recuperar
Então, “abandonaram-se” os municípios. sua autonomia, se não tendo um fundo financeiro
específico, ao menos ganhando liberdade para
Houve uma sucessão de críticas. A primeira veio em gerir orçamento e tendo um quadro de pessoal não
1958, no seminário promovido pelo Instituto Roberto mais com servidores públicos, e sim com pessoas
Simonsen para o Desenvolvimento Econômico. A geridas pelas leis trabalhistas. Mas a nova estrutura,
segunda, já mais simples, porque num contexto em lugar de mudar a situação presente, dando-lhe
de comissão ou grupo de trabalho, veio em 1962. unidade de decisão, a esgarçaria e a agravaria.
A seguinte ocorreu em 1964, num contexto de con- O CNE e o CNG, em lugar de serem revistos, se
sultoria internacional, pelo antigo técnico do IBGE tornaram institutos autônomos, o IBE e o IBG23.
Tulo Hostílio Montenegro (que saíra no bojo da crise
Polli Coelho), então no Instituto Interamericano de
23 Depois, no início da gestão Isaac Kerstenetzky, foi criado o IBI, voltado
Estatística (cujo primeiro presidente foi Teixeira de à informática.

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Em meio às mudanças, houve a preocupação das Paralelamente às mudanças, o censo de 1960 foi
autoridades ibgeanas de afirmarem que Teixeira de concluído, e o censo de 1970, realizado. Virão novas
Freitas apoiaria as mudanças. Queriam ter o apoio pesquisas, como o Estudo Nacional da Despesa
dele, embora já estivesse morto. Familiar (Endef), e foi criado o Sistema Nacional
de Índices de Preços ao Consumidos (SNIPC). O
Já havia mudanças nos processos de pesquisa, e Plano Geral de Informações Estatísticas e Geográ-
a técnica de amostragem foi ensaiada na Pesquisa ficas (PGIEG) foi discutido e aprovado, juntando a
Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) no estatística e a geografia no programa de trabalho.
contexto do Projeto Atlântida, em que órgãos de De técnico-administrativas, face às evoluções meto-
estatística americanos ensinaram sua prática. Teve dológicas e tecnológicas, as atividades estatísticas
início um processo de renovação das estatísticas e geográficas se tornaram técnico-científicas. O
temáticas, via centros de estudos e pesquisas IBGE se transformou em um centro de cálculo, na
vinculados ao IBGE: das demográficas (o registro expressão de Bruno Latour. Nascia um segundo
civil foi atualizado), das agropecuárias, em franco modelo estatístico e geográfico.
sucesso, mas nada avançou nas educacionais.
Houve outros progressos. Agora vinculado ao Ministério do Planejamento
(coordenação-geral), o IBGE passou a integrar o
Mas nas estatísticas derivadas, em especial de Sistema de Planejamento (centralizado) Nacional.
natureza econômica, os tão esperados e deseja- Mas, a rigor, esse sistema, pretendido centralizado,
dos avanços inexistiram, e as frustrações foram em forte atuação do Estado nacional, nunca passou
inevitáveis. Era preciso renovar a mudança, e Isaac de virtual. Contudo, houve avanços internos, como
Kerstenetzky, que assumira em 1970, refundou a a organização dos resultados das pesquisas no
fundação, pela Lei nº 5.878, de 11 de maio de 1973 Sistema de Estatísticas e Indicadores Econômicos
(chamada, pela memória da instituição, de Lei (e logo algo afim à área social seria feito), garantindo
Isaac). Os institutos desaparecem, e a estrutura foi que a instituição aumentasse sua credibilidade e
moldada em diretorias.24 A centralização, pretendida ganhasse crescente legitimidade. Mas face à crise
na reforma de 1967, ganhou impulso e agilidade. O do Estado nacional mundo afora – diante das crises
modelo original mudou à grande, mas o espírito ib- do petróleo e como fruto do final da União Soviética
geano seguiu idealista. Mesmo com quadros novos, e das partições ideológicas, sem olvidar o retorno à
os antigos eram ouvidos e respeitados. O IBGE se democracia, marcado na Constituição de 1988 –, o
fez forte produtor, e a coordenação foi deixada em IBGE passou por grande abalo. Perdeu orçamento
segundo plano. Os sistemas estatístico e geográfico e quadro, que voltou a integrar o serviço público.
centralizados abandonaram a prática colegiada.
Seguiu-se uma sucessão de presidentes, em cur-
tas gestões, mas nem por isso sem continuidade
24 Há quem afirme que Isaac Kerstenetzky teria moldado essas mudan-
ças a partir de intensos diálogos com os técnicos da ala geográfica, administrativa. Na gestão de Edmar Bacha (logo
pela grande qualidade desse corpo técnico. Ora, por certo havia na
ala geográfica grandes nomes, como Speridião Faissol, Pedro Geiger,
após Jessé Montello, que sucedera a Kerstenetzky),
Nilo Bernardes, Nísia Bernardes, Orlando Valverde, Fanny Davidovich, a estrutura foi enxugada, e várias pesquisas foram
Marília Galvão e vários outros, e Isaac Kerstenetzky terá tido prazer de
conversar com eles, homens cultos que eram, e terá se valido de suas eliminadas, havendo o desejo de revisão do PGIEG.
opiniões. Contudo, afirmar que não teria tido igual diálogo com os no-
mes da estatística (e dos censos) é um grande equívoco. Na verdade, Com Edson Nunes, em meio a greves loucas, esse
com esses homens (entre outros, Ovídio de Andrade Júnior e Amaro da desejo foi renovado e ocorreu um sentimento ins-
Costa Monteiro), já vinha tendo intenso diálogo, de longa data, e já sa-
beria suas concepções da atividade estatística. Já da geografia, e dos titucional de pertencimento altamente necessário
geógrafos, provavelmente pouco sabia, razão de seu intenso diálogo
naquela ala, com vistas às mudanças. e há muito ansiado. Na gestão de Charles Mueller,

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finalmente, deu-se início à revisão do PGIEG, que saídas ainda. As instituições estatísticas nacionais
só se efetivaria na gestão de Eduardo Augusto sofreram, perderam recursos ou os tiveram fixados
Guimarães, infelizmente, sem ser devidamente sem aumentos, mas as demandas aumentaram e se
oficializado. Vieram duas gestões de transição, diversificaram. A cooperação, embora continuasse,
Eurico Borba e Silvio Minciotti. Tentaram-se solu- perdeu ritmo.
ções, buscou-se sair da crise. E outra evolução foi
manifestada, já na gestão de Simon Schwartzman, No âmbito interno, áreas temáticas, como saúde,
com marco em c1996. educação, segurança etc., mais e mais usavam re-
gistros administrativos, mas o faziam à margem da
Nesse tempo, de c1966 a c1996, ninguém escreveu instituição estatística nacional. E o sistema estatísti-
na intensidade e menos ainda na profundidade de co nacional perdeu unidade (e, sobretudo, amplitu-
Teixeira de Freitas sobre o sistema estatístico (ou de). Era imperativa a recuperação da coordenação,
sobre a atividade estatística brasileira). Há, contudo, tônica do primeiro modelo, esmaecida no segundo.
um texto ótimo de Eduardo Augusto Guimarães, As instituições estatísticas estaduais viviam uma du-
Produção de Estatística e Sistema Estatístico, e vá- pla identidade: nem bem eram produtoras, sequer
rios de Simon Schwartzman, todos ainda valiosos, indiretas, nem bem eram analistas das realidades.
a clamar por leituras (SENRA, 2009). Este, além Era necessário buscar-se clareza de papel, e de
disso, e também por ser um pensador do Brasil, é
novo a coordenação era fundamental. Felizmente,
quem mais se assemelha a Teixeira de Freitas como
a dinamização da disseminação por parte do IBGE
escriba. Pois virá dele o esforço de levantar o IBGE
facilitou uma identificação, mas ainda era pouco.
do marasmo em que se encontrava, com ousadia,
Havia todo um programa estatístico estadual no
coragem e competência. Ele deixou uma marca e
limbo, um conjunto de instituições flutuantes, afeitas
disse que a instituição atuava para a sociedade e
aos humores dos governos. Havia uma legislação
era um órgão de Estado, ou seja, tanto contribuía
estatística por demais atrasada.
para a formação da cidadania, quanto apoiava a
busca do bem comum. O IBGE, não sem dores, se Esses pontos foram tratados com prudência, é cer-
afastou da prática do planejamento, que, diga-se to, como manda a tradição, mas talvez demasiado
mesmo, já nem mais existia.
lentamente. Entrementes, noutro aspecto, nesse
terceiro modelo, o IBGE ampliou suas clássicas
Ao tempo de Simon Schwartzman, o IBGE foi
fortemente inserido na ordem global. A coopera- atividades estatísticas e geográficas, inserindo-se
ção internacional foi estimulada e valorizada. Sua na produção histórica (ou sócio-histórica). Para
presença em organismos internacionais tornou-se além de avançar nos estudos da memória institu-
frequente. A harmonização internacional das esta- cional, formar acervo de história oral, recuperar
tísticas foi assumida. Princípios, padrões e normas documentos históricos e os reeditar em volumes,
foram adotados e divulgados internamente. Novos com estudos de avaliação de atualidade, inseriu-
temas surgiram, e nem sempre foi possível mensurá- -se em momentos marcantes da história nacional,
-los e nem mesmo quantificá-los. O social cresceu como os 500 anos do Descobrimento, os 100 anos
em demanda, para a fixação de direitos básicos, da migração japonesa, os 50 anos da capital fe-
o ambiental tornou-se vital, o econômico recebeu deral (Brasília) e datas cheias de várias de suas
críticas, o financeiro mais ainda. Apesar de alguns personalidades. Em cada ocasião, uma obra foi
senões, a situação parecia rósea, até que a ordem feita, todas de valor, algumas de grande beleza
global entrou em crise (em 2008), sem se anteverem iconográfica.

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Além disso, o IBGE apoiou a produção da Histó- A divulgação e a disseminação


ria das Estatísticas Brasileiras (1822-2002), uma
coleção em quatro grandes volumes (Estatísticas
Nos primeiro modelo, como visto, os usuários
Desejadas (1822-c1889), Estatísticas Legalizadas
eram fortemente os produtores, na intimidade das
(c1889-c1936), Estatísticas Organizadas (c1936-
instituições. O IBGE, através de alguns poucos,
-c1966), Estatísticas Formalizadas (c1966-2002)),
Teixeira de Freitas à frente na educação, fez leitura
ricamente ilustrados, que oferece uma trajetória
das realidades através das estatísticas. Fora, ainda
da atividade estatística brasileira e lança pontos a
eram poucos. Pouco a pouco, surgiram os usuários
clamar por novas pesquisas, diversas revisões e
externos ao IBGE. Num primeiro momento eles
mesmo correções. Esse processo, agora tornado
eram chamados de consumidores, em contraponto
sistemático, foi uma novidade institucional, mas
a produtores, mas logo se percebeu que estatística
era sonho antigo, já acalentado pelos fundadores,
não se consome quando usada e surgiu o termo
Teixeira de Freitas à frente, com sua prática de
usuário. A oferta, então, não estava mais acorde
incorporar documentos aos ditos anais do IBGE.
com os primeiros tempos. Havia vazios e atrasos,
E bem ao caso, no prefácio ao quarto volume da
e forte demanda por estatísticas econômicas, e a
obra, Gilberto Hochman observou:
FGV, até então a produtora, precisava renovar as pri-
Este volume encerra um detalhado trabalho márias. Veio o segundo modelo, e o IBGE se tornou
de reconstituição histórica dessa “ciência de produtor de sínteses, fortemente a econômica, mas
Estado” no Brasil e contribuiu para preencher havia ainda a social (e não se falava de ambiental).
uma enorme lacuna na história das institui- Os resultados eram divulgados em grandes volu-
ções estatais produtoras de conhecimento. mes temáticos, mas ainda retratos. Alguns usuários
A partir da década de 1990 emergiu uma
queriam algo mais, mas para isso era necessário
prolífera e profícua produção sobre espaços
manusear grandes fitas de dados, só possível aos
de ciência no Brasil na qual o IBGE, ou mesmo
possuidores de equipamentos computacionais de
a estatística, não foi contemplada. A história
da ciência institucionalmente organizada no grande porte, que poucos possuíam. Aos mais for-
Brasil, mais preocupada com a medicina, a tes, o IBGE atendia em “tabulações especiais”, de
física, a biologia, a matemática e as ciências lenta produção, o que sempre desagradava.
humanas, não atentou para outras ciências
e instituições que estiveram no centro da Pouco a pouco, com o advento da microinformática,
construção simbólica e material do Brasil. essa situação se agravou, pondo as instituições
Até a iniciativa dessa história das estatísticas estatísticas contra a parede. O fato é que os usu-
brasileiras, o IBGE e os esforços precedentes ários se tornavam mais e mais capazes de gerar
não faziam parte da agenda mais ampla de eles próprios suas tabulações, na medida exata
pesquisa e reflexão. O diálogo entre estatís- de seus desejos e de suas necessidades. Diante
ticos e historiadores, para uma história da desse fato, as fitas de dados eram impróprias e se
estatística e de suas instituições em nosso
precisa de bases de dados em disquetes, em CDs,
país, tem sido provocado pelos primeiros,
em DVDs, em sofisticação crescente. Como atender,
em particular por aqueles que empreenderam
essa história das estatísticas no Brasil. É dos
mesmo com lentidão, se as instituições estatísti-
autores desta coleção que partiu a iniciativa cas não preparavam exatamente bases de dados,
do diálogo com a história, e que deve ser tra- mas antes planos de tabulações tradicionais? Pois
vado também com o campo da história das seria preciso uma grande mudança, e o fecho da
ciências. (HOCHMAN, 2009, p. 25). oferta não mais seria a preparação desses planos

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tabulares, já tradicionais, mas antes as próprias técnicas e tecnologias, em métodos e metodologias,


bases de dados. Os dados é que seriam validados o IBGE aumentou sua credibilidade e sua legiti-
na apuração. Era uma mudança de cultura, difícil e midade e é hoje visto como uma das mais sérias
lenta, mas que viria para ficar. instituições públicas nacionais. Sua independência
e sua autonomia estão amparadas na sociedade e
As instituições eram, ao fim e ao cabo, beneficiárias são apoiadas pelo Estado nacional, sem nenhuma
da microinformática, abreviando seus processos de contestação dos governos da República.
produção. Viriam novas mídias eletrônicas e não
tardaria a surgir a digitalização, para acesso direto
dos usuários. As instituições estatísticas passariam, Nomes de ontem e de hoje
então, a elaborar apenas planos tabulares simples,
como parte de pequenas análises, para públicos É difícil apontar nomes que tenham feito inflexões
gerais, em anuários, ou para públicos gerais es- positivas nas instituições. Difícil e perigoso, pelas
pecíficos nas mídias de comunicação. Em suma, omissões imperdoáveis e pelas excessivas valoriza-
de um atendimento padronizado, passando por ções (excessivas para alguns, é claro). Mas, na linha
um difícil atendimento personalizado, chegava-se de Edson Nunes, na citação a seguir, entende-se
a um autoatendimento. Processos de recuperação que as instituições sofrem fortemente a influência
de informações se tornaram tão amigáveis que se de certas pessoas e se assumem as escolhas.
retomou, com incrível facilidade, o potencial do
atendimento personalizado, na forma de rápidas As organizações sempre resultam da inten-
ção dos atores que as criam, estão pautadas
“consultorias” aos usuários “menos preparados”
por teorias acerca das formas pelas quais as
por parte das instituições estatísticas.
atividades podem ser organizadas, teorias
estas que se associam sempre ao manuseio
O IBGE viveu este processo no segundo e no ter-
de recursos e à existência de um sistema de
ceiro modelos. Na gestão Edmar Bacha, passou-se
autoridade próprio. Organizações são produto
à expressão disseminação, como uma relação com
da vontade dos atores e de sua pauta de cren-
especialista, com pares. A expressão divulgação ças e valores em operação sobre os recursos
se restringiu à relação com o grande público – e e a tecnologia social disponível; refletem antes
aí se inseriram o anuário, o atlas escolar e outros os valores e interesses dos homens do que a
produtos similares e mais alguns serviços on-line vontade de uma invisível mão que põe ordem
–, bem como à relação com a imprensa. Na gestão às coisa e à anarquia. (NUNES, 1976) .
de Simon Schwartzman, uma nova plataforma de
informática foi adotada, mais dinâmica, moderna, No tempo inicial, c1936 a c1966, há alguns nomes
ousada, e o portfólio de disseminação/divulgação de primeira grandeza, a começar por Teixeira de
se sofisticou e se diversificou. E teve o apoio de Freitas, Macedo Soares (incansável negociador das
David Wu Tai, à frente do Centro de Documentação vicissitudes sociopolíticas) e Simões Lopes (como
e Disseminação de Informações (criado na gestão uma espécie de ibgeano no governo). E mais, Car-
de Edmar Bacha e implantado na de Edson Nunes), neiro Felippe (condutor do primeiro censo em 1940),
ibgeano com visão de mundo invejável, admirável. Giorgio Mortara (fundador da demografia brasileira),
Rafael Xavier (municipalista de primeira ordem), Wal-
Por tudo isso, por essa área (disseminação e divulga- demar Lopes (introdutor da imprensa no cotidiano
ção), por certo sem olvidar os avanços na estatística ibgeano), Renato Americano (homem da gráfica)
e na geografia (agora chamada de geociências), em e Tulo Hostílio Montenegro, Lyra Madeira e vários

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outros. Na área da geografia, Christóvam Leite de Seus projetos sempre surpreendem e podem até
Castro, Fábio de Macedo Soares Guimarães, Jor- amedrontar um interlocutor algo desavisado. E
ge Zarur, Walter Egler e vários outros. Sem olvidar que visão para descobrir valores humanos!
os consultores nacionais e os internacionais. Sem
esquecer os muitos anônimos, cada qual fazendo • Luiz Gazzaneo (recém-falecido), que pôs, por
seu trabalho com dedicação. assim dizer, o IBGE nas mídias. Para isso,
promoveu autêntica revolução interna, num
No tempo seguinte, c1966 a c1996, a grande figura esforço diuturno de “ampliação” na ambiên-
seria Isaac Kerstenetzky, mas com vários seguido- cia da produção e mesmo da disseminação,
res importantes: Maristela Sant’Anna, Jane Souto, ajustando-as às razões e às visões das mídias
Tereza Cristina, Magdalena Cronemberger, Speri- de comunicação. Em sua equipe (que precisou
dião Faissol, Pedro Geiger, Nilo Bernardes e vários configurar) merece destaque especial Silvia
outros (merecem realce, ademais, Francisco Moura Maia Fonseca, que o sucedeu. Por seu trabalho
de Melo, Ricardo Braule, Kaizô Beltrão, Manoel honra a Waldemar Lopes, aos tempos do retor-
Antônio Soares da Cunha e muitos outros). E logo no do embaixador à presidência da instituição,
virão Edmar Bacha, Edson Nunes, Charles Mueller em seus esforços de colocar o instituto presente
e Eduardo Augusto Guimarães, com nomes diver- na imprensa, bem como a Shirley Soares, ao
sos como auxiliares (alguns excelentes, meritórios). tempo de Edmar Baixa, em seus esforços de
Nessas gestões, é difícil apontar nomes, já que mudar as visões dos técnicos sobre as mídias.
as tarefas cotidianas se tornaram mais técnico-
-científicas, o que indica a solidão e o isolamento. • Martha Mayer (já não mais na casa), que intro-
duziu renovações nos cotidianos da produção,
No tempo corrente, desde c1996, o nome que o alinhando-a ao mundo global. Introduziu os
marca é Simon Schwartzman, e entre muitos outros, calendários de divulgação dos resultados de
Fernando Abrantes merece destaque por sua de- pesquisa, rigorosamente obedecidos, o que se
dicação ao planejamento estratégico, uma prática oferece como um grande elemento de transpa-
necessária às instituições. Por força da relação mais rência institucional. Viveu uma forte catequese
próxima com a imprensa, e maior participação em das ditas best practices, quase que um mote
congressos científicos, muitos técnicos ganharam entre as grandes instituições estatísticas. Suas
visibilidade. E é difícil nomeá-los, mas valerá o ris- convicções quanto à atividade estatística geral-
co de apontar quatro nomes, com todos os riscos mente desmobilizavam seus interlocutores, mes-
subjacentes: mo quando superiores hierárquicos, a menos
que tivessem argumentos convincentes. Era uma
• David Wu Tai, que desde bom tempo conduz gestora pública com traços de gestora privada.
os destinos da disseminação, que, sem dúvida Firme, sem dúvida, mas não sem ternura.
alguma, revolucionou, seja na natureza dos
seus portfólios, seja nas formas de atendimento • E last but not least Nuno Duarte Bittencourt, res-
aos demandantes, mais e mais passando ao ponsável por modernizações extraordinárias na
autoatendimento e simplificando sobremaneira administração da instituição, introduzindo no-
o atendimento personalizado. Sua visão de mun- vas políticas de gestão, sobremodo valorizando
do e sua dinâmica tecnológica são proverbiais. o planejamento estratégico. Tem capacidade
Sempre pensa grande, sem limites, parecendo de negociação incomum, em infinita paciência
antes um gestor privado, de grandes negócios. sempre camuflada numa impaciência inexis-

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tente. Tem capacidade tecnológica admirável, BRASIL. Decreto nº 21.047, de 18 de fevereiro de


mas não admira a máquina ou a técnica por 1932. Aprova o regulamento do Departamento
ela em si, bem sabendo utilizar esses valores Nacional de Estatística, e dá outras providências.
para facilitar a gestão. Tem pendor natural para Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,
comandar, para administrar, mas se mostra, à Brasília, DF, 11 mar. 1932.
primeira vista, um rude, o que logo se vê ser
______. Decreto nº 24.609, de 6 de Julho de
uma percepção equivocada. Sua memória é
1934. Cria Instituto Nacional de Estatística e
prodigiosa. Como poucos, valoriza a amizade.
fixa disposições orgânicas para a execução e
desenvolvimento dos serviços estatísticos. Diário
Enfim, pessoas capazes de inovar e evoluir e que
Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília,
sabem fazê-lo. E não são únicos. São apenas al-
DF, 14 jul. 1934.
guns entre muitos. Sem olvidar, mas sem nomear os
muitos nomes na rede de coleta, desde o primeiro CAMARGO, Alexandre de Paiva Rio. O ideário cívico
modelo. Todos são exemplos de um IBGE que do IBGE: reformas sociais de base e projeto de Brasil
nasceu da razão e da paixão de Teixeira de Freitas aos olhos da estatística. In: SENRA, Nelson. História
e que em sua tradição foi evoluindo. Evoluções na das estatísticas brasileiras (1822-2002). Rio de
solidez dessa tradição, sem “anos zeros”, sempre Janeiro: IBGE, 2008. p. 371-409. v. 3
terríveis e malfadados às instituições. Evoluções
saudáveis, sem os arroubos das revoluções. Assim, CARVALHO, Daniel de. A estatística brasileira e o
sendo esse o exemplo da história, novos tempos de regime federativo. Revista Brasileira de Estatística,
mudança poderão se apresentar, e o IBGE estará Rio de Janeiro, v. 11, v. 44, p. 553-558, out./dez.
pronto para se adequar, para se ajustar, pronto 1950.
a evoluir, no respeito à tradição. Nossos mestres
DÉCIMO-QUINTO aniversário do IBGE. Revista
garantem. Brasileira de Estatística, Rio de Janeiro, v. 12, n. 46,
p. 250-262, abr./jun. 1951.
REFERÊNCIAS
DOCUMENTAÇÃO fac-similar. Revista Brasileira de
ANIVERSÁRIO de instalação do IBGE e “Dia do Estatística, Rio de Janeiro, v. 29, n. 113, p. 27-42,
Estatístico”. Revista Brasileira de Estatística, Rio de jan./mar. 1968.
Janeiro, v. 6, n. 22, p. 291-309, abr./jun. 1945.
O FALECIMENTO do Dr. M. A. Teixeira de Freitas.
BRASIL. Decreto nº 19.433, de 26 de novembro Revista Brasileira de Estatística, Rio de Janeiro, v. 17,
de 1930. Cria uma Secretaria de Estado com a n. 65, p. 57-71, jan./mar. 1956
denominação de Ministério do Trabalho, Indústria e
FREITAS, Mário Augusto Teixeira de. Os cinco últimos
Comércio. Diário Oficial [da] República Federativa do
septênios da evolução estatística brasileira. Revista
Brasil, Brasília, DF, 2 dez. 1930.
Brasileira de Estatística, Rio de Janeiro, IBGE, v. 4, n.
______. Decreto nº 19.669, de 4 de fevereiro de 15, p. 515-530, jul./set. 1943.

1931. Dispõe sobre a organização do Departamento FREITAS, Mário Augusto Teixeira de. O Instituto
Nacional de Estatística, criado pelo decreto n. 19.667 Brasileiro de Geografia e Estatística e a segurança
de 4 de fevereiro de 1931. Diário Oficial [da] República nacional. Revista Brasileira de Estatística, Rio de
Federativa do Brasil, Brasília, DF, 4 fev. 1931. Janeiro, v. 1, n. 1, p. 100-1003, jan./mar. 1940.

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HOCHMAN, Gilberto. De memória e história: o IBGE PESSOA, H. E. Alvim. A cooperação disciplinada e os


em transformação na virada do século. In: SENRA, recentes progressos da estatística no Brasil. Revista
Nelson. Estatísticas formalizadas: c1972-2002. Rio Brasileira de Estatística, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p.
de Janeiro: IBGE, 2009. p. 25. v. 4. (História das 86-99, jan./mar. 1940.
Estatísticas Brasileiras: 1822-2002”).
SENRA, Nelson. História das estatísticas brasileiras
M. A. TEIXEIRA de Freitas na Sociedade Brasileira (1822-2002): estatísticas organizadas (c1936-c1972).
de Geografia. Revista Brasileira de Estatística, Rio de Rio de Janeiro: IBGE, 2008. v. 3.
Janeiro, v. 14, n. 54, p. 204-207, abr./jun. 1953. P. 206
SENRA, Nelson (Org.) O IBGE na história do
NUNES, Edson de Oliveira, A divisão do trabalho municipalismo e sua atuação nos municípios: o
e a rotina da pesquisa. 1976. 121 f. Dissertação pensamento de Teixeira de Freitas e de Rafael Xavier.
(Mestrado em Ciência Política)-Instituto Universitário Rio de Janeiro: IBGE, 2008. 428 p.
de Pesquisa do Rio de Janeiro, Universidade Candido
Mendes, Rio de Janeiro, 1976. SENRA, Nelson de Castro. Pensando e mudando a
atividade estatística brasileira. In: SCHWARTZMAN,
Felipe F. et al. (Org). O sociólogo e as políticas
públicas. Rio de Janeiro: IBGE, 2009. p. 175-198.

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Projeções Nesse quadro de complexidade crescente do ciclo


de formulação e avaliação de políticas, há novas
populacionais e demandas por dados estatísticos mais consis-
tentes e específicos do ponto de vista temático
políticas públicas: e territorial, produzidos com maior regularidade,

importância e desafios para estruturar programas sociais, embasar estu-


dos de viabilidade de investimentos, dimensionar
das novas agendas1 mercados e acompanhar a conjuntura social e
econômica dos países.

Essa demanda de informações estatísticas tem sido


Paulo de Martino Jannuzzi2
atendida pela implementação de novas pesquisas
ou reformulação das já existentes, além da utiliza-
ção cada vez maior de registros administrativos, de
Introdução programas e cadastros públicos. Além disso, há um
movimento igualmente importante de produção de
A produção de Estatísticas Públicas no Brasil e na Estatísticas Derivadas cada vez mais sofisticadas,
América Latina vem ganhando contornos cada vez construídas por meio de métodos diversos- da
mais complexos nas últimas décadas à medida que Demografia, Estatística, Geomática e Economia- a
se ampliam o escopo e escala das Políticas Sociais, partir das Estatísticas Primárias provenientes de
os investimentos públicos e privados em Infraestru- Censos Demográficos, pesquisas amostrais e re-
tura e se recupera a capacidade de planejamento gistros administrativos.
e gestão do setor público nos diversos países. Na
região, os programas sociais têm se diversificado, È nesse contexto em que as Estimativas e Projeções
têm ampliado sua cobertura, tornando-se mais Populacionais vem adquirindo maior importância,
complexos e requerendo maior aporte de recursos sobretudo no contexto vivenciado em todos os
humanos, materiais e financeiros. No provimento de países da região de rápida transição dos níveis de
bens e serviços, cada país lida com desafios pró- fecundidade e mortalidade, e de complexificação
prios da descentralização da ação governamental, dos padrões de mobilidade populacional, de mi-
da articulação horizontal entre Ministérios setoriais, gração rural-urbana para diversas modalidades de
da articulação vertical entre Governos Federal, Es- mudança de curta, média e longa distância do local
tadual (provincial) e local, da articulação diagonal de residência e de deslocamentos casa/trabalho/
entre setor público, sociedade civil, organizações estudo. Afinal, a fim de que os recursos e esforços
não governamentais e setor privado. governamentais possam ser melhor empregados
nas oportunidades e desafios criados nesse quadro
de transformações demográficas, é necessário que
o gestor público disponha de estimativas atualiza-
1 Este texto é uma versão em português de capítulo publicado no livro das de públicos-alvo das políticas e programas,
eletrônico “Estimaciones y proyecciones de población en América La-
tina: desafíos de una agenda pendiente”, organizado por Suzana Cave- quantificados por idade, sexo e outros recortes
naghi, e publicado pela ALAP em 2012. Está disponível para download
em http://www.alapop.org/Docs/Publicaciones/e-Investigaciones/N2/ sociodemográficos, para grandes ou pequenos
Serie_e-InvestigacionesN2.pdf. domínios territoriais, e de dados prospectivos-
2 Professor do Mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais projeções- desses públicos no futuro, igualmente
da ENCE/IBGE. Atualmente é Secretário de Avaliação e Gestão da In-
formação do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome. detalhados.

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Além de estimativas e projeções de população por atender no futuro. Constituem-se em um recurso


grupos etários para as políticas e programas univer- importante para orientar a alocação dos recursos
sais na Educação e Saúde, vêm sendo demandados públicos nos planos governamentais de médio e
quantitativos de população potencialmente benefici- longo prazo, definir a natureza e conteúdo das po-
ária de programas de transferência de renda, de ser- líticas e estabelecer as diretrizes de investimento
viços previdenciários e assistenciais, de programas em infra-estrutura e de equipamentos públicos.
de qualificação profissional. Requer-se informações Seja na ampliação da rede de postos de saúde e de
ao nível nacional mas também para pequenas loca- serviços médicos, na extensão da cobertura da rede
lidades, com atualizações mais regulares. de abastecimento de água e saneamento básico,
na definição de uma campanha de vacinação de
Advogar pela necessidade de produção regular, crianças ou no provimento de vagas e contratação
abrangente e multidisciplinar de estimativas e de professores em escolas públicas, é fundamental
projeções de população e de públicos-alvo es- que o agente público, em qualquer nível de governo,
pecíficos de Políticas Sociais é o objetivo deste disponha de estimativas da população presente
texto. Para tanto, ele está organizado, além da e futura a ser atendida pelos programas. Através
introdução e considerações finais, em três seções. dessas estimativas obtêm-se indicações úteis e
A primeira trata da importância dos condicionantes instrumentais da evolução quantitativa da popula-
demográficos na formulação das políticas sociais; ção e da mudança da sua estrutura demográfica,
a segunda seção procura mostrar a necessidade permitindo a readequação dos programas sociais
de considerar as projeções como componentes e dos serviços públicos à nova demanda e ao novo
de Cenários Prospectivos mais abrangentes para perfil etário do seu público-alvo (MADEIRA; TOR-
Políticas Públicas; a terceira discute alguns cri- RES, 1996; SMITH et al., 2001).
térios para validação de projeções demográficas
que procurem atender as demandas atuais dos As projeções de segmentos populacionais espe-
formuladores de Políticas Sociais. cíficos como a população economicamente ativa
permitem avaliar situações futuras de escassez ou
excesso de recursos humanos no país e em suas re-
Condicionantes demográficos giões, possibilitam o ajuste dos programas públicos
das Políticas Sociais de formação profissional e ensino profissionalizante,
subsidiam a formulação de projetos de desenvolvi-
A incorporação de projeções demográficas no pla- mento regional ou de frentes de trabalho para uso
nejamento governamental e na definição de estraté- intensivo de mão-de-obra e permitem a avaliação
gias de desenvolvimento econômico é uma temática da demanda potencial de serviços previdenciários
recorrente no âmbito das agências internacionais. As no futuro. Além disso, estas projeções possibilitam
projeções demográficas constituem-se no insumo estimar a taxa de expansão do mercado consumi-
básico para estimação da capacidade de criação dor e, por conseguinte, permitem definir cenários
de empregos, da expansão dos níveis de renda e prospectivos sobre a evolução da parcela da renda
consumo domiciliar, do nível de investimento público disponível para consumo de bens e serviços, insumo
nas áreas sociais e na construção de equipamento estratégico para o planejamento empresarial e das
sociais (NAÇÕES UNIDAS, 1989). concessionárias de serviços públicos (CEPAL, 1992).

Projeções populacionais permitem fazer melhores As projeções populacionais permitem estimar o


estimativas de público-alvo de serviços sociais a quantitativo de pessoas em cada fase do ciclo vital e,

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por conseguinte, avaliar a demanda


potencial de cada tipo de serviço
e a necessidade de oferta de re-
cursos humanos e equipamentos.
Afinal, cada política social tem um
público-alvo determinado, diferen-
ciado em termos de volume, ritmo
de crescimento, composição etária
e distribuição espacial pelo território
(CEPAL, 1992). Essa configuração
demográfica dos públicos-alvo está
estreitamente relacionada ao com-
portamento das necessidades e re-
querimentos de serviços e produtos
Figura 1
dos indivíduos ao longo do ciclo de
Demanda de serviços sociais ao longo do ciclo vital
vida de indivíduos e famílias.
Fonte: Elaboração própria.

