16° Ergodesign – Congresso Internacional de Ergonomia e Usabilidade de
Interfaces Humano Tecnológica: Produto, Informações Ambientes
Construídos e Transporte
16° USIHC – Congresso Internacional de Ergonomia e Usabilidade de
Interfaces Humano Computador
CINAHPA | 2017 – Congresso Internacional de Ambientes Hipermídia
para Aprendizagem.
A CONSTRUÇÃO DE SIGNIFICADO NA HIPERMÍDIA
THE CONSTRUCTION OF MEANING IN HYPERMEDIA
Luiz Roberto Carvalho1, M. Sc.
Alice Theresinha Cybis Pereira2, PhD.
(1) Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
e-mail: semprecarvalho@gmail.com
(2) Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
e-mail: acybis@gmail.com
Hipermídia, Ciberespaço, Ambientes Interativos
A hipermídia é uma forma híbrida de representação e comunicação resultante da comunhão de processos
indissociáveis, mesclados, mas distintos - o sonoro, o visual e o verbal. Com base na sua tríade, formada por som,
imagem, e hipertexto -, é possível assinalar os ambientes interativos como um análogo da linguagem, porém,
expresso num nível tecnológico superior. Essa perspectiva valida a hipermídia como um meio de comunicação que
se assemelha às formas mais primitivas de interação humana, conferindo as interfaces digitais como dispositivos
capazes de estabelecer relações cognitivas que independem da perspectiva linguística para que a comunicação
ocorra. O presente estudo objetiva pontuar o fenômeno da comunicação na hipermídia, caracterizando suas
correspondências sensoriais, estruturais e tecnológicas, a partir de uma abordagem sistêmica da sua morfologia, que
é composta pela sintaxe, forma e discurso. Nesse sentido, ao perspectivar a hipermídia numa visão holística, é
possível verificar a sinergia e a co-dependência pertinente aos seus processos e componentes.
Hypermedia, Cyberspace, Interactive Environments
Hypermedia is a hybrid form of representation and communication resulting from the communion of inseparable,
merged, but distinct processes - sound, visual and verbal stimuli, represented by hypertext. Based on its triad,
formed by sound, image, and hypertext, it is possible to point the interactive environments as an analogue of
language, but expressed at a higher technological level. This perspective validates hypermedia as a means of
communication that resembles the most primitive forms of human interaction, pointing the digital interfaces as
devices that can establish cognitive relations that does not need the linguistic perspective to communicate. The
present study aims to characterize the communication phenomenon in hypermedia, characterizing its sensorial,
structural and technological correspondences, from a systemic approach of its morphology, that is composed by
syntax, form and discourse. In this sense, when looking at hypermedia in a holistic view, it is possible to verify the
synergy and co-dependence pertinent to its processes and components.
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1 A Linguagem Pré-Discurso dos Ambientes
Interativos
Utilizando-se dos mais variados recursos acerca da
língua e da linguagem, o homem vem, cada vez
mais, criando meios para suprir suas necessidades
de se comunicar e interagir com o mundo que o
cerca, e assim ampliar seus conhecimentos.
[GALLI, 2010] coloca que cada tipo de linguagem
apresenta sua natureza, manifestando-se por
diferentes tipos de elementos linguísticos e, através
deles, extralinguísticos1, apontando suas
características e especificidades, que são passíveis
de reconhecimento. Grande parte dos avanços
tecnológicos está no processo evolutivo da
comunicação, conduzindo-se para uma maior
democratização da informação, e,
consequentemente, do saber.
A linguagem dos gestos2 é considerada a primeira
ferramenta de comunicação do homem, enquanto o
discurso é definido como um recurso secundário. A
comunicação não verbal é popular, por exemplo,
em cenários como o diálogo entre mães e seus
recém-nascidos, na comunicação com animais, e
em ambiente de idioma desconhecido, pois atua no
reforço da capacidade de persuasão de expressões,
e nas demais situações quando a voz não funciona
como única ferramenta comunicativa. De maneira
geral, pode-se dizer que o objetivo da ação
comunicativa está na transferência de mensagens
compatíveis para a criação de uma linguagem
comum, a fim de alcançar uma compreensão mútua
entre emissor e receptor.