Como ilustra a Figura 1, os re-


querimentos de alimentação são dos 50 anos, por uma inexorabilidade biológica,
crescentes até os 20 anos, quando então começam os requerimentos de serviços de saúde passam a
a declinar suavemente. A demanda de unidades aumentar mais rapidamente.
habitacionais tem um padrão semelhante, mas
defasado em cerca de dez a quinze anos, já que Face a esses requerimentos diferenciados de servi-
atinge seu ponto máximo na faixa de idade de 30 ços por faixas etárias, do volume e ritmo de cresci-
a 40 anos, no ciclo de maturação do ninho familiar mentos desses públicos, a ênfase e conteúdo das
e maior disponibilidade de recursos financeiros da políticas sociais serão diferenciados dependendo
família. Os requerimentos individuais de serviços do estágio em que a população se encontra no
educacionais concentram-se entre 3 e 24 anos, processo de transição demográfica. Em regiões em
atingindo seu máximo dos 7 aos 17 anos, faixas situação pré-transicional, caracterizada por grande
de escolarização básica e, em geral, compulsória. concentração de jovens e por um perfil epidemio-
A demanda por postos de trabalho cresce a partir lógico de óbitos marcado por doenças infecciosas
dos 15 anos, expandindo-se rapidamente até os 20; e parasitárias, as políticas públicas tenderiam a
atinge, então, o máximo aos 30-45 anos, faixa etária priorizar a saúde materno-infantil e a educação
da força de trabalho primária, tornando-se então básica. Em regiões recém-iniciadas no processo
declinante após os 65, por conta da mortalidade, de transição demográfica, com aumento da taxa de
ingresso na aposentadoria e inatividade. Os reque- urbanização e do crescimento demográfico (pela
rimentos de serviços de saúde são altos no primeiro redução da mortalidade infantil), as políticas de
ano de vida, em vista dos cuidados especiais com habitação e expansão dos serviços urbanos passam
o recém-nascido, mas vão caindo até os 10 anos, também a ser requeridos com maior intensidade
quando então voltam a ser crescentes, dados os pela população. Na fase de “plena transição”, com
riscos decorrentes do ingresso na vida economi- a redução dos níveis correntes de fecundidade e
camente ativa (acidentes, doenças ocupacionais mudança do perfil epidemiológico dos óbitos, a
etc), da reprodução (no caso das mulheres). A partir saúde da população adulta passa a ser uma ques-

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tão cada vez mais importante, assim como o ensino de frequência escolar ou atendimento de serviços
superior e a qualificação profissional. Em um con- urbanos- é necessário dispor , no denominador, das
texto “pós-transicional”, a ênfase da política social medidas do tamanho do público potencial usuário
passa a ser dedicada à população idosa, seja na dos serviços ou programas disponibilizados. Se
saúde, na assistência e previdência social. Enfim, disponíveis no grau de detalhamento requerido, as
a agenda das políticas sociais procura se orientar, projeções populacionais naturalmente suprem essa
ademais das prioridades políticas definidas, pelo demanda para cômputo dos indicadores. Contudo,
volume e tendências demográficas dos diversos se as projeções não são atualizadas com alguma
públicos-alvo de programas especificos, como regularidade, os indicadores de monitoramento e
exemplificado no Quadro 1. avaliação de programas podem informar níveis in-
consistentes- super ou subestimados- de cobertura
Política setorial Público-alvo
ou efetividade dos programas e serviços. Taxas de
Educação
atendimento de crianças em educação infantil, por
infantil 0 a 5 anos
básica 6 a 14 anos exemplo, podem estar artificialmente elevadas- in-
médio 15 a 17 anos clusive acima de 100%- se as projeções de crianças
técnica/tecnológica 18 a 19 anos de 0 a 3 anos – ou 4 a 5 anos- estiverem subestima-
superior 18 a 24 anos das, em decorrência de hipóteses de queda de fe-
Saúde cundidade ou de migração não verificadas, de fato,
0 a 4 anos
materno-infantil no país ou região em estudo. Taxas de cobertura de
mulheres de 15 a 44 anos
ocupacional população ativa de 15 a 64 anos
vacinas específicas para população idosa- como as
geriátrica idosos de 65 anos ou mais preventivas de influenza – podem sugerir baixa efe-
Qualificação Profissional 18 anos ou mais tividade da campanha de vacinação pública se os
Seguridade Social 55 anos ou mais quantitativos populacionais projetados em questão
Assistência social e combate
Pessoas com deficiências estiverem superdimensionados em decorrência de
Famílias pobres, com elevado número
à pobreza
de crianças
hipóteses otimistas de evolução da esperança de
vida em um dado contexto e período.
Quadro 1
Públicos-alvo nortativos ou prioritários
Quanto mais defasadas as projeções e mais espe-
de Políticas Sociais
Fonte: Elaboração própria.
cíficos os segmentos demográficos de interesse,
maior o risco de que os indicadores de monitora-
mento e avaliação padeçam desse tipo de proble-
ma, de informar níveis de cobertura e efetividade
Se as projeções populacionais são importantes para
fins de formulação e programação orçamentária não consistentes, por se valerem no seu cômputo,
dos programas sociais, em função do tamanho e de públicos-alvo super ou subdimensionados no
ritmo de crescimento dos públicos-alvos a atender denominador. Por isso é necessário dispor de proje-
no futuro mais imediato ou mais distante, a dispo- ções populacionais revistas com certa regularidade,
nibilidade de estimativas anuais revisadas desses com ajustes necessários nas hipóteses sobre evo-
segmentos é fundamental para permitir o monitora- lução dos componentes demográficos, balisados
mento e avaliação do acesso e efeitos dos progra- pelas tendências apontadas pelas pesquisas do
mas sociais. Afinal, para cálculo de indicadores de Sistema Estatístico, Cadastros públicos e registros
monitoramento ou avaliação de acesso ou efetivida- administrativos. Uma alternativa à tal necessidade
de aos programas sociais - como cobertura vacinal, de revisão periódica das projeções é a produção

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de estimativas computadas por diferentes técnicas crescente, garantindo prestígio, dinheiro e influência
quantitativas, apoiadas nos dados e informações para místicos e, às vezes, para especuladores pouco
regularmente produzidos ou disponibilizadas pelas escrupulosos3.
fontes há pouco citadas.
Em que pese o sucesso midiático de cenários ca-
tastrofistas pouco consistentes e tecnicamente em-
Projeções Populacionais basados- de “explosão populacional”,, inclusive- há
como componente de um número crescente de pesquisadores seriamente
Cenários Futuros comprometidos com os Estudos do Futuro- assim
como sítios e blogs sobre o tema-, produzindo pre-
visões e prognósticos acerca dos ciclos econômi-
A incorporação de Projeções Populacionais nas
cos, crises de produção e booms de properidade
atividades de formulação de Políticas Públicas
econômica, antecipando e inovações tecnológicas
vem sendo acompanhada da preocupação cres-
importantes em diferentes áreas, buscando delinear
cente de considerar a elaboração de Cenários
cenários tendenciais, exploratórios e normativos, que
Futuros mais abrangentes para o Planejamento.
permitem vislumbrar futuros não desejáveis, possí-
Afinal, a viabilidade ou sucesso de uma dada po-
veis ou ideais e as estratégias e Políticas Públicas
lítica social depende, ademais das considerações
para tentar construí-los (JANNUZZI; VANETI , 2011).
da dinâmica demográfica como discutido na seção
anterior, das perspectivas econômicas, culturais O Estudo do Futuro como atividade sistemática
e tecnológicas futuras, que podem criar dificulda- em ambientes acadêmico-científicos é, contudo,
des ou oportunidades adicionais para as políticas relativamente recente. É a partir da Segunda Guerra
sociais. Além disso, as próprias hipóteses consi- Mundial que estudos desta natureza se consolidam,
deradas nas projeções demográficas não podem primeiramente como recurso metodológico para
estar desconectadas do que se antevê como as elaboração de planos de contingência e estratégias
perspectivas da economia, distribuição de renda de combate em situações de um sempre possível
e bem estar, ou da evolução da tecnologia médica confronto entre os EUA e a então União Soviética,
e farmacêutica na reprodução ou sobrevivência nos tempos da Guerra Fria, e depois, como instru-
humana ou ainda das mudanças de valores mento mais geral para antecipação dos impactos
socio-culturais no médio e longo prazo. Por essas do desenvolvimento tecnológico, decisões geopolí-
motivações que se discute nessa seção a relação ticas, estratégias corporativas de grandes empresas
entre Projeções Populacionais e Cenários Futuros. etc. Os primeiros trabalhos da Rand Corporation
e o relatório do Clube de Roma sobre o esgota-
A especulação sobre o futuro é uma atividade que
mento dos recursos naturais são alguns exemplos
sempre despertou fascínio e desfrutou de prestígio
de estudos de futuro com larga repercussão pelo
na história das sociedades, como revelam o poder
e a influência dos sacerdotes, astrólogos, escritores
de ficção científica e futurólogos, da Antiguidade
3 Nos tempos dos Faraós, na primavera, os sacerdotes reuniam-se na
ao mundo contemporâneo. A antecipação de desíg- margem do rio para verificar a cor da água, próximo do encontro dos
nios, catástrofes, períodos de estiagem e abundân- 3 confluentes. Se a água estivesse clara, o Nilo Branco ... dominaria o
curso ... e os fazendeiros teriam colheita pequena. Se a corrente esti-
cia de colheita, a especulação acerca do sucesso vesse escura, predominariam as águas do Nilo Azul, proporcionando
cheias adequadas e colheitas abundantes. Finalmente, se dominassem
de guerras, invasões e conquistas, o vaticínio de as águas verde-escuras do Atbara, as cheias viriam cedo e seriam ca-
epidemias devastadoras e curas milagrosas têm tastróficas. Nos dias de hoje, os neomalthusianos presentes em muitas
instituições internacionais fazem suas previsões catastrofistas com me-
se constituído em produtos de consumo massivo e nos criatividade e base empírica, vale comentar.

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mundo. Desde então, os Estudos do Futuro vêm se positivistas de linearidade e gradualismo das
desenvolvendo e conformando uma área multidis- transformações socioeconômicas e culturais, tão
plinar de conhecimento acerca das perspectivas arraigados na área.
de mudança da sociedade contemporânea, com
objetos de investigação parcialmente estruturados e Tal como outras atividades de pesquisa nos Estudos
um rico acervo de técnicas adaptadas de diferentes do Futuro, a elaboração de projeções demográficas
disciplinas científicas (MARINHO; QUIRINO, 1995). é um atividade que combina ciência, técnica e arte.
Afinal, o demógrafo projetista apoia-se, explicita
As projeções demográficas certamente se enqua- ou implicitamente, em paradigmas especificos da
dram como uma das técnicas abarcadas nessa área relação População e Desenvolvimento e em estudos
multidisciplinar de conhecimento, ainda que não e análises de tendência passadas – os compo-
tenham sido relacionadas na extensa compilação nentes científicos do “fazer projetivo” –, aplicando
de técnicas de Estudo do Futuro - Futures Research técnicas estruturadas para cálculo das projeções
Methodology - de Gordon e Glenn (2003). Afinal, os e as validando perante usuários – o componente
métodos de projeção demográfica se prestam a técnico desse fazer- e vale-se de conhecimentos
antecipar cenários específicos de população e de semi-estruturados acerca do futuro – o componente
demanda de serviços, para fins de planejamento artístico, lúdico e/ou imaginativo desse `fazer´.
e tomada de decisão em políticas públicas e em Entender as projeções como parte do campo dos
organizações privadas; gozam de status técnico- Estudos do Futuro é reconhecer que o `fazer
-científico conferido pelas atividades desenvolvidas projetivo´ é um exercício responsável de aplicação
nos centros de pesquisa em Estudos Populacionais de Ciência, Técnica e Arte, e não um vaticínio de
e, ademais, compartilham com os Estudos do Futu- cunho místico ou religioso como parecem sugerir
ro, a consanguinidade de origem – ou paternidade alguns estudos que advogam catastrofismos so-
comum – conferida pelos estudos de Condorcet ciais ou ambientais inexoráveis no futuro próximo
e Malthus, dois autores clássicos e fundantes da ou avanços e progressos sociais auto-realizáveis.
Demografia (ALVES, 2002), e tidos também como
precursores dos Estudos contemporâneos do Fu- A elaboração das projeções enquanto atividade
turo (MARINHO; QUIRINO, 1995). acadêmico-científica apoia-se em um dos quatro
paradigmas da relação entre População e De-
Entender as projeções demográficas como área de senvolvimento, classificados por Robinson (2003)
conhecimento com sombreamento com esse cam- em modelo Malthusiano, do Avanço Tecnológico,
po multidisplinar e semi-estruturado de pesquisa da Auto-regulação e modelo Eclético. O modelo
pode conferir ao campo uma perspectiva – até mes- Malthsusiano – e sua atualização Neomalthusiana
mo epistemológica- diferente acerca das práticas – é certamente o que tem embasado implicita ou
usualmente empregadas na sua elaboração, ou explicitamente o maior número de projeções de-
uma abordagem mais holística do seu fazer. Se as mográficas elaboradas – seja no passado, seja no
projeções demográficas são técnicas a serviço dos presente. Nessa perspectiva analítica, a população
Estudos do Futuro, devem procurar, pois, responder estaria fadada a se estabilizar em um patamar de
às demandas de Cenários Prospectivos- visões subsistência, depois de atingir um pico máximo
estruturadas, multidisciplinares e diversas de futuro- e esgotar os recursos vitais como água, ar puro,
não aos condicionantes tendenciais do passado. clima adequado, alimentos etc. A função logística
Nessa perspectiva o ‘fazer projetivo’ ganha alguns é um modelo matemático que retrata bem tal com-
graus de liberdade em relação aos pressupostos portamento, o que a torna peça-chave em muitos

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procedimentos quantitativos na Demografia e nas demógrafos, e que ilustra sua natureza técnica, é o
Projeções. modelo de projeções por componentes demográ-
ficas. Esta técnica tende a produzir projeções com
No modelo do Avanço Tecnológico, ao contrário, o estruturas etárias consistentes e se assenta em rela-
crescimento populacional persistiria por muito tem- ções bastante intuitivas: o quantitativo populacional
po, na medida em que as inovações tecnológicas de uma da região daqui a alguns anos equivale ao
permitiriam uso mais intenso e potencializador dos quantitativo existente na data inicial acrescido dos
recursos disponíveis, como teria mostrado a história nascimentos e imigrantes e subtraído dos óbitos e
do homem em momento cruciais. Nesse modelo, o emigrantes.
crescimento populacional seria, em última instância,
o motor da inovação. No macro-modelo da Auto- A simplicidade aritmética do método contrapõe-se,
-regulação entre População e Desenvolvimento, o contudo, à complexidade da definição das funções
crescimento populacional acelerado e/ou a baixa específicas (por idade e sexo) e das hipóteses
disponibilidade momentânea de recursos acabaria sobre o comportamento futuro da fecundidade,
“acionando” mecanismos de redução das taxas de mortalidade (ou sobrevivência) e migração. É aqui
crescimento e estimulando o avanço tecnológico, que o “fazer projetivo” orienta-se pela Arte, ou pela
de modo a permitir nova ampliação do consumo dos imaginação sociológica.. Afinal, é preciso mais do
recursos e novo ciclo de ajuste entre a população, que conhecimento das tendências da fecundidade,
os recursos e a tecnologia. Na perspectiva Ecléti- mortalidade e migração no passado para especular
ca, o crescimento populacional depende/ajusta-se/ sobre as perspectivas do futuro dessas componen-
influencia o nível de consumo de recursos, o nível tes. É preciso imaginar outros futuros que não sejam
de desenvolvimento tecnológico, a estrutura ocupa- a continuidade do passado e do presente..
cional, a estrutura familiar e os padrões culturais. É
certamente um modelo analítico mais compreensivo Imaginação de menos e certezas demasiadas sobre
e relacional, bastante sedutor do ponto de vista o passado tem limitado um necessário e desejável
conceitual, mas bastante complexo – e ainda pouco componente especulativo na elaboração de pro-
efetivo- para orientar a produção de projeções po- jeções populacionais. Os cenários populacionais
pulacionais como mostram os sistemas projetivos têm sido delineados, de um lado, pelo vaticínio
demo-econômicos ( SMITH et al., 2001). neomalthusiano acerca da necessidade de desace-
leração do crescimento populacional; de outro, pela
Em sua perspectiva aplicada, isto é, enquanto crença positivista da linearidade e continuidade das
Técnica, a elaboração de projeções vale-se de um tendências do passado. Pressupostos normativos
vasto elenco de métodos de natureza quantitativa. ex-ante e visões do passado acabam condicio-
As técnicas de projeção podem ser mais ou menos nando a forma de ver o futuro. Neste sentido, as
complexas, segundo a quantidade de informação projeções tendem a ser mais conservadoras do
requerida, ou escala geográfica e segmento etário que propriamente “imaginativas” ou rompedoras
visado. Técnicas mais complexas não produzem de tendências do passado. Talvez isso decorra do
necessariamente projeções mais precisas, pois fato de que apostar em rupturas expressivas de ten-
podem exigir como insumo informações mais espe- dências não só tornam as projeções demográficas
cíficas, sujeitas a maior erro amostral e não-amostral menos aceitas pelos potenciais usuários – que, em
ou suposições mais difíceis de se estabelecer e última instância legitimam sua validade externa, na
sustentar (JANNUZZI, 2007). Um dos métodos de falta de outro critério científico- como também pela
projeções mais legitimados pela comunidade de crença – em parte empiricamente corroborada- de

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que os fenômenos demográficos são mais “bem aparecimento daquelas já tidas como erradicadas
comportados” que outros processos econômicos ou sob controle como tuberculose, dengue etc?
e sociais. Assim, manter as tendências do passa- Ademais da transição da fecundidade e a transição
do no futuro acabaria funcionando bem. Bulatao epidemiológica, as projeções convencionalmente
(2001) mostra que a maior parte das projeções da realizadas pressupõem a continuidade da transição
população mundial, elaboradas há quase 50 anos rural/urbana, campo/cidade, áreas menos dinâmi-
pelas Nações Unidas e outras instituições também cas e pobres para áreas mais desenvolvidas, com
pouco ousadas no estabelecimento de hipóteses mais empregos e recursos, convergindo no médio a
sobre a dinâmica populacional, chegaram muito longo prazo para equilíbrio de entradas e saídas de
próximas ao efetivo contabilizado pelos censos pessoas (saldo migratório nulo). Mas, dada a exten-
demográficos da rodada de 2000. Nas projeções sa fronteira do Brasil com países latino-americanos
demográficas para países, contudo, os resultados e a situação social e política desses países, e as
foram muito menos alvissareiros. dificuldades crescentes de brasileiros emigrarem
para Estados Unidos, Canadá e Europa, pode-se
De fato, na maioria das projeções elaboradas no imaginar que as entradas de migrantes tenderão
Brasil, por exemplo, as hipóteses sobre evolução a se igualar ao fluxo de saídas de residentes para
da fecundidade pressupõem a continuidade de sua outros países? Em uma perspectiva nacional,
queda, para níveis abaixo do nível de reposição, por estariam os fluxos migratórios na atualidade tão
força de fatores socioeconômicos, urbanização e aderentes às dinâmicas do mercado de trabalho
mudanças sócio-culturais. Mas será que a fecundi- metropolitano de São Paulo? Os programas sociais
dade se manterá abaixo do nível de reposição nos e a extensão da previdência aos trabalhadores ru-
próximos vinte anos? E qual seria o impacto sobre rais teriam impactado na intensidade e direção dos
a fecundidade das pesquisas de ampliação do ci- fluxos emigratórios do Nordeste?
clo reprodutivo feminino e da fertilização humana?
Como outras pesquisas acadêmicas dos Estudos
Continuará elevada a prevalência da laqueadura
do Futuro, projeções populacionais não são previ-
de trompas como meio anticoncepcional no país?
sões astrológicas ou profecias místicas, mas prog-
Nessas projeções há também a aposta no aumento
nósticos criados com alguma arte e imaginação,
da esperança de vida em direção ao limite biológico
apoiados em estudos passados, com emprego de
do homem, em função da melhoria da infraestrutu-
métodos legitimados pela comunidade técnica-
ra, atendimento à saúde, tecnologia médica, com
-científica, que, por sua vez, assenta-se implicita
queda da incidência da mortalidade por doenças
ou explicitamente em um dos paradigmas da rela-
infecto-parasitárias (afetando o nível da mortalidade
ção População e Desenvolvimento. As projeções
infantil) e transição para um perfil de mortalidade
dependem, pois, das idiossincrasias paradigmá-
mais “moderno” , com maior prevalência de óbitos ticas, do conhecimento técnico e da “imaginação
por neoplasias, doenças do aparelho circulatório, sociológica” do grupo de técnicos e pesquisadores
acidentes etc. Mas como lidar com os efeitos con- que as elaboram. Diferentes grupos e instituições
trários à elevação da esperança de vida devido à produzirão possivelmente projeções diferentes,
sobremortalidade de jovens do sexo masculino informando tendências diferentes para os formula-
decorrente do acirramento da violência nos centros dores de Políticas.
urbanos? Como considerar os efeitos demográficos
do aparecimento de novas doenças – como o HIV/ Como bem coloca Patarra (1996), a dificuldade de
Aids, ainda em nível endêmico na Africa- ou do re- encontrar respostas para questões tão complexas

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como as acima relacionadas tendem reforçar o tais como:


“conservadorismo” nas hipóteses, mesmo quando
há fortes evidências que a continuidade do passado • Desenvolver técnicas para projeções sócio-
no futuro é pouco provável. Elaborar projeções po- -demográficas e população-alvo de programas
pulacionais para subsidiar Políticas Sociais requer
• Elaborar projeções com referência a cenários
alguma ousadia adicional dos demógrafos proje-
multidisciplinares
tistas, até mesmo para incorporar nas hipóteses
os efeitos das mudanças de bem estar promovido • Explicitar relações entre determinantes sociais
pelas políticas. e econômicos sobre variáveis demográficas
O usuário das projeções populacionais no setor • Explicitar margem de incerteza das projeções
público e privado é cada vez mais qualificado. As
políticas sociais tem envolvido um corpo técnico Fazer estudos comparativos de métodos e téc-
de formação multidisciplinar, com conhecimento nicas de projeção demográfica, abordando suas
empírico da realidade social em foco, que tem maior características, vantagens, precisão e limitações
capacidade de entender e contribuir na produção dos mesmos
dessas informações. È preciso abrir-se oportunida-
des para que estes possam contribuir na definição
das hipóteses e na interpretação dos fatores sociais
e econômicos que podem explicar a evolução dos Esta não é certamente uma lista exaustiva e nem
componentes demográficos no passado. é intenção discuti-la extensamente nesse texto,
por fugir de seu propósito. Mas é preciso registrar
alguns apontamentos críticos dessa agenda, na
Critérios de validação de medida em que pode ter impactos importantes no
projeções populacionais aprimoramento do “fazer projetivo” voltado a subsi-
diar a formulação de Políticas Sociais. De alguma
Além do desafio epistemológico de romper com forma, direta ou indiretamente, já se tratou na seção
o conservadorismo nas hipóteses e vaticínio ne- anterior dos quatro primeiros tópicos da agenda 4,
assim como em artigos anteriores (JANNUZZI 2007;
omalthusiano tão presente no “fazer projetivo”
JANNUZZI; VANETI, 2011). Assim, a ênfase da dis-
e considerar hipóteses mais “ecléticas” para os
cussão desta seção recai sobre a necessidade de
componentes demográficos em cenários futuros
estudos compativos de métodos e técnicas na área
multidisciplinares, é necessário que a comunida-
em busca de critérios de validação das projeções
de de pesquisadores da área rediscuta algumas
populacionais.
práticas usuais na elaboração das estimativas e
projeções populacionais. É necessário definir uma
A bibliografia referida nesse texto e os principais
agenda de pesquisa na área, de modo a produzir
manuais de projeção trazem um extenso elenco de
projeções populacionais que venham atender às
técnicas de projeção populacional em uso na área,
novas demandas.
envolvendo desde técnicas qualitativas – empre-
gadas quando não se dispõe de séries históricas
Como advogam alguns pesquisadores importantes
na área, tais como Ahlburg e Lutz (1999), Arriaga
(2003), Smith e outros (2001), essa agenda de pes- 4 È preciso reconhecer que pouco se tratou na seção anterior de “mar-
gem de incerteza” das projeções, no sentido probabilístico do termo,
quisa na área deveria incluir temas de investigação tal como referido pelos pesquisadores citados.

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consistentes,de volumes e registros populacionais de aplicação, utilidade como ferramenta analítica e


como no passado não muito distante de alguns aceitação política das projeções elaboradas.
países da Africa- até as mais sofisticadas técnicas
quantitativas. Entre essas últimas, há as técnicas A precisão se refere ao erro encontrado quando os
de extrapolação de tendências (como modelos resultados são comparados com os dados obser-
de formas funcionais matemáticos, de razões e vados. Seria o critério mais importante, segundo os
correlações); os modelos demográficos (Coortes- autores, pelo uso das projeções populacionais na
-componentes, multi-regional, Duchesne e adapta- tomada de decisões em atividades de planejamento
ções); os modelos estruturais (demo-econômicos, e alocação de recursos. Se, em um conjunto de
econométricos, de simulação urbana); simulação projeções populacionais elaboradas, identifica-se
estocástica e os algoritmos de interpretação de que uma em particular parece ser a mais precisa, o
imagens de satélites. método empregado na mesma deveria ser replicado
no próximo exercício projetivo..
Sofisticação da técnica não produz, necessaria-
mente, melhor capacidade e precisão preditiva Contudo, como observam Smith e outros (2001), a
pois podem depender da disponibilidade de maior escolha da técnica pode recair sobre aquela que
quantidade de dados e, portanto, da qualidade pode produzir as projeçoes populacionais segundo
dos mesmos. Podem ser projeções muito “ancora- o nível de detalhamento geográfico, demográfico e
das” em dados e tendências do passado. Podem temporal demandado. Se a demada de projeções
requerer um esforço computacional muito grande, demográficas for a obtenção de totais populacio-
considerando as necessidades de informação nais para um horizonte de um a 3 anos à frente de
necessária ou a extesão do horizonte de projeção. um Censo Demográfico ou Contagem, para áreas
“Boas” projeções demográficas não são, pois, extensas, sem detalhamento por grupos etários, é
aquelas produzidas por técnicas mais comple- bem provável que as técnicas extrapolativas pos-
xas, mas as que respondem às necessidades de sam chegar a resultados bastante satisfatórios em
informação para a formulação das Políticas, que termos de precisão.
se valem das técnicas adequadas de acordo com
o tipo de aplicação, apoiadas na disponibilidade Mas se a população a ser projetada refere-se a um
dos dados e nivel de confiabilidade dos mesmos, pequeno domínio geográfico, modelos intrinse-
que podem ser reelaboradas mais prontamente, se camente demográficos podem não produzir bons
os pressupostos implicitos não se mostrarem não resultados, já que o componente migratório ou de
válidos. “Boas” projeções garantem, sobretudo, mobilidade residencial pode ser muito mais impor-
sua aceitação, legitimação e uso efetivo por parte tante que o crescimento vegetativo na determinação
dos usuários. do quantitativo populacional. De fato, quanto menor
o domínio territorial considerado, maior a impor-
Brito, Cavenaghi e Jannuzzi (2008) sistematizaram tância dos fatores sociais, urbanos e econômicos
os critérios que Smith e outros (2001) julgam rele- na determinação do quantitativo populacional. Ao
vantes para escolha de uma técnica de projeção nível microregional, a dinâmica do mercado de
e seus resultados, relacionando a precisão dos trabalho e nível de acesso às politicas públicas
resultados, nível de detalhes gerados ou apresen- tem forte determinação nos fluxos migratórios. Ao
tados, validade interna da técnica, plausibilidade nível municipal ou inframunicipal, o deslocamento
das hipóteses requeridas, custos de produção, populacional – mobilidade residencial - responde
atualidade ou frequência de atualização, facilidade a processos urbanos mais específicos tais como o

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custo da moradia e aluguel, legislação e controles importante para escolha da técnica projetiva. Se
de uso do solo, verticalização ou expansão do um método de projeção requer o estabelecimento
comércio, condicionantes ambientais, facilidades de hipóteses e pressupostos cuja plausibilidade
de acesso e transporte e instalação ou retirada de futura seja difícil de sustentar, talvez seja melhor
grandes equipamentos privados (shoppings cen- usar uma técnica mais simples, em que tais hipó-
ters, prisões, conjuntos habitacionais, dormitórios teses não precisem ser estabelecidas de forma
universitários ou alojamentos militares). peremptória – ainda que possam estar implicita-
mente definidas.
A validade interna é um critério relacionado à esco-
lha de uma técnica projetiva coerente com as infor- Os custos de produção de uma projeção popula-
mações- de qualidade- disponíveis e a possibilida- cional - determinados pelo volume de trabalho,
de de estabelecimento de hipóteses consistentes. tamanho de equipe e requerimento de recursos- são
Se uma projeção está voltada apenas para prever certamente critérios fundamentais na escolha das
o total de uma população, um sofisticado modelo técnicas de projeção. Smith e outros (2001) suge-
estrutural ou um complexo modelo multirregional rem que o custo de produção aumenta conforme
não são, necessariamente, melhores do que simples o grau de complexidade metodológica, o nível de
extrapolações das tendências recentes. Mas, se as desagregação geográfica e demográfica e a aten-
projeções irão traçar as implicações de cenários ção voltada para populações especiais. Entretanto,
alternativos – econômicos ou demográficos – então, espera-se que os custos diminuam a cada repetição
torna-se necessário o uso de modelos estruturais da aplicação de um método, pelas economias de
ou o método das componentes. escopo, aprendizagem e organização das séries
históricas usadas.
A qualidade dos dados usados para gerar as pro-
jeções populacionais também afeta a validade. A atualidade de uma projeção é certamente um crité-
Estimativas pós-censo são, por exemplo, menos rio importante para julgar se seus resultados devem
precisas do que os dados decenais do Censo, prin- ser usados em detrimento de outros produzidos an-
cipalmente para áreas com crescimento ou declínio teriormente. Imagina-se que projeções recém elabo-
rápidos. Estatísticas vitais podem ser imprecisas ao radas incorporem informações acerca de tendências
nível municipal, mas podem ser ajustadas de modo mais recentes dos processos demográficos, que po-
consistente para domínios maiores. A validade dem ter se comportado de forma diferente do suposto
também é afetada pela atualidade, periodicidade e anteriormente. Mas a atualidade de uma projeção ou
extensão da série histórica dos dados usados no a periodicidade com que é revista depende muito da
modelo projetivo. Registros administrativos estão facilidade de aplicação da metodologia empregada,
disponíveis anualmente, mas dados coletados pelo ou melhor, da capacidade e rapidez inerentes à co-
Censo, estão disponíveis apenas a cada dez anos. leta, tratamento dos dados básicos, estabelecimento
Além disso, os dados mais específicos provenientes de hipóteses e aplicação dos algoritmos previstos.
do Censo não são tabulados e divulgados até dois Em situações em que a realidade sociodemográfica
anos depois que o Censo é conduzido, limitando o é muito dinâmica talvez seja recomendável empregar
emprego de métodos que requeiram informações técnicas mais simples, que permitam revisões perió-
mais detalhadas dos mesmos. dicas dos cenários projetados.

A plausibilidade que se pode conferir às hipóteses Técnicas de estimação populacional baseada em


requeridas ao modelo de projeção é outro critério modelos estatísticos ou contabilidade demográ-

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fica– e não projeção demográfica - podem ser Considerações finais


mais adequadas para atender os requerimentos
de atualização mais frequente de quantitativos
Nas últimas duas décadas, os países da América
populacionais. Nesse caso, é necessário buscar
Latina têm vivenciado mudanças significativas no
uma forma de sustentar a existência de projeções
escopo e alcance de suas políticas sociais. Novas
populacionais e estimativas demográficas com va- políticas e programas demandam informações mais
lores e tendências diferentes. No caso do Census específicas em termos de públicos-alvo a atender,
Bureau americano, por exemplo, se reconhece em dominíos territoriais em diferentes escalas, com
que os dois sistemas – de estimativas anuais de maior regularidade de atualização e maior consi-
população e de projeções- produzem resultados tência técnica na sua produção. Tais característi-
diferentes. Contudo, a existência do sistema de es- cas afetam não apenas as Estatísticas Primárias,
timativas é fundamental para revisão das hipóteses produzidas pelas pesquisas regulares do Sistema
do sistema de projeção. Estatístico e pelo uso qualificado de Cadastros Pú-
blicos e Registros Administrativos, mas também as
Há circunstâncias em que a demanda prospectiva Estatísticas Derivadas computadas por diferentes
não é a de obteção de quantitativos populacio- técnicas, entre as quais as estimativas e projeções
nais mais precisos possíveis, mas a simulação de populacionais.
cenários demográficos alternativos. Há situações
em que o objetivo do estudo é o de analisar com- O contexto de mudanças demográficas vivenciado
ponentes de crescimento, investigar os efeitos na região cria oportunidades em determinadas
das tendências ou variações específicas nestas áreas de atuação social do Estado e desafios em
tendências, demonstrar a sensibilidade do cres- outras, valorizando ainda mais o uso das projeções
cimento populacional para variáveis ou hipóteses populacionais no ciclo de formulação e avaliação
das Políticas Sociais. É fato que, na saúde, um nú-
particulares e relacionar variações provenientes de
mero menor de nascimentos alivia a pressão sobre
variáveis demográficas com variações em variáveis
a necessidade de expansão de serviços médicos de
econômicas etc. Nesses casos a escolha do méto-
obstetrícia, ginecologia e pediatria, e na educação
do vai recair sobre aquele que melhor se adequa
implica uma redução no volume de ingressantes
aos objetivos e interesse da investigação.
em creches e escolas. Por outro lado, o aumento
Não menos importante na escolha da técnica ou absoluto e relativo da população idosa exige inves-
timentos custosos para atendimento de doenças
conjunto de resultados de projeção populacional,
geriátricas e degenerativas, e aumenta a demanda
é sua a aceitação política. As projeções são in-
por serviços previdenciários e de equipamentos
fluenciadas pelo contexto no qual são produzidas e
públicos de lazer. A formação de famílias menores,
pelas perspectivas de quem as produz (ou aprova).
especialmente de baixa renda, poderia significar
Como se discutiu na seção anterior, as projeções
maior conforto material e suprimento alimentar
refletem, além das escolhas técnicas, juízos de na-
per capita, reduzindo ou alterando a demanda por
tureza teórica e política. Ao avaliar a necessidade
serviços de distribuição e suplementação alimentar.
de uso de uma projeção populacional disponível,
o usuário deve estar ciente do contexto em que ela As altas taxas de urbanização hoje observadas na
foi produzida: quem a produziu, qual a motivação, América Latina facilitam a universalização dos ser-
para que fins foi produzida. viços de saúde e educação, além de proporcionar

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B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

ganhos de escala na produção dos serviços. No ALVES, J. E. D. A polêmica Malthus versus Condorcet
entanto, exigem investimentos crescentes e caros reavaliada a luz da transição demográfica. Rio de
em infra-estrutura de saneamento, transporte, habi- Janeiro: ENCE, 2002. (Texto para discussão ENCE, 4).
tação e lazer. A diminuição do ritmo de crescimento
BRITO, L. P. G. de; CAVENAGHI, S.; JANNUZZI, P.
dos grandes centros urbanos pode desafogar, de M. Estimativas e projeções populacionais para
nestes, a necessidade da expansão acelerada e pequenos domínios: uma avaliação da precisão
caríssima da oferta de serviços e equipamentos para municípios do Rio de Janeiro em 2000 e 2007.
urbanos. Em contrapartida, a exigirá em ritmo mais Revista Brasileira de Estudos de População, Rio de
intenso nas cidades pequenas e médias, nas quais Janeiro, v. 27, p. 35 - 57, 2010.
os recursos orçamentários podem ser mais escas-
sos e insuficientes para tais aportes de investimento. BULATAO, R. A. Visible and invisible sources of error
in World Population Projections. In: CONGRESSO
Naturalmente, não se pode esquecer que essas ten- MUNDIAL DE POPULAÇÃO. 5., 2001, Salvador.
dências gerais podem não estar se verificando em Anais... Salvador: IUSSP, 2001.
áreas específicas dos países, seja pela intensidade CEPAL. América Latina y el Caribe: dinamica de la
dos fluxos migratórios – e seus efeitos de rejuve- población y desarrollo. Santiago: FNUAP; Celade,
nescimento populacional - seja pelo nível efetivo da 1992.
fecundidade. Além disso, os déficits de atendimento
para alguns serviços sociais - vagas em Creches e GORDON, T. J.; GLENN, J. C. Futures research
Ensino Infantil, leitos infantis em unidades de tera- methodology. Washington: American Council for the
United Nations University, 2003. (The Millennium
pia intensiva, para citar dois exemplos- são ainda
Project)
realidades efetivas em muitos países da região.
JANNUZZI, P. M. Estimação de demandas sociais
O contexto demográfico e político-institucional pre- futuras e as projeções populacionais: marco
sente nos países da América Latina é, pois, muito metodológico e aplicação ilustrativa. In: JANNUZZI,
favorável à utilização das Estatísticas Públicas, em P. M.; PATARRA, N. L. Manual para capacitação
geral, e das Projeções Populacionais, em particular. em indicadores sociais nas políticas públicas e em
Há, pois, que se fazer esforços para que a pequena direitos humanos. Rio de Janeiro: ENCE; FORD,
comunidade de pesquisadores especializados no 2006.
tema na região possam trocar mais suas experiên-
JANNUZZI, P. M. Cenários futuros e projeções para
cias, métodos e técnicas projetivas e bucar maior
pequenas áreas: método e resultados para os
proximidade com técnicos envolvidos com as distritos paulistanos 2000-2010. Revista Brasileira de
atividade de formulação e avaliação de programas Estudos da População, Rio de Janeiro, v. 24, p.109 -
sociais. Os eventos e publicações da Associação 137, 2007.
Latino-Americana de População são certamente
instrumentos para isso. JANNUZZI, P. M.; VANETI, V. Projeções de emprego e
ocupações: elementos para conformação de campo
de estudos aplicados no Brasil. Bahia Análise &
referências Dados, Salvador, v. 21, n. 2, p. 373-391, 2011.
AHLBURG, D. A.; LUTZ, W. Introduction: the need to MADEIRA, F.; TORRES, H. G. População e
rethink approaches to population forecasts. In: LUTZ,
W. et al. Frontiers of population forecasting. New York: reestruturação produtiva: novos elementos para
Population Council, 1999. p. 1-14. Suplemento de projeções demográficas. São Paulo em Perspectiva,
Population and Development Review, n. 24. São Paulo, v. 10, n. 2, p. 3-8, 1996.

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MARINHO, D. N. C.; QUIRINO, T. R. Considerações O’NEILL, B. et al. A guide to global population


sobre o estudo do futuro. Sociedade e Estado, projections. Demographic Research, [S.l.], v. 4, n. 8,
Brasília, v. 10, n. 1, p. 13-47, 1995. p. 203-288, June 2001.

NAÇÕES UNIDAS. Projection methods for integrating PATARRA, N. Projeções demográficas: velhos
population variables into development planning: desafios, novas fronteiras. São Paulo em Perspectiva,
conceptual issues and methods for preparing São Paulo, v. 10, n. 2, p. 12-17, 1996.
demographic projections. New York: UN; DESA,
1989. v. 1. ROBISON, W. C. Demographic history and theory as
guides to the future of world population growth. LIX,
NAÇÕES UNIDAS. World population ageing: 1950- [S.l.], n. 3/4, p.11-41, 2003.
2050. New York: UN; DESA, 2002.
SMITH, S. K. et al. State and local population
______. World population prospects: the 2004 projections: methodology and analysis. New York:
revision. New York: UN; DESA, , 2006. v. 3. Kluwer, 2001. cap. 1-2.

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Mudanças estruturais de Belo Monte (HBM). Os resultados mostram que a


dinâmica demográfica observada na RI foi alterada a

no território paraense partir dos anos de 2000, em função das especulações


de construção da HBM o que motivou a mobilidade

e a dinâmica de pessoas de outros municípios do Pará e de outros


estados vizinhos do Pará para Altamira.

populacional na Palavras-chave: TRegião de Integração Xingu, mu-

Região de Integraço danças estruturais, território, dinâmica populacional.

(RI) Xingu - Pal


Introdução
Otávio do Canto1
O presente estudo discute as principais caracte-
Sérgio Gomes2
rísticas populacionais nos municípios da Região
Raymundo Costa3 de Integração Xingu que, segundo Becker (2007a)
Maria Gláucia Pacheco Moreira4 decorreu, em grande medida, das mudanças estru-
turais ocorridas nas últimas cinco décadas na região
amazônica com destaque aos grandes projetos de
Resumo infraestrutura física de transportes, portos e hidre-
létricas, o avanço da exploração e exportação de
O artigo tem por objetivo discutir as principais carac- minérios, grãos e produtos florestais madeireiros.
terísticas populacionais nos municípios da Região de
Integração Xingu e estimar a população residente por
Como forma de melhor qualificar a discussão sobre
município para o período de 2011 – 2030. As informa-
ções aqui apresentadas resultaram, inicialmente, da a dinâmica atual, resultante das mudanças ocorri-
sistematização dos dados demográficos disponíveis das nos últimos anos, e as tendências futuras da
nas duas principais fontes de dados primários e população da RI Xingu, desenvolveu-se a estima-
secundários, quais sejam: o IBGE e o IDESP. E da ção da população para o período de 2011 a 2030,
aplicação de técnicas demográficas de projeção
considerando dois cenários: um conservador, que
da população para pequenas áreas considerando
os efeitos exógenos provocados pelo processo de reflete as proporções da população dos municípios
tecnificação de algumas áreas da região amazônica sobre as áreas maiores conforme o modelo AiBi;
por conta de seu potencial hidrográfico e condição e outro, incorporando a mobilidade da população
geopolítica, foi escolhida para receber a Hidrelétrica que se deslocou para o município de Altamira a
busca de trabalho, conforme registros do Consórcio
1 Geógrafo. Professor Doutor do Núcleo de Meio Ambiente da Universi- Construtor de Belo Monte.
dade Federal do Para (NUMA/UFPA). Consultor do Instituto de Desen-
volvimento Econômico, Social e Ambiental do Pará (IDESP).
As informações demográficas são importantes
2 Matemático. Diretor de Estatística do Instituto de Desenvolvimento Eco-
nômico, Social e Ambiental do Pará (IDESP). Professor Doutor do Pro- na medida em que norteiam o planejamento dos
grama de Pós-Graduação em Administração (PPAD) da Universidade territórios no que diz respeito a oferta de serviços
da Amazônia (UNAMA). sergio.gomes@idesp.pa.gov.br
públicos; a definição da quantidade produzida de
3 Estatístico. Técnico da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Finan-
ças do Estado do Pará (SEPOF) e do Instituto de Desenvolvimento Eco- alimentos, serviços privados de transporte, saúde,
nômico, Social e Ambiental do Pará (IDESP).
raymundo.costa@idesp.pa.gov.br
previdência e entretenimento, e das oportunidades
que podem ser concretizadas em um mercado em
4 Estatística. Coordenadora Técnica da Diretoria de Estatística, Tecnologia
e Gestão da Informação do IDESP. glaucia.moreira@idesp.pa.gov.br constante ebulição, como o de Altamira, provocado

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pela elevação da demanda estimulada pelo proces- para a análise do comportamento populacional
so de construção da hidrelétrica. dessa região de integração.

O artigo se compõe de cinco seções além dessa A estratégia metodológica foi concebida em três
introdução e das considerações finais. O segundo etapas: em primeiro lugar levantou-se os dados re-
apresenta os procedimentos metodológicos de ferentes à população absoluta dos dez municípios e
coleta, sistematização e representação dos dados calculou-se a taxa média geométrica de crescimento
e dos métodos de estimação da população. Em se- anual para o período; em segundo, os dados foram
guida se discute as mudanças estruturais ocorridas sistematizados considerando a população residente
no território paraense, a estruturação do território no meio rural e no meio urbano; em terceiro, os da-
paraense em regiões de integração, em especial a dos da população residente por lugar de nascimento
do Xingu. Por fim, a dinâmica populacional da RI foi organizado como uma forma de identificar a po-
Xingu na década de 2000 a 2010 e a estimativa para pulação migrante residente na RI Xingu. O resumo
o período 2011 a 2030. dos dados e informações produzidas a partir deles
foi apresentado utilizando-se de tabelas e gráficos.
FONTES E PROCEDIMENTOS Como forma de subsidiar a discussão sobre a re-
lação faixa etária por sexo, utilizou-se as pirâmides
METODOLÓGICOS
etárias da RI Xingu, construídas no “Projeto Série”
do IDESP e da Universidade Federal do Pará (UFPA).
As principais fontes utilizadas neste estudo são os
dados disponíveis e sistematizados a partir dos O estudo apresenta a projeção da população resi-
censos do Instituto Brasileiro de Geografia e Esta- dente para o período de 2011 a 2030 que contribuirá
tística (IBGE), correspondentes, fundamentalmente, no entendimento da dinâmica populacional no lon-
aos anos de 2000 e 2010, referentes à dinâmica go prazo e ofertará informações indispensáveis ao
demográfica da Região de Integração Xingu. Por planejamento territorial dessas áreas em acelerada
essa via, buscou-se compreender as principais transformação socioeconômica, ambiental, política
características populacionais recentes dessa região e cultural.
de integração do estado do Pará.
Para realização da projeção populacional conce-
A Metodologia utilizada constituiu-se na sistema- beu-se um modelo hibrido conjugando métodos
tização e análise de dados com base nos censos. objetivos e subjetivos. No primeiro caso, aqui
Levantaram-se dados relativos ao estado do Pará tomado como cenário1, utilizou-se o método de
e aos dez municípios que compõem a RI Xingu, ou razão (ratio methods) que estima a população de
seja: Altamira, Anapu, Brasil Novo, Medicilândia, uma área menor considerando o crescimento da
Placas, Pacajá, Porto de Moz, Uruará e Vitória do área maior, para tal, foi aplicada a técnica da Par-
Xingu. tição do Crescimento (Share-of-Growth), em que a
projeção populacional da pequena área levou em
A escolha dos censos 2000 e 2010 se justifica de consideração a sua contribuição no incremento
duas maneiras, em primeiro lugar, por serem os absoluto da população esperada para a maior área
mais recentes e, em segundo, pelo fato de que três (WALDVOGEL, 1998 apud SANTOS, 2010).
municípios foram criados somente na década de
1990 (Anapu, Brasil Novo e Vitória do Xingu), por O método da partição do crescimento foi denomi-
isso, tornou inviável o uso dos censos anteriores nado no Brasil de “método dos coeficientes ou AiBi”

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em que o crescimento das áreas menores guarda gratório e impõe novo ritmo de crescimento demo-
relacionamento linear com o crescimento da área gráfico nos territórios, em particular ao município
maior conforme Santos (2010) que aponta como de Altamira que aparece como polo de atração de
vantagens a facilidade de interpretação dos coe- migrantes vindos de outros municípios do Pará ou
ficientes, a possibilidade de ajustes e a facilidade de outros estados do Brasil, com destaque para os
de replicação. da Região Nordeste.

Em termos de formulação algébrica o modelo é Os estudos de impacto ambiental elaborados pelo


representado por: consórcio construtor indicaram a necessidade de um
Pit  Pil   ( Pil  Pib) /( P jl  Pjb)  (Pjt  Pjl ) quantitativo de trabalhadores bem acima da força de
(1) trabalho disponível na região o que provocou uma
elevação da dinâmica migratória no território e impôs
em que:
ao cálculo da projeção do município de Altamira
Pit = população a ser projetada para o município i um fator de correção como forma de incorporar no
no ano t processo à dinâmica acentuada de crescimento do
contingente populacional resultante da migração de
Pil = população inicial para o município i
pessoas ao município atraídas pelo empreendimento.
Pib = população base do município i
Diante de tal situação utilizou-se os registros feitos
Pjl = população inicial para RI Xingu pelos Balcões de captação de mão de obra man-
Pjb = população base para RI Xingui tidos pelo Consórcio ou por empresa contratada
conforme análise do 1°, 2° e 3° Relatórios Semestrais
Pit = população a ser projetada RI Xingu no ano t de Andamento do Projeto Básico Ambiental e das
Condicionantes da Licença e Instalação 795/2011,
A equação 1 pode ser reescrita da seguinte forma: da Usina Hidrelétrica Belo Monte (UHBM), processo
Pit  Ai Pjt  Bi 02001.001848/2006-75, disponibilizado no site do
(2)
MMA. No entanto, os deslocamentos migratórios
em que Ai é o coeficiente de proporcionalidade entre realizados por outros motivos e que não foram regis-
o crescimento da área menor e a maior e Bi funciona trados nos balcões não foram inseridos no modelo.
como um coeficiente linear de correção (SANTOS,
2010). Utilizou-se como base a Projeção da Popu- O relatório n.1, de 2011, informa que do total de
lação do Brasil, Revisão 2008, realizada pelo IBGE. 18.091 pessoas registradas nos balcões de capta-
ção de mão de obra 2.456 eram migrantes juntos
No cenário 2 considerou-se a atratividade popu- com os seus acompanhantes. No relatório n.3, de
lacional presente na RI Xingu por conta da con- 2012, esse número chegou a 9.477, uma diferença
cretização dos investimentos realizados na região, absoluta de 7.021 pessoas que irão incrementar a
decorrentes do início das obras da Hidrelétrica população dos anos seguintes até 2016, período
de Belo Monte (HBM) e que impôs mudanças es- de maior concentração e finalização da obra. Essa
truturais no território com efeito imediato sobre o diferença absoluta foi incrementada no coeficiente
município de Altamira. linear da equação 2.

Neste cenário, parte-se do princípio que fatores Para os anos de 2017 a 2030 adotou-se uma taxa
econômicos locacionais orientam o processo mi- média anual de decrescimento de 10% no período

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de 2017 a 2021 e de 5% para os anos de 2022 70.191.370 habitantes do Brasil, aproximadamen-


a 2030. Essas taxas seguem o comportamento te 38,5 milhões viviam no campo e 31,5 milhões
temporal observado para o município de Tucuruí nas cidades. Na década seguinte (1970), passou
quando da instalação da Hidrelétrica de Tucuruí. a ter uma população urbana maior do que a rural
Este procedimento visa inserir na projeção a traje- - 52.084.984 e 41.054.053, respectivamente. Qua-
tória decrescente do tamanho da população após tro décadas depois, o Censo 2010 indicou que,
a finalização das obras de construção civil. dos 190.732.694 milhões de habitantes, somente
29.852.986 (15,65%) viviam no campo e 160.879.708
(84,35%) nas cidades. Assim sendo, se for conside-
MUDANÇAS ESTRUTURAIS NO rada a evolução da população brasileira, verifica-se
TERRITÓRIO PARAENSE que a população do campo retraiu, enquanto que a
da cidade teve um expressivo crescimento.
A partir da segunda metade do século passado,
significativas mudanças estruturais têm decorrido A Região Amazônia segue o mesmo ritmo, embora
das novas formas de uso do território amazônico. a superação da população rural pela urbana tenha
Neste contexto, uma de suas maiores expressões sido registrada somente no Censo 1991, quando a
encontra-se no Pará. Becker (2007) destaca três população urbana atingiu 9.580.105 (55,74%) habi-
aspectos dessas mudanças estruturais recentes: tantes e a rural, 7.607.935 (44,26%). No Censo 2010,
a conectividade, a econômica e a estrutura de essa diferença se acentuou ainda mais, ou seja,
povoamento. 18.294.459 (71,81%) habitantes na zona urbana e
7.179.906 (28,19%) na rural. Portanto, a população
A conectividade, da qual Becker (2007) se refere, rural retraiu entre os referidos censos.
decorre da construção das estradas, nas décadas
de 1960/1970, com destaque para Belém-Brasília O Estado do Pará, durante o período em questão,
(BR-010), Transamazônica (BR-230) e Cuiabá- seguiu o mesmo ritmo. De acordo com o último
-Santarém (BR-163). No entanto, o mais importante Censo, sua população atingiu 7.581.051 habitantes,
instrumento de conectividade se deu a partir das com 68,48% vivendo em áreas urbanas e 31,52% em
redes de energia e telecomunicações, permitindo áreas rurais. Em função de sua grande diversidade
ligação mais rápida e eficiente com o território na- territorial e do processo de ocupação por diferentes
cional e com o exterior. grupos de migrantes, suas características popula-
cionais se diferenciam bastante entre si.
A segunda mudança estrutural importante encontra-
-se no plano econômico e foi promovida pela transfor- Outro aspecto relevante do ponto de vista da es-
mação de uma economia extrativista rudimentar para trutura de povoamento está vinculado à sua espa-
um extrativismo altamente tecnificado e também pro- cialização. No passado, ocorria principalmente nas
vocador de conflitos de grandes proporções. Como margens dos rios, lagos e igarapés. Não obstante,
resultado desse processo, o Pará hoje apresenta uma ocorreu uma reorientação de povoamento a partir
das maiores explorações mineral do Brasil e do mun- da abertura dos grandes eixos rodoviários, estradas
do, a exemplo da mineradora Vale, além de outras. vicinais e ramais. Uma nova forma de ocupação e
dinamização econômica ajudou não só a mostrar as
A terceira grande mudança está vinculada à estru- diferenças existentes, mas também produziu novas
tura de povoamento. Nesse aspecto, é importante contradições, entre as quais o acirramento pelo
observar que, de acordo com o Censo 1960, dos uso da terra e apropriação dos “recursos naturais”.

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Nas últimas décadas, o Pará é um dos estados da conclusão das eclusas de Tucuruí e o derrocamento
Amazônia que mais têm passado por acelerado do pedral do Lourenço), entre outras.
processo de tecnificação do território. Os anos 1970
e 1980 foram marcados por grandes investimentos, Esse processo em curso no Pará, produzido pela
em especial nos setores rodoviário, energético, tecnificação do seu território, faz emergir novas (re)
agropecuário, comunicação e mineração. Nos anos organizações territoriais, migrações, projetos de
de 1990 houve uma desaceleração dos investimen- colonização, agropecuários, madeireiros, energé-
tos estatais para esses setores, mas após esse ticos e de mineração. O último caso se aplica aos
período, o governo federal colocou em curso um mais recentes empreendimentos de mineração da
novo modelo de investimento, agora em parceria ALCOA em Juruti e da VALE em Canaã dos Carajás,
com a iniciativa privada, prevendo a ampliação do além de outros em curso.
sistema de transporte para dinamizar o fluxo econô-
Acredita-se que o processo de tecnificação
mico, no qual o cultivo de grãos e a mineração para
recente vinculado à expansão do cultivo de
a exportação passaram a ter enorme destaque, o soja, atividade mineradora e energética poderá
que provocou a instalação de novos portos fluviais agravar ainda mais os problemas territoriais,
estratégicos ao sistema logístico planejado para a caso não seja estabelecido, de modo urgente,
região amazônica. um maior controle sobre essas atividades.

Aliados aos interesses das grandes empresas, os Nesse contexto observa-se que, conforme os
governos estadual e federal estimularam a expan- dados dos censos IBGE, a região conhecida
são do agronegócio e das atividades minerais com como RI Xingu tem sua dinâmica populacional
o uso de alta tecnologia em território paraense. fortemente marcada pelo processo de tecni-
Esse processo, atualmente em curso, implica em ficação do seu território, principalmente com
mudanças radicais do ponto de vista do ordena- o advento da Transamazônica e, nos últimos
mento territorial do Pará. Inclusive com asfaltamento tempos, o processo de licenciamento e cons-
trução da UHBM.
de rodovias aberta na década de 1970 (BR-230 e
BR-163), além disso, o governo federal, esta cons-
truindo um dos maiores complexos hidrelétricos A REGIÃO DE INTEGRAÇÃO (RI)
do Brasil (UHE Belo Monte), no rio Xingu, além XINGU NO TERRITÓRIO PARAENSE
de outras obras que fazem parte do Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC).
O governo do Pará, através do Decreto Estadual nº
Interessados nos baixos preços das terras e redu- 1.066, de 19 de junho de 2008 (PARÁ, 2008), oficia-
zidas distâncias que representam em relação aos lizou a regionalização do estado5. Assim o referido
países importadores, além da expansão da linha de Decreto traz como objetivo o seguinte:
transmissão de energia da Hidrelétrica de Tucuruí,
muitas empresas, principalmente, do setor de grãos, O Pará é o segundo maior estado brasileiro em
passaram a investir cada vez mais na tecnificação extensão territorial, sendo superado apenas pelo
do território paraense. Além disso, existe uma gran-
de expectativa, fundamentalmente empresarial, em 5 Art. 1° A regionalização do Estado do Pará tem como objetivo definir
torno da execução de obras públicas de grande regiões que possam representar espaços com semelhanças de ocu-
pação, de nível social e de dinamismo econômico e cujos municípios
porte, tal como: o complexo hidrelétrico do Tapa- mantenham integração entre si, quer física quer economicamente, com
a finalidade de definir espaços que possam se integrar de forma a serem
jós; hidrovia do Tapajós, do Araguaia-Tocantins (a partícipes do processo de diminuição das desigualdades regionais.

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Amazonas, que também está localizado na Região A Região de Integração Xingu é constituída por dez
Norte. Sua dimensão é de 1.247.689 km² (CENSO municípios (Mapa 1), cujas origens remontam ao
DEMOGRÁFICO, 2011), ou seja, cerca de 13 vezes o período de ocupação colonial do rio Xingu e, mais
de Portugal, uma das razões pelas quais existem rei- recentemente, a colonização via abertura da rodovia
vindicações sistemáticas defendendo a sua divisão. Transamazônica (BR-230). Portanto, são processos
muito distintos que deram origem aos componentes
Se, por um lado os setores que reivindicam tais divi- dessa Região de Integração (RI).
sões alegam a incapacidade do estado em promover
políticas de gestão territorial eficiente devido a sua Do ponto de vista da criação oficial, os municípios
grande extensão territorial. Por outro lado, o Pará ca- mais antigos são Altamira e Porto de Moz e, os
rece de políticas que pensem e reflitam os problemas mais recentes são Anapu e Placas. As sedes dos
territoriais do estado como todo e não de políticas primeiros com origem às margens do rio Xingu e,
que privilegiam um ou outro ponto do seu território, as sedes dos dois últimos às margens da rodovia
dando a sensação de abandono frente aos desafios Transamazônica.
colocados pelas especificidades dos lugares e pela
ordem dos desafios que cada vez mais são globais. Os municípios instalados às margens da rodovia
Transamazônica (Anapu, Brasil Novo, Medicilândia,
O grande território paraense está dividido em 12 Pacajá, Placas e Uruará) têm as suas origens rela-
Regiões de Integração (RI)6 e comporta no seu cionadas ao Programa de Integração Nacional (PIN),
interior várias Amazônias. Cada uma delas apre- instituído em 1970 e implantado de modo autoritário,
senta ambiente e construções territoriais distintas. a partir de 1971, pelo Governo Federal na época
Por essa razão se torna importante realizar estudos da ditadura militar. Portanto, foi na perspectiva de
que valorizem essas especificidades, adentrando promover a colonização e a reforma agrária que a
na dinâmica dos lugares, sem deixar, é claro, de
emblemática Rodovia Transamazônica foi aberta no
valorizar as indispensáveis conexões existentes
seio da grande floresta densa. No estado do Pará
entre o lugar e o mundo.
dois trechos, dessa rodovia tem grande destaque: o
eixo que liga Marabá - Altamira (onde se originaram
Nas últimas décadas, o território paraense tem
passado por um significativo processo de criação os municípios de Anapu, Pacajá e Novo Repartimen-
de novos municípios, estimulados, dentre outros to) e o eixo Altamira - Itaituba (os municípios de Brasil
fatores, pela instalação de grandes projetos de in- Novo, Medicilândia, Uruará, Placas e Rurópolis).
fraestrutura, mineração, madeireiros, agropecuários,
Altamira é o município mais antigo da RI Xingu, insta-
além de outros. Em 1960, o estado apresentava 63
lado em 1º de janeiro de 1912. Embora o seu território
municípios, na década seguinte chegou a 83 e assim
tenha sofrido desmembramento para dar lugar a no-
se manteve até a década de 1980. No censo de 1991,
vos, continua sendo o maior do país, com 159.533,73
já contava com 105 e atualmente já são 144 (com a
Km², de acordo com o Censo Demográfico (2011).
recente criação do município de Mojuí dos Campos).
A colonização oficial promoveu mudanças estru-
6 “A nova proposta de regionalização para o estado do Pará surgiu da turais muito importantes, dado o peso econômico
constatação de que as regionalizações estabelecidas pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Mesorregião e Micror- dos investimentos e da grande migração que pro-
região – não mais refletiam a realidade estadual. A identificação das moveu para a Região do Xingu, em que Altamira já
12 Regiões de Integração levou em consideração as características
de concentração populacional, acessibilidade, complementaridade e ocupava uma condição de liderança desde a época
interdependência econômica”. (http://www.seir.pa.gov.br. Acesso em
dez. de 2009). da exploração de castanha-do-pará e de outros

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Mapa 1
Mapa da Região de Integração Xingu
Fonte: base cartográfica adaptada IBGE, 2006.
Elaboração: IDESP – Pará (2011).

recursos florestais. Do mesmo modo sua liderança zônia (Belém e Manaus). Altamira, nesse mesmo
populacional respondeu à sua condição estratégica período, contrariou essa lógica, uma vez que a
frente aos projetos que foram implantados no seu população residente cresceu 35% média/década.
entorno, a exemplo da Transamazônica, projetos Entretanto, no período de 70-80, com o advento da
de assentamentos rurais e mais recentemente o Transamazônica, o crescimento populacional foi de
processo de instalação da UHBM. Nesse aspecto,
203%. Entre 2000-2010 embalado pela perspectiva
pode-se observar a evolução da população absolu-
de construção da UHE Kararaô (Hoje Hidrelétrica
ta desse município nas últimas décadas (Gráfico 1).
de Belo Monte), o crescimento foi de 28%. Isso,
Mougeot (1983), atenta para o fato de que no de- portanto, demonstra que, considerando o efeito
correr das décadas de 1940-1970, há redução do migratório para a região, a construção da rodovia
peso demográfico das pequenas cidades e uma Transamazônica foi muito mais expressiva que a
maior concentração nas duas maiores da Ama- atual construção da UHE Belo Monte.

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Artigo
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120.000 trabalho, destacadamente estimu-


lado pela atração populacional
100.000
exercida pelo maior empreendi-
80.000 mento hidroelétrico do Brasil na
atualidade – UHBM. Nesse senti-
Habitantes

60.000
do, as políticas de compensação
financeira derivadas da instalação
40.000
e funcionamento da Usina devem
20.000 considerar as demandas deriva-
das dessas rápidas mudanças
0
1960 1970 1980 1991 2000 2010 impostas às populações locais com
Urbana Rural Total acentuada vulnerabilidade sociais.

Gráfico 1 O ritmo de crescimento popu-


Distribuição da população residente – Altamira – 1960-2010 lacional urbano para o período
Fonte: IBGE,1960-2010.
2000-2010 foi 43% superior ao
crescimento da população rural, ou
seja, enquanto a população urbana
A DINÂMICA POPULACIONAL DA RI cresceu cerca de 49% a rural cresceu apenas cerca
XINGU NO PERÍODO 2000-2010 de 6%. No caso de Altamira, maior população da RI
Xingu, a população urbana cresceu 35% e a rural
Evolução da População Residente decresceu em 1,10%, no mesmo período.

A população residente da RI Xingu, de acordo Destaca-se que dos dez municípios que compõe
com o Censo Demográfico (2000), foi de 263.309 a RI Xingu, somente dois (Placas e Porto de Moz)
habitantes e de 331.770 para o Censo 2010, com apresentaram taxa de crescimento populacional ru-
um crescimento de aproximadamente 26%. Nesse ral superior à urbana. Anapu bateu recorde de cres-
mesmo período houve certa equidade com o cresci- cimento da população urbana (218,90%), seguido
mento da população residente de Altamira e Vitória por Uruará com 85,60%, Pacajá com 80,80% e Brasil
do Xingu (municípios que estão no epicentro da Novo com 57,80%, acompanhando a tendência de
construção da UHBM), ou seja, de 27,90%, saindo urbanização da população brasileira que de acordo
de 77.439 para 99.075 habitantes, no primeiro caso; com o Censo de 1960 era de 70.191.370 habitantes,
e de 20,50%, de 11.142 para 13.431, no segundo. dos quais aproximadamente 38,5 milhões viviam no
campo e 31,5 milhões na cidade. Uma década de-
Nos municípios de Placas e Anapu o crescimento
pois, o Censo apontou uma mudança substancial,
populacional foi exponencial, em que o primeiro
ou seja, pela primeira vez a população urbana se
teve crescimento de 78,70% e o segundo atingiu o
mostrou superior à população rural, 52.084.984 e
teto da RI Xingu, ou seja, 118,40%, de acordo com o
41.054.053, respectivamente. Duas décadas depois,
censo 2010. Os municípios de Uruará, Brasil Novo e
Senador José Porfírio tiveram crescimento negativo o Censo 1991, demonstrou pela primeira vez que
de 0,90%, 8,70% e 17,00%, respectivamente. a Amazônia Legal havia passado a ter população
urbana maior que a rural, 9.580.105 (55,74%) e
Essa condição, dentre outros aspectos, denota a 7.607.935 (44,26%). O Pará, por sua vez, seguiu
diferenciação espacial da mobilidade da força de o mesmo ritmo e, de acordo com o último Censo,

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sua população atingiu 7.581.051, dos quais 68,48% Do conjunto dos migrantes para a RI Xingu cinco
vivendo nas áreas urbanas e 31,52% nas rurais. As- estados têm maior destaque em ordem decres-
sim sendo, conclui-se que a RI Xingu acompanha a cente, são eles: Maranhão, Bahia, Ceará, Paraná e
tendência de urbanização da população brasileira, Minas Gerais. O maior grupo, representado pelos
embora de maneira retardatária, demonstrando os maranhenses, em 2010 representavam 26.848
nexos da dinâmica populacional local com os pro- migrantes, ou seja, 28,78%, do total de migrantes
cessos globais, uma vez que essa é uma tendência para a região.
mundial, que expressivamente vem se desenvolven-
do desde a Revolução Industrial. No mesmo período, o município de Altamira teve um
crescimento de 13,5% de imigrantes, passando de
Origem dos migrantes 25.334 para 28.763 imigrantes na composição da
sua população total. Portanto, seu crescimento não
Conforme os Censos Demográfico (2000, 2011), a está entre os maiores destaques da RI Xingu (Anapu
população residente da RI Xingu se constituída de e Placas), situação que pode indicar que o empre-
33.83% e 28,11% de imigrantes, respectivamente. Em endimento Belo Monte não atrai população apenas
números absolutos isso equivale, a 89.091 e 93.277 para os municípios em que ocorre a sua instalação,
habitantes. Entretanto é importante ressaltar que, ele cria muitas outras expectativas gerando diversi-
enquanto o crescimento da população total foi de ficadas formas de mobilidade de força de trabalho.
26%, o crescimento de imigrantes foi apenas em 5%.
Outro aspecto importante, obtido por meio da siste-
Na década em foco, a soma do crescimento natural matização e análise dos dados do censo IBGE 2000
ou vegetativo, acrescido da mobilidade interna da e 2010, foi não só a confirmação de que a principal
população do estado do Pará foi mais expressiva origem dos imigrantes para a RI Xingu é proceden-
que a imigração derivada de outros estados brasi- te da Região Nordeste e a menor é da Norte (sem
leiros, tal condição pode ser observada no gráfico contar com a migração interna do estado do Pará),
a seguir, onde os indivíduos nascidos no Pará pas- seguida pelas regiões Sul e Sudeste. A migração
saram de 66,10%, em 2000, para 71,73%, em 2010, nordestina lidera com 67,69% e 65,93% para os anos
da população total que compõe a RI Xingu. de 2000 e 2010, respectivamente.

250.000
Evolução e distribuição da
200.000
população por faixa etária
e sexo
150.000

Observou-se que nas últimas déca-


100.000
das a população paraense passou
50.000
gradativamente por um amadu-
recimento, de tal maneira que,
0
AC AL AM AP BA CE DF ES GO MA MT MS MG PA PB PR PE PI RJ RN RS RO RR SC SP SE TO
em 1950, o percentual de idosos
2000 2010
homens era de 3,69 e de mulheres
4,34, mantendo-se estável até a
Gráfico 2
RI Xingu: População residente (com o Pará) por lugar de nascimento década de 1980. Porém, a partir da
2000-2010 década de 1990 o crescimento se
Fonte: IBGE – Censo Demográfico (2000, 2010). tornou mais expressivo, chegando,

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mais saiu de 4,8% em 1991, 5,9%,


em 2000, e 7,4, em 2010.

Comparando-se os dados da pirâ-


mide de idade e sexo da RI Xingu,
tanto à equivalente ao Censo 2000
como ao de 2010, com as pirâmi-
des do estado do Pará e do Brasil,
observa-se praticamente a mesma
tendência, ou seja, o avanço dos
percentuais relativos à população
adulta e idosa, ao mesmo tempo
em que ocorre a diminuição da po-
pulação jovem, exigindo cada vez
mais preocupações e planejamen-
Gráfico 3
Composição por sexo e idade da população residente no Pará tos relativos à previdência social.
1950-20100
Fonte: IBGE, 1950 -2010.
Embora a RI Xingu, em 2010, apre-
sente pirâmide etária com maior
em 2010, a 6,84% de idosos masculinos e 7,29% destaque para adultos e idosos,
femininos. superior a 50% da população total, a população
jovem ainda é expressiva, demandando serviços
Por outro lado, a população paraense de jovens e de investimentos em longo prazo como a educação
adultos, da década de 1950 a de 1990 se mante-
e preparação para o futuro mercado de trabalho.
ve, respectivamente, acima de 50% e por volta de
Essa é uma condição comum às sociedades que
40%. Situação que tem rápida mudança a partir dos
apresentam má distribuição de renda, baixo nível
dados do censo 2000, provocando a inversão dos
educacional e reduzido acesso aos serviços e in-
percentuais da população jovem e adulta que, em
fraestrutura social.
2010, ficou em 41,75% de jovens homens e 41,12%
mulheres, ao passo que os adultos passaram a ter Assim sendo, a atual pirâmide etária da RI Xingu,
a maior participação no total da população do Es-
reflete de maneira geral um baixo nível de desen-
tado, ou seja, 51,41% homens e 51,59% mulheres,
volvimento social, denunciando a necessidade de
como pode ser constatados por meio dos dados
investimentos urgentes, condição que, pelos dados
apresentados no Gráfico 3.
utilizados (2000 e 2010), antecedem as mazelas so-
De modo geral, é possível afirmar que o compor- ciais derivadas da implantação da UHBM que, caso
tamento da população paraense nas últimas dé- não se efetive uma política firme de investimento e
cadas seguiu a trajetória da população brasileira, compensação para a sociedade local, tenderá a
ou seja, de acordo com o IBGE, o Censo de 1991 se agravar ainda mais os problemas sociais pré-
apontou que o grupo de crianças de zero a quatro -existentes, inclusive com aqueles decorrentes da
anos representava 5,7% homens e 5,5% mulheres. forma de ocupação desordenada, estimulada pelo
Porém, o Censo 2000 caiu para 4,9% e 4,7% e, Governo Federal a partir do início da década de
em 2010, registrou 3,7% e 3,6%, respectivamente. 1970, com a construção da transamazônica e dos
Ao mesmo tempo, a população de 65 anos ou projetos de colonização.

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Em 2000, a distribuição por sexo e faixa


etária da população residente da RI Xingu
era constituída de 52,51% da população
masculina e 47,49% da feminina. Em 2010
a distribuição foi registrada em 52,35%
e 47,65%, respectivamente. Portanto,
situação praticamente inalterada entre
sexos. Porém, é significativa a mudança
quando se observa os percentuais nas
faixas de idades entre os censos 2000 e
2010, mostrando que a população em dez
anos passou por acentuado processo de
amadurecimento. Assim, a população jo-
vem, de zero a 19 anos, que em 2000 era
50,09% constituída de homens e 52,74%
de mulheres; em 2010, caíram para 43,17%
e 45,65%; os adultos, de 20 a 59 anos
44,73% homens e 43,01% mulheres subiu
Gráfico 4
para 50,34% e 48,82% e, finalmente os
População residente por sexo e faixa etária – RI Xingu – 2000
Fonte: IBGE - Censo Demográfico (2000).
idosos, de 60 ou mais anos também subi-
ram de 5,18% homens e 4,25% mulheres
para 6,49% e 5,53%. Essas informações
podem ser visualizadas nas pirâmides
etárias apresentadas a seguir.

Outro aspecto importante decorre do fato


de que, embora a população idosa tenha
crescido a sua participação é pequena
na população absoluta, dessa maneira,
verifica-se que na área em foco ocorre uma
baixa expectativa de vida, reproduzindo o
perfil das pirâmides de sociedades com
baixo nível de desenvolvimento social.

Resultados da estimação da
população residente para o
período de 2011 a 2030
• Cenário 1

Gráfico 5 Mantida as condições dos parâmetros con-


População residente por sexo e faixa etária – RI Xingu – 2010 forme as características do modelo AiBi os
Fonte: IBGE - Censo Demográfico (2011). resultados mostram que a população da RI

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Tabela 1
Estimativa da população residente nos municípios da RI Xingu – 2010-2030

Ano Porto de Vitória do Senador


Altamira Anapu Medicilândia Pacajá Placas Brasil Novo Uruará
estimativa Moz Xingu José Porfírio
2010 99.080 20.540 27.330 39.980 23.930 33.960 13.430 15.690 13.050 44.790
2011 103.387 22.763 28.514 42.190 26.035 36.031 13.887 15.390 12.512 44.707
2012 105.033 23.609 28.966 43.033 26.836 36.823 14.061 15.276 12.308 44.676
2013 106.599 24.415 29.397 43.836 27.599 37.576 14.227 15.167 12.114 44.646
2014 108.095 25.186 29.808 44.603 28.328 38.296 14.385 15.063 11.929 44.617
2015 109.529 25.924 30.202 45.338 29.027 38.986 14.537 14.964 11.752 44.590
2016 110.910 26.634 30.582 46.046 29.699 39.651 14.683 14.868 11.581 44.564
2017 112.243 27.321 30.949 46.729 30.349 40.292 14.824 14.775 11.416 44.538
2018 113.533 27.985 31.303 47.391 30.977 40.913 14.961 14.686 11.257 44.514
2019 114.783 28.628 31.647 48.031 31.586 41.514 15.093 14.599 11.102 44.490
2020 115.994 29.251 31.980 48.652 32.176 42.097 15.221 14.515 10.952 44.467
2021 117.168 29.855 32.303 49.254 32.748 42.662 15.345 14.433 10.807 44.444
2022 118.303 30.440 32.615 49.836 33.301 43.208 15.465 14.354 10.667 44.423
2023 119.399 31.004 32.916 50.397 33.835 43.736 15.581 14.278 10.531 44.402
2024 120.450 31.545 33.205 50.936 34.347 44.241 15.692 14.205 10.401 44.382
2025 121.452 32.060 33.481 51.450 34.835 44.724 15.798 14.136 10.277 44.363
2026 122.400 32.548 33.741 51.936 35.297 45.180 15.899 14.070 10.160 44.345
2027 123.289 33.006 33.986 52.391 35.730 45.607 15.993 14.008 10.050 44.328
2028 124.114 33.431 34.213 52.815 36.132 46.005 16.080 13.951 9.948 44.312
2029 124.873 33.821 34.421 53.203 36.501 46.370 16.160 13.898 9.854 44.298
2030 125.561 34.175 34.611 53.556 36.837 46.701 16.233 13.850 9.769 44.285
Fonte: IBGE.
Elaboração do IDESP a partir de dados do IBGE.

do Xingu chegaria em 2030 com 416 mil habitantes haverá neste ano, um acréscimo de 37,5 mil pessoas
contra 331,7 mil registrados em 2010, de acordo residindo na RI do Xingu e, em relação ao município
com o censo demográfico. A população estimada, de Altamira esse plus será de 36,2 mil pessoas, ou
em 2030, para o município de Altamira deverá ser seja, quase a totalidade do incremento populacional
de 125,6 mil habitantes com uma participação de deverá habitar o território desse município conforme
30,0% no total da população da RI Xingu, conforme as premissas do estudo.
os dados da Tabela 1.
A partir de 2017 é esperado uma desaceleração no rit-
• Cenário 2 mo de crescimento da população que deverá refletir, a
partir de 2025, o fluxo vegetativo da região, em especial
Segundo os resultados da estimativa apresentada do município de Altamira, porém mantendo-se o nível
na Tabela 2 a RI do Xingu, em 2016, contará com populacional acima do verificado no censo de 2010.
um contingente populacional de 406,7 mil habitan-
tes, cerca de 4,88% da população do Estado que Vale ressaltar que a estimativa realizada poderá não
contará com 8,3 milhões de pessoas e o município refletir a realidade futura e o distanciamento dos
de Altamira chegará ao total de 148,4 mil pessoas, valores reais dependerá do sucesso das políticas
em torno de 36,50% da população da RI. implementadas na RI do Xingu, com destaque para
o Plano de Desenvolvimento Territorial Sustentável
Em comparação ao cenário 1 cuja população es- da Região de Integração do Xingu (PDRS), dos
timada para 2016 ficará em 369,2 mil habitantes, programas e projetos associados.