[BRESKIN, 2010] aponta que a cultura humana se
originou a partir do surgimento de sinais e sistemas
de signos - a linguagem. O autor se refere à
linguagem como um modo de acumulação de
informação exclusivamente peculiar à sociedade
humana. Assim, a cultura humana foi aceita como
um sistema secundário (o sistema primário é a
1
Diz respeito aos aspectos não relativos ao sistema linguístico ou à
linguística, tais como o gesto, o olhar, a postura. Em suma, às ações
direcionadas a um objetivo de comunicação [DASCAL, 2006].
2
Linguagem corporal e entonações de voz representam recursos
completos de informações transferidas [GALLI, 2010].
linguagem natural, não apreendida) e desenvolvida
através de uma combinação de signos e linguagem
por conta da capacidade biológica do ser humano
para identificar sinais e sistematizá-los
linguisticamente. Enquanto adquiria os conceitos
básicos da linguagem, o homem antigo transferia
informações para sua tribo representando objetos
reais através de desenhos, e referindo-se a eles
através de movimentos imitativos, como na dança,
ou pela emissão de sons, através da música.
Etimologicamente, tais manifestações folclóricas,
como arte visual, música e dança, remetem,
portanto, a objetos, sons e cenários vivenciados
pelo homem primitivo:
“Nas sociedades orais, as informações eram consumidas
na mesma esfera espaço-temporal em que eram
produzidas, razão pela qual os anciãos eram
considerados depositários vivos da memória social,
pois, através deles, as informações poderiam ser
consumidas em momentos posteriores à sua produção”
[ALZAMORA, 2007, p.76].
Ao aplicar a mecânica de formação de símbolos
(em tradução livre) proposta por [BRESKIN,
2010], chega-se à seguinte constatação: através da
descrição de um objeto por meio de movimentos e
gesticulações, com o uso de representações
gráficas, como desenho, e expressão vocal, cria-se
um sinal complexo multimídia, um símbolo. Este
sinal complexo é um conceito que, exposto a um
processo de homogeneização (ou nivelamento)
para que haja sua circulação prática, perde alguns
de seus elementos excessivos, e gradualmente
transforma-se num sinal vocal. Posteriormente,
esse sinal vocal integra-se ao discurso linguístico e
passa a ser representado através de uma palavra.
Conclui-se então que a transição de signos
complexos para o discurso verbal foi um longo
processo psicolinguístico de abstração da
“consciência pictórica” e da semiótica corporal
para sinais fonéticos sobre as bases de
denominações de sons disponíveis que, por sua
vez, começaram a desempenhar um papel ativo na
formação de palavras. Nesse contexto, o processo
de vocalização que definiu o som como uma
ferramenta básica de comunicação influenciou
significativamente na validação do mundo como
um todo, pois possibilitou o surgimento das
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relações interpessoais através da linguagem. A
partir desta etapa, a criatividade oral ganhou seu
sentido verdadeiro e pleno. Num período em que o
discurso foi envolvido em muitas funções de troca
de informações, o homem antigo alcançou uma
nova experiência estética com o uso habitual dos
fundamentos expressivos da língua. Os modos de
percepção3, transferência e armazenamento de
informações foram otimizados, e tornou-se
possível o registro e o resgate de distintas
manifestações folclóricas (gestos, linguagem
corporal e sons) de maneira sistemática e ordenada,
através da linguagem.
imagem, movimento e som -, é possível assinalar
os ambientes digitais interativos como um meio
análogo de linguagem pré-linguística expresso
num nível tecnológico superior. Essa perspectiva
valida a hipermídia como um meio de
comunicação que se assemelha às formas mais
primitivas de interação humana, assinalando as
interfaces5 digitais como dispositivos capazes de
estabelecer relações cognitivas que independem da
perspectiva linguística para que a comunicação
ocorra.
Nessas novas configurações comunicativas, o
homem desenvolveu-se prioritariamente em torno
do signo verbal, subordinando a ele diferentes
classes de signos - da visualidade, da sonoridade,
da espacialidade e da cinética. Desse modo, as
formas de representação gráfica, musical e
corporal mantiveram-se num status de realidade
primária até o momento em que deixam de ser
utilizadas devido ao pleno desenvolvimento e
distribuição de uma linguagem de expressão vocal.
Sendo a linguagem o principal sistema de
modelação da cognição, imagem, música e dança,
gradualmente desenvolveram-se como arte4, não
sendo mais dedicados às suas históricas funções
linguísticas, passando a ser considerados elementos
pré-linguísticos.
Como um dos mais tradicionais meios de
expressão da linguagem, os livros têm sido o
método primário para fornecer informação. Sua
estrutura interna tem se mantido a mesma,
consistindo-se em índice, capítulos, glossário. Com
o surgimento das interfaces digitais, permitiu-se
que a informação fosse reestruturada em sistemas
que estão mais próximos do que os livros da
maneira como processamos as informações
recebidas por nossos órgãos sensoriais. Nesse
contexto, o fenômeno da Interação HumanoComputador possibilita experiências de
engajamento sensorial que otimizam as habilidades
humanas de acessar e processar informações.
Esta multimedialidade expressiva no período prédiscurso nos permite traçar um paralelo com a
dinâmica da Interação Humano-Computador, e
assim contextualizar a interatividade nos ambientes
digitais. Com base nos componentes da sua tríade 3
Do latim perceptio, percepção é a organização, identificação e
interpretação de informações sensoriais, a fim de gerar uma
representação mental através de um processo de transdução, no qual
sensores no corpo humano transformam sinais do ambiente em sinais
neurais codificados. Este processo de atividade neural cíclica utilizase de estímulos físicos e molda-os em relação à memória, expectativa
e aprendizagem individual [SCHACTER 2011].
4
2 Hipermídia e Ciberespaço
O ciberespaço é um contexto complexo no qual
ocorrem relações que envolvem a troca de
informação e conhecimento, sendo considerado
como todo e qualquer espaço informacional
multidimensional que, dependente da interação do
usuário, o permite acessá-lo, manipulá-lo, e
transformá-lo através do intercâmbio de seus
fluxos codificados de informação. A tradução desse
espaço em ambientes navegáveis é a hipermídia,
definida como uma linguagem a partir da qual se
torna possível propor aos usuários novas formas de
comunicação e novos paradigmas cognitivos. Em
uma definição sucinta, [SANTAELLA, 2009, p.
48] conceitua hipermídia como “a integração, sem
suturas, de dados, textos, imagens, e sons, dentro
de um único ambiente de informação digital”.
A arte pode ser considerada um sistema secundário - em outras
De acordo com [CAVALCANTE, 2010, p.200], “por interface
palavras, um análogo da realidade, traduzido para o sistema principal
5
da linguagem através de signos.
entende-se a superfície de acesso e troca de informação”.
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Dentre as principais características da hipermídia
tem-se a possibilidade de apropriar-se de distintas
linguagens, processos, códigos e mídias. Essa
hibridização6 requer uma reorganização do modelo
cognitivo do usuário, como aponta [SANTAELLA,
2009, p. 37] ao afirmar que “a navegação no
ciberespaço e em outros ambientes hipermídia
envolve a transformação perceptivo-cognitiva do
leitor tradicional”. Na prática, hibridizar
linguagens significa, por exemplo, criar interfaces
que possuam imagens, textos e sons, de modo que
a soma destes elementos resulte na formação de
uma unidade semântica. Esta mistura de
linguagens possibilita ao usuário uma “leitura
sinestésica” ligada não somente à mensagem
proposta, mas também ancorada ao seu repertório
de experiências culturais e sensoriais. Por utilizar
distintas mídias, a hipermídia pode ser descrita
como um agrupamento de subprojetos que podem
passar desde a simples criação de um texto à
elaboração complexa de animações e vídeos
interativos, baseados em realidade virtual7:
6
O significado de híbrido tem sua origem no campo da biologia e
define o indivíduo resultante do cruzamento de duas espécies
diferentes. Analogamente, no contexto das linguagens aplicadas ao
ciberespaço, o hibridismo passa a ser o termo que melhor define a
miscigenação de linguagens, sejam estas visuais, verbais e sonoras,
que se fazem presentes em ambientes interativos [SANTAELLA,
2009].