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Artigo
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Tabela 2
Estimativa da população residente nos municípios da RI Xingu – 2010-2030

Ano Porto de Vitória do Senador


Altamira Anapu Medicilândia Pacajá Placas Brasil Novo Uruará
estimativa Moz Xingu José Porfírio
2010 99.080 20.540 27.330 39.980 23.930 33.960 13.430 15.690 13.050 44.790
2011 105.843 22.763 28.514 42.190 26.035 36.031 13.887 15.390 12.512 44.707
2012 114.510 23.609 28.966 43.033 26.836 36.823 14.061 15.276 12.308 44.676
2013 123.097 24.415 29.397 43.836 27.599 37.576 14.227 15.167 12.114 44.646
2014 131.614 25.186 29.808 44.603 28.328 38.296 14.385 15.063 11.929 44.617
2015 140.069 25.924 30.202 45.338 29.027 38.986 14.537 14.964 11.752 44.590
2016 148.471 26.634 30.582 46.046 29.699 39.651 14.683 14.868 11.581 44.564
2017 146.048 27.321 30.949 46.729 30.349 40.292 14.824 14.775 11.416 44.538
2018 143.958 27.985 31.303 47.391 30.977 40.913 14.961 14.686 11.257 44.514
2019 142.165 28.628 31.647 48.031 31.586 41.514 15.093 14.599 11.102 44.490
2020 140.637 29.251 31.980 48.652 32.176 42.097 15.221 14.515 10.952 44.467
2021 139.347 29.855 32.303 49.254 32.748 42.662 15.345 14.433 10.807 44.444
2022 138.708 30.440 32.615 49.836 33.301 43.208 15.465 14.354 10.667 44.423
2023 138.171 31.004 32.916 50.397 33.835 43.736 15.581 14.278 10.531 44.402
2024 137.721 31.545 33.205 50.936 34.347 44.241 15.692 14.205 10.401 44.382
2025 137.341 32.060 33.481 51.450 34.835 44.724 15.798 14.136 10.277 44.363
2026 137.018 32.548 33.741 51.936 35.297 45.180 15.899 14.070 10.160 44.345
2027 136.738 33.006 33.986 52.391 35.730 45.607 15.993 14.008 10.050 44.328
2028 136.487 33.431 34.213 52.815 36.132 46.005 16.080 13.951 9.948 44.312
2029 136.256 33.821 34.421 53.203 36.501 46.370 16.160 13.898 9.854 44.298
2030 136.033 34.175 34.611 53.556 36.837 46.701 16.233 13.850 9.769 44.285
Fonte: IBGE - Censo Demográfico (2011).
Elaboração e Cálculos: IDESP, 2013.

Os números estimados para população contribuem PDRS do Xingu de maneira a construir as bases do
para a elaboração, implementação e efetivação das desenvolvimento sustentável em suas dimensões
ações governamentais integradas e expostas no econômica, social, ambiental, institucional e cultural.

O contingente populacional estima-


do para as próximas duas décadas,
mantida as características dos
componentes populacionais – na-
talidade, mortalidade, migração e
emigração, e das estruturas etária,
de localização e de gênero, indica
que a RI Xingu deverá ser dotada de
infraestrutura física urbana e rural
capaz de atender as demandas
dessa população no que se refere
a quantidade de escolas, postos
de saúde, delegacias, transporte
Gráfico 6
coletivo urbano e rural, equipa-
Trajetória da população residente nos municípios da RI Xingu – 2010-2030
mentos culturais, entre outros
Fonte: IBGE - Censo Demográfico (2011).
Elaboração e Cálculos: IDESP, 2013. itens necessários ao bem-estar da

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Artigo
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

população, daí a importância do presente estudo registros do Consórcio Construtor e dos gestores
ao planejamento regional. municipais provocou a elevação da demanda por
serviços na região e a redução da qualidade dos
CONCLUSÃO serviços prestados no que tange a oferta da educa-
ção, saúde, transporte, segurança, habitação entre
outros tantos problemas.
A construção do conhecimento sobre a realidade
amazônica, em todas as suas especificidades, O deslocamento da população rural para o meio
requer a produção da informação elaborada de urbano foi observado no Norte e que também é
maneira sistemática, ancorada nos pressupostos fato em todas as regiões brasileiras. No entanto, a
da produção científica e nos princípios da ética e redução da mão de obra rural compromete a pro-
da moral, para que os seus resultados reflitam fiel- dução de culturas importantes para o controle da
mente os fatos registrados nos territórios em que segurança alimentar no município e que impõe aos
eles acontecem. moradores locais o consumo de produtos alimen-
tícios básicos procedentes das regiões Nordeste
As informações aqui apresentadas resultaram, e do Centro-Oeste do Brasil e que adquiridos a
inicialmente, da sistematização dos dados demo- preços elevados que refletem as falhas existentes
gráficos disponíveis nas duas principais fontes de no mercado local.
dados primários e secundários, quais sejam: o IBGE
e o IDESP. E da aplicação de técnicas demográficas As projeções mostram que no ano de 2016 deverá
de projeção da população para pequenas áreas ocorrer o pico do incremento populacional coin-
considerando os efeitos exógenos provocados cidindo com o fim da etapa de construção civil e
pelo processo de tecnificação de algumas áreas da início de uma etapa que requer mão de obra com
região amazônica, como é o caso da RI Xingu que, maior qualificação cuja demanda deve ser suprida
por conta de seu potencial hidrográfico e condição por trabalhadores da região sudeste do país.
geopolítica, foi escolhida para receber a Hidrelétrica
de Belo Monte (HBM). A implementação das diretrizes formuladas no
PDRS Xingu poderá contribuir para formação de
Diante dos resultados foi possível perceber que a uma economia local sustentável estabelecida na
dinâmica demográfica observada na RI foi alterada exploração adequada dos recursos existentes na
a partir de meados da primeira década de 2000, em região. No entanto, o Estado no seu dever de promo-
decorrência das especulações de construção da ver o desenvolvimento, dar segurança e educação
HBM o que motivou a mobilidade de pessoas de básica em seu território deverá estabelecer ações
outros municípios do Pará e de estados vizinhos, para garantir as necessidades básicas da popula-
com destaque para o Maranhão cujo deslocamento ção da região que chegará a quase meio milhão de
se deu por conta das oportunidades de emprego pessoas em 2030.
na construção da hidrelétrica demandante de ele-
vado contingente de trabalhadores na fase inicial
de construção civil. REFERÊNCIAS

Vale ressaltar que esses imigrantes trouxeram con- BECKER, B. Amazônia. São Paulo: Ática, 1990.
sigo pelo menos uma pessoa que em alguns casos
foram às esposas, ou elas e seus filhos, ou amigos ______. Fronteira Amazônica: questões de gestão
e parentes. Esse processo de mobilidade, conforme do território. UNS; URRS, 1992.

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BECKER, B. Amazônia: geopolítica na virada do III MELLO, A. O tamanho do Pará. Revista de Estudos
milênio. Rio de Janeiro: Garamond, 2007a. Paraenses, Belém, v. 1, n. 2, p. 9-10, 2008.

______. A Amazônia e a política ambiental bra- PARÁ. Decreto Estadual nº 1.066, de 19 de junho
sileira. In: SANTOS, M. et al. Território, territórios: de 2008. Dispõe sobre a regionalização do Estado
ensaios sobre o ordenamento territorial. Rio de do Pará e dá outras providências. [Diário Oficial do
Janeiro: Lamparina, 2007b. p. 22-40. (Col. Espaço, Estado do Pará], 19 jun. 2008.
Território e Paisagem).
PARÁ. Instituto de Desenvolvimento Econômico,
CORRÊA, R. Região e organização espacial. São Social e Ambiental do Pará. Estatística municipal:
Paulo: Ática, 1990. Juruti. Belém: IDESP, 2011.

CENSO DEMOGRÁFICO 1970. Rio de Janeiro: SANTOS, M. Metamorfose do espaço habitado. São
IBGE, 1970. Paulo: Hucitec, 1988.

CENSO DEMOGRÁFICO 1980. Rio de Janeiro: ______.Técnica, espaço, tempo: globalização e


IBGE, 1980. meio técnico-científico informacional. São Paulo:
Hucitec, 1994.
CENSO DEMOGRÁFICO 1991. Rio de Janeiro:
IBGE, 1991. SANTOS, R. História econômica da Amazônia
(1800/1920). São Paulo: T.A. Queiroz, 1980.
CENSO DEMOGRÁFICO 2000. Rio de Janeiro:
IBGE, 2000. ______. O. Projeções populacionais para pequenas
áreas a partir de cenários econômicos: aplicação de
CENSO DEMOGRÁFICO 2010. Rio de Janeiro: ratio methods para a região do Alto Paraopebas-MG,
IBGE, 2011. 2010-2025. 2010. Dissertação (Mestrado)-Centro
de Desenvolvimento e Planejamento Regional, Belo
GARCIA, A. Terra de trabalho. Rio de Janeiro: Paz e
Horizonte, 2010.
Terra, 1983.
VELHO, O. Capitalismo autoritário e campesinato.
MARTINS, J. Expropriação e violência: a questão
São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1979.
política no campo. São Paulo: Hucitec, 1991.
WALDVOGEL, B. Técnicas de projeção populacional
para o planejamento regional. Belo Horizonte: UFMG;
CEDEPLAR, 1998. 162 p. (Estudos Cedeplar, n. 1).

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Anexos
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A economia das recomendações da OMT, com algumas dife-


renças devido à falta de dados no âmbito regional.
do turismo de A principal base de informação do trabalho é uma
Conta Satélite do Turismo de Pernambuco – CST/
Pernambuco PE, que foi elaborada com o ano base de 2005.
O trabalho foi realizado com a parceria de três
importantes instituições: a Agência Estadual de
Maurílio Soares de Lima1 Planejamento e Pesquisas de Pernambuco – Agên-
cia CONDEPE/FIDEM, a Fundação de Amparo à
Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco
Introdução - FACEPE e a Universidade Federal Rural de Per-
nambuco - UFRPE.
Nas últimas décadas, a atividade turística vem
A Tabela de Recursos e Usos (TRU) foi a principal
ganhando importância na economia mundial, por
ferramenta de analise e extração de dados, estima-
apresentar uma fonte de receita em franca expan-
da pela Agência CONDEPE/FIDEM, e como é inte-
são, além do seu impacto econômico, cultural,
grada conceitualmente e metodologicamente com
social, bem como as suas inter-relações com di-
aquelas produzidas para o Brasil e com o Sistema
versas atividades produtivas. E para acompanhar
de Contas Nacionais e com o Sistema de Contas
seus impactos, muitas pesquisas são realizadas
Regionais, possibilitou a elaboração do estudo.
atualmente, em sua maioria, focam em medir a gran-
deza do turismo nas economias locais e regionais. Além da TRU/PE, as outras fontes de dados foram:
Porém, até o presente, não há uma preocupação o Sistema de Contas Regionais de Pernambuco
de comparabilidade entre si. – SCR, a Empresa Pernambucana de Turismo -
Empetur, a Empresa Brasileira de Infraestrutura
Com essa preocupação a Organização Mundial do
Aeroportuária- Infraero, a Empresa Brasileira de
Turismo (OMT) elaborou definições metodológicas
Turismo – Embratur, a Relação Anual de Informa-
que permitissem a obtenção de indicadores com-
ções Sociais – RAIS/M.TE, a Pesquisa Nacional de
paráveis internacionalmente, são sugestões para
Amostra de Domicílios – PNAD/IBGE, a Pesquisa
cálculo de indicadores comparáveis internacional-
de Orçamento Familiar – POF/IBGE, a Tabela de
mente, bem como, preocupação com a comparabi-
Recursos e Usos – Brasil/IBGE, a Pesquisa Anual
lidade dos indicadores do turismo com os demais
dos Serviços – PAS/IBGE e a Fundação Instituto de
segmentos produtivos da economia através da
Pesquisas Econômicas – FIPE.
adequação do RIET (2008) ao Sistema de Contas
Nacionais de 2008 (SCN, 2008) e ao Manual do
Mesmo com diversas fontes existentes ainda existe
Balanço de Pagamentos.
uma lacuna para âmbito regional, sobretudo refe-
rente ao consumo do turismo, o que levou a abor-
O trabalho “A ECONOMIA DO TURISMO DE PER-
NAMBUCO” é uma aplicação do arcabouço teórico dagem metodológica utilizada para a estimação da
CST/PE a considerar a necessidade de efetuar dois
procedimentos: a estimação das contas de produ-
1 Economista; especialista em Pesquisa Social, Planejamento Social,
Planejamento Estratégico; atual presidente da Associação Nacional
ção dos setores de atividade do turismo e o cálculo
das Instituições de Planejamento, Pesquisa e Estatística - ANIPES e das contas de produção dos setores de atividade
da Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco
– CONDEPE/FIDEM. do turismo – parte referente ao turismo.

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O ponto de partida do trabalho ocorreu com base transporte ferroviário, este percentual foi utilizado
em informações da Pesquisa de Turismo Receptivo para ponderar o VBP, o CI, o VAB, os Salários e Ou-
realizada pela EMPETUR e nos resultados da TRUR tras Remunerações além das Remunerações totais.
– PE, tornando possível a elaboração da Tabela 1,
que apresenta o peso das atividades mais expres- A Tabela 1 representa o principal quadro de uma
sivas do turismo na oferta da economia pernambu- CST, o Quadro 6 - Contas de Produção dos Seto-
cana. Essa tabela possibilitou o desenvolvimento res de Atividade do Turismo e a parte turística que
de grande parte do trabalho. cada segmento representa na economia estadual.

Tabela 1
Gasto turístico e oferta total das atividades selecionadas e o percentual no total da oferta
Gasto Turístico Oferta
Atividades % do Turismo
(R$ milhões) (milhões)
Alojamento 677 4.040 17%
Hotéis e outros alojamentos 305 340 90%
Residência Secundária 372 3.700 10%
Alimentação 511 1.984 26%
Transporte de Passageiros 1.209 2.936 41%
Aéreo 633 840 75%
Rodoviário 544 1.736 31%
Ferroviário 15 162 9%
Aquaviário 1 13 9%
Serviços de Apoio 17 185 9%
Agências de Viagens e Operadores Turísticos 67 90 74%
Aluguel de Veículos 48 160 30%
Serviços Recreativos, Culturais e Desportivos 147 574 26%
Margem de Comércio 517 7.659 7%
Serviços 84 22.095 0%
Total da Economia 3.259 117.587 3%
Fonte: Conta Satélite do Turismo – CST – PE

Com os dados relativos à Permanência Média em Incorporando várias fontes de informação levantou-
dias, Gasto Médio em Real, Fluxo de Turistas em -se a demanda e a oferta do Segmento Turístico e
unidade e perfil dos gastos em percentual, dispo-
Conexos, classificou-se o segmento de acordo com
nibilizada pela EMPERTUR e pela POF, foi possível
seu consumo Interno ou receptivo. Foi elaborada a
elaborar uma série de resultados para confronto
maioria das Tabelas que estruturam uma CST, ade-
com a oferta total dos segmentos turísticos.
quando-se a metodologia do SCR para elaboração
O principal ponto a enfatizar é a possibilidade de se do PIB do setor e seus componentes segundo a ótica
estimar, dentro da oferta total de um segmento, o da Produção (2006 a 2009). Foram estimados os
valor correspondente ao setor turístico através dos vetores de emprego e renda para o segmento (2006
gastos dos turistas. Exemplificando: se o gasto do a 2009), e elaborou-se um indicador de Curto Prazo
turista representar 9% da oferta total da atividade de relacionado ao Nível de Atividade do Segmento.

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Para estimar o emprego nos seto-


res atividade do turismo as princi-
pais fontes de informação foram a
TRUR/PE e a PNAD. Na estimação
da parte turística foi adotada a
mesma metodologia do tópico
Contas de Produção dos Setores
de Atividade do Turismo – Parte
Referente ao Turismo, ou seja,
cada atividade tinha um percentual
definido, a exceção dos serviços de
aluguéis, que para separar a segun-
da residência e o aluguel de carros,
utilizou-se o peso no VAB do SRC.
Gráfico 1
Participação do VAB e emprego do turismo na economia de Pernambuco
Com o detalhamento das informa-
2005-2009
ções captadas no Quadro – Con-
Fonte: Elaboração própria.
tas de Produção dos Setores de
Atividade do Turismo – (ver anexo),
relação ao preço praticado para os indivíduos não
estimou-se os números para o Valor Bruto de Pro-
turistas, os residentes.
dução- VBP, o Consumo Intermediário - CI e o Valor
Adicionado Bruto - VAB dos 13 segmentos da CST Os resultados obtidos indicam que o turismo repre-
de Pernambuco para o ano de 2005. sentou 3,8% do VAB total da economia pernambu-
cana em 2009, conforme demonstra o gráfico 1. No
Os resultados para cada um dos segmentos foram
o período estudado, 2005 a 2009, essa participação
calculados para os outros anos correntes, com
variou entre 4,3% e 3,8%.
os vetores obtidos para o turismo pernambucano
através de indicadores de volume e preço com au- Outro fator importante do estudo foi possibilitar a
xilio da planilha de cálculo do Sistema de Contas aferição do desempenho do setor no curto prazo, já
Regionais – SCR, visto que o ano base da CST para que o SCR divulga o PIB de Pernambuco com uma
Pernambuco foi 2005, assim como a TRUR/PE. defasagem de dois anos, o que torna necessário a
criação de um mecanismo de acompanhamento no
Ressalta-se que a metodologia adotada para a curto prazo, para suprir as demandas tanto por parte
maioria dos segmentos foi a mais adequada devido dos agentes públicos como pela iniciativa privada,
à falta de informação sobre o setor. Utilizar como a tempo de corrigir os investimentos realizados no
índice de volume o fluxo de turista ou o índice de setor, caso não produzam os resultados esperados.
preço da atividade ao qual o segmento pertence no
SCR foi a opção que melhor retratou a realidade. O gráfico 2 demonstra que o setor de turismo
Isto porque foi considerado que só haverá incre- continua sua trajetória ascendente, iniciada no
mento na atividade de alimentação (parte turística) ano de 2008, apresentando taxas de crescimento
se ocorrer aumento no fluxo de turistas, ao mesmo superiores às apresentadas pela economia per-
tempo em que seu preço não tenha diferença em nambucana. No ano de 2008, mesmo com a crise

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lariados e por conta própria, para


o ano de 2005. O procedimento
metodológico foi o mesmo utiliza-
do para encontrar o VAB, a parte
turística no VAB total da economia
de Pernambuco.

Por atividade os maiores segmen-


tos empregadores são: o comércio
(margem de comércio de bens), os
serviços de alimentação e o trans-
porte rodoviário, onde podemos
destacar neste último a categoria
de conta própria onde se enqua-
Gráfico 2 dram os taxistas.
Evolução do VAB do Turismo e da Economia de Pernambuco – 2005-2011
Fonte: Elaboração própria. Com os procedimentos semelhan-
(1) Dados preliminares.
tes aos outros resultados, o mer-
cado de trabalho do setor turístico
internacional, o setor apresentou taxa acima da também foi evoluído até 2009. Para
economia estadual. a evolução por segmento foi necessário o agrupa-
mento de algumas atividades, tendo como fontes
Vale ressaltar que os números apresentados para de informação a PNAD e a RAIS.
os anos de 2010 e 2011 são preliminares, tanto em
relação ao PIB divulgado pela Agência CONDEPE/ A participação do pessoal ocupado no turismo
FIDEM quanto aos dados apurados pelo estudo no do mercado de trabalho total de Pernambuco,
CST-PE, devendo ser confirmados por pesquisas apresentou em 2005 o percentual era de 3,9%,
definitivas. chegando a 4,2% (o maior ano) em 2007 e voltando
a 4,0% do mercado de trabalho pernambucano em
Na Tabela 2 (Emprego nos Setores de Atividade 2009 (Gráfico 1).
do Turismo) apresentamos o número de pessoal
ocupado por atividade turística e por categoria de Por segmento os maiores empregadores são: aloja-
emprego (assalariados, empregados, trabalhadores mento e alimentação, o comércio e os transportes,
por conta própria e sem remuneração). Utilizando destacando o primeiro que é tipicamente turístico.
essas informações foi possível evoluir os dados
encontrados pela CST de Pernambuco de 2005 até Existem várias outras informações e detalhamento
o ano de 2009. Salienta-se que o trabalho apresenta metodológico no trabalho, todavia ressalta-se que
o mesmo período final encontrado no SCR até o a maioria dos objetivos foi alcançada, mesmo com
momento da execução do estudo. a carência de informações oficiais detalhadas para
o segmento de turismo. Confirmou-se que, quanto
A Tabela 2 mostra que o setor é responsável por maior o detalhamento dos dados, mais difícil é
aproximadamente 154 mil postos de trabalho, onde encontrar fontes de informação. Por outro lado,
grande parte está concentrada na categoria assa- devido à comparabilidade com o SCR foi neces-

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Tabela 2
Pessoal Ocupado (PO) por categoria, segundo as atividades turísticas em Pernambuco – 2005
Atividades turísticas PO Total Assalariados Empregadores Conta própria Não remunerado
Alojamento 16.238 15.842 99 234 63
Hotéis e outros serviços de alojamento 14.952 14.952 0 0 0
Serviços de residência secundária por
1.286 891 99 234 63
conta própria ou gratuita
Serviços de Alimentação 40.338 18.450 1.984 14.513 5.392
Transporte de Passageiros 42.145 17.872 2.514 18.829 175
Serviços de transporte ferroviário 447 447 0 0 0
Serviços de transporte rodoviário 34.618 15.482 818 18.143 175
Serviços de transporte aquaviário 31 8 0 23 0
Serviços de transporte aéreo 2.514 0 0 0 0
Serviços de Apoio 241 0 0 0 0
Agências de Viagens, operadores e guias
4.293 1.934 1.696 663 0
turísticos
Aluguel de Veículos 164 113 13 30 8
Serviços Culturais, de Recreação e Lazer 7.507 4.351 287 2.695 174
Margem de comércio de bens 45.007 22.664 2.991 16.775 2.578
Outros serviços 2.177 2.015 36 113 12
Total 153.575 81.307 7.923 53.188 8.401
Fonte: Elaboração própria.

sária a utilização de procedimentos específicos, trabalho no âmbito regional e sua utilização para
para garantir o alcance desse pressuposto, como próximos estudos, mesmo com alguns resultados
também o compatibilidade, visto que grande parte ainda bastante provisórios, sobretudo os relacio-
das informações advém desse Sistema, sobretudo nados ao peso da parte turística na oferta total da
da TRU/PE. Por fim, destaca-se o pioneirismo do economia pernambucana.

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Continua...

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Conclusão.

Fonte: Conta Satélite do Turismo – CST/PE .

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Anexos
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Estimativas indiretas ração entre populações recenseadas em diferen-


tes períodos podem significar um complemento
da migração para importante para as avaliações dos deslocamentos
populacionais. A partir de tais informações, é pos-
o estado de São sível calcular indiretamente os saldos migratórios

Paulo com base para Estados, regiões ou municípios, indicando a


participação do componente migratório no cresci-
em informações do mento da população.

registro civil Neste estudo, apresenta-se a metodologia de cálcu-


lo das estimativas indiretas dos saldos migratórios a
partir das informações do Registro Civil do Estado
Sonia Perillo1 de São Paulo, tomando-se como base os dados do
Valmir Aranha2 Sistema de Estatísticas Vitais (SEV), da Fundação
Seade, e dos Censos Demográficos realizados
pelo IBGE. Realiza-se, também, uma síntese dos
Introdução principais resultados da aplicação deste método,
considerando como unidades de análise o Estado
de São Paulo e seu recorte regional em capital, Re-
A inexistência de um sistema de registro contínuo gião Metropolitana de São Paulo (RMSP) e interior3.
dos deslocamentos espaciais da população coloca
o Censo Demográfico como a principal fonte de
observação do fenômeno migratório no Brasil. O Estimativas da migração a
Censo, além de investigar diretamente o local de partir das Estatísticas Vitais
nascimento e de residência anterior, indaga sobre
várias características dos migrantes – idade, sexo,
Diversas metodologias permitem mensurar indire-
escolaridade, ocupação entre outros – e possibilita,
tamente a migração em determinada área. No caso
ainda, a aplicação de diversos métodos de avalia-
do conjunto do Estado de São Paulo e suas regi-
ção indireta de intensidade e padrão por idade e
ões, onde as estatísticas de nascimentos e óbitos
sexo do fenômeno migratório (FERREIRA, 1981).
apresentam grau de cobertura bastante elevado
Em que pesem os avanços nos quesitos migratórios
(WALDVOGEL & FERREIRA, 2003), a Fundação
ao longo dos últimos levantamentos censitários (RI-
Seade estima e divulga, a cada novo levantamento
GOTTI, 2008), bem como a captação do fenômeno
censitário, os saldos migratórios para o total do
para as Unidades da Federação por meio da Pes-
Estado de São Paulo, suas regiões e municípios.
quisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD),
Tais estimativas são também consideradas na ela-
ainda existem lacunas para avaliação da migração
boração das hipóteses de comportamento futuro
para áreas menores e períodos intercensitários.
do componente migratório, para a elaboração de
projeções populacionais realizadas pela Fundação
A disponibilidade de estatísticas de nascimentos e
Seade (WALDVOGEL et al., 2003; TORRES & WALD-
óbitos com elevado grau de cobertura e a compa-
VOGEL, 2013).

1 Demógrafa, Analista de Projetos da Fundação Seade.


3 Interior aqui definido como o conjunto de todas as regiões paulistas,
2 Sociólogo, Analista de Projetos da Fundação Seade. excluindo-se a Região Metropolitana de São Paulo.

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Trata-se de um método bastante simples, que toma I = número total dos imigrantes recebidos por de-
como base as informações de nascimentos e óbitos terminada área nesses n anos;
para calcular o saldo vegetativo em determinado
período, que, ao ser subtraído do crescimento to- E = número total dos emigrantes que deixaram
tal da população neste mesmo período, gera por determinada área nesses n anos;
diferença o volume do saldo migratório.
(N-O) = saldo vegetativo, que é a diferença entre
Quando negativo, esse saldo indica maior parcela os nascimentos e óbitos ocorridos em determinada
de migrantes saindo do que entrando naquela área, em determinado período;
área e, quando positivo, significa que a entrada
(I-E) = saldo migratório, que é a diferença entre o
de migrantes superou a saída. A soma dos saldos
volume de pessoas que entram e saem de determi-
migratórios de todos os municípios de um Estado,
nada área em determinado período.
por exemplo, corresponde ao saldo migratório
estadual, observando-se que, nessa operação, os Definindo-se SMt+n = (I-E) como o saldo migratório
movimentos migratórios intraestaduais se com- do período considerado, tem-se a equação:
pensam, de modo que seu resultado contabiliza
apenas os movimentos migratórios interestaduais SMt+n = (Pt+n - Pt) - (N-O), ou seja, a partir da diferença
e internacionais, isto é, cuja origem ou destino es- entre o crescimento total da população e o saldo
tiveram fora do território selecionado para o cálculo vegetativo é possível estimar indiretamente o saldo
das estimativas. migratório de determinada localidade, nesses n
anos, objeto deste estudo.
No caso das estimativas para determinada região,
aplica-se a mesma lógica de compensação interna, É necessário também ajustar a série de dados sobre
ou seja, o saldo regional reflete o movimento mi- nascimentos e óbitos, tornando sua periodicidade
gratório externo a essa região (outras localidades compatível com a data de referência do período
interestaduais, outros Estados brasileiros ou outros censitário. No caso dos Censos 2000 e 2010, como
países). a data de referência do levantamento é o último dia
de junho, devem-se considerar os nascimentos e
A estimativa dos saldos migratórios resultante dessa óbitos exclusivos deste período4.
metodologia é representada pela seguinte equação:
Do ponto de vista da consistência teórica, este
método proporciona avaliação correta do saldo
Pt+n = Pt + (N-O) + (I-E) migratório, pois engloba inclusive os migrantes que
morreram durante o período considerado para a
onde: estimativa, recurso que o método direto utilizando
dados censitários, ao entrevistar os residentes de
Pt = população censitária no início do período (t);
determinada região, não capta (FERREIRA, 1981;
Pt+n = população censitária no final do período (t+n); CAMARGO, 1981, 1985). Conforme mencionado, os
resultados deste método dependem da qualidade
N = número total de nascimentos ocorridos nesses
n anos;
4 Outra possibilidade de ajuste é considerar apenas 50% dos eventos
para 2000 e 50% para 2010 da série de nascimentos e óbitos do perío-
O = número total de óbitos ocorridos nesses n anos; do, já que o período de referência censitária localiza-se exatamente na
metade do ano.

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das informações de nascimentos e óbitos, pois gração no Estado de São Paulo, entre 2000 e 2010,
os sub-registros referentes a essas informações quando o saldo migratório anual correspondeu a
acarretam indiretamente uma superestimação dos 47.265 pessoas e foi responsável por 11,1% do cres-
saldos migratórios. cimento absoluto da população5. Essa proporção
equivale apenas à quarta parte do que a migração
Outro indicador que pode ser calculado é a taxa de já representou para o crescimento populacional
migração, que corresponde à razão entre o saldo paulista no período de maior expansão migratória,
migratório e a população média. Este indicador entre 1970 e 1980, quando alcançou 42,3%.
permite dimensionar o impacto da migração na
população de determinada localidade, além de per- Tal redução não é propriamente uma novidade, pois
mitir comparações entre localidades com volumes a reversão da tendência migratória em São Paulo se
populacionais distintos. deu nos anos 1980, quando a participação desse
componente no crescimento populacional diminuiu
Apresenta-se, a seguir, rápida exploração dos para 9,1%, numa brusca mudança em relação à
resultados das estimativas indiretas de migração, década anterior. Apesar de essa participação ter
combinando tais informações com as taxas de aumentado para 24,0%, entre 1991 e 2000, as infor-
crescimento da população, o que fornece uma boa mações do período 2000-2010 mostram a retomada
noção de seu alcance analítico. da trajetória decrescente da migração para o Estado
de São Paulo.
Tendências da migração no Es-
tado de São Paulo: síntese dos O saldo migratório anual do período analisado
(47.265 pessoas) foi o menor registrado na história
resultados
recente do Estado, sendo que apenas nos anos
Os dados da Tabela 1, calculados a partir das infor- 1980 atingiu patamar semelhante (53 mil pessoas).
mações do Registro Civil, apontam redução da mi- Este saldo anual corresponde a praticamente um

Tabela 1
População e crescimento anual, por componentes – Estado de São Paulo – 1970-2010
Componentes do crescimento
Taxa de
Crescimento Saldo Saldo Participação no
Anos População crescimento
médio anual vegetativo migratório crescimento (%)
anual (%)
anual anual
Vegetativo Migratório

1970 17.670.013
3,51 728.323 420.006 308.317 57,67 42,33
1980 24.953.238
2,12 589.367 536.034 53.333 90,95 9,05
1991 31.436.273
1,82 615.345 467.902 147.443 76,04 23,96
2000 36.974.378
1,10 427.778 379.832 47.946 88,79 11,21
2010 41.252.160
Fonte: Fundação Seade – IBGE.
5 Para uma análise mais detalhada das tendências dos saldos migra-
tórios indiretos calculados a partir do movimento do Registro Civil do
Estado de São Paulo, ver Perillo e outros (2011a, 2011b) e Waldvogel e
outros (2012).

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terço do verificado na década de (Em %)

1990 (147 mil pessoas) e a 17,3% do 3,5


observado nos anos 1970 (308 mil
3,0
pessoas). O impacto nas taxas de
migração foi bastante pronunciado: 2,5
a taxa anual do Estado reduziu-se
2,0
de 4,3 migrantes ao ano por mil
habitantes, entre 1991 e 2000, para 1,5
1,2 por mil, entre 2000 e 2010.
1,0

Entretanto, isso não significa, ne- 0,5


cessariamente, inércia migratória
na dinâmica populacional paulista, 0
1980/91 1991/00 2000/10
uma vez que reflete o resultado
Estado de São Paulo RMSP
líquido de entrada e saída de mi-
Município de São Paulo Demais município da RMSP, exceto São Paulo
grantes, cujos fluxos migratórios
ainda são expressivos, apesar de Gráfico 1
praticamente se compensarem, Taxas anuais de crescimento populacional Estado de São Paulo – RMSP
como revelou os resultados do Município de São Paulo e demais municípios da RMSP – 1980-2010
Censo Demográfico de 2010. Fonte: Fundação Seade – IBGE.

A despeito das grandes trans- ao ano, equivalente à perda populacional de 300


formações econômico-sociais, o Estado de São mil pessoas, na última década. Essa perda é ainda
Paulo continuou protagonizando o processo de superior à registrada nos anos 1980, quando a
redistribuição da população no território brasileiro, RMSP registrou saldo migratório negativo de 275
mil pessoas em 11 anos.
destacando-se como a principal área de concentra-
ção populacional do país. Em 2010, sua população O Município de São Paulo manteve tendência de
somava 41,3 milhões de habitantes, representando desaceleração no ritmo de crescimento já eviden-
21,6% do total do Brasil e 51,3% da Região Sudeste. ciada desde a década de 1980, com taxa de 0,8%
ao ano, entre 2000 e 2010. Nessa área, observa-se
A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) cons-
pequena recuperação das perdas populacionais
titui a principal área de concentração populacional e em comparação às registradas entre 1991 e 2000.
das atividades econômicas do Estado. Seguindo a O MSP, que perdia em torno de 50 mil pessoas ao
tendência estadual, essa região manteve a tendên- ano neste último período, diminui tal perda para 33
cia de desaceleração do ritmo de crescimento de mil pessoas ao ano, entre 2000 e 2010. A taxa de
sua população, exibindo taxa de 0,97% ao ano, entre migração mostra redução da evasão no MSP: de
2000 e 2010, a menor de sua história recente. Entre -5,1 migrantes ao ano por mil habitantes para -3,0
1980 e 1991, crescia a uma taxa de 1,86% ao ano. migrantes, entre esses dois períodos.

Essa área não só acompanhou a tendência estadual Entretanto, como outros estudos já indicaram,
de redução da migração, como também apresen- isso também não significa inércia migratória no
tou saldo migratório negativo de 30 mil pessoas Município de São Paulo. As entrada e as saídas de

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migrantes nesta cidade ainda são intensas, porém 2,5 mil pessoas ao ano, e a taxa de migração foi
elas agora se compensam. praticamente nula, de 0,3 migrante ao ano por mil
habitantes nesse período.

(por mil hab.) Nos anos 1990, essa área caracte-


rizava-se como a de maior cresci-
15,00
mento migratório do Estado, com
volume anual de 75 mil migrantes
10,00 e taxa de 11,5 migrantes ao ano
por mil habitantes. Nesta década,
o crescimento populacional e mi-
5,00 gratório da região foi tão intenso,
que superou aquele verificado em
regiões do Estado como a Região
0,00
Administrativa de Campinas e a
Região Metropolitana da Baixada
Santista.
-5,00

As tendências migratórias ob-


servadas no interior paulista não
-10,00
Estado de São Paulo RM de São Paulo
Município Outros municípios diferem, fundamentalmente, das
de São Paulo da RMSP
apresentadas para o conjunto do
1980-1991 1991-2000 2000-2010
Estado de São Paulo. Entre 2000 e
2010, o saldo migratório dessa área
Gráfico 2 também diminuiu: passou de 123
Taxas anuais de migração Estado de São Paulo – RMSP e Interior – 1980-2010 mil pessoas ao ano, entre 1991 e
Fonte: Fundação Seade – IBGE. 2000, para 78 mil entre 2000 e 2010.

Apesar das características marcantes do Município A intensidade dos movimentos migratórios no


de São Paulo, a novidade no fenômeno migratório interior pode ser dimensionada pelo volume de
na última década encontra-se nos outros municípios migração (saldo migratório). Entre 2000 e 2010,
metropolitanos. Grande parte dos municípios do en- essa área registrou saldo migratório de 78 mil pes-
torno metropolitano diminuiu o ritmo de crescimento soas ao ano, o equivalente à redução anual de 40
populacional, passando a registrar taxa anual de mil pessoas, em relação ao período 1991-2000. A
1,3%, entre 2000 e 2010, contra 2,9%, entre 1991 e migração voltou a alcançar patamar muito próximo
2000, e 3,2% entre 1980 e 1991. do observado nas décadas de 1970 e 1980, quando
os volumes de migração oscilavam em torno de 78
As alterações nas tendências migratórias desse mil pessoas ao ano. A taxa do interior, que era de
conjunto de municípios foram surpreendentes, praticamente 7 migrantes ao ano por mil habitantes,
caracterizando essa área como a de maior desa- diminuiu para 3,9 por mil (Tabela 2).
celeração da migração do Estado de São Paulo,
entre 2000 e 2010. O volume de migrantes dos ou- Além do componente migratório, a queda da fe-
tros municípios da RMSP passou a ser de apenas cundidade também tem contribuído para o menor

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crescimento demográfico da população paulista. A avaliação das taxas de migração segundo os


Em especial no interior do Estado, simultaneamente municípios do Estado de São Paulo mostra grandes
à redução do componente migratório, o saldo vege- heterogeneidades migratórias nas diversas regiões
tativo anual do interior também diminuiu de forma e municípios, no período entre 2000 e 2010 (Mapa
sistemática: era de 255 mil pessoas, entre 1980 e 1). Dos 645 municípios que compõem o Estado de
1991, e chegou a 167 mil na última década. O de- São Paulo, 370 apresentaram taxas de migração
créscimo conjunto dos componentes responsáveis positivas e 275 taxas negativas nesse período.
pelo crescimento demográfico nas últimas décadas Observa-se uma concentração de municípios
resultou no menor crescimento populacional regis- com taxas de migração negativas elevadas na
trado pelo interior nos últimos 30 anos, atingindo porção sul do Estado, enquanto as taxas positivas
1,2% ao ano, entre 2000 e 2010. encontram-se espalhadas no sentido norte e noro-
este do interior do Estado. Outra informação que
Um aspecto importante a se destacar é que, apesar vale destacar é que mais de 75% dos municípios
do menor crescimento, o conjunto dos municípios paulistas apresentam taxas de migração entre -10
localizados no interior do Estado de São Paulo e 10 migrantes ao ano por mil habitantes, entre
continua mantendo papel importante nos cenários 2000-20106.
estadual e nacional, caracterizando-se como a
segunda concentração industrial do país, só per-
dendo para a Região Metropolitana de São Paulo. Considerações finais
A importância do papel do interior fica ainda mais
evidente quando se observa que, em 2010, essa As estimativas de migração constituem importante
área concentrava 52,3% da população paulista e instrumento para o acompanhamento da evolução
11,3% da nacional. Do ponto de vista econômico, da população de determinada região, tornando-se,
o PIB do conjunto dos municípios que integram o desse modo, indispensáveis para implementação,
interior representava, em 2011, 43,68% do total do monitoramento e avaliação de várias políticas
Estado e 14,22% do total do país. públicas, especialmente aquelas relacionadas às

Tabela 2
Saldos migratórios e taxas anuais de migração Estado de São Paulo, Região Metropolitana de São Paulo e Interior
1980-2010
Taxas anuais de migração
Saldos migratórios anuais (por mil hab.)
Estado de São Paulo, RMSP
e Interior
1980-1991 1991-2000 2000-2010 1980-1991 1991-2000 2000-2010
Estado de São Paulo 53.333 147.443 47.946 1,89 4,31 1,23
RMSP - 24.972 - 24.399 - 30.362 - 1,79 - 1,47 - 1,62
Município de São Paulo - 68.724 - 50.824 - 32.814 - 7,60 - 5,07 - 3,03
Outros municípios da RMSP 43.752 75.223 2.452 8,90 11,41 0,31
Interior 78.305 123.044 78.308 5,50 6,99 3,85
Fonte: Fundação Seade – IBGE.

6 As estimativas dos saldos migratórios e das taxas de migração. para to-


dos os municípios e regiões do Estado de São Paulo, podem ser aces-
sadas em http://produtos.seade.gov.br/produtos/imp/.

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Taxas de migração
2000/2010
< - 10
-10 a 0
0 a 10
10 a 30
> 30

Mapa 1
Taxas Anuais de Migração
Municípios do Estado de São Paulo – 2000/2010
Fonte: Fundação Seade – IBGE.

demandas sociais, como por exemplo nas áreas mesmo tempo, aumento no número de registros de
de saúde, educação, habitação e segurança. Em nascimentos em todas as Unidades da Federação
que pese a boa disponibilidade de informação e diminuição no número de registros atrasados ao
migratória a partir do levantamento censitário, as longo da década, o que conjuntamente indicam
estimativas indiretas dos saldos migratórios são melhoria na cobertura dos registros vitais. Por
recursos que podem ser facilmente aplicados para
outro lado, houve uma sensível redução no sub-
várias realidades estaduais e municipais, amplian-
-registro dos óbitos em todo o país (INSTITUTO
do o conhecimento sobre a dinâmica demográfica
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA,
dessas áreas por meio de informações confiáveis,
atualizadas e detalhadas. 2012). Observa-se, como resultado, que os Estados
do Sudeste e do Sul apresentam boas estatísticas,
Em 2012, o IBGE divulgou as informações das es- o que os qualificaria para utilizar tal procedimento
tatísticas do Registro Civil de 2011 e apontou, ao metodológico.

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das Estatísticas Vitais: uma aplicação para o Estado RIGOTTI, J. I. R. Os dados censitários brasileiros
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16, p. 187-225, 1985. análise. In: SEMINARIO-TALLER LOS CENSOS DE
2010 Y LA MIGRACIÓN INTERNA, INTERNACIONAL
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2008, Santiago de Chile. [Anais...] Santiago de Chi-
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da vida. SP em Perspectiva, São Paulo, v. 17, n. 3-4,
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jul./dez. 2003.
PERILLO, S. R.; PERDIGÃO, M. O Estado de São
WALDVOGEL, B. C et al. Projeção da população
Paulo continua sendo o principal pólo de migrantes
paulista como instrumento de planejamento. SP em
do país. SP Demográfico, São Paulo, v. 4, n. 5, set.
Perspectiva, São Paulo, v. 17, n. 3-4, jul./dez. 2003.
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WALDVOGEL, B. C. et al. Mudanças nos componen-
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ESTUDOS POPULACIONAIS, 13., 2002, Ouro Preto,
MG. Anais... Ouro Preto, MG: ABEP, nov. 2002.

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Memória
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SAGI: Dez anos Essa ampliação do escopo e da escala das políti-


cas sociais vem tornando a gestão de programas
de informação e e serviços públicos no país mais complexa e mais
profissionalizada, requerendo, em especial, a incor-
conhecimento para poração de mais informação e conhecimento nos

aprimoramento processos decisórios e operacionais. Dimensionar


públicos-alvo, conhecer suas características, de-
das Políticas de senhar programas e serviços para mitigar ou equa-
cionar problemas sociais específicos, monitorar a
Desenvolvimento implementação e avaliar os resultados são algu-

Social e Combate à mas das atividades típicas do ciclo de gestão das


políticas que requerem estatísticas abrangentes,
Fome registros administrativos detalhados e confiáveis,
e estudos técnicos mais especializados.

Por meio de departamentos de estatísticas, de


Paulo de Martino Jannuzzi1
Paula Montagner2 núcleos de informação estratégica, de observa-
tórios, de institutos de pesquisa e de unidades
de monitoramento e avaliação de programas, o
setor público brasileiro vem se estruturando para
A Missão Institucional responder a essas demandas de mais informação
e de conhecimento crescentemente complexo
para aperfeiçoar de forma consistente a gestão de
A estruturação do Sistema de Proteção Social bra-
políticas e programas sociais. No Ministério do
sileiro nesses 25 anos, pós-Constituição de 1988,
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS),
e mais intensamente nos últimos dez anos, tem
o arranjo institucional escolhido foi o de uma secre-
sido marcada por uma combinação virtuosa de
taria nacional - a Secretaria de Avaliação e Gestão
fortalecimento de políticas sociais de natureza uni-
da Informação (SAGI) – instituída desde a criação do
versal – garantindo direitos nas áreas de educação,
Ministério em 2004, pela Medida Provisória n. 163
saúde, trabalho e assistência social – e da criação e
de 23 de janeiro de 2004 - convertida no Decreto
rápida expansão das políticas de desenvolvimento
nº5.074, de 11 de maio de 2004.
social e outras inovações programáticas de cunho
redistributivo, voltadas a segmentos historicamente
Nestes dez anos, a SAGI tem procurado acompa-
vulneráveis pela precariedade da inserção ocupa-
nhar a ampliação da agenda de atuação do MDS,
cional, pela fome, pela violência, pelo abandono
produzindo e sistematizando informações e análises
familiar, pelo isolamento territorial, pela falta de
que apoiaram o aprimoramento do desenho e da
meios ou apoio e recursos à produção.
gestão de políticas e programas voltados à popula-
ção de menor renda, tornando visível desafios antes
desconhecidos. Temos buscado compartilhar esses
insumos com a população, a academia e os técni-
1 Secretário de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério do De-
senvolvimento Social e Combate à Fome.
cos e gestores dos três níveis de governo, envolvi-
dos na operação do Programa Bolsa Família, nos
2 Secretária Adjunta de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. serviços do Sistema Único da Assistência Social,

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na implementação das ações do Sistema Nacional estudos técnicos acerca de aspectos específicos
de Segurança Alimentar e nas iniciativas do Plano da operação e resultados das ações do Ministério,
Brasil Sem Miséria, para que seja possível a todos como ilustrado no Diagrama 1.
colaborar para a construção de uma sociedade mais
igualitária e participativa. Reconhecendo que boa parte do sucesso na im-
plementação de um programa decorre do nível de
Este esforço permite que a SAGI ofereça um conjun- engajamento e compreensão dos agentes operado-
to diversificado de 25 produtos, ajustados ao está- res acerca dos objetivos, público-alvo e processos
gio de maturidade dos programas e à complexidade de trabalho envolvidos na produção dos serviços
operacional, como as ferramentas informacionais e ações, a SAGI também vem ampliando sua atua-
voltadas para a organização e a disponibilização ção na organização de cursos de capacitação e de
de dados na internet, os aplicativos para consulta formação, de curta e média duração, presenciais
e entrada de dados de atendimentos nos equi- e a distância, assim como no desenvolvimento de
pamentos sociais nos municípios, os painéis de produtos informacionais que comtemplam as várias
indicadores de monitoramento de programas e de temáticas do Ministério, distribuídos como publica-
conjuntura social, as pesquisas de avaliação e os ções impressas e em formato digital.

Diagrama 1
Diversidade de produtos, serviços e entregas da SAGI para atender às demandas crescentes da agenda de políticas e
programas do MDS
Fonte: Elaboração própria.

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Memória
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Processos de trabalho, As pesquisas de avaliação e estudos avaliativos


produtos e a equipe técnica para aprimoramento dos programas e ações do
Ministério são desenvolvidas pelo DA. Já o DFD
planeja e desenvolve, em parceria com as demais
Em função da natureza especializada das atividades secretarias, projetos e programas de capacitação e
desenvolvidas na Secretaria, ela está estruturada, formação nas modalidades presencial e a distância,
desde 2010, em quatro departamentos – Gestão da para diferentes públicos do Ministério, além de ser
Informação (DGI), Avaliação (DA), Monitoramento responsável pelas publicações impressas e eletrôni-
(DM) e Formação e Disseminação (DFD), além do cas e outras ações de disseminação da Secretaria.
Gabinete. O DGI organiza e administra as bases
de dados dos programas e das ações do MDS e A especialização técnica dos projetos e atividades
elabora ferramentas informacionais para apoiar desenvolvidos na SAGI faz com que os produtos
as atividades de monitoramento e avaliação das sejam desenvolvidos em cada equipe, mas com
secretarias finalísticas. O DM realiza o desenho do importantes interações e colaborações interde-
modelo lógico de programas e o mapeamento de partamentais. Nos últimos anos, foram mapeados
processos e fluxos, , organiza painéis de monitora- 22 macroprocessos de trabalho na Secretaria, nu-
mento de programas e elabora análises sobre estes. cleados em seis grandes eixos estruturadores dos

Diagrama 2
Funcionograma com eixos estruturantes e macroprocessos de trabalho da SAGI – 2014
Fonte: Elaboração própria.

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projetos e atividades. Eles são apresentados no conhecimentos projetos inéditos, mas transmitiram
Funcionograma (Diagrama 2), tais como Desenvol- seus conhecimentos às nossas equipes.
vimento de Sistemas Especialistas, Integração de
Base de Dados, Gestão de Pesquisas de Avaliação, Como revela a Linha do Tempo de Produtos e
Planejamento de Programas de Formação, Produ- Atividades, disponível no Portal “Conheça mais a
ção Editorial e Cooperação Multilateral. Cada de- SAGI” - http://aplicacoes.mds.gov.br/sagi/portal/gru-
partamento tem os seus instrumentos de gestão de po.php?g=76 - entre os maiores desafios nesses dez
projetos e atividades, com detalhamento de equipes anos podemos citar a Pesquisa Nacional de Popu-
técnicas, produtos e prazos. Desses instrumentos lação em Situação de Rua, a Avaliação de Impacto
departamentais são extraídas informações para o do Bolsa Família, o Registro Individualizado de
SIGE, Sistema de Gestão Estratégica da SAGI, que Atendimentos da Assistência Social, o Censo SUAS,
permite ao Gabinete o acompanhamento técnico e o Estudo Avaliativo de Nutrição Infantil de Crianças
gerencial dos projetos e atividades em desenvolvi- do Cadastro Único e registro do Sistema Nacional
mento na Secretaria. de Vigilância Alimentar e Nutricional, o Painel de
Indicadores de Monitoramento do Plano Brasil Sem
Esses macroprocessos têm produzido diferentes Miséria, o arranjo operacional do CapacitaSuas e
tipos de “pacotes” customizados de Informação a escolha pela disponibilização das publicações
e Conhecimento – ferramentas, base de dados, impressas e eletrônicas.
indicadores, pesquisas, cursos e publicações. Ao
longo desses dez anos, foram produzidas pesqui-
sas com repercussão na comunidade acadêmica,
Avaliação do alcance, uso e
que utilizam técnicas inovadoras e incluem aportes
efetividade da Secretaria: um
inéditos dos gestores do MDS; ferramentas infor-
grande desafio
macionais com ampla aceitação de usuários; indi-
cadores com instrumentalidade para as políticas; O marco de dez anos enseja uma boa motivação
publicações que buscam atingir a linguagem dos e oportunidade para mais uma etapa de avaliação
diferentes públicos, seguindo a linha editorial em da SAGI. Certamente que se espera identifi car
construção; programas de formação que levaram os avanços e registrar as lições aprendidas; mas,
conteúdos fundamentais para ponta, para gestores para garantir que a trajetória do passado se trans-
municipais em todo o país. forme em um presente e futuro exitosos, é preciso
investigar com mais profundidade as lacunas de
Essa oferta crescente de produtos, pesquisas informação, os problemas e deficiências técnicas
e serviços da Secretaria só foi possível com os a sanar, os desafios que a agenda das políticas
concursos que aumentaram as equipes dando- sociais e Cenários do Desenvolvimento do Brasil
-lhes maior perspectiva, ampliando seu interesse nos impõem nos próximos dez anos.
por qualificação e por novos desafios. Desde sua
criação, o corpo de funcionários da Secretaria tem Temos de avançar para além da usual métrica das
sido marcadamente multidisciplinar, contando com sugestões e recomendações implementadas nos
técnicos que realizam cursos de especialização, programas. Isto é fundamental, porque a métrica
mestrado ou doutorado, em geral associados às usual não reflete a diversidade de “entregas” que
suas experiências concretas na gestão de pro- tem legitimado a SAGI junto ao corpo diretivo do
gramas. Temos contado ainda com consultores MDS e suas secretarias, como parceiro para o
especializados que não apenas apoiaram com seus aperfeiçoamento das ações, programas e políticas.

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Pela posição funcional que a Secretaria se encontra da cobertura, pelo contexto federativo de gestão e
no organograma do Ministério –em linha com as operação das políticas e programas sociais, a intro-
demais secretarias nacionais – seu papel, legi- dução de inovações e o redesenho de processos
mitidade e relevância junto aos parceiros do MDS não podem envolver descontinuidades junto à po-
dependem da busca permanente de trabalho téc- pulação, devendo se adequar a um calendário que
nico colaborativo que permita identificar avanços, compatibiliza agenda de prioridades de correção de
apontar problemas e, sempre que possível, sugerir problemas com as janelas de oportunidades para
encaminhamentos factíveis e circunstanciados para a implementação de mudanças.
os desafios encontrados.
Tal como programas e serviços complexos, essa
A métrica “recomendações e sugestões adotadas avaliação requer uma abordagem multimétodos,
nos programas” encontra-se baseada em pressu- com metodologias quantitativas, entrevistas envol-
postos de linearidade positivista e de ingenuidade vendo múltiplos sujeitos e usuários, levantamentos
tecnocrática, que não cabem na realidade con- de satisfação pela web, análises institucionais com-
creta de produção de políticas públicas de amplo paradas com unidades congêneres e integrando, in-
espectro como ocorre no Brasil. Pela amplitude clusive, técnicas mais recentemente desenvolvidas

Figura 1
O novo portal SAGI, com mais funcionalidades e produtos á disposição
Fonte: Elaboração própria.

91
Memória
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

e aplicadas em situações correlatas, como a difusão SAGI passou de cerca de 10 mil/mês em outubro
de inovações tecnológicas, impacto de produção de 2011 (quando se iniciou esse acompanhamento)
técnico-científica, acesso a portais e ferramentas para cerca de 55 mil/mês em abril de 2014. Com
na Internet e repercussões de mídias sociais. De relação às citações às pesquisas, publicações e
maneira preliminar empregou-se duas dessas es- base de dados da SAGI referenciadas na bibliogra-
tratégias “mais modernas” – não necessariamente fia acadêmica, a tendência de aumento é também
expressiva, tendo alcançado 284 menções em
melhores ou mais abrangentes – adotadas para
material publicado em 2013 (com 944 citações acu-
monitorar e avaliar parcela do alcance dos produtos
muladas até 29/05/2014), com indicador de impacto
e atividades da Secretaria: a contagem de acessos
H de 14, patamar alcançado por algumas das mais
ao Portal SAGI pelo Google Analytics e Número e prestigiadas revistas de ciências sociais no Brasil.
Perfi l de Citações de pesquisas, estudos e dados
disponibilizados por meio do Google Acadêmico. Tendo comemorado os 10 anos, já iniciamos os
Pelo primeiro instrumento, verifi ca-se que o nú- “10 anos +1”, com novo portal, novos produtos e o
mero de usuários que acessaram as páginas da mesmo comprometimento que nos trouxe até aqui!!

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Relatos de Experiências
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Uso de Palavras chaves: PIndicadores sociais. Georreferen-


ciamento. Sistema de Informação.
indicadores sociais
georreferenciados INTRODUÇÃO

no planejamento e A tendência de valorização do uso dos indica-


gestão municipal dores na tomada de decisões e planejamento
de políticas públicas vem se consolidando no
de São Luís – MA Brasil, até em níveis municipais, como já atestava
Jannuzzi (2005). Em parte, isso reflete mudanças
institucionais da administração pública, como
Laura Regina Carneiro1
a consolidação do planejamento plurianual e o
Eduardo Celestino Cordeiro2
aprimoramento do controle administrativo e social.
Aline Serêjo Rocha3
Reformas gerenciais da gestão pública ocorridas
na década de 1990 tiveram um papel importante
Resumo nesse processo, mas a adoção de novas tecno-
logias mostra-se fundamental na utilização de
O presente artigo visa aduzir acerca da implantação
indicadores como ferramenta de planejamento.
do uso de indicadores sociais georreferenciados no
Dentre essas tecnologias, as de georreferencia-
planejamento e gestão municipal, em São Luís, capi-
tal do Maranhão. Para tanto, tece-se considerações
mento têm se destacado, sendo utilizadas por
acerca dos conceitos de indicadores, indicadores amplo número de governos.
sociais, informação, tecnologia da informação e sis-
tema de informação geográfica. Com isso, a relação Frente a esse contexto, o cerne do presente artigo
entre indicadores sociais e georreferenciamento é é tratar do uso de indicadores sociais georreferen-
destacada, o que permite entender a importância das ciados no planejamento e gestão municipal em São
iniciativas discorridas, nas seções seguintes, sobre Luís, focando no Portal “Mapa Socioeconômico de
o uso dessa ferramenta como instrumento de plane- São Luís”.
jamento e definição das prioridades espaciais, para
fins de intervenções governamentais em São Luís. Nesse intuito, o capítulo 2 trata sobre a definição
e propriedades de indicadores sociais, e como
1 Economista e Administradora, especialista em Engenharia Econômica tal recurso pode ser qualificado através do geo-
e em Gestão Pública. Assessora de Elaboração e Análise de Projetos
da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento – SEPLAN da Pre- processamento e Sistemas de Informações Geo-
feitura de São Luís, onde exerce a função de Coordenadora Geral do
Departamento da Informação e Inteligência Econômica – DIIE. gráficas (SIGs). Já no capítulo 3, são detalhadas
laura.carneiro@uol.com.br
algumas iniciativas de utilização de indicadores
2 Geógrafo, especialista em Gestão Pública Municipal e mestre em De-
senvolvimento Socioespacial e Regional. Técnico de Nível superior – sociais georreferenciados no planejamento e
Geografia da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento – SEPLAN
da Prefeitura de São Luís, onde exerce a função de Coordenador da
gestão municipais realizadas pela Prefeitura
Área de Estudos Econômicos e Sociais do Departamento da Informa- Municipal de São Luís. Com isso, obtêm-se ele-
ção e Inteligência Econômica – DIIE. celestinocordeiro@yahoo.com.br
mentos para discutir, na conclusão, a ligação
3 Administradora. Assistente Administrativo da Secretaria de Planeja-
mento e Desenvolvimento – SEPLAN da Prefeitura de São Luís, onde entre indicadores e geoprocessamento, de forma
exerce a função de Coletora do Departamento da Informação e Inteli-
gência Econômica – DIIE. aline.serejo@hotmail.com teórica e prática.

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Relatos de Experiências
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

REVISÃO DE LITERATURA ponto se chegou, com determinada práticas e/ou


políticas”.
Indicadores sociais
No âmbito das políticas públicas, Jannuzzi (2012,
A discussão sobre indicadores provoca, prioritaria- p. 21) define:
mente, o estabelecimento da relação entre dados
Um indicador social é uma medida
brutos (primários), dados agregados (analisados),
em geral quantitativa dotada de signi-
indicadores e índices. Tal escalonamento é visível ficado social substantivo, usado para
através da Figura 1 e desencadeia na hierarquização substituir, quantificar ou operacio-
dessas informações, tendo os índices como ápice nalizar um conceito social abstrato,
de agregação. de interesse teórico (para pesquisa
acadêmica) ou programático (para
formulação de políticas). É um re-
Quanto menor o nível de
Quanto maior o nível de
curso metodológico, empiricamente
Ap

agregação dos dados,


agregação dos dados, mais
ro

maior a possibilidade de se
são

referido, que informa algo sobre um


fu

sintéticas e direcionadas
nd

realizar cruzamentos e
são as informações,
eci

Índices
am

permitindo a interpretação
aplicar métodos estatístico aspecto da realidade social ou sobre
ed

en

para aprofundar o
e a tomada de decisão
mudanças que estão se processan-
to
ad

conhecimento sobre os
mais rápida.
do
ad

fenômenos estudados.
do na mesma.
co

Indicadores
tom

nh
ec
na

im

[...] o que é importante ressaltar é


ez

en
pid

to

Dados agregados que os indicadores sociais se pres-


Ra

tam a subsidiar as atividades de


Dados brutos planejamento público e formulação
de políticas sociais nas diferentes
Figura 1 esferas de governo, possibilitando
Hierarquia das informações – pirâmide o monitoramento das condições de
Fonte: Serviço Social da Indústria – SESI, 2010. vida e bem-estar da população por
parte do poder público e sociedade
civil permitindo aprofundamento da investi-
Essas duas categorias que estão no topo da pi-
gação acadêmica sobre a mudança social e
râmide são variáveis compostas que apresentam,
sobre os determinantes dos diferentes fenô-
de forma sintética, um “conjunto de aspectos da
menos sociais.
realidade; agrupam, em um único número, vários
indicadores simples, estabelecendo algum tipo de Por fim, cabe esclarecer sobre as propriedades
média entre eles, fundamentais para julgamentos desejáveis dos indicadores. Na medida do possível,
de valor [...]” (SILVA; WIENS; RAULI, 2010, p. 57). devem ser confiáveis, comunicáveis, com periodici-
dade regular, sensíveis e desagregáveis.
Para Bellen (2005, p.42 apud SILVA; WIENS; RAULI,
2010, p. 56), “O objetivo dos indicadores é agregar Informação e tecnologia a serviço
e quantificar informações de modo que sua sig-
nificância fique mais aparente”. E, complementa: A globalização suscita não só o uso exaustivo de
“Se o objetivo é a busca de uma medida para o tecnologias de informação (TI), mas aprofunda a
desenvolvimento sustentável, ele deve ter a função incerteza, em função do imenso volume dados de
de apontar para uma direção, ou mostrar em que inúmeras fontes. Assim, a inovação vem se impon-

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Relatos de Experiências
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

do, através da busca incessante por sistemas de TI, criam-se os sistemas de informação, que são
informação eficazes, atuais, confiáveis, precisos, entendidos como:
completos e funcionais.
conjunto de componentes inter-relacionados
Estudos como o realizado pela Organização para trabalhando juntos para coletar, recuperar,
processar, armazenar e distribuir informação
a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
com a finalidade de facilitar o planejamento, o
(OECD), constatam que mais do que 50% do PIB
controle, a coordenação, a análise e o processo
dos países desenvolvidos são oriundos do conhe- decisório [...]. Esses sistemas transformam a
cimento. Não obstante, o conceito de informação informação com o sentido de facilitar a análise e
proposto por Tarapanoff (2001 apud FERREIRA, visualização de assuntos complexos e a tomada
2006, p. 22) trata a informação “como sendo dados de decisão, e o fazem por meio de um ciclo de
processados destinados, por meio inteligível, a três atividades básicas: entrada, processamento
pessoas que irão utilizá-los”. e saída. (PRADO; KEINERT, 2009, p. 192).

O papel da informação nessa nova sociedade está Assim, mais especificamente, a ferramenta que pos-
bem definido e, portanto, ser parte dessa sociedade sibilita a operacionalização do georreferenciamento
do conhecimento significa reconhecer informação aplicado como instrumento de tomada de decisão
como principal recurso (Figura 2). é um sistema de informação, denominado Sistema
de Informação Geográfica (SIG).
Informação
O SIG permite a associação de diferentes bancos de
Recurso
Estratégico dados georreferenciados em uma base comum, o
que torna uma importante ferramenta para as análi-
Leva à
ses espaciais. Ou seja, sempre que o “ONDE” surge
nos questionamentos, pode-se adotar um SIG.

Inovação Globalização Podemos definir geoprocessamento como


a área do conhecimento que utiliza técnica
matemáticas e computacionais para tratar a
Garante
informação geográfica, e Sistema de Informação
Geográfica como o ambiente computacional
para o geoprocessamento que integra dados
Competitividade cartográficos, cadastrais, de sensores remotos,
redes e modelos numéricos de terreno, com o
objetivo de consultar, recuperar, visualizar, mani-
pular e plotar o conteúdo de um banco de dados
Figura 2
georreferenciados. Sua utilização pode ser tanto
Síntese do novo paradigma organizacional como ferramenta para a produção de mapas
Fonte: SILVA (2013). (geração e visualização de dados espaciais)
quanto como suporte para a análise espacial
Alinhado ao diagnóstico anterior, a ferramenta do de fenômenos (combinação de informações
georreferenciamento está ligada, intrinsecamen- espaciais) e banco de dados geográficos (ar-
te, à utilização de tecnologia da informação (TI), mazenamento e recuperação de informação
dada a natureza de sua coleta e uso. Através da espacial). (PRADO; KEINERT, 2009, p. 194).

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Relatos de Experiências
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Portanto, o SIG não apenas figura como uma fer- Entregue cerca de três meses depois do início
ramenta do georreferenciamento, mas também um do convênio, o sistema elaborado possibilitou a
importante instrumento no processo informacional organização, armazenamento e manipulação de
voltado à tomada de decisões estratégicas. dados socioeconômicos. Com interface simples, o
sistema também foi disponibilizado na internet, por
meio do endereço eletrônico http://198.199.93.24/
UTILIZAÇÃO DE INDICADORES saoluisppa/. Adotou-se, assim, a internet como re-
SOCIAIS GEORREFERENCIADOS curso para facilitar o acesso dos gestores públicos
NO PLANEJAMENTO E GESTÃO municipais aos dados reunidos. Não obstante, o
MUNICIPAIS PELA PREFEITURA sistema também permitiria a seleção, coleta e in-
serção futura de novos dados.
MUNICIPAL DE SÃO LUÍS-MA.
Além da visualização espacial, os dados também
SIG PPA: O Projeto Piloto podiam ser apresentados no formato de tabelas,
gráficos e relatório. Os dados disponíveis no re-
Em 2013, a Prefeitura Municipal de São Luís – PMSL, curso intitulado de Relatório Espacial foram divi-
através da Secretaria Municipal de Planejamento e didos em quatro temas, quais sejam: Domicílios,
Desenvolvimento – SEPLAN, desenvolveu um proje- Moradores, Pessoas; e Responsáveis por Faixa
to piloto intitulado SIG PPA. O nome traz referência Etária. Destes temas, várias outras subdivisões são
ao uso de SIG (Sistema de Informação Geográfica) apresentadas, todas originárias de dados Censo
e a finalidade de subsidiar a elaboração do Plano 2010. Os mesmo temas e subdivisões também fo-
Plurianual – PPA municipal. ram usados nas seções dos relatórios tabulares e
gráficos, mas com a inclusão de dados de censos
Na verdade, a adoção do mesmo buscou responder anteriores, quando disponíveis.
uma necessidade emergencial de disponibilizar,
aos diversos gestores municipais, e em breve pe- Com esses recursos, o sistema ficou disponível,
ríodo de tempo, uma ferramenta para consulta de mas não contou com um monitoramento que indi-
casse seu uso por parte dos gestores municipais,
dados correspondentes à realidade de São Luís, de
seja na elaboração do PPA como também em outras
forma a possibilitar sua tabulação, relatoria e visu-
atividades. No entanto, enquanto projeto piloto, a
alização cartográfica. Tratava-se, portanto, de uma
implementação do sistema possibilitou uma melhor
ferramenta voltada, principalmente, aos gestores
condução do que viria a ser o Mapa Socioeconô-
incumbidos da elaboração do PPA ludovicense,
mico de São Luís, cuja iniciativa se deu no bojo do
de forma a possibilitar a identificação de setores
chamado Programa Bacia do Bacanga.
críticos e definições de indicadores para servir ao
acompanhamento dos resultados das intervenções Portal “Mapa Socioeconômico de São
planejadas. Luís”: Antecedentes e Coordenação
Para tanto, através de um convênio de cooperação
ANTECEDENTES: Programa Bacia do
técnica com a Universidade Federal do Maranhão –
Bacanga e o Plano DEL
UFMA, foi contratado um serviço de modelagem de
banco de dados geográficos para armazenamento a) Programa de Recuperação Ambiental e
de um painel de desempenho de indicadores so- Melhoria da Qualidade de Vida da Bacia do
cioeconômicos. Bacanga – Programa Bacia do Bacanga.

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Relatos de Experiências
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A operacionalização do Programa de Recupe- b) Plano de Desenvolvimento Econômico Local


ração Ambiental e Melhoria da Qualidade de – Plano DEL.
Vida da Bacia do Bacanga, também conhecido
como Programa Bacia do Bacanga, é fruto do Segundo o que consta no próprio Plano DEL, o
acordo de empréstimo entre a Prefeitura Mu- documento “deve ser entendido como uma ferra-
nicipal de São Luís e o Banco Mundial (BIRD), menta capaz de catalisar, por meio de programas
assinado em novembro de 2008, com prazo de específicos, projetos e ações bem definidas, o
encerramento previsto para 2015. potencial de desenvolvimento de São Luís” (SÃO
LUÍS, 2011, p.12). Isso porque, no contexto do
De seu orçamento total de 59,4 milhões de Projeto da Bacia do Bacanga, o plano
dólares, a maior parte do montante dos recur-
sos financeiros do projeto provém da referida [...] é o instrumento no qual são elaboradas,
operação de crédito externo, com garantia da de forma participativa, estratégias de de-
República Federativa do Brasil, no valor de 35,6 senvolvimento econômico, mediante ações
milhões de dólares. Os outros 23,76 milhões de de incremento da produtividade e fortaleci-
dólares correspondem a recursos próprios da mento dos clusters existentes e potenciais,
Prefeitura de São Luís. com o objetivo de incrementar a atividade
econômica e o nível de emprego e renda
Segundo documento divulgado pelo BIRD, o e, assim, permitir a melhoria da qualidade
projeto previa intervir na maior área de captação de vida e o bem-estar da população. (SÃO
bruta de água situada na ilha onde se localiza o LUÍS, 2011, p.12)
município de São Luís, tendo uma extensão de
130 km², ocupada por cerca de 230 mil pessoas Trata-se, portanto, de um plano estratégico
e na qual se concentra a maior proporção da po- voltado à promoção de atividades econômicas
pulação municipal de baixa renda (BIRD, 2007). situadas em São Luís, classificadas segundo
clusters existentes ou em potenciais da econo-
Tendo como objetivo geral “a melhoria da quali- mia local. Sendo assim, o Plano DEL apoia-se
dade de vida da população de São Luís, especial- em uma análise socioeconômica de São Luís,
mente da população de baixa renda que reside além do estudo acerca da competitividade
na Bacia do Bacanga” (SÃO LUÍS, 2006), o Proje- da cidade, para “a definição de uma visão, a
to Bacia do Bacanga foi estruturado segundo três elaboração de estratégias, ações e sistemas
eixos de ação ou componentes: Componente de monitoramento e acompanhamento de re-
1 – Fortalecimento da Gestão Municipal e De- sultados.” (SÃO LUÍS, 2011, p.54, grifo nosso).
senvolvimento Econômico Local; Componente
2 – Melhorias de Saneamento; e Componente Desse modo, a prospecção analítica da econo-
3 – Melhorias Urbanas e Ambientais. mia ludovicense não só representa uma das ba-
ses da construção do Plano DEL, mas também
Através do Componente 1, uma serie de ações é colocada como estratégia necessária para
resultaram na elaboração do Plano de Desen- o correto desenvolvimento do mesmo. Assim,
volvimento Econômico Local, chamado de evidencia-se que não basta medir o andamento
Plano DEL, o qual merece aqui destaque por das ações previstas, é necessário também men-
ter estabelecido como meta a atualização do surar os resultados destas ações no contexto
Mapa Socioeconômico de São Luís e a criação considerado. Com esse objetivo em vista, o
do Departamento da Informação e Inteligência Plano DEL propôs à Prefeitura de São Luís a
Econômica. criação de um departamento de informação e

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inteligência econômica, que seria criado quase estatística e geografia, além de tecnologia da infor-
três anos depois, e o qual teria como ferramenta mação (analista de sistemas, programador, espe-
já disponível o Mapa Socioeconômico de São cialista em banco de dados etc.) e comunicação. O
Luís, atualizado e remodelado. mesmo foi vinculado à Secretaria de Planejamento
e Desenvolvimento da Prefeitura de São Luís, que o
COORDENAÇÃO: Departamento da Informa- formalizou através de portaria administrativa.
ção e Inteligência Econômica – DIIE
Com relação a sua estrutura organizacional, hoje
Proposto em 2011, através do Plano DEL, o DIIE foi o DIIE funciona segundo o seguinte organograma:
idealizado para servir como um dos mecanismos
estratégicos voltados ao aperfeiçoamento do clima Para a operacionalização dessa estrutura, um traba-
de negócios da capital. Não obstante, sua configu- lho prévio de sistematização metodológica de dados
ração também passou a ser pensada para ser útil às e a elaboração de instrumentais para o DIIE foi ne-
instâncias estratégicas da gestão e
planejamento municipais.

Conforme o Plano DEL, a criação


do DIIE teria como missão:

• Gerenciar e manter atualizado o


Portal de informações socioeco-
nômicas da cidade, que será uma
evolução do já existente, o Mapa
Socioeconômico de São Luís;
Figura 3
• Trabalhar permanentemente na Organograma DIIE
pesquisa, coleta e análise de in-
Fonte: Elaboração própria.
formações econômicas regionais;

• Realizar pesquisas e análises de interesse regio- cessário. O desenvolvimento das atividades iniciou-
nal, especialmente nos temas de desenvolvimento -se no ano de 2013, através da contratação da Fun-
econômico; dação Sousândrade de Apoio ao Desenvolvimento
da Universidade Federal do Maranhão – FSADU. O
• Manter-se atualizado quanto às tecnologias de- objeto do contrato foi a implementação do DIIE com
senvolvidas sobre banco de dados; o desenho e instalação de Portal Socioeconômico,
mediante a criação de mecanismos e instrumentos
• Desenvolver indicadores setoriais específicos
capazes de atualizações, aperfeiçoamentos e am-
sobre os clusters de interesse de São Luís;
pliações do Mapa Socioeconômico de São Luís.
• Publicar periodicamente um Boletim de Conjuntura
Econômica de São Luís (mensal, trimestral etc.). Características gerais do portal “Mapa
(SÃO LUÍS, 2011, p.126). Socioeconômico de São Luís”

Uma vez definidas tais diretrizes, o DIIE foi planeja- A atualização do Mapa Socioeconômico consistiu
do para ser constituído por profissionais formados num trabalho de sistematização computacional
ou com conhecimentos nas áreas de economia, de dados, com objetivo de constituir um portal

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eletrônico: Portal “Mapa Socioeconômico de Como requisito do projeto, os dados apresentam


São Luís”, disponível através do endereço www. um suporte espacial, sempre que possível, o que
mapasocioeconomicoslz.com.br. Sua finalidade é implica em associar uma localização à informa-
responder a necessidade de publicação de dados ção desejada. O processo inicial foi prover duas
socioeconômicos de São Luís e, assim, subsidiar características solicitadas como funcionalidades
o planejamento público municipal e facilitar acesso observadas:
dos cidadãos e investidores, ao congregar uma
ampla gama de informações de fontes diversas. • Suporte espacial para Setores censitários, Uni-
dades de Análise, Regiões SEMOP, Municípios;
Com este objetivo, o Portal é dotado de ferramentas de
visualização e criação de indicadores flexível, com as- • Prover mecanismos de extensão do suporte
sociação espacial dos dados, através de Sistemas de espacial para qualquer subgrupo de análise
Informações Geográficas em ambiente Web (SigWeb). criado através de facilidades de implementação
e atualização.
De forma geral, foi desenvolvido para três tipos de
usuários: o Externo, que consiste no usuário que A partir do item 1, foram definidos inicialmente os
deseja fazer apenas consultas aos dados do portal; seguintes suportes espaciais:
o Interno, responsável pela criação de novos indi-
Com base nas unidades básicas de suporte espa-
cadores e manutenção das produções e notícias; e
cial, foi definido o mecanismo de inclusão de novos
o Administrador, habilitado a carga e manipulação
suportes caso venham a ocorrer. A ideia básica é
do banco de dados.
fazer com que todos os dados sejam ligados a uma
entidade de suporte espacial denominada “Unidade
Suporte Espacial Descrição
Setores Censitários Correspondente aos setores censitários definidos pelo IBGE para o ano de 2010.
Unidades de Análise Agregação de setores utilizada pela Prefeitura de São Luís para fins de planejamento e análise
Regiões SEMOP Agregação de setores utilizada pela Prefeitura de São Luís para fins de planejamento e análise
Municípios Espacialização de municípios.