7
Realidade Virtual (RV) pode ser definida como um sistema
“Quando o usuário “pilota” o computador, ele está
sempre dentro de um espaço informacional, um
ambiente de signos híbridos no qual imagens, gráficos,
desenhos, figuras, palavras, textos, sons e mesmo vídeos
misturam-se na constituição de uma metamídia. Ora, a
profusão híbrida de signos que povoam as telas não é
uma profusão aleatória. Essa profusão está estruturada
em nexos (links) ou atalhos, que, uma vez acionados,
levam o usuário a saltar de uma página a outra, de um
campo a outro, de uma informação a outra. [...] Isso é
chamado de hipermídia, a linguagem própria dos
ambientes informacionais que foram batizados no
ciberespaço” [SANTAELLA, 2009, p.144-145].
Diferentemente de estruturas lineares que
implicam na continuidade e têm início e fim
delimitados, interfaces híbridas propõem
ambientes nos quais as informações são dispostas
de forma a possibilitar que o discurso ocorra em
várias direções. Este fluxo de informação ocorre
numa estrutura ramificada e não sequencial por
meio do hipertexto, e está diretamente relacionado
à navegação8, visto que é através dos links
propostos nas estruturas hipertextuais que o
usuário se move nos ambientes interativos:
“Em vez de um fluxo linear de texto como é próprio da
linguagem verbal impressa, no livro particularmente, o
hipertexto quebra essa linearidade em unidades ou
módulos de informação, consistindo de partes ou
fragmentos de textos. Nós e nexos associativos são os
tijolos básicos de sua construção. Os nós são as
unidades básicas de informação em um hipertexto”
[SANTAELLA, 2009, p.50].
informático capaz de criar um universo simulado dentro do qual o
usuário tem a impressão de estar manipulando objetos físicos reais.
Trata-se de um sistema que permite ativar percepções humanas ao
ponto de produzir o mais alto grau de imersão sensória no ambiente
simulado. A realidade virtual se constitui na extensão máxima do
ciberespaço [SANTAELLA, 2009]. Nesse contexto, [Blauert, 2006]
enfatiza que o significado da palavra "virtual" é muitas vezes
erroneamente interpretado como "fictício". O significado original da
palavra é, no entanto, "existente em termos de seu poder", ou seja,
"eficaz" (do latim virtus, que significa energia, potência). Se uma
realidade virtual, ou mesmo uma realidade real é tomada como
ilusória ou real, esta depende da percepção do observador. Para o
autor, um ambiente é tomado como verdadeiro quanto mais o
observador é exposto a este e assim adquire uma sensação de imersão
e presença (por presença, entenda-se a sensação de fazer parte deste
ambiente).
O hipertexto é o elemento básico da linguagem da
hipermídia, e através do link, ou nó, que é sua
unidade de estrutura de informação, constitui-se
numa forma fragmentada e descentralizada de
distribuição de informação. A navegação nos
ambientes hipermidiáticos se constrói por
percursos através de sequências de links, na forma
8
[Garret, 2011] define o design de navegação como uma forma
especializada de design de hipermídia destinado à apresentação de
espaços de informação, apontando que o mesmo deve cumprir com
três objetivos simultâneos: a) fornecer aos usuários um meio para ir de
um ponto a outro; b) comunicar a relação entre os elementos da
interface; c) comunicar a relação entre o conteúdo e a página que o
usuário está visualizando no momento.
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de textos, imagens, sons, vídeos, sendo que há uma
lógica de conexão e coerência percebida pelo
usuário cumulativamente no decorrer de sua
trajetória. Como resultado, o papel do usuário
torna-se cada vez mais ativo, tendo em vista que
uma diversidade de caminhos sobre a informação
pode ser tomada, e a maneira como o conteúdo é
disponibilizado pode ser controlada.