Quadro 1
Suportes espaciais para o Mapa Socioeconômico de São Luís
Fonte: Elaboração própria.

Quanto às tecnologias adotadas para a implemen-


de análise”. Esta Unidade contém, portanto, a refe-
tação das funcionalidades do Portal, elas foram
rência de localização de todos os dados analisados.
escolhidas com base na documentação existente, na
disponibilização de suporte adequado, experiência
da equipe e na utilização dos chamados software
Considerações acerca de uma proposta de
livre. Optou-se, portanto, pelas seguintes tecno-
regionalização do município de São Luís
logias: Geoserver (Servidor de Mapas); (Postgres
com extensão Postgis) SGBD; PHP + CodeIgniter + Para a representação espacial de dados no “Mapa
OpenLayers + BootStrap (Plataforma de Desenvol- Socioeconômico de São Luís” fez-se necessário
vimento); Servidor Web; HTTP, WWW (Protocolo de um exercício segundo duas propostas de regiona-
Comunicação); Distribuída MVC (Arquitetura de Im- lização do município. Isso porque a capital mara-
plantação), Facade (Arquitetura de Implementação). nhense não conta com uma legislação específica de

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Relatos de Experiências
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regionalização, apesar de vários órgãos municipais amostra do Censo Demográfico 2010 e utilização
utilizarem alguma forma de subdivisão espacial de de uma nomenclatura para cada agrupamento),
São Luís, não oficiais. o INCID aprimorou a regionalização de São Luís,
considerando todos os estudos citados, criando
A primeira, leva em consideração o uso dos setores agrupamentos (Áreas de Ponderação), que recebe-
censitários do IBGE. Esse critério mostra-se rele- ram um nome de bairro representativo e, de forma
vante, dada a riqueza de informações preexistentes generalizada, denominadas “Unidades de Análise”.
para este recorte geográfico, o que fundamenta
a análise de dados socioeconômicos referentes
Interface e operacionalização do portal
às características básicas das populações e dos
domicílios do município de São Luís. As informa- Tela Principal
ções disponibilizadas nesse nível de agregação
referem-se às características da população sobre A tela principal do Portal (Figura 4) corresponde a
sexo, idade, situação do domicílio, emigração uma interface pública, composta por três seções:
internacional, ocorrência de óbitos, cor ou raça,
registro de nascimento, alfabetização e rendimento • Espacial: acesso a base espacial de informa-
das pessoas de 10 anos ou mais de idade além de ções. Todos os indicadores nessa interface
informações sobre composição e características possuem espacialização;
dos domicílios. Além disso, a malha digital desses
setores foi incorporada, dando a possibilidade de • Temas: acesso a base de dados através dos
georreferenciamento das informações disponibili- formatos tabulares e gráficos. A informação de
zadas nesse nível geográfico. indicadores em temas é enriquecida por filtros
e subclassificações que torna os dados compa-
A segunda regionalização utilizada incorpora os rativos entre suas regiões de análise;
trabalhos realizados pelo Instituto da Cidade, Pes-
quisa e Planejamento Urbano e Rural – INCID. Este • Publicações: espaço para postagem de publi-
Instituto tomou por base três limites pré-existentes: cações, assim como a inserção de notícias e
postagens relevantes.
• Distritos Urbanos, que possui limites resultan-
tes de mapas e leis de zoneamento passados; Temas

• Regionais da SEMOP, criadas pela Secretaria A interface Temas realiza consultas na base de
de Orçamento Participativo e concebidas em indicadores e obtêm informações temáticas rela-
2004 e; cionadas a São Luís comparativamente com outras
capitais do Nordeste. A visualização dos dados é
• Limites das Unidades Fiscais do Cadastro realizada no aspecto tabular e gráfico.
Técnico, da Secretaria de Mobilidade Urbana
e Rural, concebidos em 2001. A interface é composta pelos itens demonstrados
na Figura 5:
Seguindo, ainda, as diretrizes básicas dadas pelo
IBGE para a criação de uma Área de Ponderação • O item A corresponde a área de definição do
(agrupar setores censitários contíguos; agrupamen- indicador, ou seleção de área, subárea e indi-
to com, no mínimo, quatrocentos questionários da cador propriamente dito;

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Relatos de Experiências
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Figura 4
Tela Inicial do Portal Eletrônico

Figura 5
Tela Temas

101
Relatos de Experiências
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• O item B diz respeito à definição da visualização ser exportados para o formato PNG e inclusão em
ou região de análise; relatórios técnicos das áreas (Figura 6).

• O item C diz respeito à definição do tipo de visu- Espacial


alização: no caso de tabular os dados, ele serão
A interface espacial permite a visualização dos in-
apresentados em tabelas, sendo os modelos
dicadores com dados intramunicipais. Entende-se
possíveis de agregações em linhas ou colunas.
intramunicipais como dados referentes a Setores
No caso da escolha de gráficos, os dados serão
Censitários, Unidades de Análise e Regiões SEMOP
demonstrados em gráficos nos formatos: barra,
(Figura 7).
coluna, pizza, radar, linhas;
Dados extramunicipais não serão acessíveis por
• O item D apresenta uma lista de filtros dispo-
esta interface, por não oferecer ganho técnico de
níveis para o indicador. Obrigatoriamente dois visualização de dados. A Figura 7 apresenta a in-
filtros são sempre carregados, região de análise terface inicial da consulta espacial, onde podemos
e anos, por corresponderem duas dimensões destacar os itens A –D:
de todos os dados.
• Item A: área de consulta para selecionar área,
É possível realizar, a qualquer momento, outras con- subárea, indicador, tipo de espacialização e anos;
sultas alterando o valor de indicador, e manipular
todos os dados contidos na base. Se necessário, as • Item B: controles de movimentação do mapa,
tabelas poderão ser exportadas para o formato.xls caso necessário, incluem controles de zoom,
para análise e processamento. Os gráficos poderão pan e translação do mapa;

Figura 6
Utilização dos gráficos temáticos

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Relatos de Experiências
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Figura 7
Tela inicial consulta espacial

• Item C: área de apresentação do mapa. Ao fundo localidade de São Luís. Poderá ser carregado na
é demonstrado como camada principal o Goo- forma de setores, unidades de análise e regiões
gle Maps com finalidade de situar o usuário a da SEMOP;

Figura 8
Consulta espacial realizada

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Relatos de Experiências
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

• Item D: área de opções. Primeiro item representa do marcar ou desmarcar para visualizar/retirar uma
camadas que podem ser adicionadas aos dados, camada (Figura 9).
segundo item opção de salvar o relatório espa-
cial, terceiro item a opção de relatório gráfico. Para visualizar o dado especificamente de uma lo-
calidade, basta clicar sobre a região. Uma caixa, ou
Um exemplo do resultado da consulta é demonstra- janela (tooltip), será exibida com algumas opções e
do na Figura 8. Inicialmente, verifica-se que as Uni- descrições da região de interesse, conforme Figura 10.

Figura 9
Inclusão e Exclusão de camadas no espacial

dades de Análise (A) foram desenhadas conforme A qualquer momento, o usuário pode confrontar
um esquema de cores definidos pela legenda (B). as informações consultadas na forma espacial
O elemento Legenda somente estará disponível se com visualizações tabulares e gráficas. Essa ferra-
pelo menos uma consulta for realizada. menta pode ser útil para ter um complemento das
informações representadas no mapa e, portanto,
Se necessário, pode-se ir ao item Camadas e inserir são carregadas em janelas suspensas passíveis de
novas camadas para fundamentar a análise, bastan- movimentação caso exista a necessidade.

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Relatos de Experiências
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Figura 10
Tooltip dos dados espaciais

CONSIDERAÇÕES FINAIS espaço municipal, em geral, não é homogêneo e


nem igualitário.

A utilização de indicadores sociais constitui uma Cabe ao SIG nesse contexto, não apenas gerar
importante fonte de informação acerca de uma as representações cartográficas da realidade
dada realidade, na medida em que sintetiza um em questão, mas também subsidiar as análises
conjunto de dados já trabalhados, e, por isso, serve espaciais das variáveis de estudo, o que permite
como instrumento de previsão de cenários. Por seu acompanhar a evolução territorial de determinados
processos e condições.
turno, o uso do georreferenciamento, no âmbito
dos indicadores, permite melhor identificação e Não obstante, os avanços das TIs têm possibi-
delimitação dos territórios prioritários e facilita o litado a criação de mapas temáticos dinâmicos,
processo de vigilância socioassistencial, já que o associados a gráficos e informações alfanuméricos

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Relatos de Experiências
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

tradicionais, possíveis de serem acessados através SÃO LUÍS. Plano de desenvolvimento econômico
da internet e exportados em forma de arquivos local. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal
eletrônicos. Frente a tais possibilidades, ao adotar Extraordinária de Projetos Especiais e Secretaria
essas tecnologias, tanto no SIG-PPA, como no Municipal de Planejamento e Desenvolvimento: São
Luís, 2011.
Portal Mapa Socioeconômico, a Prefeitura de São
Luís incrementa e inova seus recursos de gestão e FERREIRA, J. L. P.. Inteligência competitiva e gestão
planejamento municipal. de informação estratégica na regulação do serviço
de fornecimento de energia elétrica no Estado de
Em adição, por estar disponível à consulta via inter- Mato Grosso do Sul. 2006. 108 f. Dissertação (Mes-
net, os indicadores georreferenciados também pode trado em Ciência da Informação)-Universidade de
servir como instrumento de controle social. Isso Brasília, Brasília, 2006.
porque o sistema permite atender ao objetivo final
JANNUZZI, P. de M.. Indicadores para diagnóstico,
do usuário desse tipo de recurso, a saber: processar
monitoramento e avaliação de programas sociais no
uma série histórica de determinados indicadores,
Brasil. Revista do serviço público. Brasília, v. 56, n.
dentro de um SIGs, permitindo a análise desses da- 2, p.137-160, abr/jun. 2005.
dos coletados com visualização da espacialização.
JANNUZZI, P. de M. Indicadores Sociais no Brasil:
Portanto, superada a etapa de difusão da importân- conceitos, medidas e aplicações. 5. Ed. Campinas:
cia de indicadores georreferenciados, as iniciativas Alínea, 2012. 156 p.
da PMSL podem tornar-se referência para o planeja-
mento local, exacerbando sua utilidade como critério PRADO, O.; KEINERT, T. M. M. Metodologia de
implantação do observatório da qualidade de vida
para definição de prioridades de ações e investimen-
de Santo André. In: Claudete C.S. Vitte e Tânia M. M.
tos municipais, especialmente, para formulação de
Keinert, Qualidade de Vida, Planejamento e Gestão
políticas públicas de combate à exclusão social, bem Urbana – Discussões teórico-metodológicas. Rio de
como o monitoramento e avaliação dessas políticas. Janeiro: Bertrand Brasil, 2009.

SESI - Serviço Social da Indústria. Departamento


REFERÊNCIAS Regional do Estado do Paraná. Observatório Re-
gional Base de Indicadores de Sustentabilidade.
Construção e Análise de Indicadores. Curitiba:
BIRD. Brazil São Luís Enhancing Municipal Gov-
[s.n.], 2010.108 p.
ernance and Quality of Life project PO9431 5: re-
gional environmental assessment executive sum- SILVA, H. P. da. Inteligência competitiva na Internet:
mary. Disponível em: http://wwwwds.worldbank.org/ um processo otimizado por agentes inteligentes. Ci.
external/default/WDSContentServer/WDSP/IB/200 Inf., v. 32, n.1, p. 115-134, abr. 2003. Disponível em:
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PDF/432400BR01writ10only10SecM200810151.pdf. Acesso em: 2 jun. 2013.
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SILVA, C. L. ; WIENS, S. ; RAULI, F. C. . Indicadores:
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Comunicações de Pesquisas
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Análise da gestão A pesquisa apresenta diferentes componentes e se


propõe a se articular com os esforços empreendi-
e da governança dos pelo IPEA no sentido de compreender melhor
as relações federativas do país. Os procedimentos
metropolitanas das metodológicos envolvem tanto a realização de estu-

funções públicas de dos e análises comparativas, quanto à realização de


estudos de caso, conforme a manifestação de inte-
interesse comum resse das equipes estaduais envolvidas no projeto.

selecionadas Justificativa

Marco Aurélio Costa1 As transformações por que passa o capitalismo cau-


Bárbara Oliveira Marguti2 sam efeitos importantes sobre as metrópoles: maior
velocidade dos fluxos financeiros e de mercadorias,
num mercado cada vez mais internacionalizado;
reestruturação produtiva da atividade industrial,
Introdução que permite a fragmentação de sua produção; e
dinâmica do setor de serviços, que se transforma e
A pesquisa da Governança Metropolitana no Brasil contribui seja para a velocidade dos fluxos financei-
reúne uma articulação, no âmbito da Rede IPEA, ros e comerciais como para a reestruturação produ-
que conta com a participação dos 12 espaços me- tiva. Essas transformações geram maior incerteza
tropolitanos brasileiros, reconhecidos pela REGIC quanto à localização das atividades no território e,
2007 (IBGE, 2008) aos quais se somam três outros assim, reforçam a centralidade e o papel atual das
espaços dinâmicos que poderão despontar, no metrópoles no mundo.
curto prazo, como novos espaços metropolitanos,
No Brasil contemporâneo, tanto ou mais que o fe-
a saber, Grande Vitória (ES), Vale do Rio Cuiabá
nômeno da urbanização, a metropolização vem se
(MT) e Grande São Luís (MA).
configurando como uma tendência de organização
do espaço, seja enquanto fenômeno socioespacial,
Trata-se de um esforço de articulação institucional
seja como fenômeno político-institucional, o que se
relevante para o Brasil contemporâneo, que se refle-
reflete no aumento da importância das metrópoles
te numa pesquisa que deverá, de forma balanceada,
brasileiras e no aumento do número de Regiões
permitir a construção de quadros comparativos
Metropolitanas.
sobre aspectos importantes da gestão e da gover-
nança metropolitanas, ao mesmo tempo em que A governança desses espaços, especialmente no
contempla a caracterização das especificidades que diz respeito à gestão das funções públicas de
presentes na gestão desses espaços. interesse comum, emerge como um desafio, cliva-
do, do ponto de vista institucional, pelas possibi-
lidades e limites das relações federativas trazidas
pela Constituição Federal de 1988.
1 Doutor em Planejamento Urbano e Regional, Técnico de Planejamento
e Pesquisa (IPEA) e coordenador da Rede IPEA.
É neste sentido que se propõe para a Rede IPEA
2 Mestre em Planejamento Urbano e Regional, Assistente de Pesquisa do
Projeto Governança Metropolitana no Brasil (IPEA). a construção de um projeto de pesquisa que, em

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Comunicações de Pesquisas
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

diálogo com os estudos e investigações que tem • Levantamento de experiências locais como
como foco as relações federativas, procura investi- inspiração para a gestão e governança metro-
gar as especificidades, condições e condicionantes politanas no país.
da governança metropolitana, partindo da análise
e/ou avaliação da gestão das funções públicas
Produtos e Atividades
de interesse comum, mas enfocando também a
perspectiva de interação dos agentes econômicos
e políticos e dos atores sociais que contribuem Fase 1 (Relatório 1.1. e Volume 1)
para a conformação do espaço metropolitano e
para o campo de possibilidades de sua gestão e No período de setembro a dezembro de 2012 as
transformação. equipes estaduais desenvolveram o componente
1.1 da pesquisa – Arranjos Institucionais de Gestão
Metropolitana – e participaram de Oficina em Bra-
Objetivos sília, com os seguintes objetivos:

• Apresentação dos resultados preliminares do


Geral Subcomponente 1.1. Arranjos Institucionais de
Gestão Metropolitana;
O objetivo geral da pesquisa consiste em carac-
terizar e avaliar, numa perspectiva comparativa e • Encaminhamento do Relatório 1.1;
tendo como referência o marco das relações fede-
rativas no Brasil, a governança metropolitana, seja • Definição de Metodologia e Instrumentos de
Pesquisa para o tema das Funções Públicas de
como subsídio para o desenho, implementação
Interesse Comum e dos Agentes da Dinâmica
e avaliação das políticas públicas relacionadas à
Metropolitana.
gestão das funções públicas de interesse comum
nos diferentes espaços metropolitanos brasileiros, Essas atividades tiveram como resultados os se-
seja como insumo para fortalecer a questão metro- guintes produtos:
politana na agenda política do país.
• 14 Relatórios Técnicos de Pesquisa: Arranjos
Específicos Institucionais de Gestão Metropolitana, em
processo de editoração, disponíveis em formato
• Caracterizar e avaliar os diferentes desenhos/ digital a partir de Agosto/2014;
arranjos de gestão metropolitana;
• Publicação, em agosto/2013, do livro “40 Anos
• Analisar a gestão de funções públicas de inte- de Regiões Metropolitanas no Brasil”3.
resse comum selecionadas;
Os Relatórios Técnicos de Pesquisa trazem infor-
• Mapear e fazer o registro de práticas, iniciativas mações sobre o arranjo institucional para a gestão
e modelos de gestão e governança vigentes nas
metropolitana, do ponto de vista das instituições que
RMs participantes da pesquisa ou desenvolver
estudos temáticos específicos; integram a gestão metropolitana, dos instrumentos
de planejamento e gestão e do orçamento e financia-
• Qualificar as relações e conflitos decorrentes
do arranjo federativo brasileiro e explorar as
possibilidades abertas pelas experiências dos 3 COSTA, Marco Aurélio; TSUKUMO, Isadora T. Lemos (orgs.). 40 anos
de Regiões Metropolitanas no Brasil. Série Rede Ipea, Projeto Gover-
consórcios intermunicipais. nança Metropolitana no Brasil, v.1. Brasília: IPEA, 2013.

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Comunicações de Pesquisas
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

mento. Complementarmente é feita uma avaliação da prévia e diretrizes metropolitanas, e a presença


governança metropolitana com base nos impactos de órgão colegiado deliberativo e promotoria do
do arranjo institucional na governança metropolitana Ministério Público para as questões exclusivamente
e nos atores e agentes da dinâmica metropolitana. metropolitanas.

Por sua vez, o livro 40 anos de Regiões Metropoli- Esta fase do projeto tem 3 produtos finais:
tanas no Brasil. Volume 1 - Série Rede IPEA traz em
seu capítulo inicial uma análise comparativa e uma • 14 Relatórios Técnicos de Pesquisa Análise
proposta tipológica para os sistemas de gestão das Comparativa da Gestão das FPICs;
regiões metropolitanas do Brasil. Na sequencia são • Livro: Volume 2 Série Rede IPEA – Projeto Go-
apresentadas, em forma de capítulos, as experiên- vernança Metropolitana e
cia de cada uma das RMs em estudo.
• Livro: Volume 3 Série Rede IPEA – Projeto Go-
Fase 2 (Relatório 1.2 e Volumes 2 e 3) vernança Metropolitana.

Para o componente 1.2 foi aprofundada a análise do Os Relatórios Técnicos de Pesquisa trazem infor-
quadro atual da gestão e governança nas RMs do mações necessárias para uma análise comparativa
país, através da avaliação de três funções públicas da gestão das FPICs, através da caracterização da
de interesse comum, selecionadas pelas equipes dinâmica metropolitana, da análise de cada uma
participantes da Rede IPEA, a saber: uso do solo, das FPICs, do histórico e caracterização da gestão
saneamento ambiental e transporte público/mobi- da FPIC, além de uma análise da efetividade do
lidade urbana. arranjo de gestão e da governança metropolitana

Através do componente 1.2. (Relatório Técnico O Volume 2 da Série Rede IPEA, ainda em constru-
de Pesquisa Análise Comparativa da Gestão das ção com previsão de lançamento em novembro de
FPICs), e do preenchimento das planilhas de Aná- 2014, trará, além de um capítulo de análise síntese
lise das FPICs e de Grandes Empreendimentos dos instrumentos e mecanismos para o planejamento
elaborados pelos parceiros estaduais foi possível e gestão metropolitana das FPICs, três capítulos de
obter, para todas as RMs em análise, informações especialistas nas áreas de transporte e mobilidade,
sobre planos metropolitanos e municipais setoriais, saneamento ambiental e uso do solo incorporando a
tais como Planos Diretores, Plano de Gestão de análise crítica qualitativa das experiências relatadas
Resíduos Sólidos e outros. Do ponto de vista da nos Relatórios Técnicos e nos demais capítulos que
gestão, foi levantada a existência de consórcios farão parte do Volume 2. A seguir são apresentados
intermunicipais, que envolvessem parte ou a to- os temas específicos tratados para cada RM.
talidade de municípios metropolitanos. No caso
do transporte público/mobilidade urbana, além Livro: Volume 2 - Série Rede IPEA
dos aspectos mencionados acima, foram também (Temas para capítulos)
consideradas a existência de pesquisa Origem-
-Destino, a integração modal e tarifária no sistema 1. FPIC Uso do Solo
e, nos casos em que não existiam, a previsão de
1.1 A gestão do território na RMBH.
integração. Especificamente para a função pública
Uso do Solo, foi levantada a existência de órgãos 1.2 Transformações urbanas e gestão do uso
de controle, responsáveis por conceder anuência do solo na RM de Curitiba.

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Comunicações de Pesquisas
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1.3 Região Metropolitana do Recife: o desa- 3.4 Governança metropolitana na RMRJ: Aná-
fio da gestão compartilhada e a integra- lise da FPIC Saneamento Socioambiental
ção territorial.
Por fim, o Volume 3, também em construção, trará
1.4 Funções públicas de interesse comum estudos de casos específicos de cada RM, que
na Região Metropolitana de São Paulo. vão desde um tratamento mais profundo sobre a
gestão das FPICs trabalhadas no Volume 2, quanto
1.5 Governança metropolitana e uso e ocu-
a relatos e balanços tratando de experiências di-
pação do solo na Região Metropolitana
versas ligadas à temática metropolitana, como é o
do Vale do Rio Cuiabá: conflitos e de-
caso da habitação, da agricultura familiar, do fluxo
safios na gestão integrada das funções
públicas de interesse comum. de mercadorias entre os municípios, entre outros.
A seguir são apresentadas as temáticas que farão
1.6 Condições e contradições da governan- parte do Volume 3.
ça do uso do solo na Região Metropoli-
tana Grande São Luís. Livro: Volume 3 - Série Rede IPEA
(Temas para capítulos)
2. FPIC Transporte
1. Saneamento básico e governança metropolita-
2.1 A integração da rede de transporte cole- na na Região Metropolitana de Belém (RMB).
tivo da Região Metropolitana de Goiânia.
2. Parcerias público-privadas aplicadas à gestão
2.2 A Política de Transporte Público e a es- de resíduos sólidos: projeto em andamento na
truturação do espaço urbano na Região RMBH.
Metropolitana de Belém.
3. O rural na metrópole: a importância da agri-
2.3 Governança metropolitana e transportes cultura familiar na Região Metropolitana de
na RMPA. Curitiba

2.4 Transporte público e (i)mobilidade urba- 4. Fluxo Intermunicipal de Mercadorias na Região


na na Região Metropolitana da Grande Metropolitana de Fortaleza
Vitória.
5. Estratégia para eliminação do risco de desa-
bastecimento de água na RMG: o desafio do
3. FPIC Saneamento Ambiental
Sistema Produtor João Leite.
3.1 Saneamento Ambiental e Transporte
6. Saneamento Ambiental na Grande São Luís: o
na Ride/DF: os desafios da gestão das
que os olhos não veem, a população sente.
funções públicas de interesse comuns e
o planejamento integrado. 7. Consórcios públicos intermunicipais na Região
Metropolitana de Porto Alegre.
3.2 Governança do saneamento básico na
Região Metropolitana de Salvador: um 8. O território oeste da Região Metropolitana do
olhar sobre os resíduos sólidos. Recife: a trajetória da ocupação recente até o
megaevento Copa 2014.
3.3 Governança do Saneamento Ambiental na
Região Metropolitana de Fortaleza: novos 9. Gestão impositiva x governança metropolitana:
Instrumentos e Antigas Dificuldades; um estudo de caso sobre a FUNDREM (RMRJ).

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Comunicações de Pesquisas
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10. Plano Metropolitano de Desenvolvimento Resultados


Habitacional: identificação de áreas de risco
para subsidiar empreendimentos habitacionais
(RMSP). O processo de metropolização institucional caracte-
rizado pelos estudos prévios do IPEA (2010) aponta
11. Governança e instrumentos de gestão na para uma fragmentação e fragilização da gestão
Região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá metropolitana no Brasil. Tendo esse processo como
(RMVRC): Planos Diretores Municipais e Plano
pano de fundo, o estudo dos 12 espaços metropoli-
Diretor Participativo Integrado Metropolitano
tanos da REGIC (2008) e de 3 aglomerações dinâ-
(PDPI).
micas (que são institucionalmente metropolitanas)
12. O espaço metropolitano do Distrito Federal: mostra que há uma grande diversidade de arranjos
uma nova RIDE. institucionais e articulações, em diferentes estágios
de formalização, mas predominantemente não
13. Investimentos em mobilidade na RM de Sal- consolidados e com fraca articulação institucional,
vador e a construção de uma governança
nenhum dos arranjos se aproxima do que seria uma
metropolitana.
situação ideal.

Cronograma
Cronograma
Atividades Início Conclusão

Fase 1

Editoração e divulgação, em formato digital, dos Relatórios Técnicos de Pesquisa: Arranjos Institu-
mar/14 ago/14
cionais de Gestão Metropolitana (Subcomponente 1.1.)

Fase 2

Revisão e entrega dos Relatórios Técnicos de Pesquisa: Análise Comparativa da Gestão das FPICs
nov/13 jan/14
(Subcomponente 1.2.)

Editoração e divulgação, em formato digital, dos Relatórios Técnicos de Pesquisa: Análise Compa-
jun/14 out/14
rativa da Gestão das FPICs

Revisão e entrega dos textos correspondentes ao Volume 2 Série Rede Ipea – Projeto Governança
jan/14 abr/14
Metropolitana

Sistematização e análise comparativa de instrumentos, recursos e mecanismos para o planeja-


fev/14 jul/14
mento, a gestão e a governança das FPICs

Organização do Volume 2 Série Rede Ipea – Projeto Governança Metropolitana fev/14 jul/14

Revisão e entrega dos textos correspondentes ao Volume 3 Série Rede Ipea – Projeto Governança
jan/14 jun/14
Metropolitana

Organização do Volume 3 Série Rede Ipea – Projeto Governança Metropolitana mai/14 jul/14

Revisão e editoração dos Volumes 2 e 3 Série Rede Ipea – Projeto Governança Metropolitana jul/14 out/14

Lançamento Nacional Volumes 2 e 3 nov/14

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Comunicações de Pesquisas
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O divórcio entre a conformação dos espaços tais espaços em programas de investimento


metropolitanos (dinâmica socioeconômica) e e políticas setoriais. No entanto, a União não
a metropolização institucional do Brasil é evi- valoriza o instrumento da regionalização, seja
dência de que a regionalização como instru- para promover o ordenamento territorial, seja
mento de planejamento e gestão encontra-se para dar uma solução para os conflitos fede-
em crise – num processo potencializado pela rativos ainda não regulamentados.
CF 1988 (estadualização da criação e gestão
das RMs e desarranjos federativos). A crescente pressão social por equipamentos
e serviços de consumo coletivo traz, em seu
Paradoxalmente, na medida em que somos bojo, a possibilidade de trazer para a agenda
cada vez mais um país metropolitano, esvazia- política a questão metropolitana. O Estado,
-se a fragiliza-se a gestão metropolitana. O as diferentes esferas de governo e os diver-
baixo grau de institucionalização, a baixa sos agentes econômicos e atores políticos e
efetividade da gestão metropolitana e a sociais estão sendo crescentemente estimu-
ocorrência de crescentes arranjos baseados lados a refletir sobre as metrópoles e sobre
em articulações institucionais setoriais ou a gestão de suas questões compartilhadas.
de abrangência territorial limitada sugerem a
existência de uma crise da gestão metropo- O Estatuto da Metrópole surge como oportu-
litana, expressa, em particular, na busca por nidade de buscar soluções para resolver os
novas soluções institucionais. conflitos federativos existentes, através da
valorização da regionalização como instru-
Sob a perspectiva do singular federalismo mento de planejamento e gestão do território
brasileiro, a União desempenha papel para- (seja do ponto de vista regional ou urbano) – a
doxal dada a insuficiência de recursos (orça- questão dos critérios; da solução de conflitos
mentários/tributários) para os municípios e federativos horizontais e verticais (sem com-
estados lidarem com a demanda por investi- prometer avanços do Estatuto das Cidades),
mentos em infraestrutura social e urbana, a da regulamentação da gestão metropolitana
União é o principal ator na provisão desses e orientações para os desenhos institucio-
recursos, em especial, por meio de transfe- nais, considerando os riscos envolvidos na
rências voluntárias. Adicionalmente, políticas fragmentação da gestão setorial e/ou dos
governamentais reconhecem a importância arranjos não abrangentes e do controle e
dos espaços metropolitanos e privilegiam participação social.

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Comunicações de Pesquisas
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Elaboração de particulares e “customizadas” para formatação


de ações públicas mais dirigidas, no grau que se
diagnósticos para requer atualmente. Nos diagnósticos contratados
pelo setor público, contribuem para isso, sem
programas sociais: dúvida, as imprecisões ou lacunas dos termos de

a estratégia multi- referência – que espelham, muitas vezes, a falta


de clareza dos objetivos e natureza do programa
métodos para o público a ser posto em prática – e a exigüidade de
tempo e recursos para realização de levantamentos
Programa Estadual de campo específicos (WORTHERN et al 2004).

de Qualificação No campo da formulação e aprimoramento de pro-

Profissional gramas de qualificação profissional, esse quadro de


limitações e parcialidade dos diagnósticos não é di-
ferente, embora tenha havido, desde os anos 1990,
um esforço significativo na proposição de modelos
Paulo Jannuzzi
mais consistentes para elaboração de estudos de
Alexandre Loloian
análise de demanda para programas dessa nature-
Vivaldo Conti1
za, assim como de sua avaliação (BULHÔES 2004).

O fato é que a efetividade de programas de quali-


Introdução ficação depende – ademais da evolução favorável
do emprego- de um desenho apropriado de seus
Em diversos círculos técnicos da administração componentes. A complexidade operacional envol-
pública, afirma-se que não é por falta de estudos vida em seu ciclo de gestão é certamente muito
e diagnósticos que os programas sociais não con- maior do que a de diversos programas sociais, o
seguem alcançar os resultados e impactos espera- que valoriza ainda mais a necessidade de dispor de
dos. Afinal, é fato que as universidades, centros de um diagnóstico consistente, mais rico e específico
pesquisa e empresas de consultoria têm produzido do que os tipos de estudos citados anteriormente.
um amplo conjunto de trabalhos, artigos e estudos
Em primeiro lugar é preciso ter clareza sobre quem
sobre diferentes aspectos da realidade social,
é o público-alvo do programa, quantos são, como
referidos direta ou indiretamente ao contexto de
são, aonde estão. O dimensionamento do público-
operação dos vários programas públicos.
-alvo de programas de qualificação envolve critérios
Entretanto, muitos desses trabalhos, mesmo os de elegibilidade mais abrangentes do que outros
contratados para subsidiar a formulação de pro- programas, contemplando a identificação de tra-
gramas específicos, são, na prática, diagnósticos balhadores desempregados – pela automação ou
descritivos bastante gerais, aplicáveis a diferentes baixo crescimento econômico – ou em risco de
programas sociais, com contribuições certamente desemprego – como os trabalhadores da cana –,
relevantes, mas desprovidas de informações mais aqueles com baixa escolaridade, menores rendi-
mentos, mal inseridos na estrutura ocupacional
e pertencentes a grupos sócio-demográficos em
1 Fundação SEADE.
situação de desvantagem no mercado de trabalho,

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Comunicações de Pesquisas
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como jovens, mulheres, negros, portadores de -Trabalho, Pesquisa Municipal de Qualificação,


deficiência. Sondagem com Prefeitos e Oficinas Técnicas de
Prospecção de Demandas de Qualificação- são,
Ademais, a implementação de programas de qua- pois, os objetivos deste texto.
lificação profissional envolve ainda a especificação
de cursos adaptados não apenas às caracterís-
ticas de um público-alvo com elevado déficit de Boletins Foco: Análises
escolaridade básica, mas também à capacidade Regionais do Mercado de
de sua absorção no mercado de trabalho local. A Trabalho
contratação de instituições para oferecimento dos
cursos, o acompanhamento da oferta, as avalia-
Por meio da análise de estatísticas públicas e regis-
ções de aprendizagem e de egressos e os esforços
tros oficiais disponíveis – em particular no Banco
para captação de vagas nas empresas são outras
de Indicadores Municipais do Seade, na Relação
atividades bastante complexas envolvidas em um
Anual de Informações Sociais e Cadastro Geral de
programa de qualificação.
Empregados e Desempregados do Ministério do
A gestão descentralizada do programa é uma impo- Trabalho e nos registros e pesquisas do IBGE –,
sição para alcançar melhores ajustes entre procura buscou-se entender o comportamento recente da
e oferta de qualificação e requer também mecanis- dinâmica demográfica, da estrutura econômica, do
mos de coordenação e monitoramento bastante so- mercado de trabalho e da evolução das ocupações
fisticados, nem sempre disponíveis adequadamente predominantes nas regiões e municípios paulistas.
em nível municipal, em sindicatos, de trabalhadores
Esse conjunto de informações permitia dimensionar,
ou patronais, ou em organizações sociais.
para cada município e região, a pressão de ingresso
Tais dificuldades foram reconhecidas pela Secre- de jovens no mercado de trabalho, as atividades
taria do Emprego e Relações do Trabalho (Sert) no econômicas predominantes e investimentos previs-
início de 2007, ao procurar a Fundação Seade para tos, além das ocupações mais dinâmicas e absorve-
produzir subsídios para o redesenho do Programa doras da mão-de-obra paulista, pelo menos aquela
Estadual de Qualificação Profissional (PEQ), bem empregada no mercado celetista e estatutário.
como para o desenvolvimento de instrumentos
Essas análises foram sistematizadas em 15 rela-
para apoiar sua implementação e gestão nos anos
tórios – os Boletins Foco- um para cada Região
seguintes.
Administrativa, além da Região Metropolitana de
A elaboração do diagnóstico para formulação e São Paulo. Eles se constituíram um primeiro diag-
acompanhamento do PEQ envolveu a utilização nóstico aproximativo e contextual para o programa
de diferentes abordagens metodológicas de pes- e serviram para orientar a organização da base de
quisa e organização de dados. À semelhança de informações, que passou a ser periodicamente atu-
um quebra-cabeça, cada abordagem contribuiu alizada em um sistema de informações específico
com um conjunto de informações específico e (o SIM-Trabalho).
complementar às demais, delineando um mosaico
A análise das estatísticas apresentadas nos Boletins
informacional abrangente para a Secretaria. Regis-
revelou, tal como ocorria no país, forte dinamismo
trar as atividades e apresentar os cinco principais
do emprego formal no Estado em meados nos anos
instrumentos desenvolvidos- Boletins Foco, SIM-
2000. De modo geral, percebia-se que o emprego se

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Comunicações de Pesquisas
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expandia mais rapidamente pelas ocupações com perspectivas do mercado de trabalho nos muni-
baixas exigências de qualificação profissional, em cípios paulistas. Foi desenhado para subsidiar
praticamente todos os setores de atividade, sobretu- gestores e técnicos estaduais, das prefeituras e os
do na construção civil. Em contraste, as ocupações membros das Comissões Municipais de Emprego
menos dinâmicas estavam associadas a níveis na formulação e acompanhamento dos programas
intermediários da hierarquia das empresas – pelo locais de geração de emprego, trabalho, renda e
avanço de novas formas de gestão e automação da
qualificação profissional.
produção – e às atividades agrícolas, especialmente
as dependentes da colheita da cana-de-açúcar.     Por meio do conjunto de tabelas e gráficos disponi-
bilizados pelo sistema se possibilitava acompanhar
O SIM-Trabalho o crescimento da população e da força de trabalho,
da expansão ou retração de vagas e ocupações es-
O SIM-Trabalho – Sistema de Informações Muni- pecíficas e a estrutura e o dinamismo da produção
cipais sobre Trabalho, Ocupações e Qualificação econômica local e regional. O aplicativo permite
– foi um aplicativo desenvolvido em plataforma de que gestores autorizados construam relatórios e
software DataWareHouse para organizar os dados indicadores próprios através de cruzamento de
e informações levantados no diagnóstico e permitir variáveis definidas a partir da base de dados que
o acompanhamento periódico da conjuntura e as alimenta o sistema.

Figura 1
SIM – Trabalho com sua estrutura de menus e tabelas

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Comunicações de Pesquisas
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Além de dados disponíveis nos Boletins Foco, em denado de qualificação profissional. A existência de
escala municipal, o sistema também reunia os rela- instrumentos de atração de empreendimentos nos
tórios das pesquisas primárias junto às prefeituras municípios também foi investigada.
para caracterização da estrutura de gestão e das
ações de geração de emprego, trabalho, renda e Nessa perspectiva, a Pesquisa Municipal de Qualifi-
qualificação profissional em cada município do Es- cação apontou, por sua vez, uma situação bastante
tado, além de relatórios de acompanhamento dos heterogênea quanto à disponibilidade de estrutura
principais programas da Secretaria. institucional dos municípios. Assim, foram identi-
ficados municípios mais bem aparelhados, onde
o programa pode ser implantado rapidamente, e
A Pesquisa Municipal de
aqueles em que seria necessário um esforço prévio
Qualificação de construção dessa estrutura.

Identificado o público-alvo do programa e seu perfil, Verificou-se que os cursos promovidos nos últimos
mapeadas as localidades e setores de atividade anos (2005-2007), embora tenham oferecido mais
econômica mais dinâmicos – que apontam os gar- de 800 mil vagas, concentraram-se em atividades
galos de mão-de-obra qualificada – e levantadas as artesanais, de informática e outros, voltados à gera-
ocupações em situação de maior vulnerabilidade ção de renda e ao auto-emprego, sem a definição de
ao desemprego, era preciso avaliar a capacidade um público-alvo preciso. Em outros termos, houve,
e experiências de gestão municipal de programas nos últimos anos, grande pulverização de recursos,
de qualificação profissional e intermediação de de agentes promotores e de público beneficiado por
mão-de-obra. essas ações. Na ausência de uma coordenação, de
definição de metas e objetivos do programa e de
Neste sentido foi proposta a realização da Pesquisa
sistemas de monitoramento e avaliação, os efeitos
Municipal de Qualificação, junto aos 645 municípios
desses cursos sobre as possibilidades de inserção
paulistas. Investigaram-se na pesquisa, entre outros
produtiva de seus beneficiários são de difícil men-
aspectos, a existência de Comissão Municipal de
suração e, provavelmente, foram muito menores do
Emprego, de local de atendimento a trabalhadores
que poderiam ter sido se o programa e sua execução
e empresas que recorrem ao sistema público de
tivessem sido realizados de forma mais adequada.
emprego, a oferta de cursos gratuitos de qualifi-
cação profissional e seus públicos-alvo, além dos
tipos de entidades executoras e os procedimentos Sondagens com prefeitos
de encaminhamento dos participantes dos cursos sobre tendências da economia
ao mercado de trabalho. Os formulários da pesquisa local
foram distribuídos em mais de 20 reuniões regio-
nais organizadas para divulgar as novas diretrizes
Nesses eventos de apresentação da Pesquisa Muni-
do PEQ junto aos prefeitos e técnicos municipais,
cipal aproveitou-se ainda para aplicar uma enquete
com uma taxa de retorno de 96% dos formulários.
junto aos prefeitos sobre a dinâmica do mercado de
Tais informações indicariam, em princípio, as ba- trabalho local, as mudanças estruturais em proces-
ses institucionais e a experiência acumulada das so (desemprego tecnológico, informalização etc.) e
prefeituras paulistas nesse campo e, assim, suas o impacto recente da migração sobre a demanda
possibilidades de integração num programa coor- por trabalho no município.

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Comunicações de Pesquisas
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Mais que observadores privilegiados, os prefeitos são As oficinas foram organizadas e conduzidas pela
atores importantes da economia municipal – e sua Fundação Prefeito Faria Lima-Cepam, com apoio
percepção das perspectivas da dinâmica ocupacional local de técnicos das prefeituras, que se encar-
constitui fonte de informação relevante para prospec- regaram também de convidar representantes das
tar demandas futuras de qualificação profissional. instituições locais envolvidas ou interessadas na
temática da qualificação profissional. Dada a impos-
De fato, as tendências gerais apontadas pelos da- sibilidade de realizar esse tipo de levantamento em
dos estruturados foram corroboradas pelos prefei- um número muito amplo de municípios, pelo tempo
tos na sondagem: a maioria identificou os setores e complexidade operacional, foram estabelecidos
da construção civil, do comércio e da indústria critérios para seleção do conjunto de localidades
como os mais dinâmicos em termos ocupacionais que sediariam as oficinas – municípios com 100 mil
e o emprego agropecuário como o mais vulnerável ou mais habitantes, sedes de região de governo ou
em seus municípios. Para eles, o bom desempenho de relevância estratégica na microrregião. Segundo
tais critérios, selecionaram-se 89 locais.
do mercado de trabalho local seria decorrência da
implementação de novos empreendimentos e da As oficinas foram desenvolvidas em três etapas
ampliação das atividades urbanas. principais, seguindo um roteiro típico de um levan-
tamento de informações por grupo de discussão,
As Oficinas Técnicas de com a moderação realizada pela equipe do Cepam
Prospecção de Demandas
Na primeira etapa, desenvolvia-se uma dinâmica
Regionais de Qualificação
participativa para a construção de um “retrato do
município”, com a identificação dos setores da
As peças finais para encaixar no quebra-cabeça economia que mais empregam mão-de-obra, os
do diagnóstico do programa de qualificação pro- setores menos dinâmicos e as oportunidades de
fissional vieram das oficinas de levantamento de geração de trabalho no município. Para orientar
demandas de cursos em municípios-pólo no Estado. os trabalhos, inicialmente, a Sert apresentava as
Essa abordagem objetivou identificar demandas diretrizes do Programa Estadual de Qualificação.
de qualificação profissional a partir da visão dos Para subsidiar as discussões, a Fundação Seade
diferentes agentes locais envolvidos ou interessa- elaborou material específico, distribuído e apresen-
dos na questão, como a prefeitura, os postos ou tado no início das atividades. Esse material incluía
centros de intermediação de mão-de-obra, sindi- os Boletins Foco, já mencionados, um estudo do
catos de trabalhadores, sindicatos e associações mercado de trabalho do Estado de São Paulo e
suas regiões, baseado nos resultados da Pesquisa
patronais, instituições de educação profissional,
de Condições de Vida de 2006 da Fundação Sea-
entidades locais vinculadas ao Sistema S (Sebrae,
de, e, complementando os estudos anteriores, um
Sesc, Senai etc.), organizações representativas da
conjunto de tabelas sobre a estrutura e conjuntura
sociedade civil local e, naturalmente, a Comissão
recente do emprego formal e principais ocupações
Municipal de Emprego. Pelas atividades que exe-
do município onde se realizava a oficina, elaboradas
cutam, experiência na oferta de cursos e vivência com base nos registros oficiais do Ministério do
cotidiana no município, esperava-se que esses Trabalho e Emprego (Rais e Caged).
agentes trouxessem subsídios importantes – como,
de fato, ocorreu – para complementar o diagnóstico Na segunda etapa, os participantes, divididos em
para o programa. grupos, eram convidados a propor e registrar em

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Comunicações de Pesquisas
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quadros os cursos de qualificação profissional sejável, ao tê-la como público preferencial, avaliar
necessários para o município, a partir do retrato a possibilidade de acoplar a esses cursos, além de
elaborado anteriormente. conhecimentos de habilidades específicas, a oferta
de noções básicas de português e aritmética, de
A última fase da oficina, realizada de forma coletiva, modo a suprir uma carência herdada do passado
constituía-se na escolha e priorização de até dez e aumentar suas chances de inserção produtiva.
cursos de qualificação, entre os propostos na dinâ-
mica de grupo anterior. Ao final, a equipe do Cepam Ainda que a efetividade de programas sociais de-
reunia o material elaborado pelos participantes para penda de um conjunto muito extenso e variado de
sistematização dos resultados. fatores e atores intervenientes, a disponibilidade de
diagnósticos “customizados” e específicos podem
Nas oficinas, a maioria dos participantes apontou que potencializar as chances de seu sucesso. Sem um
as ocupações em atividades tipicamente urbanas, diagnóstico abrangente acerca das características
associadas à construção civil, ao comércio e a alguns da mão-de-obra, das necessidades específicas de
ramos dos serviços – como alojamento e alimenta- qualificação profissional pelos Estados e municípios
ção – seriam aquelas com maiores perspectivas de e da capacidade institucional de implementação de
crescimento no futuro próximo. Em regiões mais ações dessa natureza pelos agentes envolvidos,
industrializadas, foram destacados os segmentos não é de estranhar que programas de qualificação
acabem por não revelar os impactos esperados e,
sucroalcooleiro, têxtil e de vestuário, de calçados e
pior, acabem por desacreditar a pertinência de um
metalmecânico como os mais promissores em termos
programa dessa natureza na agenda das Políticas
de geração de novos postos de trabalho. Além disso,
Públicas no país.
particularmente nas áreas de expansão da cultura ca-
navieira sobre atividades agropecuárias tradicionais È neste sentido que a experiência da produção do
e naquelas em que a mecanização da colheita tem diagnóstico do PEQ pela Fundação Seade, com
sido adotada, manifestou-se a preocupação com a múltiplas estratégias de levantamento e organiza-
redução da oferta de trabalho com baixos requisitos ção de informações é uma boa prática a ser reme-
de qualificação profissional e a necessidade de re- morada nessa oportunidade.
colocação e requalificação profissional dos trabalha-
dores atingidos por essas mudanças.
Referência

Considerações finais CARVALHO, S.N. Avaliação de programas sociais:


balanço das experiências e contribuição para o de-
O uso integrado das diversas informações produzi- bate. São Paulo em Perspectiva, São Paulo,17(3-4):
das permitiu a identificação de cerca de 170 cursos 185-197, 2003.
de qualificação – num universo de 900 possibilida-
BULHÕES, M.G.P. Plano Nacional de Qualificação
des –, dos quais foram apontados 40 prioritários.
do Trabalhador – Planfor: acertos, limites e desafios
Boa parte desses cursos relaciona-se com ocupa-
vistos do extremo sul. São Paulo em Perspectiva,
ções cujas exigências de qualificação profissional
São Paulo, 18(4):39-49, 2004.
são básicas e, por permitirem maior acesso à popu-
lação com baixa escolaridade, inclusive de origem WORTHERN,B.R. et al. Avaliação de programas:
rural, devem ser privilegiados. Ademais, diante da concepções e práticas. São Paulo, Edusp/Gente,
baixa escolaridade da população adulta, seria de- 2004.

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Projeto de pesquisa: Na primeira seção da pesquisa é proposta uma


“Leitura do Estado do Pará”, através de uma pers-
Lendo o Pará pectiva urbana, isto é, para visualizar e entender
como está disposta a atual infraestrutura urbana
do Estado, levando em consideração a dinâmica
produtiva, a disposição das cidades e os diversos
tipos de fluxos regionais e locais. Primeiramente,
Introdução realizou-se um resgate histórico-geográfico de
dois períodos importantes de produção do espaço
amazônico. São eles: a) o período de dinamização
Este resumo apresenta o projeto de pesquisa inti-
de fluxos (pessoas, mercadorias e informações)
tulado “Lendo o Pará”, em desenvolvimento pelo
principalmente através dos cursos fluviais (antes
Núcleo de Estudos Urbanos (NEURB) do Instituto
de Desenvolvimento Econômico, Social e Ambiental da década de 1960); e b) o período mais dinâmico
do Pará (IDESP). O principal objetivo do Lendo o de aproveitamento econômico e de modernização
Pará consiste em disseminar reflexões e informa- do território, com maior inserção de outros modais
ções sistematizadas sobre a atual infraestrutura de transporte, principalmente o rodoviário, para a
urbana do Estado do Pará e analisar as principais dinamização de fluxos regionais (depois da década
transformações ocorridas em seu espaço urbano, de 1960). Considera-se que o resgate histórico-
principalmente no período de 2000 a 2010, a fim de -geográfico constitui um procedimento indispensá-
contribuir para a implementação, gestão e monito- vel para o entendimento da atual organização do
ramento de políticas públicas no estado do Pará. espaço urbano do Estado do Pará, tendo em vista
que ele retoma importantes fatos e processos que
As informações serão apresentadas basicamente imprimiram suas marcas na atual configuração ur-
sob três enfoques: a) A produção, ao longo do bana estadual, levando em consideração, ademais,
tempo, do espaço urbano regional e paraense; como este historicamente se constituiu (foi produ-
b) Situação atual do Estado (riquezas, potencia-
zido) e se inseriu no contexto regional amazônico,
lidades, problemas); c) Desafios à ser superados
nacional e global.
(perspectivas para o desenvolvimento futuro). Ao
apresentar os dados e analisá-los, contribui-se para Após a contextualização histórica e geográfica, bus-
a implantação, gestão e monitoramento de políticas ca-se apresentar dados que apresentem a realidade
públicas no Estado do Pará, principalmente por mais recente do Estado do Pará, considerou-se im-
fornecer um conjunto de dados (histórico-geográ-
portante para isto à análise da última década (2000-
ficos, financeiros, populacionais, de infraestrutura
2010), onde se utiliza dados censitários do IBGE,
e de dinâmica produtiva), informações e reflexões,
além de indicadores de estudos mais recentes,
de maneira sistematizada e atualizada, acerca da
para complementação do quadro atual do estado.
dinâmica urbana do Estado do Pará, o que possibi-
Nesta seção do trabalho, foram definidos eixos de
litará lê-lo, de maneira geral, através de um enfoque
estudos: demografia, dinâmica econômica e pro-
eminentemente urbano.
dutiva, infraestrutura urbana, investimentos, cultura
O Lendo o Pará está estruturado em duas partes: e turismo e dimensão ambiental. A sistematização
Parte I – O Estado do Pará a partir de uma análise dessas temáticas é pertinente para compreensão
urbana: Aspectos Gerais; e Parte II - As Regiões de de um conjunto de aspectos (sociais, econômicos,
Integração do Estado do Pará. culturais e ambientais) sobre o estado.

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Comunicações de Pesquisas
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Na segunda seção adotou-se o recorte territorial Destaca-se, então, que na Amazônia brasileira os
das doze regiões de integração do Estado do Pará primeiros aglomerados populacionais, embriões
(RI), criadas a partir da regionalização feita pelo dos atuais núcleos urbanos, surgiram ao longo
governo estadual, através do decreto nº 1.066 dos rios, principalmente pela importância estraté-
de 19 de junho de 20081, com vistas a agrupar e gica que estes desempenhavam na defesa contra
representar municípios com semelhanças de ocu- invasores e para a circulação de fluxos regionais
pação, de nível social e de dinamismo econômico, (pessoas e mercadorias) (TRINDADE JR.; SILVA;
e cujos espaços mantém integração entre si, física AMARAL, 2008).
e economicamente. O Objetivo da segunda seção
é aprofundar a análise iniciada na primeira seção. Assim, o início do povoamento da Amazônia, a ex-
Busca-se, então, construir uma caracterização geral ploração das “drogas do sertão” e, posteriormente,
para cada RI, sistematizando-se informações consi- a agricultura comercial ou mesmo o ciclo econô-
deradas relevantes para compreender sua dinâmica mico extrativista da borracha, foram expressões
urbana e participação econômica no estado. Assim, socioeconômicas que fizeram surgir aglomerações,
identificam-se as especificidades de cada RI e o vilas, cidades e toda uma ligação/interação socio-
papel que seus municípios exercem em uma escala econômica ao longo dos cursos fluviais (CORRÊA,
regional, aponta-se potenciais e desafios que seus 1987; TRINDADE JR., 2008).
municípios possuem.
É por conta dessa dinâmica produtiva e pela articu-
O Lendo o Pará apresenta conteúdo relevante e lação existente entre cidades, que se desenvolvia
atual para o estudo da dinâmica urbana do Estado notadamente através de cursos fluviais que, segun-
do Pará. O principal produto resultante da pesquisa do Corrêa (1987), configurou-se uma rede urbana
será um fascículo, pensado em contribuir para a do tipo dendrítica na Amazônia, isto é, uma rede
gestão de cidades, oferecendo material informativo marcada pela posição proeminente da cidade de
e de apoio para elaboração de políticas urbanas. Belém, no Estado do Pará, assim como por uma
circulação, articulação e dispersão de núcleos ur-
banos e aglomerados populacionais principalmente
JUSTIFICATIVA ao longo dos rios.

A produção do espaço urbano regional, que se deu Por outro lado, após a década de 1960 intensifica-se
em sentido amplo (produção econômica, política o processo de incorporação da Amazônia brasileira
e simbólico-cultural), remonta principalmente ao à economia nacional e global. É um momento que
período de início da colonização européia na Ama- se destaca pela presença de uma racionalidade
zônia e estende-se até os diais atuais, nos quais capitalista perpetuada pelo Estado Nacional, que
se intensifica a modernização e o aproveitamento passa a organizar o território em função de inte-
capitalista do território amazônico e paraense. resses nacionais (geração de energia, exploração
mineral e madeireira, projetos de colonização etc.)
em meio tanto de estratégias geopolíticas de ocu-
pação humana com vistas a garantir o domínio da
1 Foram instituídas 12 Regiões de Integração para o Estado do Pará, com Amazônia (CARDOSO; LIMA, 2006), quanto por
seus respectivos pólos. São elas: região metropolitana (Belém); região
Guamá (Castanhal); região Rio Caeté (Capanema); região Araguaia meio da realização de parcerias entre o Estado
(Redenção); região Carajás (Marabá); região Tocantins (Abaetetuba);
região Baixo Amazonas (Santarém); região Lago de Tucuruí (Tucuruí); desenvolvimentista e as grandes empresas, que
região Rio Capim (Paragominas); região Xingu (Altamira); região Marajó
(Soure); e região Tapajós (Itaituba).
tiveram como resultado, notadamente, a criação

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de toda a sorte de infraestrutura necessária para METODOLOGIA


que os grandes grupos econômicos nacionais e
internacionais desenvolvessem as suas atividades
O ponto de partida metodológico adotado se
e/ou empreendimentos, sejam eles agropecuários,
fundamentou em três vertentes de análises. A pri-
minerais, energéticos ou industriais (CORRÊA,
meira consiste no resgate histórico-geográfico de
1987; ROCHA, 2008).
dois períodos importantes da produção do espaço
É em face desse contexto que se dá, na Amazô- urbano amazônico, quais sejam: o período corres-
nia brasileira, a complexificação de sua rede de pondente a década de 1960, quando a dinamização
cidades e a modernização territorial através dos dos fluxos de pessoas, mercadorias e serviços se
perfazia prediminantemente por cursos fluviais
“novos objetos” inseridos na região, quais sejam:
(padrão dendrítico da rede urbana), e o período
as plantas industriais, o novo sistema de circulação,
pós década de 1960, marcado pela introdução de
estabelecido pelas rodovias e ferrovias; as redes de
outros modais de transporte e por outras lógicas de
telecomunicações; os novos sistemas portuários; a
produção social do espaço urbano na Amazônia,
expansão da rede de energia elétrica, apoiadas na
com destaque para o modal rodoviário.
instalação de hidrelétricas; a presença de grandes
projetos econômicos e de infraestrutura, e igual- A segunda vertente metodológica adotada foi a
mente, as suas modernas cidades (TRINDADE JR., análise da dinâmica econômica e produtiva recente
2010a).Tais elementos contribuem para a difusão do no estado do Pará. Tomando como referência os
urbano na Amazônia, assim como são responsáveis dados do Produto Interno Bruto (PIB) e do Valor
pela mudança na dinâmica urbana paraense, pelo Adicionado (VA), ambos calculados pelo IBGE em
aparecimento de novos municípios, pela chegada parceria com a SEPOF/IDESP (2000-2010). A partir
de novos e mais capitalizados agentes/grupos e desses dados é possível identificar se houve mu-
por alterações na infraestrutura, nos perfis e nos danças significativas na composição do potencial
níveis diferenciados de cidades (pequenas, médias produtivo do estado do Pará na década. A espa-
e metrópoles). cialização dos dados do PIB estadual no período
em questão permitiu que se observassem onde as
Neste sentido, se faz importante entender como
atividades econômicas estavam localizadas, ou
está disposta a atual infraestrutura urbana existente
seja, quais municípios paraenses concentraram a
no Estado do Pará, bem como apreender e mapear
maior participação no total do PIB estadual.
os diversos tipos de fluxos (econômicos, sociais e
culturais) dinamizados por esta infraestrutura no Por conseguinte, foi realizada uma análise sobre a
período recente. Adotando-se o recorte temporal de atual situação da infraestrutura estadual paraense,
2000 até 2010, para analisar a dinâmica socioeco- em termos de infraestrutura viária (rodovias federais
nômica mais atual do estado. Assim, espera-se que e estaduais), ferroviária, fluvial e aeroviária. O Pro-
o estudo proposto, seja uma forma de contribuição grama Estadual de Logística e Transporte do Estado
no avanço de pesquisas sobre dinâmica urbana do Pará (PELT), elaborado pela Secretaria de Es-
anteriores, dando prosseguimento na reflexão, tado de Transportes (SETRAN) em 2010, serviu de
de forma mais aprofundada, em relação às novas base de informação para a análise da infraestrutura
mudanças da rede urbana e organização territorial viária do estado do Pará, destacando os seguintes
encontradas no estado. Além de fornecer subsídio aspectos: rede rodoviária existente e planejada em
para políticas urbanas, setoriais e territoriais. km; estado de conservação das rodovias existentes;

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as rodovias federais e estaduais e rede ferroviária cação Básica (IDEB) para os anos de 2000 e 2010.
no estado. Por sua vez, os serviços e equipamentos de saúde
foram analisados com base no banco de dados
No que se refere à infraestrutura fluvial do Estado do do DATASUS (2011), tomando como referência o
Pará, este fascículo dedicou uma análise mais apro- número de hospitais existentes e a quantidade de
fundada sobre esta questão, dada a importância leitos hospitalares por 1000 habitantes.
que este modal de transporte historicamente exerce
na compreensão da dinâmica urbana na Amazônia. Os principais investimentos em infraestrutura foram
Construiu-se um mapa da atual estrutura portuária esquematizados com o intuito de demonstrar as
do estado do Pará administrada pela Companhia principais intervenções dos governos estadual e
Docas do Pará (CDP, 2013). Esta espacialização federal nas questões relacionadas à infraestrutura
mostrou onde estão localizados os principais e viária, ferroviária e hidroviária, além dos principais
mais dinâmicos portos paraense. Em seguida, por empreendimentos hidrelétricos implantados ou em
meio de um estudo realizado em 2012 pela Agência construção no Estado do Pará. Os investimentos
Nacional de Transporte Aquaviário (ANTAQ), foi previstos para o eixo rodoviário, os Projetos logísti-
possível analisar as seguintes variáveis: Demanda cos hidroviários e hidroelétricos e os melhoramentos
e oferta de passageiros e cargas; Os principais por- da infraestrutura portuária estão previstos no Plano
tos/terminais; Linhas e embarcações existentes na Estadual de Logística e Transporte (PELT), produzido
Amazônia; Perfil socioeconômico dos passageiros pela Secretaria de Estado de Transporte do Pará
que circulam na região. (SETRAN-PA) e a serem executados no horizonte de
tempo de 2011-2015. As intervenções do Governo
Os dados referentes à infraestrutura dos terminais, Federal no Pará estão acopladas no Programa Ace-
rampas e trapiches de pequeno porte foram coleta- leração do Crescimento (PAC) com obras previstas
dos diretamente da Companhia de Portos e Hidro- no 7º Balanço do PAC (Janeiro a Abril de 2013) e
vias do Estado do Pará (CPH), para o ano de 2012. classificadas de acordo com os seguintes eixos do
Por fim, por meio de dados coletados da Infraero programa: Eixo Infraestrutura Rodoviário (ações na
(2010) foi analisada a atual situação da infraestru- área de infraestrutura viária); Eixo Cidade Melhor (in-
tura aérea existente no Estado do Pará e, também, tervenções nas áreas de saneamento, prevenção em
a movimentação operacional da rede Infraero no áreas de riscos, pavimentação e mobilidade urbana);
Estado no período de janeiro a dezembro de 2010, Eixo Água e Luz para Todos (água em áreas urbanas
destacando-se: A movimentação operacional das e Luz para Todos); Eixo Urbanização em Assenta-
aeronaves em voos domésticos e internacional nos mentos precários (implementação de infraestrutura
aeroportos de Belém, Carajás, Altamira, Marabá e urbana e produção de unidades habitacionais).
Santarém; e a movimentação de passageiros em
voos domésticos e internacional nos aeroportos Ressalta-se que as intervenções do Governo Fe-
descritos no tópico anterior. deral na área da habitação (produção de novas
unidades habitacionais) também estão previstas
Outro aspecto importante foi o mapeamento dos no Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV),
equipamentos de educação e saúde no Estado do de acordo com os dados referentes a 2009-2011
Pará. A distribuição espacial dos estabelecimentos da Caixa Econômica Federal (CEF) para o estado
de ensino (fundamental, médio, técnico e superior) do Pará e seus 143 municípios. Este programa está
existentes no estado foi mapeada de acordo com sedimentado em três faixas de rendas: Faixa 1 (0 a
os dados do Índice de Desenvolvimento da Edu- 3 S.M), Faixa 2 (3 a 6 S.M) e a Faixa 3 (6 a 10 S.M).

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A cultura, o turismo e o meio ambiente foram os três econômica e social do Estado do Pará. Utilizando-
últimos aspectos abordados nesta segunda ver- -se o recorte territorial das Regiões de Integração,
tente de análise da dinâmica urbana no estado do caracterizou-se de forma minuciosa cada região
Pará. Na seção Cultura do Pará, o principal foco de e seus respectivos municípios, por meio de uma
análise consistiu na busca das principais formas de associação e sistematização de um conjunto de
expressão da cultura do Estado manifestadas atra- variáveis e indicadores listados a seguir:
vés do seu patrimônio cultural, as festas religiosas,
os monumentos, conjuntos arquitetônicos e bens É proposta a elaboração dos mapas de fluxos que
materiais tombados pelo Instituto do Patrimônio representam a centralidade dos centros urbanos
Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e Secretaria situados no estado do Pará, a partir de um recorte
de Estado de Cultura (SECULT). territorial centrado nas 12 Regiões de Integração
paraenses, teve por base o estudo Região de
Os locais com potencial turístico foram definidos Influência das Cidades (REGIC, 2008). O atual es-
pela Secretaria de Turismo do Pará (SETUR-PA) tudo das Regiões de influência das Cidades, que
por meio de uma análise de inventários realizados periodicamente é atualizado, retoma a concepção
em diversas cidades do estado, destacando os utilizada nos primeiros estudos realizados pelo
principais atrativos naturais, culturais, históricos e IBGE (1972), que resultaram na Divisão do Brasil
manifestações folclóricas desenvolvidas. O Plano em regiões funcionais urbanas. Assim, estabelece
de Desenvolvimento Turístico do estado do Pará inicialmente uma classificação dos centros, delimi-
chamado “Plano Ver o Pará” (2010) foi o ponto de tando, num momento posterior, as suas áreas de
partida para se analisar o setor de turismo no Estado atuação (REGIC, 2008).
do Pará. Este plano definiu seis polos turísticos no
Busca-se discutir em cada região de integração os
Pará, a saber: Polo Belém; Polo Amazônia Atlân-
aspectos do processo de deslocamentos pendu-
tica; Polo Tapajós; Polo Marajó; Polo Xingu; Polo
lares estabelecidos entre os municípios do estado
Araguaia-Tocantins.
do Pará por motivos de trabalho e/ou estudos,
Na seção “O meio ambiente e a dinâmica urbana tendo como base de dados a pesquisa “Reflexões
no estado do Pará” foram apresentados alguns sobre os Deslocamentos Populacionais no Brasil2”
aspectos ambientais, mais precisamente aqueles produzido pelo IBGE (2010). Os fluxos de desloca-
relacionados à dinâmica urbana do estado, tais mento em função de trabalho e estudo podem ser
como: desmatamento acumulado, áreas especiais empregados como parâmetros de identificação de
(unidades de conservação, de uso sustentável e de centralidades, os dados são interessantes tanto por
proteção integral, terras indígenas e quilombolas reforçar o papel dos polos regionais, assim como,
etc.) e alguns tipos de desastres ambientais com também oferecem subsídio para o confronto de mu-
maiores impactos na dinâmica da rede de cida- nicípios que oficialmente possuem papel de polos,
des. Essas informações foram retiradas tanto do porém não exercem centralidade expressiva na RI.
estudo “(Di)visões territoriais, perspectivas sociais,
econômicas, financeiras e ambientais”, realizado
pelo IDESP em 2011, quando do Atlas Brasileiro de 2 O objetivo desta pesquisa foi elaborar um estudo sobre as mais distin-
tas dimensões da mobilidade populacional no Brasil, abrangendo as
Desastres Naturais (2011). migrações internas e externas e os movimentos pendulares. Segundo
o IBGE (2010), a discussão dos movimentos pendulares pode está as-
sociada à expansão da metrópole e a sua área de influencia em relação
A terceira vertente metodológica adotada se re- à centralidade do mercado de trabalho aonde a mobilidade cotidiana é
mais ampla, e também, aos deslocamentos realizados em função dos
fere à análise mais específica da dinâmica urbana, estudos.

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Comunicações de Pesquisas
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

Aspectos Variáveis, indicadores e fontes consultadas

Aspectos
População total e urbana, taxa de urbanização, área em km, densidade demográfica e migração.
demográficos

Análise do comportamento do PIB municipal e do Valor Adicionado das atividades da Agropecuária, Indústria e Serviços
tipo de rebanho predominante (IBGE – Pesquisa Pecuária Municipal de 2010); produção agrícola municipal (IBGE – Pes-
quisa Produção Agrícola Municipal de 2010, destacando as maiores produções nas lavouras temporárias e permanentes
Aspectos
em cada RIs); tipo de produto extrativo (alimentícios e produção vegetal) extraídos da Pesquisa Produção da Extração
econômicos
Vegetal e da Silvicultura do IBGE (2010); número de empresas e outras organizações atuando nas seguintes atividades
econômicas: agricultura e pecuária, indústria, comércio e serviços (IBGE – Cadastro Central de Empresas – 2010); Valor
Adicionado Fiscal das atividades de industriais, comércio e serviços (Secretaria de Estado da Fazenda – SEFA/PA, 2010).

Dados do deslocamento pendular trabalho/estudo retirados da Pesquisa “Reflexões sobre os deslocamentos popula-
cionais no Brasil”, publicada pelo IBGE (2010). Os quesitos que investigam o deslocamento por motivo de estudo levam
em consideração a distribuição dos estudantes que se deslocam entre os municípios do Estado do Pará (deslocamento
intermunicipal) e Unidades da Federação (deslocamentos interestaduais), sem, no entanto, saber a periodicidade do
movimento. Foi possível, também, identificar quais cursos (Fundamental, Médio, Superior de Graduação, Curso de
Aspectos Especialização e Pós-graduação) que foram decisivos para a população se deslocar do seu lugar de origem para estudar
funcionais em outro município e/ou unidades da federação. Com a base de dados pronta e disposta em uma planilha Excel 2007
e com o auxílio de uma tabela dinâmica, o passo seguinte foi filtrar os dados para os municípios de origem (saídas de
pessoas) e municípios destinos (entrada de pessoas). A listagem das atividades econômicas classificadas pela CNAE 2.0
e os principais cursos de educação foram cruzados com os dados de deslocamento origem-destino. O total de entrada
e saída de pessoas de cada um dos 143 municípios do Pará foi somado para se obter o total de pessoas que realizaram
deslocamento pendular em função dos estudos e do trabalho em 2010.

Aplicação da ferramenta estatística Distribuição de Frequência de dados para identificar a intensidade das ligações
existentes entre os chamados Centros de Gestão do Território e os demais centros classificados pelo IBGE através da
Pesquisa Regiões de Influencias das Cidades (REGIC, 2007). Após a identificação dos Centros de gestão do território, a
Regiões de referida pesquisa delineou as áreas de influencias destes Centros, tomando como base a intensidade das ligações entre
influência das as cidades. Esta intensidade foi obtida por meio da aplicação de um questionário pelo IBGE para identificar as Redes de
cidades Influencias das Cidades, considerando as seguintes variáveis: principais ligações de transportes regulares (em particular
as que se dirigem aos centros de gestão) e os principais destinos dos moradores dos municípios pesquisados para obter
produtos e serviços tais como: compra em geral, educação superior, aeroportos, serviços de saúde, bem como os fluxos
para a aquisição de insumos e o destino dos produtos agropecuários.

Critério de
De forma geral, este critério foi estabelecido pelo estudo Regiões de Influência das Cidades (REGIC), elaborado pelo IBGE
Centralidade
em 2010. Este classifica e hierarquiza os centros urbanos da rede urbana do Brasil, identificando, assim, seus principais
para os centros
tipos de centros urbanos. O estudo da REGIC, cujos dados embasaram boa parte da análise da dinâmica de fluxos e/ou
urbanos no
vinculações existentes entre os centros urbanos paraenses.
estado do Pará

Quadro 1
Variáveis e indicadores utilizados na pesquisa

Resultados preliminares corresponde a 31,5%. Observa-se que nos últimos


dez anos o crescimento populacional em áreas
urbanas é maior do que a rural. Neste sentido, des-
O Estado do Pará apresentava, em 2010, 7.581.051 taca-se no período estudado o crescimento urbano
habitantes e densidade demográfica de 6,08 hab./ de cidades médias e pequenas, as quais também
km². Atualmente, a maior parte de sua população tem se destacado economicamente. Nota-se na
do estado mora em áreas urbanas, representando economia que a atividade industrial apresentou um
68,5% dos habitantes, enquanto a população rural significativo aumento em relação ao ano de 2000.

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Comunicações de Pesquisas
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

No ano de 2010, os municípios que mais se des- públicos, PIB elevado para os padrões paraenses,
tacaram foram: Parauapebas, Belém, Tucuruí, Bar- sendo dinamizada por atividades relacionadas à
carena, Canaã dos Carajás, Marabá, Ananindeua, agropecuária, principalmente pela extração mineral
Oriximiná, Paragominas e Juruti. Observa-se que a e criação de bovinos (pecuária de corte e produção
maioria está ligada a extração mineral. leiteira) (IDESP, 2011).

Os municípios que apresentaram maiores taxas Apesar das cidades médias e pequenas possuírem
de crescimento populacional foram aqueles cujas o maior crescimento populacional, é importante
sedes são de pequeno porte, localizadas em geral frisar a importância que a Região Metropolitana
fora do eixo metropolitano, isto demonstra que há ainda exerce influência na dinâmica estadual, apre-
um movimento de desconcentração urbana em sentando os maiores contingentes populacionais.
relação à metrópole (PINHEIRO et al, 2010, 2011) Belém possui uma forte concentração de atividades
e, por outro lado, ocorre a estruturação de outros administrativas, equipamentos e serviços exercendo
núcleos urbanos, tornando a rede urbana paraen- uma polarização que alcança outros estados como
se mais diversificada, hierarquizada e complexa. Amapá, Maranhão e Tocantins (REGIC, 2008).
O crescimento de cidades médias e pequenas do
Pará é observado desde a década de 1970, período Na segunda seção da pesquisa, Lendo o Pará atra-
de explosão demográfica no estado, resultante das vés das Regiões de Integração, chegou-se a um nível
transformações geradas pela política desenvolvi- detalhado de análise de cada RI do estado. Através
mentista que inseriu grandes empreendimentos na da pesquisa histórica e geográfica foi possível anali-
região (PINHEIRO et al, 2010, 2011). Desde o período sar a ocupação territorial de cada RI e compreender
assinalado, ocorre crescimento populacional no a sua formação socioeconômica e cultural. Neste
estado, já que novas cidades foram criadas através sentido, foi possível reconhecer as transformações
de colonização dirigida pelo estado; company towns no espaço em diferentes períodos históricos, sendo
criadas para apoiar grandes projetos e as que se for- possível uma melhor leitura da configuração atual
maram influenciadas pelas atividades dos grandes da RI. As variáveis e indicadores adotados para
projetos ou a partir de entroncamentos comerciais. a análise, colaboraram para a sistematização de
informações sobre cada município, sendo possível
No período entre 2000 e 2010, observa-se que identificar, deste modo, o papel de cada município
o crescimento populacional é maior no Sudeste em relação a sua RI e na escala estadual.
paraense, essa região foi favorecida com a criação
de rodovias (PA-150, PA-279, BR-422 e BR-222), Destaca-se a elaboração de ilustrações e mapas
e instalação de empreendimentos como a Usina analíticos nesta seção do trabalho. A proposta de
Hidrelétrica de Tucuruí, Projeto Ferro Carajás e criar imagens ilustrativas que seriam auto-explicati-
polos agropecuários, ocorrendo uma reorganiza- vas e didáticas colaborou para uma caracterização
ção produtiva do território. Grandes contingentes geral da RI e espacialização de sua dinâmica econô-
migratórios foram atraídos principalmente para mica. A figura destinada a caracterização geral da
Marabá e Tucuruí, que sofreram maiores transfor- RI foi construída a partir da base cartográfica oficial
mações em seu espaço, e ao longo das décadas do estado, onde pode ser visualizada a delimitação
geraram outras cidades como Parauapebas, Canaã territorial de seus municípios integrantes. As infor-
dos Carajás, Eldorado dos Carajás, Curionópolis mações inseridas na cartografia seguiram três eixos:
entre outras (COELHO et al, 2005). Atualmente, 1) A infraestrutura de transporte; 2) A distribuição de
a região destaca-se ao apresentar investimentos equipamentos públicos, considerados relevantes,

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Comunicações de Pesquisas
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

conforme as variáveis de pesquisa adotadas (Ban- com a cidade, apresentando maiores fluxos de
cos, estabelecimentos educacionais e de saúde); deslocamento. É chamada atenção para o fluxo
e 3) Aspectos culturais através da exposição das presente entre Belém e Barcarena, o qual se apre-
principais manifestações culturais e da presença sentou superior a de cidades integrantes da RMB
de patrimônio histórico e cultural tombado. em algumas situações.