Ao relacionar unidades de informação de natureza
distinta (imagética, sonora e verbal) numa estrutura
interativa, a malha hipertexual cria um paradigma
cognitivo que ultrapassa as possibilidades
oferecidas pelos gêneros multimodais tradicionais.
Esse potencial comunicativo diferenciado pode
favorecer a construção de mensagens através da
utilização de distintas modalidades sensoriais,
favorecendo assim a apreensão de uma mesma
informação por usuários com modelos cognitivos
distintos. Sendo a hipermídia o resultado da
combinação consistente e equilibrada de elementos
hipertextuais e multimidiáticos, a eficácia da
comunicação neste meio deve-se principalmente à
capacidade de articulação, superposição e
combinação dessas linguagens:
“[…] no ciberespaço existem processos de inferência e
raciocínio que funcionam como rotas mentais
condutoras da atividade de navegação. Esses processos
inferenciais são inseparáveis da riqueza sensorial das
linguagens multimidiáticas que são próprias da
hipermídia, na sua junção do verbal, do visual, e do
sonoro. Isso traz como consequência a indissolubilidade
entre a sinestesia, vários sentidos sendo estimulados ao
mesmo tempo, a consequente densidade perceptiva e as
complexas atividades mentais” [SANTAELLA, 2009, p.
131].
2.1 O Design de Hipermídia
O desenvolvimento de um projeto de hipermídia é
um processo complexo, evidenciado
principalmente pela interdisciplinaridade
pertinente ao processo. [BAETA NEVES, 2006]
coloca que, para comunicar, a hipermídia necessita
engajar seu público em sua própria dinâmica de
virtualidades. A interface deve estabelecer relações
formais e funcionais que tornem possível prever a
configuração e a organização de informações
verbais, visuais, sonoras, sinestésicas, de interação
e navegação. [MOURA, 2003, p.159] elucida tal
constatação, ao conceituar design de hipermídia
como:
“[...] uma atividade que diz respeito à aplicação e ao
conhecimento de diferentes linguagens de expressão e
de comunicação e suas possibilidades de inter-relação.
Lida com diferentes tipos e procedências de imagens,
textos e sons, onde é necessário o domínio e
conhecimento dos procedimentos e elementos
projetuais, técnicos e tecnológicos, bem como as
relações e questões do ciberespaço e as pertinentes ao
usuário.”
A consolidação do ciberespaço representa uma
mudança de paradigma no processo de formação
dos profissionais que atuam na produção de
sistemas interativos e exige uma releitura das
habilidades que lhes são ofertadas no ambiente
acadêmico. [BORTOLATO et al, 2010] aponta que
a partir da última década, a discussão dos conceitos
de complexidade e de interdisciplinaridade passou
a ganhar destaque entre os educadores. Dada sua
capacidade de associar diferentes meios e
informações, a hipermídia foi considerada
idealmente adequada para fomentar a
interdisciplinaridade, promovendo uma articulação
dos saberes em toda sua extensão e complexidade:
“No cenário atual de convergência entre as mídias,
profissionais com diferentes perfis têm sido forçados a
dar um passo adiante. Enquanto os produtores de vídeo
estão entrando na área de autoração, território “nativo”
dos programadores de software, por causa do
surgimento do DVD, os profissionais de áudio estão
incorporando funções como edição e captura de
imagens. [...] Estes fatos representam uma ruptura e, ao
mesmo, uma diluição entre as fronteiras tradicionais do
que chamamos de “produtora de vídeo”, “produtora de
áudio”, e “produtora de hipermídia”. Em algum grau,
todas essas empresas estarão vinculadas ao conceito de
hipermídia. Isso não quer dizer que todas elas farão todo
tipo de trabalho [...] O que muda é que haverá
intersecções maiores entre as áreas de atuação das
diversas empresas. [...] E qual é o impacto de todas
essas transformações no processo de produção de
conteúdos audiovisuais para sistemas hipermidiáticos?
Em primeiro lugar, muda o perfil do profissional que,
cada vez mais, precisa estar familiarizado com diversas
linguagens” [SHUM, 2009, p.135-136].