A ilustração destinada a dinâmica econômica da A concentração de equipamentos e serviços en-


RI, agrega as principais atividades econômicas e contrados em Belém, e maiores oportunidades de
bens produzidos por município, sendo possível uma trabalho, emprego e renda fazem com que a cidade
relação entre logística e economia do estado, pela receba um fluxo de pessoas tanto dos municípios
presença da infraestrutura de transportes nessas integrantes da RMB, como de outras regiões de in-
imagens. Desta forma, a ilustração torna-se impor- tegração como a Região do Guamá, Tocantins e Rio
tante para a análise pela espacialização da distri- Caeté. Em relação ao fluxo de educação, Belém é o
buição das atividades econômicas por município e principal destino na Região Metropolitana. Observa-
pela possibilidade de se fazer uma leitura sobre a -se a entrada de pessoas das regiões do Guamá,
caracterização econômica da RI. Tocantins, Rio Caeté, Rio Capim, Carajás, Marajó e
Lago de Tucuruí. Estas buscam o acesso principal-
Em cada RI, alcançou-se o mapeamento de fluxos mente ao ensino médio e superior, sobretudo, oferta
do deslocamento de pessoas em função de estudos de cursos de graduação e pós-graduação, muitas
e trabalho e a identificação de centralidades. Sendo vezes, apenas encontrados na capital.
uma informação considerada importante para ana-
lisar como se constitui a rede urbana no estado e o
estudo de seu dinamismo, podendo ser empregada
REFERêNCIAS
para estudos futuros. O estudo dos fluxos por RI
tornou-se uma ferramenta de pesquisa importan- COELHO, Maria Célia; MONTEIRO, Maurílio; LO-
te, ao reforçar centralidades já reconhecidas pelo PES, Adaise; LIRA, Sergio. Regiões do entorno dos
poder público e pesquisas anteriores, e também projetos de extração e transformação mineral na
por apresentar dados que confrontam o REGIC e Amazônia Oriental. Novos Cadernos NAEA, v. 8, n.
a própria regionalização proposta pelo governo 2, p. 73-107, dez. 2005.
estadual, quando se observa, por exemplo, muni-
CORRÊA, R. L. A periodização da rede urbana da
cípios que interagem mais com a região vizinha, ou
Amazônia. Revista Brasileira de Geografia. Rio de
sobre municípios que sobre a definição de polos
Janeiro, v.49, n.3, p.39-68, jul./set. 1987.
regionais, os quais nem sempre necessariamente
apresentaram expressividade nos estudos de fluxos.
IBGE. Regiões de Influência das Cidades (REGIC)
2007, Rio de Janeiro. 2008.
Observa-se que o movimento de pessoas entre os
municípios da Região Metropolitana é significativo, IDESP. Estado do Pará: (di)visões territoriais, pers-
sobretudo em função do trabalho. Os dados de pectivas sociais, econômicas, financeiras e ambien-
deslocamentos reforçam os dados do estudo da tais. Belém: IDESP, 2011.
REGIC (2008), demonstrando a centralidade que
Belém exerce entre os municípios da RMB, como ROCHA, G. M. Todos convergem para o lago! Hidre-
também outros municípios do estado. Ananindeua, létrica de Tucuruí: municípios e territórios na Amazô-
Marituba e Benevides são os que mais interagem nia. Belém: NUMA/UFPA, 2008.

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Comunicações de Pesquisas
B ole t im E st at íst ic as Públic as • n. 9/ 10 • Sa lva dor, ju l ho 2014

PINHEIRO, A, PENA,H, AMARAL,M, HERREROS, TRINDADE JR., S. C.; AMARAL, M. D. B.; SILVA, M.
M. Formação e Transformações recentes da rede A. P. Das “janelas” às “portas” para os rios: com-
urbana da Amazônia: o caso do estado do Pará. In: preendendo as cidades ribeirinhas na Amazônia. In:
Infraestrutura social e urbana no Brasil: subsídios TRINDADE JR., S. C.;
para uma agenda de pesquisa e formulação de
políticas públicas / Instituto de Pesquisa Econômica TAVARES, M. G. (Orgs.). Cidades ribeirinhas na
Aplicada. – Brasília : Ipea, 2010. v. 2 (912 p.) pp: 715- Amazônia: mudanças e permanências. Belém: EDU-
746: gráfs., mapas, tabs. (Série Eixos Estratégicos FPA, 2008. p. 27-47.
do Desenvolvimento Brasileiro; Infraestrutura Eco-
TRINDADE JR. S. C. A cidade e o rio na Amazônia:
nômica, Social e Urbana; Livro 6).
mudanças e permanências face às transformações
PINHEIRO, A; PENA, H, BRITO, M; AMARAL, M; sub-regionais. Projeto de pesquisa submetido ao
HERREROS, G. Dinâmica urbana do estado do Pará Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
(2000-2008). In: Dinâmica urbano-regional: rede Tecnológico – CNPq. Belém, 2008.
urbana e suas interfaces / organizadores: Rafael
_________. Cidades na floresta: os “grandes ob-
Henrique Moraes Pereira, Bernardo Alves Furtado –
jetos” como expressões do meio técnico-científico
Brasília: Ipea, 2011.
informacional no espaço amazônico. Revista do
SETRAN (Secretaria de Estado de Transportes). Pla- Instituto de Estudos Brasileiros, São Paulo, Instituto
no estadual de logística e transportes - PELT. Belém, de Estudos Brasileiros, n. 51, p. 113-137, mar./set.
Pará: SETRAN, 2010. 2010a.

127
Anexos
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Comunicações de Pesquisas
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Repercussões Todo esse processo de intensificação da integração


econômica fez com que diferentes países, e as em-
dos projetos presas neles localizadas, percebessem que suas
economias estão inseridas numa cadeia de relações
estruturantes sobre de extensão geográfica global. Isto implica que

o desenvolvimento inserir-se de modo competitivo nessa nova dinâmica


econômica e espacial requer importantes investi-
socioeconômico da mentos em elementos de infraestrutura logística.
Têm-se a perspectiva de que grandes projetos e
Bahia investimentos em infraestrutura de transportes pos-
sam vir a reorientar a dinâmica do desenvolvimento
socioeconômico de distintas regiões. Nesse con-
Edgard Ramos Porto texto, ganharam relevância estratégica os sistemas
Edmundo Figueiroa multimodais de transportes mais eficientes, o que
Ilce Maria Marques de Carvalho significa adequação às características dos fluxos
de mercadorias mais importantes, confiabilidade,
custos competitivos e gestão capaz de adaptar-se
Introdução à dinâmica econômica mundial.

Grandes obras de infraestrutura, especialmente


Nesta primeira década do século XXI, a aceleração associadas a tais sistemas de transportes, têm sido
do processo de globalização e a nova configuração um dos meios pelos quais a política econômica
do comércio internacional tornaram visíveis novos pretende influenciar o crescimento das regiões,
espaços e atores no cenário econômico. Nesse constituindo quase que o ponto de partida clás-
novo ambiente competitivo internacional, distintas sico das intervenções governamentais em prol do
regiões inserem-se de modo diferenciado, com des- desenvolvimento. Nesse sentido, diversos estudos
taque para quatro regiões principais: Ásia, Europa, têm enfatizado o papel dos gastos em infraestrutu-
América do Norte e América do Sul. ra como variável determinante para o crescimento
econômico, destacando especialmente as relações
Os países asiáticos, com destaque para a China, existentes entre investimentos públicos e aumento
buscam atrair grande parte das unidades industriais da produtividade e competitividade, particularmente
e expandir seus sistemas multimodais de trans- os investimentos em infraestrutura de transportes.
portes para reforçar seus fluxos internacionais de
circulação de mercadorias. Os países desenvolvi- Segundo Haddad (2006), a expansão e as melho-
dos, da Europa e América do Norte, mesmo em um rias nos sistemas de transportes representam um
contexto de crise econômica, tendem a absorver meio importante para a promoção do crescimento
os serviços tecnologicamente mais avançados e econômico regional e nacional, pois propiciam a
adaptar seus já estruturados sistemas logísticos de redução nos custos das firmas, possibilitando a
modo a torná-los ainda mais eficientes. Já os países expansão das oportunidades econômicas, com
sulamericanos, especialmente o Brasil, tentam ade- reflexos positivos sobre a renda e o padrão de vida
quar-se a essa nova realidade e colocam-se como dos habitantes de uma determinada região. Além
importantes centros de produção de commodities disso, conforme ressaltado pelo mesmo autor, deve-
agrícolas e minerais. (PORTO et al, 2012) -se levar em consideração os impactos espaciais

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Comunicações de Pesquisas
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decorrentes dos investimentos em infraestrutura tos em infraestrutura de transportes considerados


de transportes, pois intervenções espacialmente prioritários e estruturantes para o desenvolvimento
localizadas podem ter a capacidade de aumentar as socioeconômico estadual – sejam estes restritos
vantagens competitivas de uma determinada região. às fronteiras do Estado ou no contexto da região
Nordeste do país – com destaque para as principais
Neste ponto, reside uma das questões cruciais repercussões socioeconômicas esperadas a partir
para a avaliação dos impactos de uma determinada da implantação e operação de tais investimentos.
política de transportes: a correlação espacial entre Em síntese, a peculiaridade desse estudo está em
distintas regiões. Ao levarem-se em consideração busacar a identificação das repercussões (eco-
as relações de complementaridade e competição nômicas, sociais e especiais) que ocorrerão no
entre diferentes espaços econômicos, as mudanças futuro (no médio e longo prazo), em decorrência
ocorridas em uma determinada localidade podem da implementação, também no futuro, de novos
resultar em potenciais efeitos – positivos e/ou ne- investimentos estruturantes em infraestrutura de
gativos – sobre outras regiões. transportes.

Além disso, sempre que o tema do desenvolvimento A análise terá como foco as perspectivas de trans-
econômico é tratado, uma importante ressalva deve formação na dinâmica socioeconômica a partir
ser feita: o impacto do crescimento econômico das repercussões econômicas, sociais e espaciais
depende do modo como seus resultados são esperadas, no médio e longo prazo, com a futura
aproveitados. Sendo assim, entre a diversidade de execução dos novos investimentos em infraestrutura
novos espaços e atores nesse ambiente econômico de transportes – considerados prioritários e estrutu-
em constante mutação, chamam atenção aquelas rantes – dentro do rol dos projetos e investimentos
regiões que apresentam os mais baixos indicadores previstos pelo governo federal e estadual, tais como
socioeconômicos. no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC 1 e
2), no Programa de Investimentos em Logística do
Observa-se ainda, que, em um contexto de interde-
Governo Federal e na proposta dos Eixos Logísticos
pendência e concorrência entre empresas, países
para o Desenvolvimento do Nordeste anunciada
e regiões, são imprescindíveis profundas modifica-
pelo Conselho Nacional dos Secretários Estaduais
ções no planejamento público e privado, exigindo
do Planejamento (CONSEPLAN).
uma leitura integrada e profunda dos fatores que
impulsionam ou impossibilitam o desenvolvimento Desse modo, conforme será apresentado nesse es-
regional. Novos investimentos, espaços, atores e tudo, busca-se responder às seguintes perguntas:
dinâmicas de desenvolvimento suscitam novos
critérios e instrumentos de estudo para a solução • Dados os novos investimentos estruturantes em
de velhos e novos problemas. infraestrutura de transportes previstos para o
Estado da Bahia – e em seu contexto dentro da
Dado que a nova dinâmica da economia mundial região Nordeste do Brasil – quais repercussões
requer importantes investimentos em elementos de econômicas, sociais e espaciais podem ser
infraestrutura logística, busca-se, através do desen- esperadas no médio e longo prazo?
volvimento do estudo das REPERCUSSÕES DOS
INVESTIMENTOS ESTRUTURANTES SOBRE O • Diante deste cenário vislumbrado, como isso
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DO ESTADO repercutirá sobre o desenvolvimento socioeco-
DA BAHIA, analisar os novos investimentos propos- nômico estadual e no contexto regional?

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Comunicações de Pesquisas
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Justificativa respectivamente. Porém, o PNLT propôs que, até


2025, deveria ser aumentada a participação desses
modais para 32% e 29%, respectivamente.
A problemática regional ainda permanece como
um dos principais entraves ao desenvolvimento No Brasil, as políticas adotadas pelas esferas na-
nacional., pois a característica concentradora do cional e estaduais, nas duas últimas décadas, têm
crescimento econômico brasileiro tem propor- sido marcadas por investimentos insuficientes em
cionado, ao longo do tempo, a formação de uma infraestrutura, principalmente em áreas fundamen-
sociedade com um dos maiores índices mundiais tais como energia, transporte e comunicação, fato
de desigualdade. A região Nordeste do Brasil, pri- que pode, em parte, explicar o baixo desempenho
meiro espaço de ocupação demográfica do país, econômico brasileiro recente. Compreendendo
apresenta, ainda no século XXI, os menores índi- esta necessidade, os governos federal e estadual,
ces de desenvolvimento humano entre as regiões tem desenvolvido diversos projetos e planos para
do Brasil, grande desigualdade de distribuição de
melhoria e expansão da infraestrutura logística
renda e concentração da infraestrutura e atividades
de cargas, com foco nas demandas atuais e fu-
econômicas em sua faixa litorânea, principalmente
turas. Assim é que, no início de 2007, o anúncio,
nas capitais estaduais.
pelo governo federal, do Plano de Aceleração do
Diversos estudos têm enfatizado o papel dos gastos Crescimento (PAC) trouxe de volta as discussões
em infraestrutura como variável determinante para sobre as carências e deficiências da infraestrutura
o crescimento econômico, destacando a relação brasileira e os obstáculos que estas representam ao
entre produtividade e investimentos públicos, par- crescimento e desenvolvimento econômico.
ticularmente os investimentos em infraestrutura de
Neste contexto, é importante compreender os im-
transportes, e sua capacidade de influenciar ativa-
pactos de novas infraestruturas, como também con-
mente o desenvolvimento de uma região estagnada,
siderar a implantação de novos empreendimentos
possibilitando o aumento de produção e/ou sua
capazes de gerar novos fluxos de grande magnitu-
especialização regional.
de, como também redirecionar os fluxos existentes.
Uma adequada infraestrutura logística para o esco- Em que pese a existência de limites para às possi-
amento da produção pode constituir uma vantagem bilidades de indução do desenvolvimento regional,
competitiva capaz de impulsionar as atividades a perspectiva de grandes projetos e investimentos
econômicas de uma determinada região. Porém, em infraestrutura pode modificar e reorientar a dinâ-
no Brasil, país de dimensão continental, a infraes- mica do desenvolvimento socioeconômico destes
trutura logística para o transporte de cargas ainda espaços. Considera-se de grande importância os
é deficiente, onerando os custos de produção e investimentos propostos dentro do rol dos projetos
comercialização, afetando a competitividade dos previstos no Plano de Aceleração do Crescimento
produtos brasileiros, não só no exterior, mas tam- (PAC 1 e 2), no Programa de Investimentos em
bém no mercado interno. Logística (PIL) e a proposta dos Eixos Logísticos
para o Desenvolvimento do Nordeste, esses últimos
Em 2007, o Plano Nacional de Logística e Trans- anunciados pelo Conselho Nacional de Secretários
portes (PNLT, 2007), propôs uma alteração na Estaduais do Planejamento (CONSEPLAN).
estrutura da matriz de transportes brasileira. Nesse
ano, os modais hidroviário e ferroviário represen- Vale salientar que o momento constitui uma ex-
tavam 13,86% e 20,86% da matriz de transportes, celente oportunidade para avaliar as potenciais

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repercussões das atuais políticas de investimentos 2. Aspectos metodológicos


públicos, facilitando e apontando as possibilidades
de “novos rumos” para o planejamento e desenvol- A elaboração desse estudo embora com foco no
vimento regional. Estado da Bahia, pressupõe um olhar sobre a
realidade do Nordeste brasileiro, possibilitando a
1. Objetivos compreensão da realidade estadual em seu contex-
to regional, assim como o balizamento da avaliação
1.1 Objetivo geral das repercussões dos investimentos estruturantes
no conjunto de investimentos regionais.
Identificar as principais repercussões da
implementação dos novos investimentos em A principal função das avaliações de impacto é a
infraestrutura de transportes no desenvolvi- obtenção de evidências críveis sobre a efetividade
mento socioeconômico do Estado da Bahia, de uma determinada intervenção. Sendo assim,
possibilitando a compreensão da realidade objetivam determinar o modo como estas afetam
estadual em seu contexto regional, assim como os resultados de interesse. Para tanto, buscam
balizar ações potencializadoras ou mitigadoras responder às seguintes perguntas: Uma determi-
dos resultados previstos. nada intervenção é efetiva ao comparar-se com a
hipótese de sua ausência, ou seja, qual é o impacto
1.2 Objetivos específicos
(efeito causal) de uma determinada intervenção
sobre um resultado de interesse?
Identificar as principais repercussões econômi-
cas esperadas ( no médio e longo prazo), com
A peculiaridade do ESTUDO DAS REPERCUSSÕES
a implementação dos novos investimentos em
DOS NOVOS PROJETOS ESTRUTURANTES SO-
infraestrutura de transportes – considerados
BRE O DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO
prioritários e estruturantes – para o desenvol-
DA BAHIA está em que se busca identificar reper-
vimento socioeconômico do Esatdo da Bahia; cussões (econômicas, sociais e espaciais) que
ocorrerão no futuro (no médio e longo prazo), em
• Identificar as principais repercussões sociais
decorrência da implementação, também no futuro,
esperadas ( no médio e longo prazo), com a
de novos investimentos em infraestrutura de trans-
implementação dos novos investimentos em
portes dentro do rol dos projetos e investimentos
infraestrutura de transportes – considerados
previstos pelos governos federal e estaduais, tais
prioritários e estruturantes – para o desenvol-
como aqueles previstos no Plano de Aceleração do
vimento socioeconômico do Esatdo da Bahia;
Crescimento (PAC 1 e 2), no Programa de Investi-
• Identificar as principais repercussões espaciais mentos em Logística (PIL) e na proposta dos Eixos
esperadas ( no médio e longo prazo), com a Logísticos para o Desenvolvimento do Nordeste,
implementação dos novos investimentos em esse último anunciado no âmbito do Conselho Na-
infraestrutura de transportes – considerados cional de Secretários Estaduais do Planejamento
prioritários e estruturantes – para o desenvolvi- (CONSEPLAN).
mento socioeconômico do Esatdo da Bahia; e
Sendo assim, nesse estudo, propõe-se uma adap-
• Oferecer subsídios à formulação e/ou refor- tação na metodologia utilizada para as avaliações
mulação das políticas públicas para o Estado de impacto de intervenções já implementadas..
da Bahia. A adaptação será realizada no sentido de que as

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relações causais entre os novos investimentos em seguintes atividades: i) Seleção dos investi-
infraestrutura de transportes e suas repercussões mentos estruturantes e complementares; ii)
socioeconômicas e espaciais sejam definidas a Metodologia de seleção de informações sobre
partir da construção de cenários futuros. Em sín- os investimentos pesquisados; iii) Definição
tese, ao invés da identificação da relação causal dos agrupamentos de investimentos para
a partir de fatos já verificados, busca-se identificar análise das repercussões socioeconômicas;
– a partir de uma revisão da literatura, da definição e iv) Mapeamento dos agrupamentos de in-
clara da cadeia de resultados e de estimações de vestimentos.
indicadores confiáveis – as possíveis repercussões
socioeconômicas e espaciais (no médio e longo 2.2.1 Seleção dos investimentos
estruturantes e complementares
prazo) no desenvolvimento do Estado da Bahia.
Inicialmente, deverá ser elaborada uma
Sendo assim, conforme será apresentado a seguir,
relação preliminar de investimentos
o desenvolvimento desse estudo está divido em
dentre aqueles previstos pelo governo
quatro etapas principais:
federal e estadual e, a partir dessa lis-
2.1 Etapa 1 - Atividades preliminares ta, serão realizados contatos com os
órgãos públicos para eleição dos pro-
Essa fase tratará do detalhamento e ajustes jetos estruturantes e complementação
dos conteúdos, metodologia e cronograma a do rol preliminar de investimentos a
serem desenvolvidos no decorrer do trabalho, serem pesquisados. Para essa seleção
assim como a definição das bases de dados e serão cotejados os principais progra-
fontes de informação. mas e propostas de investimentos em
infraestrutura de transportes nacional
2.2 Etapa 2 - Identificação e caracterização e para o Estado da Bahia, compondo
dos investimentos selecionados para o um rol de investimentos públicos para
estudo o horizonte compreendido entre os
anos de 2010 a 2020. Os investimentos
Trata-se da identificação e caracterização do
selecionados serão aqueles previstos
elenco de investimentos considerados estrutu-
pelo governo federal e estadual, princi-
rantes – e a respectiva infraestrutura existente
a estes relacionados ou investimentos futuros palmente aqueles anunciados em três
complementares – e descritas suas principais planos/programas principais, são eles:
características, que servirão de base para a i) Plano de Aceleração do Crescimento
análise das principais repercussões de tais (PAC 1 e 2); ii) Programa de Investimen-
investimentos sobre o desenvolvimento socio- tos em Logística do governo federal;
econômico estadual. Busca-se da definição do e iii) Proposta dos Eixos Logísticos
rol de investimentos com um elevado grau de para o Desenvolvimento do Nordeste,
complexidade e sobre os quais espera-se gran- anunciada pelo Conselho Nacional dos
de impacto socioeconômico – considerando a Secretários Estaduais do Planejamento
sua relevância isoladamente ou como compo- (CONSEPLAN). Além disso, será feita
nente de um agrupamento – na transformação uma referência à ausência de investi-
do desenvolvimento estadual e/ou regional. mentos para o Estado da Bahia dentre
Com essa finalidade serão desenvolvidas as os projetos previstos pela agenda da

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Iniciativa para a Integração da Infra-es- • Cronograma do projeto, contendo da-


trutura Regional Sul-Americana (IIRSA). tas de início das obras e conclusão; e

2.2.2 Coleta e sistematização das informa- • Explicitação dos benefícios gerados


ções sobre os projetos estruturantes segundo os agentes responsáveis
selecionados pelo próprio projeto (incluindo as
metas anunciadas, se houver).
Definidos os investimentos a serem
avaliados, se procederá à coleta de Complementando esse procedimento
informações, que possam caracteriza- será realizado mapeamento dos pro-
-los e fundamentar a avaliação. Essas jetos com os respectivos registros na
informações serão complementadas base cartográfica da Bahia, utilizando
com pesquisa na internet e outras fon- programa de geoprocessamento.
tes, visando contemplar os seguintes
aspectos: 2.2.3 Agrupamento dos projetos

• Descrição das principais característi- Sempre que pertinente, serão criados


cas do investimento, tais como tipo de grupos de projetos que configurem con-
modal (ex. porto, ferrovia ou hidrovia), juntos sinérgicos, cujas externalidades
localização/traçado, demanda atendi- possam constituir um sistema capaz de
da e fonte de financiamento, natureza apresentar melhores respostas do que
jurídica/ vínculo administrativo (ex. pu- o desempenho isolado dos projetos que
blico, privado, concessão ou parceria o compõem. Os critérios utilizados para
público-privada); a proposição de agrupamentos serão: i)
a existência de demandas específicas
• Estágio ou fase atual do investimento
por transporte; ii) as afinidades das car-
(ex. em concepção, projeto básico/
gas (e passageiros) às modalidades de
executivo elaborado, em execução
transporte/movimentação em terminais
ou obras interrompidas), incluindo
contemplados nesses agrupamentos;
respectivas explicações relacionadas
iii) sinergia entre os projetos; e iv) com-
às pendências;
partilhamento de áreas de influência
• Discriminação da instituição respon- geográfica.
sável pelo desenvolvimento e acom-
panhamento da execução do projeto; 2.3 Etapa 3 - Elementos para
Fundamentação
• Existência de articulação com outros
projetos - indicar investimentos que Nesssa etapa serão contempladas as seguin-
possuam relações de complementa- tes atividades de forma a identificar os elemen-
ridade espacial e econômica; tos e indicadores que balizarão as avaliações

• Custo do investimento, considerando 2.3.1 Fundamentação teórica


todas as fases até sua operação, seja
esse resultado de uma estimativa ou A partir de revisão bibliográfica serão
orçamento detalhado; identificadas e sistematizadas as prin-

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cipais referências e experiências que • Pesquisa Agrícola municipal (PAM);2


descrevem os resultados relacionados
aos investimentos em infraestrutura, • Evolução do emprego, por setor de
atividade e por Município3;
considerando as modalidades a serem
avaliadas. • Taxa de crescimento da população
total, urbana e rural, e grau de urba-
2.3.2 Especificação da cadeia de causali- nização para os Municípios baianos,
dade teórica segundo os Censos Demográficos de
1991, 2000 e 2010; e
Com base nessas referências, serão
especificados os possíveis nexos de Levantamento dos principais investi-
causalidade, do ponto de vista teórico, mentos públicos e privados realizados
por tipo de investimento, de forma a entre os anos de 1991 e 2010 – Essa
direcionar as investigações e análises informação servirá de base para ex-
a serem desenvolvidas nas etapas plicar o desempenho econômico das
subsequentes. regiões identificadas como dinâmicas,
estagnadas e economicamente depri-
2.3.3 Análise da dinâmica econômica baia- midas e identificar possíveis relações
na no período 1991 - 2010 de causa efeito.

Tendo por base dados e indicadores Para fundamentar as análises, os


econômicos para os Municípios do resultados das tipologias serão re-
Estado da Bahia, será traçado um presentados em mapas (com base
panorama da evolução da economia municipal), buscando-se, sempre que
baiana entre os anos de 1991 e 2010, possível, dirigir o foco na perspectiva
de forma a identificar possíveis relações dos grupos dinâmicos e não dinâmi-
com os grandes investimentos públicos cos (estagnados, deprimidos ou em
e privados realizados no Estado nesse recessão), relacionando-os aos fatores
período, ou do período imediatamente causais, sobretudo aos investimentos
anterior. do período de análise, ou ao período
imediatamente anterior.
Para isso será construída uma tipologia
que identifique as regiões dinâmicas, 2.4 Etapa 4 – Análise das repercussões dos
de baixo dinamismo, estagnadas, de- projetos estruturantes sobre a dinâmica
primidas ou em recessão, com base econômica do Estado
nas seguintes informações:
Nessa etapa serão reunidos elementos que funda-
• Produto Interno Bruto (PIB) munici- mentem a construção de perspectivas para o desen-
pal1; volvimento econômico do Estado. Para cumprir tal

2 Informação disponível no Sistema de Dados Estatísticos (SIDE) da Su-


1 nformação disponível nos Censos Demográficos do Instituto Brasileiro perintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI).
de Geografia e Estatística (IBGE) e no Sistema de Dados Estatísticos
(SIDE) da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia 3 Informação disponível na consulta online à base de dados do Relatório
(SEI). Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho.

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objetivo, o método proposto se apoia na análise de • Com o objetivo de parametrizar a


referências do passado recente do Estado da Bahia, análise das repercussões dos in-
identificando possíveis nexos entre o desenvolvi- vestimentos estruturantes, deverão
mento e os grandes investimentos, principalmente ser configuradas perspectivas para
os de infraestrutura de transportes, assim como a economia baiana considerando
na construção de parâmetros de desenvolvimento o conjunto de investimentos e parte
macroeconômicos, de forma a balizar a construção deles. Como resultados dos debates
de perspectivas para o desenvolvimento, a partir deverão ser sistematizadas as prin-
dos investimentos em foco. cipais perspectivas que balizarão a
análise das repercussões econômi-
A seguir apresenta-se uma breve descrição das cas, destacando os seguintes pontos:
seguintes atividades a serem desenvolvidas: i)
Análise prospectiva da economia; e ii) Avaliação • Perspectivas de crescimento da pro-
dos investimentos propostos. dução, na hipótese de não implemen-
tação do investimento estruturante;
2.4.1 Análise prospectiva da economia
• Perspectivas para os fluxos da produ-
Com o objetivo de parametrizar a análi- ção, atuais e futuros; e
se das repercussões dos investimentos
estruturantes selecionados, deverão • Identificação dos investimentos
ser definidas perspectivas para o de- públicos e privados associados às
senvolvimento econômico do Estado perspectivas para o desenvolvimento
da Bahia, tomando como referência o econômico do Estado da Bahia.
contexto mundial.
2.4.2 Avaliação dos investimentos propostos
Com essa finalidade serão promovi-
dos seminários, no qual especialistas Para cada um dos investimentos estru-
irão debater possíveis repercussões turantes em infraestrutura de transpor-
da nova dinâmica global e nacional tes selecionados, e admitindo como
na economia baiana, identificando diretriz as teorias da mudança e cadeia
possíveis caminhos na direção de um de resultados identificados em etapa
desenvolvimento com inserção positiva, anterior, serão delineados cenários
sustentável e inclusivo, focando nos futuros, especificamente em relação às
seguintes debates: repercussões econômicas e espaciais,
a partir da definição da cadeia de resul-
• A partir das perspectivas de cresci-
mento da produção baiana, quais as tados e de estimações de indicadores.
limitações da capacidade produtiva?
Construção
• Quais os cenários de exportação, Construção Estimação
de
da Cadeia de de
frente as estratégias e crise mundial? Cenários
Resultados Indicadores
Futuros

• Como a infraestrutura logística baia- Figura 1


na irá se relacionar com a rede de Estrutura lógica de avaliação dos projetos estruturantes
infraestrutura logística nordestina e selecionados
nacional? Fonte: Elaboração própria.

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2.4.3 Construção da cadeia de resultados • Identificação dos principais resulta-


dos esperados decorrentes dos in-
Apoiado nas teorias de mudança e ca- vestimentos/agrupamentos previstos;
deias de resultados teóricas, por moda-
lidade de investimento, serão montadas • Zoneamento das áreas de produção
as cadeias de resultados esperados na área de influência direta (AID);
para os agrupamentos de projetos.
• Cenários de crescimento da produção
2.4.3.1 Delimitação da área de influência dos sem o investimento;
projetos
• Cenários para os fluxos da produção; e
Utilizando-se a base cartográfica, serão
definidas as áreas de influência direta e • Identificação de Investimentos pri-
indireta dos investimentos selecionados vados e públicos associados aos
para o estudo, compreendida como a cenários..
área que de alguma forma recebe e
exerce influência sobre o investimento, 2.4.3.4 Síntese das análises
quanto aos aspectos socioeconômicos.
Para essa atividade serão definidos cri- Nessa atividade serão sistematizadas
térios conforme o tipo de infraestrutura. as principais avaliações, comparando
a situação atual e a situação com a
2.4.3.2 Estimação dos indicadores seleciona- implantação dos projetos programados.
dos
2.5 Etapa 5: Análise das repercussões dos
Visando parametrizar as análises, serão
projetos estruturantes sobre a dinâmica
descritas e qualificadas as repercus-
social
sões dos projetos sobre a produtividade
e a renda, considerando os seguintes Com essa análise busca-se compreender a
aspectos:
capacidade que cada agrupamento de ações
• Emprego gerado e perfil da mão-de- possui em dinamizar os circuitos inferiores
-obra, da economia, amenizando, assim, as condi-
ções da pobreza, e suas implicações sobre
• Renda gerada; o desenvolvimento das cidades, na área de
influência dos projetos. Busca-se avaliar se
• Repercussão sobre as cadeias pro- alem dos benefícios econômicos relacionados
dutivas; e aos projetos, se esses também podem ser
capazes de criar oportunidades de melhoria
• Possibilidade de complementação
das condições de vida das populações, ou
com outros investimentos.
ainda possam constituir fatos geradores de
2.4.3.3 Construção de cenários futuros novas demandas urbanas, contemplando as
seguintes atividades:
Serão sistematizadas as seguintes in-
formações para subsidiar essa análise • Identificação de descrição de possíveis
prospectiva e a construção de cenários repercussões – serão descritas e qualifica-
futuros: das as repercussões dos projetos sobre as

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condições de vida da população da área de HADDAD, Eduardo Amaral. Transporte, eficiência e


influência direta dos projetos, considerando desigualdade regional: avaliação com um mode-
os circuitos inferiores da economia e possí- lo CGE para o Brasil. IPEA. 2006. Disponível em:
veis impactos na rede urbana; http://ppe.ipea.gov.br/index.php/ppe. Acesso em:
10/09/2012.
• Seleção de Indicadores – indicação dos
indicadores possíveis de mensuração das IBGE. Participação das Grandes Regiões e
repercussões, ou mesmo de análise qualita- Unidades da Federação no Produto Interno Bruto
tiva das transformações indicadas; – 1995 a 2009. Disponível em: http://www.ibge.gov.
br/home/estatistica/economia/contasregionais/2009/
• Avaliação dos Indicadores Selecionados – defaultrepond_zip.shtm. Acesso em: 22/08/2012.
análise qualitativa e quantitativa das reper-
cussões sociais na área de influência dos IPEADATA. Número de pessoas pobres – 2002 a
projetos, considerando, dentre outros, os 2009. Disponível em: http://www.ipeadata.gov.br/.
seguintes aspectos: Acesso em: 22/08/2012.

• Geração de renda; MACHLINE, Claude. Cinco décadas de logística


empresarial e administração da cadeia de supri-
• Ampliação da demanda sobre infraestrutu- mentos no Brasil. Rev. adm. empres., São Paulo,
ra regional e urbana; e v. 51, n. 3, June 2011 . Disponível em: http://www.
scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-
• Capacidade de cada agrupamento de
-75902011000300003&lng=en&nrm=iso>. Acesso
projetos em dinamizar os circuitos inferio-
em: 18/10/2012.
res da economia, amenizando, assim, as
condições da pobreza, e suas implicações PORTO, Edgard; Carvalho, Ilce; Braunstein, Leib.
sobre o desenvolvimento das cidades, na Constrastes e desigualdades da integração física
área de influência dos projetos, ou seja, sulamericana: e o Nordeste do Brasil, para onde
busca-se avaliar as repercussões para além vai? XII Seminário Internacional RII, Belo Horizonte,
dos benefícios econômicos relacionados 2012.
aos projetos.
BAHIA. Secretaria de Infra-Estrutura. PELTBAHIA –
Programa Estadual de Logística de Transportes:
REFERÊNCIAS caminhos para o desenvolvimento. Secretaria de
Infra-Estrutura. Salvador, 2004.
GERTLER, P.J.; MARTÍNEZ, S.; PREMAND, P.;
RAWLINGS, L. B.; VERMEERSCH, C. M.. La eva- BRASIL. MINISTÉRIO DOS TRANSPORTES. Pla-
luación de impacto en la práctica. World Bank. no Nacional de Logística e Transportes - PNLT.
2010. Disponível em: http://siteresources.worldbank. Secretaria, Brasília, 2007. Disponível no site http://
org/INTHDOFFICE/Resources/IEP_SPANISH_FI- www.transportes.gov.br/conteudo/3280, em
NAL_110628.pdf. Acesso em: 27/08/2012. 15/10/2012.

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Caderno de Estudos – Para cada pesquisa são apresentados os objetivos


Desenvolvimento Social em de avaliação, as instituições envolvidas, os procedi-
mentos metodológicos e os principais resultados.
Debate. Síntese das pesquisas de
Avaliação de Programas Sociais Esse volume dá continuidade à sequência de publi-
do MDS cação de sínteses das pesquisas publicadas nesses
dez anos de existência do MDS. Em 2007, no volume
5 desta série, foram registradas as fichas-resumo

de pesquisas de 2004 a 2006. No volume 13, publi-


nº 5 – 2004-2006
1 cado em 2010, foram organizadas as informações
nº 13 – 2006 - 2010 relativas ao período entre 2006 e 2010.

nº 16 – 2011 - 2014 Esse conjunto de sínteses de pesquisas é um ma-


terial valioso para diferentes públicos e propósitos.
Editora: MDS Para gestores, técnicos e conselheiros das políticas
ISSN: 1808-0758 sociais, esse material traz insumos para refletir as
práticas cotidianas de gestão, desafios e dificul-
A série Cadernos de Estudos Desenvolvimento So- dades enfrentadas. Para pesquisadores, trata-se
cial em Debate visa divulgar avaliações e estudos, de um acervo de estudos e dados empíricos para
disseminar resultados de pesquisas e subsidiar uso e contextualização do estado da técnica e da
discussões acerca das políticas, programas, ações investigação em temáticas específicas das políti-
e serviços sociais. cas sociais no Brasil. Para a sociedade brasileira,
jornalistas e agentes de outras políticas públicas,
O número 16 da série apresenta a síntese das pesqui- esse conjunto de evidências aportadas nos estudos
sas de avaliação dos programas sociais do Ministério avaliativos trazem subsídios robustos para avaliação
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) do esforço governamental para a superação de
que foram concluídas entre 2011 e março de 2014. iniquidades sociais do País nos últimos dez anos.

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Revisa Brasileira de Monitoramento e Avaliação (RBMA), com apoio da


Monitoramento e Avaliação Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
Fome (SAGI/MDS).

Perseguindo sempre o
objetivo de proporcio-
nar uma visão plural,
integrada e multidisci-
plinar, a revista ofere-
ce novos espaços para
publicação de trabalhos
no campo de M&A, cada
vez mais frequentes em
função do avanço da cul-
tura de formulação, mo-
nitoramento e avaliação
de políticas e programas
no Brasil.

A revista busca criar


oportunidades para o
registro e intercâmbio de
estudos de distintas na-
turezas – conceitual, me-
todológica e aplicada – e
diferentes abordagens
de pesquisa empírica
– qualitativa, quantitati-
va, quase-experimental,
estudos de casos, entre
outros. L ançada em
2011, a revista possui seis números publicados,
reunindo um conjunto de artigos e contribuições
Editora: MDS
2 ISSN: 2236-5877
variadas, além de resenhas, ensaios e entrevistas.

A Revista Brasileira de Monitoramento e Avaliação


tem a proposta editorial de disseminar experiências
em monitoramento e avaliação (M&A) em políticas
públicas, programas e projetos sociais no Brasil
e no mundo. É uma iniciativa de pesquisadores,
técnicos e colaboradores da Rede Brasileira de

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