Nesse contexto, ao perspectivar o projeto de design
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de hipermídia numa visão holística, e pontuar a
sinergia e a co-dependência pertinente aos seus
processos, tem-se uma visão projetual abrangente,
que expande o espectro das suas componentes, e
expõe o projeto hipermidiático como a soma de
todos os seus elementos constituintes.
2.2 A Construção de Significado nos Ambientes
Interativos
Na medida em que participa diretamente de um
processo de comunicação, a linguagem da interface
pode ser comparada com a linguagem natural,
tanto em função comunicativa quanto em estrutura,
como um sistema em evolução composto de
elementos e inter-relacionamentos. A construção
deste signo híbrido processa-se em uma tríade
composta pela sintaxe, forma e discurso. A sintaxe
lida com a combinação de diversos elementos,
como textos, figuras, cores e sons. Desse modo, a
sintaxe pressupõe a existência de elementos
(objetos) a serem combinados. Ao traçar esses
elementos (sonoros, imagéticos e linguísticos) em
uma composição, adquire-se uma forma. Esta nada
mais é que a harmonização da sintaxe, expressa na
dimensão da interface. Esta forma cria uma
mensagem, que, através dos links, confere-lhe uma
narrativa, constituindo-a como um discurso, ou
argumento.
sintaxe de seus elementos, constituindo uma
composição através de uma forma que, por meio
do hipertexto, traça um discurso. O que se
desenvolve nesse contexto é um emaranhado de
intersemioses, um encadeamento de intercâmbios
sígnicos dos elementos da sintaxe na confecção de
uma forma que, organizada, caracteriza o discurso.
Entender a construção dessa complexidade
intersemiótica e como esta interage com o usuário
é fundamental para o desenvolvimento de
interfaces ricas em potencialidade de significação.
Nesse contexto, interfaces são apenas fragmentos,
são recortes pelos quais a navegação traça uma
ordem, e dá-lhes um sentido. É na navegação,
portanto, que a característica do discurso mostra-se
evidente. A arbitrariedade do link, ao associar uma
interface à outra, é o que respalda a construção de
um discurso, e confere a hipermídia uma
linguagem própria. [SANTAELLA, 2001, p.115]
assevera que o “[...] traço mais característico do
signo linguístico está na sua arbitrariedade e
convencionalidade”, pois sem a arbitrariedade do
hiperlink, as interfaces são elementos isolados, que
podem ou não ter relações entre si, sendo apenas
fatos brutos, eventos particulares.
O hibridismo sígnico ocorre na hipermídia através
de uma troca entre os princípios lógicos que regem
suas três matrizes de linguagem: sonora, visual e
verbal. Estas linguagens se combinam por meio da
Figura 1: Hibridismo da interface expresso através das
matrizes da sintaxe, forma e discurso.
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A linguagem da hipermídia demanda uma
organização que seja capaz de harmonizar todos os
seus elementos e processos, de modo que as
interfaces contemplem em totalidade suas distintas
matrizes de linguagem, envolvendo as
propriedades das linguagens sonora, visual e
verbal. Nesse contexto, [MARTINEZ, 2004]
assevera que a combinação de meios sonoros,
imagéticos e textuais resulta em saltos de
significação que não podem ser simplesmente
descritos como uma adição. Essas combinações
constituem sistemas sui generis que não se
explicam pela soma de suas partes. Seguindo essa
perspectiva, o que se constata é que unidade da
hipermídia configura-se como sistêmica, isto é, há
um conjunto de agentes com funções específicas
que interagem e se integram na realização da obra.
[VIEIRA, 2007] aponta que existem três
parâmetros classificatórios fundamentais para se
observar um sistema9: sua capacidade de
permanência, seu meio ambiente e sua autonomia.
Ainda dentro dessa perspectiva, para um sistema se
consolidar como tal, existem parâmetros chamados
hierárquicos ou evolutivos delineados, a saber:
composição, conectividade, estrutura,
integralidade, funcionalidade e organização, sendo
todos permeados por um parâmetro que pode
surgir desde o primeiro estágio, a complexidade.
Assim, um sistema é caracterizado por seu
processo temporal e sua capacidade de
crescimento, sendo que a complexidade de tal
movimento se dá pela diversidade de conexões que
são realizadas em prol da sobrevivência do próprio
sistema. Nesse contexto, abordar a hipermídia
como um sistema de signos10 é perspectivá-la
numa dimensão global, como substituto da
realidade natural e como unidade integradora de
subsistemas e códigos que, ao integrarem-se uns
com os outros, perdem parcialmente sua autonomia
de acordo com a função que realizam.
9
[MEISTER, 1999] define sistema como uma entidade composta de
elementos que trabalham juntos - interagem - de modo a atingir um
objetivo que esses mesmos componentes não seriam capazes de
produzir isoladamente.
10
[QUEIROZ, 2010] assinala que um sistema semiótico é um sistema
que produz, transmite e interpreta signos de diferentes tipos.
A hipermídia se apresenta como a articulação entre
organização e complexidade, sendo que uma
ordem complexa só existe se a conexão entre
ordem e desordem existir. Para [LEÃO, 2002], há
complexidade se houver simplicidade, ao
exemplificar que as escolhas aleatórias do usuário
só funcionarão se o sistema for previamente
programado, determinando possíveis ligações a
pontos específicos. Uma pesquisa não sequencial
só é possível porque houve um trabalho prévio,
necessariamente sequencial, e uma rota de
navegação livre, criativa e fluida, fora,
necessariamente, desenvolvida com precisão, rigor
e obediência aos padrões necessários para tornar
tais associações possíveis. A elasticidade dos
sistemas hipertextuais, sua capacidade de expansão
e retração, está diretamente ligada a uma
construção firme, sintética, e blocos sólidos de
informações.
Neste complemento organizacional entre ordem e
desordem, simples e complexo, determinado e
aleatório, sequencial e não-sequencial, livre e
rígido, evidencia-se a dimensão da hipermídia.
Este fenômeno pode ser facilmente observado nos
caminhos da leitura hipertextual, como por
exemplo, quando um usuário percorre um caminho
complexo ao se deslocar entre os links a partir de
um software navegador na web. Apesar da
desordem no percurso, uma ordem oculta está
presente, podendo ser encontrada através do
comando histórico, que refaz a rota completa de
navegação deste usuário. Desse modo, concebemse as noções de organização e complexidade dos
sistemas como uma rota circular ad infinitum.
3 Considerações Finais
Um dos cuidados mais importantes que se deve ter
com sistemas consiste em tentar analisá-los. Os
sistemas devem ser entendidos como um todo que
se articula e só existe como tal, tendo em vista que
ao reduzi-lo às suas partes mais simples,
decompondo-o, este não é mais concebido como
um sistema. Daí o equívoco em analisar as
componentes da interface isoladamente,
negligenciando suas relações com os demais
elementos do sistema. É através dos eixos lógicos
da sintaxe, forma e discurso, e das propriedades
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das linguagens verbal, visual e sonora da interface
que é possível compreender a hipermídia em
totalidade. Nesse sentido, a complexidade do
sistema demanda uma observação dos princípios
organizativos que operam dentro de uma
heterogeneidade formada por componentes
específicos, mas que operam em sinergia.
4 Referências Bibliográficas
ALZAMORA, Geane Carvalho. Fluxos de
informação no ciberespaço – conexões emergentes.
Revista Galáxia, São Paulo, n. 13, p. 75-88, jun.
2007.
BAETA NEVES, Ana Q. Novos Encantamentos:
Design de hipermídia enquanto design de
engajamento. Dissertação de mestrado – PUCRio, 2006.
BLAUERT, Jens. Real Worlds, Virtual Worlds –
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ISCA/DEGA Tutorial & Research Workshop on
Perceptual Quality of Systems, Berlim;
Alemanha, set., 2006.
BORTOLATO, Márcia Melo; PEREIRA, Alice T
Cybis; GONÇALVES, Marília Matos. O uso de
mapas conceituais no design educacional para o
planejamento de hipermídia na educação a
distância. In: Simpósio Hipertexto e Tecnologias
na Educação. NEHTE/UFPE, 2010.
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